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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO
Curso de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo
Área de Concentração “Estruturas Ambientais Urbanas”
A contribuição das casas modernas para o ensino de projeto de
arquitetura:
uma interpretação do estudante na sua formação
São Paulo
2006
Dissertação de Mestrado
Orientando – Elvis José Vieira
Orientador – Prof. Dr. Lúcio Gomes Machado
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2
A contribuição das casas modernas para o ensino de projeto de
arquitetura:
uma interpretação do estudante na sua formação
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FAUUSP
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO
Curso de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo
Área de Concentração “Estruturas Ambientais Urbanas”
A contribuição das casas modernas para o ensino de projeto de
arquitetura:
uma interpretação do estudante na sua formação
4
SUMÁRIO
Agradecimentos ...................................................................................................... 005
Dedicatória ............................................................................................................... 006
Resumo / Abstract ................................................................................................... 007
Introdução ................................................................................................................ 008
1.0 – O Modernismo ................................................................................................ 014
2.0 - A Casa Modernista como Objeto de Experimentação do Ensino
de Projeto .............................................................................................................. 044
2.1 - O projeto como investigação ....................................................................... 046
2.2 - A casa modernista como elemento de repertório ........................................ 048
2.3 - Considerações Finais .................................................................................. 080
3.0 - ANÁLISE GRÁFICA DE EXEMPLARES DA ARQUITETURA RESIDÊNCIAL
MODERNA: Estudos de caso - a casa modernista produzida no século XX ..... 082
3.1 - Em busca dos objetos significativos ............................................................ 083
3.2 - Análise gráfica sobre alguns exemplares da arquitetura moderna ............. 086
4.0 - ENSINO E APRENDIZAGEM: Por uma experiência de ensino .................... 114
4.1 - Um breve histórico do ensino de arquitetura ............................................... 115
4.2 - Compreendendo o ensino de arquitetura e suas influências no Brasil ....... 116
4.3 - As experiências didáticas das escolas russas e alemães ........................... 122
4.4 - O ensino de arquitetura no Brasil ................................................................ 135
4.5 - Uma experiência didática na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da
Universidade Braz Cubas .................................................................................... 144
4.5.1 - As experiências didáticas e os resultados alcançados durante três
semestres na FAUUBC ................................................ ...................................... 149
5.0 – Considerações finais ..................................................................................... 170
5.1 - Conclusão final da pesquisa ........................................................................ 171
5.2 - Anexo I ........................................................................................................ 179
6.0 – Bibliografia ...................................................................................................... 181
5
AGRADECIMENTOS
Agradeço ao meu orientador, o Prof. Dr. Lucio Gomes Machado, pela generosa
disposição de aceitar meu trabalho de pesquisa e me incentivar no registro desta
experiência que tive como docente durante três semestres.
Agradeço também a ele a compreensão pelos momentos em que minha vida
acadêmica, profissional e como pesquisador se fundiram, ficando por diversas vezes
escassos o tempo dedicado a esta pesquisa.
Aos alunos do 2º semestre de 2001 e 1º e 2º semestre de 2002 da Faculdade de
Arquitetura e Urbanismo da Universidade Braz Cubas, principalmente as alunas
Fernanda Kano, Claudia Carriço, Carla e Érica, que gentilmente forneceram seus
trabalhos para o desenvolvimento desta pesquisa.
Aos professores Ms. Marta Lagreca e Dr. Paulo Amaral que em 1998 me aceitaram
como monitor em suas disciplinas e, indiretamente, me iniciaram na carreira docente
na FAUUBC, sou muito grato àqueles dois anos que acompanhei os trabalhos
desenvolvidos por estes dois professores e muito aprendi com esta experiência.
Agradeço também aos professores que junto lecionei como Alexandre Loureiro,
Renata Piazzalunga, Mauricio Ribeiro e Frederico Zanelato, e que muito contribuíram
para a realização deste trabalho.
Sou igualmente grato aos demais professores da FAUUBC, em especial Marcos
Boldarini e Dr. Décio Amadio pelas horas de discussão sobre o ensino de arquitteura
não somente em nossa escola, mas o rumo que tomamos para o ensino em nosso
país. E ao Prof. Álvaro Dariza, aluno da primeira turma da FAUUBC e que muito
contribuiu com seus depoimentos vivenciados com o Prof. Eduardo Corona. Assim
como não poderia deixar de agradecer ao Prof. Dr. Guido Laganà, do Politécnico de
Turim – Itália, pela suas valiosas observações sobre o ensino na Itália e a experiência
de trabalhar com a metodologia da cooperação técnica com outros países.
6
DEDICATÓRIA
À minha mãe – Rosa.
7
RESUMO
Esta dissertação tem como objetivo investigar as casas modernas de arquitetos que
contribuíram na formação e transformação do viver urbano, onde estes objetos de
estudos podem ser utilizados como fio condutor para a discussão do ensino da
disciplina de projeto de arquitetura. Também é analisado as principais escolas de
arquitetura, tanto européias como as brasileiras que consolidaram um novo modo de
compreender o programa de ensino das disciplinas e do curso de arquitetura no
ensino moderno e contemporâneo, onde a Bauhaus, na Alemanha, influenciou muitas
escolas no Rio e São Paulo, como a FAUUSP e FAUUBC, esta última elemento
norteador da pesquisa geradora dos estudos de caso nos anos de 2001 e 2002, onde
lecionei como professor assistente e posteriormente como responsável na disciplina
de Projeto de Arquitetura, consolidando um conjunto de material para a análise do que
chamo de “experiência didática vivenciada”.
ABSTRACT
The present dissertation aims to study and analyze the modern house projects which
have contributed to new living architecture and urban concepts, and the
acknowledgement of these intentions and purposes is used as guideline for the
development of didactical orientations. Different projectual concepts that belong to the
Twentieth Century architecture history are also compared in order to set up an
internationally constructed scenario which will include brazilian didactical teaching
experiences (FAUUSP and FAUUBC) as well as historical european examples such as
the BAUHAUS experience in Germany. The faculty teaching carreer of the author shall
help the construction of the concept he names as “shared didactical experience”.
8
“O que significa educar na atual conjuntura de colapso e
crise? Como se posicionar frente à disciplina em cenários locais
e globais fortemente contrapostos? Como organizar um Taller
em contextos massivos e com grandes restrições? Que
estratégias docentes e pedagógicas são pertinentes?”
Thomas Sprechmann
In, Trajetórias recentes no ensino da arquitetura contemporânea.
1
Introdução
1
. Universidad de la Republica. Faculdade de Arquitectura. Explora (o ensino da arquitetura – em la
enseñanza de la arquitectura). Porto Alegre: Ed. Ritter dos Reis, 2003, p. 26.
9
O presente trabalho é produto das incertezas na minha condição de professor de
projeto na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Braz Cubas, em
Mogi das Cruzes – SP, faculdade esta que iniciou suas atividades em 1970 sob os
conceitos pedagógicos da “FAU de Artigas” e, que ao longo destes mais de trinta
anos, contribuiu com importantes nomes para a história da arquitetura.
Estas indagações nascem a partir do segundo semestre de 2001, logo após passar
quatro semestres como auxiliar na disciplina de Projeto de Urbanismo, ministrada
naquela ocasião pelos professores Dr. Paulo Amaral e Ms. Marta Lagreca, que me
aceitaram com minha quase nula experiência em ajudá-los em seu curso, onde, sem
dúvida, muito aprendi naqueles anos que passei ao lado destes dois competentes
arquitetos e professores.
No entanto, ao assumir uma disciplina, mesmo como professor auxiliar, acredito que
as responsabilidades são ainda maiores e, no meu caso particularmente, uma
pergunta me era colocada naquele momento: Como produzir um curso para uma
turma que inicia sua vida acadêmica, inclusive de projeto, contribuindo para sua
formação profissional, de forma igualitária e uniforme à todos os alunos? Isto fez com
que a elaboração do curso da disciplina de projeto de arquitetura daquele semestre
fosse construído a partir do tema proposto – a casa – como objeto de estudo sob a
ótica que, sem dúvida, todos os alunos independente de sua experiência ou formação
profissional, pudessem contribuir para o desenvolvimento dos exercícios e do curso,
visto que o tema fazia parte do cotidiano e da cultura de todos.
A construção do curso deveria ser norteada pelo fio condutor, que provocaria uma
discussão heterogênea entre as experiências trazidas por cada aluno, sua visão sobre
o morar, a cultura de cada família, bem como seu olhar particular sobre a importância
de cada ambiente da casa. No entanto, isto não bastaria para a contribuição colocada
no inicio: o curso proposto deveria conduzir o aluno a uma discussão aparentemente
simples, embora complexa, se olharmos como um elemento que se transformou ao
longo destes cinco séculos.
Outro aspecto em que esta pesquisa se deteve foi quanto a metodologia adotada para
a transmissão do conhecimento, visto que a turma ainda não possuía uma experiência
sobre a produção de projetos de arquitetura e, conforme a metodologia adotada
poderia acarretar num “prejuízo” a construção das idéias durante a vida acadêmica do
estudante.
Neste aspecto, estas inquietações e questionamentos expostas, que leva à “escolha
do tema”, nos levou a iniciar a pesquisa pelo tema proposto discutindo inicialmente a
importância e influências que o Movimento Moderno teve sobre diversos países no
mundo, inclusive os da América Latina com grande produção no Brasil.
Diante disso, o Capítulo 1, intitulado de “O Modernismo”, foi dedicado à pesquisa e
discussão sobre o Movimento Moderno, tendo como um dos principais protagonistas
da história o arquiteto Le Corbusier, o qual difundiu os “princípios essenciais” da
arquitetura moderna – piloti, planta livre, fachada livre, teto jardim e brise-soleil – e
que conquistou um grande número de seguidores com sua arquitetura inovadora para
o início do século XX.
Por outro lado, é importante ressaltar que não cabe a este capítulo apontar os
personagens ou obras dos artistas ou arquitetos que contribuíram para a produção e
difusão do movimento, nem tão pouco levantar questões sobre os resultados e
reflexos alcançados por esta produção, mas sim, pretende apenas dar um breve
10
panorama dos estudos elaborados pelos principais personagens desta fase da história
da arquitetura.
Além disso, dá ênfase à existência dos CIAMs que muito contribuíram para a difusão
do movimento, inclusive tendo grande expressão no Brasil, sob a figura de dois
arquitetos, de origem estrangeira, Rino Levi e Gregori Warchavchick. Estes podem ser
considerados como marcos do início da arquitetura moderna brasileira.
O marco se dá com a publicação de dois manifestos – “A arquitetura e a estética das
cidades” e, “Acerca da arquitetura moderna” – textos fundamentais para a
consolidação de um novo movimento na arquitetura, assim como a existência da
Semana de 22, com a presença de importantes artistas como Anita Malfatti, Antonio
Garcia Moya e Georg Przyrembel, estes dois últimos arquitetos que apresentaram
suas obras nesta Semana de Arte Moderna em São Paulo. Porém não podemos
ignorar uma importante personalidade que foi o arquiteto Lucio Costa, que juntamente
com Oscar Niemeyer e sua equipe levou o Brasil para o conhecimento de diversos
países na Europa.
No que tange à particularidade do tema objeto de estudo desta pesquisa de mestrado,
a casa modernista, o Capítulo 2 – “A casa modernista como objeto de experimentação
do ensino de projeto” - foi elaborado com a intenção de discutir a utilização dos
projetos residenciais como objetos de experimentação para o ensino de projeto de
arquitetura.
Este capítulo intitulado trata especificamente sobre o processo de transformação
espacial e conceitual na forma de habitar, detendo-se na casa moderna como um
tema presente no decorrer do texto que justificará a importância destes objetos como
elementos de utilização no ensino de projeto.
A participação destes objetos arquitetônicos - como elementos de estudo e análise na
formação de conceitos e repertório arquitetônico, além de um raciocínio construtivo por
meio de modelos a serem investigados, relacionados à composição arquitetônica:
elementos de arquitetura, elementos de composição e estratégias compositivas,
buscam neste capítulo, rever a forma de habitar e viver sobre a cidade moderna e os
novos conceitos de compreender o “ser urbano”.
Cabe ressaltar que esta fase da pesquisa nos possibilitou discutir o recorte ao qual o
trabalho se deteria; entretanto, o dilema de fazer um recorte muito específico nos
levou a considerar alguns elementos como norteadores desta decisão. Mesmo
compreendendo a importância da existência das casas modernas como objetos de
referência para a construção do repertório necessário ao estudante de arquitetura,
visto que esta pesquisa esta ancorada sobre o ensino para os estudantes iniciantes no
curso de arquitetura, consideramos que não seria necessário, ou até mesmo
“possível”, descrever sobre toda a produção das casas modernas em diversos países.
Deste modo, decidimos fazer inicialmente um recorte temporal sobre a pesquisa do
que trata o Capítulo 2, onde concentramos os estudos entre as décadas de 40 e 80 do
século XX. Outro fator se concentrou no estudo e discussão da escolha dos objetos
relevantes que auxiliassem na construção deste repertório arquitetônico para o
estudante, assim como apontou alguns arquitetos de relevante importância e
contribuição para o Movimento Moderno em diversos países, inclusive o Brasil.
A partir dos resultados alcançados no Capítulo 2, conseguimos selecionar um conjunto
de casas, em diversos países e autores, que nos auxiliaria para a construção do
11
Capítulo 3, que se deteve, de forma muito breve, em tecer uma reflexão sobre o tema
desta pesquisa de mestrado.
Entendemos que a casa moderna buscou discutir não somente o espaço físico
resultante da criação de ambientes livres e abertos, na forma plástica em que a casa
moderna se coloca, ou a estrutura que se liberta da composição dos espaços físicos;
mas também na formação de uma nova forma de compreender o habitat e a
sociedade moderna.
Assim, o Capítulo 3 – “Análise gráfica de exemplares da arquitetura residencial
moderna: estudos de caso – a casa modernista produzida no século XX”, constitui-se
da análise de exemplares da casa moderna, produzidas no século XX, dentro do
recorte já estabelecido no capítulo anterior, de diversos arquitetos e em vários países,
principalmente no Brasil como estudos de caso que venham a contribuir para uma
discussão mais aprofundada sobre o tema da pesquisa.
A escolha dos objetos estudados foram apontados conforme a confirmação destes
objetos como elementos de formação do repertório preparatório para a discussão do
tema do curso da disciplina de Projeto de Arquitetura, disciplinando um repertório
satisfatório sem afetar a criatividade do aluno.
Para a análise e seleção destes objetos adotamos inicialmente a coleta de dados por
meio de produções bibliográficas, como ensaios, documentações, registros e
publicações compostas por textos, registros fotográficos, desenhos e ilustrações, pela
incapacidade de ir aos diversos países onde as obras estão implantadas.
Já os modelos apontados dos exemplares brasileiros, foram adotados na medida do
possível, e adotamos a metodologia de coletar as imagens no local de estudo, assim
os objetos apontados como elementos de análise e estudo para este capítulo, foram
utilizados não somente os textos das produções bibliográficas, mas também as
imagens disponíveis, como plantas baixas, cortes, elevações, gráficos, dentre outros
citados nas Referências e dispostos no decorrer da pesquisa.
Neste sentido, entendemos que este capítulo trata-se de uma peça fundamental para
a constituição da dissertação do mestrado, apontando os objetos capaz de contribuir
para os demais capítulos e conclusão da pesquisa, que enriquecido pelo conjunto de
imagens que auxiliaram na compreensão dos textos descrito ao decorrer deste
capítulo, onde em cada momento no decorrer da análise sobre os objetos eleitos para
exemplificar nossas indagações e “teses”, com o apoio iconográfico nos darão um
enriquecedor arcabouço na confirmação das casas modernas como objetos passíveis
de estudo na contribuição para a construção de uma metodologia na disciplina de
Projeto de Arquitetura.
A constituição do Capítulo 4 – “Ensino e Aprendizagem: por uma experiência didática”,
possui o objetivo de responder, ou ao menos sanar nossas indagações, sobre a outra
vertente do objeto da pesquisa desta dissertação. No entanto não se pretende
consolidar com este capítulo uma discussão específica sobre o ensino de arquitetura,
mas possibilitar uma análise mínima sobre as principais escolas que influenciaram o
ensino de arquitetura das principais escolas contemporâneas que lecionamos.
Assim, este capítulo é composto de um histórico sucinto sobre o percurso histórico do
ensino de arquitetura, abarcando as escolas mais significativas que envolveram em
sua trajetória as mais relevantes disciplinas, capazes de formar e capacitar
profissionais nas mais variadas especialidades e que, ao longo dos anos, passaram a
se tornar referências para diversos estudantes e profissionais no decorrer dos séculos
12
XIX e XX, colocando a atividade projetual como a “espinha dorsal” na vida acadêmica
de alunos e pesquisadores.
Entendemos que devido a especificidade deste tema tratado no Capítulo 4, e a grande
diversidade que este poderia ocasionar, visto que somente a discussão sobre o ensino
de arquitetura já nos seria objeto de inúmeras discussões e, no que trata esta
pesquisa de mestrado, o estudo de um percurso histórico. Isso abarcando as escolas
que envolvem o ensino de arquitetura mais relevante no século XX, compreendendo
sua influência no ensino contemporâneo, fato este de grande contribuição para a
consolidação desta pesquisa.
Portanto o Capítulo 4 se deteve em apontar inicialmente os princípios e conceitos do
ensino grã-bretanho, francês e americano na busca de construir um conjunto de
elementos que subsidiasse no entendimento do ensino de arquitetura naqueles
países. Por outro lado, os estudos das escolas russas e alemãs se aproximam mais da
realidade e metodologia adotada nas escolas brasileiras.
Logo, o estudo destas escolas como os VKhUTMAS-VKhUTEIN, a Bauhaus e a
Hochschulu für Gestaltung tem por objetivo aproximar estas experiências da realidade
de nossas escolas brasileiras, tomando como objetos de estudo as escolas cariocas e
paulistas, com ênfase na ENBA, assumida por Lucio Costa que reformulou o ensino
acadêmico daquela escola e a FAUUSP, com a nova estrutura física e pedagógica de
Vilanova Artigas. Em suma, este capítulo descreverá a experiência didática vivida por
mim em três semestres, em 2001 e 2002, como professor da disciplina de Projeto de
Arquitetura na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Braz Cubas,
em Mogi das Cruzes – SP.
A construção de um programa de ensino foi norteada, naquele momento, em investir
num curso novo sob a ótica da pesquisa e experiência com os objetos de estudo.
Porém, entendemos que a ocasião sugeria uma experiência nova para a disciplina
dada aos alunos do segundo semestre do curso, sendo o primeiro contato com o
projeto do edifício na vida acadêmica. É importante considerar, entretanto, que no
primeiro semestre as questões levantadas na disciplina de projeto buscam dar uma
visão geral sobre arquitetura para “nivelar” os conhecimentos dos alunos.
Neste sentido, ao elaborar o curso e seu conteúdo programático, resolvemos trabalhar
sobre o tema da casa, experiência vivida por todos os alunos e tema discutido por
diversos autores, assim como possibilitar o debate sobre vários aspectos: a cultura, a
forma de abrigo, tecnologia etc.
Neste ponto, o tema “casa” é escolhido como fio condutor da análise de um objeto
arquitetônico, onde uma infinidade de arquitetos por todo o mundo trabalha sobre um
programa de necessidades extremamente simples que, ao longo do tempo, admite a
variação infinita.
Ainda neste capítulo, nos detemos em descrever a metodologia adotada para a
transmissão dos conhecimentos, com a utilização das casas modernistas de arquitetos
reconhecidos e importantes na história da arquitetura moderna.
Para a descrição deste trecho do Capítulo 4, utilizamos material gráfico e iconográfico
adquirido durante os semestres lecionados na FAUUBC: plantas baixas, cortes,
elevações e os diagramas construídos pelos alunos para a elaboração dos exercícios
propostos no programa de trabalho. Outro material que subsidiou a elaboração deste
trecho do capítulo foram as imagens das maquetes físicas das casas estudadas e,
mais tarde do exercício final proposto.
13
Os resultados alcançados são ainda descritos neste capítulo como uma forma de
“fechar o ciclo” de idéias e indagações lançadas desde o início desta dissertação, em
que as reflexões sobre a experiência didática vivida nos levaram a refletir sobre os
métodos adotados para a transmissão e troca de experiências.
Deve-se notar que uma disciplina para ser bem abstraída de forma crítica e coesa
pelos alunos, deve possuir alguns atrativos, além do quadro curricular do curso, e que
tragam confiança e ansiedade de conhecimento por parte do futuro arquiteto.
No entanto, em se tratando de um modelo pedagógico geral, este desenvolvimento
apenas aponta tendências de uma nova forma de ensino, na busca de uma nova
dinâmica funcional entre o professor – que transmite o conhecimento e o estudante –
captador das informações colocadas pelo corpo docente.
Entendemos que a pluralidade de soluções e resultados em que o método pode
chegar são diversas e, cientes que a forma com que é conduzida a parte teórica e
pratica da disciplina. Deste modo, supondo, então, que o tema proposto constitui
apenas um caso a ser estudado com possíveis reinterpretações – alterar, substituir,
revelar, questionar e até mesmo propor – e esta dissertação de mestrado, antes que
um projeto finalista, teve como meta, apontar hipóteses, caracterizar e interpretar as
percepções e resultados do aluno e arquitetura sobre o tema proposto.
São nestas condições que a elaboração do último capítulo – “Conclusão” - são
colocadas como uma reflexão sobre o decorrer das pesquisas de cada capítulo
elencado, tendo como parâmetro o compromisso de fornecer uma contribuição sobre o
tema e suas indagações a respeito do ensino de projeto nas escolas de arquitetura de
nosso país.
Neste sentido as propostas e descrições aqui apresentadas devem falar mais como
“exemplos”, que para regulamentações – repropondo as relações aluno/professor,
ensino e aprendizagem, que incidam de alguma maneira sobre sua organização geral
de cada escola.
Esta dissertação, além de permitir a aferição destas indagações e hipóteses
pedagógicas, mais que trazer soluções, pretende levantar questões a serem
discutidas, além de confrontar alguns modelos pedagógicos existentes.
Pretende-se que o resultado final possa fornecer subsídios para novos planos e
metodologias pedagógicas para o ensino de projeto de arquitetura, cumprindo, como
Paschoal Leme aponta em seu manifesto dos pioneiros da educação nova:
“... preparar pessoas competentes nas áreas de conhecimento que
escolheram, com uma ampla e sólida formação humanista e acima de tudo
dotadas de agudo senso critico que as leve a nada aceitar para critério de
imposição e autoridade”.
14
1 O Modernismo
15
A arquitetura moderna é um produto da civilização ocidental e começou a tomar forma
durante o fim do século XVIII com as revoluções democráticas e industrial, as quais
produziram a era moderna.
2
Como produção arquitetônica, o moderno possibilitou as
realizações únicas e excepcionais, aplicadas às soluções das necessidades do novo
cliente – o homem “urbano e moderno”.
É este conceito fundamental de “cultura do modo de vida”
3
que estará na base de
todas as teorias arquitetônicas e, enquanto arte, revelou algumas verdades básicas da
condição humana, além de que, como toda arte, desempenhou um importante papel
na mudança e reforma dessa própria condição.
Contudo, a caracterização do que seria o movimento moderno tem tido abordagens
bastante diferentes para diversos historiadores do período, sobretudo no que se
relaciona com as “origens” ou a definição do ponto em que se define, com clareza, o
estabelecimento da arquitetura moderna.
4
Para tanto, tomar algumas posições a respeito dessa caracterização, buscando um
registro conciso e contínuo da história da arquitetura moderna, inevitavelmente cairá
em contradições e, no que considero mais grave, poderia deixar de mencionar, ou dar
seu devido mérito, a personagens fundamentais para a formação, concretização e
consagração deste movimento.
Uma adequada interpretação do entendimento da essência da arquitetura moderna
revela a dinamização entre as diversas “áreas” em que o modernismo existiu. Falar da
arquitetura sem mencionar o artista moderno, que surge como um indivíduo autônomo
do Romantismo e criador que não está sujeito às exigências de um cliente.
5
Obras de Pablo Picasso, Wassili Kandinsky, Kasimir Malevich e Piet Mondrian que
buscaram a possibilidade da “desmaterialização”: o plano e a composição, as linhas e
as cores na pintura, as estruturas, os elementos e as formas geométricas puras. Assim
como não se pode deixar de mencionar James Joyce na literatura, Arnold Schönberg
na música, Ludwig Wittgenstein na filosofia entre outros que contribuíram para a
criação de uma nova sociedade.
“[Com] o desenvolvimento de meios de comunicação cada vez mais abstratos, a
continuidade de uma comunicação arraigada é substituída por novos sistemas que
continuam a se aperfeiçoar ao longo do século XIX, permitindo à população maior
mobilidade e proporcionando uma informação que é mais precisamente sincronizada
com o ritmo acelerado da história. A ferrovia, a imprensa diária e o telégrafo
suplantarão aos poucos o espaço em seu papel informativo anterior”.
Françoise Choay
A cidade moderna: planejamento do século XIX, 1969.
Em 18 de novembro de 1926, numa conferência feita em Leningrado, Anatoli
Lunatcharski, dizia em relação à vida cotidiana russa da época:
2
. Scully Jr., Vincent. Arquitetura moderna: a arquitetura da democracia. 2002. pág. 15.
3
. Kopp, Anatole. Quando o moderno não era um estilo e sim uma causa. 1990. pág. 19.
4
. Machado, Lúcio Gomes. In Rino Levi e a Renovação da Arquitetura Brasileira. 1992. pág. 03.
5
. Montaner, Josef Maria. La modernidad superada, Arquitectura, arte y pensamiento del siglo XX. 2001.
pág. 09.
16
“Não se passará mais de um ano ou dois para que essas questões (referentes ao
modo de vida – AK) ocupem o primeiro lugar em nossa ação, porque o verdadeiro
objetivo da revolução é justamente a reestruturação total do modo de vida”.
Porém, ao “remontar” sobre a história da arquitetura moderna, há importantes nomes
em que devemos mencionar para que possamos constituir os aspectos formais e
princípios estabelecidos em que nossa arquitetura – e arquitetos – se referenciam
projetualmente. Pois, se examinarmos o que se constrói hoje, o que se mostra nas
exposições, o que se publica nas revistas especializadas e até mesmo na grande
imprensa, podemos considerar que a arquitetura – como na “Belle Époque” da Escola
de Belas Artes - não é mais do que um simples jogo de formas e volumes.
6
Fica claro, que não devemos nos levar pelas considerações de Anatone Kopp que
apesar de sua importante reflexão sobre nossa produção arquitetônica
contemporânea, deixa claro em seu discurso a relação do uso a que se faz um edifício
limitado-se a observação do exterior.
Deve-se considerar que o movimento moderno, decorrente dos novos programas que
irá enfrentar, aborda as transformações culturais, territoriais e difunde a questão
tecnológica, na qual emergiu no modernismo possibilitando o desenvolvimento urbano
e engenharia levando à criação de novas formas espaciais.
Para tanto, é perfeitamente lógico mencionar como os primeiros arquitetos dos tempos
modernos, Stuart e Revett, Ledouox, Jefferson, unindo-os num percurso histórico a
partir deles até o presente e a obra inicial de Le Corbusier, onde, será um dos
principais personagens e incentivadores deste movimento por todo o mundo,
difundindo seus cinco “princípios essenciais” da arquitetura moderna: o piloti, planta
livre, fachada livre, teto jardim e o brise-soleil.
Casa dos guardas rurais, em Mapertuis, 1780 Edificio da biblioteca. Universiade de Virgínia
gravura – Claude-Nicolas Ledox Charlottesville – 1819-26 – Thomas Jefferson
Os elementos valorizados por Le Corbusier: a nova qualidade estética da máquina, a
limpeza formal, a rejeição do ornamento e a disciplina do standard manufaturado, são
atributos estéticos de uma nova linguagem, compromissada com um estamento
sintético que só se traduzia através do estímulo emocional do criador.
7
Para ele, seus princípios deveriam ser considerados como a nova arquitetura que o
Movimento Moderno levaria aos diversos países do mundo como forma de um novo
conceito de vida. Sua forma racionalista de pensar o edifício e a cidade influenciou
novas gerações de arquitetos através da reformulação de uma nova sociedade,
6
. Kopp, Anatole. Quando o moderno não era um estilo e sim uma causa. 1990. p. 15.
17
mostrando que a arquitetura moderna é técnica, estética, economia, higiênica e
ideologicamente melhor que a tradicional.
8
Prova disto está na Unidade de Habitação em Marselha - 1946-52, onde o arquiteto
busca uma monumentalidade ativa através da estrutura de concreto armado. Cada
apartamento é tratado como uma unidade (quase) autônoma e cada morador tem a
sua disposição tudo o que necessita para morar, enquanto que as áreas coletivas são
concentradas criando-se novos espaços e conceitos defendidos por Corbusier. "O pé-
direito duplo de cada apartamento dá para as montanhas e o mar, e é em relação às
montanhas e ao mar que o edifício como um todo deve ser visto".
9
Porém é com esta obra que podemos observar os "princípios essenciais" que Le
Corbusier defende para a formação da nova arquitetura, assim como a proposta para
Chandigarh, na Índia, em que coloca na prática seus princípios para a cidade moderna
no plano geral para esta cidade, desenhando ao norte a ampla Plaza que é formada
pelos edifícios do complexo do Capitório, o Secretariado e a Corte Suprema. Estes
são definidores de espaço que abrigam em seu interior a Assembléia e o Palácio do
Governo equilibrando com as formas na paisagem que tem ao fundo as montanhas do
Himalaia.
Cabe ressaltar que esta análise deve ser observada além da configuração espacial
dos edifícios neste complexo. A forma com que o arquiteto defendia a configuração
das novas cidades, que já vinha demonstrando em seus estudos para a Carta de
Atenas e Ville Radiese e que somente neste momento consegue por em prática,
apesar de parcialmente, mas que irá influenciar e pôr em discussão o "racionalismo e
a setorização" na conformação das novas cidades.
Unidade Habitacional de Marselha – França Parlamento de Chandigarh – Índia
Foto do autor - 2006
Toda esta descrição tem apenas como intenção demonstrar que entre os diversos
arquitetos que contribuíram com a consolidação do Movimento Moderno desde o fim
do século XIX e início do século XX não deverão ser menosprezados e/ou ignorados
pela história, visto que cada personagem deste percurso possuiu sua identidade
própria e linguagem arquitetônica sem se "desconectar" dos princípios defendidos por
Le Corbusier.
Desta forma é inevitável não deixar de mencionar a arquitetura organicista de Frank
Lloyd Wright onde podemos citar uma de suas obras mais significativas como a Casa
da Cascata na Pensilvânia - 1936-37. Há ainda o racionalismo de Mies van der Rohe
que expressou em sua obra a sua influência à redução da assimetria e das formas
espacialmente fluidas, e a uma concentração renovada no edifício como uma estrutura
7
. Barone, Ana Cláudia Castilho. Team 10: arquitetura como crítica. São Paulo: Annablume: Fapesp,
2002, p. 153.
8
. Idem, p. 28.
9
. Scully Jr., Vincent. Arquitetura moderna: a arquitetura da democracia. 2002, p. 96-97.
18
ideal e uma expressão da ordem humanista
10
.
Sobre isso podendos citar diversas obras de relevância como a Residência Farnsworth
em Illinois - 1950, os Edifícios Residenciais Lake Shore Drive em Chicago - 1951 ou o
Edifício Seagram, Nova York -1958 em parceria com Philip Johnson; ou o racionalismo
e a metodologia de Walter Gropius, principal protagonista no ensino da arquitetura
moderna, inclusive com a criação da Bauhaus como um dos objetos de metodologia
para o "novo ensino".
Portanto, não interessa neste capítulo destacar o estudo das obras de cada arquiteto
ou artista que contribuiu para a consolidação do Movimento Moderno, os fatos
relevantes em si mesmo, ou as soluções de projetos elaborados por eles diante do
panorama da história da arquitetura.
O objetivo desta análise é possibilitar uma breve descrição do panorama em que
arquitetos de diversos países, principalmente da Europa, estavam estudando e
discutindo através da troca de experiências sobre os trabalhos desenvolvidos. A
existência dos CIAM - Congressos Internacionais de Arquitetura Moderna, desde a sua
primeira edição em 1928, em La Sarraz, foram inicialmente propostos por Le
Corbusier, um dos maiores defensores da adoção da nova linguagem arquitetônica.
Esta seria uma solução universal para a questão do espaço na Europa durante os
anos 20
11
, considerando sua existência nas 10 edições, a consolidação de uma
hegemonia para a arquitetura e o urbanismo modernos em função de princípios e
diretrizes.
12
Isso nos remete ao fato de que a compreensão dos "primórdios" sobre o modernismo
no Brasil deve ser construída a partir dos acontecimentos não somente internos no
país, mas aos fatos em que os países europeus passavam e aos personagens
modernistas que influenciaram os jovens arquitetos brasileiros.
Diante do panorama ainda marcado seja pelo ecletismo - como era o ambiente da
Capital Federal, seja por uma natural resistência a qualquer alteração do quadro
tradicional das cidades provincianas - como era o caso de São Paulo - não havia maior
repercussão, entre nós, das diversas e profundas inovações, que se observam na
Europa, no campo das artes e da arquitetura.
13
A arquitetura no Brasil está positivamente deslocada das duas
correntes em que se divide, do ponto de vista artístico, a
concepção da arquitetura moderna. Não está, de fato, nem com os
reformadores revolucionários que procuram na arquitetura um jogo de
formas geométricas primárias ordenadas no espaço virtual e de um
caráter social marcado; nem com os tradicionalistas que a querem
encarada sob uma óptica local, em todos os aspectos que toma a seu
ambiente. Nem se orienta no sentido de uma "arte mundial" em que se
apaguem as diferenças regionais e cuja estética resulte da nossa técnica
de construção e da solução de problemas puramente utilitários; nem
tenta vincular a arte às tradições locais e ao espírito da raça. Em uma
10
. Idem, p. 71.
11
. Le Corbusier. Por uma arquitetura. São Paulo. Edusp, 1973.
12
. Barone, Ana Cláudia Castilho. Team 10: arquitetura como crítica. São Paulo: Annablume: Fapesp,
2002, p.25.
13
. Costa, Lucio. Muita Construção, alguma arquitetura e um milagre. In, Depoimento de uma geração –
arquitetura moderna brasileira. São Paulo: Cosac & Naify, 2003, p. 95.
19
palavra nem é tradicionalista, nem antitradicionalista. Nem nacional,
nem "supranacional". Definiu-a Monteiro Lobato com essa expressão
motejadora: "um jogo internacional de disparates..."
Fernando de Azevedo [1926a]
Neste sentido, os textos de Rino Levi, em outubro de 1925 e, Gregori Warchavchik em
novembro do mesmo ano, são considerados pelos historiadores como marcos do
início da arquitetura moderna no Brasil, e de onde podemos extrair um trecho de cada
publicação para a contribuição deste trabalho:
"... A coisa é muito diferente quando examinamos as máquinas para habitação - os
edifícios. Uma casa é, no final das contas, uma máquina cujo aperfeiçoamento técnico
permite, por exemplo, uma distribuição racional da luz, calor, água fria e quente
etc..."
14
"... A arquitetura, como arte mãe, é a que mais se ressente dos influxos modernos
devido aos novos materiais à disposição do artista, aos grandes progressos
conseguidos nestes últimos anos na técnica da construção e, sobretudo, ao novo
espírito que reina em contraposição ao neoclassicismo, frio e insípido. Portanto,
praticidade e economia, arquitetura de volumes, linhas simples, poucos elementos
decorativos, mas sinceros e bem em destaque, nada de mascarar a estrutura do
edifício para conseguir efeitos que, no mais das vezes, são desproporcionados ao fim,
e que constituem sempre uma coisa falsa e artificial..."
15
Observa-se que nos dois trechos selecionados das publicações de Warchavchick e
Levi descrevem uma vontade em buscar novas soluções para uma sociedade "viciada"
em um modo de vida e costumes, sociais e estéticos, advindos dos países
colonizadores.
Esta busca pela liberdade estética e tecnológica por uma personalidade arquitetônica
brasileira que ganharia mais tarde um personagem fundamental para este fato, o
arquiteto Lucio Costa com suas propostas e obras de uma arquitetura “moderna
tropical" e sua breve contribuição na ENBA - Escola Nacional de Belas Artes no Rio de
Janeiro.
Por outro lado, é pertinente mencionar outros acontecimentos que contribuíram para a
consolidação do modernismo no Brasil e que, de certa forma, mesmo não estando
ligados diretamente à arquitetura, foram de suma importância para a construção de um
novo olhar sobre um Movimento que se inseria no país.
“Trata-se de uma série de atividades artísticas realizadas em São Paulo, em fevereiro
de 1922, com grande alarde e no intuito de provocar escândalos. Seus participantes
pretendiam subverter os padrões estéticos dominantes: o escândalo destinava-se a
chamar a atenção do público para as novas manifestações. Era uma ruptura com as
idéias vigentes, mas uma ruptura sob proteção das representações mais consagradas
14
. Warchavchick, Gregori. Acerca da arquitetura moderna. In, Depoimento de uma geração – arquitetura
moderna brasileira. São Paulo: Cosac & Naify, 2003, p. 35.
15
. Levi, Rino. A arquitetura e a estética das cidades. In, Depoimento de uma geração – arquitetura
moderna brasileira. São Paulo: Cosac & Naify, 2003, p. 38.
20
do regime, as mais austeras, as mais conservadoras”.
16
Não somente a conhecida “Semana de 22”, em pleno ano de comemoração do
centenário da Independência do Brasil, realizada no Teatro Municipal de São Paulo
com três saraus com literatura e música, uma exposição de arquitetura, escultura e
pintura; motivada por um desafio a um novo espírito que preconizava na sociedade.
Mas também, a exposição de pinturas de Anita Malfatti – jovem artista que expunha o
seu aprendizado artístico na Alemanha e Estados Unidos – não pretendia, com suas
telas de caráter fauve, deflagrar nenhum movimento,
17
contribuíram para a formação
de um grupo de artistas que viriam a alimentar uma nova corrente contra os valores
acadêmicos vigentes.
No que tange a arquitetura, tanto Georg Przyrembel – arquiteto polonês, como Antônio
Garcia Moya – de ascendência espanhola, não apresentaram grandes novidades na
Semana de Arte Moderna, Przyrembel demonstrou sua interpretação do neocolonial
aplicada em casa de praia
18
e Moya expôs desenhos de monsoléus, templos e casas
de inspiração maia ou asteca, confundíveis também com influências da arquitetura
popular mediterrânea, sem dúvida estranhos aos cânones Beaux-arts.
19
Diferentemente das demais artes ali expostas, como a música, literatura e pintura, fica
claro que a arquitetura não acompanhava o mesmo vigor das demais, onde os
arquitetos não ostentavam uma consistência programática como os seus colegas
literários ou artistas plásticos.
Contudo, é com a construção de uma casa na Rua Santa Cruz, no distante subúrbio
da Vila Mariana, concluída em 1928, para sua própria moradia, que Warchavchick
consolida seus conceitos de um racionalismo formalista, herdeiro das primeiras
propostas de Le Corbusier e de alguns arquitetos que o precederam na formação
desta tendência, como Loos,
20
constituindo a primeira expressão de arquitetura
moderna em São Paulo e no país.
Casa da rua Santa Cruz - São Paulo – 1928
Arq. Gregori Warchavchick
16
. Sodré, Nelson Wernwck. A verdade sobre o modernismo. In, Depoimento de uma geração –
arquitetura moderna brasileira. São Paulo: Cosac & Naify, 2003, p. 32.
17
. Segawa, Hugo. Arquitetura no Brasil 1900-1990. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo,
2002, p. 42.
18
. Amaral, Aracy. Artes plásticas na Semana de 22: Subsídios para uma história da renovação das artes
no Brasil. São Paulo: Perspectiva / Edusp, 1972, p. 237-238.
19
. Segawa, Hugo. Arquitetura no Brasil 1900-1990. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo,
2002, p. 43.
20
. Costa, Lucio. Muita Construção, alguma arquitetura e um milagre. In, Depoimento de uma geração –
arquitetura moderna brasileira. São Paulo: Cosac & Naify, 2003, p. 95.
21
"A primeira casa é moderna mais na aparência do que no seu verdadeiro partido. De
fato, foi, por exemplo, construída com técnica tradicional de tijolos, incompatível com a
proposta de 'janelas de canto' nela presentes. Além disto, há total incoerência entre a
forma das fachadas e a planta, entre a fachada frontal e a posterior e, ainda entre a
forma geometrizada e a cobertura de telhas capa-e-canal. É verdade, que a realização
material das propostas teóricas do racionalismo de Le Corbusier eram de extrema
complexidade para a técnica disponível à época e que, mesmo o arquiteto suíço,
somente no final da década de 20, pode ser construídas suas primeiras propostas".
21
Entre 1928 e 1931, Warchavchick projetou sete residências (além da sua) e dois
conjuntos de moradias econômicas em São Paulo, bem como uma residência no Rio
de Janeiro. Dessas obras, a casa da rua Itápolis, no Pacaembu, foi a que mais se
aproximou do ideal à Bauhaus de integração das artes.
22
“Na rua Itápolis nº 61, a casa moderna da ‘Cia City’.
Muita gente conhece. Ela teve um dia de popularidade. Suas paredes nuas
desconcertaram, suas janelas quadradas irritaram, seu ar de fortaleza
mexicana causou arrepios. Hoje entrou integralmente em nossos costumes.
Venceu. Quem constrói um bangalô, já espeta no terreiro um mandacaru. [...].
Os congressistas presentes foram unânimes em admirar a construção do
senhor Gregori Warchavchick, manifestando o seu agrado àquele arquiteto...
“A impressão é agradável. Os que se mantinham em reserva foram logo
conquistados. Afinal, pensando bem, os modernistas não fizeram mais que
limpar as fachadas, ampliar e retificar os respiradouros, abrir espaços para a
luz e para o ar, suprimir arrebiques, frisos, lambrequins, tudo aquilo que
durante muito tempo pareceu enfeitar uma casa...Uma casa modernista é uma
casa que alcançou a última simplicidade. Disso surgiu a beleza.”
23
Casa na rua Itápolis – São Paulo, 1928
Arq. Gregori Warchavchik
Porém é com um grupo de jovens arquitetos brasileiros, coordenado por Lucio Costa e
com a colaboração de Le Corbusier, que durante cerca de um mês trabalhou sob o
convite dos brasileiros para a elaboração do projeto do Ministério da Educação e
Saúde, no Rio de Janeiro, formado por Carlos Leão, Jorge Moreira, Affonso Eduardo
Reidy, Ernani Vasconcelos e Oscar Niemeyer.
21
. Idem, p. 95-96.
22
. Segawa, Hugo. Arquitetura no Brasil 1900-1990. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo,
2002, p. 45.
23
. O Estado de S. Paulo, 28 de maio de 1931.
22
Evolução do projeto do Ministério da Educação e da Saúde
Rio de Janeiro – 1936-37
O projeto do ministério refletia o dilema da dependência que envolvia o
desenvolvimento artístico brasileiro: ao buscar um símbolo de modernização nacional,
os brasileiros abraçavam formas corbusianas e uma ideologia européia. As formas e
métodos de Le Corbusier foram facilmente aceitos porque eram vistos como
apropriados ao clima do novo regime político brasileiro e às possibilidades técnicas de
uma nação em processo de industrialização, em que o concreto armado era muito
mais acessível do que o aço.
24
Desta forma, a sede do Ministério da Educação e
Saúde é considerado o ponto inicial de uma linguagem realmente do modernismo
brasileiro.
Oscar Niemeyer que neste momento era apenas um jovem arquiteto recém formado,
cuja confiança de Lucio Costa, coloca-o como responsável por finalizar os projetos do
MES terá sua carreira e sua linguagem própria reconhecida por diversos paises do
mundo. Sua arquitetura modernista de formas livres e puras, desenhando edifícios que
considere o clima tropical de nosso país, faz dele um dos mais importantes arquitetos
do século XX e representantes da arquitetura brasileira pelo planeta.
Seu projeto para o Pavilhão do Brasil na Feira Mundial de Nova York, em conjunto
com Lucio Costa, em 1938, demonstram a consolidação de uma linguagem
arquitetônica que considerasse os preceitos de Le Corbusier com a identidade
brasileira, onde o pilotis, a rampa de acesso e os elementos vazados de fachada,
funcionam como brise-soleil, assim como a curvatura da parede acompanhando o
terreno e o jardim na parte posterior.
Sua primeira afirmação independente acerca de um modernismo de formas livres veio
em 1940,
25
onde por encomenda do então prefeito de Belo Horizonte – MG, Juscelino
Kubitscheck, projetou em um bairro afastado cerca de 10 Km do centro da cidade, um
conjunto de edifícios ao longo do lago artificial.
O programa composto pelo cassino, um iate clube, uma casa de baile e restaurante,
uma casa de férias para o prefeito, uma pequena igreja dedicada a São Francisco e
24
. Underwood, David Kendrick. Oscar Niemeyer e o modernismo de formas livres no Brasil. São Paulo:
Cosac & Naify Edições, 2002, p. 35.
25
. Idem, p. 54.
23
até mesmo um hotel,
26
foi pensado pelo arquiteto como um “carnaval de formas para
uma elite exuberante, um complexo de lazer”.
27
Destas obras propostas por Niemeyer, talvez a mais polêmica seja a igreja de São
Francisco de Assis. Inovadora pelo inusitado emprego de uma casca parabolóide para
a nave, associada a abóbadas para o abrigo das demais dependências religiosas.
28
A
forma escultural com que o arquiteto se apropria para desenhar esta pequena “capela”
faz dela uma das obras mais fascinantes na vida profissional de Niemeyer.
Além disso, ele estabelece uma grande harmonia com o entorno através do
paisagismo de Burle Marx e da exploração de um “belíssimo” painel de Candido
Portinari estabelecendo uma relação com a tradição decorativa da arquitetura colonial
portuguesa por meio do uso de azulejos (a composição branca e azul de Portinari).
Pampulha – BH – Minas Gerais. Croqui da Igreja de São Francisco – Pampulha, 1943
Implantação em torno da lagoa, 1940
Contudo acredito que é com a realização de Brasília que Niemeyer chega ao ápice de
sua arquitetura, podendo demonstrar todos seus conceitos que o arquiteto acredita
como ideal para a arquitetura moderna e, sobretudo a brasileira.
Na realização do concurso para a escolha do Plano Piloto de Brasília
29
, onde o
arquiteto e urbanista foi o vencedor apresentando uma idéia, um plano-piloto em uma
única planta e croquis ilustrativos dos conceitos contidos num relatório. “O relatório de
Lucio Costa era direto quanto à apresentação das soluções. Propunha a cidade ‘não
apenas como urbs, mas como civitas, possuidora dos atributos inerentes a uma
capital’.
Seu desenho inicial nasceu de uma poética analogia ao ‘gesto primário de quem
assinala um lugar ou dele toma posse: dois eixos cruzando-se em ângulo reto, ou seja,
o próprio sinal da cruz’”.
30
“A Arquitetura Brasileira tem serviços prestados à
nacionalidade nesse sentido. Mostrou ao mundo admirado que o Brasil pode
erguer-se para o concerto universal de nações, com linguagem própria, na qual
26
. Neste programa proposto, o hotel não foi executado.
27
. Segawa, Hugo. Arquitetura no Brasil 1900-1990. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo,
2002, p. 54.
28
. Idem, p. 100.
29
. Oscar Niemeyer era um dos participantes do júri do concurso do Plano Piloto de Brasília.
30
. Costa, Lucio. Relatório do Plano Piloto de Brasília. Brasília: Governo do Distrito Federal, 1991, p. 20.
24
o brasileiro e o universal se casam harmoniosamente. Ontem, construíamos
timidamente alguns edifícios; hoje, fazemos Brasília – uma cidade inteira – com
argumentos nossos. De Casa em Casa, de Cidade em Cidade, ficai certos,
ajudaremos a reconquistar o Brasil para os brasileiros”.
João Vilanova Artigas, 1959.
Incumbido das obras de Brasília pelo então presidente da república Juscelino
Kubitscheck, Niemeyer desfrutou de uma virtual “carta branca” para decisões artísticas
na criação dos principais monumentos da cidade.
31
Neste sentido, o arquiteto propõe
edifícios com uma plástica ainda não vista pelo mundo, fazendo da capital brasileira
um “festival de imaginação” que iria demonstrar um novo rumo para a arquitetura
moderna no Brasil e, por conseguinte, colocando o jovem Niemeyer como um dos
mais importantes arquitetos do século XX.
O conjunto de edifícios implantados no eixo monumental talvez seja um dos mais
significativos em Brasília, visto que a integração entre os temas trabalhados pelo
arquiteto e a paisagem do Planalto Central – tendo ao fundo o Lago Paranoá –
harmonizando revolução e magia.
Revolução por diversos aspectos: a idéia da transferência da capital do país do Rio de
Janeiro para o coração do território brasileiro,
32
além do desafio colocado no slogan
do Governo JK – “cinqüenta anos de progresso em cinco” – no que colocaria uma
verdadeira multidão de técnicos e profissionais que migrariam para o Planalto Central
para a construção de Brasília. Enquanto a magia ficaria a cargo de Oscar Niemeyer, a
qual tinha como função a construção de edifícios que simbolizasse uma nova era para
o Brasil.
A composição dos edifícios que compõem a Praça dos Três Poderes – o Congresso,
Supremo Tribunal Federal e o Palácio do Planalto, cada qual com sua particularidade
assumem levíssimas estruturas que vemos apenas tocar o solo, como se fossem
aves:
“Quando tentava soluções para a forma destes palácios, tinha
também em mente a atmosfera que eles iriam conferir à Praça dos Três
Poderes [...]. Eu visualizava os palácios com uma riqueza de formas, sonhos e
poesia, como as misteriosas pinturas de Carzou, novas formas, surpreendendo
os visitantes pela sua leveza e liberdade de criação; formas que não estavam
presas rígida e estaticamente à terra, mas que erguessem os Palácios como se
fossem surpreendê-los, brancos e etéreos, nas noites sem fim do planalto;
formas surpreendentes e de tirar o fôlego que elevariam o visitante, mesmo
que só por um breve instante, por sobre os problemas difíceis e às vezes
esmagadores que a vida oferece a cada um de nós”.
Oscar Niemeyer
Por outro lado, a concepção do Congresso em relação à Esplanada dos Ministérios
tem a ilusão do conjunto dos “grandes paralelepípedos verdes” ao longo do eixo
monumental e do gramado ao centro, que guardam, ou protege o Congresso
simbolizado pelas duas cúpulas (côncava e convexa) em perfeito equilíbrio entre si.
31
. Underwood, David Kendrick. Oscar Niemeyer e o modernismo de formas livres no Brasil. São Paulo:
Cosac & Naify Edições, 2002, p. 81. (grifo nosso).
32
. A proposta de transferir a capital do país não pode ser colocada apenas como inédita por Juscelino
Kubitscheck, já que a constituição republicana de 1891 apontava para o planalto central a nova capital,
que ao longo da primeira metade do século seguinte foram desenvolvidos os estudos.
25
Pode se dizer que este conjunto se completa com a divina proteção expressa na
Catedral de Brasília. Ao definir o edifício com relação à essência volumétrica criada
por seus elementos estruturais, Niemeyer alcança unidade de forma, volume, estrutura
e simbolismo religioso.
33
Nisto, a forma proposta pelo arquiteto nos remete a diversas compreensões sobre as
“mensagens” que a catedral pode transmitir a seu visitante, seja ela espiritual quando
Niemeyer remete o topo pontiagudo simbolizando a coroa de espinhos de Cristo,
estendendo-se aos céus “como um grito de fé e esperança”
34
, ou mesmo pela solução
técnica encontrada através das dezesseis nervuras em forma de “bulmerangue”,
esqueleto que estrutura a edificação que constitui uma das mais ousadas máximas de
Niemeyer: “quando a estrutura está pronta o edifício foi finalizado”.
35
Brasília – Vista aérea da Praça dos Três Poderes e Superquadras
Também é justo mencionar a grande contribuição de Lucio Costa para a consolidação
da arquitetura moderna no Brasil, que a partir da realização do Ministério da Educação
e Saúde, da estadia de Le Corbusier em diversos países da América Latina,
principalmente no Brasil onde foi um dos grandes contribuidores para o projeto do
MES, onde se coloca em prática pela primeira vez suas teorias
36
.
Ressaltamos ainda sua breve passagem pela direção da Escola Nacional de Belas-
Artes, capítulo aparte na história do ensino da arquitetura no Brasil e as diversas obras
realizadas pelo arquiteto. Este considerava como elemento primordial de sua
arquitetura seu país natal e as características físicas de cada local de intervenção que
ele propõem.
A casa de Argemiro Hungria Machado, no Rio de Janeiro – 1942, demonstra uma obra
ainda discreta na sua expressão moderna com a utilização ainda de telhas coloniais e
a simetria das janelas da fachada principal se contrapõem ao exterior ligado ao
interior, o brise-soleil em madeira e os jardins do pavimento superior.
