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IVANIR REIS NEVES ABREU
CONVÊNIO ESCOLAR:
UTOPIA CONSTRUÍDA
SÃO PAULO
2007
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO
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IVANIR REIS NEVES ABREU
CONVÊNIO ESCOLAR:
UTOPIA CONSTRUÍDA
Dissertação de mestrado apresentada à Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo da Universidade de São Paulo para obtenção do título de
Mestre em Arquitetura e Urbanismo
Área de concentração: Projeto de Arquitetura
Orientador: Prof. Dr. Adilson Costa Macedo
São Paulo 2007
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AUTORIZO A REPRODUÇÃO E DIVULGAÇÃO TOTAL OU PARCIAL DESTE
TRABALHO, POR QUALQUER MEIO CONVENCIONAL OU ELETRÔNICO,
PARA FINS DE ESTUDO E PESQUISA, DESDE QUE CITADA A FONTE.
Abreu, Ivanir Reis Neves
A162c Convênio escolar: utopia construída / Ivanir Reis Neves Abreu.
– São Paulo, 2007.
334 p. : il.
Dissertação (Mestrado – Área de Concentração: Projeto de
Arquitetura) – FAUUSP.
Orientador: Adilson Costa Macedo
1.Escolas (Arquitetura) – São Paulo(SP) 2.História da arquitetura
I.Título
CDU 727.1(816.11)
Aos que me educaram: Francisco e Teresinha
A quem comigo educa: Nice
Aos que educo: João Pedro e Mariana
AGRADECIMENTOS
Agradeço a compreensão de todos aqueles que sentiram minha falta, quando
precisei priorizar esta pesquisa; agradeço aos professores Paulo Bruna, Hugo Segawa,
Mônica Junqueira, José Eduardo de Assis Lefévre, Dario Montesano e Benedito Lima de
To ledo que ministraram as disciplinas que cursei na pós-graduação e pelas possibilidades
que me ofereceram em seus cursos de ampliar o horizonte desta pesquisa; aos arquite-
tos da FDE, com quem divido minhas cotidianas descobertas e angústias relativas à
arquitetura escolar; à amiga Naide Patapas, ao abrir meu caminho para esta especiali-
dade da arquitetura, quando tudo parecia muito confuso; aos professores Alexandre
Delijaicov e novamente a Mônica Junqueira, pela pertinência dos comentários na qual-
ificação desta dissertação, fundamentais para a finalização desta pesquisa; ao meu ori-
entador Adilson Costa Macedo, que sempre confiou em minha dedicação e que me
deixou imprimir um ritmo próprio ao trabalho, o que permitiu que eu pudesse me
dedicar aos meus filhos pequenos que cresceram junto com este mestrado.Agradeço,
finalmente, à estratégica colaboração de Samira Chahin que, pacientemente, organi-
zou todos os desenhos das escolas aqui apresentadas, à colaboração de Luciana
Rodrigues, que possibilitou com seu projeto gráfico, a qualidade desta apresentação
final, e a Vera Lígia Amadi, por conhecer, mais do que todos, as entrelinhas deste texto
em suas minuciosas revisões.
RESUMO
Esta dissertação tem como objeto de estudo a análise de um conjunto de
escolas construído entre os anos de 1949 e 1953, quando vigorou o 2º Convênio
Escolar, acordo entre Estado e Município, com a finalidade de zerar, até as
comemorações do IV Centenário, o grave defict de salas de aula na cidade de São
Paulo. A equipe de profissionais, contratados para a concepção e desenvolvimento dos
projetos, dirigida pelo arquiteto Hélio de Queiroz Duarte, era composta pelos
arquitetos Eduardo Corona e Roberto Goulart Tibau, cariocas formados pela Escola
Nacional de Belas Artes e pelos paulistas Oswaldo Côrrea Gonçalves, engenheiro-
arquiteto, e Ernest Robert Carvalho Mange, engenheiro, ambos formados pela Escola
Politécnica da Universidade de São Paulo. O trabalho dessa equipe resultou na
construção de 52 edifícios escolares aos quais foram aplicados, em seus programas
arquitetônicos, os conceitos de uma escola aberta à comunidade, conforme apregoava
o educador Anísio Teixeira, com quem o arquiteto Hélio Duarte trabalhou, na Bahia,
no planejamento de uma rede de escolas públicas voltada à inclusão das crianças
carentes, que não tinham acesso à educação pública. Esse convívio entre o educador e
o arquiteto traduziu-se em sólidos conceitos pedagógicos, aplicados na concepção dos
projetos arquitetônicos do convênio escolar: arquitetura e pedagogia, a partir dos
princípios utópicos da arquitetura moderna e das idéias libertadoras da “escola nova”
resultaram na unidade que caracterizou esse conjunto de escolas. O meu objetivo em
pesquisar esse conjunto de obras está na possibilidade de reconstruir a história da
moderna arquitetura brasileira através do viés da educação e, para tanto, traçar uma
linha histórica, objetivando localizar o início da ligação entre os pedagogos escolano-
vistas e a arquitetura. No início dos anos 30, em plena era Vargas, assistimos à
construção de um plano visando ao desenvolvimento do país, a partir do estabe-
lecimento de um parque industrial nacional. Esse movimento provocou profundas
mudanças na estrutura social brasileira. A educação, através do movimento
escolanovista, passou a ser indutora dessa transformação, ao lutar pelo direito de todas
as crianças de freqüentarem uma escola pública, além de apresentar um novo modelo
pedagógico decorrente dessa nova postura que levou à necessidade de um novo
espaço físico para abrigar essa escola renovada. O plano de desenvolvimento nacional,
no plano cultural, uniu políticos e intelectuais na construção de uma identidade
nacional, e a arquitetura, enquanto expressão de um tempo, apropriou-se dos
conceitos racionalistas da arquitetura moderna internacional que, nas mãos de jovens
arquitetos, pôde encontrar na arquitetura escolar um rico campo de experimentação.
O cenário desse movimento é a cidade de São Paulo que, em meados da década de
40, já havia se transformado em metrópole internacional e revelava, em seu espaço
urbano, a contradição entre a riqueza e a pobreza, na divisão entre centro e periferia.
As escolas do convênio escolar vieram atender aos bairros que tiveram, na escola
pública, o primeiro sinal da presença de um Estado que, saído da ditadura de Getúlio
Vargas, democratizava-se.
ABSTRACT
This thesis focuses on the analysis of a set of schools built between 1949 and
1953 in São Paulo, during the 2nd School Agreement (2º Convênio Escolar), a contract
between state and municipality authorities ,which its main purpose was to extirpate the
serious lack of classrooms,until the Celebration of the 400th Anniversary of the city of
São Paulo.
The team engaged in the conception and development of the projects was
coordinated by the architect Hélio de Queiroz Duarte and composed by two architects
from Rio de Janeiro, Eduardo Corona and Roberto Goulart Tibau, both graduated at
Escola Nacional de Belas Artes, Oswaldo Correa Gonçalves, engineer–architect and
Ernest Robert Carvalho Mange, engineer, both graduated at Escola Politécnica from
University of São Paulo.
The result of their work are 52 schools which have been built with a specific
architectural programme, concepts of a school opened to the community, according to
Anísio Teixeira’s beliefs, educator, with whom Hélio Duarte has worked in Bahia,
developing a public school planning to include deprived children and give them
opportunity to attend a school.
This exchange of ideas between architect and educator resulted in solid
pedagogic concepts, and were applied on the projects of the Convênio Escolar
,architecture and pedagogy, beginning with the idealistic principles from modern
architecture and the renewal ideas from New School Movement in Brazil (Escola Nova),
coming from the international movement “Education Act”, resulted in an identity which
characterized this set of schools.
The objective of this research is to create the possibility to recognize the
history of Brazilian Modern Architecture from the educational perspective and design a
time scale to locate the beginning between pedagogues from Escola Nova movement
and architecture.
In the beginning of 1930s, during Getúlio Vargas era, we watched the construction
of a national development plan, from the establishment of a national industrial park.This
movement caused deep changes into social Brazilian structure. Education, through Escola
Nova movement, became the guide line of this transformation, fighting for the children’s
right to attend public school, besides presenting a new pedagogical model structured from
this new attitude which claimed for a new space to reflect this renewal model of school.
The national development plan, at the cultural sphere, got together politicians
and intelectuals to build a national identity, and architecture, meaning here the
expression of a time, appropriated the rationalism of modern international architecture
that, in the hands of young architects could find a rich field of experiment.
São Paulo is the scene of this movement, that in the mid of 1940s, was already
an international metropolis and revealed in its urban space, the contradiction between
richness and poorness, between center and outskirts.
The schools of the Convênio Escolar came to serve the districts which have,
in the public school, the first sign of the presence of a State Government that, coming
from the dictatorship of Getulio Vargas, start a new democracy phase.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO........................................................................................................................................................1
CAPÍTULO 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR: A IMPORTÂNCIA
DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
........................................................................13
1.1 Modernidade no Sistema Educacional Brasileiro:
Os Pioneiros da Nova Educação................................................................................................................
17
1.2 O Modelo de Escola Moderna derivado do Modelo Platoon americano
e sua aplicação no Rio de Janeiro, através do educador Anísio Teixeira ............................
25
1.3 Modernidade na Educação do Estado de São Paulo:
O Código de educação de 1933 e a Comissão Permanente de Ensino............................
41
1.4 Modernidade na Educação do Município de São Paulo:
o Departamento de Cultura e Recreação e os Parques Infantis ............................................
53
1.5 Os Convênios Escolares: O diálogo construído entre o Estado
e o Município para a Ampliação da Rede Pública de Escolas....................................................
61
1.5.1 O 1º Convênio Escolar (1943-1948) ........................................................................................65
1.5.2 O 2º Convênio Escolar (1949-1953) ........................................................................................69
1.5.3 O 3º Convênio Escolar (1954-1959) ........................................................................................75
CAPÍTULO 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS..................................................................................................77
2.1 O contraditório contexto urbano de metrópole cosmopolita
no qual a s escolas do 2º Convênio foram implantadas ..............................................................
81
2.1.1 A cidade se revela em suas contradições nos preparativos para
a comemoração do IV Centenário da cidade paulistana ............................................................
85
2.1.2 Os novos hábitos culturais paulistanos......................................................................................92
2.1.3 Os novos hábitos de morar na cidade paulistana ..............................................................94
2.1.4 A SAGMACS e a revelação da cidade real.............................................................................96
2.2 As definitivas influências da hegemônica arquitetura carioca......................................................99
2.2.1 Breve histórico para compreensão da hegemonia da arquitetura
carioca no cenário nacional ........................................................................................................................
103
2.2.2 O papel de Oscar Niemeyer na afirmação de um vocabulário
arquitetônico nacional ....................................................................................................................................
110
2.3 Referenciais profissionais: os exemplos de Affonso Eduardo Reidy
e Aluísio Nunes ..................................................................................................................................................
115
2.3.1 A inspiradora referência de Affonso Eduardo Reidy ......................................................118
2.3.2 O exemplo do arquiteto Luis Nunes na gestão da diretoria
de Arquiteura e Construção do Estado de Pernambuco ........................................................
124
CAPÍTULO 3 A MODERNA ARQUITETURA DO 2º CONVÊNIO ESCOLAR............................................................127
3.1 O levantamento da situação do ensino na cidade paulistana e
as conseqüentes posturas iniciais adotadas........................................................................................
131
3.1.1 Os trabalhos iniciais do 2º Convênio Escolar ....................................................................135
3.1.2 O embasamento pedagógico aplicado às escolas
do 2º Convênio Escolar ................................................................................................................................
137
3.1.3 Causas para o sucesso do 2º Convênio Escolar ..............................................................144
3.1.4 Arquitetura escolar experimental: a construção de conceitos
a partir da escala da criança........................................................................................................................
146
3.1.5 Recomendações técnicas adotadas pela equipe de Hélio Duarte ........................150
3.2 Racionalização na produção seriada de projetos econômicos,
implantação e programa arquitetônico dos novos edifícios
para a educação: praças de serviços públicos nos bairros paulistanos..............................
155
3.2.1 O programa arquitetônico de 12 salas de aula ................................................................159
3.2.2 Considerações com a cidade, o bairro e o entorno imediato ................................162
3.3 Análise dos projetos construídos: ............................................................................................................165
3.3.1 Hélio Duarte e equipe: obras do 2º Convênio em análise........................................171
3.3.1.1 Breve biografia de Hélio Duarte ..............................................................................173
3.3.2.1 A equipe e os 52 projetos do 2º Convênio escolar ....................................177
Arquiteto Hélio de Queiroz Duarte......................................................................179
Arquiteto Eduardo Corona..........................................................................................201
Arquiteto Roberto Goulart Tibau............................................................................215
Engenheiro Ernest Robert Carvalho Mange......................................................234
Arquiteto Oswaldo Corrêa Gonçalves ................................................................246
Arquiteto Juvenal Watege e Arquiteto Aluísio Rocha Leão......................259
Obras com autores não identificados....................................................................265
CONSIDERAÇÕES FINAIS
........................................................................................................................................297
ANEXO
........................................................................................................................................................................303
CRÉDITOS DAS ILUSTRAÇÕES
................................................................................................................................307
BIBLIOGRAFIA
..........................................................................................................................................................311
“PRIMEIRO: ESCOLAS
...Fazer escolas, fazer escolas, fazer escolas, está bem, fazê-las, o fato enquadra-
se em tentativas abstratas, em retumbantes decisões ministeriais: falta o interesse
ardente, falta a dramaticidade da cousa. É necessário dramatizar o problema das
escolas, torná-lo vivo, presente, cotidiano...
A premissa para edifícios construídos em função de sedes escolares, à
primeira vista aparece transpor o problema arquitetônico, mas é pelo contrário a ele
estreitamente ligado...
As formas que se expandem, que se ligam com o exterior, o jardim, as janelas
largas, aquele ar de não severidade, é o primeiro passo para a abolição de barreiras. A
escola fortim, gótica, normanda ou sem estilo mas com denominador comum de
edifício-prisão lembrando quase aos alunos que o estudo é um penoso dever, esta
escola tornou-se longínqua e obsoleta. E o próprio fato que arquitetos modernos
tenham sido chamados para projetar todas estas escolas nos parece uma profecia.
Comecemos pelas escolas e, sobretudo comecemos pela arquitetura.
(in Lina Bo Bardi, prefácio Revista Habitat nº 4, São Paulo, set-dez de 1951)
INTRODUÇÃO
1
INTRODUÇÃO
“...o moderno nasceu como resposta a uma situação histórica, o moderno
na arquitetura é um momento da história, uma tomada de posição permanente,
fundada em princípios e métodos estabelecidos com relação aos problemas de seu
tempo e apoiando-se no desenvolvimento científico e técnico mais avançado e na
análise das necessidades e das possibilidades que a sociedade tinha para
satisfazê-las. É com este sentido que o moderno poderia existir hoje – apesar dos
efeitos contrários da moda, da mídia e da busca do lucro imediato – tornando-se
de novo uma língua viva/linguagem atuante, uma causa, como foi durante o período
entre Guerras e não um estilo como está reduzido por alguns. (in Kopp, revista AU,
pág. 93, dez/jan de 87/88)
A arquitetura moderna brasileira, construída sobre bases sociais e humanistas,
tem ainda muito a nos revelar, e seus atores, os arquitetos que enfrentaram as questões
sociais e de desenvolvimento humano, como justificativa para sua profissão, não
puderam, muitas vezes, registrar seus projetos da devida maneira: não havia tempo, as
questões eram muitas e deveriam ser resolvidas com urgência.
Felizmente, foram muitos os arquitetos que abriram mão de sua projeção
pessoal, dos elogios de uma crítica elitista e da elaboração de discursos articulados, em
favor da prática consciente e do exercício constante do projeto arquitetônico.
2
INTRODUÇÃO
Esta pesquisa pretende colaborar nesse sentido: recuperar, no tempo e no
espaço, um determinado grupo de arquitetos, que, visionário, e trabalhando em um
órgão público municipal, conseguiu construir um conjunto de obras que, sem dúvida,
pode ser chamado de legítima arquitetura moderna brasileira. Esse grupo não só se
apropriou dos princípios acadêmicos do modernismo, mas também conferiu à
arquitetura um valor social e humano inquestionável: um lugar apropriado para a
educação, dentro de um projeto de desenvolvimento social do Brasil.
A arquitetura moderna do convênio escolar será abordada dentro dos
princípios do modernismo, tal e qual foi teorizada por Anatole Kopp – “arquitetura
moderna como causa e não estilo”, e acreditando que o movimento moderno
perdurará enquanto persistirem as injustiças sociais.
A questão social, assim entendida, foi a ossatura da arquitetura moderna, e é
o que lhe dá suporte e a justifica, até hoje. As formas que o modernismo conferiu à
arquitetura das escolas construídas pelo convênio escolar, naquele momento,
atenderam às questões sociais que lhe foram postas como desafio: a construção do
espaço da escola nova voltada para a criança e para a comunidade na qual estava
inserida – a escola construtora da cidadania. A reflexão e o estudo desses edifícios
escolares servem para que pensemos novas formas arquitetônicas, aproveitando aquilo
que a equipe de arquitetos do convênio escolar alcançou: a racionalidade científica, que
colocou o arquiteto como centro da produção do projeto, base para a construção dos
edifícios escolares, tendo como meta a justiça social e o humanismo, um projeto
coletivo em detrimento de vontades pessoais.
INTRODUÇÃO
3
“...Entretanto, as referências, as argumentações conceituais e as técnicas
dos modernos não se esgotaram enquanto possibilidades, preservando o núcleo
racional da criação arquitetônica. Trata-se de não desprezar os ensinamentos do
passado e, ainda, não incorrer na subjetividade e no espontaneísmo da simples
cópia como querem alguns. (in Kopp, revista AU, pág. 91, dez/jan de 87/88)
Para o resgate das raízes do modernismo a serviço das causas sociais no Brasil,
o recorte para a pesquisa, oferecido pela ação dos arquitetos do 2º Convênio Escolar
revelou-se expressivo, quanto ao quadro de desequilíbrio social que se apresentava, no
tocante ao oferecimento de vagas em escolas públicas entre 1949 e 1953. E tendo em
vista a demanda por 48.000 vagas a serem oferecidas na rede pública de ensino, foram
construídos 52 edifícios escolares, no município de São Paulo, cidade que despontava
como o maior Parque Industrial da América Latina e que se dividia espacialmente entre
uma cidade cosmopolita metropolitana, para alguns, e uma cidade ilegal e improvisada,
para a maioria.
Cinco arquitetos e um engenheiro, coordenados pelo arquiteto Hélio de
Queiroz Duarte, produziram todos os projetos arquitetônicos dessas 52 escolas, com
racionalidade e princípios programáticos para que fosse uma escola libertadora,
pensada a partir de uma pedagogia escolanovista, e resultando em uma nova arqui-
tetura escolar, concebida para a escala da criança, com a finalidade de formar cidadãos
em bairros que, até então, em sua grande maioria, eram desprovidos de qualquer
equipamento público.
A produção arquitetônica do convênio escolar, enquanto forma arquitetônica,
representou a introdução da linguagem moderna na arquitetura pública paulista,
arquitetura nascida a partir dos preceitos de Le Corbusier e que ganhou os contornos
4
INTRODUÇÃO
orgânicos a partir da releitura dos jovens arquitetos formados pela Escola Nacional de
Belas Artes, com destaque para Oscar Niemeyer. Essa arquitetura carioca, produzida no
Rio de Janeiro, então Distrito Federal, espalhou-se pelo país, a partir dos arquitetos que,
do Rio de Janeiro, saíram em busca de trabalho em todos os estados e também das
novas faculdades de arquitetura que foram fundadas em várias cidades brasileiras. Na
segunda metade da década de 40 e início da década de 50, a linguagem moderna
carioca já estava consagrada como aquela que, culturalmente, expressava nossa
brasilidade, reconhecimento que vinha inclusive da Europa e dos Estados Unidos após
a Segunda Grande Guerra.
Este trabalho de finalização do Curso de Mestrado, ao eleger esse conjunto
de escolas, expressão da moderna arquitetura carioca, pretendeu investigar a que essa
nova linguagem arquitetônica servia, uma vez que foi resposta a um novo modo de
pensar e produzir projetos arquitetônicos com uma finalidade social.
O tema arquitetura escolar foi escolhido também em função de este
pesquisador trabalhar com a produção de edifícios escolares junto à Fundação para o
Desenvolvimento da Educação – FDE que, ligada à Secretaria de Estado da Educação
de São Paulo, é responsável, entre outras atribuições, pela construção e manutenção
física da rede de escolas estaduais. A rotina de trabalho que desenvolvo impõe ao
técnico e arquiteto conviver diariamente com o dilema quantidade e qualidade, e as
decisões e definições projetuais devem ser pensadas em função de uma rede de
escolas e do grande número de estudantes que deverá ser atendido. Parte do meu
trabalho cotidiano é fazer com que o arquiteto que presta serviços para a FDE na
execução de projetos arquitetônicos, compreenda essa lógica, abrir mão de uma ou
outra questão pontual de seu projeto, em favor da questão coletiva relativa à rede de
INTRODUÇÃO
5
escolas. A partir desse modo de pensar, que permeia minha rotina, é que encontro uma
causa considerada moderna: dentro dos princípios da nova arquitetura abrir mão do
projeto individual visando à construção do projeto coletivo, no caso a manutenção e a
construção de uma rede de escolas públicas destinada a atender, com qualidade, todas
as crianças do Estado, em que a arquitetura é só uma parte, complementada pelo
projeto pedagógico.
As escolas construídas pelo convênio escolar vêm ao encontro dessa
reflexão: foram erguidas cerca de 52 escolas em 5 anos, ou seja, pouco mais de 10
edifícios escolares por ano, quando a racionalização da construção ainda não existia na
cidade de São Paulo. Dessa forma, a racionalização existiu somente na produção dos
projetos: esses deveriam ser concebidos, considerando a construção em massa, em um
curto espaço de tempo.
Fica a primeira questão a ser respondida: de que modo os arquitetos do
convênio organizaram a produção de seus projetos arquitetônicos e por que a
moderna arquitetura carioca prestou-se a essa produção em massa?
Parte do meu trabalho na FDE é coordenar projetos visando a intervenção
em edifícios existentes e, por decorrência, acabei me deparando com os edifícios
construídos pelo convênio escolar. Não conhecia ainda o conjunto dessas escolas, mas
via uma grande semelhança entre vários edifícios construídos no final da década de 40
e início da década de 50 na cidade de São Paulo, que mostravam uma interessante
unidade, configurando um conjunto.
Eram pilotis, grandes extensões de janelas, oferta de espaços livres ajardinados,
recreios cobertos abertos, pés-direitos mais baixos que os convencionais, marquises
sinalizando a entrada dos edifícios, coberturas em asa de borboleta, sem concreto
6
INTRODUÇÃO
aparente, sem malabarismos estruturais, nem mesmo grandes teorias e discursos, que
estavam como que resguardadas do registro da história da moderna arquitetura paulista.
Essas escolas estão, há 50 anos, espalhadas pela cidade, e se mostram muito diferentes
do que eu havia aprendido e adotado como verdade no meu curso de graduação na
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo – FAUUSP, na
hegemônica arquitetura moderna paulista presente na formação de seus alunos.
Ao conhecer os primeiros exemplares das escolas do convênio, através de
meu trabalho rotineiro procurei saber mais sobre aquele conjunto de escolas: eram as
“escolas do convênio escolar do Hélio Duarte”. Ao pesquisar, no arquivo da FDE,
verifiquei que o conjunto das escolas construídas era muito mais expressivo, não só por
sua qualidade arquitetônica mas também pela sua quantidade.
Conhecendo os primeiros exemplares, constatei que uma escola pública esta-
dual ao lado de minha casa, no bairro da Lapa, que conhecia desde a infância, era uma
das escolas do convênio, projetada por Hélio Duarte, a mesma que vi registrada em uma
exposição da FAU, por ocasião de uma homenagem ao arquiteto, falecido em 1989.
Nas minhas recordações de infância estavam o espaço daquela escola, as salas
de aula fartamente iluminadas, com corredores repletos de luz que passava através de
uma infinidade de vidros quadriculados e um galpão abobadado, onde aconteciam as
festas juninas do bairro. Conhecer essa escola com os olhos de criança foi fundamental
para compreender as teorias acerca da escala aplicada na arquitetura escolar pelos
arquitetos do convênio.
Fica, no entanto uma segunda pergunta: de que maneira e que diretrizes os
arquitetos do convênio utilizaram para construir um programa e alcançar uma escala
de espaço que prioriza a criança?
INTRODUÇÃO
7
A escola do convênio, da qual sou vizinho, chama-se EE José Monteiro
Boanova. Implantada no bairro, abre-se para uma esquina que se prolonga para uma
praça pública. A calçada entra na escola e continua até o bloco administrativo e o
recreio coberto. Na entrada do bloco administrativo, encontra-se uma singela marquise
demarcando a mudança da escala pública do espaço urbano para a escala da criança.
O recreio coberto abobadado, também no prolongamento da calçada, recebe o
visitante que, se adulto, quase encosta a cabeça na telha de cimento amianto que cobre
os arcos.A escola, em sua implantação, convida e recebe seus estudantes e moradores
do bairro.
Fica, ainda, uma terceira questão: essa generosa relação com o bairro foi uma
característica que se repetiu em todo o conjunto de escolas do convênio?
Motivado pelas questões que acabei de colocar, iniciei minha pesquisa,
construindo uma linha do tempo histórica, a partir das primeiras escolas republicanas,
porque é a partir dessas escolas que tem início o projeto de construção de uma Nação
através da educação – localizar o conjunto de escolas do convênio, no quadro de
produção da arquitetura escolar paulista, pesquisar de onde vieram e de que forma
foram aplicados os princípios que orientaram a produção desses espaços, foi para mim
de suma importância.
A dissertação foi organizada em três capítulos:
No Capítulo 1 – Modernização do sistema escolar: a importância da
arquitetura na nova concepção pedagógica – é relatada a importância do movimento
escolanovista nas políticas educacionais do estado republicano, com ênfase na gestão
de Anísio Teixeira junto à Secretaria de Educação e Cultura do Distrito Federal, quando
reformulou o sistema escolar com base na nova pedagogia. Reorganizou aquele órgão
8
INTRODUÇÃO
público, ao implementar uma linha de ação baseada em estatísticas e procedimentos
científicos. Ao lado do arquiteto Enéas Silva, projetou uma rede de escolas baseada
nas escolas americanas Platoon, que se caracterizavam pelo ensino integral com
disciplinas informativas (ensino tradicional) e disciplinas formativas (esporte, artes
industriais, dança, teatro, biblioteca etc). Essa nova pedagogia levou à busca de uma
nova arquitetura para o desenho de um novo edifício escolar – desde então,
arquitetura e pedagogia passaram a caminhar lado a lado.
Em função dessa experiência e dos constantes esforços dos escolanovistas para
a renovação do sistema educacional brasileiro, o estado de São Paulo, através da
Comissão Permanente de Ensino passou a reformular a rede estadual e seus edifícios.
Assim, os programas arquitetônicos passaram a contar com auditórios e bibliotecas e a
atentar-se para as questões de higiene pública ao implantar seus edifícios, considerando
como premissas as questões de aeração e insolação das salas dos diferentes ambientes.
Por sua vez, na cidade de São Paulo, um conjunto de edifícios denominados
Parques Infantis, implantado por Mário de Andrade em sua gestão na Secretaria
Municipal de Cultura, criou uma primeira referência para o ensino, complementar ao
ensino ministrado na escola pública, através da formação cultural e educação para os
hábitos de higiene e esportes. Mário de Andrade preocupou-se com a formação do
espírito de brasilidade nas crianças.
Por fim, ainda, nesse primeiro capítulo, é colocado o que foram os três
convênios escolares celebrados entre o Estado e o Município, em atendimento à
crescente demanda por salas de aula no Município paulista.
Para a elaboração desse capítulo, alguns livros foram imprescindíveis e
possibilitaram recuperar, na linha do tempo, a seqüência das iniciativas a favor do
INTRODUÇÃO
9
aperfeiçoamento do sistema escolar público e em decorrência, da arquitetura escolar.
São eles: O Município de São Paulo e o Ensino Primário, de Carlos Corrêa Mascaro, 1960;
Parques Infantis de São Paulo: lazer como expressão de cidadania, de Carlos Augusto da
Costa Niemeyer, 2002; Arquitetura e Educação: Organização do Espaço e Propostas
Pedagógicas dos Grupos Escolares Paulistas, 1893/1971 de Esther Buffa e Gelson de
Almeida Pinto, 2002 e a dissertação de mestrado A Modernidade Oficial: a arquitetura
das escolas públicas do Distrito Federal (1928-1940) de Beatriz Santos de Oliveira, 1991
e a tese de doutorado Arquitetura para Educação: escolas públicas na cidade de São Paulo
(1934 -1962), de Mário Henrique de Castro Caldeira, 2006.
Esta dissertação, no seu Capítulo 2, intitulado Contextos e Referências,traça
para o leitor, em sua primeira parte, o panorama da cidade de São Paulo no momento
da implementação dos convênios escolares: renovação de costumes de uma sociedade
industrial que se tornava cosmopolita e registrava em seu espaço urbano não só as novas
maneiras de morar, como também os novos hábitos adquiridos nos passeios à Cinelândia
e aos museus paulistas. Os preparativos para a comemoração do IV Centenário da
cidade de São Paulo, com suas obras de infra-estrutura, revelaram uma metrópole sem
planejamento e sedimentando seu crescimento industrial na frágil base de uma cidade
dividida entre pobres e ricos.
A periferia revelava-se e começava a fazer parte das preocupações dos políticos
que, acabada a ditadura getulista, iriam passar por eleições para a conquista de seus cargos
públicos.A burguesia industrial pontuou os espaços da cidade paulistana com modernidade,
e o parque do Ibirapuera, projeto de Oscar Niemeyer, foi o símbolo desse desejo. Para a
compreensão da cidade, na década de 50, foi imprescindível a leitura da tese de doutorado
Metrópole e Urbanismo, São Paulo anos 50, de Regina Maria Meyer Prosperi, 1991.
10
INTRODUÇÃO
Nesse mesmo capítulo foi também, de fundamental importância, a fim de
contextualizar o panorama arquitetônico no qual foram produzidas as escolas do
convênio escolar, o resgate da gênese da arquitetura carioca, desde o racionalismo da
moderna arquitetura internacional até a síntese de Niemeyer, celebrada com a
construção do conjunto arquitetônico de Pampulha. Nessa parte, o livro Arquiteturas
no Brasil: 1900 – 1990 de Hugo Segawa, 1999, orientou minha pesquisa.
Para que o leitor tenha referências das posturas profissionais que permearam
o trabalho da equipe do convênio escolar e seu modo de produzir modernidade
através da arquitetura, foram escolhidos dois arquitetos, estratégicos para compre-
endermos a arquitetura moderna enquanto resposta às questões sociais. São eles :
Affonso Eduardo Reidy e Luis Nunes.
O primeiro foi, declaradamente, referência para a equipe do convênio, por sua
postura profissional e, como resultado formal arquitetônico; a escola do conjunto Pedre-
gulho foi referência formal, que facilmente identificamos em várias escolas construídas em
São Paulo. O livro Affonso Eduardo Reidy,organizado por Nabil Bonduki, 2000, foi
esclarecedor para, através do detalhado relato de suas obras e posturas, compreender a
moderna arquitetura brasileira fundamentada em bases sociais. O segundo arquiteto, Luis
Nunes, foi apresentado, a fim de mostrar como a modernização das repartições públicas
a serviço da população, e mais especificamente do departamento de arquitetura, foram
estratégicos para a modernização do estado.
No Capítulo 3, esta dissertação é finalizada com a reflexão colocada no início
desta introdução, através da análise dos projetos desenvolvidos pela equipe dirigida por
Hélio Duarte, durante o 2º Convênio Escolar: arquitetura moderna, enquanto resposta
às necessidades sociais concretas. As posturas da equipe são destrinchadas de maneira
INTRODUÇÃO
11
a compreendermos de que modo a criança é priorizada no projeto de um edifício
escolar, de acordo com a pedagogia escolanovista.Através de recomendações técnicas,
são desvendadas as teorias científicas que pautaram o desenvolvimento dos projetos.
E, por fim, com a apresentação dos desenhos de cada uma das escolas, pode-se
visualizar o universo de soluções que se manifestaram através de um resultado que
apresentou variedade na unidade: uma resposta às questões pedagógicas que a história
da arquitetura escolar ainda não conseguiu repetir.
Foi de fundamental importância para a completude desta dissertação o livro
Arquitetura Escolar Paulista: anos 1950 e 1960,organizado por Avany de Francisco
Ferreira e Mirela Geiger de Mello, onde pude pesquisar todo o acervo de desenhos
dos projetos das escolas do 2º Convênio Escolar.
Uma dissertação na área de projetos não poderia prescindir de visitas aos
edifícios estudados. Por isso, visitei dez escolas do universo das 52 construídas,
localizadas nos bairros da Lapa,Tatuapé, Barra Funda e Bairro do Limão e projetadas
por três diferentes arquitetos: Hélio Duarte, Roberto Tibau e Eduardo Corona.
12
13
CAPÍTULO 1
MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR: A IMPORTÂNCIA DA
ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
14
15
“O fim da escola – pontificava Cubberley – não é somente saber, mas saber
enquanto útil; não somente disciplina mental, mas disciplina da vida toda; não uma
cabeça cheia de fatos, mas uma cabeça cheia de idéias; não regras de procedimentos
aprendidas, mas habilidade de se conduzir corretamente; não conhecimento das matérias
que constituem educação cívica, mas capacidade de pensar sobre as coisas cívicas; não
tanto um erudito quanto um produto bem educado.
A escola, como se vê, deixara de ser a casa onde se estudavam alguns assuntos
especiais que, se dizia, preparavam para a vida, para ser... o lugar onde as crianças
vivem e, diariamente, são postas em contato com as reais experiências industriais e
sociais, da comunidade da vida, experiências que as educam e armam para os mais
árduos problemas da existência adulta que as espera. (in, Hélio Duarte 1973, pág.16)
16
17
1.1 MODERNIDADE NO SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO: OS PIONEIROS
DA NOVA EDUCAÇÃO E A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1934
18
O Brasil Republicano, até a década de 20, pouco avançou no campo da
educação pública, no que diz respeito à sua modernização e à sua adequação para a
nova sociedade urbana que se desenvolvia, reflexo daquilo que já acontecia no resto
do mundo, a partir do acelerado processo de industrialização das cidades.
Apesar de destinarem seus majestosos edifícios neoclássicos para as escolas
em suas praças centrais, em substituição às Igrejas, de acordo com a importância dada
à educação em um regime republicano, o Estado pouco acrescentou em matéria de
ensino para a grande maioria da população, que ao emigrar para as cidades não tinha
oportunidades concretas de educação, seja pela exigüidade de oferta de vagas nessas
escolas, seja pelo ensino intelectualista, verbalista e excludente que passaram a
representar. As escolas na Primeira República eram para poucos.
“Na verdade, a escola, nos diversos graus, e o diploma interessam a todas
as camadas sociais. Os latifundiários querem filhos doutores, não só para bem exer-
cer as atividades políticas e lhes dar prestígio social como também para enfrentar
possíveis situações de ruína. As camadas médias (pequenos comerciantes, constru-
tores, funcionários públicos mais graduados etc.) e os trabalhadores urbanos viam
na escolarização dos filhos um meio de aumentar as chances de ingresso numa
função burocrática das mais simples às mais prestigiadas, essas ocupadas, sobre-
tudo pelos bacharéis, seguidos pelos engenheiros. (in Buffa, 2001, pág. 64)
A emigração do campo para as cidades e entre países, em função da demanda
por mão-de-obra na indústria, exigiu que as cidades e novas formas de morar fossem
repensadas para acolher os núcleos familiares e seus novos hábitos de vida, e as escolas
modernas republicanas eram parte dessa invenção.
