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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
INSTITUTO DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
AGENOR DE OLIVEIRA
MOVIMENTOS SOCIAIS NA PARÓQUIA DO ROSÁRIO E SÃO
BENEDITO NA DÉCADA DE OITENTA
Uma educação popular potencializadora de Libertação?
CUIABÁ/MT
2008
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
INSTITUTO DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
AGENOR DE OLIVEIRA
MOVIMENTOS SOCIAIS NA PARÓQUIA DO ROSÁRIO E SÃO
BENEDITO NA DÉCADA DE OITENTA
Uma educação popular potencializadora de Libertação?
CUIABÁ/MT
2008
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AGENOR DE OLIVEIRA
MOVIMENTOS SOCIAIS NA PARÓQUIA DO ROSÁRIO E SÃO
BENEDITO NA DÉCADA DE OITENTA
Uma educação popular potencializadora de Libertação?
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Educação da Universidade
Federal de Mato Grosso, como requisito para
obtenção do título de Mestre em Educação
(Área de Concentração: Educação, Cultura e
Sociedade) Linha de Pesquisa: Movimentos
Sociais, Política e Educação Popular.
PROFESSOR DOUTOR LUIZ AUGUSTO PASSOS
ORIENTADOR
CUIABÁ/MT
OUTUBRO DE 2008
OLIVEIRA, Agenor de.
Movimentos sociais na Paróquia do Rosário e São Benedito na
década de oitenta: uma educação popular potencializadora de
libertação? / Agenor de Oliveira. Cuiabá, MT: Universidade Federal
do Mato Grosso, 2008.
146p.
Dissertação Universidade Federal do Mato Grosso, Instituto de
Educação. Programa de Pós-Graduação em Educação. Mestrado em
Educação, 2008.
Orientador: Prof. Dr. Luiz Augusto Passos.
1. Educação. 2. Educação Popular. 3. Libertação. 4. Movimentos
Sociais. 5. Dissertação. I. Autor. II. Título. III. Orientador.
CDU 37.035(817.2)
A Iracema, companheira de
todas as horas...
REGISTRO DE GRATIDÃO
REGISTRO DE GRATIDÃOREGISTRO DE GRATIDÃO
REGISTRO DE GRATIDÃO
In Memoriam
In MemoriamIn Memoriam
In Memoriam
Graciliano de Oliveira, meu pai...
Ester Aparecida de Oliveira, minha filha...
Itacir Antonio de Oliveira, meu irmão...
HOMENAGENS
HOMENAGENSHOMENAGENS
HOMENAGENS
A todos aqueles que me desafiaram a praticar loucuras com critérios,
e ao tempo, bálsamo sagrado que cura todas as feridas...
AGRADECIMENTOS ESPECIAIS
A Deus, que me estendeu a corda de Sua proteção;
A minha família, pelo apoio;
Aos meus professores e professoras, pela dedicação e incentivo;
Aos colegas, pela energia que me passaram;
Aos entrevistados e depoentes, pelas clarificações;
À Paróquia do Rosário e São Benedito, pelo incentivo e colaboração nas pesquisas;
Aos diretores, funcionários e servidores da UFMT, pela eficácia e lhaneza;
À Banca, pelas pistas e indicações;
E ao Professor Doutor Luiz Augusto Passos, pela paciência e firmeza nas
orientações.
RESUMO
O objeto deste trabalho, de perfil analítico-compreensivo, dentro dos princípios da pesquisa
qualitativa e ancorado na intencionalidade fenomenológica merleaupontyana, integra-se no rol
do que preconiza o Grupo de Pesquisa em Movimentos Sociais em Educação GPMSE-, do
Instituto de Educação IE- da Universidade Federal de Mato Grosso UFMT. Debruça-se
sobre a atuação da Paróquia do Rosário e São Benedito, na década de 80, procurando desvelar
a sua contribuição ao sistema educacional local em pleno regime de exceção, suas influências
e atuação nos Movimentos de ocupações de lotes urbanos oportunizadas pelos conflitos
oriundos da expulsão do campo, quanto àqueles relacionados ao surgimento de novos bairros
e à pressão popular por moradia e infra-estrutura, e versa sobre ações pastorais. O trabalho, ao
pretender resgatar memórias de sujeitos que hoje estão no anonimato, registra ações pontuais
de Movimentos Sociais específicos, muitos dos quais ainda atuantes, tais como: e Alegria;
Centro Pastoral do Rosário, Centro João Bosco Burnier e etc. As categorias centrais
aprofundadas se referem às de Movimentos Sociais, Educação Popular e Libertação. A
metodologia utilizada se ampara em duas vertentes principais: História dos Movimentos
Sociais e História Oral. A bibliografia visa compreender a relação entre os Movimentos
Sociais e a Educação Popular, as suas conseqüências e impactos e se estriba em GOHN
(2002) e BARBIER (1985; 2004). Quando trata de práticas educacionais e politização de
comportamentos entre Igrejas, trabalha com CERTEAU (2002). Ao procurar identificar as
maneiras “como em diversos lugares e momentos determinada realidade social é construída,
pensada e dada a ler via escolhas metodológicas”, CHARTIER (2002) é a bússola. O trabalho
dialoga com contribuições de autores que se dedicam à História da Igreja da América Latina e
da Teologia da Libertação e procura uma adequação do Projeto às “Práticas Educativas
Emancipatórias dos Movimentos Sociais de/em Mato Grosso” e seu impacto nas práticas e
pensamentos que foram centrais na articulação da Igreja do Rosário em Cuiabá, no período
analisado.
Palavras-chave: Movimentos Sociais. Educação Popular. Libertação.
ABSTRACT
The object of this work, of an analytical and comprehensive profile, within the principles of
alternative research and based on the Merleau-Ponty phenomenological intentionality,
interlocks in the list of what recommends the Research Group on Social Movements in
Education – GPMSE, of the Federal University of Mato Grosso (UFMT) Education Institute –
IE. It looks into the performance of the Parish of the Rosário and São Benedito, in the
eighties, trying to disclose its contribution to the local educational system in the midst of the
exception government, its influences and actions in the Movements of occupation of urban
plots permitted by the conflicts due to the expulsion from the countryside, as well as those
related to the emergence of new districts and the popular pressure for lodging and
infrastructure, and speaks about pastoral actions. This work, on pretending to recover
memories from persons who are now anonymous, registers punctual actions of specific
Social Movements, many of which are still in activity, such as : Faith and Joy; the Pastoral
Center of the Rosário; the João Bosco Burnier Center, etc. The deepened central categories
refer themselves to those of the Social Movements, Popular Education and Libertation. The
applied methodology relies on two principal aspects: the History of the Social Movements and
Oral History. The bibliography aims at understanding the relationship between the Social
Movements and Popular Education, their consequences and impacts and relies on GOHN
(2002) and BARBIER (1985; 2004). When dealing with educational practices and
politicization of behaviors between Churches, it works with CERTEAU (2002). On
attempting to identify the ways "in which in various places and moments a determined social
reality is built, thought and given to read through methodological choices", CHARTIER
(2002) is the compass. This work interacts with contributions of authors that dedicate
themselves to the History of the Latin American Church and of the Libertation Theory and
seeks an adequacy to the Project "Emancipating Educational Practices of the Social
Movements of/in Mato Grosso" and its impact on
the practices and thoughts that were central in the articulation of the Church of the Rosário
in Cuiabá, in the analyzed period.
Keywords: Social Movements. Popular Education. Libertation.
SIGLAS
ANAMPOS Articulação Nacional dos Movimentos Populares e Sindicais
AEC Associação de Educação Católica
ASCCMT Associação de Solidariedade às Comunidades Carentes de Mato Grosso
BMT Centro Burnier de espiritualidade
CCCC Cursilhos de Cristandade
CDHHT Centro de Direitos Humanos Henrique Trindade
CEDOP Centro de Direitos Humanos de Petrópolis
CEAS Centro de Ação Social
CEBs Comunidades Eclesiais de Base
CENE Centro de Nova Evangelização
CELAM Conselho Episcopal Latino Americano
CNBB Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
CERIS Centro de Estatísticas Religiosas
CETRA Centro de Treinamento Polivalente Rainha dos Apóstolos
CEP Comissão Episcopal Pastoral
CGT Central Geral dos Trabalhadores
CIAS Centro de Investigação Social
CIMI Centro Indigenista Missionário
COHAB Companhia de Habitação (Cooperativa Habitacional)
CONIC Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil
CONINTER Conselho Interconfessional de Igrejas Cristãs para o Ensino Religioso
CRB Conferência dos Religiosos do Brasil
CPP Conselho de Pastoral Paroquial
CPT Comissão Pastoral da Terra
CUT Central Única dos Trabalhadores
DRECs Diretorias Regionais de Educação
FEMAB Federação Matogrossense das Associações de Bairros
FONAPER Fórum Nacional Permanente para o Ensino Religioso
GERA Grupo de Estudos Rurais da Amazônia
GPMSE Grupo de Pesquisa em Movimentos Sociais e Educação
IBRADES Instituto Brasileiro de Ação Social
ICHS Instituto de Ciências Humanas e Sociais
IECLB Igreja Evangélica de Confissão Luterana do Brasil
MEB Movimento de Educação de Base
MEC Ministério de Educação e Cultura
MR – 8 Movimento Revolucionário 8 de Outubro
MST Movimento dos Sem Terra
NPG-EDU Núcleo de Pós Graduação - Educação
ONGs Organizações Não Governamentais
RCC Renovação Carismática Católica
SEDAC Studium Dom Aquino Correa
SEDUC Secretaria Estadual de Educação e Cultura
SIN Serviço de Inteligência Nacional
SINTEP Sindicato dos Trabalhadores da Educação Pública
SJ Societá Jesú
UFMT Universidade Federal de Mato Grosso
URSS União das Repúblicas Socialistas Soviéticas
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .............................................................................................. 15
Período de incertezas ............................................................................................................ 21
2 (RE)CONHECENDO O CAMPO DE PESQUISA .................................... 34
O Espaço-Temporalidade da Paróquia Nossa Senhora do Rosário ...................................... 35
A Criação da Paróquia do Rosário e São Benedito de Cuiabá - 24 de Maio de 1945 .......... 38
Pare, Olhe, Escute, Pense! .................................................................................................... 39
Da provisão do primeiro Pároco em 1948 e as primeiras anotações do Livro Tombo ......... 40
Tombamento como Patrimônio Histórico, em 1987 ............................................................ 40
De 1948 a 1979 - Crônica dos Fatos Notáveis assentados no Livro Tombo ........................ 42
A falta de “Espírito Sobrenatural” ........................................................................................ 44
Partindo de um Programa Radiofônico ................................................................................ 45
As primeiras tensões ............................................................................................................. 47
Um novo jeito de administrar ............................................................................................... 48
O começo das mudanças - A Festa de São Benedito ............................................................ 52
A Festa como Movimento de Resistência ............................................................................ 54
3 A DINAMICIDADE DE UMA ÉPOCA CONTROVERTIDA E SEUS
EFEITOS NA PARÓQUIA DO ROSÁRIO E SÃO BENEDITO ................ 58
As migrações e o inchaço da cidade ..................................................................................... 58
O despontar de um novo ciclo: Novos Atores Sociais, Símbolo de Mudança! .................... 60
Os Movimentos Sociais e a Educação Popular: A Radicalidade de uma Opção! ................ 66
Um território provocante ...................................................................................................... 70
1980 – Uma década de Contestação e de Abertura .............................................................. 77
Paróquia do Rosário: primeiro acolher, depois perguntar! ................................................... 82
As Redes como estratégias de fortalecimento de lutas ......................................................... 83
O “Inédito Viável”: veredas da Esperança! .......................................................................... 86
O Ecumenismo na Paróquia do Rosário e São Benedito ...................................................... 88
O que é hoje o Ecumenismo? ............................................................................................... 89
O Ensino Religioso: A Diversidade na Rede de Movimentos Sociais ................................. 91
O Ensino Religioso – pequeno histórico .............................................................................. 92
4 A UTOPIA ENCARNADA OU A LIBERTAÇÃO EM PROCESSO? .... 95
Os Movimentos na Paróquia do Rosário e São Benedito na década em estudo ................. 102
O Centro Burnier Fé e Justiça......................................................................................... 103
Dois personagens. ............................................................................................................... 105
Padre Jacob Teodoro Weber ........................................................................................... 106
Dom Bonifácio Piccinini ................................................................................................ 107
14
EPÍLOGO ........................................................................................................ 110
REFERÊNCIAS .............................................................................................. 113
Apêndice I ........................................................................................................ 118
CLARIFICAÇÃO SOBRE OS TERMOS COMUMENTE USADOS .............................. 118
Apêndice II ....................................................................................................... 119
A FENOMENOLOGIA APLICADA NESTE TRABALHO, ........................................... 119
O QUE É E QUANDO SURGIU? ..................................................................................... 119
Apêndice III ..................................................................................................... 127
CONDENSAÇÃO DO LIVRO TOMBO DA PARÓQUIA DO ROSÁRIO E SÃO
BENEDITO - Arquidiocese de Cuiabá: 14 de Maio de 1945 a Junho 1989.......................127
127
15
1 INTRODUÇÃO
A presente dissertação de Mestrado, de perfil analítico-compreensivo, foi construída
no âmbito do Curso de Mestrado do Programa de Pós-Graduação em Educação, do Instituto
de Educação, da Universidade Federal de Mato Grosso, na área de concentração ”Educação,
Cultura e Sociedade”. A temática é conseqüência de um desafio lançado por meu orientador,
professor Doutor Luiz Augusto Passos, que se centra em uma pergunta: Os Movimentos
Sociais desencadeados na Paróquia de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito, de Cuiabá,
na década de 80, se constituíam em uma proposta de educação popular potencializadora de
libertação? Na tentativa de responder a esta pergunta, ancorei o presente trabalho nos
meandros da intencionalidade fenomenológica merleaupontyana - na qual procurei um
conhecimento mais compreensivos dos “mundos-vida, das limitações, das possibilidades e das
significações dadas a um mundo cheio de tragédias” que se encontravam encravados na
Paróquia em estudo (MARTINS, 1992, p.29). Aliado aos encantos da fenomenologia como
orientação da pesquisa escolhida, houve um esforço em conduzir este trabalho dentro do que
preconiza a pesquisa qualitativa BOGDAN (1994), BARBIER (1985; 2004) e THIOLLENT
(2007), pois entendi que este é um caminho possibilitador de acesso às veredas que tentei
abrir, buscando compreender esses processos vivenciados, no espaço-tempo circunscrito da
Paróquia. Embora me ampare em Merleau-Ponty, entendo por bem enunciar que, a partir dele,
aceitei a interlocução com outras correntes e ferramentas que melhor contribuíssem para uma
compreensão fenomenológica. Esse diálogo tem por finalidade clarificar pontos de
confluência ou, eventualmente, atritos de idéias e interpretações. Dialogo com outros autores
como, por exemplo, Gramsci, com o qual procuro estabelecer pontes com seu conceito de
intelectual orgânico, portanto, utilizo este conceito como categoria auxiliar à interpretação
porque facilita o adensamento da formulação de questões expostas no relato desta pesquisa.
Idêntico expediente é utilizado com autores de orientação freireana - Streck, Brandão, Gadotti
- e autores da teologia da Libertação, com maior destaque para Boff, Gutierrez e Galilea, na
medida em que forem demandados na exposição do trabalho. Desejando estabelecer uma
direção, procurei pistas que me elucidassem sobre o significado e o conceito de Movimento
16
Social (notadamente na década de 80) e como devo entendê-lo, para o desenvolvimento desta
pesquisa. Ilse Scherer-Warren (2005, p.10), ao analisar a idéia de rede, se expressa da
seguinte forma sobre os Movimentos Sociais:
Enfim, trata-se de buscar os significados dos movimentos sociais num mundo que se
apresenta cada vez mais interdependente, intercomunicativo, no qual surge um
número cada vez maior de movimentos de caráter transnacional, como os de direitos
humanos, pela paz, ecologistas, feministas, étnicos e outros.
Para sentir-me mais seguro, procurei apoio também em Maria da Glória Gohn (2002,
p. 379-383), notadamente quando se refere ao mesmo assunto e considera-os, em minha
opinião, sem entrar em choque com SCHERER-WARREN, como movimentos de caráter
nacional, classificando-os como: Movimentos pela Redemocratização do país, (1972-1984),
Movimento Feminista (1975-1982) ou o das “Diretas Já” (1984), Movimentos Sociais
populares urbanos, rurais, sindicais, estudantis e outros, inclusive Movimentos Sociais
Internacionais, como o Greenpeace, na condição de movimento ecológico. Como Scherer-
Warren (2005, p.18), afirma que “Não há, todavia, um acordo sobre o conceito de movimento
social”, preferi, então, acompanhar Gohn, pois comungo com seu pensamento sobre
definição/ conceituação de movimento social quando diz:
Desde logo recusamo-nos a reconhecer a existência, a priori, de uma definição ou
conceituação geral, única e universal, pelo fato de esta definição variar segundo os
paradigmas teórico-metodológicos que embasam a análise do autor. Entretanto, é
possível localizar dentro de cada teoria de um dado paradigma qual a concepção que
se está utilizando de movimento social (GOHN, p. 244-245).
Procurando manter-me fiel, no que for possível conciliar à posição destas autoras, e
sem me deter no exame de concepções teóricas, atendo-me às ações que pesquisei, pois desejo
explicitar exatamente a que me reporto quando me refiro a “Movimentos Populares”.
Busquei, então, conhecer o que pensa Frei Beto, citado por Brandão (2003)
1
. Aprendi que
esse tipo de movimento refere-se àquele que congrega e mobiliza o mundo popular
(assalariados, desempregados, excluídos e marginalizados), portanto, movimentos de
conquista de direitos, de resistência, de protesto. Sendo assim, quando me reportar a
determinados Movimentos Sociais, que até poderão estar relacionados aos sujeitos múltiplos
1
Citação em nota de rodapé, em Soletrar a letra P: Povo, Popular, Partido e Política, apud FÁVERO Osmar,
SEMERARO, Giovanni (Orgs.). 2003.
17
citados por Scherer-Warren (2005, p.17) - movimentos urbanos, Cebs, de luta pela terra, pela
moradia, das mulheres, ecológicos, de grupos de jovens, de sindicatos, de defesa dos direitos
humanos e de defesa étnica e outros, ou até de ONGs - não me refiro às Organizações Não
Governamentais que representam as Fundações ou os grandes grupos internacionais ligados a
interesses de mercado, mas sim àquelas que, dentro da nova realidade dos movimentos
sociais, articulam-se com os movimentos referidos e subsidiários ao grande movimento de
construção, autonomia e emancipação dos setores empobrecidos faço alusão, então, àquele
tipo de Movimento citado por Frei Beto e relacionado à conquista de direitos, de resistência,
de protesto, ou seja, dentro da categoria de Movimento Social de caráter popular, cuja
identidade penso ter encontrado eco nos movimentos sociais ligados à Paróquia de Nossa
Senhora do Rosário e S. Benedito de Cuiabá, Mato Grosso, objeto deste trabalho. Assim
sendo, enfatizo, ao fazer menção a ONGS, acompanho Scherer-Warren (2005, p. 23), pois me
refiro às organizações sociais específicas, fragmentadas, organizadas pelos movimentos
populares, que se articulam em redes de movimentos que, embora não sendo movimento
social, comungam com a idéia de Movimento Social e estão representadas por grupos
organizados, tais como cooperativas etc. e que trabalham em função de demandas específicas
e voltadas à afirmação de setores populares. Ao mencionar o termo “Educação Popular”,
acompanho o que preconiza NUNÊZ-HURTADO (1992, p.64), ao defini-la como um
“Processo de formação e capacitação dentro de uma perspectiva política de classe para
alcançar o objetivo de construir uma sociedade nova, de acordo com seus interesses”. Sob a
ótica de procurar alcançar objetivos, perseguida pelos Movimentos Sociais e pensando na
intercomunicabilidade das experiências e nas práxis relativas ao estilo de ações ocorridas na
territorialidade rosário-beneditina, a mim ficou evidente que, entre os vários Movimentos
Sociais citados, por sua peculiaridade, tornou-se oportuno e relevante destacar dois
interessantes trabalhos: - O Ecumenismo e o Ensino Religioso - consignados no Livro Tombo,
às páginas 64 e 73, respectivamente, aos quais, na intenção de provocar uma reflexão, dedico
uma exposição maior. Ao visitar Paulo Freire para procurar compreender o universo da sua
Pedagogia do Oprimido e a sua Pedagogia da Esperança e visando estabelecer diálogo com
os movimentos sociais do Rosário, quis saber se estas obras freireanas colaboraram nos
exercícios de compreensão das definições de liberação e libertação. Foi então que tive a grata
surpresa de sentir que também aí se bebe, sedento, nas fontes da “perspectiva dialética
fenomenológica” (STRECK; REDIN; ZITKOSKI, 2008, p.20). Foram estas fontes que,
merleaupontyanamente, tanto desafiaram este pesquisador, na construção desta dissertação.
No diálogo com Geertz, etnograficamente, a referência consistiu em buscar perceber que tipo
18
de ões existiu anteriormente na comunidade estudada para poder fazer, a partir do que este
autor preconiza como descrição densa, a escolha dos sentidos mais relevantes dentro da
proposta que nucleou o cotidiano daqueles que tomaram parte nos trabalhos, nos Movimentos
e Organizações situados no período pesquisado, na Igreja do Rosário. Procurei interpretar
como essas propostas se circunscreveram nos sentidos macros, ou de uma estrutura maior e
dinâmica, e busquei verificar se lhes foi atribuído um sistema de referências. Na tarefa de
modelar a argumentação da pergunta central e para melhor respondê-la, além de Maurice
Merleau-Ponty, conversei com outros autores que se inspiram na fenomenologia - Martins,
Rezende, Do Carmo - para, assim, dar melhor embasamento à pergunta e às significações dos
próprios atores sociais envolvidos no processo, o que possibilitaria identificar, como me
propus nesta pesquisa, se os Movimentos Sociais na Paróquia em estudo, na década de
oitenta, praticaram ações propiciadoras de uma educação popular potencializadora de
Libertação. A partir destas e de outras leituras e desafios, embora ainda meio atordoado, senti-
me encorajado a admitir que, quando me propus a realizar esta pesquisa e estudar uma das
mediações ligadas aos Movimentos Sociais capitaneado por Igrejas, não esperava que o
assunto fosse tão complexo, amplo e palpitante.
Para iniciar a pesquisa, a bússola foi buscada em Barbier (1985 e 2004) para, assim,
navegar com segurança a partir do que ele preconiza como Pesquisa Ação. Partindo da
“Escuta Sensível”,
2
procurei saber escutar e saber ver para compreender as atitudes e
comportamentos do outro, suas idéias, seus símbolos, seus mitos. Tentei não emitir opiniões,
todavia, ofereci respostas compreensivas (Idem, p.92-93), pretendendo atribuir sentido aos
dados coletados. A partir de então, busquei saber se o investimento educativo - aqui
concebido como a capacidade de fazer mudanças - não só dando o saber, mas acolhendo o dos
outros (Idem, p.124), tornou possível perceber se, nas várias ações desencadeadas na
Freguesia pesquisada - Freguesia entendida aqui, rigorosamente, como o distrito de uma
Paróquia - houve realmente um caráter político-revolucionário, ou seja, se foram introduzidos
novos processos nos modos de ser e estar social naquela territorialidade. E, ao inquirir se,
entre as rias atividades que integram os Movimentos Sociais, seu investimento educativo
com proposta de mudanças teve um caráter dialético, isto é, se originaram novas formas de
libertação e ou desaguaram em outros sistemas de formação dinâmicos e fiéis a outras
2
Utilizo aqui o conceito de “Escuta Sensível” para, apoiando-me na empatia, procurar sentir o universo afetivo,
imaginário e cognitivo do outro para “compreender do interior” as atitudes e os comportamentos, o sistema de
idéias, de valores, de símbolos e de mitos (ou a “existencialidade interna”), na minha linguagem. (BARBIER,
2004, p 93-94).
19
historicidades e temporalidades - como, por exemplo, a Pedagogia do Oprimido, de Freire -
recorri a Fischer (apud BARBIER, 1985, p. 23), com o qual concordo ao afirmar que: “O
homem não nasce dialético, torna-se dialético”. Para complementar meu argumento, apoiei-
me em Zitkoski (2008) quando, ao comentar sobre a originalidade de Freire na elaboração de
uma nova visão epistemológica do conhecimento, assinala
“... nova visão epistemológica a partir da produção do conhecimento de forma
dialógica, intersubjetiva e dialeticamente aberta para o dinamismo da vida, a
diferença e o inédito viável, além de inspirar profundas inovações na visão política e
ética dos problemas que desafiam o mundo atual” (
ZITKOSKI, p.
128).
A partir daí, procurei saber, dentro das situações limites que aparecem na pesquisa,
se esse investimento educativo pôde tornar-se dialético. Ora, nesta pesquisa, o campo para
despertar a dialeticidade é o ir às coisas mesmas (HUSSERL. 1985), MERLEAU-PONTY
(2006). Assim sendo e como, neste trabalho, busco o significado da concepção
fenomenológica dialética, servi-me de NUNÊZ-HURTADO (1993, p.8) que afirma:
Uma concepção metodológica dialética é precisamente uma forma coerente de
entender e interpretar o mundo dentro de uma perspectiva dialética, entendida como
um sistema de pensamento que incorpora as suas contribuições científicas para os
processos históricos de transformação, com uma forma de conhecer, interpretar e
transformar a realidade objetiva, cientificamente.
Sendo assim, tive que mergulhar nos acontecimentos. Desejei olhar para uma
temporalidade na qual Passos entende que as dimensões de conflito, de luta, de alegria, de
páscoa, foram vividas nas necessidades extremas, no salvar a vida ameaçada e na qual,
festivamente, na comunhão e na solidariedade, não como estratégia ou de uso, mas de
sobrevivência, houve a necessidade de tomar posições. Então, foi muito importante saber
escutar os gritos silenciosos do fenômeno que pretendi abordar. Com a ajuda de Martins
(1992. p. 55), esforcei-me para dar voz e vez aos conflitos irrompidos no tempo e na
espacialidade do território da Paróquia de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito, de
Cuiabá, Mato Grosso, na década de oitenta. Para que isto acontecesse, tive que, como numa
viagem ao Túnel do Tempo, visitar essas temporalidades, e nesse empreendimento, exercitar-
me na experiência de ouvir os atores, que a muito custo consegui encontrar para, através dos
seus testemunhos gravados em entrevistas, fazer as releituras do que disseram ter realizado
em outra temporalidade, e então, em confronto com a atual, revisitar, reinterpretar e
20
ressemantizar o que lá havia ocorrido, evitando macular a originalidade daquelas partilhas. E
é nesse entrecruzamento ou intersecção de espaço e de tempo que se tem a impressão de que
termina um mundo e começa outro, novo (WESTHELLE, 2008). É ali, repito, que encontrei
atores de diversas procedências ideológicas e com posições definidas, sendo alguns deles
sociólogos, militantes políticos, agentes de pastoral, e, segundo depoimentos, uma grande
parte deles comprometidos com a Teologia da Libertação, e outros, consorciados com
algumas das ações alinhadas com muitas outras perspectivas marxistas. Na coleta dos dados,
das informações e significações das situações, tentei não ser induzido pelas distorções e ou
interferências que poderiam estar embutidas em uma entrevista, possivelmente carregada de
subjetividades do entrevistado.
Como Thiollent (2007, p.31) ensina, “não pesquisa sem raciocínio”, nesse
exercício, percebi, ao analisar as situações, tanto nas ações como nas entrevistas, muitas
opiniões conflitivas, das quais inicialmente destaco as daqueles que seguiam a linha do Geral
da Companhia de Jesus, à época Reverendíssimo Prepósito Geral, Pe. Pedro Arrupe s.j., com
sua grande discussão entendendo a referida Companhia como missão específica de cuidar dos
pobres; e a de outros, propondo uma formação mais voltada para as lides paroquiais,
afastando-se, portanto, das atuações nos grandes Estabelecimentos de Ensino, ou daqueles
preocupados com a páscoa dos deserdados da sorte, ou a bifurcação de orientações entre a
CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) e a Arquidiocese local, como veremos
mais adiante. Some-se a isso, ainda, o status quo desembestado pela Ditadura Militar que
estimulava reações. E que reações. Nesse caldeirão de idéias, que exigia uma tomada de
posições, algumas entrevistas mostram opiniões que foram contestadas por outros critérios de
interpretação afirmativa. Na coleta de informações no Livro Tombo e em depoimentos que
pedem privacidade, percebi que atores externos, alguns dos quais serão nominados mais
adiante, eram tidos como referência, uns mais, outros menos explícitos, e transitavam por um
espaço propício ou pelo campo, onde puderam semear grãos de utopias com a
intencionalidade de provocar discussões que se abeirassem o máximo possível das fontes das
verdades em que acreditavam. Segundo um entrevistado (gravação 6 Carlos Cezar), tal
abeiramento surgia nas clarificações ocorridas nas reuniões do Conselho Paroquial, nas
missas e nas homilias, notadamente em um destes espaços, no Bairro Cabeça de Boi, onde,
para evitar o enfrentamento com as forças repressivas, um dos padres da paróquia realizou
uma celebração que se prolongou por sete horas, entremeadas por muitos batismos, para que o
período previsto no mandato judicial para o despejo, naquele dia, se esgotasse. Portanto, a
21
metodologia presente nos enredos das festas, nas palestras realizadas, nas hortas comunitárias,
nas reuniões do Conselho Paroquial, nos atos públicos, nas comemorações, nos sacramentos,
nas ações sociais, nas denúncias de ações contra os direitos humanos, enfim, nas ações
educativas encetadas naquele território considerado por muitos como um chão sagrado, foi a
de militância mesmo, mais concentrada nas ações, e voltada para pessoas concretas. Ora, esse
tipo de práticas, somadas a outras, segundo o que entendi, é o que se pode chamar de setas
indicativas sobre como iniciar um processo propiciador à abertura de profundos sulcos em
consciências oprimidas e desejosas de transformá-las em terrenos férteis. Sendo assim,
permito-me pensar que, no intuito de implantar as sementes de cidadania, de criação de uma
ética de situação, tornou-se justificável o rito religioso a serviço da vida palpitante das pessoas
que ali estavam. Se, no despertamento para as realidades é que se potencializam os estímulos
que acordam as consciências adormecidas, o que se deseja saber é: as articulações dos
Movimentos Sociais registradas no Livro Tombo tiveram realmente a finalidade consciente de
intensificar uma educação popular potencializadora de Libertação?
Período de incertezas
A pesquisa desenvolve-se em um período que, como reflexo das ações repressivas da
Ditadura Militar, foi considerado como um período de incertezas, o qual estendeu sua
influência até sobre as linhas de direção da Igreja Católica no Brasil, e notadamente na
florescente CNBB - Conferência Nacional dos Bispos do Brasil- capitaneada por Dom Hélder
Câmara. Detectamos que, à época, em Cuiabá, foi criada uma representação social acerca da
existência de uma incógnita denominada “regional zero”. Segundo um depoente, este fato
ensejou uma bifurcação de orientações, ou seja, enquanto a Paróquia do Rosário e São
Benedito, por vezes em certo atrito com a Igreja local, divulgava documentos que emanavam
as orientações da CNBB, reforçando a legitimação de suas práticas a partir dos documentos
oficiais da CNBB, com sua Comissão Episcopal de Pastoral (CEP) e uma secretaria geral
progressista, tendo à frente D. Luciano Mendes de Almeida (e mais tarde, D. Celso Queiroz),
a Arquidiocese de Cuiabá seguia aberta e proclamadamente as orientações afinadas com D.
Eugênio Salles, então líder de um setor importante da Igreja conservadora, representada pela
Arquidiocese do Rio de Janeiro. Acompanhava Dom Eugênio Salles uma tendência de bispos
que, após alguns anos, conseguiu maioria na representação da CEP, tornando, portanto, a
mesma CNBB mais conservadora.
22
Chamou-me a atenção quando, analisando detidamente o Livro Tombo, nos
depoimentos e entrevistas, me pareceu ficar claro que a Paróquia do Rosário e São Benedito,
embora enfrentando reticências da hierarquia eclesiástica, sempre desenvolveu ações que,
num período atípico, demonstraram uma autonomia incomum e tão ao sabor dos atos
característicos aos de uma “Prelazia Pessoal
3
”. Intrigado, fui buscar o depoimento de Dom
Bonifácio Piccinini, então Arcebispo Metropolitano, e hoje Arcebispo Emérito, que destacou
o seguinte:
Como Pastor, devo respeitar os carismas e as possibilidades apresentadas pelos
Agentes de Pastoral, pois todo batizado tem em si o Espírito Santo que o ilumina e o
conduz dentro de uma consciência para a realização do Reino de Deus. Daí o
cristão ter o direito e o dever de ser político no sentido de ser germe na maioria das
questões. Enquanto não houve gravidade, não interferi ou proibi (Entrevista,
Outubro, 2008).
Esta compreensão daquele momento histórico pode nos levar a pensar que o campo
ficou aberto, dentro da Diocese, para que algumas das ações de missionários militantes
4
(hoje,
nem todos presentes na Paróquia) à época, inspirassem a criação de novas significações às
ações então existentes e instituíssem uma práxis que possibilitou maior associação entre as
múltiplas e conflitivas opiniões, entre os diversos trabalhos paroquiais e os movimentos
sociais daquele território. Os dados das entrevistas começaram a mostrar que o esforço para
romper com situações limites, tentando a construção de um mundo novo, teve na zanga, na
denúncia, na rebeldia mesmo, a busca da transcendência e da reinvenção do agir e do “pensar
esperançoso” alimentado pelo binômio da unidade dialética da práxis, ou seja, o do saber,
fazer, saber avaliar e fazer de novo e que então procurava se expressar criando novos
significados, dizendo “sua palavra”. Os dados e as entrevistas vão demonstrar um início e um
ensaio sobre a genuína aplicabilidade do que Freire chamaria de “inédito-viável” (STREK,
2008).
3
Figura jurídica que descreve a condição de autonomia administrativa e operativa da Ordem Beneditina.
4
Eudson de Castro Ferreira; Lúcio Libânio de Souza (Nonô); Irmã Dineva Vanuzzi; Felinto Ribeiro Neto; Profª
Drª Artemis Torres; Dona Nair Francisco de Souza (Bairro Planalto); Inácio Werner; Edna Amaral, do Leblon;
Benedito da Silva, o Dito do Bairro Canjica, Dona Adelaide, do Pedregal; Nildes Magalhães do Rosário, Dalva e
José Maria Rodrigues, da Lixeira; Seu Antonio, do Carumbé; Enelinda Scalla ex-vereadora do PT; João
Monlevade; Glorinha Albuez; Valdir e Dora Bertúlio; Lúcia Palma; Sr. Armandinho de Rosário Oeste e um
número quase infindo de pessoas. Entre os contatos com a Igreja, os pastores da IECLB Igreja Evangélica de
Confissão Luterana no Brasil, Arteno Spellmeyer; Teobaldo Franz; Hans Trein; Geraldo Sach e os membros da
Igreja Dieter Metzner; Vilmar Schrader; Íris Pedrotti, José Antonio da Silva, Maria Maglori, Maria Jorgina e
tantos outros. Muito importante, na época, o Diretório Central dos Estudantes e a Associação Mato-grossense de
Estudantes e um significativo número de pessoas ligadas ao movimento estudantil. De outro lado, D. Pedro
Casaldáliga e agentes de pastoral da prelazia; D. Tomás Balduino, em Goiás; D. Máximo Biénnes, em Cáceres;
D. Fernando, em Goiânia; D.Osório Stoffels, em Rondonópolis e outros.
23
É importante salientar que a Paróquia do Rosário e São Benedito, ao assistir, em sua
territorialidade, a um aumento de aterrissagens e ou de desabrochar de vários Movimentos
Sociais de emancipação humana no final da década de setenta e início da década de oitenta,
acentua a mobilização de vários recursos para enfrentar os efeitos e as repercussões
provocadas em sua jurisdição. Para tal mister, sempre imprimiu um atento acompanhamento,
com uma orientação metodológica sistemática e, claro, ensejando ações práticas pelos jesuítas
daquela comunidade. Consultando o Livro Tombo, fica evidente que, para enfrentar os
desafios da década de oitenta, houve a necessidade de uma rearticulação total nos movimentos
daquele território, inclusive com a entrada em cena de novos atores - notadamente padres -
que vieram para somar esforços, levantar novas bandeiras e ou acrescentar uma nova
oxigenação às ações nos movimentos sociais ali existentes. Por razões práticas e estratégicas,
a prudência recomendou-lhes a criação de uma rede de articulação com outras entidades e ou
movimentos similares, a fim de garantirem algo como um “guarda-chuva” e a busca de
proteção externa contra o arbítrio, os desmandos e a violência institucional.
É nesse contexto que o efeito de tal trabalho repercutiu e ainda repercute nas
referências a esta paróquia. O fato marcante é o de que, quando novos leigos e novos
sacerdotes chegaram a Cuiabá, a partir do final de 1979, eles contribuíram com um estilo de
militância estribada por experiências em movimentos político-sindicais, semelhante às
realizadas por ocasião de inserções, tais como as de operários da metalurgia no ABC paulista
e ou em movimentos de ação política. Foi desenvolvido, na territorialidade do Rosário, um
eficiente trabalho social com práticas amparadas na Teologia da Libertação, marcadamente
inspiradas na doutrina social da igreja e em diálogo com concepções histórico-dialéticas, com
as quais a referida Teologia comungava, permitindo-lhe dialogar com a visão crítico-social da
economia capitalista realizada pelo marxismo. Naquele período, com ardor renovado, através
da conscientização de direitos e obrigações, eles instituíram novas práticas de libertação, se
bem o entendemos, partindo das contradições encontradas e mais centradas nos aspectos
estruturais e na perspectiva de quando se “analisa questões da reprodução da força de
trabalho, do consumo coletivo, da importância estratégica dos movimentos para mudanças no
próprio Estado capitalista e etc.” (GOHN, 2002, p. 282). É deste lugar que consegui perceber
o alvoroço ocorrido naquele tempo e espaço em um período de ditadura militar, com uma
igreja conservadora e burocratizada nos movimentos de recuperação com certa participação
de massa, dentro de uma perspectiva de aliança com os setores que utilizavam
espiritualidades, que legitimavam uma vida de fé, intrapessoal e de consciência intimista.
24
Existiam até alguns movimentos sem envolvimento com as questões sociais, como, por
exemplo, os cursilhos de cristandade e o movimento de juventude que grassava naquele
momento com bandeiras moralistas, mas sem a crítica e a intervenção que existiam antes, na
chamada Ação Católica.
Tanto os entrevistados como o próprio Livro Tombo são unânimes ao afirmar que, a
partir da chegada de novos sacerdotes, com seu trabalho em colegiado e introduzindo novas
reformulações nas práticas de incentivo às comunidades excluídas, alvoreceu um esperançoso
despertamento e emergiu um novo ardor que gerava uma consciência crítica, então, criadora
de práticas libertadoras, sistematizadas dentro de uma realidade social, com conseqüências
tanto no campo político, seja dando apoio e estímulo à criação do PT - Partido dos
Trabalhadores (junho, 1981, p. 64), ou no campo social, com a ativa participação na fundação
do CDHHT Centro de Direitos Humanos Henrique Trindade (LIVRO TOMBO, Abril,
1982, p. 70) ou nos eventos e ocasiões especiais em que, para causar melhor impacto, contou
com as presenças de Hélio Bicudo, Dalmo Dallari, Dom Luciano Mendes de Almeida, e os
jesuítas padres assessores eventuais, Albano Trinks, José Ivo Follmann, Pe. Antonio Abreu e
Thierry, do IBRADES) e Quirino Weber, João Batista Libânio, Francisco de Assis Taborda; e
a presença dos Provinciais Paulo Englert, João Rohr, Padre Ivo Weber, representantes
institucional da Província dos Jesuítas da Província Meridional – notadamente durante a
Semana dos Direitos Humanos, realizada a partir de 19.06.19 (idem, p.71), ou na dimensão
Educacional Libertadora, com a inauguração da Escola Fé e Alegria (idem, Março de 1982 p.
67). Acrescente-se o estímulo na organização do Movimento de Defesa dos Favelados que
assumia o acompanhamento das ocupações de terras na periferia, a organização de
representação mato-grossense na Articulação Nacional de Apoio aos Movimentos Populares e
Sindicais (ANAMPOS); a articulação local do Movimento Popular de Saúde (MOPS-MT) e a
articulação do Grupo de União e Consciência Negra (LIVRO TOMBO, 1984, p.72), e a nova
modelagem nas Festas de São Benedito, agora com a efetiva prática da mística negra, popular
e libertadora deste santo (Idem, Junho de 1981, p. 64). Outras ações desencadeadas que se
destacaram foram: a Criação do Primeiro Conselho Paroquial (Idem, Janeiro de 1981 p.62), a
organização do Conselho Administrativo da Paróquia, a elaboração do Plano de Pastoral, a
inauguração de um jornalzinho de comunicação com as comunidades de Base da Paróquia do
Rosário, intitulado “O Rosarinho” e as reuniões de Saúde e de Horta Comunitária nos bairros
(Idem, p.63). Outras tantas iniciativas foram se acumulando, por vezes, contínuas, outras
vezes, temporárias, sempre em respostas a situações demandadas. A partir do que
25
pesquisamos, estes movimentos parecem estar enunciando uma intencionalidade, ou seja,
foram emergindo paulatinamente e caminhando claramente para desembocar em uma
educação popular potencializadora de Libertação, aparentemente sem perder o foco. Nas
informações posteriores, percebe-se que, desde a década de 1970, na Paróquia em estudo,
sentia-se a necessidade da criação de um órgão centralizador de orientações e formação. Na
seqüência dos acontecimentos, embora em gestação desde a década de setenta e oitenta, a
partir do ano 2000, acontecerá a materialização de um centro coordenador, o Centro Burnier
Fé e Justiça, atual centro das orientações sociais, que emerge e está encravado no território da
Paróquia do Rosário e São Benedito, sobre cujas ações reservaremos capítulo à parte.
No campo polêmico do Ensino Religioso, o Livro Tombo mostra que, com o padre
José Ivo Hoffmann, houve um apoio expressivo à implantação da referida disciplina no
sistema público de Ensino do Estado de Mato Grosso. Tratava-se de trazer à rede pública
novos significados a esse Ensino, o qual se fazia artesanalmente e de maneira confessional,
sem um enfoque ecumênico ou possibilitador de libertação. Havia um avanço no que se
referia às antigas posturas proselitistas na pedagogia desse ensino. Também na Dimensão
Ecumênica, que sonha com a diversidade reconciliada, foi praticada uma excepcional abertura
de espaços para que pastores evangélicos colaborassem ativamente com as várias ações ético-
religioso-libertadoras ali desencadeadas, divulgando assim pontos de uma prática humanista,
libertadora e de reconhecimento das diferenças entre as confissões religiosas e que, então,
juntas, somavam esforços. Embora não se refira à Igreja do Rosário, com efeito, vejamos este
registro: “Um padre católico confessava que tinha mais comunhão eclesial com os luteranos
do que com seu bispo “católico”. (SILVA, 2005, p. 34). Não veja este relato como um
anarquismo ou uma contra pedagogia, e sim como a arte de um recado muito forte. O Livro
Tombo, ao registrar a realização de vários atos ecumênicos, informa que a Semana de Oração
pela Unidade dos Cristãos, que em 2008 completou 100 anos de existência, e que inexistia em
Cuiabá, começou a ser praticada, pioneiramente, na Paróquia do Rosário, a partir de 1988
(LIVRO TOMBO, p.78-88). É interessante ressaltar que os trabalhos da Pastoral de Saúde,
com sua Semana de Lutas pela Saúde (Idem, p.75), baseada na homeopatia ou em outras
práticas de saúde, tiveram, pelo seu alcance comunitário, um caráter macro-ecumênico
efetivo. Alcance, ainda hoje, obtido por um amplo raio de atuação e aceitação, percebidos na
criação do IPESP Instituto Pastoral de Educação Popular e Saúde (1986) e, posteriormente,
da ABHP - Associação Brasileira de Homeopatia Popular (1996), como desdobramento destas
mesmas ações de Educação e Saúde Popular.
26
As várias experiências
Notamos que o Livro Tombo registra, com certa insistência, várias experiências, tais
como as de fatos relacionados aos problemas nos assentamentos, dificuldades de diálogo com
o Presidente da COHAB (Companhia Habitacional) que provocaram representações de
Comunidades junto à referida Instituição e ao Exmo. Sr. Governador do Estado (LIVRO
TOMBO, p. 62) e outras. Por ocasião dos assentamentos, nas áreas de ocupação, à época
oportunizada pelo inchamento da cidade e resultante da expulsão dos trabalhadores do campo,
em virtude de sua mecanização, começaram a aparecer nos novos bairros lutas por novas
bandeiras, notadamente aquelas relacionadas com a carência de infra-estrutura, de energia, de
escolas, transportes, Igrejas, água etc. Alguns fatos, como veremos adiante, tiveram
desdobramentos que ultrapassaram as fronteiras nacionais, que mostravam seu caráter de luta
contra a arbitrariedade, a exclusão e a negação de direitos, mormente os provenientes da ação
autoritária do Estado (mortes, desaparecimentos, prisões etc). Isso demonstra que os
movimentos sociais em efervescência, na territorialidade da Paróquia do Rosário e São
Benedito, tiveram também forte expressão nos atos de apoio contra a ditadura militar e na luta
pela democracia que, ainda hoje, se processa.
A pesquisa verificou que o centro de inspiração do pensamento pedagógico ali
praticado foi o educador Paulo Freire e teólogos brasileiros e latino-americanos, simpatizantes
ou referenciados pela Teologia da Libertação (Livro Tombo, p. 67, 76). Na seqüência deste
trabalho, para clarificar melhor, concordo com Castoriadis (apud, BARBIER, 1985, p. 79-81),
quando diz que “uma formação histórica tem um magma de significações imaginárias sociais”
e que “as conexões mais importantes não estão onde os participantes pensam explicitamente
que elas se situam”, pois notei que é no espaço social e no tempo social” que a pesquisa
procura sedimentar-se, e tive que me estribar sobre as noções que introduzem as diferenças, a
fim de que, afastando-me do que parece ser o impossível utopia pudesse, então, se não
alcançar, ao menos chegar o mais próximo daquilo que foi o realizável para aqueles atores.
Ao respeitar a diversidade de origens daqueles personagens, procurei reviver, ao seu modo, as
emoções dos seus privilegiados momentos de libertação, tão caros a este pequeno estudo.
Uma constatação ficou evidente: se, por um lado, os que assumiram a frente de uma
contestação, permitiram aos movimentos uma autogestão de fato, a aparente ausência de um
poder decisório central, para mim pareceu claro que ela, justamente aí, esteve dissimulada por
27
uma gestão de não diretividade, possibilitando, assim, maior espaço para o incentivo à
criatividade nos responsáveis pela condução das ações político-sócio-educativas a que os
Movimentos Sociais se propunham. O resultado obtido através desse tipo de gestão evidencia
que aquele estilo de práticas, capitaneadas efetivamente por lideranças oriundas da paróquia
em estudo, além de conseguirem aglutinar com sucesso os diversos agentes pastorais da Igreja
do Rosário e São Benedito de Cuiabá, à época um útero grávido de explosivas situações
sócio-econômico-político-religiosas, conseguiu também fazer desse território um laboratório
fértil para as ousadias políticas tão marcantes e tão características da histórica mística
jesuítica.