As habitações no Parque Guinle, também no Rio de Janeiro – 1948 -1950 –1954, com
seis edifícios residenciais que levam a novas propostas de conjuntos habitacionais e
uma nova linguagem arquitetônica sobre este conjunto que está inserido num grande
parque próximo ao centro do Rio.
33
. Underwood, David Kendrick. Oscar Niemeyer e o modernismo de formas livres no Brasil. São Paulo:
Cosac & Naify Edições, 2002, p. 100.
34
. Idem, p. 100.
35
. Oscar Niemeyer.
36
. Apesar da consultoria prestada por Le Corbusier, a convite do grupo de arquitetos brasileiros, a
proposta colocada em prática surgiu com uma independência própria e uma preocupação de adequar as
condições locais verdadeiramente admiráveis.
26
Há ainda o Park Hotel, projeto de 1944 em Nova Friburgo no Rio de Janeiro, exemplo
claro de integração ao meio ambiente, “ditada por um espírito de relação afetiva com o
passado, livre de qualquer imitação ou cópia, abrindo caminho para a adoção de
soluções tipicamente contemporâneas”.
37
Oswaldo Arthur Bratke, arquiteto-engenheiro formado pela Escola de Engenharia
Mackenzie, foi um grande pesquisador de novos materiais e técnicas construtivas que
contribuísse para a realização de suas obras com uma arquitetura moderna própria,
que respeitasse o local e a paisagem existente.
Suas casas podem ser consideradas os exemplos mais significativos de seus
conceitos estudados e defendidos durante sua vida profissional. Neste sentido, cultura
técnica e potencial expressivo. Tectônica e estética. Modernidade e tradição
38
, serão
marca registrada da obra do arquiteto que entre seus contemporâneos, pouco se
influenciou com Le Corbusier, mas por outro lado são de grande contribuição para sua
arquitetura obras dos arquitetos Walter Gropius e Richard Neutra, este último a quem
acompanhou em sua passagem por São Paulo.
Sua residência e estúdio no Morumbi, projetada em 1951, sintetizou um conjunto de
práticas que vinha desenvolvendo nas obras anteriores, onde dois anos antes havia
concluído a sua casa ateliê experimental na rua Avanhandava.
39
Esta casa onde o
programa de necessidades foi desenvolvido num único pavilhão conformando uma
casa térrea implantada na parte mais alta do terreno, mantendo apenas as áreas de
serviços e sala de jogos no pavimento inferior explorando o desnível do terreno.
Nisto esta obra torna-se mais horizontal valorizada ainda mais pela modulação dos
pilares de concreto que sustentam a laje plana e os elementos vazados de concreto –
cobógos. Vale mencionar que esta é a primeira obra de Bratke que explora a cobertura
plana equacionando os problemas climáticos da cidade paulistana.
Oswaldo Bratke foi um arquiteto que permeou diversos temas e programas em sua
vida profissional – edifícios comerciais como Jaçatuba – 1942, edifício ABC – 1949 e
Renata Sampaio Ferreira – 1956, o que demonstra claramente a trajetória de sua
arquitetura que foi evoluindo a cada proposta colocada em prática nesta esquina da
rua Major Sertório com o largo próximo à avenida Ipiranga na cidade de São Paulo.
Vista de três obras projetadas por Btatke em diferentes
períodos na confluência das ruas Araújo e Major Sertorio:
edifícios Renata Sampaio Ferreira, ABC e Jaçatuba (a
partir da esquerda, em sentido horário).
37
. Mindlin, Henrique E. Arquitetura moderna no Brasil. Rio de Janeiro: Aeroplano Editora/IPHAN,
2000, p. 128.
38
. Segawa, Hugo. Oswaldo Arthur Bratke. São Paulo: Proeditores, 1997, p. 49.
39
. Idem, p. 107.
27
O Balneário Municipal em Águas de Lindóia, no interior do Estado de São Paulo, como
diversas obras de Bratke, explora, o terreno e a paisagem como partido arquitetônico
para chegar à forma e plástica dos edifícios propostos.
“A compreensão do conjunto arquitetônico não se faz de imediato. As primeiras
vistas tomadas de pontos elevados insinuam um edifício principal como um
volume horizontal que atravessa o pequeno vale. Ao se aproximar, percebe-se
que sua configuração global envolve tamm um edifício baixo, entranhado na
depressão do vale, formando um pátio. O teto-jardim desse bloco (que abriga
alguns banhos, duchas e massagens) e sua implantação rente às vertentes da
gleba atenuam sua presença na paisagem, ressaltando o volume principal à
maneira de uma estrutura-ponte, de aspecto introspectivo porquanto também
abriga banhos”.
40
Este extenso conjunto de edifícios, implantados em forma de um quadrilátero
resultando num interessante pátio com jardins desenhados por Roberto Burle Marx e
murais em mosaico vitroso elaborados por Lívio Abramo dão a esta obra uma maior
leveza e integração ao entorno e a paisagem existente, criando um edifício harmônico
e gracioso de se visitar.
Balneário em Águas de Lindóia – SP – 1952/59
No entanto, é com o projeto urbanístico e arquitetônico para Vila Serra do Navio e Vila
Amazonas, encomendado pela empresa Indústria e Comércio de Minérios – Icomi, que
iria explorar jazida de manganês na Serra do Navio, no território do Amapá, que
Oswaldo Bratke chega ao ápice de sua carreira com a construção destes núcleos
urbanos na Amazônia.
Responsável por todo o dimensionamento e elaboração dos núcleos, o arquiteto foi
reunindo informações das necessidades básicas de uma cidade, chegando a um
programa que atendesse a uma população prevista entre 2.500 e 3.500 habitantes,
41
considerando a possibilidade de ampliar a capacidade destes núcleos.
Com isto, nasce uma cidade toda planejada para abrigar os trabalhadores da
empresa, desde os diretores até os operários. A diversidade das tipologias das casas
propostas tinha características semelhantes entre si, a técnica construtiva adotada, de
alvenaria de vedação simples e cobertura de duas águas e grandes beirais protegiam
as moradias do intenso calor da região norte do país e uma linguagem arquitetônica
igualitária entre si não possuindo hierarquia nas soluções adotadas pelo arquiteto.
40
. Ibidim, p. 201.
41
. Número de habitantes apontado por Bratke numa série de tabelas elaboradas por ele.
28
Além das moradias, Vila Serra do Navio também foi provida dos equipamentos
necessários para seu funcionamento, considerando que este núcleo está inserido em
plena Floresta Amazônica, cerca de 200 Km de Macapá, que em meados do século
XX este núcleo estaria muito afastado de toda infra-estrutura das cidades mais
próximas. Neste sentido, Vila Serra do Navio foi dotado de comércio, clube dos
operários, setor administrativo, casa de hóspedes e complexo educacional.
Vista da Vila Serra do Navio – Amapá - 1959
[...] a arquitetura moderna, tal como a conhecemos, é uma arma de opressão, a
arma da classe dominante, uma arma de opressores contra oprimidos.
42
Em 1952, João Vilanova Artigas publica o polêmico “Caminhos da Arquitetura
Moderna” em que contesta dura e agressivamente os dois maiores expoentes da
arquitetura moderna: Frank Lloyd Wright e Le Corbusier.
43
É com este manifesto e com a construção de sua primeira casa, a conhecida
“Casinha” num bairro da zona sul da cidade, que Artigas demonstra sua forma e ver,
desenhar e construir a arquitetura moderna no Brasil.
João Vilanova Artigas é responsável por diversas obras de grande importância como o
Estádio do Morumbi – 1952, os Vestiários do São Paulo Futebol Clube – 1961,
Anhembi Tênis Clube – 1961, Garagem de Barcos do Santa Paula Iate Clube – 1961,
as escolas Itanhaém, Guarulhos e Santo André em 1959, 60 e 62 consecutivamente.
Há ainda em Londrina, Paraná, a Casa da Criança, construida em 1950, e a
Rodoviária do mesmo ano; em Jaú – SP a Rodoviária em 1973 e em 75 o Balneário da
cidade, podem ser alguns dos diversos temas e edifícios que Artigas ao longo de sua
carreira pôs em prática.
Com o tema da habitação, Artigas teve duas contribuições consideráveis para a
arquitetura moderna brasileira, primeiro com o Edifício Louveira, na Vila Boim em São
Paulo, projetado em 1946 este conjunto habitacional composto por duas laminas de
oito pavimentos conformador de um pátio ajardinado que coloca em questão um novo
42
. João Vilanova Artigas. Os caminhos da arquitetura moderna, in Caminhos da arquitetura. São Paulo:
Cosac & Naify, 1999, p. 27.
43
. Kamita, João Masao. Vilanova Artigas. São Paulo: Cosac & Naify, 2000, p. 7.
29
olhar sobre a forma de ocupação dos edifícios residenciais que vinham surgindo na
cidade de São Paulo.
Já em 1967 Artigas coordena uma equipe formada por Fábio Penteado e Paulo
Mendes da Rocha para a elaboração do Conjunto Habitacional “Zezinho Magalhães
Prado” em Guarulhos para abrigar cerca de 50 mil habitantes. Dada a escala do
empreendimento, o programa prevê vários serviços além das moradias,
44
apesar da
proposta não ser colocada totalmente em prática, o Parque CECAP Guarulhos é tido
até hoje como um importante elemento formador e conformador do repertório
arquitetônico de diversos estudantes e arquitetos.
Edifício Louveira – SP – 1946 / Ginásio de Guarulhos – SP – 1960 / Conjunto Habitacional Zezinho
Magalhães Prado – Guarulhos – SP - 1967
Porém é com a consolidação da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo de São Paulo
– FAUUSP que Vilanova Artigas demonstra toda sua visão e conceito sobre a
arquitetura moderna, não somente na forma plástica, estética e espacial, mas também
no modo de compreender o ensino da arquitetura naquele momento.
45
Um grande paralelepípedo que pousa sobre os pilares de concreto, liberando o térreo
para abrigar o pátio de encontros da faculdade, mais tarde batizado de “Piso
Caramelo”, dando maior flexibilidade ao programa e ao conceito do novo modo de
ensino sobre arquitetura. A rampa cumpre a função de interligar os níveis dos
pavimentos intercalados que abrigam os ateliês e salas teóricas. Já a biblioteca se
integra ao piso caramelo numa grande vitrine para o vazio coberto e iluminado pela
iluminação zenital se comunica diretamente com o pátio central da escola, local de
encontros, assembléias, exposições.
A forma com que o concreto se expressa através do imenso volume retangular com
seus apoios, resultado do tratamento e forma construtiva adotado pelo arquiteto onde
as marcas das fôrmas de madeira impressas na sua superfície impõem com
veemência a “caixa opaca erguida sobre o solo por altos pilares que vencem a altura
de dois pavimentos”.
46
“O que me encanta é usar formas pesadas, chegar perto da terra e,
dialeticamente, negá-las”, expressando a contradição, “entre o fazer e a
dificuldade de realizar”.
47
É com estes conceitos que Artigas produz sua arquitetura e experimenta suas formas
pesadas e robustas para abrigar uma grande diversidade de temas e programas:
44
. Idem, p. 106.
45
. As discussões a respeito dos conceitos de Artigas sobre o ensino de arquitetura serão mencionados em
capítulo especifico posteriormente nesta dissertação.
46
. Kamita, João Masao. Vilanova Artigas. São Paulo: Cosac & Naify, 2000, p. 35.
47
. Vilanova Artigas.
30
habitação social, escolas, teatros e centros institucionais, fazendo de sua arquitetura
um “agente de interação social”, pelo menos expressos na definição e compreensão
do programa de cada edifício proposto pelo arquiteto.
Mais tarde surge Paulo Mendes da Rocha, formado pela Escola Mackenzie em 1954,
com uma expressão contundente da confiança num projeto moderno que se considera
ainda não suficientemente implantado nas cidades brasileiras,
48
vai tornar-se uma
figura importante na história da arquitetura moderna, principalmente a paulista. É desta
forma que a arquitetura de Paulo Mendes da Rocha vai tornando-se representativa e
sucessora da primeira geração moderna, como Oscar Niemeyer e Lucio Costa, com
fortes influências e numa releitura de mestres da arquitetura moderna como Mies van
der Rohe e Le Corbusier, onde cada obra demonstra sua fascinação pela engenharia
e pela técnica, levando-o a ser reconhecido como um dos integrantes da chamada
Escola Paulista Brutalista.
Sua produção arquitetônica, no entanto, atua articulando estética, tecnologia e função
social da arquitetura; prova disto esta em um de seus primeiros projetos, o ginásio do
Clube Atlético Paulistano de 1957. “O ginásio surge como proposta de continuidade
espacial entre o tecido urbano, a obra arquitetônica e a percepção humana,
demonstrando que a arquitetura de uma cidade industrial é sempre a sua paisagem, a
sua segunda natureza.
49
Aliás, este tema é muito desenvolvido pelo arquiteto ao longo de sua carreira e seus
projetos. Para Paulo Mendes da Rocha, a arquitetura deve cumprir o papel de
redesenhar a paisagem e o território existente, de modo que as obras do arquiteto por
diversas vezes transformam a paisagem com harmonia e dissonância, não somente
como o ginásio acima descrito, mas outros como sua própria casa próximo a cidade
universitária da Universidade de São Paulo e o Pavilhão do Brasil na ”Expo 70” em
Osaka, no Japão.
”Somos nós que temos que tocar a terra de maneira inaugural, de forma nova...
com uma nova visão de paisagem”
50
“O espaço que nós (arquitetos) tratamos é um espaço de consciência universal,
é uma liberdade no âmbito do projeto universal, e não particular”
51
Neste sentido, o Pavilhão de Osaka se coloca na condição de uma obra simbólica: um
espaço que guarda uma relação íntima entre cultura e natureza: “uma praça no
parque”,
52
onde o arquiteto reconstrói a paisagem redesenhando a topografia do
terreno proposto.
O Pavilhão, em síntese, é composto por uma laje única, uma grande sombra que
acolhe o uso proposto. Este edifício aberto estabelece uma continuidade total entre
interior e exterior, onde o chão orgânico é composto pela ondulação do piso
reconstruído pelo desenho do arquiteto, e o pilar em cruz funciona como ponto crucial
entre a nova paisagem proposta e a estrutura que flutua sobre a terra.
48
. MONTANER, Josep Ma. e VILLAC, Maria Isabel. Mendes da Rocha. Portugal: Editorial Blau, 1996,
p. 06.
49
. Idem, p. 13.
50
. Paulo Mendes da Rocha em “Exercício da Modernidade”, in AU-Arquitetura e Urbanismo, nº 8, São
Paulo, Outubro/Novembro, 1996.
51
. Paulo Mendes da Rocha, “Cumbica 5”, in Debate CEB-GFAU, São Paulo, 1968.
52
. MONTANER, Josep Ma. e VILLAC, Maria Isabel. Mendes da Rocha. Portugal: Editorial Blau, 1996,
p. 14.
31
A obra de Paulo Mendes da Rocha está no limite entre o objeto construído pelo
homem e a paisagem em que esta à transforma, para tanto, ter contato com a
arquitetura de PMR é repensar a arquitetura moderna como transformadora não
somente o contexto econômico, social e político, no qual aparece essa ideologia
“moderna” na arquitetura e no urbanismo,
53
mas do território ao qual a intervenção se
coloca, haja vista este conceito é compreendido no Museu Brasileiro da Escultura –
MUBE, projeto de 1986, embora realizado somente em 1995.
“Compreender o Museu Brasileiro da Escultura – MUBE – desde o ponto de vista
programático faz com que o projeto pareça óbvio um espaço urbano – praça – que
abriga um teatro aberto, esculturas ao ar livre e jardins concebidos como mostra
exemplar do conhecimento artístico e científico do jardim do Brasil; abaixo, como falso
subsolo, um edifício que abriga exposições temporais, pinacoteca, escritórios de
administração, depósitos, cafeteria e uma sala de atos”.
54
No entanto uma visita a esta obra pode transformar-se num interessante “jogo de
descobertas” a cada espaço deste museu: a pedra plana que emoldura o vazio
arquitetônico da praça recepciona quem chega pela parte superior do museu,
convidando o visitante a participar da exposição abrigada nos jardins desenhados por
Roberto Burle Marx, com espelhos d´água, grande arvoredo, bromélias e flores
nativas, além da sombra que a “grande pedra” proporciona para o teatro ao ar livre,
levando o visitante a entrada principal do museu.
Neste espaço o percurso das exposições temporais são interrompidas, provavelmente
de forma proposital, pelas demais atividades do edifício – escritórios, ateliês, até
chegar ao grande salão de exposições iluminado pela zenital que dá acesso a praça
de chegada. Há ao fundo, a sala de atos sob o espelho d´água finalizando este
percurso que nos leva a uma praça rebaixada próximo a entrada principal do edifício.
Esboços do Pavilhão do Brasil na Expo de Osaka – 1969/70 e
Museu Brasileiro da Escultura – São Paulo – 1986/95
“A obra de Paulo Mendes busca ser manifestação de uma forma peculiar de
conhecimento sobre o universo real, o habitat do homem”,
55
e encontra no gesto
fundador a dimensão essencial do significado da arquitetura.
56
Lina Bo Bardi, arquiteta italiana que chega ao Brasil no início do século XX, teve em
sua carreira uma importante contribuição para a arquitetura moderna no Brasil,
53
. Como descrito por Anatole Kopp, em Quando e moderno não era um estilo e sim uma causa.
54
. MONTANER, Josep Ma. e VILLAC, Maria Isabel. Mendes da Rocha. Portugal: Editorial Blau, 1996,
p. 16.
55
. Paulo Mendes da Rocha em “Trajetória pessoal e modernidade”, in AU-Arquitetura e Urbanismo, nº
8, São Paulo, Ouubro/Novembro, 1996.
56
. MONTANER, Josep Ma. e VILLAC, Maria Isabel. Mendes da Rocha. Portugal: Editorial Blau, 1996,
p. 21.
32
influenciando diversos profissionais desta segunda geração modernista,
principalmente em São Paulo. Duas de suas obras neste Estado podem ser
referenciadas como fundamentais para descrever seus conceitos e forma de ver
arquitetura, que considera de forma expressiva a história do local e da civilização a
cada projeto.
O MASP – Museu de Arte de São Paulo, projeto de 1951 e o SESC Fábrica da
Pompéia, de 1977, são dois exemplares da obra de Lina Bo Bardi que constituem
formas diferentes de conceber o projeto, cada qual com sua especificidade, porém
com a personalidade própria da arquiteta.
A grande caixa de vidro que representa o MASP e o vão livre que recria o boulevard
para a Av. 9 de julho, este antagonismo entre a obra brutalista de Lina representada
pelos pesados pilares retangulares vermelhos e o pavilhão de exposições elevado do
térreo liberando a vista para o centro de São Paulo, faz a obra desta arquiteta uma
forma muito particular e fácil de identificar por onde Lina projetou.
O mesmo se pode identificar com a Fábrica da Pompéia onde a proposta da arquiteta
parte do respeito à história do local e do objeto de intervenção. Desta forma, Lina
mantém os galpões existentes, como poucos que participaram das propostas para o
SESC, assumindo as novas atividades que o programa necessitava e construindo
apenas duas torres que abrigam as atividades esportivas e ateliês, garantindo a
memória do bairro de forma harmônica com o novo uso proposto.
O concreto armado é a linguagem mais usual dos arquitetos brasileiros modernistas, e
Lina também se utiliza deste material como principal expressão de seu trabalho onde a
forma natural do material é levado ao extremo para compor sua arquitetura. Porém o
brutalismo da obra de Lina também se expressa de forma muito sutil e leve, como em
sua casa construída no Morumbi.
Nesta construção a arquiteta se utiliza da resistência que o concreto armado propicia
para resultar numa obra leve e transparente; a Casa de Vidro, como é conhecida, se
apropria da paisagem existente para explorar de forma magnífica o interior e exterior
da obra num só espaço onde o “bloco principal”, uma caixa de vidro sobre leves pilotis
de concreto, se abre para o entorno repleto de uma intensa massa verde do terreno.
Casa de Vidro – 1949 /Museu de Arte de São Paulo – 1957 /SESC Fabrica da Pompéia - 1977
Entretanto, descrever as obras paulistas e cariocas como únicos e exclusivos
contribuintes para a arquitetura moderna brasileira é injusto com o grande número de
profissionais que “desbravaram” o país colocando em prática seus ideais e conceitos
do Modernismo. A grande diversidade de programas e temas desenvolvidos
principalmente na primeira metade do século XX fez do Brasil um importante
laboratório para a arquitetura, o design e urbanismo colocando-o num novo patamar
na história da Arquitetura Moderna mundial.
33
Nisto, “a arquitetura moderna brasileira, mesmo informada de um conteúdo
internacionalista, corresponde a um esforço de transfiguração de concepções,
adquirindo cores próprias sem se apoiar numa tradição local imediata (eclética nas
três primeiras décadas do século 20), mas buscando no passado referências de
identidade – um desafio próprio daqueles que buscam a criação e a originalidade
inerentes à contemporaneidade, mesmo enfrentando e carregando as marcas das
incoerências políticas e sociais bem como o peso das divergências ideológicas de um
país à margem”.
57
Porém, listar autores ou obras projetadas e construídas durante o século XX pode
acarretar numa simples quantificação das contribuições destes profissionais para a
arquitetura moderna brasileira, podendo, nesta pesquisa, ser injusto com os diversos
profissionais que contribuíram direta ou indiretamente para o patrimônio moderno do
país.
Por outro lado, deixar de mencionar alguns personagens que participaram desta
história durante o século passado torna-se necessário para a contribuição desta
dissertação e demais pesquisadores que a considerarem válido para futuros estudos.
Obras como o Centro Cívico Estadual, em Curitiba – PR, projeto do arquiteto David
Xavier Azambuja e equipe, de 1951, demonstra um perfeito domínio do espaço de
intervenção com uma ocupação dos edifícios propostos de forma harmônica com a
malha viária da cidade, assim como o Fórum de Três Lagoas – MT, assinado em 1966
pelo arquiteto Oscar Arine, contribuíram através de edifícios administrativos com a
melhoria urbana e da infra-estrutura das cidades.
Arine, arquiteto paulista, que se transferiu para a capital do Estado, Cuiabá,
desenvolveu diversos projetos de edifícios públicos – “escolas, fóruns, hospitais,
cadeias, delegacias, auditórios e até um campus universitário -, levando para uma
região inóspita um tipo de arquitetura de vanguarda que se praticava em São Paulo
nos anos de 1960”.
58
Alvaro Vital Brazil em muito contribuiu com sua arquitetura, tanto em São Paulo como
em outros Estados, como em Minas Gerais com o Edifício do Banco da Lavoura, em
Belo Horizonte – 1951, assim como o arquiteto Luiz Nunes, do Departamento de
Arquitetura e Urbanismo de Olinda – Pernambuco, que tanto contribuiu para o
planejamento urbano desta cidade e importantes edifícios como o “leprosário de
Mirueira, o pavilhão de verificação de óbitos da Faculdade de Medicina e o
reservatório de água de Olinda”
59
, que utiliza-se de forma intensiva do emprego do
cobogó criando superfícies servindo como brise-soleil e como superfície de ventilação,
muito bem empregados naquela região do país.
Pode-se dizer que a Bahia também recebeu grandes personagens e obras que muito
contribuíram com a arquitetura moderna brasileira, como o Elevador Lacerda em
Salvador, considerada por Segawa como a “inserção mais espetacular de uma obra
Déco na paisagem tradicional”, que cumpre o papel de ligar a parte alta à baixa da
cidade numa estrutura de 73,50m de altura em concreto armado.
57
. Segawa, Hugo. Arquitetura no Brasil 1900-1990. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo,
2002, p. 112.
58
. Hugo Segawa, 1990.
59
. Segawa, Hugo. Arquitetura no Brasil 1900-1990. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo,
2002, p. 84.
34
“Projetado pelo arquiteto Fleming Thiesen, foi detalhado pelo escritório Prentice &
Floderer do Rio de Janeiro, com a provável participação do arquiteto húngaro
Adalberto Szilard para a firma dinamarquesa Christiani & Nielsen e construído ao
longo do ano de 1929. Paulo Ormindo de Azevedo o considera a primeira obra de
arquitetura moderna construída na Bahia.”
60
No entanto, ao mencionarmos a arquitetura moderna baiana não podemos deixar de
mencionar o nome do arquiteto João Filgueiras Lima, o conhecido Lelé, que muito
contribuiu com a construção de Brasília a convite de Oscar Niemeyer, desenvolvendo
com maestria uma importante pesquisa em pré-moldados para a realização das
unidades habitacionais da nova capital brasileira.
Lelé utilizou desta técnica para desenvolver sua linguagem arquitetônica ao longo de
sua vida profissional, podendo citar diversas obras significativas como os Hospitais da
Rede Sara Kubistcheck ou a Prefeitura de Salvador.
Apesar do grande número de obras e intervenções urbanas que a arquitetura moderna
brasileira pôde estabelecer como uma nova linguagem arquitetônica a evolução
técnica e construtiva num país que se desenvolvia com rapidez no inicio do século XX,
o emprego do concreto armado como principal material de expressão do “modernismo
brasileiro” faz também evoluir o desenho das obras e a liberdade plástica de cada
projeto proposto.
Porém, não é somente na técnica construtiva que a arquitetura moderna pode
estabelecer um novo patamar na história da arquitetura no século XX, ao menos no
Brasil. Podemos chegar a conclusão que os idéias e conceitos estabelecidos pelos
arquitetos que propagaram o Movimento por diversos países, dentre os quais Le
Corbusier, Frank Lloyd Wright, Mies van der Rohe, Walter Gropius entre tantos outros,
o programa de necessidades das novas edificações são as que mais sofreram
alteração durante o século passado, uma vez que romper com paradigmas
estabelecidos à séculos eram um dos grandes desafios para a nova sociedade que
nascia junto a este século.
Neste ponto, a residência foi o tema que mais sofreu, e ainda sofre, mudanças em sua
compreensão junto a um novo modo de viver – a cultura, costumes e crenças, uma
nova sociedade, que se transforma com a “Era da Máquina”.
Quando falamos deste tema – a casa – é inevitável não deixar de mencionar os
conceitos de Vilanova Artigas e suas casas que por si só foram manifestos dos
conceitos defendidos pelo arquiteto. Com sua obra ele busca “modificar a tipologia da
casa paulistana”, seguindo “as modificações sociais que se processavam em nosso
país”.
61
É com a casa que fez para si que Artigas põem em prática seus ideais e conceitos da
nova casa moderna:
“Foi um rompimento formal grande, tive coragem de fazer porque era para mim,
me libertei inteiramente”.
62
60
. Idem, p. 64.
61
. “Depoimento” de Artigas em Alberto Xavier (org), Depoimento de uma geração. São Paulo.
ABEA/FVA/Pini, 1987, p. 186.
62
. Vilanova Artigas, in ARANTES, Pedro Fiori. Arquitetura Nova: Sérgio Ferro, Flávio Império e
Rodrigo Lefèvre, de Artigas aos mutirões. São Paulo: Ed. 34, 2002, p. 15.
35
A “Casinha”, construída em 1942, pode ser destacada por diversos aspectos como os
materiais utilizados para sua execução numa fase difícil para o país com o segundo
pós Guerra Mundial e a escassez de alguns materiais, como o cimento e o aço
importados, materiais que representavam a arquitetura moderna neste momento. Mas
o que mais impressiona nesta obra e a forma com que Artigas desenha os espaços
deste programa que se modificava com a “nova sociedade”. “... A planta é fluida e
circular, integrando as áreas de uso comum (sala, cozinha e varanda); estabelece um
núcleo hidráulico central que organiza simultaneamente o espaço; e, por fim, destaca
da área comum o dormitório e o ateliê que, organicamente integrados, dão o exemplo
do novo homem que ali mora e que, mesmo quando descansa, é sobre o próprio
trabalho”.
63
A forma com que Artigas trata o programa da casa modernista como um modo de
estabelecer uma nova ética, e neste sentido a “Casinha” de Artigas abre a discussão
sobre o morar modernista e também as experiências com as diversas casas que o
arquiteto vai produzir durante a sua vida profissional.
Com a Residência Olga Baeta, executada em 1956 em São Paulo, Artigas ensaia um
programa de necessidades onde o interior e exterior da casa se fundem num só
espaço, fazendo com que esta casa se abra para a lateral do terreno possibilitando
maior integração entre o local de intervenção e o objeto proposto. Já na Residência
Elza Berquó, projetada em 1967 para o casal Elza Berquó e Rubens Murilo Marques,
podemos considera-la como uma “casa manifesto”:
“Elza me procurou para que eu fizesse uma casa para ela. Respondi-lhe
dizendo: ‘Você está louca! Estou sendo julgado pelo tribunal de segurança. A
primeira sessão vai ser depois de amanhã. Vou ser condenado. O que é que
você quer, que eu faça um projeto de uma casa para você na cadeia?’ Mas
você conhece a Elza, a robustez catastrófica... e fiz o desenho dessa casa
meio como ‘arquiteto-presidiário’”.
64
Este momento é conturbado da vida de Artigas, onde com o golpe de 1964 o arquiteto
é preso, libertado após 12 dias e exilado por um ano no Uruguai, porém
permanecendo na clandestinidade até ser absolvido em 1966, um ano antes da
execução desta casa que foi projetada durante este panorama em sua vida:
“Fiz uma estrutura de concreto armado apoiada sobre troncos de madeira, para
dizer que, nessa ocasião, essa técnica toda, de concreto armado, que fez essa
magnífica arquitetura não passa de uma tolice irremediável em face das
condições políticas que viria nesse momento”.
65
Neste momento, o desenho-desígnio de Artigas parece ter ficado sem ponto de apoio.
Como lembra Elza, naqueles anos de liberdade ameaçada, o abrigo tornou-se
refúgio.
66
E é com este panorama que surge esta casa desenhada por Artigas para os
professores da USP, uma residência em único pavimento com seus ambientes
63
. ARANTES, Pedro Fiori. Arquitetura Nova: Sérgio Ferro, Flávio Império e Rodrigo Lefèvre, de
Artigas aos mutirões. São Paulo: Ed. 34, 2002, p. 16.
64
. Vilanova Artigas, in ARANTES, Pedro Fiori. Arquitetura Nova: Sérgio Ferro, Flávio Império e
Rodrigo Lefèvre, de Artigas aos mutirões. São Paulo: Ed. 34, 2002, p. 39.
65
. Vilanova Artigas.
66
. Depoimento de Elza Berquó citado em Maria Luiza Corrêa, in ARANTES, Pedro Fiori. Arquitetura
Nova: Sérgio Ferro, Flávio Império e Rodrigo Lefèvre, de Artigas aos mutirões. São Paulo: Ed. 34, 2002,
p. 40.
36
organizados ao redor de um pátio central, de forma a explorá-lo como elemento de
iluminação zenital para estes ambientes.
Residência Elza Berquó – SP – 1967
Outros arquitetos brasileiros podem ser aqui mencionados por terem colocado em
suas obras, especialmente as casas por si projetadas, como objetos de estudo e
pesquisa sobre o modo de morar do homem moderno. Neste sentido, Oswaldo Bratke
fez de suas casas um incansável laboratório aplicando novos conceitos e resultando
em “casas estéticamente inovadoras; socialmente instigadoras, porque as pressupõem
adaptadas a novos padrões de vivência”
67
, não somente na forma de compreendê-las
como objetos de transformação social, mas como novas tecnologias em sua execução
e a valorização dos materiais industrializados como solução para a rápida construção
de suas obras.
Admirador da obra de Walter Gropius e influenciado pela arquitetura de Richard
Neutra, sua produção foi sempre disciplinada pelo rigor técnico e pela lógica
construtiva
68
, sem necessariamente associá-lo ao racionalismo da pura técnica, visto
que suas obras são compreendidas em seu potencial expressivo, onde o tema
explorado – a casa, é colocada pelo arquiteto como fonte de inúmeros experimentos
condicionados entre o “lugar, o arquiteto e o cliente”.
69
As casas que Bratke projetou e executou para si podem ser citadas como importantes
exemplos de objetos onde o morar e trabalhar se encontram numa só obra. Tanto a
Casa e ateliê na rua Avanhandava como a no Morumbi foram concebidas de forma
que o programa da casa não entrasse em atrito com o estúdio de trabalho, e é neste
ponto que esta nova “cultura moderna” do homem do século XX se coloca como
desafio aos jovens arquitetos modernos do Brasil.
A metodologia utilizada por Bratke para alcançar o resultado plástico e sensorial em
suas obras, disponibilizando como instrumento de trabalho sua sensibilidade de
organizar os espaços e correspondê-los ao lugar, fica claro na descrição de Segawa
sobre a Residência e estúdio no Morumbi, projeto de 1951 implantado neste recém
formado bairro com características de cidade-jardim:
“Internamente, os três setores domésticos essenciais – estar, dormir e serviços
– obedeciam à rigorosa modulação estrutural, mas admitindo reordenações na
planta. Na ala dos dormitórios, a configuração dos quartos era definida pela
disposição dos armários – estruturas móveis de madeira compensada com
isolante acústico, assegurando remanejamento dos cômodos segundo as
67
. Segawa, Hugo. Oswaldo Arthur Bratke. São Paulo: Proeditores, 1997, p. 26.
68
. Esta disciplina modular é marcante na obra de Bratke, sobretudo as dos anos 1950 e principalmente
em suas residências.
69
. Chegamos a esta conclusão a partir dos estudos e análises das obras do arquiteto e às visitas as
residências citadas.
37
exigências, numa solução que vinha sendo adotada em outros projetos
residenciais de anos anteriores”.
70
Esta descrição também nos possibilita confrontar a residência do arquiteto às casas
projetadas por Richard Neutra, onde a modulação estava sempre presente em suas
obras, assim como o modo com que setorizava suas casas – organizando-as em alas
como Bratke assume nesta residência, deixando claro a influência e referência às
obras do arquiteto Sueco.
Rino Levi também teve uma significativa contribuição para a consolidação da
arquitetura moderna brasileira. Entretanto suas residências projetadas e construídas
em meados do século XX tornaram-se interessantes objetos de estudos e
significativos modelos de um novo modo de vida deste século.
Suas casas introvertidas
71
, compostas por paredes opacas ou elementos vazados, as
coberturas quase planas reforçando a horizontalidade de suas obras. Porém o que
mais surpreende em suas casas é a composição entre o interior e exterior, cheio e
vazio onde o pátio interno assume o papel de organizador central de todo o programa
de necessidades da casa.
Estas composições são facilmente identificadas em diversas casas do arquiteto
durante sua trajetória profissional, onde o pátio central cumpre o papel de organizar os
espaços e ambientes destas residências. A casa Arnstein em São Paulo (1940) e a
casa de hóspedes para a família Médici, também em São Paulo de 1945, são típicas
deste partido arquitetônico adotado por Rino Levi na busca por espaços e ambientes
integrados através das áreas vazias e tomando os espaços exteriores como
composição para a paisagem vista do interior dos ambientes.
Planta da Casa Arnstein – SP – 1940 e Casa de hóspedes/pavilhão de lazer para a família Medini –
SP - 1945
Outro fator relevante nas casas de Rino Levi é a composição entre a construção do
abrigo e a integração às artes. Em sua grande maioria, suas obras são projetadas e
elaboradas em conjunto a painéis, esculturas e pinturas que se interagem a todo o
conjunto proposto. Neste sentido, a casa Olívio Gomes em São José dos Campos
pode ser considerada um interessante exemplar desta manifestação da arte através
dos painéis, pinturas e também com o próprio paisagismo proposto por Burle Marx
para esta casa.
70
. Segawa, Hugo. Oswaldo Arthur Bratke. São Paulo: Proeditores, 1997, p. 108.
71
. Adjetivo utilizado por Renato Anelli em Rino Levi – arquitetura e cidade. São Paulo: Romano Guerra
Editora, 2001, p. 94.
38
“Tinha papel importante na arquitetura e Rino Levi alertou-me para o fato de
que a cor dos azulejos forçosamente ligava-se à cor das folhas e das plantas
escolhidas. A dominante azul do painel unia-se aos ocres da arquitetura. Foram
então escolhidas plantas com folhas de cor violeta e flores amarelas e
vermelhas”.
72
Fica claro, através deste depoimento de Burle Marx, que a preocupação em valorizar a
arquitetura proposta fazia com que o arquiteto acompanhasse de perto as
intervenções no sentido destas entrarem em sintonia com sua obra.
Residência Olívio Gomes – São José dos Campos – SP – 1949/51
Apontar a grande diversidade produzida ao longo do século XX em todo o país pelos
arquitetos modernistas brasileiros poderia tornar este capítulo numa incansável
listagem e quantificação de casas, não somente em São Paulo e Rio de Janeiro, mas
em quase todos os Estados do Brasil. No entanto, este texto tem como “obrigação”
colocar a disposição do leitor algumas obras, selecionadas por nós, que foram
significativas não somente para a história da arquitetura moderna brasileira, e mundial,
mas também que contribuíram para uma nova forma de compreender o modo de vida
do “homem moderno”.
Sabemos que elencar algumas obras ou autores destas casas pode-se cair numa
“injustiça” com determinadas obras ou arquitetos que não venham a ser mencionado
nesta pesquisa. Porém, entendemos que deixar de mencioná-las também pode ser
uma “injustiça” àqueles que tanto contribuíram para a produção da arquitetura
moderna em nosso país.
O projeto da Casa de Argemiro Hungria Machado, no Rio de Janeiro, proposta por
Lucio Costa e executada em 1942, a primeira impressão nos remete a uma construção
onde os conceitos modernistas são no mínimo “obscuros”, no entanto a “construção
maciça, o grande beiral, as telhas coloniais; o alinhamento simétrico das janelas da
fachada principal e os muxarabis do pátio – evocação nostálgica do passado – se
fundem naturalmente com as características modernas do projeto: o exterior ligado ao
interior por uma varanda inteiramente aberta ao pátio, uma grande porta com brise-
72
. BURLE MARX, Roberto. Depoimento sobre Rino Levi, in Rino Levi 1901-1965, Arquitetura e
Cidade. São Paulo: Romano Guerra Editora, 2001, p. 144.
39
soleil móveis em madeira dando para o jardim da frente e, no andar superior, os
jardins de inverno junto aos respectivos quartos”.
73
O mesmo já não podemos dizer da proposta de Vilanova Artigas para a Casa de
Heitor Almeida, de 1949 em Santos – SP, influenciado por Frank Lloyd Wright integra
o pátio central, responsável pela articulação vertical da casa, integrando ao volume da
construção, que também setoriza a casa e organiza os espaços em dois blocos em
níveis diferentes.
Casa de Argemiro Hungria Machado – RJ – 1942 – Arq. Lucio Costa e Casa de Heitor Almeida –
Santos – SP – 1949 – Arq. Vilanova Artigas
Henrique Mindlin produziu um número considerável de obras que merecem ser
mencionadas, ou ao menos apontadas nesta pesquisa – a casa de campo de George
Hime em Petrópolis – RJ (1949) e mais tarde, em 1955, a casa de campo de Lauro
Carvalho também em Petrópolis no Rio de Janeiro são objetos exemplares da
arquitetura moderna onde o arquiteto explora a paisagem para compor suas obras,
fazendo-as participar do local de intervenção, ora através das aberturas e janelas que
exploram a vista do entorno,
74
ou compondo um verdadeiro “quadro”, uma tela
composta pela obra e a paisagem, explorada na casa Lauro Souza Carvalho.
Assim como Mindlin, Sérgio Bernardes também possui um acervo arquitetônico muito
rico e válido de se estudar, como a casa de campo de Guilherme Brandi – 1952, em
Petrópolis – RJ, onde “(...) o tratamento da área dos pilotis, a leveza da escada e a
maneira como o muro de sustentação de pedra liga a casa ao jardim estão
subordinados às linhas claras e nítidas que definem o volume principal da casa”.
75
Casa de campo de Guilherme Brandiu – RJ – 1952 - Arq. Sergio Bernardes e
Casa de campo de Lauro Souza Carvalho – RJ – 1955 – Arq. Henrique E. Mindlin
73
. Mindlin, Henrique E. Arquitetura moderna no Brasil. Rio de Janeiro: Aeroplano Editora/IPHAN,
2000, p. 44.
74
. Isto acontece essencialmente na casa de George Hime.
75
. Mindlin, Henrique E. Arquitetura moderna no Brasil. Rio de Janeiro: Aeroplano Editora/IPHAN,
2000, p. 72.
40
Outros arquitetos merecem ser mencionados nesta pesquisa, onde as casas
projetadas para si ou clientes são consideradas referências para a história da
arquitetura moderna brasileira, não somente pela forma plástica alcançada, o sistema
estrutural proposto ou o modo com que a obra se relaciona com o entorno, mas
também as experiências colocadas em prática em relação ao novo programa de
necessidades da casa moderna.
Casas projetadas por Carlos Millan, uma no Alto de Pinheiros e outra na Cidade
Jardim
76
, ambas em São Paulo, são dois exemplos de residências onde os preceitos
modernistas são identificados com clareza, onde o concreto armado se expressa
livremente como partido plástico das obras, além da utilização da circulação vertical
como elemento de composição do resultado formal das residências, levando para a
parte exterior da obra “inaugurando uma sistemática logo seguida pelos seus jovens
colegas”.
77
Carlos Lemos e Eduardo Corona muito contribuíram para o desenvolvimento da
arquitetura moderna brasileira, não somente através de suas obras, mas também com
seus conceitos e métodos pedagógicos, principalmente Corona que juntamente com
Eduardo Keenese de Melo muito contribuíram com o ensino da arquitetura. A
residência Luiz Eduardo Magalhães Gouvêa, projetada em 1961 em São Paulo, possui
características muito interessantes a serem estudadas: o terreno com
aproximadamente mil metros quadrados possibilitou aos arquitetos explorá-lo de forma
muito interessante, onde o partido arquitetônico valoriza o pavimento superior,
abrigando os dormitórios, com um volume triangular em concreto armado, enquanto o
térreo é em sua maioria envidraçado protegida por uma longa empena de elemento
vazado e a utilização de painel artístico como elemento de integração entre a obra e a
paisagem proposta – “(...) os arquitetos pretenderam distinguir, no partido adotado, o
volume superior..., fazendo com que as paredes externas, em forma de triângulo, se
dirigissem diretamente ao solo... A grande área de estar é parcialmente envidraçada,
estando a sala de jantar voltada para o pátio interno, onde há um espelho d’água. Num
dos terraços cobertos foi executado grande painel cerâmico, autoria de Lula Cardozo
Ayres (...)”.
78
Residência Luís Eduardo Magalhães Gouvêa – SP – 1961 – Arq. Carlos Lemos e Eduardo Corona
A residência do arquiteto Joaquim Guedes, projetada em 1971, pode ser apontada
como uma das mais significativas obras deste arquiteto, que explora nesta casa a
grande declividade do terreno com cerca de 1.800,00 m
2
, no bairro do Morumbi em
São Paulo, para propor uma construção em três pavimentos, porém garantindo uma
76
.A primeira residência foi projetada em 1960 para o Sr. Roberto Millan, e a segunda para a Sra. Nadir
de Oliveira, também em 1960.
77
. XAVIER, Alberto, LEMOS, Carlos, CORONA, Eduardo. Arquitetura Moderna Paulistana. São Paulo:
Pini, 1983, p. 54.
78
. Idem, p. 68.
41
construção longa promovendo a “horizontalidade” da obra. O pavimento intermediário
abriga as principais funções desta casa onde o salão de estar se transforma em
terraço, “graças as amplas portas corrediças, voltadas para NE e SO, faces protegidas
por generosas marquises”.
79
Residência do Arquiteto – SP – 1971 – Arq. Joaquim Guedes
Residências projetadas pelo arquiteto Ruy Ohtake, entre elas a de sua mãe e artista
plástica Tomie Ohtake cujo partido arquitetônico pode ser caracterizado pela laje
nervurada que vai da frente aos fundos do terreno abrigando as funções desta casa,
criando amplos espaços de convivência sob esta cobertura.
A residência José Antonio Filipelli possui um partido muito próximo da primeira, onde a
laje de cobertura encosta-se nas laterais do lote explorando, de forma inteligente, a
iluminação zenital através de pérgulas para levar luz natural aos ambientes desta
casa; nas duas obras citadas vale ressaltar o constante uso do concreto armado e do
vidro como expressão plástica para as obras, com um minucioso trabalho com as
formas de madeira para compor um “desenho harmonioso” entre a obra e a paisagem.
Vista externa da residência José Antonio Filippelli – SP – 1971 e Vista interna da residência Tomie
Ohtake – SP – 1968 (ambas obras do arquiteto Ruy Ohtake)
As residências projetadas por diversos arquitetos modernistas para si mesmo
tornaram-se grandes experiências bem sucedidas, onde o autor pôde explorar
livremente os conceitos do modernismo e transformar sua moradia num “catalogo”
para os clientes que de certa forma ainda permaneciam receosos com esta nova
forma de morar.
As casas de arquitetos como José Eduardo de Assis Lefèvre, na Lapa – SP, projetada
em 1972, explora as abóbadas em concreto armado como elemento estrutural para a
cobertura, além do resultado plástico causado por esta solução. Marcos Acayaba
utiliza um partido estrutural para sua casa muito próximo a de Lefèvre, neste caso um
grande teto parabólico cumpre a função de abrigar os ambientes desta casa, “com
isto, o arquiteto conseguiu um bom efeito visual, onde fica bem patente a função
‘protetora’ da laje curva”.
80
79
. Ibdim, p. 134.
80
. Ibdim, p. 176.
42
Já Eduardo de Almeida necessitada projetar uma casa para sua família relativamente
numerosa – casal, cinco filhos e sogra – requerendo do arquiteto explorar o terreno
que apesar de amplo, possuía uma grande declividade para trás; a harmoniosa
combinação das rampas com os vazios permitiram maior controle dos espaços
projetados e dosagem da iluminação natural desta casa.
Em 1976 Abrahão Sanovicz, projeta sua casa no Butantã – SP, cujo partido
arquitetônico caracteriza-se numa caixa de concreto suspensa sobre quatro pilares, já
o resultado plástico desta obra nos remete as soluções de Le Corbusier para suas
obras, criando as aberturas como elementos que compõe de forma harmoniosa o
volume final da casa.
Residência dos arquitetos (em ordem) – José Eduardo de Assis Lefèvre – 1972 / Marcos de
Azevedo Acayaba – 1973 / Eduardo de Almeida – 1975 / Abrahão Sanovicz - 1976
Porém, alguns arquitetos puderam experimentar por mais de uma vez seus ideais e
conceitos para a arquitetura moderna, Vilanova Artigas e Oswaldo Bratke construíram
para si mais de uma casa ao longo de sua carreira profissional. Oscar Niemeyer
também produziu diversas casas para si, podendo notar uma ligeira evolução e
liberdade nas formas encontradas para estas casas.
A primeira residência que o arquiteto fez para si, em 1942, foi construída ao mesmo
tempo em que surgia o Conjunto da Pampulha em Belo Horizonte; de pequena escala,
a Casa na Lagoa na Fonte da Saudade – RJ, que busca adaptar aos ares e culturas
tropicais.
“A casa da rua Carvalho de Azevedo apresenta interesse não só como embrião de
fases futuras. Ela é, em si, um excelente exemplar de arquitetura que, apesar de
compacta e econômica, não abre mão da criatividade e invenção espacial”.
81
Em 1949, Oscar projeta sua segunda casa nos arredores de Mendes – RJ, onde
busca fugir da tipologia de casas tradicionais: “uma enorme treliça de madeira ocupa
toda a fachada inclinada da casa”,
82
servida de brise-soleil para proteger e dar
privacidade aos dormitórios da casa. Esta casa projetada para o descanso e lazer do
arquiteto se integra com graciosidade à paisagem e a natureza deste local.
A Casa das Canoas, construída em 1953 em São Conrado – RJ, pode ser considerada
o ápice de sua arquitetura nas experiências que fez com suas moradias. Considerada
uma das belas residências modernas do mundo, toda composição surge a partir de
uma grande rocha existente no qual se desenvolve em seu entorno a casa e a piscina.
O ponto focal esta na cobertura plana de forma abstrata que pontua os espaços
abertos da casa, protegidos pela parede de vidro que acompanha a forma da laje,
estabelecendo um diálogo com a exuberante paisagem da montanha e do mar
carioca.
81
. CAVALCANTI, Lauro (org). Quando o Brasil era moderno: guia de Arquitetura 1928 – 1960. Rio de
Janeiro: Aeroplano, 2001, p. 265.
82
. Idem, p. 277.
43
Casas de Oscar Niemeyer – na Lagoa Rodrigo de Freitas – 1942 / em Mendes – 1949 / nas Canoas -
1953
Fica claro que a casa modernista, não somente as brasileiras, mas as diversas obras
executadas durante o século XX por uma grande diversidade de arquitetos que
acreditaram, estudaram ou até mesmo questionaram os conceitos de Le Corbusier e
seus discípulos, contribuíram muito para a transformação de uma sociedade e a forma
de se morar no “mundo moderno”.
A casa modernista ganhou diversas formas plásticas, várias soluções estruturais com
a larga utilização do concreto armado e a liberdade expressam com a utilização do
painel de vidro. A implementação dos painéis de mosaico ou as pinturas dos artistas
plásticos como Portinari, Genaro Carvalho, entre outros, e a interação da obra
construída a paisagem existente ou proposta, por muitas vezes por Roberto Burle
Marx, fizeram deste período um rico acervo da produção da arquitetura ao longo da
história até hoje entendidas como elementos fundamental para a composição de um
repertório arquitetônico de grande valia.
Isto fica claro quando estudamos a obra de Sérgio Ferro, Flávio Império e Rodrigo
Lefèvre que receberam grande influência da arquitetura de Vilanova Artigas. “A
Arquitetura Nova, entretanto, mais ensaiou e abriu perspectivas do que de fato as
realizou”.
83
Da mesma forma outros arquitetos receberam grande influência de seus precursores,
o escritório Brasil Arquitetura composto pelos arquitetos Francisco Fanucci, Marcelo
Ferraz e Marcelo Suzuki
84
tiveram e ainda mantém seus trabalhos norteados nos
conceitos e ideais da arquiteta Lina Bo Bardi, onde os três foram estagiários e
participaram de diversos projetos juntos com a arquiteta.
Paulo Bruna, que trabalhou no escritório de Rino Levi levou de sua experiência a
doutrina e sistemática do arquiteto. Assim como outros tantos podem aqui ser
mencionado chegando até os dias atuais como o escritório MMBB ou UNA Arquitetos
que por diversas vezes demonstram em seus projetos uma forte influência de Paulo
Mendes da Rocha.
A casa, no entanto, após as experiências colocadas em prática durante o século XX, e
principalmente entre as décadas de 40 e 80, foram suficientes para compor um
“catalogo” de propostas que transformaria o modo de viver do homem brasileiro e, por
mais que tentamos questioná-las, torna-se difícil não nos remeter a estas obras
produzidas por um número incontável de arquitetos, reconhecidos ou não, que
colocaram o tema – a casa moderna – como objeto de transformação de toda uma
sociedade.
83
. ARANTES, Pedro Fiori. Arquitetura Nova: Sérgio Ferro, Flávio Império e Rodrigo Lefèvre, de
Artigas aos mutirões. São Paulo: Ed. 34, 2002, p. 84.
84
. Este último agora mantém carreira sólo, com escritório próprio.
44
“A casa é a primeira construção, e construção, é o tema, constrói o homem. A
casa é o seu corpo, que é a medida do mundo, dá as verdadeiras referências
do prazer e guia o espírito”.
Joaquim Guedes. In Eupalinos ou o Arquiteto. pág. 08.
2 A Casa Modernista como
Objeto de Experimentação do
Ensino de Projeto
45
Verifica-se que ao estudarmos o tema CASA muitas questões podem ser levantadas
sobre este objeto que vem sofrendo um processo de transformação espacial e
conceitual na forma de habitar. Refletir sobre a casa, “a velha maquina de morar”,
85
é
para o arquiteto, um exercício delicioso e infinito.
Estas transformações são, e sempre foram, causadas devido a estrutura da família ao
longo do tempo, que refletem no espaço físico do habitat: casas-grande, casas térreas,
sobrados, palacetes, vilas, apartamentos, conjuntos habitacionais, condomínios
horizontais e verticais, flats – várias formas de morar, porém todas guardando inter-
relações semelhantes, mesmo com o passar do tempo, deixando entrever que a
sociedade brasileira tem uma face
86
, que por muitas vezes, abstraída da cultura
importada por nossos exploradores e mais tarde por migrantes que aqui chegaram
para colonizar este país.
Neste âmbito, a casa moderna se destaca como um tema sempre presente no
discurso; se por um lado ocupa as mentes dos arquitetos, por outro seu exercício
prático permite experimentar novas tecnologias e teorias definidas pelo autor, além de
exercerem um papel importante na difusão dos ideais político-sociais de todos seus
“seguidores”.
Assim, as características destas casas anunciam uma transformação na arquitetura
por meio da expressão dos materiais e da estrutura da composição univolumétrica, da
unificação espacial interna e da continuidade interior-exterior.
87
Desta forma, a participação destes objetos arquitetônicos como elementos de estudo e
análise na formação de conceitos e repertório arquitetônico, além de um raciocínio
construtivo através dos modelos a serem investigados, relacionados a composição
arquitetônica: elementos de arquitetura, elementos de composição e estratégias
compositivas, buscam rever a forma de habitar e viver sobre a cidade moderna e
novos conceitos de compreender o “ser urbano”.
