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UFRRJ
INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM
DESENVOLVIMENTO, AGRICULTURA E
SOCIEDADE
TESE
“Se Faltar a Gente Inventa”
Estudo Sobre Crescimento e Mudanças
Organizacionais a Partir do Caso da
APAEB/Valente
Eduardo Jordão de Araújo
2008
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2
UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO RIO DE JANEIRO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO,
AGRICULTURA E SOCIEDADE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO DE CIÊNCIAS SOCIAIS EM
DESENVOLVIMENTO, AGRICULTURA E SOCIEDADE
“SE FALTAR A GENTE INVENTA”
ESTUDO SOBRE CRESCIMENTO E MUDANÇAS
ORGANIZACIONAIS A PARTIR DO CASO APAEB/VALENTE
EDUARDO JORDÃO DE ARAÚJO
Sob a Orientação da Professora
Ana Célia Castro
Tese submetida como requisito parcial para
obtenção do grau de Doutor em Ciências
Sociais, no Curso de Pós-Graduação de
Ciências Sociais em Desenvolvimento,
Agricultura e Sociedade, Concentração em
Desenvolvimento e Agricultura.
Rio de Janeiro, RJ
Setembro de 2008
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3
UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO RIO DE JANEIRO
INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS
CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS EM
DESENVOLVIMENTO, AGRICULTURA E SOCIEDADE
EDUARDO JORDÃO DE ARAÚJO
Tese submetida como requisito parcial para obtenção do grau de Doutor em Ciências Sociais,
no Curso de Pós-Graduação de Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e
Sociedade, Concentração em Desenvolvimento e Agricultura.
TESE APROVADA EM / /
Ana Célia Castro. Título (Dr.)
Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, CPDA
Universidade Federal do Rio de Janeiro, CCJE
Nome completo (Dr.).
Sigla da Instituição
Nome completo. (Dr).
Sigla da Instituição
Nome completo. (Dr).
Sigla da Instituição
Nome completo. (Dr.).
Sigla da Instituição
4
338.981
A663s
T
ARAÚJO, Eduardo Jordão.
“Se Faltar a Gente Inventa” Estudo sobre
Crescimento e Mudanças Organizacionais a partir do
Caso APAEB/Valente/ Eduardo Jordão Araújo2008.
175 f.
Orientador: Ana Célia Castro.
Tese (doutorado) – Universidade Federal Rural
do Rio de Janeiro, Instituto de Ciências Humanas e
Sociais.
Bibliografia: f. 159-164.
1. Crescimento Organizacional – Brasil – Tese. 2.
Estratégia – Brasil – Teses. 3. Mudança
Organizacional – Brasil – Teses. I. Castro, Ana Célia.
II. Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro.
Instituto de Ciências Humanas e Sociais. III. Título.
5
A Inesita, em reconhecimento
à sua extrema dedicação, solidariedade e amor
em todos os momentos de minha vida.
A todos os que fizeram e fazem a APAEB/Valente,
por provarem que é possível conciliar
desenvolvimento econômico, sustentabilidade
ambiental e desenvolvimento social.
6
AGRADECIMENTOS
Ao longo das várias etapas percorridas na elaboração desta tese, contei com o apoio
inestimável de algumas pessoas e instituições e desejo deixar aqui registrado a todos meu
mais profundo agradecimento. Gostaria de dizer que sou muito particularmente grato:
À Universidade Estácio de Sá, da qual sou professor, pela concessão de uma bolsa de
estudos no período de abril de 2002 a agosto de 2003;
A Dra. Ana Célia Castro, minha orientadora, por acreditar no projeto e me ajudar a
encontrar os caminhos;
A Ismael Ferreira de Oliveira, diretor executivo da APAEB/Valente e amigo de longa
data, pelo apoio incondicional, pelo estímulo e pelo acolhimento fraterno em sua casa, em
muitas visitas a Valente;
A Misael Lopes da Cunha, presidente e toda a diretoria da APAEB/Valente, por terem
me recebido com tanta cortesia, atenção e por terem disposto do seu tempo e me oferecido
seus saberes;
A Izenildo Araújo, pelo acesso sempre prestimoso às indispensáveis informações
estatísticas sobre a cultura do sisal;
A Kátia Lerner, cara amiga, que gentilmente preparou o Abstract da tese;
A Inesita, por sua palavra sempre incentivadora à realização deste trabalho e por suas
sempre pertinentes sugestões ao longo do processo.
7
O Sertão tem tudo que se precisa.
Se faltar a gente inventa.
Lema da APAEB/Valente
8
RESUMO
ARAÚJO, Eduardo Jordão. “Se faltar a gente inventa”. Estudo sobre crescimento e
mudanças organizacionais a partir do caso da APAEB/Valente”. 2008. 175p. Tese
(Doutorado em Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade,
Concentração em Desenvolvimento e Agricultura). Instituto de Ciências Humanas e Sociais,
Departamento de Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade, Universidade Federal Rural do
Rio de Janeiro, RJ, 2008.
O presente trabalho aborda o tema das organizações, do seu crescimento e transformação
interna. Particularmente, enfoca a relação entre formulação de estratégias e mudanças
estruturais. O estudo perseguiu a realização de alguns objetivos, dentre os quais: descrever o
processo de formulação de estratégias na organização; interpretar este processo em sua
relação direta com o ambiente, detectando os principais fatores que interferiram nas escolhas
feitas; identificar e descrever as escolhas estratégicas feitas ao longo da história da
organização; correlacionar a formulação das principais estratégias com o efeito interno sobre
a estrutura organizacional; compreender como os membros da organização implementaram as
mudanças organizacionais. Foi empregado o método do estudo de caso qualitativo, utilizando-
se a histórica experiência da APAEB/Valente - Associação de Desenvolvimento Sustentável e
Solidário da Região Sisaleira, localizada no município de Valente no Estado da Bahia. Os
principais resultados obtidos na pesquisa expressam que a influência dos fatores sociais,
econômicos, institucionais e políticos é um componente essencial na relação organização –
ambiente, no sentido de que aqueles fatores são levados em conta pela organização no
desenvolvimento de suas estratégias. O estudo revelou que as estratégias que a
APAEB/Valente formulou ao longo de sua história se alinharam quase que integralmente com
as estratégias particulares da sua fábrica de tapetes e carpetes, a sua unidade de negócio mais
importante. Por isto, são poucas as diferenças do processo que ocorre no tipo empresa e o
processo vivenciado naquela organização. No entanto, o processo de estratégia, transformação
organizacional e gestão apresentaram algumas nuances próprias do tipo de organização
estudada, tais como dificuldade para a implementação de decisões feitas; ocorrência de
confusão e conflito de papéis entre diferentes níveis hierárquicos no interior da organização e
um processo de centralização das decisões no topo da organização, notadamente nos
momentos de crise. Estas constatações induzem à afirmação da não ocorrência automática do
alinhamento estratégia – estrutura, descrita e demonstrada pelo caso, fato que corrobora as
diferenças de natureza das organizações econômicas não-capitalistas.
Palavras-chave: Crescimento Organizacional, Estratégia, Mudança Organizacional
9
ABSTRACT
ARAÚJO, Eduardo Jordão. "Whatever is missing, we make it up". Study about growth
and organizational change on APAEB/Valente case”. 2008. 175p. Thesis. (Doctor in
Social Sciences in Development, Agriculture and Society) Course of Post-Graduation in
Development, Agriculture and Society, Agriculture Federal University of Rio de Janeiro,
Institute of Sciences Social Human, Rio de Janeiro, RJ, 2008.
The current work approaches the subject of organizational growth and change, particularly the
relationship between the development of strategies and structural changes. The research
aimed to carry out a couple of objectives, such as: describe the process of developing
strategies for an organization; interpretate this process taking into account the environment
and detecting the main factors that affected the choices made; identify and describe the
strategic choices made throughout the history of the organization; correlate the development
of strategies and its effects on the organizational structure; understand how the members of
the organization implemented their organizational changes. The researcher conducted a
qualitative case study, analyzing the APAEB/Valente – Association of sustainable and
solidaire development of the Sisaleira Region, located at Valente city, at Bahia State. The
main results express that the influence of social, economic, institutional and political factors is
an important element of the organization-environment relationship, because those factors are
taken into account by the organization when developing their strategies. The research revealed
that the strategies developed by APAEB/Valente throughout its history were very similar to
the strategies developed by its carpet factory, its main business unit. There are few differences
between the process which takes place at that kind of business and the process that takes place
at that organization. However, the process of strategy development, organizational change and
management revealed some specificities of the kind of organization at stake, such as the
difficulties to implement decisions, occurrence of conflict and misunderstanding about the
roles of different hierarchy levels within the organization and centralization of decisions at the
top of organization, mainly at crisis moments. Those findings lead to the conclusion that there
is no automatic relationship between strategy and structure, described and demonstrated by
the study case, which corroborates the need for a specific approach for the non-capitalistic
economic organizations due their particular nature.
Key-words: Organizational Growth, Strategy, Organizational Change.
10
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico I - Universo das Organizações........................................................................
.
9
Gráfico II - Países Produtores de Fibras de Sisal em 2006 - Participação Percentual..
76
Gráfico III - Produção Brasileira de Fibras de Sisal....................................................... 76
Gráfico IV - Sisal, Volume Exportado - Participação % por Produto, Ano 2007..........
.
77
Gráfico V - Sisal - Participação % por Produto nas Exportações.................................. 78
Gráfico VI - Sisal - Preço Médio de Exportação de Fibras e Manufaturados -
1997 a 2007................................................................................................
.
79
Gráfico VIII - Sisal - Preço Médio de Exportação de Tapetes - 1997 a 2007................... 79
Gráfico VIII - Principais Países Importadores de Fibra de Sisal em 2006........................ 80
Gráfico IX - Estrutura Organizacional da APAEB/Valente...........................................
.
116
Gráfico X
-
Organigraph da APAEB/Valente..............................................................
.
117
11
LISTA DE QUADROS
Quadro I - Weak and Strong Varieties of Institutionalism........................................
.
15
Quadro II
- Produtos Derivados do Sisal....................................................................
.
75
Quadro III - Cronologia das unidades e atividades......................................................
.
92
Quadro IV - Evolução Institucional.............................................................................. 102
Quadro V - Crises, escolhas Estratégicas e Transformação Organizacional..............
.
105
12
LISTA DE ABREVIAÇÕES
ANTEAG
-
Associação Nacional de Trabalhadores em Empresas de Auto Gestão
APAEB/Valente -
Associação de Desenvolvimento Sustentável e Solidário da Região
Sisaleira
APAEB - Associação dos Pequenos Produtores do Estado da Bahia
APL - Arranjos Produtivos Locais
BNB - Banco do Nordeste do Brasil
CCAB - Câmara de Comércio Árabe Brasileira
CACEX - Carteira de Comércio Exterior
CAIS
-
Centro de Aprendizagem e Intercâmbio de Saberes
CEDITER - Comissão Evangélica dos Direitos da Terra
CEF - Caixa Econômica Federal
CEPAL - Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe
CIS - Centro Industrial de Subaé
CODES
-
Conselho de Desenvolvimento Territorial da Região Sisaleira
CONAB - Companhia Nacional de Abastecimento
COSIBRA - Companhia Sisal do Brasil
COOPERAFIS - Cooperativa Regional de Artesãs Fibras do Sertão
COOPERE - Cooperativa de Crédito
COOPERSISAL - Cooperativa Mista de Produtores da Região Sisaleira
DDC
-
Departamento de Desenvolvimento Comunitário
DISOP/BRASIL
- Instituto de Cooperação Belgo-Brasileira
EFA - Escola Família Agrícola
EMBRAPA - Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
FAO - Food and Agriculture Organization
FATRES
-
Fundação de Apoio aos Trabalhadores Rurais da Região Sisaleira
FGV - Fundação Getúlio Vargas
GDN - Global Development Network
IAF - Interamerican Foundation
ICMS
- Imposto de Circulação de Mercadorias e Serviços
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
MOC - Movimento de Organização Comunitária
ONG - Organizações não Governamentais
PIB - Produto Interno Bruto
PPRA - Programa de Prevenção de Riscos Ambientais
13
PRONAF - Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar
REDESIST - Sistema de Informações de Arranjos Produtivos Inovativos Locais
SECEX - Secretaria de Comércio Exterior
SESI - Serviço Social da Indústria
SIF - Serviço de Inspeção Federal
VBR - Visão Baseada em Recursos
14
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO..............................................................................................................
.
1
1. TRANSFORMAÇÕES INTERNAS NAS ORGANIZAÇÕES: O PAPEL
DAS ESTRATÉGIAS................................................................................................. 7
1.1. Organizações e instituições.................................................................................... 7
1.1.1. Da ação coletiva às organizações...............................................................
.
7
1.1.2. A cooperação humana nas organizações.................................................... 10
1.1.3. As instituições: natureza, conceitos e funções...........................................
.
13
1.1.4. A evolução institucional e o desenvolvimento econômico........................
.
16
1.1.5. A coordenação entre organizações na vida econômica..............................
.
20
1.1.5.1. As “formas híbridas” e sua gestão....................................................
.
22
1.1.6. Os novos formatos: as organizações–rede e as redes de organizações.......
.
25
1.1.6.1. A corporação-rede...............................................................................
.
25
1.1.6.2. A rede de organizações........................................................................ 26
1.2. As firmas e o ambiente: a questão da evolução....................................................
.
28
1.3. Estratégia e estrutura............................................................................................. 31
1.3.1. Preliminares................................................................................................
.
31
1.3.2. Abordagens teóricas sobre estratégia..........................................................
.
33
1.3.2.1. As três principais abordagens sobre estratégia..................................
.
33
1.3.2.2. A concepção de Henry Mintzberg: o processo da estratégia..............
.
40
1.3.2.3. Teoria da contingência........................................................................
.
43
1.3.2.4. Alinhamento organizacional................................................................ 47
1.3.2.5. A estratégia da crise............................................................................
.
48
1.4. Estratégias e modelos de gestão............................................................................. 51
2. ESTUDO DE CASO QUALITATIVO COMO ESTRATÉGIA DE
PESQUISA EM ORGANIZAÇÕES........................................................................ 53
2.1. Definição e características da estratégia de pesquisa utilizada.............................
.
54
2.1.1. Tradição nas Ciências Sociais.....................................................................
.
54
2.1.2. Definição......................................................................................................
55
15
2.1.3. Unidade-caso, contexto e ambiente externo e interno................................. 58
2.1.4. Adequação, utilidade e importância............................................................
.
60
2.1.5. Teoria e fontes de dados.............................................................................. 61
2.2. O planejamento e a realização do estudo de caso na APAEB/Valente.................. 62
2.2.1. Primeira etapa da pesquisa de campo.......................................................... 63
2.2.2. Segunda Etapa da Pesquisa de Campo........................................................ 64
3. TRANSFORMAÇÃO ORGANIZACIONAL, INOVAÇÃO E
ADAPTAÇÃO AO MEIO EXTERNO: O CASO DA APAEB/VALENTE.........
.
73
3.1. Dados macros sobre o sisal...................................................................................
.
74
3.2. O Arranjo Produtivo Local do sisal no Estado da Bahia......................................
.
80
3.3. O município de Valente e a área de intervenção da APAEB................................ 83
3.4. A APAEB/Valente e a evolução de suas atividades.............................................
.
86
3.5. A evolução institucional da organização............................................................... 101
3.6. Crescimento, crises e a transformação organizacional.........................................
.
106
3.7. Respondendo ao meio externo: estratégias de adaptação e superação
articuladas com alternativas de organização e gestão........................................... 110
4. ESTRATÉGIA E ESTRUTURA: TEORIA E PRÁTICA
ORGANIZACIONAL................................................................................................ 120
4.1. A re-problematização do tema: as questões propostas e sua pertinência.............. 121
4.1.1. Algumas percepções iniciais do tema em estudo........................................
.
121
4.1.2. A escolha da questão principal a ser respondida pelo estudo...................... 122
4.1.3. A influência dos fatores sociais sobre a organização.................................. 123
4.1.4. A influência dos fatores econômicos sobre a organização.......................... 126
4.1.5. A influência dos fatores institucionais e políticos sobre a organização...... 127
4.1.6. Os fundamentos das respostas da organização na sua interação
com o ambiente...........................................................................................
.
128
4.2. A sustentação das proposições iniciais que explicaram o caso em estudo............. 129
4.3. A discussão do processo de construção de estratégias a partir do caso de
uma organização de agricultores familiares........................................................... 133
4.3.1. Processos de estratégias............................................................................... 133
4.3.2. Crescimento das organizações..................................................................... 135
4.3.3. Crise e Organizações................................................................................... 141
4.4. A discussão das conexões reais entre processo de estratégia, transformação
organizacional e gestão.......................................................................................... 142
16
4.4.1. Estratégia e transformação das estruturas organizacionais.......................... 142
4.4.2. Transformação organizacional e processo de gestão................................... 147
CONCLUSÃO................................................................................................................
.
152
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.........................................................................
.
159
ANEXOS.........................................................................................................................
.
165
Anexo I - Agenda de Oficina 2004 – Grupo Pensante (Estratégia).............................. 166
Anexo II - Agenda da Oficina 2007.............................................................................. 167
Anexo III - Roteiro de Entrevista – 2007 – Diretoria Executiva..................................
.
168
Anexo IV - Roteiro de Oficina 2007 – Grupo que “pensa” a APAEB......................... 169
Anexo V - Roteiro de Entrevistas 2007 – Parceiros.....................................................
.
170
Anexo VI - Encadeamento de evidências e análise de resultados................................
.
171
Anexo VII - Programa da primeira visita á APAEB/Valente....................................... 172
Anexo VIII - Programa da segunda visita á APAEB/Valente......................................
.
173
Anexo IX - Indicadores de monitoramento do projeto IAF.......................................... 174
Anexo X - Estrutura Organizacional da APAEB / Geral.............................................. 175
1
INTRODUÇÃO
Este estudo decorreu inicialmente de um interesse pragmático do autor. Por seu
histórico de trabalhos de consultoria a organizações do terceiro setor, ele nutriu por anos uma
curiosidade em entender os processos organizacionais em suas origens, desenvolvimento e
efeitos. Dois, porém lhes foram mais atraentes: o crescimento das organizações e as mudanças
nelas ocorridas internamente, suas conseqüências no plano administrativo, na teia das relações
sociais e na cultura organizacional.
Aliado ao interesse genérico manifesto no parágrafo anterior, o conhecimento e o
acompanhamento, desde sua origem, da experiência de uma organização singular composta
por agricultores familiares da região sisaleira do Estado da Bahia, atualmente denominada de
APAEB/Valente – Associação de Desenvolvimento Sustentável e Solidário da Região
Sisaleira, apontaram para a construção de um objeto de pesquisa para uma tese de doutorado.
Somado a isto, o estudo do tema ‘organizações’, o tomar conhecimento das várias
correntes de pensamento, de distintas teorias, de diferentes abordagens e enfoques sobre o
tema nos conduziram a querer aliar prática e teoria em um só objeto de estudo que fosse capaz
de atender também ao antigo interesse.
Durante uma pesquisa documental, pudemos nos informar que o caso em referência já
havia sido pesquisado por diversos autores e sob distintas óticas entre as quais aludimos:
SILVA e al. (1993), História do movimento social e da organização; ALMEIDA (2000)
Cidadania ativa; OLIVEIRA (2002) Produção familiar na região semi-árida; SANTOS
(2002), Reorganização espacial e desenvolvimento; NASCIMENTO (2003), Evolução do
capital social; ABRAMOVAY e al. (2003), Mercados do empreendedorismo de pequeno
porte; SILVEIRA e al. (2005), Organização social e crédito para pequenos produtores;
VERDE (2007), Desenvolvimento sustentável; SANTOS (2007), Associativismo e
territorialidade versus Desenvolvimento; CRUZ, Arranjos produtivos locais; BARROS JR.
(1995), Sistematização de experiências associativas; PAULA, A ética do discurso: uma
experiência bem sucedida.
2
No entanto, além da interface desses assuntos com o nosso interesse, não localizamos
nenhum outro estudo que contemplasse as questões do crescimento e das mudanças
organizacionais então ocorridas na APAEB/Valente, nem de per si nem correlacionando-as.
Partimos então para o campo das teorias das organizações e da sociologia das
organizações, esperando encontrar elementos e caminhos para clarificar mais a escolha do
nosso tema e a sua delimitação. Ao nos dedicar ao estudo da abordagem da visão baseada em
recursos (VBR) e a contribuição crítica de HENRY MINTZBERG, tomamos consciência de
que a questão do crescimento das organizações teria que ser atrelada à questão da formulação
das estratégias organizacionais, pois a primeira pode ser visualizada como resultante da
segunda. A questão das mudanças organizacionais, por seu turno, também se correlaciona
com a da formulação de estratégias. Em geral, compreende-se que mudanças ou ajustes nas
estruturas organizacionais são necessários ao pleno desempenho das estratégias pretendidas.
Assim visto, este trabalho parte de indagações tais como: Por que as organizações
crescem e/ou se transformam? Quais os fatores responsáveis pelo surgimento, modificação ou
extinção de unidades na estrutura de uma organização? Por que a APAEB/Valente cresce e se
transforma continuadamente? Que critérios os seus componentes utilizam para conduzir esses
processos organizativos?
Em decorrência de o nosso questionamento seguir nessa direção, os objetivos
principais foram assim definidos:
Descrever o processo de formulação de estratégias na organização;
Interpretar este processo em sua relação direta com o ambiente, detectando os
principais fatores que interferiram nas escolhas feitas;
Identificar e descrever as escolhas estratégicas feitas ao longo da história da
organização;
Correlacionar a formulação das principais estratégias com o efeito interno sobre a
estrutura organizacional;
Compreender como os membros da organização implementaram as mudanças
organizacionais.
Este trabalho justifica-se pelo crescente interesse no estudo das organizações como um
campo de investigação que pode revelar não só como esses “enclaves protetores” - no dizer de
HODGSON - conquistam competitividade, mas como eles constroem processos
organizacionais fundamentados na totalidade das relações sociais que ali são vivenciadas.
3
Especialmente quando se trata de organizações econômicas solidárias, o conhecimento
disponível ainda é reduzido e as abordagens teóricas específicas para essa categoria são
praticamente inexistentes. Acrescente-se que o processo real de ‘construção de estratégias e
transformação de estruturas organizacionais’ em organizações do tipo é pouco estudado,
mormente em organizações de agricultores familiares distintas das cooperativas.
O estudo não se justifica, porém, apenas academicamente. Esperamos que ele venha a
contribuir para ampliar o conhecimento e propiciar suporte à formulação de políticas públicas
mais refinadas e concernentes com o universo de organizações solidárias que atuam na vida
econômica capitalista.
Neste sentido, o caso estudado é extremamente importante para o universo onde ele
está situado. A APAEB/Valente é uma das organizações sociais do país cuja atuação é uma
das mais reconhecidas e premiadas em níveis nacional e internacional.
Dos anos 1998 aos anos 2006, aquela associação recebeu os prêmios das instituições:
a. Fundação Getúlio Vargas (FGV) - 1998 (classificada entre as 10 principais parcerias para
combate à miséria no Brasil); b. Fundação Schwab, com sede na Suíça, elegeu o Diretor
Executivo, Ismael Ferreira, como um dos principais empreendedores sociais do mundo no ano
de 2001; c. SESI concedeu no ano de 2002 o prêmio Educação e Responsabilidade Social,
pelo programa de alfabetização de funcionários executado em parceria com a mesma; d.
Câmara de Comércio Árabe Brasileira (CCAB) concedeu no ano de 2003 o prêmio Cidadania
Brasil de Exportação a exportadores que fazem trabalho social; e. BNB – Banco do Nordeste
do Brasil concedeu à associação o prêmio Empreendimento XXI; f. GDN – Global
Development Network concedeu no ano de 2004 o prêmio Japão para projeto mais inovador
de desenvolvimento. A APAEB/Valente ficou colocada entre as finalistas no mundo; g.
Fundação Kanitz no ano de 1997 e também no ano de 2004 concedeu o prêmio Bem
Eficiente, identificando a associação com uma das melhores instituições do terceiro setor; h.
CEPAL selecionou no ano de 2005 projetos sociais inovadores em toda América Latina e
Caribe. A APAEB/Valente recebeu menção honrosa por se classificar entre as 20 finalistas da
premiação; i. CEF – Caixa Econômica Federal identificou iniciativas locais bem sucedidas de
desenvolvimento tanto do poder público como da sociedade civil. A associação foi uma das
10 vencedoras da 4ª. Edição do prêmio Melhores Práticas em Gestão Local para o período
2005/2006.
O método de pesquisa adotado para o estudo levou em consideração as questões
conceituais referentes ao entendimento da formação da estratégia e da mudança
4
organizacional como processos. Assim, está calcado mais firmemente em teorias de caráter
descritivo, que se propõe a desvendar ‘como’ os processos organizacionais e sociais se
realizam e não naquelas que possuem um forte tom prescritivo. Essas últimas, em geral, são a
favor de uma determinação dedutiva da condução daqueles mesmos processos. Escolhemos a
estratégia de pesquisa ‘estudo de caso qualitativo’, por acreditar que ela, além de manter a
coerência com as premissas teóricas aceitas neste trabalho, favorece a formação de uma
compreensão mais adequada sobre os processos empíricos que a teoria intenta desvendar. Os
detalhes sobre os procedimentos e técnicas adotados durante a pesquisa estão contidos no
segundo capítulo.
Os capítulos do trabalho são em número de quatro. Eles estão organizados de modo a
contemplar inicialmente as questões de natureza teórica e metodológica reunidas no primeiro
e segundo capítulos, respectivamente. O terceiro capítulo descreve o estudo de caso e contém
uma análise empírica. O quarto capítulo analisa e discute o próprio caso sob a luz de enfoques
teóricos distintos, porém articulados e coerentes com o exposto no capítulo de fundamentação
teórica.
Assim, o primeiro capítulo apresenta e discute as questões gerais presentes na
literatura sobre organizações e instituições. No tocante às organizações, enfatiza a relação
dessas com o ambiente e particulariza o aspecto do seu crescimento ou evolução. Este aspecto
é retomado na relação entre estratégia e estrutura. Neste sentido o capítulo apresenta as três
principais abordagens sobre o tema, quais sejam a visão baseada em indústria, a visão baseada
em recursos (VBR) e a visão baseada em instituições. Há também uma descrição de algumas
idéias de HENRY MINTZBERG sobre o mesmo tema.
O segundo capítulo está organizado de dupla maneira. Primeiramente, ele tem a
intenção de mostrar, explicar e justificar o estudo de caso qualitativo como uma estratégia de
pesquisa apropriada para o estudo das organizações. E, secundariamente, informar sobre o
processo de planejamento e realização do estudo de caso na APAEB/Valente. Em virtude do
nosso desejo de apresentar o conjunto do planejamento de modo integral, o capítulo traz a
versão completa do protocolo de pesquisa.
O terceiro capítulo contém a descrição empírica do caso selecionado para dar
concretude ao tratamento do tema do trabalho. Na sua organização reúne informações de
contexto sobre a economia sisaleira, o Arranjo Produtivo Local do Sisal no Estado da Bahia e
o município de Valente. Em seguida, passa a revelar os processos organizacionais
desenvolvidos na APAEB/Valente, conferindo destaque ao seu processo de crescimento e
5
transformação enquanto organização. Trata da relação da organização com o ambiente,
identificando suas estratégias pretendidas principais e a articulação dessas com as alternativas
de organização implantadas por seus membros.
O quarto e último capítulo são de natureza analítica. A análise e discussão dos
resultados da pesquisa são desenvolvidas tendo em vista o propósito de entender os processos
organizacionais que foram conduzidos no interior da APAEB/Valente e a articulação destes
com a teoria. Os processos básicos dizem respeito a como uma organização composta por
agricultores familiares fomentou estratégias para manter-se competitiva em combinação com
a realização de seus objetivos sociais e como esta mesma organização implementou as
mudanças sociais e organizacionais condizentes com os seus propósitos estratégicos.
6
CAPÍTULO I
TRANSFORMAÇÕES INTERNAS NAS ORGANIZAÇÕES:
O PAPEL DAS ESTRATÉGIAS
7
CAPÍTULO I
TRANSFORMAÇÕES INTERNAS NAS ORGANIZAÇÕES:
O PAPEL DAS ESTRATÉGIAS
1.1. Organizações e Instituições
1.1.1. Da ação coletiva às organizações
A ação humana inevitavelmente confronta-se com a proposição de fins para si mesma
e a conseqüente escolha de meios para alcançá-los. Conforme MAX WEBER teorizou, esta
ação, realizada em um quadro de interação social, assume a natureza de ação social e tenderá
a adquirir graus maiores de racionalidade na sociedade moderna. Racionalidades distintas
baseadas em interesses ou em valores sociais informam e legitimam as escolhas que os
indivíduos fazem na vida social e em particular na vida econômica. Nesta última, a ação
social dos indivíduos buscará, de modo individual ou coletivo, realizar suas escolhas no
mercado ou fora dele. As ações coletivas, em geral, vão se consolidar na construção de
organizações formais, que objetivariam suprir aos indivíduos grupalizados o que eles não
conseguiriam obter de modo individual.
WEBER também cunhou dois conceitos, o de “associação” e o de “empresa”:
“O termo ‘associação’ está reservado a uma relação social que é fechada
para estranhos ou restringe sua admissão por regulamentos, e cuja autoridade
é imposta pelas ações de indivíduos especificamente encarregados desta
função, como por exemplo, um dirigente ou chefe, geralmente incluindo um
quadro administrativo”. (1989, p. 93)
“Uma ‘empresa’ é um sistema de atividade contínua perseguindo um fim de
uma espécie definida. Uma ‘associação empresarial’ é uma sociedade
caracterizada por um quadro administrativo cuja atividade se orienta
exclusivamente e continuamente a alcançar os fins da organização”. (Ibid., p.
105)
A ênfase reservada ao quadro administrativo, nas duas definições, é parte da valoração
que aquele autor atribui à burocracia como elemento de mediação política, realização e
8
controle social.
Deixando estes enunciados fundamentais, nos deteremos agora em compreender
organizações na perspectiva da economia. MÉNARD relembra algumas noções antigas que
ressaltam distintos aspectos complementares:
“(...) a organização é um princípio que, por analogia com a biologia,
assegura a unidade de organismos econômicos complexos e resulta-lhes
necessário em razão de seu grau avançado de diferenciação e
complexificação”. (1990, p. 13)
“Em economia, o princípio de organização tem uma expressão precisa: é a
divisão do trabalho, na medida em que esta se articule em funções
especializadas”. (Ibid., p. 13)
Entendido neste nível de abstração, a organização é então aquilo que
caracteriza uma unidade econômica e social”. (Ibid., p. 13)
As idéias de unidade e de princípio integrador de equilíbrio entre funções cada vez
mais complexificadas num processo evolutivo de um organismo, compõem uma visão de
organização para dentro e ainda dissociada de uma compreensão de ambiente e de interação
de mercado.
A partir destas referências – ambiente e mercado –, MÉNARD vai apresentar e
distinguir noções modernas que denomina de integracionista e complementarista. Estas seriam
assim definidas:
. Abordagem integracionista: “... privilegia um ponto de vista global,
segundo o qual, a organização designa a arquitetura de um sistema
econômico no mesmo sentido de arquitetura de um sistema de informática.
A economia de mercado aparece, neste caso, como uma forma
organizacional particular, caracterizada pela descentralização de decisões e a
predominância de um mecanismo específico de coordenação, o mercado”.
(Ibid., p. 14)
. Abordagem complementarista: “... O conceito de organização é, neste
caso, circunscrito, e pensado como forma econômica complementar com
relação aos mercados. Sob esta ótica, a economia de mercado se caracteriza
pela coexistência destes dois diferentes mecanismos de coordenação, a
organização e o mercado”. (Ibid., p. 15)
A abordagem complementarista tem dado margem a uma flexibilização do conceito de
organização na economia heterodoxa, possibilitando a ampliação da cobertura empírica do
conceito a outras formações. Segundo ARROW:
9
“... Há muitas outras organizações entre o governo e a firma. Mas, todas elas,
se partidos políticos ou movimentos revolucionários, universidades ou
igrejas, participam da característica comum da necessidade, para ação
coletiva ou para alocação de recursos, de recorrer a métodos do não
mercado”. (s/d, p. 26)
O gráfico que se segue foi elaborado por HODGSON e nos dá uma noção da
complexidade da natureza do universo das organizações:
GRÁFICO I
Universo das organizações
Fonte: HODGSON, G. Apresentação em aula. UFRJ, 2007.
Os anéis nos revelam quatro grandes tipos de organizações: as firmas capitalistas, as
firmas empregadoras, as firmas e as genericamente denominadas de organizações. As firmas
não capitalistas (empregadoras e simplesmente firmas) têm crescido em sua atuação na
sociedade e obtido relevância no campo do estudo das organizações.
Por seu turno, OLSON reafirma o caráter relacional do conceito de organizações,
argumentando:
Exchange, Markets and Firms
Firms
Capitalist Firms
Non-Organizations
Markets
Exchange
Modern Households
Self-Employed Producers
Worker Cooperatives
Slave Estates
Public Hospitals
Peasant Family Units
Modern Corporations
Nationalized Industries
Most Modern Charities
Medieval Guilds
Most Privately-Owned Modern Firms
With Employees
Primitive Tribes
Modern Joint Ventures
Organizations
Networks
States
Public Corporations
Employment Firms
State Schools
10
“(...) que a maioria das ações (mas de forma alguma todas) praticadas por
um grupo de indivíduos ou em nome dele se dá através de uma
organização”.
E acrescenta:
“(...) um propósito que de fato é característico da maioria das organizações, e
com certeza de praticamente todas as organizações com um importante
aspecto econômico, é a promoção dos interesses de seus membros”. (1999,
p. 17-18)
Sob a perspectiva da sociologia das organizações, o tema em estudo progressivamente
superou seus limites iniciais relativos aos efeitos na vida social (condições de vida e trabalho
do operariado do século XIX) gerados pela indústria e definiu seu rumo na linha da análise
sistêmica. Esta linha empatiza com algumas abordagens teóricas da ciência da administração,
entre as quais a de ELTON MAYO, que ressalta em sua análise o papel fundamental dos
aspectos informais do comportamento humano nas organizações. Uma compreensão
particular e interessante nos é apresentada por DELORENZO NETO:
“Os sistemas modernos de tomar decisões denominam-se organizações. [...]
Compreende toda influência que o aperfeiçoamento das máquinas, a equipe e
os sistemas administrativos exercem sobre os indivíduos. [...] Classicamente,
o ato de organizar é um ato de criação refletida: por meio dele o indivíduo ou
o grupo alcança os seus próprios fins e conserva o seu trabalho. O esforço
coletivo do homem não se perde na inércia. A organização se identifica com
o planejamento”. (1975, p. 336)
1.1.2.
A cooperação humana nas organizações
É através das relações sociais de produção, com caráter cooperativo, entre empresários
e funcionários, que as organizações industriais funcionam e alcançam seu propósito de
realizar a produção estabelecida. A visão teórica clássica de MARX inclui também em sua
análise não só o que se convencionou conceituar de cooperação humana, mas também o
aspecto oposto à cooperação, que é o conflito. O atributo do conflito, portanto, é considerado
por MARX também constituinte das relações sociais de produção. O conflito, enquanto tal
existe em função e é determinado pela existência de interesses distintos no tocante às
condições de produção, como também com respeito à apropriação dos resultados da produção
por aqueles dois grupamentos humanos (empresários e funcionários). Teórica e
11
metodologicamente, MARX discute a formação de interesses divergentes, formulando os
conceitos do binômio ‘forças produtivas relações de produção’ e o de ‘extração de mais-
valia’.
Nesta visão, a formação de interesses divergentes, portanto conflituais, levados ao
limite, prejudicariam a própria realização da produção. Este problema não seria, pois,
resolvido ao nível da indústria, mas sim no plano macro do sistema econômico e político,
através de uma reforma nas regras básicas que estabelecem a cooperação.
Uma visão mais recente aborda a questão dos interesses na organização sob outra ótica
e está mais interessada em provar a relação entre ‘interesse-benefício-ação coletiva’. Esta
visão foi desenvolvida por OLSON, em seu livro “A Lógica da Ação Coletiva” (1999).
Se fizermos um esforço para reduzir a complexidade intrínseca de toda e qualquer
organização a um patamar mínimo inicial de sua formação, poderíamos afirmar com um
mínimo de risco possível que seu propósito fundamental é a promoção dos interesses de seus
membros.
Tal assertiva reúne uma maior dose de certeza quando aplicada diretamente àquelas
organizações originárias de uma motivação econômica comum aos seus membros.
Mais que em épocas anteriores, sob o predomínio de estruturas fundadas e
reproduzidas por organizações ou grupos sociais básicos como a família e o grupo de
parentesco, a sociedade moderna é o locus privilegiado da aglutinação dos indivíduos por
motivações e propósitos secundários, isto é, pela formação e organização manifesta de
interesses de parcelas, segmentos econômicos, classes sociais etc. a serem defendidos no
mercado ou fora dele. OLSON já afirmara antes que:
“As organizações podem, portanto desempenhar uma função importante
quando há interesses comuns ou grupais a serem defendidos e, embora elas
freqüentemente também sirvam a interesses puramente pessoais e
individuais, sua função característica básica é sua faculdade de promover
interesses comuns de grupos de indivíduos”. (Ibid., p. 19)
Observando sob este prisma, não caberia aqui falarmos mais da ocorrência de um
sentimento natural gregário dos indivíduos ou da necessidade sentida e manifesta por
indivíduos de pertencer a um grupo social ou organização, em decorrência da insegurança e
da incerteza resultantes da percepção da fragmentação do todo social, mas sim de realização
de interesses e conquista de vantagens ou benefícios, sejam individuais ou coletivos.
12
As organizações, enquanto tais estariam aptas a atender e a respaldar a essas
expectativas, que em si são explicadas e justificadas como legítimas. É também OLSON que
relembra quanto a isto o que FESTINGER
1
assinalou:
“A atração que exerce a afiliação a um grupo não é tanto pela sensação de
pertencer, mas mais pela possibilidade de conseguir algo através desse
pertencer”. (Ibid., p. 18)
Isto posto, cabe-nos agora indagar: toda e qualquer organização vai poder atender
efetivamente às expectativas de promoção dos interesses e de provimento de benefícios? Ou,
há que se fazer distinção, p.ex., entre o tamanho das organizações ou números de membros?
Há lógicas de funcionamento distintas, uma para a organização pequena e outra para a
organização grande, que poderão facilitar ou criar obstáculos à obtenção dos benefícios
coletivos?
OLSON tece toda uma argumentação no sentido de demonstrar que há uma diferença
de base entre a lógica de funcionamento da organização pequena (grupo social) e a da
organização grande.
No grupo social, o indivíduo estará coeso com o grupo e disposto a trabalhar
coletivamente, despendendo um esforço relativamente similar ao dos outros membros na
promoção dos interesses grupais. Portanto, dar-se-á a conquista do benefício coletivo, quase
num ponto ótimo, quando o montante do benefício auferido for maior que o custo individual e
que o custo grupal para o provimento do benefício. Em contraposição, na organização grande
o benefício auferido nunca cobrirá o custo individual para obtê-lo e muito menos o custo
grupal. Em decorrência, afirma OLSON:
“O indivíduo membro da grande organização típica está em posição análoga
à da empresa em um mercado perfeitamente competitivo, ou à do
contribuinte em um Estado: seus esforços individuais não terão um efeito
sensível sobre a situação de sua organização, e ele poderá desfrutar
quaisquer vantagens obtidas pelos outros, quer tenha ou não colaborado com
o grupo”. (Ibid., p. 28)
A análise de OLSON, na verdade, encobre um debate mais de fundo a respeito da ação
do indivíduo enquanto ator individual ou sob a proteção de uma organização. O debate, enfim,
1
FESTINGER, L.. “Group attraction and membership”. In: Cartwright, D e Zander, A., Group dynamics,
EVANSTON, III. Row, PETERSON, 1953, p. 93.
13
está centrado na possibilidade de estender ao âmbito dos grupos sociais e das organizações a
aplicação da premissa do comportamento racional centrado nos próprios interesses do
indivíduo. Ele discorda dessa possibilidade, afirmando que:
“(...) a menos que o número de indivíduos do grupo seja realmente pequeno,
ou a menos que haja coerção ou algum outro dispositivo especial que faça os
indivíduos agirem em interesse próprio, os indivíduos racionais e centrados
nos próprios interesses não agirão para promover seus interesses comuns
grupais”. (Ibid., p. 14)
Ao defender esta posição, o autor nos põe frente à imperiosa necessidade de criação de
instituições que possam vir a determinar o comportamento econômico não só individual, mas,
sobretudo, a ação grupal nas organizações fundadas nos interesses de seus membros em obter
benefícios.
Esta dualidade de condicionamento – coerção e indução – apresenta-se como um
recurso diante da quase impossibilidade das grandes organizações propiciarem benefícios
compensadores aos indivíduos que as compõem; como vimos anteriormente, quando da
comparação com o grupo social. Inevitavelmente, em organizações de dimensões maiores, a
busca do consenso entre seus membros pela obtenção dos benefícios coletivos subordina-se a
uma coordenação e ao aprimoramento da organização social. Aqui também se trabalha com a
idéia de diferenciação interna entre os membros da organização.
A concessão de incentivos econômicos e incentivos sociais, segundo OLSON, fará
com que os indivíduos se mobilizem para a afirmação dos interesses grupais e possam se
sentir diferenciadamente compensados por benefícios, tais como conquista de status social,
reconhecimento no grupo, liderança, ou outros na mesma linha.
A análise de OLSON aponta, portanto, para a conclusão de que as organizações nunca
proverão benefícios líquidos compensadores e que, mesmo assim, se mantêm e são
consideradas exitosas, devido a outras atividades e compensações que oferecem.
1.1.3. As instituições: natureza, conceitos e funções
Não é de hoje que o conceito de “instituições” é utilizado na análise da vida
econômica dos povos. Cientistas sociais e particularmente os antropólogos, estudaram usos,
costumes, práticas de intercâmbio, tabus, moedas de troca etc., que compõem o espectro
analítico de uma antropologia econômica, enquanto disciplina acadêmica.
14
Destarte, as instituições só vieram atrair a atenção da ciência econômica quando a
noção de mercado como único regulador das trocas mostrou-se insuficiente ou foi contestada
até mesmo entre seguidores da corrente principal.
CORIAT e DOSI definem o termo “instituições” em sentido amplo, onde incluem:
“a) organizações formais (abrangendo desde firmas a sociedades
técnicas, sindicatos, universidades, todo o caminho para Agências de
Estado);
b) padrões de comportamentos que são compartilhados coletivamente
(de rotinas para convenções sociais para códigos de ética);
c) normas de proibição e constrangimentos (de prescrições morais até
leis formais)”. (1995, p. 4)
Progredindo para a discussão sobre o papel que as ‘instituições’ desempenham, os
mesmos autores apontam para duas configurações e afirmam que elas:
“(...) podem ser vistas como: (i) parametrizando (impor parâmetros) o estado
de variáveis ambientais (custos comparativos de mercados, híbridos e
hierarquias em Williamson ou próximo dos interesses evolucionários,
oportunidades tecnológicas e condições de apropriabilidade); e (ii)
restringindo o menu de ações disponíveis ao agente (o que em algumas
versões de jogos-teóricos reduz-se para “as regras do jogo”)”. (Ibid., p. 4)
CORIAT E DOSI (Ibid., p. 5), além de trabalharem conceito e função das
“instituições”, enveredam na discussão sobre algumas dicotomias, as quais ainda não foram
esclarecidas e muito menos resolvidas na teoria.
A primeira diz respeito à origem das instituições. A questão colocada é: as instituições
são anteriores à teoria ou a “racionalidade da auto-busca” (self-seeking) é inicial e
“instituições” é um conceito derivado? Respostas afirmativas para ambas as questões existem
e são defendidas de acordo com a ‘variedade’ da corrente que as defende.
A segunda dicotomia é concernente aos graus de intencionalidade da construção
institucional. A pergunta básica é: são as instituições propositadamente construídas, de acordo
com algum modo de atividade coletiva constitucional ou, contrariamente, elas são
essencialmente o resultado de um não-institucional processo de auto-organização? Um
posicionamento idêntico ao da questão anterior é geralmente assumido.
15
A terceira e última dicotomia coloca em questão a eficiência (efficiency properties).
Elas – as propriedades da eficiência – existem porque “desempenham uma função” e, assim, é
o equilíbrio resultado de algum processo que elege em favor desta função? ou,
contrariamente, são elas essencialmente “mensageiras da historia”, no sentido de que tendem
para dependentemente reproduzir elas mesmas além do tempo de sua utilidade?