É por isso que, no hoje distante do ontem de agora, observando atentamente essa
história, vista de baixo, para perceber o silencioso grito dos deserdados da sorte. Ainda dá
para escutar o berro do rebento Paiaguá imitando o Sepé Tiaraju, alertando a todos de que
“Esta terra tem dono!”. Foi na acolhida das timas de perseguição e vazada nos seguintes
termos: “qualquer pessoa ou grupo ameaçado, primeiro apoiamos e defendemos, depois
discutiremos quem tem razão”, é que a Pastoral do Rosário se escudou. É também por isso
que muitos dos atores que formavam uma grande frente de atuação na Paróquia do Rosário,
como militantes políticos ou de movimentos sociais, fossem eles padres ou leigos, jovens e
adolescentes, pessoas recém-anistiadas ou na clandestinidade, oriundos de diferentes filiações
aos setores da então esquerda brasileira, perseguidos políticos, se engajaram nas ações
educacionais, sociais e políticas de todos os movimentos que se organizavam no território
paroquial em estudo. E os que o fizeram, assim agiram por que estavam embebidos pela
atmosfera do transgredir as fronteiras de um círculo vicioso que precisava ser rompido através
de novas significações e que tinham por fito a democracia e a liberdade. Não havia outra
chance para garantir a vida.
Na seqüência da pesquisa, está evidente que um conjunto de pessoas, além das
citadas acima, apesar de não militarem nem residirem em Cuiabá, por aqui também irradiaram
suas ações e idéias. Muitas delas até serviram de referências a algumas das ações pastorais e
político-educacionais realizadas no território da Igreja do Rosário e São Benedito. Todavia,
percebe-se que, apesar disso, não havia unidade de orientações. Até porque o que ali estava
em processo era um arco de alianças entre concepções políticas e pedagógicas distintas.
Dentre essas pessoas de referência, consta que algumas, significativas na teologia da
Libertação, respeitavam o trabalho que se realizava no Rosário, mas havia posições distintas,
do ponto de vista estratégico e político. Até onde pude pesquisar, a leitura nos diz que a
28
colaboração se dava entre os movimentos de luta pela terra no Araguaia em
complementaridade com ações na periferia e na Igreja de Cuiabá. Havia trocas de
informações, debates, soma em todas as situações que envolvessem pessoas, comunidades,
risco de vida para os líderes, denúncia e divulgação de fatos na imprensa. Mas não havia
identidade política nem homogeneidade. As diferenças estavam postas entre o que se seguia
no Araguaia e as visões que em Cuiabá dirigiam os processos: no Araguaia, o PMDB,
(Partido do Movimento Democrático Brasileiro) na institucionalidade, servia como
balizamento para as ações de construção da democracia; na igreja do Rosário, havia uma clara
opção pelo PT (Partido dos Trabalhadores), ainda em construção, que era apenas um
movimento e não ainda um partido – após 1981, somente – e, portanto, tinha um papel
instituinte, não instituído, o que ocorreu muito mais tarde. Um depoente entende que estas
diferenças faziam-se sentir nas prioridades, na concepção de direção política, na relativização,
sobretudo nos primeiros tempos, em que o PT era um partido de quadros e não pretendia ser
um partido de massas institucional. O PT não tinha, de início uma moldura de partido
eleitoral e o PMDB desenvolvia sua ação em base da institucionalidade, com sucesso, aliás,
no Araguaia, onde várias prefeituras foram conquistadas por militantes que tinham atuações
ligadas à pastoral” (PASSOS, In: orientação).
Registro que, quando me refiro a pessoas que irradiaram idéias ou foram referências
junto à Paróquia do Rosário, penso, por exemplo, em sua Excelência, o Sr. Bispo da Prelazia
de São Felix do Araguaia, D. Pedro Casaldáliga, bem como em outras personalidades que
serão citadas. que, para mim, como disse, essas pessoas não interferiam diretamente no
que estava em curso na Igreja do Rosário, ainda que lhe tenham influenciado efetivamente na
busca de “uma articulação das esquerdas”, naquele momento histórico por que passava o país,
o de uma ditadura militar cruel e arbitrária. Desse período, destaco a presença de algumas
personalidades que pertenciam aos setores da hierarquia católica, que eram referências para
ações educacionais e para as pastorais desenvolvidas na defesa de valores comuns. Entre eles,
além de Dom Pedro Casaldáliga, então Bispo da Prelazia de São Félix do Araguaia, cito: Dom
Luciano Mendes de Almeida (Secretário e depois Presidente da CNBB); Dom Celso Queiroz;
Dom Hélder Câmara (Arcebispo de Olinda e Recife); ou teólogos importantes, como
Leonardo Boff, Frei Carlos Mesters, Frei Beto, os Padres Jesuítas Francisco Taborda; Albano
Trinks, José Ivo Follmann; o beneditino D. Marcelo Barros; Padre diocesano de Campinas,
Benedito Ferraro; o assessor da CNBB do setor de Juventude Jorge Boran; o Padre Augustin
Castejón Presidente da AEC Nacional Associação de Educação Católica da Linha 6 da
29
CNBB (Pastorais sociais). No campo das personalidades leigas ligadas aos Direitos
Humanos, entre outras, sobressaiam-se: Dalmo Dallari, Hélio Bicudo, Pedro Pontual, Jair
Kristche, Pedro Wilson de Goiânia, Paulo Schilling. E existiam entidades atuantes como, por
exemplo, o Centro de Direitos Humanos e a Comissão Pontifícia de Justiça e Paz de
Arquidiocese de São Paulo; o Centro de Comunicação Popular Pastoral de Vergueiro (São
Paulo); Centro de Direitos Humanos de Petrópolis, CEDOP (Petrópolis / RJ); Centro Popular
de Vitória (Vitória / Espírito Santo); IBRADES (Rio de Janeiro); CEAS (de Salvador /
Bahia); CERIS órgão da CNBB (Rio de Janeiro). E, em Cuiabá, os Padres Luiz Augusto
Passos, Padre José Ten Cate, Padre Ivo Hoffmann, Padre Teodoro e leigos como Edna
Fernandes do Amaral, Lucilo e Francisca Libânio de Souza (Nono e Chica), Felinto Ribeiro
Neto. Há o registro de profissionais sem vínculo religioso como Artemis Augusta Mota
Torres, Paulo Speller, Joaquim Barbosa, Luís Scalla, Isaías, Enelinda Scalla e equipe da
UFMT, que protagonizaram um trabalho da Universidade Federal de Mato Grosso, no Bairro
Bela Vista, com o projeto específico de acompanhar a luta pela criação da Escola no Bairro e
projetos de educação escolar e popular, com uma postura militante e participando das
reuniões da Pastoral da Saúde do Bairro Pedregal e adjacências. Muitos outros merecem ser
aqui citados. Com certeza, corri o risco de não registrar todos os que estiveram envolvidos em
ações no período e na Paróquia em estudo. Reconheço os limites de uma pesquisa, porém
todos esses outros, não registrados, fizeram a diferença no processo vivido nesse espaço-
tempo da Paróquia do Rosário e na vida das pessoas envolvidas direta e indiretamente nesse
contexto.
A partir do Livro Tombo e das entrevistas, fui percebendo que o então contexto
econômico-sócio-político-religioso local refletia o momento brasileiro de um período
fortemente marcado pelas tensões entre concepções diferenciadas acerca do poder político,
dos direitos humanos, do lugar da fé nestas questões, geradas pelo clima repressivo da
Ditadura Militar de 1964 e pela própria Igreja local. O estupor causado pela truculência no
estilo da implantação de mudanças fez com que o assombro tenha se refletido nas suas
correntes de pensamento e influenciado tanto na criação de ilhas de aprovação, como nas de
desconforto. O fato hoje relevante é que essas lutas não foram interrompidas e entendo ser
muito importante salientar que muitos desses atores ainda permanecem exercendo uma
marcante atuação e influência tanto em nível local, como nacional e alguns em nível
internacional. E os que ainda continuam trabalhando nas lutas sociais que se desenrolam
em Mato Grosso.
É por tudo isso e muito mais do que foi acima relatado, que sou daqueles
30
que entendem que uma homenagem deve ser prestada a uma pessoa enquanto ela vive, e não
depois de morta. Daí o meu desejo que este trabalho provoque uma sadia curiosidade pela
história desses personagens eis que espero que os futuros pesquisadores consigam beber das
águas límpidas das ações desses homens e mulheres, e possam se assemelhar àquele que fez
sua caminhada para Damasco (BARBIER, 1985). Quero registrar que, através do agradável
diálogo com algumas dessas lideranças, que com muito custo conseguimos encontrar, foi
possível reconstituir, se não na sua totalidade, pelo menos alguns dos fatos marcantes que,
após criteriosamente selecionados, agora vêm a público.
Ao procurar responder à pergunta para saber se nos Movimentos Sociais existentes
na Paróquia do Rosário e São Benedito, de Cuiabá, na década de oitenta, do século passado,
houve a intenção de uma educação popular potencializadora de libertação, foi muito
importante o diálogo com Gramsci, Marx e outros. Recorri a Martins (1992, p. 61-67) para
reafirmar como sustento este trabalho nos meandros da intencionalidade fenomenológica
merleaupontyana e esclarecer que essa intencionalidade fenomenológica consiste em através
de uma conceituação, trazer uma compreensão diferenciada daquela da “intelecção”
tradicional, procurando uma compreensão mais afinada com as naturezas “verdadeiras e
imutáveis, daquilo que existe por definição ou porque alguém ensina”. Partimos da
compreensão de mundo, ou seja, a de que o mundo não é apenas aquilo que pensamos, mas
aquilo que percebemos do que vivenciamos. Esse mundo existe antes que a reflexão se
inicie. Então, é estando abertos para o mundo que nós estaremos em comunicação com ele e
com sua infinitude. Sendo assim, a consciência, quando se dirige para uma entidade no
mundo, humana ou não humana, inicia um movimento, uma direcionalidade que vai incidir
sobre algo que lhe é externo, realizando-a como consciência de ver e se expressar. Essa
direcionalidade da consciência tem uma intencionalidade que, segundo Martins, Husserl
subdivide em dois tipos: a intencionalidade do ato que se refere aos nossos juízos e às
ocasiões, quando voluntariamente assumimos uma posição - a intencionalidade da Crítica da
Razão Pura de Kant - e a intencionalidade operativa, aquela intencionalidade ativa que
trabalha e produz. Esta intencionalidade, portanto, como direcionalidade da consciência,
produz a unidade do mundo. Uma unidade “antipredicativa”, ou seja, não classificatória, não
afirmativa sobre o mundo. Ela está aparente em nossos desejos, em nossas avaliações daquilo
que vemos, mais claramente do que estaria um conhecimento objetivo e fornece a textura que
o conhecimento procura traduzir numa linguagem precisa.
31
O que tenciono enfatizar é o fato de que, graças à preocupação em perceber os
acontecimentos históricos e procurando acompanhar o conjunto dos seus movimentos, em
suas idas e vindas, pretendi encontrar o sentido e não a lei do tipo físico-matemático, que é
descoberta através do pensamento objetivo”. Cogitei compreender a coisa percebida,
buscando encontrar na sua intencionalidade operativa e através da minha maneira de olhar
para o mundo pesquisado, a possibilidade de entender sua significação através da
intersubjetividade. Como, de acordo com a fenomenologia, não haverá no mundo coisa
alguma que não tenha uma significação possível” (MARTINS, 1992, p. 63), nesta pesquisa,
serão estas as significações que estaremos garimpando, mas sempre com o olhar voltado para
a pergunta: Os Movimentos Sociais existentes na Paróquia do Rosário e São Benedito, de
Cuiabá, na década de oitenta, proporcionaram uma educação popular potencializadora de
Libertação? Almejo, também, provocativamente, levantar uma discussão relacionada à
polêmica dimensão do Ensino Religioso na Escola Pública, notadamente nas ações de
interação com as diferenças religiosas e culturais, e para reacender uma discussão sobre uma
área de conhecimento que resiste em ser implantada na e pela referida Escola Pública. Para tal
mister, procuro ligar a convergência entre paradigmas da Libertação que sustentaram uma
teoria e práticas vinculadas, uma à outra, tanto na Teologia (Leonardo Boff, Gustavo
Gutierrez, Segundo Galilea, Juan Luís Segundo), quanto na Filosofia da Libertação (Dussel,
Rubem Alves, Hugo Assmann etc), como na Educação Libertadora (Paulo Freire, Carlos
Rodrigues Brandão, Benedito Ferraro, Carlos Mesters, Marcelo Barros, Sérgio Haddad, Elsa
Costa, Maria Nildes Moceloni, Marcos Arruda) que proporcionam um modelo teórico-
metodológico em que se somam conseqüências ético-educacionais-culturais e religiosas tendo
em vista a libertação dos oprimidos. Na análise de algumas propostas estudadas, aparecem
sinais de que a Teologia da Libertação e a figura de Dom Hélder Câmara, inspirador do
Modelo de Igreja latino-americana adotado após Medellín (1968) e Puebla (1979),
influenciaram sobremaneira os integrantes dos Movimentos Sociais da Paróquia do Rosário
reforçando uma Práxis da Libertação. Havia ainda uma direção desses processos que vinham
da própria Companhia de Jesus, sob a égide das orientações do Padre Geral, Pedro Arrupe, de
uma articulação interna de jovens jesuítas e nos escritos da pastoral popular.
Na seqüência,
quando tratarei de temporalidades, metodologicamente, este projeto ancora-se em duas
vertentes principais: A história dos Movimentos Sociais na Igreja Católica e, em partes, na
polêmica História Oral. Respeito a corrente dos que entendem que a História dos Movimentos
Sociais na Igreja também se fazem pela e na História Oral. Sustentando-se na
intencionalidade fenomenológica merleaupontyana, a técnica procurará “refletir sobre as
32
partes da experiência que nos parecem significativos e cognitivos, afetivos e conativos e,
sistematicamente, imaginar cada parte como estando presente ou ausente na experiência”.
(MARTINS, p. 60). Ao abordar a dinâmica gerada pela ação dos rios níveis da realidade ao
mesmo tempo, acompanho Nicolescu apud Barbier (1985), quando afirma que o enfoque deve
ser aquele da transdisciplinaridade. Para tal propósito, procuro praticar a descrição densa
gertziana, auxiliado pela etnografia e pela antropologia, a fim de, fenomenologicamente,
abeirar-me da percepção que pretende captar o que os diversos atores do objeto de pesquisa
dizem e pensam e, nessas subjetividades, a intencionalidade maior de sua participação em um
movimento social. Na experiência perceptiva, tudo indica que houve uma heterogeneidade de
procedências, militância, ideologias e objetivos. O que desejo, também, é saber se, apesar das
diferenças, essas experiências conduziram a um denominador comum, ou seja: através da
unidade na diversidade, os múltiplos olhares conseguiram chegar a resultados significativos?
Como, na pesquisa qualitativa, a busca consiste em saber de que tratamos, nas
entrevistas semi-estruturadas as perguntas abertas tiveram o intuito de provocar o surgimento
de histórias de vida e retratos de experiências marcantes. Foram respeitadas as definições
fornecidas por pessoas e grupos organizados e resguardados os anonimatos solicitados. Da
observação participante, aproveitei alguns fragmentos de anotações feitas em um pequeno
diário de campo onde estão registradas algumas impressões colhidas nos fatos e fotos ou em
eventuais filmes exibidos nos debates no GPMSE (Grupo de Pesquisa em Movimentos
Sociais e Educação), que tanto me auxiliaram em tudo o que considerei importante para este
trabalho. Na produção de conhecimento, o sentido da novidade, a existência do desconhecido,
as numerosas aproximações em direção ao que se quer, espero, ajudem a compreender o que
não é compreendido, dentro da práxis da pesquisa. No recorte especial, a aproximação gradual
com as pessoas da área, no envolvimento compreensivo, possibilitou a seleção dos dados para
os estudos e na apreensão da situação, dentro de uma confiabilidade associada a um
referencial teórico, procurei a empatia com o objeto, incluindo a aceitação do grupo que ainda
me alimenta. Nas premissas, ou seja, naquilo que pretendi buscar, aproximei-me das aberturas
para novas possibilidades e procurei manter o prudente distanciamento do informante visando
à compreensão do problema. Por saber antropológico, procurei permanecer atento aos signos,
e esforcei-me para compreender o outro e a mim mesmo. Foi esse movimento de entrar pela
porta dos fundos o passo que, apesar das dificuldades, tanto me auxiliou a descrever os
hábitos, os costumes, os comportamentos e as práticas sociais. Tive a intenção de fazer uma
interpretação que se considere relevante e significativa, exposta em uma linguagem que
33
realmente espelhe a representação efetiva das coisas que aconteceram, porém, mantendo, ao
mesmo tempo, o rigor e o distanciamento crítico em relação ao achado exposto ao meu olhar.
Com este propósito, deixo a descrição suficientemente flexível e aberta para que outras
pessoas possam reinterpretá-la a partir do seu sistema de referências e recriar os sujeitos a
partir de sua experiência vivida. Finalizando, o trabalho foi organizado em 03 (três) capítulos,
sendo que, no primeiro, trato dos aspectos históricos e da criação da paróquia e seu posterior
desenvolvimento até a década em estudo (1980). O segundo capítulo reporta-se às tensões
surgidas naquele espaço-tempo, bem como aos enfrentamentos que conduziram às ações e à
constituição dos movimentos sociais daquele momento. O terceiro capítulo procura oferecer
uma compreensão fenomenológica merleaupontyana dos fenômenos pesquisados, assim como
uma rápida apresentação de alguns movimentos e pessoas que se mostraram relevantes tanto
na paróquia como para esta pesquisa.
34
2 (RE)CONHECENDO O CAMPO DE PESQUISA
Triscando as margens da transgressão de alguns limites, mas sem provocação, com
muito respeito e humildade, a partir de agora nos depararemos com as falas e acontecimentos
que ocorreram em um cotidiano cheio de intersecções temporais, de espacialidade e dentro da
pertinência de suas categorias, seus grupos etc. O antropológico e o etnográfico estarão
centrados no desejo de compreender o outro, seja através de seu olhar, dos seus a priori, dos
relatos interpretativos de suas falas e ações e, repetimos, buscando manter fidelidade às
particularidades do que foi por nós pesquisado. Na matriz fenomenológica merleaupontyana,
o trabalho desenvolve-se em duas categorias básicas: o cotidiano e o cultural, e dentro dos
seus pressupostos específicos, ou seja, na busca da compreensão a partir de uma descrição
suficiente, não pretendendo que esta seja completa e acabada, pois que o fenômeno é
polissêmico. (REZENDE, 1990, p. 30-31). Atribuímos importância significativa à consciência
dos indivíduos, seja no questionamento da vida social, na busca de intencionalidades, na
importância da experiência de vida, gerando hábitos e atitudes cognitivos e procurando tornar
explícita a consciência daquilo que estava latente, mas dissimulado, na vida cotidiana.
Portanto, o entendimento da vida cotidiana não é aquele da mera aceitação do senso comum,
mas sim o da busca de significados sociais nos fenômenos que servem para configurar o
referido fato cotidiano (GOHN, 2002, p. 136 a 137). Para que o leitor possa transitar pelos
caminhos que nos levaram aos estudos sobre esse tempo/espaço que pesquisamos,
rebuscamos um pouco do que já se encontra nos relatos da nossa História Regional. Os dados
aqui mencionados foram retirados da monografia de Oliveira (2003), pois é justamente na
transcrição sintética dessas informações que se pretende propiciar uma ajuda para aclarar a
compreensão efetiva tanto da mística daquela vetusta Igreja, bem como do porquê de sua
influência nos Movimentos Sociais surgidos na década citada, em Cuiabá. Os documentos
básicos escolhidos para a elaboração deste capítulo foram: O Livro Tombo da Paróquia do
Rosário e São Benedito de Cuiabá, seu Guia de Visitação, elaborado pelo Padre José da Silva
Moura, S.J., alguns dados contidos em entrevistas selecionadas, registros anotados no Diário
de Campo, nos fragmentos de nossos colóquios informais acontecidos por ocasião de visitas à
35
Paróquia. Fundamentado no que preconiza a Linha de Pesquisa no Programa de pós
Graduação do Instituto de Educação da Universidade Federal de Mato Grosso
PPGE/IE/UFMT aproveito-me também de informações colhidas nos demorados círculos de
estudos semanais das quintas-feiras, realizados pelo Grupo de Pesquisas em Movimentos
Sociais e Educação GPMSE. Resumindo, a exposição deste capítulo encontra-se assim
sistematizada. Primeiro, uma sintética apresentação do espaço-temporalidade da Paróquia do
Rosário e São Benedito na História de Mato Grosso; em segundo lugar, será apresentado um
pequeno relato sobre a História de Cuiabá; e, por último, a partir da seleção de dados
considerados relevantes, faço um mergulho em fatos e atos da História da referida Paróquia,
agora centrado no cenário das tramas e dos fenômenos ali ocorridos na década de oitenta,
fenômenos esses que, ainda hoje, permanecem, com sua polissemia, caminhando com a
história desta Igreja. Importante é salientar que, embora pareça, este trabalho não se configura
uma denúncia, e sim uma tentativa de compreensão fenomenológica, dentro de um sentido
prático, objetivo, no qual procuro, mediante um envolvimento compreensivo, imputar
confiabilidade ao meu referencial teórico. Como a fenomenologia está aberta ao diálogo com
outros pontos de vista filosóficos, e o fenômeno Educação tem relevância e pertinência neste
trabalho, é através da fenomenologia que perseguirei a resposta que pretendo encontrar, qual
seja: na territorialidade e na espacialidade em estudo, os Movimentos Sociais surgidos na
década de 1980 tiveram, realmente, uma intencionalidade que desaguasse em uma educação
popular potencializadora de Libertação?
O Espaço-Temporalidade da Paróquia Nossa Senhora do Rosário
Nos seus albores, a história mato-grossense registra que, no início do século XVIII,
quando os integrantes da bandeira de Pascoal Moreira Cabral caçavam índios e procuravam
metais e pedras preciosas, por acaso, descobriram ouro no Arraial de São Gonçalo Velho. No
registro desta descoberta, em 8 de abril de 1719, que vale como certidão de nascimento de
Cuiabá, a ata descreve que aqueles bandeirantes consagraram o Arraial à proteção de Nossa
Senhora da Penha de França, dando-nos, assim, as pistas sobre as origens de sua religiosidade.
Nessa época, esta região pertencia à Capitania de São Paulo e o seu governo geral, muito
distante, sentia dificuldades em controlar a mineração que aqui se realizava. Sabia que a
distância facilitava a burla e o contrabando que, de fato, aconteciam com freqüência, em
36
virtude da proximidade fronteiriça com o Vice-Reino espanhol. Ora, como a excepcional
produção aurífera chamava a atenção da coroa portuguesa, exigiu especiais resguardos. Então,
como solução ideal, a metrópole entendeu que, por ser a Capitania de São Paulo muito
extensa, deveria desmembrar esta região e, para tanto, criou uma nova Capitania, a Capitania
de Mato Grosso. Ato contínuo, através da Carta Régia de 09 de março de 1748, nomeou o
nobre Dom Antonio Rolim de Moura para ser o seu primeiro governador e defensor dos
interesses lusitanos nestas terras. Assim, o monarca português protegia e consolidava seu
império além- mar e engordava cada vez mais seu tesouro à custa da sua distante colônia. A
ata registro da descoberta de Ouro, no Arraial de São Gonçalo Velho, é datada de 08 de abril
de 1719 e, como dissemos, vale para a maioria como a certidão de nascimento de Cuiabá.
Já a implantação da “Villa do Senhor Bom Jesus de Cuyabá”, conforme MADUREIRA
(2002, p. 37), ocorreu no dia de janeiro de 1727, pelo Capitão General de São Paulo,
Rodrigo César de Menezes, a mando do Rei de Portugal. Portanto, a data da implantação da
“Villa do Senhor Bom Jesus de Cuyabá” vem a ser a do término do Arraial, agora promovido
à categoria de “Villa”, e é considerada também, por alguns, como a verdadeira data da
fundação de Cuiabá. Não é incomum, contudo, encontrarmos nas discussões sobre o assunto,
aqueles que querem considerar a implantação da “Villa” como a verdadeira data da fundação
de Cuiabá. Eu acompanho a corrente dos que defendem o primeiro registro.
Com relação à data da fundação da Igreja do Rosário e São Benedito, não existe uma
consensualidade sobre o assunto. No livro Igreja de Nossa Senhora do Rosário e São
Benedito. Guia de Visitação, o Padre José Moura e Silva S.J. 2006, a partir da página 56,
escreveu o seguinte:
Não registro histórico da data de construção da Igreja. Barboza de diz que, na
rua do Sebo, os negros levantaram a primeira capela de Cuiabá, coberta de palha e
logo ruiu e não mais se levantou. Fica sem resposta a pergunta sobre o local daquela
primeira capela. Ultimamente, por documento apresentado por Cristiane dos Santos,
em tese de Mestrado, a irmandade de Nossa Senhora do Rosário de Cuiabá suplica à
Rainha de Portugal, em 1750, autorização para culto oficialmente reconhecido. Na
petição, diziam os devotos que a Irmandade funcionava desde o tempo do arraial.
Pergunta-se: como poderia a Irmandade funcionar sem ao menos uma capela? Sendo
consentâneo terem os devotos erigido ao menos uma capela, pergunta-se sobre o
tempo da construção, sabendo-se que foi ainda no tempo do arraial, conforme a
afirmação dos devotos de Nossa Senhora do Rosário na petição à Rainha, para
funcionamento legal (GUIA DE VISITAÇÃO, p.13).
Realmente, nos relatos da historiografia local, informa-se que, a partir das
descobertas de ouro em 1719, constam em seus registros a presença de padres nesse Arraial, e
37
depois Vila. Portanto, se existiam padres para celebrar missas, tudo indica que, embora em
condições precárias, é possível supor que também existissem Igrejas. Como veremos na
proposta de Tombamento adiante descrita, Barbosa de Sá, cronista da época, trata da
existência de duas Igrejas em 1722, sendo uma, a de São Benedito. O Padre Luigi Fávero,
sdb, em sua dissertação de mestrado, As Cartas Pastorais de Dom Francisco de Aquino
Corrêa (1996, p. 50/51), no subtítulo: A Igreja em Mato Grosso, escreveu que no princípio
do século XVIII, as crônicas registram a presença de dois sacerdotes que rezaram as
primeiras missas: Padre Jerônimo Botelho (1720) e frei Pacífico dos Anjos (1722). Nesses
mesmos anos, Dom Antônio de Guadalupe, bispo do Rio de Janeiro, criou a primeira
paróquia e nomeou pároco o Pe. Francisco Justo...” Ora, se Dom Antônio criou a primeira
paróquia e nomeou um pároco, embora não necessário, é de se supor que o fez exatamente
porque existia uma ou mais das Igrejas citadas em Cuiabá e que necessitava de pastoreio.
Elizabeth Madureira Siqueira (2002), em sua obra História de Mato Grosso Da
ancestralidade aos dias atuais relaciona, à gina 266, os bens tombados como patrimônio
histórico cultural e registra a data da fundação da Igreja de Nossa Senhora do Rosário como
ocorrida entre 1750 e 1751.
Essa Igreja do Rosário, citada pelo Padre Moura como possível de já existir em 1750
e registrado por Madureira (2002, p. 266), como existente em 1750-1751 e que mais tarde
incorporou a Igreja de São Benedito, merece uma melhor leitura, pois se, na petição à Rainha
de Portugal, em 1750, afirma-se que a Irmandade de Nossa Senhora do Rosário de Cuiabá
existia desde os tempos do Arraial -1719-1727- é de se supor que uma das Igrejas citadas por
Barbosa de como existentes em 1722 seja exatamente a Igreja do Rosário. Quanto à Igreja
de São Benedito incorporada pela Igreja do Rosário, não é de se estranhar que seja a
remanescente da Igreja fundada em 1722, que, conforme os registros acima, “depois ruiu e
nunca mais se levantou” (BARBOSA DE SÁ, In: SILVA, 2006). Até agora, não se encontrou
nenhum documento sobre essa fusão e nem se sabe em que data aconteceu. Porém, para
confirmar a longevidade dessa Igreja, no Livro Tombo, à página 9, em Janeiro de 1954,
consta a existência da Irmandade de São Benedito, fundada em 1896, confirmando assim as
suspeitas do referido sacerdote sobre a possibilidade de existência da citada “capela”, quando
fala da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário como existente desde 1750. Suspeita que
considero reforçada pelos dados de Siqueira (2002). Aliás, é bom lembrar um dado também
muito importante, ou seja, o de que na religiosidade popular católica, São Benedito é fiel
38
devoto de Nossa Senhora do Rosário e, em suas celebrações festivas, a catolicidade e os
seguidores de religiões afros geralmente fazem os dois santos andarem juntos.
A Criação da Paróquia do Rosário e São Benedito de Cuiabá - 24 de Maio de 1945
Apesar das controvérsias sobre a data da construção da Igreja do Rosário, assunto
sobre o qual trataremos mais adiante, quero alertar que é somente a partir do ano de 1948 que
a Paróquia do Rosário e São Benedito de Cuiabá torna-se uma comunidade que começa a
ganhar visibilidade institucional de unidade de administração pastoral e que guarda um
determinado território da circunscrição diocesana. Convém lembrar que, para que se crie uma
Paróquia, é necessário que existam as condições ideais para esse ato eclesiástico, ou seja, a
comunidade deve estar alicerçada em uma vida religiosa muito intensa e abranger,
igualmente, um extenso território de atuação. A prova disso está contida no Decreto de
desmembramento desse território, criando a referida Paróquia, em 1945, e somente mais tarde
destinando-a aos padres jesuítas que a assumem a partir de 1948. Estes a transformaram em
uma espécie de quartel general de apoio aos trabalhos que desenvolvem na missão de Mato-
Grosso, por seus confrades da Província Sul Brasileira, junto aos indígenas, com ênfase à
Missão de Utiariti. A seguir, será transcrito, na íntegra, o Decreto Episcopal que criou a
Paróquia em estudo. O referido documento foi extraído da cópia do Livro Tombo daquela
Igreja, mantendo fidelidade aos registros, preservando a formatação original e a ortografia,
porém aqui, para dar maior realce, digitado em itálico. Ali se encontra escrito assim:
Nota: Consta um Livro manuscrito de 50 fls. Na cópia, acrescentou-se texto entre
chaves { }.
A exposição e ortografia foram unificadas
CRIAÇÃO DA PARÓQUIA DO ROSÁRIO E SÃO BENEDITO
{1945
{“DECRETO
{de 24 de Maio de 1945, que fixa a nova divisão da Arquidiocese de Cuiabá {em 11
paróquias
{Dom Francisco de Aquino Corrêa
{por mercê de Deus e da Santa Sé Apostólica Arcebispo Metropolitano de Cuiabá,
{AOS QUE O PRESENTE DECRETO VIREM, SAUDAÇÃO
{E BENÇÃO EM CRISTO SENHOR NOSSO
39
{Considerando a necessidade de fixar melhor os limites das várias Paróquias da
Arquidiocese,
{Considerando a conveniência de fazer coincidir, quanto possível, os limites
eclesiásticos com os civis,
{Considerando que algumas Paróquias se podem convenientemente desmembrar em
outras,
{E usando de atribuição que lhe confere o cânon 1427 do Código do Direito
Canônico,
DECRETA
{Art. I Fica dividida a Arquidiocese de Cuiabá em onze Paróquias seguintes: 1.
Paróquia do Senhor Bom Jesus da Sé;2. Paróquia de São Gonçalo de Pedro
Segundo; 3. Paróquia de Nossa Senhora da Boa Morte; 4. Paróquia de Nossa
Senhora do Rosário de Cuiabá; 5. Paróquia de Nossa Senhora da Guia da Várzea
Grande; 6.Paróquia de Nossa Senhora da Guia do Coxipó da Ponte; 7. Paróquia de
Nossa Senhora da Guia do Coxipó-Açú; 8. Paróquia de Nossa Senhora de Brotas do
Acorizal; 9. Paróquia de Santa Ana do Engenho; 10. Paróquia de Santo Antônio de
Leverger; 11. Paróquia de Nossa Senhora do Rosário Oeste.
{Art. II Sejam a esse fim desmembradas: da Paróquia do Senhor Bom Jesus da Sé,
a Paróquia de Nossa Senhora do Rosário de Cuiabá; da Paróquia de São Gonçalo de
Pedro Segundo, a Paróquia de Nossa Senhora da Guia da Várzea Grande e a
Paróquia de Nossa Senhora da Guia do Coxipó da Ponte; da Paróquia de Nossa
Senhora de Brotas do Acorizal, a Paróquia de Santa Ana do Engenho.
{ Art. III Ficam ipso facto elevadas à categoria de Matrizes, as Igrejas filiais de
Nossa Senhora do Rosário de Cuiabá, de Nossa Senhora da Guia da Várzea Grande,
de Nossa Senhora da Guia do Coxipó da Ponte e de Santa Ana do Engenho.
{Art. IV Os limites das sobreditas Paróquias, são os que constam dos anexos
documentos, sendo, porém,provisórios os limites com a Diocese de Cáceres,porque
pendentes de aprovação da Santa Sé.
{Art. V – O presente Decreto entrara em vigor, na data da sua publicação revogadas
as disposições em contrário.
{Dado e passado, sob nosso Sinal e Selo das nossas Armas, nesta cidade de Cuiabá,
aos 14 de maio de 1945.
{+FRANCISCO / Arcebispo de Cuiabá.
Pare, Olhe, Escute, Pense!
A partir de agora, dentro da pertinência do foco sobre o que a pesquisa considera
relevante para os encadeamentos a que se propõe este trabalho, iniciaremos nossa caminhada,
partindo do período que começa em de Janeiro de 1945, data da história da criação da
Paróquia do Rosário e São Benedito até chegarmos em 31 de Dezembro de 1979. Faremos
uma pequena incursão sobre o Tombamento dessa Igreja como Patrimônio Histórico, em
1987, e retornaremos aos estudos relacionados à década de oitenta. Esse tipo de demarcação
foi eleito porque, mais adiante, me deterei mais demoradamente nos acontecimentos ocorridos
durante a década de 80. Inicialmente, desejo lembrar que os atos e fatos relatados a seguir
referem-se a dados de atos internos de uma Igreja, cuidadosamente selecionados e extraídos
40
do seu Livro Tombo, portanto, atos e fatos que foram consultados diretamente em uma
genuína fonte de documentação oficial e que exigem muito de um pesquisador na sua
exposição. As eventuais transcrições estarão dispostas em ordem cronológica e procurando
respeitar a maneira como o escriba às anotou.
Da provisão do primeiro Pároco em 1948 e as primeiras anotações do Livro Tombo
O Arcebispo Dom Francisco de Aquino Corrêa, atendendo ao provincial Padre Artur
Afonso, S.J. provê o Padre Emilio Faure S.J. ao cargo de Vigário Paroquial, cujo mandato se
inicia em três de abril de 1948 e termina em 31 de Janeiro de 1949 (LIVRO TOMBO, p.3). O
que se quis informar no Livro Tombo é que a Paróquia ficou, de 1945 a 1948, sem provisão
de Pároco, o que não significa que ela tenha ficado sem atividades. Pelo contrário. Embora
não tenha conseguido encontrar registros desse lapso de tempo, tudo indica que, nesse
período, embora assistida pela antiga Sede e agora sendo uma Paróquia, essa comunidade
se portava como independente da Igreja Matriz de Cuiabá, ou seja, independente da então
Paróquia do Senhor Bom Jesus da Sé. Esse embasamento se sedimenta nos registros
consignados no Livro Tombo, com data de 27 de fevereiro de 1955, nos quais se relata que,
nessa comunidade, desde muito tempo, praticavam-se atividades sociais. Acrescente-se
também que o então Vigário, Padre Teodoro Weber S.J., nessa mesma data, narra o episódio
da substituição do Presidente de uma Instituição de caráter beneficente, cujo cargo assumira
desde 1946, portanto, um ano depois da expedição do Decreto que provisionou a referida
Paróquia. Ora, vejo, então, os primeiros sinais da vocação dessa Igreja para com o social
(LIVRO TOMBO, p. 5). Na continuidade da pesquisa, ao tentar demonstrar a vocação dessa
Igreja, nos serviremos, também, das anotações dos registros do ano de 1948 em diante, desde
que pertinentes ao objeto desta premissa.
Tombamento como Patrimônio Histórico, em 1987
Como a paróquia está situada em local histórico, o governo estadual de Mato Grosso,
mais precisamente do ano de 1987, em sintonia com os anseios da comunidade, procurando
salvaguardá-la como seu patrimônio histórico e cultural, fez o tombamento da Igreja do
41
Rosário e São Benedito. Achamos interessante transcrever o texto do Tombamento original na
sua íntegra e o destacamos em itálico. Da página 83 em diante, consta o registro seguinte:
Da Documentação da Fundamentação do Tombamento
No mês de outubro ocorreu o Tombamento estadual da Igreja de Nossa Senhora do
Rosário. Eis o texto do processo culminado com a formalização do Tombamento
pela Fundação Cultural de Mato Grosso, de 15 de outubro.
PROCESSO DE TOMBAMENTO 03/87 / IGREJA DO ROSÁRIO / CUIABÁ – MT
(Timbre das Armas) – ESTADO DE MATO GROSSO / FUNDAÇÃO CULTURAL
DE MATO GROSSO
FUNDAMENTAÇÃO DO TOMBAMENTO
A construção da Igreja do Rosário advém da descoberta em outubro de 1721, por
Miguel Sutil, de um novo filão de ouro; este acontecimento provoca a mudança da
área de mineração, que até então se localizava no Arraial de Forquilha (1), para as
imediações da colina do Rosário, na margem esquerda do córrego da Prainha.
A riqueza deste novo filão era tão expressiva que em 1727, segundo registro do
cronista da época, Barbosa , o arraial que ali surgiu reunia cerca de três mil
habitantes, duas Igrejas e três ruas mal alinhadas.
Em 1722, no Canto do Sebo, os negros construíram uma pequena capela em
invocação a São Benedito, que após algum tempo veio a ruir, confirmando a
precariedade das técnicas construtivas da época.
Os negros não mais conseguiram reerguer esta capela e isto fez com que a Igreja do
Rosário passasse a também ser considerada como de São Benedito.
Não se tem com exatidão a data de sua construção, contudo tem-se por certo que
esta Igreja sofreu rias reformas que alteraram em muito seu estilo como pode ser
observado pela ilustração 01 de 1884 (2) até a composição de fachadas de 1978
(3).
//(1) – Local onde Pascoal Moreira Cabral implantou o núcleo inicial de Cuiabá em
08-04-1719.//
//(2) Extraído do livro Igreja e Sobrados de Cuia Cadernos Cuiabanos /
Mendonça, Rubens P. 14 Des. Karl Van Den Steinen.//
//(3) – Idem, fotos s/ autoria.Pág. 16/
A Igreja do Rosário foi restaurada na DÉCADA DE 80, quando retornou à
composição de 1844, em obra conduzida pela SPHAN.
Seus interiores demonstram inequivocamente a mais plena característica barroca,
que pode ser impressa no tempo nas condições tão adversas da época. Possui três
altares, o da capela-mor e dois do cruzeiro, sendo estes do Século XVIII.
PROPOSTA DE TOMBAMENTO
Propomos o tombamento do corpo principal da Igreja do Rosário, excluindo deste a
Residência paroquial que funciona em anexo no fundo do lote.
A área do monumento, de acordo com o capitulo. III, a-1º, da Lei 3774, de
20.09.1976, será definida pelos móveis cadastrados pela Prefeitura Municipal de
Cuiabá, discriminados abaixo e demarcados em planta anexa.
À descrição acima, no Livro Tombo, segue-se a citação de uma Bibliografia que foi
consultada para a elaboração da proposta de tombamento, a transcrição do registro da Portaria
74/87, que dispõe sobre o Tombamento ao Patrimônio Histórico, publicada em 15 de
outubro de 1987, bem como a indicação de um anexo da cópia do Diário Oficial do Estado de
Mato Grosso, datado de 04 de novembro de 1987. Embora conste a existência destes
documentos na cópia do Livro Tombo em nosso poder, cedido pelo Padre Moura, não
42
estavam apensados os anexos de eventuais cópias de fotografias ou dos documentos aqui
citados, nem dos dados mencionados à página 83 e seguintes.
Na seqüência do encadeamento deste trabalho, acompanhando a disposição dos
registros no Livro Tombo, selecionei alguns atos e fatos considerados relevantes para a
pesquisa. Eles ocorreram em um período denominado carinhosamente, pelo referido Livro,
“Crônica dos Fatos Notáveis”. Vejamos:
De 1948 a 1979 - Crônica dos Fatos Notáveis assentados no Livro Tombo
A partir de agora, convido-o a me acompanhar na busca de novas premissas. Alerto,
porém que, desde o início de nosso passeio por outros tempos, faremos algumas paradas
rápidas, as quais ocorrerão em função dos objetivos desta pesquisa. Desejo lembrar que, ao
utilizar dados extraídos do Livro Tombo, tenho como objetivo realçar assuntos que considero
de particular importância. Eles até podem estar contaminados pelo vôo nas dimensões de
subjetividades, mas, tenha certeza, estarão se referindo a perplexidades ou inadequações do
que estava em curso. Portanto, tem a pretensão de referir-se a informações relevantes,
significantes, pertinentes e suficientes para provocar a compreensão de atos e fatos
relacionados à história, tanto de nossa sociedade local, bem como à da Igreja do Rosário e São
Benedito que nem sempre partilha da visão de senso comum, pelo lugar social onde o
notário se situa. Portanto, com o apoio de Rezende (1990, p. 9-10) convido-o ao contato com
fatos reais que serviram de alicerce a muitos dos Movimentos Sociais que estudaremos
adiante. Iniciemos a caminhada.
No princípio, foi assim: no ano de 1948, o Padre Vigário da Paróquia do Rosário e
São Benedito, de Cuiabá, iniciou as obras estruturais da Paróquia, tais como a construção de
um poço, a troca do forro da nave principal da Igreja, a revisão completa do telhado, das
janelas, a construção de parede para o batistério, a caiação das paredes, fez uma nova
instalação elétrica, aquisição de globos, refletores etc. Nos registros da página 4 do Livro
Tombo, consta que, para esses trabalhos, a paróquia teve as despesas seguintes:
A - na Igreja, cerca de 14.300 cruzeiros.
B - na casa paroquial (com o poço) uns três contos de réis. Nesses gastos a caixa de
São Benedito entrou com 14.800 cruzeiros;
43
Os outros 2.500 foram pagos pelos ministérios do vigário ou por esmolas que lhe
foram entregues.
Até 23 de agosto o Vigário e seu auxiliar vinham almoçar e jantar no Seminário dos
Padres Salesianos. Daquele tempo em diante o Vigário, que já não vinha para o café
ao Seminário, ficou morando na casa paroquial nova, mandando vir comida em
marmitas, conforme combinou com a família do Sr. João Abreu a quem pagava uma
pensão de mais ou menos 350 cruzeiros, incluída a lavagem da roupa
5
.
Ainda no ano de 1948, além das reformas citadas, os registros referem-se
preferencialmente às ações de caráter pastoral e administrativo, tais como: a realização e ou
regularização de casamentos, cerimônias de batizados, de crismas, procissões,
estabelecimento de novos horários para as missas, visitas a capelas, expediente paroquial e
outras atividades típicas dos encargos de um pároco. Ainda não se registra nenhuma ação de
cunho social mais efetivo, a não ser, é claro, as atividades de uma associação de caridade que,
conforme consta, já existia antes de 1935 e cuja diretoria atuava com independência e, ao que
parece, sem prestar contas de seus atos ao vigário, provocando com isso um grande
desconforto entre o titular da Paróquia e a diretoria da referida entidade. Sobre este assunto,
mais à frente, registraremos seu desfecho.
Em Janeiro de 1955, o Livro Tombo registra que ocorreu a fundação do Centro São
Benedito dos Círculos Operários
6
(Idem, p.5) - não confundir com a Irmandade de São
Benedito, fundada em 1896. Nas páginas seguintes, lavrou-se o registro de construções de
capelas, entre elas a de Nossa Senhora de Fátima, cuja pedra fundamental fora lançada em
13.10.52. Em fevereiro de 1962, um registro de queixas de malversação do dinheiro da
festa na Capela de Nossa Senhora do Rosário do Coxipó do Ouro, portanto, sem resultado
espiritual e financeiro esperados. Parece que essa capela não era afeita à prestação de contas
de sua administração, pois as anotações dizem que ali foi encontrado em 1888 ou 89 em
5
Era comum na ordem dos jesuítas que, salvo a estrita manutenção das necessidades da comunidade, todos os
ganhos com a prestação de serviços como espórtulas de Missas encomendadas, batizados realizados, entre outros
trabalhos de seus membros, fossem aplicados na obra em questão e, por isso, na manutenção da própria Igreja.
6
Os Círculos Operários possuíam uma inspiração remota no que se chamava Associação de Trabalhadores
Católicos que se inspirava nas formas existentes, sobretudo na Alemanha, de onde proveio parte dos primeiros
jesuítas da Província Sul Brasileira, que eram alemães ou, em alguns casos, filhos de alemães que guardavam a
cultura de seus pais e avós, quando da migração para o Rio Grande do Sul. De sorte que, no Rio Grande do Sul,
verdadeiros povoados, cidades ou zonas rurais formadas por descendentes que guardam a língua, costumes,
organização geral do cotidiano, festas, comidas inspiradas no modelo trazido da Alemanha, conservando todas as
idiossincrasias da Alemanha que existira, na Europa daquele tempo. As comunidades organizavam os chamados
VOLKSVERREIN, que eram círculos populares - a idéia de círculos vem da tradição tribal que organiza a
sociedade alemã como uma sociedade de iguais que assumem prover todos os bens necessários à plena
integração de todos na saúde, educação, lazer, religião, ação social etc. Os Círculos Operários como instituição
nascem pela iniciativa de um Jesuíta da Província Sul Brasileira, Padre Brentano, que formalizou
institucionalmente, servindo-se da Lei das Cooperativas, o sistema que ainda hoje se desenvolve e exerce um
importante papel como instrumento de coesão, solidariedade e participação de todos nas ações da entidade.
44
documento de lata - um processo narrado pelo relatório do presidente de Província de desvio
de Bois do Coxipó do Ouro, e relativo a produto de uma da festa. (Idem, p. 24).
A falta de “Espírito Sobrenatural”
A Paróquia completava sete anos de existência, o Pároco havia visitado todas as
capelas e todas as povoações de sua jurisdição e, conseqüentemente, ministrado à exaustão as
orientações sobre como desejava ver imprimido, nas comunidades, o seu estilo de trabalho e
como esperava que elas se portassem à frente da administração dos bens e das atividades
pastorais que lhes foram designadas pela sua Igreja. Portanto, houve tempo mais do que
suficiente para que o pessoal de linha de frente e os responsáveis por atividades ligadas à
Paróquia, além do preparo específico, estivessem acostumados às naturais prestações de
contas de suas áreas de atuação. As exigências não são absurdas para administradores de bens
materiais coletivos ou institucionais no nível formal prescrito pela modernidade e pela
administração dos bens da Igreja. E aqui, uma surpresa.
