Download PDF
ads:
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Gerson Leite de Moraes
A força midiática da Igreja Internacional da Graça de
Deus
DOUTORADO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO
SÃO PAULO
2008
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
2
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Gerson Leite de Moraes
A força midiática da Igreja Internacional da Graça de
Deus
DOUTORADO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO
Tese apresentada à Banca Examinadora
como exigência parcial para obtenção do
título de Doutor em Ciências da Religião,
pela Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo, sob a orientação do Prof. Dr.
Edin Sued Abumanssur.
SÃO PAULO
2008
ads:
3
FOLHA DE APROVAÇÃO
BANCA EXAMINADORA
____________________________________________
____________________________________________
____________________________________________
____________________________________________
____________________________________________
4
Para Sara e Lídia, minhas amadas. As
lembranças de seus rostos e sorrisos
sempre me animaram a continuar
na dura empreitada de escrever
esta tese. Este trabalho é dedicado
a vocês.
5
AGRADECIMENTOS
Certa feita, lendo a tese do meu orientador, Dr. Edin Sued Abumanssur, dei-me
com esta página relativa aos agradecimentos, e ele mencionava que esta era a
página da injustiça. Nas palavras dele, era a página da injustiça, pois, em primeiro
lugar, nós somos incapazes de nos lembrar de todos aqueles que, direta e
indiretamente, contribuíram para a realização do trabalho, e, em segundo lugar,
mesmo a quem nos lembramos de agradecer, as palavras são sempre
insuficientes e inadequadas para expressar nossa gratidão. Concordo plenamente
com ele. Contando com perdão de ambos os grupos, registro para a posteridade
alguns nomes.
A CAPES, pela bolsa concedida.
A minha, esposa Sara Lautenschleger de Moraes, pela presença, que jamais
permitiu que eu desanimasse ou pensasse em desistir.
Ao meu orientador, Dr. Edin Sued Abumanssur, pela acolhida e cuidado em todos
os momentos da minha caminhada acadêmica. A confiança demonstrada e
incentivo constante me fizeram enxergar que valia a pena continuar nessa
empreitada. Minha eterna gratidão.
Ao meu amigo, Reverendo Wilson Santana da Silva, pelo companheirismo e por
ter acreditado em mim, quando ninguém mais acreditava.
Aos colegas e professores do Programa de Pós-Graduação em Ciências da
Religião pela sensação e comprovação na prática de que eu estava entre os
melhores.
6
RESUMO
Este é um trabalho que versa sobre o poder midiático de um grupo religioso
que, nos últimos anos, tem ocupado um espaço importante no cenário nacional
brasileiro. Nascida dentro do movimento pentecostal, mais especificamente no ano
de 1980, a Igreja Internacional da Graça de Deus confunde-se com o seu líder e
fundador, o missionário Romildo Ribeiro Soares, mais conhecido como RR
Soares. Com uma atuação forte nos campos religioso, político e midiático, a Igreja
Internacional da Graça de Deus, comandada por seu líder maior, tem conseguido
acumular capital religioso e midiático, e com isso, concentrado poder para se
destacar entre os demais grupos religiosos de matriz pentecostal no Brasil,
conseguindo comunicar-se e influenciar de alguma maneira grupos religiosos que
tradicionalmente não compartilham das mesmas práticas religiosas que igreja
acima citada.
Com aquisições de rede de televisão, emissoras de rádio, jornais, revistas,
internet, editora e até uma gravadora, a aldeia global de Soares está construída e
faz parte de sua estratégia comunicacional para divulgar seus princípios religiosos
junto à sociedade brasileira.
A força midiática da Igreja Internacional da Graça de Deus advém de vários
fatores que foram explorados ao longo da tese. A força midiática da Igreja
Internacional da Graça de Deus é uma tese de ciências da religião que vale-se de
muitos referenciais teóricos para tentar compreender de que maneira essa força
foi construída e de que maneira essa força se manifesta junto a outros grupos
religiosos nacionais.
PALAVRAS-CHAVE: religião, pentecostalismo, campo religioso, campo
político e campo midiático.
7
ABSTRACT
This work deals with the media power of a religious group that, in the past few
years, has taken an important place in the Brazilian social mechanics. Born inside
Pentecostal churches, more specifically in the 1980´s, the so-called Igreja
Internacional da Graça de Deus (in a free translation - International Church of
God´s Grace) cannot be separated from its founder and leader, Romildo Ribeiro
Soares, best known as RR Soares. This church, due to its important penetration in
religion, politics and media, managed to acquire power and money and, this way, it
has stood out when compared to other Pentecostal religions. This power influences
even other religions that do not share the same beliefs of this church.
By buying TV networks, radio stations, newspapers, magazines, internet sites, a
Publishing company and even a music record company, Soares now manages to
spread his religious beliefs to the entire Brazilian society.
The media power of this church stems from several factors explored by this
thesis and it is a branch of the Sciences of Religion that is based on several
theoretical backgrounds as an effort to understand how this power has been built
and how it influences other national religious groups.
Keywords: Religion, Politics, Media power, pentecostalism.
8
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
10
CAPÍTULO 1
1. MÍDIA, RELIGIÃO E POLÍTICA: UMA RELAÇÃO ESTREITA
1.1 Modernidade e Mídia 19
1.2 Mídia e Religião 26
1.3 Mídia Religiosa e Política 32
1.4 Concessões no Brasil e o Coronelismo Eletrônico 40
1.5 Mídia, Política e a Igreja Internacional da Graça de Deus 61
CAPÍTULO 2
2. A TRAJETÓRIA DO CIDADÃO KANE EVANGÉLICO NO
CAMPO RELIGIOSO BRASILEIRO
2.1 Aquém do Cidadão Kane, mas ao lado de Jesus 73
2.2 Um breve histórico do Missionário Romildo Ribeiro Soares 75
2.3 O nascimento da IIGD e sua aldeia global 84
2.4 RR Soares: Profeta, Sacerdote e Mago 88
2.5 Aplicando a Teoria de Campo Religioso na Organização da IIGD 95
2.6 As influências literárias e teológicas do Missionário 102
2.7 Autor de Livros, Compositor de Músicas e Cantor Gospel 107
CAPÍTULO 3
3. AS MÍDIAS DA INTERNACIONAL DA GRAÇA –
A ALDEIA GLOBAL DE RR SOARES
116
3.1 Mídia Religiosa X Mídia “Religiosa” Secularizada.
A disputa entre A IIGD e a IURD na representação dos Evangélicos 120
3.2 Televisão – RIT/ Nossa TV – A TV da Família 130
3.3 Programa Show da Fé 148
3.4 Aplicação da teoria da Escolha Racional 158
3.5 Nossa Rádio 167
3.6 Graça Music 176
3.7 Mídia Infantil 181
9
CAPÍTULO 4
4. A IGREJA “INTERNACIONAL” QUE AGRADA O
PÚBLICO “NACIONAL”
191
4.1 Recepção dos membros de outras igrejas 194
4.2 Edificação, dupla pertença e transpentecostalismo 199
4.3 Estaria acontecendo uma “internacionalização”
do campo religioso nacional? 209
CONSIDERAÇÕES FINAIS
215
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
219
10
INTRODUÇÃO
A força midiática da Igreja Internacional da Graça de Deus é o título da tese
que ora se apresenta. Esse título parece estranho para uma tese, pois propõe
analisar algo que é difícil dimensionar no campo das ciências humanas. Quando
pensamos em “força midiática”, estamos pensando basicamente, no conceito
desenvolvido por Clifford Geertz, que aponta para a maior ou menor centralidade
que um modelo religioso ocupa nas personalidades dos indivíduos que o adotam.
Não nos interessa, aqui, analisar o grau de religiosidade de uma pessoa, mas sim
os estilos de devoção e configurações sociais de extensão da esfera religiosa
(GIUMBELLE, 2003, p.p.213-214).
O que importa analisar nesse trabalho é o poder midiático que foi desenvolvido
pela Igreja Internacional da Graça de Deus, comandada pelo Missionário RR
Soares.
O trabalho está estruturado em quatro capítulos. No capítulo primeiro,
propomo-nos a analisar o nascimento da modernidade, vinculado ao nascimento
da imprensa. Esse nascimento vinculado a uma mídia é sintomático. De formas
múltiplas, observa-se que a modernidade será crivada o tempo todo pelas mídias
que a acompanharão e a determinarão, desde então. É impossível falar de
modernidade e não tocar no assunto da mídia como um produto e um agente da
modernidade.
Se, por um lado a modernidade está umbilicalmente ligada ao fenômeno
midiático, por outro lado, a modernidade também está ligada à religiosidade, pois
a modernidade nasce entre outras coisas, como símbolo da pluralidade de
pensamento, e isso, no âmbito religioso, significa o fim do monopólio religioso
católico no mundo ocidental. A partir de então, ocorre um desencantamento do
mundo, para usar um conceito de Max Weber, e a possibilidade de escolha de
11
uma nova prática religiosa, ou mesmo de nenhuma, torna-se algo comum na
sociedade secularizada.
O movimento protestante é o grande e lídimo representante dessas novas
possibilidades de prática religiosa no mundo ocidental, na medida em que rompe
com o catolicismo de base romana e propõe uma nova forma de relação com o
sagrado; relação essa que seria segundo, os protestantes, nascida da releitura e
da re-significação dos textos bíblicos, em circulação, no mundo ocidental.
Portanto, pode-se perceber como a mídia esteve desde o início da modernidade
vinculada aos interesses religiosos.
As possibilidades de práticas religiosas a partir da modernidade, tornam-se
muito grandes, e para que um movimento religioso na modernidade tenha sucesso
é mister conhecer bem e lidar melhor ainda, com as mídias que foram sendo
construídas a partir da modernidade, desde a simples comunicação naquilo que
convencionou-se chamar de boca a boca, passando pela impressão e entrega de
folhetos, um programa de rádio, ou mesmo a detenção de um canal de televisão.
A mídia na modernidade logo foi percebida como um meio de ampliação e
consolidação de poder. E os políticos da modernidade, sejam eles, absolutistas,
liberais, de direita, esquerda ou de centro, populistas demagógicos democráticos,
ou totalitários, todos eles sabem muito bem que a mídia é um meio de ampliação e
manutenção de poder, por isso, a mídia ou a concessão dela virou um caso de
Estado. Vale ressaltar que esse Estado que nasce na modernidade não é um
estado subordinado aos interesses religiosos, mas sim laico, e que quer manter a
religião enquanto sistema cultural e individual.
Cabe ao Estado laico na modernidade, decidir a quem ou a quais grupos
oferece “fatias” dessas mídias tão importantes para o jogo político. Após pintar
essa paisagem no capítulo primeiro, procuramos enfatizar a forma como os grupos
religiosos vão entrar e se posicionar nessa arena de luta, estranha para a maioria
dos religiosos.
Nesse ponto, nossa análise recai na organização religiosa do Brasil. Desde a
Constituição de 1988, a prerrogativa de concessões midiáticas no Brasil não se
encontra mais como uma atividade exclusiva do Poder Executivo. Fora assim,
12
durante muito tempo, aliás, essa era uma arma política poderosa na época da
Ditadura Militar no Brasil (1964-1985).
Como foi dito acima, a partir de Constituição de 1988, houve uma quebra nesse
monopólio de concessões, e o Poder Legislativo passou a exercer uma influência
gigantesca no que tange às concessões. Desde então, observa-se no campo
religioso brasileiro, uma mudança em relação à visão tradicional sobre o campo
político. Religiosos, até então distantes da luta engajada politicamente, ditos
alienados, começaram a mudar o seu discurso e entenderam que a política é um
espaço de conquista de muitas coisas, mas principalmente um espaço de busca e
controle do poder; poder esse que determina assuntos essenciais para a
existência e manutenção desses grupos religiosos.
Os grupos religiosos envolvidos na política, analisados no capítulo primeiro
desta tese, são os evangélicos.
Na arena renhida de busca de poder e ampliação do capital religioso, os
deputados evangélicos, eleitos em seus currais eleitorais de matriz religiosa,
procuram comissões estratégicas para ficarem perto das meninas dos olhos de
todo político evangélico, a saber, a Comissão de Ciência, Tecnologia
Comunicação e Informação (CCTCI), onde ocorrem as alianças políticas e as
trocas de favores que ampliarão o poderio religioso dos grupos que aquinhoam as
concessões midiáticas.
O que foi dito acima é comprovado na tese pela participação cada vez maior de
deputados evangélicos nessa comissão. A bancada evangélica não poupa
esforços para participar desse jogo político, que é sabido por todos, como um jogo
no mínimo que gera suspeição.
Finalmente, no capítulo primeiro, procuramos analisar como a Igreja
Internacional da Graça de Deus tem procurado se posicionar nesse intrincado jogo
político. Não é de se admirar que a Igreja Internacional da Graça de Deus tem
procurado ampliar seu capital religioso, por meio do capital político. Três pessoas
ligadas diretamente ao Missionário Soares foram eleitas para cargos estratégicos.
Foram eleitos para o cargo de deputado federal, os senhores, Jorge Tadeu e
Adilson Soares; este último, irmão do Missionário. Além disso, o filho de RR
13
Soares iniciou também sua trajetória política no estado de São Paulo, tendo sido
eleito para a função de Deputado Estadual e tem atuado para ampliar suas bases
políticas usando as mídias já conseguidas para Igreja Internacional.
no capítulo segundo, procuramos focalizar e apresentar a figura que um dia
imaginou, construiu e procura manter a força midiática da Igreja Internacional da
Graça de Deus em funcionamento, o Missionário Romildo Ribeiro Soares,
popularmente conhecido como RR Soares. Como um Cidadão Kane Evangélico, o
Missionário Soares procurou criar uma série de empresas ligadas aos interesses
de sua igreja.
Nesse capítulo, os primeiros passos dele na cristã foram registrados, bem
como sua instrução no universo protestante histórico e sua passagem para o
pentecostalismo, que, após algumas mudanças, ele e outros agentes religiosos
ajudaram a transformar e a configurar aquilo que veio a ser chamado no Brasil de
neopentecostalismo.
Soares sempre foi um sonhador pragmático, desde a infância pobre na cidade
de Muniz Freire no Espírito Santo. Após ter seu primeiro contato com a televisão,
entendeu que aquele veículo poderia ser usado em prol da causa de sua
religiosidade. Quando jovem, após uma fase de esfriamento da fé, teve o seu
grande encontro com Robert Mclister, que veio o ser o iniciador do
neopentecostalismo no Brasil. Seus filhos na mais proeminentes foram o
Missionário Soares e o Bispo Macedo da IURD.
Ainda nesse capítulo segundo, um enfoque nessa parceria dos dois maiores
representantes religiosos no campo da mídia brasileira. Cunhados, portanto com
vínculos familiares, ambos convertidos a uma que prometia transformação para
os outros e projeção para eles mesmos, iniciaram e organizaram em 1977, a Igreja
Universal do Reino de Deus, e como a disputa por capital religioso entre eles
tornou-se muito acirrada. Em 1980, a parceria termina e Soares organiza a Igreja
Internacional da Graça de Deus. Detalhes desse racha e desse recomeço por
parte de Soares são oferecidos no segundo capítulo.
Com o nascimento da IIGD, Soares começou a planejar sua aldeia global. Seu
crescimento não foipido e nem tão assustador como do Bispo Macedo e, talvez
14
por isso, ele não seja tão rotulado e nem tão mal visto como o Bispo da Record.
Soares gradativamente foi construindo sua trajetória midiática, como dono de
empresas midiáticas, que sua atuação nessa área data da segunda metade da
década de 70 do século XX. Hoje ele é o tele-evangelista mais antigo em atuação
no país. Ele é mais palatável ao público brasileiro, não esteve envolvido em
escândalos de grande repercussão nacional e sua imagem na televisão é um
símbolo apreciado por religiosos de várias matrizes.
Para construir sua própria igreja e as empresas midiáticas incorporadas a elas,
Soares teve que ocupar várias funções dentro do campo religioso.
Nesse, momento a teoria de campo religioso de Pierre Bourdieu é uma
ferramenta indispensável para se estudar a trajetória de um líder carismático como
Soares. Trabalhando com os conceitos de Profeta, Sacerdote e Mago, procuramos
entender como essas funções ocupam um espaço dinâmico no campo religioso.
Não se tratou de usar uma teoria para encaixar uma determinada figura, como que
simplesmente para cumprir um pré-requisito acadêmico, mas usou-se a teoria
dentro de suas possibilidades e dentro sua dinâmica.
Como representante do neopentecostalismo, [sendo porque não um de seus
pais fundadores, pelo menos da forma atual como ele se apresenta no campo
religioso brasileiro], Soares nutriu-se e ainda nutre-se de várias fontes para
alimentar seu sonho de construção de uma mídia religiosa de amplitude nacional.
Nesse momento, procuramos analisar as influências literárias e teológicas de
Soares. Todos os autores analisados são representantes da teologia da
prosperidade e da confissão positiva.
Soares é, antes de mais nada, um trabalhador; pode-se discordar ou até
mesmo duvidar dos reais interesses do Missionário Soares, o que não para
esconder é que ele é um grande trabalhador em prol de sua causa maior. A
qualidade como escritor, compositor de músicas evangélicas e cantor gospel são,
sem sombra de dúvidas, questionáveis, mas não se pode negar que sua atuação
pode ser comparada ao de Workaholic. Essas atividades de Soares são todas
analisadas no segundo capítulo.
15
No capítulo terceiro, a ênfase recai nas mídias da Igreja Internacional da Graça
de Deus. Essa igreja transformou-se desde a sua fundação, numa poderosa igreja
midiática. Sua organização desde o início esteve embasada na premissa de que
uma igreja pode ter forte penetração na sociedade brasileira, se possuir meios
de comunicar-se com a população. O capítulo tem como título: A Igreja
Internacional da Graça de Deus a aldeia global de RR Soares e possui sete
tópicos.
No primeiro pico do capítulo terceiro, procuramos analisar dois modelos de
mídia religiosa no Brasil. A Igreja Internacional da Graça de Deus e a sua irmã
mais velha, a Igreja Universal do Reino de Deus. Ambas estão vinculadas
historicamente e doutrinariamente que seus fundadores, Romildo Ribeiro
Soares e Edir Macedo foram, no passado, parceiros de ministério; eles foram
gerados no mesmo “útero” e nasceram para o mundo religioso na mesma
comunidade e conviveram no mesmo “ninho espiritual” durante muito tempo.
Apesar da Universal ser mais poderosa, pelo menos no que tange à penetração
midiática, sua prática de mídia religiosa pode ser definida como uma prática
secularizada, pois ela procura transformar suas mídias em mídias mais palatáveis
para o público brasileiro. Seu canal midiático de maior expressão é a Rede Record
de Televisão, que, nos últimos quatro anos, tem procurado aprimorar sua grade de
programas e contratar artistas de prestígio nacional para seus quadros com a
finalidade de alcançar a toda poderosa Rede Globo de Televisão. A estratégia da
Rede Record tem funcionado, pois, até o início de sua campanha pela liderança,
ela ocupava o terceiro lugar entre as Redes de Televisão no país. Já superou a
segunda colocada, o Sistema Brasileiro de Televisão SBT, comando por Silvio
Santos, e está no encalço da primeira colocada, que inclusive teve que se mexer e
lançar uma campanha, no início de 2008. Reforçando que sua liderança, assenta-
se em sua qualidade, ou seja, naquilo que ficou conhecido como padrão Globo de
Qualidade. Agora, o que precisa ser dito é que a Rede Record de Televisão, para
conseguir espaço junto ao público brasileiro, precisou abrir mão de fazer da
Record uma rede evangélica. Ela começou a explorar assuntos e posturas que até
então estavam presentes em sua concorrente maior, como por exemplo, a
16
presença de casais homossexuais em plena novela de horário nobre. A Record
expulsou para o horário morto da madrugada suas sessões de aconselhamento
pastoral e suas sessões de exorcismo ou transferiu essas atividades para redes
menores, também ligadas à IURD, como a Rede Família. Pode-se dizer que a
Mídia Religiosa da IURD é secularizada. Nisso, a Igreja Internacional da Graça de
Deus, comandada por Soares, difere veementemente da postura adotada pela
IURD. Soares sonha em criar uma rede nacional de televisão que seja poderosa,
que influencie a população brasileira, mas que não abra mão de seu conteúdo
religioso. Soares acredita que todas as suas mídias, por mais ecléticas e
aparentemente abertas, elas devem carregar explicitamente um conteúdo
eminentemente religioso. Soares quer influenciar e transformar o país por meio de
suas mídias, e estas não devem abrir mão de suas essências religiosas, de suas
raízes evangélicas.
Para conseguir influenciar a sociedade brasileira, Soares não procurou comprar
uma rede de televisão perigando ir à falência como fez Macedo, mas procurou por
meios políticos conseguir sua própria rede de TV. Em 2002 entrou em
funcionamento, a RIT, Rede Internacional da Graça. Nesse capítulo, procuramos
analisar a estrutura da RIT.
Não contente em possuir a RIT, Soares a partir de 2007, lançou a Nossa TV
A TV da Família, uma TV por assinatura que apresenta uma série de canais, todos
escolhidos a dedo, que não venham a ferir a moral religiosa de Soares e de seus
seguidores. Ele tentou com a criação da Nossa TV, competir com grupos bem
estruturados nesse segmento, como a NET e a SKY. A promessa para os
assinantes é que eles terão canais que respeitam os valores evangélicos.
Além de analisarmos as mídias acima citadas, o poderíamos deixar de lado
o programa que projetou Soares para o grande público no Brasil, o programa
Show da Fé, que é apresentado em horário nobre pela Rede Band de Televisão.
Procuramos analisar alguns quadros do programa a partir da teoria sociológica de
Rodney Stark. Nesses quatro anos de acompanhamento das mídias da Igreja
Internacional da Graça de Deus, assistimos a mais de 400 programas Show da
17
Fé, além de acompanhar a gravação desses programas ao vivo, assistindo aos
cultos na sede da Igreja em São Paulo.
Outra mídia analisada é uma das mídias quentes, como definiu Marshall
McLuhan, a saber, o rádio. Foram ouvidas mais de 80 horas de programação
radiofônica nessa pesquisa. A Rádio de Soares é a Nossa dio, aliás, foi daqui
que Soares retirou o nome de sua TV por assinatura. Novamente procuramos
analisar as estratégias de comunicação e constatamos que uma “nova
liderança”, já consolidada dentro da Igreja Internacional da Graça de Deus, o
Pastor Jaime de Amorim Campos, que tem ocupado a estrutura midiática ligada
ao rádio, e isso é uma estratégia bem delineada por Soares, pois este reconhece
que seu maior potencial está ligado à TV e não ao rádio.
Tanto o Jornal, quanto a Revista mais importante da Igreja Internacional da
Graça de Deus chamam-se Show da Fé. Como se pode perceber, Soares não é
muito criativo nos nomes de suas mídias, mas isso pode ser encarado também
como uma estratégia midiática para reforçar no mercado, o nome, a marca.
Qualquer pessoa que tenha acesso ao jornal ou a revista, automaticamente é
reportada ao programa televisivo Show da . Nesses veículos de comunicação –
revista e jornal Soares usa e abusa de comunicações e tenta de alguma forma
criar um ambiente de informações de interesse geral, não só de cunho religioso,
mas trazendo informações sobre saúde, gastronomia, empregos e curiosidades
gerais. Estas mídias não foram analisadas na tese, mas serviram como base para
muitas de nossas pesquisas. Foram adquiridas as revistas mensais desde 2006
até a presente data, bem como foram colecionados os jornais tamm desde
2006, registrando que os jornais são distribuídos gratuitamente.
No tópico seguinte, analisamos a Graça Music, a gravadora oficial da Igreja
Internacional da Graça de Deus. Nossa análise recaiu nesse tópico sobre a
produção e o conteúdo da gravadora.
E para encerrar a análise das mídias da Igreja Internacional da Graça de Deus
no capítulo terceiro, procuramos analisar a mídia infantil de Soares através da
Revista Infantil da Turminha da Graça que tem sua referência na Revista Infantil
Nosso Amiguinho, da Igreja Adventista do Sétimo Dia, a revista infantil de cunho
18
religioso mais antiga no Brasil. Tentamos analisar como Soares e sua equipe
procuraram seguir os mesmos passos da turminha da revista Nosso Amiguinho,
tanto nas aventuras realizadas, como na essência da mensagem transmitida às
crianças. Perambulando por um sebo, conseguimos toda coleção da Revista
Nosso Amiguinho da década de 90 e tivemos acesso ao último ano de circulação
da revista da Turminha da Graça.
No capítulo quarto, foi eleito um grupo religioso dentro do protestantismo
histórico, a saber, os presbiterianos que serviram de base para uma pesquisa na
qual algumas suspeitas que tínhamos, antes de iniciarmos a tese, foram
corroboradas, e outras mostraram-se descabidas, a partir da pesquisa.
Essa pesquisa foi realizada com presbiterianos do interior paulista. Ao todo
foram 40 entrevistados; todos membros ativos de igrejas presbiterianas, sendo
que a grande maioria era de presbiterianos da Igreja Presbiteriana do Brasil – IPB.
A pesquisa visava a esclarecer que tipo de relação pode existir entre membros
de uma igreja do espectro histórico e a produção midiática de um grupo religioso
que se situa dentro da esfera do pentecostalismo. Como se efetua a recepção da
mensagem pelo grupo histórico? Como esse grupo equaciona seu pertencimento
a um grupo histórico e seu flerte com um discurso tão diametralmente oposto?
Essas são algumas das questões que pretendíamos responder.
Finalmente, apresentamos no trabalho algumas considerações finais que
encerram essa tese, mas não o trabalho de pesquisa sobre o objeto. Uma
pequena parcela da realidade sobre o objeto foi capturada, temos a plena
consciência de que um assunto tão apaixonante e de dimensões tão gigantescas
não se encerra com facilidade.
19
CAPÍTULO 1
MÍDIA, RELIGIÃO E POLÍTICA: UMA RELAÇÃO ESTREITA
“As mídias ocupam espaço tão grande em nossa visão do futuro que corremos o risco de não
reconhecer a importância que tiveram no passado, de modo que o presente pode ser percebido
como uma época de transição, em que os modos de comunicação tomam o lugar dos modos de
produção como força motriz da história. Eu gostaria de contestar esse ponto de vista,
argumentando que cada era foi, à sua própria maneira, uma era da informação, e que os sistemas
de comunicações sempre moldaram os acontecimentos”
.
ROBERT DARNTON -
professor de História na Universidade de Princeton
1.1 – Modernidade e Mídia
Quando se fala em mídia, automaticamente surge a imagem das grandes
tecnologias presentes no mundo hodierno. Pensa-se num conjunto de diversos
meios produtores e difusores de mensagens informativas (JÚNIOR, 2004, p.130),
para usar uma terminologia mais técnica. Ou pode-se pensar ainda nos mass
media (expressão inglesa) ou mass midia (expressão aportuguesada), isto é, os
meios de massa, que atingem uma gama vastíssima de pessoas. Define-se mass
midia, como um:
20
Conjunto dos meios de comunicação de massa, que inclui veículos, recursos e
técnicas variados: jornal, dio, televisão, cinema, outdoor, ginas impressas,
propaganda, mala-direta, balão inflável, anúncio em site da internet (MARTINS,
2006, p.132)
Ainda sobre o mass midia, Marilena Chauí oferece uma boa contribuição sobre
a evolução lingüística do termo.
“Em latim, meio’ se diz medium e, no plural, ‘meios’ se diz media. Os primeiros
teóricos dos meios de comunicação empregaram a palavra latina media. Como
eram teóricos de língua inglesa, diziam: mass media, isto é os meios de massa. A
pronúncia, em inglês, do latim media é mídia’. Quando os teóricos de língua
inglesa dizem the media’, estão dizendo: ‘os meios’. Por apropriação da
terminologia desses teóricos no Brasil, a palavra ‘mídia’ passou a ser empregada
como se fosse uma palavra feminina no singular – ‘a mídia’”. (CHAUÍ, 2006, p.35)
Em se tratando de um pesquisador, quando o tema dia entra na pauta de
discussões, parece haver a necessidade de se retornar ao período da antiguidade
e reconstruir todos os passos midiáticos desde a escrita cuneiforme até a mais
recente inovação tecnológica
1
. Não é essa a intenção inicial deste capítulo. O
recorte histórico, neste trabalho recai sobre o aparecimento da mídia na
modernidade ocidental, muito embora se reconheça que a matriz midiática do
mundo ocidental esteja na China, porque foi que apareceram dois elementos
fundamentais para o desenvolvimento da mídia, a saber, o papel e as técnicas de
impressão. John Thompson refere-se assim à importância da China nesse
processo:
1
Quem realiza esse trabalho de forma muito competente é John B. Thompson, em suas obras.
Pelo menos duas delas estão registradas na Bibliografia.
21
“O papel foi inventado na China pelo ano 105 dC (sic!). Os têxteis eram separados
em fibras, molhados na água e então estirados em papel e secados (...) O uso do
papel aos poucos se espalhou pelo Ocidente e pelo fim do século V era usado,
de modo geral, na Ásia Central. No século VIII, os árabes venceram o exército
chinês no que se chama Turquestão, e tomaram como prisioneiros vários
fabricantes de papel. Fábricas de papel foram construídas em Bag e
subseqüentemente em Damasco, que se tornaram as principais fontes de
suprimentos para a Europa. A técnica de fazer papel espalhou-se via Egito para
Marrocos e Espanha. Em 1276 a primeira fábrica de papel italiana foi construída
em Montefano. A fabricação italiana de papel se espalhou rapidamente; em 1283
havia pelo menos 12 fábricas de papel em Fabriano, e, no século XIV, a Itália se
tornou a principal produtora de papel para a Europa. Do mesmo modo que a
invenção do papel, as técnicas de impressão foram desenvolvidas originalmente
na China. A impressão por tipos evoluiu gradualmente de processos de carimbo e
estampagem e foi usada pela primeira vez provavelmente durante o século VIII.
Pelo século IX, as técnicas relativamente avançadas foram desenvolvidas e
usadas para imprimir textos religiosos. Métodos aperfeiçoados foram introduzidos
durante a dinastia Sung (960-1280)”. (THOMPSON, 1995, p. 229-230)
O processo iniciado na China impactou de forma veemente o mundo ocidental.
O processo de desenvolvimento da imprensa permite afirmar que a modernidade
ocidental nasceu sob a égide da comunicação. Quando as universidades
medievais européias começaram a ganhar uma estruturação mais contundente,
isso por volta o século XIII, houve uma necessidade de reproduzir em grande
escala os livros que até então eram copiados a mão e extremamente caros para a
época.
Nas palavras do historiador Jacques Verger, as universidades medievais
possuíam algumas características originais, entre elas, “a autonomia”, “o
universalismo” e a “proteção do papado”. Sobre isso, ele diz:
“De início, a originalidade estava na autonomia ou, como se dizia, nas liberdades
e privilégios’ de que usufruíam mestres e estudantes (...) Em suma, a autonomia
universitária era bem real e garantia, simultaneamente, um funcionamento interno
bastante democrático e o exercício de uma liberdade eminentemente favorável à
atividade intelectual. Outra característica marcante da Universidade medieval era
sua vocação universalista (...) Extraído de dupla fonte, da ciência antiga
22
(oportunamente enriquecida pelos árabes) e da Revelação cristã, este saber era o
mesmo em toda parte. Ensinado em uma língua também universal (o latim),
apoiado em todos os locais sobre as mesmas ‘autoridades’ (Prisciano, Aristóteles,
Galieno, o Corpus iuris civilis, a Bíblia, as Sentenças de Pedro Lombardo etc),
alheio, portanto, a qualquer particularismo nacional ou regional, era
uniformemente encontrado em todas as universidades da Cristandade (...) Ao
mesmo tempo, causa e conseqüência desta vocação universalista, as
universidades ligavam-se diretamente ao poder universal por excelência, o
papado. Era o papa que confirmava seus privilégios, era em seu nome que o
chanceler conferia a licença ubique docendi (‘válida em toda parte’), era ele que
protegia mestres e estudantes contra os ‘abusos’ das autoridades locais, laicas ou
eclesiásticas. Em troca, o papa esperava das universidades que fossem fiéis e
ortodoxas auxiliares doutrinais do magistério romano e que acolhessem em seu
seio esses agentes especialmente devotado ao papado, que eram os religiosos
mendicantes”. VERGER, Jacques. “Universidade”. In: LE GOFF, Jacques &
SCHMITT, Jean-Claude. Dicionário Temático do Ocidente Medieval. TOMO II,
p.579-580.
Esse ambiente universitário medieval criou uma demanda cada vez maior no
que tange à produção acadêmica de novos autores, e à reprodução de obras
daqueles que eram considerados como autoridades legítimas da cristandade (pais
da Igreja, Agostinho, São Tomás de Aquino). É bem verdade que, no final da
Idade Média, o ambiente universitário não será tão tranqüilo quanto sugere o
historiador acima mencionado, pois com o advento do humanismo, os “livres
pensadores” desenvolveram o espírito de pesquisa e valorizaram os métodos de
observação responsáveis pela criação da ciência moderna. Contudo, o que
importa ressaltar é que ainda na Idade Média houve uma necessidade real de
reproduzir as obras usadas nas Universidades e isso contribui para o
aparecimento da imprensa no século XV.
Num primeiro momento, tentou-se gravar o texto em madeira, aquilo que
convencionou-se chamar de xilografia. As letras eram desenhadas em uma
prancha de madeira, que, depois, era cavada ao redor das letras, fazendo com
que o texto aparecesse em relevo. Formada uma prancha, passava-se tinta e
prensava-se uma folha de papel sobre ela para obter uma página de livro. Esse
procedimento, além de trabalhoso, que exigia um trabalho artesanal no entalhe
23
da madeira, era muito custoso, e poder-se-ia dizer, também, que era descartável,
tendo em vista que as letras ou caracteres eram imóveis e, portanto, não poderiam
servir para a composição de outros livros.
Acredita-se que, em princípios do século XV, na região dos Países Baixos,
Lourenço Coster teve a iia de separar os caracteres e torná-los móveis, por isso
ele pode ser chamado de precursor da imprensa moderna. Essa técnica permitia a
reutilização dos caracteres, mas como os mesmos eram de madeira havia uma
deterioração rápida. Somente em 1440, John Gutenberg (1394?-1468), um
germânico de Mainz resolveu aprimorar a técnica de separar os caracteres. Ele
fez caracteres ocos, (obtendo, portanto, matrizes de letras) e os enchia com uma
liga metálica de chumbo e antimônio. Com caracteres móveis e de grande
resistência nascia a possibilidade de reproduzir em larga escala os livros. E o
primeiro livro, que Gutenberg imprimiu por esse novo processo foi uma Bíblia
2
em
1457.
Com a invenção da imprensa, as organizações tipográficas e editoras que
surgem no início da Idade Moderna vão acumulando um poder simbólico e
econômico muito grande porque exploravam as estruturas do novo modo de
produção em vigor na Europa, que era o capitalismo comercial. Explorando as
convergências de interesses e ao mesmo tempo, os conflitos entre o poder local
(cidades), o poder nacional (Estado Nacional Moderno, com poder centralizado
nas mãos de um rei) e o poder supranacional (Igreja), a indústria editorial
européia, organizada de muitas e diferentes formas no continente conseguiu uma
certa autonomia que lhe permitia concentrar um poder significativo, evitando,
assim, um controle sobre o seu campo de atuação.
2
. “No início da década de 1450, Gutenberg iniciou a impressão da célebre blia, de 42 linhas em
duas colunas. Cada letra era feita à mão, e cada página era montada juntando-se as letras. Depois
de prensada e seca, era feita a impressão no verso da página. Gutenberg teria imprimido trezentas
folhas por dia, utilizando seis impressoras. A Bíblia têm 641 páginas, e calcula-se que foram
produzidas cerca de trezentas cópias, das quais ainda
existem aproximadamente 40. Nem todas
as cópias são iguais, tendo algumas, no início de novos capítulos, letras pintadas à mão. A Bíblia
foi impressa em dez seções, o que significa que Gutenberg deve ter possuído tipos suficientes
para imprimir 130 páginas de cada vez”. Gutenberg Disponível:
http://pt.wikipedia.org/wiki/gutenberg/>. Acesso: 20/07/2007.
24
“O surgimento da indústria editorial criou novos centros e novas redes de poder
simbólico que se baseavam principalmente nos princípios da produção mercantil,
e que eram por isso mesmo relativamente independentes do poder político e
simbólico controlados pela Igreja e pelo estado. Tanto a Igreja quanto o estado
procuravam usar esta indústria nascente para finalidades próprias, encomendando
documentos oficiais, comunicações impressas e normas, como também trabalhos
dos mais diversos tipos. Mas toda tentativa de controlar a produção impressa e os
novos centros de poder simbólico foi sempre muito limitada de muitos modos”.
(THOMPSON, 1998, p.57)
O impacto da invenção de Gutenberg espalhou-se rapidamente por toda
Europa e promoveu a possibilidade da disseminação do conhecimento. Esse
impacto pode ser medido em números. Briggs e Peter Burke apontam de forma
detalhada como isso aconteceu:
“Por volta de 1500, haviam sido instaladas máquinas de impressão em mais de
250 lugares na Europa – 80 na Itália, 52 na Alemanha e 43 na França. As prensas
chegaram na Basiléia em 1466, a Roma em 1467, a Paris e Pilsen em 1486, a
Veneza em 1469, a Leuven, Valência, Cracóvia e Buda em 1473, a Westminster
(distinta da cidade de Londres) em 1476 e a Praga em 1477. Todas essas gráficas
produziram cerca de 27 mil edições até o ano de 1500, o que significa que
estimando-se uma média de 500 cópias por edição – cerca de 13 milhões de livros
estavam circulando naquela data em uma Europa com cem milhões de habitantes.
Cerca de dois milhões desses livros produzidos somente em Veneza, enquanto
Paris era um outro centro importante, com 181 estabelecimentos em 1500”.
(BRIGGS, 2006, p.25)
Onde havia forte censura, principalmente por parte da Igreja, houve a criação
de um mercado clandestino de comerciantes de livros, ou seja,
contrabandeadores de cultura afloravam para burlar a lei.
25
“Em 1501 o Papa Alexandre VI tentou estabelecer
um sistema de censura mais
rigoroso e abrangente, proibindo a publicação de qualquer livro sem a autorização
do poder eclesiástico...” “Mas embora as intervenções das autoridades religiosas e
políticas fossem numerosas no final do culo XV e durante todo século XVI,
pouco sucesso elas obtinham. Os editores sempre encontravam meios de burlar
os censores, e os livros banidos numa cidade ou região eram editados numa outra
e contrabandeados por comerciantes e mascates. A censura estimulava um
vigoroso comércio de contrabando de livros”. (THOMPSON, 1998, p.57)
Percebe-se desde essa época que a mídia é um objeto de difícil controle.
Qualquer tentativa de controlar a mídia em qualquer tempo é uma ação infrutífera.
A modernidade nasceu rompendo com padrões arcaicos e trazia no seu bojo o
germe da liberdade.
Não é um exagero dizer que a modernidade nasceu sob o impacto do
desenvolvimento da mídia, principalmente da mídia escrita, - que foi pioneira
nesse contexto -, abrindo com isso, um largo caminho para o desenvolvimento da
liberdade e da expressão dessa liberdade por meio de outras mídias que serão
desenvolvidas nos séculos seguintes.
26
1.2 – Mídia e Religião
Um grande evento que aproveita de forma muito profícua a invenção da
imprensa é a chamada, Reforma Protestante. Pode-se dizer que a Reforma
Protestante é mais uma cisão da cristandade, vale ressaltar que não é a primeira,
pois este posto cabe à divisão ocorrida no século XI, mais especificamente no ano
de 1054, no episódio denominado de “Cisma do Oriente”, que gerou dois grupos
majoritários que arvoram-se como lídimos herdeiros da tradição apostólica, a
saber, a Igreja Católica Apostólica Romana e a Igreja Ortodoxa Grega.
A Reforma Protestante gera inicialmente três novos grupos cristãos: os
luteranos, os calvinistas e os anglicanos. O contexto onde emerge a Reforma
Protestante é o contexto da Renascença que inicialmente desenvolve-se a partir
da Península Itálica entre os séculos XIV (O Trecento), XV (O Quattrocento), e XVI
(Cinquecento), e espalha-se por toda a Europa, penetrando nos mais variados
campos do conhecimento. Uma das características do Renascimento é a
valorização do individualismo
3
, e, de certa forma, essa posição é assumida no
campo religioso pelos protestantes, pois com o desenvolvimento das doutrinas
protestantes percebe-se o afastamento de qualquer mediação humana e
institucional que pudesse colocar o homem frente ao numinoso. Peter Berger
ressalta isso, ao dizer que:
“O católico vive em um mundo no qual o sagrado é mediado por uma série de
canais os sacramentos da Igreja, a intercessão dos santos, a erupção corrente
3
Fazendo uma referência às possibilidades de trabalho da Nova História, Peter Burke descreve a
importância de alguns elementos para o desenvolvimento do trabalho dos novos historiadores e
cita como exemplo de valorização do individualismo na Idade Moderna alguns objetos; ele diz: Os
argumentos sobre a ascensão do individualismo e da privacidade no início do período moderno
estão agora baseados não somente na evidência da manutenção de um diário, mas também em
mudanças como a criação de caras individuais (em lugar de tigelas de uso coletivo) e cadeiras
(em lugar de bancos coletivos) e o desenvolvimento de quartos específicos para dormir”.(BURKE,
1992, p.28)
27
do ‘sobrenatural’ em milagres – uma vasta continuidade de ser entre o que se vê e
o que não se vê. O protestantismo aboliu a maior parte dessas mediações. Ele
rompeu a continuidade, cortou o cordão umbilical entre o céu e a terra, e assim
atirou o homem de volta a si mesmo de uma maneira sem precedentes na
história”. (BERGER, p.124-125)
Esse acesso direto ao sagrado sem a mediação de nenhuma instituição ou de
qualquer rito sacerdotal pressupunha que todo cristão é em última instância um
sacerdote diante de Deus, esse princípio é justificado entre os protestantes pela
doutrina do “sacerdócio universal dos crentes”. Lançado fora do paraíso
novamente, destituído da proteção eclesial, o protestante necessita de um guia
nesse mundo tenebroso, e, para guiar-se nesse campo, a referência maior passa
a ser a Bíblia, vista como Palavra de Deus (Sola Scriptura) e que o orienta em
todas as áreas de sua vida.
Desde o início, os reformadores perceberam a necessidade de colocar a Bíblia
nas mãos do povo leigo para que este pudesse orientar-se em suas ações. E toda
ação religiosa é uma ação racional, já dizia, Max Weber (WEBER, 2004, p.279).
Essa ação religiosa racionalizada entre a divindade e os seres humanos
mediada somente pela letra sagrada é um dos motivadores da secularização e do
desencantamento do mundo desde então.
O termo “secularização” nasce no contexto religioso-jurídico da Reforma
Protestante acima citada, quando aconteceram as expropriações de terras que
pertenciam à Igreja Católica e estas estavam situadas dentro do Sacro Império
Romano Germânico
4
. No século XIX, a palavra ganha como diz Pierucci:
4
. Nesse contexto, parece que muitos príncipes alemães aderem à Reforma, pela possibilidade de
confiscar os bens da Igreja Católica e também de contestar o poderio político do imperador Carlos
V, católico. Somente a título de curiosidade, vale ressaltar que a mais importante das
secularizações nessa época foi realizada no ano de 1525, por Alberto Hohenzollern de
Brandenburgo, da Ordem dos Cavaleiros Teutônicos. Com os extensos domínios conseguidos
pelas expropriações, formou-se o Ducado da Prússia, que está na origem do Reino da Prússia;
esse importante estado alemão que no século XIX conduzirá o processo de Unificação da
Alemanha, possibilitando o aparecimento do II Reich Alemão (1871-1919).
28
“...uma notável extensão semântica: primeiramente, no campo histórico-político,
em seguida à expropriação dos bens e dos domínios religiosos fixada pelo decreto
napoleônico de 1803 (daí a carga polêmica com a qual o termo foi empregado
durante o Kulturkampf), e posteriormente no campo ético e sociológico”.
(PIERUCCI, 1997, p.100)
Sem sombra de dúvidas, o contexto onde nasce a palavra “secularização” e
conseqüentemente a sua enorme carga de significados é uma era axial da história
para usar uma expressão muito comum nos escritos de Yves Lambert. Esse autor
diz que:
“O conceito de era axial tem sido usado para se referir a um período histórico (...)
Essa noção de era axial tem sido utilizada por sociólogos para analisar a
modernidade (...) nós podemos, portanto, periodizar a modernidade. Ela começa
com este momento axial dos séculos quinze e dezesseis, no qual não somente
começa o que os historiadores chamam de era moderna’, mas também a ciência
moderna, e o nascimento do capitalismo e da burguesia. Mas a modernidade
somente torna-se um fenômeno maior no fim desse período com o Iluminismo, e
especialmente, com as Revoluções Americana e Francesa, o nascimento do
pensamento e método científico e o nascimento da indústria (segundo momento
axial)”. (LAMBERT, 1999, p.02)
O nascimento da modernidade traz consigo mudanças importantes no campo
religioso. A Reforma Protestante marca o fim do monopólio religioso nas mãos da
Igreja Católica e possibilita a pluralidade de crenças e práticas religiosas. No
entanto, as próprias igrejas que nascem com o protestantismo histórico sofrerão
com os efeitos da secularização, na medida em que terão que se adaptar a uma
cultura onde o religioso não dita mais as regras. Aqui não entra nenhum juízo de
valor, não cabe aqui uma análise se a secularização é boa ou ruim, ocorre tão
somente uma constatação que verifica o fim do monopólio religioso, de qualquer
igreja, instituição, seita ou denominação religiosa.
29
Nesse momento histórico aconteceu aquilo que Max Weber denominou de
“desencantamento do mundo” (Entzauberung der Welt). Lísias Negrão (2005)
comentando a tese de Livre Docência do professor Pierucci (2001), intitulada
Desencantamento do Mundo: os passos do conceito em Max Weber, diz que este
realizou uma exegese na obra weberiana e encontrou alguns dados importantes
sobre os conceitos de secularização e desencantamento do mundo.
“Pierucci encontrou o termo secularização em oito passagens da sociologia do
direito (Economia e Sociedade, cap.VII, parte 2, tomo 1), distinguindo os seguintes
empregos: expropriação dos bens eclesiásticos; destradicionalização;
racionalização formal das leis, do pensamento jurídico e do poder; surgimento do
direito natural como uma esfera diferenciada de valor; dessacralização do
pensamento; e desencantamento. Conclui o autor que, nesse contexto da
sociologia jurídica e da burocratização do Estado, aparece genericamente o
sentido forte de secularização como decadência do poder hierocrático”.
(NEGRÃO, p.28-29).
“Quanto ao conceito de desencantamento de mundo, Pierucci compulsou
dezessete textos ao longo da obra weberiana escrita entre os anos de 1913 e
1920, aos quais denominou ‘passos’. O conceito não é unívoco, pois desdobra-se
em dois tipos: desencantamento do mundo pela religião e pela ciência. O primeiro
refere-se ao processo de desmagificação procedida pela religião ética, iniciado
pelos profetas pré-exílicos israelitas e que alcançou seu ápice com a emergência
do protestantismo ascético racionalizado; o segundo, pelo desenvolvimento da
ciência, do cálculo e da tecnologia, que relegaram a religião ao âmbito do
irracional e a destituíram de sua proeminência na vida social”. (Ibid., p.29).
Steve Bruce (2002) um grande estudioso do fenômeno religioso discute o
paradigma da secularização, dando um lugar de destaque para a Reforma
Protestante e apresenta um diagrama com os elementos chaves que
desenvolvem-se a partir daí.(BRUCE, p.04). Ética Protestante, Individualismo,
Racionalidade, Capitalismo Industrial, Desenvolvimento da Ciência e Tecnologia,
Propensão ao cisma, formação de seitas e diversidade social, cultural e religiosa
seriam conseqüências da secularização iniciada a partir da Reforma Protestante.
30
Outro grande pensador em matéria de religião é Peter Berger que na sua obra
clássica, O Dossel Sagrado, trabalha o paradigma da secularização. Para Berger
o processo de desencantamento do mundo, manifestado sim a partir do
Protestantismo do século XVI, tem as suas raízes em outro momento histórico, a
saber, no judaísmo monoteísta, manifestado nas páginas do Antigo Testamento.
Peter Berger define da seguinte maneira, secularização:
“Por secularização entendemos o processo pelo qual setores da sociedade e da
cultura são subtraídos à dominação das instituições e símbolos religiosos. Quando
falamos sobre a história ocidental moderna, a secularização manifesta-se na
retirada das igrejas cristãs de áreas que antes estavam sob seu controle ou
influência: separação da Igreja e do Estado, expropriação das terras da Igreja, ou
emancipação da educação do poder eclesiástico, por exemplo. Quando falamos
em cultura e símbolos, todavia, afirmamos implicitamente que a secularização é
mais que um processo socioestrutural. Ela afeta a totalidade da vida cultural e da
ideação e pode ser observada no declínio dos conteúdos religiosos nas artes, na
filosofia, na literatura e, sobretudo, nas ascensão da ciência, como perspectiva
autônoma e inteiramente secular, do mundo. Mais ainda, subentende-se aqui que
a secularização também tem um lado subjetivo. Assim, como uma
secularização da sociedade e da cultura, também uma secularização da
consciência. Isso significa, simplificando, que o Ocidente moderno tem produzido
um número crescente de indivíduos que encaram o mundo e suas próprias vidas
sem o recurso às interpretações religiosas”. (BERGER, 1985, p.119-120)
Entende-se, portanto, que a teoria da secularização/desencantamento do
mundo (temas meos, como afirma Pierucci, 1997, p.100) foram processos
iniciados no Judaísmo e que atingiram o ápice com a Reforma Protestante e suas
ramificações.
Pode-se dizer que a mídia moderna nasce diretamente associada à religião.
Mídia e religião formam um par perfeito que andará de mãos dadas pelos séculos
seguintes e encontrará nos dias atuais, marcados pela cultura de massa, um meio
de conseguir ainda mais fiéis. Se no passado era fundamental distribuir Bíblias
para alcançar seus objetivos, hoje em dia, as religiões precisam demarcar seus
espaços na grande mídia, adquirindo emissoras de rádio, canais de televisão,
31
aquisição de jornais e revistas, e para tal é fundamental ter apoio político.
Principalmente quando se fala em Brasil, onde os meios de comunicação de
massa são concessões dadas pelo Estado, a relação dia religiosa e política,
torna-se de suma importância.
E será esse o próximo tópico a ser abordado.
32
1.3 – Mídia Religiosa e Política
Quando se trata de analisar a relação entre política e religião no contexto
brasileiro, é necessário, primeiramente, apontar para as facilidades que a
secularização criou, ao relegar a religiosidade ao foro íntimo de cada pessoa e ao
promover a separação entre Estado-Igreja, tornando os agentes religiosos sujeitos
ativos no campo da política, transformando os mesmos em defensores de suas
bandeiras no âmbito do debate político mais amplo. Se por um lado, a
secularização reduziu a influência da religião no campo político, por outro lado
permitiu que os religiosos ao se organizarem possam reivindicar seus valores
impondo-os como princípios basilares para toda sociedade.
“No caso brasileiro, a ampla liberdade religiosa resultante da secularização do
Estado está na raiz da desmonopolização religiosa, da formação e expansão do
pluralismo religioso e, por conseqüência, do acirramento da concorrência religiosa.
Isto é, a concessão de liberdade religiosa e a separação Igreja–Estado romperam
definitivamente o monopólio católico, abrindo caminho para que outros grupos
religiosos pudessem ingressar e se formar no país, disputar e conquistar novos
espaços na sociedade, adquirir legitimidade social e consolidar sua presença
institucional”. “De todo modo, atualmente o Estado brasileiro trata de modo
isonômico, pelo menos no plano jurídico, os diferentes grupos religiosos”.
(MARIANO, 2003, p.113)
Falar em política e religião no contexto brasileiro implica reconhecer que os
evangélicos têm tido uma penetração importante no cenário político nacional,
especialmente ao reconhecer a força dos grupos pentecostais nas urnas.
Os evangélicos pentecostais não inauguraram uma nova forma de fazer política
no Brasil. Eles são acusados de clientelistas, corporativistas, fisiológicos, etc
(MACHADO, Maria das Dores Campos. “Existe um estilo evangélico de fazer
política?”. In: BIRMAN, Patrícia. Religião e espaço público. p.284).
33
As lideranças políticas evangélicas agem da mesma forma como os maus
políticos sempre agiram no Brasil.
Constantemente casos de políticos evangélicos acusados de corrupção e
dos mais variados absurdos com o erário público. No entanto, essa prática política
não foi inventada pelos pentecostais. Ela está instalada no Brasil desde a primeira
forma de organização política que se tem notícia na colônia portuguesa do além-
mar. (CÃNEDO, Letícia Bicalho (2003). “Aprendendo a Votar”. In: PINSKY, Jaime
& PINSKY, Carla Bassanezi. História da Cidadania. p.516-543).
O que chama a atenção nos políticos evangélicos, e de certa forma assusta, é
que os mesmos são eleitos baseando suas estratégias de ação política sobre a
mais ilibada moralidade.
Entendendo a organização social demarcada pelo maniqueísmo
5
, os políticos
evangélicos conclamam os fiéis a votarem nos candidatos que são “irmãos na fé”
para poder derrotar as estratégias malignas que impedem a felicidade da nação.
É comum entre os candidatos evangélicos a menção de serem filiados a uma
igreja específica, mas com pretensões de trabalhar para todo o povo de Deus, e
isso, logicamente inclui todos os evangélicos, de todas as matizes, tanto os
protestantes históricos, quanto os pentecostais e neopentecostais. Além da
filiação e do rótulo, evangélico, a incorporação ao nome do candidato, do título
eclesiástico que possui, como, por exemplo, bispo, pastor, missionário, etc, facilita
o reconhecimento por parte do eleitorado daquele candidato afinado com os
valores defendidos por esse grupo social.
“Em se tratando da configuração dos atores políticos evangélicos, pode-se dizer
que a menção ao cargo eclesiástico cumpriria um duplo papel: sinalizaria que o
candidato compartilha do ethos e da visão de mundo do grupo evangélico para o
5
. Temos uma guerra declarada contra o pecado e contra satanás e agora vamos para uma
guerra política. [...] Não temos eleitores, temos ovelhas. Mas somos pastores e queremos
despertar o povo para exercer a cidadania. Pagamos impostos e queremos decidir o futuro político
do Brasil”. (MACHADO, Maria das Dores Campos. “Existe um estilo evangélico de fazer política?”.