GRUPO ESCOLAR DO BRÁS – RAMOS DE AZEVEDO
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
19
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
20
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
Nesta perspectiva, a educação, através da escola, passa a ser fundamental
na capacitação da mão-de-obra qualificada para a indústria, que exigia cada vez mais
preparo e especialização, e para a formação dos novos extratos sociais, advindos da
formação da burguesia industrial.Assim, desde a 1ª infância, as crianças necessitavam
aprender hábitos de higiene e desenvolver capacidades para a vida em grupo,
reflexo da mobilidade e da inclusão social oferecidas pela vida urbana.
A ciência da pedagogia se desenvolve e se moderniza para atender a esta
nova realidade. Segundo os pedagogos, já a partir da década de 20, passa a escola a
ter o papel de ensinar a viver, muito mais do que somente instruir. As cidades, na
perspectiva da sociedade industrial, passam a ser os espaços de aprendizado para a
vivência em uma sociedade participativa. Podemos afirmar, dentro desta linha de
raciocínio, que a educação e o urbanismo passaram a caminhar juntos com o advento
da sociedade industrial – era necessário, na escola, aprender a viver nos espaços
urbanos modernos e, desta forma, o espaço físico da escola pública passa a ser um
importante espaço para a vivência dessa urbanidade.
“A arquitetura escolar haveria, pois, de simbolizar as finalidades sociais
morais e cívicas da escola pública. O lugar de formação do cidadão republicano
teria que ser percebido e compreendido como tal” (in Souza 1998, pág. 124)
A pedagogia como ciência no mundo todo e no Brasil passa a ser reformulada,
conforme coloca Carlos Augusto da Costa Niemeyer em seu livro Parques Infantis de
São Paulo, 2002, pág. 78:
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
21
“... a exemplo de bem sucedidas experiências européias, serão aqui tam-
bém introduzidas reformas educacionais de peso em boa parte dos estados brasi-
leiros durante os últimos anos da década de 1920. Iniciado na Inglaterra, em 1918,
com as reformas educacionais realizadas por Lord Fisher e seu Educacion Act, o
movimento reformador expande-se pela Áustria (1919), Prússia e Estados Alemães
(1922-1925), estes últimos sob a influência da constituição liberal de Weimar, atin-
gindo, na seqüência, os demais países europeus, chegando à Rússia pós- revolução,
considerada pelo educador Fernando de Azevedo como “a mais audaciosa e radi-
cal de todas as reformas que então se realizaram” (in Pena, 1987, págs. 32-3).
No Brasil, o novo ideário pedagógico influenciará diversas reformas
educacionais, realizadas, inicialmente, nos estados de São Paulo (1922), por Sampaio
Dória; no Ceará (1922-3) por Lourenço Filho; no Rio de Janeiro (1928) por
Fernando de Azevedo; na Bahia (1928) por Anísio Teixeira, e em Minas Gerais
(1928), por Francisco Campos. Essas reformas surgirão como o meio dinâmico
requerido pelos intelectuais e educadores para iniciar o tão sonhado processo de
transformação das mentalidades. (in Niemeyer, 2002, pág.78)
Os intelectuais brasileiros que promoveram essas reformas foram
chamados de “Renovadores da Educação” – os escolanovistas – e denunciaram
publicamente a situação calamitosa do ensino em nosso país. Para tanto, fundaram
em 1924 a Associação Brasileira de Educação – ABE – que a partir de 1927,
realizava, anualmente, Conferências Nacionais de Educação, a fim de discutir com
todos os interessados a real situação na área da educação e a perspectiva de
qualificá-la, a partir da troca de experiências, inclusive internacionais, propagadas
pelo Escolanovismo.
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
22
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
Os “Renovadores da Educação” foram chamados, a partir da década de 30, a
colaborar com o Governo Getúlio Vargas, empenhado em transformar nosso país
agrário em um país desenvolvido e industrial. Entre as várias iniciativas, Getúlio Vargas
cria, em 1930, o Ministério da Educação e Saúde e, assim, pela primeira vez em nosso
país, a educação contaria com uma pasta própria ao lado da saúde, com a qual, a partir
daí, caminharia.
O plano de reformulação da educação, preparado pelos “Renovadores da
Educação” para o Ministério da Educação e Saúde foi, entretanto, substituído por uma
reforma do ensino superior e secundário, sem considerar sua contribuição.
Diante do fato, os educadores, em 1932, lançaram à Nação um manifesto
conhecido como “Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova”, assinado por expressivas
personalidades envolvidas com a questão (in Buffa, pág. 66). “Neste documento eram
retratadas muitas mazelas do nosso ensino e também eram expostos princípios que
deveriam nortear sua reformulação. Dentre esses, merece destaque a proposta de uma
escola primária pública, universal, leiga, obrigatória e gratuita em consonância com a nova
realidade do país; a proposição de uma escolarização adaptada às características regionais
e a formação em grau superior de todos os professores. (in Buffa, págs. 65-66).
Entre os intelectuais e educadores que assinaram o manifesto, merecem desta-
que os educadores Anísio Teixeira, Secretário de Educação carioca que, na década de 30,
implantou a primeira rede de escolas públicas no Rio de Janeiro, inspirado nas teorias do
educador norte-americano Jonh Dewey e no modelo americano das Escolas Platoon, e
o educador Fernando de Azevedo que colaborou com o governo de São Paulo quando,
em 1933, empreendeu uma reforma do ensino e instituiu o “Código de Educação do
Estado”, com o objetivo de unificar toda a legislação escolar.
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
23
Anos depois, conforme nos relata Esther Buffa, Fernando de Azevedo afirmou que
esse Código fora elaborado dentro das diretrizes essenciais do movimento de reconstru-
ção escolar. Ou seja, através de Fernando de Azevedo, o Estado de São Paulo contou com
o que havia de mais avançado no tocante às discussões do ensino no que diz respeito às
escolas públicas e à nova pedagogia internacional.
Os Pioneiros da Escola Nova, anos mais tarde, prepararam, de acordo com o
solicitado pela ABE (Associação Brasileira de Educação), um texto com sugestões para
o anteprojeto de lei a ser apresentado aos constituintes de 1934. Nesse texto, foi res-
saltada a necessidade de construção de sistemas educacionais regionalizados,
colocando a esfera estadual como a responsável pela implantação desse sistema, uma
vez que os municípios encontravam-se ainda bastante defasados em relação à infra-
estrutura já disponível no Estado.Aventou-se, entretanto, a possibilidade de municípios
mais abastados e adiantados poderem tomar a frente nesta questão. Os Pioneiros,
assim, colocaram-se contrários à federalização dessas questões, uma vez que defendiam
que somente as iniciativas e comprometimentos locais relativos à questão educacional
poderiam construir sistemas educacionais legítimos e adequados às especificidades de
cada localidade, considerando-se a extensão de nosso país.
“A competência da União se estende, entretanto à fixação do plano geral,
à coordenação suprema das atividades educativas nacionais e ao exercício de uma
ação estimulante, ampla e vigorosa. A União, tomando a si o estudo dos sistemas
educacionais e mantendo um serviço permanente e autorizado de inquéritos, pes-
quisas e informações, atuará como uma poderosa força intelectual na direção da
educação nacional” (in Mascaro, 1960, págs. 51 a 53).
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
24
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
A Constituição Federal de 1934, a primeira versão de nossa Carta Magna a
incluir no seu corpo de disposições fundamentais um capítulo especial sobre a educação
e o ensino no país, estabeleceu que, para a constituição destes sistemas educacionais, os
recursos financeiros deveriam ser obtidos da seguinte forma: 10% provenientes da União
e Municípios e 20% provenientes dos Estados, recursos esses advindos dos impostos
arrecadados por cada uma das esferas de poder. Assim a proposta dos “Pioneiros da
Educação” em colocar o Estado como esfera responsável pela implantação dos sistemas
educacionais tornava-se viável.
25
1.2 O MODELO DE ESCOLA MODERNA NO BRASIL DERIVADO DO MODELO PLATOON
AMERICANO E SUA APLICAÇÃO NO RIO DE JANEIRO PELO EDUCADOR ANÍSIO TEIXEIRA
26
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
27
A Revolução de 30 ao destituir do poder central a oligarquia agroexpor-
tadora, e pretendendo implantar um plano nacional de desenvolvimento baseado na
economia industrial, encontrou nos conceitos escolanovistas para a educação um tema
que uniu as várias tendências políticas.
Em 1931, Anísio Teixeira, um dos principais protagonistas do movimento
“Renovadores da Escola Nova”, foi nomeado Secretário Geral de Educação e Cultura
do Distrito Federal, durante a administração de Pedro Ernesto (1931 a 1936), em
substituição a Fernando de Azevedo, após regresso de duas viagens de estudos aos
Estados Unidos.
Anísio Teixeira deixa claro, desde o início, suas intenções como
administrador público:
“Ele se dizia um democrata e um liberal convicto e não escondia sua
profunda admiração pelo poder de organização e capacidade de progredir da
sociedade americana.Aceitou o cargo, colocando-se como continuador do programa
traçado por Fernando de Azevedo, mas, disposto a dar ao serviço de educação do
Distrito Federal uma feição técnica e científica, que julgava ter sido minimizada por
uma administração de caráter extremamente personalista. (in Oliveira, 1991, pág. 136).
Dessa forma, Anísio Teixeira, ao assumir o cargo de Secretário Geral de
Educação e Cultura do DF, propõe, utilizando-se metodologia científica, a renovação
da administração pública, e implanta em sua Secretaria um sistema escolar, a fim de
trazer para a máquina administrativa a eficiência do processo produtivo industrial.
Esse processo deveria culminar em um produto de qualidade: a escola pública
eficiente e universal.
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
28
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
Anísio Teixeira, dessa maneira, não apregoava um sistema escolar estático, mas
ativo, em constante mutação,de acordo com a dinâmica do desenvolvimento e coerente
com a modernidade, e os princípios dos valores modernos de democratização dos
ganhos da sociedade industrial.
O seu reconhecido humanismo científico – de resto, uma característica
escolanovista – fazia-o avesso a organizações que pleiteavam as formas da unifor-
midade e da centralização porque estas eram, para ele, meios de morte e não de vida.
Emperravam o vigor das iniciativas, desestimulando a transformação e impedindo o
desenvolvimento. Para Anísio, a organização racional era aquela que buscava, na
unidade de um “princípio”, a singularidade de sua forma, e não na repetição literal de
um arranjo de seus elementos. Este “princípio” era entendido como o conjunto de
idéias comuns que derivavam da filosofia de vida moderna. Eram decorrentes, portanto,
da razão científica e da razão moral (ética). Sendo assim, eram estas que, em última
instância, regeriam os objetivos e finalidades de qualquer conduta, modelando os
planos, no intuito de conferir-lhes uma unidade, mas preservando-lhes a especificidade.
(in Oliveira, 1991, pág. 175 e 176).
O humanismo defendido por Anísio Teixeira coloca o aluno como o elemento
central da organização do sistema escolar. É pelo aluno que o sistema escolar deveria
sempre ser visto e revisto, em um equilíbrio dinâmico. Conhecer a heterogeneidade
dos alunos é fundamental para preservar esse equilíbrio, principalmente em um país
com nossa extensão territorial. As escolas, em sua organização espacial deveriam
refletir esse humanismo; o espaço destinado à criança deveria ser adequado para
trabalhar suas sensações e atender às suas necessidades de conforto acústico, térmico,
psicológico, a fim de garantir o seu melhor desempenho pedagógico.
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
29
A rede de escolas proposta por Anísio Teixeira inseriu-se no Plano
Urbanístico de Alfred Agache, recém implantado no Rio de Janeiro, e o modelo ideal
de edifício escolar adotado foi inspirado nas escolas americanas tipo Platoon, modelo
esse já experimentado nos Estados Unidos, em um momento de crescimento e
estruturação da rede pública de escolas norte-americanas que Anísio Teixeira
conheceu de perto em suas viagens de estudo.
O que impressionou o educador Anísio Teixeira, ao conhecer de perto tal
experiência, não foi somente a grande oferta de edifícios escolares construídos, mas,
sobretudo, a qualidade de ensino oferecida através de escolas de período integral, nas
quais os alunos iam muito além das “letras e dos números”, vivenciando atividades
culturais, esportivas e de lazer como parte fundamental de sua formação.
“As escolas construídas no Rio de Janeiro, neste período, carregavam o
estigma de serem vitrine da política educacional pretendida para o restante do
país, portanto, têm de ser necessariamente vistas sob a ótica da reprodução de um
discurso, materializado em uma forma que se pretendia modernizadora, mas
também carregada da afirmação de um estado que fosse capaz, junto a uma nova
proposta pedagógica, de inserir a criança e o adolescente em um modo de vida
que até então muito poucos tinham acesso. (in Caldeira, 2006, pág. 41).
O conjunto de escolas a ser construído deveria, portanto, ser planejado
estrategicamente, levando-se em consideração, para a sua concretização, a realidade
brasileira, consideradas suas especificidades e realidades regionais. Para tanto, foram
criadas seções dentro da Secretaria de Educação e Cultura, com o propósito de
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
30
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
auxiliar no conhecimento de nossa realidade escolar: seção de recenseamento,
matrícula e freqüência; seção de estatística escolar; seção de antropometria; seção de
medidas e eficiência escolares, entre outras (in Oliveira, 1991, págs. 141 e 142).
Para poder implantar esse modelo no Brasil, Anísio precisou conhecê-lo,
precisou buscar nossa identidade, e todo o Governo Federal, viu-se envolvido nessa
busca, uma vez que a mudança pretendida para o Brasil só poderia acontecer em
bases concretas, seguras, e só uma metodologia investigativa poderia garantir o
sucesso do projeto de desenvolvimento nacional pretendido.
Como conseqüência dessa decisão, data de 1931 a criação do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), realizada em um Congresso da Associa-
ção Brasileira de Educação (ABE), reduto escolanovista, o que evidencia a seriedade
e a profundidade como era considerada a questão educacional. Começou-se a partir
daí, a discussão da importância das estatísticas e a escolha do padrão metodológico
a ser adotado para as pesquisas e quantificações necessárias para o planejamento do
sistema escolar a ser implantado pela Secretaria de Educação e Cultura. O levan-
tamento e análise de nossas condições eram uma necessidade proporcional ao
desejo de modificar a face do país. (in Oliveira, 1991, pág. 143).
Foram essas estatísticas que mostraram a Anísio Teixeira a carência e a
precariedade dos edifícios escolares. Como grande defensor da arquitetura escolar,
enquanto promotora das bases físicas para o progresso do sistema educacional,
concluiu que um novo projeto pedagógico só se sustentaria com uma nova maneira
de pensar a escola, e à arquitetura caberia projetar um novo edifício, um novo
programa arquitetônico que refletisse, no conjunto de seus ambientes, essa
pretendida nova maneira de ensinar.
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
31
“Esse era, sem dúvida, um ponto de vista característico da Escola Nova. Boa
educação era um direito de todos e precisava de boa arquitetura para realizar-se,
portanto, boa arquitetura escolar era direito de todos os cidadãos. O sentido da
instrumentalização da arquitetura para ganhos pedagógicos concretos, e não para
alcances puramente estéticos e propagandísticos, estava presente nas realizações
dos reformadores escolanovistas, mesmo quando discordavam quanto ao que fosse
bom ou não em arquitetura de escolas. (in Oliveira, 1991)
As primeiras escolas construídas na gestão de Anísio Teixeira, cujos projetos
arquitetônicos foram de autoria do arquiteto Enéas Silva, inauguraram a iniciativa, no
Brasil, de se construir uma rede de escolas com uma proposta pedagógica sintonizada
com uma nova filosofia de educação pública, uma escola formadora de hábitos, alinhada
com as mudanças pelas quais passava o país da era Getulista. A escola pública deveria
ganhar da “rua” a disputa pelo tempo das crianças em relação à sua educação.
As escolas modelo “Platoon”, adotadas por Anísio Teixeira, caracterizavam-se,
formalmente, pela disposição de seus blocos de salas em pelotões. O primeiro pelotão
seria destinado ao ensino tradicional com salas de aula para instrução das letras e
números, através das disciplinas fundamentais (ou home-room-subjects), e o segundo
pelotão (ou special-subjects), para as atividades especiais, formativas e complementares
de artes, esportes, higiene, biblioteca, atividades manuais e industriais etc.
Os estudantes nessas escolas permaneceriam em horário integral, entrando no
início da manhã e saindo ao final da tarde. As crianças que na parte da manhã
desenvolviam atividades de instrução, à tarde participavam das atividades formativas;
por sua vez, a turma que de manhã tinha atividades formativas, à tarde desenvolvia
atividades de instrução.Assim o uso intensivo dos espaços viabilizava economicamente
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
32
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
essas escolas. Cada pelotão poderia ser equiparado a uma linha de produção industrial,
em que a “matéria-prima aluno” entraria na 1ª sala para sair formado integralmente
pelas últimas salas do pelotão.
O educador Anísio Teixeira, ao conhecer as escolas Platoon, em Detroit, nos
Estados Unidos, impressionou-se pela maneira como o trabalho manual era valorizado
na educação do povo americano, enquanto o povo brasileiro ainda associava o trabalho
manual ao trabalho escravo, característica essa que a sociedade brasileira, compro-
metida com um futuro industrial, deveria repensar e modificar. O modelo Platoon de
escolas apresentava como proposta central unir o pensar ao fazer ou o pensar e o viver
ativo em um mesmo espaço físico.
Essa tipologia de edifícios, entretanto, exigia grandes terrenos para sua
implantação, uma vez que haveria salas de aula clássicas, ou do ensino elementar, e
ginásios, auditórios, bibliotecas, oficinas características do ensino especial. Terrenos com
o porte necessário para essas escolas eram poucos, o que comprometia o modelo
Platoon como modelo oficial a ser implantado.
De espírito objetivo, já que buscava atender à realidade que lhe era imposta,
Anísio Teixeira criou dois modelos de escola que interagindo, ganhariam a completude
pretendida pelas escolas Platoon. Eram as escolas-classe (somente classes para o ensi-
no fundamental) e as escolas-parque (espaços para o ensino especial) e a combinação
dessas duas tipologias, onde quatro escolas-classe se complementariam com uma
escola-parque, adequar-se-iam ao modelo Platoon pretendido.
Desse modo, Anísio Teixeira encomendou aos arquitetos seis tipos de
projetos de escolas, que, gradativamente, buscavam atender aos ideais da escola de
ensino integral:
PLATOON 16 CLASSES, ENTRADA POSTERIOR
PLATOON 16 CLASSES, PERSPECTIVA
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
33
Escola Tipo Mínimo (240 alunos): 2 salas de classes fundamentais e 1 sala de classe
complementar, a serem implantadas em áreas de reduzida demanda por escolas.
Escola Nuclear (1.000 alunos): 12 salas de classes fundamentais com biblioteca
para os professores.
Escolas – Parque ou Parques escolares que atenderiam, cada um, ao conjunto de
quatro escolas nucleares, complementando seu programa arquitetônico de acordo
com o modelo Platoon: direção geral; serviço médico e fichamento para controle
de educação física; auditório e palco; ginásio esportivo; banheiros e vestiários;
refeitórios e anexos (copa, cozinha, serviços); sala de música; jardim de infância;
biblioteca; salas para clubes escolares; sala para projeção; terraço-jardim; estádio
para concentração e pista de corrida; campos para voleibol (14 pequenos campos);
equipamento completo para ginástica e playground.
Escolas Platoon com 12 classes, 16 classes e 24 classes, sendo que as de 12 e as
de 16 classes necessitariam das escolas-parque para complementar seu programa
arquitetônico para o ensino integral.
— Platoon 12 classes: 6 classes para o ensino fundamental e 6 classes para o ensino com-
plementar, com salas para leitura e literatura, com biblioteca anexa; ciências sociais; ciências,
com respectivo “vivarium”; desenho e artes industriais; auditório; música, recreação e jogos;
Platoon 16 classes: 12 classes para o ensino fundamental; 4 classes para o ensino
complementar: ciências e ciências sociais; música, recreação e jogos; auditório;
Platoon 24 classes: 12 classes para o ensino fundamental e 12 classes para ensino
complementar: biblioteca; ciências sociais; ciências; desenho e artes industriais; auditório
com palco; música;recreação; jogos; ginásios; refeitório e anexos correspondentes;
almoxarifado escolar; salas de professores.
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
34
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
ESCOLA-PARQUE ESCOLA-MÍNIMA
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
35
PERSPECTIVA NUCLEAR 12 SALAS
PERSPECTIVA PLATOON 12 SALAS
NUCLEAR 12 CLASSES, ENTRADA LATERAL
NUCLEAR 12 CLASSES, TERRAÇO JARDIM
ESCOLA NUCLEAR – PERSPECTIVA E PLANTAS
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
36
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
NUCLEAR 12 CLASSES, PERSPECTIVA
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
37
O comprometimento do educador com a busca, na educação, de uma iden-
tidade nacional encontra no discurso dos arquitetos modernos brasileiros o mesmo
comprometido discurso que, entretanto, engatinhava enquanto resultado formal.
A arquitetura brasileira, nesse momento, como em todo o mundo, buscava
se reposicionar na sociedade, apresentando-se através do domínio da técnica
projetual e construtiva, tão cara a uma sociedade industrial.
Os hábitos que a escola pretendia transformar redesenharam também os
espaços necessários ao homem moderno. Esses espaços precisavam ser dese-
nhados, construídos, agora não mais com uma finalidade meramente estética, o
que cabia ao arquiteto clássico no uso da cartilha de estilos, mas ao arquiteto
técnico e construtor, que domina os processos construtivos. O profissional
arquiteto passa a fazer parte do processo produtivo, com o papel de dimensionar
os espaços, seu desempenho e sua técnica construtiva, através de dados
científicos. Assim, justificativas projetuais, tais como as teorias dos educadores
escolanovistas, passavam na mão dos arquitetos por análises científicas, pautadas
em números e estatísticas.
Junto com o educador Anísio Teixeira, arquitetos como Enéas Silva
constroem escolas e um discurso ético para justificar sua arquitetura, em que o
pensar arquitetura e o fazer arquitetura se fundem em um mesmo ato, e projetam
pensando em como construir, pois, as escolas precisam de eficiência, precisam
mostrar resultados espaciais funcionais, concebidas que foram a partir de um
projeto pedagógico transformador e preciso. Os arquitetos, sobretudo com a
arquitetura escolar, passam a estar a serviço de uma nova ordem social e colocam-
se com um claro desejo de ser instrumentos de transformação da sociedade.
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
38
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
Na sua dissertação de mestrado, Beatriz Santos de Oliveira descreve o texto
do arquiteto Enéas Silva, datado de 1935 e publicado na revista da Prefeitura do
Distrito Federal. Neste texto, encontramos as justificativas técnicas que balizaram a
concepção de uma escola tipo Nuclear com 12 salas de aula e que exemplificam o
comprometimento da arquitetura com a precisão do discurso pedagógico. Enéas
coloca a necessidade de o arquiteto, comprometido com a arquitetura escolar,
pesquisar, indo além das questões construtivas e assumindo compromisso com as
questões educativas, levando-se em conta as questões biológicas e psicológicas da
criança, sua mentalidade, maneira de viver, agir e julgar as coisas e, conseqüentemente,
concretizando na arquitetura os princípios de segurança, salubridade, expansão,
flexibilidade, conveniência, aspecto arquitetônico e economia, características essências
de eficiência de um prédio escolar.
Enéas descreve com precisão os cuidados para com a orientação solar dos
ambientes destacando, as caixas de escada para circulação como fontes de luz natural. O
sistema estrutural proposto deveria ser em concreto armado, incluindo suas fundações,
com vedações em alvenaria de blocos cerâmicos alveolares para isolamento térmico e
acústico, e as lajes em concreto armado, cuja cobertura deveria ser impermeabilizada e
receberia uma camada de 15 cm para isolamento térmico, com a finalidade de garantir
seu uso como terraço jardim para as aulas de educação física ao ar livre.As janelas seriam
desenhadas com caixilhos de ferro basculantes, a fim de garantir abertura total para
ventilação dos ambientes.A disposição das salas, uma ao lado da outra com estrutura de
concreto independente das vedações, garantiria a possibilidade para futuras mudanças, e
o bloco de salas de aula permitiria a sua ampliação nas duas extremidades. A volumetria
final, descreve Enéas Silva, seria singela e resultado da funcionalidade de sua planta. Sua
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
39
linguagem arquitetônica é, assim, resultado direto da eficiência, otimização e conforto de
seus espaços e custos de construção.
O discurso do arquiteto reflete seu comprometimento com a técnica, em que
a plástica passa a ser produto dessa preocupação. A arquitetura moderna brasileira
caminha no sentido de substituir sua condição de artista inspirado para a de agente de
transformação social.
Anísio Teixeira, dessa forma, se identificava e se aproximava dos arquitetos
modernistas brasileiros, que, como ele, buscavam, através da construção de novos
programas, respostas para as novas necessidades sociais, baseadas na ciência e na razão,
uma vez que funcionalistas e racionalistas poderiam responder com novas formas às
carências do povo brasileiro e, em especial, às dos educadores com a construção de
edifícios voltados à educação e à cultura Uma nova forma, entretanto, ainda estava por
ser desenhada para expressar este movimento.
Assim, as escolas criadas no Rio de Janeiro por Anísio Teixeira e Enéas Silva
são uma forte referência que irá permear as teorias de todos os educadores e o
discurso ético dos arquitetos. A partir de então, a união entre essas duas áreas do
conhecimento passa a ser fundamental para a qualidade da educação em nosso país.
Há que se ressalvar que o conjunto de escolas construído nesse período não
é a expressão plástica de nossa moderna arquitetura brasileira, pois são ainda criadas
dentro das regras da Art-Decô, a partir de elementos que evocam a máquina, a
arquitetura naval, a velocidade e a aerodinâmica, respostas formais a um modismo que
evocava o futuro.
Esses projetos aproximam-se da arquitetura moderna, demonstrando
coerência em suas plantas funcionais, conseqüência dos inovadores programas das
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
40
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
escolas de ensino integral, e a necessária economia de recursos para sua construção
além do racionalismo programático com o qual foram concebidos. Assim, a eficiência
dos ambientes, sua funcionalidade e o discurso ético é que lhes confere este pioneiro
papel de modelo para as escolas modernas que serão construídas no país,
principalmente em São Paulo, através da Comissão Permanente, pelas mãos de
arquitetos como José Maria da Silva Neves e Humberto do Val Penteado.
41
1.3 MODERNIDADE NA EDUCAÇÃO DO ESTADO DE SÃO PAULO: O CÓDIGO
DE EDUCAÇÃO DE 1933 E A COMISSÃO PERMANENTE DE ENSINO
42
ESCOLA NORMAL CAETANDO DE CAMPOS – RAMOS DE AZEVEDO
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
43
As primeiras escolas construídas na cidade de São Paulo, a partir do espírito
de renovação e modernidade apregoado pelos “Renovadores da Escola Nova”, foram
empreendidas pela Comissão Permanente de Ensino, por iniciativa do Estado. Essa
Comissão foi instituída pelo Código de Educação do Estado, datado de 1933 e
organizado pelo educador Fernando de Azevedo, que o destacou no capítulo intitulado
“Do serviço de prédios e instalações escolares”, com o objetivo de:
“propagar a nova política das construções escolares, ampliando em todas
as camadas sociais a consciência da necessidade de cada escola possuir
instalações pedagógicas que façam dela centro de saúde e alegria, ambiente de
educação estética e fator de nacionalização” (Artigo 32).
É importante salientar que o Estado de São Paulo, a partir da Revolução de
1932, firmou, perante a Nação, seu compromisso com o desenvolvimento e a
modernidade, e, assim, a educação mereceu seu devido e estratégico destaque
neste processo.
Até então as escolas construídas na Primeira República pelo Departamento
de Obras Públicas (DOP) do Estado representavam uma nova condição para a
educação da sociedade, na possibilidade que ofereciam de formar o cidadão repu-
blicano. As majestosas escolas neoclássicas colocaram o edifício escolar como
protagonista do espaço urbano; com a chegada de um novo tempo, porém,
reduziram-se a edifícios com o simplificado programa de um conjunto de salas de
aula, organizadas em duas alas simetricamente divididas, uma para cada sexo, pátio
para recreação, uma pequena administração e sanitários. A educação era nessa
primeira fase da República para poucos.
ESCOLA PADRÃO VILA MARIANA – RAMOS DE AZEVEDO
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
44
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
As escolas da Primeira República representavam, na vida dos estudantes,
momentos de instrução intelectualista e verbalista. Eram em pouco número, e por isso
somente privilegiados tinham direito a esse serviço público. Na maioria das vezes, nem
o programa mínimo era atendido, e a situação dos professores e estudantes era bem
pior, uma vez que contavam unicamente com espaços improvisados em edifícios
alugados, sem condições mínimas de salubridade para as atividades pedagógicas.
As escolas construídas pela Comissão Permanente de Ensino inauguraram a
modernidade na arquitetura escolar em nosso Estado. Importa frisar que essas escolas
carregam a experiência trazida do Rio de Janeiro, então Capital do país que, como já
vimos anteriormente, implantou a primeira rede de escolas com o espírito de
modernidade, através de iniciativa do educador Anísio Teixeira.
A Comissão Permanente, para efetivar o planejamento da rede de escolas do
Estado, além de contar com a referência das escolas-classe e escolas-parque e o
modelo Platoon da rede pública do Rio de Janeiro, contou, para o seu planejamento,
com os dados coletados pelo Censo Escolar de 1934. Os dados técnicos e a ciência
começavam a fazer parte também do planejamento da rede escolar paulista.
O Censo Escolar revelou em números para o Estado de São Paulo a já
conhecida e calamitosa situação do ensino público de nosso país, denunciada pelos
“Pioneiros da Escola Nova”: contabilizou-se nesse censo uma população escolarizável
de 1.137.091 habitantes entre 7 e 14 anos, com uma população urbana de 38,36% e
rural de 61,64%. Os números finais do censo revelaram que mais da metade da
população escolarizável não freqüentava a escola – (62,07% ou seja 705.793 habitan-
tes) e revelaram também que a situação já preocupante nas cidades era pior ainda na
área rural.A falta de edifícios específicos para a educação era apontada com veemência
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
45
no resultado apresentado. A partir dessa constatação, o Governo do Estado
encomendou à Diretoria de Ensino recém criada, órgão ligado à Secretaria dos
Negócios da Educação e Saúde Pública, um plano de edificações e adaptações de
escolas, que resultou no livro publicado em 1936, intitulado “Novos Prédios para
Grupo Escolar”, com a finalidade de subsidiar sua política educacional, no que tange à
expansão de sua rede de escolas.
A Comissão Permanente formada contava com técnicos de duas Secretarias
Estaduais (Secretaria da Educação e Saúde e Secretaria da Viação e Obras Públicas)
e era constituída por uma equipe multidisciplinar de notáveis profissionais, o que
demonstra a importância dada à questão da educação no Estado nesse momento.
Dessa comissão participavam arquitetos, engenheiros, administradores, professores,
médicos e higienistas, nomes expressivos como Antônio de Almeida Júnior – ex-
chefe do serviço de higiene escolar, Francisco de Prestes Maia – engenheiro chefe do
escritório técnico da diretoria de obras públicas, José Maria das Neves – chefe da
seção técnica de projetos de grupos escolares, Carlos Alberto Gomes Cardim Filho
– chefe da divisão de urbanismo da prefeitura da capital, Oscar Machado de Almeida
– diretor de obras públicas, Luis Motta Mercier – chefe dos serviços de prédios
escolares da Diretoria de Ensino, Geraldo de Paula Souza – diretor do Instituto de
Higiene, Figueira de Mello – inspetor chefe da Inspetoria de Higiene Escolar e
Educação Sanitária, Danton Malta – inspetor médico escolar,Vicente de Sampaio Lara
– médico instrutor do Instituto de Higiene, Moacir Álvaro Eyck – médico
oftalmologista, Noemy Silveira Rudolfer – professora de psicologia educacional do
Instituto de Educação, Quintiliano José Sitrangulo – Delegado Regional de Ensino,
Carolina Ribeiro – diretora do curso primário, Milton da Silva Rodrigues – professor
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
46
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
de estatística e educação comparada do Instituto de Educação e Jorge Mancebo –
desenhista arquiteto da Diretoria de Ensino. (in: Novos Prédios para Grupos
Escolares, 1936, págs.37 e 38).
A composição da Comissão, tendo em vista o expressivo número de médicos
e higienistas nos dá a dimensão da preocupação do Estado com as questões de saúde
pública, questões essas que passaram a ser consideradas nos desenhos dos projetos
dos novos edifícios escolares. Assim, novos ambientes foram propostos para atender
ao programa arquitetônico das novas escolas, a fim de abrigar no edifício escolar o
médico sanitarista, o dentista e a colocação dos vestiários para promover o hábito de
banho nos alunos.
A Comissão Permanente caracterizou-se por promover discussões multi-
disciplinares. Assim, reuniões promovidas pelo Secretário de Educação, para discutir
questões relativas ao edifício escolar, contavam com as diversas áreas de conhecimento
ligadas às questões educacionais. No livro “Novos Edifícios para Grupo Escolar”,
algumas dessas reuniões são relatadas.
Capítulos foram escritos ressaltando a importância dos auditórios e das
bibliotecas nos programas arquitetônicos das escolas desse período. As janelas e sua
relação com o espaço externo mereceram capítulo a parte, em que foram
minuciosamente discutidas. Entretanto não consideravam, ainda, a escala da criança para
definição final de suas dimensões.
A elaboração dos projetos dos novos edifícios escolares revelou a
preocupação com as questões higienistas, que pautaram o urbanismo moderno,
através da correta implantação dos edifícios em relação à insolação e à ventilação
dos ambientes. Assim, a rígida simetria do edifício eclético das escolas da Primeira
EEPG VISCONDE CONGONHAS DO CAMPO – JOSÉ MARIA DA SILVA NEVES
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
47
Republica rompe-se e cede espaço para o edifício que busca o sol. Edifícios com
plantas em forma de “L”, “Z”, “U”, “E são projetados, de preferência, com os
corredores que dão acesso aos ambientes de um só lado, para garantir a iluminação
das salas de aula na fachada mais propícia à incidência de luz solar.
As salas, dispostas em corredores, unilateralmente, apesar de serem as
melhores do ponto de vista da insolação, não foram as mais recomendadas, diante do
enorme número de salas a ser construído; assim, recomendaram-se corredores com
salas de aula dos dois lados, para tivessem, na cidade de São Paulo, iluminação NNE ou
SSO. Todas essas recomendações foram feitas por Prestes Maia, em seu estudo
publicado no livro “Novos Prédios para Grupo Escolar”, baseadas na experiência de
vários autores em diferentes países. Nesse estudo, Prestes Maia detalha as várias
situações climáticas do estado de São Paulo e propõe, cientificamente, a adequação dos
projetos a essas particularidades.
Com o intuito de gerar informações para a construção específica de
edifícios escolares, Prestes Maia faz várias considerações a respeito da questão
relativa à orientação dos edifícios; relata, por exemplo, um estudo que prioriza a
busca pelo menor nível de ruído para o desenho das plantas, ou da melhor claridade
e não, necessariamente, da melhor incidência solar. Em suas considerações, propõe
a insolação para cada um dos ambientes a partir do uso pretendido, assim, até a
fachada sul poderia ser a mais indicada para as aulas de culinária, por exemplo.