Alguns, que haviam constituído uma espécie de feudo, na visão do vigário e de seus
assessores, reagiram como se nada estivesse acontecendo e decidiram medir forças, impor
resistência ou para testar a têmpera do Vigário e acabaram sendo destituídos do poder.
Destaquei um registro que, após análise, transcreverei. Peço um pouco de paciência aos
leitores, pois a transcrição é relativamente extensa. Neste episódio, o nome do personagem
principal será substituído e chamado de “Pintassilgo, o pároco de Padre Flores do Campo”
S.J., a seu preposto chamaremos de “João de Barros” e à entidade envolvida, de “Sociedade
Beneficente”. A ortografia será preservada. Vamos ver o que aconteceu? No Livro Tombo
consta o registro seguinte:
27 fevereiro 1955 - Desde mais de 20 anos funciona uma das salas da Igreja de
Nossa Senhora do Rosário um ramo da “Associação Beneficente”. Desde 1946
estava na frente dela o Senhor “Pintassilgo”. Acostumado a trabalhar
independentemente de qualquer autoridade entrou em questão com os Vigários que
se sucediam na Paróquia desde 1948 Dizia ser Presidente Vitalício. Eu
pessoalmente passei o meu primeiro ano de Vigário sem praticamente conhecê-lo.
Não reconhecia vigário. Desde agosto de 1954 a março de 1955 realizou uma
reunião quando os “associados” se devem reunir semanalmente. Muitos me diziam
que o homem era macumbeiro. Finalmente no dia 15 de fevereiro, Dom Francisco de
Aquino Corrêa, D.D. Arcebispo de Cuiabá me pediu um nome de pessoa competente
45
que pudesse substituí-lo. Eu Pe. Flores de Campo, S.J. Vigário da Paróquia,
apresentei o Sr “João de Barros” E assim recebi e Publiquei o seguinte:
“Arcebispo de Cuiabá”
Exmo. E Revmo. Sr. Dom Francisco de Aquino Corrêa, DD. Arcebispo de Cuiabá,
usando das atribuições que lhe confere o regulamento “dos associados”, resolveu
nomear o Sr. João de Barro, para exercer o cargo de Presidente da “Sociedade
Beneficente”, com sede na Igreja de Nossa Senhora do Rosário em substituição do
ex-presidente Senhor Pintassilgo”.
“Cumpra-se e comunique-se. Palácio do Arcebispo de Cuiabá, em 18 de fevereiro de
1955. (Ass.) Dom Francisco de Aquino Corrêa / Arcebispo Metropolitano“.
Fiz ler este decreto no dia 27 de fevereiro de 1955 às 8,30 da manhã na sala de
reuniões da “Sociedade Beneficente” e dei posse ao Novo Presidente estando
presente às pessoas cujos nomes constam no livro de atas da dita Sociedade. Tudo
correu na maior calma a não ser uma pequena manifestação de desagrado como era
de esperar, do antigo Presidente, (Sr. Pintassilgo). Manifestou falta de espírito
sobrenatural.
Partindo de um Programa Radiofônico
Na seqüência, estão relatados outros tipos de ações, agora de aspecto educativo
como, por exemplo, a relacionada com os meios de comunicação social da época e mostrando
o pioneirismo da paróquia com a educação popular. Trata-se de um programa produzido por
aquela paróquia e transmitido pela Rádio Bom Jesus hoje, pertencente à Arquidiocese de
Cuiabá e cedida à Rede Canção Nova e mais tarde transmitida por outra emissora, à época,
de propriedade particular. O Livro Tombo registra assim:
A partir de abril de 1966 passam a
funcionar na Rádio Cultura, em continuação, um idêntico programa anterior da Rádio Bom Jesus”.
Como o Livro Tombo não clarifica mais nada sobre essa informação, tivemos que
buscar entre os nossos entrevistados o significado das anotações que transcrevemos abaixo:
Felinto:...Houve aqui, o MEB -Movimento de Educação de Base que ele era ligado a
CNBB foi em 1963 e era ligado à Rádio, foi uma experiência que trouxeram da
Colômbia que a Igreja fez um trabalho pelo rádio e aqui foi alfabetização de adultos
que na época estava surgindo com Paulo Freire etc. Tem toda uma história bonita o
MEB.
Agenor: Mas nessa época estava surgindo o Mobral também no Brasil?
Felinto: Não, o Mobral já foi depois, entendeu. Bem depois, né. Então o MEB
principalmente no Nordeste. Norte e Nordeste. Foi bem, bem forte. E inclusive
depois, quando houve o golpe militar eles...Foi muito reprimido. As Cartilhas
tinham que ser enterradas e etc. Mas é o que foi um trabalho assim excelente na
alfabetização. E a animação! Foi um pessoal muito bem formado. Fizeram curso na
Bélgica com pessoal que tinha trabalhado na África. Então, ah, é, sociólogos e até
hoje tem muitos, livros sobre isso, sobre o MEB. O Carlos Brandão era uma febre,
né, o Carlos Rodrigues Brandão. E tem vários outros. O rcio Fávero. Então tinha
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um pessoal de ponta na CPT e que era... é..., que esse movimento foi, ainda existe
MEB, mas com outra característica né, eles estão trabalhando, estão tentando fazer.
Mas foi muito combatido até dentro da Igreja, né. O MEB tinha sede em Cuiabá e
programa de rádio na Radio Voz do Oeste, na época pertencente ao Júlio Campos. A
irmã do Júlio Campos ou do Álvaro (?) Scofaro -repórter e depois administrador da
Rádio Bom Jesus de Cuiabá - coordenara o MEB de Cuiabá... (Fonte: Gravação 4
– com o Doutor Felinto da Costa Ribeiro – 13.10.2007).
Como o intuito deste registro é o de mostrar o pioneirismo da Paróquia do Rosário
com a Educação Popular, esclareço que, atualmente, a única informação que temos disponível
é a de que essa experiência via programa radiofônico foi encerrada. Restou-nos um
depoimento, cuja identidade do depoente se preserva, no qual se pondera sobre malversação
de recursos, todavia, sem explicitar responsabilidades. Na seqüência dos relatos do Livro
Tombo, consta que, a partir de janeiro de 1970, embora nada tendo a ver com a Paróquia do
Rosário, em Cuiabá, houve o início do Movimento de Cursilhos de Cristandade e, a partir de
então, alguns cursilhistas, sentindo a necessidade de assumir compromissos com o social,
começaram a assumir funções pastorais, tais como cursos de batismo, curso de formação nos
bairros - dezembro de 1971 - preparação de Pais e Padrinhos para o Batismo - fevereiro
de1973 - e, no caso do Rosário, procurando colaborar com o novo estilo de organização nas
festas no Coxipó do Ouro (LIVRO TOMBO, p.50-54). Porém, é importante dizer que essa
assunção de funções pastorais pelos cursilhistas não refletia uma característica do Movimento
de Cursilhos, e sim se relacionava a iniciativas pessoais de paroquianos do Rosário, pois esse
Movimento não tem a característica de assumir compromissos com o social. Para dar
consistência, transcrevo um registro de recente desabafo de um depoente, cuja data e
identidade também preservo:
“Os cursilhistas estavam na outra ponta... não eram aliados... Eu, enquanto padre no
Rosário, sempre apoiei movimentos religiosos de base, inclusive a Liga dos
Apóstolos da Caridade não tinha boa convivência com Cursilhistas ou com o pessoal
do Movimento Carismático, eles sempre se queixaram de falta de apoio específico.
Eles tinham seus assessores e acompanhadores como todo o movimento, e por isso
não pertenciam à estrutura da pastoral... Essa razão ajudei algumas vezes cursilhos
em muitos lugares, mas sempre tive críticas severas à metodologia de
condicionamento, arbitrariedade de impactos emocionais, fanatismo, espírito
fechado no movimento, e... expulsão do Jesuíta que os trouxe para o Brasil, padre
Haroldo Rahm e que tinha sensibilidade social e compromisso com os pobres e
jovens e foi marginalizado pela direção do CCCC”.
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As primeiras tensões
1975 A partir deste ano, o Livro Tombo começa a tratar sobre os efeitos das
primeiras ocupações de terras na periferia, informando que estas deram origem a bairros e
relata os primeiros confrontos com os que se diziam proprietários dessas terras. A migração,
a seguir comentada, como veremos adiante, tida como conseqüência do incremento da frente
pioneira da estratégia política da ditadura, de desenvolvimento das áreas da mata, face aos
riscos de ser ocupada sem retorno ao capital, ou mesmo por formas incompatíveis com o
capitalismo, está relatada assim:
Nos primeiros meses deste ano, começou o trabalho no Carumbé e São João dos
Lázaros. Uma equipe de cursilhista começou a trabalhar no Jardim Leblon. Pelo fim
do ano começou a entrar muita gente nestes bairros. Vieram famílias do interior do
Mato Grosso como do Nordeste, Minas, São Paulo onde anos fez a mecanização da
Lavoura – Pobres, peregrinos sem dinheiro, sem trabalho, sem terra e sem casa
perseguidos e expulsos de suas terras e do seu trabalho. Não tendo onde ir ocuparam
nos cerrados da periferia da cidade onde nem casas nem cercas nem sinal de dono o
progresso se percebia. Quando perseguidos fizeram seus barracos. Apareceram os
tubarões reclamando posse de direito. Deu muita questão mas a Prefeitura
desapropriou os donos da terra e loteou. Assim surgiu – Barro Duro – Jardim Leblon
Santo Antonio do Pedregal Bairro Areão Cabeça-de-Boi e finalmente o
Canjica. – O Carumbé foi loteado por primeiro
(Idem, p.55-56).
1976 - Destacamos, sem transcrever, o registro sobre as Anotações do caderno de
Leda Thommen, onde constam os atos do Tombamento Histórico do “Museu de Arte Sacra da
Igreja do Rosário”, realizado por iniciativa da primeira dama do Estado, D. Maria Ligia
Garcia.
1978 - Construção da Capela do bairro Jardim Leblon e tendo como Padroeira Nossa
Senhora da Conceição. Houve a construção da nova Igreja Nossa Senhora de Fátima e obras
de término da Igreja São Judas Tadeu. Surgiu o Bairro Planalto e houve o assentamento dos
pobres em local escolhido pela Prefeitura (Idem, p. 60).
1979 - O Livro Tombo registra que, nesse ano, surgiu o grande núcleo populacional
COHAB do CPA-1, com 1000 casas para pessoas abaixo da classe média. Os Vicentinos
concluem a casa de atendimento aos pobres no bairro do Barbado e o Padre Emilio Reinehr
faz um curso de reciclagem entre os jesuítas. O Padre Teodoro Werner faz um curso de
parapsicologia pastoral, no mês de julho, e o Padre Erno Luetkemeyer, além dos trabalhos da
Paróquia, lecionou Língua Inglesa em dois colégios do Estado. No mês de Novembro, sem
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especificar o dia, consta o registro de que chega o Padre Luiz Augusto Passos para ajudar na
Paróquia. Realizaram 2.300 batizados e 280 casamentos. Assim finalizam as anotações
relativas ao ano de 1.979 (Idem, p. 60-61).
Aqui concluo, sinteticamente, uma seleção de dados coletados e relacionados ao
tópico denominado “Crônica dos Fatos Notáveis”, que cobriu o período de 03-04-1948 ao
mês de Novembro de 1979. Nesse mês, no Livro Tombo, as anotações não contemplam as
realizações do dia-a-dia, somente engloba, em bloco, as do referido período. Com o registro
do que até aqui se elencou, o intuito maior foi o de apresentar dados que colaborem na
obtenção da resposta à pergunta que persigo, ou seja, estes dados possibilitam responder
satisfatoriamente à indagação relativa a se os Movimentos Sociais encravados na Paróquia do
Rosário e São Benedito proporcionaram efetivamente a realização de uma educação Popular
potencializadora de Libertação. Continuemos nossa pesquisa.
Um novo jeito de administrar
Geralmente, em Instituições com alta rotatividade administrativa ou compostas por
pessoas com muito tempo em seus cargos, a experiência ensina que não é incomum o
surgimento de pontos de vista divergentes, principalmente quando nela se inserem novos
rumos. Ora, uma Paróquia não foge à regra. Na consulta dos registros, é possível perceber os
conflitos que o Pároco
P. Teodoro Weber S.J. enfrentou quando quis imprimir seu estilo de
administração paroquial na novel Paróquia do Rosário e São Benedito, logo após a sua posse
como Vigário de uma Igreja com quase duzentos anos de existência e que precisava ser
sacudida na sua maneira de agir. Vamos procurar entender o que aconteceu.
De início, a recém-criada Paróquia começou a ser administrada com o seu status
próprio, portanto, não mais o de uma submissa Capela. A nova instituição passou a ser
administrada por um Padre jesuíta novo. Conforme relatamos anteriormente, o Arcebispo
Dom Francisco de Aquino Corrêa, atendendo ao provincial Padre Artur Afonso, S.J. provê o
Padre Emilio Faure S.J. ao cargo de Vigário Paroquial, cujo mandato iniciou-se em 03 de
abril de 1948 e terminou em 31 de Janeiro de 1949. O registro diz que, em 1953, o Pe. Moisés
deixou a Paróquia e voltou para a sua Província, tomando conta, provisoriamente, o então Pe.
João Batista Selvaggi, Pároco de Diamantino, que tomou posse definitiva em17 de junho
do mesmo ano. Em 6 de fevereiro de 1954, em um sábado à noite, às 21 horas, chegou o P.
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Teodoro Weber S.J. de “Utiariti todo enlamaçado”, certamente se referindo à “Missão de
Utiariti”, sob encargo dos jesuítas desta Província Eclesiástica. (LIVRO TOMPO, p. 9).
14-02-1954 Domingo O Padre Teodoro Weber S.J.tomou posse da Paróquia
Sª do Rosário, tendo por testemunhas os senhores Izaltino Fontes e Wilfrido Paes de Arruda.
Dotado de um dinamismo considerado muito incomum para os padrões da época, o
padre Teodoro, com seu novo estilo de trabalho, provocou reações e exigiu providências
impactantes. Algumas dessas mudanças foram de caráter administrativo, tais como a
necessidade de a comunidade colocar à disposição do novo administrador os seus cargos de
confiança, a necessidade de prestação de contas pelas Diretorias das Entidades ali
estabelecidas, enfim, todas as normais providências estratégicas para o bom funcionamento
das eventuais iniciativas do pároco recém-empossado. Isso exigiu um estado de espírito
sempre alerta por parte dos paroquianos, e notadamente das lideranças, a fim de estarem
atentos às novidades que doravante o novo Pároco começou a implementar no seu território
de Jurisdição Eclesiástica. Além das medidas de caráter administrativo, foram tomadas outras
providências, sobretudo de caráter pastoral, tais como, a alteração nos horários de missas, a
criação de cursos de preparação para o batismo, a primeira eucaristia, o crisma, casamentos e
ou outras práticas religiosas.
Elenco alguns fatos de tensão, selecionados por suas peculiaridades, que julguei
merecedores de registro. Em alguns dos episódios narrados, por questão de prudência, os
nomes dos atores envolvidos estarão substituídos por nomes de flores e aves (Como foi o caso
do Pintassilgo). Nos demais, permanecem os nomes dos atores reais.
19-20-21 1955 de Fevereiro Atividades na Capela do Coxipó do Ouro. O Vigário
queixa-se de que nos três dias de festa arrecadou-se mais de 100.000 (cem contos)
em esmola e “o festeiro consome tudo sem deixar um vintém para a Igreja que está
caindo. Passam as noites a dançar Cururu e Siriri”.
Convém lembrar que a comparação entre a Igreja caindo e o “passam as noites a
dançar Cururu e Siriri” parece mostrar um desconhecimento das formas culturais cuiabanas.
Não se veja aqui uma depreciação preconceituosa e etnocêntrica por aquele que chega para a
função de investidura eclesiástica sem o devido conhecimento da região. No caso específico
do Padre Teodoro, as anotações registram que ele “não adorava, como até dançava Cururu
e Siriri”. Além de queixas sobre a falta de uma espiritualidade desejada, de que não se fazia
prestação de contas à Igreja, constam, também, relatos de malversação desses recursos e da
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necessidade de coibição de tais práticas. A tomada de providências drásticas afetou os estilos
de encaminhamento e, daí em diante, até da finalidade das futuras festas. Então, novos
colaboradores foram se agregando. Foram muito bem-vindas instituições religiosas que
chegaram para somar esforços no enfrentamento das diversas frentes de trabalho ali
encetadas. Chama atenção a instalação, no território da paróquia do Rosário e São Benedito,
da Província das Irmãzinhas da Imaculada Conceição que, como veremos mais adiante, ainda
hoje, essas religiosas participam ativamente das ações sociais paroquiais e que, inclusive,
dedicavam um especial tempo aos misteres da educação. Vejamos o registro:
10 de Fevereiro 1963 O dia 10 foi assinalado com a instalação da Província das
Irmãzinhas da Imaculada Conceição em Mato Grosso: O noviciado está em
Diamantino. Para a sede da Província tomaram o Pensionato de Nossa Senhora do
Carmo em nossa paróquia. Dom Orlando rezou missa em nossa igreja empossando
em seguida, no pensionato, a primeira provincial que é a Madre Ivone... (Idem, p.
28).
Na seqüência dos registros, quanto ao aspecto das lutas pela preservação da moral e
dos bons costumes da comunidade, entendo oportuno destacar alguns fatos. Entre outros,
destaco aquele que procurou sensibilizar o poder público municipal para que retirasse a zona
de meretrício que se encontrava, e ainda se encontra, muito próxima à Igreja do Rosário e São
Benedito. Na leitura subseqüente do Livro Tombo, percebe-se que as gestões do Pároco e da
comunidade sensibilizaram um vereador que, aliado ao clamor paroquial apresentou-se
solidário e procurou dedicar seu empenho junto às autoridades locais. Vejamos o que o ilustre
edil providenciou:
17 Junho 1963 Por iniciativa do vereador Clovis Pompeu de Barros, se fez uma
reunião com a finalidade de se afastar as casas de meretrício, praticado no Bairro do
Baú, área da Paróquia do Rosário.
09-06-1964 - “No dia 9 Sr. Delegado de Ordem Política Social e Investigações, 1º
ten. Nelson Salomão Saigali, em cumprimento da portaria 38/64 do Sr. Chefe de
Polícia, Ten. Cel. José Silvério Magalhães, baixou portaria constante de 11 itens
combatendo o meretrício. A ACM regozijou-se cobrando novas esperanças de que
em breve ficarão livres das meretrizes as Ruas do Carmo e S. Francisco, como já o
são as de Santo Antônio e as outras até o Tanque do Baú” (Idem, p.23).
A curiosidade, e a curiosidade de um pesquisador, me levou a fazer uma rápida
visita ao local. Percebi que, ainda hoje, boa parte da referida zona de meretrício permanece no
local, imponente como sempre, e alheia aos clamores das vozes que reclamam. À noite, coisas
51
estranhas ainda acontecem: camas rangem, escutam-se gemidos semelhantes aos de casas
mal-assombradas e, sob o efeito etílico, a boemia ainda ali se acotovela e mariposas enrolam-
se em lençóis faceiros. Coisas de uma legião de cúmplices das voluptuosidades típicas da
carne aquecida pelo sol destes trópicos.
Destaco agora um registro que o Livro Tombo fez questão de salientar. Deixo ao
leitor a liberdade de tirar suas conclusões.
1968 Junho No mês de junho houve reza a benção do SS. Diariamente. Neste
mês o governo de Pedro Pedrossian inicia os trabalhos da Praça do Rosário.
(O Governador mandou que o arquiteto encarregado da obra tomasse, como ponto
de unidade do conjunto, o panorama que se avista do sétimo andar do Palácio
Alencastro, onde despacha, olhando para a igreja do Rosário. A pedra para o serviço
é a legítima canga, formada por óxido de ferro, onde a cor avermelhada) (Idem,
p.44).
Solicito, neste momento, sua obsequiosa atenção para uma ação que considero de
longo prazo e como sinais cifrados de um plano de transformação das festas de São Benedito,
com vistas a retirar seu caráter mundano. Aqui serão mantidos os nomes dos paroquianos,
pois entendemos que devemos manter a fidelidade aos registros consultados.
02.01.74 – Pe.Teodoro ficou no lugar do Pe.Emílio que foi de férias.
A partir de agora, preocupação em formar homens capacitados para assumirem a
Festa de São Benedito (Idem, p. 54).
Janeiro de 1979 –... Um trabalho difícil prolongado foi realizado na capela de
Nossa Senhora do Rosário do Coxipó do Ouro. Os senhores João Batista Pedroso e
André de Freitas e Adolfo Vilela trabalharam muito para cristianização da Festa
que era pura e simplesmente mundaria. E reconstruíram a capela que estava em
péssimo estado. Restauraram também a sala de festas e construíram uma grande
área coberta para refeições. Levantaram um monumento em homenagem a Primeira
Missa em Mato Grosso e dirigem a comunidade de culto cada domingo (Idem,
p.60).
Este registro, sob a aparência de um inocente e singelo detalhe, como veremos à
frente, mostrava uma preocupação com a necessidade de um planejamento de ações de
longo prazo, cujos desdobramentos pudessem possibilitar vigorosas ações de mudanças nas
futuras festas de São Benedito. O que desejo salientar é que são esses pequenos sinais que,
semelhantes a ruídos aparentemente inexpressivos, se não forem atentamente interpretados,
poderão deixar passar despercebidos projetos de mudanças educativas trazidas em seu bojo e
que futuramente surpreenderão a muitos. Vejamos o que os passos seguintes nos reservam
para ajudar na lógica de nossa construção de proposições que auxiliem na clarificação de
52
nossa proposta, que pretende saber se os Movimentos Sociais da Paróquia em estudo
contribuíram com o processo educacional popular potencializador de libertação.
O começo das mudanças - A Festa de São Benedito
Estiveram na Paróquia de Nossa Senhora do Rosário e S. Benedito em atividades
eminentemente paroquiais, os seguintes padres jesuítas, nesta década de oitenta, com a
seguinte seqüência cronológica: Pe. Teodoro Jacob Weber, Pe. Emílio Reihner, o Pe. Erno
Lütkemeyer, Pe. Luiz Augusto Passos, Pe. João Manoel Mira, Pe. José Ivo Hoffmann, Pe.
José Ten Cate e Pe. José Moura e Silva. A continuação dos registros consultados, embora
muitos ainda se refiram principalmente a atividades pastorais, a partir de agora, discorreremos
sobre a constante preocupação do pároco, relacionada aos rumos da Festa de São Benedito.
De início, uma festa realizada pela negritude cuiabana que se sentia alijada da festa branca do
Divino Espírito Santo. A devoção ao santo negro atrai a elite que se apodera da mesma,
branqueando-a. E então, entre outras coisas, vimos que, em uma das comunidades
paroquiais, a referida festa, apesar de ser realizada sob os auspícios da Igreja, tinha os
resultados sociais, econômicos e religiosos desviados da finalidade preconizada pelo evento,
nos moldes estabelecidos em nível pastoral e em nível canônico, ou seja, pela Lei eclesiástica
que deveria conformá-lo. O relato afirma que os festeiros, além de não se preocuparem com
os frutos espirituais característicos da mística do Santo Padroeiro, carreavam o produto
financeiro para atividades que nada tinham a ver com a destinação normalmente recomendada
pela Igreja. Com o passar dos anos, o padre vigário até conseguiu pequenos avanços, porém,
ficou muito claro que houve a necessidade de lançar algumas novas estratégias. Diante disso,
no Livro Tombo consta que houve a necessidade de uma paciente e constante atenção aos
rumos da Festa de São Benedito. O Livro Tombo relata a existência de várias atitudes
consideradas profanas e nada condizentes com a religiosidade popular e, portanto, totalmente
em desafinação e fora da mística preconizada pelas virtudes do Santo homenageado. Desde
1974, foi preparada uma equipe formada por homens e aos quais foi dada a necessária
capacitação para assumirem a direção da referida festa. Mandou a prudência e o bom senso
que, primeiro, se esgotassem todos os recursos antes de serem tomadas providências mais
enérgicas. Apesar da paciência, finalmente, em Julho de 1979, elas tiveram que acontecer e
com o desfecho que se segue:
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1979 Dia 4 de Julho Reunião do CPP para elaborar as normas para os novos
festeiros de São Benedito. Os Festeiros não aceitaram as mudanças propostas pelo
CPP. O CPP não aceitou os festeiros indicados para 1982 (Idem, p.60).
Um pequeno alerta. Não existe contradição ao dizer que o CPP, em reunião do dia 04
de julho de 1979, não aceitou a indicação dos festeiros de São Benedito para 1982. Pelo
contrário, este fato demonstra a grande preocupação antecipada e relacionada à organização
desse evento.
Continuando, à página 64 do Livro Tombo, consta o seguinte:
A questão teve inicio nos enredos da Festa. Os Festeiros dividiram a festa em
classes. Os ricos tomaram c com bolo e realizaram baile e jantarada no Clube
Dom Bosco, enquanto os pobres, no domingo, tiveram que esperar até as três horas
da tarde para receberem bolachas e um pouco de arroz no Ginásio da Lixeira. No
fim os festeiros disseram que não sobrou dinheiro para a Creche do Canjica, pois
sumira nos bolinhos dos pobres e as festanças dos poucos ricos no Clube Dom
Bosco. Depois da Festa, Frente à tomada de posição da Paróquia, os festeiros
entregaram as insígnias ao Senhor Arcebispo. A Paróquia reuniu-se com o Senhor
Arcebispo e o Senhor Arcebispo entregou as insígnias à Paróquia. Também ficou
estabelecido que os festeiros seriam escolhidos de entre os devotos de São Benedito,
que participam da Missa de São Benedito nas terças-feiras às 5 horas da manhã.
Dia 22 - Reunião do Conselho Comunitário. Tomaram-se medidas para a realização
da Festa de São Benedito no pátio da Igreja...
1982 – Janeiro Dia 8 – O CPP reuniu-se com o Senhor Arcebispo onde trataram das
atividades de 1981 e decidiu-se que a Paróquia do Rosário deve assumir a Festa de
São Benedito, junto com outras Paróquias locais e do Estado. Mesmo sem a
denominação explícita, aqui começa um como que Santuário de São Benedito.
Não é propósito desta pesquisa aprofundar a temática “Festa de São Benedito”,
mesmo porque sobre ela já existem excelentes trabalhos, dos quais destaco a bonita
monografia de ABREU (2007). A título de registro, a Capela de São Benedito, do Bairro Boa
Esperança, no próximo ano, estará comemorando o centenário do nascimento do senhor Edgar
Vieira, fundador do bairro e doador do terreno e do prédio da referida Capela à Mitra
Arquidiocesana de Cuiabá. Já está formada uma equipe de trabalho, na qual estamos
inseridos, que promete trazer a lume interessantes informações, incluídos os dados
relacionados à Festa de São Benedito, do qual não o referido senhor, mas uma significativa
parcela dos habitantes desse Bairro, se declaram fiéis devotos.
Para concluir, desejo partilhar uma experiência. Em 1995, escolhido pela
comunidade da Capela de São Benedito, do Bairro Boa Esperança, tive a honrosa
54
incumbência de ser o Rei da festa. Nas reuniões preparatórias, era comum o fato de muitas
pessoas antigas não me confidenciarem que ainda sentiam saudades das antigas festas, mas
até procuravam, saudosistamente, influenciar os rumos daquele evento, notadamente no
sentido de que voltássemos às práticas antigas, nas quais tudo, segundo eles, deveria correr de
graça durante os quatro dias. Para motivação, diziam que, justamente por que tudo era de
graça, houve festeiro que ganhou, em festas anteriores, mais de 120 bois e que, normalmente,
os Reis das festas, geralmente eram pessoas de destaque na sociedade mato-grossense, que
São Benedito derramava graças a mãos cheias a seus devotos. Para impressionar, relatavam
que muitos festeiros foram e ou acabaram sendo até ocupantes de altos cargos públicos e ou
galgaram destacadas posições na sociedade cuiabana. As pretensões da minha devoção a São
Benedito e Nossa Senhora do Rosário nunca chegaram a tais reivindicações. Porém, o
episódio relatado serviu para me ajudar a entender as razões do porquê, ainda hoje, ocorrem
acirradas disputas para ser festeiro deste santo.
A Festa como Movimento de Resistência
Não é possível deixar passar despercebido que, ao registrar os eventos aparentemente
circunstanciais, relativos à festa de São Benedito, se tenha somente a impressão de um
registro de mero produto de incidentes domésticos. As entrevistas mostraram que é
exatamente neste ponto que se encontra uma chave para a interpretação de uma ação muito
profunda que precisa ser decodificada. Em 1979, se percebia claramente que, em
conseqüência do inchaço da cidade e dos problemas sociais dele decorrentes, da bandidagem
com a conivência do Estado, (Gravação 6), aliada aos atos de resistência que se faziam à
Ditadura Militar de 1964, a Paróquia precisava iniciar práticas mais comprometidas com as
várias dimensões: saúde, política, social, educacional, religiosa, diálogo e da vida; o que fez
em várias frentes, tais como o apoio ostensivo aos Sem Terra, seja oferecendo-lhes o espaço
territorial da Igreja para acamparem e se reunirem enquanto diligenciava o agendamento de
contatos com o INCRA e demais autoridades, ou a cozinha para preparação da alimentação, e
o Templo para realização de missas. Quanto aos Sem-teto, além do acompanhamento de seus
pleitos, ajudou-os a se instalarem no território dos bairros invadidos. No campo dos Direitos
Humanos, cedeu o espaço físico para as reuniões e deu assistência em sua caminhada, e no
Ensino Religioso na Escola Pública, colaborou junto à Secretaria Estadual de Educação na
55
elaboração dos textos bases para essa disciplina. No Ecumenismo, realizou a aproximação
efetiva entre as Igrejas cristãs, seja em ações como a da realização da Semana de Oração pela
Unidade dos Cristãos, de cultos ecumênicos e outras práticas que colaboravam para a
cicatrização de feridas ainda existentes.
Usando uma expressão gaúcha, foi no “entrevero”
7
dessas ações aqui recordadas que
se percebeu que uma festa, se bem utilizada, pode ser transformada em um forte momento de
resistência. (Gravação nº 5 e confirmada pela gravação nº 6). A Festa de São Benedito sempre
serviu a propósitos, e sob uma nova orientação, pelo fato de se ordenar à Vida e à liberdade,
no contraforte de uma ditadura militar, com seus desaparecimentos e torturas, a Festa se
mostra como uma celebração religiosa eivada de apelo ético, clamando pela justiça por causa
da fé, que trazia na nova roupagem da cultura cuiabana, a leitura de um efetivo desgaste em
todas as formas autoritárias, antidemocráticas e ditatoriais de todas as organizações sociais de
então. Neste sentido, ela também servia como movimento de afirmação da cultura popular e
de reação ao sistema ditatorial da época. Para isso, o ambiente da festa permitiu aos festeiros
estimularem artistas e compositores, pintores, poetas cuiabanos, para que produzissem, em
suas criações artísticas, culturais etc. uma arte libertária, a fim de apresentarem essas criações
durante e no recinto da Festa de São Benedito, para que soassem como gritos de protestos.
Para maior estímulo, instituiu-se uma premiação àquelas criações que se destacassem, e,
claro, desde que estivessem enquadradas dentro da proposta e do projeto daquele evento,
sobretudo com o tema e lema da festa, sempre com um caráter voltado a uma espiritualidade
comprometida, de opção pelos pobres, em favor do engajamento e da transformação do país.
Portanto, a Festa de São Benedito transformou-se em um espaço de expressão popular, lugar
onde todos, além de festar, poderiam também apresentar seus eventuais trabalhos e expor suas
críticas através da exposição de sua arte, concorrendo a prêmios de valor cultural,
instrumentos de música, livros, bíblias. A partir dessa festa, preparada coletivamente pelos
grupos de base, preparavam-se também longamente, através de novenas, caminhadas,
reuniões prévias, no qual a festa era um dos momentos públicos de expressão do que estava
em curso. Havia ainda uma preocupação de que o espaço da festa fosse um momento
formativo, de sorte que cursos, encontros, seminários eram realizados com convidados que se
misturavam aos agentes de base e às lideranças das comunidades eclesiais de base para, na
ocasião, exporem e debaterem temas que levassem à politização, à mobilização e à
responsabilidade militante da fé. As obras de arte emolduravam, com suas temáticas
7
No conflito, na luta.
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provocativas e começaram a incomodar os olheiros de plantão. E não tardou a que, por
ocasião da realização de seus concursos para a escolha das letras musicais, muitos desses
trabalhos fossem reprimidos pela censura, pois em várias dessas letras ou trabalhos,
apareciam temas considerados como protestos perigosos. Uma destas músicas, de Tião Preto,
expunha de maneira clara o que ocorria:
Jesus Comunista
Um dia apareceu um homem
Humilde e bondoso,
Veio libertar os pobres
Das mãos dos poderosos,
Ele veio libertar o povo oprimido
E foi proclamado como subversivo.
Hoje quem luta com os pobres contra as injustiças
É chamado pelos poderosos de Jesus comunista!
Nesse terreno em que se deu vazão à criatividade através da arte popular local, na
interpretação de um dos personagens, havia uma leitura de que, na Festa, estava sendo gestada
uma nova proposta de luta mais ostensiva, e o poucos eram os que desejavam que o seu
protesto se materializasse em ações mais concretas contra a ditadura. Lembremo-nos de que,
segundo um depoente, a Paróquia teve, sob seu manto protetor, a pessoa que participou do
seqüestro do embaixador americano Charles Burke Elbrick, em setembro de 1969, bem como
parentes de vítimas desaparecidas e ou mortas, pessoas caçadas pela Ditadura, jovens
perseguidos e jurados de morte, enfim, perseguidos de todas as horas... Segundo essa e outras
leituras, disseram-me que, sob a pertinência de uma religiosidade popular, engendrava-se uma
fermentação nos espíritos para que, dentro de uma coerência com a Teologia da Libertação,
que assegurava a estreita e compacta subjetivação da luta por causa da fé, as ações chegassem
a extremos. Esse movimento que ali se gestava só não chegou a cair na clandestinidade
justamente porque houve, a tempo, a abertura política da época (depoente). A partir desse
movimento de pretensão de rompimento com o instituído, começaram a surgir com mais
clareza, para os propósitos desta pesquisa, novas setas indicativas de caminhos que pedem
novas leituras para uma percepção mais definida e lógica sobre o que procuro saber, ou seja,
dados que se relacionem com os propósitos de uma educação popular potencializadora de
Libertação. Justamente porque a resposta é provocativa, espero que isso desperte a
curiosidade de futuros pesquisadores. Finalizando, no próximo capítulo, apresentarei, de
forma comentada, dados que, ao serem analisados, mostraram as estratégias dos governos
57
militares e do estadual que provocaram profundos reflexos na territorialidade da Paróquia do
Rosário e São Benedito, na década de oitenta. Foi através de interpretações ideológicas e de
articulações que, ao que parece, ali foram sugeridas ações com a finalidade de construir uma
vontade coletiva, só que, agora, através de uma política de base nas camadas populares.
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3 A DINAMICIDADE DE UMA ÉPOCA CONTROVERTIDA E SEUS
EFEITOS NA PARÓQUIA DO ROSÁRIO E SÃO BENEDITO
Este capítulo apresentará, como antecipei, uma leitura sobre as pistas referentes
aos efeitos ocorridos na Paróquia do Rosário e São Benedito, de Cuiabá, decorrentes, em
grande parte, das estratégias governamentais de incentivo para a ocupação de espaços vazios
da região amazônica, incentivados, à época, pela Ditadura Militar; as conseqüências da
Divisão territorial do Estado de Mato Grosso, bem como uma rápida pincelada sobre a
correlação com a metodologia fenomenológica utilizada nesta pesquisa. Tendo como ponto de
partida, notadamente, os desafios surgidos com a divisão do Estado instituído pela Lei
Complementar nº 31, de 11de outubro de 1977, articularei as seções deste capítulo da seguinte
forma: As migrações e o inchaço da cidade, com ênfase naquelas relacionadas com a
espacialidade da Paróquia em estudo e na necessidade de rearticulação dos seus trabalhos e/ou
de novos reforços para as lides pastorais etc. Procurarei fornecer algumas pistas sobre as
lideranças, sobre aspectos considerados distintivos dos Movimentos Sociais ali surgidos,
sobre o Ecumenismo e o Ensino Religioso, e espero proporcionar uma leitura objetiva sobre
fatos que a pesquisa considerou marcantes e que ocorreram em uma época em ebulição.
Iniciemos a caminhada!
As migrações e o inchaço da cidade
Convém relembrar que, como estratégia de ocupação dos espaços vazios da região
amazônica, a Ditadura incentivou uma verdadeira marcha para o Oeste e ofereceu vários tipos
de incentivos fiscais a empresários que por aqui desejassem realizar investimentos. Mato
Grosso, com a nova divisão do Estado, instituída pela Lei Complementar 31, em 11 de
outubro de 1977, necessitava do aporte de novos investimentos para contribuir com a
consolidação de sua economia, justamente para compensar as perdas ocorridas em
conseqüência daquela divisão. Aliado a isso, estava em andamento a abertura sempre
59
protelada de uma nova fronteira agrícola, esta também sob os auspícios de grupos
internacionais respaldados pelos interesses dos governos estaduais e federais. Estes dois fatos
atraíram e estimularam a instalação, neste Estado, de várias colonizadoras, todas beneficiadas
com a concessão de grandes glebas de terras pelo Governo local e com vistas ao surgimento
de novas cidades para capitanearem novos pólos de desenvolvimento. Os conflitos de terras
no Rio Grande do Sul em Cacique Doble, Gleba Natalino, resultaram na busca por áreas
livres. O mesmo sucedeu imediatamente com a população do Paraná, sobretudo por gaúchos
ou colônias de origem sulista ou italiana. Por vezes, os colonizadores tinham ligações internas
com as Igrejas locais, tanto católicas como protestantes. Em nosso caso, a Luterana. Como
conseqüências de uma maciça propaganda de povoamento, grande número de pequenos
proprietários rurais, do sul do país e de outras regiões, venderam suas terras e vieram investir
nesta região. Junto com eles, outros trabalhadores por aqui aportaram, em busca das novas e
promissoras oportunidades de enriquecimento, prometidas pelos arautos das colonizadoras.
Encontraram muitas irregularidades, abandono, epidemias por conta da abertura da mata,
conflitos com populações indígenas, seringalistas e garimpeiros; ausência de estrutura de
saúde e educação; impossibilidade de retorno; ligações econômicas que acenavam, por
parte das cooperativas, uma continuidade do trabalho escravo, em determinados períodos. A
abertura da frente pioneira foi feita de forma violenta. Houve extermínio, por vezes ampliado,
da população que incomodava; ausência de legalidade ou utilização de assentamentos de
títulos falsos, com descrições de referência geográfica imprecisa que assegurava, por vezes, o
apoio da justiça, da política ou de esquemas paramilitares, ilegais. E então, a total falta de
estrutura, falta de comunicações, de estradas, de assistência médica e outros problemas,
aliados às epidemias da região, provocaram dificuldades de toda ordem, ocasionando o
inchaço da periferia da cidade de Cuiabá. Conseqüentemente, começam a aparecer na capital
novos tipos de problemas sociais, assim como o início de alguns novos bolsões de miséria. O
relato do Livro Tombo atribui esse êxodo rural à mecanização das lavouras, que expulsava o
trabalhador rural para as cidades. É desnecessário dizer que, se, por um lado, a política oficial
atraiu investimentos reais, por outro, gerou muitas expectativas irreais, provocou uma
mobilização de migrantes de diversas procedências e atraiu pequenos investidores sem muita
experiência, os quais, por falta de um melhor preparo e de uma melhor assistência oficial,
tornaram-se as vítimas imediatas do tão propalado milagre brasileiro. Não é de causar
surpresa, então, o fato de que as vítimas do interior tivessem que vir pedir socorro nesta
capital. E, por coincidência ou não, ou pelos apoios explícitos que ali se praticava, o território
da Paróquia do Rosário e São Benedito foi o reduto preferido daqueles que, procurando a terra
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prometida, estavam sendo tragados pelos desertos. É desse palco privilegiado que estarão
sendo extraídos muitos dos gritos de revolta contra o milagre dos generais. Vejamos a
pungência deste registro:
1975 Nos primeiros meses começou o trabalho no CARUMBÉ e São João dos
Lázaros. Uma equipe de cursilhistas começou a trabalhar no Jardim Leblon. Pelo
fim do ano começou a entrar muita gente nestes bairros. Vieram famílias e mais
famílias do interior do Mato Grosso, como do Nordeste, Minas, São Paulo onde anos
fez a mecanização da Lavoura Pobres, peregrinos sem dinheiro, sem trabalho, sem
terra e sem casa perseguidos e expulsos de suas terras e do seu trabalho. São os
frutos do milagre brasileiro dos Generais. Sofreram injustiças e perseguição. Não
tendo a onde ir, ocuparam nos cerrados da periferia da cidade onde nem cercas nem
sinal de dono o progresso se percebia. Quando perseguidos fizeram seus barracos.
Apareceram os tubarões reclamando posse de direito. Deu muita questão, mas a
Prefeitura desapropriou os donos da terra e loteou. Assim surgiu Barro Duro
Jardim Leblon Santo Antonio do Pedregal Bairro Areão Cabeça de Boi e
finalmente o Canjica. – O carumbé foi loteado primeiro (Livro Tombo, p. 54-55).
Não se dizia, mas freqüentemente havia estoque de terras, sobretudo quando, através
de informações privilegiadas, tinha-se conhecimento de planos de urbanização de uma
determinada área. Os terrenos eram comprados a preços baixíssimos e estocados para fins de
valorização. Por outro lado, toda vez que uma área ocupada era trabalhada, em pouco tempo
tinha água, luz, asfalto, que o mesmo povo que tinha recebido essas benfeitorias, sem que
os seus salários aumentassem, era obrigado, pelas circunstâncias, a ir viver mais retirado,
começando tudo de novo, procurando a ocupação e a abertura da cidade em outros lugares,
mais longínquos, desvalorizados, sem infra-estrutura, escola, trabalho próximo e assim por
diante. As aberturas de cidades ainda continuam sendo feitas com o suor e o sacrifício dos
pobres.
O despontar de um novo ciclo: Novos Atores Sociais, Símbolo de Mudança!
A Paróquia crescia em problemas, inchava a periferia de seu território e surgia a
necessidade de se dar organicidade aos trabalhos pastorais e sociais. Então se fez necessária a
vinda de mais colaboradores, preferencialmente de padres, com experiência em um novo
estilo de inserção social.
61
A inserção social de freiras e padres passou a se tornar um objetivo necessário e
louvável: o de estar presente e próximo à vida do povo. Tal inserção consistia em procurar
empregos de remuneração baixa, no nível econômico da vida da população e vivendo dois,
três, cinco anos num trabalho direto eclesial. Havia também outras formas, como a ocupação
de um trabalho profissional sem ligações imediatas com a(s) Igreja(s) e, por vezes,
preferencialmente sem se identificar como padre, para poder agir na comunidade como se
fosse um operário comum, a fim de adquirir uma nova experiência e incorporá-la à sua vida
sacerdotal para, quando necessário, colocá-la a serviço das comunidades em que fosse exercer
seu ministério e despertar nela as ações pontuais que as situações sociais viessem a requerer.
A raiz desta motivação era de cunho pastoral político-pedagógico, mas não deixava de ser
compreendida à luz da espiritualidade da encarnação: Jesus tomando um corpo e tornando-se
homem como todos. Em nossa pesquisa, descobrimos que um dos sacerdotes que por aqui
militaram, foi trabalhador metalúrgico em uma linha de montagem no ABC paulista.
Ninguém sabia nada a seu respeito. Ele era peão. Foi trabalhar porque queria um trabalho
direto e comum, igual ao das pessoas pobres. Ele foi morador da Favela Santo Eduardo, na
região leste de São Paulo. Ao pedir demissão de seu emprego de operário da metalurgia, o
patrão, que ignorava sua condição, ficou estremecido, não apenas porque desorganizava sua
produção com esta ausência, mas provavelmente ante a preocupação com sua imagem. Se, em
muitos momentos de conflito, aquele patrão julgava tratar com uma pessoa ingênua, agora
descobre, desconcertado, que tinha um peão com uma formação, um conhecimento, que era
padre e Jesuíta.
Quando nos referimos a Jesuítas, normalmente uma tendência a pensar em um
grupo coeso, que pensa em conjunto, que desencadeia ações sob a inspiração inaciana. Aqui
em Cuiabá, dentro de uma intencionalidade dialética fenomenológica, como em outros lugares
no mundo, também foram muitas as diferenças face às individualidades, à origem cultural, às
experiências de vida, à formação distinta e a concepções diferenciadas, teológicas e políticas.
Aqui também não foi diferente, pois havia um rompimento com certa postura tradicional, que
fez surgir um novo estilo de práxis dentro da então Província da Companhia de Jesus, em que
se praticaram algumas inovações em diálogo com a cultura popular e com as realidades locais.
Nos Movimentos Sociais pesquisados, ficou claro que foi realizado um trabalho com
eco e com abrangência, porque havia uma cultura eclesial que se redefinia, desde o Concílio
Vaticano II, Medellín e, mais tarde, Puebla. Havia uma postura crítica, naquele momento de
igreja, por algumas congregações femininas e masculinas, entre estas, os jesuítas, que tinham
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impacto na formação de opinião. Era o Brasil buscando formas de libertar-se da ditadura. Os
movimentos sociais reagiam e demandavam expressão e espaço. A greve do ABC abriu um
flanco que não mais se fecharia: o da participação coletiva e democrática, nos movimentos
sociais. Some-se o retorno de militantes políticos que tinham perspectivas mais avançadas
acerca dos processos sociais e voltavam para por as mãos na massa. Somente por isso, o
trabalho do Rosário não foi de uma minoria, da minoria de padres ali engajados. Havia uma
curiosa expectativa sobre o que ali iria acontecer. Efetivamente, para perceber que
determinados movimentos não representavam a totalidade dos jesuítas, e sim representavam
alguns jesuítas, os quais, por razões ideológicas, de comunhão de razões pastorais e de
interpretação de mundo, tinham outras referências, destacando-se entre essas, a do então geral
da Companhia de Jesus: Padre Pedro Arrupe. Sem anacronizar, na pesquisa sobre os
movimentos sociais ali encravados, percebe-se que alguns sacerdotes trabalharam de maneira
semelhante ao que se preconiza dentro de uma situação limite e dentro do binômio dialético
ação, reflexão, ação procurando reinventar lutas e buscando novas formas de expressá-las.
Um exemplo: Se na cristã a essência é Jesus Cristo, então as práticas litúrgicas e os
sacramentos etc. serão os caminhos para se chegar a essa essência. Mas não era somente
através das homilias das missas que eles ajudavam a encontrar novos rumos, novas essências.
Ora, na Paróquia do Rosário e São Benedito, as práticas de militância, geralmente,
implicavam intencionalidades amadurecidas e cheias de significações. Se, por um lado,
levavam ao desencadeamento de novas frentes de trabalhos sociais, por outro, realizavam a
completa reestruturação das eventuais práticas já existentes, seja prestando as necessárias
assessorias nos planejamentos ou capacitando as lideranças. Tratava-se, portanto, de uma
educação humanista crisque potencializava ao seu agente ser um novo sujeito apostólico.