In: BIRMAN, Patrícia. Religião e espaço público. p.283).
34
qual a campanha foi dirigida, mas também destacaria a autoridade do especialista
do sagrado”. (MACHADO, 2006, p.34)
A força dos especialistas do sagrado inserindo-se no contexto de eleições a
cargos públicos mostra a força do capital político adquirido pelos religiosos.
É claro que os políticos evangélicos lançam mão de outros capitais para
poderem concorrer a cargos públicos, mas sem dúvida a posse de um título
eclesiástico facilita a aproximação com o eleitorado.
Maria das Dores Machado cita Pierre Bourdieu para referir-se a esse
fenômeno.
“Analisando as bases da representação política, Bourdieu distingue dois tipos de
capital político: o que se detém a título pessoal e o que se obtém por delegação
(como mandatário de determinada instituição ou organização). O primeiro tanto
pode resultar da notoriedade, caso em que remete à popularidade e ao
reconhecimento, quanto estar associado a um capital heróico, oriundo de um
capital marcante em alguma situação de crise. Geralmente, os postulantes a
cargos eletivos lançam mão dessas diferentes formas de capital para conquistar a
empatia dos eleitores, mas não pode ignorar, que no grupo aqui estudado, o cargo
eclesiástico constitui um capital simlico muito forte na comunidade dos crentes”.
(MACHADO, 2006, p.34)
O capital cultural incorporado
6
, para usar uma expressão de Pierre Bourdieu,
faz com que os políticos evangélicos que detenham cargos eclesiásticos tornem-
se representantes do discurso e da visão de mundo da comunidade a qual ele
6
Bourdieu observa que o capital cultural pode se apresentar em três modalidades: objetivado,
incorporado ou institucionalizado. O primeiro diz respeito à propriedade de objetos culturais
valorizados (notadamente, livros e obras de arte). O segundo se refere à cultura legítima
internalizada pelo indivíduo, ou seja, habilidades lingüísticas, postura corporal, crenças,
conhecimento, preferências, hábitos relacionados à cultura dominante adquiridos e assumidos pelo
sujeito. Finalmente, o terceiro se refere, basicamente, à posse de certificados escolares, que
tendem a ser socialmente utilizados como atestado de certa formação cultural. (NOGUEIRA, 2006,
p.41)
35
pertence. E isso acaba ferindo os princípios de uma democracia representativa,
onde os cargos eletivos devem ser ocupados por pessoas compromissadas com o
interesse público, e não somente com os interesses de um grupo minoritário, que,
comparado ao conjunto geral da população, tem poder para eleger um
representante, mas que não pode torná-lo um agente somente de seus interesses.
A política inicialmente era vista como algo extremamente mundano, algo que
não poderia estar associado a uma ética eminentemente cristã, pensavam os
evangélicos. Contudo, a partir dos anos de 1980 e 1990, essa posição alterou-se
radicalmente. A entrada de evangélicos na política tornou-se importante e
indispensável para a manutenção aquinhoada por grupos religiosos. E os grupos
pentecostais no Brasil foram os primeiros a entender as regras desse jogo.
“E a política dá aceso também a recursos mais concretos que ajudam a estruturar
o vasto mundo pentecostal, cuja rápida expansão está sempre produzindo novos
líderes ansiosos para fortalecer suas posições. Entrar na política ou lançar nela
um familiar ou protegido, pode reduzir as tensões e ajudar a organizar o mundo
pentecostal. A conexão pública ajuda a estruturação interna, fortalecendo o
acesso à mídia, que é outra maneira de estabelecer lideranças. A mídia e a
política se reforçam mutuamente na estruturação do meio evangélico”.
(FRESTON, 1994, p.63)
Como bem assinalou Freston, de fato, dia e política se fortalecem e numa
relação de reciprocidade, estruturam-se e progridem irmanadas ao ponto, de não
conseguirem mais um afastamento. Tornam-se mutuamente dependentes e
exploram-se até as entranhas. É bem verdade também que exceções, existem
políticos que elegem-se com um discurso religioso, tendo toda sua base eleitoral
dentro de uma instituição e ao assumirem seus cargos começam a entender que
não podem tornar-se reféns daquela organização religiosa. É o caso do deputado
Almir Moura
7
(atualmente sem partido), pastor da Igreja Internacional da Graça de
7
. A trajetória religiosa e a carreira pública do deputado Almir Moura (sem partido) ilustram bem
essa via de acesso ao Legislativo. Filho de um pedreiro e uma dona-de-casa, ambos católicos,
36
Deus que elegeu-se como Deputado Estadual para a atual legislatura pelo Rio de
Janeiro.
“Eu tenho tido muitos problemas com o ministro RR Soares pelo fato de procurar
ser deputado de todo mundo, de todo um país, e não só dos evangélicos da minha
Igreja. Ele acha que tem que ser segmentado, eu não penso assim. Então, ele tem
uma certa rusga comigo por causa disso... Eu também acho que a religiosidade
tem que ter muito social. Eu acho que as igrejas evangélicas fazem muito pouco
pelo social e eu sou criticado no meio da Igreja por causa disso. Mas é o que eu
acho que tem que ser feito. Têm igrejas que têm o orçamento muito maior do que
muitos municípios, e não dão uma cesta básica para quem está morrendo de
fome. Se você não sabe disso, eu sei porque sou lá de dentro. Você pega minha
Igreja, ela tem um orçamento lá, não estou bem certo, mas presumo que está
girando em torno de 30 miles por ano, no mínimo. Estou falando da Igreja
Internacional da Graça de Deus, mas se vofor para a Universal, você vai subir
isso por dezenas de vezes. Mas e o social? Têm pessoas de barriga vazia, se
quiser um tênis ou um prato de comida tem que roubar, assaltar... Eu acho que
tem que ter o aspecto social. Podem não me apoiar, podem fazer o que quiser
comigo. Podem não votar nunca mais, mas vou defender aquilo que eu acho que
é direito defender. Eu pego uma cidade como Miracema, por exemplo, que tem 27
mil habitantes, com um orçamento de 1.200.000... Você sabe quanto é orçamento
de uma única igreja nossa em São Paulo? Dois milhões. não dá, você tem que
fazer algo pelo social. O prefeito tem que fazer saneamento, pagar funcionário,
tem que cuidar do agricultor, das enchentes de todo ano, conhecer o orçamento...
e, eu, pergunto a você: e esses 2 milhões? O que faz? Vai para a televisão e é
isso”. (MACHADO, 2006, p.157)
O Deputado Almir Moura, fruto político de um grupo religioso, cita números
importantes aqui. Orçamentos de milhões estão à disposição de grupos religiosos
e para evitar problemas, esses grupos que investem pouco no social, - em relação
ao montante que arrecadam, já que o importante é investir em mídia elegem
políticos para blindar seus negócios. o é interesse desse trabalho discorrer de
esse parlamentar passou a freqüentar a Igreja Casa da Benção ainda adolescente, estimulado por
uma vizinha que ajudava nos cuidados das crianças da família. Porém, logo em seguida, se
afastou da comunidade religiosa e em 1981 entrou na IIGD. Sete anos mais tarde, foi
consagrado pastor dessa Igreja. Segundo ele, a primeira participação em uma disputa eleitoral
ocorreu 14 anos depois de sua inserção nos quadros eclesiásticos...” (MACHADO, 2006, p.p.147-
148)
37
forma pormenorizada sobre a atuação política dos evangélicos, mas é intenção
declarada entender como se dá a relação entre política e mídia. É intenção
entender como a política nacional favorece a criação de impérios midiáticos
religiosos que servirão a interesses dos mais variados.
A publicação de jornais e revistas de cunho religioso, nunca despertou muitas
discussões no Brasil. São meios de comunicação que têm uma certa penetração,
em um certo público e que, portanto, não podem ser definidos como meios de
comunicação de massa tão agressivos, com fins proselitistas e que estejam
atingindo um sucesso esplendoroso ao converter novos fiéis por meio de seus
editoriais e reportagens. Várias igrejas, tanto do grupo do protestantismo histórico,
quanto do universo pentecostal brasileiro mantém seus jornais e revistas em
circulação e isso não gera tantos debates e polêmicas.
Não se pode dizer o mesmo sobre a concessão
8
de canais de televisão e
emissoras de rádio no Brasil. As concessões de rádio e televisão viraram objetivos
reais para os vários grupos religiosos brasileiros, mas isso setratado mais à
frente.
No que tange ao funcionamento de rádio e televisão no Brasil, o sociólogo
Alexandre Brasil Fonseca define o modelo brasileiro como um modelo “híbrido”.
No Brasil não um modelo gido e que regula de forma clara o funcionamento
desses veículos de comunicação de massa.
“A televisão e o rádio no Brasil estruturam-se num modelo que poderíamos
considerar híbrido entre os adotados nos Estados Unidos e no Reino Unido – um à
mercê do mercado e outro sob a égide do Estado. Enquanto na Inglaterra temos
um modelo restrito no acesso e centralizado no controle e, nos Estados Unidos,
um sistema aberto no acesso e difuso no controle -, o que propicia a grande
8
“No Brasil, assim como em praticamente todo o mundo, as emissoras de rádio e TV são
concessões públicas, ou seja, são uma autorização do Estado que, em nome do povo brasileiro,
quem pode e quem não pode explorar os serviços de radiodifusão. Durante muito tempo as
concessões foram dadas pelo governo federal sem que houvesse qualquer tipo de controle, o que
acabou por tornar as outorgas uma forte moeda de troca política. Isso significa que as concessões
eram distribuídas aos amigos e simpatizantes do governo. Após a Constituição de 1988, além do
Executivo, a outorga passou a precisar também da aprovação do Congresso, o que teoricamente
garantiria um controle maior sobre as novas concessões”. (INFORMATIVO INTERVOZES, Tv
Digital: saiba por que você precisa participar desse debate, Novembro de 2005, p.06)
38
presença de televangelistas -, o Brasil se caracteriza por um acesso restrito e um
controle difuso. Esse modelo pouco regulado na programação e na estruturação
de redes permite que as emissoras transmitam qualquer tipo de programa:
televenda, religioso ou erótico, alugando seus horários marginais’. a obtenção
de uma emissora, que implica o estabelecimento de uma ampla programação, é
mais difícil e exige, além de alto investimento financeiro, forte ação política”.
(FONSECA, Alexandre Brasil. “Igreja Universal: um império midiático”. In: ORO,
Ari Pedro, CORTEN, André, DOZON, Jean-Pierre (Orgs). Igreja Universal do
Reino de Deus – os novos conquistadores da . 2003, p.p.263-264).
A força da mídia no Brasil é de fato assustadora. E muito tempo isso tem
sido uma realidade. O Instituto de Estudos e Pesquisas em Comunicação
apresenta alguns dados interessantes:
“3,5 horas é a média diária de tempo que o brasileiro passa vendo TV. 81% da
população assiste à TV todos os dias. A TV e o Rádio são as maiores e únicas
fontes de informação para a maioria dos brasileiros. A TV está presente em 87,7%
dos domicílios e 88% dos brasileiros ouvem rádio todos os dias”. (EPCOM, 2002)
Mesmo assim, os dados brasileiros, no que concerne especificamente à
televisão são menores do que os dados norte-americanos. Nos Estados Unidos,
98% dos lares americanos possuem pelo menos um aparelho de televisão, que
fica ligado pelo menos seis horas e meia por dia, aproximadamente (BRETON,
2002, p.120).
O Brasil possui uma tradição mais recente na relação entre o público e os
meios de comunicação de massa, principalmente rádio e televisão.
Mas, sem sombra de dúvidas, a detenção de canais de rádio e emissoras de
televisão rendem um poder sem paralelos num território onde mais de 80% da
população acessam de alguma forma essas mídias. É o fenômeno do
“coronelismo eletrônico”. E os grupos religiosos no Brasil logo perceberam o poder
39
que esses meios lhes confeririam e lutaram e lutam muito para conquistar e
manter esse poderio midiático.
40
1.4 – Concessões no Brasil e o Coronelismo Eletrônico.
Para se falar em concessões midiáticas eletrônicas no Brasil e a formação
de um séqüito de coronéis eletrônicos, é necessário lembrar que as concessões
no Brasil são prerrogativas do Governo Federal. As emissoras de rádio e TV são
concessões públicas e necessitam de autorização do Estado para funcionarem.
Isso por si torna a relação de concessões um intrincado jogo de poder
político. Com certeza, conseguirão concessões aqueles grupos que melhor se
articularem no campo. Os grupos religiosos midiáticos sabem muito bem disso e
procuram articular-se do ponto de vista político para poderem aquinhoar um
capital político forte e, assim, exercerem controles tanto no campo político, como
no campo religioso.
Outra questão importante tratada neste tópico é a relação entre mídia e religião
no Brasil e como essa relação foi apropriada pela esfera política. Para entender
essa situação, é necessário fazer um breve apanhado entre religião e mídia
eletrônica no Brasil para se perceber como os grupos religiosos, através de seus
líderes, conseguiram não criar coronéis midiáticos, mas também conseguiram
implementar o fenômeno do coronelismo, marcado pela atuação gida desses
coronéis sobre os fiéis, com o intuito de conseguirem votos amiúde de uma massa
de eleitores obedientes, bem como pela troca de favores, a partir de interesses
comuns tanto do lado religioso, quanto do lado político.
A relação entre religião e mídia eletrônica
9
no Brasil data do início da década
de 40 do século XX. O primeiro programa religioso de rádio no Brasil, data de 23
9
. Aqui se fala em mídia eletrônica pensando em Rádio e TV, que os grupos religiosos usavam
outras mídias desde o século XIX, como por exemplo, os jornais de várias denominações
tradicionais. “Uma década depois da publicação da Imprensa Evangélica, em janeiro de 1874, foi
lançada a segunda publicação presbiteriana, O Púlpito Evangélico, período mensal com sermões,
editado por Emanuel Vanorden e George Chamberlain (fundador do Mackenzie). Foram publicados
24 números (1874-1875). Foi ditado em São Paulo e depois transferido para o Rio. Também foi
publicado no Rio, em 1889, O Christão Brasileiro. O Púlpito Evangélico ressurgiu em Campinas-
SP, sob a direção do Reverendo Eduardo Lane e companheiros. Numa terceira fase passou a ser
ditado em Lavras-MG, encerrando sua carreira em 1900.
41
de Setembro de 1943, intitulado a Voz da Profecia, e foi transmitido pelo pastor
Roberto Rabello da Igreja Adventista, que a cada dois ou três meses dirigia-se aos
Estados Unidos para gravar os programas. A grande sensação desse programa foi
o curso bíblico oferecido pela Escola Radiopostal.
“No programa, era oferecido aos interessados um curso bíblico pela Escola
Radiopostal, cuja sede foi instalada na cidade de Niterói-RJ, em 1945. Dirigida por
Ilka Reis, a Escola Radiopostal servia para viabilizar o envio de lições dos alunos
de cursos bíblicos e para responder às correspondências dos ouvintes (...) Entre
1943 e 1963, o programa havia recebido mais de 400 mil pedidos para inscrições
na Escola Radiopostal, de pessoas interessadas em fazer cursos bíblicos por
correspondência”. (FONSECA, 2003, p.46-47)
As chamadas igrejas do protestantismo histórico não ficaram alheias à
novidade do Rádio. Foram várias tentativas de se estabelecerem, usando esse
meio de comunicação. A mais importante foi a criação do CAVE (Centro
Audiovisual Evangélico) que tentou produzir material de cunho “tradicional” para
as igrejas do protestantismo histórico. Nascido da iniciativa idealista e
empreendedora dos Reverendos Robert McIntire (norte-americano apaixonado por
fotografia) e Celso Wolf (brasileiro recém-formado pelo Seminário Presbiteriano do
Sul em Campinas e que também amava fotografias). Aliás, o encontro entre os
dois foi um tanto quanto inusitado. Karina Bellotti registra assim o encontro entre
esses dois empreendedores:
Themudo Lessa afirmou que também foram presbiterianas as iniciativas em vários outros Estados.
No Rio Grande do Sul: em 1877, o Rev. Vanorden lançou O Pregador Cristão.Em Alagoas foi
lançado, em 1885, O Evangelista; Em Minas Gerais: na cidade de Bagagem, em 1889, é produzido
o homônimo O Evangelista, a cargo do missionário Rev. John Boyle. No Rio Grande do Norte, em
1893, saiu O Pastor, publicado pelo Prof. Lourival. Também no Ceará: os primeiros jornais
evangélicos, publicados a partir de 1894, na cidade de Baturité, tinham presbiterianos como
redatores. No Paraná: saiu em 1898, na cidade de Castro, a Aurora do Evangelho. Também em
Sergipe, Paraíba e Santa Catarina, os primeiros jornais evangélicos foram de procedência
presbiteriana”. (SILVESTRE, 1996, p.25-26)
42
“Em 1948, quando o americano foi ministrar uma palestra no Seminário
Presbiteriano do Sul, encontrou um rapaz com uma estranha máquina fotográfica
nas mãos, documentando o evento. Amante da fotografia foi conversar com o
jovem e descobriu que era uma máquina feita em casa. Admirado por ter
encontrado um seminarista louco por fotografia, McIntire convidou o jovem para
revelar seus filmes na câmara escura que possuía em casa. Inicia-se uma longa
amizade com Celso Wolf, visando o uso dos meios de comunicação para realizar
trabalho evangelístico”. (BELLOTTI, 2000, p.7)
Naquela época, a Confederação Evangélica do Brasil (CEB) havia recebido
vários equipamentos de gravação que foram doados pelo Comitê de Cooperação
para a América Latina (CCLA). Necessitando de uma pessoa que tivesse
inclinações para essa área de trabalho, a CEB solicita à Missão Presbiteriana do
Brasil Central o recrutamento de um missionário e o escolhido foi o Dr. McIntire.
Este foi aos Estados Unidos para fazer um curso de treinamento para poder
utilizar os equipamentos que a CEB havia ganhado.
Aquela amizade, iniciada em 1948, com Celso Wolf, deu os seus primeiros
frutos no que tange ao projeto de utilizar os recursos audiovisuais com intuitos
evangelísticos, entre 1950 e 1951. Celso Wolf havia terminado o curso de teologia
em 1950 (SILVA, 1995, p.63) e retornado para o Presbitério de Rio Claro, e é
nesse momento que McIntire solicita formalmente a esse Presbitério que ceda o
agora, Reverendo Celso Wolf para a obra evangelística audiovisual. Com poucos
recursos, o Centro Áudio-Visual Evangélico teve início oficialmente nos porões da
casa da Missão Presbiteriana do Brasil Central, na Alameda Campinas, 139, em
São Paulo. Na capital paulista mudou de endereço algumas vezes, tendo inclusive
como sede por algum tempo, a lavanderia de propriedade da Igreja Presbiteriana
Unida
10
. Aliás, essa igreja foi uma grande parceira do CAVE, inclusive
patrocinando o programa radiofônico inaugural do CAVE, transmitido pela Rádio
Tupi de o Paulo. O programa chamava-se Jardim das Oliveiras, e era
apresentado pelo Reverendo José Borges dos Santos Júnior.
10
. Essa Igreja Presbiteriana Unida é uma igreja afiliada à Igreja Presbiteriana do Brasil e nada tem
a ver com a Igreja Presbiteriana Unida, fundada em 1978. A IPU como é conhecida é uma
denominação dissidente da IPB.
43
Nessa época o CAVE não possuía uma sede própria e McIntire procurou
alguns amigos da Igreja Cristã Reformada Holandesa, Jacques e Margarida
Dultilh, que possuíam uma fazenda na estrada Campinas-Mogi-Mirim, chamada
Pau D’ Alho. Esses irmãos cederam dois alqueires para a construção da sede do
CAVE. O dinheiro para a construção da sede própria foi levantado pela
RAVEMCCO
11
, e a obra custou aproximadamente 100 mil dólares. Após dois anos
de obras, a sede foi inaugurada em Agosto de 1958. (ibid, p.8)
“O Centro Áudio-Visual Evangélico começou como um departamento da
Confederação Evangélica do Brasil no Rio de Janeiro, transferido logo para São
Paulo. Sua sede atual com estúdios de gravação-filmagem e laboratório de filmes
encontra-se perto (sic) de Campinas. O CAVE existe para servir a causa geral do
evangelismo no Brasil, produzindo filmes fixos, filmes de cinema, discos e
programas radiofônicos. Dezoito denominações e missões evangélicas constituem
a assembléia geral do CAVE, na qual participam as duas igrejas presbiterianas e
as quatro missões presbiterianas. O CAVE está ligado ao Comitê para
Cooperação na América Latina e ao RAVEMCCO (do Conselho Nacional de
Igrejas Cristãs dos Estados Unidos). O Secretário geral é o Reverendo Robert
McIntire, membro da Missão Presbiteriana Central”. (Revista sobre o centenário da
Igreja Presbiteriana do Brasil, 1959, p.143)
A administração fez com que o CAVE entrasse em crise e fechasse suas
atividades em 1971. Outras igrejas protestantes históricas tentaram criar seus
programas radiofônicos, mas sem sucesso. Um exemplo dessas tentativas foi o
que fez A Igreja Presbiteriana Independente que tentou criar nos anos 60, um
programa de alcance nacional, A Voz do Estandarte, no entanto, sem sucesso.
O grupo religioso brasileiro que mais se adaptara ao rádio é sem sombra de
dúvidas, o grupo pentecostal. Calcula-se que no final dos anos 60, havia 64
programas radiofônicos irradiados na Grande São Paulo, sendo que 53% desses
programas eram pentecostais (CAMPOS, 1997, p.270)
11
RAVEMCCO é a sigla de Radio Audio-Visual Education and Mass Comunication Committee.
(BELLOTTI, 2005, p.15).
44
O “pentecostalismo de cura divina” será o grupo que conseguirá entender
melhor as mudanças que estavam ocorrendo no Brasil na década de 50. Com um
intenso êxodo rural, as cidades tornam-se inchadas e essa população sofrida será
acolhida por esses grupos religiosos, que usarão muito bem o rádio como um
veículo que trará consolo e acolhimento para esses migrantes sofridos.
Em 1951, a Igreja do Evangelho Quadrangular
12
chegou ao Brasil e colocou em
prática toda sua experiência de uso do rádio nos Estados Unidos, como meio de
propagação de sua doutrina.
Igreja que adotou métodos inovadores, centrando sua mensagem na cura
divina e gerou críticas por parte da dia secular que definiam essas práticas de
charlatanismo e curandeirismo. (MARIANO, 1999, p.30)
Nascida da costela da Igreja do Evangelho Quadrangular, a cismática Igreja
Pentecostal O Brasil para Cristo, comandada pelo pernambucano ex-missionário e
ex-diácono quadrangular Manoel de Mello, soube usar muito bem esse meio de
comunicação para atingir as massas urbanas.
“O Brasil para Cristo roubou as multidões e as atenções da dia. A Igreja
Quadrangular ensinou ‘o caminho das pedras’ para o desenvolvimento de um
proselitismo urbano responsável pela importação de técnicas mais adequadas à
sociedade de massas. Entre essas técnicas temos o uso dos meios de
comunicação eletrônicos: A Brasil para Cristo investiu pesadamente em
programas de rádio e até de televisão. Embora um programa próprio de TV (...)
tenha durado pouco, os líderes aceitavam convites para comparecer a outros
12
. Era o ano de 1951, ou 1953 segundo outra versão, quando o norte-americano Harold Edwin
Williams, missionário da Igreja Internacional do Evangelho Quadrangular, após uma série de
tentativas frustradas pelo interior de São Paulo, resolveu fazer um jejum de 40 dias. Findou o jejum
com uma resposta: a visão de seu amigo americano Raymond Boatright pregando às multidões
brasileiras. Nos meses seguintes, Harold e Raymond articularam uma ‘ofensiva evangelística’ no
bairro de Cambuci, em o Paulo... O sucesso da ofensiva em Cambuci desembocou em uma
campanha que iria multiplicar, planejada e intencionalmente, esse novo estilo pentecostal pelos
quatro cantos do Brasil na chamada ‘Cruzada Nacional de Evangelização’. Sob o teto de 24 tendas
12 financiadas por brasileiros, 12 pelos irmãos americanos –, esses dois missionários circularam
nos fins da década de 50 pelo interior de São Paulo, seguindo na década seguinte para o Paraná,
Santa Catarina, Rio Grande do Sul, e depois para os estados do Rio de Janeiro, Minas Gerais,
Espírito Santo, Mato Grosso, Goiás e Amazonas. A cada lugar, propagavam a notícia dos quatro
princípios básicos da Igreja Internacional do Evangelho Quadrangular: ‘Cristo Salvador, Cristo
Batizador, Cristo Médico, Cristo Rei que de voltar’. Tal declaração de seguia a inspiração de
Aimée Semple McPherson, que fundou a denominação em 1918, em Los Angeles. (MAFRA, 2001,
p.p.35-36)
45
programas, mesmo àqueles que chocavam os pentecostais, como o da jovem
Hebe Camargo”. (FONSECA, 2003, p.47)
Um dado interessante sobre a Igreja Pentecostal O Brasil para Cristo, é que ela
nasceu do programa radiofônico comandado por Manoel de Mello, intitulado A Voz
do Brasil para Cristo. Leonildo Silveira Campos registra assim esse episódio:
“No início de 1955, Melo iniciou um programa radiofônico na Rádio América e
alguns meses depois passou a transmiti-lo pela Rádio Tupi de o Paulo, então a
mais poderosa emissora paulista. O programa durava apenas quinze minutos e ia
ao ar entre 6h30 às 6h45 da manhã... Assim nasceu o programa A Voz do Brasil
para Cristo, talvez um dos poucos casos de um programa radiofônico a gerar uma
Igreja que recebeu o mesmo nome, Igreja Evangélica Pentecostal ‘O Brasil para
Cristo’, fundada em 1956...” (CAMPOS, 1997, p.270-271)
Coube também à Igreja Adventista
13
o mérito de inaugurar o primeiro programa
religioso na TV, no dia 18 de novembro de 1962, intitulado, para Hoje,
apresentado pelo pastor Alcides Campolongo e sua esposa. Logo depois, ainda
nos anos 60 foi a vez do bispo Robert McAlister, líder da Igreja Nova Vida, ninho e
laboratório do chamado neopentecostalismo, marcar de forma muito contundente
sua participação na TV brasileira, vale lembrar que McAlister foi o grande tutor e
mestre do bispo Edir Macedo e do missionário RR Soares. Ele apresentava um
programa com o nome sugestivo, Café com Deus. No final dos anos 60 foi a vez
do pastor presbiteriano em Recife, João Campos, apresentar o programa Encontro
com Deus. Ainda nessa década, nomes importantes do cenário religioso nacional,
13
“Até onde pudemos averiguar, o primeiro programa evangélico na televisão, como no rádio, foi
produzido pelos adventistas. A Seventh-Day Enciclopaedia 1996 Edition registra que no dia 18 de
novembro de 1962 teve início, primeiramente em São Paulo e logo depois no Rio de Janeiro, o
programa Fé para Hoje, apresentado pelo pastor Alcides Campolongo e sua esposa”. (FONSECA,
2003, p.55)
46
como Manoel de Melo e o pastor batista Nilson do Amaral Fanini começaram suas
atividades na televisão. Enquanto Manoel de Melo teve curta duração nesse
veículo, o pastor Fanini conseguiu emplacar seu programa de TV, intitulado,
Reencontro, que chegou a ser transmitido por 88 emissoras. O que caracteriza as
primeiras inserções evangélicas na televisão brasileira é o amadorismo. No
entanto, apesar das dificuldades enormes, houve quem se destacasse e
conseguisse sobreviver. É o caso do pastor Fanini. O maior feito de Fanini ocorreu
nos anos 80, quando especificamente no ano de 1982, reuniu mais de 120 mil
pessoas no estádio Maracanã, contando inclusive com a participação do então,
presidente da República, o General João Batista Figueiredo. Sua influência
moralista junto ao público evangélico foi muito bem vista pelo Regime Militar
brasileiro, que, apesar de estar agonizando, precisava cumprir seu ideal de
abertura “lenta e gradual”, implicando uma saída honrosa para os militares do
cenário político nacional. Nas eleições ocorridas em 1982, com a existência de
vários partidos políticos recém-organizados, Fanini
14
apoiou o partido ligado ao
governo militar, o PDS, e foi agraciado com a concessão de um canal de televisão.
“Como resultado da colaboração prestada ao partido oficial da ditadura nas
eleições parlamentares, Fanini foi agraciado em 1983 com a concessão do canal
13 do Rio de Janeiro, por 15 anos. A estação de Fanini montada em parte com
recursos nacionais e também com donativos norte-americanos da Billy Graham
Evangelistic Association, da Convenção Batista do Sul e, possivelmente, com a
ajuda da World Vision, somente entrou no ar cinco anos depois, sem contudo
conseguir decolar. Alguns anos mais tarde, pressionado por enormes dívidas,
14
“Números e realizações grandiosas sempre acompanharam a trajetória do pastor batista Nilson
do Amaral Fanini, um dos mais conhecidos e respeitados líderes evangélicos do país. Fanini, que
nos últimos 41 anos liderou a Igreja Batista de Niterói (RJ), realizou cruzadas em 109 países,
celebrou cerca de 11 mil batismos e ocupou cargos importantes como a presidência da Convenção
Batista Brasileira (CBB) e da Aliança Batista Mundial, que congrega mais de 100 milhões de fiéis
em todo planeta (...) No ocaso do seu ministério, o pastor teve seu nome envolvido num rombo
financeiro que drenou R$ 1,67 milhão dos cofres de sua igreja (...) O dinheiro foi depositado na
conta de terceiros que, segundo o pastor, possibilitariam um empréstimo no exterior que seria
usado para iniciar a construção da Catedral Batista (...) O dinheiro arrecadado em campanhas
missionárias pelos membros nos últimos cinco anos, foi cedido a doleiros e intermediários de
transações financeiras como garantia para cobrir o seguro do empréstimo. A malsucedida
transação passava pelo paraíso fiscal das Ilhas Virgens, de onde viria a verba para alavancar a
obra”. (DUTRA, Marcelo. A Maldição da Catedral. In: Revista Eclésia. p. 9-10)
47
Fanini e seus sócios, Maurício Athayde e Cláudio Macário, venderam suas
participações na TV Rio a representantes da IURD”. (CAMPOS, 1999, p.283)
vários outros exemplos de televangelistas brasileiros, que aventuram-se na
televisão, começando muitas vezes com a compra de um espaço numa TV de
menor penetração, como fazia e ainda faz o pastor Silas Malafaia, ou montando a
sua própria Rede de Televisão, como fizeram o Bispo Edir Macedo e o Missionário
RR Soares. Isso sem contar nomes como do Reverendo Caio Fábio D’Araújo Filho
e o casal Hernandes. Quando se estuda a trajetória dos televangelistas brasileiros,
pode-se constatar facilmente a inflncia que as chamadas Igrejas Eletrônicas
norte-americanas exerceram sobre tais pregadores. O modelo que emplacará no
Brasil, no que tange a fazer televisão é o modelo das Igrejas Eletrônicas norte-
americanas, tanto na luta por concessões de canais de televisão, quanto nas
características de organização e funcionamento, que terão por base os valores
comerciais, os chamados valores de mercado. As características das Igrejas
Eletrônicas podem ser assim elencadas:
“...a inserção de valores comerciais; as teologias experimentais; a na
tecnologia, a presença de líderes carismáticos; e, por fim, o formato semelhante
aos dos programas dos meios de comunicação convencionais. As Igrejas
Eletrônicas são administradas, em parte, tendo em vista fins comerciais e valores
corporativos, incluindo eficiência, produtividade e expansão, ao contrário das
igrejas mais tradicionais, que pregam valores espirituais. Desta maneira, os
princípios de marketing e gerenciamento profissional têm prioridade, mas apesar
de os ministérios televisivos serem dirigidos conforme o paradigma comercial,
seus princípios são a edificação espiritual e evangelização”. (FACCIO, 1998, p.42)
A chamada Igreja Eletrônica iniciou sua penetração no Brasil no final dos anos
70. Nomes como Rex Humbard, Pat Robertson e o mais famoso de todos eles em
terras brasileiras, Jimmy Swaggart, conseguiram penetração considerável nos
48
círculos evangélicos nacionais. A crítica que se fazia a esses pregadores e
conseqüentemente aos seus programas era a falta de adaptação da mensagem
evangelística ao contexto latino-americano, mais precisamente ao contexto
brasileiro. Além das acusações freqüentes no que tange aos pedidos de dinheiro
para a causa.
Conhecendo bem a realidade nacional, os televangelistas brasileiros
apropriam-se desse campo entre o final dos anos 70 e início dos 80, com um
pouco mais de experiência que os pregadores televisivos brasileiros da década de
60, que primaram pelo amadorismo completo. Usando canais de menor alcance e
horários de madrugada ou nas primeiras horas da manhã, os televangelistas
brasileiros (de segunda geração) avançaram muito desde então. E a conquista
desse campo dependeu muito e ainda depende de apoios políticos que esses
grupos religiosos venham a conseguir. Não é por acaso, que as igrejas
evangélicas no Brasil começaram a investir em candidaturas. O poder político de
um candidato que representa a Igreja é enorme, principalmente no campo
midiático. Existe uma voracidade por parte dos grupos religiosos no que diz
respeito à aquisição de meios de comunicação de massa.
As concessões tanto de rádio quanto de televisão no país para grupos
religiosos são questões de suma importância. Não seria possível ir adiante, nesse
trabalho se não houvesse uma investigação nessa área. Existem atualmente, no
Brasil, segundo dados do Ministério das Comunicações, 6952 emissoras de rádio,
456 emissoras de TV, com outorgas. Esses dados foram conseguidos pelo
Ministério das Comunicações, visando a atualizar os dados cadastrais das
entidades de radiodifusão. O Governo em Agosto de 2007 baixou ato
determinando a realização de Recadastramento de Todas as Entidades
Executadoras dos Serviços de Radiodifusão sonora e de Sons e Imagens, de
acordo com o constante da Portaria 447, de 09/08/07. Ficaram de fora, as
empresas de radiodifusão comunitárias.
49
Portaria nº 447 de 09/08/2007
:: Total de emissoras com outorgas no país nas diversas modalidades de serviço de
radiodifusão:
RÁDIO OUTORGADAS
FM – Comercial 1794
FM – Educativa 417
OM – Ondas Médias 1702
OC – Ondas Curtas 66
OT – Ondas Tropicais 75
Rádio Comunitária* 2898
TOTAL RÁDIO 6952
* As rádios comunitárias não estão incluídas no recadastramento
TELEVISÃO OUTORGADAS
TV – Comercial 279
TV – Educativa 177
TOTAL TELEVISÃO 456
Fonte: MC: Sistema Rádio Comunitária - RADCOM / Sistema de Controle de Radiodifusão -
SRD - agosto/2007
Recadastramento de Emissoras. Disponível em http://www.mc.gov.br/ >. Acesso:
17/02/2008.
Com certeza, um dos motivos que fazem com que muitas igrejas apóiem
determinados candidatos a cargos eletivos, seja no Senado Federal ou na Câmara
dos Deputados. E por que a preferência pelo poder Legislativo? Isso pode ser
explicado porque a Constituição de 1988, no seu parágrafo do Artigo 223,
estendeu ao Congresso Nacional o poder de outorgar e também renovar
concessões de rádio e televisão. Historicamente essa prerrogativa cabia ao
Executivo e são notórios os casos de abusos e favorecimentos de determinados
grupos, por exemplo, durante o Regime Militar brasileiro (HAMBURGER, 1998,
p.454-455). A Constituição de 1988,
50
“...também proibiu que deputados e senadores mantenham contrato ou exerçam
cargos, função ou emprego remunerado em empresas concessionários de serviço
público (letras a e b do item I do Artigo 54). Restrição semelhante existia no
Código Brasileiro de Telecomunicações (CBT, Lei 4.117/62) desde 1962,
determinando que aquele que está em gozo de imunidade parlamentar não pode
exercer a função de diretor ou gerente de empresa concessionária de dio ou
televisão (Parágrafo único do artigo 38)”. (LIMA, 2006, p.120)
Infelizmente, há fortes evidências de que essas normas legais não estão sendo
cumpridas, e, em se tratando de dominar o campo de concessões de rádio e
televisão, vários Deputados e Senadores m legislado em causa própria, o que
fere o § do Artigo 180 do Regimento Interno da Câmara dos Deputados e o
artigo 306 do Regimento Interno do Senado Federal (ibid., p.120). Esse legislar
em causa própria significa participar estrategicamente nos:
“...trabalhos da Comissão de Ciência, Tecnologia, Comunicação e Informática
(CCTCI), na Câmara dos Deputados, e da Comissão de Educação, no Senado
Federal, instâncias decisivas não na tramitação dos processos de renovação e
de homologação das novas concessões, mas também na aprovação de qualquer
legislação relativa à radiodifusão”. (ibid., p.120)
Para se ter uma idéia de como essas comissões são estratégicas, somente a
partir de novembro de 2003, o Ministério das Comunicações começou a
disponibilizar via Internet, cadastro dos concessionários de rádio e televisão no
país. No entanto, apesar do avanço, deve-se tomar todo cuidado com esses
dados porque geralmente eles estão desatualizados. Além de outro detalhe
importante: geralmente alguns políticos usam “laranjas” para fugir das limitações
que a lei impõe.
51
“Os verdadeiros controladores das concessões têm recorrido a vários expedientes
para proteger sua identidade. Nomes de parentes e de ‘laranjas’ são recursos
comuns não só para esconder o patrimônio como para fugir das normas restritivas
aplicáveis a deputados e senadores já mencionadas e também daquelas que
limitam a participação societária de ‘entidades’ de radiodifusão a cinco concessões
em VHF em nível nacional e duas em UHF em nível regional (artigo 12 do
Decreto-Lei 236/67). Um exemplo, com grande repercussão, envolveu o então
deputado federal Roberto Jefferson (PTB-RJ). Atribui-se a ele o real controle de
duas emissoras de rádio no interior fluminense que, no cadastro oficial do
Ministério das Comunicações (MiniCom), aparecem em nome de dois
concessionários, sendo que um deles declara nem sequer ter conhecimento de
que é sócio”. (ibid., p.122)
Somente nos dois primeiros anos (2003-2004), da 52ª Legislatura (2003-2006),
tramitaram 762 processos de renovação ou outorga de concessão de rádios
comerciais. Desses 183 transformaram-se em Decretos Legislativos. Vale
ressaltar que não entram no montante acima citado, as concessões de emissoras
educativas e/ou comunitárias.
A CCTCI de 2003 tinha 51 membros titulares, sendo que 16 deputados
membros dessa Comissão eram sócios ou diretores de concessionárias – 31
emissoras de rádio e 6 de televisão – cabe ressaltar que numa situação de
quorum mínimo (26 deputados), os concessionários teriam a maioria dos votantes
que poderiam aprovar ou rejeitar qualquer proposição (ibid., p.125). Dos 16
deputados concessionários, 05 eram da chamada Bancada Evangélica
15
.
15
. Lista dos Deputados que não voltaram para a Câmara em 2007: Adelor Vieira (PMDB/SC) -
Assembléia de Deus; Agnado Muniz (PP/RO) - Assembléia de Deus; **Almeida de Jesus (PL/CE) - Igreja
Universal; Almir Moura (PFL/RJ) - Igreja Internacional da Graça de Deus; **Ana Alencar (PSDB/TO); André
Zacharow (PMDB/PR) Batista; Bispo João Mendes (Sem Partido/RJ) - Igreja Universal; Bispo Rodrigues
(PL/RJ) - Igreja Universal Renunciou; **Bispo Vieira Reis (Sem partido/RJ) - Igreja Universal; Cabo Júlio
(PMDB/MG) - Assembléia de Deus; Carlos Nader (PL/RJ) - Assembléia de Deus; Costa Ferreira (PSC/MA) -
Assembléia de Deus; **Edna Macedo (PTB/SP) - Igreja Universal; Gerson Gabrielli (PFL/BA) – Batista;
Gilberto Nascimento (PMDB/SP) - Assembléia de Deus; Hélio Esteves (PT/AP) – Protestante; Herculano
Anghinetti (PP/MG) – Batista; Isaías Silvestre (PSB/MG) - Assembléia de Deus; **Jair de Oliveira (PMDB/ES) -
Igreja Cristo Verdade que Liberta; Jefferson Campos (PTB/SP) – Quadrangular; João Batista (PP/SP) - Igreja
Universal; **João Mendes de Jesus (Sem partido/RJ) - Igreja Universal; João Paulo Gomes da Silva (PL/MG) -
Igreja Universal; Josué Bengtson (PTB/PA) - Quadrangular
**Lino Rossi (PP/MT) Batista; Milton Barbosa (PSC/BA) - Assembléia de Deus; Neuton Lima (PTB/SP) -
Assembléia de Deus; Nilton Capixaba (PTB/RO) - Assembléia de Deus; Pastor Amarildo (PSC/TO) -
Assembléia de Deus; Pastor Francisco Olímpio (PSB/PE) - Assembléia de Deus; Pastor Frankembergen
Galvão (PTB/RR) - Assembléia de Deus; Pastor Heleno (PL/SE) - Igreja Universal; **Pastor Jorge Pinheiro
(PL/DF) Igreja Universal; **Pastor José Divino (Sem partido/RJ) - Igreja Universal; Pastor Marcos Abramo
52
Eram eles:
Tabela – Bancada Evangélica na CCTCI – 2003
TS
Nome Parlamentar Partido TC Localidade Nome da Concessionária
S Bispo Wanderval PL/SP OM
Gravataí/RS RÁDIO CULTURA DE GRAVATAÍ LTDA
S Bispo Wanderval PL/SP OM
Feira de
Santana/BA RÁDIO DIFUSÃO E CULTURA LTDA
S Bispo Wanderval PL/SP FM
Gália/SP REDE RIJOMAR DE DIFUSÃO LTDA
S Bispo Wanderval PL/SP FM
São José/SC RÁDIO CONTINENTAL FM LTDA
SD
Bispo Wanderval PL/SP FM
Santa Rita/PB
RÁDIO LIBERDADE FM DE SANTA RITA
LTDA
S Bispo Wanderval PL/SP FM
Salvador/BA RÁDIO ARATU LTDA
S Carlos Nader PFL/RJ FM
Barra do Piraí SOC. BARRENSE DE RADIODIFUSÃO LTDA
D João Batista PFL/SP TV São Paulo RÁDIO E TELEVISÃO RECORD S.A
S João Batista PFL/SP TV Itabuna/BA TV CABRÁLIA LTDA
D João Batista PFL/SP OM
São Paulo RÁDIO E TELEVISÃO RECORD S.A
S João Batista PFL/SP OM
Londrina/PR RÁDIO ATALAIA DE LONDRINA LTDA
D João Batista PFL/SP OC
São Paulo RÁDIO E TELEVISÃO RECORD S.A
S João Batista PFL/SP FM
Brasília/DF RÁDIO ANTENA NOVE LTDA
S João Batista PFL/SP FM
Santo André/SP RÁDIO 99 FM STEREO LTDA
S
João Mendes de
Jesus PSL/RJ OM
Gravataí/RS RÁDIO CULTURA DE GRAVATAÍ LTDA
S
João Mendes de
Jesus PSL/RJ FM
Maceió/AL ALAGOAS RÁDIO E TELEVISÃO LTDA
S Oliveira Filho PL/PR FM
Mamborê/PR SAFIRA RADIODIFUSÃO LTDA
TS: Tipo de Sócio (S:Sócio; D:Diretor; SD: Sócio Diretor); TC: Tipo de Concessão.
(PP/SP) - Igreja Universal; **Pastor Marcos de Jesus (Sem partido/PE) - Igreja Universal; Pastor Oliveira Filho
(PL/PR) - Igreja Universal; Pastor Paulo Gouveia (PL/RS) - Igreja Universal; Pastor Pedro Ribeiro (PMDB/CE)
- Assembléia de Deus; Pastor Reginaldo Germano (PP/BA) - Igreja Universal; Pastor Reinaldo (PTB/RS)
Quadrangular; Paulo Baltazar (PSB/RJ) Adventista; Philemon Rodrigues (PTB/PB) - Assembléia de Deus;
Raimundo Santos (PL/PA) - Assembléia de Deus; *Salatiel Carvalho (PFL/PE); Silas Brasileiro (PMDB/MG) -
Assembléia de Deus; **Wanderval Santos (PL/SP) - Igreja Universal; **Zelinda Novaes (PFL/BA) - Igreja
Universal; Zico Bronzeado (PT/AC) Batista; * sem identificação da Igreja ** Parlamentares que não foram
candidatos.
Lista dos Deputados da Bancada Evangélica Reeleitos para a 53ª Legislatura (2007-2010): Arolde de
Oliveira (PFL/RJ) - Batista Reeleito; Carlos William (PTC/MG) - Maranata - Reeleito
Dr. Antonio Cruz (PP/MS) - Assembléia de Deus Reeleito; Edinho Montemor (PSB/SP) - Batista Reeleito;
Eduardo Cunha (PMDB/RJ) - Sara Nossa Terra Reeleito; Gilmar Machado (PT/MG) - Batista Reeleito;
Henrique Afonso (PT/AC) - Presbiteriano Reeleito; João Campos (PSDB/GO) - Assembléia de Deus
Reeleito; Júlio Redecker (PSDB/RS) - Luterana Reeleito (morto no maior acidente aéreo da História do
Brasil – acidente do dia 17 de Julho de 2007, com o avião da TAM em São Paulo); Natan Donadon
(PMDB/RO) - Batista Reeleito; Neucimar Fraga (PL/ES) - Batista Reeleito; Onyx Lorenzoni (PFL/RS) -
Luterano Reeleito; Pastor Lincon Portela (PL/MG) - Batista - Reeleito
Silas Câmara (PTB/AM) - Assembléia de Deus Reeleito; Takayama (PMDB/PR) - Assembléia de Deus
Reeleito; Walter Pinheiro (PT/BA) - Batista Reeleito; Zequinha Marinho (PSC/PA) - Assembléia de Deus
Reeleito. * sem identificação da Igreja. Disponível em
http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u85068.shtml/
>.
Acesso: 20/07/07
53
Na CCTCI de 2004, havia 33 membros titulares, sendo que 15 deputados eram
sócios e/ou diretores de 29 concessionárias – 26 emissoras de rádio e 3 de
televisão (ibid., p.127). Interessante perceber que houve uma mudança
substancial na composição geral da CCTCI de 2004, no entanto os mesmos
deputados da Banca Evangélica, mencionados na Tabela acima, continuaram
membros dessa nova Comissão.
Parece que a Bancada Evangélica de fato entendeu a importância da CCTCI,
já que houve um aumento substancial do número de membros na comissão
durante os anos que se seguiram. Para se ter uma idéia, dos quarenta membros
titulares da CCTCI de 2006, 10 eram das Bancada Evangélica, além de 05
suplentes. A Comissão era assim composta:
TITULARES
SUPLENTES
PT
Jorge Bittar RJ (Gab. 232-IV) Angela Guadagnin SP (Gab. 270-III)
Mariângela Duarte SP (Gab. 924-IV) Fernando Ferro PE (Gab. 427-IV)
Walter Pinheiro BA (Gab. 274-III) Guilherme Menezes BA (Gab. 743-IV)
Lino Rossi PP/MT (Gab. 808-IV) Josias Gomes BA (Gab. 701-IV)
Maurício Rabelo PL/TO (Gab. 958-IV) Vicentinho SP (Gab. 740-IV)
Pedro Irujo PMDB/BA (Gab. 818-IV) Salvador Zimbaldi PSB/SP (Gab. 538-IV)
PMDB
Aníbal Gomes CE (Gab. 731-IV) César Bandeira S.PART./MA (Gab. 502-IV)
Eunício Oliveira CE (Gab. 244-IV) Eduardo Cunha RJ (Gab. 510-IV)
Gilberto Nascimento SP (Gab. 910-IV) Henrique Eduardo Alves RN (Gab. 539-IV)
Jader Barbalho PA (Gab. 831-IV) João Magalhães MG (Gab. 211-IV)
Nelson Bornier RJ (Gab. 576-III) Takayama PR (583-III)
Wladimir Costa PA (Gab. 343- IV) 1 vaga
Bloco PFL, PRONA
Corauci Sobrinho SP (Gab. 460-IV) * Arolde de Oliveira RJ (Gab. 917-IV)
Davi Alcolumbre AP (Gab. 231-IV) Eduardo Sciarra PR (Gab. 433-IV)
Fábio Souto BA (Gab. 827-IV) Marcos de Jesus S.PART./PE (Gab. 745-IV)
José Mendonça Bezerra PE (Gab. 314-IV) Murilo Zauith MS (Gab. 479-III)
Vic Pires Franco PA (Gab. 519-IV) Robson Tuma SP (Gab. 834-IV)
PSDB
Alberto Goldman SP (Gab. 324- IV) Lobbe Neto SP (Gab. 718-IV)
Gustavo Fruet PR (Gab. 821- IV) Manoel Salviano CE (Gab. 506-IV)
Julio Semeghini SP (Gab. 242-IV) Professora Raquel Teixeira GO(Gab. 206 IV)
Narcio Rodrigues MG (Gab. 431-IV) Zenaldo Coutinho PA (Gab. 336-IV)
PP
54
João Batista SP (Gab. 962-IV) Antonio Cruz MS (Gab. 368-III)
Marcos Abramo SP (Gab. 311-IV) Francisco Garcia AM (Gab. 520-IV)
Ricardo Barros PR (Gab. 412-IV) Romel Anizio MG (Gab. 545-IV)
Sandes Júnior GO (Gab. 702-IV) Vanderlei Assis SP (Gab. 935-IV)
PTB
Silas Câmara AM (Gab. 532-IV) Arnon Bezerra CE (Gab. 413-IV)
Almir Moura S.PART/RJ (Gab. 639-IV) Iris Simões PR (Gab. 948-IV)
Júlio Cesar PFL/PI (Gab. 944-IV) Philemon Rodrigues PB (Gab. 226-IV)
PL
Badu Picanço AP (Gab. 223-IV) Almeida de Jesus CE (Gab. 313-IV)
Carlos Nader RJ (Gab. 533-IV) Amauri Gasques SP (Gab. 354-IV)
Raimundo Santos PA (Gab. 809-IV) Remi Trinta MA (Gab. 543-IV)
PSB
João Mendes de Jesus S.PART/RJ (Gab.572-III) Ariosto Holanda CE (Gab. 575-III)
Luiza Erundina SP (Gab. 620-IV) Mário Assad Júnior MG (Gab. 252-IV)
PDT
Adelor Vieira PMDB/SC (Gab. 441-IV) Ademir Camilo MG (Gab. 744-IV)
Durval Orlato PT/SP (Gab. 820-IV) Luiz Piauhylino PE (Gab. 224-IV)
PPS
Nelson Proença RS (Gab. 804-IV) Raul Jungmann PE (Gab. 367-III)
PC do B
Renildo Calheiros PE (Gab. 356-IV) Jandira Feghali RJ (Gab. 421-IV)
PV
Jovino Cândido SP (Gab. 238-IV) Leonardo Mattos MG (Gab. 914-IV)
PSOL
Orlando Fantazzini SP (Gab. 579-III) Ivan Valente SP (Gab. 716-IV)
PSC
José Rocha PFL/BA (Gab. 908-IV) Zequinha Marinho PMDB/PA (Gab. 823-IV)
Relatório de atividades da CCTCI 2006. Disponível em:
http://www2.camara.gov.br/internet/comissoes/cctci/relatorios.html/Relatorio%20Ati
vidades%202006.pdf/>. Acesso: 17/02/2008.
Os deputados evangélicos, seus respectivos partidos e igrejas, membros da
Comissão eram: Adelor Vieira (PMDB/SC) - Assembléia de Deus; *Almeida de
Jesus
16
(PL/CE) - Igreja Universal; Almir Moura (PFL/RJ) - Igreja Internacional da
Graça de Deus; Carlos Nader (PL/RJ) - Assembléia de Deus; João Batista
16
.
* Indicação de Membro Suplente.
55
(PP/SP) - Igreja Universal; João Mendes de Jesus (Sem partido/RJ) - Igreja
Universal; Lino Rossi (PP/MT) – Batista; Pastor Marcos Abramo (PP/SP) - Igreja
Universal; *Pastor Marcos de Jesus (Sem partido/PE) - Igreja Universal;
*Philemon Rodrigues (PTB/PB) - Assembléia de Deus; Raimundo Santos
(PL/PA) - Assembléia de Deus; *Arolde de Oliveira (PFL/RJ) Batista; Silas
Câmara (PTB/AM) - Assembléia de Deus; *Takayama (PMDB/PR) - Assembléia
de Deus; Walter Pinheiro (PT/BA) – Batista.
O que fica evidente é que a CCTCI é um espaço privilegiado para os interesses
midiáticos dos grupos evangélicos, pode-se dizer também que a CCTCI é um
lugar de disputas entre diferentes especialistas do campo religioso. Sabendo que
essa comissão é estratégica no que concerne às concessões de rádio e TV no
Brasil, não causa surpresa a predileção dos políticos que representam os
evangélicos, em participar da referida comissão. Os campos religioso e político no
Brasil estão se tangenciando, e internamente em luta lembremo-nos de que o
campo é um espaço de luta e a mídia é o butim disputado que aumentará o
capital religioso e político de cada agente. Quando um especialista religioso,
tornado político, participa da CCTCI, ele tenta se apropriar do butim midiático, que
aumentará o seu cacife tanto no campo da política, como no campo religioso. Ele
particularmente terá o seu capital religioso e o seu capital político, valorizados,
mas o grupo religioso ao qual ele pertence também terá ganhos e verá seu capital,
tanto religioso quanto político, aumentados e é por isso que a CCTCI torna-se um
espaço de disputas e barganhas políticas. Às vezes, as lutas internas do campo
religioso afloram e tornam-se evidentes para a população. Geralmente isso ocorre
e ganha maior repercussão com os grupos religiosos com maior poderio midiático.
Como se pode perceber,
a situação envolvendo os grupos religiosos midiáticos
é muito nebulosa. E quando a relação mídia-religião caminha pelo carreadouro da
política a situação fica mais complicada.
