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FUNDAÇÃO INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA
ESCOLA NACIONAL DE CIÊNCIAS ESTATÍSTICAS
MESTRADO EM ESTUDOS POPULACIONAIS E PESQUISAS SOCIAIS
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: DEMOGRAFIA
DINÂMICA TERRITORIAL NO MUNICÍPIO DE NITERÓI: UM FOCO NA
EMERGÊNCIA DOS CONDOMÍNIOS FECHADOS DA REGIÃO OCEÂNICA.
LUCIANO GAGLIARDI PAEZ
ORIENTADOR: CESAR AJARA
RIO DE JANEIRO
2006
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DINÂMICA TERRITORIAL NO MUNICÍPIO DE NITERÓI: UM
FOCO NA EMERGÊNCIA DOS CONDOMÍNIOS FECHADOS DA
REGIÃO OCEÂNICA.
CAPÍTULO 1. APRESENTAÇÃO
Pensar a cidade através da vida cotidiana de seus moradores não é tarefa das mais
simples. Esta área de grande complexidade que o homem produz para suas necessidades de
sobrevivência no espaço, esteve sempre nos meus pensamentos enquanto um ser curioso.
Na minha formação acadêmica tive a oportunidade de aprofundar certos assuntos que antes
eram difusos ou meramente simplórios. Foi na graduação em Geografia pela Universidade
Federal do Rio de Janeiro, durante os anos de 1999 a 2003, que tive os primeiros contatos
teóricos e conceituais sobre o tema.
Nomes como Maucio de Almeida Abreu, Roberto Lobato Corrêa, Marcelo José
Lopes de Souza, Paulo César da Costa Gomes, Iná Elias de Castro, Lia Ozório e Cláudio
Egler, além de servirem como grandes orientadores nas discussões sobre o espaço
geográfico, através de seus inúmeros livros e artigos científicos, foram excelentes
professores na graduação, onde pude consolidar questões sobre este ambiente tão diverso.
Como esse assunto sempre esteve na pauta das minhas prioridades enquanto
estudante, fui buscar estágio de iniciação científica no Instituto de Pesquisa e Planejamento
Urbano e Regional (IPPUR/UFRJ), onde trabalhei durante os anos de 2000 e 2001. Nesta
instituição tive a honra de ser orientado pelo professor Adauto Lucio Cardoso, que me
ajudou a pensar a cidade de uma forma mais humana e também tecnicista. Participar de
pesquisas como: Sustentabilidade e Justiça Ambiental – Mapeando indicadores sócio-
ambientais na Região Metropolitana do Rio de Janeiro (2000) e Cidade, Moradia e Meio
Ambiente: Uma análise crítica da Agenda 21 e da Agenda HABITAT e de seus
desdobramentos a nível local (2001), foi de fundamental importância para a minha
formação intelectual e profissional.
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Neste início de caminhada profissional no IPPUR, busquei acompanhar com
atenção, as conseqüências de processos urbanos problemáticos, onde o fenômeno da
metropolização, sobretudo na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, gerou carências
infra-estruturais, pobreza, e acima de tudo, desigualdades sócio-espaciais.
Para continuar aprofundando minhas intenções acadêmicas, busquei aprimorar meus
estudos após a graduação, em uma instituição que me pudesse auxiliar em uma pesquisa
que hoje pode ser concretizada. A Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE,
com singularidades no ensino que vão desde a interdisciplinaridade científica, até uma
sólida infra-estrutura física e profissional, auxiliou e muito no meu desempenho enquanto
pesquisador no Mestrado. A conjunção entre ciências estatísticas e sociais, foi
preponderante para aumentar o entendimento sobre questões urbanas.
Cabe ainda ressaltar as minhas vivências em Niterói, cidade onde nasci, obtive
minhas referências educacionais antes da graduação, experiências e olhares críticos sobre a
urbe, e acima de tudo, acompanhei de perto como morador e espectador, as grandes
transformações que se fizeram neste município, não somente na Região Oceânica, mas em
toda reestruturação espacial ao nível municipal.
Uma cidade é uma cidade. Ela é feita à imagem e
semelhança de nosso sangue mais secreto. Uma cidade não é
um diamante transparente. Ela espelha, palmo a palmo, o
mundo dos homens, suas contradições, abusões, virtudes e
desterros. Milímetro por milímetro. A mão do homem em
toda parte. No asfalto. No basalto domado. Na pedreira. Nos
calçadões. Na rua, onde os veículos veiculam o nosso
exaspero e desespero. Uma cidade nos revela. Nos denuncia
naquilo que escondemos (...). Construímos nossa cidade.
Somos construídos por ela (...) (Hélio Pellegrino).
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1.1. Introdução
De acordo com (CORRÊA, 2001), “...a cidade pode ser considerada, como a
expressão concreta de processos sociais na forma de um ambiente físico construído sobre o
espaço geográfico. Expressão de processos sociais, a cidade reflete as características da
sociedade”. Através desse significado teórico dado ao urbano, partimos para elaborar o
tema de interesse que pretendemos desenvolver no Programa de Mestrado em Estudos
Populacionais e Pesquisas Sociais da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE.
Tendo o Capitalismo como sistema econômico hegemônico mundial, as cidades
modernas constituem-se em importantes locais de acúmulo de capital, e onde as condições
para a reprodução da força de trabalho podem mais plenamente ser realizadas. Com isso,
tais processos sociais produzem sobre o espaço urbano, formas, movimentos e conteúdos,
originando a organização espacial do espaço antrópico.
Tendo como foco de estudo o município de Niterói – RJ, percebe-se, não somente
através de pesquisas analisadas pelos Censos Demográficos de 1970, 1980, 1991 e 2000,
além da contagem populacional de 1996, produzidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística, e também pelos embasamentos teóricos que tratam da questão urbana, em
especial a auto-segregação, mas também por uma análise crítica no que concerne o
empírico da situação retratada.
Com isso começamos as questões pertinentes a esse estudo. Uma primeira hipótese
que justifica este trabalho de pesquisa é se está havendo fragmentação espacial no
município de Niterói. E a segunda indagação, que necessariamente se articular e aglutina-se
com a primeira é se a ocupação da Região Oceânica de Niterói, através de um molde
segregacionista, expressa uma fragmentação do espaço urbano desta cidade.
O recorte espaço-temporal privilegia os bairros da Região Oceânica de Niterói. Uma
maior atenção será dada aos bairros de Piratininga, Itaipu e Camboinhas, quanto aos fatores
do capital imobiliário e investimentos feitos nesses locais. Esta dinâmica começa a existir
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com grande impulsão já no final dos anos 1960, como conseqüência de fatores internos e
externos ao local de estudo.
A operacionalização desta pesquisa se dará pelo pilar da segregação sócio-espacial,
como forma de elucidar os movimentos no espaço urbano, sob o prisma territorial. Esta
proposta não se pretende a divagar entre todas as ciências sociais que tratam do tema,
porém é justificada a articulação e interdisciplinaridade científica, para abarcar o complexo
estudo do urbano. Desse modo a metodologia aplicada procurará através de indagações
feitas, unir o empírico com os modelos científicos clássicos do tema central e possíveis
transversais que surgirem, para levar as respostas da questão chave deste trabalho,
consequentemente às conclusões nas quais queremos chegar.
O trabalho se apóia também nos agentes sociais que fazem e refazem o espaço
urbano. Tais agentes modeladores do espaço, desempenharam e continuam desempenhando
transformações profundas no interior deste município via incorporação de novas áreas
intra-regionais de Niterói, a exemplo a Região Oceânica, nomenclatura esta utilizada no
Capítulo VI, artigo 205 do Plano Diretor deste município. Os proprietários fundiários e os
promotores imobiliários foram os principais agentes modeladores do espaço caracterizado
como Região Oceânica, e também nota-se outras mudanças como a densificação do uso do
solo principalmente no núcleo central da cidade; deterioração de certas áreas – como o
centro histórico chamado Ponta D’Areia, onde existe nos tempos atuais a economia
pesqueira e a construção naval - renovação urbana; relocação diferenciada da infra-
estrutura, estas sendo direta ou indiretamente influenciadas por tais atores acima citados,
em conjunto com o governo municipal.
Para explicitar de forma adequada a temática que este trabalho de pesquisa pretende
desenvolver, faremos uma ligação sucinta com a história deste município e de sua região de
análise, para compreendermos os porquês da dinâmica dos fluxos intra-regionais que serão
identificados, sem a princípio nos focalizar em muitos registros históricos.
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Então, com o intuito de alcançar os objetivos pretendidos e responder às questões
enunciadas e seus desdobramentos, este trabalho obedeceu à seguinte estruturação:
Neste primeiro capítulo, buscou-se através da apresentação da trajetória do autor,
com suas vivências teóricas e práticas no assunto, além de mostrar nesta parte introdutória
qual é o objetivo que se pretende alcançar no trabalho, com as hipóteses, questões
pertinentes e a forma que será usada para a elaboração da pesquisa, iniciar uma discussão
geral sobre o tema proposto.
O segundo capítulo tem a fundamentação teórica e conceitual como pano de fundo
para ser amplamente articulada com toda a dissertação. É através dos conceitos expostos
sobre a segregação sócio-espacial que iremos nos remontar ao longo de quase todo o
trabalho. Os agentes modeladores neste capítulo terão papel fundamental na apresentação
do tema, onde serão mostrados como expressão de toda reestruturação territorial nas
cidades.
No terceiro capítulo se fará um breve resgate da dinâmica territorial do município de
Niterói, onde se inscreverá através de momentos históricos, as diversas transformações que
a cidade vem passando ao longo do tempo. Analisaremos o município que o escopo deste
trabalho faz parte, com sua inserção na dinâmica intra-metropolitana, e depois se mostrará a
história da Região Oceânica, com o seu desenvolvimento urbano e criação dos seus bairros
como conseqüência de poderes sócio-político-econômicos.
O quarto capítulo será o começo de se juntar as peças do “quebra-cabeça”, ou seja,
com a base teórica exposta, e a evolução histórica abordada no capítulo anterior, será
permitido analisar como o capital imobiliário, através de suas ações no espaço, definirá
uma nova forma de olhar a cidade de Niterói, sobretudo a Região Oceânica, com o molde
segregacionista dos condomínios fechados como resultado da fragmentação espacial.
No quinto e último capítulo será pretendido responder algumas questões levantadas
durante o processo de construção desta dissertação, com as considerações que percebemos
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importantes elucidar. Durante esta discussão, apareceram indagações que não poderão ser
elucidadas no momento, deixando possibilidades e aberturas para novas pesquisas.
CAPÍTULO 2. PRESSUPOSTOS TEÓRICOS CONCEITUAIS SOBRE
SEGREGAÇÃO SÓCIO-ESPACIAL.
A estrutura social resulta das disputas entre classes e grupos pelo uso e ocupação do
território da metrópole, cujo fundamento é o acesso aos recursos urbanos que se acumulam.
Estes recursos incidem sobre a qualidade de vida das pessoas, quando se trata de bens de
consumo coletivo (equipamentos e serviços urbanos), e sobre as possibilidades de auferir
renda monetária, quando se trata do sistema de infra-estrutura urbana que permite a
mobilidade da população entre os locais de residência e de trabalho. Da dinâmica de
apropriação destes recursos resulta a divisão social do espaço, comumente conhecida como
segregação urbana.
2.1. Os Agentes Sociais
De acordo com Abreu (1997) A Região Metropolitana do Rio de Janeiro tem sido
marcada, ao longo dos anos, por um processo de crescimento que reflete, também
espacialmente, “a coerência e as contradições dos sistemas econômico, institucional e
ideológico prevalecentes no país”.
Neste caso, as transformações dos agentes promotores no espaço urbano são
variáveis no tempo e no espaço, de acordo com ações políticas e econômicas que são
sazonais no processo de construção e reconstrução do espaço.
O espaço urbano que é um produto social, resultado de ações acumuladas através do
tempo (CORRÊA, 1999), se faz a partir de agentes sociais concretos, onde o processo está
em constante modificação espacial, ora através da incorporação de novas áreas ao espaço
urbano – objeto de interesse desta pesquisa -, ora na densificação do uso do solo, na
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deterioração de certas áreas, ou ainda na relocação diferenciada da infra-estrutura em
algumas áreas previamente privilegiadas, dentre outras.
Segundo Santos (1985), para se compreender a totalidade social espacializada,
deve-se perpassar a relação dialética existente entre estrutura, processo, função e forma. As
bases teóricas e metodológicas servem para a discussão dos fenômenos espaciais em sua
totalidade. Portanto, a compreensão da dinâmica social, tendo em vista o entendimento dos
processos de mudança e permanência do uso do solo em determinadas frações do espaço
urbano e regional pode ser feita com base nesses elementos.
O caráter mutável do uso do solo na cidade capitalista decorre fundamentalmente de
dois fatores: necessidades do processo de acumulação capitalista e necessidades de
reprodução das classes sociais. Fatores estes que são aplicados na cidade de Niterói, com
modelagens espaciais segregadoras.
As necessidades do processo de acumulação capitalista e de reprodução simples e
ampliada das classes sociais materializam, no território, formas espaciais de natureza
econômica, jurídico-política e ideológica. Estes processos fazem com que uma paisagem
seja escrita sobre outra como herança de momentos diferentes, e não sendo a ela inerme ou
acabada, mas criada não só por acréscimos, mas também por substituições.
Na cidade de Niterói, como na grande maioria das cidades capitalistas, os agentes
que fazem e refazem esta área, de acordo com Corrêa (1999) são os proprietários dos meios
de produção, sobretudo os grandes industriais, os proprietários fundiários, os promotores
imobiliários, o Estado, e os grupos sociais excluídos. Trataremos então de abordar a ação
de cada agente, em especial aos promotores imobiliários que são o escopo deste capítulo.
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2.1.1. Os Proprietários dos Meios de Produção
Os grandes proprietários industriais e das grandes empresas comerciais, segundo
Corrêa (1999), são grandes consumidores de espaço. Estes agentes buscam locais onde
tenham terrenos amplos e baratos, e com certa infra-estrutura de fixos para otimizar a
produção, como portos, estradas, linhas férreas, boa acessibilidade para a população, e etc.
Para os proprietários dos meios de produção, esta terra tem o valor de troca, e não de uso
como em áreas rurais, portanto a especulação fundiária é um processo conflitante para tais
agentes.
Os proprietários industriais, no caso de Niterói no final do século XIX, eram
grandes consumidores de espaço. A atividade industrial de maior impacto neste período era
a portuária. Como grandes consumidores de espaço, o aumento do preço da terra, resultado
de um aumento da demanda, não foi interessante no processo de ampliação da produção no
município.
O movimento portuário de Niterói foi se esvaziando no período de 1964-67, com a
decadência da economia cafeeira do Norte Fluminense. Aliado a esta decadência, que foi
regional, a própria economia niteroiense sofreu várias dificuldades no seu setor industrial, a
começar pela indústria têxtil, um dos ramos mais tradicionais. Com baixa produtividade do
trabalho comparado com outras cidades do Estado e do país, por possuir máquinas e
equipamentos antiquados, o setor têxtil niteroiense foi perdendo competitividade. A
indústria da construção e reparos navais que, historicamente, é o ramo mais denso e com
maior capacidade de absorção de mão de obra e de geração de recursos, encontra-se
mergulhada em uma crise muito grande por falta de novos investimentos e por dificuldades
gerenciais (HONORATO, 1999).
2.1.2. Os Proprietários Fundiários
Os proprietários de terras irão atuar no sentido de obter grandes possibilidades de
renda sobre a terra. Como estão preocupados com o valor de troca e não de uso da terra, a
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ampliação da área urbana da cidade é fundamental para aumentar a demanda por espaços,
consequentemente o aumento do valor do terreno, pois a terra no meio urbano é mais
valorizada que no rural (CORRÊA, 1999). Com isso, os proprietários fundiários podem
tentar pressionar o Estado, para que faça leis de zoneamento urbano, além de pressionar
também para que construam estruturas viárias. Neste sentido a terra ficará mais valorizada.
De acordo com Corrêa (1999), “A propriedade fundiária da periferia urbana,
sobretudo aquela da grande cidade, constitui-se no alvo de atenção dos proprietários de
terras. Isto se deve ao fato de estar ela diretamente submetida ao processo de transformação
do espaço rural em urbano”.
As propriedades fundiárias da periferia urbana, segundo Corrêa (1999), recebem
grande importância, sobretudo a de grandes cidades. Isto se deve ao fato destas estarem
diretamente submetidas ao processo de transformação do espaço rural em urbano. Porém,
essa alteração de usos do solo, dependerão do confronto entre as rendas a serem obtidas
com a produção agrícola e com a venda de terras para fins urbanos. Como foi salientado,
segundo Honorato (1999), a região oceânica de Niterói tinha propriedades familiares de
subsistência em sua maioria. A agropecuária voltada para o mercado não era empregada na
região. Com isso, esta área foi gradativamente reconstruída com moldes capitalistas
urbanos.
O aumento populacional na cidade que acontece sobretudo após a construção da
ponte Costa e Silva na década de 1970, demandou a busca por terras e habitações. Com o
forte apelo ambiental, a região oceânica seria o local ideal em Niterói para ocorrer a
transformação de área rural em urbana. Isto favoreceria os donos das terras que lucrariam
com esta substituição.
Esta demanda de terras e habitações em Niterói que foi ocasionada pela construção
da ponte, conhecida popularmente como Rio-Niterói, é uma das causas da articulação
política entre os atores do espaço urbano para modificarem a área rural do município em
urbana. Este eixo de circulação foi fundamental para que esta transformação no espaço
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ocorresse. Neste período, Santos (2005) mostra que o fenômeno da metropolização
incorpora novo perfil, onde cidades médias como Niterói, se inscrevem como novos
espaços de crescimento urbano. Segundo Santos:
A partir dos anos 1970, o processo de urbanização alcança
novo patamar, tanto do ponto de vista quantitativo, quando
do pondo de vista qualitativo. Desde a revolução urbana
brasileira, consecutiva à revolução demográfica dos anos
1950, tivemos, primeiro, uma urbanização aglomerada, com
o aumento do número – e da população respectiva – dos
núcleos com mais de 20 mil habitantes e, em seguida, uma
urbanização concentrada, com a multiplicação de cidades de
tamanho intermédio, para alcançarmos, depois o estágio da
metropolização, com o aumento considerável do número de
cidades médias (em torno do meio milhão de habitantes)
(SANTOS, 2005)
Para acontecer o loteamento de áreas rurais, para a transformação em áreas urbanas,
de acordo com Corrêa (1999) assumem-se duas diferentes formas de ocupação, no que
concerne a habitação, que são: urbanização de status e urbanização popular. Como a região
oceânica está localizada em um local com amenidades físicas como as praias, a lagoa, o
belíssimo verde que se traduz na mata atlântica, os proprietários fundiários agem de forma
a pressionar o poder público, visando à instalação da infra-estrutura urbana para a
valorização dos terrenos. Como sabemos que a distribuição espacial dos equipamentos
urbanos acompanha, de um modo geral, a distribuição da população e das atividades
econômicas, está área terá investimentos dos setores público e privado, para a
implementação desses fixos.
2.1.3. Os Promotores Imobiliários
Este é o agente modelador do espaço urbano com características das mais
complexas no que concerne a sua definição. Eles são responsáveis, de acordo com Santos
(1985), pela construção de habitação para o circuito superior da economia, que atende às
faixas de demanda solváveis.