Arremata, colocando que essas considerações fazem parte da maneira moderna de
pensar o projeto, em detrimento da estética que dominava a simetria dos edifícios
neoclássicos, então referência para a produção da arquitetura escolar. (in “Novos
Edifícios para Grupo Escolar, págs. 42 a 60)
EEPG PROFª MARINA CINTRA – JOSÉ MARIA DA SILVA NEVES
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
48
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
No livro “Novos Edifícios para Grupo Escolar”, a arquitetura moderna é cons-
tantemente colocada como aquela que atende, em sua funcionalidade, à nova pedagogia.
A esse respeito, o arquiteto José Maria das Neves coloca que “as escolas de
fachada” são substituídas por “fachadas de escolas”, que resultam de uma nova maneira
de compreender a função da arquitetura a serviço das questões educacionais; assim,
critica o neocolonial como reprodução artificial de técnicas superadas, longe da
verdade necessária que o edifício escolar deveria revelar, no tocante à sua construção.
“...fazer arquitetura não é somente construir fachadas.A arquitetura é função
dos processos de construção da época. O grande arquiteto de uma época é o seu
estado social. Acima das obras, acima dos programas especiais, há o programa dos
programas: a civilização de cada século, - a fé ou a incredulidade, a democracia ou
a aristocracia, a severidade ou a desmoralização dos costumes.A verdade se impõe
à arquitetura...
Fazer arquitetura moderna não significa copiar o último figurino de Moscou
ou Paris. A arquitetura racional exige o emprego de materiais da região, atendendo
às condições de clima, usos, costumes, etc. Obedecendo a esses princípios básicos
criaremos um estilo para cada povo. Não deve haver temores quanto a monotonia
da arquitetura.
A arquitetura nacional brasileira virá naturalmente, apresentando aspectos
característico de cada estado. (in José Maria das Neves, págs. 63 e 64)
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
49
EEPG PROFª MARINA CINTRA
EEPG PRINCESA ISABEL
EEPG SILVA JARDIM
EEPG SILVA JARDIM – JOSÉ MARIA DA SILVA NEVES
EEPG PROFª PRINCESA ISABEL – JOSÉ MARIA DA SILVA NEVES
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
50
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
Os volumes resultantes, a partir dos arranjos das plantas, são, dessa maneira,
conseqüência da funcionalidade e eficiência pretendida no programa arquitetônico
proposto. Assim, a planta, a partir das considerações funcionais, passa a ser a geratriz
para o desenho da volumetria final.
A leitura dos volumes revela as funções dos ambientes: os maiores abrigam as sa-
las de aula e mostram rasgos horizontais em toda a sua extensão, com molduras reforçando
sua horizontalidade, uma vez que a, ainda incipiente, tecnologia do concreto armado não
possibilitava o rasgo contínuo de todo o vão da sala de aula. Os volumes verticais das esca-
das, amplas e claras, por sua vez, quebram a horizontalidade do conjunto, funcionando como
elementos plásticos de transição entre as diferentes funções e seus diferentes volumes.
Os volumes são marcados por aberturas que lembram escotilhas; nos terraços,
seus guarda-corpos em alvenaria são arrematados por tubos metálicos, um conjunto de
detalhes que remete à arquitetura naval, tão cara aos arquitetos que trabalhavam com a
linguagem art déco. As entradas são marcadas por marquises que identificam a transição
entre os espaços público e privado.
A volumetria final mostra um articulado conjunto de sólidos simples que, em
alguns casos, ergue-se do chão através da colocação de pilotis, definindo o pátio coberto
que, até então, era um volume separado do conjunto arquitetônico nas escolas da
Primeira República.
Ensaia-se, assim, nos novos edifícios escolares construídos pela Comissão
Permanente, o modernismo que precederia a composição dos edifícios escolares na
década de 40 e 50.
O livro “Novos Prédios para Grupos Escolares” registra na página 34 a
explícita opção pela arquitetura moderna para as novas escolas: “modernismo
EEPG PADRE MANOEL DA NÓBREGA – HERNANI DO VAL PENTEADO
EEPG PROFª PRINCESA ISABEL – JOSÉ MARIA DA SILVA NEVES
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
51
sóbrio, discretamente sentimental, mais próximo do equilíbrio francês do que do
arrojo desconcertante das composições mexicanas”.
O significativo resultado arquitetônico que descrevemos refere-se a um con-
junto de apenas 11 escolas construídas na cidade de São Paulo, dentro de um conjunto
em todo o Estado que somava mais de 400 edifícios, na maioria térreos e bastante
singelos, com a finalidade de atender à enorme demanda por novas escolas.
Exemplos de referências à arquitetura neocolonial brasileira fizeram parte da
linguagem adotada por algumas das escolas construídas no interior, em um claro
compromisso de, no edifício escolar, refletir a busca de nossa identidade nacional.
Dois arquitetos merecem destaque na construção de escolas desse período,
sendo que o primeiro – José Maria das Neves – projetou nove dos 11 edifícios mencio-
nados. O segundo é Ernani do Val Penteado, que projetou importantes obras públicas
como funcionário do Departamento de Obras Públicas (DOP), entre as quais a mais
significativa foi o Aeroporto de Congonhas, na cidade de São Paulo. José Maria das Neves,
por sua vez, foi um incansável defensor da arquitetura moderna e da arquitetura de Le
Corbusier, em particular.
Em 1934, a Associação Brasileira dos Educadores promoveu uma exposição de
arquitetura escolar (num total de duas) em que o Prof. Sud Menucci argumentou sobre
as vantagens da arquitetura moderna defendida por Le Corbusier e seus cinco pontos
dogmáticos – terraço-jardim, janelas horizontais, fachada livre, uso de pilotis e planta
livre. Ao analisarmos as escolas projetadas por José Maria das Neves, podemos concluir
que seus projetos se comprometem com os pontos apregoados por Le Corbusier, ainda
de maneira tímida, uma vez que nossa tecnologia construtiva era ainda incipiente para
atender a todas as inovações propostas.
EEPG PROFª GODOFREDO FURTADO – JOSÉ MARIA DA SILVA NEVES
EEPG PROFª GODOFREDO FURTADO – JOSÉ MARIA DA SILVA NEVES
52
53
1.4 MODERNIDADE NA EDUCAÇÃO DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO: O DEPARTAMENTO
DE CULTURA E RECREAÇÃO E OS PARQUES INFANTIS
54
MÁRIO DE ANDRADE EM VISITA AO PARQUE ESCOLAR
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
55
Até 1934, na esfera municipal, na cidade de São Paulo, nada se fez a favor da
educação pública.Todas as questões ligadas à ela dependiam, até então, de uma ação
da esfera estadual, até porque o município não tinha qualquer responsabilidade legal
sobre essa questão. Alguns outros municípios do Estado, entretanto, mantinham
escolas urbanas ou rurais com recursos próprios, em complementação à rede
estadual (in Mascaro, 1960, pág. 59).
No município de São Paulo, os únicos recursos comprometidos com a
educação popular, até então, serviram à manutenção da Biblioteca Municipal, do
Teatro Municipal e do Parque Infantil do Parque Pedro II.Algumas escolas de iniciativa
privada também recebiam auxílio financeiro público da municipalidade (in Mascaro,
1960, pág. 59).
Essa situação se modifica a partir de 1935, reflexo do determinado pela
Constituição Federal de 1934, quando a cidade de São Paulo, sob a gestão do Prefeito
Fábio Prado, através do Departamento de Cultura e Recreação, passa a ser núcleo
irradiador de cultura para todo o Estado.
O governador do Estado de São Paulo era Armando de Salles Oliveira que,
em 1934, fundou a Universidade de São Paulo, entre as várias medidas para colocar o
Estado de São Paulo no papel que deveria ocupar, em função de seu desenvolvimento
econômico, dentro do projeto de construção de um país moderno e industrializado.
O prefeito Fábio Prado ao assumir o cargo contou com a colaboração de
um importante grupo de intelectuais, que passariam a apoiar e a colaborar com a
modernização da administração municipal paulista. O modernista Mário Andrade,
um destes intelectuais assumiu, em 1935, a diretoria do Departamento de Cultura
e Recreação, que abrangia o serviço de Parques Infantis, cuja finalidade era de dar
PARQUE INFANTIL DA BARRA FUNDA (1940)
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
56
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
assistência a menores e educação extra-escolar, complementando a rede de
escolas estaduais.
É através desse serviço, por iniciativa de Mário de Andrade, que assistiu-se
a construção de parques infantis em várias regiões da nossa cidade, inaugurando um
original sistema de educação extra-escolar que serviria de referência a outras cidades
do continente europeu e americano, que aqui vieram buscar inspiração para a
implantação de instituições para a educação infantil, os mesmos europeus e ame-
ricanos que, em um primeiro momento, serviram de referência para a construção
dos primeiros parques infantis paulistanos.
Importante salientar que, sob a direção de Mário de Andrade, os primeiros
parques infantis não foram reduzidos a dar continuidade à idéia do lazer organizado
das cidades industriais com a função de um papel moralizador, higienista e
controlador do trabalhador urbano, particularmente das crianças, filhos desses
trabalhadores. Mário de Andrade ampliou em muito as possibilidades deste
equipamento urbano e vê nos parques infantis a possibilidade de investir na educa-
ção do trabalhador desde a sua mais tenra idade, incuntindo-lhe os valores de nossa
nacionalidade, na construção de um espírito de brasilidade, tão caro a todos os
modernistas da Semana de 22, ou seja, o papel moralizador e organizativo, presente
na gênese dos parques infantis, ganham contornos revolucionários em nossa cidade.
No parque infantil, a primeira instituição de iniciativa municipal com a
finalidade de educar os filhos dos trabalhadores urbanos, em sua maioria marginais
às instituições de ensino privadas e mesmo da incipiente rede pública estadual de
escolas, as crianças puderam encontrar um meio de se apropriar da cultura urbana
em um espaço físico desenhado para essa finalidade. Naquele momento, o
PARQUE INFANTIL DA VILA ROMANA (1940)
PROJETO E IMPLANTAÇÃO DO PARQUE INFANTIL DE SANTO AMARO
(DÉCADA DE 1930): SÉRIE PIONEIRA
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
57
Departamento de Cultura e Recreação previa a articulação dos Parques Infantis aos
melhoramentos urbanos previstos para a cidade de São Paulo, conforme afirma
Niemeyer em seu livro “Parques Infantis de São Paulo – Lazer como expressão de
cidadania”, pág. 104.
Os parques infantis atenderam, no âmbito municipal, ao que fora formulado
na Constituição Federal de 1934 em que se estipulou que caberia aos Municípios
entrosar suas iniciativas educativas às iniciativas do Estado voltadas à comple-
mentação do sistema educacional em construção. Assim, as autoridades municipais,
através da Lei Orgânica, deliberaram não estabelecer qualquer sistema paralelo, ou
rede de escolas concorrente com o sistema estadual. Conforme nos relata Mascaro
em seu livro “O Município de São Paulo e o Ensino Primário”, pág. 65.
Assim, por ser a única iniciativa municipal voltada à educação, o Depar-
tamento de Cultura e Recreação contou com vultosos recursos para seus projetos
que correspondiam a 10% do recolhimento dos impostos do Município, especifica-
mente para a construção dos primeiros parques infantis.
O uso desses recursos pelo Departamento de Cultura levou a grandes
discussões na Câmara Municipal, chegando a ser proposta a construção de uma rede
de mil escolas municipais, colocando em questão à iniciativa municipal de, através dos
parques infantis, complementar à instrução já oferecida pela rede estadual.
Discutido o tema, entretanto, a Câmara Municipal votou manter os
recursos para o Departamento de Cultura e Recreação. Mais tarde, a colaboração
entre o Estado e o Município no âmbito dos Convênios Escolares delineou o
papel de cada uma das esferas, na construção de uma rede de edifícios dentro de
nosso Município.
PARQUE INFANTIL D. PEDRO II INSTALADO NO INTERIOR DO PARQUE DE
MESMO NOME (DÉCADA DE 1940)
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
58
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
Em função de uma política Federal modernizadora e industrial, imple-
mentada por Getúlio Vargas, assistiremos ao surgimento de grandes parques
industriais pelo país. A cidade de São Paulo, em particular, assume o papel de
protagonista desta crescente industrialização e urbanização, processo que se reflete
no crescente movimento migratório do campo para as cidades, inchando-as com
uma densidade populacional que a sua precária infra-estrutura não conseguirá
atender com dignidade.
Uma sociedade rigidamente hierarquizada, com base em uma política
agroexportadora, é paulatinamente substituída por uma sociedade industrial urbana.
Assim, novos hábitos e novos personagens passam a fazer parte do cenário urbano.
São operários, funcionários públicos, profissionais liberais, estudantes de todas as faixas
etárias, professores, comerciantes, bancários, que passam a disputar as oportunidades
de trabalho dentro das novas possibilidades de mobilidade e inclusão social, criadas
por um estado republicano e industrial. A escola, assim, passa a ser o trampolim para
a ascensão do imigrante e do trabalhador urbano recém-chegado em nossas cidades.
Os parques infantis, na escala Municipal, passam a atender a esse público
infantil que, ao ter um apoio extra-escolar, se educa a conviver nas grandes cidades,
nele são incutidos novos hábitos de higiene, a prática de jogos esportivos organi-
zados e a iniciação às questões de saúde pública. O lazer e o tempo livre eram assim
meticulosamente controlados, o que convencia até os mais retrógrados políticos
sobre a eficácia desse empreendimento. É importante salientar, que o número de
escolas públicas ainda era ínfimo, e o atendimento tornava-se cada vez mais precário,
em detrimento do enorme crescimento da cidade paulistana que, nessa década,
alcançava a casa de um milhão de habitantes.
PARQUE INFANTIL DA VILA ROMANA (1940)
PARQUE INFANTIL PRESIDENTE DUTRA (1949)
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
59
Na modernização da máquina administrativa, promovida pelo prefeito Fábio
Prado, não só o poder executivo passou por grandes mudanças modernizadoras, mas
também a Câmara Municipal se modernizava, ao criar comissões específicas para a
discussão de questões culturais e educativas referentes à cidade paulistana.
Todo o avanço assim realizado deveu-se, conforme nos relata o educador
Carlos Corrêa Mascaro, à atuação de um grupo reduzido mas seleto de colaboradores,
dos quais se cercara o prefeito Fábio Prado, especificamente, para a realização de
estudos relacionados à criação do Departamento de Cultura, que contava com
notáveis colaboradores, entre eles o educador Fernando de Azevedo, mentor dos
parques infantis urbanos da cidade paulistana.
Os parques infantis, além de criarem uma referência para o desenvolvimento
de projetos educacionais, consideradas as questões do uso dos espaços livres urbanos,
possibilitaram o início da discussão sobre a questão educacional de iniciativa municipal.
60
61
1.5 OS CONVÊNIOS ESCOLARES: O DIÁLOGO CONSTRUÍDO ENTRE
O ESTADO E O MUNICÍPIO PARA A AMPLIAÇÃO DA REDE PÚBLICA DE ESCOLAS.
O SUCESSO DO 2º CONVÊNIO
62
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
63
O convênio entre a União, Estados e Municípios, com a finalidade de
implementar um sistema de ensino primário no país, foi conseqüência da promulgação
do Decreto-Lei Federal nº 4.598, de 1942, no qual foi instituído o Fundo Nacional de
Ensino Primário.
Através desse fundo estabeleceram-se cotas de arrecadação para cada uma
das esferas de poder e definiram-se as bases para a efetivação dos sistemas
educacionais propostos. Como já foi colocado, a Constituição de 1934 estabeleceu
uma cota da arrecadação para aplicação nos sistemas de ensino equivalente ao
recolhimento de 20% dos impostos arrecadados pelos Estados e de 10% dos impostos
arrecadados pelos Municípios com a finalidade do desenvolvimento e manutenção dos
sistemas educativos.
Os convênios criados pelas três esferas foram além da definição de cotas
de arrecadação e contribuição; estabeleceram uma fórmula de colaboração entre
os poderes e o modo como deveriam ser aplicados os recursos recolhidos no
desenvolvimento de um sistema educativo a nível nacional, de acordo com Carlos
Correa Mascaro em sua obra “O município de São Paulo e o Ensino Primário”,
págs. 71 e 72.
Os convênios, entretanto, não apresentaram substancial resultado em escala
nacional, sobretudo nos acordos estabelecidos entre a União e os Estados.
A cidade de São Paulo, assim como outros municípios do estado de São
Paulo, recorrem aos convênios firmados entre o Estado e o Município para o atendi-
mento à crescente demanda por educação pública e, mais especificamente, para a
construção de edifícios escolares, uma vez que o município de São Paulo, até a
década de 60, ainda não contava com uma estrutura própria para a sua construção.
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
64
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
Nos convênios firmados entre o Estado e o Município de São Paulo, no total de três,
pudemos ver variações nas atribuições de cada uma das partes. Ao Estado,
independente das cláusulas de cada convênio, sempre coube a responsabilidade pela
formação do quadro de professores, do quadro administrativo e da manutenção das
escolas, e ao Município, a construção dos edifícios escolares. As discussões sobre as
competências e responsabilidades das partes, mais tarde, suscitaram a possibilidade
da municipalização do ensino na cidade paulistana.
A arquitetura escolar, a serviço de uma específica questão municipal e o
edifício escolar com suas particularidades, através da definição do programa arquite-
tônico, traduz um modo de educar, uma determinada linha pedagógica; assim sendo,
em pouco tempo, as questões específicas de nossa cidade exigiram uma particu-
larização do programa a ser atendido; não caberia mais o mesmo edifício, com o
mesmo programa arquitetônico, que se repetia por todo o Estado, para a cidade de
São Paulo, sobretudo na década de 40, quando já figurávamos como uma grande
metrópole industrial.
Foram três os convênios escolares firmados entre o Estado e o Município
de São Paulo. O primeiro reduziu-se à construção de somente três novas unidades,
sem importância relevante quanto ao resultado arquitetônico; o segundo, objeto
deste estudo, notabilizou-se pela produção de 52 edifícios no espaço de cinco anos,
marcando a arquitetura pública de nossa cidade com a afirmação da arquitetura
moderna em nossa paisagem, sobretudo nos bairros que atendeu, e o último
convênio, derradeiro, construiu pouco mais de 15 unidades.
Nos estudos referentes aos convênios escolares, reduz-se os três acordos
ao 2º Convênio, dado o alcance que obteve em relação aos demais; entretanto, é
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
65
importante fixarmos suas diferenças, até para compreendermos as causas que
levaram ao feliz resultado isolado desse 2º Convênio.
1.5.1 O 1º CONVÊNIO ESCOLAR (1943 – 1948)
O 1º Convênio foi celebrado em 14 de setembro de 1943, quando era
interventor estadual Fernando da Costa e nomeado prefeito, desde 1938, o urbanista
Francisco Prestes Maia. Nesse ano, a cidade de São Paulo já era considerada o maior
aglomerado humano do país, o maior parque industrial da América Latina e a cidade
de maior índice de crescimento urbano em todo o mundo. Esses números deveram-
se, sobretudo, ao cenário mundial que, em função da 2ª Grande Guerra arrasou a
Europa e proporcionou o crescimento industrial de países americanos. Há que se
considerar, para complementar o cenário em que se instalara o 1º Convênio, que ainda
estávamos sob o regime do Estado Novo de Getúlio Vargas.
O convênio escolar fez-se necessário devido ao grande número de crianças
sem escola na cidade paulistana, cuja população já encostava na casa de 1 milhão de
habitantes, e a colaboração entre Estado e Município foi estratégica, a fim de reverter
a situação alarmante que esse apresentava.
Educar as crianças passou também a ser estratégico para a nova burguesia
industrial que se firmava, uma vez que a indústria lhe cobraria mão-de-obra qualificada,
a fim de garantir o constante desenvolvimento de seu parque industrial.
Nessa soma de esforços, caberia ao município a construção das escolas e
ao estado, a formação dos professores e a abertura das salas de aula a serem
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
66
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
construídas. Para tanto, o Município estaria obrigado a contribuir com um valor
fixado percentualmente sobre sua receita (advindas do recolhimento de impostos):
nos cinco anos desse Convênio (1943 a 1948), o município reservaria, respec-
tivamente ano a ano, as porcentagens de 10%, 11%, 12%, 13% e 15%.
A cota anual reservada, de acordo com o estabelecido pelos termos do
convênio, deveria ser dividida em 3 partes: a primeira de 68% seria destinada à
construção, compra, adaptação, restauração e conservação de terrenos e prédios
escolares para o ensino primário ou para instituições auxiliares; a segunda de 10%
deveria ser reservada para o serviço de Caixa Escolar e para a instalação das insti-
tuições auxiliares da escola primária, e a terceira, de 22%, para a construção,
ampliação e manutenção das bibliotecas, parques infantis municipais e auxílio
municipal às escolas primárias ou instituições auxiliares. Caso a verba reservada para
determinado ano não fosse totalmente utilizada, deveria ser reservada para o
próximo ano, a fim de ser investida na construção da rede primária de ensino.
Foi formada uma Comissão de cinco membros, composta por profissionais
da Secretaria Estadual de Educação e Saúde e da Prefeitura Municipal, com a
finalidade de informar e dar suporte técnico às ações do convênio.
O estado, por sua vez, comprometia-se a continuar investindo na compra
e construção de edifícios escolares e a criar “o quadro de pessoal docente e admi-
nistrativo necessário ao bom desempenho dos serviços do ensino primário e das
instituições auxiliares” e “a prestar toda a assistência técnica solicitada pelo muni-
cípio, para a mais perfeita organização dos serviços do ensino primário”.
Apesar da clareza com que se redigiram os termos do Convênio, os
resultados foram pífios, perante as necessidades da população em idade escolar que
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
67
deveria se atendida. Foram vários os motivos que contribuíram para o fracasso dos
objetivos. Entre eles, merece destaque, conforme nos relata Carlos Corrêa Mascaro,
na pág. 76 de seu livro “O município de São Paulo e o Ensino Primário”:
“O compasso de espera inicial decorreu, segundo afirmam, do estilo de ação
do então prefeito – urbanista de prestígio firmado e autoridade acatada pela
orientação que havia adotado e vinha imprimindo... Centralizador e autoritário, o
prefeito começou por não promover a instalação da Comissão prevista na cláusula
12 do Convênio, preferindo traçar pessoalmente os planos e fazer elaborar, por
engenheiros de sua confiança pessoal e fiscalizar, pelo Departamento Municipal de
Obras, sob suas vistas diretas, os projetos que seriam financiados pela Prefeitura,
entregando as construções, sob regime de administração, a firmas idôneas.
As primeiras escolas começaram a ser construídas somente em 1944 e
visaram a atender os bairros de maior densidade populacional. Foram projetados
edifícios de grande porte, de maneira a abrigar grande parte das crianças de um
mesmo bairro.
“Construções de grande porte, sólidas e bem planejadas, capazes de impressionar
pela majestade de suas linhas e capacidade de abrigar numerosa clientela. Junto ao
estabelecimento deveriam ser construídas dependências para a instalação de serviços de
assistência alimentar escolar, gabinetes médicos e dentários”. (Mascaro, 1960, pág. 77)
O saldo da administração de Prestes Maia foi somente de três novas escolas,
algumas bibliotecas e parques infantis. Em 1945, com o fim do governo de Getúlio
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
68
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
Vargas, novo prefeito é imposto – o jurista Abrahão Ribeiro – e a partir dele, apesar
de o Convênio Escolar manter-se, é dada prioridade à construção dos parques infantis,
equipamento que sempre caracterizou os investimentos dos governos municipais
paulistas na área da educação, desde o mandato do Prefeito Fábio Prado.
A morosidade no atendimento e o pouco volume de obras resultaram,
entretanto, em uma generosa reserva de dinheiro a ser aplicada no 2º Convênio
Escolar. Importante salientar que neste período como no período do governo de
Prestes Maia, a Comissão Executiva praticamente não existiu, ficando a cargo do
Gabinete do Prefeito as decisões a respeito da aplicação e das prioridades a serem
dadas para as obras do Convênio Escolar.
Em 1946, é promulgada nova Constituição e nela fica determinada a nova cota
a ser aplicada na educação: 20% e não mais os 15% dos recursos já reservados pelo
município paulista.
O final do 1º Convênio é marcado, na administração estadual do governador
Adhemar de Barros, pela constante troca de prefeitos, por um enorme saldo de
dinheiro no caixa da Secretaria de Educação e Cultura e pela prioridade no
atendimento à criança resumido aos parques infantis (18 construídos no total).
Somente em 1948, é instituída a Comissão Executiva do Convênio Escolar,
prevista desde 1943. Sua principal tarefa passou a ser o estudo para a base de sua
renovação, uma vez que se compreendeu que, para a parceria estado e município dar
certo, a comissão seria estratégica para resolver com independência a enorme
demanda de salas de aula.
Em 1950, já sob a gestão do 2º Convênio Escolar, a Comissão Executiva
divide-se em duas subcomissões: uma de planejamento e outra de construções; assim,
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
69
independentes do gabinete do Prefeito conseguem trabalhar e atender à construção
de edifícios escolares com mais eficiência ao poder colocar em prática suas metas.
1.5.2 O 2º CONVÊNIO ESCOLAR (1949-1953)
O 2º Convênio escolar foi assinado em 28 de dezembro de 1949. Para
presidente da Comissão Executiva foi nomeado o engenheiro José Amadei que exercia,
até então, na prefeitura de São Paulo, o cargo de diretor do Departamento Municipal de
Obras; para diretor da Subcomissão de Planejamento foi nomeado o arquiteto Hélio de
Queiroz Duarte, recém-chegado da Bahia, onde trabalhara diretamente com o educador
Anísio Teixeira e, para a Subcomissão de Obras o engenheiro Ernesto de Faria Alves.
Conforme Decreto nº 1.145, de 30 de maio de 1950, eram atribuições das
subcomissões:
Artigo 2º - Compete à Subcomissão de Planejamento:
a) a pesquisa e coleta dos elementos indispensáveis à boa localização e
dimensionamento dos imóveis, cuja aquisição seja de interesse para o
Convênio Escolar;
b) o exame dos terrenos convenientes à construção de novos prédios, bem
como tomar as providências necessárias ao seu recebimento em doação,
por aquisição amigável ou expropriação judicial;
c) a elaboração de projetos de novos prédios e de reformas dos já
existentes, desde que sejam de propriedade do Estado ou do Município
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
70
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
e de adaptação dos que, para os fins previstos no Convênio Escolar,
forem adquiridos.
Artigo 3º - Compete à Subcomissão de Construções:
a) a elaboração de orçamentos e de editais de concorrência para a execução
das obras;
b) a direção, quando por administração direta, e a fiscalização, quando por
empreitada ou por administração contratada, da execução das obras;
c) a recepção, guarda e distribuição de todo o material permanente desti-
nado às escolas e instituições auxiliares.
A Comissão Executiva do Convênio Escolar não se subordinava diretamente
a nenhuma Secretaria, mas diretamente ao Prefeito, conforme estipulado pelo decreto
do convênio.
As aplicações anuais deveriam obedecer à seguinte divisão de verbas, de
acordo com seu Decreto de regulamentação:
“72% para construção, aquisição, adaptação restauração e conservação de
imóveis destinados ao ensino de pré-primário, primário, secundário, especializado e
instituições auxiliares de ensino primário, dentro das divisas do município, inclusive
na aquisição de mobiliário e instalações para os novos edifícios e nas despesas da
Comissão Executiva; 23% para manutenção de instituições auxiliares de ensino
primário e auxílio às escolas primárias e instituições auxiliares destas; 5% para a
Caixa Escolar. Consideravam-se instituições auxiliares de ensino primário: as bibliotecas
e parques infantis, os serviços de assistência médica, terapêutica e dentária, de
alimentação supletiva, cinema educativo, parques recreativos, de desportos ou de
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
71
educação física, colônias de férias, desde que destinadas aos escolares de
estabelecimentos de ensino primário oficial e particular não remunerado, registrado no
departamento de educação do Estado. (Mascaro,1960, pág.83)
O 2º Convênio Escolar apresentou à sociedade um completo programa de
atendimento a todas as necessidades das crianças pobres da cidade, dando-lhes
condições plenas de se desenvolver como cidadãos; entretanto, a população infantil
crescia muito além do previsto inicialmente e, assim, o convênio não conseguiu
alcançar seus objetivos de atender a todas as crianças que, anualmente, procuravam
por vagas na rede pública.
O 2º Convênio caracterizou-se pela construção de edifícios de menor porte
com, na maioria, 12 salas de aula. Este critério adotado substitui o anterior de
construir grandes edifícios, reflexo da carência que se generalizou por toda a cidade
na falta de salas de aula. Assim, optou-se por formar, a partir dos edifícios escolares,
pequenas comunidades de bairro, dentro de um raio de 1.500 m de abrangência, de
modo a se distribuírem por todo o município paulistano.
Nos primeiros três meses de trabalho a Subcomissão de Planejamento
procurou fazer um levantamento detalhado da demanda das carências por salas de
aula por toda a cidade, pois mesmo os escassos levantamentos estatísticos existentes
na época mostravam a calamitosa realidade existente. Por mais ágeis que fossem as
respostas dessa subcomissão o crescimento da cidade e de sua população extra-
polavam qualquer planejamento que se fizesse.
Os trabalhos da Comissão Executiva do 2º Convênio Escolar demonstraram,
em cinco anos de atividades, um surpreendente resultado:
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
72
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
“Em cinco anos, a Comissão se mostrara capaz de construir quase
novecentas salas de aula, cerca de 180 por ano. Ela também já havia, na mesma
ocasião, localizado 41 terrenos, colocando-os em vias de desapropriação, para neles
serem levantados edifícios para grupos escolares de diferentes tamanhos, além do
relacionamento de 19 outros prontos para receber as construções projetadas prela
Comissão do Convênio, duas na fase de pronto início das obras, 4 em concorrência
pública e as restantes com os projetos em estudo. Havia ainda 34 Projetos de Lei
de desapropriação preparados.Acrescentem-se a esses, 12 outros, cujas obras iriam
ser postas em concorrência pública”. (in Mascaro, 1960, pág. 91)
Esse resultado revela um processo que aplicou como princípio a produção em
série de projetos, de acordo com o preconizado pela moderna arquitetura brasileira,
nessa época reconhecida mundialmente, por revelar uma linguagem arquitetônica
singular, relativa à produção mundial.
O crítico de arte, Sr. Quirino da Silva, sobre a exposição que aconteceu no
MASP, em que se mostraram, através de maquetes e projetos, escolas projetadas pela
Comissão Executiva, escreveu:
“O sentido dessa obra de grande alcance social parece ter-se orientado dentro
do mais sadio critério, porque os membros da referida Comissão não se restringiram
somente a construir escolas; antes procuraram, acima de tudo, edificar obras que
refletissem um espírito moderno, compatível com as normas da moderna pedagogia.
Os edifícios dos grupos escolares até agora construídos, bem atestam o caráter de
modernidade das modernas casas de ensino. Compreenderam, pois, que era
indispensável educar as crianças num ambiente que refletisse a conquista da
arquitetura contemporânea, para que estas bem cedo se familiarizassem com as
formas que surgiram como produto natural de nossa cultura e civilização. A moderna
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
73
arquitetura, realizada sob a orientação da Comissão de Convênio é um fato que
orgulha São Paulo, não só por partir dos poderes públicos, mas também, por ser obra
de grande extensão empreendida somente em países de organização social bastante
evoluída. Para termos uma idéia dos trabalhos da Comissão do Convênio, basta visitar
a mostra da arquitetura Escolar recentemente inaugurada na grande sala de
exposições periódicas do Museu de Arte. Ali está, em suas linhas sóbrias e modernas,
o ambiente em que será educada a futura geração desta cidade. Os projetos são
dignos do bom nome que a arquitetura brasileira granjeou no estrangeiro, e o Museu
de Arte, ao pôr em relevo o programa do Convênio, transmite um apelo ao governo
para prosseguir nessa orientação de apoio aos valores da arquitetura contemporânea.
Esperamos que essa orientação sadia atinja também outros órgãos da administração
pública”. (in Mascaro, 1960, págs. 100 e 101)
Mesmo alcançando reconhecimento de vários setores da sociedade, a
Comissão Executiva do 2º Convênio Escolar, por ocasião das eleições para a Câmara
dos Vereadores de 1951, passou a receber críticas de vários vereadores que, em sua
maioria, não sabiam dos reais propósitos e obrigações do Convênio. As críticas
fundamentavam-se a partir dos seguintes problemas enfrentados para a viabilização da
construção dos edifícios escolares:
— o tempo para a efetivação do processo de desapropriação era longo, por todas
as suas implicações legais e, mesmo com as devidas explicações do presidente da
Comissão Executiva, os vereadores colocavam responsabilidade desta morosidade
na ineficiência dos profissionais que participavam da Comissão, de modo a levá-la
ao descrédito popular;
— o número de crianças a serem atendidas extrapolava aquele projetado pela
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
74
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
Comissão; assim, as escolas, mesmo projetadas e construídas em tempo recorde,
não atingiam a população necessária;
— as sobras de dinheiro do orçamento anual destinado à Comissão do Convênio
revelavam, no modo de entender dos candidatos a vereador, ineficiência da equipe
na produção das escolas, o que era rebatido pela Comissão, tentando esclarecer
que o processo envolvia não somente o tempo de projeto e sua construção, mas
também o tempo das desapropriações e licitações para as obras.
O fato é que o Convênio contava com uma verba vultosa para a realização
de suas metas, verba essa desejada por outros órgãos da prefeitura que, muitas vezes,
dela tentaram se apropriar para aplicação em obras de melhorias urbanas que não
necessariamente tinham a ver com as escolas. A aproximação do IV Centenário de
aniversário da cidade também fez com que parte dessa verba fosse desviada para a
construção do Parque do Ibirapuera.
O ano de 1951 foi marcado pela eleição direta para prefeito que, até então,
era escolhido diretamente pelo Governador do Estado.Venceu a eleição o candidato
Jânio Quadros, que passou a interferir diretamente nas ações da Comissão Executiva.
O arquiteto Hélio Duarte chegou a receber “bilhetinhos” diretamente do Prefeito
solicitando alterações no planejamento traçado pela equipe.
Os membros da Comissão do Convênio gastaram parte de seu restrito tempo
de trabalho para responder ofícios de vereadores e políticos,dando explicações que, muitas
vezes, estavam publicadas nos objetivos do Convênio, em conformidade com seus Decretos
de regulamentação. Em meio a esse desgaste e tendo chegado o ano de 1954, o arquiteto
Hélio Duarte demitiu-se do cargo de diretor da Subcomissão de Planejamento.
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
75
O detalhado estudo dos 52 edifícios escolares projetados e seu modo de
produção é tema do 3º capítulo desta dissertação.
1.5.3 O 3º CONVÊNIO ESCOLAR (1954-1959)
O 3º Convênio Escolar foi promulgado através da Lei Estadual nº 2.816, de 27
de novembro de 1954, e difere dos demais por carregar consigo, desde o ano de 1951,
quando foram iniciadas as negociações para a renovação do 2º Convênio, a discussão
sobre a municipalização do ensino em nossa cidade. Os recursos que se avolumavam
ano a ano, em decorrência do crescente aumento do recolhimento de impostos e pelo
fato da Comissão Executiva, pelos motivos já enumerados, não gastar o dinheiro
reservado, continuavam a chamar a atenção dos políticos que viam aí a possibilidade
de o município não só construir os edifícios escolares, mas também gerir toda a rede
de Ensino Municipal.
O 3º Convênio foi extinto em 1959, longe de alcançar a qualidade que
apresentou o 2º Convênio: enquanto o 2º Convênio Escolar construiu 52 escolas em
5 anos, o 3º construiu somente 17 escolas ao longo de, também, 5 anos de existência.
