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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS
PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS -GRADUAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS -GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO SOCIAL
A MODERNIDADE NO SERTÃO: A experiência do I Plano
Diretor de Montes Claros na década de 1970 .
LINDON JONHSON DIAS DA SILVA
MONTES CLAROS
2008
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1
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS
PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS -GRADUAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS -GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO SOCIAL
A MODERNIDADE NO SERTÃO: A experiência do I Plano
Diretor de Montes Claros na década de 1970.
Texto apresentado ao Programa de Pós -
Graduação em Desenvolvimento Social
da Universidade Estadual de Montes
Claros (MG) para obtenção do título de
Mestre em Desenvolvimento Social.
Banca Examinadora:
Prof Dra. Regina Célia Lima Caleiro
(Unimontes) – Orientadora
Prof.ª Dra. Márcia Pereira da Silva
(UNESP)
Prof. Dr. Antônio Dimas Cardoso
(Unimontes)
MONTES CLAROS
2008
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SILVA, Lindon Jonhson Dias da.
A MODERNIDADE NO SERTÃO: A experiência do I Plano Direto r de
Montes Claros na década de 1970.
Lindon Jonhson Dias da Silva – Montes Claros, MG: [s.n.], 2008. 99f.
Orientadora: Dra. Regina Célia Lima Caleiro
Dissertação (Mestrado) Universidade Estadual de Montes Claros/UNIMONTES,
Bibliografia; f.
1. Planejamento. 2. Urbanismo Moderno. 3. História Urbana .
I CALEIRO, Regina Célia Lima. II - Universidade Estadual de Montes Claros.
CDU: ........ (...........)
3
Dedico este trabalho a meu pai,
Aderaldino F. da Silva (in memoriam), a
minha mãe, Tercília Dias da Silva ( in
memoriam), a Ellen Cristina, minha
esposa, que tanto ajudou, e a um amigo
fiel, que já não está mais entre nós.
4
AGRADECIMENTOS
Gostaria de agradecer a minha orientadora, ProfDoutora Regina Célia
Caleiro, pela contribuição inestimável; à Prof Doutora Simone Lessa, pelas
infindáveis correções e sugestões; ao Prof. Doutor Antônio Dimas Cardoso , pela
constante atenção e colaboração; e, finalmente, a todos aqueles que, de uma forma
ou de outra, contribuíram para este trabalho.
5
“... lugar sertão se divulga: é onde os
pastos carecem de fechos; onde um pode
torar dez, quinze léguas, sem t opar com
casa de morador; e onde criminoso vive
seu cristo-jesus, arredado do arrocho de
autoridade. O Urucuia vem dos montões
oestes. Mas, hoje, que na beira dele, tudo
fazendões de fazendas, almargem
de vargens de bom render, as vazantes;
culturas que vão de mata em mata,
madeiras de grossura, até ainda virgens
dessas lá há. O Gerais corre em volta.
Esses gerais são sem tamanho. Enfim,
cada um o que quer aprova, o senhor
sabe: pão ou pães, é questão de
opiniães... O sertão está em toda parte .
Guimarães Rosa
6
SILVA, Lindon Jonhson Dias da. A MODERNIDADE NO SERTÃO: A experiência do
I Plano Diretor de Montes Claros na década de 1970. 2008. Dissertação (Mestrado
em Desenvolvimento Social) – Universidade Estadual de Montes Claros.
RESUMO
Este trabalho apresenta a análise da tentativa de modernizar o espaço urbano do
município de Montes Claros na década de 1970, através do planejamento, mais
especificamente, por intermédio do I Plano Diretor Urbano . Os entraves, as
dificuldades e o relato históric o dessa experiência é o que tentamos abordar, sob a
luz e o espírito da modernidade. A idéia é estudar o fenômeno da modernidade em
sua relação com o urbano, sobretudo a partir dos fatos ocorridos no município de
Montes Claros, na virada da década de 1970. A tentativa de reorientação de seu
sítio urbano, tendo como elemento norteador o I Plano Diretor do município,
possibilitou-nos a escolha de um sistema no qual o fenômeno da modernidade,
associado à questão da urbanidade, não diferiu muito do ocorrido em outros locais,
sem desconsiderarmos, obviamente, as particularidades locais. Montes Claros não
fugiu muito do contexto geral aplicado até mesmo aos gra ndes centros urbanos
ocidentais. O padrão de intervenção ou de tentativa de intervenção na estrutura
urbana do município traz em seu bojo as características e peculiaridades das
intervenções modernizadoras que afetaram não só a s grandes cidades ocidentais,
em sua maioria, como também as cidades de menor porte, a partir do século XIX e,
sobretudo, ao longo do século XX. O objetivo proposto neste trabalho de se
identificarem as características peculiares dess as intervenções na estrutura urbana
da cidade de Montes Claros justifica sua elaboração. Os parâmetros dess a relação
serão estabelecidos a partir dos eleme ntos de congruência do fenômeno da
modernidade, segundo autores como Marshall Berman, Jane Jacobs, José Murilo de
Carvalho e Le Corbusier, Choay, dentre outros.
Palavras-chave: Planejamento urbano, história urbana, planejamento local e
regional.
7
SILVA, Lindon Jonhson Dias da. THE MODERNITY IN THE INTERIOR: The
experience of the I master plan of Montes Claros in the decade of 1970 . 2008.
Dissertation (Master's Degree in Social Development) State University of Montes
Claros.
ABSTRACT
This work presents the analysis of the attempt of modernizing the urban space of the
municipal district of Montes Claros in the decade of 1970, through the planning, more
specifically through the I Urban master plan the fetter, the difficulties and the
historical report of that experience is what we tried to approach, under the light and
the spirit of the modernity. The idea is to study the phenomenon of the modernity in
your relationship with the urban, more particularly starting from the facts happened in
the municipal district of Montes Claros, in the turning of the decade of 1970. The
attempt of reorientação of your urban ranch, tends as element norteador the I master
plan of the municipal district, it made possible us the choice of a comparison system
in which the phenomenon of the modernity, associated to the subject of the urbanity,
didn't differ a lot of the happened at other places, without we disrespect, obviously,
the local particularities. Montes Claros didn't escape a lot from the applied general
context even to the great western urban centers: the intervention pattern or of
intervention attempt in the urban structure of the municipal district brings in your
salience the characteristics and peculiarities of the interventions modernizadoras that
affected not only the great western cities, in your majority, as well as the cities of
smaller load, starting from the century XIX and, above all along the century XX. The
objective proposed in this work of settling down some comparison criteria and of
identifying the peculiar characteristics of these interventions in the urban structure of
the city of Montes Claros they justify your elaboration. The parameters of this
comparison will be established starting from the elements of consistency of the
phenomenon of the modernity, according to authors as Marshall Berman, Jane
Jacobs, José Murilo of Carvalho and he/she Reads Corbusier, Choay, among others.
Key-words: Urban planning, urban history, local and regional planning.
8
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 -
A bela foto é da virada dos anos 40, início da década de 50.
Mostra a Praça Douto r Chaves, homenagem da cidade a seu
filho Antônio Gonçalves Chaves, governador de Minas e de
Santa Catarina, no Império ....................................
26
Figura 2 -
Mapa 9 A expansão urbana de Montes Claros de 1970 a 2000
.......................................................................................................
53
Figura 3 -
Proposta de zoneamento do I Plano Diretor Urbano ................... .
67
Figura 4 -
Proposta de sistema v iário do I Plano Diretor Urbano .................
69
Figura 5 -
As personalidades do ano de 1966 ...............................................
71
Figura 6 -
Documento de assinaturas dos vereadores ..................................
78
Figura 7 -
Mancha urbana de Montes Claros da década de 1970 ................
83
Figura 8 -
Evolução urbana do Município de Montes Claros .........................
85
Gráfico 1 -
Quadro comparativo de crescimento urbano ............. ...................
56
Quadro 1 -
Cidade do Rio de Janeiro Síntese histórica das
transformações espaciais nas áreas central e da Lapa ................
44
9
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ............................................................. ......................................
11
CAPÍTULO 1 ......................................................................................................
UMA VISÂO DO URBANISMO MODERNO ................................................ ......
19
Uma visão panorâmica da dinâmica urbana moderna ...................................... .
19
Os antecedentes locais ...................................................................... ................
26
O século XIX e a construção de novos conceitos urbano s ................................
28
Os primeiros traços do urbanismo moderno .......................................................
31
A cidade moderna e a necessidade de se manter viva ......................................
33
New York e a reação ao urbanismo moderno do início do século XX ................
35
O Fausto de Goethe/Hausmann/Robert Moses .................................................
37
A cidade e a modernidade ......................................................................... .........
39
As cidades brasileiras e as bases do urbanismo moderno – A chamada
renovação urbana ...............................................................................................
41
CAPÍTULO 2 ............................................ ..........................................................
OS PRINCÍPIOS DO URBANISMO MODERNO E A CIDADE DE MONTES
CLAROS .............................................................................................................
46
Antecedentes as décadas de 1960 e 1970, Montes Claros e a
Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE) .......................
46
As transformações no espaço urbano de Montes Claros na década de 1960 e
início dos anos 70 do século XX ................................................ .........................
54
A cidade, a industrialização e sua estrutura urbana .............................. ..........
60
O I Plano Diretor de Montes Claros (Plano Diretor de Toninho Rebello): A
expressão das forças mo dernizantes da década 1970 ......................................
62
CAPÍTULO 3 ......................................................................................................
O I PLANO DIRETOR E A CIDADE DE MONTES CLAROS: UMA VISÃO DA
MODERNIDADE NO SERTÃO ..........................................................................
71
Um balanço sobre o I Plano Diretor de Montes Claros e o “caso” do centro
urbano da cidade ..................................................................... ...........................
75
A construção de um ideário de modernidade a partir da perspectiva do I Plano
Diretor Urbano, na cidade de Montes Claros .................................................... .
81
10
CONSIDERAÇÕES FINAIS ...............................................................................
90
REFERÊNCIAS ..................................................................................................
93
11
INTRODUÇÃO
A proposta de estudar o fenômeno da modernidade e suas formas na
relação com o urbano, a partir das ocorrências e particularidades do município de
Montes Claros, no início da cada de 1970; bem como a tentativa de reorientação
de seu tio urbano, tendo como elemento norteador o I Plano Diretor do município,
possibilitaram-nos a escolha de um sistema no qual o fenômeno da modernidade ,
associado à questão urbana, não diferiu muito do ocorrido em outros centros
urbanos, sem desconsiderarmos, no entanto , as particularidades locais.
Montes Claros não fugiu do contexto geral, aplicado até mesmo aos
grandes centros urbanos ocidentais. O padrão de intervenção ou de tentativa de
intervenção na estrutura urbana do município traz em seu bojo as características e
peculiaridades das intervenções do chamado planejamento urbano moderno
convencional
1
, que afetaram não as grandes cidades ocidentais, em sua maioria,
como também as cidades de menor porte, a partir do século XIX e, sobretudo depois
do pós-guerra.
A tentativa de se estabelecerem alguns critérios de aproximação e de se
identificarem as características peculiares des sas intervenções na estrutura urbana
do município de Montes Claros, a partir dos elementos caracterizadores do
urbanismo moderno - e que foram estabelecidos em grandes centros urbanos
mundiais, notadamente em cidades como New York, Paris, Rio de Janeiro e outr as -
definiu o eixo de referência para a abordagem de um dos problemas mais
importantes que a cidade enfrentaria nas décadas seguintes: a estruturação de sua
malha urbana e viária.
As tentativas de intervenção urbana na cidade de Montes Claros terão
impregnadas, após a elaboração do I Plano Diretor, tra ços que remetem
necessariamente a alguns princípios e padrões estabelecidos em conformidade com
o planejamento urbano modern o convencional e construídos quando da elaboração
do I Plano Diretor urbano do município de Montes Claros.
O caso concreto do município de Montes Claros nas experiências do
planejamento local, na maioria de seus aspectos, foi fruto da tentativa, por parte do
Estado, de regular o sistema econômico, promovendo , dessa forma, a modernização
1
Conceito estabelecido por Jacobs (2000, p. 357).
12
das cidades brasileiras. Entretanto, as pticas do planejamento local, em grande
número de municípios brasileiros, não levaram em conta o conflito distributivista ,
tampouco as externalidades negativas decorrentes da necessidade de tornar a
cidade o lócus apropriado à acumulação capitalista e ao processo de
industrialização de nossa sociedade. Ess a prática foi reflexo do papel exercido pelo
Estado brasileiro, ao longo dos úl timos anos, na tentativa de trazer ao país a
decantada modernidade ocidental.
O I Plano Diretor, datado de abril de 1970; o Plano de Desenvolvimento
Local Integrado (PDLI) , de 1973; e o Projeto Cidade Porte Médio (PCPM) de Montes
Claros da década de 1980, ou seja, os principais planos locais, foram elaborados em
uma época em que o papel do Estado brasileiro era o de promover, difundir,
generalizar e uniformizar a prática de elaboração de planos diretores, segundo uma
postura de integração supostamente multi disciplinar e de racionalidade técnica
modernizante. Ressalta Avritzer que
desse modo, o processo de modernização brasileiro, que implicou na
criação de uma burocracia especializada de acordo com as
prescrições weberianas não conseguiu, via esse acesso, l idar com as
necessidades sociais mais prementes do país.
2
Nessa concepção de idéia de neutralidade excessiva da atuação
governamental e valorização do “saber competente” na elaboração das propostas de
intervenção do municí pio é que foram elaborados o I P lano Diretor, o PDLI, o PCPM
e o II Plano Diretor urbano do município, datado da década de 1990 . Em decorrência
dessas concepções, minimizaram-se as relações políticas de caráter local e,
definitivamente, os segmento s populares ficaram à margem de todas as
experiências de planejamento.
Em Montes Claros, o planejamento urbano da cidade , nas últimas
décadas, ocorreu sem o efetivo controle por parte da sociedade sobre o
ordenamento do espaço urbano e , como em outras localidades brasileiras, a
tentativa de ordenamento do sítio urbano retratava, de forma explícita, a
necessidade de modernização da cidade para o capital .
O I Plano Diretor, na década de 70, fazia referência ao novo espaço
2
AVRITZER, Modelos de deliberação democrática : uma análise do orçamento p articipativo no Brasil,
p. 570.
13
urbano que começava a ser construído com ele, emergiam, em Montes Claros , o
moderno e o civilizado, em iniciativa proposta pelos dirigentes da cidade à época,
vinculados às diretrizes propostas no I PNDI Plano Nacional de Desenvolvimento
Integrado. Essas diretrizes refletiam o contexto nacional, que visava à modernização
das nossas cidades.
A questão da modernidade, do modernizante , do modernizador no
ambiente urbano, é muito bem retratada por Marshall Berman :
Nas últimas três décadas, uma imensa quantidade de energia foi
despendida em todo o mundo na exploração e deslindamento dos
sentidos da modernidade. Muito dessa energia se fragmentou em
caminhos pervertidos e autoderrotados. Nossa visão da vida
moderna tende a se bifurcar em dois níveis, o material e o espiritual:
algumas pessoas se dedicam ao ‘modernismo’ , encarado como uma
espécie de puro espírito, que se desenvolve em função de
imperativos artísticos e intelectuais autônomos; outras se situam na
órbita da ‘modernização’ , um complexo de estruturas e processos
materiais políticos, econômicos, sociais que, vez encetada, se
desenvolve por contra própria, com pouca ou nenhuma interferência
dos espíritos e da alma humana. Esse dualismo, generalizado na
cultura contemporânea, dificulta nossa apreensão de um dos fatos
mais marcantes da vida moderna: a fusão de suas forças mat eriais e
espirituais, a interdependência entre o indiví duo e o ambiente
moderno (grifo nosso). Mas a primeira grande leva de escritores e
pensadores que se dedicaram à modernidade Goethe, Hegel e
Marx, Stendhal, Baudelaire, Carlyle e Dickens, Herzen e Do stoievski
tinham uma percepção instintiva dessa interdependência; isso
conferiu a suas visões uma riqueza e profundidade que
lamentavelmente faltam aos pensadores contemporâneos que se
interessam pela modernidade .
3
Como Marshall Berman , acreditamos na p ossibilidade de
interdependência entre o indiví duo e o ambiente moderno . Essa perspectiva
apresenta-se como um dos pilares de sustentação deste trabalho . Entendemos,
assim como Berman, que o entendimento dos s entidos da modernidade percorre
não só os aspectos políticos, econômicos e sociais , bem como se desenvolve
através dos espíritos e da alma humana. M odernização e modernismo são faces de
uma mesma moeda: a modernidade. D ifícil seria tratar de uma sem perceber a
importância da outra, isto é, dissociá-las não seria possível em nossa visão.
Nosso enfoque acerca das intervenções urbanas em Montes Claros
3
BERMAN, Tudo que é sólido desmancha no ar : a aventura da modernidade, p. 129.
14
procurou considerar não um complexo de estruturas e processos materiais , como
também as forças dos espíri tos e das almas que possibilitaram a apreensão desse
processo de interdependência entre o indivíduo e o ambiente moderno na cidade.
Procuraremos, a partir de elementos norteadores do I Plano Diretor
Urbano da cidade, estabelecer os padrões de referência , com a finalidade de
visualizarmos como uma proposta de intervenção no espaço urbano da cidade pôde
retratar as manifestações “modernas” de uma época tida como a mais auspiciosa da
história da cidade. O I Plano Diretor Urbano de Montes Claros constituiu -se em
espelho de uma época na qual o desejo de mode rnidade se apresentou, como
nunca, de forma tão intensa - pelo menos para os governantes da época .
Visto por esse ângulo, o crescimento da cidade e a urbanização da região
estão atrelados a partes de um industrialismo em expansão. A questão urbana está
intimamente ligada à industrialização, ou seja, a cidade como ce ntro de reprodução
do capital. Em razão do papel desempenhado pelo Estado - principalmente nos
momentos de recuperação econômica – É do período do “milagre brasileiro” ( 1971 a
1976) que datam as experiências mais significativas de tentativa de intervenção do
executivo local.
Uma análise social e histórica do impacto do processo de planejamento
urbano oficial sobre a cidade de Montes Claros, na década de 1970, e o papel
destinado à população local nesse processo acentua a necessidade de
conhecermos nossa história sob o prisma das relações sociais e políticas ali
existentes.
A questão urbana no Brasil se constitui - ao longo do processo mais geral
de urbanização que integrou as regiões do país, atrav és da modernização e
ajustamento ao sistema capitalista mo derno - O conflito gerado entre as
necessidades do capital modernizante e os habitantes da cidade , sobretudo das
camadas populares. A interpretação dess e conflito, na cidade de Montes Claros,
será alvo de nossa atenção; a resposta da população a ess e fenômeno foi registrada
através de diversas passagens aqui creditadas aos moradores das áreas passíveis
de intervenção naquela época.
Segundo Franco, autores como Tocqueville, Jacobs e Putnam entendiam
o desenvolvimento e falavam da sociedade em conjunto , e de maneira a estabelecer
uma conexão entre o desenvolvimento, a sociedade civil e a democracia. Eles
estavam vislumbrando uma relação intrínseca entre desenvolvimento e o modo
15
como a sociedade se estru tura e regula seus conflitos
4
.
O desenvolvimento, as redes, a democracia e a participação da
sociedade civil no processo d e produção de seu espaço urbano são produtos de um
mesmo contexto.
As experiências de planejamento consolid adas no município após 197 0
dificilmente consideraram o princípio de que o planejamento é u ma experiência
técnica, política e social. Portanto, o não engajamento da população no processo de
planejamento da cidade impossibilitou a generaliza ção da prosperidade da cidade,
não permitindo à população local a participação ness e processo.
Um dos objetivos deste trabalho será o de avaliar e caracterizar a história
das principais experiências de plane jamento da cidade de Montes Claros e o lugar
da população local, notadamente, no I Plano Diretor Urbano, datado da década de
1970.
A pesquisa utilizará como método de procedimento as pesquisas
bibliográficas, as pesquisas com fontes primárias e secundárias, e as de campo,
especificamente o procedimento de campo na forma de levantamentos com os
agentes envolvidos com as expe riências locais de planejamento no período
proposto.
Um ponto de vista relevante neste trabalho é a necessidade de ampliação
do referencial teórico do tema, de forma a permitir um mínimo de generalização em
relação às discussões aqui suscitadas.
