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INSTITUTO DE GERIATRIA E GERONTOLOGIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM
GERONTOLOGIA BIOMÉDICA
ROSA MARIA GROSS DE ALMEIDA
CONCEPÇÃO E IMAGINÁRIO SOBRE ENVELHECIMENTO
E CONCEPÇÃO DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL: UM
ESTUDO JUNTO A POLICIAIS MILITARES NA ATIVA
Porto Alegre
2007
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL
INSTITUTO DE GERIATRIA E GERONTOLOGIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GERONTOLOGIA BIOMÉDICA
ROSA MARIA GROSS DE ALMEIDA
CONCEPÇÃO E IMAGINÁRIO SOBRE ENVELHECIMENTO E CONCEPÇÃO DE
FORMAÇÃO PROFISSIONAL: UM ESTUDO JUNTO A POLICIAIS MILITARES
NA ATIVA
Porto Alegre
2007
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ROSA MARIA GROSS DE ALMEIDA
CONCEPÇÃO E IMAGINÁRIO SOBRE ENVELHECIMENTO E CONCEPÇÃO DE
FORMAÇÃO PROFISSIONAL: UM ESTUDO JUNTO A POLICIAIS MILITARES
NA ATIVA
Tese de Doutorado em Gerontologia Biomédica.
Para obtenção de título de Doutor em Gerontologia
Biomédica
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do
Sul
Instituto de Geriatria e Gerontologia
Programa de Pós-Graduação em Gerontologia
Biomédica
Orientadora: Prof. Dr. Valdemarina Bidone de Azevedo e Souza
Porto Alegre
2007
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Bibliotecário Responsável
Ginamara Lima Jacques Pinto
CRB 10/1204
A447i Almeida, Rosa Maria Gross de
Concepção e imaginário sobre
envelhecimento e concepção de formação profissional: um estudo junto
a policiais militares na ativa / Rosa Maria Gross de Almeida. Porto
Alegre, 2007.
215 f.
Tese
(Doutorado
) – Instituto de Geriatria e Gerontologia.
Programa de Pós-Graduação em Gerontologia Biomédica. PUCRS,
2007.
Orientador: Prof. Dr. Valdemarina Bidone de Azevedo e Souza
1. Polícia Militar 2. Qualidade de Vida na Aposentadoria.
3. Envelhecimento – Aspectos Psicológicos. 4. Policiais Militares –
Aposentadoria.
I. Título.
CDD : 618.97
ROSA MARIA GROSS DE ALMEIDA
CONCEPÇÃO E IMAGINÁRIO SOBRE ENVELHECIMENTO E CONCEPÇÃO DE
FORMAÇÃO PROFISSIONAL: UM ESTUDO JUNTO A POLICIAIS MILITARES
NA ATIVA
Doutorado em Gerontologia Biomédica
Tese entregue como requisito para obtenção de título de Doutor em Gerontologia
Biomédica
Instituto de Geriatria e Gerontologia Biomédica
Programa de Pós-Graduação em Gerontologia Biomédica
Porto Alegre 23 de abril de 2007
__________________________________________________
Prof. Dr. Valdemarina Bidone de Azevedo e Souza
__________________________________________________
Prof. Dr. Maria Beatriz Radhe
__________________________________________________
Prof. Dr. Leda Lísia Portal
__________________________________________________
Prof. Dr. Sergio Antonio Carlos
DEDICATÓRIA
A todos os Policiais Militares, Policiais Civis, Policiais
Federais, Policiais Rodoviários Federais, Bombeiros
Militares e Guardas Municipais que, no decorrer destes
onze anos de trabalho, me permitiram partilhar de suas
caminhadas, com afeto e confiança, minha especial
gratidão. A estes e a todos os Profissionais Trabalhadores
da Segurança Pública, dedico este estudo.
AGRADECIMENTOS
Este trabalho é resultado foi realizado com muitas mãos e muitos corações, e agradeço a todos
e a todas que nele estão, de alguma forma presentes:
Professora Doutora Valdemarina Bidone de Azevedo e Souza, amiga e orientadora;
Márcia Beatriz Bertuol, amiga e supervisora dos conteúdos de Análise Transacional;
CAPES, com o apoio financeiro que possibilitou a realização deste estudo;
Docentes, com quem muito aprendi neste Instituto;
Secretaria Nacional de Segurança Pública do Ministério da Justiça – SENASP/MJ, através do
Departamento de Pesquisa, Análise da Informação e Desenvolvimento de Pessoal;
Diretor de Ensino da Brigada Militar do Rio Grande do Sul, que facultou a realização da
Pesquisa com os alunos do Curso Básico de Administração Policial da Brigada Militar;
Policiais Militares, alunos do Curso Básico de Administração Policial Militar da Brigada Militar do
Rio Grande do Sul, pela disposição em colaborar com este Estudo através de seus
depoimentos;
Colega e amigo Major Pedro Joel Silva da Silva, que com presteza e competência possibilitou a
realização da pesquisa junto aos alunos do Curso Básico de Administração Policial da Brigada
Militar do Rio Grande do Sul;
Colegas, que comigo partilharam alegria, conhecimento e afeto;
Letícia Machado, colega e amiga, sempre disposta a retirar do computador seus melhores
recursos;
Fabiane Azevedo de Souza, que em meio a sua própria correria encontrou tempo para ajudar
na minha;
Amigos e amigas que, na ausência que este tempo me exigiu, estiveram sempre presentes
quando precisei;
Minhas irmãs Elena, Elisabeth, Izabel e Marlene, meu irmão João Batista, afilhadas, afilhado,
sobrinhas e sobrinhos, pelo carinho, incentivo, paciência e estrutura com que me cercaram;
Meus tios, Roberto Paulo de Almeida e minha tia, Maria das Dores de Almeida, exemplos vivos
de longevidade com qualidade, através de quem agradeço também aos meus pais, João Batista
e Alvina, já falecidos.
A Deus, a quem tudo devo e, especialmente, a quem devo estas presenças e tantas
outras que aqui não nomeei, todas imprescindíveis na minha vida.
RESUMO
Introdução: Estudos sobre o envelhecimento de profissionais que atuam em
Segurança Pública se fazem necessários para que estes profissionais possam
exercer sua condição de cidadãos, com direito a construir uma vida com qualidade,
especialmente em sua velhice, na reserva. A atenção à concepção de
envelhecimento, ao imaginário associado e à formação que inclua em sua
transversalidade conteúdo de aprendizagem, qualidade de vida e aposentadoria.
Objetivo Geral: Propor pontos de referência que auxiliem na argumentação da
necessidade de políticas públicas que possibilitem aos policiais envelhecerem com
melhor qualidade de vida. Objetivos específicos: a) Analisar a concepção de
envelhecimento de policiais militares ainda na ativa, numa perspectiva psicológica,
identificando a forma como vêm convivendo com seu envelhecimento e como
pensam que deveriam envelhecer; b) Analisar a concepção de envelhecimento
implícita no imaginário associado ao fenômeno; c) Analisar a concepção de
Formação e sua articulação com a concepção e imaginário sobre envelhecimento; d)
Analisar a orientação paradigmática implícita nas concepções e no imaginário; e)
identificar contradições implícitas nos depoimentos dos participantes. Referencial
Teórico: Principal: Teoria da Complexidade de Edgar Morin; Nery, A.; Hayflick, L.;
Mafesolli, M.; Duran G.; Silva, J; Berne, E.; Hine, J.; Allen,J.; Perrenoud P.; Paquay,
P. e Wagner,M.C.; Altet, M.; Baillauqués, S. Método: Pesquisa qualitativa, numa
perspectiva dialógica implícita ao todo da complexidade em triangulação com a
semiologia de Penn, no artigo 1. Nos artigos 2 e 3 a triangulação se deu com a
fenomenologia. Resultados: No artigo 1, os principais resultados sugerem que a
concepção de envelhecimento implícita no imaginário dos policiais militares
participantes do estudo apresenta orientação paradigmática simplificadora, onde o
envelhecimento está associado basicamente à dimensão biológica. No artigo 2 são
apresentados resultados que indicam também a presença de concepção de
envelhecimento com orientação paradigmática simplificadora e de contradições
entre respostas vindas a partir de diferentes estados do ego. O artigo 3 aponta em
seus resultados, para as implicações resultantes da concepção com orientação
paradigmática simplificadora de formação profissional para um envelhecimento com
qualidade. Conclusões: Desta forma, fica confirmada a tese: Policiais em nível
intermediário, da Polícia Militar de Porto Alegre/RS têm concepções de
envelhecimento, imaginário e concepção de formação profissional simplificadoras.
Palavras-Chave: Envelhecimento; Imaginário; Formação; Complexidade;
Segurança Pública; Policiais Militares.
ABSTRACT
Introduction: Studies about the aging of these professional people that work in
Public Security Force are needed in order they can carry out their citizen
conditions, with the right to have a good life, especially when they get old and
retire. The focus at the conception of aging, to the imaginary and to a
background that includes in its transversality contents of apprenticeship of
reference for life quality and retirement. General Objective: To propose points of
reference in order to help the argumentation about the need of a Government
Policy, to make possible to the police force to age with better quality of life.
Specific Objectives: a)To analyze the aging conception of Militar Police Force
still at work, under a psychologic sight identifying the way how they are living with
their aging and how they think how they should age; b) to analyze the conception
of aging implicit at the imaginary associated to the phenomenon; c) to analyze the
background and its articulation with the conception and imaginary about aging; d)
to analyze paradigmatic orientation implicit in the conceptions and the imaginary;
e) to identify the implicit contradictions in the participants depositions.Theorical
Sources: Principal: Theory of complexity from EdgarMorin; Nery, A.; Hayflick, L.;
Mafesolli, M.; Duran, G.; Silva,J.; Berne, E.; Hine, J.; Allen, J.; Perrenoud, P.;
Paquay,P. e Wagner,M.C.; Altet, M.; Baillauquès, S. Method: Qualitative
research in a dialogic perspective implicit to the complexity in triangulation with
Penn’s semeology at article 1. At articles 2 and 3, the triangulation was with the
phenomenology. Results: In the article 1 the main results suggest that the
conception of aging implicit in the imaginary of Militar Police Force that participate
in this study shows simplifying a paradigmatic orientation where the aging is
associated basically to a biological dimension. At article 2 the results also
indicate the presence of aging concept with answers from different ego states.
The article 3 points to implications as a result of the conception with the
simplifying paradigmatic orientations of professional background for an aging with
quality. Conclusions: this way is confirmed the thesis: Police Force at an
intermediate level, from Militar Police of Porto Alegre/RS, have aging concepts,
imaginary and conception simplifying of professional background.
Key words: Aging; Imaginary; Background; Complexity; Public Security; Militar
Policement.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1: Quadro comparativo..................................................................................37
Figura 2: Matriz.......................................................................................................108
Figura 3: Depoimentos escritos dos entrevistados.................................................112
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 14
1 JUSTIFICATIVA E INTENÇÕES DO ESTUDO......................................................17
1.1 JUSTIFICATIVA ..................................................................................................17
1.2 INTENÇÕES DO ESTUDO: PROBLEMA, OBJETIVOS E TESE........................21
2 CONTEXTUALIZAÇÃO DA PROBLEMÁTICA INVESTIGADA..............................23
2.1 O ENVELHECIMENTO E SEU CONTEXTO TEÓRICO......................................23
2.2 CARACTERIZANDO O CONTEXTO ..................................................................30
2.3 SÍNTESE DA BASE TEÓRICA ADOTADA DA ANÁLISE DA REALIDADE
INVESTIGADA ..........................................................................................................32
2.3.1 Análise Transacional ........................................................................................32
2.3.2 Teoria da Complexidade ..................................................................................36
2.3.3 Qualidade de vida ............................................................................................39
2.3.4 A formação.......................................................................................................41
2.3.5 Imaginário e concepção ...................................................................................45
3 MÉTODO E METODOLOGIA.................................................................................50
3.1 FALANDO SOBRE O MÉTODO .........................................................................50
3.2 CARACTERIZANDO OS PARTICIPANTES........................................................52
3.3 DESENVOLVIMENTO DO ESTUDO ..................................................................56
3.4 COLETA E ANÁLISE DE DADOS.......................................................................58
3.5 ASPECTOS ÉTICOS...........................................................................................62
4 ANÁLISE FENOMENOLÓGICA: A DESCRIÇÃO, COMPREENSÃO E
INTERPRETAÇÃO DA CONCEPÇÃO DE ENVELHECIMENTO E DE FORMAÇÃO
..................................................................................................................................63
4.1 CONCEPÇÃO DE ENVELHECIMENTO .............................................................63
4.2 CONCEPÇÃO DE FORMAÇÃO..........................................................................80
CONCEPÇÃO DE ENVELHECIMENTO IMPLÍCITA NO IMAGINÁRIO ASSOCIADO:
UM ESTUDO JUNTO A POLICIAIS MILITARES .....................................................96
CONCEPÇÃO DE ENVELHECIMENTO: TECENDO A COMPLEXIDADE.............122
13
CONCEPÇÃO DE ENVELHECIMENTO E DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL E
SUAS IMPLICAÇÕES NA CONSTRUÇÃO DE UMA VELHICE COM QUALIDADE
................................................................................................................................157
CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................................177
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................182
ANEXOS .................................................................................................................186
ANEXO 1: TERMO DE CONSENTIMENTO INFORMADO.....................................187
ANEXO 2: TABELAS...............................................................................................188
ANEXO 3: COMITÊ DE ÉTICA ...............................................................................194
ANEXO 4: ARTIGO PUBLICADO ...........................................................................195
ANEXO 5: APRESENTAÇÃO................................................................................. 206
ANEXO 6: ESQUEMA 1..........................................................................................210
ANEXO 7: ESQUEMA 2..........................................................................................211
ANEXO 8: ESQUEMA 3..........................................................................................212
ANEXO 9: ESQUEMA 4..........................................................................................213
ANEXO 10: ESQUEMA 5........................................................................................214
ANEXO 11: ESQUEMA 6........................................................................................215
ANEXO 12: ESQUEMA 7........................................................................................216
ANEXO 13: ESQUEMA 8........................................................................................217
ANEXO 14: ESQUEMA 9........................................................................................218
ANEXO 15: ESQUEMA 10 ....................................................................................... 219
INTRODUÇÃO
Envelhecimento e Segurança Pública são dois temas que vêm ganhando
espaço de atenção no cotidiano, na mídia e na pesquisa, provavelmente em razão
do aumento da população idosa e do recrudescimento da violência, da criminalidade
e da criminalidade violenta.
O processo de envelhecimento, pelos múltiplos aspectos que envolve,
necessita ser considerado a partir de objetivos que vão além de sua dimensão
biológica, considerando a qualidade de vida dos indivíduos em sua integralidade, o
que significa considerar também as dimensões sociais, psicológicas, culturais e
educacionais relativas ao fenômeno.
No Brasil, iniciativas importantes, entre elas o Programa Nacional de
Imunização, em 1973 e, mais recentemente, o Estatuto do Idoso, aprovado em 21
de agosto de 2003, m significado, por parte das autoridades governamentais, a
possibilidade de garantir a cidadania em todas as etapas da vida, especialmente na
velhice, aos 20 milhões de brasileiros que, à época da promulgação deste último,
haviam atingido 60 anos e que, segundo dados do IBGE, serão 32 milhões até 2020.
Dentre eles estão profissionais que trabalharam durante em média 30 anos de suas
vidas, 24 horas por dia, em Segurança Pública.
As Universidades despontam como produtoras de conhecimento sobre
formação em Segurança Pública (Universidade Fluminense, Universidade Federal
do Rio Grande do Sul, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, por
exemplo), mas associado a aspectos gerontológicos e ao imaginário tem sido
prerrogativa da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
Assim sendo, são ainda incipientes os estudos que tratem do
envelhecimento dos profissionais que atuam em Segurança Pública, dificultando o
15
acesso destes profissionais aos benefícios dos avanços de estudos nesta área do
conhecimento.
Faz-se necessária especial atenção ao direito dos operadores de
Segurança Pública no sentido de construírem suas vidas com qualidade enquanto
contribuem para a qualidade de vida da sociedade, trabalhando para sua segurança.
O presente estudo qualitativo, enquanto contribuição a esta finalidade, se
constitui de três artigos em que são apresentados e discutidos resultados
provenientes de pesquisa realizada junto a 22 profissionais da Polícia Militar do
Estado do Rio Grande do Sul e que, observadas as diferentes realidades, poderá ser
replicada em outras instituições e lugares. Os dados foram coletados por
depoimento escrito.
Após elementos pré-textuais e esta introdução, o estudo está estruturado a
partir de sua justificativa que, partindo da reflexão sobre os temas envelhecimento e
Segurança Pública, traça um panorama desta problemática na realidade brasileira e
ressalta o ineditismo deste estudo voltado ao tema envelhecimento policial, tema
que não tem recebido atenção tanto por parte das instituições policiais quanto das
políticas públicas. A esta justificativa estão acrescentadas as intenções do estudo,
problemas, objetivos e tese a ser confirmada.
Seguem, a contextualização da problemática investigada, caracterizando a
Instituição Brigada Militar e os sujeitos da pesquisa e a apresentação e referencial
teórico básico sobre o qual está construído o estudo.
A seguir, é feita exposição sobre o Método e a Metodologia utilizados,
explicitando as atividades de pesquisa desenvolvidas, a partir das quais foi
elaborada a síntese da realidade investigada, finalizando com a forma como os
dados foram coletados e a sua discussão.
Esta parte do trabalho é concluída com a descrição do relato dos entrevistados
sobre concepção de envelhecimento, imaginário e concepção de formação, a partir
de análise fenomenológica.
Após é apresentado o artigo “Concepção de envelhecimento implícita no imaginário
associado: um estudo junto a Policiais Militares”, onde são apresentados os
resultados da pesquisa referentes a este foco, a partir de abordagem qualitativa,
numa perspectiva dialógica implícita ao todo da Complexidade, em triangulação
com a semiologia de Pen.
O artigo “Concepção de envelhecimento: tecendo a complexidade” trata da
concepção de envelhecimento do grupo entrevistado, a partir de aspectos
psicológicos a ela ligados, numa triangulação entre a teoria da Complexidade e a
16
teoria psicológica da Análise Transacional, com utilização do método
fenomenológico, a partir dos seguintes passos: leitura dos depoimentos escritos;
identificação das Unidades de Significado; transformação das Unidades de
Significado em Linguagem Gerontológica, quanto à concepção de envelhecimento e
Linguagem Gerontológica educacional, quanto à concepção de formação.
O terceiro artigo, “Envelhecimento e sua Interdependência com a Formação
Profissional”, trata da concepção de envelhecimento e de formação profissional
destes profissionais a partir do método fenomenológico em triangulação com o
método da complexidade.
Em sua parte final o presente estudo traz suas considerações finais,
sugestões e anexos.
17
1 JUSTIFICATIVA E INTENÇÕES DO ESTUDO
1.1 JUSTIFICATIVA
Na contemporaneidade, devido à importância e atualidade dos problemas
relacionados ao aumento da população idosa e da crise na Segurança Pública,
muito se pesquisa e escreve sobre os índices indicadores de impactos sociais do
envelhecimento populacional e da violência em suas diferentes formas de
manifestação. Sobre o profissional de Segurança, sujeito/indivíduo que exerce a
função de policial, entretanto, poucas são as pesquisas que tratam especialmente
sobre aspectos gerontológicos. Entre os estudos hoje realizados encontram-se
outras três teses em desenvolvimento no Programa de Pós-Graduação em
Gerontologia/Instituto de Geriatria e Gerontologia/PUCRS (uma sobre formação e
sobre metas motivacionais, outra sobre mal-estar).
No Brasil a Segurança Pública - sistema/totalidade - compreende os
seguintes órgãos subsistemas/partes: Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal,
Polícia Ferroviária Federal, Polícia Militar, Polícia Civil e Corpos de Bombeiros
Militares. A estas instituições e seus profissionais, conforme a Constituição Brasileira
em seu artigo 144, cabe exercer a Segurança Pública, “dever do Estado, direito e
responsabilidade de todos”, preservando a ordem pública e a incolumidade de
pessoas e patrimônios
1
.
Hoje a Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP) também
trabalha junto às Guardas Municipais no aspecto da prevenção. Portanto, o sistema
de Segurança Pública, numa perspectiva Moriniana, constitui uma totalidade que se
encontra de alguma forma representada nos subsistemas (partes) que o constituem
e que interagem dialogicamente e recursivamente entre si e com ele princípios
hologramático, dialógico e recursivo. Alterações numa das partes (subsistemas)
implica efeito nas demais partes constituintes (subsistemas interdependentes com
potencial de antagonismo, complementaridade e concorrência princípio dialógico)
e no sistema (totalidade) pelas interações estabelecidas - princípio recursivo.
2
O ineditismo do foco principal do estudo concepção de envelhecimento de
policiais na ativa da análise da realidade numa triangulação entre Berne –Análise
Transacional e Morin Teoria da Complexidade se faz presente, tanto na área da
Gerontologia quanto na de Segurança Pública e na Psicologia.
18
Analisando documentos da Secretaria Nacional de Segurança
Pública/Ministério da Justiça e na Internet, sobre a presença de aspectos
gerontológicos nos Cursos de Formação Policial no Brasil, encontra-se a referência
a uma disciplina denominada Gerontologia Policial que faz parte do currículo da
Academia de Polícia Civil do Estado de Minas Gerais e à qualidade de vida na
disciplina Motivação, Integração e Autoconhecimento, do curso de Especialização
em Segurança Pública a distância desenvolvido na Pontifícia Universidade Católica
do Rio Grande do Sul (PUCRS), em 2007.
No desenvolvimento das atividades de formação destes profissionais vem
sendo fortalecida, pela Matriz Curricular Nacional para Formação dos Profissionais
da Segurança Pública (MCN)
3
, a idéia da importância destes seres
humanos/profissionais policiais/cidadãos, com direito a receberem condições que
lhes permitam construir e manter qualidade em suas vidas e possibilitem a que
envelheçam com autonomia, independência, saúde física, podendo desempenhar
papéis sociais, permanecer ativos e desfrutar de senso de significado pessoal.
4
Profissionais que trabalham com o objetivo de segurança de outros seres
humanos precisam ser também assistidos e esta é uma necessidade de
profissionais policiais que arriscam suas vidas na segurança da sociedade. A
aproximação com eles, entretanto, tem mostrado que não a consciência de que é
preciso dar a estes profissionais uma educação gerontológica que lhes propicie
envelhecer com qualidade. Ou, seja, foram e são desassistidos em seu presente
como em seu futuro.
Estes são os argumentos que embasam a relevância para o presente
estudo sobre as concepções de envelhecimento de policiais militares na ativa, o
imaginário associado e concepções de formação. Com seus resultados pretende
contribuir para a reflexão sobre a necessidade do cotidiano e da formação destes
profissionais policiais e das políticas públicas incluírem aspectos relacionados à
Gerontologia.
A compreensão/explicação do imaginário associado à
descrição/compreensão de suas concepções de envelhecimento, de aspectos
psicológicos associados à personalidade e do papel da formação na tomada de
consciência necessária à construção de um envelhecimento com qualidade, são
finalidades do presente estudo.
19
Questões institucionais têm colaborado para a realidade constatada e este
trabalho objetiva chamar a atenção para a necessidade de maior humanização do
trabalho e do processo de formação. Isto representa relevante expressão da
responsabilidade para com seus profissionais e de superação da cultura de descarte
pela aposentadoria. Portanto, trata-se da concepção de envelhecimento e da
formação profissional de policiais militares na ativa, considerando o cidadão sob a
farda, desassistido e que exerce profissão de garantia da segurança de outros.
Este estudo volta-se para aqueles que vêm trilhando o caminho da
Segurança Pública e cujos resultados em seu processo de envelhecimento
interdependem de causas diversas: biológicas, psicológicas, sociais, culturais e
educacionais que têm levado a indesejáveis efeitos, que retroagem sobre estas
causas, modificando-as e sendo por elas modificados, numa recursividade que tem
pouco contribuído para uma vida profissional e após aposentadoria mais saudável.
Compreender as concepções e o imaginário dos profissionais participantes
do estudo representa a possibilidade de construir pontos de referência para a
formulação de políticas que contribuam para a reconstrução de concepções de
envelhecimento, abrangendo sua interdimensionalidade.
Esta compreensão/explicação precisa ser revisitada, para ser reconstruído o
sentido do envelhecimento e do trabalho do operador de Segurança Pública, para
iluminar o caminho na busca da longevidade com qualidade e de uma concepção de
envelhecimento onde não mais se tome a decrepitude por inevitável, mas que
traduza a infinita potencialidade do ser humano para crescer em direção ao melhor
de si mesmo e do mundo.
A consciência com/ciência desta necessidade virá do entendimento dos
múltiplos aspectos que envolvem suas concepções de envelhecimento e do
imaginário associado e da possibilidade de intervenção a partir da formação, o que
imprime caráter preventivo neste estudo no que se refere ao futuro dos profissionais
de Segurança Pública. A partir daí, conhecidos os resultados desta pesquisa, poder-
se-á construir hipóteses a serem testadas nas realidades que compõem a realidade
brasileira e apresentar um referencial para a formulação de políticas que possibilitem
a efetivação de atuação preventiva em relação ao envelhecimento.
Se pela tradição as instituições não incluem aspectos pertinentes a uma
educação gerontológica daqueles que ainda estão no exercício de sua função,
20
menos intensa é a possibilidade de que iniciativas desta natureza sejam oferecidas
quando já estiverem fora dela.
É importante colaborar para a ruptura com políticas que incentivam uma
“cultura” de coisificação
5
, de descarte daqueles considerados “improdutivos”.
Possivelmente seja importante refletir sobre as causas da violência partindo daí, da
forma como o status de seres humanos está perdendo espaço e significado.
Refletir sobre as soluções conjuntas adotadas numa cultura perversa de
descarte, de “descontinuidade estrutural”
6
em que a sociedade está imersa, pode
trazer compreensão/explicação sobre a violência e apontar indicadores para a
elaboração de estratégias que levem a mudanças substanciais.
O envelhecimento é um tema que se torna a cada dia mais importante e
sobre ele muito tem sido escrito.
O conhecimento sobre as próprias concepções assume relevância para
mudanças nos pensamentos, nas ações e nas atitudes em relação à própria vida e
o presente estudo poderá contribuir para a reconstrução das concepções de
envelhecimento a partir da consciência de sua importância na formação continuada
dos profissionais da área da Segurança Pública.
As concepções humanas constituem um fenômeno complexo tecido numa
rede de intra e inter-relações que, ao serem conhecidas, auxiliam na compreensão
da realidade, das manifestações comportamentais e do plano imaginário. Estão
associadas à formação de conceitos e configurações originais, constituindo matriz
para reconstrução de conceitos, a partir do desenvolvimento do pensamento
7
.
As concepções de envelhecimento e de formação implícitas no imaginário,
ambas implícitas/explícitas nas palavras e expressões escritas dos participantes da
pesquisa, apresentam articulação com teorias e paradigmas nos quais se inscrevem,
são concebidas em função de princípios/regras, teorias, noções, mitos e discursos.:
as concepções estão também articuladas a dispositivos lingüísticos e culturais e à
criação, apresentando vulnerabilidade ao risco do erro e da ilusão
8
.
Com base na análise das respostas dadas pelos participantes do presente
estudo às solicitações do roteiro de depoimento escrito que se referem ao
envelhecimento, foi possível fazer uma leitura de suas concepções em relação a
este fenômeno e de suas metas com relação a ele bem como das contradições
detectadas.
21
As questões que se referem à formação profissional buscaram identificar a
concepção que estes profissionais têm deste fenômeno para, a partir delas
estabelecer articulações entre o processo de formação e a construção de um
envelhecimento com qualidade.
O presente trabalho representa esforço de pesquisa que questiona esta
problemática, tratando de realidade policial militar em nível intermediário por ser o
segmento que desenvolve atividades de ligação entre oficiais e tropa no
policiamento ostensivo (fardado e junto à comunidade).
9
1.2 Intenções do estudo: problema, objetivos e tese
O presente estudo teve como problema principal: como se caracterizam
paradigmaticamente a concepção e o imaginário sobre envelhecimento e a
concepção de formação profissional de policiais de nível intermediário da Brigada
Militar/RS?
Em busca de resposta a este problema teve-se como objetivos:
Geral Propor pontos de referência que auxiliem na argumentação da
necessidade de políticas públicas que possibilitem aos policiais envelhecerem com
melhor qualidade de vida.
Específicos
a) Analisar a concepção de envelhecimento de policiais militares ainda na
ativa, numa perspectiva psicológica, identificando a forma como vêm convivendo
com seu envelhecimento e como pensam que deveriam envelhecer;
b) Analisar a concepção de envelhecimento implícita no imaginário
associado ao fenômeno;
c) Analisar a concepção de Formação e sua articulação com a concepção e
imaginário sobre envelhecimento;
d) Analisar a orientação paradigmática implícita nas concepções e no
imaginário;
e) identificar contradições implícitas nos depoimentos dos participantes.
Pretendeu-se, no alcance destes objetivos e nas respostas encontradas ao
problema proposto, buscar indicativos que possibilitassem a confirmação/refutação
da tese, que traz implícita a hipótese inicial do trabalho: Policiais em nível
22
intermediário, da Polícia Militar do Rio Grande do Slul têm concepções de
envelhecimento, imaginário e concepção de formação profissional construídas com
orientações paradigmáticas simplificadoras.
23
2 CONTEXTUALIZAÇÃO DA PROBLEMÁTICA INVESTIGADA
2.1 O ENVELHECIMENTO E SEU CONTEXTO TEÓRICO
Alguns conceitos de envelhecimento envolvem caráter negativo,
caracterizando-o somente como processo de perda gradativa das funções
biológicas, de aumento da probabilidade de morte ou somente associado a
doenças
6
.
O envelhecimento é fenômeno complexo em que ocorrem alterações nas
características biológicas do organismo vivo e, ao longo do tempo, estas alterações
trazem reflexos no comportamento, nas habilidades intelectuais, na capacidade
física e na participação social. Geralmente o papel de idosos na comunidade, na
família ou no ambiente de trabalho torna-se diferenciado com o avanço da idade em
relação aos papéis desempenhados pelos mais jovens. De acordo com a cultura de
diferentes povos, o papel desempenhado pelo idoso varia.
6
A Gerontologia é o estudo do fenômeno envelhecimento nos organismos
vivos. Inclui não apenas a biologia do envelhecimento, mas também aspectos
sociológicos, psicológicos, educacionais, éticos, culturais entre outros.
O envelhecimento como tema de estudo desenvolvido junto a policiais
militares que estão ainda na ativa pode contribuir para a reflexão sobre suas
múltiplas dimensões o que possibilitará tecer e compreender sua “arquitetura
complexa”, formando a base onde poderão se assentar proposições de políticas
destinadas à melhoria da qualidade de vida de idosos inativos da área da
Segurança Pública contribuindo para um envelhecimento mais saudável.
O envelhecimento populacional é uma tendência mundial. Em 1998 existiam
cerca de 579 milhões de idosos no mundo, o que representa um crescimento de
quase 8 milhões de pessoas idosas por anos, tendo como referência os dados de
1950 do IBGE
10
.
No ano de 2002 foi realizada a segunda Assembléia Mundial sobre
Envelhecimento em Madri na Espanha, ocasião em que foi estimado em 629 milhões
o número de pessoas com 60 anos ou mais no mundo, com uma projeção de 2
bilhões em 2050, ultrapassando o número de crianças de 0 a 14 anos, que sempre
foi o maior grupo etário
11
.
24
Foi estimado pelas Nações Unidas que, em 2050, existirá uma pessoa
idosa para cada cinco pessoas e em 2150, uma em cada três pessoas terão 60 anos
ou mais. Esta porcentagem é mais alta nos países desenvolvidos do que nos menos
desenvolvidos, porém o envelhecimento destes também está ocorrendo de modo
muito rápido.
A população brasileira convive com uma ampliação da expectativa de vida e
com a estimativa de ser o sexto país do mundo em número de idosos em 2025, ao
mesmo tempo em que aumentam os índices de violência e criminalidade.
No último censo do IBGE 2000
10
, foi constatado que no Brasil vivem 14.128
milhões de idosos, (8,3% da população) existindo uma projeção de aumentar para
58.390 milhões em 2050, ou seja, neste período espera-se que 24% da população
esteja com 60 anos ou mais.
O envelhecimento populacional brasileiro, tem sido atribuído a fatores como
a queda na fecundidade e da mortalidade infantil e à melhoria nas condições
médico-sanitárias, embora este não seja um fenômeno uniforme no país. Se por um
lado a longevidade decorre de conquistas no campo social e da saúde, o
envelhecimento populacional apresenta novas e relevantes demandas por serviços,
benefícios e atenção que consistem desafios para governantes e para a sociedade
do presente e do futuro. Esta questão merece cada vez mais interesse dos órgãos
públicos, dos formuladores de políticas econômicas e sociais e da sociedade em
geral
12
.
Por tudo isto e especialmente no que se refere à Gerontologia associada ao
mundo policial, torna-se necessária uma atenção, por parte de Programas de Pós-
Graduação em Gerontologia, para a realização de pesquisas que objetivem
conhecer a realidade para sustentar possíveis alternativas que auxiliem na
longevidade com qualidade de vida de profissionais que atuam na área da
Segurança Pública e que vivem em constante e intensa tensão no enfrentamento de
conflitos sociais. Entretanto, as pesquisas precisarão incluir dados não
quantitativos, pois as perspectivas qualitativas têm excelente contribuição a dar em
relação a aspectos não explicáveis a partir de teorias essencialmente calcadas em
variáveis passíveis de quantificação, como é o caso do presente estudo, que lançou
mão de dados quantitativos para caracterizar os participantes do estudo e de
abordagem interpretativa para tratar sobre concepções e imaginário.
25
Entre as teorias sobre envelhecimento encontram-se as de natureza
biológica
13
, sociológica e psicológica
6
, que são a seguir brevemente apresentadas.
As teorias revelam diversas visões e ângulos, a partir dos quais o
envelhecimento vem sendo abordado
13
. Algumas teorias biológicas postulam que o
fenômeno do envelhecimento estaria baseado numa rie de eventos propositais,
que trazem alterações importantes desde o nascimento até a morte.
A Teoria da Substância Vital defende a idéia que a vida dos animais começa
com uma quantidade limitada de alguma substância vital e que, a partir daí, tem
início o processo de desgaste, que com o passar da idade vai se acentuando até a
extinção desta substância, que culmina na morte. Segundo Bernard Strehler, a
substância vital poderia ser o DNA dos genes essenciais que não se dividem e que,
com o passar do tempo têm a síntese protéica, essencial à manutenção da
funcionalidade fisiológica máxima, comprometida, significando perda da substância
vital e conseqüente envelhecimento.
Já a Teoria da Exaustão Reprodutiva concebe o envelhecimento como
conseqüência natural esperada, após um surto de atividade reprodutiva, embora
esta co-relação não seja o padrão universal da natureza.
Para a Teoria da Mutação Genética são as mutações sofridas pelas células
as responsáveis pelo envelhecimento, por impulsionarem a evolução e a seleção
natural.
outras teorias que buscam explicar de forma semelhante, citadas por
Hayflick.
13
Dentre elas, Strehler com a teoria que explica o envelhecimento como
deletério, progressivo na perda de funções fisiológicas, pelas mudanças graduais:
intrínseco, pois as perdas não podem ser corrigidas e universal, por ocorrerem em
todos da espécie. Não são abrangidos por esta teoria fenômenos biológicos como
as doenças, por exemplo.
também a teoria que defende a idéia de um relógio biológico baseado
em séries de eventos químicos ou mudanças físicas em moléculas específicas
(genes da morte ou hormônios). Esta teoria assumiu nova aparência a partir da idéia
de que o DNA de cada lula fornece um mapa para todos os eventos que
acontecem a partir da fertilização do óvulo até a maturação sexual e início da idade
adulta, até completar-se o processo do envelhecimento. Muitas críticas têm discutido
o determinismo desta teoria.
13
26
Entre as teorias que concebem o envelhecimento como resultado de
eventos acidentais não programados (acúmulos de erros em moléculas importantes,
resultados de desgaste ou acúmulo de degetos), encontra-se a Neuroendócrina que
defende a idéia que as mudanças associadas à idade resultariam de efeitos
provocados pelo sistema neuroendócrino. Não há evidências que a confirmem.
A Teoria do Desgaste explica o envelhecimento e a morte pela
impossibilidade de renovação indefinida dos tecidos, resultando o excesso do uso
em danos nos sistemas vitais, levando ao desgaste. Isto ocorre, mas não explica
todo o processo do envelhecimento.
Para a Teoria do Ritmo de Vida, os animais nasceriam com uma quantidade
limitada de uma substância, energia potencial ou capacidade fisiológica, que seria
gasta com ritmos diferentes, mais ou menos rápido.
A teoria do Acúmulo de Resíduos afirma que, com o passar do tempo, as
toxinas e resíduos acumulados prejudicam a função celular normal, culminando com
a morte da célula o que ocorre, nas células nervosas e nas células do músculo
cardíaco.
Segundo a Teoria das Ligações Cruzadas, com o passar do tempo aumenta
o número de ligações cruzadas entre algumas proteínas, impedindo processos
metabólicos através da obstrução da passagem de nutrientes e resíduos para dentro
e para fora das células.
Para a Teoria dos Radicais Livres ocorre uma reação química complexa,
quando certas moléculas suscetíveis encontram e quebram moléculas de oxigênio,
formando pedaços de moléculas altamente reativos, instáveis, que tentam se religar
a qualquer molécula próxima. O radical livre ao se unir a uma molécula importante,
pode trazer danos, pois a molécula afetada pode se desativar ou agir
inadequadamente.
a Teoria do Sistema Imunológico está baseada na idéia de que com a
idade é reduzida a capacidade do sistema imunológico de produzir anticorpos em
número adequado e do tipo correto, podendo produzir incorretamente anticorpos
contra proteínas normais dos organismos o que gera propensão à aquisição e
manifestação de doenças e outras patologias próprias da velhice.
A teoria dos Erros e Reparos propõe que os próprios reparadores podem
cometer erros ou os processos utilizados podem ser inadequados ou impróprios.
27
Na Teoria da Ordem à Desordem, à medida que a ordem molecular do
organismo se deteriora, aumenta a desordem, significando mais deterioração. São
estes aumentos da desordem que respondem pelas mudanças associadas à idade.
Numa perspectiva de complexidade, é possível sugerir a idéia que na
interação entre ordem e desordem celular, em movimentos de recursividade, a nova
ordem resultante, impregnada da superação à ordem inicial, vai ganhando espaço,
trazendo deterioração.
14
Néri
6
apresenta como principais teorias sociológicas do envelhecimento, em
nível Microssocial:
a) a Teoria da Atividade com base principalmente na idéia de que o declínio
das atividades físicas e mentais na velhice são fatores predisponentes às doenças
psicológicas;
b) a Teoria da Continuidade que procura explicar como idosos tentam
manter estruturas internas e externas preexistentes, aplicando estratégias
conhecidas;
c) a Teoria do Colapso de Competência referindo-se às crises que podem
surgir na vida do idoso, significando colapso em sua competência e à possibilidade
de reversão deste quadro pela “ teoria de reconstrução social”;
d) a Teoria da Troca Social, partindo da idéia que o idoso tende a se afastar
das interações sociais porque, numa sociedade que depende da relação
custo/benefício, teria pouco a contribuir, onerando com isto o grupo social. Na
consideração das interações sociais do idoso com outros grupos etários, esta teoria
propõe as normas de reciprocidade, de justiça distributiva e de beneficência;
e) a Teoria do Construcionismo Social tem como conceitos principais as
questões do significado social, as realidades sociais e as relações sociais no
envelhecimento, as atitudes diante o avanço da idade e o envelhecimento, os
eventos de vida e timing.
Como teorias no nível Micro/Macrossocial:
a) a Teoria do Desengajamento, tentativa de explicar o processo de
envelhecimento e as mudanças nas relações entre o indivíduo e a sociedade e a
análise da condição do idoso em sua reação psicológica e social diante do
envelhecimento, enfatizando o afastamento do prisma da funcionalidade, da
mutualidade, da inevitabilidade e da universalidade;
28
b) a Teoria da Modernização que descreve a relação entre a modernização
e as mudanças nos papéis sociais e no status dos idosos, enfatizando a relação
direta com o nível de industrialização da sociedade;
c) a Teoria da Subcultura que defende a idéia que os idosos estão
desenvolvendo uma cultura própria, a partir de suas crenças e interesses comuns,
da exclusão de interações com outros grupos etários e do crescimento de interações
entre si;
d) a Teoria da Extratificação por Idade cujas principais proposições são os
estudos do movimento das coortes de idade através do tempo, da assincronia entre
mudanças estruturais e mudanças individuais através do tempo e da
interdependência entre as coortes de idade e as estruturas sociais;
e) as Teorias e Perspectivas Feministas que incluíram a questão do gênero
na pauta dos estudos do envelhecimento e chamarem a atenção para os
preconceitos de gênero dentro das ciências sociais;
f) a Perspectiva do Curso de Vida que repousa em aportes da Sociologia e
da Psicologia e permite a análise de processos nos níveis micro e macrossocial de
indivíduos e populações ao longo da vida.
Entre as teorias do nível macrossocial encontram-se:
a) a Teoria Político–Econômica que tem como proposições básicas a
interação de forças econômicas e políticas, as restrições econômicas e políticas que
modulam a experiência do envelhecimento, as experiências de vida e os fatores
estruturais;
b) a Teoria Crítica que focaliza as dimensões estrutural e humanística e as
refletidas na Gerontologia contemporânea tais como a teoria político-econômica
do envelhecimento e as teorias feministas.
Segundo Néri
6
, do ponto de vista psicológico, o fenômeno do
envelhecimento pode ser analisado a partir das perspectivas de Ciclo de Vida, Curso
de Vida e Liife–Span indicando, como principal diferença entre elas, o fato de a
Perspectiva de Ciclo de vida adotar o critério de estágios como princípio organizador
do desenvolvimento, enquanto as Perspectivas do Curso de Vida e Life -Span,
mesmo admitindo que a vida seja demarcada no tempo, não utilizam este mesmo
critério.
Na Perspectiva do Ciclo de Vida o critério de estágios é o princípio
organizador do desenvolvimento e a expressão“ ciclo de vida”, está diretamente
29
relacionada ao sentido em que o termo foi usado por Eric Erikson em sua teoria do
desenvolvimento. Para Néri
6
, por considerar a vida humana em toda a sua extensão
e em propor que a manifestação e a resolução das crises evolutivas do ciclo de vida
se dão no contexto das influências socioculturais, esta teoria representou avanços
importantes com relação às teorias clássicas do desenvolvimento.
A Perspectiva do Curso de Vida focaliza o desenvolvimento do ponto de
vista das inter-relações do desenvolvimento individual, familiar e societal ao longo do
tempo, considerando o impacto da sincronia ou da assincronia entre tempo
individual, tempo familiar e tempo histórico sobre o desenvolvimento individual.
A Teoria de Estruturação Etária em Gerontologia e a Teoria Sociológica da
Extratificação por Idade compartilham desta mesma orientação, pois as pessoas em
seu desenvolvimento o avançam isoladas, compartilhando experiências
socioculturais com seus semelhantes, influenciando e sendo por eles influenciadas
(princípio recursivo)
15
. Ao conjunto de pessoas nascidas numa época, que entram e
saem juntas de seus sistemas ou instituições e que tendem a passar pelas mesmas
experiências em termos de eventos históricos, nas mesmas épocas de suas vidas,
denomina-se coorte.
Este é um conceito importante, bem como os conceitos de geração e o de
descontinuidade estrutural “que se manifesta, quando uma sociedade é incapaz de
assegurar papéis sociais que permitam a seus membros mais velhos saudáveis e
ativos continuarem engajados socialmente ou terem acesso às oportunidades e
gratificações sociais disponíveis para os outros extratos etários”
6
. A partir de
expectativas e normas comportamentais prescritas pela sociedade como adequadas
às diferentes faixas etárias se constituiriam os estágios de desenvolvimento. Estas
prescrições sociais internalizadas, associadas à presença de eventos biológicos,
terminaria por construir os cursos de vida e a percepção de si mesmo como alguém
que esta em conformidade com o exigido, resultando num senso de normalidade e
pertinência.
A Perspectiva Life–Span admite que a vida seja efetivamente demarcada no
tempo, não adotando o critério de estágios como princípio organizador do
desenvolvimento. Adota os critérios de extensão ou abrangência da vida em toda a
sua duração e de algum período particular. A idade é vista como variável importante,
porém não como causa e sim como elemento organizador na pesquisa sobre o
desenvolvimento. Pela combinação das estratégias longitudinal e de corte
30
transversal, é possível atentar para os eventos do contexto, o que significa poder
investigar o efeito do pertencimento a uma coorte. Para Néri
6
, esta “talvez seja a
contribuição metodológica mais importante da perspectiva life-span à pesquisa
psicológica.”
2.2 CARACTERIZANDO O CONTEXTO
A coleta dos dados do presente estudo foi desenvolvida em 2006 junto a um
grupo de profissionais policiais militares integrantes da Brigada Militar do Rio Grande
do Sul, alunos do Curso Básico de Administração Policial Militar.
Esta instituição, cuja história se confunde com a história do Rio Grande do
Sul, é um dos órgãos que integram o Sistema Estadual de Segurança blica e tem
por função exercer o policiamento ostensivo, com objetivo de preservação da ordem
pública.
O policiamento ostensivo é efetuado por policiais fardados, em locais
públicos e tem caráter preventivo
9
.
Em 1737, este Estado constituiu ponto de concentração do Exército
Português e, para defender seu território de inimigos, necessitou de força militar o
que levou à criação da Força Pública, composta por tropas que participaram
ativamente de contendas internas quanto externas, como a guerra do Paraguai em
1865 e a batalha de Buri, em 1924
16
.
Durante a República Velha, em 1892, esta Corporação iniciou um processo
de mudança de mentalidade junto a seus integrantes, buscando prepará-los
intelectual e tecnicamente e recolhendo-os aos quartéis.
Assim foram criadas as “Escolas Regimentais” em cada Unidade de Tropa,
desenvolvendo cursos de primeiro grau ou escola de praças, e de segundo grau ou
escola de graduados, tendo como docentes os oficiais das Unidades
16
.
A partir daí foram realizadas manobras no sentido de aperfeiçoamento
constante e passou a ser dada grande atenção ao setor de preparação física, tendo
início as escolas de esgrima e ginástica.
Também neste período, as instituições de ensino da Corporação ganharam
sede na então Chácara das Bananeiras, atualmente bairro Partenon em Porto
Alegre, RS.
31
A instrução era, entretanto, voltada para a guerra, para estratégias de
combate a e montado, com grande valorização da coragem, vigor físico, amor à
verdade e à obediência.
No Decreto nº. 88.777
17
, de 30 de setembro de 1983, conhecido como R-
200, embora houvesse clara referência a que a formação, especialização e
aperfeiçoamento técnico-profissional dos Policiais Militares deveriam estar voltados
para a Segurança Pública, também determinava que a estrutura de ensino era
dependente de diretrizes do Exército, resultando no preparo das Polícias Militares
para atuarem como braço armado do regime militar, enquanto a Força Terrestre
que se autodenominava reserva moral do País ocupava-se das manifestações
urbanas.
Em 1997, pela Lei Nº 10.990
18
, de 18 de agosto, foi instituído o Estatuto dos
Servidores Militares da Brigada Militar do Estado do Rio Grande do Sul, e no seu Art.
46, inciso XV, estabelece como direito do Policial Militar “a saúde, higiene e
segurança no trabalho”, incluindo não somente o período de tempo em que o
servidor estiver na ativa, mas também quando estiver na reserva, aposentado.
Desta forma, a menos de dez anos a Corporação passou a contar com
dispositivo legal que prevê a necessidade de cuidados com a saúde o que traz
implícita a oportunidade de um envelhecimento com melhor qualidade.
Em 1998, as bases curriculares dos cursos e treinamentos dos profissionais
da área da Segurança blica foram alteradas, objetivando o ensino profissional e
com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
19
(Lei 9394/96 - LDB), o
ensino militar passou a ser equivalente ao ensino regular, embora esta lei reconheça
as especificidades deste ensino e a necessidade de que seja regido por lei
específica.
Este ensino deve preparar os policiais militares para atender e proteger a
população e para estabelecer os limites, quando ocorram violações dos direitos
individuais e coletivos, garantidos pela Constituição Federal do País, num cenário de
desigualdades e injustiças sociais. Entretanto, este ensino não inclui em sua
transversalidade a preparação para uma longevidade e uma aposentadoria com
qualidade.
Buscando a criação de um polícia cidadã, com policiais preparados para o
enfrentamento da crescente violência em uma Sociedade Democrática de Direito e
ciente do papel da formação neste processo, o Governo Federal iniciou um processo
32
de reflexão em nível nacional que resultou na elaboração da recente proposta da
MCN pelo Ministério da Justiça, em 2004.
A proposta pedagógica implícita neste documento oficial encaminha para
uma formação consciente da necessidade de atenção aos profissionais da área da
Segurança Pública como seres humanos com direito ao exercício da cidadania o que
inclui uma vida com qualidade e dignidade.