Durante sua vigência, as ações do 3º Convênio estiveram muito mais voltadas
à construção de galpões de madeira. Consta que, durante os dois últimos convênios,
cerca de 500 galpões de madeira foram construídos visando, em um primeiro mo-
mento, a funcionar como “biruta” para medir a demanda de uma determinada região,
para, posteriormente, serem substituídos por edifícios de alvenaria. Esses galpões,
porém, passaram a fazer parte da paisagem da cidade durante vários anos.
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
76
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
De acordo com a Revista Engenharia Municipal nº 13, de 1959, as comissões
Executivas e suas subcomissões foram assim compostas:
A primeira Comissão Executiva do Convênio Escolar, no período de 1949 a
1953, foi assim constituída: presidente, engenheiro José Amadei; chefe do setor de cons-
truções, engenheiro Ernesto de Faria Alves; chefe do setor de projetos, arquiteto Hélio
de Queiroz Duarte e, finalmente, chefe do setor de contadoria, Celso Hahne.
Posteriormente, a presidência da referida Comissão passou pelas seguintes
modificações:
de 1953 a 1954: engenheiro Werther Krause
de 1954 a 1955: o engenheiro José Amadei
de 1955 a 1955: o engenheiro Maury de Freitas Julião
de 1957 a 1955: o engenheiro Jayme da Rocha Pereira
de 1958 a 1959, o engenheiro José Olavo de Freitas
Quanto ao setor de construções:
de 1953 a 1954: engenheiro Armando de Arruda Camargo
de 1954 até 1959: engenheiro Cyro Ribeiro Pereira
Quanto ao setor de projetos [sic]:
de 1952 a 1953: arquiteto Julio Cezar Lacreta
de 1954 a 1956: arquiteto Elvio Novelleto
de 1956 a 1959: arquiteto Raul Bolliger.
77
CAPÍTULO 2
CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
78
79
“Se a República era o lugar do ‘homem novo’, tornava-se necessário repensar este
ambiente, organizado, higienizado, ordenando o espaço físico da cidade e, por conseqüência,
o espaço físico da escola. Os prédios escolares surgem, então, com uma finalidade específica,
ou seja, o lugar onde se processa a formação do cidadão. (in Dórea, 2000, pág. 1)
80
81
2.1 O CONTRADITÓRIO CONTEXTO SOCIAL E URBANO DA METRÓPOLE COSMOPOLITA
NO QUAL AS ESCOLAS DO 2º CONVÊNIO ESCOLAR FORAM IMPLANTADAS
82
Como vimos no capítulo 1, com a modernização dos sistemas escolares
ocorrida no Rio de Janeiro, em 1930, durante a gestão do educador Anísio Teixeira,
e, em São Paulo, a partir de 1936, com o trabalho da Comissão Permanente de
Ensino, a escola pública passou a ampliar o seu papel na sociedade se definindo como
espaço para a formação dos cidadãos.
As escolas na Primeira República (1889-1930) caracterizaram-se urbanis-
ticamente por ocuparem espaços estratégicos nos centros urbanos, ao pretenderem
mostrar o papel redentor que se atribuía à educação no regime republicano recém-
implantado: a igreja e o campanário, tradicionais das cidades coloniais, são substituídos,
respectivamente, pelo edifício escolar e pelo mastro da bandeira nacional. Essa
centralidade física e a necessidade de destacar o edifício escolar no espaço urbano,
através de sua monumentalidade, não subsistem à revisão do papel social da
educação defendido pelos ideais escolanovistas: a centralidade física foi então
substituída por uma “centralidade funcional”, ou seja, uma vez que o edifício escolar
passa a ser equipamento estruturador dos bairros, em conseqüência do programa
arquitetônico que se incrementou, ao oferecer equipamentos urbanos como
auditórios e bibliotecas, serviços de assistência social e de saúde, sua localização e
número de edifícios passaram a ser estratégicos, no intuito de atender a toda
população urbana.
Dessa maneira, os bairros passaram a organizar parte de seu cotidiano em
função dos serviços oferecidos pelas modernas escolas escolanovistas. O caráter
social conferido ao edifício escolar, na década de 50, passou a definir uma nova
“centralidade” para a escola que, de monumento, rende-se à escala da criança e se
dilui no cotidiano dos bairros.
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
83
CAP. 1 MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR:
84
A IMPORTÂNCIA DA ARQUITETURA NA NOVA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA
Essa mudança da função da escola dentro do espaço urbano, sua quantidade
e porte ocorreram em decorrência das transformações pelas quais passaram os
bairros, na cidade de São Paulo, a partir da década de 50, conseqüência do crescente
processo de descentralização que começa a caracterizar as transformações urbanísticas
da cidade, na proximidade de seu IV Centenário de fundação.
Assim, as escolas durante o convênio escolar, dentro desse processo de
descentralização da cidade em relação ao seu centro histórico, ganham definitivamente
status de equipamento público educativo e cultural, referências urbanas na formação
de cidadãos, equipamentos disponíveis, não somente aos estudantes matriculados, aos
quais em um primeiro momento se destinava, mas também a seus pais e vizinhos que
compartilhariam o mesmo espaço físico: nas reuniões de bairro que ocupariam as salas
de aula em horários de ociosidade, alfabetização de adultos em cursos noturnos, uso
de seus espaços livres para atividades físicas e recreativas, bibliotecas, salas de artes,
museus de exposição e no uso do pátio coberto, equipado com palco para as mais
diversas apresentações artísticas.
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
85
2.1.1 A CIDADE SE REVELA EM SUAS CONTRADIÇÕES NOS
PREPARATIVOS PARA A COMEMORAÇÃO DO IV CENTENÁRIO
DE FUNDAÇÃO
No período de 1951 a 1954, a cidade de São Paulo preparou-se oficialmente
para a comemoração do IV Centenário de sua fundação. Seu caráter metropolitano e
cosmopolita de maior Parque Industrial Latino-Americano cobrava-lhe uma tomada de
posição quanto ao grave desequilíbrio social que se revelava na contramão de seu
vertiginoso desenvolvimento econômico. Assim, para as comemorações do IV Cente-
nário, a Câmara Municipal de São Paulo aprovou em setembro de 1951, o Plano de
Melhoramentos Públicos. O plano representou somente uma proposta de melhorias
urbanas e não a proposição de um conjunto de ações que, planejadas ao longo do
tempo, pudessem construir um plano urbanístico para a metrópole que se definia.
Várias equipes constituíram-se para a viabilização desse plano, e merece
destaque a Equipe de Planejamento, liderada pelos arquitetos Eduardo Kneese de
Mello e Ìcaro de Castro Mello que defenderam ser de fundamental importância a
elaboração de um plano diretor que ordenasse o crescimento da cidade: as
comemorações do IV Centenário deveriam ensejar a possibilidade de se planejar o
futuro da cidade, contemplando seu equilíbrio social e econômico e, por isso, os
arquitetos colocaram em discussão a necessidade de frear o vertiginoso
crescimento da capital paulista tendo em vista o grave desequilíbrio social sobre o
qual ele se sedimentava. Esse plano diretor não se efetivou.
Com as obras do Plano de Melhorias, a cidade, a partir de 1951, transformou-
se em um gigantesco canteiro de obras como não se via desde o Plano de Prestes Maia
PARQUE DO IBIRAPUERA,1954 – DESTAQUE DAS COMEMORAÇÕES
DO IV CENTENÁRIO
86
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
de 1930. Obras de saneamento foram realizadas, através da construção de 18 galerias
para escoamento das águas pluviais; pontes e viadutos foram construídos, como a
estratégica ponte de acesso à Via Anhanguera; outras pontes já existentes foram
substituídas por estruturas mais modernas como a Ponte da Freguesia do Ó, Ponte do
Limão, Ponte da Casa Verde, Ponte dos Remédios e Ponte Metálica da Armour.
“O Programa Quadrienal de Obras e Melhoramentos tinha também como
meta a execução de avenidas cujos projetos datavam da década de 30. Com
origem no “Plano de Avenidas”, algumas destas artérias foram reavaliadas pelo
Departamento de Urbanismo que apenas atualizou as propostas elaboradas por
Prestes Maia. Faziam ainda parte deste agrupamento de melhoramentos, a
Avenida Leste (Radial Leste), a Avenida Anhangabaú-Tiradentes (Radial Norte), a
Avenida Anhangabaú Superior (antiga Itororó e atual 23 de Maio), a Avenida
Sumaré, a Avenida Água Funda, a Estrada de Santo Amaro e as Avenidas Marginais
do Tietê no trecho Osasco e Guarulhos. (in Meyer, 1992, pág. 52)
Através de volumosas obras de infra-estrutura viária, a cidade conectava seu
centro aos bairros, que se consolidavam. Evidenciando o caráter de descentralização
contido no plano em relação ao seu centro histórico, foram construídos o mercados
distrital de Osasco, então pertencente ao município de São Paulo, e o mercado distrital
do bairro da Lapa.
A área cultural foi, sem dúvida, uma das mais privilegiadas, com a construção
(sob a responsabilidade e custeio da Prefeitura Municipal) do Parque do Ibirapuera, onde
a grande exposição do IV Centenário aconteceu. Cenário moderno, seus edifícios e
marquises foram projetados por equipe liderada por Oscar Niemeyer, então o arquiteto
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
87
com maior prestígio em nosso país. O projeto dos espaços livres ficou sob a
responsabilidade do paisagista Burle Marx, substituído depois pelo projeto do
engenheiro Otavio Augusto Teixeira Mendes.
O projeto do Parque Ibirapuera trouxe para a cidade paulistana um sinuoso
e moderno parque concebido para a “vida urbana da luz, do verde e do ar”, de acordo
com o que havia de mais contemporâneo na arquitetura nacional, então reconhecida
internacionalmente em sua singularidade. Dessa maneira, a burguesia industrial
pretendeu registrar no espaço físico da cidade paulistana, em seu aniversário de 400
anos, a modernidade arquitetônica.
As propostas do Plano de Melhorias visaram a atenuar os efeitos de uma
cidade que crescia sem qualquer planejamento e que, por conseqüência, gerou grandes
vazios urbanos, privilegiando, através de seu especulativo mercado imobiliário, somente
a região central e adjacências.
Conforme descreveu Luis Saia, a cidade de São Paulo, em 1954, havia crescido
substancialmente: dos 130 km
2
em 1930, para uma área de 420 km
2
,e esse crescimento
deveu-se, em grande parte, à expansão do mercado imobiliário que, sem qualquer traço
de planejamento urbano, resultou em loteamentos e bairros desconectados, carentes de
serviços básicos e de infra-estrutura urbana. Saia também descreveu que o processo de
industrialização, em substituição à economia monocultora do café impulsionou esse
crescimento e transformou a cidade em metrópole, ao conectá-la regionalmente às
cidades do ABC, Guarulhos, Osasco, São Miguel e Santo Amaro, que passaram a
participar do mesmo processo de industrialização atendendo à diversificação da
produção de manufaturas, característica da produção industrial.Assim, o mesmo processo
de regionalização, que conectou esses municípios em torno da monocultura cafeeira,
SÃO PAULO ANOS 30
SÃO PAULO ANOS 50
88
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
possibilitou a transformação da economia na diversificação da produção industrial: a
conexão dos municípios, em função da economia monocultora, transformou-se indutora
do processo de diversificação característico da economia industrial.
Em sua tese de doutorado “Metrópole e Urbanismo – São Paulo Anos 50”,
Regina Meyer ao descrever as conclusões de Luis Saia, reforça a tese de crescimento
espacial horizontal metropolitano, através, também das teorias de Langenbuch:
“Com base nos censos demográficos de 1940, 1950 e 1960 e com dados
divididos por subdistritos e distritos, Langenbuch conclui que o aumento da
população foi de 207%, e o que é essencial: o rebatimento espacial deste
crescimento foi maior nos `arredores´ do que na `cidade´. Segundo os dados
apresentados, a `cidade´ cresceu 171% e os `arredores´ 364%. Langenbuch atesta
assim a tese de que a intensa verticalização da área central da cidade, sem dúvida
alguma uma das fortes características do período, é objetivamente menos intensa
do que a vigorosa compactação horizontal periférica”. (in Meyer, 2002, pág. 15)
Langenbuch em sua teoria abrangeu dois períodos: o primeiro de 1915 a
1940, quando ocorreu a verdadeira metropolização, e um segundo, de 1940 a 1954.
No primeiro período, Langenbuch descreveu um cenário urbano que vai além daquele
verticalizado e concentrado em seu centro histórico e que se caracterizou por revelar
a grande extensão horizontal de nossa cidade; o segundo período descrito
caracterizou-se pela conexão regional, viabilizada pela construção de rodovias, de
loteamentos e de conjuntos habitacionais modernos que se destacaram na paisagem
por sua homogeneidade de tratamento.
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
89
No primeiro período (1915-1940), São Paulo passou a se caracterizar por um
grande crescimento horizontal, através da construção dos novos loteamentos
promovidos pela especulação imobiliária, que foram implantados desconectados dos
bairros já consolidados.
Dentro desse processo de crescimento horizontal desordenado, destacamos
duas modalidades de subúrbio:
— subúrbios industrial-residenciais que, segundo a análise de Langenbuch, tiveram
sua implantação condicionada ao trinômio ferrovia, terrenos grandes, planos e
baratos e água fluvial – os chamados subúrbios-estação;
— subúrbios que surgiram em função de loteamentos conectados através de
ônibus, que chegaram a esses novos bairros depois de as pessoas aí já terem se
fixado e reivindicado esse meio de transporte.
Se o caminho do trem costurou os bairros em linha, com a racionalidade
dos trilhos, os ônibus possibilitaram a expansão da cidade por regiões totalmente
desconectadas da cidade existente e obedecendo somente a lógica da especulação
da terra urbana.
No segundo período,a partir de 1940, a nova paisagem suburbana de São Paulo
passou a ser construída ao longo das rodovias que, conectadas para o escoamento da
produção industrial, costuraram o tecido regional.
“...Via Anchieta, Via Anhanguera e Via Dutra – como agentes do desen-
volvimento suburbano, verdadeiros eixos em escala regional. Além de estimular o
desenvolvimento suburbano em seus domínios, as auto-estradas se mostraram
propícias à industrialização nas suas bordas, resultando em uma nova paisagem
90
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
industrial. Implantadas em grandes áreas ajardinadas, as industrias passam a
explorar a visibilidade propiciada pela via. Um indiscutível caráter moderno marca
a instalação destas indústrias. (in Meyer, 1991, pág. 15)
Outra paisagem que passou a caracterizar as áreas suburbanas foi a dos
conjuntos habitacionais homogêneos, produzidos em escala industrial por iniciativa
do Estado ou da iniciativa privada, repetindo, entretanto, os mesmos problemas de
falta de equipamentos urbanos dos demais subúrbios existentes.
Esta breve caracterização dos bairros da cidade de São Paulo e seu
incipiente processo de urbanização, em resposta a um crescimento demográfico
exponencial, provocado pelo vertiginoso desenvolvimento da indústria e sem a
intervenção de qualquer órgão planejador do Estado, têm a função de ilustrar a
dificuldade em planejar a construção de escolas em um território que se espalhava
sem qualquer critério, nas décadas de 40 e 50. Atender à criança em um território
tão disperso e heterogêneo e com o princípio de educar para “viver na cidade”,
fizeram das escolas construídas pelo 2º Convênio Escolar equipamentos essenciais na
qualificação dos bairros suburbanos e na vida de suas crianças.
A Comissão Executiva do 2º Convênio Escolar iniciou, em 1949, seus
trabalhos com uma científica e detalhada pesquisa, levando em conta o
crescimento demográfico dos 41 distritos que compunham a cidade e a demanda
por escola de cada um deles, a partir da população infantil existente em idade
escolar e, para tanto, incluiu visitas às áreas a serem atendidas e o levantamento
dos problemas no próprio local.
As escolas do convênio e seu princípio de educar cidadãos revelaram,
também, uma postura que se alinhava com os desejos da burguesia industrial que
se consolidava, em substituição à sociedade agrária que dominou o cenário de
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
91
São Paulo até o início da década de 30. A década de 40 mostrou-nos que o
processo de construção de uma sociedade urbana já se apresentava irreversível na
cidade paulistana.
Educar para viver na cidade, instruir para que o filho do trabalhador pudesse
servir à indústria, e por conseqüência, usufruir de seus benefícios, era parte do ideal que
alimentava os novos extratos sociais advindos do desenvolvimento de uma sociedade
urbana e industrial.
A mudança da sociedade revelou-se, também, nos novos hábitos adquiridos e,
por decorrência nas novas necessidades,a serem atendidas.Assim, a educação e a cultura,
o acesso à arte e ao cinema passou a fazer parte do cotidiano do cidadão paulistano.
CINE IPIRANGA E HOTEL EXCELSIOR – ARQUITETO RINO LEVI, 1941
92
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
2.1.2 0S NOVOS HÁBITOS CULTURAIS PAULISTANOS
Na década de 50, a cidade de São Paulo já ocupava lugar de destaque no
cenário cultural nacional e internacional; um meio cultural urbano e cosmopolita que
guardava, na complexidade de seu tecido social, diversas formas de representação
cultural – se a geração modernista da década de 20 perseguia nossa identidade, através
do nacionalismo, o “ser moderno” da década de 50 perseguiu o cosmopolitismo como
uma forma de nos inserirmos no mundo:
“A cidade dos italianos está definitivamente superada, a diversidade dos
imigrantes justifica a observação de Oswald de Andrade de que São Paulo tornara-
se naquele momento uma sociedade das nações urbana. Entretanto, apesar desta
transformação ter grande significado para a vida metropolitana, pois as influências
culturais se diversificaram enormemente, ela não era a responsável nem direta nem
única do novo cosmopolitismo paulistano.
O cosmopolitismo dos anos 50 difere do anterior por não ser apenas a
somatória de indivíduos estrangeiros presentes na sua população. Na sua nova
acepção, o cosmopolitismo paulistano baseava-se em novos valores. Pertencer ao
mundo, ser homem do mundo era então o ideal que se manifestava na sociedade
paulistana da década de 50. O desenvolvimento industrial, a presença do capital
estrangeiro, a modernização da vida cotidiana, criavam a expectativa de
transformar esta aspiração em realidade palpável. (in Meyer, 1992, págs. 48 e 49)
O espaço físico da cidade de São Paulo refletiu sua modernidade nos novos
programas arquitetônicos voltados à cultura. Desde o final da década de 40, São
TEATRO CULTURA ARTÍSTICA – ARQUITETO RINO LEVI, 1942/1943
CINE IPIRANGA E HOTEL EXCELSIOR – CORTE LONGITUDINAL
E RESTAURANTE DA COBERTURA DO HOTEL
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
93
Paulo contava com dois museus – O Museu de Arte de São Paulo (MASP), fundado
em 1947 por Assis Chateaubriand, e o Museu de Arte Moderna (MAM), criado em
1948 pelo industrial Francisco Matarazzo Sobrinho, no qual se instalou, em 1951, a
1ª Bienal Internacional de Artes Plásticas, contando com a participação de mais de
20 países e visitada por mais de 20.000 pessoas. A primeira televisão, a TV TUPI, foi
ao ar em 1950, sacramentando a sociedade de massas que se consolidava.
Na década de 50, São Paulo já contava com 119 cinemas freqüentados por
35 milhões de espectadores ao ano (in Meyer, 1992, pág. 36). O circuito constituído
pelas avenidas Ipiranga e São João e arredores formavam a Cinelândia paulistana,
com cinemas que foram sendo construídos a partir da década de 30. Em 1936, foi
inaugurado o Ufa-Palace, projeto do arquiteto Rino Levi com 3.139 lugares que,
exemplar, foi adotado como modelo e fez de seu arquiteto referência no domínio da
técnica para desenvolvimento de projetos de salas de projeção.
EDIFÍCIO PRUDÊNCIA – ARQUITETO RINO LEVI, 1948
94
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
2.1.3 OS NOVOS HÁBITOS DE MORAR NA CIDADE PAULISTANA
A intensa verticalização da área central da cidade levou os paulistanos a
adquirirem novos hábitos de moradia – os condomínios verticais foram uma conse-
qüência desse processo – morar na cidade passou a significar morar com densidade,
ao menos para uma parcela da população que podia usufruir de seu centro econômico
e financeiro e dos bairros diretamente a ele relacionados.
Desde a década de 50, os condomínios verticais ofereciam na base de suas
torres, serviços de recreação e comércio, a partir de uma arquitetura comprometida
com a moderna escola de arquitetura internacional.
Regina Meyer nos descreve, sucintamente, uma cronologia da produção de
edifícios verticais para habitação, entre as décadas de 40 e 50:
“Ao abrir a década de 50 a cidade de São Paulo já contava com um
número razoável de edifícios de apartamentos, cujas propostas arquitetônicas
mostravam sintonia com a arquitetura erudita internacional e mais intensamente
com o Movimento Moderno. Os mais representativos exemplos destes edifícios
residenciais são seguindo uma ordem cronológica: o edifício Columbus, projeto do
escritório Rino Levi Arquitetos Associados, situado na Avenida Brigadeiro Luiz
Antônio, no ano de 1932; o edifício Esther, dos arquitetos Álvaro Vital Brasil e
Adhemar Marinho, inaugurado em 1935 na Avenida Ipiranga; o Edifício Santarém,
projeto de Henrique Mindlin, na Rua Barão de Campinas, do ano de 1940; o
Edifício Anchieta, de 1941, projetado pelos irmãos Marcelo Roberto e Milton
Roberto, situado na esquina da Av. Angélica com a Av. Paulista; o Edifício Louveira,
projeto de Vilanova Artigas e Carlos Cascaldi, situado na Praça Vilaboim, de 1946
e o Edifício Prudência, de 1948, projeto de escritório Rino Levi Arquitetos Asso-
ciados, situado na Avenida Higienópolis. (in Regina Meyer, 1992, págs. 36 e 37)
EDIFÍCIO LOUVEIRA – ARQUITETO VILANOVA ARTIGAS 1946
EDIFÍCIO ESTHER – ARQUITETO ÁLVARO VITAL BRASIL, 1935
Por outro lado, se os bairros centrais ou os bairros a eles diretamente ligados
tinham garantidas as benesses de uma sociedade moderna, industrial e urbanizada, outra
grande parte do território do município – sua maior parte – representada pelos
subúrbios de estação ou subúrbios de loteamentos ficaram à margem deste processo
de modernização, relegados ao esquecimento do Estado. Sua população amontoava-
se, sem equipamentos ou infra-estrutura urbana, nos cortiços de periferia e nas casas
auto-construídas.
A real situação destes bairros periféricos foi detalhadamente revelada
somente com a contratação da Sociedade para a Análise Gráfica e Mecanográfica
Aplicada aos Complexos Sociais (SAGMACS).
EDIFÍCIO COLUMBUS – ARQUITETO RINO LEVI, 1932
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
95
96
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
2.1.4 A SAGMACS E A REVELAÇÃO DA CIDADE REAL
Durante o Governo de Lucas Nogueira Garcez (1951 a 1953), a
SAGMACS (Sociedade para a Análise Gráfica e Mecanográfica Aplicada aos
Complexos Sociais), fundada no Brasil em 1948 pelo Padre Lebret, promoveu um
estudo sobre as possibilidades e necessidades do Estado de São Paulo e, em 1956,
a mesma SAGMACS foi contratada para elaborar uma pesquisa, visando a analisar
e diagnosticar detalhadamente a cidade de São Paulo, e que se constituiu em um
marco na formação dos urbanistas paulistanos.
Tratou-se de um estudo voltado ao planejamento e desenvolvimento
equilibrado de todo o território urbano, priorizando a instalação de equipamentos
urbanos para toda a população, que só poderiam ser planejados por meio do
conhecimento da cidade real, de suas carências e potencialidades. É através dessa
postura no enfrentamento de seus desequilíbrios, que podemos identificar na história
de nossa cidade um conjunto de profissionais que trabalharam na convergência de
um projeto humanista, com a intenção de reduzir e denunciar as desigualdades
sociais da cidade de São Paulo.
As escolas propostas pelo 2º Convênio Escolar, com seu programa arqui-
tetônico abrangente, foram parte desses equipamentos urbanos que, além de educar
para o ensino tradicional, extrapolaram, em seu espaço físico, para as possibilidades
de encontro entre as pessoas, na discussão de seu cotidiano. Hélio Duarte, chefe da
equipe de arquitetura do Convênio Escolar”, na revista Habitat nº 4, ao apresentar
as primeiras escolas, confirma esta constatação:
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
97
“Por que não considerar em cada bairro – a escola, o grupo escolar, como
fonte de energia educacional, como ponto de reunião social, como sede das
sociedades amigos de bairro, como ponto focal de convergência dos interesses que
mais de perto dizem com a vida laboriosa de suas populações?
Nela com o aproveitamento integral do prédio, em rodízio de um farto
número de horas, poderíamos, a par da educação ministrada à noite a adultos,
recrear e educar um grande número de pessoas.
A escola passaria a ser um verdadeiro cadinho do amálgama da nossa
heterogênea população. Reuniões de pais, pequenos bailes, cursos para as mães e
noivas, pequenas palestras, cinema e teatro educativos, biblioteca, audições de
música, teatro de bonecos e jogos.Tudo aí poderia ser realizado. Forças centrípetas
convergiriam para a escola e seriam as concorrentes da formação intelectual,
social, e profissional dessas pequenas comunidades, onde depois de processadas
passariam a ser as forças centrífugas - difusoras do conhecimento adquirido.
A visão orgânica de cidade, apresentada pela SAGMACS é reforçada pela
visão humanista esboçada pelo arquiteto Hélio Duarte em sua coordenação nos
trabalhos do Convênio Escolar”, sem que uma tenha servido diretamente para
alimentar os ideais da outra. Na realidade, as duas atenderam à mesma “causa” social
que caracterizou, de acordo com Anatole Kopp, o movimento genuinamente
moderno: ambas as visões moveram-se pelo sonho de uma sociedade humana e
igualitária - a equipe liderada por Hélio Duarte, na escala do edifício que só se faz
completo com a visão da cidade, e a SAGMACS, na escala da cidade que só se
completa no pleno atendimento dos serviços de saúde, educação, justiça e infra-
estrutura urbana de sua população.
A cidade, através do diagnóstico apresentado pela SAGMACS, revelou todas
as suas faces, escancarando aquela da periferia improvisada para a moradia do
98
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
trabalhador urbano, excluído que foi do espaço central da cidade paulistana. Nabil
Bonduki, em seu livro “Origens da Habitação Social no Brasil”, aponta a situação que
encontramos na periferia paulistana, no início da década de 50, e a conseqüência
política desse abandono: terreno fértil para a demagogia populista.
Podemos concluir que, junto à ideologia apregoada pelas escolas do
Convênio Escolar”, dentro de um processo de descentralização do poder pelo qual
passava o país naquele momento, vimos o surgimento do populismo que se apossou
dos ideais de cidade e transformou-os em peças de um jogo eleitoreiro e pseudo-
democrático. Montou-se, assim, o campo de batalha entre os arquitetos, com sua
técnica e seus projetos, e o jogo demagógico dos políticos populistas.
Podemos concluir também que, apesar de não fazer parte do “Programa de
Melhoramentos Públicos de 1951”, que teve na construção do Parque do Ibirapuera
sua maior expressão, em função das comemorações do IV Centenário da cidade, o
Convênio Escolar” fez parte de um conjunto de intervenções na cidade paulistana na
década de 50 que visava a “correr atrás” dos anos de desprezo relativos às questões
voltadas à carência de escolas e às primeiras considerações com os distantes bairros
operários suburbanos.
99
2.2 NO CONTEXTO DA PRODUÇÃO ARQUITETÔNICA NACIONAL
AS DEFINITIVAS INFLUÊNCIAS DA HEGEMÔNICA ARQUITETURA CARIOCA
NA LINGUAGEM ADOTADA PARA AS ESCOLAS DO 2º CONVÊNIO ESCOLAR
100
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
101
“Contudo, para melhor situar as razões e significados contidos nesses
projetos, será preciso retomar os princípios espaciais que governam a revolução
moderna na arquitetura, considerando, para o caso brasileiro, a penetração
predominante da vertente corbusiana. Quer dizer, a idéia de construções “amplas,
horizontais, espaçosas, no meio de jardins”, pressupõe uma compreensão da
relação entre edifício e espaço urbano completamente distinta da que se
consolidou nas cidades tradicionais européias da metrópole e da colônia: edifícios
relativamente uniformes, respeitando os gabaritos e alinhamentos dos lotes, e
definindo pátios centrais fechados nos miolos das quadras”. (Wisnick no livro
Arquitetura Escolar Paulista anos 50 e 60, 2006, pág.62)
Desde Mário de Andrade, com os parques infantis paulistanos, na década de
30, a arquitetura voltada à educação procurou expressar a busca por uma identidade
nacional. A experiência adquirida com o Neocolonial, que cativou em um primeiro
momento Mário de Andrade e até mesmo Lúcio Costa, deve ser avaliada como parte
de um processo que levou à definição de uma linguagem arquitetônica singular e que
culminou na moderna arquitetura carioca.
A trajetória para a invenção dessa linguagem arquitetônica, legitimada como
expressão cultural brasileira, tem sua gênese no rígido racionalismo europeu, que
orientou a concepção de nossos primeiros edifícios modernos, como classificamos as
escolas construídas por Enéas Silva, na década de 30, no Rio de Janeiro, ao lado do
educador Anísio Teixeira, e as escolas construídas pela Comissão Escolar, em São Paulo,
a partir de 1936, pelos arquitetos José Maria das Neves e Hernani do Val Penteado.
Vimos também que o rígido racionalismo presente nessas primeiras escolas
refletiu-se somente na composição de seus arranjos espaciais, apresentando uma
102
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
roupagem art decô em sua forma final.
As escolas do 2º Convênio Escolar, a partir de 1978, por sua vez, definiram sua
linguagem arquitetônica a partir da arquitetura moderna carioca, então consagrada
internacionalmente, como representante máxima da arquitetura moderna brasileira.
Essa linguagem se originou a partir dos ensinamentos de Le Corbusier, com o
qual alguns de nossos primeiros arquitetos modernos brasileiros puderam dividir a
prancheta, na elaboração do projeto do Ministério da Educação e Saúde, na gestão do
Ministro Gustavo Capanema, em 1937, sob o comando do arquiteto Lúcio Costa.
O percurso entre o austero racionalismo do início dos anos 30 até as
orgânicas e plásticas formas da arquitetura carioca é contado a partir das
experiências de engajados e idealistas arquitetos como Eduardo Affonso Reidy que,
como veremos a seguir, resultaram das mudanças implementadas pela direção de
Lúcio Costa na Escola Nacional de Belas Artes, ao romper com o ensino de
arquitetura clássico ortodoxo e substituí-lo pelo ensino dos modernos conceitos da
arquitetura internacional, a partir dos cinco pontos propagados por Le Corbusier
para uma nova arquitetura.
O ornamento clássico ou eclético não teria nenhuma razão de ser para um
arquiteto comprometido com o desenvolvimento de um país moderno e
industrializado, afinado com a construção de um espírito nacional e a serviço de um
povo que, urbanizado, teria acesso a uma moderna vida com qualidade.
O percurso dessa busca tem seu desfecho em obras como o Ministério da
Educação e Saúde, coordenado por Le Corbusier, o Pavilhão Brasileiro, projetado por
Lúcio Costa e Oscar Niemeyer para a Feira Mundial de 1939, em Nova York e com a
importante exposição Brazil Builds no MoMa de NY.
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
103
2.2.1 BREVE HISTÓRICO PARA COMPREENSÃO DA HEGEMONIA
DA ARQUITETURA CARIOCA NO CENÁRIO NACIONAL
A hegemonia da escola moderna carioca deveu-se, entre outras coisas, ao fato
de essa moderna arquitetura ter tido como mecenas o Governo Federal de Getúlio
Vargas (não se tratou de torná-la arquitetura oficial, mas de seu uso oportuno por
alguns de seus ministros e colaboradores, identificados com a busca por uma identi-
dade nacional para nossa arquitetura). Exemplo dessa intenção foi dado pelo Ministro
Gustavo Capanema que dirigiu a contratação de jovens arquitetos cariocas, sob a
coordenação de Lúcio Costa, para a execução do projeto da sede do Ministério da
Educação e Saúde com o acompanhamento do mestre Le Corbusier e também pelo
fato de os arquitetos, que se espalhavam pelo país, deverem sua formação ao curso de
arquitetura da Escola Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro, após a curta e
transformadora gestão de Lúcio Costa.
No Rio de Janeiro, os arquitetos, desde a palestra proferida por Le Corbusier
na Escola Nacional de Belas Artes, em 1929, passaram a ter um primeiro contato com
suas revolucionárias idéias na propagação dos ideais modernistas por toda a América
Latina. A obra de Le Corbusier passou a ser referência fundamental, para a produção
de nossas primeiras obras com explícita linguagem moderna.
“A sedução que ela exercia pode ser explicada pela unidade do sistema proposto,
que partia de ordem econômica e social, de um lado, e de argumentos de ordem técnica
de outro, culminando numa concepção artística. Seu espírito dogmático atraÍa os jovens
espíritos, um tanto desorientados, na procura de um caminho; oferecia, ao mesmo tempo,
um ideal, regras precisas e uma disciplina que podiam servir de referências e orientar os
inseguros passos iniciais”. (in Bruand, 1981, pág. 74).
104
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
Para Lúcio Costa, entretanto, não foi esse primeiro contato com Le
Corbusier que o cativou; sua importância e a descoberta da consistência de sua obra
só foram consideradas, após conhecer por escrito suas teorias, em período posterior
à sua saída da direção da Escola Nacional de Belas Artes. Lúcio Costa aceitou o cargo
de diretor do curso de arquitetura por seu descontentamento com o ensino
tradicional e por estar alinhado com o estilo Neocolonial, então compreendido
como aquele que exprimia nossa nacionalidade.
No início, não despertou oposição, mas ela começou a acontecer à medida
que aplicava as mudanças que achava necessárias, a começar pela demissão de
professores defensores do ensino tradicional e contratação de novos professores
como Gregori Warchavchik (que despontava, desde seu manifesto modernista de
1925, como liderança na defesa da arquitetura moderna no Brasil), Affonso Eduardo
Reidy (jovem arquiteto formado pela Escola Nacional de Belas Artes e defensor da
arquitetura racional exemplificada pelo projeto vencedor no concurso para o
Albergue da Boa Vontade) e Alexander Buddeus introdutor de publicações européias
que difundiam conceitos do racionalismo europeu (Segawa, 2002, pág 78). Para
exemplificar o impacto dessas novas idéias, vejamos o que defendia Buddeus:
“O modernismo não é uma evolução do tradicional, isto é dos valores artísticos do
passado, mas uma criação integral do nosso tempo. A orientação moderna é construtiva,
social e econômica, ao passo que a orientação tradicional era artística, decorativa,
simbólica. (in Santos, 19777, pág.108)
Dessa maneira, Lúcio Costa, ao se mostrar disposto a mudanças radicais que
pouco tinham a ver com as propostas neocoloniais, foi exonerado da direção da Escola
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
105
Nacional de Belas Artes, mesmo antes de completar um ano no cargo, no entanto esse
tempo foi suficiente para marcar uma geração inteira de estudantes que por lá
passaram e que, formados, começaram a projetar, a partir dos pressupostos aprendidos
nesse movimento reformador.