Uma aproximação com os paradigmas do planejamento urbano moderno
convencional, principalmente por aqueles estabelecidos a partir de alguns dos
grandes centros urbanos ocidentais, possibilitará o estabelecimento do eixo -teórico
que norteará o processo de discussão e avaliação local.
O método comparativo procede pela investigação de indivíduos,
classes, fenômenos ou fatos, com vistas a ressaltar as diferenças e
similaridades entre eles. Sua ampla utilização nas ciências sociais
deve-se ao fato de possibilitar o estudo comparativo de grandes
grupamentos sociais, separados pelo espaço e pelo tempo. Assim é
que podem ser realizados estudos comparando diferentes culturas
ou sistemas políticos.
5
4
FRANCO, Capital Social e Desenvolvimento Local , p. 4.
5
GIL, Métodos e técnicas de pesquisa social , p. 35.
16
Os parâmetros dessa aproximação serão estabelecidos a partir dos
elementos de congruência do fenômeno da modernidade, segundo autores como
Marshall Berman, Jane Jacobs, José Murilo de Carvalho e Le Corbusier, entre
outros.
As correlações podem ser úteis quando se trata de cidades, pois
elementos comuns se aplicam a qualquer uma delas , afinal as cidades modernas
podem ser definidas, conforme salienta Rolnik, como as cidades do capital , já que “a
partir de certo momento da hist ória, as cidades passam a se organizar em função do
mercado”
6
. E, se considerarmos que o processo político brasileiro no sécul o XX,
promovido pelas elites, baseou-se na tentativa de modernização convencional do
país e, por conseguin te de suas cidades, torna-se possível, assim, estabelecer
aproximações entre algumas cidades.
A comparação, enquanto momento da atividade cognitiva pode ser
considerado como inerente ao processo de construção do
conhecimento nas ciências sociais. É lançado mão de um tipo de
raciocínio comparativo que podemos descobrir regularidades,
perceber deslocamentos e transformações, construir modelos e
tipologias, identificando continuidades e descontinuidades,
semelhanças e diferenças, e explicitando as determinações mais
gerais que regem os fenômenos sociais .
7
Portanto, o estabelecimento das correlações propost as neste estudo do
urbanismo moderno tem utilidade, sobretudo por possibilitar o estabelecimento das
relações existentes entre as teorias gerais e as explicações nitidamente de caráter
local.
O método comparativo tem sido empregado das mais diversas
maneiras no campo das ciências sociais. Os distintos usos da
comparação refletem diferentes posições acerca das relações
existentes entre as teorias gerais e as explicações locais, os quadros
conceituais e as técnicas de pesquisa, a formulação de hipóteses e
sua validação.
8
Na tentativa de desenvolver, esclarecer e até mesmo modificar os
6
ROLNIK, O que é cidade, p. 30.
7
SCHNEIDER; SCHIMITT, O uso do método comparativo nas Ciências Sociais , p. 49-86.
8
Ibidem, p. 49-86.
17
conceitos tratados neste trabalho, decidimos por fazer uma p esquisa de cunho
exploratório, com o objetivo de se proporcionar uma visão geral d o problema
levantado, mormente em virtude da pouca exploração do tema escolhido, no
contexto urbano do município de Montes Claros e da região norte do Estado de
Minas Gerais.
Todo o material sobre as experiências de planejamento urbano do
município de Montes Claros, tais como planos diretores, diretrizes, diagnósticos,
planos de desenvolvimento , entre outros, serão alvo de uma análise pormenorizada
e detalhada, consolidando a pesquisa bibliográfica e possibilitando , assim, um maior
refinamento no trato da investigação documental.
A pesquisa documental assemelha -se muito à pesquisa bibliográfica.
A única diferença entre ambas está na natureza das fontes.
Enquanto a pesquisa bibliográfica se utiliza fundamentalmente das
contribuições dos diversos autores sobre determinado assunto, a
pesquisa documental vale -se de materiais que não receberam ainda
um tratamento analítico, ou ainda podem ser reelaborados de acordo
com os objetivos da pesquisa .
9
Por fim, será dado um tratamento especial aos chamados documentos de
comunicação de mas sa, tais como jornais, revistas, entre outros, que registram a
história do município.
Uma análise das intervenções no espaço urbano do município de Montes
Claros, bem como daquelas estabelecidas no I Plano Diretor, além das ocorridas em
outros sistemas urban os, como New York, Paris e Rio de Janeiro,dentre outros, e
dos autores que tratam o assunto , serão alvo de pesquisa e de estudo , como forma
de estabelecer um conjunto de p ontos comuns aos sistemas escolhidos e revisar a
literatura existente.
Feito acima, o delineamento da pesquisa , nossa preocupação passará a
ser essencialmente com os problemas de ordem prá tica de verificação, no sentido
de se permitir uma maior liberdade no tratamento dos dados coletados e na
condução da pesquisa como um todo. Entendemos p or dividir e organizar o text o em
três capítulos. No primeiro, a proposta é a de estabelecer aproximações entre
Montes Claros e outros centros urbanos ocidentais considerados como paradigmas
9
GIL, Métodos e técnicas de pesquisa social , p. 73.
18
do planejamento urbano moderno convencional e envolvidos em semelhantes
processos de modernização de seus espaços e que, por vezes, afetou
substancialmente seus habitantes.
No segundo capítulo, uma abordagem geral da problemática local nos
dará uma compreensão do processo de planejamento urbano ocorrido no m unicípio
de Montes Claros, nas ú ltimas décadas (1970, 1980 e 1990), tendo como referência
o I Plano Diretor Urbano da cidade .
No terceiro capítulo, será feito um relato atento dos acontecimentos
ocorridos em Montes Claros, especialmente no período marcado pela tentativa de
implementação do I Plano Diretor no município, e suas conseqüências para os
habitantes locais, bem como para o sítio urbano da cidade, seus reflexos e marcas
que irão influenciar todas as tentativas de regulação do esp aço urbano desde então.
As discussões e os impactos do I Plano Diretor Urbano de Montes Claros
entremearão todo o trabalho , de maneira a propiciar uma análise homogeneizante,
que decorreu das necessidades e diretrizes propostas no I PNDI .
19
CAPÍTULO 1
UMA VISÃO DO URBANISMO MODERNO
Uma visão panorâmica da dinâmica urbana moderna
O município de Montes Claros, assim como quase todos os municípios
brasileiros, foi vítima da centralização de poderes no Governo Federa l e pouco teve
a fazer a não ser se enquadrar como instrumen to de execução da política urbana
nacional vigente nas décadas de 1960 e 1970 , tendo no planejamento o seu
principal instrumento.
A saída para essa situação veio com o advento do intitulado
“planejamento urbano”, que, na realidade, camuflava a pretendida i mplementação do
planejamento econômico. Com conseqüência disso, as cidades de porte dio,a
exemplo de Montes Claros, experimentaram um acentuado crescimento
demográfico, nem sempre alinhado com um adequado ordenamento do território, e
muito menos com uma estrutura econômica e social local capaz de absorver os
problemas decorrentes desse tipo de iniciativa.
A história das transformações urbanas em Montes Claros não foi muito
diferente da realização do paradigma de modernização de centros urbanos
espalhados pelo mundo, respeitadas as proporções devidas. A crítica ao urbanismo
modernista feita por autores como Jacobs e Berman, dentre outros, e a valorização
e redescoberta das assim chamadas qualidades da cidade tradicional trouxeram
para a prática uma nova ati tude diante do projeto do urbanismo ortodoxo do século
passado. Vejamos o que nos diz Jacobs :
20
Este livro é um ataque aos fundamentos do planejamento urbano e
da reurbanização ora vigentes. É também, e principalmente, uma
tentativa de introduzir novo s princípios no planejamento urbano e na
reurbanização, diferentes daqueles que hoje são ensinados em todos
os lugares, de escolas de arquitetura e urbanismo a suplementos
dominicais e revistas femininas, e até mesmo conflitantes em relação
a eles. Meu ataque não se baseia em tergiversações sobre métodos
de reurbanização ou minúcias sobre modismos em projetos. Mais
que isso, é uma ofensiva contra os princípios e os objetivos que
moldaram o planejamento urbano e a reurbanização moderna e
ortodoxa.
10
Segundo alguns, a tendência surgida nos anos de 1960 e 1970 do século
XX, com o objetivo de buscar uma maior integração das novas áreas habitacionais à
cidade, é, em parte, fruto da crítica ao modo de vida produzido pelos chamados
conjuntos habitacionais modernist as, desenho urbano aliado ao fracasso da cidade
modernista.
Jacobs reforça a do papel representado pelo planejamento urbano
moderno convencional na construçã o do desenho urbano das cidades ao afirmar
que
As cidades são um imenso laboratório de tentativa e erro, fracasso e
sucesso, em termos de construção e desenho urbano. É nesse
laboratório que o planejamento urbano deveria aprender elaborar e
testar suas teorias. Ao contrário, os especialistas e os professores
dessa disciplina (se é que ela pode ser as sim chamada) têm
ignorado o estudo do sucesso e do fracasso na vida real, não têm
tido curiosidade a respeito das razões do sucesso ines perado e
pautam-se por princípios derivados do comportamento e da
aparência de cidades, subúrbios, sanatórios de tuber culose, feiras e
cidades imaginárias perfeitas qualquer coisa que não as cidades
reais. Não é de estranhar a sensação de que os segmentos
reurbanizados das cidades e os infindáveis novos empreendimentos
que se espalham para além delas reduzem a área urba na e a rural a
uma papa monótona e nada nutritiva .
11
E sobre o papel das cidades, continua Jacobs:
10
JACOBS, Morte e vida de grandes cidades , p. 1.
11
Ibidem, p. 5.
21
Em primeira, segunda, ter ceira e quarta mão, tudo provém da mesma
gororoba intelectual, uma gororoba em que as qualidades, as
necessidades, as vanta gens e o comportamento das grandes
cidades têm sido inteira mente confundidos com as qualidades, as
necessidades, as vantagens e o comportamento de outros tipos de
assentamentos menos ativos.
Não nada que seja econômica ou socialmente inevitável tanto em
relação ao declínio das cidades tradicionais, como em relação à
recém-inventada decadência da nova urbanização inur bana. Ao
contrário, nenhum outro aspecto da nossa economia e da nossa
sociedade tem sido mais intencionalmente manipulado por todo um
quarto de século com o fim de atingir exatamente o que
conseguimos. Tem-se exigido um volume extraordinário de
incentivos financeiros governamentais para obter esse nível de
monotonia, esterilidade e vulgaridade. As várias décadas de dis -
cursos, textos e exorta ções de peritos serviram para convencer a nós
e aos legisladores de que uma gororoba dessas deve fazer nos bem,
desde que esteja coberta de gramados .
12
Aguiar ressalta, ainda, uma atitude em que estratégias de planejamento
baseadas na organização da cidad e através do zoneamento de uso tendiam a ser
substituídas por uma estratégia de absorção da chamada complexidade do urbano.
Entende-se por essa complexidade o lugar onde uma variedade de interesses
expressos no uso dos solos tenderia a interagir e usufruir dos benefícios da
integração, como de fato ocorre nas cidades, onde diferentes usos e extratos s ociais
freqüentemente convivem em uma mesma porção do território, em um mesmo bairro
e, muitas vezes, em uma mesma rua
13
.
Especificamente no caso do planejamen to urbano, é óbvio que uma
grande quantidade de pessoas sérias e sinceras se preo cupa
profundamente com construção e renovação. Apesar de al guma
corrupção e da considerável cobiça pela vinha do próxi mo, as
intenções em meio às trapalhadas são, no cômput o geral,
exemplares. Planejadores, arquitetos do desenho urbano e aque les
que os seguem em suas crenças não desprezam consciente mente a
importância de conhecer o funcionamento das coisas. Ao contrário,
esforçaram-se muito para aprender o que os santos e os sábios do
urbanismo moderno ortodoxo disseram a respeito de como as
cidades deveriam funcionar e o que deveria ser bom para o povo e
os negócios dentro delas. Eles se aferram a isso com tal devoção,
que, quando uma realidade contraditória se in terpõe, ameaçando
destruir o aprendizado adquirido a duras pe nas, eles colocam a
realidade de lado.
14
12
JACOBS, Morte e vida de grandes cidades , p. 5.
13
AGUIAR, Colisões Urbanas: continuidades e descontinuidades, p. 7.
14
JACOBS, op. cit., p. 6-7.
22
A distribuição espacial dos bairros no território da cidade tende em geral a
espelhar a distribuição dos diversos segmentos sociais. Pode -se dizer que a
organização espacial dos diferentes extratos de renda tende a ser legitimada pela
história da cidade.
Em Montes Claros, ocorreu uma espécie de estruturação urbana n a qual
as classes mais abastadas tendem a concentrar -se em certas zonas, a classe média
em outras, assim como os extratos de renda mais baixa , em outras. Essa
distribuição é freqüentemente alterada ao longo do tempo , e áreas outrora
periféricas passam à condição de áreas nobres. Áreas outrora residenciais de classe
alta tornam-se distritos comerciais.
Essa dinâmica urbana, típica das grandes cidades do mundo ocidental,
tem clara explicação a partir da lógica econômica de ocupação social e técnica do
território. No entanto, a partir da década de 1960, autores como Jacobs passaram a
questionar os princípio s clássicos do urbanismo e do planejamento urbano moderno,
acentuando o valor do grau de vitalidade urbana das cidades.
Para Meyer, a tese central é clara: o grau de urbanidade de uma cidade
depende, sobretudo, do grau de vitalidade urbana ali existente. Suas análises,
histórias, exemplos e citações estabelecem que tipo de ações urbanas e situações
seriam capazes de potencializar ou destruir essa vitalidade primordial. Segundo
Meyer, Jacobs está consciente de quais processos sociais são responsáveis pela
degradação e extinção das próprias cidades
15
.
A proposta de Jacobs é de enfrentamento e de reversão dos processos
desvitalizadores introduzidos por intervenções urbanas equivocadas.
15
JACOBS, Jane Jacobs: Morte e Vida de Grandes Cidades. Resenha de MEYER, p. 54 -57.
23
Quanto maior for o êxito das cidades na geração de diversidade e
vitalidade em qualquer uma de suas zonas, obvia mente maiores
serão as probabilidades de elas obterem êxito tam bém em outras
zonas – inclusive, provavelmente, as mais desen corajadoras.
Não é preciso dizer que as ruas e os bairros que possuem boa
combinação de usos principais e têm êxito na geração da diversi dade
devem ser admirados e não desprezados por causa dessas mesclas
e destruídos pela tentativa de separar seus elementos. In felizmente,
os planejadores tradicionais parecem ver nesses mesmos lugares
populares e atraentes apenas um convite irresistível para empregar
os propósitos tacanhos e destrutivos do planeja mento urbano
ortodoxo. Quando dispõem de recursos federais e poder suficientes,
os urbanistas têm plenas condições de destruir as misturas de uso s
principais urbanas mais rápido do que elas con seguem florescer nos
bairros espontâneos, de modo que o resul tado é a perda da mescla
principal básica. Na verdade, é isso o que está acontecendo hoje em
dia.
16
Para Vaz, desde a década de 1930, nos Estados Unidos e no Canadá, a
renda média de uma família era suficiente para pagar o custo da compra de uma
casa ou o aluguel de um apartamento. Mas, a partir dos anos 70, as estatísticas
mostravam que apenas 10% das famílias dispunham de renda para a compra de
uma casa “média”. As despesas domésticas, porém, aumentaram, quando uma nova
necessidade se impôs: o automóvel, devido ao declínio ou desaparecimento dos
transportes públicos nos subúrbios
17
.
Nas cidades que se modernizavam e nos novos subúrbios, a distância
entre o local de moradia e o de trabalho se ampliava crescentemente, obrigan do as
famílias a utilizarem o automóvel não somente para o trabalho, mas para os mais
diversos deslocamentos o ir e vir das famílias nas cidades definiria o papel do
automóvel na sociedade moderna.
16
JACOBS, Morte e vida de grandes cidades , p. 195.
17
JACOBS, Jane Jacobs: Olhando as cidades, percebendo as trevas. Resenha de VAZ, p. 123 -125.
24
Le Corbusier [...] procurou fazer do planejamento para automóveis
um elemento essencial de seu projeto, e isso era uma idéia nova e
empolgante nos anos 20 e início dos anos 30. Ele traçou grandes
artérias de mão única para trâ nsito expresso. Reduziu o número de
ruas, porque ‘os cruzamentos são inimigos do tráfego’. Propôs ruas
subterrâneas para veículos pesados e transportes de mercadorias, e
claro, como os planejadores da Cidade -Jardim, manteve os
pedestres fora das ruas e de ntro dos parques. A cidade dele era
como um brinquedo mecânico maravilhoso. Além do mais, sua
concepção, como obra arquitetônica, tinha uma clareza, uma
simplicidade e uma harmonia fascinantes. Era muito ordenada, muito
clara, muito fácil de entender. Tran smitia tudo num lampejo, como
um bom anúncio publicitário. Essa visão e seu ousado simbolismo
eram absolutamente irresistíveis para urbanistas, construtores,
projetistas e também para empreiteiros, financiadores e prefeitos. Ela
deu enorme impulso aos ‘pro gressistas’ do zoneamento, que
redigiram normas elaboradas para encorajar os construtores a
reproduzir ainda que parcialmente o sonho .
18
Com a imposição dos veículos na cultura urbana das cidades modernas,
a organização e o ordenamento espacial dos centros urbanos estabeleceram uma
nova forma de convívio entre as pessoas e o automóvel. O a utomóvel pode ser
concebido, desde então, como o elemento desagregador da estrutura social e
urbana das cidades.
[...] o maior destruidor das comunidades americanas não f oi nem as
drogas nem a televisão, mas o automóvel. A modernização por meio
da renovação urbana destruiu comunidades ao arrasar bairros
antigos para a passagem de highways e expressways. Estes, por sua
vez, induziam a expansão, com a construção de subúrbios que se
alternavam com shopping centers . Mas poucas foram as
comunidades novas que se formavam, porque junto com a
eliminação das antigas comunidades desaparecia também a
memória do que haviam sido. Além disso, o espaço público não
propiciava mais o enc ontro de pessoas, um ponto fundamental na
formação e na ação das comunidades. Pois muitas das demandas
das populações são providas pelas comunidades, sendo as mais
importantes aquelas totalmente intangíveis e informais, e que
respondem à necessidade de con tatos pessoais, de pertencimento a
grupos e redes, de comunicação com o outro .
19
Vaz, em uma resenha feita sobre a obra de Jacobs , enfatiza a crítica à
cidade dispersa:
18
JACOBS, Morte e vida de grandes ci dades, p. 23.
19
JACOBS, Jane Jacobs: Olhando as cidades, percebendo as trevas. Resenha de VAZ, p. 123 -125.
25
A crítica ao sprawl (dispersa) se apresenta habitualmente
confrontando a cidade dispe rsa à cidade histórica, central,
consolidada, apontando as vantagens desta sobre aquela. Apontam -
se na cidade difusa a falta de historicidade, de identidade, de
centralidade, de espaços efetivamente públicos, assim como a
predominância do transporte partic ular e o consumo excessivo do
território, com a perda de espaços verdes .
20
O processo de modernização das cidades brasileiras ao longo da história
guarda algumas semelhanças intrínsecas com os processos modernizante s das
grandes cidades ocidentais. Como exemplo, podemos citar a tentativa de
modernizar o Rio de Janeiro no século XX , que apresenta peculiaridades inerentes a
muitas tentativas de trazer o moderno para nossos centros urbanos, mesmo os do
interior, como no caso de Montes Claros. Nesse sentido, te ntaremos vislumbrar
algumas semelhanças ness e processo, como forma de id entificar elos que
aproximam essas experiências.
A leitura do ordenamento urbano das cidades pode , em determinado
momento, ser também uma forma de leitura e compreensão da história de uma
população, de seus anseios, suas reivindicações e decepções. A leitura do passado
urbano deve ser indicativa para procedimentos que afetarão as cidades no futuro.
No entanto, não é desejável que contenha elementos normativos para quem quer
que ouse pensar as cidades.
Incomoda pensar que os ho mens que são jovens hoje, os homens
que estão estudando hoje para fazer carreira devam aceitar, sob o
argumento de que preci sam ter um raciocínio ‘moderno’, conceitos
sobre as cidades e o trânsito que são não ape nas inviáveis, mas que
também não receberam nenhuma contribuição significativa desde
que os pais deles eram crianças .