Ao longo dos anos, a formação dos policiais da Brigada Militar vem
passando por reformulações para acompanhar as transformações e demandas da
sociedade, especialmente a partir de outubro de 1988, pela promulgação da
Constituição Cidadã na qual, em seu artigo 144 prescreve a Segurança Pública
como “dever do Estado, direito e responsabilidade de todos”
1
.
Hoje a Brigada Militar conta com um efetivo de 24000 profissionais e está
estruturada em Estado Maior, Comando do Corpo e Bombeiros, Comandos de
Policiamento Ostensivo e Comandos de Unidades Especiais, sendo que os dois
últimos Comandos citados estão subdivididos em escalões menores ao nível de
Grupos Policiais Militares que são Comandados por sargentos
16
.
2.3 SÍNTESE DA BASE TEÓRICA ADOTADA DA ANÁLISE DA REALIDADE
INVESTIGADA
2.3.1 Análise Transacional
A Análise Transacional é uma teoria psicoterápica criada pelo psiquiatra
canadense Eric Berne
20
, posteriormente corroborada especialmente pelos estudos
de Penfield
21
, Jaspers
22
, Federn
23
e Weiss
24
entre outros. Penfield trouxe
descobertas no campo da neurocirurgia e da epilepsia descobrindo que a
estimulação do lobo temporal levava os sujeitos a revivenciarem, impregnada de
percepções físicas e dos mesmos sentimentos, situações vividas no passado.
Berne entendia que os estudos de Federn e seu discípulo Weiss sobre os
sonhos e sobre suas sessões com pacientes psicóticos, ressaltaram no campo da
psiquiatria o que os estudos de Penfield em neurocirurgia haviam constatado. O
termo “estado do ego”,foi introduzido por Federn e significou a mudança de uma
abordagem conceitual, ortodoxa, para uma abordagem fenomenológica. Também é
33
dele o conceito de “catexia” muito utilizado por Berne para se referir ao potencial de
energia dos estados do ego
20
.
Berne também se refere às contribuições de autores como Piaget, quanto
às características do Pai, do Adulto e da Criança na criança real e de Melanie Klein e
de sua escola, cujos trabalhos sobre os primeiros estágios do superego se fazem
presentes no que Berne chama “a vocação do Pai”
20
.
“O interesse básico da Análise Transacional é o estudo dos estados de ego,
que são sistemas coerentes de pensamento e sentimento manifestados por padrões
de comportamento correspondentes”
25; 25
.
Os estados do ego são a manifestação fenomenológica dos órgãos
psíquicos exteropsique, neopsique e arqueopsique, respectivamente e se
apresentam de três formas: Pai, Adulto, Criança que juntos constituem a estrutura da
personalidade. A identificação e análise destes estados do ego é feita pela análise
estrutural, pela identificação e separação de padrões de sentimento e
comportamento que a cada um corresponde.
O estado do ego Pai (exteropsique) tem origem nas figuras parentais, sendo
constituído de conteúdos introduzidos do exterior e sua ação é imitativa. Inclui o
conceito aprendido de vida; o estado do ego Adulto (neopsique) é um processador
de informações internas e externas, que utiliza as experiências passadas e responde
às demandas do aqui e agora de forma adequada, tratando-se de um conceito
pensado de vida; o estado do ego Criança (arqueopsique) é o componente biológico
da personalidade, contendo a bagagem genética e os registros das experiências da
infância, representando o conceito sentido de vida.
Berne defendia a tese: “[...] em qualquer momento, todo indivíduo presente
a uma reunião social estará exibindo um estado do ego do tipo Pai, Adulto ou
Criança, e as pessoas podem mudar, com variados graus de rapidez e presteza de
um estado para outro”
26; 26
.
O movimento da catexia entre os estados do ego supõe a existência de
fronteiras entre eles e pode apresentar-se sob três formas, o que vai determinar as
manifestações de diferentes estados do ego: atada (energia potencial), desatada
(energia cinética), e livre (energia muscular).
A catexia livre movimenta-se com maior facilidade entre os estados do ego,
enquanto as catexias atada e desatada encontram maior resistência à sua
passagem pelas fronteiras dos estados do ego. Estes movimentos da catexia vão
34
determinar qual o estado do ego está sendo vivido como “Eu real” e se será este ou
outro a deter o “poder de comando” em determinada situação.
Segundo Berne
20
, para que um estado do ego seja percebido como “Eu”, a
catexia nele predominante deverá ser a catexia livre e para que este mesmo estado
do ego tenha também o poder de comando, deverá estar a ele também
acrescentada a catexia desatada (cinética). A catexia desatada interagindo com a
catexia livre resulta na catexia ativa, o que permite ao estado do ego não só ser
vivido como “Eu real” mas também ter o “poder de comando”. o estado do ego
que contenha apenas catexia atada permanece latente.
Por vezes, um estado do ego é percebido como “Eu real”, mas não detém o
poder de comando, pois a catexia desatada está em outro estado do ego. É o que
pode ser percebido especialmente nos estados neuróticos, quando, embora o
Adulto do indivíduo seja vivenciado como “eu real” e permaneça com a possibilidade
de crítica sobre determinado comportamento, a atuação é da Criança, carregada de
catexia desatada.
Na personalidade cada um destes estados do ego possui função própria e
importante para o equilíbrio dos indivíduos: o estado do ego Pai tem por função
conservar a energia e diminuir a ansiedade, por permitir a tomada de certas
decisões “automáticas” e relativamente inabaláveis. É particularmente eficaz se as
decisões forem sintônicas com a cultura local”
20; 72
; o Adulto “é, em parte, um
computador de probabilidades autoprogramador, destinado a controlar os estímulos
ao lidar com o ambiente externo” e o que conta é a “qualidade do processamento de
dados e o uso que determinado indivíduo em particular faz dos dados disponíveis”
25;
72
; a Criança tem como função “motivar o processamento de dados e a programação
do Adulto, de modo a obter a maior quantidade de gratificação para si mesma
25; 72
.
O diagnóstico dos estados do ego pode ser obtido através de diagnose
comportamental, (gestos, tons de voz, palavras, expressão facial), diagnose social
ou operacional (análise do padrão de comportamento que surge como resposta a
estímulos específicos do ambiente), diagnose histórica (resultante da identificação,
pelo indivíduo, da figura parental que serviu de modelo ao seu comportamento) e
diagnose fenomenológica (que emerge da possibilidade da revivência do momento
de seu desenvolvimento em que se deu a incorporação deste modelo)
20
.
35
Aos achados de Berne que responderam ao “o quê” acontecia na mente dos
seres humanos, hoje acrescentam-se os estudos, especialmente de Le Doux
27
, que
buscam responder ao “como” e ao “porquê” do funcionamento do cérebro.
Hine entende que “Esses dois pontos de vista combinam muito bem com o
modelo de Representação Generalizada (GR) de formação e operação do sistema
mental” e nos permitem “um quadro muito mais claro das bases neurais da teoria da
Análise Transacional”
28; 61
. Define Rede Generalizada como um”padrão específico
de conexões mentais ou neurais que foram reforçadas de tal forma a serem
confiavelmente ativadas por sinais familiares”
28; 65
. Os estados do ego Pai, Adulto e
Criança seriam, então, “redes amplamente distribuídas e redes de redes de RGs”:
O funcionamento de um de nossos estados-self P-A-C (Pai-Adulto-Criança)
é, portanto, a totalidade de um estado particular de ativação mental em resposta aos
sinais de pessoas ao nosso redor ou sinais de origem interna, formado e
condensado através do tempo como sistema complexos do RGs
interconectadas
28;66
.
Segundo Hine, as redes neurais que posteriormente constituirão o estado
do ego Criança começam a se formar ainda antes do nascimento e continuarão a ser
construídas durante os primeiros anos de vida. “As RGs que compõem esta rede de
atividade neural parecem emergir de sensações corporais e experiências emocionais
precoces e posteriores juntamente com os padrões que emergem das interações
diárias, em geral, emocionalmente carregadas, com seus “cuidadores”.” Este estado
do ego reage, principalmente, a sinais corporais e emocionais
28; 68
.
Diferentemente da Criança, a formação do estado do ego Adulto se
desenvolve em todos os momentos da vida, pelo uso dos órgãos dos sentidos para
exploração do mundo e de si mesma. “As RGs formam-se mais ativamente num
estágio mais tardio de desenvolvimento cerebral, quando a memória de longo prazo
e linguagem já foram adquiridos”
28; 69
.
O estado do ego Pai, que se constitui pela introjeção dos cuidadores, possui
as RGs “mais implícitas” e uma grande parte dos sistemas cerebrais fazem parte de
sua construção
28
.
36
2.3.2 Teoria da Complexidade
Para Morin
15
, a Complexidade não é resposta, é desafio e traz em si a
imperfeição, a incerteza e o reconhecimento do irredutível sem recusar a clareza, a
ordem, o determinismo, reconhecendo seus limites. Não se reduz à união da
complexidade e da não complexidade (a simplificação), pois se encontra no centro
da relação antagônica/ complementar entre o simples e o complexo. Tampouco “se
reduz à incerteza, é a incerteza no seio de sistemas ricamente organizados”
15;52
. Se
constitui na dialógica ordem/desordem/organização indo além delas, dissolvendo-as,
superando-as e levando-as a progredir. A complexidade é um princípio regulador
que não perde de vista a realidade do tecido fenomenal no qual nos encontramos e
que constitui o nosso mundo”
15; 152
.
Morin
15
divide os Paradigmas em duas grandes vertentes: o Paradigma da
Simplicidade composto pelas orientações paradigmáticas anteriores e o Paradigma
da Complexidade que embasa a Teoria da Complexidade, cuja caracterização é
apresentada na figura 1 a seguir e utilizada para a identificação da orientação
paradigmática implícita nas concepções e no imaginário de que tratam o presente
estudo.
37
Figura 1: Quadro comparativo
Paradigma da Simplicidade Paradigma do Pensamento Complexo
Põe ordem no universo e expulsa a
desordem A ordem é reduzida a uma
lei, a um princípio.
A interação entre ordem e desordem gera organização. Uma
suprime a outra, mas ao mesmo tempo, em certas situações,
colaboram e produzem complexidade (princípio dialógico).
Os fenômenos desordenados são necessários em certas
situações para a produção de fenômenos organizados.
Separa o que está ligado (princípio da
disjunção).
Unifica o que está disperso (princípio
da redução).
Tal causa produz tal efeito (relação
linear).
Princípios de distinção, de conjunção e de implicação.
Busca de princípio capaz de unir o que está disjunto. Tudo é
solidário.
A causa gera um efeito, que retroage sobre ela, modificando-a
e sendo por ela modificado: princípio recursivo.
Desintegra a complexidade da
realidade. Só vê as partes ou só vê o
todo.
Integra a simplificação, mas recusa as conseqüências
redutoras e unidimensionais.
A parte está no todo, o todo está de alguma forma inscrito na
parte: princípio hologramático.
A complexidade está onde não se consegue superar uma
contradição.
Algo escapa ao tempo e ao espaço, mas não anula o fato de,
simultaneamente, estar inquestionavelmente no tempo e no
espaço.
Vê o uno ou o múltiplo, sendo incapaz
de perceber a interdependência entre
eles.
Realidade compreendida como una/complexa/diversa/múltipla.
Separa o observador e o conceptor da
observação e da concepção.
Integra o observador e o conceptor na observação e na
concepção.
Visão unidimensional. Visão multi e interdimensional.
Visão determinista que elimina a
noção de sujeito com autonomia
construída nas relações de
interdependência.
Não recusa a idéia de determinismo. Acha-a insuficiente, pois
não é possível programar a descoberta.
Os sistemas criam as próprias determinações e finalidades,
numa noção de sujeito autônomo/dependente, vacilante e
provisório; incapaz de estar seguro e de evitar contradições.
A distinção e a clareza são caracteres
intrínsecos da verdade de um
conceito.
Os conceitos não são definidos pelas suas fronteiras, mas a
partir de seu núcleo.
Desvela mediações/contradições
As contradições precisam ser
superadas.
As contradições são espaços para construção, significando
uma visão mais aprofundada do fenômeno.
Usa programação, que sofre de rigidez
em relação à estratégia.
Usa estratégias comunicacionais não lineares.
Conflito associado a situações
anormais a serem corrigidas.
Reconhecimento dos processos de confrontação como meio
de inovação.
Consideração aos aspectos formais e
relações unidirecionais.
Consideração a aspectos informais e de relações
bidirecionais.
Esquema estímulo-resposta para
explicação das condutas individuais e
organizacionais.
Esquema diagnóstico do conhecimento prévio e da reflexão
sobre ele para explicação das condutas individuais e
organizacionais.
Meio ambiente externo determinante
das mudanças organizacionais.
Meio ambiente externo como um dos fatores de influência nas
mudanças organizacionais.
Fonte: elaborado por AZEVEDO E SOUZA, Renata Bidone de. O Caminho de Bom a Melhor: estratégias
comunicacionais, uma perspectiva de complexidade. [Tese]. Faculdade de Comunicação Social. Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 2007, p. 32 ( a partir da obra de Morin).
38
A partir dos descritores destes dois grandes paradigmas, é possível afirmar
que na realidade policial brasileira, o pensamento simplificador não tem considerado
a importância de uma concepção de diversidade (dos componentes) na unidade do
ser humano, o que tem gerado produções bibliográficas incapazes de contribuir para
a elaboração de estratégias que possibilitem trabalhar sobre o envelhecimento em
sua complexidade.
A ênfase dada neste estudo aos aspectos psicológicos que envolvem as
concepções de envelhecimento, não significa permanecer numa visão simplificadora
deste fenômeno, reduzindo-o ao psicológico, e sim numa chamada de atenção a um
de seus aspectos fundamentais e que têm implicações na formação e atuação
profissional e sobre a forma como os policiais convivem com o envelhecimento.
Para Balestreri
29
, a miséria econômica, cultural e psíquica da maior parte da
polícia, na maioria dos estados brasileiros, constitui uma calamidade e um
impedimento-chave para que se desenvolvam processos democráticos e
civilizatórios. “Investir, pois, no aparelhamento, assalariamento e formação técnico-
científica e humana nos policiais, é o grande caminho para a transformação do
sistema”
29
e para a conquista de melhores condições de vida: uma formação
concebida como processo educativo, construtivo e permanente se faz necessária, a
partir do estabelecido na Matriz Curricular Nacional para a Formação de
Profissionais da área da Segurança Pública.
3
Certos tipos de trabalho policial podem levar o homem a tornar-se
brutalizado, induzindo-o a fazer coisas que jamais teria imaginado fazer,
especialmente em períodos de exceção
30
. Estas ações deixam marcas que
interferem nas suas concepções. Além disto, considerando-se que se trata de
profissionais para os quais, chegar à aposentadoria significa ser quase um/uma
sobrevivente, aprender sobre o tema envelhecimento pode parecer ser fonte de
sofrimento ou perda de tempo. Assim sendo, a compreensão sobre o processo de
envelhecimento, como objetivo componente da transversalidade da rede de
objetivos do programa de formação principal se faz necessária, o que não significa
apenas informar, mas auxiliar na reconstrução das concepções, a partir do
conhecimento prévio, para que, a partir dele, mudanças possam acontecer.
A consciência da multi/interdimensionalidade do fenômeno do
envelhecimento se faz presente em boa parte da bibliografia à disposição, embora
as abordagens raramente apresentem o distanciamento de uma visão especializada.
39
No presente estudo, é assumida uma concepção de envelhecimento como
fenômeno complexo, constituído pela interação entre diferentes dimensões
(biológica, social, psicológica, educacional, ética e cultural).
2.3.3 Qualidade de vida
Segundo documento do Grupo de Qualidade de Vida da divisão de Saúde
Mental da OMS, qualidade de vida é "a percepção do indivíduo de sua posição na
vida no contexto da cultura e sistema de valores nos quais ele vive e em relação aos
seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações"
31
, com consciência de suas
relações de interdependências
32
.
Segundo este documento, três características fazem parte desta definição,
quais sejam, subjetividade, (percepção do indivíduo), multidimensionalidade
(dimensões física, psicológica e social, entre outras) e bipolaridade (dimensões de
positivo e negativo sobre as diversas condições)
31
.
Numa perspectiva de complexidade implica dizer: interdimensionalidade,
entendendo-se as dimensões constituintes como partes de um todo que interagem
entre si e com ele, (princípio hologramático)
15
gerando a qualidade de vida, o que
está descrito em Neri
6
quando acentua que as condições necessárias a uma vida
com qualidade estão ligadas a ltiplos fatores e influências pois, [...] “em qualquer
momento do ciclo vital e em qualquer sociedade, qualidade de vida é um fenômeno
de várias faces e assim, é mais bem descrito por intermédio de um construto
multidimensional”
6; 162
.
O termo qualidade de vida tem significados diferentes para diferentes
pessoas, diferentes lugares, diferentes momentos históricos e, por vezes, para a
mesma pessoa, em momentos diferentes de sua vida
4
.
Desta forma, os parâmetros através dos quais se define qualidade de vida
também mudam, à medida que são construídos a partir do que, em determinado
tempo e lugar, é reconhecido como valor inerente a uma vida com qualidade.
Para atender à complexidade envolvida neste tema, este construto contém
critérios biológicos, sociais e psicológicos a partir dos quais é percebido o trajeto da
história de vida de indivíduos, grupos humanos e sociedades, bem como seu
momento presente e suas projeções para o futuro, incluindo seu ambiente físico e
social. Estes critérios, objetivos e subjetivos, individuais e coletivos, estão
40
associados a normas e a valores sociais e individuais e também sujeitos a
mudanças.
Cícero ressaltava as qualidades da sabedoria, clarividência, e discernimento
como “Qualidades das quais a velhice, não não está privada, mas, ao contrário,
pode muito especialmente se valer”
33;19
como compensação à perda de condições
como força, agilidade física, rapidez. Apontava com isto, valores a serem cultivados
para uma velhice bem sucedida. Ainda que estes sejam valores importantes em
qualquer época, talvez não devessem ser apontados como importantes à qualidade
de vida na velhice na sociedade atual, onde o processo de degerontocratização
resulta no desejo de permanecer jovem, belo e ser eterno
34
.
Do ponto de vista objetivo, as condições desta qualidade podem ser
observadas a partir de parâmetros estabelecidos e replicáveis tais como
competências comportamentais, condições do ambiente físico; acesso a serviços de
saúde, lazer e educação; finanças; existência e características da rede de
apoiadores informais; índices de urbanização e de alfabetização; padrões sociais de
morbidade e mortalidade para as diferentes faixas etárias; possibilidades/limitações
e condições de produtividade/improdutividade.
as condições subjetivas são obtidas a partir dos relatos de indivíduos e
de grupos sobre as condições objetivas em que vivem, do quanto lhes parecem ou
não satisfatórias e sobre seus efeitos no bem-estar/mal-estar individual e coletivos.
Lawton
35
construiu um modelo de qualidade de vida na velhice baseado em
critérios inter-relacionados: Competência comportamental, Condições ambientais,
Qualidade de vida percebida e Bem-estar subjetivo.
A Competência comportamental leva em conta o funcionamento e
desempenho do indivíduo no que se refere à saúde, funcionalidade física, cognição,
comportamento social e utilização do tempo. Está relacionado ao potencial dos
indivíduos e à sua história pessoal, experiências, valores, condições de vida,
desenvolvimento pessoal, entre outros.
As Condições ambientais referem-se à compatibilidade do ambiente com as
condições físicas e competências comportamentais do idoso.
A Qualidade de vida percebida prende-se à avaliação que o próprio
indivíduo faz de sua própria vida, de suas condições e de seu funcionamento nas
diversas áreas, de expectativas pessoais e sociais, expressadas no como se
percebe em relação a elas, bem como de seu ambiente físico e social.
41
O Bem-estar subjetivo pertence ao âmbito da experiência privada e deve
considerar o nível de satisfação, global e específica, com relação às diversas áreas
da vida, tais como saúde física, saúde cognitiva, sexualidade, relações sociais,
relações familiares e espiritualidade. Também inclui medidas cognitivas e
emocionais, englobando os três critérios anteriores.
Paschoal refere estudos empíricos que demonstram que a qualidade de
vida percebida está relacionada ao bem – estar subjetivo e mecanismos de
personalidade tais como o senso de controle, de eficácia pessoal e de significado,
bem como às estratégias de enfrentamento.
4
Néri ressalta a importância da competência adaptativa, resultado das
competências emocional, cognitiva e comportamental que possibilitam lidar com o
estresse, resolver problemas e relacionar-se socialmente, o que resulta na
manutenção de papéis, atividades e relações sociais e no ajustamento pessoal,
com importantes reflexos na saúde física e mental dos idosos
6
.
2.3.4 A formação
Se o policial ao exercer suas funções convive com o risco de vida, como
não trabalhar suas concepções de vida, morte, envelhecimento? Como promover
uma competência coletiva profissional, uma íntima relação com o desenvolvimento
das capacidades de leitura e gestão situacional, se não forem exploradas a leitura e
a gestão de suas próprias vidas?
3
.
Os cursos de formação policial pretendem preparar profissionais
competentes que assumam a responsabilidade pelo seu próprio desenvolvimento
profissional. Entretanto, na prática, o “desenvolvimento profissional” pode estar
sendo reduzido às habilidades técnicas, como se a dimensão pessoal fosse
separada da dimensão profissional e como se as concepções das pessoas sobre
fenômenos inerentes a sua natureza não fossem importantes de serem discutidas
3
.
Para isto, se faz necessário que a formação seja concebida como
“impulso para além do imediatismo da prática e, ao mesmo tempo, em
direção a um aquém capaz de reter os sujeitos, os formadores e os
responsáveis à beira de ações mais implicativas, personalizadas e, porque
não, culturais. Algo que se colocaria como uma relação de tensão, senão de
conflito, diante das definições de uma formação em termos de “ensino
profissional”, ligada à uniformidade, às normas e à prescrição enunciada e
42
talvez esperada de utilidade e de eficácia, as mais imediatas possíveis
36;
48
.
Nesta orientação a transversalidade curricular desempenha papel
organizador da coerência interna e papel integrador em relação a uma identidade
policial militar construída na confluência das dimensões profissional e pessoal, onde
os currículos tenham como finalidade a construção de uma competência coletiva a
partir do desenvolvimento e da transformação progressiva das capacidades
intelectuais e afetivas para o domínio de conhecimentos, habilidades, hábitos e
atitudes também relacionadas a uma vida com melhor qualidade. E isto inclui
atenção ao próprio envelhecimento
37
.
Na Matriz Curricular Nacional para a Formação em Segurança Pública
3
proposta pela Secretaria Nacional de Segurança Pública/Ministério da Justiça
(SENASP/MJ) em 2004, fica explicitado, com base em Altet,
38
o entendimento de
competência profissional como o conjunto de saberes, esquemas de ação,
posicionamentos assumidos, habilidades, hábitos e atitudes necessários ao
exercício das funções de Segurança Pública. Assim, o conjunto de competências
que forma a competência profissional é de natureza cognitiva, afetiva e prática e de
ordem técnica e didática. Entre os saberes que integram a competência profissional,
encontra-se o saber instrumental, que desenvolve a competência “saber analisar
criticamente”. Entretanto, é preciso entender que este saber também diz respeito à
dimensão pessoal
3
.
Tal como o conhecimento científico, as práticas sociais também são
construídas tendo por base paradigmas.
38
Estes, embora nem sempre explícitos,
determinam ângulos, impregnam e direcionam as ações, os objetivos, as
estratégias
37
.
Paquay e Wagner, destacam seis tipos diferentes de paradigmas de
formação, que objetivam formar diferentes tipos de profissionais pois “o tipo de
competências a que se chegou está fortemente associado ao método de
produção”
39; 136
.
Assim sendo, se o profissional desejado é aquele que tem o domínio dos
saberes relativos à profissão, temos o paradigma do “profissional culto”.
Dentre os profissionais policiais, possivelmente o domínio de saberes não
constitua o principal objetivo a ser buscado, estando esta profissão construída sob
43
imaginário voltado especialmente à força e agilidade físicas, “forma formadora”
40
, a
um só tempo causa e efeito,
40
que transparece na imagem destes profissionais no
cotidiano das ruas e reforçado através de personagens mostrados em filmes e
seriados.
Quando a formação profissional tem como objetivo um profissional que
domine o saber-fazer técnico, o paradigma é o do “técnico”, voltado para o
desenvolvimento de competências esperadas. Este saber-fazer técnico tem na
profissão policial restrito espaço de possibilidades pelas características do agir
policial, onde são necessárias várias competências associadas para fazer frente à
complexidade das situações nele envolvidas. Entretanto, na formação destes
profissionais este paradigma tem resultado em ensino voltado prioritariamente à
transmissão de conhecimentos técnicos e operacionais, possivelmente reforçando
um imaginário que associa a técnica a poder, domínio e controle
41
, distanciando-se
de se conceber como seres humanos, com necessidades universais.
O profissional “prático artesão” é aquele que adquiriu na prática, o que os
autores chamam de “esquemas de ação contextualizados”. O conhecimento prático
adquirido no cotidiano policial pode trazer importante acréscimo ao conhecimento
teórico. Entretanto, dissociado da teoria, poderá significar a reprodução de práticas
estabelecidas com o passar do tempo, sem questionamentos à sua eficácia ou
adequação, repercutindo num imaginário que dissocia teoria e prática e não
reconhece o profissional e a formação como uma integralidade. Importa um
movimento permanente de aproximação da teoria com a prática, interdependentes
que são, onde a contribuição entre ambas resulte em enriquecimento recíproco.
A formação profissional construída sob o paradigma do “pratico reflexivo”
objetiva profissionais que construam um saber ancorado na experiência,
sistematização, suporte teórico e que pode ser a outros comunicado. Este
profissional terá condições para analisar situações singulares e de sobre elas refletir
para encaminhar soluções.
A formação deste profissional em permanente evolução, agregando novos
conhecimentos, analisando critica e continuadamente os resultados de suas próprias
práticas e das práticas observadas, constitui desafio para uma formação e uma
prática ainda exercidas a partir de diferentes imaginários, resultando em dissociação
entre teoria e prática, entre Academias, como o lócus da Formação e as ruas, lugar
das práticas.
44
A formação e a profissão policial, por suas características próprias e pela
constituição hierárquica das instituições policiais, carecem de um aspecto importante
apontado pelo autor para formar práticos reflexivos, a autonomia.
Além disto estes profissionais, em seu cotidiano precisam, em fração de
segundos, tomar decisões em situações de intensa pressão, incerteza e risco,
agindo e reagindo em tempo real, sob circunstâncias carregadas de tensão. Isto não
impede, entretanto, que exercitem a reflexão sobre suas práticas, tanto
individualmente quanto em seus grupos de trabalho, desde que disponham de
condições para isto.
O paradigma do profissional como “ator social”, busca formar profissionais
inseridos em projetos coletivos e conscientes da complexidade de seu agir
profissional o que constitui mais um dos desafios colocados à formação dos
profissionais policiais e a um imaginário, muitas vezes reforçado nos processos de
formação, onde policiais e cidadãos civis estão colocados em lados opostos.
O aumento da violência, da criminalidade e da criminalidade violenta tem
exigido dos policiais o saber analisar criticamente estas situações a partir de um
ponto de vista sistêmico, sob pena de não compreendê-las em suas múltiplas
dimensões.
O Plano Nacional de Segurança Pública traz em seus eixos articuladores
que, o novo ângulo de abordagem exige que as proposições estejam em sintonia
com a complexidade do problema a ser enfrentado; devem se traduzir em projetos
multidimensionais; mobilizar recursos multissetoriais; envolver atores públicos e
privados de diferentes tipos e que se inspirem em conhecimentos
interdisciplinares.
42
Todavia a competência necessária a esta visão da Segurança
Pública, envolvendo os diversos atores dentro da sociedade e o saber atuar em
meio a estes atores, sem perder de vista os papéis inerentes à sua profissão,
precisa ser desenvolvida, assim como uma visão sobre a realidade que se
movimenta, numa recursividade que permite enxergar as diversas situações em sua
realidade própria e imediata com também situá-la em contextos sempre mais
abrangentes.
A formação onde o profissional é concebido como “pessoa” em permanente
desenvolvimento pessoal, relacional e profissional, estrutura-se sobre a construção
de uma identidade profissional positiva e sobre o desenvolvimento de competências,
45
pessoais e relacionais, dentro de uma atmosfera de confiança e clareza na
comunicação.
Neste caso, o imaginário a ser enfrentado tanto internamente às instituições
quanto junto à população, é aquele que associa os profissionais com características
que estão além ou aquém das expectativas humanas, resultando em que eles
mesmos não tomem contato e não atendam às suas necessidades.
Como referem Paquay e Wagner, os diversos paradigmas necessitam ser
percebidos de forma articulada, atendendo a diferentes competências profissionais
(e a diferentes imaginários) o que significa que nenhum deles pode ser descartado
e, tampouco, pode ser forçada uma integração entre eles o que, por sua
artificialidade, poderia produzir um “amálgama incoerente”
39
.
A complexidade da profissão policial exige formação que contemple
competências com ela compatíveis, pela articulação entre os saberes, as
habilidades, hábitos, atitudes e os esquemas de ação conforme delineado na MCN
3
,
incluindo a reflexão sobre o imaginário implícito nas concepções que sustentam
políticas públicas para propiciar condições para um exercício profissional
acompanhado de qualidade de vida, o que poderá resultar num devir construído
sobre concepção de envelhecimento com bases que questionem estereótipos e
preconceitos
3
. Destarte, assegurar uma formação profissional com qualidade
significa evoluir no sentido de uma visão educacional mais humanizadora, que
priorize uma aprendizagem continuada sobre a melhoria na qualidade de vida antes
e após a aposentadoria.
Numa problemática desta natureza é preciso auxiliar na construção de uma
identidade policial militar que inclua uma nova cidadania (social e solidária),
garantindo um maior tempo na vida produtiva e uma velhice com qualidade.
2.3.5 Imaginário e concepção
Gilbert Durand, em Comunicação apresentada no 1
o
Congresso
Internacional de Transdisciplinaridade, na Universidade Internacional de Lisboa,
Novembro de 1994, referiu-se ao imaginário como “lugar do “entre-saberes”, “tecido
conjuntivo “entre” as disciplinas, o reflexo ou a “reflexão”? que acrescenta ao
banal significante os significados, o apelo do sentido”
40; 231
.
46
Segundo este autor, a “civilização da imagem” representou, não a
valorização do imaginário, como também sua aproximação às diversas disciplinas:
[...]”o imaginário que emerge de todas as disciplinas e as reforça”
40; 232
.
O imaginário faz os fenômenos serem o que são, pois fazem parte de uma
construção histórica e de uma cultura resultante de uma atmosfera em constante
produção de imagens. Desta forma, as imagens associadas ao fenômeno
envelhecimento são parte das concepções de mundo, alimentando/sendo
alimentadas por conhecimentos elaborados a partir de princípios
7
de organização
do pensamento, resultando em outras imagens e em ações sobre a realidade
compatíveis com elas, pois o imaginário “apresenta, claro, um elemento racional, ou
razoável, mas também outros parâmetros, como o onírico, o lúdico, a fantasia, o
imaginativo, o afetivo, o não racional, o irracional, os sonhos, enfim, as construções
mentais potencializadoras das chamadas práticas”
43; 76
.
O imaginário representa a relação entre os limites que a sociedade e que a
própria vida, como realidade objetiva impõe à subjetividade. “Nisso entra, ao mesmo
tempo, algo sólido, a vida com suas diversas modulações, e alguma coisa que
ultrapassa essa solidez. sempre um vaivém entre as intimações objetivas e a
subjetividade. Uma abre brechas na outra”
43; 80
.
O imaginário é uma construção mental, social e do espírito, do pensamento
racional/não racional que se nutre das realidades nutrindo-as, as
enriquece/enriquecendo-se e as ultrapassa, impregna o coletivo/individual,
estabelece laços/disjunções; é individual/coletivo; produz imagens que, ao mesmo
tempo contribuem para a sua formação e transformação e, embora cada indivíduo
viva este imaginário a partir de suas idiossincrasias, permanece sendo um fenômeno
grupal, tribal, partilhado, trazendo a sensação de fazer parte de algo, de partilhar,
“funciona pela interação, pela vibração comum e pela sensação partilhada”. É o
“estado de espírito de um grupo”, um “cimento social” em que o individual assume a
forma de um reflexo grupal. É algo que ultrapassa o indivíduo”, algo que “impregna o
coletivo ou, ao menos, parte do coletivo”
43; 76
, algo que “instala-se por contágio”
41; 13
.
Silva
41
define imaginário como reservatório e motor: Como reservatório,
“agrega imagens, sentimentos, lembranças, experiências, visões do real que
realizam o imaginado, leituras da vida”, a partir do que constrói “um modo de ver, de
ser, de agir, de sentir e de aspirar estar no mundo”. Este movimento de construção
se dá, a um tempo, nos indivíduos e nos grupos e constitui “marca digital
47
simbólica”. Como motor, “o imaginário é um sonho que realiza a realidade, uma força
que impulsiona indivíduos ou grupos”, condição estruturante que possibilita a ação
do homem no mundo
41; 12
. Assim sendo, o imaginário, que nasce da própria
realidade, a ela retorna, idealizado, como força propulsora de ação sobre esta
realidade.
As formas a partir das quais se a construção do imaginário nos
indivíduos e nos grupos seguem caminhos diversos. Nos indivíduos pela
“identificação (reconhecimento de si no outro), apropriação (desejo de ter o outro em
si) e distorção (reelaboração do outro para si)”; nos grupos, pela “aceitação do
modelo do outro (lógica tribal), disseminação (igualdade na diferença) e imitação
(distinção do todo por difusão de uma parte)”
41; 13
.
Morin, em artigo publicado no livro “Edgar Morin: Ética, Cultura e
Educação”
44
fala em “complexos imaginários”, formados a partir dos processos de
projeções, identificações e transferências, em que os sujeitos/indivíduos projetam
estados psíquicos no mundo externo, identificam-se com o projetado
44
. Nos
complexos imaginários estes elementos são distintos/ interdependentes.
“O complexo imaginário [...] determina a vida imaginária” e representa “um
análogo (analogon) psíquico das relações de troca entre um ser vivo e seu meio”
44;
90-1
. Este complexo está de tal forma imerso na vida prática que Morin refere-se a
uma “osmose entre imaginário e prática”
44; 101
.
O imaginário e as concepções sobre envelhecimento e sobre formação são
configurações originais, que formam uma unidade engendrada por um espírito
humano que, num determinado espaço e tempo, ao criar exclusões sociais,
apresenta seqüelas nascidas no imaginário social
8
.
A construção das concepções está associada ao desenvolvimento da
estrutura da personalidade, compreendendo sentimentos e pensamentos
relacionados aos fenômenos
20
, a partir de acontecimentos, articulações, objetos,
estruturas, leis do mundo
8
, imaginário e motivação.
Nesta construção também participam a inteligência e a memória, que
auxiliam na transformação do conhecimento em concepção. A memória associada
ao pensamento, aciona o processo de autocrítica
8
, que é importante à
reconsideração das próprias concepções e à reconstrução do conhecimento. Este
movimento de reconsideração inclui a consciência dos processos internos
48
relacionados à concepção, produzindo a reflexão que permite a autocorreção e o
autodesenvolvimento
8
.
As concepções podem ser concebidas como um sistema aberto formado por
instâncias interdependentes, que se produzem umas às outras em circuito
reflexivo/recursivo. Isto significa afirmar que os processos cognitivos são produtores
e produtos da atividade hipercomplexa de um “aparelho” que computa/cogita de
modo informacional/representacional/ideal, de forma digital/analógica,
quantitativa/qualitativa, lógica/alógica, precisa/imprecisa, analítica/sintética,
imaginativa/verificadora, racional/mitológica
8
.
“A imaginação elabora formas ou figuras novas, inventa/cria sistemas a
partir dos elementos captados aqui e ali, o que confirma, na esfera do pensamento,
o caráter experimental de toda evolução criadora”
7
.
No Projeto de Pesquisa Matriz “Concepção de Envelhecimento”,
coordenado por Azevedo e Souza, participam diferentes subprojetos realizados em
diferentes estratos da realidade nos anos de 2000, 2002 e 2003, utilizando-se de
dados também relacionados ao imaginário associado à concepção. Os resultados
destes estudos apontam para concepções simplificadoras de envelhecimento e
mostram que nelas, a dimensão mais presente tem sido a biológica associada a
efeitos negativos, inclusive em resultado sobre imaginário associado ao fenômeno
envelhecimento em estrato composto por profissionais que trabalham na área da
Gerontologia, ocasião em que foi identificada contradição entre a concepção
emergente da fala e a emergente das imagens associadas, (numa conotação
preconceituosa e estereotipada).
A partir da análise do imaginário associado ao envelhecimento é possível
constatar se as concepções incluem descritores favoráveis e/ou desfavoráveis, o
que pode indicar visão de envelhecimento com consciência da ambivalência contida
na complexidade deste fenômeno ou se as concepções do envelhecimento
apresentam indícios de simplificação ou complexidade.
As imagens associadas aos fenômenos infiltram-se na concepção de mundo
do sujeito/indivíduo
8
e têm sua origem em conhecimentos e sentimentos construídos
em vivências e percepções da realidade que se desenvolveram durante a história
pessoal
20
.
As pessoas tornam-se timas de suas próprias construções imagéticas;
quando jovens contribuem para a criação de estereótipos em relação ao
49
envelhecimento, que com o passar dos anos assumem configuração
fantasmagórica. Esta estereotipificação parece afetar a confiança, baixando a auto-
estima
45
.
A “perda” da condição estética desejada/imposta culturalmente pelo
envelhecimento faz sentir-se diferente, perceber o afastamento do ideal estético
corporal.
O envelhecimento psicológico tem relação com o sentido subjetivo de idade,
que depende de como cada um avalia a presença ou não de marcadores biológicos,
sociais e psicológicos em comparação com outras pessoas.
O corpo, com suas modificações pode originar sentimentos de perda e de
luto por um corpo que se distancia do ideal de juventude socialmente instituído
45
.
Na realidade investigada, a complexidade associada ao fenômeno
envelhecimento torna-se ainda mais complexa pela possibilidade permanente de
morte prematura e pelo papel que ocupam a vitalidade e a força física como
condições para o desempenho profissional..
50
3 MÉTODO E METODOLOGIA
3.1 FALANDO SOBRE O MÉTODO
O estudo foi desenvolvido numa abordagem qualitativa, numa perspectiva
dialógica implícita ao método da complexidade, em triangulação com a semiologia
(no artigo sobre a concepção de envelhecimento implícita no imaginário) e com a
fenomenologia (nos artigos sobre as concepções de envelhecimento e de formação
manifestadas no depoimento escrito dos participantes do estudo).
O todo da complexidade constitui pensamento que se nutre de incerteza
e da reflexão, recusando o conhecimento fragmentado e redutor
15
.
Este método constitui a busca de um pensar que seja capaz de respeitar a
realidade, em sua multidimensionalidade, sua riqueza e mistério e de reconhecer
que o objeto do conhecimento é co-determinado pelas determinações cerebral,
cultural, social e histórica
15
.
No desenvolvimento da presente pesquisa foi utilizado o método da
complexidade que concebe o sujeito/indivíduo em sua autonomia/dependência e em
sua singularidade/generalidade, numa relação recorrente na qual o sujeito/indivíduo
é “simultaneamente gerado/produzido/determinado e
gerador/produtor/determinante”; que reconhece a realidade complexa das
emergências (qualidades fenomênicas) que retroagem sobre o que as causou e que
são parte constitutiva do todo
46; 295
.
O método da complexidade implicou elaboração de estratégia na busca e
alcance da compreensão/explicação da realidade.
“A compreensão é justamente o conhecimento por projeção/identificação
que torna um ser-sujeito inteligível para outro ser-sujeito [...] traz uma possibilidade
de inteligência da subjetividade pela subjetividade”, que pode e deve ser não
reflexiva mas combinada indissoluvelmente com a 'explicação', isto é, os modos
objetivos de inteligibilidade. Compreensão e explicação devem controlar-se e
completar-se reciprocamente e remeterem-se uma à outra num circuito cognitivo
explicação compreensão
46; 325
.
Os princípios metodológicos interdependentes que permearam a pesquisa
foram os que embasam a dialógica proposta por Morin
15
:
51
princípio hologramático, em que a parte está no todo e o todo está de
alguma forma nela representado, numa concepção de recursividade entre totalidade
e partes constituintes
princípio recursivo em que a causa age sobre o efeito, e o efeito age
sobre a causa, modificando-a, gerando um novo efeito...(retroação auto-reguladora);
em que os produtos e os efeitos são produtores e causadores do que os produz,
num entendimento de autoprodução e auto-organização;
princípio dialógico, numa união entre idéias antagônicas,
complementares ou concorrentes, formando novas sínteses provisórias, num
determinado tempo e espaço.
Assim sendo, partes antagônicas/complementares/concorrentes interagem
entre elas e com o todo, que de alguma forma está nelas representado, e o todo, ao
ser transformado/transformado-se, as transforma (princípios dialógico, hologramático
e recursivo);
A busca da objetividade, no presente estudo, implicou mobilização da
curiosidade intelectual diante do desconhecimento sobre a realidade e diálogo com
autores e o emprego da subjetividade o que significou compreender a objetividade
incluindo “aderências subjetivas”, pois “a objetividade se aprofunda na sua raiz
subjetiva/objetiva”
46; 328.
Só um sujeito consciente de ser sujeito pode lutar contra a subjetividade. Só
um sujeito consciente de ser sujeito pode conceber o seu auto-egocentrismo e tentar
descentrar-se através do espírito, inscrevendo-se num circuito transubjetivo superior
que vai chamar-se o amor da verdade
46; 328
.
Foi preciso adotar princípios metodológicos capazes de agrupar pontos de
vista que “se excluem, se opõem, se inter-hierarquizam de modo que, não deixando
de ser antagônicos ou concorrentes, se tornam complementares e dependem da
realidade complexa do indivíduo”
46; 294
.
Como principais garantias da qualidade dos dados qualitativos (equivalentes
à confiabilidade, validade e relevância), utilizou-se:
47
a) a triangulação entre tipos de análises (análise de conteúdo e análise
semiológica) e a reflexividade (equivalente à confiabilidade e validade);
b) a transparência e a clareza nos procedimentos (equivalente à
confiabilidade), explicitadas nos quadros e esquemas elaborados a partir das falas
dos participantes;
52
c) a construção do corpus ( equivalente à confiabilidade e relevância) a
partir da decisão sobre a fonte de dados e do critério de saturação (quando o
material analisado não apresenta mais novidade);
d) a descrição detalhada (equivalente à confiabilidade e relevância) o que
permitirá que outros pesquisadores possam fazer réplica do estudo.
3.2 CARACTERIZANDO OS PARTICIPANTES
A Brigada Militar do Estado do Rio Grande do Sul teve um percurso histórico
singular, de defesa de território, o que culminou numa denominação diferenciada do
resto das polícias militares brasileiras em que Brigada significa uma Divisão do
Exército. Sua singularidade também se manifesta na sua identidade e imagem junto
a seus públicos e nas características estaduais.
O estudo foi desenvolvido junto a um grupo de 22 alunos sargentos do
Curso Básico de Administração Policial Militar, de formação de nível intermediário da
Polícia Militar do Rio Grande do Sul escolhidos de forma aleatória, dentre o total de
alunos do curso, em número de 147, compreendendo profissionais de todas as
regiões do estado.
Estes alunos sargentos -, concluindo o curso estarão habilitados a ser
promovidos a 1
o
Tenente, posto de nível intermediário na hierarquia policial militar,
considerado elo de ligação entre os oficiais, gestores da instituição e a tropa
diretamente envolvida com a população.
Assim, para poderem realizar este curso, os sargentos passaram por um
processo seletivo do qual constaram provas escritas, exames de saúde, testes
físicos e exame profissiográfico, este com o objetivo de verificar se o candidato
possuía ou não perfil para exercer o posto de Tenente.
O número total de sargentos no Estado é de aproximadamente 10500.
A opção pelo critério de inclusão/exclusão tempo de serviço igual ou
superior a 20 anos deveu-se ao fato destes profissionais terem atualmente a
possibilidade de aposentarem-se aos trinta anos de trabalho. Assim, o limite em
vinte anos significa um mínimo de dois terços de tempo na ativa e a possibilidade
dos respondentes terem no mínimo trinta e cinco anos.
A decisão sobre a amostra - 22 participantes - manteve-se nos limites
considerados na literatura consultada para a realização de atividades de coleta de
53
dados em nível coletivo, pela saturação dos dados (critério de confiabilidade e
relevância), o que encontra suporte em Flick
48
e Bauer e Gaskel
47.
.
Flick denomina de “amostragens teóricas” as que podem ser tomadas
quando se pretende comparar sem ter como base uma amostragem estatística. Os
participantes foram selecionados de acordo com o que era esperado de dados
emergentes para o conhecimento que estava sendo construído
48
e foi a construção
do corpus (indicador de confiabilidade e relevância) o critério que permitiu uma
coleta sistemática de dados, o que exigiu transparência nos procedimentos e nos
critérios utilizados
47
.
O tamanho da amostra permitiu atender à tendência de saturação, pois a
generalização pretendida foi a analítica (análise teórica), o que significa que os
resultados encontrados foram referentes aos componentes do corpus e poderão ser
transpostos para novos contextos sob a forma de hipóteses,
47
desde que seja
realizada análise criteriosa do novo contexto de aplicação.
Aos policiais foi entregue um roteiro para depoimento por escrito, cuja
primeira parte constava de questões fechadas, com o objetivo de caracterização. Na
segunda parte constavam 11 questões abertas sobre envelhecimento e formação
profissional, que foram analisadas numa abordagem fenomenológica. As questões e
as respostas dadas constam dos anexos deste estudo.
Uma destas perguntas solicitava que citassem objetos ou descrevessem
imagens que associavam ao envelhecimento e, sobre as respostas dadas a esta
pergunta, foi realizada análise semiológica, utilizando-se a análise proposta por
Penn
49
.
O valor cognitivo das metáforas foi utilizado, pois através destas os
entrevistados revelaram seu imaginário.
A metáfora freqüentemente fornece precisões que a língua puramente
objetiva ou denotativa não pode fornecer. Ao estabelecer uma comunicação
analógica entre realidades diversas, a metáfora intensidade afetiva à
inteligibilidade que apresenta.
50
Assim sendo, quando os participantes citaram bom
vinho, bom livro, bengala e ferrugem, por exemplo, possibilitaram uma melhor
compreensão da qualidade atribuída ao envelhecimento.
Identificar concepções de envelhecimento e identificar sob que imaginário
se foram construindo, é condição para qualquer intervenção que vise à reconstrução
de concepções de envelhecimento que possibilite olhar a velhice (etapa do
54
processo) a partir de uma visão sistêmica, de sua “arquitetura complexa”, que é
construída sobre pilares não biológicos como, também, sociológicos,
psicológicos, culturais e educacionais.
Os profissionais policiais militares caracterizam-se por:
a) idade entre 36 e 51 anos, sendo que, destes, 2 entre 30 e 39 anos, 19
entre 40 e 49 anos e 1 entre 50 e 59 anos (tabela 1 – Anexo 2).
b) estado civil: 11 casados, 4 solteiros, 2 divorciados, 2 separados (tabela 2-
Anexo 2).
c) escolaridade: 6 com curso superior incompleto e 9 completo, 4 com curso
de especialização, 8 com Ensino Médio completo (tabela 3- Anexo 2).
d) formação: 12 fizeram curso téçnico-operacional, 5 de cultura geral, 2
pedagógica, 2 recursos informatizados (tabela 4- Anexo 2).
e) tempo de exercício na função: entre 16 e 30 anos (tabela 5- Anexo 2).
f) tempo em exercício de policiamento ostensivo: 3 participaram por 3 anos,
2 por 5 anos, 1 por 6 anos, 3 por oito anos, 1 por 10 anos, 1 por 14 anos, 1 por 15
anos, 1 por 17 anos, 1 por 18 anos, 1 por 19 anos, 2 por 20 anos, 3 por 21 anos, 1
por 22 anos e 1 por 23 anos (tabela 6- Anexo 2).
g) Doenças crônicas: 18 afirmaram não ser portador de doença crônica, 2
referiram-se a problemas na coluna vertebral e 1 a diabetes (tabela 7- Anexo 2);
h) Uso de medicação: 17 aasseveraram não utilizar medicação e dos 4 que
declararam que sim 1utiliza medicamento para problema de pressão arterial, 2
utilizam analgésicos e 1 não informou) (tabela 8- Anexo 2).
i) Internação para tratamento emocional: 1 informou ter sido internado; 19
afirmaram não ter se submetido a psicoterapia, 2 declararam que sim e 1 que está
em acompanhamento psicológico (tabelas 9 e 10 - Anexo 2).
Considerando-se que situações do cotidiano policial têm potencial para
gerar estresse o que pode levar à ansiedade e depressão, julgou-se importante a
aplicação do Inventário de Depressão de Beck
51
para verificar se os participantes
encontravam-se com traços de depressão, pela potencial de influência nos
resultados.
O Inventário de Depressão foi desenvolvido por Aaron T. Beck e colegas,
para medir manifestações comportamentais da depressão. A opção pela inclusão
deste teste foi pelo fato de referências bibliográficas aludirem à relação deste fator
com a ansiedade e à aprendizagem de novos domínios como possibilidade de gerar
55
ansiedade ante a novidade
52
(os policias militares que participaram da pesquisa
encontravam-se em fase final de curso de formação de nível intermediário).