Após sua saída da Escola Nacional de Belas Artes, Lúcio Costa enfrentou um
período de ostracismo, que o levou a refletir com profundidade sobre suas convicções
modernas, através das leituras sobre esse movimento, de acordo com suas declarações
em entrevista a Hugo Segawa:
(...) “foi então, nessa época, que tomei conhecimento a fundo, de verdade,
de todo esse movimento que havia ocorrido na Europa (...) Aí comecei a tomar
conhecimento da obra de Le Corbusier e me apaixonei, porque ele era
extraordinário, tanto na paixão que tinha pelo que estava fazendo como foi o único
daqueles arquitetos que trabalharam na época, todos extraordinários – o Gropius,
o Mies Van der Rohe - que fez uma abordagem completa do movimento do ponto
de vista social, do ponto de vista tecnológico, das novas técnicas construtivas, e do
ponto de vista plástico, ponto de vista das artes. Ele reunia esses propósitos
abrangentes; os outros cuidavam da arquitetura, mas nunca em uma abordagem
global. (Le Corbusier) Criou um movimento unânime no sentido de encarar essa
possibilidade de transformações tanto no campo da arquitetura e do urbanismo
como do ponto de vista social, pois havia uma coincidência. Na época estávamos
convencidos de que uma coisa era vinculada a outra, tendo as mesmas origens, na
revolução industrial. Essa arquitetura nova que vinha surgindo destinava-se a uma
nova era social, uma nova época, porque parecia que as coisas iam se encaminhar
num sentido muito claro. Havia uma certa ética, uma coisa de cunho moral até,
um apego de não se permitir liberdades que não se enquadrassem bem dentro
dessa concepção sociológica. (in Segawa, 1987, pág.147)
106
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
As reflexões de Lúcio Costa, publicadas no livro de sua autoria “Razões da
Nova Arquitetura” elaborado, em 1934/ 1935 serviram para propagar, entre os
arquitetos brasileiros, os ideais da arquitetura moderna que então passou a defender
com convicção.
Uma importante fonte de informações a respeito do movimento moderno e
seus resultados no Brasil e no exterior foi a revista PDF, publicada pelo Departamento
de Engenharia e Obras Viárias do Distrito Federal. Fundada em 1932, a revista serviu
para difundir o movimento moderno na arquitetura ao publicar desde projetos
modernos nacionais não construídos como também idéias e conclusões do
movimento moderno internacionais, defendidas nos pelos Congressos Internacionais
de Arquitetura Moderna (CIAMs).
Vários anteprojetos de concursos em linha moderna não aproveitados
eram divulgados nas suas páginas (sede da associação Brasileira de Imprensa,
Aeroporto Santos Dumond, cidade operária de Vila Monlevade). Um melhor
conhecimento sobre insolação e iluminação (fundamental para o desenho de
brise-soleil) derivou dos estudos de um colaborador da PDF, o engenheiro Paulo
Sá. A revista serviu também como veículo de informações arquitetônicas
internacionais: notícias sobre os CIAMs, Cirpac, os grupos Presens ZP (polonês),
Gatepac (espanhol), Mars (inglês) e Tecton (do qual se publicou o Penguin Pool,
cujas rampas certamente influenciaram os arquitetos brasileiros) e textos de Le
Corbusier (...) (in Segawa, 2002, pág. 82)
Jovens arquitetos passaram a aplicar os pressupostos modernistas em
diversas obras, como Álvaro Vital Brasil e Adhemar Marinho (edifício Esther em São
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
107
Paulo, 1936 – com a integral aplicação dos 5 pontos da arquitetura nova, preconizados
por Le Corbusier), ou como os irmãos Marcelo e Milton Roberto que, ao ganharem,
em 1936, a concorrência para o projeto da Associação Brasileira de Imprensa e, em
1937, o concurso para o anteprojeto do Aeroporto Santos Dumond, também aplicam
em seus projetos os conceitos da moderna arquitetura internacional.
A linguagem moderna internacional, a partir das idéias corbusianas, ganhava,
assim, força dentro do cenário brasileiro e era protagonista das discussões sobre os
destinos da arquitetura moderna brasileira.
Questões do ideário moderno, como comprometimento social, funcio-
nalidade e clareza dos programas arquitetônicos e o desenvolvimento das tecnologias
construtivas, através da racionalização de sua produção, já faziam parte de nossa
arquitetura, desde o início da década de 30; entretanto, sua expressão formal, como já
foi dito, ainda não traduzia essa modernidade.
A experiência desses jovens arquitetos, a propagação das idéias corbusianas
através das publicações nacionais e internacionais, não foram suficientes para fazer do
ideário moderno nossa arquitetura oficial, mas, por certo, serviram para dar um rumo
para a nova geração que se espalhava pelo Brasil, responsável pela construção de várias
obras e pela fundação de novas escolas para o ensino de Arquitetura.
A força dessas idéias, felizmente, também permeara a mente dos intelectuais
modernistas brasileiros que assessoravam o ministro Gustavo Capanema, desde o ano
de 1934, e, após o resultado do concurso para o projeto da sede do Ministério da
Educação e Saúde que premiou os arquitetos Archimedes Memória e Francisque
Cuchet com um projeto de linhas marajoaras, o Ministro decidiu somente pagar o
prêmio e não executar a idéia vencedora. Para a execução do projeto convidou em
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE IMPRENSA – MARCELO E MILTON ROBERTO
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E SAÚDE
108
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
setembro de 1935, Lúcio Costa para apresentar uma nova proposta, uma vez que
nesse momento Lúcio Costa já era bastante considerado pela defesa que fazia de
nossa moderna arquitetura e, assim, os auxiliares intelectuais modernistas do Ministro,
conhecedores da discussão em curso sobre os rumos de nossa arquitetura,
propuseram seu nome.
“Lúcio Costa não tomou o encargo apenas para si. Convocou os arquitetos
que haviam apresentado anteprojetos modernos no concurso para formarem uma
equipe sob sua chefia: Affonso Eduardo Reidy, Carlos Leão e Jorge Moreira. Ernani
Vasconcellos reivindicou um lugar por ser assistente de Moreira e Oscar Niemeyer
fez o mesmo, pelo lado de Lúcio Costa. Assim organizado, o grupo passou a
desenvolver o novo projeto. (in Segawa, 2002, pág. 89).
Essa corajosa decisão do Ministro Gustavo Capanema a favor da arquitetura
moderna brasileira representou uma mudança de rumo dentro de nossa história. O
novo projeto para a Sede do Ministério, com a assessoria direta do mestre Le
Corbusier para uma equipe de jovens arquitetos, já comprometidos com a
modernidade de nossa arquitetura, garantiu a liberdade plástica que faltava ao duro
racionalismo que praticavam.
O projeto para o edifício do Ministério da Educação e Saúde iniciou-se em
1936 e foi inaugurado somente em 1945. Seus arquitetos, durante esse período, fize-
ram vários outros projetos, dentro dos ensinamentos adquiridos nessa direta relação
com Le Corbusier. O projeto mais importante, considerada a dimensão alcançada
internacionalmente, foi o projeto para o pavilhão brasileiro da Feira Internacional de
Nova York de 1939, feito por Lúcio Costa com a colaboração de Oscar Niemeyer.
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
109
O surpreendente resultado final encantou a crítica internacional no uso das sinuosas
curvas propostas pelo jovem arquiteto. O sucesso desse pavilhão colocou o Brasil em
evidência nas publicações internacionais, conforme descreve Hugo Segawa em seu
livro Arquiteturas no Brasil, 1900-1990:
“O sucesso na mídia internacional gerou uma positiva repercussão no
Brasil, com a revista Arquitetura e Urbanismo reproduzindo os comentários elogio-
sos à arquitetura brasileira (“o pavilhão brasileiro tem uma pureza e estilo que
fazem a gente perder o fôleg”o, elogiava o magazine Art, ou “Lúcio Costa e Oscar
Niemeyer são provas da maturidade intelectual do Brasil”, comentava Fortune).
Uma mistura de surpresa e ufanismo caracterizavam o noticiário brasileiro do feito
em Nova York”. (in Segawa, 2002, pág. 93)
Hugo Segawa, a respeito do amadurecimento da arquitetura moderna
brasileira, conclui:
“Estava amadurecida, também, a superação do racionalismo mais ortodoxo,
com a consciência de uma nova dimensão estética da arquitetura moderna acima
da aridez do mero rebatimento da função sobre a forma – lição aprendida no
convívio com Le Corbusier em 1936 e algo mais”. (in Segawa, 2002, pág. 93)
A contribuição do pavilhão por sua arquitetura e conseqüente propagação
dos ensinamentos modernistas nacionais, revelados em uma original síntese brasileira
a partir dos cinco pontos preconizados por Le Corbusier, é revelada pela originalidade
das curvas que passaram a fazer parte do vocabulário moderno nacional, respaldado
a partir do discurso de nosso passado barroco.
PAVILHÃO BRASILEIRO DA FEIRA INTERNACIONAL DE NOVA YORK DE 1939
ACESSO SUPERIOR AO PAVILHÃO BRASILEIRO
JARDINS INTERNOS DO PAVILHÃO BRASILEIRO
110
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
Lúcio Costa, a respeito da interação entre as diversas manifestações artísticas
que passou, também, a caracterizar a arquitetura moderna brasileira, escreveu:
“Queremos, isso sim, a aplicação rigorosa da técnica moderna e a satisfação
precisa das exigências de programa e locais, tudo porém guiado e controlado, no conjunto
e nos detalhes pelo desejo constante de fazer obra de arte plástica no sentido mais puro
da expressão. Na arquitetura assim compreendida, a pintura e a escultura vêm tomar
naturalmente cada qual o seu lugar não como simples ornatos ou elementos decorativos
mas como valor artístico autônomo, embora fazendo parte integrante da composição”.
2.2.2 O PAPEL DE OSCAR NIEMEYER NA AFIRMAÇÃO DE UM
VOCABULÁRIO ARQUITETÔNICO NACIONAL
Para a compreensão da afirmação do vocabulário que passou a identificar
nossa arquitetura moderna nacional, é importante revisitarmos algumas obras emble-
máticas da carreira de Oscar Niemeyer e que irão contribuir para a compreensão
das composições propostas pelos arquitetos do 2º Convênio Escolar e de todos os
arquitetos comprometidos com um plano de reconstrução nacional e com a concre-
tização de uma identidade cultural brasileira.
Após a revelação do talento de Oscar Niemeyer, aos 32 anos, em sua
participação no projeto do Pavilhão de Nova York, o Serviço de Patrimônio Histórico
Artístico Nacional (SPHAN) convida-o, em 1939, para um desafio: projetar o Grande
Hotel de Ouro Preto, de acordo com a postura que o Serviço de Patrimônio
Histórico Artístico Nacional (SPHAN), adotou ao inserir modernidade mesmo em
PAVILHÃO BRASILEIRO DA FEIRA INTERNACIONAL DE NOVA YORK DE 1939
CAPELA SÃO FRANCISCO – OSCAR NIEMEYER
MURAL – PORTINARI
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
111
situações tão peculiares como o dessa cidade setecentista. O projeto resultou, após
muita polêmica com os arquitetos neocoloniais, em um trabalho moderno que,
mesmo marcando a paisagem com um edifício contemporâneo, conseguia dialogar
com seu entorno, através do uso de materiais e detalhes pertinentes à arquitetura
colonial dominante.
O projeto do Grande Hotel garantiu o contato de Niemeyer com o governo
mineiro e, assim, Juscelino Kubistschek, então prefeito de Belo Horizonte, convida-o
para projetar um conjunto de edifícios à beira do lago de Pampulha, então planejado
para ser um novo bairro de lazer para a Capital mineira. O conjunto encomendado
contemplava um cassino, um iate-clube, um restaurante/casa de baile, um hotel e um
clube de golfe, além de uma capela (Segawa, 1985). O conjunto final se resumiu ao
cassino, ao iate-clube, ao restaurante/casa de baile e à capela, acrescentado de uma casa
para o prefeito Juscelino Kubistheck.
Essas obras resultaram em um original vocabulário de formas arquitetônicas,
concebidas a partir da arquitetura corbusiana: o telhado asa de borboleta da casa
Errazuris, projetado em 1930 por Le Corbusier e Pierre Jeanneret, é aplicado na
cobertura da casa projetada para o prefeito Juscelino Kubistheck e na cobertura do
cassino; no conjunto dos edifícios, os cinco pontos da arquitetura nova são harmoni-
camente desenhados e combinados a elementos autóctones como a organicidade das
curvas que remetiam ao nosso barroco colonial mineiro.
A capela franciscana, no conjunto construído, destacou-se por sua origina-
lidade, ao aplicar abóbodas e uma casca parabolóide (elementos até então usados
somente na arquitetura industrial), resultando em uma harmoniosa volumetria revelada
no genial acerto de sua escala.
CAPELA SÃO FRANCISCO – OSCAR NIEMEYER
VISTA DA LAGOA
IATE-CLUBE PAMPULHA – OSCAR NIEMEYER
112
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
Niemeyer consagrou-se, assim, como o arquiteto brasileiro que desen-
volveu uma expressão própria para nossa arquitetura. Suas obras foram divulgadas
em várias publicações nacionais e internacionais e passaram a ser referência
corrente para a produção de obras de arquitetos brasileiros e estrangeiros.
A exposição Brazil Builds, datada de 1943, montada por iniciativa do MoMa
de Nova York, e a publicação de seu catálogo de aproximadamente 200 páginas,
divulgou para o mundo a história e a originalidade da arquitetura brasileira, e
mesmo os brasileiros passaram a ter noção do valor de nossa produção arquite-
tônica através dessa publicação americana, conforme escreveu Hugo Segawa:
“Brazil Builds resgatava algumas imagens esquecidas e muitas inéditas.
Dividida em duas partes – obras antigas, com fotografias da arquitetura colonial e
do Império, e obras modernas – Goodwin organizou uma publicação de arquitetura
brasileira que os próprios brasileiros desconheciam, como testemunha Mário de
Andrade (...) Goodwin, como um observador externo, enfatizava certas conquistas
de que a média dos arquitetos brasileiros não se apercebia. Tomando o exemplo
do Ministério da Educação e Saúde (então em construção), o norte-americano
reconhecia a influência de Le Corbusier (...) mas a ênfase recaiu sobre a produção
vinculada aos arquitetos do Rio de Janeiro, com destaque (pelo menos quatro
páginas a cada um) para o Ministério da Educação e Saúde (Lúcio Costa e
equipe), a sede da Associação Brasileira de Imprensa (Marcelo e Milton Roberto),
a Estação de Hidroaviões (Atílio Correia lima e equipe), a casa Cavalcanti, o
Grande Hotel de Ouro Preto, a Obra do Berço e o conjunto da Pampulha (Oscar
Niemeyer). (Hugo segawa, 2002. pág. 101)
CASA JUSCELINO KUBISTHEK – OSCAR NIEMEYER
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
113
A arquitetura nacional, reconhecida pela intelectualidade brasileira e críticos
internacionais como representante de nossa identidade cultural, forneceu a todos os
arquitetos brasileiros, a partir da segunda metade dos anos 40, forte referência para os
projetos a serem idealizados, de acordo com o espírito de nacionalismo e comprome-
timento com o projeto de desenvolvimento nacional. Na realidade, não era somente
um vocabulário que se oferecia, mas todo um discurso e uma coerência ideológica que
fez desse período um dos mais profícuos para a história da arquitetura nacional.
CASA ERRAZURIS - ARQUITETO LE CORBUSIER E PIRRE JEANNERET, 1930
CASA DE BAILE – OSCAR NIEMEYER
CASSINO – OSCAR NIEMEYER
114
115
2.3 REFERENCIAIS POSTURAIS: OS EXEMPLOS DE
AFFONSO EDUARDO REIDY E LUÍS NUNES
116
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
117
A autêntica arquitetura moderna, conforme defende Anatole Kopp, revela-se
na preocupação social da produção da arquitetura: no atendimento à produção da
habitação mínima digna, como desafio para o atendimento da moradia para todos, na
produção de edifícios públicos para o atendimento aos programas arquitetônicos para
a saúde, para a cultura, para a educação e para o transporte, enfim, no atendimento a
todas as melhorias urbanas que a convivência social, nas modernas cidades industriais,
pode oferecer.
Esse posicionamento profissional alimentou o sonho de uma sociedade
melhor, fruto do labor de muitos arquitetos, entre os quais aqueles que se propuseram
a trabalhar no serviço público no Brasil, engajados em um legítimo projeto de
desenvolvimento nacional: a ética social moveu o discurso e a ação de vários arqui-
tetos que se identificaram com a escola moderna internacional de arquitetura.
O serviço público para aqueles profissionais comprometidos com o projeto
de desenvolvimento nacional, oferecia a oportunidade para que o arquiteto trabalhasse
diretamente com a produção de edifícios públicos, uma vez que o Estado não tercei-
rizava, ainda, os projetos arquitetônicos institucionais. Se o escritório do profissional
liberal ofereceu ao arquiteto a liberdade formal no desprendimento com o mercado
especulativo das construtoras, trabalhar no serviço público ofereceu a possibilidade de
se dedicar integralmente a uma causa social.
De acordo com o que vimos nos capítulos anteriores, a modernização dos
sistemas de ensino destacou a arquitetura como área técnica estratégica para a
implementação da nova escola pública. O modo de produção da arquitetura moderna,
com sua racionalização, passou a ser a resposta à enorme demanda no serviço público
por edifícios escolares. Caberia, portanto, ao arquiteto que ocupasse algum desses
118
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
postos de comando no serviço público a organização de uma linha de produção de
projetos, que viesse atender às necessidades que se colocavam, sempre com a
solicitação para a produção de um grande número de edifícios, em um curto prazo
para sua realização.
A seguir, serão destacados os trabalhos, no serviço público, de dois arquitetos
que se assemelharam, por suas posturas projetuais e condução dos projetos dentro de
repartições públicas, à equipe de projetos do 2º Convênio Escolar.
2.3.1 A INSPIRADORA REFERÊNCIA DE AFFONSO EDUARDO REIDY
No Rio de Janeiro,Affonso Eduardo Reidy, então recentemente formado pela
Escola Nacional de Belas Artes, viu no serviço público a oportunidade de exercer
integralmente os ideais preconizados pela arquitetura moderna, podendo colocar-se
à margem da construção comercial, comprometida com a especulação imobiliária.
Ao ingressar na Prefeitura do Rio de Janeiro, em 1932, a partir de
concurso público para o cargo de arquiteto, trouxe consigo uma significativa
bagagem profissional adquirida ao trabalhar com o urbanista Agache no plano de
reurbanização da cidade do Distrito Federal, quando teve a oportunidade de
conhecer de perto a produção de um projeto público. Agache aplicou uma
metodologia para o desenvolvimento de projetos urbanísticos que mais tarde
Reidy, ao ocupar a diretoria de urbanismo no Rio de Janeiro, viria a praticar como
arquiteto contratado pela prefeitura.
119
“Agache (...) introduziu no Brasil uma nova metodologia para se pensar o
urbanismo, realizando um plano urbanístico que compatibilizava uma proposta
global de ordenamento da cidade, incluindo zoneamento, legislação, saneamento e
sistema viário, com um plano de embelezamento e remodelação, preocupado com
aspectos estéticos e visando sobretudo à área central, onde se destacava a
necessidade de urbanização da Esplanada do Castelo” (in Nabil, 2000)
Outra importante experiência, anterior à sua entrada na Prefeitura, refere-se à
sua premiação em concurso público de projetos, ao lado do arquiteto Gerson Pinheiro,
para o Albergue da Boa Vontade. Nesse projeto, o arquiteto expressa seus ideais de
modernidade ao apresentar, em 1931, uma proposta inovadora, quando despe o edifício
de qualquer ornamento e passa a se preocupar, essencialmente, com a funcionalidade
de seu programa arquitetônico. O que mais chamou a atenção dos jurados, entretanto,
foi o tratamento humano dado à questão, revelando essa nobre característica que Reidy
imprimiu à sua profissão. Esse projeto, mesmo sendo um dos primeiros de sua carreira,
revelou as principais características que iriam acompanhá-lo: o racionalismo e o
entendimento de que a função desenha o edifício e de que sua plástica é uma resposta
prática à necessidade que o gerou; em sua obra, forma e função devem ser
compreendidas como um todo indivisível.
“... o júri, por unanimidade, escolheu o projeto “Ubiratan” por ser aquele que
melhor resolvera o lado social do problema.Tratava-se de um trabalho interessante
como partido, pois os seus autores, posteriormente verificado serem os talentosos
e jovens arquitetos Affonso Eduardo Reidy e Gerson Pompeu Pinheiro, resolveram
com muita felicidade o lado social do problema, adotando uma planta em que a
ALBERGUE DA BOA VONTADE – REIDY E GERSON PINHEIRO
120
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
entrada é franca para um pátio central coberto em grande parte pelas construções
do segundo pavimento, onde o albergado aguarda discretamente, fora do olhar
público, o momento de ser levado para subir aos dormitórios. Foi esta interessante
solução um dos motivos poderosos para sua classificação, além de terem os
premiados resolvido as dependências internas com muita lógica” (in Bonduki, 2000).
Na prefeitura do Distrito Federal, Reidy ocupou rapidamente cargos de
relevância, onde projetou várias obras que, como é característico no serviço público,
ficaram arquivadas em gavetas. Sua parceria com Carmem Portinho, então engenheira da
Secretaria Geral de Viação, Trabalho e Obras e adepta incondicional dos conceitos
racionalistas que orientavam a produção da arquitetura moderna, foi muito frutífera,
garantindo a execução de sua obra mais significativa: o Conjunto Pedregulho. Carmem
Portinho, expansiva e política no trato dos projetos públicos, complementava a persona-
lidade introspectiva de Reidy e dessa combinação foram garantidas as construções
integrais do projeto de Pedregulho, do MAM carioca, e das casas de Jacarepaguá e Itaipava.
É Importante ressaltar, para compreendermos o desafio que sempre foi
convencer a aplicação dos conceitos modernos na arquitetura pública, que Carmem
Portinho,com a finalidade de divulgar a arquitetura moderna, fundou a Revista da Diretoria
de Engenharia da Prefeitura do Distrito Federal (PDF) em 1932, em que foram publicados
projetos modernos de relevância, com o intuito de difundir a produção moderna
arquitetônica por todo o país. A própria Carmem Portinho redigiu alguns artigos, entre os
quais se destacou o artigo difundindo a moderna arquitetura construída na Holanda.
Alguns projetos de Reidy, engavetados, significativos pelas soluções apresentadas, foram
registrados nessa revista. É também nessa revista que as primeiras escolas modernas do
arquiteto Enéas Silva, construídas na gestão de Anísio Teixeira, foram publicadas.
ALBERGUE DA BOA VONTADE
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
121
“Para este grupo de profissionais, Reidy incluído, tratava-se de uma fase
heróica, quase de uma luta militante, e a PDF, sigla pela qual a revista passou a
ser conhecida, tornou-se uma espécie de trincheira, órgão oficioso deste
movimento” (in Bonduki, 2000).
O convite a Reidy para integrar, em 1936, o grupo de arquitetos com a
finalidade de desenvolver o moderno projeto para o edifício do Ministério da Educação
e Saúde ao lado de Oscar Niemeyer, Lúcio Costa, Carlos Leão e Hernani Vasconcellos
e a coordenação de Le Corbusier, representou um ponto de inflexão em sua carreira,
no que tange a importância do resultado formal que, até então, era preponderan-
temente conseqüência do arranjo funcional de seus projetos.
Prova disso, foi uma das versões para o edifício-sede da prefeitura do Rio de
Janeiro que, após o contato com Le Corbusier, na equipe do Ministério da Educação e
Saúde, apresentou uma solução não só muito bem resolvida quanto às questões
funcionais mas também inovadora quanto às questões plásticas.
“A observação dos três projetos realizados por Reidy para o edifício-sede
da prefeitura do Distrito Federal atesta o impacto da experiência da equipe do
ministério e do contato pessoal com Le Corbusier sobre a linguagem do
arquiteto. Na terceira solução, desenvolvida em 1938, Reidy superou a unifor-
midade e monotonia plástica presente até então em seus projetos, e propôs um
novo agenciamento do espaço, com volumes hierarquizados e diferenciados.
Além disso, introduziu uma fachada totalmente protegida com brise-soleil, como
no projeto do ministério. Abria-se uma nova fase para o trabalho de Reidy” (in
Bonduki, 2000).
CONJUNTO PEDREGULHO – REIDY
122
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
A obra mais emblemática de Reidy, que o projetou para o mundo, foi sem
dúvida o Conjunto Pedregulho, quer pelo resultado social alcançado, quer pelo seu
surpreendente resultado formal. A expressão plástica típica de nossa produção
moderna, cujos primeiros ensaios remetem aos edifícios projetados por Niemeyer, foi
muito criticada por estrangeiros, mas essa mesma crítica, diante do resultado social
representado pelo Projeto de Pedregulho, abrandou esse julgamento.
A análise do projeto do conjunto de Pedregulho revela o modo “reidyano” de
projetar e que, segundo depoimento do arquiteto Roberto Tibau, integrante do 2º e
3º Convênios Escolares serviu de referência para o desenvolvimento dos projetos da
equipe no município paulistano.
O arquiteto Francisco Bolonha, colaborador constante da equipe de Reidy
durante vários anos, descreveu para o livro organizado por Nabil Bonduki, publicado
em 2000, o modo “reidyano” de projetar:
“(...) ao reconhecer, de início o sítio escolhido, exigia completo levantamento
topográfico, a orientação e o programa a obedecer. Revisitava o local,
familiarizando-se com o ambiente, anotando a circulação de pedestres e de
veículos, sem, contudo, desprezar a paisagem urbana, que reputava de excepcional
importância. Era a preocupação da ‘heterogeneidade quanto ao homem’. De posse
dos primeiros dados, silencioso, debruçava-se na prancheta a fim de, com
obstinação, estudar o problema e esquematizar a solução. Desenhava e refazia até
concluir a elaboração de suas idéias. Ansiava pelo perfeito funcionamento do
objeto, o que levava a acurado estudo da infra-estrutura, da superestrutura e de
todas as instalações. A priori, o essencial era o dimensionamento dos pilares, vigas
e lajes, assim como o comportamento das instalações para não ver lesado o
conceito do sistema estrutural: atingia-se, então, a homogeneidade quanto à
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
123
‘operação do pensamento’. Reidy assessorava-se de excelentes engenheiros
especialistas, discutindo a forma mais racional e eficiente para a condução do
empreendimento: ‘quanto aos movimentos virtuais´.
Estabelecidos, destarte, todos os elementos, Reidy iniciava a fase de
anteprojeto, tarefa assaz demorada, porquanto já não era o poeta a arquitetar mas
o arquiteto a burilar o objeto de sua paixão. (...) Reidy analisava seu trabalho
através de levantamentos, cortes, planos, perspectivas. (...) essa fase do trabalho
apresentava-a sempre desenhada, cotada, com indicação das áreas, estrutura e
passagens das instalações e, por vezes, do mobiliário e acabamento do edifício.
Aprovado o anteprojeto pelo cliente, Reidy se dispunha à “fase definitiva,
cujo desenvolvimento confiava a seus colaboradores. Na conclusão do projeto,
Reidy, reunido com seus engenheiros, discutia até a exaustão” (Bolonha, 1985)
O respeito à paisagem com sua topografia, clima e ventos, a leitura porme-
norizada das necessidades a serem atendidas na formatação de criterioso programa
arquitetônico, a perfeita correspondência entre a arquitetura e os sistemas
construtivos e uma coerente coordenação entre vários e diferentes profissionais, a
fim de alcançar o melhor resultado quanto às questões técnicas, fizeram de Reidy
referência nacional para os arquitetos. Reidy foi poeta e técnico, arquiteto e
humanista em sua carreira ao colocar o ser humano como centro de suas preocu-
pações, através de seu racional entendimento.
“A arquitetura existe em função do homem. Ele é o centro de todas as
preocupações e o módulo a que se relacionam todas as medidas. Seu passo
determina relações de tempo e de espaço nos locais onde vivemos. Suas
necessidades físicas ou espirituais geram os programas a que os arquitetos devem
atender... (Reidy, 1955)
ESCOLA INTEGRANTE DO PROJETO PEDREGULHO – REIDY
MAQUETE MOSTRA ESCOLA E CONJUNTO ESPORTIVO
ESCOLA RURAL ALBERTO TORRES, RECIFE, 1935 – LUÍS NUNES
124
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
2.3.2 O EXEMPLO DO ARQUITETO LÚIS NUNES NA GESTÃO
DA DIRETORIA DE ARQUITETURA E CONSTRUÇÃO DO ESTADO
DE PERNAMBUCO
O arquiteto Luís Nunes, ao assumir, em 1934, a Diretoria de Arquitetura e
Construção do estado de Pernambuco, criou um referencial moderno para o
desenvolvimento de projetos em uma repartição pública, para a construção de edifícios
institucionais naquele Estado e que serviu de exemplo para todo o país. Sua
contratação deveu-se à iniciativa do governo de Carlos de Lima Cavalcanti que tinha
como objetivo a modernização da máquina administrativa em uma região liderada pela
mentalidade oligárquica dos usineiros de cana-de-açúcar.
“É também meu desejo que todos compreendam sem a menor dúvida que
estas nossas realizações, cheias do espírito contemporâneo, isentas de qualquer
influência individualista, que foram até agora dirigidas por um critério de absoluta
honestidade profissional, capaz de conduzir a uma técnica mais evoluída, mais
perfeita e, portanto, mais eficiente, ficará durante algum tempo ainda, marcando
em Pernambuco uma época em que, como nos centros grandes e civilizados, a
arquitetura é uma preocupação administrativa, uma demonstração de cultura e
espírito, muita cousa de humano e social” (Luís Nunes, 1935)
O arquiteto Luís Nunes, formado pela Escola Nacional de Belas Artes, foi um
dos líderes estudantis na greve deflagrada a favor de Lúcio Costa, em sua tentativa de
introduzir os ensinamentos da arquitetura moderna naquela instituição. Assim, ao
assumir em Recife, o cargo de diretor de um departamento público de arquitetura e
LEPROSÁRIO DE MURUEIRA (PE), 1936 – LUÍS NUNES
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
125
construção, pôde colocar em prática os ideais modernos que o moviam.
Luís Nunes, apesar das dificuldades em trabalhar em um órgão público
coordenou seu grupo de trabalho de forma inovadora ao conseguir integrar as
diferentes áreas do conhecimento ligadas à ação do projetar (uma equipe integrada
por engenheiros, técnicos e artesãos) e por conseqüência envolvidas com as questões
construtivas. Adepto da escola internacional de arquitetura, sobretudo inspirado por
Gropius, imprimiu no Recife uma arquitetura racional e contida.
“Sua originalidade tornou-se evidente desde os primeiros projetos, onde
demonstrou que a padronização em nada se opunha à expressão arquitetônica e
que uma construção podia ser econômica e funcional, oferecendo, ao mesmo
tempo, soluções técnicas e formais audaciosas. (in Bruand, 2003)
O estado de Pernambuco, bastante atrasado em sua indústria da construção
civil, obrigou Luis Nunes a adaptar soluções àquela realidade. Soluções inspiradas em
referências da arquitetura internacional como Gropius e Le Corbusier, os quais
admirava, só puderam se concretizar com a adequação dessas soluções projetuais à sua
realidade, em resposta às questões sociais que visava a atender.
Exemplo de sua criatividade e capacidade de adaptação é a aplicação do
cobogó, elemento construtivo largamente usado na arquitetura moderna brasileira e
que teve nos edifícios do Recife sua primeira utilização. A aplicação do cobogó foi
inventada na administração de Luís Nunes ao inverter-se a posição do bloco já utilizado
para construir paredes; quando invertida, sua posição permitia o sombreamento das
fachadas sem comprometer a ventilação necessária.
HOSPITAL DA BRIGADA MILITAR, RECIFE, 1935-1937 – LUÍS NUNES
126
CAP. 2 CONTEXTOS E REFERÊNCIAS
“O movimento do Recife foi um episódio breve, mas não se pode negar sua
importância. Extremamente dinâmico, representou significativo esforço de implantação,
profunda e racional, da nova arquitetura no Brasil. Perfeitamente homogênea, em
conseqüência da personalidade dominante de Luís Nunes, tomou o caminho de uma
síntese entre o caráter universal dos princípios básicos e a expressão regional que lhe podia
ser conferida. (in Bruand, 2001)
A racionalidade necessária à produção dos edifícios públicos, aliada ao claro
desejo do uso dos materiais “in natura”, mostrou-se expressivamente na composição da
textura de seus planos e na volumetria dos edifícios e exibiu sua diferença em relação
à produção dos arquitetos cariocas. As equipes interdisciplinares, que Luis Nunes cons-
tituiu, resultaram na apresentação para o cenário da arquitetura nacional de profissionais
como o paisagista Burle Marx e o engenheiro e poeta Joaquim Cardozo.
Podemos concluir, a partir desses dois grandes exemplos que a década de 30
funcionou como uma incubadeira de idéias e de profissionais que iriam construir e
inspirar obras de destaque nas décadas de 40 e 50. Assim, podemos ver que a arqui-
tetura moderna, paulatinamente, criou referências brasileiras e passou a ocupar
posição central no desenvolvimento da construção de edifícios públicos no Brasil.
127
CAPÍTULO 3
A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
128
129
“Com efeito, pela sua nova arquitetura, o Brasil vem participando de um espírito de
coragem e de saudável aventura que não anima nenhum outro setor da vida nacional,
embora outro não devesse ser o espírito da civilização que se deveria implantar nas
amplitudes vazias e promissoras deste continente. O amor ao adquirido e ao privilégio – hoje
conquistado repentinamente – um exasperante senso de segurança e um trágico horror ao
risco, aliados, à coragem puramente passiva de tudo suportar, fazem de nosso país a mais
palpitante contradição. (...) Um pequeno grupo, entretanto, de arquitetos e engenheiros salva
o espírito brasileiro, com essa arquitetura moderna que é, antes de tudo, um ato de confiança
no país, no gênio de seu povo e no progresso do conhecimento humano.
Todos nós que sonhamos um estado de entusiasmo para a grande aventura de
construir nacionalidade, temos nesse movimento da arquitetura brasileira, uma pequena
amostra do que poderíamos ser (...)” (in Anísio Teixeira, em “Um presságio de progresso”,
revista Habitat nº. 4, São Paulo, set-dez de 1951)
130
131
3.1 A EQUIPE, O LEVANTAMENTO DA SITUAÇÃO DO ENSINO NA CIDADE
PAULISTANA E AS CONSEQUENTES POSTURAS INICIAIS ADOTADAS
132
“Não à escola-monumento, escola fortim que infunde respeito e que
aparece às tenras fantasias das crianças como algo de tenebroso, de áulico e até
de inimigo. (...) As escolas do convênio escolar são amplas, horizontais, espaçosas
no meio de jardins, são um convite amigável para as nossas crianças...”. (in Hélio
Duarte, revista Habitat nº. 4, São Paulo, set-dez de 1951, pág. 17)
As 52 novas escolas construídas durante a vigência do 2º Convênio Escolar,
objeto de estudo desta dissertação, revela, no seu conjunto, uma unidade no trata-
mento dos volumes e de sua implantação, que nos chama a atenção. A arquitetura
que se revelou nesses novos prédios escolares inaugurou, na construção de edifícios
públicos, a linguagem moderna como forma arquitetônica, adotada em grande escala
na cidade de São Paulo, em substituição à arquitetura eclética e neoclássica que até
então caracterizava os edifícios institucionais.
A linguagem moderna adotada para esses novos edifícios foi conseqüência da
hegemonia exercida pela escola moderna carioca na produção arquitetônica, nesse pe-
ríodo, em todo o país, conforme colocado no capítulo anterior, e reforçada pela formação
dos arquitetos cariocas que fizeram parte da equipe da subcomissão de planejamento do
2º Convênio Escolar:Hélio de Queiroz Duarte, Roberto Goulart Tibau e Eduardo Corona
que, graduados pela escola de Belas Artes do Rio de Janeiro, carregaram a herança de
Lúcio Costa em sua breve e transformadora passagem por aquela instituição.