Verifica-se que este tema, antes de tudo, deve ser discutido em suas origens e
definições colocadas por diversos pensadores ao longo do tempo:
“casa (do lat. casa). S.f. 1. edifício de um ou poucos andares, destinado
geralmente, a habitação; morada, vivenda, moradia, residência; 2. cada
uma das divisões de uma habitação; dependência, quarto, sala; 3. lar,
família (...)”
88
“casa – edifício para habitação, residência, vivenda. Essa é a acepção
vulgar ou popular do tempo antigamente, entre nós porém, e em Portugal,
ainda hoje é assim, casa designada como um dos compartimentos da
moradia. Dizia-se: “casa de dormir, ou quarto”, casa de frente, ou de
visitas, etc. esse antigo costume perdura até hoje por designar certos
locais, como por exemplo, CASA DE MÁQUINAS, casa de despejo ou
depósito de trastes, casa de negócios ou salão comercial, CASA DE
85
. “A casa é uma máquina de morar”. Le Corbusier.
86
. VERÍSSIMO, Francisco Salvador, BITTAR, Willian Seba Mallmann. 500 anos da casa no Brasil.
Ediouro. 2. Edição. Rio de Janeiro. 1999. p. 28.
87
. SANVITTO, Maria Luiza Adams. Brutalismo Paulista: o discurso e a obra. Revista Projeto Design, n.
207, abril de 1997. p. 92.
88
. HOLANDA. Aurélio Buarque de. Novo Aurélio século XXI, o dicionário da língua portuguesa. 3.
Edição. RJ. 1999. p. 420.
46
PURGAR, etc. É também o nome que recebe construção ou edifício
importante ou público.”
89
“Uma verdadeira residência não é representada pelo impacto
que possa provocar, mas pelo seu conteúdo...
o ambiente em que a pessoa, mesmo estando só, não se sente desamparada.
Oferece sensação de segurança, bem estar, não cansa, não
é para impressionar os amigos, para demonstração de status.
É para si mesmo.”
Oswaldo A. Bratke
90
Observa-se que as definições acima expostas colocam o tema estudado como um
elemento responsável pelo abrigo e proteção do homem. Como Corona coloca, a casa
possui várias possibilidades de denominações como dormir, trabalhar, depositar; mas
fica claro a importância da casa como objeto de proteção do homem. Assim como a
definição de Oswaldo Bratke coloca de forma simplificada, a importância da casa não
apenas como abrigo, mas como elemento que compõem a vida cotidiana do homem
urbano.
2.1 – O projeto como investigação
O projeto arquitetônico não está tão distante da investigação científica. Não lhe falta
temática, a indagação, as referências teóricas, as hipóteses de trabalho, a
experimentação, a escolha da melhor alternativa para a sua devida otimização e,
finalmente, a divulgação e a publicação.
91
O verbo ensinar, quando se refere ao projeto arquitetônico, tem um sentido muito
diferente de quando aplicado à outras áreas do conhecimento.
Se o projeto não pode ser ensinado, como dizem muitos, certamente pode ser
aprendido.
92
Esse aprendizado se dá na própria prática de projetos, pela repetição de
um procedimento e pelo acúmulo de conhecimentos que acarreta.
A transmissão de conhecimentos arquitetônicos se dá também por exemplos,
elementos estes que devem refletir e transformar-se em repertório arquitetônico para a
compreensão e acúmulo de conhecimentos científicos, teóricos e práticos que
estimule a criatividade do estudante de arquitetura e construa sua visão crítica sobre o
tema estudado e possibilite a formação de uma identidade arquitetônica própria.
Vivemos em um tempo sem certezas, e temos a consciência de que as coisas sempre
podem ser de outra maneira. Portanto, sempre há vários modos de resolver um
projeto. Para aqueles que tem como objetivo realizar uma arquitetura autêntica, afastar
ao máximo a arbitrariedade das suas decisões é essencial. Talvez o único modo de
controlar essa arbitrariedade seja fundamentar as decisões projetuais sobre as
condições intrínsecas e específicas de cada problema arquitetônico.
89
. CORONA. Eduardo. LEMOS. Carlos. Dicionário da Arquitetura Brasileira. Edart. São Paulo, 1976.
90
. SEGAWA. Hugo. DOURADO. Guilherme Mazza. Oswaldo Arthur Bratke. Pro Editores, São Paulo,
1997. p. 99.
91
. CAMPOS, José Carlos. SILVA, Cairo Albuquerque. O projeto como investigação científica: educar
pela pesquisa.
92
. MAHFUZ, Edson da Cunha. Reflexões sobre a construção da forma pertinente.
47
Para tanto, a questão que se coloca vem em encontro a quais serão as condições no
início deste novo século que recrie uma nova identidade arquitetônica capaz de
contribuir para este próximo milênio.
“Em toda construção deve-se levar em conta a solidez, sua utilidade e sua beleza”,
dizia Vitruvio 2000 anos atrás. Até meados do século XVIII a boa arquitetura seria
aquela que apresentasse um equilíbrio entre os três componentes da tríade vitruviana:
Firmitas (solidez) e Utilitas (adequação funcional), fazem parte da esfera racional do
conhecimento e Venustas (beleza, no entendimento de alguns), que é o componente
estético da tríade simplificando o que, em tempos pré-modernos, estava centrado nas
relações proporcionais e na aplicação das ordens clássicas ao exterior dos edifícios.
93
No século XIX, soma-se àquela concepção outro entendimento da boa arquitetura.
Para que um edifício pudesse ser considerado de qualidade, deveria apresentar
composição correta, referente a sua organização formal/espacial em duas e três
dimensões.
Através destas interpretações, Edson Mahfuz redefine os aspectos essenciais da
arquitetura por meio de um quaterno composto por três condições internas ao
problema projetual (programa, lugar e construção) e uma condição externa, o
repertório de estruturas formais que fornece os meios de sintetizar na forma as outras
três. (figura 1).
Figura 1 – O quaterno contemporâneo, a partir de discussões com o arquiteto Alejandro Aravena.
Fonte: Edson Mahfuz
Aquelas três condições internas poderíamos também chamar de estimulantes da
forma,
94
pela sua presença constante, com maior ou menor intensidade, na origem e
no desenvolvimento do processo projetual.
Neste sentido, a evolução compositiva na forma projetual, nos coloca a disposição um
conjunto de elementos para a discussão, junto aos estudantes de arquitetura, para
compreendermos a importância de exemplos existentes como formação de um
repertório teórico-crítico para a formulação e estímulo a criatividade sobre os novos
projetos.
Desta forma, a utilização de modelos arquitetônicos, como metodologia de ensino,
para a construção de um repertório teórico-crítico nos permite apontar métodos e
93
. Para Ludovico Quaroni, a Venustas é oconhecimento cultural, o modo de manipular as outras duas
para obter arquitetura. Ver Projectar um edifício. Ocho lecciones de arquitectura, Xarait Ediciones,
Barcelona, 1987.
94
. Outro conceito que define a relação precisa entre forma e vida, ou entre uma construção e seus usos, é
o de fatos arquitetônicos, desenvolvido por Alejandro Aravena.
48
diretrizes na formação de profissionais que atuarão na cidade, com valores humanos,
em que os projetos sejam a expressão contínua de um modo de vida de seus
usuários.
E enquanto a casa, objeto de abrigo do homem durante os tempos, cuja forma
respeite seus desejos e padrões de comportamento, ajudando-o a viver e a criar sua
cultura,
95
torna-se objeto fundamental para a construção deste repertório, junto aos
estudantes de arquitetura, e possibilite a discussão de um tema inicialmente simples e
pertencente ao cotidiano e a cultura de todos, porém com grandes possibilidades de
multiplicar os temas e complexidades no que a casa gera através das experiências
individuais de cada estudante de arquitetura.
Assim, utilizar os estudos de projetos arquitetônicos de casas pré-selecionadas, que
provoquem as discussões necessárias ao tema pertinente, busca configurar
experiências relacionadas ao espaço, hierarquias, formas de circulação horizontal e
vertical, relações de pé-direito, meios-níveis e mezaninos; formas novas de privatizar o
espaço, transparências e opacidades, novas relações interior/exterior.
“Pelo universo de possibilidades que abre, a casa – principalmente a moderna – é
também o espelho crítico do arquiteto quanto às vanguardas, às novas questões
globais e regionais de arquitetura, seus ideais espirituais e políticos”.
96
Esta investigação colocada como proposta de investigação capaz de construir um
primeiro repertório do estudante de arquitetura, explorando sua própria cultura e
vivência trazida do cotidiano possibilita ainda deter-se na análise dos objetos
selecionados de duas formas:
compreender e refletir sobre a evolução do morar, tomando como referência a
estrutura familiar, seus aspectos comportamentais e sócio-culturais ao passar dos
anos;
compreender a casa como uma realidade visual e tangível:
97
volumes, planos,
linhas retas, linhas curvas..., assim como, entender a casa como um espaço vivido
pelo homem, que adquire valores humanos.
Neste âmbito, a CASA MODERNA se destaca como um tema sempre presente no
discurso, se por um lado ocupa as mentes dos arquitetos, por outro seu exercício
prático permite experimentar novas tecnologias e teorias defendidas pelo autor, além
de exercerem um papel importante na difusão dos ideais político-sociais de todos
seus “seguidores”.
2.2 – A casa modernista como elemento de repertório
A casa tem se constituído, ao longo da história da arquitetura, um momento e um meio
fundamental para a prática da arquitetura onde os arquitetos testam e expõem seus
desejos e ideários. A leitura de determinados objetos arquitetônicos torna-se
necessária, principalmente para os iniciantes no curso de arquitetura, para a
formulação e construção de um repertório coerente ao caminho em que estes seguirão
nos próximos cinco anos e futuramente na vida profissional.
95
. DIAS, Márcia Lucia Rebello Pinho. Desenvolvimento urbano e habitação popular em São Paulo, 1870
a 1914. p. 10.
96
. BISELLI, Mario. A casa, tema universal, permite testar, experimentar, subverter. Revista Projeto
Design, n. 219, abril de 1998, p. 85.
97
. Digo tangível, pois o estudante de arquitetura deve adquirir repertório vivenciado, focado e palpável.
49
O principal instrumental do arquiteto é a capacidade de pensar e de expressar-se por
meio de desenhos, assim como o processo de criação em arquitetura não é linear, e
envolve inúmeros agentes participadores que diretamente ou indiretamente interferem
neste processo.
98
Sendo as obras de arquitetura objetos entre os demais objetos criados pelo homem,
cresce em relevância a afirmação que sustenta que “Uma edificação, especialmente
uma residência, não pode ser limitada a uma função única, porque qualquer edificação
é um cenário onde se desenvolve a vida humana, e a vida humana é heteromorfa”.
99
Neste sentido, a utilização deste tema – a casa – como fio condutor da análise para a
construção de um repertório crítico-filosófico, através de objetos significativos na
história da arquitetura, onde uma infinidade de arquitetos por todo o mundo trabalha
sobre um programa de necessidades extremamente simples e básico que, ao mesmo
tempo, admite a variação infinita.
100
Presente desde que o homem deixou as cavernas, a casa é um dos registros mais
importantes da história humana e o termômetro mais confiável das tendências e das
questões da arquitetura, num determinado espaço e tempo. Passado, presente e
futuro da arquitetura estão na casa.
101
A casa, principalmente no Brasil, deve ser avaliada do ponto de vista da evolução da
família brasileira que se desenvolveu desde a chegada dos portugueses aqui nesta
terra. A descrição da Carta de Pero Vaz de Caminha ilustra muita bem a maneira de
pensar do português diante da visão das novas terras:
Traz, ao longo do mar, nalgumas partes, grandes barreiras, algumas
vermelhas, outras brancas; e a terra por cima toda plana e muito cheia de
grandes arvoredos. De ponta a ponta, é toda a praia como uma palma mui
plana e mui formosa. Pelo sertão, nos pareceu, do mar, muito grande porque, a
estender os olhos, não poderíamos ver senão terra com arvoredos que nos
parecia mui longa terra... Porém, a terra em si é de muito bons ares, assim frios
e temperados, como os de Entre-Douro e Minho, porque, neste tempo de
agora, os achávamos como os de lá. Águas são muitas, infindas.
102
“Mas a terra em si é muito boa de ares, como os de
Entre-Douro e Minho...” (da Carta de Caminha) e
“ainda vai cumprir seu ideal: ainda vai tornar-se um
Império Colonial” (da peça Calabar, de Chico Buarque
e Ruy Guerra)
98
. FLÓRIO, Wilson. Projeto residencial moderno e contemporâneo: análise gráfica dos princípios de
forma, ordem e espaço de exemplares da produção arquitetônica residencial. p. 9.
99
. JAN MUKAROVSHI, in COMAS, Carlos Eduardo (org). Projeto arquitetônico disciplina em crise,
disciplina em renovação. São Paulo, Projeto, 1986, p. 50.
100
. Principalmente se considerarmos as peculiaridades locais de clima, cultura e tecnologia.
101
. BISELLI, Mario. A casa, tema universal, permite testar, experimentar, subverter. Revista Projeto
Design, n. 219, abril de 1998, p. 85.
102
. Carta ao Rei D. Manuel – Pero Vaz de Caminha.
50
Fica claro neste trecho da Carta de Caminha ao Rei D. Manuel em Portugal, que os
que aqui chegaram ficaram encantados com as terras que haviam descoberto, que
este “Novo Mundo” possuía grandes possibilidades de povoamento e expansão da
cultura lusitana.
Porém, cabe ressaltar que a cultura dos que aqui já viviam eram muito diferentes dos
portugueses que chegavam aqui no século XVI, a moradia do índio possuía o caráter
de abrigo representado pela “Maloca” onde as famílias indígenas viviam num só
grande espaço coberto, sem qualquer divisão ou compartimento que classificasse uma
hierarquia ou tipo de uso específico; diferentemente dos primeiros portugueses –
principalmente os da família real – que aqui desembarcaram foragidos de Portugal.
Com o índio, aprenderam que cozinhar nos trópicos é uma tarefa a ser feita do lado de
fora
103
, além de compreender que os espaços criados pelos nativos possuíam várias
funções como: abrigo, alimentação, educação, trabalho, repouso, religião, lazer, sexo;
atividades estas realizadas dentro da Maloca ou próximo a ela, na aldeia.
Habitação coletiva indígena.
Mais de quinhentos anos se passaram após a chegada dos primeiros “colonizadores”
que aqui chegaram e a casa passou por diversas alterações em sua concepção. Estas
transformações de usos dos espaços gerados pelos processos sócio-econômicos e
pela própria globalização geraram grandes mudanças na forma do homem viver e no
seu espaço de morar.
O espaço de conforto e intimidade deixa de ser o mero abrigo do homem e absorve
também o lugar de trabalho, morar e trabalhar funde-se num só objeto em busca de
respostas a uma nova sociedade capitalista. Porém é no século XX que a casa vai
passar pelo processo de transformação, em diversos aspectos, onde hoje
conhecemos, e são os arquitetos modernistas, juntamente com o conjunto de
artistas e profissionais e diversos fatores decorrentes do século passado
104
,
responsáveis pelas alterações e mudanças que hoje estamos habituados.
O contexto econômico, social e político na qual aparece essa ideologia “moderna”, não
só na arquitetura, mas também no urbanismo, deve ser levado em conta. Grandes
parcelas da população acreditam na eminência de transformações sociais e políticas
fundamentais.
Mas o outro aspecto, o da crença profunda nas transformações iminentes, foi sem
dúvida alguma mais importante entre as massas despossuídas e entre certos
103
. VERÍSSIMO, Francisco Salvador. 500 anos da casa no Brasil. Rio de Janeiro. Ediouro, 1999, p. 19.
104
. Pode-se dizer que um dos principais fatores que levou as transformações com o Movimento Moderno
foi a Segunda Guerra Mundial, responsável pela destruição de várias cidades Européias.
51
intelectuais (entre os quais arquitetos e urbanistas) que nesse momento se aliaram ao
movimento operário.
105
É neste contexto que podemos dizer que o arquiteto franco-suíço Charles-Edouard
Jeanneret, conhecido por Le Corbusier, concebe em 1914 as Casas Dominó, um
sistema estrutural independente das funções previstas para a edificação: essa
estrutura consiste simplesmente em lajes e em uma escadaria. Era fabricado com
elementos-padrão combináveis entre si, o que permitia uma grande diversidade no
agrupamento das casas.
Proposta de Le Corbusier - estrutura-padrão para execução em série, 1914.
“Sob a impressão das devastações causadas pela guerra na região de Flandres. Esse
esqueleto em concreto armado deveria permitir uma reconstrução rápida, enquanto
que os apartamentos seriam instalados pelos habitantes segundo suas
necessidades”.
106
Em 1920, Le Corbusier apresenta seus primeiros estudos para as Casas “Citrohan”,
apesar de não avançarem do projeto, as primeiras casas em série, em dois pisos que
se comunicavam por um vão, pode ser considerada como um avanço sobre a Casa
Dominó, primeira proposta de estrutura-padrão.
Casas “Citrohan” - 1º estudo – Vista da casa e plantas baixas
105
. KOPP, Anatole. Quando o moderno não era um estilo e sim uma causa. São Paulo. Nobel: Editora da
Universidade de São Paulo, 1990, p. 17.
106
. Citado por Stanislas Van Moos, in: Le Corbusier, l’architecte et son mythe. Paris, 1968.
52
Dois anos depois, em 1922 as Casas “Citrohan” continuam em estudo pelo arquiteto,
que exibe no Salão de Outono uma grande maquete em gesso desta casa estudada
mais a fundo e que comporta, antes de mais nada, a padronização sistemática dos
elementos construtivos: estrutura, janelas, escadas etc. outro fato relevante diz
respeito ao pilotis, um dos elementos defendidos por Le Corbusier, que pela primeira
vez aparecem em seus projetos.
Maquete em gesso apresentado no Salão de Outubro em 1922
Ainda em 1922 os estudos sobre a forma e as estruturas-padrão são colocadas em
prática na Casa do pintor Ozenfant, em Paris (avenue Reille, 83). Esta casa de
composição simples em sua fachada livre onde as janelas são padronizadas segundo
a escala humana, possui além do programa de necessidades de qualquer casa do
início do século XX, o ateliê surge junto a casa como local de trabalho inserido no local
de abrigo e descanso, onde neste caso o arquiteto propõe de forma elegante um
mezanino que resguarda o espaço de trabalho do morar.
Casa do pintor Ozenfant – 1922
Após sete anos estudando as primeiras casas “Citrohan”, Le Corbusier coloca em
prática as duas casas em Stuttgart-Weissenhof, que apesar de completamente
diferentes os resultados alcançados são de suma importância para o desenvolvimento
das teorias defendidas pelo arquiteto, e que mais tarde iriam tornar-se conhecidas em
vários países.
A primeira casa é o resultado destes estudos em torno do tipo denominado “Citrohan”,
o segundo tipo de casas obedece à mesma tese, mas sob uma forma diferente: a sala
grande é formada pela eliminação de paredes móveis, empregadas somente à noite
para transformar a casa numa espécie de carro-dormitório.
107
107
. BOESIGER, Willy. Le Corbusier. São Paulo: Martins Fontes, 1994, p. 29.
53
1929 – duas casas em Stuttgart-Weissenhof
Outro ponto que deve ser estudado na arquitetura de Le Corbusier é a forma com que
trabalha no que ele chama de linhas diretrizes, um recurso geométrico ou aritmético
que permite se obter grande precisão nas proporções de uma composição plástica
(arquitetura, pintura ou escultura). Neste caso podemos citar três exemplos de
composições que acabamos de mencionar: casa La Roche, casa Stei em Garches,
casa em Stuttgart e casa Savoie em Poissy.
Quatro composições das chamadas “linhas diretrizes” nos estudos de Le Corbusier
As linhas diretrizes da fachada da casa La Roche/Jeanneret em Auteuil (Paris)
54
Porém é na Casa Cook, localizada na rue Denfert-Rochereau, 6 em Boulogne-sur-
Seine, projetada em 1926 que o arquiteto consegue aplicar claramente as certezas
adquiridas até o momento. Os cinco pontos defendidos por Le Corbusier: o pilotis, a
planta livre, a fachada livre, a janela contínua e o teto jardim.
Esta casa de planta quadrada com a circulação vertical centralizada de modo que
defina os espaços desde o pavimento térreo até o jardim da cobertura, onde fica claro
que esta setorização guiada pela circulação vertical coloca do lado direito – de quem
entra na casa – os ambientes mais livres como entrada, salas de estar e jantar e
terraço.
Em se tratando do lado esquerdo, este abriga os ambientes mais fragmentados e
compartimentados como cozinha, área de serviços e demais ambientes. Isto também
fica claro na composição da fachada que é desenvolvida através do quadrado e pela
composição através de figuras geométricas nas janelas contínuas e outros elementos
da fachada.
Casa Cook – Boulogne-sur-Seine – 1926
Não é em vão dizer que Le Corbusier foi um dos principais arquitetos que
influenciaram a arquitetura e o urbanismo no Movimento Moderno por diversos países
no mundo, isto se deve ao fato de que ele foi um dos primeiros a utilizar a fotografia e
as publicações para “promocionar” seu trabalho e anunciar publicamente sua
produção teórica através de seus escritos.
Seus estudos desde as primeiras casas no início do século XX – como as Casas
Dominó – permitiram que avançasse sobre seus conceitos, defendidos pelos cinco
pontos, e utilizasse as casas como laboratórios experimentais para seu próprio
repertório arquitetônico. Desta forma em 1929 o arquiteto recebe a encomenda de
projetar uma casa de campo nos arredores de Paris.
55
Encomendada pela Madame Savoye, esta casa previa um programa de necessidades
como de qualquer outra da época, porém seus estudos foram desenvolvidos de
outubro de 1928 à fevereiro de 1929
108
, passando por diversas alterações durante este
tempo na intenção de reduzir os custos finais da obra estimado na época em 785.000
francos.
109
Esta casa onde o pavimento de moradia
110
e seu jardim suspenso se erguem sobre os
pilotis que abriga os automóveis – elemento importante na concepção dos projetos
residenciais do início do século XX, e os dormitórios de empregados – também
elemento importante na concepção das casas desta época, além de permitir a ampla
visão do horizonte. A orientação do sol é oposta à da vista, buscando o sol através de
espaços abertos dos jardins da cobertura
111
. Para coroar o conjunto, um solário cujas
formas curvas resistem a força dos ventos e formam um elemento arquitetônico muito
rico.
Na Casa Savoye o arquiteto interrompe a uniformidade da retícula estrutural que
compõem o pilotis para acomodar a circulação vertical aqui representada não só pela
escada mas também pela rampa como uma segunda possibilidade de acesso ao
“pavimento de moradia” explorando as vistas do sítio onde a casa está implantada.
A estrutura realizada em concreto armado e as fachadas em ladrilhos vitrificados tendo
seus elementos pintados em branco – exceto os caixilhos pintados em preto –
garantem ao resultado plástico da casa uma superfície lisa, uniforme e neutra ao sítio
a que foi implantada, valorizando a paisagem local como “pano de fundo” deste
espaço existente. As janelas horizontais de correr foram desenhadas especialmente
sob medida e mostram claramente a influência do desenho industrial contemporâneo
dos automóveis, trens e barcos que influenciavam na forma de viver e morar na
cidade.
Desta forma, esta casa que durante muitos anos, mesmo após o arquiteto ter entregue
a obra a Madame Savoye, Le Corbusier continuou tendo contato com o cliente onde
em carta declara: “Siempre tengo que seguir siendo amigo de mis clientes”
112
Mais de 50 anos se passaram após a primeira proposta da Casa Dominó e Le
Corbusier continuava a ensaiar e pesquisar sobre a “Máquina de Morar”, onde
defendia que a casa deveria abrigar todas as funções necessárias em uma moradia:
social, serviços e íntimo, além de um elemento novo incorporado à família moderna: o
automóvel, assim como a casa deveria possuir todos os novos equipamentos
eletrônicos que surgiam a cada momento para facilitar a vida do homem urbano que
na sua rotina tem o trabalho como elemento detentor de boa parte do dia.
Desta forma, a Casa do Homem em Zurique, projetada em 1963 para um magnífico
terreno em um parque, cedido pela prefeitura da cidade para a execução deste
experimento, onde o pavilhão é composto por duas estruturas de ferro independentes
uma da outra, pela cobertura formando um guarda-sol, enquanto que o “corpo do
edifício” é proposto baseado nas proporções do Modulor,
113
que permite uma
108
. POPLE, Nicolas. Casas experimentales. Barcelona, Gustavo Gili, 2001, p. 15
109
. Ibid.
110
. Este nome é dado pelo próprio arquiteto.
111
. BOESIGER, Willy. Le Corbusier. São Paulo: Martins Fontes, 1994, p. 42
112
. Tim Benton in, Casas Experimentales. Barcelona: Gustavo Gili, 2001, p. 15
113
. O Modulor é o resultado de um conjunto de pesquisas minuciosas compondo uma gama de
dimensões harmônicas com a escala humana, formulado em 1942.
56
multiplicidade de disposições a partir deste conceito defendido pelo arquiteto. As
fachadas são feitas em painéis esmaltados coloridos, com os caixilhos em ferro.
Nesta casa podemos observar as evoluções na arquitetura deste arquiteto que não
chegou a ver esta obra realizada que veio a falecer (1963) logo após a conclusão dos
projetos executivos. A condução da obra foi garantida por dois de seus colaboradores,
Taves e Rebutato, de Paris.
114
Porém deve-se observar que até tal proposta o arquiteto trabalhava com a estrutura
em concreto armado como elemento plástico em suas casas, e mesmo os cinco
elementos colocados em seus projetos evoluem como forma de compor plasticamente
a obra e que mantém até a Casa do Homem norteando seus projetos e, que sem
dúvida, influenciou muitos arquitetos pelo mundo até os tempos contemporâneos.
Plantas e elevações da Casa do Homem em Zurique
Ludwig Mies van der Rohe (1886-1969), arquiteto alemão apaixonado pela estrutura
metálica e grande dominador da execução de obra e detalhes de projeto, onde sempre
dizia a respeito da arquitetura e seus projetos: “Less is More”,
115
frase mundialmente
conhecida pela sua característica de compreender a arquitetura como um conjunto de
elementos estruturais capazes de compor espaços.
Portanto, por mais que Mies van der Rohe defendesse que “Menos é Mais”, sua
arquitetura foi sempre muito rica em detalhes e uma utilização muito interessante na
114
. BOESIGER, Willy. Le Corbusier. São Paulo: Martins Fontes, 1994, p. 140
115
. Menos é Mais
57
composição de espaços explorando-se ao máximo as características técnicas de cada
material empregado, especialmente o vidro e o tijolo.
Em 1929 recebe uma encomenda para a construção de uma casa para Madame
Grete Tugendhat, sobre um terreno a meio nível. As condições da topografia plana do
terreno possibilitou a Mies a criar uma planta livre para seus habitantes, explorando
suas espetaculares vistas através dos jardins orientado a sul.
A estrutura metálica da casa consiste em uma armação regular composta por uma
retícula de 5,00 x 4,60m, sendo suas colunas independentes, revestidas em chapas de
aço cromado e afastados aproximadamente um metro da fachada que recebe seus
caixilhos em vidro abrindo-se para os jardins externos da casa, onde a paisagem
compõe um quadro de fundo para esta obra. Nesta casa, Mies conseguiu combinar
neste trabalho o uso de materiais muito bem elaborados e detalhados por ele próprio e
que, estes conceitos viriam a influenciar diversos arquitetos no início do século XX.
Casa Tugendhat – Brno, República Tcheca.
Outra casa de Mies digna de ser estudada é a Fransworth, projetada e executada
entre 1945 e 1950 em Illinois, esta casa para fins de semana ficou conhecida
mundialmente por sua simplicidade em seu partido arquitetônico, mas com riquíssimo
nível de detalhe construtivo. Apoiada em um único andar e situada na parte plana da
área e entre grandes árvores, a vista para o rio Fox é explorada de forma formidável
no limite sul do terreno.
Sua forma plástica é composta pela laje que flutua sobre o terreno e a laje de
cobertura que são suportadas por oito pilares exteriores e vedado por placas de vidro
criando um paralelepípedo translúcido entre o conjunto de grandes árvores da área de
intervenção.
Desta forma, esta casa torna-se um objeto fundamental para o estudo de casas
modernistas que influenciaram a uma releitura sobre o tema colocado em questão,
onde o abrigo torna-se elemento da composição da paisagem existente e eleva a
moradia como objeto de arte onde questiona a forma de morar do homem moderno.
58
A casa vista sobre o rio Fox, no inverno.
O Movimento Moderno possibilitou questionar uma nova forma de compreender a
moradia, o abrigo, a forma plástica através do concreto armado como expressão
colocada aos arquitetos e urbanistas daquela época. Assim, muitos autores, ou
melhor, dizendo – artistas, utilizou-se da casa modernista como objetos de ensaio
para suas teorias na busca de respostas a uma nova sociedade dependente de novas
tecnologias, em especial o automóvel que no início do século XX torna-se parte
integrante da família.
Neste contexto, várias casas projetadas e construídas são tomadas até hoje, quase
um século após aos primeiros manifestos da casa modernista, como objeto de estudo
e inspiração para propostas da moradia contemporânea.
A famosa Casa da Cascata, projetada em 1936 na Pennsylvania para a família
Kaufmann pode ser considerada uma das mais importantes obras-primas do arquiteto
norte-americano Frank Lloyd Wright na larga produção arquitetônica no Movimento
Moderno.
Esta casa implantada sobre uma cascata e entre as colinas na formação rochosa, faz
com que esta impressionante casa se integre a natureza de forma passível a
paisagem encontrada, assim “Wright concebe o edifício como uma série de tabuleiros
separados por breves massas de pedra e inteiriços nos bordos.
Fixou a massa da chaminé directamente sobre um grande macinho e ao redor dela
projectou os espaços”.
116
Fallingwater representa a suprema vitória sobre todos os
limites que a milênios tinham condicionado a arquitetura, a “caixa” é completamente
116
. Edgar Kaufmann Jr. in Frank Lloyd Wright, p. 152
59
destruída deixando de existir paredes e ambientes confinados, abrindo a possibilidade
de discutir a casa como um conjunto de ambientes que se integram compondo a
moradia, é a liberdade da mudança.
O cenário natural e a arquitetura, vista da cascata.
Walter Gropius pode ser considerado um dos arquitetos que mais utilizou sua
arquitetura como elemento de ensaio para as novas tecnologias colocadas no inicio do
século passado. Nisto o jogo de casas em série (1923), projetadas pelo arquiteto com
colaboração com Adolf Meyer, desenvolvidas como um jogo de construções em
diversas dimensões formuladas para serem executadas de forma econômica.
O próprio autor afirma: “Objetivos de la construcción residencial, superando las
tendencias contrarias: la máxima estandarización posible (bajos cortes) y la máxima
veriedad posible de la vivenda. Estandarización de los elementos básicos de
construcción, que podrán agregarse según distintos módulos de vivendas”.
117
Variação nos volumes e plantas propostas por Gropius.
117
. Texto dirigido ao empresário Rathenau por Walter Gropius em 1910 a respeito das casas em série.
60
O conjunto de casas para os professores da Bauhaus, em Dessau e projetadas em
1925/1926 devem ser colocadas como objetos de estudo pela sua diversidade
compositiva e composição geométrica propostas numa rua arborizada cercada por
edifícios da Bauhaus. Este conjunto composto por uma casa unifamiliar (casa para o
diretor) e três emparelhadas para os professores.
A casa unifamiliar segue um esquema da planta baixa em L, enquanto que as demais
possuem a forma em S, forma esta adquirida através do acoplamento dos braços em L
e rotacionando em 180º. Estas casas aparentemente simples em suas formas
geométricas resultantes deste jogo de manipulação com os ambientes propostos
resultando em elevações compositivas com formas geométricas puras, onde as
dimensões das aberturas são responsáveis pelo resultado de luz e sombra, quente e
frio, “mostrar ou esconder”, numa interpretação do arquiteto que relaciona o interior x
exterior das casas propostas.
Casa do Diretor e Professores para a bauhaus de Dessau.
Fica claro que Walter Gropius foi um grande pesquisador nas técnicas construtivas
que possibilitasse a execução de casas em grande escala capaz de suprir os
problemas causados durante a I Guerra Mundial, onde diversas cidades necessitaram
de serem reconstruídas, tendo os Modernistas à imaginar no papel um futuro heróico
para o mundo. Neste sentido, em 1927 duas casas pré-fabricadas são propostas para
a Exposição de Deultscher Werkbund em Stuttgart.
A racionalização das casas unifamiliar, sua total pré-fabricação tem como finalidade
promover de forma renovada e econômica como um modelo de moradia para a família
alemã. Gropius elabora nesta ocasião um sistema experimental de montagem a seco
para uma estrutura composta de um esqueleto em aço e vedação em painéis pré-
fabricados modulares, porém esta proposta não pode seguir adiante devido ainda ao
alto custo para sua execução, não desmerecendo a proposta colocada pelo autor do
projeto.
Axonométricas das casas propostas.
61
Não poderíamos deixar de mencionar neste estudo a casa do arquiteto em Lincoln –
Massachusetts, projetada em 1937 em colaboração com Marcel Breuer. Esta casa se
evidencia em sua forma plástica, em um momento dominado pela identificação do
Racionalismo arquitetônico com o Internacional Style.
“Siempre he combatido esta expressión, porque pienso que el puento de partida es
consecuencia, más bien, del respeto a las condiciones regionales y no a la fidelidad de
determinados preceptos internacionales”.
118
Construída em uma colina, prestando particular atenção à paisagem do entorno, a
casa Gropius assume totalmente a nova tendência da casa urbana modernista: casa
em dois níveis, de dimensões medianas, estrutura em pedra no embasamento, e
madeira com partes em ladrilho para o restante da casa.
119
Casa do arquiteto Walter Gropius – Lincoln - Massachusetts
Podemos dizer que o arquiteto austríaco Richard Neutra, discípulo de Otto Wagner e
Adolf Loos, formado pela Universidade Técnica de Viena em 1918, possui
características muito semelhantes ao alemão Gropius. Tanto na forma de propor uma
arquitetura racionalista como no estudo das formas puras para compor suas obras.
Neutra reinventou decerto o humano dentro de espaços notáveis assim como as
tecnologias usadas para conceber esses espaços.
120
O que tornou Neutra único não
foi a busca infindável da forma, mas sim a busca contínua do ser humano.
A casa Lovell Health, projetada em 1927-1929 para Philip e Lea Lovell em Los
Angeles, California é reconhecidamente uma das casas mais importantes do século
XX. Foi a primeira residência americana com estrutura em aço. Nesta casa Neutra
quebrou a caixa wrighitiana horizontal e verticalmente, e enquanto os pilotis da Villa
Savoye de Le Corbusier içavam a moradia, o mesmo acontece aqui através da
utilização de uma construção com arquitrave, não muito diferente da do Pártenon.
118
. Walter Gropius, 1937.
119
. BERDINI, Paolo. Wlater Gropius. Barcelona: Gustavo Gili, 1994, p. 163
120
. LAMPRECHT, Barbara. Richard Neutra. Köln: Taschen, 2004, p. 7
62
Esta casa foi maioritariamente uma construção especial. Em 1930, ao final da obra o
arquiteto apresentou a conta final da casa: US$ 58.672,32, os seus honorários foram
de US$ 5.863,00.
121
Porém, os Lovell consideravam Neutra um “gênio” e a casa “uma
obra de arte”.
Casa Lovell Health, projetada em 1927-1929
Outra obra que deve ser mencionada na larga produção de moradias de Richard
Neutra é a casa Kaufmann, projetada em 1946-1947 em Palm Springs, Califórnia.
Dez anos depois de Edgar Kaufmann ter encomendado a Frank Lloyd Wright a
construção de sua famosa casa Falling Water, a família quis estabelecer uma
residência na costa ocidental norte-americano. Esta casa com quase 300,00 m²,
moderna e grandiosa dominava a “paisagem lunar”
122
como um avião prateado
aterrado num tapete verde, fixo ao chão meramente por rochas ali colocadas.
O desenho original de Neutra da planta cruciforme revela mais contrastes. O jardim
penetra na casa com descontraídos traços curvilíneos. A planta de quatro alas com o
espaço de convívio ao centro favorece uma iluminação e ventilação natural a todas as
quatro alas. É válido mencionar que esta casa foi projetada para ser usada pela família
durante um mês por ano – em janeiro.
Casa Kaufmann vista de sudeste – o quarto de dormir
dos pais fica à direita, por detrás da piscina. Persianas
de bronze nas janelas suavizam o brilho prateado da
casa
121
. Idem, p. 26
122
. Como lhe chamou Neutra
63
Os arquitetos portugueses não poderiam deixar de ser mencionados, a arquitetura
moderna lusitana possui diversas obras capaz de influenciar estudantes e arquitetos
por muitas gerações. Pode-se dizer que Fernando Távora seja o precursor da
arquitetura moderna portuguesa e que muitos outros influenciou durante o século XX,
sua arquitetura que “tudo inclui e nada exclui” definido por si próprio coloca a
disposição uma gama de trabalhos que demonstram de forma brilhante a cultura
portuguesa e sua influência com o ambiente existente. Prova disto é a Casa Ribeiro da
Silva, projetada em 1957-1958 num pinhal perto de Ofir, próximo de Braga, do qual se
contempla o rio Cávado e a vila costeira de Esposende.
Esta casa de férias com planta em T, formado pelo corpo dos quartos e pela ala do
núcleo diurno, desdobra-se ainda em três corpos autônomos – separando a sala da
área da cozinha. Uma leve inflexão liberta as vistas e concede uma maior autonomia
ao living room, peça identificada, pela classe média alta portuguesa, como centro da
vida doméstica a partir do modelo americano popularizado em revistas da época.
123
Esta obra, de dimensões modestas, exerceu uma grande influência na arquitetura
portuguesa. Nela, o quotidiano, certas tradições locais, o caráter concreto do sítio,
harmonizam-se com o tratamento analítico e a plástica abstrata da herança moderna.
Planta baixa e vista do pátio da Casa Ribeiro da Silva de Fernando Távora.
Álvaro Siza Vieira é um dos arquitetos portugueses mais influenciados por Távora,
onde durante sua carreira profissional obteve grande respeito e reconhecimento em
diversos países da Europa e América. Observa-se que tanto a Casa Alcino Cardoso
em Moledo do Minho - 1ª fase: 1971-1973; 2ª fase: 1988-1991, como a Casa Rocha
Ribeiro em Maia – 1960-1962, possuem características muito semelhantes ao projeto
de Távora em Ofir.
A primeira casa mencionada, localizada em área rural faz com que o arquiteto possa
explorar a paisagem e fazer com que as edificações propostas – com intervalo de 20
anos entre elas – participem de forma passível com o sítio existente; já a segunda
proposta possui uma grande semelhança no partido arquitetônico adotado com a Casa
Ribeiro da Silva, esta moradia em um único andar, encosta-se no fundo do terreno,
criando um pátio com os limites interior da casa e afastando-se da rua, integrando-se
com o arvoredo existente no terreno, que foi conservado pelo arquiteto.
123
. ARMESTO, Antônio. PADRÓ, Quim. Casas Atlânticas. Lisboa: Editorial Blau, 1996, p. 78
64
Casa Alcino Cardoso em Moledo do Minho
Casa Rocha Ribeiro em Maia
Outro arquiteto lusitano de grande contribuição para a Arquitetura Moderna
Portuguesa é Eduardo Souto de Moura, discípulo de Álvaro Siza e autor de
importantes obras em diversas regiões de Portugal.
Pode-se afirmar que a Casa Fernades, em Braga – 1989-1994, tornou-se uma de
suas obras mais conhecidas no mundo. Esta espaçosa casa situa-se numa ladeira
desde a qual é possível contemplar a cidade de Braga. O partido arquitetônico surge
da atitude radical em “encaixar” a moradia em um corte no terreno capaz de criar os
dois níveis da casa e formalizar os ambientes íntimos sobre a ala mais alta da casa.
Esta arquitetura proposta por Souto de Moura consegue uma imagem unitária
conjugando a dualidade dos elementos. “A ascensão, por uma senda inclinada e
oblíqua, a um temenos ou terraço-recinto sobre o qual se erige um pórtico”,
124
remete
ao grande tema da acrópole e do santuário helênico, paradigmas amplamente
freqüentados pelos mestres modernos.
124
. Eduardo Souto de Moura, 1994.
65
Casa Fernandes - Braga
Outras obras podem ser aqui citadas como “estudos de caso” para o ensino de
arquitetura através do Movimento Moderno e suas influências na Arquitetura
Contemporânea. Casas como do arquiteto português João Álvaro Rosa – duas casas
na Várzea em Maia – 1988-1993; Adalberto Dias – Casa Neto em Aguda, Arcozedo –
1986-1991 e Santiago Seara – Casa do arquiteto em Pedro de Pino, Corrubedo, A
Coruña – 1989-1991, contribuem para a reflexão da casa moderna sobre a vida
urbana, e rural, no pós-guerra em diversos países e sua influência sobre a vida
cotidiana com a chegada de um novo programa para compor a moradia.
Casa Seara – Pedro do Pino, A Coruña – arq. Santiago Seara
Casa Neto – Aguda – arq. Adalberto Dias Duas casas na Várzea – Maia – arq. João A Rocha
66
O Brasil adentrava o século XX com uma população da ordem de 17 milhões de
habitantes, com cerca de 36% dos brasileiros vivendo nas cidades.
125
Diferentemente
de muitas cidades européias que necessitavam ser reconstruídas devido as
destruições causadas pelas guerras, o Brasil era um país novo em pleno
desenvolvimento e passível a novas experiências urbanísticas e arquitetônicas.
As cidades afirmavam-se como o palco do moderno – modernização tendo como
referência a organização, as atividades e o modo de viver do mundo europeu,
126
o
desejo de mudança era nítido e nisto atraia engenheiros e arquitetos, muitas vezes
recém-formados, a colocarem seus ideais como prática profissional a serviço da
construção de um país modernista.
Esta manifestação nasce de um grupo de intelectuais paulistas e cariocas, que
juntamente ao ano da comemoração do centenário da independência do Brasil, abriga
em São Paulo, no Teatro Municipal a Semana de Arte Moderna: três saraus com
literatura e música, uma exposição de arquitetura, escultura e pintura. A reação do
público foi um escândalo, mas o desafio estava perpetrado.
127
A Semana de 22 foi o manifesto necessário para provocar uma sociedade elitista
presa numa cultura “colonial” trazida de Portugal por seus “colonizadores”. Nisto,
Fernando de Azevedo, em 1926 coloca de forma sucinta:
“A arquitetura no Brasil esta positivamente deslocadas das duas correntes adversárias
em que se divide, do ponto de vista artístico, a concepção da arquitetura moderna.
Não está, de fato, nem com os reformadores revolucionários que procuram na
arquitetura um jogo de formas geométricas primárias ordenadas no espaço virtual e de
um caráter social marcado; nem com os tradicionalistas que a querem encarada sob
uma óptica local, em todos os aspectos que toma ao seu ambiente. Nem se orienta no
sentido de uma ‘arte mundial’ em que se apaguem as diferenças regionais e cuja
estética resulte da nova técnica de construção e da solução de problemas puramente
utilitários; nem tenta vincular a arte às tradições locais ao espírito da raça. Em uma
palavra nem é tradicionalista, nem antitradicionalista. Nem nacional, nem
‘supranacional’. Definiu-a Monteiro Lobato com essa expressão motejadora: ‘um jogo
internacional de disparates...’
Três anos após a famosa, porém ainda não muito influente, Semana de 22, surgia na
grande imprensa (1925) dois artigos que registravam os primeiros discursos de fundo
moderno publicados em nosso país. O primeiro deles publicado no jornal O Estado de
S. Paulo, em 15 de outubro, era uma carta do jovem brasileiro Rino Levi (1901-1965)
enviada de Roma (onde cursava a Real Escola Superior de Arquitetura)
A carta é intitulada “A Arquitetura e a Estética das Cidades”. No mês seguinte, em 1°
de novembro, o Correio da Manhã do Rio de Janeiro publicava o artigo “Acerca da
Arquitetura Moderna” do arquiteto russo emigrado para o Brasil, Gregori Warchavchik
(1896-1972).
128
É justamente com este arquiteto russo emigrado que surge a primeira casa moderna
no Brasil, Gregori Warchavchik em 1928 concluía no distante subúrbio da Vila
125
. SEGAWA, Hugo. Arquiteturas no Brasil 1900-1990. São Paulo: Editora da Universidade de São
Paulo, 2002, p. 18
126
. Idem, p. 19
127
. Ibdim, p. 42
128
. Ibdim, p. 43 e 44
67
Mariana
129
a sua própria casa na rua Santa Cruz, inspirada nas obras dos mestres do
racionalismo europeu, principalmente Le Corbusier.
Apesar de não conseguir empregar os princípios defendidos pelo arquiteto, a casa foi
objeto de forte reação, por parte dos arquitetos acadêmicos e do público em geral, era
uma casa que apresentava ter uma geometria própria para racionalização da
construção, mas era toda de tijolo revestido e não empregava o concreto armado,
tampouco componentes pré-fabricados.
Outro ponto que não identificamos na casa de Warchavchik é o teto jardim, elemento
defendido por Le Corbusier, isto se explica pelo simples fato de que por mais que
Gregori fosse um grande dominador da construção civil, ainda não tínhamos técnica
construtiva suficiente para dependermos apenas da laje como protetor térmico e
acústico da moradia, principalmente num país tropical como o Brasil onde as
temperaturas variam muito durante o ano.
Casa da rua Santa Cruz – Gregori Warchavchik – 1928. Foto da época, do acervo do arquiteto.
Em 1928, num artigo de jornal, Osvaldo Costa, chamava a atenção sobre a
incorporação de elementos tradicionais na casa da rua Santa Cruz:
[...] o mais curioso é que Warchavchik pôde e soube extrair para ela
interessantes elementos do nosso colonial, e isso porque, ao contrário dos
demais pesquisadores que, preocupados exclusivamente com o ornamental do
nosso velho estilo, se esqueceram de ver nele, como Warchavchik, o essencial.
E foi assim que o ilustre arquiteto russo [...] chegou, sem esforço, a lançar as
bases de uma arquitetura, essa sim puramente brasileira, ou melhor, tropical,
de tal modo se adapta às condições e circunstâncias do meio ambiente e
corresponde às necessidades do nosso clima, temperamento, tradição,
costumes etc.
130
129
. Áreas pertencentes à família Klabin, onde Warchavchik era casado com Nina Klabin - 1927
130
. Ferraz, 1965 in Arquiteturas do Brasil. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2002, p. 49.
68
Porém fica difícil estudar o Movimento Moderno Brasileiro sem mencionar dois
protagonistas deste evento que mudou a história da arquitetura de nosso país e
tornaram referência no mundo. Lúcio Costa e Oscar Niemeyer foram grandes
contribuidores para várias gerações de arquitetos desde meados do século XX até os
dias de hoje.
Oscar Niemeyer, muito antes que outro arquiteto de qualquer nacionalidade explorou,
no início dos anos 40, as imensas possibilidades plásticas oferecidas pelo concreto
armado, rompendo a falsa oposição entre liberdade criativa e disciplina técnica.
131
Neste sentido, a Casa das Canoas, construída em 1953 para o próprio arquiteto,
torna-se objeto indispensável de estudo e formação de repertório para estudantes, não
só de arquitetura, mas também de engenharia civil pela técnica utilizada na época
para sua execução.
A casa das Canoas é uma das cinco mais belas residências modernas do mundo
132
.
Uma grande rocha é centro de toda composição, em torno da qual se desenvolve a
casa e a piscina. A cobertura plana, com uma forma abstrata em seu contorno, pontua
os espaços, liga o exterior ao interior e estabelece um rico diálogo com a exuberante
paisagem da montanha e mar carioca. Canoas é também uma prova de que, como
observou Le Corbusier, a “paixão pode criar o drama a partir da pedra inerte”.
133
Neste conceito, diversos arquitetos brasileiros, ou emigrantes, utilizaram-se do
concreto armado como instrumento de expressão de seus anseios sobre as formas
geométricas possíveis de se materializarem em espaços e ambientes e, ora como um
manifesto claro sobre a nova forma de morar na cidade.
Assim, algumas casas devem ser citadas nesta pesquisa como objetos de estudo para
a formação de um repertório técnico-filosófico para a formação do arquiteto e
urbanista. Podemos dizer que João Vilanova Artigas foi um grande contribuinte para a
arquitetura moderna, em especial para a chamada “Escola Paulista”,
134
que institui
para seus projetos: “Mudar a tipologia da casa paulistana”, seguindo “as modificações
sociais que se processavam em nosso país”.
135
131
. MINDLIN, Henrique E. Arquitetura Moderna no Brasil. Rio de Janeiro: Aeroplano Editora/IPHAN,
2000, p. 13
132
. Idem, p. 13
133
. UNDERWOOD, David Kendrick. Oscar Niemeyer e o modernismo de formas livres no Brasil. São
Paulo: Cosac & Naify Edições, 2002, p. 75
134
. Compunham a Escola Paulista de Arquitetura, nomes hoje consagrados como Artigas, Paulo Mendes
da Rocha, Oswaldo Bratke, entre outros.
135
. XAVIER, Alberto (org.). Depoimento de uma geração. São Paulo: ABEA/FVA/Pini, 1987, p. 186
69
Estudar a arquitetura de Artigas é compreender a trajetória de um homem que
participa da conturbada história política do país em meados do século XX, participante
desde 1945 do Partido Comunista
136
, participou de forma realmente representativa do
ensino da arquitetura na então recente Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da
Universidade de São Paulo – FAU USP
137
, mas acima de tudo um grande estudioso
da arquitetura e sua técnica construtiva; visto que em seus textos e declarações,
desde o início, abre grandes reflexões sobre paradigmas conceituais adotados por
diversos arquitetos no mundo.
Prova disto, está em seus textos publicados em 1952, o polêmico “Caminhos da
arquitetura moderna”, em que contesta dura e agressivamente os dois maiores
expoentes da arquitetura moderna: Frank Lloyd Wright e Le Corbusier
138
, onde afirma,
após uma breve introdução, ser seu objetivo demonstrar que “a obra dos arquitetos
exprime ideologicamente o pensamento da classe dominante”
139
, chegando a seguinte
conclusão:
“[...] a arquitetura moderna, tal como a conhecemos, é uma arma de opressão,
arma da classe dominante, uma arma de opressores contra oprimidos”.
140
Porém é em suas obras que podemos compreender este manifesto acima descrito, em
sua própria casa, feita em 1942, no segundo pós-guerra, que deu a Artigas a certeza
de estar trilhando um caminho próprio. A “Casinha” , como é conhecida, representou
um ponto de inflexão para o arquiteto: “Foi um rompimento formal grande; tive
coragem de fazer porque era para mim, me libertei inteiramente”
141
.
A “Casinha” inaugura o processo de invenção da casa paulistana, utiliza materiais
brutos e sem revestimentos (tijolo, madeira, telha cerâmica); nega a idéia de fachada,
fazendo a frente da casa uma conseqüência do jogo de volumes de toda a edificação.
Casinha – Vilanova Artigas - 1942
Sete anos após este primeiro manifesto de Artigas, o arquiteto propõe em 1949,
vizinha a primeira residência do arquiteto, sua segunda residência, formada por um
136
. Esta atitude faz com que Artigas ficasse exilado por um bom tempo fora do país devido ao Regime
Militar.
137
. A FAU-USP foi inaugurada em 1940 na rua Maranhão e mais tarde transferida para a Cidade
Universitária – com projeto do próprio Vilanova Artigas.
138
. KAMITA, João Masao. Vilanova Artigas. São Paulo: Cosac & Naify, 2000, p. 7
139
. Idem, op. cit.
140
. ARTIGAS, João Batista Vilanova. Caminhos da arquitetura. São Paulo: Cosac & Naify, 1999, p. 27.
141
. ARANTES, Pedro Fiori. Arquitetura Nova: Sérgio Ferro, Flávio Império e Rodrigo Lefèvre, de
Artigas aos multirões. São Paulo: Ed. 34, 2002, p. 15.
70
volume único e extenso, habilmente setorizado, tanto em planta – pela posição
intermediária dos banheiros que, como um núcleo interno, divide a área de estar da
área dos quartos – quanto pelo movimento do telhado
142
, formado por dois planos
inclinados que se encontram na ala de serviços.
Segunda residência do arquiteto
Como vimos, Artigas reinventa a casa burguesa com o objetivo de reeducar seus
moradores. Destrói os palacetes do café e restitui em seu lugar espaços de uma
“moral severa”, que o esforço de industrialização nacional exige.
143
Neste sentido, é na
Casa Olga Baeta, projetada em 1956, é possível reconhecer o “tema” sobre a qual o
arquiteto fará suas variações: uma grande cobertura que acolhe todo o programa de
usos. Em si, a cobertura é a representação do ato elementar de abrigar-se – já é a
própria solução do habitar enquanto necessidade humana.
