nossa questão, devemos ir às bases do capitalismo atual para apreender as determinações
concretas do enclausuramento ideológico ao qual já nos referimos. Com esse objetivo, vale a
pena recorrermos a Robert Kurz, cujo diagnóstico da crise mundial do sistema produtor de
mercadorias vai ao encontro de algumas das teses mais importantes de Jameson,
especialmente no diz respeito à conclusão dos processos de modernização e o conseqüente
esgotamento do projeto da modernidade
64
.
O colapso da modernização, a nível global, assinala, segundo Kurz, a chegada do
capitalismo a seus limites históricos e lógicos, ou seja, o sistema produtor de mercadorias já
dominou inteiramente o planeta e, hoje, somente permanece de pé por conta de uma série de
recursos e mecanismos que negam frontalmente a lógica de funcionamento do mercado e sua
suposta capacidade de auto-regulamentação
65
. A crise estrutural da ordem do capital e a
derrocada dos países do leste europeu, sugere Kurz, são momentos diferentes de um mesmo
fenômeno, que deve ser compreendido, em suas mais amplas implicações, como a crise
terminal da sociedade do trabalho
66
. A produção atual, turbinada pela informática, a
microeletrônica, a robótica etc, tomou o lugar do antigo modelo de acumulação, o fordismo,
mas o fez, em resposta a crise iniciada na década de 1970, às custas da dissolução da
substância trabalho. Devemos ressaltar, com Kurz, que a crescente incapacidade do capital de
explorar trabalho humano não assinala, historicamente, o fim daquele processo absolutamente
necessário que Marx chamou de metabolismo do homem com a natureza; a crise da sociedade
do trabalho, que produziu o chamado desemprego estrutural, diz respeito ao processo
fetichista de transformação do trabalho em dinheiro, ou seja, à exploração do trabalho que
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Ver, especialmente, JAMESON, F. O Marxismo realmente existente. In: “ Espaço e Imagem: Teorias
do pós-moderno e outros ensaios. Rio de Janeiro: Editora da UFRJ, 1995.
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Podemos lembrar aqui as ações dos bancos centrais europeus e dos Estados Unidos que, em 2007,
despejaram, em poucas semanas, quase 400 bilhões de dólares no mercado mundial a fim de impedir o colapso
do sistema financeiro internacional. Mais recentemente, o jornal O Globo, do dia 8/09/2008, publicou a
seguinte notícia: “ O governo americano assumiu ontem o controle da Fannie Mae e da Fredie Mac, gigantes do
setor de hipotecas afetados pela crise financeira dos EUA. Ao anunciar um pacote de medidas, o secretário do
Tesouro, Henry Paulson, sinalizou ao mercado que pode injetar até US$ 200 bilhões para evitar a falência das
empresas. Se isso for necessário, será o maior socorro na História do país. ”
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“ Nem o descontentamento latente do terço de pobres na periferia e tampouco a repercussão das
crises e colapsos de outras regiões do globo nos centros ocidentais constituirão a última fase do processo de
crise mundial. Pois a promessa de uma nova prosperidade futura também cobrirá de vergonha as economias
do ocidente, cujas zonas de normalidade já vêm se tornando cada vez mais restritas. A lógica da crise está
avançando da periferia para os centros. Depois dos colapsos do Terceiro Mundo nos anos 80 e do socialismo
real no começo dos anos 90, chegou a hora do próprio ocidente. O princípio da rentabilidade ainda partirá para
uma última corrida deslumbrada antes de percorrer, até o fim, seu caminho duplo de ‘ emancipação negativa ’
e destruição social-ecológica. ” (KURZ, 2004, p. 192)