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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS
CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DE TECNOLOGIA
DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA DE PRODUÇÃO
Competências Essenciais na Distribuição de carne bovina brasileira para a Europa:
um estudo multicaso
Dissertação de Mestrado
Aluno: José Stamato Neto
Orientadora: Prof
a
. Dr
a
. Rosane Lúcia Chicarelli Alcântara
SÃO CARLOS-SP
Novembro de 2007
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2
Competências Essenciais na Distribuição de carne bovina brasileira para a Europa:
um estudo multicaso
José Stamato Neto
Orientadora: Prof
a
. Dr
a
. Rosane Lúcia Chicarelli Alcântara
SÃO CARLOS-SP
Novembro 2007
Dissertação apresentada à Universidade
Federal de São Carlos, Departamento de
Engeharia de Produção – Área de
Concentração: Gestão da Produção, como
requisito para a obtenção do título de Mestre
em Engenharia de Produção.
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Ficha catalográfica elaborada pelo DePT da
Biblioteca Comunitária da UFSCar
S783ce
Stamato Neto, José.
Competências essenciais na distribuição de carne bovina
brasileira para a Europa : um estudo multicaso / José
Stamato Neto. -- São Carlos : UFSCar, 2008.
214f.
Dissertação (Mestrado) -- Universidade Federal de São
Carlos, 2007.
1. Engenharia de produção. 2. Canais de distribuição. 3.
Carne bovina. 4. Exportação. 5. Estratégia. 6. Competências
essenciais. I. Título.
CDD: 658.5 (20
a
)
~
~ /
".-
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA DE PRODUÇÃO
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS
DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO
Rod. Washington Luís, Km. 235 - CEPo 13565-905 - São Carlos - SP - Brasil
Fone/Fax: (016) 3351-8236 /3351-8237 /3351-8238 (ramal: 232)
FOLHA DE APROVAÇÃO
Aluno(a): José Stamato Neto
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO DEFENDIDA E APROVADA EM 12/11/2007 PELA
COMISSÃOJULGADORA: '
\~~~~Q~"
Profl ora Rosane Lúcia ChicarelWAlcântara
Orientador(a) PPGEP/UFSCar
ÚJV l3c -I-cJL
Prat. Dr. Mário Otávio Batalha
PPGEP/UFSCar
P&. !
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& .
Prot.~~tt~;;;'I~eS e Souza FIlho
PPGEP/UFSCarr \
~~
Prot.Dr.RÕbert~Ant nioMartins
Vice-Coordenadordo PPGEP
3
DEDICATÓRIA
Esta dissertação é dedicada à minha esposa Patrícia, meu filho Pedro,
minha mãe Fúlvia e minha avó Wanda, cada qual com sua importância em minha vida.
Vocês estiveram do meu lado, nos bons momentos e nos momentos mais difíceis. Sem o
apoio e o amor de vocês eu não teria conseguido.
Dedico também àqueles que, infelizmente, se foram e não puderam
compartilhar comigo as alegria e as dificuldades da elaboração desta dissertação. De todo
modo, tenho certeza que torceram muito por mim, onde estiverem: meu pai, José Stamato
Junior; meu padrasto, José Carlos Nogueira; meu avô, Bonaventura Antônio Gravina e
minha avó, Nair da Cunha Stamato.
4
AGRADECIMENTOS
Gostaria de fazer um agradecimento especial à Prof
a.
Dr
a.
Rosane Lúcia
Chicarelli Alcântara pela orientação, incentivo, estímulo, dedicação e apoio.
Agradeço também os professores Mário Otávio Batalha, Hildo Meirelles
e Marcos Fava Neves, pela participação na banca de defesa e pelos comentários valiosos
que enriqueceram o trabalho.
Aos proprietários e representantes das empresas pesquisadas: Wesley
Batista, Joesley Batista, Rogério Bonato e Neila Vieira (JBS-Friboi), Dominic
MacDermot (Bertin) e Raphael Xavier Martin e Janaína Azevedo (Quatro Marcos).
À Universidade Federal de São Carlos, em especial aos professores,
funcionários e alunos do Departamento de Engenharia de Produção, pelo apoio e
amizade ao longo do mestrado. Agradecimento especial à Raquel Ottani Boriolo, da
Secretaria da Pós-Graduação, pelas suas preciosas orientações sobre os procedimentos
para a qualificação, defesa e homologação da dissertação.
Abraço especial aos meus colegas do DEP e GEPAI, Grupo de Estudos e
Pesquisas Agroindustriais: Luciano (Txau), Luís Gustavo, Renata (Bicu), Guilherme,
Thaís (Gud) e Fabiana (Zaranha), alguns já amigos desde os bons tempos da ESALQ.
Agradeço também minhas várias famílias: Stamato, Gravina, Ferrari e de Oliveira pelo
apoio e paciência em relação às festas e churrascos perdidos por conta “do meu
mestrado”. Um beijo para minhas queridas irmãs, Daniela, Adriana, Lígia, meus
cunhados, Alexandre, Daniel, Amaury, Marcelo, tias, especialmente a Cláu (pelo apoio
e conselhos), tios, primos e primas. Naturalmente um beijo especial aos meus sobrinhos
queridos, Antônio e Bruno, e minhas sobrinhas lindas, Julia, Laura e Malu. Um beijo
5
especial também para minha sogra, Dona Ruth, meu sogro, Sr. Aílton e minha terceira
avó, Dona Hermínia (in memorian). Agradeço a Célia pelo apoio e carinho pelo Pedro.
Um abraço a todos meus amigos, de infância e adolescência em São
Carlos, do “Bloco Baiacu”, e dos saudosos tempos da ESALQ, em Piracicaba,
principalmente os irmãos de todas as gerações da República Jacarepaguá. Nomear um
ou outro seria uma injustiça histórica com os demais, pela importância de todos em
minha vida. De todo modo, gostaria de fazer um agradecimento especial ao Dr. Scot
pela ilustríssima presença e apoio na defesa do mestrado.
Ao meu amigo Nilberto Sindeaux Brasil (Nilba) por me fornecer seus
contatos nos frigoríficos, que me foram bastante úteis no processo de agendamento das
entrevistas.
Por fim, um agradecimento aos meus amigos e colegas das empresas
onde já trabalhei, pelo incentivo, estímulo e apoio, principalmente pela disponibilização
de tempo para a dedicação às aulas, estudos e elaboração da dissertação.
6
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1.1- Exportações do Agronegócio Brasileiro (2005) ....................................17
QUADRO 2.1 - A Evolução do Foco Estratégico ..........................................................31
QUADRO 2.2 - Recursos Tangíveis...............................................................................34
QUADRO 2.3 - Recursos Intangíveis.............................................................................34
QUADRO 2.4 - Recursos e Capacitações.......................................................................39
QUADRO 2.5 - Capacitações levando à Vantagem Competitiva...................................46
QUADRO 2.6 - Resultados das combinações dos critérios para a obtenção da Vantagem
Competitiva Sustentável .........................................................................................55
QUADRO 2.7 – Estratégias de Entrada em Mercados Internacionais............................77
QUADRO 3.1 - Evolução da produtividade na pecuária de corte Brasileira..................81
1994 vs. 2004 ..................................................................................................................81
QUADRO 4.1 - Resultados das combinações dos critérios para a obtenção da Vantagem
Competitiva Sustentável .......................................................................................114
QUADRO 5.1 - Unidades Industriais – Bertin Alimentos - 2006 ................................121
QUADRO 5.2 - Abertura das Vendas de Carne Bovina em R$ e mil toneladas – Grupo
Bertin – 2005 e Primeiro Semestre de 2006 .........................................................124
QUADRO 5.3 – Recursos e Capacitações Tangíveis – Bertin Alimentos....................130
QUADRO 5.4 – Recursos e Capacitações Intangíveis – Bertin Alimentos..................131
QUADRO 5.5 - Exportações de Carne Bovina da JBS – Principais Destinos em 2004 a
2006.......................................................................................................................145
QUADRO 5.6 – Recursos e Capacitações Tangíveis – JBS.........................................154
QUADRO 5.7 – Recursos e Capacitações Intangíveis – JBS.......................................155
QUADRO 5.8 - Unidades Industriais e Centros de Distribuição – Frigorífico Quatro
Marcos- 2007 ........................................................................................................169
QUADRO 5.9 - Varejo alimentício europeu: número de lojas e faturamento..............173
QUADRO 5.10 – Recursos e Capacitações Tangíveis – Quatro Marcos .....................176
QUADRO 5.11 – Recursos e Capacitações Intangíveis – Quatro Marcos ...................177
QUADRO 5.12 – Recursos e Capacitações Tangíveis Conjunto dos Frigoríficos
Estudados ..............................................................................................................189
QUADRO 5.13 – Recursos e Capacitações Intangíveis – Conjunto dos Frigoríficos
Estudados ..............................................................................................................190
7
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1.1 - Estrutura do Trabalho .............................................................................22
FIGURA 2.1 - Forças que Dirigem a Concorrência na Indústria ...................................24
FIGURA 2.2 - A Organização como um Conjunto de Recursos....................................37
FIGURA 2.3 - Cadeia de Valores – McKinsey...............................................................40
FIGURA 2.4 - A Cadeia de Valores Genérica................................................................42
FIGURA 2.5 - Competência Essencial como uma Capacitação Estratégica ..................54
FIGURA 3.1 - Segmentação de Mercado para Carne Bovina ........................................99
FIGURA 5.1 - Destino das Exportações de Carne in Natura – Bertin em 2005 ..........125
FIGURA 5.2: Destino das Exportações de Carne Industrializada – Bertin em 2005 ...126
FIGURA 5.3 - Esquematização do Canal de Distribuição da Bertin na Europa em 2007
...............................................................................................................................128
FIGURA 5.4 – Fluxograma das Competências Essenciais - Bertin..............................132
FIGURA 5.5 - Competências Essenciais Sustentáveis x Temporárias – Bertin Alimentos
...............................................................................................................................133
FIGURA 5.6 – Resumo: Recursos, Capacitações e Competências Essenciais
Sustentáveis e Temporárias – Bertin Alimentos...................................................134
FIGURA 5.7 – Infra-Estrutura de Produção da JBS Alimentos no Brasil e Argentina -
2007.......................................................................................................................139
FIGURA 5.8 - Evolução das Exportações de Carne Bovina da JBS e Participação de
Mercado em relação às Exportações Brasileiras – 1998 a 2006 ...........................144
FIGURA 5.9 - Esquematização do Canal de Distribuição da JBS na Europa em 2004148
FIGURA 5.10: Esquematização do Canal de Distribuição da JBS na Europa em 2007
...............................................................................................................................152
FIGURA 5.11: Fluxograma das Competências Essenciais - JBS.................................156
FIGURA 5.12 - Competências Essenciais Sustentáveis x Temporárias – JBS.............157
FIGURA 5.13 – Resumo: Recursos, Capacitações e Competências Essenciais
Sustentáveis e Temporárias – JBS ........................................................................158
FIGURA 5.14: Capacidade de Abate dos Principais Frigoríficos Brasileiros (em
cabeças/ dia) – Dados de Setembro de 2007.........................................................159
FIGURA 5.15: Principais Exportadores de Produtos de Origem Bovina no Brasil (US$)
– 2006
(1)
................................................................................................................160
FIGURA 5.16 - Abertura das Vendas do Frigorífico Quatro Marcos por Produto.......171
FIGURA 5.17 - Abertura das Vendas do Frigorífico Quatro Marcos por Destino.......172
FIGURA 5.18 - Esquematização do Canal de Distribuição do Quatro Marcos na Europa
em 2007.................................................................................................................174
FIGURA 5.19 – Fluxograma das Competências Essenciais – Quatro Marcos.............178
FIGURA 5.20 - Competências Essenciais Sustentáveis x Temporárias – Quatro Marcos
...............................................................................................................................179
FIGURA 5.21 – Resumo: Recursos, Capacitações e Competências Essenciais
Sustentáveis e Temporárias – Quatro Marcos.......................................................180
FIGURA 5.22 – Fluxograma das Competências Essenciais – Conjunto dos Frigoríficos
Estudados ..............................................................................................................192
FIGURA 5.23 - Competências Essenciais Sustentáveis x Temporárias – Conjunto de
Frigoríficos Analisados.........................................................................................193
8
FIGURA 5.24 – Resumo: Recursos, Capacitações e Competências Essenciais
Sustentáveis e Temporárias – Conjunto de Frigoríficos Analisados ....................194
9
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ..................................................................................................13
1.1. Apresentação...................................................................................................13
1.2. Problema a ser estudado..................................................................................15
1.3. Justificativa e Importância do Tema ...............................................................16
1.4. Questão da pesquisa........................................................................................19
1.5. Objetivos e Proposições..................................................................................19
1.6. Esquema Geral da Dissertação........................................................................20
2. REFERENCIAL TEÓRICO ...............................................................................23
2.1. Recursos, Capacitações e Competências Essenciais.......................................23
2.1.1. Breve Contextualização Histórica ........................................................................23
2.1.2. Recursos................................................................................................................31
2.1.3 Capacitações (ou Capacidades) ............................................................................37
2.1.4. Competências Essenciais – Core Competences....................................................46
2.1. Canais de distribuição .....................................................................................56
2.2.1. Definições e aspectos gerais.................................................................................56
2.2.2. Canais de Distribuição como Fonte de Vantagem Competitiva...........................59
2.2.3. Funções dos Canais de Distribuição ....................................................................60
2.2.4. Agentes do Canal - Intermediários .......................................................................65
2.2.5 Extensão, Estrutura e Cobertura dos Canais de Distribuição ..............................69
2.2.6 Canais de Distribuição Internacionais..................................................................76
3. A CADEIA AGROINDUSTRIAL DA CARNE BOVINA NO BRASIL .........79
3.1 Sob o ponto de vista da Oferta..............................................................................79
3.2. Sob o ponto de vista da Demanda........................................................................82
3.3 Segurança do Alimento e Segurança Alimentar ...................................................86
3.4. Identificação, Rastreabilidade e Certificação.......................................................89
3.5. Certificações Públicas e Privadas para Exportação para a União Européia.........94
4. METODOLOGIA DO TRABALHO................................................................101
4.1. Justificativa do Método Utilizado......................................................................102
4.2. Fontes de Dados.................................................................................................103
4.3 Tipo e Design de Pesquisa ..................................................................................105
4.4. População e Tamanho da Amostra.....................................................................106
4.5. Procedimento de Coleta de Dados .....................................................................108
4.6. Análise e Interpretação dos Dados.....................................................................109
5. ESTUDOS DE CASO, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS RESULTADOS
116
5.1. Estudo de Caso: Grupo Bertin ...........................................................................116
5.1.1. – Introdução/Histórico........................................................................................116
5.1.2. – Infra-Estrutura e Escala de Produção.............................................................121
5.1.3. – Suprimentos (Gado Bovino para Abate)..........................................................122
5.1.4 – Produtos, Marcas e Certificações.....................................................................122
5.1.5 – Exportações.......................................................................................................124
5.1.6. – Canais de Distribuição na Europa ..................................................................126
5.1.7. Competências Essenciais e Distribuição de Carne Bovina Brasileira na Europa
.......................................................................................................................................129
10
5.2. Estudo de Caso: JBS S.A. ..................................................................................136
5.2.1. – Introdução/ Histórico.......................................................................................136
5.2.2. – Infra-Estrutura e Escala de Produção.............................................................137
5.2.3. – Suprimentos (Gado Bovino para Abate)..........................................................139
5.2.4. – Produtos, Marcas e Certificações....................................................................142
5.2.5. – Exportações......................................................................................................144
5.2.6 Canais de Distribuição na Europa ......................................................................146
5.2.7 Competências Essenciais e Distribuição de Carne Bovina Brasileira na Europa
.......................................................................................................................................153
5.3. Estudo de Caso: Frigorífico Quatro Marcos ......................................................167
5.3.1 Introdução/ Histórico...........................................................................................167
5.3.2 Infra-Estrutura e Escala de Produção.................................................................167
5.3.3 Suprimentos (Gado Bovino para Abate)..............................................................169
5.3.4 Produtos, Marcas e Certificações........................................................................169
5.3.5 Exportações..........................................................................................................170
5.3.6 Canais de Distribuição na Europa ......................................................................172
5.3.7. Competências Essenciais e Distribuição de Carne Bovina Brasileira na Europa
.......................................................................................................................................175
5.4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS.............................................184
5.4.1 Canais de Distribuição da Carne Bovina Brasileira na Europa.........................184
5.4.2 Competências Essenciais e Distribuição da Carne Bovina Brasileira na Europa
.......................................................................................................................................188
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................196
REFERÊNCIAS............................................................................................................200
APÊNDICES.................................................................................................................210
11
RESUMO
Devido ao seu dinamismo e crescente importância na economia
brasileira, a cadeia agroindustrial da carne bovina pode servir como objeto de estudo
para a elaboração de pesquisas em diferentes áreas ligadas à estratégia e gestão de
negócios (estratégia empresarial, gestão da produção) e marketing (diferenciação de
produtos, canais de distribuição). O presente trabalho procura fazer uma intersecção
entre algumas destas diferentes áreas de pesquisa, estudando os seguintes tópicos: core
competences (competências essenciais) e canais de distribuição.
Esta pesquisa foi estruturada como um estudo multicaso com três dos
principais frigoríficos brasileiros exportadores de carne bovina e teve como objetivos
analisar as competências essenciais existentes nestes frigoríficos, a atual estrutura de
seus canais de distribuição para o mercado europeu e, finalmente, como a existência
destas competências essenciais impacta a estruturação destes canais de distribuição.
A pesquisa demonstrou que os frigoríficos estudados possuem diferentes
estruturas de distribuição de seus produtos na União Européia. Um dos frigoríficos
estudados distribui seus produtos através de intermediários no canal (trading companies
e distribuidores), enquanto outro possui uma estrutura de distribuição própria, atuando
em joint-ventures com distribuidores locais. Finalmente o terceiro frigorífico está
migrando do modelo baseado no uso de intermediários para uma estrutura própria de
distribuição na Europa.
A pesquisa de campo mapeou e determinou 25 recursos, 23 capacitações
e 19 competências essenciais que suportam as exportações de carne bovina para a União
Européia. As competências essenciais são, em grande parte, baseadas em recursos e
capacitações tangíveis, porém são aquelas baseadas em recursos intangíveis, como
conhecimento do mercado, tradição, reputação, marcas e qualidade da carne, que
alavancam as exportações de carne bovina para a Europa e impactam a estruturação dos
canais de distribuição neste continente. Tais competências são geradoras de vantagem
competitiva, pois possibilitam o estabelecimento de relações de longo prazo nos canais
de distribuição, permitindo a migração do modelo de distribuição genérico, baseado no
uso de trading companies, para estruturas de canais mais específicos, como a
distribuição para grandes redes de supermercados.
Palavras-chave: Carne Bovina. Capacitações. Competências Essenciais. Exportações.
Canais de Distribuição.
12
ABSTRACT
Due to its current dynamism and increasing importance in the Brazilian
economy, the beef agri-chain in Brazil can be analyzed under different fields of strategy
and business administration (corporate strategy, operations management) and marketing
(differentiation of products, marketing channels). This research aims to join some of
these different research areas, by studding core compences and marketing channels.
The research was structured as a multi-case study with 3 of the main
Brazilian exporting beef processors. The main objective of the research was the analysis
of the core competences of some of the most important Brazilian beef processors, as
well as the analysis of the marketing channels of the Brazilian beef in the European
market, and to understand how the core competences impact the marketing channels in
the European Union.
The results of the research show that the Brazilian beef processors
distribute their products through different marketing channels in the European Union.
One of the companies distributes its products through the use of intermediaries (trading
companies and distributors) in the marketing channels. Other beef processor has its own
distribution structure in Europe, operating through joint-ventures with local distributors.
The last researched company is migrating from the model based on the use of trading
companies and distributors to the model of owning its distribution structure in Europe.
The research mapped 25 resources, 23 capabilities and 19 core competences
which support beef exports to the European Union. Most core competences were based in
tangible resources, however the most important core competences which leverage
Brazilian beef exports to European Union and impact the structuring of marketing channels
in the European market are core competences based on intangible resources, such as:
market knowledge, tradition/ reputation, brands and beef quality. These core competencies
are sources of competitive advantage, since they allow Brazilian beef processors to
gradually establish long term relationships in the marketing channels with their clients.
These relationships allow Brazlian beef processors to to migrate from generic marketing
channel models, based on the use of trading companies and distributors, to specific
marketing channels, such as large supermarket chains in the European market.
Key-words: Beef. Capabilities. Core Competences. Exports. Marketing Channels.
13
1. INTRODUÇÃO
O presente capítulo contém a apresentação do trabalho, a descrição do
problema a ser estudado e a questão que norteou o desenvolvimento desta pesquisa.
Posteriormente, são destacadas a relevância do trabalho e a justificativa para sua
realização. Também são abordados neste capítulo os objetivos gerais e específicos da
dissertação.
1.1. Apresentação
Num contexto de economia mundial em constante e rápida evolução, a
comercialização de bens e serviços ocorre em ambientes cada vez mais complexos e
instáveis. O conhecimento dos mercados, particularmente dos consumidores e dos
sistemas de comercialização utilizados ou que possam a vir ser implantados, torna-se
fundamental para a sobrevivência e desenvolvimento de empresas (PALACIOS &
SOUZA, 2004).
Neste novo cenário de negócios, o bom desempenho das empresas está
diretamente relacionado à obtenção de vantagens competitivas sustentáveis. Essa
perspectiva abre um leque de oportunidades de estudos sobre recursos, capacitações e
competências essenciais, que constituem um ferramental de análise estratégica do
ponto-de-vista interno das firmas.
De acordo com HOSKISSON et. al. (2004) recursos (resources),
capacitações (capabilities) e competências essenciais (core competences) são
características internas das empresas que podem proporcionar a base para a criação de
vantagem competitiva sustentável.
PRAHALAD & HAMEL (1990) consideram que as competências
essenciais são o aprendizado coletivo na organização, especialmente os de como
coordenar as diversas habilidades de produção e integrar as múltiplas correntes de
tecnologias.
Outra definição aponta que as competências essenciais são recursos
intangíveis que são difíceis de serem imitados pelos concorrentes. São também recursos
essenciais para que a empresa possa prover produtos/ serviços diferenciados em relação
a mercados e clientes. De certa forma, o conceito de competências essenciais aproxima-
14
se do conceito de capacitações. Entretanto, na ótica de HOSKISSON et. al. (2004)
apenas as capacitações, que geram vantagens competitivas efetivas e sustentáveis,
podem ser consideradas competências essenciais. Para que isto aconteça, a capacitação
deverá ser: (i) geradora de valor; (ii) rara; (iii) difícil de ser imitada; e (iv) não
substituível.
Serão estas então, as características a serem consideradas para definir
uma competência como essencial na presente pesquisa.
Por outro lado, este novo contexto de negócios globais foi responsável
por um aumento na importância relativa dos canais de distribuição em comparação com
os demais elementos do composto de marketing (produto, preço e promoção). Novos
estudos vêm sendo desenvolvidos sobre canais de distribuição depois que importantes
autores, como ROSENBLOOM (1999) e FERREL & HARTLINE (2005),
estabeleceram que a distribuição pode ser o único composto de marketing capaz de
gerar vantagens competitivas efetivas e que se mantém ao longo do tempo. Produtos
podem ser facilmente copiados, sendo o mesmo raciocínio válido, até certo ponto, para
as atividades de promoção e preços.
De acordo com NEVES (1999) os canais de distribuição oferecem a
construção de vantagens competitivas sustentáveis, por suas características de longo
prazo, tanto no planejamento como na implantação, por exigirem estrutura de
organizações consistentes e por terem base em pessoas e relacionamentos.
A cadeia agroindustrial da carne bovina brasileira está totalmente
inserida no contexto de negócios globais mencionado no início desta apresentação. Esta
situação contrasta com o posicionamento histórico desta cadeia, por muito tempo
voltado para o atendimento do mercado doméstico, e a coloca frente ao desafio de atuar
em mercados internacionais.
Com isto, abrem-se perspectivas para a elaboração de novos estudos
sobre a cadeia da carne bovina no Brasil, estudos estes que venham a contemplar a
análise das competências essenciais dos principais frigoríficos exportadores brasileiros e
da estrutura de distribuição da carne bovina utilizada em mercados internacionais, como
é o caso desta pesquisa.
15
1.2. Problema a ser estudado
O crescimento da importância da cadeia agroindustrial da carne bovina
no agronegócio brasileiro tem suscitado o interesse de pesquisadores de diversas áreas
nos últimos anos. Alguns trabalhos foram realizados com o intuito de se determinar a
competitividade desta cadeia (BATALHA & SILVA, 2000, por exemplo), enquanto que
outras pesquisas procuraram aprofundar-se na questão das barreiras não-tarifárias que
impedem a expansão das exportações brasileiras de carne bovina, como é o caso de
MIRANDA, 2001. Alguns autores realizaram trabalhos que utilizam os referenciais
teóricos da Economia dos Custos de Transação e da Nova Economia Institucional para
analisar as relações dos diferentes agentes que compõem a cadeia agroindustrial da
carne bovina. Pode-se citar, neste caso, o trabalho de BÁNKUTI (2002), que se utilizou
da Nova Economia Institucional e da Economia dos Custos de Transação como
arcabouço teórico para o estudo dos entraves institucionais na cadeia agroindustrial da
carne bovina que acabam por estimular o abate clandestino. Cita-se também o trabalho
de PITELLI (2004), que analisou o impacto das mudanças institucionais européias sobre
as estruturas de governança nas exportações de carne bovina brasileira para a União
Européia.
Devido ao seu dinamismo e crescente importância na economia
brasileira, a cadeia agroindustrial da carne bovina pode servir como objeto de estudo
para a elaboração de pesquisas em diferentes áreas ligadas à estratégia e gestão de
negócios (estratégia empresarial, gestão da produção) e marketing (diferenciação de
produtos, canais de distribuição). O presente trabalho procura fazer uma intersecção
entre algumas destas diferentes áreas de pesquisa, estudando os seguintes tópicos: core
competences (competências essenciais) e canais de distribuição.
O termo core competences, competências essenciais, ganhou destaque
com a publicação do artigo seminal “The Core Competence of the Corporation,
publicado na Harvard Business Review em 1990. Neste artigo, PRAHALAD &
HAMEL estabelecem um novo conceito sobre a formulação da estratégia empresarial,
que acabou sendo utilizada como linha de pesquisa para outros autores. Para eles, a
estratégia empresarial é muito mais um processo formulado no âmbito interno das
empresas do que propriamente uma resposta a estímulo de fatores externos. A estratégia
16
seria então estabelecida tendo como base capacitações que a empresa possui e que são
geradoras de vantagens competitivas sustentáveis.
Já os canais de distribuição são os meios pelos quais as empresas fazem seus
produtos e/ou serviços chegarem até seus clientes. De acordo com COUGHLAN et al.
(2002, p. 20), “um canal de marketing (de distribuição) é um conjunto de organizações
interdependentes envolvidas no processo de disponibilizar um produto ou serviço para uso
ou consumo”. Muito mais do que se preocupar apenas com os aspectos físicos da
distribuição (o que está mais relacionado a questões logísticas), os canais de distribuição
englobam um conceito mais amplo, que envolve a efetiva transferência de produtos e
serviços entre os agentes do canal, incluindo a transferência dos direitos de propriedade
sobre os produtos.
1.3. Justificativa e Importância do Tema
O agronegócio brasileiro tem sido a grande ‘locomotiva’ da economia
brasileira durante os últimos cinco anos. Dados do MINISTÉRIO DA
AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO (MAPA, 2005) apontam que o
agronegócio brasileiro é responsável por 33% do Produto Interno Bruto (PIB), 42% das
exportações totais e 37% dos empregos brasileiros.
A cadeia agroindustrial da carne bovina, por sua vez, é uma das mais
importantes do agronegócio brasileiro. Dados da SECRETARIA DE COMÉRCIO
EXTERIOR (SECEX, 2005), compilados pelo INSTITUTO DE ESTUDOS DO
COMÉRCIO E NEGOCIAÇÕES INTERNACIONAIS (ICONE, 2005) e apresentados
no Quadro 1.1, apontam que em 2005 cerca de 10% do valor das exportações do
agronegócio brasileiro (US$ 31,6 bilhões) foi oriundo das exportações de carne bovina,
o que faz com que a cadeia agroindustrial da carne bovina seja a quarta cadeia
agroindustrial que mais gera divisas para o Brasil, atrás apenas do complexo soja,
açúcar e álcool e carne de frango.
17
QUADRO 1.1- Exportações do Agronegócio Brasileiro (2005)
Complexo Agroindustrial US$ milhões %
1 Complexo Soja
9.476
30%
2 Açúcar e Álcool
4.699
15%
3 Carne de Frango
3.509
11%
4 Carne Bovina
3.014
10%
5Café
2.919
9%
6Fumo
1.707
5%
7Carne Suína
1.163
4%
8Suco de Laranja
1.110
4%
9 Algodão
457
1%
10 Frutas
387
1%
Outros
3.212
10%
Total
31.653 100%
Fonte: Secretaria de Comércio Exterior
Elaboração: ICONE (2005)
A importância da cadeia agroindustrial da carne bovina brasileira não se
restringe ao Brasil. Nos últimos anos, esta cadeia passou por um ‘choque de
competitividade’ que garantiu a posição do Brasil como o maior exportador mundial de
carne bovina em quantidade. Fatores externos, como a ocorrência de problemas
sanitários, retiraram temporariamente do mercado internacional alguns dos principais
concorrentes brasileiros e também contribuíram para que o Brasil atingisse essa posição.
Dados do UNITED STATES DEPARTMENT OF AGRICULTURE
(USDA, 2006), que corresponde ao Ministério de Agricultura dos Estados Unidos,
apontam que o Brasil é maior exportador mundial deste produto em termos de
quantidade, com exportações estimadas em 1.800 mil toneladas equivalente-carcaça
para 2006, à frente da Austrália, com exportações estimadas em 1.400 mil toneladas
equivalente-carcaça no mesmo ano.
Tal representatividade do Brasil no comércio internacional da carne
bovina é garantida por uma série de fatores, dentre os quais o tamanho de seu rebanho.
Dados do USDA (2006) apontam que o Brasil possui o segundo maior rebanho bovino
mundial, com cerca de 175 milhões de cabeças. Isso equivale a cerca de 20% do
rebanho mundial bovino. Entretanto, considera-se que o Brasil possui o maior rebanho
comercial do mundo, tendo em vista que a Índia, cujo rebanho totaliza 332 milhões de
18
cabeças (32% do rebanho mundial), possui produção e consumo de carne bovina
limitada por razões religiosas.
Tamanho rebanho garante ao Brasil a posição de segundo maior produtor
mundial de carne bovina, com produção estimada em 8.810 mil toneladas equivalente-
carcaça, que corresponde a aproximadamente 16% da produção mundial de carne
bovina (estimativas do USDA para 2006).
Portanto, a cadeia agroindustrial da carne bovina no Brasil possui grande
relevância na economia brasileira e destaque no comércio internacional de carne bovina,
o que justifica a utilização de alguns de seus agentes (frigoríficos exportadores) como
objeto de estudo no presente pesquisa.
Justifica-se a adoção dos corpos teóricos escolhidos por suas relevâncias
tanto no âmbito acadêmico quanto empresarial. A possibilidade de interseção entre as
diferentes teorias utilizadas na pesquisa também foi um fator preponderante para a
escolha dos corpos teóricos utilizados.
O primeiro arcabouço teórico utilizado diz respeito ao conceito de
competências essenciais. Optou-se por iniciar a revisão bibliográfica por este assunto,
pois ele está diretamente relacionado ao aspecto operacional e estratégico das empresas
analisadas, que são o ponto de partida da presente pesquisa.
Notou-se, através da revisão bibliográfica, a falta de estudos que
abrangessem este tópico na cadeia da carne bovina brasileira, ou, mais especificamente,
nos principais frigoríficos de carne bovina brasileira. Trata-se de uma teoria que ganhou
bastante repercussão quando lançada, no início da década de 1990, principalmente por
contestar a visão então em voga de que a formulação da estratégia das empresas deve-se
ater principalmente à análise do ambiente externo, visão esta cujo maior expoente é
MICHAEL PORTER e suas ‘Lei das 5 Forças’.
A opção de fazer uso da teoria dos canais de distribuição na presente
pesquisa justifica-se pela nova conotação dada à distribuição de produtos e serviços no
ambiente de marketing. Antes considerada uma atividade secundária dentre os 4 P’s do
marketing (preço, produto, promoção e ponto-de-venda), atualmente a distribuição tem
sido vista como fator estratégico para as empresas, por ser o único dos 4 P’s capaz de
gerar vantagem competitiva sustentável para as empresas. Por fim, considerou-se o
19
estudo de canais de distribuição nos mercados internacionais pelo recente e expressivo
avanço das exportações brasileiras de carne bovina.
1.4. Questão da pesquisa
A questão da pesquisa serve como sua principal referência e serve de
ponto de partida para seu desenvolvimento, o qual se dá através da formulação de
hipóteses, explicações e levantamento de dados e informações que procurarão respondê-
la. De acordo com SÜDMERSEN (1983) apud FLICK (2004), a formulação de
questões de pesquisa, em termos concretos, é guiada pelo objetivo de esclarecer o que
os contatos de campo irão revelar. Quanto menos clareza houver na formulação de uma
questão de pesquisa, maior será o risco de os pesquisadores acabarem impotentes diante
da tentativa de interpretar uma montanha de dados.
Já para LAKATOS & MARCONI (1992), enquanto o tema de uma
pesquisa é uma proposição até certo ponto abrangente, a formulação do problema é mais
específica: ela esclarece a dificuldade particular com a qual se defronta e que se
pretende resolver por intermédio da pesquisa.
Com base nos conceitos acima mencionados, formulou-se a seguinte
pergunta, que referencia esta pesquisa e que serviu de base para o desenvolvimento do
presente trabalho:
“Sob o ponto de vista dos frigoríficos brasileiros exportadores de carne
bovina, quais são as competências essenciais necessárias para que estas empresas
conquistem os mercados internacionais, principalmente o mercado europeu, e como
estes exportadores estruturam seus canais de distribuição nestes mercados?”
1.5. Objetivos e Proposições
O objetivo deste trabalho é analisar as competências essenciais dos
principais frigoríficos exportadores de carne bovina no Brasil e a atual estrutura de seus
canais de distribuição para o mercado europeu. Buscou-se também verificar se a
20
existência destas competências essenciais impactou a definição da estrutura de
distribuição utilizada para a carne bovina brasileira na Europa. Com os resultados
obtidos, espera-se auxiliar os gestores de frigoríficos brasileiros de carne bovina a
visualizarem e desenvolverem essas competências essenciais, na busca do aumento das
suas exportações e da estruturação canais de distribuição mais adequados ao mercado
europeu.
A pesquisa parte das seguintes proposições:
a. Os frigoríficos brasileiros exportadores de carne bovina possuem competências
essenciais que os tornam competitivos para exportar (em relação aos frigoríficos/
indústrias que somente atendem o mercado interno).
b. Existem aspectos normativos relativos à segurança do alimento, especificamente
rastreabilidade e certificação, que regulamentam as exportações brasileiras de carne
bovina para a União Européia, sendo que nem todos os frigoríficos de carne bovina
no Brasil possuem os recursos e capacitações que atendam estes critérios.
c. Os frigoríficos exportadores participam de diferentes estruturas de distribuição nos
mercados internacionais que são, de certa forma, determinadas por suas
competências essenciais.
1.6. Esquema Geral da Dissertação
O primeiro capítulo contém a apresentação da pesquisa, a justificativa
para realizá-la, a questão que a norteará, seus objetivos e o esquema geral da
dissertação.
O segundo capítulo introduz os referenciais teóricos que sustentam e
suportam a pesquisa: competências essenciais e canais de distribuição.
O terceiro capítulo apresenta uma breve descrição e contextualização da
cadeia agroindustrial da carne bovina e aponta os determinantes de sua evolução nos
21
últimos dez anos. Ela também contextualiza a cadeia da carne bovina no que se refere à
rastreabilidade, normas e certificações voltadas para o mercado externo.
O capítulo quatro expõe a metodologia da pesquisa e indica os motivos
pelos quais se optou pela realização de uma pesquisa qualitativa para explorar os
objetos de estudo. Discorre sobre o porquê da utilização de estudos multicaso para
responder as questões que norteiam a pesquisa e também para atingir seus objetivos.
Trata também da operacionalização da metodologia em si, com a determinação das
fontes de pesquisa e descrição dos procedimentos para coleta de dados, através da
aplicação de questionários estruturados em entrevistas com os executivos das empresas
que são objeto do estudo. Demonstra também as limitações da metodologia que
impactam os resultados e conclusões da pesquisa.
O quinto capítulo refere-se aos estudos de caso propriamente ditos,
estudos esses elaborados com os dados coletados nas entrevistas realizados nos
frigoríficos. Este capítulo também apresenta a análise e discussão dos resultados da
pesquisa.
Por fim, o sexto capítulo trata das considerações finais, conclusões e
limitações do trabalho, apresentando também sugestões para pesquisas futuras, com
base em questionamentos e conclusões que emergiram da presente pesquisa.
A Figura 1.1 apresenta a estrutura deste trabalho.
22
Fonte: Elaborado pelo Autor
FIGURA 1.1 - Estrutura do Trabalho
Capítulo 1 – INTRODUÇÃO
Apresentação; Problema a ser estudado; Justificativa e Importância do
Tema ;Questão da Pesquisa; Objetivo e Proposições; Esquema Geral da
Dissertação.
Capítulo 2 – REFERENCIAL TEÓRICO
2.1. Recursos, Capacitações e Competências Essenciais: Breve
Contextualização Histórica; Recursos; Capacitações; Competências
Essenciais.
2.2. Canais de Distribuição Definições e Aspectos Gerais; Canais de
Distribuição como fonte de Vantagem Competitiva; Funções dos Canais
de Distribuição; Agentes do Canal – Intermediários; Extensão, Estrutura
e Cobertura dos Canais de Distribuição; Canais de Distribuição
Internacionais.
Capítulo 4 – METODOLOGIA DO TRABALHO
Justificativa do Método Utilizado; Fonte de Dados; Tipo e Design da
Pesquisa; População e Tamanho da Amostra; Procedimento de Coleta de
Dados; Análise e Interpretação dos Dados.
Capítulo 3 – A CADEIA AGROINDUSTRIAL DA CARNE
BOVINA NO BRASIL
Lado da Oferta, Lado da Demanda, Segurança do Alimento e Segurança
Alimentar; Identificação, Rastreabilidade e Certificação; Certificações
Públicas e Privadas para a Exportação para a União Européia.
Capítulo 6: CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
ANEXOS
Capítulo 5 – ESTUDOS DE CASO, ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS
RESULTADOS
Bertin, JBS, Frigorífico Quatro Marcos, Análise e Discussão dos
Resultados
23
2. REFERENCIAL TEÓRICO
O presente capítulo apresenta os arcabouços teóricos que suportam a
pesquisa.
O primeiro deles a ser estudado diz respeito ao conceito de competências
essenciais, que é assumido neste trabalho como sendo uma conseqüência dos recursos e
capacitações que uma empresa possui. O enfoque deste corpo teórico é importante para
se determinar na pesquisa quais são os recursos, capacitações e, em última instância, as
competências essenciais que tornam um frigorífico de carne bovina habilitado e
competitivo para exportar seus produtos para a União Européia.
O conceito de capacitações e competências essenciais é abordado neste
capítulo apenas na esfera organizacional (estratégia corporativa e aspectos operacionais
das empresas).
O segundo corpo teórico estudado neste capítulo diz respeito aos canais
de distribuição, sendo aqui explicitadas suas definições e conceituações, estrutura,
design e seus agentes, com destaque para o papel dos atacadistas (intermediários).
Também está destacada a importância dos canais de distribuição como fonte de
vantagem competitiva e uma. Por fim, é feita revisão bibliográfica sobre canais de
distribuição internacionais.
2.1. Recursos, Capacitações e Competências Essenciais
2.1.1. Breve Contextualização Histórica
Os debates sobre os fatores que determinam a competitividade das
empresas têm sido enriquecidos nos últimos anos com novas abordagens. O enfoque
clássico é a ‘análise da indústria’ ou do ‘posicionamento estratégico’, que tem em
MICHAEL PORTER seu maior expoente. Esta abordagem prioriza a análise dos
mercados e da competição e o entendimento da posição relativa de cada empresa em sua
indústria ou segmento produtivo como elementos primordiais no processo de
formulação da estratégia (PORTER, 1980, 1996 apud FLEURY & FLEURY, 2003). Os
24
principais focos de análise são produtos, consumidores e competidores, e a estratégia da
empresa deve ser resultante da identificação de tendências e oportunidades. Neste
sentido, é considerada uma abordagem ‘de fora para dentro’.
Esta visão fica evidente quando PORTER (1986) menciona que a
essência de formulação de uma estratégia competitiva é relacionar uma companhia ao
seu meio ambiente.
O conceito de posicionamento estratégico ganhou corpo com a
publicação da obra ‘Estratégia Competitiva’, lançada em 1980 por MICHAEL
PORTER. Nesta obra, este autor estabeleceu um modelo que contemplava as ‘cinco
forças’ e uma matriz dois por dois, das quais derivam as estratégias competitivas
básicas, ou genéricas.
As cinco forças estabelecidas por PORTER (1986) estão expressas na
figura 2:
CONCORRENTES
NA INDÚSTRIA
Rivalidade entre as Empresas
Existentes
SUBSTITUTOS
ENTRANTES
POTENCIAIS
COMPRADORESFORNECEDORES
Poder de negociação dos
fornecedores
Ameaça de produtos ou
serviços substitutos
Poder de negociação dos
compradores
Ameaça de novos entrantes
Fonte: PORTER (1986, p. 23)
FIGURA 2.1 - Forças que Dirigem a Concorrência na Indústria
Segundo PORTER (1986), ao confrontar as cinco forças competitivas,
existem três abordagens estratégicas genéricas potencialmente bem sucedidas para
25
superar as outras empresas em uma indústria (que podem ser usadas isoladamente ou de
forma combinada): liderança no custo total, diferenciação e enfoque.
A primeira estratégia, liderança no custo total, que se tornou bastante
comum nos anos 1970 devido à popularização do conceito de curva de experiência,
consiste em atingir a liderança no custo total em uma indústria através de um conjunto
de políticas funcionais orientadas para este objetivo básico. A liderança no custo exige a
construção agressiva de instalações em escala eficiente, uma perseguição vigorosa de
reduções de custo pela experiência, um controle rígido de custo e de despesas gerais,
que não seja permitida a formação de contas marginais dos clientes, e a minimização do
custo em áreas como P & D, assistência, força de vendas, publicidade etc. Intensa
atenção ao controle dos custos é necessária para atingir estas metas. Custo baixo em
relação aos concorrentes torna-se o tema central de toda a estratégia, embora a
qualidade, a assistência e outras áreas não possam ser ignoradas.
A segunda estratégia genérica é diferenciar o produto ou serviço
oferecido pela empresa, criando algo que seja considerado único no âmbito de toda a
indústria. Os métodos para esta diferenciação podem assumir muitas formas: projeto ou
imagem da marca, tecnologia, peculiaridades, serviços sob encomenda, rede de
fornecedores, ou outras dimensões. Em termos ideais, a empresa diferencia-se ao longo
de várias dimensões. PORTER (1986) utiliza o exemplo da empresa de tratores e
máquinas para a construção pesada Caterpillar, que na década de 1980 era reconhecida
não apenas por sua rede de revendedores e excelente disponibilidade de peças
sobressalentes, como também por seus produtos de alta qualidade e extremamente
duráveis, tudo isto sendo crucial no ramo dos equipamentos pesados, onde o tempo
parado é muito dispendioso. Deve ser ressaltado que a estratégia de diferenciação não
permite à empresa ignorar os custos, mas eles não são ao alvo estratégico primário.
Por fim, ainda segundo PORTER (1986), a última estratégia genérica é
focar um determinado grupo comprador, um segmento da linha de produtos, ou um
mercado geográfico. Da mesma forma que a diferenciação, o enfoque pode assumir
diversas formas. Embora as estratégias de baixo custo e de diferenciação tenham o
intuito de atingir seus objetivos no âmbito de toda a indústria, toda a estratégia de
enfoque visa atender muito bem o alvo determinado e cada política funcional é
desenvolvida levando isso em conta. Esta estratégia repousa na premissa de que a
26
empresa é capaz de atender seu alvo estratégico estreito mais efetiva ou eficientemente
do que os concorrentes que estão competindo de forma mais ampla. Conseqüentemente,
a empresa atinge a diferenciação por satisfazer melhor as necessidades de seu alvo
particular, obtém custos mais baixos na obtenção deste alvo, ou ambos. Mesmo que a
estratégia de enfoque não atinja baixo custo ou diferenciação do ponto de vista do
mercado como um todo, ela realmente atinge uma ou ambas as posições em relação ao
seu estreito alvo estratégico.
As críticas às cinco forças de PORTER são de que elas se constituem em
ferramental quase que integralmente pautado na análise do ambiente externo, sem se
preocupar com questões internas das empresas que podem se constituir em vantagens
competitivas. Todavia, é importante ressaltar que o objetivo de PORTER ao criar este
modelo foi exatamente o de determinar a influência do ambiente externo na criação de
vantagens competitivas. Assim sendo, seu objetivo foi plenamente atingido, tendo em
vista que este modelo é até hoje utilizado para esta finalidade.
Na evolução de seus estudos sobre vantagem competitiva, PORTER
encarregou-se posteriormente de aperfeiçoar este modelo, com a inclusão de outros
fatores. De acordo com FLEURY & FLEURY (2003), o próprio PORTER em 1985 já
ampliava seu foco com o conceito de cadeia de valor e sistema de valor, reconhecendo
as atividades da empresa como base da vantagem competitiva. Segundo PROENÇA
(1999) apud FLEURY & FLEURY (2003), os direcionadores para a redução de custos
ou para a diferenciação serão identificados a partir das atividades internas a empresa e
das ligações entre elas.
Entretanto, a despeito da evolução dos trabalhos de PORTER no sentido
de reconhecer que ‘as atividades da empresa’ são base da vantagem competitiva, o fato
é que com o passar do tempo o modelo da análise da indústria elaborado por PORTER
continuou sendo muito criticado pelo fato de não dar a devida ênfase ao ambiente
interno das empresas e sobre como as vantagens competitivas podem advir de suas
próprias atividades. De acordo com FLEURY & FLEURY (2003), as críticas à análise
do posicionamento estratégico vêm se avolumando ao longo do tempo, principalmente
aquelas que mencionam que o sistema de PORTER possui natureza estritamente
estática.
27
A alegação de muitos profissionais, tanto da área de gestão de negócios
quanto do meio acadêmico, é que o modelo do posicionamento estratégico não
consegue explicar porque, em um mesmo ambiente de negócios, muitas empresas foram
capazes de estabelecer vantagens competitivas sustentáveis e outras não.
A resposta de PORTER a tais críticas foi a criação do conceito da Cadeia
de Valor (1992), que será abordada posteriormente nesta revisão.
Apesar de sua importância, a análise do posicionamento estratégico não
foi historicamente o único modelo utilizado para a se determinar porque algumas
empresas criam vantagens competitivas sustentáveis ao longo do tempo e outras não. De
acordo com SANCHEZ & HEENE (2004), desde a década de 1950 existem autores,
notadamente SELZINCK (1957) e PENROSE (1959), que argumentam que qualquer
forma de vantagem competitiva sustentável que uma firma possa desenvolver resulta de
uma combinação única de recursos da empresa.
De todo modo, esta visão baseada em recursos internos da empresa como
fator gerador de vantagens competitivas sustentáveis ganhou corpo somente na década
de 1980, possivelmente como uma resposta aos conceitos de PORTER, que ganharam
destaque nesta década. Em 1984, WERNERFELT publicou o artigo que lançou as bases
para o conceito de Resource-Based View (‘RBV’), ou Visão Baseada em Recursos.
Esta visão é corroborada por GHEMAWAT (2000) que afirma que a
visão baseada em recursos é uma idéia antiga que foi revivida em 1984 em artigo de
WERNERFELT (1984).
Segundo FAHY & SMITHEE (1999), a lógica básica da visão baseada
em recursos é relativamente simples. Ela começa com a premissa de que adquirir uma
vantagem competitiva sustentável possibilita à firma obter resultados econômicos acima
da média (de determinada indústria/ setor). A visão baseada em recursos apregoa que a
resposta a esta questão baseia-se na posse de certos recursos básicos, recursos estes que
possuem características como ‘valor’, ‘barreiras para duplicação’ e ‘capacidade de
apropriação’. Uma vantagem competitiva sustentável ocorre se a firma efetivamente
dispõe desses recursos em seu mercado de atuação. Portanto, a visão baseada em
recursos enfatiza uma opção estratégica da firma, no sentido de que encarrega sua alta
gestão com as importantes tarefas de identificar, desenvolver e tornar acessíveis estes
recursos básicos, de forma a maximizar retornos econômicos.
28
Já para COLLIS & MONTGOMERY (1995) apud ANDERSON &
NARUS (2004), a visão baseada em recursos da firma “enxerga as companhias como
coleções muito distintas de ativos físicos e ativos intangíveis, e de capacitações”.
Nenhuma companhia é igual à outra porque nenhuma companhia possui a mesma gama
de experiências, adquiriu os mesmos ativos ou as mesmas habilidades, ou construiu as
mesmas culturas organizacionais.