A arquitetura da casa paulistana pretende também orientar os princípios de uma
educação moderna na família, como descreve Artigas na Casa Baeta: “Um trecho
azul, um pedaço branco, um amarelo e um risco preto. A sala de jantar é azul. Pode-
se sentar no sofá dentro do branco e a entrada é um quadrado vermelho que encaixa
no conjunto. Tudo está ligado a esse ideário em relação ao espaço e à apropriação de
cada usuário segundo seu julgamento sobre a visualidade, e não às limitações de
paredes”.
144
Apesar de afirmar que suas casas foram feitas para serem vistas por dentro e não por
fora, pois é seu interior que revela a “proposta do espírito”, Artigas também trabalhou a
cobertura como invenção. Neste sentido, a cobertura independente alivia a alvenaria e
sua carga estrutural, e permite ao arquiteto dispensar portas e paredes que considera
desnecessárias, criando um espaço integrado e fluido.
142
. KAMITA, João Masao. Vilanova Artigas. São Paulo: Cosac & Naify, 2000, p. 58.
143
. ARANTES, Pedro Fiori. Arquitetura Nova: Sérgio Ferro, Flávio Império e Rodrigo Lefèvre, de
Ratigas aos multirões. São Paulo: Ed. 34, 2002, p. 23.
144
. Idem, p. 26.
71
Assim, a Casa Baeta como outros exemplos da produção de Artigas como a FAU-USP
ou a Rodoviária de Jaú, em maior escala, podem resumir os propósitos plásticos do
arquiteto: “O que se encanta é usar formas pesadas, chegar perto da terra e,
dialeticamente negá-las”, expressando a contradição “entre o fazer e a dificuldade de
realizar”.
145
Casa Olga Baeta - SP
Neste sentido, a expressão utilizada por Lina Bo Bardi em seu breve e certeiro artigo
em 1950, resume de forma concreta a arquitetura em que Artigas se propunha a fazer:
“Uma casa construída por Artigas lhe impõe uma lei vital, uma moral que é sempre
severa, quase puritana. Não é ‘vistosa’, nem se impõe por uma aparência de
modernidade.[...] Cada casa de Artigas quebra todos os espelhos do salão burguês.”
146
O Brutalismo Paulista coloca em questão diversos aspectos de uma expressão e um
ideário, defendido principalmente pelos arquitetos paulistas, que utilizavam-se do
concreto armado como instrumento de expressão para definirem formas geométricas e
espaços que integrem o interior ao exterior, ou o objeto à paisagem.
A conhecida “Casa de Cristal”, projetada em 1951 pela arquiteta Lina Bo Bardi para si
própria e seu marido Pietro Maria Bardi, no subúrbio de São Paulo em uma nova zona
residencial.
Esta casa combina bem com seus proprietários, um casal italiano culto e refinado,
Pietro um conhecido crítico de arte que ajudou a criar e dirigir o Museu de Arte de São
Paulo e sua mulher, arquiteta de formação européia, que imprimiu ao projeto a marca
do seu gosto e pelo detalhe refinado e pelo emprego de elementos associados a
técnicas industriais avançadas.
147
A casa foi projetada como um “mínimo” de proteção para tirar o máximo proveito da
soberba vista da imensa paisagem que se descortina sobre a grande cidade que se
estende no horizonte. Ao mesmo tempo em que abriga adequadamente seus
ocupantes contra a intempérie, ela não os impede de viver em contato estreito com a
natureza nem de desfrutar o amanhecer e o pôr-do-sol e, até mesmo, as tormentas e
tempestades.
145
. Ibdim, p. 27.
146
. Ibdim, p. 16.
147
. MINDLIN, Henrique E. Arquitetura Moderna no Brasil. Rio de Janeiro: Aeroplano Editora/IPHAN,
2000, p. 64.
72
Seu partido arquitetônico explorando o terreno em inclinação faz com que a frente da
casa em pilotis, abrigue a escada de acesso principal à casa, um bloco extremamente
leve em concreto armado envidraçada em três lados e apoiadas em tubos de aço sem
costura. Neste sentido, a “caixa de vidro” apoiada sobre os leves pilotis dão a esta
casa a leveza necessária para integrar com a paisagem existente, como defendido por
Wrigth em sua “Casa da Cascata” na Pensilvânia.
Casa de vidro – arquiteta Lina Bo Bardi
Neste mesmo contexto, as casas projetadas por Paulo Mendes da Rocha que
representa uma postura limite, exemplar pela sua coerência. Partindo da fascinação
pela engenharia e pela técnica, ele tem recriado o espaço básico conformado pela
forma estrutural.
148
A obra de Paulo Mendes da Rocha deve ser entendida, dentro da chamada “escola
paulista”, neste ambiente cultural e formal do qual participam arquitetos como Oswaldo
Arthur Bratke, Joaquim Guedes, Sérgio Ferro e Ruy Ohtake. De todas as formas, a
arquitetura desta escola paulista, baseada em formas fechadas para o exterior, em
espaços “sanduíche”
149
, de procedência miesiana, que se configuram como caixas
elevadas sobre pilotis, com pátios e jardins interiores com mobiliário fixo realizado em
concreto, tem sido levada ao limite por Mendes da Rocha.
Sua casa projetada em 1964, localizada próximo à Cidade Universitária e enfrente à
Casa Bandeirista, é um exemplo claro de seus ideais defendidos em seus projetos
arquitetônicos e pela forma em que compreender o morar paulistano urbano. Esta
casa trata-se de uma grande pedra de concreto armado que abriga o programa de
necessidades da família.
Podemos dizer que esta casa trata-se de um grande laboratório colocado em prática
pelo arquiteto como uma forma de experimento à setorização utilizada até o momento,
inclusive por outros arquitetos paulistas como Artigas e Bratke em suas casas.
148
. MONTANER, Josep Ma., VILLAC, Maria Isabel. Mendes da Rocha. Lisboa: Editorial Blau, 1996,
p. 6
149
. Idem, p. 7.
73
Praticamente toda a casa é elevada sobre um terreno “artificialmente” recriado a partir
da movimentação de terra do terreno, os ambientes voltados para o interior da
edificação faz com que o controle de luz da casa seja feito de forma zenital,
principalmente na ala íntima da casa, onde os dormitórios se abrem para a varanda
fechada e coberta através de paredes deslizantes projetadas especialmente para esta
casa. A ala social é representada por um grande pavilhão setorizado pelo mobiliário
em concreto armado proposto pelo arquiteto e explorando, com pequenos nichos e
aberturas, a paisagem externa da cidade de São Paulo.
Já a Residência Antônio Junqueira – 1976-1980, é marcada pelo pórtico de concreto
armado e a empena na diagonal que protege além do programa usual, a existência de
uma sala de estudos e uma biblioteca com cerca de 10.000 volumes
150
. O que se
admira nesta solução encontrada por Mendes da Rocha é a forma com que a
paisagem, com a serra da Mantiqueira e o pico do Jaraguá, orienta as visuais e a
posição da casa no jardim, ao passo que a biblioteca tem um uso e uma posição mais
privada.
Neste sentido, a obra de Paulo Mendes da Rocha torna-se essencial na descoberta de
uma arquitetura que aparentemente mostra-se bruta e pesada, mas coloca em
questão a possibilidade de rediscutir o objeto e sua relação com o homem e a cidade.
Embora se considera próximo a Vilanova Artigas e Oscar Niemeyer e, normalmente
sacrifique a lógica estrutural aos desejos formais, Mendes da Rocha considera a forma
resultado do rigor estrutural, não só a forma resultante, mas a plástica encontrada e os
materiais empregados – o concreto armado.
150
. Ibdim, p. 42.
74
Apesar de Oswaldo Arthur Bratke participar de forma ativa junto a estes arquitetos
acima descritos, como Artigas, Rino Levi, Lina Bo Bardi, sua arquitetura pode ser
considerada com uma postura mais “tropical”, interpretando o sítio proposto e o clima
onde a obra está implantada.
Desta forma o concreto armado na obra de Bratke pouco será explorado como
elemento essencial na composição formal ou estética da obra deste arquiteto. Porém o
que se deve ser elencado é a forma sutil com que o arquiteto desenha suas casas e
como esses objetos inserem-se na paisagem existente.
Diversas casas poderiam aqui representar a produção de Bratke, contudo algumas
destas devem ser mencionadas como objetos essenciais à produção de um repertório
arquitetônico ao estudante de arquitetura.
A residência e estúdio no Morumbi em São Paulo, projetada em 1951, bairro da
periferia da cidade e com projeto de urbanização do próprio Bratke. Esta segunda
casa possibilitou ao arquiteto um exercício projetual estimulante, livre das imposições
de clientes, é o momento de vislumbrar novos caminhos de repensar a casa urbana.
No Morumbi, o arquiteto logrou sintetizar magistralmente um conjunto de práticas que
vinha desenvolvendo na década anterior, assinalando o início da sua fase mais
criativa.
151
Bratke propõe para esta casa uma obra marcada pelo ritmo uniforme e pelas
cuidadosas proporções de uma malha estrutural de concreto, numa lógica construtiva
racional. Vale ressaltar que Oswaldo Bratke sempre estabeleceu em suas obras uma
admirável flexibilidade na composição de suas obras, o contraponto entre cheios e
vazios, a articulação de espaços fechados, abertos e semi-abertos, explorando
assimetrias em suas formas propostas e combinando materiais produzindo diferentes
texturas e efeitos de luz e sombra.
A casa do Morumbi foi a primeira obra em que o arquiteto realizou um teto plano (e
talvez uma das bem-sucedidas aplicações de lajes de cobertura em São Paulo)
incorporando definitivamente essa solução do vocabulário do movimento moderno da
arquitetura em suas obras
152
, isso demonstra a rigorosa pesquisa realizada durante
151
. SEGAWA, Hugo. Oswaldo Arthur Bratke. São Paulo: ProEditores, 1997, p. 107.
152
. Idem, p. 108.
75
muitos anos sobre as técnicas construtivas para a obtenção de resultados plásticos
satisfatórios em suas obras.
153
Adotando a geometria e a modulação como matrizes compositivas da arquitetura, a
casa Oscar Americano – 1952 – revela a habilidade de Bratke em propor uma casa
com um amplo conjunto de exigências programáticas de uma família de seis pessoas
com resultados plásticos e volumétricos equilibrados em harmonia com a paisagem do
sítio.
O posicionamento do edifício na paisagem tira proveito da vegetação como uma
moldura que o destaca, sem pretender minimizá-lo ou diluí-lo em meio aos elementos
naturais.
154
Outro elemento em que o arquiteto explora de forma “exuberante” é a
capacidade de compor as alas (social, íntimo e serviços
155
) e ambientes com a
formação de pátios e jardins internos que alardeiam em conjunto do externo com o
interno de cada espaço.
Cada ambiente proposto pelo arquiteto proporciona uma surpresa de escala, luz e
transparência: salas de estar e visitas, jantar e sala íntima convoca o visitante a um
delicioso percurso repleto de textura e sensações provocadas pela composição
harmônica entre os materiais utilizados e volumes propostas para esta casa.
Casa Oscar americano - SP
Outra obra que retrata as casas modernistas, principalmente em São Paulo na década
de 50,
156
é a moradia planejada originalmente para casal de filhos pequenos em 1956
na rua Suécia no bairro Jardim Europa
157
. Diferentemente das demais casas acima
citadas, a Casa na rua Suécia estava implantada num lote urbano de dimensões
limitadas e com normas urbanísticas a serem respeitadas, conferindo com isto a
implantação colocada pelo arquiteto para esta casa.
153
. Vale ressaltar que até o momento as obras de diversos arquitetos eram realizadas com coberturas
convencionais, pois ainda não dominavam as lajes planas tão pouco a impermeabilização de coberturas,
apesar de muitos defenderem os conceitos de Le Corbusier.
154
. SEGAWA, Hugo. Oswaldo Arthur Bratke. São Paulo: ProEditores, 1997, p. 121.
155
. Estes termos foram mais utilizados após a Segunda Guerra, com os conceitos de Le Corbusier.
156
. A década de 1950 em São Paulo pode ser considerada o período de auge da arquitetura moderna no
país.
157
. O bairro do Jardim Europa foi planejado e comercializado nos anos 1920, projetado pelo escritório
técnico Hippolyto Gustavo Pujol, adotando o modelo das cidades-jardins.
76
Elemento evocativo em vários projetos residenciais de Oswaldo Bratke, um núcleo de
circulação articula os principais espaços internos de modo a evitar cruzamentos
indesejáveis entre as áreas de descanso, serviço e estar, garantindo a privacidade das
diversas peças e domésticas.
158
A composição estrutural da casa compõe um jogo geométrico com a fachada que
denunciam a hierarquia dos usos propostos na planta desta casa. O vazio central da
composição frontal tornou possível criar um jogo de volumes conciliando a estrutura
em concreto armado, revestido de pastilhas, elementos vazados de cimento e madeira
– tábuas afastadas da alvenaria, formando colchão de ar para melhorar as condições
de isolamento dos interiores, demonstrando que Bratke nunca deixou de responder as
necessidades técnicas (térmicas e acústicas) e físicas (espaços e ambientes) de forma
harmoniosa e coerente a cada objeto proposto.
Fica claro que Oswaldo Bratke foi um grande pesquisador em sua profissão, em
especial nas residências que desenhou e contribuiu para uma nova forma de
compreender a moradia paulista urbana, os novos modos culturais do morar
modernista, mas principalmente às técnicas e métodos construtivos em cada proposta
colocada pelo arquiteto durante a década de 50 e 90, formando um rico acervo
arquitetônico para todo o século XX para várias gerações de arquitetos e urbanistas
em todo o país.
Uma frase de Bratke resume seu domínio sobre a construção, sobre o trabalho no
canteiro, as técnicas e pormenores construtivos, sobre a análise de programas, mas,
sobretudo a uma linguagem própria adotada por este arquiteto:
“Um arquiteto profissional precisa ter os conhecimentos necessários, ou o
domínio das fontes onde pode colher informações para resolver qualquer
problema que não seja diretamente relacionado com sua formação e ao qual
venha a ser solicitado, sem preocupação de imprimir sua marca, a não ser a de
sua competência”.
159
Pode-se dizer que Rino Levi muito contribuiu para a consolidação de uma arquitetura
moderna com identidade própria para o país. Para ele, a obra arquitetônica era o
resultante de um conjunto de fatores que o levavam a considerar todos os detalhes
necessários para que o projeto não fosse apenas uma solução estética, mas uma
interação da beleza e da forma aliados à função; No jogo de volumes, a forma e a cor
tinham objetivos não só estéticos, mas também sociais e psicológicos.
160
Neste sentido algumas casas projetadas por Rino Levi devem ser analisadas
graficamente na intenção de compreender seus conceitos e partido arquitetônico
adotado pelo arquiteto a cada obra proposta. “Paredes opacas ou de elementos
vazados, construídos sobre o recuo obrigatório, constituíam uma única volumetria
englobando os jardins no interior da habitação”.
161
A casa que um arquiteto concebe para si mesmo é, em geral, o manifesto das suas
aspirações, o testemunho, a confissão de suas franquezas, quase um documento
158
. SEGAWA, Hugo. Oswaldo Arthur Bratke. São Paulo: ProEditores, 1997, p. 138.
159
. Idem, p. 183.
160
. ROBERTO BURLE MAX. Rino Levi. In, Depoimento de uma geração – arquitetura moderna
brasileira. São Paulo: Cosac & Naify, 2003, p. 340.
161
. ANELI, Renato. GUERRA, Abílio. KON, Nelson. Rino Levi, 1901-1965 Arquitetura e Cidade. São
Paulo: Romano Guerra Editora, 2001, p. 95-95.
77
holográfico, o qual, além da leitura dos textos visíveis, revelam grafologicamente os
motivos íntimos de sua ação: as raízes secretas onde o autor suga a própria linfa.
162
Desta forma, a residência particular do arquiteto construída em 1949 em São Paulo,
na rua Bélgica esquina com a rua Suécia nos dão uma total compreensão sobre os
conceitos de Rino Levi para a arquitetura residencial. O partido arquitetônico adotado
faz com que a casa se volte para o interior do lote, abrindo-se para um grande jardim
que compõem a paisagem da área social.
A cada área da casa – social, intima e serviços – integra-se a um espaço aberto
especifico, sendo o de maior interesse o jardim definido em lados opostos pela sala de
estar e pela galeria dos dormitórios, fechando-se nos dois outros pelos muros de
divisa.
163
Fica claro que a opção do arquiteto em criar um conjunto de dormitórios na
área mais reservada do lote possui a intenção de propiciar espaços mais
aconchegantes para a área intima da casa, que se estrutura através da circulação
linear perpendicular a rua Suécia cumprindo o papel de ligação entre a área social e
serviços com a íntima.
Através de um sistema construtivo relativamente simples, a casa é vedada com
alvenaria simples reforçada em concreto armado e coberta com telhas de fibro-
cimento tornando a obra mais leve.
Residência Rino Levi – São Paulo - 1944
A residência Olívio Gomes, projetada em 1949-51 para o empresário em São José dos
Campos no Vale do Paraíba. Com a colaboração de Burle Marx esta casa torna-se
uma importante referência na obra do arquiteto.
Livre dos limites de um lote urbano, Rino Levi pode explorar a paisagem da área de
intervenção criando uma casa que se integra à paisagem existente numa fluidez com a
concepção do objeto proposto e a área.
162
. ERNESTO NATHAN ROGERS. Pretextos para uma crítica não formalista. In, Depoimento de uma
geração – arquitetura moderna brasileira. São Paulo: Cosac & Naify, 2003, p. 168.
163
. ANELI, Renato. GUERRA, Abílio. KON, Nelson. Rino Levi, 1901-1965 Arquitetura e Cidade. São
Paulo: Romano Guerra Editora, 2001, p. ANELI, Renato. GUERRA, Abílio. KON, Nelson. Rino Levi,
1901-1965 Arquitetura e Cidade. São Paulo: Romano Guerra Editora, 2001, p. 152.
78
A forma com que o arquiteto setoriza esta casa faz com que mesmo possuindo um
programa de necessidades extenso, a obra se integra à paisagem de forma “leve e
harmônica”.
Dois longos pavilhões compõem a forma com que a casa se apropria da paisagem.
Uma grande sala de estar cumpre o papel de articular os demais setores: ao fundo a
área de serviços – copa/cozinha, lavanderia – e a área intima que se estende em um
pavilhão independente voltando os dormitórios para a vista mais privilegiada onde a
casa foi implantada.
Já nesta casa, Rino Levi ousa na estrutura para criar amplos espaços onde as colunas
em concreto armado faz com que libere a vedação para a utilização dos grandes
caixilhos de aço e vidro que amplia a visão para a paisagem integrando a casa ao
exterior do local.
Outro elemento importante a salientar é quanto ao grande número de painéis onde
Burle Marx compõem de forma que os jardins entrem em sintonia com a casa e todo o
entorno da área de intervenção.
Residência Olívio Gomes – São José dos Campos – SP – 1949/51
A partir da residência Milton Guper, projetada em 1951-52 em São Paulo, que Rino
Levi experimenta a composição dos ambientes que integre interior e exterior com um
único espaço formado por caixilhos de aço e vidro.
Nesta casa toda área de estar se abre para o recuo lateral protegido pela vedação da
sala que se estende até o muro lateral do lote.
Os pátios propostos por Levi permitem a entrada de luz, ar e chuva sobre a vegetação
em espaços reservados que garantam maior segurança aos moradores. Composto por
pergolados, esses pátios criam um interessante resultado espacial. A setorização da
casa foi cuidadosamente planejada localizando a área social e intima no setor mais
privativo do lote, trazendo para as faces da rua os ambientes de serviços como
banheiros e dormitório de empregados.
Todos os acessos são propostos para a rua Nicarágua que nos leva ao hall principal
responsável em distribuir para as áreas da casa: social à frente, serviços à esquerda e
através da circulação à direita a área íntima da casa.
79
Residência Milton Guper – São Paulo – 1951/52
Residência Castor Delgado Perez – São Paulo - 1958
Porém é com a casa Castor Delgado Perez, num terreno na avenida 9 de Julho
esquina com a rua Rússia e projetada em 1958-59 que Rino Levi desenvolve um
partido arquitetônico em espaço único, constituído de duas faixas laterais com jardins
descobertos e uma faixa central coberta e protegida.
164
Nesta casa, a sala de estar torna-se o ator central de todo o projeto, iluminada pelos
jardins pergolados que ampliam o espaço físico da sala num surpreendente caixilho de
correr que recolhe nos cantos junto aos blocos laterais.
Os dormitórios dispostos ao fundo do lote cumprem a função de organizar os jardins
centrais, já a parte frontal da casa é composta por muro em “L” executado em tijolo
cerâmico vazado protegendo a área de serviços da casa, onde o dormitório de
empregada é curiosamente elevado numa caixa branca com empena cega para a rua,
compondo de forma muito harmoniosa a elevação frontal desta casa.
Longe de ser opção formalista, o partido arquitetônico de suas casas representam
para ele mesmo, a possibilidade de uma nova sociabilidade, utopicamente severa e
feliz, impregnada pela harmonia que deveria existir na natureza.
165
Desta forma, a
contribuição da obra do arquiteto Rino Levi, através das casas projetadas em São
Paulo e São José dos Campos no Vale do Paraíba, demonstra o perfeito domínio
sobre as técnicas construtivas, mas, sobretudo sobre o domínio do espaço proposto
para cada casa, cada qual com sua peculiaridade – local, programa e forma proposta.
Para tanto, o estudo das casas de Rino Levi possui o caráter de assumi-las como
elementos individuais que compõem um conjunto de fatores empíricos à formação do
repertório arquitetônico para o estudante de arquitetura.
164
. Idem, p. 234.
165
. Ibdim, p. 96.
80
2.3 – Considerações Finais
Como toda arquitetura, a moderna tentou criar um ambiente especial para a vida
humana e compor uma imagem dos pensamentos e ações dos seres humanos como
eles mesmos desejavam parecer. Da mesma forma, como toda arte, revelou algumas
verdades básicas da condição humana e, também, como toda arte, desenhou um
papel na mudança e reforma dessa própria condição.
166
Na história do ensino de arquitetura não foi diferente, a Bauhaus tinha como meta
principal o preparo e a formação de uma nova geração de arquitetos em contato íntimo
com os modernos meios de produção
167
. Desta forma, a criatividade era provocada a
partir da experimentação em seus diversos campos da arte.
A Bauhaus alemã, com este novo método aplicado principalmente por Walter Gropius,
influencia diversas escolas de arquitetura do mundo ocidental durante o século XX,
inclusive no Brasil com a abertura de novas escolas em diversos Estados,
principalmente em São Paulo com o surgimento da Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo da Universidade de São Paulo com uma metodologia divergente das atuais
existentes na cidade: a Escola Politécnica, fundada pelo governo do Estado em 1894 e
a Escola de Engenharia Mackenzie, organizado em 1917 pelo arquiteto Christiano
Stockler das Neves; colocando o ensino de projeto como instrumento de investigação.
O ensino de projeto arquitetônico busca, pela investigação contínua e sistemática de
problemas paradigmáticos,
168
promover a transmissão, a transformação e o
crescimento do saber.
A criação do repertório é uma tarefa coletiva em que os interesses comuns disciplinam
e direcionam os esforços e o engenho individual. Desta forma, toda atividade projetual
se dá tomando como referência um repertório de imagens, modelos e tipos
arquitetônicos,
169
que fornecem as hipóteses que fundamentam a geração do partido
e às quais serão contrapostos os elementos de programa e sítio. Conduzindo a um
projeto específico que contém e qualifica o conhecimento prévio do projetista.
Outro ponto relevante na escolha dos objetos a serem estudados capaz de contribuir
para a formação de um repertório arquitetônico teórico-filosófico para o futuro arquiteto
e urbanista diz respeito a sua formação cultural em que chega à universidade e qual a
experiência de vida, inclusive profissional, com que o aluno define sua profissão. Nisto
a noção de repertório deve ser trabalhado como elemento norteador de um processo
contínuo de pesquisa capaz de subsidiar as propostas arquitetônicas defendidas por
si.
Neste sentido, a escolha da utilização de casas modernistas como objetos de
experimentação, para a construção de repertório teórico-filosófico, e contribuição para
o ensino de projeto no contexto geral do ensino de arquitetura, coloca estes objetos
pré-selecionados como fontes de pesquisa para a discussão no coletivo discente
sobre um tema conhecido por todos, cada qual a sua cultura adquirida e forma de
viver e compreender a casa, não só como abrigo, mas também como espaço social e
de manifestações a cada tipo de família.
166
. SCULLY JR, Vicent. Arquitetura moderna: a arquitetura da democracia. São Paulo. Cosac & Naify,
2002, p. 16.
167
. Walter Gropius. Bauhaus: novarquitetura. São Paulo: Editora Perspectiva, 2001, p. 30.
168
. Carlos Eduardo Comas, in COMAS (org). Projeto arquitetônico disciplina em crise, disciplina em
renovação. São Paulo: Projeto, 1986, p. 75.
169
. Entende-se que a construção deste repertório passa tanto pelo processo de pesquisa teórica como
“vivida”, com visitas programáticas nas obras em estudo.
81
Nisto a casa torna-se elemento neutro na discussão junto a estudantes de arquitetura
recém chegados à vida acadêmica. Tema este com infinitas possibilidades de
discussões sobre diversos pontos, da mesma forma que a casa modernista torna-se a
“ruptura formal e funcional” do conhecimento sobre o morar e o habitar. Nisto, Le
Corbusier foi o arquiteto mais influente dos últimos quarenta anos
170
na forma de ver e
compreender a arquitetura, quase sempre mal compreendida, de que “Devemos
considerar uma casa uma máquina de morar ou uma ferramenta [...]”
171
é entendida
como tendo sido puramente humanista, centrada no homem. Isso significa que a casa
é para ser usada pelos homens, e deve ser um lugar de ação, não um refúgio ilusório.
Desta forma, a função de uma escola de arquitetura é criar condições para que os
futuros arquitetos possam desenvolver uma atitude de reflexão, tanto crítica como
filosófica sobre seu trabalho, dando-lhes uma capacidade suficiente para atender às
exigências individuais e coletivas da sociedade.
Um método de ensino de projeto embasado na transmissão de repertório coerente a
sua atual capacidade de abstrair e contribuir para a discussão coletiva do corpo
discente faz com que o “aprender” se torne uma função natural dentro do processo de
aprendizagem e desenvolvimento em sua futura vida profissional.
“Nada existe sem experiências anteriores.
Não se inventa a arquitetura toda a manhã.”
172
“Invenção é uma nova combinação daquelas
imagens que foram previamente reunidas e
depositadas na memória: nada vem do nada.
O arquiteto que não armazena materiais
não pode produzir nenhuma combinação.”
173
170
. A influência de Le Corbusier foi sentida no mundo inteiro, inclusive em suas habitações propostas e
suas teorias defendidas.
171
. SCULLY JR, Vicent. Arquitetura moderna: a arquitetura da democracia. São Paulo. Cosac & Naify,
2002, p. 90.
172
. VARAS, Alberto. El laboratorio de arquitectura. Buenos Aires: Ediciones Union Carbide, 1985, p.
22.
173
. LETHABY, William. Architecture, Mysticism and Myth. London: Persival, 1981, p. 21.
82
3 Análise Gráfica de Exemplares
da Arquitetura Residencial Moderna:
Estudos de Caso - A Casa
Modernista produzida no Século XX
83
As casas modernistas que contribuíram na formação e transformação do viver urbano,
casas que se tornaram paradigmas, que carregam a radicalidade de suas idéias e a
grandeza de seu talento, com a finalidade de compreender o verdadeiro valor
arquitetônico e sócio-cultural que o “morar” contribui para a formação de uma
sociedade, e discutir possíveis alternativas de gerar espaços habitacionais
compatíveis com a então realidade contemporânea.
174
Os objetos estudados configuram experiências em relação ao espaço, hierarquias,
formas de circulação horizontal e vertical, relações de pé-direito, meios-níveis e
mezaninos; formas novas de privatizar o espaço, transparências e opacidades; novas
relações interior/exterior.
Pelo universo de possibilidades que abre, a casa é também o espelho do
posicionamento crítico do arquiteto quanto às vanguardas, às novas questões globais
e regionais da arquitetura, seus ideais espirituais e políticos.
175
A casa contém uma identidade própria e infinita na sua forma de pensar, agir e
conceber espacialmente para cada homem. No caso da Arquitetura Moderna, observa-
se que a lógica construtiva do espaço de morar é influenciada por uma nova cultura
emergente no início do século XX, seja ela, de ordem social, econômica ou até mesmo
religiosa.
As transformações de usos dos espaços gerados pelos processos sócio-econômicos e
pela própria globalização geraram grandes mudanças na forma do homem viver e no
seu espaço de viver. O espaço de conforto e intimidade deixa de ser o mero abrigo do
homem e absorve também o lugar de trabalho; morar e trabalhar fundem-se num só
objeto em busca de respostas a uma nova sociedade.
Prova disto estão nas casas projetadas tanto por Oswaldo Bratke como Vilanova
Artigas que desenham em meados do século XX casas que acomodam além do
programa “convencional” da casa, a garagem que abriga a “máquina desejada por
todos” – o automóvel, e o escritório particular com capacidade, por muitas vezes, em
estender o local de trabalho até a moradia.
A confirmação das casas modernas como objetos passíveis de estudo, principalmente
de arquitetos que contribuíram para a manifestação dos conceitos e ideários, referem-
se em disciplinar uns repertórios arquitetônicos satisfatório sem afetar na
criatividade do aluno. Nisto utilizar-se destas casas como fio condutor e
transformador de novos conceitos na forma de compreender e refletir sobre o morar,
do ponto de vista espacial, formal, da estrutura proposta e até mesmo da forma de
viver que tanto influenciaram nas casas contemporânea.
3.1 – Em busca dos objetos significativos
O século XX daria coordenadas absolutamente inéditas ao mundo. Provocaria
transformações radicais e profundas.
176
A arquitetura moderna tinha como “missão” a
174
. Neste caso, o termo “contemporâneo” deve ser compreendido como o Movimento Moderno, do início
do século XX.
175
. BISELLI, Mario. A casa, tema universal, permite testar experimentar, subverter. Projeto Design, n°
219, abril de 1998, p. 85.
176
. BRITO, Mário da Silva. As coordenadas do século XX. in, Depoimento de uma geração – arquitetura
moderna brasileira. São Paulo: Cosac & Naify, 2003, p. 25.
84
cumprir modificar a forma de viver em novas cidades planejadas para uma civilização
movida pela máquina”, entusiasmada pela Era Industrial.
Ao mesmo tempo, o homem do século XX que conheceu os efeitos da máquina, não
pode viver da mesma maneira que o homem que não a conhecia. Nisto, a casa torna-
se um acessório para auxiliar o homem a viver, enquanto que a “casa antiga”
177
era
uma fortaleza para proteger numa demonstração de medo sobre o qual o homem tinha
do mundo, enquanto que a “casa de hoje”
178
é uma demonstração da ausência do
medo. A fragilidade e a leveza da arquitetura moderna revelam uma nova forma de
compreender a casa como elemento integrante da nova vida contemporânea.
O homem do século XX, o homem que conheceu a máquina, não tem mais tempo a
perder em contemplação beatífica.
179
A evolução das condições econômicas,
religiosas e sociais transformou completamente o valor da moradia para o homem.
Desta forma, a razão pela qual a máquina moderna inicia um processo de formação e
composição na vida do homem moderno coloca em questão a discussão sobre o
morar e a forma físico-espacial da casa sobre a ótica do progresso rápido que a
máquina propiciou.
“A coisa é muito diferente quando examinamos as máquinas para habitação – os
edifícios. Uma casa é, no final das contas, uma máquina cujo aperfeiçoamento técnico
permite, por exemplo, uma distribuição racional de luz, calor, água fria e quente
etc.”.
180
Portanto, praticidade e economia, arquitetura de volumes, linhas simples, poucos
elementos decorativos, estrutura do edifício denunciada de forma a cumprir sua função
e compor o volume desejado tornam-se elementos significativos da causa defendida
por estes arquitetos que acreditavam na transformação de uma sociedade através da
arte.
Desta forma, a casa torna-se num elemento essencial nesta discussão sobre a
produção da arquitetura moderna. A casa tem se constituído, ao longo da história da
arquitetura, um momento e um meio fundamental para a prática arquitetônica onde os
autores testam e expõem seus ideários. Esta produção é vista como um manifesto em
seus discursos arquitetônicos expressos em seus programas.
Pode-se dizer que um grande grupo de arquitetos, em quase todo o mundo, foi
responsável por esta nova forma de “fazer arquitetura” para o homem moderno. Nesse
conjunto de profissionais igualmente interessados na renovação da técnica e da
expressão arquitetônica, destacam-se os estudos realizados por Walter Gropius e
Mies van der Rohe.
Suas teorias e realizações desenvolvidas principalmente entre os anos de 1931 a
1935 possibilitaram que a arquitetura moderna contribuísse para esta nova sociedade
recém nascida. Mas talvez o principal protagonista deste movimento foi Le Corbusier,
que durante os anos formou um grupo de seguidores de suas teorias, inclusive os
arquitetos cariocas e paulistas como Lucio Costa, Oscar Niemeyer, Gregori
177
. A nomenclatura “casa antiga” foi apenas mencionada para demonstrar a divisão no tempo entre a
casa até o século XX e a casa moderna.
178
. Entenda-se a “casa de hoje” como a casa modernista do século XX.
179
. CARVALHO, Flávio de. A casa do homem do século XX. in, Depoimento de uma geração
arquitetura moderna brasileira. São Paulo: Cosac & Naify, 2003, p. 52.
180
. Gregori Warchavchik. Acerca da arquitetura moderna, 1925.
85
Warchavchik, Rino Levi entre outros responsáveis pela difusão dos princípios de Le
Corbusier nas escolas de arquitetura e em suas obras.
Contudo, o marco definitivo da nova arquitetura brasileira, que se haveria de revelar
igualmente, apenas construído, padrão internacional e onde a doutrina e as soluções
preconizadas por Le Corbusier tomaram corpo na sua feição monumental pela
primeira vez, foi, sem dúvida, o edifício construído pelo ministro Gustavo Capanema
para a sede do novo Ministério,
181
edifício projetado e construído durante os longos e
acidentados anos de um Brasil em pleno desenvolvimento, o Ministério da Educação e
Saúde, já atestava, o alto grau de consciência, capacidade e aptidão em que nossa
arquitetura vinha alcançando.
Ministério da Educação e Saúde, 1936-43
Nisto o Ministério da Educação e Saúde, de Lucio Costa, Affonso Eduardo Reidy,
Oscar Niemeyer e outros, a Obra do Berço no Rio de Janeiro, o Edifício Esther, de
Álvaro Vital Brazil, em São Paulo, o Pavilhão da Feira Internacional de Nova York, de
1939, a Estação de Barcos e Hidroaviões, de Atílio Corrêa Lima, perfazem um
conjunto de obras que caracteriza com exatidão a primeira fase de realização integral
em todo o mundo.
182
Da mesma forma, as casas modernistas forma produzidas durante o século XX como
manifestos de uma nova arquitetura que apontava uma expressão colocada nas
“pranchetas” por diversos arquitetos, ora seguidores dos conceitos de Le Corbusier,
ora defensores de outras teorias levadas a fundo na forma de compor os espaços e o
resultado plástico como elementos da formação de uma nova sociedade que emergia
junto a um conjunto de situações artísticas, sociais e políticas em que o mundo
passava naquele momento.
181
. COSTA, Lucio. Muita construção, alguma arquitetura e um milagre. in, Depoimento de uma geração
– arquitetura moderna brasileira. São Paulo: Cosac & Naify, 2003, p. 93.
182
. GUIMARÃES, Eduardo Mendes. Forma e racionalismo na arquitetura contemporânea brasileira. in,
Depoimento de uma geração – arquitetura moderna brasileira. São Paulo: Cosac & Naify, 2003, p. 232.
86
A casa moderna, neste contexto, incide no manifesto através dos novos materiais
empregados na concepção plástica da obra, principalmente o concreto armado,
material disponível aos “artistas”
183
, aos grandes progressos conseguidos durante os
anos na técnica da construção.
Portanto, praticidade e economia, arquitetura de volumes, linhas simples, poucos
elementos decorativos, mas sinceros e bem em destaque, nada de mascarar a
estrutura do edifício
184
, compõem estes objetos explorados pela maleabilidade do
concreto, possibilitando a concepção plástica de formas mais livres e liberto das
amarras colocadas até o momento pela história tanto da arquitetura como da
construção civil em todo o mundo.
3.2 – Análise gráfica sobre alguns exemplares da arquitetura moderna
A casa, abrigo e moradia para o homem, evoluiu durante os anos em paralelo ao
desenho da cidade junto as mudanças sócio-economicas da sociedade. Vitrúvio no
seu plano de uma cidade ideal
185
, tendo como expressão física a arquitetura romana,
desenvolvida como um somatório de partes tendo a casa, moradia, habitação, uma
função estruturante na definição do espaço público.
A célula de base da nova cidade é a residência, concebida para ao mesmo tempo se
adaptar às novas necessidades e para agir sobre seus utilizadores, participando assim
de sua transformação: residência nova e sociedade nova – para Le Corbusier as duas
coisas andam juntas.
186
Pompéia, produto de reconstrução (200 a 100 a.C.), impôs um novo traçado que
regula a ocupação de lotes (regulares) definindo a estrutura pública da cidade. Esta
tipologia de ocupação sobre o tecido urbano, organiza de modo formal a criação dos
pátios em sua organização espacial, à semelhança da casa grega
187
, cujos espaços
comunicavam entre si através do “atrium” - pátios de diferentes dimensões com função
reguladora a forma da casa.
Pompeia, planta de detalhe das “insulae”, planta
da casa de Salustio e
planta tipo de um castro romano.
183
. Entende-se a expressão artista aos arquitetos, pintores e escultores responsáveis pela divulgação dos
preceitos do Movimento Moderno.
184
. LEVI, Rino. A arquitetura e a estética das cidades. in, Depoimento de uma geração – arquitetura
moderna brasileira. São Paulo: Cosac & Naify, 2003, p. 38.
185
. Rosenau afirma: “[...] A cidade de Vitrúvio não é uma utopia social, mas sim um modelo formal,
característico do seu próprio período [...]”.
186
. KOOP, Anatole. Quando o moderno não era um estilo e sim uma causa. São Paulo: Nobel, Editora da
Universidade de São Paulo, 1990, p. 126.
187
. Pode-se afirmar que a casa romana repetiu basicamente o modelo grego.
87
A tipologia da casa foi sendo regularizada acompanhando o desenho da cidade, como
é o caso das colônias, sendo o exemplo mais racional Tingad, na Argélia
188
, que
apesar de manter a utilização de uma tipologia da casa-pátio, surge uma nova
estrutura formada por quarteirões no plano do desenho do tecido urbano. A cidade de
Gardaia, na Argélia, representa um exemplo deste tema descrito acima, embora com
diferentes tipologias, o desenho da casa surge-nos com regras claras: edificação em
dois pisos
189
- a moradia e a cobertura de terraço.
Planta da organização dos espaços públicos de Gardaia, planta
das duas tipologias dominantes na cidade de Gardaia.
O desenho da cidade medieval nos séculos V a XIV, quanto a sua origem, poder-se-á
classificar genericamente em cinco tipos
190
: de origem romana, mantendo a estrutura
de organização inicial; os burgos, de origem militar; cidades de crescimento orgânico
desenvolvidas a partir de pequenas estruturas de lugares; as cidades “Bastide
fundadas na França e Inglaterra durante a guerra dos cem anos
191
.
Neste sentido, Portugal utilizou-se do desenho geometrizado na fundação ou na
expansão dos novos aglomerados preexistentes com a utilização das “Ruas Direitas”
ou “Ruas Novas”
192
para a formatação de uma nova analogia voltada ao “plano-tipo”
na ocupação do território. Com isto, a casa, de modo particular, utiliza-se do desenho,
na arte de construir, na busca de construir a geometria do espaço e a teorização da
perspectiva, quer ao nível da paisagem como no edificado, com a preocupação de
estética, estando bem definidos os conceitos de proporção e harmonia. Porém, é o
188
. MORAIS, João Sousa. Metodologia de projecto em arquitectura. Lisboa: Editorial Estampa, 1995, p.
170.
189
. Idem, p. 171.
190
. MORRIS, A E.J. Historia de la forma urbana. Barcelona: Editorial GG, 1984, p. 84.
191
. O Imperador Frederico III, o rei Luis IX (Fraa) e Eduardo I (Inglaterra) são identificados como
criadores deste tipo de cidades, situando-se estas em pontos altos, desenvolvidas em planta regular, com
uma muralha envolvente.
192
. MORAIS, João Sousa. Metodologia de projecto em arquitectura. Lisboa: Editorial Estampa, 1995, p.
174.
88
programa da casa que se fortalece no sentido de definir os espaços físicos
relacionados a realidade sócio-econômica de cada família.
O rápido crescimento de um conjunto de grandes cidades que ultrapassam já os
100.000 habitantes implica problemas de reordenamento e crescimento do tecido
urbano
193
, dando forma a ideais de centralização e poder, redesenhando-se como um
todo.
Assim, Haussmann rasga a cidade de Paris pré-existente com uma nova estrutura de
boulevards”, dando resposta às pretensões da cidade, transformando estruturalmente
a cidade numa capital aberta com um poderoso suporte de zonas verdes, com o
objetivo de eliminação da insalubridade face a densificação das habitações. Neste
sentido, a requalificação do parque habitacional passa por um processo estruturação
voltados as questões de higiene individual (casa) e coletiva (cidade).
Mas é com a proposta de Ildefonso Cerdà, em 1859, para o plano de expansão de
Barcelona, que a casa passa a ter o caráter da coletividade sobre o tecido proposto
para a cidade. Seu projeto que tinha como suporte um traçado regulador com uma
quadrícula de sete quilômetros de extensão, partindo de uma grelha de 113,3 metros
entre cruzamentos num sistema contínuo de quarteirões, intersectados por duas
grandes diagonais que lhe dão uma entidade peculiar.
O “ensanche” correspondendo ao modelo de ordenamento de Cerdà é fundamental
para a compreensão da cidade, do ponto de vista da moradia individual, de que o
tecido urbano é composto pelo resultado da construção da forma edilícia na
“manzana”, colocando a abordagem da casa como uma forma inexistente na
discussão deste plano, porém observa-se que a visão de Cerdà vinha em encontro ás
necessidades da expansão da cidade de forma ordenada. Nisto, a casa revela-se
como um elemento integrador do conjunto de estrutura urbana responsável pela
composição da morfologia urbana.
Modelo teórico de Cerdà, perspectiva geral do plano.
O urbanismo progressista, de que faz parte Le Corbusier, absorve os princípios
inerentes às funções do habitar, trabalhar, cultivar o corpo e o espírito e circular, ideais
que estão estruturados na Carta de Atenas, representam a declaração de princípios
metodológicos da maneira de pensar urbanismo e arquitetura de Le Corbusier do
ponto de vista do funcionamento da cidade. Deste modo, o arquiteto tenta demonstrar
a relação que o observador, à dimensão do “Modulor”, tem ao nível da percepção
experimental, através de quatro exemplos
194
:
193
. Veneza, em 1575, tem 195.000 habitantes; Milão tem 200.000 e Nápoles 240.000; Paris, em 1594,
tem 180.000 habitantes e Londres alcança 250.000 em 1602.
194
. “(...) Concebeu-se um sistema de estrutura – ‘ossauture’ – completamente independente das funções
do plano da casa: este esqueleto suporta simplesmente as lajes e a escada. Esta é fabricada em elementos
89
- o primeiro reporta-se ao efeito que um traçado regulador da fachada de um edifício
produz sobre um observador, percebendo-se este da forma e da dimensão do
objeto em presença;
- o segundo relaciona-se com a escala do território onde se implanta um grande
edifício. A regra funciona para o edifício mas não para a paisagem, em virtude do
observador não ter a visão do todo;
- no terceiro caso, recorre-se ao exemplo do Museu Contemporâneo composto por
três elementos standard, onde os elementos são relacionados com a exploração
do sistema métrico e de proporções (produzido pelas regras) produzirá uma
sensação de organização;
- por último, reporta-se a unidade de habitação de Marselha (no Boulevard Michelet,
representa no estudo o imóvel com uma carga de 1.600 habitantes,
compreendendo 26 serviços comuns. De 140 metros de comprimento para 24 m
de largura e 56 m de altura, tinha 58 fogos por piso), aplicando o sistema de
Medidas Harmônicas de Modulor. Usa 15 medidas deste para demonstrar a sua
escala humana, cujo efeito produzido é de agregação, requalificando a sua
textura.
195
Estes ensaios de caráter demonstrativo pretendem fundamentar a nova arquitetura,
pautada pelo exemplo dos “cinco pontos da nova arquitetura”: o pilotis, o terraço
jardim, a planta livre, a janela contínua e a fachada livre.
196
É neste sentido que a Vila Savoye, projetada em 1929 por Le Corbusier, enquadra-se
nesta discussão como um exemplar modelo, mesmo fora do contexto urbano em sua
implantação, no que tange os princípios defendidos pelo arquiteto para a “Nova
Arquitetura” que se instalava naquele momento.
A planta baixa que tem como suporte o quadrado, com a estrutura como elementos
portantes: pilares de secção quadrada com laje de betão. O volume, um prisma puro
que repousa sobre os pilotis - protegendo o pavimento térreo que abriga os serviços,
possibilita a distribuição do programa da casa no primeiro pavimento, utilizando-se
ainda da cobertura para a formação do solário
197
. Os vãos são resultado do corte do
volume na horizontalidade iluminando a planta livre e garantindo uma imagem
harmônica na paisagem do local.
A orientação do sol é oposta à da vista da casa. Buscou-se, portanto, o sol, através do
espaço aberto do jardim da cobertura, dando-lhe a possibilidade de iluminar os
ambientes de forma mais rica e equilibrada.
Sua estrutura modulada de forma linear e contínua possibilitou a composição dos
espaços internos que garantam uma volumetria pura, mas diversificada em seu
compromisso com a paisagem. Desta forma, a implantação proposta pelo arquiteto faz
com que esta casa repouse na área cercada por árvores e componha uma só
paisagem em Poissy, na França.
standard combinados uns com os outros, permitindo uma grande diversidade no agrupamento de casas...
(...)”. Estes elementos fornecem a Le Corbusier um instrumento de ocupação do espaço, privilegiado na
concepção.
195
. MORAIS, João Sousa. Metodologia de projecto em arquitectura. Lisboa: Editorial Estampa, 1995, p.
205.
196
. BENEVOLO, Leonardo. História da Arquitetura Moderna. Barcelona: Editorial GG, 1979, p. 189.
197
. Neste momento a proposta de Le Corbusier não explora a cobertura como “teto jardim”, elemento
também defendido pelo arquiteto, nota-se que este elemento não fora proposto talvez devido ao cinturão
verde onde a casa foi implantada.
90
Esta mesma estrutura organiza o pavimento térreo localizando os serviços na periferia
da casa, centralizando a circulação vertical através de duas possibilidades de se
chegar ao pavimento da moradia (primeiro pavimento), a escada: que garante uma
circulação de serviços que interliga o térreo a ala da cozinha, e a rampa
198
: mais
centralizada na planta da casa que leva os moradores a sala e ao jardim deste
pavimento. Estas duas circulações se estendem até o solário garantindo o acesso a
este pavimento.
Vila Savoye – Planta Baixa dos pavimentos térreo, primeiro e segundo.
A rigor, o Movimento Moderno assenta em princípios metodológicos que resultam em
uma praxis para a discussão de uma nova sociedade e sobre o morar contemporâneo.
Este rompe com a crença histórica e, em vez de ser pensada como um “processo
problema” é entendido como um objeto reprodutível
199
, tornando-se um verdadeiro
modelo.
Enquanto Corbusier traduz a sua racionalidade como um sistema estrutural, composto
por elementos verticais e horizontais compondo a obra, Walter Gropius entende a
racionalidade como método, permitindo-lhe equacionar a problemática existencial, a
fim de lhe dar resolução. O primeiro produz manifestos através do seu “Esprit
Nouveau”, enquanto Gropius elabora e transforma o seu posicionamento teórico
através do seu grande laboratório, a Bauhaus
200
.
198
. Vale lembrar que Vilanova Artigas utilizará desta mesma forma de circulação em suas casas entre as
décadas de 50 e 70.
199
. Giulio Carlo Argan refere-se sobretudo a Hussel, ao qual está ligado historicamente, tratando-se,
sobretudo, de deduzir da “pura estrutura lógica do pensamento”.
200
. MORAIS, João Sousa. Metodologia de projecto em arquitectura. Lisboa: Editorial Estampa, 1995, p.
209.
91
A planta livre de Corbusier é entendida por Gropius de um modo mais orgânico, não
tendo necessidade de uma estruturação geométrica elaborada. O arquiteto explora os
vãos rasgando as elevações em função das exigências internas do espaço e não
apenas como uma imposição formal, relacionando a obra diretamente com o “sítio”
onde está implantada. Nisto, o edifício, como refere Charles Moore
201
, tem por objetivo
assinalar o lugar, não passando forçosamente por um plano, da mesma forma sendo o
estatuto do monumento concedido em função do significado que possui no lugar
202
.
O projeto de Walter Gropius, durante a década de 1910 e início de 1920 documenta os
planos continuamente horizontais de Wrigth, evitando-se a plasticidade dos volumes e
limitando-se a fechar o edifício – como que criando uma pele à ele. Deste modo, cria
uma espécie de continuidade da expressão e movimento espacial, ausentes em
Behrens
203
, que identifica sua obra como objeto racionalmente elaborado em
metodologia própria desenvolvida por ele.
A casa do arquiteto em Lincoln – Massachusetts (1937) pode ser considerado um
exemplo destes conceitos estudados por Gropius durante sua vida profissional. A
atenção tomada pelo arquiteto nesta casa resultou num objeto integrado à paisagem
de forma harmônica, que assume uma nova tendência para a casa modernista urbana.
Mies van der Rohe, também discípulo de Behrens, buscou em seus projetos conciliar a
compulsão americana em direção ao movimento moderno com um instinto europeu de
“formas fechadas, limitadas”,
204
tanto que suas obras expressavam as novas
tecnologias e “facilidades” em que a modernidade possibilitava para esta sociedade.
As formas desenvolvidas por Mies buscavam uma harmonia, uma linearidade entre os
materiais utilizados – a metálica e o vidro, a mecânica em que estes propiciam e o
ambiente; nisto seus edifícios, na maioria das vezes e principalmente nas casas
propostas, apoiam-se sobre uma plataforma que flutua sobre o terreno em que estas
estão inseridas, quase como um pódio clássico suspenso sobre o solo.
Assim, a casa Tugendhat, projetada em 1929 pelo arquiteto, nos possibilita uma
análise sobre os preceitos de Mies van der Rohe, que possuía uma forma muito
interessante em propor a forma arquitetônica e sua volumetria plástica, onde nesta
casa coloca como premissa não só o objeto proposto.
Entretanto, a isso cabe todo o sítio proposto – as condições topográficas existentes, a
vegetação do entorno, além de inaugurar um novo conceito de compreender a
setorização da casa em função modo de vida. Assim como, a facilidade de expressar
seus ideais
205
em suas obras demonstram o domínio do arquiteto sobre a técnica
construtiva do aço, até então não utilizado pelos demais arquitetos modernistas do
início do século XX.
Esta casa, projetada para a Madame Grete Tugendhat, tem como partido arquitetônico
um pequeno pavilhão que flutua sobre o gramado da área proposta, esta casa
composta por um conjunto de pilares metálicos e lajes planas, emoldurados por uma
201
. Nos anos sessenta assiste-se nos EUA à teorização de posições que se aproximam ao conceito de
“locus”, onde o edifício tem um estatuto próprio (associando-se já ao sentido de lugar). Estas teses estão
associadas à Universidade de Berkeley.
Esta problemática foi retomada por Robert Venturi numa óptica projetual.
202
. MORAIS, João Sousa. Metodologia de projecto em arquitectura. Lisboa: Editorial Estampa, 1995, p.
211, 212.
203
. Walter Gropius foi um dos vários excelentes alunos de Behrens.
204
. SCULLY JR, Vincent. Arquitetura moderna: a arquitetura da democracia. São Paulo: Cosac & Naify
Edições, 2002, p. 54. (grifo nosso).
205
. Entenda-se estes ideais pela tão conhecida frase de Mies – “Less is More”.
92
pele de vidro que cumpre o papel de vedação da casa, porém com a função de
garantir a casa uma transparência para o objeto e compondo com a paisagem do local
de forma mais passível e harmônica com o entorno. Esta atitude faz com que os
limites entre o interior e exterior sejam rompidos numa só paisagem.
Casa Tugendhat, 1929 – Mies van der Rohe
Assim, a composição dos espaços é determinada pelo núcleo central que abriga o
setor de serviços da casa: a cozinha e banheiro são locados de forma a proporcionar
uma maior liberdade na composição da forma da obra. Isto faz com que todas as
elevações tornem-se livres para receberem a vedação em panos de vidro, dando a
casa a sensação de um “grande aquário” para quem à habita.