21
Em seu livro “Os Bestializados”, o cientista político e hist oriador José
Murilo de Carvalho avalia porque, sob o argumento de que prec isam ter um
raciocínio “moderno” sobre as cidades e o trânsito , a república capitalizou e
remodelou cidades, mas não permitiu a formação de seus cidadãos
22
.
Para Carvalho, o Rio de Janeiro do iní cio do Século XX era espaço
20
JACOBS, Jane Jacobs: Olhando as cidades, percebendo as trevas. Resenha de VAZ, p. 123 -125.
21
JACOBS, Morte e vida de grandes cidades , p. 413.
22
CARVALHO, Os bestializados: O Rio de Janeiro e a República que não foi, p. 12.
26
adequado para o estabelecimento da república brasileira, que desenhava seus
primeiros passos. O Rio de Janeiro do início da r epública não se apresentou para
sua população como espaço clássico função das cidades modernas para o
desenvolvimento da cidadania. A o contrário, os traços estabelecidos pelo urbanismo
moderno, marcados pelas intervenções então realizadas, não segregaram sua
população, como impossibilitaram a formação de uma idéia de cidadania e de
formação da idéia de pertencimento do indivíduo ao s modelos institucionalizan tes
que se apresentavam , com o surgimento da r epública brasileira. No Rio de Janeiro ,
temos clara a segregação espacial da população até os nossos dias, uma vez que
morros e favelas passaram a definir os espaços da população carente
23
.
Essa idéia de pertenc imento do indivíduo a uma coletividade se
cristalizará em sua participação formal e institucionalizada na estrutura de poder das
cidades. Essa clareza, vale destacar, é necessária nas experiências de
planejamento de nossas cidades.
Os antecedentes locais
FIGURA 1 - A bela foto é da virada dos anos 40, início da década de 50. Mostra a
Praça Doutor Chaves, homenagem da cidade a seu filho Antônio
Gonçalves Chaves, governador de Minas e de Santa Catarina, no
Império.
Fonte: http://www.montesclaros.com.
23
CARVALHO, Os bestializados: O Rio de Janeiro e a República que não foi, p. 64 -65.
27
Uma foto da virada da década de 1940 mostra a principal praça do
município de Montes Claros, a D outor Chaves homenagem seu filho ilustre Antônio
Gonçalves Chaves. Ao se observar atentamente a foto, percebe -se que a “Praça da
Matriz”, como é popularmente co nhecida, havia acabado de receber uma reforma,
que perdura, em linhas gerais, até hoje. Há, no fundo, do lado esquerdo, na direção
em que aparece uma palmeira, a silhueta da primeira casa de Montes Claros,
derrubada por volta da década de 1970. Imponente, ao lado da Matriz, está o
sobrado do industrial Oldemar Santos, também demolido. As ruas ao redor da
praça, na foto, apresentam-se sem calçamento. Montes Claros tinha, se tanto, 15 mil
habitantes. É o início da história urbana do município e também das primeiras
intervenções urbanistas.
A percepção do espaç o urbano assentada sob a óptica do moderno traz
em seu bojo a expressão de algumas preocupações especificamente ditas como
modernas, entre elas, o desejo de mudança, de autotransformação e da
transformação do mundo ao redor. A foto acima é uma expressão precisa da
dimensão do que o moderno faria à cidade, trinta ou vinte anos passados da
produção da mesma foto.
Nas décadas seguintes, Montes Claros se via compelida a enfrentar as
forças do urbanismo moderno, a lutar para recusar seu próprio mundo e estabelecer
uma transformação do mesmo, movida não pelo desejo de mudança , como pela
desestruturação do mundo ao redor. O desejo de modernidade, de modernização do
seu traçado urbano, chega, na década de 1970, ao município, como uma nova força,
e com as tentativas da intervenção no espaço urbano. Esse anseio, consolidado no I
Plano Diretor Urbano do Município, é o traço mais marcante daquilo que Berman vai
caracterizar como um tipo vital de experiência experiência de tempo e espaço, de
si mesmo e dos outros, das possibilidades e dificuldades impostas pela vida
moderna que é compartilhada por homens e mulheres em todo o mundo. Em Montes
Claros, esse desejo e essa experiência não foi diferente esse conjunto de forças é
o que podemos denominar de “modernid ade”
24
.
Antes, porém, convém traçarmos as linhas e a evolução dess a aventura
humana denominada modernidade, tendo como base alguns dos grandes centros
urbanos modernos e os t raços característicos de alguns deles características e
24
BERMAN, Tudo que é sólido desmancha no ar : a aventura da modernidade, p. 34 -37.
28
princípios que foram objeto de aná lise de pensadores que ousaram desvendar as
faces da modernidade de alguns dos principais centros urbanos do s séculos XIX e
XX.
O século XIX e a construção dos novos conceitos urbanos
O conceito de espaço urbano (cidades) ao longo da histó ria muito
deixou de se restringir a um conjunto espe cífico de edificações delimitadas em um
perímetro, para agregar uma dinâmica incessante, na qual o urbano ocupa to do o
espaço das zonas agrícolas. Nesse sentido, Rolnik é muito clara:
Na busca de algum sinal que pudesse apontar uma característica
essencial da cidade de qualquer tempo ou lugar, a imagem que me
veio à cabeça foi a de um imã, um campo magnético que atr ai, reúne
e concentra os homens .
25
No século XIX, aprofunda-se a transformação do espaço rural em espaço
urbano, principalmente a transformação da vida medieval em espaço urbano
destinado ao locus da acumulação capitalista, a chamada cidade -capital de então.
O Estado moderno, que vai pautar-se em uma reorganização do modelo
de cidades até então conhecidos, a mercantilização do espaço urbano e a
segregação espacial vão marcar a reestruturação das cidade s modernas, imposta
pelo Estado moderno, cuja lógica passa a ser a capitalista, na condução de uma
política de ocupação das cidades, expressa quase sempre na intervenção do Estado
no espaço urbano. Essa intervenção vai ser organizada e pré -ordenada, e encontra
amparo, sobretudo, naquilo que conheceremos hoje como planejamento urbano. A
idéia de ordem, de máquina, da cidade mecânica estará se mpre presente na cidade
moderna. Nessa perspectiva,
25
ROLNIK, O que é cidade, p. 12.
29
Se nos adiantarmos cerca de um século, para tentar identificar os
timbres e ritmos peculiares da modernidade do século XIX, a primeira
coisa que observaremos será a nova paisagem, altamente
desenvolvida, diferenciada e dinâmica, na qual tem lugar a
experiência moderna. Trata -se de uma paisagem de engenhos a
vapor, fábricas automati zadas, ferrovias, amplas novas zonas
industriais; prolíficas cidades que cresceram d o dia para a noite,
quase sempre com aterradoras conse qüências para o ser humano;
jornais diários, telégrafos, telefones e outros instrumentos de media,
que se comunicam em escada cada vez maior; Estados nacionais
cada vez mais fortes e conglomerados mul tinacionais de capital;
movimentos sociais de massa, que lutam contra essas
modernizações de cima para baixo, contando com seus pró prios
meios de modernização de baixo para cima; um mercado mundial
que a tudo abarca, em crescente expansão, capaz de um
estarrecedor desperdício e devastação, capaz de tudo exceto solidez
e estabilidade.
26
E Berman continua, nesse mesmo sentido, afirmando que
Todos os grandes modernistas do século XIX atacam esse ambiente,
com paixão, e se esforçam por fazê-Io ruir ou explorá-Io a partir do
seu interior; apesar disso, todos se sentem surpreendentemente à
vontade em meio a isso tudo, sensíveis às novas possibilidades,
positivos ainda em suas negações radicais, jocosos e irônicos ainda
em seus momentos de mais grave seriedade e profundidade.
27
As faces dessa intervenção têm, por um lado, a dimensão e a
especialização do trabalho , e, de outro lado, a ordem, a regularidade e a
planificação, com o objetivo de garantir à cidade sua função essencial de
maximização da prodão capitalista. Rolnik avalia como resultado desse
processo de industrialização dos principais centros urbanos a indústria como um
fenômeno tipicamente urbano e que exige grande mero de trabalhadores
disponíveis
28
. Concomitantemente, ess a mesma indústria produz um efeito
desterritorializador, abrindo passagem para os movimentos migratórios das grandes
massas: a migração para as grandes cidades se acelera. Esse fato alimentou, desde
o início, a revolução industrial, no século XIX.
A reordenação e a definição do papel das cidades no século XIX vão
26
BERMAN, Tudo que é sólido desmancha no ar : a aventura da modernidade, p. 19.
27
Ibidem, p. 19.
28
ROLNIK, O que é cidade, p. 78-79.
30
subverter toda a lógica de estruturação d o espaço urbano, que prevalece até os
nossos dias. Em consonância com Le Corbusier,
A estrutura das cidades nos revela duas espécies de
acontecimentos: o ajuntamento progressivo , aleatório, com seu
fenômeno de estratifica ção lenta, de formação escalonada, e depois
sua força de atração adquiri da, crescente, força centrífuga, sedução
violenta, investida, balbúrdia. Foi assim Roma, como é Paris,
Londres ou Berlim.
Ou então: a construção da cidade, nascida de um programa, de uma
vontade, de uma ciência adquirida; é assim Pequim ou são as
cidades fortes do Renascimento (Palmanova), ou são as cidades
colonizadoras dos romanos erigidas no âmago dos países
bárbaros.
29
Le Corbusier ainda explica que
Nosso Ocidente, tendo derrubado o Império empobrecido por um es -
forço demasiado extenso, encontrou -se sozinho com seus meios
embrionários; os séculos se somarão antes que do campo fortificado,
antiga imagem do selvagem cercando de carros seu bivaque, saísse
pouco a pouco uma intenção, se manifestasse uma concepção clara,
se oferecessem meios técnicos suficientes, se organizasse a
potência financeira útil.
O espírito, sob a fronte dos reis, concebe e aspira a realizar;
tentativas magníficas, lampejos de luz no bulício bárbaro: Praça de
Vosges, Luís XIII; Versalhes, ilha Saint -Louis, Luís XIV; Campo de
Marte, Luís XV; Étoile e as grandes estradas de acesso a Paris,
Napoleão. Enfim, dádiva magnífica que um monarca deixa a seu
povo: obras de Haussmann, Napoleão III .
30
A estruturação do espaço urbano (cidades) como o concebemos inicia-se
no século XIX e adquire sua expressão máxima durante o século XX a luta contra
a desordem, o acaso, a aspiração à ordem por meio da geometria, terá com o palco
vários centros urbanos, em especial, a Paris do início do século XX; e, como
protagonista, o espírito de homens como Hausmann e Le Corbusier, entre outros.
29
LE CORBUSIER, Urbanismo, p. 84.
30
Ibidem, p. 84.
31
Os primeiros traços do urbanismo moderno
No icio do século XX, a cidade moderna sofre os efeitos da
concentração urbana, da necessidade de mobilidade, da necessidade de uma
organização interior precisa, enfim , do imperativo da ordem, sobretudo da ordem
sobre o movimento.
O Estado de fato e o estado de espírito afrontados, são precisamente
todo o problema do urbanismo: animar com um alento unitário a
complexidade esmagadora do fenômeno social; manter o movimento,
quando a paralisia toma conta .
31
A cidade moderna adquiria novas formas diferentes das cidades do
século XIX.
Até o século XX, as cidades são traçadas a partir de um programa de
defesa. A orla da cidade é um fato preciso, um organismo límpido de
muralhas, de portas, de ruas que desembocam e de ruas que vão
do exterior ao centro.
Ademais, até o século XIX, entra -se na cidade pela periferia. Hoje, as
portas das cidades estão no centro. São as estações.
A cidade moderna não pode defender -se militarmente; sua orla
tornou-se uma zona equívoca e sufocante comparável a imensos
acampamentos de ciganos amontoados em suas carroças em m eio à
desordem da improvisação. De modo que a extensão da cidade
agora só ocorre através de um obstáculo poderoso .
32
Diante dos novos desafios , traçados pelas cidades modernas devido ao
urbanismo, novos princípios vão garantir à cidade a estrutur ação de seu espaço
urbano segundo bases que poderíamos denominar de princípios do urbanismo
moderno.
Da necessidade de mobilidade d e circulação das massas urbanas e do
aumento da população nas cidades modernas trata Le Corbusier, quando argumenta
que, de 1800 a 1910 em cem anos –, cidades como Paris, Londres, New York e
Berlim passaram de 600.000 para 3.000. 000 de habitantes, de 800.000 para
7.000.000 de habitantes, de 60.000 para 4.500.000 de habitantes, e de 180.000 para
31
LE CORBUSIER, Urbanismo, p. 87.
32
Ibidem, p. 87.
32
3.500.000 habitantes, respectivamente
33
. Esse fato demonstra claramente o
aumento populacional nos grandes ce ntros urbanos ocidentais, no iní cio do século
XX, e o movimento das massas populacionais, no sentido de se abrigarem nos
grandes centros.
A necessidade de se aumentar a densidade por metro quadrado, devido à
nova dimensão mercantil dada ao espaço urbano, com sua mercantilização; a nova
dimensão da rua como meio de circulação dos veículos; além das necessidades de
arborização com fim de assegurar a higiene e a calma útil ao trabalho, vão levar à
elaboração de um conjunto de pressupos tos tidos como bases na s quais se
assentaria o urbanismo na primeira metade do século XX.
Eis-nos conduzidos a formular as bases do urbanismo moderno com
quatro postulados brutais, concisos, que respondem com exa tidão
aos perigos ameaçadores:
1.º Descongestionar o centro das cidades para fazer frente às
exigências do trânsito.
2.º Aumentar a densidade do centro das cidades para realizar o con-
tato exigido pelos negócios.
3.º Aumentar os meios de circulação, ou seja, modificar
completamente a concepção atual da rua que se acha sem efeito
ante o fenômeno novo dos meios de transporte modernos: metrôs ou
carros, bondes, aviões.
4.º Aumentar as superfícies arborizadas, único meio de assegurar a
higiene suficiente e a calma útil ao trabalho atento exigido pelo ritmo
novo dos negócios.
34
Sendo assim, foi na necessidade de estruturar um conjunto básico de
instrumentos que assegurasse uma nova ordem geométrica de intervenção no
espaço urbano da Paris do início do século XX que encontramos, no urbanismo de
Le Corbusier, a necessidade de adaptar a cidade moderna à sua época, nem que
para isso fosse necessário opor o s entimento de modernização a tudo e a todos. É
necessário destruir e reconstruir; o novo prevalece e o velho desaparece.
Le Corbusier é bastante enfático quando escreve sobre as intervenções
necessárias a serem feitas no centro da Paris do iní cio do século XX.
33
LE CORBUSIER, Urbanismo, p. 86.
34
Ibidem, p. 91.
33
Hoje (1925) a demolição foi em part e realizada. Uma área
impressionante permite, antes que seja recober ta de construções,
sonhar... com muitas coisas. A área está ali; criaram -na; é um evento
urbano de 1925, no centro de Paris. Cirurgia ousada. Haussmann
decidira isso. A obra formi dável desse homem obstinado foi toda de
cirurgia; retalhou Paris sem pie dade. Parecia que a cidade ia morrer
por isso. Paris-automóvel de hoje vive por Haussmann!
Tais operações são então possíveis? É possível expropriar,
indenizar, fazer o que é preciso? Sim, sob Haussmann e o
Imperador. Sim, mesmo sob a democracia atual.
O imenso buraco aberto na cidade amontoada, esmagada, supersa -
turada, entre a rua Taitbout e os bulevares, causa uma impressão
emocionante.
É uma prova.
O passado responde: cirurgia e medicina. Cirurgia no centro.
Medicina fora.
35
Para os urbanistas do in ício do século XX, a cidade moderna deve dispor
de velocidade para dispor de sucesso, tudo estabelecido segundo a ordem e
estruturação do capitalismo moderno . Afinal, a cidade, o espaço urbano, serve
copiosamente ao capital e às implicações geradas por sua utilização. Deve se
adequar, nem que seja m necessárias milhares de cirurgias abrindo e fechando
corpos.
A cidade e a necessidade de se manter viva
Originalmente, a investigação urbanista possui um caráter humanista,
com origem nos séculos XIX e XX, equi parada à ciência moderna e decorrente da
necessidade de responder aos graves pr oblemas urbanos decorrentes da Revolução
Industrial.
Rolnik estabelece algumas relações importantes , segundo as quais o
urbanismo nasce das necessidades quantitativas (aumento da população) e
qualitativas (formação estrutural e qualitativa da cidade moderna) geradas na
estrutura urbana e social das cidades e decorrentes das transformações e
exigências de uma sociedade pautada no capitalismo industrial
36
.
As adequações necessárias aos grandes centros urbanos ocidentais para
se integrarem ao capitalismo industrial estabelece m e priorizam a necessidade de
35
LE CORBUSIER, Urbanismo, p. 245-247.
36
ROLNIK, O que é cidade, p. 78-79.
34
uma cidade ligada ao espírito de uma nova sociedade ativa e moderna, propiciando,
assim, uma área de transição da ar quitetura para o urbanismo. Nesse sentido,
Jacobs chama a atenção para a idéia central que une arquitetura/urbanismo e as
cidades do início do século XX.
O homem que teve a idéia mais espantosa a respeito de como
colocar todo esse planejamento anticidade diretamente de ntro das
próprias cidadelas da iniqüidade foi o arquiteto europeu Le Corbusier.
Ele planejou nos anos 20 uma cidade imaginária que denominou Ville
Radieuse, composta não dos prédios baixos, tão caros aos
descentralizadores, mas principalmente de arra nha-céus dentro de
um parque. Imagine que estamos entran do na cidade pelo Grande
Parque’, escreveu Le Corbusier. Nosso carro veloz toma a rodovia
elevada especial entre os majestosos arranha -céus; ao chegar mais
perto, vemos contra o céu a suces são de vinte e quatro arranha-
céus; à esquerda e à direita, no en torno de cada área específica,
ficam os edifícios municipais e administrativos; e circundando esse
espaço, os prédios universi tários e os museus. A cidade inteira é um
Parque’.
37
Segue Jacobs em sua crí tica aos expoentes do planejamento urbano
moderno convencional, como Le Corbusier:
Na cidade vertical de Le Corbusier, a massa da população seria
alojada a uma taxa de 296 habitantes por mil metros quadrados, uma
densidade urbana sem dúvida fantasticamen te alta, mas, em virtude
das construções altas, 95 por cento do solo permaneceria livre.
Os arranha-céus ocupariam apenas 5 por cento do solo. As pes soas
de alta renda ficariam nas moradias mais baixas e luxuosas, ao redor
de pátios, com 85 por cento de á rea livre. Aqui e acolá haveria
restaurantes e teatros. Le Corbusier planejava não apenas um
ambiente físico; projetava também uma utopia social .
38
Parece-nos que a cidade moderna tem a necessidade de se apresentar
viva, sempre em movimento para cima e para baixo para o lado não interessa –,
tem de facilitar o movimento de todos os fatores que proporcionam a produção
capitalista. O trinômio movimento/cidade/produção estabelece cada vez mais a
necessidade de uma cidade que é puro movimento.
Portanto, quando se fala em “cidade viva” , pode-se dizer que isso decorre
37
JACOBS, Morte e vida de grandes cidades , p. 21.
38
Ibidem, p. 21.
35
da gênese da cidade moderna, constituída a partir dos princípios urbanistas dos
séculos XIX e XX.
Os princípios do urban ismo moderno foram usados de forma a assegurar
a prevalência da ordem, do movimento, da quina sobre a ambientação das
pessoas nos centros urbanos modernos. Mas , a partir do trabalho de Jacobs, o
principal expoente do urbanismo americano o elemento humano passa a se
colocar como eixo central do desenvolvimento das cidades mode rnas. Desde então,
conceber a dimensão qualitativa dentro do urbanismo moderno se tornou imperfeito.
O que se coloca como elemento delineador , então, é o movimento dos
olhos, das pessoas, da dança e não mais o movimento dos carros, da produção, da
geometria, ou seja, a vida das cidades está em seus habitantes.