De acordo com SANCHEZ & HEENE (2004) o artigo de
WERNERFELT serviu de base para que outros autores pudessem desenvolver seus
próprios modelos, que consideram os recursos da empresa como base para sua
vantagem competitiva. BARNEY (1997) popularizou o conceito de Value-Resources-
Imitability-Organization (VRIO), que é um modelo que propõe que a análise interna dos
pontos fortes e fracos de uma empresa deveria levar em consideração quatro questões
sobre a natureza e o uso de recursos da uma firma:
a. A questão do valor: os recursos de uma firma a possibilitam responder a
ameaças e oportunidades oriundas do meio-ambiente?
b. A questão da raridade: quantas empresas concorrentes já detêm estes recursos
valiosos?
c. A questão da capacidade de imitação: as empresas que não detêm estes recursos
valiosos possuem uma desvantagem de custos em relação às empresas que já
possuem tais recursos valiosos?
d. A questão da organização: trata-se de uma empresa com a capacidade de fazer
pleno uso de seus recursos de forma a obter uma vantagem competitiva
sustentável?
Um ponto interessante da abordagem de FAHY & SMITHEE (1999) diz
respeito à ênfase ao link existente entre recursos internos das empresas e as condições
de mercado, relação esta que muitas vezes é negligenciada segundo os autores. AMIT &
SCHOEMAKER (1993) e COLLINS & MONTGOMERY (1995) são autores que
também fazem essa conexão entre os recursos internos das empresas e as condições de
mercado, de acordo com FAHY & SMITHEE (1999).
29
HOOLEY et al (1997) apud FAHY & SMITHEE (1999) criticam a visão
baseada em recursos por seu foco excessivamente interno, correndo-se o risco, dessa
forma, de se ignorar as demandas do mercado.
De acordo com SANCHEZ & HEENE (2004), outros autores que
estudaram o conceito de visão baseada em recursos foram GRANT (1991) e
MOLLONA (1998).
Para HENDERSON & COCKBURN (2000), recentemente tem ocorrido
um ‘revival’ no interesse em vários autores estudaram a visão-baseada-em-recursos. Os
trabalhos nesta linha de pesquisa buscaram inspiração em SELZNICK (1957) e
PENROSE (1959) e sugerem que a heterogeneidade inimitável da firma, ou a posse de
“capacitações” ou “competências” únicas pode ser uma importante e duradoura fonte de
vantagem competitiva. Os autores citam os seguintes autores como a nova geração dos
pesquisadores na visão-baseada-em-recursos: LIPPMAN & RUMELT (1982);
WERNERFELT (1984); BARNEY (1986); RUMELT (1991). AMIT &
SCHOEMAKER (1993); DOSI & TEECE (1993) e PETERAF (1993). Na ótica de
HENDERSON & COCKBURN (2000), esta perspectiva promete ser um complemento
importante para desenvolvimento no campo da gestão estratégica.
GRANT (2005), um dos expoentes da visão baseada em recursos, faz
uma importante distinção entre os recursos de uma firma e suas capacitações. Este autor
caracteriza os recursos como insumos para os processos de produção da firma, mas
ressalva que apenas alguns poucos desses recursos são de fato insumos para um
processo produtivo, ou seja, são poucos os recursos que efetivamente diferenciam o
processo de produção em uma firma (‘production process’ versusproductive process’,
segundo o autor). Para que a firma produza algo, os recursos precisam ser coordenados;
uma capacitação é justamente o resultado do ato de a firma coordenar seus recursos
efetivamente, de forma a realizar alguma tarefa ou atividade. Na importante extensão do
conceito realizada por GRANT (2005), os recursos são essenciais para a criação das
capacitações de uma firma, mas as capacitações são a fonte de qualquer vantagem
competitiva sustentável que a firma adquire no mercado (e não os recursos por si só).
Outro conceito que emerge da discussão entre recursos e capacitações é o
da ‘Visão das Capacidades Dinâmicas’. De acordo com GHEMAWAT (2000), a visão
das capacidades dinâmicas da empresa difere da visão baseada em recursos porque as
30
capacidades precisam ser desenvolvidas em vez de serem consideradas existentes. A fim
de ilustrar este conceito, o autor destaca frase de artigo de TEECE et al. (1992, p. 12-
13).
“Se o controle sobre recursos escassos é a fonte de lucros econômicos, logicamente
questões como aquisição de qualificações e aprendizado assumem importância estratégica fundamental.
É esta segunda dimensão, que abrange aquisição de qualificações, aprendizado e acumulação de
aptidões que .....chamamos de “abordagem dinâmica das capacidades”....As rupturas são vistas não
como resultantes da incerteza....., mas também de atividades dirigidas por empresas que criam
capacidades diferenciadas e de esforços gerenciais para distribuir estrategicamente esses ativos de
maneiras ordenadas”. TEECE et al. (1992, p. 12-13 apud GHEMAWAT,2000).
Outras terminologias utilizadas na análise e elaboração da estratégia
empresarial são ‘top-down’ e ‘bottom-up’. O pensamento top-down considera a análise
do ambiente externo como o principal fator para a elaboração da estratégia empresarial.
Resumidamente, esta é a tônica da linha de pensamento de PORTER.
Já a linha de pensamento bottom-up considera a análise dos aspectos
internos da empresa como ponto de partida para a formulação da estratégia empresarial.
A tônica da evolução do pensamento estratégico tem sido, portanto, do estilo top-down
para o bottom-up.
CARVALHO & LAURINDO (2003) afirmam que modelos como o da
análise estrutural da indústria (PORTER, 1985) ajudam a entender o ambiente externo.
Enquanto isso, existem outros, como o das competências essenciais – core competences
(PRAHALAD & HAMEL, 1990) – que se prestam à análise da situação interna da
empresa.
O Quadro 2.1, adaptado de BARLETT & GHOSHAL (2002) apud DE
KLUYVER & PEARCE (2003) apresenta um resumo da conceituação do foco
estratégico contrastando as principais características do foco em ‘Produtos e Mercados’
versus ‘Recursos e Competências’. O que os autores denominaram ‘Produtos e
Mercados’ é o foco da análise do ambiente externo, aproximando-se da análise do
posicionamento estratégico de PORTER. Já o foco ‘Recursos e Competências’
assemelha-se à visão baseada em recursos, complementado pelo conceito de
capacitações e competências essenciais, a serem posteriormente abordados no presente
trabalho.
31
QUADRO 2.1 - A Evolução do Foco Estratégico
Foco Competitivo Objetivo Estratégico
Recurso Estratégico
Essencial
1-) Análise da indústria
2-)
nálise dos concorrentes
3-) Segmentação e posicionamento
4-
)
Plane
j
amento estraté
g
ico
1-) Competências Essenciais
Capital
Or
g
anizacional
2-
)
Estratégia baseada em recursos
3-) Redes ("networks")
Recursos e Competências Vantagem sustentável
Capital Financeiro
Ferramentas
Produtos e Mercados
Defesa de posição de
mercados e produtos
Fonte: BARTLETT & GHOSHAL (2002, p. 34-41) apud DE KLUVYER & PEARCE (2003, p. 13)
Da evolução da visão baseada em recursos e das capacitações de GRANT
(2005) surgiu o conceito de competências essenciais, conceito este utilizado como parte
do referencial teórico neste trabalho.
2.1.2. Recursos
“Os analistas tendem a definir os ativos (de uma empresa) de uma forma muita estreita,
identificando apenas aqueles que são mensuráveis, como plantas (industriais) e equipamentos. Os ativos
intangíveis, como uma tecnologia particular, informações acumuladas sobre os consumidores, marca,
reputação e cultura corporativa, são de valor inestimável para o poder competitivo das empresas. Na
verdade, esses ativos invisíveis são geralmente as únicas fontes de vantagem competitiva efetiva que
podem ser sustentadas ao longo do temp.” (HIROYUKI ITAMI, “Mobilizing Invisible Assets”, apud
GRANT, 2005 p. 130).
De forma geral, a estratégia empresarial está preocupada em fazer com
que as empresas conciliem seus recursos e capacitações com as oportunidades que
surgem no ambiente externo. O interesse relativamente novo da estratégia de negócios
nos recursos e capacitações contrasta com o papel central que a análise de recursos
sempre teve na estratégia militar.
Até o colapso da União Soviética, a diplomacia internacional foi pautada
pela noção baseada em recursos de ‘balanço de poder’. Os resultados finais da maior
parte das principais guerras foram determinados pela superioridade em recursos. O
desconforto do Alto Comando Militar Alemão em relação à estratégia militar adotada
pela Alemanha durante a Segunda Guerra Mundial foi baseado no fato de que este país
32
não dispunha de recursos suficientes para atuar simultaneamente em diferentes fronts de
batalha em países ocidentais, orientais e do norte da África, com atuações no céu e no
mar. O historiador militar LIDELL HART argumenta que o princípio fundamental da
estratégia militar é ‘a concentração das forças contra as fraquezas’ (GRANT, 2005, p.
132).
De acordo com HOSKISSON et. al. (2004) recursos (resources),
capacitações (capabilities) e competências essenciais (core competences) são as
características que proporcionam a base para a criação de vantagem competitiva para as
empresas.
Na verdade, essas características estão interelacionadas, no sentido de
que uma característica depende da outra. Segundo estes autores, os recursos são a fonte
das capacitações das empresas. As capacitações são, por sua vez, a fonte das
competências essenciais, que são a base das vantagens competitivas.
O conceito de recursos é amplo e cobre um espectro de fatores
individuais, sociais e organizacionais. Tipicamente, um recurso isoladamente não é
capaz de determinar uma vantagem competitiva, fazendo-se necessária uma combinação
de recursos para que a vantagem competitiva seja criada, segundo HOSKISSON et. al.
(2004).
De acordo com HARRISON (2003), nos últimos anos outra perspectiva
sobre desenvolvimento de estratégia ganhou grande receptividade. De todo modo,
apesar da maior aceitação recente, o método de administração estratégica baseada em
recursos, na verdade, tem suas raízes no trabalho dos primeiros teóricos da
administração estratégica (BARNEY & ARIKAN, 2001 apud HARRISON, 2003). Este
método da administração baseada em recursos surgiu a partir desta pergunta: “Por que
algumas empresas têm consistentemente um desempenho melhor do que outras? ”.
HARRISON (2003) afirma que uma resposta inicial a essa pergunta era
que algumas empresas conseguiam desenvolver recursos e competências diferenciadas
em determinadas áreas.
“O método de administração estratégica baseada em recursos considera a empresa
como um conjunto de recursos; as empresas podem obter vantagem competitiva se possuírem recursos
superiores” (HARRISON, 2003, p. 29).
De acordo com HOSKISSON et. al. (2004) alguns recursos são tangíveis,
enquanto outros são intangíveis. Recursos tangíveis são ativos que podem ser
33
observados e quantificados. Equipamentos pertencentes à linha de produção e as
próprias plantas industriais são exemplos de recursos tangíveis.
Já os recursos intangíveis incluem ativos que estão profundamente
enraizados na história da firma e são acumulados ao longo do tempo. Pelo fato de
estarem estabelecidos em padrões únicos e exclusivos de rotina, os recursos intangíveis
são difíceis de serem analisados e copiados pelos competidores. Conhecimento,
confiança entre funcionários e gerentes, idéias, capacidade de inovação, competências
gerenciais, rotinas organizacionais (maneiras únicas das pessoas trabalharem em
conjunto), capacitações científicas, a reputação da empresa e como a empresa interage
com as pessoas (funcionários, clientes e fornecedores), são todos exemplos de recursos
intangíveis.
Os quatro tipos de recursos tangíveis são: financeiros, organizacionais,
físicos e tecnológicos. Já os três tipos de recursos intangíveis são os recursos humanos,
inovadores e reputacionais. (BARNEY, 1991; GRANT, 1991, apud HOSKISSON et.
al., 2004).
O Quadro 2.2 apresenta alguns exemplos de recursos tangíveis, enquanto
o Quadro 2.3 apresenta exemplos de recursos intangíveis.
34
QUADRO 2.2 - Recursos Tangíveis
Recursos
A capacidade da firma se financiar.
A capacidade da firma
g
erar fundos.
Recursos Organizacionais
A estrutura formal de relatórios da empresa, que inclui
seus sistemas formais de planejamento, controle e
coordenação.
Recursos Físicos Sofisticação de equipamentos e localização da empresa.
Acesso a matérias-primas.
Recursos Tecnológicos
"Estoque" de tecnologia como patentes, trademarks
(
marcas re
g
istradas
)
e co
py
ri
g
hts
(
direitos autorais
)
.
Descrição
Recursos Financeiros
Fonte: BARNEY, 1991; GRANT, 1991 (apud HOSKISSON et. al. (2004, p. 109)
QUADRO 2.3 - Recursos Intangíveis
Recursos
Conhecimento
Confiança
Capacitações Gerenciais
Rotinas Organizacionais
Idéias
Capacitações científicas
Capacidade em inovar
Reputação com consumidores
Marca
Percepção de qualidade, durabilidade e confiança nos produtos.
Reputação com fornecedores, de forma a criar interações e relações
mutamente eficientes e eficazes.
Descrição
Recursos Inovadores
Recursos Reputacionais
Recursos Humanos
Fonte: HALL, 1992; GRANT, 1991 (apud HOSKISSON et. al. (2004, p. 109)
JOHNSON et. al. (2007) qualificam os recursos tangíveis como os ativos
físicos de uma organização, como fábrica, mão-de-obra e finanças. Em contraste,
recursos intangíveis são os ativos não-físicos, como informações, reputação e
conhecimento. Geralmente, os recursos de uma organização podem ser considerados
dentro das quatro categorias abaixo:
35
a. Recursos físicos: como o número de máquinas, imóveis ou capacidade de
produção da organização. A natureza desses recursos, como idade, condição,
capacidade e localização de cada um, vai determinar sua utilidade;
b. Recursos financeiros: como capital, dinheiro, devedores, credores e
fornecedores de dinheiro (acionistas, bancos etc.);
c. Recursos humanos: incluem o número e o mix (ex.: perfil demográfico) de
pessoas numa organização. O recurso intangível das habilidades e
conhecimentos de cada um também tende a ser importante. Isso se aplica tanto
aos funcionários como a outras pessoas na rede de uma organização. Nas
economias baseadas em conhecimento, as pessoas genuinamente tornam- se o
ativo mais valioso;
d. Capital intelectual: é um aspecto importante dos ativos intangíveis de uma
organização. Inclui patentes, marcas, sistemas empresariais e bancos de dados de
clientes. Não deve haver dúvida de que esses recursos têm seu valor, pois
quando as empresas são vendidas, parte do valor é representada pela “clientela”.
Numa economia baseada em conhecimento, o capital intelectual tende a ser um
ativo importante para muitas organizações.
Já para WALKER (2007), um recurso é um ativo relativamente
observável e comercializável que contribui para o posicionamento de mercado de uma
firma ao melhorar o valor ao consumidor ou reduzir custos (ou ambos). Como exemplo
o autor cita a localização geográfica, que seria o “mantra” de um competidor no varejo
(“localização, localização, localização”). O autor cita os seguintes exemplos de
recursos:
a. Uma patente ou uma combinação de patentes de um produto (neste caso, o autor
menciona a patente do microprocessador original de um computador, ou a
patente da primeira televisão);
b. Um processo desenvolvido por uma firma, que o autor chama de “processo
proprietário” (no caso, ele menciona o processo que a Illinois Tool Works
desenvolveu para produzir screws especializados para plástico e concreto);
36
c. Propriedade de uma fonte abundante ou valiosa de determinado recurso mineral
(ex.: uma mina);
d. Uma marca bem estabelecida (ex.: IBM, Porsche);
e. Uma rede eficiente de distribuição (ex.: os revendedores de tratores da
Caterpillar nos Estados Unidos).
Para este mesmo autor, alguns recursos, como uma patente ou
localização geográfica, mantêm seu valor com apenas um pouco de manutenção. Porém,
outros recursos, como uma marca ou um canal de distribuição, necessitam de uma
manutenção contínua para a sustentação de seus valores. Por exemplo, o valor de uma
marca depende de um design de produto efetivo e decisões de marketing, como a
Reebok e a Adidas descobriram ao competirem contra a Nike no mercado de tênis
esportivos.
De acordo com HARRISON (2003), para muitos autores o sucesso
organizacional pode ser explicado em termos de recursos e capacidades possuídas por
uma organização. Segundo esta visão, uma organização é um conjunto de recursos que
se encaixam nas categorias gerais de: 1-) recursos financeiros, incluindo todos os
recursos monetários com os quais uma empresa pode contar; 2-) recursos físicos, como
fábricas, equipamentos, instalações e acesso a matérias-primas; 3-) recursos humanos,
que englobam as habilidades, a formação e o treinamento de gerentes e funcionários, e
também a maneira como eles são organizados; 4-) conhecimento e aprendizado
organizacional; e 5-) recursos organizacionais gerais, incluindo reputação da empresa,
nomes de marca, patentes, contratos e relações com agentes externos.
A organização como um conjunto de recursos é representada na Figura
2.2.
37
Recursos organizacionais gerais
1-) Reputação da empresa;
2-) Nome de marcas e patentes;
3-) Contratos
4-) Relações com Pis
Recursos financeiros Recursos físicos
1-) Fontes de financiamento
Conhecimento e aprendizado
1-) Fábricas e equipamentos;
interno e externo
organizacional
2-) Localizações da organização;
2-) Situação financeira 3-) Acesso a matérias-primas.
Recursos humanos
1-) Habilidades, formação e treinamento
de gerentes e funcionários;
2-) Estrutura organizacional
Fonte: HARRISON (2003, p. 3)
FIGURA 2.2 - A Organização como um Conjunto de Recursos
Para produzir uma vantagem econômica, um recurso precisa ser difícil de
ser imitado pelos competidores ou dificilmente neutralizado por um substituto.
WALKER (2007) cita a fórmula da Coca-Cola como exemplo de recurso não imitável
ou substituível. Segundo o autor, a Coca-Cola criou uma enorme presença global
baseada em seu sabor, que advém do xarope cuja fórmula apenas a Coca-Cola possui. A
empresa guarda em segredo os ingredientes deste xarope, de forma a prevenir que seus
competidores imitem seu sabor. Sem o xarope, seria inconcebível a Coca-Cola ter
atingido tamanha aceitação de seu produto. Esta conceituação de WALKER (2007)
aproxima-se, de certa forma, do conceito de competências essenciais.
2.1.3 Capacitações (ou Capacidades)
Sozinhos, os recursos realizam pouco. É pelo trabalho conjunto que os
recursos executam tarefas produtivas e assim estabelecem a vantagem competitiva. A
capacidade organizacional é o nome dado à capacidade que a empresa tem de realizar
tarefas e atividades específicas (CRAIG & GRANT, 1999). É interessante observar que
o conceito de capacitações também pode ser definido e/ou traduzido pela terminologia
capacidades. De todo modo, no presente trabalho assumir-se-á unicamente a
terminologia “capacitações” para explicitar o conceito de capabilities.
38
Como distinguir os recursos das capacitações? DRANOVE &
MARCIANO (2005) apresentam uma receita prática e original. De acordo com estes
autores, os recursos seriam como substantivos, ou ‘itens’ que as firmas possuem. É
geralmente fácil identificar os recursos-chave das organizações bem sucedidas. Os
autores citam o caso da Avon, que possui uma ampla linha de cosméticos de boa
qualidade e um time de vendedoras leais, que possui relacionamento muito próximo de
suas consumidoras. Já o eBay possui uma tecnologia diferenciada para realizar leilões
on-line e uma grande base instalada de vendedores e compradores.
CRAIG & GRANT (1999), afirmam que a análise das capacitações
começa com a classificação das atividades da empresa. Antes de perguntar: ‘O que a
empresa faz eficientemente?’, é necessário primeiro indagar: ‘O que a empresa faz?’.
Um motivo comum do fracasso dos negócios não é a ausência de capacitações, mas a
inabilidade de reconhecer quais são elas e colocá-las em prática. Portanto, a análise das
capacitações deve começar com um reconhecimento cuidadoso das atividades que a
empresa desempenha.
Para CRAIG & GRANT (1999), os recursos são os patrimônios
específicos da empresa: bens de capital, qualificação dos funcionários, patentes, marcas
e similares. As capacitações são o que a empresa pode fazer: o resultado dos recursos
trabalhando em conjunto para realizar tarefas produtivas.
Capacitações seriam verbos, na ótica de DRANOVE & MARCIANO
(2005). Em outras palavras, as capacitações demonstram o que as empresas fazem com
seus recursos. A Avon, segundo os autores, torna o processo de compra em algo
divertido, enquanto que o eBay, além de tornar o processo de compra divertido, também
garante aos participantes os melhores preços possíveis.
BESANKO et al (2004) fazem uma comparação semelhante à realizada
por DRANOVE & MARCIANO (2005). Para estes autores também se pode imaginar os
recursos como substantivos (os itens que as firmas possuem), enquanto que as
capacitações são os ítens que a firma faz. As capacitações podem residir em
determinadas funções. Como exemplo, os autores citam as habilidades da Procter &
Gamble na promoção de sua(s) marca(s), bem como a habilidade da empresa Nine West
em gerenciar suas funções de originação e procurement no negócio de sapatos fashion.
39
Para SANCHEZ & HEENE (2004), as capacitações correspondem ao
padrão repetitivo de ações que as organizações adotam no uso de seus ativos. Em outras
palavras, as capacitações são recursos baseados em ações que ocupam um nível médio
na hierarquia de habilidades que uma empresa deve ter. No nível mais básico, os
indivíduos que fazem parte das organizações possuem habilidades, que representam a
capacidade individual em realizar determinada tarefa. Já as capacitações surgem em
uma organização quando grupos ou times de indivíduos são capazes de coordenar suas
habilidades na condução de processos de importância para as atividades que geram
valor para a organização como um todo.
O Quadro 2.4 sintetiza as diferenças entre recursos e capacitações, na
ótica de DRANOVE & MARCIANO (2005).
QUADRO 2.4 - Recursos e Capacitações
Recursos x Capacitações Descrição Exemplos
Patentes
Mão-de-obra
Talentos
Marcas
Localização
Produzir eficientemente
Oferecer bons produtos e serviços
Ordem customizadas
Capacitações
Substantivos: Itens que as
empresas possuem
Recursos
Verbos: Itens que as empresas
"fazem bem"
Fonte: DRANOVE & MARCIANO (2005, p. 51)
Para CRAIG & GRANT (1999), existem muitos métodos que podem ser
usados para identificar e classificar as capacitações de uma empresa. Duas estruturas
comuns são a classificação funcional e a cadeia de valor.
Do mesmo modo que os negócios são organizados, tipicamente, segundo
linhas funcionais, as capacitações organizacionais também podem ser descritas e
classificadas por área funcional.
Já a cadeia de valor é uma representação gráfica das atividades de uma
empresa, organizada de maneira a mostrar a seqüência dessas atividades. A cadeia de
valor fornece uma estrutura poderosa para identificação e avaliação dos recursos e
capacitações de uma empresa, em parte porque facilita as comparações entre empresas,
considerando tanto as atividades individuais como a estruturação das atividades. A
40
TECNOLOGIA
PROJETO DO
PRODUTO
FABRICAÇÃO MARKETING DISTRIBUIÇÃO ATENDIMENTO
Fonte
Sofisticação
Patentes
Escolha de
produto/
processo
Função
Características
físicas
Estética
Qualidade
Integração
Matérias-primas
Capacidade
Localização
Compra
Produção de
peças
Montagem
Preços
Propaganda/
promoção
Força de vendas
Localização
Embalagem
Marca
Canais
Integração
Estoque
Armazenagem
Transporte
Garantia
Velocidade
Cativo/
independente
Preços
representação mais simples da cadeia de atividades de uma empresa é o sistema
empresarial da McKinsey & Co. A cadeia de valores genéricos desenvolvida por
PORTER (1992) analisa as atividades da empresa em detalhes maiores, distinguindo
entre atividades operacionais (ou ‘primárias’) e atividades de apoio.
A figura 2.3 apresenta a cadeia de valor do sistema empresarial da
McKinsey.
Fonte: CRAIG & GRANT (1999, p. 40)
FIGURA 2.3 - Cadeia de Valores – McKinsey
Para JOHNSON et. al (2007), se as empresas querem atingir vantagem
competitiva entregando valor aos clientes, elas precisam entender como esse valor é
criado ou perdido. Os conceitos de cadeia de valor e rede de valor podem ser úteis para
entender como o valor é criado ou perdido em termos de atividades desempenhadas
pelas organizações. De acordo com estes autores, a cadeia de valor descreve as
atividades dentro e em torno da organização que, juntas, criam um produto ou serviço. É
o custo dessas atividades de valor e o valor que elas representam que determinam o
desenvolvimento de produtos ou serviços de melhor valor.
Já a rede de valor é o conjunto de associações e relações
interoganizacionais necessárias para criar um produto ou serviço. A rede de valor existe
porque, na maioria dos segmentos, é raro que uma única organização desempenhe
internamente todas as atividades de valor, desde o projeto do produto até a entrega do
produto ou serviço final para o cliente. Geralmente há especialização de papéis e cada
organização faz parte da rede de valor mais ampla.
41
Para PORTER (1992), a cadeia de valores desagrega uma empresa nas
suas atividades de relevância estratégica para que se possa compreender os
comportamentos dos custos e as fontes potenciais e existentes para a diferenciação. A
cadeia de valores é um ferramental analítico para examinar de forma sistemática todas
as atividades executadas por uma empresa e do modo como elas interagem. Das
atividades da empresa e da interação entre elas surgem as fontes de vantagem
competitiva.
Em termos competitivos, valor é a quantidade (de unidades monetárias)
que um comprador deseja pagar pelo que determinada firma lhe proporciona. Os
consumidores obtêm valor através da diferenciação de produtos, custo dos produtos e da
habilidade da empresa atingir suas necessidades. Atividades geradoras de valor são,
portanto, os ‘tijolos’ da construção da vantagem competitiva (DE KLUYVER &
PEARCE, 2003).
A cadeia de valores exibe o valor total e consiste em margem e
atividades de valor. As atividades de valor são as atividades física e tecnologicamente
distintas, através das quais uma empresa cria um produto valioso para os seus
compradores. A margem é a diferença entre o valor total e o custo coletivo da execução
das atividades de valor. A margem pode ser medida de várias formas. As cadeias de
valores do canal e do fornecedor também incluem uma margem cujo isolamento é
importante para a compreensão das fontes de posição de custo de uma empresa, pois as
margens do canal e do fornecedor fazem parte do custo total arcado pelo comprador.
Uma cadeia de valor é, portanto, a representação (modelo) dos processos
envolvidos em um negócio. Ela decompõe o processo de criação de valor em uma série
de atividades, começando com o processamento de matérias-primas e terminando com
as vendas e serviços prestados aos usuários finais. A análise da cadeia de valor envolve
o estudo dos custos e elementos de diferenciação de produtos ou serviços através da
cadeia de atividades e dos elos entre as atividades, de forma a determinar as atuais e
potenciais fontes de vantagem competitiva (DE KLUYVER & PEARCE, 2003).
De acordo com PORTER (1992), atividades de valor podem ser divididas
em dois tipos gerais, atividades primárias e atividades de apoio. As atividades primárias
são as atividades envolvidas na criação física do produto e na sua venda e transferência
para o comprador, bem como na assistência após a venda.
42
DE KLUYVER & PEARCE (2003) baseiam suas afirmações no modelo
de valor de PORTER (1992). Segundo estes autores, a cadeia de valor divide os
processos de negócios de uma empresa em atividades componentes que geram valor: as
atividades primárias que contribuem com a criação física do produto, e as atividades de
suporte, que auxiliam as atividades primárias e até mesmo as atividades de suporte.
A Figura 2.4 apresenta a cadeia de valores genérica preconizada por
PORTER (1992).
INFRA-ESTRUTURA DA EMPRESA
GERÊNCIA DE RECURSOS HUMANOS
DESENVOLVIMENTO DE TECNOLOGIA
AQUISIÇÃO
LOGÍSTICA
INTERNA
OPERAÇÕES LOGÍSTICA
EXTERNA
MARKETING
& VENDAS
SERVIÇO
ATIVIDADES PRIMÁRIAS
ATIVIDADES
DE APOIO
M
AR
G
E
M
M
A
R
G
E
M
Fonte: PORTER (1992, p. 34)
FIGURA 2.4 - A Cadeia de Valores Genérica
A identificação das atividades de valor exige o isolamento de atividades
tecnológica e estrategicamente distintas. As atividades de valor e as classificações
contábeis raramente são as mesmas. As classificações contábeis (por exemplo,
encargos, despesas indiretas, mão-de-obra direta) agrupam atividades com tecnologias
discrepantes e separam custos que fazem parte da mesma atividade.
PORTER (1992) menciona que existem cinco atividades genéricas de
naturezas distintas envolvidas na concorrência em qualquer indústria, conforme pode
43
ser observado na figura 5. Cada categoria pode ser dividida em uma série de atividades
distintas que dependem da indústria particular e da estratégia da empresa:
a. Logística Interna: atividades associadas ao recebimento, armazenamento e
distribuição de insumos no produto, como manuseio de material, armazenagem,
controle de estoque, programação de frotas, veículos e devolução para
fornecedores;
b. Operações: atividades associadas à transformação dos insumos no produto final,
como trabalho com máquinas, embalagens, montagem, manutenção de
equipamento, testes, impressão e operações de produção;
c. Logística externa: atividades associadas à coleta, armazenamento e distribuição
física do produto para compradores, como armazenamento de produtos
acabados, manuseio de materiais, operação de veículos de entrega,
processamento de pedidos e programação;
d. Marketing e Vendas: atividades associadas a oferecer um meio pelo qual
compradores possam comprar o produto e a induzi-los a fazer isto. Tais
atividades incluem propaganda, promoção, uso de força de vendas, cotação,
seleção de canal, relações com canais e fixação de preços;
e. Serviço: atividades associadas ao fornecimento de serviços para intensificar e
manter o valor do produto, como instalação, conserto, treinamento, fornecimento
de peças e ajuste do produto.
Já as atividades de valor de apoio, que também estão em envolvidas na
concorrência em qualquer indústria, podem ser divididas em quatro categorias
genéricas, também apresentadas na figura 2.5.
a. Aquisição: a aquisição refere-se à função de compra de insumos empregados na
cadeia de valor da empresa, e não aos próprios insumos adquiridos. Insumos
adquiridos incluem matérias-primas, suprimentos e outros itens de consumo,
bem como ativos como máquinas, equipamentos de laboratório, equipamento de
escritório e prédios. Embora estes insumos adquiridos estejam comumente
associados a atividades primárias, eles estão presentes em cada atividade de
44
valor, como atividades de apoio. PORTER (1992) cita como exemplo o caso de
aquisição de suprimentos laboratoriais e serviços de testes independentes, que
são insumos adquiridos comuns no desenvolvimento de tecnologia, enquanto
uma firma de contabilidade é um insumo adquirido comum na sua infra-
estrutura. Como todas as atividades de valor, a aquisição emprega uma
‘tecnologia’, como, por exemplo, procedimentos para lidar com vendedores,
normas de qualificação e sistemas de informação;
b. Desenvolvimento de Tecnologia: Cada atividade de valor engloba tecnologia,
seja ela know-how, procedimentos ou a tecnologia envolvida no equipamento do
processo. A variedade de tecnologias empregadas na maioria das empresas é
muito ampla, variando daquelas empregadas na preparação de documentos e no
transporte de mercadorias até aquelas envolvidas no próprio produto. Além
disto, a maioria das atividades de valor emprega uma tecnologia que combina
uma série de subtecnologias diferentes envolvendo diferentes disciplinas
científicas. A operação com máquinas, por exemplo, envolve metalurgia,
eletrônica e mecânica;
c. Gerência de Recursos Humanos: A gerência de recursos humanos consiste em
atividades envolvidas no recrutamento, na contratação, no treinamento, no
desenvolvimento e na compensação de todos os tipos de pessoal. A gerência de
recursos humanos apóia as atividades primárias e de apoio (por exemplo,
contratação de engenheiros) e a cadeia de valores inteira (por exemplo,
negociações trabalhistas). As atividades da gerência de recursos humanos
ocorrem em diferentes partes de uma empresa, conforme outras atividades de
apoio, e a dispersão destas atividades pode resultar em políticas inconsistentes.
Além disso, os custos cumulativos da gerência de recursos humanos raramente
são bem compreendidos, assim como os trade-offs em diferentes custos da
gerência de recursos humanos, como o salário comparado ao custo de
recrutamento e treinamento, devido à rotatividade;
d. Infra-estrutura da Empresa: A infra-estrutura da empresa consiste em uma série
de atividades, incluindo gerência geral, planejamento, finanças, contabilidade,
problemas jurídicos, questões governamentais e gerência de qualidade. A infra-
estrutura, ao contrário de outras atividades de apoio, geralmente dá apoio à
45
cadeia inteira, e não a atividades individuais. Dependendo de a empresa ser
diversificada ou não, a sua infra-estrutura pode ser fechada ou dividida entre
uma unidade empresarial e a corporação da matriz. Em empresas diversificadas,
as atividades as infra-estrutura são em geral divididas entre a unidade
empresarial e os níveis da empresa (por exemplo, o financiamento quase sempre
é feito no nível da empresa, enquanto a gerência de qualidade é feita no nível da
unidade empresarial). Muitas dessas atividades ocorrem, contudo, em ambos os
níveis.
Feitas as devidas considerações sobre como a cadeia de valor pode ser
uma ferramenta interessante para demonstrar as capacitações de uma firma, é
importante ressaltar a forte relação existente entre capacitações superiores e vantagens
competitivas. LASERRE (2003), por exemplo, menciona a relação intrínseca entre
capacitações e vantagens competitivas. Segundo este autor, vantagens competitivas são
capacitações difíceis de serem imitadas, replicadas e que são não comercializáveis.
Interessante notar que estas características também são a base para conceituar
competências essenciais, conforme poderá ser visto no tópico seguinte, sendo, portanto,
possível inferir uma correlação entre capacitações, competências essenciais e vantagens
competitivas.
De forma geral, é possível distinguir dois tipos de capacitações que
levam a vantagens competitivas:
a. Capacitações levando à geração de valor para o consumidor através de
desempenho, qualidade, serviços e marca (reputação), por intermédio de uma
proposição de diferenciação;
b. Capacitações levando a uma base de custos mais baixos, como mão-de-obra
mais barata, matéria-prima mais barata, economias de escala e eficiência, por
meio de uma proposição de liderança em custos.
As proposições acima, baseadas em PORTER (1986), possibilitaram a
construção do Quadro 2.5, no qual LASSERRE (2003) estabelece alguns tipos de
capacitações que levam aos dois tipos diferentes de vantagens competitivas
(diferenciação e baixo custo).
46
QUADRO 2.5 - Capacitações levando à Vantagem Competitiva
Capacitações levando à criação de valor para os
consumidores através da diferenciação
Capacitações levando à posição de baixo
custo
Tecnologia avançada Matéria-prima de baixo custo
Qualidade superior Mão-de-obra barata
Design inovador Economias de escala
Melhores funcionalidades Economias de escopo
Customização Volumes cumulativos
Melhores serviços Base de consumidores
Compras "one-stop" Externalidades de rede
Vendas inteligentes Processos tecnológicos eficientes
Valor e imagem da marca Gestão do tempo
Distribuição responsiva Gestão da produtividade
Relacionamento com clientes
Serviços aos clientes
Facilidade com financiamentos
Fonte: LASSERRE (2003, p. 47).
Nota-se, através das afirmações acima, a estreita relação entre recursos,
competências e vantagens competitivas. O tópico a seguir inserirá o conceito de
competências essenciais.
2.1.4. Competências Essenciais – Core Competences
O conceito de competências essenciais ganhou destaque no contexto
empresarial e no mundo acadêmico com a publicação do artigo ‘The Core Competence
of the Organization’, de PRAHALAD & HAMEL, em 1990. De acordo com estes
autores, as competências essenciais correspondem ao aprendizado coletivo na
organização, especialmente como coordenar as diversas habilidades de produção e
integrar as múltiplas correntes de tecnologias.
Entretanto, o conceito de competências essenciais não diz respeito
exclusivamente aos aspectos tecnológicos. De acordo com estes autores, o conceito de
competências essenciais também está associado à organização do trabalho e à entrega de
valor. FLEURY & FLEURY (2003) mencionam que as competências essenciais não
estão estritamente relacionadas à tecnologia, mas podem estar localizadas em qualquer
função administrativa. Além disso, para desenvolver competência essencial em longo
47
prazo, a companhia necessita de um processo sistemático de aprendizagem e inovação
organizacional.
De acordo com JOHNSON et al (2007), os recursos são importantes, mas
o que uma organização faz – como ela emprega seus recursos e dispõe deles – é tão
importante quanto os recursos que ela possui. Não faz sentido ter equipamentos de
última geração ou conhecimento valioso ou um marca valiosa se isso não for usado de
forma efetiva. A eficiência e eficácia dos recursos físicos ou financeiros, ou das pessoas
em uma organização, dependem não apenas de sua existência, mas da forma como são
gerenciados, da cooperação entre as pessoas, sua capacidade de adaptação, sua
capacidade de inovação, da relação com clientes e fornecedores e da experiência e
aprendizado sobre aquilo que funciona bem e o que não funciona bem. Para estes
autores, o termo competência significa as atividades e os processos através dos quais
uma organização dispõe de seus recursos efetivamente. Para entender capacidade
estratégica, então, a ênfase não está apenas nos recursos que existem, mas na forma
como eles são usados.
Para RITZMAN & KRAJEWSKI (2004), uma boa habilidade gerencial
isoladamente não pode lidar com mudanças ambientais. A estratégia corporativa é que
precisa lidar com elas. As empresas obtêm sucesso tirando vantagem daquilo que fazem
particularmente bem – isto é, os pontos fortes exclusivos da organização. Para estes
autores, competências essenciais são os recursos exclusivos e pontos fortes da alta
administração que uma organização considera quando formula estratégias. Elas refletem
o conhecimento coletivo da organização, especialmente de modo a coordenar os
diversos processos e integrar as múltiplas tecnologias. Estas qualificações incluem os
seguintes fatores:
a. Equipe de trabalho: uma equipe de trabalho bem treinada e flexível permite às
organizações responderem às necessidades do mercado em tempo hábil. Essa
competência é particularmente importante nas organizações prestadoras de
serviços, nas quais o cliente entra em contato direto com os empregados;
b. Instalações: possuir instalações bem localizadas – escritórios, lojas e fábricas –
constitui uma vantagem básica por causa do tempo necessário para construir
novas instalações. A expansão para novos produtos e serviços pode ser realizada
48
rapidamente. Além disso, instalações flexíveis, que permitem à empresa lidar
com uma variedade de produtos ou serviços em níveis diferentes de volume,
proporcionam uma vantagem competitiva;
c. Know-how mercadológico e financeiro: uma organização que pode obter
facilmente capital pela venda de ações, comercializar e distribuir seus produtos
ou diferenciar seus produtos de similares no mercado possui uma vantagem
competitiva;
d. Sistemas e tecnologia: as organizações especializadas em sistemas de
informação terão uma vantagem em indústrias que utilizam intensivamente
dados e informações, como o setor bancário. Particularmente vantajosa é a
especialização em tecnologias e aplicações da Internet, tais como os sistemas
empresa-consumidor (business-to-consumer, ou B2C) e empresa-empresa
(business-to-business, ou B2B). Possuir as patentes de uma tecnologia nova
constitui também uma grande vantagem.
O conceito de competências essenciais ganhou muitos adeptos, tanto no
mundo acadêmico quanto no mundo corporativo. Entretanto, existem autores que
questionam o conceito por duvidarem de sua praticidade, tendo em vista que muitas
vezes ele não é bem compreendido pelos gestores das empresas. Motivado por este
sentimento, COYNE et al (1997) conduziram uma pesquisa com empresas norte-
americanas, na qual diagnosticaram o uso inapropriado do conceito de competências
essenciais. Segundo os autores, apesar de toda atenção que o conceito recebeu, seu
impacto tangível no desempenho corporativo é, no mínimo, questionável, conforme
pode ser observado pelas afirmações abaixo:
“É difícil definir com precisão o que são as verdadeiras competências essencias, até
mesmo porque estas são geralmente ‘descobertas’ em retrospectiva. Isto é, as competências essenciais
são definidas simplesmente por descrever seus sucessos e fracassos”.
COYNE et al (1997)
“Nós conversamos (com especialistas em competências essenciais) e pedimos que eles
nos ajudassem a identificar nossas competências essenciais. Porém, após termos feito com que eles
trabalhassem com nossa gerência sênior, através de alguns exercícios em grupo, o que nós tínhamos em
mãos era uma verdadeira bagunça. Nós não conseguimos definir o que era ‘essencial’ e o que não era
‘essencial; também não conseguimos definir o que era ‘competência’ em contraposição a ‘alguns
processos que nós apenas fazíamos bem’”. COYNE et al (1997)
49
COYNE et al (1997) prosseguem afirmando que se está diante de um
paradoxo. O conceito de competências essenciais é claramente importante e algumas
companhias parecem ter a habilidade de fazer este conceito funcionar. Porém, para a
maioria dos gerentes, o conceito de competências essenciais é como se fosse uma
miragem: algo que parece oferecer algum tipo de esperança em um ambiente hostil
quando visto de longe, porém se transforma em areia quando visto de perto.
A despeito do eventual desconhecimento sobre o conceito, o fato é que o
mesmo possui boa aceitação no mundo acadêmico, com pesquisas sendo conduzidas de
forma a analisar as competências essenciais de empresas de diferentes setores.
FLEURY & FLEURY (2003) fazem parte do rol dos pesquisadores que
estudaram competências essenciais de empresas brasileiras. Estes autores partem do
estudo clássico de WOODWARD (1965) – ‘Industrial Organization: theory and
practice’ para construir uma tipologia para competências organizacionais (essenciais).
A pesquisa realizada por WOODWARD (1965) foi realizada com empresas britânicas e
estabeleceu que toda empresa possui, em diferentes proporções, competências
relacionadas a três diferentes funções: Operações (Produção e Logística),
Desenvolvimento de Produto e Comercialização (Vendas & Marketing).
Dependendo do tipo de produto/ mercado, umas das funções vai ser mais
importante e ‘ter mais poder’ do que as outras, na medida em que exercerá um papel de
coordenação geral entre as funções. FLEURY & FLEURY (2003) afirmam que para a
realização da estratégia da empresa, as competências acumuladas nesta função crítica
constituem a ‘competência essencial da empresa’. Em outras palavras, ela (a função
crítica – competência essencial) é a mais importante para a realização da estratégia
competitiva da empresa e as demais funções são de apoio.
A estratégia da Excelência Operacional é aplicada pelas empresas que
competem em mercados nos quais a relação qualidade/ preço é a maior determinante da
competitividade de produtos ou serviços. Ainda segundo FLEURY & FLEURY (2003),
são nesses casos em que se encontram as ‘estratégias baseadas em operações’, como
descritas por HAYES & UPTON (1998). Estes autores afirmam que “a eficiência
operacional superior fortalece a posição competitiva da empresa e, quando baseada na
capacidade dos seus recursos humanos e nos seus processos operacionais, dificulta a
50
imitação pelos concorrentes. Por essa razão, pode prover a base para que a companhia
adote a mesma posição competitiva de uma ou mais concorrentes”.
A estratégia da Excelência Operacional implica desenvolver e colocar no
mercado produtos/ serviços que aperfeiçoem a relação qualidade/ preço. A lucratividade
da empresa é função direta da margem por produto e da escala de produção.
Por outro lado, as companhias que competem com uma estratégia de
‘Inovação em Produto’ estão continuamente investindo para criar conceitos de produto
radicalmente novos para clientes e segmentos de mercados definidos. A função crítica é
Pesquisa & Desenvolvimento & Engenharia (P&D&E), ainda de acordo com FLEURY
& FLEURY (2003). Os autores mencionam as indústrias de Tecnologia da Informação
(TI), Telecomunicações, Computação e Internet como sendo guiadas pela Inovação em
Produto. De todo modo, segundo ressalva dos próprios autores, também existem
inovadores no mercado de consumo, como a Sony e a 3M.
As empresas baseadas na Inovação em Produto garantem seu sucesso
econômico com a alta lucratividade que alcançam no período em que usufruem a
posição de monopólio de mercado. O que é crítico para esse tipo de companhia é a
rápida concepção de novos produtos e de seus respectivos processos de produção, que
evoluem da escala laboratorial para escala industrial.
Por fim, as empresas que adotam a estratégia ‘Orientada para Cliente’
são voltadas para as necessidades de clientes específicos e procuram se especializar no
desenvolvimento de produtos, sistemas e soluções que atendam a suas demanda atuais e
futuras. Para isso, tais companhias priorizam o desenvolvimento do conhecimento sobre
cada cliente e seu negócio: Vendas & Marketing torna-se a função crítica,
impulsionando os esforços de Pesquisa, Desenvolvimento e Engenharia, e também de
Operações, de acordo com FLEURY & FLEURY (2003). Infere-se, portanto, que no
caso da estratégia ‘Orientada para o Cliente’ a competência essencial da empresa esteja
desenvolvida nas funções de Vendas & Marketing.
PRAHALAD & HAMEL (1990) afirmam que as competências essenciais
são seus recursos críticos, sendo que a alta gerência deve assegurar que os portadores dessa
competência não sejam mantidos presos por algum negócio em particular. Ainda de acordo
com estes autores, as competências essenciais não diminuem com o uso. Ao contrário dos
51
recursos físicos, que se deterioram com o tempo, as competências desenvolvem-se à
medida que são aplicadas e compartilhadas.
Nota-se, através das definições acima, uma correlação entre competências
essenciais, recursos e capacitações. De acordo com HOSKISSON et al. (2003), as
competências essenciais são os recursos e capacitações que servem como a fonte de
vantagem competitiva de uma firma sobre seus competidores. Elas distinguem a empresa
em termos competitivos e refletem sua personalidade. As competências essenciais
emergem ao longo do tempo através de um processo organizacional de acumulação de
aprendizado sobre a melhor utilização dos recursos e capacitações da empresa. Em outras
palavras, segundo os autores, as competências essenciais seriam a ‘jóia da coroa’, ou seja,
as atividades que a empresa desempenha especialmente bem comparado com seus
principais competidores.
FITZROY & HULBERT (2005) também estabelecem a relação entre
recursos e competências essenciais. Segundo estes autores, a perspectiva baseada em
recursos (visão baseada em recursos) enxerga a firma como uma combinação única de
recursos e competências que são a base de sua estratégia e sucesso. Os recursos são os
fundamentos mais básicos da firma em termos financeiros e físicos, bem como os atributos
intangíveis da firma. Já as competências se referem à habilidade da firma em combinar e
integrar estes recursos.
Alguns autores, como BESANKO et al. (2004), chegam ao ponto de não
fazer distinção entre capacitações e competências essenciais. Para estes autores,
capacitações são atividades que a firma faz especialmente bem quando comparado com
outras firmas. Outros termos para este conceito seriam competências distintivas e
competências essenciais.
Sob este ponto-de-vista, as diferenças entre o sucesso de diferentes firmas
podem ocorrer por conta dos diferentes recursos e competências que as mesmas possuem.
Isto poderia explicar o porquê empresas do mesmo setor apresentam desempenhos
diferentes (independentemente do grau de atratividade do setor).
CRAIG & GRANT (1999) afirmam que, se uma empresa possui recursos e
capacidades superiores aos de seus concorrentes e adota uma estratégia que utiliza esses
recursos e capacidades de maneira eficaz, ela poderá criar uma vantagem competitiva.
Mas, em termos de capacidade de tirar proveito dessa posição de vantagem competitiva,
52
uma questão decisiva é o período durante o qual a empresa poderá manter sua vantagem. A
capacidade de sustentação da vantagem competitiva depende de três características
principais de recursos e capacidades: de durabilidade, de transferência e de reprodução;
enquanto que a capacidade de empresa obter lucros de sua vantagem competitiva depende
da capacidade de apropriação desses retornos:
a. Capacidade de durabilidade: o período durante o qual uma vantagem competitiva
se mantém depende, em parte, da velocidade com que os recursos e as capacitações
de uma empresa deterioram-se. Nos setores em que a velocidade de inovação do
produto é grande, é bem provável que as patentes dos produtos se tornem obsoletas.
De modo similar, as capacitações resultantes do conhecimento administrativo
especializado do diretor-superintendente também são vulneráveis à sua
aposentadoria ou saída. Por outro lado, muitas marcas têm um apelo altamente
durável. Se as capacitações forem administradas com cuidado e o treinamento dos
funcionários for eficaz, as capacitações poderão ser mantidas mesmo quando
houver uma mudança de funcionários dos quais essas capacitações dependem;
b. Capacidade de transferência: Mesmo que os recursos e capacitações, nos quais a
vantagem competitiva se baseia, sejam duráveis, é provável que se desgastem pela
concorrência dos adversários. A capacidade de os rivais atacarem posições de
vantagem competitiva depende do acesso aos recursos e capacitações necessárias.
Quanto mais fácil for a transferência de recursos e capacitações entre empresas,
menos sustentável será a vantagem competitiva que serve de base a eles. Os ativos
físicos e as habilidades associadas a funcionários individuais estão entre os ativos
mais facilmente transferíveis. Se a vantagem de custo da empresa baseia-se no
investimento em equipamentos automatizados de última geração, mas se o
equipamento for fornecido por um terceiro, outras empresas poderão adquirir a
mesma vantagem. Outros recursos apresentam uma alta probabilidade de serem
específicos a determinadas empresas (a reputação corporativa, por exemplo),
enquanto certas capacitações, quando dependentes de grupos de pessoas que
trabalham juntas, também são difíceis de transferir;
c. Capacidade de reprodução: se os recursos e capacitações não podem ser
comprados por um provável imitador, eles devem ser construídos a partir do nada.
53
Com que facilidade e rapidez seus concorrentes desenvolvem os recursos e
capacitações nos quais sua vantagem competitiva se baseia? Em algumas empresas,
a reprodução é fácil: nos serviços financeiros, as inovações não têm proteção legal
e são facilmente copiadas. Aqui, novamente, a complexidade de muitas
capacidades organizacionais pode fornecer certo grau de defesa competitiva.