A relação entre políticos e grupos religiosos é antiga no Brasil, mas a forma de
ampliação do capital religioso por meio da dominação de meios de comunicação
de massa é um fenômeno do final do século XX, início do século XXI.
Além de ter
uma forte presença no Legislativo, esses grupos religiosos, que raramente tentam
56
conquistar o Poder Executivo, nas três esferas do Poder no Brasil, Municipal,
Estadual e Federal, procuram manter com este uma relação fisiológica, de troca
de favores.
Em matéria veiculada em 18 de junho de 2006, o governo Lula é apontado
como um utilizador da máquina pública, no que concerne à concessões de rádio e
televisão que teriam a finalidade de conseguir apoio político junto aos grupos
religiosos evangélicos, por ocasião das eleições presidenciais de 2006.
“O governo Lula destinou pelo menos uma televisão e dez rádios educativas a
fundações ligadas a denominações religiosas. As Igrejas têm forte lobby no
Congresso as evangélicas com número crescente de fiéis, representam 15,5%
da população em 2000, segundo o IBGE. A Fundação Sara Nossa Terra, presidida
pelo Bispo Robson Rodovalho, obteve do governo concessões para uma emissora
de TV em Mateus Leme (MG) e uma rádio em Itaguaí (RJ) (...) A Igreja Renascer
e a Assembléia de Deus também obtiveram autorizações para rádios. No caso da
Renascer, para Goiânia. No caso da Assembléia de Deus, para Joinville (SC)”.
(Folha de São Paulo, 18 de Junho de 2006, p.A7)
Aliás, essa prática não é exclusividade dos grupos evangélicos, a mesma
reportagem diz sucintamente sem citar nomes, nem de instituições e nem dos
envolvidos que Padres e bispos da Igreja Católica estão na direção de fundações
contempladas com ao menos quatro rádios: duas em Minas Gerais e duas no
Piauí”.(ibid., p.A7).
Como se pode perceber essa questão é grave e parece estar longe de um
consenso. O que ocorre de fato é que os grupos religiosos sabem do poder
midiático e procuram dominar o campo da política para atingir suas estratégias.
Os políticos que procuram manter ou ampliar privilégios midiáticos para seus
grupos de origem, e fazem isso como forma de agraciar quem os auxiliou nas
campanhas eleitorais, geralmente o grande líder da denominação que conseguiu
uma margem expressiva de votos dos fiéis. Mas, os políticos evangélicos eleitos
graças à participação efetiva dos evangélicos que compraram seus respectivos
57
discursos, também realizam o trabalho de ampliar o poder midiáticos desses
grupos, pois eles sabem o quanto a mídia religiosa influi nas eleições. Para
exemplificar isso, cita-se a pesquisa da DMaria das Dores Campos Machado
sobre a eleição de evangélicos nas eleições de 2002.
“... dos 11 parlamentares eleitos em 2002, pelo menos cinco atuaram como
radialistas antes da disputa eleitoral, atividade que favorece a construção de uma
personalidade pública e a ampliação da zona de inflncia dos atores religiosos”.
No caso dos parlamentares com cargos eclesiásticos, verificou-se que, além dos
programas radiofônicos, todos participaram, seja na condição de apresentador,
seja na de convidado, da programação produzida e transmitida na rede de
televisão dos próprios grupos religiosos ou veiculada nos horários alugados nas
TVs comerciais”. (MACHADO, 2006, p.152)
Lutar por concessões de rádio ou de televisão é uma questão tão estratégica
quanto tentar converter novos fiéis para aumentar seus rebanhos. A conquista de
novos fiéis, passa pelo menos num primeiro momento pela ampliação de poder
midiático.
E engana-se quem acredita que as concessões de TV são as mais desejadas.
Elas são importantes, são necessárias, mas elas aparecem num estágio posterior,
em grau de prioridade, pois as concessões de rádio são os “sonhos de consumo”
dos grupos religiosos.
O rádio pode ser definido como um meio “quente”, enquanto a televisão seria
um meio “frio”.
“Há um princípio sico pelo qual se pode distinguir um meio quente, como o
rádio, de um meio frio... como a televisão. Um meio quente é aquele que prolonga
um único de nossos sentidos e em alta definição. Alta definição se refere a um
estado de alta saturação de dados”. (McLUHAN, 1974, p.38)
58
E não é de hoje que os grupos religiosos midiáticos sabem muito bem disso. O
dono da Rádio 93 FM, chamada EL Shaddai, Arolde de Oliveira em entrevista a
Alexandre Brasil Fonseca, já dizia:
“O rádio é um veículo muito mais quente, porque permite que ao mesmo tempo
que você ouve rádio, você pode fazer outras coisas, pode se reunir em grupo, o
rádio é um complemento, um instrumento quente de comunicação”. “Quando a
pessoa se recolhe e es refletindo, ela está muito aberta a compreender as
mensagens evangélicas... o rádio é quente, o rádio é quente, ele é quente... ele
traz uma mensagem, traz um apelo muito maior. No rádio você se sente muito
mais envolvido com o comunicador, há intimidade”. (FONSECA, 2003, p.112)
O rádio cumpria e ainda cumpre um papel que visa territorializar o sagrado,
sendo que os templos nesse caso, cumprem um papel central.
“...os templos constituíam-se nas bases físicas definidoras do local das
manifestações do sagrado e dos ensinamentos sobre o sagrado. As
programações de rádio tinham por função transmitir a programação pentecostal,
objetivando atrair novos e necessitados adeptos aos templos, exercendo um
caráter de complementaridade e, acima de tudo, reforçando a importância da
freqüência aos templos das mais diversas localidades das cidades e dos estados
da Federação”. (GOUVEIA, 2005, p.p.135-136)
Quem compreendeu muito bem esse poder do rádio foi o líder da Igreja
Pentecostal Deus é Amor, o missionário paraense Davi Miranda. Ele começou a
escrever sua história de forma marcante no campo religioso brasileiro, desde a
década de 60. A Igreja do Missionário Davi Miranda, que prega atualmente
59
protegido por uma cabine à prova de balas, e diz ter o maior templo de todos os
tempos, com capacidade para mais de 60 mil pessoas; templo este inaugurado em
01/01/2004, e que foi chamado de O Templo da Glória de Deus, segundo
informações do site oficial da igreja; esta possui mais de 11 mil igrejas,
espalhadas pelo Brasil e mais em 136 países, de todo o Mundo”. (Disponível
em:http://www.ipda.org.br/>. Acesso: 20/07/2007). Como grande diferencial dessa
igreja em relação às outras, pode-se dizer que nenhuma outra igreja investiu tanto
e adaptou-se tão bem ao meio de comunicação radiofônico. A IPDA é a igreja que
mais investe em rádio no país. Segundo “Davi Miranda, o rádio serve como porta
de entrada, uma forma de convidar as pessoas a participarem dos cultos da Deus
é Amor” (FONSECA, 2004, p. 48-49).
“Dos estúdios localizados em sua sede mundial, um antiga fábrica desativada
próxima à Praça da Sé, no centro de São Paulo, a voz do ‘consagrado homem de
Deus, missionário Davi Miranda, de seus presbíteros, evangelistas, filhas, genros
e obreiros ecoam”(CAMPOS, 1997, p.273) por muitas horas numa programação.
A disputa por concessões de rádio no Brasil é acirrada. Em 2003, a IPDA criou
onze empresas em nome de pastores e fiéis para poder disputar a concessão de
várias rádios. O limite da legislação brasileira é de 06 rádios por empresa. O jornal
Folha de São Paulo cobriu o episódio e deu o seguinte título para essa matéria:
Mídia Evangélica: “Igreja evangélica disputa 649 licenças de FM”, copyright Folha
de S. Paulo, 5/01/03
“O movimento mais surpreendente, no entanto, é o da Igreja Pentecostal Deus É
Amor, fundada pelo pastor David Miranda. Em maio do ano passado, o contador
da igreja registrou na Junta Comercial de São Paulo 11 empresas em nome de
pastores e fiéis. As empresas estão em 649 concorrências de rádio FM,
espalhadas por todo o país.Todas as 11 empresas têm sede na rua Direita (centro
de São Paulo), onde funciona uma sala de orações da igreja, e tudo indica que
foram produzidas em série. Elas foram ‘batizadas’ com números, em vez de
60
nomes: Rádio 630 Ltda., Rádio 1030 Ltda., Rádio 880 Ltda. e assim por diante.As
concorrências ainda estão em andamento, mas a igreja está bem posicionada na
disputa: suas empresas foram habilitadas em cerca de 600 licitações. Segundo o
Ministério das Comunicações, nos últimos cinco anos, o governo colocou à venda,
por licitação, 1.625 concessões de dio FM, 274 concessões de rádios AM e 77
concessões de TV. As empresas ligadas à Deus É Amor estão em 40% do total
das concorrências de rádios FM, o que indica que o objetivo da instituição é
assegurar a obtenção do máximo de emissoras permitido por lei. Os limites de
propriedade de meios de comunicação são definidos pelo decreto 236/67. No caso
de rádios FM, o teto é de seis concessões, em âmbito nacional, por empresa.
Significa que as empresas ligadas à igreja de David Miranda podem vir a adquirir
66 emissoras. A dona-de-casa Margarida Eudete de Oliveira Luzia, moradora do
bairro Jardim Miriam (zona sul de São Paulo), é sócia da Rádio 1030 Ltda., que
concorre em 95 licitações. Localizada, por telefone, ela disse que o contador da
igreja, Isaias Oliveira, preparou a documentação da empresa e é quem
acompanha as licitações. Questionada sobre como vai pagar as concessões que
vier a adquirir, ela respondeu: Deus é rico’, sugerindo que os recursos virão da
igreja. O fundador, David Martins Miranda, aparece como acionista principal da
Rádio 880 Ltda. Os filhos David e Daniel Miranda são sócios da 880 e da 820. A
filha Léia Miranda Sora e o genro pastor Sérgio Sora são sócios, respectivamente,
das rádios 690 e 910. As demais empresas estão em nome de outros pastores, de
funcionários e de fiéis. Um deles é Domázio Pires de Andrade, que figura como
sócio da Rádio 541 Ltda (em 79 licitações). A Folha falou com a mulher dele, Ana
Maria Carneiro de Andrade, por telefone. Ela disse que o marido é funcionário da
igreja”. Disponível em
http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos/asp080120035.htm/>. Acesso:
20/07/2007.
As concessões de dia eletrônica no Brasil tornaram-se espaços de luta para
ampliação do capital político. E no caso dos grupos religiosos midiáticos, além de
ampliação do capital político, ocorre a ampliação do capital religioso. E os grandes
líderes religiosos, ao conseguirem emplacar candidatos que se elejam para cargos
na esfera Legislativa Federal, conseguem angariar condições para a manutenção
e ampliação de seus impérios. Os meios usados para se manter um capital político
produz verdadeiros coronéis religiosos eletrônicos.
61
1.5 Mídia, Política e a Igreja Internacional da Graça
de
Deus
Como foi dito acima, a política é o campo escolhido estrategicamente pelos
líderes religiosos para atingirem seus objetivos e manterem seus poderes na
estrutura social. A manutenção e ampliação de projetos, principalmente midiáticos
passa pela presença nas esferas políticas da República brasileira.
Percebe-se que a Igreja Internacional da Graça de Deus nos últimos anos, com
sua expansão midiática precisou delimitar seu campo de atuação no cenário
político nacional. Muitos candidatos foram lançados nas últimas eleições da
década de 90 e início do século XXI, com amplo apoio do Missionário RR Soares,
e alguns deles tiveram pleno êxito.
Chega a ser estranho, pois o próprio Missionário Soares, em 1986 candidatou-
se a Deputado Federal e não conseguiu eleger-se, apesar de ser um líder religioso
conhecido, com uma pequena presença na mídia. Atualmente, com seu
prestígio religioso aumentado devido principalmente às suas aparições na mídia,
através do programa Show da Fé e nos programas da RIT e da Nossa Rádio, o
Missionário conseguiu ampliar seu capital político e oferecer um apoio substancial
para seus protegidos políticos.
A forma como Soares pensa a política pode ser expressa nas afirmações do
Deputado Almir Moura, que atualmente anda atritado com seu mentor.
“Um dia, o missionário RR Soares me chamou: ‘Olha, Almir, você vai para Brasília
e vai ser núncio em Brasília e dentro de dois anos você se candidata a deputado
federal’. E, então, eu vim e passei um ano em Brasília. Depois desse período ele
me chamou e disse: ‘Almir, olha, você quer ser candidato por onde? Qual (sic!)
estado você quer ser candidato a deputado?’ eu disse assim: São Paulo, eu
teria 300 mil votos em São Paulo. Então, ele me disse que em São Paulo já tinha
o Jorge Tadeu e que teria que escolher entre Minas e Rio. Então, eu disse o
62
seguinte: o Senhor vai me ajudar com o dinheiro da campanha? E ele [RR Soares]
disse: Não, não dou dinheiro, eu peço voto. Eu digo é de Jesus, é de Jesus... Eu
não dou dinheiro, mas os votos eu peço pra você’. Eu disse, então, Rio, ele
retrucou: ‘Se você está em Minas 10 anos, por que não Minas?’ Eu disse:
porque o senhor não vai dar dinheiro, e no Rio é mais fácil de fazer campanha, em
Minas Gerais, você sobe e desce morro, e o número de municípios é muito
grande. E fui pro Rio faltando um ano e pouco pra eleição”. (MACHADO, 2006,
p.148).
Com uma visão pragmática e corporativa das disputas eleitorais, Soares tem
procurado ampliar seu espectro político por meio de representantes em todas as
esferas de poder que irão lutar pelos interesses de sua Igreja. Sua estratégia tem
sido a do uso da mídia em prol de seus candidatos.
Nesse tópico, as três lideranças políticas com maior prestígio atualmente,
ligadas à Igreja Internacional da Graça de Deus serão analisadas, a saber, os
Deputados Federais, Jorge Tadeu Mudalen do PMDB, e o Dr. Adilson Soares do
PR, ambos eleitos em 2006, para exercerem a legislatura na Câmara dos
Deputados entre 2007-2011, na 53ª Legislatura. E o terceiro político ligado à IIGD
é o filho do Missionário Soares, o Deputado Estadual por São Paulo, André
Soares do DEM.
Por uma questão de ordem geográfica, serão analisados alguns aspectos da
prática parlamentar dos Deputados eleitos em São Paulo, o Deputado Federal
Jorge Tadeu e o Deputado Estadual André Soares e num outro momento, será
analisada a atividade parlamentar do Deputado Federal eleito pelo Rio de Janeiro,
o Dr. Adilson Soares. É do interesse desse trabalho entender de que forma os
mandatos desses políticos servem à causa da ampliação do poderio midiático da
Igreja Internacional da Graça de Deus.
Nas eleições de 2006, Soares realizou inúmeras incursões pelo Estado de São
Paulo entre os meses de Agosto e Setembro sob o pretexto de realizar
campanhas de libertação, intituladas, “Festa do Céu”.
Num desses eventos realizados na cidade de Campinas-SP, no Centro de
Convivência, podia-se observar a velha estratégia de reunir todos os membros das
63
igrejas da região no local escolhido para a realização do evento. Aliás, essa é uma
prática comum; quando o Missionário quer reunir um número expressivo de fiéis
em seus eventos, ele usa todas as mídias para divulgar essas reuniões,
geralmente estendendo o convite para todas as denominações e credos religiosos,
inclusive, umbandistas, espíritas e católicos; mas também exige que os pastores
daquela determinada região que sediará o evento promovam caravanas para lotar
o local e assim mostrar através de uma presença maciça de público que o evento
foi um sucesso.
Nesse evento de Campinas, realizado no final do mês de Agosto de 2006, RR
Soares chegou depois que a reunião havia sido iniciada e, quando começou a sua
explanação, disse que havia visitado várias cidades do interior de São Paulo
naquele dia e que contava com as orações dos irmãos para enfrentar uma série
de provações, que estavam levantando-se contra a RIT. Para enfrentar essas
provações precisava que os fiéis apoiassem os candidatos a Deputado Estadual e
Deputado Federal que a Igreja Internacional da Graça de Deus estava apoiando,
eram eles, respectivamente, André Soares
17
(seu filho) e Jorge Tadeu
18
, ambos do
PFL, agora DEM.
Ambos foram levados ao palco e bandeiras com os números e fotos dos
candidatos começaram a tremular, bem como, começou uma distribuição por
17
. André Bezerra Ribeiro Soares, 31 anos, foi eleito com 120.168 votos pelo PFL. Formado em
direito pela Universidade Gama Filho, no Rio de Janeiro, tem pós graduação em direito
penal pela
mesma
universidade e pelo Christ for the Nations Institute (CFNI), em Dallas, Estados Unidos.
Além de
advogado, o
Deputado André Soares tem um extenso trabalho social junto à Igreja
Internacional da Graça de Deus. (informações do site da Ass. Legislativa de São Paulo)
18
Jorge Tadeu Mudalen, Nascimento: 03/01/1955. Profissões: Engenheiro Civil. Filiação: Elias
Mudalen e Farida Mudalen.Legislaturas: 1991-1995, 1995-1999, 1999-2003, 2003-2007 e 2007-
2011.
Mandatos Eletivos: Deputado Estadual (Constituinte), 1987-1991, SP, PMDB; Deputado Federal
(Congresso Revisor), 1991-1995, SP, PMDB. Dt. Posse: 01/02/1991; Deputado Federal, 1995-
1999, SP, PMDB. Dt. Posse: 01/02/1995; Deputado Federal, 1999-2003, SP, PPB. Dt. Posse:
01/02/1999; Deputado Federal, 2007, SP, . Dt. Posse: 04/01/2007; Vereador, 01/01/2005-, São
Paulo, SP, ; Deputado Federal, 2007-2011, SP, PFL. Dt. Posse: 01/02/2007. Suplências e
Efetivações: Assumiu, como Suplente, o mandato de Deputado Federal na Legislatura 2003-2007,
em 4 de janeiro de 2007. Filiações Partidárias: PMDB, 1980-1995; PPB, 1995-1999; PMDB,
1999-; PFL, 2005-2007; DEM, 2007-.
64
todos os cantos do Centro de Convivência de “santinhos” e adesivos para carros,
dos candidatos em questão.
Soares disse que lamentava muito o fato de Jorge Tadeu não ter sido eleito em
2002, e que por conta disso, ele [Soares] havia enfrentado muitas lutas no
Congresso para levar adiante seus projetos midiáticos.
No jornal de sua denominação, o Jornal Show da Fé, de Setembro de 2006,
Soares em Editorial, intitulado: Não se Omita!, usava a velha tática de pedir votos
aos evangélicos para brecar uma ação orquestrada pelo inimigo e que traria sérios
danos à Igreja Evangélica no país.
“Com as notícias ultimamente divulgadas pela mídia acerca de mensalão’, máfia
‘disso’, máfia ‘daquilo’, ‘sanguessugas’, etc., muitas pessoas estão tomando a
péssima decisão de anular o voto nas próximas eleições. [...] Sempre teremos
decepções, pois os ‘mestres’ na arte de enganar os lobos que se disfarçam de
cordeiros fingem ser pessoas boas e gentis, mascaradas sob discursos bonitos,
nos quais prometem coisas mirabolantes que jamais serão cumpridas. É fato, no
entanto, que esse tipo de pessoa existe e sempre surgirá como candidata a um
cargo público. Nós que temos compromisso com a Palavra de Deus, sabemos que
é pelo fruto que a árvore é conhecida. Isso vale para todos os assuntos, inclusive
as eleições. É claro que pessoa alguma dará jeito em todos os problemas do
nosso país. No entanto, podemos escolher indivíduos que atenuarão o sofrimento
dos menos favorecidos e respeitarão a Palavra do Senhor Deus durante o
exercício das funções que lhes foram delegadas. Hoje, os evangélicos constituem
cerca de 30% da população brasileira um número alto em comparação a alguns
países. Se nós, os crentes, que sabemos o que é bom para todos, examinarmos
bem e votarmos em quem realmente tem condições de nos representar, teremos
políticos mais dedicados a cuidar dos interesses da sociedade. Algo precisa ser
feito com urgência. No dia 31 de dezembro, entrará em vigor o Estatuto das
Cidades, uma lei aprovada pelo Congresso e sancionada pelo então presidente
Fernando Henrique Cardoso durante seu primeiro mandato. Se não for
modificada, será mais difícil abrir novas igrejas no país, pois ela prevê, dentre
outras coisas, prévia permissão da comunidade para que uma congregação seja
aberta. Cristão, seu voto é muito importante! Não o ‘venda’ nem despreze. Seja
um representante da sociedade e faça valer seu direito de escolher os melhores
para dirigir nossa nação. Vote consciente, ore antes de decidir e siga firme na
convicção que o Senhor colocar em seu coração. Converse com seus entes
queridos e alerte-os para fatos como esse Estatuto das Cidades. Vamos fazer o
melhor para nosso país! [...] Quanto à eleição do dia 1 de outubro, não se omita:
vote consciente”! (Jornal Show da Fé, Ano 1 nº 08 – Setembro de 2006, p.02).
65
A dedicação de Soares naqueles meses trouxe frutos. O resultado das eleições
foi muito satisfatório para a IIGD. Com 120.168 votos, André Soares foi eleito
Deputado Estadual e com 165.699 votos, Jorge Tadeu foi eleito Deputado Federal.
Houve várias tentativas de entrevistar os dois candidatos acima citados, no
entanto os dois sempre esquivaram-se das perguntas, e com desculpas das mais
variadas, recusaram-se a prestar qualquer esclarecimento que os envolvesse
como políticos ligados à IIGD.
Por meio de suas assessorias, os nobres deputados evitaram qualquer tipo de
declaração sobre o envolvimento deles com a IIGD, e desta com a construção de
um império midiático, intermediado por ações políticas promovidas pelos dois.
O Deputado Jorge Tadeu, que segundo sua assessora de gabinete, tem estado
ocupado por conta de ter assumido a Presidência da Comissão sobre a
Legalização do Aborto
19
e do projeto político de candidatar-se a Prefeito de
Guarulhos nas eleições municipais de 2008, foi e é uma peça fundamental na
construção do poder midiático da IIGD. Ele não participou de nenhuma CCTCI nos
últimos anos e como este poderia influenciar em alguma decisão favorável à
Internacional da Graça?
A resposta é simples e quem oferece essa resposta é sua assessora de
gabinete; a Senhora Jussara Almeida. Ela diz:
“O Deputado Jorge Tadeu conheceu o Missionário aqui em Brasília. Ele [Jorge
Tadeu] não era crente, mas sua sogra sempre foi da Internacional. Ela é uma
crente muito antiga daquela igreja. E ela colocou o Missionário em contato com o
Deputado, ainda no mandato passado. O Missionário pedia que ele conversasse
com ministros, marcasse audiência com ministros para desemperrar alguns
processos sobre rádios pertencentes ao Missionário que estavam parados. O
Deputado foi fazendo isso e eles tornaram-se amigos. O Missionário começou a
levar o Deputado para os grandes eventos da Igreja; Programa Show da Fé,
Cruzadas e até para igrejas fora do Brasil. Aí, eu acho que de tanto andar com o
19
. Deputado Jorge Tadeu é contra legalização do aborto. O deputado Jorge Tadeu Mudalen (
DEM-SP) apresentou, no dia 21 de novembro, parecer pela rejeição do Projeto de Lei 1135/91, que
legaliza o aborto em qualquer circunstância. necessário nos posicionarmos sobre uma questão
que perdura nesta Casa dezesseis anos., defende Mudalen. (INFORMATIVO DO GABINETE
DO DEPUTADO JORGE TADEU MUDALEN NÚMERO 3 - NOVEMBRO 2007).
66
Missionário, ele converteu-se. Hoje ele diz que é crente. O Missionário suga
demais o Deputado. Ele tem muito interesse em questões ligadas à sua TV e suas
rádios”. (Entrevista em 27/02/2008)
Como se pode perceber, o Deputado Jorge Tadeu é o braço forte do
Missionário em Brasília. Ele trabalha para ampliar o grau de inflncia do
Missionário junto a políticos importantes na área da comunicação. Jorge Tadeu
ampliou o capital político do Missionário, que, aliás, nunca foi muito forte. A IIGD
nunca conseguiu emplacar uma base política muito forte, como a sua concorrente
maior, a Universal do Reino de Deus, comandada pelo seu cunhado e
declaradamente desafeto, Edir Macedo.
Outro nome importante no cenário político e que representa a IIGD é o filho de
Soares, o Deputado Estadual paulista André Soares.
Eleito pelo PFL, agora denominado DEM, André Soares é um jovem advogado
que há muito trabalha junto às estruturas midiáticas da Internacional da Graça. Ele
é o produtor do Programa Show da e estando tanto nesse meio midiático
sabe, como ninguém, qual o peso e a importância que a presença na mídia
representam na vida de qualquer pessoa, seja ela, uma liderança religiosa ou
política. Talvez, por isso, ele não saiu da mídia da Internacional da Graça de
Deus. Ele que antes tinha um papel atrás das câmeras, agora esdiante das
mesmas na função de apresentador. Ele apresenta um programa intitulado: O
Grande Estado de São Paulo, veiculado pela RIT aos sábados às 19:30. Nesse
programa, segundo site da RIT são apresentadas reportagens quese propõem
a revelar as várias faces, os povos, a cultura, o lazer e o que São Paulo tem de
melhor. São reportagens curiosas, cheias de história e personagens que fazem do
nosso Estado o Grande Estado de São Paulo”. O Grande Estado de São Paulo.
Disponível em: http://www.rittv.com.br/programas/programa.php?41/>. Acesso:
02/03/2008.
O Deputado André Soares vale-se desse programa para entrevistar
principalmente personalidades políticas que, com certeza, representarão num
67
futuro próximo uma ampliação do seu capital político. Ele entrevista muitos
prefeitos do interior de São Paulo que almejam um espaço na mídia para expor
suas idéias e suas atividades, como foi o caso da entrevista que André Soares
realizou com o Prefeito de Lindóia, uma cidadezinha com cerca de 6.000
habitantes, encravada entre cidades com mais projeção no circuito das Águas do
interior de São Paulo.
“O deputado André Soares (DEM) recebeu, nesta quarta-feira, 14/2, o prefeito de
Lindóia Élcio Fiori de Godoy para um bate-papo. A conversa entre eles faz parte
do quadro “Entrevista”, do Programa Grande Estado de São Paulo, apresentado
pelo deputado Soares. O deputado André Soares entrevistou o prefeito Elcio Fiori
de Godoy sobre seu governo, atrativos de Lindóia e, principalmente, a alta carga
tributária embutida na água que sai da cidade. Aproveitando a oportunidade, o
deputado Soares e o prefeito Elcio de Godoy discutiram soluções para a
diminuição dos impostos que encarecem o principal produto de Lindóia: a água. A
entrevista vai ao ar no dia 23 de março, sábado, às 19h30 na RIT (Rede
Internacional de TV canal UHF). Os internautas também podem acompanhar
pela internet através do site www.ongrace.com na mesma data e horário”.
Deputado André Soares entrevista Prefeito de Lindóia: Disponível em : www.
spvirtual.net/ sao_paulo_politica_-o53980-en.html>. Aceso: 02/03/2008.
A impressão que se tem é que o nobre Deputado André Soares, ao privilegiar
entrevistas com lideranças políticas do interior de São Paulo, mesmo que estas
sejam de menor expressão no momento atual, tem procurado ampliar suas bases
e suas relações políticas. Ora, isso não é nenhuma novidade e não nada de
ilícito nisso. Isso só comprova que o mesmo veio para ficar no campo da política e
que num projeto com ambições maiores, o atual deputado pretende num futuro
próximo alçar vôos maiores na política nacional.
O que chama atenção é o uso que o mesmo faz de uma poderosa mídia que
possui para tornar-se conhecido nas cidades do interior paulista. A entrevista de
um prefeito a um deputado que nas horas vagas faz as vezes de apresentador de
programa televisivo, sem dúvida é algo que constrói uma relação política
importante, que num dado momento acabará numa barganha política ou numa
68
relação de troca de favores ou mesmo de apoio político numa determinada
eleição. As várias mídias da Internacional da Graça servem para consolidar e
ampliar o poderio político dos representantes da IIGD nas várias esferas de poder
no Brasil.
Sua atuação como parlamentar é pífia. Não nenhum grande projeto de sua
autoria. Nenhuma lei, lei complementar, emenda, moção, etc, de grande
relevância fazem parte de sua atividade parlamentar. Ele participa de algumas
comissões
20
segundo informações oficiais do site da Assembléia Legislativa de
São Paulo (ALESP).
Apesar de ser um Deputado sem grandes projeções, André Soares causou
uma certa polêmica ao fazer uma afirmação que, ao mesmo tempo que é taxativa,
é simplista porque parte de uma visão utópica e até ingênua de sociedade.
Na Revista Show da 9, numa matéria que tratava do embate sobre a
aprovação ou não de leis contra a homofobia, André Soares foi taxativo:
“Não é necessário criar leis para as minorias, mas acabar com as minorias.
Como? Tornando-as iguais, dando educação de qualidade para o rico e para o
pobre, para o branco e para o negro. Segundo meu ponto de vista, o que se deve
fazer é excluir esse termo minoria’ e tratar todos como devem ser tratados, com
igualdade”. (Revista Show da Fé, Rio de Janeiro, ano 9 - nº 102, p 47).
O Deputado André Soares foi procurado diversas vezes para explicar essas e
outras frases e atuações ou não-atuações, como representante do povo paulista,
mas em todas as ocasiões negou-se a oferecer qualquer explicação sobre suas
posições e sua atuação parlamentar.
20
O Deputado André Soares é Membro das seguintes Comissões: Comissão de Legislação
Participativa (Vice-Presidente); Comissão de Legislação Participativa (Efetivo); Comissão de
Direitos Humanos (Efetivo); Comissão de Constituição e Justiça (Efetivo); Comissão Ética e Decoro
Parlamentar (Efetivo); Comissão de Esportes e Turismo (Suplente); Comissão de Promoção Social
(Suplente) André Soares Deputado Estadual. Disponível em:
http://www.al.sp.gov.br/portal/site/alesp/template/>. Acesso: 28/01/2008.
69
Se André Soares tem sido o representante da IIGD na política paulista, seu tio,
o Dr. Adilson Soares do PR/RJ, antigo PL, tem sido o representante da IIGD em
Brasília como Deputado Federal eleito pelo Rio de Janeiro. Ele iniciou sua
trajetória política no Rio de Janeiro como vereador eleito em 2004, para exercer o
mandato 2005-2008. No entanto, nas eleições de 2006, concorreu ao cargo de
Deputado Federal e foi eleito com 48.371 votos e declarou que o valor máximo
que gastaria na campanha seria em torno de R$ 500.000,00 segundo informações
do TSE. Gastou R$ 129.578,43. Tomou posse no início de 2007 para a legislatura
2007-2011. O curioso é que entre os doares de sua campanha aparece o nome do
Missionário RR Soares doando R$ 20.000,00, além, da Graça Artes Gráficas e
Editora que pertence ao grupo midiático da Igreja Internacional da Graça de Deus
doando em torno de R$ 6.162,00 para a campanha. Vele lembrar que o
Missionário dizia que não ajudava seus candidatos com dinheiro para a
campanha, mas se isso for verdade, no caso de seu irmão, ele abriu uma
exceção. A lista de doadores é essa:
Dr. Adílson Soares (PL)
Valor total das despesas: R$ 129.547,73
Valor total das receitas: R$ 129.578,53
Os financiadores - valor (R$)
ADILSON SOARES-3.006,90
ADILSON SOARES-2.000,00
ANTONIO VANDERLER DE LIMA-10.000,00
ATLANTA 96 BICICLETAS LTDA-10.000,00
Comitê Financeiro Único PL-RJ-446,43
CONDOMINIO DO EDIFICIO TEMTUDO SUPERCENTRO DE COMPRAS DE
MADUREIRA-1.905,00
CONDOMINIO DO EDIFICIO TEMTUDO SUPERCENTRO DE COMPRAS DE
MADUREIRA-1.905,00
DI MILESI HAIR LTDA-4.000,00
DI MILESI HAIR LTDA-5.800,00
70
EDNILSON GONÇALVES DA COSTA-5.000,00
GRAÇA ARTES GRÁFICAS E EDITORA LTDA-120,00
GRAÇA ARTES GRÁFICAS E EDITORA LTDA-408,00
GRAÇA ARTES GRÁFICAS E EDITORA LTDA-500,00
GRAÇA ARTES GRÁFICAS E EDITORA LTDA-1.323,00
GRAÇA ARTES GRÁFICAS E EDITORA LTDA-900,00
GRAÇA ARTES GRÁFICAS E EDITORA LTDA-455,00
GRAÇA ARTES GRÁFICAS E EDITORA LTDA-196,00
GRAÇA ARTES GRÁFICAS E EDITORA LTDA-546,00
GRAÇA ARTES GRÁFICAS E EDITORA LTDA-546,00
GRAÇA ARTES GRÁFICAS E EDITORA LTDA-160,00
GRAÇA ARTES GRÁFICAS E EDITORA LTDA.-1.008,00
LIRA ALVES E MACHADO ADVOGADOS ASSOCIADOS-10.000,00
MARCELO RODRIGUES SOARES-853,20
MARCELO RODRIGUES SOARES-1.500,00
P.C.P. COMERCIO DE PAPÉIS LTDA - ME-42.000,00
ROMILDO RIBEIRO SOARES-10.000,00
ROMILDO RIBEIRO SOARES-10.000,00
VALMIR GONÇALVES DA SILVA-5.000,00
Fonte: TSE. Disponível em:
http://congressoemfoco.ig.com.br/Noticia.aspx?id=12199/>. Acesso: 02/03/2008.
Como Vereador na cidade do Rio de Janeiro participou somente de uma
comissão especial, que foi a Comissão da Infância e da Juventude que, aliás,
presidiu entre 2005 e 2006.
Na Câmara dos Deputados, segundo informações do site da Câmara dos
Deputados, no início dos trabalhos em 2007, ele constava como membro
titular da mais sonhada comissão permanente da Câmara dos Deputados, por
parte dos políticos evangélicos, a CCTCI. É essa comissão que trata das
concessões de mídia no Brasil.
CÂMARA DOS DEPUTADOS: COMISSÕES PERMANENTES: Ciência e
Tecnologia, Comunicação e Informática: Titular, 14/2/2007-20/3/2007;
Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio: Titular, 29/6/2007-; Direitos
Humanos e Minorias: Suplente, 13/3/2007-27/4/2007; Meio Ambiente e
Desenvolvimento Sustentável: Suplente, 14/2/2007-28/2/2007. COMISSÕES
ESPECIAIS: PL 01/07, Salário nimo: Suplente, 7/3/2007. Documento
71
produzido em 24/02/2008 14:43 (SILEG - Módulo Deputados). Deputados:
Disponível em: http://www2.camara.gov.br/deputados/>. Acesso: 24/02/2008.
O que precisa ficar claro é que participar de uma comissão tão importante
como a CCTCI não significa que o Deputado membro dessa comissão e que seja
evangélico, ou esteja a serviço de alguma organização evangélica, seja de fato
uma pessoa com atitudes suspeitas, mas significa o desejo declarado de participar
das decisões de concessões que aumentarão o poderio midiático de grupos
religiosos e por outro lado, enfraquecerão o poderio igualmente midiático de
grupos rivais.
Por exemplo, às vezes, um político membro dessa comissão não privilegia o
seu grupo religioso, mas impede que outros grupos religiosos tenham acesso às
concessões midiáticas no Brasil, o que equivale a sustentar indiretamente o
poderio midiático de grupos consolidados. Imaginem que dois grupos
religiosos que estão solicitando emissoras de rádio. Um desses grupos é
evangélico, o outro é ligado ao candomblé. O deputado que representa uma
agremiação religiosa evangélica e que é membro da CCTCI pode não conseguir
apoio para aprovar a concessão para os evangélicos naquele momento, mas
lutará tenazmente para conseguir apoio para vetar a concessão para o grupo
ligado ao candomblé.
O que os deputados evangélicos pretendem ao participar da CCTCI é
conseguir concessões midiáticas para grupos religiosos evangélicos, em segundo
lugar evitar que grupos rivais tenham acesso a concessões equivalentes e, em
terceiro lugar é usar esse poderio que a comissão oferece para ampliar o capital
político, conseguindo, assim, transformar isso numa moeda de troca importante no
campo da política. Esse é o papel que o Dr. Adilson Soares realiza em Brasília.
Em suma, quando se analisa os papéis estratégicos que os políticos mais
importantes ligados à IIGD executam; percebe-se que funções previamente
distribuídas.
Jorge Tadeu é o político que “abre portas” e cria um bom ambiente para Soares
conseguir levar à diante e a contento seus planos de ampliação do seu poderio
midiático; ao mesmo tempo, em São Paulo, o Deputado Estadual André Soares
torna-se conhecido de lideranças políticas interioranas de São Paulo, usando,
72
para tal, o poderio midiático já conquistado, e em Brasília, o Dr. Adilson Soares
participa estrategicamente da Comissão Permanente mais importante em relação
às concessões midiáticas no Brasil, a CCTCI.
Esses três políticos têm a função de ampliar o capital político do Missionário
RR Soares e com esse capital político ampliado, o Missionário pretende aumentar,
ainda mais, o seu poderio midiático. Religião, mídia e política formam uma trinca
importantíssima na conjuntura brasileira na atualidade.
73
CAPÍTULO 2
A TRAJETÓRIA DO CIDADÃO KANE EVANGÉLICO NO
CAMPO RELIGIOSO BRASILEIRO
2.1. AQUÉM DO CIDAO KANE, MAS DO LADO DE
JESUS
Romildo Ribeiro Soares sempre quis ser dono de um império midiático. Desde
a primeira vez que assistiu a uma televisão, ainda na infância, acreditou que esse
veículo e tantos outros veículos midiáticos poderiam servir à causa religiosa.
O título desse tópico é um trocadilho com o lendário e cult documentário inglês,
Muito além do Cidadão Kane [Beyond Citizen Kane], exibido pela primeira vez em
1993, no canal britânico Channel 4, e que abordava os bastidores da mídia e
política brasileiras da época. O diretor do documentário, Simon Hartog finalizou o
documentário em Março de 1992 e, em junho daquele ano, entrou em coma, vindo
a falecer em Agosto de 1992, antes da obra ser exibida no Reino Unido e não
pode ter acesso ao impacto que sua obra causou junto principalmente ao mundo
acadêmico e sobre o público que gosta de estudar mídia, ou melhor, a
concentração de mídia no Brasil. O professor John Ellis, do Departamento de
mídia e artes da Universidade de Londres, na época, sócio de Simon, na extinta
74
produtora independente Larger Door, supervisionou a revisão do programa e
incluiu uma única entrevista para atualizar o filme, que foi ao ar em Maio de 1993.
Esse documentário que custou cerca de US$ 260 mil [R$ 445 mil], transformou-se
num ícone na luta pela democratização do acesso à informação.
O documentário usa o empresário Roberto Marinho (1904-2003), dono das
organizações Globo, como metonímia da concentração da mídia no Brasil, e vem
daí a referência a Charles Foster Kane, personagem criado por Orson Welles em
Cidadão Kane (1941).
No Brasil, pode-se dizer que o filme é proibido, pois muitas imagens pertencem
à Rede Globo de Televisão, e esta, não cede os direitos de exibição de suas
imagens, e isso implica que nenhum canal brasileiro, - exceto a própria Globo
pode exibir essa obra. Em função dessa situação, o documentário continua
underground. Ele pode ser encontrado na Internet e foi visto mais de 800 mil
vezes.
Soares, no Brasil, está muito longe de ser um Charles Foster Kane, ou mesmo
um Roberto Marinho, mas, com certeza, tem pretensões que o colocam no mesmo
patamar desses poderosos gestores midiáticos.
75
2.2 UM BREVE HISTÓRICO DO MISSIONÁRIO ROMILDO
RIBEIRO SOARES
Um breve histórico de Romildo Ribeiro Soares pode ser realizado se à sua
vida pessoal forem estabelecidas referências religiosas que delimitaram
momentos cruciais em sua existência. Antes mesmo de falar sobre o jovem
Romildo, é mister reconhecer os vínculos religiosos que acompanharam os Ribeiro
Soares.
Seu avô paterno, Cornélio Ribeiro Soares fundou a primeira igreja evangélica
de Muniz Freire ES. Após sua conversão que ocorreu na cidade de Castelo,
vizinha de Muniz Freire, este levou um pastor batista para visitar seus familiares,
com a finalidade de evangelizá-los. Após alguns membros de sua família dizerem
sim à fé, houve uma série de batismos realizados pelo pastor batista que fora
convidado para tal obra.
“Assim, Cornélio e os familiares tornaram-se os membros fundadores da Primeira
Igreja Batista em Muniz Freire. A princípio, até que a Igreja fosse organizada, no
dia 29 de Agosto de 1946, os cristãos evangélicos reuniam-se na casa de
Cornélio. A família Soares plantou mesmo uma história do Evangelho em Muniz
Freira’, afirma o pastor presbiteriano Heron José Soares”. (Revista Graça Show
da Fé nº 69 p. 48.)
A família Soares orgulhava-se do seu pioneirismo na região. Alguns chegam a
atestar que, mesmo antes do pioneirismo do Sr. Cornélio Soares, outra pessoa
dessa família teria tido a primazia de ter abraçado o Evangelho.
76
“Curiosamente, antes mesmo da fundação do templo, outra parente fez história na
cidade: a cunhada de Cornélio, Purcina Figueiredo Soares, que foi a primeira
evangélica convertida de Muniz Freire e, depois, tornou-se membro daquela
congregação batista”. (ibid., p.48)
Foi nesse ambiente familiar crivado pela religiosidade que, no dia 06 de
Dezembro de 1947, na cidade Muniz Freire no Espírito Santo, nasceu Romildo
Ribeiro Soares. Como toda criança que nascia numa família pobre, num Brasil em
transição do mundo rural para o mundo urbano, no período pós-guerra, o pequeno
Romildo teve uma infância alegre, podendo brincar à vontade nas ruas de sua
cidadezinha natal (tomava banho de rio, andava de bicicleta e jogava bola no
campo de Muniz Freire; ibid.,p.46), mas sofrendo as agruras da condição social de
sua família. Entretanto, no início da década de 50, aconteceria algo que mudaria
os rumos de sua vida. Com seis anos de idade, portanto no ano de 1953, sua
família foi convidada para assistir a um culto de ação de graças pelo aniversário
da Igreja Presbiteriana
21
de Muniz Freire, cujo templo situava-se ao lado de sua
casa.
Segundo informações dadas pelo Reverendo Heron José Soares, pastor atual
da Igreja Presbiteriana de Muniz Freire:
“O pastor naquela época era o Reverendo Antônio Souza Lima. Apesar do
trabalho presbiteriano ter sido iniciado no Norte do Espírito em 1910, e a Igreja
Presbiteriana somente organizou sua comunidade em Muniz Freire em 1947,
localizada à Rua: Félix Machado 60, no centro de Muniz Freire, bem ao lado da
residência dos Ribeiro Soares, sendo que inclusive em 1993, o Missionário RR
Soares doou esse terreno que pertencia à sua família para a Igreja Presbiteriana.
(Entrevista em 24/01/08)
21
. Vários deres neopentecostais tiveram suas raízes no ambiente presbiteriano. Segundo o
sociólogo Ricardo Mariano, além de RR Soares, Sônia Hernandes, Bispa da Igreja Renascer em
Cristo, também teve origem presbiteriana, mais especificamente na Igreja Presbiteriana
Independente, onde seu pai era presbítero. Outro nome importante da onda neopentecostal que
teve suas origens no seio do presbiterianismo foi o pastor Robson Rodovalho, que converteu-se
num acampamento organizado pela mocidade da Igreja Presbiteriana do Brasil. (MARIANO, 1999,
p.99-105)
77
O pai do jovem Romildo, Atair Ribeiro Soares, havia freqüentado a Igreja
Batista e, naquela época, estava, como se diz no linguajar religioso, “desviado”, ou
seja, fora da igreja. Sua mãe, Dona Altamira Areias Soares era católica e não
suportava “os crentes”. Como se pode perceber, o pequeno Romildo vivia num lar
formado por um “casamento misto
22
”. O convite foi recebido pelos pais do jovem
Romildo com cortesia, mas como o Sr. Atair e Dona Altamira eram de orientações
religiosas diferentes, isso causou uma grande discussão em casa, ao ponto de
eles não irem para o culto de ão de graças, mas enviarem os filhos, para
representá-los. Foi nesse culto que o pequeno Romildo teve o seu primeiro
encontro com Deus, como ele mesmo atesta.
“...lembra-se o Missionário, que entregou sua vida a Jesus naquela noite. ‘Deus
falou ao meu coração durante a mensagem. Quando o pastor fez o apelo para as
pessoas aceitarem Cristo, as lágrimas desceram em meu rosto. Declarei que
recebia Jesus como meu Salvador, recorda R.R Soares”. (Revista Graça Show
da Fé nº 69 p.p. 44-45.)
Ainda criança, trabalhou um período plantando milho nas terras do avô
Cornélio, depois foi sapateiro e aos 13 anos começou a trabalhar no cinema da
cidade de Muniz Freire.
“...‘Ele ajudava a exibir filmes aqui [Muniz Freire] e em Anutiba [cidade vizinha].
Ficou pouco tempo na função, pois, em seguida, foi para o Rio’, conta o primo
Rubens Ribeiro Soares. No Rio de Janeiro, Romildo, com um dos seus irmãos
(Adilson Soares), começou a vender roupas de porta em porta. ‘Comprávamos em
22
. Casamento misto é a definição que os evangélicos dão para um casamento onde um dos
cônjuges é crente, conhecedor da Palavra, freqüentando ou não uma comunidade, e o outro
cônjuge é considerado não-crente, de uma outra orientação religiosa, por exemplo, católica,
espírita, etc. Essa definição de casamento misto está baseada, segundo os evangélicos no texto
de 2 Co. 6.14-18, onde o apóstolo Paulo trata da comunhão dos crentes com os incrédulos. Casar-
se com um não-crente é colocar-se em jugo desigual, em comunhão com as trevas.
78
São Paulo e vendíamos no Rio. Naquela época não havia problema de assalto,
então as pessoas nos atendiam bem em casa’, recorda-se Adilson”. (Revista
Graça – Show da Fé nº 69 p.49)
Convertido aos seis anos de idade numa Igreja Presbiteriana, o jovem Romildo
passou a freqüentar então, a Igreja Batista que seu avô havia fundado. Mostrava-
se muito interessado pelo Evangelho e pelas histórias bíblicas, principalmente as
que relatavam milagres e curas.
“... ‘Quando, certa vez, lemos no culto doméstico a passagem bíblica sobre a cura
da sogra de Pedro, Romildo guardou aquele texto, sentou-se em um toco de
madeira e ficou questionando: Como mandou a doença sair e ela foi embora? Se
eu mandar esse toco sair do lugar ele vai sair? Então, a doença obedeceu às
ordens porque Jesus mandou e ela saiu’. Foi a primeira vez que ele refletiu sobre
o dom da cura, conta dona Maria”. [tia do missionário] (Revista Graça Show da
Fé nº 69 p.45)
Ainda criança, teve o seu primeiro contato com uma televisão na década de 50
na cidade de Cachoeiro de Itapemirim ES, desde cedo percebeu que esse
veículo poderia ser muito útil para a pregação do Evangelho. Dona Jether Soares,
uma das tias paternas do missionário registrou assim esse primeiro encontro:
“Quando esteve em Cachoeiro [de Itapemirim], ainda pequeno, ele assistiu à
televisão pela primeira vez e disse: ‘Tanta gente fala de tudo aqui, mas não se
refere a Deus. Se o Senhor me der condições, um dia vou estar ali [na TV] falando
do seu nome’. Soares cresceu com esse sonho e não desistiu. Acho que ele fez
um grande trabalho, atendendo ao chamado de Deus”. (Revista Graça Show da
Fé nº 69 p.45)
79
Sua estada em Muniz Freire foi feliz e rica em acontecimentos. Até hoje os
moradores da cidade, quando questionados sobre o famoso missionário que
aparece em horário nobre na TV brasileira orgulham-se de seu conterrâneo mais
ilustre.
Em 2003, durante os festejos de aniversário do município, o então prefeito da
cidade, Zaedis de Oliveira Thezolin, que fora amigo de infância e chegou a
trabalhar junto com Romildo num dos trabalhos informais da adolescência
concedeu uma honraria significativa ao velho amigo.
“...concedeu ao Missionário o título mais importante com o qual a cidade
homenageia seus filhos queridos: Cidadão Muniz-freirense Ausente (número um).
Essa designação foi criada para homenagear pessoas que, nascidas na cidade e,
hoje, distantes dela, representam muito bem ao município. ‘Temos conhecimento
de que o Missionário sempre se lembra de sua terra aonde quer que vá. Essa foi
uma justa homenagem a alguém que deu seus primeiros passos na educação por
meio das escolas daqui e, hoje é conhecido internacionalmente’, declara o
presidente da Câmara Municipal, José Manoel Almeida Bolzan”. (Revista Graça
Show da Fé nº 69 p.47)
Lideranças religiosas de outras denominações reconhecem o seu papel, como
um filho ilustre da cidade, como, por exemplo, o pastor presbiteriano citado
nesse trabalho.
“Os habitantes de Muniz Freire, sejam evangélicos ou não, têm um grande
apreço pelo Missionário
.
A opinião geral é de que se trata de um homem de bem.
Ele é muito respeitado”, sentencia o Reverendo Heron José Soares, que não
possui nenhum vínculo familiar com o Missionário, apesar do mesmo sobrenome.
(Entrevista em 24/01/08)
Quando completou dezesseis anos
,
em abril de 1964, resolveu abandonar a
cidadezinha de Muniz Freire e tentar a sorte na cidade grande. Dirigiu-se para o
Rio de Janeiro e lá o seu fervor religioso esfriou nos quatro anos que se seguiram.
80
“...aquele fervor pela Palavra não foi o mesmo. ‘Não abandonei a fé; apenas não
me firmei. Nunca usei drogas, mas as namoradas, as festas e o futebol no
Maracanã me deixaram fraco na fé. Naquele período não me sentia forte
espiritualmente, apesar de nunca ter desprezado a Palavra. Todo domingo eu ia à
igreja, mas não estava como era antes”. (Revista Graça – Show da Fé nº 69 p.46)
No entanto, no ano de 1968, Romildo Ribeiro Soares teria um outro encontro
religioso que mudaria mais uma vez a sua vida. Convidado por sua tia, Romildo foi
a um culto da Igreja Pentecostal de Nova Vida, culto este realizado no prédio da
Associação Brasileira de Imprensa (ABI), no centro do Rio de Janeiro.
Na igreja do Bispo Robert McAlister, Romildo começou a presenciar a prática
de exorcismos e rituais de cura. Nesse mesmo ano, ele leu o livro do seu “mestre”
literário, T.L. Osborn (mais adiante será dedicado um capítulo especial somente
para tratar das influências literárias e teológicas do Missionário RR Soares),
intitulado, Curai os enfermos e expulsai os demônios, e esse livro foi decisivo em
sua prática religiosa.
Em 1968, RR Soares conheceu o seu referencial prático (Bispo Mcalister) e o
seu referencial teórico (T.L. Osborn). Ele até desistiu de estudar russo para poder
cursar Medicina na Universidade da Amizade dos Povos, em Moscou, na antiga
URSS.
“Sonhava em ser médico e havia-me inscrito para participar de um programa
universitário na Rússia, porque davam bolsas de estudo, o que era ideal para mim,
pois não podia pagar por aquilo. Eu me matriculei em um curso de russo e
estava no quarto livro quando Deus me chamou para pregar as Escrituras”.
(Revista Graça – Show da Fé nº 69 p.48)
Na Igreja Nova Vida, ele permaneceu por seis anos e conheceu muita gente
interessante, entre eles aquele que viria ser seu cunhado, Edir Macedo, e Samuel
Coutinho. A convite deste último, em 1974, o entusiasmado obreiro da igreja do
81
Bispo McAlister, nessa época, um homem casado,
23
foi visitar uma Igreja Casa
da Benção, liderada pelo missionário Cecílio Carvalho Fernandes.
“...‘Ele [Samuel] me apresentou ao Cecílio, Quando o culto ia começar, um obreiro
perguntou ao reverendo quem pregaria naquela noite, e Cecílio respondeu que
seria eu! Fiquei assustado e disse eu não estava preparado, mas ele insistiu e
acabei concordando. Eu lembro que na mesma hora que comecei a pregar, um
demônio se manifestou em uma pessoa. Pedi que todos ficassem calmos porque
Deus estava libertando aquela alma. O missionário Cecílio Carvalho me convidou
para me associar à sua igreja, mas eu disse que estava orando e o Senhor iria dar
a direção. Fiquei ali por algum tempo’, recorda-se o Missionário, que um ano
depois, foi consagrado pastor por Cecílio e liberado para fazer um trabalho de
oração no cinema Marajó, na Freguesia, bairro da zona oeste do Rio de Janeiro”.
(Revista Graça – Show da Fé nº 69 p.p.46-47)
Romildo Ribeiro Soares e seu cunhado, Edir Macedo, saíram em 1975 da
Igreja Nova Vida e, juntamente com Samuel Coutinho e Fidélis Coutinho,
fundaram, em 13 de Abril de 1975, o Salão da (Cruzada do Caminho Eterno).
O templo funcionava no cinema Marajó que fora alugado para a realização das
reuniões da nova igreja. As reuniões aconteciam entre 09h da manhã e meio-dia,
as terças e quintas-feiras, e aos sábados e domingos. Coutinho relata “que o
primeiro milagre na nova igreja foi a cura de uma moça paralítica de 25 anos de
idade, e no primeiro mês, eles realizaram 96 batismos”. (Revista Graça Show
da Fé nº 69 p.47)
Além do funcionamento no cinema Marajó, a Igreja Cruzada do Caminho
Eterno funcionou em outros lugares inusitados. Ela era uma igreja, pode-se dizer,
itinerante, pois ela funcionava em desde um coreto de praça (no Jardim do Méier,
no subúrbio carioca), até em outros cinemas alugados e suas reuniões de batismo
por imersão aconteciam nos mais variados lugares, como por exemplo, num lago
formado pelo resto da caixa d’água da cidade de Rio Pequeno.
23
. Ele casou-se com Maria Magdalena Bezerra Ribeiro Soares, irmã caçula do Bispo Edir Macedo,
no dia 10 de Março de 1973, com quem teve cinco filhos (David, André, Daniel, Marcos e Felipe).