Para CORIAT E DOSI (Ibid., p. 6) a explicação para estas dicotomias pode ser
encontrada a partir da comparação entre distintas “visões” institucionalistas e o padrão do
paradigma neoclássico de onde aquelas se originam. Ou seja, a maior ou menor distância do
padrão instituições-livres, com agentes perfeitamente racionais e invariáveis preferências. Os
dois autores usam as expressões: “frágil institucionalismo” e “forte institucionalismo” para
polarizar as diferenças entre os dois conjuntos de caracteres.
Incluímos o quadro abaixo por ser elucidativo daquilo a que estamos nos referindo.
Quadro I
Weak and Strong Varieties of Institutionalism
“Weak” Institutionalism “Strong” Institutionalism
1) Role of institutions
Parameterize system
variables; constrain menu
of strategies
Also “embed” cognitive and
behavioural patterns; shape
identities of actors
2) “Primitives” of the
theory
(Perfectly or boundedly)
rational self-seeking
agents; institutions as
derived entities
Institutions as “primitives”;
forms of “rationality” and
perceptions of self-interest
as derived entities
3) Mechanisms of
institution-formulation
Mainly intentional,
“constitutional”, processes
Institutions as “carriers of
history”; reproduces path-
dependently, often
irrespectively of this
functional efficiency
Fonte: CORIAT e DOSI, 1995.
16
1.1.4. A evolução institucional e o desenvolvimento econômico
O que vamos aqui expor está relacionado com o suposto de que os mercados por si só
não são suficientes para organizar as trocas entre os agentes econômicos individuais. Em
outras palavras, as relações de mercado necessitam largo senso, de instituições para se
concretizarem. Neste sentido, o estudo das instituições, de sua gênese e desenvolvimento está
intimamente associado, ou melhor, é parte do estudo do desenvolvimento econômico.
De acordo com NORTH,
“O foco maior da literatura sobre instituições e custos de transação tem sido
sobre instituições como eficientes soluções para problemas de organização
numa estrutura competitiva (WILLIAMSON, 1975; 1985). Deste modo,
mercado de câmbio, franchising ou integração vertical são concebidas na
literatura como soluções eficientes para o complexo problema que enfrentam
empresários sob várias condições de competição”. (1991, p. 98)
O mesmo autor desenvolveu o que poderemos denominar de recurso a uma
antropologia econômica ou uma arqueologia dos sistemas de trocas, para desenvolver o seu
argumento da gênese da relação entre instituição e desenvolvimento econômico.
No fundo, a idéia é compreender que os sistemas de trocas não são regidos ou
regulados por determinações racionais dos agentes individuais, mas sim por construções
normativas de caráter social, quer dizer, instituições. Ele afirma que em sociedades primitivas
“com pequena escala, comércio local, existe uma ‘densa’ rede social de restrições informais
que facilitam as trocas locais, e os custos de transação neste contexto são baixos”. (Ibid., p.
99)
Além de regras de conduta, restrições e impedimentos consuetudinários, NORTH
apresenta outros tipos de instituições que surgiram para organizar e disciplinar os sistemas de
troca, em particular para facilitar e expandir o comércio exterior:
“Os problemas de violência nas rotas foram resolvidos por forças armadas
protegendo os navios ou caravanas ou por pagamentos de pedágios ou
proteção paga a grupos coercivos locais. Negociações e esforços em partes
estranhas no mundo requereram tipicamente o desenvolvimento de pesos e
medidas padronizadas, unidades de aferição, câmbio médio, cartórios,
cônsules, cortes mercantis, e enclaves de comerciantes estrangeiros
protegidos por príncipes estrangeiros, a seu turno, por impostos”. (Ibid., p.
100)
17
Este complexo de instituições (normas, organizações e instrumentos), com forte
caráter pessoal, foi suficiente por algum tempo para cumprir a função de expandir o comércio,
porém não suficiente para regular; formas de trocas mais complexas surgidas. Para estas,
foram os contratos a ferramenta mais apropriada. Afirma NORTH a respeito:
“(...) as sociedades necessitam efetivamente, contratos impessoais de
constrangimentos, porque armadilhas pessoais, voluntárias restrições, e
ostracismo não são efetivamente duradouros como as mais complexas
formas de trocas emergentes”. (Ibid., p. 100)
Um outro sub-campo das instituições é formado pelas as organizações. São elas
modernamente que garantem aos atores econômicos, juntamente com os contratos, a
observância das “regras do jogo”. Sobre este ponto, é interessante reter duas pertinentes
afirmações de NORTH:
“Da necessidade, portanto, de formas de transação altamente especializadas,
organizações emergem. Especialização internacional e divisão do trabalho
requerem instituições e organizações para salvaguardar direitos de
propriedade através de fronteiras internacionais (...)”. (Ibid., p. 101-102)
e:
“No suporte desta evolução não é somente de qualquer custo de informação
e economia de escala, sempre que o desenvolvimento de melhorias de
restrições de contratos seja permitido, e de fato encorajem mais complicadas
formas de troca, mas também se organizações têm o incentivo para adquirir
conhecimento e informação que lhes induzirão para continuar na mais
socialmente produtiva direção”. (Ibid., p. 102)
Genericamente, poderemos afirmar que as formas ou sistemas de troca mais
complexos e o próprio desenvolvimento econômico, como um todo, geraram pressões no
ambiente institucional de modo que este respondesse efetivamente às novas cenas. Estas
respostas estiveram ligadas às características do período econômico e à velocidade que as
transformações ocorriam no mesmo. NORTH chamou-as de “inovações”. Para ele,
“Inovações que reduzem custos de transação consistem em mudanças
organizacionais, instrumentos, e técnicas específicas e restrições
18
características que reduzem os custos de atração (costs of engaging) em
trocas sob longas distâncias”. (Ibid., p. 105)
As inovações mais significativas ou de maior impacto econômico ocorreram:
“(...) em três custos-marginais: (1) aquele que aumenta a mobilidade do
capital, (2) aquele que reduz custo de informação, e (3) aquele que expande
risco”. (Ibid., p. 105)
Com respeito ao desenvolvimento sobre a mobilidade do capital, é de supor que as
inovações introduzidas nos sistemas de troca foram não somente uma função do
desenvolvimento de instituições específicas preexistentes, mas e principalmente da escala da
atividade econômica.
“Crescendo o volume obviamente faz desta maneira desenvolvimento
institucional”. (Ibid., p. 106)
O problema da “incerteza” nas relações de troca foi seguramente contornado com uma
maior disponibilidade de informações posta aos atores econômicos e a custos mais reduzidos.
Não obstante, a criação de instituições mais específicas e até certo ponto mais complexas
contribuiu para reduzir o grau de incerteza. Estas instituições não só alcançaram êxito, mas
transformaram substantivamente o fator incerteza em risco. Afirma NORTH que:
“no mundo moderno, seguro e portfólio de diversificação são métodos para
converter incerteza para risco e consequentemente, reduzindo o custo da
transação, através da provisão de uma ‘hedge’ contra a variabilidade”.
(Ibid., p. 106)
Em resumo, a busca proposital pela redução dos custos de transação nos sistemas
econômicos modernos esteve sempre associada à construção de um complexo de instituições,
que por sua vez respondeu aos condicionantes da afirmação e generalização da economia de
escala e ao incremento do comércio mundial. Esta relação funcional gerou também um
desenvolvimento organizacional sem precedentes históricos. Como exemplos, podemos tomar
a criação de arbitrários códigos de conduta e métodos sofisticados de contabilidade e
auditoria.
19
A questão sobre o papel do Estado no conjunto bipartite evolução institucional e
desenvolvimento econômico parece-nos estar incluída no ambiente institucional e com pouca
relevância. O Estado seria uma instituição exposta a condicionantes do desenvolvimento
econômico, articulando seu curso, porém sujeito a determinantes e restrições postos por outras
instituições.
A respeito disto, é interessante a afirmação de NORTH, quando se refere ao
desenvolvimento do mercado de capitais:
“A cadeia de regras arbitrárias de comportamento e o desenvolvimento de
regras impessoais que sucessivamente limitam ambos o Estado e
organizações voluntárias foram elementos-chave deste processo conjunto. O
desenvolvimento de um processo institucional pelo qual governo obriga-se a
difundir tornou-se parte de um mercado de capital regular, e ser construído
por origens regulares de taxação foi também um elemento-chave (TRACY,
1985; NORTH e WEINGAST, 1989).” (Ibid., p. 108)
Outra maneira de ver organizações como instituições é a de SELZNICK. Ele
reapresenta o debate da compatibilidade entre meios e fins, que tanto interessa aos
administradores e critica que:
“o culto da eficiência na teoria e prática administrativa é a maneira moderna
de super acentuar meios e negligenciar fins”. (1997, p. 21)
Para SELZNICK, uma organização existe quando um organismo social é capaz de
satisfazer sua missão básica. Para isto a liderança é fundamental, ela age no sentido de
proporcionar aquela conquista.
No percurso para obtenção de êxito, certas firmas ou agências são marcadas por
distintos modos de tomar decisões, ou por peculiar acordo para definir objetivos, por métodos
ou por clientes.
“Neste caminho a organização como um instrumento técnico assume (para
si) valores”, SELZNICK complementa, afirmando que o processo de
internalizar valores é parte do que denomina institucionalização. (Ibid., p.
21)
A liderança na organização joga um importante papel nesse processo e tem a “tarefa
de guiar a transição da organização para instituição, desde que o resultado final incorpore
20
efetivamente desejados objetivos e padrões”. (Ibid., p. 23)
Esta liderança, denominada de institucional, é apresentada como um dote especial:
“A arte do líder criativo é a arte de construir instituição, o refazer de
materiais humano e tecnológico para modular um organismo que incorpore
novos e duradouros valores”. (Ibid., p. 25)
Além das visões sobre instituições já apresentadas, temos outra mais recente,
construída por HODGSON. Ele retoma a discussão sobre as duas visões clássicas já expostas,
mais precisamente aquelas que desenvolveram as noções de coercibilidade e de “regras do
jogo” e afirma categoricamente que “instituições são sistemas duradouros de regras
socialmente estabelecidas e emergidas que organizam a interação social” (s/d, p. 1)
2
.
A idéia de “embedded”, também já bastante desenvolvida por GRANOVETTER, pode
nos dar uma noção de instituição não só como algo que constrange os indivíduos em suas
relações sociais, mas também uma outra noção, a de fazer desejar, de buscar algo nas
situações de interação social, ou, em outras palavras, construir condutas socialmente
desejadas para um momento histórico. E isto, em se tratando de desenvolvimento econômico,
é especialmente relevante. Há, portanto, uma noção de fundo, que é a de generalização de
consensos tácitos e representações coletivas progressivamente construídas por e para uma
sociedade.
É, pois, nesta perspectiva, que HODGSON desenvolve sua noção de “downward
causation” e a descreve do seguinte modo:
“Eu descrevo como ‘causação sucessiva reconstitutiva’, envolve indivíduos e
populações não somente reprimidos, mas também transformados, como uma
resultante de forças causais associadas com intenso nivelamento”. (Ibid., p.
8)
Este efeito-instituição é mais significativo ainda quando se trata de política de
desenvolvimento. O desenvolvimento, enquanto processo ou realização, supõe a construção
de instituições e estas só tornar-se-ão efetivas se houver um esforço de internalização ao nível
dos hábitos individuais do costume (compartilhamento social) e de outros aspectos informais
de cultura, que sejam consistentes com as metas da política.
2
“Institutions are durable systems of established and embedded social rules that structure social interactions.”
21
1.1.5. A coordenação entre organizações na vida econômica
Gostaríamos de voltar no tempo e examinar como a questão da coordenação
econômica foi inicialmente posta e a seqüência de desdobramentos que teve.
A idéia mais elementar é a de imaginarmos um ‘gradiente’ onde se posicionam, nos
extremos, o individualismo e a cooperação. A coordenação, enquanto tal seria o condicionar
das ações econômicas dos atores individuais, incentivando-os a livrarem-se do individualismo
e encontrarem compensações na cooperação. Aqui há um suposto de que estamos tratando de
economias de mercado, na qual a coordenação via preços é compreendida como insuficiente,
já que existem falhas, imperfeições informação assimétrica, ineficácia etc., contribuindo para
aumentar o grau de incerteza no ambiente macroeconômico. A coordenação fora do mercado
via organizações (hierarquia), em primeira instância e, posteriormente, as relações entre
empresas, supostamente supririam a relação básica, substituindo o mercado quando ele não
satisfizesse ou fosse menos vantajoso. Em particular, as relações entre empresas tendem a ser
caracterizadas como esforço de cooperação.
De acordo com BAUDRY (1995), foi COASE que primeiramente expressou que a
coordenação também se fazia fora do mercado. Uma especial ênfase na questão do
comportamento oportunista o levou a afirmar que, além do mecanismo de preços exercido no
mercado, existia o mecanismo de autoridade exercido pela firma. Já WILLIAMSON enfoca o
papel dos ativos específicos como fundamental nas relações de troca entre comprador e
fornecedor, atribuindo a aqueles ativos o poder de reger as formas de transação entre os
agentes. Nomeada de ‘paradigma transacional’, a análise de WILLIAMSON vai privilegiar
as transações e seus custos, também denominados de ‘custos de transação’. É este tipo de
custo e a relativa dependência do ativo que uma empresa tem dele que vão determinar o
mecanismo de coordenação a ser adotado. No limite, poderemos ter uma situação de
aquisição de uma empresa por outra ou a integração vertical nos casos onde se configura na
relação à quase-renda (ex-post).
Ainda seguindo com BAUDRY, a problemática da cooperação nas relações entre
empresas, conforme apresentada por RICHARDSON, é um desdobramento da análise de
COASE. RICHARDSON introduz um terceiro mecanismo de coordenação denominado de
concertação (ex-ante). Seria este mecanismo que possibilitaria, entre outras atividades, a
discussão sobre a organização física da produção e a coordenação de planos entre
contratantes. Porém, aquele autor admite a convivência das três formas de coordenação
22
(mercado-firma-cooperação), que denomina de divisão do trabalho, esta se subordinando às
similaridades, às competências organizacionais, às vantagens comparativas e
complementaridade.
Na linha de defensores da cooperação, prosseguimos com AOKI, também analisado
por BAUDRY. Sua análise se baseia na comparação da eficácia entre firmas americanas e
japonesas. Ele argumenta que problemas de coordenação econômica foram superados na
economia japonesa nos anos 80 com algumas práticas que ajudaram a minimizar a incerteza
nas transações. Entre elas, ressalta as práticas da subcontratação, da longa duração na relação
contratual, da partilha de benefícios e da aprendizagem permanente. Teoricamente, AOKI
dialoga com WILLIAMSON, confrontando a noção de ‘quase-renda’ com a de ‘quase-renda
relacional’, de onde deriva a opção pela partilha de benefícios, ao invés da integração vertical,
solução classicamente adotada.
A redução da incerteza e o alto padrão de eficiência são categorias próprias que
permeiam toda a busca de aprimoramento dessas formas de coordenação, cuja implementação
ocorre em ambiente de relativa estabilidade construída pela afirmação do paradigma fordista.
A partir do desencadeamento de transformações radicais nos planos tecnológico e
organizacional ao nível mundial, que apontam para outro paradigma tecno-econômico, é
procedente questionarmos se ditas formas de coordenação ainda são aplicáveis e se podem
responder positivamente às demandas do ambiente em mudança. Evidências empíricas
parecem apontar para o fato de que a reestruturação das firmas e das organizações em geral e
as novas relações implementadas entre elas exigem a orquestração de novas formas que
possam superar os problemas de coordenação surgidos a partir da quebra da relativa
estabilidade anterior. As chamadas formas híbridas talvez possam se constituir num avanço
neste campo.
1.1.5.1. As “formas híbridas” e sua gestão
Anteriormente nos referimos a AOKI, mostrando que sua análise avançou no campo
das relações entre empresas. Agora, sob este título gostaríamos de tratar algo mais orgânico,
o que MÉNARD considera como “formas híbridas”. A idéia é tentar compreender o
fenômeno, o seu modo de gestão e sua funcionalidade na nova economia.
Referindo-se às formas híbridas, afirma MÉNARD:
23
“Este conceito recobre uma família diversificada de arranjos, do tipo
franchise, contratos de longa duração entre empresas em rede, as quais
imprimem uma coerência ao identificar características que lhes são comuns,
em particular a transferência parcial do poder de alocação dos recursos sem
transferência simultânea de direitos de propriedade
3
”. (1997, p. 742)
Por seu caráter descritivo, esta conceituação está muito mais direcionada a identificar
manifestações empíricas, cremos, numa tentativa de torná-las eqüidistantes dos pólos mercado
e hierarquias, do que revelar seu constitucional intrínseco. Porém, logo em seguida MÉNARD
envereda pela dimensão estrutural e coloca a questão da governança:
“(...) as formas híbridas designam uma classe de structures de
gouvernance que asseguram o manejo de transações implicando uma
dependência significativa entre ativos de propriedade de unidades
autônomas, sem que esta especificidade justifique a integração em uma
empresa unificada”.
4
(Ibid., p. 742)
Tais estruturas de governança para unidades autônomas revelam a criatividade de uma
construção social, obra de agentes econômicos, que vão tanto avançar na concepção do
mercado neoclássico, como consolidar completamente a negação de relações verticalizadas
entre empresas. Contudo, a questão estrutura-entidade ainda é relevante na medida em que a
governança vai demandar coordenação e controle. É o próprio MÉNARD que diz:
“Temos assim uma situação onde a dependência determina uma
continuidade de relações e exige mecanismos de coordenação e de controle
mais potentes que leve à constituição de uma entidade economicamente e
juridicamente unificada. O problema se põe então de saber quais são as
propriedades exatas de tais estruturas”
5
. (Ibid., p. 742).
Novamente aqui se poderia compreender, a respeito da última afirmação sobre a
constituição de uma terceira entidade, o desejo do autor de reafirmar que as formas híbridas se
3
“Ce concept recouvre une famille diversifiée d’arrangements, du type franchise, contrats interentreprises de
long terme, entreprises en réseau, auxquels il donne une cohérence en identifiant des caractéristiques qui leur
sont communes, en particulier le transfert partiel du pouvoir d’allocation des ressources sans transfert simultané
des droits de propriété”.
4
“(...) les formes hybrides désignent une classe de « structures de gouvernance » qui assurent le pilotage de
transactions impliquant une dépendance significative entre actifs détenus par des unités autonomes, sans que
cette specificité justifie l’intégration dans une entreprise unifiée”.
5
“On est ainsi dans un cas de figure où la dépendance commande une continuité des relations et exige des
mécanismes de coordination et de contrôle plus puissants qu’il y ait constitution d’une entité économiquement et
juridiquement unifiée. Le problème se pose alors de savoir quelles sont les propriétés exactes de telles
structures”.
24
afastam das hierarquias, assim como tão claramente se distinguem em relação às transações
no mercado. A questão conforme compreendemos não consiste em estabelecer estruturas de
governança abstratas, mas examinar quais diferentes perfis e contornos que a governança
pode adquirir. Deste modo, cabe então fazer uma distinção entre as formas ‘contratos’ e
‘redes’.
Como enuncia o próprio MÉNARD (1997, p. 742-745), sua análise sobre as formas
híbridas se inscreve no quadro da economia neo-institucional com forte influência de
WILLIAMSON. Sendo assim, a noção de ‘arranjos institucionais’ para facilitar ou apoiar as
transações vai ser qualificada de estruturas de governança. Estas estruturas estão
intrinsecamente associadas à celebração e execução de contratos, daí as categorias
‘complementaridade de ativos, contratos multilaterais, cláusulas de adaptação e controle’ etc.
Sendo este o modelo básico, é bastante plausível que as estruturas de governança não
demandem organizações próprias de coordenação e controle. Porém, no caso das redes de
empresas, mesmo supondo-se a relação contratual entre elas, as relações sociais construídas
entre empresas, governos, instituições de pesquisa e indivíduos etc. têm dimensões mais
amplas do que as contidas nos contratos. E isto, a nosso ver, vai exigir ‘estruturas
organizativas’ cujo papel fundamental é a promoção e concertação dos interesses estratégicos
da rede, nesse caso, sem recorrer à hierarquia. Os consórcios são exemplos dessa estrutura
organizativa.
Segundo MÉNARD, a gestão das formas híbridas é específica e própria e se rege pela
autoridade:
“Sustenta-se que existe uma modalidade específica de gouvernement destas formas,
destinada a exprimir as insuficiências da relação contratual, e que apela a um princípio
de autoridade, distinto da relação hierárquica assim como da relação por preço, que
caracterizam respectivamente as organizações e os mercados”
6
. (Ibid., p. 742)
É por ser assim que a dinâmica de sua gestão realça atributos tais como
intencionalidade, reversibilidade, simetria e confiança recíproca, que constroem uma
configuração de flexibilidade e maior dinamismo, características fortes que se coadunam com
a face do novo ambiente econômico.
6
“On soutiendra qu’il existe une modalité spécifique de « gouvernement » des ces formes, destinée à parlier les
insuffisances de la relacion contractuelle, et qui fai appel à un principe d’autorité, distinct de la relation
hiérarchique comme de la relation par les prix, qui caractérisent respectivement les organisations et les marchés”
25
1.1.6. Os novos formatos: as organizações–rede e as redes de organizações
1.1.6.1. A corporação-rede
Das relações inter-empresas, formas híbridas e diferenciadas estruturas de governança
que vão se afirmando na nova economia, chegamos até as redes e, em particular, às redes
produtivas. Agora pretendemos olhar para dentro das organizações, enquanto unidades
autônomas interconectadas em rede. De antemão, queremos expressar a íntima inter-relação
que existe entre a forma ‘rede’ e as unidades que a compõem. Conforme LASTRES,
“Salienta-se especialmente que:
a) a constituição de “redes” de todos os tipos é considerada a “mais
importante inovação organizacional” “associada” à difusão do novo
paradigma tecno-econômico das tecnologias da informação e da Economia
da Informação e do Conhecimento ; e
b) a “competitividade” das “organizações” passa a estar relacionada à
“abrangência das redes” em que estão inseridas, assim como à “intensidade
do uso” que fazem das mesmas”. (1999, p. 48)
Dessas dinâmicas entre rede e organização produziram-se transformações adaptativas,
com repercussões nas formas de produzir, gerir e comercializar das próprias organizações.
Reafirmamos que, numa cadeia de repercussões, foram os ambientes hipercompetitivos onde
as organizações interagem que propiciaram o surgimento das redes e, por conseguinte,
levaram ao surgimento de novos formatos organizacionais no nível das unidades. Estes estão
provocando uma transformação de comando e controles nas organizações baseadas na
informação. Por seu turno, esses novos formatos serão variados. QUINN et al. defendem a
hipótese de que não teremos uma estrutura dominante ajustada ao ambiente hipercompetitivo,
mas a possibilidade de construção de várias formas de cadeia organizacional. Além disto,
“(...) estas formas raramente ocorrem em estado puro atravessando a
totalidade da entidade, integrando todos os aspectos da empresa”. (1999, p.
350)
Não obstante, reconhecem que a organização do futuro não será híbrida, mas deverá
ser polimórfica, contendo dentro de si mesma subunidades cuja maneira fundamental de
26
conduzir inteligência (intellect) para arcar com problemas é vastíssimamente diferente em
uma ou outra.
As ‘corporações-rede’ são a forma organizacional por excelência. Elas alcançam
simultaneamente patamares superiores de eficiência e de flexibilidade, se comparadas às
formas antigas e hierárquicas.
Há uma relação direta entre redes, rapidez e inteligência. QUINN et alii afirmam que:
“(...) o desafio básico que enfrenta a moderna empresa é a necessidade para
desenvolver e espalhar ativos intelectuais. A “empresa inteligente” usa
várias formas de cadeia para conduzir sua inteligência para abordar
problemas críticos (...)” (Ibid., p. 351)
e, em uma época de mudança no capitalismo, o principal componente de criação de valor não
é o capital nem o trabalho e sim o conhecimento (knowledge) e as capacidades intelectuais.
Consequentemente, o valor agregado vai depender da captura e distribuição de “outputs
intelectuais” nos adequados pontos de uso.
Seguindo as linhas de eficiência e flexibilidade, é de supor que diferentes organizações
existirão para atender a diferentes propósitos. Suas estruturas de organização em rede podem
assumir diferentes formatos (infinitamente plana, invertida, teia de aranha, cluster e estrela
explodida), porém, conforme QUINN et al. (op.cit.), serão quatro dimensões que irão
definitivamente caracterizar sua natureza, a saber:
locus da inteligência”, o principal domínio e onde reside o conhecimento
(knowledge);
locus da inovação”, a principal locação e onde a inteligência é aplicada em novas
soluções;
“modo de conexão”, a direção do fluxo de informação e como o locus da
inteligência e o locus da inovação estão conectados;
“fonte de emprego”, como a empresa emprega seu saber principal.
1.1.6.2. A rede de organizações
Comentando sobre as organizações e suas estratégias em rede e, mais particularmente,
sobre alianças estratégicas e colaboração na produção, POWELL (s/d) pergunta como podem
27
ser instituídas “redes de cooperação”, a não ser que igualmente haja proximidade ou um senso
de participante comum”. Ele responde afirmando que tal tipo de acordo tem uma base natural
de confiança e que a construção de “acordos contratuais” contribui para minimizar as chances
do potencial oportunismo dos atores envolvidos na transação. Para ele, “o processo é
interativo – o nível de cooperação cresce com cada acordo entre os mesmos partners e os
partners individualmente tornam-se mais capazes por meio da aprendizagem através de
alianças”. (p. 390)
Outro tipo de formato organizacional que POWELL considera, são “as redes
estratégicas”. Ele diz que elas “têm sido definidas como relações entre firmas autônomas, as
quais permitem a elas serem mais competitivas em comparação com as não afiliadas de fora”
(p. 390). Esse tipo de acordo estratégico facilita a efetivação de processos de transferência de
informação, produção de conhecimento, inovação e a formação de parâmetros para decisões
sobre aplicação de recursos. Neste caso, POWELL, citando SYDOW
7
, questiona se não muda
o funcionamento gerencial das organizações envolvidas na aliança. Que tipos de repercussões
incidem sobre a organização interna das firmas (estruturas)?
Não obstante, esse autor vai questionar se é possível ser simultaneamente estratégico e
cooperativo. Sua resposta está associada ao exame dos processos de subcontratação. A tese
diz que a subcontratação reduz os custos e aumenta a capacidade dos partners envolvidos no
acordo. Nem sempre esta afirmação tem respaldo factual. Os subcontratados assumem mais
custos e riscos no desenvolvimento do produto e neste sentido a relação é de desigualdade
entre os pólos. A relação de cooperação seria movida pelo poder, já que até o tamanho dos
recursos postos no acordo pelas respectivas partes define a apropriação do conhecimento-
chave posto à disposição e/ou gerado. De qualquer forma, o partner mais frágil também
disporá de parte do conhecimento-chave, caracterizando pouco a pouco o processo
cooperativo como dúbio. Ou seja, o processo cooperativo possui a “semente da
transformação” e os “riscos de severas falhas”. Enfim,
“(...) através da experimentação com novas formas de organizar, as firmas
estão descobrindo que suas identidades vão sendo transformadas de um
modo que elas não previram”. (Ibid., p. 391)
7
SYDOW, J. 1991. “On the management of strategic networks”. Working paper nº 67/91. Institut Für
Management. Berlin: Freie Universität.
28
1.2. As Firmas e o Ambiente: a questão da Evolução
Continuando a considerar a questão dos formatos organizacionais, abordemos agora o
assunto da evolução das organizações. Por que as organizações crescem? Elas são
impulsionadas apenas pelas exigências de suas condições internas de organização e
funcionamento (custos crescentes, conhecimento, recursos disponíveis etc.) ou respondem de
modo não mecânico as determinações do seu entorno ou, melhor compreendendo, do
ambiente onde estão inseridas e atuando?
Na verdade, a compreensão vigente é a de que não se pode conceber a existência e o
desenvolvimento das firmas sem que as vejamos sempre num contexto de forte interação com
o ambiente. De fato, a própria percepção e a identificação de aspectos e variáveis favoráveis
ao crescimento das firmas se dão nessa permanente interação.
As estratégias de crescimento de uma organização são construídas ou gestadas nos
contextos de interação que ela desenvolve com o ambiente a partir do diagnóstico técnico e ou
dos insights que as levam a tomar decisões para o futuro. As estratégias de crescimento de
caráter racional ou de caráter intuitivo têm uma importante repercussão no interior da própria
organização:
“(...) as estratégias de crescimento são articuladas a partir de um conjunto de
elementos dados pelas relações técnicas e relações sociais. Essas estratégias
moldam as estrutura da organização”. (MEDEIROS & BELIK, 2000, p. 5)
Na percepção e identificação do conjunto de variáveis favoráveis ao crescimento das
organizações econômicas, a variável tecnologia se apresenta não só como variável do
ambiente, mas primordialmente para a organização como a condição desejada e ou reforçada,
quando já disponível, para o crescimento:
“Alguns mecanismos são de vital importância para este movimento; a busca
e utilização contínua de tecnologia incorporada tanto ao produto, quanto ao
processo acaba por ter um peso significativo na evolução tecno-
organizacional da empresa”. (OLIVEIRA, 2004, p. 35)
A segunda questão que apresentamos é: o crescimento da organização ou da firma é
apenas a única resultante individual do processo de interação com o ambiente, ou este
crescimento também afeta o próprio ambiente?
29
A presença da firma no mercado, sua participação e sua transformação não é apenas
um fenômeno que acontece ao nível da mesma, pois tudo que acontece a ela acaba influindo
no mercado e no todo do ambiente, via as relações técnicas e sociais que ela desenvolve com
as outras firmas, com o Estado etc.. Neste sentido, o crescimento individual das firmas não
acontece por si só:
“a idéia de modificações pontuais e paradigmáticas na empresa não se
concretiza. A partir do momento em que uma firma introduz a modificação
no seu padrão de comportamento a ponto de se destacar no segmento que
atua, cria-se uma ruptura na estrutura de mercado”. (POSSAS
8
apud
OLIVEIRA, 2004, p. 35)
Assim, na teoria, as inovações técnicas e ou organizacionais introduzidas pela firma
repercutem no mercado e no ambiente a tal ponto que ambos tenderão a se recompor para a
nova dinâmica de relações que aí se instala. Ainda como afirma Oliveira, citando Possas,
sobre as outras firmas:
“Aquela que não acompanhar o processo evolutivo inovador estará fadada à
extinção, pois a modificação desestabiliza toda a estrutura de mercado
ocorrida anteriormente, criando, assim, um novo padrão concorrencial e uma
nova dinâmica de equilíbrio”. (Ibid., p. 35).
Dois outros processos podem também ser aqui visualizados: o de adaptação da firma
ao ambiente e o da modificação do ambiente por ela própria, em razão do seu interesse
enquanto unidade desse conjunto sistêmico. No primeiro processo, destacamos dois elementos
condicionantes, o marco institucional existente sob o qual a firma opera e o contexto
histórico, que imprime certa determinação ao funcionamento orgânico do ambiente.
“A firma, como visto anteriormente, não atua sozinha no mercado. Diferente
de experimentos laboratoriais é impossível observar a dinâmica da empresa
considerando uma situação de “condições normais de temperatura e pressão”
(Ceteris Paribus), pelo contrário, a firma está sujeita a uma série de fatores e
condicionantes que se modificam no decorrer da história, em função do
padrão de concorrência de segmentos e/ou setores, da institucionalidade
existente e de sua eficiência, do acesso e/ou capacidade tecnológica, além
das condições de um ambiente de desenvolvimento central ou periférico
8
POSSAS, M. L. Competitividade: Fatores sistêmicos e política industrial. In: CASTRO, A.B. (org). Estratégias
empresariais na indústria brasileira: discutindo mudanças. Rio: Ed. Forense, 1996.
30
entre os países em que a firma pode eventualmente concorrer”. (OLIVEIRA,
op.cit., p. 36)
No segundo processo, a depender de sua posição no mercado, a firma opera no sentido
de ajustar o ambiente, de reduzir o grau de incerteza etc. Assim, pois, de fazê-lo favorável a si
própria enquanto uma unidade organizada como sistema “autônomo”. Conforme MORIN
(1990)
9
resume, os dois processos existem em razão da dinâmica firma - ambiente e são
dialeticamente complementares:
“Na verdade, é a evolução sistêmica, complexa e acumulativa que viabiliza
sua trajetória. “Quanto mais complexos forem os comportamentos, mais
manifestarão flexibilidades adaptativas em relação ao ambiente; os
comportamentos serão aptos a se modificar em função das mudanças
externas, sobretudo das aleatoriedades, das perturbações e dos
acontecimentos, e serão aptos igualmente a modificar o ambiente imediato,
em resumo, adaptar o ambiente ao sistema”. (Ibid., p. 37)
Cabe aqui complementar a respeito das estratégias de crescimento da firma, indicando
que elas passam a ser construídas não só no novo patamar de comportamento organizacional,
mas que este novo patamar as transforma qualitativamente:
“A flexibilidade adaptativa do comportamento vai exprimir-se no
desenvolvimento de estratégias heurísticas, inventivas, variáveis, que
substituirão os comportamentos programados”. (MORIN, Ibid., p. 303)
A evolução tecno-organizacional ocorrida na firma em razão da inovação em processo
e produto, associada às estratégias de crescimento, se por um lado configura a “nova firma”,
dentro da abordagem evolucionista, esta evolução não fica restrita à própria firma. A evolução
enquanto processo se alastra inevitavelmente para todo o setor ou segmento em que a firma
atua. Neste caso, a evolução da firma conduz a evolução do ambiente imediato onde ela atua.
Porém, inversamente, a evolução tecno-organizacional que atuou no sentido de assegurar mais
integração organizacional e eficiência dos meios à firma pode ser paradoxal para a
continuidade daquela mesma evolução:
9
MORIN, E. 1990. In: CASTRO, A.B. (org). Estratégias empresariais na indústria brasileira: discutindo
mudanças. Rio: Ed. Forense, 1996. p. 303.
31
“Ao mesmo tempo, à medida que as modificações de processo são
incorporadas, atualizadas e aperfeiçoadas, podem inibir a capacidade
inovativa da empresa no tocante à inovação de produto, “à medida que um
produto torna-se mais padronizado e é produzido por um processo mais
sistemático, a interdependência entre as subunidades organizacionais
aumenta lentamente, dificultando e tornando mais onerosa a incorporação de
inovações radicais”. (UTTERBACK,
10
, apud OLIVEIRA, op.cit., p. 38)
Nesses casos, o processo continuado de construção de estratégias de crescimento e
adequação da estrutura organizacional às novas estratégias, na firma, poderá ser afetado
negativamente.
1.3. Estratégia e Estrutura
1.3.1 Preliminares
CHANDLER, em seu artigo seminal sobre estratégias e estruturas, se pergunta:
“De que maneira eles fazem a estrutura para administrar cada grande
empresa”? E “onde eles inovam?” (1997, p. 41).
Parte ele de uma distinção entre o que é o estratégico e o que é o tático. O estratégico
engloba decisões concernentes à condição de longo prazo da empresa, enquanto o tático reúne
as decisões dadas sobre o dia-a-dia, visando a eficiente e tranqüila operação. No
desenvolvimento do argumento, ele é enfático quando afirma:
“A tese que formas organizacionais diferentes resultam de diferentes tipos de
crescimento pode ser fixada mais precisamente se o planejamento e o
desenvolvimento de cada crescimento é considerado uma estratégia, e a
organização projetada para administrar essas atividades ampliadas e
recursos, uma estrutura”. (Ibid.)
Portanto, a estratégia pode ser definida como uma determinação das finalidades
fundamentais de longo termo e objetivos de uma empresa e a adoção de “cursos de ação” e de
10
UTTERBACK, 1994, p. 91. In: CASTRO, A.B. (org). Estratégias empresariais na indústria brasileira:
discutindo mudanças. Rio: Ed. Forense, 1996.
32
“alocação” de recursos necessários para alcançar essas finalidades. Por seu lado, a estrutura
pode ser definida como o design de organização através do qual a empresa é administrada.
“As organizações e os mercados têm o seu formato determinado pela
estratégia definida pelos agentes”. (Idem, 1962)
Nesta terceira afirmação, CHANDLER incorpora a existência da instituição ‘mercado’
e reforça a atuação humana socialmente organizada na realização dos seus interesses. Em
verdade, a questão das estratégias e estruturas se põe socialmente contextualizada e numa
perspectiva de comportamento humano racionalizado.
Um outro elemento, que se sobrepõe à noção de mercado por sua amplitude é o de
ambiente. No estudo da relação estratégia e estrutura organizacional, a noção de ambiente é
imprescindível para configurar o ‘quadro’ no qual aquela relação se estabelece e se
desenvolve:
“A forma como os diversos agentes tomam suas decisões quanto aos
relacionamentos com os seus iguais nas atividades produtivas está ligada a
decisões de cunho estratégico. Essas decisões, por sua vez, são construídas
dentro de relações sociais e relações técnicas que evoluíram ao longo do
tempo. Ao estabelecer as suas conexões o conjunto dos agentes mantém uma
relação de dupla determinação com o ambiente institucional. Os agentes
organizados interferem no ambiente através da legislação e das práticas
empresariais e sociais e, ao mesmo tempo, recebem influência direta do meio
social e dos seus determinantes legais”. (MEDEIROS & BELIK, op.cit., p.
4)
Na conceituação de ambiente, consideramos incluídas outras variáveis além da
variável institucional destacada por esses últimos autores e a desdobramos em duas noções, a
de ambiente geral e a de ambiente tarefa. Eis suas definições:
“Ambiente Geral: é também chamado macro ambiente e é constituído de um
conjunto amplo e complexo de condições e fatores externos que envolvem e
influenciam difusamente todas as organizações, é um conjunto de condições
genéricas e externas a organização que contribui de um modo geral para tudo
aquilo que ocorre em cada organização, para as estratégias adotadas e para as
conseqüências das ações organizacionais. Geralmente, pode ser constituído
das variáveis que não estão associadas ao dia-a-dia da organização:
tecnologia, políticas, economia, sociais, demografia e ecologia”.
(CHIAVENATO, 2004)
33
“Ambiente de Tarefa: é o contexto ambiental mais próximo da organização
que lhe fornece as entradas ou insumos de recursos e informações, bem
como a colocação e distribuição de suas saídas ou resultados. O ambiente de
tarefa é constituído pelas partes do ambiente que são relevantes ou
potencialmente relevantes para a organização poder estabelecer e alcançar
seus objetivos. Geralmente, constituído de agentes com quem a organização
tem uma relação direta no seu dia-a-dia como os consumidores, clientes,
usuários, fornecedores, concorrentes e organizações reguladoras”. (Idem,
Ibid.)
Considerando, pois, os elementos básicos – estratégia, estrutura organizacional e
ambiente – de modo preliminar, através de suas compreensões e definições, passemos a
estudá-los de modo articulado e consubstanciados em tipos cristalizados no universo das
organizações.
1.3.2 Abordagens teóricas sobre estratégia
É nosso propósito agora considerar os elementos básicos e referenciais para nossa
análise teórica – estratégia, estrutura organizacional e ambiente – segundo alguns
enfoques teóricos específicos e distintos.
Inicialmente apresentaremos e descreveremos neste item as três abordagens
consideradas principais na literatura sobre estratégia, a Visão baseada em indústria, a Visão
baseada em recursos (VBR) e a Visão baseada em instituições. Em seguida, ofereceremos a
concepção crítica desenvolvida por HENRY MINTZBERG sobre estas abordagens.
1.3.2.1 As três principais abordagens sobre estratégia
Antes mesmo de descrever as abordagens, iniciaremos pondo três questões
fundamentais que são comuns às mesmas.
A primeira delas: O que é estratégia? A estratégia pode ser vista como um plano, uma
ação e, se abandonarmos as posições extremas sobre o tema, pode ser vista como integração.
Vejamos algumas definições nesta perspectiva:
Estratégia como Plano: “Uma série de planos concretos a fim de ajudar a
organização a alcançar seus objetivos.” (OSTER, 1994).
34
Estratégia como Ação: “Um padrão em um fluxo de ações ou decisões”.
(MINTZBERG, 1978).
“A criação de uma posição única e valiosa, que envolve uma série de atividades...
fazendo em competir... criando uma coerência entre as atividades da companhia.”
(PORTER, 1996).
Estratégia como Integração: “A determinação de objetivos básicos da empresa em
longo prazo, a adoção de modos de ação e a alocação de recursos necessários para o
cumprimento dos objetivos.” (CHANDLER, 1962).
“Uma série de comprometimentos e ações integrados e coordenados, desenvolvidos
a fim de explorar as competências centrais e ganhar vantagem competitiva.” (HITT,
IRELAND e HOSKISSON, 2003).
A segunda questão situa-se no âmbito da oposição ‘Plano versus Ação’. A estratégia
como Plano (a Escola de Planejamento) tem sua origem no campo da estratégia militar e só
posteriormente penetrou no mundo dos negócios. Esta origem fez com que a noção de plano
fosse associada umbilicalmente à da formação da estratégia nas organizações. A noção de
ação ora pode ser vista contestando a outra de plano ora pode ser compreendida como
complementar à mesma:
“Dentro do campo da estratégia de negócios, o defensor mais vigoroso dessa
escola de estratégia como ação é HENRY MINTZBERG... MINTZBERG
postula que, além da estratégia pretendida, enfatizada pela escola, pode
haver uma estratégia emergente, que não é resultado do planejamento
‘meticuloso’, ‘de cima para baixo’, mas conseqüência de um fluxo de
pequenas decisões ‘práticas’ ‘de baixo para cima’”. (PENG, 2008, p. 9)
A Estratégia como Teoria é o âmbito da terceira questão. Emergindo da prática da
análise dos casos vem se formando uma compreensão de que a estratégia não é só uma
resultante de um ponto de vista qual seja só plano ou só ação, mas um combinado:
“Muitos acadêmicos e administradores perceberam que, na realidade, a
essência da estratégia é como uma ‘combinação’ tanto de ações
deliberadamente planejadas quanto de atividades emergentes não planejadas,
o que leva a uma escola da estratégia como integração. (CHANDLER
inicialmente)”. (Idem, Ibid., p. 9)
35
Já a definição adotada por PENG preconiza que estratégia, além de compreender o
atributo da integração, pode ser expressa como:
“Uma teoria da empresa sobre como competir com sucesso”. (Ibid., p. 9)
Além das questões enunciadas anteriormente, um ponto é fundamental no estudo da
estratégia: como as empresas se comportam? As respostas são várias e foram organizadas de
acordo com a visão quase tem do tema da estratégia:
“A visão baseada em indústria sugere que a principal tarefa estratégica é examinar
as cinco forças competitivas que afetam um setor industrial (em seguida
indicaremos estas forças) e determinar a posição menos vulnerável com relação a
essas cinco forças.” Ela é centrada nas oportunidades e ameaças ‘externas’;
“A visão baseada em recursos, concentra-se nas forças e fraquezas ‘internas’ da
empresa. Essa visão postula que os recursos e as capacidades específicos de uma
empresa diferenciam empresas de sucesso de empresas fracassadas”;
“Segundo a visão baseada em instituições, além das condições industriais e
empresariais, as empresas devem considerar influências mais amplas, vindas de
fontes como o Estado e a sociedade, ao traçar sua estratégia”. (Idem, Ibid., p. 13)
Passemos a descrever e detalhar estas três visões sobre estratégia:
- A visão baseada em indústria (
PORTER
)
O Modelo desta visão supõe a existência de cinco forças vitais externas que devem ser
analisadas pela empresa antes de estabelecer sua estratégia. São elas:
1. a intensidade da rivalidade entre os competidores;
2. a ameaça de novos concorrentes em potencial;
3. o poder de barganha dos fornecedores;
4. o poder de barganha dos compradores;
5. a ameaça dos substitutos.
36
A partir desta análise, segundo PORTER, três estratégias são possíveis (Ibid: 47 e 48):
a. Liderança de Custo: “... a teoria de uma empresa para sobre competir com sucesso
é centrada em baixos custos e preços”.
b. Diferenciação: “... centra-se na distribuição de produtos valiosos e diferentes para
os consumidores”.
c. Foco: “... atende às necessidades de segmentos ou nichos específicos de uma
indústria.”
Em resumo:
“Quanto mais fortes e competitivas são as cinco forças, menor a
probabilidade de empresas de uma determinada indústria obter retornos
acima da média e vice-versa”, (Idem, Ibid., p. 58)
- A visão baseada em recursos (VBR)
Esta visão se direciona para dentro da organização no sentido de avaliar seus recursos
e capacidades e a partir desta avaliação formular a estratégia. Estes atributos são assim
definidos:
Recursos: “ativos tangíveis e intangíveis utilizados por uma empresa a fim de
escolher e implementar suas estratégias”.
Capacidades: “... dizem respeito à aptidão de uma empresa para empregar
recursos de forma dinâmica.” Há uma distinção entre recursos e capacidades. É
uma visão baseada em capacidades dinâmicas.