Sujeito esse que realmente se engajava em atividades que visassem à transformação de
pessoas e estruturas sociais, portanto, com claras intenções de uma educação popular
potencializadora de Libertação. Ao menos é o que se depreende ao constatar que desejaram
criar, naquela instância, como dissemos: um Centro de Espiritualidade, Reflexão e Ação
Social’ no modelo jesuítico daqueles que existiam em toda a América Latina, sendo dois
deles no Brasil - o “Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Social IBRADES” (RJ), e o
Centro de Ação Social (CEAS), na Bahia. Em Cuiabá, faríamos uma base, epicentro de uma
articulação com a Amazônia. (PASSOS, in: correspondência eletrônica, posteriormente
transformado em artigo). que o referido projeto, por divergências de pontos de vista, não
conseguiu consolidar totalmente a sua implantação de direito, e sim, somente de fato.
Algumas práticas sociais preconizadas se desenvolveram, sendo que algumas tiveram
63
realmente as características de um desejado centro de capacitação. Este foi o caso do
Conselho Paroquial, por exemplo, das CEBs e, porque não dizer, a partir do ano 2.000, do
Centro Burnier Fé e Justiça.
Para somar esforços, na Paróquia em estudo, o Livro Tombo registra que, a partir de
Novembro de 1979, vieram para Cuiabá, o Padre Luiz Augusto Passos e o Padre João Manoel
Lima Mira (o Padre Joca), que permaneceu pouco tempo em Cuiabá. Padre negro, alma
gêmea que acompanhou Passos, ambos da cidade de Pelotas, do Estado do Rio Grande do
Sul. Sua passagem foi meteórica. Aqui ficou doente. Foi para o Japão trabalhar na
Universidade de SOFIA. Todavia, quando aqui chegaram, estes dois novos jesuítas deram
ênfase às pastorais sociais, notadamente as realizadas através do modelo das Comunidades
Eclesiais de Base (CEBs), movimento esse que, segundo consta, tinha forma de comunidades
ligadas a grandes igrejas, paróquias, não possuíam a forma dinâmica, flexível e pequena, de
núcleos, como costumava se organizar em nível de país. O modelo das CEBs ainda não existia
em Cuiabá. As CEBs de então praticavam um modelo democrático popular de organização da
Igreja. Se, por um lado, obedecia à dimensão de fé, por outro, articulava-se dentro de uma
perspectiva política bem definida e com uma espiritualidade combativa.
Após a saída do Padre Mira, o Padre Ivo José Hoffmann e o Padre Passos investiram
nas Pastorais sociais de apoio às lutas dos mais empobrecidos, fundamentados em uma lógica
de reinvenção da Educação Popular, e bastante engajados na luta por uma educação
potencializadora de libertação. A chegada, mais tarde, do Padre José Ten Cate, de certa forma
radicalizou as dimensões desta mesma luta. O Padre José Ten Cate vinha da militância na
Pastoral Operária, nos trabalhos de formação de militantes que atuassem no mundo do
trabalho, em uma perspectiva de alterar as relações ou de enfrentá-las coletivamente. Nunca
foi ignorado que o Padre José Ten Cate passava as noites panfleteando e pondo cartazes nos
postes, tomando posição junto às greves, tendo sido ferido muitas vezes nos confrontos corpo-
a-corpo com a polícia. Em um dos últimos dos quais participou, -uma greve de transporte
coletivo-, foram veiculadas imagens em nível nacional. José Ivo não agia diferente no que
tangia à defesa do espaço da população e foi no Bairro Quarta-feira que radicalizou sua luta
com risco, em certa ocasião, com confronto quase corporal. É possível criticar estas formas de
luta direta, contudo, na verdade isso ocorreu porque foram abertos precedentes de outra forma
de pensar e organizar os direitos da população. Hoje, as saudades deixadas entre as pessoas da
Paróquia Nossa Senhora do Rosário e entre os militantes dos Movimentos Sociais tanto pelo
Padre Passos, quanto pelo Padre Ivo e pelo Padre José Ten Cate, este último relembrado a
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cada momento após sua morte, são testemunho da afinação aos ideais defendidos por eles, na
radicalização da entrega de suas vidas, na luta direta que empreenderam.
Os depoimentos de todos os entrevistados salientam que aqueles atores sabiam que
enfrentariam focos de tensão com a ditadura e com a estrutura eclesial conservadora. Para
reforço e segurança, a partir de uma ação participativa, percebe-se, pelos relatos de seus
contatos, que eles, para obter respaldo e apoio, buscaram aliança e articulação de rede entre o
que se realizava nas pastorais, e politicamente, em nível de país, para aquilo que poriam em
marcha no Rosário. Criaram como que um guarda-chuva às iniciativas que, no futuro, eles,
juntamente com o povo, fariam surgir em Cuiabá. Vários depoimentos mostram que eles
entendiam que o isolamento das iniciativas paroquiais e nos movimentos sociais em curso
poderia ser tanto ou mais perigoso do que a ditadura. Justamente por isso, buscaram também
pessoas, movimentos, organizações que tivessem afinidade política e identidade religiosa e
pastoral com os movimentos locais. Desejavam, desde o princípio, que os trabalhos não
dependessem exclusivamente da organização ou de diretrizes da Igreja Católica local e da
regional e, de certa forma, pretenderam a autonomia da igreja. Se, na perspectiva religiosa, o
ecumenismo de fato era essencial por seu valor intrínseco e teológico, para a teologia da
libertação, perseguida por eles, essa dimensão representava, ao mesmo tempo, uma condição
estratégica para certa autonomia. Como? Apoiando a direção de determinados Movimentos
Sociais - Centro de Direitos Humanos Henrique Trindade, por exemplo, entregando sua
direção a um Pastor da Igreja Evangélica de Confissão Luterana; ou na organização do
Movimento de União e Consciência Negra propondo sua direção a pessoas ligadas ao Congá,
espiritismo local; ou organizando os movimentos com pessoas que não tinham nenhuma
articulação com a Igreja, como a Associação de Solidariedade às Comunidades Carentes de
Mato Grosso (ASCCMT). Essa estratégia espelha a importância, para eles, como dissemos
anteriormente, de não colocar na Igreja institucional Católica as bases principais dos
processos organizativos que viessem a apoiar. Evitavam, e foi importante, impossibilitar que a
Igreja institucional, por seu rígido poder hierárquico, pusesse, eventualmente, fim a esses
movimentos, ou os penalizasse, o que havia acontecido com outros padres que os tinham
precedido, de sorte que a hierarquia local e mesmo os conselhos paroquiais e suas estruturas
organizativas não teriam poder para extinguir nenhum desses processos de organização.
Conseqüentemente, é possível entender que realmente essa era mais uma das razões
pelas quais o trabalho com outras Igrejas institucionais poderia garantir um desdobramento a
prazo maior. A mesma razão acabou por definir, anteriormente, que alguns padres trouxessem
65
outras pessoas, de fora de Cuiabá, para um apoio imediato às iniciativas de organização.
Inicialmente, um jovem conhecido por um deles, de nome José Masiero e que, à sua chegada,
foi imediatamente morar no Bairro Leblon, trabalhando na construção civil e, mais tarde,
casou-se e teve filhos, residindo até o momento em Cuiabá. O citado padre João Manoel
Lima Mira, apelidado de o ‘Joca’, enviou do Rio de Janeiro, antes mesmo de ele próprio
chegar a Cuiabá, o jovem Sérgio Ferrez e, mais tarde, Iara Araújo hoje advogada – que aqui
se casou, teve seus filhos, e aqui está sediada até o presente momento, na atuação como
advogada e educadora. Masiero, Sérgio e Iara realizaram o importante trabalho inicial de
avaliarem com um olhar ‘de fora’ o que ocorria na paróquia, contribuindo na reflexão,
planejamento, execução e, sobretudo, na formação das comunidades, pastorais, círculos
bíblicos e na luta concreta do bairro, bem como junto com o Padre Passos, quando o Padre
Joca estava afastado, na organização do incipiente Partido dos Trabalhadores, ainda não
legalizado como partido, e que pretendia estabelecer um grande Projeto Nacional democrático
popular, possivelmente de massa, para o Brasil. Passos, trabalhando como metalúrgico em S.
Paulo, participara das reuniões dos núcleos em S. Miguel Paulista, visando à formação
desse Projeto Nacional. Relembro que, pelas informações obtidas, o PT então nem sonhava
em ser Partido, mas se estruturava como movimento dos trabalhadores. Padre Jacob Teodoro
Weber, precedeu a todos os padres citados neste trabalho. Era conhecido como um homem de
vozeirão forte e de atitudes extremas e sobre quem falaremos mais à frente. De momento,
posso dizer que a Paróquia do Rosário, antes da chegada dos jesuítas Luiz Augusto Passos,
João Manoel Lima Mira, apelidado de o ‘Joca’, e mesmo antes dos Padres José Ivo Hoffmann
e Padre José Ten Cate, que chegaram bem mais tarde, era capitaneada pelo Padre Jacob
Teodoro Weber, que tinha como ajudante o Padre José Luetkemeyer e o Padre Emílio
Reinher.
Quando chegaram os jesuítas destinados a atuarem no Projeto de formação de um
Centro de Reflexão e apoio a atividades da região, na perspectiva do Projeto Social da
Companhia de Jesus, neste mesmo projeto, era repensado o sentido da própria atividade de
uma Paróquia de Jesuítas. Conforme documentos, os jesuítas, sendo uma congregação
religiosa, na época, ordem religiosa, não tinham a estrita incumbência de desempenharem
funções de administração paroquial, como serviço diocesano ligado ao bispo. Havia certa
independência reconhecida, enquanto organização autônoma, na Igreja. A permanência deles
na Paróquia dependia da renovação esporádica do convênio com a diocese. E eles, desde a
década de quarenta, a tinham como local de serviço e apoio à missão indígena. Nos anos
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oitenta, contudo, a Paróquia parecia ser um centro de atividades pastorais voltado a ações de
assessoria, de apoio aos movimentos, de construção de um projeto que tinha nos setores
pobres a sua maior expressão. Tal projeto era fundado no que se conhecia como Comunidades
Eclesiais de Base e nas pastorais sociais, de sorte que não havia um projeto de cabeças
individuais, ainda que elas fossem fundamentais para a qualidade e eficácia do projeto em
questão. Isso provocou uma movimentação incomum e começou a chamar a atenção das
demais paróquias da Diocese de Cuiabá que não conseguiam compreender toda aquela
movimentação. Segundo depoente, a liderança exercida pela Igreja do Rosário e São
Benedito, de Cuiabá, na década de 80, fazia com que as pessoas pensassem que essa paróquia
tinha um projeto que, quando conhecido, poderia fornecer a chave de leitura que ajudaria a
entender toda a têmpera e a radicalidade que orientava as ações dos demais jesuítas daquela
comunidade. Será exatamente sobre isso que discorreremos a seguir.
Os Movimentos Sociais e a Educação Popular: A Radicalidade de uma Opção!
Vamos, a partir de agora, nos esforçar para compreender se os movimentos sociais
surgidos na Paróquia em estudo, na década de 80, foram realmente movimentos que tinham
uma orientação comum, se existia um projeto que unificava as ações, os objetivos, a
metodologia e como se fazia a leitura e a compreensão do mundo, dos processos políticos e o
significado deles na perspectiva das lutas sociais e se já poderíamos traduzir essas ações como
a busca da realização de uma educação popular potencializadora de Libertação. Inicialmente,
vale lembrar que, em que pese sua heterogeneidade e autonomia incomum, segundo um
depoente, esses movimentos sempre estiveram ancorados num projeto que, apesar das
diferenças, unificava-os como em rede, o que fazia com que os sujeitos acreditassem na
radicalidade de uma proposta, apesar dos impasses de uma Ditadura Militar.
Dentro do que preconiza a intencionalidade fenomenológica merleaupontyana, no
prólogo deste trabalho, procurou-se distinguir Movimento Popular, Movimento Social e
Educação Popular, definindo-os. Mencionei anteriormente que, para Frei Beto (In: FAVERO;
SEMERARO, 2003), o Movimento Popular é um tipo de movimento que congrega e mobiliza
o mundo popular e, sem querer entrar em definição geral, é composto por assalariados,
desempregados, excluídos e marginalizados, sendo, portanto, movimentos de conquista de
direitos, de resistência, de protestos. O que se percebe na paróquia em estudo é que, ainda que
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se pudesse discordar ou conceituar de maneira diferente esta distinção, esta diferença era o
que traçava a linha divisória nas lutas empreendidas pelos agentes de pastoral na Igreja do
Rosário, na década de oitenta. Entendia-se, como Frei Beto ensina, que a atuação é específica
e diferenciada de alguns outros Movimentos Sociais, que Movimento Popular é aquele que,
notadamente, mas nem sempre, tem uma atuação via ONGs, não aquelas, como disse, que
representam interesses internacionais, mas as representadas por grupos organizados, por
cooperativas etc. e que trabalham em função de demandas específicas (FÁVERO;
SEMERARO, 2003). Por isso, quando falo resumidamente em Hortas Comunitárias, em
apoio ao MST e ou em ações pontuais em passeatas etc., procuro relacionar estas ações às de
movimentos populares, embora também, em dados momentos, estejam contempladas ações de
atuação características dos Movimentos Sociais e da forma como estão definidos acima, isto
é, como movimentos que trabalhavam e ou ainda trabalham em função de demandas
específicas - CDHHT, CEBs, Criação do PT, Escola Fé e Alegria entre outros.
Para alicerçar a argumentação sobre o assunto em estudo, durante a pesquisa, embora
tenhamos extraído vários dados do Livro Tombo da Igreja do Rosário e São Benedito, dados
esses que até foram cotejados com outros documentos oficiais, tais como o Guia de Visitação
da referida Paróquia, a bem da verdade, esclareço que o produto das entrevistas realizadas foi
o que possibilitou maior clareza do que acima descrevemos. Para se ter uma idéia das
dificuldades encontradas, notadamente a da ausência de documentos que autentiquem muitas
informações colhidas, registro com certa tristeza o que um dos entrevistados assegurou.
Disse-me ele que por questão de segurança, houve até a necessidade da queima de vários
documentos importantíssimos”, (GRAVAÇÃO 4 - Felinto–13-10-2007) trecho sublinhado
por mim. Portanto, em atenção a uma necessária preocupação epistemológica, alerto que os
meus entrevistados são o que posso chamar de os meus verdadeiros arquivos vivos e dos quais
muitas vezes me utilizo. Vejamos o que um deles me disse:
“Nós estávamos saindo da Ditadura Militar. Então, muita coisa não
podia ser registrada. OK. Inclusive talvez o nascimento da CPT?
Ninguém podia assinar que era pego e massacrado mesmo. E então,
uma das funções que eu tinha como Coordenador, ou vamos dizer
animador da Pastoral Social, era fazer acontecer os movimentos”
(GRAVAÇÃO Nº 4 – Felinto -13-10-2007).
68
No intuito de oferecer uma leitura ainda mais consistente sobre o fenômeno
“Movimentos Sociais”, aterrissados em uma territorialidade sob os efeitos de uma Ditadura
Militar e, conforme aqui está sendo descrito, procurei rebuscar alguns apontamentos efetuados
em um curso ministrado pelo professor e ex-padre Jonel, em que colhi e selecionei
informações sobre as influências emanadas da III Conferência Geral do Episcopado Latino
Americano de Puebla (1979). Para reforçar, também adicionei dados colhidos em leituras
feitas em alguns eventos eclesiais, notadamente sobre aqueles relacionados às Conferências
Episcopais Latino-Americanas do Rio de Janeiro, (1955); de Medellín (1968) e na Teologia
da Libertação. Fiz isso porque tento compreender o que dizem ser a mística que caracterizou
os movimentos sociais que pesquisei, especialmente a referente à polêmica opção preferencial
pelos pobres.
Como aqui tratamos de fatos ocorridos em Movimentos Sociais surgidos na Paróquia
do Rosário e São Benedito, de Cuiabá, ou seja, dentro da espacialidade territorial da Igreja
Católica Apostólica Romana, desejo fazer outro alerta: embora eu seja católico, quero
salientar que o produto desta pesquisa não reflete eleição de uma eticidade. Não é nada disso.
Os fatos aqui narrados referem-se estritamente ao resultado do desafio que possibilitou este
trabalho naquele espaço eclesial. Por isso, não me permito entrar na discussão sobre a
Instituição Igreja, se ou não uma Igreja, se ela reflete metades sociais e tendências gerais
da sociedade, suas ideologias, clivagens etc., ou se a Igreja como pertencente ao mundo é pólo
social que concilia determinadas contradições. Aqui, respeito a todos aqueles e aquelas que,
no seu modo de pensar, têm leituras diferenciadas de um mesmo acontecimento social. Faço
estes esclarecimentos, pois, como poderão notar, algumas das opiniões não obtiveram
consenso entre os entrevistados. Como o meu material de pesquisa expressa diferenças de
pontos de vista entre os atores, e no intuito de abrir temas para sadia discussão, permito-me
aproveitar trechos de entrevistas como, por exemplo, a do Padre Pedro Schroeder, em que
comenta sobre a sua experiência na Paróquia em estudo, ou de Passos que, logo a seguir, nos
mostra pontos de tensão e leituras interessantes sobre a educação pública, privada e o Estado.
Vejamos:
Na década de 1970, com a anistia, os exilados políticos retornam ao país em 1978 e
1979. Com isso, praticamente mudou toda a configuração por parte de um governo
que agora permite o surgimento de Movimentos Sociais, não tão vinculados ao
regime então vigente como antes, eis que até então, esses Movimentos eram muito
reprimidos, e a não ser que estivessem estritamente ligados ao sistema, não
poderiam ter atuação como algo independente ou de confrontação com a Ditadura.
Os Movimentos Sociais de agora vieram justamente com o perfil de mostrar um
69
modelo de trabalho e de organização e de assistência à sociedade, não paralelos ao
governo e sem a idéia de uma confrontação. Porém, na Paróquia em estudo, os
Movimentos Sociais surgiram não só como uma alternativa de serviço e organização
social, mas sim, em parte, como ação de confronto e para fazer valer todo aquele
discurso de democracia que estava se fazendo presente, e como cobrança da omissão
do governo nas suas ações de política públicas, de assistência à sociedade e etc. O Fé
e Alegria, por exemplo, veio como movimento social não de apoio ao serviço de
educação de qualidade, mas como um serviço público (como resposta a uma
demanda pública). Em 1984 firmou um Convênio com a Secretaria de Educação do
Estado para manter a Escola. Isso foi tido pelos Movimentos Sociais da época como
um ato de pelego, e, por isso mesmo, foi muito criticado porque caracterizava uma
aliança com um governo cujo objetivo era mais o de ser criticado e jamais o de ser
aliado ou parceiro. E teve que funcionar o bom senso e a diplomacia de Passos
para serenar os ânimos. por exemplo o MST, ou CPT, CIMI, são movimentos que
surgem com uma forte atuação de reivindicação de direitos, de participação da
sociedade de direitos civis, de cobrança ao governo num maior compromisso com a
situação social do povo e etc. Uma Pessoa que não aparece muito, Inácio Werner, o
Tião Preto que teve um trabalho com o Padre Teodoro, com Passos, em
assentamentos...Ele morou na Paróquia e teve uma atuação mais no interior, como
em Rosário Oeste, Nobres e etc. Medellín e Puebla foram os momentos fortes de
estudo e que deram a base para os trabalhos ali encetados (GRAVAÇÃO 3
Padre Pedro -17.09.2007).
Na seqüência, e após a entrevista com o Padre Pedro, colhi a explicação que
transcrevo na íntegra e que tem a intenção de permitir uma clarificação sobre o entendimento
que os Movimentos Sociais da Paróquia, na época, tinham sobre a sua contribuição para a
Educação neste Estado.
Foi isso mesmo, professor. Quando Serys, junto com Darci Secchi meu colega, com
João Monlevade do PT assumiram a secretaria de educação do Dante, e eu fui pedir
convênio, eles disseram que nós éramos de e Alegria um grupo privado,
particular, e que o dinheiro público era para as escolas públicas. Tive que lhes dizer
em bom português, mas não dessa forma que isso era leitura política equivocada;
e Alegria não era um grupo privado, era público, sua contribuição à educação dos
setores empobrecidos não era cobrada de forma alguma, era prestação de serviço
público, o que e Alegria não era, e não queria ser era ESTADO. Serviço público
disse-lhes - não se confunde com serviço estatal. Até porque freqüentemente o
Estado não era público! Levaram meses para deglutir, mas acabaram reconhecendo
nossa condição específica (PASSOS, EM ORIENTAÇÃO).
Como podemos apreender da fala do professor Passos, correntes com formas
diferenciadas de compreender o que é público e o que é Estatal. A Educação é de interesse
público, é obrigação do administrador público, é destinada ao conjunto da população e
regulamentada por legislação própria, faz parte do conjunto de deveres dos governantes e dos
direitos dos cidadãos. É por isto que concordo com Scherer-Warren (2005, p.113 a 118)
quando ela discute a incapacidade do Estado em gerenciar satisfatoriamente os serviços
públicos indispensáveis e mostra a desmodernização política, a exclusão econômica, a
70
pobreza e o aumento da desigualdade social, a desordem urbana e a escalada da violência
organizada, o que gera espaço para a expressão de novos atores socais fazer uma verdadeira
rede de movimentos que visam suprir estas necessidades e garantir os direitos sociais.
Também entendo que uma nação independe da existência de um Estado território (ex: o
povo Judeu), no entanto, quando temos um Estado, este tem como uma de suas finalidades
legislar sobre a Educação, seja ela oferecida por instituições de interesses privados,
normalmente econômicos, seja ela oferecida por instituições de interesse público (não
econômico), podendo ser, dessa maneira, oferecida pelo próprio Estado, através de seus
ministérios, secretarias etc., ou por Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público-
OSCIP Lei 9790 de 1999. E essa é uma luta que e Alegria antecipava desde a década
de 80, mostrando seu pioneirismo, engrossando as fileiras daqueles que ajudaram na
implantação e no reconhecimento definitivo deste dever do Estado e direito do cidadão. Por
isso mesmo, podemos dizer que os movimentos da Paróquia em estudo tinham características
do que entendemos como Educação Popular, pois estavam voltados para a defesa dos
interesses de classes. Vejamos:
a educação popular é um processo de formação e capacitação que se dentro de
uma perspectiva política de classe e que toma parte ou se vincula à ação organizada
do povo, das massas, para alcançar o objetivo de construir uma sociedade nova, de
acordo com seus interesses (NÚÑEZ-HURTADO, 1993, p. 8).
Portanto, como podemos observar na Paróquia do Rosário, foi na legalidade das
organizações populares e na sua multiplicidade que, a partir do povo organizado,
desenvolveu-se a capacidade de pensar por si mesmo e participar plenamente do processo
Libertador, bem ao estilo freireano.
Um território provocante
No aspecto de pesquisa qualitativa, de perfil analítico-compreensivo, com enfoque na
intencionalidade fenomenológica merleaupontyana, e com o propósito de captar parte
significativa das prováveis intenções, desejos, interesses, sentidos pelos quais, na década de
oitenta, tantos buscaram o espaço e trabalharam na territorialidade de uma Igreja que tanto me
fascina, chama atenção o fato de que, ao caldeirão de propostas existentes naquele território
71
somaram-se outras ações sociais, tais como a presença, naquela jurisdição paroquial, sem
vínculo com a igreja, de representantes da Universidade Federal de Mato Grosso – UFMT. Na
perspectiva de ação social, vejo isso como uma inteligente capacidade de iniciativa acadêmica
que descobre o potencial e a riqueza de um espaço prenhe de oportunidades possibilitadoras
de uma prática de ações que permitiram aos seus profissionais avançarem juntos em direção a
libertações. Para que não surjam distintas interpretações e até para uma melhor compreensão
das outras seções deste trabalho, entendo por bem transcrever, na íntegra, os dados colhidos
junto à ilustre professora Drª Artemis Torres, conforme segue:
Havia na UFMT um núcleo de pesquisa e pós-graduação em educação (NPG-EDU),
no qual participamos, eu, Paulo Speller, Joaquim Barbosa e outros. João Monlevade,
também da UFMT e do Departamento de Educação, articula-se com os três
primeiros numa tarefa de redação de artigos sobre educação, para o Diário de
Cuiabá. Durante um ano. João Monlevade, no entanto, tem seu nome mais vinculado
ao Sintep, do qual era um líder muito respeitado, naquela época. Quanto ao Eudson,
sociólogo, também se articula com o NPG-EDU, em discussões que fazíamos sobre
a realidade social, econômica e política de Mato Grosso, que foram, aliás, células
fomentadoras da fundação do GERA (Grupo de estudos rurais da
Amazônia)/UFMT, que ele coordenou por vários anos. No trabalho do Bela Vista,
além de outros, estivemos Paulo e eu, que éramos os que buscávamos uma
aproximação com o Passos.
O Eudson e o Monlevade, originários do PMDB, se transferiram para o PT, partido
do qual participei desde o início, no Rio de Janeiro, acompanhando as primeiras
discussões de pré-fundação e tendo tido também oportunidade de presenciar o ato de
fundação, assinando a ata da famosa reunião, em S. Paulo, no Colégio Sion, em
fevereiro de 80, se bem me lembro. Início do ano seguinte, concluído meu mestrado,
retornei a Cuiabá. Antes, porém, busquei informação sobre possíveis parceiros de
PT, em Cuiabá, tendo sabido de Gilney Vianna, que, segundo me informaram, teria
se mudado pra cá, com a missão de ajudar a criar o PT, em Mato Grosso. Foi de
fato, um líder de presença marcante, nesse processo. E, como no Rio eu
acompanhava meu então marido Luiz Scala em um trabalho de educação em saúde
pública, na periferia (Padre Miguel), também tive interesse de saber quem poderia
ser um contato em Cuiabá, que tivesse atuação na periferia. Foi quando me deram o
nome do Padre Passos. No mesmo ano de 81, ao retornar a Cuiabá, imediatamente
ingressei no NPG-EDU, como faziam os recém-titulados como mestres e dispostos a
continuar fazendo pesquisa. Nesse semestre, surgiu um convite ao Luiz Scala, ainda
meu marido, para auxiliar a paróquia do Rosário, na pastoral de saúde, no bairro
Pedregal. Foi quando conhecemos o Passos. Em seguida, veio a possibilidade de,
pelo NPG-EDU, desenvolver um projeto na periferia, com verba do Prodasec, um
programa do MEC. Foi quando levei o Paulo Speller, consultor do NPG-EDU e
coordenador do Projeto do Prodasec, para uma conversa com o Passos, uma vez que
os bairros escolhidos estavam nos limites da paróquia do Rosário (Bela Vista,
Carumbé e Planalto).
Como resultado, não necessariamente desta aproximação, e sim estimulada por um
conjunto de forças que se articularam, surgiu a luta pela implantação de uma escola pública
no Bairro Bela Vista, em uma perspectiva de construção da democracia e de autonomia e
72
gestão de recursos. A referida escola pública foi construída com a ajuda dos moradores
daquele Bairro engrossando o rol de ações sociais encetadas na área de ação daquela paróquia
(TORRES, 1994). Segundo um depoente, havia, ainda, naqueles tempos, através de Enelinda
Scalla, uma luta forte da universidade na saúde pública e outras no campo de alternativas de
energia, na luta sindical, bem como havia um desenvolvimento significativo da Associação
dos Professores, que precedia o SINTEP, e que movimentara a primeira greve em 1979, em
favor da gestão democrática. A associação mato-grossense dos estudantes se manifestava e
surgiam as lutas nas associações de Bairros na FEMAB, as atuações do Movimento contra
carestia, as lutas da oposição no órgão trabalhista que lutava com os trabalhadores rurais. Não
estava, por isso, a igreja do Rosário isolada. Havia um conjunto de dimensões intersubjetivas,
de respostas às angústias de muitos, de expectativas daqueles que não tinham, efetivamente,
face às arbitrariedades, a que ou quem recorrerem. Na verdade, para amenizar situações, não
tinham sido nem as soluções, que ninguém as tinha, não tinha sido o serviço jurídico, que na
verdade pouco funcionava, em um sistema de arbitrariedade escancarada, nem o apoio no
diálogo com o Estado que fazia ouvidos de mercador, e até subscrevia para dentro dos
sistemas de segurança e justiça, bandidos armados, com carros sem placas, abertamente, numa
ordem alheia à constitucionalidade e tecida de exceção. O que, então, levava a buscar o
espaço da Igreja do Rosário? O desespero. A esperança de poder ser ouvido. A esperança de
que havia um lugar em que essas estórias não expressas até então de certa forma saíssem
do anonimato e virassem linguagem. E viravam denúncias! Juntavam pessoas que pudessem
conversar sobre as violências sofridas, amenizavam o pânico, tiravam o medo dos que se
sentiam ilhados por ele. Por muitos anos, pessoas ameaçadas buscavam inclusive o amparo do
teto da Igreja. Eram jovens marcados para morrer, pessoas perseguidas pelas polícias políticas
do Uruguai, do Chile, mas também brasileiros recém-retornados da Ditadura. Havia algumas
ações que eram realizadas pela intercessão de pessoas que tinham escasso acesso aos órgãos
de segurança e que, nas denúncias, podiam parcialmente freá-los. Essas pessoas, cujos nomes
ainda precisam ser preservados de publicação, ligadas à Igreja, conforme podemos perceber,
fizeram um bem enorme àqueles que careciam de apoio, de libertação. Houve, ainda, durante
o período militar, um serviço na igreja do Rosário, que se chamava Serviço de Informação
Nacional, SIN. O SIN tinha uma de suas bases na Igreja do Rosário e funcionava como uma
rede, da qual faziam parte todos os Centros de Direitos Humanos, Centro Indigenista
Missionário, Comissão Pastoral da Terra, pessoas individualmente que tinham um recurso
pequeno, de emergência, para divulgar ou por telefone, ou por escrito (correio), toda e
qualquer denúncia. Havia ainda uma rede local de entidades, grupos e movimentos signatários
73
das denúncias, que eram enviadas para todos os outros núcleos. Estes núcleos tinham ainda
ligações com pessoas importantes dentro da institucionalidade, muitos no anonimato, que
divulgavam as informações. Muitas vezes, esta era a única maneira de respaldar pessoas
ameaçadas. Ao mesmo tempo, enviavam, juntos, telegramas para deputados, senadores, sobre
pessoas envolvidas na prática de violências, autoridades do judiciário ou nos aparelhos
policiais e de segurança mostrando que, em curto espaço de tempo, entidades e pessoas de
todo o país estavam monitorando as violências que se processavam. Havia ainda pessoas
ligadas aos meios de Comunicação, jornalistas, alguns periódicos, boletins que floresceram do
nada, em todas as Igrejas e movimentos de Igrejas, que formavam uma imprensa nanica de
informação e que prestavam um enorme trabalho de divulgação, apoio, informação e
denúncia. “De Cuiabá tínhamos acesso, contava Passos, a pessoas dum influente canal de
Televisão e que, por três ou quatro vezes, solicitamos a ajuda desta pessoa, porque tínhamos
necessidade que a pauta do jornal nacional divulgasse o que aqui estava acontecendo, dado
que a imprensa local estava mancomunada com as atrocidades. E, nestas vezes,
“milagrosamente” funcionou. O Jornal Nacional mandou a pauta para a emissora de Cuiabá e,
de certa forma, o Brasil ficava sabendo do que o aparecia no Jornal televisivo local. O caso
das pessoas queimadas vivas em Matupá, a fita realizada de modo caseiro, e, sequer
estávamos sob ditadura, foi enviado para o exterior através da anistia internacional e houve
pressão sobre o governo brasileiro.” Em alguns casos, durante a ditadura, conta ainda Passos,
havia um piloto da Varig que levava o dosspara fora do país. Tratava-se de uma rede de
pessoas de todos os matizes que prestaram serviços àqueles que estavam condenados à morte
ou expostos às violências. Em grande parte, isso freava os militares, os órgãos de
(in)segurança. É importante ainda lembrar que o grande evento de direitos humanos em que se
reuniram, em uma única semana, em Cuiabá, grandes juristas, mencionados, Hélio Bicudo,
Dalmo Dallari, também D. Luciano, tinha claramente definido na pauta que os Direitos
Humanos eram direitos dos Oprimidos e ficava evidente a linha divisória entre os oprimidos e
os que lideravam as violências contra eles: O Estado. Se consultarmos os trabalhos de
Boaventura de Souza Santos (2000), veremos que o que se apontava naquele tempo era que a
declaração dos direitos humanos servia aos brancos, ao poder, à minoria, aos cidadãos de
elite, mas não contemplavam diferenças raciais e étnicas, não consideravam as grandes
maiorias. A semana na rua, à frente da Igreja do Rosário, mas também nos Bairros durante a
noite, com a presença da viúva de Henrique Trindade, denunciava a violência do aparato legal
e judicial, além disso, ensinava, através de Jair Kristche, que havia legalidade que a própria
comunidade tinha que assumir, afora os procedimentos ortodoxos que freavam por vezes na
74
formalidade, a justiça. Ele fora o grande e terrível advogado, sem nenhum título na área de
direito, que acompanhou casos, inclusive internacionais, como o da presa política brasileira no
Uruguai, Flávia Schilling, através do Movimento de Direitos Humanos de Porto Alegre e que
formava a população nos bairros para entrarem legalmente com representações, por vezes sem
advogados. Quando mergulhamos na complexidade infinita de sentidos, é significante o
porquê, na paróquia em estudo, houve a interlocução com outros pontos de vista, nossos
atores comungavam com outros caminhos, alternativos, para resolver situações localizadas e
semelhantes àquelas que tanto incomodaram o poder instituído. A tal ponto de se nos permitir
traçar paralelos com aqueles que, na época, se registraram, tanto no interior do Estado de
Mato Grosso, como nesta capital, de onde extraímos os registros das constantes denúncias de
práticas de violação de direitos e prisões arbitrárias. Foi assim com o caso do Padre Balduino
Loebens, preso sigilosamente em de Agosto de 1985, e até de assassinatos de sacerdotes,
como foi o caso do Padre Ezequiel Ramin, em de setembro de 1985 (LIVRO TOMBO,
p.76), do Padre Jesuíta Vicente Cañas encontrado morto em 16-05-1987 (SILVA, 2005, p.
45), ou de líderes leigos, como Henrique José Trindade, assassinado em Capão Verde,
conforme noticiado no Jornal Diário de Cuiabá de 09-09-1982 e que empresta nome ao
Centro de Direitos Humanos. No período de 30 de outubro a 10 de Dezembro de 1984, em
Cuiabá, sete pessoas foram assassinadas (seis homens e uma mulher) por policiais, com um
tiro na nuca e todos, com exceção da mulher foram encontrados com o rosto amarrado com
uma tira de toalha azul - Jornal Diário de Cuiabá, 30 de outubro de 1984 - (SILVA, 2005,
p.40). Muitos destes crimes, por incrível que pareça, ainda não foram definitivamente
julgados. A lista é grande. Se nos aprofundarmos nas análises sobre os constantes crimes de
arrombamento de salas, violações de correspondências e ou ameaças veladas, subtração de
materiais, enfim, não será surpresa se, no futuro, algum pesquisador se deparar com serviçais
da ditadura infiltrados nas atividades dos Movimentos Sociais em estudo. Há hoje, nos
arquivos locais da ditadura, postos à pesquisa pública, os nomes dos pretensos envolvidos em
subversão ao regime militar. ainda registros em que se mostra que uma considerável
parcela da cuiabania protestou contra as mudanças, mostrando-nos, com isso, que havia uma
função progressiva de um novo caminho alternativo, que ocupava espaço, que tomava fôlego
e incomodava a cultura tradicional até então ali encravada - (GRAVAÇÃO, 6), (Idem,
LIVRO TOMBO).
Desiludidos pela impunidade dos mentores destas e de outras barbáries, pode-se
dizer que foi na zanga, na denúncia, na revolta ou no silêncio das catacumbas da Prainha de
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tantas tradições, que se forjaram as lutas desses contestadores que, desafiadoramente,
instigaram e alimentaram o ideário dos movimentos sociais que floresceram na jurisdição da
Igreja do Rosário e São Benedito. Foi ali que mentores, com muita eficiência, burilaram a
pedra bruta da insatisfação social, transformando-a em marcos diferenciados que tanto
contribuíram para quebrar as correntes de opressão. A influência desses acontecimentos,
como em uma espiral, chama atenção a tal ponto que, ainda hoje, esses ruídos continuam
chegando a locais como, por exemplo, os embates acadêmicos travados no Grupo de
Pesquisas em Movimentos Sociais e Educação GPMSE, do Programa de Pós-Graduação em
Educação, do Instituto de Educação da Universidade Federal de Mato Grosso –UFMT, onde
os mestrandos procuram auscultá-los, ora cada um dando sua perspectiva significadora, ora
com Edna Silva dedicando-se a pesquisas no campo dos Direitos Humanos, outros dando
pistas e informações ainda não vindas a lume e em que se toma conhecimento de um certo
Tião Preto, que formatou um precioso livrinho, publicado inclusive fora do país: Os direitos
Humanos em cordel. Este Tião Preto mereceu uma pesquisa na UFMT que tomou o formato
de monografia, na qual procuram entender como Tião, que não tinha estudo, tinha tanta
informação social, política e de luta. Nos estudos sobre o e Alegria, processo educacional
que em fenomenologia é uma dialética humana e que consiste na capacidade de orientar-se
para o possível, superando-se a si mesmo (SEVERINO, 1999, p.81), vimos, na entrevista com
o Padre Pedro que, na briga pela igualdade de oportunidades, embora procurando libertar-se
do Estado, serviram-se do Estado. Nas novas significações das festas de São Benedito, Dejacy
nos faz acompanhar as caminhadas e as bandeiras do santo negro e provoca até nossas
lembranças de Sérgio Schaefer, ex-jesuíta, quando nos dizia sobre a Festa de São Benedito:
“Peneira de garimpeiro que a Jesus Cristo só não bamburra
Costela de peão magro que aparece para levar surra..
São festas de mil leilões que entristecem os padroeiros...
Intrigas e egoísmo que enaltecem politiqueiros...
É bem aqui, é bem aqui que Jesus Cristo quer sua igreja,
Humilde e forte, servindo a todos, que seja assim que assim seja!”(Passos)
Para entendermos essas intencionalidades, ou seja, a tentativa de tornar explícitos os
processos sociais criados para projetar uma consciência de mundo, nos quais se propuseram a
transformá-lo através da experiência pessoal, dotando-o de uma consciência que criasse novas
significações, aqui a percepção, isto é, o fazer o outro ver o que eu vejo, me faz dialogar com
76
Gohn (2002), quando ensina que a fenomenologia é uma importante fonte de referência à
abordagem dos Novos Movimentos Sociais, dizendo que:
Outra fonte de referência à abordagem dos Novos Movimentos Sociais é a
fenomenologia. Duas categorias básicas cotidiano e cultura presentes nas
diferentes abordagens sobre a questão dos movimentos sociais m seus
fundamentos nesta abordagem (GOHN, p. 136-137).
Ora, é justamente ao cotidiano e ao cultural que estamos nos referindo. Portanto, é
nestas categorias que estamos fazendo as nossas abordagens e bem dentro dos seus
pressupostos específicos. Partindo do pressuposto de que “o mundo é um horizonte no qual os
objetos são percebidos de vários pontos de vista”, quando tento abordá-lo, tenho que respeitar
a subjetividade dos sujeitos como inseparáveis dos fenômenos, entendendo que, “ao se
revelarem à percepção se abrem ao mundo”, pois quando
...estivermos dando importância à consciência dos indivíduos seja no
questionamento da vida social, na busca da intencionalidade da consciência, na
importância da experiência na vida dos indivíduos, gerando hábitos e atitudes
cognitivas e tentando tornar explícita a consciência daquilo que estava latente na
vida cotidiana e, que se encontrava dissimulado (...), aqui o entendimento da vida
cotidiana não deve ser visto como o “da mera aceitação do senso comum, mas a
busca de significados sociais dos fenômenos que serviram para configurar o fato
cotidiano (SEVERINO, 1999, p. 111).
Portanto, aqui estou me sentindo como que mergulhado em um mundo, e em um
mundo com objetos, sujeitos e signos polissêmicos, isto é, com muitos sentidos, e procuro
descrever, sempre que possível, os prováveis sentidos que pude colher desses fenômenos
(REZENDE, 1990, p.13-15), notadamente o daquele que tem a pretensão de ser o que me leve
a responder se posso falar em um processo educacional popular capaz de provocar libertação.
E isso me leva a pensar em um processo, isto é, em uma transformação em operação, em uma
mudança permanente, em um sistema educacional que esteve produzindo pessoas, vidas, e
exigindo participação, autonomia e emancipação dentro de um extrato ou classe popular, de
explorados, empobrecidos, oprimidos, excluídos, vítimas de um capitalismo selvagem e de
uma ditadura implacável, mas que agora percebo: iniciaram um caminho potencializador e
provocador de uma libertação que conduzia, ao retirar as algemas ou os grilhões que
impediam as pessoas de se gentificarem (FREIRE, 2006). A seguir, nesse mergulho, pretendo
cimentar a argumentação sobre a influência que determinados movimentos sociais exerceram
77
no território da Paróquia do Rosário e São Benedito, de Cuiabá, na década de 1980. Porém,
antes disso, entendo ser prudente discorrer ligeiramente sobre algumas das ondas que varriam
o continente sul-americano no decênio em estudo. Sem a pretensão de uma cientificidade,
tentarei fazer a catalogação de alguns dos fatos que considerei muito marcantes para auxiliar
na compreensão do período que compreende este estudo.
1980 – Uma década de Contestação e de Abertura
O limiar da década de 80 foi uma temporalidade de final da gravidez dos
acontecimentos engendrados a partir do divisor de águas de 1968, os quais, em pleno
epicentro de uma Guerra Fria, levantaram a bandeira de “Paz e Amor”, o “Faça Amor, não
Faça Guerra” e se espraiaram sugestionando episódios em várias partes do ecúmeno. Na
América Latina, como movimentos de reação aos regimes ditatoriais de então, podemos citar
o Movimento dos Tupamaros, o dos Zapatistas, o MR8 e outros Movimentos de contestação,
com suas vozes que ecoavam provocando profundas reflexões nas juvenis cabeças das
mocidades sul-americanas, notadamente naquelas dos que transitavam pelos Movimentos
Sociais daquele período. Nos Estados Unidos da América do Norte ou na velha e
sugestionadora Europa, frontes sisudas mostravam-se preocupadas com os acontecimentos de
Cuba, da URSS, da China, do Vietnã, da África ou daqui, do Novo Mundo, onde existiam
atores que estudavam Marx, Engels, Lenin, Trotsky, Mao, Stalin e a Teologia da Libertação.
Havia os profetas, que rasgavam os véus do tempo para dar visibilidade a um futuro, em que,
sequiosos, todos pudessem beber do poço das refrescantes águas acenadas pelos discursos de
gentes vestidas de pombos da paz, mas muitos deles vilões, verdadeiros lobos travestidos de
ovelhas. Sonhos de esperança da era de Aquário e de queima de pestanas de pesquisadores, de
sociólogos, de padres, de militantes, de Teóricos e de Igrejas, desejosos de reascenderem a
força da raça humana diante da opressão. Também bebemos dessas promíscuas fontes, que
hoje transformaram alguns de seus lagos em depositários de águas amargas, especialmente as
que corroem salários, aposentadorias, ou negam o direito à saúde, à educação e derrocaram o
Estado do Bem Estar Social e deveres mais. Estranho mundo esse do esquecimento que
provoca a sonolência preguiçosa em consciências entorpecidas pelos venenos que fritam
aqueles que ousam ser voz nos desertos. “Se querem te fritar, lembra-te de que é nas
catacumbas que se forjam homens e mulheres de melhor têmpera”, disse-me Passos.
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Em um pequeno exercício de rememoração, desejo lembrar um pouco o que me
marcou e que julgo significativo e possível de estabelecer relações com os fatos ocorridos no
Rosário, na década de 80. Em 1964, no Brasil, com o golpe militar de 31 de março, foram
fechados os sindicatos e as liberdades individuais foram suspensas. Em 1968, surgiu o AI-5
com suas conhecidas conseqüências e um país mergulhado na escuridão. Em Paris, os
estudantes viraram a mesa e estimularam o arregaçar as mangas. Muitos dos principais líderes
político-sindicais e religiosos acabaram sendo cassados, presos, torturados, desaparecidos,
mortos. Em 1978, começaram as grandes greves do ABC paulista, que iriam projetar
nacionalmente o metalúrgico Luiz Inácio Lula da Silva, com vitória em 1979. E chegou a
Cuiabá o padre Passos, que trabalhara na inserção social no ABC paulista e participara dessas
greves. Em 1980, os trabalhadores rurais começam a se unir aos operários urbanos. Nessa
década, Tancredo Neves foi eleito presidente da República, porém o cargo seria assumido por
José Sarney. Nos Planos Econômicos, a palavra de ordem era “Eficiência e Produtividade”,
Controle de qualidade ISO 9000, 14.000 e por aí afora. Esse período foi o da arrancada para a
automação, das demissões em massa, da expulsão do homem do campo, do amordaçamento
dos sindicatos e da consolidação do liberalismo econômico. Em 1983, sob a influência direta
do PT, foi fundada a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e, em 1986, foi criada a Central
Geral dos Trabalhadores (CGT), que se opõe à CUT. Com o descontrole inflacionário, o país
começou a enfrentar uma inédita onda de greves e, em 1989, após a queda do Muro de
Berlim, o Movimento Sindical começou a perder força. A média de greves, que chegou a
2.200 por ano na década de 80, cairia para 950 na década seguinte. Em 1991, aconteceu o
esfacelamento da URSS e surgiu a hegemonia americana, provocando um desequilíbrio de
forças. E a Paróquia do Rosário e São Benedito, de Cuiabá, como se portava nesse fervilhar
de acontecimentos? Antes de mergulhar mais a fundo, lembremo-nos de que, segundo os
depoentes, alguns dos quais pedem e realmente ainda precisam ter os nomes preservados, na
Igreja do Rosário buscava-se inspiração na então Teologia da Libertação e nos documentos da
igreja latino-americana, tais como Medellín (1968), Puebla (1979) e ou em orientações da
então nascente CNBB. Portanto, o procurar compreender as razões de sua ação estará
intimamente ligado à Igreja Católica Apostólica Romana, tal como se fazia presente naquela
conjuntura, de onde ela tirava suas razões para a luta na América Latina e no Brasil e, em
nosso caso, em Cuiabá, onde a motivação principal era o da efetiva opção preferencial pelos
pobres. Vejamos algumas diretrizes provocadoras dessas linhas de ação: CELAM, RIO DE
JANEIRO; MEDELLIN; PUEBLA; SANTO DOMINGO; A IGREJA CATÓLICA E SUA
OPÇÃO PREFERENCIAL PELOS POBRES.
79
discorremos rapidamente sobre algumas das ondas que varreram o continente sul-
americano nas décadas de 1970 e 1980, e que, segundo o Livro Tombo e os próprios
entrevistados, contribuíram para influenciar as ações das Igrejas cristãs e da Igreja Católica
Apostólica Romana no Brasil, com reflexos diretos nas atividades paroquiais de nossa cidade.