Quando as capacitações exigem redes de rotinas organizacionais, cuja eficácia
depende da cultura corporativa,a reprodução é difícil. Freqüentemente, existem
muitos fatores sutis que formam a base do sucesso de rotinas organizacionais
complexas, tais como o JIT (just-in-time) ou os círculos de qualidade, em que as
normas de cooperação social, juntamente com a cultura corporativa, são decisivas
para o sucesso;
d. Capacidade de apropriação: Mesmo nos casos em que os recursos e as
capacitações possam proporcionar uma vantagem sustentável, ainda existe a
questão de quem recebe os retornos sobre esses recursos. Esse é especificamente o
caso das habilidades humanas e das capacitações baseadas nelas. Enquanto uma
empresa possui seus ativos físicos e sua tecnologia própria, os funcionários
possuem suas habilidades e, na medida em que uma parte do lucro (ou ‘renda’)
obtido pela empresa é um retorno sobre o know-how, como esse lucro deverá ser
dividido entre o proprietário da empresa e seus funcionários? A capacidade de
apropriação é capacidade que o proprietário da empresa tem de apropriar os lucros
à sua base de recursos. O problema de indivíduos altamente qualificados, que se
apropriam da maior parte das rendas associadas às suas qualificações, é
particularmente importante em empresas tais como consultoria administrativa,
serviços financeiros, agências de publicidade, produtora de filmes e propaganda, A
razão de tantas empresas de serviços profissionais serem organizadas como
parcerias e não como corporações é, em parte, um desejo de evitar conflitos de
interesses e de prender os profissionais à empresa. O desejo de evitar que se
dependa estrategicamente de indivíduos estimulou várias empresas de consultoria
administrativa e agências de publicidade a organizarem-se para que as capacitações
sejam baseadas na equipe e não em indivíduos.
54
Como então identificar e construir as competências essenciais? Para
HOSKISSON et. al (2004), existem duas ferramentas que ajudam nesta tarefa. A primeira
ferramenta consiste na aplicação de quatro critérios específicos de vantagem competitiva
sustentável que as empresas devem usar para determinar se seus recursos e capacitações
são, ou têm potencial de ser, competências essenciais. A segunda ferramenta é a análise da
cadeia de valor, previamente discutida no tópico anterior sobre capacitações. As empresas
usam esta ferramenta para selecionar as competências criadoras de valor que deveriam ser
mantidas, melhoradas ou desenvolvidas, bem como aquelas que deveriam ser terceirizadas.
A aplicação da primeira ferramenta (quatro critérios específicos de
vantagem competitiva sustentável) inicia-se com a análise que está sintetizada na Figura
2.5.
Recursos:
Insumos para o processo
produtivo de uma firma
A fonte de
Capacitações:
Integração de uma série
de recursos
Competência Essencial:
Uma capacitação
estratégica
A capacitação satisfaz o
critério de ser uma vantagem
competitiva sustentável?
Capacitação
Um agrupamento de
recursos não estratégicos
Sim
Não
Fonte: HOSKISSON et al. (2004, p. 115).
FIGURA 2.5 - Competência Essencial como uma Capacitação Estratégica
Resumidamente, tem-se que os recursos são insumos das capacitações, que,
por sua vez podem ou não serem fontes de vantagens competitivas sustentáveis. Caso isso
seja verdadeira, ou seja, a capacitação em questão é uma fonte de vantagem competitiva
sustentável, então ela é uma capacitação estratégica e pode ser denominada competência
essencial. Caso isso não ocorra, a capacitação em questão é apenas um agrupamento de
recursos não estratégicos.
Como determinar se a capacitação é de fato uma fonte de vantagem
competitiva sustentável? HOSKISSON et al (2004) sugerem então a aplicação dos quatro
55
critérios de determinação. Segundo estes autores, para a capacitação ser considerada uma
vantagem competitiva sustentável, ela deverá preencher os quatro critérios, ou seja, deverá
ser:
a. Geradora de Valor: Auxilia a empresa a neutralizar ameaças externas ou explorar
novas oportunidades. Com isso gera valor para o consumidor;
b. Rara (escassa): Não é possuída por vários outros competidores;
c. Difícil de ser imitada: Dividida em ‘histórica’ (cultura ou marca), ‘causa ambígua’
(as causas da competência não estão claras) ‘complexidade social’ (fatores sociais
sendo responsáveis pela competência, como confiança, amizade etc.).
d. Não substituível: Não há opção estratégica equivalente.
De acordo com os autores, as capacitações que são geradoras de valor, raras
(escassas), dificilmente de serem imitadas e que são insubstituíveis podem ser consideradas
competências essenciais. Por conseqüência, capacitações que não atendem os quatro
critérios não são competências essenciais.
O Quadro 2.6 apresenta uma representação gráfica dos quatro critérios
propostos por HOSKISSON et. al. (2004).
QUADRO 2.6 - Resultados das combinações dos critérios para a obtenção da
Vantagem Competitiva Sustentável
Retornos acima
da média
Vantagem
competitiva
sustentável
SimSim Sim Sim
Retornos
ligeiramente
acima da média
Vantagem
competitiva
temporária
Sim/ NãoNãoSimSim
Retornos
semelhante aos
dos competidores
Paridade
competitiva
Sim/ NãoNãoNãoSim
Retornos abaixo
da média
Desvantagem
competitiva
NãoNãoNãoNão
Implicações na
performance da
empresa
Conseqüências
competitivas
Este recurso ou
capacitação é
insubstituível?
Este recurso ou
capacitação é
difícil ou caro de
ser imitado?
O recurso ou
capacitação é
escasso?
O recurso ou
capacitação é
gerador de
valor?
Retornos acima
da média
Vantagem
competitiva
sustentável
SimSim Sim Sim
Retornos
ligeiramente
acima da média
Vantagem
competitiva
temporária
Sim/ NãoNãoSimSim
Retornos
semelhante aos
dos competidores
Paridade
competitiva
Sim/ NãoNãoNãoSim
Retornos abaixo
da média
Desvantagem
competitiva
NãoNãoNãoNão
Implicações na
performance da
empresa
Conseqüências
competitivas
Este recurso ou
capacitação é
insubstituível?
Este recurso ou
capacitação é
difícil ou caro de
ser imitado?
O recurso ou
capacitação é
escasso?
O recurso ou
capacitação é
gerador de
valor?
Fonte: HOSKISSON et. al. (2004, p. 118)
56
Os quatro critérios de HOSKISSON et. al. (2004) acima nortearão a
conceituação de competências essenciais na presente pesquisa.
2.1. Canais de distribuição
2.2.1. Definições e aspectos gerais
De acordo com COUGHLAN et al. (2002), os canais de marketing
(também conhecidos por canais de distribuição) são formados pelas empresas que se
unem para levar produtos e serviços do local de origem ao local de consumo. Os canais
de distribuição representam a parte a jusante da cadeia de valor, sendo a maneira pela
qual o fabricante dos bens ou o prestador dos serviços obtém acesso ao mercado. Dessa
forma, os canais de distribuição constituem um elemento fundamental para a estratégia
comercial.
De acordo com ROSENBLOOM (1999) existe muita confusão
conceitual na definição dos canais de distribuição, sendo que isso ocorre por conta das
diferentes perspectivas ou pontos-de-vista dos membros do canal. Uma indústria, por
exemplo, poderá focar os diferentes intermediários necessários para fazer o produto
chegar até o consumidor final, de forma que ela poderá definir os canais de distribuição
em termos do movimento dos produtos através desses vários intermediários. Já agentes
intermediários, como atacadistas ou varejistas, por exemplo, que geralmente carregam
grandes estoques de produtos oriundos de várias indústrias e por isso correm os riscos
associados com essa função, podem enxergar e conceituar os canais de distribuição
simplesmente como o fluxo de direitos de propriedade dos produtos. Os consumidores,
por sua vez, podem visualizar os canais de distribuição simplesmente como um
‘amontoado de intermediários’ situados entre o fabricante do produto e eles,
consumidores. Por fim, o pesquisador que observa a maneira pela qual os canais de
distribuição operam no sistema econômico pode descrevê-lo em termos de suas
dimensões estruturais e a eficiência de suas operações. Conclui o autor, afirmando que
em decorrência desses diferentes pontos-de-vista, não é possível existir uma única
definição de canais de distribuição.
57
De todo modo, em sua conceituação, ROSENBLOOM (1999), analisa os
canais de distribuição sob o ponto-de-vista gerencial e com vistas à tomada de decisão,
o que faz com que o autor visualize os canais de distribuição sob a ótica da gestão do
marketing de empresas manufatureiras (industriais). Esta é a visão de canais de
distribuição adotada no presente trabalho.
“Canais de distribuição podem ser definidos como a organização contatual externa
que a empresa opera para atingir seus objetivos de distribuição”.
ROSENBLOOM (1999, p. 9).
Alguns pontos merecem destaque na definição acima: ‘organização
contatual’, ‘externa’, ‘opera’ e ‘objetivos’.
O termo externa significa que os canais de distribuição existem do lado
de fora das firmas. Em outras palavras, não faz parte da estrutura organizacional interna
das firmas. O termo organização contatual refere-se às empresas ou agentes que estão
envolvidos em funções de negociação existentes na medida em que um produto ou
serviço se movimenta do produtor ao usuário final. Funções de negociação consistem na
compra, venda e transferência do direito de propriedade dos produtos.
Consequentemente, qualquer agente que realize uma dessas atividades faz parte do
canal de distribuição.
O terceiro termo, opera, sugere o envolvimento dos gestores nos
assuntos relativos ao canal de distribuição. Este ‘envolvimento’ pode variar desde o
desenvolvimento inicial da estrutura do canal, até a participação diária na gestão do
canal. Por fim, segundo ROSENBLOOM (1999), o fato de existirem objetivos da
distribuição, o quarto termo na definição, implica que os gestores (de determinada
empresa ou mesmo de determinado canal) têm em mente certas metas de distribuição.
Os canais de distribuição existem, portanto, para atender estes objetivos. A estrutura e
gestão do canal de distribuição ocorrem, portanto, para atender os objetivos de
distribuição da firma. Como os objetivos de distribuição mudam, espera-se que também
ocorram variações na organização contatual externa e nas formas como os gestores
procuram operá-la.
De acordo com FERREL & HARTLINE (2005), os canais de
distribuição são um sistema organizado de instituições de marketing, através dos quais
os produtos, recursos, informações, fundos e/ou propriedades sobre produtos fluem do
58
ponto de produção até o consumidor final. Alguns membros do canal, ou intermediários,
detêm a posse física dos produtos (ex.: atacadistas, distribuidores, varejistas), enquanto
outros membros apenas facilitam os processos (ex.: agentes, corretores, instituições
financeiras).
Para NOVAES (2001), há certo paralelismo e uma correlação estreita
entre as atividades que constituem a distribuição física dos produtos e os canais de
distribuição. Em função da estratégia competitiva adotada pela empresa, é escolhido um
esquema de distribuição definido. As atividades logísticas relacionadas à distribuição
física são então definidas a partir da estrutura planejada para os canais de distribuição.
FERREL & HARTLINE (2005), por sua vez, definem a distribuição
física como a coordenação do fluxo de informações e produtos entre os membros do
canal de forma a garantir a disponibilidade de produtos no lugar correto, nas
quantidades certas, no período adequado e de uma maneira eficiente em termos de
custos.
Especificamente em se tratando da distribuição de commodities
agropecuárias brasileiras para os mercados internacionais, NEVES (2000) afirma que os
canais de distribuição são as organizações envolvidas no fluxo das commodities
brasileiras até o destino final, ou consumidor final (tradings, atacados, centrais de
compras, varejos, setor de serviços, de alimentação, entre outros). Ou seja, é a parte do
sistema agroalimentar (Sag) entre a empresa analisada (fazenda, agroindústria ou outra)
e o consumidor final.
Para BOWERSOX & CLOSS (2001), um canal de distribuição é uma
rede de entidades fantasticamente complexa, agrupadas em várias combinações.
Segundo estes autores, cada entidade ligada a um canal de distribuição existe para uma
determinada finalidade e presta serviços na expectativa de um dado retorno sobre o
investimento, como contrapartida de seus esforços.
Os próximos tópicos abordarão com maior detalhamento algumas
características importantes dos canais de distribuição.
59
2.2.2. Canais de Distribuição como Fonte de Vantagem Competitiva
Para ANDERSON et al. (1997), quando forem escolher canais de
distribuição para seus produtos, as empresas precisam atrelar o desenho dos canais com
suas estratégias competitivas e seus objetivos de desempenho. Em outras palavras,
garantir que as estruturas dos canais de distribuição sejam fontes de vantagens
competitivas.
Sob esse aspecto, ROSENBLOOM (2001), afirma que atualmente os
canais de distribuição constituem a única fonte de vantagem competitiva sustentável.
Constituem-se num diferencial competitivo que não pode ser facilmente copiado pela
concorrência, o que vem ficando cada vez mais difícil de alcançar mediante estratégias
de produto, preço e promoção.
Alguns autores corroboram essa visão de ROSENBLOOM (2001) de que
a distribuição muitas vezes foi relegada a um segundo plano dentre os compostos de
marketing (4 P’s: preço, produto, propaganda e praça; este último como sinônimo de
distribuição).
FERREL & HARTLINE (2005) estão entre estes autores que concordam
com o ponto de vista de ROSENBLOOM (2001). Segundo estes autores, ao longo de
todo o século 20, a distribuição foi o elemento esquecido da estratégia de marketing.
Esses autores inclusive fazem menção ao fato de que o quarto ‘P’ (dentre os compostos
de marketing) sempre foi tratado pelos autores como ‘place’ (praça, ponto-de-venda),
sendo que na verdade deveria ser considerado um “D”, referente à ‘distribution’
(distribuição).
NEVES (1999) afirma que os canais de distribuição oferecem a
construção de vantagens competitivas sustentáveis, por suas características de longo
prazo, tanto no planejamento quanto na implementação, por exigirem estrutura de
organizações consistentes e terem base em pessoas e relacionamentos.
BOWERSOX & CLOSS (2001) ressaltam a falta de compreensão sobre
canais de distribuição, ao afirmarem que entre as áreas menos compreendidas no mundo
empresarial está o complexo agrupamento de instituições chamado canal de distribuição
ou canal de marketing.
Segundo estes autores, outro ponto interessante sobre a até então pequena
importância relativa da distribuição (e também do gerenciamento da cadeia de
60
suprimentos - supply chain management) é que ambos os processos são mantidos
‘invisíveis’ aos consumidores, pois ambos ocorrem nos ‘bastidores’. Os consumidores
raramente apreciam ou mesmo têm conhecimento sobre como as indústrias se conectam
às suas linhas de fornecedores, como os bens se movem das indústrias até os varejistas
ou mesmo como as prateleiras dos varejistas mantêm-se cheias. Os consumidores
assumem esses processos como naturais e só se dão conta de suas existências quando
percebem interrupções na cadeia de suprimentos ou nos canais de distribuição (quando
um produto está em falta na prateleira de um supermercado, por exemplo).
Esse cenário vem sendo forçadamente alterado, não pela diminuição da
importância dos demais compostos do marketing, mas sim porque as empresas
(industriais, atacadistas e varejistas) vêm notando que o arranjo distributivo pode
efetivamente ser fonte importante de vantagem competitiva. Em outras palavras, um
produto que tenha um preço adequado aos seus atributos e que tenha a promoção
adequada para atingir seu público-alvo continuará mantendo sua importância. O que as
empresas vêm descobrindo é que fazer esse produto (com preço e promoções
adequadas) chegar ao consumidor final é tão importante quanto o produto em si.
A presente pesquisa assume essa visão de que a estruturação dos canais
de distribuição podem ser fontes de vantagem competitiva para as empresas que serão
objeto de estudo do trabalho.
2.2.3. Funções dos Canais de Distribuição
De acordo com NEVES (1999), as principais funções dos canais de
distribuição são a execução e monitoramento dos seguintes fluxos:
a. Posse física: refere-se ao fluxo físico do produto do fabricante até o consumidor. É
a parte em que predomina a logística;
b. Propriedade: é ter o direito de propriedade sobre o produto (quase todos assumem,
exceto agentes e representantes);
c. Promoção: é a atividade realizada com o objetivo de criar demanda, pois os
participantes do canal são responsáveis pelos contatos;
d. Negociação: existe em todas as etapas do canal;
61
e. Financiamentos: são formas de pagamentos e fluxos financeiros ligadas ao custo de
capital, principalmente o de carregar estoques no sistema;
f. Riscos: são envolvidos nos fluxos, abrangendo aqueles advindos de obsolescência,
enchentes, incêndios, sazonalidade, crescimento da competição, problemas
econômicos, ‘recalls’ dos produtos e baixa aceitação destes, entre outros;
g. Pedidos: é o fluxo de pedidos de produtos;
h. Informações: é a comunicação adequada entre os agentes, passando as percepções
de cada um sobre os produtos e serviços, e, principalmente a informação que parte
dos consumidores finais, de fundamental importância para todos os agentes;
i. Pagamentos: é o fluxo de pagamentos existentes no sistema.
NEVES et. al. (2000) afirmam que existem pelo menos quatro serviços
tradicionais prestados pelo canal de distribuição:
a. A conveniência espacial: reduz o tempo e os custos de procura e de transporte para
os consumidores encontrarem os produtos em oferta;
b. O tamanho dos lotes dos produtos: permite a compra de produtos por unidade e não
por caixas, por exemplo;
c. O tempo de espera: tempo entre o pedido de um produto e a entrega do mesmo;
d. Variedade de sortimentos: propicia a conveniência da compra sob ‘o mesmo teto’.
Com relação às funções dos canais de distribuição, os autores mencionam a
posse física dos produtos (incluindo transporte, estoques etc.), envolvendo ou não: direitos
de propriedade sobre os mesmos (caso, por exemplo, das empresas de transporte que não
são donas do produto), funções de promoção, de negociação, de financiamentos, assumir
riscos, realização de pedidos, fluxo de informações e funções de pagamentos.
De acordo com FERRELL & HARTLINE (2005), os canais de distribuição
tornam nossas vidas muito mais fáceis em decorrência da série de funções desenvolvidas
pelos membros do canal. Por exemplo, agentes dos canais de distribuição, notadamente os
produtores/ fabricantes, podem cortar custos através dos intermediários dos canais. O
benefício mais básico dos canais de distribuição é a ‘eficiência do contato’, que reduz o
número de contatos necessários para trocar mercadorias. Sem a eficiência do contato, os
consumidores teriam que visitar padarias, fazendas, abatedouros e laticínios apenas para
62
comprar os produtos necessários para um café da manhã. Outro exemplo é que a eficiência
do contato possibilita a Procter & Gamble, por exemplo, atingir milhões de consumidores
ao vender para apenas alguns intermediários, como mercearias e varejistas de grande porte.
Os autores prosseguem afirmando que ao longo dos canais de distribuição,
algumas empresas são boas em manufatura, enquanto que outras são eficientes em
transporte ou armazenamento e outras firmas são boas em vender para os consumidores.
Dados os custos envolvidos, é virtualmente impossível para uma única empresa realizar
todas as funções do canal de distribuição. Como resultado, os intermediários do canal
tipicamente detêm um nível de especialização em uma ou mais das seguintes funções:
a. Sortimento: Os produtores somente produzem um tipo de produto (ou uma
variedade relativamente limitada de produtos), enquanto que os consumidores
necessitam de uma ampla variedade e adequado sortimento de diferentes produtos.
Ao proporcionar sortimento adequado de produtos no canal, os intermediários
corrigem essa discrepância de sortimento;
b. Porcionamento: os produtores produzem grande quantidade de um determinado
produto de forma a se beneficiarem de economias de escala. Entretanto, os
consumidores tipicamente querem somente um item específico. Ao transformar
grandes quantidades de produto (‘a granel’) em menores quantidades, os
intermediários, notadamente os varejistas, corrigem essa discrepância;
c. Estoques: Visto que os produtores não conseguem produzir seus produtos
exatamente na mesma proporção da demanda, o canal de distribuição deverá
possibilitar a estocagem de produtos para futuro compra e uso. Ao manterem
estoques, os intermediários corrigem esta discrepância temporal. Entretanto, este
caso não se aplica para alguns tipos de serviços, no qual o produto é produzido e
consumido simultaneamente. Como exemplo, os autores citam viagens aéreas e
cortes de cabelo;
d. Aproximação/ Localização: Dado que os produtores e consumidores normalmente
possuem uma separação geográfica, o canal de distribuição corrige esta
discrepância espacial ao tornar os produtos disponíveis em locais apropriados e
convenientes;
63
e. Serviços: Os canais de distribuição agregam valor aos produtos ao providenciarem
serviços e facilidades aos consumidores (ex.: seguros, estocagem, financiamento),
bem como ao possibilitarem uma padronização no processo de troca (ex.:
pagamento, entrega, apreçamento).
Os autores concluem afirmando que todas as funções acima ocorrem em
todos os canais de distribuição. As raras exceções referem-se à prestação de serviços
altamente intangíveis (ex.: consultorias, educação, aconselhamento).
Para COUGHLAN et. al. (2002), a explicação para a existência dos canais
de distribuição pode ser analisada sob duas óticas: fatores por parte da demanda e da
oferta.
Fatores por parte da demanda:
a. Facilitação da busca: os canais de distribuição, através de seus intermediários,
existem, em parte, porque facilitam a busca. O processo da busca é caracterizado
pela incerteza tanto dos usuários finais quanto dos vendedores. Os usuários finais
não sabem ao certo onde encontrar os produtos e serviços que procuram, enquanto
os vendedores não sabem ao certo como alcançar os usuários finais. Se não
existissem intermediários, os vendedores que não possuem uma marca conhecida
não conseguiriam gerar muitas vendas. Os usuários finais não saberiam se deveriam
acreditar nas afirmações dos fabricantes sobre a natureza e a qualidade de seus
produtos. Por outro lado, os fabricantes não teriam certeza se estariam alcançando o
tipo certo de usuário final com suas atividades promocionais. Os autores concluem
afirmando que em vez disso, ou intermediários facilitam as buscas nas duas
extremidades do canal;
b. Ajuste da discrepância do sortimento: Os intermediários independentes em um
canal de distribuição desempenham a importante função de classificação de
produtos. Ela é importante devido à discrepância natural entre a variedade de bens
e serviços produzidos por um determinado fabricante e a variedade exigida pelo
usuário final. Essa discrepância ocorre devido ao fato de os fabricantes em geral
produzirem uma grande quantidade de sortimento limitado de bens, enquanto os
64
consumidores geralmente pedem apenas uma quantidade limitada de um grande
sortimento de bens e mercadorias.
A função de classificação do produto desempenhada pelos intermediários
inclui as seguintes atividades:
a. Seleção: envolve dividir um fornecimento heterogêneo em estoques separados que
sejam relativamente homogêneos (por exemplo, uma empacotadora de frutas
cítricas seleciona as laranjas pelo tamanho e pela categoria);
b. Acumulação: o intermediário reúne estoques semelhantes provenientes de várias
fontes, transformando-os em um único estoque homogêneo e maior (os atacadistas
acumulam bens variados para os varejistas, e estes acumulam bens para os
consumidores);
c. Loteamento: refere-se à divisão de um estoque homogêneo em lotes cada vez
menores. O ato de lotear no nível do atacadista é chamado de fracionamento (por
exemplo, bens recebidos em grandes lotes são vendidos em lotes menores. Um
comprador de lotes menores, por sua vez, vende unidades individuais);
d. Sortimento: esta é a formação de um grupo de produtos para revenda em associação
entre si (os atacadistas formam sortimentos de bens para varejistas, e os varejistas
formam sortimentos para os consumidores).
Conclui-se que, do lado da demanda, os usuários finais desejam uma
combinação de serviços, produtos e canal que são atraentes para suas necessidades. Os
intermediários podem, dessa maneira, serem vistos como entidades que criam utilidades
para o usuário final. As utilidades podem ser de posse, lugar e tempo. Em outras palavras,
os canais de distribuição e seus intermediários disponibilizam os produtos em sortimentos
adequados, no local adequado e na época adequada. Essas utilidades são todas importantes
ao usuário final.
Fatores por parte da oferta:
a. Criação de rotina de transações: cada decisão de compra envolve pedir, avaliar e
pagar por bens e serviços. O comprador e o vendedor devem chegar a um acordo
65
sobre a quantia, o modo e o prazo de pagamento. Os custos de distribuição podem
ser minimizados se as transações forem transformadas em rotinas; caso contrário,
cada transação fica sujeita ao processo de barganha, com perda de eficiência. Além
disso, a transformação em rotina leva à padronização de bens e serviços para as
quais as características de desempenho podem ser facilmente comparadas e
avaliadas. Ela incentiva a produção de itens de alto valor. Em suma, a
transformação em rotina leva a uma maior eficiência na execução das atividades do
canal;
b. Redução do número de contatos: Sem intermediários no canal, cada produtor teria
de interagir com cada comprador em potencial para criar todos os intercâmbios
possíveis de mercado. À medida que o intercâmbio (de produtos e serviços)
aumenta de importância em uma sociedade, o mesmo acontece com a dificuldade
de se manter todas essas interações. Por exemplo, um pequeno vilarejo com apenas
cinco domicílios especializados exigiria dez transações para realizar intercâmbios
descentralizados (ou seja, intercâmbios em cada ponto de produção). Os
intermediários reduzem a complexidade desse sistema de intercâmbio, facilitando
as transações. Com um mercado central de apenas um intermediário, somente cinco
transações precisariam ser realizadas.
2.2.4. Agentes do Canal - Intermediários
A importância dos canais de distribuição está primordialmente
relacionada com o fato de que, através dessas várias tarefas/funções, eles interligam
fabricantes e consumidores.
Essa interligação muitas vezes é realizada fazendo-se uso de
intermediários. Os intermediários, que são de vários tipos, são importantes pois são
especializados em realizar as tarefas de distribuição, conforme pôde ser observado no
tópico anterior.
KOTLER (1998) afirma que o uso de intermediários aumenta a eficiência
da distribuição de bens por torná-los disponíveis e acessíveis aos mercados-alvo.
Com relação ao comércio exterior, os intermediários surgem nas trocas
de commodities pois podem aumentar a eficiência do processo, trazendo um menor
número de transações internacionais. Eles também aparecem para ajustar as
66
discrepâncias, principalmente através de padronização da oferta, acumulação de
diversas fontes de um mesmo produto em um lote, alocação de grandes lotes em lotes
menores e até individuais e, finalmente, juntando produtos diferentes para a venda
(COUGHLAN et al., 1996; BERMAN, 1996; ROSENBLOOM, 1999; PELTON et al.,
1997; COREY et al., 1989, apud NEVES, 2000).
BOWERSOX & CLOSS (2001) classificam-nos em intermediários
atacadistas e intermediários funcionais. Os intermediários atacadistas são aqueles que
compram e vendem por sua própria iniciativa, assumindo os riscos do negócio. Eles
podem ser divididos em: atacadistas tradicionais, distribuidores industriais, atacadistas
sem depósito, atacadistas de vendas a vista, distribuidores de porta a porta, atacadistas
de serviço integral, atacadistas reguladores e meio atacadistas, cada qual com uma
maneira distinta de operar, porém mantendo sua posição de tomador de risco.
Já os intermediários funcionais são as empresas que não tomam posse das
mercadorias; contudo executam muitas funções dos atacadistas. Todos os intermediários
incluídos nessa categoria são, por definição, atacadistas de funções limitadas, por não
assumirem os riscos de manutenção dos estoques. Os atacadistas intermediários
funcionais englobam: agentes de vendas, representantes de vendas, agentes
comissionados, corretores, leiloeiros e armazéns (BOWERSOX & CLOSS, 2001).
De acordo com ROSENBLOOM (2001), os atacadistas tradicionais
atendem tanto aos fabricantes quanto aos varejistas e outros clientes. Eles vêm
sobrevivendo como intermediários no canal de marketing porque, como especialistas no
desempenho das tarefas de distribuição, podem operar em maiores níveis de eficiência e
eficácia Atacadistas modernos e bem administrados são especialmente adequados para
desempenhar os seguintes tipos de tarefas de distribuição para os fabricantes:
a. Fornecer cobertura de mercado;
b. Fazer contatos de vendas;
c. Manter estoques;
d. Processar pedidos;
e. Reunir informações de mercado;
f. Oferecer suporte ao cliente.
67
Já para ALCÂNTARA (1999), uma das mais complexas atividades
dentro dos sistemas de distribuição é realizada pelo atacado, que tem como função
básica coordenar a produção e o consumo, combinando demandas heterogêneas com
suprimentos heterogêneos, tendo de um lado fabricantes interessados em vender toda
sua linha de produtos e de outros varejistas interessados no oferecimento de múltiplas
marcas e múltiplas linhas de produto aos seus consumidores finais. Para o fabricante, o
atacadista realiza as funções de cobertura de mercado, vendas, estocagem de inventário,
processamento de ordens e compra de qualquer volume, pesquisa de mercado e serviço
ao consumidor. Em relação aos varejistas oferece disponibilidade de produtos,
sortimento conveniente, quantidade de produtos adequada à necessidade do varejista,
crédito e financiamento, consultoria e suporte técnico.
De acordo com PETER & DONNELLY. (1998), existem muitos tipos de
intermediários nos canais de distribuição, muitos dos quais são tão especializados por
função e indústria que não podem ser definidos em termos genéricos. De forma geral, os
intermediários nos canais de canais de distribuição podem ser definidos da seguinte
forma, segundo estes autores (usando com referência BENNETT, 1995):
a. Middleman’: termo genérico utilizado para definir um agente de negócios
independente que opera como um link entre os produtores e consumidores finais
ou compradores industriais;
b. ‘Merchant middleman’:Um middleman que compra os direitos de propriedade
de determinados bens, tornando-se seu proprietário;
c. Agente: Uma unidade de negócios qualquer que negocia compras, vendas, ou
ambos, porém não possui direitos de propriedade sobre os bens que
comercializa;
d. Atacadista: Um estabelecimento comercial que opera com o objetivo primário
de comprar, tomar posse, normalmente estocar e manusear produtos em grandes
quantidades, revendo-os em menores quantidades, para os varejistas ou para
consumidores industriais (ou de outros negócios);
e. Varejista: um agente comercial que está primariamente comprometido em
vender aos consumidores finais;
68
f. Broker ou Corretor: um agente que serve como um facilitador para o comprador
ou vendedor. O corretor não assume riscos e geralmente não possui a custódia
física do produto, bem como não é considerado um representante fixo tanto do
comprador quanto do vendedor;
g. Agente industrial: um agente que normalmente opera sob um base contratual
mais extensa, geralmente vendendo em um território pré-definido e operando
com linhas de produtos não-concorrentes (porém relacionadas entre si). Este tipo
de agente possui autoridade limitada em relação a preços e condições das
vendas;
h. Distribuidor: Um tipo de atacadista que atua em linhas em que a distribuição
seletiva ou exclusiva é comum. Neste caso, o produtor espera forte suporte
promocional a ser realizado pelo atacadista. Por conta dessa proximidade, surge
a terminologia ‘distribuidor’ (de todo modo, os autores ressaltam que a própria
terminologia atacadista pode ser empregada neste caso);
i. Jobber’: um agente que compra do produtor e revende para os varejistas; pode
ser entendido como uma espécie de atacadista;
j. Agente facilitador: uma empresa que auxilia na desempenho de algumas tarefas
da distribuição que não aquelas relacionadas à compra, venda e transferência de
direitos de propriedade (ex.: empresas transportadoras, armazéns etc.).
CERTO et al (2005), baseados em WEBSTER JR, (1974) apresentam
as seguintes definições para os principais tipos de intermediários no mercado:
a. Revendedor: qualquer intermediário que transita entre os mercados do fabricante
do produto e o usuário final;
b. Agente: qualquer revendedor com autorização legal para agir em nome do
fabricante;
c. Representante do fabricante: um revendedor que vende o produto, mas
normalmente não tem título legal ou a posse física do bem;
d. Atacadista: um revendedor que fornece para outros revendedores, normalmente
varejistas;
e. Varejista: um revendedor que vende para os consumidores;
69
f. Corretor: um revendedor que realiza funções limitadas de vendas. Normalmente
apenas emite ordens para que a indústria faça a entrega e se especializa em
vendas para uma classe especial de consumidor, como supermercados;
g. Agente de vendas: um revendedor que concorda em vender toda a produção de
uma indústria por uma taxa de comissão fixa, mas que normalmente não tem a
posse física ou título legal do bem;
h. Distribuidor: um termo impreciso, habitualmente usado para descrever um
revendedor que realiza diversas funções de distribuição, incluindo vendas,
manutenção de estoques, concessão de crédito e assim por diante. É um termo
comum no mercado, mas também pode ser usada para referir a atacadistas;
i. Negociante: um termo certamente mais impreciso, que pode significar o mesmo
que distribuidor, atacadista, varejista e assim por diante. É sinônimo de
revendedor;
j. Intermediário: habitualmente usado em um contexto de marketing industrial
para se referir a distribuidores ou, em certo campos, tais como os de papéis e
ferragens, a atacadistas caracterizados pela ampla linha de produtos e ofertas
razoáveis de serviço completo.
A opção da utilização ou não de intermediários é relacionada com a
estrutura e extensão dos canais de distribuição.
2.2.5 Extensão, Estrutura e Cobertura dos Canais de Distribuição
Segundo ROSENBLOOM (2001), extensão do canal é o número de
níveis de um canal de distribuição, que pode variar de dois níveis, no qual o produtor ou
fabricante vende diretamente a consumidores (distribuição direta), até mais de dez
níveis, nos quais podem existir mais de oito instituições intermediárias entre fabricantes
e consumidores (canais tão extensos são raros nos países desenvolvidos, excetuando-se
o Japão).
Já a estrutura do canal consiste de todas as empresas e instituições
(inclusive produtores ou fabricantes e clientes finais) que estão envolvidos na execução
das funções de compra, venda e transferência de propriedade (ROSENBLOOM, 2001).
70
Outra definição de ROSENBLOOM (2001) conceitua a estrutura dos
canais de distribuição como sendo o grupo de membros do canal para o qual foi alocado
um conjunto de tarefas de distribuição. Esta definição de estrutura do canal engloba o
conceito de decisão de alocação: dado um conjunto de tarefas de distribuição que devem
ser desempenhadas para alcançar os objetivos de distribuição, o gerente do canal deve
decidir como alocar ou estruturas as tarefas.
Dessa forma, a estrutura do canal é determinada: (i) pelas tarefas de
distribuição que precisam ser executadas; (ii) pela economia da execução das tarefas de
distribuição e (iii) pelo desejo de controlar a distribuição.
De forma simples e concisa, o autor conceitua a estrutura dos canais de
distribuição. Além disso, reforça um conceito importante na estrutura de canais que é a
decisão de alocação, que sinteticamente pode ser definida como a maneira pela qual o
gestor de canal distribui as tarefas de distribuição entre os membros do canal, dados os
objetivos de distribuição de determinada empresa. Em outras palavras, a estrutura do
canal refletirá a maneira pela qual o gestor alocou as tarefas entre os membros do canal.
Existem muitas opções estratégicas para a estrutura de um canal de
distribuição; estas estratégias são geralmente complexas e muito caras de se
implementar. Entretanto, uma boa estratégia de distribuição é fundamental para seu
sucesso, visto que quando uma empresa escolhe um canal de distribuição e se
compromete com ele, a distribuição geralmente se torna altamente inflexível devido aos
contratos de longo termo, investimentos de grande porte e compromissos entre os
membros do canal (FERREL & HARTLINE, 2005).
De acordo com NEVES (1999), quanto maior for o grau de serviços
exigido pelo produto, tanto maior o número de intermediários. Se o consumidor deseja
comprar em pequenos lotes, grande número de lojas deverá conter os produtos, da
mesma forma que, se o tempo desejado para ter os produtos for pequeno, muitos devem
ser os intermediários, pois mais estoques serão necessários ao longo do canal.
A cobertura de distribuição é relacionada com a extensão e estrutura dos
canais de distribuição. De todo modo, optou-se por tratar da cobertura de distribuição
em um tópico exclusivo.
Por causa das características do produto, do ambiente necessário para
vendê-lo e das necessidades e expectativas de potenciais compradores, a cobertura de
71
distribuição pode variar. Entre os tipos de cobertura, tem-se a distribuição intensiva
que envolve a venda do produto por meio do maior número de atacadistas e varejistas
possível -, a distribuição exclusiva – que envolve o uso de apenas um revendedor em
determinado território – e a distribuição seletiva – que envolve o uso de um número
limitado de revendedores por área geográfica (CERTO et al., 2005).
ROSENBLOOM (1999) insere a questão da cobertura de distribuição no
tópico concernente à gestão do canal de distribuição, principalmente no que tange à
implementação de um programa para obter a cooperação dos membros do canal. Para
que isso aconteça, o fabricante que deseja implementar esse programa de cooperação
depara-se com as seguintes questões:
a. Quão próximo deverá ser o relacionamento com os membros do canal?
b. Como os membros do canal devem ser motivados para cooperar com o
fabricante na obtenção dos seus resultados de distribuição?
c. Como o mix de marketing deverá ser usado para ampliar a cooperação dos
membros do canal de distribuição?
A pergunta acima se refere justamente à questão da cobertura de
distribuição, que ROSENBLOOM (1999) denomina ‘proximidade nas relações do
canal’. Segundo este autor, no passado recente (em relação a 1999) surgiu na literatura
sobre canais de distribuição um corpo teórico que apregoava a necessidade de
estabelecimento de relacionamentos mais próximos entre os fabricantes e os membros
do canal nos níveis do atacado e/ou varejo. Essa aproximação poderia se dar através de
‘relações próximas’, ‘parcerias’ ou até mesmo ‘alianças estratégicas’ entre fabricantes e
distribuidores. O autor prossegue afirmando serem poucos os autores que contestam
essa visão da necessidade quase única de aproximação entre os membros do canal. Na
verdade, o que era esquecido no debate (ou no argumento único de necessidade de
aproximação entre os membros do canal) é que o quão próximo um fabricante deverá se
relacionar com os membros de um canal é meramente uma questão de estratégia de
distribuição. Neste sentido, a proximidade entre fabricante e membros do canal pode ser
interessante para determinado produto e estratégia de distribuição, ao passo que outros
produtos exigem outras estratégias de distribuição que não implicam proximidade entre
72
fabricante e demais membros do canal (na verdade, para alguns produtos, a proximidade
entre os membros do canal pode ser perda de dinheiro, tempo e energia).
FRIEDMAN & FUREY (1999) inserem a questão da cobertura de
mercado no tópico em que tratam das características dos produtos que são importantes
no processo de seleção dos canais de distribuição. Segundo estes autores, existem vários
atributos do produto que afetam a escolha do canal (o que os autores denominaram
‘encaixe’ entre produto e canal). Os autores denominam estes atributos de ‘dimensões’
do produto e canal, que são respectivamente: definição, customização, agregação,
exclusividade, educação do consumidor, substituição, maturidade, risco do consumidor
e negociação.
No atributo ‘exclusividade’, os autores iniciam a análise na mesma linha
de pensamento de ROSENBLOOM (1999), ao afirmarem que alguns produtos são
vendidos para o maior número possível de consumidores, enquanto que outros produtos
são ‘exclusivos’, ou seja, são posicionados como tendo maior prestígio e um grupo
limitado (e geralmente mais rico) de consumidores. Algumas empresas como a Honda,
oferecem uma versão melhorada de seus produtos ou possuem marcas exclusivas em
seu portfolio de produtos. Outras empresas, como a Gucci, oferecem somente produtos
exclusivos.
Posteriormente, entretanto, os autores se atêm especificamente na
definição e explicação dos canais exclusivos e fazem menção nenhuma sobre os demais
tipos de cobertura de mercado.
Segundo estes autores, a opção por produtos exclusivos traz consigo duas
implicações para a seleção dos canais de distribuição: ‘canais de alta proximidade’ e
‘canais únicos’ (no sentido de exclusividade de canais):
a. Canais de alta proximidade: A natureza ‘premium’ e de alto status dos produtos
exclusivos demanda a seleção de um canal que será considerado ‘valioso’ pelos
consumidores. Em outras palavras, os consumidores de um produto exclusivo
vão demandar melhores serviços e um canal que reflita o valor e status do
produto. Esta questão explica o declínio da Gucci no fim da década de 1980 e
sua ressurreição alguns anos depois. O declínio foi causado por uma tentativa de
a empresa obter rápido crescimento, disponibilizando seus produtos de prestígio
73
em um mercado de massa, distribuindo-os através de um canal composto por
milhares de varejistas. A imagem da empresa foi ‘ferida’ e foi reconstruída
somente quando a empresa voltou a adotar uma estratégia de distribuição
exclusiva, selecionando um grupo seleto de apenas 500 lojas que ofereciam
serviços de primeira linha para distribuir seus produtos;
b. Canais únicos: as pessoas não querem apenas melhores serviços quando
compram um produto exclusivo; elas querem um sinal tangível de que estão
comprando um produto de maior status e prestígio. Este foi o caso da Honda,
quando do lançamento do novo Acura, em 1987. A empresa resolveu distribuir a
nova linha Acura por intermédio de uma rede de concessionárias totalmente
diferente daquela que distribuía os demais produtos de seu portfolio. Por mais
que essa estratégia de distribuição tenha custado milhões de dólares, ela se
mostrou acertada no sentido de possibilitar à Honda adentrar no segmento de
carros de luxo. A estratégia criou um sentimento de ‘exclusividade; ser único’ ao
consumidor do Acura, que queria ser visto de maneira diferente em relação
consumidores tradicionais dos carros da Honda. Os autores concluem afirmando
que produtos exclusivos não implicam somente a adoção de canais com maior
proximidade, mas podem também significar a adoção de um canal único
servindo exclusivamente aos consumidores desse produto exclusivo.
FERREL & HARTLINE (2005) não só definem a exclusividade dos
canais, como também tratam de definir e explicar as demais opções estruturais básicas
para a distribuição em termos de cobertura de mercado e nível de exclusividade entre
distribuidores e varejistas. Para estes autores existem três tipos de distribuição em
termos de cobertura de mercado: distribuição exclusiva, distribuição seletiva e
distribuição intensiva.
A distribuição exclusiva é o tipo de cobertura de mercado mais restrita.
As empresas usando este tipo de estratégia conferem a um distribuidor ou revendedor o
direito exclusivo de vender um produto em uma região previamente definida. Esta
estrutura de canal é mais comumente associada com produtos de prestígio e status, ou
com empresas que procuram conferir aos seus produtos uma imagem de exclusividade
ou prestígio. Os autores citam como exemplo os casos da BMW, Jaguar e Mercedes que
74
tipicamente conferem distribuição exclusiva a apenas um revendedor em qualquer área
pré-determinada.
As empresas que fazem uso da distribuição exclusiva normalmente têm
como objetivo atingir um segmento de mercado único e bem definido. Os consumidores
que fazem parte deste segmento devem querer, procurar e até mesmo viajar para
comprar o produto e o farão por conta do prestígio ou exclusividade do produto ou da
marca. Por fim, segundo os autores, esse tipo de distribuição controlada também
permite um uma influência muito maior no apreçamento do produto do que nas demais
opções de distribuição.
Já na distribuição seletiva, as empresas concedem a diversos
revendedores ou distribuidores o direito de vender um produto em uma região
previamente definida. A distribuição seletiva é desejável quando os consumidores
desejam comparar os produtos; nesse caso, os serviços pós-venda são muito importantes
(FERREL & HARTLINE, 2005). Os autores citam o exemplo das câmeras digitais da
Kodak, que estão disponíveis nas lojas Circuit City, Best Buy e Office Depot (nos
Estados Unidos), bem como em vários revendedores na internet. Esta ampla cobertura
de distribuição permite aos compradores coletarem informações sobre os produtos da
Kodak e de seus competidores, bem como comparar preços, comprar em suas lojas
favoritas, usar uma variedade de meios de pagamento e finalmente adquirir o modelo
que eles querem, mesmo que determinada loja não tenha o produto em estoque. A
Kodak não disponibiliza seus produtos em lojas de conveniência ou supermercados
devido ao custo relativamente alto dos produtos, à necessidade dos consumidores
obterem informações sobre eles e também pelo desejo da própria Kodak em manter
certo controle sobre os preços e sobre os displays nos pontos-de-venda.
Várias empresas usam amplamente a distribuição seletiva para muitas
categorias de produtos. Os autores citam o caso da Tommy Hilfiger (roupas), Clinique
(cosméticos), Bose (aparelhos eletrônicos) e Science Diet (‘premium pet food’). O
McDonald’s e outros franqueadores também utilizam a distribuição seletiva na alocação
de franquias. Esta seletividade pode ser baseada em população e aspectos demográficos
(ex.: uma franquia por 250 mil habitantes), volume de vendas (quando as vendas
atingem determinado valor, o franqueador autoriza a abertura de uma nova loja na
região) ou qualquer outro critério de seleção. Em cada caso, a distribuição seletiva
75
permite ao fabricante ter controle maior sobre os preços, sobre os displays nos pontos-
de-venda e técnicas de venda. Os fabricantes selecionam cuidadosamente seus
distribuidores e revendedores, de forma a garantir que sua imagem e técnicas de venda
sejam condizentes com o perfil esperado.
Por fim, tem-se a distribuição intensiva, que torna o produto disponível
ao número máximo de distribuidores e comerciantes em cada região de distribuição, de
forma a obter a maior exposição e vendas possíveis. Essa opção de distribuição é a
normalmente adota no caso de produtos de conveniência, como balas, refrigerantes,
remédios e cigarros, e também no caso de produtos de escritório, como papel e toners
de impressoras. A fim de obter tamanha visibilidade e volume de vendas, o fabricante
deverá abrir mão de um bom grau de controle sobre preços e layout nos pontos-de-
venda. Muitas vezes o fabricante enfrenta resistência dos membros do canal em
distribuir seus produtos, visto que muitos varejistas são relutantes em distribuir produtos
que já fazem parte do seu portfolio de distribuição.
Os autores concluem afirmando que as empresas que adotam uma
abordagem de segmentação de mercado de massa geralmente optam pela estratégia de
distribuição intensiva. Se um consumidor não encontra o produto de uma empresa em
determinado local, ele simplesmente comprará o produto de outra marca para atender
sua demanda. Por outro lado, conforme os produtos ‘envelhecem’ (conceito de ciclo de
vida do produto), eles geralmente passam a ser distribuídos pela estratégia de
distribuição intensiva. Por exemplo: na década de 1970, as calculadoras eram difíceis de
serem encontradas e custavam por volta de 300 dólares, atualmente elas podem ser
encontradas em quase toda loja de conveniência e custam em torno de dez dólares (os
modelos mais simples).
ROSENBLOOM (1999) propõe uma escala (‘continuum’) para sinalizar
as diferentes estratégias de distribuição no que se refere à cobertura de mercados, que o
autor chamou de intensidade da distribuição. Esta representação gráfica, apresentada na
Figura 2.6, é uma maneira interessante de visualizar as diferentes estratégias de
cobertura de mercado propostas por FERREL & HARTLINE, 2005.
76
Intensiva
(muitos distribuidores)
Seletiva
(relativamente poucos
distribuidores)
Exclusiva
(um distribuidor)
FIGURA 2.6 - ‘Continuum’ de intensidade da Distribuição
Fonte: ROSENBLOOM (1999, p. 185).
2.2.6 Canais de Distribuição Internacionais
Existem três maneiras principais de ‘entrar’ em um país estrangeiro: via
exportações; pela transferência de tecnologia e as habilidades necessárias para se
produzir e comercializar os produtos com uma organização em um país estrangeiro
através de um acordo contratual; e através de investimentos diretos (BOYD et. al.,
1998). Na presente revisão bibliográfica, por limitação do escopo, tratar-se-á
exclusivamente das exportações vinculadas aos canais de distribuição internacionais.
A exportação é a maneira mais simples de adentrar um mercado
internacional, visto que ela envolve o menor comprometimento e risco. A exportação
pode ser direta ou indireta. A exportação indireta apóia-se na expertise de distribuidores
que trabalham com comércio internacional e têm conhecimento das particularidades dos
mercados onde a empresa deseja entrar. Os tipos mais comuns de distribuidores são as
empresas comerciais exportadoras e as trading companies, que efetivamente compram
as mercadorias e as revendem por conta própria em mercados estrangeiros; os agentes
de exportação, que vendem os produtos com base em comissões; e as cooperativas de
exportação, que são responsáveis pela exportação de vários produtores (muitas vezes
produtores de produtos agropecuários).
Já a exportação direta usa agentes próprios baseados nos países
estrangeiros ou através de unidades operacionais (filiais ou subsidiárias) nos países para
onde se quer exportar.
MEEK & MEEK (2001), afirmam que a entrada e atuação em canais
internacionais pode variar desde a exportação indireta, quando a empresa comercializa
seus produtos para um comprador que opera no mercado destino, até para situações em
que a empresa realize investimentos de larga escala e instale indústrias nos mercados
internacionais. Segundo os autores, não existe um método ideal de atuação, sendo que
77
muitas organizações internacionais usam uma mistura de estratégias, como, por
exemplo, a McDonald’s, que utiliza tanto restaurantes próprios quanto franquias.
No Quadro 2.7 é possível observar a maneira que os autores classificam
as estratégias de entrada nos mercados internacionais.
QUADRO 2.7 – Estratégias de Entrada em Mercados Internacionais
Modalidade Opção Descrição
Indireta
Não existe diferença em relação a vender no mercado doméstico. Muitas
empresas multinacionais possuem escritórios de compras espalhados pelo
mundo todo, com destaque para as trading companies japonesas.
Direta
Neste caso, a indústria, por exemplo, desempenha a função de exportação
ao invés de delegá-la para outras empresas. Isso inclui realizar pesquisa de
mercado, estabelecer relações com agentes do canal, efetuar a distribuição
física dos produtos, documentação etc.