Competências centrais: referem-se “... aos atributos internos de uma empresa que
fornecem uma base para a vantagem competitiva.”
Recursos tangíveis: “são ativos observáveis e facilmente quantificados.” São eles:
financeiros, físicos, tecnológicos e organizacionais.
Recursos intangíveis: “são, por definição de difícil observação e (às vezes
impossível) quantificação. Ex.: humanos, inovadores e reputacionais. (Idem, Ibid.,
p. 69).
37
O Modelo desta visão categoriza os recursos e capacidades da organização de acordo
com o seu valor, raridade e imitabilidade e os prioriza conforme a sua potencialidade de gerar
vantagens competitivas. Então, afirma:
“Somente recursos que agregam valor podem levar a vantagens competitivas...”
“Somente recursos e capacidades valiosos e raros têm potencial para fornecer
vantagem competitiva temporária.”
“Recursos e capacidades valiosos e raros somente podem ser fontes de vantagens
competitivas se os competidores tiverem dificuldades para imitá-los.” (Idem, Ibid.,
p. 74-76).
Esta mesma compreensão está na base de uma perspectiva mais ampliada que associa
o crescimento das organizações com suas estratégias:
“No caso da visão baseada em recursos, a questão relevante é como o
sistema econômico, ou mais precisamente as firmas, crescem e se
transformam. A questão central é a do crescimento das empresas e, por
derivação, do sistema. Daí a importância das estratégias. Nesse caso, a
unidade de análise é a coleção única de fatores produtivos da firma, ou sua
core competence, ou suas ‘dynamic capabilities’, numa versão mais
elaborada.” (CASTRO, s/d, p. 1)
Ainda PENG, afirma que esta visão “... sugere que empresas existem para desenvolver
e alavancar recursos e capacidades de forma superior àquela passível de ser executada por
indivíduos.” (PENG, 2008, p. 79)
Complementando a afirmação anterior, o mesmo autor nos chama a atenção para a
correlação que existe entre recursos e capacidades tácitos e as formas de organização:
“Outra idéia organizacional é a complexidade social, que se referem às
formas socialmente complexas de organização, típicas de muitas empresas.
... Freqüentemente, nesse tipo de organização, são os relacionamentos
invisíveis que agregam valor, e não as estruturas formais. (Idem, Ibid., p. 58)
Portanto, tais recursos e capacidades, como organizações intrínsecas, são de
difícil imitação por parte dos rivais.” (Idem, Ibid., p. 79).
Em resumo, “Recursos e capacidades são ativos tangíveis e intangíveis utilizados pelas
empresas a fim de implementar suas estratégias.” (Idem, Ibid., p. 84) e o modelo sugere que
38
“somente recursos e capacidades valiosos, raros, de difícil imitação e com organizações
intrínsecas geram vantagens competitivas sustentáveis.” (Ibid., p. 84).
- A visão baseada em instituições (NORTH, Williamson)
Esta visão, ao contrário da anterior, se direciona para fora da organização e intenta
detectar as influências do aparato institucional existente sobre a organização. Ela trabalha com
a noção básica de instituições.
Independentemente da noção primária de instituições como ‘regras do jogo’, duas
outras definições dizem melhor sobre elas. A original de NORTH, que considera as
instituições como instrumentos de repressão criados pelos homens a fim de estruturar a
interação humana. E a de RICHARD SCOTT, que as considera como estruturas e atividades
regulamentárias, normativas e cognitivas que dão estabilidade e significado ao
comportamento social. Detalhando os termos:
Regulamentário: é o poder coercitivo dos governos;
Normativo: refere-se a como valores, crenças e normas de jogadores relevantes
influenciam no comportamento dos indivíduos e das empresas;
Cognitivo: refere-se aos valores e crenças, internalizados e convencionados, que
dirigem o comportamento dos indivíduos e das empresas.
Na justificação desta visão, são fundamentais as respostas a uma pergunta básica: o
que as instituições fazem?
A principal função das instituições é ‘reduzir a incerteza”;
As instituições influenciam as tomadas de decisões dos indivíduos, sinalizando
quais as condutas são aceitáveis e quais não o são:
As instituições também afetam as estratégias das empresas, restringindo o número
de ações aceitáveis;
As instituições definem o que é (ou não) legítimo.
A síntese do modelo e suas proposições centrais são:
39
“... A visão baseada em instituições centra-se na interação dinâmica entre
instituições e empresas e considera as escolhas estratégicas resultado de tais
interações”;
“Instituições vêm sendo reconhecidas como mais do que condições secundárias, e
muitos acreditam que ‘instituições determinam diretamente quais setas uma empresa
possui em sua aljava ao bravamente formular e implementar estratégias e criar
vantagem competitiva”;
“As escolhas estratégicas são feitas dentro de restrições institucionais”;
“A combinação de instituições formais e informais rege o comportamento das
empresas em situações em que as instituições formais falham”. (PENG, Ibid., p.
100-102).
As respostas estratégicas às pressões institucionais poderão ser dos seguintes tipos:
a. Reativa: “... As empresas não se sentem compelidas a agir na ausência de desastres
ou protestos. Mesmo quando surgem alguns problemas, a negação costuma ser a
primeira forma de defesa. ... a necessidade de agir não é nem internalizada por meio
de crenças cognitivas, nem uma norma na prática. Somente intensas pressões
regulamentarias formais fazem que tais empresas entrem em ação”;
b. Defensiva: “Uma estratégia defensiva centra-se no consentimento regulamentário.
Na ausência de pressões regulamentarias, as empresas costumam resistir às pressões
que exijam mudanças em suas estratégias”;
c. Adaptativa: “Uma estratégia adaptativa é caracterizada por uma norma
organizacional emergente, a fim de que a responsabilidade seja aceita, e por uma
série progressiva de crenças e valores cognitivos internalizados, a fim de que certas
mudanças sejam feitas”;
d. Proativa: “Empresas proativas constantemente antevêem as mudanças
institucionais e esforçam-se para fazer mais do que esperado. A administração geral,
além de apoiar e patrocinar tais atividades, considera-as como fonte de
diferenciação”. (Idem, Ibid., p. 112-113)
Em resumo:
40
“Comumente denominadas ‘regras do jogo’, as instituições possuem
componentes formais e informais, cada um dos quais com pilares de
sustentação diferentes (pilar regulamentário, para instituições formais e
pilares normativos e cognitivos para instituições informais). As principais
funções das instituições são reduzir a incerteza, cortar os custos de transação
e combater o oportunismo.” (Idem, Ibid., p. 117).
1.3.2.2. A concepção de HENRY MINTZBERG: o processo da estratégia
Em seu artigo seminal “Cinco P’s para Estratégia”, MINTZBERG analisou
criticamente como o conceito de estratégia tem sido utilizado e compreendido por vários
autores. Os Cincos P’s para Estratégia são: Estratégia como Plano; Estratégia como Pretexto;
Estratégia como Padrão; Estratégia como Posição e Estratégia como Perspectiva.
Já que nos referimos anteriormente às noções de Estratégia como Plano e Estratégia
como Padrão, passamos a considerar as duas últimas.
A noção de Estratégia como Posição está ligada à escola de planejamento e à visão
baseada em indústria. A idéia básica é estabelecer posições vantajosas para a empresa no
mercado e reduzir a influência do processo competitivo sobre o desempenho da organização.
Uma variante atual e interessante são, no pensamento de MINTZBERG, as Estratégias
Coletivas e/ou Estratégias Políticas.
A Estratégia “Coletiva” é entendida como:
“... estratégia que visa promover a cooperação entre as organizações, mesmo
supostos concorrentes (equivalente, em biologia, a animais que se reúnem
em bandos em busca de proteção). Tais estratégias podem variar ‘de acordos
e discussões informais a mecanismos formais, como diretorias corporativas
associadas, joint-ventures e fusões’. Na verdade, consideradas de um ângulo
ligeiramente diferente, elas podem ser descritas algumas vezes como
estratégias ‘políticas’, ou seja, estratégias para subverter forças legítimas de
competição.” (citações de ASTLEY e FROMBRUN, 1983). (MINTZBERG,
2006, p. 27)
A noção de Estratégia como Perspectiva está associada mais ao desenvolvimento de
linhas de conduta e de processo organizacional interno. Sua idéia básica é a compreensão da
formação da estratégia na organização. Trabalha com o conceito de “Visão do Mundo”,
definindo-o como “intuição coletiva sobre como o mundo funciona”. (Idem, Ibid.).
A Estratégia é entendida então como um ente gerado no interior da organização e que
contamina e orienta a todos os seus membros. Deste modo:
41
“... estratégia é uma perspectiva compartilhada pelos membros de uma
organização, por suas intenções e/ou por suas ações. Na verdade, quando
falamos sobre estratégia neste contexto, entramos na esfera da ‘mente
coletiva’ – pessoas unidas por pensamento e/ou comportamento comum.
Dessa forma, uma questão importante no estudo da formação de estratégia é
como ler essa mente coletiva – para entender como as intenções se espalham
pelo sistema chamado organização para se tornarem compartilhadas e que
ações devem ser praticadas em bases coletivas e consistentes”. (Idem, Ibid.,
p. 27)
Na verdade, no pensamento de MINTZBERG, os Cinco P’s não são satisfatórios de
per si para compreender e explicar o todo da formação de estratégia. Os conceitos ou as
noções a eles associados são incompletos ou limitados para expressar o que acontece na
realidade da organização. Melhor então conceber o inter-relacionamento dos P’s, pensá-los
como etapas de um processo organizacional longo e diversificado. Sendo assim, no entender
daquele autor, aceitar a perspectiva do ecletismo em estratégia é mais recomendado.
A noção de Estratégia como Perspectiva pode ser ainda muito mais. Ela pode nos
ajudar a revelar o locus da estratégia, ou seja, a organização. Neste sentido,
“... a estratégia como perspectiva levanta a questão de como as intenções se
difundem por meio de um grupo de pessoas para se tornarem compartilhadas
como normas e valores, e como padrões de comportamento se tornam
profundamente arraigados no grupo. Assim, estratégia não é apenas a noção
de como lidar com um inimigo ou um grupo de concorrentes ou um
mercado, como é mencionado em grande parte da literatura e seu uso
popular. Ela também nos leva a algumas questões mais fundamentais sobre
organizações como instrumentos para percepção e ação coletiva.” (Idem,
Ibid., p. 28-29)
MINTZBERG pensa estratégia como processo. Em seu artigo em conjunto com
JOSEPH LAMPEL, intitulado de Reflexão sobre o Processo Estratégico, listou dez Escolas de
Pensamento, agrupando seus integrantes e destacando seus principais autores. MINTZBERG
classifica essas escolas em duas categorias, as de prescrição e as de descrição.
Cremos ser importante destacar cinco dessas, em função de nossos interesses, com
vista ao suporte teórico que necessitamos para este trabalho. Para tanto, apresentamos
algumas informações básicas sobre as mesmas:
42
A Escola de DESIGN enfoca estratégia como um processo de concepção. A ela
estão associados autores que estão nas origens da VBR tais como: SELZNICK,
CHANDLER E ANDREWS;
A Escola de POSICIONAMENTO enfoca estratégia como um processo analítico.
Seu expoente é PORTER;
A Escola de APRENDIZADO enfoca estratégia como um processo emergente. Nela
o destaque é para MINTZBERG. Há também certo diálogo entre autores de
gerações mais recentes da VBR, entre eles PRAHALAD E HAMEL;
A Escola AMBIENTAL enfoca estratégia como um processo reativo. Sua matriz é a
Teoria da Contingência e sua referência original está em CHANDLER;
A Escola da CONFIGURAÇÃO que combina perspectivas distintas sobre estratégia
e a vê como um processo de transformação. Aí também se localizam CHANDLER
E MINTZBERG.
Na categoria de prescritivas estão as Escolas de Design e a de Posicionamento e na
categoria de descritivas se encontram as Escolas de Aprendizado e a Ambiental. A última, a
Escola de Configuração, contempla traços e aspectos de prescrição e também de descrição.
O argumento de MINTZBERG é o de que estas Escolas e as outras cinco aqui não
apresentadas trabalham com enfoques distintos de um mesmo processo de formação de
estratégias. Segundo suas próprias palavras (2006, p. 43),
“Algumas das escolas são claramente estágios ou aspectos do processo de
formação da estratégia”.
E comenta:
“A formação da estratégia é projeto sensato, visão intuitiva e aprendizado
emergente; é sobre transformação e também perpetuação; deve envolver
cognição individual e interação social, cooperação e conflito; tem que incluir
análise prévia e programação posterior, além de negociação durante; e tudo
isso deve ser em resposta ao que pode ser um ambiente exigente. Tente
omitir qualquer um desses itens e veja o que acontece!” (Idem, Ibid., p. 43).
Neste sentido, é o próprio MINTZBERG que nos diz que estratégia não pode ser vista
como ponto de vista ou processo único. Mas, há uma implícita necessidade de aceitação do
43
ecletismo no reconhecimento da procedência e importância dos Cincos P’s e do papel que
cada um pode jogar como etapa do processo de estratégia vivenciado em uma organização.
Do mesmo modo, esta atitude deve ser explicitada em relação às Escolas mencionadas,
pois os enfoques mais recentes da formação de estratégia utilizam preceitos e noções de uma
Escola combinada com os de outra.
Este fato nos indica mais uma vez a necessidade de reconhecermos a perspectiva
eclética no estudo deste campo. São exemplos citados por MINTZBERG:
“... o trabalho de PORTER e outros sobre o que pode ser chamado de
manobra estratégica (vantagem do primeiro a mover-se, uso de ataques
simulados, etc.) conectam a escola de posicionamento à de poder. ... Talvez
o enfoque mais conhecido seja o de ‘capacidades dinâmicas’ de
PRAHALAD e HAMEL. Vemos suas noções de competência básica,
objetivo estratégico e extensão – reminiscências do trabalho anterior de
ITAMI – como um híbrido das escolas de aprendizado e design: liderança
forte para encorajar o aprendizado estratégico contínuo.” (Ibid., p. 43).
1.3.2.3. Teoria da contingência
Os dois enunciados abaixo resumem de forma incisiva a elaboração teórica formulada
a partir de uma de uma inferência suscitada pela análise e interpretação de situações
empíricas:
“Aabordagem contingencial’ explica que existe umarelação funcional’
entre as condições do ambiente e as técnicas administrativas apropriadas
para o alcance eficaz dos objetivos da organização. As variáveis ambientais
são ‘variáveis independentes’, enquanto as técnicas administrativas são
‘variáveis dependentes’ dentro de uma relação funcional. Na realidade, não
existe uma causalidade direta entre essas variáveis independentes e
dependentes, pois o ambiente não causa a ocorrência de técnicas
administrativas. [...] Essa ‘relação funcional’ é do tipo se-então’ e pode
levar a um alcance eficaz dos objetivos da organização”. (CHIAVENATO,
op.cit.)
e
“Arelação funcional’ entre as variáveis independentes e dependentes não
implica que haja uma ‘relação de causa-e-efeito’, pois a administração é
ativa e não passivamente dependente na pratica daadministração
contingencial’. O reconhecimento, diagnóstico e adaptação à situação são
certamente importantes, porém, eles não são suficientes. As ‘relações
44
funcionais’ entre as condições ambientais e as práticas administrativas
devem ser constantemente identificadas e especificadas”. (Ibid.)
Esta denominada abordagem contingencial, reconhecida como clássica na ciência da
administração, está calcada em estudos de caso e pesquisas de campo realizadas há mais de
quatro décadas e permanecem como referências para novas aplicações e atualizações de
conceitos. Todos os estudos procuraram compreender os determinantes das estruturas
organizacionais estabelecidas e praticadas no funcionamento das organizações. Acrescente-se
que, de algum modo, alguns foram instigados pela necessidade de relacionar a existência de
um determinado tipo de estrutura com o tema da eficiência organizacional. Ou seja, se
fizeram a seguinte pergunta: existe algum “melhor” tipo de estrutura para as organizações?
As respostas para esta problemática apresentada se resumem nas informações e
conclusões indicadas abaixo:
“(...) pesquisas feitas [na década de 60] para verificar quais os modelos de
estruturas organizacionais mais eficazes em determinados tipos de indústrias
[...] foram contingentes na medida em que procuravam compreender e
explicar o modo pelo qual as empresas funcionavam em diferentes
condições. Estas condições variam de acordo com o ambiente ou contexto
que as empresas escolheram como seu domínio de operações. [...] essas
condições são ditadas de acordo com seu ambiente externo. Essas
contingências externas podem ser consideradas como oportunidades ou
como restrições que influenciam a estrutura e os processos internos das
organizações”. (Ibid.)
Vale destacar, na afirmação acima, que a administração é ativa e que, por isto mesmo,
as contingências externas deverão ser percebidas pelos agentes na qualidade de alternativas
disponíveis, dignas de análise, questionamento e avaliação de seu aproveitamento em relação
às escolhas que terão que fazer sobre a estrutura acreditada como “melhor” para a sua
organização.
Coerentemente com as afirmações anteriores, a conclusão fundamental foi que:
“(...) os resultados surpreenderam, pois indicavam que não havia uma forma
melhor ou única, e sim que tanto a estrutura quanto o funcionamento das
organizações dependiam da relação com o ambiente externo”. (Ibid.)
As quatro principais pesquisas realizadas naquele período (década de 60), comentadas
por CHIAVENATTO (Ibid., grifos nossos) foram:
45
a) A pesquisa de ALFRED D. CHANDLER sobre “(...) estratégia e estrutura
organizacional envolvendo o processo histórico das grandes empresas Du Pont,
General Motors, Sears e Standard Oil”, conclui que “(...) na história industrial dos
últimos cem anos, a estrutura organizacional das grandes empresas americanas foi
sendo gradativamente determinada pela sua estratégia mercadológica.
Outra conclusão é que “(...) a estrutura organizacional corresponde ao desenho
da organização, isto é, à forma organizacional que ela assumiu para integrar seus
recursos, enquanto a estratégia corresponde ao plano global de alocação dos
recursos para atender a uma demanda do ambiente”.
Segundo essa pesquisa, a trajetória das empresas contempla quatro fases iniciais
distintas: acumulação de recursos (integração vertical e economia em escala);
racionalização do uso dos recursos (planejamento, organização e coordenação);
continuação do crescimento (eficiência e diversificação) e racionalização do uso
dos recursos em expansão (departamentalização e planejamento em longo prazo;
administração por objetivos e avaliação do desempenho).
Sua principal conclusão foi: “(...) Diferentes ambientes levam as empresas a
adotar diferentes estratégias, que exigem diferentes estruturas organizacionais” (p.
2);
b) A pesquisa de T. BURNS e G. M. STALKER sobre “organizações mecanísticas e
orgânicas”, verificou “a relação existente entre as práticas administrativas e o
ambiente externo dessas organizações.” A partir da impressão que tiveram com as
nítidas diferenças entre os métodos encontrados, elas passaram a classificar “(...)
as indústrias pesquisadas em dois tipos, ‘mecanísticas’ (burocrática, permanente,
rígida, definitiva e baseada na hierarquia e no comando) e ‘orgânicas’ (flexível,
mutável, adaptativa, transitória e baseada no conhecimento e na consulta)” (p. 2).
De fato, “(...) a organização mecanística funciona como um sistema mecânico,
fechado e introspectivo, determinístico e racional, voltado para si mesmo e
ignorando totalmente o que ocorre no ambiente externo que a envolve”, enquanto
que “(...) as organizações orgânicas funcionam como um sistema vivo, aberto e
complexo, extrovertido e voltado principalmente para sua interação com o
ambiente externo. A adaptação e o ajustamento às demandas ambientais provocam
constantes mudanças internas na organização” (p. 2-3).
46
Sua conclusão principal foi: “Há uma espécie de seleção natural do tipo:
sistemas mecanicistas sobrevivem em ambientes imutáveis e estáveis, e sistemas
orgânicos se adaptam bem a ambientes instáveis e turbulentos” (p. 3).
Em que pese a pertinência dessas conclusões, poder-se-ia questionar se existe a
possibilidade de termos “ambientes instáveis e imutáveis”, ou esta seria uma
maneira de estabelecer uma oposição radical entre os ambientes estudados;
c) A pesquisa de EMERY, F. E. e TRIST, E. L. sobre os contextos ambientais e
suas conseqüências para as organizações se propôs a “identificar o processo e as
reações que ocorrem no ambiente como um todo, no sentido de classificar a
natureza do ambiente que circunda a organização e as conseqüências da natureza
ambiental sobre a natureza da organização” (p. 3).
Concluíram que “existem quatro tipos de contexto ambiental, cada qual
proporcionando determinada estrutura e comportamentos organizacionais”. (p.3).
São eles: o meio plácido e aleatório (concorrência pura, produtos homogêneos e
muitas empresas pequenas); o meio plácido e segmentado (concorrência
monopolística, produtos diferenciados e organizações de médio porte; crescimento
do tamanho das organizações; multifuncionalidade, hierarquia e controle e
coordenação centralizados); o meio perturbado e reativo (dinâmico, organizações
do mesmo tamanho, tipo e objetivo, simetria de informações, oligopólio) e o meio
de campos turbulentos (complexidade, turbulência e dinamicidade;
relacionamento de cooperação entre as organizações e autonomia de cada uma;
inovação, pesquisa e desenvolvimento; monopólio puro);
d) A pesquisa de LAURENCE, P. R. e LORSCH, J.W. sobre a defrontação entre
organizações e ambiente, foi conduzida em dez empresas dos ramos de plásticos,
alimentos e recipientes. Eles concluíram que os problemas básicos daquela
interação são os processos organizacionais de diferenciação e de integração. Na
diferenciação, “(...) cada qual desempenha uma tarefa especializada em um
contexto ambiental também especializado. Cada subsistema ou departamento tende
a reagir unicamente àquela parte do ambiente que é relevante para a sua própria
tarefa especializada” (p. 4). Indo adiante, os autores afirmam:
“Se houver diferenciação ambiental, aparecerão as diferenciações na
estrutura organizacional e na abordagem empregada pelos departamentos: do
ambiente geral emergem ambientes específicos, a cada qual correspondendo
47
um subsistema ou departamento da organização. Cada subsistema da
empresa reage apenas à parte do ambiente que é relevante às suas
atividades”. (p. 4)
A integração “refere-se ao processo oposto, isto é, ao processo gerado por pressões
vindas do ambiente global para alcançar unidades de esforços e coordenação entre os vários
departamentos. As partes de uma empresa constituem um todo indissolúvel e nenhuma parte
pode ser afetada sem afetar as outras partes” (p. 4).
O cotejo entre diferenciação e integração deixa um primeiro alerta sobre os possíveis
problemas que podem afetar as organizações que venham a flexibilizar – optar pela
diferenciação – sua estrutura em função de um ambiente super competitivo. Uma estratégia
como a considerada poderá criar alguns problemas para o funcionamento interno da
organização que talvez não sejam compensados pelo maior ajuste almejado.
Finalizando, esta última das quatro pesquisas conduziu à formulação da Teoria da
Contingência. Sua premissa fundamental é a de que “não existe uma única maneira melhor de
organizar, em vez disso, as organizações precisam ser sistematicamente ajustadas às
condições ambientais”. Essa teoria defende que “(...) a organização é de natureza sistêmica;
ela é um sistema aberto”. E, por conseguinte, “As variáveis organizacionais apresentam um
complexo inter-relacionamento entre si e com o ambiente” (p. 4).
1.3.2.4. Alinhamento organizacional
Esta outra ótica sobre a relação estratégia – estrutura preconiza uma lógica de
coerência ideal entre os dois elementos da relação. Ela considera dois tipos de estratégias, as
estratégias emergentes e as estratégias intencionais e está estribada nas idéias de
MINTZBERG & WATERS (1985). Compreende-se por emergentes aquelas estratégias que
resultam das respostas no trabalho diário às ameaças e oportunidades, daqueles gerentes que
têm a tarefa de implementar a estratégia da organização (as intencionais). As estratégias
emergentes aproximam as estratégias intencionais da ação.
De acordo com esta mesma ótica, as organizações podem ser classificadas em
organizações baseadas em trabalho e organizações baseadas em conhecimento. Essas duas
formas de organização não são excludentes e podem conviver dentro de uma só organização
empresarial.
48
A representação de uma organização é feita geralmente pelo desenho denominado de
organograma. Esta perspectiva introduz a noção de organigraph como o desenho que pode
expressar melhor a dinâmica interna das organizações.
“(...) os organogramas [...] mostram, principalmente, a relação de poder, não
conseguindo representar a dinâmica do funcionamento da organização. [...]
MINTZBERG e HEYDEN (1999) experimentaram novas formas de
desenhar e ver organizações, resultando numa proposta que eles
denominaram organigraph”. (CRUZ JUNIOR, 2005, p. 431)
Conforme este autor, citando ainda MINTZBERG e HEYDEN, “para desenhar um
organigraph você deve aceitar o fato de que ele mostra mais relacionamentos e processos”.
O termo “organigraph” introduz novos componentes que procuram refletir as várias
maneiras como as pessoas se organizam atualmente no trabalho. Os dois principais
componentes são ponto central (hub) e rede (web):
“Um hub serve como centro de coordenação. É qualquer ponto físico ou
conceitual para o qual pessoas, coisas e informação se movem. Webs são
conexões sem um centro: elas permitem comunicação aberta e
movimentação contínua de pessoas e idéias”. (MINTZBERG & HEYDEN
11
,
apud CRUZ JUNIOR, p. 431)
Esta segunda abordagem aqui apresentada avança no terreno das próprias formas
organizacionais. Ela nos revela opções paradigmáticas de funcionamento das organizações
para os agentes que estariam predispostos a conquistar, na prática, o alinhamento perfeito
entre a construção das estratégias e a implementação de um processo inovativo de
configuração organizacional.
1.3.2.5. A estratégia da crise
Sob a perspectiva da informação e comunicação em estratégia, o cientista francês
PIERRE FAYARD nos apresenta outra abordagem, centrada na relação estratégia –
ambientegestão. O seu foco, porém, está na ocorrência da crise, enquanto elemento ou
parte constitutiva dessa relação.
11
MINTZBERG, H. & HEYDEN, L. Organigraphs: Drawing How Companies Really Work. Harvard Business
Review, p. 87-94, Sept/Oct. 1999.
49
Inspirado nas filosofias orientais milenares, particularmente na chinesa, FAYARD
(2000) nos põe diante de duas situações peculiares que, segundo ele, são de profunda
importância para o estudo das organizações. Uma é o entendimento de que a crise começa
por si mesma e a outra é que a situação de crise pode ser conduzida e administrada.
Observemos a primeira situação:
A crise começa por si mesma
“No pensamento chinês, a essência da vida é a mudança. Todo equilíbrio é
visto como resultado temporário de uma dinâmica comportando elementos
da evolução chamados a se desenvolver. A inteligência da mudança pela
leitura desses sinais preliminares se situa no coração da arte estratégica
chinesa. No instante de suas vibrações iniciais, as futuras tendências são
ainda maleáveis. O momento é propício para desposá-las, a fim de melhor
conduzi-las”. (Ibid., p. 103).
No sentido apresentado pelo autor, a questão da estratégia se coloca com uma “lógica
da antecipação permanente”, o que faz que os agentes estejam sempre identificados com a
ocorrência “natural” da transformação das variáveis do ambiente, da inter-relação entre elas e
delas com a organização. Haveria sempre a presença e atuação das forças da anti-ordem no
ambiente, fato que exigiria que os agentes inteligentes e atentos se posicionassem para atuar
no sentido de obter um “novo equilíbrio”, portanto desencadeando uma nova estratégia.
A questão de fundo que nos é posta se traduz pela compreensão de que é necessário
detectar o momento exato em que se impõe a ação dos agentes, pois, de acordo com
FAYARD:
“Uma vez que o tempo as tenha solidificado (as tendências) sob a forma
enérgica de um maremoto, a margem da manobra do ator se estreita. A
inteligência das situações permite despender poucos meios para orientar as
tendências antes que se manifestem tensões e resistências. Nessa zona morna
da pré-crise, é mais fácil modificar suas disposições. Pode-se dizer que o
erro é ainda possível, pois é retificável pela leveza do comprometimento”.
(Ibid., p. 103)
Além da detectação pelos agentes do momento exato para a nova intervenção no
ambiente, esta abordagem sobre estratégia não nos apresenta a crise apenas como algo
negativo e prejudicial, mas como um processo que se manifesta com dupla natureza e
50
perceptível ou não, a depender do senso de mudança detido pelos agentes. Nas palavras de
FAYARD:
“Na China, os ideogramas correspondentes ao conceito de crise combinam
com os de perigo e de oportunidade. O ator hábil evita o perigo e aproveita a
oportunidade. Trata-se da virada do espírito ofensivo e antecipador.
Industrialmente, o Japão utiliza as rupturas tecnológicas em suas estratégias
de desdobramento em setores de atividades nos quais ele estava ausente até o
momento. Por ocasião da revolução tecnológica do relógio a quartzo, o setor
francês de relógio herda o perigo, e o Japão, a oportunidade, utilizando a
propulsão desse novo potencial. A identificação desses elementos de ruptura
– antes que eles alcancem um forte poder de pressão – constitui uma das
melhores preliminares à prevenção e, além disso, à gestão da crise”. (Ibid., p.
104)
Devido ao processo de interação organização – ambiente a ocorrência da crise,
geralmente é vista como uma ameaça que provêm do exterior em direção à organização. Ela, a
crise, então só será passível de detectação e reversão se a dialética exterior – interior for assim
compreendida e aceita pelos agentes em atuação no ambiente. Daí a certeza de que:
“Antes de serem externas, as condições de crise são freqüentemente, internas
e estruturais. Uma vez que se negligenciam por muito tempo sinais e
informações, a energia brutal toma a dianteira e chama à ordem a realidade”.
(Ibid., p. 105)
Enfim, de acordo com essa linha de interpretação,
“Uma crise manifesta um déficit de adaptação, de evolução ou de adequação
entre um ou entre diversos atores e um ambiente determinado”. (Ibid., p.
105)
Observemos a segunda situação:
Conduzir as crises
“Efetuada no tempo esperado, a decodificação da mensagem se abre à
possibilidade de conduzir, ou seja, ao ‘uso das crises’. Ao contrário, quando
a capacidade de discernimento não se faz presente, elas explodem numa
pedagogia brutal e diretiva. A margem de manobra dos atores ficará mais
reduzida quando eles tiverem por demais refletidos. Por falta de
51
interpretação dos signos ‘pré’ sofre-se a crise ‘depois’ e no calor das piores
condições”. (Ibid., p. 106)
No entendimento expresso por FAYARD, a problemática da crise não contém apenas
o elemento da decisão estratégica na relação ambiente – organização – ambiente. A
construção da estratégia por si só é necessária, mas não suficiente. No aproveitar da crise
impõe-se pensar e selecionar ações concernentes à viabilização da prática da estratégia. Dito
de outro modo, o uso positivo das crises supõe um passo seguinte que é o estabelecimento de
um processo de gestão para a estratégia construída.
Complementando, o pensar estratégico é também o antecipar-se à crise no momento
exato e ou quando já instalada, geri-la para o seu próprio proveito:
“Prevenir as crises consiste em atuar no possível e no futuro num momento
em que seu conteúdo não parece inevitável! As crises provocam
freqüentemente ondas de choque, cuja energia trabalha para além da ruptura
e dos equilíbrios instáveis; são os ‘aceleradores temporais’. (Ibid., p. 107)
1.4. Estratégia e Modelos de Gestão
Outra maneira de enfocar o tema das estratégias é aquela que vai considerar a
construção das mesmas, como parte da trajetória das organizações. Dito de outro modo, um
processo que se desenvolve em uma constante interação entre o meio interno e o meio
externo, ao longo da história das mesmas.
É interessante notar que esta perspectiva estaria interessada no ‘como’ as organizações
constroem suas estratégias ao longo de suas existências e qual a aprendizagem daí resultantes
para o futuro das mesmas na dinâmica do ambiente – organização. Ressalte-se que, quando
esta aprendizagem é realizada pelo todo da organização, ela se transforma em uma habilidade
coletiva da mesma.
A questão básica a ser enfrentada pelas organizações é: como criar uma estratégia? De
acordo com PROENÇA (s/d, p. 2), as organizações poderão vivenciar uma fase de criação
artesanal e outra de criação intencional. Nesta trajetória evolutiva, faz-se indispensável o
exercício da ação de lideranças que formatem o ambiente interno nas organizações para as
decisões que seus membros obrigatoriamente deverão tomar.
52
Desdobrando a questão básica, temos que o problema não se resume apenas ao como
proceder para construir ou criar as estratégias, mas e primordialmente, como implantar e
acompanhar as práticas decorrentes das decisões tomadas. Este segundo elemento – a gestão –
é concebido como ‘modelo’ que se traduz por “um conjunto de premissas e orientações,
estruturas de administração, gerência de recursos humanos e orientações para o
comportamento gerencial, incluindo os valores acreditados pela organização”. (Ibid., p. 3)
Assim compreendido, a escolha do modelo de gestão estará ligada a considerações de ordem
estratégica.
Diante de tamanha importância atribuída à direção dos processos – o modelo de gestão
– PROENÇA defende que se dê um passo à frente no trato da relação estratégia–gestão:
“O que propomos aqui é que se vá além, e assuma-se que, precedente à
reconfiguração dos processos, conduza-se a uma avaliação de qual modelo
de gestão necessário à empresa considerada sua inserção estratégica no
ambiente para o futuro imediato, e diante de cenários possíveis de sua
evolução posterior. O que está em jogo, repetimos, é a lógica da dinâmica de
processo estratégico almejada na organização”. (Ibid., p. 5)
Não obstante, talvez sejamos conduzidos a pensar a relação acima a partir da inversão
de seus pólos, qual seja, tornar a gestão uma variável ‘quase’ independente. Porém, para
finalizar, o próprio PROENÇA explica:
“Em última instância, as considerações aqui colocadas procuram dar
substância à ação gerencial consciente sobre o ciclo ‘estratégia – estrutura –
estratégia’ [...] reconhecendo sua imprevisibilidade e o ambiente de incerteza
em que se desenvolve, mas assumindo sua existência e a possibilidade de
orientar sua evolução”. (Ibid., p. 6)
53
CAPÍTULO II
ESTUDO DE CASO QUALITATIVO
COMO ESTRATÉGIA DE PESQUISA EM ORGANIZAÇÕES
54
CAPÍTULO II
ESTUDO DE CASO QUALITATIVO
COMO ESTRATÉGIA DE PESQUISA EM ORGANIZAÇÕES
2.1. Definição e Características da Estratégia de Pesquisa Utilizada
O propósito deste item é não só expor o que é a estratégia de pesquisa estudo de caso,
descrever as suas características e sua importância, mas e principalmente, defender a sua
adequabilidade à investigação do tema estudado neste trabalho.
2.1.1. Tradição nas Ciências Sociais
Iniciamos por situá-lo no conjunto das estratégias de pesquisa e qual tem sido
historicamente sua reputação neste mesmo conjunto. A tradição nas ciências sociais nos
revela que algumas estratégias de pesquisa, como os estudos de campo e survey na sociologia
e os estudos etnográficos na antropologia, têm dominado o cenário das investigações sobre o
comportamento humano e de certo modo o comportamento organizacional ao longo de muitas
décadas.
O sucesso dessas estratégias – notadamente as aplicadas nos estudos de natureza
sociológica - tornou-se bem mais patente e reconhecido nas esferas acadêmicas e das
organizações empresariais, quando as mesmas incorporaram com todo vigor os métodos
quantitativos e mais recentemente os recursos da informática e das ciências da informação
associados àqueles.
Estes fatos não só desenvolveram a capacidade de investigação das ciências sociais em
geral, como também ampliaram seu reconhecimento público enquanto “ciência”,
aproximando-as mais das chamadas “ciências” ou “ciências naturais”, hegemônicas no vasto
campo do conhecimento humano. Obrigatoriamente, as ciências sociais se viram diante de
categorias científicas como certeza, objetividade, rigor, precisão, aplicabilidade, entre outras.
A conseqüência, quase inevitável, foi a constituição de certa hierarquia entre as
estratégias e métodos de abordagem e investigação do social, que pôs no topo as estratégias
55
que trabalham com as categorias da ciência e numa posição inferior as outras, como os
estudos de caso, a pesquisa-ação ou a pesquisa participante, essas denominadas também de
qualitativas.
Como nos enuncia o reconhecido pesquisador YIN, referindo-se a uma dessas
estratégias:
“O estudo de caso há muito foi (e continua a ser) estereotipado como o
parente pobre entre os métodos de ciência social. Os pesquisadores que
realizam estudos de caso são vistos como se tivessem rebaixado o nível de
suas disciplinas acadêmicas. Os estudos de caso também têm sido
denegridos, como se tivessem precisão (ou seja, quantificação), objetividade
e rigor insuficientes”. (2005, p. xi)
A partir da hierarquização, conseqüências se apresentaram entre elas a depreciação da
importância e validade das próprias estratégias qualitativas:
“Gostaria de poder pintar um quadro diferente. No entanto, o estereótipo
existe, e o aviso, portanto, é bem simples: faça estudo de caso, mas faça-os
com a compreensão de que seus métodos serão postos em cheque a partir de
perspectivas racionais (e irracionais) e que os insights obtidos com seus
estudos de caso podem ser depreciados”. (Ibid., p. xi)
Paradoxalmente, para o consolo dos cientistas sociais que acreditam na necessidade,
importância e validade dos estudos qualitativos, uma “nova onda” surgida no século passado
valorizou, estimulou e fez difundir em larga escala a estratégia de pesquisa estudo de caso,
tornando-a uma ferramenta merecedora de credibilidade e respeito. Talvez possamos supor
que certo desencanto com as limitações que os métodos quantitativos apresentam com
respeito à compreensão vertical e em profundidade do comportamento humano e
organizacional tenha colaborado para gestar a reação contrária. O mesmo YIN nos fala do
uso acentuado e extensivo da ferramenta metodológica:
“Ao mesmo tempo, busque algum conforto da observação de que, não
obstante o estereótipo dos estudos de caso como um método deficiente, os
estudos de caso continuam a ser utilizados de forma extensiva em pesquisa
nas ciências sociais – incluindo as disciplinas tradicionais (psicologia,
sociologia, ciência política, antropologia, história e economia) e as áreas
com orientação prática, como planejamento urbano, administração pública,
política pública, ciência da administração, trabalho social e educação”.
(Ibid., p. xi)
56
Correlacionado a este fato, nos fala também do reconhecimento acadêmico que a
estratégia estudo de caso tem alcançado:
“O método também é o modelo freqüente para a pesquisa de teses e
dissertações em todas essas disciplinas e áreas”. (Ibid., p. xi)
2.1.2. Definição
Um comparativo entre a compreensão que alguns autores possuem sobre o estudo de
caso nos revela algumas perspectivas. A primeira delas entende a realidade como um “ente
social” que nos podemos observar e entender, basta que escolhamos algum método para fazê-
lo. Esta mesma perspectiva nos informa que a realidade terá que ser percebida como um
“todo” indivisível com suas fronteiras delimitadas. Nesta compreensão há uma nítida
influência da sociologia clássica de ÉMILE DURKHEIM por sua abordagem de totalidade
social.
A referência de fundamento é o livro seminal “Métodos em Pesquisa Social”, escrito
por GOODE e HATT, ao qual GODOY (2006) se refere para dar uma definição inicial sobre
a estratégia de estudo de caso. Segundo ele, os autores perceberam o estudo de caso como
“um método de olhar a realidade social”. Este método utiliza técnicas comuns às pesquisas
sociais, tais como entrevistas, observação participante, uso de documentos pessoais e coleta
de histórias de vida. GOODE & HATT
12
caracterizam o estudo de caso como um:
“(...) meio de organizar dados sociais preservando o caráter unitário do
objeto social estudado [...] uma abordagem que considera qualquer unidade
social como um todo [...] [e] inclui o desenvolvimento dessa unidade, que
pode ser uma pessoa, uma família, ou outro grupo social, um conjunto de
relações ou processos (como crises familiares, ajustamento à doença,
formação de amizade, invasão étnica de uma vizinhança etc.) ou mesmo toda
uma cultura [...]”. (GODOY, 2006, p. 118)
12
GOODE, W.J. & HATT, P.K. Métodos em pesquisa social. São Paulo: Nacional, 1968. p. 422
57
A segunda perspectiva, a enunciada por MERRIAM (1988)
13
vinte anos após, preserva
os elementos de unidade e totalidade contidos na anterior e inclui outros, tais como processos
sociais, variáveis e hipóteses. Esta perspectiva de definição introduz a comparação no sentido
de afirmar o objeto que o autor deseja definir. Nas palavras de GODOY podemos perceber
implicitamente aspectos de um debate, ainda não superado, entre o que se propõem as
estratégias qualitativas versus o posicionamento afirmado das estratégias quantitativas:
“Também MERRIAM (1988) se refere ao estudo de caso qualitativo como
uma descrição (holística e intensiva) de um fenômeno bem delimitado (um
programa, uma instituição, uma pessoa, um grupo de pessoas, um processo
ou unidade social). Para a autora, o uso do estudo de caso denota que o
interesse do pesquisador está mais voltado à compreensão dos processos
sociais que ocorrem num determinado contexto do que às relações
estabelecidas entre variáveis. Tem sido escolhido por pesquisadores
especialmente interessados no insight, na descoberta, na interpretação, mais
do que na verificação de hipóteses.” (Ibid., p. 119)
A terceira perspectiva, anunciada por MARTINS, coerente com a anterior apresentada,
defende que não se trata apenas de escolher um método qualquer para conseguirmos entender
a realidade social. A compreensão deste autor é que as estratégias de pesquisa qualitativas e,
em particular, o estudo de caso nos possibilitam de fato a penetração na realidade e, no nosso
entendimento, nos provêem o conhecimento da mesma enquanto tal. Conforme aquele autor:
“Trata-se de uma investigação empírica que pesquisa fenômenos dentro de
seu contexto real (pesquisa naturalística), onde o pesquisador não tem
controle sobre eventos e variáveis, buscando apreender a totalidade de uma
situação e, criativamente, descrever, compreender e interpretar a
complexidade de um caso concreto. Mediante um mergulho profundo e
exaustivo em um objeto delimitado – problema da pesquisa -, o Estudo de
Caso possibilita a penetração na realidade social, não conseguida plenamente
pela avaliação quantitativa”. (2006, p. xi)
Podemos concluir, pois, que a evolução da compreensão sobre o que é um estudo de
caso e as suas várias definições alcançou o ponto onde se passa a compreender a referida
estratégia de pesquisa não apenas como uma das estratégias de aproximar, penetrar ou revelar
a realidade social, mas, como a que mais reúne elementos para esta conquista.
13
MERRIAM, S.B. Qualitative research and case study applications in education. San Francisco (LA): JOSSEY-
BASS, 1998.
58
Particularmente no que toca a este trabalho, torna-se bem vindo um refinamento das
definições de estudo de caso direcionado para a pesquisa sobre organizações. Isto porque
estaremos aqui fundamentalmente nos propondo a captar, compreender e interpretar uma das
mais expressivas facetas de uma organização real, a inter-relação de suas estratégias
construídas para incidirem sobre o contexto ou ambiente com as suas estruturas
organizacionais, entendidas como instrumentos de organização e regulação de relações sociais
e processos de gestão. Deste modo, passaremos de agora por diante a discorrer sobre o estudo
de caso como uma das estratégias de pesquisa no universo dos estudos organizacionais. Nada
melhor que iniciarmos essas considerações com a definição de HARTLEY
14
, contida na
informação oferecida por GODOY:
“(...) consiste de uma investigação detalhada, freqüentemente com dados
coletados durante um período de tempo, de uma ou mais organizações, ou
grupos dentro das organizações, visando prover uma análise do contexto e
dos processos envolvidos no fenômeno em estudo (1995, p. 208-209.)”.
(Ibid., p. 120)
2.1.3. Unidade-caso, contexto e ambiente externo e interno
Quando essa investigação detalhada for planejada e conduzida sob a perspectiva de
compreender uma organização como um todo unitário de caráter singular e significativo num
dado contexto social, o caso se reveste de uma qualidade que poderemos denominar de
“unidade-caso”:
“Em sua acepção clássica, a unidade-caso refere-se a um indivíduo num
contexto definido. Por exemplo: um paciente de transplante de coração,
antes, durante e seis meses após a cirurgia, no contexto de sua família e do
hospital. O conceito no caso, no entanto, ampliou-se, a ponto de poder ser
entendido como uma família ou qualquer outro grupo social, um pequeno
grupo, uma organização, um conjunto de relações, um papel social, um
processo social, uma comunidade, uma nação ou mesmo toda uma cultura”.