Dentro do espírito que capitaneou e/ou tem suleado (Dicionário Paulo Freire, 2008) as
Conferências Gerais do Episcopado Latino-Americano, orientadoras-mor das várias ações
sociais nessa Igreja, destacam-se as de Medellín (Colômbia), em 1968, e a de Puebla
(México), em 1979. Lembro a Primeira Conferência Latino-americana, arquitetada por D.
Hélder Câmara, no Rio de Janeiro (1955), que criou o CELAM, órgão colegiado que congrega
os Bispos de toda a América Latina e que teve, sobretudo um caráter de organização e direção
para as futuras convocações. Além disso, todas as Conferências Episcopais refletiram as
profundas preocupações ocorridas no seio da Igreja e na sociedade da América Latina e do
Caribe e propuseram novas reflexões e adequações às orientações pastorais elaboradas como
respostas para a realidade comum que atingia todo esse conjunto de países, tais como as
questões: cultural, indígena, étnica, de pobreza, de violência e de colonialismo, que os
tornavam presas fáceis do capitalismo mundial.
A base teológica das Conferências Episcopais Latino-Americanas esteve ancorada
em pressupostos do documento Lúmen Gentium”, documento do Concílio Vaticano II que
mais influenciou a Igreja na sua concepção, missão, organização interior (ad intra) e outro
documento do Concílio “Gáudio et Spes”, considerado o documento que olha a Igreja na
perspectiva de sua ação exterior (ad extra) e que provocou uma mutação significativa em sua
concepção e maneira de relacionar-se com o mundo. As orientações desses eventos
provocaram reflexos na maneira de conceber, agir em situações concretas, tendo forte
impacto, causando, inclusive, uma redução no número de ministros que, com certa
flexibilização, pediram afastamento de suas atividades ministeriais. Houve, ademais, um
conceito que passou a crescer, o da construção de colegiados, sobretudo a colegialidade
episcopal que, de certa forma, realçou uma descentralização dos processos organizativos,
salientou as Igrejas locais, implicou no diálogo com a interculturalidade, e o mais polêmico
dos temas, que foi mal absorvido posteriormente, o do sacerdócio comum dos fiéis. Neste
sentido, o Concílio esteve muito presente na leitura dominical, em lâminas de retroprojetor
dos dois documentos acima, que interessavam à paróquia, bem como outro documento que
trabalhava o ecumenismo, chamado “Ad gentes”. Foram também matéria de leitura os
80
documentos das “Diretrizes da Ação Pastoral da Igreja do Brasil”, utilizando este mesmo
processo.
A Conferência de Medellín esteve sempre muito presente na Igreja do Rosário, em
seus estudos sistemáticos. Tratava-se da II Conferência Geral do Episcopado Latino-
Americano e que reatualizava o Concílio Vaticano II, sobretudo lendo-o à luz da conjuntura
política latino-americana. Ela conseguiu traduzir o concílio permitindo responder à aspiração
de “fazer acontecer uma rápida aplicação da renovação conciliar em todo o nosso continente”
(DOM CÂNDIDO PADIN, OSB. In: Puebla, 1998, p. 227). Foi uma “reunião de Bispos para
tomar certas decisões pastorais e administrativas para as suas dioceses” (Idem). Dentre as
várias reflexões levadas a efeito naquela Conferência Episcopal, destaco a da Educação, que
precisa atender às necessidades de uma “Educação Libertadora” objetivando “transformar o
educando em sujeito de seu próprio desenvolvimento” (Idem, p.88). Aqui se fez notar seus
primeiros vagidos em favor de uma opção pelos pobres, estribada na Teologia da Libertação;
neste caso, estão claramente presentes Paulo Freire e D. Hélder Câmara. Nessa ocasião, se
salientava e com muita ênfase, a nova missão da Igreja, notadamente no que se referia à sua
“missão específica de promover e fomentar a educação cristã, a fim de que seus batizados
alcancem a tão desejada maturidade” (Idem, p. 91). Mas o fator mais significativo foi a
compreensão realizada pelo documento da existência de uma sociedade de classes, de uma
relação estabelecida entre exploradores e explorados, ou seja, entre opressores e oprimidos e a
noção da necessidade de uma luta dos setores marginalizados, não apenas para a libertação
pessoal ou como grupo, mas o enfrentamento deles contra os processos de hegemonia do
colonialismo versus terceiro e quarto mundos. O evangelho de Jesus e a experiência do Êxodo
passam a ser acontecimentos centrais, na perspectiva da passagem da morte para a vida, da
escravidão para a liberdade. Deus, um Deus que se levanta em favor da libertação dos
oprimidos. Esta tônica teológica passa a incomodar a visão de neutralidade de Deus sobre as
questões políticas, econômicas, culturais.
A III Conferência Geral do Episcopado Latino-Americana
8
, realizada entre 27 de
janeiro a 13 de fevereiro de 1979, na cidade de Puebla de los Angeles, México, “teve como
tema a evangelização no presente e no futuro da América Latina. Sua preocupação principal
foi o trabalho evangelizador da Igreja, numa seqüência do Sínodo dos Bispos de 1974, que
8
1979- PUEBLA –México Utilizo os documentos seguintes: Texto oficial Evangelização no presente e no
futuro da América Latina. Conclusões da Conferência de Puebla”, 12ª Edição, publicado pela Paulus em 2001 e
por alguns artigos do Pe. Antônio Manzatto, publicados no Semanário Litúrgico “O Domingo”, em edições de 18
e 26 de agosto e de 02 de setembro de 2007, assim numerados: 38,40 e 41 e que sintetizo acima.
81
trabalhou exatamente este assunto, motivando mesmo o aparecimento da Evangelii Nutiandi,
documento de Paulo VI e importantíssimo para a vida da Igreja. Este foi um dos documentos
lidos no Rosário, na missa dominical, à noite, em lâminas de Power Point. Como
evangelização não se faz separadamente da promoção humana, é por este caminho que a
Conferência de Puebla será uma confirmação de toda a prática eclesial do continente,
mormente aquela desenvolvida após Medellín e fundamentada pela teologia da libertação”.
Segundo o Padre Antônio Manzatto,
Puebla ficou conhecida universalmente por duas de suas afirmações fundamentais: a
compreensão da Igreja como comunhão e participação e a opção preferencial pelos
pobres. Devemos entender que aquela formulação de opção preferencial pelos
pobres é apenas uma ratificação do que a Igreja sempre proclamou ao longo dos
séculos e representa seu eco ao cuidado de Deus para com os pobres, lição que
aparece desde o Antigo Testamento, sobretudo no acontecimento do êxodo e na
pregação dos profetas. (O DOMINGO, Idem).
Portanto, se Evangelizar é fazer germinar a semente do Evangelho, com esta opção, a
Igreja, ao retomar, então com renovado ardor, uma vocação cuja prática andou meio
esquecida, procurou fazer atual a afirmação de que a multidão de fiéis era um coração e
uma alma. Ninguém dizia que eram suas as coisas que possuía; mas tudo entre eles era
comum. (At.4,32). O documento convoca à reflexão sobre a violência na América Latina,
lembrando que se trata de responsabilidade cristã promover o restabelecimento da justiça e
defesa dos mais fracos (PUEBLA, 1998, p. 224). Com isso, entende-se, criaram-se condições
propícias para o incitamento à criatividade de um novo tipo de caminhada em nosso
Continente, naturalmente, de cunho libertador.
Como as outras conferências, a de 1992, em Santo Domingo, na República
Dominicana, e a brasileira, de Aparecida do Norte - SP, não foram realizadas na década de
oitenta, seus conteúdos não foram utilizados nos processos em curso na Igreja do Rosário.
Mas é importante saber que a conferência de Santo Domingo não se faz em Santo Domingo,
mas inicia pela reação dos que se sentiram ameaçados pelas conferências anteriores. Da
mesma forma, a conferência de Aparecida, considerada por alguns setores como fruto de
grandes articulações políticas de bastidores, procurando, tanto quanto possível, corrigir
desvios da chamada “Teologia da Libertação” e, portanto, a orquestração de um retorno à
ordem romana, branca, com afastamento progressivo dos “rostos”, que Puebla
82
magnificamente descreve, de todos os sofredores e oprimidos, que eram considerados no
documento como os apelos vivos à evangelização de todos, a partir dos pobres.
Paróquia do Rosário: primeiro acolher, depois perguntar!
Dentro do corolário dos fatos citados anteriormente e com certo espírito de
vanguarda, a Paróquia do Rosário e São Benedito de Cuiabá se distinguiu por seu pioneirismo
e por ter procurado manter uma certa autonomia administrativa e pastoral em relação à
Arquidiocese da Igreja Católica Apostólica Romana, local.
9
Havia quem brincasse que se poderia entender a paróquia do Rosário como uma
“Prelazia Pessoal” dentro da Arquidiocese (Depoimentos). Houve, é óbvio, um clima de
tolerância do senhor Arcebispo Metropolitano, também ele pressionado sistematicamente por
uma classe de católicos conservadores e por algumas figuras importantes do cenário político
partidário, segundo os quais esta paróquia representava um papel contestatório ao instituído,
perigoso à Igreja e à sociedade. E que a diversidade dos campos de sua atuação não era
passível de controle. As diversas frentes de trabalho pastoral tinham comunhão com outras
Igrejas do Brasil e não podiam ser consideradas atividades não eclesiais, como a formação de
uma escola política, ou os movimentos de defesa dos favelados (MDF), o acompanhamento e
apoio ao Movimento Sem Terra (MST). As inovações da Festa de São Benedito, a
hospitalidade ecumênica e a promoção do diálogo entre as diversas confissões religiosas,
inclusive não cristãs, ajudavam a alargar excessivamente o conceito de ecumenismo. O apoio
e incentivo, com sua estrutura física e econômica, aos Comitês de Defesa dos Direitos
Humanos, ao Movimento de Consciência Negra e/ou a um celeiro criativo de inovações que
estavam nas fronteiras paroquiais, entre outras iniciativas, incomodavam. Uma rede, via CEBs
e Movimentos, se estruturava dentro e fora do território paroquial. Os vigários e párocos, de
outras localidades, sentiam-se ameaçados por católicos militantes de suas paróquias que se
articulavam com movimentos da Paróquia do Rosário. Do ponto de vista do Direito Canônico,
houve uma estrita observância no campo territorial. Um lado da rua pode pertencer à ação de
9
Nota explicativa: O termo Igreja Católica Apostólica Romana, refere-se à Igreja com seu caráter universal, ou
seja, que por sua catolicidade atinge todo o ecúmeno. Por Arquidiocese, entenda-se uma jurisdição eclesiástica,
que abrange um vasto território, que possui várias paróquias e está sob o governo de um Bispo ou Arcebispo.
por Paróquia, ou Igreja particular, estamos nos referindo a uma jurisdição eclesial, subordinada a um Bispo ou
Arcebispo, e que está sob a responsabilidade de um Pároco e seus colaboradores.
83
uma Paróquia e o outro lado, a outra Paróquia e, por isso, não é incomum existirem conflitos
de invasão de área. Os trabalhos exercidos na Paróquia do Rosário excediam a paróquia e
Cuiabá.
Como os trabalhos aumentavam e os problemas cresciam, na década de 80, como
dissemos, para auxiliar o quadro administrativo paroquial, aportaram nessa Paróquia alguns
operários do espírito, muitos deles já arejados pelos bafejos da abertura política nacional,
pelos novos ventos do pós-Concílio Vaticano II e por outras correntes que varriam a América
Latina, notadamente as perfumadas pela eloqüência da Teologia da Libertação, com seu
caráter de volta às origens do cristianismo, à época muito criticada, como se fora uma
Teologia com estilo marxista e ares de contestação anticapitalista mesmo. É bom lembrar que,
em Cuiabá, nem todos, somente alguns sacerdotes estiveram engajados na luta pela opção
preferencial pelos pobres, na tarefa de animar, de estimular, de encorajar, de persuadir, enfim,
de procurar dar vez e voz aos marginalizados de todas as espécies e procedências, pois certos
setores, a exemplo dos da ala conservadora da Igreja Católica, estavam mais preocupados com
ações que visavam o fim do comunismo e que para isso trabalhavam com afinco. Por isso,
nem sempre as aduzidas razões religiosas eram a principal fonte de conflito. Ora, em Cuiabá,
especificamente na Paróquia em estudo, as ações se desenrolaram na contestação desse clima
então vigente e dentro do que se entendia como uma prática revolucionária dos trópicos, ou
seja, de primeiro acolher para depois perguntar. Esta prática, apesar de ter sido muito
contestada, foi mantida como princípio de orientação, possibilitando, então, o aproveitamento
de energias represadas que muito contribuíram para o engendramento de um processo
educador e popular.
As Redes como estratégias de fortalecimento de lutas
Qual foi o tipo de leitura social-política, ético-valorativa que influenciou os
Movimentos Sociais que estudamos, que aqui aportaram ou tiveram sua gênese? Na análise
das ações realizadas pelos e nos Movimentos Sociais, na década de 1980, na Paróquia acima
mencionada, dá para perceber com muita clareza que os dirigentes paroquiais desse período
em estudo tiveram que usar de comportamentos práticos. Para chegar a essa conclusão, dentro
dos critérios básicos para o entendimento de concepção de mundo nos princípios de uma
intencionalidade fenomenológica merleaupontyana e de uma pesquisa qualitativa, o foco, no
que for possível, é feito associando aquelas ações dentro dos seguintes passos:
84
1 Se aqueles atores tivessem concebido os Movimentos Sociais de maneira isolada
e ou independente, teriam sobre seus ombros toda a responsabilidade da vida coletiva. E, em
caso de problemas, ficariam ilhados e desprotegidos, sem poder chamar atenção sobre seu
trabalho e correndo o perigo de serem riscados do mapa. Se alguns dos seus membros
ocasionalmente viessem a ser punidos pela Ditadura ou pela rigorosa disciplina eclesiástica,
acabariam as possibilidades de continuidade de seu trabalho. Daí a necessidade de eles se
vincularem a movimentos similares e com uma práxis de libertação que fosse referência tanto
nacional como internacional e em categorias como aquelas praticadas pelos Centros de
Direitos Humanos ou de Comunicação Popular, dentre os quais destaco: Centro Pastoral de
Vergueiro (São Paulo); CEDOP (Petrópolis / RJ); Centro Popular de Vitória (Vitória /
Espírito Santo); IBRADES (Rio de Janeiro); CEAS (da Salvador / Bahia); CERIS órgão da
CNBB – (Rio de Janeiro). Com as apropriadas providências, criaram uma verdadeira rede que
se pautava por finalidades afins.
2 – Como tivessem adotado a concepção participativa de rede, de integração e
aperfeiçoamento, o alcance de suas ações teve caráter mais prático, pois, ao se associarem aos
Movimentos similares e ao beberem das águas dessas práticas, compartilharam as suas ações
e as reciprocidades formaram um escudo de proteção tão necessário e estratégico para aquele
momento histórico. Com isto, além de servirem de contrapeso à concepção daquele mundo
ditatorial, ao promoverem as capacitações de seus agentes, ou novos sujeitos apostólicos,
dentro de uma educação humanista cristã, conseguiram se proteger contra as eventuais
arbitrariedades da Ditadura que a tudo perseguia implacavelmente. Essas ligações
viabilizaram as possibilidades para que, no caso de um eventual cerceamento de suas ações,
ou das costumeiras violações de seus direitos, as suas denúncias fossem espalhadas
imediatamente, tanto em nível nacional quanto internacional. Desta forma, conseguiriam
mostrar ao mundo que sua militância estava grávida de valores universais e, como de fato o
desejavam, conseguiriam provocar as oportunas reações de indignação na opinião pública, tão
necessárias para servirem de freios aos impulsos das retaliações ditatoriais daqueles
conturbados dias. Em Cuiabá, foi fundamental a liderança carismática daqueles que se
propuseram a, respeitando as origens dos atores e a formação das comunidades,
desencadearem ações que chamarei de despertamento e de descoberta de talentos que tanto
contribuíram para o relativo sucesso de suas caminhadas. Na pesquisa, aparece muito claro o
seguinte: embora sendo católicos, na referida paróquia, eles queriam, desde o princípio, que
os trabalhos não dependessem exclusivamente da Igreja Católica. Também está muito
85
evidente que o objetivo não foi somente o de evitar que o poder hierárquico os destruísse,
caso esses padres tivessem que ser expulsos, o que havia acontecido com outros que os
precederam. Esta era mais uma das razões pelas quais fica evidente que o trabalho com outras
Igrejas institucionais ajudaria a garantir um desdobramento a prazo maior. E é por isso que
eles não vieram sozinhos. É por isso que vieram com eles algumas pessoas, anteriormente
citadas, e para as quais foram atribuídas tarefas específicas. Quanto ao trabalho organizativo,
se lermos atentamente o Livro Tombo, percebe-se que a estratégia foi a de engajamento de
agentes de pastoral, constituído por leigos ou por pessoas capazes de manterem-se com
autonomia, podendo continuar o trabalho fora da paróquia, se necessário, até
independentemente de seus padres.
Para que se materializassem todas as propostas de trabalho social que surgiram, foi
necessária a criação do espaço físico compatível, espaços esses onde foram acolhidas e
realizadas as atividades de apoio aos Movimentos Sociais, tais como as reuniões, os arquivos
do material de expediente, os relatórios e as comunicações com o mundo, a respeito daquelas
atividades. O Livro Tombo mostra, em seus vários registros que, para atender a crescente
demanda e/ou necessidades e apelos que surgiam nas suas comunidades, a Igreja do Rosário,
tanto na Matriz, como em instalações nos bairros periféricos, teve que fazer sua
intercomunicação de maneira horizontal, isto é, tornando-se, paulatinamente, como que o
guarda chuva dos movimentos sociais que iam surgindo. Vejo aqui uma semelhança com o
que Ilse Scherer-Warren (2005, p.7-9) analisa sob o conceito de “Redes de Movimento”, ou a
ação no sentido de possibilidades de “integração de diversidade” proposta por Archer (1991),
citado pela autora. E isso é tão verdade que a Paróquia abrangeu as várias dimensões, tais
como a social, a ecumênica, a educacional, a política, a de nero etc., independentemente de
estarem ou não ligadas à Igreja. Sempre que necessário, denunciavam publicamente quaisquer
conflitos que emergissem, notadamente as iniciativas das pessoas mais empobrecidas e
aquelas em favor de direitos, de terra, de moradia, de água etc. Digna de registro foi a
proteção que ali se deu aos perseguidos e ameaçados, acolhendo as pessoas que chegavam
com a cabeça a prêmio, qualquer que fosse a razão. Nossa correspondência vinha
completamente dilacerada e colada indecentemente com esparadrapo. Tínhamos sinais de
ameaça, olheiros e denunciantes”. (PASSOS, In: Orientação). Nesse clima da então Ditadura,
ou seja, o da intimidação, do patrulhamento ideológico, da perseguição, das mortes, da
delação e dos desaparecimentos, eram necessárias providências acauteladoras que
preservassem a integridade física de seus militantes, pois, lamentavelmente, para piorar a
86
situação, não foram poucos os que, mesmo pertencendo aos quadros da Igreja, colaboravam
com o regime e, entre esses, alguns membros do próprio clero. E aqui, onde o contexto em
que estávamos não era o de uma revolução, que é uma coisa boa...”, mas o de um terreno
minado, apesar de um certo clima de anarquia, de golpe, e sem as condições de ambos os
lados tanto por parte da política ou da repressão e do exército, como da nossa parte”
(Depoente), em algumas lideranças dos vários escalões do governo, como na direção dos
Movimentos Sociais em estudo, providencialmente, falou mais alto o espírito de bom senso e,
por que não dizer, o de justiça mesmo. Você pensa que esse pessoal se intimidava? O Livro
Tombo e os Depoimentos mostram que, pelo contrário, não foram poucos os beneficiados por
esses anônimos e tão importantes defensores dos desprotegidos. De acordo com depoimentos,
com a criação de espaços próprios para o trabalho, tais como reuniões, arquivos, material de
expediente, estratégias diferenciadas de divulgação e de lançamento de trabalhos sociais etc.,
as salas tinham de ser despojadas de todo o material que pudesse vir a comprometer seus
militantes. Mesmo assim, muitos documentos sumiram efetivamente.
O “Inédito Viável”: veredas da Esperança!
Então, surge uma pergunta: Como poderemos hoje compreender, ao menos
parcialmente, a complexa e dramática realidade política e sócio-cultural que aconteceu na
década de 80, no território daquela paróquia? Que espécie de motivação foi colocada em
prática, seja com a finalidade de aglutinar pessoas e/ou formar grupos de reflexão dentro do
que parecia ser mais importante realizar, em um período com tal clima de incertezas? É então
que, mais uma vez, teremos que nos apoiar tanto nas anotações do Livro Tombo da paróquia,
quanto nos depoimentos de nossos entrevistados e/ou em depoimentos orais, dos quais alguns
ainda nos solicitaram o anonimato. Segundo nos disseram, foi a partir de duas perspectivas,
ou seja, da compreensão da realidade política e da complexa realidade sócio-cultural que teve
início o estafante trabalho de, pacientemente, elaborar atividades a partir das necessidades,
demandas e clamores, de forma que se pudesse ter uma noção do quê e do como fazer,
daquilo que parecia ser o importante e viável a fazer. A partir daí, alguns dos padres da
Paróquia trataram de, diligentemente, nuclear pessoas escolhidas com a finalidade de
formarem grupos de reflexão. Este trabalho começou com visitas, entrevistas, longas
conversas com pessoas, grupos, movimentos etc. Associaram-se a pessoas que
87
compartilhavam dos mesmos pensamentos, que tinham semelhantes afinidades ético-políticas
e que estivessem bem afinadas com os princípios que suleavam seu projeto e ação. Até
conseguirem criar uma base bem estruturada de apoio, capaz de deflagrar algumas
importantes iniciativas, passaram-se quase dois anos. Esse grupo era composto por pessoas
que tinham convergência com perspectivas libertadoras da educação popular e mobilizavam
suas comunidades para que tomassem parte ativa, debatendo, votando e criando uma
consciência participativa nos processos. Nasciam, assim: o Movimento de Defesa dos
Favelados (MDF), o Movimento de União e Consciência Negra; a Fraternidade Cristã de
Doentes e Deficientes (FCD); o Comitê de apoio a El Salvador; o Movimento de
solidariedade aos refugiados do Chile e do Uruguai; a Articulação Nacional dos Movimentos
Populares e Sindicais (ANAMPOS), A Comissão Pastoral da Terra (CPT), o Conselho
Indigenista Missionário (CIMI), o Movimento e Alegria de Educação Popular, o Centro
Pastoral do Rosário (CPR), o Centro de Direitos Humanos Henrique Trindade (CDHHT) e
muitas outras iniciativas.
Assim, algumas figuras tornaram-se nossos companheiros desde o início: Eudson de
Castro Ferreira; Lucilo Libânio de Souza (Nonô); Irmã Dineva Vanuzzi; Felinto
Ribeiro Neto; Artemis Torres; Dona Nair Francisca (Bairro Planalto); Inácio
Werner, Edna Amaral, do Leblon; Sr. Dito do Bairro Canjica; Dona Adelaide do
Pedregal; Nildes Magalhães do Rosário, Dalva e José Maria Rodrigues; Seu
Antônio do Canjica; Gilney Viana; Wilmon do Bairro Carumbé, Enelinda Scalla;
João Monlevade; Glorinha Albuez; Valdir Bertúlio; Lúcia Palma; Sr. Armando de
Rosário Oeste e um número quase infindo de pessoas. Entre os contatos com a
Igreja, os pastores da IECLB, Arteno Spellmeyer, Teobaldo Witter, Hans Trein,
Geraldo Sach e membros da Igreja Luterana, Dieter Metzner, Vilmar Schrader e um
infinito número de pessoas (PASSOS, In: Orientação).
E dentro dessa criação de consciência participativa, tratarei agora de outro destaque,
extraído do Livro Tombo e complementarmente subsidiado pelas informações fornecidas em
entrevista anterior, pela Irmã Anete (Albina Pedó), relacionado ao controvertido tema do
Ensino Religioso na Escola Pública (Livro Tombo, p. 64) e sobre o Ecumenismo. Estou
utilizando, também, alguns dos dados que extraí de minha monografia do Curso de
Especialização em Ensino Religioso, ministrado pelo Instituto de Educação, da UFMT, em
2001-2003. Embora o Livro Tombo ajude a falar do cotidiano, das vivências, das
discriminações, dos preconceitos, de grupos, de etnias, de transgressões, de culturas, de
silêncios gritantes, de intencionalidades fenomenológicas merleaupontyanas, os depoimentos
também me possibilitaram entender com mais clareza os significados desses trabalhos que se
88
articulam do particular ao global, na Paróquia pesquisada. Começa a aparecer o melhor
sentido das ações, sobre o Ensino Religioso ou sobre o Ecumenismo, quando, nas conversas
informais, nos relatam o belíssimo trabalho de um Padre José Ivo Hoffmann; os relatos de
irmã Anete (outra personagem, com uma colaboração aparentemente anônima) que ajudaram
no embasamento das dimensões relacionadas ao ecumenismo e o Ensino Religioso e que se
refletiam nos Movimentos Sociais tanto daquela territorialidade quanto na Escola Pública, em
Cuiabá. É quando se descobre que esses atores, que capitanearam várias ações coletivas, são
citados singelamente. Embora em tempos e espaços diferentes, andaram juntos nessa bonita
caminhada relacionada ao Ensino Religioso na Escola Pública de Mato Grosso e no
Ecumenismo e, no silêncio, muito contribuíram com seu trabalho para uma efetiva educação
popular potencializadora de Libertação, dentro de uma intenção de articulação com o que
ocorria nos Movimentos Sociais com a pretensão de serem libertadores. Na temática sobre o
ecumenismo, uma constatação: as lideranças das Igrejas conhecem o assunto, porém, de um
modo geral, não o deixam descer às suas bases. Por quê? Vamos caminhar um pouco por um
terreno muito delicado, que se fez e se faz muito presente na Paróquia do Rosário e São
Benedito, de Cuiabá.
O Ecumenismo na Paróquia do Rosário e São Benedito
Conforme mencionado anteriormente, e mesmo correndo o risco de ser considerado
repetitivo, lembro que o medo de que as ações desencadeadas ou as que viessem a despontar
pudessem desagradar à hierarquia da Igreja local, possibilitando uma provável expulsão, fato
que havia acontecido anteriormente, fez com que os sacerdotes da Paróquia do Rosário e
São Benedito, por questão de estratégia e autonomia, não estruturassem na Igreja Institucional
Católica daqui as bases principais de alguns dos processos organizativos que viessem a
apoiar. Ao estabelecer parcerias com outras Igrejas cristãs locais, sobretudo com a IECLB -
Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil - com a qual não havia uma dissociação
entre as dimensões de e políticas, praticaram um Ecumenismo, à época, diferente daquele
em que, mesmo de maneira sutil, a Igreja Católica se julgava a dona da verdade e do
“depósito da fé”, ou algo a ser defendido contra os infiéis, ou como aquele que ainda hoje se
pratica e que proíbe a eucaristia a determinados cristãos. Também não foi aquele em que se
esqueceram que, na casa de Cornélio, o valor do Batismo (Sacramento) não é negado quando
89
o espírito se manifestou em línguas (Atos, 10, 24), mas o de uma práxis sobretudo de
sentido administrativo, que resultou em uma verdadeira prática ecumênica e até assentada nos
documentos oficiais das respectivas Igrejas envolvidas. O Livro Tombo registra, por exemplo,
que em Junho de 1984, o Pastor Hans Trein, da IECLB, assessorou o tema “Direitos
Humanos” da 15ª Assembléia Paroquial da Igreja do Rosário e São Benedito. Em diversas
ocasiões, registros de que esta comunidade participou de comemorações, tais como a do
Culto Ecumênico contra o Apartheid, em junho de 1986, assinala-se sua participação na
Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos e, entre outras ações, uniu seus esforços aos da
luta pela implantação do Ensino Religioso na Escola Pública.
Houve, segundo Passos, um convite pessoal formulado pelos pastores da Igreja
Batista e por seus alunos para discutirem a Teologia da Libertação. Passos telefonou ao pastor
Hans Trein, que coordenava a igreja local da IECLB, este se muniu de vestes que o
referenciavam em sua função, tomou a Bíblia e, em poucos minutos, chegou à igreja do
Rosário, com um sorriso, dizendo: “É preciso que todos saibam que a Teologia da Libertação
não pertence exclusivamente à Igreja Católica Romana, ela é também propriedade de todos
nós, protestantes”. O diálogo, na escola teológica, foi enormemente precioso, porque capaz de
localizar pontos de partida da Reforma, evocar os teólogos protestantes e fundamentar as
razões de uma Teologia da Libertação como referência para uma leitura possível e uma
espiritualidade de ação profética para toda a igreja.
Portanto, aqueles atores fizeram dessa função um auxílio tanto à dimensão apostólica
quanto à dimensão ecumênica e, ao modificarem posturas e práticas, realizaram, em minha
interpretação, um ecumenismo fenomenológico-dialético que se aproximou de resultados
concretos e com possibilidades de desaguar em uma educação popular.
O Ensino Religioso, ministrado como área de conhecimento, também conduzia a
uma verdadeira prática macro-ecumênica. Feito essas considerações, agora, para melhor
entendimento desta pesquisa, julgo oportuno clarificar, sucintamente, o que estou significando
como ecumenismo, quais suas bases legais e a quem se destina. Vejamos:
O que é hoje o Ecumenismo?
Hoje, chamamos de Ecumenismo a busca da unidade entre as Igrejas Cristãs. Na
Igreja Católica, o Código de Direito Canônico no seu Cânon 755 § 1, diz que:
90
- Compete, em primeiro lugar, a todo o Colégio dos Bispos e à Sé Apostólica
incentivar e dirigir entre os católicos e movimento ecumênico, cuja finalidade é
favorecer o restabelecimento da unidade entre todos os cristãos, a cuja promoção a
Igreja está obrigada por vontade de Cristo.
§ 2. Compete aos Bispos e, de acordo com o direito, às Conferências dos Bispos,
promover (sic) essa unidade e, de acordo com as diversas necessidades ou
oportunidades de circunstâncias, estabelecer (sic) normas práticas, respeitando as
disposições da suprema autoridade da Igreja.
Além das normas instituídas por seu Código de Direito Canônico, revisado após o
Concílio Ecumênico Vaticano II, a Igreja Católica tem realizado várias ações e emitido vários
documentos sobre o ecumenismo, entre os quais merecem destaque: o Decreto Unitatis
Redintegratio, publicado em 1964, a Carta Apostólica TERTIO Millennio Adveniente, de
1994, e a Carta Encíclica Ut Unun Sint, de 1995. Essa Igreja criou o Conselho Pontifício para
a Promoção da Unidade dos Cristãos, o qual, entre outros, publicou o Diretório para a
aplicação dos princípios e normas sobre o ecumenismo. Trata-se de um texto básico que
instrui os católicos nas suas relações e no trato com as ações ecumênicas. Existe, ainda, o
Catecismo da Igreja Católica que, nos seus artigos 816 a 822, orienta o trabalho catequético
sobre o assunto. A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB, na sua antiga Linha 5
Ecumenismo e Diálogo Inter-religioso Estudos da CNBB publicou o Documento 21
Guia Ecumênico. Entre as demais publicações sobre o ecumenismo, destaco a obra de Hortal
(1989).
Embora não tenha sido a intenção explícita da Igreja do Rosário e São Benedito, as
forças das circunstâncias ocasionadas pela onda migratória que vieram acompanhadas por um
considerável contingente humano de diversas procedências, inclusive de caráter religioso,
fizeram surgir, nos vários Movimentos Sociais ali encravados, vários atos de natureza
ecumênica que provocaram impactos, dentre os quais o que acima destacamos. Este registro
tem a finalidade provocativa de aguçar uma eventual intenção de aprofundamento de tão
palpitante dimensão, pois, como se nota pelos registros no Livro Tombo, este assunto
mereceu a melhor atenção daquela freguesia. Tendo tratado do tema ecumenismo, façamos
agora um passeio por um tema não menos explosivo e relacionado com a decisiva atuação da
Paróquia do Rosário e São Benedito: o Ensino Religioso.
91
O Ensino Religioso: A Diversidade na Rede de Movimentos Sociais
Na possibilidade de integração da diversidade, como preconizam as “Redes de
Movimentos Sociais” (SCHERER–WARREN, 2005), e sem nada a ver com proselitismo,
uma constatação que merece aprofundamento é a relacionada com a disciplina “Ensino
Religioso” na Escola Pública e seu caráter ideológico, que tem brecado a implementação
desta disciplina na referida Escola. Na gina 64 do Livro Tombo, em rápido relato, o
registro de que, de abril a junho de 1981, o Padre José Ivo Hoffmann participou com a AEC
da elaboração de aulas para o ensino Religioso nas escolas públicas estaduais e municipais.
O que significa este aparente e singelo relato? Lembremo-nos de que pela paróquia transitava
também a Irmã Albina Pedó (Irmã Anete), que mais tarde presidiu o CONINTER Conselho
Interconfessional de Igrejas Cristãs para o Ensino Religioso, entidade que congrega 27
Igrejas, incluindo outros sistemas de eticidades e que hoje assessora a SEDUC nas
normatizações desta disciplina, no Estado de Mato Grosso. Feita esta ressalva, pretendo
analisar essa luta a partir de um sentido de “Redes de Movimentos” e de múltiplos sujeitos, ao
qual se refere Scherer-Warren (2005, p.7-9). Embora o Ensino Religioso não seja um
Movimento Social, relaciono-o aqui como uma atividade correlata, pois vejo uma como que
intercomunicação com os Movimentos Sociais que estiveram sob o guarda-chuva da Igreja
em estudo, na década de 80. Só que, aqui, o intuito maior é o de oferecer uma visibilidade
sobre a amplitude das ações que se processavam na paróquia pesquisada, a qual, na década de
80, em pleno burburinho das ações sociais que ocorriam em sua territorialidade, destacou-se
entre as demais paróquias locais, contribuindo para o alargamento de transformações sociais.
Como se verifica, na sua intercomunicação horizontal, esta Igreja apoiou os que defenderam
novas propostas. Dentro dessa coerência e pensando desde um ponto de vista epistemológico,
esta Paróquia, “na busca de formas de articulação entre o local e o global, entre o particular e
o universal, entre o uno e o diverso, nas interconexões dos atores”, na busca de significados,
no meu entendimento, muito ajudou na “integração da diversidade” dos sujeitos múltiplos a
que se refere a autora acima (p. 7-17). Por isso, penso, é graças a tal interconexão de
identidades que essa Freguesia consegue fazer nexo com inteligências que, entre outras ações,
à época, se dedicaram, em seu território, à consolidação do Ensino Religioso, hoje tema
transversal na Escola blica que nada tem a ver com proselitismo, e sim se refere à pura e
simples área de conhecimento.
92
O Ensino Religioso – pequeno histórico
A História desta disciplina é a história de uma longa caminhada e o registro extraído
do Livro Tombo merece um especial cuidado. Este relato não se refere somente a um pequeno
detalhe. Nele está embutida, de maneira muito sutil, a continuidade da longa história das
influências relacionadas às lutas surdas relativas ao Ensino Religioso na Escola Pública. Hoje,
felizmente, esta disciplina, anteriormente ancorada numa pedagogia fundamentada em
princípios filosófico-teológico e eclesial, evoluiu até centrar-se numa antropologia que agora
trabalha para que tal disciplina não mais signifique o proselitismo de uma religião ou
religiões, e sim uma área de conhecimento e, hoje, tema transversal. Portanto, o registro da
participação do Padre José Ivo Hoffmann, representa a decidida e efetiva colaboração da
paróquia em estudo aos objetivos que desaguaram nas lutas posteriores para a consolidação do
Ensino Religioso na Escola
Pública em Mato Grosso. Não foi somente o padre José Ivo
Hoffmann que representou a referida Paróquia. Albina Pedó, mais conhecida como Irmã
Anete, também se encontrava envolvida nessa dimensão. Por razões de transferência, o padre
José Ivo Hoffmann foi prestar seus serviços em outras querências. Dentro da mística desse
Ensino, Anete permanecia na luta e, associando-se aos clamores da nação brasileira, ajudou
decisivamente na implantação de um novo projeto de Ensino Religioso na Escola Pública. A
Paróquia do Rosário e São Benedito, sempre pioneira em relação às demais paróquias da
Arquidiocese de Cuiabá, apoiou a Irmã Anete para que, a partir do CONINTER Conselho
Interconfessional das Igrejas Cristãs para o Ensino Religioso atual entidade responsável
junto à Secretaria de Estado de Educação e Cultura, para o assessoramento da matriz
curricular da disciplina do Ensino Religioso na Escola Pública, se envolvesse de corpo e alma
nesta dimensão. Para entendermos melhor, vamos lembrar um pouquinho dessa história:
O Ensino Religioso na Escola pública no Brasil, no início, referiu-se ao ensino da
Religião. Por isso não conflitou com o projeto político do Brasil Colônia que, à época do
padroado, tinha como ênfase a integração da escola com a Igreja, com a sociedade e com a
economia, mas fazendo da Igreja seu aparelho ideológico de Estado. Portanto, ao incentivar o
Ensino da Religião Oficial, o Império Português e suas colônias objetivavam a consolidação
de seu poder, e o faziam através da evangelização dos gentios, ou seja, pela catequese dos
índios e, posteriormente, também dos negros. Com o passar do tempo, surgem vagidos contra
a hegemonia da Igreja Católica e, no Brasil, já influenciado pelos ideais da Revolução
93
Francesa, amplia-se a discussão que almejava a separação entre Igreja e Estado. É nesses
embates que o então Ensino Religioso, paulatinamente, liberta-se da pedagogia teológico-
eclesial até passar para o campo da antropologia e tornar-se área de conhecimento e tema
transversal. Todavia, a sua implantação, por incrível que pareça, ainda hoje sofre os revezes
da intolerância e do proselitismo. (FONAPER, 1996). A pesquisa verificou também que,
durante o Regime Republicano (1890-1930), o artigo 72, parágrafo 6 da sua primeira
Constituição, embora tenha separado a Igreja do Estado e declarado que “Será leigo o ensino
ministrado nos estabelecimentos oficiais de Ensino”, a Igreja Católica, hegemonicamente,
continuou normalmente essa atividade. Em relação ao estudo sobre os reflexos do período de
transição 1930-1937, nos efeitos da reforma do Ensino de Francisco Campos, na área do
Ensino Religioso no Estado Novo -1937-1945 e no avanço do ideário liberal ou no período
ditatorial –1964-1984 – esta disciplina pouco se diferenciou de suas práticas iniciais. Some-se
a isso que a Ditadura Militar também inclui o Ensino Religioso na Escola Pública, embora
com matrícula facultativa. Com a Nova República -1984 aos dias atuais- o País decide-se por
uma nova Carta Constitucional -1988- ocasião em que reacende o debate entre as duas
correntes, ou seja, aquela que é a favor do Ensino Religioso e a dos “setores contrários à sua
inclusão como disciplina escolar”. Como resultado de uma maciça campanha nacional, a
disciplina é garantida pelo Artigo 210 § da Constituição Federal de 05.10.1988 e
regulamentada pela Lei nº 9.475 de 22 de julho de 1997 e Resolução CEBNº 2 de 07.04.1.998
(FONAPER, Idem).
Conforme registrado, de abril a junho de 1981, o Pe. José Ivo Hoffmann, da
Paróquia do Rosário e São Benedito, participou da elaboração de aulas para o ensino
Religioso nas escolas públicas estaduais e municipais. Na mesma ocasião, a educadora Albina
Pedó, religiosa da Congregação das Irmãs da Divina Providência, à época, praticamente anexa
à Igreja do Rosário, também estava envolvida nas articulações sobre esse Ensino. Esta
congregação tem uma mística diferente daquela citada à página 49 deste trabalho e
relacionada à instalação da Província da Congregação das Irmãs da Imaculada Conceição em
1963, no Pensionato de Nossa Senhora do Carmo, situado no território da paróquia em estudo.
Segundo a referida religiosa, no início da década de 1960, ela chegou a Paranatinga, neste
Estado, procedente do Rio Grande do Sul, seu estado natal. É ela que nos conta que se sentiu
muito atraída para exercer seu ministério na área educacional. Realizamos, na Paróquia do
Rosário, várias reuniões do CONIC Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil,
Regional de Cuiabá, para tratarmos sobre aspectos do ecumenismo e, não poucas vezes, a
94
Irmã Anete, que participava de nossas atividades, trazia à baila informes sobre os avanços e
recuos de sua luta em favor do Ensino Religioso na Escola Pública.
Ao constatar a necessidade de ministrar também uma sólida educação religiosa para
os seus alunos, a Irmã Anete (Albina Pedó) registra que percebeu que esta disciplina, que
abarcaria todo o território mato-grossense, necessitava de “um projeto de implementação do
Ensino Religioso na Escola Pública” para que não continuasse sem orientação como estava à
época. Conta que engatinhou seus primeiros passos, provocando a discussão e avaliando os
resultados. Seu trabalho chamou a atenção das autoridades e foi reconhecido pelas mesmas, as
quais, pela Portaria 2749 de 13-08-1982, nomeiam-na para coordenar as atividades do Ensino
Religioso, na Delegacia de Ensino de Cuiabá, onde, mais tarde, teria a incumbência de
continuar seu projeto, na Secretaria de Educação, alcançando, assim, todas as Escolas
Públicas do Estado de Mato Grosso.
Finalizando este capítulo, informo que, no próximo, vamos navegar por utopias.
Antes, considero importante lembrar que esses acontecimentos se referem a uma década de
transição: a década de oitenta. Década grávida dos acontecimentos de 68 que se espraiaram a
partir dos movimentos estudantis de Paris, influenciaram o surgimento da contra-cultura dos
hyppies, da bossa nova, se insurgiram contra a guerra do Vietnã e deram sinais de que algo de
novo estava acontecendo no mundo, apontando que o capitalismo estava em transformação,
ou seja, estava criando condições para o aparecimento dos programas de controle de
qualidade (ISO 9000, 14000 etc), do enxugamento do Estado, do fim do Estado de Bem Estar
Social, criando as chamadas para a eficiência, a eficácia e a produtividade, amordaçando os
sindicatos e bebendo o sangue dos operários. E nós, no Brasil, com uma Ditadura que
colocava “irmãos contra irmãos”. Essa foi uma década diferente, cuja dinâmica, por sua
radicalidade, colocava a sociedade em estado de alerta e mostrava a necessidade de uma nova
organização que possibilitasse os tão sonhados ares democráticos. Mato Grosso não estava
alheio a esse processo e, em Cuiabá, a Paróquia do Rosário foi perceptiva a esse movimento.
A tal ponto que, conforme nos indicam os dados desta pesquisa, acolheu em seu seio todos e
todas que, sentindo-se atentos a esses acontecimentos, procuraram aqui fazer transformações.
E, do plano das idéias, das utopias, partiu-se para a luta concreta. A partir de agora,
refletiremos um pouco sobre as lutas no Rosário, fundamentando-nos em alguns autores
citados anteriormente neste trabalho.
95
4 A UTOPIA ENCARNADA OU A LIBERTAÇÃO EM PROCESSO?
Não pretendo discutir projetos imaginários nem parecer em delírio quando penso em
construção de sujeitos e de sonhos, pois, para mim, a utopia, presença ausente, mas desejada e
necessária, se constrói e se materializa por meio de reivindicações e de lutas. Ora, para os
propósitos desta pesquisa, ao que tudo indica, a esperança qualifica os Movimentos Sociais,
os quais, creio, podem, ainda que parcialmente, ajudar a provocar e a estabelecer as mudanças
estruturais em uma dada sociedade. E estou falando sobre e de um lugar de referência - a
Paróquia do Rosário e São Benedito, de Cuiabá, na década de oitenta- de onde uma grande
plataforma de esperança em um futuro melhor se propôs à construção de um inédito viável e
em conformidade a uma dialética que se desenha como fenomenológica merleaupontyana.
Vejamos:
Antes, sobretudo em um sentido laudatório, desejo discorrer levemente sobre alguns
aspectos relacionados à fenomenologia, pois é nela que me ancoro nesta pesquisa.
Inicialmente, sirvo-me de Rezende (1990, p.8) e, eventualmente, de outros autores, para expor
alguns dados a respeito de Maurice Merleau-Ponty e de sua filosofia fenomenológica.
Historiador da filosofia que estudou as obras de muitos filósofos célebres, apesar de debater
assuntos tratados por outros pensadores, investiga questões novas. É conhecido por
integrar-se a uma corrente de pensamento chamada “Fenomenologia”, cujo expoente maior
foi Edmund Husserl (1859/1938). Essa corrente propunha que a filosofia deveria se preocupar
com a “volta às próprias coisas”, isto é, com aquilo que cotidianamente nos cerca; isso
permitiu que ele, atendendo a um clamor da juventude francesa, incorporasse a filosofia às
preocupações contemporâneas das ciências humanas, tornando-a mais concreta e menos
reflexiva. Merleau-Ponty, embora fiel discípulo de Husserl, tem seu próprio caminho, sua
filosofia se preocupa com o homem, mais na sua experiência do que na sua essência, ou seja,
com o homem como ser-no-mundo (o vivido), do que com o homem-como-ser-ideal (o
pensado). Ensina que a consciência é o Fenômeno e o objeto é a coisa. Portanto, para ele, a
fenomenologia é o estudo do fenômeno, no qual busca sua coerência lógica, ou seja, a sua
essência. que o descrever supõe abordar o fenômeno tal como ele se apresenta, na
96
perspectiva do homem, à sua consciência, então, a fenomenologia tem com ponto de partida
não negar a realidade do mundo exterior. Como o mundo vivido é descrito pela
fenomenologia no plano das idéias, temos que entender que, além do mundo das idéias, nós
vivemos, também, em um mundo exterior. Portanto, constituem, por conseqüência, um único
fenômeno, logo, idéias e coisas não podem ser separadas. Sendo assim, o mundo é o meio da
realização da consciência. Se o homem é um ser-no-mundo, a consciência tem que coexistir
nesse mundo que o envolve e precede. Merleau-Ponty nos mostra que existe um
“enraizamento” do espírito no corpo, ou seja, “a consciência está atada a um corpo que a liga
ao mundo” MERLEAU-PONTY (2006, p. 24), e que em fenomenologia somos orientados
para descrever o fenômeno e não comentá-lo. Por isso as subjetividades terão que ser sutis,
como que dando um empurrãozinho, a fim de ajudarem na clarificação das ações vividas
pelos sujeitos em estudo. Isso se torna possível se é verdade que você tem condições de
entender o que o outro está dizendo.