Licenciamento (de patentes, marcas registradas e direitos autorais).
Contratos de manufatura.
A maior vantagem desta abordagem é o compartilhamento de riscos. A
empresa é capaz de ganhar habilidades ou estabelecer relações com um
agente local. Esta pode ser ima importante rota de entrada em mercados
difíceis, sendo a principal estratégia de entrada de muitas empresas na
China.
Ex.: Uma joint-venture ou uma subsidiária localizada em território
estran
g
eiro.
Manufatura em mercados
estrangeiros
Exportação
Sem investimento direto
Com investimento direto
Fonte: MEEK & MEEK (2001, p. 339)
De acordo com TERPSTRA & SARATHY (2000), uma vez que a firma
tenha estabelecido sua estratégia para adentrar os mercados internacionais, seu próximo
desafio é efetivamente fazer a distribuição dos produtos nestes mercados. Após a
pergunta ‘como eu faço meus produtos chegarem aos mercados internacionais?’, surge a
pergunta ‘como eu faço para distribuir meus produtos nos mercados internacionais?’.
Ainda segundo estes autores, dependendo da maneira como as firmas
optam por distribuir seus produtos nos mercados internacionais, elas acabam não
gerenciando as tarefas de distribuição nestes mercados. Esse é o caso válido para a
exportação indireta. Neste caso, para estas empresas, a questão da distribuição foi logo
resolvida assim que elas optaram pela sua maneira de entrar nos mercados estrangeiros.
As firmas que vendem através de trading companies, empresas de gestão da exportação
78
ou outros métodos indiretos têm que aceitar a distribuição nos mercados externos
oferecida por estes intermediários.
Uma vez que o design básico do canal de distribuição foi determinado, o
produtor deverá iniciar uma pesquisa com os candidatos disponíveis que devem
preencher as tarefas de distribuição definidas. As opções deverão ser feitas
considerando-se o modelo que engloba a filosofia geral de distribuição da empresa (no
caso, o produtor). Neste sentido, as decisões recaem sobre a opção de usar distribuidores
versus agentes, bem como se a empresa utilizará uma abordagem direta ou indireta nos
mercados estrangeiros (CZINKOTA et al. 2001).
Prosseguem os autores afirmando que as empresas que possuem
distribuição internacional bem sucedida atestam a importância de encontrar
representantes de seus produtos que sejam da primeira linha.
Um dos pontos de destaque na questão da estruturação dos canais de
distribuição internacionais é justamente a escolha dos distribuidores e/ou representantes
dos produtos dos frigoríficos brasileiros na União Européia, principalmente no que se
refere à opção pela exportação direta ou indireta. Um dos frigoríficos estudados possui
estrutura de exportação indireta, enquanto que outro frigorífico estudo está em estágio
mais avançado de distribuição e já possui estrutura própria de distribuição (exportação
direta). Por fim, o terceiro frigorífico estudado está justamente em uma fase transitória
entre efetuar a exportação indiretamente para migrar para a exportação direta.
79
3. A CADEIA AGROINDUSTRIAL DA CARNE BOVINA NO
BRASIL
Neste capítulo, inicialmente, será feita uma breve apresentação dos
principais acontecimentos dos últimos 15 anos no mercado nacional de carne bovina
(tanto sob a ótica da oferta quanto da demanda), com fortes impactos nas exportações
brasileiras de carne bovina neste período.
Na seqüência do capítulo, discorrer-se-á sobre o sistema de
rastreabilidade e as certificações, públicas e privadas, que regulam as exportações
brasileiras de carne bovina.
Depois de uma série de ocorrências de contaminação de alimentos de
origem animal por diferentes patógenos nos últimos anos, observa-se, no mundo todo,
uma mudança na postura dos consumidores, que passaram a se preocupar com questões
relativas à segurança e origem dos alimentos.
Nessa nova realidade, sistemas de rastreabilidade vêm sendo implantados
em cadeias agroindustriais no mundo todo, inclusive no Brasil. Com a implantação do
SISBOV - Sistema Brasileiro de Sistema Brasileiro de Identificação e Certificação de
Origem Bovina e Bubalina, no ano de 2002, a cadeia agroindustrial da carne bovina no
Brasil inseriu-se nesta nova realidade, garantindo a continuidade das exportações à
Europa, principal consumidor do produto brasileiro e região mais afetada pelos
acontecimentos negativos à imagem da carne bovina.
3.1 Sob o ponto de vista da Oferta
Os históricos baixos índices de produtividade da pecuária de corte
brasileira foram alterados ao longo dos últimos 10 anos. Isso teve como reflexo um
aumento sem precedentes na produção de carne bovina no Brasil, o que possibilitou o
aumento das exportações brasileiras desta. Por outro lado, o parque frigorífico também
se modernizou, depois de anos de defasagem tecnológica causada, dentre outros
motivos, pela alta ociosidade com a qual a indústria da carne bovina operou durante os
anos 1970, 1980 e boa parte dos anos 1990.
80
A cadeia da carne bovina foi forçada a mudar com a implantação do
Plano Real em 1994, que foi o plano econômico responsável pelo expressivo
decréscimo dos índices de inflação e estabilização da economia brasileira. Em um
primeiro instante, a estabilização de preços foi acompanhada de um aumento real no
consumo de carne bovina, o que temporariamente capitalizou as empresas
processadoras de carne (‘frigoríficos’), após anos de resultados negativos.
Por outro lado, com o fim da hiperinflação a pecuária de corte deixou de
ser encarada como reserva de valor. Alterou-se, portanto, o enfoque da pecuária de
corte: antes do Plano Real, a proteção de capital era sua maior atratividade (visto seus
preços serem corrigidos pela inflação), enquanto que, após o plano, a busca crescente
por aumentos de produtividade foi a forma encontrada pela maior parte dos pecuaristas
para obterem maiores rentabilidades na atividade. Com isso, a pecuária de corte
brasileira adentrou na era de profissionalização.
A adoção de novas tecnologias garantiu expressivos ganhos de
produtividade na pecuária de corte brasileira. Melhoramento genético, suplementação
mineral, aumento na utilização de rações graças ao gradual aumento no número de
animais confinados e semi-confinados, utilização de adubação em pastagens, melhorias
no tratamento sanitário do rebanho, difusão de técnicas de gestão da propriedade rural
etc., garantiram expressivos aumentos em termos de precocidade e ganho de peso (dois
itens fundamentais de ganhos de produtividade). Apesar destes avanços recentes, ainda
existe espaço para ganhos futuros de produtividade, o que deverá aumentar ainda mais a
importância do Brasil como produtor e exportador de carne bovina.
Como resultado da adoção de tecnologia e instalação de ferramentas de
gestão em muitas fazendas pecuárias, importantes índices de produtividade da pecuária
de corte brasileira apresentaram melhorias significativas nos últimos 10 a 15 anos.
Dados compilados por TORRES & ROSA (2005) e apresentados no
Quadro 3.1 demonstram a magnitude da evolução da produtividade na pecuária de corte
brasileira.
81
QUADRO 3.1 - Evolução da produtividade na pecuária de corte Brasileira
1994 vs. 2004
Indicadores 1994 2004 Var. %
Idade de abate (anos) 5.0 3.5
-30%
Taxa de natalidade (%) 50.0 60.0
20%
Mortalidade até a desmama (%) 10.0 8.0
-20%
Idade da primeia cria (anos) 5.0 4.0
-20%
Taxa de lotação (UA/ ha) 0.5 0.7
40%
Taxa de abate (%) 16.5 21.0
27%
1 UA = Unidade Animal = 450 kg peso vivo
Fonte:TORRES & ROSA. (2005)
Um dos principais índices que apresentou evolução significativa foi a
taxa de lotação, que era estimada em 0,5 unidades animais por hectare em 1994 e foi
estimada em 0,7 UAs por hectare em 2004, representando um acréscimo de 40% no
período. Em outras palavras, em 2004 os pastos brasileiros suportavam 40% mais
animais do que em 1994, o que garantiu a expansão do rebanho brasileiro no período.
Por mais que a taxa média de lotação da pecuária brasileira ainda
permanecesse relativamente baixa em 2004 (0,7 unidades animais/ ha), o que ainda
pode caracterizar a pecuária brasileira como extensiva, o fato é que esse aumento na
capacidade de suporte médio das pastagens brasileiras é significativo no sentido de
demonstrar a evolução ocorrida nas práticas de manejo de pastagens no Brasil nos
últimos anos. Maiores índices de produtividades na pecuária de corte são relacionados,
dentre outros fatores, com disponibilidade de alimentos e o melhor manejo das
pastagens brasileiras repercute no aumento médio da produtividade do rebanho
brasileiro.
A fertilidade do rebanho brasileiro também aumentou no período, visto
que evolui de 50% em 1994 para 60% em 2004 (fertilidade média do plantel de vacas
do rebanho brasileiro). Isso implica no maior nascimento de bezerros(as), aumentando a
quantidade futura de carne bovina produzida. De todo modo, a taxa de natalidade média
do rebanho nacional ainda permanece baixa em relação aos índices zootécnicos
considerados adequados, que indicam taxa de natalidade superiores a 80%.
Em termos de aumento de precocidade do rebanho, os índices a serem
destacados são idade da primeira cria, que decresceu 20% no período na média do
rebanho nacional (de cinco para quatro anos) e idade de abate, que diminui de 5 anos
82
para 3,5 anos em média, aumentando o ‘giro’ do rebanho brasileiro e a produção de
carne bovina como um todo.
Tamanho crescimento nos índices de produtividade da pecuária brasileira
é bastante significativo, principalmente considerando a forte heterogeneidade existente
nos vários sistemas de produção vigentes na pecuária brasileira.
A conjugação de todos esses fatores garantiu um aumento da taxa de
desfrute do rebanho brasileiro no período de 10 anos. Em 1994, a taxa de desfrute era
estimada em 16.5%, enquanto que em 2004 esse índice evoluiu para 21%. Como
conseqüência, a produção de carne cresceu de 5.2 milhões de toneladas equivalente-
carcaça em 1994, para cerca de 8.3 milhões de toneladas equivalente-carcaça em 2004,
de acordo com o CONSELHO NACIONAL DE PECUÁRIA DE CORTE (2005).
Tamanho aumento na produção de carne bovina brasileira possibilitou a
impressionante expansão das exportações brasileiras de carne bovina. O ‘lado da oferta’
foi impulsionado pela repentina mudança no cenário do mercado internacional da carne
bovina. Uma série de fatores garantiu a expansão da demanda, conforme explicitado no
tópico abaixo Sob o ponto de vista da Demanda.
3.2. Sob o ponto de vista da Demanda
Um fator importante que moldou o mercado mundial de carne bovina nos
últimos anos foi a ocorrência de uma série de enfermidades nos rebanhos dos principais
países produtores.
Os primeiros casos de BSE (Bovine spongiform encephalopathy – ou
encefalopatia espongiforme bovina – EEB) foram diagnosticados em 1986 no Reino
Unido. Posteriormente, outros casos foram reconhecidos. De todo modo, os níveis de
preocupação com a doença intensificaram-se a partir de 1996, quando o Comitê
Ministerial Japonês sobre BSE fez uma conjectura estabelecendo um link entre a BSE e
a doença de Creutzfeld-Jackob (CJD), que é fatal para os seres humanos.
Este fato gerou uma crise no mercado da carne bovina sem precedentes e
determinou a proibição das exportações de carne bovina do Reino Unido e de outros
países afetados pela doença. A preocupação com a BSE também causou redução
significativa no consumo per capita de carne bovina na Europa. Além disso, a
83
ocorrência de BSE implicou na remoção de 5,2 milhões de cabeças de gado bovino na
cadeia agroindustrial da carne bovina no Reino Unido, visto serem animais que
poderiam estar contaminados pela doença.
A segunda ‘onda’ de casos de BSE ocorreu entre 2000 e 2001, sendo que,
desta vez, a doença se alastrou por boa parte do continente europeu, com casos
confirmados em países como Dinamarca, Áustria, Alemanha e Itália. Também
ocorreram notificações de casos de BSE na Europa Central e Oriental, em países como
Polônia, Eslováquia, Eslovênia e República Checa.
Esta segunda crise de BSE na Europa causou impactos severos no
consumo de carne na União Européia, visto que o consumo per capita da carne bovina
diminui quase 15%. Esta segunda crise de BSE também foi responsável pela redução
das exportações européias de carne bovina da ordem de 35%, abrindo espaço para o
surgimento de novos fornecedores de carne bovina em mercados tradicionalmente
abastecidos pela carne bovina européia. O Brasil aproveitou-se desta situação,
aumentando o leque de importadores e aumentando suas exportações de carne bovina.
A crise de BSE recrudesceu em 2001 com a descoberta do primeiro caso
fora da Europa, no Japão. Novos casos em países fora do continente europeu foram
reportados em 2003 (Canadá) e 2004 (Estados Unidos em 2004). Uma série de ações foi
rapidamente colocada em prática pelos países com casos confirmados de BSE, de forma
a garantir e informar aos consumidores do mundo todo sobre a segurança da carne
bovina produzida nestes países.
Entretanto, tais esforços não surtiram o efeito desejado em muitas
situações, como no caso das exportações de carne bovina dos Estados Unidos, que
tiveram decréscimo de 82% no ano de 2004 (em relação ao valor exportado em 2003),
de acordo com dados do USDA. Tamanha redução nas exportações norte-americanas de
carne bovina ocorreu por conta do embargo imposto por alguns dos principais países
importadores da carne bovina norte-americana, que são o Japão e Coréia do Sul.
Embora não seja exportador de carne bovina para estes países, o Brasil
foi indiretamente beneficiado por este embargo, visto que alguns dos principais
concorrentes do Brasil no comércio internacional da carne bovina acabaram
direcionando suas exportações de forma a ocupar o lugar previamente ocupado pelas
exportações norte-americanas. Importante notar que o mercado japonês é o que pratica
84
os maiores preços da carne bovina, motivo pelo qual ocorreu esse redirecionamento das
exportações de alguns países para atender esse mercado ‘Premium’.
O caso mais nítido desse rearranjo no mercado internacional da carne
bovina foi a Austrália, que historicamente já exportava para o Japão e a Coréia do Sul e
que acabou aumentando suas exportações de carne bovina para estes dois países de
forma a preencher o vazio de oferta de carne dos Estados Unidos. Com isso, países que
anteriormente importavam carne da Austrália acabaram ficando desabastecidos, o que
implicou na busca de novos fornecedores. O Brasil, com isso, ganhou novos mercados
de carne bovina no exterior.
A Austrália possui limitações para expandir sua produção e exportação
em decorrência de secas severas nos últimos anos que forçaram a redução do rebanho
bovino deste país. Este foi outro fator externo que contribuiu para o aumento das
exportações de carne bovina do Brasil. Tivesse a Austrália capacidade de expandir sua
produção e exportações, possivelmente a expansão das exportações de carne bovina do
Brasil não tivesse ocorrido com tamanha intensidade. O fato é que esta limitação para a
Austrália expandir sua produção e, conseqüentemente, exportações é estrutural, visto ser
um país com pouca disponibilidade de terras apropriadas para a pecuária (a não ser com
a adoção de taxas de lotação bastante baixas), períodos prolongadas de seca e
dificuldade de intensificação da atividade pecuária neste país (apesar da existência de
confinamentos).
Em paralelo à crise de BSE que assolou a pecuária bovina européia no
início dos anos 2000, a febre aftosa também esteve em curso em alguns dos principais
países exportadores de carne bovina nos últimos anos. O país mais afetado foi
possivelmente a Argentina, que teve sérios problemas de febre aftosa em 2001 e ficou
temporariamente fora dos mercados internacionais. O Brasil aproveitou-se desta
situação ganhando mercado de países que tradicionalmente se abasteciam de carne
argentina, como é o caso do Chile e Egito.
O Brasil também sofreu com a ocorrência de casos de febre aftosa nos
anos recentes. De todo modo, o impacto da febre aftosa no Brasil tem sido menor do
que nos demais países, visto que, de forma geral, apenas os estados afetados (e estados
limítrofes, em alguns casos) têm sofrido embargos por conta de países importadores.
Este é o caso dos estados de Mato Grosso do Sul e Paraná, que tiveram casos
85
confirmados de febre aftosa no fim de 2005, e que sofreram embargos comerciais de
cerca de 50 países, que interromperam temporariamente a importações de produtos
cárneos desses estados (e o estado de São Paulo, em algumas situações). O término do
embargo ao estado do Paraná está previsto para ocorrer no fim do mês de outubro de
2006, sendo que o Ministério da Agricultura já reafirmou a condição do estado do
Paraná como livre de aftosa com vacinação.
Essa conjunção de fatores no mercado internacional da carne bovina fez
com que alguns dos principais exportadores do produto se defrontassem com
impossibilidade de manter seus níveis anteriores de exportação. Por outro lado, a oferta
de carne bovina no Brasil consistentemente aumentava por conta dos ganhos de
produtividade discutidos no tópico anterior ‘Sob o ponto de vista da Oferta’. Além
disso, países antes abastecidos por carne bovina dos Estados Unidos, Canadá, Austrália
e Argentina (todos os países com algum tipo de banimento de exportações ou restrições
de crescimento das exportações) necessitavam buscar novos fornecedores de carne
bovina.
Como resultado desta alteração no comércio mundial de carne bovina e
aumento expressivo da produção doméstica, o Brasil tornou-se o principal exportador de
carne bovina do mundo em quantidade e valor, ultrapassando a Austrália como principal
exportador de carne bovina no mercado internacional. Os números são significativos:
em 1994 o Brasil era apenas o quinto maior exportador do produto em termos de
quantidade, enquanto que atualmente é o número um. Em termos de participação de
mercado, os números são ainda mais impressionantes: em 1994, o Brasil era responsável
por cerca de 5% das exportações mundiais de carne bovina, enquanto que atualmente o
país é responsável por mais de um quarto de toda carne bovina comercializada
internacionalmente (dados do USDA, 2006).
De todo modo, ainda existem obstáculos a serem superados. O Brasil não
consegue acessar o mercado ‘Premium’ da carne bovina nos mercados internacionais
por duas razões básicas. Em primeiro lugar, barreiras não-tarifárias impedem o Brasil de
exportar carne bovina in natura para os Estados Unidos, Canadá, Japão e Coréia do Sul,
que correspondem a cerca de 60% do consumo mundial de carne bovina (dados do
USDA, 2006). Como estes países não aceitam o critério de regionalização para a febre
aftosa, o Brasil fica impedido de vender carne in natura para esses países, perdendo
86
ótimas oportunidades de mercado, visto que os preços da carne bovina nesses mercados
podem atingir valores até três vezes superiores aos preços dos mercados que o Brasil
atualmente acessa.
O segundo motivo diz respeito aos hábitos dos consumidores e limitam
de certa forma a penetração da carne bovina brasileira nos mercados premium até
mesmo da União Européia, que é um dos principais compradores de carne bovina do
Brasil. O padrão de consumo dos europeus é baseado no consumo de carne oriunda de
gado de raças européias, que possuem características organolépticas diferentes da carne
bovina brasileira, que é produzida primordialmente do abate de bovinos nelore ou
anelorados (que produzem uma carne mais magra do que a carne oriunda de animais de
raças européias). Existe também certa desconfiança dois europeus quanto à sanidade do
rebanho brasileiro e o sistema de rastreabilidade brasileiro (SISBOV), além de existirem
fortes pressões por parte dos pecuaristas europeus no sentido de boicote à carne bovina
brasileira, pela alegação de que a carne bovina brasileira é um dos principais
responsáveis pelo desmatamento da Floresta Amazônica.
3.3 Segurança do Alimento e Segurança Alimentar
Faz-se necessária uma distinção entre os termos “segurança alimentar” e
“segurança do alimento”, tendo em vista muitas vezes ocorrer a utilização incorreta de
ambos termos por profissionais dos agronegócios, inclusive por acadêmicos.
Entende-se por alimento seguro aquele que não oferece risco à saúde de
quem o consome ou, por definição do HACCPP (Hazard Analysis and Critical Control
Points), é aquele alimento isento de perigos físicos, químicos e microbiológicos (RIES
& AMBROSINI, 2003). Ou seja, o termo “segurança do alimento” possui aspecto
qualitativo, que se relaciona com não oferecer risco à saúde de quem o consome.
Já segurança alimentar é um termo de aspecto quantitativo, sendo
relacionado com a disponibilidade de alimentos para determinada população.
NOGUEIRA (2003) também faz as devidas ressalvas com relação à
confusão existente entre os dois conceitos. Segundo esta autora, é importante definir o
conceito de “segurança do alimento”, que tem sido, em alguns casos, utilizado com
significados distintos. Quando o enfoque utilizado é quantitativo, referindo-se ao
87
abastecimento adequado de uma população, a expressão correta é segurança alimentar.
Nos casos em que o enfoque é qualitativo, ou seja, ligado à saúde e segurança, usa-se
segurança do alimento.
VINHOLIS & AZEVEDO (2001) afirmam que segurança do alimento,
uma das dimensões da qualidade da carne bovina, está diretamente relacionada à
ausência de microrganismos patogênicos e traços químicos que podem prejudicar a
saúde humana.
A despeito das diferenças conceituais existentes entre segurança do
alimento e segurança alimentar, é natural que ambos os termos estejam bastante
associados, ou seja, não adianta disponibilizar alimentos em quantidade suficiente para
determinada população (aspecto quantitativo), se os mesmos não dispõem dos aspectos
qualitativos necessários adequados para o consumo humano (valores nutricionais,
isenção de riscos etc.).
UNNEVERH (2003) corrobora a afirmação acima. Segundo este autor, o
tema segurança dos alimentos vem recebendo grande atenção no mundo todo à medida
que cada vez mais relações entre nutrição e saúde são reconhecidos. Aumentar a
segurança dos alimentos é um elemento essencial para aumentar a segurança alimentar,
que ocorre quando as populações têm acesso à comida saudável em quantidade
suficiente.
Feitas as devidas ressalvas, a questão da segurança do alimento atingiu
notoriedade nos últimos anos por conta de uma série de problemas relacionados ao
consumo de alimento de origem animal. Termos como “rastreabilidade”, antes
praticamente restrito às indústrias automobilística, farmacêutica e aeroespacial,
“certificação” e “rotulagem” tornaram-se comuns à importante parcela da população,
agora mais preocupada com relação à segurança e origem dos alimentos consumidos.
De acordo com RIES & AMBROSINI (2003), a BSE faz parte de um
grupo de doenças classificadas como TSE (Encefalopatia Espongiforme Transmissível),
que inclui, entre outras, o Scrapie, que afeta ovinos e caprinos e a Doença de
Creutzfeld-Jakob (CJD, da sigla em inglês) que afeta humanos. São, portanto, doenças
inter-específicas, capazes de saltar entre diferentes espécies, sendo que a CJD atinge o
sistema nervoso dos humanos de maneira semelhante à que a BSE ocasiona nos
bovinos, provocando lesões degenerativas de aspecto espongiforme.
88
Ainda segundo estes autores, o desenvolvimento da BSE nos bovinos é
atribuído ao consumo de rações à base de proteína animal, provavelmente contaminada
por Scrapie, a partir do preparo de farinha de ossos, sangue e vísceras, em temperaturas
incapazes de exterminar o agente causador da doença. Sobre a causa desta, muito há
para se estudar, mas a hipótese mais aceita é que ela seja determinada por um “príon”,
que vem a ser um tipo de proteína.
De acordo com MATHEWS JR et al (2004), a BSE ou “doença-da-vaca-
louca” tornou-se um problema de saúde pública em 1996, a partir do anúncio de
especialistas do Reino Unido, que afirmaram haver uma conexão entre a BSE e uma
variante da Doença de Creutzfeld-Jakob (CJD) em humanos. Para estes autores, a BSE é
um problema de grande dimensão na saúde pública, bem como uma questão muito
importante em termos de saúde animal, afetando a produção, consumo e
comercialização de carne bovina por uma série de razões:
a. a incerteza sobre como exatamente a doença é transmitida para os humanos ou
sobre qual a melhor maneira de preveni-la;
b. a incerteza quanto ao número correto de casos de BSE e CJD, em parte por conta
de longos períodos de incubação tanto em bovinos quanto em humanos;
c. a incapacidade de se destruir o príon, o agente tido como causador da BSE e
CJD;
d. a ausência de cura para a BSE e CJD;
e. a habilidade limitada de confirmar a doença (post-mortem).
A despeito do aumento da importância da BSE nos últimos anos, eventos
que envolvem segurança dos alimentos não são exclusividade desta doença.
De acordo com OLLINGER & BALLENGER (2003), o número de
recalls na indústria de alimentos nos Estados Unidos aumentou drasticamente. No
período de 1993 a 1996 o número de recalls na indústria da carne nos Estados Unidos
totalizou cerca de 24 ocorrências por ano, com o recolhimento de quase 700 toneladas
de carne anuais. O período de 1997 a 2000 apresentou cerca de 41 ocorrências por ano,
com o recolhimento de quase 11 mil toneladas de carne por ano.
89
Tamanho aumento nas ocorrências, segundo os autores, são relacionados
com a mudança em aspectos regulatórios na indústria da carne nos Estados Unidos.
Primeiramente, em 1989, o Serviço de Segurança do Alimento e
Inspeção (FSIS, da sigla em inglês), do Departamento de Agricultura dos Estados
Unidos (USDA, da sigla em inglês) adotou uma tolerância zero para a ocorrência de
Listeria monocytogenes, ou seja, não é permitido detecção de nível algum deste
patógeno em carnes prontas para o cozimento (“ready to cook”). A partir desta
determinação, passaram a ocorrer freqüentes testes para este patógeno na carne
consumida nos Estados Unidos. O FSIS adotou a mesma medida para E. coli O157:H7
na carne bovina. Tais patógenos são as causadoras da maior parte dos recalls do tipo 1
na indústria da carne estadunidense.
A segunda causa para o aumento expressivo do número de recalls na
indústria da carne dos Estados Unidos é que o FSIS passou a realizar testes mais amplos
para a detecção de patógenos na indústria da carne dos Estados Unidos, a partir de 1997
e introduziu uma tecnologia mais avançada a partir de 1999.
Por fim, o Centro para Prevenção e Controle de Doenças (CDC, da sigla
em inglês) está se tornando mais eficiente em detectar doenças relacionadas à ingestão
de alimentos, à medida que se desenvolve maior capacidade de rastrear tais doenças.
3.4. Identificação, Rastreabilidade e Certificação
À semelhança do ocorrido entre os termos “segurança do alimento” e
“segurança alimentar”, muitas vezes observa-se uma confusão no emprego dos termos
“identificação”, “rastreabilidade” e “certificação”.
Para RIES & AMBROSINI (2003), identificação é o processo de
identificar unidades de produto ou lotes de produto.
Definir rastreabilidade é uma tarefa mais complicada. Até o momento,
não existe acordo internacional que conceitue este termo, apesar disso estar sob
discussão intensa na Comissão do Codex Alimentarius, na Organização Mundial do
Comércio (OMC) e na International Organization for Standardization (ISO). De forma
90
geral, rastreabilidade é definida como a capacidade de seguir o movimento de um
determinado alimento através de estágios específicos do processamento, produção e
distribuição, porém existem outras definições em uso.
GOLAN et. al (2003) apud MONTEIRO & CASWELL (2004) definem
os sistemas de rastreabilidade em termos de sua abrangência, profundidade e precisão.
Abrangência é definida como a quantidade de informação guardada pelo sistema,
profundidade é o quanto “para frente” e “para trás” a rastreabilidade é mantida e a
precisão é definida como sendo a habilidade que o sistema tem em detectar o ponto
original de determinado problema.
Outra definição é realizada por RIES & AMBROSINI (2003), que
afirmam que rastreabilidade (na cadeia da carne bovina) é o processo de identificação,
coleta, controle e processamento de dados que se faz necessário para o
acompanhamento de todos os eventos, ocorrências e manejos sanitários, manejos
nutricionais, transferências e movimentações na vida de um animal. É o processo que
visa a qualidade, permitindo identificar um lote de carne de características diversas
associando essa carne aos animais gerados, identificando seu manejo e produtor.
Com relação à necessidade de individualização dos animais para a
rastreabilidade, estes autores são enfáticos ao afirmarem que a característica de
individualidade de identificação é fundamental devido à facilidade na realização dos
registros de acompanhamento que se fazem necessários. Desta forma, todas as
informações são armazenadas em um banco de dados central, permanentemente
atualizado on-line, com todas as informações padronizadas e passíveis de avaliação,
investigação e auditoria.
MONTEIRO & CASWELL (2004), ao analisarem a regulamentação que
define o sistema de rastreabilidade em vigor na União Européia afirmam que a
rastreabilidade é definida como um sistema de identificação organizado por todos os
agentes envolvidos nas diferentes partes da cadeia da carne bovina, sendo que tal
sistema deve permitir a ligação adequada entre a carne e os animais que geraram essa
carne (como será visto na seqüência, trata-se de um sistema perfeitamente rastreável).
Tal sistema de identificação deve pelo menos registrar qualquer informação sobre
embarque e chegada de animais (transferências, compra e venda), carcaças e/ou cortes
91
cárneos entre diferentes agentes de tal forma que as correlações (transações) entre eles
estejam garantidas. O regulamento também define o nível de segurança esperado para a
informação contida nos certificados e em todos os tipos de registro existentes. Por fim, o
sistema estabelece as devidas sanções para os casos de não conformidade, o que pode
incluir a remoção da carne comercializada fora dos padrões preestabelecidos do
mercado.
De forma geral, a implantação de sistemas de rastreabilidade pode ter
duas causas distintas: obrigatória, como no caso da União Européia, em que os
participantes de determinada cadeia são forçados a adotar os procedimentos de
rastreabilidade e a voluntária, em que os participantes de determinada cadeia podem ou
não passar a adotar os sistemas de rastreabilidade. O atual modelo brasileiro é uma
mistura destes dois modelos: a carne a ser exportada para a União Européia deve ser
obrigatoriamente originária de animais rastreados, enquanto que a rastreabilidade para o
mercado doméstico é optativa (ou voluntária).
A adoção de sistemas de rastreabilidade pode surgir de demandas tanto
da esfera pública quanto da privada. Usualmente as iniciativas de rastreabilidade
adotadas a partir de demandas públicas têm como objetivo o atendimento de questões de
saúde pública. Já quando os sistemas de rastreabilidade são adotados a partir de
demandas do setor privado, normalmente se procura melhorar processos produtivos e/ou
aumentar o nível de coordenação em determinada cadeia produtiva, através do
compartilhamento de informações. Espera-se, em ambos os casos, que os benefícios
advindos da adoção dos sistemas de rastreabilidade suplantem os custos necessários
para seus funcionamentos (questão muito importante quando se tem sistemas de
rastreabilidade do tipo obrigatório: permanece a questão sobre quem vai pagar pelos
custos da rastreabilidade).
GOLAN et. al (2003) apud MONTEIRO & CASWELL (2004)
exemplificam a questão da obrigatoriedade ou não da adoção de sistemas de
rastreabilidade. Segundo estes autores, o sistema de rastreabilidade para a carne bovina
vigente na União Européia pode ser considerado, pelo menos em teoria, bastante preciso
e “profundo” o suficiente. Tal sistema funciona através da identificação obrigatória dos
animais e do esquema de rotulagem compulsória. A única ressalva realizada pelos
92
autores é quanto à possível armadilha (possible pitfall) do sistema que ocorre em plantas
frigoríficas em que os elos (entre frigoríficos e pecuaristas) são estabelecidos através de
grupos de animais, ao invés de individualmente.
MONTEIRO & CASWELL (2004) afirmam que existem quatro
diferentes padrões de adoção de sistemas de rastreabilidade nos principais países
produtores e consumidores de carne bovina: adoção de sistemas obrigatórios em
resposta à preocupação dos consumidores (União Européia e Japão), adoção de
rastreabilidade obrigatória para manutenção ou ganhos de fatias nos mercados
internacionais (Austrália, Brasil e Argentina), programas obrigatórios comandados pela
indústria (Canadá) e sistemas voluntários de adoção (Estados Unidos).
Já a certificação é o processo de verificar e validar a realidade ou
veracidade de um fato. O fato em questão é a origem do animal, local onde o mesmo
nasceu ou que foi identificado, sua raça, sexo e idade. As práticas e controles
especificados na rastreabilidade de acordo com normas e padrões internacionais também
devem ser certificáveis. No Brasil, as empresas certificadoras, após terem obtido o seu
credenciamento junto ao MAPA, têm a função de atestar e certificar a veracidade das
informações declaradas e registradas pelo produtor no processo de rastreabilidade (RIES
& AMBROSINI, 2003).
Outra definição é realizada por VICTORELLI, 2004. Segundo este autor,
certificação é o conjunto de medidas e atividades desenvolvidas por um organismo
independente da relação comercial, de terceira parte, com o objetivo de atestar
publicamente, por escrito, que determinado produto, processo ou serviço está em
conformidade com os requisitos especificados.
Das definições acima, é possível extrair algumas características
importantes dos processos de identificação, rastreamento e certificação. De acordo com
RIES & AMBROSINI (2003), os sistemas de identificação que precedem os processos
de rastreabilidade e certificação devem ser auditáveis, o que implica nas seguintes
demandas:
93
a. Necessidade de individualidade do animal no grupo, lote e âmbito nacional;
b. Processo de fixação: o identificador utilizado precisa estar fixado no animal e
não pode ser reaproveitado, caso seja retirado do mesmo. Essa inviolabilidade
dos indicadores é uma característica essencial dos sistemas auditáveis de
identificação, rastreabilidade e certificação;
c. Perpetuidade no tempo: Deve levar em consideração a durabilidade do
identificador ao longo do tempo, possibilitando boa fixação e leitura das
informações numéricas e descritivas contidas no mesmo.
De acordo com JANK (2003), os processos de rastreabilidade e de
certificação apresentam os seguintes pontos comuns e discrepâncias:
a. exigem a coordenação dos agentes econômicos de um ou mais sistemas
agroindustriais;
b. lidam com processos;
c. sistemas rastreáveis exigem algum nível de certificação;
d. porém, nem todos sistemas com certificação precisam ser rastreáveis.
Em decorrência de não existir um acordo internacional que defina
rastreabilidade, bem como a mesma ser implantada por diversas motivações, nota-se a
existência de diferentes níveis de rastreabilidade e certificação (cada qual adotado em
decorrência das necessidades dos agentes de determinada cadeia de produção). A
existência de diferentes níveis de rastreabilidade fez com que surgissem definições
quanto à extensão e abrangência dos diferentes sistemas vigentes.
JANK (2003) define dois níveis de rastreabilidade: “SPER” (Sistemas
Perfeitamente Rastreáveis ou Rastreabilidade Plena) e “SPAR” (Sistemas Parcialmente
Rastreáveis ou Rastreabilidade Parcial).
Segundo este mesmo autor, SPERs ocorrem quando é possível identificar
todos os pontos críticos e elos de ligação do subsistema produtivo ou do sub-SAG
(Sistema Agroindustrial) coordenado, inclusive apontando os procedimentos envolvidos
nas transações entre as empresas. Identificação do ponto de origem (que pode ou não ser
94
o ponto inicial do sistema) e, por conseqüência, dos agentes envolvidos, no caso de
problemas na qualidade ou sanidade do alimento.
SPARs, ainda segundo JANK (2003), ocorrem quando há um
rastreamento de um ou mais elos da cadeia produtiva, sem, no entanto, identificar
perfeitamente todos os pontos críticos e elos de ligação, bem como não permitindo a
identificação de todas as etapas intermediárias. Pode ser um passo inicial e menos
custoso em relação à implantação de SPERs, podendo evoluir para tal (ou não, de
acordo com a análise dos pontos críticos do sistema).
RIES & AMBROSINI (2003) trazem definições diferentes, que incluem
a rastreabilidade e o processo de certificação.
Para estes autores, existem duas modalidades que merecem destaque:
a. Rastreabilidade e Certificação de Origem Total: Identificação, coleta e
processamentos dos dados são realizados desde o nascimento do animal até seu
abate;
b. Rastreabilidade e Certificação de Origem Parcial: Ocorre a partir da data de
entrada do animal no sistema (animal jovem e adulto). Como será visto
posteriormente, é o que ocorre atualmente no SISBOV.
Confrontando as definições de JANK (2003) com as elaboradas por RIES
& AMBROSINI (2003), é possível inferir que tanto o sistema de Rastreabilidade e
Certificação de Origem Total quanto o sistema de Rastreabilidade e Certificação de
Origem Parcial são sistemas parcialmente rastreáveis, pelo fato do rastreamento ocorrer
somente na fase de produção pecuária, sem o conseqüente acompanhamento à jusante
da cadeia da carne bovina.
3.5. Certificações Públicas e Privadas para Exportação para a União Européia
Conforme visto, a ocorrência da BSE em alguns dos principais países
produtores, consumidores e exportadores de carne bovina acarreta sérios impactos no
95
comércio internacional da carne bovina, com banimentos das importações e
conseqüente redução nos fluxos comerciais, impondo sérias perdas para a cadeia
produtiva da carne bovina dos países afetados.
Outro impacto da ocorrência da BSE é a necessidade de instauração de
programas de rastreabilidade, de forma a amainar a apreensão gerada nos consumidores
e reduzir o impacto negativo da ocorrência da BSE junto à opinião pública. Também
pode ocorrer da necessidade da implantação de programas de forma a se manter as
exportações de carne bovina para determinado país (ou grupo de países)
No primeiro caso, temos o ocorrido na União Européia. Segundo
MONTEIRO & CASWELL (2004), a resposta da União Européia à crise da BSE estava
embutida no Single European Act, de 1986, que permitiu que a Comissão Européia
propusesse as medidas necessárias para garantir aos consumidores “um alto grau de
proteção”. O Livro Branco sobre Segurança dos Alimentos, de janeiro de 2000,
continha as premissas da abordagem da União Européia quanto à questão se segurança
dos alimentos e nova legislação européia, especificando os prazos para as partes mais
importantes da legislação. Este documento considerava o compartilhamento de
informações ao longo das cadeias agroindustriais de forma transparente, global,
integrada e harmônica, entre os diferentes estados-membros, de forma a recuperar a
confiança dos consumidores. Após o Livro Branco, a legislação européia sobre
segurança dos alimentos foi finalmente publicada no verão de 2000: Regulation (EC)
1760/2000 do Parlamento Europeu em 17 de julho de 2000 e a Regulation (EC)
1825/2000, de 25 de agosto de 2000. Ambos os regulamentos entraram em vigor a partir
de 1º de setembro de 2000.
Já a adoção de programas de rastreabilidade para a manutenção de
exportações é o ocorrido no caso da necessidade de implantação de programa de
rastreabilidade na cadeia da carne bovina brasileira por exigência, ainda que indireta, da
União Européia. Isso ocorre, segundo MONTEIRO & CASWELL (2004), pois quando
um importante importador de carne bovina decide impor um programa de
rastreabilidade obrigatório em seus domínios, tal importador acaba por conseqüência
exigindo rastreabilidade da carne bovina que adquire. Essa necessidade acabou
96
ocasionando o lançamento do SISBOV – Sistema Brasileiro de Identificação e
Certificação de Origem Bovina e Bubalina, no ano de 2002.
De acordo com WAGNER NETO (2004), os frigoríficos exportadores
trabalham há anos com certificações sanitárias obrigatórias para mercados específicos
(União Européia, Chile, USDA e outros), ao lado de certificações de segurança do
alimento, como Hazard Analysis and Critical Control Points (HACCP) e normas
técnicas privadas, como a do British Retail Consortium (BRC). Adicionalmente,
clientes específicos pedem certificação dos sistemas de gestão da qualidade, que não se
refere à qualidade específica do produto, mas à gestão do sistema de produção da
empresa (série ISO 9.000). Muitas indústrias estão se preparando para atender aos
requisitos da série ISO 14.000, para certificação ambiental, e SA8.000 (ABNT NBR
16.001), para certificação de responsabilidade social.
Ainda segundo o mesmo autor, em muitos casos, a indústria frigorífica,
para atender a normas técnicas e requisitos adicionais de clientes (importadores/
distribuidores, redes de supermercado etc.), exige de seus fornecedores de matéria-
prima – os pecuaristas – qualificações que vão além das especificações normais dos
animais a serem abatidos (sexo, idade, acabamento de gordura, peso nominal), tais
como rastreabilidade, bem-estar animal, alimentação, medicamentos usados (resíduos),
cumprimento de legislação ambiental e outras. A comprovação de que o fornecedor/
pecuarista cumpre essas exigências pode se dar por meio de uma declaração de
conformidade, pelo fornecedor – procedimento pelo qual um fornecedor apresenta, por
escrito, que um produto ou serviço está em conformidade com requisitos específicos, o
que representa uma certificação de primeira parte (ISSO/ EIC 22). A própria indústria
ou o cliente podem realizar a verificação da conformidade (inspeção/ auditoria), o que
seria uma certificação de segunda parte. Todavia, as principais certificações de produtos
e sistemas de qualidade são realizadas por terceiros – de forma independente e sem
conflitos de interesses – por ser a mais aceitável pelos compradores, importadores e
autoridades reguladoras.
A certificação necessária para os frigoríficos exportarem para a União
Européia é denominado “Health Certificate”, enquanto que o certificado necessário para
a exportação para os países da “Lista Geral” é denominado “Official Meat Inspection
Certificate”. O Health Certificate contempla normativas da própria União Européia. O
97
Ministério da Agricultura mantém um sistema on-line com os frigoríficos exportadores
de forma a mantê-los atualizados sobre eventuais mudanças nas diferentes normativas
que compõem cada um dos certificados acima mencionados.
As informações acima são corroboradas por LOPES et. al (2007), em
breve análise sobre a normatização necessária para a exportação de carnes para a União
Européia. Segundo o Ministério, dentre os principais produtos exportados, observa-se
exigências relativas à rastreabilidade individual de bovinos, bem como a rastreabilidade
de cortes exportados e a sua ligação com os animais que deram origem ao produto.
Dentre os requisitos sanitários para exportação à UE estão a maturação sanitária da
carne bovina, a permanência dos bovinos por 90 dias na área aprovada pela UE no
Brasil para exportação de produtos desses animais e por 40 dias na última propriedade
anterior ao abate.
Além disso, os controles, de maneira geral, envolvem questões relativas à
sanidade animal, como programas de monitoramento soro-epidemiológico para febre
aftosa, programas de monitoramento quanto à doença de Newcastle, influenza aviária e
avaliação da execução dos serviços pelas esferas municipal, estadual e federal. Quanto à
saúde pública são aplicáveis as definições do chamado “pacote higiênico da UE”
(Regulamentos comunitários 852, 853 e 854/2004), além de outras exigências
específicas como controles especiais para Salmonella em produtos exportados para a
Suécia e Finlândia.
A principal certificação privada utilizada por um grupo seleto de
frigoríficos nacionais (Bertin, JBS e Marfrig) é a EUREPGAP.
De acordo com MARIUZZO (2005) apud FELÍCIO (2005), EUREP
(Euro-Retailer Produce Working Group) é a sigla do nome de um grupo formado, em
1997, por atacadistas e varejistas europeus, que desenvolveu, em 2002, o Protocolo
EUREPGAP IFA com o objetivo de estimular a implementação de sistemas agrícolas e
de produção de animais levando em consideração as boas práticas de produção, a
segurança alimentar, bem como a minimização dos impactos adversos ao meio-
ambiente e a proteção social do trabalhador.
O Protocolo EUREPGAP IFA estabelece uma estrutura de Boas Práticas
Agrícolas (em inglês GAP – Good Agricultural Practices) e de Garantia Integrada da
Fazenda (IFA –Integrated Farm Assurance) em propriedades rurais, e define elementos
98
essenciais para sua aplicação global na produção de alimentos, tendo por base padrões
mínimos aceitáveis.
É de fundamental importância que as organizações envolvidas na
produção responsabilizem-se pela implementação completa do Protocolo EUREPGAP
IFA, com o objetivo de manter a confiança do consumidor nos alimentos adquiridos.
Os produtores recebem aprovação quanto à adoção dos padrões de boas
práticas e de eliminação de quaisquer práticas inadequadas da cadeia produtiva de
alimentos, através de verificação independente realizada por um Organismo Certificador
(OC) aprovado pelo EUREP.
Em linhas gerais, os princípios do esquema EUREPGAP baseiam-se nos
Termos de Referência EUREPGAP, apresentados resumidamente a seguir:
a. Segurança do Alimento: estabelece critérios de segurança alimentar derivados da
aplicação dos princípios gerais de APPCC (HACCP em inglês);
b. Proteção do Ambiente: estabelece boas práticas agrícolas de proteção ambiental,
concebidas de forma a minimizar os impactos negativos da produção
agropecuária no ambiente;
c. Condições de Trabalho, Saúde e Segurança dos Trabalhadores: estabelece um
nível global de critérios de higiene e segurança no trabalho nas unidades de
produção, bem como a conscientização e responsabilidade quanto a assuntos
sociais;
d. Bem-estar animal: estabelece um nível global de critérios de bem-estar animal
nas unidades de produção.
O que se espera do Protocolo é que uma vez obtida a certificação
EUREPGAP IFA, o produtor será capaz de demonstrar:
a. Respeito às legislações nacional e internacional;
b. Manutenção da confiança do consumidor na qualidade e segurança do alimento;
c. Minimização dos impactos negativos ao meio ambiente;
d. Redução do uso de produtos defensivos;
e. Aumento da eficiência do uso de recursos naturais;
99
f. Responsabilidade com a saúde e segurança do trabalhador;
g. Adequação das instalações;
h. Treinamento e capacitação de todos os funcionários;
i. Criação de documentos de controle das etapas do processo produtivo;
j. Maior controle operacional das atividades e processos;
k. Transparência e credibilidade por parte de fornecedores e clientes;
l. Desenvolvimento e aprimoramento de recursos humanos.
VICTORELLI (2004) acredita que o impacto das certificações privadas
será também grande e que serão definidos segmentos de mercado bastante específicos,
variando com o tipo de rastreabilidade e certificação realizados, principalmente no que
se refere à agregação de valor. O autor faz uso do conceito de “consumidores críticos”,
que é uma categoria de consumidores extremamente atenta ao produto que consome e
com poder aquisitivo para pagar pela exigência.
São, portanto, segmentos de mercado que valorizam aspectos qualitativos
que, quanto mais específicos os produtos, maiores valores alcançam. Os desafios são no
sentido de se vencer barreiras estruturais na cadeia da carne bovina, como a falta de
conexão entre os diferentes elos da cadeia, devendo ser valorizados alguns atributos
essenciais para se atingir esses mercados especiais, como a padronização e regularidade
(de oferta).
A Figura 3.1 apresenta o modelo proposto por este autor.
FIGURA 3.1 - Segmentação de Mercado para Carne Bovina
Fonte: VICTORELLI (2004) apud ANUALPEC 2004 (pg. 54)
Rastreados
Valor
Mercado
Certificados diferenciados
Certificados especiais
100
Os certificados diferenciados, segundo o autor, são produtos com
características que os diferenciam dos considerados comuns (commodities). Nesta
categoria encontra-se a maioria dos “selos de qualidade”, marcas próprias, produtos
garantidos originados de determinada raça ou cruzamento ou carne certificada
produzida em certa região. Já os certificados especiais, também segundo VICTORELLI
(2004) são produtos mais específicos que os diferenciados. Nesta categoria destacam-se
a certificação orgânica, normas Eurepgap (padrão baseado na Good Agricultural
Practice – GAP, elaborado por iniciativa do Euro-Retailer Produce Working Group) e
certificações de qualidade agregadas a normas ambientais e sociais, entre outras.
Seguido a linha de raciocínio de VICTORELLI (2004), é possível inferir
que a rastreabilidade é o sistema mínimo necessário para atendimento das futuras (ou
atuais, em alguns casos) exigências dos consumidores. Em outras palavras, a tendência
é que a rastreabilidade não seja um item de diferenciação do produto, mas apenas uma
exigência mínima para que a carne bovina seja comercializada (pelo menos nos
principais mercados internacionais). Atributos de diferenciação serão garantidos através
da vinculação de diferentes certificados, cada qual com sua especificidade, visando
atingir diferentes segmentos de mercado.
101
4. METODOLOGIA DO TRABALHO
Partindo da definição etimológica do termo, temos que a palavra
Metodologia vem do grego meta que significa ‘ao largo’; odos, que significa ‘caminho’;
e logos, que significa ‘discurso’, ‘estudo’ (BARROS & LEHFELD, 2000).
Ainda de acordo com BARROS & LEHFELD (2000), a metodologia é
entendida como uma disciplina que se relaciona com a epistemologia. Consiste em
estudar e avaliar os vários métodos disponíveis, identificando suas limitações ou não em
nível das implicações de suas utilizações. A metodologia, em um nível aplicado,
examina e avalia as técnicas de pesquisa, bem como a geração ou verificação de novos
métodos que conduzem à captação e processamento de informações com vistas à
resolução de problemas de investigação.
Assim, pode-se dizer que a metodologia científica consiste no estudo, na
geração e verificação dos métodos, das técnicas e dos processos utilizados na
investigação e resolução de problemas, com vistas ao desenvolvimento do
conhecimento científico. O conhecimento científico é construído por meio da
investigação científica da pesquisa, utilizando-se a metodologia (RODRIGUES 2006).
A metodologia é, portanto, um conjunto de regras e métodos que ajudam
a transformar os resultados de determinada pesquisa em conhecimento científico. Com
base em um determinado problema e nos objetivos propostos na pesquisa, a
metodologia funciona como um norteador no levantamento de dados, revisão
bibliográfica, levantamento e análise dos resultados e elaboração das conclusões finais.