Sob a aparente desordem da cidade tradicional, existe, nos lugares
em que ela funciona a contento, uma ordem surpreen dente que
garante a manutenção da segurança e a liberdade. É uma ordem
complexa. Sua essência é a complexidade do uso das calçadas, que
traz consigo uma sucessão permanente de olhos. Essa ordem
compõe-se de movimento e mudança, e, embora se trate de vida,
não de arte, podemos chamá -Ia, na fantasia, de for ma artística da
cidade e compará-Ia à dança não a uma dança mecânica, com os
figurantes erguendo a perna ao mesmo tempo, rodopiando em
sincronia, curvando-se juntos, mas a um balé complexo, em que
cada indivíduo e os grupos têm todos papéis distintos, que por
milagre se reforçam mu tuamente e compõem um todo ordenado. O
balé da boa calçada urbana nunca se repete em outro lugar, e em
qualquer lugar está sempre repleto de novas improvisações .
39
New York e a reação ao urbanismo moderno do início do século XX
New York sentiu fortemente os impactos do chamado planejamento
urbano moderno convencional em sua estrutura urbana , e Jacobs percebeu
claramente seus elementos mais nocivos, e que levaram à decadência e à
degradação diversas partes da cidade. “A autodestruição da diversidade pode
ocorrer nas ruas, em pequenos nichos de vitalidade, em quarteirões ou em distritos
inteiros. Este último é o caso mais sério”
40
.
A necessidade de modernizar a cidade e de adequá-la ao
39
JACOBS, Morte e vida de grandes cidades , p. 52.
40
Ibidem, p. 268.
36
desenvolvimento capitalista, capitaneados pelos massivos investimentos es tatais,
fez com que New York sentisse a falta da diversidade, da combinação diversi ficada
de usos e da concentração de pessoas , o que gerou inevitavelmente, a degradação,
a monotonia, à obsolescência do espaço da cidade, sobretudo na década de 1970.
A necessidade de usos combinados, da mistura das idades das
construções, a alta concentração de pessoas e a rua freqüente mente revigorada em
sua função de elemento norteador da dança, do movimento das pessoas , são
ingredientes necessários para a recuperação dos centros urbanos modernos, tal
qual se fazia necessário na New York dos anos de 1960 e 1970.
Minhas observações e conclusões até aqui se resumem ao se guinte:
nas cidades norte-americanas, precisamos de todos os ti pos de
diversidade, intrincadamente com binados e mutuamente
sustentados. Isso é necessário para que a vida urbana funcione
adequada e construtivamente, de modo que a população das ci dades
possa preservar (e desenvolver ainda mais) a sociedade e a
civilização. Os órgãos públicos e semipúblicos são responsáveis por
alguns dos empreendimentos que ajudam a construir a diver sidade
urbana como parques, museus, escolas, a maioria dos auditórios,
hospitais, certos escritórios, certas moradias. Toda via, a maior parte
da diversidade urbana é criação de uma quantidade inacreditável de
pessoas diversas e de organizações priva das diversas, que têm
concepções e propósitos bastante diversos e planejam e criam fora
do âmbito formal da ação pública. A principal responsabilidade do
urbanismo e do planejamen to urbano é desenvolver na medida em
que a política e a ação públi ca o permitam cidades que sejam um
lugar conveniente para que essa grande variedade de planos, idéias
e oportunidades extra -oficiais floresça, juntamente com o
florescimento dos empre endimentos públicos. Os distritos urbanos
serão lugares social e eco nomicamente convenientes para que a
diversidade surja por si e atinja seu potencial máximo, caso os
distritos possuam boas combinações de usos principais, ruas
freqüentes, densa mistu ra de idades das construções e alta
concentração de pessoas .
41
A imperiosidade da diversidade nos centros urbanos modernos foi
registrada por Jacobs como forma de reação à uniformização oriunda dos princípios
do urbanismo e do planejamento do início do século XX, sobretudo daqueles
princípios apregoados por Hausem ann, Le Corbusier, entre outros.
As condições para a diversidade urbana foram dadas por Jacobs , que
estabeleceu os princípios a serem aplicados em diversos centros urbanos, como em
41
JACOBS, Morte e vida de grandes cidades , p. 267-268.
37
New York, primeiramente. Torna-se importante verificar o que é fundamental na
teoria urbana jacobsiana para gerar a diversidade.
quatro condições indispensáveis para gerar uma diversi dade
exuberante nas ruas e nos distritos:
1. O distrito, e sem dúvida o maior númer o possível de segmentos
que o compõem, deve atender a mais de uma função prin cipal; de
preferência, a mais de duas. Estas devem garantir a pre sença de
pessoas que saiam de casa em horários diferentes e es tejam nos
lugares por motivos diferentes, mas se jam capazes de utilizar boa
parte da infra-estrutura.
2. A maioria das quadras deve ser curta; ou seja, as ruas e as
oportunidades de virar esquinas devem ser freqüentes.
3. O distrito deve ter uma combinação de edifícios com ida des e
estados de conservação variados, e incluir boa porcenta gem de
prédios antigos, de modo a gerar rendimento econômico variado.
Essa mistura deve ser bem compacta.
4. Deve haver densidade suficientemente alta de pessoas, se jam
quais forem seus propósitos. Isso inclui alta conc entração de
pessoas cujo propósito é morar lá.
A obrigatoriedade dessas quatro condições é o ponto mais
importante deste livro.
42
Estavam estabelecidas , a partir de então, as bases para a reação ao
urbanismo moderno, e que passaram a prevalecer para diver sos pensadores
contemporâneos que se aventuram nos estudos e princípios do planeja mento
urbano. Vale registrar que temos acompanhado ess a linha.
Seja qual for a proposta deste estudo, não se pode deixar de mencionar a
contribuição legada pelos princípios acima citados ao urbanismo e ao planejamento.
Ressalte-se que a dimensão do trabalho de J acobs se deu, também, em
virtude de seu objeto do estudo proposto, ou seja, New York, cidade que comporta
uma complexidade sem fim de análises em relação a sua estrutura urbana.
O Fausto de Goethe/ Hausmann/ Robert Moses
Quando Berman traduziu a modernidade na expressão tudo o que sólido
desmancha no ar”
43
, ele certamente tinha a certeza da efemeridade do fenômeno. A
racionalização do processo de produção, a prevalênc ia do homem econômico
42
JACOBS, Morte e vida de grandes cidades , p. 165.
43
BERMAN, Tudo que é sólido desmancha no ar : a aventura da modernidade , p. 15.
38
racionalista traz em seu bojo o incerto, o frígido, a insegurança, a fragilidade da vida
moderna. Todos ess es aspectos vão influenciar fortemente a mente e as ações dos
responsáveis por transformar as nossas cidades , de forma a prepará-las para a
sociedade industrial em que vivemos.
Alguns personagens que participaram da construção dos ideais e das
ações das cidades modernas, em todo o mundo, apres entam pontos e ações
comuns. O Barão Hausmann, na Pa ris do século XIX; Robert Moses, na New York
dos anos 1950 e 1960; Barata Ribeiro, no Rio de Janeiro na virada do século XIX
para o século XX; entre outros, trazem consigo não os elementos da ordem, do
progresso, da razão, mas, sobretudo, a face do Fausto urbano: presente s os
elementos usticos de Goethe da criação e da destruição, do bem e do mal; é
preciso destruir e criar. Criar o novo, o moderno ; e destruir o velho, o antigo.
Algumas ações merecem atenção de maneira a ilustrar o plano de
reforma do centro de Paris idealizado pelo Barão Hausmann, administrador de
Napoleão III que consistia na criação de grandes artérias de trá fego (boulevards),
tudo feito com a demolição (destruição) de vários bairros populares. Na New York
dos anos 1950 e 1960, Robert Moses criou símbolos e imagens que marcaram a
cultura moderna, promovendo a ruína e a destruição de vá rias partes da cidade. “Por
dez anos, do final dos anos 50 ao iní cio dos 60, o centro do Bronx foi mar telado,
dinamitado e derrubado”
44
.
No Rio de Janeiro do início do século XX, B arata Ribeiro, influenciado
pela sanha reformista e movido pelo desejo de criar os novos símbolos da repú blica
que acabara de nascer, promoveu o chamado “bota abaixo”.
A nova cruzada contra o atraso e a barbárie monta seus exércitos.
Pás e picaretas vigorosame nte vão destruindo o velho Rio do
Império. Aquele casario macerado, vincado pelo correr do tempo,
superlotado de adventícios europeus, asiáticos e de migrantes
internos muitos deles tangidos para a Capital pela decadência do
café vale paraibano –, cede aos soldados do progresso e da higiene,
que os derribam com a fé en sandecida dos lunáticos e dos beatos .
45
A figura do fausto tem apresentado elementos que o traduzem em uma
imagem representativa de boa parte da cultura moderna, no que tange
44
BERMAN, Tudo que é sólido desmancha no ar : a aventura da modernidade, p. 277.
45
UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA,Estudos de História, p. 84.
39
principalmente a alguns de seus elementos urbanos. A criação e a destruição,
elementos do poder divino, é a marca fáustica deixada sobre a cultura urbana
moderna. Alguns dos personagens possuem os elementos presentes nas
transformações usticas mais puras: Hausmann, Moses e Barata Ribeiro possuem
os elementos da heroicidade do Fausto g oethiano criar e destruir é necessár io.
Berman entende que a força vital que anima o F austo goethiano e que gera muito de
sua riqueza é o dinamismo e o desejo de desenvolvimento, como no relato
46
.
Uma das idéias mais originais e frutíferas do Fausto de Goethe diz
respeito à afinidade entre o ideal cultural do autodesenvolvimento e o
efetivo movimento social na direção do desenvolvimento econômico.
Goethe acredita que essas duas formas de desenvolvimento devem
caminhar juntas, devem fundir -se em uma só, antes que qualquer
uma dessas modernas promessas arquetípicas venha a ser
cumprida. O único meio de que o homem mode rno dispõe para se
transformar. Fausto e nós mesmos o veremos é a radical
transformação de todo o mundo físico, moral e social em que ele
vive. A heroicidade do Fausto goethiano provém da liberação de
tremendas energias humanas repri midas, não nele mesmo, mas
em todos os que ele toca e, eventual mente, em toda a socied ade a
sua volta. Porém, o grande desenvolvi mento que ele inicia
intelectual, moral, econômico, social representa um altíssimo custo
para o ser humano. Este é o sentido da relação de Fausto com o
diabo: os poderes humanos podem se desenvolver atr avés
daquilo que Marx chama de ‘os poderes ocultos’ , negras e
aterradoras energias, que podem irromper com força tremenda, para
além do controle humano. O Fausto de Goethe é a primeira e ainda a
melhor tragédia do desenvolvimento .
47
Por fim, aponta Berman: O interminável canteiro de obras de F austo é o
chão vibrante, porém, inseguro , sobre o qual devemos balizar e construir nossas
vidas”
48
.
A cidade moderna tem o chão vibrante e inseguro , no qual se assenta boa
parte de nossas esperanças de um futuro promiss or.
A cidade e a modernidade
46
BERMAN, Tudo que é sólido desmancha no ar : a aventura da modernidad e, p. 41.
47
Ibidem, p. 41-42.
48
Ibidem, p. 84.
40
As cidades sob nossos pés têm que se acomodar à noção racional
moderna da criação e reconstrução constante , dada a inconsistência em função da
frugalidade dos tempos modernos – literalmente, nada é sólido, tudo pode ser
desmanchado. Basta que o espírito do desenvol vimento prevaleça nas mentes de
nossos Faustos. Afinal, a metamorfose na cultura moderna faz parte de sua própria
essência e é uma condição para a existência da sociedad e capitalista como a
conhecemos. Nossas cidades não fugiram dessa lógica, presente na história do
desenvolvimento das sociedades burguesas.
No entendimento de Berman, o resgate e a preserva ção da tradição da
memória e de seus lugares, a preservação da possibilidade de mantermos um elo
com nosso passado, de aprendermos e resgatarmos aquilo que nos faz humanos e
não autômatos inseridos na lógica do mercado parecem cada vez mais difíceis nos
centros urbanos modernos
49
.
Berman retoma Marx para ratificar a gica da efem eridade da sociedade
de mercado e de nossas cidades, que se têm apresentado como palco para a
construção deste modelo de de senvolvimento com base no efêmero, na
substituição, na troca permanente do velho pelo novo, como entendeu Berman.
O imenso volume de dinheiro e energia investido em co nstruir e o
autossumido caráter monumental de muito dessa construção de
fato, em todo o século de Marx, cada mesa e cadeira num interior
burguês se assemelhava a um monumento testemunham a
sinceridade e seriedade dessa proclamação. Não obstante, a
verdade é que, como Marx o vê, tudo o que a sociedade burguesa
constrói é construído para ser posto abaixo. ‘Tudo o que é sólido’
das roupas sobre nossos corpos aos teares e fábricas que as tecem,
aos homens e mulheres que ope ram as máquinas, as casas e a os
bairros onde vivem os trabalhadores às firmas e corporações que
os exploram, às vilas e cidades, regiões inteiras e até mesmo as
nações que as envolvem tudo isso é feito para ser desfeito
amanha, despedaçado ou esfarrapado, pulverizado ou dis solvido, a
fim de que possa ser reciclado ou substituído na semana seguinte e
todo o processo possa seguir adiante, sempre adiante, talvez para
sempre, sob formas cada vez mais lucrativas .
50
Berman ainda enfatiza a força destrutiva do capitalismo moderno,
traduzido pela fragilidade das construções burguesas.
49
BERMAN, Tudo que é sólido desmancha no ar : a aventura da modernidade, p. 97 -98.
50
Ibidem, p. 97-98.
41
O fathos de todos os monumentos burgueses é que sua força e
solidez material na verdade não contam para nada e carecem de
qualquer peso em si; é que eles se desmantelam como frágeis
caniços, sacrificados p elas próprias forças do capitalismo que
celebram. Ainda as mais belas e impressionantes construções
burguesas e suas obras públicas são descartáveis, capitalizadas
para rápida depreciação e planejadas para se tornarem obsoletas;
assim estão mais próximas, em sua função social, de tendas e
acampamentos que das ‘ pirâmides egípcias, dos aquedutos
romanos, das catedrais góticas’ [...].
51
A aventura da modernidade se apresentou pa ra quase todas as principais
cidades ocidentais, de maneira geral, de uma forma que em muito se assemelha ao
relatado até aqui. No Brasil não foi muito diferente , já que a aventura do moderno
urbano traz características e particularidades próprias ao processo de
desenvolvimento capitalista local, como veremos à frente.
As cidades brasileiras e as bases do urbanismo moderno a chamada
Renovação Urbana
Nas cidades ocidentais, sobretudo a partir da segunda metade do século
XX, os elevados custos da infr a-estrutura, a segregação sócio-espacial, as carências
de transporte, a violência urba na, a elevação do preço dos imóveis , entre outros
danos atribuídos à vida urbana, decorreram , principalmente, de uma desmedida
expansão horizontal e de um inaceitável processo demolitório, justificado pelo que
se convencionou chamar de renovação urbana:
A análise da literatura relativa ao tema orientou a divisão dos
processos de intervenção em centros urbanos em três períodos
principais: Renovação urbana, relativo às décadas de 1950 e 1960;
Preservação urbana, desenvolvido nas décadas de 1970 e 1980;
Reinvenção Urbana, nascido por volta da década de 1990 e
prolongado até os dias atuais. È, contudo, necessário observar que
esses períodos não são rigorosos nas suas delimitações nem
excludentes entre si.
52
No Brasil e em outras partes do mundo, a preferência pelo novo marcou
os processos de intervenção urbana no primeiro período denominado de renovação
51
BERMAN, Tudo que é sólido desmancha no ar : a aventura da modernidade, p. 97 -98.
52
VARGAS; CASTILHO , Intervenções em Centros Urbanos : objetivos, estratégias e resultados, p. 0 5.
42
urbana. Para Vargas e Castilho, s em dúvida, a carta de Atenas de 1933, que
expunha a proposta do urbanismo do movimento moderno , sinalizou as ações que
logo se sucederiam demolir e construir para renovar permearia os interesses tanto
da elite que idealizou o m ovimento quanto daquela que o materializou
53
.
Este processo ficou conhecido como Renovação Urbana (Urban
Renewal), no qual não havia intuito de preservar os edifícios ou
mesmo o conjunto deles. Alguns estudiosos definem este período
como bulldozer days, ou seja, um arrasamento de quarteirões, como
aqueles que se observam após as guerras.
54
Em relação às áreas centrais da maioria das cidades ocidentais, onde se
deu tal processo, é importante observar, no contexto deste trabalho , que elas
desempenharão um importante papel.
A idéia que permeou o movimento de renovação urbana (1950 a 1970)
seria eliminar o congestionamento das áreas centrais, com a criação de gr andes
espaços para um sistema de vias amplas, estaci onamentos, áreas institucionais
etc.
55
Na cidade de Montes Claros, as diretrizes então estabelecidas no I Plano
Diretor Urbano contemplavam a mesma vertente. Verificaremos, adiante, como
esses preceitos estavam contidos nas orientações do sistema viário a ser
implementado.
Importante ressaltar que os primeiros planos que poderiam ser
enquadrados dentro do conceito de renovação urbana foram propostos no século
XIX, quando a palavra de ordem era a “higienizaç ão” o exemplo clássico é a
reforma de Paris, realizada por Haussmann (1851 -1870): ao estabelecer a
organização da cidade em arrondissements, foram abertas largas avenidas,
ampliando-se os limites do território urbanizado , e destruindo, arrasando grande
parte da estrutura então existente. No Brasil, o exemplo singular, respeitada s as
proporções, é a reforma realizada pelo pre feito Pereira Passos, no Rio de Janeiro
(1903 -1906), então capital do país
56
.
53
VARGAS; CASTILHO, Intervenções em Centros Urbanos : objetivos, estratégias e resultados, p. 08-
09.
54
Ibidem, p. 09.
55
Ibidem, p. 13-15.
56
Ibidem, p. 56-57.
43
Segundo Choay e Merlin
57
, citados por Vargas e Castilho, a crítica ao
modelo de renovação u rbana deve-se centrar no Plano S ocial, uma vez que desfaz
o laço de habitantes da área “renovada” , quando são removidos para outros
lugares
58
. Segundo Vargas e Castilho, a morfologia do lugar é rompida brutalmente ,
desfazendo as características do tecido urbano anterior e a relação com a
vizinhança
59
. Essa atitude foi própria das idéia s modernistas, e tais princípios estão
implícitos na carta de Atenas
60
e foram fortemente reforçados por Le Corbusier, o
que acabou por influe nciar várias gerações de urbanistas modernos.
No período pós-guerra, com a reconstrução das cidades européias e o
surgimento de novas capitais pelo mundo, cidades como Brasília e Belo Horizonte,
no Brasil, foram construídas de acordo c om os preceitos de Le Corbusier.
No Rio de Janeiro, exemplo clássico brasileiro, as intervenções
renovadoras modernas no século XX contribuíram para resu ltados imprevistos que
levaram à degradação dos espaços da cidade, sobretudo até a década de 1970, que
marca o fim da renovação urbana no Rio e o iní cio do período conhecid o como
preservação urbana.
Cabe, ainda, ressaltar que o objeto de estudo deste trabalho é o
aprofundamento das discussões ligadas à renovação urbana modernista, mais
especificamente em Montes Claros . Segue um quadro apresentando as fases deste
período – renovação urbana , no Rio de Janeiro dos séculos XVII ao XX.
57
CHOAY; MERLIN, Dictionaire de l’urbanisme et l’aménagement , p. 580.
58
VARGAS; CASTILHO, Intervenções em Centros Urbanos : objetivos, estratégias e resultados, p. 56 -
57.
59
Ibidem, p. 56-57.
60
CURY, Cartas Patrimoniais . Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional IPHAN, p. 2.
44
QUADRO 1
Cidade do Rio de Janeiro – Síntese histórica das transformações espaciais nas áreas central e da
Lapa
PERÍODO
INTERVENÇÃO/
PROJETO
OBJETIVO
ENUNCIADO
CONSEQÜÊNCIA
(ÁREA CENTRAL)
CONSEQÜÊNCIA
(LAPA)
Séculos
XVII/XIX
Desmonte de morros;
Aterros;
Aqueduto da Carioca.
Ocupação do território;
Criação de solo
urbanizável;
Construção de infra-
estrutura urbana.