É por isso que, nesta pesquisa, utilizei o procedimento e
raciocínio seguinte: O que antes era ou parecia fechamento, pouco a pouco foi se abrindo e,
quando procurei romper e ir mais além, comecei a perceber-me e a sentir-me ou tornar-me
mais crítico. Foi semelhante a um “Abre-te, mente” pois senti que se rompeu um círculo
vicioso. Foi como um sair das sombras. E ver uma Luz. Foi como participar do Mito da
caverna. A partir de então, busquei a constatação para saber se, e em que, as lideranças
ajudaram a desenvolver talentos, se utilizaram cnicas gerenciais, psicológicas, sociológicas,
antropológicas econômicas etc., dando assim um caráter mais revolucionário às ações –
revolucionário, aqui, no sentido de caráter de medidas extraordinárias. A partir de agora,
dentro de um referencial teórico, tornou-se-me possível uma abordagem de fundo com base
nos depoimentos dos informantes e contribuindo para melhor clareza metodológica na análise
dos fatos e dados oferecidos. Houve até um esforço na tentativa de envolver os informantes
com os fatos lembrados e oferecidos para discussão e mostrar que suscitou emoções. Foi
tentando dar sentido de vida que procurei me relacionar com o passado e o presente. Montou-
se, assim, então, o “jogo com as cartas dos informantes”. Isso deu ao pesquisador um sentido
seletivo no processo de produção e o remeteu para além dos limites dos grupos que
sustentaram este trabalho. Ampliou-se, com isso, o alcance social que ajudou a reconstruir a
trajetória dos acontecimentos até este momento de estudo. Procurei, também, mostrar que
existiram focos de relações conflitivas na Paróquia, tanto na administração da capela como
nos entreveros relacionados à Festa de São Benedito, nas desconfianças sobre a existência de
olheiros da Ditadura, doenças, mortes, enfim. Houve até a preocupação em ressuscitar
lembranças individuais, coletivas, de cultura, identidade, étnica, de gênero, tipos de meio
97
social e cultural dos atores nas relações sociais; discutiu-se se o acesso à terra foi fundado no
igualitarismo, procurando verificar se a distribuição foi eqüitativa e baseada na cooperação e
solidariedade. No processo de formação das comunidades, quis saber se eles expressavam
exercícios de cidadania àqueles pobres e marginalizados que antes não a exerciam. Sem
machismos, foi tentando mostrar qual o papel da mulher nesses movimentos que se
mostraram os homens que assumiram a manutenção, o funcionamento etc. das comunidades,
com as mulheres como adjutórios importantes. Assim era a expressão do coletivo e a
comunidade nela se reconhecendo. O interessante é que percebi que o canto e a música, que a
seguir destaco, ali foram tidos como instrumento de aprendizagem. Vejamos dois exemplos:
LIDER DOS AFLITOS!
(Letra e música Carlos Cesar)
Dizem que o homem já não sofre escravidão
Por causa de um decreto assinado por alguém
Mas não vejo nunca esta liberdade clara
O homem continua sendo escravo e explorado
Só que em nossos dias é maior a escravidão,
É o Branco, o negro, o seu irmão...(bis)
Jesus falou que o homem seja livre e tenha
E que esta vida interia não gaste na ilusão
Maldito o sistema que permite a exploração
O corpo de ninguém sirva para alimentar
O nosso egoísmo que mantém a escravidão
Do branco, do negro, do seu irmão....(bis)
Todo eu vejo na Igreja do Rosário
O negro que foi santo descendente de escravos
Deus o libertou e o fez líder dos aflitos
Mostrando a dignidade e o valor do operário
Um dia os que trabalham vão ser todos benditos
O branco, o negro, o seu irmão...
ENAWENE NAWEÊ
(Letra e Música Passos)
Mais uma vez, mataram a humanidade,
No céu de hoje há menos claridade...
Mais uma vez, mataram o irmão, o amigo,
Meu Deus do Céu, jamais fora preciso.
Nossa vingança, Vicente, é um bandeira,
Que vence o luto e a morte derradeira
Vai triunfar...
Vai triunfar
Dos planos da opressão,
Tua morte anunciará o fim da escravidão
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Enfim, Ressurreição!
Como será, na pauta do destino,
Um povo nu nos planos de assassinos?
Como estará a noite em tua aldeia
Sem tua sombra talhada em lua cheia
Nossa esperança, Vicente, é nova aurora
Vence da Cruz, na força desta hora,
Vai triunfar...
Vai triunfar,
Das trevas do rancor,
Tua morte julgará os cúmplices da dor...
Teu povo vencerá,
Por vida e pelo Amor
Ao associar-me com alguns autores, como Paulo Freire, a codificação, ou
possibilidades da relação dialógico-comunicativa, com vistas a fomentar práticas de liberdade,
neste trabalho, foi feita através do uso da técnica de investigações temáticas para encontrar os
sujeitos e aproveitei o conceito de descrição densa, de Geertz, para negociar com Merleau-
Ponty. O meu modo de negociar entre os autores -Freire, Geertz, Merleau-Ponty e Brandão-
construiu-se através de perguntas em várias direções. Ex. Brandão, o que é o método de Paulo
Freire e, Freire, o que é a Interpretação das culturas, em Geertz? E assim fui desenvolvendo
esta investigação, procurando aproximar-me cada vez mais da resposta às minhas
inquietações. Então, com Merleau-Ponty e a Fenomenologia, a pesquisa não foi buscar as
essências. Ela procurou repô-las na existência. É o a priori de Kant, isto é, nós é que o
colocamos ao enunciar os Temas. Ao procurar ir ao encontro com os autores, a partir de meus
achados, com Passos, a partir de sua orientação e de sua obra, entendi que temporalidades
podem trazer pressupostos. Se, na Etnografia, você faz um relato de uma cultura específica,
procurei circular em uma comunidade a fim de encontrar maneiras de expor seus problemas.
Muitas vezes senti que, alguns dos atores que, hoje, estão em outras localidades, estiveram ali.
E tudo isso na tentativa de descobrir os momentos em que saíram da situação de
oprimido/opressor. Para isso, busquei dar ênfase à percepção dos sujeitos, e também à minha,
descrevendo as situações densamente e tentando dar cientificidade às subjetividades desses
sujeitos. No uso da sua linguagem, a intenção foi a de fazer que as palavras trouxessem, além
dos sentidos, outros encontros, mas sem perder a cientificidade. É o captar dos sentidos que
explode naqueles momentos de conversa e na tentativa de descrever a intencionalidade do
encontro. Lembrei-me de Ir. Anete. Devo intercalar o seu passado como pergunta para obter a
resposta de seu trabalho? Respondendo, procurei fazer a descrição densa do encontro. Aqui,
repito, semelhante ao bígamo na busca do casamento de opiniões, dialoguei com vários
99
autores no sentido de que me auxiliassem e, então, falei com os acima citados, com Passos e
outros. Em fenomenologia, o trabalho foi desenvolvido nos tempos vividos, aliados aos
tempos diferentes do sujeito, enquanto que na Intencionalidade, a temporalidade foi descrita
como condição de possibilidades, (PASSOS em orientação), mas trabalhando sempre com
uma pergunta problema e perseguindo sua resposta. Ao procurar fugir das hipóteses, mesmo
entendendo que elas podem ser pressupostos e temendo que elas atrapalhassem a descrição
densa, marquei posição, pois percebi, de início, que existe uma hipótese explícita. Quando fiz
a descrição, tentei não permitir que a hipótese prejudicasse a densidade fenomenológica e não
me preocupei em cotejar com outras metodologias. Se isso é autonomia, então, posso dizer
que trabalhei com ela. Na relação entre o sujeito, o pesquisador e o objeto movimentos
sociais e seus sujeitos – busquei entender se o fenômeno se revelou em toda a sua exuberância
ou se continuou polissêmico. Se ele continua polissêmico, quais os signos que nos ajudam a
perceber seus sentidos ou que permitam uma interpretação que possibilite aproximar-nos do
objetivo central que esta pesquisa persegue, ou seja, descobrir se os Movimentos Sociais
surgidos na Paróquia do Rosário e São Benedito, de Cuiabá, produziram uma educação
popular potencializadora de Libertação. Aqui, uma constatação. Tenho que conceder um
grande respeito ao leitor. O fenômeno pesquisado, ao revelar o sistema de relações que o
compõe e o objeto dentro da sua autonomia relativa -embora às vezes oculta- possibilita ao
sujeito que o desnude, mas não permite ainda que se veja todo o seu corpo. Embora a
fenomenologia esteja aberta ao diálogo com outros pontos de vista filosóficos, é bom lembrar
que ela tem características bem nítidas e que lhe são próprias (REZENDE, 1990, p.8-9). Isto
significa que, quando o pesquisador busca mostrar aquilo que estava impedindo - ou impede -
o objeto de se mostrar como ele realmente é, estará construindo um texto polissêmico como
os outros, que levam o leitor a fazer a sua interpretação, podendo, inclusive, descobrir outros
sentidos, porém sem neutralizar as significações encontradas. Por exemplo, nas ações
ecumênicas, as alternativas utilizadas para evitar a idéia de confrontação com o Senhor Bispo
Arquidiocesano e vice-versa. É aqui que entrou a dialética, ou seja, o descobrir que o objeto é
constituído de uma raridade de bens e de uma multiplicidade de variedades necessárias. É por
isso que a fenomenologia ainda tem muito a fazer, ou seja, continuar avançando o percurso
para se aproximar mais e mais da sua essência, de uma essência que não se esgota, que se
ressignifica, paulatinamente, durante o processo de seu desvelamento, propiciando a imagem
que Merleau-Ponty tantas vezes menciona: a de um horizonte, para o qual se avance e que se
projete sempre mais além
. Aqui, um cuidado com as diferenças de perspectivas. Explico: A
classe social dos personagens da pesquisa, em sua maioria, é de origem popular, mas
100
pessoas letradas; cada qual a seu modo o mundo de significados. Precisei, então, lançar
mão das intersubjetividades para poder enxergar as coisas que surpreenderam.
Interessante é um resultado que me chamou a atenção. De um historiador dito
positivista e historiográfico, de um católico de alguma forma subserviente à hierarquia, esta
pesquisa me fez adotar a coragem de tomar certa distância crítica, e ter de posicionar-me
realmente quanto à questão da teologia da libertação, da Cruz... etc... Este se reposicionar,
aprender, crescer, está sendo para mim o mais importante deste processo. E é, pois, nesta
interlocução pesquisador-pesquisa-objeto, que se uma estranha mutação, concreta,
fenomenológica; é aqui que minha percepção do mundo, de mim mesmo, dos momentos
sociais, da Teologia, do passado do Rosário, me fizeram experienciar um caminho semelhante
ao de Damasco. E logo eu, que pensava que sabia das coisas. Sabia nada... É nessa relação
homem-mundo que o foco pôde ser re-interpretado. Para isso, o orientador me ajudou a
encarar os fatos, só que agora com a ajuda de seu olhar, de um olhar de alguém de uma classe
mais privilegiada (BARBIER, p. 110), ou seja, a de alguém que, parece, já rompeu o círculo e
se libertou. Que Freire não se revire no túmulo.
Ao deparar-me com alguns conceitos Gramscianos, tais como os de intelectual
orgânico, intelectual coletivo, revolução passiva, ideologia alternativa, partidos etc. (SADER,
2005), resolvi estabelecer um diálogo com essas dimensões a partir da intencionalidade
fenomenológica pretendida neste trabalho. Não com surpresa, posso assegurar que percebi
que um grande número de atores e de ações dos Movimentos Sociais, presentes na Paróquia
do Rosário e São Benedito, de Cuiabá, na década de 80, desenvolveram suas atividades
perfeitamente enquadradas em alguns dos conceitos gramscianos acima citados. Vejamos:
No decorrer da pesquisa, para mim ficou evidente que os atores estudados,
geralmente os padres em suas homilias e ou reuniões, ou mesmo alguns leigos anistiados ou
perseguidos pela Ditadura, trabalharam claramente com idéias contrárias ao do então poder
dominante, em parte, como ação de confronto e para fazer valer todo aquele discurso de
democracia que estava se fazendo presente, e como cobrança da omissão do governo nas
suas ações de política públicas, de assistência à sociedade e etc...” (Gravação número 3
Padre Pedro -17.09.2007). Portanto, com opiniões que tendem a alterar a organização da
sociedade em um sentido avançado em liberdades. (C. AULETE, 1964). Aqui, idéias - em que
polêmica me envolvi - me levam a atentar ao que Passos diz: “não são somente os discursos
feitos de quem faz idéias ou pretende tê-las, e que são criadas entre chopes e batata-frita, mas
que não mudam a realidade; aqui é a ação de quem carrega o piano, efetivamente, que muda
101
relações práticas”. Acompanho meu orientador quando afirma que Marx tem razão. Os
intelectuais iluministas, dizia ele, “passaram toda a história dizendo que eles mudavam a
realidade fazendo idéias de mudanças, mas não mexeram com um dedo nas relações; quem
mexe são os sem-terra, são os operários, são os camponeses que se revoltam, são os
estudantes que embargam, são os artistas que expressam e incendeiam certezas, os anarquistas
que bloqueiam estradas, aqueles que quebravam as máquinas, os que elegeram presidentes
sem possuir escola e universidade, para enlouquecimento dos príncipes da academia que não
mexeram nem na economia brasileira”. Não foram as palestras feitas ao povo rude e sem
cultura política que fizeram a mudança. Foram os trabalhos nas Hortas Comunitárias, para
evitar a exploração predatória dos atravessadores, os trabalhos conjuntos, compartilhados, sob
nova relação de autonomia, com menos venda do sangue e do suor, com mais comida na
mesa, sem tanto agrotóxico. “Valeram as contribuições dos intelectuais, dos acadêmicos, com
certeza, mas não foram eles que ousaram dependurar o sininho no gato”. É justamente o que
se entende ao se dizer que o intelectual é aquele que sabe, mas o povo é que sente, Passos,
citando Gramsci. O que educa é o trabalho! E, novamente, Marx tem razão! e Alegria era
uma educação para o trabalho. Há um artigo sobre isso, do Fé e Alegria, na revista da AEC. A
inspiração para o trabalho de co-gestão, trabalho que não se alienava e que era expressão de
criação (coisa humana), que era fazer-se pelo trabalho, orientado pela pedagogia socialista
(Pistrak) nos coletivos de trabalhos, ligados concretamente à construção e ao fortalecimento
do poder de comunidades específicas, ou seja, das comunidades dos desfavorecidos. Já
alertamos para o fato de que “A tarefa era de constituir algo como um ‘Centro de
Espiritualidade, Reflexão e Ação Social’ no modelo jesuítico, daqueles que existiam em
todo o mundo, mas com sintaxe própria da América Latina”, e onde “pretendiam fazer uma
base que fosse o epicentro de uma articulação com a Amazônia” (PASSOS em
correspondência eletrônica). Some-se a isso a declaração explícita de “investir freireanamente
nas Pastorais sociais de apoio às lutas dos mais empobrecidos em favor de sua emancipação,
sabendo que teriam focos de tensão com a ditadura e com a estrutura eclesial conservadora”.
Diante de tal densidade de informações, pode-se afirmar que as ações ali desencadeadas
foram realmente ações desencadeadas por intelectuais orgânicos. No entanto, o que
poderíamos chamar de intelectuais coletivos, para mim, são aqueles que compuseram a ala
dos que trabalharam não somente com idéias; aqueles que, em colegiado ou não, realmente
alimentaram o ardor das batalhas. E, todos, ao visarem à criação de uma ideologia alternativa
e de luta pelo poder, deram um sentido político às estratégias de formação intelectual e moral
nas comunidades trabalhadas, parecendo encetar propostas à realização de uma educação
102
popular potencializadora de Libertação, no território da freguesia em estudo. Feitas as
considerações acima, nas quais incluí meu referencial teórico-metodológico e como temos
uma estrada a seguir, vamos, a partir de agora, falar um pouco sobre aquilo que considero
uma utopia encarnada e tão cara ao objeto de nossa pesquisa.
Os Movimentos na Paróquia do Rosário e São Benedito na década em estudo
Embora não seja o propósito desta pesquisa fazer um elenco em que se traçaria o
perfil de todos os Movimentos Sociais surgidos na Paróquia do Rosário e São Benedito, de
Cuiabá, na década de oitenta, nem das personalidades neles envolvidos, uma vez que muitos
deles ainda continuam em plena atuação, e, inclusive alguns, com atuações que ultrapassam
fronteiras, permito-me, entre as tantas ações encontradas neste trabalho, selecionar, não como
exceção, mas a título de amostragem, dados que forneçam um rápido perfil da Pastoral da
Saúde Popular, um dos tantos projetos nascidos no bojo daquele momento e que se
despontava como possibilidade de cura das feridas provocadas pelo descuido do Estado
àquele povo sofrido, despertando lideranças comunitárias para a busca de direitos sociais.
Trago a experiência de Edna Amaral, moradora de uma das comunidades da Paróquia do
Rosário e São Benedito que, no intuito de melhoria da qualidade de vida, de sua família e da
própria comunidade, envolve-se nas lutas tornando-se uma das lideranças nas lutas por saúde.
Juntamente com outros membros (intelectuais orgânicos) inseridos, desenvolveu um projeto
de Educação para a saúde, o qual, em 10 anos de atividades locais, articuladas com uma rede
nacional de luta por melhores condições de vida e de saúde e de uma política pública de saúde
(MOPS – Movimento Popular de Saúde entre outros), rompe as fronteiras da Paróquia,
alcança todo o Estado de Mato Grosso, atinge o País e, em conseqüência do contínuo
desenvolvimento de suas ações, ganha reconhecimento nacional e se transforma em uma
Associação Brasileira de Homeopatia Popular ABHP em 1996. Essa Associação que,
embora sendo de caráter Nacional, espraiou-se a tal ponto que hoje já possui braços de
articulação com outros países, como Angola, Espanha, Moçambique etc.
Na continuidade, e principalmente no intuito de mostrar homogeneidade de
características e dar uma idéia de como foram sistematizados os demais Movimentos e/ou
Organizações Sociais, surgidos na paróquia em estudo, selecionei o Centro Burnier Fé e
103
Justiça, sobre o qual vimos nos referindo ao longo deste trabalho. Após fazer sua
apresentação, apresento-lhes duas pessoas que considero relevantes, sobretudo com o desejo
de provocar nos futuros pesquisadores uma sadia curiosidade sobre os demais atores que
transitaram e ainda transitam naquele chão sagrado. Vejamos o que segue:
Inicialmente, darei uma sintética informação sobre o Centro Burnier Fé e Justiça que,
como já mostrei ao longo da pesquisa, sempre esteve latente nas ações da Paróquia do Rosário
e São Benedito, de Cuiabá. A intenção, ao fazer sua apresentação, é a de demonstrar a
existência de características homólogas aos demais Movimentos Sociais assentados na
Paróquia em estudo. Para uma melhor descrição desse Centro, que funciona como o guarda-
chuva de uma rede de ações sociais, me servirei das informações colhidas tanto na entrevista
número sete, com o Padre João Inácio Wenzel, quanto das cópias do material que nos foi
concedido pelo mesmo, pelo jesuíta Padre Roberto Rossi, bem como de dados discutidos com
o professor Dr. Luiz Augusto Passos, com o senhor Inácio Werner, com o Padre Moura e com
o Padre Pedro Schroeder. Vejamos:
O Centro Burnier Fé e Justiça
Para o padre Roberto Rossi, a Pastoral Social da Paróquia do Rosário, em Cuiabá, e o
Centro Burnier Fé e Justiça têm sido um trabalho conjugado que tem marcado o modo
jesuítico de ser que, inclusive, foi agraciado com uma nota pública de educadores da
Universidade Federal de Mato Grosso. Para ele, os movimentos sociais assentados na
Paróquia do Rosário tiveram seu marco inicial a partir da formação de comunidades nascidas
por ocasião das invasões de terras na periferia de Cuiabá, ocorridas quando da chegada de
migrantes pobres, no ano de 1974, e com maior ênfase a partir de 1980. Com certo
saudosismo, ele elenca, sem mencionar datas, a criação do “Fé e Alegria, o Centro de Direitos
Humanos Henrique Trindade, o trabalho com Deficientes Físicos, o Instituto de Pastoral de
Homeopatia Popular, a criação do Partido dos Trabalhadores e a própria Festa de São
Benedito, a criação do CIMI Conselho Indigenista Missionário, as CEBs Comunidades
Eclesiais de Base, a CPT- Comissão Pastoral da Terra - as lutas de apoio pelas ocupações do
bairros, a luta pela água nos bairros, a luta contra os despejos, o apoio e denúncias das
questões agrárias e indígenas, o trabalho de apoio à Horta Comunitária de e Alegria no
104
Bairro Alvorada, com Passos, Irmã Dineva, Dieter, Faraó, Edna, Igreja Luterana, padre José
Ten Cate, Maria, Nono, Dalva, João Pedroso, Ari Vonil e outros. Diz ele que, à época, se
arrebanhou o povo de toda a cidade no sentido de uma ampla mobilização e de ajuda ao povo
carente do interior da Paróquia. Concluindo, as informações que ele fornece sobre a fundação
do Centro Burnier Fé e Justiça são as mesmas fornecidas pelo padre João Inácio Wenzel.
Quanto ao Padre João Inácio Wenzel, apresentou dados que contam a história do
Centro Burnier e Justiça e que transcrevemos na íntegra, como segue: “O Centro Burnier
e Justiça tem sua origem no final da década de 1970, quando a Província do Brasil
Meridional enviou alguns jesuítas para Mato Grosso, para estudarem a possibilidade de
conceber um Centro de Investigação e Ação Social (CIAS) na região amazônica. Cidades
como Ji-Paraná, Porto Velho e Cuiabá foram visitadas. Optou-se por Cuiabá - MT- como
lugar geográfico de referência. Contudo, não se criou um centro de investigação como fora
previsto. Por outro lado, neste intervalo de tempo, foi se constituindo em um centro de apoio e
referência para o surgimento de diversos movimentos e organizações sociais. No campo da
formação e capacitação, os jesuítas que atuaram na paróquia, durante esse período,
desencadearam um amplo processo de organização de comunidades eclesiais e de formação
de lideranças cujo destaque foi a formação de lideranças jovens. Na década de 80, além de se
manter a proposta de constituir um CIAS em Cuiabá, a pastoral popular sugere a criação de
um centro pastoral em Porto Velho, CEPAPE. A partir de 1995, começa um processo de
acompanhamento espiritual e alguns retiros são organizados para lideranças da paróquia
Nossa Senhora do Rosário e São Benedito. Nesse período, concretizam-se os primeiros passos
para a criação de um Centro de Espiritualidade, a partir da Paróquia do Rosário,
estabelecendo-se a primeira equipe em 1997. Esta experiência serviu de base para a
elaboração do projeto “Centro Burnier de Espiritualidade Inaciana” da Região do Mato
Grosso da Companhia de Jesus (BMT), criada em 2000. Em 2001, o projeto idealizado no
final da década de 1970, as iniciativas tomadas pela Paróquia do Rosário e São Benedito nas
décadas de 70 e 80 e os projetos idealizados pela BMT Centro Burnier de Espiritualidade,
capacitação de lideranças populares e atividades do setor social se materializam com a
criação do Centro Burnier e Justiça, mantido pela Missão Anchieta. Desde então, o Centro
Burnier vive um processo intenso de planejamento, de estruturação e de consolidação de sua
missão. O primeiro passo foi a nomeação, pelo superior regional, em agosto de 2001, de uma
equipe de trabalho integrada por três jesuítas Roberto Rossi, Jair José Schuh e João Inácio
Wenzel que, até o final do ano, refletindo com outros jesuítas de Cuiabá, chegou a um
105
primeiro esboço do que seria o Centro Burnier e Justiça, que deveria “começar pequeno e
sonhar grande”. Tendo como base uma infra-estrutura nima uma sede e um carro o
trabalho voluntário dos jesuítas e uma secretária contratada a meio expediente, iniciaram-se os
trabalhos de interação com o movimento social e a composição de uma equipe de
espiritualidade. Esta, integrada por leigas e leigos, uma religiosa e dois jesuítas, iniciou seus
trabalhos com um programa de capacitação de acompanhantes dos Exercícios Espirituais
(EE), pelo método aprender fazendo. Com a visita de uma representante do Centro Magis,
surge a idéia de se organizar e informatizar a biblioteca e criar um banco de dados. O projeto
exigiu também a adequação do espaço físico e a elaboração de um projeto estratégico que teve
início no período de 05 a 07 de fevereiro de 2003. Com assessoria de Luiz Augusto Passos,
deu-se continuidade a esse planejamento com a realização do seminário para a definição do
Projeto Político Pedagógico do Centro, sistematizado pela equipe executiva e apresentado
para discussão ampliada no dia 06 de agosto de 2003. Em meados de 2003, foi contratado um
articulador para trabalhar com o movimento social e, a partir do final do ano, foram
consolidadas várias parcerias: com o Centro Pastoral para Migrantes, o projeto Cidadania e
Esperança, integrado mais tarde também pela CRB; com a Paulus Livraria, o projeto Bate
Papo Literário e com o FORMAD, a partir de 2005, o projeto Mato Grosso Sustentável e
Democrático. “No segundo semestre de 2006, iniciamos um processo de avaliação e
planejamento com uma metodologia própria, cuja referência fundamental é o Programa
Pedagógico Inaciano”.
Apesar da carência de dados que nos foram disponibilizados, entendo ser possível ter
uma boa visão sobre o Centro Burnier e Justiça e perceber a dialeticidade embutida no
permanente processo de intenso planejamento, de estruturação e de parcerias e que tanto
ajudam na consolidação de sua missão.
Dois personagens.
Várias foram as pessoas que contribuíram decisivamente para o sucesso das ações
desencadeadas pelos Movimentos Sociais, na territorialidade da Igreja do Rosário, na década
de 80, e todas as que chegaram ao meu conhecimento estão citadas neste trabalho. No intuito
de não cometer injustiças, reafirmamos que não é o objetivo desta pesquisa destacar atores e/
ou personagens individualmente, e sim retratar ações e repercussões que possam demonstrar o
106
caráter educativo libertador dos movimentos sociais, naquele espaço Paroquial. Para as
pesquisas de cunho histórico-político-social de caráter biográfico, espero que os futuros
pesquisadores elaborem novas garimpagens. Aqui, a título de registro, talvez correndo o risco
de cometer alguma injustiça, faremos referência a apenas dois personagens. O primeiro, Padre
Jacob Teodoro Weber, será apresentado sob a ótica do professor Dr.Luiz Augusto Passos. O
segundo refere-se a Dom Bonifácio Piccinini, hoje Arcebispo Emérito que, à época, era
Arcebispo da Sede Plena da Arquidiocese de Cuiabá. Os dados deste último foram extraídos
de sua auto-apresentação. O que desejo ressaltar são os dois aspectos de um fenômeno que se
apresenta para o pesquisador. Um, visto sob o olhar de um estudioso da filosofia
fenomenológica, o outro, apresentando-se a si mesmo. Coube ao pesquisador acolher os dados
e descrevê-los e a você cabe escutar os gritos dos silêncios.
Padre Jacob Teodoro Weber
A singeleza da narrativa abaixo se refere a reminiscências de uma amizade, que
transcrevo na íntegra, como segue:
A Paróquia, quando aqui chegamos, tinha um pároco sexagenário que a conduzia e
que definia o controle do território no estilo da Prelazia pessoal, de sorte que,
inclusive o bispo, sentia-se pouco à vontade de coordenar aquele ‘território livre”.
Esse era Padre Jacob Teodoro Weber. Estivera algum tempo na Missão Anchieta,
acompanhado o trabalho indigenista, mas ficara ainda muito mais tempo atendendo
os sítios, em Diamantino e região, mais tarde entre o Rio Manso, atendendo a lombo
de mula, as comunidades durante muitas semanas, quase por mês inteiro. Era uma
figura completamente ‘explícita’ e, dizia, por vezes, mais do que qualquer um de nós
teria coragem dizer. Essa força, pertinácia, tamanho físico avantajado e cheio de
força, temperada por sua aspereza de colono de origem alemã do Rio Grande do Sul,
e um sentido de felicidade e de assertividade rara num ser humano, contrastava com
a doçura extrema diante da poesia, da música, da beleza. Costumava defini-lo como
um “poço de virtudes exageradas”. Se alguém, em qualquer iniciativa em favor de
mais empobrecidos precisasse de um defensor, tinha em Teodoro a força da
profecia, do sacrifício, a largura infinita da compreensão e desprovido do atoleiro da
dúvida. Era um guerrilheiro duro. Amado e odiado com a mesma força com que se
ama e se odeia um profeta. Jamais nos abandonou em qualquer situação em que
estivéssemos em apuro. Ainda que discordasse, manifestava, discutia, compreendia e
apoiava. Até o fim (...). Vocês imaginaram um padre ancião, de cabelos brancos,
compridos e amarrados de “colinha” à frente de um grupo de congada de negros de
Vila Bela da Santíssima Trindade, pulando feito menino nas ruas de Cuiabá, sem se
por, a qualquer momento, o que estariam pensando seus adversários? Ou quando,
nas missas de S. Benedito, a mãe de candomblé, Dona Maria, paramentada a rigor,
com seus filhos de Santo, chegam no finzinho da Igreja, e ficam lá, quase que
escondidos face à atmosfera racista existente em Cuiabá, serem chamados à frente,
com uma imensa alegria radiante e com desmesurado carinho espalhafatoso, para
enfeitar o altar de S. Benedito durante a missa? OU... intimidades, que aqui conto.
107
Tinha na parede da Secretaria da Paróquia uma fotografia linda com um terço
dependurado sobre um fuzil, homenagem a Camilo Torres. Teodoro, como eu,
éramos pacifistas, mas ele como eu, pensávamos no direito de defesa e de
sobrevivência das populações sob genocídio e guerra. Ele voltara do retiro espiritual
como bom jesuíta e me dizia. “Rezei muito. Mas, minha contemplação, quase
mística, foi ver Camilo Torres e Che Guevara junto com Jesus. São santos que temos
que venerar.... (Transcrição do e-mail de PASSOS, 2007).
Dom Bonifácio Piccinini
Dados curriculares elaborados por este autor e mencionados anteriormente como
parte integrante de seu trabalho acadêmico “Um Certo Bonifácio Ecumênico”, quando Aluno
Especial da disciplina História das Populações, ministrada pela professora Doutora Maria
Adenir Peraro, do Programa de Mestrado em História, em 2006, do ICHS Instituto de
Ciências Humanas e Sociais – da UFMT, cujos dados foram extraídos da gravação nº 4 de 14-
07-2004 e da cópia do Curriculum Vitae, fornecidos por Dom Bonifácio Piccinini a este
pesquisador. Em seus dados, consta o seguinte: Os seus bisavós, Joaquim Piccinini e Virginia
Toldo, atraídos pela propaganda de emissários do Império brasileiro na Europa, no final da
década de 1870, mais precisamente em 1877, vieram em busca da América. Partindo da
Província de Trento, norte da Itália, procedentes de um lugarejo situado nas montanhas e
chamado de Lavarone, aportaram com os seus familiares e demais companheiros em Itajaí, no
Estado de Santa Catarina, onde ficaram hospedados em um barracão de recepção de
emigrantes. Seu bisavô faleceu no barracão e sua bisavó, Dona Virginia, seguiu com seus
filhos menores - seu avô Giusto Benvenutto Piccinini e outros irmãos - e demais imigrantes,
para o lugar denominado Primeiro Braço do Norte, situado à esquerda do Rio Luiz Alves na
região denominada Luiz Alves de Maçaranduba. Lá, receberam os lotes do Projeto destinado
aos imigrantes. Abriram as primeiras clareiras e fizeram os primeiros barracos de palha e os
homens voltaram para buscar suas famílias. Não temos informações sobre as condições de
sobrevivência inicial. O que os antigos moradores dizem é que eram muito precárias. Mesmo
assim, estabeleceram-se, lutaram, criaram sua capela, multiplicaram-se e subdividiram as
colônias para os filhos e netos por ocasião de seus casamentos.
Dom Bonifácio Piccinini nasceu em Luiz Alves (SC), a 13 de maio de 1.929, sendo
seus pais José Piccinini e Maria Stolf Piccinini - ambos falecidos. Primeiro filho, de uma
prole de oito irmãos, e com forte vocação para as lides religiosas, destacam-se entre eles seu
irmão, o Padre Severino e as Irmãs Religiosas Ida e Vergínia, todos salesianos. Em Lorena,
108
cursou o ginásio, fez o curso clássico e os estudos filosóficos, bem como a profissão perpétua
na referida Congregação. Seguiu para a Itália em 1955, onde, após licenciar-se em filosofia e
teologia, foi ordenado presbítero na Basílica de Maria Auxiliadora, em Turim, no dia 11 de
fevereiro de 1.960. Em Roma, doutorou-se em filosofia, no ano de 1962. Trabalhou por 12
anos em Lorena, no Seminário Maior, na Faculdade de Filosofia e no Oratório São Luis, onde
foi administrador, professor e Superior. Em Lorena, deixou indeléveis lembranças. Em 1974 é
nomeado Diretor do Seminário Menor de Lavrinhas - SP, onde, a 2 de julho de 1975, é eleito
arcebispo titular de Torres de Bizacena e coadjutor com direito à sucessão de D.Orlando
Chaves, arcebispo de Cuiabá. Em 31 de agosto de 1975, recebe, em Lavrinhas, a consagração
episcopal das mãos de Dom Carmine Rocco, já falecido, e então Núncio Apostólico no Brasil.
A 5 de outubro do mesmo ano, na Catedral-Basílica de Cuiabá, toma posse de suas altas
funções. A 31 de março de 1976, assume o governo ordinário, agora como Administrador
Apostólico Sede plena. A 15 de agosto de 1981, com o falecimento de Dom Orlando Chaves,
sucede-lhe como arcebispo metropolitano.
Em seus dados biográficos, consta que seu dinamismo apostólico estimulou a criação
de dezenas de novas comunidades, sobretudo nas zonas periféricas da grande Cuiabá, entre as
quais, sete novas paróquias e deu espaço para a organização de novas pastorais.
Administrador de visão, em convênio com a UFMT, organizou o Arquivo da Cúria
Metropolitana de Cuiabá, organizando a catalogação de todos os documentos Históricos e
acompanhou pessoalmente a construção e reforma de várias capelas, igrejas e centros de
evangelização CETRA, CENE, Asilo Santa Rita e recriou o Seminário Maior em Cuiabá -
Studium Dom Aquino Correa – SEDAC.
Foi contrário à divisão do Estado e, na ocasião, promoveu uma significativa passeata
de protesto, inclusive e também, contra o divórcio. No perseverante e prudente cultivo das
vocações, viu ordenados, em seu tempo de arcebispo, todos os padres atualmente incardinados
em Cuiabá. Empenhou-se também para a obtenção de vários sacerdotes de dioceses do Brasil
e do exterior. Segundo o mesmo, sem medo da multiplicidade dos carismas do Reino,
promoveu a vinda de quatro novas congregações masculinas e dez outras, femininas.
Prestigiou a Renovação Carismática Católica (RCC) e os demais Movimentos da Igreja,
reavivou a Rádio Bom Jesus e, na dimensão ecumênica, promoveu os decisivos passos para a
sua definitiva implementação em terras mato-grossenses.
Ao chegar ao final
deste capítulo,
desejo registrar que o meu projeto pretende
continuar ampliando esta pesquisa. Portanto, é bom frisar que nem tudo foi colocado a
109
descoberto e que ainda existe um riquíssimo material que, qual pedra bruta, necessita ser
burilado por profissionais competentes. O que até aqui veio a lume deve ser entendido como
uma pequena mostra de um vetusto fenômeno chamado de Paróquia Nossa Senhora do
Rosário e São Benedito, que, ao implantar e construir caminhos de utopias, com seu silêncio,
grita para ser revelado. É como que um trabalho de pastoral de saúde. que a saúde que se
procura é a de um mundo novo, onde reine a paz, a liberdade, a justiça, o respeito e a
democracia. E isso é igual à conversão. É utopia encarnada, ou processo de libertação que não
cessa. É trabalho de toda uma vida e se faz na estrada, caminhando!
EPÍLOGO
A partir da análise dos fatos apresentados e da vivência na territorialidade rosário-
beneditina com alguns dos atores dessa comunidade como, por exemplo; o padre João Inácio
Wenzel, ex-pároco dessa comunidade e meu ex-professor do curso de Teologia para Leigos; o
Sr. Nonô, representante do Movimento Leigo e grande líder do Rosário; meu orientador, o
professor Dr. Luiz Augusto Passos; a Irmã Anete, então Presidente do CONINTER; o seu
Tesoureiro, Horst Siegfred Musskopf, Pastor da Igreja Luterana do Brasil, e os demais,
pastores e leigos das Igrejas que compõem aquela entidade, que trabalham com a Dimensão
do Ensino Religioso na Escola Pública, ou na Dimensão Ecumênica, o Frei Tarcisio, então
Presidente do CONIC, e a quem honrosamente sucedi, em eleição justamente nessa paróquia,
em 1999; o padre Luigi Fávero, então Delegado Regional e acumulando a de Delegado
Diocesano da Dimensão Ecumênica; a Irmã Cleofas, do Diálogo inter-religioso na
Arquidiocese de Cuiabá; o Padre Deusdedit Monge de Almeida, Vigário Geral da referida
Arquidiocese, além de muitas outras pessoas que me permito não citar, procurei encontrar
nexos quem me sugerissem verificar se, através das interpelações ideológicas presentes nos
Movimentos Sociais surgidos na territorialidade da Paróquia do Rosário e São Benedito, na
década de 80, é possível falar em uma educação popular potencializadora de Libertação, como
resultado desta pesquisa. Para esta resposta, inicio afirmando que, ao pretender fazer as
descrições da (des)organização social naquele tempo e espaço, saltou aos meus olhos a
existência de uma efetiva intencionalidade fenomenológica merleaupontyana, bem como senti
naquelas ações sociais uma clara evidência da existência de uma prática freireana que
potencializava o ato de pensar certo, o repensar, o ser mais, e até maneiras de pensar a
realidade que sugerem uma dialética fenomenológica conseqüente dos novos enfoques e das
inovações surgidas a partir da realidade ali existente – pobreza, crescimento urbano acelerado,
exclusão social, insegurança etc. Ao buscar perceber o tipo de engajamento que se sobressaiu
nas ações coletivas, notei sinais de um diálogo crítico e problematizador, cheio de
solidariedade e em um “mundo fenomenológico”, onde o “eu” se instaurou e se afirmou
construindo mundos de experiências, e onde se verificaram sujeitos conquistando esse mundo
e descobrindo-se, então, mais humanos. Isso porque os responsáveis foram o que posso
111
chamar de os verdadeiros animadores culturais. Para mim, a leitura sobre o Ecumenismo e o
Ensino religioso mostra que essas dimensões apresentam-se como duas experiências que
ultrapassaram fronteiras, isto é, que se intercomunicaram em um sentido de Integração de
Diversidade (SCHERER-WARREN, 2005, p. 9). Ao procurar a coerência lógica dos eventos
pesquisados, notadamente quando auxiliado por meu orientador, um estudioso da
fenomenologia que jogou um raio de luz para que esse fenômeno pudesse se revelar como
realmente é, tentei trabalhar com uma metodologia das ciências sociais, para demonstrar que
não interferi nas coisas e, sim, que elas se mostraram ao pesquisador, ou melhor, se deixaram
revelar. Daí o cuidado, quando me propus a descrever o fenômeno, evitando, tanto quanto
possível, interferir ou introduzir nele as minhas categorias lógicas. Na dimensão simbólica
que, segundo Passos -em orientação- é a força mais presente na sociedade de hoje, busquei na
potência da palavra geradora o que ela pariu de substancial quando nos liga, na
inseparabilidade da dimensão cósmica, com a dimensão consciência e nos faz construtores de
nossa própria história. Donde o esforço que fiz ao prestar atenção a um corpo que fala, em
uma verdadeira endosmose com a natureza e com o transcendental, a fim de dar sentido às
suas lutas, não na fatalidade dos destinos, mas na sintonia com a mãe vida que é luta e
transformação, ou seja, que é dialética e que se desnuda frente àqueles que têm a coragem de
rasgar os seus véus e se jogam na rede dos seus fenômenos. Convém lembrar a importância
das subjetividades, da descrição densa, das temporalidades, da etnografia, da antropologia e
da hermenêutica que tanto me ajudaram a trilhar pelas veredas e incógnitas dos fenômenos.
As subjetividades tiveram que ser sutis, dando um pequeno impulso, a fim de ajudarem na
clarificação das ações vividas pelos sujeitos em estudo. E isso foi possível quando me
esforcei em entender o que o outro está dizendo. Ora, ao analisar a paróquia em questão, para
mim ficou claro que todos somos atores e também que todos estamos num palco e, tal como
ocorre com os fenômenos, todos temos condições de nos fazer entender quando estamos
falando ou agindo, posto que portadores de linguagem. É o que Merleau-Ponty (2006) ensina
quando nos incita a descobrir os códigos para sermos um entendido. É descobrindo essa
linguagem que se conseguirá desvendar os códigos do fenômeno. O cuidado me fez conservar
a vigilância para manter o foco centrado na linha de chegada do mundo pesquisado. Lembra
que a fenomenologia ensina que o homem é um “ser-no-mundo”, então, sua consciência, ao
coexistir com esse mundo vivido e que o envolve, atua atada ao corpo que a liga a esse mundo
que a realiza como consciência? Ora, como é no tempo e no espaço que se desenrolam os
acontecimentos e desnudam-se as transcendências, tive que tentar retornar a essas dimensões
para saber de que o fenômeno estava falando. E foi então que, como pesquisador, tive que
112
intuir para explorar a primordialidade fenomenológica que me encantou e me espantou. O que
busquei na temporalidade e na territorialidade da Igreja do Rosário e São Benedito de Cuiabá,
na década de 80, foram sujeitos múltiplos, os quais, através de elementos inovadores,
procuraram escrever uma nova história dentro de modelos que possibilitassem a gestação de
uma nova cultura e que permitissem ao povo daquela territorialidade adquirir novas
significações. Encontrei muitos desses sujeitos, todos eles ainda de mangas arregaçadas e com
o coração ardente, fazendo a sua caminhada, interrogando-se, buscando significações e todos
me pareceram estar trilhando o sonhado itinerário do retorno de Emaús, quando nos conta que
31 Então se lhe abriram os olhos e o reconheceram... mas ele desapareceu.32 Diziam
então um para o outro: “Não se nos abrasava o coração, quando ele nos falava pelo
caminho e nos explicava as Escrituras?” 33 Levantaram-se na mesma hora e
voltaram a Jerusalém. acharam reunidos os onze e os que com eles estavam. (Lc.
24, 31-33).
Pois é justamente assim que me pareceu esta caminhada. Tenho voltado muitas vezes
ao território da paróquia em estudo, como se fora o retorno à minha Jerusalém da pesquisa,
para, como os servos de Emaús, novamente beber de suas refrescantes fontes da memória, a
fim de retomar a caminhada. Não a faço sozinho. Estou em companhia e tudo me diz que este
trabalho não é feito somente por mim. É bem semelhante a esta dissertação. Não fui eu que a
fiz. Foram todos vocês que a fizeram. Muito obrigado. A minha parúsia ainda não aconteceu
totalmente. É uma utopia que quase alcanço. Só que agora, para escutar a Pedro e ao povo
para aprender a transitar por esses sendeiros de mil direções e polissemia de sentidos. O
caminho de Santiago continua sendo feito. Ainda não está concluído. vejo as luzes da
cidade santa e escuto o alvoroço das canções de liberdade. Por enquanto, o que descobri é que
é na caminhada que se liberta e se faz libertação. Estou caminhando... E assim, já tocado pelas
coisas e por intermédio deste templo chamado corpo, como desejo que surja nos sujeitos a luz
da sua palavra significadora. Aquela que nos liga à dimensão cósmica e nos faz entender
nossa missão para podermos dizer, parafraseando o aluno que na escola-mundo cumpriu
sua tarefa: sim, “cantarei com o espírito, mas cantarei também com o entendimento” (1ª Cor.
14, 15b).
113
REFERÊNCIAS
ABREU, Dejacy de Arruda. Educação na Festa: Tecituras da Cultura Popular na Festa de
São Benedito. 2007. 317 p. Dissertação (Mestrado em Educação)- Programa de Pós-
Graduação em Educação da Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá-MT, 2007.
ALVES-MAZZOTTI, Alda Judith; GEWANDSZNAJDER, Fernando. O Método nas
Ciências Naturais e Sociais. 2. ed., São Paulo: Pioneira. 2000. 203 p.
AMARAL, Edna Fernández; PASSOS, Luiz Augusto. Utopia da Educação Popular:
Saudade ou Esperança1?. In: Semiedu/2007. Publicado pelo Instituo de Educação –
IE/UFMT. CD – ISSN – 1518-4846.
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REVISTAS
IMAGINÁRIO. Revista do Laboratório de Estudos do Imaginário (LABI). Instituto de
Psicologia da Universidade de São Paulo. Palavra. 4. Discurso Editorial. SP. 1998,
153 p.
GRAVAÇÕES
GRAVAÇÃO Nº 1 e 2 –Entrevista com o Padre Moura em 09.02.2007.
GRAVAÇÃO Nº 3 – Entrevista com o Padre Pedro Cometti em 17.09.2007
GRAVAÇÃO 4 Entrevista com o Doutor Felinto da Costa Ribeiro, em
13.10.2007
GRAVAÇÃO Nº 5 – Entrevista com o Sr.Inácio Werner em...
GRAVAÇÃO Nº 6 – Entrevista com o Sr. Carlos Cezar de Lima, em...
GRAVAÇÃO Nº 7 – Entrevista com o Sr. Padre Inácio Wenzel em 24.04.2008.
GRUPOS DE ESTUDOS
GPMSE Grupo de Pesquisa em Movimentos Sociais e Educação Anotações em
caderno de aula. 2006.
118
Apêndice I
CLARIFICAÇÃO SOBRE OS TERMOS COMUMENTE USADOS
Consciência: O Fenômeno. Não cria. Elabora. É atividade. Tem uma região.
Diálogo> Aqui é o encontro com os outros, a coincidência de intenções, na qual, juntos,
recriamos criticamente novas situações para o enfrentamento de obstáculos, em que se
redescobre o mundo, se constitui, e se elabora uma intenção significante. É quando o homem
se descobre “sujeito” de todo o processo histórico e cultural e, forçosamente, nessa
descoberta, “se faz e se refaz” e não se deixa mais “aprisionar” pelas ideologias alienantes. E
nessa dialética, o homem transcende-se a si e à sociedade em que vive. Agora, ele aprende a
ver e a observar.
Essências> O sentido verdadeiro em um fenômeno.
Físico> A Coisa.
Idealidades> Dar significações lógicas ou ideais.
Imanência> Que é próprio da coisa. Capacidade de outorgar sentido às coisas exteriores.
Intencionalidade> É o abrir horizontes sempre maiores do que os que nos circundam,
sobrepassando as coisas, enfrentado-as como objetos e tornando-as objetimavel (FIORI, In;
FREIRE. P.14). Um dirigir-se para visar alguma coisa, buscar a essência.
Noemas: O sentido das coisas. Essências.
Noesis: Atividade da Consciência. Empírico e ou Transcendental.
Objeto> Infinitas combinações de sentidos. Quando transfigurados pela crítica, retornam com
outras significações ideais. Portanto, o objeto não é objeto. É, ao mesmo tempo, problema,
obstáculo, interrogação. É ver como o “objetosaiu de “meu universo” e como é que ele
volta. A própria hermenêutica da palavra lhe novas significações. O mesmo acontece com
as ações. Ex: Ontem o Vassalo, hoje o assalariado.
Palavras geradoras> Através da combinação de elementos básicos, propiciar a formação de
outras.
Redução> Recuar indefinidamente até seu “instante” inicial. Célula Primordial. É o afastar-se
para admirar e daí decodificar a abrir novas possibilidades.
119
Apêndice II
A FENOMENOLOGIA APLICADA NESTE TRABALHO,
O QUE É E QUANDO SURGIU?