O inventário compreende categorias de sintomas e atitudes, com afirmações
com um grau crescente de severidade da depressão. O escore total é composto da
soma dos escores de 0 a 3 para cada item. O indivíduo testado deve marcar a
alternativa que mais se aproxima do seu estado de humor. A auto-administração do
teste é feita em, aproximadamente, 15 minutos.
Três dos 22 entrevistados obtiveram escore zero, quatro obtiveram escore
1,um obteve escore 2, dois obtiveram escore 5, dois obtiveram escore 6, cinco
obtiveram escore 7, dois obtiveram escore 8, um obteve escore 12 e um obteve
escore 20. (Tabela 11 - Anexo 2)
De acordo com Beck et al.
51
, escores entre 0 e 4 estão abaixo do normal e
podem significar negação da depressão; escores entre 5 e 12 são considerados
como não significativos; escores entre 13 e 20, moderados e entre 26 e 36, denotam
quadros severos.
De acordo com esta tabela, dentre os policiais entrevistados, 8
apresentaram índice considerado indicativo de possível negação da depressão; 12
estão na faixa de escores considerados não significativos e um encontra-se na faixa
considerada depressão moderada.
Tratando-se de policiais militares, cuja missão é zelar pelo bem da
comunidade em situações de risco relacionado à segurança e que exigem repressão
e/ou prevenção, os cursos de formação e aperfeiçoamento têm como conteúdo
transversal a atitude de enfrentamento e a leitura e gestão situacional em alto risco.
Assim sendo, os profissionais são treinados para controlar o medo e a ansiedade,
que podem contribuir para a depressão e o estresse
52
.
Os fenômenos que compõem o mundo humano atendem à prerrogativa da
complexidade. Impossível pensá-los sem pensar sobre suas relações de
interdependências:
8
é conveniente discutir resultados de uma pesquisa sobre
envelhecimento realizada junto a policiais militares, considerando bibliografia de
áreas pertinentes,o que encaminhou para a necessidade de busca de sintomatologia
da depressão e uso decorrente de medicamentos como também, do estresse e da
ansiedade. Estes dois últimos não fizeram parte do presente estudo e podem
impulsionar a continuidade e o aprofundamento da pesquisa em relação ao
cruzamento de dados, podendo ajudar a esclarecer relações de interdependência e
56
a romper com posicionamentos científicos simplificadores e reducionistas da
realidade humana.
3.3 DESENVOLVIMENTO DO ESTUDO
Após a escolha do tema, definição do problema e dos objetivos do estudo,
foram desenvolvidas as seguintes atividades de pesquisa:
escolha de ângulo e da abordagem teórica de análise;
elaboração de referencial teórico inicial, que foi complementado ao
longo da pesquisa e ao longo da elaboração dos artigos com os resultados;
estruturação da trajetória metodológica;
elaboração do instrumento de coleta de dados sobre as concepções e
imaginário sobre envelhecimento;
aplicação do instrumento de coleta de dados;
busca de informações sobre a realidade investigada que
complementassem e ampliassem a proposta e o referencial teórico;
interpretação dos dados e discussão sobre os resultados;
análise crítica dos resultados alcançados e elaboração de pontos
referenciais;
busca de indícios de que a produção desenvolvida era consistente e
coerente;
reflexão sobre reformulação ou rejeição de idéias do próprio sistema de
referência;
identificação de acréscimos sobre o conhecimento anterior.
No momento em que o grupo de policiais militares foi convidado para
participar da pesquisa, lhes foram apresentados os objetivos, os procedimentos, os
instrumentos de coleta de dados e o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
(Anexo 1) para assinatura.
Inicialmente foi percebida uma relativa resistência por parte de dois
profissionais que mencionaram um pesquisador anterior que havia simplesmente
levantado os dados não oferecendo nenhum retorno. Ao ser explicado que, após o
preenchimento dos instrumentos, teriam a oportunidade de discutir sobre o tema
envelhecimento e formação, os dois profissionais decidiram participar.
57
A discussão foi acompanhada de uma apresentação em PowerPoint sobre
concepções de envelhecimento nos aspectos biológicos, sociológicos, psicológicos,
educacionais e culturais com o objetivo de levá-los à reflexão sobre as suas próprias
concepções e imaginário registrados no instrumento de coleta de dados (Anexo 5).
Desta forma, foi-lhes proporcionado momento de avaliação de suas próprias
concepções o que tem potencial para mobilização para futuras reflexões sobre seu
próprio projeto de vida.
53
Pela observação participante foi possível perceber que o profissional, que
apresentava uma resistência inicial mais intensa, passou a manifestar interesse em
discutir os temas mais longamente do que os demais, pois permaneceu após o
encerramento do trabalho, apresentando detalhes sobre como encarava o
envelhecimento e solicitando mais informações.
O presente estudo proporcionou estímulo a descobertas em relação a
aspectos pouco definidos da realidade do profissional policial militar em fase de
preparação para ocupar nível intermediário entre oficiais e a tropa.
Nele, inicialmente foi configurada a problemática investigada e o
desenvolvimento da base teórica necessária o que facilitou a coleta de dados e
balizou a generalização analítica dos resultados.
Para generalização analítica utilizou-se o referencial teórico previamente
desenvolvido com o qual se comparou resultados empíricos obtidos.
54
o que
possibilitou a construção de conclusões que têm potencial para serem testadas em
novos contextos de aplicação.
O estudo contemplou os seguintes elementos básicos:
Questão principal do estudo - Qual a concepção de envelhecimento
implícita no imaginário a ela associado e no depoimento escrito?
Questões complementares sobre limitações e possibilidades em
relação a este fenômeno; expectativas após os 60 anos; e sobre a concepção de
formação profissional (o que é, como deveria ser);
Unidades de Análise definidas (Unidades de Registro na análise de
conteúdo e Unidades de Significado na análise fenomenológica) de forma que
delimitassem a abrangência, estando relacionadas com as questões norteadoras do
estudo.
Ao desenvolver estes elementos básicos, foi preciso ter presente os
princípios da dialógica de Morin o que ajudou a esclarecer sobre a questão principal
58
e as complementares, o propósito do estudo e as unidades de análise e possibilitou
a articulação entre dados e o contexto.
Estes passos básicos permearam a:
orientação e preparação do estudo;
redação do projeto;
identificação de fonte de dados;
coleta de dados;
elaboração de protocolo contendo: uma visão geral do estudo: objetivos,
a questão principal do estudo e leituras relevantes; procedimentos (aplicação do
roteiro de depoimento escrito com questões abertas e observação participante); as
questões que o investigador tinha em mente na coleta de dados, as fontes de
informação, o registro dos dados e as potenciais fontes de informação.
Para a análise das evidências o pesquisador optou pela descrição do
desenvolvimento do estudo, que se caracterizou pela elaboração de um esquema
descritivo e identificação do que foi significativo para ajudar na interpretação do
fenômeno. Neste estudo, o esquema inicial foi:
Entendendo a relevância e as intenções do estudo
Contextualizando teoricamente
Entendendo a metodologia
Descobrindo as concepções e o imaginário, dos policiais militares
Analisando as evidências
Elaborando pontos de referência
3.4 COLETA E ANÁLISE DE DADOS
Referente à observação participante, os dados foram registrados por meio
de nota de campo por ocasião da aplicação do instrumento e discussão sobre
concepções e imaginário com os participantes.
54
O trabalho que incluiu os dados coletados pela observação participante
percorreu os movimentos com base em Haguette:
54
leituras sucessivas dos dados, reunindo as notas de campo e os dados
coletados por depoimento escrito;
59
rastreamento das pistas de dados emergentes, interpretações e idéias,
registrando o que pareceu importante durante a aplicação do instrumento, a leitura
e a reflexão sobre os dados;
identificação das concepções e imaginário, em relação ao
envelhecimento e formação, utilizando-se da análise fenomenológica e análise
semiológica das imagens associando-se análise de conteúdo.
Por vezes estes tipos de análise são considerados como instrumentos de
análise diversos, mas permitem aproximações (complementações) –princípio
dialógico -, pois a inclusão de códigos interpretativos (baseados mais na conotação
do que na denotação) nas análises de conteúdo são explicitação da influência da
semiologia. A análise de conteúdo, pela possibilidade de sistematização e de
confirmação, auxilia a análise semiológica a contornar influências idiossincráticas
54
.
A análise semiológica dos dados compreendeu:
a) análise das imagens, tornando claros aspectos componentes para a
compreensão de seu sentido, acordo com o objetivo do estudo e a disponibilidade
do material;
b) inventário realizado em relação a cada uma das imagens citadas;
c) associações a partir de questões como:
Que associações foram trazidas à mente quando citaram as imagens?
Como a imagem se relaciona com a concepção de envelhecimento?
Que aspectos culturais são importantes para entender as imagens
associadas?
O que predomina na imagem?
d) elaboração de matrizes a partir do inventário e das respostas às
questões.
e) análise do texto, segundo Bardin
55
, triangulando-se com Penn
49
, foi
realizada através das seguintes etapas:
Leitura flutuante: leitura global das respostas às questões abertas,
seguida de uma leitura individualizada;
exploração do material, incluindo a identificação das Unidades de
Registro, organizando-se na forma de esquemas e posteriormente na forma de
matrizes;
categorização;
60
análise das contradições implícitas e explícitas;
compreensão/explicação da realidade com base no referencial teórico
construído.
A escolha pela triangulação entre o método Fenomenológico e o da
Complexidade (nos artigos sobre concepções de envelhecimento e de formação)
teve como objetivo a complementação de perspectivas de análise e a compreensão
de que o estudo fenomenológico propicia a descrição e compreensão do fenômeno
necessária ao método dialógico, possibilitando a explicação e uma aproximação do
foco de interesse e o seu diálogo com o referencial construído.
A fenomenologia é o estudo dos fenômenos, caracterizando-se por atitude
de reflexão e um método, respondendo às exigências e necessidade da
cientificidade.
Como atitude inclui a concepção de “intencionalidade da consciência”
56
,
como consciência orientada para as coisas, -“toda consciência é consciência de” si
próprio e do mundo
57
e do conhecimento do conhecimento
7
.
O mundo é inseparável do sujeito, de um sujeito que é projeto do mundo e o
sujeito é inseparável do mundo que ele mesmo projeta”
7
em suas relações
intersubjetivas na busca de objetividade
58
.
O pesquisador para conhecer os participantes da pesquisa precisa
“percebê-los objetivamente, estudá-los, se possível, objetivamente, outrossim deve
compreendê-los subjetivamente. O desenvolvimento de um conhecimento objetivo
do mundo deve avançar junto com um conhecimento intersubjetivo do outro”
58; 80
.
Trata-se de explorar a própria coisa que se percebe, em que se pensa, de quem se
fala, evitando elaborar hipóteses, “tanto sobre o laço que une o fenômeno com o ser
de que é fenômeno, como o laço que une com o “Eu” para quem é fenômeno
59
.
Neste estudo, triangulou-se com os passos do Método Fenomenológico
apontados por Amedeo Giorgi
60:
a) o sentido do todo compreendendo a descrição do fenômeno, a partir da
leitura dos depoimentos por escrito, articulando-se os objetos da experiência da
forma como é vivida pelo sujeito de forma que seja evidenciado o que ele representa
na situação investigada, respeitando a parte-todo que aparece;
b) a identificação das Unidades de Significado (partes) realizada a partir do
sentido do todo obtido na descrição, processando a redução fenomenológica, numa
61
atitude de pré-reflexão para captar o fenômeno tal como se mostra, sem a
cumplicidade do senso comum;
c) a transformação das Unidades de Significado (linguagem cotidiana) em
Linguagem Gerontológica (concepção de envelhecimento) e Linguagem
Gerontológica e educacional (concepção de formação) para a construção do objeto
de estudo a partir de interpretação, permitindo a redução da extensão da descrição
representativa do fenômeno explicitado pelo sujeito.
d) a síntese das Estruturas de Significado, compreendendo uma descrição
que equivale à estrutura da experiência vivida, buscando-se o conjunto dos
significados (todo formado pelas essências do fenômeno), que é discutido
teoricamente, acentuando modos de pensar a realidade, levando à compreensão do
fenômeno estudado.
A análise fenomenológica realizada sobre as concepções de
envelhecimento são apresentadas no próximo capítulo.
Com passos do Método da Complexidade
15
:
a) a reflexão sobre as próprias preconcepções (certezas provisórias do
pesquisador) como momento de reflexão sobre o que espera encontrar na realidade
e sobre sua própria concepção sobre o fenômeno investigado, vivenciando
momentos de conhecimento do próprio conhecimento e preparando uma base para
avaliar seus próprios avanços a partir dos resultados da pesquisa;
b) a reflexão sobre as incertezas que permeiam os dados coletados da
realidade;
c) a análise intradiscurso, elaborando representação gráfica, a partir das
Unidades de Significado, para melhor perceber as inter-relações entre elas;
d) a análise interdiscurso, buscando aspectos implícitos nas inter-relações
entre as Estruturas de Significado;
A esta triangulação foi acrescentada a contribuição de Comiotto
60
à análise
fenomenológica de Giorgi, identificando-se as dimensões implícitas nas essências.
Completando-se a exploração dos dados foi realizada uma análise com
base nos princípios da dialógica Moriniana. Esta opção significou a consciência de
que as imagens (metáforas) associadas e os depoimentos escritos dos participantes
expressam intencionalidades, revelando aspectos de suas concepções que nem
sempre são transparentes nos discursos orais.
62
3.5 ASPECTOS ÉTICOS
A realização do presente estudo foi efetuada após a aprovação da
Comissão Científica do Instituto de Geriatria e Gerontologia da PUCRS e do Comitê
de Ética em Pesquisa na Área de Saúde da PUCRS.
Os voluntários da pesquisa assinaram termo de consentimento livre e
esclarecido (Anexo 01).
A pesquisa foi conduzida dentro das normas da Resolução 196/1996 do
Conselho Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP) sob mero de aprovação
1066/05-CEP, em 07 de novembro de 2005 (Anexo 02) com o título “Concepção de
envelhecimento e interdependências: um estudo junto a policiais idosos
aposentados e policiais na ativa”.
4 ANÁLISE FENOMENOLÓGICA: A DESCRIÇÃO, COMPREENSÃO E
INTERPRETAÇÃO DA CONCEPÇÃO DE ENVELHECIMENTO E DE FORMAÇÃO
4.1 CONCEPÇÃO DE ENVELHECIMENTO
A partir da transcrição dos textos dos depoimentos por escrito foram
realizadas as descrições dos depoentes, apresentadas a seguir, identificadas, em
negrito, as unidades de significado, realizada a transposição para a linguagem
gerontológica e, após, coletivamente identificadas as essências que compõem a
essência do fenômeno concepção de envelhecimento.
a) Participante 1: declarou que deveria parar de fumar e ter uma alimentação
saudável e estudar um pouco mais, para envelhecer com melhor qualidade.
Entende que o envelhecimento significa uma maior limitação física, esperando as
limitações causadas pela doença e pelo desgaste físico, mas que, quanto mais o
tempo passa, mais as pessoas gostam porque vivem intensamente todos os
momentos. Quando idosa, espera ter as possibilidades que construir antes pois
nada cai do céu e tem que se buscar aquilo que se quer. Associa o
envelhecimento a cabelos brancos, doenças e bengala. Espera ter saúde e ficar
perto das pessoas das quais gosta. Espera o sentir solidão; curtir sua casa e
ser voluntária em projetos assistenciais. Tem como meta ser independente,
respeitada e aceitar-se sem traumas em virtude da vaidade e não ser inútil.
Transposição para linguagem gerontológica: Para o participante não fumar, ter
uma alimentação saudável e manter atividade intelectual são importantes para um
envelhecimento com melhor qualidade. Concebe o fenômeno envelhecimento
associado à limitação física e às causadas por doença e pelo desgaste físico,
associando-o a aspecto indicador de velhice (cabelos brancos) e à metáfora que
personifica perda relacionada à locomoção (bengala); à possibilidade de solidão, de
cuidar da casa, de trabalho voluntário; de gostar de viver intensamente os
momentos. Tem como meta manter a autonomia e a utilidade, o respeito e aceitar-se
sem traumas em relação ao aspecto físico.
64
b) Participante 2: menciona que está estudando para melhor acompanhar as
mudanças e praticando atividade física. Entende que num envelhecimento com
melhor qualidade, o principal é a saúde e cultura, acompanhando a evolução
rápida das novas gerações e exercendo outra atividade após a aposentadoria,
ocupando-se com algo. Considera o envelhecimento fator natural, de movimento
que consta de tudo, associando este fenômeno a doenças, rejeição e solidão.
Suas metas em relação ao envelhecimento o manter a saúde com atividade
física e com saúde mental. Declara que, como idoso não terá atividade sexual
como hoje e que terá, como possibilidades, manter uma boa relação com as
pessoas da família e cultivar outras amizades.
Transposição para linguagem gerontológica: o participante associa o
envelhecimento à necessidade de atividade intelectual para o acompanhamento das
mudanças e da evolução rápida das novas gerações, de atividade física e laboral; de
saúde física e mental. Concebe o envelhecimento como fator natural, ativo em todos
os momentos e associado a doenças, diminuição da atividade sexual, aos
sentimentos de rejeição e de solidão e à possibilidade de bom relacionamento com
familiares e cultivo de novas amizades.
c) Participante 3 afirma o estar pensando sobre o envelhecimento e que
deveria estar fazendo uma poupança, para não passar dificuldade mais tarde.
Entende que envelhecimento é aquela situação em que as capacidades física e
mental são reduzidas, associando a este fenômeno as imagens: ferrugem, rugas,
podridão, doença, dificuldade e experiência. Como idoso, acredita que sua
limitação será ter problemas com a saúde e por isso procura, sempre que possível,
praticar algum esporte. Como não terá mais a obrigação de cumprir horários
poderá ter condições de desfrutar um pouco da vida.
Transposição para linguagem gerontológica: o participante não pensa sobre o
envelhecimento e sim que é importante investir em poupança para evitar dificuldade
econômica na velhice e, ainda, praticar alguma atividade física. Concebe o
envelhecimento associado à redução das capacidades física e mental, às imagens
65
de deterioração, de sinal de velhice, de problemas de saúde, dificuldade, experiência
e condições de desfrutar a vida pela desobrigação de cumprimento de horário.
d) Participante 4: afirma que desenvolve outra profissão, “extra BM”, pois
trabalha 16 anos como técnico de enfermagem e como técnico em informática,
não pretendendo ficar “parado” após a aposentadoria, somente contando
tempo de vida. Declara que deveria alimentar-se melhor, tendo melhor qualidade
de vida (lazer, cultura, viajar mais, divertir-me mais), estudando mais, lendo
muito mais e descansando bastante. Considera sedentarismo, estagnação,
“parado no tempo”, formas de envelhecimento. Concebe a “velhice como
passagem da vida ativa para uma vida contemplativa, sendo a hora de desfrutar
e/ou colher os frutos plantados. Quanto a objetos ou imagens a que associa o
fenômeno do envelhecimento cita: um bom livro, um ótimo vinho, que, quanto
mais velho, melhor seu paladar e seus ensinamentos. Acredita que para
conhecer o seu futuro, basta olhar para o passado com os olhos do presente. Após
completar 60 anos, espera descansar um pouco, viajar muito, dançar mais e
continuar usando a mente lendo, vendo, sentindo as coisas boas da vida. Suas
metas em relação à velhice são: ver seus netos crescidos. Apesar da diabete espera
estar bem de saúde, realizado profissionalmente e feliz com a vida. Entende que,
em função de sua doença, poderá ter problemas visuais, circulatórios e/ou
renais, mas como se cuida muito, isto não ocorrerá,”se Deus quiser”. Assim
sendo, declara que poderá fazer tudo o que o seu organismo agüentar e a mente
quiser.
Transposição para linguagem gerontológica: o participante considera importante
manter-se produtivo após a aposentadoria. Concebe envelhecimento associado à
alimentação, problemas de saúde, realização profissional, ao sentimento felicidade e
à qualidade de vida em seus aspectos culturais, de lazer e diversão, e leitura, estudo
e descanso; à possibilidade de estagnação e sedentarismo; às imagens
representativas de atividade intelectual, de qualidade relacionada à possibilidade de
ensino. Concebe a velhice como predomínio da vida contemplativa, constituindo
tempo de desfrute, lazer e diversão e colheita de resultados de ações passadas.
66
e) Participante 5: declara que está iniciando uma formação acadêmica em Direito
e planejando a organização de um escritório para atuar no ramo Penal Militar, após a
aposentadoria. Para um envelhecimento com melhor qualidade deveria estar
formado. Entende que o envelhecimento é uma opção, questão de ponto de vista
e de comportamento, ligado à auto-estima. Associa este fenômeno a imagens
como piscina, caminhar na praia, olhar para a Torre Eiffel, sentir a neve no
rosto. Tem como metas chegar à velhice com saúde e com companhia
interessante e também saudável. Como limitações que pensa terá como idoso
mencionou perda da agilidade, cansar mais rápido e que, com certeza,
economizará com cortes de cabelo e gastará mais com outras coisas. Entende
que terá, como idoso, a possibilidade de ter que cuidar de netos, de ter que cuidar-
se mais, de ter saudade de não ter feito o que pode fazer hoje, com saúde com
força e com felicidade.
Transposição para linguagem gerontológica: o participante pretende permanecer
produtivo após a aposentadoria. Concebe envelhecimento como uma opção, uma
questão de ponto de vista, de comportamento, de realização de curso superior.
Associa o fenômeno a imagens representativas de atividade física, contemplação de
criação humana e ao sentimento de frio. Entende a velhice relacionada à
expectativa de saúde e companhia interessante; perda de agilidade, cansaço mais
rápido, valorização de novos aspectos (não relacionados a cuidados com a
aparência física), aproximação de familiares, cuidados consigo mesmo e sentimento
de saudade e de arrependimento em relação a não realizações quando tinha força,
saúde e felicidade.
f) Participante 6: declara que o pretende depender de outras pessoas,
familiares ou não, que é preciso ter uma vida mais ou menos regrada
financeiramente ou no trato com a saúde, o cometendo abusos. Afirma que
deveria estar praticando mais exercícios físicos e ter uma melhor qualidade de
vida, tendo uma alimentação mais balanceada, podendo ter uma maior atividade de
lazer. Entende que o envelhecimento é quando o corpo passa a ter ou apresentar
algumas limitações físicas, embora a mente esteja até preparada para
desempenhar determinadas tarefas, quando acontecem quedas, falta de motivação
67
e fragilidade. Após completar 60 anos espera continuar com saúde para poder
trabalhar e realizar seus sonhos, entendendo que as oportunidades no mercado
de trabalho deverão ser muito poucas.
Transposição para linguagem gerontológica: o participante concebe o
envelhecimento associado à necessidade de autonomia, vida regrada
financeiramente e em relação à saúde, sem excessos, exercícios físicos,
alimentação balanceada e atividade de lazer; corpo com limitações físicas, mesmo
quando a mente estiver produtiva; possibilidades de quedas, falta de motivação e
fragilidade. Percebe a velhice como tempo de busca de manutenção da saúde para
poder manter-se produtivo e realizar sonhos, com o entendimento da diminuição de
oportunidades no mercado de trabalho.
g) O participante 7: declara que busca ter boa qualidade de vida através do estar
bem com as pessoas, amenizando as situações, tratando principalmente do
espírito. Afirma que é preciso ter um maior cuidado com as condições apresentadas
no ambiente de trabalho. Declara que busca sempre o diálogo para não sofrer e
não apresentar o aspecto negativo das coisas. No seu entender envelhecimento
é: pobreza de espírito, quando não se cuida da alma, do corpo, do intelecto,
pois tudo é exercício. Associa as imagens de árvore frondosa, bengala e livros
ao envelhecimento. Afirma ainda não ter pensado em suas metas para após os
sessenta anos, mas espera para ver o que o futuro terá para lhe oferecer.
Finaliza dizendo que, quer estar de bem consigo e com a vida. Pensa que terá
como limitação física, mas que, pelo exercício do intelecto através de leituras e
do físico com atividades como esportes e danças e se tratar o espírito, não
terá limitações, mas possibilidades, pois cuida bem de si em todos os sentidos.
Transposição para linguagem gerontológica: o participante associa a qualidade
de vida ao bom relacionamento com as pessoas, evitando sofrimento e não
apresentando o aspecto negativo das coisas; à amenização de conflitos e à
espiritualidade, às condições do ambiente de trabalho. Associa o envelhecimento à
pobreza de espírito, quando não o cuidado com a alma, o corpo, o intelecto, pois
o exercício destes aspectos é importante; a imagens de maturidade, limitação na
68
locomoção e intelecto; a estar em bem consigo mesmo e com a vida; limitação física,
espiritualidade e cuidado integral.
h) O participante 8: afirma que, para um envelhecimento com qualidade, busca um
melhor entendimento de si mesmo, cuidando gradativamente para ter uma
alimentação mais saudável. Entende que é preciso buscar atender a saúde,
mental e material. Concebe o envelhecimento como perda da auto-manutenção,
quando a pessoa começa cada vez mais a depender dos outros, associando o
fenômeno do envelhecimento a uma cadeira de balanço próxima a um fogão à
lenha. Declara não esperar muito do futuro, após os 60 anos, pois vive num
país onde todas as instituições são muito carentes principalmente de seriedade.
Suas metas em relação ao envelhecimento são envelhecer ao lado de seus filhos
com saúde e realizado profissionalmente. Entende, também, que a perda do
pensamento rápido e da mobilidade física serão as limitações que te como
idoso e que as possibilidades serão muito poucas.
Transposição para linguagem gerontológica: o participante associa o
envelhecimento com melhor qualidade a um melhor entendimento de si mesmo e a
uma alimentação saudável, ao atendimento à saúde física e mental e às condições
materiais. Percebe o envelhecimento como perda da auto-manutenção, da
autonomia, associando o fenômeno à imagem de uma cadeira de balanço próxima a
um fogão à lenha. Tem poucas expectativas em relação ao futuro, após os 60 anos,
pois vive num país com instituições carentes, principalmente de seriedade. Pretende
envelhecer com saúde, ao lado de seus filhos e sentindo-se realizado
profissionalmente. Entende que a perda da agilidade de pensamento e da
mobilidade física serão limitações e que as possibilidades serão poucas na velhice.
i) O participante 9: declara estar desenvolvendo uma atividade religiosa
(evangélica) e também a atividade ser escritor “pois é um Poeta Brigadiano”. Pensa
que deveria estar “preparando” o envelhecimento com melhor qualidade tendo um
bom salário para freqüentar boas Universidades e aumentar o seu nível cultural e
poder ser um multiplicador da cultura ou do conhecimento adquirido. Entende
69
que um envelhecimento com qualidade de vida é saber viver com as suas
diferenças e limitações, sabendo respeitar os outros, fazendo a parte que lhe
couber, sem se importar se não for grande o bastante como gostaria que
fosse, mas que o fique em estado de inércia. Associa as imagens cadeira de
descanso, pessoas caminhando ou fazendo exercícios em piscinas, pescaria,
chimarrão e sentar-se a beira mar ao envelhecimento. Espera contribuir de
alguma forma para que as gerações futuras adquiram o que adquiriu e
aprender com os mais novos para viver ainda mais. Tem como metas uma vida
saudável, atividade prazerosa como leitura e escrever muitos livros. Pensa que
terá limitações somente financeiras para fazer cursos em Universidades e terá que
usar óculos. Entende que as possibilidades serão todas as que possuía desde
jovem que, com o passar dos anos e com mais experiência, diminuirão cada
vez mais as chances de errar, tendo mais acertos para uma melhor qualidade de
vida.
Transposição para a linguagem gerontológica: o participante entende que para
um envelhecimento com qualidade é preciso saber viver com diferenças e
limitações, sabendo respeitar os outros, cumprindo com suas responsabilidades,
mesmo que não alcance o sucesso desejado, não permanecendo em inércia.
Associa o envelhecimento a imagens representativas de descanso, atividade física,
lazer e imobilidade contemplativa; à contribuição com gerações futuras e à
aprendizagem com os mais jovens; à possibilidade de desenvolvimento de atividade
intelectual prazerosa; à limitação visual e a limitações financeiras para acesso a
Universidades e aumento do nível cultural, para ser um multiplicador da cultura ou
do conhecimento adquirido; e à possibilidade da experiência diminuir as chances de
errar.
j) O participante 10 declara que, atualmente, procura realizar os cursos possíveis
na instituição, visando uma melhor ascensão profissional e ganho financeiro,
para viver com menos dificuldades. Também pretende realizar algum tipo de
curso para ter uma atividade profissional após a aposentadoria. Sobre como
deveria estar “preparando” um envelhecimento com melhor qualidade, disse
preocupar-se com o fato de ainda não ter realizado um curso para uma atividade
70
pós- aposentadoria. Percebe o envelhecimento como um estágio da vida em que
se chega após um longo percurso, tendo atingido um amadurecimento e várias
experiências, já estável (teoricamente), procurando uma melhor qualidade de
vida, podendo cuidar melhor da saúde, passeios, convívio social. Associa o
envelhecimento a uma árvore desde o seu nascimento, como plantinha, até a
velha árvore que, após passar por todos os estágios da vida e, embora
cascuda e envelhecida, continua dando sombra. Após os 60 anos, espera estar
bem de saúde física e psicológica para poder continuar numa atividade
profissional e realizar os prazeres de que gosta e viver de uma forma digna,
confortável e tranqüila, vendo como limitação a capacidade física diminuída e
como possibilidade a de realizar passeios, viagens, algum tipo de esporte,
alguma atividade profissional e atividade comunitária.
Transposição para linguagem gerontológica: o participante associa o
envelhecimento à necessidade de ascensão profissional e ganho financeiro, saúde
física para viver com menos dificuldades; à manutenção de atividade profissional
depois da aposentadoria e à realização de prazeres, tranqüilidade, conforto e
dignidade. Entende o envelhecimento como estágio da vida que chega, após
amadurecimento e várias experiências, acompanhado da busca por uma melhor
qualidade de vida, pela disponibilidade para cuidar melhor da saúde, lazer e convívio
social. Associa o envelhecimento à imagem representativa que indica seu início no
nascimento e que, após estágios, culmina na velhice (com alterações no aspecto
físico e possibilidade de dar apoio), à diminuição da capacidade física e à
possibilidade de dedicação ao lazer, atividade física, profissional e comunitária.
k) O participante 11 declara não ter preocupação com o envelhecimento porque
ainda não se sente velho”. Manifesta que, às vezes, pensa em se aposentar e se
dedicar mais ao lazer junto com seus familiares e que para um envelhecimento
com melhor qualidade, é preciso um melhor salário, no final da carreira, melhores
planos de saúde para si e familiares, ter uma atividade que não tome muito seu
tempo e viajar, curtir a natureza. Entende que envelhecimento é parar de sonhar,
é desistir de seus ideais, é entregar-se para doenças, não lutar, perder o prazer
pela vida. É o amadurecimento e o crescimento intelectual, associando o
71
fenômeno a doenças, estresse, pressão externa, cansaço mental, sedentarismo
e asilo. Após os 60 anos, espera estar desfrutando a aposentadoria junto com os
seus familiares, tendo como meta a saúde. Cita como limitação o medo de ser
discriminado e como possibilidade, mencionou viajar, conhecer novos lugares,
praia, pescaria e curtir os netos.
Transposição para linguagem gerontológica: o participante associa o
envelhecimento ao sentimento “ser velho”, à saúde e à possibilidade de dedicação
ao lazer com familiares, à atividade com menor carga horária em razão da
aposentadoria; à necessidade de um melhor salário, no final da carreira, de
melhores planos de saúde para si e familiares. Associa o envelhecimento como a
ausência de sonhos, à desistência dos ideais, à entrega para doenças, ao estresse,
à pressão externa, ao cansaço mental e à perda do prazer pela vida, sedentarismo e
instituição asilar; ao amadurecimento e ao crescimento intelectual; e à possibilidade
do sentimento de medo da discriminação.
l) O participante 12 declara que o envelhecimento exige cuidado com a
alimentação, do corpo como um todo e evitar excesso e que para um
envelhecimento com melhor qualidade é preciso um bom entendimento e
compreensão do estado espiritual. É o “outono”, não chegando em tempo
determinado, pois a cada dia vivido, se tem consciência de ter aprendido algo
mais e que também deu alguma coisa em troca, que da juventude a cada dia se
despede um pouco. Associa o fenômeno do envelhecimento a outono, ferrugem e
oxidação. Sua meta em relação ao envelhecimento é a de repassar suas
experiências profissionais e de vida, de forma a ajudar as outras pessoas.
Pensa que terá limitações físicas e possibilidades de realizar alguma atividade,
desde que se prepare para tal.
Transposição para linguagem gerontológica: o participante associa o
envelhecimento ao cuidado com a alimentação, com o corpo em sua totalidade e à
ausência de “excessos”; ao bom entendimento e à compreensão da dimensão
espiritual. Concebe o envelhecimento como processo sem tempo determinado para
iniciar, associando-o à possibilidade diuturna da consciência de constante
72
aprendizagem e troca; ao distanciamento da juventude e à limitações físicas; à
imagem representativa de perdas, deterioração; à invocaçã0 de experiências
profissionais e de vida como forma a ajudar aos outros; à possibilidade de alguma
atividade, para a qual houve preparação.
m) O participante 13 está estudando e, para uma melhor qualidade entende que
deveria comprar uma chácara no campo para pescar, fazer exercícios, viajar e
realizar atividade de serviço voluntário. Declara que envelhecimento é parar de
produzir e começar a usufruir da aposentadoria para dar lugar no mercado de
trabalhopara a juventude. Após completar 60 anos espera ter uma aposentadoria
que lhe permita adquirir chácara no campo para pescar, fazer exercícios, viajar e
não voltar a trabalhar novamente, pois não quer tirar o lugar de uma pessoa jovem
que está entrando no mercado de trabalho. Suas metas em relação ao
envelhecimento são pescar e exercer atividade de serviço voluntário. Assevera
que limitações que terá como idoso serão as normais e que terá a possibilidade de
relacionamento e convívio social.
Transformação para a linguagem gerontológica: o participante associa atividade
intelectual, aquisição de moradia rural, lazer, atividade física e retirada do mundo do
trabalho assalariado e inclusão em atividade voluntária a uma melhor qualidade e ao
envelhecimento. Entende que na velhice poderá ter limitações inerentes ao
envelhecimento e que terá a possibilidade de relacionamento e convívio social.
n) O participante 14 associa o seu envelhecimento à independência, cuidando da
saúde, adquirindo conhecimentos diversos e fazendo exames dicos e que é
preciso um cuidado melhor de sua saúde, ampliando as relações sociais e se
estressando menos para um envelhecimento com melhor qualidade. Entende
que o envelhecimento é ficar cada vez mais sozinho e ter dificuldade em
entender as mudanças da sociedade. Após os 60 anos, espera ter mais contato
com a natureza, não estar tirando uma vaga no mercado de trabalho, ter uma
boa relação social, viajar mais e ter boa saúde. Suas metas são de maior
contato com a natureza e manutenção de um bom convívio social. Não imagina
73
que limitações terá como idoso e declara que, quanto às possibilidades, elas
serão as que quiser ter.
Transformação para a linguagem gerontológica: o participante associa o
envelhecimento à autonomia, ao cuidado com a saúde, à aquisição de conhecimento
e à realização de exames médicos, ampliação das relações sociais e diminuição do
estresse. Concebe o envelhecimento com a presença da solidão e da dificuldade no
entendimento das mudanças na sociedade; aproximação da natureza e abertura de
vaga no mercado de trabalho; não incluindo a consciência de limitações e
possibilidades relacionadas ao envelhecimento.
o) O participante 15 declara que após a aposentadoria pretende esquecer que foi
uma Policial Feminina pioneira, ter isto na lembrança e procurar um trabalho
voluntário, pois não se acha em condições de, aos 50 anos, ser uma Policial.
Afirma que não se sente velha, que adora viver e que aos 70anos estará lendo,
indo ao cinema, caminhando no parque e que somente falará de sua vida como
Polícia a quem lhe conhece. Sobre o envelhecimento, menciona ver jovens velhos,
que limitações físicas e que se preocupa com o físico porque é muito
vaidosa. Quanto às imagens às quais associa o fenômeno do envelhecimento cita
dificuldade em locomover-se (velha sentada na cadeira), a sabedoria adquirida
na experiência (velho contando histórias) e a loucura pela solidão (um velho
sentado sozinho). Após completar 60 anos, se como alguém com bichos e
feliz, lendo livros espíritas. Tem como meta aproveitar um pouco mais sua vida,
pois na profissão que exerce é uma escrava dos relógios e dos compromissos.
Pede a Deus para não ter dificuldades de locomover-se devido à coluna e que sua
memória não fique falha. Declara não ver muitos benefícios no envelhecimento,
mas que terá uma boa aposentadoria e poderá viajar bastante. Não pretende ser
uma velha visitando quartéis, pois acha este ambiente muito pesado. O tempo de
policial separa contar histórias para netos. Afirma não ver a velhice como um
problema, mas como uma conseqüência natural.
Transposição para linguagem gerontológica: a participante entende que, após a
aposentadoria, não deve haver referência à função profissional, guardando-a
74
somente para ser revivida somente com conhecidos e com os netos, devendo
procurar um trabalho voluntário, por considerar que aos 50 anos não terá mais
condições para o tipo de trabalho desempenhado. Percebe a velhice como
conseqüência natural, associando-a ao desenvolvimento de atividade intelectual,
lazer, atividade física. Sobre o envelhecimento, não associa este fenômeno à idade,
associa a limitações físicas; a imagens representativas à dificuldade de locomoção,
perda de memória; à sabedoria da experiência e à loucura pelo sentimento solidão,
a presença de animal de estimação e atividade intelectual relacionada à opção
espiritual; ao lazer livre do compromisso com cumprimento de horários.
p) O participante 16 declara que sempre procura manter o condicionamento
físico. Entende que deveria dar mais atenção à parte intelectual, pois não tem o
hábito de leitura e em algumas vezes sente certa dificuldade nesta parte. Concebe
o envelhecimento associado àquela pessoa que pensa que tudo acabou, que o
mais motivos para iniciar algo novo, pelo simples fato de estar aposentado.
Cita, como imagens às quais associa o fenômeno do envelhecimento, casa sem
pintura, determinado local que não é cuidado, não sofre manutenção e carro
enferrujado. Após completar 60 anos, pretende não se descuidar da parte física e
ver seus filhos muito bem encaminhados e casados. Como metas, declara que
gostaria de fazer algum curso voltado para a eletrônica. Pensa que não terá
nenhuma limitação como idoso e nenhuma possibilidade.
Transposição para linguagem gerontológica: o participante associa o
envelhecimento à manutenção do condicionamento físico e da atenção ao intelecto
(leitura); ao desejo de que os filhos estejam seguros, ao pensamento de que “tudo
acabou”, que não motivos para “iniciar algo novo”; a imagens representativas de
deterioração, falta de cuidado; a uma posição em que não é esperada nenhuma
limitação e nenhuma possibilidade.
q) O participante 17 declara que ainda falta muito tempo para a preparação de
seu envelhecimento, está vendo o lado financeiro e que deveria estar
cuidando mais de sua alimentação, para chegar “no envelhecimento” com saúde.
Considera que o envelhecimento, é pessoal, pois uma pessoa pode ter uma idade
75
avançada e um espírito jovem. Cita cabelos brancos, pele enrugada,
dificuldade para se locomover como imagens às quais associa o fenômeno do
envelhecimento. Após completar 60 anos, espera ter boa saúde, para poder viajar
e desfrutar da vida, o que não fez no tempo em que estava na ativa. Quanto a
metas em relação ao envelhecimento afirma que não irá trabalhar mais, mas
somente curtir. Espera não ter limitações como idoso e que está pensando
no lado financeiro e de saúde, que são os principais, que lhe darão condições para
desfrutar da aposentadoria.
Transposição para linguagem gerontológica: o participante entende o
envelhecimento como algo ainda distante e associado ao aspecto financeiro e de
alimentação para chegar à velhice com saúde. Concebe o envelhecimento como
fenômeno individual e associado à juventude do espírito, a sinais na aparência física
e à dificuldade de locomoção; à boa saúde, afastamento do mundo do trabalho e
lazer na velhice.
r) O participante 18 entende que o envelhecimento precisa ser sadio tanto mental
como fisicamente e que isso não começou a ocorrer “ontem pois este é um
processo que deve ser cuidado desde o início da vida, pois “Quando nascemos
no dia seguinte começamos a envelhecer.” Pensa que seria preciso fazer esta
pesquisa não com pessoas praticamente na reserva, mas fazendo a preparação
desde o ingresso na Carreira para ter um bom resultado no final.
Envelhecimento é um estado mental e físico e as imagens as quais associou o
fenômeno do envelhecimento foram: um grande júri, uma bela casa e boas
ações. Após completar 60 anos, espera completar cem anos, repleto de saúde
física e mental e depois pensar no que fazer nos próximos anos. Suas metas
visam continuar com saúde física e mental e pensa que, como idoso, terá tantas
limitações quantas desejar ter, que não terá limitações e sim, troca de
atividades. Pensa que terá as possibilidades que lutará para ter.
Transposição para linguagem gerontológica: o participante concebe o
envelhecimento como processo a ser cuidado desde o início da vida, pois que
começa no nascimento, constituindo um estado mental e físico e associado à saúde
mental e física, atividade diversa, a uma preparação durante a carreira profissional, a
76
imagens representativas de um julgamento sobre as ações, boa moradia e boas
ações, às limitações assumidas e às possibilidades conquistadas.
s) O participante 19 afirma em relação envelhecimento, que é preciso o cuidado
físico através de exercícios e funcional preparando atividade para quando a
velhice chegar e deveria estar preparando um envelhecimento com melhor
qualidade através de uma boa dieta alimentar e mantendo o corpo em atividade,
física e psíquica. Entende que o envelhecimento é quando a pessoa perde a
aptidão, para desempenhar atividades que faria quando era novo. Trata-se de
perda em caráter normal, não por motivo de doença ou outro mal qualquer. Cita
carro e barco naufragado há 90 anos como imagens às quais associa o fenômeno
do envelhecimento. Após completar 60 anos espera que os anseios de hoje sejam
conquistados. Tem como meta chegar a ter mais idade com os seus objetivos
alcançados. Quanto às limitações que terá como idoso, entende que serão as
comuns, que todas as pessoas ditas idosas possuem e que as possibilidades serão
de curtir a família, ajudar e fazer caridade.
Transposição para linguagem gerontológica: o participante associa
envelhecimento à atividade física e psíquica, ao preparo para desenvolver atividade
funcional na velhice e a boa dieta alimentar. Percebe que o envelhecimento traz
limitações que lhes são inerentes, iniciando quando perda da aptidão para
desempenhar atividades consideradas prerrogativas para jovens, associando-o a
imagem de deterioração e ao alcance dos objetivos declarando ainda que as
limitações serão as comuns; as possibilidades serão de conviver com a família,
ajudar e fazer caridade.
t) O participante 20 afirma que ainda não parou para pensar o que fazer após
aposentar-se e ficar mais velho e que um bom envelhecimento deve estar junto
com uma boa saúde, porque tendo uma vida saudável, a pessoa terá uma boa
velhice. Entende que o envelhecimento é o período em que o homem alcançou
todos os seus objetivos e que, entrando na terceira parte, deverá tirar o proveito
com uma boa qualidade de vida e procurar uma atividade para ocupar o seu
77
tempo. Aparência física, ociosidade e não estar fazendo nada foram imagens às
quais associou o fenômeno do envelhecimento. Após completar 60 anos, espera ter
uma boa qualidade de vida e continuar com arte marcial. Tem como meta, fazer
um trabalho comunitário. Espera não ter nenhuma limitação como idoso, pois
sempre manteve uma boa qualidade de vida, mas como tem problemas com
bronquite, pensa que terá problemas e que como possibilidades convites para
trabalhar em atividades comunitárias, pois desde procura interessar-se nestas
funções.
Transposição para linguagem gerontológica: o participante afirma que ainda não
parou para pensar o que fazer após a aposentadoria. Entende que o envelhecimento
com qualidade está associado à saúde, à atividade produtiva profissional e
comunitária; aos sinais na aparência física, ociosidade; à atividade física. Concebe o
envelhecimento como período em que os objetivos foram alcançados, com
limitações associadas a aspectos de saúde no presente.
u) O participante 21 declara que vem alcançando as metas que previu quando
assinou contrato com a BM. Trabalha o necessário e é radicalmente contra o
retrabalho após a aposentadoria. Pensa que deveria estar preparando um
envelhecimento com melhor qualidade e que vem, passo a passo, construindo
sua velhice, buscando para si condições boas de trabalho, para a equipe e a
comunidade. Almeja tranqüilidade, mas sempre alcançando as metas propostas.
Considera que o envelhecimento é amadurecimento físico e psicológico,
associando-o a um Mustang verde limão de plástico e que não encontrando o
mais o carro de plástico verde, se brincando de futebol e pião c/ afilhado e de
cavalinho, rolo e bolinho com a neta. Após os 60 anos, espera estar com saúde e
ter o próprio negócio. Almeja que o envelhecimento não seja de maneira
dolorosa e sim um pouco mais tranqüila, pois foram longos dias de chuva e frio,
que certamente também ocorrerão, mas aí doerá menos. Entende que, como
idoso, terá limitações de saúde e que as possibilidades serão o conhecimento
adquirido, o respeito conquistado, mais tempo para si, para a família e ajudar
com opinião, se alguém procurar.
78
Transposição para linguagem gerontológica: o participante associa o
envelhecimento ao alcance de metas, à saúde e à substituição de atividade laboral
remunerada por negócio próprio, preparando-se para uma velhice com melhor
qualidade através da busca de si condições boas de trabalho para si, a equipe e a
comunidade. Concebe o envelhecimento como amadurecimento físico e psicológico,
associando-o a limitações de saúde; à possibilidade de reconhecimento do
conhecimento e respeito; à tranqüilidade e disponibilidade de tempo para si e a
família; à saudade da infância, que é revivida nas brincadeiras com netos.
v) O participante 22 declara estar desenvolvendo atividades físicas para cuidar
do corpo e da mente, realizando cursos e especializações para dar aulas e que
as pessoas deveriam ter consciência que todos vão envelhecer: todos querem
viver muito, mas ninguém quer ficar velho. Entende que o envelhecimento é um
processo entrópico em que o organismo perde gradativamente a sua
funcionalidade ou a plena eficácia. Cita, como imagens às quais associa o
fenômeno do envelhecimento, componentes mecânicos ou eletrônicos com
tecnologia ultrapassada e fornece, como exemplos, carruagem, máquina
datilográfica, telex e ser humano que o conseguiu mais acompanhar o
desenvolvimento físico ou intelectual. Declara estar trabalhando e investindo para
construir uma pousada no nordeste, onde possa receber amigos e, quem sabe,
alguns queiram morar com ele e seus familiares, sem fins lucrativos. Tem como
meta, envelhecer com saúde. Quanto a limitações que terá como idoso, pensa que
será a resistência à fadiga e que terá mais tempo disponível e experiência de
vida.
Transformação para linguagem gerontológica: o participante associa
envelhecimento à atividade física e saúde, cuidado com o corpo e a mente;
preparação intelectual para desenvolver outras atividades e para lazer e atividades
não lucrativas após a aposentadoria; ao tempo disponível e experiência de vida; a
imagens representativas de processo mecânico ou eletrônicos com tecnologia
ultrapassada e ser humano que não conseguiu mais acompanhar o desenvolvimento
físico ou intelectual. Entende o envelhecimento como processo entrópico em que o
organismo perde gradativamente a funcionalidade ou a plena eficácia.
79
Com base nesta descrição e análise foram identificadas as seguintes
Estruturas de Significado (essências), que constituem partes por vezes
antagônicas, complementares, concorrentes, constituintes do todo concepção de
envelhecimento -, que, ao interagir, modificam/são modificadas/modificam-se nas
relações consigo, com os outros e com o mundo:
a) Envelhecimento como fenômeno de natureza biológica associado a
limitações físicas e limitações e possibilidades psicológicas, sociais, educacionais,
culturais e espirituais.
b) Envelhecimento como processo sem tempo determinado para iniciar,
independentemente da idade e distante do momento presente.
c) Envelhecimento como processo a ser cuidado desde o início da vida, pois
começa ao nascer.
d) Envelhecimento como processo entrópico em que o organismo perde
gradativamente a funcionalidade ou a plena eficácia.
e) Envelhecimento como fenômeno ambivalente em sua associação a um
imaginário que composto por representações de limitações e possibilidades.
f) Envelhecimento como sinônimo de velhice e afastamento da juventude.
g) Velhice associada à preparação de condições intelectuais e financeiras
para manter a saúde e lazer e afastamento do trabalho para dar espaço para jovens.
h) Velhice como conseqüência natural, associando-a ao desenvolvimento de
atividade intelectual, lazer, atividade física.
Utilizando-se o acréscimo feito por Comiotto
55
à análise fenomenológica de
Giorgi, identificou-se as seguintes dimensões:
Biológica: concepções em que o fenômeno envelhecimento se confunde com a
velhice, embora esta seja apenas uma etapa; envelhecimento associado a cuidados
com a alimentação, autonomia e atividade física, como processo distante (no futuro),
que está presente desde o início da vida.