Alteração do meio
ambiente;
Expansão da área urbana;
Adensamento
populacional.
Criação do futuro
marco;
Elemento simbólico
da área;
Ocupação urbana.
Déc. 1900
Reforma urbana
Pereira Passos:
Abertura de vias;
Criação do porto.
Saneamento;
Embelezamento;
Modernização;
Ordem urbana.
Expulsão da moradia;
Formação de favelas;
Destruição do patrinio;
Área central como área
de lazer e cultura.
Expulsão da moradia;
Destruição do
tecido urbano.
Déc. 1920
Arrasamento do Morro
do Castelo.
Saneamento, aeração e
higiene;
Abertura de vias,
modernizão.
Destruição de marcos e
do tecido urbano;
Formação de vazios e
favelas.
Déc.
1920/1930
Renovação da área
da Cinelândia;
Mudança de uso na
Lapa.
Modernização;
Área de lazer das
classes altas;
Criação de lugares da
Boemia;
Sede de jornais.
Início da verticalização;
Área central como área
de lazer e cultura de
elite.
Lugar da boemia e
de lazer da classe
média, de sedes
de jornais e de
manifestações
políticas.
Déc. 1940
Estado Novo: abertura
da Av. Presidente
Vargas;
Controle de atividades
urbanas.
Rodoviarismo,
transporte individual;
Embelezamento e
ordem urbana;
"Limpeza de usos sujos".
Expulsão da moradia;
Formação de vazios;
Destruição do
patrimônio.
Repressão das
atividades de
lazer, cabarés,
prostíbulos.
Déc. 1950
Arrasamento do Morro
de Santo Antônio;
Degradação da Lapa.
Saneamento;
Abertura da Av. Norte-
Sul (não concretizada).
Destruição da primeira
favela da cidade;
Formação de vazios.
Expulsão da moradia;
Destruição do
tecido urbano.
Déc.
1950/1960
Construção da Av.
Perimetral;
Extensão da Av.
Perimetral.
Obra viária.
Rompimento da relação
do centro com o mar.
Perda de status;
Degradação do
tecido urbano.
Déc. 1960
Renovação do Estácio
e do Catumbi;
Destruição do casa rio
da Lapa.
Obras viárias – acessos
ao túnel Santa Bárbara.
Arrasamento dos
bairros do Estácio e
Catumbi;
Expulsão da moradia.
Destruição e
degradação do
tecido urbano.
Déc. 1970
Construção do metrô.
Dec. n. 322/76 proíbe
uso residencial na
ACN;
Destruição da casa rio
da Lapa.
Transporte de massa;
Ordenação do espaço
urbano.
Destruição do tecido
urbano histórico;
Formação de vazios;
Expulsão da moradia.
Arcos da Lapa
destacados na
paisagem urbana;
Expulsão da moradia.
Fonte: VARGAS; CASTILHO, 2006.
45
Ainda sobre o assunto:
Assistiu-se na cidade do Rio de J aneiro, durante décadas, à
constante decadência dos bairros centrais, até surgirem indícios de
uma reversão dessa dinâmica. Ao contrá rio do que se observam até
meados da década de 1970, seguindo uma t endência
contemporânea de cidades européias e norte -americanas, as
grandes intervenções urbanas com base em bula rasa foram
substituídas por intervenções físicas e ações localizadas, pontuais ou
mais amplas.
61
Finalmente, a necess idade de incorporação , a essa análise, do
reconhecimento do valor da histó ria da cidade e do elemento humano como ser
sócio-cultural constatação irrelevante pelas ações decorrent es da renovação
urbana moderna deve ser seriamente considerada. Sobre o assunto, Vargas e
Castilho são bastante felizes, ao postularem que [...] toda cidade é histórica, pois
ela é a materialização do processo histórico; é impossível não deixar de atribuir juízo
de valor ao escolher as áreas para intervenções
62
.
Por fim, a percepção da importância do fenômeno da modernidade,
sobretudo quando ligado ao urbano, às nossas cidades, deve ser alvo de atenciosa
e detalhada análise, para que possamos bem dimensionar a relevânc ia desse
evento na construção de nosso entendimento do que seja a cidade moderna, a
cidade com que nos deparamos em nosso dia-a-dia.
Nos próximos capítulos, reduziremos o foco para os eventos ocorridos na
cidade de Montes Claros no final da década de 1960 e no iní cio da década de 1970.
Destaque-se o período ligado à elaboração do I Plano Diretor Urbano da cidade , que
parece expressar, de forma geral , a necessidade dos governantes à época de se
adequarem às práticas , então existentes, da chamada renovação urbana,
responsável pela transformação de inúmeras cidades por toda parte do mundo.
61
VARGAS; CASTILHO, Intervenções em Centros Urbanos : objetivos, estratégias e resultados, p. 68.
62
Ibidem, p. 62.
46
CAPÍTULO 2
OS PRINCÍPIOS DO URBANIS MO MODERNO E A CIDADE DE MONTES
CLAROS
Antecedentes as cadas de 1960 e 1970, Montes Claros e a
Superintendência de D esenvolvimento do Nordeste (SUDENE)
Quando Guimarães Rosa, em “Grande Sertão: Veredas”, logo no início do
livro, define o sertão, tem em mente a noç ão do que representa o espaço físico
neste lugar. Afinal, no norte de Minas Gerais , o sertão está em toda parte, no
espírito e na matéria. Nesse sentido, vejamos:
[...] lugar sertão se divulga: é onde os pastos carecem de fechos;
onde um pode torar dez, quinze léguas, sem topar com casa de
morador; e onde criminoso vive seu cristo -jesus, arredado do arrocho
de autoridade. O Urucúia vem dos montões oestes. Mas, hoje, que
na beira dele, tudo fazendões de fazendas, almargem de
vargens de bom render, as vazantes; culturas que vão de mata em
mata, madeiras de grossura, a ainda virgens dessas há. O
Gerais corre em volta. Esses gerais são sem tamanho. Enfim, cada
um o que quer aprova, o senhor sabe: pão ou pães, é questão de
opiniães... O sertão está em toda parte.
63
A idéia de um lugar singular, diferenciado por um conjunto de
características próprias e autônomas, faz do sertão, quase sempre, um lugar
carecedor de uma abordagem peculiar seja nas art es, na ciência, na religião, seja no
que for, como lhe seria pertinente.
A cidade de Montes Claros está cravada em meio ao ser o norte-mineiro.
Traz em seu bojo um conjunto de ambigüidades que são inerentes à sua posição
geo-estratégica, uma cidade com t raços de urbanidade e formas características dos
grandes centros urbanos nacionais. Indús trias, comércio, transporte, comunicação,
estrutura urbana e viária das mais modernas do país, tudo isso imerso em um lugar,
onde muitas vezes, como diz Guimarães: “os pastos carecem de fecho
64
.
Ao se estabelecer um conjunto de pontos relevantes no trato da estrutura
63
ROSA, Grande sertão: veredas, p. 8.
64
Ibidem, p. 8.
47
urbana da cidade, tais aspectos devem ser levados em conta, contudo , ao se cogitar
sobre a questão urbana de Montes Claros, não se pode perder de vista que dois
aspectos assumem características fundamentais: a industrialização e o papel
desempenhado pelo Estado. Portanto, vincular -se-ão esses dois aspectos à
problemática urbana local.
O Estado Brasileiro, nas décadas de 1960 e, sobretudo 1970, procurou
garantir ao capital, tanto nacional quanto internacional, as condições necessária s a
sua reprodução, para, com isso, garantir o desenvolvimento do país. “E a cidade
tem-se apresentado ao capital industrial moderno com o o centro ideal de reprodução
deste capital”
65
.
A participação do estado no processo de reprodução do capital tem um
caráter significativo, cabendo a ele garantir a reprodução daqueles elementos que
não oferecem remuneração suficientemente eficaz para atrair o capital privado.
Algumas vezes, ess es elementos, após terem atingindo determinadas
condições de rentabilidade necessárias, volta m à esfera do setor privado, a exemplo
da habitação. Com isso, os salários desses elementos se vêem como resultante das
implicações de uma produção extremamente merc antil.
Todavia, em seu bojo, essas implicações carregam uma contradição , que
é a de que a produção mercantil dess es elementos traz, implicitamente, a lógica da
valorização do capital invest ido. Sendo assim, o acesso a ess es bens deveria dar-se
por meio de melhoria das condições salariais.
Porém, o que se tem assistido no Brasil, nas últimas décadas, é a uma
perda progressiva do poder aquisitivo dos trabalhadores, decorrente da
desvalorização dos salários reais.
Isso, é lógico, impossibilita, a muitos brasileiros o acesso à maioria dos
bens de consumo coletivo, que passam à área da iniciativa privada. Além disso, a
verdade é que historicamente, em períodos de crise, ocorre uma redução das verbas
destinadas ao subsídio do consumo coletivo , uma vez que uma par te significativa
dos recursos vai para o setor privado, sob a forma de subsídios à produção, créditos
à agricultura, baixas taxas de juros etc., visando, obviamente , amenizar os efeitos da
crise no capital privado.
Explica-se, assim, o fato de o êxito do processo reivindicatório dos
65
ZULAR, Curso sobre a Elaboração de Planos Diretores, p. 27.
48
trabalhadores para satisfação de suas necessidades de consumo coletivo, e o
aprofundamento dos serviços prestados pelo Estado estarem intimamente ligados à
conjuntura político-econômica, vivida pelo país quando do processo reivi ndicatório.
Vale, ainda, registrar: “fica claro que aceleração do ritmo de urbanização
do Brasil, a partir do século passado, tem por causa básica a industrialização. Este é
um fato notório”
66
.
Visto por esse ângulo, o crescimento de uma cidade ou a urbaniz ação de
uma região estão atrelados a partes de um industrialismo em expansão.
Conclui-se, então, que a questão urbana no Brasil se molda , ao longo do
processo mais geral de urbanização que integrou todas as regiões do país, através
da modernização e ajusta mento ao sistema capitalista moderno.
A análise das questões urbanas no Brasil passa pela reflexão da situação
do consumo coletivo da sociedade brasileira, situação intimamente vinculada ao
papel desempenhado pelo Estado durante o processo de urbanização e
industrialização das cidades brasileiras.
É nesse contexto que foi criada a Superintendência de Desenvolvimento
do Nordeste (SUDENE) , instituída pela Lei 3692 e que tinha por finalidades: estudar
e propor diretrizes para o desenvolvimento do N ordeste; supervisionar, controlar e
coordenar a elaboração e execução de projetos a cargo dos órgãos federai s na
região e que se relacionam especificamente com o seu desenvolvimento; executar
diretamente ou mediante convênio, acordo ou contrato , os projetos relativos ao
desenvolvimento no Nordeste, que lhe foram atribuídos em termos de legislação
vigente; e coordenar programas de assistência téc nica, nacional ou estrangeira no
Nordeste.
Para fins de criação da SUDENE, considerou -se como Nordeste a região
compreendida pelos Estados do Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte,
Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia, tendo , ainda, atuação na zona de
Minas Gerais compreendida como “Polígono da Secas”, basicamente norte e
nordeste de Minas.
Dentro de um objetivo ma ior do governo federal à época (1970), qual seja
o de construir no Brasil uma sociedade desenvolvida,
66
LOPES, Desenvolvimento e mudança social , p. 35.
49
Expressa o atual governo, que com o objetivo de construir no Brasil
uma sociedade desenvolvida, consideram -se 3 perspectivas: a curto
prazo com o program a de ação (1970/73) dentro do presente
mandato presidencial; a da década 1970/80; e a de uma geração, até
o ano 2000, para construir um paí s plenamente desenvolvido.
A realização desses objetivos pode trazer modificações substanciais
na estrutura urbana do país que modifiquem o rumo das tendências
examinadas, merecendo ser analisadas, especialmente à luz da
concepção das metas traçadas para o período de 197 0/73. O fato de
criar-se entre 800 mil e 1 milhão de empregos por ano , que
provavelmente serão do tipo urbano em sua maioria, induz a estudar -
se o efeito sobre o fenômeno irreversível da urbanização.
A estratégia do desenvolvimento que se apóia na conciliação da
agricultura e da indústria, com o aumento do emprego da mão de
obra e a busca da expansão do me rcado interno, sem sacrifício das
taxas de aumento do PIB (acima de 7% ao ano), implica , por um
lado, a seleção de setores na área urbana (como o da construção)
que absorvam maciçamente a mão de obra e, por outro lado, a
ampliação da fronteira.
Espacialmente isso significa:
A) Integração, particularmente no centro -sul, do desenvolvimento
industrial acelerado, com crescimento mais rápido da agricultura ,
para permitir a expansão complementar da demanda dos setores;
B) Incorporação de novas áreas à economia nacional, principalmente
no planalto central, vales úmidos do nordeste e, progressivamente, a
Amazônia.
67
O que aconteceu no Brasil, naquela época, tinha uma estreita vinculação
com o programa da Organização dos Estados Americanos ( OEA), cujo interesse, em
matéria de desenvolvimento urbano, está relacionado com o então iniciado
Programa de Desenvolvimento Urbano (PDU), a cargo do Departamento de
Assuntos Sociais, em sua Divisão de Desenvolvimento Urbano, o órgão da época.
No caso do Brasil, a Coordenação Regional I da Unidade de Urbanização
atendeu a esse Programa, p ara o qual estava assessorando o SERFHAU (Serviço
Federal de Habitação e Urbanismo ), organismo federal de desenvolvimento urbano
à época e que contava com um programa de ação coincid ente com o formulado pela
OEA e que viria a ser executado em conjunto.
O Programa da OEA visava fortalecer a capacidade dos Estados
membros da Organização para a formação e execução de políticas nacionais de
desenvolvimento urbano, como parte dos planos globais de d esenvolvimento
nacional. Visava, ainda, ao fortalecimento da capacidade técnica das instituições
nacionais, regionais e locais para a execução de políticas de desenvolvimento
67
BRASIL, Anais do Seminário de Desenvolvimento Urbano e Local, p. 110-111.
50
urbano, para que pudessem integrar-se aos sistemas nacionais de planejamento do
desenvolvimento.
Em Montes Claros, a criação da SUDENE influencia diretamente sua
estrutura urbana, como salienta Oliveira:
A partir da SUDENE, se instala um parque industrial um tanto
caótico, não complementar, com indústrias tradicionais ao lado
daquelas de tecnologia de ponta, ligadas ao capital do centro -sul e,
portanto, podendo ser independentes do grupo de poder local.
Entretanto isto não ocorre. O processo de industrialização é
resultado da justaposição de interesses locais e nacionais. São suas
articulações que propiciam a chegada do paraíso fiscal e financeiro
chamado SUDENE. Após este acordo político é que são abertas as
portas para qualquer empresário que tenha acesso ao parecer
favorável da SUDENE ou o apoio político do governador de Minas.
68
Quando se trata da modernização do município, Oliveira é ainda mais
contundente ao afirmar que
entre 1960 e 1985 o município se redefine. A sociedade está
industrializada e os mecanismos políticos mais modernos legitimam a
ordem autoritária e conservadora. As forças políticas se enfrentam
em novas circunstancias.
69
Sobre a SUDENE, crescimento urbano e industrialização, Oliveira e
Rodrigues destacam:
No período da industrialização incentivada ganha destaque em
Montes claros a década de setenta, com um cresc imento
populacional de 52,21%. O processo de crescimento urbano continua
acelerado, tendo se iniciado na década de sessenta, com 97,58%
prosseguindo na de setenta com 82,39%, enquanto no mesmo
período a população rural se vê reduzida.
70
Sobre o estado de “espíritos” (mentalidade) da época, seguem Oliveira e
Rodrigues enfatizando:
68
OLIVEIRA, Nova Cidade, Velha Política : Um estudo de poder sobre Montes Claros MG, p. 163.
69
Ibidem, p. 93.
70
OLIVEIRA; RODRIGUES, Formação Social e Econômica do Norte de Minas , p. 61.
51
O próprio discurso utilizado pelo governador, para justificar sua
presença mais ativa, contribuía para gerar tais expectativas, que
eram extremamente favoráveis as interesses do Estado Nacional.
Pregava-se, na ocasião, a necessidade de integrar o Norte de Minas
ao processo de industrialização nacional. Neste sentido, a criação
das condições necessárias a expansão do capital nacional e
internacional na região foi, conforme enten de-se aqui, quase que
uma pré-condição para tanto.
71
Neste trabalho, como dito anteriormente, não se pode separar a
mentalidade reinante à época d as ações propostas e executadas: são lados de uma
mesma moeda. Como é sempre de bom alvitre enfatizar o que p ensavam os
“espíritos” à época, por assim dizer, apelamos novamente,para Oliveira e Rodrigues:
A idéia de Estado modernizador, ou seja, Estado com discurso
Modernizador (grifo nosso), também é discutida por Moraes (1993, p.
84). Conforme destaca a autora , o carro chefe deste discurso era a
necessidade de integrar a economia norte -mineira à Nacional,
objetivo que seria alcançado através da industrialização,
modernização agrícola e política da área social. Estes argumentos
corroboram em grande medida aquele s apresentados por Augusto
(1989, p. 5); segundo os quais tal objetivo foi perseguindo,
principalmente através de dois canais, ‘ [...] os chamados projetos de
desenvolvimento (ou econômico) e os conhecidos projetos especiais
ou sociais, ou seja, projetos políticos’.
72
Portanto, no processo de urbanização e industrialização de Montes
Claros, é notório o papel da SUDENE como agente modernizador da estrutura
econômico-social e do espaço urbano da cidade e da região.
Bastante feliz a colocação de Gomes, quando fala de Montes Claros
como uma cidade em transformação na década de 1970:
71
OLIVEIRA; RODRIGUES, Formação Social e Econômica do Norte de Mi nas, p. 225.
72
Ibidem, p. 235.
52
A consolidação de Montes Claros em C idade industrial, ainda que
incompleta, gerou maior diversidade das suas atividades econômicos
(expansão e diversificação dos serviços) , decorrentes da entrada do
capital industrial. A década de 70 foi, portanto, um período de
transição entre a cidade Agrário -Mercantil e a cidade Urbano -
Industrial.
73
A FIG.2 abaixo demonstra o crescimento da malha urbana entre as
décadas de 1970 e 2000. Na década de 1970, o grau de urbanização do município
era de aproximadamente 73,10%.
73
GOMES, Discursos contemporâneos sobre Montes Clar os: (re)estruturação urbana e novas articulões
urbano-regionais, p. 67.
53
FIGURA 2 - Mapa 9 – A expansão urbana de Montes Claros de 1970 a 2000.
Fonte: GOMES, 2007 , p. 92.
A necessidade de adequar Montes Claros a ess e conjunto de
transformações, complexas, em um ambiente único, levou os “espíritos” da época a
organizarem e planejarem o desenvolvimento da cidade.
54
A resposta veio sob a forma do I Plano Diretor, popularmente conhecido
como Plano Diretor de “Toninho Rebello”, o prefeito da época.
As transformações no espaço urbano de Montes Claros na década de 1960 e
início dos anos 70 do século XX
As perspectivas para a cidade, já no início da década de 1970, eram de
progresso e de entusiasmo p or parte dos dirigentes locais. O I Plano Diretor, em sua
página de apresentação , trazia a seguinte menção àquele momento único na
história da cidade:
Montes Claros, tida no momento como a comuna de maior progresso
de todo o Estado, por fatores que saltam aos olhos, há de ser
também a mais importante das c idades mineiras, antes que vinte
anos sejam decorridos, se hoje, se agora, planejarmos o seu futuro.
74
As transformações do espaço urbano do município eram visíveis e os
aspectos e transformações demográficas não ficaram atrás. O I Plano Diretor
retratou fidedignamente este processo . Vejamos o que ele trazia nessas duas
dimensões:
Examinando a evolução da cidade reconhecemos a sucessão de
cinco períodos do ponto de vista da população:
- uma fase inicial, independente da atividade regional da cidade,
em que apenas funcionam os papéis de centro administrativo -
religioso, até o final do século XIX. A população estimada nesta
época é de 5.000 habitantes;
- Um período de crescimento lento, até 1 926, que reflete os
primeiros esforços de valorização de uma á rea em expansão. De
acordo com o Anuário de Minas Gerais de Ne lson Senna, em 1909 a
cidade possuía 9.000 habitantes;
- Um período de expansão acelerado, caracterizado pelo
envolvimento da estrada de ferro e de uma aglutinação em torno da
estrada de rodagem que conduz a Bahia. Em 1 940 o censo
estabelece 13.768 habitantes na cidade.