De forma a facilitar a explicitação da metodologia adotada nesta
pesquisa, este capítulo está subdividido em cinco itens. O primeiro apresenta a
justificativa do método empregado, seguido pela descrição das fontes de dados
(primárias e secundárias) utilizadas na pesquisa. Em seguida, faz-se uma breve
descrição do tipo e design da pesquisa, para então, no quarto item do presente capítulo,
discorrer-se sobre a população e tamanho da amostra (empresas que serão objeto dos
estudos de caso que suportam a pesquisa). Por fim, explicitar-se-á o procedimento para
coleta de dados, no quinto item do capítulo.
102
4.1. Justificativa do Método Utilizado
O presente trabalho é uma pesquisa de perfil qualitativo, pois está
preocupada com a compreensão de eventos (mercadológicos e empresariais) e não com a
mensuração destes fenômenos.
De acordo com FLICK (2004), sob a rubrica da pesquisa qualitativa,
resumem-se várias abordagens de pesquisa que diferem em suas suposições teóricas, no
modo como compreendem seu objeto e em seu foco metodológico.
A pesquisa por meio de estudos de caso tem sido enquadrada no grupo de
métodos denominados qualitativos, que se caracteriza por um maior foco na compreensão
dos fatos do que propriamente na sua mensuração. Contrasta, portanto, com os métodos
quantitativos, que se preocupam com mais intensidade em mensurar fenômenos e são
aplicados normalmente em amostras mais extensas (LAZZARINI, 1997).
Já para MICHEL (2005), o estudo de caso caracteriza-se por ser um estudo
aprofundado, qualitativo, no qual se procura reunir o maior número de informações,
utilizando-se várias técnicas de coletas de dados, com o objetivo de apreender todas as
variáveis da unidade analisada e concluir, indutivamente, sobre as questões propostas na
escolha da unidade de análise. Sua vantagem está na possibilidade de penetração na
realidade social, o que não é conseguido no estudo quantitativo.
Por fim, de acordo com YIN (2001), um estudo de caso é uma investigação
empírica que investiga um fenômeno contemporâneo dentro de seu contexto da vida real,
especialmente quando os limites entre o fenômeno e o contexto não estão claramente
definidos.
Propõe-se que a presente pesquisa possua natureza qualitativa e seja
composta por uma série de estudos de casos, nos quais os objetos de estudo são frigoríficos
de carne bovina in natura de grande porte com perfil exportador.
Optou-se pelo uso de estudos de caso na presente pesquisa pois esta
metodologia:
a. permite investigar fenômenos contemporâneos em seu contexto real;
b. caracteriza-se por ser uma metodologia mais preocupada em compreender os fatos
do que mensurar fenômenos;
103
c. procura reunir o maior número de informações sobre a unidade analisada (objeto de
estudo; nos casos, frigoríficos exportadores de carne bovina e a indústria de
alimentos);
d. permite a utilização de várias técnicas de coletas de dados (o que abre o leque de
possibilidades para o pesquisador);
e. diferentemente dos estudos quantitativos, permite maior penetração na realidade
social (ou mesmo econômica, no caso da análise de empresas).
Como a presente pesquisa procurará contextualizar fenômenos e não
quantificá-los, e considerando o pequeno universo de empresas pesquisadas, o que confere
a possibilidade de maior aprofundamento na análise destas empresas, optou-se pela escolha
do estudo de caso (multicaso) como a metodologia adequada para a presente pesquisa.
4.2. Fontes de Dados
O referencial teórico que engloba os assuntos ‘recursos’, ‘capacitações’,
‘competências essenciais’ e ‘canais de distribuição’ será coberto por dados secundários.
A seção que engloba o histórico da cadeia da carne bovina no Brasil, bem
como seu atual status (aqui inclusos dados estatísticos) também será referenciada por
dados secundários.
Dados primários foram obtidos nas entrevistas com as empresas estudadas
na presente pesquisa e que constituem a base dos estudos de caso, análise e discussão dos
resultados e suportam as considerações finais da presente pesquisa.
No total três empresas foram pesquisadas, o que garante uma boa
representatividade, principalmente considerando que as três empresas entrevistadas, JBS,
Bertin e Frigorífico Quatro Marcos situam-se entre os 7 maiores exportadores de carne
bovina do Brasil. A Marfrig e a Independência Alimentos inicialmente faziam parte da
pesquisa, mas estas empresas optaram por não participar da mesma. Os frigoríficos
Minerva e Mataboi, que inicialmente não faziam parte da pesquisa foram também
contatados, mas optaram por não participar da pesquisa. Trata-se de uma quantidade de
estudos de casos apropriada, levando-se em consideração que são poucos os frigoríficos de
104
carne bovina habilitados a exportar para a União Européia e observa-se uma concentração
nas exportações por parte desses frigoríficos.
Dados secundários também foram utilizados na elaboração dos estudos de
caso, principalmente com o intuito de permitir uma melhor contextualização das empresas
estudadas. Desta forma, foram utilizados dados públicos obtidos nos websites das
empresas, websites de relação com investidores das empresas, prospectos de emissão de
Oferta Pública Inicial de Ações e de operações de mercado de capitais (Eurobonds), bem
como jornais e revistas especializadas em agronegócios e cadeia da carne bovina.
De acordo com LAKATOS & MARCONI (1992), toda pesquisa implica o
levantamento de dados de variadas fontes, quaisquer que sejam os métodos ou técnicas
empregadas. Os dois processos pelos quais se podem obter os dados são a documentação
direta e a indireta.
A primeira constitui-se, em geral, no levantamento de dados no próprio
local onde os fenômenos ocorrem. Esses dados podem ser conseguidos de duas maneiras:
através da pesquisa de campo ou da pesquisa de laboratório. Ambas se utilizam das
técnicas de observação direta intensiva (observação e entrevista) e de observação direta
extensiva (questionário, formulário, medidas de opinião e atitudes técnicas
mercadológicas).
A segunda serve-se de fontes de dados coletados por outras pessoas,
podendo constituir-se de material já elaborado ou não. Dessa forma, divide-se em pesquisa
documental (ou de fontes primárias) e pesquisa bibliográfica (ou de fontes secundárias).
Dados Primários
O levantamento dos dados primários foi realizado através de pesquisa de
campo realizada pelo pesquisador através da utilização de questionários estruturados.
A pesquisa de campo foi realizada com três das principais empresas
processadoras de carne bovina no Brasil (frigoríficos): JBS, Bertin e Frigorífico Quatro
Marcos. Estas empresas possuem plantas industriais espalhadas pelos principais estados
produtores de carne bovina no Brasil, bem como estão avançando no processo de
internacionalização, com aquisição de plantas industriais nos principais países
produtores de carne bovina no mundo (não válido por ora para o Quatro Marcos).
105
Dados Secundários
Dados secundários relacionados aos assuntos ‘competências essenciais’,
‘canais de distribuição’, bem como dados e estatísticas relacionadas à cadeia da carne
bovina no Brasil, foram utilizados na revisão bibliográfica, tendo em vista serem os
referenciais teóricos do presente trabalho. Dados secundários pertinentes a estes
assuntos foram obtidos em livros, revistas, jornais, periódicos, dissertações, teses, anais
de congressos e instituições ligadas aos corpos teóricos escolhidos e ao setor estudado.
Conforme mencionado anteriormente, dados secundários foram também utilizados na
elaboração dos estudos de caso.
4.3 Tipo e Design de Pesquisa
Optou-se pela elaboração de uma pesquisa qualitativa por considerá-la
mais apropriada para a realidade da presente pesquisa. Através da pesquisa qualitativa
(estudos de caso) acredita-se ser possível obter informações estratégicas, operacionais e
comerciais muito mais profundas e detalhadas de um grupo seleto de empresas do que
as informações que seriam obtidas no caso de um levantamento quantitativo em um
universo de pesquisa muito maior.
Existe um trade-off entre os possíveis e esperados ganhos obtidos a partir
de uma análise feita de forma detalhada e personalista versus os ganhos obtidos através
de procedimentos matemáticos e/ou estatísticos utilizados para comprovar ou refutar
determinada(s) hipótese(s) em pesquisas com amostras de grande porte.
Dentro do escopo da pesquisa qualitativa, o design mais adequado para a
presente pesquisa é o estudo de caso, pois, de acordo com MICHEL (2005), este método
permite, mediante o estudo de casos isolados ou de pequenos grupos, entender
determinados fatos sociais. Ainda segunda a autora, o estudo de caso é uma técnica de
pesquisa de campo que se caracteriza por ser o estudo de uma unidade, ou seja, de um
grupo social, uma família, uma instituição, uma situação específica, empresa, entre
outros, com o objetivo de compreendê-los em seus próprios termos.
Buscou-se através da pesquisa definir ‘quais’ competências essenciais as
empresas possuem, e ‘como’ e ‘por que’ tais competências foram desenvolvidas. Ainda,
106
procuro-se definir ‘como’ as empresas estruturam seus canais de distribuição na Europa
e ‘por que’ estruturam dessa forma.
Tendo em vista se tratar de mais de um estudo de caso, a pesquisa é
considerada do tipo ‘multicaso’. De acordo com LAZZARINI (1997), um mesmo
problema de pesquisa pode ser tratado por diferentes estudos de casos. O estudo de
casos múltiplos se baseia em replicações de um dado fenômeno. A vantagem da
utilização de casos múltiplos reside no fato de que estes proporcionam evidências
inseridas em diferentes contextos, o que acaba tornando a pesquisa como um todo mais
robusta.
Na presente pesquisa, optou-se por mais de um estudo de caso em
primeiro lugar para explorar um maior número de empresas e, principalmente, para
garantir maior robustez na elaboração das conclusões.
Por fim, tem-se que a presente pesquisa é do tipo exploratória a qual,
como o próprio nome aponta, possui um caráter de explorar determinado assunto. De
acordo com COOPER & SCHINDLER (2003) o estudo explanatório é baseado na teoria
que, por sua vez, é criada para responder às perguntas ‘por que’ e ‘como’. A pesquisa
exploratória vai além da descrição e tenta explicar as razões para o fenômeno que o
estudo descritivo apenas observou. O pesquisador usa teorias ou pelo menos hipóteses
para encontrar as forças que levaram certo fenômeno a ocorrer.
Por outro lado, CERVO & BERVIAN (2002) afirmam que os estudos
exploratórios não elaboram hipóteses a serem testadas no trabalho, restringindo-se a
definir objetivos e buscar mais informações sobre determinado assunto de estudo. Tais
estudos têm por objetivo familiarizar-se com o fenômeno ou obter nova percepção do
mesmo e descobrir novas idéias. Por fim, segundo os autores, a pesquisa exploratória
realiza descrições precisas da situação e quer descobrir as relações existentes entre os
elementos componentes da mesma.
4.4. População e Tamanho da Amostra
De acordo com LAKATOS & MARCONI (1992), existem duas grandes
divisões no processo de amostragem: a não-probabilista e a probabilista. A primeira
opção, não fazendo uso de uma forma aleatória de seleção, não pode ser o objeto de
107
certos tipos de tratamento estatístico, o que diminui a possibilidade de inferir para o
todo os resultados obtidos para a amostra. A segunda baseia-se na escolha aleatória feita
pelos pesquisadores, sendo que o termo ‘aleatório’ significa que a seleção se faz de
forma que cada membro da população tinha a mesma probabilidade de ser escolhido.
A presente pesquisa fez uso da amostragem não-probabilística (ou não-
probabilista), visto que o universo das empresas a serem estudadas será escolhido de
forma arbitrária. Para MATTAR (1997) apud WOLLENHAUPT (2004) existem
diferentes razões para a utilização de amostras não-probabilísticas. Uma das razões, que
se aplica na presente pesquisa, é o fato de que a obtenção de uma amostra de dados que
reflita uma população pode não ser o propósito principal da pesquisa. Se não houver
intenção de generalizar os dados obtidos na amostra para a população, então não deverá
haver preocupações quanto à amostra ser mais ou menos representativa da população.
WOLLENHAUPT (2004) menciona três tipos de amostragens não-
probabilísticas: amostragem por conveniência, amostragem por julgamento e
amostragem por quotas. Para esta pesquisa optou-se pela amostragem por julgamento,
na qual, segundo WOLLENHAUPT (2004), os elementos da amostra são selecionados
segundo um critério de julgamento do pesquisador, tendo como base o que se acredita
que o elemento selecionado possa fornecer ao estudo. De todo modo, existe um
componente de amostragem por conveniência na presente amostragem, visto que os
elementos da amostra estão sendo selecionados também de acordo com a conveniência
do pesquisador, em decorrência de estarem ao alcance do pesquisador e eventualmente
dispostos a responder um questionário.
A população desta pesquisa é composta pelos principais frigoríficos
exportadores de carne bovina no Brasil.
Alguns critérios foram estabelecidos para a determinação da amostra:
a. empresas que abatem bovinos e que sejam processadoras de carne bovina;
b. empresas que estejam classificadas entre os 10 maiores frigoríficos de carne
bovina no Brasil;
c. empresas de perfil exportador, preferencialmente associadas à ABIEC
(Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne), entidade que
congrega os principais frigoríficos exportadores de carne bovina no Brasil;
108
d. empresas que preferencialmente tenham plantas industriais espalhadas pelos
principais estados produtores de carne bovina no Brasil.
Desta forma, os frigoríficos escolhidos e que aceitaram participar da
presente pesquisa foram: Bertin Alimentos Ltda., (“Bertin” ou “Grupo Bertin”), JBS
S.A (“JBS” ou “Friboi”) e Frigorífico Quatro Marcos Ltda. (“Quatro Marcos”).
A escolha da Bertin como uma das empresas a serem estudadas na
presente pesquisa decorre do fato de que se trata de um dos principais produtores e
exportadores de carne bovina no Brasil. Ainda, o grupo é extremamente diversificado e
verticalizado, o que o diferencia em relação a maior parte de seus principais
concorrentes e o torna um alvo interessante para o presente estudo, no sentido de
entender as competências essenciais de um grupo industrial tão diversificado e
verticalizado.
A escolha da JBS como uma das empresas a serem estudadas na presente
pesquisa decorre do fato de ser o maior grupo frigorífico do Brasil (e um dos maiores do
mundo). Torna-se interessante, portanto, o estudo das competências essenciais de um
frigorífico cujo foco de atuação aparentemente está pautado nos ganhos de escala de
produção. O estudo dos canais de distribuição deste frigorífico na Europa torna-se
interessante, principalmente no que se refere ao relacionamento da JBS com seus
clientes.
A escolha do Quatro Marcos se justifica por ser um frigorífico de menor
porte em relação aos demais estudados, principalmente no que se refere ao volume de
exportações, visto que a empresa possui maior foco de atuação no mercado doméstico.
4.5. Procedimento de Coleta de Dados
Os questionários utilizados na pesquisa (levantamento de dados nos
estudos de caso) foram padronizados ou estruturados. Segundo LAKATOS &
MARCONI (2004), a entrevista padronizada ou estruturada ocorre quando o
pesquisador segue um roteiro previamente estabelecido. As perguntas feitas aos
indivíduos são, portanto, predeterminadas.
109
De todo modo, apesar da roteirização das entrevistas, não se pretendeu,
na presente pesquisa, perder a flexibilidade existente em outro tipo de entrevista,
despadronizada ou semi-estruturada, na qual, de acordo com LAKATOS & MARCONI
(2004), o entrevistador tem liberdade para desenvolver cada situação em qualquer
direção que considere adequada, sendo uma forma de poder explorar mais amplamente
a questão.
Pretendeu-se desta forma, fazer o uso de um questionário estruturado de
forma a sistematizar a coleta de dados, sem que isso seja feito de tal modo a engessar o
entrevistado. Por isso tem-se a opção de certa flexibilização em relação ao roteiro
inicial, caso se fizer necessário.
A coleta de dados foi realizada através de entrevistas pessoais com os
acionistas ou executivos das empresas-alvo dos estudos de caso.
O questionário estruturado que norteou as entrevistas foi elaborado com
base nos diferentes arcabouços teóricos que fazem parte desta pesquisa, com o devido
cuidado em se fazer a adequada conexão entre os diferentes assuntos que permeiam o
presente trabalho.
O questionário e as entrevistas tiveram como objetivos principais
responder às questões que norteiam a presente pesquisa, de forma a permitir o
levantamento e análise de dados, com posterior elaboração das conclusões.
A transcrição do questionário aplicado na pesquisa encontra-se no Anexo
A.
4.6. Análise e Interpretação dos Dados
De acordo com BARROS & LEHFELD (2000), na fase de coleta de
dados, o pesquisador registra os dados obtidos para depois passar ao processo de
classificação e categorização. Nesse momento, os dados são examinados e transformam-
se em elementos importantes para a comprovação ou não das hipóteses.
Ainda de acordo com os autores, antes de se passar à fase de
interpretação, é necessário que o pesquisador examine os dados, isto é, ele deve
submetê-los a uma análise crítica, observando falhas, distorções e erros.
110
Para RODRIGUES (2006), após coletar os dados, o pesquisador deverá
analisá-los e interpretá-los objetivando a solução do problema da pesquisa. A análise
corresponde a organizar, apresentar e descrever os resultados, demonstrando as relações
existentes entre os dados obtidos do fenômeno estudado em busca da solução do
problema. A interpretação visa à reflexão e à explicação; busca apresentar os resultados
em um contexto mais abrangente, interligá-los, compará-los e avaliá-los para solucionar
o problema.
A interpretação é uma atividade que leva o pesquisador a dar um
significado mais amplo às respostas. De acordo com LAKATOS & MARCONI (1992),
citados por BARROS & LEHFELD (2000), na interpretação dos dados, dois aspectos
são importantes:
a. Construção de tipos, modelos e esquemas através do uso dos conceitos teóricos,
relação com as variáveis quantificadas e realização de comparações pertinentes;
e
b. Ligação com a teoria – pressupõe uma definição metodológica e teórica do
pesquisador em termos de seleção entre as alternativas disponíveis da
interpretação da realidade.
Com base nas afirmações acima, conseguiu-se, através da análise dos
dados, obter-se resultados que apontam as competências essenciais das empresas
analisadas, principalmente no que se refere à capacidade dessas empresas exportarem
seus produtos. Conseguiu-se também avaliar a estrutura dos canais de distribuição
destas empresas em mercados internacionais (União Européia, no caso).
De todo modo, algumas considerações são importantes na classificação
de competências essenciais dos frigoríficos analisados.
A primeira consideração diz respeito ao impacto destas competências
essenciais na criação de vantagens competitivas sustentáveis de um frigorífico em
relação ao outro. Em outras palavras, existem competências essenciais com maior
impacto competitivo do que outras e com diferentes impactos entre os frigoríficos,
sendo que a presente pesquisa não se preocupou em determiná-los, muito menos
explicitá-los.
111
A segunda consideração diz respeito à temporalidade das competências
essenciais; justamente porque algumas competências essenciais em princípio parecem
ser “menos fortes” do que outras. Com isso, estas competências parecem poder garantir
vantagem competitiva sustentável por determinado período, até que os concorrentes
consigam de alguma forma copiá-la, replicá-la etc. Quando isso ocorrer, esta
competência essencial se tornará então apenas mais uma das capacitações da empresa.
A questão da temporalidade das competências essenciais foi abordada
por CRAIG & GRANT (1999), Segundo estes autores, se uma empresa possui recursos
e capacidades superiores aos de seus concorrentes e adota uma estratégia que utiliza
esses recursos e capacidades de maneira eficaz (ou seja, possui competências essenciais
em relação aos seus competidores), ela poderá criar uma vantagem competitiva. Mas,
em termos de capacidade de tirar proveito dessa posição de vantagem competitiva, uma
questão decisiva é o período durante o qual a empresa poderá manter sua vantagem. A
capacidade de sustentação da vantagem competitiva depende de três características
principais de recursos e capacidades: de durabilidade, de transferência e de
reprodução; enquanto que a capacidade de empresa obter lucros de sua vantagem
competitiva depende da capacidade de apropriação desses retornos.
A durabilidade diz respeito à velocidade com que os recursos e as
capacitações de uma empresa se deterioram. A capacidade de transferência diz respeito
à capacidade de os rivais atacarem posições de vantagem competitiva, o que depende do
acesso aos recursos e capacitações necessárias. Já a capacidade de reprodução é
relacionada com a facilidade e rapidez com que os concorrentes desenvolvem os
recursos e capacitações nos quais a vantagem competitiva de determinada empresa se
baseia. Por fim, a capacidade de apropriação é a capacidade que o proprietário da
empresa tem de apropriar os lucros à sua base de recursos, situação muito comum em
empresas de prestação de serviços especializados, como consultoria de gestão, empresas
de serviços financeiros, agências de publicidade etc.
A terceira consideração diz respeito ao fato de que parece existir um
sistema de retro-alimentação dentre algumas competências essenciais, sendo difícil
discriminar a causa e o efeito de uma competência sobre a outra.
A metodologia utilizada para a análise e interpretação dos dados
utilizados para a determinação das competências essenciais - que impactam a
112
distribuição da carne bovina brasileira no mercado europeu - foi baseada na combinação
de conceitos de diversos autores.
Dada a forte correlação existente entre recursos, capacitações e
competências essenciais, o ponto de partida para a determinação das competências
essenciais foi o mapeamento dos principais recursos e capacitações dos frigoríficos
analisados.
A etapa inicial foi a identificação dos recursos dos frigoríficos analisados
na presente pesquisa. Esta identificação seguiu a teoria explicitada por BARNEY, 1991;
GRANT, 1991 (apud HOSKISSON et). al. (2004, p. 109), que separa os recursos em
tangíveis e intangíveis.
Os recursos tangíveis são ativos que podem ser observados e
quantificados, de acordo com HOSKISSON et. al. (2004): recursos financeiros,
organizacionais, físicos e tecnológico.
Já os recursos intangíveis incluem ativos que estão profundamente
enraizados na história da firma e são acumulados ao longo do tempo, também de acordo
com HOSKISSON et. al. (2004). De forma geral, os recursos intangíveis são difíceis de
serem analisados e copiados pelos competidores, por estarem estabelecidos em padrões
únicos e exclusivos de rotina. Os recursos intangíveis identificados na pesquisa são
humanos, inovadores e, principalmente, reputacionais, como tradição, marca, percepção
de qualidade e relacionamento com fornecedores.
A metodologia proposta por BARNEY, 1991; GRANT, 1991 (apud
HOSKISSON et. al. (2004, p. 109)) sugere a existência de quatro tipos de recursos
tangíveis e três tipos de recursos intangíveis. Os tangíveis são agrupados da seguinte
forma: financeiros, organizacionais, físicos e tecnológico. Já os três tipos de recursos
intangíveis são os recursos humanos, inovadores e reputacionais.
Esta metodologia foi utilizada para realizar o mapeamento e
determinação dos recursos, tangíveis e intangíveis, dos frigoríficos analisados. Os
recursos propriamente ditos, agrupados de acordo com esta metodologia, são resultados
da pesquisa de campo.
Com base nos recursos dos frigoríficos estudados, o passo seguinte foi a
identificação das capacitações dos frigoríficos estudados. Uma capacitação é uma série
de recursos integrados. A classificação das capacitações partiu dos conceitos de
113
DRANOVE & MARCIANO (2005) que qualificam as capacitações como “verbos”.
Sob esta ótica, as capacitações demonstram o que as empresas fazem com seus recursos.
A determinação das capacitações também seguiu CRAIG & GRANT
(1999) apud HOSKISSON et. al. (2004), que afirmam que os recursos são os
patrimônios específicos da empresa: bens de capital, qualificação dos funcionários,
patentes, marcas e similares, enquanto que as capacitações são o que a empresa pode
fazer, ou seja, o resultado dos recursos trabalhando em conjunto para realizar tarefas
produtivas.
Desta forma, os recursos mapeados na pesquisa combinam-se de forma a
gerar diferentes tarefas produtivas, ou diferentes capacitações. Importante notar que os
recursos e capacitações mapeados e identificados são os mesmos para cada frigorífico
analisado, ou seja, tais recursos e capacitações estão presentes, com maior ou menor
intensidade, nos frigoríficos analisados na presente pesquisa. Estes recursos e
capacitações são a base das competências essenciais dos frigoríficos analisados, cuja
determinação será descrita no passo seguinte.
O passo seguinte e de extrema importância foi analisar quais destes
recursos e capacitações geram vantagens competitivas para os frigoríficos analisados.
Esta análise foi realizada de maneira individualizada para cada frigorífico e seguiu os
conceitos de LASSERRE (2003), que menciona a intrínseca relação entre capacitações e
vantagens competitivas. Segundo este autor, vantagens competitivas são capacitações
difíceis de serem imitadas, replicadas e que são não comercializáveis.
A classificação das capacitações em competências essenciais seguiu
também os conceitos de HOSKISSON et. al. (2004,). Segundo estes autores, se a
capacitação satisfaz o critério de ser uma vantagem competitiva, então ela é uma
capacitação estratégica, logo, uma competência essencial. Entretanto, se a capacitação
não satisfaz o critério de ser uma fonte de vantagem competitiva para a empresa, então
ela é apenas um agrupamento de recursos não estratégicos.
Com base nestes conceitos, foram identificadas as competências
essenciais individuais de cada frigorífico analisado na pesquisa.
As competências essenciais de cada frigorífico afetam em diferentes
níveis a capacidade de exportação destes frigoríficos e a estruturação de seus canais de
114
distribuição na Europa, ou seja, a importância relativa das mesmas não é homogênea
para todos eles.
A definição da capacitação como fonte de vantagem competitiva (logo,
competência essencial) também seguiu os quatro critérios de HOSKISSON et al.
(2004), que definem que para a capacitação ser considerada uma vantagem competitiva
sustentável, ela deverá preencher quatro critérios, ou seja, a capacitação deverá ser: (i)
geradora de valor; (ii) rara (escassa); (iii) cara ou difícil de ser imitada; e (iv) não
substituível.
De todo modo, como nem sempre uma competência essencial preenche
claramente os quatro critérios acima descritos, os mesmos autores realizaram uma
combinação destes critérios de forma a determinar se determinada capacitação leva à
uma vantagem competitiva sustentável ou temporária, conforme pode ser observado
pelo Quadro 4.1.
QUADRO 4.1 - Resultados das combinações dos critérios para a obtenção da
Vantagem Competitiva Sustentável
Retornos acima
da média
Vantagem
competitiva
sustentável
SimSim Sim Sim
Retornos
ligeiramente
acima da média
Vantagem
competitiva
temporária
Sim/ NãoNãoSimSim
Retornos
semelhante aos
dos competidores
Paridade
competitiva
Sim/ NãoNãoNãoSim
Retornos abaixo
da média
Desvantagem
competitiva
NãoNãoNãoNão
Implicações na
performance da
empresa
Conseqüências
competitivas
Este recurso ou
capacitação é
insubstituível?
Este recurso ou
capacitação é
difícil ou caro de
ser imitado?
O recurso ou
capacitação é
escasso?
O recurso ou
capacitação é
gerador de
valor?
Retornos acima
da média
Vantagem
competitiva
sustentável
SimSim Sim Sim
Retornos
ligeiramente
acima da média
Vantagem
competitiva
temporária
Sim/ NãoNãoSimSim
Retornos
semelhante aos
dos competidores
Paridade
competitiva
Sim/ NãoNãoNãoSim
Retornos abaixo
da média
Desvantagem
competitiva
NãoNãoNãoNão
Implicações na
performance da
empresa
Conseqüências
competitivas
Este recurso ou
capacitação é
insubstituível?
Este recurso ou
capacitação é
difícil ou caro de
ser imitado?
O recurso ou
capacitação é
escasso?
O recurso ou
capacitação é
gerador de
valor?
Fonte: HOSKISSON et. al. (2004, p. 118)
Desta forma, a competência essencial que preenche os quatro critérios é
uma fonte de vantagem sustentável, cuja implicação no desempenho da empresa é
proporcionar à empresa retornos acima da média do setor (no caso, retornos no canal de
115
distribuição acima da média dos concorrentes). Infere-se, portanto, que é uma
competência essencial sustentável.
Já a competência essencial que é fácil (ou barata) de ser imitada, leva à
uma vantagem competitiva temporária, com retornos ligeiramente acima da média.
Infere-se, portanto, que se trata de uma competência essencial temporária.
Os critérios acima foram utilizados em cada estudo de caso de forma a
determinar as competências essenciais, sustentáveis e temporárias, que impactam as
exportações e a estruturação dos canais de distribuição de cada frigorífico no mercado
europeu.
Os resultados estão expressos nos tópicos “5.1.7. Competências
Essenciais e Distribuição da Carne Bovina Brasileira na Europa – Bertin”; “5.2.7.
Competências Essenciais e Distribuição da Carne Bovina Brasileira na Europa –
JBS”; e “5.3.7. Competências Essenciais e Distribuição da Carne Bovina Brasileira na
Europa – Quatro Marcos”.
Por fim, as competências essenciais do conjunto destes frigoríficos foram
discutidas no tópico “5.4.2. Competências Essenciais e Distribuição da Carne Bovina
Brasileira na Europa”.
116
5. ESTUDOS DE CASO, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS
RESULTADOS
Este capítulo contém os estudos de caso da presente pesquisa: Grupo
Bertin, JBS-Friboi e Frigorífico Quatro Marcos. Os estudos de caso servirão de base
para a análise e discussão dos resultados, bem como suportarão as considerações finais
da presente pesquisa.
5.1. Estudo de Caso: Grupo Bertin
5.1.1. – Introdução/Histórico
A história do Grupo Bertin remonta ao ano de 1977, quando o Sr.
Henrique Bertin, o mais velho entre seis irmãos, fundou a empresa que deu origem à
atual Bertin Ltda. A primeira unidade de abate foi inaugurada na cidade de Lins em
1977, com uma capacidade inicial de abate de 50 cabeças/ dia. Durante a década de
1980, a empresa iniciou seu processo de diversificação, ou seja, ao mesmo tempo em
que permaneceu no seu principal negócio (“core business”) relacionado ao
processamento de carne bovina, a empresa iniciou suas operações no mercado de couro.
Na década de 1990, a empresa melhorou seu posicionamento competitivo na cadeia
agroindustrial da carne bovina, ao aumentar sua capacidade de abate e ao iniciar seu
processo de expansão e diversificação geográfica, ao adquirir unidades de abate e
processamento de carne bovina nos estados de Mato Grosso do Sul, Minas Gerais e São
Paulo. Na seqüência, a empresa adquiriu unidades de abate e de processamento de carne
bovina nos estados de Goiás, Bahia e Pará. Com a aquisição, modernização e melhoria
das plantas industriais, o Grupo Bertin aumentou sua capacidade diária de abate de
2.500 cabeças por dia para as atuais 7.200 cabeças/ dia. A capacidade de processamento
de couro bovino aumentou de 4.000 peles/ dia para 23.900 peles/ dia.
Atualmente, Grupo Bertin pertence aos cinco irmãos da Família Bertin e
aos herdeiros do Sr. Henrique Bertin. Trata-se, portanto de uma holding company de
capital 100% nacional, que atua nos segmentos de agroindústria e infra-estrutura. O
117
Grupo Bertin é sediado na cidade de Lins, estado de São Paulo, e possui 28 unidades
produtivas distribuídas pelo Brasil, nos vários segmentos em que a empresa opera, onde
operam 20 mil colaboradores diretos.
O setor de agroindústria do Grupo Bertin é composto por um
conglomerado industrial focado em nove divisões de negócios: Agropecuária,
Alimentos, Biodiesel, Cosméticos, Couros, ‘Dog Toys’, Equipamentos de Proteção
Individual, Higiene e Limpeza e Higienização Industrial.
No setor de infra-estrutura, o Grupo Bertin está estabelecido nas áreas de
construção civil, saneamento básico, energia e transporte, contando ainda com um
Resort, localizado na cidade de Lins.
Na seqüência, apresentar-se-á um breve resumo das empresas que
compõem o Grupo Bertin.
Bertin Alimentos
A Bertin Alimentos é a empresa do Grupo Bertin responsável pelo abate
de bovinos e processamento de carne bovina. A empresa possui 7 unidades de abate e
plantas frigoríficas espalhados pelo território nacional e localizadas nas principais
regiões pecuárias do Brasil. A Bertin Alimentos ainda possui duas fábricas produtoras
de lata, que produzem as latas utilizadas na produção de carne industrializada da Bertin
Alimentos.
Bertin Agropecuária
A Bertin Agropecuária investe na criação de gado de corte e em
pesquisas para melhoramento genético da raça Nelore. A empresa possui confinamentos
para engorda de bovinos que são abatidos nas plantas industriais do Grupo Bertin.
Bertin Biodiesel
O Grupo Bertin inaugurou em setembro de 2007 sua usina de Biodiesel,
utilizando como matéria-prima principal o sebo bovino. A intenção é atender 14% da
118
demanda nacional, com a adição de 2% do produto ao diesel. A unidade comportará um
processamento anual de 100 mil toneladas, o equivalente a 100 milhões de litros de
biodiesel, a maior capacidade instalada no País.
Bertin Cosméticos
A Bertin Cosméticos é representada pelas marcas OX, Phytoderm,
Neutrox, Capi Vida, Elle Ella, Karina e Kolene. Ao todo são 445 itens, entre xampus,
condicionadores, cremes corporais, protetores solares, desodorantes e sabonetes, além
de uma linha completa de perfumaria.
Bertin Couros
A Bertin Couros opera através da marca Bracol, produzindo e
comercializando peças nos estágios wet-blue, semi-acabado e acabado para os
segmentos moveleiro, automobilístico e calçadista.
Bertin Produtos Pet
A Bertin Produtos Pet fabrica mastigadores e snacks para cães, a partir de
matéria-prima selecionada das empresas que pertencem ao Grupo. Os produtos da
Bertin Produtos Pet são feitos artesanalmente e comercializados com exclusividade pela
empresa norte-americana Hartz Mountain Corporation, com as marcas Hartz, Harper’s,
Nelore, Premium Beef Hide e Deli Hartz.
Bertin Equipamentos de Proteção Individual (“EPIS”)
A Bertin Equipamentos de Proteção Individual (“EPIS”) produz, através
da marca Bracol, equipamentos de segurança para proteção individual, como calçados e
luvas de segurança, que são utilizados pelos funcionários do Grupo Bertin e prestadores
de serviços em suas atividades diárias. Além de calçados confeccionados com couro
gerado nas unidades do Grupo, há também uma ampla linha de luvas e botas de PVC.
119
Bertin Higiene e Limpeza
A Bertin Higiene e Limpeza é líder na produção de sebo bovino e massa
base e fornece matéria-prima para pequenas, médias e grandes empresas, além de
fabricar e comercializar, sob as marcas Brisa e Lavarte, um mix de produtos que inclui
sabão em barra, desinfetante, lava louça, amaciante, lava roupa, multiuso, limpa vidro,
limpeza perfumada e limpeza pesada.
Bertin Sistemas de Higienização
Responsável pela fabricação de mais de 70 itens para limpeza profunda e
desinfecção de ambientes, a Bertin Sistemas de Higienização, com a marca Bracol,
fornece soluções para empresas, indústrias, metalúrgicas, hospitais, hotéis, órgãos
públicos e estabelecimentos em geral. Todos os produtos, entre detergentes,
sanitizantes, desinfetantes e bactericidas, além de linhas agrícolas e veterinárias, são
certificados pelo Ministério da Agricultura e Agência Nacional de Vigilância Sanitária.
Bertin Construção Civil
O Grupo Bertin também atua no setor de construção civil através de sua
empresa Contern, que tem foco em edificações, engenharia urbana, acabamentos,
instalações prediais e superestruturas.
Bertin Saneamento Básico
Após acordo com a prefeitura municipal da cidade de Campo Grande, o
Grupo Bertin assumiu 50% do controle da empresa Águas Guariroba S.A., com o intuito
de melhorar o abastecimento de água e esgoto na capital do estado de Mato Grosso do
Sul.
120
Bertin Rodovias
O Grupo Bertin detém 50% da Concessionária Rodovias das Colinas,
empresa dedicada a operar, conservar e ampliar um conjunto de 300 quilômetros de
estradas que atravessam 17 municípios do interior de São Paulo e atendem anualmente
mais de 30 milhões de veículos.
Bertin Energia Elétrica
O Grupo Bertin construiu sua primeira central hidrelétrica (PCH),
denominada “Sacre 2”, na cidade de Brasnorte, Mato Grosso. A Brasil Central Energia
S.A., uma das empresas pertencentes ao Grupo Bertin, será a empresa responsável por
comercializar a energia gerada por esta PCH, que terá 30 mW de potência e capacidade
para abastecer uma cidade de até 30 mil habitantes.
Resort Lins
O Grupo Bertin possui um resort denominado Resort Lins, localizado no
km 443 da Rodovia Marechal Rondon. O Resort Lins é administrado pela rede de hotéis
Blue Tree e oferece 114 apartamentos, completa infra-estrutura de lazer e infra-estrutura
adequada para a realização de eventos de negócios.
O foco da presente pesquisa será a divisão de Alimentos do Grupo Bertin
(também denominada no presente trabalho como “Bertin Alimentos” ou mesmo “Grupo
Bertin”), visto ser a divisão responsável pelo abate, desossa, processamento e
distribuição de carne bovina. Esta divisão objetiva o aproveitamento total da cadeia da
carne bovina, com foco na produção de carne bovina e aproveitamento de seus
subprodutos, seguindo uma estratégia de verticalização dos negócios.
121
5.1.2. – Infra-Estrutura e Escala de Produção
A Bertin Alimentos possui seis unidades de abate e duas plantas de
processamento de carne bovina localizadas nas principais praças pecuárias do país. A
empresa também possui um frigorífico no Uruguai, denominado Canelones. A empresa
possui grande dispersão geográfica, o que reduz seu risco sanitário. O Quadro 5.1
abaixo apresenta as unidades de abate e processamento de carne bovina da Bertin
Alimentos.
QUADRO 5.1 - Unidades Industriais – Bertin Alimentos - 2006
Cidade Estado Atividades
Capacidade de Abate
(cabeças/ dia)
Ano do início
das operações
Lins São Paulo Abate/ Desossa/ Processamento 1.550 1977
Ituiutaba Minas Gerais Abate/ Desossa 950 1993
Naviraí Mato Grosso do Sul Abate/ Deossa 1.600 2001
Mozarlândia Goiás Abate/ Desossa 2.000 2000
Marabá Pará Abate/ Desossa 800 2005
Itapetinga Bahia Abate/ Desossa 300 2005
Votuporanga São Paulo - 1996
Total - - 7.200 -
Fonte: Bertin (2006)
Por fim, está prevista para fim de janeiro de 2008 a inauguração da
segunda unidade frigorífica da Bertin Alimentos no estado de Mato Grosso do Sul, de
acordo com informações da mídia.
A estrutura da planta de Campo Grande deverá ser a segunda maior do
mundo em número de abates diário, com capacidade inicial de abate estimada em 3 mil
cabeças/dia. A unidades deverá alcançar seu potencial instalado final em 2009/2010,
quando terá capacidade nominal de abate de 4 mil cabeças/dia, gerando 4.400 empregos
diretos. Nessa fase, a unidade será considerada a maior planta industrial de
processamento de carne do mundo. O investimento estimado de R$ 320 milhões.
A unidade está sendo construída numa área de 50 mil m². Além do abate,
na unidade também serão integrados os processos de produção de carne cozida
congelada, supergelados, couro e o confinamento de bovinos, somando um total de 7,1
mil empregos diretos e indiretos.
122
A produção de carne cozida congelada e de supergelados deverá atender
ao mercado de food services. O curtume, que deverá executar as fase wet-blue e semi-
acabados, deverá ter capacidade de processamento entre 3 mil e 4 mil peles/ dia. Por
fim, o confinamento, processo que será feito de forma integrada com os produtores
locais, deverá ter uma capacidade para 150 mil cabeças/ ano.
5.1.3. – Suprimentos (Gado Bovino para Abate)
A Bertin Alimentos possui equipes especializadas na compra de gado nas
regiões em que atua. Estas equipes compõem o Departamento de Compra de Gado, que
possui um banco de dados com informações relativas aos fornecedores de gado da
empresa. A empresa ainda não possui um programa formal de qualidade baseado na
premiação de carcaças; de todo modo a empresa consegue identificar quais são os
fornecedores que conseguem atingir o “padrão-exportação” nas regiões próximas a cada
uma de suas plantas industriais. A empresa aos poucos está aderindo ao sistema de
certificação Eurepgap já existindo pecuaristas certificados em sua base de fornecedores.
A certificação Eurepgap possui forte penetração no mercado europeu de alimentos e é
altamente respeitada, por assegurar que os produtos certificados são: (i) seguros
(segurança do alimento); (ii) respeitam o meio-ambiente; (iii) são produzidos em boas
condições de trabalho; e (iv) são produzidos sob a ótica do bem-estar animal.
Por fim, a empresa afirma em seu website que adotará um programa de
qualidade baseada na premiação de carcaças, com o objetivo de aumentar a oferta de
carne de qualidade superior.
5.1.4 – Produtos, Marcas e Certificações
Em sua divisão de Alimentos, o Grupo Bertin possui marcas fortes,
atuando no mercado interno e em mais de 80 países, nos 5 continentes. A empresa
produz mais de 300 itens entre carne in natura e industrializada, com especificações e
cortes especiais. A empresa é auditada pelo Ministério da Agricultura do Brasil e recebe
com freqüência missões e inspeções de diversos países, incluindo missões de
veterinários da União Européia que vistoriam in loco as instalações da Bertin Alimentos
123
para checar se elas estão em conformidade com os pré-requisitos necessários para a
habilitação para as exportações para a União Européia.
A Bertin Alimentos produz as seguintes linhas de produto a base de carne
bovina:
a. Cortes in natura;
b. Porcionados;
c. Miúdos;
d. Envoltórios;
e. Charque;
f. Supergelados;
g. Enlatados;
h. Linha “Pronto Sabor”;
i. Carne Cozida Congelada;
j. Extrato de Carne
Os produtos da Bertin Alimentos são comercializados com as marcas
“Tutty Bom” e “Bertin”. A empresa também produz e embala produtos para várias
indústrias de alimentos e redes varejistas, através de marcas próprias destas empresas,
dentre as quais se destacam: Prince e Tesco (Reino Unido) e Hormel, Costco, Sampco e
Keefe, nos Estados Unidos.
Baseado em normas e legislações nacionais e internacionais, a Bertin
Alimentos trabalha com programas como o APPCC (“Análise de Perigos e Pontos
Críticos de Controle”), Boas Práticas de Fabricação, procedimentos de higiene pré-
operacional e operacional, rastreabilidade, programas de bem-estar animal, controle
integrado de pragas, alergênicos, entre outros, garantindo um rígido controle de
qualidade.
A Bertin Alimentos também conta com os certificados públicos (“Health
Certificate”) que o habilitam a comercializar seus produtos cárneos para a União
Européia. A empresa também possui certificações privadas, como a certificação BRC –
British Retail Consortium,que é uma certificação do varejo britânico, e a certificação
AIB – AIB Consolidated Standards for Food Safety, para os Estados Unidos. Além
124
disso, a empresa também é certificada pela SGS - Société Générale de Surveillance. Por
fim, a empresa está implementando a certificação Eurepgap.
5.1.5 – Exportações
Em 2005, as vendas de carne bovina do Grupo Bertin totalizaram quase
R$ 2 bilhões, sendo 37,7% desse valor correspondente às vendas no mercado doméstico
e 62,3% referentes às exportações de carne bovina.
As exportações de carne in natura totalizaram R$ 674 milhões, o que
correspondeu a 34% das vendas totais de carne bovina do Grupo Bertin em 2005. Já as
exportações de carne industrializada totalizaram R$ 520 milhões, o que correspondeu a
26,3% das vendas totais de carne bovina do Grupo Bertin em 2005, conforme pode ser
observado no Quadro 5.2 abaixo.
QUADRO 5.2 - Abertura das Vendas de Carne Bovina em R$ e mil toneladas –
Grupo Bertin – 2005 e Primeiro Semestre de 2006
Quantidade
(1)
Vendas
Líquidas
(2)
%
Quantidade
(1)
Vendas
Líquidas
(2)
%
2005 Primeiro Semestre de 2006
Vendas Domésticas
Carne in natura
141,6 537,3 27,1% 106,7 310,3 29,5%
Carne industrializada 31,7 146,3 7,4% 19,1 86,8 8,2%
Outros 121,7 63,4 3,2% 75,2 33,0 3,1%
Total - Vendas Domésticas
295,0 747,0 37,7% 201,0 430,1 40,8%
Exportações
Carne in natura
110,2 673,6 34,0% 54,1 310,8 29,5%
Carne industrializada 68,5 520,2 26,3% 42,2 294,7 28,0%
Outros 17,7 39,7 2,0% 7,0 18,0 1,7%
Total - Exportações
196,4 1.233,5 62,3% 103,3 623,5 59,2%
Total - Divisão Carne Bovina 491,4 1.980,5 100% 304,3 1.053,6 100%
Fonte: Bertin (2006)
Em dólares norte-americanos, as exportações de carne in natura do
Grupo Bertin em 2005 corresponderam a US$ 295 milhões, o equivalente a 12,2% das
exportações brasileiras de carne in natura.
A Bertin possui uma extensa rede de distribuição de carne in natura,
exportando para cerca de 80 países, que consumiram 38% das exportações de carne
bovina in natura da Bertin Alimentos em 2005. Na Figura 5.1 abaixo, este valor está
125
contabilizado sob a rubrica “outros”, não havendo informações sobre os países que
compõem este valor.
Em termos individuais, o Chile foi principal destino das exportações de
carne in natura do Grupo Bertin em 2005, correspondendo a 22% de suas exportações.
Na seqüência, todos os principais países importadores de carne in natura do Grupo
Bertin em 2005 são países europeus: Itália (11,3%), Suíça (10,0%), França (6,7%),
Alemanha (6,5%) e Holanda (5,1%), demonstrando, a importância da Europa como um
dos principais canais de distribuição de carne bovina in natura do Grupo Bertin.
A Figura 5.1 abaixo apresenta os principais importadores de carne bovina
in natura do Grupo Bertin no ano de 2005.
Chile; 22,0%
Itália; 11,3%
Suíça; 10,0%
França; 6,7%
Alemanha; 6,5%
Holanda; 5,1%
Outros; 38,4%
Vendas em 2005: US$ 295 milhões
Participação nas exportações brasileiras de carne
in natura:
12,2%
Fonte: Bertin (2006)
FIGURA 5.1 - Destino das Exportações de Carne in Natura – Bertin em 2005
Em 2005 os Estados Unidos foram o principal destino das exportações de
carne industrializada do Grupo Bertin. Neste ano quase metade dos US$ 210 milhões
exportados pelo Grupo Bertin de carne industrializada tiveram como destino os Estados
Unidos. Países europeus também tiveram importância nas exportações de carne
industrializada do Grupo Bertin, conforme pode ser observado pela Figura 5.2 abaixo.
126
EUA; 48,8%
Reino Unido;
20,0%
Bélgica; 9,7%
Itália; 4,8%
Canadá; 4,0%
Japão; 3,2%
Emirados Árabes
Unidos; 2,2%
Outros; 7,3%
Vendas em 2005: US$ 210 milhões
Participação nas exportações brasileiras de carne industrializada: 34,3%
Fonte: Bertin (2006)
FIGURA 5.2: Destino das Exportações de Carne Industrializada – Bertin em 2005
5.1.6. – Canais de Distribuição na Europa
O entendimento da evolução da estrutura dos canais de distribuição do
Grupo Bertin passa pelo entendimento da filosofia de trabalho que vem norteando o
Grupo desde sua fundação, que é a busca pela agregação de valor em seus produtos.
As primeiras exportações do Grupo Bertin foram realizadas há
aproximadamente 30 anos, por meio de de um agente comercial que se encarregava de
realizar a distribuição da carne do Bertin na Europa. O Grupo Bertin operava em caráter
de exclusividade com este agente comercial, que era remunerado por meio de
comissões.
Este primeiro estágio das exportações do Grupo Bertin foi muito
importante para que a empresa conhecesse o padrão de qualidade necessário para
exportar para a Europa, bem como para conhecer o mercado como um todo (por mais
que o agente comercial realizasse as vendas dos produtos da Bertin, a empresa tinha
conhecimento dos clientes de seu agente comercial).
127
Na medida em que a empresa desenvolveu ainda mais a qualidade de
seus produtos, de forma a atender o padrão europeu, a empresa percebeu que não mais
fazia sentido operar com o agente comercial, pois era este agente comercial quem estava
se beneficiando da agregação de valor realizada pela Bertin. Em outras palavras, havia
alguém se beneficiando da agregação de valor dos produtos da Bertin que não a própria
empresa, o que contraria os preceitos mencionados no início deste tópico, preceitos
esses que guiam os negócios da empresa desde seus primórdios.
Desta forma, desde 1998 a empresa opera uma rede própria de
distribuição na Europa, com o estabelecimento de escritórios de representação na
Inglaterra, Itália, Escandinávia e, mais recentemente, França e Alemanha. Estes
escritórios são joint-ventures com agentes locais que possuem expertise sobre cada
mercado local. O Grupo possui 50% da composição acionária destas empresas, sendo
que os restantes 50% pertencem a seu parceiros europeu. Estas empresas efetivamente
importam os produtos da Bertin Alimentos e realizam a distribuição em território
europeu.
Com isso, a empresa consegue ter maior controle sobre sua distribuição,
e consegue estreitar o relacionamento com seus clientes, que são em grande parte
grandes redes de supermercados. A empresa também consegue obter maiores margens
comerciais, ao eliminar o intermediário do canal. Não há prejuízo no que se refere à
capacidade de distribuição da empresa, pois ela se associa com agentes que possuem
grandes redes de relacionamentos e conhecimento do mercado europeu.
O fator negativo é que o risco da operação aumenta, pois a empresa
assume maiores custos, como frete e os impostos de importação, que são bastante altos
para carne bovina na Europa. O próprio tempo da operação aumenta, pois agora a
empresa se responsabiliza pela entrega do produto em território europeu (C.I.F.) e não
mais no porto de origem (F.O.B.), como é o comum para o setor da carne bovina no
Brasil. Como os preços da carne bovina são bastante voláteis, este tempo maior na
operação total de distribuição se constitui um risco comercial para a empresa.