Outro elemento importante desta casa diz respeito a circulação periférica proposta
pelo autor, devido ao setor de serviços estar localizado no centro da planta da casa, a
circulação horizontal se faz pelas faces próximas as elevações possibilitando um maior
dinamismo na composição dos espaços nos demais setores – social e íntimo.
De todo o programa da casa modernista, podemos dizer que a cozinha foi a que mais
sofreu alteração durante o início do século XX. A residência burguesa que supunha a
presença de empregados domésticos para os quais estavam previstos os “quartos de
empregada”.
206
Esse pessoal trabalhava na cozinha, eventualmente em uma copa e
uma lavanderia, afastadas das peças principais da habitação: local de recepção,
quartos de dormir etc...
207
Em 1923 os professores e estudantes da Bauhaus de Welmar construíram uma “casa
experimental”, a “Haus am Horn”, na qual a cozinha era resultado de avançados
estudos funcionais e ergométricos
208
. Outro exemplo importante foi a cozinha e os
anexos da casa construída em 1927 por Bruno Taut, na qual o lugar de cada utensílio
é predeterminado e onde os percursos necessários à realização de cada uma das
funções domésticas foram reduzidos ao mínimo.
209
Neste sentido, a nova cozinha é um elemento essencial para a simplificação das
tarefas domésticas, isto vem incorporado por um conjunto de elementos e costumes
de uma nova sociedade que busca se adaptar à água corrente e encanada, luz elétrica
206
. Às vezes um simples cubículo elevado e acessível através de uma escada.
207
. KOOP, Anatole. Quando o moderno não era um estilo e não uma causa. São Paulo: Nobel, Editora da
Universidade de São Paulo, 1990, p. 54.
208
. Idem, p. 56.
Essa “Bauhaus-küche (cozinha da Bauhaus) era concebida como um laboratório culinário na qual teriam
suas dimensões padronizadas, constituindo um plano de trabalho na qual a pia estava incorporada.
209
. Ibdim, p. 56.
93
e o fogão a gás, além das geladeiras importadas – sensação do mercado: água
gelada, sorvetes, frutas frescas possibilitando armazenar alimentos e comprar em
maior quantidade.
A nova família do século XX também vai refletir no espaço físico deste ambiente, a
mulher que neste momento começa a ter sua participação não somente nas “prendas
domésticas”, mas como personagem integrante da economia da casa. Isto faz com
que a cozinha tenha que cumprir um papel de “facilitadora” dentro dos conceitos
domésticos, reduzindo o tempo de permanência neste ambiente e praticidade na
execução das tarefas domésticas.
Na década de 40, as geladeiras
foram a sensação do mercado.
Richard Neutra, arquiteto austríaco formado pela Universidade Técnica de Viena, não
era apenas um desenhador perfeito, mas também um artista cujos esboços produzidos
com grande rapidez e desenhos são impressionantes. Enquanto Neutra parece não ter
deixado influenciar pelo estilo de Loos – um distanciamento do ornamento movido por
razões de ética
210
, em favor de cubos e tijolos lisos e espacialmente compactos, faz
com que sua arquitetura seja considerado objetos valiosos para o modernismo na sua
discrição na utilização dos materiais com valiosos resultados plásticos sem o emprego
de adornos desnecessários à prática da arquitetura de suas casas.
O movimento holandês De Stijl foi sem dúvida uma fonte de inspiração na busca da
forma de sua arquitetura. Deste modo, Neutra ensaiou primeiramente a ênfase da
massa e da proporção, além do modo de criação com base em “ponto, linha e plano”
resultando em diversos exemplos dignos de análise e estudo por estudantes e
profissionais de arquitetura em busca da compreensão da metodologia adotada e
utilizada por Neutra demonstrada em suas obras através da assimetria controlada e na
disposição flexível de funções dentro do mesmo espaço resultado numa rica
diversidade de sensações físicas a cada objeto projetado pelo arquiteto.
Pode-se dizer que a Casa Lovell Health (1927 – 1929) é reconhecidamente uma das
casas de habitação mais importantes do século 20
211
. Esta casa baseada na
tecnologia de construção dos arranha-céus foi a primeira residência americana com
estrutura metálica
212
, onde Neutra rompe com a “caixa wrighiana” horizontal e
verticalmente e utiliza-se da Vila Savoye, de Le Corbusier, como referência para esta
210
. LAMPRECH, Barbara. Richard Neutra. Köln: Taschen, 2004, p. 9.
211
. Idem, p. 23.
212
. Neutra “devorava com os olhos” os arranha-céus quando era desenhista em Nova Iorque e Chicago.
94
obra, porém ao invés de içar a obra sobre os pilotis como fez o arquiteto, utiliza-se de
uma construção com arquitrave para construir esta casa.
“Uma passagem de betão liga a rua à entrada da casa sobre o abismo. Aqui encontra-
se um vestíbulo baixo, revestido com painéis de madeira escura, descendo por uma
escada enquadrada por paredes de vidro, para chegar à sala de estar, moderna e
luminosa, passando pelo farol de um carro de marca Ford, instalado na caixa da
escada – símbolo do capitalismo americano”.
213
Esta descrição de Barbara Lamprech sobre a casa do Sr. Philip e Lea Lovell nos
coloca num delicioso passeio sobre esta obra ancorada no terreno, criando um
interessante jogo entre os espaços livres e de abrigo da família. Deste modo, o
arquiteto inverte o terraço-jardim de Le Corbusier, o que está por cima passa a estar
por baixo recriando a paisagem do entorno e explorando a paisagem existente de Los
Angeles – Califórnia, além de possibilitar uma diversidade espacial nos ambientes
propostos para esta obra.
Sua estrutura composta por um esqueleto em aço, onde ele coloca séries de três
janelas de caixilho de aço, ligadas a finos pilares de metal verticais, entre postes de
aço mais largos, que por sua vez eram soldados às vigas de rótula, as quais
suportavam os tetos dos andares com chapa ondulada.
214
Do ponto de vista formal, a elevação principal da casa nos remete a uma obra de
formas puras, simples e leves que flutuam sobre a paisagem de fundo, fazendo com
que o branco aplicado nas vedações da casa crie uma harmonia com a vegetação do
local e reforçando a horizontalidade da obra.
Planta baixa do pavimento superior e inferior da casa.
Vista para oeste através da ponte até ao cume das colinas. Sala de estar no extremo oeste.
213
. LAMPRECH, Barbara. Richard Neutra. Köln: Taschen, 2004, p. 23.
214
. Idem, p. 25.
95
Outra casa de grande importância na produção arquitetônica de Neutra foi a projetada
e construída entre 1946 e 1947 para o Sr. Edgar Kaufmann, em Palm Springs –
Califórnia, dez anos depois de ter encomendado a Frank Lloyd Wright a construção da
sua famosa casa Falling Water.
Esta casa com quase 300,00m
2
, moderna e grandiosa, dominava a “paisagem lunar”
(como lhe chamou Neutra) como um avião prateado recentemente aterrado num
tapete verde, fixo ao chão meramente por rochas ali colocadas.
215
Neutra incorporou a
casa no cenário inóspito, assentando a obra neste “clima artificial”, às condições
climáticas, o luar branco e pateado e o céu estrelado.
216
Como em outras construções
pioneiras suas da década de 1940, os edifícios combinam-se com a paisagem, sem
perderem as qualidades tensamente concentradas das casas precedentes. A casa
Kaufmann decompõe o espaço em superfícies horizontais prateadas, por cima de
vidraças transparentes, colocando a chaminé como o único elemento sólido vertical a
se destacar no conjunto da obra.
Planta baixa da Casa Kaufmann
O desenho da planta cruciforme revela mais contrastes. O jardim penetra na casa com
descontraídos traços curvilíneos, possibilitando assim como o próprio Neutra
mencionava sobre suas casas: “é possível estarmos sentados numa sala de estar ... e
mesmo assim desejarmos ir para dentro da casa”
217
, criando uma interação interior x
exterior entre a obra e a paisagem existente.
A planta de quatro alas com o espaço e convívio ao centro fornece uma iluminação e
ventilação natural a todas as quatro alas
218
. A centralização da ala social,
representada pela sala de estar, se coloca como elemento organizador dos espaços
das demais alas e configuram a volumetria da casa de forma a se harmonizar com a
paisagem do local.
215
. Ibdim, p. 57.
216
. Richard Neutra.
217
. Idem, p. 11.
218
. Neutra chamava os setores da casa por ala: social, serviços, íntima e lazer.
96
A forma com que compõem e organiza o programa desta casa faz referência, apesar
de não mencionada pelo arquiteto, à Mies van de Rohe em suas obras criadas a partir
da composição dos espaços através de “longas empenas”, criando o contra-ponto
entre os espaços abertos e de abrigo da família.
Outro ponto a se considerar é quanto a circulação horizontal, também em cruciforme,
que indiretamente organiza e hierarquiza as alas da casa.
Mais contrastes manifesta-se nos materiais desta casa: a pedra natural clara de
Utah
219
, utilizada para o exterior e interior, colocada a seco (apenas ligada por trás
com argamassa), provoca um efeito vivo, que se destaca das superfícies restantes.
Vista de sudeste da casa e sala de estar com a piscina ao fundo.
É certo que existe uma grande diversidade de objetos dignos de serem estudados e
analisados como referências na contribuição para o ensino da arquitetura. Entendendo
que estas casas, em sua maioria, foram objetos de manifesto e ensaio sobre a técnica
construtiva, a forma plástica proposta, mas acima de tudo, ao novo modo de vida que
se estabelecia com o modernismo.
Assim, algumas obras são merecedoras de uma melhor análise pelo estudante de
arquitetura na busca por um conjunto de repertório que o auxilie, não só na vida
acadêmica, mas na formação de uma identidade própria para toda a vida profissional.
Desta forma, a arquitetura moderna, em especial a casa moderna, cumpriram com seu
papel fundindo-se com as tradições locais e se transformando para atender às
exigências das diferentes culturas e climas, como por exemplo a Casa Koshino
(1979-81) de Tadao Ando ou Casa e Estúdio Ball-Eastway (1980-83) do arquiteto
Glenn Murcutt.
Da mesma forma, deixar de mencionar as obras de Frank Lloyd Wright e sua forma de
compreender a arquitetura e o meio em que estas se inserem na paisagem pode se
tornar num grande equívoco na contribuição deste arquiteto por várias gerações de
profissionais; obras como a Casa Robie (1908) e Casa da Cascata (1935-37) podem
ser considerados importantes exemplos de sua produção e ideologia sobre a
arquitetura.
219
. LAMPRECH, Barbara. Richard Neutra. Köln: Taschen, 2004, p. 60.
97
Antoni Gauudí, ao propor a Casa Milà (1906-10), um grande prédio de apartamentos,
trouxe grandes desafios práticos;
220
em uma massa contínua e ondulada, onde suas
formas suaves são realçadas pelas criativas grades de ferro das sacadas desenhadas
pelo seu assistente mais talentoso, Josep Maria Jujol.
221
Vale também mencionar a Casa Schröder, projetada em 1924 por Gerrit Rietveld, que
resultou em uma casa rica em detalhes onde as horizontais e verticais assumiram a
importância cósmica onde “todos os detalhes refletiam o princípio organizador da
casa, ou seja, a definição, e não a delimitação, do espaço por meio de linhas e planos”
222
que “representem o feminino/terra e o masculino”
223
, fazendo com que esta casa
influenciasse diversos outros projetos durante o século XX.
Assim como as obras do mexicano Luis Barragán são representativas neste conjunto
de obras produzidas durante o movimento moderno, deste modo sua Casa e Estúdio,
projetada em 1947-48, é austera e nada excepcional, uma presença anônima em um
bairro despretensioso da Cidade do México, mas no interior o ambiente é singular com
influência do estilo colonial espanhol e com bastante influência das cores vivas da
arquitetura tradicional mexicana e, em relação ao resultado formal, a marcante clareza
geométrica do estilo internacional torna-se presente nesta obra.
Casa Milà – Antoni Gaudí – 1906/10 Casa Schröder – Gerrit Rietveld – 1924.
Fica claro que o movimento moderno internacional teve grande influência em diversos
países do planeta, inclusive os arquitetos brasileiros que no início da década de 1920,
buscavam um rumo aos anseios da sociedade e às novas tecnologias.
São Paulo, no início do século XX, já se gabaritava como a grande metrópole
brasileira. Lugar onde a riqueza do café patrocinava um quadro de prosperidade
material e capacitação industrial num Brasil ainda dominantemente rural.
224
A Semana de 22 pode ser considerado a primeira manifestação conjunta de um grupo
de intelectuais paulistas e cariocas, em pleno ano da comemoração do centenário da
Independência do Brasil. Em fevereiro, o Teatro Municipal de São Paulo abrigou a
Semana de Arte Moderna: três saraus com literatura e música, uma exposição de
arquitetura, escultura e pintura.
225
Rino Levi e Gregori Warchavchick eram dois personagens com traços comuns nesse
momento, ambos afastados do ambiente local, onde Levi estava estudando em Roma
220
. WESTON, Richard. Plantas, cortes e elevações – Edifícios-chave de século XX. Barcelona: Gustavo
Gili, 2005, p. 38.
221
. Idem.
222
. Ibdim, p. 48.
223
. Gerrit Rietveld
224
. SEGAWA, Hugo. Arquiteturas no Brasil 1900-1990. São Paulo: Editora da Universidade de São
Paulo, 2002, p. 42.
225
. Idem, p. 42.
98
e Warchavchick recém chegado ao Brasil colocam à público dois manifestos de
grande importância que denunciavam suas idéias sobre este novo movimento que
iniciava no país.
226
“Neste tempo, era significativo o prestígio do arquiteto americano Frank Lloyd Wrigth
entre os arquitetos de São Paulo. Sobretudo quando, no fim dos anos 20, o estudo de
sua obra foi introduzido na Escola Politécnica pelo arquiteto Victor Dubugras,
renovando o ensino tradicional e obsoleto da arquitetura, até então voltado para a
engenharia civil”.
227
Desta forma, a primeira obra do arquiteto Gregori Warchavchick, sua própria
residência na rua Santa Cruz, não pode ser considerada um trabalho fiel ao ideário
moderno europeu, tampouco ao discurso revolucionário: era uma casa que aparentava
ter uma geometria própria para racionalização da construção, mas era toda de tijolo
revestido e não empregava o concreto armado, tampouco componentes pré-
fabicados.
228
Porém isto pode ser justificado nas próprias palavras do arquiteto sobre
suas primeiras obras:
“... Em São Paulo, dada a caresia de cimento e a falta de materiais para construção
(materiais adequados à construção moderna) ainda não é possível o que já se faz em
outras partes do mundo. A indústria local, bem que em estado de incessante
progresso, ainda não fabrica as peças necessárias, estandartizadas, de bom gosto e
de boa qualidade, como sejam: portas, janelas, ferragens, aparelhos sanitários etc.
Estamos sempre peiados pela obrigação de empregar material importado, o que vem
a encarecer muito as construções...”
229
Mas é com a Casa das Canoas, projeto de 1936 de Oscar Niemeyer para sua própria
moradia, que podemos dizer que a influência do “Movimento Internacional” toma como
referência para a produção da Arquitetura Moderna Brasileira iniciasse sua própria
identidade dentro da história da arquitetura. A descoberta sensual de uma rocha e de
uma casa que dela emana, em um microcosmo poético da paisagem brasileira, reflete
o desejo de encontrar permanente integração nessa paisagem, por meio da
arquitetura.
Casa das Canoas – Rio de Janeiro – 1936
226
. Rino Levi publica, em 15 de outubro de 1925, no jornal O Estado de São Paulo, uma carta que
enviada de Roma intitulada “A Arquitetura e a Estética das Cidades”, enquanto que Warchavchik no mês
seguinte, em 1° de novembro, o Correio da Manhã do Rio de Janeiro publica o artigo “Acerca da
Arquitetura Brasileira”.
227
. Yves Bruand in, ACAYABA, Marlene Millan. Residências em São Paulo 1947-1975. São Paulo:
Projeto, 1986, p. 15.
228
. SEGAWA, Hugo. Arquiteturas no Brasil 1900-1990. São Paulo: Editora da Universidade de São
Paulo, 2002, p. 46.
229
. Gregori Warchavchick, in Arquiteturas no Brasil 1900-1990.
99
Esta casa que pode ser considerada uma das casas mais belas e importantes do
século XX, explora as possibilidades de novas formas e cria um vocabulário plástico
original no contorno caprichoso da laje de cobertura, no contraste entre a parede curva
do living e as grandes superfícies envidraçadas.
As formas expressivas são típicas da poesia visual de Niemeyer, o crítico italiano
Ernesto Rogers, embora criticando o aspecto “romântico” da casa natural sem
precedentes de Neimeyer, claramente “ouviu” a linguagem das formas dos blocos de
granito de Canoas e da sua arquitetura precursora:
“Duvido que alguma vez possa esquecer aquela cena: o sol tinha apenas
mergulhado por trás do horizonte, deixando-nos num escuro mar de laranja,
violeta, verde e anil. A casa repetia os temas da orgiástica paisagem
(fragrância, zumbido de insetos); uma vasta rapsódia, começando no telhado,
descia vibrando as paredes e seus nichos para acabar na piscina, onde a água,
em vez de ser ordenadamente murada, espalhava-se com liberdade ao longo
das rochas de um tipo de piscina florestal”.
230
Porém é com três arquitetos paulistas que a arquitetura residencial moderna vai se
desenvolver de forma a criar uma “identidade própria” na produção das casas
modernas em São Paulo do início do século XX: Oswaldo Arthur Bratke, João Vilanova
Artigas e, mais tarde, Paulo Mendes da Rocha vão desenvolver projetos residenciais
influenciados pela “Arquitetura Internacional”, através das poucas publicações até aqui
enviadas.
Estes três “pesquisadores” da nova vida cotidiana da vida moderna foram, cada qual
com sua particularidade, responsáveis pela nova forma de compreender a moradia
urbana inserida numa cidade que se expandia nas áreas mais afastadas, e nobres de
São Paulo. Mas sempre tomando como referência os grandes mestres como Le
Corbusier, Mies van der Rohe, Frank Lloyd Wrigth, Walter Gropius, Adolf Loos,
Richard Neutra, entre tantos outros responsáveis por obras referenciais para toda uma
nova geração de arquitetos que se formava em diversos países.
Pode-se dizer que Oswaldo Bratke foi o arquiteto marcado pela disciplina modular e a
potencialidade expressiva da composição e contraposição entre estrutura,
paramentos, cheios e vazios.
231
Seu rigor técnico e a lógica construtiva fazem do
trabalho de Bratke um perfeito exemplar da “Arquitetura Moderna Paulista” com uma
linguagem e interpretação das obras dos grandes mestres do século XX para um país
tropical e com suas limitações de materiais de construção, como já mencionado por
Warchavchick.
Bratke foi um grande pesquisador durante sua vida profissional, em suas obras via-se
claramente a cada ensaio um manifesto concretizado através dos desenhos e
propostas colocadas em prática em suas casas. Alguns elementos construtivos que
utilizamos naturalmente em diversas obras até hoje foram estudados e elaborados
pelo arquiteto, e empregados em suas obras como “laboratório experimental” de suas
propostas colocadas em prática.
O elemento vazado de concreto, conhecidas até aquele momento por cobogós, uma
peça pré-fabricada de cimento e areia destinada a levantar paredes permeáveis
230
. UNDERWOOD, David Kendrick. Oscar Niemeyer e o modernismo de formas livres no Brasil. São
Paulo: Cosac & Naify Edições, 2002, p. 77.
231
. SEGAWA, Hugo. Oswaldo Bratke. São Paulo: ProEditores, 1997, p. 44.
100
visando ventilação e iluminação natural, este elemento faz com que exista uma
releitura sobre o brise-soleil de Le Corbusier. O desenho de mobiliário foi uma
atividade eventual, geralmente associada à especificidade de atender clientes em
projetos residenciais,
232
realizando inúmeros desenhos de mobiliário e cozinhas sem
a perspectiva de produção em série.
Diversas casas do arquiteto são dignas de análise, principalmente se
compreendermos a obra de Bratke como uma grande contribuição para a produção da
residência moderna paulistana, onde o estudante de arquitetura deve conhecer e
aprofundar-se sobre a obra deste arquiteto. Desta forma quatro casas podem ser
eleitas para esta pesquisa como objetos que demonstram a busca pela
experimentação projetual sobre o tema, a discussão sobre o programa de
necessidades e a demonstração do amadurecimento da profissão através da pesquisa
e prática sobre a o tema da casa moderna.
Suas duas primeiras casas são objetos representativos dos primeiros ensaios com a
casa urbana moderna. A Casa e ateliê na rua Avanhandava (1947) coloca ao
arquiteto a possibilidade de compreender a moradia e o local de trabalho, neste caso
seu próprio ateliê de arquitetura colocado em prática neste objeto. Situado num lote já
no final dos anos 1940 cercado por edifícios altos, o projeto propunha-se de duas
pequenas volumetrias que particularizavam a residência e o ateliê, servidos por
acessos independentes e isolados em meio a jardins
233
.
A setorização da casa e do ateliê ficam clara ao observarmos a planta baixa, o
pavilhão do ateliê situado nos fundos do lote, ligado à rua através de corredor
posicionado junto à divisa. Sua planta livre possibilitava, já naquela época, a idéia de
integração da equipe de trabalho, usufruindo de iluminação natural zenital e vistas
para o jardim; enquanto que a moradia, posicionada na faixa frontal do lote, foi
organizada obedecendo um compacto programa familiar – casal e dois filhos
pequenos, onde o setor de estar e refeições foi destinado a maior parcela da casa
visando incentivar o encontro e a vivência da família e amigos.
Fachada lateral que se volta aos jardins.
Em termos construtivos, o conjunto foi um campo de provas de novos produtos
lançados no mercado da construção na época, como outros inventados pelo arquiteto.
Bratke buscou utilizar, onde possível, componentes industrializados, reduzindo o
tempo de obra para seis meses (metade do usual) e os custos de construção na
ordem de 30%.
234
232
. Idem, p. 34.
233
. Ibdim, p. 101.
234
. Ibidim, p. 102.
101
Quatro anos depois (1951), Bratke propunha sua Residência e estúdio no Morumbi,
que no início dos anos 1950, implantou junto com Oscar Americano o projeto de
urbanização denominando-o Palmeiras do Morumbi, onde, nessa oportunidade,
projetou e construiu sua segunda moradia.
Neste projeto o arquiteto estava totalmente descompromissado com os limites do lote
urbano, visto que a área de intervenção possuía cerca de 180.000 m
2
, fazendo com
que a casa proposta integrasse a paisagem como mais um elemento do lugar.
Residência e estúdio no Morumbi
O partido arquitetônico desta casa será uma constante nas obras de Bratke durante
sua trajetória profissional, a elegância do volume é comprovada pela cobertura plana
garantida pela laje de cobertura,
235
onde a clareza formal é valorizada pela pureza
dos volumes utilizados e o domínio sobre os processos construtivos garantindo a
integridade da qualidade final da obra.
O jogo entre cheio e vazio colocado em prática nesta casa através da utilização dos
elementos estruturais claramente demonstrados na elevação do objeto e a localização
perfeita dos elementos vazados de concreto, ora na face dos pilares periféricos da
casa, ora recuados e protegendo a circulação horizontal da mesma, criando um jogo
de texturas e luz sobre os ambientes propostos, como o próprio Hugo Segawa
descreveu sobre a obra:
“a casa resultou numa sábia combinação de soluções na qual criatividade e
sensibilidade fluíram proporcionando substância arquitetônica para a
austeridade aparente de uma realçada estrutura. Um volume prismático virtual
cuja sutileza de relações entre as partes reforçava a contigüidade da natureza
e seus interiores diáfanos, de onde se podia contemplar vistas em direção ao
vale do rio Pinheiros.”
236
235
. Vale ressaltar que as pesquisas de Bratke para os elementos construtivos vinham a buscar bons
resultados na forma plástica até então alcançados pelos arquitetos modernistas paulistas. Desta forma,
pode-se dizer que esta foi uma das mais bem sucedidas coberturas em São Paulo.
236
. SEGAWA, Hugo. Oswaldo Bratke. São Paulo: ProEditores, 1997, p. 108. (grifo nosso).
102
Fachada principal da residência e estúdio no Morumbi
Esta casa que obteve menção especial durante a 1
a
Bienal de São Paulo em 1951 e
visitada por mestres como Walter Gropius, Marcel Breuer, Alvar Aalto, Kenzo Tange,
Siegfried Giedion, Ernesto Rogers, entre outros, fazendo desta obra um clássico da
arquitetura moderna brasileira. É na Casa Oscar Americano, projetada em 1952 para
o amigo e parceiro no empreendimento das Palmeiras do Morumbi, Oscar Americano,
que Bratke pôs em prática seus ensaios sobre a casa urbana em um programa de
necessidades para uma família de seis pessoas com intensa vida social, num grande
terreno com características campestres e belas paisagens.
O partido arquitetônico adotado pelo arquiteto possibilitou que a geometria da
residência fosse lida sob dois campos visuais, a entrada pela elevação frontal faz com
que a volumetria recrie uma casa térrea com uma linguagem semelhante a sua casa e
estúdio do Morumbi, a precisa geometria não rivaliza com a paisagem do entorno,
valorizando a horizontalidade da obra. Porém ao chegar pela parte baixa do terreno,
tem-se a casa com dois pavimentos, abrigando na parte inferior as áreas de serviços e
íntima interligados por uma varanda coberta pelo pavimento superior, acessado
também pela parte alta do terreno.
Plantas baixas da Casa Oscar Americano
A perfeita harmonia entre a modulação proposta e os materiais empregados fazem
desta casa um exemplar objeto, onde o branco empregado nas alvenarias de vedação
entram em contraste com o revestimento em tijolo cozido e os caixilhos de madeira,
tipo guilhotina, desenhados pelo arquiteto num fantástico mecanismo de contra-pesos
muito bem resolvido por Bratke.
103
Vista da casa a partir da parte superior do terreno
Por fim vale mencionar a Casa na praia de Pernambuco (Guarujá, 1988-90),
projetada aos 81 anos de idade a pedido de amigos e parentes, buscando um
ambiente atraente e convidativo para a casa. Neste projeto a fluidez espacial norteia o
desenho dos ambientes, criando a sensação de maior tamanho e privilegiando a
integração entre os espaços, o interno e externo da obra e a relação com a paisagem
do local.
Agora, Bratke mais maduro, o arquiteto retoma e reinventa com criatividade a
volumetria precisa em sua obra, valorizando as formas puras, mais contrastante entre
o cheio e vazio, interno e externo, liso e rústico numa harmonia com estes elementos
propostos pelo arquiteto durante sua carreira profissional.
A planta de geometria variável, onde os pátios se multiplicam na sua configuração, faz
com que os espaços propostos se integre pela circulação horizontal voltada para o
pátio principal, responsável pela composição formal dos espaços desta casa.
Pavimento térreo e inferior da casa na praia de Pernambuco
104
Entre seus contemporâneos e conterrâneos notáveis, ele foi o arquiteto que menos se
abeberou na fonte de Le Corbusier. Seus ascendentes anglo-saxônicos decerto
facilitaram a compreensão das perspectivas teóricas de um Walter Gropius ou abraçar
procedimentos análogos ao de Richard Neutra. Para tanto, “para o arquiteto se
profissionalizar, precisa ter em mente como conduzir um projeto, de maneira a sobrar
tempo para encontro com clientes, visitas a obras, conduzir o ateliê e para estudar os
projetos”
237
.
Estudo de volumetria feito por Bratke.
“O que se encanta é usar formas pesadas, chegar perto da terra e,
dialeticamente, negá-las”.
238
É com esta frase que João Vilanova Artigas resume seus propósitos plásticos sobre
sua obra durante sua vida acadêmica e profissional. Em 1952, Artigas publica o
polêmico “Caminhos da arquitetura moderna” (revista Fundamentos), em que contesta
dura e agressivamente os dois maiores expoentes da arquitetura moderna: Frank
Lloyd Wright e Le Corbusier. Após uma breve introdução o autor chega a seguinte
conclusão:
“[...] a arquitetura moderna, tal como a conhecemos, é uma arma de opressão,
arma da classe dominante, uma arma de opressores contra oprimidos”.
239
Artigas era um homem de ação, inquieto, aceitava desafios, assumias bandeiras, vivia
intensamente os misteres da profissão e as responsabilidades de cidadão.
240
Desta
forma, podemos afirmar que as razões estilísticas de Artigas foram priorizadas em
detrimento da verdade da construção, que diante da impossibilidade da técnica dá
preferência a honestidade construtiva, embora predominantemente artesanal,
principalmente em suas primeiras obras, ainda busca uma manifestação formal e
plástica onde o desenho assume o papel de “desígnio” em suas obras.
Acredito que algumas obras de Artigas são dignas de representarem a arquitetura
moderna brasileira, em especial a paulista, onde o arquiteto permeia por diversos
temas e programas de forma muito natural e responsável: Ginásio Estadual de
237
. Oswaldo Bratke, in SEGAWA, Hugo. Oswaldo Bratke. São Paulo: ProEditores, 1997, p. 78. (grifo
nosso).
238
. ARANTES, Pedro Fiori. Arquitetura Nova: Sérgio Ferro, Flávio Império e Rodrigo Lefèvre, de
Artigas aos multirões. São Paulo: Ed. 34, 2002, p. 27.
239
. João Batista Vilanova Artigas. Caminhos da arquitetura. São Paulo: Casac & Naify, 1999, p. 27.
240
. KAMITA, João Masao. Vilanova Artigas. São Paulo: Cosac & Naify Edições, 2000, p. 9.
105
Guarulhos, Anhembi Tênis Clube, Rodoviária de Jaú e Londrina, Edifício Louveira,
Conjunto habitacional Zezinho Magalhães Prado e Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo da USP demonstram a capacidade do arquiteto em propor sua arquitetura
como manifestos.
Porém é com suas casas que Artigas coloca em prática todo seu conceito sobre o
modernismo e a nova vida que se iniciava com o século XX. Suas casas pretendem
estabelecer uma nova ética,
241
onde o desenho da casa funde-se com os desígnios
da construção em conjunção dos materiais brutos e o espaço racionalizado, onde
“tudo é útil e nada é desnecessário”
242
, fazendo com que cada casa fosse elaborada
como uma forma nova para expressar essa tensão entre necessidade e invenção.
Ginásio Estadual de Guarulhos (1960), Anhembi Tênis Clube (1961), FAU-USP (1961).
Foi a casa que fez para si próprio, em 1942, que deu a Artigas a certeza de estar
trilhando um caminho próprio. A “Casinha”, como é conhecida, representou um ponto
de inflexão para o arquiteto: “Foi um rompimento formal grande; tive coragem de fazer
porque era para mim, me libertei inteiramente”.
243
Utilizando-se de materiais brutos e
sem revestimentos, tijolo, madeira e telha cerâmica compõem um conjunto de
elementos responsáveis pela estrutura da obra
244
e a composição dos espaços.
Situada em terreno de esquina, a casa contraria a implantação tradicional, situando a
obra em 45° em relação às ruas, possibilitando um jogo de volumetria dinâmica por
quem caminha pelo bairro. A planta é fluida e circular, integrando as áreas de uso
comum (sala, cozinha e varanda), onde estabelece de forma muito racional um núcleo
hidráulico central e estabelece a organização do dormitório e o ateliê.
Plantas baixas da Residência do Arquiteto e elevação/entrada principal – 1942.
241
. ARANTES, Pedro Fiori. Arquitetura Nova: Sérgio Ferro, Flávio Império e Rodrigo Lefèvre, de
Artigas aos multirões. São Paulo: Ed. 34, 2002, p. 16.
242
. Vilanova Artigas.
243
. ARANTES, Pedro Fiori. Arquitetura Nova: Sérgio Ferro, Flávio Império e Rodrigo Lefèvre, de
Artigas aos multirões. São Paulo: Ed. 34, 2002, p. 15.
244
. Deve-se considerar que a “Casinha” foi executada em plena Segunda Guerra Mundial, onde os
materiais de construção, principalmente os importados, eram muito escassos.
106
Apesar de propor uma casa pequena e compacta, visto que o lote implantado era bem
generoso, o resultado plástico desta casa ganha um valor funcional e autêntico em seu
posicionamento “obrigando” o arquiteto a desenhar cada elevação com a mesma
importância, mas com uma “moral severa” referenciando indiretamente às obras de
Wrigth, como a Robie House projetada em 1908-10 em Chicago pelo arquiteto.
Outra característica das obras de Artigas diz respeito ao manifesto, denunciado
fisicamente, dos espaços dos ambientes propostos em contradição à nova cultura
modernista, onde se pode dizer que nesta casa, inaugura o processo de invenção da
casa paulistana. Como expressa Lina Bo Bardi, em breve artigo de 1950:
“Uma casa construída por Artigas lhe impõe uma lei vital, uma moral que é sempre
severa, quase puritana. Não é ‘vistosa’, nem se impõe por uma aparência de
modernidade. [...] Cada casa de Artigas quebra todos os espelhos do salão burguês”.
245
Nisto, esta casa flagra-se como uma revolução democrático-burguesa que deveria,
assim, ser concretizada como etapa necessária à formação de uma nação moderna.
Já em sua segunda casa (1949) implantado no mesmo lote que a primeira, demonstra
uma maturidade nas técnicas construtivas empregadas nesta obra. Esta casa formada
por um volume único e extenso, onde o atendimento às várias funções suportadas
pela casa eram setorizadas novamente por um núcleo interno, composta pela cozinha
e banheiros, que organiza o setor íntimo (dormitórios) agrupados a oeste e o social
num único ambiente que se abre para o terraço e ao estúdio, num mezanino formado
pelo movimento da cobertura. A circulação, por sua vez, é resolvida pela periferia da
casa garantindo a flexibilidade dos espaços, assim como a decisão de inclinar a
garagem e o acesso faz com que esta se integre a “Casinha” numa única entrada pela
rua principal.
Planta baixa do pavimento térreo.
Outro fato relevante diz respeito a técnica construtiva empregada. Nesta casa, o tijolo
agora é utilizado como elemento de vedação, diferentemente da primeira que cumpria
o papel de estrutura do objeto, onde o emprego do concreto armado revelam a
utilização do material como função estrutural e compositor da forma desejada.
Porém é com a casa Olga Baeta, projetada em 1956, que Artigas revela sua
intimidade com o concreto armado. Uma grande cobertura acolhe todo o programa de
necessidades; Em si, a cobertura é a representação do ato elementar de abrigar-se –
já é a própria solução do habitar enquanto necessidade humana.
246
245
. Lina Bo Bardi, “Casas de Vilanova Artigas”, revista Habitat, n° 1, 1950, p. 2. (grifo nosso).
246
. ARANTES, Pedro Fiori. Arquitetura Nova: Sérgio Ferro, Flávio Império e Rodrigo Lefèvre, de
Artigas aos multirões. São Paulo: Ed. 34, 2002, p. 23.
107
Sob esta cobertura, os ambientes se articulam de forma livre e integrada da estrutura,
que por tornar-se um elemento independente, alivia a alvenaria de sua carga estrutural
permitindo ao arquiteto dispensar portas e janelas que considera desnecessárias. Esta
casa paulista pretende também orientar os princípios de uma educação moderna da
família, como descreve Artigas para esta casa:
“Um trecho azul, um pedaço branco, um amarelo e um risco preto. A sala de jantar é
azul. Pode-se sentar no sofá dentro do branco e a entrada é um quadrado vermelho
que encaixa no conjunto. Tudo está ligado a esse ideário em relação ao espaço e à
apropriação de cada usuário segundo seu julgamento sobre a visualidade, e não as
limitações de paredes”.
247
Desta forma, a casa Baeta demonstra todo o domínio do arquiteto sobre o concreto
armado e a flexibilidade que o material propicia, fazendo com que a estrutura torne-se
um elemento independente e responsável pela forma desejada. Outro fato importante
é quanto a decisão do arquiteto em eleger a fachada principal como uma empena
cega em concreto, reservando para o interior do lote toda a intenção de integração
entre os ambientes internos e os espaços externos desenhados, numa harmonia plena
entre o cheio x vazio, luz x sobra.
Casa Olga Baeta, 1956
A planta da casa ganha maior importância para o interior do lote, valorizando seus
espaços externos e integrando-os ao abrigo de seus moradores. Assim a concepção
dos ambientes favorece uma liberdade espacial e sensorial com o resultado plástico
alcançado, “onde o espaço único distribuído em meios-níveis, a sala com pé-direito
duplo, o estúdio a meio-nível e os dormitórios acima”
248
cumprem o papel de
organizar o programa da casa, locando no pavimento térreo o setor de serviços e
social (sala, cozinha) e reservando para o pavimento superior o setor íntimo
(dormitórios) integrados através da circulação vertical e o ateliê proposto em meio-
nível aberto e com total controle sobre as atividades da casa.
Assim, o que distingue Vilanova Artigas de seus colegas mais velhos e mais
experientes (Oswaldo Brakte, Rino Levi) era sua adesão que não se limitava à
absorção de soluções engenhosas, mas vinha sempre acompanhada de um estudo
radical de seus pressupostos teóricos das “razões” que comandavam as soluções, ou
seja, as “causas” profundas dos resultados visíveis.
249
Como Paulo Mendes da Rocha que possui uma expressão contundente da confiança
num projeto moderno que representa uma postura livre e coerente, sem deixar-se
247
. Idem, p. 26.
248
. ACAYABA, Marlene Millan. Residências em São Paulo 1947-1975. São Paulo: Projeto, 1986, p. 17.
249
. Catálogo da Exposição Vilanova Artigas. Instituto Tomie Ohtake. São Paulo: Takano Editora Gráfica
Ltda, p. 46.
108
influir pela “moda arquitetônica”. Partindo da fascinação pela engenharia e pela
técnica, ele tem recriado o espaço básico conformado pela forma estrutural.
250
Uma leitura sobre a obra de Mendes da Rocha nos remete a reinterpretações de
diversos mestres da arquitetura moderna como Le Corbusier, Mies van der Rohe,
entre outros que influenciaram o arquiteto em suas obras onde prevalece a estrutura
arquitetônica como elemento focal de sua forma na busca pelo partido arquitetônico.
É evidente que a obra de Vilanova Artigas abriu caminho para várias gerações de
arquitetos paulistas, com sua peculiar arquitetura socialmente responsável, coloca em
prática uma nova ordem urbana à escala do homem moderno, realizando com grandes
estruturas de concreto armado sem ornamento.
Isto não será diferente dos conceitos defendidos por Paulo Mendes da Rocha,
denominada por “escola paulista”, onde se baseia em formas fechadas para o exterior,
em espaços “sanduíche”,
251
que se configuram como “caixas elevadas” sobre pilotis.
A escola paulista também pode ser relacionada ao “Brutalismo Arquitetônico” pelo seu
caráter direto, com o concreto armado, a estrutura como elemento formal da
arquitetura e, às vezes, as instalações expostas numa posição conceitual sobre os
materiais empregados na obra.
Neste sentido, suas casas são colocadas como objetos de pesquisa entendida como
uma nova monumentalidade de formas brutas capazes de elevar-se à “esculturas
arquitetônicas” que reconstroem, por vezes, a paisagem existente e recriá-las em
espaços cobertos e protegidos para o homem. Assim, as residências Paulo Mendes
da Rocha e L. G. Cruz Secco, projetadas em 1964 no bairro do Butantã, em São
Paulo, pode ser considerado uma destas casas onde a intervenção do arquiteto
propõe sua obra como um objeto que redesenha a paisagem natural.
A vizinhança destas duas casas modernas com a fronteira Casa Bandeirista sugere
um contraponto, distinguindo o morar antigo do morar contemporâneo
252
, colocando
em evidência um novo planejamento domiciliar da arquitetura urbana. A planta
quadrada propiciou um setoramento das funções da casa de forma a valorizar a área
de lazer e estar, de um lado e voltado para a rua o grande salão de estar iluminado por
um grande caixilho metálico definindo a fachada livre daquela casa e libertando-a de
qualquer fragmento na estrutura proposta.
Há o nicho, ou seteira
253
, que surge da empena de concreto armado voltada para a
outra rua, esta pequena abertura busca alcançar o olhar do morador, através deste
rasgo, até o vale do rio Pinheiros, demonstrando a perfeita compreensão de Mendes
da Rocha sobre o território em que está projetando.
O outro lado voltado para o interior do lote, o arquiteto setoriza a varanda comunitária,
é responsável pela entrada e recepção da casa. O setor de serviços e íntimo é
localizado no centro da planta protegidos por uma grande cobertura de concreto
armado que se abre em determinados pontos possibilitando a iluminação zenital de
250
. MONTANER, Josep Ma. VILLAC, Maria Isabel. Mendes da Rocha. Lisboa: Editorial Blau, 1996, p.
6.
251
. Expressão utilizada por Josep Ma. Montaner, em seu texto sobre a obra de Paulo Mendes da Rocha
no panorama internacional, in. Mendes da Rocha. Lisboa: Editorial Blau, 1996.
252
. XAVIER, Alberto, LEMOS, Carlos, CORONA, Eduardo. Arquitetura moderna paulistana. São
Paulo: Pini, 1983, p. 77.
253
. Termo utilizado pelos espanhóis para identificar pequenos rasgos em empenas cegas para captação de
luz ou busca de algum ponto na paisagem.
109
dormitórios e banheiros. As divisórias baixas destes ambientes proporcionam uma
continuidade espacial que vem atender a um modo de vida particular, certamente não
muito comum.
254
Todos estes ambientes são elevados sobre os pilotis proporcionando no pavimento
térreo o local de abrigo para os automóveis e integrados aos jardins existentes. Desta
forma o arquiteto redesenha a paisagem com a criação de um talude natural que
protege a área de lazer e garagem da rua.
Vistas da casa Paulo Mendes da Rocha
Esta casa, aparentemente simples em sua forma “limpa e bruta”, esconde um rico
nível de detalhamento em vários pontos: as empenas cegas laterais da cobertura são
afastadas cerca de cinqüenta centímetros das empenas inferiores possibilitando um
interessante caixilho horizontal em toda a extensão da casa, como uma grande mesa
longínqua e transparente.
As portas de correr dos dormitórios, em madeira, contrapõem ao concreto bruto
empregado e possibilitam maior integração com a varanda comunitária ao deslizarem
interligando-os num só espaço; o talude recriado pelo arquiteto faz com que a casa
pouse levemente sobre o gramado criando a impressão de uma casa térrea e mais
integrada à paisagem local, ao mesmo tempo escondendo a área de lazer desta
residência.
A residência Mário Masetti, projetada em 1968 no Pacaembu, pode ser considerada
uma evolução de sua própria casa projetada quatro anos atrás, debruçada sobre o
vale da Avenida Pacaembu, todo o programa é resolvido também num único
pavimento elevado sobre quatro pilotis, liberando o térreo para o lazer da família
desde a praça fronteira a casa até a piscina que é executada sobre a encosta,
demonstrando novamente o domínio do arquiteto sobre a paisagem em intervenção.
Apesar de Paulo Mendes da Rocha liberar integralmente do terreno o “bloco flutuante”
da casa, optou-se pela criação de duas empenas estruturais nas faces norte e sul da
casa liberando as demais para as aberturas livres direcionadas para a rua e o vale da
avenida Pacaembu, muito semelhante à sua casa que cria as fachadas livres em duas
254
. XAVIER, Alberto, LEMOS, Carlos, CORONA, Eduardo. Arquitetura moderna paulistana. São
Paulo: Pini, 1983, p. 77.
110
faces e abre pequenas aberturas posicionadas estrategicamente através das empenas
cegas de concreto armado.
Planta baixa, corte e vistas da residência Mario Masetti
Os ambientes são divididos em dois grandes núcleos pelo “bloco flutuante”, o setor
íntimo é posicionado a frente do bloco voltado para a rua e para a face oeste protegido
pelo avanço da cobertura, funcionando como um brise-soleil para esta face; e o
grande salão que abriga a sala de estar e cozinha, criada através de paredes baixas
garantindo a integração entre os espaços.
O acesso a casa é garantido através das duas escadas posicionadas na lateral e junto
às empenas de concreto, uma na face sul dá acesso a cozinha da casa para uma
entrada de serviços, enquanto que a entrada social é feita por uma escada semi-
circular, de maior diâmetro, ligando o térreo à sala de estar.
Particularmente, a residência Antônio Junqueira, projetada em 1975 e executada
entre 1976 e 1980, busca um partido arquitetônico que responda a um programa que
atendesse aos anseios da família, além da existência de uma sala de estudos e uma
biblioteca com cerca de 10.000 volumes.
Plantas baixas dos pavimentos inferior e térreo.
111
O terreno trapezoidal com acentuada declividade para os fundos fez com que o
arquiteto proponha uma casa térrea, abaixo do nível da rua e explorando os visuais
para a Serra da Mantiqueira e o pico do Jaraguá, voltando-a para trás e aproveitando
melhor os benefícios da face norte
255
.
A estrutura porticada, em concreto armado, vence um vão de 14 metros que cria o
partido da casa – local responsável por abrigar o pátio de chegada e acima a
biblioteca com o piso irregular que quase não encosta nas empenas estruturais e é
protegida da visão da rua pela empena branca, diagonal à rua e controlando a
iluminação deste ambiente.
Todo o programa da casa é desenvolvido numa planta em L onde os dormitórios estão
voltados para o norte, juntamente com a sala de estar que se abre para os jardins dos
fundos. Já todo o setor de serviços (cozinha, área de serviços e empregados) se
localizam à sul voltados para a rua, porém protegidos pelo desnível do terreno e o
jardim frontal.
A cobertura da residência é de concreto impermeabilizado, cujas nervuras invertidas
compartimentam sucessivos espelhos d'água
256
, contribuindo para o controle térmico
da obra, onde o arquiteto propõe sobre a laje uma passarela sinuosa que parte da
biblioteca em direção a piscina localizada sobre a área de serviços.
Elevação principal da residência Antonio Junqueira
Esta casa, de formas pesadas e brutas identificam a linguagem utilizada por Paulo
Mendes da Rocha em suas obras, onde a aplicação dos materiais buscam criar a
plástica desejada ou solucionar os desafios da estrutura colocada pelo programa
exigido. Desta forma, o concreto armado, para o arquiteto, tem como finalidade a
definição formal unido ao resultado estrutural necessário à execução da obra.
A casa Gerassi (1988) é límpida e agradável
257
. Resultado da utilização de elementos
pré-fabricados geralmente empregados para a execução de obras de grande porte e
rápida execução, esta obra torna-se um manifesto à existência da indústria da
construção em elementos pré-fabricados em concreto.
255
. Idem, p. 193.
256
. Ibdim, p. 193.
257
. ARTIGAS, Rosa (org.). Paulo Mendes da Rocha. São Paulo: Cosac & Naify, 2000, p. 178.
112
A limitação de peças e possibilidades de flexibilidade na composição formal do edifício
faz com que exija do arquiteto um compromisso maior com a obra proposta. A planta
quadrada é suspensa cerca de 3,00 metros, liberando pouco mais de 2,00 metros no
pavimento térreo para abrigar a garagem e piscina nos fundos do lote.
O acesso à moradia é feita através da escada que nasce à esquerda da obra,
chegando no pavimento superior no hall que distribui para a área de serviços (cozinha
e banheiros) e a social – uma ampla sala de estar iluminada pela clarabóia proposta
na cobertura e piso deste ambiente que distribui luz até o pavimento térreo e, a
fachada livre que se abre para a rua, vedada por um caixilho metálico protegido pela
árvore existente na rua, funcionando como um brise-soleil natural para toda a face
norte da casa.
Plantas baixas do pavimento térreo e superior da casa.
Vista da casa a partir da rua.
Além da facilidade de execução desta casa em suas fases, esta obra possibilita uma
leitura estrutural muito evidente; demonstrando de forma clara o partido estrutural
adotado e a facilidade exposta na determinação dos espaços internos que possuem
total independência estrutural para a composição dos espaços.
Neste sentido, a obra de Paulo Mendes da Rocha nos chama a atenção por sua
clarividência no que diz respeito a implantação do projeto, que ao desenhar uma casa,
113
ele é o urbanista que explora seu entorno e visuais de forma brilhante; quanto ao
território: o arquiteto o transforma “naturalmente” como uma reconstrução do local
proposto. Ao trabalhar com concreto armado (na maioria de suas obras), ele o explora
em sua plástica, bruta e pesada, como um elemento capaz de criar espaços e
ambientes que abrigam diversas atividades.
Quanto a compreensão da organização dos espaços, Mendes da Rocha desafia o
usuário a uma nova forma de morar na cidade, discutindo-a como um cientista social e
quanto ao edifício, ao propor, reconhece cada objeto proposto como uma experiência
a técnica construtiva e a forma de viver do homem urbano moderno.
114
4 Ensino e Aprendizagem: por
uma Experiência de Ensino
115
4.1 - Um breve histórico do ensino de arquitetura
O estudo de um percurso histórico sobre o ensino de arquitetura, abarcando as
escolas mais significativas que envolveram em sua trajetória as mais relevantes
disciplinas capaz de formar e capacitar profissionais nas mais variadas especialidades
e que, ao longo dos anos, passaram a se tornar referências para diversos estudantes
e profissionais no decorrer dos séculos XIX e XX.
Eles colocam a atividade projetual como a “espinha dorsal” na vida acadêmica de
alunos e pesquisadores, assim como seus processos e manifestações através de uma
linguagem única a cada profissional, do ponto de vista de sua identidade conceitual e
projetual, porém como expressão fundamental às idéias e propostas colocadas no
papel.
A história torna-se importante não mais quanto narração, registro ou estudo, mas
como conhecimento do passado humano, no que esse passado significa em termos de
experiência. “A história não é uma ciência e apenas nada tem a esperar das ciências;
nem explica nem tem método”.
258
Assumindo que a realidade do ensino de arquitetura deve ser analisada como
“processo, forma e conteúdo pedagógico”, a compreensão dos fatos deve ser
trabalhada de forma em que a análise, compreensão das teorias e os conceitos
utilizados questionem as formas de ensino da arquitetura e urbanismo, em especial a
de projeto de edificação, que busca reconstruir parte do processo pedagógico com que
hoje nos ancoramos.
A escola por sua vez, deve promover as condições necessárias ao desenvolvimento
das faculdades técnicas, históricas e artísticas do aluno, orientando o sentido desse
desenvolvimento e auxiliando-o a torná-lo consciente de seu “poder criador” e reflexivo
na vida profissional que o espera. Desta forma, cabe a escola demonstrar que as
obras de arquitetura são objetos, entre os demais objetos criados pelo homem, uma
relevância que sustenta que: “Uma edificação, especialmente uma residência, não
pode ser limitada a uma função única, porque qualquer edificação é um cenário onde
se desenvolve a vida humana, e a vida humana é heteroforma”.
259
Nisto, por mais generalizada que sejam os conceitos e métodos adotados pela
faculdade de arquitetura, o elemento humano não pode ser colocado como apenas um
tema a ser discutido, visto que o homem torna-se ator presente e constante em todas
as disciplinas e faculdades a serem discutidas pelos alunos e responsável, de certa
forma passível, a organização do espaço como um todo, com respeito a todas as
ações físicas e psíquicas de que ele é capaz, e das quais uma edificação pode servir
como cenário.
Em relação a isso deve-se ressaltar que a noção de sujeito engloba o homem como
indivíduo e como coletividade, e que a auto-realização do sujeito se refere tanto ao
seu efeito direto sobre a realidade como a outras funções que não tendem a uma
transformação direta da realidade.
260
258
. VEYNER, Paul. Como se escribe la historia. Foucault Revoluciona la Historia. Alianza Editorial.
Madri: 1984, p. 10.
259
. MUKAROVSKI, Jan. Structure, Sign and Function. New Haven, Yale University Press, 1978, p.
237.
260
. COMAS, Carlos Eduardo, org. Projeto arquitetônico disciplina em crise, disciplina em renovação.
São Paulo: Projeto, 1986, p. 50.
116
Os métodos de ensino devem aqui também ser analisados, não na intenção de
construir uma critica sobre as escolhas e caminhos trilhados pelas faculdades de
arquitetura ao longo do tempo, mas como objetos a serem debatidos sobre os
resultados alcançados pelo corpo docente e também às respostas do corpo discente a
cada exercício lançado.
Deve-se entender que a atividade docente contribui para a formação de um corpo
doutrinário que explique um sistema de referência para a ação projetual, atribuindo ao
ensino de projeto uma dimensão teórico-crítica.
261
Isto não significa, como bem
entendido, propugnar por uma organização rígida e dogmática do conhecimento, até
porque o ensino de projeto se faz também de forma espontânea explorando a
criatividade e curiosidade do aluno, mas confinando-o a uma aplicação de cânones
encastelados em uma distante respeitabilidade acadêmica.
Outro fato relevante a ser analisado e questionado é quanto à estrutura física em que
as escolas de arquitetura possuem, apesar desta pesquisa não se deter neste tema,
como forma de subsidiar o ensino e estimular o aluno à pesquisa e conhecimento
durante seu percurso acadêmico. Neste ponto, o ateliê torna-se uma unidade
fundamental do ensino de arquitetura, e a seqüência de disciplinas de projeto forma a
“espinha dorsal” que estrutura as atividades de todo o curso.