(GIL, 2002, p. 138, grifo nosso)
Aqui adquire relevância a noção de contexto. Situando a organização escolhida como
unidade-caso num contexto que a faz significativa, poder-se-á deste modo entender que a
14
HARTLEY, J.F. Case studies in organizational research. In: CASSEL, C. e SYMON, G. (Ed.) Qualitative
methods in organizational research: a practical guide. London, Sage, 1995, p. 208-209
59
unidade-caso assim o é devido aos influxos proporcionados pelo seu contexto. Nesta
condição, os contornos da unidade-caso são passíveis de serem confundidos com os de seu
contexto social. Exemplos desta situação são as organizações civis que são criadas no
contexto de um movimento social ou de uma problemática econômica que afeta a vida de
milhares de indivíduos. Esses fenômenos se configuram especiais para os estudos de caso e
acrescentam mais um elemento (o contexto) à sua definição:
“YIN (2001) tenta reunir em sua definição técnica do estudo de caso os dois
aspectos principais que caracterizam essa estratégia de pesquisa: seu escopo
e seus aspectos metodológicos”. (YIN
15
, apud GODOY, Ibid., p. 120)
Quanto ao escopo, ressalta que:
Um estudo de caso é uma investigação empírica que investiga um fenômeno
contemporâneo dentro de seu contexto de vida real, especialmente quando os
limites entre o fenômeno e o contexto não estão claramente definidos [...]”.
(YIN
16
, apud GODOY, Ibid., p. 120)
Diferentemente da situação anterior, a realidade pode nos apresentar uma outra
configuração de inter-relações entre uma organização e seu contexto. É quando a organização
é autônoma em relação ao seu contexto (ambiente), porém não se encontra imune às
determinações, condicionamentos ou influências dele. Os estudos de caso compreendidos
como estratégia de pesquisa qualitativa poderão ter o propósito de revelar a intrincada teia de
influências recíprocas entre o ambiente e a organização.
No largo campo dos estudos organizacionais, esta problemática tem sido valorizada e
as repercussões que a construção de novas estratégias de inserção, manutenção ou superação
por uma determinada organização poderão demandar necessárias reformas ou mudanças no
ambiente interno da mesma, especialmente em seu modo de gestão e na estrutura daí
decorrente.
“HARTLEY (1995) destaca que o estudo de caso tem sido amplamente
utilizado na área de comportamento organizacional especialmente quando se
quer compreender processos de inovação e mudança organizacionais a
partir da complexa interação entre as forças internas e o ambiente externo.
15
YIN, R.K. Estudo de Caso: Planejamento e métodos. Porto Alegre: Bookman, 2001, p. 32.
16
YIN, R.K. Estudo de Caso: Planejamento e métodos. Porto Alegre: Bookman, 2001, p. 32.
60
Segundo o autor, o estudo de caso permite rastrear processos de mudança
identificando e analisando as forças históricas, pressões contextuais e a
dinâmica dos vários grupos de stakeholders na aceitação ou oposição a tais
processos, em uma ou mais organizações, ou em grupos específicos no seu
interior”. (Ibid., p. 121, grifos nossos)
Este ‘modo de ver as coisas’, ou seja, de entender os processos de mudança
organizacional vis-à-vis um processo de estratégias ante o que o ambiente, deixa antever
indica que este recorte da realidade social e organizacional é passível de ser trabalhado pelo
estudo de caso enquanto ferramenta metodológica. O estudo de caso qualitativo poderá
imprimir uma maior verticalidade à pesquisa e à compreensão e interpretação daquele
fenômeno social.
É por esta trilha do conhecimento que o estudo ora apresentado foi planejado e
executado.
2.1.4. Adequação, utilidade e importância
Cabe-nos agora especificar os aspectos que poderiam clarificar a adequação do estudo
de caso como estratégia de pesquisa para o nosso problema de estudo acima exposto.
Na verdade, quando GODOY se refere à interação que acontece entre o processo da
estratégia e o da mudança organizacional, o que se deseja investigar mais a fundo é como são
conduzidos os processos internos da organização unidade-caso do estudo. E, se possível,
quais os valores sociais que inspiram os seus membros na condução daqueles processos.
Neste sentido, a estratégia de pesquisa que aqui analisamos pode ser profícua. Na
interpretação deste autor, a afirmação acima é sumamente válida e ele vai mais além:
“Para HARTLEY (1995), é possível explicitar um conjunto de motivos que
sustentam a importância da utilização dos estudos de caso no entendimento
do funcionamento das organizações. Segundo o autor, os estudos de caso
são especialmente úteis quando o pesquisador deseja compreender os
processos e interações sociais que se desenvolvem nas organizações,
situando-os no contexto histórico – atual e/ou passado – no qual estão
imersos. Também possibilitam uma análise processual, contextual e, em
algumas situações, longitudinal, das várias ações que ocorrem no interior
das organizações e dos significados a elas atribuídos. Constituem-se numa
modalidade de pesquisa, especialmente indicada, quando se deseja capturar
e entender a dinâmica da vida organizacional, tanto no que diz respeito às
atividades e ações formalmente estabelecidas quanto àquelas que são
informais secretas ou mesmo ilícitas”. (Ibid., p. 127, grifos nossos)
61
Esta mesma visão é corroborada por MARTINS, que também é categórico em afirmar
a importância da abordagem qualitativa, na qual se inscreve a estratégia de estudo de caso.
“No campo das Ciências Sociais Aplicadas há fenômenos de elevada
complexidade e de difícil quantificação, como por exemplo, a supervisão de
funções administrativas dentro de uma organização, estratégias de uma
organização não governamental, políticas governamentais etc. Nestes
casos, abordagens qualitativas são adequadas, tanto no que diz respeito ao
tratamento contextual do fenômeno, quanto no que tange à sua
operacionalização. O tratamento de eventos complexos pressupõe um maior
nível de detalhamento das relações dentro das organizações, entre os
indivíduos e as organizações, bem como dos relacionamentos que
estabelecem com o meio ambiente em que estão inseridos”. (2006, p. xi-xii,
grifo nosso)
Porém, se tudo nos leva a uma convergência entre a estratégia do estudo de caso e o
objeto da investigação que aqui apresentamos pelo menos um alerta é válido:
“Uma das maiores limitações da estratégia de pesquisa de um Estudo de
Caso é a possibilidade de contaminação do estudo pelas ‘respostas do
pesquisador’, isto é, a forte possibilidade de o pesquisador ter uma falsa
sensação de certeza sobre suas conclusões. Como o pesquisador, em geral,
conhece profundamente o fenômeno em estudo, ou melhor, pensa que o
conhece totalmente, poderá, deliberadamente, enviesar os dados e evidências
de forma a comprovar suas pressuposições iniciais”. (Ibid., p. xii-xiii)
2.1.5. Teoria e fontes de dados
O estudo de caso permite avançar a teoria:
“(...) Problemas de pesquisa que geram estudos de caso podem surgir de
situações cotidianas, ou seja, serem identificados a partir do desejo do
pesquisador de explicar alguma situação a partir da prática. [...] Os estudos
de caso, no entanto, também podem ser motivados por questões de natureza
conceitual, que surgem de teorias previamente estabelecidas, ou que se
propõem a elaborar uma teoria a partir de um ou mais casos analisados. São
problemas de pesquisa que procuram responder a questões sobre processos
(‘por que’ e ‘como’ as coisas acontecem), assim como a questões de
compreensão que procuram descrever e interpretar ‘o que’ aconteceu numa
determinada situação”. (GODOY, op.cit., p. 127, grifo nosso)
62
Neste trabalho, o conhecimento da experiência da organização propiciou-nos
transformar uma questão resultante da observação do cotidiano em um problema de pesquisa
com apoio da teoria, estabelecendo uma articulação entre as duas coisas. Neste sentido, o item
2.2, relata o desenrolar dessa prática.
A composição do ‘todo’ da unidade-caso não se conforma apenas como questão de
percepção direta – através da observação - da realidade social ou organizacional pelo
pesquisador. Várias fontes de dados colaboram para obter um “todo” mais rico e substancial.
“(...) MERRIAM (1988, p.16), afirma que no estudo de caso qualitativo
busca-se ‘uma descrição e análise holística e intensiva de uma simples
entidade, fenômeno ou unidade social’. Para ela, ‘estudos de caso são
particularistas, descritivos e heurísticos e apóiam-se fortemente no raciocínio
indutivo a partir do manuseio de múltiplas fontes de dados’.” (Idem, ibid., p.
123)
Por outro lado, as várias fontes de dados têm outra importante tarefa: é o primeiro
passo do processo de triangulação praticado em análises dos resultados obtidos nos processos
de pesquisa. Este estudo de caso se apóia fortemente em várias fontes de dados, conforme está
relatado no item 2.2.
Esperamos ter não somente cumprido o propósito deste item, mas também ter oferecido os
fundamentos que poderão facilitar a compreensão da aplicação da metodologia ao caso
estudado.
2.2. O Planejamento e a Realização do Estudo de Caso na APAEB/Valente
Nosso interesse particular pela APAEB (Associação dos Pequenos Produtores do
Estado da Bahia) na qualidade de unidade de pesquisa remonta à década de 1970, quando
estivemos acompanhando profissionalmente os primeiros passos para a criação daquela
organização. Posteriormente, ao final dos anos 1980 e início dos anos 1990, tivemos a grande
e compensadora oportunidade profissional e humana de vivenciar uma experiência de
monitoria de projeto que se processou entre os anos 1989 e 1992. O projeto focado era o da
Batedeira Comunitária de sisal, que iniciara a concretização de um sonho maior de um grupo
de produtores familiares do Município de Valente, incrustado na porção semi-árida do Estado
63
da Bahia. O projeto fora apoiado financeiramente pela Interamerican Foundation (IAF),
organismo de apoio ao desenvolvimento vinculado ao Congresso dos Estados Unidos da
América.
O trabalho de monitoramento do projeto contemplava um leque de aproximadamente
15 indicadores, em sua quase totalidade de natureza quantitativa. Esses indicadores eram
atualizados semestralmente durante nossas visitas ao projeto. Como o apoio da IAF era
restrito ao fornecimento de capital de giro para aquisição de matéria prima e esforço de
exportação, os indicadores objetivavam expressar notadamente o desempenho e as
repercussões obtidas pelo aporte financeiro concedido. Na parte reservada aos anexos, pode-
se tomar conhecimento da lista de indicadores utilizados à época.
2.2.1. Primeira etapa da pesquisa de campo
Em uma etapa da implantação do projeto de doutoramento, voltamos a visitar a
APAEB/Valente, com a intenção de reatar os vínculos humanos e profissionais, bem como de
obter uma atualização sobre a história recente da organização. Esta etapa ocorreu no ano de
2004 e nossos propósitos acadêmicos se inclinavam na direção da compreensão da natureza
do processo de crescimento institucional ali ocorrido.
Com um grande interesse e sob a influência dos estudos sobre as redes de
organizações, entendemos naquele momento que a APAEB/Valente poderia ser estudada
sobre aquela perspectiva, inclusive ainda não visualizada por outros interessados no estudo
daquela organização. A suposição mais geral era de que a multiplicidade de unidades de
negócio construídas, atuantes e interligadas funcionalmente no formato de uma rede era
decorrente da estratégia geral da organização para se manter competitiva no mercado de fibras
naturais. Essa mesma estratégia contemplava objetivos concernentes à manutenção das
atividades educativas e sociais da organização e o provimento de benefícios econômicos aos
seus associados.
Naquele ano e para a pesquisa de campo que qualificamos de exploratória, os
objetivos principais do trabalho foram: a. compreender o processo de formulação de
estratégias da organização; b. explicitar e compreender as novas formas de organizar e de
coordenar no âmbito interno e externo da APAEB/Valente e c. estudar os efeitos econômicos
e sociais produzidos pelo conjunto das atividades da organização, particularmente das
unidades de negócio. Estes objetivos me possibilitaram dar uma atenção especial à morfologia
64
e à dinâmica de funcionamento da organização, o que se concretizou em um produto
denominado de mapa das relações inter-organizacionais (programa da pesquisa em anexo).
Para a programação da visita, assim como para complemento dos dados obtidos, foram
utilizados os Relatórios Anuais da organização referentes ao período de 1999 - 2003. Todo o
material obtido foi registrado em um diário de campo.
A pesquisa de campo naquele ano atendeu nossas expectativas e seus resultados nos
levaram a rever nossa percepção sobre o formato organizacional da APAEB/Valente.
Passamos a compreender a organização não mais como uma rede de organizações, mas como
um tipo especial de corporação que atuava em forma de rede. Também descartamos o terceiro
objetivo inicialmente proposto para o estudo, referente aos efeitos econômicos e sociais
produzidos pela organização na região sisaleira. Esta decisão foi tomada a partir do
reconhecimento de que este item não teria tanta importância na problematização do tema que
pretendíamos continuar pesquisando através do estudo de caso.
2.2.2. Segunda etapa da pesquisa de campo
No ano de 2007, elegemos como central o tema estratégia e estrutura nas organizações
e o trabalhamos previamente antes de voltar para completar a parte de campo do estudo de
caso. O produto deste trabalho foi um plano para realizar o estudo de caso, cuja elaboração
orientou-se pelas recomendações extraídas do manual de pesquisa intitulado de “Estudo de
Caso - Uma Estratégia de Pesquisa”, escrito por Gilberto de Andrade Martins.
O procedimento metodológico do estudo no seu todo está aqui apresentado:
ª Estudo de Caso - Planejamento
1. CAMPO
Teoria das organizações e Sociologia das organizações.
2. ASSUNTO
Estratégias e mudanças nas estruturas das organizações.
3. TEMA
O papel das estratégias na transformação das estruturas organizacionais.
O estudo limitar-se-á ao crescimento da função econômica da APAEB/Valente,
em particular, ao impacto que a fábrica de carpetes e tapetes e outros negócios
correlacionados geram nas formas de organização internas. Este impacto é
65
entendido como uma decorrência de um esforço maior da organização para gerar
emprego e renda para a população envolvida com a produção sisaleira.
CHANDLER (1997), em seu artigo seminal sobre estratégias e estruturas, se
pergunta: De que maneira eles fazem a estrutura para administrar cada grande
empresa”? e “onde eles inovam”? (p. 41). Parte ele de uma distinção entre o que é
o estratégico e o que é o tático. O estratégico engloba decisões concernentes à
condição de longo prazo da empresa, enquanto o tático reúne as decisões dadas
sobre o dia-a-dia, visando a eficiente e tranqüila operação. No desenvolvimento
do argumento, ele é enfático quando afirma:
“A tese que as formas organizacionais diferentes resultam de diferentes tipos
de crescimento pode ser fixada mais precisamente se o planejamento e o
desenvolvimento de cada crescimento é considerada uma estratégia, e a
organização projetada para administrar essas atividades ampliadas e
recursos, uma estrutura”. (Ibid.)
Portanto, a estratégia pode ser definida como uma determinação das finalidades
fundamentais de longo termo e objetivos de uma empresa e a adoção de “cursos
de ação” e de alocação de recursos necessários para obter, alcançar essas
finalidades. Por seu lado, a estrutura pode ser definida como o design de
organização através do qual a empresa é administrada. O período coberto pelo
estudo será aquele que vai da tentativa de modificação do modelo de
desenvolvimento rural até o atual modelo de convivência com o semi-árido (cf.c/
a periodização da história da organização).
4. PROBLEMATIZAÇÃO
O propósito fundamental para a criação da APAEB (geral) – e ainda o é – a
obtenção e o provimento de benefícios econômicos coletivos para o seguimento
dos sisaleiros do semi-árido do Estado da Bahia. No presente, essa organização é
a expressão de um grande grupo social exclusivo, assim qualificado porque o seu
caráter econômico de atuação nos mercados nacional e internacional de fibras
naturais visa preferencialmente auferir e prover benefícios econômicos (preços,
notadamente) para seus associados. Isto não impede, porém, de generalizar tais
benefícios para um conjunto maior de produtores não-associados à organização
(grupo inclusivo). O formato organizacional inicial da APAEB (associação civil)
66
condiz com as disposições legais do ordenamento jurídico brasileiro e, portanto,
insere-se nos marcos institucionais que regulam as atividades econômicas. A
partir então dessas primeiras considerações tentaremos problematizar nosso
objeto.
Por que as organizações crescem ou se transformam?, Quais os fatores
responsáveis pelo surgimento, modificação ou extinção de unidades na estrutura
de uma organização? Por que a APAEB/Valente cresce e se transforma
continuadamente? Que critérios os seus componentes utilizam para conduzir
esses processos organizativos?
O nosso conhecimento e experiência pessoal junto a essa organização, ao longo
de mais de 20 anos, fizeram com que essas indagações orientassem um projeto de
pesquisa que pretende encontrar não todas e exaustivas respostas, mas um eixo
coerente de ação que ajude a interpretação da causalidade desse fenômeno social e
com mais ênfase a compreensão das motivações, os significados, os valores
sociais envolvidos nos cursos da ação e seus efeitos enquanto um processo de
grupos numa organização camponesa singular.
É também fundamentado em estudos prévios (cf. c/ NASCIMENTO, 2003 e
CAMAROTTI e SPINK, 2000) e no acompanhamento permanente de
informações de noticiários produzidas pela mídia e por ela própria sobre a
APAEB/Valente, que passamos a exercitar a construção de um leque de sub-
questões que desmembram aquelas expostas acima. Estas indagações especificam
aspectos vários que acreditamos que naquela realidade organizacional e na ampla
realidade social se ponham em posição de interação permanente.
Eis, postos de forma ordenada, alguns dos múltiplos aspectos que nos parecem
importantes e esclarecedores para os propósitos da pesquisa. Indagamos:
a. o crescimento e ou transformação que ocorre naquela organização se deve a
aceitação de uma racionalidade intrínseca do conviver com o semi-árido?
b. o crescimento e ou transformação se apóia na visão de intervenção sistêmica na
economia e sociedade do sisal?
c. o crescimento e ou transformação é decorrente de imposições que os
stakeholders fazem à organização?
d. o crescimento e ou transformação é pautado pelas demandas diversificadas da
população local?
67
e. o crescimento e ou transformação é função do atendimento às demandas dos
movimentos sociais locais, nacionais e até mesmo internacionais?
f. o crescimento e ou transformação se deve à posição da organização enquanto
elemento constitutivo de uma ou mais redes de organizações sociais?
g. o crescimento e ou transformação é a resultante organizacional da elaboração
de estratégias diferenciadas ao longo da história da organização?
h. o crescimento e ou transformações se deve à pujança das lideranças
institucionais?
i. o crescimento e ou transformação permanente é algo próprio da natureza das
organização do terceiro setor?
Importante, então, destacar nesta reflexão dois pontos, os quais neste momento
parecem-nos bem estruturantes do processo em tela. Um deles, a presença e o
papel capitaneador que cumpre a unidade fábrica de carpetes e tapetes no corpo
organizacional; o outro, a qualidade das escolhas e decisões feitas pelos membros
da APAEB/Valente com respeito ao próprio processo aqui estudado. Quanto ao
segundo, acreditamos que esse processo organizacional tem sido conduzido e
referenciado por valores sociais, tais como solidariedade, cooperação,
reciprocidade, responsabilidade, entre outros do tipo, que suporiam a geração de
um ‘efeito lealdade’ interno entre os membros da organização e externamente com
os beneficiários da mesma.
5. PROPOSIÇÕES
Os indícios apontados pela realidade social que envolve a APAEB/Valente
levam-nos a cogitar a defesa da idéia de que é inevitável não considerar a
multiplicidade de aspectos ou fatores através dos quais podemos nos aproximar da
realidade da organização. Cabe então aqui listar algumas explicações parciais que
ganham sentido na medida em que se articulam em um conjunto coerente:
a. a intervenção visando o desenvolvimento do semi-árido exige que a mesma
seja multifacetada;
b. devido às adversidades impostas pelo meio ambiente e pelo sistema
econômico-social do sisal, que contempla um forte conteúdo de dominação nas
relações sociais e humanas, as ações que se venham a realizar carecem de
lideranças institucionais fortes e contestadoras do próprio sistema;
68
c. impõe-se acertadamente a tentativa de utilizar, maximizar ou inovar
permanentemente o uso dos recursos humanos, físicos, de informação e
conhecimento endógenos à região;
d. o processo de rede de organizações faz com que a intervenção de uma
organização do terceiro setor naquela realidade seja mais sólida e efetiva. As
relações de solidariedade, cooperação recíproca e complementaridade entre as
unidades potencializam ações de cada uma das mesmas;
e. a experiência distributiva de benefícios financeiros e materiais aos sócios da
organização e ao conjunto dos produtores de sisal integrados às ações
desenvolvimentistas tem-se mostrado adequada e correta. Essa escolha política
dá visibilidade às conquistas do movimento social dos sisaleiros e sustentação
social à intervenção da organização;
f. Na medida em que a intervenção assume o caráter de pioneirismo, em muitas
ocasiões a mesma se faz na perspectiva de ‘ensaio e erro’.
Do reconhecimento da validez deste leque de assertivas, podemos construir
logicamente uma interpretação para um processo de estratégias organizacionais da
APAEB/Valente fundado em posturas coerentes com o ambiente externo, tanto
quando o mesmo apresenta-se com certa previsibilidade ou quando a incerteza é a
tendência prevalente. A prática dos processos de estratégia só vai ser eficaz se
acompanhada de permanentes alterações nos procedimentos de intervenção
(ações) e nos aparatos que as organizações internamente necessitam para
exercerem suas competências e efetivarem ações concernentes aos seus objetivos
estratégicos. A inovação organizacional que a APAEB/Valente nos contempla é a
de que as escolhas estratégicas, econômicas e organizativas são fundadas em
valores sociais que orientam a organização desde sua origem. Buscar elementos e
evidências para demonstrar esta compreensão norteadora é o propósito deste
estudo.
6. FIXAÇÃO DE PARÂMETROS
A realidade social que pretendemos estudar é vasta e multifacetada. Ela nos
permite enfocá-la nos contextos dos arranjos produtivos locais, dos movimentos
sociais, do terceiro setor e também do contexto das redes de organizações locais.
Optaremos neste estudo apenas por um, no caso o contexto das redes de
organizações, pois a organização APAEB/Valente não pode ser enfocada apenas
69
como uma organização singular. Ela só poderá ser compreendida em sua
totalidade quando posta em um contexto dado, ou seja, em interação com outras
organizações não similares e, também por isto, complementares. Quanto à
realidade organizacional, ela é também vasta, complexa e dinâmica. Este estudo
pretende restringir-se a uma parte dessa realidade por supormos que o domínio
selecionado é o estruturador da ação econômica e estratégica da organização e,
por conseguinte, de interveniência fundamental na construção e alteração da
estrutura organizacional. Estamos nos referindo à fábrica de tapetes e carpetes em
conjugação com os negócios correlacionados (batedeira comunitária, posto de
vendas, laticínio, riquezas do sertão, curtume e couros Valente e clube social).
Além dos contextos temáticos, há também que serem incorporados ao estudo
variáveis tais como a organização da família na agricultura familiar, o papel das
lideranças no âmbito da organização e da sociedade local, o universo dos
stakeholders e a relação da organização com os distintos níveis do Estado. Estas
variáveis fazem incidir sua força de atributo político na determinação dos
contornos organizacionais, em particular no processo organizativo. A escolha de
um período de tempo determinado auxilia-nos sobremaneira a recortar o objeto
deste estudo e por certo virá a contribuir para a caracterização, interpretação e
compreensão das opções de estratégia feitas e praticadas pela APAEB/Valente.
Assim dito, o estudo estará direcionado à investigação da função econômica da
APAEB/Valente, que compreende a fábrica de tapetes e carpetes e os outros
negócios a ela correlacionados, no período que remonta da intervenção da
organização visando à modificação do modelo de desenvolvimento rural
historicamente consolidado (sistema do sisal) até o atual modelo de convivência
com o semi-árido (cf. c/ Quadro 3, Cap. III, p. 105 ). Atualmente, a fábrica
emprega em média 500 funcionários e é abastecida pela matéria prima de três
batedeiras, sendo uma comunitária e outras duas particulares que prestam serviço
exclusivamente à APAEB/Valente. No total, incluindo a parte administrativa, a
organização emprega mais de 900 pessoas.
ª Estratégias para obtenção dos dados e evidências
O trabalho de campo para obtenção de dados e evidências foi conduzido
através da realização de uma oficina com membros da Diretoria Executiva e
70
responsáveis pelas unidades de negócio; de reuniões com a Diretoria Executiva;
de reuniões com os membros das unidades de negócio e de entrevistas individuais
com diretores e responsáveis pelas unidades de negócio. Os roteiros para a
realização da oficina e para entrevistas com a Diretoria Executiva comportaram os
itens dinâmica do ambiente-organização; o processo da estratégia; tipos de
estruturas organizacionais mais adequadas; dinâmica e processos que permitem a
implantação da estratégia (gestão) e conhecimento e práticas organizacionais.
Esses roteiros completos podem ser consultados nos Anexos deste trabalho. A
estratégia para essa parte da coleta de dados foi a de repetir praticamente o mesmo
roteiro nos distintos níveis da organização, com o propósito de obter possíveis
posicionamentos distintos em acordo com as posições dos membros na estrutura
da organização. As entrevistas individuais não foram conduzidas com roteiro
previamente construído, tendo o propósito de deixar os entrevistados ‘à vontade’
para narrar a condição atual dos negócios e expor suas opiniões particulares sobre
os assuntos abordados.
No geral, o clima organizacional encontrado na visita do ano de 2007 foi de
tensão e de até medo de comprometimento entre os participantes das práticas de
pesquisa, diferentemente do ano de 2004 quando o clima ainda era de otimismo e
crença no futuro. É bom explicitar que o ano 2004 marca a afirmação de uma
grande crise financeira na instituição e o ano de 2007 vinha se configurando como
o ano de auge da mesma crise (programa da visita em anexo).
ª Indicadores
De modo complementar, com respeito à realização da investigação sobre o
processo real de construção das estratégias na organização, foi construído e
aplicado um rol de indicadores, organizado segundo três categorias, a saber, os
indicadores de ‘performance’ das unidades de negócio; os indicadores da
consecução do processo e os indicadores que poderiam revelar os impactos das
estratégias construídas sobre a estrutural organizacional.
Eis o rol de indicadores aplicado:
71
SISTEMA DE INDICADORES
1. INDICADORES DE PERFORMANCE DAS UNIDADES DE NEGÓCIO
¾ aquisição de matéria prima (produto do associado e do produtor familiar);
¾ custos de produção;
¾ vendas (evolução dos preços do sisal, do leite de cabra, das peles, etc.);
¾ lucros;
¾ prejuízos;
¾ endividamento;
¾ taxa de crescimento;
¾ benefícios realizados para o associado e para o produtor familiar.
2. INDICADORES DO PROCESSO DE ESTRATÉGIA
¾ realização de reuniões com o objetivo de formular as estratégias;
¾ freqüência das reuniões (semanais, mensais, etc.);
¾ pessoal ou grupos participantes do processo, inclusive associados e produtores.
3. INDICADORES DO IMPACTO DAS ESTRATÉGIAS SOBRE A ESTRUTURA
¾ surgimento e extinção de unidades na estrutura;
¾ variação da importância da unidade na estrutura;
¾ representação gráfica (organogramas, fluxogramas, etc.);
¾ articulação das unidades internamente na estrutura (formato);
¾ articulação das unidades intra-rede externa;
¾ gargalos organizacionais;
¾ processos de gestão idealizado e real;
¾ distribuição do poder nas unidades da estrutura.
Todas as informações obtidas nas diferentes práticas de pesquisa foram registradas em
“diário de campo” e posteriormente organizadas em relatórios específicos.
A documentação foi outra fonte de pesquisa utilizada no estudo de caso. De
fundamental importância para compreender a evolução institucional da unidade de pesquisa,
foram estudados:
os Relatórios Anuais da APAEB/Valente do período de 1999-2006;
72
um Relatório de Avaliação Externa, realizada entre os anos de 1999 e 2000;
relatórios de estudos anteriores sobre a organização.
Também foi utilizada pesquisa na Internet para obter informações sobre o Arranjo
Produtivo do Sisal.
No tocante à tarefa de análise, foram seguidas as orientações do manual já citado, no
qual são enfatizadas como da maior importância as etapas de encadeamento das evidências e
de análise dos resultados em sentido estrito. O modo de processamento dessas etapas, de
acordo com o que prescreve MARTINS (op.cit.), encontram-se em anexo.
73
CAPÍTULO III
TRANSFORMAÇÃO ORGANIZACIONAL, INOVAÇÃO E
ADAPTAÇÃO AO MEIO EXTERNO: O CASO DA APAEB/VALENTE
74
CAPÍTULO III
TRANSFORMAÇÃO ORGANIZACIONAL, INOVAÇÃO E
ADAPTAÇÃO AO MEIO EXTERNO: O CASO DA APAEB/VALENTE
3.1. Dados Macros sobre o Sisal
A principal matéria prima agrícola processada pela APAEB/VALENTE é o sisal,
também chamado de agave. De acordo com SANTOS (s/d):
“A denominação Agave é derivada de Agavos que, em grego, significa
magnífico, admirável. O Sisal ou Agave é uma planta originária do México
que gera a fibra dura mais importante do mundo. É uma planta muito
resistente, xerófita, de cultura perene e capaz de desenvolver-se em regiões
de baixa precipitação pluviométrica e com temperaturas elevadas. Pertence à
classe dos Monocotiledônea, família Agavaceae, gênero Agave, espécie A,
Sisalana”.
Sua vida útil é de oito anos, e apresenta brotações ao redor de um bulbo (o caule), das
quais surgirão novas folhas no ano seguinte ao corte. Cada pé produz de 50 a 60 folhas
(palmas) anualmente – ásperas, alongadas, com um espinho de dois centímetros na
extremidade, atingem até 1,80 metros de comprimento e 15 centímetros de largura. A colheita
inicia-se 20 a 30 meses após o plantio. O desfibramento da sua palma produz o suco, a
mucilagem, e a fibra verde (úmida). Desta última, procedendo-se a secagem e o
beneficiamento, se obtêm a bucha, o refugo e a fibra DB. A bucha é aproveitada na indústria
na fabricação de mantas e nos estofados, enquanto que a fibra DB é utilizada na fabricação de
cabos, cordas, fios, binder twine e baler twine. Da mucilagem, pode-se obter a ração animal
suplementar e o adubo orgânico e do suco é possível produzir biofertilizantes. O quadro
seguinte apresenta um esquema completo do aproveitamento dessa planta.
75
Quadro II
Produtos Derivados do Sisal
Fonte: EMBRAPA
A produção do sisal é realizada em três continentes. Nas Américas os principais países
produtores são o Brasil, a Venezuela, El Salvador, o México, Cuba e o Haiti. Na África,
podem-se listar como principais o Quênia, a Tanzânia, Madagascar, Moçambique e a África
do Sul. Na Ásia a produção é realizada predominantemente na China. Em 2006, de uma
produção mundial de 246,6 toneladas, a participação do Brasil em termos percentuais foi de
50.4%, vindo logo abaixo a Tanzânia e a China, ambas com uma participação de 14.2% e o
Quênia com 10.1%. A Venezuela e Madagascar, respectivamente com 4.3% e 3.9%,
apresentam uma inexpressiva participação. Outros seis países somados totalizam 3.0% do
total (Gráfico II). O Brasil, entre os anos de 1995 e 2007, produziu em média 130.1 toneladas
por ano, mantendo uma posição privilegiada no ranking (Gráfico III).
PRODUTOS DERIVADOS DO SISAL
Desfibramento
(palma)
Suco Mucilagem Fibra Verde
Suco Ração Animal (úmida)
(prensado) (suplementação)
Biofertilizantes Secagem
Adubo orgânico fibra sec
a
Melaço
Bactéria
s
(Saccharomices cerivisae) Beneficiamento
Geia (gel)
Bucha Refugo Fibra "DB"
Torta
Industrialização
Esteróides Mantas PO
Elastina
Pectina Estofados Cistoesteróides Ração Animal
Alectina Hecogenina
Ácido Glicólico
Predinilisona
Cortisona Industrialização
Estradiol Baler Twine
Testoesterona Binder Twine
Progesterona Fios
Cordas
Fonte: Embrapa Cabos
76
PAÍSES PRODUTORES DE FIBRAS DE SISAL EM 2006
PARTICIPAÇÃO PERCENTUAL
Tanzânia
14,2%
Quênia
10,1%
Outros (06)
3,0%
Madagascar
3,9%
China
14,2%
Brasil
50,4%
Venezuela
4,3%
Produção em 2006 = 246,6 mil toneladas
Fonte: FAO. Elab.: CONAB.
Fonte: FAO. Elaboração CONAB.
Gráfico II
Países Produtores de Fibras de Sisal em 2006 – Participação percentual
Gráfico III
Produ
ç
ão Brasileira de Fibras de Sisal
0,0
40,0
80,0
120,0
160,0
E
M
T
O
N
E
L
A
D
A
PRODUÇÃO BRASILEIRA DE FIBRAS DE SISAL
CONAB
140,0 125,0 135,0 135,3 110,0 124,6 127,2 138,1 142,0 139,7 119,1 123,4 132,0
1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007(*)
Fonte e Elaboração: CONAB
(*) = Previsão
+ 7%
Fonte: CONAB
77
No tocante à exportação brasileira de fibra e manufaturados, os dados da
SECEX/CONAB revelam que o Brasil alcançou as cifras de 62,2 mil toneladas até o mês de
julho do ano de 2007 e 61,2 mil toneladas até o mês de julho do ano anterior. Este feito
corresponde a 57,1 milhões de dólares para o ano de 2007 e de 56,3 para o ano de 2006.
Do volume exportado até julho do ano de 2007, a participação brasileira por produto
foi de 55.2% de sisal beneficiado, 33.2% de cabos, cordas e cordéis, 9.6% de fios e apenas
2.0% de tapetes. (Gráfico IV). A participação por produto na pauta de exportações brasileiras
foi sendo modificada historicamente, constatando-se que em 1998 as fibras diversas eram
responsáveis por 33.8% e os cabos e cordas por 61.5%, enquanto que até julho de 2007 as
fibras diversas perfizeram 55.2% e os cabos e cordas caíram para 33.2%. É interessante notar
que, no período referido, as exportações de fios cresceram de 1.5% em 1998 para 9.6% até
julho de 2007. Contudo, a participação de tapetes, que em 1998 foi de 3.2%, manteve-se
relativamente estável até o ano 2002, começando a decrescer a partir do ano 2003 e
alcançando os 2.0% em julho do ano de 2007 (Gráfico V).
Gráfico IV
Sisal - Volume Exportado – Participação % por Produto, ano 2007
SISAL, VOLUME EXPORTADO - PARTICIPAÇÃO % POR
PRODUTO, ANO 2007
Cabos, Cordas e
Cordeis
33,2%
Sisal Beneficiado
55,2%
Fios
9,6%
Tapetes
2,0%
Exportação até 07/07 = 62,2 mil toneladas
Fonte: SECEX. Elab.: CONAB.
Fonte: SECEX. Elaboração: CONAB
78
Gráfico V
Sisal – Participação % por Produtos nas Exportações.
Com respeito à geração de divisas, de acordo com dados também da SECEX/CONAB,
a participação por produto no ano de 2007 até o mês de julho foi de 40% para cabos, cordas e
cordéis; de 38.8% de sisal preparado; de 13.9% de fios e 7.3% de tapetes. O item tapetes, que
teve sua exportação iniciada em 1992, gerou naquele ano 696 mil dólares, alcançou em 1997 a
cifra de 11.994 mil dólares, a partir do ano seguinte foi declinando e no ano de 2006 gerou
divisas de 7.717 mil dólares. Até julho de 2007 foram computados apenas 4.142 mil dólares.
A evolução dos preços médios de exportação de fibras e manufaturados no período de
1997 a julho de 2007 apresentou um melhor desempenho para os fios diversos, seguidos pelos
cabos e cordas e, por fim, das fibras. O preço médio de tapetes é superior aos dos outros
produtos no mesmo período, porém sua participação relativa no total das exportações
brasileiras é insignificante (Gráficos VI e VII).
0%
20%
40%
60%
80%
100%
E
M
T
O
N
E
L
A
D
A
S
1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 7/2007
SISAL - PARTICIPAÇÃO % POR PRODUTOS NAS EXPORTAÇÕES
CABOS, CORDAS ETC FIBRAS DIVERSAS FIOS TAPETES
1
2,0
9,6
55,2
33,2
61,5
33,8
3,2
1
,
5
Fonte: SECEX. Elaboração: CONAB.
79
Gráfico VI
Sisal – Preço Médio de Exportação de Fibras e Manufaturados.
Período: 1997 a 2007
Gráfico VII
Sisal – Preço Médio de Exportação de Tapetes - Período: 1997 a 2007.
SISAL - PREÇO MÉDIO DE EXPORTAÇÃO DE FIBRAS E
MANUFATURADOS. PERÍODO: 1997 a 2007
1.106
645
1.330
200
400
600
800
1.000
1.200
1.400
1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 7/2007
E
M
U
S
$
/
t
F
O
B
B
R
A
S
I
L
FIBRAS CABOS/CORDAS FIOS DIVERSOS
Fonte: CECEX/DECEX. Elaboração: CONAB.
SISAL - PREÇO MÉDIO DE EXPORTAÇÃO DE TAPETES,
PERÍODO: 1997 a 2007
3.289
1.500
2.000
2.500
3.000
3.500
4.000
1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 7/2007
E
M
U
S
$
/
t
F
O
B
B
R
A
S
I
L
T A P E T E S
Fonte: CECEX/DECEX. Elaboração CONAB
80
Os dados sobre os principais países importadores de fibras de sisal no ano de 2006
revelam a participação majoritária dos Estados Unidos da América com 41.4% e a China com
29.0%. Seguem-se Portugal com 7.5%, o México com 4.0%, a Alemanha com 2.3%, a França
com 1.5%, o Chile e o Marrocos com 1.4% cada, a Argélia e a Holanda com 1.3% cada e a
Guatemala com 1.0%. Outros países totalizam 7.7% (FAO/CONAB) (Gráfico VIII).
3.2. O Arranjo Produtivo Local do Sisal no Estado da Bahia
A produção brasileira do sisal é realizada em cerca de 110 municípios do país,
conforme dados da CONAB. A produção de fibras é majoritariamente feita no Estado da
Bahia que, no ano de 2006, segundo a SECEX/CONAB, foi responsável por 89.5% do total
produzido, ou seja, 124.290 toneladas. Os outros estados apresentam uma pequena
participação na produção, tais como a Paraíba 8.1%, o Rio Grande do Norte 1.9%, o Ceará
0.6% e o Estado de Pernambuco com apenas 0.006%.
PRINCIPAIS PAÍSES IMPORTADORES DE FIBRAS DE
SISAL EM 2006 - PARTICIPAÇÃO PERCENTUAL
Holanda
1,3%
Marrocos
1,4%
México
4,0%
Portugal
7,5%
Outros(56)
7,7%
França
1,5%
EUA
41,4%
China
29,0%
Chile
1,4%
Argelia
1,3%
Alemanha
2,3%
Guatemala
1,0%
Exportação em 2006 = 106,5 mil toneladas
Fonte: FAO, Elaboração: CONAB.
Fonte: FAO. Elaboração: CONAB.
Gráfico VIII
Principais países importadores de fibra de sisal em 2006
81
No Estado da Bahia, cerca de 70 municípios produzem as fibras do sisal (CONAB),
sendo este produto cotado como o décimo da pauta de exportações do estado. Há uma
variação nos volumes produzidos nesses municípios, que vai daqueles que produzem até 600
toneladas aos que produzem aproximadamente 40 mil toneladas por ano (Foto I). Segundo o
Censo do IBGE do ano 2000, o Estado possui uma superfície territorial de 567.295 km
2
, que
englobam 415 municípios. Sua população é de 13.070.250 habitantes, com uma densidade
demográfica de 23 habitantes /km
2
e grau de urbanização de 67.1%. Ele ocupa o 4º lugar em
população no país e é o mais populoso da região Nordeste do Brasil. (OLIVEIRA, 2002, p. 8)
Sua porção semi-árida ocupa a região central do mesmo, representando mais de 60% da sua
superfície territorial. Ela abrange 258 municípios, com uma população estimada em cerca de
5.6 milhões de habitantes. Nessa região, o relevo exerce um papel significativo na distribuição
das chuvas; o regime pluviométrico caracteriza-se por precipitações irregulares no decorrer
dos meses e dos anos, ocorrendo períodos cíclicos de estiagem. Essas irregularidades
climáticas geram, periodicamente, crises econômicas e sociais resultantes da baixa
produtividade do sistema agrícola vigente. (Ibid., p. 10) A atividade humana da região é
predominantemente pastoril, distinguindo-se pelo fato do criatório extensivo ter prioridade e
as parcelas cultivadas serem cercadas. Deste modo, atualmente a pecuária extensiva ocupa
grandes partes, constituindo a base econômica dessa região. Subsiste também uma agricultura
sem grande expressão econômica, principalmente ao sul da planície, representada
basicamente pelo cultivo do algodão herbáceo, batata-doce, mamona, sisal, banana, melancia
e os de subsistência como feijão, milho e mandioca cultivada nos vales. A agricultura,
entretanto, assume relevante importância social por ocupar a maioria da força de trabalho
regional. (Ibid., p. 11).
Sob a ótica da metodologia de APL – Arranjos Produtivos Locais, desenvolvida pela
REDESIST (Sistema de Informações de Arranjos Produtivos Inovativos Locais), o Estado da
Bahia possui um APL onde a produção do sisal é realizada de modo massivo e concentrado na
porção semi-árida do mesmo. O território considerado no Arranjo abrange três microrregiões,
sendo elas a Nordeste, o Piemonte da Diamantina e a de Paraguaçú. Diferentemente da
estatística da CONAB, o APL considera um número maior de municípios produtores do sisal,
totalizando mais de 150. (cf. Relatório REDESIST, p. 4)
Por seu turno, o IBGE (PRODUÇÃO AGRÍCOLA MUNICIPAL, 2002) considera que
75 municípios são produtores do sisal. Juntos, ocupam uma área de 80.6 mil hectares e
abrigam uma população de 1.5 milhões de habitantes. Esses municípios encontram-se
82
localizados naquelas microrregiões do Arranjo e, do total, 36 são mais representativos no todo
da produção. (ALVES, 2006, p. 371) Na microrregião Nordeste, 15 municípios são mais
representativos em termos de produção: Araci, Cansanção, Conceição do Coité, Euclides da
Cunha, Monte Santo, Nordestina, Queimados, Quijingue, Retirolândia, Santa Luz, São
Domingos, Serrinha, Teofilândia, Tucano e Valente, localidade que sedia a APAEB. (Ibid., p.
371) As outras duas microrregiões, Piemonte da Diamantina e Paraguaçu, contam com 12 e 9
municípios de maior representatividade, respectivamente. Ainda na microrregião Nordeste, o
número de propriedades rurais dos municípios chega a 63.5 mil, ocupando uma área total de
1.33 milhões de hectares. Do total de estabelecimentos rurais, 95.7% são familiares, ocupando
57.7% da área total. O tamanho médio dos estabelecimentos familiares é 12.61 hectares,
enquanto que os patronais têm área média de 219.47 hectares (BRASIL, 2000). Em termos de
área plantada, o sisal ocupa o segundo lugar, perdendo somente para o feijão (102.700
hectares). (Idem, Ibid., p. 371)
O APL é classificado de agroindustrial e é composto de 30.000 produtores de sisal, de
3.000 donos de motores de desfibramento, de 40 donos de batedeiras (usinas de
beneficiamento) e de 12 indústrias de transformação. Neste universo existem distintos portes
empresariais, entre as quais micro, pequenas e médias empresas e também organizações
outras, como associações e cooperativas de produtores. As principais organizações
econômicas existentes são a Companhia Sisal do Brasil (COSIBRA), a Sisalana S/A -
Indústria e Comércio, a Associação dos Pequenos Agricultores do Estado da Bahia – APAEB
e a Cooperativa Mista de Produtores da Região Sisaleira (COOPERSISAL).
Segundo dados da REDESIST, no ano de 2001, a cultura do sisal praticada no Estado
da Bahia gerou um montante da ordem de R$ 67.707.000,00. Da produção do sisal
beneficiado, 70.0% foram destinados aos mercados europeu e asiático, apresentando Portugal
uma participação de 50.0% nas compras. Já o sisal manufaturado apresenta como principais
importadores os Estados Unidos da América, com a participação de 86.0% e o Canadá, com
5.0%.