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Entre os promotores imobiliários estão os incorporadores, cuja operação chave é a
participação em toda etapa de construção. Estes são os grandes responsáveis pela
transformação do capital dinheiro em capital mercadoria. Outros agentes que fazem parte
desse grupo são os financiadores, que podem ser formados por bancos, grupos de fundos de
pensão, empresas e também pessoas físicas. Existem também os construtores –
engenheiros, economistas e arquitetos – que são os agentes responsáveis por todas as etapas
do processo produtivo. Estes trabalham o estudo técnico, visando verificar a viabilidade da
obra dentro de parâmetros definidos anteriormente pelo incorporador. Muitas construtoras
entram na área das incorporações para ampliarem seus lucros. E, por fim, temos os
corretores, que são responsáveis pela comercialização ou transformação do capital-
mercadoria em capital-dinheiro, obviamente visando o lucro. Os corretores, os planejadores
de vendas e os profissionais de propaganda são os responsáveis por esta operação.
(CORRÊA, 1999).
Cabe ressaltar que os agentes concretos, compostos de promotores imobiliários,
podem ser formados por uma ou mais combinações de operações exercidas no processo de
acumulação de capital. Podem estar envolvidos, por exemplo, com a incorporação e a
construção, ou então, com a construção e a comercialização, ou ainda, em todas as etapas e
muitas outras combinações, que tornam este grupo extremamente complexo.
A ação dos promotores imobiliários na produção de habitações para a população de
médio e alto status, se faz correlacionada a quatro fatores:
Ao preço da terra e alto status do bairro, outro fator
importante é a acessibilidade, eficiência e segurança dos
meios de transportes (posição), outros fatos são amenidades
naturais ou socialmente produzidas, e por fim, a criação de
imagens do bairro (simbologia) que dispõe de alguns
atrativos o que o tornam de status elevado e que surgem, na
verdade, para suprir a carência de oferta de terrenos para
construção (CORRÊA, 1999).
A atuação dos promotores imobiliários se dá estrategicamente. Por um lado, na
produção de habitação em espaços de interesse do capital imobiliário para a população que
constitui a demanda solvável, sempre com a intenção de ampliar sua margem de lucro. E
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por outro lado, na construção de conjuntos populares em espaços não adequados às
exigências espaciais visíveis, criando, reforçando e ratificando a segregação residencial no
meio urbano.
Mas esta não é a situação usual nas cidades de países periféricos. O capital não tem
interesse em produzir habitações para as camadas populares. Os promotores imobiliários
neste caso, em primeiro lugar, satisfazem a demanda solvável. Também obtém ajuda do
Estado no sentido de tornar solvável a produção de residências para satisfazer a demanda
não-solvável (CORRÊA, 1999).
A atuação espacial dos promotores imobiliários se faz de modo desigual, criando e
reforçando a segregação residencial que caracteriza a cidade capitalista. E, na medida em
que em outros setores do espaço produzem conjuntos habitacionais populares, a segregação
é ratificada.
Antes de falarmos do quarto agente, cabe lembrar que todos os agentes modeladores
do espaço urbano citados até agora estão ligados, direta ou indiretamente, ao capital
imobiliário, utilizando-se assim das mais diversas ‘táticas’ para extrair o máximo de lucro
da terra. É importante explicitar que todas as ações desses agentes, que produzem e
reproduzem o espaço urbano, quase sempre visando à acumulação capitalista, carecem da
‘legitimação social’ possibilitada pelo Estado (SOUZA, 2000).
Uma dessas estratégias desse agente modelador se materializa nos nomes dos
loteamentos que na metade do século XX surgem no Distrito de Itaipu, em Niterói: Cidade
Balneária, Maralegre, Marazul, Maravista, Terranova, tentando atrair o comprador pela
imagem de natureza e proximidade do mar. É o paradigma moderno dos loteamentos de
veraneio, introduzido no século XX. Os valores, necessidades e desejos de uso do espaço
urbano mudam ao longo dos anos com a participação e atuação do capital imobiliário.
Como exemplo no município estudado por nós, houve o interesse primeiro das classes
médias e altas o primeiro interesse pelo bairro de São Francisco e mais tarde por Pendotiba,
Piratininga e Itaipu, sendo estes dois últimos componentes da Região Oceânica.
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Para elucidar estas alterações de gostos e costumes sociais ao longo do tempo,
Santos (1985) relata:
A cultura burguesa avança e se aprimora e é resultante de
uma conivência entre todos os que a sustentam. Utilidade
não é uma qualidade dos objetos (casas, terrenos,
localizações únicas). É um significante de qualidade
objetivas. O que fez os ricos antigamente no Rio preferirem
os bairros mais quentes e agora os leva para os mais
ventilados, o que os fez deixarem os morros e o fundo da
Baía para os pobres, quando em outros lugares do mundo é o
inverso, não tem conexão necessária e obrigatória com
qualidades físicas e com as relações que delas possam sair.
Nenhum lugar, ou edificação, ou objeto, existe nas
sociedades humanas (e urbanas...) exceto através dos
significados que lhes são atribuídos. SANTOS (1985) Apud:
SALANDÍA, 2001.
2.1.4. O Estado
O Estado atua na modelagem do espaço urbano de três formas. Pode ser um agente
modelador direto, quando interfere diretamente no espaço urbano através de suas políticas
de investimento, principalmente nas áreas de habitação, transporte, infra-estrutura e
saneamento. Pode ser agente modelador indireto, quando interfere na Legislação ou nos
controles que ele mesmo exerce, como por exemplo, no controle das externalidades, através
da regulação do zoneamento urbano. E por fim, como agente de redistribuição de renda,
quando pratica ações que visam minorar os efeitos causados pela falta de qualidade de vida
e de justiça social, refletidos em alguns setores da sociedade. Vale lembrar que:
A ação do Estado processa-se em três níveis político-
administrativos e espaciais: federal, estadual e municipal. A
cada nível sua atuação e seu discurso que encobrem os
interesses dominantes mudam. Mas é no nível municipal que
estes interesses se tornam mais evidentes e o discurso menos
eficaz, devido à legislação que garante à municipalidade
muitos poderes sobre o espaço urbano, poderes estes que
advém e estão direcionados aos interesses das elites locais.
(CORRÊA, 1999).
Portanto, o Estado possui diversos instrumentos que podem ser aplicados no espaço
urbano e que são indispensáveis na resolução parcial dos conflitos encontrados nos grandes
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centros. Mas, infelizmente, o Estado capitalista, em diversas instâncias e na maioria dos
casos, visa e trabalha para criar condições que viabilizem o processo de acumulação e
reprodução das classes sociais e suas frações. Então, pode-se dizer que a atuação do Estado
capitalista na modelagem do espaço urbano, muitas vezes, vem no sentido de criar ainda
mais mecanismos que ratificam a segregação residencial, agravando a injustiça social intra-
urbana.
Por fim, cabe lembrar que a cidade capitalista, produto de diversos processos
espaciais, não é uma máquina perfeita controlada pelo Estado, e sim uma interação
complexa composta de diversos agentes modeladores do espaço, que estão rodeados de
interesses, significações e fatores estruturais. Esta configuração faz do Estado apenas um
dos condicionantes em jogo.
2.1.5. Os Grupos Sociais Excluídos
Nas cidades capitalistas, a hierarquia social se faz presente na seletividade das
residências de acordo com a sua renda. Os grupos sociais excluídos são os ocupantes dos
cortiços da zona periférica do centro; residem nas casas auto-construídas; localizam-se nos
loteamentos periféricos (irregulares e clandestinos), ou instalam-se em favelas.
É na produção da favela, em terrenos públicos ou privados invadidos, que este
grupo atua efetivamente na modelagem do espaço urbano. Segundo Corrêa (1999), “a
produção deste espaço é uma forma de resistência, ao mesmo tempo que é uma estratégia
de sobrevivência.” As formas de ocupação desses espaços, muitas vezes geram conflitos,
quando isso não acontece, é porque estes não interessam ao capital imobiliário.
O crescimento progressivo das favelas permite a formação de bairros, que muitas
vezes passam a ser urbanizados e ‘legalizados’ através de pressões exercidas pelas
associações e do ‘aval’ dos outros agentes modeladores do espaço urbano.
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No que diz respeito a região oceânica de Niterói, com o aumento e consolidação da
área urbana, houve o deslocamento de pessoas de baixa renda, para áreas menos
valorizadas desta região. Com a instalação dos condomínios residenciais horizontais,
demandou-se também mão-de-obra no setor de serviços para trabalhar nestes condomínios
exclusivos. O bairro do Jacaré é um exemplo de aglomeração subnormal, que cresceu, fruto
dessas demandas.
2.2. A Segregação Sócio-Espacial
Para se estudar a divisão espacial de distintos grupos sociais internos nas cidades,
temos que nos remontar ao conceito de segregação sócio-espacial, que é um fenômeno
importante no estudo sobre o espaço urbano, pois as regras deste espaço são estruturadas
basicamente por padrões de diferenciação social, que indicam, sobretudo, como os grupos
sociais se inter-relacionam no espaço da cidade. Em outras palavras, a segregação é um
processo fundamental para a compreensão da estrutura espacial intra-urbana, enquanto
elemento de diferenciação social, portanto, de diferenciação de classe, constituindo-se num
problema de suficiente relevância para suscitar uma discussão.
A segregação é um processo que origina a tendência a uma organização espacial em
áreas de “forte homogeneidade social interna e de forte disparidade social entre elas”
(CASTELLS, apud: CORRÊA, 2001). As áreas segregadas tendem a apresentar estruturas
sociais que podem ser marcadas pela uniformidade da população em termos de renda,
status ocupacional, instrução, etnia, fase do ciclo de vida e migração, podendo-se falar em
áreas sociais caracterizadas, por exemplo, por bairros operários com residências uni-
familiares modestas, bairros de classe média com apartamentos ou condomínios horizontais
exclusivos – foco deste estudo – favelas, dentre outros (CORRÊA, 2001).
A fragmentação do tecido espacial é um fenômeno bastante complexo, onde ao
longo da formação do processo urbano na história, sempre existiram grupos com
características específicas, quer seja a pobreza, a etnia ou a religião, que foram induzidos
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ou forçados a viver em certas áreas menos atraentes, anecúmenas, ou sem grandes
amenidades.
Antes do século XIX, Abreu (1997) mostra que a estrutura urbana era mais estável.
O surgimento da grande indústria e o desenvolvimento do transporte (bondes, ferrovias...),
trouxeram mudanças nas cidades e propiciaram uma renovação no espaço urbano. Tal
constatação é sentida não só na cidade do Rio de Janeiro, mas também nas principais
cidades capitalistas do mundo ocidental. Com os novos modelos de segregação sócio-
espaciais, advindos dessas transformações, surgem correntes analíticas que procuram
estudar tais padrões. Dentre elas estão: Escola de Chicago ou de Ecologia Humana e a
Escola Neoclássica.
Para tratarmos do fenômeno da segregação sócio-espacial, dissertaremos
inicialmente sobre a origem deste conceito. Segundo Vasconcelos (2004), a utilização do
termo “segregação” pela academia aparece nos trabalhos pioneiros de R. Park, E. Burgess e
R. Mckenzie, da Escola de Ecologia humana, que analisaram a realidade de Chicago.
Pode-se considerar como marco da corrente, o artigo que Park escreveu em 1916
(In: Vasconcelos, 2004) intitulado “A cidade: sugestão para investigação do
comportamento humano no meio urbano” no qual afirma que:
Os processos de segregação estabelecem distâncias morais
que fazem da cidade um mosaico de pequenos mundos que
se tocam, mas não se interpenetram. (p. 20)
No mesmo artigo, outro modelo citado foi o de Mckenzie em 1924, que ao tratar da
Comunidade Humana diz que o processo de invasão é destacado e a partir dele resultariam
as “áreas naturais” ou formações, assim como as segregações e associações.
Segundo Gottdiener (1997), no modelo de segregação de Burgess, foi desenvolvido
a noção de centralidade, ou seja, visualizou-se o centro da cidade em função da posição dos
processos históricos de aglomeração e de competição em torno do mesmo. Como as cidades
americanas cresceram de tamanho, a competição e a maior divisão do trabalho,
17
determinaram dois processos ecológicos: centralização e descentralização, que foram uma
inversão funcional do ciclo de invasão-sucessão. Burgess desenvolveu o famoso modelo
dos círculos concêntricos, em que a zona I era definida como o distrito comercial central,
onde os preços do solo eram mais elevados e havia maior fluxo de pessoas e de transporte
durante o dia. A zona II, seria uma zona de transição próxima ao centro, que se deteriorou
ao longo dos anos, sendo habitada por ladrões, vagabundos, guetos prostitutas, etc. A zona
III, seria o lugar dos trabalhadores de classe baixa, logo representada por residências bem
simples. A zona IV, seria a de melhores residências, pois estava ocupada pela classe média
americana e a zona V se distinguia por habitações uni-familiares de qualidade pelo bem
viver, já que era ocupada pela elite dominante.
Com isso, Burguess admite esse padrão espacial como ponto de sua análise, não se
preocupando com a gênese do mesmo. Numa lógica ecológica de invasão-sucessão, as
áreas abandonadas pela classe média e alta eram ocupadas por outras populações de menor
renda, sucedendo então a um aumento de pobres no centro da cidade e ao deslocamento dos
extratos superiores da sociedade para a periferia. Esse seria o padrão natural de segregação
sócio-espacial. Nas palavras de Gottdiener: “A diferenciação interna do uso da terra
representava uma gradiente de patologia social do centro para a perifeira” Gottdiener, 1997.
Mostra-se com isso que o padrão espacial da segregação sócio-espacial, que se
verificava naquele momento para as cidades americanas capitalistas industriais, foi
sistematizado e mapeado ecologicamente de forma hipotética nos círculos concêntricos de
Burguess.
O que Burguess e a Escola de Chicago, assim punham, em
primeiro plano, não era uma estrutura social menos ou mais
justa, mas os indivíduos competindo entre si. Expressão mais
clara do individualismo norte-americano, impossível.
(SOUZA, 2003, p. 72)
De acordo com Souza (2003) é importante chamar a atenção para outros modelos
criados dentro da Escola de Ecologia Humana, como o de Hoyt, que toma o de Burguess
como base, mas faz uma leitura mais complexa a partir da inclusão e combinação dos
18
círculos com setores. Neste caso, Hoyt leva em conta a influência das malhas viárias e do
transporte. Já o modelo de Harris e Ulman leva em conta a existência de sub-centros de
comércios e serviços, assim como a presença de áreas industriais e residências localizadas
ao entorno da cidade.
Entretanto a Escola Neoclássica baseia-se em uma teoria subjetiva: a do valor-
utilidade e na lei dos rendimentos decrescentes. Estes conceitos compõem a base teórica
desta corrente, ao contrário da Escola de Ecologia Humana, que se apóia principalmente no
Darwinismo Social para explicação da segregação sócio-espacial. A teoria do valor-
utilidade surge em oposição à teoria do valor trabalho advindo da Escola Clássica, onde os
neoclássicos mostram que:
A utilidade de cada bem e sua capacidade de satisfazer as
necessidades humanas, acreditando que o mecanismo de
concorrência (ou interação da oferta e da demanda),
explicado a partir de um critério psicológico (maximização
do lucro pelos produtores e da utilidade pelos consumidores),
é a força reguladora da atividade econômica, capaz de
estabelecer o equilíbrio entre produção e consumo.
(SANDRONI, 1996, p. 157)
Segundo Pieri (2005), esta teoria parte de um comportamento subjetivo individual e
da qualidade de equilíbrio estático da economia. A espacialidade dessa teoria se manifesta
quando cada lugar possui um valor-utilidade para diferentes usuários (indivíduos e firmas),
segundo os interesses dos mesmos. Desse modo, é estabelecida uma competição pelo uso
da terra em busca de localizações melhores aos indivíduos de maior demanda solvável.
Pode-se dizer que a lei de rendimentos tem como pressupostos básicos a competição
perfeita, a racionalidade econômica e a presença de uma planície isotrópica. Ela pode ser
idealizada da seguinte forma:
Aumentando a quantidade de um fator variável e
permanecendo fixa a quantidade dos demais fatores, a
produção, de início, crescerá a taxas crescentes; a seguir,
após certa quantidade utilizada do fator variável, passará a
crescer a taxas decrescentes; continuando o aumento da
utilização do fator variável, a produção decrescerá. Um
19
exemplo clássico corresponde ao aumento do número de
trabalhadores em certa extensão de terra a ser cultivada.
Numa primeira fase a produção aumenta, mas logo se atinge
um estado de nenhum aumento dela, devido ao excesso de
trabalhadores em relação à extensão de terras (que não
aumentou). (SANDRONI, 1996 p. 231)
A base teórica acima foi objeto de análise para Von Thünen (1783-1850), que no
plano rural, formulou a teoria dos círculos concêntricos e verificou que a localização do
terreno passa a ser base do estudo de valorização da terra, reconhecendo assim, a
importância da renda; em qualquer localização, ser igual ao valor de seu produto, menos os
custos de produção e transporte.
Ao aplicar a mesma idéia no plano urbano, Hurd (1903) verificou que o valor do
solo urbano está relacionado com a distância em relação ao centro, ou seja, quanto mais
longe do centro, menor o preço do solo.
Desde que el valor depende de la renta econômica y la renta
depende de la localizacíon, que por sua vez depende de la
conveniência y esta, de lacercania, se pueden eliminar los
pasos inetremediários y decir que el valor depende de la
cercania (HURD, 1903, apud QUESADA, 1980, p.18-19).
Outro teórico neoclássico de suma importância é Willian Alonso (1964), que
trabalhou a questão do valor das terras urbanas e admitiu ser a acessibilidade um bem
inferior em relação à preferência dos consumidores por comprar um espaço na cidade.
Alonso procura explicar o conhecido paradoxo americano, que faz os pobres preferirem
viver nas terras mais caras próximas ao centro e os ricos se interessarem pela periferia,
onde os preços da terra são mais baixos. Utilizando a teoria do valor-utilidade, sua idéia
baseava-se no fato de que a classe média pagava alto preço de transporte em busca de um
local de menor densidade demográfica, por conseguinte de maior qualidade de vida,
enquanto que a classe menos privilegiada optava pela área central, onde a proximidade ao
trabalho compensava a alta densidade demográfica.
Ainda como modelos neoclássicos importantes citados por Quesada (1980), temos
de explicitar o de Brigham (1972), o qual busca inter-relacionar o valor da terra a fins
20
residenciais. Brigham acredita que a oferta de terra é algo estável e que o valor da mesma
gira em torno da demanda por espaço urbano, além disso a região também está subordinada
por fatores como acessibilidade, topografia e históricos, assim como a proximidade do
centro, que aumentava o valor do solo.
O último modelo neoclássico importante de explicitar ilustra de forma mais clara o
padrão de segregação sócio-espacial proposto pela escola neoclássica. É o de Berry (1974),
o qual observou que os valores da terra são mais altos quanto mais próximas do centro da
cidade e dos eixos rodoviários mais importantes. Quando não tão próximos ao centro,
fatores como interseções das artérias do tráfego e eixo de transportes, eram extremamente
determinantes no valor da terra. Berry era adepto da idéia de que as classes menos
favorecidas localizavam-se nas terras próximas ao centro - mais valorizadas -, enquanto a
elite residia na periferia da cidade, onde, apesar dos custos de transporte serem levemente
compensados pelo custo da terra, buscava maior qualidade de vida.