4.2 - Compreendendo o ensino de arquitetura e suas influências no Brasil
Em princípios do século XIX, o Estado francês criou um novo método de reprodução
de uma escola cuja finalidade era treinar arquitetos, a École des Beaux-Arts. Sabe-se
que por quase toda a história da transmissão de conhecimentos e a produção de
“capital simbólico da arte e da arquitetura” foi, na sua maioria das vezes, conduzidas
por meio de mestres e “pupilos”
262
numa rede de contatos pessoais na busca do
conhecimento sobre a produção da arquitetura.
Por outro lado, a inserção do estudante de arquitetura nas instituições de ensino,
comparados aos arquitetos listados na MEA – Ministério de Ensino de Arquitetura,
desde 1800 não obteve um número significativo, chegando no final do século XIX com
40% dos profissionais. Já o século XX teve um número mais expressivo, partindo de
40% para quase 70% no final do século passado, como demostra o gráfico abaixo:
Porcentagem de arquitetos listados na MEA que freqüentaram uma instituição educacional.
Fonte: O círculo privilegiado: fundamentos sociais da distinção arquitetônica, pág. 194.
261
. Idem, p. 78.
262
. Hoje podemos dizer que pouco mudou desde o século XIX, visto que muitos estudantes de
arquitetura ainda procuram os escritórios de arquitetura e urbanismo em busca de novos conhecimentos
como estagiários.
117
Isto demonstra que por mais que o sistema de “pupilagem” fosse uma atividade
comum para a obtenção de conhecimentos entre os mestres, as escolas de arquitetura
contêm o respeito e a idéia básica na reprodução dentro do sistema formal do ensino
da profissão, não somente como elemento da produção de edifícios, mas também na
pesquisa sobre uma grande diversidade de temas.
Modelo-padrão do relacionamento entre as universidades, as escolas de arquitetura e o corpo de seus
praticantes. Produção e reprodução estão unidas.
Fonte: O círculo privilegiado: fundamentos sociais da distinção arquitetônica, pág. 195.
Da França, adotamos a noção de um ensino de arquitetura formal e organizado: da
Alemanha, o conceito de que há e deve haver um elo entre o ensino e a pesquisa e
que isto ocorre nas universidades. Essas duas idéias foram reunidas de um modo
incongruente nos Estados Unidos, onde se sobrepuseram a um sistema de
aprendizado por pupilagem herdado da Grã-Bretanha.
263
4.2.1 – O ensino na Grã-Bretanha
A primeira escola no Reino Unido a oferecer um programa estruturado de instrução foi
a Architectural Association (AA), fundada em 1847 por auxiliares de ensino de
arquitetura descontentes.
264
Durante o século XIX, a formação de arquitetos não foi
muito significativa, visto que a escola somente ofereceu um curso em tempo integral,
com quatro anos de duração, apenas em 1889.
263
. STEVENS, Garry. O círculo privilegiado: fundamentos sociais da distinção arquitetônica. Brasília:
Editora Universidade de Brasília, 2003. p. 200.
264
. Idem, p. 202.
118
Com a formação de novas escolas por todo Reino Unido, a partir da década de 1920 a
pupilagem entrou em declínio, onde na maioria das vezes os alunos buscavam uma
formação formal de sua profissão. Quando, por ocasião da primeira discussão
importante sobre educação arquitetônica no Reino Unido após a Segunda Guerra
(Conferência de Oxford, em 1958), foi feito um apelo para transferir o ensino para o
âmbito das universidades, cerca de 63% de todos os estudantes de arquitetura
estavam em escolas politécnicas ou de arte, 22% em universidades propriamente e os
demais estavam abrindo seu caminho trabalhando em escritórios.
265
Entendo que a pupilagem, como era colocado anteriormente como um mecanismo de
aprendizagem e ensino da arquitetura, possui diversas vantagens, visto que possui um
fino controle da oferta de novos praticantes da profissão garantindo a qualidade final
do resultado concreto da arquitetura, o edifício propriamente dito; Outro fato relevante
é que a vida acadêmica por muitas vezes não leva em consideração a realidade e as
exigências do mercado, substituindo-a por sua própria lógica, relativamente
independente e derivada do interesse e lógica do mercado de trabalho.
Por outro lado, a pupilagem adotada até o final do século XIX, quando estava no seu
auge, demonstrava que a maioria dos aprendizes ingleses eram oriundos de classes
mais elevadas, resultado das relações sociais entre famílias tradicionais e importantes
escritórios de arquitetura. Isto ainda é visto até os dias atuais com as “indicações” de
estudantes de arquitetura para estágios nos escritórios mais significativos da produção
arquitetônica.
Nisto esta prática acaba tendo grande influência na formação do estudante de
arquitetura e no conceito teórico e prático do profissional. A maioria das escolas de
arquitetura inseriram em sua grade curricular a disciplina de Estágios com a intenção
de capacitar seus estudantes para a vida profissional.
4.2.2 – A experiência francesa
A reforma do ensino superior na época de Napoleão estabeleceu duas características
definidoras das profissões: o serviço para o Estado e as credenciais acadêmicas
certificadas pelo Estado obtidas em uma das grandes écoles de elite.
À medida que evoluiu ao longo do século XIX, o sistema de ensino superior
estabeleceu, e ainda estabelece, com uma forte estratificação vertical
266
, onde na
França, as profissões são definidas pelo Estado e tendo o controle, através das
instituições, dos trabalhos de ensino e pesquisa para o desenvolvimento do país.
Portanto, não é nenhuma surpresa que a França tenha inventado o ensino
academizado de arquitetura com a École des Beaux-Arts, na busca de um sistema de
aprendizagem que contribuísse para o acúmulo de capital intelectual no campo da
arquitetura e para o desenvolvimento da produção arquitetônica de todo o país.
Assim como as grandes écoles mesmo nos dias de hoje, a École des Beaux-Arts não
era uma organização educacional como as universidades modernas, nas quais a
pesquisa é uma missão central, realizada sistematicamente por grande parte do corpo
265
. Crinson e Lubbock, Architecture: Art or Profession?
266
. STEVENS, Garry. O círculo privilegiado: fundamentos sociais da distinção arquitetônica. Brasília:
Editora Universidade de Brasília, 2003. p. 206.
119
docente e dos estudantes mais avançados com a expectativa de que seja filtrada para
o ensino.
267
A experiência da França foi de grande valia para o desenvolvimento do ensino da
arquitetura, principalmente para os países da América Latina, colocando como ponto
central a pesquisa como instrumento de ensino e recobre a uma teoria para
construção de uma arquitetura estruturada nos trabalhos acadêmicos e pesquisas
realizadas nas mais diversas faculdades.
4.2.3 – O modelo Americano: uma síntese instável
Os Estados Unidos oferecem um modelo de ensino profissional, ao lado do sistema
inglês, dominado por seus praticantes e do sistema dominado pelo Estado.
Depois da Revolução Americana, as profissões americanas perderam o apoio do
Estado: até meados do século XIX não havia sistema algum de licenciamento tanto na
medicina como no direito; por sua vez, o arquiteto não precisava ser licenciado até
1897, quando o Estado de Illinoins adotou legislação específica sobre o assunto. Seus
sucessores foram profundamente reorganizados nas décadas próximas à virada do
século XX.
268
A formação de associações e entidades profissionais, que defendessem os interesses
dos arquitetos, foi pouco representativa no país e encontrou grandes dificuldades em
sua constituição. Diferentemente das poderosas associações inglesas que chegavam
a intervir no ensino de arquitetura, as dos Estados Unidos que possuíam pouca
representatividade nas duas associações do país: cerca de 66% pertencem ao RIBA e
52% ao AIA.
269
A fraqueza das associações profissionais foi crítica na formação da educação
profissional dos Estados Unidos. Antes da Guerra Civil, as universidades americanas
seguiam, em geral, o modelo Oxbridge, oferecendo uma educação erudita e algum
treinamento para religiosos e professores.
270
A história do ensino profissional americano é aquela do aproveitamento por essas
universidades das oportunidades de mercado para oferecer a educação padronizada
que a profissão era incapaz de prover por si mesma.
271
Desse modo, a expansão dos
arquitetos nos Estados Unidos deu-se com a criação de novas escolas de arquitetura
nas universidades (MIT, Cornell, Illinois) com um certo controle das associações,
particularmente o RIBA, que exerceu um papel importante no controle do ensino da
profissão.
267
. Idem, p. 209.
268
. Ver Abbott, The System of Professions.
269
. STEVENS, Garry. O círculo privilegiado: fundamentos sociais da distinção arquitetônica. Brasília:
Editora Universidade de Brasília, 2003. p. 212.
270
. Idem, p. 212.
271
. Ver Abbott, The System of Professions.
120
Número de estudantes de arquitetura americanos por milhão de habitantes.
Fonte: O círculo privilegiado: fundamentos sociais da distinção arquitetônica, pág. 213.
A noção de que a pesquisa é uma missão fundamental da universidade surgiu apenas
com a importação do modelo alemão em fins do século XIX, com a criação da
Universidade Johns Hopkins (1876), da Universidade de Clark (1887) e da
Universidade de Chicago (1892).
272
Porém, o estudo através das pesquisas não obteve grandes transformações no ensino
de arquitetura dos Estados Unidos, inclusive não influenciando no ensino das escolas
da América Latina e em especial as brasileiras que tomaram como modelos as
inglesas e alemãs em sua formação. Como ressalta Abbott, as profissões americanas
mantiveram uma profunda ambivalência quanto à educação universitária, porque
“estavam na universidade, mas não pertenciam a ela”.
273
4.2.4 – Alemanha: o ensino através da pesquisa
O elo entre pesquisa e ensino, que hoje aceitamos como fundamental para a missão
das universidades, foi primeiro estabelecido em começos dos anos 1800 na Prússia,
começando com a Universidade de Berlim,
274
onde a pesquisa coordenadas pelo
corpo de professores cumprisse o papel de contribuir para o desenvolvimento de
novos trabalhos para a sociedade alemã.
272
. R. L. Geiger, “The American University Research”, University and Society, ed. M. Trow e T. Nybom
(Londres: Jessica Kingsley, 1991), p. 200-215.
273
. Abbott, The System of Professions, p. 207. (grifo nosso).
274
. STEVENS, Garry. O círculo privilegiado: fundamentos sociais da distinção arquitetônica. Brasília:
Editora Universidade de Brasília, 2003. p. 209.
121
O modelo alemão de universidade.
Fonte: O círculo privilegiado: fundamentos sociais da distinção arquitetônica, pág. 210.
Esta conexão pesquisa-ensino diferia daquela que prevalece hoje no ensino superior
anglo-americano, tanto em sua estrutura como em seu conteúdo.
275
A pesquisa torna-
se um campo a ser explorado pelos intelectuais e pesquisadores, que trabalhavam
também como professores nas universidades, na busca de novas propostas e
soluções para a vida cotidiana, desde mobiliário até um novo habitat para o homem
moderno. Prova disto está na criação da Bauhaus, a escola de arquitetura e design
que mais contribuiu para a formação de um novo conceito de ensino de arquitetura em
diversas escolas do mundo.
A arquitetura era uma das ocupações ensinadas nessas instituições que não estavam
voltadas para a pesquisa
276
, as escolas politécnicas ou os liceus de artes e ofícios
tinham como “tarefa” das disciplinas a execução dos trabalhos de forma prática onde
os alunos destas escolas exercitavam o que aprendiam nas aulas teóricas. Porém o
estudante de arquitetura, principalmente os da Alemanha tinham a possibilidade de se
especializarem em algum tema e/ou disciplina que ele se interessar.
275
. Idem, p. 209.
276
. Ibdim, p. 211.
122
Como o Estado ainda cumpria um forte papel na vida profissional dos arquitetos desde
os fins do século XVIII, faz com que até 1880, apenas 42% dos arquitetos alemães
trabalhassem na iniciativa privada.
277
4.3 – As experiências didáticas das escolas russas e alemães
Pode-se dizer que as escolas de artes e arquitetura tiveram muito a contribuir para o
ensino em diversas escolas, influenciando principalmente as da América após a
Segunda Guerra Mundial onde uma grande diversidade de intelectuais, estudiosos e
profissionais imigraram para os países da América do Norte e Latina em busca de
novas experiências no “Novo Mundo”.
Com isto, as escolas de arquitetura recepcionaram estes mestres com a oportunidade
de abstrair suas experiências acadêmicas e profissionais e desenvolveram uma nova
metodologia de ensino para estas escolas. Assim, três experiências podem ser
apontadas como referências e influências para o ensino das artes e arquitetura:
VKhUTEMAS-VKhUTEIN
O estudo das artes no período pré-revolucionário acontece na Escola Stroganov de
Artes Aplicadas e na Escola de Pintura, Escultura e Arquitetura de Moscou,
278
porém
estas duas escolas possuíram um tempo de vida muito curto, sendo fechadas em
1917, mas tendo continuidade com uma nova organização nos “Estudos Livres do
Estado”.
A evolução destas escolas para os Estudos Livres do Estado teve uma importante
contribuição dos artistas independentes, na condição de precursores do movimento
construtivista. Neste sentido, os “trabalhos de laboratório” são realizados em
experiências bi e tridimensionais na intenção de discutir a respeito da forma, materiais,
cor e espaço.
279
Os artistas plásticos como Malevich, Kruchenykh e Stepanova muito contribuíram com
os Estudos Livres do Estado, assim como Tatlin, considerado o fundador do
construtivismo, professor nos VKhUTEMAS no departamento de cerâmica utiliza-se da
metodologia tridimensional aplicada aos estudos de esculturas soltas no espaço,
explorando os conceitos de “movimento, tensão e suas inter-relações”.
280
01- (esq.) Relevo pictórico. Papel de parede, madeira, metal e cristal. V. Tatlin, 1913
02- (centro) Contrarelevo: seleção de materiais. Ferro galvanizado sobre madeira. 100 x 64 x 24 cm.
V. Tatlin, 1916.
03- (dir.) Escultura de canto. V. Tatlin, 1915.
277
. V. Clark, “A Struggle for Existence: The Professionalization of German Architects”, German
Professions 1800-1950,ed. G. Cocks e K. Jarausch (Oxford: Oxford University Press, 1900), p. 143-160.
278
. GARCIA, Herman Carlos W.S. VKhUTEMAS/VKhUTEIN, BAUHAUS, HOCHSCHULE FÜR
GESTALTUNG ULM: Experiências didáticas comparadas. FAU-USP, 2001, p. 16 (dissertação de
mestrado).
279
. Idem, p. 16.
280
. Grifo nosso.
123
Os Primeiros e Segundos Estudos Livres são fundados em dezembro de 1918, tendo
como função formar o povo nas belas artes e com uma completa percepção da cultura
artística nos campos da pintura, arquitetura e escultura. Contrapondo as
conservadoras escolas pré-revolucionárias, a didática dos Estudos Livres inclui a
abordagem a temas como a análise da forma e do volume, estudos com pinturas não
figurativas, exercícios e teoria do cubismo, futurismo e suprematismo.
281
Os VKhUTEMAS – Atelieres Superiores Artísticos e Técnicos do Estado, são fundados
em 29 de novembro de 1920 com a intenção de formar “Artistas Construtores”
treinados tanto nas artes como nas técnicas e processos produtivos da indústria.
Assinado por Lenin, o decreto estipula no primeiro ponto:
“Los VKhUTEMAS de Moscú son una instituición educativa especializada en la
ensenanza artística y técnica avanzada, há sido creada para preparar artistas
professores altamente calificados para la industria, así como instructores y
directores de la educación profesional y técnica.
282
Prédio utilizado pelos VKhUTEMAS e VKhUTEIN, Moscou.
Pelas características em que a escola se insere no processo político do país, o curso é
criado com dimensões gigantescas se comparado com a Bauhaus no mesmo período.
Os VKhUTEMAS inicialmente tinham 2.000 alunos e posteriormente, em torno de
1.500, isto é, dez vezes maior que a Bauhaus que tinha em média 150 alunos.
283
Durante a sua existência pode-se dizer que a evolução dos VKhUTEMAS e
VKhUTEIN, de 1920–30, sendo marcado por três períodos correspondentes a seus
respectivos diretores:
1°) Ravdel no período de 1920-23, marcado por constantes experimentações, num
esforço de consolidar uma escola de design (artístas-construtores), aproveitando as
experiências didáticas de grande parte dos professores e reformulando a estrutura
pedagógica no que norteará a criação dos atelieres dos VKhUTEMAS
281
. Nas escolas pré-revolucionárias o ensino acontece numa extensa dedicação ao desenho de figuras
com o uso de tinta à óleo.
282
. LODDER, Christina. El Constructivismo Ruso. Madri: Alianza, 1988, p. 114.
283
. GARCIA, Herman Carlos W.S. VKhUTEMAS/VKhUTEIN, BAUHAUS, HOCHSCHULE FÜR
GESTALTUNG ULM: Experiências didáticas comparadas. FAU-USP, 2001, p. 26 (dissertação de
mestrado).
124
2°) Favorski no período de 1923-26, período de consolidação de sua estrutura
administrativa e didática, reforçada pelo reconhecimento internacional e prêmios
conseguidos na exposição internacional de Artes Decorativas e Industriais Modernas
de Paris, em 1925;
3°) Novitski no período de 1926-30, onde reestrutura os cursos, os quais passam a ter
uma orientação mais industrial e tecnológica, alterando o conceito de “Atelieres” para
“Instituto”, passando a se chamar VKhUTEIN – Instituto Superior Artístico e Técnico do
Estado, em 1927.
Cronologia dos VKhUTEMAS e VKhUTEIN
= datas de outros autores.
284
O VKhUTEIN tem nova e última reorganização em março de 1930 e logo depois é
extinto, fechando assim o período de atividades dos VKhUTEMAS-VKhUTEIN,
obrigando os distintos cursos a se disseminarem transformando-se em institutos
independentes ou se associar a outras instituições existentes.
285
Os VKhUTEMAS têm como objetivo propiciar uma educação geral artística e prática,
científica, teórica, social e política. Além das disciplinas artísticas e práticas, os
estudantes tem que cumprir as matérias teóricas de química, física, matemática,
geometria, teoria das sombras, aprendizagem militar, teoria científica da cor, uma
língua estrangeira e história da arte.
286
Toda esta visão genérica era transmitida ao estudante nos primeiros anos de estudos,
no que eles denominavam de “Curso Básico”, com duração de um ano e igual
conteúdo programático para todos os alunos, sendo o curso pré-requisito para a
posterior escolha da faculdade específica:
“El curso fundamental se propone los seguientes objetivos: 1) Dar una
instrucción artística superior, de carater general; 2) Enseñar de forma práctica
los elementos fundamentales del ofício de artista, asi como los medios de
284
. A bibliografia disponível apresenta discrepâncias cronológicas constatadas em três autores:
a) KHAN-MAGOMEDOV S. O. no livro Vhutemas. Paris: Editions du Regarde, 1990;
b) LODDER, Christina. El Constructivismo Ruso. Madri: Alianza, 1988;
c) MISLER, Nicoletta. Em artigo para revista Casabella n° 435.
Em relação ao início do VKhUTEIN, C. Lodder define como sendo em 1928 e os outros dois autores
em 1927.
A respeito do início da Dermetfak, os dois primeiros autores definem a data de 1926 e N. Misler em
1928.
285
. GARCIA, Herman Carlos W.S. VKhUTEMAS/VKhUTEIN, BAUHAUS, HOCHSCHULE FÜR
GESTALTUNG ULM: Experiências didáticas comparadas. FAU-USP, 2001, p. 27 (dissertação de
mestrado).
286
. Idem, p. 28.
125
expresión, y 3) Desarrollar en el estudiante una actitud consciente y crítica
respecto a la materia estudiada, presupuesto indispensable para lograr la
originalidad creadora del estudiante.”
287
Inicialmente, em 1920, o Curso Básico se constituiu de cinco disciplinas artísticas e
práticas ainda cursadas por todos os estudantes, sendo estas:
1. Revelação da cor ao máximo (Popova);
2. Revelação da forma por meio da cor (Osmerkin e Fedorov);
3. Simultaniedade da forma e cor no plano (Drevin);
4. Cor no plano (Klyun);
5. Construção (Rodchenko).
Pelos nomes destas disciplinas se percebe que ainda refletem o espírito da Escola
Stroganov de Artes Aplicadas na sua orientação principalmente para os problemas da
pintura e da representação bidimensional.
288
Após o estudante cursar as disciplinas teóricas e práticas do Curso Básico do
VKhUTEMAS, eles devem ingressar em uma das Faculdades, no qual cada um
possuirá sua particularidade e disciplinas que atendam o objetivo do curso: Faculdade
Dermetfak – Derfak (faculdade de madeira) e Metfak (faculdade de metal), Faculdade
de Artes Gráficas, Faculdade de Têxtil, Faculdade de Cerâmica, Faculdade de
Escultura, Faculdade de Pintura e Faculdade de Arquitetura, no qual este estudo se
aprofundará na pesquisa e discussão.
A Faculdade de Arquitetura inicia suas atividades em 1920, junto com a fundação dos
VKhUTEMAS, tendo como objetivo a formação de “arquitetos-artistas” com
competência no desenho de edificações, planejamento, conhecimento das tecnologias
contemporâneas e economia da construção.
289
Diversos arquitetos de vanguarda como Zholtovsky, Ladovsky, Ivan Fomin, Ilya
Golosov e Alexander Vesnin entre outros contribuíram com suas experiências na
discussão do processo educacional no início da fundação do curso.
A orientação pedagógica nos primeiros anos do curso de arquitetura nos VKhUTEMAS
não pode ser considerado uma grande evolução que contribuísse para a história do
ensino de arquitetura, porém sua evolução eleva a Faculdade de Arquitetura a não ser
mais apenas um curso dentro do VKhUTEMAS, mas também o lugar de
experimentação e aplicação dos conceitos arquitetônicos mais importantes da
época,
290
com diversos trabalhos com ampla divulgação e repercussão nacional e
internacional.
Pode-se dizer que dos diversos grupos de estudos criados na Faculdade de
Arquitetura, dois foram de grande importância para a construção de uma nova
arquitetura russa: os Racionalistas representado por Lavinsky e os Construtivistas com
Alexander Vesnin, um dos principais lideres da arquitetura Construtivista russa dos
anos vinte.
287
. COMUNICACION, Colección Constructivismo. Madrid: Alberto Corazón, 1972. Série A, V. 19, p.
349.
288
. GARCIA, Herman Carlos W.S. VKhUTEMAS/VKhUTEIN, BAUHAUS, HOCHSCHULE FÜR
GESTALTUNG ULM: Experiências didáticas comparadas. FAU-USP, 2001, p. 29 (dissertação de
mestrado).
289
. Idem, p. 44.
290
. Ibdim, p. 46.
126
(dir.) Projeto para o Palácio Central do Trabalho, Moscou – VKhUTEMAS, Sobolev, 1926
Prof. Alexander Vesnin
(esq.) Projeto para o Palácio Central do Trabalho, Moscou – VKhUTEMAS, Kozhin, 1926
Prof. Alexander Vesnin
Edifício de estacionamento. VKhUTEMAS. Vitaly Lavrov, 1924
Prof. Ladovsky
Os arquitetos racionalistas se concentram na ASNOVA
291
, fundada por Ladovsky,
Krinski e Dukuchaev em 1923, onde o método “analítico e racional”, evolucionando
para o método “psicológico-analítico”, que leva a partir de 1926 à formação de um
“laboratório-analítico” dentro da faculdade.
Este processo de transformação pedagógica dentro da faculdade faz deste grupo – os
racionalistas – experimentarem diversas formas e métodos de ensino que buscam
discutir os assuntos estéticos e formais da arquitetura contemporânea, dando grande
importância aos últimos avanços da técnica e da ciência.
Por outro lado, a arquitetura construtivista liderada principalmente por Moisei Ginzburg
e os irmãos Vesnin, concentrada na OSA fundada em 1925
292
, possuíam uma outra
linha de raciocínio que visa a construção do socialismo através de um método
funcional de racionalização do material e seu método construtivo.
293
291
. ASNOVA – Associação dos Novos Arquitetos.
292
. OSA – Associação dos Arquitetos Contemporâneos.
293
. GARCIA, Herman Carlos W.S. VKhUTEMAS/VKhUTEIN, BAUHAUS, HOCHSCHULE FÜR
GESTALTUNG ULM: Experiências didáticas comparadas. FAU-USP, 2001, p. 29 (dissertação de
mestrado).
127
Bauhaus
O mérito do Arts and Crafts Movement, é que se trata da primeira tentativa e o começo
da evolução de um raciocínio que tem como tema de discussão a produção artesanal
e a mecanização com a sua produção industrializada, com todas as suas implicâncias
sociais, sistemas produtivos, novos materiais, seu tratamento e seu significado
estético, e não necessariamente no aprimoramento da teoria e prática industrial: “O
Arts and Grafts Movement contribuiu para a renovação do artesanato artístico, e não
das artes industriais”.
294
Pode-se dizer que o Arts and Grafts Movement, juntamente com outros fatos a partir
de meados do século XIX, contribuíram dentro de um contexto histórico e produto das
reformas das escolas de arte européias como uma herança pedagógica para a
fundação da Bauhaus em Weimar. O nome inspirado nas Bauhütten existentes entre
os séculos XII e XIII,
295
e que consistiam numa organização de trabalho baseado na
figura do “mestre da construção”, num método de aprendizado através da prática
direta do ofício, isto é, “ensinar fazendo e aprender imitando”, sob a orientação dos
mestres.
Vale-se de que van de Velde realizou o “esboço” original da Bauhaus, ao ser
contratado na Alemanha, em 1902. Numa informação pouco divulgada, e que se
encontra na biografia de van de Velde:
“O pintor Henry van de Velde, chamado a Weimar, atuará independentemente
da Escola de Arte, como conselheiro artístico para a indústria e as artes
industriais. Não estabelecerá ateliers, mas tem intenção de criar, para as
industrias locais, um atelier experimental de arte industrial, onde poderão ser
desenhados novos modelos e ensaiar-se novos tipos de técnica”.
296
Em 1906, surgia a nova escola de arte de Weimar, onde o método de ensino era todo
norteado por desenhos através de modelos e as relações espaciais, porém a Primeira
Guerra Mundial interrompe os trabalhos de van de Velde e, em 1908, ao terminar a
guerra, van de Velde indica Gropius como único nome da Alemanha que poderia ser
seu sucessor.
297
Devido a utilização da escola como hospital militar de reserva, somente em 1919 a
escola pode iniciar suas atividades, inicialmente dando continuidade à escola de Henry
van de Velde e incorporando a Escola Superior de Belas Artes, mantendo ainda um
sistema de ensino conservador.
A Bauhaus pode ser estudada por diversas abordagens estruturais ou sociológicas:
por fases – Fundação (1919-1923), Consolidação (1923-1928) e Desintegração (1928-
1933); pelas cidades onde se estabeleceram – Bauhaus Weimar (1919-1925),
Bauhaus Dessau (1925-1932) e Bauhaus Berlin (1932-1933) ou pelos seus diretores
que por ali passaram – Walter Gropius (1919-1928), Hannes Mayer (1928-1930) e
Mies van der Rohe (1930-1933). Neste estudo levaremos em consideração a
abordagem através dos diretores e da pedagogia e metodologia de ensino teórico e
prático que venham à contribuir no processo de projeto.
294
. PEVSNER, Nikolaus. Os Pioneiros do Desenho Moderno. São Paulo: Martins Fontes, 1995, p. 8.
295
. GARCIA, Herman Carlos W.S. VKhUTEMAS/VKhUTEIN, BAUHAUS, HOCHSCHULE FÜR
GESTALTUNG ULM: Experiências didáticas comparadas. FAU-USP, 2001, p. 62 (dissertação de
mestrado).
296
. GROPIUS, Wlater. Bauhaus: Novarquitetura. São Paulo: Editora Perspectiva, 2001. Coleção
Debates, p. 12.
297
Idem, p. 12.
128
Walter Gropius (foto de Lucio Gomes Machado)
De 1919 a 1928 Gropius dirigiu como diretor da Bauhaus, primeiro em Weimar, depois
em Dessau, onde as concepções pedagógicas, sem dúvida, foram as mais
importantes e representativas na formação da escola.
A proposta de ensino consistia numa escola que admitiria somente alunos com uma
certa familiaridade, seja nas técnicas artesanais ou experiência em desenho,
298
entendendo que as experiências dos atelieres deveriam ser prolongados até as
fábricas e para a vida cotidiana do “homem moderno”.
Na aplicação deste sistema pedagógico, Gropius levanta a hipótese da criação de um
“novo estilo”:
“En el ambiente de una escuela de esta clase podría resurgir una comunidad
de trabajo no menos feliz que aquella outra tan ejemplar que poseian las
‘fábricas’ mediovales, en las que nomerosos artistas de disciplinas afines –
arquitectos, escultores y artesanos de todos los niveles – se reunían y,
animados por um mismo espíritu, sabían adaptar con modestia su trabajo
parcial a la tarea común, ... las formas de expresión de nuestro tiempo ganarán
en unidad para al fin dar lugar en el futuro a un nuevo estilo”.
299
Estas “propostas” em certa forma foram uma antecipação do famoso manifesto de 1º
abril de 1919, onde Gropius se volta à idéia da importância do artesanato e do ideal de
organização e a arquitetura dos ofícios que deveriam desenvolver com harmonia entre
artistas e artesãos.
298
. GARCIA, Herman Carlos W.S. VKhUTEMAS/VKhUTEIN, BAUHAUS, HOCHSCHULE FÜR
GESTALTUNG ULM: Experiências didáticas comparadas. FAU-USP, 2001, p. 72 (dissertação de
mestrado).
299
. WINGLER, Hans Maria. La Bauhaus. Barcelona: Gustavo Gili, 1980, p. 34-35.
129
Manifesto de Walter Gropius para a Bauhaus de Weimar, com Xilografia de Lyonel Feininger, 1919.
Entende-se que Gropius não pode ser o único a receber os méritos pelo
desenvolvimento da Bauhaus. Houve um momento em que seu criador agrupou ali os
nomes mais representativos de um “momento culminante” da história das artes do
século XX.
300
Passaram por ali importantes professores como Paul Klee, Gerhard
Marks, Lyonel Feininger, Johannes Itten, Oskar Schlemmer, Wassily Kandinsky, Adolf
Mayer, Lothar Schreyer, Georg Muche, Laszlo Moholy-Nagy, entre outro que
compunham uma importante equipe das artes contemporâneas.
Ao analisarmos o quadro do currículo da escola, observa-se que as características
programáticas do curso era compreendido dentro do conceito da “arte unitária”, que
incluía escultura, pintura, artes aplicadas e artesanato, tendo como objetivo a obra
arquitetônica, mesmo sabendo que a disciplina de arquitetura propriamente dita, só
veio a acontecer oficialmente em Dessau em 1928.
Esta primeira fase da Bauhaus está constituída as bases que configuram e influenciam
o desenvolvimento pedagógico. Porém não resta dúvida que a atitude de Gropius em
preparar o estudante primeiramente a uma visão global, por mais que o método
adotado permita tratar um “problema” de acordo com suas condições peculiares, no
qual o aluno entrava em contato com experimentos sobre proporção e escala, ritmo,
luz, sombra e cor.
O curso preparatório buscava amadurecer a inteligência, o sentimento e a fantasia, e
visava desenvolver o “homem inteiro”
301
, desprendido de qualquer preconceito que
concretizasse uma arquitetura moderna que, como a natureza humana, abrangesse a
vida em sua totalidade.
Neste sentido, as “oficinas”
302
cumprem um papel fundamental nas experimentações
didáticas em que Gropius aplica na Bauhaus, tanto de Weimar como Dessau, onde os
estudantes eram incentivados a produzir com entusiasmo seus trabalhos e
300
. GROPIUS, Wlater. Bauhaus: Novarquitetura. São Paulo: Editora Perspectiva, 2001. Coleção
Debates, p. 13.
301
. Idem, p. 38.
302
. Hoje poderíamos entender as oficinas batizadas por Gropius como os atelieres de diversas escolas de
arquitetura em diversos países.
130
realizações. Este método de ensino busca levar o estudante a uma posição criativa,
que lhe permite pôr em harmonia, a um só tempo, forma, construção, economia e
finalidade social de toda e qualquer tarefa que lhe é dada,
303
visto que estes
trabalham sempre com uma realidade palpável onde canteiro e oficina tornam-se um
único componente de ensino.
A partir de meados dos anos vinte, coincidindo e também por causa da mudança do
curso para Dessau, as apreciações subjetivas dão lugar ao estudo “objetivo e
técnico”,
304
tomando uma orientação mais realista na solução dos problemas da
arquitetura e da indústria, começando a ganhar importância as matérias com
orientação mais prática, técnica e científica.
Prédio da Bauhaus em Dessau – Alemanha.
Desta forma, duas frases de Gropius podem definir primeiro a vida e o idealismo da
obra do arquiteto e mestre, e depois o conceito básico da Bauhaus visto pelo arquiteto:
“... se o arquiteto perseguia o sentido vivo da criação, onde quer que os
programas de trabalho o requeressem, sua consciência contemporânea
procurava modificar o ambiente, o habitat humano, oferecendo-lhe
oportunidade de usufruir a vida em toda a plenitude. Esse objetivo de uma
tarefa de arquiteto, de organizador do espaço, desde que sua autonomia
criadora começou a plasmar os seus projetos e a colocá-los no inventário da
construção de nosso tempo”.
“A experimentação tornou-se, uma vez mais, o centro da arquitetura; e isto
requer um espírito aberto e coordenante, e não o tacanho e limitado
especialista...
O que a Bauhaus propôs, na prática, foi uma comunidade de todas as formas
de trabalho criativo,...”
305
303
. GROPIUS, Wlater. Bauhaus: Novarquitetura. São Paulo: Editora Perspectiva, 2001. Coleção
Debates, p. 86.
304
. GARCIA, Herman Carlos W.S. VKhUTEMAS/VKhUTEIN, BAUHAUS, HOCHSCHULE FÜR
GESTALTUNG ULM: Experiências didáticas comparadas. FAU-USP, 2001, p. 75 (dissertação de
mestrado).
305
. GROPIUS, Wlater. Bauhaus: Novarquitetura. São Paulo: Editora Perspectiva, 2001. Coleção
Debates, p. 11 e 32.
131
O período Hannes Meyer se caracteriza como o intento de recuperar uma organização
desgastada pelos ataques que obrigaram Gropius a abandonar o curso. A partir de
1928 quando Meyer assume a escola, o curso se torna mais específico, prático e na
procura por resultados. Esta atitude do diretor leva a escola, neste período, a ter uma
maior produtividade, ficando em segundo plano as discussões da estética e
conceituais.
É neste período que o curso de arquitetura é implementado com maior destaque,
sendo mais definido em termos da construção, que tem como objetivo neste momento,
resolver os problemas de organização das funções do homem, materializadas através
de técnicas racionais.
306
Desta forma, fica evidente a visão de Meyer para um ensino orientado através da
experiência prática aplicada a problemas reais e com ênfase para o trabalho em
grupo. Este método de ensino permite um estímulo precioso, tanto para os estudantes
como professores, que possuem a oportunidade de atuarem em conjunto com outros
sem perder a identidade.
Isto nos remete a outra questão que é quanto à prática aplicada ao ensino da
arquitetura, nisto a visita a construções, fábricas e institutos de pesquisas fomentará
mais a fantasia do estudante e reforçará seu entendimento da fabricação e do
processo de construção,
307
já defendidos por Gropius no período em que comandou a
Bauhaus.
As mudanças pedagógicas a partir de 1928, acontecem nas matérias artísticas. Estas,
no período de Gropius tinham bastante importância, agora passam a ser
constantemente questionadas na sua função dentro da escola.
308
Desta forma, as
disciplinas técnicas e científicas como Psicologia, Sociologia, Engenharia e Economia
Nacional ganham maior destaque no curso passando a ser ministrada por palestrantes
convidados dentro de cada área como complemento ao conceito geral do ensino.
Neste sentido, as oficinas e departamento de arquitetura são trabalhados sob o tema
da moradia popular. Visto que o assunto era amplamente discutido por arquitetos e
urbanistas, como conseqüência das crescentes dificuldades econômicas da época,
que tinham levado a grandes massas da população carente de moradia.
Assim, as oficinas que no período de Gropius incentivavam projetos conceituais ou
simplesmente experimentais, com Meyer existe um anseio em dirigir o ensino de forma
que a aprendizagem seja voltada à produção e contribuição para a discussão da
moradia em que a União Soviética, durante os anos vinte foi muito intensa, assim
como em diversos países da Europa, como os significativos projetos de grandes
assentamentos em Berlin de Bruno Taut, e “Das neue Frankfurt” em Frankfurt de Erns
May.
A importante passagem de Hannes Meyer pela Bauhaus se interrompe em 1930
quando o “burgomestre-mor” de Dessau Fritz Hesse, sob acusação de ser marxista e
306
. Neste ponto, Meyer manteve os mesmos conceitos de Gropius quanto a forma de compreender
arquitetura de forma racional.
307
. GROPIUS, Wlater. Bauhaus: Novarquitetura. São Paulo: Editora Perspectiva, 2001. Coleção
Debates, p. 92.
308
. GARCIA, Herman Carlos W.S. VKhUTEMAS/VKhUTEIN, BAUHAUS, HOCHSCHULE FÜR
GESTALTUNG ULM: Experiências didáticas comparadas. FAU-USP, 2001, p. 76 (dissertação de
mestrado).
132
de ter incentivado idéias de esquerda, pede o seu afastamento e contrata no seu lugar
Mies van der Rohe, que virá a ser o terceiro e último diretor da Bauhaus.
309
Hannes Meyer, 1927. Mies van der Rohe
A indicação de Mies van der Rohe tinha sido sugerida por Gropius, ambos se
conheciam há bastante tempo e tinham trabalhado juntos no escritório de Peter
Behrens. Sua reconhecida obra não só na Alemanha, mas em todo o mundo como
arquiteto de vanguarda o habilitava para assumir o cargo de diretor da Bauhaus.
Uma das principais medidas que tomou ao assumir o cargo, de forma a reverter a
situação em que a escola passava devido ao afastamento de seu último diretor e a
política daquele momento, consistiu em desmatricular todos os alunos e aceitá-los
depois de conversas particulares que provassem o abandono de posturas políticas,
310
para só então iniciar o programa didático da escola com o cuidado de caracterizá-lo
num curso teoricamente despolitizado.
Mies van der Rohe ao elaborar a estrutura do curso de arquitetura altera a duração
que era de nove semestre para apenas seis, na intenção de torná-lo mais específico,
somando a uma certa urgência na formação de profissionais para atuarem nas
cidades
311
, continuando, no entanto, com uma orientação técnica e prática.
Os cursos das oficinas que eram orientados ao “aprender fazendo” com objetivos na
produção, agora são mais orientados para assuntos didáticos, teóricos e de corte mais
acadêmico.
312
Se por um lado a crítica à pedagogia aplicada na Bauhaus por Mies van der Rohe, que
foi contrária ao espírito da escola até o momento onde sempre tentou despertar e
309
. Idem, p. 78.
310
. Ibdim, p. 79.
311
. Esta atitude de Mies van der Rohe pode ser considerável, visto que o número de arquitetos formados
em relação ao número de habitantes em diversos países ainda era muito pequeno. Como por exemplo, os
Estados Unidos que nesta mesma época – 1920-30, possuíam cerca de 180 arquitetos para cada milhão de
habitantes (Fonte: Ilustração Censo americano).
312
. GARCIA, Herman Carlos W.S. VKhUTEMAS/VKhUTEIN, BAUHAUS, HOCHSCHULE FÜR
GESTALTUNG ULM: Experiências didáticas comparadas. FAU-USP, 2001, p. 79 (dissertação de
mestrado).
133
estimular as habilidades dos alunos a partir das oficinas, exercícios e trabalhos
práticos, no caso de Mies o ensino era pensado nos moldes acadêmicos tradicionais
onde o aluno é condicionado a fazer o que o seu mestre faz, houve uma grande
contribuição para a história do ensino de arquitetura, e principalmente o projeto de
edifício, que coloca as lições dadas com suas obras que servirão de “exemplos ou
referência projetual” para grande maioria dos participantes do Movimento Moderno em
todo o mundo.
Definitivamente, a passagem de cada diretor pela Bauhaus teve sua parcela de
contribuição no processo de desenvolvimento e emadurecimento das propostas e
metodologias em que a escola se propunha. Fica claro que o nome de Walter Gropius
ficou mais associado ao da escola, por diversos fatores, sua longa permanência no
curso não só como diretor, mas também como professor da escola (1919-1928), pelos
seus ideais e propostas revolucionárias para o ensino das artes e arquitetura, ou até
mesmo pelo seu posicionamento profissional.
Ou seja, “o arquiteto do futuro terá de encontrar novamente, através de seu trabalho,
uma expressão original construtiva para as necessidades intelectuais e materiais da
vida humana, e dar assim novos impulsos intelectuais, em vez de reproduzir
repetidamente o pensar e o fazer dos tempos anteriores.”
313
De qualquer maneira, as experiências da Bauhaus muito contribuirão para as
discussões sobre o ensino de arquitetura em diversos países, inclusive as escolas
existentes no Brasil que tomaram como referência pedagógica os conceitos desta
escola e seus diretores ao longo da história.
Hochschulu für Gestaltung Ulm – HfG
Se as duas escolas acima estudadas possuem semelhanças em suas experiências
contemporâneas que contribuíram e influenciaram o ensino da arquitetura em diversas
escolas do mundo, diferentemente, a experiência da HfG em Ulm se dá numa relação
de continuidade e dependência da experiência da Bauhaus, revelada somente nos
primeiros anos de sua existência.
314
A experiência do mito da Bauhaus, interrompido pela Segunda Guerra Mundial, que se
constitui numa lacuna de uma experiência bem sucedida, retomada agora na HfG com
a intenção de continuidade da Bauhaus de Dessau. Isto fica claro quando estudamos
o currículo pedagógico que mantém as características pedagógicas nos seus primeiros
anos de atividade, que incluem o Curso Básico e a relação arte-design, assim como o
quadro de docentes formado por ex-professores ou ex-alunos da Bauhaus.
Em meados do século XX, surge a Fundação Scholl, com direção de Inge Scholl,
315
um corpo legal e financeiro responsável pela HfG e que tem em sua junta
personalidade de renome como Walter Gropius (nesta época professor em Cambridge,
Massachusetts) e Herry van de Velde (Suíça) e que tem como função manter os
objetivos da fundação.
316
313
. GROPIUS, Wlater. Bauhaus: Novarquitetura. São Paulo: Editora Perspectiva, 2001. Coleção
Debates, p. 84.
314
. GARCIA, Herman Carlos W.S. VKhUTEMAS/VKhUTEIN, BAUHAUS, HOCHSCHULE FÜR
GESTALTUNG ULM: Experiências didáticas comparadas. FAU-USP, 2001, p. 96 (dissertação de
mestrado).
315
. Inge Sckoll era irmã de Hans e Sophie Sckoll assassinados durante o período do nazismo.
316
. GARCIA, Herman Carlos W.S. VKhUTEMAS/VKhUTEIN, BAUHAUS, HOCHSCHULE FÜR
GESTALTUNG ULM: Experiências didáticas comparadas. FAU-USP, 2001, p. 99 (dissertação de
mestrado).
134
O que inicialmente se planejou para ser a Geschwister-Scholl-Hochschule, agora em
1953 se viabiliza como uma nova unidade de ensino. Assim no desejo de criar uma
“Nova Bauhaus”, toma emprestado o nome de Hochschule für Gestaltung, que era o
subtítulo da Bauhaus de Dessau.
317
A base educacional desta escola é de uma formação específica, unida a uma
formação geral das disciplinas sobre a profissão e complementando a pesquisa,
individuais e em equipe. Sua estrutura interna é “desenhada” através de uma livre
combinação de atelieres, laboratórios, oficinas e estudos num trabalho conjunto. A
idéia de uma “comunidade de trabalho” é consolidada no campus da escola, onde
professores e alunos moram juntos.
Outro fato relevante é quanto a diversidade dos alunos que freqüentam a escola, onde
cerca de 40-50% dos alunos são estrangeiros (europeus, norte-americanos e
japoneses) e do corpo docente com cerca de 20 professores permanentes e 200
convidados
318
de diversas nacionalidades, isto faz com que a HfG tivesse uma grande
variedade de idéias, opiniões e experiências no quadro de docentes e influenciando
um grande número de estudantes em diversos países do mundo.
A duração do curso foi ampliada para quatro anos, mantendo a mesma característica
até 1961 com o Curso Básico, o qual foi substituído a partir de 1962 pelo Primeiro Ano
de Estudos. Desta forma, a estrutura do curso inicialmente em quatro departamentos:
Design de Produtos, Comunicação Visual, Arquitetura e Informação. Posteriormente
em 1961, se incorpora o departamento de Cinema.
319
O Departamento de Arquitetura da HfG tinha como um de seus aspectos a prática e as
orientações com o foco na produção, onde o curso também entendido de “Edificações
Industrializadas”, se centra no estudo dos sistemas de produção industrial, como
resposta a uma realidade que solicita respostas mais eficientes e econômicas.
320
O curso inclui disciplinas práticas nos diversos assuntos e as disciplinas teóricas
preferencialmente estão associadas com exercícios práticos. Nota-se a preocupação
com o estudo sistemático das estruturas pré-fabricadas, demonstrando a relação da
escola com a realidade em que as cidades do pós-guerra estavam passando e as
técnicas construtivas contemporâneas. A preocupação em dar uma resposta ao
mundo moderno prevê a construção com estruturas leves,
321
não só por economia de
material, mas também pela facilidade de se implantar os edifícios.
317
. Idem, p. 99.
318
. Entre os professores permanentes podemos destacar: Max Bill, Tomás Maldonado, Gui Bonsiepe,
Herbert Lindinger, Max Bense, entre outros. Os professores convidados, os mais conhecidos são: Josef
Albers, Frei Otto e Johannes Itten e os palestrantes: Walter Gropius, Mies van der Rohe, Charles Eames,
Reyner Banham, entre outros.
319
. GARCIA, Herman Carlos W.S. VKhUTEMAS/VKhUTEIN, BAUHAUS, HOCHSCHULE FÜR
GESTALTUNG ULM: Experiências didáticas comparadas. FAU-USP, 2001, p. 102 (dissertação de
mestrado).
320
. Idem, p. 117.
321
. Ibdim, p. 119.
135
(dir.) Estudos para edifícios de escritórios. Forné, 1964. Prof. Peter Sulzer
(esq.) Protótipo de estrutura tubular em PVC. 2 e 3 Studienjahr. Heins Dobrinsky, Horst Schu e Max
Thanner, 1962-63. Prof. Rudolf Doernach.
Este departamento teve como principais professores Max Bill, Rudolf Doernach,
Herbert Ohl, Claude Schnaidt e Werner Wirsing, que desenvolveram seus cursos
utilizando-se de exercícios conceituais, teóricos e práticos para alcançarem o objetivo
das disciplinas: “preparar um profissional capaz de assumir encargos que envolvam a
construção industrializada.”
322
(esq.) Sistema modular para posto de gasolina. Herbert Ohl e Bernd Meurer, 1962.
(centro) Maquete de prédio residencial em Ulm. 3 Studienjahr. Fundel, Hufenus, Rusconi, Stocker e
Stuber, 1965-66. Prof. Herbert Ohl.
(dir.) Sistema modular para montagem de indústrias de grande porte. Werner Wirsing. 1967-68.
4.4 – O ensino de arquitetura no Brasil
O ensino de arquitetura no Brasil é anterior ao estabelecimento dos cursos jurídicos,
mas nem por isso os arquitetos angariaram prestígio equivalente ao dos bacharéis.
Data de 1816 a vinda de um grupo de artistas franceses para a corte do Rio de
Janeiro, ainda sob a regência de então príncipe D. João (1767-1826 – futuro D. João
VI, rei de Portugal), para introduzir no país um conhecimento artístico de gosto
neoclássico.
323
Porém somente 11 anos depois da chegada deste grupo, organizado por Auguste
Henri Victor Grandjean de Montigny – arquiteto francês, começa a funcionar a
Academia de Belas-Artes, incluindo em seu currículo a arquitetura, sendo por muito
tempo a única opção para os poucos que poderiam estudar uma profissão.
Bernardo Ribeiro de Freitas, engenheiro civil formado pela Escola Politécnica em
1881, publica em 1888 um artigo intitulado “A Arquitetura Moderna”, numa avaliação
do quadro da arquitetura naquele final de século, onde neste estudo, vale ressaltar um
322
. Ibdim, p. 118.
323
. SEGAWA, Hugo. Arquiteturas no Brasil 1900-1990. São Paulo: Editora da Universidade de São
Paulo, 2002, p. 29.
136
trecho em que o engenheiro brasileiro discute e demonstra o dilema da modernidade
arquitetônica no final do século 19 e que refletirá sobre o ensino e produção da
arquitetura para o século XX:
“O artista moderno, o arquiteto moderno luta com grandes dificuldades, se se
filia à escola racionalista, tendo por único guia a mecânica aplicada, tende a
cair em formas secas, frias, esqueletos, órgãos de máquinas antes do que
elementos arquitetônicos; se aceita a escola eclética...
Desse estado da arquitetura moderna nasce o individualismo em questão da
arte; cada um é seu próprio juiz e não admite dogmas e preceitos estéticos.”
324
Hoje entendemos este documento de Ribeiro de Freitas mais que um artigo que
registrou suas opiniões sobre a arquitetura no final do século XIX, mas podemos
considerar um manifesto às transformações que estavam por vir no que seria
considerado o século do Movimento Moderno em diversos países do mundo. Até
mesmo as Escolas de Artes e Arquitetura se renderam a este movimento que
questiona séculos de produção arquitetônica no Velho Mundo.
A Escola Nacional de Belas-Artes (ENBA) assumida por Lucio Costa aos 29 anos foi
indicado com plenos poderes para reformular o ensino acadêmico daquela escola. A
contratação de novos professores como Alexander Buddeus, Gregori Warchavchik
para as disciplinas de Composição de Arquitetura V e IV consecutivamente; Celso
Antonio para Escultura e Leo Putz para Pintura, foram uma das alterações em que
Costa iniciou sua reforma na ENBA.
Entende-se esta atitude de Lucio Costa se compreendermos primeiramente a situação
em que se encontrava a ENBA antes da chegada deste novo diretor, que por sinal se
formou nesta escola juntamente com tantos outros arquitetos que contribuíram para a
Arquitetura Moderna deste país: Affonso Eduardo Reidy, Marcelo Roberto, Attílio
Corrêa Lima, Paulo Antunes Ribeiro e Jayme da Silva Teles também são fruto desta
escola que deteriorava a passos largos. O ensino da arquitetura era encarado, na
época, de um modo completamente obsoleto
325
onde os alunos tinham aula
juntamente com os cursos de pintura, escultura e gravura.
Com a sua nomeação para a diretoria da ENBA, Lucio Costa, conseguiu transformar
um museu numa escola viva, onde se começava a ensinar arquitetura com uma nova
mentalidade para o ensino e metodologias até então desconhecida em nossas
escolas. Estudavam os temas propostos em todos os seus mínimos detalhes,
observando seu funcionamento com muito cuidado. Neste ponto podemos nos remeter
as escolas da Bauhaus de Weimar e HfG de Ulm que chegavam a discutir e analisar
os temas com o devido cuidado em busca da sabedoria e conhecimento dos materiais.
A “função” também é consideravelmente estudada na ENBA, cada cômodo – a
utilidade de uma cozinha, salas e quartos tornam-se objetos de análise e discussão na
escola, mesmo libertos dos cânones pré-existentes, com uma nova leitura através da
planta livre, defendida e difundida por Le Corbusier. Porém a experiência renovadora
implantada por Lucio Costa duraria até setembro de 1931, quando ele foi exonerado
do cargo, sob o protesto dos estudantes, que iniciaram uma greve.
324
. Freitas 1888, p. 133-134, in SEGAWA, Hugo. Arquiteturas no Brasil 1900-1990. São Paulo: Editora
da Universidade de São Paulo, 2002, p. 31-32.
325
. XAVIER, Alberto (org.). Depoimento de uma geração – arquitetura moderna brasileira. São Paulo:
Cosac & Naify, 2003, p. 65.
137
Embora tenha durado pouco mais de sete meses e nada tenha restado da
restruturação após a saída de Lucio Costa, esse período foi marcante o suficiente para
que uma geração de futuros arquitetos tivesse consciência das transformações em
curso na arquitetura mundial – consciência impensável numa estrutura conservadora
como que prevaleceu.
326
“A primeira escola, o que pode-se chamar legitimamente de ‘escola’ de
arquitetura moderna no Brasil, foi a do Rio de Janeiro, com Lucio Costa à
frente, e ainda está inigualada até hoje.”
Mário de Andrade, 1943
Enquanto no Rio era essa a situação quanto ao ensino da arquitetura, em São Paulo a
situação era praticamente a mesma, tendo a seu favor a luta gigantesca que travaram
para impor suas idéias três grandes personalidades da arquitetura moderna: Gregori
Warchavchik, Rino Levi e Flávio de Carvalho que, vindos da Europa, de lá trouxeram
as novas idéias e a arquitetura européia.