A Figura 5.3 resume e esquematiza o atual canal de distribuição da carne
bovina da Bertin na Europa.
128
Bertin
Europa
Joint-venture
entre Bertin e
agente local
Grandes redes de
supermercados
Boutiques
de carnes
Açougues
Brasil
Consumidores
Finais
Nível do canal em
que a Bertin atua
Nível do canal em
que a Bertin atua
Nível do canal em
que a Bertin não
atua
Fonte: Autor, elaborados com os dados da pesquisa.
FIGURA 5.3 - Esquematização do Canal de Distribuição da Bertin na Europa em
2007
Conforme pode ser visto pela Figura 5.3 acima, a Bertin possui forte
atuação em vários níveis do canal de distribuição de seus produtos na Europa. Isso
ocorre desde o momento em que a empresa instalou o atual modelo de distribuição, que
consiste em abrir empresas na Europa (joint-ventures com agentes locais), que
efetivamente importam os produtos da Bertin e os distribuem na Europa. Com isso, a
empresa consegue um maior controle do canal de distribuição e uma grande
proximidade com as grandes redes de supermercados, aumentando, por conseguinte, a
aproximação com o consumidor final. A vantagem de operar desta maneira é a obtenção
de maiores margens comerciais e a possibilidade de capturar o valor decorrente dos
investimentos em qualidade que a empresa realiza. A grande desvantagem é o maior
risco da operação.
129
5.1.7. Competências Essenciais e Distribuição de Carne Bovina Brasileira na Europa
Neste tópico, serão discutidas as principais competências essenciais da
Bertin Alimentos que impactam suas exportações de carne bovina e a estruturação de
seus canais de distribuição na União Européia (principalmente carne in natura).
Inicialmente, a pesquisa de campo mapeou 25 recursos que compõem as
atividades básicas ou estão à disposição da Bertin e demais frigoríficos estudados. Dos
25 recursos, foram mapeadas 23 capacitações.que correspondem ao uso desses recursos.
Este agrupamento de recursos e capacitações foi estabelecido para todos
os estudos de caso. Estes recursos e capacitações são utilizados ou estão disponíveis a
todos os frigoríficos estudados. A padronização foi estabelecida de forma a possibilitar
que a determinação das competências essenciais de cada frigorífico partisse da mesma
base de recursos e capacitações.
O Quadro 5.3 abaixo apresenta a relação dos recursos e capacitações
tangíveis na Bertin Alimentos. Já o Quadro 5.4 apresenta a relação dos recursos e
capacitações intangíveis na Bertin Alimentos.
Nota-se pelo Quadro 5.3 o grande número de recursos físicos na Bertin
Alimentos: plantas industriais, equipamentos e mão-de-obra para abate e desossa,
matéria-prima (animais prontos para abate), recursos logísticos, câmaras frigoríficas,
localização das plantas industriais etc.
O agrupamento destes recursos físicos gera as capacitações (baseadas em
recursos físicos). Tais capacitações correspondem ao uso ordenado dos recursos físicos
da Bertin para desempenhar determinada tarefa. “Desta forma, o agrupamento dos
recursos físicos “plantas industriais”, “equipamentos para abate e desossa” e mão-de-
obra – linha de abate e desossa” geram a capacitação “processo de abate e desossa”. Já o
agrupamento dos recursos “câmaras frigoríficas” geram a capacitação “capacidade de
armazenamento da carne bovina” e assim sucessivamente.
Por outro lado, existem recursos organizacionais envolvidos nas
operações cotidianas da Bertin. Desta forma, o agrupamento dos recursos “estrutura
formal dos relatórios da empresa” gerou a capacitação “governança corporativa”, que é
um conceito mais amplo do que apenas o uso dos relatórios no âmbito interno dos
frigoríficos analisados. Por outro lado, o agrupamento dos recursos “certificação pública
130
para exportação” se traduz na capacitação “habilitação/ certificação para exportação
para canal genérico”. Ou seja, a Bertin ao possuir o recurso “certificação pública para
exportar para a União Européia”, possui, na verdade, uma capacitação que a credencia e
habilita a exportar de maneira genérica para a União Européia. Já o recurso
“certificações privadas” é mais restrito e gera uma capacitação que poucos frigoríficos
brasileiros possuem, que é a habilitação para exportação para canais de distribuição
específicos na União Européia (como, por exemplo, redes de supermercados que
exigem a certificação Eurepgap).
QUADRO 5.3 – Recursos e Capacitações Tangíveis – Bertin Alimentos
Recurso Descrição Capacitação
Financeiro Capacidade da firma se financiar.
Acesso a mercado de capitais (nacional e internacional).
Estruturação de operações de Eurobonds e abertura de
capital.
Organizacional
A estrutura formal de relatórios da empresa, que inclui seus sistemas
formais de planejamento, controle e coordenação.
Governança Corporativa
Organizacional Opinião dos funcionários Gestão participativa
Organizacional Empresas concorrentes, distribuidores de carne bovina Estratégia de crescimento via fusões & aquisições
Organizacional Empresas concorrentes, distribuidores de carne bovina (internacionais) Internacionalização
Organizacional Sistemas de Qualidade (HACCP, BPF, ISO) Controle de processos
Organizacional Certificação Pública para Exportação (inclui rastreabilidade)
Habilitação para exportação para canal de distribuição
genérico
Organizacional Certificações Privadas (Ex.: Eurepgap, BRC etc.)
Habilitação para exportação para canal de distribuição
bastante específico
Físico Plantas industriais Processo de abate e desossa
Físico Equipamentos de abate e desossa Processo de abate e desossa
Físico Mão-de-obra - linhas de abate e deossa Processo de abate e desossa
Físico Câmaras frigoríficas Processo de armazenagem da carne bovina
Físico Matéria-prima
Capacidade de adquirir animais "padrão-exportação" com
certa regularidade.
Físico Localização
Acesso à matéria-prima (principais praças pecuárias);
diversificação geográfica
Físico Recursos logísticos em geral Transportar eficientemente os produtos da empresa
Físico Escala de Produção Operar em grande escala de produção
Físico Integração entre produção de carne in natura e carne industrializada
Agregar valor à carne do dianteiro bovino e criar novos
canais de distribuição para este produto
Tecnológico
"Estoque" de tecnologia como patentes, trademarks (marcas registradas)
e copyrights (direitos autorais).
Produtos com alto uso de tecnologia de processamento
Fonte: Autor, elaborado com os dados da pesquisa e baseado em BARNEY, 1991; GRANT, 1991 (apud
HOSKISSON et. al. (2004, p. 109)).
131
O mesmo raciocínio de análise do Quadro 5.3 é válido para o Quadro 5.4,
com a diferença de que, neste caso, os recursos são intangíveis, ou seja, difíceis de
serem mensurados, analisados e copiados pelos competidores.
QUADRO 5.4 – Recursos e Capacitações Intangíveis – Bertin Alimentos
Recurso Descrição Capacitação
Humano Conhecimento Conhecimento do mercado europeu da carne bovina.
Humano Capacitações Gerenciais Gestão profissionalizada
Inovador Idéias/ Capacitações científicas/ capacidade em inovar Produtos inovadores
Reputacional Reputação com consumidores Tradição
Reputacional Marca
Oferececimento de bons produtos aumentando confiança do
cliente.
Reputacional Percepção de qualidade, durabilidade e confiança nos produtos.
Oferececimento de bons produtos aumentando confiança do
cliente.
Reputacional
Reputação com fornecedores, de forma a criar interações e relações
mutamente eficientes e eficazes.
Capacidade de adquirir animais "padrão-exportação" com
certa regularidade.
Fonte: Autor, elaborado com os dados da pesquisa e baseado em BARNEY, 1991; GRANT, 1991 (apud
HOSKISSON et. al. (2004, p. 109)).
Com base nos recursos e capacitações da Bertin, determinou-se as
competências essenciais deste frigorífico, que nada mais são do que capacitações que
são fonte de (ou que geram) vantagem competitiva para a Bertin.
Desta forma, a Figura 5.4 apresenta o fluxograma das competências
essenciais da Bertin Alimentos. Ela parte dos 25 recursos e 23 capacitações acima
discriminadas, de forma a detectar quais destas capacitações geram vantagem
competitiva para a Bertin Alimentos no que se refere às suas exportações e estruturação
de seus canais de distribuição na União Européia. As capacitações que são fontes de
vantagem competitiva para a Bertin são suas competências essenciais
132
Capacitações
1) Acesso a recursos financeiros diferenciados (mercado de capitais,
possibilidade de abertura de capital)
2) Governança corporativa
3) Gestão participativa
4) Estratégia de crescimento via fusões & aquisições
5) Internacionalização
6) Sistemas de qualidade/ controle de processos
7) Certificação – exportação canal genérico
8) Certificação – exportação canal específico
9) Processo de abate e desossa
10) Processo de armazenagem de carne bovina
11) Capacidade de adquirir animais “padrão-exportação” com certa
regularidade
12) Diversificação geográfica (hedge sanitário e acesso à matéria-prima)
13) Transportar eficientemente os produtos da empresa
14) Operar em grande escala de produção
15) Agregar valor à carne do dianteiro bovino e criar novos canais de
distribuição para o produto
16) Produzir produtos tecnológicos
17) Conhecimento do mercado europeu da carne bovina
18) Gestão profissionalizada
19) Produção de produtos inovadores
20) Tradição
21) Marcas: credibilidade/ bons produtos/ confiança do cliente
22) Percepção de qualidade: qualidade/ credibilidade/ confiança do cliente
23) Relacionamento com fornecedores: capacidade de adquirir animais
padrão-exportação
Competências Essenciais
1) Acesso a recursos financeiros diferenciados (mercado de capitais,
possibilidade de abertura de capital)
2) Governança corporativa
3) Internacionalização
4) Certificação – exportação canal genérico
5) Certificação – exportação canal específico
6) Processo de armazenagem de carne bovina
7) Capacidade de adquirir animais “padrão-exportação” com certa
regularidade
8) Diversificação geográfica (hedge sanitário e acesso à matéria-prima
9) Operar em grande escala de produção
10) Agregação de valor à carne do dianteiro bovino e criar novos canais
de distribuição para o produto
11) Conhecimento do mercado europeu da carne bovina
12) Gestão profissionalizada
13) Tradição
14) Marcas: credibilidade/ bons produtos/ confiança do cliente
15) Percepção de qualidade: qualidade/ credibilidade/ confiança do cliente
16) Relacionamento com fornecedores: capacidade de adquirir animais
padrão-exportação
Capacitações 3, 4, 6, 9, 13, 16 e 19 não são claramente fontes de
vantagens competitivas para a Bertin, logo são agrupamentos de recursos
não estratégicos.
Recursos
1) Financeiros: Capacidade da firma se financiar
2) Estrutura formal de relatórios
3) Opinião dos funcionários
4) Empresas concorrentes/ distribuidores de carne bovina
5) Empresas concorrentes/ distribuidores de carne bovina
(internacionais)
6) Sistemas de qualidade (HACCP, por exemplo),
7) Certificação pública para exportação
8) Certificações privadas (ex.: Eurepgap)
9) Plantas industriais
10) Equipamentos de abate e desossa,
11) Mão-de-obra – abate e desossa
12) Câmaras frigoríficas
13) Matéria-prima (gado bovino para abate)
14-) Localização
15-) Recursos logísticos
16-) Escala de produção
17-) Integração carne in natura e carne industrializada
18-) Estoque de tecnologia (patentes, marcas registradas)
19) Conhecimento
20-) Capacitações gerenciais
21-) Inovação
22) Reputação com consumidores
23) Marca
24) Percepção de qualidade/ durabilidade/ confiança
25) Reputação com fornecedores
Fonte: Autor, elaborado com os dados da pesquisa e baseado em BARNEY, 1991; GRANT, 1991 (apud
HOSKISSON et. al. (2004, p. 109), DRANOVE & MARCIANO (2005, p. 51), LASSERRE (2003, p. 47)
e HOSKISSON et al. (2004, p. 115).
FIGURA 5.4 – Fluxograma das Competências Essenciais - Bertin
133
De todo modo, nem todas as competências essenciais são sustentáveis
por muito tempo, tendo em vista que eventualmente elas podem ser imitadas pelos
concorrentes. Desta forma, a Figura 5.5 apresenta a abertura das competências
essenciais sustentáveis e temporárias da Bertin Alimentos.
Bertin Alimentos – Competências
Essenciais
1) Acesso a recursos financeiros diferenciados
(mercado de capitais, possibilidade de
abertura de capital)
2) Governança corporativa
3) Internacionalização
4) Certificação - canal genérico
5) Certificação - canal específico
6) Armazenagem
7) Matéria-prima diferenciada (animais
padrão-exportação)
8) Diversificação geográfica
9) Operar em grande escala de produção
10) Agregação de valor à carne do dianteiro
bovino (industrialização)
11) Conhecimento do mercado europeu de
carne bovina
12-) Gestão profissionalizada
13-) Tradição
14-) Marcas: oferecimento de bons produtos/
credibilidade
15-) Percepção de qualidade: oferecimento de
bons produtos/ qualidade
16-) Relacionamento com fornecedores:
capacidade de adquirir animais padrão-
exportação com regularidade
Capacitação/
competência
cara ou difícil
de ser
imitada?
Sim
Não
Competências Essenciais Sustentáveis
1) Acesso a recursos financeiros diferenciados
2) Internacionalização
3) Certificação - canal genérico
4) Certificação - canal específico
5) Operar em grande escala de produção
6) Conhecimento do mercado europeu de carne
bovina
7) Tradição
8) Marcas: oferecimento de bons produtos/
credibilidade
9) Percepção de qualidade: oferecimento de
bons produtos/ qualidade
Competências Essenciais Temporárias
1)Governança corporativa
2) Armazenagem
3) Aquisição de animais-padrão exportação
4) Diversificação geográfica
5) Agregação de valor à carne do dianteiro
bovino (industrialização)
6) Gestão profissionalizada
7) Relacionamento com fornecedores: aquisição
de matéria-prima diferenciada.
Fonte: Autor, elaborado com os dados da pesquisa e baseado em BARNEY, 1991; GRANT, 1991 (apud
HOSKISSON et. al. (2004, p. 109), DRANOVE & MARCIANO (2005, p. 51), LASSERRE (2003, p. 47)
e HOSKISSON et al. (2004, p. 115)).
FIGURA 5.5 - Competências Essenciais Sustentáveis x Temporárias – Bertin
Alimentos
Já a Figura 5.6 apresenta um resumo dos recursos, capacitações,
competências essenciais sustentáveis e temporárias da Bertin Alimentos.
134
Recursos: 25
Tangíveis: 18
Intangíveis: 7
Competências Essenciais
Sustentáveis: 9
Tangíveis: 5
Intangíveis: 4
Capacitações: 23
“Tangíveis”: 16
“Intangíveis”: 7
Competências
Essenciais: 16
“Tangíveis”: 10
“Intangíveis”: 6
Competências Essenciais
Temporárias: 7
Tangíveis: 5
Intangíveis: 2
Fonte: Autor, elaborado com os dados da pesquisa.
FIGURA 5.6 – Resumo: Recursos, Capacitações e Competências Essenciais
Sustentáveis e Temporárias – Bertin Alimentos
Nota-se pelas figuras 5.5 e 5.6 o grande número de competências
essenciais sustentáveis com natureza intangível na Bertin Alimentos, dentre as quais se
destacam: conhecimento do mercado europeu de carne bovina, tradição, marcas e
percepção da qualidade.
A ocorrência destas competências essenciais baseadas em recursos e
capacitações intangíveis no caso da Bertin Alimentos não é ocasional. Retomando o
conceito de HOSKISSON et. al. (2004), temos que “os recursos intangíveis incluem
ativos que estão profundamente enraizados na história da firma e são acumulados ao
longo do tempo. Pelo fato de estarem estabelecidos em padrões únicos e exclusivos de
rotina, os recursos intangíveis são difíceis de serem analisados e copiados pelos
competidores”.
Da análise dos dados da presente pesquisa nota-se que o Grupo Bertin é
um dos pioneiros na exportação de produtos cárneos para a União Européia, tendo
realizado suas primeiras exportações para este continente há aproximadamente 30 anos
135
atrás. Em outras palavras, o Grupo Bertin vem ao longo dos últimos 30 anos
desenvolvendo suas capacitações de forma a expandir suas exportações para a União
Européia. Dentre os grandes frigoríficos brasileiros de carne bovina atualmente em
operação, possivelmente o Grupo Bertin seja o mais antigo exportador.
Em outras palavras, a Bertin Alimentos possui longa tradição e
conhecimento do mercado europeu de carne bovina, visto possuir longo tempo de
relacionamento comercial com importantes agentes do comércio europeu da carne
bovina. São ambas importantes competências essenciais da Bertin Alimentos no
mercado europeu, pois garantem vantagem competitiva sustentável para o Grupo Bertin
em relação aos seus concorrentes no mercado europeu.
Por outro lado, desde seus primórdios na exportação da carne bovina para
a União Européia, e principalmente a partir de 1998, quando a estrutura de distribuição
própria da empresa passou a vigorar, o Grupo Bertin procura agregar valor a seus
produtos in natura ao elaborar cortes com especificações técnicas de seus clientes finais
(rede de supermercados, por exemplo) Desta forma, as competências essenciais
“percepção de qualidade” e “marca” também figuram dentre as principais vantagens
competitivas da Bertin Alimentos no mercado europeu.
Tem-se, portanto, importantes ativos que por estarem profundamente
enraizados na história da Bertin Alimento são muito difíceis de serem imitados por seus
concorrentes, sendo fonte de vantagens competitivas importantes para a empresa no
mercado europeu e com forte impacto na estruturação de seus canais de distribuição
neste mesmo mercado, visto que o estreitamento dos relacionamentos no canal de
distribuição possibilitou à Bertin Alimentos estruturar sua distribuição própria no
mercado europeu.
136
5.2. Estudo de Caso: JBS S.A.
5.2.1. – Introdução/ Histórico
As operações da JBS foram iniciadas em 1953, na Cidade de Anápolis,
Goiás, com uma pequena planta de abate, com capacidade de abate de cinco cabeças de
gado por dia. Seu crescimento foi inicialmente baseado na construção e
desenvolvimento da cidade de Brasília-DF, tanto que o primeiro frigorífico adquirido
localizava-se na cidade de Planaltina-DF.
Em 1968, a empresa adquiriu sua primeira planta de abate e em 1970 a
segunda, aumentando sua capacidade de abate para 500 cabeças de gado por dia.
De 1970 a 2001, a JBS expandiu significativamente suas operações no
setor de carne bovina no Brasil. Tal expansão deu-se por meio de aquisições de plantas
de abate e unidades produtoras de carne industrializada, bem como por meio de
investimentos no aumento da capacidade produtiva de suas plantas. Nesse período, a
empresa aumentou sua capacidade de abate de 500 cabeças/dia para 5,8 mil cabeças/dia.
De 2001 até 2006, sua capacidade de abate aumentou de 5,8 mil cabeças/dia para 22,6
mil cabeças/dia e a JBS passou a operar um total de 21 plantas no Brasil e cinco na
Argentina.
Em agosto de 2005, a empresa iniciou seu processo de
internacionalização e adquiriu indiretamente 100% do capital social da Swift, a maior
produtora e exportadora de carne bovina na Argentina, por meio de outra holding, a JBS
Holding Internacional.
Em janeiro de 2007, a JBS adquiriu 100,0% das ações de emissão da
empresa norte-americana SB Holdings e suas subsidiárias, Tupman Thurlow, Astro
Sales Internacional e Austral Foods, importante distribuidora de produtos
industrializados de origem de carne bovina no mercado norte-americano.
Ainda em janeiro de 2007, a JBS adquiriu, por meio da Swift, uma planta
de abate em Berazategui, Buenos Aires, com capacidade de abate de aproximadamente
1.000 cabeças de gado por dia.
Outras aquisições ocorridas em 2007 (até o momento) foram: o
frigorífico Garantia, no Paraná, que aumentou a capacidade de abate da JBS em 1.500
137
cabeças/dia; e uma propriedade rural no município de Castilho, no estado de São Paulo,
destinada ao início da atividade de confinamento de bovinos pela JBS.
Internacionalmente, a empresa adquiriu a empresa fabricante de latas para embalagens
Argenvase, localizada na Argentina, dando com isso continuidade à sua estratégia de
assegurar a fabricação das embalagens para seus produtos.
No primeiro semestre de 2007 a JBS fez seu lance mais ousado e
agressivo, ao adquirir a Swift nos Estados Unidos e Austrália, o que a tornou uma das
maiores empresas de carne bovina do mundo.
Atualmente, a JBS possui 40 plantas, localizadas no Brasil, Argentina,
Estados Unidos e Austrália, além de 4 centros de distribuição no Brasil, um terminal de
contêineres próximo ao porto de Santos, e subsidiárias no Chile, Egito, Inglaterra e
Rússia, que distribuem os produtos da JBS nesses países.
5.2.2. – Infra-Estrutura e Escala de Produção
O Grupo JBS é uma das maiores empresas do setor de carne bovina do
mundo. O grupo produz carne bovina in natura, carne industrializada, pratos
elaborados, vegetais em conserva, além de subprodutos de origem bovina. De acordo
com dados da própria empresa, atualmente, a JBS é:
a. o maior produtor e exportador de carne bovina da América Latina, com uma
capacidade de abate de 22,6 mil cabeças/dia (capacidade de abate no mundo
superior a 40 mil cabeças/ dia);
b. o segundo maior exportador de carne bovina do mundo em termos de
faturamento, além de acreditar ser o maior exportador de carne industrializada
do mundo;
c. o terceiro maior produtor de carne bovina do mundo; e
d. o líder em vendas de carne bovina no mercado brasileiro.
As operações da JBS são realizadas em 23 plantas industriais localizadas
em 9 estados no Brasil, 5 plantas localizadas em 3 províncias na Argentina, 8 plantas
nos Estados Unidos e 4 plantas na Austrália. A empresa possui modernas instalações de
138
abate, desossa, processamento e armazenamento de carne bovina, que estão
estrategicamente localizadas nas regiões com maior concentração de gado bovino no
Brasil e na Argentina. O fator “localização” proporciona flexibilidade operacional de
produção e menores custos logísticos, principalmente no que se refere à gestão de
cadeia de suprimentos (compra de bovinos para abate). Além disso, mitiga riscos
operacionais e comerciais que poderiam advir de eventuais problemas sanitários (como,
por exemplo, embargos comerciais por conta de casos de febre aftosa se todas as plantas
da empresa estivessem localizadas em apenas um estado brasileiro).
Atualmente, as unidades da JBS estão dispostas da seguinte maneira:
a. vinte plantas de abate localizadas nos estados do Acre, Goiás, Mato Grosso,
Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraná, Rondônia e São Paulo, sendo que
cinco dessas plantas possuem também unidades produtoras de carne
industrializada;
b. uma planta de carne em conserva localizada no Estado do Rio de Janeiro;
c. uma planta de vegetais em conserva no Estado de Minas Gerais; e
d. cinco plantas de abate localizadas em três províncias da Argentina (Buenos
Aires, Entre Rios e Santa Fé), sendo que quatro dessas plantas possuem também
unidades produtoras de carne industrializada;
e. uma planta de fabricação de embalagens de lata na Argentina;
f. uma instalação de confinamento de bovinos no estado de São Paulo.
A JBS conta ainda com unidades de apoio logístico, que são
fundamentais na distribuição dos produtos da empresa.
a. quatro centros de distribuição, sendo três no Estado de São Paulo e um no
Estado de Minas Gerais;
b. um pátio de contêineres localizado próximo ao porto de Santos, Estado de São
Paulo; e
c. subsidiárias no Chile, Egito, Inglaterra, Rússia e Estados Unidos, que são
responsáveis pela distribuição e comercialização de seus produtos em tais países.
139
A Figura 5.7 apresenta um resumo da infra-estrutura de produção e
distribuição dos produtos da JBS no Brasil e Argentina, bem como sinaliza as
principais regiões pecuárias em ambos os paises.
Fonte: JBS (2007)
FIGURA 5.7 – Infra-Estrutura de Produção da JBS Alimentos no Brasil e
Argentina - 2007
5.2.3. – Suprimentos (Gado Bovino para Abate)
A JBS adquire gado de mais de 12.000 pecuaristas no Brasil, localizados
em um raio de até 500 quilômetros de suas plantas de abate. No caso de suas operações
na Argentina, a JBS adquire gado em feiras de gado e de aproximadamente 1.600
pecuaristas localizados em um raio de até 350 quilômetros de suas plantas de abate.
Tamanha proximidade das unidades de abate em relação aos principais
centros de produção faz com que a empresa tenha custos reduzidos de transporte de
animais para abate. Além disso, esta proximidade faz com que a empresa seja capaz de
140
mitigar o risco de perda de peso e ferimento do gado durante o transporte até as plantas
de abate, melhorando as condições gerais dos animais no pré-abate, o que, teoricamente,
deverá contribuir para uma melhor qualidade do produto final (carne bovina).
A JBS diferencia-se dos demais frigoríficos no Brasil por celebrar
acordos de aquisição de gado a termo. A empresa auxilia os pecuaristas a obterem
financiamento com instituições financeiras por meio de um programa específico para os
pecuaristas melhorarem e expandirem suas operações. Este programa foi criado para
estreitar o relacionamento comercial da JBS com seu pool de fornecedores de gado
bovino, bem como para proporcionar linhas de financiamento que são tradicionalmente
difíceis de serem obtidas pelos criadores locais. O funcionamento do programa de
financiamento ocorre da seguinte maneira:
a. Uma instituição financeira local concede um empréstimo de curto prazo a um
criador de gado;
b. O criador de gado fornece em garantia ao referido empréstimo um determinado
número de cabeças de gado, cujo valor, na data do contrato do empréstimo,
excede o montante principal do financiamento;
c. A JBS compromete-se a adquirir o gado da instituição financeira na data do
vencimento do empréstimo por um preço determinado no contrato com um
desconto, sendo que o pagamento é realizado mediante a entrega do gado nas
plantas de abate da empresa;
d. O risco de inadimplência permanece com o criador do gado, visto que a empresa
somente está obrigada a adquirir o número de bovinos que ela considera
saudáveis e adequados e desde que entregue pelo criadores nas unidades de
abate da empresa;
e. A instituição financeira utiliza os recursos pagos pela JBS para reduzir o
montante principal e de juros acumulados no empréstimo, reembolsando o
criador com qualquer montante em excesso.
Através deste mecanismo, a empresa auxilia no financiamento do capital
de giro (ou mesmo investimento) de sua rede de fornecedores, prestando um importante
serviço para estes pecuaristas. Por outro lado, garante um fluxo de animais para abate
141
que abastecerão suas escalas de abate no futuro. Este programa aproxima-se de uma
competência essencial da JBS por se tratar de um programa único na cadeia
agroindustrial da carne bovina. Por ora, o programa garante uma vantagem competitiva
em relação a seus concorrentes, porém com sustentabilidade relativamente questionável
na medida em que outros frigoríficos podem estabelecer programas semelhantes.
Por fim no que tange à compra de gado para abate, a empresa possui
funcionários especializados nesta função, localizados em todas as principais áreas de
compra de gado no Brasil. De acordo com informações da empresa, estes funcionários
são treinados para selecionar animais de alta qualidade e animais “padrão-exportação”
no caso de exportações para a União Européia.
A empresa não possui nenhum programa específico de seleção de
animais para abate, porém os responsáveis pela compra de gado são profissionais
experientes e com relacionamento de longa data com os fornecedores de gado de cada
região. Dessa forma, já existe um conhecimento tácito dos fornecedores que possuem
animais neste padrão de exportação, sendo que as escalas de abate são preenchidas de
acordo com a disponibilidade de animais de abate e de acordo com os pedidos dos
clientes na outra ponta. Por exemplo: se existe um grande pedido de determinado
produto para exportação a ser embarcado em determinada semana, a escala de abate
deverá ser montada com animais oriundos desses fornecedores já conhecidos pelo
padrão de seu gado. Desta forma, ocorre uma interação de processos entre a área
comercial, área de operações (indústria) e área de compra de gado, de forma a conseguir
atender esse pedido específico. Naturalmente pode haver certa heterogeneidade entre os
produtos finais pela própria heterogeneidade do rebanho brasileiro, por isso a empresa
opera com certa margem de segurança de forma a atender satisfatoriamente seus clientes
com a entrega dos produtos finais no padrão desejado.
Dependendo das condições de mercado, isto é, oferta de animais para
abate e a demanda específica por determinado produto, a empresa bonifica seus
fornecedores que possuem animais no padrão das exportações. Porém, não existe
nenhum programa específico de bonificação, apesar de a empresa possuir seus próprios
critérios de classificação e tipificação de carcaça, o que, em tese, poderia servir de
parametrização para o estabelecimento de um programa de bonificação por qualidade da
carne.
142
Por fim, a empresa exige de seus fornecedores a documentação de
qualidade de suas operações e também a verificação de que a utilização de produtos
químicos agrícolas e antibióticos segue os padrões da indústria. Todo animal pronto
para abate que a empresa recebe em seus currais pré-abate é inspecionado pelos
veterinários do Serviço de Inspeção Federal do Ministério da Agricultura, que autoriza o
abate e o processamento da carne bovina. Os animais cuja carne será destinada à
exportação têm que estarem rastreados e constantes do banco de dados do SISBOV, que
é o programa oficial de rastreabilidade do Governo Federal. Existem empresas
certificadoras, inseridas no SISBOV e credenciadas pelo Ministério da Agricultura, que
certificam a rastreabilidade destes animais.
5.2.4. – Produtos, Marcas e Certificações
A JBS é uma empresa de alimentos com foco na produção de carne
bovina in natura e industrializada.
A empresa possui carne in natura resfriada e congelada, incluindo cortes
de picanha, costela, filé mignon, cortes dianteiros, miúdos de boi entre outros. Em 2006,
a empresa comercializou 739,1 mil toneladas de carne in natura resfriada e congelada,
um valor praticamente estável em relação às 729,8 mil toneladas comercializadas em
2005.
A empresa também produz carne cozida, carne em conserva, extratos de
carne, carne industrializada (hambúrguer, quibes, salsichas e mortadelas) e pratos
prontos. Em 2006, a empresa vendeu 158,6 mil toneladas de carne industrializada, um
crescimento de 36,3% em relação às vendas de 2005, que totalizaram 116,3 mil
toneladas.
A JBS possui marcas reconhecidas e tradicionais, como: “Friboi”,
“Swift”, “Maturatta”, “Cabaña Las Lilas”, “Organic Beef”, “Anglo”, “Mouran” “Plate”
e “La Blanca”. Todas estas marcas são reconhecidas como símbolos de qualidade nos
mercados em que são comercializadas.
Além disso, a partir de janeiro de 2007 a empresa começou a operar com
as marcas de carne industrializada “Hereford”, “Manco Pride” e “Rip n’ Ready”, as
quais proporcionam acesso direto ao mercado norte-americano de carne industrializada.
143
A aquisição das marcas supracitadas foi conseqüência da aquisição de 100% das ações
da empresa norte-americana SB Holdings e suas subsidiárias, Tupman Thurlow, Astro
Sales International e Austral Foods, considerada uma das maiores distribuidoras de
produtos industrializados de carne bovina no mercado norte-americano.
Por fim, com a aquisição da Swift nos Estados Unidos, a JBS passou a
operar também com a marca Swift (e as marcas de seu portfolio) no mercado norte-
americano de carnes.
A JBS foi o primeiro frigorífico brasileiro a implementar uma ferramenta
de gestão de qualidade nas fazendas fornecedoras de animais. Chamada de Friboi
Quality Farms, a iniciativa visa preparar os produtores para o EurepGAP (Eurep - Euro-
Retailer Produce Working Group e GAP - Good Agricultural Practice) e adquirir
animais certificados.
O documento normativo é baseado nas boas práticas agrícolas. O
objetivo é assegurar integridade, transparência e harmonia dos padrões globais. Os
alimentos devem ser produzidos respeitando a saúde, segurança e bem-estar dos
funcionários, além de cuidados com o animal e meio-ambiente.
A JBS S/A disponibiliza uma equipe de profissionais capacitados para
orientar e treinar os pecuaristas para que possam requisitar a certificação. As fazendas
pré-selecionadas são contatadas e, quando aceitam participar do programa Friboi
Quality Farms, passam por uma pré-auditoria e iniciam-se os trabalhos para adequação.
O EurepGAP é uma ferramenta de gestão que apresenta informações sobre pontos fortes
da propriedade e pontos que precisam de mais atenção. Assim, possibilita um
planejamento eficiente, remanejamento de recursos e alocação de ganhos, fortalecendo
o negócio.
Além do Eurepgap, a JBS possui as seguintes certificações/ sistemas de
qualidade: PPHO – Operating Hygiene Standard Procedure, BPF – Boas Práticas de
Fabricação – HACCP – Hazard Analysis and Critical Control Point.
Por fim, as instalações da JBS são frequentemente vistoriadas por
veterinários do Serviço de Inspeção Federal – SIF, do Ministério da Agricultura, bem
como técnicos de outros países, que vistoriam suas plantas e processos industriais com
vistas à certificação para exportação.
144
5.2.5. – Exportações
Os produtos da JBS são exportados para mais de 500 clientes localizados
em mais de 110 países; as vendas são bastante distribuídas, não havendo concentração
em nenhum dos clientes no mercado externo (em 2006, o maior cliente externo foi
responsável por apenas 4,5% da receita operacional bruta da empresa). A empresa
possui subsidiárias no Chile, Egito, Estados Unidos, Inglaterra e Rússia, que são
responsáveis pela distribuição e comercialização dos produtos da JBS nesses países.
A Figura 5.8 apresenta um comparativo da evolução das exportações
brasileiras de carne bovina in natura e industrializada e da evolução das exportações da
JBS de carne bovina in natura e industrializada, de 1998 a 2006 (dados em US$). O
gráfico apresenta também a participação das exportações da JBS em relação à
exportações brasileiras de carne bovina (in natura e industrializada).
24
50
87
153
165
271
599
795
1.149
590
804
779
1.014
1.096
1.518
2.467
3.047
3.879
4,1%
6,2%
11,2%
15,1%
15,1%
17,9%
24,3%
26,1%
29,6%
0
500
1.000
1.500
2.000
2.500
3.000
3.500
4.000
4.500
5.000
1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006
0%
5%
10%
15%
20%
25%
30%
Ex
p
orta
ç
ões - JBS Brasil Ex
p
orta
ç
ões Brasil Partici
p
a
ç
ão de Mercado - JBS
Taxa Composta de Crescimento ("CAGR") - JBS: 62,2%
Taxa Composta de Crescimento ("CAGR") - Brasil: 26,5%
Fontes JBS (2007) – Exportações da JBS de carne bovina in natura e industrializada.
SECEX/ MDIC apud JBS (2007) – Exportações brasileiras de carne bovina in natura e industrializada.
FIGURA 5.8 - Evolução das Exportações de Carne Bovina da JBS e Participação
de Mercado em relação às Exportações Brasileiras – 1998 a 2006
145
Pela Figura 5.8 é possível observar a impressionante expansão das
exportações de carne bovina da JBS. Em 1998, a JBS exportou o equivalente a US$ 24
milhões, entre carne bovina in natura e industrializada, o que equivalia a 4,1% do valor
das exportações brasileiras de carne bovina. Já em 2006, a JBS exportou US$ 1.05
bilhão de carne bovina (in natura e industrializada), o que correspondeu a quase ¼ das
exportações brasileiras totais de carne bovina, que totalizaram US$ 3,8 bilhões no
período.
Tamanho crescimento das exportações da JBS ocorreu a uma taxa
composta de crescimento de 62,2% ao ano, bastante superior à também impressionante
taxa composta de crescimento das exportações brasileiras de carne bovina (26,5% ao
ano, no período).
Já o Quadro 5.5 apresenta a abertura do destino das exportações de carne
bovina, in natura e industrializada, da JBS de 2004 a 2006.
QUADRO 5.5 - Exportações de Carne Bovina da JBS – Principais Destinos em
2004 a 2006
País
V
alor %
V
alor %
V
alor %
Rússia 43,8 7,3% 105,8 13,3% 203,3 17,7%
Reino Unido 71,2 11,9% 105,2 13,2% 119,5 10,4%
EUA 28,7 4,8% 46,0 5,8% 112,9 9,8%
Itália 46,2 7,7% 51,3 6,4% 82,8 7,2%
Holanda 78,4 13,1% 81,7 10,3% 82,4 7,2%
Egito 26,34,4% 34,34,3% 55,34,8%
Alemanha 31,8 5,3% 39,0 4,9% 48,9 4,3%
Hong Kong 25,9 4,3% 30,7 3,9% 47,3 4,1%
Bulgária 11,3 1,9% 28,4 3,6% 30,7 2,7%
Outros 235,8 39,3% 273,0 34,3% 365,5 31,8%
Total Geral 599,4 100,0% 795,4 100,0% 1.148,6 100,0%
União Européia 293,6 49,0% 378,0 47,5% 458,7 39,9%
2004 2005 2006
Fonte: JBS (2007)
Pelo Quadro 5.5 acima é possível notar a importância da União Européia
nas exportações da JBS. Em 2004, a União Européia era o destino de 49% das
exportações de carne bovina da JBS (em valor). Já em 2006, a participação decaiu para
40%, não pela diminuição das exportações em si, mas sim em decorrência do expressivo
146
aumento das exportações de carne bovina para a Rússia, que cresceram 364% no
período, de US$ 44 milhões em 2004 (ou 7,3% das exportações) para US$ 203 milhões
em 2006 (ou 17,7% das exportações da JBS em 2006.)
No mesmo período, as exportações para a União Européia cresceram
56%, passando de US$ 294 milhões em 2004 pra US$ 458,7 milhões em 2006.
Na União Européia, o principal destino das exportações da JBS é o Reino
Unido, que importou US$ 71,2 milhões de carne bovina da JBS em 2004 e US$ 119, 5
milhões em 2006. As exportações da JBS para o Reino Unido são constituídas em
grande parte da carne industrializada; os demais países europeus basicamente importam
carne in natura, resfriada e congelada. Itália e Holanda possuem a mesma importância
relativa na importação de carne bovina da JBS: ambos os países importaram 8,8% das
exportações de carne bovina da JBS em 2006. Por fim, a Alemanha é também
importante destino das exportações de carne bovina da JBS; em 2006 a Alemanha
importou o equivalente a US$ 48,9 milhões, o que correspondeu a 4,3% das exportações
da JBS nem 2006.
5.2.6 Canais de Distribuição na Europa
Ao longo dos últimos 3 anos, a JBS vem reestruturando seus canais de
distribuição na Europa. Em decorrência desse fator, o presente tópico será dividido em
duas partes: ano de 2004 e ano de 2007.
A) Ano de 2004
Até 2004, a JBS exportava diretamente para cerca de 30 importadores
espalhados pela Europa, notadamente trading companies. O principal porto de destino
para a carne do Grupo JBS era o Porto de Roterdã, na Holanda, e o maior importador de
carnes do Grupo JBS era a Zandbergen, que é a maior trading company de carnes da
Europa. Em 2004, a Zandbergen importava cerca de 40% de toda carne do Grupo JBS
exportada à União Européia.
A importação era em grande parte realizada por trading companies,
empresas essas que muitas vezes operam como simples comerciantes de carne bovina (e
147
outras carnes também), comprando carne brasileira e revendendo-as prontamente na
União Européia. Entretanto, em muitas situações, tais trading companies, além de
exercerem a função de importadores, também exercem a função de “atacadistas
tradicionais” no canal de distribuição. Estas trading companies/ atacadistas exercem a
função de intermediários no canal de distribuição e foram em grande parte os
responsáveis pelo sucesso da distribuição do Grupo JBS na União Européia em um
primeiro instante.
Do importador/ atacadista, a carne prosseguia para o varejo, sendo que
70% da carne exportada por este frigorífico tinha como destino final os food services,
com o restante do produto predominantemente sendo destinado aos supermercados
(grandes e pequenas redes, sem distinção). Em 2004, do total da carne embarcada para a
Europa, cerca de 70% era carne in natura, com os demais 30% sendo carne
industrializada.
A Figura 5.9 esquematiza o canal de distribuição da JBS na União
Européia em 2004.
148
Friboi (atual JBS)
Brasil Europa
Trading Companies/
Distribuidores
(1)
Food Services
Supermercados
(2)
70%
30%
Consumidores
Finais
Nível do canal em que
a JBS atuava
Nível do canal em que
a JBS não
atuava
Nível do canal em que
a JBS não atuava
Fonte: Autor, elaborado com os dados da pesquisa.
(1) Uma trading company/ distribuidor sozinho era responsável por cerca de 40% da distribuição da carne
do Friboi (atual JBS) na Europa em 2004.
(2) Grandes e pequenas redes de supermercados, sem distinção.
FIGURA 5.9 - Esquematização do Canal de Distribuição da JBS na Europa em
2004
Conforme pode ser observado pela Figura 5.9 acima, até 2004 a JBS atuava
em um canal de distribuição bastante genérico, baseado na utilização de intermediários
no canal (trading companies e distribuidores), sem que a empresa tivesse grande
controle sobre o destino final de sua carne na Europa. Este modelo foi importante para a
JBS em um primeiro instante, até mesmo porque era condizente com a especificação de
carne commodity que a JBS produzia até então. Na medida em que empresa investe em
qualidade, esta estrutura de distribuição não se mostra mais apropriada e a empresa teve
que desenvolver um novo modelo de distribuição, como será visto na seqüência.
Por fim, em 2004, praticamente 100% da carne exportada para a Europa era
vendida com marcas pertencentes à JBS (Friboi na época). Porém, como boa parte da
carne tinha como destino final os food services, os consumidores finais praticamente
149
não tinham conhecimento de que estavam ingerindo carne bovina do Grupo JBS (ou
mesmo tinham ciência de estarem ingerindo carne brasileira). A carne in natura que era
destinada aos supermercados era comercializada com marcas próprias dos
supermercados (ou mesmo do atacadista importador). Dessa forma, havia pouca
promoção das marcas do Grupo JBS no varejo europeu. Já a carne industrializada era
exportada em sua grande maioria com a marca do importador, também dificultando
maior penetração das marcas do Grupo JBS no mercado europeu.
B) Ano de 2007
Atualmente, a JBS possui um departamento comercial com foco
exclusivo de vendas para a Europa. Esse departamento é composto por vários
profissionais denominados traders, que atuam em dupla cobrindo determinada região da
Europa, sendo um dos traders o responsável pela conta e o outro o responsável pelo
‘pós-vendas’.
Existe uma equipe com atuação específica para a Holanda, Alemanha,
Bélgica e Polônia e outra equipe com foco específico de atuação nos países nórdicos
(Noruega, Suécia e Dinamarca).
Em princípio, as exportações são centralizadas no Brasil; entretanto ao
longo dos últimos anos, a JBS vem expandindo sua atuação na Europa por meio de
escritórios de representação, que atuam como agentes comerciais e dão suporte às
vendas do frigorífico em território europeu. Alguns desses escritórios de representação
operam exclusivamente para a JBS, funcionando praticamente como traders próprios da
empresa. A empresa também aos poucos está fornecendo diretamente para redes de
supermercados e indústria de carnes (incluindo porcionadoras de carne).
Por exemplo, a JBS possui acordo comercial com um escritório de
representação na Grécia, que é um mercado com várias particularidades: em primeiro
lugar, é um mercado de menor expressão, composto por vários clientes de pequeno
porte. Boa parte dos importadores gregos não fala inglês, dessa forma é mais vantajoso
operar com um escritório de representação que entenda estas particularidades e conheça
bem o mercado grego.
150
A empresa também possui parceria comercial com um escritório de
representação localizado em Madri, Espanha, que centraliza as vendas da JBS nas Ilhas
Canárias. O mercado das Ilhas Canárias possui certa importância, com
aproximadamente 30 clientes. É um mercado parecido com o mercado grego, onde a
confiança é um atributo importante nas negociações comerciais. Desta forma, a empresa
optou por trabalhar com um representante comercial que se relaciona há 30 ou 40 anos
com os clientes das Ilhas Canárias.
Na Itália e Suíça a empresa também atua através de um escritório de
representação, que atua exclusivamente para a JBS e que é remunerado através de
comissões de vendas. Este escritório é localizado em Lugano, na parte italiana da Suíça,
e é responsável por atender as porcionadoras italianas, supermercados e indústrias de
carnes. Existe um grande mercado para o coxão-mole brasileiro na Itália, carne magra
bastante adequada para a produção da braseola, que é uma carne defumada muito
consumida na Itália. Algumas indústrias italianas só compram diretamente dos
fornecedores; neste caso o escritório de representação atua praticamente como um
trader da JBS no relacionamento com os clientes italianos.
Na Inglaterra, a empresa possui um escritório próprio, que atua na Grã-
Bretanha e Irlanda. Este escritório importa carne industrializada da JBS para efetuar a
distribuição localmente. Entretanto, o escritório ainda não importa carne in natura para
efetuar a distribuição própria; em relação a este produto, o escritório opera no sentido de
aproximação e estreitamento do relacionamento com os importadores, ao mesmo tempo
em que possibilita à empresa aprofundar seus conhecimentos sobre o mercado inglês e
irlandês. Desta forma, gradativamente, a empresa se prepara para no futuro passar a
importar e distribuir 100% da carne comercializada na Grã-Bretanha e Irlanda.
Aos poucos a empresa também passa a realizar suas exportações
diretamente para grandes importadores, como é o caso da Espanha, onde a empresa
exporta praticamente diretamente para a maior rede local de supermercados, a
Mercadona, que possui 1.200 lojas espalhadas pelo país. Na verdade, como a rede
Mercadona não possui um departamento próprio de importação; quem realiza a
importação é uma distribuidora da qual a rede Mercadona é um dos principais acionistas
e de quem a JBS é fornecedor exclusivo. Esta distribuidora proporciona impressionantes
300 toneladas de carne por dia, considerando carne bovina, suína, de frango e ovinos.
151
A adoção dos escritórios de representação e da venda direta a redes de
supermercados e/ou indústrias de carnes e porcionadoras faz parte de uma estratégia
agressiva da JBS, que pretende em no máximo três anos passar a realizar a distribuição
própria de seus produtos na Europa. Isso faz com que a estruturação dos canais de
distribuição da JBS na Europa em 2007 seja bastante diferente daquela verificada em
2004, sendo que, atualmente, a JBS está em uma fase de transição entre uma
distribuição realizada majoritariamente por trading companies (cenário de 2004) para
esta futura estrutura própria de distribuição A própria escala de exportações da JBS
força a empresa a buscar outras maneiras de distribuir sua carne em território europeu,
que não seja através das trading companies e/ou distribuidoras de carnes (volume muito
grande para ser absorvido por poucos atacadistas).
A empresa entende que deve estar plenamente adaptada para realizar a
distribuição de seus produtos na Europa, por se tratar de um processo “sem volta”, pois
na medida em que a empresa passe a importar seus produtos e distribuí-los em território
europeu, a empresa passará a competir com seus atuais clientes, que suportaram o
desenvolvimento das vendas da empresa na Europa até o momento.
Por outro lado, a empresa entende que existe uma demanda por parte de
grandes importadores, que estão procurando trabalhar diretamente com grandes
fornecedores, diminuindo parcialmente a importância das trading companies e grandes
distribuidoras que historicamente dominaram a distribuição da carne bovina na Europa.
Existem ainda clientes que preferem operar parcialmente com
importações diretas e parcialmente com compras realizadas através de trading
companies e/ou distribuidoras. Este é o caso de uma grande rede supermercadista de
Portugal, que não quer depender exclusivamente de grandes fornecedores diretos, como
a JBS. Por outro lado, esta rede de supermercado já possui relacionamento de longa data
com as trading companies e distribuidores e, mais importante, as trading companies
e/ou distribuidores possuem uma flexibilidade operacional que a JBS ainda não possui,
que é a de distribuir pequenas quantidades de determinada carne para suprir demandas
eventuais e temporárias. Este fator é influenciado pelo fato de que esta rede de
supermercados especificamente (e outras, de forma geral), não gosta de operar com
grandes estoques. Então, por exemplo, no caso do supermercado necessitar de pallets de
filé-mignon, ele pode recorrer a trading companies e/ou distribuidores de Portugal,
152
Holanda e até mesmo Inglaterra, que prontamente disponibilizarão o produto à rede de
supermercados.
A Figura 5.10 sintetiza e resume o novo modelo de distribuição da carne
bovina da JBS na Europa.
JBS
Europa
Escritório de
representação
(agente
comercial
parceiro da
JBS)
Grandes redes de
supermercados
Boutiques
de carnes
Açougues
Brasil
Nível do canal em
que a JBS atua
Consumidores
Finais
Nível do canal em
que a JBS atua
Nível do canal em
que a JBS não
atua
Fonte: Autor, elaborado com os dados da pesquisa.
FIGURA 5.10: Esquematização do Canal de Distribuição da JBS na Europa em
2007
Conforme mencionado, a JBS está reestruturando seus canais de
distribuição em um processo de processo de verticalização a jusante no canal, que deve
culminar com a instalação do esquema de distribuição próprio da JBS na União
Européia.
De todo modo, neste caso e conforme pode ser observado na Figura 5.10
acima, a verticalização a jusante não implica na redução dos níveis no canal de
distribuição, mas sim na maior participação da JBS no nível do canal mais próximo dos
consumidores finais, o que não acontecia em seu modelo antigo de distribuição. Agora,
é a JBS em parceria com seus agentes comerciais quem realiza a venda e distribuição
153
dos produtos para o varejo, notadamente grandes redes de supermercados, como a rede
Mercadona, na Espanha e o Grupo Jerônimo Martins, em Portugal.