No início do 2º Convênio Escolar, a partir de 1949, juntaram-se ao arquiteto
carioca Hélio Duarte, então designado diretor da subcomissão de planejamento, os
paulistas: Oswaldo Corrêa Gonçalves, engenheiro-arquiteto e Ernest Robert de
Carvalho Mange, engenheiro, ambos formados pela Escola Politécnica da Univer-
sidade de São Paulo.
ESCOLA DOMINGOS FAUSTINO SARMIENTO – PROJETO DE ERNEST MANGE
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
133
RESIDÊNCIA TAQUES BITENCOURT (1949) – VILANOVA ARTIGAS
E CARLOS CASCALDI
134
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
É dessa correspondência entre a plástica consagrada por Niemeyer e Reidy,
trazida pelos arquitetos cariocas, e a precisão da técnica construtiva, na preocupação
que Oswaldo Corrêa Gonçalves e Ernesto Mange carregavam em função de sua
formação pela Escola Politécnica, que assistiremos a um ensaio da “escola paulista de
arquitetura”, revelada anos depois.
Cabe ressaltar que consagrados arquitetos paulistas como Vilanova Artigas
e Rino Levi, em meados da década de 40, produziam de acordo com os postulados
da escola moderna carioca, “corbusIana” por princípio, aplicando como solução
arquitetônica a planta-livre, os volumes prismáticos que se articulam por adição de
funções, o pilotis, os brise-soleis e as coberturas “asa de borboleta”.
RESIDÊNCIA CZAPSKI (1949) – VILANOVA ARTIGAS
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
135
3.1.1 OS TRABALHOS INICIAIS DO 2º CONVÊNIO ESCOLAR
A comissão executiva do 2º Convênio Escolar, nos três primeiros meses de
trabalho, percorreu a cidade com uma pequena equipe, constituída de três enge-
nheiros e um arquiteto, e pôde verificar in loco a calamitosa situação física das escolas
existentes (108 no total). O engenheiro José Amadei, presidente dessa comissão,
relatou em conferências públicas algumas das situações encontradas:
“Crianças em porões, em garages, em salas acanhadas comportando
normalmente apenas a terça parte dos alunos nela amontoados, salas de prédios
novos com a lotação quase dobrada, três, quatro e até seis períodos de aulas, como
no G.E. de Vila Guarani, ausência de ar e de luz, e de pátios de recreação,
ambientes de ar viciado, muitas vezes uma só instalação sanitária para centenas
de crianças de ambos os sexos, água de poços abertos junto às fossas negras,
carteiras de caixão de querosene ou de cebola, bancos de tábuas apoiadas sobre
pilhas de tijolos, médicos atendendo crianças na rua (G.E. Vila Leopoldina).
Dezenas de milhares de crianças mal nutridas, percorrendo às vezes
distâncias enormes, de alguns quilômetros para serem alojadas em pardieiros,
necessitando às vezes trazer consigo um vidro com água para matar a sede,
alimentadas e vestidas com os minguados recursos da Caixa escolar socorrida com
a contribuição de professores particulares. (trecho de palestra do Engenheiro José
Amadei, em palestra proferida em outubro de 1949, na Biblioteca Municipal)
Ao conhecimento da situação real, feito em tão pouco tempo, devido à
urgência de se colocar em prática a construção das escolas, somaram-se as dificuldades
na coleta de dados estatísticos que ajudassem no dimensionamento da demanda de
136
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
estudantes a ser atendida: a comissão trabalhou com os dados de 1940, projetados
pelo departamento de estatística da Prefeitura para o ano de 1947. Dessa maneira,
através de projeções, pôde-se estimar o crescimento da população em idade escolar
e, assim, o número necessário de salas de aula a serem construídas.
A equipe de planejamento, em uma postura claramente científica, traçou,
para o início dos trabalhos, apesar das dificuldades, critérios técnicos para o
planejamento da distribuição das escolas nos bairros e para o início dos projetos
arquitetônicos.
Na leitura dos dados, constatou-se um déficit de 1.200 salas de aula, para
uma população de 48.000 crianças. A comissão dimensionou cada classe com 40
alunos para escolas com, no máximo, 12 salas de aula. Assim, seria necessária a
construção de 100 novas escolas, no período de 5 anos. Para tanto, foi traçado um
plano qüinqüenal, prevendo-se a construção de 20 escolas por ano, com a
finalidade de zerar o déficit de salas de aulas até o ano de 1954, em comemoração
ao IV Centenário de fundação da cidade de São Paulo. Esse plano qüinqüenal
previu também a construção, por ano, de 2 bibliotecas infantis, de 2 dispensários
médicos escolares e de 1 ginásio e incluiu dotações outras destinadas à manu-
tenção de parques infantis e instituições auxiliares de ensino.
Apesar do número considerável de edifícios a serem construídos, essa
quantidade estava aquém das reais necessidades, uma vez que o regime de tresdo-
bramento ainda persistia, ou seja, as escolas, depois de inauguradas, atenderiam a
três classes no período diurno, por sala de aula, uma situação condenada por Anísio
Teixeira, devido ao reduzido número de horas que a criança passaria dentro do
ambiente escolar.
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
137
Para o cumprimento do plano qüinqüenal, o engenheiro José Amadei confiou
ao arquiteto Hélio Duarte a chefia da subcomissão de planejamento. O arquiteto
Hélio Duarte havia recém-chegado da Bahia, onde trabalhara com o educador Anísio
Teixeira no projeto de implantação do Centro Educacional Carneiro Ribeiro –
conjunto de escolas-classe e escolas-parque – o mais ambicioso projeto do educador
Anísio Teixeira para a inclusão da criança pobre no sistema educacional baiano.
3.1.2 O EMBASAMENTO PEDAGÓGICO APLICADO ÀS ESCOLAS
DO 2º CONVÊNIO ESCOLAR
Para a compreensão do embasamento pedagógico aplicado por Hélio
Duarte nas escolas do 2º Convênio Escolar, é de fundamental importância ter
conhecimento dos conceitos aprendidos com o educador Anísio Teixeira na
concepção do projeto do Centro Educacional Carneiro Ribeiro ao lado do arquiteto
Diógenes Rebouças.
O Centro Educacional Carneiro Ribeiro representou a implantação do
modelo ideal de escola pública, denominado escola-parque e escola-classe, projeto
concebido por Anísio Teixeira na década de 30, como vimos no Capitulo I. Imple-
mentar junto ao sistema educacional baiano esse modelo de escola, com o
oferecimento de uma estrutura de excelência, através de um completo programa
arquitetônico, cuja a finalidade era atender a todas as carências sociais do público
infanto-juvenil que morava na pobre periferia da cidade de Salvador, Bahia, rendeu a
Anísio premiações concedidas pela Unesco, e o reconhecimento internacional de
138
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
exemplo no atendimento à educação completa e de qualidade. O Centro
Educacional Carneiro Ribeiro fazia parte de um complexo de escolas-classe e
escolas-parque a serem distribuídas estrategicamente pela periferia de Salvador
(cada 4 escolas-classe seriam complementadas com 1 escola parque). Lamentavel-
mente, a proposta foi reduzida somente a esse conjunto no bairro da Liberdade, que
foi finalizado quase 20 anos após o início de suas obras, já na década de 70.
DISTRIBUIÇÃO DOS 7 CONJUNTOS INICIALMENTE PREVISTOS
PARA O MUNICÍPIO DE SALVADOR
CONJUNTO DA LIBERDADE – ESQUEMA DA IMPLANTAÇÃO
DO CONJUNTO ESCOLAS-CLASSE ESCOLAS-PARQUE NA
CONFIGURAÇÃO TOPOGRÁFICA LOCAL
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
139
Para o educador Anísio Teixeira, a educação era uma questão de estratégia
nacional a ser enfrentada com os maiores recursos possíveis. Defendia que a
qualidade na educação não podia se submeter às questões meramente quantitativas,
conforme nos relatou Hélio Duarte, em publicação da Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAUUSP) de 1973:
“Ao invés disso, tudo simplificamos e tudo aceitamos na ilusão de que
qualquer cousa é sempre melhor do que nada, o que seria verdade se educação
não fosse antes qualidade do que quantidade. Não importa quanta educação, mas
qual a educação que está a criança recebendo. Se a simplificação dos meios e a
pobreza dos mestres levam a escola a criança a ser inexata, impontual, ineficiente,
estúpida, mistificadora, irreal e falsa, está claro que ela não está recebendo, pelo
menos, um pouco de educação, mas péssima educação. O que se supunha ser
apenas pouco é pouco e péssimo, e somente menos péssimo porque pouco. Se
pelo mesmo processo formos com a educação até ao ensino superior, então
teremos muito e péssimo.
Inspirado no pensamento de Rui Barbosa, Anísio Teixeira afirmava:
“É custoso e caro porque são custosos e caros os objetivos que visa. Não se
pode fazer educação barata – como não se pode fazer guerra barata. Se é a nossa
defesa que estamos construindo, o seu preço nunca será demasiado caro, pois não
há preço para a sobrevivência. (in Hélio Duarte, apostila FAUUSP, 1973, pág. 26)
A educadora Ester Buffa, sobre a escola de ensino integral e a posição de
Anísio Teixeira, escreveu:
140
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
“Anísio Teixeira criticava a escola existente reduzida a objetivos
intelectualistas, a um ensino verbalista, a um ensino que classifica (diríamos hoje, um
ensino que distingue), destinada às crianças das elites e das camadas médias. Além
disso, a presença dos pobres na escola primária impunha à organização escolar
problemas que era preciso resolver: irregularidades no desenvolvimento orgânico dos
alunos, em suas reações emocionais, nas dificuldades de socialização e no
estranhamento da cultura escrita acarretando repetência e evasão.A escola primária
só poderia então ser uma escola voltada à educação integral: física, psicológica, moral,
intelectual. O edifício escolar exigia, assim, um novo programa arquitetônico, distinto
daquele que formara a concepção dos grupos escolares do início do século.
Para Anísio Teixeira, o governo paulista, no intuito de democratizar a escola
primária, mas sem os necessários recursos, acabou por simplificá-la ao máximo,
reduzindo-a à simples função de alfabetizadora:
É Anísio Teixeira que afirma: a simplificação teve força para congestionar as
escolas primárias com os turnos sucessivos de alunos, reduzindo a educação
primária não só aos três anos escolares de Washington Luiz, mas aos três anos de
meios-dias, ou seja, ano e meio e até, na Grande São Paulo, aos três anos de terço
de dia, o que equivale realmente a um ano de vida escolar.
O próprio Anísio Teixeira, no relato abaixo, explica-nos a concepção
idealista contida no Centro Educacional Carneiro Ribeiro e sua contraposição ao
modelo adotado no Estado de São Paulo naquele momento. Apesar de longa, vale
a pena transcrever a citação completa que carrega o idealismo e a fé, características
do educador:
“... o corpo de alunos se matriculava nas quatro escolas-classe, onde se
organizariam pelas classes e graus convencionais de cada escola e passariam
metade do período escolar completo de 9 horas, dividido em 4-1-4 horas. A outra
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
141
metade do tempo decorreria na escola-parque, de organização diversa da escola
tradicional, agrupados os alunos, dominantemente pela idade e tipo de aptidões,
em grupos já não mais de quarenta, mas de vinte, que deveriam, durante a
semana, participar de atividades de trabalho, atividades de educação física,
atividades sociais, atividades artísticas e atividades de organização e biblioteca.
Cada manhã, metade dos alunos estaria na escola-parque e a outra metade
distribuída pelas quatro escolas-classe. Ao meio dia, os alunos da manhã das
escolas-classe e se dirigiriam para a escola parque, onde almoçariam,
descansariam em atividades de recreio e depois, se distribuiriam, de acordo com o
programa, pelas diferentes atividades da escola-parque. E os alunos que haviam
passado a manhã na escola-parque iriam, por sua vez, almoçar nas escolas-classe
se distribuiriam a seguir pelas suas atividades escolares. Cada aluno pertencia,
deste modo, a seu grupo da escola-classe e a outro possível grupo da escola-
parque. Como, ao todo, movimentam-se, em cada dia, por vários lugares, primeiro
da escola-classe para a escola-parque e, depois, nesta, para o pavilhão de
trabalhos, o ginásio de educação física, o pavilhão de atividades sociais, o teatro, a
biblioteca e o restaurante, compreende-se que não faltaria complexidade a essa
movimentação de dois mil alunos de cada vez para atividades diversas e em locais
diferentes. O plano de funcionamento, de horários e de movimentação das crianças,
então elaborado, mostrava a perfeita exeqüibilidade do programa e dava ensejo a
que se pudesse apreciar os benefícios educativos da estrutura prevista. A
organização da escola, pela forma desejada, daria ao aluno a oportunidade de
participar, como membro da comunidade escolar, de um conjunto rico e
diversificado de experiências, em que sentiria, o estudante da escola-classe, o
trabalhador, nas oficinas de atividades industriais, o cidadão, nas atividades sociais,
o esportista, no ginásio, o artista, no teatro e nas demais atividades de arte pois
todas essas atividades podiam e deviam ser desenvolvidas partindo da experiência
atual das crianças para os planejamentos elaborados com sua plena participação
e depois executadas por elas próprias.
VISTA GERAL DO CENTRO CARNEIRO RIBEIRO
142
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
ESQUEMA DO CENTRO EDUCACIONAL CARNEIRO RIBEIRO
Seriam experiências educativas, pelas quais as crianças iriam adquirir
hábitos de observação, desenvolver a capacidade de imaginar e ter idéias,
examinar como poderiam ser executadas e executar o projeto, ganhando, assim,
habilitação para a ação inteligente e eficiente em sua vida atual, a projetar-se para
o futuro. Se a escola-classe mantinha, em essência, a antiga escola convencional, as
condições de trabalho da escola-parque iriam facilitar sobremodo a aplicação dos
melhores princípios da educação moderna”
VIZINHANÇA POBRE DO CENTRO CARNEIRO RIBEIRO
BIBLIOTECA DO CENTRO CARNEIRO RIBEIRO
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
143
REFEITÓRIO DO CENTRO CARNEIRO RIBEIRO
O Centro Educacional Carneiro Ribeiro através da implantação do modelo
escola-classe e escola-parque foi, na opinião de Anísio Teixeira, a primeira
demonstração do concreto modelo que tinha a oferecer na passagem da escola de
poucos para a escola de todos.
A experiência de Salvador – BA, trazida por Hélio Duarte em sua
convivência com Anísio Teixeira, reflete a pedagogia aprendida com o educador
americano John Dewey que defendia a educação como “processo de reconstrução
e reorganização da experiência”; assim, o problema da criança, conhecido e
destrinchado, é que dá condições ao educador de buscar soluções para os
problemas relacionados à sua educação; é na vida do aluno e na satisfação de suas
necessidades que encontraremos matéria-prima para educá-lo.
Enquanto na Bahia as mudanças na concepção das novas escolas passaram
por uma revolução no sistema de ensino, em São Paulo as mudanças deram-se no
modo de produzir o projeto arquitetônico da escola e no papel que ela que desem-
penharia nos bairros em que seria implantada.
Hélio Duarte, devido ao fato de ter compartilhado de tão perto as idéias
de Anísio Teixeira, e de sua grande experiência na condução de projetos nas áreas
da saúde e educação, fez de sua indicação o nome adequado para o desafio pro-
posto para a equipe do 2º Convênio Escolar em São Paulo.
144
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
3.1.3 CAUSAS PARA O SUCESSO DO 2º CONVÊNIO ESCOLAR
O 2º Convênio Escolar foi antecedido pelo fracasso do 1º Convênio Escolar,
acordado em 1943 e finalizado em 1948, resultando na construção de somente três
edifícios escolares, deixando, entretanto, no fundo reservado à educação, um grande
volume de dinheiro a ser investido na construção dos edifícios escolares.
As causas que levaram ao resultado positivo deste 2º Convênio, em relação
aos demais, deveram-se à soma de inúmeros fatores, entre os quais, merecem
destaque:
— o volume de recursos disponíveis para a específica construção de edifícios
destinados, direta ou indiretamente, à educação, de acordo com o preconizado pelo
2º Convênio, no qual a contribuição Municipal dobrou de 10% para 20% de acordo
com o estabelecido pela Constituição Federal de 1946;
— o parque industrial paulista cresceu excepcionalmente ano a ano gerando uma
receita generosa para aplicação na construção de novos edifícios escolares;
— a formação de uma Comissão Executiva, em 1948, destinada exclusivamente à
viabilização do plano para a construção de 100 escolas e equipamentos de apoio
ao ensino primário;
— o binômio arquitetura moderna e projetos pedagógicos escolanovistas estarem
caminhando juntos, desde a década de 30, a favor da renovação da escola pública;
— o reconhecimento de que a arquitetura moderna, fruto do pensamento técnico-
científico, traria resultados econômicos na produção seriada de edifícios públicos
voltados para a educação, sem abrir mão de uma genuína expressão da cultura
nacional, reconhecida também no cenário internacional;
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
145
— a disponibilidade de um quadro de jovens arquitetos preparados para a produção
de projetos modernos, e formados pela Escola Nacional de Belas Artes;
— o serviço público, naquele momento, representou para alguns jovens arquitetos o
ambiente ideal para a produção da legítima arquitetura moderna, longe das amarras
do especulativo mercado imobiliário, já enraizado nas grandes cidades brasileiras;
— a arquitetura moderna carioca era hegemônica no quadro da produção nacional
de arquitetura;
— os bairros adquiriram importância estratégica nos planos dos políticos que
passaram a enfrentar os pleitos eleitorais para a permanência no poder;
— o grande e crescente déficit de salas de aula, que aumentava exponencialmente
ano a ano, exigindo medidas efetivas das autoridades municipais.
Dessa maneira, a equipe de arquitetura liderada por Hélio Duarte e
respaldada pelo apoio incondicional do Presidente da Comissão Executiva, engenheiro
José Amadei, pôde apresentar com liberdade as propostas escolanovistas inspiradas
em Anísio Teixeira para a composição do programa arquitetônico das escolas e, ao
mesmo tempo, garantir a linguagem moderna carioca como expressão, para a
arquitetura dos novos edifícios escolares.
É fato, também, que os arquitetos modernos gozavam de grande prestígio
junto à burguesia industrial e a classe política, uma vez que a arquitetura moderna,
pelo significado que passou a ter naquele momento, legitimava de certa maneira
seus planos. Para confirmar esse fato, como visto no capítulo 2, temos nesse mesmo
período, Oscar Niemeyer, o mais destacado arquiteto da escola moderna carioca,
sendo contratado para projetar os edifícios do Parque do Ibirapuera. A burguesia
146
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
industrial paulistana visava a colocar a cidade de São Paulo no circuito cultural
nacional e internacional, de acordo com a posição econômica que já ocupava no
cenário mundial daquela década.
3.1.4 ARQUITETURA ESCOLAR EXPERIMENTAL: A CONSTRUÇÃO
DE CONCEITOS A PARTIR DA ESCALA DA CRIANÇA
Hélio Duarte em artigo para a Revista Habitat nº. 04, sobre o início dos
trabalhos da Comissão Executiva, descreveu as preocupações e posturas iniciais da
equipe de projetos para a construção dos novos grupos escolares:
“A nós arquitetos e engenheiros ocorreu-nos perguntar? – Para que
espécies de ensino deveriam ser feitos os grupos? Quais os rumos da educação?
Qual o meio subjetivo adequado a uma melhor integração da psique infantil?
Qual o ambiente físico mais propício? Essas nossas perguntas ficaram sem
respostas. Procuramos então contornar o problema imaginando um novo tipo de
grupo que mais se aproximasse da mentalidade infantil. É possível que um
ambiente modernizado imponha, de certo modo, por si mesmo, uma reforma de
Ensino. Resta-nos, ao menos, essa esperança. Indagações sobre o programa
escolar, sobre a vida ativa de um grupo, pesquisas sobre os novos métodos de
ensino, consultas às boas fontes da psicologia infantil, tudo foi sumariamente
passado em revista, comentado e discutido.Trabalho de monta apenas iniciado e
que figura como condição indispensável e como complemento determinativo
para um bom projeto.
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
147
Para Hélio Duarte e equipe, foi destinado às crianças, o modelo de escola a
ser criado: para suas medidas, suas sensações e sua psique. Entretanto, os arquitetos
só poderiam atender a essa prioridade, à medida que obtivessem dados e respostas
para as questões educacionais pertinentes à esse universo, pois acreditava-se, como já
vimos, que o espaço físico a ser projetado era um dos meios para que o projeto
pedagógico escolanovista se realizasse.
Hélio Duarte lamentou que o tempo fosse tão curto para atender à
construção de número tão grande de escolas e que sua equipe não pudesse ter um
conhecimento mais aprofundado das questões educacionais que já eram discutidas
pelos educadores e filósofos da educação no Brasil, desde a década de 30.
148
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
Reuniões com delegados de ensino e autoridades ligadas à educação
municipal foram feitas à exaustão, não se chegando, entretanto, aos resultados
esperados; mas mesmo diante dessa dificuldade, a comissão do convênio chegou às
primeiras conceituações que nortearam o início dos projetos arquitetônicos:
— é para a criança que a escola deverá ser projetada;
— a primeira questão a ser resolvida passa pela quantidade de edifícios a serem
construídos; assim, as definições de projeto devem passar, necessariamente, pelas
questões econômicas;
— a natureza deverá fazer parte do desenho das escolas, de maneira a integrar-se
aos ambientes construídos para a criança;
— os funcionários da escola também deverão ser considerados no dimensiona-
mento dos espaços com “conforto simples, mas efetivo”;
— o mobiliário deverá ser padronizado e projetado, considerando-se as diferentes
medidas das crianças em suas várias faixas etárias;
— os espaços deverão privilegiar a flexibilidade de uso, de acordo com a dinâmica
de transformações pelas quais passam os projetos pedagógicos; não devem ser
“recintos catalogados e fechados, como peças em um museu de cera”;
— os espaços deverão ser desenhados, considerando-se a mobilidade infantil, seus
passos, acessos verticais, distâncias a serem percorridas, correrias e integração entre
os espaços livres e construídos;
— domínio das técnicas e teorias relativas ao conforto auditivo, visual, térmico para
o adequado desenho dos ambientes a serem construídos;
— transição entre o espaço público e o espaço do edifício escolar, de modo a
introduzir os usuários na escala da criança.
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
149
Essas primeiras conceituações não eram fechadas, uma vez que a arquitetura
escolar, devido ao seu comprometimento com o projeto pedagógico escolanovista,
estaria sempre em constante revisão, e assim como área específica da arquitetura seria
experimental, por princípio.
O engenheiro Ernest Robert de Carvalho Mange, membro da equipe de
Hélio Duarte, conclui, acerca do experimentalismo da arquitetura escolar:
1. “Se quase todas as obras de arquitetura são hoje experimentais, esse
caráter acentua-se extraordinariamente em matéria de arquitetura escolar.
2. “Considerando-se a importância e a complexidade do programa
educacional só um trabalho de equipe (arquitetos com a colaboração de
professores, psicólogos, médicos etc), de pesquisa e experimentação poderá
produzir protótipos de real valor.
3. “O mundo civilizado procura intensamente soluções para seus problemas
educacionais, pesquisa sua arquitetura escolar. No Brasil, o problema se põe em
termos dramáticos, pois, quantitativamente, pouco temos com relação ao que
deveríamos ter: praticamente está quase tudo por fazer. É preciso não perder de vista
que devemos fazer muito e bem; resolver o problema em números e em qualidade.
Impõe-se, assim, ao lado das básicas providências que permitam obter os recursos
necessários, a formação das equipes de trabalho, preparadas para a função. Essa é
uma tarefa de arquitetos. (in revista Acrópole nº 197, março de 1955)
ESCOLA PEDRO VOSS – OS PROJETOS DE ERNEST MANGE, ATRAVÉS DE PÁTIOS
INTERNOS, POSSIBILITARAM ILUMINAÇÃO BILATERAL NAS SALAS DE AULA
150
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
3.1.5 RECOMENDAÇÕES TÉCNICAS ADOTADAS PELA EQUIPE
DE HÉLIO DUARTE
A subcomissão de planejamento do 2º Convênio Escolar em seus “Estudos
Técnicos sobre Grupos Escolares”, recomendava para aplicação nos projetos:
Iluminação:a sala de aula deve estar voltada para a face norte, a fim de obter o
máximo de iluminância natural; essa face oferece, também, maior quantidade de calor
no inverno, e o fato de seu oposto ser a face sul, promove ventilação cruzada, uma
vez que os ventos dominantes na cidade são os que incidem a partir do sudeste e
sul. A iluminação bilateral é recomendada pelo convênio.
Ventilação:a ventilação cruzada é recomendada, de modo que haja uma
renovação de ar na sala de aula na ordem de 5 trocas do volume total do ar a cada
1 hora. O caixilho basculante, com aberturas na parte inferior para tomada de ar frio
e saída de ar quente a partir de seu basculante superior, é também recomendado
pelo convênio.
Circulação vertical:a escada, em função da extensão do passo da criança, deve
ter seu espelho e pisada do degrau revistos de 17 cm, para 12,5 cm e de 30 cm para
20 cm, respectivamente, considerando que a criança tem passo de 45 cm contra os
63 cm, em média, de um adulto.
Dimensões e escala dos ambientes voltados à percepção infantil:o engenheiro
Ernest Robert de Carvalho Mange, a respeito da dificuldade de arquitetos adultos
projetarem para a escala da criança, escreveu artigo na revista Acrópole nº 194 de
março de 1955:
ESCOLA BRASÍLIO MACHADO DA VILA MADALENA – ARQUITETO HÉLIO DUARTE
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
151
“Nisso reside talvez uma das maiores dificuldades da arquitetura escolar,
particularmente porque o arquiteto como adulto terá de realizar grande esforço de
acomodação. Como exemplo típico do fator arquitetônico de enorme valor na
ambientação psicológica podemos citar a escala.A escala dos elementos e do todo
da obra deve subordinar-se a este imperativo. Advém daí, dada a extensão dos
programas, uma dificuldade séria. Devemos sempre ter em mente que a avaliação
sensível dos volumes será feita pela criança em função de seu próprio volume.
Assim para uma criança normal de 1,20 m de altura, com relação a um adulto
médio, as sensações dos volumes estarão na relação de 3 para 1.
hc/ha=1,20/1,70 - 0,7 Vc/Va – (0,7)ao cubo = 1/3
hc = altura da criança; ha = altura do adulto; e Vc = volume da criança;
Va = volume do adulto
Essas considerações levam à diminuição das alturas dos compartimentos e
a tratamentos especiais de suas superfícies, visando a harmonizar as dimensões
funcionais dos volumes à escala da criança. Exagerando-se um pouco: principia a
estar bem para a criança quando, começa a ficar ruim para o professor...
Cores: como em todos os outros quesitos técnicos, a equipe de projetos
procurou atender às questões cromáticas das escolas, pesquisando várias e diferentes
teorias, com a finalidade de aplicar o que de melhor na área de arquitetura escolar
pudesse atender ao conforto da criança e à melhoria de seu desempenho peda-
gógico. Para o uso de cores é recomendado:
152
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
“Em nossas salas poderíamos concluir optando pelo forro caiado de branco,
por ser o cal fosco e o branco o melhor refletor de luz.
A parede norte poderia ser verde clara ou de cor neutra. Preferivelmente o
branco nos fornece boa reflexão de luz.
A parede sul deve também ser branca para refletir a luz que vem do norte,
principalmente nos dias encobertos.
A parede dos fundos que não é vista pelo aluno deve ainda ser branca pela
mesma razão.
A porta deve ser cinza ou outra cor neutra.
Assim toda a atenção do aluno recairá na parede da frente a qual deve ser
cor de laranja sem mistura.
O quadro tradicionalmente negro deve ser verde escuro pois esta cor
absorve em parte a luz sendo auxiliada pela posição do quadro...
O giz usado deveria também, para atrair a atenção da criança, ser amarelo
pois está provado e adotado nas estradas de rodagem do mundo inteiro, que o
amarelo sobre o preto é mais visível que o preto sobre o branco.
Como iremos usar verde escuro, o amarelo deve ainda ser mais indicado
que o branco e com a vantagem de ser a cor que mais estimula a criança no
elemento que mais deve chamar sua atenção que é o giz.
A cor estimulante disposta em menor área e justamente onde se espera a
atenção do aluno deve ser mais racional do que na sala toda, onde pode ser
elemento de indisciplina.
A equipe de projetos do 2º Convênio Escolar notabilizou-se por fazer uso
da pesquisa a fim de que seus resultados fossem produtos da organização de
informações científicas. O apuro nas definições técnicas resultou em velocidade e
uniformidade de produção, e a padronização foi entendida como algo mais
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
153
complexo, não como mera repetição, mas como escolha do que é mais adequado às
várias situações que levam à sua repetição.
A produção da equipe confirmou uma uniformidade que colocou em dúvida
a autoria de muitos projetos, o que denota que a autoria ficou em segundo plano,
em relação à importância das questões que os unia como equipe.
Hélio Duarte, sobre o papel que cabia à arquitetura, nos diz:
“Como bem podem ter verificado, existe em todas as unidades
apresentadas a mesma ordem de idéias – porque arquitetura é isto mesmo –
ordem, questão de organização – organizar um conjunto de elementos dispô-lo em
ordem, a melhor – uns em relação aos outros, distribuir as respectivas dimensões,
assegurar, com igual esforço, a ligação e a coexistência que deve existir entre eles
a fim de que o conjunto seja, verdadeiramente, uma unidade congruente.
É neste sentido que arquitetura pode ser considerada síntese, não consistindo
somente, em adicionar e justapor elementos separados, mas ligá-los entrosando-os
em função determinada e capaz de constituir uma unidade orgânica efetiva.
154
155
3.2 RACIONALIZAÇÃO NA PRODUÇÃO SERIADA DE PROJETOS ECONÔMICOS,
IMPLANTAÇÃO E PROGRAMA ARQUITETÔNICO DOS NOVOS EDIFÍCIOS PARA A
EDUCAÇÃO: PRAÇAS DE SERVIÇOS PÚBLICOS NOS BAIRROS PAULISTANOS
156
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
157
O atendimento ao plano qüinqüenal para a construção de 20 escolas por
ano orientou a dinâmica dos trabalhos da Subdivisão de Planejamento da Comissão
Executiva. Para tanto, organizou-se uma linha de produção de projetos para edifícios
escolares sem repeti-los como edifícios padrão e a padronização aplicou-se no uso
de componentes construtivos e na definição de três blocos funcionais que,
articulados em função das diferentes implantações, respondiam às variáveis dos
terrenos escolhidos ou disponibilizados para suas construções.
A necessária produção em série e a racionalização da produção dos pro-
jetos, propostas por Hélio Duarte, partiram, em linhas gerais, dos seguintes
pressupostos, conforme nos revelou a análise dos 52 projetos produzidos pelo 2º
Convênio Escolar:
— compartimentação das escolas em três blocos funcionais: bloco de ensino, bloco
administrativo e bloco de recreação, com a repetição de um mesmo programa
arquitetônico básico (das 52 escolas construídas, 45 escolas atenderam ao mesmo
programa com pequenas variações e 7 escolas contemplaram programas mais
complexos e específicos, como escola vocacional, escola rural, escola para “aulas ao
ar livre”, escolas com ambientes como auditório, equipamentos esportivos com
ginásios e piscinas, oficinas industriais e salas específicas para deficientes mentais);
— repetição do mesmo projeto em casos muito específicos, onde a topografia e a
insolação permitissem (o engenheiro Ernest Mange usou a mesma volumetria em
diferentes situações topográficas tendo como resultando edifícios com distribuição
de ambientes variada; Hélio Duarte usou o mesmo projeto no Bairro da Lapa e
em Indianópolis);
— repetição dos mesmos blocos funcionais em arranjos que se diferenciavam a
158
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
partir de sua topografia e insolação (ver projetos ao final deste capítulo);
— elaboração de componentes construtivos; muitos projetos apresentavam as
mesmas pranchas com os detalhes construtivos que se repetiam;
— utilização de soluções construtivas, racionais e econômicas, como a ventilação
cruzada, resolvida através de tubos de fibrocimento embutidos nas paredes dos
corredores das salas de aula, de planos de vidro estruturados, a partir de elementos
vazados com rebaixos para receber vidros de 3 mm a 4 mm e das coberturas com
telhas de fibrocimento;
— racionalização da construção, com aplicação de arcos pré-moldados para
solucionar o vão de cobertura do recreio coberto;
— aplicação de soluções construtivas de fácil assimilação pelas construtoras;
— trabalho de equipe em um ambiente tal e qual uma linha de produção de fábrica,
onde todos os profissionais trabalham em um salão de produção, sem divisões, com
livre circulação de idéias, dúvidas e soluções; assim, as questões postas e resolvidas
podem ser rapidamente assimiladas nos projetos. O 2º Convênio Escolar produziu
seus projetos como qualquer escritório de projetos, com o diferencial de produzir
unicamente arquitetura pública;
— as questões de conforto da criança – acústico, térmico, de iluminação, ergonô-
mico, deveriam ser justificadas a partir de parâmetros estabelecidos cientificamente.
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
159
3.2.1 O PROGRAMA ARQUITETÔNICO DE 12 SALAS DE AULA
O programa arquitetônico escolanovista adotou o trinômio aprender,
recrear e nutrir, que se repetiu como padrão nas escolas do convênio escolar. Esse
programa proposto sofreu variações, impostas pelo aperfeiçoamento da experiência
acumulada ao longo do tempo. Assim, podemos considerar, a partir da subdivisão da
escola de 12 salas de aula em três blocos funcionais (ensino, recreação e
administração), o seguinte conjunto de ambientes:
— Bloco de ensino: 12 salas de aula (com 48 m
2
), circulação (1m para 100 alunos),
sanitários (1 bacia e 1 mictório por sala masculina e 1,5 bacia por sala feminina),
museu escolar, biblioteca infantil e área para ginástica programada;
— Bloco de recreação: recreio coberto com área de 0,9 m
2
/aluno ou 300 m
2
,
contemplando cinema recreativo com palco para apresentações, vestiários e
sanitários (repete critério já exposto);
— Bloco Administrativo composto por três sub áreas:
a) área de administração propriamente dita, com salas para diretoria (10 m
2
),
secretaria (16 m
2
), arquivo, material escolar (6 m
2
), sala de professores com
biblioteca didática (20 m
2
), almoxarifado e cômodo dos serventes.
b) área de assistência escolar, abrangendo as especialidades: atendimento médico
(10 m
2
), atendimento dentário dentárias (10 m
2
), atendimento social e de
nutrição (nutricionista, cozinha e distribuição de alimentos);
c) zeladoria com apartamento próprio para o(a) zelador(a).
CROQUI DE HÉLIO DUARTE – AS NOVAS RELAÇÕES COM O ESPAÇO EXTERNO E A POSSIBILIDADES DE
ARRANJO DO MOBILIÁRIO
160
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
(Obs.: as áreas discriminadas correspondem às áreas recomendadas pelo
projeto econômico proposto pelo convênio)
O bloco de ensino era constituído, na maioria das vezes, por 2 pavimentos
e salas de aula para 40 alunos cada (com 1,20 m
2
por aluno), formando um retângulo
de 6m x 8m já tradicionalmente encontrado nas escolas públicas desde os primeiros
edifícios escolares construídos no século 20, totalizando 48 m
2
por sala (as 4 salas
das pontas eram maiores para proporcionar arranjos espaciais diferentes da
organização tradicional da sala de aula).