A cultura do sisal é intensiva de mão de obra. Essa é proveniente da agricultura
familiar, a qual articula o trabalho das culturas alimentares tradicionais (milho, feijão,
mandioca, etc.) com os cuidados rotineiros que o sisal exige. Estima-se que existem no
Estado, direta ou indiretamente envolvidos com a cultura sisaleira, aproximadamente 700 mil
pessoas. (Relatório REDESIST, p. 5)
83
De acordo com a fonte de informação referida acima (p. 5 e p. 6), o APL apresenta
uma série de gargalos que obstaculizam a sua melhoria. Entre os principais arrolam-se:
A qualidade do sisal brasileiro é considerada inferior à de seus competidores
internacionais;
Baixo conteúdo tecnológico. Utilizam-se equipamentos de baixa produtividade, com
elevado grau de desperdício das fibras contidas nas folhas e elevado número de
acidentes de trabalho;
Baixa eficiência. Aproveitam-se apenas 4.0% das fibras obtidas durante o processo;
Manejo cultural inadequado, influenciando a qualidade e a produtividade;
Baixo aproveitamento dos subprodutos do sisal, gerando rejeitos que poderiam ser
utilizados em outras atividades (herbicidas, produtos farmacêuticos, ração animal,
substrato para a plantação de cogumelos comestíveis, entre outros);
Inexistência de exploração consorciada com outras culturas;
Baixo grau de transferência de tecnologia ao pequeno produtor;
Estrutura de produção, distribuição e comercialização deficientes;
Necessidade de pesquisas sobre novos usos para a fibra do sisal;
Baixa remuneração dos trabalhadores;
Precariedade das relações de trabalho;
Condições de segurança no trabalho precárias. Número preocupante de acidentes
com mutilações de membros superiores no trabalho de desfibramento/
descortiçamento da folha realizado com a máquina “paraibana”.
O mesmo documento traz uma observação afirmando que:
“[...] o surgimento da APAEB (ASSOCIAÇÃO DOS PEQUENOS
PRODUTORES DO MUNICÍPIO DE VALENTE), na década de 80, teve
um importante papel no sentido da promoção de condições e relações de
trabalho mais dignas. [...] Posteriormente, a APAEB introduziu uma usina de
beneficiamento comunitária e criou uma indústria de tapetes e carpetes,
agregando valor à produção e gerando mais empregos”. (p. 5)
3.3. O Município de Valente e a Área de Intervenção da APAEB
O Município de Valente dista 240 km da cidade de Salvador, capital do Estado da
84
Bahia. Ele está posicionado na latitude sul 11º 24’ 44” e longitude 39º 27’ 43”, podendo ser
acessado pelas rodovias BR-234, BR-116 e BA-120. Faz limites a leste e sul com os
Municípios de Conceição do Coité e Retirolândia, a oeste com o de São Domingos e ao norte
com o de Santaluz. Encontra-se a uma altitude de 358 m entre as bacias hidrográficas dos rios
Itapicuru e Jacuipe e o relevo caracteriza-se pelo pediplano sertanejo. Por estar localizado no
semi-árido baiano, seu clima é quente e seco e sua vegetação característica é a caatinga
arbórea com palmeira. (VERDE, 2007).
“Ele situa-se no meio da região sisaleira do estado e contribui com 85.0% da
produção nacional. ... Considerado a capital brasileira do sisal, Valente deve
seu nome a um boi. Consta que, no início do século passado, um novilho se
desgarrou da boiada e se perdeu na caatinga. Durante anos, os vaqueiros
tentaram pegá-lo, sem sucesso. Arisco, destemido, ele sempre dava um jeito
de escapar. Até que um dia foi subjugado e levado para um curral nas
cercanias do povoado que deu origem à cidade. O barbatão não aceitou, no
entanto, a nova condição. Lutou até morrer. Preferiu se jogar numa vala
profunda a se render”. (GLOBO RURAL, dez. 2006, p. 4-5)
O município foi criado em 1958, desmembrado do município de Conceição do Coité,
ao qual pertencia. Em 1989, sofreu, por sua vez, o desmembramento territorial que resultou a
criação do município de São Domingos. No presente, possui uma área de 356.9 km
2
. Valente
vivenciou um período de quase trinta anos de crescimento em função do apogeu da cultura do
sisal. Nessa época foi construído o prédio da Prefeitura Municipal, um aeroporto e realizadas
obras de expansão e urbanização da cidade. Nas décadas de 50 e 60, a fabricação artesanal de
cordas foi expressiva, gerando renda e emprego para o município. Essa produção decaiu até
desaparecer, a partir da progressiva substituição do fio natural do sisal por sucedâneos
sintéticos. (VERDE, op.cit.)
Segundo o Censo do IBGE de 2000, a população de Valente era de 19.129 habitantes,
dos quais 9.632 (50.4%) pertenciam à zona rural. No ano de 2006, a população foi estimada
em 20.114 habitantes. A sua população rural pode ser classificada em: a) pequenos
proprietários rurais que utilizam basicamente a mão-de-obra familiar no processo produtivo.
Essa categoria produz e extrai a fibra do sisal, se dedica à criação de ovinos e caprinos e
pratica a pequena agricultura (cultivo de milho, feijão e mandioca); b) médios e grandes
proprietários rurais, os quais são responsáveis pela criação do gado bovino de forma extensiva
e c) trabalhadores rurais sem-terra. Esta última categoria trabalha como diarista na extração da
fibra do sisal ou nas fazendas de gado bovino. Ela também pode atuar como pequenos
85
produtores mediante contratos de utilização de terras de fazendeiros dos municípios da região,
associando a este trabalho a prática dos pequenos criatórios e da pequena agricultura
alimentar. A população urbana encontra-se ocupada nos serviço público municipal
(aproximadamente 1.300 funcionários), nas várias atividades da APAEB desenvolvidas na
cidade, incluindo a fábrica de tapetes e carpetes (900 empregados), na fábrica de calçados da
Via Uno (600 empregados) e no pequeno comércio local. (Ibid., Id.)
Segundo o PIB municipal, as principais atividades econômicas do município são a
agropecuária com uma participação de 14%, a indústria com 40% e os serviços e comércio
com 46%. (SEI, 2004) Para realizar a produção agropecuária o município, conta com 1.132
propriedades rurais, sendo que destas 55.30% possui área inferior a 10 ha e ocupam 14.9% do
município; 42.3% possuem áreas entre 10 e 100 ha e ocupam 51.5% da área total. Existem
2.4% das propriedades (26) com área superior a 200 ha que ocupam 33.6%.
O município possui 37 povoados, dos quais o maior deles, Santa Rita de Cássia, dista
18 km da sua sede.
Além de Valente outros 14 municípios estão incluídos na área de intervenção da
APAEB. São eles: Araci, Campo Formoso, Cansanção, Conceição do Coité, Itiuba, Jaguarari,
Monte Santo, Nordestina, Pintadas, Queimadas, Quixabeira, Retirolândia, Santaluz e São
Domingos, todos integrantes do Arranjo Produtivo do Sisal.
De acordo com o censo do IBGE de 2002, a população total dessa área é de 441.440
habitantes. Destes, 280.505 vivem nas áreas rurais perfazendo 58.8% do conjunto.
A estrutura de propriedades no conjunto desses municípios segue a tendência já
descrita para o Município de Valente e alcança índices mais elevados no caso das
propriedades com menos de 10 ha, que é de 67.50% (34.383). Entre 10 a menos de 100 ha
foram registradas 28.99% (16.342) e acima de 100 ha existem 3.52% (2.041) de um total de
52.766 unidades. Se somadas as propriedades de até 100 ha obteremos um índice de 96.5%.
(OLIVEIRA, op.cit., p. 12)
A atividade pecuária nessa porção do APL do sisal é praticada extensivamente e
apresenta um rebanho bovino de 366.262 cabeças, um de caprino com 308.406 e um de ovino
com 335.154. Nesse conjunto, o município de Valente dispõe respectivamente de 9.886
bovinos, 6.634 caprinos e 11.387 ovinos, enquanto que o município de maiores rebanhos é o
de Monte Santo, contando com 46.277 bovinos, 98.894 caprinos e 83.331 ovinos (APAEB,
2000). Conforme a mesma fonte:
86
“... nota-se uma considerável evolução do rebanho ovino e caprino que já
superou, senão individualmente, mas em conjunto, ao rebanho bovino de
tradição secular. Esta mudança vem acompanhada também de uma
transformação do cenário agrícola, onde a introdução de forrageiras e plantas
resistentes à seca, além do aproveitamento de resíduos de sisal são pontos a
serem considerados, ao lado de novos procedimentos tecnológicos, como o
armazenamento de alimentos para o rebanho sob a forma de silagem e
fenação para os períodos mais críticos de escassez”. (p. 12)
A renda média em reais dos chefes de domicílios, obtida nesse mesmo conjunto de
municípios, é de R$127,73, incluindo-se o Município de Serrinha e excluindo-se o de
Quixabeira. Observe-se que o Município de Serrinha possui a renda média mais elevada do
conjunto, ou seja, R$180,00 e o de Nordestina com R$84,00 é o município que apresenta a
menor renda. Outrossim, mais de 3/4 da sua população daquele município concentra-se na
zona rural. O município de Valente tem uma renda acima da média, ficando com R$133,00.
(Ibid., p. 10)
3.4. A APAEB/Valente e a Evolução de suas Atividades
O Município de Valente vem, ao longo desses últimos quase 27 anos, testemunhando
um significativo processo de revitalização econômica e renovação cultural, estribado na
retomada da velha agricultura do sisal. Este fato se deve à constituição, organização e
desenvolvimento da APAEB – Associação dos Pequenos Agricultores do Estado da Bahia.
Segundo um histórico de fonte secundária,
“No final da década de 1970, as comunidades rurais de Valente, sob a
orientação da Pastoral Rural, incorporaram-se à discussão sobre a realidade
econômica local e regional e associaram-se à luta dos pequenos produtores
rurais de Feira de Santana, Serrinha, Anguera, Ichu, Santa Bárbara e Araci
que reivindicavam a isenção do ICM (hoje ICMS) para o excedente da
produção agropecuária que se destinava ao mercado. É quando surge a idéia
de formação de uma “Cooperativa Regional” para assumir a comercialização
dos produtos agropecuários originários da agricultura familiar”. (APAEB
2000, p. 13)
O relato segue chamando a atenção para:
87
“O fato de a legislação impedir a formação de cooperativas só de pequenos
produtores, como era o desejo das principais lideranças, e também pela
história do cooperativismo na região, mantido e utilizado pelos médios e
grandes produtores como instrumento político em favor dos grupos
dominante, optou-se pela criação de uma entidade associativa em 1980: a
APAEB – Associação dos Pequenos Agricultores do Estado da Bahia, de
caráter regional, com sede no município de Serrinha. De imediato, foram
implantadas filiais nos municípios de Feira de Santana, Araci e Ichu. Em
1981, instalou-se a filial de Valente”. (Idem)
A APAEB/VALENTE possui um quadro de sócios composto por 350 pequenos
produtores rurais, situando-se a sua maioria numa faixa de idade superior a dos 50 anos.
Conforme avaliação institucional (APAEB, 2000):
“O número de sócios é relativamente pequeno para as dimensões da entidade
e dois fatores contribuem para isso. Por um lado, há uma estratégia
deliberada, por parte da diretoria de, em vez de aumentar o quadro de sócios,
fortalecerem as bases das entidades populares que são parceiras do trabalho:
sindicatos de trabalhadores rurais, associações localizadas nas comunidades,
movimento de mulheres, etc. (e por outro) [...] as dificuldades práticas de
construir um efetivo processo de participação de participação com
associados de municípios distantes”. (Idem)
E completa:
“[...] Entretanto, o número de sócios poderia ser bem maior nos Municípios
de Valente e vizinhos”. (Idem)
A entidade é constituída juridicamente como uma sociedade civil, sem fins lucrativos
e é formada por pequenos produtores rurais que têm a agropecuária como atividade principal
e não mantêm empregados permanentes, conforme disposição do artigo 5º do seu estatuto
social. Há três condições que os indivíduos deverão satisfazer para associarem-se à
organização: pagar uma única contribuição de 25.0% do salário mínimo vigente em até cinco
vezes parceladas; assumir os compromissos e deveres definidos pelos estatutos e, por último,
participar das reuniões, de assembléias por um período de três meses.
Organicamente, a assembléia de sócios, na qualidade de órgão máximo da associação,
a cada dois anos elege um conselho administrativo composto por até 24 (vinte e quatro)
membros; uma diretoria executiva composta por seis membros, sendo três efetivos e três
suplentes; um conselho fiscal de igual composição e três sócios para supervisionar cada um
88
dos quatro departamentos (agropecuário, educativo, comercial e industrial) totalizando doze
sócios. A figura do diretor executivo surgiu recentemente após a reestruturação
organizacional acontecida no ano 2001.
Considerando o todo do processo da organização, que inclui acentuadamente suas
facetas: econômica, organizacional, estratégica, social e política, interessa-nos compreender o
desenvolvimento da construção institucional nele contido. No dizer de Selznick (1997, p. 22),
“o caminho que a organização, como um instrumento técnico, assume valores” (grifo nosso).
Iniciamos, pois, pelo surgimento, ampliação e diversificação das atividades. Para efeito de
descrição, a história da APAEB comporta uma classificação de três fases principais.
Na fase inicial, a compra de uma antiga batedeira comunitária de sisal e a montagem
de um posto de vendas de gêneros alimentícios e instrumentos de trabalho deram corpo a uma
ação econômica idealizada por pequenos produtores rurais socialmente organizados, cujos
propósitos políticos e sociais apontavam para a conquista da melhoria das condições de
produção do sisal, de trabalho e de vida em geral. Na verdade, eles – enquanto agentes
econômicos – pretendiam melhorar sua posição no sistema de produção daquela fibra,
minimizar a penosidade do trabalho e facilitar o acesso aos bens industriais de consumo
imediato. Cronologicamente, antecedeu ao surgimento da APAEB a existência de um fundo
rotativo de micro-créditos gerenciado por uma organização não governamental, denominada
MOC – Movimento de Organização Comunitária, o qual foi assumido pela APAEB. Esta
atividade era conduzida de forma associada a ações de caráter educativo (cursos e reuniões)
nas comunidades rurais. O papel econômico reservado à batedeira foi o de regulador do preço
de mercado da fibra entregue pelos produtores às batedeiras privadas da região. A associação
praticou a elevação dos preços de compra da fibra dos seus associados e forçou a
generalização do procedimento. Também foi nesta fase que houve, de parte da APAEB, um
esforço para substituir antigas máquinas de desfibramento usadas em etapa do processo
produtivo anterior à da batedeira e que eram responsáveis por centenas de mutilações entre os
produtores. A Associação também introduziu uma classificação técnica mais refinada das
fibras, que propiciou um escalonamento dos preços. O período coberto por esta fase vai dos
anos do início de funcionamento, ou seja, de 1981 até o começo da década seguinte.
A análise do funcionamento da cadeia produtiva do sisal (da lavoura até a produção
industrial) deu elementos para a Associação diagnosticar que os maiores ganhos eram gerados
justamente na etapa industrial e que ela, então, deveria estar presente em todo o ciclo da
produção. Nesta segunda fase de sua história que se desenrola por toda década de 1990, a
89
APAEB implantou uma fábrica de tapetes e carpetes de sisal, que atualmente emprega 560
funcionários e incorporou uma nova batedeira comunitária, que compra a produção de cerca
de 1000 produtores e emprega 42 funcionários. Não sendo suficiente para atender a demanda
da fábrica, a Associação contratou com duas outras batedeiras privadas a entrega da produção
das mesmas, com exclusividade. Estas unidades reunidas somam 120 empregos diretos. Nesta
fase, já podemos identificar de fato uma experiência de relação de cooperação que pode
traduzir o alcance de outro patamar econômico e uma indicação de construção de um processo
de rede.
Na Foto abaixo se pode observar as dimensões da fábrica:
Foto I
Fábrica de tapetes e carpetes da APAEB
Originária ainda na primeira fase foi expandida na fase aqui tratada a produção de
artesanato de peças utilitárias e decorativas, a partir das fibras naturais, desenvolvida por
Fonte: APAEB/Valente.
90
mulheres nas comunidades rurais. Esta atividade teve sua importância ampliada em função de
que seus produtos guardam complementaridade comercial com os produtos da fábrica de
tapetes e carpetes; de disponibilidade maior de matéria prima; do reconhecimento do seu valor
econômico pelos produtores e do contexto favorável dos mercados para os produtos naturais.
Esta fase está mais voltada para a ampliação, diversificação e complementaridade das
atividades. Foi nela que efetivou-se a constituição, em 1993, de uma cooperativa de crédito
intitulada COOPERE, que originou-se a partir de um sistema informal de poupança
gerenciado pela Associação e na base da confiança recíproca entre ela e seus associados. Com
organização e personalidade jurídica própria, a COOPERE presta serviços bancários a 1.340
associados, obtém financiamento para a produção e concede crédito aos mesmos. Foi esta
outra organização que proveu a base de recursos financeiros para a implantação da fábrica de
tapetes e carpetes.
Aproveitando também da valoração social da caprinocultura, a APAEB decidiu dar
mais um passo, que se traduziu no fomento e melhoria do rebanho de caprinos e na
organização de duas outras unidades produtivas. A primeira unidade é uma usina de leite com
produção de leite e derivados (queijos e iogurtes) e a segunda é um curtume que compra dos
associados, processa e vende peles de caprinos. Associada a ele, há uma produção de
artesanato de couro que, da mesma forma que o artesanato de fibras naturais, articula-se
complementarmente com a venda dos produtos industriais da fábrica de tapetes e carpetes e
com a demanda regional por artefatos de couro, de forte tradição.
A partir da necessidade de agir complementarmente em outras áreas não econômicas, a
rede APAEB vai fomentando o surgimento de organizações escolares e patrocinando
atividades culturais. São prova disto a importância dada a uma Escola Família Agrícola (EFA)
situada em uma fazenda experimental (Madeira), iniciada na década anterior, que funciona
com uma pedagogia de alternância e repassa para a família os conhecimentos para
convivência com a seca que periodicamente atinge a região; a inauguração de uma escola de
informática para os jovens e o suporte financeiro a grupos folclóricos que mantêm viva a
tradição musical e contribuem para a recriação de uma identidade regional. Ainda foi
agregado a este complexo um clube social para a prática do lazer.
Ao longo deste processo, informação e conhecimento têm sido ferramentas bem
manejadas pela Associação, que percebeu já tenramente que as alterações necessárias à
revitalização do sistema não dependeriam apenas de ações políticas. O recurso à pesquisa e à
inovação tecnológica aos níveis de campo e da transformação industrial está presente, sempre,
91
incorporando-se como constituinte da estratégia organizacional. Um exemplo desta postura é
a busca para identificação de alternativas para as antigas máquinas desfibradoras utilizadas
ainda, no nível do campo, por homens e crianças. Concretamente, muitas viagens de visita e
intercâmbio foram realizadas a centros de pesquisa da EMBRAPA que desenvolviam
protótipos para experimentação. Outra área de investigação é a dos mercados. Inicialmente, a
comercialização foi direcionada à venda da produção da batedeira para mercados de países
europeus (Bélgica e Alemanha), contando com a assessoria de agências de cooperação para o
desenvolvimento. Em seguida, a partir do funcionamento da fabrica, a APAEB vem contando
com a consultoria de firmas com sede em Salvador e São Paulo que orientam e negociam em
mercados internacionais de fibras naturais.
A maior parte das unidades e atividades criadas pela APAEB localiza-se por toda a
década de 1990, porém algumas delas só começaram a funcionar no início da década seguinte.
É, portanto, a fase do grande crescimento da organização. As palavras do presidente na época,
Luiz Mota, ao final da década (RELATÓRIO ANUAL DE ATIVIDADES), corroboram esta
afirmação:
“... pois 1999 foi um ano de consolidação de conquistas da APAEB, com
uma grande expansão na oferta de empregos e o início de atividades que vão;
nos próximos anos diversificar a atuação econômica da Associação, trazendo
para os produtores novos benefícios de forma semelhante ao que já havíamos
conquistado com a participação no mercado de sisal”. (1999, p. 07)
Na terceira e atual fase, iniciada no final dos anos 90 e início dos anos 2000,
consolida-se uma visão que a APAEB pouco a pouco vem formulando, no sentido de
compreender a revitalização do sistema de produção do sisal no semi-árido baiano como um
conjunto articulado de iniciativas econômicas e não econômicas, sem priorizar as primeiras
sobre as segundas e firmando deste modo uma noção de desenvolvimento que vai além do
puro crescimento econômico. Os anos 2000 iniciam com o aniversário dos 20 anos da
Associação, que une uma visão de consolidação do crescimento institucional a uma nova
expectativa de futuro. Na mensagem do mesmo presidente (RELATÓRIO ANUAL DE
ATIVIDADES),
“O ano 2000 foi especial para nós porque marcou o aniversário de 20 anos
da Associação. ... Mas, a ênfase, como sempre, está no trabalho. Porque
como todos sabemos, há muito que fazer para alcançar o sonho de ver a
região sisaleira desenvolvida e oferecendo condições dignas de vida para
92
nossa gente. ... A missão agora é expandir mais e mais essa experiência,
levando a outras atividades o mesmo padrão de qualidade e promoção do
desenvolvimento comunitário... .” (2000, p. 07).
O quadro seguinte mostra a cronologia de surgimento das unidades e atividades da
organização e está organizado por décadas.
1980
1981 - Posto de vendas e armazéns comunitários
1984 - Batedeira comunitária
1986 - Fazenda Madeira
1986 - Departamento de Desenvolvimento comunitário
1986 - Fundo rotativo para produtores familiares
1989 - Folha do Sisal
1990
1990 - Cultura popular
1990 - Educação e cidadania
1990 - Convivência com a seca
1993 - Batedeira terceirizada 1
1993 - Batedeira terceirizada 2
1994 - Viveiro de mudas
1996 - Indústria de tapetes e carpetes
1996 - EFA
1998 - Clube sócio-recreativo
1998 - Rádio
1998 - Comunicação (OBS: Foi melhor estruturado enquanto setor, na
verdade já funcionava desde o inicio do Folha do Sisal)
1998 - Artesanato (Mulheres)
1999 - TV (foi projetado em 1999, começou funcionar como TV Itinerante
em 2001 e 2003 canal aberto)
1999 - Laticínio DaCabra
1999 - Riquezas do sertão
1999 - Provedor SertãoNet
2000
2000 - Escola de informática e cidadania
2000 - Curtume
2001 - Casa do mel
2001 - Couros Valente
2002 - Centro de treinamento (CAIS)
2004 - Casa da Cultura
2004 - Bola da Vez
2005 - Casa Brasil
Fonte: Elaboração própria.
Quadro III
Cronologia das Unidades e Atividades
93
Do conjunto das unidades e atividades expostas, este trabalho vai se dedicar apenas
àquelas compreendidas como integrantes do âmbito econômico, ou seja, vamos apenas
descrever e analisar as unidades de negócio. Neste sentido, é válido estabelecer um
comparativo entre a condição das mesmas no ano de 2004 e no ano de 2007. A escolha do ano
2004 se deve a ser ele significativo no histórico da organização, em virtude de ter sido
reconhecido como o ano que dá o início à crise financeira atual vivida pela APAEB, enquanto
que o ano de 2007 se apresenta como aquele em que esta mesma crise alcança seu ponto mais
agudo. Foi também no ano de 2004 que a APAEB trocou sua razão social para Associação de
Desenvolvimento Sustentável e Solidário da Região Sisaleira. Esta modificação atende a
injunções de ordem jurídica, para que a organização se posicione adequadamente ante os
órgãos governamentais que estão relacionados a questões do desenvolvimento rural. No ano
2005, a APAEB completou 25 anos sob o clima de crise e seu presidente anuncia, no
Relatório Anual de Atividades:
“Não podemos perder o foco no fato maior que é o trabalho de
desenvolvimento (não apenas econômico, mas também humano) que a
instituição vem fazendo desde que começou a atuar em 1980; e que
continuará a fazer, independente das circunstâncias e obstáculos que surjam
no caminho”. (2005, p. 1)
Passando para a descrição e análise do desempenho das unidades econômicas em
2004, temos o seguinte:
A fábrica de tapetes e carpetes é a base do processo de desenvolvimento conduzido
pela Associação. É através do seu funcionamento e das sobras obtidas que a organização
obtém a maior parte dos recursos financeiros para impulsionar e ou manter os outros projetos,
sejam eles, econômicos ou sociais e educativos. O ano de 2004 foi considerado um ano que
apresentou dificuldades em decorrência da queda nas vendas para o mercado externo. Houve
também dificuldades para obtenção de contêineres e navios para o embarque das mercadorias.
Porém, o fato mais grave foi a queda na cotação do dólar e a conseqüente repercussão no
volume de receita da APAEB. Em contrapartida, esta situação foi acompanhada pelo aumento
dos estoques e da redução do capital de giro, provocando problemas no fluxo de caixa. De
acordo com o relatado pela organização:
“Normalmente, nas vendas ao exterior o pagamento ocorre cerca de 90 dias
depois de fechado o negócio. Já os produtores que nos vendem a fibra,
94
recebem o pagamento todas as semanas.” (RELATÓRIO ANUAL DE
ATIVIDADES, 2004, p. 17).
A redução na disponibilidade de capital de giro obrigou a APAEB a recorrer a
empréstimos e a descontos de duplicatas para receber os créditos de suas vendas. Em paralelo,
as vendas subiram no mercado interno, o que provocou uma melhora na situação financeira.
Neste ano, foi contabilizado um total de 602 funcionários na unidade. Visando atender
a demanda por fios agrícolas, foi iniciada a construção de um terceiro galpão para instalação
de novas máquinas, ampliação de espaço conseguida com recursos do Banco do Nordeste do
Brasil. Dois programas foram continuados na unidade: o sistema de gestão pela qualidade,
utilizando os critérios do Programa de Qualidade do Estado da Bahia e o Programa de
Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA). Os benefícios econômicos mais substanciais
gerados pela fábrica para os pequenos produtores são aqueles relativos ao preço da fibra.
Antes da inauguração da unidade em 1996, os produtores recebiam no mercado US$ 130.00
por tonelada. Segundo dados do ano de 2003, eles estavam obtendo US$ 350.00 por tonelada
da fibra extra e US$ 300.00 por tonelada da fibra comum. (RELATÓRIO ANUAL DE
ATIVIDADES, 2003, p. 13)
A batedeira comunitária (usina de desfibramento) comprou a fibra em 12 municípios
da região, beneficiando aproximadamente 180 produtores. A estimativa é a de que mais de
1.000 famílias tenham sido atingidas com as compras, pois em cada motor de sisal no campo
trabalham em média seis pessoas. Na compra foram gastos R$ 5,2 milhões de reais e
beneficiadas na batedeira 4,7 mil toneladas de fibra. Deste volume, a fábrica de tapetes e
carpetes consumiu 61.0% e os 39.0% restantes foram vendidos no mercado interno. A fábrica
utiliza a fibra extra devido às especificações do mercado externo e conseqüentemente
incentiva os produtores, via preços diferenciados, a melhorarem a qualidade de seu produto.
Em 2004, a batedeira comunitária empregou 31 homens e 14 mulheres. As duas
batedeiras terceirizadas, responsáveis por 16.0% da produção total empregaram 65
trabalhadores. No total as três batedeiras empregaram diretamente 110 trabalhadores, sendo
que deste total, 64 foram homens e 46 mulheres.
Tanto a fábrica de tapetes e carpetes como a batedeira comunitária, de modo
articulado, jogam papéis importantes e fundamentais no complexo de atividades da APAEB.
Anteriormente, uma pesquisa realizada em 1999, três anos depois do início de funcionamento
da fábrica, comprovou o impacto de ambas as unidades no desenvolvimento e
95
complexificação da organização. Estes papéis fazem com que também se amplie o dinamismo
da economia ao nível da macro-organização social no nível municipal:
“Enfrentando os mais variados tipos de empecilhos a batedeira comunitária
de sisal (central de beneficiamento) cumpriu e ainda cumpre hoje importante
papel: funcionou, durante alguns anos, como uma espécie de laboratório para
o aprendizado da equipe sobre todo complexo que envolve o setor comercial
do sisal e de experimento para o aprendizado das questões administrativo-
gerenciais. Além disso, na batedeira é feito parte da industrialização do sisal,
executando-se as primeiras tarefas (classificação da fibra, amaciamento etc.)
para depois ser feita a produção de tapetes e carpetes. A indústria que faz os
tapetes e carpetes foi implantada há três anos, mas somente agora alcança as
condições plenas de produção; disputa os mercados nacional e internacional
com outras empresas tradicionais do setor e oferece mais de 500 empregos
diretos. Para se ter uma idéia exata da importância do empreendimento, para
uma região pobre onde quase metade das famílias da zona rural alcançam
apenas meio salário mínimo por meio de rendimento, basta lembrar que a
cidade de Feira de Santana, a segunda maior do Estado da Bahia, hoje com
uma população beirando a casa dos 500 mil habitantes, que sedia o segundo
centro industrial mais importante do Estado da Bahia, Centro Industrial de
Subaé (CIS) possui apenas 8 (oito) empresas que oferecem mais de 500
empregos diretos. Do total de empregos oferecidos pelo setor público e
privado, em Valente, a participação da APAEB corresponde a 28.8%; se
excluirmos o setor público, o número de empregos diretos gerados pela
APAEB (administração comercial e industrial) corresponde a 51.4% do
número de empregos do setor privado no município (700 empregos diretos
gerados pela APAEB e 662 dos outros empregadores).” (APAEB, 1999, p.
14-15)
O posto de vendas (supermercado) foi o primeiro projeto econômico da APAEB. Seu
objetivo é, por um lado, revender produtos industrializados aos seus associados a preços
acessíveis e por outro adquirir e comercializar a produção dos pequenos produtores. Nesse
ano foram adquiridos 8.187 kg. de carne caprina e ovina. Também no rol das compras da
produção local estão os itens temperos e produtos de limpeza, entre outros. O total de itens
disponíveis no posto de vendas foi ampliado de 4.700 para 9.800. No período considerado, os
empregados diretamente na unidade totalizam 34 pessoas.
Após intenso trabalho educativo realizado com os pequenos produtores, a Associação
propôs aos mesmos três projetos econômicos ligados à prática da caprinovinocultura. São
eles, ‘o laticínio’, ‘o curtume’ e o ‘Couros Valente’. Como atividades preparatórias a
implementação dos projetos, a organização intermediou a concessão de créditos aos criadores
a serem aplicados para compras de animais e investimentos nas propriedades. Foi instalado
96
um laboratório para controle de verminoses e um veterinário foi disponibilizado para aqueles
produtores que não têm acesso à assistência técnica oficial.
No período aqui considerado, o laboratório realizou 141 análises e o veterinário
realizou 337 consultas no escritório e 82 visitas às propriedades. Também o Departamento de
Desenvolvimento comunitário focalizou a sua orientação a 35 famílias de produtores que
trabalhavam com a caprinovinocultura de corte. De acordo com este procedimento, foram
aplicadas técnicas de melhoramento genético que resultaram no nascimento de 20 animais
melhorados através do cruzamento das raças Dorper e Boer. Os criadores também foram
orientados sobre os vários procedimentos para enriquecer a alimentação dos animais e sobre a
produção da carne. Também no campo específico da saúde animal os produtores participaram
de cursos de homeopatia para tratamento de verminoses e infecções em geral. Há uma
estimativa que metade dos fornecedores adotou as técnicas aprendidas.
Do ano de 2001 ao de 2005, o Laticínio Dacabra teve uma evolução na compra do
leite dos produtores de 159,5 para 694 litros/dia, respectivamente, bem como o número de
fornecedores no período considerado vai de 16 em 2001 para 78 em 2004. No cotejo entre os
anos 2003 e 2004, foram comprados naquele primeiro ano 203.888 litros e em 2004 o
quantitativo foi de 253.568 litros, perfazendo um crescimento nas compras pelo laticínio de
24.0%. O crescimento do número de fornecedores foi impulsionado a partir do
estabelecimento de um convênio entre a CONAB e a APAEB para fornecimento de leite para
a merenda escolar em sete municípios. O leite também foi distribuído aos moradores pelas
associações locais de moradores. Nessa ação foram beneficiadas 15 creches com 667 alunos e
1264 famílias residentes nos municípios.
Considerando o preço de R$1,10 para o litro de leite comprado pelo laticínio, a renda
média dos fornecedores com a atividade subiu de R$ 357,00 em 2003 para R$ 450,00 em
2004. Nesse ano, a menor renda por produtor foi de R$ 235,00 e a maior de R$ 2.713,00.
As unidades de negócio curtume e Couros Valente são interligadas. O curtume foi
criado com o propósito de beneficiar as peles de caprinos e ovinos agregando valor a este
produto. Antes da entrada de funcionamento do curtume uma pele de ovelha era vendida pelo
produtor ao preço de US$ 1,00 e a de cabra por US$ 0,80. Posteriormente, com o curtume já
em funcionamento, os preços alcançaram respectivamente os valores de US$ 3,40 na pele de
ovelha e US$ 2,80 na pele da cabra. Utilizando dados do ano de 2003, devido da ausência de
registros para o ano 2004, temos que foram adquiridas pelo curtume 9.726 peles de caprinos e
16.543 de ovinos. A unidade gera apenas cinco postos de trabalhos.
97
A proposta da Couros Valente é utilizar parte do couro beneficiado pelo curtume para
produzir bolas de futebol, chuteiras, cintos, luvas, porta-óculos etc. No ano de 2004, a
organização constatou que a sua maquinaria era insuficiente e desatualizada para seguir
produzindo aqueles artigos. Apesar desta constatação, foi firmado um negócio com o
Comércio Justo para que a unidade fornecesse bolsas para a Itália, em conjunto com outros
grupos de produtores regionais e de artesãos. À época a unidade gerava oito empregos diretos.
A Riquezas do Sertão é uma unidade comercial localizada na rodovia BA-120 que
corta o município de Valente. O objetivo de sua criação foi o de ter um ponto de exposição e
venda (showroom) para os produtos industriais e artesanais, tanto das unidades da APAEB
como dos grupos e organizações de artesãs e artesãos locais e regionais. Esses últimos são em
maioria filiados à Cooperativa de Fibras do Sertão. Sendo uma unidade de negócio recente, a
Riquezas do Sertão, obteve um faturamento mensal médio no ano de 2003 de R$ 9.000,00 e
um crescimento significativo deste faturamento no ano seguinte da ordem de R$ 27.000,00.
Com respeito à participação das artesãs dos municípios de Valente, São Domingos e Araci
orientadas pela Cooperativa Regional de Artesãs Fibras do Sertão (COOPERAFIS), tivemos
no ano de 2004 a presença registrada de 122 mulheres. As peças produzidas por elas e
vendidas no showroom totalizaram 6.500 unidades dos mais variados tipos.
Sobre o todo das unidades e atividades é significativa a conclusão expressa em estudo
da FGV, datado do ano 2000, a respeito de soluções locais para a pobreza, que enfatiza várias
nuances do esforço da APAEB em vista de um reordenamento regional:
“A APAEB soube catalisar o espírito participativo das comunidades
envolvidas, alcançando sucesso em seus projetos econômicos. Teve, ainda,
uma visão abrangente das alternativas disponíveis para a região sisaleira,
ampliando sua intervenção política para além de seu espaço de ação. Isso
permitiu o desenvolvimento de seus projetos básicos (Batedeira, Cooperativa
de Crédito e Fábrica) a partir de uma estratégia ampla de políticas públicas
para toda a zona produtora de sisal da Bahia. Ou seja, ao mesmo tempo em
que cuidou de tarefas práticas para viabilizar seus empreendimentos, tratou
de fazê-los articulados a uma discussão com outros parceiros”.
(CAMAROTTI, 2000, p. 11-32)
Avançando no tempo e chegando ao ano atual de 2007, passamos a descrever e
apontar as alterações ocorridas nas unidades anteriormente apresentadas. Para que este
procedimento possa se efetivar e seu conteúdo tornar-se compreensível, o mesmo será
apresentado a partir de uma afirmação do diretor executivo da organização a respeito da crise
financeira instalada na fábrica de tapetes e carpetes e irradiada para a totalidade da
98
organização. A declaração pública está contida no Relatório Anual de Atividades do ano de
2005, o qual foi divulgado no ano seguinte:
“Com a queda nas vendas em 2003 e 2004 a APAEB teve que recorrer a
empréstimos de curto prazo com juros elevados, chegando em 2004 a pagar
mais de R$ 2,9 milhões de juros bancários. Em 2005 essa situação se
agravou e passamos dos R$ 4 milhões de juros pagos. Ao lado disso, a perda
de receita foi R$ 3.800.000,00 pela queda do dólar frente ao Real (o dólar
desceu de R$ 3,80 em 2002/2003 para R$ 2,20 em 2005)”.
E conclui:
“Na busca de alternativas tomamos os seguintes encaminhamentos:
a) reestruturação interna com redução de custos;
b) ganhos internos com qualidade e produtividade;
c) mudança de foco do mercado externo para o mercado interno;
d) aumento de vendas de tapetes já acabados, que têm maior valor agregado;
e) substituição dos créditos de curto prazo e altos juros por longo prazo e
taxas menores, com limites de créditos;
f) novos financiamentos”. (2005, p. 1)
Com respeito aos itens listados, a fábrica de tapetes e carpetes priorizou os de letra a, b
e c, elegendo estratégias particulares para o enfrentamento da situação diagnosticada. Neste
sentido, uma série de medidas de redução de custos foram implementadas; pontos de
ineficiência no processo produtivo foram identificados e receberam soluções adequadas e para
ampliar a participação no mercado interno a linha de produção foi diversificada, incluindo a
linha agrícola que compreende fios para a amarração de feno, buchas para uso na construção
civil e resíduos e fios para a composição de cobertura morta na plantação. Foi também
adotada a diversificação de pontos-de-venda, incluindo-se aí as lojas de departamentos,
showroom de móveis, feiras e exposições. Para reforçar o suporte das atividades dos
representantes comerciais, a gerência comercial criou um ponto fixo de atuação no estado de
São Paulo, em meados de 2007.
Consoante com as determinações gerais da diretoria executiva e as suas decisões
específicas, a fábrica no ano de 2006 passou a operar em dois turnos e os esforços realizados
mantiveram uma produção mensal de 40.000 m
2
. Com esta medida, os custos mensais com
pessoal e encargos sociais foram reduzidos em R$ 96.000,00, acrescidos de R$ 15.000,00 de
99
energia elétrica. A reestruturação interna reduziu cargos e funções. Também levou a
substituição de matérias primas e peças importadas por similares nacionais; da lenha de
eucalipto por substitutos gerados no processo produtivo; do metaflex do acabamento dos
tapetes pelo látex produzido pela máquina de emborrachar; do gás de botijão por gás de
caminhão tanque e da energia elétrica nos momentos de pico por uso de gerador próprio.
Completaram esse processo a racionalização do uso dos veículos e a secagem das fibras em
espaços mais próximos da unidade.
Diante da redução vertiginosa das vendas e do conseqüente agravamento da crise
financeira na fábrica e no todo da APAEB e mesmo considerando a eficácia dessas medidas
de reestruturação operacional, no mês de julho de 2007 a direção da fábrica decidiu dar
licença não remunerada aos empregados por 60 dias. Este ato foi acrescido de 18 dias de
férias coletivas, totalizando 78 dias de paralisação. Neste período ficaram funcionando as
atividades de vendas, de faturamento e de expedição. A decisão incluía que, havendo
necessidade de produzir algum item, por este não estar disponível no estoque, um esquema
especial seria montado para tal.
No tocante à batedeira comunitária, suas condições de funcionamento e de
desempenho se apresentam pouco alteradas no ano em pauta. A unidade adquire cerca de 200
toneladas por mês de 100 produtores, o equivalente a um benefício direto estimado a 600
pessoas. A aquisição é semanal e em média é de 500 a 700 kg. por produtor, sendo o
pagamento da compra da fibra aos produtores realizados a cada semana. Quando o produtor é
associado à APAEB, ele ganha 4% a mais no preço de venda de sua produção. Para que isto
aconteça, a unidade desembolsa em torno de R$ 70.000,00 de cada vez. A organização
garante a prática do preço mínimo estipulado pelo Governo Federal.
Da produção semanal da batedeira 70.0% são destinados para fábrica de tapetes e
carpetes que se coloca como um mercado cativo da unidade. Os 30.0% restantes são
destinados ao mercado interno. Praticamente, este mercado é composto pelas empresas
FIBRAEX e Hamilton Rios, localizadas no Município de Conceição do Coité e SISALANA,
no Município de Simões Filho, ambos no Estado da Bahia; FIBRACOCO e FIBRASA,
localizadas no estado da Paraíba e COMPEL, no Estado de São Paulo. Em particular, devido a
situação financeira geral da APAEB, tem havido uma inversão na qualidade da fibra
adquirida, ocorrendo o consumo maior do sisal tipo 1 em lugar do tipo extra. Devido à
centralização das finanças na matriz, a batedeira tem tido dificuldade de pagar em dia aos
100
produtores fornecedores da fibra. Na atualidade a batedeira emprega 40 funcionários e 1
gerente.
A condição de funcionamento e o equilíbrio financeiro do Posto de Vendas estão
sendo mais afetados pela crise maior da organização. Devido à falta de capital de giro, a
receita da unidade é apropriada pela matriz. Por outro lado, os funcionários da Associação
compram a crédito através do mecanismo de desconto em folha e considerando que os
salários são pagos com atraso, a conseqüência é a desorganização das contas da unidade.
Mesmo com este quadro de dificuldades, o Posto segue adquirindo os produtos
oriundos da agricultura familiar (carne, farinha de mandioca, feijão, milho, entre os
principais). Com relação à carne de caprinos, o Posto disponibiliza o seu frigorífico, que
encontra-se articulado com o matadouro municipal.
Os associados da APAEB possuem prioridade neste negócio e, além disto, em suas
compras na unidade os associados recebem um desconto de 4.0% nos pagamentos a vista e de
2.0% nos pagamentos a prazo. Complementarmente, outro benefício é concedido aos
associados, o de seus filhos terem prioridade em caso de preenchimento de vagas de
funcionários do Posto.
O Laticínio Dacabra é uma das unidades menos afetadas pela crise financeira atual.
Seu funcionamento e desempenho econômico seguem dentro dos padrões praticados no ano
de 2004. De qualquer modo, a unidade também recebe os efeitos da centralização das finanças
na matriz, pois este procedimento pode vir a afetar o pagamento regular dos fornecedores de
leite. Ele prossegue fabricando o leite em pacote, o iogurte e o doce de leite. Como estratégia
para o futuro próximo, está prevendo a ampliação de sua participação no mercado interno.
Com vistas a isto, um projeto de ampliação e modernização das instalações foi construído e
aguarda a liberação oficial para entrar em funcionamento. Um limite para a concretização
dessa disposição é a inexistência do selo SIF (Serviço de Inspeção Federal) de âmbito
nacional, que impede a unidade de comercializar fora do Estado da Bahia.
As unidades curtume e Couros Valente não evoluíram com sucesso como as demais. O
curtume em meados do ano de 2007 foi fechado por 30 dias, devido á crise financeira geral. A
decisão compreendeu somente a compra de peles de caprinos e ovinos originárias da produção
familiar, funcionando a unidade de forma terceirizada para uma empresa da cidade de
Salvador.
A unidade de negócio Riqueza do Sertão tem tido sucesso no seu propósito de criar
um “ponto de venda” e “vitrine” para os produtos da APAEB e dos grupos de artesãos. Em
101
sua loja são vendidos da fábrica os tapetes; da Escola Família Agrícola - EFA e agricultores o
mel de abelha e a farinha láctea, entre outros; do Laticínio Dacabra o iogurte e o doce-de-
leite; do Projeto Cabochá o sabonete, a pimenta em frasco e os temperos caseiros; do grupo
Cantiga de Roda, cd’s com músicas da cultura regional e também as peças artesanais feitas
em fibras de sisal pelos grupos de mulheres artesãs.
Os artigos mais importantes no conjunto das vendas são os oriundos das unidades de
negócio da APAEB. No ano de 2007, a receita bruta mensal da unidade foi de R$ 50.000.00,
duplicando a obtida no ano de 2004. Visando a divulgação dos produtos que ela comercializa,
a unidade tem participado de feiras e exposições comerciais e de movimentos sociais ligados
ao rural nas cidades de Salvador e em cidades da região sisaleira. Com menor intensidade que
as demais unidades, a Riqueza do Sertão também sofre as conseqüências do modelo de gestão
financeira da matriz.
3.5. A Evolução Institucional da Organização
Uma outra maneira de visualizar o todo do processo organizacional e institucional é
mirar a APAEB sob dois aspectos, o das formulações estratégicas e o das transformações ou
mudanças organizacionais ocorridas. O quadro seguinte é uma construção a partir do histórico
da relação entre esses componentes. Ele indica por década e anos os momentos e as decisões
estratégicas, destaca as estratégias mais relevantes ou significativas (¾) e os efeitos que essas
últimas provocaram na estrutura da organização ().