Psicossocial: concepções em que o fenômeno envelhecimento foi
associado a lazer com familiares, bom relacionamento, lazer, improdutividade,
produtividade, autoconhecimento, situação financeira, trabalho voluntário,
discriminação.
Educacional: concepção em que o fenômeno envelhecimento é
associado à preparação acadêmico-intelectual para atividades a serem
80
desenvolvidas após aposentadoria e de natureza diversa à profissional
desempenhada no presente.
Cultural: concepção de envelhecimento em que o imprinting e a
normalização cultural se fazem presentes nas Unidades de Significado identificadas,
em que envelhecimento está associado a uma etapa após aposentadoria,
confundindo-o com uma de suas etapas – a velhice.
Com base nestas essências e dimensões foi elaborado o artigo
“CONCEPÇÃO DE ENVELHECIMENTO: TECENDO A COMPLEXIDADE”.
4.2 CONCEPÇÃO DE FORMAÇÃO
Nesta análise optou-se por integrá-la à concepção de envelhecimento para
melhor perceber articulações possíveis.
a) O participante 1 declara que os cursos e a experiência profissional deram
suporte prático para uma melhor qualificação. Acredita que seu processo de
formação profissional está de acordo com a expectativa. Entende formação
profissional como cursos, experiências e busca do conhecimento e
aperfeiçoamento. Do futuro, após completar 60 anos, espera ter saúde e ficar
perto das pessoas que lhe são caras, “ou seja, o sentir solidão; curtir sua
casa e ser voluntária em projetos assistenciais ou semelhantes”. Em relação à
velhice tem como meta ser independente, respeitada e aceitar-se sem traumas
em virtude da vaidade e não ser inútil. Quanto às limitações que pensa terá como
idoso, responde que serão aquelas causadas pela doença e pelo desgaste físico,
quanto às possibilidades, serão todas aquelas que construir antes pois, “nada cai
do céu e tem-se que buscar aquilo que se quer”.
Transposição para linguagem educacional/gerontológica: Para o participante,
cursos e experiência profissional dão suporte prático para melhorar a qualificação e
a formação profissional está ligada a cursos, a experiências, busca de conhecimento
e aperfeiçoamento. Sua concepção de envelhecimento inclui a possibilidade de
doenças, o desgaste físico, a aproximação de pessoas com ligação afetiva, a
preocupação com a solidão e projetos assistenciais. Associa velhice com
81
independência, respeito e auto-aceitação das mudanças na aparência física e com
produtividade. Entende que sua velhice será resultado daquilo que construir antes.
b) O participante 2 declara que o processo de formação profissional deveria ser
sempre atualizada através de instrução. Considera que a instrução e atualização
são necessárias em virtude das mudanças rápidas a que todas as instituições estão
submetidas, mudanças mundiais. Para ele, formação profissional é a capacitação
do homem para exercer uma atividade profissional específica. Do futuro, após
completar 60 anos, espera estar com saúde, bem informado e exercer outra
atividade profissional na área privada. Suas metas em relação à velhice são
manter a saúde com atividade física e com saúde mental. Pensa que, como idoso,
terá como limitação a redução da atividade sexual e, como possibilidades,
manter uma boa relação com as pessoas da família e cultivar outras amizades.
Transposição para linguagem educacional/gerontológica: Para o participante a
formação profissional deve ser sempre atualizada e é a capacitação para atividade
profissional específica, associando-a à atualização e à instrução. Sua concepção de
envelhecimento está associada à saúde física e mental, à informação, a
produtividade. Associa a velhice com saúde, atividade física, e uma menor atividade
sexual, manutenção de boas relações familiares e de novas amizades.
c) O participante 3 declara que o processo de formação profissional deveria dar
condições para uma vida com tranqüilidade junto da família, podendo inclusive
auxiliar aos mais novos não com sua experiência, mas também
financeiramente. Formação profissional para ele é a condição exigida para uma
melhor capacidade. Do futuro, após completar 60 anos, espera ter saúde e uma
condição financeira razoável para desfrutar bem e de uma forma salutar a vida.
Quanto às metas em relação à velhice, declara que ainda não pensou sobre isto.
Como idoso, acredita que sua limitação será ter problemas com a saúde e por isso
procura, sempre que possível, praticar algum esporte. Pela ausência de obrigação
de cumprimento de horários pensa que, idoso, poderá ter condições de desfrutar
um pouco da vida.
82
Transposição para linguagem educacional/gerontológica: O participante associa
formação com condições para vida tranqüila junto da família e possibilidade de
auxiliar aos mais novos pela experiência e financeiramente; a condição para melhor
capacidade profissional. Sua concepção de envelhecimento está associada ao
cuidado da saúde, finanças, possibilidade de problemas de saúde, atividade física e
não necessitar mais cumprir horários, o que permitirá desfrutar da vida. Ainda não
pensa na velhice.
d) O participante 4 declara que o processo de formação profissional deveria ser
uma constante preparação profissional e um aprimoramento (ou lapidação)
emocional, como base de aplicabilidade dos conhecimentos e experiências
adquiridas ao longo da vida preparando para uma aposentadoria tranqüila,
tanto econômica quanto emocional. Entende formação profissional, como
conhecimentos técnicos (práticos ou não) adquiridos ao longo do seu espaço
laboral (adolescente até adulto) com todos requisitos necessários ao bom
desempenho de suas funções laborais. Do futuro, após completar 60 anos,
espera descansar um pouco, viajar, dançar e continuar usando a mente lendo,
vendo, sentindo as coisas boas da vida. Suas metas em relação à velhice, são
de ver seus netos crescidos e, apesar da diabete, estar bem de saúde, realizado
profissionalmente e feliz com a vida, por cuidar-se muito. Reconhece que poderá
ter, como limitações, problemas visuais, circulatórios e/ou renais. Quanto às
possibilidades, declara que poderá fazer tudo o que seu organismo agüentar e a
mente, base de tudo, quiser.
Transposição para linguagem educacional/gerontológica: O participante associa
o processo de formação profissional a uma constante preparação profissional e
aprimoramento emocional, aplicação de conhecimentos e experiências, preparo de
aposentadoria tranqüila, econômica e emocionalmente, conhecimento técnico,
requisito necessário ao bom desempenho de funções laborais. Sua concepção de
envelhecimento está ligada a descanso, lazer, uso da mente através de leituras e
prazer. Associa velhice a ver os netos crescidos, ter saúde, realização profissional,
83
felicidade e auto cuidado. Reconhece a possibilidade de limitações física e declara
que poderá fazer tudo o que seu organismo permitir e a mente quiser.
e) O participante 5 declara que seu processo de formação profissional tem
transcorrido além do esperado e quer mais, mas sempre aliando a teoria com a
técnica. Formação profissional é a aquisição de conhecimento cnico
transformador do comportamento. Nova visão do que é feito e que influencia no
comportamento e na civil. Do futuro, após completar 60 anos espera viajar,
ingressar em grupos e freqüentar festas da terceira idade e ser, se possível,
esportista sênior. Tem como metas em relação à velhice a saúde e companhia
interessante e saudável. As limitações que pensa que terá como idoso serão
perder a agilidade, mas não toda e cansar mais rápido. Quanto às
possibilidades, entende que haverá uma grande possibilidade de ter que cuidar de
netos, de ter que cuidar-se mais, de ter saudade de não ter feito o que pode
fazer hoje, com saúde com força e com felicidade.
Transposição para linguagem educacional/gerontológica: para o participante, a
formação procura aliar teoria e técnica, inclui aquisição de conhecimento técnico
transformador do comportamento, uma nova visão do que é feito. Sua concepção de
envelhecimento está ligada ao lazer, esportes, saúde, companhia, perda de parte
da agilidade física, cansar mais rapidamente, cuidar de netos, necessidade de maior
autocuidado, saudade do que não fez quando tinha saúde, força e felicidade.
Associa velhice à saúde e companhia saudável.
f) O participante 6 declara que seu processo de formação profissional tem sido
muito lento e com metas que a instituição alterou várias vezes, causando
prejuízos e falta de motivação. Formação profissional é a base para o
desenvolvimento de qualquer profissão. Do futuro, após completar 60 anos espera
continuar com saúde para poder trabalhar e realizar seus sonhos. Com relação à
velhice espera ter muita saúde e poder continuar trabalhando.
84
As limitações que pensa que terá como idoso o limitações de locomoção e falta
de motivação e entende que as possibilidades, em relação ao mercado de
trabalho, deverão ser muito poucas.
Transposição para linguagem educacional/gerontológica: O participante associa
formação profissional a metas constantemente alteradas pela instituição resultando
em prejuízos e falta de motivação; é base para a profissão. Sua concepção de
envelhecimento está ligada à saúde, produtividade e realização de sonhos, a
limitações de locomoção, falta de motivação e poucas possibilidades no mercado de
trabalho. Associa velhice à saúde e produtividade.
f) O participante 7 declara que seu processo de formação profissional não foi
nada fácil e entende que deveria ser de forma mais tranqüila. Formação
profissional é o aprimoramento técnico e a busca de conhecimentos. Do futuro,
após completar 60 anos, declara que ainda não pensou, mas espera para ver o
que o futuro terá para lhe oferecer. E acrescenta que, quer é estar de bem
consigo e com a vida. Suas metas com relação à velhice são continuar
trabalhando na área de Segurança Pública, concluir a faculdade e preparar-se
para uma nova profissão. As limitações que terá como idoso serão, talvez, físicas,
entretanto, se exercitar o intelecto através de leituras, o físico com atividades
como esportes e danças e tratar o espírito, não haverá limitações. Quanto às
possibilidades pensa que terá todas, pois cuida bem de si em todos os sentidos.
Transposição para linguagem educacional/gerontológica: Para o participante o
processo de formação profissional deveria ser de forma tranqüila, concebendo-a
como aprimoramento técnico e conhecimento. Sua concepção de envelhecimento
está ligada a expectativas do que o futuro oferecer, a estar bem consigo e com a
vida, a limitações físicas, desenvolvimento e manutenção de funções superiores,
atividades esportivas, lazer e espiritualidade, o que permitirá as possibilidades.
Associa velhice a possibilidade de continuar trabalhando em Segurança blica,
concluir curso superior, preparar-se para uma nova profissão, a limitações físicas
que podem ser evitadas pelo exercício do intelecto, do corpo e do espírito,
permitindo possibilidades.
85
g) O participante 8 declara que seu processo de formação profissional foi
sempre com muito stress, falta de informação e falta de preparo dos
instrutores, além da falta de objetividade. Formação profissional para ele é um
conjunto de informações dentro da realidade que se vive, ancoradas pela prática.
Do futuro, após completar 60 anos responde não esperar muito, pela carência de
seriedade das instituições. Suas metas em relação à velhice são envelhecer ao
lado de seus filhos com saúde e realizado profissionalmente. Declara, ainda,
que a perda do pensamento rápido e da mobilidade física serão as limitações
que terá como idoso e que as possibilidades serão muito poucas.
Transposição para linguagem educacional/gerontológica: O participante associa
o processo de formação a stress pela falta de informação, instrutores preparados e
objetividade; a informações sobre a realidade vivida, ancorada na prática. Sua
concepção de envelhecimento está ligada à baixa expectativa, pela descrença na
seriedade das instituições; proximidade dos familiares; saúde; realização
profissional; perdas intelectuais e físicas e poucas possibilidades. Associa a velhice
com proximidade com filhos, saúde e realização profissional.
h) O participante 9 declara que seu processo de formação profissional foi mais
voltado ao objeto (produto) Segurança Pública, policiamento, esquecendo o
sujeito, com poucos cursos de aperfeiçoamentos ou habilitações para tal.
Formação profissional é dar as condições (mínimas) necessárias para capacitá-
lo a fim de ter condições de trabalho para o exercício profissional que escolheu.
Do futuro, após completar 60 anos, espera contribuir de alguma forma para que
as gerações futuras adquiram o que adquiriu e também aprender com os mais
novos a fim de viver ainda mais. Tem como metas em relação à velhice, ter uma
vida saudável, atividade prazerosa como leitura e escrever muitos livros. Como
idoso terá somente limitações, do lado financeiro, para a execução de cursos em
Universidades e também o uso de óculos e as possibilidades serão todas as que
possuía desde jovem, com mais experiência, diminuindo cada vez mais as
chances de errar e, sim, ter mais acertos para uma melhor qualidade de vida.
86
Transposição para linguagem educacional/gerontológica: O participante
percebe o processo de formação como voltado para o produto, esquecimento do
sujeito, com poucos cursos de aperfeiçoamento ou habilitações; a condições
mínimas de capacitação para o trabalho. Sua concepção de envelhecimento está
associada à contribuição e à aprendizagem com as gerações futuras, para viver
mais, limitações físicas e financeiras e as mesmas possibilidades da juventude,
experiência, menos erros e mais acertos o que associa a uma melhor qualidade de
vida. Associa a velhice a ter saúde, prazer e a desenvolver atividades para a
manutenção de funções superiores.
i) O participante 10 declara que seu processo de formação profissional tem sido
bom na medida em aproveitou as oportunidades que apareceram para progredir
profissionalmente. Acha que a instituição deveria investir mais no preparo técnico
de seus integrantes e ser mais especialista do que generalista. Formação
profissional, é a busca e recepção de novos conhecimentos que possam
contribuir na evolução intelectual e técnico-profissional do indivíduo. Do futuro,
após completar 60 anos, espera estar bem, de saúde física e psicológica para
poder continuar em uma atividade profissional, realizar prazeres e viver de uma
forma digna e confortável. Suas metas em relação à velhice são ter saúde
suficiente para realizar as coisas de que gosta, de uma forma tranqüila. Entende
que, como idoso, te como limitação a diminuição da capacidade física, mas
pretende e almeja que não se incapacite totalmente. as possibilidades, serão
de realizar passeios, viagens, algum tipo de esporte, alguma atividade
profissional e outra atividade comunitária.
Transposição para linguagem educacional/gerontológica: Para o participante o
processo de formação está ligado a oportunidades de progresso profissional, mais
preparo técnico, ser mais especialista do que generalista; à busca de conhecimento
necessário à evolução intelectual e técnico-profissional. Sua concepção de
envelhecimento está associada à saúde física e psicológica, a produtividade, a
prazer, dignidade e conforto, limitações físicas, atividade profissional e atividade
comunitária. Alia velhice à saúde, realização e tranqüilidade.
87
j) O participante 11 declara que seu processo de formação profissional foi com
muita teoria, ensino rígido e voltado para a marcialidade, pouco voltado para a
humanidade. Acrescenta que, com o passar dos anos, este ensino vem dando
maior ênfase ao lado humano e que deveria ser associado o teórico ao prático
e voltado para o lado humanitário, com ações integradas entre polícia e
comunidade. Formação profissional é o conhecimento que é transmitido aliado
com o conhecimento adquirido com a execução do serviço. Do futuro, após
completar 60 anos, espera estar desfrutando a aposentadoria junto com os seus
familiares. Tem como meta em relação à velhice, chegar com saúde. Pensa que,
como idoso terá como limitação o medo de ser discriminado. Quanto às
possibilidades, cita viajar, conhecer novos lugares, praia, pescaria e curtir seus
netos.
Transposição para linguagem educacional/gerontológica: O participante associa
formação à teoria, rigidez, voltada para a marcialidade e pouco voltada para a
humanidade, o que vem mudando, com maior ênfase ao lado humano, necessitando
associar o teórico ao prático, ao lado humanitário e com ações de aproximação entre
polícia e comunidade; é conhecimento transmitido e conhecimento adquirido na
execução do serviço. Sua concepção de envelhecimento está associada a desfrutar
da aposentadoria, convívio familiar, medo de ser discriminado, lazer e conhecimento
de novos lugares. Associa velhice à saúde.
k) O participante 12 declara que, embora desejasse que seu processo de
formação profissional fosse com mais qualidade, entende a formação cultural a
qual está afeto e as condições sócio-econômicas do Estado, enquanto provedor
principal dos recursos materiais da instituição. Formação profissional é a
capacitação para o melhor desempenho em determinada atividade. Do futuro,
após completar 60 anos, espera ter condição física e saúde para realizar alguma
atividade profissional, ser útil e realizar-se como pessoa. Suas metas em
relação à velhice referem-se à oportunidade de repassar suas experiências,
profissionais e de vida, de forma a ajudar as outras pessoas. Como idoso,
88
entende que somente terá limitações físicas e as possibilidades de realizar
alguma atividade, desde que se prepare para tal.
Transposição para linguagem educacional/gerontológica: Para o participante
sua formação está aquém da qualidade desejada pelas condições do Estado; é
capacitação para desempenho em atividade. Sua concepção de envelhecimento
está associada à saúde, condições físicas para a produtividade, utilidade e
realização pessoal, limitações físicas e possibilidade de realizar atividades para as
quais tenha preparo. Liga velhice à transmissão de experiências profissionais e de
vida para ajudar outras pessoas.
l) O Participante 13 declara que a formação profissional de todo serviço de
dedicação exclusiva, como é o da Polícia Militar, onde os profissionais trabalham
diretamente com o público e onde os anseios da sociedade (em especial os pobres)
neles são descarregados, deveria ser voltada para as “Ciências Humanas” e
Psicologia”. Formação profissional é o preparo para exercer a profissão. Do
futuro após completar 60 anos, espera ter uma aposentadoria que lhe permita
adquirir chácara no campo para pescar, fazer exercícios, viajar e não voltar a
trabalhar novamente, pois não quer tirar o lugar de uma pessoa jovem, que está
entrando no mercado de trabalho. Suas metas em relação à velhice são pescar e
exercer atividade de serviço voluntário. Entende que as limitações que terá
como idoso serão as normais e, como possibilidades, o relacionamento com
pessoas normais e convívio social.
Transposição para linguagem educacional/gerontológica: Para o participante a
formação deveria ser voltada para as Ciências Humanas e Psicologia, preparo para
a profissão. Sua concepção de envelhecimento está associada à aposentadoria, a
vida no campo, a não voltar a trabalhar para não tirar lugar de pessoa jovem, ao
lazer, às limitações normais de idoso, ao relacionamento com pessoas normais e ao
convívio social. Associa velhice a lazer e trabalho voluntário.
89
m) O Participante 14 declara que o processo de formação profissional, deveria
trazer mais conhecimento nas áreas humanas: Psicologia, Antropologia,
Sociologia, Relações Humanas, Direitos Humanos. Formação profissional, é
aquela recebida para o exercício da profissão e que sirva aos interesses da
instituição. Do futuro após completar 60 anos, espera ter mais contato com a
natureza, não estar tirando uma vaga no mercado de trabalho, mas poder
proporcioná-la a alguém, ter uma boa relação social, viajar e ter boa saúde. Suas
metas em relação à velhice são de maior contato com a natureza e manter um
bom convívio social. Hoje não imagina que limitações terá como idoso e, quanto
às possibilidades, serão as que quiser ter.
Transposição para linguagem educacional/gerontológica: Para o participante a
formação deve incluir conhecimentos nas áreas humanas, Psicologia, Antropologia,
Sociologia, Relações Humanas e Direitos Humanos; é transmitida para o exercício
da profissão e atendimento aos interesses da instituição. Sua concepção de
envelhecimento está associada a contato com a natureza, a não tirar vaga no
mercado de trabalho, a convívio social, lazer e às possibilidades que queira ter. Alia
velhice ao contato com a natureza e ao convívio social
n) O Participante 15 declara que seu processo de formação profissional foi, no
início, doloroso, deixando marcas, ditatorial, torturante, enlouquecedor: quem
ficou na corporação foi pela teimosia, “eu sou forte eu consigo”. Nos dias de hoje,
pensa que melhorou, havendo mais ensinamentos práticos e gritos. Entende
Formação profissional como os meios oferecidos para a pessoa se tornar um
profissional capacitado na sua área de trabalho, Do futuro, após completar 60
anos, declara que se como alguém com bichos e feliz, lendo os seus livros
espíritas e completa, não tendo muita preocupação com isso mas com o físico,
pois é muito vaidosa. Tem como metas em relação à velhice, aproveitar um pouco
mais sua vida, pois na profissão que exerce é uma escrava dos relógios e dos
compromissos. No que se refere às limitações que poderá vir a ter como idoso,
pede a Deus para não ter dificuldades de locomover-se e que sua memória não
falhe. Quanto às possibilidades declara que não vê muitos benefícios, mas acha
que terá uma boa aposentadoria e poderá viajar bastante. Acrescenta não
90
pretender ser uma velha visitando quartéis, pois acha este um ambiente muito
pesado. O tempo de policial será para contar histórias para netos. Não velhice
como um problema, mas como uma conseqüência natural.
Transposição para linguagem educacional/gerontológica: O participante associa
formação a processo que pode ser doloroso, deixar marcas, ser ditatorial, torturante
e enlouquecedor, que evoluiu e que está melhor, com ensinamentos práticos e
gritos; constitui meios para capacitar profissionalmente. Sua concepção de
envelhecimento está ligada ao convívio com animais, à felicidade, à espiritualidade,
à completude, à preocupação com o físico, à possibilidade de limitações físicas e de
memória, a uma boa aposentadoria, ao lazer, sendo uma conseqüência natural.
Associa velhice com aproveitar a vida, sem preocupação com horários e com
compromissos.
o) O Participante 16 declara que em seu processo de formação profissional
houve preocupação com a parte de legislação, dos direitos das pessoas,
enquanto no seu entender, nos dias atuais deveria ser dada maior importância à
parte cnico-profissional para que o policial saiba proteger–se melhor.
Formação profissional é a maneira de tornar uma pessoa capaz de exercer uma
determinada profissão. Do futuro, após completar 60 anos, espera o se
descuidar da parte física e ver seus filhos muito bem encaminhados e casados.
Como metas em relação à velhice, declara que gostaria de fazer algum curso
voltado para a eletrônica. Acrescenta que não terá nenhuma limitação como
idoso, bem como nenhuma possibilidade.
Transposição para linguagem educacional/gerontológica: Para o participante
formação está associada à preocupação com a legislação sobre direitos das
pessoas em detrimento da parte técnico-profissional necessária para que o policial
saiba se proteger e à capacitação para a profissão. Sua concepção de
envelhecimento está associada a cuidados com o corpo, família, curso, a nenhuma
limitação e nenhuma possibilidade. Alia velhice à possibilidade de estudar eletrônica.
91
p) O Participante 17 declara que o processo de formação profissional deveria
ser, primeiramente, com honestidade. Formação profissional é o ensinamento ou
aprendizado recebido desde criança através dos pais - saber seguir o caminho
correto. Do futuro, após completar 60 anos, espera ter boa saúde, para poder
viajar e desfrutar da vida. Suas metas em relação à velhice, espera não trabalhar
mais mas somente curtir. Limitações como idoso assinala que, se Deus quiser,
nenhuma e, quanto às possibilidades, declarou que está pensando nos lados
financeiro e de saúde, que entende serem os principais, que lhe darão condições
para desfrutar da aposentadoria.
Transposição para linguagem educacional/gerontológica: Para o participante o
processo de formação envolve honestidade, ensinamento e aprendizagem. Sua
concepção de envelhecimento está associada a lazer, desfrutar a vida, finanças,
nenhuma limitação, saúde e aposentadoria. Liga velhice ao afastamento da vida
produtiva e a aproveitar a vida.
q) O Participante 18 declara que seu processo de formação profissional foi bom,
dentro do conteúdo esperado. Acrescenta que quando, do ingresso, deveria ser
incluída matéria sobre preparação para nova etapa de vida. Formação
profissional, é o homem apto a desenvolver sua atividade profissional, ou seja, ter
adquirido conhecimento suficiente para bem executar suas atividades. Do futuro,
após completar 60 anos, espera estar com saúde física e mental e depois pensar
no que fazer nos próximos anos. Suas metas em relação à velhice são traçadas
para continuar com saúde física e mental. Como idoso, te tantas limitações
quantas desejar ter e conclui que não terá limitações e sim, troca de atividades.
Quanto às possibilidades, terá aquelas as quais lutará para ter.
Transposição para linguagem educacional/gerontológica: Para o participante o
processo de formação deve incluir matéria sobre preparação para a nova etapa de
vida e envolve conhecimento para executar suas atividades profissionais. Sua
concepção de envelhecimento está ligada a tantas limitações quantas desejar ter,
troca de atividades e possibilidades que lute para ter. Associa velhice à saúde física
e mental.
92
r) O Participante 19 declara que seu processo de formação profissional tem sido
uma busca constante, mas por interesse pessoal e entende que deveria ser do
interesse também do local ou instituição onde o profissional presta serviço.
Entende que Formação profissional ocorre quando o ser humano adquire
conhecimento através dos bancos escolares, ou através da prática ou do
convívio em determinada profissão. Do futuro, após completar 60 anos espera
que os anseios de hoje sejam conquistas. Tem como metas em relação à
velhice, ter seus objetivos alcançados. Quanto às limitações que terá como
idoso, pensa que serão as comuns, que todas as pessoas idosas possuem e que
as possibilidades serão de curtir a família, ajudar e fazer caridade.
Transposição para linguagem educacional/gerontológica: Para o participante
processo de formação significa busca constante, por interesse pessoal e deveria
também ser do interesse da instituição; é conhecimento adquirido nos bancos
escolares, ou na prática, do convívio na profissão. Sua concepção de
envelhecimento está associada a anseios conquistados, limitações comuns,
convívio familiar e caridade. Alia a velhice a objetivos já alcançados.
s) O participante 20 declara que seu processo de formação profissional foi
apenas rever conteúdos de que já tinha conhecimento. Pensa que os cursos
devem priorizar matérias técnicas, saindo dos conteúdos de matérias militares,
pois a sociedade quer mais um policial do que um milico na rua. Entende Formação
profissional como a síntese de todos os conteúdos, devidamente debatidos e
ministrados aos integrantes da força. Do futuro, após completar 60 anos, espera
ter uma boa qualidade de vida e continuar a arte marcial. Tem como meta em
relação à velhice fazer trabalho comunitário. Almeja não ter nenhuma limitação
como idoso, pois sempre manteve uma boa qualidade de vida, mas como tem
problemas com bronquite, pensa que terá problemas. Quanto às possibilidades,
pensa que teconvites para trabalhar em atividades comunitárias, pois desde
já procura interessar-se nesta direção.
Transposição para linguagem educacional/gerontológica: O participante associa
formação profissional à revisão de conteúdos, quando deveria priorizar matérias
93
técnicas, saindo dos conteúdos de matérias militares; a síntese de conteúdos
debatidos e ministrados aos integrantes da força. Sua concepção de envelhecimento
está ligada à qualidade de vida, arte marcial, possibilidade de limitações físicas,
convites para trabalhar e atividades comunitárias. Associa velhice à possibilidade de
trabalho comunitário.
t) O Participante 21 declara, sobre seu processo de formação profissional que a
instituição deveria valorizar muito mais a educação, a formação profissional
completa. Formação profissional é a busca de conhecimento técnico ou o seu
fornecimento, indução. Do futuro, após completar 60 anos, espera estar com
saúde e ter o próprio negócio. Quanto às metas em relação à velhice, espera
que não seja de maneira dolorosa e sim um pouco mais tranqüila pois foram
longos dias de chuva e frio, que certamente também ocorrerão, mas doe
menos. Declara, ainda, que como idoso terá limitações, talvez, de saúde, o que
considera o mais importante e, quanto às possibilidades, serão o conhecimento
adquirido, o respeito conquistado, mais tempo para si, para a esposa para a
família e ajudar com opinião, se procurado.
Transposição para linguagem educacional/gerontológica: O participante associa
formação profissional à educação e à necessidade de maior valorização pela
instituição, ao conhecimento técnico. Sua concepção de envelhecimento está ligada
à saúde, produtividade, conhecimento, respeito e tempo, para si e familiares e para
ajudar os outros. Alia velhice à vontade de que não inclua dor e que seja mais
tranqüila.
u) O Participante 22 declara que seu processo de formação profissional tem sido
com pouca ou nenhuma atenção ao individual e acrescentou que os policiais
são peças descartáveis, que têm valor quando produzindo. Finaliza dizendo
que os policiais trabalham protegendo as pessoas, mas ninguém os protege e
que sua formação profissional deveria focar nos homens pois eles fazem a
instituição. Formação profissional significa forma + ação: forma = instrumento
para modelar ou deixar todos iguais; ação = agir: formação é agir de forma que
94
todos tenham procedimentos iguais ou parecidos. Entende que a formação
profissional dos policiais é muito complexa, pois estes trabalham com pessoas nas
mais diversas atividades e classes sociais e são formados para ser imparciais e
justos. Do futuro, após completar 60 anos, espera estar trabalhando e investindo
para construir uma pousada no Nordeste, onde possa receber os amigos e, quem
sabe, alguns queiram morar com ele e seus familiares.Tem como meta em relação
à velhice ter saúde e quanto às limitações que terá como idoso, pensa que terá
menor resistência à fadiga e que, como possibilidades, terá mais tempo
disponível e experiência de vida.
Transposição para linguagem educacional/gerontológica: O participante
associa o processo de formação à desatenção ao individual, a uma concepção de
policiais como peças descartáveis, que têm valor quando estão produzindo,
protegendo as pessoas sem serem protegidos; deveria focar nos homens; é forma +
ação: forma como instrumento para modelar, deixar todos iguais e ação como agir
de forma que todos tenham procedimentos iguais ou parecidos; é processo
complexo que visa formar policiais para serem imparciais e justos. Sua concepção
de envelhecimento está ligada à produtividade, investimento em estabelecimento de
lazer em outro Estado para receber amigos, a menor resistência à fadiga, a tempo
disponível e à experiência de vida. Alia a velhice à saúde.
Essências:
Formação:
a) Formação profissional como fenômeno de natureza
Educacional/Profissional/Técnica, associado à capacitação profissional;
b) Formação profissional associada à possibilidade de tranqüilidade nas
relações familiares e no auxílio a outros por ingerências de experiência e financeiras;
c) Formação profissional como compromisso de preparação profissional e
aprimoramento emocional;
d) Formação profissional como compromisso de articular teoria e prática;
e) Formação profissional como portadora de potencial de motivação,
estresse e experiência traumática;
f) Formação profissional como promotora de condições para aproximação
da comunidade;
95
g) Formação profissional voltada para qualidade, produto e sujeito;
h) Formação profissional como prática interdisciplinar, incluindo
conhecimentos de diferentes áreas;
i) Formação profissional como compromisso individual e da instituição.
Utilizando-se o acréscimo feito por Comiotto
55
à análise fenomenológica de
Giorgi, foram identificadas as seguintes dimensões:
Formação:
Dimensão Técnico-profissional-educacional: concepções em que a
formação está ligada ao aspecto capacitação para exercer a profissão;
Dimensão Psicossocial e Institucional: concepções em que a formação
aparece como condição para uma vida tranqüila emocional e financeiramente, sendo
de responsabilidade individual e institucional.
CONCEPÇÃO DE ENVELHECIMENTO IMPLÍCITA NO IMAGINÁRIO
ASSOCIADO: UM ESTUDO JUNTO A POLICIAIS MILITARES
Rosa Maria Gross de Almeida
Valdemarina Bidone de Azevedo e Souza
RESUMO: Este artigo trata sobre a concepção de envelhecimento implícita no imaginário a ele
associado por parte de profissionais policiais militares. Os aportes trazidos por esta pesquisa
significam relevante contribuição para a reflexão sobre a necessidade de atenção ao imaginário sobre
envelhecimento e sua interpenetração nas concepções sobre o fenômeno. O estudo foi desenvolvido
numa abordagem qualitativa, numa perspectiva dialógica implícita ao Método da Complexidade, junto
a um grupo de 22 alunos de curso de formação de nível intermediário da Brigada Militar/RS com, em
média, 20 anos na profissão e idade superior a 35 anos. Os dados foram coletados por meio de
depoimento escrito e analisados semiologicamente e por
análise de conteúdo de Bardin. Os
principais resultados do estudo apontam para concepções de envelhecimento implícitas num
imaginário com orientação paradigmática simplificadora.
PALAVRAS CHAVE: Envelhecimento, Imaginário, complexidade, Segurança Pública, policiais
militares.
ABSTRACT: This article approaches the conception of aging implicit in the imaginary associated to it
by military police officers. The findings of this research are a relevant contribution to the reflection on
the necessity of attention to the imaginary about aging and its interpretation in the conceptions about
this phenomenon. The study was developed through a qualitative approach, in a dialogic perspective
implicit in the Method of Complexity, with a group of 22 students of an intermediate course to form
professionals of the Military Force/RS, with an average of 22 years in this profession and over 35
years old. Data were collected by means of written testimonies that were semyologically analyzed and
through the content analysis by Bardin. The main results of this study have pointed out conceptions of
aging that are implicit in an imaginary with simplifying paradigmatic orientation.
Key Words: Aging, Imaginary, Complexity, Public Security, Military Police Officers
1 INTRODUÇÃO
A incapacidade de conceber a complexidade da realidade
1
e, mais
particularmente do processo de envelhecimento tem dificultado a elaboração e
implementação de estratégias que evoluam na promoção de condições preventivas
para um envelhecimento com qualidade pelos profissionais da área da Segurança
Pública
1
.
A complexidade do cotidiano vivido por estes profissionais é tecida na
constante reconstrução do conhecimento prático adquirido nos acontecimentos e
ações vivenciadas nas relações de trabalho, permeados pela convivência com o
97
caos social, os desvios, o risco de vida, a ambigüidade, o inexplicável o que tem
levado à carência de tempo para pensar, tanto sobre a prática profissional quanto
sobre a própria vida
1
.
A reflexão sobre a necessidade de políticas públicas e de reflexão pessoal
sobre a importância de um envelhecimento mais sadio significa a ruptura com
orientações paradigmáticas alicerçadas numa compreensão de profissional da
Segurança Pública como alguém com o compromisso de zelar pelo exercício da
cidadania de muitos, sem que seja, ele próprio, incluído neste zelo. Este
pensamento simplificador não tem permitido considerar a importância da diversidade
na unidade do ser humano e tem gerado a sensação de desvalorização profissional,
além de não contribuir para a elaboração de estratégias que possibilitem trabalhar
sobre o envelhecimento na formação profissional em sua complexidade.
Isto posto, é preciso indagar: aque ponto os idealizadores das políticas
vigentes exercem a reflexão sobre o que é envelhecimento? Até que ponto têm
domínio sobre as conseqüências de suas ações e de suas contradições? Até que
ponto as políticas de saúde são elaboradas sobre o alicerce de uma visão sistêmica
do fenômeno e sobre um imaginário permeado por possibilidades? Até que ponto os
profissionais de Segurança Pública são contemplados com ações preventivas, para
uma melhor qualidade de vida? Até que ponto a reflexão sobre o envelhecimento em
sua complexidade integra o rol de objetivos transversais das instituições que
desenvolvem atividades de formação policial?
Se o estado da arte do conhecimento sobre envelhecimento é um reflexo de
análises principalmente biológicas, sociológicas e psicológicas na Segurança Pública
o estado da arte do conhecimento é um reflexo de análises principalmente em
preceitos legais. Nestas duas áreas o componente imaginário parece ignorado,
como se não fosse parte constituinte da natureza humana e organizacional.
Na sociedade ocidental, a concepção de envelhecimento tem sido
permeada pela valorização de aspectos estéticos associados à beleza do corpo
jovem.
A estética oferece a possibilidade de uma incursão ao imaginário,
permitindo olhar de frente o que causa temor, como a aproximação da finitude
2
, os
sinais do envelhecimento.
Entre os profissionais da área da Segurança Pública, os policiais militares
passam por processos formativos que incluem intenso preparo físico e associam a
98
profissão à coragem e força física, gerando um ideal de beleza à vida e, à medida
que estes profissionais se deparam com modificações corporais em decorrência do
envelhecimento não lhes é possível deixar de perceber o distanciamento do ideal
estético corporal/profissional, ganhando espaço o receio da degeneração. A
percepção de si se modifica, sua visão sobre suas próprias possibilidades e
potencialidades se curva sob o peso de fantasmas criados e alimentados em seu
imaginário. “É o homem e a mulher que o querem envelhecer, que querem ficar
jovens para sempre [...] sempre desfrutarem do presente”
2; 152
.
Olhar para os sinais que indicam a velhice pode significar olhar a si próprio
como “sujeito de morte anunciada [...] testemunhos da finitude, da transitoriedade, e
da morte”
3
.
A autoridade antes conferida à velhice como experiência de vida, sabedoria,
discernimento, vem perdendo espaço para a novidade, agilidade, audácia, num
movimento que Morin chama de “degerontocratização”
2
.
O ganho em respeitabilidade, prestígio, atenção, que surgiam como
substitutos das perdas especialmente físicas, decorrentes da idade, passaram a ser
menos valorizados. “A velhice fica como que desligada, rejeitada para fora do curso
real da vida
2;148
. O resultado contribui para alimentar um imaginário que alimenta a
busca desesperada pelo impossível : permanecer jovem, belo e ser eterno.
No Brasil, a ampliação da expectativa de vida tem resultado em crescente
número de idosos, ao mesmo tempo em que a população não tem acesso a uma
preparação para a velhice e a aposentadoria; não investimento significativo em
pesquisas, políticas e ações de prevenção para um envelhecimento saudável.
Embora iniciativas legais, importantes para a consolidação da cidadania dos
idosos venham ocorrendo desde a década de 20 no Brasil, ampliando as
possibilidades de valorização do idoso, o país ainda convive com a marginalização
da velhice
4
.
Se a Gerontologia, como área do conhecimento, ainda carece de produção
científica, esta carência se potencializa, quando se refere ao envelhecimento
daqueles que trabalham na área da Segurança Pública - os policiais - que
confrontam-se diariamente com a crescente violência e com os ideais de vigor físico,
força e audácia.
Ante seu próprio envelhecimento e com a aposentadoria, estes profissionais
convivem com a perda das condições destes ideais, tanto em nível pessoal como no
99
imaginário coletivo, associada à perda da referência identitária
3
representada, nos
policiais militares, principalmente na farda considerada camada da pele - com
conseqüências sobre a qualidade de sua vida.
Segundo Moragas
5
um dos fatores de risco ao equilíbrio psíquico no
envelhecimento são as frustrações e a perda do sentido de vida.
Devido à importância e atualidade dos problemas relacionados ao aumento
da população idosa e da crise na Segurança Pública, muito se discute sobre os
índices sinalizadores de impactos sociais, da violência, das ocorrências policiais.
Sobre o profissional de Segurança Pública, sujeito/indivíduo que exerce a
função de policial, pesquisas realizadas têm especialmente concentrando seu foco
nos profissionais ainda na ativa, sem se ocupar daqueles em final de carreira e
aposentados.
As políticas implementadas no período 2003-2006 pela Secretaria Nacional
de Segurança blica (SENASP), tratam da criação de uma “Polícia Cidadã”, que
não apenas obedece aos preceitos de Direitos Humanos, mas seja deles
promotora
6
.
Esta implementação passa pela reconstrução pessoal, de
sujeitos/indivíduos autônomos/dependentes, com concepções, crenças, convicções
6
,
que exercem a profissão e pela reconstrução institucional.
Na formação destes profissionais vem sendo fortalecida pela Matriz
Curricular Nacional de Formação para Profissionais da Segurança
Pública/SENASP/Ministério da Justiça/Brasil
7
, a importância destes profissionais
como cidadãos que têm como missão preservar e promover a vida
8
de outros seres
humanos/e a sua própria, ao arriscarem suas vidas nas suas relações com a
sociedade, onde é preciso [...] saber que algo possível ainda invisível no real”
9
, a
possibilidade de erro
10
no exercício da função.
Para toda ação em contexto de incerteza “existe contradição entre o
princípio do risco e o princípio da precaução [...]
9
, a incerteza é ao mesmo tempo
risco e possibilidade para o conhecimento“. Enquanto a ignorância da incerteza
conduz ao erro, o conhecimento da incerteza conduz não somente à dúvida, mas
também à estratégia”
10
.
Junto a 22 profissionais da Segurança Pública foi desenvolvido o estudo
que teve como um de seus objetivos analisar as concepções de envelhecimento
implícitas no imaginário associado a este fenômeno, entendendo-se que o
100
aprofundamento do conhecimento sobre concepções humanas e sobre o imaginário
é relevante para mudanças nos pensamentos, nas ações e nas atitudes em relação
ao trabalho e à própria vida.
Os profissionais participantes da realidade investigada são policiais militares
que, pela possibilidade de desenvolverem atividade de policiamento ostensivo, estão
mais expostos ao risco, à violência e às suas implicações e conseqüências.
O estudo tem caráter de ineditismo na área da Gerontologia e da Segurança
Pública no Brasil e, com os aportes vindos dele, pretendeu-se contribuir com
subsídios para a elaboração de políticas e processos de formação em Segurança
Pública mais humanizadores e a reflexão, por estes profissionais, sobre a
necessidade de reconstruírem suas concepções sobre o próprio envelhecimento,
conscientes da influência do imaginário nas suas crenças, convicções e concepções.
2 O MÉTODO E SUA APLICAÇÃO
2.1 FALANDO SOBRE O MÉTODO
O estudo foi desenvolvido numa abordagem qualitativa, numa perspectiva
dialógica implícita ao método da complexidade.
O todo da complexidade não pretende encontrar certezas e o princípio
Uno da verdade. Constitui reflexão sobre o pensamento que se nutre da incerteza,
recusa o conhecimento fragmentado e redutor, investiga sobre o conhecimento do
conhecimento
11
.
No desenvolvimento da pesquisa foi preciso utilizar um método desta
natureza, que concebe o sujeito/indivíduo ao mesmo tempo em sua
autonomia/dependência e em sua singularidade/generalidade, numa relação
recorrente na qual o sujeito/indivíduo é “simultaneamente
gerado/produzido/determinado e gerador/produtor/determinante”; um método que
reconhece a realidade complexa das emergências que retroagem sobre o que as
causou e que são parte constitutiva do todo
12; 246
.
Utilizar este método implicou na busca de estratégia metodológica que
oferecesse condições não para a descrição da realidade, mas também para sua
compreensão/explicação.
101
A compreensão é o conhecimento por projeção/identificação que torna o
ser-sujeito inteligível para outro ser-sujeito, que é reflexiva e combinada com a
'explicação'
12
.
Os princípios metodológicos interdependentes que permearam a análise
dos dados foram os que embasam a abordagem dialógica proposta por Morin:
princípio hologramático, em que a parte está no todo e o todo está de
alguma forma nela representado, numa concepção de recursividade entre totalidade
e partes constituintes;
princípio recursivo em que a causa age sobre o efeito, e o efeito age
sobre a causa, modificando-a, gerando um novo efeito...(retroação auto-reguladora);
em que os produtos e os efeitos são produtores e causadores do que os produz,
num entendimento de autoprodução e auto-organização;
princípio dialógico, numa união entre idéias antagônicas,
complementares ou concorrentes, formando novas sínteses provisórias, num
determinado tempo e espaço.
Desta forma, partes antagônicas/complementares/concorrentes interagem
entre elas e com o todo que, ao ser transformado/transformado-se, as transforma
(princípios dialógico, hologramático e recursivo).
O reconhecimento da imprecisão humana não implicou afastamento da
precisão e da reflexão. Produzida a interpretação sobre a realidade, ela devolve uma
outra vida, expressando uma co-autoria entre pesquisador e pesquisado.
Segundo o pesquisador e teóricos utilizados, a mensagem dos participantes
da pesquisa foi compreendida e explicada. Tratou-se de uma associação e
articulação das idéias entre si, adotando-se princípios metodológicos com potencial
para agrupar pontos de vista que “se excluem, se opõem, se inter-hierarquizam de
modo que, não deixando de ser antagônicos ou concorrentes, se tornam
complementares e dependem da realidade complexa do indivíduo”
12; 194
.
Como principais garantias da qualidade dos dados qualitativos (equivalentes
à confiabilidade, validade e relevância), utilizou-se:
13
e) a triangulação entre tipos de análises (análise de conteúdo
interpretativa/compreensiva/explicativa e análise semiológica) das imagens e a
reflexividade;
f) a transparência e a clareza nos procedimentos, explicitadas, no
esquema e matrizes elaborados a partir dos depoimentos escritos dos participantes;
102
g) a construção do corpus foi realizada a partir da decisão sobre a fonte
de dados e do critério de saturação (quando o material analisado não apresentou
mais novidade);
h) a descrição detalhada, o que permite a réplica do estudo.
O presente estudo foi realizado, em 2006, junto a 22 profissionais em nível
intermediário da Brigada Militar do Estado do Rio Grande do Sul.
Esta Corporação teve um percurso histórico singular, de defesa de território,
o que culminou numa denominação diferenciada do resto das polícias militares
brasileiras em que Brigada significa uma Divisão do Exército. Sua singularidade
também se manifesta na sua identidade e imagem junto a seus públicos e nas
características estaduais
14
.
2.2 CARACTERIZANDO OS PARTICIPANTES
Os participantes eram alunos sargentos do Curso Básico de Administração
Policial Militar, de formação de nível intermediário da Polícia Militar do Rio Grande
do Sul que, concluído o curso, poderão habilitar-se ao posto de 1
o
Tenente, posto
este considerado elo de ligação entre oficiais gestores da instituição e a tropa
diretamente envolvida com a população. Atualmente, o número total de sargentos no
Estado é de aproximadamente 10.500.
A opção pelo critério de inclusão/exclusão tempo de serviço igual ou
superior a 20 anos deveu-se ao fato destes profissionais terem atualmente a
possibilidade de se aposentarem aos trinta anos de trabalho. Assim, o limite em vinte
anos significa um mínimo de dois terços de tempo na ativa e a possibilidade dos
respondentes terem no mínimo trinta e cinco anos.
A decisão sobre o corpus depoimentos escritos de 22 participantes -
manteve-se nos limites considerados na literatura para a realização de atividades de
coleta de dados em nível coletivo, pela saturação dos dados (critério de
confiabilidade e relevância), o que encontra suporte em Flick
15
e Bauer e Gaskel.
13.
Aos policiais militares foi entregue um roteiro de depoimento com questões
fechadas para caracterização dos participantes e questões abertas sobre
envelhecimento e formação profissional. Uma das perguntas solicitava que citassem
objetos ou descrevessem imagens que associavam ao envelhecimento e, sobre as
respostas dadas a esta pergunta, foi realizada análise semiólógica.
103
Às metáforas foi atribuído valor cognitivo pois através delas foi explicitado o
imaginário dos entrevistados. A metáfora estabelece uma comunicação analógica
entre realidades diferentes, dando intensidade afetiva à inteligibilidade que
apresenta.
16
Ao citarem bom vinho, bom livro, bengala e ferrugem, por exemplo, os
participantes possibilitaram uma compreensão das qualidades por eles atribuídas ao
envelhecimento que vai além das possibilidades que a linguagem objetiva
possibilitaria.
A identificação das concepções de envelhecimento permite identificar sob
que paradigmas estão construídas, se de simplificação ou de complexidade, bem
como indicativos do imaginário sob os quais se abrigam. A partir daí, é possível
encaminhar intervenções visando a sua reconstrução, quando construídas sob
paradigmas de simplificação, intervenções que possibilitem um novo referencial
sobre o fenômeno do envelhecimento, concebendo-o em sua “arquitetura complexa”,
abrangendo dimensões biológicas, sociológicas, psicológicas, culturais e
educacionais.
Os profissionais policiais militares participantes do estudo caracterizam-se
por:
a) idade entre 36 e 51 anos, sendo que, destes, 2 entre 30 e 39 anos, 19
entre 40 e 49 anos e 1 entre 50 e 59 anos;
b) estado civil compreendendo 11 casados, 4 solteiros, 2 divorciados, 2
separados;
c) escolaridade, 6 tendo curso superior incompleto e 9 completo, 4 curso de
especialização, 8 com Ensino Médio completo;
d) cursos de formação em que 12 fizeram curso téçnico-operacional, 5 de
cultura geral, 2 pedagógica, 2 recursos informatizados;
e) tempo de exercício na função policial entre 16 e 30 anos, sendo que 3
participaram do policiamento ostensivo por 3 anos, 2 por 5 anos, 1 por 6 anos, 3 por
oito anos, 1 por 10 anos, 1 por 14 anos, 1 por 15 anos, 1 por 17 anos, 1 por 18 anos,
1 por 19 anos, 2 por 20 anos, 3 por 21 anos, 1 por 22 anos e 1 por 23 anos;
f) saúde: 18 afirmam não serem portadores de doença crônica, 2 referem-se
a problemas na coluna vertebral e 1 a diabetes; 17 afirmam não utilizar medicação e
dos 4 que declaram que sim 1utiliza medicamento para problema de pressão arterial,
e 2 utilizam analgésicos; 1 informa ter sido internado para tratamento emocional;
104
19 afirmam não ter se submetido a psicoterapia, 2 declaram que sim e 1 que está
em acompanhamento psicológico.
Foi aplicado o Inventário de Depressão de Beck
17
para verificar se os
participantes encontravam-se com traços de depressão, pelo potencial de influência
nos resultados. Nenhum dos participantes foi considerado com traços de depressão
severa.
De acordo com Beck
17
, o “ponto de cortedos escores depende do tipo de
amostra e dos objetivos do estudo.
No presente estudo se os resultados do inventário apresentassem escores
acima de 20, seriam pareados com três itens do questionário aplicado aos
entrevistados, o item relativo a tratamento emocional, o item referente à psicoterapia
e o item relacionado ao uso de medicação.
O objetivo de sua aplicação foi detectar possível presença de quadros
depressivos entre os entrevistados e sua tradução nos resultados da pesquisa.