327
O ensino de arquitetura em São Paulo, que naquele tempo era um curso dado na
Escola Politécnica, fundada por volta de 1894. O curso era dividido na ocasião em três
etapas: preliminar – para todos os alunos iniciantes com duração de um ano, geral –
em dois anos, ainda comum a todos, e especial – onde as turmas se dividiam cada
qual em sua especialidade com duração de três anos. Porém o ensino ainda era
transmitido através do método da “passagem do conhecimento” do mestre para o
aluno, sem qualquer tipo de inovação.
É somente na década de 1940, concomitante ao crescimento do prestígio da
arquitetura como atividade (devido a sua repercussão internacional), o ensino da
arquitetura vai ganhando nitidez e autonomia das estruturas de escolas de belas-artes
e engenharia.
328
A primeira a ganhar autonomia em suas atividades foi a Escola Nacional de Belas-
Artes do Rio de Janeiro, que torna-se independente em 1945 surgindo a Faculdade
Nacional de Arquitetura da Universidade do Brasil. Um ano depois os diplomas da
Escola de Arquitetura da Universidade de Minas Gerais foram validados. Em 1947,
reconhecia-se, no nível federal, a Faculdade de Arquitetura Mackenzie em São Paulo
(separada da Escola de Engenharia). A fundação da Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo de São Paulo (independente da Escola Politécnica) deu-se no ano
seguinte, em 1948, com currículo de urbanismo ministrado no período de
graduação.
329
Assim este processo de transformação, autorização e criação das Escolas e
Faculdades de Arquitetura se desenvolveram até meados dos anos 70 por todo o país:
Faculdade de Arquitetura da Universidade do Rio Grande do Sul (1945-51), Faculdade
de Arquitetura da Universidade da Bahia (1946-59), Curso de Arquitetura em Curitiba
na Universidade do Paraná (1961), em Belém na Universidade Federal do Pará
(1965).
326
. SEGAWA, Hugo. Arquiteturas no Brasil 1900-1990. São Paulo: Editora da Universidade de São
Paulo, 2002, p. 79.
327
. XAVIER, Alberto (org.). Depoimento de uma geração – arquitetura moderna brasileira. São Paulo:
Cosac & Naify, 2003, p. 69.
328
. SEGAWA, Hugo. Arquiteturas no Brasil 1900-1990. São Paulo: Editora da Universidade de São
Paulo, 2002, p. 130.
329
. Idem, p. 130.
138
Citamos também, em Fortaleza, a Universidade Federal do Ceará (1965), Faculdade
de Arquitetura da Universidade de Brasília (1964), Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo da Universidade de Santos e da Universidade Braz Cubas (1970),
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo Farias Brito (1973-76), Faculdade de
Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Mogi das Cruzes (1974), Faculdade de
Arquitetura e Urbanismo Pontifícia Universidade Católica de Campinas (sd).
A criação destas escolas por diversas regiões do país foi importante para a
disseminação dos valores da arquitetura moderna no Brasil, o deslocamento de
profissionais, muitas vezes recém-formados, foi decisivo para a afirmação de uma
linguagem comum pelo território brasileiro.
330
A união entre escola recém-inaugurada e
professores recém-formados foi o fator fundamental para a criação de um ambiente de
discussão e novas idéias sobre o Movimento Moderno em nosso país.
Faculdade de Arquitetura da Universidade Mackenzie – FAM
O curso de arquitetura nasceu ainda na Escola de Engenharia Mackenzie (EEM) em
1917, apesar da EEM ser fundada em 1896 como subsídio da Universidade de Nova
York. Idealizado pelo arquiteto Christiano Stockler das Neves
331
, o curso possuía um
modelo de ensino diferente das escolas até então existentes no país, como a Escola
de Belas-Artes do Rio de Janeiro ou Politécnica de São Paulo, pois além das matérias
básicas de engenharia, o currículo para os engenheiros-arquitetos tinha cadeiras de
desenho (desenho à mão livre, sombras e perspectivas, desenho de aquarela e
desenho técnico), modelagem, teoria da arquitetura e composição arquitetônica.
332
Em 1947 o curso de arquitetura se emancipou da EEM, tornando-se a primeira
faculdade de arquitetura de São Paulo. A independência do curso possibilitou a
formação de uma nova categoria profissional – os arquitetos, onde até sua
emancipação não havia muito interesse dos estudantes para a profissão, visto que até
1947 formavam-se em média três ou quatro engenheiros-arquitetos, já com a
formação da faculdade as turmas começaram a crescer consideravelmente com cerca
de 30 a 50 alunos em poucos anos.
Nesta ocasião a estrutura curricular se manteve, sendo incluso algumas matérias
como traçado das cidades, arquitetura paisagista, arquitetura no Brasil, assim como
algumas foram excluídas mais ligadas ao curso de engenharia (química, mineralogia e
geologia).
Esta reforma curricular leva a escola a “reafirmar a definição de Arquitetura, não
somente como a arte das edificações, mas estabelecendo-se ao meio ambiente
habitado e adequando-a às exigências sociais e condicionantes tecnológicas atuais,
que devem ser observados sob dois aspectos: o verbal (interpretação e teoria) e o
formal (criação e projeto).”
333
Pode-se dizer que a Universidade Mackenzie contribui com grandes profissionais para
a produção da Arquitetura Moderna, não só em São Paulo como em diversos Estados
do país, mesmo quando ainda mantinha seus conceitos da Escola de Belas-Artes:
330
. Ibdim, p. 131.
331
. Christiano Stockler das Neves foi diplomado em 1911 pela Universidade da Pensilvânia nos Estados
Unidos
332
.CAMARGO, Mônica Junqueira de. História da FAU/Mackenzie sintetiza transformação da
arquitetura paulista nos últimos cinqüenta anos. Revista Projeto/Design, n° 212, set. 1997, p. 34.
333
. ZANETTINI, Siegbert. O ensino de projeto na área de edificação. São Paulo: FAUUSP, 1980, p. 27
139
Oswaldo Bratke, Eduardo Kneese de Mello, Henrique Mindlin, Miguel Forte, Jacob
Ruchti, Plínio Croce colaboraram com esta fama, ainda quando a escola pertencia a
EEM; Eduardo Longo, Paulo Mendes da Rocha, Carlos Millan e Roberto Aflalo
também passaram pela FAM e, mais recentemente, Isay Weinfeld, Arthur de Mattos
Casas e Mario Biselli também foram alunos desta faculdade.
Após a aposentadoria de Stockler das Neves, Carlos Millan assume a direção da
escola perfazendo algumas mudanças significativas na estrutura e conceito da
faculdade. Em primeiro lugar, estabeleceu-se a colaboração de arquitetos estrangeiros
que chegaram à cidade no pós-guerra – o tcheco Franz Heep e o polonês Victor Reif
334
– e passaram a lecionar na FAM. A reestruturação do curso e a adaptação curricular
buscaram dar um novo direcionamento aos conceitos da escola quanto à moderna
maneira de pensar arquitetura, deixando de ser vista como uma escola voltada às
construções para compreender a obra como arte e arquitetura. Isto também significou
a criação de espaços dignos das atividades pedagógicas e próprias para o curso de
arquitetura.
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo –
FAUUSP
A história da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo
deve primeiramente ser vinculada a existência da Escola Politécnica de São Paulo,
fundada em 1894 com o curso de engenheiro-arquiteto, que ao longo dos seus 59
anos de atuação no ensino, formou apenas 119 profissionais.
335
Francisco de Paula
Ramos de Azevedo, um dos fundadores da Politécnica, marcou a transformação de
São Paulo no final do século XIX.
Em 1948 é criada oficialmente a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, onde na
ocasião se instalam numa residência, na Vila Penteado, importante exemplar da
arquitetura art-nouveau. Esta casa doada pelos irmãos Sílvio e Armando Álvares
Penteado abrigou até a transferência para a Cidade Universitária em 1969.
Estes fatos podem ser reafirmados através da situação política interna em que a
escola enfrentava naquela época e as transformações da arquitetura, a luta por uma
escola de arquitetura autônoma,
336
dedicada no principal aos problemas dessa arte
criam o ambiente para o contraponto à técnica da Politécnica, dirigida até então sob
um outro olhar.
Já na nova escola, a discussão se centrava em torno dos internacionais conceitos do
organicismo de Wrigth, do racionalismo de Le Corbusier, do purismo tecnicista de Mies
van der Rohe, apoiada na teoria de Gropius, Benévolo, Zevi e nas experiências da
Bauhaus. Lucio Costa e, principalmente Niemeyer, são os nomes nacionais mais
pronunciados.
337
Descrever sobre os professores da FAUUSP não é uma tarefa fácil, visto que boa
parcela que passou pela faculdade muito contribuiu para o ensino e o desenvolvimento
de diversos profissionais, assim como a própria produção arquitetônica também pode
ser considerado de grande valia para o ensino da arquitetura em todo o país.
334
. CAMARGO, Mônica Junqueira de. História da FAU/Mackenzie sintetiza transformação da
arquitetura paulista nos últimos cinqüenta anos. Revista Projeto/Design, n° 212, set. 1997, p. 40.
335
. SERAPIÃO, Fernando. Aos 50 anos, o núcleo da escola paulista de arquitetura é notável centro de
ensino, pesquisa teórica e debates. Revista Projeto/Design n° 228, jan-fev/1999, p. 44.
336
. ZANETTINI, Siegbert. O ensino de projeto na área de edificação. São Paulo: FAUUSP, 1980, p. 19.
337
. Idem, p. 19.
140
Porém um destes “mestres” pode ser considerado um dos mais importantes
professores que esta faculdade possuiu, Vilanova Artigas não foi apenas arquiteto,
mas um líder em sua categoria profissional, militante político, professor renomado e
criador de um novo modelo de arquitetura paulista.
338
Vista da entrada da FAUUSP
Artigas ao ser transferido para a FAU lecionou desde a primeira turma, tornando-se,
graças a sua retórica, professor de destaque entre os alunos e articulador de
importantes mudanças estruturais no ensino da escola. Sua obra arquitetônica criou
um modelo de arquitetura baseado em princípios éticos e políticos ligados ao
socialismo, onde seu trabalho em sintonia com o novo brutalismo , como a Unidade
Habitacional de Marselha, de Le Corbusier, tem presença marcante ao longo da
história da FAU.
Apesar da desvinculação do curso do Politécnico, somente em 1950 a faculdade foi
transferida para a Vila Penteado, como já dito Artigas ingressou como professor desde
o início do curso, mas também Abelardo Reidy de Souza, além de alguns formados
pela Poli: Ícaro de Castro Mello, Zenon Lotufo, Roberto Cerqueira Cézar, Oswaldo
Correia Gonçalves e Ernest Mange.
Neste período as turmas eram pequenas, normalmente com cerca de 25 alunos, no
que possibilitava uma metodologia de ensino mais próxima na relação mestre-aluno,
porém a casa que abrigava a faculdade tinha suas limitações físicas para a estrutura
necessária do curso de arquitetura.
Isto fica claro na declaração de Paulo Bruna, que lembra que até a década de 60, os
alunos se deslocavam de Higienópolis para o bairro da Luz, para aulas na Poli.
339
Neste período o curso de arquitetura era estruturado em cinco anos de duração, e
estava previsto o curso de urbanismo, nunca implantado, com duração de dois anos
para arquitetos e engenheiros.
Das diversas discussões e episódios em que a FAU passou, Artigas sempre foi um
grande protagonista destes “debates” de reflexão sobre a reforma do ensino de
arquitetura. Mas é apartir de 1961 que a FAU passará por sua maior transformação
física e conceitual em sua história. O projeto do novo prédio da FAUUSP apresenta as
principais características da escola paulista.
“Na FAUUSP podemos ler a nova “escala democrática” proposta pelo
movimento moderno. Pode-se dizer que os espaços específicos rodeiam o
338
. SERAPIÃO, Fernando. Aos 50 anos, o núcleo da escola paulista de arquitetura é notável centro de
ensino, pesquisa teórica e debates. Revista Projeto/Design n° 228, jan-fev/1999, p. 48.
339
. Idem, p. 52.
141
central do prédio, batizado de Salão Caramelo pelos alunos, desde as
primeiras turmas que o habitaram.”
340
Sem dúvida trata-se de uma obra emblemática para os arquitetos, pois reúne, entre o
espaço criado e o programa proposto, a essência do movimento. Porém o prédio da
FAU vai muito além desta essência em que a obra se coloca, ele não pode ser visto
apenas como um “monobloco”, constituído de uma grande cobertura sustentada por
empenas estruturais com poucos pontos de apoio, possibilitando extensos vão e,
como o próprio Artigas dizia em suas aulas:
“O que me encanta é fazer formas pesadas, chegar perto da terra e negá-las, como se
fossem cair, vencidas pelo peso. Mas não caem...”, a FAU é, naquele momento, a
experimentação física sobre um novo olhar para o ensino de arquitetura. O programa
do edifício está intimamente ligado à reforma universitária implantada em 1962, na
gestão do diretor Lourival Gomes Machado, pela Lei de Diretrizes e Bases da
Educação, que criou departamentos nas faculdades e obrigou à realização de
mudanças na estrutura da FAU.
341
Desta forma, os espaços criados por Artigas através da ausência de barreiras de
vedação e as rampas que interligam os vários níveis garantem que o prédio possa
contribuir para a reforma do ensino. Os ateliês também passam por uma nova
proposta, onde os espaços são desenhados de forma a compor um único salão de
discussão sobre arquitetura, com isto busca-se a interação e integração dos alunos
em todos os anos do curso, com cinco anos de duração; tendo as aulas práticas
desenvolvidas neste grande espaço, enquanto que as disciplinas teóricas são
lecionadas em salas fechadas.
A proposta de reforma no ensino do curso de arquitetura previu a criação de três
departamentos: história, tecnologia e projeto. As disciplinas neles incluídas
caracterizaram quatro linhas básicas de estudo – desenho industrial, projeto de
edificações, programação visual e planejamento urbano. Entendendo que os
departamentos passam a ser a espinha dorsal da escola, principalmente o de projeto:
“... a proposta didática. ‘A Comissão acredita ser a atividade de projeto o
elemento deflagrador do processo do conhecimento do aluno de arquitetura’.
Entendemos por atividade de projeto a reflexão sobre o projeto, a elaboração
do projeto e a transmissão de conhecimento, momentos estes que se
manifestam no próprio ato de expressar.”
342
Os outros departamentos também possuíam sua carga de importância dentro do
conjunto do currículo de ensino proposto, assim como a biblioteca, os laboratórios de
artes gráficas e fotografia, a oficina de modelos, os museus e o GFAU também
compõem o conjunto de propostas colocada para a reforma de ensino da FAU.
A partir de 1964, o projeto de ensino sofreu com a falta de perspectivas, a repressão
aos debates, a perseguição a professores. Artigas exilou-se no Uruguai por um curto
340
. VILANOVA ARTIGAS. Catalogo da Exposição. Instituto Tomie Ohtake. São Paulo, 2003, p. 71.
341
. SERAPIÃO, Fernando. Aos 50 anos, o núcleo da escola paulista de arquitetura é notável centro de
ensino, pesquisa teórica e debates. Revista Projeto/Design n° 228, jan-fev/1999, p. 60.
342
. ZANETTINI, Siegbert. O ensino de projeto na área de edificação. São Paulo: FAUUSP, 1980, p. 24.
142
período de tempo.
343
O final da década é marcado por outra reforma curricular (1968),
que criou novos departamentos, estabeleceu o ateliê interdepartamental e dividiu as
matérias em obrigatórias e optativas.
Somente em 1969 a FAU é transferida para a “casa nova” na Cidade Universitária,
porém sem a presença de seu autor e um dos principais professores – Vilanova
Artigas, que como Paulo Mendes da Rocha e Maitrejean foram cassados. Em
solidariedade, Oscar Niemeyer recusou-se a proferir a aula inaugural no novo edifício.
Artigas e os demais professores voltariam somente dez anos depois com a anistia,
sendo admitidos como auxiliares de ensino no departamento de projeto.
A história da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo
poderia ser contada de diversas maneiras. Não se pode falar apenas de arquitetura,
desconsiderando a proposta de uma formação generalista que estimula a criatividade
em diversas manifestações. O conceito ideológico colocado em pauta na história desta
escola não pode ser desconsiderada, nem tão pouco a influência que marcou uma
geração de arquitetos que por ali passaram.
A proposta de um novo modelo de ensino, com a reforma curricular e estrutural de 62,
não somente em seus conceitos aplicados, mas também com uma “reforma física” na
compreensão da estrutura necessária para a criação de um espírito ideal para o
estudante e o ensino de arquitetura no século XX. Estas questões levam diversas
escolas de arquitetura, algumas recém ou a se formar, a repensar seus conceitos e
espaços físicos destinados ao ensino.
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Braz Cubas –
FAUUBC
“Está em funcionamento desde abril deste ano a mais recente faculdade de
arquitetura fundada no Brasil. Trata-se da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
‘Braz Cubas’ de Mogi das Cruzes, em São Paulo, que já conta com mais de
duzentos alunos”.
“... a Faculdade de Mogi das Cruzes, terá uma das oportunidades mais
interessantes para o planejamento arquitetônico. Uma grande área de terreno será
adquirida pela organização Braz Cubas e já prevista no Plano Diretor... nesta área
a primeira edificação a ser feita será a da Faculdade de Arquitetura com carater
provisório e nela e seu curso será desenvolvido o plano geral da Universidade no
qual trabalharão professores e alunos, numa equipe completa e uma oportunidade
única de caráter didático para exemplificar toda uma teoria e uma concepção nas
aulas mais práticas possíveis, ao pé das obras, num excelente canteiro de
serviço...”
344
A Universidade Braz Cubas, fundada no início dos anos 1960, foi projetada por
Eduardo Corona, num conjunto de edifícios compostos por mais de 160 salas de aula,
laboratórios, auditórios, ginásio poliesportivo, gráfica, maquetaria, bibliotecas, centro
de processamento de dados, laboratório de computação, lanchonete,
estacionamentos, etc numa área construída com mais de 34.000 m
2
. A Faculdade de
Arquitetura e Urbanismo iniciou suas atividades em 1970. Escola fundada por Eduardo
343
. SERAPIÃO, Fernando. Aos 50 anos, o núcleo da escola paulista de arquitetura é notável centro de
ensino, pesquisa teórica e debates. Revista Projeto/Design n° 228, jan-fev/1999, p. 66.
344
. CORONA, Eduardo. Uma nova Faculdade de Arquitetura. Revista Acrópole n° 379, novembro,
1970.
143
Kneese de Melo e Eduardo Corona, além de outros professores da FAUUSP, foi a
segunda escola privada de São Paulo após o Mackenzie.
Universidade Braz Cubas - 1973
Em 1992, a faculdade se muda da edificação provisória para o prédio definitivo, isto
faz com que a direção da escola, atendendo aos anseios de alunos e professores,
inicia-se o primeiro processo de reestruturação e reformulação do curso. Apesar de
ser fundada por professores da FAUUSP e com o mesmo conceito de ensino desta
escola, a FAUUBC estava instalada num espaço que não possibilitava por em prática
a estrutura idealizada inicialmente, com o curso elaborado para duração de 4 anos.
Com aulas nos períodos matutino e vespertino, a escola possuía três departamentos
fundamentais: Desenho – desenho do edifício, desenho da cidade e desenho da
paisagem, além de desenho da informação e do objeto; Tecnologia – matemática,
geometria, física, mecânica, resistência dos materiais, tecnologias do conforto, da
estabilidade das construções, da análise do solo, da estatística, da programação, das
estruturas, etc; e História.
Esta se encarregará do estudo sistemático da evolução da vida do homem em
comunidade (na casa, na cidade, na região), bem como as questões sociológicas e
econômicas. E ainda uma formação filosófica para o arquiteto, centralizada no estudo
da estética.
345
A reestruturação prevista para a FAUUBC não era apenas em seu conceito, que
buscava criar um currículo mínimo que atendessem as questões pertinentes à prática
cotidiana em sala de aula. Desta forma, o espaço físico também será uma peça
fundamental nesta nova “fase da escola”. Eduardo Corona já não estava mais na
escola, por diversas razões, mas seu conceito e referência na escola de Artigas se
concretizaram neste novo espaço de debates da arquitetura brasileira.
Os espaços dos ateliês propostos remetem a FAUUSP em seu conceito de salas
abertas e interligadas na intenção de dar maior liberdade ao aluno em interagir entre
os semestres. Fica claro que a escala da escola é muito reduzida em relação a FAU
de Artigas, causando alguns problemas nas aulas teóricas que por vezes são
345
. CORONA, Eduardo. A arquitetura e o seu ensino. Revista Acrópole n° 383, abril, 1971.
144
ministradas nos ateliês abertos, porém o espírito de uma escola aberta a novas
discussões, idéias e propostas se mantém vivo nas aulas e corredores da escola, que
juntos alunos e professores atuam no mesmo espaço de debates.
4.5 – Uma experiência didática na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da
Universidade Braz Cubas
Após a reforma estrutural e curricular de 92, a faculdade já em seu edifício novo, com
os espaços e ateliês remetendo-se aos da FAUUSP, e com um corpo docente com
arquitetos, em sua maioria formado pela “FAU de Artigas”, como por exemplo: Álvaro
Puntoni, Angelo Bucci, Candido Malta Neto, Carlos Warchavchik, Carlos Dias,
Elisabete França, Guilherme Mendes da Rocha, Marcelo Suzuki, Marta Moreira, Milton
Braga, Paulo Brazil, Rosa Artigas, entre outros que compunham o quadro de
professores como Álvaro Dariza (ex-aluno da primeira turma da FAUUBC) e Guilherme
Mattos (FAUUMC), coordenados por Ciro Pirondi que naquele momento era o diretor
da faculdade.
Até 1996, a faculdade passa por um espírito de descobertas e debates sobre
arquitetura junto a este grupo de professores e alunos
346
que buscavam juntos ensinar
e aprender nos ateliês e corredores da escola.
Porém em meados deste ano a escola entra em crise devido ao recém criado “Curso
Integral”, uma nova proposta colocada em prática pelo diretor na justificativa de que
Mogi das Cruzes comportaria mais um curso
347
, causando um grande atrito entre
corpo docente/corpo discente/reitoria, levando a uma greve que durou cerca de 15
dias de discussão sobre o futuro da FAU.
Houve, de um lado os professores e direção, os quais defendiam a nova proposta
colocada em prática, de outro a reitoria, que justificava o prejuízo financeiro causado
pelo novo curso. Enquanto que os alunos apenas defendiam um ensino de qualidade e
contemporâneo. Isto resultou numa grande manifestação dos professores e alunos em
busca de soluções para o problema que se instalava, resultando na demissão de cerca
de 80% dos professores que lá lecionavam.
Uma semana depois, assumia a direção o arquiteto Antonio Gameiro das Neves e
junto com ele alguns dos professores que foram readmitidos como: Alexandre
Loureiro, Elisabete França, Carlos Dias, Guilherme Mattos, e outros convidados como
Marta Lagreca, Paulo Amaral, Cleber Machado e Carlos Costa (os dois últimos - ex-
alunos da FAUUBC).
Este novo grupo tinha como missão dar continuidade a uma escola que acabara de
passar por uma crise acadêmica e, além de seu prejuízo didático, tinham que cumprir
o calendário para terminar o semestre. Tal semestre acarretou uma alteração em
quase todo o quadro docente e as mudanças didáticas e metodológicas criaram um
outro espírito na FAU, não mais o da busca pelo conhecimento e debates, mas agora
de uma faculdade com seus objetivos mais ligados as questões práticas da profissão.
Em 1998 iniciei meu Trabalho de Graduação Interdisciplinar sendo orientado por
Elisabete França e Marcelo Suzuki, que naquele momento voltara para a UBC a
346
. Pode-se dizer que naquele momento a FAU abrigava cerca de 2.000 alunos nos seus dez semestres do
curso nos dois períodos.
347
. Naquele momento a escola possuía dois cursos – o matutino e o noturno.
145
pedido da turma para ser orientador daquela disciplina.
348
No início do 2° semestre
daquele ano fui convidado pelos professores Paulo Amaral e Marta Lagreca, que
lecionavam Projeto de Arquitetura VII e VIII e Projeto de Urbanismo I e II, para ser
monitor destas disciplinas. Permaneci no cargo até o 1° semestre de 2001 e fui
contratado como professor daquela instituição a convite do Prof. Gameiro.
No 2° semestre daquele ano assumia, juntamente com os professores Renata
Piazzalunga e Alexandre Loureiro, a disciplina de Projeto de Arquitetura B, uma
experiência nova visto que nunca havia lecionado para alunos iniciantes no curso –
esta disciplina é dada aos alunos do segundo semestre do curso e é o primeiro
contato com o projeto do edifício na sua vida acadêmica.
Isso ocorre considerando que no primeiro semestre as questões levantadas na
disciplina de projeto buscam dar uma visão geral sobre arquitetura para nivelar o
conhecimento dos alunos – e depois seria minha primeira experiência como professor
responsável por uma disciplina.
Ao elaborar o curso e seu conteúdo programático, resolvemos trabalhar sobre o tema
da “casa”, experiência vivida por todos os alunos e tema discutível por diversos
autores, assim como o tema possibilita o debate sobre vários aspectos: a cultura, a
forma de abrigo, tecnologia, etc.
Neste sentido, o tema “casa” é escolhido como fio condutor da análise de um objeto
arquitetônico, onde uma infinidade de arquitetos por todo o mundo trabalha sobre um
programa de necessidades extremamente simples e básico que, ao longo do tempo,
admite a variação infinita.
349
Presente desde que o homem deixou as cavernas, a casa é um dos registros mais
importantes da história humana e o termômetro mais confiável das tendências e das
questões da arquitetura, num determinado espaço e tempo. Passado, presente e
futuro da arquitetura estão na casa.
350
Verifica-se que este tema – a casa – vem sofrendo um processo de transformação
espacial e conceitual na forma de habitar; refletir sobre a casa, a velha máquina de
morar
351
é, para o arquiteto, um exercício delicioso e infinito. Estas transformações
são, e sempre foram, causadas devido a estrutura familiar brasileira, que ao longo
destes cinco séculos refletem no espaço físico de morar.
Enfim, casas-grandes, casas térreas, sobrados, palacetes, vilas, apartamentos,
conjuntos habitacionais, condomínios horizontais e verticais, flats – várias formas de
morar, porém todas guardando inter-relações semelhantes, mesmo com o passar do
tempo, deixando entrever que a sociedade brasileira tem uma face.
352
A partir destes
preceitos elaboramos um curso onde o estudante de arquitetura poderia discutir o
tema sob um olhar crítico sobre o espaço, num processo de desmontagem, pesquisa,
descobertas e conclusões sobre o objeto estudado.
348
. Em 1998 a disciplina de TGI - 9° e 10° semestre, era composto pelos professores Elisabete França,
Marcelo Suzuki, Cleber Machado, Emmanuel dos Santos e Júlio Strelec.
349
. Principalmente se considerarmos as peculiaridades dos locais de clima, cultura e tecnologia.
350
. BISELLI, Mario. A casa, tema universal, permite testar, experimentar, subverter. Revista
Projeto/Design, n° 219, abril de 1998, p. 85.
351
. “A casa é uma máquina de morar”, Le Corbusier .
352
. VERÍSSIMO, Francisco Salvador, BITTAR, William Seba Mallmann. 500 anos da casa no Brasil.
Rio de Janeiro: Ediouro, 2° edição, 1999, p. 28.
146
A disciplina tinha como objetivos “aprofundar os conceitos de espaço, experiência e
percepção, através da leitura crítica do mesmo, convívio e intervenção, onde cultura,
tempo e história estarão incluídos. Espaço este compreendido como material
primordial da arquitetura”.
353
O conteúdo programático estava centrado em capacitar o estudante de arquitetura na
analise e compreensão de um determinado tema que o auxilie na formulação de suas
propostas com expressão própria, clara e eficiente no resultado plástico, estrutural e
conceitual da obra. Desta forma, a pesquisa tornou-se o ponto inicial dos trabalhos na
busca do conhecimento e aprofundamento do tema proposto – a casa, compreender a
casa e sua evolução formal, estética, cultural e espacial capacitaria o aluno a discutir o
tema com mais propriedade na disciplina.
Entendemos que a maior contribuição para a discussão sobre o tema estava centrada
no Movimento Moderno, que através de seus conceitos e ideários sempre esteve
muito presente no discurso das casas, que influenciaram a formação profissional de
vários seguidores. Neste sentido, elegemos para aquele semestre a discussão sobre a
obra do arquiteto mexicano Luís Barragán, que possui uma produção muito
interessante de casas em seu país.
Nos estudos previstos para o curso, as casas modernas deverão constituir o elemento
privilegiado de análise, devendo ser estudado os projetos mais significativos da
produção do arquiteto, nos métodos pedagógicos adotados pelo grupo de professores.
Por não constituir uma ciência exata, o projeto de arquitetura dispõe como forma de
verificação de suas hipóteses os estudos dos objetos elencados. As casas modernas –
que além de colocar a prova suas proposições, possibilitam a “apropriação” de
determinados resultados positivos ou não, conforme a receptividade ao programa
proposto aos alunos.
Desta maneira, para a análise das interpretações dos estudantes de arquitetura, estão
previstos a desfragmentação do objeto de estudo, com o intuito de inter-relacioná-los
uns aos outros num só objeto, com o intuito de chegar ao partido arquitetônico da casa
em estudo. Nesta análise são considerados conceitos relacionados a espacialidade,
sensações e técnica construtiva.
Para tanto, as análises das casas escolhidas para o estudo de caso, terão como base
a produção de diagramas concebidos pelos estudantes de forma crítica, onde neste
exercício serão desenvolvidos os trabalhos em duplas, na justificativa primeiramente
do número de alunos por turma
354
e depois na intenção de contribuir com o outro na
leitura e compreensão dos exercícios propostos.
Assim cada dupla será responsável por uma casa a ser estudada, entendendo que
cada etapa do trabalho deverá ser considerada um exercício a ser cumprido pela
dupla e levado a discussão no ateliê onde se compartilham as experiências e
resultados do exercício.
Foram elencados cinco diagramas que possibilite o aluno compreender a casa
estudada de forma completa, fragmentando-a em etapas de estudo sem perder a idéia
geral da obra. A cada estudo os alunos cumprem uma fase de discussão, com todos
os alunos do ateliê, demonstrando suas conclusões e relacionando-as entre os objetos
estudados, visto que as obras selecionadas compõem um conjunto de objetos de um
353
. FAUUBC, programa da disciplina de Projeto Arquitetônico B, 2001.
354
. Naquele período as turmas eram compostas em média de 100 alunos.
147
mesmo arquiteto, onde os alunos devem inicialmente conhecer a história e percurso
profissional do mesmo.
Estes diagramas devem também servir de instrumentos de compreensão para a
construção da maquete volumétrica da casa estudada, transportando os estudos e
análises antes fragmentadas num só objeto tridimensional que traduza as conclusões
da dupla de alunos.
A casa e a cidade, setorização/ espacialidade, fluxos e fixos, luz e sombra e, técnica
construtiva deverão ser estudados pela dupla como forma de compreender a casa
estudada em seus diversos aspectos de como o arquiteto, ao projetar, pensa, desenha
e soluciona estes temas num só objeto – a casa – e em especial a casa modernista
que é evidenciado de diversas maneiras, como o concreto armado utilizado como
forma de expressão através do material bruto, ou a “denuncia” do sistema estrutural
proposto.
A casa e a cidade
A idéia de que o objeto estudado deve ser compreendido para além de suas paredes,
coloca o aluno, desde já, na posição não somente como produtor de edifícios mas na
condição de observar cada objeto estudado e a relação com o entorno. Fica claro que
nesta fase de seu aprendizado – 1º ano de formação – sua compreensão sobre o
desenho urbano ou o urbanismo ainda está por se formar.
No entanto, justifica-se esta análise se considerarmos que diversas casas modernas
tiveram em seu partido arquitetônico e na sua implantação uma importante relação
junto ao espaço público e ao desenho urbano, até porque em sua maioria estas eram
construídas em novos bairros, principalmente em São Paulo, implantados sobre os
conceitos urbanísticos modernistas que aqui chegavam.
Neste sentido, o aluno deverá iniciar suas análises compreendendo que o objeto de
estudo – a casa moderna - está inserida num contexto urbano onde as relações entre
a construção e o entorno também devem ser explorados na construção do projeto da
edificação.
Nisto, o tema permite questionar as lacunas, os vazios, os silêncios, as intenções do
arquiteto numa mútua conversa do objeto com a malha urbana onde está implantada.
O desenho resultante, apesar de muitas vezes apresentada com uma representação
gráfica simples
355
, permite a reflexão sobre conceitos de articulação entre a escala
urbana com a edilícia e desta com seus componentes.
No final deste exercício, este material se converte em uma ferramenta válida de
representação, verificação e avaliação, gerando uma amostragem da produção do
introdutório
356
, reunindo-se mais tarde ao conjunto de todos os exercícios;
Setorização/espacialidade
Este exercício, dentro do processo de entendimento e contribuição das demais etapas
do trabalho, possui uma grande importância no entendimento de que a compreensão
355
. Entenda-se que os alunos deste semestre não possuem experiência com o desenho técnico.
356
. Universidad de la República. Facultad de arquitectura. Taller Sprechmann. Explora (o ensino da
arquitetura – en la enseñanza de la arquitectura). Porto Alegre: Ed. Ritter dos Reis, 2003, p. 37.
148
da setorização da casa está diretamente ligada ao programa de necessidades do
objeto e que o resultado espacial de cada ambiente (interno e externo) vão se
relacionar com a cultura da família que irá habitar aquele objeto e as interferências
naturais da área de intervenção (terreno).
Desta forma, este exercício estabelece procedimentos de classificação e ordenamento
das funções em setores funcionais, refletidos nos arranjos espaciais da casa, em
busca da compreensão das decisões tomadas pelo arquiteto na composição dos
espaços e ambientes que organizam a vida cotidiana da família que irá habitar esta
casa;
Fluxos e fixos
Tem por objetivo estudar, analisar e compreender todos os fluxos de circulação
(horizontal e vertical) da casa em estudo, delimitados pela hierarquia de uso em três
níveis: social, íntimo e serviços, que demarca o itinerário dos moradores da casa, dos
visitantes/convidados e eventualmente prestadores de serviços
357
. Este mapeamento
resulta na “planta de espaços fixos”, passíveis de serem ocupados pelo mobiliário da
casa.
Esta análise terá grande valia na contribuição ao entendimento, por parte do aluno, da
importância em utilizar o sistema de circulação como instrumento de setorização e
hierarquia na espacialização da casa, explorando este tema como elemento
compositor do conjunto da obra em estudo e a correta utilização em cada momento e
efeito em que o autor queira explorar através deste tipo de circulação;
Luz e sombra
O conceito de abrir ou fechar um vão, neste exercício será mapeado na intenção de
analisar os resultados alcançados com a exploração das aberturas propostas no
objeto, nisto o resultado psicológico e climático que se pode causar com o controle de
luz e sombra, junto à necessidade climática e estética devem ser levadas em
consideração neste “diagrama”;
Técnica construtiva
A coordenação modular e racional da construção tornou-se soluções do Movimento
Moderno utilizado como um dos princípios da arquitetura moderna. Para tanto, a dupla
deverá investigar a aplicação dos materiais e componentes utilizados na composição
da casa, compreendendo as necessidades e possibilidades de cada material
empregado no objeto.
Sabe-se que as estruturas modulares foram utilizadas pelos arquitetos modernistas
como metodologia construtiva, através de um sistema de unidades – os módulos, para
estruturar através de uma “malha” utilizando-se de múltiplos e submúltiplos do
“módulo-modelo” adotado como elemento que componha com a arquitetura elaborada.
Neste sentido, o estudo da técnica construtiva utilizada na casa-estudo busca
compreender inicialmente como esta foi concebida pelo autor do projeto levando-se
em consideração a época em que foi projetada, a situação econômica e tecnológica no
país. Esta análise faz com que a dupla possa ter contato com o estudo das técnicas
357
. Estas demarcações nem sempre estão diretamente ligados à hierarquia de percursos da família (social,
íntimo e serviços).
149
construtivas e as possibilidades e decisões necessárias no momento da elaboração do
projeto arquitetônico.
A partir destes estudos, a equipe deve elaborar os diagramas, cruzando as
informações levantadas, tendo uma compreensão completa do objeto estudado, onde
completado o “ciclo” da construção dos “diagramas” citados acima, entendemos que a
dupla já é capaz de iniciar a produção da maquete volumétrica da casa estudada.
Neste momento, a percepção do trabalho tem como objetivo a compreensão espacial
da casa modernista, visto que até este momento a dupla “desfragmentou” o objeto e o
estudou de forma segmentada
358
, e a partir deste estágio, tem-se uma visão global do
objeto estudado para a construção da maquete volumétrica, que subsidiará na
conclusão final do trabalho.
As etapas estudadas individualmente, de forma fragmentada, mas com um olhar sobre
conjunto final – a casa, que deve ser entendida como objeto único de estudo. No
entanto, estas decisões apenas demonstram uma hipótese pedagógica onde a casa
modernista participa como protagonista no ensino de projeto de arquitetura para uma
certa quantidade de alunos desprovidos de repertório refinado sobre as discussões da
produção arquitetônica utilizada nos meios acadêmicos e na prática encontrada nos
escritórios de arquitetura.
4.5.1 - As experiências didáticas e os resultados alcançados durante três
semestres na FAUUBC
Colocar em prática experiências didáticas sobre o ensino de arquitetura considerando
objetos reais e existentes como forma de estudo e construção do “repertório básico”
para o estudante de arquitetura, principalmente os iniciantes de arquitetura
359
, pode
levar à resultados muito satisfatório na construção do conhecimento dos alunos e no
aprimoramento da didática utilizada e na aplicação da metodologia elaborada para o
curso.
Isto se faz necessário para a compreensão e aprimoramento dos resultados
alcançados, não somente como método pedagógico, mas também como indicadores
para medir os resultados alcançados pelos alunos, a compreensão e o avanço do
conhecimento do curso como um conjunto único das disciplinas de Projeto, Tecnologia
e História.
Nisto, a experiência que perdurou até o 2° semestre de 2002 com a utilização de
outras casas e arquitetos como estudo de caso: 1° semestre de 2002 – arquiteto
Oswaldo Arthur Bratke e João Vilanova Artigas no semestre seguinte, foi de grande
valia para colecionar um conjunto de questões e resultados que possam contribuir
para uma reflexão sobre os métodos pedagógicos utilizados na construção do
repertório arquitetônico do estudante de arquitetura e, em sua devida escala, uma
contribuição no conjunto do ensino de arquitetura.
Durante estes três semestres podemos observar e aprimorar nossa metodologia
adotada na elaboração de cada curso, ora no sentido de ajustar algumas “falhas”
358
. Entenda-se o estudo segmentado do objeto apenas como uma metodologia adotada pelos professores
para uma melhor compreensão do aluno, sob várias óticas do “olhar do arquiteto”, sem perder a
compreensão do conjunto edilício – neste caso a casa modernista.
359
. Entenda-se o iniciante de arquitetura os estudantes do primeiro ano do curso, onde no caso da
FAUUBC, somente no segundo semestre o aluno terá contato direto com o desenvolvimento do projeto
arquitetônico.
150
observadas durante o desenvolvimento do curso com a primeira turma, que em muito
contribuiu para descobrirmos novas formas de transmitir nosso conhecimento, ora na
busca de medir e compreender os resultados alcançados a cada etapa do exercício
proposto para o curso.
A primeira turma trabalhou com as casas do arquiteto Luís Barragán, nascido em
Guadalajara – México em 1902, estudou engenharia antes de voltar-se para a
arquitetura. Diversas casas foram estudadas para compreender sua produção
arquitetônica durante sua carreira profissional: casa Prieto Lopez (1948-49), casa
Gálvez (1955-56), casa Gilardi (1976), casa Meyer (1978), entre outras; no entanto,
vamos utilizar a Casa e Estúdio Barragán como objeto resultante da turma do segundo
semestre de 2001.
Casa Gálvez, casa Prieto Lopez e casa Gilardi
“Externamente, a casa de Barragán é austera e nada excepcional, uma
presença anônima em um bairro despretensioso. Mas, no interior, o ambiente é
singular. Tem alguma influência do estilo colonial espanhol, bastante influência
das cores vivas da arquitetura tradicional mexicana e, em relação à marcante
clareza geométrica, do estilo internacional. Mas a síntese é exclusiva de
Barragán: sua casa é uma composição de cômodos e, embora sem nenhuma
relação estilística, talvez a comparação mais exata seja com o Raumplan da
Casa Muller de Adolf Loos”.
360
Esta por ser uma das obras mais conhecidas de Barragán, principalmente entre suas
casas, muito contribuiu para a pesquisa e aquisição de material gráfico para a
elaboração dos exercícios propostos no curso.
Inicialmente a equipe deveria coletar o máximo de informações capaz de compreender
a obra do arquiteto de forma integral – a plástica adotada, a relação da casa com o
entorno, os espaços físicos internos e externos criados pelo autor, além do material
gráfico como as plantas baixas, cortes, elevações e fotos da obra. Este exercício foi
acompanhado pela pesquisa da biografia profissional do arquiteto, onde os alunos
possam ter uma compreensão das obras realizadas pelo arquiteto e sua evolução
profissional.
Após algumas aulas onde a equipe deveria pesquisar e coletar as informações e
peças gráficas sobre a casa estudada, as equipes deverão apresentar o resultado de
sua pesquisa, numa forma de “sociabilizar” as informações e, numa troca mútua,
ampliar o repertório arquitetônico sobre aquele arquiteto estudado. É a primeira
360
. WESTON, Richard. Plantas, cortes e elevações – edifícios-chave do século XX. Barcelona: Editorial
Gustavo Gili, 2005, p. 96.
151
oportunidade dos alunos conhecer o trabalho do arquiteto e iniciar uma análise
primária sobre o “amadurecimento arquitetônico” do arquiteto mexicano, neste caso.
Casa-estúdio do arquiteto – Luis Barragán
Após a coleta de informações, dados e peças gráficas da casa estudada, a equipe
desenhará, em escala, as peças gráficas da casa. Esta fase do exercício tem por
finalidade uma leitura minuciosa sobre o projeto estudado onde através da reprodução
das plantas baixa, cortes e elevações os alunos iniciam uma compreensão sobre os
espaços criados pelo arquiteto.
Entretanto, também é nesta fase do exercício que surgem as primeiras dúvidas que
junto às descobertas e leitura das peças gráficas, leva a equipe a buscar mais
informações sobre o arquiteto e a casa estudada. Neste sentido, estudar sobre a
evolução da casa brasileira e sua transformação ao longo das décadas, entendendo-a
sobre vários aspectos – principalmente do ponto de vista econômico e social – que
refletirá na estrutura física dos espaços e dos ambientes que foi se modificando para
atender às novas sociedades que surgiam ao longo dos anos.
Este estudo torna-se importante para o aluno compreender a transformação dos
espaços físicos da casa, onde no caso especifico da arquitetura mexicana, muitas
vezes de influência árabe, e particularmente as obras de Luís Barragán que possui
uma contribuição muito significativa para a arquitetura moderna, não somente
mexicana, mas também mundial.
Plantas baixas, Elevação frontal e Corte longitudinal da casa, desenhados pela equipe.
152
Com a conclusão dos desenhos da casa estudada, a equipe inicia a construção dos
diagramas previstos na estrutura do curso. O primeiro diagrama corresponde a
elaboração da setorização e espacialidade da casa.
Os três primeiros diagramas demonstram a compreensão da equipe quanto a
setorização dos espaços, hierarquizando-os em três setores: intimo, social e serviço,
onde pela leitura dos estudantes grande parcela da casa, principalmente no pavimento
térreo, é destinada ao setor social, onde elas consideram pátio/jardim como uma área
comum da casa e, apenas o estúdio e a biblioteca são considerados como setores
íntimos, ambientes destinados ao uso “restrito” dos moradores da casa. Conforme os
pavimentos vão surgindo, a casa se torna cada vez mais íntima, garantindo maior
privacidade aos moradores desta casa.
Diagrama de Setorização/Espacialidade - Plantas baixas da casa-estúdio
Nesta análise, a equipe sentiu a necessidade de construir outros diagramas que
auxiliassem numa maior compreensão do tema discutido neste momento. A
construção dos diagramas de setorização e espacialidade se pressupõe na reflexão e
discussão sobre a forma com que a casa foi concebida, relacionando-a a cultura de
uma sociedade de meados do século XX, e costumes de seus moradores, mesmo
cientes de que este objeto trata-se da casa e estúdio do próprio arquiteto Luis
Barragán. Neste sentido, a equipe construiu três outros diagramas que os auxiliassem
e detalhasse mais sobre o tema.
O primeiro destaca os ambientes como Eixos Espaciais, uma forma de demonstrar a
partir da setorização, os ambientes considerados como espaço comum – áreas
destinadas aos moradores, prestadores de serviço (empregados) e visitantes, e
espaço privado – áreas com maior restrição aos que passam pela casa.
153
Diagrama de Setorização – Plantas baixas dos eixos espaciais
Num segundo diagrama, a equipe analisa a partir da compreensão da construção dos
espaços verticais – como o resultado alcançado com a diversificação de pés-direitos
altos, baixos e até mesmo duplos – esta análise resultou num diagrama de Eixos
Espaciais relacionados aos espaços vertical e horizontal, onde numa rápida leitura
sobre o diagrama apresentado, concluímos que a utilização de espaços verticais
significa uma maior exploração de pés-direitos duplos como um método de garantir
uma espacialidade mais confortável aos usuários da casa, assim como, estes estão
relacionados às áreas de uso comum como o estúdio, biblioteca e sala.
Diagrama de Setorização – Plantas baixas dos eixos vertical e horizontal
154
Num último diagrama a equipe analisa a casa sobre o olhar do “construído e não
construído”, demonstrando e demarcando claramente os espaços artificial e natural,
entendendo este último como as áreas livres do terreno. Neste momento não cabe aos
estudantes de arquitetura refletir sobre o meio ambiente natural ou construído, busca-
se apenas que a equipe possa distinguir os dois espaços apontados nos diagramas e
os resultados espaciais que algumas soluções podem alcançar.
Diagrama de Setorização – Plantas baixas dos espaços natural e artificial
Outro diagrama proposto para a desfragmentarão da casa, no decorrer do curso, era a
compreensão dos fluxos e fixos relacionados a circulação interna e externa da casa, e
os espaços resultantes como fixos para a elaboração do layout do objeto estudado.
Nisto, a equipe identificou duas formas de circulação – horizontal e vertical, mapeando
os possíveis caminhos que os usuários da casa podem utilizar.
Como demonstrado nas figuras abaixo, o pavimento térreo é composto por grandes
eixos de circulação horizontal que cumprem a função de interligar os ambientes deste
pavimento. Já nos dois outros pavimentos a circulação horizontal resume-se em
pequenos hall de distribuição para os ambientes mais íntimos da casa. Por outro lado,
observa-se que as circulações verticais, compostas essencialmente por escadas, são
distribuídas de modo a atender as diversas funções da casa.
Diagrama de Setorização – Plantas baixas de circulação
155
Se por um lado os primeiros diagramas foram elaborados com grande precisão pela
equipe, infelizmente os demais diagramas – luz e sombra, técnica construtiva – não
foram elaborados. Isto se deu por dois motivos: primeiro que entendemos, como
professores responsáveis pela disciplina, que a construção destes dois diagramas
poderia influenciar no cronograma previsto no início do curso, onde decidimos,
naquele momento, não excluir totalmente esta fase dos exercícios, mas considerá-los
apenas como uma etapa de pesquisa da equipe. Nisto, entendemos que a construção
da maquete volumétrica da casa estudada contribuiria para uma maior compreensão
do objeto de estudo.
Maquete volumétrica – Casa e Estúdio Luis Barragán
A construção da maquete volumétrica faz com que a equipe possa tridimensionar os
estudos elaborados até o momento. Como a maioria dos alunos neste semestre não
possuíam experiência profissional, decidimos trabalhar com um material para a
execução das maquetes de fácil manuseio, pois o papel metiê pode ser manuseado
por todos os alunos sem a necessidade de ferramentas especificas ou outro qualquer
material especial. Neste momento a avaliação da volumetria da casa estudada não
deve ser levada à técnica da execução ou o resultado final dela, mas a compreensão
da equipe em traduzir os estudos até então bidimensional na volumetria da casa.
A decisão de manter a maquete volumétrica num só material buscava naquele
momento, não influenciar os estudantes em distinguir com cores, texturas ou material
os diversos componentes da casa, deixando a maquete neutra mesmo cientes que no
caso especifico das obras do Barragán um dos aspectos mais significativos está na
exploração das cores quentes.
156
Por este aspecto, esta casa possui uma grande diversidade capaz de ser explorada e
estudada pelos estudantes de arquitetura, e como descreve o arquiteto e professor
Carlos Eduardo Dias Comas: “La arquitectura de la casa Barragán és una arquitectura
de planos, pero no la del neoplasticismo ni la de la planta libre y su espacio
‘sandwich’”.
361
Após a conclusão do curso neste semestre, entendemos que a estrutura do mesmo
deveria passar por uma revisão no sentido de ajustar alguns problemas surgidos
durante as aulas teóricas e praticas. Remodelamos as aulas teóricas com uma
discussão mais aprofundada na historia da casa brasileira – suas origens e
transformações relacionadas as questões sócio e econômicas do país e seus
habitantes.
Para tanto, adotamos duas publicações como “bibliografia base” para a construção
dos conceitos junto aos estudantes de arquitetura; a primeira publicação adotada
busca colocar em discussão a evolução, em ordem cronológica, dos espaços da
habitação no Brasil – o livro de autoria de Francisco Salvador Veríssimo e William
Seba Mallmann Bittar – 500 anos da Casa no Brasil – tornou-se peça importante na
produção de nosso curso, onde utilizamos uma literatura de fácil acesso e
entendimento dos alunos. Casa Paulista, de autoria de Carlos Lemos também se
tornou uma literatura indispensável para a consulta dos estudantes, no intuito deles
compreenderem a evolução da casa paulista desde o século XVI ao atual.
Outro fato relevante foi quanto a produção das maquetes volumétricas das casas
estudadas do arquiteto eleito para o estudo do semestre. Apesar da importância de
Luis Barragán para a produção da arquitetura mexicana e demais países da América
Latina, entendemos que uma etapa do curso ficou prejudicada.
A experiência vivida não pode ser completada pela impossibilidade de não visitarmos
as obras estudadas, isto se deu devido a estrutura do curso onde primeiramente os
alunos estudam no período noturno por trabalharem durante o dia e depois porque
nem todos os alunos teriam condições financeiras para viajarem até as cidades onde
as casas estão implantadas. Concluímos que isto prejudicou na compreensão
completa sobre a casa estudada, pois todas as maquetes foram construídas a partir da
leitura das imagens e peças gráficas pesquisadas pela equipe; nisto entendemos que
o próximo curso deveria ser eleito um arquiteto brasileiro e especificamente, um
arquiteto paulista na intenção de possibilitar a visita às obras estudadas.
Ao elaborarmos o curso para o 1º semestre de 2002, elegemos o arquiteto Oswaldo
Bratke para estudarmos sua produção arquitetônica e contribuição, através das casas,
para a arquitetura moderna brasileira. Com a experiência adquirida com a primeira
turma, alguns ajustes foram colocados em prática no intuito de construir um curso com
resultados que reflitam sobre o “olhar do estudante”.
Inicialmente inserimos no programa de ensino uma primeira visita as obras do
arquiteto, numa ordem cronológica que subsidie na compreensão da evolução
conceitual e profissional do arquiteto estudado. Naquele semestre nossa visita foi
acompanhada pelo Prof. Guilherme Mazza Dourado, colaborador do livro sobre o
arquiteto de autoria do Prof. Hugo Segawa, sua colaboração tornou a visita numa
verdadeira “aula externa”, onde os alunos puderam conhecer as obras de Bratke com
depoimentos de um estudioso sobre o arquiteto eleito para este semestre.
361
. COMAS, Carlos Eduardo Dias. Memorandum latinoamericano: la ejemplariadd arquitectónica de lo
marginal. 2G – revista internacional de arquitectura. Barcelona: Editorial Gustavo Gili, 1998, p. 130-144.
157
Neste semestre a turma era formada por cerca de trinta alunos, no que possibilitou o
estudo das casas projetadas por Bratke desde a Residência no Jardim América, nos
anos trinta, em sociedade com Carlos Botti, passando pela Residência na rua Sofia
(1945/1947) ainda com influências de Wright e sua Casa e ateliê na rua Avanhandava
(1947), até a última casa projetada pelo arquiteto, em 1988/90 no Guarujá, a Casa na
praia de Pernambuco onde Bratke busca ensaiar a distinção entre a moradia e o local
de descanso.
“Há uma grande diferença entre o que chamamos de moradia e casa de férias.
A primeira é adaptada aos costumes de uma família, o lugar onde se vive, se
sonha. É a fortaleza que com os anos se torna um confidente de recordações
confortantes ou tristes, com suas lembranças estampadas nos objetos, na
decoração. Essa casa, bem planejada, reflete a personalidade da família que
nela habita. Já a outra é para gozo de férias, para receber amigos, alegrando-
os e se alegrando em companhia deles. E talvez o lugar para esquecermos as
asparezas da vida – portanto, onde deve haver alegria permanente.