102
Quadro IV
Evolução Institucional
1980
81-82 - Elevação do padrão de vida do agricultor sertanejo através do
incremento de sua renda (Armazéns comunitários e Postos de Venda)
- Redução da intermediação comercial
84 ¾ Realização de empreendimentos econômicos de maior porte por
municípios (Moinho de fubá em Serrinha e Batedeira Comunitária em Valente)
Atribuição às Comissões Municipais da responsabilidade sobre os
projetos e o trabalho de base
- Revitalização da lavoura do sisal em nível regional (Central de
Comercialização da Produção)
- Intervenção em toda a cadeia produtiva
87-89 - Intervenção de planejamento na unidade familiar de produção (redução da
importância dos Postos de Vendas e do Programa de Armazenamento e
inviabilidade do Moinho de Fubá-Serrinha)
¾ Articulação regional através de um projeto econômico estratégico para o sisal
1990
92 Municipalização: autonomia administrativa e financeira
- Exportação direta da matéria prima (fibra) evitando as firmas
exportadoras (Batedeira Comunitária-Valente)
93 - Formação de poupança no segmento de produtores familiares
(COOPERE)
96 - Industrialização da produção (Fábrica de tapetes e carpetes)
¾ Sobrevivência e convivência no semi-árido através:
do combate a todo tipo de exploração que conduza à exclusão social (Projetos e
atividades sociais e educativas)
da promoção da viabilidade e sustentabilidade socioeconômica da unidade
familiar rural (Projetos e atividades econômicas)
2000
¾ Ajuste no ritmo de crescimento e continuidade ...
01 Adequação da Estrutura Organizacional: criação do cargo de
Diretor Executivo
¾ Manutenção da Continuidade...
06 - Racionalização da produção industrial através da reestruturação da
fábrica de tapetes e carpetes
07 Reforma Institucional via criação da Fundação APAEB
Legenda
:
¾ estratégia principal; mudança organizacional significativa.
Fonte: Elaboração própria.
103
O quadro nos mostra os quatro grandes momentos de decisão de crescimento e de
conseqüentes ações que permitiram a mudança na estrutura da organização e em seus
processos internos de gestão. Os três momentos iniciais mais fortes e significativos localizam-
se nas décadas de 80 e 90 e o quarto e último na década de 2000, plasmando o futuro da
APAEB. Foi o reconhecimento nos finais dos anos 80 de que a problemática da região
sisaleira demandava um projeto estratégico global e que a implementação deste não seria
possível com a estrutura inicial da organização, que tomou concretude na municipalização da
APAEB e instituiu-se a autonomia administrativa e financeira de cada filial. Contudo, a
segunda metade dos anos 90 pode ser considerada decisiva na configuração atual da
organização, desde que foi a estratégia de trabalhar na perspectiva de sobrevivência e
convivência com o semi-árido que proporcionou o crescimento almejado. Há também de ser
reconhecido que, após a exportação direta da fibra e com a implantação da fábrica de tapetes e
carpetes, a organização ganhou em dimensão econômica e o patamar institucional de hoje,
sem o que ela não poderia obter a sua sustentabilidade.
A criação do cargo de diretor executivo no ano de 2001 foi decisiva para atender a
necessidade de implementação e coordenação das atividades e imprimir eficiência ao conjunto
da organização. Ou seja, dar mais suporte, estabilidade e coesão ao crescimento.
Após o reconhecimento do aguçamento da crise financeira no ano de 2007 e negativas
repercussões institucionais que abalaram a crença interna no formato organizacional e nos
processos atuais de gestão, foi criada a Fundação APAEB. Esta solução vem por fim
reconhecer que as unidades e atividades econômicas não conseguem mais dar sustentação
financeira as atividades educativas e sociais e que estas últimas necessitam obter suas próprias
fontes de manutenção protegidas das variações ocorridas no mercado de fibras e
manufaturados do sisal.
Por fim, o progresso da organização APAEB pode ser visualizado interna e
externamente, segundo a análise daquilo que move a própria construção institucional. Por
dentro, aquela inicial pequena Associação foi sendo construída ao longo dos seus vinte e sete
anos desde as pequenas atividades iniciais até o respeitável complexo existente hoje. Estatutos
sociais, regimentos internos, propósitos, planos operativos, avaliações etc. traduzem esse
progresso. Por fora, o crescimento da produção dos seus associados, a tecnificação, a
transformação industrial do produto dos pequenos produtores etc. Em ambos os espaços,
porém, o reviver da confiança na categoria social, da auto-estima do pequeno produtor e do
que é mais importante, uma retomada dos valores tradicionais do campesinato, tais como
104
confiança, cooperação e solidariedade, junto com valores oriundos da economia
contemporânea, como qualidade e respeito ao meio ambiente. Valores que estimulam o dia a
dia do processo para iniciativas criativas e arrojadas, que plasmam as comunidades rurais e
apontam para uma retomada em outras bases da vida econômica e social da região. Conforme
afirmou Ismael Ferreira, Diretor Executivo,
“(...) valores sociais cultuados pela organização tais como honestidade,
eficiência, criatividade, responsabilidade, transparência, cooperação,
agilidade, respeito, persistência, compromisso (...)”.
Neste sentido, podemos afirmar que o progresso organizacional da APAEB embute a
recriação e a afirmação de valores. Deste modo, como afirma SELZNICK (1997), a
organização que se rege por valores torna-se uma instituição. E por isto também se pode
explicar a acentuada diversificação de atividades sem a perda de uma linha-mestra na
condução dos negócios.
Este mesmo processo de institucionalização (estabelecer e difundir valores) a APAEB
procura incutir nas parcerias que estabelece com outras organizações e no conjunto dos outros
atores sociais a ela inter-relacionados e sujeitos do processo de desenvolvimento local. No
compreender do mesmo Ismael,
“(...) precisamos sensibilizar outras pessoas e ainda que estes ajudem a
sensibilizar outras, a mudar mentalidades”.
É a partir deste novo estilo que podemos compreender a natureza da articulação que a
direção da APAEB, mais especificamente sua diretoria executiva, exerce nesse conjunto. Essa
diretoria, criada em 2001, assumiu toda a atribuição de orientar e articular estrategicamente as
unidades da organização, os seus programas e o leque de ações em uma perspectiva de
corporação-rede. Tal unidade trabalha estimulando a cooperação no conjunto das unidades,
não apenas tomando por referências: objetivos, métodos e padrões, mas – e fundamentalmente
– os valores instituídos que dão suporte e permitem o processo de cooperação interna. A
confiança e a reciprocidade dão base para as iniciativas arrojadas e a descentralização não se
faz sem que haja uma consciência coletiva de possíveis processos de complementaridade
técnica e social, no sentido da formação dos recursos humanos.
105
Por fim, a diretoria executiva, para cumprir este papel, está dotada de uma capacidade
de liderança institucional que já se exerce desde a origem do processo organizacional e que,
no dizer de SELZNICK,
“(...) tem um criativo papel que comporta dois aspectos. Primeiro, é aquele
chamado ‘incorporação institucional de propósitos’ Segundo, criatividade é
exercida por planejamento estratégico e tático, isto é, analisando o ambiente
para determinar como melhor usar os recursos existentes e capacidades da
organização”. (Ibid., p. 25)
3.6. Crescimento, Crises e a Transformação Organizacional
A evolução institucional da APAEB surpreende pelo crescimento das unidades e
atividades acontecido nos anos 90. Este fenômeno organizacional explica o complexo de
atividades existente na atualidade e uma série de problemas práticos e questões merecedoras
de reflexão, dignas da magnitude alcançada pela organização. Analisaremos e tentaremos
interpretar o histórico da evolução com base no reconhecimento que o todo da construção
institucional da APAEB se faz a partir de uma relação direta entre decisões estratégicas de
crescimento – influenciadas pela incidência de crises associadas a injunções do macro
ambiente econômico e político – e a conseqüente transformação ou mudança na estrutura
organizacional. A elaboração do quadro a seguir, possui o propósito de demonstrar a relação
entre as três variáveis consideradas.
Quadro V
Crises, escolhas Estratégicas e Transformação Organizacional
(Continua na próxima página)
1980 Criação da APAEB (Geral)
1984 Atribuição às Comissões Municipais a responsabilidade sobre os projetos e sobre o trabalho
de base
1987 CRISE: finalização dos projetos Postos de Vendas e do Programa de Armazenamento
1990 10 anos da APAEB
Decisão de realizar a exportação diretamente;
1992 Autonomia administrativa e financeira da APAEB/Valente em relação a Geral
106
Quadro V - Crises, escolhas estratégicas e transformação organizacional (Cont.)
Da análise do quadro podemos indicar que o processo de crescimento foi todo
permeado por crises e quatro delas se tornaram mais significativas em virtudes dos efeitos que
provocaram no âmbito da organização, bem como pelos desdobramentos que esses efeitos
tiveram na economia regional. Na seqüência cronológica, as crises aconteceram nos anos
1987, 1993, 2000 quando a APAEB estava completando 20 anos de existência e no ano de
2004, considerado o berço da crise atual e a mais aguda já acontecida. Naquele momento de
sua história, a organização estava beirando os seus 25 anos de criação.
1993 CRISE: falta containeres e navios para realizar a exportação
Decisão de implantar a fábrica de tapetes e carpetes
Realização de um estudo sobre os 10 anos da organização
1997 INAUGURAÇÃO DA FÁBRICA
1999 Consolidação do crescimento
1999 20 anos da APAEB
CRISE: falta de capital de giro para a fábrica
Decisão e realização de uma Avaliação Interna
Criação dos comitês de gerenciamento e execução (força-tarefa)
Financiamento do BNB para compra de máquinas e capital de giro
1999 ADEQUAÇÃO DA ESTRUTURA ORGANIZACIONAL
Criação do cargo de Diretor Executivo
2004 CRISE: origens da crise atual devido a baixa cotação do dólar e quase suspensão total das
vendas da fábrica para o exterior
Falta de capital de giro para a fábrica e crescimento do endividamento
Repercussão da falta de recursos financeiros no funcionamento das atividades sociais e
educativas
2005 25 anos da APAEB
2006 REESTRUTURAÇÃO DA FÁBRICA
Decisão sobre a redução dos custos operacionais
No geral da APAEB, separação da contabilidade dos projetos e melhoramento do sistema de
administração e gerenciamento visando maior eficiência e agilidade
Separação da contabilidade da fábrica do conjunto das atividades da APAEB
2007 Criação da FUNDAÇÃO APAEB
Decisão de separar as atividades econômicas das atividades sociais e educativas sob o prisma
administrativo e financeiro, ficando a nova entidade com a atribuição de administrar os projetos
da área social.
Fonte: Elaboração própria.
107
Segundo a estratégia analítica geral adotada, há crises que impulsionaram o
crescimento da organização e as outras que se apresentaram oferecendo em si grandes
obstáculos de difícil superação. As duas primeiras, acontecidas nos anos 1987 e 1993,
respectivamente por encerramento de uma fase de dois grandes e estruturadores projetos
(Postos de Vendas e o Programa de Armazenamento) e por problemas de ordem logística de
exportação, foram seguidas de fases de superação, crescimento e mudança qualitativas
decisivas. A crise de 1987 forjou a decisão de fazer a exportação direta da fibra produzida na
Batedeira Comunitária, enquanto foi, notadamente, a crise vivenciada em 1993 que contribuiu
decididamente para transformar a idéia de industrialização da fibra do sisal em um projeto
executivo e viável da fábrica de tapetes e carpetes. Já a terceira crise (anos 2000), em que pese
ser ela manifestadora de um grave problema financeiro (falta de capital de giro) que se tornou
de natureza estrutural na fábrica, foi acompanhada de um processo interno de avaliação que
tornou possível a adequação da estrutura organizacional da APAEB e a decorrente criação do
cargo de Diretor Executivo, o qual passou a imprimir um curso novo e ágil para as atividades
da organização e maior sentido de organicidade e coesão social ao conjunto da mesma.
A quarta crise iniciada no ano de 2004 e continuada até os dias de hoje, herda toda a
problemática financeira da história particular da fábrica e reflete de maneira extraordinária no
todo da Associação. Esta fase revelou o aguçamento da exigüidade do capital de giro para
movimentar a compra de matérias primas e financiar a produção e as exportações. É também
nessa última e grande crise que se manifesta mais transparentemente a repercussão da redução
de recursos financeiros para a manutenção das atividades sociais e educativas comprometidas
com as sobras da atividade da unidade industrial.
Não obstante, todo o trauma interno provocada pelo seguimento desta crise por quase
os últimos quatro anos, a mesma impulsionou a APAEB a promover uma intensa
reestruturação da fábrica de tapetes e carpetes com uma série de conseqüências positivas já
descritas anteriormente. Por fim, a crise atual precipitou a tomada de posição da instituição
sobre uma velha questão vez por outra posta na mesa e traduzida pelo dilema de separar o
processo operacional e financeiro das atividades econômicas daquele das atividades sociais e
educativas, sem a perda do conceito de totalidade organizacional. Com essa crise estavam,
pois, reunidas as condições necessárias e desejáveis para a criação da Fundação APAEB em
meados do ano de 2007, outra organização que tem por função implementar e gerir as
atividades e projetos de natureza não econômicas da original APAEB.
108
Seguindo na mesma estratégia de análise, reunimos um conjunto de evidências que
nos permitem demonstrar e detalhar ainda mais a articulação entre os componentes crises e
crescimento institucional:
1. Há períodos de crise, crescimento e transformação na vida da organização quase
que regulares (1987 - 1993 - 2000 - 2004 - 2007). O ano 2001 foi “um ano para
arrumação da casa”, em virtude do ano 2000 ter sido o ano que aconteceu a grande
avaliação institucional, cujos resultados confirmaram a necessidade de projetar
uma grande mudança no sistema de gestão da instituição.
2. Existe internamente na APAEB um processo permanente de avaliar e projetar o
futuro. Este processo é um componente integrante do sistema de funcionamento da
organização que é cultivado e valorado a partir da percepção de que a Associação
é um organismo com potencial para se transformar e uma prática de agir
permanentemente com sentido estratégico.
3. Há duas concepções de desenvolvimento convivendo historicamente dentro da
organização. Uma prioriza o econômico, enquanto a outra prioriza o social e o
educativo. Estas duas concepções historicamente têm-se articulado no sentido de
resguardar e cumprir a missão institucional da APAEB, mesmo quando as crises
muitas vezes apontam para superação somente pela via estritamente econômica.
4. O posicionamento estratégico da APAEB ao longo de sua história tem
contemplado:
a elaboração de estratégias diferenciadas que refletem os momentos
significativos de crescimento;
a necessidade de uma reavaliação de sua organização e a projeção de uma outra
estrutura que responda e se afine com os momentos de crescimento;
o reconhecimento que se faz necessário uma posição de liderança da instituição
em nível local e regional;
o desenvolvimento de perspectivas diferenciadas de intervenção na economia e
sociedade sisaleiras.
A construção de uma consciência coletiva da racionalidade do conviver com o
semi-árido.
5. O papel capitaneador da fábrica de tapetes e carpetes no corpo organizacional da
APAEB é fundamental para as escolhas estratégicas. A fábrica é a principal fonte
109
de renda da instituição e é responsável por aproximadamente 90.0% de seus
recursos orçamentários. Portanto, quando a fábrica é atingida por fatos
desfavoráveis da vida econômica a repercussão desses atinge o todo da
organização.
6. As questões referentes à racionalização da produção e à eficiência do trabalho na
fábrica ficaram mais expostas nesta última crise. As fragilidades operacionais
reveladas no diagnóstico da crise deram a medida exata do quanto àquela unidade
carece de outro processo de racionalização e adequação revelado pelo atual
momento crítico. Vale ressaltar aqui como que o operariado de origem na pequena
produção agrícola se adequou às vicissitudes impostas pelas crises na produção
industrial e se coloca pronto para o enfrentamento da mesma com um sentido
maior do que a defesa apenas a defesa de seus empregos.
7. O papel de suporte exercido pela fábrica na manutenção das atividades educativas
e sociais da organização. No auge desta última crise as atividades não econômicas
se apresentaram com muito mais vulnerabilidade, já que a fonte de recursos
internos está fragilizada pela crise financeira.
8. A APAEB está conseguindo implantar com eficácia um programa de
desenvolvimento voltado para “[...] geração de emprego e renda; valorização da
cultura e elevação do padrão de vida com investimentos baixos e metodologia
diferenciada para o semi-árido”. (ALMEIDA, 2000, p. 31)
9. A geração de um ‘efeito lealdade’ interno entre os membros (dirigentes, sócios e
funcionários) da organização, o qual tem sido fundamental para aqueles
suportarem as crises periódicas. Este se tornou o sustentáculo para que os
membros da organização não abram mão do propósito maior de salvaguardá-la em
função dos interesses individuais.
10. A notória ênfase na importância de ‘gerar empregos diretos’ através das atividades
da organização (os relatórios anuais de atividades da APAEB apresentam este item
como meta). Este item tem sido utilizado para balizar as decisões administrativas e
estratégicas ao longo das crises.
11. A geração de benefícios financeiros para os produtores sisaleiros, através da
valorização dos produtos da agricultura familiar; do crescimento dos preços
relativos da fibra e da geração de valor agregado no setor (relação entre
distribuição das sobras versus benefícios econômicos e sociais). Há um
110
entendimento, particularmente na Diretoria Executiva, de que é necessário
assegurar o benefício econômico de longo prazo e sustentável para a economia da
região em contraposição a distribuição imediata de ganhos auferidos no mercado
de fibras e produtos do sisal.
12. A definição da missão institucional se tornou um ‘eixo coerente’ de sentido para
as escolhas institucionais de planejamento e ação. Há uma preocupação presente
nos integrantes da organização de não se afastar da missão e ao mesmo tempo
tomá-la como referência de base para a busca de alternativas de solução para as
crises.
Este conjunto de constatações obtido através da análise da realidade organizacional da
APAEB e do seu contexto de intervenção remete para um segundo momento de análise, qual
seja o da relação da organização com o meio externo e as influências geradas por aquele na
construção de estratégias que repercutem na mudança interna no âmbito da estrutura
organizacional e no modo de gerir a instituição.
3.7. Respondendo ao Meio Externo: Estratégias de Adaptação e Superação Articuladas
com Alternativas de Organização e Gestão
O processo de construção de estratégias na APAEB foi e é conduzido pela Diretoria
Executiva e realizado através de reuniões semanais ocorridas naquele nível e mensais com o
conjunto dos membros das unidades, atividades e da administração.
Ao longo da história da Associação podemos eleger e enumerar cinco grandes
estratégias que revolucionaram substancialmente a organização e imprimiram um futuro de
crescimento e transformação organizacional. São elas:
Duas dessas estratégias foram lançadas nos anos 80, mais precisamente no ano de
1984, quando da decisão para realizar empreendimentos econômicos de maior porte
nos municípios de Serrinha e Valente e no final daquela década, quando a APAEB
percebeu a necessidade e se lançou para liderar uma articulação regional através de
uma mobilização visando a criação de um projeto estratégico para a região sisaleira
do Estado da Bahia. Esta segunda estratégia vai começar a tomar corpo na década
111
de 90, no ano de 1992, quando a Associação implementa a exportação direta da
fibra beneficiada através da Batedeira Comunitária de Valente e no contexto do
processo de municipalização da entidade. Vem reforçar, ampliar e conduzir todo
um processo de crescimento que acontece durante a década, a etapa de
industrialização da produção, através da criação e implantação da fábrica de tapetes
e carpetes.
A terceira estratégia significativa é decorrente da amplitude de percepção sobre
uma atuação da APAEB, que ultrapassaria a região sisaleira e consideraria o
contexto de semi-árido. Estamos falando da perspectiva de sobrevivência e
convivência no semi-árido em sua vertente sócio-educativa e de viabilização e
sustentabilidade da agricultura familiar. Esta estratégia é responsável por acentuar o
período de crescimento e diversificação das atividades da organização e também
pelo sucesso alcançado na atuação econômica e social. Nesta compreensão, a
fábrica, como principal unidade econômica da Associação, deu o suporte para a
geração dos recursos financeiros requeridos para o funcionamento de outras
unidades e atividades já existentes e às novas que foram incorporadas ao conjunto
da organização.
A quarta estratégia dá a continuidade a anterior, tendo seu foco no ajuste do
processo de crescimento organizacional iniciado com as anteriores. Esta atitude se
impõe diante do fato de os anos 2000 iniciam com uma grande crise financeira nos
negócios da fábrica e que se reflete no todo da instituição.
A quinta estratégia apenas mantém a continuidade e ressalta a administração da
crise financeira.
Na análise desse processo de construção de estratégias da APAEB e na tentativa de
interpretá-lo, indicamos algumas evidências reveladas pelo processo de estudo que nos
parecem interessantes:
1. A construção de estratégias e a transformação organizacional da APAEB estão
associadas a um elenco de fatores do ambiente externo, tais como:
imposições que os stakeholders fazem;
demandas diversificadas da população local em geral, do segmento social dos
sisaleiros e do corpo de associados;
112
demandas dos movimentos sociais locais e regionais;
integração a redes de organizações regionais, nacionais e internacionais;
fatores dos mercados de fibras naturais e de produtos derivados;
injunções dos marcos regulatórios nacional e internacional;
condições de produção e de logística de exportação;
políticas de Estado direcionadas para a agricultura familiar e em particular para a
cultura do sisal.
2. Há um peso variável dos fatores levados em consideração no item anterior em cada
momento significativo de crise.
3. Existe a presença marcante dos valores sociais próprios da cultura da agricultura
familiar, como valorização dos seus produtos, valorização da família, solidariedade,
cooperação, reciprocidade, entre outros, informando a construção das estratégias e a
aplicação de critérios, normas e procedimentos dentro da organização e perante a
sociedade.
A partir da descrição e análise do processo de construção de estratégias na APAEB,
foi possível chegar a algumas conclusões que nos facilitarão a etapa seguinte da tarefa a que
nos propusemos neste item, a de demonstrar a relação entre a construção de estratégias e as
mudanças organizacionais ocorridas no caso estudado:
Ocorre um processo interno permanente na APAEB de consulta, análise e
diagnóstico da constelação de variáveis ambientais que poderão indicar a
necessidade e a oportunidade de uma reação da organização, no sentido de ajustar-
se, adaptar-se ou mesmo construir alternativas para superar adversidades que
possam vir a afetar a sua existência e funcionamento.
Aconteceu o crescimento do número de unidades de negócios e atividades em
decorrência da implantação das estratégias que marcaram fortemente o final dos
anos 80 e a década de 90. O crescimento resultou da necessidade de responder
positivamente as oportunidades identificadas a partir da análise do ambiente e das
chances de mobilizar os recursos financeiros e competências necessários para que a
organização viesse a ampliar a sua intervenção.
Nem sempre as estratégias formuladas são acompanhadas da proposição imediata de
novos formatos organizacionais para a Associação. Mas, só algumas delas ao longo
113
da história da organização se apresentaram consistente ao ponto de demandarem
para sua implementação um ajuste, modificação ou uma transformação mais
substancial da estrutura organizacional vigente.
Ao continuar examinando a questão das estratégias, vamos nos fixar no momento que
diz respeito às estruturas, ou melhor, às mudanças que ocorreram no formato organizacional
da APAEB e como essas podem ser articuladas com a construção das estratégias significativas
já apresentadas e analisadas aqui.
Para efeito do nosso estudo, as mudanças substanciais ocorridas na estrutura
organizacional da Associação podem ser enumeradas e localizadas cronologicamente nos
seguintes termos. A primeira acontece durante o ano de 1984, quando as Comissões
Municipais ganham a atribuição de serem responsáveis pela implementação dos projetos
econômicos de maior porte (Moinho de fubá em Serrinha e Batedeira Comunitária em
Valente) e sobre o conjunto das atividades do trabalho de base realizado com os pequenos
produtores (veja quadro sobre Evolução Institucional). Este fato revela o início da tendência à
descentralização administrativa que vai se concretizar plenamente no ano de 1992, quando se
efetiva o processo de municipalização cujo bojo continha a autonomia administrativa e
financeira das sedes municipais da APAEB. Essa autonomia revela uma segunda e decisiva
mudança estrutural, que se completa com o desmembramento da Associação denominada até
aí de APAEB Geral. Para a APAEB/Valente a finalização desse processo favoreceu a reunião
das condições favoráveis para a sua evolução ajustada aos seus interesses e aos da região
sisaleira. Portanto, foi possível, com essa mudança, concretizar uma articulação regional para
a construção de um projeto estratégico para o sisal, já pensada nos finais dos anos 80.
Os anos 90 mostraram uma década de crescimento e êxito, embalados pelas grandes
decisões estratégicas de exportar diretamente a fibra beneficiada, de industrializar a produção
através da fábrica de tapetes e carpetes e da nova visão de desenvolvimento local, que
acreditava que a sobrevivência humana na região semi-árida só seria possível quando as ações
ali promovidas se ajustassem às suas características climáticas, históricas, econômicas, sociais
e culturais. Convivência, viabilidade e sustentabilidade foram as palavras-chaves naquele
momento, cuja estratégia principal levava em conta a realidade da região, propondo um
processo de desenvolvimento a ela ajustado e endógeno.
Porém, a sustentabilidade do todo do processo de crescimento foi edificada com base
nas exportações da fábrica e nas sobras que a mesma produzia e, na medida em que as
114
oscilações e variações dos mercados do sisal impactaram aquela unidade, o sistema APAEB
revelou suas fragilidades. O crescimento e a diversificação, enquanto processos permanentes
demandavam ajustes e, como tal, a necessidade de uma nova adequação da estrutura
organizacional da Associação se fez presente. Neste sentido, foi criado o cargo de Diretor
Executivo, com a missão precípua de reordenar a gestão administrativa e financeira. Esta
terceira mudança estrutural de caráter centralizador foi suficiente para dar sustentação
financeira e reforçar a organicidade da Associação no início dos anos 2000. De acordo com as
palavras do Luiz Mota, Presidente na época, “Desde o ano de 2000, através de um trabalho de
avaliação e autocrítica da APAEB, ficou claro que havia diversas mudanças a serem feitas
para que a gente pudesse adequar nossa estrutura ao próprio crescimento da Associação.” E
completa: “[...] O ano 2001 marcou o início da implantação dessas modificações internas, que
já começaram a nos dar melhores condições de gerenciar o dia a dia e garantir o futuro deste
sonho que vem durando há mais de 20 anos”. (RELATÓRIO ANUAL de 2001, p. 07)
Ajustar o processo de crescimento e dar continuidade à estratégia principal de
sobrevivência e convivência no semi-árido não foi o suficiente. A crise financeira da
organização avolumou-se e mesmo com todos os esforços de racionalização do
funcionamento na fábrica a crise geral que também abarca as atividades não econômicas não
foi superada. O novo contexto apontou para a necessidade estratégica de separar as atividades
econômicas das atividades sociais e educativas e uma nova reforma institucional e quarta
mudança se efetivou no início do ano de 2007, com a criação da Fundação APAEB.
Segundo a Folha da APAEB (Abr. 2007),
“Há mais de um ano, os diretores da APAEB em parceria com a ANTEAG
(Associação Nacional de Trabalhadores em Empresas de Auto Gestão)
discutem sobre o desmembramento dos setores sociais e econômicos da
Associação. Foram várias as reuniões e planejamentos onde os diretores,
sócios e representantes de entidades parceiras consolidaram a criação da
Fundação APAEB que passa a gerir todos os projetos sociais da Associação.
Em assembléia realizada no dia 13 de março, foi escolhida a diretoria da
Fundação que é composta por 10 membros distribuídos entre o conselho
executivo, deliberativo e fiscal”.
E o informativo conclui:
“... A Fundação APAEB é uma instituição, que nasce com o objetivo de
contribuir com a natureza gerencial e administrativa de um conjunto de
ações da própria APAEB , mas que irá funcionar com autonomia no que diz
115
respeito as ações sociais como a Casa da Cultura, CAIS (Centro de
Aprendizagem e Intercâmbio de Saberes), DDC (Departamento de
Desenvolvimento Comunitário), Comunicação entre outros”.
No contexto dessa mudança tornou-se vital a obtenção dos recursos financeiros para
dar prosseguimento ao projeto social da APAEB. Talvez até por isto, a nova organização –
que em 2007, no momento desta pesquisa ainda não estava efetivamente funcionando – se
tornou realidade mais rapidamente:
“... Uma das responsabilidades da Fundação será a de buscar apoio para
conduzir os projetos a partir da soma dos parceiros a exemplo do Sindicato
dos Trabalhadores Rurais e Agricultores Familiares de Valente, APAEB,
FATRES (Fundação de Apoio aos Trabalhadores Rurais da Região
Sisaleira), CODES (Conselho de Desenvolvimento Territorial da Região
Sisaleira), SICOOB - COOPERE, entre outras parcerias institucionais, que
servirão de ponte para discutir com a Fundação aonde buscar recursos, sejam
eles privado ou público a serem revertidos em ações sociais no Território do
Sisal.” (Idem)
Por outro lado, no que se refere à APAEB, mesmo tendo sido pensada a separação
jurídica das unidades de negócios, os mecanismos satisfatórios ainda não foram encontrados.
Enquanto isso não ocorre foram tomadas as seguintes decisões:
1. separar a contabilidade e administração das unidades, ou seja, responsabilizar os
gerentes pela administração, cobrar resultados e manter os dados contábeis
separados para saber a situação de cada um;
2. no caso da fábrica, devido ao tamanho do projeto, criar um mecanismo de
participação dos colaboradores na decisão, não apenas os gerentes e supervisores;
3. aperfeiçoar os sistemas de contabilidade e custos para que se tenha maior agilidade
nas informações, auxiliando as decisões do dia a dia;
4. dar maior agilidade nas decisões dos gerentes com a Diretoria Executiva.
Segundo o Diretor Executivo,
“o mais importante nesse momento é procurar envolver as pessoas,
especialmente os que estão na frente”. (ENTREVISTA AO
PESQUISADOR)
116
Ainda sobre mudanças organizacionais, passemos a discorrer sobre as estruturas
stricto sensu. Ao longo da história da organização, o modelo de estrutura adotado foi o
departamental, hierárquico e concentrador de poder nas instâncias superiores. O surgimento
de novas unidades ou extinção de outras, assim como a variação da importância da unidade no
design institucional tem sido em geral uma função da relação da organização com o ambiente
e reflete o tom do período de crescimento, noutras palavras de expansão ou retração.
A análise dos diagramas seguintes nos levou a estas constatações gerais, porém, um
olhar refinado dos mesmos; indicam-nos que certa atualização ou modernização verificou-se
ao longo da história da Associação. No Gráfico IX, a estrutura departamental revela uma
classificação de níveis de unidades estratégicas, administrativas e operacionais plasmados
pelo processo interno da comunicação organizacional. Conforme explica o Diretor Executivo,
em entrevista ao pesquisador,
“Todas as unidades são consideradas importantes, no entanto, algumas delas
estão no organograma ligado ao Diretor Executivo e a Diretoria Executiva e
outras passam por um setor intermediário. Por exemplo: a fábrica de tapetes
se relaciona diretamente com o Diretor Executivo, já o laticínio, responde ao
gerente de projetos produtivos.”
Gráfico IX
Estrutura Organizacional da APAEB
Fonte: APAEB/Valente
ESTRUTURA ORGANIZACIONAL DA APAEB
Nível Estratégico / Administrativo / Operacional
Diretor Executivo
Diretoria Executiva
Presidente
Diretor Secretário
Diretoria Financeira
Conselho de Administração
Conselho Fiscal
Assembléia Geral
SISTEMA DE COMUNICAÇÃO
Nível Político Estratégico
Jurídico
Consultoria
Captação de
Recursos
Comunicação
Controladoria
Recursos
Humanos
Relações
Públicas
Departamento de
Desenvolvimento
Comunitário
Escola Família
Agrícola
Gencia Geral
Gerência
Comercial
Setor de
Pessoal
Contabilidade
Gerencial
Gerência
Administrativa
Financeira
Gerência de
Projetos
Produtivos
Gerência de
vendas
Gerência de
Com
p
ras
vendas
Faturamento
Compras
Contabilidade
Fiscal
Custos
Almoxarifado
Serviços Gerais
Caixa
Contas a Pagar
Contas a Receber
Unidades
de Apoio
Unidades de Apoio
Fábrica de Tapetes e
Car
p
etes
Batedeira
Sertão.Net
Perfuratriz
Laticínio
Curtume
Casa do Mel
Posto de Vendas
Clube Social
Couros Valente
Riquezas do Sertão
Informática
Transporte
117
No Gráfico IX, no entanto, as relações hierárquicas são desprezadas e revela-se a
funcionalidade interna da organização combinando-se processos de hub com processos de
web. Essas duas representações da organização estrutural da APAEB se completam e
traduzem bem a dualidade de posicionamentos sobre a questão organizacional ali presente.
Noutras palavras, faz-se necessário a centralização de poder nas unidades denominadas de
estratégicas para que as partes da organização possam funcionar descentralizadamente.
Gráfico X
Organigraph da APAEB
Fonte: APAEB/Valente
As estruturas apresentadas datam do ano de 2001, quando foi criado o cargo de Diretor
Executivo e se mantêm em vigor na atualidade. A prevalência do formato departamental e
hierárquico em detrimento do modelo descentralizado é resultante do momento crítico
vivenciado pela organização. No entanto, a crença de que esta é a melhor escolha não é
partilhada pela totalidade de seus membros.
O processo de gestão da organização tem-se caracterizado pelo seu tom artesanal,
apresentando ao longo desses 27 anos mecanismos e instrumentos que vêm favorecendo as
118
práticas participativas em processos de diagnose, de avaliação institucional e de tomada de
decisões tanto estratégicas quanto táticas e sobre o cotidiano das unidades de negócio. As
reuniões da Diretoria Executiva, as reuniões de grupo (unidades de negócio, projetos,
atividade etc.), os coletivos mensais e as assembléias gerais, ilustram a afirmativa sobre as
práticas participativas e são responsáveis pela criação, manutenção e fortalecimento de uma
cultura organizacional do tipo democrática.
Nesse sentido habilidades coletivas foram criadas na organização e, conforme afirma
seu Diretor Executivo, em entrevista a nós concedida,
“(...) existem muitas instâncias de participação e envolvimento dos
colaboradores. As discussões nos setores e entre as pessoas (gerentes e
colaboradores), entre esses e a Diretoria, evoluiu e ajudou muito. Discutimos
muito, por exemplo, a criação do regimento interno dos setores, com todos
os funcionários, dos procedimentos diversos e tanto outros assuntos. Acho
que esse trabalho ficou comprometido nos últimos 3 a 4 anos com a crise”.
Mesmo assim,
“... com todo o dilema que vivemos hoje, ainda existem muitas (práticas
participativas) em prática, especialmente entre diretoria executiva,
gerentes/coordenadores e supervisores. No dia a dia, muitas das decisões,
como produzir, como melhorar, onde se pode reduzir custos, quais os
produtos mais adequados para o mercado, como abrir novos clientes, mudar
o foco do mercado. Todas as semanas temos reuniões gerais (diretoria e
pessoas do geral) administração, contabilidade, financeiro ... e setoriais, com
gerentes das unidades e as discussões e decisões são coletivas”. (Idem)
No entanto, talvez não seja adequado afirmar que a Associação é uma organização de
todo auto-gestionária, pois as decisões estratégias mais significativas e conseqüentes são
pensadas e assumidas pela Diretoria Executiva, com uma forte interveniência do Diretor
Executivo. As tentativas de incorporação de gestores profissionais, particularmente na fábrica
de tapetes e carpetes não têm obtido êxito. Segundo o Diretor Executivo, a prática dos
gestores profissionais não consegue se coadunar com a “cultura camponesa” da Associação.
No nível das unidades de negócio o processo participativo de construção estratégica e
tomada de decisões se reproduz, porém nenhum encaminhamento é realizado sem a
concordância do Diretor Executivo. Este procedimento foi iniciado com a criação daquele
cargo no ano de 2001 e se consolidou como padrão de referência para os procedimentos
administrativos gerais e cotidianos. Deste modo, todas as iniciativas e procedimentos surgidos
119
nas unidades de negócios convergem para obter a chancela final da Diretoria Executiva. A
partir do ano 2004 o processo descrito foi reafirmado fortemente e justificado pela ocorrência
da profunda crise financeira.
No tocante às escolhas sobre criação, manutenção ou extinção das unidades de
negócio, o relato do Diretor Executivo é categórico:
“Normalmente a idéia parte de alguém e é colocada na mesa para discussão,
inicialmente com a diretoria, as vezes com alguns gerentes e depois vai
ampliando a discussão com mais gente, até chegar a Assembléia.
Normalmente se procura clarear bastante, para que a diretoria e as pessoas de
frente (gerentes e coordenadores) entendam e passe a defender, depois é
claro de ter ficado claro e se tenha chegado a um consenso da importância do
funcionamento ou não, de como deve funcionar etc”.
Neste processo, em particular, os membros da organização levam em conta, além da
viabilidade econômico-financeira do negócio ou projeto, considerações de ordem social,
humana e filosófica que refletem aspectos da cultura da organização, da história e cultura
regional e da agricultura familiar:
“... Considera-se todos os fatores. Para APAEB é importante a viabilidade
econômica, mas também o impacto geral disso, não basta focar o econômico,
mas também o produtor e sua família. É feito um processo JUSTO, onde se
consiga viabilizar o projeto e os produtores poderem ter sua renda
aumentada, o produto valorizado e apoios educativos e culturais para toda a
comunidade”. (Idem).
Enfim, pode-se afirmar que o processo de gestão praticada é extremamente
concentrador de poder na posição do Diretor Executivo e que, por injunções da crise
financeira já demonstrada, acentuou-se no período de pós-concentração iniciado no ano de
2004.
Já no ano de 2007, há certa insatisfação no grupo de gerentes das unidades de negócios
com respeito a esse processo de gestão e a ele é atribuída parte considerável da explicação e
responsabilidade sobre a atual crise. Essa insatisfação se expressa por atos de quebra da
hierarquia, desobediência e encaminhamento de decisões de caráter unilateral.
120
CAPÍTLO IV
ESTRATÉGIA E ESTRUTURA:
TEORIA E PRÁTICA ORGANIZACIONAL
121
CAPÍTLO IV
ESTRATÉGIA E ESTRUTURA:
TEORIA E PRÁTICA ORGANIZACIONAL
4.1. A Re-Problematização do Tema: as questões propostas e sua pertinência
4.1.1. Algumas Percepções iniciais do Tema em Estudo
No ano de 2004, ao final de uma visita à APAEB/Valente, numa entrevista concedida
à FOLHA DO SISAL já se clarificara para nós as possibilidades de pesquisa e os contornos
que o mesmo poderia assumir:
“[...] meu trabalho tem por objetivo saber como as organizações criam
suas estratégias para o crescimento. A APAEB/Valente possui um
vasto material para minha pesquisa. Se destaca por ser uma
organização singular, de razoável porte, e com uma estratégia de
administração, onde a participação de todas as esferas da organização
torna-se uma peça chave para o crescimento.
[...] porém, ainda estudarei bastante para entender toda essa grande
rede que compõe a APAEB/Valente e como uma administração
descentralizada consegue conduzir os trabalhos em harmonia, sem
perder de vista sua missão, que é levar o desenvolvimento para toda a
região onde atua. Outra coisa bastante curiosa é que vocês apresentam
esta administração de modo transparente.
[...] A existência dessa organização em vinte e três anos prova que é
uma entidade eficiente naquilo que se propõe a fazer. A
APAEB/Valente, por ter seus projetos econômicos, poderia se limitar
apenas a obter lucro, mas faz mais que isso. Ela traz inúmeros
benefícios para seus sócios e população em geral.
[...] A APAEB/Valente é uma organização que oferece alternativas.
Eu percebi que há uma coisa comum entre os seus integrantes: eles
estão sempre em busca de algo novo.” (Entrevista de Eduardo Jordão
para Folha do Sisal, Mar. 2004, p. 7).
122
Todos estes itens de qualidade que ressaltamos acima à época formam um todo
sistêmico e coeso que sem dúvida expressam um tipo de cultura organizacional própria da
organização. Porém, provavelmente esta será encontrável também em outras organizações a
ela assemelhadas. Isto afirmamos em razão da ocorrência de intensos processos de interação
inter-organizacionais no universo da sociedade civil.
Por outro lado, em termos do estudo da relação entre cultura organizacional e
estratégia é adequadamente aplicável para a natureza deste estudo a afirmação de
HOFSTEDE:
“Para que a cultura esteja a serviço da empresa, a primeira coisa a fazer é
tentar olhar a organização, analisar como ela funciona. Se você está numa
posição no topo, em que é responsável pela estratégia, deve perguntar a si
mesmo se a organização é funcional para seus objetivos ou não. E, se for
disfuncional, avaliar o que pode ser feito.” (Entrevista de Geert HOFSTEDE
para a Revista Exame, Jan. 2004, p. 54).
4.1.2. A escolha da questão principal a ser respondida pelo estudo
Visto assim, o tema central deste trabalho passou a ser – em 2007 – o processo real de
construção de estratégias e a conseqüente transformação de estruturas organizacionais
ocorridas em uma organização constituída por pequenos produtores rurais – a
APAEB/Valente – ao longo de sua história. Para chegarmos à certeza deste enunciado,
indagamos inicialmente em nosso plano de estudo “Por que as organizações crescem ou se
transformam? Quais os fatores responsáveis pelo surgimento, modificação ou extinção de
unidades na estrutura de uma organização? Por que a APAEB/Valente cresce e se transforma
continuadamente? Que critérios os seus componentes utilizam para conduzir esses processos
organizativos?” (PLANEJAMENTO DO ESTUDO, Cap. II, p. 64).
As nossas questões gerais foram desdobradas em uma lista de nove questões
específicas, que nos indicaram alguns aspectos ou variáveis do tema concernentes à própria
organização estudada ou ao ambiente onde a mesma se insere e atua e a interação entre esses
dois elementos (conferir com Cap. II, p. 65).
No decorrer da própria investigação percebemos que as questões propostas para
delimitar o nosso ‘problema de estudo’ poderiam ser catalisadas em torno de uma, exatamente
aquela questão que aborda a elaboração de estratégias diferenciadas ao longo da história da
organização enfocada (Cap. II, p. 67, letra ‘g’). Este trajeto percebemos também, nos levaria a
123
encontrar as respostas desejadas e pertinentes a respeito do crescimento e transformação
estrutural das organizações daquela natureza e da APAEB/Valente em particular. Essas
respostas seriam consolidantes ou divergentes do conhecimento disponível e utilizado em
nossa análise e interpretação do fenômeno estudado.
Dessa nova configuração dada às questões específicas, nos foi possível então verificar
que os fatores ou variáveis contidos nas mesmas podem ter cumprido papéis diferenciados em
momentos distintos da história da organização (em particular nas crises ocorridas) e com
importâncias, efeitos e implicações relativizados de acordo com esses mesmos momentos.
4.1.3. A influência dos fatores sociais sobre a organização
Das influências do ambiente externo, temos a destacar que na fase inicial da história
da organização, notadamente no seu contexto de origem, foram fundamentais as demandas da
população dos pequenos produtores em geral e dos produtores do sisal, em particular. As
mobilizações sociais a respeito da arrecadação do ICM (hoje ICMS) criaram as condições
básicas propícias para a criação e constituição da APAEB. É nessa fase também que
registramos uma presença mais forte do movimento das “associações locais” e da integração
de propósitos da mobilização contra a cobrança “em cascata” do ICM com o movimento
sindical, sem perder de vista o apoio das organizações da sociedade civil.
Nas fases seguintes, a relação da APAEB com os movimentos sociais foi arrefecida e,
particularmente com o movimento sindical, foi abalada em vários momentos. Não obstante,
alguns dirigentes sindicais reconheceram o papel econômico desempenhado efetivamente pela
organização no soerguimento da economia sisaleira.
O reconhecimento – por parte da organização – da necessidade e importância de estar
presente e atuante nas redes de organizações locais, regionais, nacionais e até internacionais
se faz, nessa fase inicial, na perspectiva da busca do apoio mútuo, em geral de natureza
política. Com a municipalização da APAEB e solidificação da APAEB/Valente, esta
participação nas redes vai se desenvolver ao longo das fases seguintes, porém, localizada em
situações específicas surgidas ao longo da história da organização e que exigem das redes,
com certa freqüência, o apoio político e a cooperação econômica e financeira. Porém, não se
pode ignorar que a APAEB/Valente tem firmemente apoiado os movimentos pela cidadania e
de vigilância sobre a lisura das administrações municipais.
124
Na verdade, quando a APAEB/Valente afirma mais o caráter econômico da
organização, enquanto processadora e comercializadora da fibra e de produtos manufaturados
a partir do sisal, a sua presença nas redes se qualifica e seu apoio vem foi pouco a pouco se
direcionando para outras “associações de produtores”, em nível municipal, que trabalham com
a problemática da produção sisaleira.
Conforme afirma o Diretor Executivo da organização, a respeito dos processos de rede
nos quais a APAEB/Valente se envolve, ela se rege tanto pela confiança e cooperação como
pelo auto-interesse institucional:
“Acho que existem as duas situações. Normalmente, existe todo um
empenho muito mais pela cooperação, para manter bons relacionamentos,
ajudar outros grupos, mas também muitas vezes existem temas que são de
nosso interesse e estimula a participação.” (Entrevista cedida por Ismael
Oliveira, Março de 2004).