Nenhum resultado acima de 20 foi encontrado.
Dos resultados trazidos pelo inventário associado aos três itens referidos, é
possível sugerir que estes policiais militares, que convivem quase que diuturnamente
com situações de risco de vida, aprenderam a dominar dois dos principais
componentes da vivência subjetiva individual ou coletiva em contextos permeados
por altos índices de violência - o medo e a incerteza associados à insegurança, à
ameaça e ao desamparo, que podem levar à desesperança, ao desespero, à apatia
diminuindo, com isto, a possibilidade do medo transformar-se em depressão. O
medo é a antecipação mental da falta de superação de uma exigência e a valoração
emocional da situação pode ser de ira ou resignação
18
.
A maioria das teorias sobre o medo enfatiza que a intensidade e a sua
universalidade dependem da previsibilidade, compreensibilidade e influenciabilidade
experimentadas, de situações potencialmente prejudiciais
18
.
A imprevisibilidade e a incapacidade de controle significam a ausência de
indicativos de segurança
18
: não se sabe se algo vai acontecer, como irá acontecer e
se há chance de sucesso
18
.
No desempenho de sua profissão, os policiais militares atuam em situações
de risco e, em seu processo de formação, recebem treinamento que lhes exige
aprenderem a controlar medos e ansiedades, o que pode contribuir para a
depressão e o estresse
19
.
105
Os fenômenos que compõem o mundo humano atendem a prerrogativa da
complexidade. Impossível desenvolver reflexão sobre eles sem pensar sobre suas
relações de interdependências.
A realidade é vivida indissociada do mundo imaginário: a violência aumenta
vertiginosamente também nos ambientes familiares e institucionais. As situações
vividas podem ser de variada natureza: assaltos, acidentes de trânsito, seqüestros,
violência sexual, participação em situação violenta, ser ignorado ou não ser
valorizado pela comunidade em que presta serviço. Estas situações podem
ultrapassar o limiar de tolerância de uma pessoa e gerar ansiedade, estresse e
depressão.
O envelhecimento, quando concebido com orientação paradigmática
simplificadora e associado a imaginário onde predominam aspectos negativos deste
fenômeno, pode ser vivido como sinônimo de perdas, especialmente perda do corpo
jovem, podendo resultar em medo e depressão ante sua inexorabilidade.
2.3 A ESTRATÉGIA DO ESTUDO
No presente estudo, entende-se concepção como matriz para construções,
unidade organizada do pensamento que depende de teorias e paradigmas nos quais
se inscreve, estando associada à idéia de formação de conceito, de configuração
original. Combina a aptidão para formar imagens mentais com a aptidão para
produzir imagens materiais; utiliza palavras, idéias, conceitos, teorias, escolha,
imaginação e estratégias da inteligência.
10; 226
. Assim sendo, o fenômeno do
envelhecimento é concebido em função de princípios/regras, teorias, idéias, noções,
palavras, mitos, discursos e a partir de estratégias cognitivas. As concepções podem
ser insuficientes, equivocadas
10
.
No momento em que o grupo de policiais militares foi convidado para
participar da pesquisa, lhes foram apresentados os objetivos, os procedimentos, os
instrumentos de coleta de dados e o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
para assinatura.
No início do trabalho, foi percebida, em dois participantes uma relativa
resistência relacionada por eles, a um pesquisador que havia feito uma pesquisa
com eles sem oferecer qualquer retorno. Ao ser-lhes informado que, após o
106
preenchimento dos instrumentos, haveria um momento de discussão sobre os temas
envelhecimento e formação, os dois profissionais se dispuseram a participar.
Esta discussão teve como estímulo uma apresentação em PowerPoint
sobre concepções de envelhecimento nos aspectos biológicos, sociológicos,
psicológicos, educacionais e culturais (Anexo 5) com o objetivo de levá-los à reflexão
sobre as suas próprias concepções e imaginário registrados no instrumento de
coleta de dados.
Desta forma, foi-lhes propiciado momento de avaliação de suas próprias
concepções o que tem potencial para mobilização para futuras reflexões sobre seu
próprio projeto de vida
20
.
Pela observação participante, foi percebido que o profissional, que
apresentava uma resistência inicial mais intensa, manifestou particular interesse em
prolongar a discussão sobre os temas, permanecendo após o encerramento do
trabalho, trazendo detalhes sobre sua concepção de envelhecimento e solicitando
mais informações.
A síntese da realidade investigada, tornou explícita a articulação entre
concepção e imaginário, sobre a concepção de envelhecimento implícita nos
depoimentos participantes.
A metodologia adotada estimulou descobertas em relação ao imaginário
associado ao envelhecimento destes profissionais que se preparam para ocupar
posto em que estarão entre os oficiais gestores e a tropa. Esta é uma forma de fazer
pesquisa empírica, investigando o fenômeno em seu contexto real.
A base teórica sobre a qual o trabalho foi desenvolvido e a configuração da
problemática a ser investigada antecederam a coleta dos dados e possibilitou o
balizamento da generalização analítica dos resultados, quando foram comparados
os dados obtidos empiricamente e a teoria previamente selecionada, construindo
conclusões com potencial para se tornarem hipóteses a serem testadas em novos e
detalhados contextos
22
.
3 ANÁLISE DOS DADOS
Para a identificação das concepções de envelhecimento implícitas no
imaginário associado utilizou-se a análise das respostas à questão sobre as imagens
107
evocadas, associando-se análise de conteúdo
interpretativa/compreensiva/explicativa e análise semiológica.
Estes tipos de análise podem ser considerados como instrumentos de
análise diversos, porém permitem aproximações (complementações) –princípio
dialógico-, já que a inclusão de códigos interpretativos (baseados mais na conotação
do que na denotação) nas análises de conteúdo explicitam a influência da
semiologia.
22
a análise de conteúdo auxilia a análise semiológica a contornar
influências idiossincráticas, permitindo a possibilidade de sistematização e
confirmação
22
.
A) Análise das imagens
A análise semiológica compreendeu:
a) análise das imagens, tornando claros aspectos componentes para a
compreensão de seu sentido, acordo com o objetivo do estudo e a disponibilidade
do material;
b) inventário realizado em relação a cada uma das imagens citadas, que
serviram para a elaboração da matriz;
c) associações a partir de questões como:
Que associações possivelmente foram trazidas à mente quando
evocou a imagem?
Como a imagem se relaciona com a concepção de envelhecimento?
Que aspectos culturais o importantes para entender as imagens
associadas?
O que predomina na imagem?
e) construção da matriz a partir do inventário realizado e das associações,
em relação às questões exemplificadas (figura 1 apresentada a seguir).
108
Figura 2: Matriz
Unidades de Registro
Unidades
sintéticas de sentido
CONCEPÇÃO DE ENVELHECIMENTO
um ótimo vinho
quanto mais velho
melhor
é o seu paladar;
e ensinamentos
um bom livro
conhecer o futuro
basta olhar o passado
com olhos do presente
(4)
sentar-se
à beira mar
mar
cadeira
de descanso
caminhando
exercícios em piscinas
pescaria (9)
carro
barco
naufragado a noventa
anos (19)
cadeira de balanço
próximo ao fogão à
lenha (8)
árvore
bengala
livros (7)
qualidade
continuidade
sabedoria
aprendizagem
ensino
Sabedoria/ensino
aprendizagem
qualidade
conhecimento
prospectivo
história
leitura atual de mundo
cenário
movimento
imobilidade
tranqüilidade
movimento
lazer
mobilidade
viagem
submerso
fim de viagem
estagnação
movimento repetido
tranqüilidade, calor
frio
vida, raízes
limitação,ajuda
conhecimento, ensino
aprendizagem,
sabedoria
Envelhecimento
Fenômeno associado a um tempo
passado, presente e futuro como
momentos de possibilidades e qualidade.
aprendizagem
ensino
Envelhecimento
com
possibilidades
natureza,
intelecto
PANO DE FUNDO
Envelhecimento com
qualidade
Temporalidade
Passado, presente,
expectativa de Futuro
Anúncio de
continuidade
e sabedoria
109
Unidades de Registro
Unidades
sintéticas de sentido
CONCEPÇÃO DE ENVELHECIMENTO
arvore
desde o nascimento
até a velha árvore
passando pelos
estágios da vida
embora envelhecida
continua dando
sombra (10)
um grande júri
bela casa
boas ações (18)
piscina
caminhar na praia
olhar para a Torre
Eiffel
sentir a neve no rosto
(5)
aparência física
ociosidade
não fazer nada (20)
cabelos brancos
pele enrugada
dificuldade de
locomoção (17)
cabelos brancos
doenças
bengala (1)
vida, raízes
inicio
maturidade
movimento, ciclo
continuidade
proteção
juízo final, sabedoria
para julgar recompensa
Qualidade,
produtividade
movimento
cenário,
viagem
autonomia
viagem, frio
estética
improdutividade
imobilidade
estética
deterioração
limitação
imobilidade
estética
deterioração
limitação, ajuda
Envelhecimento
Fenômeno associado a possibilidades e
limitações com potencial para perda de
autonomia.
Cabelos
brancos e
calvície
Rugas
Envelhecimento com
sinais característicos
Natureza, estética,
intelectualidade
PANO DE FUNDO
Envelhecimento com
possibilidade. ensino
Tranqüilidade,
lazer,sabedoria,
aprend
izagem, conh
Temporalidade
presente
Expectativa de Futuro
Envelhecimento
com limitações
Anúncio de
espera
Estagnação
Rotina
Imobilidade
110
Unidades de Registro
Unidades
sintéticas de sentido
CONCEPÇÃO DE ENVELHECIMENTO
doenças
rejeição
solidão (2)
rugas
ferrugem
podridão
doença
dificuldade
experiência (3)
limitações
quedas, fragilidade
falta de motivação (6)
dificuldade na
locomoção
velha sentada na
cadeira
sabedoria com a
experiência
velho contando
histórias
loucura pela solidão
velho sentado sozinho
(15)
casa sem pintura
local não cuidado, sem
manutenção
Carro enferrujado (16)
doenças
estresse e pressão
externa
cansaço mental
sedentarismo
asilo (11)
outono
ferrugem
oxidação (12)
não encontra o carro
de plástico verde com
que brincava
brincadeiras com
afilhado e neta (21)
deterioração
isolamento
exclusão
estética
corrosão
morte
deterioração
limitação
sabedoria
vulnerabilidade
perda de autonomia
imobilidade
perda de autonomia
imobilidade
conhecimento prático
memória
transmissão de
conhecimento
demência pelo
abandono
isolamento
deterioração
cenário sem
conservação
corrosão
deterioração
vulnerabilidade
emocional, social e
biológica
imobilidade
abandono
proximidade do fim
corrosão
deterioração
saudade do passado
passado revisitado
através do presente
.
Cont.
Cabelos
brancos e
Rugas,
Envelhecimento
com limitações
Cenário biológico,
social e psicológico
PANO DE FUNDO
Envelhecimento com
características
estéticas
Temporalidade
Passado e presente
Anúncio de
deterioração,
fragilidade,
Anúncio de
Improdutividade,
Solidão,
abandono
Perda de
autonomia
Estagnação,
desatualização
ociosidade
111
Cont.
Fonte: pesquisador
B) Análise do texto, adaptando-se à técnica de Bardin,
22
através das seguintes
etapas:
Leitura flutuante: leitura global das respostas às questões abertas,
seguida de uma leitura de cada resposta;
exploração do material, incluindo a identificação dos descritores/
unidades de registro, organizando-se na forma de esquemas com as Unidades de
Registro identificadas e após elaborando-se um esquema (figura 2), apresentado a
seguir:
…………
Unidades de Registro
Unidades
sintéticas de sentido
CONCEPÇÃO DE ENVELHECIMENTO
tecnología ultrapassada
máquina de escrever
carruagem
telex,
ser humano que o
acompanhou o
desenvolvimento físico ou
intelectual (22)
desatualização
movimento
movimento, viagem
comunicação
estagnação
Envelhecimento
Fenômeno associado com limitações de natureza
biológica, social e psicológica.
Objetos/imagens associados ao fenômeno do envelhecimento
Físico
Cabelos brancos 01 07
Doenças 01 02 03 11
Rugas 03 17
Limitações
Quedas 06
Fragilidade 06
Estresse 11
Dificuldade em locomover-se
Aparência física 20
11
06
Emocional
Rejeição
Solidão 02
11
15 1 6
Falta de
motivação
Dificuldade 03
Experiência
03
Loucura pela solidão 15
Pressão externa
06
20
Ociosidade
15
Bengala 03 07
Ferrugem 03 12
Podre 03
Bom livro 04 Livro 07
Ótimo vinho
Piscina
Caminhar na praia 05
Olhar Torre Eiffel
Sentir neve no rosto
Árvore 07 10
Cadeira de balanço 08
Cadeira de descanso 09
Pessoas caminhando ou fazendo exercícios em piscinas
Pescaria
Chimarrão
Sentar-se à beira mar
Carro 19
Asilo 11
Oxidação 12
Casa sem pintura 16
Local não cuidado
Carro enferrujado
Uma bela casa 18
Boas ações
Um grande Júri
Barco naufragado a 90 anos 19
Componentes mecânicos ou eletrônicos com tecnologia
ultrapassada 22
Sabedoria
Cansaço mental
Sedentarismo
Funcional
Metáforas
09
Figura 3: Depoimento escrito dos entrevistados
Fonte: pesquisador
113
categorização;
análise das contradições implícitas e explícitas;
interpretação/compreensão/explicação da realidade com base no referencial
teórico construído.
Completando-se a exploração dos dados, foi realizada uma análise com base
nos princípios da dialógica Moriniana. Esta opção significa a consciência de que as
imagens (metáforas) associadas e as falas escritas dos participantes expressam
intencionalidades, revelando aspectos de suas concepções que nem sempre são
transparentes nos discursos.
4 CONCEPÇÃO DE ENVELHECIMENTO IMPLÍCITA NO IMAGINÁRIO
ASSOCIADO
Concepções simplificadoras de envelhecimento nascem do espaço deixado
pela desinformação, pela ausência de uma educação gerontológica que permita
compreender este fenômeno como parte do desenvolvimento do ser humano, como
processo onde perdas existem, mas onde também possibilidade de qualidade
de vida.
A concepção de envelhecimento transforma o que o homem conhece sobre
este fenômeno em pensamento, sentimentos e se traduz em ações de vida. Assim
sendo, a construção da velhice com qualidade pode ser prejudicada, quando estes
pensamentos e sentimentos são carregados de negatividade sobre esta fase da
vida. “Uma boa velhice é uma recompensa, não um direito automático.
chegaremos a ela encarando com a mente clara e aberta a perspectiva de
envelhecer”
23; 194
.
As concepções humanas constituem um fenômeno complexo tecido numa
rede de intra e inter-relações que, ao serem conhecidas, auxiliam na compreensão
da realidade e do plano imaginário. O modo como é pensado o envelhecimento
inventa e constitui este fenômeno
3
ocultando as possibilidades de uma vida que se
constrói em uma realidade onde, a própria transitoriedade pode significar “a
possibilidade de reinventar a vida a partir da finitude das formas e da
desterritorialização subjetiva”
3
.
Como muitas são as dimensões envolvidas no processo de constituição do
imaginário sobre o envelhecimento e das concepções que dele resultam, é complexo
114
o processo da passagem de uma visão simplificadora deste fenômeno que, por
negativa que seja, guarda uma carga de defensividade, para uma visão de
complexidade que leva a conviver com a ambivalência que a realidade do
envelhecimento comporta, especialmente dentro de uma sociedade que se
alimenta/é alimentada por ideais sedimentados no visual, superficial e “fast”.
Entretanto, entre indivíduo e sociedade existe uma relação interacional e isto permite
pensar na possibilidade de informar, refletir, atuar sobre, transformar e ser
transformado ao transformar-se, como co-criador desta sociedade, com o direito e o
compromisso de construir no presente a possibilidade de um envelhecimento com
qualidade.
Para Cícero,
[...] os que não obtêm dentro de si os recursos necessários para viver na
felicidade acharão execráveis todas as idades da vida. Mas todo aquele que
sabe tirar de si próprio o essencial não poderia julgar ruins as necessidades
da natureza. E a velhice, seguramente, faz parte delas! Todos os homens
desejam alcançá-la, mas ao ficarem velhos, se lamentam
24; 09
.
A qualidade de vida na velhice (etapa do envelhecimento) é resultado de um
processo com muitas causas, biológicas, sociais, psicológicas, entre outras.
Compreendê-las significa a possibilidade de mudar concepções, vendo e vivendo o
envelhecimento como um processo universal e, ao mesmo tempo único, pelas
diferenças genéticas e de experiência de vida
5
mas, sobretudo, com possibilidades a
serem atualizadas.
Esta consciência precisa ser recuperada, para ser recuperado também o
sentido do envelhecimento e do trabalho do operador de Segurança Pública, para
busca da longevidade com qualidade e de uma concepção de envelhecimento que
inclua possibilidades, para um olhar sobre si mesmo como sujeito
autônomo/dependente, que constrói sua subjetividade nas relações intersubjetivas e
com o mundo.
A Segurança Pública brasileira está em crise, o que tem significado um
acréscimo de incertezas e de ameaças aos seus profissionais policiais e uma
diminuição de sua expectativa de sobrevivência. Neste cenário, ocupar-se com um
envelhecimento com qualidade significa vencer o desafio de demandas do contexto
nacional de formação, através da reconstrução de sua configuração, passando a
incluir conteúdos diretamente relacionados à saúde humana.
115
Azevedo e Souza e Luzzi,
25
com base em Stallings e colaboradores, em
pesquisa realizada junto a profissionais da área da saúde que trabalham na área da
Gerontologia, a partir dos resultados encontrados afirmam que se as concepções
sobre o envelhecimento não forem questionadas teoricamente, é possível que sejam
consolidadas concepções de si mesmo como alguém desprovido de capacidades à
medida que os sinais de envelhecimento se manifestem. Concepções construídas
em íntima relação com a profissão escolhida, têm impacto direto e podem influenciar
as atitudes não em relação à vida, mas também em seu desempenho
profissional, resultando em desatenção com a própria saúde e segurança.
Pode também levar profissionais a deixarem de investir esforços em
conhecimento sobre um envelhecimento com qualidade de vida, perdendo a
curiosidade intelectual, o interesse e a atenção, necessários para atualização e
reconstrução de suas concepções, reforçando a vinculação com preconceitos e
estereótipos que permeiam a cultura, correndo o risco de não incluírem a esperança
e pensamentos favoráveis para um envelhecimento saudável
25
.
Na realidade policial brasileira, a consciência da necessidade da inclusão de
aspectos gerontológicos na formação policial hoje se faz presente formalmente na
forma de uma disciplina desenvolvida num curso de formação de policial, no Estado
de Minas Gerais e como conteúdo de uma disciplina no Curso de Especialização em
Segurança Pública a Distância em desenvolvimento no ano de 2007 na Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
Nas respostas obtidas, foram associadas ao envelhecimento imagens como
“um ótimo vinho, que quanto mais velho melhor é o seu paladar e ensinamentos”,
“um bom livro”, “descanso à beira mar”, denotando visão positiva associada a este
fenômeno inerente à vida.
Na pesquisa realizada por Azevedo e Souza e Luzzi,
25
sobre imaginário
associado ao envelhecimento (já citada) foram mencionadas imagens associando
este fenômeno ao vinho e a aspectos da natureza. Estas autoras sugerem que a
presença da imagem do vinho parece trazer a idéia implícita de sabedoria: “quanto
mais velho melhor” e que a referência a um cenário (beira mar/movimento)
associado ao descanso (imobilidade) pode significar, ao mesmo tempo,
tranqüilidade. As imagens “cadeira de balanço, “parada no tempo” ou “barco
naufragado a noventa anos” (como foi mencionado por sujeitos da presente
116
pesquisa), sugerem a idéia de uma relativa imobilidade, que talvez signifique a
espera da morte.
Para Morin
26
, a espera da morte representa a possibilidade de inquietude e
horror diante da decomposição do corpo e da perda de uma individualidade sentida
como presente e reconhecida, pois após a morte, com o passar do tempo surge a
indiferença.
Em uma realidade onde a imagem institucional da Segurança Pública passa
por crescente perda da sua credibilidade
1
, a confluência entre uma imagem
profissional e uma imagem a respeito de seu próprio envelhecimento negativas,
construídas numa associação entre acontecimentos cotidianos e imaginário
individual e coletivo, pode auxiliar na explicação do fortalecimento de aspectos
culturais duplamente preconceituosos: ser polícia e ser velho.
Estes profissionais policiais militares, seres humanos cujos corpos e
espíritos vão sofrendo mudanças através do tempo, ao chegarem à aposentadoria
subitamente se defrontam com sinais das profundas descontinuidades que foram
acontecendo sem que delas se apercebessem. Ao perderem a identidade
profissional policial, que os acompanhou vinte quatro horas por dia durante trinta
anos, podem perder também a sensação de pertencimento, produtividade e valor.
Não se reconhecem como cidadãos comuns e, em muitos casos, a resposta da
sociedade ao declínio biológico, a desvalorização da velhice e os preconceitos com
estes profissionais, colabora para jogá-los num “limbo”, um espaço sem definição:
não são mais policiais que foram, e tão pouco se sentem integrados na sociedade
civil. Situações desta natureza podem gerar alto nível de estresse
27
e a evolução
para a ansiedade
28
e desta para a depressão
19
. A indissociabilidade entre ansiedade
e depressão também é mencionada por Strian e Klicpera
29
.
Na presente pesquisa o envelhecimento foi associado à “falta de
motivação”, “sedentarismo”, “estagnação”, “rejeição”, “solidão”, componentes do
imaginário que sugerem potencial para o desenvolvimento de processos
depressivos, processos que se desencadeiam a partir de causas psicológicas,
sociais e culturais, todas presentes à realidade do envelhecimento destes
profissionais.
Imagens mencionadas pelos sujeitos da pesquisa, mostrando a associação
do envelhecimento com cabelos brancos, doenças, bengalas, solidão, ferrugem,
rugas, podridão e instituição geriátrica (que no Brasil recebe uma conotação
117
pejorativa de abandono) revelam um significado de envelhecimento perpassado por
simplificação, constituindo estereótipos, preconceitos e sentimentos negativos,
expressão dos arquétipos nos quais se alimentam a visão da realidade e de si
próprios. Provavelmente será sobre estas imagens que construirão sua velhice.
Este processo progride e se afirma por que os arquétipos são permanentemente
retroalimentados pelas concepções a partir deles construídas, criadores e criaturas
do imaginário que exalta, de um lado, valores de juventude e beleza e, de outro,
associa a velhice com sentimentos negativos de perda, desvalorização e morte. Esta
simplificação apresenta-se principalmente articulada às dimensões biológica,
psicossocial e cultural, estando este imaginário marcado pela presença de aspectos
biológicos limitantes, estereotipados e ligados à finitude.
Os fenômenos são o que são pelo imaginário, inserindo-se em um
processo de construção histórica e de uma cultura que é o resultado de uma
atmosfera em constante produção de imagens
30
.
As imagens associadas ao fenômeno do envelhecimento, por sua vez,
fazem parte das concepções de mundo, alimentando-se/sendo alimentadas por
conhecimentos elaborados a partir de princípios de organização do pensamento,
resultando em outras imagens e em um agir sobre a realidade que com elas sejam
coerentes pois, o imaginário contém “um elemento racional, ou razoável, mas
também outros parâmetros, como o onírico, o lúdico, a fantasia, o imaginativo, o
afetivo, o não racional, o irracional, os sonhos, enfim, as construções mentais
potencializadoras das chamadas práticas”
30; 76
.
O imaginário estabelece o elo entre a realidade objetiva e a subjetividade.
“Nisso entra, ao mesmo tempo, algo sólido, a vida com suas diversas modulações, e
alguma coisa que ultrapassa essa solidez. sempre um vaivém entre as
intimações objetivas e a subjetividade. Uma abre brechas na outra”
30; 80
.
O imaginário é uma construção mental, social e do espírito, do pensamento
racional e não racional que ao se nutrir das realidades, as enriquece e as ultrapassa,
impregnando o coletivo, estabelecendo laços; ele é individual/coletivo; produz
imagens que contribuem para a sua formação e transformação e, embora cada
indivíduo viva este imaginário a partir de suas características peculiares, ele
permanece sendo um fenômeno do grupo, da tribo, da partilha, um fenômeno que
produz a sensação de fazer parte de algo, funcionando “pela interação, pela
118
vibração comum e pela sensação partilhada” é o “estado de espírito de um grupo”,
um “cimento social” em que o individual assume a forma de um reflexo grupal
30; 80
.
A importância do imaginário depende em parte de necessidades, sonhos,
desejos, idéias, imagens, fantasias que fazem a conexão com o mundo exterior. As
concepções humanas permanentemente alimentam e são alimentadas pelo
imaginário
31
.
Inserido nesta problemática, surge o desafio de uma formação profissional
policial no Brasil que desenvolva uma cosmovisão, que inclua em sua
transversalidade aspectos gerontológicos importantes para a vivência de uma
profissão e de um envelhecimento associado a um imaginário com maior dignidade e
qualidade.
Os profissionais de Segurança Pública cumprem importante papel
pedagógico junto à sociedade
32
e, para isto, precisam estar preparados. Numa
sociedade em processo de “desgerontização”, onde o sonho que permeia o
imaginário, de encontrar a “fonte da juventude” se associa à tentativa de afastar tudo
o que representa senescência, incluindo as pessoas senescentes, faz parte deste
preparo receber educação gerontológica que permita rever e reavaliar concepções
sobre o próprio envelhecimento e como estas se foram construindo a partir do
imaginário social.
Com isto, a senescência, que pode vir acompanhada de novas
possibilidades de gratificação, chega como prenúncio de impossibilidades e perdas,
mais uma vez alimentando o imaginário que a isto a reduziu. Esta recursividade
precisa ser rompida por uma concepção complexa deste fenômeno, concebendo-o
como processo permanente de construção/desconstrução/reconstrução, envolvendo
sujeitos, realidade e mediações entre eles.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Estudos que tragam compreensão sobre a concepção de policiais a respeito
do envelhecimento significam importante aspecto motivacional para a construção de
uma identidade policial cidadã contemporânea, que inclua a melhoria da qualidade
de vida.
A identificação de concepções simplificadoras de envelhecimento e do
imaginário sob o qual se foram construindo, foi importante para a compreensão
119
/explicação da concepção sobre este fenômeno, como portador de limitações e
possibilidades, compreendendo-o a partir de uma visão sistêmica complexa de sua
multi/interdimensionalidade.
No caso dos entrevistados da presente pesquisa, cuja profissão exercida
está essencialmente associada ao desempenho físico, as conseqüências que
decorrem de uma visão distorcida de envelhecimento trazem conseqüências que
podem estar traduzidas em várias formas de desajustes pós-aposentadoria.
A inclusão de educação gerontológica na formação profissional, permitiria a
reflexão sobre as próprias concepções e condições para a reconstrução de
pensamentos, ações, sentimentos e atitudes em relação à própria vida. Sem esta
possibilidade, o espaço ocupado pelo imaginário se reforça pela ausência da
informação qualificada a estes profissionais.
No que se refere à Gerontologia associada ao mundo policial, estudos
começam a ser feitos por parte de Programas de Pós-Graduação em Gerontologia,
resultando em pesquisas que vão permitir conhecer a realidade e sustentar
cientificamente possíveis alternativas que auxiliem na longevidade com qualidade de
vida destes profissionais que vivem em constante e intensa tensão frente a conflitos
sociais.
O presente estudo busca somar-se a estas importantes iniciativas.
A implementação de políticas públicas que atendam às necessidades
próprias ao envelhecimento e que forneçam condições para que seja vivido com
qualidade, não pelos profissionais de Segurança Pública, mas para a população
em geral, é um desafio para a realidade brasileira.
Este é um caminho a ser percorrido, um processo a ser vivido e
realimentado, tanto pelos profissionais/sujeitos quanto pelas instituições. A busca é
a aproximação cada vez maior à concretude e riqueza de possibilidades da
qualidade de vida, quando liberta das visões simplificadoras que a reduzem. Estes
profissionais, como todos, têm direito a que lhes sejam dadas condições para pleno
exercício da cidadania. O resultado objetivado é a consciência da responsabilidade
de cada um como sujeitos/atores que são e a construção de condições que
garantam qualidade. O ganho maior será da sociedade como um todo, tendo sido
devolvida a condição de seres humanos a estes que a servem e protegem.
120
6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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121
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122
CONCEPÇÃO DE ENVELHECIMENTO: TECENDO A COMPLEXIDADE
Rosa Maria Gross de Almeida
Valdemarina Bidone de Azevedo e Souza
“Um rosto é um teatro onde atuam múltiplos atores. Uma vida também.
Cada um enfrenta descontinuidades pessoais na sua caminhada contínua..
Os outros moram em nós: nós moramos nos outros...
Cada um contém a multiplicidade e inúmeras potencialidades mesmo
permanecendo um indivíduo sujeito único”
1; 95
.
RESUMO: O artigo trata da concepção de envelhecimento de um grupo de 22 policiais militares,
alunos do Curso Básico de Administração Policial Militar, analisando aspectos psicológicos ligados a
esta concepção, a partir da triangulação entre a teoria da Complexidade e a teoria psicológica da
Análise Transacional de Berne, numa abordagem fenomenológica. Os dados foram coletados por
meio de depoimento por escrito e analisados fenomenologicamente com base em Giorgi. Os
principais resultados indicam concepções de envelhecimento com suporte em orientação
paradigmática simplificadora, em que este fenômeno é visto predominantemente em sua natureza
biológica, como sinônimo de limitações físicas, perda de eficácia e de funcionalidade e sinônimo de
velhice. Estes resultados indicam, ainda, a necessidade de que a formação reforce, por conteúdos e
atitudes, o estado do ego Adulto, como condição de avaliação da realidade e de um pensamento
capaz de pensar esta realidade a partir de sua complexidade.
PALAVRAS CHAVE: policiais, envelhecimento, estados do ego, segurança pública, complexidade.
ABSTRACT: This article approaches the conception of aging in a group of 22 military police officers
taking the Basic Management Course for Military Police Officers. The study analyzes psychological
aspects linked to this conception, from a triangulation between the theory of complexity and the
psychological theory of Berne’s Transactional Analysis in a phenomenological approach. Data were
collected by means of written testimony, and phenomenologically analyzed according to Giorgi. The
main results have indicated conceptions of aging with support in simplifying paradigmatic orientation,
in which this phenomenon is predominantly seen in its biological nature, as a synonym to physical
limitations, loss of efficacy and functionality, and synonym to old age. These results also indicate the
necessity that the education reinforces, through contents and attitudes, the state of the Adult self as a
condition of both evaluation of reality and ability to think this reality from its complexity.
KEY WORDS: police officers, aging, states of the self, public security, complexity
1 INTRODUÇÃO
O aprofundamento do conhecimento sobre as próprias concepções é
condição para mudanças nos pensamentos, nas ações e nas atitudes em relação à
própria profissão e à vida.
O estudo buscou o entendimento de aspectos psicológicos envolvidos nas
concepções de envelhecimento de policiais militares na ativa, em pleno exercício de
suas funções profissionais, tendo como objetivo principal a construção de pontos de
referência, que possam auxiliar na reflexão sobre a necessidade da inclusão de
123
conteúdos transversais na formação profissional, que subsidiem uma preparação em
que a cnica se associe à qualidade de vida e à atualização contínua, para
promoção de uma longevidade com qualidade após os profissionais passarem para
a reserva.
É preciso assegurar papéis sociais que permitam aos policiais militares
aposentados continuarem engajados socialmente pelo acesso às oportunidades e
valorização disponíveis para os outros estratos etários e educação gerontológica
que lhes possibilite conhecerem a multiplicidade de oportunidades contidas no
envelhecimento, inclusive na etapa velhice.
Afastar-se da vida laboral policial após, em dia, 30 anos de dedicação
diuturna parece tornar-se uma realidade ameaçada pelo anúncio da morte da
identidade como policial e da possibilidade do não nascimento de um sentimento de
pertencer ao mundo como cidadão civil, numa visão simplificadora de vida e de si
mesmo, que dificulta uma reconstrução de identidade como cidadão não policial.
Este é um argumento que sustenta o entendimento desta transição muitas
vezes traumática pela qual passam estes profissionais e a necessidade da
consciência de si como sujeito/indivíduo, autônomo/dependente, cidadão do mundo
compartilhando um destino comum
2
.
A pesquisa foi realizada junto a um grupo de policiais militares, buscando
indicativos comuns e possíveis contradições entre a concepção que eles têm de
envelhecimento e o que esperam de sua vida após completar 60 anos, a forma como
vem convivendo com seu envelhecimento e como deveriam estar vivendo seu
envelhecimento.
O objetivo é levar compreensão/explicação sobre o fenômeno
envelhecimento numa reflexão de caráter psicológico, possibilitando tecer e melhor
explicitar sua “arquitetura complexa”, formando a base onde poderão se assentar
ações de formação que incluam aspectos psicológicos e gerontológicos, bem como
proposições de políticas destinadas à melhoria da qualidade de vida de ex-policiais.
Com o crescimento da população idosa, estudos relacionados ao
envelhecimento têm buscado trazer compreensão e conhecimento sobre este
fenômeno.
No que se refere à Segurança Pública, estudos que pesquisem sobre o que
acontece aos policiais no momento de aposentadoria, que dêem conta do que
acontece a estas pessoas quando, após terem tido suas identidades confundidas
124
com seu papel profissional por, em dia trinta anos, vêem-se dela desprovidos,
são ainda incipientes.
Com referência aos policiais militares, ao ingressarem na Instituição, é-lhes
conferida uma identidade institucional e uma farda que, por tanto tempo vestida,
parece terminar por constituir uma “camada de sua pele”.
No Rio Grande do Sul, a instituição policial militar é denominada Brigada
Militar, cuja história teve início em 1737 com a criação da Força Pública, com
participação ativa em lutas internas e externas, como a guerra do Paraguai
(Paraguai) em 1865 e a Batalha de Buri em 1924 (São Paulo)
3
.
Neste período, seus integrantes eram recrutados e integrados às tropas e
recebiam instrução voltada para a guerra, para a criação de estratégias de combate
a e montado, tendo como valores principais a coragem, o vigor físico, o amor à
verdade e à obediência até 1997, quando foi instituído pela Lei Nº 10.990,
4
de 18 de
agosto, o Estatuto dos Servidores Militares da Brigada Militar do Estado do Rio
Grande do Sul, que no seu Art. 46, inciso XV, definia o direito do Policial Militar “a
saúde, higiene e segurança no trabalho”, estendidos estes direitos à aposentadoria,
ou reserva.
Com o passar do tempo, as mudanças sociais têm levado a Instituição a
buscar aperfeiçoamento, especialmente através de processos de Ensino,
reformulando currículos e atualizando recursos humanos, profissionais que em seu
cotidiano exercem/exerceram o policiamento ostensivo e se deparam com a
complexidade das questões sociais envolvidas numa Sociedade Democrática de
Direito, num país caracterizado pela desigualdade social e injusta distribuição de
renda.
A consciência da participação na sociedade como cidadão policial
militar/civil/cidadão precisa ser despertada, para ser desvelado o sentido do
envelhecimento e da formação deste agente de segurança pública, para nortear o
caminho na busca da longevidade com qualidade e de uma concepção de
envelhecimento onde o mais se tome a decrepitude por inevitável, mas que
traduza a potencialidade do ser humano, independentemente da faixa etária em que
se encontre. Tal consciência com/ciência virá do entendimento dos múltiplos
aspectos que envolvem suas concepções, alertando para a necessidade de
prevenção.
125
2 PRINCÍPIOS TEÓRICOS NORTEADORES DA ANÁLISE DA REALIDADE
O entendimento de como se vai constituindo a personalidade humana é vital
para uma compreensão/explicação de aspectos da dimensão psicológica associados
ao envelhecimento.
A teoria psicológica escolhida para o movimento de recursividade entre
descrição e compreensão foi a Análise Transacional e, para o movimento entre
compreensão/explicação, buscou-se apoio na Teoria da Complexidade, segundo
Edgar Morin.
A Análise Transacional constitui sistema de psicologia individual e social
que trata do indivíduo e suas interações no grupo numa abordagem fenomenológica.
A fenomenologia é o estudo dos fenômenos, que se caracteriza por atitude
de reflexão e um método, respondendo às exigências e necessidade da
cientificidade.
Como atitude inclui a concepção de “intencionalidade da consciência”
5
,
como consciência orientada para as coisas, -“toda consciência é consciência de” si
próprio e do mundo
6
e do conhecimento do conhecimento
7
.
Assim, mundo e sujeito são inseparáveis, o sujeito enquanto projeto do
mundo e mundo enquanto projeção deste sujeito
8
, “em suas relações intersubjetivas
na busca de objetividade, pois [...] a objetividade só pode vir de um sujeito”
1; 80
.
Para conhecer o outro, é preciso “percebê-lo objetivamente, estudá-lo, se
possível, objetivamente, mas também se deve compreendê-lo subjetivamente. O
desenvolvimento de um conhecimento objetivo do mundo deve avançar junto com
um conhecimento intersubjetivo do outro”
1; 80
.
Trata-se de explorar os dados, o fenômeno na forma como é percebido,
“evitando forjar hipóteses, tanto sobre o laço que une o fenômeno com o ser de que
é fenômeno, como o laço que une com o “Eu” para quem é fenômeno”
8
.
A concepção de sujeito comporta quatro princípios: o sujeito “como aquele
que unidade e invariância a uma pluralidade de personagens, de caracteres, de
potencialidades”, que não se diluem com o passar do tempo, que se integram, no
movimento de conjunção de papéis desempenhados acompanhados da emergência
de diferentes personalidades ao longo da vida deste “Eu único, subjetivo,
egocêntrico que é, ao mesmo tempo, “sou eu”, a objetivação do ser que ocupa este
espaço
9
.
126
Este é o princípio de distinção/diferenciação/reunificação, que permite a
distinção entre o exterior e o interior, ao qual se agregam o princípio da permanência
da auto-referência, pois, apesar das e através das transformações, o “Eu” continua o
mesmo a despeito das modificações internas do “eu” (mudanças de caráter, de
humor), do “si mesmo”
9
(mudanças físicas que ocorrem pela idade, o
envelhecimento entre elas) e, ainda, os princípios de exclusão e inclusão em que o
“EU” é, ao mesmo tempo único para cada um (exclusão) e comporta o “nós”, pela
possibilidade de inclusão de um “nós” em si mesmo e pela possibilidade de inscrever
este“ ”Eu” num “nós” (inclusão)
9
Objetivar-se num Ego permite ao Eu a autoconsciência gerando, ao mesmo
tempo, uma dualidade interior, acrescentada da inclusão do “Nós” e dos
ascendentes no Eu além de “multiplicidades internas e profundas” próprias aos
indivíduos
1; 87
, que vivem na dialógica entre o superego, as pulsões do id e o ego,
sofrendo “possessões” de um e de outro, embora permanecendo “Eu”.
9
Os
indivíduos possuem personalidade dominante e outras que lhe são
antagônicas/complementares e concorrentes e que com ela disputam o poder, além
de potenciais outras que podem se sobrepor à personalidade dominante e atualizar-
se
10
. “Cabe decompor a concepção monista, plena, substancial do sujeito individual
e recompô-la na complexidade da sua unidade. O Eu une a heterogeneidade dos
Ego”
1; 84
.
A partir destes princípios, é possível supor que as concepções de
envelhecimento dos policiais militares participantes do estudo retratam diversos
“Ego” o que auxilia na explicação de Unidades de Significado contraditórias
identificadas no discurso de um mesmo sujeito.
A utilização da Análise Transacional permitiu o entendimento e a
descrição/compreensão/interpretação da concepção de envelhecimento dos
participantes do estudo, por uma abordagem fenomenológica, considerando as
similaridades das diferentes leituras do fenômeno envelhecimento, a partir dos
estados do ego.
A Teoria da Complexidade assume em Edgar Morin uma fundamentação a
partir da dialógica gerada nas interações entre ordem (estabilidade, invariância,
equilíbrio) e desordem (instabilidade, incerteza, desequilíbrio), que resultam numa
nova organização, que representa uma nova ordem que interage recursivamente
descrevendo uma circularidade: “[...]há uma relação crucial entre a explosão da
127
desordem, a constituição da ordem, o desenvolvimento da organização”
11; 60
em
permanente co-produção simultânea e recíproca, mediada pelas interações, “ações
recíprocas que modificam o comportamento ou a natureza de elementos, corpos,
objetos, fenômenos em presença ou em influência”
11; 72
(princípio recursivo).
Ordem, desordem, organização, interações formam um circuito tetralógico
onde o sentido de cada um emerge em sua relação com os outros, sendo termos ao
mesmo tempo complementares, concorrentes, antagônicos
11
.
Esta dialógica constituída por movimentos de ruptura/continuidade está
fundamentada nos princípios interdependentes
12
:
hologramático, em que a parte está no todo e o todo está de alguma
forma nela representado;
recursivo em que a causa age sobre o efeito, e o efeito age sobre a
causa, modificando-a e sendo por ela modificado (retroação auto-reguladora);
dialógico, numa união entre idéias antagônicas, complementares ou
concorrentes, formando novas sínteses provisórias, num determinado tempo e
espaço.
Desta forma, é possível inferir que partes
antagônicas/complementares/concorrentes (estados do ego) interagem entre elas e
com o todo (a personalidade), que de alguma forma está nelas representada, e o
todo, ao ser transformado/transformado-se, as transforma (princípios dialógico,
hologramático e recursivo).
3 ANÁLISE TRANSACIONAL E TEORIA DA COMPLEXIDADE: UMA TECITURA
COMPLEXA
A Análise Transacional é uma teoria psicoterápica de cunho
fenomenológico, criada na década de 1950 pelo Psiquiatra canadense Eric Berne,
resultado de experiências clínicas, posteriormente corroboradas pela literatura,
especialmente pelos estudos de Penfield
13
, Jasper
14
, Federn
15
e Weiss
16
, entre
outros
17
.
Eric Berne, afastou-se do grupo de psicanalistas do qual fizera parte durante
quinze anos ressaltando que o significado por ele atribuído ao termo “função de
ego” era diferente daquele usado pela maioria dos psicanalistas ortodoxos, estando
mais próximo do sentido dado por Federn
15
e por seu seguidor, Weiss
16
.
128
Penfield
13
, pesquisador e neurocirurgião, trouxe importantes descobertas no
campo da neurocirurgia e da epilepsia, descobrindo que, pela estimulação do lobo
temporal, era possível levar os sujeitos a revivenciarem situações vividas no
passado, experienciando os mesmos sentimentos.
A “psicologia do ego” de Federn
15
derivou de estudos sobre os sonhos e de
trabalho com pacientes psicóticos e, segundo Berne, ele e seu discípulo Edoardo
Weiss
16
ressaltaram, no campo da Psiquiatria, o que os estudos de Penfield
13
em
neurocirurgia haviam demonstrado
17
.
O termo “estado do ego” foi introduzido por Federn, e significou a mudança
de uma abordagem conceitual ortodoxa para uma abordagem fenomenológica.
Também deste autor deriva o conceito de “catexia”, muito utilizado por Berne para
referir-se ao potencial de energia dos estados do ego
17
.
“O interesse básico da Análise Transacional é o estudo dos estados de
ego, que são sistemas coerentes de pensamento e sentimento manifestados por
padrões de comportamento correspondentes”
18;25
que em suas relações de
interdependência (partes) formam uma totalidade.
Os estados do ego se apresentam em três formas: Pai, Adulto, Criança e
juntos constituem a estrutura da personalidade. A identificação e análise destes
estados do ego é feita pela análise estrutural dos fenômenos, através da
identificação e separação de padrões de sentimento e comportamento que a cada
um correspondam,
17
embora estados interdependentes (partes) fazendo parte de
uma totalidade.
Estes estados do ego são a manifestação fenomenológica dos
componentes psíquicos exteropsique, neopsique e arqueopsique, respectivamente,
e esta é uma característica que distingue esta abordagem da abordagem
psicanalítica: id, ego e superego são conceitos enquanto Pai, Adulto e Criança são
“realidades fenomenológicas”
17
.
O estado do ego Pai (exteropsique) deriva das figuras parentais e abrange o
conceito aprendido de vida, constituindo-se de conteúdos introduzidos de fora
17
e
sua ação imitativa é construída na intersubjetividade.
O estado do ego Adulto (neopsique) é um processador de informações
internas e externas, que utiliza as experiências passadas e responde às demandas
do aqui e agora de forma adequada. Abrange um conceito pensado de vida
17
.
129
O homem computa o seu meio, extrai dele informações para reconhecer
oportunidades e riscos.
As computações vivas têm caráter cognitivo e autocognitivo, que permitem
reconhecer o meio externo e o interior: “Ao mesmo tempo em que a máquina viva
situa-se num meio que lhe é exterior, ela contém, de certa maneira, este meio no
interior do qual se situa” princípio hologramático
7; 51.
A organização viva é ao
mesmo tempo o produto e o produtor de sua organização: a computação produz a
organização, que produz a computação – princípio recursivo
7; 51-2
.
A noção de cômputo é essencial para a compreensão da noção de sujeito
situado no centro do seu mundo, para computá-lo e computar-se, constituindo e
instituindo o caráter primordial da subjetividade (auto-ego-centrismo)
7
.
O estado do ego Criança (arqueopsique) é o componente biológico da
personalidade. Nele está a bagagem genética acompanhada do potencial que é
desenvolvido através das experiências da infância. Abrange o conceito sentido de
vida.
A tese de Berne
19
é que todo indivíduo presente a uma reunião social estará
exibindo predominantemente um estado do ego Pai, Adulto ou Criança, e esta
predominância pode mudar, com variados graus de rapidez e presteza, de um
estado para outro.
Para este autor, seus pressupostos baseavam-se na consideração dos
fenômenos psicológicos, pois até aquele momento, não era possível sua
comprovação em termos neurológicos
17
.
Para explicar as mudanças de um estado do ego para outro, criou a
metáfora das mudanças nos “fluxos de catexia” ou “energia psíquica” que se
movimentam entre eles, com maior ou menor facilidade
17
.
O movimento da catexia entre os estados do ego supõe a existência de
fronteiras entre eles.
Numa leitura permeada pela Teoria da Complexidade significaria dizer que
fronteiras podem apresentar-se mais/menos intensamente difusas, mais/ menos
permeáveis, constituindo espaços que permitem interação entre as partes.
Esta catexia que se move entre os estados do ego pode determinar as
manifestações de diferentes estados do ego: atada (energia potencial), desatada (
energia cinética), e livre (energia muscular).
130
Berne usa a metáfora de um macaco numa árvore para elucidar as formas
de catexia: “Se ele fica inativo, sua posição elevada somente lhe energia
potencial. Se ele cai, sua energia potencial transforma-se em energia cinética. Mas,
sendo um ser vivo, ele pode saltar e, então, deve-se levar em conta um terceiro
componente, a energia muscular, a fim de compreender como ele chega ao
chão”
17;38
.
A catexia livre movimenta-se com maior facilidade entre os estados do ego,
enquanto as catexias atada e desatada encontram maior resistência à sua
passagem pelas fronteiras dos estados do ego. Estes movimentos da catexia vão
determinar qual estado do ego está sendo vivido como “Eu real” e se será este ou
outro que deterá o “poder de comando” em determinada situação.
Segundo Berne, para que um estado do ego seja percebido como “Eu”, a
catexia nele predominante deverá ser a catexia livre. Entretanto, para que este
mesmo estado do ego tenha também o poder de comando, deverá incluir a catexia
desatada (cinética). A catexia desatada em interação com a catexia livre resultam na
catexia ativa, o que permite ao estado do ego não ser vivido como “Eu real”, mas
também ter o “poder de comando”. o estado do ego que contenha apenas
catexia atada permanece latente
17
.
Por vezes, um estado do ego é percebido como “Eu real”, mas não detém o
poder de comando, pois a catexia desatada está conectada a outro estado do ego. É
o que pode ser percebido especialmente nos estados neuróticos quando, embora o
estado Adulto seja vivenciado como “eu real” e permaneça com a possibilidade de
crítica sobre determinado comportamento, a atuação é da Criança, impregnada de
catexia desatada
17
.
Na personalidade (totalidade), cada um destes estados do ego (partes)
possui função própria e importante para o equilíbrio/desequilíbrio dos indivíduos
19
(dialógica entre ordem e desordem)
7
.
O estado do ego Pai tem por função “conservar a energia e diminuir a
ansiedade, por permitir a tomada de certas decisões “automáticas” e relativamente
inabaláveis. É particularmente eficaz se as decisões forem sintônicas com a cultura
local”
17; 72
.
Se, por um lado um imprinting cultural, marca matricial com seus mitos,
crenças, teorias, idéias e ritos que rege seletivamente e uma normalização que
institui o que precisa ser aceito, exercendo “uma prevenção contra o desvio”, por
131
outro a possibilidade de “enfraquecimentos locais dos imprinting, brechas na
normalização, o aparecimento de desvios”. Isto explicita a pluralidade/diversidade de
pontos de vista (dialógica cultural) que pressupõe o “comércio cultural” feito da troca
de informações, idéias, opiniões e que é estimulado pelo “comércio” com outras
culturas e com a memória
20; 26-8
.
A cultura é organizada/organizadora pela linguagem, a partir de um saber
coletivo acumulado, sentimentos, aptidões, experiências, memória e crenças míticas.