75
E continua, sobre o período mais recente:
74
MONTES CLAROS, I Plano Diretor urbano , p. 1.
75
Ibidem, p. 7.
55
- Um período de expansão contido, mas de crescimento
populacional rápido na escala brasileira. Em 1950 o censo 20.370
habitantes e em 1955 a população pode ser estimada em 28.500;
- o período de 55 até hoje, 1969 (grifo do autor) apresenta um
crescimento violento, trazendo conseqüências para a vida urbana e
um aumento populacional advindo de um êxo do rural sempre
crescente. Em 1964 o censo escolar reconhece 51.002, e em outubro
de 69 a população é de 85.931.
76
Um gráfico extraído do I Plano Diretor mostra o avanço de Montes Claros,
nas últimas cadas (1960 -1970), quando comparadas a outro município mineiro
com características parecidas, à época.
76
MONTES CLAROS, I Plano Diretor urbano, p. 7.
56
GRÁFICO 1 - Quadro comparativo de c rescimento urbano.
Fonte: MONTES CLAR OS, I Plano Diretor Urbano, 1970, p. 51 .
Em relação ao espaço urbano, as transformações são ai nda mais
57
gritantes quando comparadas àquelas ocorridas nas décadas de 1960 e 1970. O I
Plano Diretor caracteriza, copiosamente, o referido período. Segue a caracterização:
O período mais recente da evolução urbana apresenta uma
ocupação territorial extens a, devido à proliferação indiscriminada de
loteamento que estendeu a cidade sem nenhum critério.
Quando da publicação de sua obra em 1957, Hermes de Paula
apresenta um diversificado quadro industrial que, contudo , não indica
uma industrialização do municíp io. Predominavam as indústrias
rurais, e algumas que o autor cita como oficinas , são extremamente
insignificantes. Considera-se ainda que a indústria de beneficiamento
de algodão é, ainda hoje sazonal, ocupando mão de obra apenas em
dois, três ou quatro me ses do ano. De qualquer maneira, havia em
1957 uma diversificação muito maior das atividades industriais do
que em 1950, e muito mai s significativa do que em 1918 , e absorvia
um expressivo contingente da mão de obra urbana.
O crescimento mais intenso da ci dade, em termo de construções e,
principalmente quanto ao crescimento vertical, é f ato da década
atual, pois, em 1957 a cidade contava apenas com cinco prédios de
três pavimentos e alguns poucos de dois pavimentos.
77
O que fica claro é que a paisagem urbana de Montes Claros, até então,
caracterizava-se pela predominância de edificações de um pav imento, prédios de
apartamentos representando, em relação ao número de unidades habitacionais das
cidades, a insignificante percentagem de 1%
78
.
O I Plano Diretor ratificava que a verticalidade das construções era um
fator de seu tempo, um aspecto mais do que necessário aos princípios da
modernidade latente, naquele momento.
Importante acusar, nes te ponto, que o I Plano Diretor trazia em seu
conjunto a percepção d o que ocorria no mundo, em termos do pro cesso de
desenvolvimento urbano, acompanhando a tendência, apresentada neste
trabalho, da renovação urbana dos grandes centros da época. Vejamos se isso não
é claro:
77
MONTES CLAROS, I Plano Diretor urbano , p. 9-10.
78
Ibidem, p. 73.
58
Será proposta a renovação do atual centro c omercial administrativo ,
(grifo nosso) capaz de provocar o crescimento vertical e conseqüente
adensamento; a possibilidade de crescimento a leste deverá ser
coibida, para não permitir o envolvimento da BR – 135; para o norte o
crescimento será dosado até a área da zona industrial a ser
proposta, e; a sul e oeste deverá ser estimulado para permitir um
desenvolvimento no sentido de uma área melhor adequada à
urbanização, sem excluir naturalmente os estímulos tendentes ao
adensamento das áreas mais centrais ocupadas e a ocupação
gradativa dos vazios urbanos.
79
E mais, quando trata da trama urbana central, voltaremos a ela mais
atentamente:
Desafogar a circulação na trama urbana central através de vias que
estimulem a renovação das edificações no centro com ercial,
adaptando-o às necessidades atuais e futuras.
As proposições que abrangem esta área implicam em uma cirurgia
urbana profunda capaz de romper todo um complexo de
desajustamentos anacrônicos, readaptando o centro urbano à sua
função, onde se concentra a pulsação da cidade.
80
Segundo Milton Santos
81
, citado por Lessa, Oliveira e Silva, a
modernização do país e das cidades interessa a todos.
A modernização do paí s e do seu território não é apenas uma
preocupação do próprio País, mas tarefa de interess e mundial,
embora seja a sociedade nacional que deva arcar com esse ônus. O
equipamento do território nacional é frequentemente financiado com
a conjugação de recursos nacionais e de recursos externos, na forma
de empréstimos multilaterais .
Em poucos anos, a infra-estrutura e a superestrutura se modificam
fundamentalmente e o processo correspondente de urbanização
também conhece mudanças. Em primeiro lugar, o arranjo espacial
das cidades muda, tanto pelo seu tamanho consideravelmente
aumentado, como pela su a localização mais dispersa, mudam,
sobretudo, suas funções. As cidades são, de um lado, os elos de
uma cooperação e de uma regulação que se devem dar em escala
nacional, a serviço das atividades com dimensão nacional, isto é, as
grandes empresas e o Estado.
82
A modernização do país e de seu território não é preocupação do próprio
79
MONTES CLAROS, I Plano Diretor urbano , p. 79-80.
80
Ibidem, p. 134.
81
SANTOS, A Urbanização Brasileira , p. 108.
82
LESSA; OLIVEIRA; SILVA, Resenhas, p. 12-13.
59
país, mas de um contexto mundial , que acaba por impor à sociedade nacional o
dever de arcar com a responsabilidade e os custos da modernização .
Em poucos anos, esse processo acaba por modificar a infra-estrutura e a
superestrutura, transformando, assim, e de forma correspondente , o processo de
urbanização, impondo uma s érie de mudanças em primeiro lugar, o que muda é o
arranjo espacial das cidades.
Em Montes Claros, devido ao arranjo (função) à época da cidade, e ante
a perspectiva de se tornar uma cidade industrial, as transformações em seu espaço
urbano foram, sem dúvida alguma, as mais marcantes de sua história.
Por fim, ao se ter em mente uma visão da questão urbana do municíp io
de Montes Claros, deve -se conceber que ela é uma visão menor da problemática
urbana nacional e, portanto, não se pode deixar de lado a visão maior da questão
urbana brasileira, nas décadas de 1960 e 1970.
Em Montes Claros, a questão urbana está intima mente ligada à
industrialização ou seja, a cidade como centro de reprodução do capital e ao
papel desempenhado pelo Estado, principalmente nos momentos de recuperação
econômica. Como mencionado , datam dessa época as experiências mais
significativas de intervenção do executivo local na estrutura urbana da cidade.
o PIB brasileiro cresce à taxa media anual de 7% durante o governo
de Kubitschek e de 10% de 1971 a 1976. Esse acelerado
crescimento entra em crise na década de 1980. De 1981 a 1988 o
crescimento anual médio do PIB é da ordem de pouco mais de 2%,
equiparando-se ao demográfico.
83
E, coincidentemente, no período de 1981 a 1988 , praticamente não se viu
nenhuma tentativa significativa, em termos de intervenção (práticas de
planejamento), para cont enção das necessidades de consumo coletivo da população
do município.
Ora, como sabemos , nos momentos de recuperação econômica são
ampliados os serviços prestados pelo Estado , devido à pressão exercida pela
população. Daí decorre o aumento da intervenção Estatal, espelhado, sobretudo, na
forma de auspiciosos planos diretores e programas de recuperação das regiões
carentes.
83
JAGUARIBE, Alternativas do Brasil , p. 14.
60
A prática de intervenção urbana do município de Montes Claros não foge
a tal caracterização, principalmente no período pós-1970. Historicamente, a
evolução mais significativa da malha urbana se em momentos de ampla
recuperação urbana, como o do início da década de 1970.
O crescimento da população urbana do município era o que mais
contrastava com a realidade regional, no in ício dos anos 70. Um exemplo dess e
contraste era o fato de a população urbana do município passar de 33,61% , em
1960, para uma participação majoritária nos anos 70 , de 73,10%. Acrescente -se a
isso uma taxa de crescimento da população urbana de 7% ao ano.
Isso decorreu justamente do fato de que Montes Claros se constituiu no
maior centro reprodutor do capital de todo o Norte de Minas Gerais. Montes Claros
passou a contar com um parque industrial de composição diversificada, sendo ,
então, o principal centro destinatár io do fluxo de mercadorias regionais.
Com maiores contatos externos e com crescente especiali zação da
pecuária local, pós-70 a única atividade da região, até então, a lém da produção de
subsistência este último período traz à região, mais precisamente à cidade, uma
transformação que vai desde o redirecionamento na alocação dos fatores produtivos
locais, sobretudo do capital, à proletarização de uma economia até então
tipicamente rural e de subsistência.
Essas eram as variáveis que atuavam sobre o municíp io e com as quais
se deparará a mais significativa tentativa de intervenção do executivo local no
espaço urbano da cidade: o I Plano Diretor.
A cidade, a industrialização e sua estrutura urbana
Até os anos 70 do século XX, a lógica da aglomeração urbana como uma
condição indispensável à produção capitalista possibilitou o s urgimento de grandes
concentrações urbana s.
No início da década de 1970, Montes Claros vivenciava um processo
de industrialização, fomentado pelos incentivos fiscais e financeiros da SUDENE, o
que acabava por acarretar profundas modificações na economia e na estrutura
urbana do município, determinando , assim, um incessante fluxo de pessoas, capital
e até tecnologias modernas.
61
A partir de então, percebe-se uma sensível melhoria da inf ra-estrutura
urbana da cidade, notadamente nos transportes e na comunicação. Gomes retrata
muito bem a importância dess e marco histórico para a cidade, ao falar da dimensão
da década de 1970 para Montes Claros:
Concomitantemente ao processo de industriali zação, houve uma
melhoria da infra-estrutura urbana da cidade (nos setores de
saneamento, comunicação, transporte e circulação) e também a
ampliação das atividades de comercio e serviços. A expansão da
rede rodoviária, sobretudo a partir da década de 1970, permitiu uma
maior articulação do município de Montes Claros com a região do
norte de minas gerais e com os principais centros econômicos do
Brasil.
84
De acordo com Souza
85
, citado por Gomes,
A estrutura urbana é o resultado de um determinado arranjo te rritorial
da articulação de diferentes formas e objetos, que se reproduzem
refletindo as relações sociais, econômicas e políticas que constituem
uma sociedade. A estrutura urbana está em constante processo de
transformação, sendo constituída de elementos q ue relacionam entre
si de tal forma que a alteração de um elemento ou de uma relação,
altera todos os demais elementos e todas as demais relações.
86
Importante salientar que ess e processo de transformação na estrutura
urbana do município é acom panhado por uma transformação em sua esfera
institucional, e que também acompanha a modernização do Estado de Minas Gerais
e do país, como deixa claro Oliveira:
Montes Claros acompanha a modernização conservadora do Estado
de Minas Gerais e do país, quando se esforça no aprimoramento de
suas instituições políticas para garantir a dominação e o controle de
uma sociedade mais diversificada.
87
Diante dessa dinâmica, o I Plano Diretor tinha o papel de dotar o
município de uma estrutura administrativa que desse continuida de ao processo de
84
GOMES, Discursos contemporâneos sobre Montes Clar os: (re)estruturação urbana e novas articulões
urbano-regionais, p. 19.
85
SOUZA, Mudar a cidade: uma introdução crítica ao planejamento e à gestão urbana, p. 37.
86
GOMES, op. cit., p. 19.
87
OLIVEIRA, Nova Cidade, Velha Política : Um estudo de poder sobre Montes Claros MG, p. 152.
62
desenvolvimento que se iniciava o documento fazia alusão à necessidade da
criação de um órgão espec ífico para a promoção do desenvolvimento da cidade:
É a medida básica para continuidade do processo de planejamento a
reorganização do departamento de urbanismo. Na atual estrutura
conta a Prefeitura com um Departamento de Urbanismo ligado
diretamente ao Prefeito Municipal. O organismo deve ser aparelhado,
com a missão de levar a cabo as tarefas de planejamento requeridas
para o desenvolvimento da comunidade.
88
A urbanização de Montes C laros e as conseqüências sobre sua estrutura
urbana, no início da década de 1970, marcam uma relação direta com o processo de
industrialização do município, em um primeiro plano. O êxodo rural, somado ao fato
de que a cidade se transformava de rural em urbana, e os movimentos migratórios
intra-regionais são conseqüências do processo de desenvolvimento acelerado das
regiões mais dinâmicas do país , à época (sudeste/centro sul).
O I Plano Diretor de Montes Claros (Plano Diretor de Toninho Rebello) : A
expressão das forças modernizantes da década de 1970
O I Plano Diretor de Montes Claros, popularmente conhecido como o
Plano Diretor de “Toninho Rebello” , consolidou, em seu tempo, a somatória das
forças da modernidade que atuavam no município ao final da década de 1960 e
início da década de 1970.
O plano marcaria toda a história da planificação urbana da cidade, pois
acabaria por influenciar os espíritos” não da época, como de toda uma geração,
como um paradigma de uma proposta avançada, muito à frente do seu tempo,
moderna e que representa va o anseio do executivo local que, naquele momento,
representava a elite modernizadora do município .
Uma primeira avaliação do I Plano Diretor nos mostrará a imp ortância
histórica do documento. Antes, porém, faremos uma breve digressão sobre seus
antecedentes históricos e de experiências mais modestas de planejamento ocorridas
na cidade.
A história do planejamento físico -territorial tem precedentes em Montes
88
MONTES CLAROS, I Plano Diretor urbano , p. 148.
63
Claros. Em 1837, o Cel. Pinheiro Neves fez uma planta da cidade visando obs ervar
alguns princípios básicos para a melhoria das condições de uso do espaçamento
físico. naquela época, quando Montes Claros era uma simples vila, observava -se
a imperiosidade em melhorar a comodidade pública, a salubridade e a melhoria nas
condições do espaço urbano
89
. Alguns especialistas do planejamento urbano
chegam até mesmo a observ ar que esse precedente de planejamento urbano na
história de Montes Claros proporcionou um traçado menos irregular ao atual centro
da cidade.
Mas o fato é que, quando elevada a Vila de Formigas , a cidade de Montes
Claros (pela Lei Mineira 802, de 03 de julho de 1837 ) se consolidava como a
capital regional do norte -ocidental. No fim do século passado e começo deste,
Montes Claros polarizava não só o n orte-ocidental, como também a parte mais
setentrional do norte-central. Minas Novas e Capelinha exportavam grande parte do
excedente da agricultura para Montes Claros.
Paula
90
, ao fazer uma breve digressão histórica, constatou que a região
norte de Minas Gerais desempenhou um importante papel econômico desde os
primeiros momentos do povoamento do Brasil, quando abastecia de carne tanto o
Nordeste açucareiro quanto a zona de mineração das Minas Gerais.
Posteriormente, as perspectivas de novos mercados e fluxos de
comercialização se consolidaram com o deslocamento dos centros econômicos
nacionais para o Rio de Janeiro e São Paulo. Desde os momentos iniciais de sua
ocupação, Montes Claros foi área de recria e eng orda, no passado.
As fases da exploração pecuarista se estendem, hoje , da criação à
industrialização; até então, o município nunca tinha sido alvo de preocupação
relevante no que diz respeito a seu ordenamento urbano.
O I Plano Diretor de Montes Claros con stava, basicamente, de diretrizes e
leis que fixavam a política de desenvolvimento urbano a ser seguida. A elaboração
do I Plano Diretor foi iniciada em julho de 1969 e concluída em abril de 1970.
Também foram reali zadas duas pesquisas diretas: primeiramen te, uma
pesquisa universal, do meio físico; em seguida, uma pesquisa social, por
amostragem de 5% da população. Ambas, visando caracterizar os aspectos sociais
do município.
89
PAULA, Montes Claros, sua história, sua gente, seus costumes , p. 44.
90
Ibidem, p. 44.
64
O I Plano Diretor considerava que:
havia perspectivas de crescente desenvolviment o, tendo em vista
medidas governamentais adotadas para área mineira do polígono
das secas
91
; era notório e crescente o aumento dos recursos
públicos municipais; a cidade de Montes Claros à época apresentava
uma baixa densidade demográfica (média 35 hab/ha) e a ocupação
de uma grande extensão territorial (2476 ha); a taxa de crescimento
urbano à época variava para uma máxima de até 9,26% ao ano. A
média brasileira era de 5% a 6% a.a.
92
Aos olhos dos planejadores da época , parecia claro que era inviável a
simples limitação das áreas urbanas a um perímetro, como medida única , básica e
suficiente.
As diretrizes básicas do I Plano Diretor constituem em propor uma política
urbana de adensamento , que tinha por
objetivos básicos:
a) uma política de adensamento, com a contenção rígida do
perímetro, porém, expansão orientada e regulada, tendo em vista a
ocupação gradativa no sentido centro -periferia; b) uma política de
adensamento que incentivasse a ocupação das áreas centrais mais
providas de equipamentos públicos; c ) uma política de adensamento,
que promovesse a renovação da estrutura do centro comercial e uma
dilatação dentro da perspectiva expansional orientada; e d) uma
política de adensamento, que visasse a ocupação efetiva das áreas
periféricas de densidade rare feita.
93
As medidas de implantação , que seriam adotadas na tentativa de se
estabelecer o I Plano Diretor, serão delineadas abaixo:
91
Áreas do norte do Estado de Minas, beneficiadas pelos incentivos da SUDENE.
92
MONTES CLAROS, I Plano Diretor urbano , p. 81.
93
Ibidem, p. 100.
65
a) organização do Departamento de Urbanismo da Prefeitura,
dotando-o de estrutura e equipe de 4 técnicos para a conti nuidade do
processo de planejamento; b) proposição de um modelo de sistema
viário capaz de induzir o adensamento desejável e simultaneamente
atender a circulação atual; c) proposição de política de investimento
público para a alteração da estrutura viária, sistematizando a
circulação em recursos hierarquizados segundo os fluxos a suportar,
e distintos segundo as funções a exercer com o objetivo de liberar
extensa zona central onde pretendia a intensificação das atividades
comerciais, de serviços e administr ativas; d) proposição de política
de investimento público em equipamentos capazes de promoverem o
adensamento das áreas residenciais; e) fixação de maiores taxas de
utilização de lotes para fins residenciais, no sentido de incentivar a
verticalidade, sem prejuízo da taxa do conforto mínimo necessária à
higiene do meio e sem conflitos com as áreas a serem renovadas; f)
reloteamento de áreas vagas ou de baixa taxa de ocupação, que
apresentem traçados inadequados, para melhor e maior
aproveitamento do solo e o rdenação da ocupação industrial, admitido
o desenvolvimento crescente deste uso; g) permissão e estímulos a
associação de lotes, objetivando o agrupamento de unidades
residenciais.
94
Por se tratar de um plano diretor urbano, achamos necessário descrever
mais de perto as propostas específicas de zoneamento e o sistema viário constantes
no I Plano Diretor.
A proposta de zoneamento, em consonância com o modelo proposto de
sistema viário, é que tentaria consubstan ciar a proposta de intervenção em seu todo.
Por exemplo: a proposta de zoneamento de uso do solo , que previa o ordenamento
e regulamento do uso do solo na cidade, sugeria o zoneamento em quatro setores:
94
MONTES CLAROS, I Plano Diretor urbano , p. 102.
66
a) Zona comercial: uma área central abrangente onde está
condensado o comércio. Nesta zona os imóveis só poderão ser
destinados aos seguintes usos: comercial, de serviços, residencial
singular, residencial coletivo, institucionais, industrial e oficinas
desde que não provoquem poeiras e ruídos nocivos á vizinhança e
não empreguem mais de oito pessoas; b) Zona industrial: propunha -
se uma zona industrial a área situada a norte da cidade que abrange
o atual distrito industrial e uma faixa para expansão industrial.