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
161
O bloco de recreação, por sua vez, era composto por recreio coberto em
abóbada estruturada através de elementos pré-moldados de concreto ou madeira,
contendo um palco (houve propostas para que fosse móvel), vestiários e cabines de
projeção. O pilotis foi adotado como recreio coberto em escolas, quando havia
exigüidade de terreno, ou quando a topografia acidentada possibilitava o aprovei-
tamento do desnível ou ainda quando o programa de necessidades mais extenso
exigia área maior de terreno para a construção de edificações de maior porte.
O bloco administrativo, térreo na maioria das escolas, apresentava pequenas
aberturas, uma vez que, por princípios econômicos e de conforto da criança, as
grandes aberturas deveriam estar nas salas de aula.
Sobre o custo dos edifícios, Hélio Duarte argumentava que “a valorização
social da escola como agrupamento unitário e ponto focal de uma comunidade,
levando-a a um uso intensivo, estaria, no mínimo, a duplicar o seu valor de uso e, na
mesma proporção, a reduzir o seu valor de custo”.
O grupo de arquitetos, liderado por Hélio Duarte, apresentou uma versão
econômica para a escola idealizada por Anísio Teixeira e foi, por ele, reconhecida
como escola modelo:
“Possam estes prédios escolares concebidos em juventude, ardentes e
elegantes como potros de raça, impacientes de dinamismo e de amor à vida,
comunicar a educação e, pela educação, a existência brasileira, as suas finas e altas
qualidades de inteligência, coragem e desprendida confiança no futuro. O Brasil
precisa para se realizar de lirismo - que é a capacidade de se esquecer – e de virtude
– que é a capacidade de se superar. A sua arquitetura moderna é uma lição
magnífica dessas duas atitudes redentoras”. (in Anísio Teixeira – Revista Habitat nº 4)
162
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
3.2.2 CONSIDERAÇÃOES COM A CIDADE, O BAIRRO
E O ENTORNO IMEDIATO
A premissa que orientou a construção das escolas do 2º Convênio Escolar
caracterizou a escola como equipamento da comunidade, do bairro onde foi
implantada, e para tanto ficou estabelecido que elas abrangeriam um raio de, no
máximo, 1,5 km, de forma a se tornarem acessíveis a todas as crianças de seu
entorno. Como vimos no Capítulo 2, a cidade crescia desordenadamente em
extensão e por isso edifícios escolares menores, distribuídos de modo a servir a
pequenas comunidades atenderiam de maneira mais coerente esse modelo de
cidade que São Paulo revelava.
A combinação das escolas com os teatros distritais, construídos pelo
convênio, as bibliotecas e os parques infantis fizeram desses conjuntos de edifícios
públicos praças de serviços nos bairros onde foram implantados, e equipamentos
estruturadores nos bairros que cresciam sem planejamento e sem oferta desses
serviços. Exemplo deste resultado encontramos na Escola Pandiá Calógeras que,
junto ao Teatro Arthur de Azevedo na Mooca, configurou-se em uma praça de
serviços públicos.
“Inicialmente na sua condição mais primária, a escola mínima assemelha-
se a uma ameba. É um ser unicelular. Pode ser representado por, apenas, uma
sala de aula. Seu crescimento corre paralelo à satisfação das necessidades
baseadas no aumento da densidade infantil e, assim, vai o organismo, em
processo evolutivo, tramando uma rede de tecidos e se diferenciando em funções
especializadas, até que atingindo o ápice do processo, estacione. Suas linhas de
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
163
influência ficam limitadas, então, a um círculo de raio igual a 1500 m, abrangendo
o máximo das solicitações externas. Ao dar corpo, no entanto, ao organismo,
encontramos incidências físicas que nos levam a soluções as mais diversas no
intuito de harmonizá-las com a programação admitida.A topografia quase sempre
torturada, os ventos nocivos, as proximidades indesejáveis, a orientação magnética
e solar, o panorama; tudo tem que entrar em consideração. (in Hélio
Duarte,1949, Habitat nº 4)
A cidade moderna, a partir do modelo “corbusiano”, rompeu com a quadra
tradicional, que se definia pelo desenho dos edifícios.As escolas do convênio escolar,
resultantes desse modelo, distribuíram seus três volumes funcionais sobre o terreno,
de modo a buscar a melhor insolação e a melhor relação entre espaço construído e
espaço livre. O espaço livre emoldurou os volumes, destacando a presença da escola
no bairro que se implantava.
Os vazios resultantes, configuraram-se em espaços que se integravam ao
entorno, de modo a garantir o contato direto das crianças com a natureza e o
contato direto com a vida do bairro, pois, afinal, a escola deveria estar onde a vida
acontece, apregoava o educador Anísio Teixeira. Cidade e natureza assim se
complementavam, conforme apregoou Le Corbusier em seus tratados sobre o
urbanismo moderno.
As escolas, assim implantadas, revelavam seus espaços para o bairro, e as
crianças eram vistas por seus pais e vizinhos correndo pelos espaços livres, a
qualquer hora do dia, e desse modo toda a comunidade era convidada a usufruir, nos
períodos fora do horário das aulas, dos mesmos espaços e equipamentos. Foi
proposto, inclusive, que as escolas não deveriam ser muradas, permitindo, através de
164
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
sua transparência, a integração com o bairro no qual se inseria. Hélio Duarte em
defesa da gradual retirada dos muros das escolas argumentava:
“Não haverá perigo de ser danificada a coisa pública. Já o vimos e sentimos.
Basta uma ação educativa junto aos escolares e seus pais. Os resultados têm sido
surpreendentes. E é porque a nossa gente é de boa índole. Ela está descrente
apenas. Nós todos, juntamente a faremos voltar a ter fé nos que a dirigem se estes
prometerem apenas aquilo que sabem poder cumprir, e cumprirem aquilo que
prometeram”. (Trecho da palestra de Hélio Duarte na Biblioteca Mário de Andrade
em outubro de 1949)
165
3.3 ANÁLISE DOS PROJETOS CONSTRUÍDOS
166
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
167
“Esse dinamismo leve e aéreo, de fluidas formas planas é, como se sabe,
uma das marcas mais reconhecíveis da arquitetura carioca das décadas de 1930
e 1940, celebrizada na produção de figuras como Affonso Eduardo Reidy, irmãos
Roberto e Oscar Niemeyer. Contudo, caracteriza uma produção que, àquela altura,
já se havia difundido enormemente pelo país, a ponto de torna-se dominante na
obra de arquitetos “paulistas” nesse período, tais com Rino Levi – Instituto Sedes
Sapientae, 1941, e Vilanova Artigas – com a Casa da Criança e Rodoviária de
Londrina, 1950. Desse modo, não é surpresa alguma a adoção dessa linha mestra
nos projetos do Convênio, desenhados por uma equipe chefiada por Hélio Duarte
(...)” (Gulherme Wisnick in Arquitetura Escolar Paulista: anos 1950 e 1960, pág 62.)
A composição do conjunto arquitetônico característico das escolas do 2º
Convênio Escolar, a partir da articulação de diferentes volumes definidos pelos blocos
funcionais (de ensino, de recreação e de administração), conectados entre si por
marquises, formando diferentes arranjos espaciais, a partir da racional distribuição dos
fluxos de alunos, público e comunidade, e da adequação à topografia existente e sua
insolação correspondente, possibilitaram que esses volumes, isoladamente, pudessem,
em alguns casos, ter o mesmo tratamento arquitetônico, em atendimento ao grande
número de escolas a ser construído.
Os diferentes arranjos desses três volumes funcionais e a tipologia das
coberturas dos recreios cobertos (cobertura em abóbadas, em pilotis e cobertura “asa
de borboleta”) configuraram a originalidade e a especificidade de cada solução
volumétrica resultante.
De todo o conjunto de 52 escolas construídas pelo 2º Convênio Escolar, a
maioria resultou em uma implantação feita a partir dos 3 blocos funcionais (de ensino,
VOLUMES SOLTOS QUE SE ARTICULAM ATRAVÉS DE MARQUISES, A FUNÇÃO
É REVELADA PELA FORMA FINAL DE CADA VOLUME – PROJETO DE PARQUE
INFANTIL NO BAIRRO DA POMPÉIA, AUTOR ARQUITETO EDUARDO CORONA
168
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
de recreação e de administração) articulados através de marquises. Algumas escolas
(5 no total de 52), devido à extensão dos programas, exigüidade dos terrenos e topografia
acidentada resultaram em um único volume, no qual se organizaram todas as funções.
Por sua vez, dos 47 edifícios compostos a partir da articulação de diferentes
volumes, 20 edifícios apresentaram blocos de recreação em abóbadas, blocos adminis-
trativos térreos e blocos de ensino com 2 pavimentos.
Os projetos que não utilizaram o recreio coberto por abóbada
apresentaram justificativa técnica para a aplicação de solução alternativa. Na análise
dos 27 edifícios que não resultaram no partido do recreio coberto em abóbada
encontramos 23 edifícios escolares com o recreio em pilotis: desses 23 edifícios escolares,
14 foram implantados em terrenos com topografia acidentada e, assim, a partir do
princípio de economia, fez-se uso do pilotis através do aproveitamento dos desníveis
naturalmente existentes; outros 5 edifícios escolares necessitaram atender a programas
muito extensos, determinando novamente a solução em pilotis, a fim de garantir um uso
mais racional do terreno; por último, 4 edifícios escolares foram implantados em terrenos
muito exíguos, impossibilitando também o uso do recreio abóbadado.
CROQUI MOSTRA A RELAÇÃO ENTRE OS TRÊS VOLUMES BÁSICOS, ADMINISTRATIVO (TÉRREO); DE ENSINO (2 PAV) E RECREIO EM ABÓBADA.
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
169
Os 4 edifícios restantes, para complementarmos os 27 edifícios escolares que
não resultaram em recreio coberto com abóbada, apresentaram, como solução da
cobertura de seu recreio, o telhado com desenho em asa de borboleta.
Mesmo sendo o pilotis a solução adotada pela maioria das escolas (23 do
total de 52), foi o recreio em abóbada (20 do total de 52) o modelo consagrado e
que identifica um projeto feito pelos arquitetos do 2º Convênio Escolar.
As diferentes combinações dos três volumes funcionais dispostos livremente
nas implantações, típicas da arquitetura carioca, resultaram na versatilidade dos
projetos e atenderam plenamente às necessidades técnicas colocadas pelos novos
edifícios do 2º Convênio.
Como dizia Hélio Duarte, os edifícios devem ser postos e não impostos aos
lugares; assim, o uso das abóbadas se limitou a situações que tecnicamente se
justificavam – adequação à topografia existente e à área do terreno disponível versus
programa a ser atendido.
PILOTIS ERGUEM O EDIFÍCIO DO CHÃO E CRIAM ESPAÇO DE RECREAÇÃO –
EE NOSSA SENHORA DA PENHA – ARQUITETO EDUARDO CORONA
170
171
3.3.1 HÉLIO DUARTE E EQUIPE: OBRAS DO 2º CONVÊNIO ESCOLAR EM ANÁLISE
172
ARQUITETO HÉLIO DE QUEIROZ DUARTE
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
173
3.3.1.1 BREVE BIOGRAFIA DE HÉLIO DUARTE
Moderno peregrino e educador, assim Hugo Segawa qualifica o arquiteto
Hélio Duarte. Logo que se diplomou em 1930, antes da gestão de Lúcio Costa, por-
tanto, com uma formação tradicional Belas Artes, Hélio Duarte participou, no Rio de
Janeiro, da elaboração dos planos urbanísticos para as cidades de Recife, João Pessoa e
Cabedelo, ao trabalhar na equipe do arquiteto Nestor de Figueiredo. Saiu pelo Brasil,
em 1936, ao ser transferido para a Bahia pelo Banco Hipotecário Lar Brasileiro,
empresa em trabalhou ao ser aprovado em concurso, no ano de 1934.
Conforme Hugo Segawa relata-nos, em artigo para a revista AU, de outubro
de 1998, Hélio Duarte, em sua passagem por Salvador, teve um primeiro contato
com a arquitetura moderna, mas, apesar de divulgar a arquitetura de Le Corbusier e
André Lurçat na Escola de Belas Artes de Salvador em 1936, não aplicou os
princípios modernistas em suas obras correntemente; em 1938, iniciou sua carreira
docente nessa faculdade.
No ano de 1938, foi contratado como arquiteto chefe da Companhia Brasileira
Imobiliária e de Construções, onde teve a oportunidade de edificar seu projeto para o
edifício Bráulio Xavier, exemplo da aplicação dos princípios da arquitetura moderna.
Em 1944, foi transferido para São Paulo, em função de seu trabalho na
Companhia Brasileira Imobiliária e de Construções. Entre os anos de 1945 e 1947,
manteve escritório paralelo de arquitetura, em sociedade com Zenon Lotufo e
Abelardo de Souza, onde desenvolveu inúmeros e expressivos projetos, de acordo
com a moderna arquitetura carioca. Hélio Duarte, em São Paulo, teve uma intensa
vida profissional e participou junto ao Instituto de Arquitetos do Brasil, da organi-
174
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
zação do 1º Congresso Brasileiro de Arquitetos de 1945; nesse mesmo ano, foi
convidado por Richard Neutra para integrar, como representante brasileiro, o
Congresso Internacional de Arquitetura Moderna (CIAM).
Para desenvolver tantas atividades profissionais, simultaneamente, Hélio Duarte
executou a maioria de seus projetos em equipe: foi com uma grande equipe que participou
da execução do projeto para a Sede do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) de São Paulo.
Em 1948, desligado da Companhia Imobiliária Brasileira e fora da sociedade
com Zenon Lotufo e Abelardo de Souza, passou a se dedicar, na prefeitura de São Paulo,
à Comissão Executiva do Convênio Escolar, programa do qual se desligou em 1952.
É também merecedora de nota sua participação no projeto do IAPC Cidade
Jardim, em 1947, Convidado pelo arquiteto Eduardo Kneese de Melo, projetou a
creche, o jardim de infância, a escola primária, o grupo social, a maternidade e o
ambulatório. Também no ano de 1948, ao integrar a equipe do Convênio Escolar,
participou da elaboração do plano para o Centro Educacional Carneiro Ribeiro na
capital baiana (a definição final dos edifícios coube ao arquiteto Diógenes Rebouças),
ao lado do educador Anísio Teixeira, cuja importância já vimos no capítulo anterior.
Paralelamente às atividades no 2º Convênio Escolar, a partir de 1950, iniciou
sociedade com o engenheiro Ernest Robert de Carvalho Mange, também membro da
Subdivisão de Planejamento do Convênio Escolar.
Essa sociedade manteve-se até o ano de 1955. Muito profícua, rendeu vários
projetos, entre os quais se destacam os projetos para o SENAI de São Paulo (criado
em 1942) – foram projetados e construídos a Escola Técnica da Vila Mariana, a Escola
Têxtil Central no Brás, o Internato de Campinas e o Pavilhão Social do Brás, projetos
que marcaram a arquitetura moderna em São Paulo.
SENAI BRÁS – PROJETO HÉLIO DUARTE E ERNEST MANGE
VISTA DO BLOCO DE OFICINAS DA ESCOLA TÊXTIL DO BRÁS
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
175
Outras frentes de trabalho significativas do escritório referem-se aos planos
urbanísticos para os campi universitários da Faculdade de Engenharia de São Carlos,
projeto de 1952, e para a Cidade Universitária de Santa Catarina, projeto de 1955.
A partir de 1955, já finalizada a sociedade com Ernest Mange, dedicou-se à chefia
do escritório de Engenharia e Arquitetura da Comissão da Cidade Universitária de São
Paulo. Nessa atuação teve relevo a elaboração do Roteiro para Replanejamento da Cidade
Universitária Armando de Salles Oliveira, quando, então, foi planejado um Core, espaço de
encontro e vivência para a comunidade universitária, de acordo com o 8º Congresso
Internacional de Arquitetura Moderna (CIAM), ocorrido em 1951, em que foi eleito o
tema “Humanização da Cidade”, que destacou a importância da apropriação pela
comunidade dos espaços públicos, ou seja, segundo o 8º CIAM, o racionalismo modernista
deveria ser revisto, humanizado, colocando o modo de apropriação do espaço por um
determinado grupo social como uma variante projetual a ser atendida. Na realidade, as
posturas de Hélio Duarte durante o 2º Convênio Escolar, reveladas na sua preocupação
em formar comunidades de bairro, mostraram que não havia novidade para o humanista
Hélio Duarte nessa revisão conceitual proposta pelo 8º CIAM. Suas posturas em colocar
o homem como centro das questões espaciais já indicavam, há tempos, esse caminho.
Em 1949, Hélio Duarte retornou ao ensino de arquitetura na Faculdade de
Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAUUSP), onde foi um dos
pioneiros arquitetos que, exercendo plenamente sua profissão, em paralelo a uma
consistente carreira acadêmica, formou uma primeira geração de doutores, ao orga-
nizar o curso de pós-graduação dessa faculdade.
Hugo Segawa resumiu a trajetória de Hélio Duarte em outras instituições
de ensino:
INTERNATO DE CAMPINAS – HÉLIO DUARTE E ERNEST MANGE
176
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
“Desenvolveu atividades docentes fora da FAU em várias oportunidades:
entre 1953 e 1955, foi professor da Escola de Engenharia de São Carlos; em 1965,
foi diretor e presidente da Comissão Organizadora da nascente Escola de
Arquitetura da Universidade Federal do Ceará; em 1967, lecionou na Universidade
de Brasília, naquele conturbado período político na capital federal, e pouco depois
se envolveu também na experimental e conturbada criação do curso de arquitetura
de São José dos Campos, São Paulo” (in Segawa, revista AU, 1998, pag. 64)
Hélio Duarte encerrou suas atividades profissionais como arquiteto em 1969
e, a partir daí, dedicou-se integralmente à FAUUSP, onde promoveu o Curso de Pós-
Graduação, o primeiro do Brasil.
No curso de graduação, reestruturou o 5º ano do curso de arquitetura ao
criar o Trabalho Final de Graduação que se tornou obrigatório e referência para
todos os cursos de arquitetura de acordo com o currículo do Ministério da Edu-
cação e Cultura.
Hélio Duarte personificou a imagem de um arquiteto pouco preocupado
com a exposição de sua imagem. Para ele a relevância do papel do arquiteto na
sociedade estava em projetar com o propósito de atender às demandas e em resolver
os diversos problemas colocados. O fazer e o ensinar a melhor arquitetura dentro das
possibilidades materiais que lhe eram colocadas, estão registrados ao longo de toda a
sua carreira, no modo como exerceu a profissão: como empregado, como funcionário
público, como profissional liberal, como acadêmico.
Pouco se fala em Hélio Duarte, quando aprendemos sobre aarquitetura
moderna, mas vivenciamos muito seus espaços e ensinamentos como professor da
FAUUSP (mesmo não tendo sido seu aluno, fiz meu TFG e minha pós-graduação baseado
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
177
nas estruturas garantidas por sua dedicação. Hélio Duarte foi um arquiteto que sempre
se preocupou com uma arquitetura feita a serviço da comunidade, uma arquitetura posta
e não imposta à sociedade, como ele próprio gostava de falar ao descrever suas escolas
do Convênio Escolar – a boa técnica a serviço do ser humano. Em seu artigo na revista
AU, que serviu de base para este texto, Hugo Segawa arremata: “o que perdura são os
rastros e, no caso de Hélio Duarte, são rastros conseqüentes”.
3.3.1.2 A EQUIPE E OS 52 PROJETOS DO 2º CONVÊNIO ESCOLAR
O espírito de equipe que animou a produção desse conjunto de edifícios
escolares revelou, também, alguns traços individuais que diversificaram a produção
arquitetônica do 2º Convênio Escolar, em decorrência da liberdade projetual que foi
garantida aos arquitetos pelo seu diretor Hélio Duarte.
A seguir, serão apresentados 37 projetos arquitetônicos do 2º Convênio
Escolar, agrupados por autores, com uma sucinta descrição das particularidades de
cada arquiteto e, logo após, serão apresentados os 15 projetos cuja autoria não foi
identificada.
Dentro de cada conjunto de projetos do mesmo autor, cada edifício escolar
será classificado a partir da solução adotada para sua implantação (blocos funcionais
independentes ou bloco único) e da volumetria resultante determinada pela cobertura
de seu recreio (abóbada, pilotis e asa de borboleta). Ver tabela anexada mostrando
resumo da análise das escolas na página 303.
178
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
179
ARQUITETO HÉLIO DE QUEIROZ DUARTE
Diretor da Subdivisão de Planejamento, Hélio Duarte assinou a autoria de 10
projetos produzidos pelo 2º Convênio Escolar. Foi o arquiteto com a maior produção
de edifícios escolares da equipe. Sua produção sintetizou as principais diretrizes
apontadas para o desenvolvimento dos projetos e, pelo fato de terem sido os
primeiros, criaram uma referência para a produção do restante da equipe.
Do total de 10 escolas projetadas por Hélio Duarte, 8 apresentaram o recreio
coberto abobadado, que, pré-moldado, reduzia o tempo de execução da obra; as
outras 2 escolas têm o seu recreio coberto abrigado por pilotis. Seguem as escolas:
180
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
EE Almirante Barroso (1949)
Localizado no bairro do Jabaquara a escola configurou-se a partir da tipologia
típica do Convênio. Apresenta o bloco administrativo térreo acoplado ao bloco de
ensino com 2 pavimentos, que se interliga, através de uma passagem coberta, ao
recreio coberto em abóbada. O mesmo projeto de galpão abobadado repete-se
na escola EE Visconde de Taunay (1949) e na EE Professor José Carlos Dias (1949).
EE ALMIRANTE BARROSO
181
182
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
EE Visconde de Taunay (1949) e EE Professor José Carlos
Dias (1949)
Localizadas nos bairros do Limão e Casa Verde, respectivamente, as duas
escolas apresentam os três blocos funcionais independentes, o bloco administrativo
térreo e o bloco de ensino em 2 pavimentos que se acoplam ao recreio coberto por
abóbada, através de marquises. Os projetos diferenciam-se somente pela posição e
dimensão da caixa de escada, confirmando que a repetição com pequenas variações
foi um dos recursos usados para a produção das 52 escolas do 2º Convênio Escolar.
EEPG VISCONDE DE TAUNAY
MARQUISE INTERLIGA BLOCO DE ENSINO AO RECREIO EM ABÓBADA
EEPG VISCONDE DE TAUNAY
VISTA 3 BLOCOS DA COMPOSIÇÃO TÍPICA DO CONVÊNIO
EE VISCONDE DE TAUNAY
183
184
EE JOSÉ CARLOS DIAS
TIPOLOGIA VOLUMÉTRICA BÁSICA USADA PARA A COMPOSIÇÃO VOLUMÉTRICA
DAS ESCOLAS DO 2º CONVÊNIO ESCOLAR – EE CÉSAR MARTINEZ
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
185
EE César Martinez (1950) e EE José Monteiro Boa Nova (1951)
A primeira escola localiza-se no bairro de Indianópolis e a segunda, no bairro
da Lapa. Os dois edifícios escolares foram construídos utilizando-se do mesmo projeto
arquitetônico, e, que, apesar de implantados em terrenos com diferentes configurações,
apresentam insolação adequada para as salas de aula.
O partido de implantação de blocos funcionais independentes, com bloco de
ensino em 2 pavimentos, bloco de recreação coberto em abóbada e bloco adminis-
trativo térreo (com marquise marcando a transição entre a escala urbana e a escala
do edifício escolar), mais uma vez predomina na organização do conjunto arquitetônico
186
EE CÉSAR MARTINEZ
EE CÉSAR MARTINEZ
187
188
EE PROF. JOSÉ MONTEIRO BOANOVA
EE PROF. JOSÉ MONTEIRO BOANOVA
189
190
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
VOLUMES DESTACADOS DO VOLUME PRINCIPAL
EE Doutor Murtinho Nobre (1950)
Localizada no bairro do Cambuci, repete o partido de blocos funcionais
independentes com o bloco de ensino em 2 pavimentos, bloco de recreação coberto
por abóbada e bloco administrativo térreo.
Sua implantação difere dos demais projetos que usam essa mesma tipologia
de implantação, em função da topografia existente, que apresenta um desnível entre o
recreio coberto e o bloco de ensino, desnível resolvido através de marquise que
acompanha a inclinação do terreno.
A marquise de entrada, desortogonalizada, convida à entrada e faz a transição
da escala urbana para o espaço construído da escola na conexão de circulação entre
os três blocos funcionais. Detalhes sutis e econômicos, como esse, revelam a intenção
presente nos projetos do convênio de convidar a comunidade do bairro a entrar na
escola e a participar dos espaços das crianças.
MARQUISE DE LIGAÇÃO ENTRE BLOCOS RESOLVE DESNÍVEL DO TERRENO.
EE DOUTOR MURTINHO NOBRE
191
192
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
FACHADA PRINCIPAL QUE SE ABRE PARA A AVENIDA PAES DE BARROS
EE Pandiá Calógeras (1949)
Localizada no Bairro da Mooca apresenta uma implantação compacta em
relação às outras escolas, uma vez que parte de seu terreno foi reservado para a
construção do Teatro Arthur de Azevedo, na intenção de criar um conjunto de
equipamentos urbanos que estruturasse e criasse referência no desenho do bairro.
Essa escola repete a tipologia básica de blocos funcionais independentes
articulados, com o bloco de ensino em 2 pavimentos, bloco de recreação coberto por
abóbada e bloco administrativo térreo, além de repetir a marquise que faz o
estratégico papel de transição entre as escalas da cidade e da criança: no desenho de
implantação notamos a continuidade natural da calçada até encontrar a porta de
acesso marcada pela marquise de entrada.
A escola organiza sua circulação através de um pátio central descoberto.
ENCONTRO ENTRE DIFERENTES VOLUMES RESOLVIDO COM A UTILIZAÇÃO
DE MUXARABIS
EE PANDIÁ CALÓGERS
193
194
EE PANDIÁ CALÓGERS
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
195
MARQUISE DE ENTRADA MARCA A TRANSIÇÃO ENTRE ESPAÇO URBANO E
ESPAÇO DA ESCOLA
EE Prudente de Moraes (data não identificada)
Localizada na Avenida Tiradentes, no bairro do Bom Retiro, essa escola repete
a conexão de blocos funcionais independentes organizados a partir de um eixo de
circulação paralelo à avenida.
Com volumes conectados lado a lado, o bloco administrativo é térreo, o bloco
de recreação é abobadado e o bloco de ensino apresenta-se em 2 pavimentos. Mais
uma vez, o arquiteto Hélio Duarte, através de uma marquise e de um pergolado,
garante uma transição de escalas entre a rua e o edifício; a calçada em curva encaminha
o pedestre para a entrada.
Nessa escola, as salas coladas ao muro foram projetadas pelo escritório do
arquiteto Ramos de Azevedo.
196
EE PRUDENTE DE MORAES
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
197
A MARQUISE DE ENTRADA SE REPETE EM TODOS OS PROJETOS DE HÉLIO
DUARTE PARA O CONVÊNIO
EE Orville Derby (1949)
Localizada no bairro de Vila Formosa, essa escola caracterizou-se volume-
tricamente pela articulação ortogonal do bloco administrativo (térreo) e do bloco de
ensino (2 pavimentos) com o bloco de recreação (pilotis sob o bloco de ensino)
configurando um volume com três pavimentos. A solução de recreio coberto por
pilotis é justificada pelo desnível existente no terreno.
198
EE ORVILLE DERBY
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
199
TRANSIÇÃO ENTRE BLOCOS RESOLVIDA ATRAVÉS DE VOLUME MAIS BAIXO
EE Brasílio Machado (1950)
Localizada no bairro de Vila Madalena, nessa escola, em função do reduzido
tamanho do terreno para o programa solicitado, optou-se pelo pilotis como solução
para o recreio coberto. Seu edifício apresenta-se com uma implantação em “U”, que
abraça o pátio descoberto da escola, criando uma escala adequada às crianças em suas
atividades recreativas. O pátio possibilita, também, a entrada de luz nordeste em todas
as salas de aula.
As salas de aula localizam-se no pavimento superior dos blocos paralelos à
rua, e o arquiteto diferencia, na forma dos volumes, o bloco ortogonal à rua, deixando-
o mais baixo e explicitando sua função de conexão.
O edifício está em cota elevada em relação à rua e a marquise de entrada,
desortogonalizada, cobre o final da rampa sinuosa, desenhada em continuidade à
calçada existente.
Esse projeto revela a coerência da arquitetura praticada pelos arquitetos do
convênio ao não impor uma tipologia padrão, e sim adequar a solução arquitetônica às
questões propostas pelo lugar.
MARQUISE DE ENTRADA ACOLHE A CRIANÇA
200
EE BRASÍLIO MACHADO
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
201
ARQUITETO EDUARDO CORONA
Seus projetos se destacaram, no conjunto das obras do convênio, pelo cuidado
com a plástica e pela elaboração de detalhes construtivos. Do conjunto das seis escolas,
projetadas entre os anos de 1950 e 1952, o uso da cobertura em asa de borboleta
caracterizou a arquitetura de quatro delas.Todas as escolas foram implantadas a partir
da articulação de blocos funcionais independentes e conectados, em sua maioria, com a
continuidade das coberturas dos blocos, o que difere das passagens cobertas, que
caracterizaram a articulação entre blocos típicos das demais obras do convênio.
O arquiteto Eduardo Corona, em depoimento publicado na tese de douto-
rado de Mário Henrique de Castro Caldeira, colocou que o arquiteto Hélio Duarte
coordenava os projetos, mas garantia liberdade de criação à sua equipe, o que
possibilitava a expressão individual de seus componentes, desde que dentro das
diretrizes estabelecidas.
Em seus depoimentos, revelou algumas discordâncias quanto à economia
sempre priorizada pelo arquiteto Hélio Duarte na elaboração dos projetos para o
convênio – dizia que uma obra econômica poderia reverter, anos depois, em altos custos
de manutenção e que projetos, com custos mais baixos, desde sua concepção, poderiam
gerar problemas nos edifícios em construção, devido à pouca qualidade das obras
públicas executadas pelas empreiteiras que venciam as licitações.
Seguem as escolas projetadas pelo arquiteto Eduardo Corona:
202
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
EDIFÍCIO DE GRANDE PORTE COM COBERTURA EM ASA DE BORBOLETA
GANHA LEVEZA ATRAVÉS DO USO DO PILOTIS
EE Nossa Senhora da Penha (1951)
Localizada no bairro do Tatuapé, esse edifício escolar comprova o apuro
estético do arquiteto, sua principal característica.Tombada pelo Conselho de Defesa do
Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo
(CONDHEPHAT), está atualmente em processo de restauro. É considerada por críticos
de arquitetura um dos exemplares mais elegantes da arquitetura escolar brasileira.
O edifício escolar contempla em seu programa, além do programa básico,
auditório, piscina, laboratórios e salas ambientes para disciplinas específicas. Seus
ambientes são organizados a partir de um pátio central, que garante iluminação
nordeste para todas as salas de aula. Esse bloco em “U” de 3 pavimentos, definido pelo
pátio, articula-se com o bloco do auditório, através de um volume em 2 pavimentos;
sob esses dois blocos é configurado um pavimento em pilotis, onde está localizado o
recreio coberto, que garante fluidez na circulação entre os espaços cobertos e
descobertos, o que vem de encontro à mobilidade infantil, tão prezada pelos arquitetos
do convênio. No volume em “U”, a cobertura em asa de borboleta é conectada ao
volume reto, com cobertura em uma água e que faz a conexão com o anfiteatro. Sua
circulação vertical apresenta, além das caixas de escada, solução em rampas que
chegam até a cota da calçada – as rampas passaram a ser implantadas em várias escolas
do convênio escolar.
DETALHES MAIS ELABORADOS CARACTERIZARAM A OBRA DE EDUARDO CORONA
EE NOSSA SENHORA DA PENHA
203
204
EE NOSSA SENHORA DA PENHA
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
205
ACESSO À BIBLIOTECA E SALAS DE PROFESSORES
EE Erasmo Braga (1950)
Localiza-se no bairro de Tatuapé. A continuidade de sua cobertura em asa de
borboleta conecta o bloco administrativo térreo ao bloco de ensino de 2 pavimentos,
e o bloco de ensino, por sua vez, apóia-se sobre o pilotis do recreio coberto.A opção
pelo pilotis foi decorrência natural da situação topográfica existente.
A solução da cobertura em asa de borboleta, elegante em suas proporções,
lembra a corbusiana casa Errazuris, que influenciou Niemeyer na solução para a
cobertura da casa de Juscelino Kubischek e o iate clube de Pampulha.
206
EE ERASMO BRAGA
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
207
EE Doutor Reinaldo Ribeiro da Silva (1950)
Localiza-se no bairro da Lapa e repete a solução da cobertura em asa de
borboleta, que conecta os blocos de ensino de 2 pavimentos ao bloco de recreação.
Neste caso, o recreio coberto está conformado por um pé-direito duplo. O bloco
administrativo, térreo com pequenas e econômicas aberturas, conecta-se ao conjunto
em asa de borboleta, através de uma singela marquise que serve de passagem coberta.
208
EE DOUTOR REINALDO RIBEIRO DA SILVA
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
209
EE Pedro Alexandrino (1950)
Localiza-se no Bairro do Tucuruvi e repete a solução das escolas anteriores, ao
conectar o bloco de ensino, de 2 pavimentos, ao bloco administrativo, também em 2
pavimentos, através do desenho da cobertura em asa de borboleta. O aproveitamento
inteligente da situação topográfica existente possibilitou a econômica solução do
recreio coberto em pilotis sob o bloco administrativo em nível com a rua.
210
EE PEDRO ALEXANDRINO
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
211
Diretoria de Ensino - Região Centro Oeste (1951)
Localiza-se no bairro de Perdizes em terreno com topografia acidentada, o
que permitiu a disposição do recreio coberto sob o pilotis, no qual se apoiam os blocos
de salas de aula.Volumetricamente, é composta por dois blocos de 2 pavimentos que
se sobrepõem, ortogonalmente, ao bloco administrativo térreo.
212
DER - REGIÃO CENTRO OESTE
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
213
EE Gabriela Mistral (1952)
Localiza-se no bairro do Tucuruvi em terreno de modestas dimensões, mas, apesar
disso, o arquiteto propôs um edifício térreo com recreio coberto em abóbada. Essa escola
repete, em sua implantação, a articulação dos três blocos funcionais independentes
(administrativo, ensino e recreação), típicos das escolas do convênio, conectados através de
passagens cobertas; no conjunto, destaca-se o bloco de ensino que remete à solução em
arcos da escola do arquiteto Reidy no conjunto habitacional Pedregulho, no qual a
cobertura do ginásio é também resolvida através de um conjunto de abóbadas.
SEQÜÊNCIA DE ARCOS CARACTERIZA O BLOCO DE ENSINO
214
EE GABRIELA MISTRAL
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
215
ARQUITETO ROBERTO GOULART TIBAU
Tibau participou efetivamente do 2º e 3º Convênios Escolares, entre os anos
de 1951 e 1955, razão pela qual tem a maior produção de edifícios, ao lado do
arquiteto Hélio Duarte. Foi encarregado de dar continuidade ao método de produção,
seus fundamentos teóricos e projetos arquitetônicos do 2º Convênio para a equipe de
arquitetos contratada para o 3º Convênio, a partir de 1953.
Recém-formado pela Escola Nacional de Belas Artes, do Rio de Janeiro, por
volta de 1945, foi contratado pelo engenheiro José Amadei, presidente da Comissão
Executiva do 2º Convênio Escolar, para fazer parte da equipe, com a finalidade de
acompanhar a execução das obras. Solicitado, porém, a fazer uma proposta de projeto
arquitetônico para a escola rural do Butantã (Escola Alberto Torres), e em função do
resultado alcançado, não parou mais de fazer projetos para o convênio, o que
alavancou sua vida profissional (avaliou ter construído mais de 500 escolas em sua
carreira de arquiteto).