82
“As reuniões da Cruzada do Caminho Eterno começaram a ficar lotadas. Além do
coreto nas noites de sábado, passaram, então a ser realizadas em um antigo
cinema em frente: o Bruni Méier. Depois num local maior: o cine Ridan, no bairro
da Piedade, também na Zona Norte do Rio”. (TAVALORO, 2007, p.109)
Depois, no ano seguinte, organizaram a Igreja da Bênção, que funcionava
numa antiga funerária; um galpão situado à Rua Suburbana 7702, no bairro
carioca da Abolição, imóvel este encontrado e indicado por Albino da Silva, que
juntamente com sua filha Alba Maria da Silva Costa, figuram como os primeiros
membros da Igreja Universal do Reino de Deus.
Em 1977, a Igreja da nção teve seu nome alterado para Igreja Universal do
Reino de Deus, sem a presença dos irmãos Coutinho. O empreendimento
coube ao pastor Romildo e ao ainda pastor Edir Macedo. Naquela época, a
liderança ministerial cabia ao pastor Romildo e o pastor Edir somente dirigia as
reuniões onde a presença do público era diminuta.
“Os dois dividiam os cultos ao longo do mês. Quando o número de fiéis era abaixo
do esperado, [RR] Soares, o líder naquela época, entregava a reunião para Edir.
‘Eu ficava feliz da vida. Acostumei a pregar para pouca gente. Recebia o culto de
coração aberto. Foi um trabalho de grão em grão’, recorda”. (ibid.,p.110)
Para alugarem o barracão onde nasceu a Igreja Universal do Reino de Deus,
os dois jovens pastores tiveram que arcar com uma responsabilidade muito
grande para ambos naquela época. É bem verdade que isso não é nada
comparado com o que os dois construíram posteriormente, mas para aquele
período inicial de vacas magras, era um passo e tanto. Ali, aconteceu a primeira
grande desavença entre os dois jovens e promissores pastores. Edir Macedo
queria usar sua mãe como fiadora do negócio e seu apartamento como garantia, e
Soares era contra. No final venceu a posição de Macedo.
83
“Mas para alugar a antiga funerária foi necessário um fiador. O valor era puxado:
9.530 cruzeiros, a moeda daquele período. Edir recorreu à mãe, que prontamente
aceitou ajudar. Eugênia, que naquela idade era chamada de Dona Geninha,
colocou como garantia seu único apartamento, situado no bairro carioca de
Fátima. Na hora da assinatura do contrato, o cunhado Soares apareceu. E tentou
mudar o rumo da história. ‘Dona Geninha não faça isso. É loucura. Seu filho não
vai conseguir pagar. A senhora vai perder o apartamento, não faça isso’ disse
Soares. Mas e é mãe. Ela assinou e fomos em frente’ lembra o bispo, que,
apesar do episódio, ainda não havia decidido romper com Soares”.(ibid.,p. 112)
A Igreja crescia de forma bem positiva. O templo da abolição que inicialmente
comportava 1.500 fiéis precisou passar por reformas e passou a comportar 2.000
pessoas. E mesmo assim ficou pequeno. Não demorou muito e um segundo
templo foi aberto em Padre Miguel, em terreno próprio e depois apareceram os
templos de Grajaú, Campo Grande, Duque de Caxias e Nova Iguaçu, na Baixada
Fluminense. Como se pode perceber, a Igreja Universal era eminentemente
carioca no final dos anos setenta.
Essa foi a primeira grande obra realizada por RR Soares. Em parceria, eles
deram início à maior igreja neopentecostal do Brasil. Mas as rusgas começaram a
tornar-se mais fortes entre eles e a parceria terminou em 1980. Com o fim da
parceria nasceu a Igreja Internacional da Graça de Deus, e é esse nascimento que
será abordado no próximo tópico.
84
2.3 O nascimento da Igreja Internacional da Graça de
Deus
A parceria entre os dois cunhados termina em 1980. A igreja havia crescido
bastante e contava com 15 pastores. Edir Macedo, até então “segundo violino
na orquestra”, começava a ganhar terreno e questionava a liderança de Soares.
Macedo propôs uma Assembléia de pastores para saber quem seria o novo
comandante da Universal. Essa votação aconteceu no dia 07 de Junho de 1980
24
.
O Pastor Macedo ganhou por 12 votos a 3. RR Soares, derrotado, não quis
permanecer sob a liderança de Macedo e, compensado financeiramente, fundou
sua própria igreja, a Igreja Internacional da Graça de Deus.
A relação entre os cunhados desde então não é nada boa.
“Nos dias de hoje, Edir e o cunhado [Soares] pouco se falam. De tempos em
tempos, o bispo recebe reclamações de que Soares tenta atrair fiéis da Universal,
enviando emissários para divulgar suas doutrinas dentro dos próprios templos de
Macedo”. “... ‘Ele vai aonde eu vou. Busca gente em nossa igreja em vez de
pregar lá fora, onde há tantas pessoas sofridas. Mas não tem problema...’ ”.
(TAVALORO, 2007, p.115)
A saída da Universal fez RR Soares começar tudo de novo. Em junho de 1980,
depois da fatídica Assembléia, onde ele perdeu a liderança para Macedo, Soares
precisou buscar uma nova clientela. Ele diz:
24
. Um mês depois, ou seja, em Julho de 1980, livre de Soares, Edir Macedo foi consagrado Bispo
e adotou o sistema episcopal de governo em sua Igreja, tal qual aprendera na Igreja Vida Nova.
Também em Julho de 1980, foi aberto o primeiro templo da Universal em São Paulo, na avenida
Gentil de Moura, no coração da cidade.
85
“No início, distribuíamos folhetos na rua e fazíamos vigílias às sextas-feiras.
Entregamos 15 mil folhetos antes da nossa primeira reunião, e muita gente
apareceu no culto, realizado em um estabelecimento alugado por nós. Mas,
depois, a esposa do dono não gostou de ver gente endemoninhada, e fez o
marido nos tirar dali, conta Adilson Soares, irmão do missionário e vereador
carioca eleito em 2004. Passados alguns meses, no entanto, a Igreja da Graça
ganharia seu primeiro templo, na Rua Lauro Neiva, 32, em Duque de Caxias
(RJ), em um galpão de uma antiga confecção desativada muitos anos”.
(Revista Graça – Show da Fé nº 69 p.49)
E de lá para cá, é inegável a delimitação de território que essa igreja conseguiu
no cenário religioso nacional, principalmente no campo midiático.
A Igreja Internacional da Graça de Deus enquadra-se naquilo que a maioria
dos especialistas chama de terceira onda do pentecostalismo brasileiro. Apesar de
reconhecer as limitações que uma tipologia produz, é necessário utilizá-la para
compreender melhor a organização do campo religioso pentecostal brasileiro.
Para tal, segue abaixo, uma breve tipologia do campo pentecostal no Brasil.
Em quase todos os livros que tratam do fenômeno religioso brasileiro no século
XX, pode-se encontrar elementos históricos que apontam para o desenvolvimento
do pentecostalismo brasileiro. (CAMPOS, Leonildo Silveira. 1999; ROMEIRO,
Paulo. 2005; MARIANO, Ricardo. 1999).
Quando se analisa a dinâmica histórico-institucional do pentecostalismo
brasileiro, levando-se em conta as mudanças ocorridas na mensagem religiosa,
bem como o processo de aculturação das teologias importadas e as adaptações
que estas teologias sofreram em solo brasileiro, pode-se chegar às tipologias mais
aceitas entre os estudiosos do fenômeno supra-citado. As vertentes do
pentecostalismo brasileiro são classificadas em ondas pela maioria dos estudiosos
brasileiros, e essas ondas podem ser assim descritas: pentecostalismo clássico,
deuteropentecostalismo e o neopentecostalismo. (MARIANO, 1999).
Contudo, tal classificação não é tão pacífica como parece, Paulo Romeiro cita
um grande expoente que pesquisa o fenômeno religioso brasileiro e diz:
86
“Antônio Mendonça divide o pentecostalismo em duas fases: os primeiros anos do
século XX, referindo-se ao que chamamos ‘pentecostalismo clássico’, e a década
de 1960, quando ocorreu o surgimento, de fato, do neopentecostalismo (ou
movimento carismático protestante), da renovação carismática católica e das
agências de cura divina”. (ROMEIRO, 2005, p.p. 49-50).
Como se pode perceber, para o prof. Mendonça, o pentecostalismo brasileiro é
dividido em duas vertentes somente. Ricardo Mariano cita Jesus Hortal, outro
grande estudioso do fenômeno religioso brasileiro, e diz que o mesmo divide o
pentecostalismo brasileiro em três gerações e não ondas. (MARIANO, 1999).
A metáfora marinha das ondas surgiu nos EUA com David Martin para designar
a história mundial do protestantismo. Ele dizia que o protestantismo podia ser
estudado em três grandes ondas: a puritana, a metodista e a pentecostal.
No Brasil, o primeiro a valer-se da metáfora das ondas foi Paul Freston. (ibid,
p.28). Quando se começa a estudar o pentecostalismo brasileiro, a
necessidade de uma redução epistemológica e por mais que se tente é difícil fugir
da metáfora das ondas.
Ricardo Mariano citando Paul Freston diz:
“O pentecostalismo brasileiro pode ser compreendido como a história de três
ondas de implantação de igrejas. A primeira onda é a década de 1910, com a
chegada da Congregação Cris(1910) e da Assembléia de Deus (1911) (...) A
segunda onda é dos anos 50 e início de 60, na qual o campo pentecostal se
fragmenta; a relação com a sociedade se dinamiza e três grandes grupos (em
meio a dezenas de menores) surgem: Quadrangular (1951), Brasil para Cristo
(1955) e Deus é Amor (1962). O Contexto dessa pulverização é paulista. A
terceira onda começa no final dos anos 70 e ganha força nos anos 80. Suas
principais representantes são a Igreja Universal do Reino de Deus (1977) e a
Igreja Internacional da Graça (1980) (...) O contexto é fundamentalmente carioca.
(ibid. p.p.28-29).
87
Quanto à primeira onda, do chamado pentecostalismo clássico, dos idos anos
da década de 1910, pode-se dizer que a marca registrada que caracterizou esse
movimento foi a ênfase no dom de línguas, o anticatolicismo, a crença na volta
iminente de Jesus e um ascetismo de rejeição ao mundo exterior. As pessoas que
compunham essas primeiras igrejas pentecostais eram majoritariamente pessoas
pobres e de pouca escolaridade.
A segunda onda é a do deuteropentecostalismo, surgida entre anos 50 e 60 do
século XX. Esse movimento difundiu-se por meio do rádio, das campanhas
evangelísticas em praças blicas, gisios de esporte, estádios de futebol,
teatros e cinemas. Tipicamente marcada pela ênfase na cura divina, essa onda
pentecostal, a despeito das críticas de charlatanismo e curandeirismo,
estabeleceu uma ruptura com o pentecostalismo clássico e abriu precedentes para
o aparecimento do neopentecostalismo.
A terceira onda, chamada de neopentecostalismo, começa nos anos 70 e
durante as três próximas décadas vai marcar de forma decisiva o campo religioso
brasileiro. Participantes ativos da política partidária e com liderança carismática
forte, os neopentecostais, ganham visibilidade com as duas maiores igrejas que
compõem esse segmento, a saber, a Igreja Universal do Reino de Deus (Bispo
Edir Macedo) e a Igreja Internacional da Graça de Deus (Missionário RR Soares).
Algumas características podem ser elencadas em relação às igrejas
neopentecostais. Elas continuam dando ênfase à cura divina, (a exemplo do que
faziam as igrejas do deuteropentecostalismo), supervalorizam os rituais de
exorcismo com forte ênfase de combate aos cultos afro-brasileiros, usam objetos
como mediação do sagrado (rosas, sal grosso, óleo da unção, etc) e tem na
guerra espiritual contra o diabo e seus asseclas uma marca registrada.
88
2.4 RR Soares: Profeta, Sacerdote e Mago
Para analisar as atividades de Soares à frente da Igreja Internacional da Graça
de Deus, é necessário usar como referencial teórico os conceitos desenvolvidos
por Pierre Bourdieu. Para tal, primeiramente, será realizada uma breve
explanação da importância de Bourdieu como uma referência no campo das
ciências sociais e a importância dos conceitos de habitus e de campo, na obra do
sociólogo francês, logo após, serão aplicados os conceitos de profeta, sacerdote e
mago em relação à atividade de Soares.
A obra de Pierre Bourdieu (1930-2002) é uma referência para várias disciplinas
das chamadas Ciências Humanas. Ele escreveu sobre arte, ciência, educação,
alta costura, televisão, religião com profundidade e rigor acadêmico.
O que interessa para este trabalho, dessa grande versatilidade de Pierre
Bourdieu, são seus escritos sobre religião.
Um de seus grandes méritos em matéria de religião foi partir dos pressupostos
das três grandes tradições clássicas (Karl Marx, Émile Durkheim, Max Weber), ou
como ele mesmo se referiu, dos três círculos mágicos” (BOURDIEU, 2005, p.27).
Vale ressaltar que essa tentativa de compatibilizar as contribuições das três
tradições clássicas não vale somente para a religião, mas tem um aspecto mais
amplo. Na verdade, Bourdieu apropria-se das três tradições clássicas na tentativa
de elaborar uma teoria dos fatos culturais e isso não pode ser visto como um
trabalho de simples bricolage. Paulo Miceli na Introdução brasileira da obra de
Bourdieu – A Economia das Trocas Simbólicas – deixa isso bem claro:
“Diante da tentativa de elaborar uma teoria regional dos fatos culturais capaz de
compatibilizar as contribuições dos fundadores (...) Marx, Weber, Durkheim
num esforço de compensar as carências e omissões derivadas da perspectiva
unilateral que assumiram, muitos poderiam, apressadamente, qualificar tal projeto
de “eclético”, pluralista”, “sincrético” e, até mesmo, pensar em bricolage. Na
89
verdade, o que Bourdieu pretende é retificar a teoria do consenso por uma
concepção teórica capaz de revelar as condições materiais e institucionais que
presidem à criação e à transformação de aparelhos de produção simbólica cujos
bens deixam de ser vistos como meros instrumentos de comunicação e/ou de
conhecimento”. (MICELI, Paulo (2005), “Introdução: A Força do Sentido”. In: A
Economia das Trocas Simbólicas. p.XII).
Apropriando-se como ninguém dos círculos mágicos, Bourdieu ampliará muitos
conceitos desenvolvidos inicialmente pelos pais fundadores”. No carreadouro de
Durkheim, quando Bourdieu refere-se à religião, ele trata-a como linguagem, como
um sistema simbólico de comunicação e pensamento e em função disso a religião
passa a ser interessante para a sociologia, tendo em vista que ela oferecerá a um
determinado grupo social a ordenação lógica entre o mundo natural e social
integrando-os numa ordem cósmica.
“Seguindo Durkheim, que define a religião como um conjunto de práticas e
representações revestidas de caráter sagrado, Bourdieu trata a religião como
linguagem: sistema simbólico de comunicação e de pensamento. É enquanto
sistema de pensamento que a religião interessa à sociologia, uma vez que ela
opera para uma dada sociedade a ordenação lógica do seu mundo natural e
social, integrando-o num cosmos. Ou seja, para a religião tudo o que existe ou
venha a existir tem sentido porque se integra numa ordem cósmica. Ao enfatizar a
produção de sentido (assumindo a contribuição de M. Weber), Bourdieu descarta
a crítica iluminista da religião (como se ela fosse um sistema explicativo,
equivalente à filosofia ou à ciência) e aponta sua especificidade: unir cada evento
particular à ordem cósmica”. (OLIVEIRA, Pedro A.Ribeiro de ( 2003). “A Teoria do
trabalho religioso em Pierre Bourdieu. In: Sociologia da Religião Enfoques
Teóricos. p.177).
Dois conceitos em Pierre Bourdieu são fundamentais para quem estuda
religião, o conceito de habitus e o conceito de campo. Em relação ao conceito de
habitus, este pode ser definido assim:
90
“Habitus surge como um conceito capaz de conciliar a oposição aparente entre a
realidade exterior e as realidades individuais. Capaz de expressar o diálogo, a
troca constante e recíproca entre o mundo objetivo e o mundo subjetivo das
individualidades. Habitus é então concebido como um sistema de esquemas
individuais, socialmente constituído de disposições estruturadas (no social) e
estruturantes (nas mentes), adquirido nas e pelas experiências práticas (em
condições sociais específicas de existência), constantemente orientado para
funções e ações do agir cotidiano. Pensar a relação entre indivíduo e sociedade
com base na categoria habitus implica afirmar que o individual, o pessoal e o
subjetivo são simultaneamente sociais e coletivamente orquestrados. O habitus é
uma subjetividade socializada. Dessa forma, deve ser visto como um conjunto de
esquemas de percepção, apropriação e ação que é experimentado e posto em
prática, tendo em vista que as conjunturas de um campo o estimulam”. (SETTON,
Maria da Graça Jacintho, 2002, p.63).
Quanto ao conceito de campo, este pode ser definido da seguinte forma:
“Campo seria um espaço de relações entre grupos com distintos posicionamentos
sociais, espaço de disputa e jogo de poder. Segundo Bourdieu, a sociedade é
composta por vários campos, vários espaços dotados de relativa autonomia, mas
regidos por regras próprias” (ibid, p.64).
Como se pode perceber pela citação acima, Bourdieu acredita na existência de
vários campos que compõem a sociedade. O que importa nesse momento é
compreender a noção de campo religioso. Noção esta que tem possibilitado
grandes avanços aos estudiosos do fenômeno religioso.
No entanto, não se pode promover uma redução do trabalho acadêmico de
Bourdieu, ele não é especificamente um sociólogo da religião, ele pode ser
definido como um teórico da cultura e a sua importância para a religião decorre da
especificidade do seu trabalho em relação à noção de campos que compõe a
sociedade, o que acabou desembocando no conceito de campo religioso, termo
91
este amplamente utilizado pelos pesquisadores de religião. É isso que afirma
Lísias Negrão:
“Sua escolha, (Bourdieu) não obstante sua obra exígua na área de meu interesse
(religião), decorre da qualidade de seu trabalho e de sua criatividade conceitual: a
noção de campos diferenciados de relações sociais, genericamente por ele
utilizada em suas alises, conduziu, em sua aplicação às relações religiosas, ao
conceito de campo religioso, largamente utilizado pela sociologia da religião,
mesmo em contextos teóricos distanciados da referência inicial”.(NEGRÃO, 2005,
p.24).
Segundo o Professor Steven Engler (2003), Bourdieu inicialmente elabora este
conceito de campo religioso em dois artigos em 1971, onde ele repensa a
distinção entre sacerdote e profeta; problemática inicialmente desenvolvida na
sociologia da religião de Max Weber. (ENGLER, p.446).
Com uma linguagem de cunho econômico, Bourdieu estrutura o campo
religioso. No campo religioso as contendas e as disputas sociais entre os diversos
atores sociais que o compõem, marcam a tônica desse espaço. Hugh B. Urban diz
o seguinte: “Como outros campos sociais, o campo religioso é para Bourdieu um
mercado competitivo”. (URBAN, 2003, p.362).
Nesse mercado competitivo, é fundamental acumular capital religioso, capital
sagrado, as contendas se dão para se definir quem administrará os bens de
salvação e quem exercitará o poder dentro do campo. Assim como uma
sociedade, divide-se em classes e hierarquiza-se, no campo religioso ocorrerá fato
semelhante.
“Em uma sociedade dividida em classes, a estrutura dos sistemas de
representações e práticas religiosas próprias aos diferentes grupos ou classes,
contribui para a perpetuação e para a reprodução da ordem social (no sentido de
estrutura das relações estabelecidas entre os grupos e as classes) ao contribuir
92
para consagrá-la, ou seja, sancioná-la e santificá-la”. (BOURDIEU, 2005, p.p.52-
53)
Ocorre dentro do campo religioso uma divisão social do trabalho, quando os
produtores de bens religiosos tornam-se especialistas sendo, portanto,
dispensados do trabalho material. Esses especialistas serão responsáveis por
produzir, gerenciar e distribuir os bens religiosos, ou em outras palavras, produzir,
gerenciar e distribuir o capital religioso. Como qualquer capital, esse capital
religioso depende da demanda religiosa e da oferta religiosa (Ibid., p.57). Se
demanda e oferta, é porque existem consumidores e estes são os “leigos”.
Destituídos de capital religioso e ignorantes de sua própria destituição, os leigos
precisam se encarregar do trabalho material e prover sustento “espiritual” para os
produtores de bens religiosos. Essas relações entre os especialistas religiosos
(produtores de bens religiosos e os detentores do capital religioso) e os leigos
(consumidores de bens religiosos e destituídos de capital religioso) criam um
habitus e constituem o campo religioso. No entanto, esse campo religioso será
marcado por conflitos, uma vez que alguns leigos tentarão uma autoprodução de
bens religiosos desafiando o poder concentrado nas mãos dos especialistas. Essa
é uma primeira tensão observada dentro do campo. Uma segunda tensão pode
ser verificada entre os especialistas que se rivalizarão na tentativa de atender às
expectativas das demandas leigas. Para entender a essas tensões e à própria
dinâmica do campo religioso, é necessário examinar os diferentes tipos de
agentes religiosos e suas relações com os “leigos” organizados em diferentes
grupos e classes sociais (OLIVEIRA, 2003, p.186).
Valendo-se da tipologia weberiana, Bourdieu classifica os agentes religiosos
como sacerdotes, profetas e magos.
O sacerdote é o agente da continuidade, da burocracia religiosa; ele procura
manter a religião estabelecida, a ordem instituída doutrinando os fiéis e cumprindo
fielmente os ritos praticados por esse grupo religioso. O sacerdote tem como área
de atuação a igreja. Ele não deve criar nada novo, ele deve reproduzir e perenizar
93
um sistema de crenças e ritos sagrados. Tudo o que fugir dessa ordem tradicional,
conservadora deve ser rotulado como “pecado”.
O profeta, por sua vez, é o agente da descontinuidade, que, em momentos de
crise, portanto, em situações extraordinárias, produzirá, através de seu discurso
ou de sua atuação prática, uma nova concepção religiosa. O profeta é legitimado
pelo carisma que lhe é socialmente atribuído. O profeta pode surgir dentro de uma
organização religiosa estabelecida (igreja), mas essa figura do profeta será
combatida pelo corpo sacerdotal, levando o profeta e seus seguidores a criar um
movimento cismático, criar uma nova seita. É interessante perceber que a morte
do profeta abrirá a possibilidade de seu carisma ser apropriado pelos discípulos
mais próximos, que tentarão dar continuidade à obra iniciada pelo profeta,
gerando um grau de institucionalização que desembocará num novo quadro de
sacerdotes, por isso todo movimento sectário acaba se organizando numa nova
igreja, que, no futuro, será objeto de contestação de novos profetas, num processo
histórico-social interminável.
O mago é o agente religioso prestador de serviços sagrados que atua de forma
autônoma, valendo-se dos bens simbólicos produzidos por sacerdotes e profetas.
Ele não se vincula a uma igreja ou a uma seita, ele não cria uma comunidade,
mas sim uma clientela. A tendência é que o mago seja combatido tanto pelo
sacerdote, como pelo profeta, que consideram que a magia realiza uma
apropriação indevida dos bens religiosos.
Interessante perceber que todas as ações desses agentes religiosos têm como
alvo o grupo social dos leigos, que se vêem nesse emaranhado de ofertas
religiosas. Essas relações de concorrência interna, de demandas e ofertas
religiosas constituem o campo religioso.
“Essas relações de transação ligam os diferentes agentes especializados a grupos
ou classes sociais com diferentes interesses objetivos. Numa sociedade de
classes, encontraremos aí as classes dominantes, que pedem à religião que
legitime sua dominação e seu bem-estar material, bem como as classes
dominadas, que pedem à religião a esperança de libertar-se de sua opressão, ou,
ao menos, uma forma de compensação (agora sofreremos, mas no futuro
94
gozaremos). No cruzamento dessas duas relações reside a lógica do campo
religioso: agentes especializados competindo entre si para conquistar o monopólio
do atendimento às demandas das diferentes classes de ‘leigos’ e, assim assegurar
sua existência material”. (Ibid., p.190).
95
2.5 Aplicando a Teoria de Campo Religioso na Organização da
Igreja Internacional da Graça de Deus
Em 2006, o movimento pentecostal completou cem anos. Nascido no subúrbio
de Los Angeles, esse movimento chega ao Brasil, por volta de 1910, estrutura-se,
multiplica-se e desemboca no movimento neopentecostal. O movimento
pentecostal no Brasil, com suas três ondas, por si é um campo religioso, no
entanto, nesse trabalho o recorte teórico recai na Igreja Internacional da Graça de
Deus, reconhecendo que ali também um campo religioso. Nessa etapa do
trabalho, serão analisados alguns aspectos do nascimento e da organização da
igreja acima mencionada na tentativa de enquadrá-los na teoria de campo
religioso desenvolvida por Pierre Bourdieu.
O missionário RR Soares é um líder carismático que tem um histórico de
rompimentos com as estruturas tradicionais. Soares era no início um profeta no
sentido weberiano:
“Por ‘profeta’ queremos entender aqui o portador de um carisma puramente
pessoal, o qual, em virtude de sua missão, anuncia uma doutrina religiosa ou um
mandamento divino. Não queremos distinguir fundamentalmente entre o profeta
que anuncia de novo uma revelação antiga (de fato ou suposta) e aquele que
reivindica para si uma revelação totalmente nova, isto é, entre o renovador’ e o
‘fundador’ de uma religião. Ambas as coisas podem estar entrelaçadas...”.
(WEBER, 2004, p.303)
Convertido aos 06 anos de idade na Igreja Presbiteriana de Muniz Freire no
Espírito Santo. Logo em seguida foi para a Igreja Batista ficando lá até os 16 anos,
quando mudou-se para o Rio de Janeiro. Em 1968 ingressou na igreja Nova Vida,
ali casou-se e aprendeu os rudimentos do movimento neopentecostal, do qual ele
96
seria um dos iniciadores. Em 1975, foi consagrado pastor na igreja Casa da
Bênção e juntamente com Edir Macedo, Roberto Lopes e os irmãos Samuel e
Fidélis Coutinho fundaram a igreja Cruzada do Caminho Eterno. Graças a
desentendimentos com os irmãos Coutinho, no ano seguinte, juntamente com seu
cunhado Edir Macedo e Roberto Lopes, fundaram a Igreja da Bênção que em
1977 teve seu nome alterado para Universal do Reino Deus. Percebe-se
fortemente o movimento da ruptura, do cisma, em todos esses homens citados,
eles não enquadram-se na figura de sacerdotes, eles são profetas que têm um
projeto de descontinuidade, seus carismas falam mais alto que burocracia
religiosa, a continuidade ordinária. Nesse momento inicial, RR Soares era o
grande líder da Universal e seu principal pregador. Inclusive em entrevista à
revista Veja, RR Soares declarou que no começo da Universal, Edir Macedo fora
seu assistente. (ROMEIRO, p.53). Devido a impasses com outro líder carismático
muito forte (Edir Macedo), RR Soares sai da Universal e funda em 1980 a Igreja
Internacional da Graça. Ricardo Mariano registrou da seguinte forma esses
impasses:
“No princípio, o missionário Romildo Soares era o líder da Universal e seu
principal pregador. Sua liderança, contudo, logo começou a ser atropelada pelo
estilo autoritário e centralizador de Macedo, bem como por seu carisma,
dinamismo e pragmatismo. Soares aos poucos foi perdendo terreno no controle da
denominação para Macedo, seu cunhado, que adquiria crescente destaque entre
os fiéis e pastores da igreja por meio de um programa (alugado inicialmente com
doações de uma fiel curada na igreja) de 15 minutos que apresentava na Rádio
Metropolitana, do Rio. Em fins, dos anos 70, os dois chegaram a um impasse.
Macedo, então, para decidir qual deles permaneceria à frente da igreja, propôs
que a disputa se resolvesse por meio de votação do presbitério. Macedo venceu o
pleito. Soares, compensado financeiramente, desligou-se da Universal para
fundar, em 1980, nos mesmos moldes de sua antecessora imediata, a Igreja
Internacional da Graça”. (MARIANO, p.56)
Essa disputa entre esses dois líderes carismáticos, sem sombra de dúvidas, é
uma disputa pelo capital religioso. Essa é uma das tensões que ocorre no campo
97
religioso, onde os produtores de bens religiosos rivalizam-se na expectativa de
atender às demandas dos leigos. Da costela da Universal nasceu a Internacional
da Graça de Deus, falando para o mesmo público e usando as mesmas táticas.
Como um profeta bem-sucedido, apesar do desentendimento com outro grande
profeta, Soares caminha para a organização de sua própria comunidade, sua
própria congregação. Esse é o processo natural para profeta marcado pelos
históricos de rupturas. Ele rompe e organiza sua própria instituição.
“...quando e onde possível, [os administradores de culto, ou profetas precisam]
passar para a formação de uma congregação, isto é, de uma relação associativa
duradoura entre os adeptos, com direitos e deveres fixos. A transformação da
adesão pessoal de uma congregação constitui, portanto, a forma normal em que o
ensino dos profetas entra na vida cotidiana, como função de uma instituição
permanente”. (WEBER, 2004, p.p.311-312)
É lógico que o carisma de profeta tem que ter sido aflorado, porque se não o
novo empreendimento não dará certo. Por que Soares conseguiu romper com
Macedo e constituir a sua própria congregação religiosa? Porque ele foi um
profeta bem-sucedido. Ele reuniu em torno de si um séqüito de discípulos.
“O profeta, quando sua profecia tem êxito, atrai acólitos permanentes,... os quais
em oposição aos sacerdotes e adivinhos que se encontram numa relação
associativa estamental ou hierárquica, de cargo, juntam-se a ele de modo
puramente pessoal. [...] E ao lado desses acólitos permanentes, que colaboram
ativamente em sua missão, na maioria das vezes também carismaticamente
qualificados de alguma forma, existe o círculo de adeptos que o apóiam com
alojamento, dinheiro e serviços, e esperam de sua missão a salvação”. (WEBER,
2004, p.310)
98
Com um grupo de acólitos permanentes, com uma leva de apoiadores dando
suporte econômico, Soares organiza a sua igreja e vai, pouco a pouco, assumindo
a forma de sacerdote. Com uma liderança personalista, “o missionário” como é
chamado, lidera uma organização religiosa e midiática de sucesso. Tudo passa
por seu crivo, nada se faz sem o aval do missionário (idem, p.65). Na figura de
sacerdote, RR Soares tem que lutar pela manutenção da ordem; tem que
reproduzir e perenizar um sistema de crenças e ritos sagrados e precisa zelar pela
organização da classe sacerdotal. Na Igreja Internacional da Graça de Deus, o
corpo sacerdotal é constituído por homens e mulheres que são inicialmente
observados pelo pastor da igreja local. Quando uma pessoa é escolhida, mediante
observação desse pastor local e da revelação de Deus, torna-se então, um obreiro
voluntário (faz limpeza do salão, distribui literatura usada no culto, prepara
cafezinho, etc), executando bem essas tarefas, o obreiro será convidado a
abandonar suas atividades profissionais para se dedicar exclusivamente às
atividades da igreja, recebendo uma pequena ajuda de custo. É um período de
privações e de testes para verificar a fidelidade do obreiro, nesse período ele tem
que viver única e exclusivamente pela fé. Tendo o obreiro sua vocação
confirmada, torna-se um evangelista (este dirige reuniões e prega) e, se
continuar fiel, será indicado para a ordenação ao ministério pastoral, tornando-se
então, um pastor. Vale ressaltar que na Igreja Internacional da Graça de Deus
somente o missionário RR Soares tem autonomia para ordenar alguém ao
pastorado (idem, p.67). E é interessante perceber que poucos pastores
ordenados nessa igreja, pois o missionário leva ario a recomendação do
apóstolo Paulo, registrada em 1Tm 5.22 – “A ninguém imponhas precipitadamente
as mãos”. A hierarquização do corpo sacerdotal na Igreja Internacional da Graça
de Deus é a seguinte: obreiro voluntário, obreiro, evangelista e pastor. Acima de
todos eles, comandando a classe sacerdotal, o missionário RR Soares.
Outro elemento que aponta para a burocratização do serviço sacerdotal é que
alguns anos foi criada a AGRADE (Academia Teológica da Graça de Deus),
onde a classe sacerdotal da Igreja Internacional da Graça de Deus recebe
formação teológica, afinal de contas é necessário preservar aquilo que foi
99
construído. A AGRADE é uma instituição que, apesar de ser anunciada como uma
instituição teológica que forma pastores para a IIGD e de arvorar-se de possuir
várias extensões em todo o Brasil, na verdade e na prática ela não funciona tão
bem assim. O currículo teológico da AGRADE apresenta matérias como, por
exemplo, “Histórias do Missionário RR Soares”, e outras tão estranhas, quanto
essa, que de alguma forma maculam a imagem de uma instituição que pretende
ser minimamente acadêmica. Apesar de apresentar no seu quadro docente
professores com um nível aparentemente bom no que concerne à formação
acadêmica, estes são apresentados como baluartes de um conhecimento
instituído, que na prática não pode ser aplicado devido às limitações teológicas
impostas pela liderança sacerdotal. No site da AGRADE anuncia-se que
extensões da AGRADE, em sua maioria no interior de São Paulo e os endereços
indicados são os das próprias igrejas. Somente para citar como exemplo, o
endereço da AGRADE em Campinas é o mesmo de funcionamento da Igreja, e
para quem conhece as acomodações da IIGD em Campinas sabe que não
infra-estrutura para acomodar uma instituição de ensino naquele local. Esse
fenômeno ocorre em outros lugares de funcionamento da AGRADE. O que se
percebe é essa preocupação em apresentar-se como uma instituição que forma
seus quadros dentro de uma lógica minimamente acadêmica é mais uma jogada
de marketing ou uma resposta à demanda de um mercado religioso evangélico
que está em expansão nesse segmento de criação de cursos teológicos. Jogada
de marketing ou resposta mercadológica, o fato é que criação da AGRADE
corrobora a idéia de uma preocupação: criar uma infra-estrutura burocrática de
serviço sacerdotal, caracterizando bem a atual fase de Soares, como um
sacerdote que pretende manter os bens simbólicos criados dentro de seu campo
religioso.
Soares perpassou por essas duas funções: ele foi profeta e rompeu com as
estruturas vigentes dentro do universo protestante onde foi criado e depois tornou-
se um sacerdote da nova igreja que fundou e que procura manter. Como Weber
bem aponta,
100
“A profecia e o sacerdócio o os dois portadores da sistematização e
racionalização da ética religiosa. Além disso, tem grande importância... a
influência daqueles sobre os quais, os profetas e os sacerdotes procuram influir
eticamente: ‘os leigos’”. (WEBER, 2004, p.303)
A profecia e o sacerdócio estão intimamente ligados ao ambiente de uma
religiosidade racionalizada, sistematizada e ética, entendida aqui, principalmente
como uma ética basilar, como um elemento central que determina, corrobora ou
funciona como testemunho de uma salvação religiosa.
Num ambiente assim, de religiosidade racionalizada parece não haver lugar
para a magia. No entanto, o que se pode perceber é que esses agentes religiosos
(sacerdote, profeta e mago), que atuam no campo podem transitar entre as
funções. Vale lembrar que esses conceitos foram desenvolvidos inicialmente por
Weber, que não os tomava como conceitos estanques, mas previa uma relação,
um intercâmbio entre os mesmos. Por isso, é possível entender que um único líder
assuma ora uma função, ora outra função. Em outras palavras, um profeta, pode
vir a ser um sacerdote e agir de maneira tal, que sua ão possa ser enquadrada
como um ato mágico. O líder carismático pode ser profeta, sacerdote e,
simultaneamente aos dois, ser um mago. Por isso, pode-se dizer que Soares foi
profeta, tornou-se sacerdote devido às demandas institucionais e em momentos
específicos de sua prática cúltica, assume a função de mago.
Soares também pode ser definido como um mago. Nesse caso, apesar de
estar vinculado a uma igreja, ele age no serviço religioso com os fiéis, como se
estes fossem clientes. Não no trabalho de Soares, aquilo que ficou
caracterizado no meio do protestantismo histórico como o serviço pastoral. Sua
relação com os freqüentadores da IIGD é uma relação, mago-feiticeiro, que
oferece serviços para uma clientela sedenta.
Como um free-lancer do sagrado, Soares não oferece disponibilidade de tempo
para atendimento pastoral para seus fiéis. Não há esse tipo de trabalho na agenda
de Soares. Esse trabalho cabe aos religiosos de escalões menores.
101
Soares nunca usou o título de pastor, que dentro da cosmovisão do
protestantismo, seja ele de cunho histórico ou pentecostal, a idéia de uma
pessoa que exerce uma função numa comunidade local, e relaciona-se com as
pessoas dessa comunidade enfrenta com elas as agruras da vida e as labutas da
existência.
Ele sempre usou o título de Missionário, tomando como referência as imagens
bíblicas de pregadores itinerantes, que não se fixavam numa determinada
comunidade, mas cumpriam o papel de propagar a mensagem das boas-novas.
Seu aparecimento num culto ou numa reunião especial (culto da libertação,
festa do céu, dia da Decisão) sempre é marcado por uma grande expectativa, e
nunca ele cumpre o papel de ter uma relação corpo-a-corpo com os fiéis. Ele
simplesmente aparece, “ministra as curas, dirige a solenidade, “administra” as
bênçãos, verifica os resultados (testemunhos que dão credibilidade ao seu
discurso religioso) e retira-se protegido por seguranças.
Estes são alguns poucos elementos, que comprovam a aplicabilidade da teoria
de campo religioso de Pierre Bourdieu no universo pentecostal brasileiro. Essa
teoria do campo religioso é uma excelente ferramenta para estudar o fenômeno
religioso pentecostal no Brasil.
102
2.6 As influências literárias e teológicas do Missionário
Romildo Ribeiro Soares conhece a religião dentro do protestantismo histórico,
mas encontra-se de fato, teologicamente e doutrinariamente, quando teve acesso
ao material do missionário TL Osborn (1923), nos idos anos da década de 60 do
século XX. Além de Osborn, outros “mestres” orientam o pensamento teológico e
doutrinário de Soares. São eles Kenneth Hagin e, atualmente, uma pastora
americana chamada Joyce Meyer. Todos eles possuem muitos livros traduzidos e
publicados no Brasil pela Graça Editorial, empresa ligada ao império midiático da
IIGD. Osborn é um importante representante da chamada Teologia da
Prosperidade e da Confissão Positiva.
i
Tommy Lee Osborn, (1923). O Dr. T.L.
Osborn, como é conhecido, é definido no meio pentecostal como um grande
evangelista mundial. Osborn tem como fundamento os princípios da Teologia da
Prosperidade e a Confissão Positiva, por isso sua atividade em mais de 70 países
ao redor do mundo sempre foi marcada por exorcismos e supostas curas. Não é
por acaso que seu livro mais famoso, que, ao ser lido por RR Soares, mudou
radicalmente a vida deste, é intitulado: Curai enfermos e Expulsai demônios. Este
livro é um bestseller, que desde 1951 já vendeu mais de um milhão de cópias.
Osborn é um lídimo representante da Teologia da Prosperidade e da Confissão
Positiva. Para entender um pouco melhor essa teologia e suas marcas principais,
é necessário mapeá-la em seu nascedouro e como esta alcança as igrejas
pentecostais no Brasil.
As primeiras igrejas pentecostais no Brasil, a aderirem a essa teologia, foram
aquelas que convencionou-se, denominar de “neopentecostais”. Essas igrejas
representam alguma continuidade do pentecostalismo de primeira e segunda
geração, mas trazem algo novo para o cenário religioso brasileiro, a saber, a
Teologia da Prosperidade. Importada dos EUA; essa corrente teológica é
103
chamada de diversas formas, entre as quais: Health and Wealth Gospel, Faith
Movement, Faith Prosperity Doctrines, Positive Confession.
Esse movimento que apregoa cura, prosperidade e poder da fé surgiu nos
Estados Unidos na cada de 40 e somente nos anos 70 ganhou forte impulso
nos arraiais evangélicos norte-americanos. O Dictionary Of Pentecostal And
Charismatic Movements, o define da seguinte maneira:
“Confissão positiva é um tulo alternativo para a teologia da fórmula da ou da
doutrina da prosperidade promulgada por vários televangelistas contemporâneos,
sob a liderança e inspiração de Essek William Kenyon. A expressão ‘confissão
positiva’ pode ser legitimamente interpretada de várias maneiras. O mais
significativo de tudo é que a expressão “confissão positiva” se refere literalmente a
trazer à existência o que declaramos com nossa boca, uma vez que a é uma
confissão”. Dictionary Of Pentecostal And Charismatic Movements. In:
Supercrentes: O Evangelho Segundo Kenneth Hagin, Valnice Milhomens e os
Profetas da Prosperidade. São Paulo, Mundo Cristão, 1993, p.06.
Contudo, apesar de iniciada por Essek Kenyon, o maior propagador dessa
“doutrina” foi um pastor norte-americano chamado Kenneth Hagin que iniciou sua
trajetória ministerial na Igreja Batista, passando posteriormente para a Assembléia
de Deus até tornar-se um evangelista itinerante, que em 1974 fundou juntamente
com seu filho Ken Jr., em Oklahoma, Rhema Bible Training Center, quartel general
e centro de formação, discipulado e treinamento de novas lideranças da confissão
positiva, ou como é chamada popularmente, Teologia da Prosperidade.
No Brasil, a Teologia da Prosperidade ganha penetração também no final da
década de 60, início da década de 70 e começou a influenciar diversas igrejas e
ministérios paraeclesiásticos, em especial: Internacional da Graça, Universal do
Reino de Deus, Renascer em Cristo, Comunidade Evangélica Sara Nossa Terra,
Nova Vida, Bíblica da Paz, Cristo Salva, Cristo Vive, Verbo da Vida, Nacional do
Senhor Jesus Cristo, Adhonep, CCHN, Missão Shekinah (MARIANO, 1999).
Pode-se dizer sem sombra de dúvidas que a Teologia da Prosperidade veio
subverter de forma radical alguns pilares da doutrina cristã no decurso histórico.
104
Para os defensores da Teologia da Prosperidade não espaço mais para o
sofrimento e as privações neste mundo. O velho ascetismo cristão, tão propalado
nos meios puritanos dos séculos XVI e XVII e no pentecostalismo clássico
brasileiro do início do século XX, cedeu espaço para a prosperidade material,
enaltecendo o bem-estar do cristão neste mundo. Pode-se perceber isso na fala
de um dos mais consagrados expoentes
dessa corrente doutrinária no Brasil, o
missionário Romildo Ribeiro Soares, mais conhecido como RR Soares, da Igreja
Internacional da Graça de Deus:
“Uma grande revolução está ocorrendo no meio do povo de Deus. Antigamente
era ensinado que para uma pessoa agradar ao Senhor, ela deveria ser pobre e
passar privações (...) Hoje milhares de filhos de Deus que estão começando a
tomar posse da herança que temos em Cristo Jesus. Por todos os lados vemos
pessoas contar os mais lindos testemunhos de prosperidade (...) A prosperidade
depende de você (...) Se você ousar crer em Deus e assumir a sua posição na
Palavra de Deus, determinando a sua prosperidade, assim será”. (Ibid, p.159).
Outro grande profeta da Teologia da Prosperidade, o Bispo Edir Macedo disse o
seguinte, em algumas situações registradas pelo professor Leonildo Campos:
“Nunca teremos suficiente nas promessas de Deus para possuir o que
pretendemos, enquanto nossos lábios estiverem confessando derrotas (...) Para o
cristão não existe ‘não posso’, nem o isso é difícil’. Não, não é não. Você pode
todas as coisas se crer assim, Tudo posso naquele que me fortalece’. Filipenses
4.13, deve ser o seu lema.
O homem foi colocado na Terra para viver em abundância, sobre fartura e a
prosperidade. Adão não tinha escassez de água, nem alimentos, e nem precisava
levar Eva sua mulher ao médico. Eles eram perfeitos e gozavam da perfeição de
Deus, sem que lhes faltasse absolutamente nada”. (CAMPOS, 1999, p.p.366-367).
105
Como se pode perceber para os defensores da Teologia da Prosperidade, o
importante neste mundo é tomar posse das bênçãos que Deus destinou aos seus
filhos através da vitória de Cristo Jesus e estes filhos de Deus estão destinados à
prosperidade, à saúde, à vitória e à felicidade.
Além de Osborn e Hagin, a pastora Joyce Meyer - também representante da
Teologia da Prosperidade e da Confissão Positiva influencia atualmente o
ministério de Soares no Brasil. vários livros dela publicados pela Graça
Editorial. Um pequeno histórico sobre, Joyce Meyer:
“...Joyce já escreveu mais de 70 livros e faz aproximadamente 20 conferências por
ano. Contando com o apoio de 8 escritórios: EUA, Austrália, Canadá, Brasil,
Inglaterra, Índia, Rússia e África do Sul; em 2004, quase 2,5 milhões de cópias de
seus livros foram vendidos, e mais de 1 milhão foram doados em todo o mundo.
Seu programa de televisão Desfrutando a Vida Diária é transmitido para uma
audiência potencial de mais de 2/3 do globo terrestre, e seu programa de dio é
veiculado em centenas de estações no mundo”. Ministério Joyce Meyer:
Disponível em: http://www.joycemeyer.com.br/jmbrasil/>Acesso: 22/03/08.
Além dessas informações, seu site oferece informações sobre seu credo
religioso, onde pode-se perceber sua atuação no universo neopentecostal:
O Batismo com o Espírito Santo: O batismo com o Espírito Santo e com o fogo
é um presente de Deus. Foi prometido por Jesus Cristo àqueles que são crentes
em seu poder e têm recebido o novo nascimento. Ele ajuda o crente dando poder
para desenvolver o caráter de Cristo e para viver todos os dias conforme o desejo
de Deus. Esta experiência é acompanhada pela evidência inicial de falar em
outras línguas, segundo o Espírito Santo. (Mateus 3:11; João 14:16-17; Atos 1:8;
Atos 2:38-39; Atos 19:1-7; Atos 2:4). A Cura Divina: A Cura divina está ativa na
vida das pessoas hoje através de Jesus, que é o Curador, mediante a oração de
fé e a imposição das mãos. É um privilégio de cada membro da igreja de hoje e só
106
pode ocorrer através de Jesus Cristo. A cura pode ser física, mental, emocional
e/ou restauração espiritual etc. (Lucas 9:11; Mateus 9:35; Atos 10:38; Mateus
10:1; Marcos 16:18; Tiago 5:14-16; 1 Pedro 2:24; Mateus 8:17; Isaías 53:4-5)
Ministério Joyce Meyer: Disponível em:http://www.joycemeyer.com.br/jmbrasil/>Acesso:
22/03/08.
Esses “gurus” da teologia da prosperidade e da confissão positiva são
fundamentais para orientar toda a estrutura de pensamento e ação de Soares.
Seu primeiro mestre, o Bispo Robert McAlister, era um praticante dessas
modalidades religiosas; desde lá, na década de 60 do século XX, Soares somente
aprimorou sua prática.
107
2.7 Autor de Livros, Compositor de músicas e cantor
gospel
O Missionário RR Soares é um polivalente. Em seu universo midiático, ele
apresenta-se como escrito de livros, artigos para revista e para jornais, além disso,
existe uma vasta lista de músicas das quais ele aparece como compositor. Neste
tópico, a intenção de demonstrar como Soares usa muito essas mídias para
promover sua imagem como grande líder religioso. Essas mídias religiosas
visitadas por Soares garantem a ele uma inserção e uma aproximação de sua
clientela.
No campo da literatura religiosa, Soares é caracterizado por escrever
pequenos livretos, sem nenhuma profundidade teológica, mas que trata de
problemas do cotidiano das pessoas. Ele pode ser classificado como um escritor
de literatura ligeira de massas, como bem definiu Richard Hoogart. Essa literatura
é caracterizada como uma literatura de fácil assimilação e bem ao gosto e das
necessidades do público.
“Os autores de literatura ligeira de massas, essas máquinas de produção literária,
são figuras fascinantes e impressionantes. O mercado parece ser muito
competitivo e, para serem bem sucedidos, isto é, para ganharem bem a vida...,
esses autores têm de ter uma noção muito exata daquilo que o público quer. ...o
escritor pode ganhar com facilidade uma grande fortuna e uma reputação
duvidosa. Para tal, é necessário que o admirem: basta que gostem de suas obras.
A multidão crescente dos leitores e a constante ânsia de novidades que esses
leitores patenteiam assegura a venda de livros”. (HOOGART, 1975, p. 56-58)
108
Soares possui 28 livros publicados pela sua Editora e os assuntos são todos
relacionados ao seu espectro teológico, ou seja, a Teologia da Prosperidade e da
Confissão Positiva.
Sobre a Confissão Positiva, Soares em um de seus muitos livros oferece uma
definição muito interessante.
“A pessoa que tem em sua boca a confissão correta sempre se distingue das
demais. Está constantemente alegre, tem sempre uma solução para os
problemas. Para ela, nunca ‘tempo ruim’, nunca é tarde demais. Essa pessoa
tem Deus em sua vida e prova que realmente ama ao Senhor. A confissão correta
é aquela que sai dos lábios de quem vive a Palavra e conhece os seus direitos em
Cristo. Esse desfruta a vida abundante que Jesus veio dar-nos, pois faz da
Palavra de Deus o Senhor e o Pastor da sua vida. O Senhor é o meu pastor nada
me faltará, Salmo 23.1. Quem faz a confissão certa jamais sofre falta de qualquer
coisa, pois tem no Senhor o pastor da sua vida. Quem confessa o que é em
Cristo, acrescenta sempre sucesso, força, saúde, prosperidade e paz à sua vida.
Em qualquer empreendimento essa vence e será sempre procurado pelas demais,
pois tem o ‘segredo’ de fazer as coisas funcionarem. Se você deseja ser uma
pessoa de sucesso em todos os setores, tenha a confissão correta. Comece a
partir de agora a mudar o seu modo de falar. Observe quão negativo tem sido o
seu discurso e comece a baseá-lo nas Escrituras. Nunca declare dúvidas,
doenças ou qualquer outro mal”. (SOARES, 2001,p.p.59-60).
Soares explicita sua crença na confissão positiva em quase todos os seus
livros e também nos seus sermões. Os títulos dos livros também expressam a
crença na confissão positiva. Além de valer-se dos livros, Soares aproveita ainda
seus sermões gravados em CDs que são enviados juntamente com os livros. Ele
procura com isso, passar a imagem de um servo trabalhador, afadigado nos
afazeres religiosos. Eis as obras elencadas:
“Kit Mensagens Clássicas + CDs:Promoção CDs Mensagens Clássicas + Livro
Com 12 Lições de Perguntas e Respostas.:::// Kit Curso - Livro + CDs:
Promoção CDs do Curso + Livro Com 12 Lições de Perguntas e Respostas.::://
Curso - 12 lições com Perguntas e Respostas: Neste curso, você deixará de
109
praticar a que é atribuída à sorte, para praticar a fé real e entender o que
realmente é crer em Deus.:::// Considerai-vos como mortos: O segredo de uma
vida de vitórias é considerar-se morto para o pecado. Mas lembre-se: morra
apenas para o pecado e viva para o Senhor Jesus.
:::// Os Segredos para a Vitória: Esse livro fornece os segredos para você ser um
Vencedor.
:::// Medo - Feche esta porta: O medo serve como porta de entrada para todos os
males. Nesse livro, você aprenderá a ser destemido diante dos problemas.
:::// Vencer, o que, onde e como?: Nesse livro, será possível encontar passos
importantes e seguros que, se seguidos, transformarão você em um vencedor.
:::// As bênçãos que enriquecem: Nesse livro, você terá um estudo sério sobre
dízimos e ofertas, e exemplos de pessoas que provaram a Deus. A saúde
depende do que você fala
Aprenda como fazer das suas palavras uma bênção produtiva. As suas palavras
ditarão o que você terá na vida:::// Os três estágios da benção: Em Os três
estágios da bênção, você saberá como proceder para tomar posse daquilo que
lhe pertence.:::// O direito de desfrutar saúde: A saúde é uma das bênçãos
conquistadas por Jesus para os cristãos. O preço foi pago para que tenhamos
uma vida saudável.
:::// A criação dos filhos: um propósito divino em cada criança que vem ao
mundo. Cabe a nós, cristãos, saber educar a nossa herança dentro dos padrões
bíblicos.:::// Meu livro de esboços: Use esse livro-caderno para fazer suas
anotações sobre a pregação das reuniões de sua igreja e utilizá-las em futuros
estudos. :::// Sete virtudes do vencedor
Descubra as sete qualidades necessárias aos crentes para que se tornem
verdadeiros reis em vida.:::// Ganhar almas: Ganhar almas é a suprema missão da
Igreja. Nesse livro, você verá que é possível cumprir essa tarefa, e que a sua
participação é imprescindível.
:::// Resgate dos filhos de Deus: Nesse livro, você descobrirá como desfrutar das
delícias que Deus preparou para que seus filhos vivessem como reis. Manual do
evangelismo
Ao seguir as orientações apresentadas nesse livro, você ficará sabendo onde,
como e quando falar de Cristo a alguém. :::// Morte- para onde iremos?
O que é a morte? Por que temos que morrer? Precisamos ter medo da morte?
Nesse livro, você encontrará as respostas bíblicas para essas e outras perguntas.
:::// Arrepender-se para não cair: As quedas de Pedro são um alerta para todos os
cristãos. Aprenda como zelar pela sua lealdade ao Senhor.:::// Grudar-se em
Jesus para vencer
Nesse livro, você aprenderá como caminhar com Jesus para vencer as batalhas e
viver no mais alto nível.:::// Enéias, Jesus Cristo te saúde
Enéias é o retrato da maioria do povo de Deus: doente, embora cristão. Descubra
que Jesus Cristo também lhe saúde!:::// Os profetas das grandes religiões
Descubra, por meio desse livro, os enganos e as contradições satânicas
existentes nas maiores religiões :::// Exija seus direitos: Como ter, usar e desfrutar
de tudo o que Cristo conquistou é um desafio que está à frente do cristão.::://
Onde está Deus, que me fez?: É tão importante crermos em Deus que isso é
condição básica para que vejamos Sua glória. :::// Presente-a dádiva que abençoa
110
quem o dá: Nesse livro, você descobrirá a chave para ter todas as suas petições
atendidas e a viria sobre situações aparentemente irreversíveis.