Portanto constatamos que o modelo neoclássico compôs basicamente o verdadeiro
paradoxo americano: a camada menos favorecida se amontoava nos centros, onde as terras
eram mais valorizadas, e por outro lado, as camadas de maior poder econômico buscavam
terras mais afastadas dos centros, que no caso, eram de menor custo e compensavam o
valor do deslocamento, pela maior qualidade de vida em bairros de menores densidades
demográficas e com mais amenidades.
Assim, é mostrado que a Escola de Ecologia Humana tinha como base o
Darwinismo Social, com isso considerava a segregação sócio-espacial como algo
funcionalista, resultante de processos ecológicos de adaptação social, competição, invasão-
sucessão e de processos de ordem moral, realizados durante o crescimento urbano, sob a
ótica da economia capitalista perfeita.
Nessas circunstâncias, considerava-se também que a segregação sócio-espacial,
tinha como pressuposto um sistema de transporte bem distribuído pela cidade e uma
heterogeneidade étnica e social. Esta era facilmente determinada pela localização da
21
população nas áreas naturais, gerando assim, verdadeiras regiões dentro da cidade,
resultantes do embate entre forças, dos diferentes indivíduos por uma posição no espaço
urbano. Observa-se que a segregação representava um tipo particular de população no seio
de uma comunidade urbana, como resultado da atuação de forças seletivas combinadas, as
quais provocavam segregações de índole social, cultural, econômica, étnica e até mesmo
religiosa.
Ao tratarmos mais especificamente do processo de diferenciação residencial,
devemos compreender que o valor do solo era um fator determinante, pois viabilizava a
distribuição dos usos do espaço urbano entre as diferentes atividades econômicas e a
população. A Escola de Ecologia Humana considerava e via processos ecológicos de
competição, dominância e invasão-sucessão, na definição de valores e uso do solo pelos
indivíduos. Esses processos eram determinantes na distribuição da população e nas
atividades econômicas do espaço urbano. Quando a área central (valor da terra mais
elevado) alastrava-se, gerava um afastamento de algumas atividades e de algumas
populações de maior renda para a região periférica que, por conseguinte, expulsavam
outras, originando uma conformação espacial da cidade em áreas concêntricas. O
surgimento de tais idéias foi materializado a partir do modelo de Burguess, que representa o
padrão espacial de segregação sócio-espacial da Escola de Ecologia Humana.
A Escola Neoclássica baseava-se na teoria-utilidade e na lei dos rendimentos
decrescentes. Nessa corrente, a segregação sócio-espacial é examinada somente como fruto
de preferências por lugares ou por modelos de residências numa escala de preço. Nela o
homem era visto como sujeito econômico, que visava menores custos e maiores vantagens
locacionais. Por fim, cabe demonstrar que a escola Neoclássica compreendia essa questão
como resultados de um trade-off entre as áreas de residências e a acessibilidade ao centro
da cidade; a partir dos pressupostos da teoria do valor utilidade e da lei dos rendimentos
decrescentes, ao contrário da Escola de Ecologia Humana, que tinha a segregação sócio-
espacial como produto de processos ecológicos de invasão.
22
Todavia, é interessante observarmos que ao se comparar o padrão espacial da
segregação sócio-espacial proposto pelas duas correntes, como no caso de Berry e
Burguess, alcançamos os mesmos resultados, os quais foram atingidos por meios teóricos-
metodológicos distintos.
É importante deixar claro que os modelos de segregação apresentados até aqui,
advém, principalmente, da literatura norte americana e expõe o problema a grupos
minoritários. Segundo Souza (2003), no Brasil a realidade é outra. A segregação afeta um
grande contingente da população urbana pobre, que vive em favelas, loteamentos
clandestinos ou irregulares, cortiços afastados do CBD (Central Business District) e das
eventuais amenidades naturais, sendo assim, desprezados pelos moradores mais abastados.
Portanto, a segregação no Brasil não é vista como um problema meramente étnico ou
cultural, onde uma minoria vive em guetos como alternativa, ou, falta de alternativas. De
acordo com Souza:
Nesses locais, não é apenas a carência de infra-estrutura, a
contrastar com os bairros privilegiados de classe média e das
elites, que é evidentemente; a estigmatização das pessoas em
função do local de moradia (periferias, cortiços e,
principalmente, favelas) é muito forte. Sérios problemas de
integração e de convivência entre grupos sociais diferentes e
de auto-estima coletiva costumam estar associados a essa
questão. Por isso, mesmo se tratando de maiorias, e não de
minorias, como nos EUA, faz sentido, sim, falar-se, também
a propósito das cidades de um país como o Brasil, de
segregação residencial, e não meramente de exclusão.
(SOUZA, 2003, p. 69).
Outras contribuições importantes de frisarmos são as de dois teóricos indispensáveis
na compreensão da dinâmica urbana. Manuell Castells e Henry Lefèbvre possuem
passagens importantes advindas do ‘campo marxista de análise’, as quais, contribuem
bastante para a compreensão desse fenômeno até aqui estudado.
Para Castells (1983) os moldes do espaço residencial e da segregação urbana,
sofrem a ação hierarquizada das estruturas da sociedade capitalista, segundo o esquema
triplo: economia, política e ideologia. No plano econômico, a segregação sócio-espacial
23
estaria de acordo com a lógica da distribuição de moradias entre os indivíduos. Cabe
ressaltar que as diferenças de localidades e a capacidade de deslocamento e acesso em
relação a pontos estratégicos da rede urbana, são fatores que também interferem na
segregação. No plano político institucional, o poder local tenderia a contribuir com o
processo de segregação urbana à medida que as políticas públicas estivessem à disposição
dos interesses da fração dominante, geralmente ligadas ao capital imobiliário. Já no plano
ideológico, a relativa autonomia de seus símbolos influenciariam nas leis econômicas de
distribuição da população, entre tipos de moradia e de espaço ocupado. Sendo assim, a
situação social de determinadas comunidades e sua locação espacial poderiam avigorar
tendências à autonomização ideológica em certos grupos de sub-culturas ecologicamente
delimitadas.
Outra afirmação de Castells é que a segregação fortalece as disparidades sociais e
espaciais, o que, em um sentido dinâmico, contribui transformar a diferença em
contradição, influindo também no nível da luta de classes.
Portanto, para Castells, o espaço urbano seria constituído por essa estrutura formada
pelos sistemas econômicos, políticos e ideológicos, dotados de relativa autonomia. Segundo
Gottdiener (1997), esta leitura, de forte inspiração estruturalista, dispõe do fato e do
objetivo de Castells em compreender o espaço urbano como um subsistema, apresentando
assim, práticas semelhantes às da estrutura maior e operando segundo as mesmas leis que
coordenam a formação social capitalista.
Uma contribuição também importante para a compreensão do fenômeno da
segregação sócio-espacial foi dada por Henry Lefèbvre (1972), que considerava a cidade
como sede de um gigantesco e assombroso poder econômico e político. Com forte ligação
às forças produtivas, a cidade também se estabelece como força produtiva e, em sua
evolução histórica, as categorias econômicas se impõem na cidade como categorias
dominantes. Sendo assim, na sociedade moderna o espaço abstrato, ou seja, homogêneo,
fragmentado e hierárquico, chega a dominar o espaço social, ou integrado de comunhão
social.
24
A partir de então, o considerado espaço social perde a sua unidade orgânica nas
cidades das sociedades modernas, e fragmenta-se em ‘guetos’ distintos. Sendo assim,
Lefèbvre (1972) considerava os lugares segregados da cidade moderna não como
justapostos e sim como hierárquicos, representando espacialmente a hierarquia econômica e
social, que é composta por setores dominantes e setores dominados.
Sendo assim, a segregação sócio-espacial, bem como a cidade moderna, é vista por
Lefèbvre, como uma forma historicamente determinada, podendo assim ser interpretada e
suprimida. O surgimento da segregação sócio-espacial pode ser melhor entendido se,
mediante a realidade das formas atuais de ordenação territorial, pudermos compreender a
sua “gênese”, o caminho do seu processo de manifestação.
A gênese do sistema urbano como etapa de uma gênese mais
ampla que é a do valor de troca generalizado do mundo da
mercadoria e do dinheiro, numa palavra, do capital.
(LEFÈBVRE 1972, p.108)
É pertinente ressaltar que ao utilizarmos modelos para tratar fenômenos sociais ou
territoriais, sempre haverá uma simplificação de tal processo, no intuito de tornar tal estudo
mais didático e heurístico, disciplinando o próprio raciocínio espacial do pesquisador e sua
própria análise.
No esforço de tornar mais compreensiva a questão da segregação sócio-espacial no
Brasil foram criados conceitos, os quais inspiraram modelos capazes de distinguir o
fenômeno até aqui tratado.
De acordo com Lago (2000) o padrão de segregação mais conhecido nas cidades,
principalmente as localizadas nas regiões metropolitanas brasileiras, é o centro versus
periferia, onde o primeiro é extremamente equipado, dotado de toda infra-estrutura urbana
advinda do setor publico ou privado e ocupado pelas classes de maior poder aquisitivo. Por
outro lado, a periferia caracteriza-se pela falta de serviços e infra-estrutura urbana,
concentrando as camadas de menor poder aquisitivo, as quais são as maiores vítimas da
questão urbana. Segundo Lojkine (1997), a segregação é um fenômeno “produzido pelos
25
mecanismos de formação do preço do solo, estes por sua vez, determinados pela nova
divisão social e espacial do trabalho”.
Lojkine (1997) não esclarece como a segregação é produzida. Para ele, as camadas
de maior poder aquisitivo concentrarem-se nas terras mais valorizadas, e as de menor poder
aquisitivo, nas terras de baixo valor. Porém, é sabido pela vasta bibliografia no assunto que
esta generalização não pode acontecer. Cidades como Niterói, Rio de Janeiro, dentre várias
outras, possuem áreas onde as classes sociais podem se mesclar. Tomemos o caso de
favelas localizadas na zona sul do Rio de Janeiro e dos cortiços localizados em bairros da
zona sudoeste paulistana, onde o preço do solo caracteriza-se por ser bem mais elevado. Por
outro lado, como se explica a concentração de mansões e condomínios fechados em bairros
como Recreio do Bandeirantes no Rio de Janeiro e Alphaville em São Paulo, onde o valor
do solo é bem menos elevado em razão, principalmente, da distância em relação à área
central da metrópole.
O conceito de sítio social criado por Santos (1993) é extremamente importante para
compreendermos de forma mais nítida como se origina e se reproduz o processo de
segregação sócio-espacial em países semi-periféricos, através de uma ótica mais dinâmica e
pragmática. De acordo com Santos:
A especulação imobiliária deriva, em última análise, da
conjugação de dois movimentos convergentes : a
superposição de um sítio social ao sítio natural e a disputa
entre atividades e pessoas por dada localização. (...) Criam-se
sítios sociais, uma vez que o funcionamento da sociedade
urbana transforma seletivamente os lugares, aperfeiçoando-
os às sua exigências funcionais. É assim que certos pontos se
tornam mais acessíveis, certas artérias mais atrativas e,
também, uns e outros, mais valorizados. Por isso são
atividades mais dinâmicas que se instalam nessas áreas
privilegiadas; quanto aos lugares de residência, a lógica é a
mesma, com as pessoas de maiores recursos buscando alojar-
se onde lhes pareça conveniente, segundo os cânones de cada
época, o que também inclui a moda. É desse modo que as
diversas parcelas da cidade ganham ou perdem valor ao
longo do tempo. (SANTOS,1993, p.96 Apud: PIERI, 2005)
26
Neste caso, o conceito de sítio social é válido para a análise dos bairros residenciais
produzidos para as burguesias, como também das áreas comerciais que elas igualmente
produzem de acordo com seus interesses.
A Segregação sócio-espacial também foi estudada por Souza (2000). Neste modelo
de estudo, é mostrado como o desenvolvimento do espaço urbano gera desigualdades
espaciais, levando ao processo de separação e exclusividade do solo.
De acordo com Pieri (2005) a fragmentação do tecido sóciopolítico-espacial
consiste numa ‘ampliação’ da discussão sobre os problemas urbanos primários, através da
busca de respostas espacialmente visíveis dessa problemática. Para se chegar a essa
concepção foram feitos levantamentos dos diversos problemas ambientais decorrentes da
dinâmica e da lógica do modo de produção capitalista. De acordo com Souza (2000) isso
foi possível sistematizar as idéias e encontrar as diversas conseqüências expostas no espaço
urbano dos países semi-periféricos.
Em seu estudo, Souza discute sobre as problemáticas enfrentadas nas duas
metrópoles nacionais: Rio de Janeiro e São Paulo. Nestas duas grandes cidades, os agentes
modeladores do espaço urbano – amplamente citados no capítulo anterior – são os grandes
atores da fragmentação do tecido sóciopolítico-espacial.
Souza descreve o espaço fragmentado de forma dicotômica. Um espaço está fadado
ao controle de atividades ilícitas, onde o mercado informal é predominante. As leis do
Estado são frágeis e pouco atuantes. Neste caso Souza trabalha com a definição de induzida
ou imposta. Esta população não reside nesses locais porque quer, e sim porque foi induzida
– através de impostos e aluguéis mais baratos. Já na outra ponta, temos uma população com
demanda solvável, onde pode pagar pelos benefícios públicos e privados instalados no
território. Para esta população que pode se ‘excluir’ do restante da sociedade, Souza chama
esse processo de auto-segregação.
27
Assim, podemos observar em todo território destas cidades, conflitos gerados por
essas duas grandes e distintas formas de segregação. O crime organizado está cada vez mais
‘dominando’ o espaço urbano – haja visto os atuais problemas que passou a cidade de São
Paulo no ano de 2006. Com isso, a população de maior renda, elabora estratégias para se
excluir ainda mais do espaço urbano deteriorado, valorizando a auto-segregação.
O espaço urbano nas cidades se torna cada vez mais fragmentado socialmente, onde
os ambientes públicos e comuns tendem a ficar fadados ao abandono social. Portanto
podemos nos arriscar a dizer que o que está em jogo com o agravamento dos problemas
acima expostos, é a cidade em seu sentido usual, ou seja, como uma unidade de
diversidade, em que as contradições de classe, as tensões de fundo étnico-econômico e a
segregação residencial daí decorrentes, não eliminam a percepção da cidade como uma
entidade geográfica coerente.
Segundo Souza, a fragmentação do tecido sóciopolítico espacial ‘direciona-se’ na
dinâmica sócio-espacial às metrópoles brasileiras, mas também pode ser relativamente
utilizado em outros países semi-periféricos. Já em países considerados centrais, por mais
grave problemática urbana, existem instituições que compõem o aparelho do Estado e que
apresentam uma capacidade muito maior, tanto de evitar a agudização da pobreza e de suas
conseqüências sócio-espaciais (ação profilática do Estado de bem estar), quanto de, uma
vez instalados os problemas, combatê-los com mais eficiência e eficácia. Além do mais,
como já visto nos países considerados centrais, a dinâmica urbano organizacional é
geralmente distinta à dos países semi-periféricos.
Niterói expressa claramente toda a complexidade do modelo explicativo aqui
estudado. De um lado a rede de tráfico de drogas e outras atividades ilícitas, extremamente
organizadas, territorializaram amplamente quase todas as favelas existentes, e por outro
lado observamos o crescimento no número de condomínios fechados (auto segregação),
onde as classes com maior poder aquisitivo, buscam além de amenidades, um novo estilo
de vida protegido da criminalidade que impera e é refletida nas áreas neutras (ruas, espaços
públicos, etc.).
28
Uma das cidades que Souza exemplifica sua obra é São Paulo, apresenta altos
índices de criminalidade e caminha cada dia mais para o ‘caos urbano’. Com isso, as
classes mais elevadas se isolam completamente em condomínios fechados, como o de
Alphaville, que possui até mesmo shopping center, com toda infra-estrutura comercial
possível para assegurar o abastecimento da cesta básica ou até supérfluos dos moradores.
Ao traçar a evolução desses processos, Souza (2000) demonstra que no Rio de
Janeiro, no final da década de 70, o tráfico de drogas era ainda pouco impactante, tanto na
escala das favelas como na escala metropolitana. As comunidades apresentavam-se como
subsistemas neutros e a auto-segregação era quase que insignificante. São Paulo, na mesma
época, também não explicitava grandes problemas relacionados à organização espacial.
Já em meados da década de 90 observou-se no Rio uma proliferação espacial da
desigualdade, em que o tráfico de drogas passou a se territorializar e as comunidades
passaram a se caracterizar, em grande parte, como sendo subsistemas fechados e
controlados por traficantes. Por outro lado, expandiu-se a auto segregação das classes
sociais mais abastadas, que articulando local de moradia (condomínios fechados) com local
de consumo (shopping center), passaram a fazer com que a cidade se tornasse um espaço
local cada vez mais fraturado socio-politicamente e menos vivenciado como ambiente
comum de socialização. Já em São Paulo, Souza (2000) observou que no final da década
de 90, apesar do crime não ser tão organizado quanto o do Rio de Janeiro, as comunidades
também apresentaram-se como subsistemas fechados e a auto segregação se tornou uma
‘escapatória’ à população de mais alto status social, que fugindo da pobreza associada à
violência, passou a viver e ‘se isolar’ em condomínios extremamente fechados e ‘auto
sustentáveis’, como o de Alphaville (Apud, PIERI, 2000).
Nas crises de identidade, grupos com um padrão identitário semelhante tendem a se
sentirem ameaçados por outros grupos, bem como pelo medo da violência e da perda de
padrões de consumo, criando-se assim espaços protegidos, através de práticas territoriais
excludentes, tentando manter uma segurança (HARVEY, 2001).
29
Corrêa (2001) mostra neste contexto que a segregação pode se constituir em uma
projeção espacial do processo de estruturação de classes, reproduzindo residências
diferenciadas no espaço, de acordo com moldes da sociedade capitalista. Podemos ainda
salientar que grandes problemas gerados no espaço urbano, são ocasionados posteriormente
a segunda metade do século XX. A exclusão crescente de uma grande parcela da população
das cidades ampliou a desigualdade social.
Portanto, a articulação entre os temas acima listados, nos mostram a complexidade e
articulação entre estes para gerar o modelo de fragmentação do tecido sociopolítico espacial
que queremos retratar. No que concerne à cidade de Niterói, temos que levar em conta as
particularidades relacionadas às características espaciais deste município, as quais são
responsáveis por uma configuração territorial bastante específica. Portanto, acredita-se que
a especificidade da segregação sócio-espacial está vinculada às características do sítio
urbano e à forma de apropriação por parte dos agentes modeladores ligados à atividade
imobiliária.
30
CAPÍTULO 3. UM BREVE RESGATE DA DINÂMICA TERRITORIAL NO
MUNICÍPIO DE NITERÓI
3.1. A Cidade de Niterói
A importância urbana de Niterói fazia-se sentir, desde a sua elevação à categoria de
Vila Real quando contava com aproximadamente 13.000 habitantes e o Juiz de Fora José
Clemente Pereira começa a implantação do Plano de Edificação da Vila Real da Praia
Grande, de autoria do pintor francês Arnaud Julien Pallière, preocupado em ordenar o
espaço urbano que crescera sobre uma lógica de cidade colonial e que, portanto,
apresentava sinais de precariedade. Preocupação ainda existente em 1841 quando foi
apresentado o plano do engenheiro militar francês Pedro Taulois que, articulado ao anterior,
construiu uma estrutura urbana que ficou basicamente inalterada por aproximadamente um
século (HONORATO, 1999).
Paralelamente às suas mudanças urbanas e diretamente articuladas com elas,
podemos observar ao longo do século XIX o expressivo crescimento "industrial" da cidade
em setores que marcaram – alguns ainda marcam – decisivamente o seu perfil, onde um
desses empreendimentos que buscaram aprofundar e ampliar setores produtivos tradicionais
da cidade como o de construção naval, onde tinha o bairro Ponta D’Areia como o embrião
da cidade.