Sendo assim, poder-se-ia afirmar que hoje a influência das redes de organizações na
determinação da escolhas estratégicas da organização é de pouca monta. O crescimento e
autonomia conquistados pela APAEB/Valente a transformaram em uma organização que mais
apóia a interação entre organizações locais e regionais do que em uma organização que se
robustece daquele processo social de troca de influências. Neste sentido, cremos que neste
momento a presença e participação em redes internacionais de solidariedade é mais benfazeja
e contribui sobejamente para a vida da organização.
Diferentemente da relação com os elementos anteriores do ambiente, a interação com
os stakeholders institucionais – organizações não-governamentais tais como o MOC, a
CEDITER ou o DISOP/Brasil; cooperativas como a COOPERE; bancos como o BANCO DO
NORDESTE DO BRASIL (BNB), entre outros - tem sido mais permanente e conseqüente.
As organizações não-governamentais (ONG) nutrem uma relação profícua e salutar
que se inicia desde antes da fundação da APAEB, passa pela etapa de implantação da mesma
e segue até os dias de hoje. Essas organizações conjugaram esforços técnicos e financeiros
para criação da APAEB e para a descentralização da mesma durante o processo de
municipalização. A APAEB/Valente ainda recebe recursos financeiros da DISOP/Brasil para
a execução de projeto específico.
O apoio financeiro da COOPERE foi de importância fundamental para a instalação do
projeto da fábrica de tapetes e carpetes, assim como o empréstimo do BNB foi decisivo para a
ampliação das instalações daquela mesma unidade de negócio.
125
Todos esses compromissos construídos ao longo da história da APAEB/Valente são
produtos de relações de apoio e solidariedade buscadas, desenvolvidas e atualizadas de parte
dos stakeholders e da organização. A ocorrência dessas relações de mútua colaboração,
primeiramente, tem sido explorada naqueles momentos de grandes e decisivas escolhas
estratégicas planejadas, sejam para uma nova opção de crescimento ou de busca de
alternativas para a superação de uma crise eventual, como tem ocorrido.
Secundariamente, muitas vezes também, as “respostas” as demandas ou pressões que
incidem sobre o cotidiano da organização ou os “inshigts” surgidos e reconhecidos como
válidos na perspectiva estratégica foram tratados no contexto das relações da APAEB/Valente
com os seus stakeholders institucionais.
Deste modo, podemos concluir pelo diferencial de participação dos fatores sociais do
ambiente no processo de construção de estratégias e que a presença marcante e decisiva da
população local, do segmento dos sisaleiros, dos associados da organização, dos movimentos
sociais organizados e das redes na fundação e primeiros tempos da APAEB/Valente foi
substituída – na medida em que a organização se tornou mais complexa e institucionalizada –
pela participação dos stakeholders institucionais. Sobre esta afirmação, em particular sobre os
associados, já no ano de 2000 o Relatório de Avaliação Institucional aludia para este fato e
discorria deste modo:
“[...] o crescimento da entidade não foi acompanhado por um processo de
reflexão interna que permitisse novas definições estratégicas capazes de
contemplar os interesses dos associados, os objetivos da organização e o
realinhamento das relações internas e externas”. (RELATÓRIO DE
AVALIAÇÃO INSTITUCIONAL, p. 53)
O mesmo documento noutro parágrafo reafirma o problema:
“[...] a entidade não tem clareza sobre os reais interesses do corpo de
associados, o que se constitui um grave problema, na medida em que pode
refletir no distanciamento da APAEB daqueles que seriam a sua base de
sustentação”. (Idem, p. 53)
Após a publicação do relatório, a organização definiu ações no sentido de minorar o
problema constatado, porém essas ações foram descontinuadas ao longo do tempo.
126
4.1.4. A influência dos fatores econômicos sobre a organização
Examinando agora os fatores econômicos do ambiente, tais como as condições locais
de produção e de logística de exportação e a especificidade dos mercados de fibras naturais e
de produtos derivados, podemos perceber que, ao longo da história da organização, estes dois
fatores mereceram de parte da mesma uma enorme atenção. Foi o reconhecimento de sua
crucial importância e o trato destes mesmos fatores que vez por outra conduziram e
direcionaram a formulação e o desenvolvimento de estratégias na primeira fase da história da
organização.
As condições locais de produção na área de intervenção da APAEB/Valente estão na
gênese da sua criação e se traduz na afirmação de que a estratégia inicial da organização foi
“[...] melhorar a posição dos trabalhadores no sistema de produção daquela fibra, minimizar a
penosidade do trabalho e facilitar o acesso daqueles trabalhadores aos bens industriais [...]”
(conferir com o Cap. III, p. 75). Isto se traduziu em três ações estratégicas fundamentais: a
criação do Posto de Vendas, da Batedeira Comunitária e o incentivo à pesquisa e inovação
tecnológica acerca da máquina de desfibramento, utilizada ainda nos campos do sisal.
Vale relembrar (cf. c/ Cap. III), então, que a aquisição de uma batedeira, logo nos
tempos iniciais de operação da Associação, fez com que ela se inserisse, na primeira etapa do
processo manufatureiro da fibra, em um mercado de commodities totalmente desorganizado e
sob o comando de indivíduos com o domínio tradicional e de algumas poucas organizações
controladoras. Este passo foi realmente estruturante, pois permitiu a regulação desse mercado,
proporcionando preços relativos mais vantajosos para os pequenos produtores e a afirmação
da liderança da APAEB/Valente na economia de parte da região sisaleira naquele momento
em aquela cultura estava desacreditada.
Já a ação estratégica de incorporar uma outra batedeira e a contratação da prestação de
serviços de duas outras, na segunda fase da história da organização, revela o reconhecimento
da necessidade de ‘verticalizar’ o processo produtivo agrícola dos associados e dos não
associados, pois, sem esta decisão, os compromissos de exportação já firmados
provavelmente seriam afetados, uma vez que o volume de produção e de processamento da
fibra próprios da organização não seriam suficientes para atender a tais compromissos.
Porém, esse processo de verticalização conviveu na época e na nossa percepção ainda
convive hoje com alguns problemas mercadológicos:
127
“O primeiro diz respeito à oferta da matéria prima básica que alimenta a
fábrica de tapetes e carpetes, a fibra do sisal, constatando-se que existem
problemas de comunicação e de atendimento entre o departamento comercial
e os produtores. Essa questão se manifesta, claramente, no problema da
baixa qualidade da fibra ofertada pelos produtores.” (Idem p. 55).
À época do citado estudo avaliativo, a conclusão sobre o problema foi:
“[...] está faltando um trabalho junto aos produtores que lhes possa mostrar a
importância da melhoria do processo produtivo, da colheita e do
beneficiamento da fibra. Evidente que esse processo só se consolidará na
medida em que os produtores sintam esse processo como fundamental para a
melhoria de suas condições econômicas.” (Idem, p. 55)
Soma-se a essa constatada falta de orientação educativa e técnica, outro aspecto
ponderado pelos avaliadores junto à organização:
“[...] o fornecimento do sisal; ser feito crescentemente por produtores não
associados e sobre os quais a APAEB exerce pouca influência.” (Idem, p.
55)
Por fim, a ‘ampliação e diversificação’ das atividades econômicas e a
complementaridade das atividades econômicas com as de suporte agrícola e com as atividades
sociais e educativas tornaram possível a implantação do todo do processo e o deslanche do
processo de crescimento ocorrido nos anos 90.
Do mesmo modo, a ‘diversificação’ de carpetes para tapetes e fios utilizados na
agricultura e a colocação destes produtos em mercados exteriores e domésticos tentam reduzir
o impacto das crises dos anos 2000.
4.1.5. A influência dos fatores institucionais e políticos sobre a organização
Analisando os fatores institucionais e políticos, percebemos que os mesmos estiveram
presentes desde antes do inicio das operações da APAEB/Valente, quando se fez necessário
um estudo jurídico prévio sobre a possibilidade legal de uma “associação” vir a atuar no
campo econômico. Posteriormente, toda uma série de dificuldades burocráticas foi enfrentada
pela organização junto a CACEX/BANCO DO BRASIL para poder receber autorização para
realizar as exportações da fibra e dos produtos manufaturados.
128
Com o passar dos anos, porém, estas dificuldades que incidiram sobre a organização
foram sendo superadas e seu impacto se tornou bem menor. Na própria APAEB/Valente
acredita-se que aquelas dificuldades em parte decorriam de ações de indivíduos e
organizações que atuavam no mercado de fibras de sisal e não queriam a entrada da
organização no mesmo.
Havia o receio, que se confirmou em ações concretas, que a entrada da
APAEB/Valente no mercado modificaria suas regras de operações costumeiras e poderia
também alterar o caráter das relações econômicas extremamente assimétricas entre os atores
produtores da fibra e compradores - comerciantes e exportadores - com repercussões
notadamente nos preços praticados na área de intervenção da organização e quiçá no todo da
região sisaleira.
Quanto às políticas de Estado para aquela região, historicamente foram quase
inexistente ou poucos eficazes junto à pequena produção familiar. No tocante à cultura do
sisal, reduziu sua ação à política de preços mínimos para a fibra beneficiada.
4.1.6. Os fundamentos das respostas da organização na sua interação com o ambiente
A APAEB/Valente é uma organização formada por pequenos produtores familiares,
educadores, profissionais de nível médio e de nível superior. Suas ações em geral não estão
determinadas por estudos ou pesquisas prévios, mas estão apoiadas, sobretudo na avaliação
das situações reais que enfrentam no cotidiano e nos momentos eventuais e formais de
planejamento da intervenção da organização.
Deste modo, é passível de ser compreendido que tal coletividade de indivíduos não
tenha a ciência como seu princípio organizativo principal. E sim, como um dos recursos de
que dispõe, entre outros, para fazer face às demandas enfrentadas pelo conjunto da
organização.
No entanto, a APAEB/Valente tem acesso – via treinamentos e consultorias - à
informação circulante e ao conhecimento existente sobre o meio ambiente e sociedade onde a
organização está inserida e atuante, sobre a economia (local, regional, nacional e
internacional), sobre os mercados onde atuam, entre outros itens. Este fato faz com que suas
decisões e passos estratégicos tenham tanto fundamento na intuição criativa como nos
procedimentos científicos e técnicos reconhecidos e acreditados como válidos pela sociedade.
129
É assim que poderemos explicar dois posicionamentos assumidos pela organização de
modo articulado e coerentemente compreendidos como parte de uma mesma unidade de ser e
de ação. São eles: a aceitação de uma racionalidade intrínseca de conviver com o semi-árido
brasileiro, em particular a porção regional do Estado da Bahia e a crença na necessidade de
intervenção sistêmica na economia e sociedade sisaleira, que só poderá ser compreendida,
enfrentada e minorada a partir do reconhecimento de sua especificidade.
Foi esta compreensão originária da teoria e pautada pela prática que embasou os
membros da APAEB/Valente na firme decisão de cogitar uma intervenção global e articulada
na região sisaleira. Esta decisão se revestiu de um caráter de estratégia, daí resultando a
concepção de um projeto econômico desenvolvido nos anos 1990 que se viabilizou a partir da
implantação da fábrica de tapetes e carpetes. Esse projeto vai complementar-se com o
lançamento de um programa de sobrevivência e convivência com o semi-árido – também de
caráter estratégico – do qual resultou o grande leque de atividades sociais e educativas que já
apresentamos no capítulo anterior.
O que queremos afirmar é que as respostas da organização às influências do ambiente
foram produzidas e projetadas à luz do conhecimento e têm sido trabalhadas sempre na
perspectiva de uma aprendizagem profícua para o posicionamento da APAEB/Valente no
próprio ambiente, na sua organização e coesão internas. A isto se ajunta a vontade de se
antecipar aos problemas e de se sobrepor as situações de dificuldade com um novo
posicionamento.
As grandes decisões tomadas nos anos 90 propiciaram o surto de crescimento
institucional alcançado pela organização durante aquela década. Porém, esta conquista só se
realizou porque decorreu da evolução do quadro das decisões estratégicas feitas anteriormente
nos anos 80 e das práticas institucionais que as consolidaram.
Outra explicação para o crescimento das organizações do tipo da APAEB/Valente
decorre da sua natureza intrínseca. Ou seja, existiria uma elasticidade, natural nesse tipo de
organização, para incorporar paulatinamente novas atividades sugeridas ou demandadas por
seus stakeholders. Sendo assim, estariam sempre crescendo ou se transformando, pois os
controles institucionais sobre elas são menores e mais brandos do que sobre as empresas.
Há que se considerar também que este tipo de organização nem sempre delimita sua
atuação de modo rígido. Ou, em algumas situações da vida organizacional, entendem que a
incorporação de novas atividades pode lhes proporcionar alguns recursos financeiros a mais.
130
Cremos que na história particular da APAEB/Valente estas duas explicações são
procedentes, porém tendemos a reconhecer que a expansão dessa organização foi concebida; e
realizada dentro de um caminho de coerência com a sua missão institucional e com as
estratégias delineadas em cada fase dessa história.
4.2. A Sustentação das Proposições iniciais que explicaram o Caso em Estudo
Sabemos que as organizações de qualquer tipo só poderão ser estudadas e
compreendidas na sua relação com o ambiente. Mas, a própria compreensão dessa relação
necessita de um aprofundamento das características da organização por um lado e na
configuração do ambiente por outro.
As organizações são assemelhadas, mas não idênticas. As organizações poderão ser de
um tipo ou de uma categoria, porém, a trajetória histórica de cada uma e os caminhos que
escolherá nessa trajetória são particularizados à sua experiência.
Revendo as proposições iniciais que davam sustentação explicativa prévia para o caso
em estudo, reconhecemos que uma maior e melhor aproximação com a realidade
organizacional, bem como uma releitura da teoria nos ajudaram a consolidar certezas e a rever
algumas conjecturas que nos pareceram adequadas naquele momento de planejamento.
Mantemos a percepção que para estudar e compreender a APAEB/Valente sob o
prisma da relação ‘estratégia e estrutura’ “é inevitável considerar a multiplicidade de aspectos
ou fatores através dos quais podemos nos aproximar da realidade da organização”
(Planejamento do Estudo). Entretanto, nem todas as explicações parciais, que faziam sentido
quando apresentadas sob a forma de um conjunto articulado anteriormente, foram
confirmadas após o estudo de campo. Sendo assim, necessitamos construir outro arranjo para
as proposições enunciadas. Neste sentido revemos as seis afirmações que sustentaram nossa
abordagem do objeto empírico:
1. a intervenção visando o desenvolvimento do semi-árido exige que a mesma seja
multifacetada;
2. devido, às adversidades impostas pelo meio ambiente e pelo sistema econômico-
social do sisal, que contempla um forte conteúdo de dominação nas relações sociais
131
e humanas, as ações que se venham a realizar carecem de lideranças institucionais
fortes e contestadoras do próprio sistema;
3. impõe-se acertadamente a tentativa de utilizar, maximizar ou inovar
permanentemente no uso dos recursos humanos, físicos, de informação e
conhecimento endógenos a região;
4. o processo de rede de organizações, com certeza, faz com que a intervenção de uma
organização do terceiro setor naquela realidade seja mais sólida e efetiva. As
relações de solidariedade, cooperação recíproca e complementaridade entre as
unidades potencializam ações de cada uma das mesmas;
5. a experiência distributiva de benefícios financeiros e materiais aos sócios da
organização e ao conjunto dos produtores de sisal integrados às ações
desenvolvimentistas têm-se mostrado adequada e correta. Esta escolha política dá
visibilidade as conquistas do movimento social dos sisaleiros e sustentação social à
intervenção da organização;
6. Na medida em que a intervenção assume o caráter de pioneirismo, em muitas
ocasiões a mesma se faz na perspectiva de ‘ensaio e erro’.
Dessas, cremos que quatro delas ainda fazem sentido. São elas as que explicitam o
caráter da intervenção multifacetada da APAEB/Valente, o uso dos recursos endógenos à
região, o sistema de dominação política e sua contestação pelas lideranças institucionais e a
perspectiva da prática de experimentação por parte da organização. Assim afirmamos porque
quando as relacionamos entre si, obtemos um conjunto sistêmico favorável ao
desenvolvimento de processos de estratégias condizentes com a prática organizacional aqui
exposta e analisada neste trabalho.
É, na verdade, o conjunto dessas quatro proposições que poderá ser complementado
com uma teoria ou teorias acerca da elaboração de estratégias organizacionais que disponham
de uma potencial capacidade para explicar o crescimento e a transformação estrutural da
APAEB/Valente.
Assim o fazendo, poderemos já em seguida desenvolver uma análise substanciosa do
objeto empírico deste estudo em consonância com nossos propósitos temáticos teóricos.
Nesta linha de raciocínio ficará de fora da análise a proposição que dava fundamento
ao processo de rede de organizações, pois a mesma não se comprovou factualmente e não há
como sustentá-la. No que tange a uma correlação positiva entre a experiência distributiva de
132
benefícios e a visibilidade das conquistas do movimento social dos sisaleiros, não a podemos
incorporá-la na nossa análise, pois não dispomos de base empírica para estabelecermos
alguma correlação comprovável. Ao contrário, a prática de campo nos mostrou que neste
momento de acentuada crise financeira por que passa a instituição, a “memória social” sobre a
relação entre benefícios auferidos e conquistas sociais do movimento dos sisaleiros da região
está bastante reduzida.
A necessidade de aferir a procedência e a aplicabilidade de uma “teoria” explicativa
inicial nos fez refletir não só sobre cada proposição de per si, mas também sobre que
resultante do conjunto poderíamos obter e para onde esta resultante apontaria. Sendo assim,
poderemos passar a discorrer sobre a construção de uma cultura organizacional própria da
APAEB/Valente que, originária da prática social, a fez definir sua missão, que elegeu os seus
valores sociais e que vem servindo de referencial para conduta social dos seus membros em
sua prática de intervenção social.
Esta nossa última afirmativa ganha mais positividade quando em se tratando da
valorização dos recursos endógenos à região e ao enfrentamento ao sistema de dominação
política e institucional praticado na sociedade da região sisaleira.
Sobre este segundo item nos falou o Diretor Executivo da organização Ismael Oliveira
a respeito dos valores cultuados pela APAEB/Valente e seu cotejo com os valores praticados
na política local:
“[...] Os valores cultuados pela APAEB são: honestidade, eficiência,
criatividade, responsabilidade, transparência, cooperação, agilidade, respeito,
persistência, compromisso... Enquanto que, a prática da política local tem
sido pautada por: falta de transparência, arrogância, corrupção, clientelismo,
favorecimento a apadrinhados, decisão exclusiva do prefeito, falta de
respeito com a população, interesses pessoais acima dos interesses da
comunidade, etc. ...” (Entrevista, Março de 2004).
A cultura organizacional da APAEB/Valente sem dúvida tem lastreado os
procedimentos externos e os seus processos internos que aqui nos interessa compreender e,
deste modo, podemos reafirmar que:
“as escolhas estratégicas, econômicas e organizativas são fundadas em
valores sociais que orientam a organização desde sua origem.”
(PLANEJAMENTO DO ESTUDO).
133
4.3. A discussão do processo de construção de estratégias a partir do caso de uma
organização de agricultores familiares
É nossa intenção neste item estabelecer uma discussão entre o conhecimento já
existente na literatura acerca do caso estudado, as nossas percepções construídas sobre o
mesmo ao longo do trabalho e as afirmações consideradas como certezas teóricas explicativas
para alguns processos vivenciados nas organizações. Afirmações às quais recorremos para dar
suporte à investigação proposta e realizada. Neste sentido, elegemos alguns tópicos para
proceder ao cotejo entre o caso da APAEB/Valente e o conhecimento sistematizado como
teoria.
4.3.1. Processos de estratégias
A idéia de entender e explicar os processos de construção de estratégias
organizacionais e sua interelação com os processos de transformação estrutural, a partir da
história de uma organização rural singular, permeou todo este trabalho.
Na verdade, a história da APAEB/Valente tem sido investigada sob diferentes aspectos
temáticos o que reflete a sua importância como organização. Entre outros trabalhos foram por
nós acessados: SILVA e al. (1993); ALMEIDA, (2000); OLIVEIRA (2002); Nascimento
(2003); ABRAMOVAY e al. (2003); SILVEIRA e al. (2005); VERDE (2007). Entretanto, o
estudo de NASCIMENTO (2003) sobre o tema da formação do capital social no município de
Valente foi o que nos forneceu mais elementos para a nossa pesquisa.
Em suas conclusões, esse autor nos remete para um elemento fundamental e também
por isto crucial da análise organizacional da APAEB/Valente: a sua permanente ‘reinvenção’
enquanto organização e instituição. NASCIMENTO afirmou:
“A APAEB-Valente, como uma experiência de invenção e reinvenção,
surgiu não só para dar uma virada no tipo de situação adversa presente no
sertão baiano, mas para permanecer como uma sólida base socioeconômica
dos pequenos agricultores. Por isso, mais que reunir aqui um ponto de vista,
buscamos neste livro tratar dos caminhos trilhados pelo movimento social,
bem como das respostas que foram dadas ao longo do processo de
organização.” (p. 109)
Embora o propósito de sua pesquisa estivesse associado a estratégias de mudança de
estruturas sociais em sentido amplo, em decorrência da inserção e compromisso social da
134
organização, sua contribuição nos levou a perceber a dinâmica e a ‘porta de entrada’ dos
processos de construção de estratégias organizacionais na APAEB/Valente. Nascimento não
limitou o processo de estratégia ao campo das mudanças de estruturas sociais exteriores à
organização, mas permitiu que este campo pudesse ser enriquecido e complementado com o
campo das mudanças de estruturas organizacionais de modo interligado, complementar e
orgânico.
Assim compreendido, reafirmamos que o processo de construção de estratégias da
APAEB/Valente, enquanto organização foi e é praticado tendo como ‘pano de fundo’ a busca
incessante pela revitalização da economia e sociedade da região sisaleira. Porém, há um nível
específico de escolhas, decisões e ações estratégicas que se limita ao âmbito da organização
que se não tivesse sido percebido e ou trabalhado coerentemente, necessariamente poderia ter
restringido o alcance maior da mudança social desejada pelo segmento social dos sisaleiros.
Independemente da questão dos formatos organizacionais terem sido deixadas para o
próximo item, não poderíamos omitir aqui que a própria escolha da APAEB/Valente pelo tipo
de organização ‘associação de pequenos produtores’ e não uma cooperativa já indica uma
decisão estratégica maior referente à natureza da mudança social desejada pelos seus
membros quando a constituíram. Confirma-se assim a teoria de que:
“as organizações têm o seu formato determinado pela estratégia”.
(CHANDLER, 1962)
Concluindo, o ambiente teria demandado um tipo de organização que se estruturaria
de modo que pudesse agir estrategicamente para mudar o próprio ambiente adverso a ela, ou
seja, contrário ao interesse da maioria dos seus integrantes. Como já nos afirmaram
MEDEIROS e BELIK (2000, p. 4) a respeito dessa interatividade ambiente - organização:
“[...] Os agentes organizados interferem no ambiente através da legislação e
das práticas empresariais e sociais e, ao mesmo tempo, recebem influência
direta do meio social e dos seus determinantes legais”.
Em sua singularidade a APAEB/Valente possui em sua estrutura organizacional uma
unidade industrial. Como toda e qualquer ‘empresa’, hoje a fábrica de tapetes e carpetes de
sisal enfrenta mercados competitivos e ambientes macroeconômicos que em muitas ocasiões
135
apresentam ameaças ao desempenho e continuidade de existência das organizações que o
integram e neles atuam.
Na história da APAEB/Valente a industrialização da fibra do sisal foi um marco para
sua dimensão econômica e consolidou um ciclo virtuoso tanto para as atividades econômicas
quanto para as atividades sociais e educativas, sustentadas em grande parte pelas sobras
financeiras geradas pela fábrica.
Foi assim, deste modo, que esta unidade de negócio se tornou a mais importante
unidade da organização e seu processo particular de construção de estratégias paulatinamente
passou a influenciar o todo da organização e, praticamente, as estratégias da fábrica foram se
tornando as próprias estratégias da organização considerada em sua totalidade.
Conseqüentemente, as outras unidades de negócio foram alinhando e articulando as suas
estratégias particulares e menores no conjunto da organização às estratégias da fábrica. Este
processo de alinhamento e vinculação também se deu no plano financeiro com as
repercussões já expostas no capítulo anterior.
Não obstante, este alinhamento estratégico foi benéfico durante o ciclo virtuoso, pois
proporcionou à organização um suporte de coesão social para o funcionamento da mesma.
Atualmente, as certezas sobre a validade das estratégias atuais da fábrica estão sendo
questionadas por integrantes da organização que possuem posição de chefia de unidades de
negócio. Portanto, uma vontade interna acerca da desvinculação, desatrelamento e
flexibilização entre as unidades e suas estratégias particulares já é percebida no clima
organizacional então presente.
A construção de estratégias de sucesso pela APAEB/Valente ao longo das décadas de
1980 e 1990 levou a organização a consolidar períodos de crescimento institucional que
exigiram algumas reformas ou mudanças organizacionais, as quais foram implementadas
naquelas mesmas décadas e na seguinte (anos 2000). No início da década atual, as estratégias
de manutenção têm sido predominantes no esforço da APAEB/Valente fazer com que suas
unidades de negócio se mantenham no mercado e ao mesmo tempo suas atividades sociais e
educativas continuem funcionando.
4.3.2. Crescimento das Organizações
A reflexão sobre a questão do crescimento das organizações enquanto uma variável
que se associa por um lado aos processos de construção de estratégias e por outro às
136
transformações ou mudanças organizacionais – em particular de estruturas – é de fundamental
importância para este trabalho.
Entendendo que os períodos de crescimento das organizações resultam da escolha e da
construção de estratégias bem sucedidas e, focando na direção de nosso caso de estudo
verificamos e comprovamos que isso realmente se sucedeu.
A literatura pré-existente sobre a APAEB/Valente já nos oferecia essa perspectiva
mesmo sem a destacá-la como seu alvo principal. NASCIMENTO (op.cit.), em uma das suas
conclusões, nos apontava:
“Portanto, entendemos que a experiência de Valente se viabilizou por causa
da interferência interna, protagonizada pelos agricultores, e externa, pelas
demais organizações com quem têm vínculos fortes e mantêm parcerias,
dentro de um processo que chamamos de empoderamento, já que, entre os
erros e acertos, a APAEB-Valente não tem inventado sozinha um modelo
sustentável para o semi-árido, pois ‘el desarrollo es uma danza que de
ningún modo se baila solo’.” (p. 112)
Este autor, ao afirmar que aquela experiência se viabilizou, na verdade está nos
falando sobre crescimento e êxito da organização em se tratando do seu impacto na região
sisaleira e também de sua afirmação como empreendimento, pois, ao abordar a interferência
interna e externa, ele nos põe a questão da interação entre organização e ambiente e nos faz
ver que o crescimento do empreendimento APAEB/Valente é uma resultante bem sucedida
dessa interação.
Portanto, compreendemos que a configuração econômica, política e institucional dos
anos 1990 (o ambiente) foi a grande estimuladora do surgimento da organização. Esta se
viabilizou por dispor de condições internas favoráveis, entre as quais de demandas
econômicas e sociais, de potencialidade de ação em rede com outras organizações e da ação
de stakeholders internacionais e nacionais. Para completar, existiam lideranças institucionais
que souberam interpretar a oportunidade e construir estratégias socialmente aceitas,
adequadas politicamente e estimuladoras da grande fase de crescimento da organização
ocorrida naquele período.
A compreensão generalizada entre os estudiosos da questão do crescimento das
organizações é a de que o crescimento individual de uma unidade poderá repercutir no
crescimento do setor ou segmento.
137
Na perspectiva teórica de Nascimento, esta assertiva é entendida como parte integrante
da teoria da formação de capital social em um território. Ele a aplica ao seu universo de
estudo, localizando a APAEB/Valente e outras organizações:
“No semi-árido baiano do Nordeste brasileiro, onde uma antiga região do
sisal sofreu transformações importantes ao longo dos últimos dez anos,
houve uma protagonização bem-sucedida que permitiu a constituição
progressiva de formas organizacionais próprias, autônomas e inseridas,
caracterizando a formação e manifestação ativa do capital social.” (Ibid., p.
117).
E complementa com uma afirmação sobre o processo de revitalização regional que
estaria vinculado àquele processo social e organizativo:
“Os pequenos agricultores sertanejos tornaram-se sujeitos de um processo no
qual sentiam-se como vítimas permanentemente, em especial no que tange à
produção e comercialização do sisal em Valente. Mas não esmoreceram,
procuraram na recuperação da lavoura sisaleira o início de outro projeto,
mais amplo, de revitalização do território com a convivência com o sertão; e,
por fim, acreditaram que tal iniciativa podia tornar diversas atividades
rurais viáveis e servir de núcleo irradiador de iniciativas locais de
desenvolvimento rural.” (Ibid.)
Na verdade houve, além da constituição da APAEB/Valente, uma conjugação de
esforços e o surgimento de outras iniciativas dos pequenos produtores rurais no macro
ambiente, em decorrência do crescimento daquela organização. Portanto, o crescimento
individual da APAEB/Valente repercutiu no crescimento do próprio setor ou segmento das
organizações da sociedade civil e dos movimentos sociais. Além do surgimento de outras
associações de atuação restrita ao nível municipal, o exemplo mais significativo foi a criação
da COOPERE. Esta, por sua vez, vem servindo de referência para a constituição de várias
cooperativas de crédito em outros municípios da área de intervenção da APAEB/Valente.
Visto por este ângulo, o crescimento individual da organização APAEB/Valente, em
razão da construção de suas estratégias organizacionais, por duas décadas aproximadamente
esteve associado ao crescimento do setor ou do segmento de organizações civis de caráter
econômico e não econômico e também ao crescimento dos setores comercial (alimentos,
vestuário, eletrodomésticos, veículos, construção civil, entre os principais) e de serviços dos
municípios da região sisaleira.
138
Em particular, parte desta afirmação pode também ser comprovada de modo inverso
ao verificar-se que nos últimos cinco anos os setores econômicos antes referidos sofreram
sensivelmente o impacto da crise financeira mais recente da organização, via queda nas suas
vendas. Outro setor fortemente atingido tem sido o de arrecadação de impostos municipais,
notadamente o do município de Valente.
Um terceiro aspecto nesta análise a merecer nossa atenção é o que compreende o
processo de evolução das organizações e a modificação do ambiente em que atuam.
Diferentemente do processo de crescimento que se reflete no tamanho ou volume da
organização, a evolução das firmas e das organizações em geral se refere às transformações
ocorridas na natureza da própria organização. OLIVEIRA (2004, p. 39) analisa a trajetória da
firma correlacionando-a com o caráter de inovação organizacional.
Neste sentido, acredita-se que inovações organizacionais são responsáveis pelas
mudanças que possam vir a ocorrer no design interno e no funcionamento das organizações
com repercussões sobre o clima e a cultura organizacional das mesmas. Nesta linha de
raciocínio, pode-se afirmar que há um processo evolutivo que se traduz por distintos
patamares de ‘organização’ que vão posicionar firmas e não-firmas de um modo distinto no
ambiente, adaptando-se ao mesmo ou modificando-o a seu favor.
Para discorrer sobre a segunda alternativa ainda recorremos a Nascimento e dele temos
a seguinte afirmação a respeito da atuação da APAEB/Valente e de seus parceiros:
“Não há dúvida de que esses novos atores políticos podem conduzir
efetivamente uma mudança institucional e enraizar suas ações coletivas
ainda mais. (Idem).
A nosso ver a APAEB/Valente atingiu um grau de complexidade organizacional
devido ao seu crescimento e evolução que a torna mais do que uma organização social que
contempla uma dimensão econômica. Ela exerce até hoje funções no ambiente que tem
transformado e que agem no sentido da sua reconstrução em favor do segmento social dos
sisaleiros.
A presença e atuação da Batedeira Comunitária de sisal como reguladora de preços da
fibra do sisal nos anos 1980 e o posicionamento da organização – ao longo de sua existência –
encetando ações direcionadas a organização e regulação dos mercados de fibras regionais,
nacional e até mesmo internacional e o apoio à inovação tecnológica no setor comprovam a
afirmação anterior.
139
A essas ações somam-se as que a organização desenvolve e também estimula ações no
âmbito do legislativo e do espaço político.
Todo este conjunto comprova o entendimento que a possibilidade de sucesso
econômico e a melhoria das condições de trabalho e de vida dos sisaleiros estão a depender de
mudanças não só econômicas, mas e principalmente institucionais. Estas mudanças,
conseqüentemente, necessitam estar direcionadas para a configuração de um ambiente
favorável à organização.
Trabalhar para modificar o ambiente a seu favor é papel da APAEB/Valente e o
desempenho desta atribuição se faz através de permanente processo de construção de
estratégias organizacionais.
A afirmação de Nascimento sobre essa organização ilustra bem a nossa visão sobre a
relação organização – ambiente – estratégia:
“Portanto, trata-se de uma organização social que nasceu da protagonização
local e inter-regional bem-sucedida entre pequenos agricultores e
sociedade civil, tornando-se uma obra de astuciadores...”. (Idem).
Concluindo, o crescimento individual da organização conduz a evolução da mesma,
que se vê diante das alternativas: ou adaptar-se permanentemente às atuais e velozes
alterações que ocorrem no ambiente ou enfrentá-las estrategicamente para que este mesmo
ambiente lhes seja favorável. No caso da APAEB/Valente, cremos que a segunda alternativa
tem sido a privilegiada.
Daí nos perguntarmos o que é verdadeiramente o enfrentamento estratégico de uma
organização com seu ambiente? O que é posicionar-se estrategicamente para uma
organização? Na visão de MINTZBERG a resposta é construir estratégias e ele as entende
deste modo:
“Eu proponho cinco definições para estratégia. Muita gente diz que ela é um
‘plano’, um guia de ação para o futuro. Outra definição é que estratégia é um
‘padrão’, ou seja, consistência de comportamento ao longo do tempo. Para
alguns, estratégia é uma ‘posição’, a localização de determinados produtos
em alguns mercados. Outros defendem que ela é uma ‘perspectiva’, a
maneira de a empresa fazer as coisas. Finalmente, estratégia pode ser um
‘truque’, uma manobra para iludir a concorrência. A definição mais popular
é de um plano deliberado, trabalhado, calculado. Isso ignora outro lado da
estratégia, que é o de um processo de aprendizado, de padrões que se
desenvolvem a partir do comportamento das pessoas, em que elas mais ou
menos aprendem o caminho. O processo estratégico tem os dois lados, mas a
140
parte emergente tem sido ignorada.” (Entrevista de Henry MINTZBERG
para a Revista Exame, Jan. 2004, p. 51).
A questão do processo de aprendizado que envolve a construção de estratégias –
enfatizado pelo autor – no caso examinado é de fundamental importância, pois se encaixa na
visão maior de construção, funcionamento e desenvolvimento da organização defendida por
seus dirigentes. Por conseguinte, tornam o processo de construção de estratégias algo com
caráter social que se inscreve na acumulação de conhecimento dos diretores, funcionários e
outros membros da APAEB/Valente e também na ampliação do capital social do segmento
dos sisaleiros.
Ainda segundo o mesmo MINTZBERG, isto é fato porque:
“[...] os estrategistas realmente criativos podem ser pessoas inteiramente
diferentes, que não parecem tão sofisticadas nem mesmo tão analíticas.”
(Entrevista de H. MINTZBERG para Revista Exame, Jan. 2004, p. 51).
Por seu turno, uma segunda questão se põe: a aprendizagem social do processo de
construção de estratégias não garante inevitavelmente a “boa” ou acertada qualidade das
estratégias construídas. Se até este momento podemos afirmar que as três grandes estratégias
construídas e implementadas pela APAEB antes da crise dos anos 2000 foram acertadas e
válidas, o mesmo não podemos fazer em relação à quarta – e referente à profunda crise
financeira – em toda sua extensão e magnitude, pois o novo e atual processo dela decorrente
ainda não se configurou totalmente.
Deste modo, ainda não sabemos se um novo processo de crescimento ou de evolução
institucional se verificará em decorrência da constituição da FUNDAÇÃO APAEB e da
conseqüente separação das atividades econômicas das outras sociais e educativas.
Retornando à relação organização – ambiente, mediada pelas estratégias da
organização, tomamos como acertada a conclusão teórica:
“O único teste verdadeiro para sua estratégia é não só se ela pode ser
implementada, mas se vai levar a organização a um ponto melhor. Isso
não se revela numa análise. É o mercado que diz.” (Entrevista de Henry
MINTZBERG - Revista Exame, Jan. 2004, p. 52).
141
4.3.3. Crise e Organizações
No capítulo anterior, destacamos a ocorrência de crises na vida da APAEB/Valente.
De modo especial até mesmo organizamos a sua história, utilizando como critério estruturador
a cronologia das mesmas associada à elaboração de estratégias de superação. Estas, por si,
provavelmente tiveram o propósito de estabelecer secundariamente um novo período de
afirmação, crescimento e evolução institucional.
Este ‘jogo da interação’, na linguagem de FAYARD (2000), se tornou muito mais
crítico em se tratando da APAEB/Valente do que noutra qualquer organização, devido ao
papel e à função a este associada que a organização joga no ambiente.
A APAEB/Valente tem se portado como uma organização da qual se tem a expectativa
que obtenha sucesso em seus propósitos programáticos, mas também em sua missão
institucional de modificar a região sisaleira onde está inserida. Ela é também visualizada pelos
seus stakeholders como um modelo de intervenção social e uma peça-chave do movimento
por um novo desenvolvimento regional.
Anteriormente, NASCIMENTO já afirmara:
“Ante a tudo isso, o que podemos chamar de Modelo-APAEB de
convivência com o semi-árido é, fundamentalmente, a importância que se
tem dado ao aproveitamento de uma potencialidade econômica regional, o
plantio comercial do sisal, associado ao caráter familiar da agricultura
sertaneja. Esse modelo fundou-se numa organização de pequenos
agricultores sertanejos, a qual vem procurando, com êxito, aprender a
aprendê-lo, a viabilizá-lo e a dotá-lo de uma perspectiva mais integral da
vida no semi-árido, onde a convivência com as adversidades, ao contrário
do que se pensa, pode gerar soluções alternativas e conseqüentes.”
(Idem, p. 112).
No sentido posto, na segunda parte da citação, podemos inferir que, em que pese as
crises terem seus desdobramentos muitas vezes maléficos ou prejudiciais à organização, do
ponto de vista financeiro, social, político e humano a reação interna dos membros da
APAEB/Valente tem sido na direção contrária.
Eles, ao invés de se desestimularem, têm descoberto nas ocorrências de momentos de
instabilidade o espaço para refletir sobre a positividade do desafio das novas oportunidades
que o ambiente suscita e da crucial necessidade de reformular e descobrir novos caminhos. E,
esses novos caminhos foram transformados historicamente em novas estratégias planejadas ou
emergentes.
142
Neste quadro, percebeu-se que a aprendizagem oriunda da vivência dos processos
organizativos tem sido de muita valia e que as estratégias emergentes, como respostas ao
imediato, denotam a riqueza e profundidade da aprendizagem ocorrida. Completando, ao
nível de cada unidade de negócio esta última afirmação é muito mais perceptível.
4.4. A discussão das conexões reais entre processo de estratégia, transformação
organizacional e gestão
Neste item, conduziremos nossa análise no sentido de demonstrar que o conjunto do
processo total – que compreende: a) a configuração do ambiente externo agindo sobre a
organização; b) a construção de estratégias de crescimento, de crise e manutenção associadas
à adaptação ou enfrentamento do ambiente; c) a escolha, redefinição e transformação de
estruturas organizacionais condizentes com as estratégias propostas e d) a implantação de
modelos de gestão com o propósito de implementar as estratégias - no caso estudado revela
algumas dissonâncias entre prática organizacional e a teoria.
Deste modo, vamos explorar inicialmente algumas conclusões de um estudo avaliativo
anterior executado no ano 2000 sobre a APAEB/Valente e cotejá-lo com a teoria e, em
seguida, aplicar o mesmo procedimento entre as nossas conclusões obtidas ao longo deste
nosso estudo e a teoria pertinente às mudanças organizacionais.
Para efeito do proposto selecionamos dois tópicos:
4.4.1. Estratégia e Transformação das Estruturas Organizacionais
Nos finais dos anos 1990, a APAEB/Valente decidiu realizar um estudo avaliativo de
caráter institucional. O seu processo de crescimento tinha sido descomunal, o seu impacto
regional incontestável, porém uma nova crise já apresentara seus prenúncios. A crise era
percebida como de esgotamento do seu modelo de crescimento. Especificamente, naquele
momento seus dirigentes percebiam essa crise como derivada da dificuldade de obtenção de
capital de giro para as operações da fábrica de tapetes e carpetes. A organização em sua
totalidade e particularmente a sua estrutura organizacional e seu modelo de gestão não mais
respondiam a contento e já havia uma consciência social sobre isto.
143
Conforme o relatório do estudo publicado no ano 2000,
“Apesar das grandes transformações ocorridas na APAEB nos últimos cinco
anos, a sua estrutura organizacional não sofreu praticamente nenhuma
alteração. Esse fato, certamente, é responsável por dificuldades funcionais,
gerenciais e comportamentais verificadas na entidade”. (RELATÓRIO DE
AVALIAÇÃO INSTITUCIONAL, p. 57).
O estudo aprofundou-se tanto na especificidade da organização que chegou até níveis
de abordagens mais baixos, porém, significativos do tipo:
“Outro fator a ser considerado é que a APAEB, contando com um quadro de
pessoal que já se aproxima dos 800 empregados, não conta com um setor
para tratar exclusivamente de recursos humanos. Esse fato tem levado a
improvisações no processo de contratação de pessoal, que tem se refletido
num alto nível de rotatividade, principalmente na fábrica. Além disso, não há
nenhum setor - ou mesmo funcionário - responsável pelo trabalho interno
junto aos demais servidores, o que contribui para a não formação de uma
visão correta sobre o "Projeto APAEB": a grande maioria vê a fábrica, por
exemplo, como um empreendimento qualquer, onde o patrão explora o
trabalhador com fins pessoais; não a concebe como um instrumento a serviço
da coletividade”. (Idem, p. 57 e 58).
Conduzido por avaliadores externos, o relatório do estudo denotava que ao mesmo
tempo em que esses avaliadores reconheciam a contribuição da organização para o
desenvolvimento regional, já se mostravam deveras preocupados com o verificado processo
de crescimento institucional e seus desdobramentos futuros sobre a estrutura e funcionamento
da APAEB/Valente:
Outro elemento que deve ser estudado com cautela são os pequenos
projetos que estão sendo implementados: curtume de peles, usina de
processamento de leite e outros que poderão vir. Eles são incorporados à
estrutura administrativa e gerencial da APAEB e trazem um conjunto de
novos problemas relacionados à administração, acompanhamento e
controles, sobrecarregando ainda mais a gerência geral. Por esse caminho,
poder-se-á chegar a situações incontroláveis, com a incorporação de novos
projetos que, certamente virão”. (Idem, p. 58)
No fundo, aquela avaliação institucional assumiu o propósito maior de alertar para a
organização sobre a grande questão da necessidade imperiosa da mudança nas organizações.
Questão esta que a APAEB/Valente, enquanto tal, não havia percebido como elemento
144
constitutivo do próprio processo de crescimento e desenvolvimento institucional acontecido
com ela na segunda metade dos anos 1990 e não menos própria e verificável também em
outra qualquer organização.
Chegara a hora da organização assumir o seu processo interno particular de mudança
planejada, processo este com características distintas de outras mudanças ocorridas
anteriormente em sua história de modo eventual e sem dúvida resultante de escolhas pontuais.
Conforme DIAS (2008) compreende a mudança:
“Mudança significa passar de uma situação a outra, quer seja em termos
pessoais ou de grupo (incluindo as organizações). Em outros termos,
podemos afirmar que “a mudança é simplesmente a alteração do status quo”.
Em termos organizacionais, isto implica numa modificação do espaço
físico, tecnologias, equipamentos, estrutura, procedimentos
administrativos, e principalmente conceitos atitudes e valores.” (Idem, p.
219).
O mesmo autor recorrendo ainda a outros autores reafirma o caráter da mudança
organizacional enfatizando seu aspecto cultural:
“A mudança numa organização é alterar como está organizado o trabalho,
como está dirigido e quem o está assumindo. A mudança organizacional
pode ser definida como sendo a introdução deliberada de novas formas de
pensar, atuar e operar em uma organização.” (Idem, p. 220).