Limitada a leste e oeste pelas rodovias Br -135 e Br-251; a sul o
contorno urbano proposto pelo plano e ao norte pelo arco de
circunferência compreendido entre as citadas rodovias, de raio igual
a 6,5 km, tendo por centro o cruzamento da rua Juramento com o
eixo rodoviário; c) Zona especial: propunha -se como zona especial
parte da área central, a posição da área, oposta aos vetores de
crescimento da zona comercial, o acanhamento da estrutura física, e
a incapacidade de conter novos sistemas de funcionamento urbano,
conduziram a zona com características especiais; d) Zona
residencial: excluídas as zonas comercial, industrial e especial e as
áreas institucionais, o restante do tecido urbano engloba a zona
residencial e áreas de expansão proposta.
95
Segue mapa extraído do I Plano Diretor Urbano , com a proposta do
zoneamento para a cidade de Montes Claros.
95
MONTES CLAROS, I Plano Diretor urbano , p. 103.
67
FIGURA 3 - Proposta de zoneamento do I Plano Diretor Urbano.
Fonte: MONTES CLAROS, I Plano Diretor Urbano, 1970, p. 52.
68
Com relação ao sistema viário , a proposta básica visava à criação de um
sistema de vias principais em vias secundárias e em vias locais:
o sistema de vias principais que, pela implantação e porte,
estabeleceriam as grandes ligações de aglomerado urbano, é
formado por eixos radiais e circulares, [..] as vias secundarias são
caracterizadas por conjuntos de artérias setoriais que pela
implantação e adaptação locais canalizam o tráfego de percursos
interiores e orientam a distribuição do uso comercial, [...] as vias
locais constituem o restante da rede urbana, atendendo a áreas
restritas, pela condução do tráfego local lento.
96
Em relação aos serviços públicos (água, luz, es goto etc.), o plano se
limitou a fazer recomendações de caráter genérico, por julgarem os planejadores
que as providências já estavam tomadas pelo poder público m unicipal.
As implicações institucionais e administrativas estariam abordadas em um
sem número de leis e códigos, tais como o código de o bras, leis de urbanismo e
zoneamento, gestões junto ao governo estadual e federal, implantação de reformas
administrativas na Prefeitura local, além, é claro, de uma leva de desapropriações.
Portanto, tratava-se de uma relação de proposi ções, formuladas pelo I
Plano Diretor, objetivando medidas de ordem prática para decisões do poder político
local, com a finalidade de ela boração dos orçamentos -programa anuais e plurianuais
de investimentos, bem como dos planos de ação do governo.
Segue mapa extraído do I Plano Diretor Urbano , com a proposta de
sistema viário para a cidade de Montes Claros.
96
MONTES CLAROS, I Plano Diretor urbano , p. 132.
69
FIGURA 4 - Proposta de Sistema Viário do I Plano Diretor Urbano.
Fonte: MONTES CLAROS, I Plano Diretor Urbano, 1970, p. 53.
70
Basicamente, as diretrizes mencionadas retratam e caracterizam o
conjunto de ações a serem implant adas com a finalidade de dotar a cidade de um
conjunto de estratégias capazes de garantir e reproduzir o novo papel representado
por ela, qual seja, de maior centro reprodutor do capital de todo o sertão norte-
mineiro e, além disso, é claro, dotar a cidade de um conjunto de forças, por assim
dizer, capaz de induzir a um processo de modernização da região como um todo.
Afinal, o I Plano Diretor nunca desconsiderou o papel de Montes Claros como a
principal indutora do desenvolvimento da região norte -mineira.
71
CAPÍTULO 3
O I PLANO DIRETOR E A CIDADE DE MONTES CLAROS: UMA VISÃO DA
MODERNIDADE NO SERTÃO
Em uma revista, de caráter social , datada da década de 1960, mais
especificamente de 1967, se podia ver a referência ao então candid ato único à
prefeitura de Montes Claros, naquele momento, o Sr. Antônio Rebello, escolhido
pela elite dirigente da época como seu único candidato, pelas qualidades de um
“bom administrador” no Frigonorte (Frigoríficos do Norte) e setores particulares.
Segue um destaque ilustração da Revista Montes Claros em Foco:
FIGURA 5 - As personalidades do ano de 1966.
Fonte: Revista Montes Claros em Foco, 1967.
Conhecido popularmente como Toninho Rebello, o prefeito de Montes
72
Claros, nos anos finais da década de 1960 e início de 1970, n o século passado,
seria eleito como a personalidade do ano de 1966, por reunir as esperanças de
trazer para Montes Claros o espírito dinâmico e empreendedor com que ansiava a
elite local. O que por certo nos a entender que ele seria o homem certo para
aquele momento histórico que vivia o município. Momento de mudança e transição
para um processo de articulação e estruturação pautado no dese nvolvimento do
município: a passagem do antigo para o novo. Caberia ao Sr. “Toninho Rebello”
conduzir o processo de modernização do município, que definitivamente estava por
chegar ao sertão norte -mineiro.
O I Plano Diretor serviu como uma espécie de oficialização ou carta de
intenções da elite dirigente local aos organismos naci onais e internacionais
responsáveis pela modernização do país e das cidades brasileiras.
Não seria de se estranhar que o I Plano Diretor fosse de “Toninho
Rebello”, o prefeito de consenso das lideranças políticas da época.
O momento era de transição de uma cidade rural, com a economia e as
relações sociais fortemente influenciadas pelas tradições locais , para se inserir em
um processo de industrialização de amplitude nacional (um projeto nacional) e de
interesse internacional.
Montes Claros jamais seria a mesma a partir daquele momento. Se
melhor ou pior, depende do ângulo sob o qual se avalia. Importante lembrar que este
trabalho não visa articular um juízo de valor acerca dos fatos e acontecimentos da
época.
A seguir, destacamos, do projeto de lei enviad o à Câmara Municipal de
Montes Claros, quando do pedido de abertura d o crédito especial para a elaboração
do I Plano Diretor, já em 17 de junho de 1969, parte da mens agem inicial do
executivo local sobre a necessidade de aplicação da “técnica moderna” ao p rocesso
de ordenação e urbanização da cidade que estava em curso:
não seria justificável que esta administração, convicta de que os
planejamentos são a principal razão do seu sucesso, não permitisse
às futuras administrações a racionalização básica de i mplantação do
seu Plano Diretor, há muito reclamado, em condições que a moderna
técnica de urbanização (grifo nosso) recomenda.
97
97
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS, Diretoria de Documentação e Informão/Divisão
de Pesquisa e Documentação Regional , APc/FD – 001.1486.
73
O estabelecimento de uma interessante relação pode ser feita ao se
observar que também é dess a época o projeto de lei encaminh ado à Câmara para a
realização de convênio para a implantação da primeira etapa do distrito industrial de
Montes Claros, datado de 26 de agosto de 1969. D ois meses antes, como vimos,
solicitava-se à mesma Câmara a abertura de crédito para a elaboração do I Plano
Diretor tal convênio seria firmado com o então D epartamento de Industrialização
do Conselho Estadual de Desenvolvimento. O projeto, que foi à sanção do executivo
em 03 de setembro de 1969, faz menção à necessidade de desenvolvimento da
cidade.
Sobre a infra-estrutura necessária ao desenvolvimento local , o documento
deixa claro que “As obras de infra -estrutura de alto custo e de grande alcance para o
nosso desenvolvimento industrial não podem parar, uma vez que [...]”
98
.
Quando faz menção à importância das obras de infra -estrutura de alto
custo e de grande alcance para o desenvolvimento industrial da cidade , pode-se
perceber, na mensagem inicial enviada à câmara, no projeto de lei 24/70,
claramente, a perce pção do poder executivo local quanto à necessidade em se
atrelar o desenvolvimento urbano da cidade ao processo de industrialização, então
nascente.
O I Plano Diretor viria a ser expressão de todos esses anseios da época,
ele traduziria a necessidade de modernizar a cidade de maneira a adequá -la às
novas “necessidades” impostas pela industrialização nascente; é nele que vamos
encontrar a expressão, o registro, o conto da necessidade de substituir o antigo pelo
novo, o “atrasado” pelo moderno. No I Plano Diretor, está registrado o anseio de
nossos dirigentes pelo moderno a opção havia sido feita pelos
dirigentes/empreendedores da época.
A elite local dirigente o desconsiderava que o processo de
desenvolvimento do município , iniciado na década de 1960, n o século passado,
seria fundamental para o desenvolvimento da cidade e uma oportunidade única que
ensejaria transformações profundas no município. Vejamos, acerca desse processo,
o ponto de vista de uma das figuras mais expressivas da intelectualidade local, o
então vereador à época e ex-prefeito do município, o vereador Simeão Ribeiro Pires ,
que fez menção à realidade fá ustica que chegaria a um futuro, então próximo,
98
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS, Diretoria de Documentação e Informaç ão/Divisão
de Pesquisa e Documentação Regional , APc/FD 001.1528
74
quando, em requerimento feito em 01 de fevereiro de 1967, fez alusão à
necessidade do governador do Estado da época de promover o desenvolvimento da
região e da cidade por intermédio da SUDENE. Vejamos o sentido dos “espíritos”,
trazendo parte do requerimento:
Ecoa ainda, exmo. Sr. Governador no arquipélago das povoações
sertanejas, os Faustos maiores da histó ria, quando reclamamos
como imperativa atualização, não a frase, mas e mais, a política
desenvolvimentista do saudoso João Pinheiro quando demonstrava
por fato: ‘Minas é um povo que se levanta’.
99
Ora, podemos compartilhar nossa opinião com Oliveira e Rodrigues
quando mencionam a necessidade e o momento de se adequar a região à
penetração do capital industrial moderno:
Na realidade, a partir da década de 1960 começaram a ser
criadas as condições necessárias à emergência de um parque
industrial em moldes tecnologicamente a vançado no Norte de Minas.
Assim, foi no decorrer da década de 1960 que a região começou a
ser preparada para a penetração do capital industrial moderno.
Capital este, alias, que iria conviver lado a lado, com processos de
produção tradicionais, provocando varias transformações nas
características da estrutura produtiva norte -mineira.
100
E mais, sobre as transformações que ocorreriam nas próximas décadas:
Esse quadro de transformações, no entanto, se tornou mais
perceptível a partir da década de 1970, época em que as unidades
produtivas modernas passaram a ser efetivamente implantadas.
Neste tópico, apresentar -se-ão as características mais marcantes
manifestadas pelo setor industrial da Região no período de 1970 a
1990, procurando explicitar a importânc ia econômica representada
por este.
101
Montes Claros deveria modernizar-se e ser o modelo de moderni dade
para a região como um todo. Conforme Oliveira e Rodrigues, novamente:
99
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS, Diretoria de Documentão e Informação/Divio
de Pesquisa e Documentação Regional , APc/FD – 001.1553.
100
OLIVEIRA; RODRIGUES, Formação Social e Eco nômica do Norte de Minas, p. 295-296.
101
Ibidem, p. 296.
75
neste último caso é interessante notar que, com o objetivo de se criar
artificialmente pólos de desenvolvimento na Região, buscou -se
incrementar as atividades industriais e terciárias. Assim, segundo os
argumentos de Gervaise (1975, p. 4 -49), no que se refere ao
estímulo às atividades industriais, a idéia era contemplar empresas
relativamente importantes, às vezes em ramos dinâmicos, como
forma de influenciar o padrão de consumo das cidades e a produção
regional. Quando às atividades terciárias, a idéia era incentivá -las,
sobretudo em Montes Claros, uma vez que estas deveriam funcionar
como uma locomotiva para a modernização dos setores produtivos
da Região.
102
A modernidade chegaria ao sertão norte -mineiro e, com ela, os anseios
de mentes e espíritos” por uma cidade moderna, em movimento, dinâmica,
adequada ao momento. O I Plano Diret or seria, então, a vivificação des se momento
histórico, nele estaria expresso um modelo/padrão de cidade completamente
ajustada aos tempos modernos, da década de 1960 e in ício da década de 1970, n o
século XX.
Veremos de que maneira o I Plano Diretor expr essaria detalhadamente a
necessidade de modernizar a cidade e de se institucionalizar, uma vez por todas, o
compromisso da elite di rigente local com seu tempo.
O I Plano Diretor de “Tonin ho Rebello” se constitui em uma espécie de
casamento da cidade de Mon tes Claros com o desenvolvimento, dito moderno ou ,
se quiserem, com a modernidade que a industrialização traria ao sertão. Era preciso
externar oficialmente tal compromisso , que pode ser visto nas linhas que traçam o I
Plano Diretor urbano da cidade.
Um balanço sobre o I Plano Diretor de Montes Claros e o “caso” do centro
urbano da cidade
O I Plano Diretor elaborado pela UPLAN (Urbanismo, Planejamento e
Arquitetura Ltda.), uma empresa de consultoria de Belo Horizonte, consistiu na
primeira tentativa real de regulação do espaço urbano da cidade de Montes Claros.
Elaborado em uma época de ampla recuperação econômica, o I Plano
Diretor era pretensioso, altamente técnico e possuía requintes apreciáveis. O Plano
fora concebido em perfeita concordância com as no rmas e exigências do CNDU
102
OLIVEIRA; RODRIGUES, Formação Social e Econômica do Norte de Minas, p. 308-309.
76
(Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano), conforme trecho da entrevista
com o prefeito da época, em que fica clara tal assertiva:
não é necessário dizer que um Plano Diretor de crescimento, [...]
poderia ser concebido em perfeita concordância com as normas e
exigências do CNDU Conselho Nacional de Desenvolvimento
Urbano (informação verbal).
103
Fica claro, também, o caráter setorial do I Plano Diretor. Tratava -se
basicamente de uma proposta de ordenamento do espaço sico e não de proposta
de intervenção global, onde fossem implementadas políticas de desenvolvimento do
município como um todo.
O I Plano Diretor foi importante como a primeira tentativa de intervenção e
regulação do município de Montes claros, visando a um planejamento racional do
município.
Um fato interessante é que o I Plano Diretor, quando apresentado para a
aprovação da Câmara Municipal em 02 de setembro de 1970, demandou três
discussões para sua aprovação, tendo sido apresentado , naquela oportunidade , um
memorial de proprietários de imóveis da época que seriam afetados pelas possíveis
desapropriações e correções necessárias à implantação do I Plano Diretor . Para
discussões mais aprofundadas, vejamos o requerimento feito à época pelo então
vereador Simeão Ribeiro Pires:
que seja adiada a discussão e votação do projeto de lei sobre o
Plano Diretor da cidade, para a próxima sessão ordinária desta
câmara, em atendimento a uma solicitação em memorial de
proprietários de imóveis desta cidade. Solicitamos mais que seja
marcada uma sessão especial (grifo nosso) para o próximo sábado,
às vinte horas, afim de aqueles interessados possam ser ouvidos por
esta casa.
104
O requerimento foi rejeitado à época; no entanto, o assunto parecia
comover a cidade. Na mesma sessão da Câmara, outro vereador, o Sr. Pedro
Narciso, em requerimento feito a o, e diante do imenso transtorno causado ao
103
Informe repassado em entrevista feita com o Prefeito Sr. Antônio Lafetá Rabello em agosto de
1990.
104
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS, Diretoria de Documentação e Informação/Divio
de Pesquisa e Documentação Regional , APc/FD – 001.1543.
77
parlamento municipal pela emergência do assunto, solicita uma se ssão
extraordinária, ainda na noite de 02 de setembro de 1970 , para a aprovação do I
Plano Diretor. O que se daria, vejamos:
que seja realizada, ainda nesta noite, uma sessão extraordinária
(grifo nosso), para que seja dado prosseguimento a discussão e a
votação, em 3ª discussão (grifo nosso), o projeto de lei ‘Plano
Diretor’, assim como as emendas apresentadas.
105
O requerimento foi assinado pelos nove vereadores da época. Segue
figura com as respectivas assinaturas.
105
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS, Diretoria de Documentão e Informão/Divisão
de Pesquisa e Documentação Regional , APc/FD – 001.1544.
78
FIGURA 6 - Documento de assinaturas.
Fonte: MONTES CLAROS, I Plano Diretor Urbano, 1 970.
FIGURA 6 - Documento da Câmara Municipal constando a aprovação do I Plano Diretor Urbano .
Fonte: MONTES CLAROS, I Plano Diretor Urbano, 1970.
79
A dificuldade na aprovação pelo parlamento municipal, à época, e os
acontecimentos desse dia histórico para o município, evidencia m a falta de
articulação entre o executivo local e a parcela da população que seria atingida,
direta ou indiretamente, pelas medidas de intervenção previstas no I Plano Diretor.
As propostas que mais discus sões suscitavam à época, sem dúvida
alguma, diziam respeito às intervenções previstas para o centro urbano da cidade,
ainda que dentro dos princípios estabelecidos pelo urbanismo moderno, a chamada
renovação urbana, nos moldes das propostas nos grandes cen tros urbanos
ocidentais, propondo intervenções “cirúrgicas”, “transplantes urbanos” ,
desapropriações, entre um sem -fim de medidas. A proposta para o centro de Montes
Claros contemplava a inic iativa de renová-lo por inteiro. Vejamos:
Entre remover o atual centro comercial e administrativo que exige
para seu transplante uma contigüidade com o atual e o abandono
com o atual e o abandono de um maior aproveitamento da infra -
estrutura disponível, sem contar o risco de sua não efetivação e
renová-lo, optou-se pela segunda solução, mais viável e compatível
com o lento, mas já iniciado processo de transformação da economia
e vida urbana locais.
106
E mais: “será proposta a renovação do atual centro comercial -
administrativo, capaz de promover o crescimento vertical e conseqüente
adensamento”
107
.
O caso do centro de Montes Claros representa um padrão para o
processo de intervenção proposto nas diretrizes básicas do I Plano Diretor para a
cidade. No caso de Montes Claros, seu centro urbano significa a produção e a
expressão do sentido do desenvolvimento moderno, desde seus primórdios . Deve-
se lembrar que Montes Claros se desenvolve u historicamente em função do seu
centro urbano, que trazia para seus habitantes, até então, os significantes do seu
processo de desenvolvimento .
Ele é dinâmico, efervescente e democraticamente usa do por todas as
classes sociais; todas as classes afluem ao centro pobres, ricos, jovens, velhos,
brancos, negros, enfim, todos. está o movimento, a vida. M udar o centro
significava alterar não s eu espaço físico urbano, mas, sobretudo , alterar a
106
MONTES CLAROS, I Plano Diretor urbano , p. 78.
107
Ibidem, p. 78.
80
produção e a construção de um conjunto de significados que, principalmente em
1970, poderia significar para a população a mudança do antigo para o novo, da
velha cidade rural, lenta e monótona, para a dinâmica da nova cidade
industrializada.
Era condição sine qua non para os dirigentes da época atacar” o centro
como forma de se alterar a própria mentali dade com que era vista a cidade por seus
moradores. Renovar o centro significava , à época, renovar não s ó a estrutura urbana
da cidade, mas, sobretudo, renovar os “espíritos”. Sobre o centro da cidade ,
constatamos que
um conjunto de fatos conduziu e favoreceu um único centro: a
expansão anárquica que impediu organizar ligações entre os bairros
periféricos e obriga a ida ao centro; a concentração no núcleo de
recursos financeiros, técnicos e sociais; a centralização das
atividades administrativas, das estações rodo -ferroviárias, e das
primeiras indústrias. O centro é, pois o verdadeiro de atividades,
de transportes, de circulação. Como as ruas mais inadequadas, pela
sua largura e indiferenciação, estão exatamente nos bairros centrais,
há o agravamento do conflito entre as formas antigas de organização
urbana e as exigências do trafego moderno (grifo nosso). Tal
arruamento era adaptado à tração animal. A introdução de veículos a
motor ocorreu em um quadro não adaptado.
108
E mais: o plano observa, ainda, que paralelamente, observa -se a
substituição do uso residencial tradicional das áreas centrais mais velh as, que
passam a concentrar nos prédios existentes, estabelecimentos comerciais e de
serviços, expulsando a população aí residente”
109
.
Conforme Castells, o centro desempenha um papel relevante nas
cidades: “[...] desempenha um papel ao mesmo tempo integrad or e simbólico”
110
.
Integrador, pois se constitui num elo entre as demais regiões da cidade , e simbólico,
porque tem ali representado s aspectos e valores culturais. É um local por onde as
pessoas se dirigem em busca de informação, mercadorias, lazer, entrete nimento
111
.