:::// A importância de crer: É tão importante crermos em Deus que isso é condição
básica para que vejamos Sua glória.:::// Como tomar posse da bênção
Você é quem decide o que terá ou não. Aprenda a tomar posse das maravilhas
que Deus já nos preparou.:::// Espiritismo a magia do engano: Esse livro desvenda
como os espíritos malignos atuam por meio do espiritismo, e ensina como vencê-
los”.
E esses livros produzidos por Soares ganham novas edições, são
apresentados com novas capas e com uma estratégia nova para continuar
fazendo sucesso entre o seu público. Geralmente esses livros não são caros, eles
têm um preço bem acessível para o padrão financeiro dos freqüentadores da IIGD.
Uma pergunta se coloca de forma espontânea, quando se tem acesso a
número excessivo de livros publicados, principalmente quando se sabe das
atividades intensas que o escritor executa em sua vida diária, como é o caso de
Soares. Qual é o segredo?
Novamente, Hoogart é importante aqui.
“Obras como essas, [são] caracterizadas por um tal conhecimento daquilo que o
leitor quer, não são construções intelectuais. Essas obras são produzidas por
pessoas dotadas de determinadas qualidades em grau superior àquele que
caracteriza os seus leitores, mas que partilham da mesma ética. ‘Toda cultura vive
no interior do seu próprio sonho’, e esses autores vivem o sonho da sua cultura.
Publicam grande número de livros todos os anos, porque não passam pelas fases
evolutivas que os escritores sérios atravessam, as quais se traduzem em
mudança de estilo; os autores em questão escrevem, porém de maneira semi-
automática”. (HOOGART, 1975, p.58)
Alguns de seus livros o traduzidos para vários idiomas, como árabe, inglês,
espanhol e francês. É o caso do livro, Como Tomar Posse da Bênção, que
recebeu traduções para mais quatro idiomas, além do Português. O interessante é
111
que o livro usa a mesma capa em todas as traduções, e isso explica-se pelo fato
de que Soares pretende imprimir a imagem da capa do livro como um elemento
que comunica algo, no caso, a polivalência e poder de penetração do autor. Essa
proposta de repetir a mesma capa em todas as traduções pode ser compreendida
como um “meio quente”, como dizia McLuhan, e nesse caso em especial, o meio
de fato é a mensagem. A capa traz um homem levantando bengalas e o título do
livro é, Como Tomar Posse da Bênção, nada mais sugestivo, pois o que importa
no meio como mensagem é o efeito mental imediato dos meios de comunicação e
não as mensagens que veiculam (SANTOS, 2003, p.101).
112
Outro livro que também foi traduzido para vários idiomas é uma obra dedicada
113
à criação de filhos, intitulado: Como Criar os Filhos, traduzido para o Espanhol e
para o Árabe. De igual modo, a capa também é sugestiva, apresentando crianças
felizes numa paisagem bucólica. Novamente, o fenômeno das capas iguais se
repete.
114
Soares adota atitudes aparentemente ingênuas, ou como poderiam pensar
alguns, que essas medidas seriam para contenção de despesas, que uma capa
serve para todas as edições nas mais variadas línguas. Mas, não é isso que está
em jogo.
A Doutora Karina Bellotti, ao estudar o uso de imagens no universo infantil,
citou com propriedade o pensamento de David Morgan, que estudou o uso de
imagens no proselitismo protestante do século XIX. Ele diz:
115
“Tanto naquela época como agora, imagens complementam práticas rituais e
ajudam a formação da memória porque, segundo neurolinguístas, uma grande
porção (40 por cento) das fibras que ligam o sistema nervoso central ao mundo
físico são dedicados a transmitir estímulos visuais” (BELLOTTI, 2005, p.121)
O fenômeno das capas repetidas na divulgação dos livros de Soares não se
trata de contenção de despesas, mas de criar, pelo menos naqueles que
conhecem o material publicado por Soares, a idéia de que o autor conseguiu
transpor os limites nacionais e emplacou suas obras, todas com o mesmo formato
e capa em outros lugares do mundo. É a vitória do conceito de “missão”, tão caro
e expressivo no meio religioso evangélico. Soares é de fato muito astuto em sua
prática como escritor, pode não ser tão bom e nem tão profundo em suas obras,
mas, com certeza, é muito perspicaz.
116
CAPÍTULO 3
3. AS MÍDIAS DA INTERNACIONAL DA GRAÇA A
ALDEIA GLOBAL DE RR SOARES
A expressão usada no título desse capítulo Aldeia Global é extraída de um
pensador de comunicação do século XX, Herbert Marshall McLuhan. Não é
possível entender a modernidade sem compreender as estruturas midiáticas que
fazem parte dela. E para compreender as várias mídias existentes é necessário
apropriar-se dos referenciais teóricos desenvolvidos na tentativa de estruturar o
campo da comunicação.
Com a modernidade e as conquistas advindas desta, os seres humanos
conheceram grandes avanços e novas possibilidades de comunicação. A
dominação da Natureza possibilitou aos seres humanos experimentar coisas
nunca antes vistas. O progresso havia chegado e impunha ajustamentos,
adaptações, revisões, reformulações e mudanças constantes em todas as áreas
do saber e em todos os comportamentos humanos, fossem eles éticos, políticos,
econômicos ou religiosos. Também com o advento da modernidade no ocidente, a
religião teve inúmeros benefícios, como, por exemplo, a possibilidade de escolha
no que concerne à crença que melhor se adapta às expectativas de seus
participantes. Ocorreu o fim do monopólio religioso, mas a religião também teve
inúmeros desafios, significativas contendas e grandes demandas. Para
compreender a religião, num mundo marcado pela secularização e pelo
desencantamento, é necessário fazer um trabalho de grande investigação, pois a
impressão que se tem é que a velocidade de transformação imposta pelas
117
conquistas tecnológicas foi compreendida pelo campo religioso que responde de
maneira pida a essas demandas da modernidade. Fundamentadas na
experiência individual e emocional, a religião criou um novo ethos religioso; criou
novas formas de expressões religiosas e adaptou-se a esse admirável mundo
novo. A religião é um campo que apesar de reveses com a modernidade i
encontrar numa das grandes conquistas desta, a saber, a mídia, uma forma
interessantíssima de responder às demandas impostas a ela.
A mídia, por sua vez, ganha um forte impulso no início do século XX, por
ocasião da Primeira Guerra Mundial (1914-1918). O final do século XIX havia sido
marcado pela idéia de uma era do progresso, em que havia vários filantropos
25
no
mundo, investindo verdadeiras fortunas em campanhas pacifistas, tentando com
isso evitar um confronto, que ao mesmo tempo que parecia arrefecido por essas
campanhas realizadas, tornava-se cada vez mais presente em função dos fortes
investimentos que as grandes nações capitalistas faziam em suas estruturas
bélicas. Paralelo a tudo isso, ocorria um debate muito forte no ambiente da
sociologia clássica alemã entre Gemeinschaft (comunidade) e Gesellschaft
(sociedade).
Enquanto a Gemeinschaft pretende se estruturar na noção de grande família,
podendo se estender até às noções de nação e pátria, tendo por princípios os
valores herdados por tradição, sendo que seus membros seriam articulados
hierarquicamente de modo pretensamente orgânico e natural; a Gesellschaft,
tendo como protótipo a grande urbe, parte do princípio que os indivíduos agregam-
25
. Entre estes filantropos estava Alfred Nobel (1833-1890), que, frustrado com seu invento, a
dinamite, legou sua fortuna para a constituição do prêmio que leva o seu nome. ‘O total de minha
herança deverá ser dividido da seguinte maneira: o capital, investido em aplicações seguras por
meus executores, constituirá um fundo, cujos juros serão anualmente distribuídos em forma de
prêmios para aqueles que, no ano anterior, realizarem os maiores benefícios para a humanidade.
Esses juros serão divididos em cinco partes iguais, que serão distribuídas da seguinte maneira:
uma parte para a pessoa que fez a mais importante invenção no campo da física; uma parte para a
pessoa que fez a mais importante invenção no campo da química; uma parte para a pessoa que
fez a mais importante descoberta no campo da fisiologia ou medicina; uma parte para a pessoa
que produziu no campo da literatura a mais destacada obra de tendência idealista; e uma parte
para a pessoa que fez a maior ou a melhor obra pela fraternidade entre as nações, pela abolição
dos atuais exércitos e pela realização ou promoção de congressos pela paz... É o meu desejo
expresso que, na concessão dos prêmios, não seja dada nenhuma consideração à nacionalidade
do candidato, mas sim que o mais válido receba o prêmio, seja ele escandinavo ou não.
(CHASSOT, 1994, p.p.170-171).
118
se de modo mecânico e arbitrário, relacionando-se de forma impessoal e
contratual. A Gesellschaft era o princípio fundador daquilo que seria definido pelos
especialistas, como a sociedade de massa.
Esse debate entre comunidade e sociedade impôs-se de forma contundente no
contexto da Primeira Grande Guerra, pois, uma Gesellschaft dificilmente
mobilizaria os indivíduos para que se esforçassem de maneira impar no contexto
de uma guerra como aquela.
“As populações diferentes, heterogêneas e diversificadas das sociedades
industriais, contudo, não estavam unidas por aquele ‘sentimento recíproco,
aglutinador... que mantém seres humanos reunidos como membros de uma
totalidade’. Não eram essas sociedades Gemeinschaft, mas eram deveras mais
sociedades de massa, carecendo destes vínculos eficazes. No entanto, eram
justamente tais laços de sentimento que se faziam necessários para unir aquela
gente em solidariedade positiva por trás dos respectivos esforços de guerra. À
medida que cada país se comprometeu politicamente com a guerra, surgiu a
necessidade mais crítica e urgente de forjar elos sólidos entre o indivíduo e a
sociedade. Tornou-se essencial mobilizar sentimentos e lealdades, instalar nos
cidadãos ódio e medo contra o inimigo, manter elevado seu moral diante das
privações e captar-lhes energias em uma efetiva contribuição para sua nação. O
meio para alcançar estas metas urgentes foi a propaganda”. (DeFLEUR, 1993,
p.179)
É nesse contexto do início do século XX, que a mídia ganhará um impulso
gigantesco. E a religião não se tornará alheia às inovações midiáticas. Para
estudar o campo midiático da Igreja Internacional da Graça de Deus é necessário
valer-se de alguns referenciais de escolas teóricas de comunicação. Neste
trabalho usadas algumas idéias da escola teórica de Jesús Martín-Barbero, além
do referencial teórico do sociólogo Rodney Stark. Existem muitas mídias que
fazem parte da aldeia global do Missionário Soares, aqui foram escolhidas
algumas, que foram consideradas de maior relevância. Foram deixados de lado,
por exemplo, a Revista Graça Show da e o Jornal Show da Fé, que foram
119
usados ao longo da pesquisa, mas que não foram considerados de grande
relevância no que tange à uma análise sobre a importância midiática da IIGD.
Por exemplo, o Jornal Show da tem tiragem de 1 milhão e 700 mil
exemplares e é distribuído gratuitamente nos templos da Igreja Internacional da
Graça de Deus, espalhadas pelo Brasil. É um jornal mensal, e que possui sessões
fixas. Geralmente a capa traz uma imagem de um grande evento realizado no mês
anterior à circulação do jornal. Ele possui um editorial escrito sempre pelo
Missionário Soares, que traz informações religiosas, geralmente análises de
passagens bíblicas. Além disso, forte ênfase em testemunhos de cura, uma
sessão dedicada a oportunidades profissionais, dicas de saúde e uma intensa
propaganda das atividades da igreja.
A Revista Graça Show da tem uma tiragem de 180 mil exemplares, e ao
contrário do jornal é vendida e pode ser adquirida nos templos da Igreja
Internacional da Graça de Deus, ou mediante assinatura anual. É uma revista com
forte propaganda das atividades da igreja, com excelente acabamento. Tanto o
Jornal Show da , como a Revista Graça Show da , no fundo representam
uma extensão do que Soares e a IIGD realizam na televisão. Portanto, isso
justifica a não realização de análises aprofundadas sobre essas mídias da IIGD.
Contudo, serão analisadas outras mídias, como a RIT Rede Internacional de
Televisão e a Nossa TV, a Nossa Rádio, a Graça Music e o setor de mídia infantil
da Igreja Internacional da Graça de Deus; além do programa Show da Fé, que
representa um marco simbólico não só para a Igreja do Missionário Soares, como
também para os evangélicos de forma geral no Brasil.
120
3.1 Mídia Religiosa X Mídia “Religiosa” Secularizada. A
disputa entre A IIGD e a IURD na representação dos
Evangélicos
Quando se analisa o campo religioso brasileiro no que tange à tentativa das
igrejas de organizarem seus impérios midiáticos, é necessário entender quem, que
grupo, essas igrejas querem de fato, ter como clientes, ou seja, para quem essas
igrejas querem falar e transmitir seus valores e suas cosmovisões.
É claro que essas igrejas querem e pretendem agradar aqueles que já são fiéis
praticantes, mas pretendem também, comunicar-se com outros grupos,
penetrando em outros nichos sociais.
Esse dilema em ser dono de um império midiático que agrada e pratica os
valores fundamentais do grupo religioso do qual nasceu, e ao mesmo tempo
comunica-se e torna-se palatável para grupos que não compartilham dessa
cosmovisão religiosa é a grande tarefa a ser cumprida por um grupo midiático
religioso.
Quando se analisa o campo religioso brasileiro, percebe-se que dois
grandes modelos midiáticos religiosos.
Aqui se fala em modelos midiáticos, mas toma-se, para tal, somente o exemplo
das Redes de Televisão, tanto a Rede Record da IURD, como a RIT da IIGD
porque no Brasil os grupos midiáticos religiosos constroem seus impérios a partir
da aquisição de Redes de Televisão. É claro que exceções como a Igreja
Pentecostal Deus é Amor, que possui uma força midiática calcada no Rádio, mas
não se pode dizer que ela construiu um império midiático, ou seja, ela não está
preocupada com outras mídias, sua especialidade é o Rádio, e é este veículo que
a auxilia na comunicação com seus fiéis.
121
O primeiro deles é o modelo da IURD. Poder-se-ia dizer que essa igreja
consolidada enquanto denominação religiosa e detentora de um grande império
midiático, é o modelo de uma “mídia religiosa secularizada”.
O termo parece contraditório e talvez o seja, mas é o que melhor reflete o atual
estado da IURD em relação aos valores que ela representa e ao mesmo tempo
nega com sua maneira de conduzir suas mídias.
A IURD ganhou espaço e visibilidade junto à sociedade brasileira quando em
1989 adquiriu a Rede Record de Televisão, que até então pertencia ao empresário
e apresentador Silvio Santos e à família Machado de Carvalho. A empresa estava
atolada em dívidas, calcula-se que arrecadava na época cerca de 2,5 milhões de
dólares por ano e tinha uma dívida de mais de 20 milhões de dólares, tinha pouco
mais de setecentos funcionários, era uma das últimas emissoras no ranking da
audiência no Brasil e valia 45 milhões de dólares.
Aliás, esse foi o valor pago pelo Bispo Edir Macedo na compra da Record.
Como ele já era uma pessoa que sofria com a desconfiança das autoridades
nacionais, por ser um suposto charlatão da fé, um ludibriador de pessoas humildes
que aderiam à sua igreja, ele não quis apresentar-se pessoalmente para adquirir a
Rede Record. Ele enviou um emissário.
A peça-chave na estratégia para a aquisição da Record foi o deputado federal
Laprovita Vieira.
“Esse sim, decisivo na compra da emissora: o pastor e ex-deputado federal
Laprovita Vieira, o mesmo que acompanharia Edir no dia de sua prisão, três anos
mais tarde. Melindrado, o bispo sabia que dificilmente obteria êxito se sua figura
aparecesse nas negociações logo no início. Seu Vieira, como era conhecido,
interpretaria o papel do comprador oficial da Record no tabuleiro de xadrez
construído por Edir Macedo”. (TAVALORO, 2007, p. 152)
122
Para comprar a Record e não aparecer, o Bispo Macedo usou todas as
estratégias possíveis e imagináveis, desde aparecer disfarçado para uma reunião,
até usar o talento artístico do Sr. Vieira.
“A encenação convenceu. E não era para menos. Edir tinha dado ordem ao
pastor: ele deveria comparecer a todas as reuniões com um maço de cigarros bem
à mostra no bolso da camisa. Ninguém poderia desconfiar que, por trás de
Laprovita Vieira, estava o fundador da igreja evangélica que mais crescia no
Brasil”. (ibid., p.p.152-153)
A estratégia funcionou e apesar do arrependimento de Silvio Santos após
descobrir quem se escondia de fato, por trás do Sr. Vieira, a venda já estava
firmada. Restava ao Bispo a dura tarefa de quitar o restante das parcelas que
somavam 31 milhões de dólares.
Depois de muitas dificuldades, e até dizer que parecia que estava carregando
todos os demônios nas costas, veio o grande alívio para o Bispo Macedo, o
famigerado Plano Collor, que Macedo faz questão de dizer que foi uma bênção de
Deus enviada para ele. Somente ele ganhou com o plano econômico porque, ao
reter o dinheiro dos brasileiros, entre outras coisas, esse plano desvalorizou o
dólar e permitiu a Edir Macedo quitar sua dívida em dólar.
“...o inacreditável aconteceu meses depois [da compra], pontualmente no dia 15
de março de 1990, com o lançamento do Plano Collor. O pacote econômico, que
se transformou em terror para a maioria dos brasileiros, virou alívio para Edir
Macedo. Criado com o objetivo frustrado de conter a hiperinflação do Brasil, o
plano confiscou o dinheiro das contas bancárias de miles de pessoas e
desvalorizou o dólar. As prestações do bispo Macedo, baseadas na cotação da
moeda estrangeira, despencaram. As dívidas da compra da Record, antes
exorbitantes, acabaram pagas com facilidade. Edir passou a zerar duas, até três
prestações em um único mês. Antes de 1992, o bispo Edir Macedo já quitara
integralmente a dívida. ‘Fui salvo pelo gongo. O Plano Collor ajudou só a mim no
Brasil inteiro, mais ninguém. Sorte? Acaso? Coincidência? Cada um acredite no
123
que quiser. Eu tenho certeza de que foi Deus afirma Edir”. (TAVALORO, 2007,
p.159)
De lá para cá, a Record consolidou-se como uma potência midiática. A Record
cobre 98% do país e seu sinal internacional chega a 125 países de quatro
continentes e hoje estaria avaliada em torno de 2 bilhões de dólares. É lógico que
esse crescimento se deve à participação nem sempre ou quase nunca bem
explicada da IURD. E é claro que a mesma beneficia-se desse crescimento, pois
anuncia “seus produtos” na segunda maior rede de televisão do país.
“Em 30 anos de existência, completados em julho [2007], a Igreja Universal do
Reino de Deus construiu não apenas um império de radiodifusão, mas um
conglomerado empresarial em torno dela. Além das 23 emissoras de TV e 40 de
rádio, o levantamento da Folha identificou 19 empresas registradas em nome de
32 membros da igreja, na maioria bispos”.
“...A igreja ainda arrenda 36 rádios, que integram a rede Aleluia. Nos últimos cinco
anos, as principais emissoras de televisão da Record passaram de outros bispos
para Edir Macedo”. (Jornal Folha de o Paulo, 15 de Dezembro de 2007, p.A1 e
A4).
A Record hoje em dia está em franca disputa com o SBT de Silvio Santos para
consolidar o segundo lugar na audiência do país. A meta é tornar-se a primeira,
pelo menos esse é o sonho do Bispo Macedo.
Pagando altos salários para astros e estrelas da poderosa Rede Globo de
Televisão, a Record não somente imita o padrão globo de qualidade, como imita
os valores transmitidos e defendidos por esta, o que representa uma contradição,
nem sempre aparente para os freqüentadores da igreja.
o outro modelo de organização do campo midiático religioso é o modelo da
IIGD. Esse modelo - a exemplo do que aconteceu com Record que está
profundamente vinculada ao Bispo Edir Macedo e a IURD também está
124
vinculado à imagem do seu criador, o Missionário RR Soares e à sua Igreja, a
Internacional da Graça de Deus. Pode-se denominar esse modelo de “mídia
genuinamente religiosa”.
Soares é o televangelista mais antigo em atividade no país. Há mais de 30
anos, desde seu início na TUPI em 1977, ele tornou seu rosto familiar para a
população brasileira. No ano de 2001, Soares foi entrevistado pelo apresentador
de Talk-Show, da Rede Globo de Televisão, Soares e uma das ênfases dadas
pelo apresentador para anunciar seu convidado era que ele era o rosto mais
veiculado na TV brasileira com mais de 100 horas de atividades em vários canais
de várias emissoras na época. De para cá, Soares continua aparecendo muito
em vários canais, mas conseguiu um espaço ainda maior, pois emplacou um
programa em horário nobre na TV brasileiro veiculado pela Rede Band de
Televisão. Além disso, conseguiu consolidar o funcionamento de sua própria Rede
de Televisão, a RIT (Rede Internacional de Televisão)
Soares na Rede TUPI em 1977, com seu programa intitulado: “Despertar da Fé”.
125
Soares sempre foi obcecado por Televisão, sempre sonhou usar esse veículo
para propagar sua crença religiosa. Nos anos 80, a chamada “década perdida”,
como dizem os especialistas econômicos, ele amargou horários nas madrugadas
de redes sem nenhuma expressão, mas nos anos 90, principalmente depois do
Plano Real, Soares começou a investir pesado para ingressar de fato na TV
brasileira e emplacar um programa em horário nobre. Alguns estudiosos
26
do
fenômeno religioso registraram o investimento que Soares fazia na época, algo
que girava em torno de 600 mil dólares, como um investimento alto para os
padrões brasileiros.
Se em Dezembro de 1997 Soares conseguiu veicular seu primeiro programa
em horário nobre na TV brasileira, numa rede sem muita penetração, em 2003,
Soares conseguiu ir além, fechou um contrato com a Rede Band de Televisão e
passou a veicular um programa intitulado, Show da Fé. Calculava-se, na época,
que ele desembolsasse em torno de R$ 2 milhões de Reais.
“Ele [Soares] recusa-se a revelar os valores investidos na empreitada. Estima-se,
entretanto, que o pagamento mensal à Band seja de R$ 2 milhões. A conta é a
seguinte: a emissora paulista faturava R$ 350 mil com o programa de Marcos
Mion, Sobcontrole, quando este era exibido às 20h. R.R. Soares ofereceu o dobro.
O restante é referente ao que a Band lucraria no horário com os anunciantes
que não intervalo comercial durante o Show da e ao repasse do dinheiro
das afiliadas, que também pararam de negociar os comerciais. A compra do
horário nobre da emissora gerou mal-estar e causou chiadeira geral tanto no
mercado publicitário quanto entre as emissoras afiliadas”. “Inicialmente, houve
também a recusa de duas afiliadas da Band de transmitir o programa evangélico,
mas a situação foi contornada. ‘Raciocinando de maneira empresarial, vale a pena
exibir o programa de R.R. Soares. É necessidade comercial’, pondera o diretor.
26
.
Em setembro de 1997, investia mensalmente em programação de TV a fabulosa cifra de 600
mil dólares, cuja soma ultrapassava US$ 7 milhões ao ano. Quantia elevada três meses depois
quando passou a veicular, na CNT, entre 20h30 e 21h30, o programa R.R Soares, o primeiro
programa evangélico a ser transmitido em rede nacional em horário nobre na televisão aberta
brasileira. Tal como o Igreja da Graça em Seu Lar, exibido diariamente nas TVs CNT,
Bandeirantes, Manchete e Vinde (UHF), é farto em promessas e testemunhos de cura,
prosperidade e libertação de demônios”. (MARIANO, 1999, p.p.100-101).
126
Antes de negociar com os Saad, donos da Band, de quem é amigo mais de 20
anos, o evangélico procurou a Rede TV!, mas não obteve resposta positiva”.
http://www.zaz.com.br/istoegente/193/reportagens/rrsoares_pastor_eletronico_01.
htm>. Acesso em 27/04/08.
Hoje em dia, calcula-se que o Missionário gaste em torno de R$ 4 milhões de
Reais mensais R$ 44 milhões anuais para manter o programa Show da
sendo veiculado em horário nobre na Band, o que é um excelente negócio,
quando se analisa os custos para se veicular um programa na TV brasileira.
Especialistas calculam que a madrugada da Record, entre 2h e 5h, custe em torno
de 2 milhões. Soares, com dois milhões a mais, consegue manter um programa
evangélico em horário nobre. Sem dúvida é um bom negócio para ele e sua igreja.
No entanto, apesar de suas conquistas midiáticas em emissoras de importância
nacional serem feitos dignos de nota, sua maior conquista veio com a concessão
de uma Rede de Televisão, a qual ele batizou de RIT Rede Internacional de
Televisão, que irradiava programação para todo país através de uma geradora em
Dourados (MS). Seu império começou a se consolidar nesse momento. A RIT é o
carro-chefe de um conglomerado midiático que quer ser eminentemente de cunho
religioso, pelo menos é que é propalado oficialmente.
“A RIT - Rede Internacional de Televisão fundada em agosto de 1999, nasceu
com o propósito de levar ao ar uma programação diferenciada para o Brasil e o
mundo. Com a estrutura de um grupo forte com mais de 25 anos de experiência,
do qual também fazem parte uma editora, gráfica, rádio, gravadora, portal e
indústria de transmissores, o objetivo da RIT é interagir com a comunidade em
geral através de uma programação variada, levando à família brasileira
informação, entretenimento, interação e edificação. Com uma equipe de
profissionais de alto nível técnico, artístico e jornalístico, a RIT tem uma filosofia:
‘Ser uma televisão para a família’. A tecnologia digital e a dedicação de todos os
funcionários fazem com que você tenha a melhor programação na atualidade, uma
TV que pensa no que você vê. No Brasil a RIT conta com 8 emissoras, mais de
170 retransmissoras e mais de 120 milhões de telespectadores em todos os
estados brasileiros. Alcança o país através de sistemas de UHF/VHF (canal
aberto), CABO e SATÉLITE, com uma programação de 24 horas por dia, estamos
127
avançando, conquistando com empenho e determinação todas as camadas da
sociedade. Sua missão está em plena fase de expansão. Através dos Satélites
Pas9 e AB1, fornecemos o sinal para a América Latina, América do Norte, Europa,
Norte da África e países do Oriente Médio, além de alcançar o mundo inteiro
online pelo site www.rittv.com”. http://rittv.com/index.html/>. Acesso em 27/04/08
Como deixa claro na citação acima, que expõe ao público os valores e
princípios que norteiam essa empresa, Soares pontua que a RIT nasceu para ser
uma rede destinada à família, cultivando valores caros ao grupo religioso ao qual
pertence.
Em entrevista à Revista ISTO É, Soares disse que não pretendia comprar uma
emissora aberta como fez seu cunhado, Edir Macedo. ‘Precisaria vender espaço
comercial e não quero isso’ (http://www.zaz.com.br/istoegente>. Acesso em
27/04/08). Até agora, Soares, apesar de usar as mesmas técnicas e linguagens
que outros conglomerados midiáticos, ele consegue revestir isso de linguagem
religiosa acentuando seu traço e seu compromisso com o grupo religioso ao qual
pertence.
Soares acredita que o poder da mídia é tão grande que pode influenciar tanto
para o bem quanto para o mal. Crítico ferrenho do conteúdo veiculado por mídias
secularizadas, Soares acredita que um conglomerado midiático, desde que com
valores cristãos bem solidificados, pode mudar radicalmente não só as vidas das
pessoas, do ponto de vista individual, mas também mudar uma nação inteira.
Soares parece acreditar naquilo que os especialistas denominaram de “teoria da
bala mágica”. Ela pode ser definida da seguinte forma:
“Com certeza, é relativamente teoria direta de estímulo-resposta, mas também é
uma teoria que presume um determinado conjunto de suposições não
mencionadas, referentes não apenas à organização social da sociedade como à
estrutura psicológica dos seres humanos que estão sendo estimulados e estão
reagindo à mensagem da comunicação de massa”. “Também foi denominado de
outras coisas pitorescas, tais como ‘teoria da agulha hipodérmica e teoria da
128
correia de transmissão’. A idéia fundamental é que as mensagens da mídia são
recebidas de maneira uniforme pelos membros da audiência e que respostas
imediatas e diretas são desencadeadas por tais estímulos”. (DeFLEUR, 1993,
p.p.181-182)
Soares de fato acredita que criar uma rede de televisão evangélica, que
professa o tempo todo valores desse grupo religioso é o meio de livrar os
evangélicos e futuros evangélicos das garras do mal. De forma maniqueísta, ele
acredita que um bom conteúdo transmitido é maneira mais rápida de transmitir
princípios e modificar a realidade. Nesse sentido, o modelo adotado por Soares
difere de forma radical do modelo adotado por Macedo. O modelo midiático
religioso da IIGD é o modelo de uma mídia genuinamente religiosa.
Basta assistir à programação da RIT para perceber isso. Nos intervalos
comerciais, não há a veiculação de propagandas seculares, no máximo o que se
são propagandas de produtos pertencentes a grupos evangélicos. As
propagandas são religiosas, geralmente ligadas à Graça Editorial, que anuncia
CDs, shows de artistas evangélicos, livros, revistas e o Jornal Show da Fé.
também anúncios de produtos do Shopping do Povo, um estabelecimento que fica
ao lado da sede da Igreja na Avenida São João e que comercializa produtos
evangélicos. Além disso, anúncios de utilidade pública, como, por exemplo,
formas para combater a dengue. O interessante, nesse último caso, é que um
anúncio veiculado na RIT sobre combater a dengue de forma “secular”, ou seja,
evitar água parada em reservatórios, mas na última semana de Abril de 2008,
ainda em plena epidemia de dengue no Estado do Rio de Janeiro, o Missionário
RR Soares no programa Show da Fé, veiculado, mais especificamente, no dia
30/04/08 na TV Band disse textualmente que a dengue era fruto da ação de um
demônio. Ele disse:
“Jesus carregou nossas dores, ele pagou por todas elas na cruz. A blia diz que
por suas pisaduras nós fomos sarados. Então, irmãos, esse negócio de dengue
129
nada mais é do que um demônio que se manifestou em sua vida. Mas Jesus pode
e quer te curar, basta fé”. (Programa Show da Fé, 30/04/08)
Soares é capaz desses paradoxos. Aliás, esse não é o único, há muitos outros.
Ele apresenta-se no vídeo sempre de maneira sóbria, com uma prédica monótona
(num único tom), onde ele é capaz de pregar sobre os mais altos poderes do
sagrado, dominar e repreender os mais temíveis demônios e com a mesma
tonalidade de voz vender o seu último CD de músicas evangélicas. Isso faz parte
de uma estratégia “clean”, onde não pode haver exageros e onde transparece
muito equilíbrio. É nesse momento que o Missionário torna-se palatável para a
imensa maioria dos evangélicos e dos simpatizantes da fé evangélica. Mas isso
será tratado mais a fundo no quarto capítulo. Por enquanto, o que importa
enfatizar é que a mídia construída pela IIGD segue um modelo de mídia
genuinamente religiosa, muito diferente do modelo desenvolvido pela sua rival, a
IURD. Nos próximos tópicos serão analisadas as mídias da Igreja Internacional da
Graça de Deus já citadas nesse trabalho.
130
3.2 Televisão – RIT e Nossa TV – A TV da família
Desde 2007, a RIT tem procurado penetrar no mercado internacional
27
. Ela tem
seguindo as estratégias de expansão da Igreja Internacional da Graça de Deus,
que almejava e continua almejando inserir-se mais fortemente em países que
congregam grupos de imigrantes brasileiros, como os EUA e Portugal.
Soares pretende consolidar seu império midiático, que abarca um grande
conglomerado de mídias, do qual a principal é, sem sombra de dúvidas, a
televisão. Ele definitivamente é um homem de televisão. De fato, a televisão
fascina. E muito cedo ele começou a ser usada por grupos religiosos. Foi nos EUA
que apareceram as primeiras relações, e as primeiras polêmicas, entre televisão e
religião
28
. Vários televangelistas, no contexto da Guerra Fria, começaram a usar a
televisão como um meio de propagação de suas mensagens religiosas, com a
finalidade de alcançar o mundo por meio da divulgação do Evangelho, e isso foi
“rotulado” como mais uma manifestação do imperialismo norte-americano (cf.
CARVALHO, 1998, p.79-112). O fato é que a religião foi muito afetada pelo
advento da televisão, que transmitia valores “seculares” para os lares americanos,
na avaliação dos religiosos americanos, e o contra-golpe não tardou; a televisão
começou a ser usada para disseminar valores “legitimamente cristãos” (inclusive
influenciando o eleitorado para apoiar políticos engajados com essas causas),
27
.
A RIT é uma realidade em Portugal. Desde que entrou no sistema IPTV da operadora Clix e
na TVTel do Porto, a Clip está acessível a milhares de portugueses e brasileiros em Portugal.
Para quem não dispõe do sistema, por toda a Europa é acessível, através da compra de um
decodificador e antena de 60cm, e sintonizando livremente pelo satélite HotBird 8”.
http://www.rittv.com.br/news/noticia.php?id=24>. Acesso em 27/04/08.
“RIT é realidade na Flórida. O Canal brasileiro está disponível no pacote básico da Comcast.
Alcançando mais de 500 mil assinantes e suas famílias, a Rede Internacional de Televisão
inaugurou sua programação em 19 cidades do Sul da Flórida no dia 29 de maio de 2007. A data foi
comunicada a um grupo de empresários que atuam junto à comunidade brasileira na região em um
almoço na sede da emissora, em abril. A RIT esta disponível no canal 77 do pacote básico da
Comcast”. http://www.rittv.com.br/news/noticia.php?id=23>. Acesso em 03/05/08
28
. E essa relação continua existindo e de forma muito contundente. Basta analisar as campanhas
presidenciais norte-americanas e perceber o impacto que a religião e a televisão causam na
política. O Jornal Folha de São Paulo traz no Caderno Mais! de 17 de Agosto de 2008 uma análise
bastante interessante sobre esse assunto, intitulado: Viagem ao Mercado das Religiões.
131
criando o fenômeno da chamada, “igreja eletrônica”. Essa é uma questão
dinâmica e, portanto, aberta à novidades nos Estados Unidos.
“O modo como a religião foi afetada pela televisão provocou um debate mais longo
e desconfortável nos Estados Unidos do que os efeitos da televisão sobre os
políticos, em especial sobre os políticos republicanos. Jerry Fawell, estrela de A
hora do Antigo Evangelho, que reivindicava ter 50 milhões de telespectadores,
durante certo tempo mobilizou o poder da ‘maioria moral’. E, na década de 1990, a
religião televisionada, a ‘igreja eletrônica’, tornou-se evidente em Garden Glove,
Califórnia, onde o reverendo Robert Schüller uma pessoa menos arrebatadora e
provocadora na tela que Jimmy Swaggart, eloqüente, mas pessoalmente
vulnerável, ou Pat Robertson, o esperançoso presidenciável construiu uma
enorme catedral com dez mil janelas. Na época elogiado por Rupert Murdoch, ele
fazia transmissões semanais para uma audiência de milhões que se estendia,
muito além dos Estados Unidos. A televisão religiosa ainda está em mudança.
Nenhuma catedral consegue contê-la. O mais global dos evangelistas, o norte-
americano Billy Graham, jamais precisou de uma catedral. Bastava-lhe um campo
de futebol, e uma capa de chuva lhe cairia tão bem quanto um grêmio escolar”.
(BRIGGS, 2006, p.250)
Em relação ao Brasil, a primeira demonstração de televisão ocorreu no dia 2 de
junho de 1939. Essa demonstração ocorreu na Feira de Amostras no Rio de
Janeiro e a aparelhagem usada foi trazida da Alemanha, e a exibição contou com
a participação de cantores de rádio.
“Onze anos após a demonstração inaugural, foi ao ar a primeira imagem de
emissora de televisão brasileira. Na TV Tupi de São Paulo, a 4 de julho de 1950, a
apresentação do cantor e ex-ator mexicano José de Guadalupe Mojica foi
acompanhada pelo público, que se juntou no saguão do edifício dos Diários
Associados e em outros ponto distribuídos pela cidade”. (HAMBURGER, 1998,
p.446)
132
O fato acima mencionado pode ser considerado uma pré-estréia da televisão
brasileira. Assis Chateaubriand exigiu que antes da inauguração oficial que
ocorreria somente em setembro, fossem transmitidas para um circuito fechado de
televisão as cerimônias de inauguração formal do Museu de Arte de São Paulo e
do Edifício Guilherme Guinle, nome da sede dos Associados na Rua Sete de
Abril... (MORAIS, 1994, p.498-499)
Nessa ocasião, somente dois monitores exibiram a pré-estréia da televisão
brasileira, um colocado no saguão do edifício e outro na esquina das ruas Sete de
Abril e Bráulio Gomes.
Estavam presentes muitos políticos, e entre eles o presidente Dutra, estavam
presentes também artistas, personalidades e empresários e num arroubo de
improvisação, devido à falta de cadeiras para todos, Chateaubriand propôs que
eles se sentassem no chão como índios tupis, essa sugestão imediatamente foi
aceita pelo milionário norte-americano Nelson Rockefelller (presidente do Museu
de Arte Moderna de Nova York), que foi o primeiro a sentar-se no chão, sob o
olhar desconfiado do presidente Dutra. Após vários discursos como é de praxe
nessas ocasiões, a festa de pré-estréia foi encerrada com a participação do frade-
cantor, José de Guadalupe Mojica que cantou o seu grande sucesso na época, o
bolero “Besame”.
A televisão estreou no Brasil, nos idos anos de 1950 com a inauguração da
PRF-3-TV, nome herdado da tradição radiofônica, mais tarde TV Tupi, ou
simplesmente, CANAL 3, vale ressaltar que a TV Tupi foi a quarta emissora de
televisão inaugurada no mundo. Somente três países possuíam emissoras de
televisão, os Estados Unidos, a Inglaterra e a França. Finalmente em 18 de
setembro de 1950 às 22:00h com duas horas de atraso, a TV Tupi transmitia o seu
primeiro programa que se chamava, Show na Taba. Tudo foi feito ao vivo e de
improviso. Durante vários meses, os artistas, oriundos do rádio, ensaiaram para
aquele momento, no entanto, cinco minutos antes de entrar no ar, a primeira
transmissão ao vivo da televisão brasileira, uma das três câmeras (aliás três
únicas) que estavam dispostas no estúdio deixou de funcionar e o pavor foi
generalizado. Várias lendas correram desde então para tentar explicar o infortúnio,
133
desde uma garrafa de champagne quebrada na câmera por Chateaubriand na
cerimônia da tarde simbolizando a inauguração oficial, ao estilo do que ocorre com
as inaugurações dos navios, até a água benta espargida pelo bispo-auxiliar de
São Paulo, Dom Paulo Rolim Loureiro, que teria molhado e conseqüentemente
danificado alguma válvula da câmera. O engenheiro norte-americano, Walther
Obermuller,
29
chegou a determinar o cancelamento da transmissão, mas foi
desobedecido pelos empregados de Chateaubriand, que provavelmente tiveram
esse ato de insubordinação e coragem por medo das conseqüências que
recairiam sobre eles. O fato é que ali diante da dificuldade apareceu o melhor do
espírito brasileiro, a capacidade de improvisação e, somente com duas câmeras, o
programa foi ao ar e estava inaugurada oficialmente ao TV no Brasil. Nos
discursos da tarde daquele dia 18 de setembro de 1950, duas falas de certa forma
proféticas merecem ser reproduzidas, uma é de David Sarnoff (Diretor da RCA
Victor, associada da NBC – canal comercial americano que serviu de modelo para
a TV brasileira) e a outra é de Assis Chateaubriand:
“Primeiro falou David Sarnoff: A televisão asas à imaginação, e eu prevejo o
dia em que ela nos permitirá percorrer com os olhos toda a Terra, de cidade em
cidade, de nação em nação’. Em seu discurso, Chateaubriand anunciou que no
cocuruto do Banco do Estado tinha sido instalada a antena que ia levar
pioneiramente aos lares paulistas o mais subversivo de todos os veículos de
comunicação do século, a televisão’ ”. (ibid.,p.502)
Esses dois discursos “proféticos” estavam corretos, de fato, a televisão
expandiu seu raio de ação e chegou a cada cidade e cada nação do planeta e
tornou-se também um veículo de comunicação que subverteu valores e a
ordenação do mundo no século XX.
29
. Após o sucesso do primeiro programa, mesmo que improvisado, dirigindo-se àqueles que lhe
haviam desobedecido, esse engenheiro sentenciou: “Quando vocês forem escrever a história da
televisão no Brasil, vão ter que dizer que no dia de estréia certamente havia mais gente atrás das
câmeras do que diante dos receptores”. (HAMBURGER, 1998, p.504)
134
Soares nunca ficou indiferente ao poder da televisão. Seu conglomerado
midiático, como foi dito anteriormente pretende ser genuinamente religioso. Sua
rede de televisão não foge à regra. Analisando a grade de programação da RIT,
pode-se perceber essa tendência. A programação da RIT tem um enfoque
eminentemente religioso. Os programas exibidos podem ser divididos em quatro
segmentos, assim ordenados: Programas que são extensões da igreja; programas
para jovens, programas para crianças e programas de interesse geral.
Os programas que funcionam como extensões da igreja são: Oração da
Manhã; Igreja da Graça em seu Lar; O Pastor da Graça em seu Lar; A Hora da
Graça de Deus; Os Portais da Graça; Curso Fé e Show da Fé.
Os programas destinados aos jovens são: Clip RIT; Tarde Show; Movimento
Jovem.
Há um único programa para crianças: Zig Zag Show.
Os programas de interesse geral são: Consulta ao Doutor, Vejam Só!; Fatos
em Foco; Telejornal Toda Hora; O Grande Estado de São Paulo.
O que se percebe é que apesar de tentar fazer uma televisão totalmente
religiosa, Soares não consegue implementar nenhuma novidade, quanto aos
formatos; estes são idênticos aos das televisões seculares; quanto ao conteúdo
percebe-se a influência religiosa em quase todos os programas. Somente os
programas de interesse geral guardam um certo tom de secularismo, e isso visa,
de alguma forma, atender demandas do público sobre questões políticas,
econômicas e sociais, além de questões básicas sobre o cotidiano. E não podia
ser diferente, pois a televisão como um meio frio permite uma liberdade muito
grande ao telespectador, e se o telespectador da RIT não tiver acesso nessa rede
sobre essas questões, ele mudará de canal para encontrá-las.
“Contrariamente ao que pode acontecer em uma sala de cinema, o nível de
atenção dos telespectadores durante o tempo em que estão diante da telinha é
extremamente variável. A experiência de assistir televisão é fisicamente
interrompida por vários deslocamentos no espaço doméstico: ver televisão
combina com várias outras atividades, como comer, costurar, conversar, ler,
participar de jogos em grupo etc. Assistir televisão aparece, portanto como uma
135
experiência psíquica em profunda descontinuidade temporal, marcada por
momentos e atenção de qualidade muito variável”. (BRETON, 2002. p.122)
O que nos propomos inicialmente em fazer nesse tópico é analisar um
programa de cada um dos quatro segmentos que definem a programação da RIT,
no entanto, foi possível analisar três programas, pois o programa infantil, Zig Zag
Show foi retirado do ar. Foram vistas várias horas de cada programa analisado,
mas foram escolhidas algumas situações que, de alguma forma, apontam para a
essência de cada programa. Em relação aos programas que definimos como
extensões da igreja, o programa escolhido foi:
CURSO FÉ – HORÁRIOS: De Segunda a Sexta: 18:35
Ensinamentos preciosos na sua televisão. Um curso que tem como objetivo ajudar
as pessoas a compreender este assunto que para muitos é mistério - o mistério da
fé. Diversos ensinamentos sobre esse tema são falados e transmitidos de diversas
maneiras, por isso, muitas dúvidas acabam ficando na mente das pessoas.
O Curso Fé, ministrado pelo Missionário R. R. Soares, procura esclarecer essas
dúvidas utilizando a verdade que na Palavra de Deus.
http://www.rittv.com.br/programas/programa.php?13.
>. Acesso em 03/07/08
Esse programa é uma ferramenta importante no projeto do Missionário Soares.
Geralmente, ele usa programas gravados muito tempo, inclusive isso fica
visível, pois ele aparece com uma imagem muito mais jovem do que ele tem na
atualidade. O cenário é simples, atrás do apresentador aparece uma estante de
136
livros, e, como se estivesse numa aula, o Missionário discorre sobre várias facetas
do Mistério da Fé.
Numa de suas aulas apresentadas no programa Curso de Fé, que, aliás, é
modulado, e, portanto, o mesmo tema repete-se em vários programas, o
Missionário Soares discorreu sobre a seguinte temática: O diabo impede a
pregação do Evangelho (texto base 1Coríntios 12.7)
Ele começou apontando para um exemplo simples, utilizando-o como metáfora
de uma realidade espiritual. Ele disse:
“Quando a pessoa está com aquela dorzinha de garganta, a garganta começa a
raspar, ou começam aqueles sintomas que se parecem com uma gripe, isso nada
mais é do que uma ação demoníaca. É o demônio pedindo permissão para entrar
na sua vida e se você não repreende no nome de Jesus, se você não amarra, não
acorrenta no nome de Jesus, a estratégia do império das trevas vai fazer morada
na sua vida. Vejam o que Paulo fala em Coríntios, ele tinha um espinho na carne,
e esse espinho na carne era um demônio muito graduado, que fora dado por Deus
para ficar esmurrando a cara do Astolo constantemente para que ele não
ficasse engrandecido com as coisas que viu no terceiro céu”. (Programa exibido
em 03/07/2008)
O Missionário é um grande comunicador, essa é uma característica apontada
por pessoas que o têm como referência e também por pessoas que não nutrem
nenhuma simpatia por ele.
Agora, quando se trata de expor um tema bíblico, e com grande dificuldade
hermenêutica como o tema do “espinho na carne do Apóstolo Paulo”, o
Missionário geralmente apela para uma simplificação rasteira. Ele tem a tendência
de espiritualizar tudo, apontando sempre para um mundo em batalha espiritual
constante. E isso se repete em todos os programas em que o missionário profere
suas aulas e a televisão é uma forte aliada do missionário nessa empreitada, pois
o tempo da televisão é o tempo da cotidianidade, um tempo repetitivo, que acaba
para recomeçar, um tempo feito não de unidades contáveis, mas sim de
fragmentos. uma simplificação proposital e isso não é gratuito, mas explica-se
137
em função do próprio público que a ele assiste. É claro, que poderíamos apontar
para as lacunas na formação teológica do Missionário, mas o que interessa de fato
aqui é o porquê da simplificação do seu discurso. Seu discurso é construído a
partir dos seus interlocutores, ou seja, aqueles que serão receptores da
mensagem. É Jesús Martín Barbero que diz que na América Latina, “com respeito
à grande maioria de usuários da televisão, as mudanças de ofertas, apesar das
propagandas sobre a descentralização e pluralização, parecem apontar para um
aprofundamento da estratificação social, pois a oferta diferenciada de produtos de
vídeo está ligada ao poder aquisitivo dos indivíduos” (BARBERO, 2006, p.294).
Segue abaixo uma amostragem do público que assiste à RIT, e essa amostragem
foi feita pela própria RIT.
“Em levantamentos feitos por amostragem, delineamos o perfil de nossos
telespectadores e descobrimos que nossa programação tende a atrair um público
com forte tendência a consumir bens de consumo. Confirma-se que 80% dos
nossos telespectadores estão mais concentrados nas classes C, D, E, sendo que
47% deles pertencem ao sexo feminino, e destes, 60% com idade entre 20 a 41
anos. Já o nosso público masculino representa 27% do total, porém com índice de
70% dos que exercem uma atividade remunerada.
http://rittv.com/index.html.>.Acesso em 27/04/08
O Missionário Soares tem um público de 80% classificado entre as classes
C,D,E, ou seja, é um público com capital cultural baixo e que se sente envolvido e
atendido em suas expectativas, em função de uma comunicação direta e de fácil
compreensão. Enquanto outras igrejas, principalmente de linha histórica procuram
promover estudos aprofundados sobre a Bíblia, Soares apela para a simplificação
e redução dos fenômenos ao nível da compreensão dos seus interlocutores.
É simples compreender que uma relação intensa entre os telespectadores,
ou seja, os receptores da mensagem, e Soares, produtor da mensagem, além
disso, uma troca fecunda entre esses agentes. Pierre Bourdieu aponta para
138
essa situação quando num livro sobre a Televisão trata da urgência da televisão e
da necessidade que ela tem de produzir mensagens simplistas, não dadas à
profundidade. Ele diz:
“Em suma, objetos que são impostos aos telespectadores porque se impõem
aos produtores; e se impõem aos produtores porque são impostos pela
concorrência com outros produtores. Essa espécie de pressão cruzada...é
geradora de toda uma série de conseqüências que se retraduzem por escolhas,
por ausências e presenças. Eu dizia, ao começar, que a televisão não é muito
propícia à expressão do pensamento”. (BOURDIEU, 1997, p.39)
Outro programa analisado foi o Clip Rit, um programa enquadrado no
segmento, programas para Jovens.
CLIP RIT - Horários: De Segunda a Sexta: 11h10 e 19h00; Sábado: 11h10
Um programa para quem curte música e vídeo clipes de qualidade. Os melhores
hits estão aqui. Paradas nacionais e internacionais para atender a todos os
gostos. O "Clip RIT" fala a linguagem da galera e atinge pessoas das mais
variadas idades, classes-sociais e religiões. Evangélicos, católicos e até pessoas
que não seguem nenhuma religião acompanham diariamente o programa,
apresentado por Andréia Rocha. Segundo a Revista "Isto É", os hits evangélicos
vêm alcançando cada vez mais adeptos e estão em terceiro lugar na
preferência do público em geral. A moda também está presente no programa.
Grifes e marcas têm espaço para serem divulgadas, a fim de atingir principalmente
os jovens e adolescentes que acompanham e curtem os clipes que vão ao ar.
http://rittv.com/index.html.>.Acesso em 27/04/08
139
Esse programa é dedicado a todos aqueles que gostam de músicas
evangélicas. É interessante perceber que os clips apresentados no programa, do
ponto de vista imagético em nada se diferem dos clips convencionais, ou ditos
seculares encontrados em outros canais de televisão, como MTV ou Multi Show.
Os conteúdos das sicas trazem à tona os aspectos religiosos, com forte apelo
para a teologia dominante no contexto da IIGD, a teologia da prosperidade e da
confissão positiva. clips internacionais e nacionais, e muitos desses o de
cantores ou bandas ligados à Graça Music, gravadora da Igreja Internacional da
Graça de Deus. O que não deixa de ser uma excelente propaganda para os
produtos da gravadora. Geralmente os clips da Graça Music procuram dramatizar
situações do cotidiano, como alguém passando dificuldades no trabalho,
opressões na vida familiar e financeira, bem como a mudança imediata após ler a
Bíblia ou ir a uma igreja, chegando ao ápice da felicidade com conquistas
materiais, como promoção no emprego, aumento de salário e aquisição de
imóveis ou carros. Essa dramatização de situações reais aproximam os receptores
da mensagem e os conduzem aos bens de salvação distribuídos pela agência de
salvação, no caso a IIGD administradora da RIT. Poder-se-ia pensar aqui nas
comunidades eletrônicas de consolo, como Eliane Hojaij Gouveia apontou; “[elas]
visam fazer com que o receptor, pela emoção, aproxime-se e se identifique com
os fatos narrados em estado de simulação” (GOUVEIA, 2007, p.04), o programa
Clip Rit, enquadra-se como um programa típico de uma comunidade de consolo e
entretenimento.
A música sempre esteve presente nos rituais religiosos e teve e continua tendo
uma função de enlevo de promoção de êxtase junto aos praticantes religiosos.
Juntamente com a música, toda sorte de entorpecentes foram e continuam sendo
usados para promover a experiência do sublime, do inefável e fazer aflorar os
sentimentos mais profundos. É Weber quem aponta para isso, ele diz:
“O leigo somente conhece o êxtase como enlevo necessariamente eventual em
face das exigências da vida cotidiana, para cuja provocação se empregam todas
as espécies de bebidas alcoólicas, bem como tabaco e narcóticos semelhantes
140
que originalmente serviram todos para fins orgiásticos e, sobretudo, a música”.
(WEBER, 2004, p.280)
Como se pode perceber a música funciona como um alucinógeno em matéria
religiosa. Os jovens religiosos identificam-se muito com esse tipo de música. Eles
gostam da melodia, da batida forte, e como são ensinados que “as músicas
mundanas” não devem ser ouvidas, eles têm como opção as mesmas melodias,
as mesmas batidas fortes só que com conteúdos religiosos. E ter acesso a isso no
conforto de casa é uma facilidade muito grande.
Tomando com referência, a obra de Jesús Martín-Barbero
30
, a Doutora Elaine
Gouveia aponta para o medo que as cidades grandes tem produzido em seus
habitantes. Ela diz:
“Nas grandes cidades, o medo tomou conta de seus habitantes, fazendo com que
todos procurem se proteger da violência urbana, se aprisionando no interior dos
espaços domésticos. A tensão e a violência, cada vez mais, expulsam seus
moradores das ruas. A realidade espinhosa das grandes cidades que desprezam,
cada vez mais, as possibilidades do amor, do sonho, dos prazeres partilhados,
fortalece por contraste, os desejos de vivenciar a comunidade imaginária de
acolhimento. Como a possibilidade de realizar o imaginado torna-se, cada vez
mais improvável, os habitantes dessas cidades procuram, cada vez mais, a
televisão para lhes fazer companhia, para amenizar suas angústias e solidão”.
(Ibid., p.05)
30
. “Tanto a atração como a incidência da televisão sobre a vida cotidiana têm menos a ver com o
que nela passa do que com o que compele as pessoas a se resguardar no espaço do lar. Como
escrevi em outro lugar: se a televisão atrai é porque a rua expulsa; é dos medos que vivem as
mídias”.(BARBERO, 2001, p.40)
141
Essa análise está na mesma linha de interpretação desenvolvida pela
pesquisadora francesa Danièle Hervieu-Léger. Cabe o registro de que para essa
pesquisadora, hodiernamente a religião pós-tradicional marcada pela
autonomização do indivíduo na sua escolha religiosa (sem as amarras da tradição
religiosa), ou seja, aquilo que ela chamou de desregulação do religioso, vai
produzir comunidades religiosas emocionais, em detrimento das organizações
religiosas tradicionais. Há, portanto, nas experiências religiosas hodiernas uma
super valorização do emocional.