Já no final do século XIX, a cidade se expande, onde nascem novos bairros como o
Ingá, Icaraí e parte de Santa Rosa que originam-se predominantemente residenciais – classe
média alta em diante -, não apresentado atividades industriais. O mesmo se poderia dizer de
São Francisco que começa a experimentar um crescimento urbano após os anos 1940 e que
também não presenciou atividades industriais que merecem registro.
Tais áreas acima descritas passam, a partir dos anos 1980 (Censo 2000), por um
processo de descentralização, por motivos como uso intensivo do solo urbano,
concentração vertical, limitado espaço horizontal, elevação do preço de compra e aluguel
dos espaços comerciais e para moradias. A descentralização de acordo com Corrêa (1999),
só se verifica quando há ou são criadas atrações em áreas não centrais tais como: terras não
31
ocupadas, a baixo preço; infra-estrutura implantada; facilidade de transporte; qualidades
atrativas do sítio, como topografia e drenagem; amenidades; dentre outros. Constatamos
com isso que a Região Oceânica de Niterói, como sendo dona da maior parte destes
predicados, foi uma área de atração neste período temporal e continua sendo no início do
século XXI, porém com registros de crescimento decrescentes (ver tabelas 4, 5, 6, 7 e 8).
Niterói é uma município com algumas singularidades no que concerne à renda da
população. Menos de 10% dos responsáveis pelo domicílio recebem até 1 salário mínimo,
enquanto que 55,9% recebem mais de 5 salários (Censo, 2000). Isto mostra que nesta
cidade houve um grande processo de valorização do solo urbano, onde se inscreve em uma
dinâmica metropolitana de atração da população de alta renda, principalmente para os
bairros da Região Oceânica (ver Cap. 3.2). No Gráfico 1 podemos fazer uma comparação
entre Niterói e a Região Oceânica desta cidade. Podemos perceber que existe uma nítida
concentração de chefes de família de alta renda na região oceânica, sobretudo a partir de 10
salários mínimos. Isto tamm é comprovado pelos mapas 1 e 2, onde é nítida a
concentração de população de alta renda em bairros litorâneos da cidade (Ingá,Icaraí, São
Francisco e os da Região Oceânica) e de menor renda nos bairros vizinhos a São Gonçalo
(Região Norte de Niterói).
Gráfico 1
Percentual de Classes de Renda do
responsável pelo domilio - 2000
0,0%
5,0%
10,0%
15,0%
20,0%
25,0%
Até 1/2 salário
Mais de 1/2 a 1
mais de 1 a 2
mais de 2 a 3
mais de 3 a 5
mais de 5 a 10
mais de 10 a 15
mais de 15 a 20
mais de 20
Niterói
Reg. Oceânica
Fonte: Censo 2000
32
Mapa 1
Mapa 2
33
3.2. Niterói no Contexto Metropolitano
A criação e o desenvolvimento da Região Oceânica de Niterói, se inscreve em uma
dinâmica que não está somente ao nível municipal. Faz-se necessário o entendimento da
escala metropolitana, que contem atividades sócio-econômicas e espaciais com elevado
grau de integração e articulação, para expressar as transformações que este espaço
geográfico sofre. A escolha de uma dada escala de observação dos fenômenos é uma
questão metodológica que implica na compreensão do sentido e no nível de detalhamento
e/ou visibilidade que se deseja obter do fenômeno investigado. Entretanto, o conhecimento
de um fenômeno só pode se dar mediante a consideração da interação do mesmo com
outros níveis de escala (OLIVEIRA; PATARRA, 2006).
Niterói, com 458.465 habitantes e uma área de 131,5 Km2, integra a Região
Metropolitana do Rio de Janeiro (RMRJ) desde a sua criação, através da Lei Complementar
nº 20 de 01/07/1974. Esta cidade foi capital do antigo estado do Rio de Janeiro entre 1835 e
1975, ano da fusão do antigo estado da Guanabara com o estado do Rio de Janeiro. Niterói
perde sua qualidade de capital do estado, apenas se transformando em mais um município,
e a cidade do Rio de Janeiro passou a ser a capital do estado homônimo. Segundo Ajara
(2006), a justificativa da criação do atual Estado do Rio de Janeiro, centrada no propósito
de desenvolvimento do interior do estado, no mínimo, careceria de uma compreensão mais
abrangente acerca dos mecanismos que respondem pela integração dos espaços à sua
dinâmica, em diferentes contextos histórico-econômicos. Isto se deve ao fato da RMRJ
polarizar grande parte da população do estado (78,82% dos habitantes residindo em 4.686,5
Km2, ou ainda, 13% do território do estado).
A cidade fica a cinco quilômetros da cidade do Rio de Janeiro, à qual é ligada pela
Ponte Rio-Niterói, cuja extensão é de catorze quilômetros, e por um serviço de barcas e
lanchas rápidas, chamadas de "catamarãs". Faz divisa ainda com os municípios de São
Gonçalo (ao norte) e Maricá (a leste). Ao sul encontra-se o Oceano Atlântico e a oeste a
Baía de Guanabara. A Região Metropolitana congrega mais de onze milhões de pessoas,
34
onde através de deslocamentos intermunicipais para trabalho e estudo, perfazem 813.703
pessoas (RIBEIRO, 2005). É uma região dinâmica no que diz respeito aos fluxos.
Depois de entradas e saídas de municípios ao longo de sua criação, a Região
Metropolitana do Rio de Janeiro se mostra hoje, segundo a Lei Complementar no 105 de
2002, composta por 17 municípios: Rio de Janeiro, Belford Roxo, Duque de Caxias,
Guapimirim, Itaboraí, Japeri, Magé, Nilópolis, Niterói, Nova Iguaçu, Paracambi,
Queimados, São Gonçalo, São João de Meriti, Seropédica, Mesquita e Tanguá (ver mapa
3).
A partir de 1980, ocorrem acentuadas transformações nos volumes, fluxos e
características dos movimentos migratórios no Brasil, sintetizados num menor crescimento
das metrópoles, numa maior predominância de migrações a curta distância e intra-
regionais, numa incidência acentuada de migrações de retorno – sugerindo uma
circularidade de movimentos -, na tendência a um crescimento de cidades de porte médio e
na configuração generalizada de periferias no entorno dos centros urbanos maiores, nas
distintas regiões do país (PATARRA, 2003).
No que concerne à migração no contexto metropolitano, existe uma diferenciação
quanto aos níveis de atração. Enquanto a cidade do Rio de Janeiro recebeu durante a década
de 1990 (Censo 2000) 82, 8% de imigrantes que vieram de fora da RMRJ, os municípios
conurbados a esta região recebem em sua maior parte, habitantes da própria região. Niterói
teve neste mesmo período um total de 41,9% de imigrantes de fora da RMRJ. Não é uma
taxa baixa se comparada com os outros municípios desta mesma região. Algumas
explicações se devem a fatores como a Universidade Federal Fluminense, a própria história
da capital do antigo estado, importantes funções portuárias e comerciais, dentre outras,
como focos de atração populacional de fora da Região Metropolitana. Alia-se a isto uma
indústria naval de peso, o que tornou o município como sendo a terceira área de mão-de-
obra metropolitana no final desta década de 1990 (LAGO, 2000).
35
Mapa 3
Fonte: Fundação CIDE
36
De acordo com Lago (2000), já a partir da década de 1920, começa a estruturação
da área metropolitana do Rio de Janeiro, em um padrão dicotômico, no que se refere às
condições urbanas de vida. Assim, começa a se rearranjar um núcleo criado para abrigar as
camadas de alto poder aquisitivo que pudessem garantir a rentabilidade do capital público e
privado investido em equipamentos e serviços urbanos, e uma periferia onde a omissão do
Estado definiu seu conteúdo social.
Jardim (2001) mostra que os deslocamentos populacionais são a expressão da luta
diferenciada e excludente pela conquista do espaço, cuja expressão são os movimentos da
mobilidade populacional e residencial, que influenciam ou são influenciados pela estrutura
sócio-econômica e populacional. Esta diferenciação social e econômica que este autor
coloca, está ligada a dinâmica metropolitana, onde a Região Oceânica de Niterói se insere.
É a partir da construção da ponte Costa e Silva (Rio-Niterói), em 1974, e da expansão e
ocupação das áreas litorâneas, que emerge uma imigração para a cidade de Niterói,
sobretudo de uma população de alta renda.
A partir deste fenômeno migratório, ocorre uma “nuclearização” da chamada
periferia, ou seja, a expansão do núcleo na periferia metropolitana, em termos da expansão
de estratos de média e alta renda. É importante ressaltar ainda que esta população migrante
detêm renda superior a população local (Jardim, 2001). Isto pode validar a influência das
migrações na estrutura sócio-econômica local, refletindo em possível indicador para
explicar o processo de segregação sócio-espacial da população de alta renda dentro do
cenário metropolitano (ver Cap. 4).
Esta avaliação da distribuição sócio-econômica no contexto metropolitano nos
mostra que Niterói apresenta um perfil voltado para as classes de maior poder aquisitivo
(ver mapa 4). Segundo Salandía (2001), para facilitar estudos sobre renda nesta região,
Ribeiro (1995 – Apud: Salandía, 2001), cria algumas categorias de análise no estado, e
aglutina a Zona Sul do Rio de Janeiro (bairros de Botafogo, Copacabana, Lagoa e Barra da
Tijuca) com todo o município de Niterói. Nesta área reside 9% das famílias do Estado, mas
concentra 31,2% dos rendimentos, ao mesmo tempo que 67,9% das pessoas ganham acima
37
de 2 salários mínimos, apenas 6,6% ganham menos de ½ salário mínimo, diferente da
situação do Estado, com índices de 32,1% e 36,1% respectivamente.
38
Mapa 4
Fonte: RIBEIRO, Luiz César de Queiroz. Análise das Regiões Metropolitanas do Brasil:
como andam as metrópoles brasileiras. Observatório das Metrópoles / FASE, 2005. * Para este
estudo, os municípios de Marica, Mangaratiba e Itaguaí permaneceram na RMRJ.
39
Ao se fazer uma correlação entre renda e cor de pele, podemos perceber que as
dinâmicas de ordenamento do espaço urbano são altamente segregadoras ao nível
metropolitano. Ribeiro (2005) mostra que as áreas mais valorizadas pelo mercado
imobiliário como a zona sul da cidade do Rio de Janeiro, a Barra da Tijuca e Niterói, o
percentual de negros e pardos não ultrapassou 20% da população, sendo os menores
percentuais encontrados nos bairros da Lagoa e no Leblon: cerca de 5% (ver mapa 5).
Através da exposição dos dados e da bibliografia consultada, verifica-se que o
processo de elitização da cidade de Niterói é acompanhado por um forte componente de
exclusão social, que provoca a periferização de alguns segmentos sociais, que buscam
alternativas de moradia e a favelização de outros, concretizando o fenômeno de
gentrificação. Este por sua vez é um processo de segregação sócio-espacial em que o
mercado imobiliário incorpora áreas do seu interesse, destinando-as aos segmentos de
maior poder aquisitivo e provocando o êxodo de moradores de menor renda para áreas
menos valorizadas (ver Cap. 4).
40
Mapa 5
Fonte: RIBEIRO, Luiz César de Queiroz. Análise das Regiões Metropolitanas do Brasil:
como andam as metrópoles brasileiras. Observatório das Metrópoles / FASE, 2005. * Para este
estudo, os municípios de Marica, Mangaratiba e Itaguaí permaneceram na RMRJ.
41
3.3. A Região Oceânica
A Região Oceânica limita-se com o município de Maricá e com as Regiões de
Planejamento Leste – nomenclatura utilizada pela prefeitura de Niterói que divide-se esta
cidade em zonas de planejamento - Pendotiba e Praias da Baía, como podemos ver na
Figura 1. Além dessas linhas limítrofes, a Região possui um trecho de litoral banhado pelo
Oceano Atlântico onde se destacam quatro das mais importantes praias do município, não
só pelas suas belezas naturais mas, principalmente, por serem pouco afetadas pela poluição,
atributo assegurado por estarem fora da Baía de Guanabara. São elas as praias de
Piratininga, Camboinhas, Itaipu e Itacoatiara, todas nos bairros de denominações iguais, e
inseridos na Região Oceânica.
Figura 1
Fonte: www.nitvista.com
Esta área que buscamos analisar neste trabalho, corresponde ao antigo Distrito de
Itaipu, que entre 1890 e 1943 pertenceu ao município de São Gonçalo, sendo
posteriormente reincorporado a Niterói. Somente a partir de 1943 a Região Oceânica
passou a integrar, em caráter definitivo, o município de Niterói constituindo-se no Segundo
Distrito. Até então essa área, total ou parcialmente, integrou alternadamente os municípios
de Niterói e o vizinho São Gonçalo. (NITERÓI BAIRROS, 1996).
42
A Região Oceânica, originalmente, era recoberta de vegetação arbustiva
característica da mata atlântica, onde ainda hoje existem manchas remanescentes como a
que recobre a Serra Grande e a Serra da Tiririca (vertente voltada para Niterói). Drenada
pelas bacias dos rios Jacaré e João Mendes entre outros, todos tributários do sistema
lagunar Piratininga - Itaipu, a região se caracteriza pela alternância de baixadas, restingas,
morros, costões rochosos e algumas escarpas. Há extensas áreas de planícies muito baixas
que dificultam o escoamento superficial ocasionando alagamentos e transbordamentos de
rios e canais por ocasião de chuvas mais fortes.
Os primeiros núcleos populacionais da área se desenvolveram a partir do século
XVIII: em Piratininga foram construídas as igrejas de Nossa Senhora de Bonsucesso (1670-
1701) que era em frente à lagoa de Piratininga. A de Nossa Senhora da Penha (1745), no
Imbuí; e entre 1711 e 1716 foi construída num morro em frente à Lagoa de Itaipu a igreja
de São Sebastião de Itaipu, elevada a categoria de paróquia independente em 1721. O
núcleo se consolidou com a criação da Freguesia de São Sebastião de Itaipu em 12.01.1755,
tendo como base econômica a pesca e a agricultura (SOUZA, 1993).
Há registros de que várias fazendas surgiram como as do Engenho do Mato, da
Piiba Grande, da Piiba dos Malheiros, do Engenho Novo, da Itaocaia e a Fazenda
Piratininga entre muitas outras. A imprecisão de suas delimitações durante o processo de
ocupação, deu margem a muitas áreas de titulação irregular, fonte de multiplicação de
posseiros e grileiros (NITERÓI: DADOS DE REFERÊNCIA, 1999).
A Freguesia de São Sebastião de Itaipu, passa a fazer parte da nova Vila Real da
Praia Grande, em 1819, onde de acordo com Souza:
Pelo alvará, com força de lei, de 10 de maio de 1819, Dom
João VI erigiu a povoação de São Domingos da Praia Grande
em vila, com o nome de Vila Real da Praia Grande,
constituída, então, das duas mencionadas povoações e das
quatro freguesias vizinhas de São Gonçalo, todas
desmembradas do termo da cidade do Rio de Janeiro, a que
pertenciam como partes integrantes (SOUZA, 1993).
De acordo com Souza (1993), em abril de 1821 foi feito um recenseamento de
eleitores da Corte e da Província, realizado pelo Exército, mas não foi incluída a freguesia
de São Sebastião de Itaipu. Em 1840 foi realizado um recenseamento registrado como
43
“Quadro estatístico da população da província do Rio de Janeiro, segundo as condições,
sexos e cores – 1840” que apontou uma população de 407.192 habitantes na província do
Rio de Janeiro, dos quais 25.815 residiam em Niterói – esta população incluía também a
Freguesia de São Gonçalo. Nesta ocasião, encontram-se em Itaipu e São Gonçalo um alto
percentual de escravos, que é explicado por se tratar de freguesias com predomínio da
atividade rural. A freguesia de Itaipu tinha uma população total de 3.201 habitantes, e em
um século aumentou lentamente, pois à época da sua reanexação a Niterói tinha
aproximadamente 4.000 habitantes.
Tabela 1 – População das freguesias de Niterói em 1840
Brancos
Livres
Mulatos
Livres
Pretos
Livres Índios
Escravos
Pretos Total
São João Batista 4.030 1.212 691 52 4.849 10.834
São Gonçalo
2.555 1.518 551 5 6.277 10.906
Itaipu
810 518 193 86 1.594 3.201
o Lourenço 819 3 02252
Niterói
7.403 3.267 1.438 143 13.564 25.815
Fonte: Dados do “Quadro estatístico da população da província do Rio de Janeiro” analisados por Souza
(1993). Apud: Salandía (2001).
Em 1833, quando foi elaborada a Planta Topográfica da Província do Rio de
Janeiro, a freguesia de Niterói não constava neste documento. Porém, de acordo com Souza
(1993), em um outro mapa de 1836, “feito em aditamento á Carta Topográfica de 1833”
tem se uma visão quase completa da parte de Niterói, que se estende pelo Saco de São
Franciso, Jurujuba, Piratininga e Pendotiba. Neste mapa constava uma estrada que partindo
da praia de Charitas subia o Morro da Viração para descer em direção ao Cafubá, passando
entre as fazendas do Arrozal, Pendotiba e Piratininga.
Em 22.09.1890, segundo Salandía (2001) foi criado o Município de São Gonçalo,
constituído pelas freguesias de São Gonçalo, Nossa Senhora de Cordeiros e São Sebastião
de Itaipu. Em 1892 Itaipu foi reincorporado por alguns meses a Niterói, mas em dezembro
desse mesmo ano retornou a São Gonçalo, embora a Laboa de Piratininga tenha ficado sob
jurisdição niteroiense. A população de Niterói, que em 1872 era de 47.548 habitantes, se
reduziu, em 1890, para 34.269 habitantes, enquanto sua área se reduziu para 83,86Km
2
. Na
44
década de 1890, apesar de ter perdido a condição de capital estadual a cidade teve um
significativo incremento demográfico, passando para 53.433 habitantes. Com a recuperação
da condição de capital e os grandes investimentos realizados na cidade, este crescimento
continua, alcançando 86.238 habitantes em 1920.
A Região Oceânica permaneceu como área rural. De acordo com Souza (1993), em
1908 a igreja católica extinguiu a paróquia de São Sebastião e a incorporou à de Nossa
Senhora de Jurujuba. A importância da atividade pesqueira resultou na criação , em 1923,
da colônia de pesca Z-7, que levou à reconstrução da Estrada Niterói-Itaipu, que serviria
também para o escoamento da produção pesqueira. Em 1938 a Lagoa de Piratininga foi
também anexada a São Gonçalo. Salandía (2001) relata que certamente a reduzida extensão
do município e as limitações geográficas devem ter preocupado as autoridades da cidade,
em um período em que se vislumbrava um grande crescimento urbano, decorrente da
industrialização e modernização da economia. Backheuser escrevia em 1942:
Niterói é, em área, um dos 14 menores municípios do Brasil.
Tem, portanto, menos de 100Km
2
, ou, mais exatamente, uns
71 escassos. No presente momento, ano da graça de 1942,
sua zona urbana forma, a bem dizer, um só aglomerado
citadino, com as únicas soluções de continuidade que os
morros condicionam Backheuser (Apud: SALANDÍA,
2001).
Esta preocupação de Backheuser com o tamanho da cidade, foi tamm a mesma
das autoridades estaduais, onde no ano de 1943, através do decreto-lei nº 1055,
reincorporam o Distrito de Itaipu definitivamente a Niterói.
Apenas um ano depois da reincorporação, as autoridades municipais apresentaram
ao governo do Estado o “Plano de Urbanização das regiões litorâneas de Itaipu e
Piratininga”, cujo reflexo mais imediato foi a abertura, em 1946, do Canal de Camboatá,
interligando as duas lagoas e ampliando as terras loteáveis em volta da Lagoa de
Piratininga.
45
A transição do estágio de agricultura de subsistência, com excedente pouco
representativo, à condição de área urbana de grande expressão, não se deu repentinamente.
Há que se destacar todo o processo de transformação da economia e da sociedade brasileira,
no decorrer do século XX, no qual a hegemonia do rural foi substituída pela autarquia do
urbano.
Segundo Souza (1993), a aprovação de loteamentos promovidos pela iniciativa
privada se iniciou quase imediatamente e entre 1940 e 1960 se configurou o desenho
urbano da Região Oceânica. O impacto ambiental provocado pelos novos loteamentos,
potencialmente grande, não foi imediato, pois apesar dos projetos preverem a ocupação de
lagoas, restingas, áreas de mata atlântica e sítios arqueológicos, a sua implantação se deu
num ritmo lento, e somente se acelerou após a construção da Ponte Costa e Silva.
3.4. Processo de Incremento Urbano na Região Oceânica
Em conjunto com o surgimento dos loteamentos promovidos pelo capital privado, o
Estado, com suas intervenções nesta área, promove uma melhor acessibilidade,
viabilizando as construções para moradia e consequentemente a atuação do capital privado.
Na década de 1940, com a construção da Rodovia Amaral Peixoto e na de 1950 a
construção do Túnel Icaraí – São Francisco melhoraram a ligação entre o núcleo central da
cidade, com a Região Oceânica.
Porém a inauguração da Ponte Presidente Costa e Silva ou Ponte Rio-Niterói no ano
de 1974, o impacto sobre o espaço foi mais marcante. Isto porque, de imediato, Niterói
passou a ser a grande zona de expansão urbana da Cidade do Rio de Janeiro. Contando com
uma qualidade de vida comparável a dos bairros de zona sul da cidade vizinha, no que
concerne a beleza natural da orla, e ainda na ocasião não ter sido ainda objeto de uma
grande especulação urbana, Niterói começou a atrair novos moradores. Porém tais
moradores acompanharam a tendência de atração para a Região Oceânica, como podemos
analisar na tabela 2.
46
Tabela 2
1970 1980 1991 2000 % 70/80 % 80/91 % 91/00
Niterói 324246 397123 436155 459451 2,05 0,94 0,52
Região Oceânica 7374 12138 33245 55790
5,11 10,60 5,31
População Residente e Taxa Geral de Crescimento Anual 1970/80/91/00
Fonte: Censo Demográfico 1970, 1980, 1991 e 2000
A integração promovida pela ponte, segundo Salandía (2001), promoveu a
valorização da Região Oceânica e o surgimento de novos parcelamentos na modalidade de
condomínios horizontais, que tinham o apelo da segurança e serviços que os antigos
loteamentos não ofereciam e o poder público não podia garantir, além de que, selecionavam
os moradores, provocando uma homogeneização sócio-econômica. Estes condomínios
horizontais ao longo dos principais eixos viários inviabilizaram a integração da malha
viária e transformam esses eixos em um extenso corredor. À exceção destes novos
condomínios, nenhum dos loteamentos existentes contava com infra-estrutura básica, o que
manteve os preços acessíveis à classe média, que ainda possuía a possibilidade de obter um
financiamento do SFH e construir sua moradia; segundo Vasconcellos (1996), a classe
média podia “ter mais metros quadrados para morar e em contrapartida mais quilômetros de
distância para chegar ao local de trabalho.” *Apud: Salandía (2001). Porém, esta área da
cidade obtém um crescimento populacional bem acima da média da própria cidade que a
contém.
Para podermos analisar melhor os dados da Taxa Média Geométrica de Crescimento
Anual da população, que é o incremento médio anual da população residente entre os anos
considerados, elaboramos o gráfico 2 que contribui dando mais clareza às informações.
47
Gráfico 2
Taxa Média Geométrica de Crescimento Anual da
População
0,00
1,00
2,00
3,00
4,00
5,00
6,00
7,00
8,00
9,00
10,00
70/80 80/91 91/00
Período
Niterói
Região Oceânica
O crescimento médio anual da população da Região Oceânica, como podemos
perceber, não está condizente com a média populacional da cidade a qual pertence. No
período de 1970/80 para 1980/91, enquanto a média para a cidade de Niterói está em
declínio, a mesma taxa para a Região Oceânica eleva-se significativamente. Porém no
período posterior – 1980/91 a 1991/00 – a tendência de declínio acontece nas duas áreas.
A dinâmica demográfica demonstrada na tabela 1 aponta o aumento da participação
da população da Região Oceânica de 5,11% no intervalo 1970/80 para 9,60% no período
posterior. Mostrando com isso que este espaço temporal foi o que obteve o maior
incremento populacional nesta região, pois no período 1980/91 a 1991/00 percebe-se um
acompanhamento de diminuição como ocorre no município.
Tais incrementos foram acompanhados por uma conseqüente dinamização das
atividades econômicas no local: multiplicaram-se e diversificaram-se os estabelecimentos
comerciais. Das quitandas e dos armazéns existentes na década de 1970, aos
supermercados, casas de materiais de construção, concessionárias de marcas sofisticadas,
farmácias, padarias, bares e restaurantes, agências bancárias, academias de ginástica, lojas
de conveniências e postos de gasolina abertos 24 horas por dia, cursos de línguas
estrangeiras, cursos pré-vestibulares, serviços médicos e odontológicos, entre outros, ou
seja, sofisticou-se o setor de serviços em função dos novos moradores. Reforçaram-se
48
também nos últimos anos, as atividades de cultura e lazer, havendo grupos organizados
desses setores, além de salões para exposições.
Em se tratando de uma área relativamente extensa (49,10km2), se comparada ao
restante do município e apesar da intensificação recente de sua ocupação, a Região
Oceânica quase não dispõe de infra-estrutura tais como água encanada e esgotamento
sanitário. É freqüente o recurso de fossas sépticas, bem como a ocorrência de esgoto a céu
aberto (valas), sendo, esta última forma, forte poluidora das águas do sistema hídrico local.
Existe uma população de classe média-alta, que se instala nos diversos condomínios
residenciais horizontais que proliferaram na região, palco teórico desta dissertação, a partir
do final da década de 1970 e que ainda hoje se expandem ocupando, em algumas ocasiões,
áreas de proteção ambiental, o que tem gerado alguns conflitos entre as construtoras, os
grupos ambientalistas e o poder público. A respeito desta população, na qual a auto-
segregação se faz presente, a demanda por infra-estrutura básica é bastante relevante.
Porém esta demanda se dá em todas as camadas sociais presentes nesta região, mostrando
assim um quadro de grande carência, não sendo esta a problemática focada nesta proposta
de trabalho, porém a sua importância, nos faz salientá-la. O capítulo 4 trará com maior
ênfase o aumento da incorporação imobiliária sob o prisma da emergência dos condomínios
horizontais fechados.
3.5. A Formação dos Bairros da Região Oceânica
Neste sub-capítulo, não pretendemos focalizar o conceito de bairro como uma forma
espacial político-administrativa fragmentada da cidade. Buscamos levar nesta fase, uma
superficial idéia dos bairros com identidades próprias, simbologias, conteúdo social, porém
inscrito em uma totalidade: a cidade de Niterói. Os agentes modeladores do espaço urbano,
discutidos no capítulo 2, constroem e reconstroem as especificidades de cada local,
alterando o padrão habitacional e suas singularidades.
Por isso, os bairros da Região Oceânica não podem ser pensados de forma a-
temporal, ou seja, de maneira a ignorar a história da cidade, pois eles não tem um grau de
realidade constante ao longo da história da cidade, e a existência histórico-concreta dos
49
mesmos, depende da conjunção de vários aspectos da sociabilidade de um local, em um
dado período.
Como vimos anteriormente, a primeira referência de ocupação na Região Oceânica,
foi a Freguesia de São Sebastião de Itaipu, criada no século XVIII e transformada, no final
do século XIX, no Distrito de Itaipu, onde foi posteriormente ocupado pelo novo município
de São Gonçalo. O decreto 4.895/1986 instituiu o abairramento municipal, onde este
distrito foi dividido, criando os bairros de Cafubá, Camboinhas, Engenho do Mato,
Itacoatiara, Itaipu, Jacaré e Piratininga (ver figura 2).
Figura 2
Fonte: www.nitvista.com
Em 1992, o Plano Diretor de Niterói, instituiu uma divisão em regiões de
planejamento (ver figura 1), ficando a maior parte do Distrito de Itaipu incorporada à
Região Oceânica. Através do Decreto 7.928 de 1998, foi extinto o Distrito de Itaipu, que
considerou nula qualquer divisão de Niterói em distritos, como parte da estratégia para
enfrentar um movimento pró emancipação deste extinto Distrito.
50
De acordo com Salandía (2001), a formação dos bairros que constituem a Região
Oceânica, foi influenciada pela existência das duas lagoas, Itaipu e Piratininga, e das
antigas fazendas que ocupavam a freguesia, mais tarde transformada em distrito. Com a
instalação dos loteamentos a partir de 1950 (ver capítulo 4), onde o mais antigo é Cidade
Balneária Itaipu, que incorporou o nome do distrito, cujo núcleo urbano se encontrava nas
proximidades do “Canto de Itaipu”, onde estão localizados os principais marcos históricos
da ocupação.
Os loteamentos Maralegre e Marazul constituem um único empreendimento na
década de 1950, denominado Bairro Piratininga. Outros grandes loteamentos que viraram
posteriormente referência territorial foram Maravista, Itacoatiara, e o Engenho do mato (a
antiga fazenda e os loteamentos resultantes da sua divisão).
O bairro de Camboinhas corresponde à parte do loteamento Cidade Balneária Itaipu
denominada Bairro Atlântico, modificada pelo Plano Estrutural de Itaipu, onde segundo
Salandía (2001), foi projetado para ser um bairro exclusivo de classe média e alta. Foi
separado do bairro de Itaipu por dois canais artificiais. O primeiro foi aberto em 1946, onde
interligou as duas lagoas, e o segundo criou uma ligação permanente entre a Lagoa de
Itaipu e o oceano. O acesso a esse bairro é feito por apenas uma entrada, com guarita da
Polícia Militar. Não é permitida a entrada de ônibus, nem sequer de excursão, o que
dificulta o acesso à praia de pessoas sem automóvel. Em Camboinhas, foram registradas
taxas extremas de crescimento demográfico a partir da década de 1980, segundo IBGE.
Quando começou a promoção deste bairro, a população local (predominantemente famílias
de pescadores) teve que sair por pressão imobiliária da Veplan. Na década de 1970, houve
um declínio de mais de 50% do contingente populacional, conseqüência do capital
imobiliário em valorizar o ambiente promovido (ver tabela 3.4). Nas décadas posteriores,
com o início da incorporação dos lotes do Plano Estrutural, a população passou de 202
habitantes em 1980 a 2.871 em 2000, registrando a taxa de crescimento demográfico mais
alta do município, embora em números absolutos, seus acréscimos representem 6% do total
registrado pela Região Oceânica nesse período.
51
O bairro do Engenho do Mato corresponde à antiga fazenda do mesmo nome e é
composto na sua maior parte pelos loteamentos Fazenda Engenho do Mato, SOTER, Vale
Feliz e Jardim Fluminense, embora a maioria das pessoas associem o nome apenas à
estrada deste nome e ao trecho do loteamento Fazenda Engenho do Mato, que ainda
conserva características rurais. Devido aos seus conflitos fundiários, os direitos dos
posseiros não foram reconhecidos pelos loteadores, onde na década de 1960, segundo
Salandía (2001) chegou a ser objeto de uma experiência piloto de reforma agrária. Através
de análises a partir de 1970, podemos verificar que é o terceiro maior bairro em população,
desde essa década, até o ano 2000.
Entre o Maciço da Andorinha, que separa este bairro com Itaipu, e a Serra da
Tiririca, que o separa do município de Maricá, está o bairro de Itacoatiara. É formado por
loteamentos e condomínios no vale entre a praia e estes dois costões rochosos. Neste
sentido, o bairro fica caracterizado pelo isolamento, com apenas um único acesso,
controlado por uma guarita da Polícia Militar, o que pode lhe conferir características de
exclusividade habitacional. Da mesma forma que Camboinhas, se caracteriza pela
homogeneidade da ocupação. Seu parcelamento se iniciou na década de 1940, com uma
estruturação definida pelo projeto do empresário suíço Mathias Sandri, e se desenvolveu ao
longo dos anos, inicialmente como local de veraneio. Pelas suas características naturais é
considerado patrimônio paisagístico do município, o que não impediu a ocupação dos
costões rochosos que contribuíram para a sua descaracterização. Desde 1980 suas taxas de
crescimento demográfico tem permanecido estáveis, em torno de 3% ao ano. A Prefeitura
de Niterói em conjunto com a Secretaria de Urbanismo e Meio Ambiente - atualmente
sendo duas secretarias distintas – elaborou um estudo em 1996, com o intuito de averiguar
o padrão das construções residenciais em cada bairro da Região Oceânica. Não cabe aqui
analisar a metodologia deste trabalho, e sim de dar um superficial suporte para o
entendimento das diferenças do nível de renda de cada bairro. Para o bairro de Itacoatiara, o
padrão construtivo é alto (ver Tabela 3)
Tabela 3
52
Bairros
Itacoatiara
Camboinhas
Itaipu
Engenho do Mato
Piratininga
Jacaré
Cafubá
Médio
Precário
Classificação dos Bairros segundo
o Padrão Construtivo Predominante
Padrão Construtivo
Alto
Fonte: PMN – SUMA
O bairro do Cafubá compreende parte do loteamento Maralegre, incluindo encostas
loteadas que se estendem até o morro da Viração, com quadras ocupadas por posseiros sem
seguir o arruamento aprovado, chegando até à favelização em alguns trechos. Apresenta
uma parte plana, ocupada por famílias de classe média. Sintomaticamente, nem os
corretores imobiliários nem os moradores se identificam com esta denominação, achando-a
pejorativa. Preferem assumir-se como parte do bairro de Piratininga, e deixando a
denominação Cafubá apenas para o morro e para um dos trechos ocupados às margens da
Lagoa de Piratininga. Seu maior crescimento demográfico, como podemos analisar na
tabela 4, se deu na década de 1970, quando a população triplicou, o que se pode entender
como resultado da localização e da enorme oferta de lotes, já que era em 1970 o segundo
bairro menos ocupado do distrito, ainda sendo o mais próximo da zona sul, mas entre 1991
e 2000 foi novamente um dos bairros de maior crescimento da cidade.
O bairro de Itaipu é composto pela maior parte das terras no entorno da Lagoa do
mesmo nome, compreendendo os loteamentos Cidade Balneária Itaipu e Maravista, e
alguns pequenos loteamentos e condomínios. A maior parte da área foi comercializada,
segundo Salandía (2001), pela Companhia Territorial de Itaipu, incluindo a tradicional
colônia de pescadores. O nome do bairro é sinônimo de Região Oceânica, o que se explica
por ter sido o nome da freguesia, do distrito e do núcleo urbano mais antigo. É uma área
que tem uma identidade forte, associada à praia, à lagoa e à colônia de pescadores. É o
bairro mais populoso da região, com taxas médias anuais de crescimento, desde 1970, bem
acima do município. Tanto do ponto de vista social como geográfico, é um bairro bastante
53
heterogêneo, composto por vários loteamentos e condomínios que apresentam todos os
padrões construtivos (ver tabela 3).
O bairro de Piratininga localiza-se no entorno da lagoa de mesmo nome, entre o
Oceano Atlântico, a Serra Grande e o Morro da Viração, limitando-se com Itaipu, Cafubá,
Camboinhas, Jacaré, na Região Oceânica e com os bairros São Francisco, Charitas e
Jurujuba na Região das Praias da Baía. O seu território apresenta todos os padrões
construtivos (ver tabela 3), incluindo favelas e áreas de posseiros. A área ao redor da Lagoa
de Piratininga é a de maior conflito e também a que reúne o maior contingente de
população de baixa renda. Segundo Salandía (2001), tem sua identidade bastante
consolidada, associada à praia e a sua lagoa, assim como acontece em Itaipu. É o segundo
bairro mais populoso da região.
O bairro do Jacaré corresponde ao vale do rio do mesmo nome, e não tem uma
tradição de exclusividade habitacional. Ao contrário dos outros bairros da Região Oceânica,
este não passou por processos de parcelamento do solo, sendo composto por sítios e áreas
ocupadas por posseiros. É um bairro de caráter mais popular. Tirando o verde (cada vez
mais desmatado pelas construções), não existem amenidades naturais para atrair uma
demanda solvável. O padrão construtivo, de acordo com estudos da Prefeitura Municipal de
Niterói e a Secretaria de Urbanismo e Meio Ambiente (PMN / SUMA) é precário. Porém,
seus indicadores sócio-econômicos não refletem esta realidade, pois o Condomínio Jardim
Ubá está incluído nos seus limites, embora seu acesso seja totalmente isolado do bairro.
Suas taxas médias de crescimento demográfico anuais, desde a década de 1970, tem
permanecido entre 5% e 6% (ver tabela 4).
Percebemos então que as amenidades e vantagens locacionais da Região Oceânica,
em conjunto com a ação do capital imobiliário, vistos ao longo deste trabalho, fazem desta
área da cidade, uma reserva de moradia para a classe média (loteamentos “abertos”) e alta
(condomínios). Mesmo ocupantes informais de áreas regulares, vão progressivamente
sendo deslocados, através de vários fatores especulativos e jurídicos. A única alternativa de
moradia na região para as classes de menor poder aquisitivo é a ocupação de áreas públicas,
54
reservas florestais, faixas marginais de proteção de rios e lagoas e saibreiras desativadas.
Estas alternativas se devem ao fato da ausência do poder municipal no que tange a
fiscalização destas áreas. Em contra partida, os moradores formais das áreas do circuito
superior da economia, temem que com o aumento da população de baixa renda nos seus
bairros, poderá haver desvalorização de suas residências.
Tabela 4
Bairro
Pop Pop Pop Pop Pop
Taxa de
Cresc
Taxa de
Cresc
Taxa de
Cresc.
Taxa de
Cresc.
1970 1980 1991 1996 2000
Anual 70-
80 (%)
Anual 80-
91 (%)
Anual 91-
96 (%)
Anual 96-
00 (%)
Praias
Oceânicas
7.374 12.138 33.245 43.727 52.927 5,11 10,60 2,78 1,93
Camboinhas 433 202 926 1.412
2 863
-7,34 16,45 4,31 7,32
Engenho do
Mato 920 1.612 5.921 8.858
12 219
5,77 13,89 4,11 3,27
Jacaré 753 1.372 2.582 3.468
4 154
6,18 6,53 2,99 1,82
Itaipu 2.354 3.754 11.136 14.572
17 330
4,78 11,49 2,73 1,75
Piratininga 1.818 2.916 9.268 11.638
14 297
4,84 12,26 2,30 2,08
Itacoatiara 621 673 995 1.146
1 334
0,81 3,99 1,42 1,53
Cafubá 475 1.609 2.417 2.633
3 593
12,98 4,15 0,86 3,16
População Residente e Taxa Média Anual de Crescimento
1970/80, 80/91, 91/96 e 96/00 - Região Oceânica
Fonte: Censo Demográfico 1970, 1980, 1991 e 2000. (Organizado pelo autor)
Tabela 5
55
Bairro
Pop Pop Pop Pop Pop
Taxa de
Cresc.
Taxa de
Cresc.
Taxa de
Cresc.
Taxa de
Cresc.
1970 1980 1991 1996 2000
Anual 70-
80 (%)
Anual 80-
91 (%)
Anual 91-
96 (%)
Anual 96-
00 (%)
Praias da
Baía
152.982 188.916 194.944 193.829 191.464 2,13 0,31 -0,06 -0,12
Charitas 1.513 3.971 3.854 5.795
6 353
10,13 -0,30 4,16 0,92
Viradouro 4.024 4.662 2.898 3.951
3 516
1,48 -4,64 3,15 -1,16
Icaraí 39.940 61.843 62.494 74.096
75 127
4,47 0,10 1,72 0,14
Morro do
Estado 4.013 8.249 3.533 4.098
3 811
7,47 -8,13 1,49 -0,72
Jurujuba 4.278 3.724 3.507 3.919
2 960
-1,38 -0,60 1,12 -2,77
Pequeno 3.862 3.358 3.283 3.484
3 841
-1,39 -0,23 0,60 0,98
Boa
Viagem 671 1.773 2.014 2.112
2 104
10,201,280,48-0,04
Ingá 9.656 13.669 15.496 16.231
16 592
3,54 1,26 0,46 0,22
São
Francisco 9.177 9.442 9.620 9.641
9 654
0,29 0,19 0,02 0,01
Ponta
d’Areia 6.763 6.760 6.942 6.952
7 162
0,00 0,27 0,01 0,30
Gragoáta 390 530 193 186
220
3,11 -9,61 -0,37 1,69
Centro 22.729 22.528 21.632 20.175
18 487
-0,09 -0,41 -0,69 -0,87
Fátima 2.036 2.744 3.867 3.590
3 767
3,03 3,49 -0,74 0,48
Cachoeiras 3.288 3.031 3.596 3.269
3 149
-0,81 1,72 -0,95 -0,37
São
Domingos 4.820 4.609 5.281 4.746
4 619
-0,45 1,37 -1,06 -0,27
Vital Brasil 3.484 3.769 3.560 2.924
3 064
0,79 -0,57 -1,95 0,47
Santa Rosa 32.338 34.254 43.174 28.660
27 038
0,58 2,34 -4,01 -0,58
População Residente e Taxa Média Anual de Crescimento
70/80, 80/91, 91/96 e 96/00 - Região das Praias da Baía
Fonte: Censo Demográfico 1970, 1980, 1991 e 2000. (Organizado pelo autor)
Tabela 6
56
Bairro
Pop Pop Pop Pop Pop
Taxa de
Cres
Taxa de
Cres
Taxa de
Cres
Taxa de
Cresc.
1970 1980 1991 1996 2000
Anual 70-
80 (%)
Anual 80-
91 (%)
Anual 91-
96 (%)
Anual 96-
00 (%)
Região
Norte
139.061 156.314 159.879 160.374 156.996 1,18 0,23 0,03 -0,21
Viçoso
Jardim 3.946 3.130 3.717 4.727
3 371
-2,29 1,73 2,43 -3,32
Caramujo 8.271 11.717 10.705 13.425
13 186
3,54 -0,90 2,29 -0,18
Santa
Bárbara 2.097 3.617 4.645 5.476
5 891
5,60 2,53 1,66 0,73
Ilha da
Conceição 4.658 5.639 5.990 6.648
6 438
1,93 0,61 1,05 -0,32
Fonseca 44.582 53.376 57.534 57.944
54 984
1,82 0,75 0,07 -0,52
Engenhoca 25.686 24.851 23.261 22.672
22 193
-0,33 -0,66 -0,26 -0,21
Barreto 15.546 17.986 16.782 15.875
15 953
1,47 -0,69 -0,55 0,05
Santana 8.558 9.543 9.506 8.885
8 813
1,10 -0,04 -0,67 -0,08
São Lorenço 13.301 10.489 9.441 8.615
8 209
-2,35 -1,05 -0,91 -0,48
Baldeador 5.582 5.121 4.756 4.211
5 107
-0,86 -0,74 -1,21 1,95
Cubango 5.406 8.735 11.222 9.927
10 643
4,92 2,54 -1,22 0,70
Tenente
Jardim 1.428 2.110 2.320 1.969
2 208
3,98 0,95 -1,63 1,15
População Residente e Taxa Média Anual de Crescimento
1970/80, 80/91, 91/96 e 96/00 - Região Norte
Fonte: Censo Demográfico 1970, 1980, 1991 e 2000. (Organizado pelo autor)
Tabela 7
57
Bairro
Pop Pop Pop Pop Pop
Taxa de
Cresc.
Taxa de
Cresc.
Taxa de
Cresc.
Taxa de
Cresc.
1970 1980 1991 1996 2000
Anual 70-
80 (%)
Anual 80-
91 (%)
Anual 91-
96 (%)
Anual 96-
00 (%)
Região de
Pendotiba
22.274 36.240 43.447 47.682 49.620 4,99 1,83 0,93 0,40
Badu 2.764 3.490 4.290 5.419
5 289
2,36 2,09 2,36 -0,24
Cantagalo 1.363 3.856 6.540 8.035
7 829
10,96 5,43 2,08 -0,26
Largo da
Batalha 5.735 7.067 8.689 9.823
9 043
2,11 2,09 1,23 -0,82
Vila
Progresso 1.855 2.558 2.160 2.391
2 942
3,27 -1,68 1,02 2,10
Matapaca 1.041 613 508 558
834
-5,16 -1,86 0,94 4,10
Maria Paula 1.934 2.591 4.251 4.614
6 049
2,97 5,08 0,82 2,74
Sapê 1.640 4.421 4.201 4.524
4 861
10,43 -0,51 0,74 0,72
Ititioca 3.125 8.381 7.847 7.778
7 642
10,37 -0,66 -0,09 -0,18
Maceió 969 2.551 4.093 3.753
4 142
10,16 4,84 -0,86 0,99
Muriqui 1.848 712 868 787
989
-9,10 2,00 -0,97 2,31
População Residente e Taxa Média Anual de Crescimento
70/80, 80/91, 91/96 e 96/00 - Região de Pendotiba
Fonte: Censo Demográfico 1970, 1980, 1991 e 2000. (Organizado pelo autor)
Tabela 8
Bairro
Pop Pop Pop Pop Pop
Taxa de
Cresc.
Taxa de
Cresc.
Taxa de
Cresc.
Taxa de
Cresc.
1970 1980 1991 1996 2000
Anual 70-
80 (%)
Anual 80-
91 (%)
Anual 91-
96 (%)
Anual 96-
00 (%)
Região
Leste
2.554 3.515 4.640 4.752 5.581 3,25 2,82 0,24 1,62
Várzeas
das
Moças 823 1.326 1.469 1.652
2 002
4,89 1,03 1,18 1,94
Rio do
Ouro 1.731 2.189 3.171 3.100
3 579
2,38 3,78 -0,23 1,45
População Residente e Taxa Média Anual de Crescimento
1970/80, 80/91, 91/96 e 96/00 - Região Leste
Fonte: Censo Demográfico 1970, 1980, 1991 e 2000. (Organizado pelo autor)
58
CAPÍTULO 4. A EMERGÊNCIA DOS CONDOMÍNIOS FECHADOS DA REGIÃO
OCEÂNICA COMO EXPRESSÃO DA FRAGMENTAÇÃO ESPACIAL
4.1. Primeiros Contatos com o Tema
Como foi discutido no capítulo 3, a “criação” da Região Oceânica de Niterói, já no
começo da década de 1940, começa a tomar novas funções com a viabilização dos
promotores imobiliários estudados no capítulo 2 deste trabalho.
Porém, tal transformação do espaço acontece de fato com a construção da ponte
Rio-Niterói no começo da década de 1970. A melhoria das vias de acesso, aquecem o
mercado imobiliário no município determinando as diretrizes de ocupação em direção às
áreas periféricas. Os investimentos que são feitos, tanto do setor público, quanto do
privado, valorizam esta região da cidade atraindo um contingente populacional que se
desloca do núcleo central de Niterói, como também de outros municípios, em direção às
zonas de expansão natural da urbe em busca de amenidades, das grandes áreas livres e
verdes ainda existentes.
Essas mudanças ocorridas na Região Oceânica seguem uma tendência intra-
metropolitana de alteração no padrão habitacional de determinadas áreas na periferia da
Região Metropolitana do Rio de Janeiro. Empreendimentos voltados exclusivamente para
os segmentos sociais médios e altos, na forma de condomínios horizontais, em áreas onde o
baixo valor da terra viabilizava a compra do imóvel.
De acordo com Fonseca (1996), a carência de serviços de abastecimento de água e
saneamento básico, bem como de outros equipamentos de uso coletivo poderia ser um
obstáculo para a efetiva ocupação e expansão da região. O capital imobiliário realizou a
partir de seus empreendimentos, uma mudança do patamar de preços pelo uso do solo, ao
introduzir inovações no espaço construído, atraindo famílias de mais alto poder aquisitivo.
O processo de valorização se dá a partir dos investimentos públicos na melhoria dos
acessos e no conseqüente deslocamento dos investimentos privados para a localidade.
59
Através do embasamento teórico, podemos elaborar uma associação entre a
migração dos investimentos e o processo de valorização imobiliária a partir da análise da
dinâmica do capital na estrutura interna das cidades. Reconhecemos assim a atuação do
capital imobiliário na transformação e configuração sócio-espacial do ambiente construído
na Região Oceânica.
4.2. O Capital Imobiliário como Ator de Transformação das Cidades
A dinâmica imobiliária tem como um dos seus elementos definidores a capacidade
dos capitais introduzirem inovações diferenciadoras capazes de deslocar a demanda. A
produção da moradia, segundo Fonseca (1996), está subordinada à estratégia dos capitais
incorporadores em modificar o uso do solo urbano. Os investimentos imobiliários, através
das inovações na ocupação e uso do solo, alteraram o perfil do ambiente construído das
regiões periféricas dos municípios ao deslocarem uma população de maior poder aquisitivo
para essas áreas.
A estratégia de atuação dos capitais do setor imobiliário é atribuída à busca da
antecipação de rendas fundiárias, orientando a decisão por investimentos para as
localidades urbanas onde possa auferir ganhos futuros. Porém, para que isso seja viável, é
preciso alterar os padrões de ocupação das áreas onde se decidiu investir, modificando
assim as características da localidade, alterando a sua posição relativa na estrutura urbana e
consequentemente as rendas fundiárias.
O simbolismo imobiliário introduz no produto habitacional modificações capazes de
deslocar a demanda para a nova área de atuação. Com isso, recorrem a artifícios, como a
reprodução do caráter sócio-segregativo do espaço urbano, induzindo as famílias a se
deslocarem espacialmente para recuperarem os atributos diferenciadores sócio-espaciais de
seus locais de origem. Para que isso ocorra, devem direcionar a demanda potencial para
uma “nova área” onde os fatores físicos, sociais, simbólicos, dentre outros, reponham as
características supostamente originais de seu antigo local de residência.
60
A estratégia dos promotores imobiliários de concentrar investimentos em
determinadas áreas da cidade é uma característica de atuação para atrair demanda solvável
para seus empreendimentos. Para tanto, devem introduzir inovações capazes de seduzir esta
população-alvo.
De acordo com Abramo (1988), o movimento dos capitais no espaço é diretamente
proporcional ao deslocamento da demanda. A classe de maior poder aquisitivo vai sendo
deslocada, atraída pelas inovações em certas áreas, enquanto os outros segmentos da
demanda são deslocados pela difusão espacial da inovação passada. O capital imobiliário, a
partir da sua ação transformadora do espaço, muda a estrutura interna das cidades,
introduzindo inovações, ou difundindo inovações passadas.
Ainda assim, os adquirentes destes imóveis urbanos, transformam-se em
investidores a partir da aquisição de moradias que efetivamente se valorizam nesta nova
organização urbana. A valorização esperada pode possibilitar ao adquirente deslocar-se na
estrutura sócio-espacial da cidade. A ação dos capitais imobiliários sobre a estrutura urbana
produz expectativas de valorização nos ativos imobiliários, o que atrai e desloca as famílias
no interior da cidade.
Ao investirem em uma localidade, Abramo (1988) afirma que os capitais
imobiliários projetam para a área um novo padrão de ocupação no futuro, e definem o uso
dos lotes de terreno segundo este padrão de ocupação “virtual”. Os capitais, ao ofertarem as
moradias nessas áreas, procuram antecipar os ganhos fundiários quando esta alcançar seu
novo padrão de ocupação. Fonseca (1996) mostra que:
A antecipação de rendas fundiárias é um cálculo que o
detentor de um título de propriedade realiza prevendo a
valorização futura de seu terreno. Como a alienação (venda)
dos direitos sobre o terreno permitirá ao novo proprietário
realizar esse ganho previsto, o proprietário que está se
desfazendo de seu terreno procurará antecipar a renda
esperada na forma de renda fundiária virtual. A possibilidade
de apropriação dessa renda virtual se faz em função da
capacidade de previsão do uso de seu terreno no ambiente
construído futuro (FONSECA, 1996).
61
Porém, à medida que os capitais atuam na área alterando o uso do solo local, o
estoque residencial aproxima-se do padrão estimado (virtual) de ocupação. Com isso, a
diferença entre a renda fundiária real, apropriada pelo proprietário do lote do terreno, e a
renda fundiária virtual, apropriada pelos incorporadores, tende a diminuir, comprimindo o
ganho dos capitais incorporadores. Quando o estoque real alcançar o virtual, os capitais não
realizarão mais os ganhos fundiários excepcionais e se deslocarão para outras áreas da
cidade a fim de recomeçar o mesmo processo.
Com isso, os movimentos de deslocamento dos capitais sendo recorrentes ao longo
do tempo, fazem com que a ocupação das áreas também se alterem. Isto define um
“percurso de existência” das localidades urbanas no tempo, ou um “ciclo de vida” das
áreas, onde os padrões de ocupação são as fases da espacialidade urbana a partir de seu
estoque residencial.
O movimento de valorização dos capitais no espaço, neste caso, acontece pela
dinâmica imobiliária, onde as decisões passadas ensejam flutuações temporais. A expressão
nas estruturas urbanas dessas flutuações é o contínuo processo de transformação das
características dos estoques residenciais em cada localidade, o que Abramo (1988) chama
de ciclo de vida.
Existe uma tendência de homogeneização do estoque residencial construído à
medida que os capitais se deslocam ao longo da malha urbana. Entretanto, contrapondo-se a
esta tendência, há o artifício da inovação do produto que reintroduz a diferenciação na
estrutura urbana, distinguindo os novos imóveis do estoque residencial existente. Assim, o
processo de valorização imobiliária produz um movimento contraditório de diferenciação e
homogeneização da estrutura urbana. O primeiro, definido pela estratégia dos capitais de
introduzirem de forma recorrente as inovações, e o segundo, através da difusão destas
inovações no tecido urbano.
Nota-se ainda que existe uma forte correlação entre a participação da produção
empresarial no total dos domicílios da área a ser promovida com os percentuais de
62
domicílios com renda maior que 10 salários mínimos. Cardoso (2000) faz uma análise
durante as décadas de 1980 e 1990 na Região Metropolitana do Rio de Janeiro (RMRJ),
mostrando que quanto maior for a presença de população de renda alta ou média-alta na
população total da Região Administrativa analisada dentro da RMRJ, maior será a
importância da produção empresarial no conjunto do crescimento domiciliar da RA.
Segundo o autor:
A produção empresarial tende, assim, não apenas a trabalhar
com as faixas de maior poder aquisitivo, como também a
privilegiar as áreas que apresentem uma maior concentração
dessa população em relação aos setores mais pobres. Desta
forma, a produção empresarial reproduz e aprofunda os
processos de segregação social no espaço (CARDOSO,
2000).
Com isso, verifica-se que a Região Oceânica de Niterói foi selecionada dentre
algumas áreas deste agente modelador no cenário urbano, para ser um espaço de
incorporação imobiliária. Espaço esse que privilegiou as camadas de maior renda da
população, tendo como conseqüência o surgimento do processo de fragmentação do tecido
sócio-espacial desta área da cidade. A seguir, continuamos a reflexão sobre este assunto de
tão grande importância para este estudo.
4.3. O Surgimento das Práticas Espaciais do Capital Incorporador na Região
Oceânica
Nos primeiros anos da década de 1940, quando Niterói assume de fato a Região
Oceânica – antes pertencente a São Gonçalo -, está área de estudo foi adquirida para a
incorporação pela “Companhia Territorial Itaipu”. Santiago (2000) mostra que esta
companhia iniciou suas atividades em 23.02.1943 e tinha como objetivo social principal o
fracionamento e a comercialização de tal área. Foi ela que entrou na Prefeitura Municipal
de Niterói com o projeto de loteamento denominado “Bairro Atlântico”, componente da
planta “Cidade Balneária de Itaipu”.
63
Neste período foram criadas uma série de empresas, tendo como objetivo o
fracionamento de terras periféricas à cidade do Rio de Janeiro. O sistema de produção da
mercadoria imobiliária destas companhias baseava-se na propriedade do solo. Normalmente
eram empresas familiares, criadas a partir da propriedade de uma grande extensão de terras,
que se propunham a extrair renda deste solo.
Este sistema de promoção imobiliária não obteve grande sucesso, como mostra
Santiago:
Esse sistema dependia para sua realização de uma demanda
solvente para os lotes produzidos, o que dificultado pelos
seguintes fatos: não haver naquele momento sistemas de
crédito que ampliassem tal demanda, e a impossibilidade de
uso imediato desses terrenos pelos compradores. Como tais
empresas normalmente não dispunham de grandes
quantidades de capital para prover de infra-estrutura básica
suas terras e o Estado não encontrava-se em condições de
fazê-lo, os lotes eram adquiridos visando um uso ou uma
troca futura, ou no máximo para serem utilizados como base
para residências de veraneio. Com o passar do tempo e a
venda contínua dos terrenos, a provisão de infra-estrutura
dos loteamentos era conseguida pelos compradores dos lotes
através de pressões que exerciam sobre o Estado, o que
permitia uma ocupação permanente da área (SANTIAGO,
2000).
O loteamento “Bairro Atlântico” acima citado e que ocupava três áreas
denominadas de: “Fazenda Itaipu”, “Fonte” e Engenhoca”, foi implantado dentro destes
moldes. Tanto o projeto como as obras executadas, seguiram os padrões dos demais
empreendimentos realizados naquela década, nesta região.
O que houve de específico e que diferencia o processo de ocupação de Itaipu das
demais áreas loteadas naquela década é explicado então pelo fato da “Companhia
Territorial Itaipu”, de acordo com Santiago (2000), não ter conseguido manter uma
continuidade nas vendas de seus lotes. Este autor afirma que a razão da inoperância desta
empresa se dá pelo fato de na época a companhia não dispor de normais condições legais e
financeiras.
64
Em 1973, a “Veplan Residência Cia. De Desenvolvimento de Turismo e Territorial
Itaipu”, subsidiária do Grupo Veplan-Residência - onde segundo Salandía (2001) era na
época uma das maiores empresas imobiliárias do país - adquiriu, através do controle
acionário a “Itaipu Companhia de Desenvolvimento Territorial”, uma área de
aproximadamente 800 hectares na bacia da Lagoa de Itaipu. Em decorrência procedeu ao
remembramento de quatro fazendas adquiridas em 1943 pela Companhia com a finalidade
de implantar o projeto inicial de lotear esta área da cidade. Como resultado, entre 1976 e
1979, foi aprovado e licenciado o “Plano Estrutural de Itaipu”, compreendendo parte do
loteamento “Cidade Balneária de Itaipu”, de 1945 da então extinta “Itaipu Companhia de
Desenvolvimento Territorial”.
Em 1979, o estatuto da Veplan-Residência é modificado em função da
reestruturação deste grupo, onde seu objetivo social passou a ser: a indústria imobiliária;
compra e venda de imóveis, a aquisição e a alienação de direitos a eles relativos; a
incorporação imobiliária; a realização de loteamentos; e a participação em
empreendimentos comerciais ou industriais em geral, bem como naqueles ligados
diretamente ou indiretamente às atividades constantes de seu objeto social (Santiago, 2000).
Com isso, esta empresa se apresentava como uma incorporadora imobiliária,
proprietária de uma grande extensão de terras, que mantinha um elo de atividades como a
construção civil, o crédito imobiliário e o financiamento imobiliário. Este fato fez com que
a promoção dos empreendimentos em Itaipu fossem facilitados, pois quase todas as
atividades necessárias à sua urbanização eram cumpridas por um único agente econômico,
o Grupo Veplan-Residência, eliminando-se, assim, as possíveis contradições entre o
proprietário da terra, o agente incorporador, a indústria da construção civil o agente
financeiro, etc.
Os prospectos promocionais distribuídos por este incorporador na época, segundo
Salandía (2002), mostravam como o empreendimento representava um novo estilo de vida.
Vogel e Santos (Apud: SALANDÍA, 2002), abordam o caso dos condomínios fechados
como “cidade feita sob encomenda” e consideraram esta modalidade de empreendimento
65
como “lugar comum mais recende do marketing habitacional da modernidade, apregoada
como concepção de vida”, espécie de passaporte para uma cidade ideal onde quem compra
sabe que “há um lugar para cada coisa e que cada coisa está em seu lugar”.
É pertinente salientar que o processo de expansão urbana de Niterói apresenta
grandes semelhanças ao experimentado pela cidade do Rio de Janeiro. Abreu (1997) afirma
que as classes média e alta foram progressivamente sendo direcionadas para habitar a orla,
induzidas pelos agentes modeladores, especialmente o incorporador imobiliário. Também
foram atraídas pelas vantagens locacionais e pelo preço da terra, apesar da sabida carência
de infra-estrutura, onde era implantada na medida em que as áreas de expansão se
adensavam.
No caso da Região Oceânica de Niterói, apenas os condomínios aprovados a partir
da década de 1970 foram dotados de serviços tais como água potável, coleta de esgoto,
pavimentação e áreas de lazer, resultando num padrão elevado de habitação, condicionado
pela legislação municipal, e pelo próprio mercado, pois destinaram-se às faixas com um
poder aquisitivo mais alto. Data deste período o Condomínio Jardim Ubá (1970), pioneiro
entre os condomínios horizontais voltados para a população de alta renda (ver Fotografia
Aérea 1).
A década de 1970 foi singular e complexa para a cidade de Niterói. Nesta época
houve um redirecionamento dos investimentos públicos na cidade, objetivando logicamente
a expansão urbana regional e local, exigindo a adequação e ampliação da infra-estrutura
básica existente, visando o crescimento do mercado imobiliário. A Ponte Rio - Niterói
intensifica a produção imobiliária nas áreas centrais e bairros litorâneos consolidados da
Zona Sul (Icaraí e Santa Rosa), além de redirecionar a ocupação para áreas expansivas da
cidade, como a Região Oceânica e Pendotiba, já mencionados anteriormente. Neste mesmo
período, a cidade sofreu outro impacto em sua estrutura econômica. A Lei Complementar
Federal nº 20 de 1º de julho de 1974, efetivaria a fusão dos estados da Guanabara e Rio de
Janeiro, retirando de Niterói a condição de capital. A implantação do novo Estado do Rio
de Janeiro ocorreu em 1975.
66
Esta mudança de status político, de capital do Estado do Rio de Janeiro para um
município dentro deste novo Estado, implicou para Niterói em uma reestruturação interna
em nível administrativo. Essa reestruturação foi demorada e o agente incorporador
beneficiou-se dessas mudanças para aprovar seu Plano Estrutural para Itaipu. Os fixos que
o bairro de Piratininga recebeu da prefeitura nesta época, deixou o município sem recursos,
sendo assim, a prefeitura recebeu de forma positiva a intenção da empresa privada em
urbanizar aquela área de expansão em sua cidade.
Niterói, por conta da mudança político-administrativa, apresentava vantagens frente
aos agentes imobiliários que se ocupavam com outras áreas de expansão dentro da Região
Metropolitana do Rio de Janeiro, a começar pela ausência de um Plano Diretor. Novas leis
estavam ainda por serem criadas para dar legitimidade ao poder municipal na organização
urbana. Com isso não haviam restrições legais para a ocupação da Região Oceânica, como
indicações de usos do solo, gabaritos, etc.
Santiago (2000) mostra que a Veplan-Residência encontrou um quadro perfeito para
agir de uma forma bastante singular. Foi ela quem criou o “Plano Estrutural de Itaipu”, e as
restrições para seu empreendimento. A prefeitura, órgão a quem habitualmente competiria à
execução deste plano, apenas deu seu aval aos interesses do capital privado. Ao aprovar o
“Plano Estrutural de Itaipu”, a prefeitura o colocou sob a forma de lei, e fazendo assim,
assumiu o papel de fiscalizador e de agente que iria garantir que tudo passasse de acordo
com os interesses da empresa.
Interessava ao grupo a aprovação do plano como um todo. No entanto,
aproveitando-se da situação institucional dos diversos aparelhos do Estado, iniciou
estrategicamente, aprovações setoriais, conseguindo a aprovação para abertura do canal que
liga a lagoa ao mar, a aprovação para a drenagem e regularização da orla da lagoa,
oferecendo-se ao Instituto do Patrimônio Histórico Artístico Nacional (IPHAN) para fazer
o levantamento dos sítios arqueológicos contidos em sua propriedade, etc.
Como já foi discutido, se as terras de Itaipu, Camboinhas e Piratininga estivessem
nas mãos de diversos proprietários ao invés de pertencer a um grande grupo econômico, a
67
união desses proprietários, necessária à que se chegasse a um entendimento com o Estado
para aprovação do plano global, seria quase impossível, dentro do quadro político em que o
município se encontrava. Ser a Veplan-Residência, o único promotor de um
empreendimento daquele porte, fez com que as relações com os contraditórios aparelhos do
Estado fossem facilitadas, permitindo assim, a viabilização do projeto.
Só que não podemos deixar de mostrar que um outro ator da modelagem espacial
realizou também suas transformações nesta região de Niterói. O Estado, visto como agente
modelador do espaço urbano no capítulo 2, interferiu sob duas formas: enquanto agente
promotor do sistema financeiro que viabilizou tal tipo de empreendimento e enquanto
agente interventor e regulador do ambiente construído.
O processo de ocupação das praias oceânicas evidencia uma forte ação especulativa,
possibilitada, entre outros fatores, pelo interesse das empresas imobiliárias, que nessa
ocasião, puderam lançar mão de mecanismos de financiamento para a casa própria
oferecidos pelo extinto Banco Nacional de Habitação (BNH), atraindo assim os
compradores. Outro fator a ser levado em conta foi o interesse da própria administração
municipal em expandir a cidade para essa direção, fixando instrumentos de legislação que,
pelo menos, passaram a prever alguns controles, como a exigência de instalação de
tratamento de esgoto individual. Como conseqüência desse processo de ocupação, foi nessa
região onde verificaram-se os maiores impactos na ocupação do solo e as mais altas taxas
de crescimento demográfico do município, como vistos no capítulo 3.
O que temos que salientar é que foi a Veplan-Residência, a maior responsável em
produzir, quase que integralmente, um empreendimento imobiliário com esse nível escalar.
Uma área com aproximadamente 7.000.000 m2, destinada a abrigar uma população
numerosa, que se desloca através dos novos limites residências da Região Metropolitana do
Rio de Janeiro, é no mínimo incomum na história urbana brasileira.
O fato deste projeto de atração habitacional estar localizado em uma região de
características fisiográficas privilegiadas, de beirar uma enseada de águas tranqüilas e
68
limpas, de apresentar uma laguna em seu interior, um relevo e uma vegetação também
atraentes, não confere tanta especificidade à área utilizada para o empreendimento. Existem
outras regiões tão belas quanto esta, encontradas em nosso vasto litoral, e também próximas
á área em estudo.
Ao que tudo indica, o que existia de singularidade na Região Oceânica de Niterói, é
ter sua localização bastante próxima a um grande centro urbano como o Rio de Janeiro, e
que ainda permanecia praticamente intocado pelo uso urbano até a década de 1970. Porém,
esta forma de reestruturação do espaço, não se afirmaria caso não existisse uma aglutinação
de forças econômicas. Nesta fase, ocorre um processo de centralização do capital
imobiliário e de sua articulação com o capital financeiro. Com isso se formava
conglomerados econômicos dentro deste setor econômico, para viabilizar projetos com esta
escala territorial. Então, não era somente o capital público o agente financiador. Sobre essas
fusões financeiras, Santiago nos elucida que:
Procurando os subsetores mais lucrativos, estes grupos
atuavam basicamente produzindo habitações para as camadas
de renda mais alta da população que demandavam terrenos
nas áreas mais privilegiadas do espaço urbano. As que já se
encontravam consolidadas como Ipanema, Leblon e Lagoa,
apresentavam problemas ao capital incorporador que
dificultavam a sua atuação. Eram problemas relativos ao
preço do solo e à própria disponibilidade de lotes vazios que
era pequena, o que obrigava ao agente promotor, além de
comprar o terreno, adquirir também o imóvel sobre ele já
construído e ainda não totalmente deteriorado, para através
de sua demolição liberar o terreno para seu novo
empreendimento. Somente a grande empresa do setor
dispunha de capital de giro que possibilitasse o pré-
financiamento deste solo. Este obstáculo fundiário, tirava a
possibilidade das pequenas e médias empresas entrarem no
mercado dito “nobre” das cidades (SANTIAGO, 2000).
Essa forma de ação no território, não tem a necessidade de ser defendida, pois o
território pode ser usado tanto para conter e restringir as classes, como também para excluí-
las. Desse modo não se trata de uma territorialidade formal, e sim, definida pelo poder
econômico, onde no nosso estudo, temos como materialização desta ação o grupo Veplan-
69
Residência. A lógica da atuação das empresas na produção do espaço urbano não é apenas
espacial, mas também territorial, permitindo assim que sua escala de atuação incida em
determinados espaços, excluindo, inibindo ou deslocando outros agentes imobiliários, de
modo a consolidar sua área de influência e de controle.
Vale salientar ainda a continuidade deste processo ao longo da década de 1980.
Cardoso (2000) mostra que a oferta de terras e a oferta de crédito condicionam e
direcionam o mercado. A crise no Sistema Financeiro de Habitação na primeira metade
desta década gerou a concentração em segmentos de mais alta renda, com maior capacidade
de poupança, que passam a se configurar como demanda solvável para o setor. A expansão
se dá nas áreas onde a oferta de terras urbanizadas se alia a uma legislação suficientemente
permissiva para viabilizar economicamente os empreendimentos (CARDOSO, 2000). É
através desse pano de fundo, que a incorporação na Região Oceânica de Niterói se faz
presente, com a forma da promoção dos condomínios residenciais unifamiliares exclusivos.
Assim, são essas empresas originárias de associações de grupos financeiros, bancos
privados e antigas empresas de engenharia e construção, como é o caso do Grupo Veplan-
Residência, que vão produzir as novas áreas nobres para habitação das cidades em nossa
região. São elas, auxiliadas pelo Estado, agora enquanto agente provedor de infra-estrutura,
que vão criar novas terras para uso urbano, vencendo assim o obstáculo encontrado nas
áreas já ocupadas.
Um exemplo na cidade do Rio de Janeiro foi a ‘criação’ da Barra da Tijuca, tendo
atuação dos grandes grupos econômicos voltados para as atividades imobiliárias. Neste
bairro carioca, com condições de pré-financiar terrenos de maior escala que no centro
urbano consolidado, encontravam condições para produzir seus empreendimentos
integrados, que se diferenciavam substancialmente dos empreendimentos isolados que
encontramos nos demais bairros da cidade, por sua escala, seu padrão de construção e os
serviços e infra-estruturas oferecidos em conjunto com os imóveis.
70
A “Comunidade Planejada de Itaipu”, um empreendimento integrante, só poderia ter
sido promovido por uma subsidiária de um grande grupo econômico que caminhava para
tal processo de conglomeração. Além disso, só poderia ter sido implementado naquele
momento devido ao fato deste grupo comportar-se pioneiramente dentro do setor tanto no
que diz respeito à sua estruturação interna como a nível dos produtos que lançava no
mercado.
4.4. Os Condomínios Fechados como Resultado da Reestruturação Sócio-Espacial
Como vimos ao longo deste trabalho, os condomínios passaram a fazer parte do
cenário das grandes e médias cidades capitalistas brasileiras a partir da década de 1970.
Neste momento começaram a surgir no Rio de Janeiro e em outras cidades os “condomínios
fechados” ou “condomínios exclusivos”. Genericamente, entende-se como condomínio, um
conjunto de habitações, constituídas de prédios altos, residenciais e multifamiliares ou um
conjunto de residências unifamiliares, isoladas por muros ou cercas da área imediatamente
em torno, com um sistema de controle e segurança próprio, equipamentos de lazer de uso
coletivo, e toda a responsabilidade quanto à manutenção da infra-estrutura interna a cargo
dos seus moradores.
O “condomínio exclusivo” ou “condomínio fechado” distingue-se do que se
convencionou denominar condomínio de um único edifício de apartamentos. Quando nos
referimos a “condomínios privados”, identificamos um agrupamento horizontal de
moradias, semelhantes pelas suas características próprias: escala do empreendimento,
fechamento ostensivo face ao exterior, desenvolvimento interno de práticas sociais de
gestão e convivência coletiva da comunidade residente e a localização nas áreas periféricas
da cidade, valorizadas pela presença de amenidades físicas e naturais.
É com esse entendimento que começaremos a mostrar a emergência dos
condomínios fechados na Região Oceânica, citando um olhar primeiramente economicista
de Schelling, citado por Souza L. (2003) quando afirma que: "a segregação se produz
quando as pessoas preferem não ter muitos vizinhos que não se pareçam com eles, seja por
71
questões culturais, raciais ou econômicas". A crescente expansão dos condomínios
residenciais e dos loteamentos "fechados" no cenário urbano brasileiro pode, em parte, ser
explicada através desta concepção. É através desse imaginário de exclusão que se inicia o
processo de formação dos condomínios em Niterói.
De acordo com Souza L. (2003), é importante salientar que o termo correntemente
utilizado, condomínio fechado, representa uma redundância, pois do ponto de vista legal,
todo condomínio é, por natureza, uma figura jurídica de Direito privado, regulamentada
pela Lei Federal nº 4.591/64 (que dispõe sobre o condomínio em edificações e das
incorporações), tendo portanto sua espacialidade e seus limites definidos, regulados e
decididos na esfera e no domínio do Direito privado. Em outras palavras, é, por lei, um
espaço de uso restrito e privativo de seus condôminos.
De forma análoga, não existe a figura jurídica do chamado "loteamento fechado",
pois todo parcelamento do solo destinado a implantação de loteamentos é regulamentado
pela Lei Federal nº 6.766/79 (que dispõe sobre o parcelamento do solo urbano, e foi
modificada parcialmente pela Lei Federal 9.785/99), que define e regulamenta as normas
dos loteamentos para fins urbanos, e que são, pela sua natureza jurídica, espaços de uso
público. Ou seja, a acessibilidade ao seu território não pode ser restrita a seus moradores,
apesar dos inúmeros exemplos em contrário existentes em nossas cidades. A prática
corrente do setor imobiliário em denominar uma coisa como sendo outra, além de constituir
um ato jurídico imperfeito, representa uma propaganda enganosa, pois cria uma falsa
sensação de segurança aos seus adquirentes. Hoje na Região Oceânica existem trinta e seis
áreas de auto-segregação, onde cinco delas são loteamentos, e trinta e uma são
condomínios. Os cinco loteamentos são “vendidos” pelo capital imobiliário como sendo
condomínios, porém, através de pesquisa junto a Secretaria de Urbanismo de Niterói,
constatou-se que não o são (ver anexo I e Tabela 9).
A expansão da figura dos condomínios residenciais nas grandes cidades ganhou
forte impulso com o aumento da chamada "violência urbana", que procura esconder,
através de seus altos muros de pedra, uma falsa sensação de segurança. Esse pseudo-refúgio
72
da classe média se difundiu rapidamente e passou a ser vendido pelo marketing imobiliário
como uma forma de "status social". Este novo padrão de segregação residencial é inserido
pela grande ausência, em um dos deveres de ação do Estado, em relação a sua população,
que é a questão da segurança pública.
Esse aumento considerável dos condomínios residenciais nas grandes e médias
cidades como Niterói, provoca não só mudanças na sua configuração espacial, mas também
modifica as relações sociais no interior do espaço urbano. Conforme demonstram estudos
de Caldeira (2000), a implantação desses grandes projetos na malha urbana provoca, não só
impactos de natureza urbanística, como também representa uma transformação no modo de
vida urbano:
Os enclaves fortificados que estão transformando cidades contemporâneas como
São Paulo exemplificam a emergência de um novo padrão de organização das diferenças
sociais no espaço urbano (CALDEIRA, 2000, Apud: SOUZA L. 2003).
A Região Oceânica de Niterói representa um exemplo desse fenômeno. Nesta área,
não só a implantação contínua de condomínios residenciais resultou em enclaves
urbanísticos, como também, a concentração de shopping centers, centros comerciais,
mercados, farmácias, padarias, escolas, etc., contribuem na fragmentação do território e
para o aumento da segregação espacial. Agrava-se esse fenômeno, quando se produz a
fortificação desses espaços e a implantação, em nome da segurança, de uma vigilância
ostensiva nesses assentamentos, que culmina com a privatização de determinados espaços
públicos como ruas e praças, e passamos a observar uma nova faceta da segregação
espacial.
Então esta nova forma de moradia, que seguia uma possibilidade de fuga dos
problemas urbanos, Souza cita que:
A auto-segregação baseada em condomínios, que parece
representar uma busca de autonomia(...), o é em um sentido
que violenta o pensamento autonomista clássico (...): ela não
representa, nem de longe, a liberdade de fazer com os outros,
73
o interesse pela cidade, mas sim a autonomia enquanto
isolamento (escapismo hipócrita: os que têm condições de se
auto-segregar estão articulados de mil maneiras, inclusive
enquanto patrões nos marcos da exploração capitalista, aos
destinos daqueles que eles desejam excluir de seu cotidiano,
banir de sua paisagem (SOUZA, 1996).
Para Maia (1998), a impessoalidade e a individualidade dominam as ações nestes
locais. As ruas das cidades não são vistas como um espaço de sociabilidade ao contrário,
ela é entendida como uma zona de risco, onde todos nós tornamo-nos sujeitos à hostilidade,
à violência. As avenidas são, tão somente, espaços de circulação. Os condomínios são
locais de morar e não de viver, pois isto implicaria numa relação menos impessoal, mais
afetiva com o lugar, coisa que não acontece, já que sequer conhecemos aqueles que,
teoricamente, seriam nossos “iguais” (oriundos de uma mesma classe, partilhando de
valores semelhantes e com as mesmas demandas). O espaço urbano da Região Oceânica
encontra-se assim, visivelmente fragmentado, concentrando “atividades e as pessoas
incluídas / excluídas na nova ordem social e econômica”. Ao lado dos condomínios
organizados segundo esses padrões estudados até então, multiplicam-se as favelas, as
ocupações irregulares. Isto só vem a comprovar que o destino de um lugar não pode, hoje,
ser pensado fora do processo de globalização, que acaba por consolidar “nossa adesão ao
modelo internacional de consumo urbano e suas conseqüências sobre a urbanização das
cidades”.
4.4.1. Caracterização dos condomínios analisados
No que concerne à estrutura interna dos condomínios da Região Oceânica, o
acesso único e controlado, a interrupção da malha viária adjacente, os lotes com áreas entre
500 e 2000m
2
(segundo a Secretaria Municipal de Urbanismo e Controle Urbano de
Niterói) e as vias sinuosas em decorrência da topografia, determinando quadras com
formatos irregulares, decorrência em grande parte da sua localização em encostas, são
alguns dos aspectos comuns destas formas segregativas de moradia na região.
O primeiro condomínio aprovado na região, data de 1972, que é o primogênito
dos “Ubá” apresenta características singulares (ver fotografia aérea 1).
74
Fotografia Aérea 1
Fonte: Ampla Energia e Serviços S.A., 2002.
Projetado pelo arquiteto João Caetano da Silva, possui apenas uma entrada pela
principal avenida de Piratininga, de nome Estrada Francisco da Cruz Nunes. Se distingue
dos demais por uma área verde central e uma outra para a qual são voltados a maioria dos
fundos de lotes interligadas por servidões de pedestres. Os lotes possuem metragens que
variam entre 660 metros quadrados, com 30 metros de profundidade, nas partes planas, e de
até 3.800 m
2
nas encostas. Após este primeiro condomínio, outros “Ubá” foram aprovados,
como: Ubá II (1980), Ubá Terra Nova (1980), Ubá Itaipu (1982), Ubá III (1984), Ubá IV
(1985), Ubá Floresta (1987), Ubá Itacoatiara (1987), Ubá VI (1987), Ubá Piratininga
(1988) e Ubá Camboinhas (1992). Nenhum desses tiveram em seu planejamento a
preocupação com a preservação de uma área verde que serviria para a convivência social
interna do condomínio.
75
Muitos loteamentos criados até o início da década de 1990, sendo auxiliados pela
ausência de leis municipais de ordenamento do solo, mesmo já existindo a Lei Federal nº
4.591/64 citada acima, se autoinstituiram condomínios. De acordo com a tabela 4.1,
podemos analisar todos os condomínios da Região Oceânica, e os que são loteamentos,
porém o capital imobiliário os trate como condomínios exclusivos.
Tabela 9
Nome Bairro Nome Bairro
Aldeia de Itaipu* Itaipu Ocean House Camboinhas
Bosque de Bourbon Itaipu Portomare Camboinhas
Bosque de Itaipu Itaipu Quartier Camboinhas Camboinhas
Bromélias de Camboinhas Camboinhas Residencial Camboatá Piratininga
Colina Azul Itaipu Solar da Serra Itaipu
Green Park* Itaipu Ubá Recanto Itaipu
Grotão* Itaipu Ubá Piratininga Piratininga
Ilhas do Sol Itacoatiara Ubá Terra Nova Itaipu
Jardim Camboatá* Camboinhas Ubá VI Itaipu
Jardim de Camboinhas Camboinhas Vale de Itaipu Itaipu
Jardim dos Ipês Itaipu Varandas de Camboinhas Camboinhas
Jardim Itacoatiara Itacoatiara Ubá Camboinhas Camboinhas
Jardim Ubá I Piratininga Ubá Floresta Engenho do Mato
Jardim Uba II* Itaipu Ubá III Piratininga
Lírios do Campo II Camboinhas Ubá Itacoatiara Itacoatiara
Mansões de Camboinhas Camboinhas Ubá IV Itaipu
Miraflores Itaipu Village Itaipu Itaipu
Ocean Hill Itaipu Village Itacoatiara Itacoatiara
Condomínios da Região Oceânica de Niterói
Fontes: Secretaria Municipal de Urbanismo e Controle Urbano de Niterói e Patrimóvel Consultoria
Imobiliária S.A. (Org. pelo autor em julho de 2006).
* Loteamentos que são tratados como condomínios fechados pelo capital imobiliário.
A Lei 1157 / 92 aprovada pela Câmara Municipal em 29/12/1992, cria o Plano
Diretor de Niterói, definindo o parcelamento na modalidade de condomínio, ficando assim
os possíveis e futuros loteamentos à mercê de continuarem, pelo menos de forma legal, se
transformando em condomínios fechados.
Como vimos que a maior parte da região foi loteada antes de 1960, os condomínios
que iniciaram seus empreendimentos somente uma década depois, acabaram por ocupar as
áreas remanescentes próximas das encostas, avançando sobre áreas de mata. De acordo com
76
Salandía (2001), alguns atores avaliam que esta localização tem evitado a favelização das
encostas, e até mesmo os órgãos ambientais municipais defendem a aprovação de
condomínios nos limites das áreas de interesse ambiental, resguardando reservas nas partes
mais altas, criando assim um cordão de ocupação. Como o incorporador tem o foco de seu
empreendimento no público solvável, e além da legislação ter se tornado mais rigorosa, os
condomínios possuem alguma infra-estrutura própria como água, drenagem e
pavimentação. Todos estes condomínios criaram convenções internas visando manter uma
unidade tipológica, como: casas em centro de terreno, proibição de muros, limite de dois
pavimentos, etc.
77
CAPÍTULO 5. Considerações Finais
O tema central desta dissertação, em torno da qual converge a maior parte das
análises, é a discussão sobre a fragmentação do tecido sócio-espacial da Região Oceânica
de Niterói. Foi através deste escopo que embrenhamos nossos estudos, para com isso tentar
responder às questões que estavam sendo levantadas.
Fez-se notar que os agentes modeladores do espaço urbano, principalmente o
Incorporador Imobiliário e o Estado, foram os grandes atores de “criação” da Região
Oceânica de Niterói, uma vez que a situação política do município recém desfigurado como
capital de estado fez com que o capital imobiliário agisse com maior poder de manobra.
O grupo Veplan-Residência foi sem dúvida o grande agente incorporador desta
cidade. A transformação do espaço da Região Oceânica, de mera área rural de um
município, em uma região de grande atração habitacional exclusiva, foi sem dúvida uma
causa para percebemos a fragmentação espacial que ocorreu nesta reestruturação urbana.
Este processo foi sem dúvida mais racional, se comparado ao restante dos bairros do
mesmo município. Foi um projeto de grande escala, com a inovação do capital privado
sendo o grande ator de transformação do incremento urbano, e não o Estado, como
predomina nas cidades brasileiras.
Esta forma de ocupação do espaço com ação segregativa foi consolidada pelos
novos moradores, na medida que os valores sociais e modos de vida são inseridos através
das dinâmicas intra-metropolitanas. A exclusividade habitacional está diretamente
relacionada com o modo capitalista de se pensar a cidade, e as mazelas que são geradas por
esse processo fragmentador.
Podemos perceber assim que a fragmentação sócio-espacial vista na Região
Oceânica de Niterói, é um produto de determinadas práticas sociais quanto também exerce
um efeito condicionador sobre as relações sociais, através da auto-segregação em
condomínios fechados, por meio de territorializações que reforçam exclusões.
78
Neste estudo pretendeu-se analisar de forma espacial como os agentes modeladores
transformaram o espaço da cidade em locais para uma população se auto-segregar. Como a
análise territorial foi priorizada, não incluímos um estudo de caso para tratar da questão
levantada. Porém para aprofundar o tema dando um viés mais sociológico, é pertinente que
seja levado em conta tal forma de análise para esses atores sociais na região retratada.
É importante salientar que o objetivo deste estudo não é de concluir esta temática de
análise, ao contrário, pretende-se com isto, elucidar algumas questões e indagar outras que
foram surgindo ao longo da dissertação. Ficam no ar várias perguntas ainda sem respostas,
dentre elas:
Quais os motivos que levam cada vez mais pessoas a optarem por morar em grandes
condomínios residenciais e loteamentos "fechados" e, de uma certa forma,
submeter-se a uma clausura voluntária?
Existem soluções para tentar minorar os impactos urbanísticos desses grandes
empreendimentos? O Estado com uma legislação mais moderna às causas urbanas
seria uma das possíveis soluções?
Podemos destacar que está existindo uma tendência de diminuição do crescimento
populacional na Região Oceânica, sobretudo na última década, de acordo com os
dados do último Censo Demográfico. Como podemos chamar este processo? Será
que está havendo um movimento de retorno da população, que foi para esta região
em busca de melhorar qualidade de vida, e através dos problemas como o caótico
tráfego viário, ou até a supervalorização fundiária, está expulsando seus
descendentes?
Seja como for, o escapismo das elites urbanas, de forma a realizar uma estratégia de
auto-segregação sócio-espacial, pode ser insustentável a longo prazo, ao menos nos moldes
sociais do início deste século. Este processo de segregação em curso nas cidades brasileiras
merece ser repensado sob a ótica da construção de uma sociedade democrática, ancorada
em princípios de justiça social que assegurem o exercício pleno da cidadania dos seus
habitantes.
79
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ii
FUNDAÇÃO INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA
ESCOLA NACIONAL DE CIÊNCIAS ESTATÍSTICAS
DINÂMICA TERRITORIAL NO MUNICÍPIO DE NITERÓI: UM FOCO NA
EMERGÊNCIA DOS CONDOMÍNIOS FECHADOS DA REGIÃO OCEÂNICA.
Dissertação apresentada ao programa de mestrado
em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais, área
de concentração em Demografia, da Escola
Nacional de Ciências Estatísticas como requisito
para obtenção do título de Mestre.
Aluno: Luciano Gagliardi Paez
Orientador: Prof. Dr. Cesar Ajara
Banca examinadora:
Profa. Dra. Neide Lopes Patarra
Prof. Dr. Adauto Lucio Cardoso
RIO DE JANEIRO
DEZEMBRO DE 2006
iii
LUCIANO GAGLIARDI PAEZ
DINÂMICA TERRITORIAL NO MUNICÍPIO DE NITERÓI: UM FOCO NA
EMERGÊNCIA DOS CONDOMÍNIOS FECHADOS DA REGIÃO OCEÂNICA.
Dissertação submetida ao corpo docente do programa de mestrado em Demografia da
Escola Nacional de Ciências Estatísticas como parte dos requisitos necessários à
obtenção do grau de mestre em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais.
Aprovada por:
_________________________________________
Prof. Dr. Cesar Ajara
_________________________________________
Profª. Dra. Neide Lopes Patarra
_________________________________________
Prof. Dr. Adauto Lucio Cardoso
Rio de janeiro, _______ / _______ / ________
iv
Ao meu avô Dante Gagliardi,
pelos grandes ensinamentos e anos
dedicados a minha formação.
v
AGRADECIMENTOS
Em primeiro lugar, agradeço a Deus, por ter me acompanhado durante esses
anos de vida, onde pude sentir como é importante existir um direcionador na nossa
caminhada.
Minha sincera gratidão ao grande professor e orientador desta dissertação, Cesar
Ajara, que ao longo deste percurso mostrou-se não somente um pesquisador, mas sim
um companheiro e amigo para as horas mais atribuladas desta jornada.
À ilustríssima Neide Lopes Patarra, onde seu olhar crítico e até subjetivo sobre a
minha formação na ENCE, foram fundamentais para o desenvolvimento deste trabalho.
Ao professor Adauto Lucio Cardoso, por ser o meu primeiro orientador ao nível
acadêmico, tendo assim uma grandiosidade ímpar na minha formação como
pesquisador.
Aos professores e funcionários da ENCE, que se dedicaram em lidar com
pessoas de diferentes formações, e mesmo assim, souberam estar na mediação do
conhecimento, em especial à Sueli e Marilene.
Aos respeitados funcionários da Secretaria Municipal de Urbanismo e Controle
Urbano de Niterói, por sempre estarem prontos em auferir e produzir informações, que
sem estas não seriam possíveis à conclusão deste trabalho.
À Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE, que me concedeu bolsa de
mestrado, através do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE.
À equipe Metrodata do Observatório das metrópoles do IPPUR / UFRJ,
especialmente aos amigos Juciano, Ricardo, Gisele e Paulo pela confecção de alguns
mapas e tabelas que foram de fundamental importância para a realização desta pesquisa.
Aos amigos do mestrado da turma 2004, meus sinceros agradecimentos por
poder ter aprofundado assuntos tão complexos e diferentes ao longo das disciplinas.
vi
Aos meus amigos que me acompanham na vida particular, pelos grandes
momentos que vivenciamos juntos e por serem de especial importância na minha
formação como pessoa.
À Cristina e ao Leonardo por estarem sempre prontos para me ajudar.
Ao meu pai, que mesmo distante, sempre se preocupou com assuntos ligados à
família.
À minha mãe por ter sido minha referência como pessoa e ter sempre me
passado valores como respeito, curiosidade, determinação, humildade e ética, como
fundamentais para a vida em sociedade.
À Marcela, por ter tido a paciência e a cumplicidade nas horas que precisei. Pelo
nosso amor, carinho, e por tudo que passamos e sonhamos passar juntos.
vii
RESUMO
O estudo tem por objetivo analisar as dinâmicas de auto-segregação no
município de Niterói, focalizando as estratégias e práticas espaciais dos atores sociais
envolvidos na reorganização recente desse espaço geográfico, em particular, no que
tange à emergência de condomínios fechados na região oceânica desse município,
sobretudo, a partir da década de 1970.
A pesquisa apóia-se na hipótese de que a ocupação da região oceânica de Niterói
encontra-se associada ao molde segregacionista expresso na fragmentação do espaço
urbano dessa cidade.
A análise privilegia a dinâmica territorial nos bairros de Piratininga, Itaipu e
Camboinhas, no período 1970-2000. Para tanto, são construídos indicadores sócio-
econômicos e demográficos com base em dados censitários do IBGE, com vistas ao
resgate do processo de ocupação na região.
Dentre os resultados encontrados, evidencia-se a particularidade do papel dos
incorporadores imobiliários no que concerne ao desenho de estratégias de criação de
novos espaços na região oceânica, orientados pelo perfil da auto-segregação.
Palavras Chaves: segregação sócio-espacial, auto-segregação, territorialidades.
viii
ABSTRACT
The aim of this study is to analyze the dynamic of self-segregation in the city of
Niterói, focusing strategies and spatial practices of the social actors involved in the
recent reorganization of this geographic space, in particular, the increasing of private
condominiums in the oceanic region of this city, over all, from the 1970’s.
The research supports the hypothesis that the occupations of the oceanic region
in Niterói is related to the segregationist model in the fragmentations of the urban space
of this city.
The analysis privileges the territorial dynamic in the areas of Piratininga, Itaipu
and Camboinhas, from 1970 to 2000. For that, socioeconomic and demographic
indicators are built based on data from IBGE, to rescue the process of occupation in the
region.
Amongst the results found in the research, it is evident the particularity of the
role of the real estate agents concerns to the drawing of creational strategies of new
spaces in the oceanic region, guided by the profile self-segregation.
Keys Words: socio-spatial segregation, self-segregation, territorialities.
ix
SUMÁRIO
CAPÍTULO 1. Apresentação.............................................................................................1
1.1. Introdução.......................................................................................................3
CAPÍTULO 2. Pressupostos teóricos e conceituais da segregação sócio-espacial...........6
2.1. Os Agentes Sociais.........................................................................................6
2.1.1. Os Proprietários dos Meios de Produção.....................................................8
2.1.2. Os Proprietários Fundiários.........................................................................8
2.1.3. Os Promotores Imobiliários.......................................................................10
2.1.4. O Estado.....................................................................................................13
2.1.5. Os Grupos Sociais Excluídos.....................................................................14
2.2. A Segregação Sócio-Espacial ......................................................................15
CAPÍTULO 3. Um breve resgate da dinâmica territorial no município de Niterói........30
3.1. A Cidade de Niterói......................................................................................30
3.2. Niterói no Contexto Metropolitano............................................................. 33
3.3 A Região Oceânica........................................................................................41
3.4. Processo de Incremento Urbano da Região Oceânica..................................45
3.5. A formação dos bairros da Região Oceânica................................................48
CAPÍTULO 4. A emergência dos condomínios fechados da Região Oceânica como
expressão da fragmentação espacial................................................................................58
4.1. Primeiros contatos com o tema.....................................................................58
4.2. O capital imobiliário como ator de transformação das cidades....................59
4.3. O surgimento das práticas espaciais do capital incorporador na Região
Oceânica de Niterói ........................................................................................................62
4.4. Os condomínios fechados como resultado da reestruturação sócio-
Espacial............................................................................................................................70
4.4.1.Caracterização dos condomínios analisados...............................................73
CAPÍTULO 5. Considerações Finais..............................................................................77
x
Referências Bibliográficas...............................................................................................79
Anexo I............................................................................................................................84
xi
LISTA DE TABELAS E GRÁFICOS
Tabela 1 – População das freguesias de Niterói em 1840...............................................43
Tabela 2 – População Residente e Taxa de Crescimento Anual 1970/80/91/00 ............46
Tabela 3 – Classificação por bairros segundo padrão construtivo predominante...........52
Tabela 4 – População residente e taxa média anual de crescimento 70/80, 80/91, 91/96 e
96/00 – Região Oceânica.................................................................................................54
Tabela 5 – População residente e taxa média anual de crescimento 70/80, 80/91, 91/96 e
96/00 – Região Praias da Baía.........................................................................................55
Tabela 6 – População residente e taxa média anual de crescimento 70/80, 80/91, 91/96 e
96/00 – Região Norte.......................................................................................................56
Tabela 7 – População residente e taxa média anual de crescimento 70/80, 80/91, 91/96 e
96/00 – Região de Pendotiba...........................................................................................57
Tabela 8 – População residente e taxa média anual de crescimento 70/80, 80/91, 91/96 e
96/00 – Região Leste.......................................................................................................57
Tabela 9 – Condomínios da Região Oceânica de Niterói................................................75
Gráfico 1 – Percentual de Classes de Renda do Responsável pelo domicílio – 2000.....31
Gráfico 2 – Taxa Média Geométrica de Crescimento da População Anual ...................47
LISTA DE FIGURAS, FOTOGRAFIAS E MAPAS
Figura 1 – Regiões de Planejamento de Niterói..............................................................41
Figura 2 – Bairros da Região Oceânica de Niterói..........................................................47
Fotografia Aérea 1 – Condomínio Ubá...........................................................................74
Mapa 1 – Município de Niterói: pessoas responsáveis por domicílio com rendimento
mensal acima de 20 salários mínimos.............................................................................32
Mapa 2 – Município de Niterói: pessoas responsáveis por domicílio com rendimento
mensal até 1 salário mínimo............................................................................................32
Mapa 3 – Região Metropolitana do Rio de Janeiro.........................................................35
Mapa 4- Percentual de pessoas com renda familiar per capita até ½ salário mínimo –
Região Metropolitana do Rio de Janeiro – 2000.............................................................38
xii
Mapa 5 – Percentual de pessoas negras e pardas – Região Metropolitana do Rio de
Janeiro – 2000..................................................................................................................40
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