Assim sendo, se manifestam uma consciência e um imaginário coletivos permeados
por regras/normas que organizam os grupos sociais e influenciam os
comportamentos individuais.
O Adulto “é, em parte, um computador de probabilidades autoprogramador,
destinado a controlar os estímulos ao lidar com o ambiente externo”. No
desempenho deste estado do ego, o que conta é a “qualidade do processamento de
dados e o uso que determinado indivíduo em particular faz dos dados disponíveis”
17;
72
. Ciência, técnica, ética atualizada, o que convém fazer, dizem respeito a este
estado do Ego.
A computação viva incessantemente precisa resolver problemas do mundo
da vida, que ajudam na sobrevivência: a computação viva regenera e reorganiza
continuamente a máquina viva, cujo trabalho incessante determina a sua
desorganização permanente (dialógica ordem/desordem, gerando nova
organização)
7
.
A noção de cômputo leva à concepção de sujeito auto-ego-cêntrico que, ao
computar o mundo, computa-se, constituindo o caráter fundamental da subjetividade,
numa identidade egocêntrica que não é fechada: há uma identidade individual e uma
genérica comum.
“O cômputo é o operador chave do processo ininterrupto de
autoprodução/constituição/organização de um ser-máquina que é ao mesmo tempo
indivíduo-sujeito”
7; 53
, cuja sensibilidade, ao provocar uma releitura de eventos
exteriores, afeta acontecimentos interiores, cuja afetividade projeta em
manifestações exteriores os eventos interiores
7
, cujo aparelho neurocerebral possui
uma complexidade organizacional que, pela linguagem, idéias e consciência,
permite desenvolver e transformar as computações em “cogitações” (pensamentos)
7
.
A Criança tem como função “motivar o processamento de dados e a
programação do Adulto, de modo a obter a maior quantidade de gratificação para si
132
mesma”
17; 72
Esta meta motivacional –obter gratificação pode significar tanto
conseqüências externas positivas (recompensas, valorização social...) como internas
(qualificação favorável, enfrentamento de problemas, defesa de seus direitos...)
21
O diagnóstico dos estados do ego pode ser obtido a partir da observação de
condutas, gestos, tom de voz, palavras, expressão facial, entre outras. Trata-se da
diagnose comportamental. A esta, acrescentam-se a diagnose social ou operacional,
que consiste na análise do padrão de comportamento que surge como resposta a
estímulos específicos do ambiente; a diagnose histórica que resulta da identificação,
pelo indivíduo, da figura parental que serviu de modelo ao seu comportamento; e a
diagnose fenomenológica, que emerge da possibilidade da reviver o momento de
seu desenvolvimento em que se deu a incorporação deste modelo
17
.
Na prática clínica, estas formas de diagnose são usadas em conjunto e seus
resultados podem vir em corroboração uns dos outros. na análise realizada no
presente estudo, os estados do ego foram identificados apenas a partir das palavras
e expressões (Unidades de Significado), diagnose comportamental, somada à
diagnose social ou comportamental, uma vez que as solicitações do depoimento
escrito se constituíram em estímulos a serem respondidos pelos sujeitos da
pesquisa.
Aquilo que, à época de Berne não foi comprovado, posteriores estudos da
neurobiologia vieram a corroborar. Autores como Allen
22
, Hine
23
têm buscado
importantes aportes ao trabalho clínico. Dentre estes, a “configuração” dos estados
do ego, a partir de redes neurais fortalece a teoria até aqui apresentada“. O padrão
total da ativação cerebral num determinado tempo- pensamento, percepção,
sentimento, conhecimento, lembrança consciente e não consciente e modelos do
self e dos outros – podem ser chamados “um estado da mente”. Quanto mais
freqüentemente um estado mental é ativado, mais facilmente será ativado no futuro.
A ocorrência de estados da mente pode ser chamada de “estados do self”.
Eventualmente, estes estados do self tornam-se facilmente reconhecidos e são
denominados “estados do ego” ou, mais especificamente, em análise transacional:
Pai, Adulto e Criança”
23
.
Aos achados de Berne que responderam ao “o quê” acontecia na mente dos
seres humanos, hoje são acrescentados os estudos de Le Doux
24
, que buscam
responder ao “como e ao “porquê” do funcionamento do cérebro. Hine
23
entende
que estes pontos de vista combinam com o modelo de Representação Generalizada
133
(GR) de formação e operação do sistema mental permitindo uma visão
esclarecedora das bases neurais da teoria da Análise Transacional
23
.
Hine define Rede Generalizada como “[...] padrão específico de conexões
mentais ou neurais que foram reforçadas de tal forma a serem confiavelmente
ativadas por sinais familiares”
23; 65
. Os estados do ego Pai, Adulto e Criança seriam,
então, “redes amplamente distribuídas e redes de redes de RGs”:
O funcionamento de um dos estados-self P-A-C (Pai-Adulto-Criança) é “a
totalidade de um estado particular de ativação mental em resposta aos sinais [...] do
ambiente e [...] sinais de origem interna, formado e condensado através do tempo
como sistema complexos do RGs interconectadas”
23; 66
.
Segundo Hine, as redes neurais que posteriormente vão constituir o estado
do ego Criança começam a se formar ainda antes do nascimento e continuarão a ser
construídas durante os primeiros anos de vida.
“As RGs que compõem esta rede de atividade neural parecem emergir de
sensações corporais e experiências emocionais precoces e posteriores juntamente
com os padrões que emergem das interações diárias, em geral, emocionalmente
impregnadas de seus “cuidadores”.” Este estado do ego reage, principalmente, a
sinais corporais e emocionais
23; 68
.
Diferentemente da Criança, a formação do estado do ego Adulto se
desenvolve em todos os momentos da vida, pelo uso dos órgãos dos sentidos, para
exploração do mundo e de si mesmo. “As RGs formam-se mais ativamente num
estágio mais tardio de desenvolvimento cerebral, quando a memória de longo prazo
e linguagem já foram adquiridos”
23; 69
.
O estado do ego Pai, constituído pela introjeção dos cuidadores, possui as
RGs “mais implícitas” e uma grande parte dos sistemas cerebrais fazem parte de
sua construção.
A consciência de quem somos surge como resultado da formação de
conexões neurais únicas, construídas a partir de uma experiência de vida
igualmente única
23
, construída nas relações intersubjetivas e com o mundo.
Estas descobertas têm permitido avançar sobre a Teoria de Berne e explicar
a partir de bases neurais as “realidades fenomenológicas” e conceitos por ele
elaborados com base em observações clínicas.
134
4 MÉTODO
O estudo sobre a concepção de envelhecimento foi desenvolvido numa
abordagem qualitativa, numa triangulação entre abordagem fenomenológica e de
complexidade.
A escolha por esta triangulação teve como objetivo a complementação de
perspectivas de análise e a compreensão de que o estudo fenomenológico propicia
a descrição e compreensão do fenômeno necessária ao método dialógico,
possibilitando uma aproximação do foco de interesse e o diálogo com o referencial
construído.
Neste estudo, triangulou-se os passos do Método Fenomenológico
apontados por Amedeo Giorgi
25
:
a) o sentido do todo compreendendo a descrição do fenômeno, a partir da
leitura dos depoimentos por escrito, articulando-se os objetos da experiência da
forma como é vivida pelo sujeito, de forma que seja evidenciado o que ele
representa na situação investigada, respeitando a parte-todo que se manifesta;
b) a identificação das Unidades de Significado (partes), realizada a partir do
sentido do todo obtido na descrição, processada a redução fenomenológica, numa
atitude de pré-reflexão para captar o fenômeno tal como se mostra, suspendendo-se
a cumplicidade do senso comum;
c) a transposição das Unidades de Significado (linguagem cotidiana) em
Linguagem Gerontológica foi utilizada para a construção do objeto de estudo a partir
de interpretação, permitindo a redução da extensão da descrição representativa do
fenômeno explicitado pelo sujeito;
d) a síntese das Estruturas de Significado, compreendendo uma descrição
que equivale à estrutura da experiência vivida, buscando-se o conjunto dos
significados (todo formado pelas essências do fenômeno), que é discutido
teoricamente, acentuando modos de pensar a realidade, levando à compreensão do
fenômeno estudado; com passos do Método da Complexidade
26
:
a reflexão sobre as próprias preconcepções (certezas provisórias do
pesquisador) como momento de reflexão sobre o que esperava encontrar na
realidade e sobre sua própria concepção sobre o fenômeno investigado, vivenciando
momentos de conhecimento do próprio conhecimento e preparando uma base para
avaliar seus próprios avanços, a partir dos resultados da pesquisa;
135
a reflexão sobre as incertezas que permeiam os dados coletados da
realidade e os métodos utilizados de forma complementar;
a análise intradiscurso, elaborando uma representação gráfica, a partir
das Unidades de Significado, para melhor perceber as inter-relações entre elas;
a análise interdiscurso, buscando aspectos implícitos nas inter-relações
entre as Estruturas de Significado;
discussão da realidade com base nos princípios dialógico, recursivo e
hologramático.
A esta triangulação foi acrescentada a contribuição de Comiotto
25
à análise
fenomenológica de Giorgi, identificando-se as dimensões implícitas nas essências
25
.
O estudo foi desenvolvido junto a um grupo de 22 alunos de curso de
formação de nível intermediário de uma Polícia Militar brasileira com, em média, 22
anos na profissão policial militar, idade média de 39 anos, escolaridade de ensino a
médio à pós-graduação em nível de especialização.
A opção pelo tempo de serviço igual ou superior a 20 anos de trabalho deve-
se ao fato destes profissionais terem atualmente a possibilidade de se aposentarem
aos 30 anos de trabalho. Assim, o corte em 20 anos significa um mínimo de dois
terços de tempo na ativa, o que corresponde a possibilidade dos respondentes terem
no mínimo trinta e cinco anos (idade correspondente aos policiais militares oficiais
que têm como idade mínima de ingresso na formação aos 16 anos).
Os policiais militares responderam, por escrito, a um roteiro de depoimento
por escrito com questões abertas.
O objetivo foi mapear representações e não medir sua distribuição relativa
na população. Na construção do corpus, o tamanho da amostra atendeu à evidência
de saturação (quando os registros não traziam mais novidade).
Como assinala Morin, “As partes são a verdade do todo, tanto quanto o todo
é a verdade das partes”
11
. Assim sendo, a generalização pretendida foi a analítica
(análise teórica) e não a estatística o que significa que os resultados encontrados
podem ser transpostos para novos contextos, bem caracterizados, sob a forma de
hipóteses
27
.
Estabelecido rapport com o grupo, foram esclarecidos os objetivos da
pesquisa e dadas explicações necessárias para que os alunos pudessem decidir-se
participar ou não. Os alunos, em sua totalidade, aceitaram participar do estudo e
assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
136
A sessão de coleta de dados foi distribuída em dois momentos: o primeiro
destinado ao preenchimento de depoimento por escrito; o segundo à discussão
coletiva sobre envelhecimento, especialmente envelhecimento de profissionais
policiais, objetivando proporcionar momentos de reflexão e revisão de suas próprias
concepções.
A discussão dos resultados teve como aportes principais a Teoria da
Complexidade de Edgar Morin e a Análise Transacional de Berne.
5 RESULTADOS E SUA DISCUSSÃO
Para tornar possível a análise das concepções de envelhecimento, as
solicitações contidas no roteiro do depoimento escrito foram divididas em função dos
tipos de estímulo que representaram para os entrevistados, constituindo convite a
respostas vindas do Adulto, do Pai ou da Criança, utilizando-se o referencial de
Berne.
A primeira solicitação se referia à descrição de como vem convivendo com
seu envelhecimento.
Esta solicitação, a partir do verbo descrever, está direcionada ao Adulto
encontrando-se as Unidades de Significado: ”cuidando da saúde”; “fazendo exames
médicos”; “sendo independente”; “alimentação”; “atividade física”; “bons
relacionamentos”; “espiritualidade”; “autoconhecimento”; “estudando para
acompanhar as mudanças”; “visto faltar muito tempo, estou vendo o lado
financeiro”; “vida regrada financeiramente ou no trato com a saúde”; “não cometendo
abusos”; “através de boa qualidade de vida”; “busca de estar bem com as pessoas”;
“ainda não estou preparando”; “ainda não pensei nisso”; “desenvolvendo atividade
religiosa”; “produzindo poesia”; “realizar atividade profissional após a aposentadoria”;
“preparando para dar aula”; “preparando atividade para quando a velhice chegar”;
“não estou preparado para o envelhecimento, não me sinto velho, penso em me
aposentar e dedicar-me ao lazer junto com os familiares”; “sou contra o retrabalho”;
“esquecer que fui policial feminina pioneira, ter na lembrança”; “procurar trabalho
voluntário”; “preparo de forma sadia mental e fisicamente: tal preparação não
começou ontem, pois é um processo que deve ser cuidado desde o início da vida”.
Com base na transposição desta descrição para a linguagem Gerontológica
foram identificadas as seguintes Estruturas de Significado (essências), que
137
constituem partes por vezes antagônicas, complementares, concorrentes,
constituintes do todo concepção de envelhecimento - que, ao interagir,
modificam/são modificadas/modificam-se:
a) Envelhecimento como fenômeno de natureza biológica associado a
limitações físicas e limitações e possibilidades psicológicas, sociais, educacionais,
culturais e espirituais.
b) Envelhecimento como processo sem tempo determinado para iniciar,
independentemente da idade e distante do momento presente.
c) Envelhecimento como processo a ser cuidado desde o início da vida, pois
começa ao nascer.
d) Envelhecimento como processo entrópico em que o organismo perde
gradativamente a funcionalidade ou a plena eficácia.
e) Envelhecimento como fenômeno ambivalente em sua associação a um
imaginário composto por representações de limitações e possibilidades.
f) Envelhecimento como sinônimo de velhice e distanciamento da juventude.
g) Velhice associada à preparação de condições intelectuais e financeiras
para manter a saúde e lazer e afastamento do trabalho para dar espaço para jovens.
h) Velhice como conseqüência natural, associando-a ao desenvolvimento de
atividade intelectual, lazer, atividade física.
Utilizando-se o acréscimo feito por Comiotto
25
à análise fenomenológica de
Giorgi, foram identificadas as seguintes dimensões:
Biológica: concepções em que o fenômeno envelhecimento se confunde
com a velhice, embora esta seja apenas uma etapa; envelhecimento associado a
cuidados com a alimentação, autonomia e atividade física, como processo distante
(no futuro), que está presente desde o início da vida.
Psicossocial: concepções em que o fenômeno envelhecimento foi associado
a lazer com familiares, bom relacionamento, lazer, improdutividade, produtividade,
autoconhecimento, situação financeira, trabalho voluntário, discriminação.
Educacional: concepção em que o fenômeno envelhecimento é associado à
preparação acadêmico-intelectual para atividades a serem desenvolvidas após
aposentadoria e de natureza diversa à profissional desempenhada no presente.
Cultural: concepção de envelhecimento em que o imprinting e a
normalização cultural se fazem presentes nas Unidades de Significado identificadas,
138
em que envelhecimento está associado a uma etapa após aposentadoria,
confundindo-o com uma de suas etapas – a velhice.
Se o sujeito/indivíduo (autônomo/dependente) não estiver preparado para
pensar a complexidade, a avaliação do Adulto sobre a realidade tenderá a ser
permeada por orientação paradigmática simplificadora, enraizada na cultura, como
ficou evidenciado nas Unidades de Significado identificadas na análise dos
depoimentos escritos, explicitadoras de concepções simplificadoras do fenômeno
envelhecimento, visto a partir de apenas uma ou duas de suas dimensões.
A segunda solicitação referia-se à descrição sobre como pensa que deveria
estar vivendo um envelhecimento com melhor qualidade.
Nesta segunda solicitação, o estímulo está dirigido ao estado do ego Pai,
pois, embora comece com o mesmo verbo da anterior, a descrição é sobre “como
deveria” estar vivendo seu envelhecimento.
Dever é uma palavra que está diretamente relacionada às mensagens
recebidas dos pais e figuras significativas e que constituem conteúdos do estado do
ego Pai. Isto pode ser evidenciado nas Unidades de Significado: “deveria estar
formado”; “deveria parar de fumar e ter alimentação mais saudável”, “deveria estar
efetuando uma poupança”; “deveria fazer mais exercícios físicos”; “deveria cuidar
melhor de minha saúde, ampliando as relações sociais, me estressar menos”;
“estudar um pouco mais”; “estar com saúde e acompanhar a evolução rápida das
novas gerações”; “exercer outra atividade após a aposentadoria”; “ocupar-se com
algo”; “lazer, cultura em geral, viajar mais, divertir-me mais”; “ler mais e descansar
bastante”; “no trabalho deveria haver um maior cuidado com as condições
apresentadas”; “buscar o diálogo para não apresentar o aspecto negativo das
coisas”, “saúde, mental e material; “bom salário para ir à Universidade [...] poder ser
um multiplicador da cultura ou do conhecimento adquirido”, “deveria fazer um curso
para atividade após aposentadoria”, “melhores planos de saúde [...], ter atividade
que não tomasse muito o tempo”; “boa compreensão do estado espiritual”, “realizar
serviço voluntário”; “ampliação das relações sociais”; “dar mais atenção à parte
intelectual”; “fazer preparação desde o ingresso na carreira, para ter um bom
resultado no final”, “manter o corpo em atividade no sentido físico e psíquico”,
“consciência de que todos vão envelhecer, todos querem viver muito, mas ninguém
quer ficar velho”.
139
Tal como evidenciado nas Unidades de Significado da solicitação anterior,
os participantes referem-se a uma ou duas das essências do fenômeno
identificadas (biológica, psicossocial, educacional e cultural). De acordo com a
Teoria de Berne, é possível que este resultado tenha sua origem no estado do ego
Pai, construindo e expressando concepções de envelhecimento, a partir da ótica de
seus pais, impregnadas pela marca cultural.
A terceira solicitação perguntava: O que é envelhecimento?
Esta foi outra pergunta dirigida ao estado do ego Adulto e nas Unidades de
Significado identificadas ficaram evidenciadas concepções simplificadoras do
fenômeno, onde são levadas em conta apenas uma ou duas de suas
dimensões: “Maior limitação física [...], mas mais eu me gosto, acho que é por viver
mais intensamente todos os momentos”; “Quando o corpo passa a ter algumas
limitações físicas, embora a mente esteja preparada para desempenhar
determinadas tarefas“; “É o fator natural a que todos estamos submetidos,
´movimento constante de tudo”; “situação em que temos nossa capacidade física e
mental reduzidas”; “sedentarismo, estagnação, parado no tempo [...] é a passagem
da vida ativa para uma vida contemplativa, é hora de desfrutar e/ou colher os frutos
plantados”; “É uma opção, questão de ponto de vista e de comportamento, muito
ligado à auto-estima”; “É um estágio da vida em que se chega após longo percurso”
“No sentido figurativo é o outono...” “É saber viver com suas diferenças e limitações”;
é pobreza de espírito quando não cuidamos da alma, do corpo, do intelecto”; É a
perda da automanutenção”; “é saber respeitar aos outros”; “estágio da vida em que
se chega após longo percurso, tendo atingido amadurecimento e experiências”;
estável teoricamente, procura melhor qualidade de vida, podendo cuidar melhor da
saúde e convívio social”; “é o outono”; “parar de produzir e começar a usufruir da
aposentadoria, para dar lugar no mercado de trabalho para a juventude”; “ficar cada
vez mais sozinho e ter dificuldades em entender as mudanças da sociedade”;
pessoa que pensa que tudo acabou, que não motivos para iniciar algo novo”; é
pessoal”; “estado mental e físico”; “quando perde aptidões, é perda normal”; “tirar
proveito com boa qualidade de vida e procurar atividade para ocupar seu tempo”;
“amadurecimento físico e psicológico”; “o organismo perde gradativamente sua
funcionalidade”.
A partir destas Unidades de Significado emergiram essências das
concepções de envelhecimento, compreendendo aspectos favoráveis como:
140
fenômeno natural e singular, movimento constante, uma questão de ponto de vista e
de comportamento, ligado à auto-estima; é estágio da vida em que se chega após
longo percurso. No sentido figurativo, é o outono; é viver mais intensamente todos os
momentos; é saber viver com diferenças e limitações, sabendo respeitar aos outros;
é amadurecimento físico e psicológico e experiência, é possibilidade de cuidar
melhor da saúde e do convívio social; é tempo de parar de produzir e começar a
usufruir da aposentadoria com boa qualidade de vida e atividade para ocupar o
tempo.
Como aspectos desfavoráveis contidos nas essências do fenômeno
envelhecimento emergiram: o organismo perde gradativamente sua funcionalidade,
apresentando maior limitação física e mental, embora a mente esteja preparada para
desempenhar determinadas tarefas; é sedentarismo, estagnação, parar no tempo; é
passagem da vida ativa para uma vida contemplativa; é pobreza de espírito, quando
não são cuidados a alma, o corpo, o intelecto; é perda da autonomia; ficar cada vez
mais sozinho e ter dificuldades em entender as mudanças da sociedade; é pensar
que tudo acabou, que não há motivos para iniciar algo novo.
Em relação às Unidades de Significado encontradas nas respostas a esta
última solicitação, emergiram explicitamente as essências biológica e psicossocial e
implicitamente a educacional e a cultural.
A educacional como carência de escolaridade que contemplasse
conhecimento sobre envelhecimento (tema do artigo “Envelhecimento e sua
Interdependência com a Formação Profissional”) e a cultural pelas crenças
associadas ao envelhecimento.
A cultura é formada por pressupostos básicos inventados, descobertos ou
desenvolvidos por determinado grupo, no processo de aprendizagem para tratar com
problemas de adaptação externa e integração interna. Os pressupostos que são
aceitos e considerados válidos, são ensinados aos demais membros e são por eles
assumidos, levando a comportamentos que podem ser internalizados como
verdades
28
.
A cultura é comunicada através de valores, crenças e pressupostos,
narrativas de eventos que informam sobre fenômenos e mitos (histórias com valores
não sustentadas pelos fatos)
29
que influenciam na formação de uma rede de
concepções, normas e valores que são adotados, permanecendo implícitos na vida
cotidiana
30
.
141
Para Schein
28
, a cultura se forma em espaços grupais com experiências
comuns (família, unidades profissionais de um mesmo segmento/ramo de atividades,
regiões geográficas, nações...), tornando-se propriedade e se fazendo presente nos
níveis hierárquicos: cada indivíduo ao realizar determinado tipo de trabalho numa
organização por determinado tempo, assume “muitos dos temas culturais partilhados
por aqueles que exercem atividades semelhantes à sua ou que trabalham na mesma
organização” o que significa dizer que “para explicar o comportamento individual,
devemos ir além da personalidade e procurar os membros dos grupos e as culturas
desses grupos, buscando conhecer as experiências e conhecimentos comuns”
28; 29
.
Uma outra solicitação se referiu à que citassem objetos ou descrevessem
imagens associadas ao fenômeno do envelhecimento, utilizando-se estímulo
diretamente direcionado à Criança por solicitar apelo ao imaginário. Nos conteúdos
deste estado do ego, vamos encontrar retratada a forma como a Criança foi vivida,
como concebia a velhice, fosse pela visão de seus avós ou de outras pessoas
envelhecidas, fosse pelas histórias que lhes eram contadas de seus antepassados,
fosse pela forma como seus pais concebiam a velhice e a forma como tratavam as
pessoas velhas, especialmente pelos sentimentos que estas situações lhes
suscitavam. Estes conteúdos gravados são traduzidos nas imagens.
“A importância da fantasia e do imaginário no ser humano é inimaginável.”,
escreve Morin
31;21
e nas respostas dos participantes, por meio de uma análise
semiológica, encontramos retratado o espaço do imaginário na construção das
concepções de envelhecimento, relatadas e discutidas no artigo “Concepção de
envelhecimento implícita no imaginário associado: um estudo junto a Policiais
Militares”.
Provavelmente, é no estado do ego Criança que esteja mais claramente
revelado o imaginário destes profissionais, ligado à valorização da força e da
agilidade física e à estética.
As imagens mencionadas pelos sujeitos da pesquisa, mostraram a
associação do envelhecimento com cabelos brancos, doenças, bengalas, solidão,
ferrugem, rugas, podridão e instituição geriátrica (no Brasil com conotação de
abandono) revelando um significado do fenômeno envelhecimento perpassado pela
simplificação, representativo de estereótipos, preconceitos e sentimentos negativos,
expressão dos arquétipos nos quais se alimenta a visão da realidade e de si
próprios. Provavelmente sesobre estas imagens que construirão sua velhice. Este
142
processo progride e se firma porque os arquétipos são permanentemente
retroalimentados pelas concepções a partir deles construídas, criadores e criaturas
do imaginário que privilegia, por um lado, valores de juventude e beleza e, de outro,
associa a velhice a sentimentos negativos de perdas biológicas e psicossociais, de
desvalorização e morte. Esta simplificação apresenta-se principalmente articulada a
um imaginário marcado pela presença de aspectos biológicos limitantes,
estereotipados e ligados à finitude
32
.
Nas solicitações contidas nas questões: “O que espera do futuro após
completar 60 anos?” (que significou um estímulo dirigido à Criança ou ao Pai por
perguntar sobre o que o indivíduo espera), as Unidades de Significado retratam
expectativas, imaginação, - predominante no estado do ego Criança - como também
o que é esperado que aconteça e “Quais suas metas em relação envelhecimento”
(pergunta dirigida ao estado Adulto) explicitaram, mais uma vez Unidades de
Significado e essências (Estruturas de Significado: biológica, psicossocial e cultural)
identificadas nas solicitações anteriores e evidenciadoras da saturação dos dados
(critério de cientificidade e comprovadora da suficiência do corpus), corroborando
uma concepção simplificadora de envelhecimento.
Repetiram-se Unidades de Significado em que são apontados aspectos
importantes para construção de uma velhice com qualidade. Entretanto, “o indivíduo
aspira a viver plenamente a sua vida”
1; 52
, o que supõe conhecer-se como um ser
com múltiplas dimensões (físicas, biológicas, psicológicas, sociais, históricas,
planetárias) com necessidades/possibilidades, o que não está traduzido nas
respostas trazidas pelos participantes do estudo.
É possível que as concepções simplificadoras de envelhecimento tenham
resultado em metas igualmente simplificadoras.
Buscando uma possível complementação nas concepções, foi solicitado que
citassem limitações (estímulo provavelmente recebido pela Criança, onde as
respostas, predominantemente, retrataram medos e pensamento mágico) e
possibilidades (estímulo dirigido ao estado do ego Adulto, pelo convite que faz a que
“pense” sobre) que pensam terão quando idosos.
As Unidades de Significado referentes às limitações foram: “medo de ser
discriminado”; “falta de motivação”; “não ter atividade sexual como hoje”; “perda do
pensamento rápido e da mobilidade física”; “problemas com a saúde”; “aquelas
causadas pela doença e pelo desgaste físico”; “perda financeira”; “dificuldade visual”;
143
“que a memória não falhe”; “terei tantas limitações quantas eu desejar, terei troca de
atividades”; “menos resistência à fadiga”.
As Unidades de Significado que se referiram às possibilidades trazem
conteúdos próprios ao estado do ego Pai, denotando preconceitos com relação a
esta fase da vida como: “em relação ao mercado de trabalho, penso que serão muito
poucas”; “Muito poucas”; “Não vejo muitos benefícios, mas acho que terei uma boa
aposentadoria e poderei viajar bastante”.
Na Unidade de Significado “todas aquelas que eu construir antes, pois nada
cai do céu...” embora o início possa ser uma resposta do estado do ego Adulto,
expressada logicamente, a expressão “pois nada cai do céu”, ao final da frase, pode
ser considerada tipicamente parental.
Já nas Unidades de Significado “viajar, conhecer novos lugares”; “mais
tempo disponível e experiência de vida”; “conhecimento adquirido, respeito
conquistado, mais tempo para si e para a família”; “ajudar, fazer caridade”; “convívio
social”; “não mais a obrigação de cumprir horários, poderei ter condições de
desfrutar um pouco da vida”; “fazer o que o organismo agüentar e a mente”; “ter que
me cuidar mais e ter saudades de não ter feito o que posso fazer hoje com saúde,
força e felicidade”; “mais experiência, menos chances de errar“, “realizar atividade,
desde que me prepare” podem ser identificadas respostas vindas do estado do ego
Adulto.
As Unidades de Significado “quero acreditar que todas”, “todas as que
possuía”; expressam uma resposta do estado do ego Criança, vendo o futuro com
temor.
A vida comporta incertezas. Aprender a pensar a complexidade significa
olhar estas incertezas não somente como risco, mas também como
possibilidade/oportunidade de desenvolver estratégias
9
.
O medo e o pensamento mágico aqui expressados, provavelmente resultam
de pensar sobre a realidade e a vida de forma simplificadora.
As teorias biológicas sobre o envelhecimento têm buscado explicar o
fenômeno, cada uma abrangendo mais detalhadamente uma determinada
especificidade.
Na Gerontologia, como nas demais áreas do conhecimento, as teorias
precisam incluir a noção de complexidade para que possam buscar um princípio que
as una, característica da Teoria da Complexidade.
144
Embora não fosse objetivo do trabalho identificar teorias sobre
envelhecimento subjacentes ao depoimento dos participantes, foram encontradas
Unidades de Significado reveladoras da Teoria da Troca Social
33
como: “parar de
produzir e começar a usufruir da aposentadoria, para dar lugar no mercado de
trabalho para a juventude”; “ter dificuldades em entender as mudanças da
sociedade”.
Esta Teoria da Troca Social, classificada em nível microssocial
33
, trata sobre
tendência do idoso em afastar-se das interações sociais em razão do lculo
custo/benefício, concebendo-se com poucas condições para contribuir socialmente.
Apresenta como proposições básicas, na consideração das interações sociais do
idoso com outros grupos etários, as normas de reciprocidade, de justiça distributiva e
de beneficência.
A Teoria da Subcultura, em nível micro/macrossocial
34
, parece estar
presente na realidade atual de idosos que buscam oportunidades de interação entre
seus pares. Esta teoria postula que os idosos estão desenvolvendo uma cultura
própria a partir de suas crenças e interesses comuns, da exclusão de interações
com outros grupos etários e do crescimento de interações dos idosos entre si.
Segundo Neri
35
, o fenômeno do envelhecimento pode psicologicamente ser
analisado a partir das perspectivas do Ciclo de Vida, do Curso de Vida e da Life-
Span, tendo como principal diferença entre elas, o fato de a primeira adotar o critério
de estágios como princípio organizador do desenvolvimento.
Na Perspectiva do Ciclo de Vida a expressão “ciclo de vida”, está
diretamente relacionada ao sentido em que o termo foi usado por Eric Erikson
36
em
sua teoria do desenvolvimento.
Esta teoria foi denominada por ele como epigenética, significando algo que
se revela ou desdobra sucessivamente, estando os estágios mais avançados
contidos nos anteriores. Neri
35
entende que, por considerar a vida humana em sua
extensão e propor que a manifestação e a resolução das crises evolutivas do ciclo
de vida se dão no contexto das influências socioculturais, esta teoria representou
avanços importantes com relação às teorias clássicas do desenvolvimento.
Comparando-se esta ênfase com a Teoria de Berne Análise Transacional
é possível dizer que este autor difere do primeiro pela ênfase no princípio da
recursividade entre os estados do ego. (com base em Morin).
145
A Perspectiva do Curso de Vida trata sobre o desenvolvimento do ponto de
vista das inter-relações em nível individual, familiar e societal ao longo do tempo,
considerando o impacto da sincronia ou da assincronia entre o tempo individual, o
tempo familiar e o tempo histórico sobre o desenvolvimento individual
35
.
Berne construiu a teoria da Análise Transacional sobre as relações
(transações) entre as pessoas. Allen acentua a construção dos estados do ego
como dependente do ambiente e que eles são construídos interpessoalmente
37
.
Entretanto, diferentemente da Perspectiva do Curso de Vida, não há
referência aos tempos individuais na teoria da Análise Transacional.
A Teoria de Estruturação Etária em Gerontologia e a Teoria Sociológica da
Extratificação por Idade compartilham destes pressupostos. Segundo essas teorias
as pessoas, em seu desenvolvimento compartilham experiências socioculturais com
seus semelhantes, influenciando/sendo influenciadas por eles e por si mesmo
(princípio recursivo em Morin). Ao conjunto de pessoas de uma mesma época, que
entram e saem juntas de suas instituições e que tendem a passar pelas mesmas
experiências (interação todo/partes e o todo de alguma forma representado nas
partes: (princípio hologramático em Morin) denomina-se coorte.
Nesta teoria são importantes os conceitos coorte e os de geração e de
descontinuidade estrutural, manifestada quando a sociedade não assegura papéis
sociais que permitam aos idosos saudáveis e ativos continuarem engajados
socialmente ou terem acesso às oportunidades e gratificações sociais disponíveis.
Desta forma, seria a partir de expectativas e normas comportamentais prescritas
pela sociedade como adequadas às diferentes faixas etárias (normalização em
Morin) que se constituiriam os estágios de desenvolvimento.
Estas prescrições sociais internalizadas, associadas a eventos biológicos,
construiriam os cursos de vida, e a percepção de si mesmo como alguém que está
em consenso em relação à normalidade e pertinência.
Nas respostas trazidas pelos sujeitos da pesquisa estão presentes a
preocupação relativa a esta normalidade e pertinência.
A autora refere-se ainda ao paradigma life-span de orientação dialética,
como resultante de várias fontes de influência sobre o pensamento psicológico que
se desenvolveu na área do adulto e do idoso: as teorias de Erikson e Riegel, a teoria
de aprendizagem social em Psicologia do Desenvolvimento e a Perspectiva de
Curso de Vida.
146
A abordagem dialética apresenta proximidade com a Fenomenologia
principalmente em relação à categoria básica totalidade (todo maior do que a soma
das partes) e difere da Teoria da Complexidade em relação a esta mesma categoria
(o todo pode ser maior ou menor do que a soma das partes na dialógica de Morin),
na categoria contradição (as contradições são espaços de construção em Morin
1
enquanto na dialética precisam ser superadas). Na Teoria da Complexidade a noção
de antagonismo, existente na dialética, está interligada à noção de
complementaridade e concorrência
38
.
No presente estudo, numa perspectiva Berniana, pela complementação e
saturação dos dados por meio de solicitações que se aproximavam e continham
estímulos aos estados do ego Adulto, Criança ou Pai, foi possível evidenciar
diferentes concepções de envelhecimento, resultantes da ativação de diferentes
redes neurais, reflexão e informações (estado do ego Adulto), conteúdos arcaicos
(estado do ego Criança) ou de conteúdos aprendidos das figuras parentais (estado
do ego Pai).
As concepções expressam, por vezes, contradições, como, por exemplo,
quando um dos participantes, respondendo à mesma solicitação, associa o
envelhecimento a “não estar fazendo nada e, ao responder sobre suas
possibilidades afirma: “terei muitos convites para trabalhar em atividades
comunitárias”.
Estas Unidades de Significado revelam concepções de envelhecimento em
que, cada uma delas, se refere à determinada essência do fenômeno não
evidenciando uma visão da complexidade do fenômeno, e tendo sua origem em
diferentes estados do ego. Cada rede neural, (estado do ego) ativada “possui regras
específicas e igualmente problemas particulares que procuram resolver. Além disto,
é provável que esta rede neural será ativada novamente, pois neurônios que
“disparam” juntos tendem a conectar-se e “disparar” juntas no futuro”
22; 254
.
Como afirmou Berne, cada estado do ego possui uma função diferente, o
que determina sua maneira própria de perceber o ambiente e, em conseqüência, de
a ele reagir: “A exteropsique é criteriosa de um modo imitativo e busca fortalecer
conjuntos de padrões emprestados”
17
.
Morin refere esta presença, não só dos pais como também dos ascendentes
na personalidade dos seres humanos, tanto através dos genes quanto de processos
inconscientes através dos quais “mil modulações de voz, modos de comportamento,
147
hábitos mentais, inscreveram-se em s por mimetismo em relação a nossos
parentes próximos. Nossos ascendentes estão incluídos em nossa identidade”
1; 87
.
A neopsique ocupa-se sobretudo da transformação de estímulos em peças
de informação e do processamento e arquivo desta informação com base na
experiência prévia
17
. As características deste estado do ego estão próximas às
características com as quais Morin qualifica a racionalidade que “[...] pode ser
definida como o conjunto de qualidades de verificação, controle, coerência,
adequação, que permite assegurar a objetividade do mundo exterior e operar a
distinção e a distância entre nós e o mundo”
1; 97
.
A arqueopsique tende a reagir de maneira mais brusca, baseada no
pensamento pré-lógico e em percepções pouco diferenciadas ou distorcidas”
17; 35
.
Morin refere-se à presença da infância e da adolescência na idade adulta,
não como estado do ego, mas a estas fases de vida estarem “recessivas” na idade
adulta: “a infância reaparece nos jogos; a adolescência nos amores e nas amizades;
também o velho guarda as idades anteriores e pode facilmente voltar à adolescência
e à infância”
1; 85-6
.
Por terem sido formados de maneiras diferentes, por usarem diferentes
caminhos neurais que ativam padrões de redes neurais diferentes, cada estado do
ego apresenta padrões comportamentais próprios em reação a estímulos
específicos, tanto internos quanto externos
23
.
Estão aí colocadas as bases neurológicas buscadas por Berne para explicar
os movimentos de um estado de ego para outro, explicados por ele através da
“catexia”, uma vez que é possível observar-se o metabolismo do cérebro em
funcionamento, bem como seu fluxo sangüíneo e atividade elétrica
37
.
“Hoje podemos falar de aumentos e diminuições observáveis na ativação
de vários circuitos neurais em tempo real. Esta compreensão mais recente da
“energia psíquica” ainda precisa ser integrada à prática psicoterapêutica, mas
propicia uma maneira inteiramente nova de conceituar cathexis [...]”
37; 266
. Desta
forma, de acordo com o tipo de estímulo que representava cada solicitação, ocorria
um movimento da catexia, movimentando-se entre diferentes estados do ego,
resultando na resposta correspondente.
O self constitui-se/é constituído na integração dos diferentes estados do ego
e é esta integração que confere aos seres humanos “um senso de continuidade e
coerência”
37
.
148
Este self integrador se aproxima do que Morin refere como ““Eu” subjetivo,
esta espécie de ponto fixo[...]”. Entretanto, enquanto a teoria da Análise
Transacional fala de estados do ego compondo uma personalidade total, Morin fala
de “várias personalidades” que ocupam, ora uma ora outra, este “Eu” subjetivo e às
quais ele confere unidade
9
. A estas personalidades chama de Ego: [...], existem
vários Ego em uma pessoa, mas eles quase o se freqüentam e o ligados por
um Eu único”
1; 94
.
Este Eu é igualmente a identidade que permanece no tempo, a despeito das
mudanças pelas quais, permanentemente, passa o sujeito: “Tão diferente ao longo
do tempo que um estranho não saberia identificá-lo em fotografias, o Eu permanece
ele mesmo através das transformações da criança em adolescente, deste em adulto,
do adulto em velho; a qualidade do sujeito transcende as mudanças do ser
individual”
1; 75
.
As Unidades de Significado vindas da Criança refletem concepção de
envelhecimento ligada a doenças, rejeição, solidão, o estar fazendo nada,
concepções estas provavelmente originadas de vivências infantis que ficaram
gravadas.
Referente às possibilidades, percebe-se que as Unidades de Significado
foram ditadas a partir do estado do ego Adulto, expressando propósito de boas
relações familiares, muitas amizades e muito o que fazer.
As unidades de significado vindas do Pai imitam comportamentos paternos e
nas respostas expressam especialmente dever: deveria parar de fumar e ter
alimentação mais saudável; deveria estar efetuando uma poupança; deveria fazer
mais exercícios físicos; deveria já estar formado.
Berne, referindo-se à “hierarquia” dos estados do ego, considerava o estado
do ego Pai como o mais fraco entre os três estados, o estado do ego Adulto vindo a
seguir e, dentre os três, considerava a Criança não como o mais forte dentre os
estados do ego mais ainda como a “parte mais valiosa da personalidade”
18; 25
.
Segundo Hine
23
, no desenvolvimento da personalidade, os estados do ego,
Pai, Adulto e Criança vão se constituindo a partir da ativação de sistemas complexos
de redes neurais e, cada um deles, carrega em si uma diferente consciência de si
mesmo” que lhe é própria: uma consciência Pai de si mesmo, uma consciência
Adulto de si mesmo e uma consciência Criança de si mesmo
23
. Os processos entre
149
eles podem ser ou não sintônicos, o que resulta num sentimento de conflito interno
40
e em ser ou não conscientes (princípio dialógico).
Para Morin a consciência, “produto supremo, o mais rico do espírito
humano”
1;111
está permanentemente vulnerável ao erro e mantém, com a
inteligência, uma relação de interdependência: “A consciência precisa ser controlada
ou inspirada pela inteligência, a qual necessita de tomadas de consciência”
1; 113
.
A possibilidade de uma consciência autoconsciente es ligada a uma
inteligência que, por sua vez, é a aptidão para enfrentar situações complexas.
A consciência das contradições expressadas em suas concepções, entre
elas a de envelhecimento, precisa ser alvo de reflexão nos Cursos de formação, pois
poderá resultar em medidas de prevenção em direção a uma longevidade com
qualidade de vida. Isto significa o desenvolvimento da consciência do que para si
significa estar bem e buscar potencializar as possibilidades, a partir de cuidados
consigo mesmo, preparando as condições necessárias para a aposentadoria, etapa
esta que estará marcada especialmente para estes policiais, pelo momento de
afastar-se de uma função que exerceram nas vinte e quatro horas de seus dias por,
em média, 30 anos.
Ignorar a peculiaridade das diferentes profissões e, neste caso, da profissão
policial militar, provavelmente resultará em envelhecimento que se aproxima de
concepções construídas a partir das vivências infantis, associadas ao sentido do
saber como deveria ter preparado, trazido pelas informações que o Adulto recebe e
acrescentado ainda da autocrítica vinda do Pai interno pelo que não foi feito e suas
conseqüências gerando, não uma circularidade promotora de crescimento, mas um
círculo vicioso que, por recursividade, poderá resultar em erros, tanto mais graves
quanto a consciência os perceba como acertos.
Os profissionais policiais por vezes não recebem cuidados, tanto do ponto
de vista emocional como de capacitação para usufruir construtivamente a
aposentadoria. Estes profissionais que protegem a sociedade com risco das próprias
vidas, quando não recebem cuidados às suas dores, aos seus temores, enfim, como
não recebem cuidados sob o ponto de vista emocional, sua Criança fica
desconsiderada e suas necessidades desqualificadas.
Se não recebem a capacitação necessária ao desempenho seguro e
qualificado de sua profissão, os temores aumentam e não suporte em seu estado
do ego Adulto para fazer frente a isto.
150
A atividade profissional policial militar, se olhada do ponto de vista do
imaginário, tanto da sociedade quanto dos próprios profissionais, está diretamente
relacionada a funções do estado do ego Pai e este, pode-se supor, termina por ser o
estado do ego a partir do qual funcionam na maior parte do tempo, o que pode
resultar num agir profissional inadequado, porque com base no passado.
Faz-se necessário que os policiais militares recebam não apenas a
formação pela qual iniciam suas carreiras, mas permanente capacitação e atenção
às suas necessidades como sujeitos/indivíduos.
São necessárias condições para o desenvolvimento do estado do ego
Adulto, pois este, como conjunto autônomo/dependente de sentimentos e
pensamentos que se expressam por meio de padrões de comportamento
correspondentes,
17
organiza as informações que recebe de dentro e de fora de si,
analisando com objetividade, utilizando sua experiência passada, e respondendo às
demandas do aqui e agora de forma lógica e adequada: “Quando no estado de ego
Adulto, a pessoa está em pleno contato com o que está ocorrendo, duplamente,
dentro e fora de seu organismo, de modo compatível com seu estágio atual de
desenvolvimento”
40; 110
.
Entretanto, este desenvolvimento do estado do ego Adulto precisa passar
por reflexão que considere a complexidade dos fenômenos, pelo desenvolvimento
da aptidão para contextualizar e integrar, para pensar “o que é tecido junto”, o
complexus
9
, para dialogar com a incerteza e a integrar seus conhecimentos na
própria vida.
Para um desempenho profissional ético e capacitado, como para
organizarem suas vidas e seu envelhecimento, não podem prescindir desta
“consciência Adulto” de si mesmos e da realidade em sua complexidade.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS: A TECITURA DA PROVISORIEDADE APOIADA
TEORICAMENTE
Os temas envelhecimento e Segurança Pública têm sido tratados de forma
descontextualizada, tratando-se seus constituintes como se eles não fizessem parte
de uma totalidade e como se não interagissem entre si e com o todo, modificando-
o/modificando-se ao ser modificado, o que tem contribuído para uma percepção
fragmentada da realidade
41
.
151
Para os profissionais policiais militares, o risco de uma morte prematura
torna mais complexa a complexidade associada ao fenômeno do envelhecimento,
podendo desestimular a reflexão e, conseqüentemente o uso do estado do ego
Adulto, tampouco levando em conta os aspectos psicológicos envolvidos tanto na
formação quanto no exercício da profissão. Mesmo naquelas onde existe a
consciência da necessidade da reflexão, esta em geral não se dá a partir do
Paradigma da Complexidade o que, ainda que promova o fortalecimento do estado
do ego Adulto, o que é positivo, não fornece informação que possibilite pensar a
complexidade, resultando em um olhar míope sobre a realidade, sobre a vida, sobre
si mesmo.
Segurança Pública é hoje no Brasil um tema revestido de grande
importância, pela crescente violência que assola o país.
Esta violência assume múltiplas formas e igualmente de múltiplas formas
atinge aos profissionais policiais. Estão sujeitos à violência das ruas e de suas
instituições que, tendo negligenciado na atenção e capacitação destes profissionais,
termina por deles descartar-se, quando chega o momento da reserva, na grande
maioria dos casos, sem preparo.
A complexidade vivida por estes profissionais é tecida na teia de
acontecimentos e ações constituintes heterogêneos inseparavelmente associados
que constituem o mundo dos fenômenos, incluindo a convivência com a confusão,
o risco de vida, a ambigüidade, o inexplicável e, o que é mais grave, o não pensar,
tanto sobre sua prática profissional quanto sobre suas vidas
41
,
se incluindo a
compreensão do envelhecimento como fenômeno complexo.
Para que esta realidade mude é preciso que o contexto nacional de
formação reconstrua sua configuração, passando a incluir conteúdos transversais
diretamente relacionados à natureza humana. Do contrário, como desenvolver
profissionais que tenham interesse em preservar a vida humana e uma visão do
idoso cidadão, se eles mesmos o são considerados em suas necessidades
pessoais, não lhes são oferecidas condições de exercício da cidadania?
Esta incapacidade de conceber a complexidade da realidade e do processo
formativo tem impossibilitado também o desenvolvimento de estratégias que
evoluam na promoção de condições preventivas para uma qualidade de vida e de
envelhecimento qualitativo dos profissionais desta área
42
.
152
Não pensar significa não estar preparado para dialogar com a incerteza que
caracteriza a vida e, especialmente esta atividade profissional. Não estar preparado
para este diálogo impede que deste, por movimentos de recursividade, a inteligência
que o permitiu, dele se alimente e se fortaleça.
Assim, pensar hoje sobre o envelhecimento de policiais significa ir de
encontro a orientações paradigmáticas alicerçadas numa compreensão de
Segurança Pública implacável e reducionista, que se recusa a perceber-se em sua
inserção num sistema.
Para Azevedo e Luzzi, com base em Morin, conceber o envelhecimento
como fenômeno complexo significa ter a compreensão de que a complexidade é
realimentada constantemente, sendo tecida na teia diária das interações entre
acontecimentos, sentimentos e ações constituintes heterogêneos
inseparavelmente associados
42
.
Para as autoras, num ideário construído com a consciência desta realidade,
surge a possibilidade de ir além da tentação de uma visão simplificadora,
assegurando-se a defesa da idéia de estudos integrados sobre as múltiplas e
interdependentes dimensões do fenômeno envelhecimento e da necessidade de que
todos sejam percebidos como cidadãos com o direito a uma vida de qualidade em
todas as suas etapas.
A articulação entre os saberes, as habilidades, hábitos, atitudes e os
esquemas de ação geram a competência profissional e pessoal
43
e a competência
pessoal inclui uma concepção de envelhecimento como processo que abrange mais
do que a dimensão biológica e que não significa doenças, dores e incapacidades.
Para a construção de um envelhecimento com qualidade, faz-se necessário
que o Estado do ego Adulto esteja consciente de que convivem nele, concepções de
envelhecimento que estão ligadas, de um lado, à forma como a Criança sentia as
experiências vividas com os idosos à sua volta e, de outro, aos modelos que a partir
daí agregou ao seu estado do ego Pai.
Esta consciência precisa estar construída sobre a aptidão para pensar a
complexidade, com isto permitindo que se reconstrua a concepção de
envelhecimento a partir do estado do ego Adulto, consciente e informado sobre a
realidade complexa, que traz dentro de si e capaz de adequar esta realidade interna
complexa à realidade externa, igualmente complexa. Permitirá que busque, dentro
de si, necessidades, sentimentos, lembranças que, enriquecidas pela informação
153
disponível no mundo externo, lhe possibilitem redesenhar e promover o
envelhecimento, considerando a interdimensionalidade do fenômeno.