“Quanto às novas expressões surgidas na alta modernidade, estas tomam a forma
de comunidades carismáticas emocionais e mantêm seus esquemas de
sociabilidade sob um caráter eletivo (fraternité élective), dispensando a
determinação de uma ‘linhagem de memória coletiva’ (proveniente de laços
familiares, sociais ou confessionais) que as identifique. Em suma, integram-se por
meio de relações emocionais. Sua identidade, enquanto religião pós-tradicional,
repousa prioritariamente em um espírito de comunidade que numa tradição”.
(CAMURÇA, 2003, p.258-259).
Fundamentadas na experiência individual e emocional, as comunidades
carismáticas criam um novo ethos religioso; criam novas formas de expressões
religiosas, com características bem definidas.
O programa Clip Rit cumpre um papel de aproximar os jovens, sejam eles de
que igreja forem. O importante para o programa é criar um espaço comunitário
que congregue as mais variadas vertentes dentro do universo religioso evangélico.
Outro programa da grade da RIT a ser analisado é o programa jornalístico
Toda Hora. Ele pode ser classificado como um programa de interesse geral.
142
TODA HORA – De Segunda a Sexta: 00h00, 08h00, 10h00, 12h00, 13h30, 16h00,
17h00, 18h00, 20h00 e 21h30. Sábados: 08h00, 10h00, 11h00, 12h00, 13h30,
16h00 e 22h00.
Transmitir fatos e notícias com precisão e imparcialidade é característica de todo
bom telejornal. Com estilo inovador, o Toda Hora informa os últimos
acontecimentos sobre os mais variados assuntos, como: segurança pública,
economia, política, saúde e esporte. As informações são sempre passadas com
muito dinamismo e espontaneidade, por profissionais que trazem a notícia do local
onde ela está acontecendo. A cada hora cheia, durante todo o dia, você fica bem
informado sobre os últimos acontecimentos do Brasil e do mundo.
As fontes usadas no Telejornal Toda Hora são da mais absoluta credibilidade e
confiança: - Agência Brasil: informações sobre tudo que acontece em Brasília.
- Agência Reuters: informações e imagens sobre todos os fatos do Brasil e do
mundo. Telejornal Toda Hora é a informação completa no seu dia-a-dia.
http://www.rittv.com.br/programas/programa.php?13.
>. Acesso em 03/07/08
Esse programa jornalístico tem 10 minutos de duração e não se difere em nada
dos programas jornalísticos de outras emissoras. Ele ocorre rias vezes por dia
de forma irregular, como os horários acima apontam. São notícias rápidas e, às
vezes, repetidas várias vezes ao longo do dia. O que se percebe é que o jornal
televisivo da RIT não foge à regra instituída no meio jornalístico hodierno. A regra
a que se faz referência aqui é a regra estandardização. E essa regra” declarada
ou velada, homogeneíza os jornais, sejam eles escritos, televisivos ou
radiofônicos, o que ocorre de fato na atualidade, para usar uma frase feliz de
Bourdieu, é uma “circulação circular da informação”, uma padronização das
informações. Bourdieu diz ainda:
143
“...pois o que tenho no espírito é que os produtos jornalísticos são muito mais
homogêneos do que se acredita. As diferenças mais evidentes, ligadas sobretudo
à coloração política dos jornais (que, de resto, é preciso dizê-lo, se descolorem
cada vez mais...), ocultam semelhanças profundas, ligadas em especial às
restrições impostas pelas fontes e por toda uma série de mecanismos, dos quais o
mais importante é a lógica da concorrência. Diz-se sempre, em nome do credo
liberal, que o monopólio uniformiza e que a concorrência diversifica. Nada tenho,
evidentemente, contra a concorrência, mas observo apenas que, quando ela se
exerce entre jornalistas ou jornais que estão sujeitos às mesmas restrições, às
mesmas pesquisas de opinião, aos mesmos anunciantes, ela homogeneíza”.”Da
mesma maneira, nos jornais televisivos ou radiofônicos, no melhor dos casos, ou
no pior, só a ordem das informações muda”. (BOURDIEU, 1997, p.p.30-31)
Essa padronização das informações é uma marca do jornalismo em todas as
suas esferas, e na esfera televisiva então, isso é ainda mais evidente. As mesmas
imagens e os mesmos assuntos são observados em todos os canais de televisão.
Inclusive, esse tipo de padronização das notícias, algo nocivo que invadiu o
jornalismo vale também para a outra ponta do processo jornalístico, a saber, os
comunicadores das notícias. Em se tratando de telejornais, percebe-se que até os
apresentadores dos telejornais são mais ou menos padronizados, com o mesmo
tipo de roupa, com a mesma entonação de voz, com cenários parecidos, enfim
tudo padronizado.
Jesús Martín-Barbero, comentando que a família constitui uma unidade básica
de audiência para as televisões, na América Latina, e apontando a família como
espaço das relações estreitas e de proximidade, onde a televisão assume e forja
dois dispositivos fundamentais, a saber: a simulação do contato e a retórica do
direto, diz que:
“Na televisão, a visão predominante é aquela que produz a sensação de
imediatez, que é um dos traços que o forma ao cotidiano”. “Na televisão, nada
de rostos misteriosos ou encantadores demais, os rostos da televisão serão
próximos, amigáveis; nem fascinantes, nem vulgares. Proximidade dos
personagens e dos acontecimentos: um discurso que familiariza tudo, torna
‘próximo’ até o que houver de mais remoto e assim se faz incapaz de enfrentar os
144
preconceitos mais ‘familiares’. Um discurso que produz seus efeitos a partir da
mesma forma com que organiza as imagens: do jeito que permitir maior
transparência, ou seja, em termos de simplicidade, clareza e economia narrativa”.
(BARBERO, 2006, p.297)
O telejornal da RIT, o Toda Hora não foge à regra de estandardização. Ele
funciona como uma pia de outros telejornais, e quem assiste a ele o percebe
nenhum tipo de diferença em relação a outros telejornais. Ele não é um jornal que
trata de assuntos religiosos ligados à IIGD, por exemplo, quando ele trata de
aspectos religiosos uma certa isenção, um certo distanciamento. O que vale
ressaltar é que ele não é um telejornal religioso, e esse destaque é importante,
principalmente quando se está tratando de uma rede de televisão que almeja ser
eminentemente religiosa.
Os programas da RIT analisados aqui representam um pouco do pensamento
do Missionário Soares sobre o que ele entende como uma rede de televisão,
especialmente uma rede televisão que pretende ser eminentemente religiosa.
Contudo, os sonhos midiáticos relativos à televisão de Soares não se restringem à
RIT.
Em outubro de 2007, Soares realizou mais um sonho, ele conseguiu colocar
em funcionamento a Nossa TV, por meio do sistema DTH (Direct To Home, termo
que designa a transmissão direta via satélite para a casa do assinante). A Nossa
TV possui por enquanto, meados de 2008, 36 canais
31
divididos em dois pacotes:
Ouro (36 canais) e Prata (22 canais), ambos com qualidade digital e contando com
os canais produzidos pela própria Igreja Internacional da Graça de Deus, a saber:
31
. Grade de Canais da Nossa TV:
1 – RIT
2 - RIT NOTÍCIAS
3 - SOS ESPIRITUAL
4 - TV ESCOLA
5 - NUESTRA TV
6 DW
7 –ENLACE
8 - TERRA VIVA
9 BANDEIRANTES
10 - FOX LIFE
11
BLOOMBERG
12 BOOMERANG
13 - DISCOVERY CHANNEL
14 - DISCOVERY KIDS
15 - DISNEY CHANNEL
16 - ESPN INTERNATIONAL 17 – TNT
18 - CNN en ESPANHOL
19 - DISCOVERY HOME & HEALTH
20 – IIGD
21 - CJC - CANAL DA JUVENTUDE CRISTÃ
22 RTPI
23 CLIMATEMPO
24 - BANDSPORTS
25 -
DISCOVERY TURBO
26 – TCM
27 - ANIMAL PLANET
28 - ESPN BRASIL
29 - DISCOVERY TRAVEL & LIVING
30
– WOOHOO
31 - TV RÁ-TIM-BUM
32 – HALLMARK
33 - DISCOVERY SCIENCE
34 - DISCOVERY CIVILIZATION
35 -NATIONAL GEOGRAPHIC
36 - TVE ESPANHA.
Grade de Canais da Nossa TV: Disponível em:
http://www.nossatv.tv.br/portal/site/gradecanais.jsp>. Acesso em 03/07/08.
145
RIT, RIT Notícias, SOS Espiritual, IIGD, CJC (Canal da Juventude Cristã) e
Nuestra TV, em espanhol. Inicialmente, a Nossa TV alcançava somente as praças
de São Paulo e Rio de Janeiro e conseguiu, em oito meses de funcionamento, a
adesão de 20 mil assinantes. A meta para o final de 2008 é atingir 100 mil
assinantes e ampliar a grade de programação para 54 canais.
A proposta da Nossa TV não difere em nada da TV RIT, pelo menos enquanto
entendimento do sentido de sua existência, de sua visão de mundo. Mais uma
vez, Soares deixa claro sua visão sobre a mídia, como algo de suma importância
para as pessoas, mas que foi cooptada por grupos que nada têm a ver com os
propósitos de Deus. Ele entende que a mídia secular é um mal a ser combatido e
para isso, os evangélicos precisam ter uma opção saudável. Ele mostra
claramente que possui uma visão maniqueísta sobre o campo midiático.
Numa reportagem sobre o Nossa TV, na Revista Graça Show da Fé veiculada
em maio de 2008, uma série de entrevistas com assinantes da Nossa TV,
quase todos pertencentes à Igreja Internacional da Graça de Deus, na condição
de membros, ou de pastores, onde estes expressam exatamente essa visão de
mundo maniqueísta, essa visão de que uma mídia perniciosa, mundana, e que
agora há uma alternativa para essa situação.
Um dos entrevistados foi o Pastor Elmo dos Santos, que é pastor auxiliar de
sua esposa, a Pastora Maria Rosa Amorim dos Santos, na Igreja Internacional da
Graça de Deus, no bairro Pilar, em Duque de Caxias (RJ). Ele diz: ‘Para quem
quer se desvencilhar dos programas mundanos, a Nossa TV é a melhor
alternativa. A sua programação é mais adequada para todos os que estão na
condição de servos de Deus’. (Revista Graça Show da Fé, ano 9, n° 106, p.37)
Outro entrevistado nessa matéria é o Pastor Alcir Veiga Júnior, titular da Igreja
Internacional da Graça de Deus, no bairro Lins, situado na zona norte do Rio de
Janeiro, e que se vangloria de ser um dos primeiros assinantes da Nossa TV. Ele
reproduz fielmente a visão maniqueísta transmitida por Soares. Para o Pastor
Alcir, bem como para o seu mentor espiritual, o Missionário Soares, a existência
de uma alternativa midiática, essencialmente religiosa é uma ferramenta
evangelizadora e propagadora de valores morais e éticos. Ele sentencia:
146
‘Por meio da Nossa TV, uma pessoa conhece a Jesus porque, querendo ou não,
vai passar pelos canais evangélicos. Se essa pessoa foi uma consumidora de
outras antenas, vai perceber a diferença de conteúdo. A implantação da Nossa TV
não é unicamente uma questão de marketing, não se trata de mais uma TV por
assinatura no mercado. Há um propósito que ultrapassa o lado comercial. Ela está
no mercado para fazer a diferença’. (Revista Graça Show da Fé, ano 9, 106,
p.38)
Como se pode perceber, um objetivo muito claro para os membros e para a
cúpula da Igreja Internacional da Graça de Deus. Tanto na RIT, quanto, na Nossa
TV, a visão que prevalece é de transmitir os valores e princípios da crença que os
move, da religiosidade que os organiza e lhes oferece sentido.
Não há nada de mais, e nem de mal em fazer isso, afinal os meios de
comunicação, hoje em dia, constituem espaços-chave de condensação e
intersecção de múltiplas redes de poder e de produção cultural, como nos lembra,
Jesús Martín-Barbero.
O que se pode criticar na visão que prevalece na IIGD, manifestada tanto na
RIT, quanto na Nossa TV, é a idéia do pensamento único, expressão utilizada
também por Jesús Martín-Barbero, ou seja, a idéia de que a tecnologia hoje é o
‘grande mediador’ entre as pessoas e o mundo, quando o que a tecnologia medeia
hoje, de modo mais intenso e acelerado, é a transformação da sociedade em
mercado, e deste em princípio agenciador da mundialização em seus muitos e
contrapostos sentidos”. (BARBERO, 2006, p.20)
O que a IIGD faz ao aquinhoar poder midiático televisivo é inserir-se numa
economia de mercado e vender o seu principal produto, ou seja, sua religiosidade.
Ao mesmo tempo, que essa religiosidade televisiva pode ser vista como uma
alternativa para os padrões considerados “mundanos” em relação à televisão
secular, ela não se difere em nada das outras estruturas televisivas, que seguem a
lógica do mercado.
Nesse sentido, a Igreja Internacional da Graça de Deus toma a Jesus Cristo,
que é transformado num produto, como qualquer outro dentro da perspectiva
mercadológica; esse produto é divulgado amplamente para os telespectadores e
147
comercializado pela televisão, sendo oferecido como solução para as mazelas da
vida.
E é nesse sentido, que, no próximo tópico, haverá uma análise do principal
programa televisivo da Igreja Internacional da Graça de Deus, o Show da Fé. Esse
programa transformou a imagem do Missionário Soares, numa imagem conhecida
nacionalmente e, conseqüentemente, alavancou também os projetos da sua
igreja. E ele é de suma importância para se compreender a força midiática da
Igreja Internacional da Graça de Deus hoje em dia.
148
3.3 Programa Show da
A Igreja Internacional da Graça de Deus tornou-se muito conhecida de grande
parte da população brasileira, a partir de 2003, quando colocou no ar diariamente
de segunda a sábado em horário nobre (das 21:00h às 22:00h) pela Rede Band
de Televisão, o programa SHOW DA FÉ. Vale ressaltar também que esse
programa diário, veiculado em horário nobre pela Band é transmitido das 17:00h
às 18:00h por outro canal de Televisão, a Rede TV, e também pela RIT em horário
concomitante com a transmissão da Band.
Segundo informações do site ongrace.com, site que divulga as várias
empresas da Igreja Internacional da Graça de Deus, o programa SHOW DA
está estruturado da seguinte forma:
“O tempo do programa é dividido entre a ministração da palavra, louvor e quadros
fixos:
1- Novela da Vida Real: A pessoa conta a história de transformação da vida dela.
Como Deus agiu em determinada situação e o que mudou depois que ela
aprendeu sobre o Poder de Deus. Os fatos são verídicos, narrados e gravados por
quem vivenciou a história. Câncer, drogas, enfermidades, vícios de cigarro e
álcool, paralíticos, cegos, problema no coração. Coisas que aos olhos humanos
não tinham solução, mas que para Deus não houve limites para operar. Uma
equipe com repórteres formadas acompanham a gravação. Após a exibição da
gravação externa, a pessoa é entrevistada pelo próprio missionário no culto,
momento de muita expectativa e emoção para todos que estão na igreja e
assistem em casa.
2- Abrindo o Coração: Cartas são enviadas pelos telespectadores das mais
diversas cidades do Brasil com histórias dramáticas. Os pedidos de
aconselhamento pastoral referem-se a uma situação específica, geralmente
pessoal, e são lidos durante o culto. Ao final da leitura, o missionário R. R. Soares
faz a orientação com direcionamento bíblico para ajudar a pessoa naquela
determinada situação. A Palavra dirigida naquele momento também serve para
outras pessoas que vivem drama igual ou semelhante.
149
3- Musicais: Cantores do meio evangélico alegram o culto e fazem a adoração
àquele único que é digno de Louvor.
4- Pergunte ao Missionário: São duas questões feitas pelo público para resposta
imediata do missionário. As perguntas variam entre versículos bíblicos, temas
atuais, diferenças de denominações” (fonte:http://ongrace.com/>. Acesso:
22/05/2006).
Vale ressaltar que todos os programas têm o mesmo formato, acrescentando à
citação acima três outros quadros, um no início e os outros dois no final do
programa. O programa sempre começa com a pregação do missionário RR
Soares ou de um outro pastor que dirija o culto (fato raro de acontecer!) e no final
do programa sempre ocorre a oração de libertação realizada pelo missionário,
onde os testemunhos de cura são imediatamente captados, logo após a oração.
Ocorre também nos últimos dez minutos de programa o quadro Agenda dos
Pastores, onde os pastores da Igreja Internacional da Graça de Deus divulgam
seus trabalhos e os endereços de suas igrejas.
Ainda, segundo o site, o programa SHOW DA FÉ é traduzido para outros
idiomas (inglês e espanhol) e é veiculado nos Estados Unidos e no México. No
Brasil ele atinge picos de 09 pontos de audiência, com uma média entre 02 e 03
pontos. Cada ponto representa 54.400 domicílios na Grande São Paulo.
“O SHOW DA ainda é traduzido para o inglês e espanhol e veiculado na
América do Norte, pela PC TV, do México, West Palm Beach e Super Channel dos
Estados Unidos”.
150
(fonte:http://ongrace.com/>. Acesso: 22/05/2006).
O que interessa na tese é analisar alguns depoimentos de dois quadros do
programa SHOW DA FÉ, a saber, o quadro da oração de libertação e novela da
vida real. As transcrições que se seguem procuraram ser fiéis às expressões
usadas pelos membros da igreja. Não há, portanto, nenhuma edição das falas.
Pode-se perceber principalmente nos testemunhos após a oração de libertação,
que as pessoas são muito simples, usando um português com muitos erros.
Em primeiro lugar é necessário dar destaque para o quadro: oração de
libertação. Serão citados dois programas SHOW DA veiculados em dias e
meses diferentes. Um ocorreu no mês de Julho e outro no mês de Agosto, ambos
em 2006. Logo após a transcrição desses quadros acima citados, haverá a
transcrição de um programa onde a atenção recairá no quadro: novela da vida
real.
No programa exibido no dia 07/07/06, o missionário deu início ao quadro
oração de libertação, pedindo a salvação das almas dos presentes que ainda não
tivessem aceitado a Jesus e, logo após, começou a orar por libertação. Ele disse:
“Em nome de Jesus, ó Pai, toque nessa pessoa, nesse coração que está fraco. Ó
meu Deus, na perna junto ao tornozelo parece que tem alguma coisa
queimando, ó Pai, destrua em nome de Jesus. Acabe com essa gastrite também,
ó Pai; destrua essa bactéria que produz isso. Senhor, eu vou usar a autoridade do
Senhor para tua glória. Como ministro da Palavra, eu paraliso toda ação do Diabo.
151
E eu digo: Espírito imundo, pega tudo o que é seu e sai dessa pessoa, vai embora
agora! Eu exijo! Sai com o seu mal em nome de Jesus. E você (referindo-se aos
presentes) diz obrigado Jesus. Abra os olhos; olha para mim. (Num tom retórico,
RR Soares disse para a platéia). Missionário, eu tava realmente com o tornozelo
aqui perto da minha perna queimando, parecia que tinha uma coisa comendo,
assim uma sensação como se algo tivesse lixando, ardendo (então num gesto
rápido ele aponta para sua própria perna). aqui essa pessoa que Deus usou
para eu fazer essa oração. E às vezes é até mais de uma pessoa”.
Logo após a oração e a suposta revelação dos grandes males a serem
enfrentados naquela reunião (coração fraco, dor na perna/tornozelo, gastrite), se
bem que, entre estes, houve uma valorização da dor na perna/tornozelo,
começaram os testemunhos da platéia. Foram sete ao todo, sendo cinco mulheres
e dois homens. Abaixo estão elencados os testemunhos do jeito como foram
pronunciados:
Mulher: Eu cheguei aqui, com assim doendo (ela apontou para o tornozelo),
bem abaixo assim (apontou de novo), aí eu expulsei, falei em nome de Jesus,
pode sair!. Agora na hora da oração acabou de sair.
Mulher: Ontem eu saí da Igreja, quando cheguei em casa, eu tava cozinhando;
parece que tava queimando toda a minha perna. eu peguei e comecei a orar e
nada! E quando foi mais tarde amanheceu inchado assim (ela então aponta para o
tornozelo inchado). Quando foi agora que o senhor orou saiu toda aquela
queimação que estava na minha perna. Acabou, ta um pouquinho inchado
ainda. (quando a câmera focalizou o tornozelo, na verdade, este estava bem
inchado!)
Mulher: No meu tornozelo parecia uma faca cortando. Assim bem inconstante
(sic) a dor né! (ela gesticulou com a mão). Agora em nome de Jesus eu sei que foi
para mim.
Mulher: Uma dor de cabeça que não passava dias. Eu acabei de voltar de
viagem de Peruíbe, mas agora graças ao Senhor Jesus, passou!
Homem: Me deu um mal nos olhos, que era assim como água escorrendo no
vidro, assim! (ele gesticulou com a mão). Mas graças a Deus, agora Deus curou.
Mulher: Eu sempre tenho dor no tornozelo. Cheguei aqui com dor no tornozelo
e agora sumiu a dor.
Homem: No início ele fala algo impossível de traduzir, ele estava muito
emocionado e depois diz: Eu tava no Guarujá. O senhor falou (apontando para o
152
missionário), Deus falou para mim, quando é que tava com dor na barriga (ele
passa a mão na barriga). Na minha garganta tinha um bicho e eu orei e saiu tudo”.
Num outro programa, exibido no dia 24/08/06, o missionário após orientar a
platéia sobre o poder de Jesus, começou a orar da seguinte maneira:
“Olhe assim em suas mãos e diga: Pai, em nome de Cristo, eu te ofereço as
minhas mãos e te peço; coloca Senhor nestas mãos o teu poder. Agora põe a mão
sobre a dor, sobre o defeito físico, sobre a doença, se não for possível coloque a
mão sobre o coração, feche os olhos e diga: Em nome de Jesus eu não aceito,
não permito mal algum na minha vida. Meu corpo fique curado para a glória de
Deus Pai”. Deixe o missionário orar agora:
Pai, eu venho a ti em nome de Jesus abençoar todo esse povo. Eu venho usar a
autoridade que o Senhor tem me dado e eu tenho certeza, meu Deus, que a tua
mão vai fazer maravilhas agora. Pai essa pessoa que tem a mente perturbada,
que não consegue firmar o pensamento; o tantas coisas que estão
atrapalhando, Senhor faça um milagre dentro dessa mente agora e que ela fique
normal.
Agora cure o corpo também, de tudo quanto é mal. Eu vou usar o poder que
tens me dado para a tua glória. Como ministro da Palavra de Deus, eu me dirijo
agora a todo espírito de doença, de enfermidade, a todo mal que se alojou nessa
pessoa. Eu digo agora: espírito de sofrimento isso é uma ordem que eu estou
passando para você. Eu ordeno agora, saia dessa pessoa. Pega a sua dor, o teu
defeito físico, surdez, cegueira, paralisia vai saindo agora, mal que paralisou os
rins, que destruiu o pâncreas. Saía dessa pessoa para nunca mais voltar, em
nome de Jesus!
Levante as mãos, Oh adore a Deus porque ele está agindo em sua vida. Pai,
muito obrigado! Recebemos a bênção em nome de Jesus.
Abra os seus olhos e abaixe as suas mãos. Faça agora o que você não podia
fazer. Você não podia levantar a cabeça, levante, abaixe; jogue para a esquerda
para a direita. Faz o que você não podia fazer. Não podia dobrar a perna, dobre
agora, em nome de Jesus.
Num tom retórico ele diz: Missionário, quem era eu para levantar o joelho? Ó
missionário, o meu mal saiu agora.
Quem é que o mal saiu agora? Levante a mão em nome de Jesus. Após olhar
para a platéia, ele disse: Nós temos já várias pessoas. Conte para nós.
Enquanto eu vou pegar testemunhos, muita gente vai ser curada. Creia
agora! Esse vai ser o seu momento. Diga aqui minha irmã:
153
Mulher: Olha! eu andava com uma dor muito forte aqui no ombro. O dico
falou que era problema de coração. O missionário a interrompeu e perguntou: Saiu
agora? Ela disse: saiu!
Mulher: Estava com muita dor nas juntas dos dedos. Passou agora graças a
Deus. Cheia de dor, nos dez dedos da mão. O missionário a interpelou dizendo:
Para abrir e fechar doía. Ela respondeu: Doía! Agora saiu tudo.
Mulher: Missionário, eu ontem à noite tava me programando para vir aqui e
amanheci com as mãos inchadas e os pés também. Quando eu cheguei aqui, eu
não conseguia mexer com esse dedo (ela mostrou todos os dedos da mão!), ainda
um pouco inchado, mas estou mexendo com as mãos. O missionário então
gritou do púlpito: Aleluia! Glória a Deus.
4ª Mulher: Meu joelho estala. Quando eu subo degrau, ele faz ...(então ela fez um
barulho com a boca, que mais parecia com um portão velho rangendo. O
missionário e a platéia riram.) Quando eu estou em casa e eu estou vendo o
Senhor, eu ponho a mão. O missionário a interrompeu e disse: então pára de
doer? Ela respondeu: Graças a Deus, to curada!
5ª Mulher: Problema de astrose (ela provavelmente queria dizer artrose) e coluna.
Tenho muita dor. Cheguei com muita dor e agora saiu tudo.
1º Homem: Dor nas costas. Tava doendo muito, passou!
6ª Mulher: Uma dor muito forte na batata da perna.
Mulher: Forte dor no lado esquerdo, pés inchados, desinchou para a glória do
Senhor.
Mulher: Eu estava com muita dor nos pés, mais de seis meses. Eu quase
não posso andar quando me levanto. E agora eu levantei e eu não to sentindo
mais.
Homem: Eu passei mal durante a noite porque eu comi uma pizza ontem à
noite. De madrugada precisei levantar para tomar remédio e por isso não vim na
reunião das sete. Mas agora, graças a Deus, passou o mal.
Homem: Tava com uma dor nas vistas. Não conseguia abrir as vistas. Agora
passou.
9ª Mulher: Dor na coluna.
10ª Mulher: Pastor depois que eu fui associada agora, eu quase morri com uma
dor. (O missionário olhou para ela com um olhar de reprovação) Então ela disse:
É sim pastor! O missionário disse: Veio uma dor para a senhora? Ela respondeu:
Sim tomou tudo. O missionário rindo disse: mandou embora? Ela então
respondeu: Mandei! Vai pros infernos, em nome de Jesus. (ouvem-se risos do
missionário e da platéia e assim foi finalizado o quadro).
Pode-se perceber pelos testemunhos acima mencionados que esse quadro do
programa SHOW DA FÉ cumpre aquilo que Danièle Hervieu-Léger (2000) chamou
de “comunidades emocionais”. Todos os testemunhos são dados com uma
emoção muito grande, uma catarse coletiva e o fato de saberem que estão
154
sendo filmados e que aparecerão em rede nacional aflora ainda mais essa
emoção. A relação com a divindade parece ser passageira e fugaz, de ordem
utilitarista mesmo, uma relação baseada nos interesses individuais. A Igreja
Internacional da Graça de Deus é filha do movimento pentecostal, no entanto está
distante do seu fato fundador. Mudou sem reconhecer que mudou. O que importa
hoje não é a glossolalia dos tempos primeiros, mas a cura, a libertação e o bem
estar individual.
Depois de transcrever essas duas sessões do quadro oração de libertação, é
mister agora fazer o mesmo com o quadro: novela da vida real, exibido no dia
22/09/06. O título da novela da vida real exibida nesse dia é esse: Eu sou um
milagre de Deus.
Eu sou um milagre de Deus
Nome: Sônia – Gerente de Loja
nove anos atrás eu servia a outros deuses. Eu era uma pessoa
completamente vazia, uma pessoa infeliz, uma pessoa que conhecia um deus
morto. Conheci vários deuses que mentiram, me enganaram dizendo que eu
estava fazendo a coisa certa, mas eram deuses que quase me levaram à morte.
Como pode você achar que está fazendo a coisa certa prejudicando outras
pessoas. Deus não faz isso.
Locutor: Sônia visitou pela primeira vez a casa de espíritos quando levou um
irmão para consultá-los.
Eu fiquei meio assustada assim. E de repente, tinha uma pessoa que estava
incorporada, e aquela pessoa saiu assim totalmente endemoninhada, agressiva.
Meu irmão estava fraco; quando eu vi que ele (pessoa endemoninhada) vinha
para dar um coice no meu irmão. Eu nem pensei; em questão de segundos, eu
senti como se alguém me jogasse ali para proteger o meu irmão, que na hora
que ele foi dar o coice eu recebi aqui (ela aponta para a barriga) como se fosse
duas pata (sic). No que senti essa patada, perdi a consciência e quando eu voltei
a mim, eles disseram assim: “Você é filha de Lúcifer!” Mas eu não entendia isso.
Eu assim, “Você é filha de Lúcifer!” Eu fiquei assim, mas o que é isso? Eu fiquei
ali, mas eu não entendia; você fica cega espiritualmente falando. eu fui
entrando, quando eu vi estava super envolvida, mas sempre eu tinha dentro do
meu coração uma diferença, que hoje eu sei. Eu era separada, não para eles,
155
mas para Jesus. Eu sempre tinha algo além do que eu estava vivendo ali, eu
sempre dizia assim. Eu sempre pensava em Deus, mas eu não conhecia a Deus
da forma que eu conheço hoje.
Eu cheguei na Igreja da Graça olhando o missionário pregar. Eu sempre
escutava ele na minha casa e eu pensava assim. Mas é assim que eu penso! E às
vezes, ele me dava palavras que eram para mim. Muitas orações eram para mim.
Deus estava falando comigo através desse missionário. E Deus falava comigo.
E eu fui mesmo porque eu e o meu esposo, a gente quer um compromisso
sério com o Senhor Jesus. A gente não quer brincar de Igreja. A gente quer viver
Jesus. A gente quer falar o que Jesus fez nas nossas vidas. Nós queremos servir
Jesus verdadeiramente. s queremos ser como Jesus era; ela não fazia acepção
de pessoas.
Joel – esposo de Sônia.
Eu também estava vindo de um passado muito triste. Eu me envolvi com
drogas no passado, então a minha vida foi muito derrotada no passado. E graças
a Deus, eu conheci a Jesus, eu me convertei (sic).
A gente tem enriquecido espiritualmente a cada dia, a cada participação, a
cada reunião. A nossa vida é uma alegria, é um gozo. A gente é muito feliz, a
gente tá sempre em comunhão um com o outro; um ajuda o outro no lado
espiritual, a gente tá sempre orando. Nós amamos ir na (sic) Igreja buscar o
Senhor Jesus. Nós ajudamos as pessoas a conhecer o Senhor Jesus. Então, a
nossa vida é muito maravilhosa.
Sônia (chorando): Eu sempre dizia: Deus eu sei que tu estás comigo e eu vou
vencer. E eu venci, eu estou aqui hoje, eu não tenho mais medo. Hoje eu sei
determinar: Sai demônio! Se vem contra mim, eu digo: comigo não tem mais vez!
Eu não sou de vocês, eu sou de Jesus e isso é que faz a diferença. Hoje eu digo
assim: Eu sou livre! Eu não era livre. Eu sou livre em Jesus, eu posso todas coisas
em Jesus. Eu digo para as pessoas que me conhecem; onde eu trabalho. Vocês
podem viver o que eu estou vivendo porque Jesus fez na minha vida. Jesus me
curou; corpo, alma e espírito. E eu estou viva, eu sou um milagre de Deus. Eu
posso dizer: Eu sou um milagre de Deus.
Testemunhos como esses que foram registrados, tanto no quadro oração de
libertação, quanto no quadro novela da vida real o fundamentais, para se
compreender a relação mídia e neopentecostalismo. Pode-se dizer que os
testemunhos são a mola propulsora da conquista de novos fiéis e simpatizantes
para a Igreja Internacional da Graça de Deus e do sucesso do programa Show da
Fé.
156
O que chama a atenção na estrutura do programa Show da é a
supervalorização do testemunho.
O testemunho tem um papel central no programa televisivo da Igreja
Internacional da Graça de Deus. Se o nome de Jesus é exaltado o tempo todo no
programa devido ao seu poder de transformar realidades, o meio de
operacionalizar tal poder tornando-o facilmente assimilável para o grande público
é o testemunho. As pessoas são ensinadas a tomar posse da bênção em nome de
Jesus. RR Soares num livreto de sua autoria diz o seguinte comentando a
passagem bíblica do Evangelho de João 14.13.
“E tudo quanto pedirdes em meu nome, eu o farei, para que o pai seja glorificado
no Filho”. Aqui está a grande revelação. A palavra pedirdes foi mal-traduzida. O
verbo pedir (sozo e seus cognatos, em língua grega) tem o sentido de determinar,
exigir, mandar. Em outras palavras, não precisamos pedir ao Senhor a bênção,
mas exigir que ela se manifeste em nossa vida. Nesse ponto, reside praticamente
metade do segredo do sucesso na vida espiritual. Exigir a bênção que, segundo
a Palavra, é nossa é simplesmente concordar com o Senhor e não deixar o
diabo ficar com aquilo que nos pertence. Ao exigirmos o cumprimento de tudo o
que legalmente nos pertence, estamos agindo estritamente dentro da vontade do
Senhor, expressa nas Escrituras. Certamente, não podemos exigir que Deus faça
algo por nós. Exigir a bênção não é dar ordens ao Senhor, mas é obedecer a Ele,
começar a assumir a posição de filho de Deus, e reconhecer que, quando Jesus
morreu no Calvário, pagando com a vida o preço do pecado de Adão, nós fomos
reconciliados trazidos a Deus. A maioria do povo de Deus está fazendo
exatamente o oposto do que deveria ser feito. Ora e jejua, suplicando ao Senhor
para dar-lhe algo que, na verdade, ele concedeu. Este não é o caminho para
recebermos as bênçãos de Deus. A maneira correta é exigir em Nome de Jesus
que o mal saia da nossa vida. SOARES, (2004) p.p.19-20.
O grande público deve aprender a tomar posse da bênção, mas é necessário
que este público tenha exemplos concretos de que tal prática de fato funciona, por
isso, numa análise cuidadosa do programa, percebe-se que o testemunho aparece
em quase todos os quadros, seja ressaltando as bênçãos de toda sorte recebidas,
a cura do mal incurável, a reconstrução de relacionamentos entre pais e filhos,
esposo e esposa, a vitória sobre as drogas, principalmente sobre o álcool.
157
Algumas questões devem ser colocadas aqui. De que forma o testemunho
credibilidade à oferta religiosa? O que leva várias pessoas que assistem ao
programa Show da Fé a optarem por participar da Igreja Internacional da Graça?
Quais são os elementos que aparecem nos testemunhos que motivam o
telespectador a acreditar na veracidade de tal fala. Usando a teoria de Rodney
Stark, pretende-se neste trabalho responder a essas perguntas. Para tal é
necessário recorrer a alguns elementos da teoria da escolha racional e isso será
realizado no próximo tópico.
158
3.4 APLICAÇÃO DA TEORIA DA ESCOLHA RACIONAL
Para se entender melhor a proposta deste trabalho, é necessário recorrer ao
cerne da teoria de Rodney Stark, esta é apresentada no capítulo dois do seu livro,
Uma Teoria da Religião
32
e é intitulada o coração da teoria: compromisso
religioso.
Nesse capítulo, Rodney Stark e William Sims Bainbridge desenvolvem um
modelo daquilo que eles entendem como as propriedades elementares da religião.
Alguns questionamentos acompanharão toda a construção desse modelo, tais
como: “Por que os seres humanos desenvolvem religião? O que recebem da
religião? Por que tipos particulares de povos são religiosos de maneira distinta?”
STARK, Rodney (1987) p.1 .
Na busca de uma teoria da religião que compreenda os fundamentos da
expressão religiosa humana, são apresentados sete axiomas, com afirmações
bem simples acerca dos seres humanos ou da condição humana. Na tentativa de
oferecer uma teoria consistente da religião e não simplesmente sistemas de
classificação (Stark, Rever, p.2), os autores promovem uma redução científica,
lembrando que toda ciência que se queira como tal, deve assumir seus
pressupostos em matéria de redução. Stark e Bainbridge fazem isso sem nenhum
constrangimento e assumem que o grande mérito do trabalho de ambos está
nessa empreitada.
“Acreditamos ser um grande mérito de nossa teoria o fato de derivar fenômenos
religiosos a partir de fenômenos não religiosos, de reduzir uma teoria da religião a
uma teoria geral da ação humana”. (STARK, 2006, p.2)
32
Todas as citações em português foram traduzidas da obra original de Rodney Stark, A Theory of
Religion, por um grupo de alunos do Programa de Ciências da Religião da PUCSP, em curso
ministrado pelo Dr. Frank Usarski. Portanto, as referências de páginas em português referem-se à
apostila que foi montada para tal curso no ano de 2006.
159
A teoria da religião de Stark e Bainbridge está estruturada em sete axiomas,
onde se pode perceber a simplicidade das afirmações que visam açambarcar as
ações dos seres humanos ou mesmo a condição humana.
Derivam-se desses axiomas uma série de informações que foram qualificadas
pelos autores de proposições.
Ligando os axiomas e as proposições ao mundo empírico aparecem as
definições. Estas operacionalizam o funcionamento da teoria. Para facilitar a
compreensão dos leitores, Stark e Bainbridge procuraram enumerar os axiomas,
as proposições e as definições. Os axiomas são sempre identificados pela letra A,
as proposições pela letra P, e as definições pela abreviação Def.
Com a teoria em pleno funcionamento, percebe-se que aqueles 07 axiomas
iniciais produziram 104 definições e 344 proposições. Aliás, vale registrar que a
leitura da obra inicialmente é bem difícil, pois é um tipo de abordagem que não
soa familiar para os pesquisadores da área das ciências humanas. Contudo,
aqueles que resistirem encontrarão uma excelente ferramenta para abordar o
fenômeno religioso. Não nenhum interesse aqui em expor todas os axiomas,
proposições e definições que foram abordados nesse capítulo dois da obra de
Stark. O que interessa aqui é apontar os axiomas, proposições e definições que
serão úteis na análise do objeto escolhido, a saber, o impacto do testemunho
dentro do programa Show da e, conseqüentemente, como isso gera a força
midiática da Igreja Internacional da Graça de Deus.
Sobre os axiomas, definições e proposições que interessam para esse
trabalho, segue abaixo a exposição dos mesmos:
A2 Os seres humanos buscam o que percebem ser recompensas e evitam o
que percebem ser custos.
Def. 3 – Recompensas são tudo o que os seres humanos incorrem em custos para
obter.
Def. 4 – Custos são tudo o que os seres humanos tentam evitar.
160
A4 A ão humana é orientada por sistema de processamento de informações
complexo, porém finito, de modo a identificar problemas e buscar soluções para
eles.
Def.7 A mente é o conjunto de funções que direciona as ações de uma pessoa.
Def.8 Os problemas humanos são situações recorrentes que requerem
investimentos (custos) específicos para que as recompensas sejam
obtidas.
Def.9 Solucionar um problema significa imaginar possíveis meios de alcançar a
recompensa desejada, escolher aquele com maior probabilidade de
sucesso à luz das informações disponíveis, e direcionar a ação ao longo
da linha escolhida até que a recompensa seja alcançada.
P3 Ao resolver problemas, a mente humana tem que procurar explicações.
Def.10 Explicações são afirmações sobre como e por que recompensas
podem ser obtidas e os custos, enfrentados.
P4 Explicações são recompensas com algum grau de generalidade.
A6 A maioria das recompensas buscadas pelas pessoas são destruídas
conforme são usadas.
Def.13 Consumíveis são as recompensas que são destruídas conforme são
usadas.
P6 Na busca por recompensas, os seres humanos intercambiam recompensas
uns com os outros.
P7 Os seres humanos buscam altas taxas de troca.
Def. 14 Taxa de troca é a relação entre as recompensas obtidas e os custos
despendidos em uma troca. .
161
O axioma nº 2 da teoria da escolha racional diz que os seres humanos buscam
o que percebem ser recompensas e evitam o que percebem ser custos. Percebe-
se claramente que este axioma está embasado num princípio utilitarista, ou seja,
no princípio desenvolvido no século XVIII no contexto da filosofia inglesa, em que
a ação dos seres humanos é orientada pela busca do prazer (recompensa) e a
tentativa de evitar aquilo que gera dor (custos).
Em matéria de religião, a ação dos seres humanos também orienta-se nessa
direção, busca-se na religião aquilo que traga prazer e evite a dor, aquilo que traz
recompensa, se possível sem custos.
O programa Show da Fé, com seu forte apelo voltado para o testemunho
estimula a aceitação por parte dos ouvintes. O testemunho tem o papel de
oferecer credibilidade aquilo que está sendo ofertado pelo programa. Para o
testemunhante, a pregação ouvida no programa se transformou numa
recompensa, pois a sua fala demonstra que uma mudança ocorreu em sua vida.
Esse testemunho tem a função de despertar no telespectador o desejo de
encontrar essa possibilidade de mudança, ou seja, usando um linguajar típico
desse contexto religioso; de tomar posse da bênção (recompensa) que está
disponível.
No entanto, vale ressaltar que toda recompensa pressupõe que haverá um
certo tipo de custo para obtê-la. Não há recompensa sem custos, o que deve estar
em pauta é a tentativa de minimizar esses custos.
No conforto do seu lar, em pleno horário nobre, qual é o custo que o
telespectador terá? Pode-se dizer que um custo mínimo. Ele terá, por exemplo,
que sacrificar o seu velho hábito de assistir às novelas. Aliás, o missionário RR
Soares diz que as novelas definem valores e que a degradação das famílias
brasileiras teve o seu início com o “boom” das novelas veiculadas em horário
nobre na TV brasileira.
“RR Soares é alguém, sobretudo, preocupado com a família e com o efeito danoso
da TV. ‘Depois que o Brasil conheceu as novelas pela televisão, a família
brasileira praticamente acabou. As pessoas absorvem aqueles conceitos e
passam a praticá-los’, analisa Soares, o qual usa seus programas na TV para
mudar essa realidade”. (Revista Graça Show da Fé, p.50)
162
Um outro aspecto que deve ser ressaltado nesse processo é que o
telespectador buscará aquela recompensa que lhe está sendo ofertada, se de
fato ele tiver necessidade dela. Por meio dos testemunhos, ele identifica um
problema, ou vários problemas que devem ser solucionados em sua vida. Os
testemunhos funcionam como tipos ideais, sempre tocando em pontos
nevrálgicos que afligem boa parte das pessoas que assistem ao programa.
Problemas relacionados às dores espalhadas pelo corpo são coisas muito
comuns. Isso aparece principalmente no quadro da oração de libertação. São
curas rápidas, instantâneas, ocorridas supostamente após a oração do
missionário. Por exemplo, no programa do dia 07/07/2006 que teve os
testemunhos transcritos nesse trabalho, houve uma forte ênfase em dores nas
pernas, nos tornozelos, problemas relacionados ao coração (coração fraco) e
problemas estomacais (gastrite). Assim que o missionário termina a oração, os
obreiros deslocam-se rapidamente pelo interior do templo na busca de
testemunhos que comprovem a eficácia da oração realizada pelo missionário.
no quadro novela da vida real, o enfoque recai geralmente em problemas
existenciais. Lares que estavam destruídos pelos vícios (bebidas, cigarro, drogas
em geral) e que foram reconstruídos mediante a aceitação da proposta oferecida
pelo programa. É muito comum a repetição da fórmula nesse quadro. Geralmente
um dos cônjuges que está vivenciando uma crise terrível em seu relacionamento,
ao assistir ao programa aceita a proposta e isso causa mudanças também no
parceiro que ao perceber uma sensível melhora no seu relacionamento, interessa-
se também pela recompensa.
Interessante perceber que tanto no caso da cura das dores físicas, quanto no
caso da cura das dores existenciais, sempre um culpado ou culpados, a saber,
o diabo e seus asseclas, que foram repreendidos pelo poder da oração do
missionário. Percebe-se isso, ao analisar trechos das orações de libertação
realizadas pelo missionário nos programas já mencionados.
“Em nome de Jesus, ó Pai, toque nessa pessoa, nesse coração que está fraco. Ó
meu Deus, na perna junto ao tornozelo parece que tem alguma coisa
163
queimando, ó Pai, destrua em nome de Jesus. Acabe com essa gastrite também,
ó Pai; destrua essa bactéria que produz isso. Senhor, eu vou usar a autoridade do
Senhor para tua glória. Como ministro da Palavra, eu paraliso toda ação do Diabo.
E eu digo: Espírito imundo pega tudo o que é seu e sai dessa pessoa, vai embora
agora! Eu exijo! Sai com o seu mal em nome de Jesus”. (Programa exibido dia
07/07/2006).
“Senhor, faça um milagre dentro dessa mente agora e que ela fique normal. Agora
cure o corpo também, de tudo quanto é mal. Eu vou usar o poder que tens me
dado para a tua glória. Como ministro da Palavra de Deus, eu me dirijo agora a
todo espírito de doença, de enfermidade, a todo mal que se alojou nessa pessoa.
Eu digo agora: espírito de sofrimento isso é uma ordem que eu estou passando
para você. Eu ordeno agora, saía dessa pessoa. Pega a sua dor, o teu defeito
físico, surdez, cegueira, paralisia vai saindo agora, mal que paralisou os rins, que
destruiu o pâncreas. Saia dessa pessoa para nunca mais voltar, em nome de
Jesus!” (Programa exibido dia 24/08/2006).
O “inimigo” e seus auxiliares tiveram os seus planos infernais descobertos. E
os telespectadores aprenderam, via programa, como controlar esses entes. É o
caso do testemunho da mulher do quadro novela da vida real, transcrito nesse
trabalho.
“Sônia (chorando): Eu sempre dizia: Deus, eu sei que tu estás comigo e eu vou
vencer. E eu venci, eu estou aqui hoje, eu não tenho mais medo. Hoje eu sei
determinar: Sai demônio! Se vem contra mim, eu digo: comigo não tem mais vez!
Eu não sou de vocês, eu sou de Jesus e isso é que faz a diferença. Hoje eu digo
assim: Eu sou livre! Eu não era livre. Eu sou livre em Jesus, eu posso todas coisas
em Jesus. Eu digo para as pessoas que me conhecem; onde eu trabalho. Vocês
podem viver o que eu estou vivendo porque Jesus fez na minha vida. Jesus me
curou; corpo, alma e espírito. E eu estou viva, eu sou um milagre de Deus. Eu
posso dizer: Eu sou um milagre de Deus”.
164
Novamente a teoria de Rodney Stark é de grande valia. No axioma 4 se lê: A
ação humana é orientada por sistema de processamento de informações
complexo, porém finito, de modo a identificar problemas e buscar soluções para
eles.
No fundo, o que ocorre é que o Programa Show da Fé oferece uma explicação
razoável para os problemas dos telespectadores. Ao culpar o diabo e seus
asseclas, o programa detectou a causa de todos os males, físicos e existenciais.
Isso cria um esquema mental muito interessante, pois os telespectadores
possuem conhecimento sobre os males, agora é necessário investir para que as
recompensas sejam obtidas. Como o próprio Stark diz:
“A mente é freqüentemente conceitualizada pelos cientistas sociais como o
sistema nervoso conforme modificado pelo aprendizado. É mais do que
simplesmente o cérebro. Em termos cibernéticos, o cérebro é o hardware,
enquanto o aprendizado é o software. A mente é a combinação total do hardware
mais o software requerido para direcionar a ação humana”.
Não importa qual seja o problema, o diabo sempre será culpado pelo fracasso
e pelas mazelas dos indivíduos, as explicações são sempre genéricas.
Todo esforço deve ser empregado para solucionar os problemas. Os
telespectadores tiveram a oportunidade de reconhecer os seus problemas e
resolvê-los por meio do programa, por isso são instados à fidelidade para que as
recompensas sejam obtidas plenamente e os custos devem ser enfrentados, ou
seja, há uma cota de sacrifício na relação.
Como num primeiro momento, a recompensa chegou ao telespectador com um
custo mínimo, isso poderia criar a falsa idéia de que essa prática religiosa
desembocaria numa religiosidade “vida mansa”, afinal basta sentar-se à frente de
um aparelho de TV e receber aquilo como um ser passivo, no entanto, não é isso
que ocorre com os telespectadores que atendem ao apelo do testemunho e
passam a buscar suas recompensas.
165
No axioma nº6 da teoria a seguinte afirmação: A maioria das recompensas
buscadas pelas pessoas são destruídas conforme são usadas.
A cura física ou existencial não possui perenidade. A manutenção das
recompensas depende da volta constante à fonte de recompensas. Isso faz com
que o telespectador tenha que entrar numa relação de troca com a divindade e
seus representantes. Não se pode esquecer que os seres humanos buscam altas
taxas de troca. Sem que se perceba, o telespectador que aceitou a oferta religiosa
(proposta) tornou-se um parceiro de troca com o programa. Essa parceria fica
evidente no convite/convocação para que o telespectador torne-se um
“patrocinador” (alguém que contribui regularmente para que o programa seja
mantido no ar) ou na proposta para que adquira os produtos da Graça Editorial
(CDs, livros, revista). Se tudo aquilo fez sentido para o telespectador, este passa a
intercambiar essas recompensas com outros, criando assim uma rede de
alimentação do projeto.
E, geralmente, os primeiros a serem buscados na relação de troca da
recompensa adquirida são os familiares. Mais uma vez é necessário recorrer à
transcrição do quadro da novela da vida real, vejam:
“Eu também estava vindo de um passado muito triste. Eu me envolvi com drogas
no passado, então a minha vida foi muito derrotada no passado. E graças a Deus,
eu conheci a Jesus, eu me convertei (sic).
A gente tem enriquecido espiritualmente a cada dia, a cada participação, a cada
reunião. A nossa vida é uma alegria, é um gozo. A gente é muito feliz, a gente ta
sempre em comunhão um com o outro; um ajuda o outro no lado espiritual, a
gente tá sempre orando. Nós amamos ir na (sic) Igreja buscar o Senhor Jesus.
Nós ajudamos as pessoas a conhecer o Senhor Jesus. Então, a nossa vida é
muito maravilhosa”. (programa exibido dia 22/09)
Um testemunho como esse funciona muito bem para cativar casais que
estejam experimentando dificuldades em seus relacionamentos. Qualquer esposo
que perceba que o casamento melhorou muito depois que a esposa aceitou a
166
oferta religiosa, entende que os prós são maiores que os contras, que as
recompensas obtidas são maiores que os custos despendidos, portanto a adesão
dele à oferta religiosa acontecerá naturalmente se ele fizer um cálculo racional,
tornando-se nesse caso membro da Igreja Internacional da Graça de Deus, ou até
tornando-se membro de uma outra comunidade, mas preservando sua relação de
troca com aqueles que lhe ofereceram a explicação que mudou sua vida. A
conversão nessa situação é uma escolha racional. Vale ressaltar que isso nunca
ou quase nunca ficará claro para o converso. Ele sempre justificará sua nova
opção de vida, sua nova religiosidade com um discurso marcadamente
espiritualista. Isso tamm soará estranho para a maioria dos estudiosos de
religião no Brasil, mas, se estes analisarem a fundo a questão, verão que a
conversão sempre tem um aspecto racional que a justifica. Conversão é uma
escolha racional ornamentada com adereços espirituais, mas sempre dentro de
uma opção racional e, no caso estudado aqui, operacionalizada via testemunhos.
O programa Show da e seu forte apelo valorizando o testemunho é um
excelente exemplo de como a religião pode ser estudada dentro de um crivo
puramente racional. Escolha racional e mídia são elementos importantíssimos
para se compreender o sucesso de algumas igrejas neopentecostais no Brasil, e
especialmente a força midiática da Igreja Internacional da Graça de Deus.
167
3.5 Nossa Rádio
Esse tópico é destinado especialmente ao veículo de comunicação que marcou
inicialmente, a relação entre religiosidade e mídia no Brasil. Como uma mídia
quente, o rádio foi e continua sendo usado por muitos comunicadores religiosos.
No entanto, a Igreja Internacional da Graça de Deus não o utiliza como principal
mídia. Vale lembrar que Soares, o grande líder da IIGD é definitivamente um
homem de televisão, só que isso não o impede de investir também no rádio. O que
faremos nesse tópico é um breve histórico das relações do poder de comunicação
do rádio no país e a forma como IIGD o usa. Para se ter uma idéia, a Nossa Rádio
da IIGD existe somente 06 anos. Ela foi inaugurada em 2002, quando Soares
havia conseguido realizar seu antigo sonho de possuir uma rede de televisão.
O século XX marca o início da comunicação de massa e o grande pioneiro nesse
segmento é o rádio. O historiador Eric Hobsbawm refere-se da seguinte maneira a
esse poderoso meio de comunicação:
“... sua capacidade de falar simultaneamente a incontáveis milhões, cada um
deles sentindo-se abordado como indivíduo, transformava-o numa ferramenta
inconcebivelmente poderosa de transformação de massa, como governantes e
vendedores logo perceberam, para propaganda política e publicidade”.
(HOBSBAWM, 1995, p.194)
A invenção do rádio data de 1901 e seu inventor Guilherme Marconi foi
homenageado em 1909 com o Prêmio Nobel, ainda nesse ano nos EUA ocorreu a
primeira transmissão experimental, e esse ato marca a relação muito estreita entre
o rádio e a religião. Leonildo Silveira Campos (1999) registra assim o episódio:
168
“... em 1909, quando o pioneiro Reginald Fersenden fez sua transmissão
experimental histórica, nos Estados Unidos a religião marcou a sua presença e o
pioneiro inaugurou o rádio lendo uma passagem bíblica”. (CAMPOS, 1997, p.266)
Essa parceria entre rádio e religião é antiga e profícua. No Brasil essa parceria
tem um grande impacto na pregação de várias denominações religiosas.
Aqui, o rádio era visto como um meio para a promoção da cultura num país
que, no início do século XX, estava tentando encontrar sua identidade. Não por
acaso, os pioneiros nessa área eram intelectuais, entre eles o médico e
antropólogo, Edgar Roquette Pinto
33
, (que nos anos dez do século XX participou
da Comissão Construtora de Linhas Telegráficas de Mato Grosso ao Amazonas,
mais conhecida como Comissão Rondon) que queriam usar o rádio para extirpar,
ou pelo menos amenizar os males culturais do país.