Tibau produziu oito edifícios escolares durante a vigência do 2º Convênio
Escolar e, no conjunto de sua obra, apresentou soluções volumétricas específicas para
os variados programas propostos (escola rural, escola de aplicação ao ar livre, escola
de grande porte com anfiteatro e piscina). Foi o arquiteto que produziu a maior
variedade de escolas de acordo com o experimentalismo permitido nas pesquisas
desenvolvidas pela equipe de arquitetura do convênio.
216
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
Dos oito projetos realizados, seis configuraram-se a partir de blocos funcionais
independentes, conectados através de marquises ou prolongamentos de coberturas
tipo asa de borboleta. Os outros dois projetos organizaram-se em um único volume
de 3 pavimentos, em função das características topográficas do terreno.
Quanto ao recreio coberto, somente um edifício escolar utilizou-se de
cobertura abobadada; dos sete restantes, dois edifícios térreos cobriram seus recreios
com uma água de cobertura asa de borboleta e os outros cinco abrigaram seus
recreios sob pilotis.
Seguem as escolas:
A COBERTURA EM ASA DE BORBOLETA CARACTERIZA O BLOCO ADMINISTRATIVO
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
217
EE Doutor Edmundo de Carvalho (1950)
Essa escola está localizada no bairro da Lapa, e foi a única do convênio a
aplicar o conceito de “aulas ao ar livre”; em que cada uma das salas de aula, térreas, se
integram a pátios de uso exclusivo através de grandes caixilhos. Esse projeto destaca-
se também, por sua econômica implantação, ao aproveitar o desnível existente e
configurar com isso o recreio coberto sob pilotis.
A escola caracterizou-se volumetricamente por três blocos funcionais: o
primeiro, administrativo, é térreo e sua volumetria é marcada pela cobertura em asa
de borboleta; o segundo, em 2 pavimentos, abriga em seu térreo em pilotis o recreio
coberto, com salas especiais para dança e pequeno ambulatório médico e, em seu
pavimento superior, acessado através de um conjunto de rampas, as salas de aula. O
terceiro bloco caracterizou-se por um conjunto de salas de aula, separadas por pátios
externos e conectadas umas às outras através de uma marquise em concreto.
218
EE DOUTOR EDMUNDO DE CARVALHO
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
219
EE Alberto Torres (1951)
Tibau foi encarregado de projetar essa, que foi a única escola rural do
convênio. Construída em uma generosa área totalmente plana, no bairro do Butantã,
é vizinha do Instituto de mesmo nome.
Nesse projeto, Tibau utilizou-se da tipologia básica idealizada por Hélio
Duarte: bloco de ensino em 2 pavimentos, bloco de recreação abobadado e bloco
administrativo, esse último, térreo, apresentando pequenas janelas e cobertura em asa
de borboleta. Os blocos foram conectados por marquises em concreto. Trata-se de
programa arquitetônico muito específico, conforme pode ser comprovado pelas
plantas apresentadas a seguir.
220
EE ALBERTO TORRES
EE ALBERTO TORRES
221
222
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
EE Comendador Mário Reys (1951) e EE Professor Ascânio de
Azevedo Castilho (1951)
Escolas localizadas no bairro de Itaquera, foram construídas a partir do
mesmo projeto e adequadas, em sua implantação, a fim de garantir a face nordeste para
insolação das salas de aula.
Singelas, são térreas e caracterizam-se pela articulação de dois blocos, o de
ensino e o administrativo, onde o recreio coberto, localizado no meio do bloco de
ensino, é abrigado por uma das águas da cobertura em asa de borboleta que cobre o
conjunto. Um pátio interno, descoberto, organiza toda a circulação desse edifício escolar.
EE COMENDADOR MÁRIO REYS
223
224
EE PROFESSOR ASCÂNIO DE AZEVEDO CASTILHO
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
225
EE Artur Sabóia (1952)
Localizada no Bairro da Saúde, essa pequena escola, com apenas cinco salas
de aula, chama a atenção pela referência que faz aos pórticos da fábrica de bolachas
Duchen, que definem a volumetria do recreio coberto. Pórticos estruturais marcam,
também, o ritmo do bloco que abriga o setor de ensino e o setor administrativo em
dois pavimentos, anunciando, nesta experimentação, um importante traço da escola
paulista de arquitetura, na apropriação da estrutura como elemento conformador da
composição arquitetônica.
226
EE ARTUR SABÓIA
EE ARTUR SABÓIA
227
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CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
EE Clóvis Bevilacqua (1950) e EE Dona Suzana de Campos (1953)
A primeira escola localiza-se no bairro de Perus e a segunda, no bairro de
Perdizes. As duas escolas foram construídas a partir do mesmo projeto arquitetônico,
devido às questões topográficas, similares nas duas situações.
A forma final da escola é caracterizada por um bloco único com três pavi-
mentos: o bloco administrativo localiza-se no primeiro andar, no nível da rua, o bloco
de recreação localiza-se no térreo, sob o pilotis, e o bloco de ensino divide-se entre
o primeiro andar, ao lado da administração, e o 2º andar.
EE CLÓVIS BEVILACQUA
229
230
EE DONA SUZANA DE CAMPOS
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
231
BLOCO DE ENSINO APOIADO SOBRE BLOCO ADMINISTRATIVO
EE Professor Alberto Conte (1953)
Localizada no bairro de Santo Amaro, essa escola, contempla, além dos
ambientes do programa básico, salas ambientes para disciplinas específicas, piscina,
auditório e quadra poliesportiva.
Uma das escolas de maior área construída pelo convênio, sua volumetria
caracteriza-se pela conexão ortogonal de um bloco horizontal térreo (administrativo),
que abriga, em uma de suas extremidades, o anfiteatro, e um bloco vertical com 3
pavimentos, que abriga no térreo o recreio coberto em seu pilotis e, no restante, as
salas de aula, salas ambientes para disciplinas específicas e laboratórios.
232
EE PROFESSOR ALBERTO CONTE
EE PROFESSOR ALBERTO CONTE
233
234
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
ENGENHEIRO ERNEST ROBERT DE CARVALHO MANGE
Sua contribuição foi marcante na área técnica, e poderíamos caracterizá-lo
como o mais teórico de todos os projetistas do convênio, até porque teve sua
formação técnica na área de engenharia. Escreveu vários artigos, registrando a
necessidade de a equipe ter fundamentação teórica e técnica, através do conhecimento
de fórmulas físicas e matemáticas para apoiar suas definições projetuais. Defendia o
conhecimento profundo das questões pedagógicas para a formatação adequada do
programa arquitetônico a ser atendido.
Projetou seis escolas entre os anos de 1950 e 1951 e, em todas, propôs a
implantação a partir de blocos funcionais independentes, articulados e entremeados
por pátios internos. Cinco delas apresentam recreio sob pilotis e uma escola, recreio
coberto por arco em abóbada.
Na análise de seus projetos, encontramos, em cinco de suas escolas, a mesma
solução volumétrica, racionalizada a partir de dois blocos separados por um pátio
central (com cobertura em asa de borboleta), no intuito de contemplar iluminação
bilateral para todas as salas de aula.
Esse rigor gerou um curioso conjunto de escolas em que as variações,
consideradas as questões relativas à topografia do terreno, mantêm a mesma relação
volumétrica entre os dois blocos. Há que se considerar a extrema racionalidade que a
repetição dessa solução trouxe para o desenvolvimento dos projetos e a construção
desses edifícios escolares.
EE DOMINGOS FAUSTINO SARMIENTO
235
VAZIO ENTRE BLOCOS GARANTE ILUMINAÇÃO BILATERAL NAS SALAS DE AULA
EE Domingos Faustino Sarmiento (1950)
Localizada no bairro do Brás, essa escola está implantada em um terreno
plano e caracteriza-se, volumetricamente, a partir da implantação de dois blocos.
O bloco de salas de aula, em 2 pavimentos, tem garantida iluminação bilateral,
em função dos pátios internos que separam esse bloco do outro, também em 2
pavimentos, no qual o setor administrativo está sobre o recreio coberto, estruturado
a partir de pilotis.
236
EE DOMINGOS FAUSTINO SARMIENTO
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
237
EE General Antônio de Sampaio (1950), EE República do Chile
(1950) e EE Professora Isabel Vieira de Serpa e Paiva (1951)
A primeira escola localiza-se em Osasco, a segunda, no bairro de Vila Nova
Cachoeirinha e a terceira no bairro do Jaraguá. Essas três escolas repetem o mesmo
projeto, mas com uma pequena variação como solução para a caixa de escada,
adaptada ao terreno. Implantam-se em terreno em aclive, no qual dois blocos se
articulam através das circulações cobertas.
A cobertura do conjunto em asa de borboleta cobre os dois blocos e
também suas passarelas de ligação; no primeiro bloco, em 2pavimentos, encontramos
o setor administrativo sobre o recreio coberto e, no segundo, térreo, encontramos o
conjunto de 6 salas de aula. O pátio, entre os blocos, garante iluminação bilateral para
as salas de aula.
238
EE GENERAL ANTÔNIO DE SAMPAIO
EE REPÚBLICA DO CHILE
239
240
EE PROFESSORA ISABEL VIEIRA DE SERPA E PAIVA
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
241
EE Professor Pedro Voss (1951)
Localizada no bairro da Saúde, essa escola assemelha-se às três anteriores. Sua
variação volumétrica deve-se à topografia, ao formato do terreno e ao número de salas
de aula exigido (12 salas). Esses fatores levaram à implantação de recreio coberto com
abóbada, típica das escolas de Hélio Duarte.
Como nas outras escolas desse engenheiro, a iluminação bilateral é garantida
através do pátio que separa o bloco administrativo (térreo) do bloco de ensino (2
pavimentos). A necessidade de garantir a iluminação bilateral obrigou a eliminação do
corredor em frente às salas de aula e, como conseqüência, o acesso às 6 salas de aula
do pavimento superior se dá através de 3 conjuntos de escada, uma escada para cada
2 salas de aula.
VOLUMETRIA CARACTERÍSTICA DAS OBRAS DE ERNESTO MANGE
MARQUISE INTERLIGA BLOCOS FUNCIONAIS
242
EE PEDRO VOSS
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
243
VISTA DO PÁTIO COM PISCINA
EE Doutor Otávio Mendes (1951)
Localizada no bairro de Santana, essa escola caracteriza-se pelo extenso
programa arquitetônico que atendeu, no qual se inclui, além do programa básico, piscina,
anfiteatro, salas ambientes para disciplinas específicas e salas de trabalhos manuais.
Sua implantação organiza-se em blocos funcionais de 2 pavimentos dispostos
em forma de “U”, abraçando a piscina. Um bloco térreo, que abriga os vestiários da
área esportiva, serve de apoio a uma das pernas do “U”, limitando o recreio coberto
em pilotis. O conjunto caracterizado por paralelepípedos tem sua monotonia quebrada
pelas variadas soluções de abertura para a entrada de luz nas circulações.
O bloco de ensino, o mais extenso, apresenta-se com salas nos dois pavimentos;
o bloco administrativo localiza-se no pavimento superior, uma outra característica do
engenheiro Ernest Mange em suas escolas: sob o setor administrativo uma área em pilotis
define uma generosa entrada coberta para a escola.
PILOTIS NAS DUAS PONTAS DÃO LEVEZA AO CONJUNTO
244
EE DOUTOR OTÁVIO MENDES
EE DOUTOR OTÁVIO MENDES
245
246
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
ARQUITETO OSWALDO CORRÊA GONÇALVES
Dos arquitetos da equipe dirigida por Hélio Duarte, Oswaldo Corrêa
Gonçalves é o que mais se aproxima da produção de seu diretor. Algumas escolas
suas chegam a repetir os mesmos blocos funcionais das escolas de Hélio Duarte, de
acordo com a racionalização proposta para orientar os trabalhos da equipe.
Durante os anos de 1950 e 1951, anos em que participou do 2º Convênio
Escolar, produziu cinco projetos. Nesses projetos, duas escolas têm recreio
abobadado e outras duas têm recreio em pilotis, sendo que uma delas em bloco
único. Um último projeto tem recreio definido com cobertura em asa de borboleta.
A análise dos projetos do arquiteto Oswaldo Corrêa Gonçalves confirma
depoimento do arquiteto Eduardo Corona (publicado na tese de doutorado de Mário
Caldeira), ao descrever o ambiente de trabalho da equipe: um galpão sem divisórias
possibilitava a todos os arquitetos acompanhar os trabalhos e idéias em desenvol-
vimento, fazendo com que as soluções caminhassem livremente pelos projetos em
produção, em resposta à busca da melhor solução, independente de sua autoria.
Seguem as escolas:
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
247
EE Canuto do Val (1950)
Localizada no bairro da Barra Funda, essa escola repete, em sua implantação,
a articulação de três blocos funcionais independentes, interligados por marquises,
soluções presentes nas obras do arquiteto Hélio Duarte, em que, o bloco adminis-
trativo, térreo, articula-se com o bloco de salas de aulas em 2 pavimentos e o recreio
coberto abobadado, através de uma marquise.
248
EE CANUTO DO VAL
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
249
EE Romeu de Moraes (1950)
Localizada no Bairro da Lapa, sua implantação foi organizada a partir dos três
blocos funcionais independentes articulados em forma de “U”, também de acordo com
a tipologia arquitetônica criada por Hélio Duarte para seus primeiros projetos. O bloco
de ensino, de maior extensão, com salas de aula nos dois pavimentos, se articula com
o recreio coberto abobadado e com o bloco administrativo, através de marquises de
concreto. O bloco administrativo, em 2 pavimentos, abriga, no térreo, as funções
burocráticas da escola e, no pavimento superior, os serviços sociais e de saúde, que as
escolas ofereciam às crianças, de acordo com o programa arquitetônico mínimo do
convênio escolar.
250
EE ROMEU DE MORAES
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
251
EE Pedro Taques (1950)
Localizada no bairro de Guaianazes, essa escola, em sua implantação, aproveita
habilmente o desnível do terreno e propõe dois blocos interligados por rampa,
definindo uma volumetria final com cobertura em asa de borboleta, lembrando, assim,
as soluções propostas pelo arquiteto Eduardo Corona. Seu recreio é coberto por uma
das laterais dessa asa, enquanto seu bloco de salas de aula distribui-se em 2 pavimentos
permitindo ampliação em um dos lados.
252
EE PEDRO TAQUES
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
253
EE Carlos Escobar (1950)
Localizada no bairro do Tatuapé, essa escola apresenta seu programa
arquitetônico organizado em um bloco de 2 pavimentos, com recreio em pilotis. No
pavimento térreo, além do recreio coberto, encontramos o setor administrativo e, no
pavimento superior, todas as 12 salas de aula (pela análise do projeto e da área
disponível de terreno, não é compreensível essa solução).
254
EE CARLOS ESCOBAR
EE CARLOS ESCOBAR
255
256
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
EE República do Paraguay (1951)
Localizada no bairro de Vila Prudente, essa escola é a única do 2º Convênio
Escolar a incluir em seu programa arquitetônico uma quadra coberta. O terreno, com
topografia em aclive, levou o arquiteto a organizar sua implantação em dois níveis e a
escolher a rampa como solução para o acesso à escola.
O projeto arquitetônico organizou a distribuição dos ambientes em torno de
um pátio central quadrado, delimitado, em seus dois lados ortogonais à rua, pelo pilotis
que abriga o recreio coberto de um lado e o refeitório do outro. Nos dois lados do
quadrado, paralelos à rua, o pátio é delimitado, de um lado, pelo bloco administrativo
e, pelo outro, por outra área em pilotis. A quadra fica um pé-direito mais alta do que
o pátio central, mesma cota de nível das salas de aula.
EE REPÚBLICA DO PARAGUAY
257
258
EE REPÚBLICA DO PARAGUAY
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
259
ARQUITETO JUVENAL WATEGE JÚNIOR e
ARQUITETO ALUÍSIO ROCHA LEÃO
Cada um dos arquitetos assinou somente um projeto arquitetônico de edifício
escolar do 2º Convênio, sendo respectivamente, as escolas:
260
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
FACHADA PRINCIPAL EE THOMAZ GALHARDO
EE Thomaz Galhardo (1952)
Localizada no bairro da Lapa, essa escola revela uma implantação que tem
como critério a ocupação do terreno a partir de seu perímetro; assim, o recreio com
sua cobertura definida por telhado de uma só água aproxima-se da divisa do terreno,
de maneira a liberar área para a recreação descoberta.
Há três blocos funcionais: o administrativo, térreo, e o de ensino com 2
pavimentos, acoplam-se ao de recreio, coberto, através de marquises. Um quarto
bloco diferencia esse programa arquitetônico dos programas das demais escolas.
Trata-se de um bloco térreo, chamado de vocacional: era preocupação da Comissão
Executiva do Convênio Escolar o futuro dos estudantes, quando terminassem o
ensino primário; assim, foi preparado um ambiente para a orientação dos estudantes
na escolha de uma profissão.
EE THOMAZ GALHARDO
261
262
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
EE Regente Feijó (1952)
Localizada no bairro da Freguesia do Ó, em terreno de pequenas dimensões,
essa escola tem seu programa arquitetônico caracterizado por três setores funcionais
(ensino, recreação e administrativo) abrigados em um único volume com 2 pavimentos.
O recreio coberto está localizado no térreo, em área de pilotis, ao lado do bloco
administrativo; as sete salas de aula, por sua vez, estão no pavimento superior.
EE REGENTE FEIJÓ
263
264
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
265
OBRAS DE AUTORES NÃO IDENTIFICADOS
O conjunto de obras do 2º Convênio Escolar é facilmente identificado pela
coerência de seu resultado formal, fruto dos princípios que guiou o desenvolvimento
dos projetos, na equipe dirigida pelo arquiteto Hélio Duarte.
Vimos, também, que houve a possibilidade de manifestações individuais, em
função da diversidade de situações, que os diferentes lugares da cidade propuseram
como desafios aos arquitetos, e do experimentalismo, em resposta às inovadoras idéias
que passaram a fazer parte dos novos programas arquitetônicos aplicados nas escolas
do convênio.
Do conjunto de 52 escolas, 15 projetos não têm autoria declarada; assim,
apresentaremos esta seqüência de projetos sem autoria definida, usando como critério
o partido adotado para a implantação dos edifícios (blocos articulados ou bloco único)
e seu partido volumétrico, a partir da definição da cobertura do recreio coberto
(abóbadas, pilotis e plano inclinado)
a) Blocos articulados com recreio em abóbada:
Dos quinze projetos sem autoria definida, sete projetos adotaram a
implantação a partir da articulação de blocos funcionais independentes (de ensino, de
recreação e de administração), conectados através de marquises e com o recreio
coberto por abóbada. Desses sete projetos, seis repetem os blocos administrativos
térreos e blocos de ensino em 2 ou 3 pavimentos.
266
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
Como podemos verificar, a tipologia determinada por Hélio Duarte foi
aplicada de forma a não se identificar vontades pessoais, mas sim soluções econômicas
e adequadas às diretrizes colocadas para uma escola voltada para a criança e inserida
na cidade, de modo a desempenhar seu papel de equipamento comunitário.
Fazem parte desse grupo as escolas:
EE Professor Isaltino de Mello (1949) – bairro de Santo Amaro
EE Professor Colombo de Almeida (1950) – bairro da Casa Verde
EE Júlio Pestana (1952) – bairro do Tucuruvi
EE Paulo Setúbal (1952) – bairro do Limão
EE Dona Zalina Rolim (1951) – bairro da Vila Matilde
EE Alfredo Bresser (1950) – bairro da Casa Verde
EE Frei Gaspar da Madre de Deus (1950) – Osasco
EE PROFESSOR ISALTINO DE MELLO
267
268
EE PROFESSOR COLOMBO DE ALMEIDA
EE JÚLIO PESTANA
269
270
EE JÚLIO PESTANA
EE PAULO SETÚBAL
271
272
EE DONA ZALINA ROLIM
EE ALFREDO BRESSER
273
274
EE FREI GASPAR DA MADRE DE DEUS
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
275
b) Blocos articulados com recreio em pilotis:
Dos quinze projetos sem autoria definida, três projetos adotaram a
implantação a partir da articulação de blocos funcionais (de ensino, de recreação e de
administração), com o recreio abrigado em pilotis.
Fazem parte dessa classificação as escolas:
EE Aristides de Castro (1951) – bairro Jardim Paulista
Diretoria de Ensino - Região Leste 4 (1950) – bairro da Vila Matilde
EE Brasílio Machado (1951) – bairro da Saúde
276
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
EE Aristides de Castro (1951)
Localiza-se no bairro Jardim Paulista e por apresentar solução com iluminação
bilateral em todas as salas de aula, e o setor administrativo no 1º andar, essa escola,
aproxima-se da produção do engenheiro Ernest Mange. O uso do pilotis foi conse-
qüência da necessidade de área que permitisse a existência de pátios entremeando
todas as salas de aula.
EE ARISTIDES DE CASTRO
277
278
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
Diretoria de Ensino – Região Leste 4 (1950)
Localiza-se no bairro de Vila Matilde em terreno exíguo, que justifica o uso do
pilotis para abrigar o recreio coberto. Sua volumetria final em asa de borboleta,
característica de seu conjunto arquitetônico, remete às soluções do mesmo tipo de
cobertura encontradas e projetadas pelo arquiteto Eduardo Corona.
DER – REGIÃO LESTE 4
279
280
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
EE Brasílo Machado (1951)
Localiza-se no bairro da Saúde, essa escola tem o recreio caracterizado por
área em pilotis sob o bloco de salas de aula. Isso se justifica por se tratar de escola com
programa extenso, em atendimento às 16 salas de aula, salas ambientes para disciplinas
específicas, laboratórios e anfiteatro com cabine de projeção.
A implantação é caracterizada por dois blocos paralelos, com 2 pavimentos
cada, recuados de maneira a criar pátios internos a fim de garantir iluminação e inso-
lação adequadas para todas as salas de aula.
EE BRASÍLO MACHADO
281
282
EE BRASÍLO MACHADO
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
283
c) Blocos articulados com recreio em plano inclinado:
Dos quinze projetos sem autoria definida, três projetos adotaram a implan-
tação a partir da articulação de dois blocos funcionais.
Fazem parte dessa classificação as escolas:
EE Deputado Pedro Costa (1952) – bairro da Vila Guilherme
EE República do Uruguay (1953) – bairro de Cangaíba
EE Dr. José Pereira de Queiroz (1951) – bairro da Vila Matilde
284
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
EE Deputado Pedro Costa (1952)
Localizada no bairro de Vila Guilherme, essa escola caracteriza-se por seu
reduzido programa arquitetônico: somente 5 salas de aula. A escola define sua
implantação a partir de dois blocos térreos paralelos, que se conectam pela extensão
da cobertura em asa de borboleta, que caracteriza a volumetria do conjunto
arquitetônico conformado.
EE DEPUTADO PEDRO COSTA
285
286
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
EE República do Uruguai (1953)
Localizada no bairro de Cangaíba, essa escola térrea também atende a um
diminuto programa arquitetônico: 6 salas de aula. Sua volumetria define-se através de
dois blocos paralelos com cobertura em planos inclinados e voltados para o pátio
central; sua passagem coberta é resolvida através de uma pequena abóbada.
EE REPÚBLICA DO URUGUAI
287
288
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
EE Doutor José Pereira de Queiroz (1951)
Localizada no bairro de Vila Matilde, essa escola caracteriza-se pela articulação
de dois blocos funcionais: bloco de ensino com 8 salas de aula, distribuídas em 2
pavimentos, setor administrativo e setor recreativo abrigados em bloco térreo com
cobertura em uma água.
EE DOUTOR JOSÉ PEREIRA DE QUEIROZ
289
290
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
d) Bloco único com recreio no pilotis:
Dos quinze projetos sem autoria definida, somente um projeto adotou a
solução de concentrar todo o programa arquitetônico em um mesmo volume.
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
291
EE Toledo Barbosa (1949)
Localizada no bairro de Vila Guilherme, trata-se de uma das primeiras escolas
edificadas pelo 2º Convênio Escolar. O partido adotado, concentrando todo o
programa em um mesmo bloco, é conseqüência das dificuldades topográficas
existentes.
O volume final resultou em edifício com 3 pavimentos: térreo com o pilotis,
ocupado pelo recreio coberto ao lado do setor administrativo e 1º e 2º andares,
ocupados pelas 14 salas de aula.
292
EE TOLEDO BARBOSA
EE TOLEDO BARBOSA
293
294
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
e) Bloco articulados com recreio em pé-direito duplo:
Dos quinze projetos sem autoria definida somente um projeto adotou a
solução de recreio coberto em pé-direito duplo.
CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
295
EE Manuela Lacerda Vergueiro (1952)
Essa escola, localizada no bairro do Ipiranga, caracteriza-se pela articulação de
três blocos funcionais: de ensino, em 2 pavimentos com salas nos 2 andares; de admi-
nistração em um único pavimento e de recreação com pé-direito duplo, possibilitando
a exibição de filmes.
296
EE MANUELA LACERDA VERGUEIRO
297
CONSIDERAÇÕES FINAIS
298
CONSIDERAÇÕES FINAISR
299
Produzir com velocidade uma arquitetura de qualidade, comprometida com os
ideais do escolanovismo na reconstrução da escola pública, trouxe mais do que um
harmonioso e moderno resultado formal dos edifícios, foi o verdadeiro sentido da
produção das 52 escolas do 2º Convênio Escolar.
A consciência da questão estratégica da educação pública, na coordenação dos
projetos, implementada por Hélio Duarte, ao lado de uma equipe afinada com os mesmos
ideais de fazer arquitetura a partir de sua função social, conferiu unidade conceitual à vasta
produção do 2º Convênio Escolar.
A forma e a coerência resultantes registraram esse comprometimento com o
ensino e a nova pedagogia, e o apoio incondicional do engenheiro José Amadei, presidente
do 2º Convênio Escolar, foi estratégico para a efetivação de resultado tão significativo para
a arquitetura paulista, haja vista a interferência política imediatista, que planos como esses
suscitam em função da visibilidade pública de seu resultado.
Hélio Duarte temia, entretanto, que seu esforço na busca pela qualidade
arquitetônica fosse transformado em forma sem conteúdo, uma vez que perderia sentido,
se desprovido da pedagogia transformadora preconizada pelo escolanovismo de Anísio
Teixeira. Portanto, dependia das prioridades políticas e do efetivo preparo dos profes-
sores na construção desses espaços. Nesse sentido, seu trabalho, ao longo da história, foi
frustrado, pois a questão quantitativa superou as questões qualitativas na educação.Anísio
Teixeira apontou as conseqüências dessa política, conforme pudemos ver.
As escolas, no recente plano da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo,
de transformar parte delas em escolas de ensino integral, apontam para a possibilidade de
recuperar esses princípios e usar espaços dos edifícios do convênio escolar, de acordo com
o potencial de uso projetado.
300
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Comissão Executiva do 2º Convênio Escolar, segundo depoimentos dos
arquitetos participantes, manteve qualidade e coerência na sua produção, mas o mesmo
não se pode afirmar sobre a qualidade das obras, uma vez que a Subcomissão de Obras
executava os edifícios sem contar com a efetiva participação dos arquitetos no processo de
construção. O arquiteto Eduardo Corona chegou a questionar a qualidade das obras que
poderia comprometer o resultado final do conjunto das escolas, alegando, inclusive, esse
motivo para a sua demissão do Convênio, em 1952.
O conjunto das 52 escolas construídas pelo 2º Convênio Escolar revela, para
nossa atualidade, o entusiasmo e a idéia força que movia a arquitetura da década de 50 –
de desenvolvimento nacional com justiça social, uma idéia que não considerava a arquitetura
enquanto fim, mas que fazia dela o meio de conquistar um futuro melhor: a verdadeira
arquitetura moderna.
Era essa idéia força que traçava as prioridades para as escolhas pertinentes ao
processo projetual e, nesse caso, a idéia força era o atendimento pleno às crianças, em uma
cidade que não parava de crescer, ou seja, produzir um grande volume de edifícios em um
curto prazo, e qualquer projeto, como podemos comparar com a situação existente,
sempre é penalizado nesses cronogramas, em detrimento dos longos prazos políticos,
quanto às decisões ligadas às questões da educação pública.
Enquanto somente invólucros, desprovidas de conteúdo, as escolas pouco nos
diriam 50 anos depois, além do seu significativo comprometimento com a arquitetura
moderna nacional. O que descobrimos, através desse conjunto de edifícios é a maneira pela
qual a produção destas escolas se organizou calcada no ideal de escola pública republicana
que ao construir a escola para todos precisou construir os melhores edifícios escolares e
precisou considerá-lo como parte estratégica de uma cidade democrática e educadora
CONSIDERAÇÕES FINAIS
301
A idéia força que alimentou nossa modernidade na produção de edifícios
escolares, nesse período, fundamenta-se na necessária e constante renovação de
nossa sociedade, na busca democrática, a partir da educação, de um país com
igualdade de oportunidades para todos e todas as crianças. Este testemunho faz-se
fundamental para repensarmos o início deste novo século e o estado em que se
encontra a educação em nosso país.
A idéia força na educação nacional continua seu movimento, e a pergunta que se
coloca é de que forma nós, arquitetos, poderemos responder e nos inserir nesse processo?
A equipe municipal da EDIF com o trabalho dos arquitetos Alexandre Delijaicov,
Wanderlei Ariza e André Takiya nos deu uma resposta com os projetos CEUs, e a FDE,
através da coordenação das arquitetas Avany de Francisco Ferreira e Mirela Geiger de
Mello, com o plano de escolas em pré-moldado também o fizeram.
Esta dissertação com o registro do 2º Convênio Escolar, pretende, contribuir e
manter viva a possibilidade de um trabalho estratégico e digno para nós, arquitetos ao lado
dos pedagogos e educadores, na área da educação pública, com aquilo que é a nossa parte:
projetos de arquitetura inseridos adequadamente nas cidades e fundamentados em proje-
tos pedagógicos transformadores da situação em que hoje nos encontramos.
“Wells, em uma de suas profecias a respeito do nosso mundo, imaginava-o
renascendo de uma fase de destruição total, por intermédio de um pequeno grupo de
aviadores, que recolhe a herança da atitude científica ao espírito de confiança na ação
humana. Quem sabe se, entre nós, a missão não caberá aos arquitetos? Primeiro o seu
trabalho toca em todos os setores da atividade humana. Nada do que é humano lhes é
estranho. Segundo o hábito de projetar para todos fá-los sensíveis e objetivos, inteligentes e
desapaixonados. Em nenhuma outra arte, além desta, o casamento entre a ciência e a
beleza é mais íntimo e inevitável. (..)” (Anísio Teixeira em “Um presságio de progresso”,
revista HABITAT nº. 4, São Paulo, set-dez de 1951)
302
303
ANEXO
304
ANEXO
305
306
CRÉDITOS DAS ILUSTRAÇÕES
307
CRÉDITOS DAS ILUSTRAÇÕES
CAPÍTULO 1
Páginas 19, 43, 47, 49, 50, 51, 52: FERREIRA, Avany de Francisco, CORRÊA, Maria
Elizabeth Peirão e MELLO, Mirela Geiger de. 1998. Arquitetura Escolar Paulista: Restauro.
São Paulo, Fundação para o Desenvolvimento da Educação.
Páginas 32, 34, 35, 36: OLIVEIRA, Beatriz Santos de. 1991. A modernidade oficial: A
arquitetura das escolas públicas do distrito federal (1928-1940). Dissertação de
mestrado, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo.
Páginas 55, 56, 57, 58, 59: NIEMEYER, Carlos Augusto da Costa. 2002. Parques infantis
de São Paulo: lazer como expressão de cidadania.São Paulo, Anablume/ FAPESP.
CAPÍTULO 2
Páginas 85, 111, 122: CAVALCANTI, Lauro. 2001. Quando o Brasil era Moderno: Guia
de Arquitetura 1928 – 1960.Rio de Janeiro, Editora Aeroplano.
Página 87: SOMEKH, Nádia, CAMPOS,Candido Malta. 2002. A cidade que não pode
parar: planos urbanísticos de São Paulo no sáculo XX.São Paulo, Mackpesquisa.
308
CRÉDITOS DAS ILUSTRAÇÕES
Páginas 92, 93, 94 (inferior), 95 (inferior): ANELLI, Renato.2001. Rino Levi: arquitetura
e cidade” .São Paulo, Romano Guerra.
Páginas 109 (inferior), 110 (superior), 112 (inferior), 113 (duas inferiores), 124, 125,
126: BRUAND,Yves. 1981. Arquitetura Contemporânea no Brasil. São Paulo, Perspectiva.
Páginas 108, 114, 119, 123:BONDUKI, Nabil. 2000. Affonso Eduardo Reidy.São Paulo,
Editorial Blau.
Páginas 94, 112 (superior): KAMITA, João Massao. 2003. Vilanova Artigas.São Paulo,:
Cosak & Naify.
Páginas 95 (superior), 107, 110 (superior), 113 (superior): Segawa, Hugo. 1999.
Arquiteturas no Brasil: 1900 – 1990.São Paulo, Edusp.
CAPÍTULO 3
Páginas 138, 142, 143: DUARTE, Hélio. 1971. Escola Parque – Escola Classe.São Paulo,
FAUUSP.
Páginas 133, 150, 169, 182, 190, 192, 195, 197, 199, 202, 203, 213, 231, 241, 243:
FERREIRA, Avany de Francisco, MELLO, Mirela Geiger de. 2006. Arquitetura Escolar
Paulista: anos 1950 e 1960.São Paulo: Fundação para o Desenvolvimento da Educação.
CRÉDITOS DAS ILUSTRAÇÕES
309
Páginas 151, 167, 168: FERREIRA,Avany de Francisco, CORRÊA, Maria Elizabeth Peirão
e MELLO, Mirela Geiger de. 1998. Arquitetura Escolar Paulista: Restauro.São Paulo,
Fundação para o Desenvolvimento da Educação.
Página 134: KAMITA, João Massao. 2003. Vilanova Artigas.São Paulo,: Cosak & Naify.
Página 160: AMADEI, José. 1951. “O Que é Convênio Escolar”.Habitat, São Paulo, (4):
3,setembro/dezembro.
Páginas 174, 175, 235: MANGE, Ernest Robert de Carvalho. 1955. “Arquitetura Escolar”.
Acrópole. São Paulo (197), 211-213, março.
Página 147: MASCARO, Carlos Corrêa. 1960. O Município de São Paulo e o Ensino
Primário (ensaio de Administração Escolar). Livre-Docência, Faculdade de Filosofia
Ciências e Letras da Universidade de São Paulo.
Página 173: Segawa, Hugo. 1990. “Hélio Duarte (1906 – 1989): moderno e peregrino”.
Projeto, São Paulo, (131), 51, maio.
Páginas 217, 260: Ivanir Reis Neves Abreu.
Desenhos de todos os projetos do Convênio Escolar; FERREIRA, Avany de Francisco,
MELLO, Mirela Geiger de. 2006. Arquitetura Escolar Paulista: anos 1950 e 1960. São
Paulo: Fundação para o Desenvolvimento da Educação.
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CAP. 3 A MODERNA ARQUITETURA DO CONVÊNIO ESCOLAR
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(197), 211-213, março.
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SOMEKH, Nádia.1997. A cidade vertical e o urbanismo modernizador: São Paulo 1920-
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WICK, Rainer. 1989. Pedagogia da Bauhaus.São Paulo, Editora Martins Fontes.
FAUUSP – 2007
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