Eric Berne construiu a teoria da Análise Transacional sobre três premissas
básicas
17
:
A primeira premissa
17
é a de que as pessoas nascem com igual capacidade
(estrutura fisiológica básica) para desenvolver consciência, espontaneidade e
intimidade consigo e com os outros.
A Consciência refere-se à possibilidade de estar consciente sobre o que
sente, de onde está e do momento que está vivendo (presente em Unidades de
Significado que expressaram a consciência do como estão vivendo e do como
deveriam estar vivendo o envelhecimento); a Espontaneidade significa opção,
liberdade de escolher suas ações e de expressar sentimentos e pensamentos
(presente em Unidades de Significado que manifestaram o desejo de conservar a
autonomia); a Intimidade diz respeito à possibilidade de viver relações onde haja
reciprocidade na expressão das emoções (presente nas Unidades de Significado
que se referiram à proximidade familiar e social), sem exploração e livre de jogos.
Para Berne a autonomia, condição do estado do ego Adulto, representa o
resgate destas premissas que são potenciais básicos do ser humano.
Morin fala da autonomia/dependente dos seres vivos que se autoproduzem
e auto-organizam (autonomia): “Ser sujeito, é ser autônomo, sendo ao mesmo tempo
dependente”
12;66
que necessitam permanentemente de energia, matéria e
informação que provém do exterior (dependência): “O princípio, aparentemente
contraditório da autonomia/dependência [...] explica-se logicamente no seu duplo
fundamento sendo inseparáveis eco- dependência e auto organização e nos
seus desenvolvimentos”
26; 425
.
Esta autonomia/dependência nos seres humanos, seres culturais e sociais,
significa autonomia e dependência originadas em relação à cultura de inserção, à
linguagem a partir da qual se comunica e ao saber, numa imersão em uma relação
trinitária indivíduo/espécie/sociedade, num movimento dialógico onde convivem o
complementar, o antagônico, o concorrente
1
.
Morin concebe a consciência como “a emergência última da qualidade do
sujeito”
9; 126
, emergência reflexiva que torna possível “o retorno da mente a si
mesma, em circuito.“ Esta que é para ele uma qualidade humana importante e ao
mesmo tempo frágil, podendo por vezes enganar-se, fazendo parte do jogo da
154
verdade e do erro, o que não diminui sua importância: “A despeito dos riscos de
suscitar outros, o exercício permanente da consciência tende a destruir as ilusões e
através disso as certezas [...]”
1; 113
.
A consciência mantém relação de interdependência com o pensamento e
com a inteligência, alimentando-se e sendo por eles alimentada, controlando e
sendo por eles controlada
7
e é nesta interdependência, que deve ser estimulada,
que poderá estar a diferença na qualidade de vida dos profissionais que trabalham
na área da Segurança Pública.
Esta consciência necessita ser permanentemente crítica e autocrítica, capaz
de voltar-se sobre si mesma e sobre os produtos de seu conhecimento através de
um anel reflexivo, pensamento do pensamento que retroage sobre si, consciência de
si retroagindo sobre si, reconhecendo-se reflexiva o que lhe permitirá reconhecer
sua natureza que é, ao mesmo tempo subjetiva e objetiva.
1
Muito próxima ao que Berne descreve como espontaneidade está a
liberdade que, para Morin, “supõe, ao mesmo tempo, a capacidade cerebral ou
intelectual de conceber e fazer escolhas e a possibilidade de operar essas escolhas
dentro do meio exterior”
9; 126
.
Além disto, Morin também enfatiza, ao falar do sujeito, a importância das
relações intersubjetivas, fundamental à teia na qual é tecida a sociedade
9
.
A segunda premissa de Berne
17
é aquela para que uma relação promova o
indivíduo, é necessário que seja estabelecida sobre bases igualitárias, onde as
pessoas envolvidas tenham igual responsabilidade sobre o que acontece.
Esta premissa se fez presente em Unidades de Significado que se referiam
ao interesse em realizar trabalho voluntário/comunitário após aposentadoria.
Quando Morin define o desenvolvimento “verdadeiramente humano” como
significando “o desenvolvimento conjunto das autonomias individuais, das
participações comunitárias e do sentimento de pertencer à espécie humana”
31; 55
está falando de elementos constitutivos da espécie humana muito semelhantes a
esta segunda premissa.
A terceira premissa
17
é a de que possibilidade de evolução e mudança.
Esta premissa se fez presente principalmente nas Unidades de Significado que se
referiam a estudar, a buscar outra forma de trabalho.
Morin, fala de uma ética complexa, de “esperança ligada à desesperança”,
uma ética que “aposta no potencial genérico (criador, regenerador) do ser humano.
155
Por isso acredita na metamorfose que produziria um renascimento da humanidade”
44; 198
, sem ignorar os muitos motivos para desesperar.
Da perspectiva das instituições policiais, isto representa a consciência da
importância de cuidarem daqueles que são sua riqueza, que as constituem e dos
que são sua razão de ser. Da perspectiva dos indivíduos, representa um viver
pessoal e profissional onde o envelhecimento é conseqüência de um passado e de
um presente vivido com consciência de si e da relevância de sua contribuição.
Da perspectiva da sociedade, significa a consciência do papel
imprescindível das forças policiais militares de Segurança Pública neste processo de
permanente reconstrução e aperfeiçoamento que é a Democracia.
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157
CONCEPÇÃO DE ENVELHECIMENTO E DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL E
SUAS IMPLICAÇÕES NA CONSTRUÇÃO DE UMA VELHICE COM QUALIDADE
Rosa Maria Gross de Almeida
“[...]todo aquele que sabe tirar de si próprio o essencial não poderia julgar
ruins as necessidades da natureza. E a velhice, seguramente, faz parte
delas!
1;9
RESUMO: Este artigo trata da concepção de envelhecimento e de formação profissional de um grupo
de 22 Policiais Militares da Brigada Militar do Rio Grande do Sul, a partir da teoria da Complexidade,
numa abordagem fenomenológica. Os dados foram coletados por meio de depoimento por escrito e
analisados fenomenologicamente com base em Giorgi e Comiotto. Os principais resultados indicam
concepção de formação profissional construída sobre orientação paradigmática simplificadora,
associando formação profissional predominantemente a aspectos técnico-profissionais. Estes
resultados indicam, ainda, a necessidade de preparar estes profissionais para atuação competente
em um universo de incertezas, o que inclui a atenção aos atores desta atuação, os policiais que
exercem este fazer, eles mesmos complexos em suas necessidades e dimensões, atenção
imprescindível à construção
de uma polícia cidadã exercendo sua profissão entre cidadãos.
Palavras Chave: policiais, envelhecimento, formação, complexidade, aposentadoria, qualidade de
vida.
ABSTRACT: This article approaches the conception of aging and professional education of a group of
22 military police officers of the Military Force in Rio Grande do Sul, from the theory of complexity, in a
phenomenological approach, pointing out the urgent necessity of preparation of those professionals
both to face the complexity of the police career through the development of a poly-competence”, and
to return to their civilian life when they retire. Data were collected by means of written testimony and
were phenomenologically analyzed according to Giorgi and Comiotto. The main results have pointed a
conception of professional education constructed on the simplifying paradigmatic orientation,
predominantly associating professional education to professional and technical aspects. These results
have also shown the necessity to prepare those professionals to act competently in a universe of
uncertainties, which includes the attention to the actors, i.e. the police officers that follow this career,
who are complex themselves in their necessities and dimensions, as well as indispensable attention to
the construction of a citizen police that exert their profession among citizens.
Key Words: police officers, aging, education, complexity, retirement, life quality
1 INTRODUÇÃO
Na sociedade brasileira, a aposentadoria geralmente acentua a consciência
do envelhecimento e ser velho é, muitas vezes sinônimo de estar excluído de
vários lugares sociais, especialmente do lugar destinado ao sistema produtivo, ao
mundo do trabalho, o que termina por levar à exclusão em outras dimensões da
vida social
2
.
158
Nesta perspectiva, assegurar uma formação profissional com qualidade
significa um distanciamento de um ensino meramente técnico evoluindo para uma
visão educacional mais humanizadora, que priorize os sujeitos desta aprendizagem
e ensine a “pensar bem” sobre o mundo e sobre ele mesmo e sobre os fenômenos
que lhes são inerentes. Também significa compreender que, estabelecer relações
igualitárias envolvendo a divisão de responsabilidades não se refere a quebrar
hierarquias. Significa, principalmente confiar no potencial humano, para uma
aproximação mais intensa do melhor de si mesmos.
O ensino policial militar tem como objetivo preparar policiais para o
atendimento e proteção à população e estabelecimento de limites relativos a
violações dos direitos individuais e coletivos, garantidos pela Constituição Federal do
País
3
, não incluindo, entre seus objetivos, a preparação para uma longevidade e
uma aposentadoria com qualidade.
Na busca da criação de uma polícia cidadã, preparada para o
enfrentamento da violência numa Sociedade Democrática de Direito e ciente do
papel da formação neste processo, o Governo Federal iniciou processo nacional de
reflexão sobre este tema, resultando na Matriz Curricular Nacional para a Formação
de Profissionais na Área da Segurança Pública
4
, sob a responsabilidade da
Secretaria Nacional de Segurança Pública/Ministério da Justiça (SENASP/MJ), em
2004.
A proposta pedagógica deste documento oficial aponta para uma formação
consciente da necessidade de atenção aos profissionais da área da Segurança
Pública como portadores do direito ao exercício da cidadania o que inclui vida com
qualidade e dignidade em todas as suas etapas.
A formação dos policiais da Brigada Militar vem passando por reformulações
buscando adequar-se às tendências e demandas da sociedade
5
e para bem atender
ao artigo 144 da Constituição Federal onde está prescrita a Segurança Pública como
“dever do Estado, direito e responsabilidade de todos”
3
.
O termo “formação” aqui empregado tem significado além das “conotações
de moldagem e conformação”
6
de que fala Morin, estando próximo do sentido por
ele dado a “ensino educativo”, cuja missão é “transmitir não o mero saber, mas
uma cultura que permita compreender nossa condição e nos ajude a viver, e que
favoreça, ao mesmo tempo, um modo de pensar aberto e livre.”
6
;11
e condições para
a reconstrução do conhecimento.
159
Depois de ter, em média, 24 horas por dia durante 30 anos, no caso dos
policiais, dedicadas ao trabalho, a aposentadoria traz consigo mudanças de vida e
de papéis sociais e mudanças na dinâmica das próprias famílias do aposentado,
implicando em novos hábitos, podendo ser vivida pela pessoa de diversas formas,
de acordo com fatores pessoais, familiares, sociais e econômicos
7
.
O “fazer”, a “ação”, estão entre as necessidades básicas do homem pois, é
através delas, que ele explora e domina a si próprio e ao mundo que o cerca, cria,
descobre, aprende e se realiza, se relaciona, transforma a si, o seu meio e o
mundo. Assim, constrói sua vida e sua história, traça e alcança objetivos e assimila
valores
2
.
Pelas características da profissão policial, exercida durante este largo
período, é provável que estes profissionais não tenham tido a possibilidade de
distribuir de maneira harmônica seus diversos papéis, familiares, sociais,
profissionais e, ao chegar o momento da aposentadoria, como sinônimo de velhice,
correm o risco de perceberem que sua imagem está ligada ao trabalho e que, sem
este papel, passam a não mais se considerarem necessários, o que pode resultar
em sentimentos de inutilidade, frustração e baixa estima pessoal
7
.
Portanto a etapa da aposentadoria exige preparação, pessoal e familiar,
pelo papel que os relacionamentos familiares, passados e presentes, desempenham
na sua qualidade de sua vida nesta etapa que, muitas vezes, vem acrescida da
perda de status e da conseqüente desvalorização social, fazendo com que o direito
à aposentadoria deixe de significar um benefício, uma conquista, ou aum prêmio,
e se transforme em um período indesejável, sinônimo de tédio, marginalização e
preocupação econômica
2
.
Uma pessoa que tenha boa saúde e que não tenha preocupações
econômicas pode enfrentar este afastamento do mundo do trabalho com maior
êxito de adaptação à sua nova situação sóciofamiliar. uma pessoa para quem o
trabalho tenha representado o centro de sua vida, que tenha escassas relações
sociais fora dele, com dificuldades econômicas e/ou saúde precária, verá na
aposentadoria um castigo difícil de ser superado e, neste caso a aposentadoria
poderá vir seguida de sentimentos de inutilidade, perda de prestigio social e estados
depressivos
8
.
Existe, por outro lado, um grande número de pessoas para as quais a
aposentadoria chega como uma grande oportunidade de sua interação social, mais
160
tempo para desfrutar da e com a família e os amigos, e para dedicar-se a atividades
de voluntariado e participação cidadã, compartilhando sua experiência e
conhecimentos neste tipo de atividades
8
. Esta disposição está presente em muitas
respostas desta pesquisa.
Dentre as possibilidades de suprir a necessidade deste preparo, surge a
urgência de uma formação profissional que atenda, além das demandas complexas
da realidade em Segurança Pública, o preparo de policiais militares para um retorno
à vida civil por ocasião da aposentadoria.
O que ressalta Morin sobre o papel da educação é válido também para o
processo de formação profissional, que “deve contribuir para a autoformação da
pessoa (ensinar a assumir a condição humana, ensinar a viver a vida) e ensinar
como se tornar cidadão”
6; 65
com direito a viver uma vida com qualidade em todas as
suas etapas, especialmente na velhice, etapa do envelhecimento.
Estes profissionais, em face dos crescentes índices da violência, da
criminalidade e da criminalidade violenta e da multiplicidade de fatores que intervêm
nestes fenômenos, necessitam formação que os prepare para serem profissionais
“policompetentes”
6
, com capacidade de compreender estes fenômenos nos
contextos dos quais emergem, articulando-os e integrando-os
9
a uma abordagem
de respeito aos Direitos Humanos, visando a uma compreensão/explicação da
contemporaneidade em sua complexidade e multidimensionalidade
9
. Esta
policompetência inclui a autoformação referida e aprender a pensar o complexo e
o multidimensional, contextualizando-os e organizando-os e dando-lhes sentido por
meio do conhecimento do conhecimento.
A “emergência de um pensamento “ecologizante””, pensamento que pensa
os acontecimentos, as informações, os conhecimentos a partir das
possibilidades/limitações de seus contextos culturais, sociais , econômicos, políticos
e naturais “torna-se, inevitavelmente, um pensamento do complexo[...]”
6;25
com
potencial para o desenvolvimento de uma policompetência, de uma formação
profissional onde o conhecimento seja desconstruído/construído/reconstruído numa
abordagem de interação/integração, como descrito nas exigências
interdisciplinares/transdisciplinares emergentes da Matriz Curricular Nacional (MCN)
4
A MCN
4
preconiza uma formação que desenvolva as competências,
habilidades e atitudes necessárias ao desempenho da profissão numa Sociedade
Democrática de Direito, a partir do delineamento de Princípios, Objetivos, Eixos
161
Articuladores, Áreas Temáticas, Orientações Pedagógicas e Sistema de Avaliação e
Monitoramento.
Para sua operacionalização, esta proposta requer o emprego de
metodologia docente fundamentada sobre o Paradigma da Complexidade,
entendendo a formação profissional como um processo de aquisição e reconstrução
de saberes necessários à intervenção social que tem por objetivo o aprimoramento
da prática pelo exercício permanente de pensar/repensar e analisar esta prática,
partilhando diferentes saberes e situações complexas.
O Curso Básico De Administração Policial (CBAPM), curso que estavam
concluindo os profissionais que responderam à presente pesquisa, tem como
objetivo habilitar os profissionais para o desempenho das funções de 1
0
Tenente,
aliando conhecimentos vindos da experiência adquirida na atividade a
conhecimentos acadêmicos. Busca capacitar através de conhecimento técnico-
profissional, para o desempenho das atividades de Polícia Ostensiva e de Bombeiro,
em consonância com os fundamentos de uma polícia cidadã. Trata-se de curso de
nível médio da Carreira
10
.
Desenvolve-se por um período de 12 meses em turno integral, em período
de uma semana letiva, com carga horária de 45 horas-aula, com carga horária total
de 1455 horas/aula
10
.
Em seu currículo constam disciplinas sobre administração, defesa pessoal,
ensino policial, direito, educação física, estatística, ética, ciência política, psicologia
geral, sociologia, comunicação e aspectos técnicos
10
.
Neste momento, o positivismo lógico que tem caracterizado a formação da
Brigada Militar começa a conviver com o paradigma da complexidade preconizado
pela MCN, com base em Edgar Morin.
Ainda não consta deste ensino, educação gerontológica que permita a estes
profissionais a construção de um envelhecimento saudável e produtivo e, tampouco,
preparação para a volta à condição civil, em sua aposentadoria.
Em dezembro de 2006, O Grêmio Beneficente de Inativos da Brigada Militar
iniciou o Projeto “VOCÊ AMANHÔ, a ser desenvolvido entre os profissionais que se
encontram a, em média, cinco anos da aposentadoria. Este Projeto encontra-se em
fase de implementação, tendo percorrido os caminhos institucionais necessários
para ser aprovado.
162
2 MÉTODO
O método é a reflexão sobre o percurso
11
e o percurso para chegar à
concepção de formação no presente estudo, se deu numa abordagem qualitativa, a
partir do método fenomenológico em triangulação com o método da complexidade.
A opção por esta triangulação deveu-se à compreensão de que este estudo
poderia beneficiar-se de aspectos complementares inerentes a estes métodos,
permitindo uma aproximação do foco de interesse e sua leitura a partir do referencial
construído.
A Fenomenologia’ – designa uma ciência, uma conexão de disciplinas
científicas; mas, ao mesmo tempo e acima de tudo, ‘fenomenologia’ designa
um método e uma atitude intelectual: a atitude intelectual especificamente
filosófica, o método especificamente filosófico
12
.
O método fenomenológico parte da intencionalidade da consciência, (a
consciência é sempre intencional é consciência “sobre”) e, através do puro ver,
determina e distingue o sentido, sem teorizar, sem matematizar, sem valer-se da
dedução para encontrar explicações.
Em pesquisa realizada junto a 22 policiais da Polícia Militar de Porto Alegre,
às questões relacionadas ao futuro e ao envelhecimento: “o que espera do futuro
após completar 60 anos?”; “Quais são suas metas em relação à velhice?”; “Que
limitações pensa que terá como idoso? e “Que possibilidades pensa que terá como
idoso” foram associadas duas questões relacionadas à formação: “Como foi, tem
sido e deveria ser o seu processo de formação profissional?” e “O que é formação
profissional?”.
Ao conjunto destas respostas foi aplicada análise fenomenológica, conforme
descrito na Metodologia.
O objetivo foi verificar, através destas respostas, a concepção de
envelhecimento e de formação profissional dos depoentes e relação/discrepância
entre elas.
Os relatos dos entrevistados foram descritos e transportados para uma
linguagem gerontológica e educacional e após foram identificadas as essências, a
partir da captação do sentido da evidência, “absolutamente intuitiva, que a si mesma
se apreende”
12
.
163
A fenomenologia é ciência de essências e “a evidência é esta consciência
que efetivamente vê, que apreende [o seu objeto] direta e adequadamente; [...]
evidência nada mais significa do que o adequado dar-se em si mesmo
12;20
.
Este “puro ver”, assim, não se reduz ao mero olhar, significando apenas
abrir os olhos e ver, pois é preciso ir além dos relatos (fenômenos), captando-lhes a
essência, modo como estes fenômenos aparecem à consciência. É, portanto,
através da consciência que se dá a transformação dos fatos em essências.
Chegar a estas essências supõe, o que Husserl chama redução
fenomenológica” que significa colocar-se como espectador, abrir mão de todo o
conhecimento que não o imanente à consciência para, assim poder efetivamente
“ver” e intuir o universal que se expressa através daquele fenômeno e faz dele aquilo
que é
12
.
Na presente pesquisa, isto exigiu por parte do pesquisador, abrir mão de
eventuais idéias pré-concebidas e resultados esperados, de tudo o que não surgiu
como evidente, para permitir espaço à redução eidética
12
, à intuição da essência,
quando na descrição dos fenômenos que aparecem à consciência, é possível colher
seu aspecto invariável entre as diversas variações das propriedades.
A análise fenomenológica teve como referência Giorgi e Comiotto
13
.
Compreendeu ainda esta metodologia análise intradiscurso, representando-
a graficamente, a partir de Unidades de Significado, tornando mais claras suas inter-
relações; análise interdiscurso, buscando eventuais aspectos implícitos nestas inter-
relações; e discussão da realidade com base nos princípios dialógico, recursivo e
hologramático.
14
3 RESULTADOS E SUA DISCUSSÃO
A análise da concepção de formação profissional foi realizada a partir das
respostas dadas através do depoimento escrito, atendendo ao critério de saturação,
e revelou uma orientação paradigmática simplificadora nas concepções de
formação.
A concepção de envelhecimento, igualmente construída a partir de
orientação paradigmática simplificadora, pode apontar para uma relação entre
formação e concepções.
164
As respostas dadas pelos entrevistados sobre o que é formação profissional
e que revelaram concepção simplificadora deste processo, reduziram-no a “cursos,
experiências, busca de conhecimento e aperfeiçoamento”, “capacitação para
atividade profissional específica”, “atualização”, “instrução”, “condição para uma
melhor capacidade profissional”, “aprimoramento emocional”, “aplicação de
conhecimentos e experiências”, “preparo para uma aposentadoria tranqüila
econômica e emocionalmente”, “conhecimentos técnicos”, “nova visão do que é
feito”, “base para a profissão”, “informações sobre a realidade vivida, ancorada na
prática”, “associação de teoria com prática e com o lado humanitário, com ações de
aproximação entre polícia e comunidade”, “atende ao exercício da profissão e aos
interesses da instituição”, “honestidade”, “ensinamento e aprendizagem”,
“conhecimentos adquiridos nos bancos escolares ou através da prática ou convívio
na profissão”, “síntese de conteúdos”, “agir de forma que todos tenham
procedimentos iguais ou parecidos”.
Pode ser questionado, até que ponto estas concepções de formação
profissional são o resultado do tipo de formação que estes entrevistados vêm
recebendo e que, por fracionar e disjuntar a realidade de seu conhecimento, acaba
dificultando uma visão do fenômeno do envelhecimento e do processo de formação
profissional numa visão de complexidade e, conseqüentemente em integrá-los à
construção de suas próprias vidas.
Perrenoud, ao definir competências profissionais como “um conjunto
diversificado de conhecimentos da profissão, de esquemas de ação e de posturas
que são mobilizados no exercício do ofício” está falando de uma “policompetência”,
embora não use o termo, pois entende que “as competências são, ao mesmo tempo,
de ordem cognitiva, afetiva, conativa e prática”
15;12
.
Morin, fala na necessidade desta “policompetência” para lidar com o grau
de complexidade da realidade, que está relacionada diretamente ao grau de
incerteza das situações, dos problemas, dos fenômenos e à necessidade de um
maior número de informações para compreendê-las e atuar sobre elas
6
. Esta
complexidade estimula o desenvolvimento da inteligência que, com isto, estacada
vez mais apta a lidar com complexidades ainda maiores.
Schön utiliza o termo “talento artístico profissional” quando se refere “aos
tipos de competência que os profissionais demonstram em certas situações da
prática que são únicas, incertas, conflituosas”
16;29
.
165
Para este autor os profissionais, ao defrontarem-se com estas situações,
desenvolvem uma “reflexão na ação”, isto é, “o pensar o que fazem, enquanto o
fazem”
16;7
, constituindo uma competência e um talento que ele propõe sejam o
ponto de partida para o conhecimento profissional.
Este conhecimento constituiria uma “epistemologia da prática através da
reflexão sobre estes “dilemas práticos” do cotidiano: “De outra forma, como os
profissionais irão aprender a agir com destreza, se o através da reflexão sobre
dilemas práticos que a exijam?
16;9
.
No caso destes profissionais, para os quais a “reflexão na ação” seja, na
maior parte das situações, difícil de ser realizada, por seu grau de tensão e urgência,
faz-se necessária uma permanente reflexão “sobre” as ações, sobre as práticas.
Paquay e Wagner
17
chamam a atenção para que o desenvolvimento da
reflexividade, entretanto, não resulte no desenvolvimento de práticas ligadas a
outros paradigmas
17;135
.
Estes autores referem-se à competência enquanto aquisição de várias
ordens: “(saberes, saber-fazer, saber-ser e saber tornar-se) necessárias à realização
de uma tarefa e à resolução de problemas em um domínio determinado”
17;136
As
competências prioritárias decorrem de paradigmas previamente escolhidos pelas
instituições, com privilégio das práticas de formação específicas, concebendo de
forma própria a articulação entre a teoria e a prática: Conforme os paradigmas
adotados, não as perspectivas o distintas (vêem-se as coisas diferentemente),
mas principalmente os modos de ação diferem (fixam-se outros objetivos, escolhem-
se outras estratégias)”
17;136
.
Ao traduzirem formação profissional como “cursos” “aprimoramento cnico”
“conhecimentos técnicos”, entre outros, estes profissionais entrevistados estão
expressando concepções de formação diretamente relacionadas à “racionalidade
técnica”, isto é, concebem o desempenho profissional exclusivamente como
solucionar problemas instrumentais usando os meios técnicos mais adequados ao
atingimento dos objetivos
16
.
Efetivamente a profissão policial está entre aquelas cujo desempenho
depende da racionalidade técnica, sendo que seus profissionais estão
cotidianamente ocupados com problemas instrumentais e sua eficácia depende do
sucesso em chegar aos resultados desejados: “Nesta visão, a competência
profissional consiste na aplicação de teorias e técnicas derivadas da pesquisa
166
sistemática, preferencialmente científica, à solução de problemas instrumentais da
prática.”
16;37
Entretanto, este fazer profissional não se reduz a isto e a consciência
desta complexidade se traduz nas respostas dadas ao como “deveria” ser sua
formação onde surgiram respostas como “Deveríamos ter nossa formação voltada
para as “Ciências Humanas” e “Psicologia” “Nossa formação profissional deveria
focar nos homens, pois eles fazem a instituição” e estes homens têm o direito de
aprender a desenvolver estratégias para enfrentar as incertezas da vida e,
especialmente, de sua vida na etapa da velhice.
Nas concepções de envelhecimento expressadas estão traduzidas
expectativas de vida ligadas à aproximação com familiares e amigos, a prazer, a
aproveitamento do tempo livre. Entretanto, para que isto seja alcançado, necessita
ter sido construído, pois esta etapa vem acompanhada da perda deste importante
papel social de ser um policial, podendo sobrevir um sentimento de não ser mais
necessário aos outros e se o espaço deixado por esta perda não estiver preenchido
pela construção de novos planos e objetivos e ainda, se for marcado por uma
concepção simplificadora do envelhecimento onde os aspectos negativos se
sobreponham, as relações familiares e de amizades poderão ser afetadas,
resultando em um processo de isolamento social
2;99-100
.
Aprender a lidar com o tempo livre é outra das necessidades para a
preparação desta etapa pois, se de um lado a necessidade humana de fazer algo
permanece, uma concepção simplificadora do envelhecimento poderá impedir
novas possibilidades deste fazer.
Sem o devido preparo, o direito ao tempo livre, ressaltado em vários
depoimentos, passa ser uma conquista não valorizada pelos aposentados, mesmo
por estes profissionais que conviveram com o risco de vida, pois foram acostumados
a ritmos que ocupavam a maior parte do seu tempo. Chegando à aposentadoria,
vêem-se donos de um tempo livre do qual não sabem o que fazer e como utilizar,
podendo incorrer no seu uso patológico onde, por exemplo, a desocupação é
compensada pela comida (principalmente as mulheres) ou bebida (principalmente os
homens) ou tornam-se hipocondríacos, ou até mesmo tristes, sem conseguir explicar
sua tristeza
2
.
Assim, os profissionais precisam estar preparados para as incertezas, para
a complexidade, de suas vidas nas diversas etapas e em sua atuação profissional.
Estar preparados para agir frente à novidade, quando, ante situações únicas, seus
167
referenciais não podem ser usados, porque não se aplicam ou quando, ante
situações múltiplas onde os problemas o, num tempo, de várias ordens. Tanto
os profissionais quanto aqueles aos quais seu trabalho se destina quanto, ainda,
aqueles que refletem sobre a competência profissional reconhecem que “as áreas
mais importantes da prática profissional encontram-se agora além das fronteiras
convencionais da competência profissional”,
16;18
o que remete ao questionamento
dos processos de educação profissional, que têm se mostrado incapazes de ensinar
o que mais necessário se faz aprender
16
: aprender a viver com qualidade.
Schön
16
fala da existência de dois terrenos na topografia da prática
profissional: “Na topografia irregular da prática profissional, um terreno alto e
firme, de onde se pode ver um pântano”
16;15
No terreno “alto e firme” os profissionais
defrontam-se com problemas que podem ser resolvidos pela racionalidade técnica, a
partir de padrões estabelecidos.
No “pântano”, estão os “problemas caóticos e confusos”, problemas que
“desafiam as soluções técnicas” e que exigem soluções que estão além do
conhecimento rigoroso.
Estes são os “problemas de interesse humano”
e cada vez
mais, os problemas enfrentados pelos profissionais são problemas desta ordem
16
.
Um ensino profissional que prepara para a atuação competente em um
universo de incertezas passa pela atenção aos atores desta atuação, os seres
humanos que exercem este fazer, eles mesmos complexos, a um tempo
biológicos, com necessidades que desta dimensão decorrem e culturais, o que os
possibilita beneficiar-se do que vem sendo acumulado, conhecer e transmitir
conhecimentos, normas e princípios
16
.
Uma formação profissional com um ensino fragmentado podeser útil para
atender especificamente aos aspectos cnicos desta profissão. Entretanto, não
possibilitará o desenvolvimento de “um pensamento capaz de considerar a situação
humana no âmago da vida, na terra, no mundo e de enfrentar os grandes desafios
de nossa época. Não conseguimos integrar nossos conhecimentos para a condução
de nossas vidas.”
6;17
, e isto foi expressado nas respostas dadas pelos depoentes
que, ao referirem-se à formação enquanto “conhecimento técnico”,
“preparação/capacitação para a profissão”, “instrumento para modelar, deixar todos
iguais”, entre outros, demonstram concepção deste processo onde não é percebida
relação entre ele a sua vida como totalidade que abrange múltiplas áreas que
necessitam ser atendidas, dentre elas as necessidades próprias à etapa da velhice.
168
Igualmente, as concepções de envelhecimento expressadas, tais como
preocupação com a solidão, possibilidade de limitações físicas, mentais e de
memória, lazer, felicidade, autocuidado, entre outras, não sugerem qualquer relação
com o processo de formação profissional.
Faz-se necessário que, não somente a formação profissional, porquanto
todo o processo educacional seja visto como um “lugar mediador e preventivo da
velhice bem sucedida, numa proposta que perpassa a vida toda do educando”, como
afirma Both
18;1110
. Entretanto, a grande parte das instituições concentra sua atenção
somente ao período laboral dos indivíduos, não levando em conta sua qualidade de
vida em suas múltiplas dimensões, compreendendo “relações permanentes de
generosidade do sujeito para consigo, das pessoas entre si, relações igualitárias de
poder distribuídas entre os diversos grupos sociais e, finalmente, relações generosas
com a natureza”
18;1110
.
Both
18
entende que ao concretizar um projeto da educação gerontológica,
este esteja em consonância com as necessidades expressadas pelos mais velhos,
construído a partir da gerontagogia
[...]ciência cujo objeto de investigação e ação reside no processo de
desenvolvimento humano tardio e suas implicações educacionais em todas
as faixas etárias e em todas as instituições nele envolvidas.[...] espaço
educacional privilegiado para o encaminhamento de suposições,
investigações, posições e proposições de ações, cujos objetivos buscam
adequar as representações e oportunidades sociais às exigências da
qualidade de vida em todos os seus períodos
18;1010
.
Pelo que ficou evidenciado nas respostas dos depoentes, estes
profissionais ainda não recebem, através de sua formação, condições “para a
conquista do desenvolvimento humano tardio”, o que poderá resultar em que
cheguem à velhice com concepção sobre esta etapa de suas vida que, em sua
simplificação, se constitua em um “conjunto fragilizado de disposições”
18
e
possibilidades.
Estes profissionais, protetores-desprotegidos, (“trabalhamos protegendo as
pessoas, mas ninguém nos protege”) são a face mais visível do Estado, (por vezes a
única) em seu contato com a população, são o que Balestreri chama “cidadão
qualificado pelo serviço”, por um lado com missão de “ouvir as dores” desta
população
e, por outro, com a permissão para o uso legítimo da força e da arma de
169
fogo,” o que lhes confere natural e destacada autoridade para a construção do
social ou para a sua devastação”
19
.
Para Balestreri, diante da complexidade da profissão, dos policiais será
cada vez mais exigida a capacidade de discernir e agir a partir de valores éticos e
com agilidade na resolução dos problemas, o que implica uma formação profissional
construída a partir de “conteúdos significativos” e com metodologias que estimulem a
participação
19
pois esta complexidade se “complexifica”, quando os problemas a
serem enfrentados envolvem conflitos de valores
20
.
Em instituições hierarquizadas linearmente, como ocorre com as instituições
policiais, é comum que as questões hierárquicas se sobreponham ao cuidado com o
papel das relações interpessoais na transmissão do conhecimento.
Com isto, o ensino perde um de seus pilares sicos pois ensinar é, por
definição, um “processo interpessoal”, uma “prática relacional finalizada”
21;26
imprescindível para formar policiais que tenham a lei e a ordem como bases para a
uma atuação profissional exercida com autonomia moral e intelectual
18
.
Altet ressalta que “o polo da dimensão relacional e da situação vivida com o
aluno em determinado contexto é tão importante quanto o pólo do conhecimento
propriamente dito
21;26
.
Schön também faz referência à importância deste aspecto nos resultados do
ensino: “Um ensino prático reflexivo é uma experiência de alta intensidade
interpessoal. O dilema da aprendizagem, a vulnerabilidade dos estudantes e os
universos comportamentais criados por instrutores e estudantes influenciam
criticamente os resultados pedagógicos”
16;133
e suas vidas.
Através de um sem-número de atos de atenção e desatenção,
designação, compreensão, estabelecimento de limites e controle, eles vêem
e mantêm os mundos que são adequados a seu conhecimento e know-how
profissional. Eles estão em transação com seus mundos práticos,
concebendo os problemas que surgem em situações práticas e moldando
as situações para que sirvam nas concepções, concebendo seus papéis e
construindo situações práticas que tornem operacionais os papéis que lhes
cabem na concepção. Resumindo, eles têm uma maneira particular e
profissional de ver o mundo e uma maneira de construir e manter o mundo
da forma como o vêem
16;39
.
A formação do profissional policial para a “policompetência”, necessária ao
bom desempenho de suas funções, pode representar uma forma de atenção a estes
profissionais, não apenas fornecendo-lhes os conhecimentos e práticas necessários
170
ao bom desempenho técnico mas, sobretudo, levando em conta que serão seres
humanos a desempenhar estas funções. Seres humanos que, para navegarem “em
um oceano de incertezas em meio a arquipélagos de certeza”
22;16
precisam estar
preparados também enquanto pessoas, em sua dimensão humana.
O agir profissional policompetente significa ir além do imediatismo da
resolução das situações de seu cotidiano, inserindo o seu fazer profissional dentro
de um projeto maior, um projeto para sua vida e para a sociedade, sendo este
projeto a matriz de suas ações: “Seu projeto [...] (pessoal) e seu projeto profissional
são projetos humanos: conferem sentido e finalidade ao ofício e a ele próprio dentro
do ofício. Ambos concorrem para o reconhecimento construtivo e criativo da
identidade profissional e da própria personalidade profissional
23;44
.
É provavelmente disto, que está falando o policial ao responder que o
processo de formação deveria “Dar condições para que se possa viver uma vida
com tranqüilidade junto de sua família, podendo inclusive auxiliar os mais novos com
experiência e também financeiramente”: de uma formação que possa traduzir um
projeto de vida, de vida com qualidade e solidariedade.
A aptidão para contextualizar estende-se à contextualização do sujeito
dentro de seu próprio universo e do universo ao qual pertence: “Quem somos nós?”
é inseparável de “Onde estamos, de onde viemos, para onde vamos?”
6;37
.
Além disto, as ações humanas não decorrem de uma fonte, resultando,
em diferentes proporções, do pensamento racional e de conteúdos não tão
conscientes, ligados à sua história de vida e da experiência profissional,
14;170
o que
significa que igual atenção precisa ser dada, no processo de formação, a todos
estes aspectos envolvidos nas ações.
Para Morin, “o dever principal da educação é de armar cada um para o
combate vital para a lucidez”
22;33
, o que é conseguido através da aprendizagem para
a auto-observação.
Sem compreender a si mesmo, não é possível compreender a outro e, as
carências e fraquezas mascaradas, resultam em intolerância com as carências e
fraquezas deste outro
22
: “Seria preciso ensinar, de maneira contínua, como cada um
produz a mentira para si mesmo, ou self-deception. Trata-se de exemplificar
constantemente como o egocentrismo autojustificador e a transformação do outro
em bode expiatório levam à ilusão e como concorrem para isso as seleções da
memória que eliminam o que nos incomoda e embelezam o que nos favorece”
6;53
.
171
Os profissionais policiais estão sujeitos a estes processos. Entretanto,
desempenham junto à sociedade, uma função onde as possibilidades de
desdobramentos desta “mentira para si mesmo” podem resultar em ações danosas,
para si e para outros, o que potencializa a importância desta “aprendizagem para a
lucidez” em seu processo de formação e ao longo de sua carreira pois, esta
aprendizagem, “além de nunca ser concluída, deve ser continuamente recomeçada
(regenerada)”
6;53
.
Os processos psíquicos de autocegueira, somados à dificuldade de pensar
o complexo, também estão na raiz dos “desvios éticos”
20
.
A ética é um terreno onde estão presentes contradições que, no agir destes
profissionais com a missão de “cuidar, preservar e promover a vida”
9
em um país
injusto socialmente e em meio ao clamor da população por segurança, se tornam
ainda mais complexas
A profissão policial termina por ocupar os espaços de suas vidas e os
policiais necessitam de aprendizagem para recompor estes espaços e que possibilite
qualidade de vida, quando chegar o momento de sua reserva/aposentadoria. As
respostas quanto às metas após os sessenta anos, em sua maioria, trouxeram a
expectativa de convívio social e a recorrência desta expectativa sugere sua
importância para estes entrevistados.
Entretanto a aposentadoria, trazida como o momento em que este convívio
poderá se efetivar, sugere que, durante seu tempo de vida laboral estes
profissionais, talvez não tenham exercido esta possibilidade.
Até que ponto, ao lá chegar, terão condições de exercê-la?
A aposentadoria pode representar possibilidades para o lazer, a realização
pessoal e o investimento em si próprio, mas isto irá depender de vários fatores, do
financeiro, do preparo recebido pelo profissional, de sua filosofia de vida, de seus
valores individuais e sociais bem como de fatores pessoais, como autoconceito e
auto-estima, fatores estes também ligados às suas interações familiares e sociais
até ali construídas
8
.
Seu processo de formação profissional, ao que parece, está dissociado
destas expectativas ligadas aos seus projetos e restringido a capacitação
eminentemente técnica. A tal ponto isto se dá que os próprios profissionais terminam
por entender que precisam “mais do mesmo”, isto é, mais da mesma formação
24
.
172
O confronto com a incerteza do amanhã, o confronto com a morte, não
podem significar o abandono da perspectiva de construção de uma vida com
qualidade
20
. Em realidade, conviver com a incerteza é o destino humano. Ainda
assim, uma vida sem investimento no futuro perderia seu sentido.
Isto representa aprender a não perder de vista a própria
multidimensionalidade, permanecendo atento às suas necessidades e, entre elas, a
da construção de um envelhecimento de qualidade.
Significa assumir sua vida como uma aventura marcada pela incerteza e
que isto significa riscos, outrossim oportunidades para aquele que a concebe em sua
complexidade, encontrando em cada etapa da vida potenciais a serem atualizados,
possibilidades a serem realizadas, conhecimentos a serem adquiridos.
A formação profissional tem fundamental papel em todo este processo, pois
deve levar em conta os indivíduos em sua integralidade, ocupando-se de
proporcionar-lhes ensinamentos que ultrapassem a esfera do propriamente
profissional, estendendo-se até seu projeto de vida, ensinando a “pensar bem”.
Neste caminho, desenvolver a capacidade de contextualizar, de pensar o
complexo, permitirá que este diálogo com a incerteza resulte fecundo.
“É preciso substituir um pensamento que isola e separa por um pensamento
que distingue e une. É preciso substituir um pensamento disjuntivo e redutor por um
pensamento do complexo, no sentido originário do termo complexus: o que é tecido
junto”
6;89
. Somente um tal pensamento será capaz de conceber a vida em sua
multidimensionalidade e embasar a construção de uma vida com qualidade, em
todas as suas etapas.
Na velhice, quando o papel profissional que servia de identidade a estes
profissionais se esvazia, a preparação que para este momento tenham recebido
permitirá a descoberta de novos potenciais emergentes
19
pois a lembrança das
realizações passadas, por si só, não esgotam o potencial de desenvolvimento
19
.
Por outro lado, a solidão é uma das grandes ameaças neste período, e seu
medo foi referido nesta pesquisa e á importante que o aposentado possa sentir-se
acolhido e valorizado por ele mesmo, pelo testemunho da vida realizadora vivida,
pela família que criou e pelas atividades que poderá vir a desempenhar
7
.
As instituições e as novas gerações muito teriam a beneficiar-se,
aprendendo da experiência dos mais idosos e este desejo foi expressado em
respostas à pergunta sobre o que espera do futuro: “repassar minha experiência
173
profissional e de vida” ou ainda, “contribuir de alguma forma com as gerações
futuras”.
Os mais velhos podem ser vistos como educadores enquanto
possuem conhecimentos em torno da pragmática da vida e das práticas
profissionais, as quais, por mais subsídios tecnológicos que tenham,
carecem de uma larga reflexão e de abordagens múltiplas. Sendo assim os
mais velhos podem cooperar com as decisões diante das exigências do
mundo-da-vida, como as do sistema, para que possam ser mais acertadas,
porque mediadas pelo olhar da experiência e por outros entendimentos
associados ao objeto a ser considerado
19; 1118
.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Fica ressaltada pelo estudo realizado a importância de que a formação dos
profissionais policiais se dê na direção deste desenvolvimento “verdadeiramente
humano”. Este é o desafio que está colocado para as instituições de ensino policial
brasileiras ante, por um lado, a mudança de paradigma do trabalho em Segurança
Pública preconizada pelo Plano Nacional de Segurança Pública
9
e, por outro, pelos
crescentes índices de violência, criminalidade e criminalidade violenta com a que
estes profissionais se defrontam.
Em uma de suas teses principais, o Plano Nacional de Segurança Pública
9
propõe uma “Articulação dos governos municipal, estadual e federal( por meio de
vários ministérios) das entidades da sociedade civil e lideranças da própria
comunidade local, a partir de um programa comum, voltado para a melhoria da
qualidade de vida”
9
.
Esta melhoria da qualidade de vida está intimamente ligada a mudanças
não no processo de formação pela qual passam estes profissionais ao
ingressarem na carreira, mas também à necessidade de um processo de formação
continuada que atenda às necessidades destes cujo fazer tem, além e em meio de
suas funções técnicas de prevenção e repressão, também uma “dimensão
pedagógica”
18
sendo um “pleno e legítimo educador”
18;19
. Mas, quem educa estes
educadores para função tão complexa?
A reflexão sobre a complexidade da profissão policial e sobre as condições
de sua formação nos diversos estados do Brasil resultou na Matriz Curricular
Nacional
4
que tem entre seus objetivos: análise da atividade de Segurança Pública
como prática da cidadania voltada para atitudes de promoção humana; o estímulo à
174
discussão de posicionamentos críticos, éticos, de Direitos Humanos e à contribuição
para a melhoria da qualidade da vida social, institucional e individual; a promoção de
análise contextualizada local e global dos impasses sociais através do pensamento
crítico e da adoção de atitudes e práticas de inclusão social e dos preceitos legais
aplicáveis; o desenvolvimento da competência interpessoal e do autoconhecimento
com vistas à melhoria da qualidade de vida e à aceitação das diferenças.
Assim sendo, este documento oficial inclui aspectos de relevância que
poderão auxiliar no desenvolvimento de uma formação que contemple tópicos que,
se considerados, implicam conhecimento importante para a construção de um futuro,
incluindo expectativas de vida produtiva após a aposentadoria.
Balestreri
18
refere-se ao protagonismo como inerente à profissão policial e a
aposentadoria, longe de afastá-lo desta missão, pode conferir-lhes a possibilidade
de sua ampliação, “protagonistas de novos caminhos, ampliando o potencial ético e
cognitivo da gestão social de todas as idades e de seus espaços existenciais”
19;1118
.
Todos estes aspectos apontam para a mesma direção, para o ser humano
que exerce a profissão, para estes homens e mulheres, filhos, filhas, mães, pais,
avôs e avós que estão sob a farda, sob a insígnia e que têm direito a receber
cuidados, sob a forma de informação qualificada, preparo técnico e, principalmente
de um ensino que os capacite a pensar a complexidade humana
6
, a sua própria, e
perceber sua vida como um processo, onde o futuro emergirá dos passos a ali
dados.
Uma tal formação se constituiria em atenção com estes profissionais e
romperia com o paradoxo por eles vivido pois, devendo trabalhar em defesa da vida,
não recebem formação que lhes possibilite cuidar de suas próprias vidas com
qualidade, o que está expresso em respostas trazidas pelos policiais entrevistados,
referindo-se à formação como tendo sido voltada “ao objeto (produto) Segurança
Pública, Policiamento, e esquecido o sujeito[...]” ou, ainda, “No início doloroso,
deixando marcas, ditatorial, torturante, enlouquecedor [...] nos dias de hoje
melhorou, há mais ensinamentos práticos e gritos.” Doloroso também é pensar que a
melhora esteja associada a “gritos”, levando a supor como se dava esta formação
anteriormente.
Até que ponto, de uma formação profissional com as características
referidas nas respostas acima, pode ser esperado um policial que esteja a serviço da
175
defesa da vida, a serviço da construção da paz e da construção de qualidade em
sua vida?
Aqui se aplica a observação de Morin
6
sobre a necessidade de uma
mudança não somente programática mas paradigmática no ensino, de um
paradigma de simplificação para o paradigma da complexidade. Importa na
formação dos profissionais policiais, que se substitua o pensamento que isola e
separa, disjunta e reduz, por um pensamento que distingue e une, por um
pensamento do complexo
6
e que, reforça-se, esta se constitua em formação
continuada pois, com escreveu Cícero, “o saber se vale das competências
acumuladas e se enriquece à medida que envelhecemos”
1;42
.
Desenvolver nestes profissionais um pensamento complexo significa dar-
lhes condições para exercerem sua profissão e pautarem suas vidas a partir de um
olhar de inclusão e solidariedade humana, com resultados benéficos para eles
próprios em todas as etapas de suas vidas e para a sociedade e isto é resultado de
uma formação profissional que conceba a vida em toda a sua extensão e que, tendo
superado o paradigma deficitário do envelhecimento e da velhice, constitua em
convite à construção de uma vida com qualidade em todas as suas idades, de modo
especial, de todas as idades da velhice
19
.
Como escreve Morin, “a reforma de pensamento teria, pois, conseqüências
existenciais, éticas e cívicas”
;6 ;97
podendo repercutir positivamente na construção de
uma polícia cidadã e se constituir em garantia do direito que têm estes profissionais,
cidadãos que são, de receber formação que lhes permita construírem uma vida de
qualidade em todas as suas etapas e, especialmente na velhice.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente estudo, buscou desvelar as orientações paradigmáticas
implícitas na concepção de envelhecimento, no imaginário associado e na
concepção de formação profissional de policiais de nível intermediário, alunos do
Curso Básico de Administração Policial da Brigada Militar do Rio Grande do Sul.
Ao analisar a concepção de envelhecimento e a implícita no imaginário
associado ao fenômeno, os resultados apontaram para concepção com orientação
paradigmática simplificadora do fenômeno do envelhecimento, concebido
basicamente em sua dimensão biológica, construída sob um imaginário onde
predominam aspectos negativos associados a este fenômeno.
Na formação dos profissionais não consta alusão ao estudo sobre qualidade
de vida, envelhecimento e aposentadoria, que lhes permita apropriar-se deste
imaginário em que o envelhecimento se mostra associado a abandono, podridão,
ferrugem, resultando em concepção de envelhecimento calcada em aspectos
negativos, perdas, limitações. Esta consciência permitiria a reconstrução deste
imaginário e desta concepção, a partir de orientação paradigmática de
complexidade, como fenômeno natural do desenvolvimento e o preparo da
qualidade para a velhice.
A análise da concepção de envelhecimento de Policiais Militares ainda na
ativa, numa perspectiva psicológica, trouxe indícios que levam à confirmação de que
estes profissionais possuem concepção com orientação paradigmática simplificadora
no que se refere ao fenômeno do envelhecimento. A triangulação realizada entre a
teoria da Análise Transacional e a teoria da complexidade permitiu constatar a
presença de contradições entre concepções de envelhecimento nas respostas
dadas por um mesmo depoente, sugerindo que estas sejam resultado da forma
178
como os diferentes estados do ego, constituintes da personalidade, sentem, pensam
e se comportam frente ao envelhecimento.