Tem-se, portanto, um canal de distribuição muito mais específico,
estruturado para atender os critérios de padronização das grandes redes de
supermercados. Desta forma, a JBS possui maior controle no canal e maior proximidade
com o consumidor final, diferentemente do modelo antigo de distribuição que era
bastante genérico e no qual a empresa tinha praticamente controle nenhum sobre qual
seria o destino final de sua carne na Europa.
Interessante notar que essa mudança na estrutura de distribuição na
Europa traz sérios impactos operacionais na JBS. Até mesmo por sua escala de abate/
produção, a JBS era, de forma geral, considerada um frigorífico de carne "commodity";
sem maiores atributos de qualidade. Este esquema de produção era condizente com o
esquema antigo de distribuição na Europa; carne com menor valor agregado, sendo
distribuído de maneira "genérica" por trading companies, que se encarregavam de fazer
a distribuição no continente europeu. Na medida em que a JBS se aproxima do
consumidor final, ocorre uma mudança no foco de qualidade, com necessidade de
readequação logística para garantir o maior frescor da carne resfriada na Europa para o
porcionamento. Neste sentido, em apenas 3 anos, a empresa conseguiu reduzir pela
metade o tempo que a carne resfriada chega à Europa, aumentando seu frescor e shelf
life, que são atributos valorizados pelo importador. Para melhorar ainda mais a logística
de distribuição, a JBS está investindo em um armazém-frigorífico no porto de Santos,
com capacidade de 240 containeres armazenados em câmaras frigoríficas mais o
armazenamento de 500 containeres em local não frigorificado.
5.2.7 Competências Essenciais e Distribuição de Carne Bovina Brasileira na Europa
Neste tópico específico, serão discutidas as principais competências
essenciais da JBS que impactam suas exportações de carne bovina e a estruturação de
seus canais de distribuição na União Européia (principalmente carne in natura).
A partir da pesquisa de campo, foram diagnosticados e determinados 25
recursos e 23 capacitações que compõem as atividades básicas ou estão à disposição da
JBS.
154
O Quadro 5.6 abaixo apresenta a relação dos recursos e capacitações
tangíveis identificados na JBS. Já o Quadro 5.7 apresenta a relação dos recursos e
capacitações intangíveis identificados na JBS.
QUADRO 5.6 – Recursos e Capacitações Tangíveis – JBS
Recurso Descrição Capacitação
Financeiro Capacidade da firma se financiar.
Acesso a mercado de capitais (nacional e internacional).
Estruturação de operações de Eurobonds e abertura de
capital.
Organizacional
A estrutura formal de relatórios da empresa, que inclui seus sistemas
formais de planejamento, controle e coordenação.
Governança Corporativa
Organizacional Opinião dos funcionários Gestão participativa
Organizacional Empresas concorrentes, distribuidores de carne bovina Estratégia de crescimento via fusões & aquisições
Organizacional Empresas concorrentes, distribuidores de carne bovina (internacionais) Internacionalização
Organizacional Sistemas de Qualidade (HACCP, BPF, ISO) Controle de processos
Organizacional Certificação Pública para Exportação (inclui rastreabilidade)
Habilitação para exportação para canal de distribuição
genérico
Organizacional Certificações Privadas (Ex.: Eurepgap, BRC etc.)
Habilitação para exportação para canal de distribuição
bastante específico
Físico Plantas industriais Processo de abate e desossa
Físico Equipamentos de abate e desossa Processo de abate e desossa
Físico Mão-de-obra - linhas de abate e deossa Processo de abate e desossa
Físico Câmaras frigoríficas Processo de armazenagem da carne bovina
Físico Matéria-prima
Capacidade de adquirir animais "padrão-exportação" com
certa regularidade.
Físico Localização
Acesso à matéria-prima (principais praças pecuárias);
diversificação geográfica
Físico Recursos logísticos em geral Transportar eficientemente os produtos da empresa
Físico Escala de Produção Operar em grande escala de produção
Físico Integração entre produção de carne
in natura
e carne industrializada
Agregar valor à carne do dianteiro bovino e criar novos
canais de distribuição para este produto
Tecnológico
"Estoque" de tecnologia como patentes,
trademarks
(marcas registradas)
e
copyrights
(direitos autorais).
Produtos com alto uso de tecnologia de processamento
Fonte: Autor, elaborado com os dados da pesquisa e baseado em BARNEY, 1991; GRANT, 1991 (apud
HOSKISSON et. al. (2004, p. 109)).
155
QUADRO 5.7 – Recursos e Capacitações Intangíveis – JBS
Recurso Descrição Capacitação
Humano Conhecimento Conhecimento do mercado europeu da carne bovina.
Humano Capacitações Gerenciais Gestão profissionalizada
Inovador Idéias/ Capacitações científicas/ capacidade em inovar Produtos inovadores
Reputacional Reputação com consumidores Tradição
Reputacional Marca
Oferececimento de bons produtos aumentando confiança do
cliente.
Reputacional Percepção de qualidade, durabilidade e confiança nos produtos.
Oferececimento de bons produtos aumentando confiança do
cliente.
Reputacional
Reputação com fornecedores, de forma a criar interações e relações
mutamente eficientes e eficazes.
Capacidade de adquirir animais "padrão-exportação" com
certa regularidade.
Fonte: Autor, elaborado com os dados da pesquisa e baseado em BARNEY, 1991; GRANT, 1991 (apud
HOSKISSON et. al. (2004, p. 109)).
Já a Figura 5.11 apresenta o fluxograma das competências essenciais da
JBS. Ela parte dos 25 recursos e 23 capacitações acima discriminadas, de forma a
detectar quais destas capacitações geram vantagem competitiva para a JBS no que se
refere às suas exportações e estruturação de seus canais de distribuição na União
Européia. As capacitações que são fontes de vantagem competitiva para a JBS são suas
competências essenciais
156
Capacitações
1) Acesso a recursos financeiros diferenciados (mercado de capitais,
possibilidade de abertura de capital)
2) Governança corporativa
3) Gestão participativa
4) Estratégia de crescimento via fusões & aquisições
5) Internacionalização
6) Sistemas de qualidade/ controle de processos
7) Certificação – exportação canal genérico
8) Certificação – exportação canal específico
9) Processo de abate e desossa
10) Processo de armazenagem de carne bovina
11) Capacidade de adquirir animais “padrão-exportação” com certa
regularidade
12) Diversificação geográfica (hedge sanitário e acesso à matéria-prima)
13) Transportar eficientemente os produtos da empresa
14) Operar em grande escala de produção
15) Agregar valor à carne do dianteiro bovino e criar novos canais de
distribuição para o produto
16) Produzir produtos tecnológicos
17) Conhecimento do mercado europeu da carne bovina
18) Gestão profissionalizada
19) Produção de produtos inovadores
20) Tradição
21) Marcas: credibilidade/ bons produtos/ confiança do cliente
22) Percepção de qualidade: qualidade/ credibilidade/ confiança do cliente
23) Relacionamento com fornecedores: capacidade de adquirir animais
padrão-exportação
Capacitações 3, 6, 9, 16 e 19 não são claramente fontes de vantagens
competitivas para a JBS, logo são agrupamentos de recursos não
estratégicos.
Competências Essenciais
1) Acesso a recursos financeiros diferenciados (mercado de capitais,
abertura de capital)
2) Governança corporativa
3) Estratégia de crescimento via fusões & aquisições
4) Internacionalização
5) Certificação – exportação canal genérico
6) Certificação – exportação canal específico
7) Processo de armazenagem de carne bovina
8) Capacidade de adquirir animais “padrão-exportação” com certa
regularidade
9) Diversificação geográfica (hedge sanitário e acesso à matéria-prima)
10) Transportar eficientemente os produtos da empresa
11) Operar em grande escala de produção
12) Agregação de valor à carne do dianteiro bovino e criar novos canais
de distribuição para o produto
13) Conhecimento do mercado europeu da carne bovina
14) Gestão profissionalizada
15) Tradição
16) Marcas: credibilidade/ bons produtos/ confiança do cliente
17) Percepção de qualidade: qualidade/ credibilidade/ confiança do cliente
18) Relacionamento com fornecedores: capacidade de adquirir animais
padrão-exportação
Recursos
1) Financeiros: Capacidade da firma se financiar
2) Estrutura formal de relatórios
3) Opinião dos funcionários
4) Empresas concorrentes/ distribuidores de carne bovina
5) Empresas concorrentes/ distribuidores de carne bovina
(internacionais)
6) Sistemas de qualidade (HACCP, por exemplo),
7) Certificação pública para exportação
8) Certificações privadas (ex.: Eurepgap)
9) Plantas industriais
10) Equipamentos de abate e desossa,
11) Mão-de-obra – abate e desossa
12) Câmaras frigoríficas
13) Matéria-prima (gado bovino para abate)
14-) Localização
15-) Recursos logísticos
16-) Escala de produção
17-) Integração carne in natura e carne industrializada
18-) Estoque de tecnologia (patentes, marcas registradas)
19) Conhecimento
20-) Capacitações gerenciais
21-) Inovação
22) Reputação com consumidores
23) Marca
24) Percepção de qualidade/ durabilidade/ confiança
25) Reputação com fornecedores
Fonte: Autor, elaborado com os dados da pesquisa e baseado em BARNEY, 1991; GRANT, 1991 (apud
HOSKISSON et. al. (2004, p. 109), DRANOVE & MARCIANO (2005, p. 51), LASSERRE (2003, p. 47)
e HOSKISSON et al. (2004, p. 115).
FIGURA 5.11: Fluxograma das Competências Essenciais - JBS
157
Por outro lado, observa-se também no caso da JBS que algumas
competências essenciais são sustentáveis, enquanto que outras são temporária, dada a
maior facilidade que os concorrentes têm em copiá-las.
A Figura 5.12 apresenta a relação das competências essenciais
sustentáveis e temporárias da JBS.
JBS – Competências Essenciais
1) Acesso a recursos financeiros diferenciados
(mercado de capitais, possibilidade de
abertura de capital)
2) Governança corporativa
3) Estratégia de crescimento via fusões &
aquisições
4) Internacionalização
5) Certificação - canal genérico
6) Certificação - canal específico
7) Processo de Armazenagem de Carne
Bovina
8 Capacidade de adquirir animais padrão-
exportação
9) Diversificação geográfica (hedge sanitário)
10) Transportar eficientemente os produtos da
empresa
11) Operar em escala de produção
12) Agregação de valor à carne do dianteiro
bovino (industrialização)
13) Conhecimento do mercado europeu de
carne bovina
14-) Gestão profissionalizada
15-) Tradição
16-) Marcas: oferecimento de bons produtos/
credibilidade
17-) Percepção de qualidade: oferecimento de
bons produtos/ qualidade
18-) Relacionamento com fornecedores:
capacidade de adquirir animais padrão-
exportação com regularidade
Capacitação/
competência
cara ou difícil
de ser
imitada?
Sim
Não
Competências Essenciais Sustentáveis
1) Acesso a recursos financeiros diferenciados
2) Estratégia de crescimento via fusões e
aquisições
3) Internacionalização
4) Certificação - canal genérico
5) Certificação - canal específico
6) Operar em grande escala de produção
7) Conhecimento do mercado europeu de carne
bovina
8) Tradição
9) Marcas: oferecimento de bons produtos/
credibilidade
10) Percepção de qualidade: oferecimento de
bons produtos/ qualidade
Competências Essenciais Temporárias
1)Governança corporativa
2) Armazenagem
3) Aquisição de animais-padrão exportação
4) Diversificação geográfica
5) Transportar eficientemente os produtos da
empresa
6) Agregação de valor à carne do dianteiro
bovino (industrialização)
7) Gestão profissionalizada
8) Relacionamento com fornecedores: aquisição
de animais padrão-exportação
Fonte: Autor, elaborado com os dados da pesquisa e baseado em BARNEY, 1991; GRANT, 1991 (apud
HOSKISSON et. al. (2004, p. 109), DRANOVE & MARCIANO (2005, p. 51), LASSERRE (2003, p. 47) e
HOSKISSON et al. (2004, p. 115)).
FIGURA 5.12 - Competências Essenciais Sustentáveis x Temporárias – JBS
Já a Figura 5.13 apresenta um resumo dos recursos, capacitações,
competências essenciais sustentáveis e temporárias da JBS.
158
Recursos: 25
Tangíveis: 18
Intangíveis: 7
Competências Essenciais
Sustentáveis: 10
Tangíveis: 6
Intangíveis: 4
Capacitações: 23
“Tangíveis”: 16
“Intangíveis”: 7
Competências
Essenciais: 18
“Tangíveis”: 12
“Intangíveis”: 6
Competências Essenciais
Temporárias: 8
Tangíveis: 6
Intangíveis: 2
Fonte: Autor, elaborado com os dados da pesquisa.
FIGURA 5.13 – Resumo: Recursos, Capacitações e Competências Essenciais
Sustentáveis e Temporárias – JBS
Algumas competências essenciais merecem destaque no caso da JBS.
Em primeiro ligar, percebe-se que a capacidade de armazenamento da
carne bovina in natura e o transporte eficiente dos recursos da empresa impacta a
estrutura de distribuição da JBS. Como a empresa opera em grande escala e está aos
poucos migrando para um sistema de distribuição própria na Europa, isso obriga à
empresa a ter uma capacidade de armazenamento adequada e um sistema logístico
eficiente para garantir que a empresa produza uma carne de qualidade adequada para
distribuir seus produtos em canais de distribuição mais específicos, que é o que a
empresa procura ao estruturar sua distribuição própria. Não por acaso, a empresa conta
com um terminal de containeres no porto de Santos e possui uma ótima pontualidade na
entrega de seus produtos no mercado europeu, atributo este inclusive reconhecido por
um de seus concorrentes estudados na presente pesquisa.
Outro fator de inegável a importância na conquista de mercados
internacionais de forma geral, e para a União Européia de modo específico, é a escala de
159
produção, que no caso da JBS configura-se em uma de suas principais competências
essenciais, traduzindo-se em grande volume de exportações e maior penetração no canal
de distribuição na Europa.
A Figura 5.14 apresenta os principais frigoríficos brasileiros e suas
respectivas capacidades de abate. Pode-se observar que os frigoríficos com as maiores
capacidades de produção (expressas através da capacidade de abate), são também os
principais frigoríficos exportadores de carne bovina do Brasil. Em particular, a JBS.é a
empresa que possui maior capacidade de abate , sendo também o maior exportador
brasileiro de carne bovina. Deve-se ressalvar que as capacidades mencionadas são
nominais e que nem toda capacidade de abate dos frigoríficos está habilitada à
exportação para a União Européia. De todo modo, parece existir uma correlação entre
capacidade de abate e a capacidade exportadora dos principais frigoríficos brasileiros,
conforme pode ser observado nas Figuras 5.14 e 5.15 abaixo.
13.968
10.300
8.920
7.700
7.200
4.300
4.069
3.300
3.150
1.850
-
-
-
-
-
-
-
947
3.100
28.000
JB
S
Marfrig
Margen
Bertin
Quatro Marcos
Merco
s
u
l
M
i
n
erv
a
In
d
ep
e
ndência
A
ran
t
es
Frigoestrela
Abate doméstico Abate internacional
Fonte: ABIEC – Associação Brasileiras da Indústria Exportadora de Carnes (2007)
FIGURA 5.14: Capacidade de Abate dos Principais Frigoríficos Brasileiros (em
cabeças/ dia) – Dados de Setembro de 2007
160
JBS; 922
Bertin; 838
Minerva; 438
Marfrig; 417
Independência; 244
Mercosul; 174
Quatro Marcos; 133
Mataboi; 118
Margen; 102
Outros; 2.372
Fonte: SECEX/ MDIC apud JBS (2007)
(1)
Inclui exportações de carne bovina in natura, industrializada e couros.
FIGURA 5.15: Principais Exportadores de Produtos de Origem Bovina no Brasil
(US$) – 2006
(1)
A questão da localização (estratégia de “hedge” sanitário) é uma das
competências essenciais baseada em recursos tangíveis da JBS. Como já visto,
atualmente, a JBS possui plantas industriais espalhadas pelos principais estados
produtores. O objetivo desta estratégia é não só estar próximo da matéria-prima “gado
bovino para abate” nas principais praças pecuárias, mas também garantir uma
diversificação geográfica que garanta o fluxo de exportações para a União Européia no
caso de um dos estados ter suas exportações embargadas por conta de algum caso de
febre aftosa. Desta forma, dentre as empresas analisadas nesta pesquisa, a JBS é o que
mais se beneficia desta política de diminuição de risco sanitário e menor exposição de
suas exportações a eventuais embargos decorrentes de problemas sanitários nas áreas
em que se localizam suas plantas industriais.
A JBS, assim como os demais frigoríficos estudados nesta pesquisa,
possui origem familiar. Porém, principalmente nos últimos dois anos, todos os
frigoríficos da pesquisa iniciaram processo de profissionalização que foi originalmente
guiado pelo aumento da importância relativa do Brasil e, consequentemente, de alguns
frigoríficos brasileiros no mercado internacional da carne bovina. Este processo é
161
bastante evidente no caso da JBS, que se encontra na vanguarda dos frigoríficos
nacionais no que tange à gestão profissional e adoção de sistemas de governança,
A visão de que os principais frigoríficos brasileiros de carne bovina vem
passando por um profundo processo de profissionalização puxado pelas exportações é
corroborada por SABADIN (2006), que afirma que o crescimento das exportações de
carne bovina tem contribuído para a modernização e profissionalização da indústria
frigorífica nacional, favorecendo a legalização da atividade e a adoção de tecnologias e
sistemas de gestão mais eficientes.
A expansão das exportações brasileiras de carne bovina causou dois
impactos imediatos na indústria frigorífica exportadora nacional.
Em primeiro lugar, a própria expansão dos principais frigoríficos
brasileiros aumentou a complexidade do necio em si, forçando a contratação de
profissionais, até mesmo de outras áreas, para a gestão de negócios nas mais variadas
funções existentes no mercado da carne bovina. Desta forma, profissionais da área de
operações, logísticas, finanças, relação com investidores, marketing, vendas, etc., foram
contratados pelos grandes frigoríficos brasileiros para auxiliá-los no processo de
expansão de suas operações em âmbito doméstico e internacional.
O segundo impacto é que o aumento da importância dos frigoríficos
nacionais no mercado internacional da carne bovina atraiu o interesse de bancos e
investidores internacionais, que voltaram a financiar operações neste mercado depois de
anos ausentes por conta de problemas do passado, quando a imagem do setor, de forma
geral, ficou associada à gestão pouco profissional, pequena transparência na relação
com o mercado financeiro e sonegação de impostos. Como os grandes bancos (inclusive
bancos de investimento internacionais) e os fundos de investimento internacionais
exigem maior transparência na condução de negócios, os frigoríficos adotaram um
sistema de governança e relação com investidores bastante eficiente, que inclui a
própria criação de departamento de Relação com Investidores, a disponibilização de
balanços auditados por uma pelas grandes firmas internacionais de auditoria
(PricewaterhouseCoopers, Ernest & Young, Delloite Touche Tomatsu e KPMG), a
criação de Conselhos de Administração, diversos comitês operacionais, etc.
Outro fator que contribuiu para o processo de profissionalização de
alguns frigoríficos brasileiros foi a abertura de capital destas empresas, conforme
162
análise efetuada pelo jornal Folha de São Paulo, de 23 de setembro de 2007 (Caderno
Dinheiro, pg. B1).
A reportagem menciona “que a onda de abertura de capital e lançamento
de ações vem trazendo rapidamente para a formalidade setores tradicionalmente menos
organizados do ponto-de-vista tributário e na contratação de mão-de-obra, sendo que as
áreas de construção civil, agronegócios e pecuária (setor da carne bovina) lideram esta
tendência. A arrecadação da Receita Federal com o abate e fabricação de produtos de
carne aumentou 26% em 2006 e mantém projeção de crescimento na casa dos dois
dígitos neste ano”. A reportagem menciona comentário de Cesário Ramalho da Silva,
presidente da Sociedade Rural Brasileira, que afirma que o agronegócio brasileiro
sempre foi “historicamente informal” e que há “forte profissionalização” em curso por
conta dos IPOs (“Innitial Public Offering” ou Oferta Pública Inicial da ações).
Prossegue a reportagem afirmando “que o processo (de abertura de capital) tem ajudado
a resolver disputas familiares em um setor pouco profissionalizado e confuso do ponto
de vista societário. Em 2007, três dos maiores frigoríficos (JBS-Friboi, Marfrig e
Minerva) realizaram IPOs”.
O acesso a capital por parte dos frigoríficos nacionais vem sendo
realizado por meio de operações estruturadas de empréstimos externos (emissões de
pré-pagamentos de exportação e Eurobonds no mercado de capitais internacionais). No
caso da JBS, estas operações garantiram os recursos financeiros necessários para a sua
expansão.
De todo modo, a despeito da importância das competências essenciais
supramencionadas, a principal competência essencial da JBS é sua capacidade de
crescimento através de fusões e aquisições. Nenhum frigorífico nacional possui tamanha
competência neste quesito e também na incorporação das empresas adquiridas.
A estratégia de crescimento da JBS foi elaborada e implementada através
da realização de fusões & aquisições de frigoríficos concorrentes. Para BATALHA &
SILVA (2001), a estratégia de fusões & aquisições é uma das principais opções
estratégicas das firmas agroindustriais. As outras estratégias são: especialização,
integração vertical, diversificação, inovação e estratégias de corte, sendo que as
empresas podem adotar (e muitas vezes adotam) estratégias mistas, que implicam na
conjugação de duas ou mais dessas estratégias.
163
A estratégia de fusões & aquisições para estes autores é justificada pelos
seguintes fatores: (a) obtenção de sinergias operacionais e/ou financeiras; (b) obtenção
de economias de escala; (c) melhoria dos resultados da empresa adquirida através de
uma gestão aprimorada (transferência de conhecimentos administrativos); (d) melhoria
da coordenação das atividades da empresa através do controle de outros mercados em
que ela participa; (e) compra de ativos avaliados abaixo de seu valor real; e (f) aumento
rápido da parte do mercado da empresa.
A compra de ativos avaliados abaixo de seu valor real, o aumento rápido
da participação do mercado e aquisição das marcas, dos canais de distribuição e da
carteira de clientes parecem ter sido os grandes motivadores da estratégia de
crescimento através de fusões & aquisições posta em prática pelo Grupo JBS.
Naturalmente os ganhos de escala e a possibilidade de melhoria dos resultados da
empresa adquirida através de uma gestão aprimorada também foram fatores importantes
na determinação da estratégia de crescimento via fusões & aquisições implantada pelo
Grupo JBS nos últimos anos.
No que tange à aquisição das marcas, alguns dos frigoríficos adquiridos
possuíam marcas de renome internacional que até hoje vêm sendo utilizadas em grande
escala por esta empresa, principalmente para os produtos industrializados. Dentre estas
marcas destaca-se a Swift, que é uma das principais marcas de carne bovina nos Estados
Unidos, conjuntamente com Iowa Beef Packers, Cargill, Tyson Foods e outros.
AAKER (1998), atenta para o conceito de Brand Equity (ou Valor da
Marca), que é um conceito de ativos e passivos ligados a uma marca, seu nome e
símbolo, que se somam ou se subtraem do valor proporcionado por um produto ou
serviço para uma empresa e/ou para os consumidores dela. Dentro desse conceito, uma
marca vale pela sua capacidade de gerar negócios atuais e futuros, ou seja, quanto mais
forte for uma marca no sentido de gerar faturamento, maior será seu valor de mercado.
Entretanto, muitas vezes esse conceito é negligenciado, surgindo oportunidade para se
adquirir, a baixos preços, marcas fortes geradoras de receitas. Em outras palavras,
comprar ativos abaixo de seu valor real.
Quanto à compra de participação de mercado, especificamente para esse
caso ela pode ser analisada sob dois aspectos: compra da carteira de fornecedores e
compra da carteira de clientes.
164
Muitos frigoríficos adquiridos pelo Grupo JBS eram empresas
tradicionais do setor da carne bovina no Brasil e mais recentemente Argentina e Estados
Unidos, que mantinham relacionamento de longa data com fornecedores qualificados de
gado pronto para abate (fator importante no suprimento de matéria-prima que será
utilizada no processamento da carne bovina a ser destinada à exportação). Muito dos
frigoríficos adquiridos pelo Grupo JBS, aqui incluída a Swift argentina, tinham tradição
e reputação no comércio exterior da carne bovina, mantendo relacionamento comercial
de longa data com muitos dos principais atacadistas e trading companies de carne
bovina na Europa.
Dessa forma, a aquisição dos frigoríficos trouxe um benefício duplo para
o Grupo JBS, tanto do ponto de vista da gestão de seus canais de distribuição quanto na
gestão de sua cadeia de suprimentos de gado bovino.
Do ponto de vista da distribuição, as aquisições garantiram a inserção do
Grupo JBS em canais de distribuição já preestabelecidos e maduros na Europa, o que
possibilitou a aquisição de fatias de mercado que possivelmente não seriam adquiridas
através de outras estratégias. Outra possibilidade é que a aquisição de fatias de mercado
e participação em canais de distribuição já estabelecidos levariam mais tempo e
possivelmente seriam mais custosas do que esta estratégia posta em prática, pelo menos
em um primeiro instante, visto que a JBS possui menos tradição nas exportações de
carne bovina do que alguns de seus principais concorrentes.
Sob a ótica da gestão da cadeia de suprimentos, as aquisições trouxeram
consigo carteiras de fornecedores de matéria-prima (bovinos prontos para abate) em
algumas das principais regiões pecuárias do Brasil, sendo que, muitos dos pecuaristas
tinham relacionamento de longa data com a empresa adquirida pelo Grupo JBS. Com
isso, o Grupo JBS reduz o risco de falta de suprimento adequado e até mesmo qualidade
padronizada, de forma a garantir o suprimento de matéria-prima para produzir seus
produtos e disponibilizá-los em seus canais de distribuição, dentre os quais aqueles
localizados na União Européia.
Tem-se, portanto, uma estratégia interessante, pois mesmo sendo uma
competência essencial com origem em recursos e capacitações tangíveis, o crescimento
via fusões & aquisições impacta também competências essenciais com origem em
recursos e capacitações intangíveis, como conhecimento do mercado europeu e tradição,
165
que são em princípio competências menores da JBS, mas que vieram implícitas com a
aquisição de importantes e tradicionais frigoríficos brasileiros exportadores, como
Bordon, Anglo, Swift e Sola.
De acordo com HARDING & ROVIT (2004), ser bem sucedido em uma
fusão ou aquisição não é um feito trivial. Dezenas de estudos indicam que as chances de
sucesso para a grande e clássica aquisição de uma empresa pela outra não são maiores
de 30%. Apesar disso, a maioria das grandes empresas de hoje é resultado de um
passado de transações. Isso indica que pelo menos algumas transações são, de fato,
boas.
Especificamente com relação ao caso estudado, essa última afirmação
parece ser aplicável, visto que a estratégia de crescimento adotada mostrou-se acertada e
teve forte impacto na conquista do mercado externo pelo Grupo JBS e por seu
crescimento como um todo. Desta forma, a capacitação que o Grupo JBS possui em
crescer via fusões & aquisições, bem como sua capacitação em integrar as empresas
adquiridas são as principais competências essenciais do Grupo JBS.
A estratégia de crescimento através de fusões & aquisições foi tão bem
sucedida no caso da JBS que acabou gerando outra competência essencial de mesma
natureza para a empresa: a internacionalização, que vem ocorrendo através da compra
de empresas concorrentes em mercados estrangeiros.
A internacionalização não só garante o aumento da capacidade de
produção, mas também possibilita a aquisição de gado em regiões com acesso a
importantes mercados internacionais, o que justifica os investimentos maciços dos
principais frigoríficos brasileiros no mercado uruguaio, que possui certificação para
exportação de carne in natura para os Estados Unidos, o que não ocorre no caso dos
frigoríficos brasileiros. No caso da JBS, a aquisição de empresas concorrentes também
se traduz em aquisição de fatias de mercado em importantes canais de distribuição de
carne bovina. Por exemplo, a compra da Swift norte-americana possibilitou o acesso a
importantes canais de distribuição da carne bovina nos Estados Unidos, enquanto que a
compra da Swift australiana trouxe consigo acesso importante nos canais de distribuição
da carne bovina no Japão e outros países asiáticos.
Para concluir, a frase abaixo, extraída de uma apresentação dos
resultados do segundo trimestre de 2007 da JBS resume a importância do processo de
166
internacionalização em curso na cadeia agroindustrial da carne bovina brasileira (grifo
do autor ressaltando os principais pontos referentes à aquisição na ótica da própria
empresa):
“A concretização da aquisição da Swift resulta na criação da maior empresa do mundo
no setor de alimentos de proteína de origem bovina e da maior empresa brasileira na
indústria de alimentos, consolidando a JBS nos mercados nacional e mundial de carne
bovina e tornando-a um importante competidor no mercado mundial de carne suína.
Com isso, a JBS passará a ter capacidade de produção e distribuição no Brasil, na
Argentina, nos Estados Unidos da América e na Austrália, os quatro principais países
produtores de carne bovina do mundo. Essa posição possibilitará à Companhia (i) ter
acesso aos dois blocos de barreiras comerciais: Atlântico e Pacífico; (ii) diversificar o
risco em relação à barreiras fito-sanitárias; (iii) unificar e fortalecer a marca Swift
globalmente e (iv) extrair valor através da recuperação dos resultados operacionais
da Swift e das sinergias existentes nos Negócios”.
(JBS, 2007; grifo do autor).
167
5.3. Estudo de Caso: Frigorífico Quatro Marcos
5.3.1 Introdução/ Histórico
O Frigorífico Quatro Marcos foi fundado em 1981 por Sebastião Xavier
na cidade de Jataizinho, Paraná. Em 1986, a empresa deslocou-se para o estado de Mato
Grosso, onde a empresa inaugurou sua primeira unidade de abate, localizada na cidade
de São José dos Quatro Marcos.
Ao longo dos anos, o Frigorífico Quatro Marcos se desenvolveu nas
principais praças pecuárias do estado do Mato Grosso, estando hoje instalado também
nas cidades de Colider, Vila Rica, Alta Floresta e Juara. O Quatro Marcos também
possui atuação nos estados do Sul e atualmente está instalando uma unidade de abate no
estado de Goiás, tendo recentemente inaugurado uma unidade de abate no estado de
Rondônia.
Atualmente o Quatro Marcos é um dos principais frigoríficos brasileiros
em termos de capacidade de abate. Trata-se de um frigorífico bastante tradicional, mas
cujo principal foco de atuação até o momento tem sido o mercado interno, o que o
diferencia de JBS e Bertin, que possuem forte penetração internacional.
5.3.2 Infra-Estrutura e Escala de Produção
A infra-estrutura de produção do Frigorífico Quatro Marcos é composta
pelas seguintes plantas industriais e centro de distribuição.
a. Centro de Distribuição em Jandira-SP: Localizado na cidade de Jandira-SP, a
cerca de 30 km da cidade de São Paulo, este centro de distribuição funciona
como um entreposto comercial que centraliza a distribuição no mercado
doméstico (região Sudeste, principalmente Grande São Paulo e interior de São
Paulo). O centro de distribuição de Jandira também funciona como um centro de
distribuição de cargas voltadas à exportação e foi recentemente modernizado
com equipamentos de desossa de primeira linha, funcionando, portanto, como
um centro de desossa do Frigorífico Quatro Marcos;
168
b. Unidade Industrial de Abate de São José dos Quatro Marcos - MT: Frigorífico e
Indústria de Enlatados. Capacidade de produção (abate diário): 1.000 cabeças;
c. Unidade Industrial de Abate de Cuiabá – MT: Capacidade de produção (abate
diário): 1.000 cabeças;
d. Unidade Industrial de Abate de Juara - MT: Frigorífico. Capacidade de produção
(abate diário): 1.000 cabeças;
e. Unidade Industrial de Abate de Alta Floresta– MT: Frigorífico. Capacidade de
produção (abate diário): 1.000 cabeças;
f. Unidade Industrial de Abate de Vila Rica - MT: Capacidade de produção (abate
diário): 1.400 cabeças;
g. Centro de Distribuição e Curtume de Vila Rica – MT;
h. Curtume – Colider – MT: Capacidade de Produção de Couro: 4.500 peças/ dia;
i. Unidades Industrial de Abate de Paragominas – PA (em construção): Previsão
do início das operações: 2009;
j. Unidades Industrial de Abate de Quirinópolis – GO (em construção):
Capacidade futura de produção (abate diário): 1.000 cabeças;
k. Escritório de Apoio à Exportação: Itajaí – SC;
l. Centro de Distribuição e Curtume de Estância Velha – RS.
O Quadro 5.8 sintetiza a infra-estrutura de produção e distribuição do
Frigorífico Quatro Marcos. A parte superior da tabela apresenta as unidades de abate,
enquanto que a parte inferior apresenta os centros de distribuição, curtumes e o centro
de apoio à exportação de Itajaí, no estado de Santa Catarina.
169
QUADRO 5.8 - Unidades Industriais e Centros de Distribuição – Frigorífico
Quatro Marcos- 2007
Cidade Estado Atividades
Capacidade de Abate
(cabeças/ dia)
São José dos Quatro Marcos Mato Grosso
Abate/ Desossa/ Indústria de
Enlatados
1.000
Cuiabá Mato Grosso Abate 1.000
Juara Mato Grosso Abate 1.000
Alta Floresta Mato Grosso Abate 1.000
Vila Rica Mato Grosso Abate 1.400
Quirinópolis Goiás Em construção 1.000
Paragominas Pará
Em construção
(1)
n.a.
Capacidade atual de abate
(cabeças/ dia)
--
5.400
(2)
Jandira São Paulo Distribuição/ Exportação/ Curtume n.a.
Vila Rica
Mato Grosso
Distribuição/ Curtume n.a.
Colider
Mato Grosso
Curtume 4.500
Itajaí
Santa Catarina
Centro de apoio à exportação n.a.
Estância Velha
Rio Grande do Sul
Distribuição/ Curtume n.a.
(1) Previsão do início das operações: 2009
(2) Valor contempla apenas as unidades atualmente em operação.
Fonte: Quatro Marcos (2007)
5.3.3 Suprimentos (Gado Bovino para Abate)
A empresa possui um departamento próprio de compra de gado que opera
nas praças pecuárias próximas às suas plantas industriais. A empresa possui
relacionamento de longa data com muitos de seus fornecedores, possuindo a capacitação
de conseguir identificar quais são os fornecedores que possuem animais “padrão-
exportação”. A empresa não possui programa específico de bonificação de carcaças.
5.3.4 Produtos, Marcas e Certificações
O portfolio de carne bovina do Frigorífico Quatro Marcos é composto
pelos seguintes produtos:
a. Carne in natura: traseiro (com todos seus cortes), dianteiro (com todos seus
cortes), ponta-de-agulha, linha “Grill” e linha “Cortes Especiais”;
170
b. Carne Cozida (produto industrializado): coxão duro, lagarto, carne cozida em
tiras, carne cozida em cubos, carne cozida moída;
c. Triparia: tripa grossa, tripa fina, fundo, culatra, bexiga;
d. Industrializados:
e. Congelados: hambúrgueres, kibes, steaks e almôndegas,
f. Enlatados: carne bovina cozida, cubos de carne bovina ao molho, carne bovina
moída ao molho, almôndegas, dobradinha com feijão branco, feijão tropeiro,
feijoada, fiambre.
g. Diversos: bananinha (músculo), bananinha (contra-filé), carne industrial, carne
de sangria, carne vermelha, carne moída, recortes, extratos de carne.
O Quatro Marcos opera com as marcas “Quatro Marcos”, “Excellence” e
Lexus. A marca Excellence é oferecida nos produtos industrializados da empresa; já a
marca Quatro Marcos se refere aos produtos congelados exportados, enquanto que a
marca Lexus é uma marca premium, utilizada nos produtos resfriados do Frigorífico
Quatro Marcos que são exportados principalmente para a União Européia.
O Frigorífico Quatro Marcos possui certificação para vendas na União
Européia em sua planta de São José dos Quatro Marcos. A planta de Quirinópolis, Goiás
possui certificação “Lista Geral”, faltando alguns poucos ajustes para a planta obter a
certificação para as vendas na União Européia. Já a planta de Ariquemes, Rondônia,
está sendo construída seguindo o padrão necessário para a obtenção da certificação para
a União Européia. O entreposto comercial de Jandira, São Paulo, também possui
certificação para a União Européia, porém como o estado de São Paulo atualmente sofre
embargo comercial da União Européia, o entreposto não está sendo utilizado para
exportações com este destino.
Além destas certificações, o Frigorífico Quatro Marcos possui
certificações para exportações para a Albânia, Argélia, Israel, e Japão.
5.3.5 Exportações
De acordo com dados do Anuário Valor 1000 (2007), em 2006 o
faturamento do Frigorífico Quatro Marcos foi R$ 746 milhões.
171
Em seu website, a empresa informa que 85% de suas vendas
correspondem à venda de carne in natura, 10% correspondem à venda de couros e sub-
produtos e, por fim, 5% das vendas correspondem à venda de carne industrializada
(produtos enlatados). Desta forma, 90% das vendas do Frigorífico Quatro Marcos são
relacionadas à venda de carne bovina. A Figura 5.16 apresenta esta abertura de vendas
do Frigorífico Quatro Marcos.
Carne
in
natura
; 85%
Couro
(1);
10%
"Enlatados";
5%
(1)
Couro e sub-
produtos
Fonte: Frigorífico Quatro Marcos (2007)
FIGURA 5.16 - Abertura das Vendas do Frigorífico Quatro Marcos por Produto
Já em termos de destino, 67% das vendas do Frigorífico Quatro Marcos
são realizados no mercado doméstico, enquanto que os restantes 33% são referentes à
exportações, conforme pode ser observado na Figura 5.17 .
A Europa é o principal destino das exportações do Frigorífico Quatro
Marcos, perfazendo 19% das vendas totais da empresa (ou 59% do total exportado). Na
Europa, os principais países-destino são: Inglaterra, Alemanha, Holanda, Portugal e
Itália. Os principais clientes em cada país são: DCD Co. Ltd. (Inglaterra), Aico GMBH
(Alemanha), Compaxo Fijne Vleeswaren BV (Holanda), Talhos da Ponte (Portugal) e
Merlo Ecoai SPA (Espanha).
172
Mercado
Doméstico; 67%
Europa; 19%
Á
sia e Oceania;
6%
África e Oriente
Médio; 6%
Américas; 2%
Fonte: Frigorífico Quatro Marcos (2007)
FIGURA 5.17 - Abertura das Vendas do Frigorífico Quatro Marcos por Destino
5.3.6 Canais de Distribuição na Europa
O Frigorífico Quatro Marcos exporta para cerca de 25 importadores na
Europa, sendo 20% das vendas realizadas via trading companies e os restante 80% das
vendas realizadas via canal direto, para os atacadistas/ distribuidores.
Primeiramente vale a pena fazer a distinção entre trading company e
distribuidor no canal de exportação do Frigorífico Quatro Marcos (e demais frigoríficos
brasileiros) na Europa. O distribuidor efetivamente compra a carne do Quatro Marcos e
toda documentação de exportação e nota fiscal contém seus os dados. Já a trading
company compra a carne e depois encaminha os dados do consignatário da carga para
que o Quatro Marcos possa emitir a documentação final (no nome do consignatário).
Ao longo dos últimos anos, o Quatro Marcos vem reduzindo suas vendas
através de trading companies, pois não deseja ficar a mercê do cliente das mesmas.
Inclusive, se o consignatário da trading company for cliente do Quatro Marcos, a venda
não é realizada.
173
Independentemente destas nuances, o fato é que tanto a trading company
quanto o distribuidor possuem a praticamente mesma função, que é a de comprar
grandes quantidades de carne bovina (e outras carnes) para ser revendida e distribuída
posteriormente no mercado europeu.
O principal motivo pelo qual o Frigorífico Quatro Marcos estrutura sua
distribuição de carne bovina na União Européia através do uso de distribuidores é a
especialização deste agente do canal na tarefa de distribuição de carne bovina em
território europeu. O varejo europeu é extremamente pulverizado, com grande número
de supermercados, açougues, restaurantes etc. espalhados pelo continente, o que torna
custosa, difícil e complicada, em um primeiro instante, a utilização de estrutura própria
de distribuição de carne bovina no continente europeu.
O Quadro 5.9 apresenta uma radiografia do setor varejista alimentício
europeu, com o número de lojas para cada segmento e o percentual de vendas de cada
segmento em relação ao faturamento total do setor (dados referentes ao ano de 2003).
Pelo Quadro 5.9, é possível observar o grande número de estabelecimentos no varejo
alimentício da Europa.
QUADRO 5.9 - Varejo alimentício europeu: número de lojas e faturamento
Descrição Número de Lojas % das Vendas Totais do Setor
Hipermercados (> 2.500 m2)
5.293
31%
Supermercados de grande porte (1.200 a 2.500 m2)
14.805
22%
Supermercados de pequeno porte (400 a 1.200 m2)
39.559
23%
Mercearias (< 400 m2)
341.094
21%
Outros
5.260
3%
Total 406.011 100%
Fonte: ACNielsen (2003) apud Defra (2004)
Ao adotar esta estratégia de distribuição, o Frigorífico Quatro Marcos
abre mão de maiores margens comerciais possíveis com a venda direto ao varejo, no
caso de uma estrutura própria de distribuição, porém consegue maior penetração de
mercado para sua carne e não arca com os maiores custos de ter uma estrutura própria
de distribuição no continente europeu. O distribuidor desempenha importante papel no
canal estudado, pois graças a seu conhecimento e boa capacidade de cobertura de
mercado, capacidade de realizar contatos e pedidos e facilidade em manusear estoques,
174
agrupando-os e desagrupando-os de acordo com as diferentes solicitações de cada
cliente, é capaz de realizar a distribuição dos produtos do Frigorífico Quatro Marcos de
maneira mais eficiente e eficaz do que a que seria realizada pelo próprio frigorífico.
A Figura 5.18 sintetiza e esquematiza o canal de distribuição da carne
bovina do Frigorífico Quatro Marcos na Europa no ano de 2007.
Frigorífico Quatro
Marcos
Europa
Trading Companies
Distribuidores
20%
80%
Food Services
Açougues
Boutiques
de carnes
Supermercados
Nível do canal em que o
Quatro Marcos atua
Consumidores
Finais
Nível do canal em que o
Quatro Marcos não
atua
Brasil
Nível do canal em que o
Quatro Marcos não
atua
Fonte: Autor, elaborado com os dados da pesquisa.
FIGURA 5.18 - Esquematização do Canal de Distribuição do Quatro Marcos na
Europa em 2007
Conforme pode ser observado pela Figura 5.18 acima, o atual modelo de
distribuição do Frigorífico Quatro Marcos é muito parecido com a estrutura de
distribuição que a JBS adotava até o ano de 2004, ou seja, distribuição realizada em um
canal pouco específico e baseado na utilização de intermediários. Conforme
mencionado anteriormente, a adoção desta estratégia possui a grande virtude de
pulverizar a distribuição da carne do Quatro Marcos no varejo europeu. Por outro lado,
a atuação em canal de distribuição genérico e no qual a empresa possui pequena
175
influência e controle possui a grande desvantagem de não permitir à empresa capturar
plenamente os investimentos que vêm sendo realizados nos últimos anos para melhorar
a qualidade e percepção de qualidade de seus produtos. Tem-se, portanto, que não é
uma estratégia condizente com os investimentos em qualidade do produto que a
empresa vem realizando nos últimos anos. A empresa deveria buscar trabalhar em
canais mais específicos, onde poderia capturar o valor adicionado ao melhorar a
percepção da qualidade do produto e ao investir no fortalecimento de suas marcas.
5.3.7. Competências Essenciais e Distribuição de Carne Bovina Brasileira na Europa
Neste tópico específico, serão discutidas as principais competências
essenciais do Frigorífico Quatro Marcos que impactam suas exportações de carne
bovina e a estruturação de seus canais de distribuição na União Européia
(principalmente carne in natura).
A partir da pesquisa de campo, foram diagnosticados e determinados 25
recursos e 23 capacitações que compõem as atividades básicas ou estão à disposição do
Quatro Marcos.
O Quadro 5.10 abaixo apresenta a relação dos recursos e capacitações
tangíveis identificados no Quatro Marcos. Já o Quadro 5.11 apresenta a relação dos
recursos e capacitações intangíveis identificados no Quatro Marcos.
176
QUADRO 5.10 – Recursos e Capacitações Tangíveis – Quatro Marcos
Recurso Descrição Capacitação
Financeiro Capacidade da firma se financiar.
Acesso a mercado de capitais (nacional e internacional).
Estruturação de operações de Eurobonds e abertura de
capital.
Organizacional
A estrutura formal de relatórios da empresa, que inclui seus sistemas
formais de planejamento, controle e coordenação.
Governança Corporativa
Organizacional Opinião dos funcionários Gestão participativa
Organizacional Empresas concorrentes, distribuidores de carne bovina Estratégia de crescimento via fusões & aquisições
Organizacional Empresas concorrentes, distribuidores de carne bovina (internacionais) Internacionalização
Organizacional Sistemas de Qualidade (HACCP, BPF, ISO) Controle de processos
Organizacional Certificação Pública para Exportação (inclui rastreabilidade)
Habilitação para exportação para canal de distribuição
genérico
Organizacional Certificações Privadas (Ex.: Eurepgap, BRC etc.)
Habilitação para exportação para canal de distribuição
bastante específico
Físico Plantas industriais Processo de abate e desossa
Físico Equipamentos de abate e desossa Processo de abate e desossa
Físico Mão-de-obra - linhas de abate e deossa Processo de abate e desossa
Físico Câmaras frigoríficas Processo de armazenagem da carne bovina
Físico Matéria-prima
Capacidade de adquirir animais "padrão-exportação" com
certa regularidade.
Físico Localização
Acesso à matéria-prima (principais praças pecuárias);
diversificação geográfica
Físico Recursos logísticos em geral Transportar eficientemente os produtos da empresa
Físico Escala de Produção Operar em grande escala de produção
Físico Integração entre produção de carne
in natura
e carne industrializada
Agregar valor à carne do dianteiro bovino e criar novos
canais de distribuição para este produto
Tecnológico
"Estoque" de tecnologia como patentes,
trademarks
(marcas registradas)
e
copyrights
(direitos autorais).
Produtos com alto uso de tecnologia de processamento
Fonte: Autor, elaborado com os dados da pesquisa e baseado em BARNEY, 1991; GRANT, 1991 (apud
HOSKISSON et. al. (2004, p. 109)).
177
QUADRO 5.11 – Recursos e Capacitações Intangíveis – Quatro Marcos
Recurso Descrição Capacitação
Humano Conhecimento Conhecimento do mercado europeu da carne bovina.
Humano Capacitações Gerenciais Gestão profissionalizada
Inovador Idéias/ Capacitações científicas/ capacidade em inovar Produtos inovadores
Reputacional Reputação com consumidores Tradição
Reputacional Marca
Oferececimento de bons produtos aumentando confiança do
cliente.
Reputacional Percepção de qualidade, durabilidade e confiança nos produtos.
Oferececimento de bons produtos aumentando confiança do
cliente.
Reputacional
Reputação com fornecedores, de forma a criar interações e relações
mutamente eficientes e eficazes.
Capacidade de adquirir animais "padrão-exportação" com
certa regularidade.
Fonte: Autor, elaborado com os dados da pesquisa e baseado em BARNEY, 1991; GRANT, 1991 (apud
HOSKISSON et. al. (2004, p. 109)
).
Já a Figura 5.19 apresenta o fluxograma das competências essenciais do
Quatro Marcos. Ela parte dos 25 recursos e 23 capacitações acima discriminadas, de
forma a detectar quais destas capacitações geram vantagem competitiva para o Quatro
Marcos no que se refere às suas exportações e estruturação de seus canais de
distribuição na União Européia. As capacitações que são fontes de vantagem
competitiva para o Quatro Marcos são suas competências essenciais.
178
Capacitações
1) Acesso a recursos financeiros diferenciados (mercado de capitais,
possibilidade de abertura de capital)
2) Governança corporativa
3) Gestão participativa
4) Estratégia de crescimento via fusões & aquisições
5) Internacionalização
6) Sistemas de qualidade/ controle de processos
7) Certificação – exportação canal genérico
8) Certificação – exportação canal específico
9) Processo de abate e desossa
10) Processo de armazenagem de carne bovina
11) Capacidade de adquirir animais “padrão-exportação” com certa
regularidade
12) Diversificação geográfica (hedge sanitário e acesso à matéria-prima)
13) Transportar eficientemente os produtos da empresa
14) Operar em grande escala de produção
15) Agregar valor à carne do dianteiro bovino e criar novos canais de
distribuição para o produto
16) Produzir produtos tecnológicos
17) Conhecimento do mercado europeu da carne bovina
18) Gestão profissionalizada
19) Produção de produtos inovadores
20) Tradição
21) Marcas: credibilidade/ bons produtos/ confiança do cliente
22) Percepção de qualidade: qualidade/ credibilidade/ confiança do cliente
23) Relacionamento com fornecedores: capacidade de adquirir animais
padrão-exportação
Competências Essenciais
1) Acesso a recursos financeiros diferenciados (mercado de capitais,
possibilidade de abertura de capital)
2) Gestão participativa
3) Certificação – exportação canal genérico
4) Processo de armazenagem de carne bovina
5) Capacidade de adquirir animais “padrão-exportação” com certa
regularidade
6) Agregação de valor à carne do dianteiro bovino e criar novos canais
distribuição para o produto
7) Gestão profissionalizada
8) Marcas: credibilidade/ bons produtos/ confiança do cliente
9) Percepção de qualidade: qualidade/ credibilidade/ confiança do cliente
10) Relacionamento com fornecedores: capacidade de adquirir animais
padrão-exportação
Capacitações 2, 4,5, 6, 8, 9, 12, 13, 14, 16, 17, 19 e 20 não são
claramente fontes de vantagens competitivas para o Quatro Marcos, logo
são agrupamentos de recursos não estratégicos.