Deste modo, as inovações na cultura organizacional deverão balizar e fundamentar as
mudanças administrativas:
“A inovação administrativa se refere à implantação de mudanças na
estrutura organizacional ou em processos administrativos. Podem ser
modificados o processo de tomada de decisões, os modelos de comunicação,
os programas de produção ou controle de qualidade, o sistema de incentivos
e recompensas, feitas alterações na cadeia de comando, no grau de
formalização, modificação dos departamentos ou supressão de níveis.”
(Idem, p. 221).
No processo de mudança planejada desenvolvido na APAEB/Valente a partir do ano
2001, podemos constatar que grande parte desses elementos estiveram presentes, porém a
extrema importância dedicada à criação do cargo de diretor executivo, entendida como o pivô
da grande mudança estrutural, fez com que os outros elementos de modelo, de processos e de
145
formato perdessem o impacto desejado e necessário. O produto principal resultante da
mudança idealizada foi então o desenvolvimento de uma extremada concentração de
iniciativas, decisões e controles naquela figura executiva de um modo ainda não conhecido na
vida da organização.
De certa maneira podemos afirmar que mesmo sendo planejada, a mudança ocorrida
manteve o caráter de evolutiva, pois a mesma efetivamente no real se reduziu a uma parte
significativa da estrutura organizacional e não à totalidade da organização. A mudança
evolutiva é entendida como:
“A mudança evolutiva ocorre quando mudam somente alguns aspectos não
essenciais da organização, aumentando sua eficácia, melhorando a situação
atual, mas mantendo as linhas gerais de funcionamento. É uma mudança
associada ao desenvolvimento e ao crescimento da organização, e, embora
possa ser significativa, busca-se modificar somente alguns subsistemas com
o objetivo de obter melhorias bastante pontuais. [...], pois foram alterados
somente alguns aspectos internos com o objetivo de adaptação ao
crescimento [...].” (Idem, p. 223),
mesmo que no processo de mudança ocorrida se destaque uma alteração substantiva nas
relações de poder dentro da estrutura organizacional, item característico das mudanças de
caráter estratégico. Esta é compreendida como:
“Mudança estratégica (ou revolucionária) que modifica a essência da
organização. Esta constitui uma mudança revolucionária que implica na
transformação de um estado a outro completamente diferente. As formas
anteriores de organização se modificam com a geração de novas práticas de
gestão que permanecerão. Constituem mudanças na totalidade da
organização, inclusive na estratégia, e que modificam profundamente os
marcos de referência anteriores. Redefinem-se os objetivos da organização
(numa empresa se redefinem os negócios), a estrutura de poder, a cultura
organizacional, os processos e a escala de valores.” (Idem, p. 223)
Outro paradoxo que registramos é o que concerne à velocidade da mudança realizada.
A criação do cargo de Diretor Executivo com voz e voto na Diretoria e no Conselho de
Administração se fez de modo imediato e coerente com a recomendação contida no relatório
da avaliação institucional. É considerada no âmbito da mudança rápida. Enquanto que a quase
totalidade das recomendações e propostas acerca de problemas de várias ordens – estratégica,
relativos ao exercício do poder, mercadológicos, gerenciais (maior parte), organizacionais, de
146
recursos humanos, de comunicação, de informatização, funcionais e comportamentais –
estava prevista para ser implantada de modo lento e gradativo.
Entende-se por mudança rápida a seguinte situação organizacional:
“Mudanças rápidas são aquelas que ocorrem num prazo curto de tempo,
constituindo um movimento rápido de um estado ou condição a outro. De
um modo geral, as mudanças rápidas são produto do ambiente externo, que
também se modifica rapidamente, tornando-se mais difícil e arriscada a
decisão do grupo dirigente em relação ao curso da ação que deve ser
seguida. As mudanças rápidas dificultam o debate sobre o destino a ser
seguido, pois este muitas vezes também não está claro; em geral, há posições
diferentes sobre o caminho a ser seguido e quando; e corre-se o risco de
menor comprometimento do conjunto da organização em relação às
mudanças.” (Idem, p. 226)
E por mudança gradativa uma outra situação organizacional:
“Mudanças gradativas são aquelas que se desenvolvem lentamente, sem
pressa, cuidadosamente planejadas buscando melhorias de desempenho
organizacional. [...] As mudanças gradativas têm como vantagem a
possibilidade de debates internos sobre os caminhos percorridos e as
possíveis alternativas, de tal modo que a discussão ocorra em todos os
níveis, obtendo-se desse modo um compromisso maior das pessoas em
relação à direção a ser seguida.” (Idem, p. 226)
Não obstante, na prática da vida organizacional da APAEB/Valente foram mesclados
procedimentos distintos do que a teoria preconiza, pois se fez simultaneamente mudanças
rápidas no bojo de um processo de implementação de mudanças gradativas.
A questão que nos chamou a atenção é que as rápidas foram mais efetivas que as
gradativas e reconfiguraram de antemão o perfil da organização. Por outro lado, várias
propostas de introdução lenta não tiveram capacidade para serem implementadas ao longo do
processo, devido a razões de ordem financeira.
A aprendizagem contida na situação híbrida de fato vivenciada na organização nos
indicou os desafios postos pelo ritmo das mudanças. Um deles nos parece fundamental para
esse tipo de organização: a manutenção da participação social e o comprometimento dos
membros da organização com a mudança organizacional.
Na APAEB/Valente podemos conjecturar que as pressões do ambiente em parte
condicionaram a construção de estratégias emergentes e as modificações no arcabouço
organizacional para torná-lo condizente com aquele momento da realidade social e
147
organizacional. Mas, isto veio a repercutir no grau de participação e comprometimento dos
responsáveis pelas unidades de negócio e funcionários, já que não havia tempo de envolvê-los
plenamente nas grandes decisões com respeito à vida administrativa e financeira da
organização.
No ano de 2007 – em meio ao aguçamento da crise financeira – quando da segunda
etapa de nossa pesquisa, a insatisfação em parte daqueles segmentos era evidente e a
explicação para tal residia no grau de concentração de poder de decisão que o cargo de
Diretor Executivo possui. O clima organizacional não se apresentava como estimulante, mas
havia a crença de que algo poderia ser feito para mudar.
Talvez uma parte dos membros da APAEB/Valente já inconscientemente, ou mesmo
conscientemente acreditem no suposto teórico de que:
“Hoje, a mudança faz parte da vida de qualquer organização e integra
seu funcionamento normal. A busca da estabilidade foi substituída pelo
movimento contínuo. Nenhuma organização escapa da necessidade de
mudar, mas os dirigentes da organização podem se vir obrigados a
compreender isso ou, pelo contrário, ser obrigados a fazê-lo.” (Idem, p. 218)
4.4.2 Transformação Organizacional e Processo de Gestão
No ano de 2000, a finalização do processo de avaliação institucional deixara evidente
que a APAEB/Valente tinha vencido um ciclo de sua história de crescimento institucional e
que por isto tornara-se urgente uma reformulação interna com substância, planejamento e
programação.
Foram diversas as críticas contundentes relativas a todas as dimensões organizacionais
investigadas e aqui – devido aos nossos propósitos de análise – realçamos aquela de caráter
mais geral direcionada à gestão da organização. O relatório do estudo afirmou
categoricamente:
“As questões agrupadas nesse bloco refletem os problemas gerenciais
vividos por uma organização que passa por um ritmo acelerado de mudança
e de crescimento, sem que isso tenha sido acompanhado por um necessário
processo de reflexão que permitisse a implementação de mudanças e
ajustes na dinâmica gerencial. Os seminários e entrevistas realizados
identificam uma série de problemas, nos diversos setores, que podem ser
generalizados para o conjunto da organização: centralização, indefinição de
papéis, coordenação precária, comunicação deficiente, dificuldades de
148
integração, ausência de mecanismos de distribuição de tarefas e de
avaliação”. (RELATÓRIO DE AVALIAÇÃO INSTITUCIONAL, p. 58)
Deteve-se também em examinar pontos específicos tais como o tratamento gerencial
dos recursos humanos da organização:
“Ou seja, tanto a enquete como os seminários e entrevistas indicam que a
APAEB carece de uma política de recursos humanos mais consistente e
ajustada ao novo ciclo de desenvolvimento da entidade”. (Idem, p. 60)
E, por último, explicou que os problemas comportamentais dos membros da
organização estavam intimamente associados aos procedimentos de gestão então praticados:
“A maioria dos problemas deste bloco (comportamento – alteração feita por
mim) foram identificados no seminário realizado com a administração.
Alguns desses problemas refletem as tensões decorrentes das deficiências
gerenciais e das tensões existentes dentro da própria instituição, que são, em
última análise, causadas pela rápida expansão das atividades, da falta de
coordenação intra e inter-setores, da inadequação na ocupação de cargos, da
não identificação clara de papéis, inclusive da incapacidade de separação de
papéis gerenciais dos de executor”. (Idem, p. 65)
Claramente, ficou evidenciado que as relações entre os procedimentos de gestão não
acompanharam o crescimento da organização ao longo da década de 1990 e que na
APAEB/Valente não havia uma percepção de que o próprio processo de gestão necessita e
demanda estar perfeitamente correlacionado com as estratégias de crescimento
organizacional.
A noção de que a gestão de uma organização se faz por e através de um ‘modelo de
gestão’ que integra num todo sistêmico um conjunto de premissas e orientações; estruturas de
administração; gerência de recursos humanos e orientações para o comportamento gerencial e
geral dos membros, através da eleição e prática de valores sociais e institucionais, ainda não
estava presente no interior da APAEB/Valente. Neste sentido, podemos cogitar em afirmar
que a gestão da instituição até aquele momento não havia sido pensada para e principalmente
responder e implementar as estratégias organizacionais, que por sua parte, foram responsáveis
pelo crescimento da organização.
No conjunto dos procedimentos administrativos a ausência de uma atitude técnica de
caráter orgânico e sistêmico fez com que os problemas decorrentes de uma gestão artesanal se
149
enraizassem ao longo do tempo. Esses problemas também são parte da problemática da crise
financeira instalada naquele ano de 2000. Eles foram percebidos com clareza na fábrica de
tapetes e carpetes – a principal unidade de negócio - pela equipe de avaliadores institucionais:
“Os problemas deste bloco foram identificados no seminário realizado com
a administração e nas entrevistas com pessoas do setor; referem-se a
problemas de setores específicos, sendo que três deles dizem respeito à
área financeiro-contábil, ficando evidenciada a necessidade de
reformulação e ajuste de todo o sistema, inclusive com implantação de
sistema de apropriação de custos que permita um melhor gerenciamento,
principalmente da fábrica de tapetes, onde não há controle de custos por
produto, apenas a apropriação de despesas por setor”. (Idem, p. 61)
No ano de 2004, quando da nossa visita à organização e em pleno processo de
implantação do conjunto de propostas integrantes da mudança planejada, constatamos que a
correção da situação diagnosticada em 2001 não havia evoluído substancialmente. Do todo da
situação gerencial destacamos três tópicos produto da nossa observação e confirmados através
de entrevista com o Diretor Executivo da APAEB/Valente:
a. As decisões estratégicas ou operacionais nem sempre são transformadas
rapidamente em ações:
“Temos algumas situações, quando trata-se de uma decisão que a implementação
requer urgência, se procura implementar de imediato, quando se trata de alguma
decisão que se for colocada em prática algumas semanas depois não trará prejuízos,
prefere-se esperar, trabalhar e sensibilizar as pessoas, ter um período de adaptação
para depois colocar em prática.” (ENTREVISTA DE ISMAEL OLIVEIRA, 2004).
b. Há uma certa confusão e conflito de papéis entre a Diretoria Executiva e os
gerentes de unidades de negócio:
“Na verdade existe certa confusão por parte da Diretoria, muitas vezes entram em
assuntos que deveria ser dos gerentes e deixa algumas ações mais específicas da
diretoria. Deveríamos exigir, cobrar resultados, dando em claros apoios e suportes
quando necessário, mas cobrando resultados.” (Idem).
150
c. Há um processo de centralização de decisões operacionais na Diretoria
Executiva:
“Existe ainda muita confusão nesta parte, mesmo tendo muitas decisões, regimentos
internos, muitas vezes o gerente ou coordenador não quer correr riscos, não assume
e acaba chegando à Diretoria. Existem decisões muito claras na maioria dos setores
e os gerentes devem dar encaminhamentos, na prática não acontece assim em
muitas unidades. As pessoas que gerenciam não querem criar atritos com um
funcionário e passa o problema para o gerente de projetos, que muitas vezes leva
para a Diretoria. Existe a definição do que produzir, então para chegar ao produto o
gerente precisa providenciar a matéria prima, comprar materiais complementares,
garantir a qualidade, exigir que as pessoas cumpram rigorosamente as instruções
sobre a produção, produtividade, higiene, indicação de pessoas para serem
demitidas, etc. Em muitas situações não assumem isso e levam a Diretoria.
Qualquer investimento, contratação, decisão, novo produto, passa pela Diretora, já
o processo normal deve ser administrado pelo gerente ou coordenador.” (Idem).
No ano de 2007 em nosso retorno ao campo, percebemos que a problemática da gestão
centralizada pela Diretoria Executiva se avantajara e, no limite, também devido à
centralização financeira, pouco restara aos responsáveis e coordenadores de negócio fazer em
termos de iniciativas de procedimentos gerenciais.
Conseqüências nefastas e restrições no campo da participação social e do
comprometimento e responsabilidade com a organização eram de nítida percepção.
Quiçá tal processo interno não venha afetar ou fragilizar a manutenção do capital
social construído através de longa história de luta política na região sisaleira e fora dela pela
APAEB/Valente, assim como também o simbolismo das suas conquistas na sociedade.
Independentemente da concretude do caso aqui estudado e relatado, é válido ampliar
nossas percepções, compreender o que há de geral no particular do caso e buscar refúgio
explicativo na teoria. Isto posto, o processo social e organizacional vivenciado pela
APAEB/Valente poderá ser compreendido como uma reprodução de um fenômeno já
apontado pela conhecimento pré-existente:
“As organizações vivem a todo o momento um dilema a respeito da
mudança planejada. Por um lado, desejam mudar para manter a
competitividade para adotar mais eficácia e eficiência, e continuar em
151
harmonia com seu ambiente externo. Por outro, com freqüência, resistem à
mudança devido ao seu desejo por uma relativa estabilidade e
previsibilidade.” (DIAS, 2008, p. 217).
Esta compreensão do geral, pois, não nos deve fazer esquecer a particularidade do caso
APAEB/Valente e nem justificá-lo pelo conhecimento prévio explicativo das situações ali
ocorridas. Faz-se necessário explicitar a especificidade da organização e a trama própria de
variáveis econômicas, sociais, políticas, institucionais, culturais e ambientais do ambiente
onde ela se insere e atua.
Daí a compreensão sobre os processos particulares de mudança planejada poder
assumir um caráter de relativismo:
“A mudança está protagonizada por sujeitos (indivíduos, grupos,
organizações e demais atores sociais) em um tempo e em um espaço
determinado. Portanto, se encontra contextualizada.” (Idem, p. 220).
Não menos importante, é levar em conta nos estudos sobre organizações a reflexão
abaixo:
“Um aspecto que deve ser destacado ao se estudar a mudança organizacional
é que de modo geral, ao se estudá-la, não se leva em consideração o tipo e o
tamanho das organizações, nem a região geográfica em que se encontram;
e muitas vezes não se incorporam outras particularidades (âmbito de atuação,
por exemplo) e seus respectivos ambientes externos, e que poderiam
contribuir para um melhor entendimento desse importante processo social e
organizacional.” (Idem, p. 221).
A existência de dissonâncias entre a prática organizacional e a teoria que fizemos
menção no inicio deste item, reveladas no todo do processo vão se apresentar nitidamente nos
momentos em que foi possível constatar que diante de crises significativas que demandaram a
construção de novas estratégias foram promovidas mudanças estruturais marcantes, contudo,
não foram estas acompanhadas da introdução de modelos de gestão coerentes com a
magnitude e com o sentido que estavam presentes às mesmas.
152
CONCLUSÃO
Este estudo se consagrou ao tema do papel que as estratégias desempenham na
moldagem e transformação das estruturas organizacionais. Em particular, enfocou o processo
de crescimento e sua relação com a formulação e implementação de estratégias e em que e
como estas conseguem modificar as estruturas organizacionais, no sentido de atualizá-las ou
adequá-las a um novo período de crescimento.
Sendo um estudo para conhecer e desvendar processos organizacionais, pensou-se em
desenvolvê-lo utilizando a longa experiência da APAEB/Valente. Porém, devido à magnitude
e ao caráter multifuncional dessa organização, o propósito restringiu-se ao entendimento do
crescimento da sua função econômica.
Não desconhecendo que a organização é uma totalidade só plenamente compreensível
pelo entendimento da interação que se realiza entre o econômico, o social, o político e o
institucional, optou-se por eleger a sua economia, acreditando que ela não é apenas básica,
mas decisiva para explicar os processos organizacionais que ali ocorreram e seguem sendo
vivenciados.
Deste modo, o estudo foi delimitado empiricamente tendo em conta a função
econômica da APAEB/Valente, particularizando-se o impacto que as estratégias da fábrica de
tapetes e carpetes e outras unidades de negócios correlacionados poderiam ter provocado na
organização interna. Supôs-se que havia por trás desse impacto um grande esforço da
organização para ampliar o emprego e gerar renda para o universo de agricultores familiares
envolvidos com a produção do sisal em parte da porção semi-árida do Estado da Bahia.
Inicialmente, nos colocamos a questão: porque as organizações crescem ou se
transformam? E seguimos a nos perguntar: estes dois processos podem ter uma relação direta
com o processo de estratégia de uma organização? Aplicando ao empírico: porque a
APAEB/Valente cresce e se transforma continuadamente? Quais os fatores responsáveis pelo
surgimento, modificação ou extinção de unidades na estrutura daquela organização? E que
critérios guiaram a ação dos seus membros no bojo desses processos organizacionais?
153
No afã de refinar nossa problematização, visualizou-se a existência de dois eixos: o da
ação estratégica no crescimento, que nos indicaria a existência de uma coerência e o das
motivações, significados e valores sociais e culturais presentes no curso da ação.
A ação foi entendida como reativa e de adaptação e ajuste da organização ao ambiente
externo. Neste sentido, cogitamos sobre algumas influências decorrentes de aspectos e
variáveis como os stakeholders, a população local, os movimentos sociais e redes de
organizações com as quais a APAEB/Valente se conecta, entre outros. E também a ação foi
entendida como proativa, na medida em que a organização formulou, ao longo de sua história,
estratégias – strictu sensu – que focaram o seu futuro. A ação também foi correlacionada com
a visão empreendedora de alguns de seus líderes.
Por conseguinte, os nossos objetivos para a realização deste estudo foram definidos no
campo dos processos de formulação das estratégias organizacionais que estariam associadas a
etapas ou fases do processo de crescimento e por mudanças organizacionais, ou seja, na
relação das estratégias com a estrutura.
Logo no início da pesquisa, percebemos que as nossas indagações relacionadas à
teoria, ao ambiente externo e à ação estratégica propriamente dita careciam de um
ordenamento e, decorrente deste, elegemos o processo de estratégia como catalisador dos
demais, tanto na problematização quanto para a condução da pesquisa.
Isto nos pareceu mais apropriado durante a pesquisa, quando começamos a conhecer e
a compreender mais precisa e profundamente o processo de crescimento e de crises e o seu
contraponto: a respostas estratégicas para adaptação e ajustes às situações e a necessária,
porém nem sempre ocorrida, transformação organizacional.
Ao longo do processo de pesquisa viemos a perceber e agora ao final estamos
convictos, que nossa hipótese geral básica ou nossas suposições iniciais sobre o assunto eram
procedentes e que aquelas suposições nos facultaram um conjunto de conclusões que aqui
passamos a expor.
Sobre a influência dos fatores sociais, econômicos, institucionais e políticos:
O que queremos afirmar é que as respostas da organização às influências do ambiente
foram produzidas e projetadas à luz do conhecimento e têm sido trabalhadas sempre na
perspectiva de uma aprendizagem profícua para o posicionamento da APAEB/Valente no
próprio ambiente, na sua organização e coesão internas. A isto se junta a vontade de se
154
antecipar aos problemas e de se sobrepor às situações de dificuldade com um novo
posicionamento.
Sobre o processo de construção de estratégias a partir de um caso de uma organização
de agricultores familiares:
A fábrica de tapetes e carpetes como unidade de negócio se tornou a mais importante
unidade da organização e seu processo particular de construção de estratégias paulatinamente
passou a influenciar toda a organização: praticamente, as estratégias da fábrica foram se
tornando as próprias estratégias da organização considerada em sua totalidade.
Conseqüentemente, as outras unidades de negócio foram alinhando e articulando as suas
estratégias particulares e menores no conjunto da organização às estratégias da fábrica.
Não obstante, este alinhamento estratégico foi benéfico durante o ciclo virtuoso, pois
proporcionou à organização um suporte de coesão social para o seu funcionamento.
Atualmente, as certezas sobre a validade das estratégias atuais da fábrica estão sendo
questionadas por integrantes da organização que possuem posição de chefia de unidades de
negócio. Portanto, uma vontade interna acerca da desvinculação, desatrelamento e
flexibilização entre as unidades e suas estratégias particulares já é percebida no clima
organizacional então presente.
A construção de estratégias de sucesso pela APAEB/Valente ao longo das décadas de
1980 e 1990 levaram a organização a consolidar períodos de crescimento institucional que
exigiram algumas reformas ou mudanças organizacionais, as quais foram implementadas
naquelas mesmas décadas e na seguinte (anos 2000) e apontaram para um certo alinhamento
entre estratégia e a nova estrutura organizacional.
No início da década atual, a organização tem se valido de estratégias de manutenção
para fazer com que suas unidades de negócio se mantenham no mercado e ao mesmo tempo
suas atividades sociais e educativas continuem funcionando. Porém, sua estrutura atual não
condiz com as necessidades ocorridas no ambiente e no funcionamento da própria
organização e tem sido um fator de emperramento.
O crescimento individual da organização conduz a evolução da mesma, que se vê
diante das alternativas: ou adaptar-se permanentemente às atuais e velozes alterações que
ocorrem no ambiente ou enfrentá-las estrategicamente para que este mesmo ambiente lhes
seja favorável. A APAEB/Valente tem recorrido à segunda alternativa e a tem conduzido e
transformado em um processo de aprendizagem organizacional.
155
Por conseguinte, torna o processo de construção de estratégias algo com caráter social
que se inscreve na acumulação de conhecimento dos diretores, funcionários e outros membros
da APAEB/Valente e também na ampliação do capital social do segmento dos sisaleiros.
Não obstante, a aprendizagem social do processo de construção de estratégias não
garante automaticamente a “boa” ou acertada qualidade das estratégias construídas. Se até
este momento podemos afirmar que as três grandes estratégias construídas e implementadas
pela APAEB antes da crise dos anos 2000 foram acertadas e válidas, o mesmo não podemos
fazer em relação à quarta – e referente à profunda crise financeira – em toda sua extensão e
magnitude. A organização pôs como fundamental o apoio financeiro do Estado da Bahia para
reorganizar sua economia e por um hiato de tempo estará bastante fragilizada. Nesta crise não
percebemos uma disposição em sua Diretoria de ‘agir com suas próprias pernas’.
Os membros da APAEB/Valente têm descoberto nas ocorrências de momentos de
instabilidade o espaço para refletir sobre a positividade do desafio das novas oportunidades
que o ambiente suscita e da crucial necessidade de reformular e descobrir novos caminhos.
Esses novos caminhos foram transformados historicamente em novas estratégias planejadas
ou emergentes.
Nesse quadro, percebeu-se que a aprendizagem oriunda da vivência dos processos
organizativos tem sido de muita valia e que as estratégias emergentes, como respostas ao
imediato, denotam a riqueza e profundidade da aprendizagem ocorrida. Ao nível de cada
unidade de negócio, a materialidade desta última afirmação é muito mais perceptível.
Nessas unidades, a noção de planejamento para o longo ou médio prazo não está
presente mesmo na unidade fábrica de tapetes e carpetes, o que pode levar a questionamentos
sobre a generalidade da tese da racionalidade da organização industrial.
Lidar com a noção de planejamento no plano estratégico tem sido também muito
difícil no toda da APAEB/Valente. Este fato pode ser explicado pela combinação do ‘pano de
fundo’ proporcionado pela racionalidade dos agricultores familiares, pela natureza distinta
desse tipo de organização não capitalista ou quem sabe, pela noção de planejamento enquanto
prescrição não aplicável a todo o universo das organizações.
Sobre o processo de estratégia, transformação organizacional e gestão
Na prática da vida organizacional da APAEB/Valente, ocorreram simultaneamente
mudanças rápidas no bojo de um processo de implementação de mudanças gradativas.
156
O que nos chamou a atenção é que as rápidas foram mais efetivas que as gradativas e
reconfiguraram de antemão o perfil da organização. Por outro lado, várias propostas de
introdução lenta não tiveram capacidade para serem implementadas ao longo do processo,
devido a não alocação de recursos financeiros.
A aprendizagem contida na situação híbrida de fato vivenciada na organização nos
indicou os desafios postos pelo ritmo das mudanças em organizações como esta. Um deles
nos parece fundamental: conciliar a manutenção da participação social e o comprometimento
dos membros da organização com a mudança organizacional, com a urgência das mudanças a
serem implementadas. Isto nos remete para o universo dos valores sociais, que numa
organização desta natureza cumpre um papel decisivo na promoção da coesão social em torno
dos objetivos organizacionais. Paradoxalmente, a urgência da mudança tem se imposto sobre
as crenças e os valores que moldaram a organização ao longo de sua história.
Sendo assim, podemos afirmar que na APAEB/Valente, em sua fase recente, as
pressões do ambiente em parte condicionaram a rápida construção de estratégias emergentes e
as modificações no arcabouço organizacional para torná-lo condizente com aquele momento
da realidade social e organizacional. Mas, isto veio a repercutir no grau de participação e
comprometimento dos responsáveis pelas unidades de negócio e funcionários, já que não
havia tempo de envolvê-los plenamente nas grandes decisões com respeito à vida
administrativa e financeira da organização.
Na verdade, os resultados da pesquisa e sua conseqüente discussão estão nos
revelando a necessidade de uma avaliação da cultura organizacional da instituição construída
ao longo de quase três décadas, não no sentido de negá-la, mas, de atualizá-la frente as
injunções do ambiente globalizado em que a APAEB/Valente está ativamente inserida.
Avançando para a questão da gestão organizacional, três importantes constatações nos
levaram à confirmação de uma pré-noção que possuíamos sobre a implementação das
estratégias na vida organizacional da APAEB/Valente. São elas:
a. As decisões estratégicas ou operacionais nem sempre são transformadas
rapidamente em ações;
b. Há uma certa confusão e conflito de papéis entre a Diretoria Executiva e os gerentes
de unidades de negócio;
c. Há um processo de centralização de decisões operacionais na Diretoria Executiva.
157
Estas constatações nos revelam, no todo do processo, a existência de dissonâncias
entre os procedimentos de formulação das estratégias pretendidas (planejamento) e a prática
da gestão organizacional.
Essas dissonâncias vão se apresentar nitidamente nos momentos em que foi possível
constatar que, diante de crises significativas que demandaram o lançamento de novas
estratégias, foram promovidas mudanças estruturais marcantes; contudo, estas não foram
acompanhadas da implementação de modelos de gestão coerentes com a magnitude das
mudanças e com o sentido que estavam presentes às mesmas.
Deste modo, a prática do processo de gestão se apresentou historicamente na
APAEB/Valente como ‘autônoma’ em relação às estratégias construídas e às estruturas
modificadas.
E, por fim, sendo coerente com a perspectiva relativista, vale assinalar que talvez não
tenha acontecido a implementação de um processo orgânico e sistêmico de mudança
organizacional planejada e sim, mudanças reativas eventuais na estrutura organizacional
respondendo às imposições que ambiente apresentara, entendendo-se por mudança reativa
aquela que:
“[...] ocorre quando responde a um estímulo externo. O grupo dirigente da
organização identifica a necessidade de mudança e prepara os passos
necessários para que a organização supere as pressões externas.” (Idem, p.
225).
Na busca de reflexões mais ampliadas e de conclusões gerais para organizações do
tipo em que a APAEB/Valente se enquadra, podemos cogitar em afirmar que a questão da
construção da estratégia não se apresenta da maneira dicotômica expressa pelo cotejo ‘plano
versus ação’, pois a dinâmica própria da vida organizacional faz com que esses dois
componentes se entrelacem e se completem.
Organizações como essa aqui estudada são construídas para agir frente a uma ou a
várias problemáticas sociais. Mesmo que o seu crescimento e institucionalização lhes
obriguem a perseguir uma maior formalização de processos internos (planejamento,
monitoramento, avaliação) e de estruturas, a própria dinâmica de relação com o ambiente
faculta-lhes a possibilidade de serem criativas e flexíveis. Assim, pois, somos levados – na
maioria das vezes – a perceber, no contato com elas, mais as estratégias emergentes que as
pretendidas resultantes de um procedimento racional de planejamento.
158
A estratégia é quase sempre uma perspectiva para essas organizações e se reveste do
caráter de algo que deve ser espraiado no todo das mesmas, na mente coletiva. Neste sentido,
a estratégia também pode guardar uma relação direta com os valores sociais praticados e
consolidados na organização ao longo de sua história. Não obstante, o crescimento
organizacional poderá conduzir a uma revisão crítica da cultura então acreditada e praticada.
Este estudo também nos ajudou a compreender mais e melhor o universo das
organizações composto por organizações assemelhadas à APAEB/Valente. Na verdade,
pudemos perceber que a distinção do caráter capitalista daquele outro solidário (não-
capitalista) não se dá por e unicamente pelos propósitos racionais manifestados por
organizações de distintas naturezas.
Os seus processos de estratégias e suas revisões, atualizações ou alinhamentos de suas
estruturas organizacionais levam em conta a necessidade de se manterem competitivas, seja
nos mercados de produtos ou serviços tanto quanto uma empresa capitalista, seja no
‘mercado’ da captação de recursos financeiros para se manterem existindo. Contudo, o que
mais distingue as organizações não-capitalistas são seus fins sociais, expressos pelas noções
de bem estar, qualidade de vida, sustentabilidade, entre outros. Isto nos põe outra questão:
organizações são ‘fins’ ou ‘meios’ para organizar a interação humana?
As organizações como a APAEB/Valente estão nos mostrando que as duas
compreensões são possíveis de serem combinadas em algo único e coerente. Estão também
nos demonstrando e provando que o sonho de construir algo transforma o sentido da ação
humana. Enfim, os membros da APAEB/Valente estão absolutamente certos ao afirmar que
‘se faltar a gente inventa’.
159
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163
DOCUMENTOS DA APAEB
1. PUBLICAÇÕES EDUCATIVAS
- “Energia solar – Um raio de sol em sua vida”. 1996. APAEB/Fund. Doen/SOS PG.
- “Comer para viver ou viver para comer?”. 1997. APAEB/Fund. Kellogs.
- “A vergonha da fome”. 1997. APAEB/Fund. Kellogs.
- “Aleitamento materno”. 1997. APAEB/Fund. Kellogs.
- “Silagem – A garantia de boa alimentação em tempo de seca”. 1997. APAEB/Fund.
Kellogs.
- “Crédito Rural – Uma alternativa e um direito”. 1999. APAEB.
- “Cerca elétrica – Como construir?”. 2000. APAEB/Winrock Int./USAID.
- “Energia solar – Um raio de sol em sua vida”. 2000. APAEB/Winrock Int./USAID.
2. FOLHETOS DE DIVULGAÇÃO
- “Valente – A natureza de volta em sua casa”. s/d. APAEB.
- “O que há de novo no sertão?”. 1999. APAEB.
- “A serviço do pequeno produtor”. 1998. APAEB/COOPERE/SICOOB.
- “APAEB” (institucional).
3. RELATÓRIOS E MONOGRAFIAS
- “APAEB: Uma história de fibra, luta e subsistência”. APAEB, Jun/93. 160 p.
- “Produção e consumo no município de Valente”. APAEB, Jun/99. 46 p.
- “APAEB – Relatório de Avaliação Institucional. 2000.
- “APAEB – Relatório Anual 1999”. Março de 2000.
- “APAEB – Relatório Anual 2000”. Março de 2001.
- “APAEB – Relatório Anual 2001”. Março de 2002.
- “APAEB – Relatório Anual 2002”. Março de 2003.
- “APAEB – Relatório Anual 2003”. Março de 2004.
- “APAEB – Relatório Anual 2004”. Março de 2005.
- “APAEB – Relatório Anual 2005”. Março de 2006.
- “APAEB – Relatório Anual 2006”. Dezembro de 2007.
- “APAEB – Folha do Sisal 10 anos”. Abril de 2000.
164
- “Projetos econômicos comunitários: estudo de uma experiência rural na região de Feira
de Santana”. MOVIMENTO DE ORGANIZAÇÃO COMUNITÁRIA, Jul/86. 186 p.
- “Self-help organizations: economic activities and performance – APAEB/BRAZIL”. In:
VERHAGEN, Koenraad. Self-help promotion. A challenge to the NGO community.
CEBEMO/Royal Tropical Institute, Amsterdan, The Netherlands, 1987. Pp. 77-92.
165
ANEXOS
166
ANEXO I
AGENDA DE OFICINA - 2004
GRUPO PENSANTE (ESTRATÉGIA)
Assunto: Construção de Estratégias
Local: Sede da organização
Participantes: 15 pessoas integrantes da diretoria executiva e de algumas unidades (fábrica,
vendas, comunicação, desenvolvimento comunitário, qualidade (fábrica) e
administração de projetos).
1. Exposição do pesquisador sobre o tema da Estratégia e Estrutura
. Estrutura de organizações em rede;
. Governança;
. Parcerias;
. Valores sociais que inspiram as redes (complementariedade, cooperação,
compartilhar os recursos, comunicação).
2. Debate sobre a estrutura da APAEB
. Hierárquica (da Executiva)
. Flexível (das unidades)
3. Exercício de desenho das estruturas existentes na organização (hierárquica e de
rede).
4. Apresentação e debate sobre o tema Rede de Organizações
¾ Revisão da rede de organizações na qual a APAEB está integrada.
Questões:
. O processo de construção da estratégia – intenção é artesanal;
. Qual a estratégia global de desenvolvimento local?
. Há várias visões distintas de desenvolvimento?
. Como as estratégias das unidades se articulam com a (as) da
fábrica?
167
ANEXO II
AGENDA DA OFICINA - 2007
Assunto: Estratégia e Estrutura
Local: Sala de reuniões da APAEB
Participantes: Edvan (Clube), Gerlândio (Gerente de projetos produtivos), Aguinaldo
(Laticínio), Mizael (Diretor), Jovanildo (Diretor), Ismael (Diretor), Izenildo
(Comercialização da fábrica), Aguinaldo (Fábrica), Luciano (Fábrica), Idaildo
(Fábrica) e Beto (Batedeira).
TEMÁRIO
1ª. Sessão
¾ Informação sobre a pesquisa (Eduardo Jordão)
¾ Metodologia da oficina (Eduardo Jordão)
¾ Apresentação de uma seqüência de slides sobre a Evolução Institucional da
APAEB (Eduardo Jordão)
¾ Trabalho de grupo sobre o tema Processo de Estratégia
2ª. Sessão
¾ Revisão dos relatórios dos grupos
¾ Trabalho de grupo sobre o tema Dinâmicas e Processos de Implantação de
Estratégias
¾ Trabalho de grupo sobre o tema Conhecimento e Práticas Organizacionais
¾ Revisão dos relatórios dos grupos
¾ Debate
¾ Encerramento da oficina
168
ANEXO III
ROTEIRO DE ENTREVISTA - 2007
DIRETORIA EXECUTIVA
1. DINÂMICA DO AMBIENTE-ORGANIZAÇÃO
RELACIONAMENTO ENTRE OS STAKEHOLDERS E A APAEB
- Influência de entidades ou organizações da sociedade civil e parcerias
- Influência de entidades ou organizações do serviço público e parcerias
2. PROCESSO DE ESTRATÉGIA
LÓGICA DA DINÂMICA DO PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DE
ESTRATÉGIAS
- Descrição do processo
- A etapa artesanal
- As estratégias da fábrica de tapetes e carpetes
- As estratégias das outras unidades de negócio
- O cotidiano: estratégias emergentes
3. TIPOS DE ESTRUTURAS MAIS ADEQUADAS
(em face da estratégia escolhida)
ORGANOGRAMAS
- Descrição e justificativa para as relações de poder
ORGANIGRAPH
- Descrição e justificativa para ênfase em relacionamentos e processos
- HUB: (ponto central) descrição de processos
- WEB: (rede) descrição de processos
4. DINÂMICA E PROCESSOS QUE PERMITEM A IMPLANTAÇÃO DA
ESTRATÉGIA (GESTÃO)
MODELO DE GESTÃO
DECISÃO SOBRE O PLENO IMPACTO DOS RESULTADOS
- Descrição do processo e responsável
PAPEL DO GESTOR
- Descrição do processo de decisão
- Formatação do ambiente para as decisões
ÉTICA
- Elaboração de regras para a organização lidar com a sociedade
5. CONHECIMENTO E PRÁTICAS ORGANIZACIONAIS
PROCESSO DE REDE DE ORGANIZAÇÕES
- Cooperação (relação informal)
- Alianças (relação formal e/ou jurídica)
169
ANEXO IV
ROTEIRO DE OFICINA - 2007
GRUPO QUE “PENSA” A APAEB
1. PROCESSO DE ESTRATÉGIA
LÓGICA DA DINÂMICA DO PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DE
ESTRATÉGIAS
- Descrição do processo
- A etapa artesanal
- As estratégias da fábrica de tapetes e carpetes
- As estratégias das outras unidades de negócio
- O cotidiano: estratégias emergentes
2. TIPOS DE ESTRUTURAS MAIS ADEQUADAS
(em face da estratégia escolhida)
ORGANOGRAMAS
- Descrição e justificativa para as relações de poder
ORGANIGRAPH
- Descrição e justificativa para ênfase em relacionamentos e processos
- HUB: (ponto central) descrição de processos
- WEB: (rede) descrição de processos
3. DINÂMICA E PROCESSOS QUE PERMITEM A IMPLANTAÇÃO DA
ESTRATÉGIA (GESTÃO)
MODELO DE GESTÃO
- Conjunto de premissas e orientações
- Estruturas de administração
- Gerência de recursos humanos
- Orientações para o comportamento gerencial (valores e regras)
4. CONHECIMENTO E PRÁTICAS ORGANIZACIONAIS
INOVAÇÃO NO MANEJO DOS RECURSOS E CULTURA
ORGANIZACIONAL
- Capacidade da APAEB de identificar e utilizar novos enfoques
- Habilidades coletivas da APAEB
- Práticas participativas
PROCESSO DE REDE DE ORGANIZAÇÕES
- Cooperação (relação informal)
- Alianças (relação formal e/ou jurídica)
170
ANEXO V
ROTEIRO DE ENTREVISTA - 2007
PARCEIROS
1. DINÂMICA DO AMBIENTE-ORGANIZAÇÃO
a. RELACIONAMENTO ENTRE OS STAKEHOLDERS E A APAEB
- Influência de entidades ou organizações da sociedade civil e parcerias
- Influência de entidades ou organizações do serviço público e parcerias
2. CONHECIMENTO E PRÁTICAS ORGANIZACIONAIS
a. PROCESSO DE REDE DE ORGANIZAÇÕES
- Cooperação (relação informal)
- Alianças (relação formal e/ou jurídica)
171
ANEXO VI
ENCADEAMENTO DAS EVIDÊNCIAS E ANÁLISE DOS RESULTADOS
ENCADEAMENTO DE EVIDÊNCIAS
Um agente investigador segue vestígios [...] Terá êxito se houver consistência
entre as etapas (encadeamento de evidências) das conclusões para as questões
iniciais, ou, inversamente, das questões para as conclusões [....] O leitor do
relatório, por exemplo, poderá notar que evidências provenientes de questões
iniciais da pesquisa levem às conclusões finais do estudo, e que há consistência
se o caminho for inverso – das conclusões para as questões iniciais. [...] Há
lógica e sintonia entre os elementos do PLANO, da EXECUÇÃO e das
CONCLUSÕES da pesquisa.
ANÁLISES DOS RESULTADOS
Se o planejamento e o protocolo foram elaborados com detalhes, pontos para
análises foram marcados e, dessa maneira, cada pesquisador deve começar seu
trabalho com uma estratégia analítica geral.
De modo geral a análise de dados consiste em
EXAMINAR,
CLASSIFICAR e, muito freqüentemente,
CATEGORIZAR OS DADOS, opiniões, e informações coletadas, ou seja, a
partir das proposições, teoria preliminar e resultados encontrados,
CONSTRUIR uma TEORIA que ajude a explicar o fenômeno sob estudo.
A análise de um Estudo de caso deve deixar claro que todas as evidências
relevantes foram abordadas e deram sustentação às proposições que
parametrizaram toda a investigação.
A qualidade das análises será notada pelo tratamento e discussão das principais
interpretações – linhas de argumentação – concorrentes, bem como pela
exposição dos aspectos mais significativos do caso sob estudo e de possíveis
laços com outras pesquisas assemelhadas.
Cuidados especiais devem ser tomados para se evitar estratégia analítica
desenvolvida exclusivamente em descrição do caso”.
Extraído e adaptado de Martins, G., “Estudo de Caso - Uma Estratégia de Pesquisa”, p.81,86, 87.
172
ANEXO VII
PROGRAMA DA PRIMEIRA VISITA A APAEB/VALENTE
(21 – 25.01.2004)
Qui 21
. reunião com a diretoria executiva com o objetivo de programar a visita.
. visitas à EFA (Escola família agrícola) e a fábrica de tapetes e carpetes.
. reunião com a diretoria executiva sobre o tema organização.
. reunião com o “grupo pensante” sobre o tema estratégia.
Sex 22
. reunião com o grupo de execução sobre o tema gestão.
. visitas à Coopere e ao showroom (Riquezas do Sertão) .
. visita a uma batedeira terceirizada.
Sáb 23
. visita a um projeto-modelo de agricultura sustentável (Cabrochá).
. visita as atividades do complexo de comunicação (rádio e tv).
. entrevista para o boletim Folha do Sisal.
Dom 24
. entrevista com o responsável pela comercialização (Izenildo Araújo) sobre as
unidades de negócio.
Seg 25
. reunião final com a diretoria executiva e apresentação de meus comentários.
. entrevista com o Diretor Executivo (Ismael Oliveira)
173
ANEXO VIII
PROGRAMA DA SEGUNDA VISITA À APAEB/VALENTE
(16 - 20.07.2007)
SEG 16
. Viagem Salvador – Valente (entrevista com o consultor Luca)
. Reunião e entrevista grupal com os integrantes da Diretoria Executiva da
APAEB
TER 17
. Entrevista com o gerente da Batedeira
. Oficina (entrevista grupal com os responsáveis pelas unidades de negócio e
diretores)
QUA 18
. Entrevista com o responsável pelo Clube social
. Entrevista com o gerente do Posto de vendas
. Entrevista com o responsável pela loja Riquezas do sertão
. Oficina (entrevista grupal com os responsáveis pelas unidades de negócio e
diretores)
QUI 19
. Visita à Fábrica de tapetes e carpetes e entrevista com o gerente comercial
. Visita ao Laticínio e entrevista com o responsável
SEX 20
. Entrevista com o diretor executivo
. Reunião de encerramento da visita com os membros da Diretoria Executiva
174
ANEXO IX
CONVÊNIO IAF BR – 702
PROJETO APAEB/VALENTE
LISTA DE INDICADORES PARA MONITORAMENTO DO PROJETO
1. Evolução nominal e real do capital de giro;
2. Evolução do preço real de compra do sisal na região;
3. Volume de compra mensal do sisal pela Batedeira Comunitária aos pequenos
produtores;
4. Volume de sisal exportado pela APAEB;
5. Crescimento da oferta de empregos diretos na Batedeira;
6. Evolução do número de associados da APAEB;
7. Expansão do trabalho da APAEB para outros municípios da região;
8. Número de famílias beneficiadas diretamente pelo projeto (produtores, donos de motor
e trabalhadores de motor);
9. Número de famílias beneficiadas indiretamente pelo projeto;
10. Melhoria no padrão de vida dos produtores do sisal (considerar: alimentação, moradia,
saúde, renda, educação formal, condições de trabalho);
11. Número de reuniões locais organizadas pela APAEB (incluir: assuntos tratados e
quantidade de participantes);
12. Número de reuniões regionais organizadas pela APAEB (incluir: assuntos tratados e
quantidade de participantes);
13. Relação cesta básica local e preço do quilo do sisal local.
(Extraído do relatório de monitoramento elaborado por Eduardo Jordão datado
de 02 de março de 1990.
175
ANEXO X
ESTRUTURA ORGANIZACIONAL DA APAEB / GERAL
Livros Grátis
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