Estes resultados apontam para a importância da consciência sobre estas
contradições, pois a concepção do Adulto sobre o envelhecimento e sobre a velhice
não garantem a construção de uma velhice com qualidade pela força que
representam, na personalidade global, o estado do ego Criança e estado do ego Pai.
Além disto, a consciência Adulto, que abrange consciência do mundo
interno e do mundo externo, precisa estar constituída a partir de pensamento capaz
de pensar a complexidade.
A análise da orientação paradigmática da concepção de envelhecimento e
da concepção de formação profissional trouxe resultados que confirmaram
concepção de envelhecimento construída a partir de paradigma de simplificação e
concepção de Formação Profissional igualmente com orientação paradigmática
simplificadora, em uma profissão que envolve grande complexidade e que, para seu
desempenho, necessita de profissionais “policompetentes”, policompetência que
deve incluir a construção de qualidade de vida em todas as suas etapas,
especialmente na etapa da velhice.
A concepção de Formação Profissional com orientação paradigmática
simplificadora voltada predominantemente para o aspecto de preparação técnico-
profissional dissocia este processo de outras áreas de suas vidas e impede que seja
visto e vivido como processo permanente de construção/desconstrução/reconstrução
de sua vida pessoal e profissional, num movimento que a ambas enriquece e
qualifica.(princípio recursivo)
Destarte, fica confirmada a tese deste estudo, de que policiais em nível
intermediário, da Polícia Militar do Rio Grande do Sul, têm concepções de
envelhecimento e de formação profissional construídas sob orientações
paradigmáticas simplificadoras, associadas a imaginário onde predominam aspectos
negativos sobre o fenômeno do envelhecimento e aspectos técnico-profissionais
sobre formação profissional.
A qualidade de vida na velhice, constitui processo com causas, biológicas,
sociais, psicológicas, culturais. Conceber o envelhecimento a partir de orientação
paradigmática simplificadora, especialmente no caso destes profissionais onde a
força e o vigor físicos desempenham papel preponderante em seu imaginário,
significa priorizar, especialmente a dimensão biológica deste fenômeno, com isto
179
restando poucas possibilidades para pensar este tempo futuro em que não mais
estarão presentes estas características. Assim, tendem a ver este tempo de uma
perspectiva irrealista, de ausência de possibilidades, de possibilidades, de
distanciado, de próximo, do presente.
Sendo este imaginário compartilhado pelo grupo de profissionais, tem
sofrido um processo de permanente realimentação, dificultando que evoluam para
concepção que abranja o envelhecimento em sua complexidade.(princípio recursivo)
A partir da concepção de envelhecimento pensam, em relação à construção
de uma velhice com qualidade, especialmente nos aspectos relacionados ao corpo,
como alimentação saudável e exercícios físicos, o que é importante mas insuficiente.
Identificar, portanto, concepções sobre o envelhecimento construídas sobre
orientação paradigmática simplificadora significa a possibilidade de intervir neste
processo, construindo uma velhice com qualidade, compreendendo esta etapa em
sua multi/interdimensionalidade, com limitações e possibilidades.
Na transformação e reconstrução desta concepção a formação dos policiais
tem papel fundamental, podendo proporcionar a estes profissionais condições para
um desenvolvimento como seres integrais que são, (princípio hologramático) sujeitos
às condições humanas, seres que envelhecem e que têm direito a que sua velhice
expresse, através de sua qualidade, o resultado de uma vida com qualidade.
Na complexidade com que se defrontam estes profissionais em seu
cotidiano, riscos de todas as ordens, situações carregadas de emoção, de
incertezas, de ambigüidades, têm a possibilidade de não dar a si mesmos e às suas
vidas a atenção necessária, especialmente à preparação para uma velhice de
qualidade.
Isto pode ser agravado quando estes profissionais, chegando à reserva, à
aposentadoria se sentem abandonados, por suas Instituições, pela Sociedade, pelo
Estado, deixando suas instituições com o sentimento de terem representado
números e de serem facilmente substituídos.
Faz-se necessário que o Estado, através dos Gestores Públicos, atente
para as difíceis condições em que estes profissionais são lançados após o seu
tempo de vida laboral e que políticas públicas venham ao encontro de mudanças
neste quadro, traduzindo-se em salários que lhes possibilitem morar e viver com
dignidade e em cuidados com sua saúde física e mental.
180
Programas de Preparação Para a Aposentadoria/Reserva, Programas onde
a larga experiência e o conhecimento destes profissionais possam ser aproveitados
por suas Instituições, Programas de Tratamento e Prevenção de Alcoolismo, que
tende a se instalar ou a se acentuar na aposentadoria, entre outros, representam
possibilidades concretas de atenção a estes profissionais.
O convívio na profissão supera de muito seu tempo junto aos familiares,
resultando em desequilíbrios familiares.
A carga emocional a que estão sujeitos diuturnamente exige a que recebam
algum tipo de acompanhamento sócioemocional, o que não ocorre, na grande
maioria das instituições policiais.
A consciência sobre as próprias concepções como condição para a
mudança de paradigmas remete à necessidade de que estes profissionais recebam
formação que lhes permita esta condição, através do desenvolvimento de
pensamento capaz de pensar a complexidade e, através dela, pensar a si, a
realidade e a si na realidade. (princípio hologramático).
Assim, a inclusão de conteúdos transversais, ligados à natureza humana na
Formação destes profissionais, dentre eles Educação Gerontológica e Políticas
Públicas que reconheçam as peculiaridades deste trabalho e destes profissionais,
bem como as necessidades próprias ao envelhecimento e que forneçam condições
para que seja vivido com qualidade são imprescindíveis à construção de uma
“Polícia Cidadã”.
Tal Polícia, é construída a partir de ações de Formação que preparem
estes profissionais para a “policompetência” necessária, de Instituições que
percebam seus profissionais como sua maior riqueza e que isto traduzam em ações
de respeito e atenção a estes seres humanos em suas múltiplas dimensões e de um
Estado que, através de Políticas blicas ampare estes profissionais na construção
de uma velhice com qualidade.
Às Universidades cabe grande possibilidade de contribuição, através do
incremento de estudos e pesquisas na área da Gerontologia associada à Segurança
Pública por parte de Programas de Pós-Graduação em Gerontologia, que permitam
uma aproximação a esta realidade peculiar e que, com isto, sirvam de sustentação
científica para alternativas que venham ao encontro da longevidade com qualidade
de vida dos policiais.
181
A sociedade em seus diversos segmentos constituintes é co-responsável,
por ações e/ou omissões, pela produção de criminalidade, violência e criminalidade
violenta e, não tomando disto consciência, concebem Segurança Pública a partir de
orientação paradigmática simplificadora, onde a polícia é vista como única
responsável por sua solução, resultando numa postura permanentemente crítica do
profissional policial e de seu trabalho e na não consideração do ser humano que
exerce esta profissão, que a isto reage com afastamento.
Conceber a sociedade de uma perspectiva de complexidade torna-se assim
fundamental para a inclusão destes profissionais neste sistema e para que, em
conjunto sejam buscadas soluções a estes problemas comuns.
A Segurança Pública brasileira está em crise o que tem significado um
acréscimo de incertezas e de ameaças aos seus profissionais e uma diminuição da
possibilidade de sobrevivência e da dignidade profissional. Neste cenário, um dos
desafios consiste na consolidação de marcos de referência para a formação policial
que permitam uma identidade cidadã.
Esta identidade para ser reconstruída e fazer sentido implica oferecimento
de condições para alcançar uma maior longevidade com qualidade. Entretanto, para
que mudanças aconteçam neste sentido é preciso que o contexto nacional de
formação reconstrua sua configuração, incluindo conteúdos diretamente
relacionados à natureza humana conforme explicitado na Matriz Curricular Nacional
para a Formação de Profissionais da área da Segurança Pública (MCN).
O presente estudo, que objetivou conhecer a orientação paradigmática sob
a concepção de envelhecimento, o imaginário associado e a orientação
paradigmática sob a concepção de formação de Policiais Militares ainda na ativa,
levou à confirmação da tese que norteou o estudo: Policiais em nível intermediário,
da Polícia Militar de Porto Alegre/RS têm concepções de envelhecimento, imaginário
e concepção de formação profissional construídas com orientações paradigmáticas
simplificadoras.
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ANEXOS
187
ANEXO 1: TERMO DE CONSENTIMENTO INFORMADO
O projeto de pesquisa .................................... tem como objetivo geral
caracterizar a concepção de envelhecimento, de formação profissional e metas
motivacionais futuras através de entrevistas, testes (Mini Mental e Beck) e
observação durante a realização de sessões de análise e discussão. Nestas
sessões o material coletado será analisado e discutido tendo como referência idéias
de autores que trabalham sobre o tema. Os próprios respondentes participarão
destas sessões sob a orientação da pesquisadora. Você tem a oportunidade de
abandonar a pesquisa se assim o desejar, de fazer perguntas e pedir
esclarecimentos sobre os procedimentos realizados e/ou interpretação dos
resultados alcançados.
O benefício da participação na pesquisa se a oportunidade de refletir e
reconstruir o que pensa sobre o fenômeno do envelhecimento, sobre sua formação
profissional e metas motivacionais futuras, o que poderá auxiliar a investir esforços
para busca de melhoria de qualidade de vida e um envelhecimento mais saudável.
Esta pesquisa também é importante por tratar de aspectos que poderão servir
de subsídios para políticas de recursos humanos e educacionais na área de
Segurança Pública.
Após ter recebido todas as informações relacionadas ao estudo eu,
_______________________, portador da CI____________________ certifico que a
Srª Rosa Maria Gross de Almeida respondeu a todas as minhas perguntas sobre o
estudo e minha condição, e eu, voluntariamente, aceito participar da pesquisa, pois
reconheço que recebi uma cópia das informações ao participante, a qual li e
compreendi por complexo, tendo sido informado sobre os objetivos e as razões que
levam ao desenvolvimento do estudo. Recebi também informações sobre os
procedimentos nos quais estarei envolvido, dos riscos e dos benefícios possíveis e
sobre a possibilidade de retirar-me a qualquer momento.
Porto Alegre, de de
_________________________________ ____________________________
Assinatura do participante Assinatura da pesquisadora
188
ANEXO 2: TABELAS
Tabela 1: Idade
Incidência
Intervalo
ƒ
%
30 – 39
40 –
49
50 – 59
02
19
01
9.09
86.36
4.54
Total 22 100
Tabela 2: Estado Civil
Incidência
Estado Civil
ƒ
%
Casados
Solteiros
Divorciados
Separados
Outros
11
04
02
02
03
50
18.18
9.09
9.09
13.63
Total 22 100
189
Tabela 3: Escolaridade
ƒ
%
Incidência
Escolaridade
I C I C
00
06
09
03
00
27.27
40.90
13.63
Ensino Médio
Ensino Superior
00
04
00
18.18
Pós- Graduação
Tabela 4 Tipos de cursos
Incidência
Ênfase
dos cursos
ƒ
%
Técnica
Operacional
Cultura Geral
Pedagógica
Recursos
Informatizados
Outro
17
07
02
03
01
77.27
31,81
9.09
13.63
4.54
Total 22
Obs: Alguns assinalaram em duas opções.
190
Tabela 5: Tempo no exercício da função policial
Incidência
Tempo na Função
ƒ
%
16 – 20
21–
25
26 – 30
06
13
03
27.27
59.09
13.63
Total
22
100
Tabela 6: Tempo em Policiamento Ostensivo
Incidência
Tempo no Polic.
Ostensivo
ƒ
%
01 – 05
06–
10
11 – 15
16 -20
20 -25
05
05
02
05
05
22.72
22.72
9.09
22.72
22.72
Total
22
100
191
Tabela 7: Presença de doenças crônicas
Incidência
Doenças
Crônicas
ƒ
%
Não
Sim
18
03
81.81
13.63
Total
22
100
Obs. 1 (4,54%) não informou
Tabela 8: Uso de Medicação
Incidência
Uso de medicação
ƒ
%
Não
Sim
Não informou
17
04
01
77.27
18.18
4.54
Total
22
100
192
Tabela 9: Internação para tratamento emocional
Incidência
Internação
tratamento
emocional
ƒ
%
Não
Sim
21
01
95.45
04.54
Total
22
100
Tabela 10: Psicoterapia
Incidência
Psicoterapia
ƒ
%
Não
Sim
19
03
86.36
13.63
Total
22
100
193
Tabela 11: Escores no Inventário de Beck
Incidência
Escore
ƒ
%
0
03
14,2
1
04
19
2
01
4,7
5
02
9,5
6
02
9,5
7
05
23,8
8
02
9,5
12
01
4,7
20
01
4,7
Total
21
100
194
ANEXO 3: COMITÊ DE ÉTICA
195
ANEXO 4: ARTIGO PÚBLICADO
O PAPEL DO IMAGINÁRIO NA CONCEPÇÃO DE ENVELHECIMENTO: UM ESTUDO JUNTO A
POLICIAIS MILITARES
Rosa Maria Gross de Almeida
Doutoranda em Gerontologia Biomédica
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul/ Instituto de Geriatria e Gerontologia
Av. Ipiranga, 6690 – 3º andar HSL CEP: 90610-000
Brasil- Porto Alegre – RS
(51)33203288 – Ramal: 217
rosaalmeida@via-rs.net
Valdemarina Bidone de Azevedo e Souza
Doutora em Educação
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul/ Instituto de Geriatria e Gerontologia
Av. Ipiranga, 6690 – 3º andar HSL CEP: 90610-000
Brasil- Porto Alegre – RS
(51)33203288 – Ramal: 217
valde@pucrs.br
RESUMO
Este artigo trata sobre a concepção de envelhecimento e o imaginário a ele associado por
parte de profissionais da área da Segurança Pública. Os aportes trazidos por esta pesquisa significam
efetiva contribuição ao cuidado com os profissionais policiais através de dados que aumentem a
compreensão de suas concepções em meio ao seu fazer profissional, compreensão do ser humano
que exerce este fazer e como o exerce, cumprindo a que metas motivacionais pessoais e a que
imaginário. O estudo foi desenvolvido numa abordagem qualitativa, numa perspectiva dialógica, junto
a um grupo de 22 alunos de curso de formação de nível intermediário de uma Polícia Militar
brasileira com, em média, 20 anos na profissão e idade superior a 35 anos. Os principias resultados
do estudo apontam para concepções de envelhecimento associadas a um imaginário com
características simplificadoras.
PALAVRAS-CHAVE: Envelhecimento, imaginário, Segurança Pública, policiais.
INTRODUÇÃO
196
A concepção de envelhecimento tem sido permeada pela valorização de aspectos
estéticos associados à beleza do corpo. A estética oferece a possibilidade de uma incursão ao
imaginário, permitindo olhar de frente o que causa temor, como a aproximação da finitude (MORIN,
2002), os sinais do envelhecimento.
O homem acostumou-se a associar beleza à vida e, à medida que se depara com
modificações corporais em decorrência do envelhecimento, não lhe é mais possível deixar de
perceber o distanciamento do ideal estético corporal e o receio da degeneração ganha espaço. A
percepção de si como ser humano se modifica, sua visão sobre suas próprias possibilidades e
potencialidades se curva sob o peso de fantasmas criados e alimentados em seu imaginário. “É o
homem e a mulher que não querem envelhecer, que querem ficar sempre jovens para sempre, se
amarem e sempre desfrutarem do presente.”(MORIN, 2002 p.152)
Assim sendo, olhar a velhice significa olhar a si próprio como “sujeito de morte anunciada
(...) testemunhos da finitude, da transitoriedade, e da morte.” (FONSECA, 2001)
A autoridade antes conferida à velhice como experiência de vida, sabedoria,
discernimento, perdeu espaço para a novidade, agilidade, audácia, num movimento que Morin chama
de “degerontocratização” (MORIN, 2002, p.148). O ganho em respeitabilidade, prestígio, atenção, que
surgiam como substitutos das perdas especialmente físicas, decorrentes da idade, não mais estão
presentes. “A velhice fica como que desligada, rejeitada para fora do curso real da vida.” (MORIN,
2002, p.148) O resultado termina por constituir a busca desesperada pelo impossível: permanecer
jovem, belo e ser eterno.
No Brasil, a ampliação da expectativa de vida tem resultado em crescente mero de
idosos, o que esbarra no despreparo do país diante deste quadro e na necessidade de pesquisas e
ações condizentes.
Embora iniciativas legais importantes para a consolidação da cidadania dos idosos
tenham ocorrido recentemente, se faz presente o paradoxo: se de um lado ampliam-se as
possibilidades de valorização do idoso, por outro convive-se ainda com a marginalização da velhice
(CASTRO, 2001).
Se a Gerontologia, como área do conhecimento, ainda carece de produção científica,
esta carência se potencializa quando se refere ao envelhecimento daqueles que trabalham na área
da Segurança Pública, os policiais. Estes, no desempenho de suas tarefas, confrontam-se
diariamente com a crescente violência e com os ideais de vigor físico, força e audácia. Ante o próprio
envelhecimento e com a aposentadoria, convivem com a perda das condições destes ideais,
associada à perda da referência identitária (FONSECA, 2001) representada por esta profissão, com
suas conseqüências sobre a qualidade de sua vida. Segundo Moragas (1997), um dos fatores de
risco ao equilíbrio psíquico no envelhecimento são as frustrações e a perda do sentido da vida.
Hoje, devido à importância e atualidade dos problemas relacionados ao referido
aumento da população idosa e da crise na Segurança Pública, muito se pesquisa e escreve sobre os
índices sinalizadores de impactos sociais, da violência e das tentativas de compreensão destes
fenômenos. Sobre o profissional de Segurança blica, sobre o sujeito/indivíduo que exerce a função
197
de policial, pesquisas têm sido feitas, especialmente têm concentrado seu foco nos profissionais
ainda na ativa, sem ocupar-se daqueles já aposentados.
Se buscássemos resumir os objetivos do trabalho que vem sendo realizado junto aos
profissionais de Segurança Pública nos últimos anos, diríamos que se trata da criação de uma
“Polícia Cidadã”, que não apenas obedeça aos preceitos de Direitos Humanos, mas seja deles
promotora: “Cabe-lhes, muito além, co-protagonizar a promoção dos direitos humanos, cônscios de
que são agentes proponentes de uma cultura moral (que em muito transcende sem negar - a mera
realidade), balizadores imprescindíveis das condutas coletivas, contenedores de desvios individuais e
grupais que atacam os direitos e garantias do conjunto da sociedade e das pessoas dos cidadãos”
(BALESTRERI, 2004 p. 50). Isto passa pela construção pessoal de sujeitos/indivíduos
autônomos/dependentes, com concepções, crenças, convicções
(MORIN, 1995) que exercem a
profissão, mas não só por eles, também pela reconstrução institucional.
No desenvolvimento das atividades de formação destes profissionais vem sendo
fortalecida, pela Matriz Curricular Nacional de Formação para Profissionais da Segurança
Pública/Ministério da Justiça/Brasil, a idéia da importância destes profissionais, cuidadores pouco ou
nunca cuidados, avós, pais, mães, filhos, filhas, irmãos, enfim, pessoas que, possivelmente na maior
parte do tempo, não são vistas e não se vêem, como tal.
Profissionais que cuidam de outros seres humanos precisam ser também cuidados, e
esta é uma necessidade de profissionais policiais que arriscam suas vidas no cuidado com a
sociedade. A aproximação com eles tem mostrado que carência de cuidados do ponto de vista
emocional e de capacitação adequada ao desempenho seguro de sua função. Os cursos de
formação não têm incluído conteúdos sobre qualidade de vida. Ao contrário, em grande parte deste
país, os policiais encontram-se imersos numa realidade que os desumaniza, os destitui de sua
condição de seres humanos com necessidades que pedem atenção.
Se as instituições pouco se
ocupam daqueles que ainda estão no exercício de sua função, menos ainda daqueles que já estão
fora dela, seguindo uma cultura de coisificação (CHAUÍ, 2001), de descarte daqueles considerados
improdutivos.
Junto a profissionais da Segurança Pública foi desenvolvida uma pesquisa tendo, como
objetivo principal, conhecer sua concepção de envelhecimento e o imaginário a ele associado,
entendendo-se que o aprofundamento do conhecimento sobre as próprias concepções assume uma
relevância inestimável para mudanças nos pensamentos, nas ações e nas atitudes em relação à
própria vida.
Os profissionais que dela participaram são policiais militares que, por estarem
encarregados do policiamento ostensivo, estão mais expostos ao risco, à violência e às suas
conseqüências. Este estudo tem caráter de ineditismo na área da Gerontologia e da Segurança
Pública no Brasil e, com os aportes vindos dele, entende-se estar dando uma efetiva contribuição no
cuidado com estes profissionais.
METODOLOGIA
198
O estudo foi desenvolvido numa abordagem dialógica junto a um grupo de 22 policiais
militares, alunos de curso de formação de nível intermediário de uma Polícia Militar brasileira com, em
média, 20 anos na profissão e idade superior a 35 anos.
Estes alunos, concluído o curso, ocuparão posto de nível intermediário na hierarquia policial
militar, posto este considerado o elo de ligação entre os Oficiais Gestores da Instituição e a tropa,
diretamente envolvida com a população.
A opção pelo tempo de serviço igual ou superior a 20 anos, deve-se ao fato de estes
profissionais terem atualmente a possibilidade de se aposentarem aos 30 anos de trabalho. Assim, o
corte em 20 anos significa um mínimo de 2/3 de tempo na ativa e a possibilidade dos respondentes
terem no mínimo 35 anos.
A opção por 22 participantes mantém-se dentro dos limites considerados na literatura
consultada para a realização de atividades de coleta de dados em nível coletivo, pela possibilidade de
saturação dos dados, critério de confiabilidade e relevância, o que encontra suporte em Flick (2004),
que apoiado em Glaser e Strauss, denomina de “amostragens teóricas” as que podem ser tomadas,
quando se pretende comparar sem ter como base uma amostragem estatística. Os participantes
foram selecionados de acordo com o que é esperado de dados emergentes para o conhecimento que
está sendo construído
(FLICK, 2004) e foi a construção do corpus (indicador de confiabilidade e
relevância) o princípio que permitiu uma coleta sistemática de dados o que exigiu transparência nos
procedimentos e nos critérios utilizados.
O tamanho da amostra permitiu atender à evidência de saturação (quando os registros
não trouxeram mais novidade), pois a generalização pretendida foi a analítica (análise teórica), o que
significa que os resultados encontrados foram referentes à amostra investigativa e podem ser
transpostos para novos contextos sob a forma de hipóteses (BAUER e GASKELL, 2001).
A estes policiais foi aplicado um questionário sendo que, dentre as perguntas, uma
solicitava-lhes a que citassem objetos ou descrevessem imagens às quais associavam o fenômeno
do envelhecimento.
A análise dos dados sobre a concepção de envelhecimento foi realizada a partir da
identificação das unidades estruturais e posterior classificação em dimensões e a análise das
imagens associadas por meio de análise semiótica (PENN, 2001)
RESULTADOS E SUA DISCUSSÃO
Nas respostas obtidas, foram associadas ao envelhecimento imagens como “um ótimo
vinho, que quanto mais velho melhor é o seu paladar e ensinamentos”, “um bom livro”, “descanso à
beira mar”, denotando visão positiva associada a este fenômeno inerente à vida.
Em pesquisa realizada por Azevedo e Souza e Luzzi (2004),sobre imaginário associado
ao envelhecimento, junto a profissionais que trabalham na área da Gerontologia também foram
mencionadas imagens, associando este fenômeno ao vinho e a aspectos da natureza. Estas autoras
sugerem que a presença da imagem do vinho parece trazer a idéia implícita de sabedoria: “quanto
mais velho melhor” e que a referência a um cenário (beira mar/movimento) associado ao descanso
199
(imobilidade) pode significar, ao mesmo tempo, tranqüilidade. As imagens “cadeira de balanço,
“parada no tempo” ou “barco naufragado noventa anos” (como foi mencionado por sujeitos da
presente pesquisa), sugerem a idéia de uma relativa imobilidade, que talvez signifique a espera da
morte.
Para Morin (1970), a espera da morte representa a possibilidade de inquietude e horror
diante da decomposição do corpo e da perda de uma individualidade sentida como presente e
reconhecida, pois após a morte, com o passar do tempo surge a indiferença.
Em uma realidade onde a imagem institucional da Segurança Pública passa por crescente
perda da sua credibilidade (AZEVEDO E SOUZA et al. 2006), a confluência entre uma imagem
profissional e uma imagem a respeito de seu próprio envelhecimento negativas, construídas numa
associação entre acontecimentos cotidianos e imaginário individual e coletivo, pode auxiliar na
explicação do fortalecimento de aspectos culturais duplamente preconceituosos: ser polícia e ser
velho.
Estes profissionais policiais, seres humanos cujos corpos e espíritos vão sofrendo
mudanças através do tempo, ao chegarem à aposentadoria subitamente se defrontam com sinais das
profundas descontinuidades que foram acontecendo sem que delas se apercebessem. Ao perderem
a identidade profissional policial, que os acompanhou vinte quatro horas por dia durante trinta anos,
podem perder também a sensação de pertencimento, produtividade e valor. Por outro lado, o se
reconhecem como cidadão comum e, em muitos casos, a resposta da sociedade ao declínio
biológico, a desvalorização da velhice e os preconceitos com estes profissionais, colabora para jogá-
los num “limbo”, um espaço sem definição: não são mais policiais que foram, e tão pouco se sentem
integrados na sociedade civil. Situações desta natureza podem gerar alto nível de estresse
(LAZAETA, 1994) e a evolução deste para a ansiedade (LESSE, 1982) e desta para a depressão
(ROTH e COLS. 1982). A indissociabilidade entre ansiedade e depressão também é mencionada por
Strian e Klicpera (1984).
Na presente pesquisa o envelhecimento foi também associado à falta de motivação”,
“sedentarismo”, estagnação”, “rejeição”, solidão”, componentes que sugerem potencial para o
desenvolvimento de processos depressivos, processos que se desencadeiam a partir de causas
psicológicas, sociais e culturais, todas elas presentes à realidade do envelhecimento destes
profissionais.
Do ponto de vista psicológico, a depressão significa auto-rejeição e a o aceitação da
velhice (LOURES e GOMES, 2006) pelas perdas das funções do ego que acarreta. Em linguagem
psicanalítica, trata-se da “depressão involutiva” ligada às perdas não de pessoas e de situações, a
aposentadoria aqui se incluindo, mas também de atributos do ego tais como força, agilidade,
agilidade de raciocínio, entre outros. (ZIMERMAN, 1999).
Imagens mencionadas pelos sujeitos da pesquisa, mostrando a associação do
envelhecimento com doenças, bengalas, solidão, ferrugem, rugas, podridão e instituição geriátrica
(que no Brasil recebe uma conotação pejorativa de abandono) revelam um significado de
envelhecimento perpassado por uma simplificação, constituindo estereótipo, preconceitos e
sentimentos negativos, expressão dos arquétipos nos quais se alimenta a visão da realidade e de si
200
próprios. Provavelmente será sobre estas imagens que construirão sua velhice. Este processo
progride e se firma porque os arquétipos são permanentemente retroalimentados pelas concepções a
partir deles construídas, criadores e criaturas do imaginário que exalta, de um lado, valores de
juventude e beleza e, de outro, associa a velhice com sentimentos negativos de perda,
desvalorização e morte. Esta simplificação apresenta-se principalmente articulada às dimensões
biológica, psicossocial e cultural, estando este imaginário marcado pela presença de aspectos
biológicos limitantes, estereotipados e ligados à finitude.
O imaginário faz os fenômenos serem o que são, pois fazem parte de uma construção
histórica e de uma cultura resultante de uma atmosfera em constante produção de imagens
(MAFFESOLI, 2001).
As imagens associadas ao fenômeno do envelhecimento, por sua vez, fazem parte das
concepções de mundo, alimentando-se e sendo alimentadas por conhecimentos elaborados a partir
de outros princípios de organização do pensamento, resultando em outras imagens e emões sobre
a realidade compatíveis com elas, uma vez que o imaginário apresenta “um elemento racional, ou
razoável, mas também outros parâmetros, como o onírico, o lúdico, a fantasia, o imaginativo, o
afetivo, o não racional, o irracional, os sonhos, enfim, as construções mentais potencializadoras das
chamadas práticas” (MAFFESOLI, p. 76, 2001).
O imaginário representa a relação entre os limites que a sociedade e que a própria vida,
enquanto realidade objetiva, impõe à subjetividade. “Nisso entra, ao mesmo tempo, algo sólido, a vida
com suas diversas modulações, e alguma coisa que ultrapassa essa solidez. sempre um vaivém
entre as intimações objetivas e a subjetividade. Uma abre brechas na outra”. O imaginário é uma
construção mental, social e do espírito, do pensamento racional e não racional que se nutre das
realidades, as enriquece e ultrapassa, impregna o coletivo, estabelece laços; ele é individual/coletivo;
produz imagens que, ao mesmo tempo contribuem para a sua formação e transformação e, embora
cada indivíduo viva este imaginário a partir de suas idiossincrasias, ele permanece sendo um
fenômeno grupal, tribal, partilhado, trazendo a sensação de fazer parte de algo, de partilhar, “funciona
pela interação, pela vibração comum e pela sensação partilhada”. é o “estado de espírito de um
grupo”, um “cimento social” em que o individual assume a forma de um reflexo grupal (MAFFESOLI,
p. 80, 2001).
A importância do imaginário para os seres humanos depende em parte de necessidades,
sonhos, desejos, idéias, imagens, fantasias que fazem a conexão com o mundo exterior. As
concepções humanas vivem e se nutrem do imaginário, ao mesmo tempo que o alimentam. (MORIN,
1999)
O imaginário e as concepções são configurações originais, que formam uma unidade
engendrada por um espírito humano, num determinado espaço e tempo (MORIN, 1999).
Concepções simplificadoras de envelhecimento nascem do espaço deixado pela
desinformação, pela ausência (no caso) de uma educação gerontológica que permita compreender
este fenômeno como parte do desenvolvimento do ser humano, como processo onde perdas existem,
mas também há possibilidade de qualidade de vida.
201
A concepção de envelhecimento transforma o que o homem conhece sobre este
fenômeno em pensamento, sentimentos e se traduz em ações de vida. Assim sendo, a construção da
velhice com qualidade pode ser prejudicada quando estes pensamentos e sentimentos são
carregados de negatividade sobre esta fase da vida. “Uma boa velhice é uma recompensa, não um
direito automático. chegaremos a ela encarando com a mente clara e aberta a perspectiva de
envelhecer.” (STUART-HAMILTON, p. 194, 2002)
As concepções humanas constituem um fenômeno complexo tecido numa rede de intra e
inter-relações que, ao serem conhecidas, auxiliam na compreensão da realidade e do plano
imaginário. O modo como é pensado o envelhecimento inventa e constitui este fenômeno
(FONSECA, 2001), ocultando as possibilidades de uma vida que se constrói em uma realidade onde,
a própria transitoriedade pode significar “a possibilidade de reinventar a vida a partir da finitude das
formas e da desterritorialização subjetiva. A produção da existência como um work in progress.”
(FONSECA, 2001)
Como muitas são as dimensões envolvidas no processo de constituição do imaginário
sobre o envelhecimento e das concepções que dele resultam, é complexo o processo da passagem
de uma visão simplificadora deste fenômeno para uma visão de complexidade que leva a conviver
com a ambivalência que a realidade do envelhecimento comporta, especialmente dentro de uma
sociedade que se alimenta e é alimentada por ideais sedimentados no visual, superficial e “fast”.
Entretanto, entre indivíduo e sociedade existe uma relação interacional e isto permite pensar na
possibilidade de informar, refletir, atuar sobre, transformar e ser transformado ao transformar-se,
como co-criador desta sociedade, com o direito e o compromisso de construir no presente a
possibilidade de um envelhecimento com qualidade.
Como bem disse Cícero, “[...] os que não obtêm dentro de si os recursos necessários
para viver na felicidade acharão execráveis todas as idades da vida. Mas todo aquele que sabe tirar
de si próprio o essencial não poderia julgar ruins as necessidades da natureza. E a velhice
seguramente faz parte delas! Todos os homens desejam alcançá-la, mas ao ficarem velhos, se
lamentam.” (p.09, 2004)
A qualidade de vida na velhice é resultado de um processo com muitas causas,
biológicas, sociais, psicológicas, entre outras. Compreendê-las significa a possibilidade de mudar
concepções sobre esta etapa da vida, vendo e vivendo o envelhecimento como um processo
universal e, ao mesmo tempo único, pelas diferenças genéticas e de experiência de vida
(MORAGAS, 1997) mas, sobretudo, como um momento com possibilidades a serem atualizadas.
Esta consciência precisa ser recuperada, para ser recuperado também o sentido do
envelhecimento e do trabalho dos profissionais de Segurança Pública, para iluminar o caminho na
busca da longevidade com qualidade e de uma concepção de envelhecimento onde não mais se
tome a decrepitude como inevitável, mas que traduza a infinita potencialidade do ser humano para
construir estratégias, em direção ao melhor de si mesmo.
Esta consciência – com/ciência – possibilita o apropriar-se da construção do futuro.
Significa olhar a si mesmo como sujeito, mesmo quando deparado com estruturas que sugerem o
mero descarte daqueles considerados “improdutivos. Talvez valesse a pena refletir sobre as causas
202
da violência partindo daí, da forma como o status de seres humanos está perdendo espaço e
significado. A dimensão que este tema assume na atualidade brasileira talvez propicie à reflexão
sobre a violência contida nas soluções conjuntas adotadas na cultura perversa de descarte, de
“descontinuidade estrutural
.
A Segurança Pública brasileira está em crise o que tem significado um acréscimo de
incertezas e de ameaças aos seus profissionais policiais e uma diminuição de sua expectativa de
sobrevivência. Neste cenário, ocupar-se com a construção de um envelhecimento com qualidade
significa vencer o importante desafio de mudanças no contexto nacional de formação, através da
reconstrução de sua configuração, passando a incluir conteúdos diretamente relacionados à natureza
humana. Do contrário, como formar profissionais que tenham interesse em preservar a vida humana
se eles mesmos não são considerados em sua humanidade? Como preparar o envelhecimento como
processo saudável num ambiente cruel e de risco?
Azevedo e Souza e Luzzi (2004), com base em Stallings e colaboradores, alertam que,
no caso de concepções sobre o envelhecimento não serem questionadas teoricamente, a
possibilidade de que sejam consolidadas concepções de si mesmo como alguém desprovido de
capacidades à medida em que este fenômeno se manifeste. É possível pensar que concepções desta
natureza, construídas em íntima relação com a profissão escolhida, têm impacto direto e podem
influenciar as atitudes não em relação à vida, mas também em seu desempenho profissional,
resultando em descuido com a própria saúde e segurança.
Isto pode levar a que estes profissionais deixem de investir esforços em conhecimento
sobre a possibilidade de um envelhecimento com qualidade de vida perdendo, conseqüentemente a
curiosidade intelectual associada ao interesse e à atenção, à necessária atualização do
conhecimento e reforçando a desvinculação de preconceitos e estereótipos a respeito do
envelhecimento. Desta forma, correm o risco de não incluírem o sentimento da esperança de um
envelhecimento saudável em seu projeto de vida, pela desarticulação com uma visão de
envelhecimento em sua interdimensionalidade e com sentimentos favoráveis em relação a ele
(AZEVEDO E SOUZA E LUZZI, 2004).
Na realidade policial brasileira, a consciência da necessidade da inclusão de aspectos
gerontológicos hoje se faz presente formalmente na forma de uma disciplina desenvolvida apenas
num curso de formação de policial, no Estado de Minas Gerais. As Universidades, entretanto,
começam a despontar como produtoras de conhecimento sobre formação em Segurança Pública
(Universidade Fluminense, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Pontifícia Universidade
Católica do Rio Grande do Sul) associada a aspectos gerontológicos (Pontifícia Universidade Católica
RS).
Inserido nesta problemática, surge o desafio de uma formação profissional policial no
Brasil que desenvolva uma cosmovisão, que inclua em sua transversalidade aspectos gerontológicos
importantes para a vivência de uma profissão e de um envelhecimento com maior dignidade e
qualidade.
Os profissionais de Segurança blica cumprem importante papel pedagógico junto à
sociedade (BALESTRERI, 2003) e, para isto, precisam estar preparados. Numa sociedade em
203
processo de “desgerontização”, onde o sonho por encontrar a “fonte da juventude” se associa à
tentativa de afastar tudo o que representa senescência, incluindo as pessoas senescentes, faz parte
deste preparo receber educação gerontológica que lhes permita rever e reavaliar suas concepções
sobre seu próprio envelhecimento e como estas se foram construindo a partir do imaginário social.
Como disse Cícero, “pretender resistir à natureza não teria mais sentido do que querer
como os gigantes- guerrear contra deuses.” (p.10, 2004) Entretanto, é esta a luta na qual aqueles que
envelhecem estão consumindo suas energias, lutando para permanecerem jovens. Com isto a
senescência, que pode vir acompanhada de novas possibilidades de gratificação, chega como
prenúncio de impossibilidades e perdas, mais uma vez alimentando o imaginário que a isto a reduziu.
Esta recursividade precisa ser rompida por uma concepção complexa deste fenômeno, concebendo-o
como processo permanente de construção/desconstrução/reconstrução, envolvendo sujeitos,
ambiente e mediações entre eles.
CONCLUSÕES
Estudos que tragam compreensão sobre a concepção de policiais a respeito do
envelhecimento significam importante aspecto motivacional para a construção de uma identidade
policial cidadã contemporânea, que inclua a melhoria da qualidade de vida.
Identificar concepções simplificadoras de envelhecimento e perceber sobre que
imaginário se foram construindo, é condição para qualquer intervenção que vise à transformação e
possibilite olhar este processo, inerente à natureza viva, como portador de limitações e
possibilidades, compreendendo-o a partir de uma visão sistêmica, que esclareça sobre sua
“arquitetura complexa” construída sobre dimensão não biológica, mas também sociológica,
psicológica, cultural, educacional.
No caso dos entrevistados da presente pesquisa, cuja profissão que exercem está
essencialmente associada ao desempenho físico, as conseqüências que decorrem de uma visão
distorcida de envelhecimento trazem conseqüências que podem estar traduzidas em várias formas de
desajustes pós-aposentadoria. Impende a inclusão de educação gerontológica na formação
profissional, educação que permita o conhecimento das próprias concepções para que sejam
oferecidas condições para mudanças nos pensamentos, nas ações e nas atitudes em relação à
própria vida. Sem esta possibilidade, o espaço ocupado pelo imaginário se reforça pela ausência da
informação qualificada e estes profissionais, que seguem sendo cuidadores descuidados em seu
presente como em seu futuro.
Por tudo isto e especialmente no que se refere à Gerontologia associada ao mundo
policial, torna-se necessária uma atenção, por parte de Programas de Pós-Graduação em
Gerontologia, para a realização de pesquisas que objetivem conhecer a realidade para sustentar
possíveis alternativas que auxiliem na longevidade com qualidade de vida de profissionais que atuam
na área da Segurança Pública e que vivem em constante e intensa tensão frente a conflitos sociais.
Estas pesquisas, entretanto, precisarão incluir dados não quantitativos, pois as perspectivas
qualitativas têm excelente contribuição a dar em relação a aspectos não explicáveis a partir de teorias
essencialmente calcadas em variáveis passíveis de quantificação.
204
A implementação de políticas públicas que atendam às necessidades próprias ao
envelhecimento e que forneçam condições para que seja vivido com qualidade, não pelos
profissionais de Segurança Pública, mas para a população em geral, é um desafio para a realidade
brasileira.
Este é um caminho a ser percorrido, um processo a ser vivido e alimentado, tanto pelos
profissionais/sujeitos quanto pelas instituições. A busca é a aproximação cada vez maior à
concretude e riqueza de possibilidades da qualidade de vida, quando liberta das visões
simplificadoras que a reduzem. Estes profissionais, como todos, têm direito a que lhes sejam dadas
condições à construção de suas vidas. O resultado, a percepção da responsabilidade de cada um
como sujeitos/atores que são e a construção de condições que garantam qualidade. O ganho maior,
será da sociedade como um todo, tendo sido devolvida a condição de seres humanos a estes que a
servem e protegem.
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205
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206
ANEXO 5: APRESENTAÇÃO
207
208
209
210
Descreva como está preparando o seu envelhecimento
Não prepara
01 03 11 20
Não pensa nisso
Alcançando
metas
21
Conhecimento
Estudo
Acompanha
mudanças
02
14
Autoconhecimento
08
Saúde
Atividade
física
02 16 19 22
Alimentação
14 06 08
Ascensão
profissional
10
Manter saúde
Mental e
física
18 22
Lazer
11
Produtividade
Técnico
Outra atividade
Formação
Escritor
04
03
09
Cursos e
especializações
Dar aulas
22
Trabalho
voluntário
Prepara
atividade
19
15
Financeiro
Autonomia e
independência
06 10 17
Qualidade de vida
Bons
relacionamentos
07
Espiritualidade
07 09
ANEXO
6
:
ESQUEMA 1
211
Descreva como pensa que deveria estar “preparando” um envelhecimento com me
lhor
qualidade
Conhecimento
Estudar
01
Acompanhar
a evolução
Ler
04
02
Preocupações
Não realização de curso
para atividades pós-
aposentadoria
Produtividade
Exercer outra atividade
pós aposentadoria
Ocupar-se de
algo
Boas
condições
Financeiro
Poupança
02 10 11
Qualidade de vida
Exercícios físicos
17 13 06
Espiritualidade
12
Atenção
08
intelectual
16
Deveria já estar
formado
Fazendo curso de
especialização e ser
um oficial BM
10
05
21
03
Bom
salário
09
Material
08
mental
Atividade
voluntária
13
Melhor
plano de
saúde
11
Para boas
universidades
Para aumentar
nível cultural
Para ser um multiplicador de
cultura/conhecimento
Para envelhecer
com qualidade
de vida
Comprar
chácara
Para
pescar
Lazer
Livros
caminhadas
cinema
viagens
descansar
Curtir a
natureza
15
11 13
04
11
06
Relacionamentos
Com diálogo
Para não sofrer
Ampliação das
relações sociais
14
Saúde
01 04 06 12 17 19
Alimentação mais
saudável
Parar de
fumar
01
04 02
Menos estresses
14
07
ANEXO 7: ESQUEMA 2
212
O que é envelhecimento?
Limitação física
01 03
06 15
Sedentarismo
Estagnação
Parado no tempo
04
02
Vida ativa
para a vida
contemplativa
Colheita de
frutos
Crescimento
intelectual
04
Fator natural
Movimento
constante
Experiência
Psicológico
Entregar-se a
doenças
22
Perda de
funcionalidade ou
plena eficácia
Estágio de vida
Amadurecimento
Estabilidade
Amadurecimento
10
Físico
Limitação mental
Parar de sonhar
Desistir dos ideais
11
Financeiro
Perda da
automanutenção
Dependência
Qualidade de
vida
Dificuldade em
entender as
mudanças da
sociedade
Solidão
outono
12
11
10
21
Perda natural
de aptidões
19
03
14
Estado mental
e Físico
Pobreza de
espírito
Não cuidado
com a alma
Com o corpo
Com o intelecto
18
07
Pensar que tudo
acabou
Sem motivação
16
08
Saber viver com
suas diferenças
Com suas limitações
Respeito
09
Parar de
produzir e
começar a
usufruir
13
Período dos
objetivos
alcançados
20
Opção
Ponto de vista
Comportamento
ligado a auto-
estima
05
Consciência
12
Saúde
Passeios
Convívio
social
10
Não lutar
Perder o prazer
pela vida 11
ANEXO 8: ESQUEMA 3
213
Objetos/imagens associadas ao fenômeno do envelhecimento
Físico
Cabelos brancos 01 07
Doenças 01 02 03 11
Rugas 03 17
Limitações
Quedas 06
Fragilidade 06
Estresse 11
Dificuldade em locomover-se
Aparência física 20
11
06
Emocional
Rejeição
Solidão 02
11
15 1 6
Falta de
motivação
Dificuldade 03
Experiência
03
Loucura pela solidão 15
Pressão externa
06
20
Ociosidade
15
Bengala 03 07
Ferrugem 03 12
Podre 03
Bom livro 04 Livro 07
Ótimo vinho
Piscina
Caminhar na praia 05
Olhar Torre Eiffel
Sentir neve no rosto
Árvore 07 10
Cadeira de balanço 08
Cadeira de descanso 09
Pessoas caminhando ou fazendo exercícios em piscinas
Pescaria
Chimarrão
Sentar-se à beira mar
Carro 19
Asilo 11
Oxidação 12
Casa sem pintura 16
Local não cuidado
Carro enferrujado
Uma bela casa 18
Boas ações
Um grande Júri
Barco naufragado a 90 anos 19
Componentes mecânicos ou eletrônicos com tecnologia
ultrapassada 22
Sabedoria
Cansaço mental
Sedentarismo
Funcional
Metáforas
09
ANEXO 9: ESQUEMA 4
214
ANEXO 10: ESQUEMA 5
215
Quais são suas metas Profissionais
Atualização constante 01 03 08
Ascender na carreira 02 04 06 09 10 11 12 13
Mais qualidade no desempenho 05 09 12 13 17 19
Continuar sendo ótimo profissional 03 18
Adquirir conhecimentos 20
Novas experiências 17
Preparar-se para nova profissão 07 14 21 6 19
Estruturar negócio 21
Concluir faculdade 07
Iniciar curso superior visando à aposentadoria 10
Mestrado 15 22
Crescer Como pessoa 09
Estabelecer convívio social fora da
Corporação
14
ANEXO 11: ESQUEMA 6
216
O que espera do futuro após completar 60 anos
Saúde
Física e mental 18
Psicológica 10
Para
trabalhar e realizar os
sonhos 06
realizar alguma atividade
profissional
ser útil 12
vaidade 15
Boas relações sociais 14
Qualidade de vida
Descanso 04
Continuar arte
marcial 20
Realização
pessoal 12
Dignidade e
conforto 10
Estar bem consigo
e com a vida 07
Curtir sua casa
Desfrutar a aposentadoria com familiares 11
Não
Não espera
Falta seriedade das
instituições 08
Com bichos e feliz 15
Produtividade
Trabalho voluntário 01
Outra atividade
Profissional 02
Transmitir informação
Contribuir com gerações
futuras
Aprender com os mais
novos 09
1
Financeiro
Desfrutar bem
Forma salutar de vida
Ter aposentadoria que
permita não voltar a
trabalhar
Pousada no Nordeste
Para receber amigos e
familiares
Lazer
Viajar 04 05 14 17
Dançar 04
Ler 04 15
Ver e sentir as coisas boas
da vida 04
Esporte 05
Contato com natureza 14
Afetivo
Não
01 02 03 14 16 17 21
ANEXO 12: ESQUEMA 7
217
Quais são suas metas em relação ao envelhecimento
Saúde
Atividade física e mental 02
Qualidade de vida
Feliz com a vida
04 09
Que não seja
muito dolorosa
21
Aproveitar a vida
15
Curtir 17
Auto-aceitação
sem traumas 01
Sabedoria 07
Ver netos crescerem 04 08
Convívio social 14
Com companhia interessante e
também saudável 05
Respeito 01
Produtividade
Realização profissional 04 06 13
Serviço voluntário 13
Trabalho comunitário 20
Contribuir com experiência e
conhecimento 10 12
Fazer novo curso 16
Chegar com objetivos alcançados 19
1
Financeiro
Independência 01
Ler 09
Escrever
Pescar 13
Contato com a natureza 14
Afetivo
Não
02 04 05 06 09 10 11 18 22
ANEXO 13: ESQUEMA 8
218
Que limitações pensa terá como idoso
Físico/ Mental
Doença 01 03 04 21
Desgaste físico
Diminuição da Agilidade 05
Limitações físicas 10 12
locomoção 06 07 08
óculos 09
Resistência à fadiga 22
Atividade sexual 02
Perda do pensamento rápido 08
Memória 15
Emocional
Falta de motivação 06
Medo da discriminação 11
Se
exercitar
Intelecto
Físico
Espírito 16 17
Financeiras 09
Peço a Deus para não ter 15
Apenas troca de atividades 18
Nenhuma
Não imagina 14
Normais 13 19
20
ANEXO 14: ESQUEMA 9
219
Que possibilidades pensa terá como idoso
As que construir 01
Respeito conquistado 21
Conhecimento
As que possuía desde
jovem 09
As que quiser ter 14
Todas 07 12
Mais experiência 22
Ter que cuidar mais de si 5
Tudo o que o organismo agüentar
e a mente quiser 04
Não ter mais obrigações com
horários 03
Mais tempo disponível 21 22
Muito pouco 08
Diminuir chances de errar 9
Mais acertos
Qualidade de vida
Boas relações
com familiares e amigos 02 11 13 19
Desfrutar da vida 03
da aposentadoria 17
Curtir a família 10 21
Netos 11
Produtividade
Atividade profissional 10
Atividade comunitária 20
Ajudar /Fazer caridade 18
Cuidar dos netos 05
Poucas no mercado de
trabalho 06
Financeiro
Boa aposentadoria
Viajar 10 11 15
Passear
Esporte
Praia 11
Pescaria
ANEXO 15: ESQUEMA 10
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