Recursos
1) Financeiros: Capacidade da firma se financiar
2) Estrutura formal de relatórios
3) Opinião dos funcionários
4) Empresas concorrentes/ distribuidores de carne bovina
5) Empresas concorrentes/ distribuidores de carne bovina
(internacionais)
6) Sistemas de qualidade (HACCP, por exemplo),
7) Certificação pública para exportação
8) Certificações privadas (ex.: Eurepgap)
9) Plantas industriais
10) Equipamentos de abate e desossa,
11) Mão-de-obra – abate e desossa
12) Câmaras frigoríficas
13) Matéria-prima (gado bovino para abate)
14-) Localização
15-) Recursos logísticos
16-) Escala de produção
17-) Integração carne in natura e carne industrializada
18-) Estoque de tecnologia (patentes, marcas registradas)
19) Conhecimento
20-) Capacitações gerenciais
21-) Inovação
22) Reputação com consumidores
23) Marca
24) Percepção de qualidade/ durabilidade/ confiança
25) Reputação com fornecedores
Fonte: Autor, elaborado com os dados da pesquisa e baseado em BARNEY, 1991; GRANT, 1991 (apud
HOSKISSON et. al. (2004, p. 109), DRANOVE & MARCIANO (2005, p. 51), LASSERRE (2003, p. 47)
e HOSKISSON et al. (2004, p. 115).
FIGURA 5.19 – Fluxograma das Competências Essenciais – Quatro Marcos
179
Por outro lado, tem-se também no caso do Quatro Marcos que algumas
competências essenciais são sustentáveis, enquanto outras competências são temporária,
dada a maior facilidade que os concorrentes têm em copiá-las.
A Figura 5.20 apresenta a relação das competências essenciais
sustentáveis e temporárias do Quatro Marcos.
Capacitação/
competência
cara ou difícil
de ser
imitada?
Sim
Não
Competências Essenciais Sustentáveis
1) Acesso a recursos financeiros diferenciados
2) Certificação - canal genérico
3) Marcas: credibilidade/ bons produtos/
confiança do cliente
4) Percepção de qualidade: qualidade/
credibilidade/ confiança do cliente
Competências Essenciais Temporárias
1)Gestão participativa
2) Armazenagem
3) Aquisição de animais-padrão exportação
4) Agregação de valor à carne do dianteiro
bovino (industrialização)
5) Gestão profissionalizada
6) Relacionamento com fornecedores: aquisição
de animais padrão-exportação
Quatro Marcos - Competências Essenciais
1) Acesso a recursos financeiros diferenciados
(mercado de capitais, possibilidade de abertura
de capital)
2) Gestão participativa
3) Certificação – exportação canal genérico
4) Processo de armazenagem de carne bovina
5) Capacidade de adquirir animais “padrão-
exportação” com certa regularidade
6) Agregação de valor à carne do dianteiro
bovino e criar novos canais distribuição para o
produto
7) Gestão profissionalizada
8) Marcas: credibilidade/ bons produtos/
confiança do cliente
9) Percepção de qualidade: qualidade/
credibilidade/ confiança do cliente
10) Relacionamento com fornecedores:
capacidade de adquirir animais padrão-
exportação
Fonte: Autor, elaborado com os dados da pesquisa e baseado em BARNEY, 1991; GRANT, 1991 (apud
HOSKISSON et. al. (2004, p. 109), DRANOVE & MARCIANO (2005, p. 51), LASSERRE (2003, p. 47)
e HOSKISSON et al. (2004, p. 115)).
FIGURA 5.20 - Competências Essenciais Sustentáveis x Temporárias – Quatro
Marcos
Já a Figura 5.21 apresenta um resumo dos recursos, capacitações,
competências essenciais sustentáveis e temporárias do Quatro Marcos
180
Recursos: 25
Tangíveis: 18
Intangíveis: 7
Competências Essenciais
Sustentáveis: 4
Tangíveis: 2
Intangíveis: 2
Capacitações: 23
“Tangíveis”: 16
“Intangíveis”: 7
Competências
Essenciais: 10
“Tangíveis”: 6
“Intangíveis”: 4
Competências Essenciais
Temporárias: 6
Tangíveis: 4
Intangíveis: 2
Fonte: Autor, elaborado com os dados da pesquisa.
FIGURA 5.21 – Resumo: Recursos, Capacitações e Competências Essenciais
Sustentáveis e Temporárias – Quatro Marcos
Algumas competências essenciais do Quatro Marcos merecem destaque
(mesmo que sejam competências essenciais temporárias). Em primeiro lugar, a
integração entre produção de carne in natura e industrializada é uma competência
essencial, por permitir que os frigoríficos consigam agregar valor a uma carne (os cortes
do dianteiro do boi) normalmente de menor valor agregado quando comparada com os
cortes traseiros. Por outro lado, tal integração permite ainda diminuir a elevada
volatilidade de preços associada a esta carne no mercado doméstico, bem como obter
sinergias de distribuição nos países europeus que consomem este produto.
Outra situação demonstra como a produção integrada de carne in natura
e carne industrializada é uma competência essencial dos frigoríficos que a possuem. No
atual cenário de embargo de exportações de carne in natura dos estados de São Paulo e
Mato Grosso do Sul, é possível para os frigoríficos que possuem produção integrada
venderem o produto na forma industrializada (cozido e enlatado), agregando valor para
181
um produto que seria colocado na forma in natura no mercado doméstico por conta dos
embargos.
São poucos os frigoríficos brasileiros que produzem conjuntamente carne
in natura e carne industrializada, o que corrobora o fato da produção integrada poder ser
considerada uma competência essencial. Coincidentemente, os três frigoríficos
estudados estão dentre os que possuem produção integrada de carne in natura e carne
industrializada. Pelas informações coletadas, afora os três frigoríficos estudados, apenas
a Marfrig (e possivelmente o Minerva) também possui produção integrada de carne
bovina in natura e carne industrializada.
Outra competência essencial extremamente importante e válida não
somente para o Quatro Marcos, mas também para os demais frigoríficos é a certificação
pública para a exportação.
A pesquisa demonstrou que existem recursos físicos e capacitações que
credenciam e certificam apenas um pequeno número de frigoríficos a exportar para a
União Européia. De acordo com PITELLI (2004), no ano de 2004 existiam no Brasil
aproximadamente 1.000 frigoríficos, dos quais 351 possuíam selo de certificação do
Serviço de Inspeção Federal - SIF e 67 estavam habilitados para exportação. Ainda
segundo a autora, as 67 plantas que atendiam a demanda internacional pertenciam a 17
grupos, que dividiam entre si 98% do faturamento bruto da comercialização externa.
Desta forma, a grande maioria dos frigoríficos que operam no mercado doméstico não
possui estas capacitações, não sendo, portanto, habilitados a exportar para este
continente. Logo, a certificação em si é uma competência essencial não substituível,
visto ser obrigatória para a exportação.
A principal competência essencial do Frigorífico Quatro Marcos diz
respeito ao reconhecimento pelos importadores da qualidade de seu produto, o que vem
associado com o fortalecimento das marcas do Quatro Marcos no mercado europeu.
Este processo veio impulsionado pela segunda principal competência
essencial do Frigorífico Quatro Marcos, que é a gestão participativa.
Explica-se: historicamente o Quatro Marcos sempre foi um frigorífico
muito fechado, com poder extremamente centralizado nas mãos de seus controladores,
com pouca delegação de tarefas e competição acirrada entre as diversas áreas e
departamentos da empresa. Nos últimos dois anos este cenário vem sendo alterado, em
182
um processo coordenado pela área comercial da empresa, que vislumbrou a grande
janela de oportunidades que estava (e ainda está) em curso para as exportações
brasileiras de carne bovina e que acabou motivando uma mudança no foco da gestão da
empresa. Atualmente, os controladores da empresa ocupam-se com questões de caráter
estratégico, como novos investimentos e expansão da empresa, enquanto que a gestão
cotidiana da empresa foi delegada a jovens executivos, que revigoraram a empresa.
Do ponto de vista da qualidade da carne, esta mudança na filosofia de
gestão da empresa teve o seguinte impacto: até então o Quatro Marcos trabalhava em
um processo de certa forma “empurrado” pela área de compras de bovinos e pela área
industrial, ou seja, a escala de abates e processo de desossa eram realizados sem grande
sintonia com a área comercial da empresa no que tange às especificações do produto,
que em princípio deveriam estar em acordo com os pedidos dos clientes finais.
Com este processo de gestão participativa, o fluxograma do processo
industrial se inverteu, ou seja, ele é agora “puxado” pela área comercial da empresa que
opera em sintonia com a área de Planejamento e Controle da Produção, adequando os
estoques e escalas de abate de acordo com as especificações dos clientes e de acordo
com uma visão mais realista do mercado.
Com este mudança de foco, a empresa está conseguindo melhorar a
qualidade (e a percepção de qualidade) de seus produtos, o que está auxiliando no
processo de consolidação das marcas do Quatro Marcos no mercado europeu e o
estreitamento do seu relacionamento com os importadores, o que é um item
fundamental para a empresa expandir suas exportações para este mercado.
Interessante notar que na medida em que o Quatro Marcos avança no
quesito “qualidade do produto” e “fortalecimento da marca”’, a atual estrutura de
distribuição da empresa não se mostra a mais apropriada, pois não permite a ela obter o
retorno dos investimentos realizados na melhoria da qualidade e agregação de valor aos
seus produtos, conforme mencionado no tópico anterior.
Em termos de capacidade de armazenamento, o fato dea empresa até
pouco atrás possuir capacidade de armazenamento limitada em sua planta industrial de
São José do Quatro Marcos fazia com que ela tivesse limitada sua capacidade de
exportação, restingia a existência de grandes estoques e praticamente obrigava a
empresa a operar em um sistema just-in-time, ainda em vigor. Desta forma, a empresa
183
trabalha “vendida” entre 20 a 25 dias, ou seja, com pedidos de compra já formalizados
para os próximos 20 a 25 dias, de forma a poder programar suas escalas de abate de
acordo com os pedidos dos clientes. Ainda, a empresa possui capacidade de abate de
7.200 cabeças por dia, mas vem operando com o nível de abate em torno de 5.500 a
6.00 cabeças por dia, justamente por conta desta limitação na capacidade de
resfriamento e armazenagem de produto in natura da empresa. Com isso a capacidade
de abate potencial não está sendo atingida, fazendo com que a empresa não consiga
maximizar o uso de suas instalações de abate.
Em termos de acesso a capital, mesmo o Quatro Marcos, que tem sido
historicamente mais conservador do que seus concorrentes, está iniciando seu processo
de captação de recursos no mercado financeiro internacional. De acordo com notícia do
jornal Valor Econômico de 02 de outubro de 2007, o Frigorífico Quatro Marcos obteve
em agosto de 2007 US$ 125 milhões, pelo prazo de vencimento de três anos, sem
amortizações, ao custo de Libor, taxa interbancária de Londres, mais 5% ao ano. De
todo modo, é uma competência essencial que ainda se manifestará, muito possivelmente
de forma positiva na empresa.
184
5.4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
O presente tópico “Análise e Discussão dos Resultados” sintetiza os
resultados obtidos nos estudos de caso e será dividido em duas seções, sendo a primeira
referente à estruturação dos canais de distribuição da carne bovina brasileira na Europa
e a segunda seção referente às competências essenciais, e como estas afetam as
estruturas de distribuição dos frigoríficos analisados na presente pesquisa.
5.4.1 Canais de Distribuição da Carne Bovina Brasileira na Europa
A análise dos dados da pesquisa demonstra que em termos de canais de
distribuição na Europa, observa-se uma distinção entre os estágios de desenvolvimento
de cada empresa.
A Bertin Alimentos é a empresa estudada que há mais tempo exporta
para Europa, possuindo, portanto, maior tempo de relacionamento com clientes no
continente europeu. Como a empresa possui a estratégia de agregar valor aos seus
produtos, ela passou a efetuar a distribuição própria de seus produtos em território
europeu, pois no modelo antigo de distribuição, baseado em uma parceria com um
agente comercial comissionado, era este agente quem captava boa parte do valor
agregado pela Bertin para seus produtos. No novo modelo, a empresa consegue maiores
margens comerciais ao eliminar intermediários, bem como consegue trabalhar mais
próximo do cliente final, de forma a consolidar a marca Bertin. Porém, os riscos são
maiores pois o tempo de recebimento das vendas é maior do que no esquema de
distribuição antigo, o que pode ser bastante arriscado em um mercado bastante volátil,
como é o mercado europeu de carne bovina.
Desta forma, a estratégia de distribuição da Bertin é condizente com
aquela preconizada por TERPSTRA & SARATHY (2000), que afirmam que uma vez
que a firma tenha estabelecido sua estratégia para adentrar os mercados internacionais,
seu próximo desafio é efetivamente fazer a distribuição dos produtos nestes mercados.
Após a pergunta ‘como eu faço meus produtos chegarem aos mercados internacionais?’,
surge a pergunta ‘como eu faço para distribuir meus produtos nos mercados
internacionais?’.
185
A JBS está em uma fase de transição entre uma distribuição realizada
majoritariamente por trading companies (que é o que ocorria em 2004) para uma
estrutura própria de distribuição, o que deve ocorrer em no máximo 3 ano, segundo
previsão da própria empresa. Por ora, a JBS está operando com vários escritórios de
representação atuando como agentes comerciais, em um processo de aproximação
comercial com fábricas de carnes na Europa, redes de supermercado e food services.
Neste processo de verticalização a jusante, que deve culminar com a instalação do
esquema de distribuição próprio, reduz-se bastante a participação das trading companies
nas importações e distribuição da carne da JBS na Europa.
Na verdade, este processo de verticalização da distribuição da JBS na
Europa parece fazer parte de um projeto muito maior que está sendo operacionalizado
pela empresa, que é seu processo de internacionalização. Nos últimos dois anos a
empresa acelerou seu processo de internacionalização, passando de um frigorífico de
grande porte em escala nacional para se tornar um dos grandes players mundiais de
carne bovina, com operações nos principais países produtores de carne bovina no
mundo: Brasil, Estados Unidos, Argentina e Austrália. Neste sentido, o maior controle
de sua distribuição em continente europeu, um de seus mercados-chave, parece fazer
todo sentido neste processo de internacionalização posto em prática pela empresa, além
de possibilitar maiores margens comerciais. A contrapartida é o maior risco envolvido
no processo, semelhantemente ao caso da Bertin Alimentos.
Naturalmente este processo de verticalização no canal de distribuição tem
que ser realizado de forma gradativa, que é o que vem sendo realizado pela empresa.
Em primeiro lugar, existe uma curva de aprendizagem neste processo de efetuar a
distribuição própria em países estrangeiros. Além disso, existe o fato de que ao
intensificar o processo de distribuição próprio, a empresa passará a competir com seus
atuais clientes, que são justamente aqueles que proporcionaram sua expansão em
território europeu até o momento.
Interessante notar que essa mudança na estrutura de distribuição na
Europa traz sérios impactos operacionais na JBS. Até mesmo por sua escala de abate/
produção, a JBS tinha seu foco baseado na produção de carne “commodity”, sem
maiores atributos de qualidade. Este esquema de produção era condizente com o
esquema de distribuição na Europa: carne com menor valor agregado, sendo distribuído
186
de maneira "genérica" por trading companies, que se encarregavam de fazer a
distribuição no continente europeu. Na medida em que ao JBS se aproxima do
consumidor final, ocorre uma mudança no foco de qualidade, com necessidade de
readequação logística, por exemplo, para garantir o frescor da carne bovina distribuída
na Europa, principalmente para o porcionamento. Neste sentido, em apenas 3 anos, a
empresa conseguiu reduzir pela metade o tempo que a carne resfriada chega à Europa,
aumentando seu frescor e shelf life , que são atributos valorizados pelo importador. A
pontualidade de entrega também é um atributo valorizado pelo importador e se
interelaciona com os demais fatores. Até mesmo por conta de sua grande escala de
produção, a pontualidade da JBS é reconhecida até mesmo pelos seus concorrentes.
Existe a necessidade de pontualidade por conta do grande volume exportado pela JBS e
pela dificuldade que seria trabalhar com grandes estoques.
Dois pontos são interessantes no que se refere à utilização de distribuição
própria, pontos esses que se relacionam tanto para a Bertin Alimentos quanto para a
JBS. Em primeiro lugar, o fator escala de produção (e vendas/ exportação) parece ser
um fator que justifica a adoção de estruturas próprias de distribuição, que são mais
custosas do que a distribuição realizada por terceiros. Isso porque, quanto maior a escala
de distribuição, mais diluídas ficarão as despesas de distribuição (em termos de
despesas unitárias). Coincidentemente, a estrutura própria de distribuição é realizada
pela Bertin Alimentos e será realizada pela JBS, que são justamente os maiores
frigoríficos exportadores de carne bovina do Brasil, conjuntamente com a Marfrig, que
também está no início da operacionalização de seu processo de distribuição própria,
segundo informações coletadas junto à uma das empresas da amostra.
Dentro desta ótica de escala de produção, faz todo sentido neste primeiro
instante o Quatro Marcos operar através de distribuidores/ trading companies e não
através de um esquema próprio de distribuição. Isso porque, mesmo se posicionando
dentre os maiores frigoríficos exportadores de carne bovina do Brasil, sua escala de
vendas (exportações) ainda é pequena quando comparada às da Bertin e da JBS e
possivelmente pequena para a adoção de estrutura própria de distribuição (as
exportações do Quatro Marcos foram aproximadamente ¼ das exportações da Bertin em
2006 – dados estimados ). Além disso, apesar de ser um dos frigorífico já tradicional
nas exportações de carne bovina, o fato é que o grosso das vendas do Quatro Marcos é
187
realizado no mercado doméstico. A utilização de intermediários no canal de distribuição
europeu, que é bastante complexo, dada a capilaridade do varejo europeu, é interessante
para o Quatro Marcos, pois possibilita e simplifica a exportação de carne bovina para a
Europa, ao mesmo tempo em que possibilita ao frigorífico manter seu foco de
distribuição da carne bovina no mercado doméstico.
Com isso, na estrutura de distribuição do Quatro Marcos fica clara a
importância dos intermediários, pois eles, por ora, conseguem realizar a distribuição da
carne bovina da empresa ao varejista europeu de maneira mais eficiente para a empresa.
A estruturação dos canais de distribuição do Quatro Marcos é portanto,
apoiada nos conceitos de FERREL & HARTLINE (2005), que afirmam que ao longo dos
canais de distribuição, algumas empresas são boas em manufatura, enquanto que outras são
eficientes em transporte ou armazenamento e outras ainda são boas em vender para os
consumidores. Dados os custos envolvidos, é virtualmente impossível para uma única
empresa realizar todas as funções do canal de distribuição.
Entretanto, como o Quatro Marcos está se estruturando para aumentar as
exportações de carne bovina para a Europa: com a construção de novos frigoríficos e
instalação de câmaras frigoríficas na planta de São José dos Quatro Marcos, é possível
que a empresa tenha que rever sua estrutura de distribuição na Europa no futuro
próximo, principalmente pelo fato de estar investindo bastante na melhoria da
qualidade de seus produtos e fortalecimento de sua marcas. Desta forma, a estratégia de
agregação de valor não será mais condizente com esta estratégia de distribuição
genérica de carne commodity atualmente posta em prática pela empresa. Na verdade, a
empresa parece seguir os passos da JBS, que iniciou suas exportações para a União
Européia através do uso de trading companies/ atacadistas no canal de distribuição.
Por fim, a estrutura de distribuição própria na Europa parece fazer
sentido em um esquema mais amplo de distribuição de proteína animal no continente
europeu. Como existe muita sobreposição entre os clientes de todos os tipos de carnes,
através da distribuição própria será possível para a Bertin Alimentos e a JBS distribuir
outras carnes no continente europeu. Não por acaso, foi recentemente anunciado na
mídia nacional a intenção da Bertin Alimentos entrar no mercado de carne suína e carne
de frango. Noticiou-se que isso seria uma forma de retaliação da empresa ao fato de a
Perdigão ter recentemente iniciado suas operações com carne bovina e também ao fato
188
de a Sadia ter anunciado seu retorno a este mercado, depois de anos ausente. De todo
modo, a complementaridade entre as diferentes carnes em um esquema próprio de
distribuição de carnes na Europa também pode ser sido um fator motivador para a
suposta entrada da Bertin Alimentos na produção e distribuição de carne suína e de
frango.
5.4.2 Competências Essenciais e Distribuição da Carne Bovina Brasileira na Europa
A análise das competências essenciais que impactam a distribuição da
carne bovina buscou responder a questão abaixo:
“Sob o ponto de vista dos frigoríficos brasileiros exportadores de carne
bovina, quais são as competências essenciais necessárias para que estas empresas
conquistem os mercados internacionais, principalmente o mercado europeu, e como
estes exportadores estruturam seus canais de distribuição nestes mercados?”
Dada a forte correlação existente entre recursos, capacitações e
competências essenciais, o ponto de partida para a determinação das competências
essenciais foi o mapeamento dos principais recursos e capacitações dos frigoríficos
analisados.
Desta forma, a pesquisa de campo identificou e determinou 25 recursos,
que são os insumos básicos para o processo produtivo ou estão à disposição dos
frigoríficos analisados, sendo que 18 deles são tangíveis e 7 são intangíveis.
Dos 25 recursos identificados na pesquisa, foram identificadas 23
capacitações. Uma capacitação é uma série de recursos integrados, ou o resultado dos
recursos trabalhando em conjunto para realizar tarefas produtivas.
Desta forma, os 25 recursos combinam-se de forma a gerar 23 tarefas
produtivas, ou capacitações diferentes. Alguns recursos, como mão-de-obra (nas linhas
de abate e desossa), equipamentos e a própria linha de abate e desossa geram uma única
capacitação, no caso a capacitação “processo de abate e desossa”. Outros recursos,
como “marca” e “percepção de qualidade” geram capacitações muito próximas, mas que
189
possuem importância no contexto da análise das competências essenciais dos
frigoríficos estudados, sendo, portanto, tratadas isoladamente.
O Quadro 5.12 apresenta os principais recursos e capacitações tangíveis
dos frigoríficos analisados. Ele corresponde exatamente ao Quadro 5.3, Quadro 5.6 e
Quadro 5.10, dos estudos de caso da Bertin, JBS e Quatro Marcos, respectivamente.
QUADRO 5.12 – Recursos e Capacitações Tangíveis Conjunto dos Frigoríficos
Estudados
Recurso Descrição Capacitação
Financeiro Capacidade da firma se financiar.
Acesso a mercado de capitais (nacional e internacional).
Estruturação de operações de Eurobonds e abertura de
capital.
Organizacional
A estrutura formal de relatórios da empresa, que inclui seus sistemas
formais de planejamento, controle e coordenação.
Governança Corporativa
Organizacional Opinião dos funcionários Gestão participativa
Organizacional Empresas concorrentes, distribuidores de carne bovina Estratégia de crescimento via fusões & aquisições
Organizacional Empresas concorrentes, distribuidores de carne bovina (internacionais) Internacionalização
Organizacional Sistemas de Qualidade (HACCP, BPF, ISO) Controle de processos
Organizacional Certificação Pública para Exportação (inclui rastreabilidade)
Habilitação para exportação para canal de distribuição
genérico
Organizacional Certificações Privadas (Ex.: Eurepgap, BRC etc.)
Habilitação para exportação para canal de distribuição
bastante específico
Físico Plantas industriais Processo de abate e desossa
Físico Equipamentos de abate e desossa Processo de abate e desossa
Físico Mão-de-obra - linhas de abate e deossa Processo de abate e desossa
Físico Câmaras frigoríficas Processo de armazenagem da carne bovina
Físico Matéria-prima
Capacidade de adquirir animais "padrão-exportação" com
certa regularidade.
Físico Localização
Acesso à matéria-prima (principais praças pecuárias);
diversificação geográfica
Físico Recursos logísticos em geral Transportar eficientemente os produtos da empresa
Físico Escala de Produção Operar em grande escala de produção
Físico Integração entre produção de carne
in natura
e carne industrializada
Agregar valor à carne do dianteiro bovino e criar novos
canais de distribuição para este produto
Tecnológico
"Estoque" de tecnologia como patentes,
trademarks
(marcas registradas)
e
copyrights
(direitos autorais).
Produtos com alto uso de tecnologia de processamento
Fonte: Autor, elaborado com os dados da pesquisa e baseado em BARNEY, 1991; GRANT, 1991 (apud
HOSKISSON et. al. (2004, p. 109)
).
Já o Quadro 5.13 abaixo apresenta os principais recursos e capacitações
intangíveis dos frigoríficos analisados. Ele corresponde exatamente ao Quadro 5.4,
190
Quadro 5.7 e Quadro 5.11, dos estudos de caso da Bertin, JBS e Quatro Marcos,
respectivamente.
A manutenção dos Quadros nos estudos de caso e na análise e discussão
dos resultados foi proposital, de forma a demonstrar que os recursos e capacitações
mapeados e definidos na pesquisa de campo são comuns, em maior ou menor escala,
aos frigoríficos analisados e foram o ponto de partida para a determinação das
competências essenciais de cada frigorífico.
QUADRO 5.13 – Recursos e Capacitações Intangíveis – Conjunto dos Frigoríficos
Estudados
Recurso Descrição Capacitação
Humano Conhecimento Conhecimento do mercado europeu da carne bovina.
Humano Capacitações Gerenciais Gestão profissionalizada
Inovador Idéias/ Capacitações científicas/ capacidade em inovar
Pequena importância na indústria da carne bovina
(principalmente in natura )
Reputacional Reputação com consumidores Tradição
Reputacional Marca
Oferececimento de bons produtos aumentando confiança do
cliente.
Reputacional Percepção de qualidade, durabilidade e confiança nos produtos.
Oferececimento de bons produtos aumentando confiança do
cliente.
Reputacional
Reputação com fornecedores, de forma a criar interações e relações
mutamente eficientes e eficazes.
Capacidade de adquirir animais "padrão-exportação" com
certa regularidade.
Fonte: Autor, elaborado com os dados da pesquisa e baseado em BARNEY, 1991; GRANT, 1991 (apud
HOSKISSON et. al. (2004, p. 109)).
O passo seguinte e de extrema importância foi analisar quais destes
recursos e capacitações geram vantagens competitivas para os frigoríficos analisados.
Esta análise foi realizada de maneira individualizada para cada frigorífico nos estudos
de caso. Destaca-se que as competências essenciais não são obrigatoriamente comuns
aos frigoríficos estudados, apesar disso poder ocorrer. Ou seja, uma mesma competência
pode ser, mas não obrigatoriamente é, comum a dois ou mais frigoríficos.
Entretanto, no presente tópico, as competências essenciais de cada
frigorífico foram agrupadas de forma a determinar quais são as competências essenciais
do conjunto dos frigoríficos estudados. Desta forma, a partir deste momento, os quadros
e figuras apresentados diferem daqueles apresentados individualmente em casa estudo
191
de caso e representam a somatória das competências essenciais de todos os frigoríficos
estudados.
Foram identificadas 19 competências essenciais conjuntas dentre os
frigoríficos analisados na pesquisa, que compõem as competências essenciais deste
pequeno, porém representativo, grupo de frigoríficos brasileiros, grandes exportadores
de carne bovina.
A Figura 5.22 apresenta o fluxograma das competências essenciais dos
frigoríficos estudados, começando pela relação de todos os recursos, tangíveis e
intangíveis, suas respectivas capacitações e a relação das capacitações que são fontes de
vantagem competitiva para os frigoríficos estudados, ou seja, são as competências
essenciais deste grupo de frigoríficos da pesquisa Estas competências essenciais afetam
em diferentes graus a capacidade de exportação deste conjunto de frigoríficos e a
estruturação de seus canais de distribuição na Europa, ou seja, a importância relativa das
mesmas não é homogênea para todos eles. Em alguns casos, determinada(s)
competência(s) detém um peso mais significativo do que em outro(s), mas de forma
geral todas elas podem ser identificadas nos casos estudados.
192
Capacitações
1) Acesso a recursos financeiros diferenciados (mercado de capitais,
possibilidade de abertura de capital)
2) Governança corporativa
3) Gestão participativa
4) Estratégia de crescimento via fusões & aquisições
5) Internacionalização
6) Sistemas de qualidade/ controle de processos
7) Certificação – exportação canal genérico
8) Certificação – exportação canal específico
9) Processo de abate e desossa
10) Processo de armazenagem de carne bovina
11) Capacidade de adquirir animais “padrão-exportação” com certa
regularidade
12) Diversificação geográfica (hedge sanitário e acesso à matéria-prima)
13) Transportar eficientemente os produtos da empresa
14) Operar em grande escala de produção
15) Agregar valor à carne do dianteiro bovino e criar novos canais de
distribuição para o produto
16) Produzir produtos tecnológicos
17) Conhecimento do mercado europeu da carne bovina
18) Gestão profissionalizada
19) Produção de produtos inovadores
20) Tradição
21) Marcas: credibilidade/ bons produtos/ confiança do cliente
22) Percepção de qualidade: qualidade/ credibilidade/ confiança do cliente
23) Relacionamento com fornecedores: capacidade de adquirir animais
padrão-exportação
Competências Essenciais
1) Acesso a recursos financeiros diferenciados (mercado de capitais,
possibilidade de abertura de capital)
2) Governança corporativa
3) Gestão participativa
4) Estratégia de crescimento via fusões & aquisições
5) Internacionalização
6) Certificação – exportação canal genérico
7) Certificação – exportação canal específico
8) Processo de armazenagem de carne bovina
9) Capacidade de adquirir animais “padrão-exportação” com certa
regularidade
10) Diversificação geográfica (hedge sanitário e acesso à matéria-prima)
11) Transportar eficientemente os produtos da empresa
12) Operar em grande escala de produção
13) Agregação de valor à carne do dianteiro bovino e criar novos canais
de distribuição para o produto
14) Conhecimento do mercado europeu da carne bovina
15) Gestão profissionalizada
16) Tradição
17) Marcas: credibilidade/ bons produtos/ confiança do cliente
18) Percepção de qualidade: qualidade/ credibilidade/ confiança do cliente
19) Relacionamento com fornecedores: capacidade de adquirir animais
padrão-exportação
Capacitações 6, 9, 16 e 19 não são claramente fontes de vantagens
competitivas para os frigoríficos pesquisados, logo são agrupamentos de
recursos não estratégicos.
Recursos
1) Financeiros: Capacidade da firma se financiar
2) Estrutura formal de relatórios
3) Opinião dos funcionários
4) Empresas concorrentes/ distribuidores de carne bovina
5) Empresas concorrentes/ distribuidores de carne bovina
(internacionais)
6) Sistemas de qualidade (HACCP, por exemplo),
7) Certificação pública para exportação
8) Certificações privadas (ex.: Eurepgap)
9) Plantas industriais
10) Equipamentos de abate e desossa,
11) Mão-de-obra – abate e desossa
12) Câmaras frigoríficas
13) Matéria-prima (gado bovino para abate)
14-) Localização
15-) Recursos logísticos
16-) Escala de produção
17-) Integração carne in natura e carne industrializada
18-) Estoque de tecnologia (patentes, marcas registradas)
19) Conhecimento
20-) Capacitações gerenciais
21-) Inovação
22) Reputação com consumidores
23) Marca
24) Percepção de qualidade/ durabilidade/ confiança
25) Reputação com fornecedores
Fonte: Autor, elaborado com os dados da pesquisa e baseado em BARNEY, 1991; GRANT, 1991 (apud
HOSKISSON et. al. (2004, p. 109), DRANOVE & MARCIANO (2005, p. 51), LASSERRE (2003, p. 47)
e HOSKISSON et al. (2004, p. 115).
FIGURA 5.22 – Fluxograma das Competências Essenciais – Conjunto dos
Frigoríficos Estudados
193
Por fim, visto que nem todas as competências essenciais são sustentáveis,
elaborou-se a Figura 5.23. Esta figura demonstra quais das competências essenciais do
conjunto de frigoríficos estudados são sustentáveis e quais são temporárias, visto serem
fáceis (ou baratas) de serem imitadas.
Frigoríficos Estudados – Competências Essenciais
1) Acesso a recursos financeiros diferenciados
(mercado de capitais, possibilidade de abertura de
capital)
2) Governança corporativa
3) Gestão participativa
4) Estratégia de crescimento via fusões & aquisições
5) Internacionalização
6) Certificação - canal genérico
7) Certificação - canal específico
8) Processo de Armazenagem de Carne Bovina
9) Capacidade de adquirir animais padrão-exportação
10) Diversificação geográfica (hedge sanitário)
11) Transportar eficientemente os produtos da
empresa
12) Operar em escala de produção
13) Agregação de valor à carne do dianteiro bovino
(industrialização)
14) Conhecimento do mercado europeu de carne
bovina
15-) Gestão profissionalizada
16-) Tradição
17-) Marcas: oferecimento de bons produtos/
credibilidade
18-) Percepção de qualidade: oferecimento de bons
produtos/ qualidade
19-) Relacionamento com fornecedores: capacidade
de adquirir animais padrão-exportação com
regularidade
Capacitação/
competência
cara ou difícil
de ser
imitada?
Sim
Não
Competências Essenciais Sustentáveis
1) Acesso a recursos financeiros diferenciados
2) Estratégia de crescimento via fusões e
aquisições
3) Internacionalização
4) Certificação - canal genérico
5) Certificação - canal específico
6) Operar em grande escala de produção
7) Conhecimento do mercado europeu de carne
bovina
8) Tradição
9) Marcas: oferecimento de bons produtos/
credibilidade
10) Percepção de qualidade: oferecimento de
bons produtos/ qualidade
Competências Essenciais Temporárias
1)Governança corporativa
2) Gestão participativa
3) Armazenagem
4) Aquisição de animais-padrão exportação
5) Diversificação geográfica
6) Transportar eficientemente os produtos da
empresa
7) Agregação de valor à carne do dianteiro
bovino (industrialização)
8) Gestão profissionalizada
9) Relacionamento com fornecedores: aquisição
de animais padrão-exportação
Fonte: Autor, elaborado com os dados da pesquisa e baseado em BARNEY, 1991; GRANT, 1991 (apud
HOSKISSON et. al. (2004, p. 109), DRANOVE & MARCIANO (2005, p. 51), LASSERRE (2003, p. 47)
e HOSKISSON et al. (2004, p. 115).)
FIGURA 5.23 - Competências Essenciais Sustentáveis x Temporárias – Conjunto
de Frigoríficos Analisados
Desta forma, nota-se que dentre as 19 competências essenciais do
conjunto de frigoríficos analisados na pesquisa, 10 competências são sustentáveis,
enquanto que 9 competências são temporárias, por serem relativamente fáceis ou
baratas de serem imitadas.
Desta forma, da combinação dos vários conceitos utilizados na presente
análise e descritos no tópico 4.6 – “Análise e Interpretação dos Dados (capítulo 4 –
Metodologia), chega-se ao seguinte resultado, expresso na Figura 5.24, que reflete os
194
recursos, capacitações e competências essenciais, sustentáveis e temporários, do
conjunto dos frigoríficos analisados na presente pesquisa.
Recursos: 25
Tangíveis: 18
Intangíveis: 7
Competências Essenciais
Sustentáveis: 10
Tangíveis: 6
Intangíveis: 4
Capacitações: 23
“Tangíveis”: 16
“Intangíveis”: 7
Competências
Essenciais: 19
“Tangíveis”: 13
“Intangíveis”: 6
Competências Essenciais
Temporárias: 9
Tangíveis: 7
Intangíveis: 2
Fonte: Autor, elaborado com os dados da pesquisa.
FIGURA 5.24 – Resumo: Recursos, Capacitações e Competências Essenciais
Sustentáveis e Temporárias – Conjunto de Frigoríficos Analisados
Nota-se, pela Figura acima, a importância dos recursos e capacitações
intangíveis na determinação das competências essenciais dos frigoríficos da amostra,
principalmente no que se refere às competências essenciais sustentáveis.
Desta forma, apesar do grande número de competências essenciais
baseadas em recursos e capacitações tangíveis, vale a pena destacar a importância das
competências essenciais que possuem origem em recursos e capacitações intangíveis
nas exportações de carne bovina para a Europa e na estruturação dos canais de
distribuição neste continente. Tais competências essenciais baseadas em recursos e
capacitações intangíveis são: conhecimento do mercado, tradição, reputação, marcas e
qualidade da carne.
195
Estas competências possuem componentes que impactam os
relacionamentos no canal e permitem aos frigoríficos analisados paulatinamente
estabelecerem relações de longo prazo com seus clientes no mercado europeu, como é o
caso da Bertin (principalmente) e JBS. Desta forma, tem-se uma situação em que as
competências essenciais baseadas em recursos e capacitações tangíveis “suportam”
aquelas baseadas em recursos intangíveis. Em outras palavras, as “competências
tangíveis” garantem a oferta adequada de carne bovina em padrões de qualidade
específicos para a exportação, mas são as “competências intangíveis” que estreitam o
relacionamento entre as partes no canal de distribuição, possibilitando a criação de
vantagem competitivas sustentáveis, conforme explicitado por ROSENBLOOM (1999)
e FERREL & HARTLINE (2005).
196
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os últimos 20 anos foram cenário de uma interessante mudança de foco
na literatura sobre estratégia empresarial. Durante a década de 1980, o conceito de
análise do posicionamento de PORTER reinou como modelo básico para determinar a
competitividade das empresas. Este modelo considera primordialmente a análise do
ambiente externo na determinação das vantagens competitivas das empresas. Durante a
década de 1990 começaram a surgir trabalhos que estabeleciam que a fonte de vantagem
competitiva das empresas se encontra principalmente no âmbito interno das firmas (na
verdade, um resgate de trabalhos originalmente publicados na década de 1950 e 1960).
Recursos e capacitações superiores são fontes geradoras de competências essenciais,
que, por sua vez, garantem vantagens competitivas sustentáveis para as empresas. O
conceito de competências essenciais foi estabelecido por PRAHALAD & HAMEL, em
1990, tendo sido este conceito um dos principais norteadores do referencial teórico para
parte da presente pesquisa.
Por outro lado, nota-se na bibliografia recente da área de marketing uma
evolução na importância dada aos canais de distribuição. Cada vez mais a distribuição é
considerada uma fonte de vantagens competitivas sustentáveis, pelo fato de envolver
relacionamentos de longo prazo entre as partes constituintes do canal (agentes do canal).
Simultaneamente às evoluções nos campos teóricos que suportam a
presente pesquisa, nota-se uma importância relativa cada vez maior do Brasil no
mercado internacional da carne bovina. Nos últimos anos o Brasil ganhou destaque
como o maior exportador mundial de carne bovina, depois de historicamente ocupar
uma posição de pouco destaque no comércio internacional deste produto.
Com o aumento da importância do Brasil como exportador de carne
bovina cresce cria-se a necessidade do estudo dos canais de distribuição utilizados pelos
exportadores de carne bovina brasileira para os mercados internacionais, com destaque
para a União Européia, que é um dos principais importadores do produto brasileiro.
A partir da análise e discussão dos resultados realizada, acredita-se que o
principal objetivo da presente dissertação tenha sido atendido, ou seja, analisou-se como
alguns dos principais frigoríficos brasileiros estruturam suas estruturas de distribuição
197
da carne bovina em território europeu e analisou-se quais são as competências
essenciais que alguns dos principais frigoríficos nacionais de carne bovina possuem e
que alavancam suas exportações de carne bovina para a Europa.
Umas das proposições iniciais desta pesquisa era que os frigoríficos
participam de diferentes estruturas de distribuição nos mercados internacionais. Esta
proposição norteou parte do objetivo principal da pesquisa, que buscou analisar a atual
estrutura dos canais de distribuição da carne bovina brasileira no mercado europeu.
No que tange à estruturação dos canais de distribuição na Europa, a
pesquisa demonstrou haver uma grande diversidade entre os modelos adotados dentre os
frigoríficos analisados. Existe uma estrutura de distribuição baseada na utilização de
intermediários no canal (trading companies e distribuidores), como é o caso do Quatro
Marcos, até o esquema de distribuição própria da Bertin Alimentos, passando por um
modelo intermediário de distribuição, como é o caso do realizado pela JBS.
Outra proposição que norteou o presente trabalho é que existem critérios
normativos e institucionais que regulamentam as exportações brasileiras de carne
bovina para a União Européia, sendo que nem todos os frigoríficos de carne bovina no
Brasil atendem tais capacitações. Esta proposição norteou a análise de quais são as
capacitações legais e normativas necessárias para os frigoríficos/ indústria de alimentos
exportarem para a União Européia.
A pesquisa demonstra que de fato existe uma série de critérios
normativos e institucionais que os frigoríficos devem cumprir para obter a certificação
para a exportação para a União Européia. A pesquisa também demonstra que de fato são
poucos os frigoríficos que conseguem atingir tais critérios de certificação, ou seja, que
possuem recursos e capacitações que os qualificam para exportar para a União
Européia, inclusive existindo alguns casos em que apenas uma planta industrial de
determinado frigorífico possui certificação para exportar. Desta forma, o próprio
processo de certificação pública é uma importante competência essencial dos
frigoríficos analisados.
Na medida em que os processos privados de certificação, como, por
exemplo, a certificação Eurepgap, ganham importância no mercado europeu da carne
bovina, maior a tendência de que estas certificações se fortaleçam como competências
essenciais dos frigoríficos que as possuem.
198
A pesquisa partiu, também, de outra proposição, a de que os frigoríficos
exportadores de carne bovina possuem competências essenciais que os tornam
competitivos para exportar (em relação aos frigoríficos/ indústrias que somente atendem
o mercado interno). Esta proposição foi importante para suportar o objetivo geral da
pesquisa, que buscou analisar as competências essenciais dos principais frigoríficos
exportadores de carne bovina no Brasil e como estas competências essenciais impactam
a estruturação dos canais de distribuição da carne bovina brasileira na Europa.
Existem competências essenciais de natureza tangível, como escala de
abate, capacidade de armazenamento, localização etc. Porém a conclusão mais
interessante da pesquisa é que as principais competências essenciais dos frigoríficos
analisados dizem respeito a recursos e capacitações intangíveis, como tradição,
conhecimento de mercado, qualidade da carne etc.
Por fim, a pesquisa partiu da proposição de que as estruturas de
distribuição da carne bovina brasileira na Europa são influenciadas pelas competências
essenciais dos frigoríficos analisados. Esta proposição ajudou analisar como as
competências essenciais impactam a estruturação dos canais de distribuição da carne
bovina brasileira na Europa,
Nota-se pela pesquisa que, de forma geral, as principais competências
essenciais dos frigoríficos analisados impacta a estrutura de distribuição da carne bovina
na Europa. Tome-se o exemplo da Bertin. A principal competência essencial da empresa
que influencia a distribuição de sua carne bovina na Europa é tradição e conhecimento
do mercado, tendo em vista ser o frigorífico que há mais tempo atua neste continente. O
atual nível de conhecimento do mercado europeu possibilita à empresa possuir uma
estrutura de distribuição própria, eliminando intermediários e garantindo maiores
margens de comercialização do produto em continente europeu. Esta estrutura de
distribuição também é condizente com a segunda competência essencial da empresa,
que é a qualidade da carne. Quanto maior o investimento em qualidade, maior deverá
ser o controle sobre a distribuição que o frigorífico possui e maior deverá ser a
proximidade com o cliente final, fatores esse proporcionados pela estrutura de
distribuição própria adotada pela empresa.
A expectativa é que a presente pesquisa tenha contribuído para o
enriquecimento do conhecimento sobre a cadeia agroindustrial da carne bovina no
199
Brasil, principalmente no que se refere à canais de distribuição (exportação) e
competências essenciais.
As limitações metodológicas da presente pesquisa são aquelas
relacionadas à utilização de estudos de caso como método de pesquisa. Ou seja, os
resultados obtidos no artigo não são conclusivos, tampouco exaustivos, e não devem ser
generalizados, devendo ser complementados com resultados de pesquisas futuras.
Como recomendação para pesquisas futuras, tem-se o aprofundamento do
presente trabalho, através do estudo de outros frigoríficos que não participaram da
presente pesquisa, inclusive aplicando a pesquisa em frigoríficos não exportadores, onde
se espera que um baixo nível de ocorrência das competências essenciais descritas no
presente trabalho, o que, em tese, fortaleceria ainda mais a aplicação do conceito de
competências essenciais impactando positivamente os frigoríficos exportadores. Sugere-
se também um maior foco no processo de internacionalização dos principais frigoríficos
brasileiros, tendo em vista os acontecimentos recentes neste mercado. Por fim, a
presente pesquisa seria interessante a complementação da presente pesquisa com a linha
teórica “Economia dos Custos de Transação”. Na medida em que os frigoríficos
investem na qualidade do produto e avançam a jusante nos canais de distribuição, mais
específico se torna o ativo “carne bovina”, o que, em tese, deveria impactar a maneira
pela qual os frigoríficos se relacionam contratualmente com seus clientes (grandes redes
de supermercados, por exemplo).
200
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210
APÊNDICES
APÊNDICE A – Questionário Aplicado.
A) DADOS GERAIS/ CARACTERIZAÇÃO DA EMPRESA:
1. Identificação da Empresa:
Nome: Razão Social
Endereço
Bairro
CEP
Cidade
UF
Telefone
Fax
E-mail
Nome/Cargo do responsável pelo preenchimento deste:
2. Idade da empresa
( ) menos de 5 anos ( ) entre 5 e 10 anos
( ) entre 10 e 20 anos ( ) acima de 20 anos
3. Idade da Planta Industrial
( ) menos de 5 anos ( ) entre 5 e 10 anos
( ) entre 10 e 20 anos ( ) acima de 20 anos
4. Composição do capital da empresa
Participação no Capital Total (%)
Capital Nacional Próprio
Capital Nacional Financiado
Capital Estrangeiro
Outro, qual?
5. Origem da Empresa
( ) Setor Industrial ( ) Setor Agropecuário
211
( ) Setor de Serviços ( ) Outra, qual?
6. Em que atividades a empresa opera
Setor de atividade
Capacidade
Instalada
(ton.)
Capacidade
em uso (%)
Funcionários
(número)
Própria ou
Terceirizado
(%)
Abate
Desossa parcial
Desossa completa
Industrialização
Subprodutos
Indiretos (escritório, adm.,
transporte)
Total
Obs. Médias referentes ao período de 12 meses, out/2005 - set/2006
B) ABATE E PROCESSAMENTO
1. Como avaliar seu posicionamento em relação ao ‘estado da arte’?
2. A questão locacional (como sua localização influencia seu desempenho?)
3. Que setores/áreas têm recebido investimentos (automação, novas instalações)
4. Há investimentos previstos em modernização?
5. Nível de uso da capacidade (quanto e por quê) / questões de escala.
C) SUPRIMENTOS
1. Questão genérica (avaliação geral da eficiência do sistema).
2. Formas de aquisição de animais (mercado aberto, contratos, etc.)
3. Práticas de pagamento (determinação de preço, peso vivo, avaliação carcaça,
etc.; prazos)
212
4. Existe algum programa/preocupação para melhora da qualidade do animal
abatido (idade, sexo, raça, peso médio, procedência, etc.)
5. Existem fornecedores de animais específicos para a exportação (e para a
rastreabilidade)? Se sim, quais as características exigidas destes animais?
6. Desde quando se relacionam os fornecedores de animais para exportação?
7. Qual o processo de negociação com estes fornecedores? (tempo, dificuldade,
necessidade de intermediador).
8. Existe intermediário que entrega animal para exportação? Se sim, são animais
diferenciados? Como garantir a rastreabilidade?
9. O frigorífico desenvolve algum tipo de trabalho com os pecuaristas para garantir
a rastreabilidade? Qual?
D) RASTREABILIDADE/ CERTIFICAÇÕES
1. Pergunta genérica: Quais são as certificações necessárias para exportação para a
União Européia?
2. Quais são os pré-requisitos necessários para a obtenção destes certificados?
3. Quais são os certificados privados que a empresa possui? Impacto (atual e
futuro) nas exportações para a União Européia?
E) RECURSOS, CAPACITAÇÕES E COMPETÊNCIAIS ESSENCIAIS
4. Recursos (pergunta genérica): Em sua opinião, quais são os principais recursos
que a empresa dispõe para obter vantagens competitivas?
213
5. Quais recursos a empresa precisa obter para melhorar seu posicionamento
competitivo?
6. Capacitações (pergunta genérica): Em sua opinião, quais são as principais
capacitações que a empresa possui para obter vantagens competitivas?
7. Quais capacitações a empresa precisa desenvolver para melhorar seu
posicionamento competitivo?
8. Como as capacitações se transformar em competências essenciais?
9. Competências Essenciais: Em sua opinião, quais são as competências essenciais
que a empresa possui para obter vantagens competitivas?
10. Como as competências essenciais se transformar em vantagens competitivas
para a empresa?
11. Como as competências essenciais impactam as exportações para a União
Européia?
12. Qual o impacto das competências essências na estrutuação dos canais de
distribuição na União Européia?
13. Quais outras competências essenciais a empresa precisa desenvolver?
F) CANAIS DE DISTRIBUIÇÃO – EXPORTAÇÃO DE CARNE BOVINA
1. Pergunta genérica: como estão estruturados os canais de distribuição de seus
produtos na União Européia?
2. Em média, desde quando mantém relação com importadores europeus? São
sempre os mesmos?
214
3. Como foi o início do processo de negociação, ou seja, como conseguiram
comercializar com estes importadores?
4. A negociação do acordo é refeita a cada transação? (duração dos contratos)
5. Qual a quantidade de importadores europeus? Existem importadores alternativos
de fácil acesso? Como tem sido a negociação com relação à exigência da
rastreabilidade? (tempo, preço e forma de pagamento)
6. Os importadores fazem algum tipo de investimento específico?
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