Como os freqüentadores são geralmente em número variável, deve-se ter em
mente a folga necessária da qualidade de espaços e suas dimensões”.
362
Pode-se dizer que Oswaldo Bratke soube traduzir a cultura de uma nova sociedade
paulista em suas obras e, principalmente com a casa, que colocou em prática uma
grande diversidade de pesquisas tanto espaciais como tecnológica.
Casa e ateliê na rua Avanhandava, Residência e estúdio no Morumbi, Casa na Avenida Morumbi
Diversos trabalhos obtiveram bons resultados naquele semestre, pois entendemos que
a aula externa possuiu um papel importante na percepção das obras estudadas,
colocando o estudante de arquitetura num outro patamar onde as casas são muito
mais que objetos a serem estudados, mas casas onde os alunos puderam observar,
tocar e sentir na visita monitorada.
No entanto, esta pesquisa se coloca apenas como contribuidora para uma reflexão
sobre os métodos utilizados no ensino da arquitetura, fazendo-se desnecessário o
registro de todos os casos de estudos elaborados pelos alunos deste semestre. Para
tanto, elegemos um dos trabalhos elaborados pelas equipes para o registro desta
pesquisa.
A Casa na rua São Valério, projeto de Bratke de 1960, foi o “último projeto elaborado
para moradia do arquiteto e seus familiares, esta residência caracterizou mais uma
experimentação descompromissada da relação arquiteto/cliente na qual se manifestou
o elevado apreço de Bratke à arquitetura japonesa – uma influência latente em seus
trabalhos desde há muito”.
363
362
. Descrição de Oswaldo Bratke sobre a Casa na praia de Pernambuco – Guarujá – SP. In SEGAWA,
Hugo. Oswaldo Arthur Bratke. São Paulo: ProEditores, 1997, p. 174.
363
. Idem, p. 165.
158
Esta residência localizada no bairro de Cidade Jardim, em São Paulo, possui algumas
curiosidades em sua concepção arquitetônica, além da influência da arquitetura
japonesa, como o castelo de Himeji, em Hyôgo, a casa possui suas fachadas
marcadas pela topografia do local – a norte configura uma residência imponente, como
os templos, castelos e habitações orientais, enquanto a sul se torna discreta e na
escala do homem, como na maioria de suas residências projetadas no decorrer de sua
produção arquitetônica.
Residência na rua São Valério – São Paulo - 1960
Inicialmente a equipe reproduziu as peças gráficas da casa fazendo uma leitura mais
detalhada sobre a residência estudada. Entendemos que o redesenho das plantas
baixas, cortes e elevações da casa faz a equipe buscar mais informações sobre o
objeto, além de exigir da equipe, desde já, uma completa compreensão das propostas
do arquiteto para a casa estudada. Neste caso observa-se que a equipe construiu a
partir do redesenho das plantas baixas, os cortes e elevações do projeto. Vimos que a
construção destas peças gráficas (cortes, elevações) foi auxiliada não somente com a
pesquisa através de bibliografia, mas foi fundamental a primeira visita às casas a
serem estudadas durante o semestre.
Plantas Baixas, Elevações e Cortes redesenhados pela equipe
A partir do redesenho das plantas baixas e a construção dos cortes e elevações. O
primeiro diagrama construído pela equipe foi a Setorização da casa estudada.
Entendemos que cada equipe deveria propor a setorização conforme a compreensão,
entendimento e leitura dos espaços propostos pelo arquiteto, assim os estudantes
identificaram além dos três setores propostos pelo exercício – social, intimo e serviços.
Adicionando-se a eles, dois setores nomeados como social/serviço apontado pela
equipe na área de recreação localizada no subsolo da casa, justificado como um
159
ambiente capaz de atender as atividades de lazer dos habitantes assim como para o
encontro e recepção para os eventos da família. Outro é o social/íntimo, apontando a
biblioteca da casa como um espaço destinado ao uso exclusivo dos habitantes, com a
possibilidade da utilização de visitantes e convidados da casa.
Diagrama de Setorização/Espacialidade – Plantas baixas da residência
O segundo diagrama elaborado pela equipe foram os estudos de Luz e Sombra
utilizando-se das elevações construídas pelas alunas. Entendemos que a construção
deste diagrama possibilitou a discussão sobre o importante papel dos caixilhos,
chamados por nós de aberturas, para a contribuição de luz nos ambientes, o controle
de ventilação na casa estudada – direta, indireta ou cruzada, além da contribuição na
construção das elevações da residência estudada.
Nisto adotamos uma metodologia simples para a identificação das informações
necessárias às discussões levantadas neste exercício. Especificamente neste
exercício solicitamos das equipes que trabalhassem com duas cores apenas: o branco
para identificar os vazios das elevações – espaços destinados aos caixilhos,
esquadrias ou simplesmente as aberturas
364
, enquanto que o preto deveria apontar os
sólidos da casa – alvenarias de vedação, muros, telhados e outros elementos que a
equipe entenda como objetos sólidos e/ou marcantes nas elevações.
Diagrama de Luz e Sombra – Elevações da residência
364
. No caso das obras de Oswaldo Bratke, os vazios ou aberturas podem ser identificados pela utilização
dos Cobogós, elemento vazado de concreto muito aplicado nas edificações propostas pelo arquiteto.
160
Os próximos diagramas discutirão sobre os Fluxos de Circulação da casa, onde no
presente exercício as estudantes entenderam que o estudo poderia ser demonstrado
através da setorização identificada no primeiro diagrama, surgindo assim os fluxos e
circulações setorizadas – serviço, social, íntimo, social/íntimo e social/serviço, cada
qual com sua função e hierarquia na distribuição dos caminhos projetados para a
casa. Estes diagramas foram construídos a partir do estudo, análise e discussão sobre
as possibilidades dos percursos dos habitantes e visitantes da casa.
Como podemos observar nas figuras abaixo, estes diagramas podem identificar não
somente os fluxos e caminhos dos habitantes da casa, como também possibilita
levantar outras questões quanto o posicionamento do layout do mobiliário para cada
ambiente proposto, assim como identificar possíveis conflitos nos fluxos entre os
setores identificados nos outros diagramas.
No entanto, concluímos que este diagrama dos Fluxos de Circulação poderia ser
desenvolvido também com a identificação do layout, possibilitando um
aprofundamento sobre o tema e até mesmo uma maior discussão entre a casa, o
mobiliário e o homem.
Diagrama de Fluxos e Fixos – Plantas baixas da residência
O último tema a ser discutido pela equipe não deve ser concluído apenas com a
construção dos diagramas, mas ser subsidiado através da pesquisa sobre o tema e
suas relações entre a casa estudada, a técnica utilizada e a história. A construção dos
diagramas da Técnica Construtiva deverá ser elaborada utilizando as plantas baixas e
as elevações, identificando inicialmente os “pontos estruturais” nas plantas baixas e
demarcando os eixos da estrutura, isto possibilita também compreender a “modulação
estrutural” adotada pelo arquiteto.
161
Já as elevações possibilitarão a compreensão das estruturas verticais e horizontais em
rebatimento com o diagrama de luz e sombra, cruzando os dados da técnica
construtiva com as aberturas propostas pelo arquiteto. No caso das casas de Oswaldo
Bratke e, particularmente, a Casa da rua São Valério, a modulação estrutural adotada
pelo arquiteto fica muito clara na construção deste último diagrama, onde a
implantação dos pilares demarca de forma clara uma modulação contínua
horizontalmente, enquanto que o vertical é marcado pelos eixos horizontais
responsáveis pelo corpo principal da casa.
“A casa é basicamente uma volumetria sob uma cobertura com duas águas –
um sistema de lajes com caimento mínimo (imperceptível ao observador
desatento, por conta dos ângulos possíveis de visão) formando grandes
beirais, destacando-se na composição do conjunto. Distintamente de seus
trabalhos precedentes, abrandava-se o emprego dos pórticos estruturais como
elementos protagonistas na formalização do edifício. As vigas não mais
compunham molduras regulares com os pilares, mas avançam em balanços,
definiam contornos nas empenas laterais”.
365
Diagrama da Técnica Construtiva – Plantas Baixas, Elevações e Cortes da Residência
Após a construção dos diagramas propostos no curso, a equipe deverá iniciar a
construção da maquete volumétrica. Sua elaboração deve ser subsidiada não somente
nos diagramas, mas também de fotos e imagens da bibliografia estudada e da visita
monitorada no início do curso. Diferentemente do semestre anterior onde esta fase foi
prejudicada pela falta de informações que possibilitasse a perfeita compreensão e
construção da maquete volumétrica da casa estudada; observamos que com a
decisão de adotarmos casas modernas paulistas para os estudos de caso, onde
possibilitou uma maior aproximação dos objetos de estudo, resultando numa leitura
mais detalhada sobre a casa.
365
. SEGAWA, Hugo. Oswaldo Arthur Bratke. São Paulo: ProEditores, 1997, p. 165.
162
Maquete volumétrica – Casa da rua São Valério – Arquiteto Oswaldo Arthur Bartke
Foto: Fernanda M. Kano
Ao final do semestre observamos que o desempenho dos estudantes foi superior aos
do semestre passado. Alguns fatores devem ser considerados nas conclusões
levantadas por nós naquele momento; Acreditamos que o primeiro fator se deu por
conta da aula externa, proferida naquele momento pelo Prof. Guilherme Mazza
Dourado, onde os estudantes puderam obter um primeiro contato com a casa a ser
estudada. Este fator que chamamos de “Experiência Vivida” foi fundamental para o
desenvolvimento dos trabalhos durante o curso.
Outro fator foi na escolha de um arquiteto brasileiro, e particularmente paulista, para
os estudos sobre sua biografia e produção arquitetônica como “elemento chave” para
a discussão sobre a casa moderna e sua evolução junto a nova sociedade modernista
que surgia na capital paulista.
Observamos que esta escolha contribuiu na pesquisa e discussão sobre o tema
proposto – a casa – que ao elaborarmos o curso em 2001, tínhamos a casa como um
elemento chave capaz de iniciar uma reflexão sobre cultura, economia, história e
arquitetura relacionados ao objeto de estudo, que ao longo dos anos foi se alterando e
adaptando conforme as mudanças sociais do homem.
Ao elaborarmos o curso para o próximo semestre decidimos manter a mesma
estrutura do curso lecionado no semestre passado, alterando apenas o arquiteto a ser
estudado pela turma. Esta alteração é justificável considerando que independente do
arquiteto estudado, a proposta do curso estrutura-se em fornecer uma metodologia
para a desfragmentação do objeto estudado, analisando os temas propostos através
dos cinco diagramas criados para compreender as propostas e decisões do arquiteto
para a casa estudada.
163
Neste sentido trabalhamos com a turma do 2º semestre de 2002 com a biografia, as
obras e as casas projetadas por João Vilanova Artigas. Arquiteto de grande expressão
na história da arquitetura moderna brasileira e importante personagem político.
“Artigas foi o profissional que mais influenciou a formação de arquitetos e
respectivos trabalhos. Algumas dissidências? Várias. É a complexidade da
arte, é a riqueza da arquitetura. São os caminhos que cada um adota e toca.
Arquiteto, professor e ideólogo foram a soma e a síntese. Deixou importantes
obras e propôs várias trajetórias.
Por tudo isso, Artigas é o mais importante arquiteto paulista do século XX”.
366
“João Batista Vilanova Artigas era um homem de ação, inquieto, aceitava
desafios, assumia bandeiras, vivia intensamente os misteres da profissão e as
responsabilidades de cidadão”.
367
A metodologia adotada no último curso, lecionado no 1º semestre de 2002,
permaneceu idêntica, pois identificamos que os resultados alcançados com a estrutura
do curso foram positivos. Após a apresentação do curso aos alunos daquele semestre,
e as primeiras aulas teóricas que conceituasse o tema proposto estudado no semestre
– a casa, além dos estudos sobre a biografia e obras do arquiteto estudado,
realizamos as visitas técnicas às casas do arquiteto que deveriam ser estudadas pelas
equipes naquele semestre. Decidimos iniciar a vista pela 1ª casa de Artigas, a
conhecida “casinha”, onde tivemos a oportunidade de ser recepcionados pelo arquiteto
Julio Artigas, filho do arquiteto estudado, onde durante duas horas ouvimos os relatos
de Julio sobre as duas casas do arquiteto e estórias sobre as obras de Vilanova
Artigas.
Visita monitorada às obras do arquiteto Vilanova Artigas, Júlio Artigas na segunda casa do arquiteto.
Selecionamos as casas que consideramos as mais significativas na produção da
arquitetura de Artigas, isto foi necessário, pois a turma daquele semestre era reduzida
impossibilitando o estudo de todas as casas projetadas pelo arquiteto. Nisto decidimos
estudar a “casinha” e a 2ª casa do arquiteto como um único objeto, conscientes que
foram projetadas e executadas em diferentes épocas e técnica construtiva
368
,
residência Benedito Levi (1944), residência Rubem de Mendonça (1958), segunda
residência Taques Bittencourt (1959), residência Mendes André (1966), residência
Elza Berquó (1967), residência Czapski (1949) e residência Olga Baeta (1956) da qual
366
. Ruy Ohtake. Lembrança. Texto do catálogo da exposição Vilanova Artigas: Instituto Tomie Ohtake,
12 de setembro a 02 de novembro de 2003, p. 21-22.
367
. KAMITA, João Masao. Vilanova Artigas. São Paulo: Cosac & Naify Edições, 2000, p. 09.
368
. A 1ª casa foi executada em 1942, enquanto que a 2ª casa foi executada em 1949, vizinha à primeira.
164
utilizaremos os diagramas elaborados pela equipe como objeto de estudo desta
pesquisa.
“Casinha” e Segunda Residência do arquiteto
“A arquitetura é uma arte, isso eu repito. No fundo, é o direito humano à beleza,
coisa que a burguesia não concebe, mas é tão fácil de oferecer”.
369
A Residência Olga Baeta é resultado de uma fase de Artigas, que vai de 1952 a 1956,
onde sua produção foi reduzida, onde as obras mais significativas ficaram por conta do
Estádio do Morumbi e a casa em questão – em compensação, são anos onde se
destaca a atividade política do arquiteto.
A residência Baeta, projetada por Artigas para o casal de amigos Olga Bohomoletz e
Sebastião Baeta Henriques, num bairro próximo ao Instituto Butantã em São Paulo,
pode ser considerada como uma casa onde os limites entre o interior e exterior se
fundem através dos caixilhos que compõem fisicamente os ambientes da residência
com a área ajardinada da casa.
Composta por duas empenas cegas de concreto armado, uma voltada para a fachada
principal da casa – para a rua, e a outra para os fundos do lote, liberando as laterais
para captar a iluminação e liberar a paisagem e visão dos moradores da casa.
Residência Olga Baeta
Inicialmente solicitamos da equipe que após a pesquisa sobre a casa estudada,
coletando as imagens, peças gráficas e a história sobre o objeto estudado e, a visita
técnica, ao qual chamamos de “experiência vivida”, a equipe reproduzisse as plantas
baixas, cortes e elevações que possam subsidiar a elaboração dos diagramas do
curso.
Observa-se abaixo, neste caso, que a representação gráfica ainda é pouco refinada,
no entanto, deve-se levar em consideração dois pontos: primeiro que os alunos do 2º
semestre ainda não possuem, em sua maioria, uma larga experiência ou manejo com
369
. Vilanova Artigas, 1984.
165
o desenho técnico, depois porque a estrutura do curso esta apoiada na
experimentação e busca da compreensão do objeto estudado – a casa moderna.
Planta Baixa, Elevação e Corte da residência redesenhada pela equipe
O diagrama de Setorização / Espacialização foi elaborado pela equipe utilizando
apenas as três hierarquias propostas pelos professores do curso: social, intimo e
serviço. Porém fica claro a forma com que Artigas pensava este tema na concepção
desta casa, onde um bloco voltado para a lateral do lote abriga as funções de serviço
da casa – como cozinha, área de serviço e despensa, enquanto que as demais
funções são distribuídas ao longo da casa, desde a parte frontal até os fundos. Já o
pavimento superior é identificado pela equipe como as áreas íntimas da casa.
Diagrama de Setorização/Espacialidade – Plantas baixas da residência
Por outro lado, a elaboração do diagrama de Fluxos e Fixos foi estudada pela equipe e
detalhado de forma muito interessante, onde cada tipo de fluxo, caminho e circulação
foram “desfragmentados” a partir do primeiro diagrama. Assim o resultado alcançado
neste exercício levou a construção de duas imagens: o pavimento térreo possui uma
circulação diversificada e diluída em diversos caminhos, enquanto que o pavimento
superior, por conta da circulação vertical existente, possui seus fluxos concentrados e
conflitantes entre eles, ocupando grande parcela da área destinada a circulação entre
os dormitórios.
166
Diagrama de Fluxos e Fixos – Plantas baixas da residência
A elaboração do diagrama da Técnica Construtiva foi constituído essencialmente
através da leitura do corte transversal da casa, ficando claro o partido estrutural
adotado por Artigas para esta casa, além da pesquisa sobre o principal material
utilizado pelo arquiteto – o concreto armado.
Diagrama da Técnica Construtiva – Corte transversal
A construção da maquete volumétrica da casa foi neste semestre uma etapa do curso
onde os alunos, na sua maioria, conseguiram chegar a um bom resultado, apesar do
prejuízo na construção dos diagramas propostos onde muitos não executaram todos
os exercícios, inclusive o da casa utilizada como objeto de estudo nesta pesquisa
370
,
os resultados alcançados com as maquetes volumétricas foram muito satisfatório, ao
nosso entender, pois a visita técnica efetuada no inicio do curso contribuiu para uma
maior compreensão da casa estudada.
370
. Neste caso o diagrama Luz e Sombra não foi elaborado pela equipe.
167
Maquete volumétrica da residência Olga Baeta.
Assim, podemos observar abaixo as demais maquetes volumétricas das casas
estudadas do arquiteto Vilanova Artigas, onde os resultados alcançados foram muito
satisfatórios.
Maquetes volumétricas da 1ª e 2ª residência do arquiteto, residência Benedito Levi, residência Czapski e
segunda residência Taques Bittencourt, consecutivamente.
Ainda neste semestre observamos que o curso poderia ir além dos estudos e análises
das casas estudadas durante o curso, apesar dos bons resultados alcançados nestes
três semestres, onde poderíamos chamar de um “laboratório pedagógico”,
entendemos que deveríamos avançar sobre o estudo da casa moderna. Assim, neste
semestre, o curso foi concluído com um novo exercício que implementamos: a equipe
deveria projetar uma casa em terreno dado pelos professores, onde se deveria
implantar uma casa-ateliê com programa pré-estabelecido para habitantes também
escolhido pelos professores.
Quanto aos moradores propomos o estudo de artistas plásticos e pintores brasileiros
que contribuíram para a história da arte modernista nacional. Apontamos como forma
de estudo, através do suposto “cliente”, artistas como Anita Malfati, Di Cavalcanti,
entre outros que pudessem funcionar como elemento real para projetar a casa-ateliê.
168
Na sua maioria, as casas propostas tiveram influência dos objetos estudados durante
o semestre, outras refletiam os “costumes e cultura” do suposto “cliente”, onde a
equipe estudou a biografia do artista tendo maior contato com os conceitos e técnicas
utilizados nas obras do artista.
Maquetes volumétricas das casas-ateliê proposto pelas equipes
Independente do resultado alcançado com os projetos deste exercício proposto como
elemento complementar ao curso, que completava neste 2º semestre de 2002 o
terceiro curso lecionado por mim e outros professores que passaram pelos semestres,
foram importantes para concluirmos que este último exercício funcionaria como um
instrumento de medição para a compreensão dos exercícios e diagramas construídos
anteriormente. Outro fator é quanto a construção de um repertório arquitetônico que
consolide não somente duranteo semestre, mas que contribua para sua formação
durante os demais anos do curso.
No entanto observamos que as casas estudadas durante o semestre e as aulas
teóricas e discussões em sala de aula influenciaram na concepção dos partidos
arquitetônicos, na forma plástica, na setorização e criação dos espaços e até mesmo
nas decisões da técnica construtiva adotada para a concepção dos projetos.
Isto nos faz valer de que a metodologia adotada para a construção do curso,
trabalhado durante três semestres e, experimentando e ensaiando as possibilidades e
flexibilidades de que o curso poderia suportar durante a sua “concepção”, entendendo
que o fio condutor do curso não poderia alterar-se, pois o tema – a casa, com um olhar
mais especifico para a casa modernista deveria se manter como o principal elemento
de estudos do curso.
Em 2003, a convite dos alunos, fui orientar os trabalhos finais de graduação e logo
depois assumir, junto com o professor Dr. Paulo José Almeida Amaral a disciplina de
Projeto de Urbanismo, onde minha vida docente, como monitor, iniciou em 1998.
169
É importante registrar, afinal faz parte da discussão desta pesquisa, que a construção
de um curso, independente da disciplina ou semestre a ser lecionado, deve partir do
pressuposto de que a estrutura deve ser flexível o possível para aceitar alterações e
ajustes que venham a contribuir para o aperfeiçoamento do ensino. Neste sentido, a
metodologia pedagógica pode ser considerada um dos principais elementos de
medição e controle dos resultados do curso proposto. Por outro lado, estes “ensaios”
não podem refletir na qualidade do ensino onde o aluno, neste caso, se torna um
“laboratório” das experiências pedagógicas aplicadas pelo corpo docente.
170
5 Considerações Finais
171
5.1 - Conclusão final da pesquisa
Ensinar significa também permanecer no processo de aprendizagem, na investigação
dos modos de enfrentar os problemas da profissão. “Assim ao formar uma proposta de
curso da disciplina, a tendência é fomentar questões e ampará-las com uma
metodologia que permita que o desdobramento avalie e analise a forma, o modo de
fazer”.
371
Assim entende-se que em relação a uma metodologia pedagógica é sempre possível
repensar, questionar e propor, com a preocupação, no entanto, de não incorrer da
abstração idealista ou da adoção de modelos ideais.
A pluralidade de soluções e resultados em que o método pode chegar são diversas,
ciente que a forma com que é conduzida a parte teórica e prática da disciplina,
supondo, então, que o tema proposto constitui apenas um caso a ser estudado com
possíveis reinterpretações – alterar, substituir, revelar, questionar e até mesmo propor
– onde o trabalho de investigação, antes que um projeto finalista, deve ter como meta,
apontar hipóteses, caracterizar e interpretar as percepções e resultados do aluno de
arquitetura sobre o tema.
Esta pesquisa que tem como objetivo o estudo do ensino institucional de arquitetura,
concentrado sobre dois panoramas: o primeiro busca compreender através do estudo
do ensino de arquitetura, não numa ordem cronológica, mas apontando determinadas
escolas, e seus conceitos, que contribuíram para um novo método pedagógico, no
qual conhecemos hoje. Por outro lado esta pesquisa permeou, de forma muito
simplificada, questionar a arquitetura moderna brasileira e suas influências no ensino
de arquitetura, em especial para a disciplina de projeto de arquitetura.
“Partindo do pressuposto de que a prática de projeto, unida ao conhecimento teórico,
são complementarias e desejáveis na formação do profissional, como Bonsiepe
recomenda: Convendrá recordar que una práctica sin transfondo teórico degenera
rápidamente em un placentero conformismo y ágil oportunismo, mientras una teoría
sin raices em la práctica concreta no va más allá del mero ejercicio verbalista.
372
No entanto, esta complementação entre a teoria e a prática se mostra necessária
considerando que o fio condutor deve partir da metodologia pedagógica adotada para
transmitir não somente os conhecimentos teóricos, a necessidade da pesquisa e
construção do repertório mínimo, mas também quanto ao modo com que é conduzido
o conceito e concepção de projeto de arquitetura a partir da teoria e pesquisa adotado
a cada curso e disciplina.
Concordamos que a discussão sobre o ensino de arquitetura não é nova e se
manifesta sob diversos aspectos, onde encontramos uma grande diversidade de
manifestos, discussões e publicações que colocam suas opiniões ou experiências para
serem discutidas.
Estudar estas experiências foram fundamentais para compreender e construir um
arcabouço de elementos capaz de contribuir para o desenvolvimento desta pesquisa,
371
. REBELLO, Yopanan e BOGÉA, Marta. Estrutura: por uma experiência de ensino. Revista Projeto
Design, nº 260, out. 2001, p. 24.
372
. BONSIEPE, Gui. Em GARCIA, Herman Carlos W.S. VKhUTEMAS/VKhUTEIN, BAUHAUS,
HOCHSCHULE FÜR GESTALTUNG ULM: Experiências didáticas comparadas. FAU-USP, 2001, p.
123 (dissertação de mestrado).
172
visto que em sua grande maioria, a bibliografia estudada consolidava os conceitos e
pedagogia utilizada nos cursos lecionados por mim durante os três semestres na
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo.
Outro fator importante foi quanto às descobertas surgidas, durante a elaboração desta
pesquisa, da relevante influência das casas modernas, em particular as brasileiras, no
qual esta pesquisa mais se deteve, no ensino de projeto de arquitetura, considerando
inclusive suas influências sociais, econômicas e estrutural da família brasileira, onde a
arquitetura moderna cumpriu importante papel nesta transformação.
“Entender as escolas dos anos vinte implica em reconhecer um entorno cultural dos
mais dinâmicos do Século XX, no qual se inclui o expressionismo, cubismo,
suprematismo, futurismo, construtivismo, De Stijl e Deutscher Werkbund que,
juntamente com o surgimento do Movimento Moderno, farão parte do contexto cultural
que vem a influir na configuração dos VKhUTEMAS e da Bauhaus”.
373
Neste sentido, o conjunto de escolas estudadas, principalmente as russas e alemãs,
acreditamos que cumpriram a função de consolidar nossos questionamentos da
influência destas escolas para o ensino da arquitetura que a maioria das instituições
utilizam até hoje.
Como aprimoramento de nossas “angustias” na busca de compreender o caminho
trilhado pela história do ensino de arquitetura, entendemos que não bastaria a
pesquisa deter-se somente às experiências internacionais, mas deveríamos, mesmo
que de forma sucinta, apontar as principais escolas que foram influenciadas pelas
acima citadas.
Provavelmente isto não seja produto exclusivo desta pesquisa, nem tão tema central
deste trabalho, que se deteve em resultados alcançados a partir de uma experiência
concreta. No entanto, sua inserção no corpo deste trabalho consolida a construção de
um pensamento lógico sobre o tema central – o ensino e seus resultados alcançados –
cientes da real dimensão do tema levantado e sua problemática, no qual poderia
resultar em outra dissertação de mestrado.
Estes estudos demonstraram que as experiências francesa, americana e da Grã-
Bretanha, tiveram sua relevante contribuição para o ensino brasileiro, cada qual com
sua parcela e métodos utilizados, o Estado francês que criou um novo método de
reprodução de uma escola cuja finalidade se resumia em treinar arquitetos, através da
École des Beaux-Arts, no qual foi inserido no Brasil pelo grupo organizado pelo
arquiteto Auguste Henri Victor Grandjean de Montigny, e que sem dúvida, foi abstraído
inicialmente pelas Academias de Belas Artes.
Posteriormente, mesmo com as reformas curriculares e pedagógicas, permaneceu
como herança o conceito de aprendizagem através de treinamento, abstraído também
pelos estágios supervisionados. Os conceitos grã-bretanios possuíam um conceito
muito próximo aos franceses, visto que a idéia de unir a teoria à prática através dos
estágios, são colocados como mecanismos de aprendizagem e ensino de arquitetura.
No entanto, sob uma outra ótica onde a idéia da pupilagem, adotada até o final do
século XIX, criando um certo “constrangimento” aos que não conquistavam uma
concorrida vaga nos importantes escritórios de arquitetura, percebendo que até o final
373
. GARCIA, Herman Carlos W.S. VKhUTEMAS/VKhUTEIN, BAUHAUS, HOCHSCHULE FÜR
GESTALTUNG ULM: Experiências didáticas comparadas. FAU-USP, 2001, p. 124 (dissertação de
mestrado).
173
do século XIX, a maioria dos aprendizes ingleses eram oriundos de classes mais
elevados.
Isto se reflete nos dias de hoje onde a pupilagem foi substituída pela prática da
“indicação” dos estudantes de arquitetura para os estágios nos escritórios mais
significativos da produção arquitetônica do país. Já o modelo de ensino americano,
inicialmente ligado à criação de uma diversidade de associações, que ainda possuíam
pouca influência sobre o ensino do país, mas que contribuiu para o controle e
padronização do ensino da profissão, assim como a idéia de que a pesquisa deveria
nortear o ensino foram muito presentes na história das escolas profissionalizantes,
apesar de não obter grandes transformações no ensino de arquitetura dos Estados
Unidos, inclusive não influenciando as escolas latinas americanas e em especial as
brasileiras.
Por outro lado, pode-se dizer que as escolas russas e alemãs tiveram muito a
contribuir para o ensino de diversas escolas, influenciando principalmente as da
América após a Segunda Guerra Mundial, ora pela importação dos conceitos adotados
por estas escolas, ora pela grande diversidade de intelectuais, estudiosos e
profissionais que imigraram para os países da América do Norte e Latina.
Observamos que na sua maioria, estas escolas eram direcionadas essencialmente ao
estudo das artes aplicadas, onde a pintura, escultura e arquitetura caminhavam
paralelamente como temas unificados dentro da estrutura das escolas. Apesar da
curta duração das escolas como os Estudos Livres do Estado, representados
principalmente pelos VKhUTEMAS e VKhUTEIN, que duraram pouco mais de treze
anos, de 1917 com a Escola Stroganov em Moscou, passando pelos Estudos Livres
de Artes do Estado até a última reorganização da estrutura dos VKhUTEIN em 1930,
propiciaram uma educação geral artística e pratica, científica, teórica, social e política,
em suas diversas Faculdades criadas na escola.
Já a Faculdade de Arquitetura que inicia suas atividades em 1920, tem como objetivo
a criação do “arquiteto-artista” com competências para o desenho da edificação,
planejamento, além do conhecimento de tecnologia e construção, onde os grupos de
estudos criados nesta faculdade fizeram surgir dois importantes grupos para a
construção de uma nova arquitetura russa.
Citamos os Racionalistas onde podemos apontar Lavinsky e os Construtivistas com
Alexander Vesnin. No entanto é com a Bauhaus que a maioria das escolas no mundo
vão se espelhar e identificar para a construção de seus currículos e métodos
pedagógicos, do qual me arrisco a dizer de um “novo conceito sobre o ensino de
arquitetura”, que influenciou e ainda vem influenciando um grande número de escolas
de arquitetura.
Acreditamos que este fator se deu pela grande divulgação dos trabalhos e resultados
em que a escola alcançou. Considerando que a proposta de ensino consistia na
experiência dos atelieres deveriam se prolongar até as fábricas e, conseqüentemente,
ao cotidiano da vida do homem moderno havia uma forte tendência dos países da
Europa e América abstraírem esta nova “evolução industrial” no campo do desenho
industrial.
Outro fator importante foi quanto às personalidades que dirigiam a escola – Walter
Gropius, Hannes Mayer e Mies van der Rohe foram também importantes responsáveis
pela divulgação da escola durante o século XX, onde sem dúvidas Gropius foi o nome
que mais se relaciona, até os dias atuais, com a Bauhaus.
174
Fica claro a contribuição do ensino da Bauhaus para as escolas no Brasil,
principalmente as cariocas e paulistas, responsáveis por um longo tempo pela maioria
da formação dos profissionais para todo o país, podendo concluir que a FAUUSP foi a
principal influenciada, principalmente com a reforma curricular proposta por Vilanova
Artigas para a consolidação de seu projeto arquitetônico para a FAU.
No entanto, seria injusto deixar de mencionar que uma grande diversidade de
Faculdades em todo o país que surgiram na década de 1970 não se serviram dos
conceitos da Bauhaus para a formulação de seus currículos e métodos pedagógicos
em busca do novo conceito de ensino de arquitetura.
No entanto, a pesquisa sobre o ensino de arquitetura no Brasil nos mostrou uma
diversidade e ecletismo na concepção dos cursos nos diversos Estados do país.
Fica claro que esta pesquisa, até por conta do recorte escolhido para a conclusão
deste trabalho, deteve-se sobre as escolas cariocas e paulistas, mas vale mencionar
que o processo de criação, transformação e autorização da abertura das Escolas e
Faculdades de Arquitetura estiveram presentes em quase todos os Estados com
grande representatividade e influência na arquitetura moderna destes.
Não somente pelo fato da criação destas escolas, mas resultante de um processo de
migração de um grande número de profissionais, formados no Rio de Janeiro e São
Paulo, que levaram suas idéias e projetos para todo território brasileiro.
Entendendo inicialmente que a contribuição da ENBA – Escola Nacional de Belas
Artes no Rio de Janeiro, com a passagem de Lucio Costa, apesar de curta, deveria
fazer parte desta pesquisa, assim como algumas escolas paulistas apontadas como a
FAU Mackenzie e USP, que iniciaram sua história como escolas técnicas, no campo
da engenharia, e se transformaram em cursos relacionados diretamente ao estudo da
arquitetura e urbanismo.
No caso das duas últimas escolas citadas, FAM e USP, foram importantes instituições
que consolidaram uma grande diversidade de profissionais para a construção de um
novo país que apontava em meados do século XX como uma importante potência
econômica e promissor território para as experiências da nova arquitetura moderna.
Isto fez com que as novas escolas e faculdades surgissem sob esta nova ótica –
formar profissionais capazes de pensar e produzir a arquitetura moderna brasileira, até
por conta do corpo docente formados com os conceitos do modernismo.
Somado a discussão do ensino de arquitetura, a pesquisa deu-se também no
descobrimento de um objeto de estudo como elemento norteador e metodológico para
o ensino de arquitetura aos alunos iniciantes do curso. Isto faz com que o tema – casa
seja elevado a um objeto linear onde todos os alunos, em teoria, poderiam participar,
discutir e contribuir para a evolução do curso.
Os capítulos do qual o trabalho se deteve ao objeto proposto, colocando a casa como
um processo de transformação espacial e conceitual na forma de habitar, onde a casa
moderna torna-se um tema presente no discurso que permite novas tecnologias e
teorias defendidas por seu autor, além de exercerem um importante papel na difusão
dos ideais político-sociais de todos seus “seguidores”.
A participação destes objetos arquitetônicos como elementos de estudo, fez da
pesquisa, neste momento, num caminho trilhado em busca de descobertas, análises e
discussões na seleção dos objetos mais significativos para a experimentação no
ensino de arquitetura.
175
É compreensivo relatar que temos um grande número de casas modernas executadas
durante o século XX, umas mais conhecidas e divulgadas através dos simpósios,
exposições, livros e revistas da época, como as casas de Le Corbusier, Frank Lloyd
Wright, Mies van der Rohe, Walter Gropius, entre outros como os brasileiros Oscar
Niemeyer, Vilanova Artigas, Gregori Warchavchick, Oswaldo Bratke, Rino Levi, e
demais arquitetos, que cada qual com sua particularidade, souberam traduzir em
forma e espaço a arquitetura moderna e a nova sociedade que surgira no Brasil,
outras nem tanto, mas que possuem a mesma importância quando estudadas e
analisadas sobre os conceitos do modernismo.
Nisto também foi muito importante a análise gráfica de um conjunto de casas
modernistas, pré-selecinadas por nós, como estudo de caso que venham a contribuir
para uma discussão mais aprofundada sobre o tema desta dissertação de mestrado.
Assim, apontamos casas e arquitetos de diversas nacionalidades, inclusive brasileiros
para estas análises, onde estes exemplares poderiam constituir num conjunto de
imagens que auxiliassem nos capítulos seguintes deste trabalho.
Fica claro que determinados objetos – a casa moderna – não pode deixar de ser
mencionada como exemplar para a análise de sua concepção, ou até mesmo como
objeto de referência que por si próprio já possui sua contribuição na história da
arquitetura mundial.
Visto isto, a Vila Savoye, projetada em 1929 por Le Corbusier, em Poissy na França
pode ser considerada um destes ícones da arquitetura que contribuiu para a história
da arquitetura moderna no século XX, no entanto outros objetos possuem a mesma
potencialidade que esta já mencionada, como a casa do arquiteto Walter Gropius, de
1937 em Lincoln – Massachusetts, ou a casa Tugendhat, projetada em 1929 pelo
arquiteto Mies van der Rohe e tantas outras que com a pesquisa podemos selecionar
como importantes para a contribuição deste trabalho.
No entanto, o Brasil também produziu importantes casas que contribuíram para a
história da arquitetura moderna, entre elas onde apontamos a Casa das Canoas do
arquiteto Oscar Niemeyer, as diversas casas, ou residências assim chamadas por
Oswaldo Bratke, que durante sua vida profissional produziu um número considerável
de casas dignas de análise, até porque Bratke foi um grande pesquisador utilizando
suas obras como um “laboratório experimental”.
Esta pesquisa também possibilitou apontar outros arquitetos brasileiros que muito
contribuíram para a evolução da arquitetura moderna brasileira, como as casas de
Vilanova Artigas, podendo citar suas duas casas construídas em São Paulo, Paulo
Mendes da Rocha que coloca em discussão através de suas casas o “repensar a
moradia urbana” ou Rino Levi que traduz em suas casas a arquitetura tropical,
sabendo traduzir o modernismo para nosso país.
Neste sentido, a junção entre a pesquisa sobre as escolas de arquitetura, a
importância do movimento moderno e a produção e transformação do tema da casa
durante o século XX, nos auxiliou nas descobertas sobre o tema colocado como fio
condutor deste trabalho – a utilização de objetos de arquitetura, existentes e palpáveis,
como elementos de ensino de projeto de arquitetura.
A aula de projeto é, por natureza, uma análise crítica do trabalho do estudante ou,
uma aula de orientação. É a partir deste ponto que entende-se que o estudante de
176
arquitetura, principalmente nos primeiros semestres (ou ano), ainda não está
preparado para receber esta crítica direta sobre sua “produção”
374
.
Neste aspecto, é mais coerente trabalhar sob outra ótica, onde a pesquisa e
descobertas ganham maior peso sobre a produção dos alunos e a produção do
conhecimento deve receber maior atenção no sentido de construir um arcabouço de
informações chamado repertório arquitetônico. Por este lado, concordamos com a
visão da professora Maria Lúcia Malard “de que qualquer projeto de arquitetura implica
necessariamente num processo de pesquisa, independentemente de sua
complexidade conceitual, funcional, tecnológica ou plástica”.
375
No entanto, o ensino de projeto geralmente é centrado na solução de problemas:
formula-se um problema arquitetônico e incumbe-se o estudante de encontrar uma
solução. Mais uma vez, fica claro que o estudante iniciante no curso deve ir além de
solucionar problemas formulados pelo corpo docente, deve-se sim criar condições do
estudante criar estimulando a imaginação e libertando-o das “amarras culturais” que
venham a dificultar a elaboração de suas propostas.
“Paulo Freire nos diz que os alunos não aprendem porque não têm estímulo: para
cada pergunta feita pelo professor, este já tem resposta, pois só faz perguntas sobre
aquilo que já sabe. O aluno tem conhecimento disso; portanto, não precisa pensar
(criar respostas a um estímulo). Repete o que já lhe foi dito, que é a resposta. É um
jogo de cartas marcadas para ambos, e, como um jogo de cartas marcadas, não é
interessante”.
376
Isto também nos leva a crer que o conceito de estímulo à pesquisa e ao conhecimento
é importante para a formação do estudante de arquitetura, no entanto, o curso deve
propiciar que o estudante possa também questionar a obra estudada e, dela, chegar a
conclusões sobre os objetos.
Por não constituir uma ciência exata, o projeto de arquitetura dispõe como forma de
verificação de suas hipóteses dos estudos dos objetos elencados. As casas modernas
– que além de colocar a prova suas proposições, possibilitam a “apropriação” de
determinados resultados positivos ou não, conforme a receptividade ao programa
proposto aos alunos.
Desta maneira, para a análise das interpretações dos estudantes de arquitetura, estão
previstos a desfragmentação do objeto de estudo, com o intuito de inter-relacioná-los
uns aos outros num só objetivo – chegar ao partido arquitetônico da casa em estudo.
Nesta análise são considerados conceitos relativos a espacialidade, sensações e
técnica construtiva.
Tem-se a intenção, com esta metodologia pedagógica apontada, de estimular o aluno
a leitura e estudo dos objetos estudados, chegando a certas conclusões sobre o
objeto, positivos ou não, mas que possibilite o aluno de compreender e selecionar os
elementos que o auxiliem na construção de seu próprio projeto, não como um ato de
“cópia” do objeto estudado, mas como estímulo a construção de um repertório
374
. Neste momento entenda-se a produção do estudante de arquitetura os trabalhos e exercícios
produzidos durante o curso.
375
. MALARD, Maria Lúcia (org). Cinco textos sobre arquitetura. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2005,
p. 90.
376
. MEIRA, Maria Elisa. A educação do arquiteto e urbanista – reflexões da profª Maria Elisa Meira.
Piracicaba: Editora UNIMEP, 2001, p. 17.
177
arquitetônico capaz de auxiliá-lo no desenvolvimento de seus conceitos, propostas e
decisões sobre o projeto arquitetônico.
A experiência de trabalhar sobre o tema da casa, particularmente a casa modernista, e
seus arquitetos, propiciam retomar a discussão sobre um tema aparentemente simples
que sofreu diversas transformações com o passar dos anos e alteração no cotidiano e
cultura na vida do homem.
Ao se tratar da casa modernista, a contribuição que os arquitetos tiveram na formação
e transformação do viver urbano, casas que se tornaram paradigmas, que carregam a
radicalidade de suas idéias e a grandeza de seu talento, transformam-se em
importantes elementos de discussão e ensino para a primeira formação do estudante
de arquitetura com um repertório construído a partir de uma experiência pré-concebida
por todos.
Por outro lado a utilização destas casas como “modelos” de uma metodologia de
ensino ganha grande valor didático nas discussões sobre o tema, visto que a beleza
plástica de seus volumes e os magníficos espaços internos resultante da nova forma
de morar através da vida comunitária e decorrente da utilização do espaço único e os
novos valores humanos em que a casa torna-se a verdadeira expressão de um novo
modo de vida, não deixando de respeitar seus desejos e padrões de comportamento,
ajudando-o a viver e a criar sua cultura,
377
porém, não bastando apenas ficar no
campo das discussões teóricas e apenas visuais.
Visto que estas questões contribuem para o desenvolvimento do “pensar arquitetura”,
a organização dos dados através da experiência vivenciada faz com que a teoria
passe a ser menos distante de uma realidade em que o aluno vivenciará o objeto
estudado mais facilmente, ampliando seu domínio e especulação sobre a “casa
exercício”. E como a teoria refere-se necessariamente ao conhecimento da
experiência, a vivência da visita a casa estudada se associa a práxis, mesmo que
indiretamente, no que resulta em uma investigação mais concreta e coesa em relação
a realidade.
Esta questão, em particular, foi observada a partir da primeira experiência com os
alunos do 2° semestre de 2001 onde trabalhamos com as casas do arquiteto mexicano
Luis Barragán, apesar dos resultados alcançados satisfatórios ao objetivo do curso e
nosso também, entendemos que a leitura das casas ainda ficavam sob o campo
abstrato, já que todos os materiais de pesquisa eram feitos através de livros e revistas
sobre o arquiteto, perdendo-se uma valiosa percepção – “sentir arquitetura”.
Inclusive prejudicando a percepção volumétrica da casa estudada ou a descoberta de
pequenos detalhes que as publicações, por muitas vezes, não exploram por interessar
demonstrar apenas o conceito geral da obra. Isto faz com que a construção do modelo
volumétrico seja prejudicada em seu entendimento à forma e aos “sentidos” em que o
autor busca passar para a obra.
Os outros dois semestres de 2002, já estavam na programação a visita ao conjunto de
casas em que iríamos trabalhar naquele semestre decorrente. Os estudos sobre a
produção do arquiteto Oswaldo Bratke contou com a colaboração do arquiteto
Guilherme Mazza, que gentilmente nos acompanhou num pequeno “tour” pelas obras
do arquiteto, descrevendo cada casa estudada e por muitas vezes, com o olhar do
autor em forma de depoimento.
377
. DIAS, Márcia Lúcia Rebello Pinto. Desenvolvimento urbano e habitação em SP. São Paulo, p. 10.
178
Já as obras de Vilanova Artigas, contaram com o bom humor de seu filho e arquiteto
Júlio Artigas, que nos recebeu em sua casa nos levando a uma “deliciosa viagem” a
década de 1950, onde Júlio e Rosa Artigas eram apenas crianças que viveram em
uma das mais importantes casas do Movimento Moderno de São Paulo, podendo com
isto, naquela ocasião, descrever sua experiência e contribuindo para a percepção dos
alunos.
A partir destas visitas monitoradas percebemos que o aluno conseguia compreender
melhor a casa estudada e a construção dos diagramas e o modelo volumétrico fluíam
mais facilmente durante o curso. No entanto este fator não nos dá a garantia da total
compreensão do aluno quanto aos exercícios propostos, visto que outros fatores
externos, como o interesse e curiosidade do aluno em aprender podem influenciar nos
resultados dos exercícios e todo o programa do curso proposto.
A iniciativa de trabalhar sobre um tema aparentemente simples – a casa – vem em
encontro justamente às possibilidades de impulsionar à maiores incentivos para o
aluno compreender, analisar e criticar de forma coesa e segura. Visto que o início do
curso é para o aluno, o momento de euforia em busca de conhecimentos, assim como,
é o momento certo para formar o repertório.
Assim o tema da pesquisa – A contribuição das casas modernas para o ensino de
projeto de arquitetura – revela um potencial no processo pedagógico para o atual
ensino e o papel da disciplina de projeto, como elemento estrutural do curso de
arquitetura, na fase inicial da aprendizagem do futuro arquiteto, com os seguintes
aspectos: um repertório arquitetônico para o seu percurso acadêmico e profissional.
Nisto, a utilização das casas modernas como fio condutor e transformador de novos
conceitos, sejam eles espaciais, formais, estruturais e até mesmo na forma de viver
que tanto influenciaram nas casas contemporâneas, vem em encontro ao significado
de ensinar partindo do pressuposto que “Ensinar significa também permanecer no
processo de aprendizagem, na investigação dos modos de enfrentar os problemas da
profissão”.
Assim, a pluralidade de soluções e resultados em que o método pode chegar são
diversas, cientes que a forma com que é conduzida a parte teórica e pratica da
disciplina e, supondo, que o tema proposto constitui apenas de um caso a ser
estudado com possíveis reinterpretações, onde esta dissertação de mestrado tem
como função apontar hipóteses, caracterizar e interpretar as percepções e resultados
do aluno de arquitetura sobre o tema proposto, entendendo-o como hipóteses e
possibilidades de uma forma didática adotada e aplicada sobre a disciplina aplicada,
onde as propostas e resultados devem investir de forma figurativa, buscando inclusive,
a resolução das rupturas nas formas didáticas adotadas atualmente em várias
faculdades de arquitetura e urbanismo do país.
179
Neste sentido, podemos resumir esta conclusão com as palavras de Louis Kahn sobre
Escola e Ensino...
“La escuela comenzó com um hombre bajo um arbol, um hombre que no sabia
que era un maestro, y que se puso a discutir de lo que habia compreendido
com algunos otros que no sabian que eran estudiantes.
Los estudiantes se pusieron a reflexionar sobre lo que habian pasado entre
ellos y sobre elefecto benéfico de aquel hombre.
Desearon que sus hijos también lo escucharon, y, así se erigieron espacios, y
surgi ola primera escuela.”
In “Louis I. Kahn e Imagen” por
Cristian Norberg-Schulz y J. G. Digerud,
Colaborador.
5.2 – Anexo I – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo de Turim – Itália
5.2.1 - Introdução
Após o evento ocorrido entre os dias 21 a 23 de setembro, tive a oportunidade de
conhecer, na companhia do Professor Dr. Guido Laganà, da disciplina de Projeto de
Urbanismo da Universidade de Turim, as instalações da Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo daquela cidade.
Instalada num antigo Castelo, construído no século XVIII, para abrigar a Família Real
durante visitas à Província de Piemont, no verão; o castelo foi implantado no Parque
as margens do Rio Po, com uma bela paisagem ao fundo das colinas da cidade.
Vista da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da
Universidade de Turim – Itália
Foto: Elvis Vieira/2005
5.2.2 - Depoimento do Prof. Dr. Guido Laganà
Na visita a FAU-Turim tive a oportunidade de trocar algumas experiências didáticas
com o Prof. Dr. Guido Laganà, que a alguns anos leciona na FAU e no Politécnico de
180
Turim, além de coordenar juntamente com a Prof. Dra. Nuccia Maritano Comoglio o
“Centro di ricerca e documentazione in Tecnologia, Architettura e Città di Politécnico di
Torino – Dipartimento Casa Città”, responsável em desenvolver pesquisas em
desenho urbano e habitação em cooperação técnica com diversos países,
principalmente Brasil. Este programa também é responsável em enviar alunos
quintoanistas para desenvolverem pesquisa para seus trabalhos de graduação, além
de funcionar como um período de estágio em outros países.
Quanto à pedagogia e metodologia adotada no curso de arquitetura e urbanismo da
FAU-Turim, percebi grande semelhança entre a utilizada nesta faculdade e as
pesquisadas durante a construção desta pesquisa de mestrado.
Segundo informações do Prof. Laganà, os alunos que ingressam no curso de
arquitetura e urbanismo iniciam sua vida acadêmica com um vasto número de
informações na intenção de introduzi-lo ao “mundo da arquitetura” e formar um
repertório mínimo que o capacite a questionar e discutir os conceitos de espaço,
forma, luz e sombra. A utilização de estudos de caso assemelha-se a metodologia
utilizada nas faculdades brasileiras, entendendo que o contato com alguns “ícones da
arquitetura” contribui para a formação deste repertório.
Entendo que esta metodologia é fruto de experiências a muitos anos utilizadas nas
principais e importantes escolas em diversos países, como VKhUTEMAS-VKhUTEIN,
Bauhaus e FAUUSP, que compreenderam a importância de novas metodologias que
contribuísse para a formação do futuro arquiteto.
Durante as poucas horas em que tive a possibilidade de conversar com este professor
de grande experiência docente e na coordenação de pesquisas, percebi que sua visão
sobre o ensino de arquitetura em muito se assemelha aos brasileiros, a defesa de que
o aluno deve dispor de diversas visões e conceitos sobre a arquitetura e a
possibilidade de experimentar e ensaiar, ao máximo, as formas e técnicas faz com sua
formação tenha uma pluralidade enorme sobre sua profissão.
E o entendimento de que o ensino também se faz com “experiências vividas” e na
pesquisa ao conhecimento e estudo dos principais objetos que fizeram e fazem a
história da arquitetura mundial, assim como seus autores, me levam à defesa de que
este método aplicado na FAUUBC durante os três semestres em que tive a
oportunidade de lecionar foi de grande valia para a investigação do ensino de
arquitetura para os recém chegados ao curso.
181
6 Bibliografia
182
ÁBALOS, Iñaki. La Buena Vida: Visita Guiada a las Casas de la Modernidad.
Barcelona: Editorial Gustavo Gili, 2000.
ACAYABA, Marlene Millan. Residências em São Paulo 1947-1975. São Paulo:
Projeto, 1986.
ALEXANDER, Christopher. La Estructura del Medio Ambiente. Barcelona: Tusquets,
1971.
_____________________ Urbanismo y participación – El caso de la Universidad
de Oregón. Colección punto y linea. Barcelona. Editorial Gustavo Gili, 1976.
ALLSOPP, Bruce. The Study of Architectural History.New York: Praeger, 1970.
ARANTES, Pedro Fiori. Arquitetura Nova: Sérgio Ferro, Flávio Império e Rodrigo
Lefèvre, de Artigas aos multirões. São Paulo. Editora 34, 2000.
ARGAN, Giulio Carlo. El Concepto del Espacio arquitectónico desde el Barroco a
Nuestros Dias. Buenos Aires, 1966.
ARTIGAS, João Batista Vilanova. Vilanova Artigas: arquitetos brasileiros. São
Paulo: Instituto Lina Bo e P. M. Bardi / Fundação Vilanova Artigas, 1997.
ARTIGAS, Rosa (org.). Paulo Mendes da Rocha. São Paulo: Cosac & Naify Edições,
s/d.
ARTIGAS, Vilanova. Caminhos da arquitetura. São Paulo. Cosac & Naify edições,
1999.
ARMESTO, Antonio, PADRÓ, Quim. Casas atlânticas. Barcelona: Editorial Gustavo
Gili, 1996.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ESCOLAS DE ARQUITETURA. Sobre a história do
ensino de arquitetura no Brasil /Associação Brasileira de Escolas de Arquitetura. São
Paulo: A Associação, 1978.
AZEVEDO, Ricardo Marques de, MARTINHO, Araken. Um território para o ensino
da arquitetura. in Revista Oculum Ensaios, dezembro 2005, p. 08-15.
BARDI, Lina Bo. Contribuição propedêutica ao ensino da teoria da arquitetura.
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