“O rádio foi lançado no Brasil por um grupo de intelectuais que via no veículo a
possibilidade de elevar o nível cultural do país. Edgar Roquette Pinto era médico e
antropólogo, e foi membro da Academia Brasileira de Ciências, da Academia
Nacional de Medicina e da Academia Brasileira de Letras, sendo ainda o fundador
do Instituto Nacional de Cinema Educativo. O companheiro de Roquette Pinto na
empreitada da Rádio Sociedade, Henrique Morize, era presidente da Academia
Brasileira de Ciência. Ambos viam no rádio a saída para os ‘males culturais do
país’ ”. (CALABRE, 2004, p.21)
33
. “O médico e antropólogo Edgar Roquette Pinto participou, de julho a setembro de 1912, da
viagem científica da Comissão Rondon à Serra do Norte, em região hoje pertencente aos estados
de Mato Grosso e Rondônia. Um dos principais objetivos da expedição era o estudo do povo
nambiquara, que nos anos imediatamente anteriores havia sido contatado por integrantes da
Comissão. Da viagem resultou a publicação em 1917, do livro Rondonia, que após, receber o
Prêmio Pedro II, conferido pelo Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro no mesmo ano, alcançou
grande repercussão nos meios científico e cultural”. Rondonia pode ser lido ao mesmo tempo
como livro de pesquisa, de defesa de uma perspectiva de ciência e de sociedade, e de denúncia
dos contrastes sociais e do desconhecimento e da alienação das elites intelectuais e políticas no
que se refere ao Brasil do início do século passado. A crítica àqueles que não conheciam o país e
insistiam em pensá-lo a partir dos centros urbanos, ignorando seus longínquos e diversificados
sertões, é um dos pontos mais fortes do livro e o inscrevem entre as grandes obras do pensamento
social brasileiro”. LIMA, Nísia Trindade; SANTOS, Ricardo Ventura; JUNIOR, Carlos E.A. Coimbra.
Rondonia de Roquette Pinto: as veias do Brasil. In: Revista de História. Rio de Janeiro. Ano 1,
11, p.p.24-25, Agosto de 2006.
169
De fato o Brasil na década de 20 do século passado, com uma população
eminentemente rural tinha uma taxa de analfabetismo vergonhosa como pode se
depreender a partir da tabela abaixo:
BRASIL
TAXA DE ANALFABETISMO, POPULAÇÃO DE 10 ANOS OU MAIS
(1920-1970)
1920 1940 1950 1960 1970
72,09* 56,96 51,65 39,37 32,05
Fonte: Dados Brutos: Tabulações avançadas do Censo Demográfico e Anuário
Estatístico do Brasil, FIBGE. In: D’ARAÚJO, Maria Celina. A Era Vargas, p.71.
(*) Para 1920, população de 07 anos ou mais.
Enquanto os intelectuais viam o rádio como um meio para minimizar os males
culturais do país, os religiosos o verão como um meio de minimizar ou mesmo
solucionar definitivamente os males “espirituais” que assolavam a pátria.
Os primeiros aparelhos de rádio presentes no Brasil são os chamados, “rádios
de galena”, que as pessoas com poder aquisitivo alto poderiam comprar
montados, ou simplesmente comprar as peças separadas e depois montá-los.
Esses rádios de galena eram rádios de escuta individual, onde se usava um fone
de ouvido. Além de caríssimos, esses aparelhos tinham uma qualidade de
recepção muito ruim, pois o sistema de transmissão era de baixa potência e de
difícil captação. Com a chegada no país, dos rádios com alto-falantes, já
montados, a escuta radiofônica ganha uma perspectiva coletiva.
“A possibilidade de escuta coletiva por toda a família ou por todas as pessoas
presentes nos recintos onde estivessem os aparelhos de rádio aumentou o
interesse pelo veículo e deu início ao processo de popularização do mesmo”.
(ibid., p.22)
170
No início da década de 20, muitos países já possuem estações de rádio e a
popularização desse meio de comunicação é algo inevitável. Em relação ao Brasil,
no ano de 1922, por ocasião do centenário da Proclamação da Independência,
foram importados 80 aparelhos de rádio.
“1922 - Já existem estações de rádio com programações regulares em quase todo
o mundo, incluindo a Argentina, Canadá, União Soviética, Espanha e
Dinamarca. Em 7 de setembro do mesmo ano, o discurso do presidente da
República, Epitácio Pessoa, em comemoração ao centenário da independência do
Brasil é transmitido via rádio, trata-se da primeira transmissão oficial pelo novo
veículo de comunicação. Foram importados 80 receptores de dio especialmente
para o evento. Em outubro, nasce a britânica BBC (Britsh Broadcasting Company),
em paralelo com as primeiras estações de rádio em Shangai, na China, e em
Cuba”. História da Radiodifusão. Disponível em: http://www.mc.gov.br/>. Acesso:
11/07/2007.
Nesse momento, o rádio passa a ser utilizado no Brasil por clubes e
sociedades de caráter erudito e literomusical que divulgavam seus conteúdos
(FONSECA, 2003, p.45); outro aspecto importante é que o dio nesse momento
não possuía um aspecto comercial. Os aparelhos eram poucos e caros e os que
queriam utilizá-los deveriam pagar uma taxa ao Estado, devido ao uso das ondas
hertzianas. Somente na década de 30, aparecem os dios com válvulas e
especificamente em 1932, o Estado passou a permitir a publicidade e as rádios
existentes na época (onze emissoras somente) poderiam dedicar 10% de seu
tempo diário para a venda de produtos e anúncios pagos. Os decretos que
regulamentavam a questão da radiodifusão no país são:
171
“O Decreto 21.111, de de março [de 1932], que regulamentou o Decreto nº
20.047, de maio de 1931, primeiro diploma legal sobre a radiodifusão define o
rádio como ‘serviço de interesse nacional e de finalidade educativa’. No mesmo
ano, o Decreto 21.111, autoriza a veiculação de propaganda pelo rádio, tendo
limitado sua manifestação, inicialmente, a 10% da programação”. História da
Radiodifusão. Disponível em: http://www.mc.gov.br/>. Acesso: 11/07/2007.
Esse é o momento inicial da popularização do rádio. Com um instrumento tão
poderoso para atingir as massas, os vários grupos religiosos não hesitaram em
usá-lo.
Na década de 1940, tem início a presença religiosa dita evangélica no rádio,
como foi apontado nesse trabalho e, de para cá, muitos grupos religiosos
aproveitaram-se das facilidades do rádio, e como foi dito também, a Igreja
Pentecostal Deus é Amor é a campeã de utilização dessa mídia. No entanto, o
que nos interessa nessa tese é apontar a forma como a Igreja Internacional da
Graça de Deus lida com o rádio.
A Igreja Internacional da Graça de Deus mantém uma rádio em funcionamento
desde 2002, a Nossa Rádio.
Essa rádio pode ser sintonizada em São Paulo na faixa 91,3 FM. E em outras
localidades por outras faixas radiofônicas
34
.
Como nos lembra Mcluhan, “o rádio foi transformado de um meio de
entretenimento numa espécie de sistema nervoso de informação” (McLUHAN,
1964, p.334).
É através do rádio que as informações mais urgentes são oferecidas à
população, que pode acessar o rádio fazendo outras coisas, como por exemplo,
ao dirigir um carro. O rádio auxilia com respeito ao clima, ao tráfego e informações
em tempo real.
A Nossa Rádio funciona como qualquer outra rádio convencional, não-religiosa.
Quem ouve pela primeira vez essa rádio, não consegue distinguir, logo de saída,
34
. 97,3 FM Belo Horizonte MG; 96,5 FM Vitória ES; 101,3 FM Teresina PI; 105,7 FM Rio de
Janeiro RJ; 106,9 Recife PE; 91,5 FM Vale do Paraíba SP; 106,7 FM Porto Alegra RS ; 107,7
Franca – SP; 89,3 Maceió – AL; 890 AM Cantagalo – RJ.
172
que ela é uma rádio religiosa, a não ser pelos cânticos religiosos que estão
presentes em toda programação. Os programas da Nossa Rádio são
apresentados por profissionais do rádio, são pessoas treinadas para aquela
função. Diferentemente da RIT que diz não aceitar patrocinadores que não sejam
religiosos, a Nossa Rádio divulga patrocínios de grupos que nada possuem de
religioso.
A Nossa Rádio prima por transmitir informações religiosas, horários de culto,
divulgação de programações especiais da Igreja Internacional da Graça de Deus,
valoriza a participação do ouvinte, oferece brindes aos participantes, e
principalmente promove os cantores e bandas que pertencem ao casting da Graça
Music, a gravadora da Igreja. também a participação de pastores durante a
programação, inclusive o próprio Soares que não mantém um programa ao vivo no
rádio, suas inserções acontecem a partir de mensagens gravadas para a televisão
e que são transmitidas no rádio.
Por que isso ocorre? Pode-se dizer que Soares é um homem de televisão e
não tem forte penetração no rádio. Sua opção sempre foi pela televisão. Sua
imagem é televisiva. Para usar expressões de Mcluhan, a figura de Soares na
televisão é uma charge e o rádio não valoriza isso, ele valoriza as figuras das
caricaturas.
O rádio tem o poder do exagero, da imaginação, da valorização dos
sentimentos e das experiências dos ouvintes.
“O dio possui o seu manto de invisibilidade, como qualquer outro meio.
Manifesta-se a nós ostensivamente numa franqueza íntima e particular de pessoa
a pessoa, embora seja real e primeiramente, uma câmera de eco subliminar cujo
poder mágico fere cordas remotas e esquecidas”. (McLUHAN, 1964, p.339)
Soares nasceu para o grande público na televisão, sua imagem, seu tom de
voz, sua retórica, sua pregação funcionam no meio frio da televisão. Ele não é
definitivamente um homem de rádio. Como se pode dizer, também, que o pastor
173
da Igreja Pentecostal Deus é Amor, Davi Miranda, é um homem de rádio e
dificilmente ele daria certo na televisão, prova disso, é que não interesse do
pastor Davi Miranda em investir em televisão. Seu negócio é o rádio, ali ele sabe
se comunicar como ninguém.
O Missionário Soares conhece o seu potencial e sabe que a sua atividade
religiosa rende frutos na televisão. Sem querer fazer “futurologia”, pode-se
presumir que seria um desastre para Soares investir maciçamente em rádio,
quando seu perfil não é esse. Mas, apesar de não ter o perfil para o rádio, Soares
necessita do mesmo para construir seu império midiático, e é por isso, que a
Nossa Rádio existe, e existe só há 6 anos.
No entanto, como o Missionário Soares não é o homem talhado para essa
função midiática ligada ao rádio, cabe a pergunta: Quem hoje em dia é o grande
representante midiático da Igreja Internacional da Graça de Deus no Rádio, ou
mesmo em outras mídias? É difícil responder a essa pergunta porque são muitos
os homens que cercam o Missionário e assumem funções consideradas menores
que não estão sendo desempenhadas pelo Missionário. Os filhos do Missionário
têm assumido funções dentro do império midiático, como, por exemplo, o
advogado David Soares que reponde por uma coluna mensal na Revista Graça
Show da Fé, mas esse tipo de participação ainda parece ser muito tímida diante
das demandas impostas pela estrutura midiática da Igreja Internacional da Graça
de Deus.
O nome mais cotado e com melhor trânsito dentro da Igreja Internacional da
Graça de Deus é o do Pastor Jayme de Amorim Campos. Ele é diretor geral dos
pastores das igrejas no Brasil e é conhecido na estrutura interna da igreja, como o
pastor multimídia.
Aliás, quando se trata de falar sobre mídia, ele tem uma visão muito clara e
pragmática sobre esse assunto. Ele diz:
“’A mídia já foi muito evitada no passado, mas hoje, chegamos à conclusão de que
ela pode ser boa ou má, de acordo com quem a utiliza. Então, por que não tomar
esse instrumento tão importante das mãos do diabo e usá-lo a serviço de Deus?’,
174
questiona ele, para quem é justamente por causa disso que o Missionário RR
Soares e a Igreja Internacional da Graça de Deus investem tanto nos meios de
comunicação. ‘Com eles, podemos pregar o Evangelho, alcançando os não-
crentes e edificando os que servem ao Senhor e que nem sempre podem
comparecer ao templo’. (Revista Graça Show da Fé, nº 106, p.20)
O Pastor Jayme apresenta, diariamente, um programa ao vivo na Nossa Rádio,
das 11 às 12 horas, intitulado: Na Mesa com o Senhor. Nos primeiros trinta
minutos do programa ele é transmitido para todo o país, e nos trinta minutos
seguintes ele é transmitido apenas para os ouvintes do estado de São Paulo.
Durante o programa, o Pastor Jayme toca músicas, responde a dúvidas de
ouvintes, prega mensagens curtas e divulga endereços e trabalhos das “filiais” da
Igreja Internacional da Graça de Deus, espalhadas pelo Brasil. Também uma
forte valorização dos testemunhos, de pessoas que ligam ou mandam cartas
dizendo que foram curadas de suas moléstias e que receberam tais bênçãos por
meio das programações da Nossa Rádio. O Pastor Jayme tem feito muito sucesso
com esse programa e tem aumentado seu capital simbólico dentro das estruturas
da Igreja Internacional da Graça de Deus. Pode-se afirmar que o Pastor Jayme de
Amorim Campos é o homem de rádio da Igreja da Graça e isso se deve à sua
experiência com esse veículo de comunicação que, aliás, antecede a sua entrada
na Igreja.
“Aliás, quando o assunto é rádio, o pastor é mestre. Sua experiência com esse
meio de comunicação remonta a 1983, quando ainda nem pastoreava. Naquela
época, o jovem Jayme atendia aos telefonemas dos ouvintes e transmitia seus
recados durante um programa diário que a igreja mantinha na Rádio
Metropolitana, no Rio de Janeiro, nas madrugadas. Um ano depois, ganhou seu
próprio programa na Rádio Cruzeiro, em Salvador (BA)”. (Revista Graça Show da
Fé, nº 106, p.21)
O Pastor Jayme está ocupando atualmente na Igreja Internacional da Graça de
Deus posições de destaque e, com esse capital religioso acumulado, ele tem se
175
mostrado um homem de visão quando o assunto é o campo midiático e sua
relação com a religiosidade. Ele diz:
“’Estamos em uma época de mudanças e as novas tecnologias abrirão muitas
possibilidades nesse sentido. Por isso temos de orar e ficar atentos’.’...será
preciso investir com urgência, na formação de novos comunicadores: homens e
mulheres de Deus que farão da mídia o seu púlpito’”. (Ibid., p.21)
Como a Igreja Internacional da Graça de Deus possui um conglomerado
midiático, nada mais natural do que pensar o futuro a partir da realidade midiática
que a cerca. O Pastor Jayme de Amorim Campos como fiel escudeiro do
Missionário Soares corrobora a visão midiática da igreja à qual pertence, além de
professar o maniqueísmo típico de Soares, ele ainda demonstra que a relação
mídia e religião é inevitável e fundamental para os planos e projetos da Igreja
Internacional da Graça de Deus.
Soares possui homens estratégicos em áreas midiáticas, que ele não consegue
dominar com a mesma competência e desenvoltura que demonstra na televisão.
Na Igreja Internacional da Graça de Deus, Soares é o homem da televisão e seu
maior comunicador, mas o Pastor Jayme é o homem do rádio e coopera para a
conquista e manutenção do império midiático da Igreja Internacional da Graça de
Deus.
176
3.6 Graça Music
A Graça Music é um dos braços da força midiática da Igreja Internacional da
Graça de Deus. Com contrato com vários cantores, cantoras e bandas de prestígio
no meio evangélico, a Graça Music coleciona vários recordes de vendas de CDs.
Num país que luta tenazmente contra a pirataria esse é um feito digno de nota.
A crise da indústria fonográfica parece que não atingiu tanto assim, a
gravadora de Soares. A medição da vendagem de CDs não é padronizada
mundialmente. Quase todos os países as categorias definidas pela IFPI
(Federação Internacional da Industria Fonográfica), que são nomeadas disco de
ouro, disco de platina e disco de diamante (disco de prata também é usado em
alguns países), mas a quantidade que equivale às categorias variam de país para
país.
No Brasil, por exemplo, desde 2004, a categoria disco de ouro é atingida
quando um artista vendeu 50 mil cópias de CDs, antes de 2004 para atingir tal
posto era necessário vender o montante de 100 mil cópias. o disco de platina
equivale hoje no Brasil à venda de 150 mil cópias e o disco de diamante equivale
a 250 mil cópias vendidas.
A Graça Music possui vários CDs que ultrapassaram a marca de 300 mil cópias
vendidas. Entre os CDs que venderam 300 mil cópias, atingindo o disco de
platina duplo estão: Minhas canções [RR Soares] na voz dos melhores, Volume 2 -
Coletânea e Cuida de Mim Ministério de adoração da Igreja Internacional da
Graça de Deus.
Os que venderam na marca de 150 mil CDs, são:
Acende uma Luz – Missionário RR Soares; Crer é a saída – Pr. Jayme de
Amorim; Grandes Louvores 5 Missionário RR Soares; Grandes Louvores 6
Missionário RR Soares; Grandes Louvores 7 Missionário RR Soares e Minhas
177
canções na voz dos melhores, Volume 1 Coletânea”. (Revista Graça Show da
Fé nº 102, p. 21.)
Entre os CDs que atingiram a vendagem de 50 mil cópias e adquiriram status
de disco de ouro estão:
Peça com Agê Ferreira; O forró do Fernandes Fernandes Lima; Carmem
Silva Volume 1 e Volume 2 Carmem Silva; Fernandes Lima Volume 3
Fernandes Lima; As Melhores da Turminha da Graça Turminha da Graça; Os
Gauchinhos de Deus Volume 3 Denian e Dianini; Minhas canções na voz do Pr.
Jayme de Amorim Pr. Jayme de Amorim; Ministério de Adoração, Rock
Ministério de Adoração da Igreja Internacional da Graça de Deus. (ibid., p.21)
Como se pode perceber, os números da gravadora são bem expressivos. O
diretor artístico da Graça Music, Pr. Geromilton Ferreira da Silva, que está sete
anos no cargo atribui o bom momento da gravadora à credibilidade que Soares
transmite ao público e aos funcionários enviados por Deus para trabalharem na
Graça Music. Ele diz:
“ ‘O sucesso da gravadora vem da confiança que o público tem em nossos
produtos e na credibilidade que o Missionário RR Soares transmite, devido ao seu
exemplo de vida e compromisso ministerial’. “...cada um que trabalha com a gente,
seja cantor ou colaborador na produção e na administração, é enviado por Deus’ ”.
(ibid., p.20)
178
Além de selecionar, contratar, gravar e divulgar os trabalhos musicais, a Graça
Music ainda responsabiliza-se pela produção dos programas televisivos, Tarde
Show e Noite com os Adoradores de Deus, ambos veiculados pela RIT.
Entre os contratados da Graça Music está uma cantora que tem se destacado
bastante no cenário da música gospel, a cantora Carmem Silva
35
, conhecida como
a “Pérola Negra do Senhor”. A história de Carmem Silva é idêntica a de muitos
outros artistas que nos últimos anos encontraram na música gospel, uma maneira
de reabilitar suas carreiras que estavam no ocaso. Tratados como verdadeiras
referências, porque foram “resgatados” do mundo, esses cantores e cantoras são
tidos como ícones no meio evangélico.
A Graça Music trabalha em várias frentes, com CDs para jovens, adultos,
crianças e em rios ritmos, desde hinos tradicionais até forro evangélico, e o
principal representante desse segmento é cantor e Pastor Fernandes Lima. Um
dos hits mais conhecidos desse cantor chama-se, “Determine”. A letra é
expressão da mais pura teologia da confissão positiva. Vejam o que ela diz:
“Ei, amigo, preste atenção!
Eu vim aqui para adorar
Prepare, agora, seu coração
Que o forró vai começar
“Ah, se o meu povo me ouvisse e me quisesse
35
. “Ela nasceu Carmem Sebastiana de Jesus, mas a fama a tornou conhecida como Carmem
Silva. Da pequena Veríssimo (MG), onde nasceu, Carmem mudou-se para a cidade grande, “tentar
a sorte”, como ela mesma disse. Carmem gostava de cantarolar os sucessos da época e sempre
que podia freqüentava os programas de calouros. Num desses programas, sua voz encantou o
apresentador, que foi peça fundamental para o início de sua carreira: Silvio Santos. A cantora
estourou em 1969, com o hit ‘Adeus, solidão’ e se tornou um fenômeno de vendas. Mas as luzes, o
sucesso, o dinheiro e o reconhecimento nacional e até internacional não a faziam feliz, como as
pessoas pensavam. Com problemas emocionais e familiares, envolvida com religiões, sem achar o
caminho para a felicidade, Carmem não via saída para sua vida tão atribulada, até que uma
viagem para os Estados Unidos mudou a sua história. Karla, sua filha, convertida ao Senhor, orava
insistentemente pela mãe. Aproveitando que a filha também morava nos EUA, Carmem foi visitá-la.
Vendo a aflição da e, Karla a convidou para assistir a um culto na igreja que freqüentava.
Naquele dia, Carmem aceitou a Cristo e iniciou uma nova vida. Sua carreira gospel começou em
2001, quando foi convidada pelo Missionário R.R. Soares para fazer parte do cast da gravadora
Graça Music. O primeiro CD vendeu mais de 100 mil cópias, garantindo à cantora Disco de Ouro
pelo trabalho. Em 2004, Carmem gravou seu segundo álbum, com músicas de sua autoria e em
parceria com uma grande amiga, a irmã Meirecler”. (http://www.carmensilva.art.br/)
179
Comeria do melhor
Mas só pratica regras do homem
Come do pior”
Ele te deu vida abundante
E oportunidade pra viver na luz
Quem te garante essa vitória
É o Senhor Jesus
E determine, determine, determine
Determine, determine, determine
Determine, determine, determine.
Determine a bênção
E faça a diferença
É tudo nosso, é a Escritura que diz:
“Determine e se esforce
A vitória Eu prometo dar
Seja guerreiro, valente, invencível
Chame pelo meu Nome
E lhe darei o impossível
Venha Comigo e você não vai se decepcionar”
Além desse hit extremamente popular, outros tantos e quase todos
expressam explicitamente os princípios doutrinários praticados na Igreja
Internacional da Graça de Deus. Vejam mais uma dessas músicas que são
verdadeiros fenômenos. Essa se chama, “Fogo Santo”.
"Glórias a Deus", alguém gritou,
Ta na hora de orar Fogo Santo vai descer
Pra todo mal queimar
Quem veio pra ser curado, deve se arrepender
Quem quer prosperar, não deixe nada o prender
Se é assunto pessoal, ou coisa familiar
Basta somente crer que o fogo vai queimar
Os profetas de hoje têm de aprender com Elias,
Que o fogo lá de cima desce sempre se clamar
Não dá pra ver as Jezabéis, enganando todo dia
Basta somente crer que o fogo vai queimar
O capeta descarado só traz sofrimento e dor
180
Ilude o crente bobinho e também o pecador
Mas pra quem é de Jesus, a receita vai funcionar
Basta somente crer que o fogo vai queimar
Se Gideão estivesse aqui,não teria medo de morrer
Confiando na palavra do Senhor que tem poder
Debulhando o seu trigo, ouviria o anjo lhe dizer:
"Basta somente crer que o fogo vai queimar"
Assim faria Sansão com quem tentasse o conter
Tinha ordens dos Céus para a obra realizar
Por que você não faz o mesmo, se é esse seu dever?
Basta somente crer que o fogo vai queimar.
Em todos os eventos realizados pela Igreja Internacional da Graça de Deus,
esses e outros cantores contratados pela Graça Music estão presentes e animam
a platéia. A idéia de Show da é algo que extrapola a dimensão da televisão, e
vai para o cotidiano das atividades da igreja. Esses cantores e cantoras têm seus
capitais musicais ampliados por estarem vinculados a uma gravadora evangélica
de sucesso, e por sua vez, na medida em que eles se apresentam nos “shows”
produzidos pela Igreja e está amplia seu capital religioso junto ao público
evangélico.
181
3.7 Mídia Infantil
A dia infantil da Igreja Internacional da Graça de Deus é representada pela
revista “Turminha da Graça”. A versão atual da Turminha da Graça entrou em
circulação em setembro de 2005. A revista é publicação mensal e visa a ser um
canal direto de evangelização junto ao público infantil. Os personagens da
Turminha da Graça são cinco crianças e uma cachorrinha, além da participação
do Missionário Soares. Esses personagens, desde 2006, extrapolaram os limites
da revista e foram criados bonecos que se apresentam nas igrejas da Graça e
igrejas de outras denominações, além de festas e eventos. E em junho de 2008
passou a ser transmitido pela CNT, às 20:00h, um programa diário de auditório,
intitulado Casa da Turminha na TV.
Na revista Turminha da Graça, a figura séria e compenetrada do missionário
Soares é transformada em algo mais próximo para as crianças. Essa revista veio
preencher uma lacuna que existia no ministério de Soares. Aliás, é ele mesmo
quem escreve as pequenas histórias, que envolvem esses personagens em
situações, que geralmente terminam com um ensinamento sobre a moralidade
cristã. Soares escreve as histórias e ainda faz as letras das músicas que embalam
as aventuras dessa turminha, cabendo a responsabilidade de musicá-las, ao
músico, Carlinhos da Banda GERD.
Soares possui uma visão muito pragmática sobre a infância. Assim como ele
converteu-se ainda criança, com seis anos de idade, na cidade de Muniz Freire
ES, ele acredita que as crianças devem desde cedo, buscar a Deus e servi-lo, e
ao fazerem isso, elas se tornam instrumentos para atraírem seus pais para a
conversão. É o que ele diz numa entrevista.
182
“A mensagem que deixo para as criancinhas é que elas são especiais para Jesus.
Devem prestar atenção à Palavra de Deus e ser boas servas; assim, irão realizar-
se em tudo. Façam como eu, busquei ao Senhor ainda criança, e toda minha
família aceitou Jesus. Sirva a Cristo. Creia! Seus familiares também servirão a
Ele!” (Revista Turminha da Graça, Ano 4, n. 28, p.25)
A revista Turminha da Graça não é uma novidade no cenário de mídia infantil
no Brasil. Várias outras denominações usam ou usaram desse expediente para se
comunicarem com o público infantil.
A revista infantil de cunho religioso mais famosa no Brasil é a Revista Nosso
Amiguinho, uma publicação da Igreja Adventista do Sétimo Dia. A revista Nosso
Amiguinho conseguiu um espaço muito grande junto à famílias de várias matrizes
religiosas, pois, apesar de ser de cunho religioso, essa revista mascarava seus
reais interesses pulverizando seus ensinamentos em tons moralizantes,
distribuídos sobre o tripé família, pátria e igreja.
“A Revista ‘Nosso Amiguinho’, intitulada ‘A Revista das crianças do Brasil .O
editorial aponta ts temas constantes na publicação: família, pátria e igreja,
delimitando o lugar da criança para a manutenção das instituições. Por igreja
entenda-se o conceito de igreja universal de fiéis a Jesus Cristo. Não há menção a
nenhuma igreja em particular, nem a cultos, pastores ou qualquer referência a
práticas evangélicas. Mas o fato de não mencionar uma igreja, mas Igreja, poderia
facilitar a aceitação da revista por famílias católicas “desavisadas”, sem prejuízo
para suas crenças. (BELLOTTI, 2007, p.99)
Analisando a revista Nosso Amiguinho e a revista Turminha da Graça pode-se
perceber algumas semelhanças e correlações entre ambas. Na revista Nosso
Amiguinho há o cãozinho Azeitona, na revista Turminha da Graça a
cachorrinha Belinha. Na revista nosso amiguinho um garoto, muito inteligente,
chamado Sabino, que usa óculos e representa o papel de intelectual da turma, na
revista Turminha da Graça também um personagem, o Binho, garoto
inteligente, que usa óculos e é o mais sabido da turma. Na revista nosso
183
amiguinho há um garoto negro chamado Zequinha e na revista Turminha da Graça
também um garoto negro, chamado Cazuza. Essas semelhanças não
representam um plágio, mas representam uma fonte de inspiração para Soares,
para que ele pudesse ocupar um espaço midiático junto a um público, que até
então era um público de difícil acesso para ele. Soares simplesmente apropria-se
de um modelo que já funcionou em outras épocas no país, e essa fórmula foi
adaptada para que a IIGD atingisse seus objetivos junto ao público infantil.
A revista nosso amiguinho sempre foi considerada um ministério da Igreja
Adventista do Sétimo Dia, e, portanto, dependia de assinaturas para sua
veiculação.
Ao contrário de outras publicações seculares, "Nosso Amiguinho" dependia de
assinaturas e era considerado um ministério da igreja. Por isso, não exibia
anúncios de patrocinadores em suas páginas. No máximo, promovia livros da
própria Casa Publicadora Brasileira, e produtos da fábrica Superbom, de
propriedade da IASD. Assim, seus editores não se sentiam obrigados a seguir
tendências de mercado para tornar a revista vendável, pois o era
comercializada em bancas de jornal. Inicialmente circulou bastante entre famílias
adventistas, e durante o ano de 1953 trazia lições da Escola Sabatina.
(BELLOTTI, 2007, p.p.99-100)
A revista Turminha da Graça também é considerada um ministério da IIGD e
também sobrevive por meio de assinaturas, podendo ser ainda adquirida nos
templos das Igrejas da Graça.
Os personagens da Revista Nosso Amiguinho faziam propagandas de produtos
da fábrica Superbom, de propriedade da IASD, os personagens da Turminha da
Graça fazem propaganda de produtos infantis, como o achocolatado Turminha da
Graça, produzido, comercializado e distribuído pela Predilecta Alimentos, uma
empresa da cidade de Matão, interior de São Paulo e macarrão instantâneo da
Turminha da Graça, fabricado e distribuído pela Faville Indústria e Comércio de
184
Alimentos, uma empresa com sede em Marechal Cândido Rondon, interior do
Paraná.
Segue abaixo, exemplares das propagandas, dos produtos acima
mencionados.
185
186
Soares parece ter encontrado mais um filão para suas estratégias
mercadológicas. Além dos produtos anteriormente mencionados, os personagens
da Turminha da Graça estampam camisetas, bonés, chaveiros que são
produzidos e distribuídos por empresas ligadas à IIGD. Abaixo seguem algumas
estampas de camisetas com os personagens da Turminha da Graça.
187
Outra semelhança entre as revista pode ser observada com relação ao
patriotismo. Em ambas publicações percebe-se uma forte tendência de
valorização dos símbolos nacionais, dos heróis nacionais e das datas
comemorativas que são importantes para a nação. A primeira imagem é da
Revista Nosso Amiguinho, de Setembro de 1994, um texto que estimula o
patriotismo nas crianças; a segunda imagem é da revista Turminha da Graça de
Setembro de 2006, um texto que mostra a importância histórica do 07 de
Setembro. As duas imagens objetivam criar um sentimento patriótico nas crianças.
As imagens abaixo ilustram isso:
188
189
Outra semelhança entre as duas revistas é a forma como se entende o tempo
para as crianças. Nas duas revistas há uma forte tendência ao entretenimento,
mas com propósitos bem definidos. A pesquisadora Karina Bellotti havia
detectado isso na revista nosso amiguinho.
“Em ‘Nosso Amiguinho’, havia constante estigma do lazer e das diversões. A
revista costumava ter quase um terço de suas 20 páginas dedicadas a
passatempos como palavras cruzadas, labirintos, adivinhas, figuras de montar e
de colorir, e por vezes alguns experimentos científicos. A diversão em si não era
condenada, desde que tivesse um propósito de ocupar a cabeça e as mãos dos
leitores com coisas ‘sadias’”. (BELLOTTI, 2007, p.134)
Na revista Turminha da Graça as partes dedicadas ao entretenimento não
chegam a quase um terço como na Revista Nosso Amiguinho. A revista Turminha
da Graça possui 82 páginas, sendo que 10 ou 12 páginas são dedicadas ao
entretenimento. Além disso, acompanha a revista um CD que narra as histórias
contadas na revista e um pôster gigante de um dos personagens.
Para atrair o público infantil, as histórias em quadrinhos o escritas com letra
maiúscula do tipo bastão e com desenhos grandes e coloridos, bem divididos nas
páginas de tamanho A4.
Os conteúdos dessas histórias são bem divertidos, apresentando sempre uma
lição de cunho moral ou que expressa valores e princípios baseados na
solidariedade, na justiça e na adequação dos sujeitos à sociedade como bons
cidadãos.
Além das histórias em quadrinhos, a revista apresenta textos informativos
sobre animais, uma temática de grande interesse para as crianças.
Outra parte da revista explora o universo criativo das crianças, orientando
passo a passo como fazer brinquedos com materiais recicláveis.
Existem três momentos que evidenciam que a revista tem um objetivo religioso
conversionista. O primeiro momento é uma sessão dedicada a testemunhos de
190
crianças, que geralmente contam como foram curadas de doenças graves por
Jesus. O segundo momento é o da aventura bíblica que conta com a presença do
missionário Soares, onde, entre outras coisas, ele estimula as crianças a irem à
Igreja aos domingos. E num terceiro momento, a revista apresenta uma sessão
com um cartaz com desenhos grandes e coloridos, sempre com um versículo para
ser memorizado pelas crianças, algo muito parecido com a proposta pedagógica
da APEC (Aliança Pró Evangelização de Crianças).
Como se pode perceber, as crianças representam um grupo importante nas
estratégias midiáticas da Igreja Internacional da Graça de Deus. Elas representam
a possibilidade de tornarem-se num futuro próximo, adultos comprometidos com
os valores apregoados nessa igreja, além de serem canais para as conversões de
seus pais. A mídia infantil da Igreja Internacional da Graça está concentrada na
trupe da Turminha da Graça, que além de promover esses princípios considerados
religiosos, também promove a venda de outros produtos que estão fora da
realidade religiosa. Esse é uma faceta um pouco estranha da visão de mídia
infantil do Missionário Soares.
191
CAPÍTULO 4
4. A IGREJA “INTERNACIONAL” QUE AGRADA O PÚBLICO
“NACIONAL”
Nesse capítulo quarto, a preocupação recaiu sobre a influência que a Igreja
Internacional da Graça de Deus exerce em relação a outros grupos religiosos,
principalmente, grupos do protestantismo histórico, mais especificamente sobre os
presbiterianos. A escolha dos presbiterianos é justificada porque, ao exercer
minhas atividades pastorais junto aos presbiterianos, pude verificar que os
mesmos tinham um grande apreço pelo Missionário RR Soares, e acompanhavam
suas programações midiáticas. Essa foi a fagulha inicial que determinou o projeto
de pesquisa que desembocou nessa tese.
Vale ressaltar que não é intenção desse trabalho fazer qualquer ilação sobre o
conjunto geral de presbiterianos, mas sim trabalhar com uma parte específica de
presbiterianos que foram analisados nesta pesquisa. A pesquisa somente nos
autoriza a dizer que os presbiterianos analisados agem dessa ou daquela forma
em relação às mídias da Igreja do missionário RR Soares. Esta pesquisa não
possui nenhum rigor estatístico, cabendo-lhe tão somente apontar através de uma
amostragem algumas marcas deixadas pela força midiática da Igreja Internacional
da Graça de Deus sobre um grupo específico de presbiterianos. A pesquisa de
campo foi feita com 40 presbiterianos, das cidades de Campinas, Itapira e Rio
Claro; cidades do interior de São Paulo, todos familiarizados, em maior ou menor
proporção com as mídias da Igreja Internacional da Graça de Deus. Esta pesquisa
foi feita pessoalmente e constava de 16 questões, sendo algumas abertas e outras
fechadas. Nossa hipótese, antes de iniciarmos a pesquisa era de que existia uma
192
excelente recepção por parte dos grupos do protestantismo histórico em relação
ao discurso efetuado pelo Missionário RR Soares, por meio de suas mídias. Nos
parecia, num primeiro momento não haver por parte desse grupo a ser
pesquisado, um entendimento muito claro sobre os pressupostos que embasam o
discurso de Soares. Os protestantes históricos analisados aqui os presbiterianos
geralmente não conseguiam, na nossa percepção, captar os postulados da
teologia da prosperidade e da confissão positiva na prédica de Soares.
Neste capítulo quarto, serão trabalhados três tópicos, sendo que o primeiro
deles é intitulado: A recepção da mensagem por parte dos presbiterianos.
Pretendemos avaliar, através da pesquisa de campo, como os membros das
igrejas analisadas recebem a mensagem proclamada pela IIGD, por meio de seu
líder maior, o Missionário Soares. Pretendemos avaliar se incongruências
doutrinárias entre o protestantismo histórico e o neopentecostalismo estão tão
perceptíveis aos “clientes” semanais de Soares. Além disso, pretendemos avaliar
por meio da pesquisa, que tipo de envolvimento, esses membros têm com a IIGD.
Seriam eles somente telespectadores, ouvintes de rádio ou patrocinadores do
programa Show da Fé? Além disso, seriam eles consumidores dos produtos
disponibilizados pela Igreja Internacional da Graça de Deus? Eles adquirem
produtos infantis e CDs de música dos cantores patrocinados pela IIGD? Essas e
outras perguntas fizeram parte do questionário que foi utilizado na pesquisa de
campo.
No tópico segundo, a ênfase foi no resultado que o discurso midiático da IIGD
tem produzido entre os presbiterianos pesquisados e foi intitulado: Edificação,
Dupla Pertença e Transpentecostalismo.
Houve uma preocupação com respeito à assimilação doutrinária desses
presbiterianos. No início da pesquisa, nossa suspeita era de que estaria ocorrendo
uma dupla pertença, ou seja, muitos membros de igrejas históricas continuavam
membros de suas igrejas, mas estavam sendo influenciados pelo modelo da Igreja
Internacional da Graça de Deus. Estes membros viveriam uma dupla pertença,
pois apesar de não abandonarem suas igrejas históricas nos finais de semana,
durante a semana estavam sendo alimentados doutrinariamente e espiritualmente
193
por Soares. Esses membros de dupla pertença nutririam uma grande simpatia
pelo discurso e pela prática doutrinária da IIGD e isso se devia à liderança
carismática de Soares, pois apesar dele ser um representante do dito
neopentecostalismo, sua base inicial foi o protestantismo histórico. Outra questão
importante que foi percebida quando a pesquisa estava concluída foi o fato de
que, o modelo tipológico mais usado no campo de investigações religiosas sobre o
pentecostalismo no Brasil, o modelo baseado em ondas, que inclusive foi usado,
no decurso do trabalho, não conseguia hodiernamente captar a religiosidade
brasileira, porque a mesma estava totalmente entrecruzada, mesclada,
aproximando grupos que anteriormente estavam distantes, e isso se deve em
grande parte ao papel que a mídia religiosa tem exercido dentro do campo
religioso nacional. A mídia tem o papel de aproximar, de diminuir as diferenças
doutrinárias pelo menos, valendo-se para tal de uma programação
espetacularizada, que serve para criar uma identidade evangélica nacional, sendo
que tal situação é muito favorável aos grupos midiáticos estabelecidos, que
imprimiram os seus modelos e têm público consumidor para os seus produtos
advindos das mais variadas matizes religiosas, contudo, quando os grupos
religiosos históricos “baixam a guarda” para pertencerem ao grupo evangélico
nacional criado pelas mídias religiosas, esses grupos têm sido afetados em suas
próprias identidades.
E no terceiro tópico, do capítulo quarto, intitulado: Estaria acontecendo uma
“Internacionalização” do campo religioso nacional? pretendemos discutir se está
ocorrendo uma “internacionalização” do campo religioso no Brasil. Assim como,
alguns anos foi dito que ocorria naquele momento uma certa “iurdinização do
campo religioso no Brasil, desejávamos saber até que ponto a Igreja Internacional
da Graça de Deus tem servido como espelho para outras igrejas, ou seja, como
modelo de organização e empreendedorismo nas atividades de cunho religioso,
principalmente no campo midiático.
194
4.1 A recepção da mensagem por parte dos presbiterianos.
A primeira questão que nos interessou foi saber se as pessoas entrevistadas
do meio presbiteriano tinham acesso às mídias da Igreja Internacional da Graça
de Deus por meio do programa Show da , o programa televisivo que tornou
Soares uma “celebridade”, no meio religioso, e como suspeitávamos, todos os
entrevistados tinham tido contato com as mídias da Igreja da Graça por meio
desse programa. Quisemos saber, então, com que regularidade, os entrevistados
assistiam ao programa em questão. As respostas ao questionamento apontam
que 40% dos entrevistados assistem pelo menos 01 vez por semana, ao
programa, 40% assistem pelo menos 02 vezes por semana e 20% assistem 03
vezes ou mais por semana.
0
5
10
15
20
25
30
35
40
%
1 vez por
semana
2 vezes por
semana
3 vezes ou
mais por
195
Como se pode perceber, o programa Show da Fé conseguiu tornar-se um
programa conceituado no meio presbiteriano analisado e possui, portanto, um
público fiel, que se digna a ligar o aparelho de televisão em horário nobre e assistir
a um programa de cunho religioso abandonando velhos hábitos, como, por
exemplo, o hábito de assistir às novelas nesse horário.
O programa Show da passou a ser um território virtual de destaque para os
presbiterianos, onde as possibilidades de consumo da são entregues em
domicílio.
E vale ressaltar que houve uma mudança de hábito mesmo, pois as pessoas
entrevistadas assistem ao programa Show da em TV aberta porque muitos
deles nunca tiveram acesso à programação da RIT. Quando questionados se
assistiam às programações da RIT, somente
17,5%
dizem ter assistido a alguma
programação nessa emissora. Confirmando o que dizíamos sobre o fato de
Soares ser eminentemente um homem de televisão, o público que assiste a ele na
TV não se interessa em acompanhá-lo no Rádio porque somente
7,5%
dos
entrevistados dizem ter ouvido alguma pregação por esse meio, não havendo
nenhum referência ao acompanhamento assíduo e regular da Nossa Rádio.
Outro dado importante é que mantendo o hábito de serem reconhecidamente
leitores de textos escritos,
50%
dos presbiterianos já tiveram acesso ao Jornal
Show da Fé e à Revista Graça Show da Fé.
196
0
20
40
60
80
100
Sim % Não %
Assistem à RIT
Ouvem a Nossa Rádio
Leram jornais ou
revistas da IIGD
Outra questão aferida pela pesquisa foi o fato de que apesar dos constantes
anúncios de produtos vinculados à IIGD em suas dias, o Missionário Soares
não consegue uma forte penetração junto aos presbiterianos quando o assunto é
venda de produtos como CDs, DVDs ou outros artigos.
Somente
10%
dos entrevistados compraram algum tipo de produto
anunciado nas mídias da Igreja Internacional da Graça de Deus.
Dos entrevistados,
72,5%
dizem que comprariam algum produto da Igreja da
Graça anunciado em uma de suas mídias, após analisarem bem o produto, o que
comprova que não um preconceito denominacional, o que há de fato é um
desconhecimento dos produtos, apesar de toda propaganda das mídias da IIGD.
O que transparece na pesquisa é que os presbiterianos analisados são
consumidores de produtos no “mercado de bens de edificação”. Não nos parece
correto usar a expressão “mercado de bens de salvação”, pois que todos os
entrevistados estão convictos de sua fé e os benefícios “eternos” que a mesma
produz. Eles consomem a mensagem, o discurso que agrada e que é visto como
necessário num determinado momento de suas vidas, mas eles não são
necessariamente consumidores de artigos religiosos.
197
Quando o assunto é dinheiro, uma irritação nos entrevistados. A grande
maioria em comentários paralelos faz observações quanto à demanda por dinheiro
nas programações da IIGD. Alguns chegam mesmo a dizer que prestam atenção
no programa, enquanto há, como eles dizem, pregação da Palavra de Deus.
Mesmo assistindo aos programas da IIGD com uma certa regularidade, somente
15%
dos entrevistados cederam ao apelo do Missionário Soares no que tange a
tornarem-se patrocinadores do programa, com a ressalva de que continuaram
dando seus dízimos às igrejas onde congregam.
0
20
40
60
80
100
Sim % Não%
Comprou produtos da
IIGD
Comprariam algum
produto
Patrocinadores do
Show da Fé
Os dados coletados nessa primeira parte da pesquisa apontam para um
impacto midiático da Igreja Internacional da Graça de Deus junto ao público
presbiteriano, no entanto, esse impacto, tem os seus limites.
O mercado evangélico está dentro da lógica do mercado que rege a economia
mundial. Ele não é estranho à macroestrutura. Para o mercado evangélico, Soares
disponibilizou um produto religioso que veio suprir uma certa demanda, já que ao
apresentar um programa evangélico para concorrer com as “famigeradas” novelas
televisivas, tão odiadas e apontadas como culpadas pela decadência moral da
198
sociedade brasileira, principalmente pelos evangélicos
36
, ele criou uma novidade e
emplacou uma marca, o Programa Show da Fé. Isso o tornou conhecido e
respeitado junto ao público evangélico, especificamente, e em relação ao que nos
interessa, junto ao público presbiteriano que até então lhe era um público distante.
Famoso no meio pentecostal e disputando um público, que no fundo é o mesmo
público que assiste à programação da IURD, Soares inovou mais uma vez e
conseguiu penetrar num público que tradicionalmente não adere tão facilmente às
novidades do mercado religioso. A força midiática da Igreja Internacional da Graça
de Deus junto ao público presbiteriano analisado está concentrada basicamente
no programa Show da Fé, no entanto, nesse momento o que se percebe é que
falta muito para Soares conseguir agregar os outros produtos disponibilizados
nesse mercado religioso. Ele vende a sua mensagem, vende a sua comunicação,
mas não consegue vender os produtos atrelados ao carro-chefe da sua proposta
midiática. Os presbiterianos analisados estão interessados na mensagem, no
discurso e o nos artigos religiosos que compõem a holding religiosa. Eles
interessam-se pelo mercado de bens de edificação.
36
. Mais Polêmica: Novela Duas Caras provoca indignação ao retratar evangélicos de forma
estigmatizada e preconceituosa: “Recentemente, uma nova controvérsia surgiu, depois do capítulo
veiculado em 12 de março (uma quarta-feira), no qual um grupo de (supostos) evangélicos,
liderados por uma mulher descontrolada e com uma Bíblia em punho, invadiu a casa onde vive o
trio amoroso formado por uma ex-drogada grávida, um garçom e um homossexual, ameaçando-os
de linchamento. A cena termina com a personagem grávida, ferida com uma pedrada, dando à luz
e pedindo ajuda a uma santa católica. A cena despertou reações dos evangélicos por todo o país,
indignados com a forma totalmente anticristã com a qual os crentes forma retratados naquele
capítulo da novela. Na opinião do Pr. Rogério Postigo, der estadual da Igreja Internacional da
Graça de Deus no estado do Rio de Janeiro, quem detém o poder da dia deveria fazer uso
dessa ferramenta com mais responsabilidade, pois a capacidade de influência é grande e pode
causar danos irreparáveis em nossa sociedade. ‘A reposta do povo de Deus deveria ser o
assistir a esse tipo de programa’, asseverou Postigo”. (Revista Graça Show da Fé, nº 106, p. 14)
199
4.2 Edificação, Dupla Pertença e o Transpentecostalismo.
Soares disponibiliza produtos de edificação para os presbiterianos analisados e
faz isso usando o que ele tem de melhor, ou seja, seu poder de persuasão. Com
uma voz monótona, ou seja, num único tom, sem grandes alardes, sem nenhuma
inovação litúrgica, muito pelo contrário, lembremo-nos que ele canta hinos que
fazem parte do cancioneiro tradicional protestante em pleno horário nobre na TV
aberta brasileira, e consegue penetrar nesse grupo considerado mais tradicional,
mais conservador.
Numa pergunta fechada, após um pré-teste foram oferecidas três opções para
os entrevistados. Foi perguntado a eles sobre o que mais os agradava no
Missionário RR Soares. Com
72,5%,
a opção “clareza na exposição blica” foi a
grande vencedora. Com
22,5%,
aparece a opção, “atitude evangelística”, e, com
apenas
5%,
aparece a opção “realizador de milagres”.
0
10
20
30
40
50
60
70
80
%
Clareza na exposição
bíblica
Ser um realizador de
milagres
Sua atitude
evangelística
200
Às vezes as pessoas se iludem com o papel da mídia, ao ponto de acreditarem
que ela tem o poder de moldar os receptores da mensagem. Isso até pode
ocorrer, mas não com tanta freqüência e não de forma o automática como
acreditam alguns; o que se percebe na pesquisa em pauta é que o público
receptor possui um contexto formador que determina seus hábitos, valores,
princípios e gostos, e ele somente vai consumir aquilo que lhe for palatável. Aquilo
que for do seu interesse.
O Missionário RR Soares que agrada o público presbiteriano é um pregador
nos moldes, pelo menos na forma, nem tanto no conteúdo, que esses
presbiterianos estão acostumados a ver nas suas igrejas.
O Soares que aparece na TV em horário nobre apresentando um programa
que é um show da fé, procura apresentar-se sempre de forma bria, lúcida, com
explicações bíblicas claras, ou que pelo menos fazem sentido e dão lógica ao seu
discurso. Não se no seu programa televisivo qualquer apelação para extremos,
como exorcismos, glossolalia, exageros que não caberiam num formato televisivo
em horário nobre. Lembremo-nos de que outros grupos religiosos compreenderam
isso também, por exemplo, a Rede Record comandada pelo Bispo Macedo. Não é
possível mais observar na Record exorcismos a qualquer horário, como ocorria no
início da compra da emissora por parte da Universal do Reino de Deus. Esses
“exageros” ficaram para as madrugadas, ou para redes menores que pertencem à
Igreja Universal.
Quem teve a oportunidade de freqüentar os cultos da Igreja Internacional da
Graça de Deus sabe que o modelo do culto televisivo não é o mesmo praticado
em seus templos.
O formato sóbrio, clean, soft do programa televisivo é apenas um convite para
uma relação que pode ser construída no espaço da virtualidade, ela não
necessariamente se construirá no espaço da realidade, mas preferencialmente no
espaço da virtualidade sacralizada, no imaginário sacralizado que gera a dupla
pertença.
Pode-se entender dupla pertença como o fenômeno em que o fiel está
vinculado a uma estrutura eclesiástica por meio de rituais tradicionais, como
201
batismo e pública profissão de fé, e dedica parte de seu tempo de devoção àquela
estrutura religiosa, contudo ao mesmo tempo participa com maior ou menor
intensidade, direta ou indiretamente de outra organização religiosa procurando
suprir suas carências, procurando complementar as lacunas deixadas pela
instituição a que se vinculou por meio de ritos tradicionais. Enquanto, no primeiro
caso, o fiel é visto como um membro da organização religiosa, no segundo caso
ele é um simpatizante; um cliente que consome aquilo que ele considerar
necessário para seu crescimento espiritual.
O que ocorre com os presbiterianos analisados nesse trabalho é exatamente o
fenômeno da dupla pertença. Quando questionados se abandonariam suas igrejas
para freqüentarem e tornarem-se membros da Igreja Internacional da Graça de
Deus, somente
12,5%
dizem que talvez trocariam de igreja e
87,5%
foram
taxativos em repudiar tal possibilidade.
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
SIM
TALVEZ
NÃO
O que se percebe é que os presbiterianos não estão dispostos a
abandonarem suas igrejas para aderirem a uma outra organização religiosa que
lhes é simpática, contudo, ela é vista somente como um complemento às suas
202
necessidades religiosas. Num mundo marcado pelas facilidades midiáticas, que
aproximam as pessoas e criam uma identidade, esse fenômeno da dupla pertença
é algo visto como natural.
Quando questionados se suas igrejas necessitariam adotar algumas práticas
religiosas adotadas na Igreja Internacional da Graça de Deus, as respostas
embasam e reforçam o que foi dito a pouco. O resultado é o seguinte:
60%
disseram que suas igrejas não precisam adotar nenhuma prática da IIGD;
27,5%
disseram que a única coisa a ser copiada da Igreja Internacional da Graça de
Deus era o investimento em mídia;
12,5%
não souberam responder.
0
10
20
30
40
50
60
%
INVESTIMENTO EM
MÍDIA
NÃO DEVE ADOTAR
NADA
NÃO SOUBERAM
RESPONDER
O fenômeno da dupla pertença é corroborado por uma outra pergunta. Quando
questionados se, não podendo ir às suas igrejas, eles, ao assistirem os cultos
televisivos da IIGD, sentem-se cultuando ao seu Deus;
50%
disseram que nessa
situação específica, ou seja, de não poderem ir às suas igrejas, a comodidade da
televisão os deixa em paz com suas consciências, mas
50%
disseram que não é a
mesma coisa, eles não entendem que aquilo seja um culto a Deus, mas um
complemento que os ajuda em suas caminhadas de fé.
203
A pergunta era: Não podendo ir à sua igreja, você se sente prestando um culto
a Deus ao assistir um programa televisivo da IIGD?
0
10
20
30
40
50
%
SIM NÃO
Soares é muito bem avaliado pelos presbiterianos; numa pergunta aberta sobre
a imagem que eles tinham de Soares;
75%
das pessoas entrevistadas, quando
solicitadas a definirem suas visões sobre o Missionário, disseram que ele é muito
inteligente, muito sábio;
25%
o avaliam como muito consagrado, muito crente, e
apenas
5%
apontam para definições desabonadoras sobre ele, dizendo que ele é
um espertalhão, um oportunista.
0
10
20
30
40
50
60
70
80
%
MUITO SÁBIO/INTELIGENTE
MUITO
CONSAGRADO/CRENTE
ESPERTALHÃO/OPORTUNIST
A
204
O que se percebe entre os presbiterianos é que Soares é alguém muito
próximo. A mídia, principalmente a televisão tem esse poder de tornar uma pessoa
distante muito familiar, afinal, diariamente durante algum tempo, essa imagem
televisiva faz parte do cotidiano das pessoas, invadindo seus lares em horários
específicos e diminuindo a solidão, gerando uma certa interação e criando uma
empatia grande.
No que tange à religião isso acaba sendo até mais forte. Alguém que procure
na religião o preenchimento de suas necessidades, em algum momento vai se
deparar com uma mensagem que o satisfaz naquele momento e, portanto, a partir
daí cria-se uma relação mística entre o produtor e o receptor da mensagem.