Para Castells, o modo como o centro se constitui e o que representa para
a cidade é denominado como simbólico urbano, ou seja, a expressão da hist ória de
um povo representado através de sua manifestação cultural, da configuração
108
MONTES CLAROS, I Plano Diretor urbano , p. 81.
109
Ibidem, p. 38.
110
CASTELLS, A questão urbana, p. 300-370.
111
Ibidem, p. 300-370.
81
econômica, social e do patrimônio histórico ali constituído e de seus significados. É
um local de consumo e de circulação de pessoas, de moradia, de diferentes classes
sociais. O intenso fluxo de pessoas favorece a oferta de serviços, a instalação de
equipamentos públicos e privados e o crescimento de com ércio. No entanto,
paralelamente ao crescimento da área central, surgem problemas relacionados ao
trânsito, ao meio ambiente, ao aumento do custo de manutenção dos imóveis,
dificultando a permanência de atividades menos com petitivas; amplia a deficiência e,
não obstante, a ausência de controle público na regulação e regulamentação de leis
voltadas para manutenção desses espaços , o que desfavorece sua qualidade e o
bem-estar dos usuários
112
.
O “enfraquecimento” da área central ocasiona sua subutilização ou
desqualificação, gerando a necessidade da intervenção do Estado através de
políticas e iniciativas voltadas para qualificar e manter as diversas formas de
ocupação e uso destas, alternando comércio, residências, espaç os de lazer,
espaços de cultura e de serviços.
Para contornar essa problemática nos grandes centros urbanos, nas
décadas que vão de 1930 a 1970, destacou -se a renovação dos espaços que
“descaracterizavam” as áreas centrais e exigiam grandes investimentos,
favorecendo os interesses imobiliários. Predominou o urbanismo modernista e
saneador que atendia, especialmente, aos interesses do capital.
Posteriormente, a partir da década de 1980, se discutia m os princípios
de revitalização e requalificação dos espaços públ icos. Ater-nos-emos ao processo
de renovação das áreas centrais.
A construção de um ideário de modernid ade a partir da perspectiva do I Plano
Diretor Urbano, na cidade de M ontes Claros
Como vimos anteriormente, a estrutura urbana de Montes Claros, n a
década de 1970, concentrava em seu centro urbano a maioria de seus
equipamentos de comércio e de serviços, inclusive o comércio atacadista, alé m de
pequenas indústrias, feira , etc., o que estabeleceu um grande fluxo de pessoas e
veículos em seu interior, criando problemas que deveriam ser alvo de intervenções
112
CASTELLS, A questão urbana, p. 300-370.
82
não por parte do I Plano Diretor, mas também das outras tentativas de
intervenção urbana que teria a cidade: as duas mais relevantes que se seguiram
foram o PCPM (Projeto Cidade Porte Médio) e o PDLI (Plano de Desenvolvimento
Local Integrado).
Gomes ressalta que a estrutura urbana de Montes Claros, à época, era
mononuclear ou monopolar , e que o PDLI observava que cerca de 90% dos
equipamentos de comércio e serviços se concentrava m no centro da cidade
113
.
Era lógico que o processo de industrialização de Montes Claros, iniciado
na cada de 1970, geraria no futuro como gerou a expansão dos serviços e da
infra-estrutura urbana da cidade. N aquele momento, entretanto, o centro da cidade
ganharia contornos especiais e uma atenção redobrada por parte do executivo local
e dos planejadores. Outro ponto relevante e que teve especial interesse foi a
implantação do distrito industrial, na zona norte da cidade, a 5 km do centro, e que
se constituiria na maior concentração de indústrias naquele local, criando a
necessidade de se estabelecer em formas de acesso que possibilitassem o
escoamento da produção, então nascente, o que no futuro se caracterizaria como
uma setorização da cidade e no que se convencionou chamar d e “cidade
setorizada”. Vejamos:
Observa-se, que o período posterior ao processo de industrialização
da cidade foi marcado por uma certa ‘setorização’ dos usos no seu
espaço urbano: no núcleo central – comercio e serviços: no anel
pericentral e nas áreas d e expansão urbana – residências; e no
distrito industrial, à norte as indústrias. Montes Claros se
configurava, neste período, como uma ‘cidade setorizada’.
114
Constate-se, na FIG. 7, a seguir:
113
GOMES, Discursos contemponeos sobre Montes Clar os: (re)estruturação urbana e novas articulões
urbano-regionais, p. 90.
114
Ibidem, p. 90.
83
FIGURA 7 - Mancha urbana de Montes Claros da década de 1970.
Fonte: GOMES, 2007, p. 90.
A visão de que o centro tradicional de Montes Claros, com ruas e
84
passeios estreitos, com alta concentração de comércio e serviços , e sobrecarga de
trânsito de pessoas e veículos , seria um entrave ao novo processo de
desenvolvimento da cidade, gera do a partir da industrialização do início da década
de 1970, era, com certeza, naquele momento, o maior problema para aqueles que
pensavam a cidade.
O conjunto de ações prev istas no I Plano Diretor visava renovar o centro
da cidade com um único objetivo: adequar o espaço urbano mais significativo da
cidade para seus cidadãos, em um ambiente com ares de modernidade, dinâmico,
com espaço, fácil de circular, adequado ao processo de produção e escoamento da
produção capitalista. A idéia do chamado centro clean”, aberto, largo, claro, d everia
vigorar, nem que para iss o fosse necessário processar uma cirurgia nos velhos
moldes decantados por Le Corbusier, Robert Moses, Hausmann ; era preciso
estabelecer o novo, não a partir do velho, mas, sim, apesar do velho.
Cardoso Júnior define muito bem a expansão do s ítio urbano da cidade e,
sobretudo, da área central do município desde os seus primórdios, em seu trabalho.
Montes Claros entre 1930 e 1964: o interior da urbe em expansão. Espaço c omum,
realidades antagônicas. Entre 1930 e 1964, Montes Claros passou por um processo
de intensas transformações. Contudo, na maior parte desse período, fora o
município espacialmente e socialmente concentrado. Historicamente, conforme
escreveu Cândida Maria dos Santos Veloso, a expansão da municipalidade deu -se
de forma contida, alicerçada em um núcleo central a praça Dr. Chaves e
manteve-se, no decorrer das primeiras décadas do século XX, circuns crita aos
limites estabelecidos: de um lado, o Rio Vieira; e, de outro, pelos trilhos da Estrada
de ferro da Central do Brasil (EFCB).
Durante longos decênios , Montes Claros cresceu sob o ímpeto sempre
irregular da expansão urbana não planejada. Ess e crescimento, alimentado por um
significativo fluxo migratório , foi impulsionado pela chegada dos trilhos e marcado
por um apreciável salto demográfico entre os anos de 1940 e 1950 , encontrando
limites apenas nos acidentes naturais e históricos que marcavam a paisagem
local
115
.
115
CARDOSO JÚNIOR, História, cotidiano popular e política : Montes Claros entre 1930 e 1964 , p. 37.
85
FIGURA 8 - Evolução urbana do Município de Montes Claros.
Fonte: MONTES CLAROS, I Plano Diretor Urbano, 1970, p. 50.
86
A área central da cidade de Montes Claros apresenta -se, historicamente,
como pólo catalisador da dinâmica sócio-econômica do município, passando a
representar, desde o in ício do século XX, o termômetro das atividades urbanas. O
centro da cidade espelha o momento histórico, apresentando-se ora como
dinamizador do processo de produção capitalista , como, por exemplo, na década de
1970 e 1980, ora como de positário das conseqüências dess a mesma dinâmica,
como na década de 1990.
O I Plano Diretor é um dos produtos da chamada modernizaçã o que se
processou no norte de M inas e, mais especificamente, em Montes Claros, a partir de
1960. Pereira é preciso ao trata r desse assunto:
[...] a modernização que se processou no Nordeste (e no Norte de
Minas), a partir de 1960, foi acima de tudo, determinada por razões
nacionais e internacionais, pela dinâmica do desenvolvimento do
capitalismo no país e em suas relações co m o capital internacional
[...].
116
O projeto se traduziu na tentativa de se adequar a cidade à dinâmica
capitalista que traria a Montes Claros, nas décadas vindouras; uma organização de
seu espaço urbano, orientado pelo processo de desenvol vimento da economia
capitalista perpetrada, então, no município.
O I Plano Diretor Urbano representa a consolidação do ideário de
modernidade da elite diri gente local, à época, nos moldes de um planejamento
formal; nele podemos observar , de modo materializado , em um documento, a
expressão e o anseio de uma época tida como a mais significativa, sob o ponto de
vista da mudança de sua estrutura produtiva e conseqüente transformação da
cidade de rural para urbana, da cidade velha para nova, enfim , a chegada definitiva
da modernidade e suas conseqüências para a cidade.
Não se pode dispensar a importância do I Plano Diretor como um
documento único para a história do desenvolvimento da cidade. Para entendermos o
processo de desenvolvimento da cidade, a partir dos anos 70 do século XX, é
necessário compreendermos como tudo se iniciou e como tudo foi tratado pelo I
Plano Diretor urbano da cidade . Choay é clara, nesse sentido:
116
PEREIRA, Em nome da região, a serviço do capital : o regionalismo político norte -mineiro, p. 78.
87
[...] recusam-se a considerar essas taras como o inverso de uma
nova ordem. De uma nova organização do e spaço urbano,
promovida pela revolução industrial e pelo desenvolvimento da
economia capitalista. Eles não imaginam que o desaparecimento de
uma ordem urbana determinada implica o surgimento de uma ordem
outra.
117
Uma nova ordem de estruturação urbana da c idade passou a ser
estabelecida desde entã o, e o I Plano Diretor Urbano registra, fotografa essa nova
ordem, em seu mais tenro momento, ou seja, quando do nasc imento do processo de
transformação da cidade, de cidade rural em cidade industrial, nos moldes
modernos.
A idéia-chave que subtendeu o novo processo de urbanização da cidade,
datado da década de 1970, foi a idéia de modernidade sem ela, seria impossível a
concepção do I Plano Diretor Urbano, nos moldes em que foi concebido . Ele é a
fotografia, o instantâneo de uma época marcada por uma concepção de era
industrial para a cidade e com uma forte ruptura histórica; a cidade do século XX
precisa realizar, por sua vez, a revolução industrial e , em Montes Claros, com muito
cuidado, tivemos a oportunidade d e estabelecer similitudes interessantes com ess e
processo, a partir do I Plano Diretor.
Choay estabelece que o princípio que permeia os anseios do chamado
urbanismo progressista é, sobretudo , a idéia de modernidade.
a idéia-chave que subtende o urbanismo progressista é a idéia de
modernidade. ‘Uma grande época está surgindo, existe um espírito
novo’, proclama Corbusier na revista L’esprit nouveau, que ele
acabara de fundar, 1919, com A. Ozenfante. Pela obra, ele
essencialmente essa modernidade em doi s campos: a industrial e a
arte de vanguarda (na ocasião o cubismo e os movimentos derivados
dele). Como no pré-urbanismo progressista, encontra -se, pois na
base do urbanismo progressista uma concepção da era industrial
como ruptura histórica radical.
118
Como ainda destaca Choay, a crítica ao urbanismo progressista feita, por
exemplo, por escritores denominados por ela como culturalistas, entre eles Jacobs,
reside no fato de que , para o modelo progressista, ao contr ário do modelo
culturalista, a prioridade é dada ao futuro, onde se integrará a investigação às
117
CHOAY, O Urbanismo: Utopias e Realidades, Uma Antologia , p. 6.
118
Ibidem, p. 20.
88
técnicas que têm caráter de previsão, no campo econômico, demográfico e outros,
como fundamento de qualquer planificação urbana; por outro lado, o padrão
culturalista é o passado que unificará uma infor mação antropológica culminando em
uma fenomenologia da consciência perceptiva
119
.
O I Plano Diretor não levou em conta a aplicação de técnicas de
informação que permitiriam elaborarem-se diretrizes que integrassem em sua
riqueza as necessidades dos homens re ais, o que equivaleria a uma verdadeira
reviravolta em concepção metodológica. Talvez resida aí, exatamente, a dificuldade
encontrada em sua implantação, a posteriori. Ninguém, hoje, sabe qual será a
Montes Claros de amanhã.
Novamente citando Choay, percebemos que
[...] A cidade não é apenas um objeto ou um instrumento, o meio de
realizar certas funções vitais; é também um quadro de relações
interconscienciais, o lugar de uma atividade que consome sistemas
de signos tão complexos quanto os evocados acima.
120
Portanto, o I Plano Diretor acompanhou as idéias do modernismo
progressista de que o construtor de cidades, assim como os arquitetos , deveriam
traçar planos na escala das capitais modernas de vários milhões de habitantes; a
proposta de intervenção para o centro urbano da cidade, prevista no I Plano Diretor,
tinha a dimensão de uma verdadeira “cirurgia” a ser feita na malha urbana d a
cidade, como enfatizado anteriormente. Novamente surge a necessidade de destruir
e construir.
A destruição proposta e a ser feita como forma de aparelhar a cidade às
novas necessidades, no efervescente centro da cidade , não encontra antecedentes
em sua história. Não encontramos antecedentes, ness e sentido, nos planos que se
seguiram.
O ideário da modernidade, da cidade industr ial, da necessidade de
modernização da cidade , encontra-se explícito no I Plano Diretor, além , é claro, do
pensar o futuro da cidade sem levar em conta as relações com o passado.
São esses elementos que norteiam o primeiro documento oficial de
planificação urbana do município, o chamado I Plano Diretor ou, como é
119
CHOAY, O Urbanismo: Utopias e Realidades, Uma Antologia , p. 50-51.
120
Ibidem, p. 52.
89
popularmente conhecido, o Plano Diretor de Toninho Rebello.
O I Plano Diretor Urbano de Montes Claros traz em seu bojo um conjunto
de proposições que, em muito, lembra as das propostas de interven ção contidas nos
mais célebres documentos de planificação ur bana dos grandes centros e que tinham
como elemento norteador padrões do chamado urbanismo progressista. Era uma
proposta de renovação urbana da cidade nos moldes e padrões da época.
90
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O I Plano Diretor de Montes Claros, na década de 1970, foi elaborado em
uma época em que o papel do Estado brasileiro era promover, difundir, generalizar e
uniformizar a prática de elaboração de planos diretores, segundo um a postura de
integração supostamente multidisciplinar e de racionalidade técnica.
As práticas do planejamento local, bem como na maioria dos municípios
brasileiros, não levaram em conta o conflito distributivista , tampouco e o pouco
externalidades negativa s decorrentes da necessidade de tornar a cidade o locus
apropriado à acumulação capitalista e ao processo de industrial ização da nossa
sociedade. E isso refletiu o papel exercido pelo Estado brasileiro na década de 1970.
Nessa concepção de idéia de neutral idade excessiva da atuação
governamental e valorização do “saber competente” na elaboração das propostas de
intervenção do município , é que foi elaborado o I Plano Diretor. Em decorrência
disso, como observamos, minimizaram -se as relações políticas de c aráter local e,
definitivamente, os segmentos populares ficaram à margem das experiências de
planejamento.
O município de Montes Claros, assim como quase todos os municípios
brasileiros, foi vítima da centralização de poderes no governo federal e pouco pôd e
fazer, a não ser se enquadrar como um elemento de execução da política urbana
vigente à época, tendo no planejamento seu principal instrumento.
O maior equívoco de tais práticas de planejament o urbano no Brasil e em
Montes Claros não foi diferente: pensar que a regulação da produção dos espaços
urbanos poderia ser considerada uma tarefa exclusivamente técnica. Ora, se o
município vem a ser a ntese da dinâmica sócio -econômico-política de uma
determinada população, seu espaço também será, por definição, a consolidação das
relações sócio-políticas e do poder econômico ali existentes.
O I Plano Diretor foi uma tentativa do executivo local de preservar o
caráter regulador da economia de mercado, assim como obter um controle
urbanístico do espaço do município.
Definitivamente, as transformações urbanas ocorridas na Montes Claros
das décadas de 1960 e 1970 não foram diferentes do paradigma da modernização
de outros centros urbanos brasileiros e , respeitadas as proporções, de outros
91
grandes centros urbanos mundi ais, vítimas da necessidade do capitalismo moderno
de adequar as cidades ao processo de industrialização, sobretudo a partir da
revolução industrial.
O que parece distinguir ess e processo de uma cidade para outra são as
circunstâncias e o momento histórico em que ele decisivamente se instala nas
cidades. Em Montes Claros, como demonstrado neste trabalho, a década de 1970
representa o marco histórico , para a cidade, da chegada e instalação definitiva de
um processo de transformação da cidade velha para a cid ade nova, moderna,
definitivamente adequada ao proce sso de reprodução do capital e à industrialização,
então nascentes.
O I Plano Diretor consistiu em um documento oficial da época , que
expressava, aos moldes do urbanismo modernista, o anseio e a preocupaç ão da
elite da época com as transformações que seriam necessárias, como uma maneira
de se preparar a cidade para o “novo” futuro que então chegava.
Para os setores mais informados da população , esse processo trazia
preocupação e inquietação, pois a perspectiva do processo de renovação da cidade,
nos moldes propostos, geraria uma ruptura vi olenta entre o passado edificante
reverenciado e o futuro moderno ansiado.
As propostas constantes d o I Plano Diretor de Montes Claros continham
fortes traços do chamado u rbanismo ortodoxo do século passado , mas careciam de
elementos de valorização e redescoberta das chamadas qualidades da cidade
tradicional, defendidas por autores como Jacobs, Marsh all, Choay, dentre outros.
O I Plano Diretor de Montes Claros constituiu o primeiro conjunto de
propostas oficiais por que passou a cidade, com o intuito de modernizar e preparar o
município para o conjunt o de transformações que estaria por vir, sobretudo a partir
do papel transformador que a SUDENE passaria a exercer no desenvo lvimento da
cidade.
A transformação da cidade antiga/rural em cidade moderna/industrial ,
como previsto nas estratégias governamentais da época , seria posta em marcha
pela elite dirigente à época e implicaria mudanças significativas para a cidade, nas
décadas seguintes a 1970: mecanização no campo, aumento de fluxos migratórios
intra-regionais, êxodo rural, aumento da população urbana, melhorias de infra -
estrutura urbana, ampliação dos serviços públicos e , enfim, de todo o conglomerado
de elementos que se atrelam ao processo de modernização das cidades.
92
Por fim, o I Plano Diretor de Montes Claros foi fruto dos anseios e dos
desejos de algumas pessoas que tinham em mente trazer definitivamente a
modernidade ao sertão norte -mineiro, a partir do processo de in dustrialização e
urbanização, então nascente, no município.
Em que pese o fato de a maioria das medidas de implantação do I Plano
Diretor não terem sido implementadas , seja pela descontinuidade política no
município, seja pela falta de artic ulação com os setores populares ou pela falta de
recursos o município dependia primordialmente de recursos da união e do estado
à época –, o I Plano Diretor se apresentou como um marco na hist ória do
planejamento urbano do município. O I Plano D iretor serve, até hoje, de referência
para os urbanistas locais quando o assunto é trazer à cidade algo novo, inovador,
moderno.
O I Plano Diretor Urbano de Montes Claros sempre será considerado
como fenômeno de modernidade para toda uma geração de urbanistas locais.
Portanto, concluímos que, ao levantarmos a discussão se o I Plano Diretor U rbano
(Plano Diretor de Toninho Rebello) representaria um paradigma da modernidade
para a cidade de Montes Claros, à sua época (década de 1970), e uma referência do
novo, do moderno, para as gerações futuras de planejadores locais e pessoas
interessadas nas discussões ligadas ao poder público local, acreditamos que isso
realmente se consolidou em Montes Claros.
O I Plano Diretor apresenta-se, em termos de planificação urbana da
cidade, como a mais importante proposta de modernizaçã o do município de Montes
Claros acontecida ao longo de sua história no setor, seja pelo momento histórico
em que foi concebido, seja pela ousadia de suas diretrizes básicas.
O I Plano Diretor constitui-se em um marco histórico de transição da
cidade velha/antiga para a cidade nova/moderna, da cidade rural para a cidade
tipicamente urbana de nossos dias. Ele traz registrado em seu bojo as inquietudes
de toda uma época, tida por todos , como a mais auspiciosa para o município, em
termos de desenvolvimento sócio-econômico.
93
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