Resumo sintético e interpretativo de: Merleau-Ponty, Maurice. Fenomenologia da
Percepção. Martins Fontes, SP. 2006. 662 p., Husserl. Coleção Os Pensadores. Tradução
Zeljko Loparic e Andréa Altino de Campos Loparic. Abril Cultural. 1985 p. VII a XIV, e
DO CARMO, Um Mergulho no Sensível. 2000.
Em fins do século XIX, a psicologia tendia a converter-se na chave de explicação da “Teoria
do Conhecimento” e da “Lógica”, retirando essas disciplinas do campo da Filosofia. Foi então
que Husserl formulou o método fenomenológico e definiu a fenomenologia dizendo tratar-se
de uma Filosofia Transcendental, dando assim origem a um movimento em torno do qual
gravitaria considerável parcela da Filosofia do Século XX.
Para REZENDE, 1990, P.14, a fenomenologia é um Estilo que evoluiu para um Método e um
Tema. Com essa definição, ele ensina que a fenomenologia procura dar sentido às coisas. Ela
apreende acontecimentos naturais e psíquicos. Para isso, ela estuda o fluxo das vivências que
constituem a consciência. Ela é como que a descrição da estrutura da consciência. Portanto, é
a consciência que vai constituir as significações dos acontecimentos naturais e psíquicos, via
atos intencionais e percepções - perceber o percebido, vivificando-o em seu sentido total,
expressando-se e doando sentido pleno ao percebido. Sendo assim, a Fenomenologia procura
alcançar a verdade e a universalidade por intermédio das significações das percepções e
utiliza-se da precisão das Leis Lógicas. Separa o físico, a coisa, do Psíquico, o fenômeno, e,
através da consciência, procura, via atos intencionais, atingir as essências dando-lhes sentidos.
em Merleau-Ponty (2006. P.1-2), embora ele diga que é na História da Filosofia que
encontraremos sua explicação e apesar de dizer que a Fenomenologia é uma ciência que ainda
não consegue definir-se completamente e que ela existe como um movimento, para ele, a
Fenomenologia é o estudo das essências. Portanto, segundo esse autor, todo o problema
resume-se em definir essências: A essência da consciência, a essência da percepção etc. Tudo
o que eu sei do mundo, mesmo pela ciência, eu o sei a partir de uma visão minha ou de uma
experiência do mundo somente minha e, sem a qual, os símbolos da ciência não poderiam me
dizer nada. Então, eu descrevo a minha experiência de mundo, tal como eu a vivi, e isso sem
ter levado em conta as explicações causais que o cientista, o historiador ou o sociólogo dela
possam oferecer. Portanto, a fonte absoluta de minhas experiências sou eu mesmo. Eu é que
caminho em direção aos meus ambientes, sustento-os e os faço serem meus horizontes e
minhas significações. Tudo o que sei de mundo, mesmo por ciência, eu o sei a partir de minha
visão ou de minha experiência de mundo, sem o qual os símbolos das ciências não poderiam
dizer nada. (Idem. P.3). É aqui que descubro o que Descartes e Kant ensinam quando dizem
que: “para que eu possa apreender alguma coisa como existente, primeiramente eu tenho que
experimentar-me como existente”. É o Cogito. (Ibidem. P.4). É então que tomo conhecimento
de minha consciência ou absoluta certeza de mim e que me liga ao espetáculo do mundo, é
aqui que procuro dar sentido às coisas, ou, melhor dizendo, à fenomenologia transcendental.
120
CRÍTICA AO PSICOLOGISMO
Husserl procurou mostrar que é impossível alcançar a necessidade e a universalidade da
verdade sem a idealidade de significações lógicas e das significações em geral. As Leis da
Lógica não podem fundamentar-se na psicologia, ciência empírica e, como tal, sem a precisão
das regras gicas. Husserl argumentou que o psicologismo ao confundir os atos e o
significado dos objetos visados, ou seja, os noesis e noemas, diz que o naturalismo leva tudo
para o que chamamos de objeto natural ou físico. O Psicologismo, portanto, confunde o Físico
e o Psíquico. Husserl disse, também, que o psíquico localiza-se numa região que possui
especificidade e peculiaridade. É o equivalente ao que Merleau-Ponty, página 5, diz quando
reflete sobre a noética (KANT), fazendo o mundo repousar na atividade sintética do sujeito e
também numa reflexão noemática. Com Husserl, procura explicitar sua unidade primordial
em lugar de engendrá-la. Para melhor compreensão sobre o que estamos falando, vamos
procurar entender bem os termos abaixo:
Noesis > Atividade atribuída pelos atos ou atividade da consciência. No nível empírico: São
os atos psicológicos e individuais para conhecer um significado. É a percepção, significação,
especulação, volição, paixão etc. É o meu jeito de visar o objeto ou dar-lhe um significado ou
conteúdo.
No Nível transcendental - é o dar o sentido às coisas, isto é, o ultrapassar a nós mesmos para
tentar chegar a um “universo” ainda sem significação, são os atos do sujeito constituinte que
cria os noemas, as essências ou seu sentido verdadeiro enquanto puras idealidades ou
significações ideais.
Noemas > Aquilo que realmente significa o objeto e ou seus conteúdos, ou aquilo que é
visado pelos atos de consciência. São as essências, ou seu verdadeiro sentido ou reais
significações.
O QUE É O FENÔMENO, A COISA E A CONSCIÊNCIA
Para Husserl, o psíquico é o fenômeno. Não é a coisa. A coisa é o físico - o fato exterior,
empírico, governado por relações causais e mecânicas. Portanto, o fenômeno é a consciência e
a consciência é o fluxo temporal de vivências, cuja peculiaridade é a imanência e a sua
capacidade de outorgar significado às coisas exteriores. É a consciência que busca a unidade
de sentido, isto é, é ela que capta na multiplicidade infinita de esboços aquele sentido uno e
total, ou seja, ela lhe dá aquele caráter, para nós, definitivo e acabado. Acompanhando
Husserl, a consciência é construída. É uma sensação de. Portanto, ela é um produto cultural.
E tem mais, para ele, a consciência é construída e é uma atividade, um fluxo temporal de
vivências, um fluir constante de vivências e um produto cultural. Assim sendo, o mesmo
ocorrerá com a Lógica e com a Verdade, pois elas também são construções culturais, ou seja,
são estados de coisas que adquiriram uma identidade e onde todos concordam com tal
(HUSSERL, 1985, p. X). Para Merleau-Ponty, (2006) a consciência, enquanto fluxo temporal
de vivências e suas significações das coisas, quando o conhecimento é feito por uma ciência
empírica, como a Psicologia, pode ser dita um “Fenômeno Empírico”. Quando ela é estudada
em sua estrutura imanente - que é dela- e específica, revela-se como algo que ultrapassa o
nível empírico, surge como condição primordial de possibilidade de conhecimento, ela é
121
“Consciência Transcendental”, pois, como já dissemos acima, procura dar sentido às coisas. A
consciência é sempre uma intencionalidade, ou seja, é uma “consciência de”, um dirigir-se
para, visa a alguma coisa. Aqui, a consciência não é uma alma. Ela é uma atividade
constituída por atos - percepção, imaginação, volição, paixão etc. Repetimos, ela sempre visa
a algo. Fiori entende-a como um “despertar criticamente, para identificar-se como
personagem que se ignorava e é chamada a assumir seu papel” (FIORI, Ernani Maria. In.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 2006, P.14.15).
A INTENCIONALIDADE, A CIÊNCIA E O MUNDO
A intencionalidade é um dirigir-se para, visar alguma coisa, buscar a “essência” de e a idéia é
um conteúdo ou significado não dependente dos atos empíricos do sujeito que procura
alcançá-la. Já a ciência deve ser entendida como um conjunto de conexões de objetos e idéias
e que visa algo mais, tais como seus conteúdos e ou significações. A Ciência forma uma
unidade. Vejamos:
Ciência > Husserl centraliza-a na noção de Unidade. Na medida em que existe uma unidade
entre o ato de conhecer e seu correlato - aquilo que é conhecido- é que se pode falar em
ciência (P. X). Merleau-Ponty ensina que o universo da ciência é construído sobre o mundo
vivido. Sendo assim, a ciência tem o sentido de ser o mundo percebido ou a explicação desse
mundo. (P.3). Ele desdobra-a em:
CIÊNCIAS EMPÍRICAS – A dos fatos.
CIÊNCIAS PURAS – Das idealidades a priori (Física, Matemática).
CIÊNCIAS EXATAS – Vinculam-se ao caráter preciso de suas mediações e experimentações.
CIÊNCIAS RIGOROSAS Vinculam-se ao caráter necessário de seus princípios básicos.
Possuem princípios fundamentais, porém, seus fundamentos não são fornecidos por elas
próprias e sim por outras ciências, ou seja, as absolutamente rigorosas.
CIÊNCIAS ABSOLUTAMENTE RIGOROSAS São aquelas que se auto-fundamentam e
fornecem a si próprias os fundamentos e os de todas as outras ciências, sejam elas puras ou
empíricas. Ex: A Filosofia - rigorosa.
O mundo é o meio natural e o campo de todos os meus pensamentos e de todas as minhas
percepções explícitas. Não existe Homem interior; o homem está no mundo e é no mundo que
ele se conhece. Portanto, os dogmatismos, tanto do senso comum como os da ciência, não são
mais do que consagrações do sujeito ao mundo. O homem no mundo tem uma consciência.
Aqui, também, consciência não é uma substância alma - e sim uma atividade, tem uma
intencionalidade, um dirigir-se para, um visar alguma coisa. E por ser uma consciência de, e
constituir-se por atos com os quais visamos a algo, eles surgem em conexão com a fala. Esses
atos ou análises reflexivas procuram encontrar a síntese do objeto em estudo. Daí que os atos
podem ser:
A Noéticos: Subdividem-se em dois níveis: O Nível Empírico - atos psicológicos para
conhecer um significado - e Atos Transcendentais ou atos do sujeito, que criam idealidades ou
significações.
B Noemáticos: tudo aquilo que é visado pelos atos. Aqui não devemos confundir atos com
as intenções dos atos.
Atos – Vejamos como Merleau-Ponty estrutura os atos e os seus correlatos.
122
Percepção > percebido } Cada um desses pares constitui uma certa
Imaginação> imaginado } região do SER ou um certo modo de um
Recordação> recordado } ENTE ser usado pela consciência.
Ideação > Ideado. Etc., Etc.
Portanto, a consciência do mundo e a consciência de si crescem juntas e em razão direta: uma
é a luz interior da outra, uma comprometida com a outra.
Idéia > É um conteúdo ou significado não dependente dos atos empíricos do sujeito.
OPERAÇÕES PARA AS PASSAGENS (EPOQUE) OU REDUÇÃO – REGIÃO
FENOMENOLÓGICA
Aqui, estaremos nos referindo às diversas passagens das regiões e suas significações, ou seja,
das regiões eidéticas, partindo da região mundo para a região da consciência - Redução ou
epoque.
1- Operações realizadas pela consciência sem perguntar se as coisas visadas por ela existem
ou não
2 - É o “suspender” se você aceita que as coisas exteriores existem tais como se as vê, ou Tese
do mundo.
3 - Cada indivíduo pode ter uma posição de aceitação - tese - do mundo diferente da sua.
Porém, isso não significa que alguém
se conscientize separadamente dos demais. Seu lugar de encontro necessário é o mundo,
que, se não for originariamente comum, não permitirá mais a comunicação. Portanto, cada
um terá seus próprios caminhos de entrada nesse mundo comum, porém, a convergência das
intenções, que o significam, é a condição de possibilidade das divergências dos que, nele, se
comunicam.” (Merleau-Ponty, 2006, p.15.16).
São os dialogantes ora “admirando” o mundo, ora afastando-se dele e ora com ele
coincidindo. É um pôr-se nele ou opor-se a ele...
4- Portanto, a Tese Natural - acreditar que as coisas exteriores existem tais como se as vê- é
diferente dessa “Tese ingênua” e irrefletida e que precisa ser fundamentada filosoficamente.
A Redução consiste em buscar o significado ideal e não empírico dos elementos empíricos e a
Redução Transcendental visa à essência da própria consciência enquanto constituidora ou
produtora das essências ideais. Ela
“permite à consciência recuar indefinidamente reduzindo horizontes
e, dentro deles, ultrapassar os momentos e as situações, que tentam
retê-la e enclausurá-la. Portanto, liberta pela força de seu impulso
transcendentalizante, pode volver reflexivamente sobre tais situações
e momentos, para julgá-los e julgar-se. Por isso é capaz de crítica.”
(FIORI, 2006, P.14)”.
A Redução não nega e nem limita o mundo. Ela coloca-o entre parênteses para desvelá-lo,
mostrando as intencionalidades, ou seja, dando-lhes o caráter de acabado - Imaginação
123
Transcendental - ou de unidade de sentido dentro da multiplicidade infinita de esboços e seu
conceito de uno e total.
(Husserl. 1985, P. XII).
AS ESSÊNCIAS, O REAL E A PERCEPÇÃO
Vimos que, em MAURICE MERLEAU-PONTY, a Fenomenologia é o estudo das essências
das significações, e todos os problemas, segundo ele, resumem-se em definir essências. Ele
ensina que tudo o que eu sei do mundo, mesmo pela ciência, eu o sei a partir de uma visão
minha ou de uma experiência do mundo, sem a qual os símbolos da ciência não poderiam
dizer nada. Para ele, a ciência não tem e não terá jamais o mesmo sentido de ser que o mundo
percebido, pela simples razão de que ela é uma determinação ou uma aplicação dele. Então,
eu sou a fonte absoluta, e minha experiência eu é que a faço para mim. Portanto, é uma
escolha que faço e que me um sentido. Para melhor entendê-la, tenho que retornar às
coisas. O retornar às coisas é retornar ao mundo anterior ao meu conhecimento. É o
assemelhar-se à Geografia em relação à paisagem, isto é, primeiramente nós apreendemos o
que é uma floresta, um prado, um riacho. Só que esse movimento é distinto do retorno
idealista à consciência. Aqui você descreve. Não analisa e nem explica cientificamente. E
ainda, você tem que entender que você não pode apreender coisa alguma como existente se,
primeiramente, você não se experimentar como existente no ato de apreender. É a partir daí
que você pode fazer as ligações com o fundamento do ligado. Aqui a unidade da consciência é
contemporânea da unidade do mundo. No entanto, nossas relações não são bilaterais, e sim
condições de possibilidades distintas e mostram-nos que o mundo tem uma Síntese Universal
como aquilo sem o que não haverá mundo.
É por isso que nossas experiências e o mundo são
uma reconstrução e você tem que entender que, ao invés de uma análise do mundo, repousada
numa atividade sintética do sujeito – noética – você tem que analisar o objeto, o qual explicita
sua unidade primordial noemática ou seja, sua essência. Para a fenomenologia, o Real
deve ser descrito, não construído ou constituído. O Real é um tecido sólido e não espera
nossos juízos e a percepção não é uma ciência do mundo nem uma tomada de posição
deliberada. Ela é o fundo sobre o qual todos os atos se destacam e é pressuposto por eles. Até
aqui o que sobressai é que, como a Filosofia, que é também uma ciência rigorosa, a
Fenomenologia fornece a si própria os seus fundamentos, à semelhança de todas as outras
ciências, sejam elas puras ou empíricas.
(Merleau-Ponty, 2006. p. 6 ss).
Vejamos agora o posicionamento de Merleau-Ponty sobre algumas correntes que abaixo
selecionamos.
Corrente empirista> Merleau-Ponty concordando com aspectos dessa corrente, aceita e
difunde a tese de que “as sensações formam percepções”, às quais se associam e formam as
idéias abstratas alojadas na mente. P.25.
Corrente intelectualista > Concordando parcialmente, ele afirma, porém, que tudo o que a
consciência conhece, “originou-se da percepção”. Daí que o aprendizado da consciência se
no dia-a-dia, ou seja, no decorrer da nossa existência. Portanto, a consciência e o corpo devem
funcionar em conjunto, um dependendo do outro. P.26.
Ambigüidade > Na relação sujeito-objeto surge o enigma da realidade cuja ambigüidade, ele
exemplifica assim: Quando a mão direita toca a mão esquerda, ocorre um fenômeno difícil de
ser determinado Quem toca e quem é tocado? Qual das mãos é o sujeito e qual é o objeto? No
caso do fenômeno, quem toca? Eu toco o fenômeno ou é ele que me toca?
Os pares - Procura reduzi-los a uma conciliação. Os pares como opostos se excluem e, ao
mesmo tempo, se interpelam, numa circularidade. P.27. Ao endossar a proposta de Husserl de
124
que “vemos as próprias coisas, o mundo é aquilo que vemos” ensina, porém, que: anterior a
todo conhecimento filosófico está o conhecimento direto da realidade vivida, a qual é o
“ponto de partida para todos os outros conhecimentos”. P. 28. Já que o mundo é aquilo que
vemos e que, portanto, precisamos aprender a -lo, os filósofos partem em busca da certeza
para, daí em diante, erguerem seu edifício filosófico. É então que Descartes, partindo da
dúvida, chegou à conclusão certeza - de que pensava. Em Merleau-Ponty, essa certeza
chama-se “Fé Perceptiva”. P.29. Então o “O pensar pensa, a palavra fala, o olhar olha”
significa que a filosofia introduz a inquietação e a dúvida. Ela não cria outro mundo: apenas
explicita-o com uma razão que faz parte do fenômeno sensível, centrando, com isso, a sua
obra na Percepção, procurando superar o dualismo entre Sentir e Entender, mas defendendo a
interação de ambos. Com isso, ele define que todo conhecimento passa primeiro pelas portas
da percepção (MERLEAU-PONTY, Maurice. SP. 2006).
UM MERGULHO NO SENSÍVEL (Do Carmo. 2000)
Com base na participação em um trabalho conjunto apresentado no GPMSE pelos mestrandos
Agenor de Oliveira, Edson B. Rondon Filho e José Dilson de A.Barbosa, em pesquisa feita na
obra “Um Mergulho no Sensível” de Paulo rgio do Carmo. Educ. 2000. SP. (P.35 ss),
pretende-se contribuir com nossa fundamentação teórica, mostrando que, entre as várias
definições, a filosofia de Merleau-Ponty pode, também, ser chamada de “Filosofia do Corpo”,
pois, para ele, é através e a partir do corpo que se estabelece a nossa existência no mundo. E o
Corpo é a “figura visível de nossas intenções”. Quando fala de consciência, parte
primeiramente do mundo das percepções, lançando mão da descrição fenomenológica. A
tradição filosófica sempre desconfiou do sensível, isto é, duvidaram dos sentidos por
identificá-los com “erro e ilusão”. Já Merleau-Ponty reabilita o sensível e, ao invés de
sobrevoá-lo como o faz a filosofia, realiza um “mergulho no sensível” e ensina que a
“sensação” não pode ser estudada por meio de um “juízo intelectual” e nem por uma
“consciência” distanciada que a toma como objeto de estudo. Para ele, “se a reflexão se
conjuga com o corpo, então não é possível que se situe fora dele, e, ao mesmo tempo, o
explicite. Portanto, a sensação, é o nosso primeiro elo com o mundo”. Daí que “tudo o que se
afirma teoricamente a respeito da sensação, tem sido uma construção acerca dela, e não a
descrição dos fenômenos tais como eles ocorrem. Com isso ele quer dizer que tudo aquilo que
a consciência possui sobre a percepção, ela o retira do percebido”. E no estudo do Pré-
reflexivo ao reflexivo, veremos que “na nossa ação cotidiana, os atos inconscientes
predominam sobre os conscientes e toda atividade, reflexiva ou não, tem como fundamento a
percepção do mundo”, sendo a atividade reflexiva de questionamento do mundo algo apenas
momentânea e artificial, pois a todo momento realizamos movimentos, gestos, ancorados
numa ciência perceptiva do mundo e das coisas, sem que a consciência tenha que refletir a
todo momento sobre eles.
Para melhor entender, somos ajudados pelo exemplo da experiência infantil, em que a criança
percebe antes de pensar, isto é, a realidade humana é aceita ingênua e simplesmente. A
presença de um mundo anterior ao pensamento reflexivo, justamente por ser anterior à tomada
de consciência do mundo, permite-nos entender o processo de conscientização. Portanto, o
fundamento “anterior” ao mundo pensado está no pré-reflexivo (anterior à reflexão) e é uma
espécie de “inconsciente”. Daí o emprego de termos como “retornar, reencontrar, recolocar,
restituir” etc. todos ligados semanticamente à idéia de regresso à origem perceptiva (p.38).
125
OS NÍVEIS DE NOSSA EXISTÊNCIA
Merleau-Ponty distingue dois níveis de existência: o pessoal e o pré-pessoal. Vejamos o que é
pré-pessoal. O pré-pessoal é o corpo. É ele que age como doador de sentido e significado.
Propicia o relacionamento que precede a toda escolha consciente. É o inverter Descartes em
“o homem pensa porque existe”. Como constantemente realizamos ações que não são
determinadas por nossa livre escolha, precisamos buscar respostas para esse substrato
corpóreo - essa ação primordial ou geneticamente acumulada - que existe em nós e nos
mantém em comunicação com o mundo. Embora o agir humano não esteja separado do
pensar, o filósofo esclarece que há um “pensamento” latente no próprio corpo e que escapa ao
crivo do pensar consciente como, por exemplo, os reflexos em um Jogo de Tênis onde o
“gesto” resolve um problema que não foi colocado pela inteligência. P.39. Merleau-Ponty
sugere que há duas tomadas de consciência:
- A consciência filosófica ou consciência ativa ou analítica.
- A consciência perceptiva - consciência passiva e fundamento da primeira.
Com a consciência filosófica, quer explicar aquilo que é “sentido” e aquilo que é “entendido”
- visão, audição, olfato-, (analítico), mas clarifica que “não duas espécies de
conhecimento”, mas sim dois diferentes graus de classificação do mesmo fenômeno. P.40. E
como exemplo as cores: Elas não possuem essências que nos permitam tratá-las
separadamente da experiência vivida. A experiência demonstra que não temos sensações
puras. Essas sensações já vêm acompanhadas de nossas interações com o mundo. É isso que
explica, por exemplo, porque o verde é visto como repousante, o vermelho como agressivo, o
amarelo como picante etc. a experiência perceptiva que nos permite dar nomes às cores, é
uma atividade elaborada pelo intelecto e posterior à visão. E cita outros exemplos às páginas
40/41. Portanto, ele nos ensina que “há um mundo anterior à investigação científica e à
própria investigação filosófica (40) e que a “percepção é a forma originária e primeira do
conhecimento”, que o percebido se transporta para a consciência quando, s, em estado de
alerta, damo-nos conta de sua manifestação. Então,
“toda percepção não é um ato de vontade e sim a expressão de uma
dada situação” e o “mundo vivido nunca é inteiramente
compreensível e isso porque a consciência não constitui o mundo e
sim o percebe. Então, como esse mundo em que estamos imersos é
inesgotável para nossa consciência, logo, haverá sempre um saber
secreto e além da nossa percepção” (MERLEAU-PONTY. 4l).
Como cada um dos nossos órgãos interroga o objeto à sua maneira e como “não existem
sensações puras”, ocorre em nós um fenômeno que podemos chamar de “visão dos sons ou da
audição das cores”. É por isso que se fala em voz “doce” ou som “áspero” ou “agudo” etc. O
mundo da publicidade é pródigo em utilizar esses recursos para criar situações de sugestão.
Como o corpo permite conexões entre campos de sensitividade, Merleau-Ponty esclarece que,
então, é possível explicar porque, mesmo surdo, Beethoven continuava com a capacidade de
compor músicas. Clarifica, assim, o porquê, através dos olhos, vê-se a fragilidade do vidro, o
peso de um bloco de ferro, a fluidez da água e a viscosidade do xarope.
126
TOCADO PELAS COISAS
Para a fenomenologia a consciência é sempre consciência de alguma coisa e o objeto é sempre
objeto para uma consciência. É nesse par coisa-consciência, sem cair na imanência da coisa
inerte e nem na transcendência de uma coisa pura que está o desvio do conhecimento sob a
perspectiva da filosofia. P.44. Como todo objeto tem sentido para s em cumplicidade
com a consciência perspectiva, a característica da coisa e do mundo é se apresentarem para
nós em perfis inacabados, parciais, fragmentários. Portanto, embora estejamos “presos ao
mundo e não consigamos nos desligar dele para passar à consciência de mundo, embora
captemos apenas determinadas facetas da coisa, a coisa se apresenta para nós em sua
originalidade”. P.45.
Como a arte realiza a expressão do homem concreto o que a ciência não se propõe
Merleau-Ponty ensina que a arte deve ser utilizada como um dos meios para entender a
realidade. Apesar de o pintor passar para a tela, pela cnica da perspectiva, o objeto do
mundo exterior, ele o faz de uma maneira subjetiva, isto é, colocando o seu olhar no resultado
final da obra. Mas como ‘olhar num objeto é mergulhar nele’, então, sob o olhar filosófico,
compreenderemos que o pintor nos deu aquilo de que teve consciência e é graças a isso que
temos o rico espetáculo do mundo. E aqui, junto com a filosofia, teremos que eliminar o
mistério das coisas ou as ambigüidades de que a arte tanto se alimenta. Merleau-Ponty afirma
que as questões filosóficas são cinematográficas por excelência, pois, para o cinema, como
para a psicologia moderna, a vertigem, o prazer, a dor, o amor, o ódio, traduzem
comportamentos. 49/50. no caso da percepção, CARMO, 2000, citando Donald M. Lowe,
diz que como a comunicação oral pode, por um lapso de memória, mudar o conteúdo do
conhecimento, lê-lo em voz alta faz com que o ouvido assimile a mensagem. Essa cultura do
oral significa o crer. Já na escrita, embora por muito tempo monopólio dos escribas e da elite,
a linguagem escrita conserva o conhecimento. Finalizando, nos levam à conclusão de que o
telefone, o rádio, o toca-disco, o gravador e a TV - nova oralidade - nos bombardeiam com
novas imagens visuais e auditivas e fazem do nosso olho uma nova hierarquia de sentido
(p.52.).
127
Apêndice III
CONDENSAÇÃO DO LIVRO TOMBO DA PARÓQUIA DO ROSÁRIO E SÃO
BENEDITO - Arquidiocese de Cuiabá: 14 de Maio de 1945 a Junho 1989.
Notas:
1 - Em alguns dados mantenho a ortografia e a disposição dos registros.
2 - Os destaques em negrito e ou em itálico foram feitos por este pesquisador e visam a
evidenciar assuntos que estão tratados nesta dissertação.
3 – Por tratar-se de uma condensação, deve ficar subentendido que a transcrição não
contempla a totalidade dos dados do Livro Tombo. Justificamos informando que muitas das
anotações são sobretudo de ordem de calendário litúrgico, de questões de ou de
providências rotineiras, assuntos esses não contemplados por esta pesquisa. Feitas estas
observações vamos às transcrições condensadas, como segue:
LIVRO TOMBO DA PARÓQUIA DO ROSÁRIO E SÃO BENEDITO Arquidiocese
de Cuiabá
Nota: Consta um Livro manuscrito de 50 fls. Na cópia, acrescentou-se texto entre chaves {
}.
A exposição e ortografia foram unificadas.
CRIAÇÃO DA PARÓQUIA DO ROSÁRIO E SÃO BENEDITO EM CUIABÁ
{1945
{“DECRETO
{de 24 de Maio de 1945, que fixa a nova divisão da Arquidiocese de Cuiabá
{em 11 paróquias
{Dom Francisco de Aquino Corrêa
{por mercê de Deus e da Santa Sé Apostólica Arcebispo Metropolitano de Cuiabá,
{AOS QUE O PRESENTE DECRETO VIREM, SAUDAÇÃO
{E BENÇÃO EM CRISTO SENHOR NOSSO
{Considerando a necessidade de fixar melhor os limites das várias Paróquias da
Arquidiocese,
{Considerando a conveniência de fazer coincidir, quanto possível, os limites eclesiásticos
com os civis,
128
{Considerando que algumas Paróquias se podem convenientemente desmembrar em
outras,
{E usando de atribuição que lhe confere o cânon 1427 do Código do Direito Canônico,
DECRETA
{Art. I – Fica dividida a Arquidiocese de Cuiabá em onze Paróquias seguintes: 1. Paróquia
do Senhor Bom Jesus da Sé;2. Paróquia de São Gonçalo de Pedro Segundo; 3. Paróquia
de Nossa Senhora da Boa Morte; 4. Paróquia de Nossa Senhora do Rosário de Cuiabá; 5.
Paróquia de Nossa Senhora da Guia da Várzea Grande; 6.Paróquia de Nossa Senhora da
Guia do Coxipó da Ponte; 7. Paróquia de Nossa Senhora da Guia do Coxipó-Açú; 8.
Paróquia de Nossa Senhora de Brotas do Acorizal; 9. Paróquia de Santa Ana do Engenho;
10. Paróquia de Santo Antônio de Leverger; 11. Paróquia de Nossa Senhora do Rosário
Oeste.
{Art. II Sejam a esse fim desmembradas: da Paróquia do Senhor Bom Jesus da Sé, a
Paróquia de Nossa Senhora do Rosário de Cuiabá; da Paróquia de São Gonçalo de Pedro
Segundo, a Paróquia de Nossa Senhora da Guia da Várzea Grande e a Paróquia de Nossa
Senhora da Guia do Coxipó da Ponte; da Paróquia de Nossa Senhora de Brotas do
Acorizal, a Paróquia de Santa Ana do Engenho.
{ Art. III Ficam ipso facto elevadas à categoria de Matrizes, as Igrejas filiais de Nossa
Senhora do Rosário de Cuiabá, de Nossa Senhora da Guia da Várzea Grande, de Nossa
Senhora da Guia do Coxipó da Ponte e de Santa Ana do Engenho.
{Art. IV Os limites das sobreditas Paróquias, são os que constam dos anexos
documentos, sendo, porém, os limites com a Diocese de Cáceres, porque pendentes de
aprovação da Santa Sé.
{Art. V O presente Decreto entrara em vigor, na data da sua publicação revogadas as
disposições em contrário.
{Dado e passado, sob nosso Sinal e Selo das nossas Armas, nesta cidade de Cuiabá, aos 14
de maio de 1945.
{+FRANCISCO / Arcebispo de Cuiabá.
1948
CRÔNICA DOS FATOS NOTÁVEIS
A Provisão do primeiro Pároco
O Arcebispo Dom Francisco de Aquino Corrêa, atendendo o provincial Padre Artur
Afonso, S.I. provê o Padre Emilio Faure S.I. ao cargo de Vigário Paroquial, cujo mandato e
inicia em 3 de abril de 1948 e termina em 31 de Janeiro de 1949. p. 3. Desde o dia 4 de
abril o novo vigário veio celebrando missa na sua igreja, ora no altar principal de São
Benedito, ora no de Nossa Senhora do Rosário, ora, sobretudo no da capela de São
Benedito, por ter este altar um sacrário mais apropriado para dar a comunhão e guardar o
Santíssimo. Fez, para isso, pôr fechadura a este sacrário, mandou-o dourar por dentro e
pintar novamente por fora. As Irmãs do Asilo fizeram a cortina interna e o véu da pequena
âmbula. A cortina da frente ficou suspensa por uma vareta de metal (em vez de 2
percevejos). O Santíssimo começou a ser conservado permanentemente na capela de São
Benedito desde o dia 2 de maio!
O horário das missas, após alguma tentativa, ficou logo fixado deste modo: nos domingos e
dias santos de guarda missa as 6 e 8 horas; durante a semana às 6 horas, com exceção da
feira, que é as 5 ¹/² (em vez de 5 h), por causa da devoção a São Benedito e por acudir
129
muita gente operária àquela missa...E seguem-se outras informações sobre práticas de
ladainhas, terços e etc.
No ano de 1948 o Padre Vigário iniciou as obras estruturais da Paróquia, tais como
construção de um poço, troca do forro da nave principal da Igreja, revisão completa do
telhado, das janelas, construção de parede para o batistério, caiação das paredes, nova
instalação elétrica, aquisição de globos, refletores, etc. Em resumo, gastou-se: A - na Igreja,
cerca de cerca de 14.300 cruzeiros. B na casa paroquial (com o poço) uns 3 contos de
réis. Nesses gastos a caixa de São Benedito entrou com 14.800 cruzeiros; outros 2.500
foram pagos pelos ministérios do vigário ou por esmolas que lhe foram entregues. P.4.
Até 23 de agosto o Vigário e seu auxiliar vinham almoçar e jantar no Seminário dos
Padres Salesianos. Daquele tempo em diante o Vigário, que já não vinha para o café ao
Seminário, ficou morando na casa paroquial nova, mandando vir comida em marmitas de
combinação com a família do Sr. João Abreu a quem pagava uma pensão de mais ou menos
350 cruzeiros, incluída a lavagem da roupa. P. 4.
1949
Abriu-se a porta da Igreja para o batistério e concluiu-se o mesmo com sua nova pia. Foi
começado o trabalho das calhas do telhado, do lado de Nossa Senhora do Carmo que ficam
prontas em princípios de 1950. A sala de reunião dos Vicentinos passou por uma reforma:
Janela, porta e caiação. Quanto ao trabalho espiritual foi fundado o Apostolado da Oração
para homens e mulheres. P.5.
1950
Tomada de Posse do Pe. Roberto Bannwarth, a 27 de janeiro. Tomada de Posse do Pe.
Paulo José de Souza, a 29 de junho. Tomada de Posse do Pe. Moysés Garcia, a 15 de
julho. Nos registros deste ano, notamos a contínua preocupação central com as reformas
estruturais da Capela de São Benedito, tais com a aquisição de bancos, Mesa de Comunhão,
forro, paredes, janelas, aquisição de bancos, genuflexórios e etc. Aqui o Padre Vigário
registra as ações Pastorais destacando: o funcionamento normal do Apostolado de Oração,
o socorro aos pobres da comunidade pelos vicentinos, catequese aos domingos de manhã
para meninas e à tarde para meninos, primeira realização das cerimônias da Semana Santa,
primeira procissão de Corpus Christi, fundação da Cruzada Eucarística, primeira Eucaristia
e realização de missas muito concorridas pelos devotos de São Benedito.
1951
Foi fundado o centro de São Benedito dos Círculos Operários Católicos pelo Bispo Auxiliar
D. Antônio Aragão Campelo. Pela Lei Municipal de 26.06.1951, a Prefeitura Municipal de
Cuiabá doa o terreno para a construção da capela de Nossa Senhora de Fátima.
1952
Pela Lei de 04.06.1952, a Paróquia recebe a doação da área de terras adjacentes à Igreja do
Rosário e São Benedito.
1953
Dia 2 Junho - Começa a nove de São Benedito. Benção simples.
130
Dia 13 Os padres se mudam para a casa do Sr. Benedito de Melo, ao lado da Igreja e
entregam sua residência para as Irmãzinhas da Imaculada Conceição.
Dia 16 As irmãzinhas chegam pela Panair e foram recebidas em festa.
1954
14 Fevereiro Assume o padre Teodoro Weber S.J. é nomeado Pároco, em substituição ao
Pe. Edgar Schmidt S.J.
14 – Março – Novo Pavilhão com capela provisória e sede da Escola do Circulo Operário
São Benedito.
2 abril - inauguração da Escola do novo centro social da capela de Nossa Senhora de
Fátima.
3 de Maio – Reuniu-se pela primeira vez a congregação dos Moços e estudantes.
6 de maio – Reunião idem, mais a admissão para a Cruzada Eucarística.
15 de outubro – Concentração Mariana com destaque pela imprensa local
Obs. A maioria dos registros deste ano referem-se mais a atividades religiosas.
1955
19-20-21 de Fevereiro Atividades na Capela do Coxipó do Ouro. O Vigário queixa-se
de que nos três dias de festa arrecadou-se mais de 100.000 (cem contos) em esmola e “o
festeiro consome tudo sem deixar um vintém para a Igreja que está caindo. Passam as
noites a dançar Cururu e Siriri”.
27 fevereiro - Desde mais de 20 anos funciona uma das salas da Igreja de Nossa Senhora
do Rosário um ramo da Conferência Vicentina. Desde 1946 estava na frente dela o Sr.
Benedito Pedroso. Acostumado a trabalhar independentemente de qualquer autoridade
entrou em questão com os Vigários que se sucediam na Paróquia desde 1948 Dizia ser
Presidente Vitalício. Eu pessoalmente passei o meu primeiro ano de Vigário sem
praticamente conhecê-lo. Não reconhecia vigário. Desde agosto de 1954 a março de 1955
realizou uma reunião quando os Vicentinos se devem reunir semanalmente. Muitos me
diziam que o homem era macumbeiro. Finalmente no dia 15 de fevereiro, Dom Aquino
Corrêa D.D. Arcebispo de Cuiabá me pediu em nome de pessoa competente que pudesse
substituí-lo. Eu Pe. Teodoro Weber S.J. Vigário da Paróquia apresentei o Sr.Ciro Gomes
Bezerra. E assim recebi e Publiquei o seguinte:
“Arcebispo de Cuiabá.
Exmo. E Revmo. Sr.
Dom Francisco de Aquino Corrêa, DD. Arcebispo de Cuiabá, usando das atribuições que
lhe confere o regulamento Vicentino, resolveu nomear o sr.Ciro Gomes Bezerra, para
exercer o cargo de Presidente da Sociedade de S. Vicente de Paula, com sede na Igreja de
Nossa Senhora do Rosário em substituição do ex-presidente Sr. João Benedito Pedroso.
Cumpra-se e comunique-se.
Palácio do Arcebispo de Cuiabá, em 18 de fevereiro de 1955.
(Ass.) Dom Aquino Corrêa / Arcebispo Metropolitano”.
Fiz ler este decreto no dia 27 de fevereiro de 1955 às 8,30 da manhã na sala de reuniões
da Sociedade Vicentina e dei posse ao Novo Presidente estando presente às pessoas cujos
nomes constam no livro de atas da dita Sociedade. Tudo correu na maior calma a não ser
131
uma pequena manifestação de desagrado como era de esperar, do antigo Presidente.
Manifestou falta de espírito sobrenatural e lamentável falta de conhecimento dos estatutos
da sociedade.
Março a Dezembro Registro de atividades pastorais, visitas de Padres, Bispos e
participação das autoridades locais nos festejos tradicionais da Paróquia.
1956
Janeiro 22- Toma posse da Paróquia o Pe.Emilio Reinehr S.J. Neste ano o Pároco iniciou e
concluiu a construção da Casa Canônica e registra várias iniciativas pastorais.
23 de fevereiro – Falecimento de Dom Aquino Corrêa e registro da comoção geral.
1957
Não consta nada registrado
1958
O Pároco sofreu um desastre de moto em 25-05-58 e parece que foi grave ficando seqüelas.
As demais atividades foram as de rotina. (missas, catequese etc).
1959
16.6.59 Registra a nomeação do Pe. Armando Fritzen S. J por um ano. 27.9.59 O Pe.
Emilio Reinehr S. J. retorna a Paróquia.
1960
Dezembro – Pe.Emílio, devido ao seu estado de saúde vai a São Paulo.
.
1961
Maio A Paróquia participa da iniciativa da Arquidiocese e colhe assinaturas para a não
oficialização do Partido Comunista.
Setembro – Reativa-se a Conferência Vicentina que esteve inativa.
Reativa-se a Congregação Mariana dos Moços.
Fundação da Irmandade do SSD. Sacramento
O Pe. Emilio retorna a São Paulo para tratamento de saúde.
1962
Fevereiro Registra-se novamente que a Capela de Nossa Senhora do Rosário de Coxipó
do Ouro fez a Festa de São Benedito distribuindo os resultados assim: Renda acima de cr$
200.000,00 dos quais o Imperador entregou cr$ 13.000,00 para o presidente dos sócios e a
outra metade reservou para si para compensar os serviços que deu a festa.Para o Seminário
entregou cr$ 12.500,00. O Vigário recebeu a coleta da missa de cr$ 1.595,00 e a jóia da
Imperatriz de 1.000,00.
13 de Maio Procissão com a imagem de Nossa Senhora de Fátima até a capela do Araés.
De um modo geral o ano foi muito rico em atividades pastorais.
132
1963
6-Janeiro – Inauguração do Órgão Eletrônico na Catedral
10 FevereiroInstalação da Província das Irmãzinhas da Imaculada Conceição
3 de junho – Falecimento do Papa João XXIII
17 JunhoPor iniciativa do vereador Covis Pompeu de Barros, se fez uma reunião com a
finalidade de se afastar as casas de meretrício, praticado do Bairro do Baú, área da
Paróquia do Rosário.
Os outros registros referem-se mais a atividades pastorais, tais como batizados, casamentos
e etc. Continua a reclamação sobre a festa em Coxipó do Ouro, a qual não produz frutos
espirituais e nem financeiros.
1964
26 Fevereiro Primeira comissão para a Campanha da Fraternidade semelhante à de
Misereor e Adveniat que os bispos alemães fazem na Quaresma e no Advento.
A Paróquia sofre alteração delimites com a Paróquia São José Operário
Além da participação do Arcebispo no Concilio Vaticano II, os demais registros referem-se
mais a ações pastorais, construções, etc. É interessante notar que não fazem referência ao
Golpe Militar de 31 de março.
1965
7 de março – Entrou em vigor a Nova Liturgia e missas em Língua vernácula
3 de maioRezas e procissão contra a praga do meretrício
Dezembro A casa paroquial passa por pequenas reformas e com vistas a servir de escola
paroquial. Os demais registros são mais de atividades pastorais normais em uma Paróquia.
1966
21 de março Inaugura-se na Radio Bom Jesus a Hora de São Benedito e que propaga
todas as 4ªs Feiras as atividades da Paróquia.
Abril- O programa radiofônico passa a funcionar na Radio Cultura, devido a que na Rádio
Bom Jesus no horário desta hora começaram as escolas radiofônicas.
- Bispos e prelados, superiores maiores religiosos de Cuiabá estiveram reunidos por alguns
dias no Arcebispado.
Junho – No Coxipó do Ouro falece aos 70 anos o Sr. Manoel de Freitas que no final de maio
pediu missa em sua casa, confessando e comungando.
Os demais registros são os rotineiros.
1967
Março o Pe. Emílio conseguiu encher a capela de Nossa Senhora de Fátima de moços e
homens para tratar do surgimento do Apostolado de Oração...
24 abril...Está havendo entre os pobres um Curso de Corte e Costura...
133
Maio Missões Populares pregada pelos padres Redentoristas Continua o espírito das
missões e começa-se a passar “filminhos” de “Catecismo de São João”.
1968
Junho O governador Sr. Pedro Pedrossian mandou que o arquiteto encarregado da obra
da Praça do Rosário, para que tomasse como ponto de partida de unidade do conjunto, o
panorama que se avista do andar do Palácio Paiaguás, onde despacha olhando para a
Igreja do Rosário.
DezembroFizeram-se vários melhoramentos em Capelas e etc. Os demais registros são os
de praxe.
1969
Abril – A festa dos 250 anos de Cuiabá foi celebrada na praça da nossa Matriz.A praça foi
feita pelo Governo do Estado para os 250 anos de Cuiabá. Foi construído um grande tablado
para o altar. A missa foi presidida pelo Cardeal de São Paulo, concelebrada por 8 bispos de
Mato Grosso e 16 padres.
30 – NovembroInício do novo Rito do Batismo. Os demais registros referem-se a missas,
batizados, novenas e etc.
1970
Janeiro Por iniciativa do Pe. Antônio Flumignau, vigário da Paróquia de São Gonçalo,
inicia para Cuiabá o movimento do Cursilho de Cristandade. Com o Grupo, foi para
São Paulo, o Sr. Lucilo Libânio de Sousa, da nossa paróquia.
Março Foi mais um grupo a São Paulo para fazer o Cursilho e desta vez o Vigário da
paróquia participou.
Setembro – Dia sete ( 7 )Às 16 horas tocaram os sinos todas as Igrejas do Brasil a pedido
do Presidente da República e em homenagem à Pátria.
As demais anotações são as de rotina
.
1971
Fevereiro – A partir de agora a preparação ao Batismo ficara a cargo dos Cursilhistas.
Junho Houve cursilho para homens no Seminário dos padres salesianos no Coxipó da
Ponte.
AgostoAproveite-se às missas para catequizar os fiéis...
Dezembro – Curso de formação cristã, nos bairros, liderado pelos Cursilhistas e cursistas.
1972
134
MaioDesde que Cuiabá tem a sua TV o movimento religioso diminuiu consideravelmente
à noite.
Julho Trouxeram a Cuiabá os restos mortais de D. Pedro I num sarcófago de 300, kg. A
nossa igreja matriz foi escolhida para hospedar o ilustre visitante.
1973
Janeiro Registra-se a exigência de que os pais é que façam as inscrições das crianças para
as aulas de catequese. Vieram poucos pais. Somente mães, avós e tias.
Fevereiro se nota a presença de cursilhistas na preparação de palestras para casamentos
e batismos. (Lenir de Arruda e Flozino da Rocha) P.51.
02.03.73 A Secretaria de Obras e Viação, interdita o prédio da Igreja. Transfere-se as
missas paroquiais para a Casa das Irmãzinhas, no fundo da Igreja até os reparos serem
concluídos. as missas de São Benedito, das Feiras, das 5,00, serão realizadas na Igreja
São Judas Tadeu e aos domingos assim: 5,30 na casa das irmãzinhas, 7,30 na capela Nossa
Senhora de Fátima, no Araés, 8,30 na Igreja São Judas Tadeu, no Areão, 128,00 na Igreja
São Judas Tadeu e 19,00 na casa das irmãzinhas.
Maio - Convite ao povo a participar do Programa da Rádio Bom Jesus de Cuiabá, as 8,3o
da noite.
Junho Registro da visita do Cardeal Primaz do Brasil, do Presidente e Secretário da
CNBB.
1974
02.01.74 Pe.Teodoro ficou no lugar do Pe.Emílio que foi de férias.P.54 A partir de agora,
preocupação em formar homens capacitados para assumirem a Festa de São Benedito. P.
54.
1975
Nos primeiros meses começou o trabalho no CARUMBÉ e São João dos Lázaros. Uma
equipe de cursilhistas começou a trabalhar no Jardim Leblon. Pelo fim do ano começou a
entrar muita gente neste bairros. Vieram famílias e mais famílias do interior do Mato
Grosso, como do Nordeste, Minas, São Paulo onde anos fez a mecanização da Lavoura
Pobres, peregrinos sem dinheiro, sem trabalho, sem terra e sem casa perseguidos e expulsos
de suas terras e do seu trabalho. São os frutos do milagre brasileiro dos Generais. Sofreram
injustiças e perseguição. Não tendo aonde ir ocuparam nos cerrados da periferia da cidade
onde nem cercas nem sinal de dono o progresso se percebia. Quando perseguidos fizeram
seus barracos. Apareceram os tubarões reclamando posse de direito. Deu muita questão,
mas, a Prefeitura desapropriou os donos da terra e loteou. Assim surgiu Barro Duro
Jardim Leblon Santo Antonio do Pedregal – Bairro Areão Cabeça de Boi e finalmente
o Canjica. – O Carumbé foi loteado primeiro. P. 54-55.
1976
20.03.76 Chegada do Pe. Erno Luetkmaier. Veio auxiliar na Paróquia que vinha crescendo
volumosamente em população.Construímos com dinheiro do Adveniat o salão da Igreja do
Carumbé com o título de Santa Luzia.
135
{Nota: Cópia do manuscrito em caderno de Leda Thommen, onde registra o {Tombamento
histórico do “Museu de Arte-Sacra” da igreja “Nossa Senhora do Rosário” da cidade de
Cuiabá do Estado de Mato Grosso, no governo de: Dr.José Garcia Neto.
Atendendo a solicitação da nossa 1ª Dama do Estado, na época: -D. Maria Ligia Garcia foi
convocada através da Secretaria de Cultura, por D. Maria Martins, para contribuir com a
elaboração deste trabalho religiosos e muito representativo para a História de nosso Estado.E
segue-se informações e catalogação de todas as peças, registro de avaliações de especialista
vindo de São Paulo. P.55-60
1977 – Construíram um salão no bairro Santo Antonio do Pedregal.
1978
Construíram uma capela no bairro Jardim Leblon, cuja padroeira é Nossa Senhora da
Conceição.Trabalho realizado por Goboborio Creusa e Dona Almira.
Construíram a nova Igreja de Nossa Senhora de Fátima. A de S.Judas Tadeu foi terminada
aos poucos.
Surgiu o grande Bairro do Planalto, a uma légua da Matriz, com mais de mil famílias pobres.
O Planalto foi o lugar escolhido pela Prefeitura de Cuiabá, para assentar as famílias retiradas
do lugar onde se encontra hoje a Rodoviária atual de Cuiabá.
1979
Janeiro Pe.Darci Pivetta, veio residir na Casa de Trânsito dos Índios, perto da Igreja São
Judas Tadeu e de muita boa vontade assumiu a assistência aos bairros São João dos Lázaros,
Jardim Leblon e São Judas Tadeu aos domingos. Neste ano formou-se 4 grupos de
movimentos jovens.
Um trabalho difícil prolongado foi realizado na capela de Nossa Senhora do Rosário do
Coxipó dom Ouro. Os senhores João Batista Pedroso e André de Freitas e Adolfo Vilela
trabalharam muito para cristianização da Festa que era pura e simplesmente mundaria. E
reconstruíram a capela que estava em péssimo estado. Restauraram também a sala de festas
e construíram uma grande área coberta para refeições. Levantaram um monumento em
homenagem a Primeira Missa em Mato Grosso e dirigem a comunidade de culto cada
domingo.
Surgiu o grande núcleo populacional este ano: a Cohab do CPA-1, com 1000 casas, de
gente abaixo da classe média.
Com a chegada do Padre Pivetta começamos a atender melhor os bairros tendo assistência
religiosa meio regular aos domingos e sábados à noite: S. Antônio, Santa Luzia, Santana do
Canjica, São João dos Lázaros, Nossa Senhora da Conceição do Leblon e em 1978 no
Planalto e em 1979, no C.P.A. Construímos com os Vicentinos uma casa de atendimento
aos pobres no Barbado num terreno doado por Antonio Moreira José na Fazenda Nova.
Continua o atendimento da Igreja Matriz, S, Judas Tadeu, Sª de Fátima, Instituto de
Promoção Humana “João XXIII”, São João dos Lázaros, Pedregal, Jardim Leblon, Cabeça
do Boi, Carumbé, Barbado, Canjica.Por duas vezes no ano visitam os católicos dos sítios da
Paróquia.
Novembro: Chega o Pe.Luiz Augusto Passos.
136
1980
Janeiro
02 – Pik-nik de solidariedade ao Pe. Paulo em Acorizal.
07 – Chegada do Padre João Manoel Mira (Joca) para ajudar na Paróquia.
08 – O Pe. Erno Luetkemayer parte para férias.
09 – Viagem dos padres Mira e Passos ao Rio e São Paulo.
10 O Escolástico Daniel Bertussi, que trabalhou um mês no Pedregal e no Carumbé, partiu
para Brasília.
Fevereiro
Visita de Sérgio, jovem leigo, enviado pelo Pe.João Mira. João Souza Oliveira passou alguns
dias na Paróquia. O Pe. Erno voltou de férias.
Março
O Pe. Pedro Von Werden ajuda na Paróquia, ocupando-se com projetos, plantas e orçamento
para os bairros Barbado, São João dos Lázaros e para a Creche do Carumbé.
Junho.Volta o Pe. Passos.
Agosto
17 – Despedida do Pe.Erno Luetkemeyer, deixando a Paróquia
21 – Chega o Pe. Vendelino Muller, que fica ajudando na Paróquia até 18 de setembro.
Neste mês tem início a atividade com os paraplégicos no Planalto, Pedregal, São
Judas.Participam o Pe. Luiz Augusto Passos, Lucilo Libânio de Souza, Sebastião Carlos
Moreira.
31Ocorreu a 1ª Assembléia Paroquial, no sítio de Lucilo Libânio de Souza (Nonô).
Novembro
02 – Volta o Pe. João Mira à Paróquia, para contato com os bairros.
20 Chegam os noviços jesuítas para o estágio na Paróquia. Waldemar Bettio, Claumir
Tomazi, Inácio Imig e Décio Severo.
Dezembro - Problemas de despejo das famílias no bairro Jardim Guanabara.As famílias
foram jogadas para a beira do córrego Barbado, indo formar o novo bairro Novo
Guanabara, para além do Canjica, formando a comunidade de São Francisco de Assis. O
noviço Inácio Immig, que passava por um estágio de Noviciado, sofreu agressão da polícia
nesse despejo ,sendo ferido. As famílias despejadas formaram o primeiro núcleo da
Comunidade católica de São Francisco de Assis
1981
Janeiro
04 Assembléia Paroquial na comunidade de São Judas Tadeu. Foram eleitos os membros
do primeiro Conselho Paroquial: Presidente, Lucilo Libânio de Souza; Vice-Presidente, João
Pedroso; 1ºSecretário, José Maria Rodrigues; Secretário, José Ferreira. Durante o ano,
pela primeira vez, a Paróquia teve Secretária: Maria Maglori.
Na primeira reunião do Conselho Paroquial (CPP), foi discutido o Plano de Pastoral da
Paróquia, que será elaborado em reuniões com as Diretorias das Comunidades, para ser
137
entregue à Arquidiocese no dia 31 de março. Seguiram-se as reuniões nas comunidades do
Planalto, Bela Vista, Santo Antônio do Pedregal, São João dos Lázaros, Nossa Senhora da
Conceição da Linha de Tiro (Leblon), Nossa Senhora de Santana do Canjica e São Judas
Tadeu.
- O Pe. Emílio foi internado na Santa Casa. Os médicos julgaram necessário trasnferi-lo para
São Paulo.
- Neste mês ocorreu uma representação de Comunidades junto à COHAB e Governador.
- Presidente da COHAB se nega a falar com todos os presidentes de bairros de uma só vez.
Dia 20.01.81, fomos convidados para uma reunião com o Dr. Aroldo (presidente da
Cohab),onde nos encontramos descontentes por parte do Doutor, onde ele não aceitou os
presidentes de bairros todos reunidos em sua sala. Assim não dá. Quis cada um de acordo
com a ordem. Isso pra nós que somos empregados não da.
Dia 22.01.81 – reunimos o líder de bairro e fomos até o gabinete do Governador para tomar
decisão, a onde fomos bem recebidos, ficamos a vontade. Foi importante nosso diálogo.
Ficou esclarecido que ele vai tomar uma decisão.
31 –Março - Chega o Pe.l José Ivo Hoffmann para ajudar na Paróquia
16 Abril Falece o Pe. Emilio Reinehr em São Paulo. O Pe. Paulo Englert, Provincial dos
Jesuítas, trouxe o corpo a Cuiabá. Missa de corpo presente concorrida. Mais concorrida
ainda, a procissão até o Cemitério da Piedade.
Em Abril, foi iniciada a construção do Centro de Pastoral do Rosário, CPR, nos fundos da
Igreja de São João dos Lázaros.
Dia 1º de Maio - Assembléia Paroquial no Coxipó do Ouro, com 110 pessoas. Estudou-se o
Plano Pastoral da Paróquia. Foi apresentado o Movimento de Educação Popular
Integral Fé e Alegria e suas iniciativas em Cuiabá.
10 Dia das Mães, pela primeira vez se celebrou missa no bairro Quarta-Feira, à sombra de
uma árvore. O povo disse que tinham o padroeira do bairro: São Pedro. Procedeu-se as
articulações para a conquista de um terreno para a comunidade.
19 Procissão de desagravo ao atentado ao Papa João Paulo II, da Igreja São Judas Tadeu
até a Sede, seguida de Missa. Nasce o “Rosarinho” órgão informativo do CPR, com
participação das comunidades.O CPR é formado por uma equipe pensante, que mantém
reuniões sistemáticas. Do CPR saiu a Organização de Integração Comunitária (OIC), que
tem ramificações em outros Estados do Brasil. O primeiro Congresso se realizou em Cuiabá
nesse ano, nos dias 18 e 19 de abril, com participação de três Estados, seis cidades. Surgiu
também a Associação de Solidariedade às Comunidades Carentes de Mato Grosso
(ASCCMT), que mantém o jornal o “Espaço”, denunciando os desmandos da sociedade. O
CPR e a Paróquia, como um todo, deu apoio à Cooperativa dos Hortigranjeiros da Gleba
Prata (COOTIBAL), de abril a junho. P. 63.
Pelo fim do mês, deu-se inicio a reuniões de saúde nos bairros mais carentes, para maior
uso de remédios caseiros. Pelo fim de maio, inicio de uma Horta Comunitária com menores
no Bairro Quarta Feira. O terreno é da CNBB. Ali mora uma comunidade da irmãzinhas da
Imaculada Conceição. Irmã Dineva, Padre Ivo e Felinto (Engenheiro Agrônomo)
contataram a LBA.
Dia 30, volta mais uma vez o Pe. João Manoel Mira (Joca), jesuíta, para ajudar na Paróquia.
138
Junho
Dia 6 Festa para angariar fundos para a Creche no bairro Canjica e para conscientizar a
população da iniciativa da Paróquia.
Durante o mês de junho, as primeiras reuniões de reforço à Comissão Pastoral da Terra
(CPT), com vistas ao surgimento do Partido dos Trabalhadores (PT).
De abril a Junho O Pe.José Ivo Hoffmann participou com a AEC da elaboração de aulas
para o Ensino Religioso nas escolas estaduais e municipais.
Julho
Dia - Constituída a Comissão da Novena de Natal. A reunião congregou 34 participantes
das comunidades.
Dia 2 – Início do tríduo de São Benedito
Dia 4 Reunião do CPP para elaborar as normas para os novos festeiros de São Benedito.
Os Festeiros não aceitaram as mudanças propostas pelo CPP. O CPP não aceitou os
festeiros indicados para 1982.
A questão teve inicio nos enredos da Festa. Os Festeiros dividiram a festa em classes. Os
ricos tomaram chá com bolo e realizaram baile e jantarada no Clube Dom Bosco, enquanto
os pobres, no domingo, tiveram que esperar até as três horas da tarde para receberem
bolachas e um pouco de arroz no Ginásio da Lixeira. No fim os festeiros disseram que não
sobrou dinheiro para a Creche do Canjica, pois sumira nos bolinhos dos pobres e as
festanças dos poucos ricos no Clube Dom Bosco. Depois da Festa. Frente à tomada de
posição da Paróquia, os festeiros entregaram as insígnias ao sr. Arcebispo.
A Paróquia reuniu-se com o Sr. Arcebispos e o Sr.Arcebispo entregou as insígnias à
Paróquia.Também ficou estabelecido que os festeiros seriam escolhidos de entre os devotos
de São Benedito, que participam da Missa de São Benedito nas terças-feiras às 5 horas da
manhã. Pg. 64.
Dia 22 - reunião do Conselho Comunitário. Tomaram-se medidas para a realização da
Festa de São Benedito no pátio da Igreja. Mesmo sem a denominação explícita, aqui
começa um como que Santuário de São Benedito.
Agosto
Visita de Dom Pedro Casaldáliga, Bispo de São Félix do Araguaia, do Pe. Atílio Hartmann,
da Liturgia da CNBB, de Geraldo Nascimento, da Coordenação Nacional da FCD.
Neste mês, reunião da e Alegria e FCD, para estabelecer prioridades. Intensificam-se as
obras do Centro de Pastoral do Rosário (CPR) em São João dos Lázaros.
Dia 26 Pe. Passos viajou para a Terceira Provação dos Jesuítas. O Pe. João Manoel Miro
adoeceu no Rio de Janeiro. A Paróquia passou a ser tendida apenas pelos padres Teodoro e
Ivo.
Setembro
Os trabalhos da Horta Comunitária motivaram reuniões pedagógicas, visando à melhoria
da alfabetização de crianças e adolescentes. As reuniões de Saúde continuaram nos bairros
Leblon e Pedregal, para a conquista de Posto de Saúde. A Equipe de Saúde elaborou um
livrinho “Plantas Medicinais – Saúde Caseira”.
Inaugurou-se a igreja do Sagrado Coração de Jesus no bairro Bela Vista, com tríduo e festa e
a Comunidade São Pedro do Bairro Quarta-Feira escolheu sua primeira Diretoria.
Completam-se assim, 17 comunidades na Paróquia. Em 11 delas funciona o Curso de
139
Batismo. P.65. Intensificação da Pastoral Vocacional. Cursos de 2 dias sobre e Política,
com 42 participantes na sede regional da FETAGRI.
Outubro De 9 a 14, os padres Ivo e José Pedro e o estudante jesuíta João Souza Oliveira,
representaram a Paróquia de Nossa Senhora do Rosário e outras paróquias, em Ribeirão
Bonito, no aniversário do Martírio do Pe. João Bosco Burnier.
Novembro
O Pe. Teodoro celebrou a inauguração do CPR.
Dia 22 Assembléia Paroquial em Coxipó do Ouro, iniciando com Via Sacra das
comunidades. Cada uma representa uma estação, com lutas e vitórias. Foi essa a Liturgia da
Palavra, seguida de ofertas. Na Ação de Graças, avaliação e planejamento de cada
comunidade e da Paróquia como um todo. Relatórios da FCD, e Alegria, Comissão da
Novena de Natal, Cursos de Batismo, Grupos de Crisma. Foi organizada a Caixa
Comunitária, com participação de 165 pessoas. P.65.
Dezembro
Estágio do Pe. João Cláudio Rhoden, por 10 dias na Paróquia, como parte dos experimentos
da Terceira Provação dos Jesuítas.
Dia 4 - Chega o Teólogo Aloísio Ruscheinski, para o estágio em e Alegria. Aloísio
auxiliou na melhoria do roteiro da Crisma e no surgimento de grupos católicos em algumas
comunidades. Neste ano o Pe. Passos acrescentou estrofes ao Hino de São Benedito...
segue-se o hino. P. 65-66
1982
Janeiro
Dia 8O CPP reuniu-se com o Senhor Arcebispo onde trataram das atividades de 1981 e
decidiu-se que a Paróquia do Rosário deve assumir a Festa de São Benedito junto com
outras Paróquias locais e do Estado.
Dia 10 - Assembléia Paroquial na Igreja São Judas Tadeu. Na primeira reunião dos novos
membros do Conselho, procurou-se ver como andam as Diretorias das Comunidades.
Procurou-se ver como auxiliar na organização das novas Comunidades Novo Guanabara,
Três Barras e Pico do Amor. A prioridade deste ano na Paróquia será a Liturgia.
Fevereiro
Dia 10 Soubemos por telefone que o Pe. Passos padece de hepatite contagiosa no Colégio
Antonio Vieira, Salvador, Bahia, não podendo voltar logo a Cuiabá. P.67.
MarçoA Paróquia recebeu a ajuda dos padres Agostinho Castejon e Raimundo Kroth, por
10 dias. Inaugurou-se a escola Fé e Alegria no Planalto.
Dia 19, após tratamento de hepatite em Salvador, volta o Pe. Passos.
Dia 24 Reunião do Conselho Paroquial com os Movimentos FCD, MDF, e Alegria,
ASCCMT, OIC, Apostolado da Oração, Legião de Maria e Liga dos Apóstolos da Caridade,
com o fim de unificar a Pastoral da Paróquia, pautando-se pela opção preferencial pelos
pobres, de acordo com a orientação de Puebla. P. 67.
Abril - A Paróquia passa a contar com um agente de Pastoral remunerado na pessoa de
Inácio José Werner, chegado no dia 27 de abril.
Assembléia Diocesana com algumas prioridades: Cebs, Pastoral Escolar e Catequese,
Pastoral Orgânica e Educação Sócio-Política.
Festival de Música e Semana Cultural “Educação e Cultura do Povo”.
140
Agosto
Ocorreram reuniões de organização do Comitê de Defesa dos Direitos Humano.
Setembro
De 19 de setembro a 2 de outubroSeminário de Educação Popular Fé e Alegria na
AEC Nacional, com presença do Pe. Paulo Englert, Presidente Nacional da Fé e Alegria e
de Cecília Cardoso Alves, Assessora Pedagógica.
A Fé e Alegria passa a trabalhar em Cuiabá, e terá sua sede na sala da nave oposta à de
São Benedito, ou seja, a da esquerda de quem entra na Igreja.
Outubro
Dia 5 O Pe. Teodoro teve problema de pressão, sendo recolhido ao hospital e voltando à
Paróquia apenas no dia 15.
Dia 20 – Tomou posse a nova Diretoria do Secretariado de Jovens. Reuniões sistemáticas do
Conselho Paroquial, elaborando o plano para 1983, partindo das prioridades da Diocese:
Cebs, Pastoral Orgânica, Educação Social e Política.
Dia 21 - O Pe. Teodoro viajou para o sul para tratamento de saúde e cursos.
Dezembro
O Pe. Expedito Nascimento veio auxiliar na Paróquia do dia 10 até inícios de 1983.
1983
Fevereiro - Dona Deozidina Maria da Costa para assumir a Secretaria da Paróquia em lugar
de Maria Maglori.
e Alegria organiza a Creche do Canjica. Encontro das Cebs, com 22 participantes no
CPR.
27-Fev, É criada a Paróquia do Divino Espírito Santo, desmembrada da Paróquia do
Rosário.
Março
O Conselho Paroquial e Comunitário procurando organizar as Diretorias das Comunidades.
A FCD inaugurou um programa dominical na Radio Industrial de Várzea Grande; Projeto
Saúde Popular em fase de aprovação, com assessoria do Dr.Renan Esquivel, médico
panamenho.
Abril
Reunião do Comitê de Defesa dos Direitos Humanos para elaborar os Estatutos e escolher
representantes de cada entidade, para constituir a Diretoria.
Inauguração da Creche Pe.Emílio, no Canjica.
Assembléia Paroquial com o tema “Luta Indígena”. Reflexão do Pe.Thomaz Lisboa com a
participação de cinco índios de dois povos diferentes. Apresentação do áudio visual “O
Índio, aquele que deve viver”. Participaram 130 pessoas.
...Aprovação dos Estatutos do Comitê de Defesa dos Direitos Humanos e primeira diretoria.
A organização dos Direitos Humanos trabalhará estritamente com a Paróquia.
Maio
Organização da Semana Santa dos Direitos Humanos, como parte da programação da Festa
de São Benedito.
141
O Arcebispo, D.Bonifácio Piccinini entrega à Paróquia um relicário de metal, contendo a
pele de São Benedito. Viera de Roma com o Sr. Núncio Apostólico. Acompanha o relicário
a certidão... Transcreve-se a certidão... P. 70-71.
Junho
Destaco a Criação de Pastoral dos Jovens.
Dia 19Início da Semana dos Direitos Humanos, com abertura do Dr.Helio Bicudo, na
Praça do Rosário.
Segundo dia: Na Comunidade São Pedro do Bairro Quarta-Feira, com o Sr.Dalmo Dalari.
E assim em cada noite em um bairro.
Encerramento na Praça do Rosário, com a presença de Dom Luciano Mendes de Almeida e
do Pe.Ivo Weber, Provincial dos Jesuítas da Província Meridional.
Realizado festival de Música e Concurso de Poesia de São Benedito com o tema da
Campanha da Fraternidade.
Julho
DIA 31 Assembléia Paroquial em Coxipó do Ouro, com o tema “O que é a Comunidade
Eclesial de Base”.
Agosto
Na reunião do Conselho Comunitário, a Associação de Solidariedade às Comunidades
Carentes de Mato Grosso (ASCCMT) se fez representar. Relato das atividades do Jornal “O
Espaço”. Tema para próxima Assembléia Paroquial “Situação do Negro no Brasil”.
Setembro
Em reunião do Conselho e com a participação de D. Bonifácio Piccinini, verificou-se a
necessidade de Ministros da Eucaristia nas comunidades. Dom Bonifácio colocou que o
critério é que sejam pessoas participantes e escolhidas pela própria comunidade. P.71.
Outubro
Criação da Pastoral Estadual da Juventude do Meio Popular, sendo o primeiro coordenador
Inácio Werner e assessorado pelo Pe. Passos.
Dia 30 Assembléia Paroquial. Aroldo, participante do Movimento de Consciência Negra
Nacional, vindo de Goiânia, apresentou o tema: “A Situação do Negro no Brasil”.
Apresentou-se um audiovisual.
Foi criada a Pastoral Estadual da Juventude do Meio Popular (PJMP), sendo o primeiro
coordenador Inácio Werner, e assessor Pe.Passos.
Novembro – A Paróquia adquiriu uma D-10 cabine dupla e a copiadora Nashua.
Encontro de Cebs no CPR. Informação sobre o Canindé e encaminhamento de ações
práticas.
Dezembro
e Alegria assinou compra de terreno na beira do rio Coxipó para horta das creches e da
Escola de Grau. A FCD realizou contatos para criação de uma escola para Deficientes
no bairro Planalto.
Publicações elaboradas pelo CPR: O Espaço, Rosarinho, Bíblia em Família, Rezar o
Rosário, Livro da Saúde, Livro de Crisma, O Cristão e a Política, Círculos Bíblicos e
Novena de Natal.
142
1984
Janeiro
Reuniões do Grupo de União e Consciência Negra. Estudo do Documento da CNBB
“Diretrizes Gerais da Ação Pastoral”, com vários grupos por áreas da Paróquia.
Preparação para a Assembléia Paroquial. Início das reuniões sistemáticas com os Festeiros
de São Benedito... O Pe.José tem Cate visitou a Paróquia por uma semana.Os devotos de
Nossa Senhora do Rosário repuseram os sinos na torre da igreja.
Fevereiro
Dia 12 – Assembléia Paroquial, na Comunidade de São Francisco Xavier do Planalto, com a
participação de 86 pessoas, com eleições diversas.
Março
Estudos do tema da Campanha da Fraternidade. Reuniões do Centro de Direitos Humanos
Henrique Trindade. Fé e Alegria assumiu a Escola Comunitária do bairro Pedregal, com 57
crianças de 3 a 7 anos.
Dias 16 e 17 Assembléia Arquidiocesana, de 100 pessoas na média. A Paróquia se fez
representar em Diamantino no encontro das Cebs, com 7 pessoas.
Abril
Ida dos Padres Passos e Ivo e mais o Ir. João e Inácio Werner à Diocese de Rondonópolis,
para auxiliar na criação de um Centro de Direitos Humanos naquela cidade.
Dia 7 Luta pela Saúde, celebrado com passeata de algumas comunidades em direção ao
Bairro Novo Guanabara, onde ocorreu Ato Público. Comemoração da Semana do Índio
com encerramento com missa na Praça do Rosário. 14ª Assembléia Paroquial com o tema
“Saúde e Direito de Todos”, no Coxipó do Ouro, com 150 pessoas.
Maio
Reuniões preparatórias para o Encontro Estadual de Cebs. No encontro, no Cetra, 160
pessoas, sendo o tema: Centro de Evangelização em Mato Grosso”. Reuniões do Centro de
Direitos Humanos Henrique Trindade, preparatórias da Primeira Jornada “Em Favor da
Vida”, a ser realizada em junho. Encontro de Catequistas no CPR.
Junho
Peregrinação da imagem de São Benedito pelas comunidades. Procissão do Corpo de Deus.
Concurso de Pintura e Poesia de São Benedito... Iniciam os Encontros de Formação,
especialmente para jovens (Pastoral da Juventude do meio Popular).
Julho - Festa de São Benedito. Avaliação... Conclusões.
15ª Assembléia Paroquial com o tema “Direitos Humanos”, com participação de 160
pessoas e assessoramento do Pastor Hans Trein.
Agosto
Festa de Nª do Carmo. 1ª Missa no Bairro Novo Mato Grosso. Retiro do Clero; 1º
Encontro Estadual de Grupos de União e Consciência Negra. Seminário de Educação
Popular, na UFMT, organizado por Fé e Alegria. Encontro de Catequistas. Assembléia
Anual do Centro de Direitos Humanos Henrique Trindade, com objetivo de expandir
atividades pelos bairros.
Setembro
143
Nascem Comissões de Direitos Humanos nos bairros Leblon e Quarta Feira. Curso para
Ministros de Eucaristia e da Palavra. Reuniões com os Festeiros de São Benedito com vistas
à melhoria do local da festa. Preparação da Festa da Padroeira, com peregrinação da imagem
de Nossa Senhora do Rosário pelas 17 comunidades. Festival de Música Religiosa, na Praça
do Rosário. Plantadas 200 mudas de banana na Chácara Nossa Senhora da Estrada. O Pe. Ivo
e mais três companheiros representam a Paróquia no 3º Encontro Regional de Direitos
Humanos, em Porto Nacional. Lá se marcou o 4º Encontro para Cuiabá.
Outubro
Festa de Nossa Senhora do Rosário, abrilhantada com o show Afro-Brasileiro do Grupo de
Estudos Afros da UFMT e Grupo de União Consciência Negra...
Oração e jejum pela Pátria.
Curso Arquidiocesano de Direito Canônico, dado por Dom José Cardoso Sobrinho.
Assessoria do Reitor da Universidade Católica de Goiânia, Pedro Wilson, em algumas
reuniões do Centro de Direitos Humanos Henrique Trindade, com vistas ao 4ºEncontro.
Novembro
16ª Assembléia Paroquial. Tema “Jovens Hoje e Seus Desafios”. 300 Participantes.
Retiro do Clero. Reunião com as Diretorias das Comunidades para rever as finanças e
estudar propostas para 1985.
Dezembro
Encontro de lideranças, movimentos, associações, representantes dos Conselhos, para
avaliação da Ação Pastoral da Diocese. Ocorreram duas reuniões de e Alegria com a
Comunidade São Pedro do Bairro Quarta Feira, em vista à construção de mais duas salas
de aula, podendo ser utilizada pela Comunidade nos fins de semana... Em reunião das
pastorais da Diocese, planejamento do Ano Internacional da Juventude. Lucilo Libânio de
Souza, Antonia da Silva e Pe.Ivo representaram a Paróquia no Encontro de Pastoral
Popular de Curitiba. Jantar beneficente da Fé e Alegria, na Praça do Rosário.
1985
Janeiro
Reuniões dos Festeiros com o Conselho Paroquial com vistas a construção da cozinha de
São Benedito no pomar.
17ª Assembléia Paroquial na Comunidade São João dos Lázaros, com 98 participantes.
Moção de “Apoio” ao 1º Encontro Nacional dos Sem Terra em Curitiba.
Paróquia. Enviou-se carta ao Presidente Tancredo Neves em apoio à Assembléia Nacional
Constituinte, com sugestões populares desta Paróquia.
Pela primeira vez formou-se a Comissão para organizar as Assembléias Paroquiais...
Fevereiro Reuniões sistemáticas do Centro de Direitos Humanos Henrique Trindade. Início
da construção da Cozinha de São Bendito. As demais anotações se referem a reuniões de
estudos, encontros de catequese, procissões etc.
Março
Inicio da luta para que a comunidade católica do bairro Novo Mato Grosso conseguisse
terreno.
Dia 17 – Jubileu de Prata Sacerdotal de Dom Bonifácio Piccinini.
Comemoração do Ano Internacional da Juventude, com caminhada da Catedral até o Ginásio
da UFMT.
Abril
144
Semana de Luta apela Saúde, com concentração em cinco bairros da Paróquia.
Atividades culturais do Secretariado de Jovens.
18ª Assembléia Paroquial. Tema: ”Os Movimentos Populares e sua relação com a Igreja”.
Fizeram se representar 11 movimentos e 3 entidades..
Semana do Índio com o filme “Meu Karpu”. Encerramento com concelebração na Praça do
Rosário.
No Encontro de Catequistas foi aprofundado o tema “Psicologia das Idades”.
Maio
Frei Carlos Mesters deu palestras na Paróquia, sobre a Bíblia.
Junho
Encontro Estadual de CEBs, aqui no Rosário.
Mês de Procissões, peregrinação da imagem de São Benedito pelas comunidades.
Intensificação de reuniões da Pastoral de Jovens (PJMP). Registro da presença da Cruz dos
500 Anos de Evangelização na América Latina, por concessão de Dom Luciano Mendes de
Almeida, Secretário da CNBB.O CDHHT prepara-se para ser o anfitrião da Assembléia de
Direitos Humanos do Centro Oeste. e Alegria luta por mais duas salas de aula na
Comunidade São Pedro.
Dias 14 e 14 Encontro Estadual de Jovens no Colégio Salesiano. Tema “Juventude Força
Evangelizadora”. Presença de 2600 jovens.
Dia 14 Criação do Regional da Congregação das Irmãs da Divina Providência, com sede
na comunidade do Canjica.
- O Pe.José Ivo Foldmann, a partir de reflexões sobre a Educação Popular e estudos sobre
a Teologia da Libertação, propôs uma reestruturação da Paróquia, procurando-se formas
mais ágeis das comunidades de reação contra a exploração do povo. O Pe. Inácio
Neutzling assessorou a Assembléia Paroquial com o tema “Teologia da Libertação e Vida”.
P. 76.
Agosto
Dia - Às 8,00 horas, recebemos um telefonema avisando que o Pe. Balduino Loebens
tinha sido preso. O dia passou-se na tentativa de localização do padre Balduíno. As
repartições policiais, em Cuiabá, diziam não saberem nada. Por telefonema, acionamos o
CIMI Nacional, Dom Luciano, o Secretário da CNBB, Dom Agostinho, o Bispo de
Diamantino e Dom Henrique, o Bispo de Sinop. No fim da tarde, por acaso os padres
Passos e Inácio Neutzling e o advogado da CPT viram soldados com flechas. Perguntados
os soldados disseram: “Nós viemos com o padre”, e informaram que o padre estava na
Secretaria de Segurança. Os dois padres e o advogado foram imediatamente para lá. De
noite, o Conselho Paroquial se postou em vigília na frente da Secretaria de Segurança.Pelas
21,30 horas. Soltaram o Pe. Balduino. O Pe. Balduino contou como foi preso
arbitrariamente no seu lugar de trabalho na Área indígena rikbákta, como foi mantido
escondido e como foi trazido a Cuiabá, para ser interrogado pelo Secretário de Segurança.
19ª Assembléia Paroquial com o tema “Teologia da Libertação”, com assessoria do Pe.
Inácio Neutzling. A presença do Pe. Balduino deu um tom dramático aos trabalhos, pois
vinha de uma prisão destemperada. Participaram 79 pessoas de 15 comunidades, e dois
representantes do CIMI.
Festa de Nossa Senhora do Carmo.
Missa de 30º dia do martírio do Pe. Ezequiel Ramin, assassinado em território
matogrossense, defensor dos empobrecidos brasileiros.
Estudos e reflexão da Pastoral da Juventude (PJMP).
145
Setembro
A imagem da Padroeira percorreu 17 comunidades da Paróquia de 27 de setembro a 3 de
outubro. O 4º Encontro Regional de Direitos Humanos foi realizado no CETRA.
Dia 22 Celebração do dia Internacional da Juventude. Estudo da Cartilha das CEBs nas
Comunidades. Encontro conjunto da AEC e CNBB, sob a coordenação do Presidente da
AEC, Pe. Passos.
Outubro
Dia 6 - Festa da Padroeira.
Preparativos intensos com estudos da Cartilha das CEBs.
Novembro
Dia 14 – Volta o Pe. José Ivo Hoffmann.
Dia 15 – Festa de Nossa Senhora do Rosário do Coxipó do Ouro.
Dia 20 – Debate e celebração folclórica na Praça do Rosário.
Avaliação do funcionamento da Escola de Fé e Alegria no Bairro Quarta Feira, que funciona
no Salão da Comunidade. Magda Lisboa foi chamada para agente de Pastoral da Paróquia.
Dezembro
Carta de agradecimento ao Prepósito da Província Brasil Meridional dos jesuítas e de boas
vindas ao Pe. José tem Cate.
Dia 10 Sessão na Assembléia Legislativa pela passagem do Dia Internacional de Direitos
Humanos, promovida pelo CDHHT;
Dia 15 – Festa de Fé e Alegria na Praça do Rosário.
As demais anotações referem-se a atividades de praxe da Paróquia. Ex. 1777 batizados e 247
casamentos.
1986
Janeiro
Dia 5 – Missa solene do Pe. João Souza. A renda da quermesse foi para as CEBs.
Dia 9 Missa Solene de posse do Secretariado Paroquial e das Coordenações de grupos das
Comunidades.
Dia 21 – Chegada do Pe. José tem Cate para ajudar na Paróquia.
Elaboração do Regimento Interno da Paróquia com base no novo Direito Canônico.
Dias 25 e 26 Encontro Diocesano de CEBs no Cetra, Tema:CEBs, um jeito novo de ser
Igreja. Participaram 32 pessoas de 9 Paróquias.
Fevereiro
Dias 7 a 9 – Encontro Regional das CEBs em Rondonópolis.
Março
Dias 1 e 2 – Encontro de Catequese na Comunidade Santa Luzia do Carumbé.
Dia 14 – Assembléia eletiva no CDHHT.
Abril
Semana de Luta pela Saúde. Semana do Índio. Forró das CEBS no Salão Comunitário de
São Pedro, para os participantes do VI Intereclesial em Trindade GO.
Preparação para o Dia do Trabalhador e primeiros passos para a Organização da Pastoral
Operária.
146
Dia 21 - Participação no Grupo de Religiosos Inseridos (OGRI), em Acorizal. Ali se propôs
o 12º Encontro Estadual para... (omitiu). Segue-se outras anotações.
Maio
Dia 31 Criação da Quase-Paróquia de Nossa Senhora de Guadalupe, em território
desmembrado da Paróquia do Rosário.
Os demais registros referem-se a atividades normais de uma Paróquia.
Junho
Celebração Ecumênica contra o “Apartheid”, na Praça da República. Demais atividades.
Dia 10 – Reunião para aprovação do Regimento do CDHHT.
Dia 12 O Pe.Balduino Loebens foi novamente preso e espancado junto com os posseiros
em Fontanilhas, Município de Juína. O Pe.Balduino veio a Cuiabá para exames médicos.
Por ação do advogado da CPT, conseguimos uma audiência com a Desembargadora
Shelma Lombardi e Mauro, donde resultou um salvo conduto para o Pe.Balduino. No dia
19, 39 pessoas representando entidades, juntamente com a presença dos espancados, se
procedeu a um repto e a publicação em jornais, exigindo o fim das arbitrariedades dos
donos do poder econômico, que contrataram a polícia, com conivência de detentores de
autoridade. No dia 23, audiência com Governador do Estado, onde lhe foi entregue um
dossiê da violência e um abaixo-assinado de 23 entidades, exigindo o fim da violência.
Dia 20 Celebração de envio de 6 participantes da Paróquia ao VI Intereclesial de CEBs:
Pe. Passos, Inácio, Maria Benvinda, Juraci, João, Berenice.
Julho
Dias 6 e 21 estagiaram na Paróquia os Escolásticos jesuítas Marino Rochenbach e José
Sérgio Reinehr.
A Equipe Pastoral com a P.O. elaborava a Missa do Dia do Trabalhador Rural, quando
soubemos da Caminhada dos Sem Terra de Jaciara MT, com o intuito de acampar em
Cuiabá. Aprovamos a idéia de acamparem na Praça do Rosário. Usariam a Cozinha de São
Benedito e o pomar da casa paroquial. Chegaram 209 no dia 24. Dia 25, participaram da
Missa. Representantes dos Sem Terra do Paraná e do Rio Grande do Sul participaram da
Missa. Após, Ato Público. No dia 28, reunião da Paróquia com a Coordenação dos
Acampados Sem Terra. Trataram-se os problemas de falta constante de água, segurança do
acampamento com perigo de penetras, contatos com autoridades e entidades.
Agosto
O Envolvimento da Paróquia e dos devotos de São Benedito com os Sem Terra caminhou
bem. Os Sem Terra participaram de discussão sobre a Constituinte nas comunidades e
avaliação do VI Intereclesial de CEBs. P. 79
Setembro
Dia 12 - Ato Público na Praça do Rosário dos Sem Terra, substituindo uma passeata pelo
centro da cidade, boicotada pelo INCRA.
Neste mês a Paróquia com os festeiros de São Benedito enviou à Prefeitura um ofício para
transformar a Praça do Rosário em um Calçadão.
Peregrinação da imagem de Nossa Senhora do Rosário pelas 19 comunidades;
As comunidades prosseguem os estudos. Ainda em setembro, debates sobre a Constituinte,
com quatro Partidos, em Barra do Bugres, com participação do Bispo de São Luiz de
Cáceres, Dom Máximo Bienés. O CPR gravou vídeo para a nossa Paróquia.
Dia 31 – Encontro Diocesano de Catequese.
147
Outubro
Dia 2 – Início do Tríduo da Padroeira.
Dia 5 Festa, com procissão e Missa do outro lado da Praça, uma vez que os Sem Terra
estavam acampados no lugar comumente destinado à Festa.
Os Festeiros assinaram um compromisso de dar o melhor de si pela Festa.
Inauguração da Livraria Vozes, com participação da Equipe de Pastoral na UFMT.
Dia 9 a 12 - A Equipe de Pastoral participou do 10º aniversário do Martírio do Pe. João
Bosco Penido Burnier. O CPR fez um vídeo.
Dia 19 - Culto Ecumênico pela Paz, na Praça do Rosário.
Dia 26 – VI Encontro de Catequistas.
Dia 29 – Concelebração.
Dia 30 Partida dos Sem Terra para Novo México, localidade do Município de Colider,
onde foram assentados. “Parece um sonhoexclamou uma mãe. A Magda deixou o trabalho
de Agente Pastoral.
Novembro / dezembro
Dia 9 De Novembro Primeiros contatos com o novo bairro nascido. O povo quer dar o
nome de Novo Paraíso. Pe. José tem Cate participou do Encontro da FCD, em Chapada dos
Guimarães e o Pe. Passos voltou do Encontro Latino-Americano de e Alegria em
Cochabamba, Bolívia. Reunião conjunta e Alegria para programar quermesse beneficente
na Praça do Rosário. O Pe.Ivo visitou familiares, abençoou o casamento de um sobrinho e
participou do VII Encontro Pastoral Popular em Curitiba. A Equipe de CEBs tem como
prioridade o estudo da Novena de Natal desse ano e formar o máximo de grupos nas
comunidades.
Dezembro
Dia 3 – Aprovação do Novo Regimento e Organograma da Paróquia.
Dia 14 – Quermesse de Fé e Alegria.
Dia 23 Confraternização do Clero de Cuiabá. No Natal missa no novo Bairro “Novo
Paraíso”. Na Matriz Missa com cantos afros e teatro, tudo fruto da criatividade da União e
Consciência Negra. As demais anotações são as de atividades normais de uma Paróquia.
1987
Janeiro
Auscultação às aspirações das comunidades e adaptação ao Novo Regimento Interno da
Paróquia. Reuniões sistemáticas da Comissão da Constituinte.
Fevereiro
Reuniões sistemáticas do Conselho Pastoral e Assembléia dos Direitos Humanos
CDHHT.Março - Cursos CEBI; Estudo Bíblico; Cursos de Homeopatia: Festa de São
Benedito: Diretrizes de Ação Pastoral; Documento 38 da CNBB; prioridades da Diocese;
Catequese Renovada; programação da Semana Santa.
Abril
Documento 38 da CNBB. Pequenos trabalhos de reforma da Igreja.
Dia 24 (Obs.anotado no mês de maio no Livro Tombo). Missa pelo irmão jesuíta Vicente
Cañas, assassinado no seu rancho missionário, próximo da aldeia do povo indígena ená-
148
wenê-nawê, na margem do rio Camararé, no dia 6 de abril. Participaram da Missa o Bispo
Dom Ervin, do CIMI e Dom Bonifácio, Arcebispo de Cuiabá, como o Pe. Ivo, Provincial dos
Jesuítas da Província do Brasil Meridional e mais oito sacerdotes.
Maio
Reuniões sistemáticas do Conselho Pastoral.
Celebração da Semana do Índio.
Junho
Estrutura-se melhor a Pastoral de Saúde Popular.
Celebramos a Semana da Unidade com a Igreja Luterana, com cultos na Comunidade de
Santo Antonio do Pedregal, na IECLB, e com encerramento na Praça do Rosário no dia de
Pentecostes.
Julho
Surgiu mais um bairro na Paróquia: o loteamento Três Barras, realizado pela Prefeitura de
Cuiabá, com previsão de cerca de cinco mil pessoas.
Dia 26 – Missa no bairro Três Barras.
Agosto
A FCD começa a preparação para a 7ª Assembléia Nacional.
Decidiu-se auxiliar com o dinheiro da FCD e comprar uma D-10 cabine dupla.
Setembro
Estudo do Livro O Profeta Elias nas comunidades...
Outubro
...Aventou-se a criação de uma Livraria na Paróquia.
As demais anotações referem-se à preparação da Festa da Padroeira, compra de aparelhagem
de som, Assembléia Paroquial e etc.
Neste mês ocorreu o Tombamento Estadual da Igreja de Nossa Senhora do Rosário. Segue-
se a transcrição dos dizeres do Processo de Tombamento 03/87. P.82 a 84.
Novembro
Dias 6 a 8 – Assembléia do Regional Oeste 2.
Decidiu-se contratar mais um agente de Pastoral para a Paróquia. Contatado o DOP para
uma revisão urgente do telhado da Igreja Matriz. Estudou-se a situação da Creche do
Carumbé, conveniada com a FEBEMAT, que desleixou as instalações do prédio.
Dia 18 O Padre Passos comunicou na reunião da Diretoria de e Alegria seu novo
projeto de vida com Edna e parou de exercer o ministério sacerdotal.
A Paróquia adiantou Crz 400.000,00 para e Alegria comprar 23 hectares e assim ampliar
o Projeto Educação-Produção no Aguaçú. Tratou-se da situação do Escritório e da
necessidade de e Alegria ter uma sede própria, deixando assim a nave esquerda da matriz
(de quem entra).
Dias 23 a 26 – Retiro do Clero de Cuiabá, orientado pelo Bispo Dom Ângelo Salvador, de
Coxim.
...Pe. José tem Cate participou do VIII Encontro de Pastoral Popular em Curitiba.
149
Dezembro
Dia 10 Dia Internacional dos Direitos Humanos, com Sessão de Promoção dos Direitos
Humanos.Tema “Os Direitos Humanos e o Menor”, na comunidade de São Pedro do bairro
Quarta Feira.
Dias 11 e 12 VII Assembléia Diocesana de Pastoral. Objetivo> CEBs, Catequese e
Família. A Paróquia assumiu nesse objetivo geral.
Dia 12 A comunidade de Três Barras escolheu São Sebastião para seu Padroeiro. Natal.
Noite de passagem comum, por ser dia de Semana.
1988
Janeiro
Dia 12 Ofício do DOP Departamento de Obras Públicas do Estado de Mato Grosso
propondo-se a realizar os serviços de conserto do telhado, todavia, como não possui as telhas
apropriadas, solicita que se faça uma campanha para ver se os paroquianos possuem-nas para
doação.
Fevereiro
Dia 14 Criação da Paróquia de Nossa Senhora Aparecida, no Coxipó. (Obs. Esta anotação
está no final da pág. 86, portanto, fora de ordem).
Abril
Dia 21 A Secretaria do Patrimônio Histórico E Artístico Nacional, emitiu uma certidão do
tombamento da Igreja matriz da Paróquia Nossa Senhora do Rosário. P.86. Nesse ano, uma
nova ocupação de povo ocorre no lugar denominado Baú Ribeirão. Organiza-se ali uma
comunidade. Ali foi realizada a Adoração da Cruz, na Sexta-Feira Santa e celebrado na
Páscoa a primeira Missa. Durante o mês de Outubro, perto das eleições para Prefeito, o
bairro foi organizado como loteamento popular. O estudante jesuíta, Rogério M. da Silva
auxiliou nesse bairro, como estagiário. Missa de Natal no bairro.
Uma ocupação nova de povo ocorre também no Bairro Sol Nascente. A Paróquia luta para
conseguir terreno para a Comunidade católica. O estudante jesuíta Nelson Knob, em ação de
Magistério dos jesuítas, auxilia na catequese.
No Bairro Jardim Leblon vai surgindo, aos poucos, uma Comunidade. No dia da primeira
Missa sortearam nove nomes para ser padroeiros. A Padroeira sorteada foi Santa Bárbara.
Missa no dia da Padroeira, com festa subseqüente. (4 de dezembro).
No prolongamento do Bairro Novo Paraíso surgiu uma nova ocupação de povo. O nome
escolhido foi Ouro Fino. A Paróquia ali se fez presente especialmente com a Pastoral da
Saúde e ação do Agente de Pastoral Lourenço. Missa no dia 29 de outubro. O estudante
jesuíta, em estágio, auxiliou na Novena de Natal.
Dia 23 – Missa por ocasião do Natal.
Pela primeira vez, a comunidade do Rio dos Peixes, no Km 27 da Estrada da Chapada
celebrou a Festa de Santo Inácio de Loyola, Padroeiro da Comunidade.
A Paróquia reiniciou as reuniões mensais das CEBs. O Regional realizou curso sobre CEBS
para Bispos, Padres, Religiosos, orientado pelo Bispo de Campina Grande-PB-, Dom
Luís Fernandes. Deu-se Cursos de Cebí, a nível regional e paroquial. A Diocese realizou
duas reuniões... Prossegue-se assim, a luta das comunidades, com prioridade para as CEBs.
Decidiu-se que a entrada de movimento só pode ocorrer via Conselho Pastoral.
150
Obs. Aqui as anotações não obedecem a uma ordem cronológica. São tratados assuntos
gerais, tais como reuniões para planejamento da Semana Ecumênica, sessões e cultos
ecumênicos, presença no julgamento dos assassinos do Pe. Ezequiel Ramin, peça teatral,
surgimento de interesse pela Pastoral do Menor, pelos Sem Teto e etc. Mostra o CDHHT
promovendo um encontrão no Bairro Canjica, com palestra de Dom Pedro Casaldáliga na
Praça da República, citam-se reuniões sistemáticas da Comissão Regional dos Leigos,
problemas no Carumbé, sem clarificar qual é o problema a que se referem. Foi solicitado às
comunidades para que, para controle do Conselho Paroquial, cada uma delas elaborasse,
dentro de um roteiro pré-estabelecido, um histórico onde as comunidades façam um pequeno
relato mostrando como começaram e em que estado se encontram. E segue-se a transcrição
da pg.90 a 98, onde as diversas comunidades contam como surgiram e fazem um breve
histórico que enviam para a Sede.
1989
Junho
A Paróquia estabelece o Regimento da Festa de São Benedito. Segue-se o regimento p.99-
100.
Obs.: estão em meu poder e à disposição para consultas e ou pesquisas, as cópias
xerocopiadas das folhas de 01 a 100 do Livro Tombo, acima citado.
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