A atitude de Soares de veicular um programa televisivo em horário nobre é
vista pelos presbiterianos como algo muito significativo. É como se a atitude fosse
uma resposta do universo evangélico ao formato secularizado das televisões
nesse horário. Compartilhando da mesma idéia de Soares, os presbiterianos
também acusam as novelas de serem responsáveis pela degradação moral da
sociedade brasileira e um programa evangélico em horário nobre é visto como
uma vitória do reino de Deus sobre o reino das trevas. Quando questionados
sobre o que achavam de ter um programa evangélico em horário nobre, os
presbiterianos disseram o seguinte:
40%
entendem que isso é algo ousado;
60%
acreditam serem necessários mais programas como esse no mesmo horário para
enfrentar as danosas novelas.
0
10
20
30
40
50
60
%
ATITUDE OUSADA
SERIAM NECESSÁRIOS
MAIS PROGRAMAS COMO
ESSE
205
Os presbiterianos entendem que um programa evangélico em horário nobre é
uma cruzada de fé, para eles é uma vitória do bem contra o mal e, nessas
circunstâncias, não importa muito o quesito denominacional, ou seja, não importa
que o dono do programa seja pentecostal, neopentecostal ou um protestante
histórico, aliás, essas nomenclaturas são muito estranhas para os religiosos
analisados. O que definitivamente está consolidado e que define os grupos
cristãos não-católicos no Brasil é o rótulo de “evangélico”. A expressão
“evangélico” parece abarcar todas as tendências religiosas cristãs que não são
católicas e oferece um sentido de identidade, de marca e de representatividade
para os entrevistados, mas ao mesmo tempo que essa expressão fortalece o
sentido de pertença ao macro grupo porque ela enfraquece as diferenças
doutrinárias e organizacionais entre os vários grupos religiosos no Brasil, ela serve
aos grupos midiáticos para conseguir penetração junto a grupos religiosos que
tradicionalmente seriam difíceis de serem conquistados.
Para se ter uma idéia de como os presbiterianos entrevistados estão alheios a
rótulos e reduções,
82,5%
não tem a menor idéia à qual linha doutrinária pertence
Soares, e somente
17,5%
o definem como pentecostal ou neopentecostal, mas
isso não é nenhum empecilho para que eles assistiam ao programa de Soares ou
acompanhem as transmissões da RIT ou de outras mídias da Igreja Internacional
da Graça de Deus.
206
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
%
NÃO SABEM
PENTECOSTAL/NEOPEN
TECOSTAL
Apesar de não saberem definir à qual linha doutrinária pertence o Missionário
Soares, os presbiterianos analisados, quando questionados se percebem alguma
diferença entre a doutrina expressada pelo Missionário em seus programas e a
doutrina que lhes é ensinada em suas igrejas,
80%
percebem alguma diferença,
mas não sabem categorizá-la e
20%
não percebem nenhuma diferença entre as
doutrinas.
207
0
10
20
30
40
50
60
70
80
%
HÁ DIFERENÇA
DOUTRINÁRIA
NÃO HÁ DIFERENÇA
DOUTRINÁRIA
O que se percebe no campo religioso brasileiro dito evangélico na atualidade é
que ele apesar das enormes diferenças que o definem internamente, na prática,
principalmente devido ao papel da mídia, as diferenças entre os grupos religiosos
foram colocadas em segundo plano em nome de uma identidade nacional. Soares
jamais conseguiria sobreviver no mundo midiático se os seus telespectadores
fossem somente os membros de sua igreja, por isso, a necessidade de se criar
uma identidade nacional é tão fundamental. Certamente, Soares não é criador
dessa identidade nacional, outros grupos iniciaram esse processo, mas o que
deve ficar claro é que Soares é um fomentador dessa idéia e alguém que se
aproveita muito bem dessa identidade evangélica nacional. A mídia religiosa no
Brasil diminuiu as diferenças entre os rios grupos religiosos, pelo menos no
plano da identidade e isso é bom para o mercado midiático.
Pesquisas como essa apontam para a complexidade do campo religioso
evangélico no Brasil. Tradicionalmente quando esse campo é analisado algumas
categorias são utilizadas pelos pesquisadores de religião, uma delas é a
tipologização do universo pentecostal brasileiro em ondas, aliás, essa tipologia foi
usada nesse trabalho. No entanto, o que se percebe é que essa tipologia não
conta da realidade do campo religioso brasileiro hodiernamente. Com toda essa
penetração entre um grupo do chamado protestantismo histórico, será que ainda é
208
possível se referir ao Missionário Soares como um pastor neopentecostal? Ele é
neopentecostal somente porque criou sua igreja num determinado momento
histórico e essa igreja possui algumas características iguais a de outras igrejas
criadas no mesmo período? Cremos que não.
Qual seria a melhor definição para o Missionário Soares na atualidade?
Diríamos que atualmente ele pode ser definido como um transpentecostal. Esse
termo o qualifica como alguém que possui um trânsito enorme entre grupos
religiosos que tradicionalmente lhe seriam hostis. Não negamos suas
características do universo pentecostal, mas isso não lhe atrapalha quando o
assunto é penetração junto aos protestantes históricos.
O campo religioso brasileiro está em constante mutação e apesar de
reconhecer a necessidade de tipologias para compreender essa realidade, elas
tornam-se menos eficazes na tentativa de apreensão da realidade.
209
4.3 Estaria acontecendo uma “internacionalização” do
campo religioso nacional?
A pergunta em epígrafe remete a um conceito que foi desenvolvido algum
tempo, mais especificamente no final dos anos noventa, início dos anos dois mil,
quando a forte penetração da Igreja Universal do Reino de Deus estava criando
um modelo que era copiado por comunidades menores e até mesmo por algumas
dissidências da própria Universal, como a Igreja Mundial do Poder de Deus, uma
igreja fundada na Cidade de Sorocaba em 1998 pelo apóstolo Waldemiro Santiago
(ex-bispo da Universal). O sucesso da Universal estava gerando uma imitação
desenfreada de um modelo que estava dando certo, e alguns estudiosos
cunharam uma expressão que definia esse fenômeno, dizia-se na época que
estava ocorrendo no campo religioso nacional uma verdadeira “iurdinização”. Será
que esse fenômeno estaria acontecendo com a Igreja Internacional da Graça de
Deus? Será que temos no campo religioso nacional uma “internacionalização” em
marcha? Será que o Missionário Soares criou um modelo a ser copiado por outros
grupos religiosos no Brasil, sejam eles de que matriz religiosa forem?
Essas perguntas precisam levar a muitas reflexões. Comecemos pela última
questão. Soares criou sim um modelo a ser copiado. É inegável seu ineditismo,
afinal ele, além de ser o televangelista mais antigo em atuação na televisão
brasileira, ainda foi o pioneiro em criar um programa evangélico em horário nobre.
Como a pesquisa entre os presbiterianos aponta, é muita forte a idéia entre os
evangélicos, de que programas evangélicos devem ocupar cada vez mais espaço
na mídia de forma geral, e em especial na televisão, que, como se sabe, é um
instrumento poderoso na formação de opinião no Brasil. Ter visibilidade na mídia
televisiva é sinal de representação da identidade evangélica e de cumprimento de
sua tarefa de expansão da fé, de sua tarefa proselitista. E Soares foi pioneiro na
210
realização dessa tarefa. Então, nesse sentido ele é visto como alguém que gerou
um modelo, e esse modelo deve ser copiado.
O Reverendo Éber Cocarelli da Igreja Presbiteriana Independente que trabalha
há 11 anos com o missionário Soares concorda com isso. Ele diz:
“Com certeza absoluta o missionário RR Soares criou um modelo midiático a ser
copiado. Desde de 1997, quando o missionário começou a ocupar horários mais
‘nobres’ na televisão brasileira, ele emplacou um modelo significativo para o
campo religioso nacional. Ele ajudou a promover alterações do perfil do rosto do
neopentecostalismo brasileiro. Como ele fez isso? Por exemplo: não falando mal
de outras religiões, não falando mal de outros grupos evangélicos, rindo no
púlpito, coisa que não era comum no meio pentecostal. Veja só, o caso do ex-
bispo da Universal, o agora apóstolo Valdemiro Santiago, ele saiu da Universal e o
seu modelo midiático é o Missionário Soares. Ele ficou tanto tempo na Universal,
mas quando ele entrou na mídia com a sua própria igreja, o modelo que ele
adotou, tanto no linguajar, quanto na postura foi do Missionário Soares. [Entrevista
no dia 06/10/2008].
O sucesso de Soares na mídia de fato criou um modelo, isso parece
inquestionável. Mas o sucesso junto ao público deve-se a quais fatores? Deve-se
inicialmente ao fato de que ele possui uma clara noção de sua mensagem e de
seu público. Soares domina os códigos e subcódigos dentro de sua estrutura
midiática. Como diz Umberto Eco:
“O conjunto dos códigos e subcódigos é aplicado à mensagem à luz de um quadro
de referência cultural geral, que constitui o patrimônio de saber do ‘receptor’: a sua
posição ideológica, ética, religiosa, as suas disposições psicológicas, os seus
gostos, os seus sistemas de valores etcetera. Paralelamente, o ente emissor e o
intérprete técnico codificam a mensagem com base em seu próprio quadro de
referência cultural: escolhem os significados a comunicar, com que fim, a quem, e
de que modo organizá-los através dos níveis de mensagem. Assim fazendo, tanto
o ente como o intérprete técnico presumem, no receptor, um quadro de referência
cultural. Podem presumi-lo análogo ao deles ou então diverso e, nesse caso,
organizarão a mensagem de modo a levar em conta a diversidade ou justamente
tender a saná-la, estimulando, através da mensagem, uma mutação do quadro de
211
referência cultural do receptor. Esse quadro de referência, que poderia chamar-se
ideologia (dando-se ao termo o significado mais lato possível), constitui um
sistema de assunções e expectativas que interage com a mensagem e determina
a escolha dos códigos à cuja luz deve ser decodificada”. (ECO, 2006, p.378)
A referência cultural geral, a ideologia que se manifesta no interior do campo
religioso evangélico no Brasil permite a Soares emplacar um modelo midiático a
ser seguido. Sua ousadia e sua obsessão midiática possibilitaram-lhe delimitar um
espaço que o torna nesse momento, um homem poderoso, no que tange
principalmente a acumulação de capital religioso. A força midiática da Igreja
Internacional da Graça de Deus, ao mesmo tempo em que é aumentada pelo
trabalho do ousado Soares, em contrapartida essa mesma força midiática confere
ao seu criador um poderio religioso muito significativo, a ponto de atribuir a Soares
um poder de penetração em outros grupos religiosos, como apontou a mesma
pesquisa entre os presbiterianos há pouco citada, um grupo que tradicionalmente
seria avesso ao discurso de Soares.
Sobre a penetração e o trânsito entre protestantes históricos, o Reverendo
Éber Cocarelli diz:
“Eu atribuo essa pentração e esse trânsito do missionário Soares entre o público
do protestantismo histórico, especialmente entre os presbiterianos, a duas coisas:
Primeiramente, que se ressaltar o dom natural, ou melhor, eu diria até
sobrenatural que o missionário possui de conquistar a atenção das pessoas. Basta
conversar dez minutos com ele para se perceber sua grande capacidade
comunicação. Ele conquista, ele cativa, ele possui um carisma muito grande. A
segunda coisa é que ele conhece aquilo que é caro aos protestantes históricos.
Ele se converteu na Igreja Presbiteriana, passou sua juventude na Igreja Batista e
mais tarde ingressou no pentecostalismo. Ele admira de verdade, não é só
palavrório não, ele admira, tem verdadeira fascinação pelo zelo de santidade de
presbiterianos e batistas. Ele sabe que o mundo pentecostal é muito volátil. A
pessoa num dia está em comunhão total com Deus e no dia seguinte é capaz dos
mais terríveis pecados. O missionário Soares valoriza muito a regularidade da vida
de santidade dos protestantes históricos. Além disso, ele admira muito a herança
missiológica dos protestantes históricos. Missionários que vieram para numa
época em que não havia liberdade de culto, onde a igreja católica era dominante.
212
Ele sempre admirou os missionários protestantes. Aliás é por isso que ele carrega
o título de missionário, por valorizar a ação de missionários do passado. Vale
ressaltar no entanto, que apesar de inspirado nos missionários protestantes do
passado, ele adotou esse título de missionário em homenagem a Manoel de Mello,
porque eles andaram juntos uma época de suas vidas. Esse era um homem a
quem Soares admirava muito”. [Entrevista no dia 06/10/2008].
Outra questão importante no que tange ao assunto tratado é que o modelo
criado pelo missionário Soares ensina, também, que, para se ter uma grande força
midiática, é necessário participação política. Qualquer grupo religioso no Brasil
que queira construir seu espaço na mídia precisa atuar no campo político. Soares
deixou isso muito claro, quando começou a colher os bons frutos para suas
empresas midiáticas, logo após promover a sua inserção na política, através de
representantes ou na aproximação de políticos já consolidados, e de fazer fortes
investimentos nessa área. A construção, a manutenção e o crescimento de grupos
midiáticos no Brasil passa pela política nacional. Os grupos religiosos que não
conseguirem aglutinar poderio midiático nos tempos atuais terão muita dificuldade
para se manter no mercado da fé.
Soares compreendeu isso muito bem. Suas estratégias, nos últimos tempos,
para construir e consolidar um império midiático, apontam nessa direção.
Então, respondendo a uma das perguntas que foram feitas no início desse
tópico, a saber: o Missionário Soares criou um modelo a ser copiado por outros
grupos religiosos no Brasil, sejam eles de que matriz religiosa forem?
A resposta é sim. Soares de fato, criou um modelo e percorreu o caminho das
pedras até consolidar o seu poderio midiático.
Se Soares por um lado é ousado e criou com isso um modelo a ser copiado no
que tange à construção de um império midiático, por outro lado, ele não traz nada
novo em matéria de inovação religiosa. Ele não é criador de uma nova doutrina,
ele o será conhecido na história como o criador de um novo movimento
religioso, muito pelo contrário, ele simplesmente usa os modelos religiosos que
estão dando certo algum tempo no campo religioso. Ele também não inovou
em matéria de liturgia; sua organização litúrgica é a mais tradicional possível, ele
213
não investiu em coreografias, em danças, em nenhum aparato litúrgico para atrair
seu público. Por isso, a resposta à pergunta: estaria ocorrendo uma
internacionalização do campo religioso brasileiro? A resposta é não.
A Igreja Internacional da Graça de Deus não é a maior igreja do país, nem em
número de membros, nem em número de templos, mas é a igreja que hoje
consegue, graças ao carisma
37
tanto pessoal, como oficial de seu líder maior,
penetrar em outros grupos religiosos, oferecendo-lhes, por meio de sua força
midiática, uma alternativa religiosa, principalmente para os grupos religiosos que
não possuem representatitividade midiática em nível nacional, ou mesmo aqueles
que possuem uma atividade midiática, contudo, sem grande repercussão. E estes
grupos, geralmente estão enquadrados no segmento das igrejas consideradas
históricas, como o grupo presbiteriano que foi analisado no tópico anteror.
Quando pensamos em alternativa religiosa não estamos pensando na
indumentária, na prática litúrgica, na teologia e na doutrina; estamos pensando na
capacidade de se metamorfosear e contudo e apesar do “mesmo”, oferecer algo
que pareça, em última instância uma novidade. E isso se deve basicamente ao
carisma e a habilidade comunicacional de Soares.
A força midiática da Igreja Internacional da Graça de Deus não é capaz de criar
um novo modelo religioso, mas é capaz de criar uma alternativa religiosa ao
oferecer seus produtos nesse mercado competitivo; usando essa mídia e criando
em outros grupos religiosos um certo “despertamento” para essa nova forma de
praticar a religiosidade no momento atual. O sucesso da Igreja Internacional da
Graça de Deus no campo midiático credencia esse grupo a se apresentar como
uma alternativa religiosa.
Novamente Cocarelli nos auxilia a compreender esse fenômeno. Ele diz:
37
. É provável que o carisma pessoal seja o original, mas o carisma oficial ganhou importância
muito grande na história de grupos religiosos. Sem vida, existe algo de elementar e irresistível
no carisma pessoal e, em comparação, com ele o carisma oficial parece menos eficaz. O último
pode ser mais claramente definido do que o tipo pessoal, vago e muitas vezes indescritível, mas é
mais restrito, mais superficial e mais limitado. Há mais uma importante diferença: o carisma
pessoal apela mais para as emoções, ao passo que o carisma oficial é mais ‘racional’. (WACH,
1990, p.404)
214
“Apesar do missionário Soares ter trânsito entre os membros das igrejas
históricas, ele não é bem visto entre os teólogos dessas igrejas. Enquanto essas
igrejas falam do lado feio dos homens, como, por exemplo, a presbiteriana; ela
enfatiza o lado decaído, pecaminoso do homem; de um homem que o vale
nada, totalmente depravado e que tem que se render a Deus, na Igreja da Graça
não é assim. Quase todas as pessoas que chegam aqui estão desiludidas da vida.
E o que é a primeira coisa que acontece com essa pessoa quando ela entra num
templo da Graça? Ele tem a sua auto-estima resgatada. Os obreiros são
orientados a o ‘levantar a bola’ da pessoa, mas a sua fé. É uma coisa bem
maniqueísta, mas que funciona. Se sua vida está ruim é porque o diabo está
incultindo esses pensamentos de que vonão vale nada. Deus não quer isso.
Aqui se resgata a auto-estima por meio da fé. Os leigos das igrejas históricas
querem ouvir que eles têm algum valor, por isso eles se identificam com a
pregação do missionário. Aqui se fala do esforço da fé, ou seja, crer naquilo que
Deus prometeu, não depende da graça de Deus, mas da sua fé. A igreja
Internacional da Graça é uma alternativa religiosa e oferece alternativas
religiosas”. [Entrevista no dia 06/10/2008].
O Missionário Soares, com a experiência que acumulou nos últimos anos
nos campos midiático e religioso, foi capaz de perceber as demandas do mercado
religioso nacional e de preenchê-las e é por isso que ele está construindo e
consolidando um império midiático atrelado à sua imagem e à sua habilidade de
comunicar-se com as pessoas.
215
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Desde as primeiras páginas desta tese tentou-se a criação de um texto que
exprimisse a relação fecunda entre religião e mídia, como fenômenos ligados à
modernidade. A modernidade traz à tona o desencantamento do mundo e a
secularização, fenômenos que inauguram a pluralidade de pensamentos e a
possibilidade de escolha no campo religioso. As estratégias midiáticas, desde
então, sempre estiveram disponíveis para os grupos religiosos exporem suas
crenças e princípios. A parceria, mídia e religião, além de profícua e duradoura
ganha novas roupagens e novas configurações, precisando de novos atores para
torná-la mais eficaz, como, por exemplo, a participação de atores políticos. As
mídias na modernidade foram vistas pelos agentes religiosos como meios para
aumento de poder. Por isso, a relação mídia, religião e política torna-se algo de
grande relevância, uma relação de suma importância na modernidade.
No que tange ao campo religioso brasileiro, essa relação não foi tão simples
assim. Os grupos religiosos mais antigos dentro do espectro pentecostal não viam
com bons olhos a presença da mídia e muito menos da política. Mas com o passar
do tempo e novas demandas, os grupos pentecostais nascidos, a partir da
segunda metade do século XX conseguiram quebrar essa barreira e começaram a
utilizar todas as mídias possíveis para atingir seus objetivos, bem como
começaram a usar a política para consolidar suas conquistas.
A Igreja Internacional da Graça de Deus nasce sob o princípio de que essa
relação acima mencionada é de fundamental importância.
Seu criador, o missionário Soares sempre foi fascinado por mídia, mais
especificamente pela televisão, e ao longo da vida desenvolveu seus princípios
religiosos. Ao encontrar-se com os princípios e crenças pentecostais, Soares
começou a colocar em prática suas estratégias midiático-religiosas. Começava ali,
o seu desejo de construir um império na área da comunicação.
216
A intersecção dos campos, religioso, midiático e político é um meio de construir
um império midiático na atualidade, aliás, talvez seja o único meio, e com certeza
é o mais eficiente para realizar tal empreendimento.
A força midiática da Igreja Internacional da Graça de Deus, comandada por
Soares manifesta-se nessa relação. Nessa tese procuramos demonstrar como os
campos religioso, midiático e político manifestam-se na construção do império
midiático do missionário Soares. Com investimentos na área política, Soares
conseguiu representantes eleitos para atuarem em prol de seu ideário.
Falar da força midiática de uma instituição como uma igreja é algo difícil, e
mais difícil ainda se torna quando a força da instituição está intimamente
associada ao carisma do idealizador desse projeto. No fundo falar de Igreja
Internacional da Graça de Deus, ou falar das mídias que essa igreja possui é em
última instância, falar de Romildo Ribeiro Soares. E é exatamente por isso, que ele
ocupa boa parte das páginas dessa tese. Desde a sua infância pobre na cidade de
Muniz Freire no estado do Espírito Santo, passando por sua conversão religiosa
no protestantismo histórico e sua guinada para o pentecostalismo, procuramos
salientar como sua trajetória sempre esteve ligada à idéia de causar impacto na
sociedade brasileira, e para tal era fundamental aquinhoar força midiática.
Iniciando de forma tímida no meio midiático, através da televisão, seu verdadeiro
fascínio, Soares fez a diferença. Com uma habilidade muito grande e com uma
experiência de mais de trinta anos de trânsito no meio midiático, Soares conseguiu
construir um império. Seu império midiático não é o maior nesse momento na
realidade brasileira, contudo, analisando a trajetória de uma pessoa como ele, e
verificando de onde saiu e aonde já chegou, não se pode prever onde chegará
esse império.
A força midiática da Igreja Internacional da Graça de Deus está na atuação
ousada e experiente de seu mentor e fundador. Atualmente pode-se dizer que
Soares é um empresário de sucesso na área midiática. Seu capital religioso
possibilita lutar por mais espaço midiático, enquanto seu capital midiático o torna
mais poderoso religiosamente falando.
217
Outra questão importante que precisa ser frisada é que a Igreja Internacional
da Graça de Deus é uma igreja midiática. A Igreja Internacional da Graça de Deus
funde-se com as suas mídias. Desde a sua fundação, a premissa básica que
sustenta o seu discurso religioso é de que somente uma igreja com força midiática
poderia causar impacto na sociedade brasileira.
Partindo desse pressuposto, Soares e a Igreja Internacional da Graça de Deus
não mediram esforços para atuar em muitas mídias. Rede de Televisão,
emissoras de rádio, jornais, revistas, internet, editora e até uma gravadora fazem
parte da aldeia global de Soares e de sua estratégia comunicacional. Algumas
dessas mídias foram analisadas nessa tese. A força midiática da Igreja
Internacional da Graça de Deus manifesta-se também nessa multiforme expressão
de poder. As mídias existentes consolidam o poder de penetração da Igreja
Internacional da Graça Deus junto à sociedade brasileira.
Soares representa, hodiernamente no meio evangélico, a figura mais bem
sucedida quando o assunto é propagação de sua crença por meios midiáticos
tornando-se capaz de dialogar com outras correntes dentro do protestantismo
histórico. Ele não carrega a antipatia que pesa sobre outros líderes religiosos
dentro do campo religioso brasileiro. Ele conseguiu, antes de vender seu produto
religioso, vender a si mesmo como um homem que merece no mínimo não ser
odiado por aquilo que faz e isso é uma grande coisa quando se trata de campo
religioso. Nisso também se manifesta a força midiática da Igreja Internacional da
Graça de Deus, na medida em que ela viabiliza e autentica a imagem de um líder
religioso que possui uma habilidade muito grande no campo das comunicações.
O império midiático que Soares construiu é eminentemente religioso. É
impressionante a trajetória de construção das mídias da Igreja Internacional da
Graça de Deus. Por enquanto, sua fidelidade à causa religiosa é a premissa
básica que sustenta sua estrutura religiosa, no entanto, como o mundo hodierno é
marcado pelas regras do mercado e por uma ética de resultados, uma grande
questão que será imposta e precisará ser respondida por Soares e pela Igreja
Internacional da Graça de Deus é até que ponto pode-se manter uma mídia
eminentemente religiosa, num mercado secularizado? Essa é uma resposta que
218
somente o tempo dará. Por enquanto, o que nos cumpriu dizer nesta tese é que a
força midiática da Igreja internacional da Graça de Deus é uma realidade, está
consolidada e apresenta-se como uma alternativa religiosa para outros grupos
religiosos sobreviverem no campo religioso atual.
No plano teórico, A força midiática da Igreja Internacional da Graça de Deus é
uma tese de ciências da religião que se vale de muitos referenciais teóricos para
tentar compreender de que maneira essa força foi construída e de que maneira
essa força se manifesta. Como o próprio campo das ciências da religião abarca
uma proposta interdisciplinar, a tese que ora se apresenta também dialoga com
várias áreas do conhecimento. A construção de uma tese é uma tarefa muito
solitária, principalmente no momento redacional, no entanto, essa tarefa torna-se
muito fascinante, quando no momento dialogal, grandes baluartes do pensamento
humano nos fazem companhia e servem de base para as reflexões que ganharão
sentido através da escrita. Os diálogos com a obra de Pierre Bourdieu, de Rodney
Satrk, Max Weber e tantos outros que estão presentes nessa tese, bem como os
diálogos com o orientador fizeram com que essa caminhada solitária fosse menos
difícil.
A força midiática da Igreja Internacional da Graça de Deus é uma tese que
tenta captar um pouco do que está acontecendo no campo religioso nacional,
campo este difícil de ser delineado, mapeado, e que está em constante mutação.
De qualquer forma, a tese em questão é uma percepção de uma parcela desse
campo e uma tentativa de compreender esses agentes religiosos em atuação e
visa produzir um diálogo mais fraterno entre os vários grupos religiosos nacionais.
219
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ABUMANSSUR, Edin Sued (2001). Moradas de Deus Representação
Arquitetônica do Espaço Sagrado entre Protestantes e Pentecostais. São Paulo.
PUCSP. [Tese do Doutorado].
_________________________(2004). Moradas de Deus Arquitetura de Igrejas
Protestantes e Pentecostais.São Paulo. Novo Século.
_________________________(2005). Os Pentecostais e a Modernidade. In:
PASSOS, João Décio (Org.) Movimentos do Espírito. São Paulo, Paulinas.
ADORNO, Theodor (2002). Indústria Cultural e Sociedade. São Paulo, Paz e
Terra. 3ª edição.
ANTONIAZZI, Alberto et alli (1994). Nem Anjos nem demônios: interpretações
sociológicas do pentecostalismo. Petrópolis, Vozes.
ASSMANN, Hugo (1986). A Igreja Eletrônica e seu impacto na América Latina.
Petrópolis.Vozes.
AYALA, Francisco J. e DOBZHANSKY, Theodosius, orgs. Estudios sobre la
Filosofia de la Biología. Barcelona, Ariel.
BARBERO, Jesús Martín & REY, Germán (2001). Os exercícios do ver:
hegemonia audiovisual e ficção televisiva. São Paulo, SENAC.
_____________________(2003). La educación desde la comunicación. Bogotá,
Grupo Editorial Norma.
_____________________(2006). Dos meios às meditações: comunicação, cultura
e hegemonia. Rio de Janeiro, UFRJ.
BARSHEVIS, Singer Isaac (1982). O Golem. São Paulo, Perspectiva.
220
BAUMAN, Zygmunt (1998). O mal-estar da pós-modernidade. Rio de Janeiro,
Jorge Zahar.
BELLOTTI, Karina Kosicki (2000). Uma Igreja Invisível? Protestantes históricos e
meios de comunicação no Brasil (anos 50 e 80). Monografia de conclusão de
graduação em História, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Unicamp.
_______________________(2005). A mídia presbiteriana no Brasil Luz para o
caminho e Editora cultura cristã (1976-2001). São Paulo, Annablume, FAPESP.
_______________________(2007). Delas é o reino dos céus: mídia evangélica
infantil na cultura pós-moderna do Brasil (anos 1950 a 2000) Campinas - SP,
UNICAMP Universidade Estadual de Campinas. [Tese de Doutorado].
BERGER, Peter (1985). O Dossel Sagrado Elementos para uma Teoria
Sociológica da Religião. São Paulo, Paulus.
_______________(1996). Rumor de anjos: a sociedade moderna e a redescoberta
do sobrenatural. Petrópolis, Vozes. 2ª edição revista.
BIRMAN, Patrícia (Org). Religião e Espaço Público. São Paulo, Attar Editorial. s/d.
BOFF, Leonardo (1997). Os sacramentos da vida e a vida dos sacramentos.
Petrópolis, Vozes.
BOLAÑO, César Ricardo Siqueira (2004). Mercado Brasileiro de Televisão. São
Paulo/Aracaju, EDUC-UFS.
________________________________(2007). Qual a lógica das políticas de
comunicação no Brasil? São Paulo, Paulus.
BOURDIEU, Pierre (1982). Ce que parler veut dire L’economie des échanges
linguistiques. Fayard.
_________________(1997). Sobre a Televisão. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Ed.
221
_________________(2005). A Economia das Trocas Simbólicas. São Paulo,
Perspectiva. 6ª Edição.
_________________(2005). Esboço de auto-análise Pierre Bourdieu. São
Paulo, Companhia das Letras.
BRETON, Philippe & PROULX, Serge (2006). Sociologia da Comunicação. São
Paulo, Loyola. 2ª Edição.
BRIGGS, Asa & BURKE, Peter (2006). Uma História Social da Mídia De
Gutenberg à Internet. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Ed.
BRUCE, Steve (2002). God is dead: secularization in the West. Malden, Blackwell.
BUCCI, Eugênio (1997). Brasil em tempo de TV. São Paulo. Boitempo.
BURKE, Peter (Org.) (1992). A Escrita da História Novas Perspectivas. São
Paulo, UNESP.
CALABRE, Lia (2004). A Era do Rádio. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Ed. (2ª
Edição)
CAMPOS, Leonildo Silveira (1999). Teatro, Templo e Mercado Organização e
Marketing de um Empreendimento Neopentecostal. Petrópolis RJ, Vozes; São
Paulo, Simpósio Editora e Universidade Metodista de São Paulo, (2ª Edição).
CAMURÇA, M.A. (2003). A Sociologia da Religião de Danièle Hervieu-Léger: entre
a Memória e a Emoção. In: TEIXEIRA, Faustino (Organizador). Sociologia da
Religião – Enfoques Teóricos, São Paulo, Vozes.
CARVALHO, José Jorge de (1998). Religião, mídia e os predicamentos da
convivência pluralista uma análise do evangelismo transnacional norte-
222
americano. In: MOREIRA, Alberto da Silva (Org.). Sociedade Global: Cultura e
Religião. Petrópolis RJ, Vozes; São Paulo, Universidade São Francisco, (2ª
Edição).
CÉSAR, Waldo & SHAULL, Richard (1999). Pentecostalismo e Futuro das Igrejas
Cristãs Promessas e Desafios. Petrópolis, RJ, Vozes; São Leopoldo, RS,
Sinodal.
CHASSOT, Attico (1994). A ciência através dos tempos. São Paulo. Moderna. (6ª
Edição)
CHAUÍ, Marilena (2006). Simulacro e Poder Uma análise da dia. São Paulo,
Perseu Abramo.
CIPRIANI, Roberto (2007). Manual de Sociologia da Religião. São Paulo, Paulus.
D’ARAÚJO, Maria Celina (1997). A Era Vargas. São Paulo, Moderna.
DAWKINS, R. (1988). O relojoeiro cego. Lisboa, Edições 70.
DEBORD, Guy (1997). A Sociedade do espetáculo. Rio de Janeiro, Contraponto.
DeFLEUR, Melvin L. & ROKEACH-Ball, Sandra (1993). Teorias da Comunicação
de Massa. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Ed.
DHERER, Martin (2006). Martinho Lutero Informes Biográficos. In: LUTERO,
Martinho. Do Cativeiro Babilônico da Igreja. São Paulo, Martin Claret.
DUARTE, Jorge & BARROS, Antonio (Orgs) (2006). Métodos e Técnicas de
Pesquisa em Comunicação. São Paulo, Atlas. 2ª Edição.
223
ECO, Umberto (2006). Apocalípticos e Integrados. São Paulo, Perspectiva. 2ª
reimpressão da 6ª Edição.
ENGLER, Steven. Modern Times: Religion, Consecration and the State in
Bourdieu. Cultural Studies – 17(3/4) 2003, p.p.445-467.
FACCIO, Maria da Penha Rocha (1998). Religião na TV: um estudo de caso de
redes brasileiras. São Paulo. PUCSP [Dissertação de Mestrado].
FAUSTO, Boris (2006). Getúlio Vargas: o poder e o sorriso. São Paulo,
Companhia das Letras.
FERREIRA, Júlio Andrade (1992). História da Igreja Presbiteriana do Brasil. Vol.1.
São Paulo, Casa Editora Presbiteriana. 2ª Edição.
FLICK, Uwe (2004). Uma Introdução à Pesquisa Qualitativa. Porto Alegre RS,
Bookman. 2ª Edição.
FONSECA, Alexandre Brasil (2003). Evangélicos e mídia no Brasil. Bragança
Paulista. Editora Universitária São Francisco.
_________________________(2003). Igreja Universal: um império midiático. In:
ORO, Ari Pedro & CORTEN, André & DOZON, Jean-Pierre (Orgs.). Igreja
Universal do Reino de Deus: os novos conquistadores da fé. São Paulo, Paulinas.
FREIRE, Paulo (2000). Pedagogia da Indignação cartas pedagógicas e outros
escritos. São Paulo, UNESP.
FRESTON, Paul (1993). Protestantes e Política no Brasil; da Constituinte ao
Impeachment. Campinas, UNICAMP [Tese de Doutorado].
______________(1994). Evangélicos na Política Brasileira: história amgua e
desafio ético. Curitiba, Encontrão.
224
______________(1994). Breve história do pentecostalismo brasileiro. In:
ANTONIAZZI, Alberto et alli. Nem Anjos nem demônios: interpretações
sociológicas do pentecostalismo. Petrópolis, Vozes.
GIDDENS, Anthony (1991). As conseqüências da modernidade. São Paulo,
UNESP.
_________________(1998). Política, Sociologia e Teoria Social Encontros com
o pensamento social clássico e contemporâneo. São Paulo, UNESP.
GIUMBELLI, Emerson (2003). Clifford Geertz: a religião e a cultura. In: TEIXEIRA,
Faustino (Organizador). Sociologia da Religião enfoques teóricos. Petrópolis,
Vozes.
GOUVEIA. Eliane H. (1998). Imagens Femininas: a reengenharia do feminino
pentecostal na televisão. São Paulo. PUCSP [Tese de Doutorado].
__________________(2005). Territorialidades do Sagrado. In: PASSOS, João
Décio (Org.) Movimentos do Espírito. São Paulo, Paulinas.
GOUVEIA. Eliane H. Entre o Templo e a Televisão: Comunidades Eletrônicas de
Consolo. Revista Nures, p.1-16.
HALL, Stuart (2005). A Identidade Cultural na Pós-Modernidade. Rio de Janeiro,
DP&A. (10ª Edição).
___________(2006). Da Diáspora Identidades e Mediações Culturais. Belo
Horizonte. UFMG.
HAMBURGER, Esther (1998). Diluindo Fronteiras: A televisão e as novelas no
cotidiano. In: NOVAIS, Fernando A. & SCHWARCZ, Lilia Moritz. História da Vida
Privada no Brasil: contrastes da intimidade contemporânea. São Paulo,
Companhia das Letras.
225
HILL, Christopher (1988). O Eleito de Deus Oliver Cromwell e a Revolução
Inglesa. São Paulo, Companhia das Letras.
________________(2003). A Bíblia Inglesa e as Revoluções do Século XVIII. Rio
de Janeiro, Civilização Brasileira.
HOBSBAWM, Eric (1977). A Era das Revoluções: Europa 1789-1848. o Paulo,
Paz e Terra, 17ª Edição.
_________________(1995). A Era dos Extremos – O Breve século XX 1914-1991.
São Paulo, Companhia das Letras.
HOGGART, Richard (1975). As utilizações da cultura aspectos da vida cultural
da classe trabalhadora - volume 2. Lisboa, Editorial Presença.
JUNIOR, Juvenal Zanchetta (2004). Imprensa escrita e telejornal. São Paulo,
UNESP.
LALLEMENT, Michel (2003). História das idéias sociológicas: das origens a Max
Weber. Petrópolis, Vozes.
LAMBERT, Yves. (1999) Religion in Modernity as a New Axial Age. Secularization
or New Religious Forms? Sociology of Religion, Fall, p.p.01-22.
LÉGER, Danièle Hervieu (2000). A transmissão na modernidade: elementos para
a construção de um objeto de pesquisa. Estudos de Religião, n.18, p.39-54
[ tradução de Dario Paulo Barrera Rivera].
LE GOFF, Jacques & SCHMITT, Jean-Claude (2006). Dicionário Temático do
Ocidente Medieval. TOMOS I e II. Bauru-SP, EDUSC.
LEMOS, André & PRYSTON, Ângela & SILVA, Juremir Machado da & SÁ, Simone
Pereira de. (Orgs) (2004). Mídia. BR – Livro da XII Compós. Porto Alegre. Sulina.
226
LIMA, Venício A. de (2006). Mídia: crise política e poder no Brasil. São Paulo,
Perseu Abramo.
MAFRA, Clara (2001). Os Evangélicos. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Ed.
MARIANO, Ricardo (1999). Neopentecostais: Sociologia do Novo Pentecostalismo
do Brasil. São Paulo, Loyola.
MARTINO, Luís Lauro Sá (2003). Mídia e Poder Simbólico: um ensaio sobre
comunicação e campo religioso. São Paulo, Paulus.
__________________________(2005). Comunicação: troca cultural? São Paulo,
Paulus.
MARTINS, Ana Luiza & LUCA, Tania Regina de (2006). Imprensa e Cidade. São
Paulo, UNESP.
MATOS, Olgária Chain Féres (1993). A Escola de Frankfurt – Luzes e Sombras do
Iluminismo. São Paulo, Moderna.
MCLUHAN, Marshall (1974). Os meios de comunicação como extensão do
homem. São Paulo, Cutrix. 4ª Edição.
MELO, José Marques de (1998). Teoria da Comunicação: Paradigmas Latino-
Americanos. Petrópolis – RJ, Vozes.
MELO, José Marques de & GOBBI, Maria Cristina & ENDO, Ana Claudia Braun
(Orgs) (2007). Mídia e Religião na Sociedade do Espetáculo. São Bernardo do
Campo, Metodista.
MORAES, Denis (Org) (2006). Sociedade Midiatizada. Rio de Janeiro. Mauad.
227
MORAIS, Fernando (1994). Chato: o rei do Brasil, a vida de Assis Chateaubriand.
São Paulo, Companhia das Letras. 2ª Edição.
NEGRÃO, Lísias Nogueira (2005). Nem Jardim Encantado, nem Clube dos
Intelectuais Desencantados. Revista Brasileira de Ciências Sociais Vol.2- nº 59.
p.p. 23-36.
NOGUEIRA, Maria Alice & NOGUEIRA, Cláudio M. Martins (2006). Bourdieu & a
Educação. Belo Horizonte-MG, Autêntica.
NOVALIS, Friedrich von Hardenberg (S/D). Pólen Fragmentos, diálogos,
monólogo. Iluminuras.
OLIVEIRA, Lucia Lippi (2004). A Criação da América. São Paulo, Atual.
OLIVEIRA, Manfredo A. de (2000). Correntes Fundamentais da Ética
Contemporânea. Petrópolis-RJ, Vozes.
OLIVEIRA, Pedro A. Ribeiro (2003). A teoria do trabalho religioso de Pierre
Bourdieu. In: TEIXEIRA, Faustino (Organizador). Sociologia da Religião
enfoques teóricos. Petrópolis, Vozes.
ORO, Ari Pedro & CORTEN, André & DOZON, Jean-Pierre (Orgs.) (2003). Igreja
Universal do Reino de Deus: os novos conquistadores da fé. São Paulo, Paulinas.
PALLA, Marco (1996). A Itália Fascista. São Paulo. Ática.
PASSOS, João Décio (Org.) (2005). Movimentos do Espírito. São Paulo, Paulinas.
PELUSO, Luís Alberto (1998). Ética e Utilitarismo. Campinas-SP, Alínea.
228
PIERUCCI, Antônio Flavio. (1997).Reencantamento e dessecularização A
Propósito do auto-engano em Sociologia da Religião. Novos Estudos CEBRAP,
nº49, p.p.99-117.
________________________(2001). Desencantamento do Mundo: os passos do
conceito em Max Weber.Tese de Livre Docência, São Paulo, Departamento de
Sociologia da FFLCH/USP.
________________________(2003). Desencantamento do Mundo: todos os
passos do conceito em Max Weber. São Paulo, Editora 34.
PINSKY, Jaime & PINSKY, Carla Bassanezi (2003). História da Cidadania. São
Paulo, Contexto.
POJMAN, Louis P. (2000). The Moral Life: An Introductory Reader in Ethics and
Literature. New York, Oxford.
PUNTEL, Joana T. (2005). Cultura Midiática e Igreja: Uma nova ambiência. São
Paulo, Paulinas.
QUINTANEIRO, Tânia & BARBOSA, Maria Lígia de Oliveira & OLIVEIRA, Márcia
Gardênia Monteiro de. (Orgs) (2002). Um Toque de Clássicos –Marx, Durkheim,
Weber. Belo Horizonte, UFMG.
RIBEIRO, Boanerges (1950). O Padre Protestante. o Paulo, Casa Editora
Presbiteriana.
RIBEIRO, Renato Janine (2004). O afeto autoritário: televisão, ética e cidadania.
Cotia SP, Ateliê Editorial.
RICOEUR, Paul (1977). Interpretação e Ideologias. Rio de Janeiro, Francisco
Alves.
229
RIVERA, Paulo Barrera (2001). Tradição, Transmissão e emoção religiosa
Sociologia do Protestantismo contemporâneo na América Latina. São Paulo. Olho
d’água.
ROBERTSON, A. H. (2003). Prefácio. In: MILTON, John. Paraíso Perdido, São
Paulo, Martin Claret.
ROMEIRO, Paulo (2005). Decepcionados com a Graça: esperanças e frustrações
no Brasil neopentecostal. São Paulo, Mundo Cristão.
SANTOS, Roberto Elísio dos (2003). As Teorias da Comunicação Da fala à
Internet. São Paulo, Paulinas.
SETTON, Maria da Graça Jacintho (2002). A teoria do habitus em Pierre Bourdieu:
uma leitura contemporânea. Revista Brasileira de Educação – nº 20. p.p.60-70.
SILVESTRE, Armando Araújo. Da Imprensa Evangélica ao Brasil Presbiteriano
O Papel (in) formativo dos Jornais da Igreja Presbiteriana do Brasil (1864-1986).
São Bernardo do Campo SP, Instituto Metodista de Ensino Superior.
[dissertação de mestrado]
SOARES, RR (2004). Como tomar posse da bênção. Rio de Janeiro, Graça
Editorial.
____________(2001). A sua saúde depende do que você fala. Rio de Janeiro,
Graça Editorial.
SOUZA, Beatriz Muniz de & MARTINO, Luís Lauro Sá. Sociologia da Religião e
Mudança Social: católicos, protestantes e novos movimentos religiosos no Brasil.
São Paulo, Paulus.
TAVALORO, Douglas (2007). O Bispo A História revelada de Edir Macedo. São
Paulo, Larousse do Brasil.
230
TEIXEIRA, Faustino (Org.) (2003). Sociologia da Religião Enfoques Teóricos,
Petrópolis, Vozes.
__________________& MENEZES, Renata (Orgs.) (2006). As religiões no Brasil
– Continuidades e Rupturas. Petrópolis, Vozes.
TFOUNI, Leda Verdiani (2002). Alfabetização e Letramento. São Paulo, Cortez.
edição. (Coleção Questões da Nossa Época, v.47)
THOMAS, Henry & THOMAS, Dana Lee (2003). Perfil Biográfico. In: MILTON,
John. Paraíso Perdido, São Paulo, Martin Claret.
THOMPSON, John B. (1995). Ideologia e Cultura Moderna teoria social crítica
na era dos meios de comunicação de massa. Petrópolis, Vozes.
___________________(1998). A Mídia e a Modernidade uma teoria social da
mídia. Petrópolis, Vozes.
URBAN, Hugh B. (2003). Sacred Capital: Pierre Bourdieu and the study of religion.
Method & Theory in the Study of Religion - nº15. p.p.354-389.
VEGA, Rodríguez Pilar (2002). Frankensteiniana, La tragedia del hombre articial.
NeoMetropolis, Tecnos/Alianza Editorial. Madrid.
WACH, Joachim (1990). Sociologia da Religião. São Paulo, Paulinas.
WEBER, Max (1985). Textos Selecionados. São Paulo, Abril Cultural. (Coleção Os
Pensadores).
____________(2004). Economia e Sociedade: fundamentos da Sociologia
compreensiva. Brasília, UNB; São Paulo, Imprensa Oficial. Volume 1. 4ª edição.
231
JORNAIS E REVISTAS
ABREU, Alzira Alves de. A Alma do Negócio Desde o século XIX a propaganda
marca presença no Brasil, fazendo anúncio de amas-de-leite ou dando publicidade
a ditadores. In: Nossa História, São Paulo, ano 2, nº 23, p.p.36-42, setembro de
2005.
ADEUS Bengalas! In: Revista Graça Show da Fé, Rio de Janeiro, ano 7, n. 85.
(provisório)
CONSTRUÇÃO do Cristo. In: Aventuras na História para viajar no tempo, São
Paulo, n. 38, outubro de 2006.
DECOUAN, Catherine. A religião faz política. In: Revolução Francesa: o contexto
político, social e econômico. História Viva Grandes Temas, São Paulo. Edição
Especial Temática nº 2.
DUTRA, Marcelo. A Maldição da Catedral. In: Revista Eclésia a revista
evangélica do Brasil. São Paulo. Ano 9. Edição 109. s/d.
ENTREVISTA Missionário RR Soares. In: Revista Turminha da Graça, Ano 4, n.
28, p.25.
ESTOU Vendo, estou vendo! In: Revista Graça – Show da Fé, Rio de Janeiro, ano
7, n. 86. (Provisório).
FREREJEAN, Alain. Thomas Paine importa liberdade da América. In: Revolução
Francesa: o contexto político, social e econômico. História Viva – Grandes Temas,
São Paulo. Edição Especial Temática nº 2.
GOUVEIA, Eliane Hojaij. Entre o templo e a televisão: comunidades eletrônicas de
232
Consolo. Revista Nures, (encontrado em
www.pucsp.br/nures/revista/eliane.pdf
). Acesso
em 28/07/07.
IGREJAS são favorecidas em rateio de rádios e TVs. In: Jornal Folha de São
Paulo, 18 de junho de 2006, p.A7.
INFORMATIVO INTERVOZES, Tv Digital: saiba por que você precisa participar
desse debate, Novembro de 2005, p.06.
LIMA, Nísia Trindade; SANTOS, Ricardo Ventura; JUNIOR, Carlos E.A. Coimbra.
Rondonia de Roquette Pinto: as veias do Brasil. In: Revista de História. Rio de
Janeiro. Ano 1, nº 11, Agosto de 2006.
LULA quer acordo moderado com Vaticano. In: Jornal Folha de São Paulo, São
Paulo, 15 de julho de 2007, p.A16.
MAIS POLÊMICA: NOVELA DUAS CARAS PROVOCA INDIGNAÇÃO AO
RETRATAR EVANGÉLICOS DE FORMA ESTIGMATIZADA E
PRECONCEITUOSA. In: Revista Graça Show da Fé, Rio de Janeiro, ano 09,
106, p.p.14-16.
MARIANO, Ricardo. Efeitos da secularização do Estado, do pluralismo e do
mercado religiosos sobre as igrejas pentecostais. Porto Alegre. Revista Civitas, v.
3, nº 1, jun. 2003
NÃO SE OMITA! In: Jornal Show da Fé, Ano 1 nº 08 – Setembro de 2006, p.02.
O BRASIL ANTENADO. In: Revista Graça – Show da Fé, Rio de Janeiro, ano 9, n°
106, p.37
O SOM DA GRAÇA. In: Revista Graça Show da Fé, Rio de Janeiro, ano 9,
102, p. 21.
233
PF INDICIA BISPO EDIR MACEDO POR FRAUDE. In: Folha de o Paulo, 16 de
Fevereiro de 2008, p. A11.
PREGADOR MULTIMÍDIA: NA TELEVISÃO, NO RÁDIO, E CDS OU NA
INTERNET, PR. JAYME DE AMORIM CAMPOS NÃO DESPERDIÇA
OPORTUNIDADE ALGUMA PARA FALAR DE JESUS. In: Revista Graça Show da
Fé, Rio de Janeiro, ano 9 - nº 106, p.p.20-21.
QUEDA DE BRAÇO: O EMBATE ENTRE EVANGÉLICOS E MILITANTES
HOMOSSEXUAIS CONTRA A APROVAÇÃO DE LEIS QUE PODEM CERCEAR A
LIBERDADE RELIGIOSA NO PAÍS. In: Revista Graça Show da Fé, Rio de
Janeiro, ano 9 - nº 102, p.p. 42-47.
SILVA, Wilson Santana. José Manoel da Conceição: o evangelista itinerante. São
Paulo, Mackenzie, 2002. 79 p. (Cadernos de Pós-Graduação n. 4)
SOARES, Romildo Ribeiro. Não se omita. In: Jornal Show da Fé, Rio de Janeiro,
ano 1, n. 08, p.02, setembro de 2006
TRAJETÓRIA de Fé, curas e vitórias. Missionário RR Soares celebra trinta anos
de um ministério evangelístico que já levou milhares de pessoas a Cristo. In:
Revista Graça – Show da Fé, Rio de Janeiro, ano 5, n. 69, p.p.44-51.
VIAGEM AO MERCADO DAS RELIGIÕES. In: Folha de o Paulo, 17 de Agosto
de 2008, p.1-10.
234
HIPERTEXTO (INTERNET)
André Soares Deputado Estadual. Disponível em:
http://www.al.sp.gov.br/portal/site/alesp/template/>. Acesso: 28/01/2008.
A RIT é uma realidade em Portugal: Disponível em:
http://www.rittv.com.br/news/noticia.php?id=24>. Acesso em 27/04/08.
Bancada Evangélica no Congresso Encolhe, aponta DIAP. Disponível em
http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u85068.shtml/>. Acesso: 20/07/2007.
Biografia de Carmem Silva em: http://www.carmensilva.art.br/>. Acesso em
07/07/08.
Constituição dos Estados Unidos do Brasil 16/07/1934. Disponível em: http://
.com.br/>. Acesso: 11/07/2007.
Consulta ao Doutor: Disponível em:
http://www.rittv.com.br/programas/programa.php?13.
>. Acesso em 03/07/08.
Curso Fé: Disponível em: http://www.rittv.com.br/programas/programa.php?13.
>.
Acesso em 03/07/08.
Deputado André Soares entrevista Prefeito de Lindóia: Disponível em : www.
sp
virtual.net/ sao_paulo_politica_-o53980-en.html/>. Aceso: 02/03/2008.
Deputados: Disponível em: http://www2.camara.gov.br/deputados/>. Acesso:
24/02/2008.
Grade de Canais da Nossa TV: Disponível em:
http://www.nossatv.tv.br/portal/site/gradecanais.jsp>. Acesso em 03/07/08.
História da Radiodifusão. Disponível em: http://www.mc.gov.br/>. Acesso:
11/07/2007.
Histórico de fundação da IPDA. Disponível em:http://www.ipda.org.br/>. Acesso:
20/07/2007.
235
Mídia Evangélica. Disponível em
http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos/asp080120035.htm/>.Acesso:
20/07/2007.
Ministério Joyce Meyer: Disponível em:
http://www.joycemeyer.com.br/jmbrasil/>Acesso: 22/03/08.
O Grande Estado de o Paulo. Disponível em:
http://www.rittv.com.br/programas/programa.php?41/>. Acesso: 02/03/2008.
O pastor eletrônico: Disponível em:
http://www.zaz.com.br/istoegente/193/reportagens/rrsoares_pastor_eletronico_01.
htm>. Acesso em 27/04/08.
Perfil do Telespectador: Disponível em: http://rittv.com/index.html. >.Acesso em
27/04/08
Programa SHOW DA FÉ. Disponível em: http://ongrace.com/>. Acesso:
22/05/2006.
Rede Internacional de Televisão. Disponível em: http://rittv.com.br/>. Acesso:
22/05/2006.
Rede de Intrigas. Disponível em:http://www.folhadespaulo/>. Acesso: 11/07/2007.
RIT é uma realidade na Flórida: Disponível em:
http://www.rittv.com.br/news/noticia.php?id=23>. Acesso em 03/05/08.
TL Osborn: Disponível em: http://www.osborn.org/about/tlosborn.html/>.Acesso:
16/03/2008.
Zig Zag Show: Disponível em:
http://www.rittv.com.br/programas/programa.php?13.
>. Acesso em 03/07/08.
236
ENTREVISTA
ALMEIDA, Jussara. [27/02/2008]. Entrevistador: Gerson Leite de Moraes.
Entrevista concedida por telefone para a produção desta tese.
COCARELLI, Éber. [06/10/2008]. Entrevistador: Gerson Leite de Moraes.
SOARES, Heron José. Depoimento [24/01/2008]. Entrevistador: Gerson Leite de
Moraes. Entrevista concedida por telefone para a produção desta tese.
FITAS DE VHS E CDs DE PROGRAMAS DO MISSIONÁRIO
RR SOARES.
FITAS VHS
A Benção de Fevereiro uma reflexão por RR Soares. Graça Editorial. Rio de
Janeiro. S/D.
A Confissão – uma reflexão por RR Soares. Graça Editorial. Rio de Janeiro. S/D.
A Sogra de Pedro. Graça Editorial. Rio de Janeiro. S/D.
Igreja da Graça de Deus em seu Lar. A nova doutrina trazida por Jesus. Graça
Editorial. Rio de Janeiro. S/D.
Igreja da Graça de Deus em seu Lar. Programação ADHONEP. Graça Editorial.
Rio de Janeiro. S/D.
Resistir até vencer. Graça Editorial. Rio de Janeiro. S/D.
CDs
Arrependei-vos, porque é chegado o Reino de Deus. Uma reflexão por RR Soares.
Cd 12. Série Mensagens 94. Graça Music. Santo Amaro. SP.
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo