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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL
CAMPUS DE AQUIDAUANA
DEPARTAMENTO DE GEOCIÊNCIAS
CURSO MESTRADO EM GEOGRAFIA
WELINGTON FERNANDO MODESTO DA SILVA
A DESCENTRALIZAÇÃO NA POLÍTICA URBANA DE CAMPO
GRANDE COMO POSSIBILIDADE DE DESENVOLVIMENTO
AQUIDAUNA – MS
2007
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WELINGTON FERNANDO MODESTO DA SILVA
A DESCENTRALIZAÇÃO NA POLÍTICA URBANA DE CAMPO
GRANDE COMO POSSIBILIDADE DE DESENVOLVIMENTO
Dissertação apresentada, como exigência final para
obtenção do grau de Mestre em Geografia, à Comissão
Julgadora do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu
em Geografia da Universidade Federal de Mato Grosso
do Sul.
Área de Concentração: Produção do Espaço Regional
Linha de Pesquisa: Planejamento Urbano
Orientação: Prof. Dr. Antônio Firmino de Oliveira Neto
AQUIDAUANA - MS
2007
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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Coordenadoria de Biblioteca Central – UFMS, Campo Grande, MS, Brasil)
Silva, Welington Fernando Modesto da.
S586d A descentralização na política urbana de Campo Grande como
possibilidade de desenvolvimento / Welington Fernando Modesto da Silva.
-- Aquidauana, 2007.
150 f. ; 30 cm.
Orientador: Antônio Firmino de Oliveira Neto.
Dissertação (mestrado) - Universidade Federal de Mato
Grosso do Sul. Campus de Aquidauana.
1. Geografia urbana – Campo Grande (MS). 2. Política
urbana - Campo Grande (MS). 3. Planejamento urbano -
Campo Grande (MS). I. Oliveira Neto, Antônio Firmino de. II.
Título.
CDD (22) 918.171
711.4098171
WELINGTON FERNANDO MODESTO DA SILVA
A DESCENTRALIZAÇÃO NA POLÍTICA URBANA DE CAMPO
GRANDE COMO POSSIBILIDADE DE DESENVOLVIMENTO
COMISSÃO JULGADORA
DISSERTAÇÃO PARA OBTENÇÃO DO GRAU DE MESTRE
Presidente e Orientador: ____________________________________________
Prof. Dr. Antônio Firmino de Oliveira Neto – UFMS
2º Examinador: ____________________________________________________
Prof. Dr. Edgar Aparecido da Costa – UFMS
3º Examinador: ____________________________________________________
Prof. Dr. William Ribeiro da Silva – UFRJ
Aquidauana – MS.
28 de setembro de 2007.
AGRADECIMENTOS
Aos meus pais, que sempre me incentivaram para os estudos e são
imprescindíveis em todas as etapas da minha vida.
Ao meu orientador Antônio Firmino de Oliveira Neto, pela paciência,
serenidade e confiança depositada em mim, pela valiosíssima contribuição e
prontidão para solucionar dúvidas e por direcionar de maneira eficaz os rumos a
serem trilhados na realização deste trabalho;
A amiga Silmara Ribeiro Martins que desde a graduação sempre
contribuiu com inestimável ajuda me auxiliando nos estudos;
Ao professor e amigo Edgar Aparecido da Costa, responsável por grande
parte da minha formação, que soube estar orientando e apontando rumos no início
do trabalho na pós-graduação;
Aos colegas de pós-graduação, em especial a Elisângela Martins de
Carvalho e a Priscila Varges da Silva, pela amizade e o aconchego durante as
freqüentes estadas em Aquidauana;
A todos os amigos presentes nesse percurso, especialmente àqueles que
tiveram a gentileza de me oferecer contribuições, informações e aconselhamentos,
visando o bom andamento do trabalho;
Aos funcionários da Biblioteca Aparecida Lopes de Oliveira e aos demais
funcionários do PLANURB que gentilmente me receberam, cedendo as informações
solicitadas;
Aos membros do CMDU em especial a geógrafa Cleonice Alexandre Le
Bourlegat que nas diversas conversas apontou caminhos a serem seguidos;
E aos Conselheiros Regionais que possibilitaram conversas importantes
na organização e direcionamento deste trabalho.
RESUMO
A cidade de Campo Grande, capital do Estado de Mato Grosso do Sul, desde 1987
passou a contar com a Unidade Municipal de Planejamento Urbano PLANURB,
com o intuito promover a participação da população no processo de
desenvolvimento urbano da cidade. Foram adotadas, desde então medidas para
aproximar o cidadão do processo de planejamento. O primeiro passo para a
participação da sociedade se deu por meio da criação do Conselho Municipal de
Desenvolvimento e Urbanização CMDU e posteriormente com a implantação dos
Conselhos Regionais, de caráter consultivo. Previstos no Plano Diretor da cidade, os
Conselhos Regionais representam um canal mais direto entre o cidadão e o Poder
Executivo, incluindo a população nas discussões sobre os problemas que afetam a
cidade. O objetivo desta dissertação é analisar a efetiva participação e contribuição
dos Conselhos Regionais no desenvolvimento urbano da cidade, bem como
identificar até que ponto sua criação promoveu a democratização da política urbana.
Sinalizando que esta forma de participação popular é capaz de promover o
fortalecimento do Capital Social, isto é, promover laços de confiança e cooperação
que, quando orientados para o bem estar comum, pode funcionar como importante
ferramenta do desenvolvimento local.
Palavras-chave: Planejamento Urbano; Desenvolvimento; Descentralização
Política; Conselhos Regionais.
ABSTRACT
The city of Campo Grande, capital of the State of South Mato Grosso, since 1987
has been able to count on the Municipal Unit for Urban Planning (PLANURB), with
the intention of promoting the participation of the population in the process of urban
development of the city. Since then, measures have been adopted to include the
citizen in the planning process. The first step for the participation of society came
about with the creation of the Municipal Council for Development and Urbanization
(CMDU) and later on with the implantation of Regional Councils of a consultative
character. Foreseen in the Guiding Plan of the City, the Regional Councils represent
a more direct channel between the citizen and the Executive Power, including the
population in discussing problems that affect the city. The aim of this dissertation is to
analyze the effective participation and contribution of the Regional Councils in the
urban development of the city, as well as identifying up to what point their creation
promoted the democratization of urban politics. This all points out that this form of
popular participation is capable of promoting the strengthening of Social Capital, that
is, promoting links of confidence and cooperation which, when guided towards the
welfare of all, can function as an important tool in local development.
Key words: Urban Planning; Development; Political Decentralization; Regional
Councils.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Campo Grande: Planta de 1909, organizada pelo engenheiro
Municipal Nilo Javari Barem........................................................................................60
Figura 2 - Campo Grande: Setorização de 1988, conforme lei 2567......................101
Figura 3 - Campo Grande: Regiões Urbanas de 1995............................................102
Figura 4 - Região Urbana do Centro........................................................................103
Figura 5 - Região Urbana do Segredo.....................................................................104
Figura 6 - Região Urbana do Prosa.........................................................................105
Figura 7 - Região Urbana do Bandeira....................................................................106
Figura 8 - Região Urbana do Anhanduizinho...........................................................107
Figura 9 - Região Urbana do Lagoa.........................................................................108
Figura 10 - Região Urbana do Imbirussu.................................................................109
Figura 11 - Sobreposição da setorização de 1988 e das regiões urbanas de 1995
...................................................................................................................................111
Figura 12 - Campo Grande: Saídas como Avenidas radiais....................................113
LISTA DE QUADROS
Quadro 01 - Zoneamento de Campo Grande proposto pela Lei nº 39/41................62
Quadro 02 - Campo Grande: população total, urbana e rural – 1909 a 2000..........63
Quadro 03 - Estrutura de funcionamento do PLANURB – 1987...............................72
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO.........................................................................................................10
2 A CIDADE E O PLANEJAMENTO..........................................................................16
2.1 O surgimento das cidades e sua produção social................................................18
2.2 Histórico do planejamento urbano........................................................................20
2.3 Reflexão sobre o espaço urbano de hoje a partir da visão de
Henri Lefebvre.............................................................................................................26
2.4 O urbanismo..........................................................................................................30
2.5 O planejamento urbano.........................................................................................33
2.6 Urbanismo versus planejamento urbano..............................................................35
3 A (RE)DEMOCRATIZAÇÃO E A DESCENTRALIZAÇÃO NO BRASIL................38
3.1 A descentralização política como possibilidade de desenvolvimento
dos municípios.............................................................................................................41
3.2 A busca da justiça social pela reforma urbana.....................................................45
3.3 O Estatuto da Cidade e a realidade urbana brasileira...............................................51
3.4 O Estatuto da Cidade e as bases para a formulação de novos planos diretores 53
4 A EVOLUÇÃO E AS INTERVENÇÕES NO ESPAÇO URBANO DE CAMPO
GRANDE.....................................................................................................................58
4.1 A administração do prefeito Juvêncio e o início da descentralização na
política urbana em campo grande...............................................................................69
4.2 O processo de discussões para a implantação do plano diretor..........................78
4.3 A importância do CMDU como instrumento de participação popular
no planejamento urbano de Campo Grande...............................................................84
4.4 O processo de discussão no Conselho Municipal de Desenvolvimento
Urbano, do projeto de elaboração do plano diretor................................................... 88
4.5 O plano diretor como ferramenta de ordenamento e descentralização na
política urbana de Campo Grande..............................................................................90
4.6 A regionalização de Campo Grande em sete áreas urbanas..............................99
5 A PARTICIPAÇÃO COMUNITÁRIA NA POLÍTICA URBANA DE CAMPO
GRANDE POR MEIO DOS CONSELHOS REGIONAIS..........................................114
5.1 O processo de instalação e composição dos Conselhos Regionais..................119
5.2 As atribuições e a atuação dos Conselhos Regionais........................................125
5.3 Os Conselhos Regionais como ferramenta de fortalecimento do capital social 134
6 CONCLUSÃO........................................................................................................139
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................................................143
APÊNDICE................................................................................................................149
1 INTRODUÇÃO
O município de Campo Grande situa-se num platô da Serra de Maracaju,
com altitudes que variam de 490 a 698 metros, na parte meridional da região Centro-
Oeste, a 1.088 km da capital federal, Brasília e apresenta topografia plana. A sede
do município está bem no epicentro do estado, eqüidistante dos extremos norte, sul,
leste e oeste, tendo o seu centro nas coordenadas geográficas 20º 26’ 34” de
latitude Sul e 54º 38’ 47” de longitude Oeste, no divisor de águas das bacias dos rios
Paraná e Paraguai.
Com uma área de 8.096,051 km² e população de 765.247 habitantes
1
,
apresentando uma densidade demográfica de 94,5 hab/km², o município faz limite
com Rochedo e Jaraguari ao norte; Nova Alvorada do Sul ao sul; Ribas do Rio
Pardo a leste e; Terenos e Sidrolândia a oeste.
Anhanduí e Rochedinho o os únicos distritos do município e que,
conforme a lei complementar 05, de 22 de Novembro de 1995, que instituiu o
Plano Diretor de Campo Grande, passaram a ser considerados como regiões
urbanas para fins de planejamento.
Cada vez é mais comum a percepção de que o Estado, pautado nos
moldes burocráticos, com rigidez organizacional e inflexibilidade de sistemas
hierarquizados, não responde às necessidades que o colocadas pela
complexidade do mundo atual e, por conseqüência, não atinge o grau de eficiência
que se espera na aplicação das políticas públicas.
Nas décadas de 1980 e 1990 ocorreu no país um processo de
descentralização, apontando para além das questões fiscais e econômicas, havendo
a preocupação do Estado em otimizar a aplicação dos recursos em equipamentos e
serviços públicos. Observamos ter ocorrido uma crise na forma gerencial,
representada por uma burocracia sem flexibilidade e incapaz de transformar suas
1
Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, 2006.
instituições. Diante desse quadro ficaram marcadas as discussões sobre a
necessidade de um debate que abordasse a reforma do Estado.
Durante o regime militar pós-1964 houve uma forte centralização do poder
no Executivo Federal e somente com o fim da ditadura, em 1985, iniciou-se um
processo que permitiu uma descentralização do poder com maior autonomia política
e administrativa para os estados e municípios, sinalizando um novo momento nas
políticas locais e regionais.
Nesse contexto, apontamos as preocupações desse trabalho, que está na
investigação da política urbana adotada pela municipalidade de Campo Grande, a
partir da criação do Instituto de Planejamento urbano PLANURB em 1987, período
que coincide com a (re)democratização do país e dos mecanismos criados com o
intuito de aproximar o Poder Público Municipal da sociedade civil, por intermédio do
Conselho Municipal de Desenvolvimento e Urbanização CMDU. Isso permitiu que
houvesse um canal de participação da sociedade campo-grandense nas questões
relacionadas com a estruturação do espaço urbano, principalmente no que se refere
a lei de uso e ocupação do solo.
Outro fator a ser considerado é a lei 05, de 22 de novembro de 1995,
que instituiu o Plano Diretor de Campo Grande e estabeleceu as diretrizes para a
criação das regiões urbanas da cidade com posterior instalação dos Conselhos
Regionais. Os Conselhos Regionais seriam um canal mais direto entre o Sistema
Municipal de Planejamento - SMP e a população campo-grandense para discutir as
medidas a serem adotadas para promover o equilíbrio na aplicação dos recursos,
possibilitando uma melhor estruturação urbana do município.
A questão norteadora desta pesquisa foi a de avaliar a que ponto a
descentralização adotada pela Prefeitura Municipal, com a instalação dos Conselhos
Regionais promoveu a participação e a democratização na política urbana e no
processo de planejamento urbano de Campo Grande.
O objetivo é analisar até que ponto a criação desses mecanismos têm
auxiliado na estruturação do espaço urbano da cidade e identificar a forma que eles
contribuem em seu desenvolvimento.
Convém ressaltar que a pesquisa é fruto da aproximação com o modelo
de gestão pública que possibilita a inclusão da população na discussão sobre a
construção da cidade como um jogo democrático, ou seja, como fruto do trabalho
coletivo da sociedade. O interesse por esta temática iniciou-se nos trabalhos da
graduação em Geografia, quando vivenciamos questionamentos quanto às teorias e
às práticas do modo de planejamento relacionado ao cotidiano de Campo Grande.
Partimos, naquela época, do estudo da implantação dos Conselhos Regionais e
freqüentamos algumas reuniões públicas com o objetivo de analisar a contribuição
dessa modalidade de participação na estruturação da cidade, provocando mudanças
significativas na sua produção. Os estudos e discussões realizadas resultaram num
trabalho de conclusão de curso tendo como foco a participação da sociedade no
processo de planejamento urbano de Campo Grande.
No entanto, foram vários os questionamentos e indagações sobre o
processo de participação da sociedade no planejamento urbano que iriam
motivar/condicionar a reestruturação da cidade e que não foram discutidos naquele
momento. Até porque esta era uma prática que apenas se iniciava e apresentava
dificuldades de ser analisada naquele momento e que agora permite-nos refletir
sobre tais inquietações.
Devemos considerar que, desde meados da década de 1980, algumas
prefeituras vêm atuando de modo a incluir a população nas decisões
governamentais, visualizando a superação do caráter excludente imposto pelo
neoliberalismo. Pautadas principalmente no orçamento participativo, elas vêm
abdicando do planejamento estritamente tecnocrático e autoritário, com o objetivo de
possibilitar um avanço com a implementação de políticas públicas mais
democráticas.
Esta maneira diferenciada de exercer o poder é importante para a
ampliação da discussão sobre o espaço urbano e direciona para a construção de
uma nova prática no planejamento, marcando o fim do regime monopolista de
administrar a cidade praticada até então. Atualmente as novas formas de
administração públicas, como por exemplo, o orçamento participativo e os conselhos
de desenvolvimento urbano, são reconhecidos nacional e internacionalmente,
ganhado destaque entre as políticas, conforme a descrição de SOUZA:
[...] não obstante o Brasil, como país semiperiférico que é, costumeiramente
ser muito mais um país importador que exportador de idéias teóricas,
tecnológicas e técnicas, em matéria de orçamentos participativos o nosso
país tem tido um papel de destaque e pioneirismo. (2004, p. 343)
É importante salientar a existência de uma nova prática de gestão em que
o controle social sobre as ações públicas torna-se presente reforçando sua
importância e ganhando espaço, traduzindo-se em diferentes mecanismos de
funcionamento, utilizados por diversas cidades brasileiras.
Essa construção traduz o momento mais importante de uma co-gestão
estatal e pública não-estatal, estimuladora de consensos majoritários a partir
de uma diretriz política irrenunciável: os interesses “subalternos” tendem a
se tornar os interesses dominantes e a cidade não pode ser mais uma
cidade para poucos, mas uma cidade para todos. (GENRO, 1997, p. 15).
Pode-se notar a existência de práticas que renegam o modo tradicional,
centralizador e excludente empregado pela gestão estatal, observando a redefinição
dos papéis do Estado e da sociedade civil, sinalizando para a ampliação da
participação entre o público e o privado, de modo a minimizar os efeitos negativos
da burocratização estatal e a mercantilização da sociedade. Colocamo-nos então a
pensar na dinâmica de construção das cidades que a partir dessa prática tende a
romper com a submissão de interesses imobiliários, possibilitando a diminuição da
segregação espacial urbana e o clientelismo político caracterizado pelas trocas de
favores que provocava o prejuízo da camada social mais pobre, transformando-os
em renegados no processo de construção da cidade. Esta nova modalidade de
participação permite que os antes excluídos, desde que organizados possam, ao
menos, participar das decisões relacionadas ao espaço urbano e definir prioridades
de cunho social mais urgente.
As relações entre Estado e sociedade ocorrem baseadas em novos
paradigmas, havendo uma maior dispersão de poder entre os diversos grupos e
classes sociais nas duas ultimas décadas do século XX. Atualmente os novos
modelos de organização social estão baseados em dois pontos principais: o primeiro
é a consolidação que LEFEBVRE (1999) define como sociedade urbana, ou seja,
uma nova forma social que se intensifica a partir do processo de urbanização em
nível mundial, colocando as questões urbanas como prioridades na formação de
novos modelos de gestão social; o segundo está relacionado às mudanças
econômicas ocorridas em escala mundial, em que o debate sobre o papel do Estado
passa a ser considerado não nas perspectivas de intervenção social, mas
também na abertura de espaços de gestão compartilhada com a sociedade
organizada.
Especificamente, pretendemos verificar as contribuições a partir do
processo de instalação do PLANURB e as políticas e mecanismos criados com o
intuito de possibilitar um desenvolvimento urbano que fosse produzido pela
população local e não com projetos prontos vindos de fora e que não se adequavam
à realidade da cidade.
Buscamos também analisar as contribuições do CMDU e da elaboração
do Plano Diretor na orientação da política urbana, possibilitando que houvesse
diretrizes a serem seguidas e permitissem uma melhor reestruturação do espaço
urbano.
Nesse sentido, tivemos como meta à obtenção de informações a respeito
do processo de planejamento adotado pela Prefeitura Municipal desde a criação do
PLANURB, que pudesse evidenciar a relevância desse Instituto no planejamento
urbano municipal.
Metodologicamente, utilizamos primeiramente de Revisão Bibliográfica
em torno do assunto. Paralelamente, levantamos documentos e arquivos que
pudessem revelar o histórico do planejamento no município de Campo Grande.
Nesse estudo, buscou-se, oferecer uma interpretação à luz teórica da
bibliografia consultada e das relações sociais e políticas comprovadas por estudos
anteriores específicos sobre o município.
Finalmente, com a interpretação das informações, dos dados obtidos e
das conversas com pessoas que participaram efetivamente desse processo pôde-se
chegar as considerações finais sobre o trabalho executado.
Esta dissertação, em seu desenvolvimento, ficou constituída por quatro
capítulos.
No primeiro capítulo, abordamos como a mudança na produção social
possibilitou o surgimento das cidades e que estas surgiram a partir da divisão social
do trabalho, considerando que as formas de intervenção no espaço urbano são uma
preocupação histórica de seus habitantes e abordamos também a forma como o
planejamento urbano e o urbanismo, enquanto disciplinas são utilizadas para atuar
no funcionamento das cidades.
No segundo capítulo, buscamos fazer um paralelo do momento em que
ocorriam as mudanças no processo de planejamento urbano de Campo Grande,
com a abertura política ocorrida após o fim da ditadura militar que possibilitou a
(re)democratização e a descentralização de poder, onde os municípios e estados
passaram a atuar mais diretamente na gestão de seus territórios, bem como a
retomada da luta pela busca da justiça social por meio do Movimento Nacional da
Reforma Urbana e a conquista de parte desses direitos através da Lei 10.257
denominada Estatuto da Cidade, que estabeleceu diretrizes para induzir melhorias
na realidade urbana brasileira.
No terceiro capítulo, fizemos um pequeno relato das intervenções urbanas
realizadas na história de Campo Grande, demonstrando que na maioria das vezes
esses projetos não alcançaram os objetivos esperados. Analisamos o processo de
planejamento desde a criação do PLANURB e os desdobramentos das políticas
adotadas a partir de então com o propósito de tornar a cidade melhor estruturada,
criando mecanismos para aproximar a população da construção da cidade.
No quarto capítulo, procuramos verificar a participação e contribuição da
população no processo permanente de planejamento do município, com o propósito
de demonstrar que, quando organizada, a comunidade pode contribuir de maneira
significativa para uma melhor estruturação e aplicação dos recursos do município.
Sinalizando que o fortalecimento do Capital Social pode funcionar como um
elemento fundamental de desenvolvimento do município.
As concepções, aqui apresentadas de forma sucinta, fazem parte de todo
o referencial e de nossas reflexões durante a pesquisa, reforçaram convicções e, ao
mesmo tempo sofreram alterações com a dinâmica de estudo, com a pesquisa e
com as contribuições propostas durante a execução do trabalho.
Estas são, em suma, as questões e reflexões que norteiam o
desenvolvimento do trabalho. Nossa expectativa é contribuir efetivamente na
compreensão do processo de planejamento urbano adotado pelo município e sua
relevância na estruturação do espaço urbano dos campo-grandenses.
2 A CIDADE E O PLANEJAMENTO
Como foi destacado por Sposito (1989) a cidade de hoje, é o resultado
cumulativo de todas as outras cidades de antes, transformadas, destruídas,
reconstruídas, enfim produzidas pelas transformações sociais ocorridas no tempo e
engendradas pelas relações que promoveram estas transformações. Portanto, para
entendermos a cidade nos dias atuais precisamos recorrer ao passado e
compreender o processo de origem da formação do espaço urbano e como elas
evoluíram com a aplicação de diferentes técnicas que permitiram mudanças
significativas desse espaço, produzindo grandes transformações na organização
social e no modo de vida urbano.
Desta maneira, neste capítulo, será feito uma reflexão sobre o espaço
urbano, desde o surgimento das primeiras cidades, analisando algumas
características que foram de grande importância para o estabelecimento do modo de
vida urbano. Levando em consideração à divisão social do trabalho, verifica-se que
algumas funções surgiram no espaço gerando fatores que permitiram, pela primeira
vez, a diferenciação do modo de vida urbano do rural. Pode-se notar também que as
cidades evoluíram bastante no decorrer da história e que, a cada inovação técnica
nos meios de produção, ocorriam mudanças nas relações sociais e na produção do
espaço urbano. Porém, é a partir do capitalismo e posteriormente da Primeira
Revolução Industrial que a terra urbana passa a ser vista como mercadoria, o que
reforçou ainda mais a dificuldade para o individuo ter acesso a um pedaço de terra e
em conseqüência sua moradia. CORRÊA nos ajuda a compreender o espaço
urbano do ponto de vista do capitalismo, quando assinala que:
O espaço de uma grande cidade capitalista constitui-se, em um primeiro
momento de sua apreensão, no conjunto de diferentes usos da terra
justapostos entre si. Tais usos definem áreas, como o centro da cidade,
local de concentrações de atividades comerciais, de serviços e de gestão,
áreas industriais, áreas residenciais distintas em termos de forma e
conteúdo social, de lazer e, entre outras, aquelas de reserva para futura
expansão. (2002, p. 07)
Estes fatores propiciaram um quadro de segregação espacial, perceptível
na formação do “centro” e da “periferia” que reflete uma produção espacial baseada
na divisão de classes sociais.
Procuramos também, fazer uma abordagem sobre as formas de
intervenção do Estado nas cidades no decorrer da história e da criação de políticas
que permitissem ordenamentos no crescimento das cidades. Faz-se necessário
também algumas considerações sobre o urbanismo na concepção e aplicação de
técnicas de produção da cidade.
Assim como discutir a forma que eram elaboradas e implantadas as
políticas de planejamento urbano e a falta de consonância em relação as
expectativas da população com a aplicação de projetos técnicos que não satisfaziam
as reais necessidades da população. Com isso é possível destacar sua relevância
para a (re)estruturação das cidades e principalmente abordar a participação da
população na discussão sobre os rumos da política urbana, demonstrando a
necessidade de criação de novos paradigmas de planejamento que incluem os
planos diretores e a participação popular na gestão urbana das cidades.
Por último, fazemos um pequeno relato sobre a história da evolução
urbana de Campo Grande, que é nosso objeto de estudo, com o propósito de
demonstrar de forma objetiva quais foram as principais medidas adotadas pelo
poder público municipal no sentido de criar mecanismos para limitar o crescimento
desordenado da cidade que levaram a criação do PLANURB - Instituto Municipal de
Planejamento e Urbanização, no ano de 1987, com o objetivo de adotar políticas
para promover o desenvolvimento urbano do município.
Diante desta abordagem, fica evidente que é preciso não entender as
cidades bem como a partir daí, compreender as formas pelas quais as pessoas se
relacionam e constituem esse espaço tão difuso. Corrêa (2002) descreveu o espaço
urbano como sendo “simultaneamente fragmentado e articulado” existindo em cada
uma de suas partes relações espaciais com as demais, mesmo que apresentando
intensidades diferentes.
O espaço urbano é aqui entendido como o lugar onde ocorre uma série
de eventos que o tornam parte das manifestações cotidianas da sua população, e
onde se desenvolvem as mais variadas atividades comerciais, serviços e gestão,
com um intenso fluxo de pessoas que se locomovem para trabalhar, estudar e
passear. Enfim, busco um melhor entendimento sobre esse “lugar que é o
intermédio entre o mundo e o individuo”. (SANTOS, 1999).
O espaço urbano é entendido como lugar onde as diversas classes
sociais vivem e se reproduzem. Sendo assim, temos a sociedade em uma das suas
dimensões, que pode ser apreendida por meio da materialização de suas formas
espaciais que Milton Santos denominou como rugosidades.
2.1 O SURGIMENTO DAS CIDADES E SUA PRODUÇÃO SOCIAL
A utilização de novas técnicas na produção agrícola foi um dos fatores
que possibilitaram o surgimento das cidades, porém não se deve atribuir o início da
formação urbana somente a esse excedente produzido no campo. É preciso
salientar, como aponta Sposito (1989) que as cidades se originaram graças às
mudanças ocorridas no aspecto social e político onde houve uma distinção bastante
nítida entre os aldeões que exerciam somente atividades primárias (agricultura e
criação) não demonstrando ocorrer entre esses uma divisão social do trabalho. Esse
fato os diferenciava dos cidadãos urbanos que se estabeleceram a partir da criação
de diferentes papéis sociais, possibilitando a existência da formação de classes
sociais, em que determinadas atividades, tais como: o estoque de alimentos, o
comércio e o poder político-religioso, permitiram que houvesse uma nova
configuração na produção social. Deu-se origem assim ao processo de exploração
(por meio dos tributos) que era a realização concreta da participação diferenciada
dos homens no processo de produção, distribuição e apropriação da riqueza,
possibilitando que houvesse então as condições necessárias para o surgimento das
cidades.
Na visão de Marx e Engels, o início de um processo de produção
social do espaço que permitiu a ocorrência então de duas formas de trabalho: o
material (responsável pela produção de alimentos, etc.) e o espiritual (responsável
pela proteção “contra ataques de bárbaros” e pela orientação religiosa), fornecendo
elementos para a separação entre campo e cidade.
Com a formação das cidades e a divisão social do trabalho, ocorreu o
surgimento de funções diferenciadas, com a necessidade de administração,
proteção, cobrança de impostos, etc. Todas essas atividades levaram uma
organização comunitária, que por necessidade estabeleceu uma organização
política.
Marx e Engels (2004) apontam que foi nesse período que, pela primeira
vez, a sociedade sofreu uma divisão em duas grandes classes e segundo os autores
esta divisão se assenta diretamente na divisão do trabalho e nos instrumentos de
produção. Marx e Engels contribuem bastante para elucidar a distinção entre o
campo e a cidade quando assinalam que:
A cidade é de fato o local da concentração da população, dos instrumentos
de produção, do capital, dos prazeres e das necessidades, enquanto o
campo mostra exatamente o fato oposto, isto é, o isolamento e a dispersão.
(2004, p. 83).
Sobre as primeiras cidades é importante demonstrar que as mesmas
tiveram suas localizações determinadas pelas condições naturais, que neste
momento histórico de início das primeiras aglomerações urbanas o nível de
tecnologia não permitia a superação de algumas limitações impostas pelo meio-
ambiente. Sposito demonstra que algumas características são comuns as primeiras
civilizações urbanas:
As mais antigas cidades tinham em comum, além da localização nos vales
de grandes rios, uma organização dominante, de caráter teocrático (o líder
era rei e chefe espiritual), e um traço na sua estruturação interna do espaço;
a elite sempre morava no centro. (1989, p. 18).
O importante é compreender o surgimento das cidades não pela sua
localização geográfica e configuração física, mas pelas relações sociais que se
estabeleceram num primeiro momento relacionada com o excedente da produção
agrícola que permitiu que parcela da sociedade se dedicasse a outras funções.
nesse momento, houve uma dominação do urbano sobre o não-urbano e de uma
classe social sobre as demais, fazendo que a cidade surjisse então como o espaço
não da produção em si, mas da dominação.
Do ponto de vista marxista, com a formação das primeiras cidades e com
o estabelecimento da propriedade privada (na cidade), ocorreu o surgimento das
classes sociais ocasionando uma divisão social do trabalho onde o indivíduo ficou
subordinado a uma atividade que lhe foi imposta transformando os indivíduos das
cidades em animais urbanos que produziam diariamente conforme o interesse da
classe dominante. Fica evidente que a propriedade privada possibilitou a exploração
do trabalho humano como dado fundamental para a manutenção dessa forma de
produção social.
2.2 HISTÓRICO DO PLANEJAMENTO URBANO
Pistas de que as civilizações humanas têm trabalhado com planejamento
nas cidades em escala limitada remonta a 3500 a.C. e muitos historiadores
consideram os gregos como os primeiros a adotar práticas de planejamento urbano,
utilizando teorias sobre o uso ideal da terra e da localização de ruas e edifícios nas
cidades. (HALL, 2004).
A noção de “cidade” e “vila” não se confunde na visão grega
1
. Porém, a
idéia de cidade surge numa sociedade rural onde, fazem parte da cidade tanto os
citadinos quanto os camponeses. Esse conceito abstrato de cidade demonstra por
que tão tardiamente os gregos vão se interessar pelos problemas das cidades.
Durante muito tempo, os gregos que se interessam pela cidade o fazem
somente na perspectiva da filosofia política e da moral. Hipócrates foi o primeiro
pensador grego a encarar a cidade estudando os efeitos do ambiente urbano de
forma sistematizada, isto é, a fazer uma abordagem das relações
sociedade/natureza
2
. Mas, foi com Platão e Aristóteles que surgiu uma verdadeira
reflexão sobre o espaço urbano. Platão expôs em Crítias e principalmente nas Leis
os princípios que deveriam comandar a instalação material da cidade ideal. Ele se
preocupava em escolher sítios que apresentassem salubridade, vantagens
econômicas e um clima psicológico e moral favorável a sua instalação. Fixou
também o número ideal de habitantes em 5.040 pessoas (HAROEUL, 1998).
Mas foi Aristóteles que apresentou uma grande preocupação com o
concreto, que se tornou o grande teórico dos estudos urbanos, ou seja, percussor do
planejamento urbano. Ele aconselhava a escolha de um sítio que além de salubre,
apresentasse também facilidade de transporte, tanto para o campo quanto para o
1
A cidade (polis) é antes de tudo uma comunidade de cidadãos, uma associação de caráter moral,
político e religioso. A vila era entendida como um lugar que tivesse algumas casas aglomeradas com
certa proximidade
2
Hipócrates estudou os efeitos do ambiente urbano (sítio, localização, natureza do solo, regime dos
ventos...) sobre os habitantes, tanto no aspecto físico quanto no aspecto moral.
mar. Demonstrava preocupação com as qualidades defensivas e recomendava
separar a água potável daquela de uso comum. Sobre a estrutura urbana, defendia
uma especialização dos bairros segundo sua função: comercial ou artesanal,
residencial, administrativo, religioso. Ele preconizava especialmente a criação de
duas praças bem distintas, uma reservada à vida pública e a outra consagrada às
atividades comerciais. (HAROUEL, 1998).
Aos muçulmanos são muitas vezes creditadas as criações do
zoneamento, criando zonas especificas para estabelecimentos comerciais,
residenciais, cultos religiosos, entre outros.
A Civilização do Vale do Indo também é reconhecida como uma das
primeiras civilizações a desenvolver o senso de planejamento urbano, por volta de
2600 a.C. ali, algumas pequenas vilas cresceram até se transformarem em grandes
cidades, contendo milhares de pessoas que, por não trabalharem primariamente na
agricultura, criaram uma cultura unificada. O repentino aparecimento dessas
grandes cidades, bem como o crescimento e a formação organizada destas cidades,
parece ser o resultado de um esforço planejado e deliberado (HALL, 2004).
Habitantes de cidades da antiguidade criaram certas áreas destinadas
para encontros, recreação, comércio e culto religioso. Muitas possuíam muralhas em
sua volta, com objetivo de impedir o acesso de possíveis inimigos. A construção de
prédios públicos e monumentos são outros exemplos de planejamento urbano nos
tempos antigos, dos quais, as cidades mais famosas são Roma e Atenas.
na idade média muitas cidades e feudos eram protegidos por muros.
Com o crescimento populacional, muitas dessas cidades aumentaram
significativamente suas populações. Para solucionar os problemas decorrentes
desse crescimento, algumas cidades derrubavam seus muros construindo outro
numa área maior e outras simplesmente deixavam seus muros antigos de pé,
construindo ao redor da antiga cidade.
A religião fazia parte integral da vida pública, cultural e social da Europa
da Idade Média, fato este que também se fez presente em diversos outros pontos do
mundo e isto se refletiu nas cidades da época onde, na maioria das vezes, a
principal igreja estava localizada no centro da cidade e era a maior e a mais alta das
estruturas. Essa realidade também pôde ser observada no Brasil e em diversos
países latino-americanos.
Durante o Renascimento, um período de grande desenvolvimento
artístico, planejadores urbanos desenhavam partes de uma cidade em grande
escala, criando grandes áreas para solucionar a super lotação de tempos antigos.
Um exemplo de uma área que foi planejada, antes de ter sido construída,
é o Palácio de Versailles, na França, uma mini-cidade por si mesma (CHOAY, 2003).
Alguns artistas conhecidos, como Leonardo da Vinci e Michelangelo, por
exemplo, desenharam e ajudaram a embelezar algumas cidades italianas, no século
XV e XVI, enquanto Georges Eugene Haussmann planejou grandes avenidas e
praças, em Paris, no século XIX.
Algumas cidades dos Estados Unidos, na América colonial foram
planejadas antes de terem sido construídas. Exemplos incluem Charleston, Filadélfia
e Savannah. O exemplo mais famoso, porém, é o da cidade de Washington DC, a
atual capital do país. George Washington contratou Pierre Charles L’Enfant, um
arquiteto francês, para planejar a cidade (CHOAY, 2003).
Com o avanço da Revolução Industrial, no século XIX e a criação de
fábricas, a população de muitas cidades européias e americanas começaram a
aumentar rapidamente, recebendo milhares de pessoas vindas dos campos,
abandonando trabalhos nas áreas rurais, para trabalhar na indústria. Isto fez com
que as cidades da época ficassem superlotadas, sujas e barulhentas. Muitas
pessoas viviam em bairros que possuíam péssimas condições sanitárias, com
famílias vivendo espremidas em casas de um ou dois cômodos, perto das fábricas
(HALL, 2004).
Reformistas sociais começaram a pedir aos governos que melhorassem
tais condições precárias de vida, sugerindo novos zoneamentos, com casas, jardins
e áreas verdes. Também sugeriram a separação de zonas industriais e residenciais,
iniciando o processo de zoneamento e segregação das cidades. Várias
municipalidades e governos tomaram algumas medidas para melhorar a salubridade
com o objetivo de possibilitar melhor qualidade de vida nas cidades, mas à medida
que elas continuavam a crescer rapidamente, as poucas medidas tomadas foram
insuficientes para surtir algum efeito.
Planejadores urbanos tentaram mostrar a imagem de uma cidade ideal,
na Feira Mundial de Chicago, em 1893. Largas e grandes avenidas, com grandes
estruturas públicas eram dois dos muitos aspectos numa cidade ideal. A exposição
marcou o início do movimento City Beautiful, nos Estados Unidos (HALL, 2004).
Até o final do século XIX, o planejamento urbano, na maioria dos países
industrializados, era de responsabilidade de arquitetos, geralmente contratados por
empresas particulares ou, raramente, pelo governo. Mas o crescimento dos
problemas urbanos durante o final do século XIX forçou governos de muitos países,
em especial dos Estados Unidos, a participar mais ativamente no processo de
planejamento urbano.
O movimento moderno na Arquitetura e no Urbanismo pregava que a
atividade de planejar as cidades era matéria de ordem eminentemente técnica e
que, portanto, possuía a neutralidade política inerente ao trabalho científico. Tal
pensamento se formalizou especialmente com os trabalhos dos CIAM Congressos
Internacionais da Arquitetura Moderna e, especialmente, com a Carta de Atenas.
Reflexos deste pensamento urbanístico podem ser observados em projetos de
novas áreas de expansão urbana totalmente desvinculados das necessidades
efetivas das comunidades que morariam. O plano-piloto da cidade de Brasília é
considerado o exemplo mais perfeito deste tipo de urbanismo modernista (HALL,
2004).
Entre 1900 e 1930, muitas cidades nos Estados Unidos introduziram
comissões de planejamento urbano e leis de zoneamento. Um dos mais famosos
planos de revitalização urbana desse período foi o Plano Burhan, que revitalizou
uma grande parte da cidade de Chicago.
A explosão populacional iniciada a partir da década de 1950 criou
problemas como congestionamentos, poluição, aparecimento ou crescimento de
favelas e falta de moradia. Para vencer os novos desafios dessas cidades em
crescimento, agências de planejamento urbano precisaram expandir seus
programas, incluindo novas residências, áreas recreacionais e melhores distritos
comerciais e industriais.
No entanto, o que se pode observar é que ao longo da evolução das
cidades muitas foram as formas de intervenção sobre o espaço urbano,
principalmente após o capitalismo. Porém não podemos deixar de destacar a
importância dos diferentes agentes sociais que estabelecem uma forma bastante
complexa e que realizam um constante processo de reprodução social que se
com a incorporação de novas áreas ao espaço urbano, densificação do uso do solo,
deterioração de certas áreas, renovação urbana, relocação diferenciada da infra-
estrutura e mudança, coercitiva ou não, do conteúdo social e econômico de
determinadas áreas da cidade. (CORRÊA, 2002).
É preciso considerar que mesmo com cada nova transformação ocorrida
no espaço urbano, ainda que esta produza alteração das formas espaciais e
mudanças de funções, ela mantém as desigualdades sociais, deixando claro que a
busca tecnocrata dos planejadores urbanos pelo equilíbrio social e da produção
espacial na maioria das vezes não passou de um discurso impregnado de ideologia.
Corrêa contribui com alguns questionamentos sobre os quais é possível
identificar os agentes sociais que produzem a cidade. Como por exemplo, “Que
estratégias e ações concretas desempenham-se no processo de fazer e refazer a
cidade?”. E segundo o autor estes são os agentes que produzem o espaço urbano:
a) os proprietários dos meios de produção, sobretudo os grandes
industriais; b) os proprietários fundiários; c) os promotores imobiliários;
d) o Estado; e d) os grupos sociais excluídos. (2002, p. 12).
Para entendermos os papéis de cada agente social na construção do
espaço urbano é preciso recorrer às proposições de Marx e Engels, ao considerar a
propriedade privada no espaço urbano e a ação do Estado que não é neutro,
refletindo os interesses dos proprietários que se beneficiam de transgressões que
beneficiam os agentes dominantes que se utilizam da ação de um marco jurídico
regulando sua atuação.
Segundo Marx e Engels (2004) o Estado capitalista é fortemente
influenciado pela classe dominante de tal modo que ficou completamente sob o
controle por meio da dívida pública, no qual a sua existência está associada aos
movimentos de alta e baixa do mercado nas bolsas de valores, em que os
burgueses são controladores do crédito comercial. A burguesia, enquanto classe
dominante organizou-se não mais apenas localmente, mas de modo que seus
interesses ganharam proporções universais.
Para entendermos de forma mais clara a relação de dependência
existente entre o Estado e os proprietários privados, Marx e Engels expõem que:
que o Estado, pois, é a forma pela qual os indivíduos de uma classe
dominante fazem valer seus interesses comuns e na qual se resume toda a
sociedade civil de um período, segue-se que todas as instituições comuns
são mediadas pelo Estado e dele adquirem uma forma política. Daí a ilusão
de que a lei se baseia na vontade e, mais ainda, na vontade livre, destacada
de sua base real. Do mesmo modo, o direito é reduzido, por seu turno, a lei.
(2004, p. 98).
O Estado atua então, de modo a criar condições necessárias para a
realização e reprodução da sociedade capitalista, isto é, propicia maneiras em que
ocorram os mecanismos para viabilizar o processo de acumulação e a reprodução
das classes sociais e suas frações. Como resultado disso, podemos observar a
segregação residencial que resulta também de ações diretas e explicitas onde o
Estado, por meio do planejamento, cria áreas residenciais que formam novas áreas
urbanas. (CORRÊA, 2002)
Atualmente, o planejamento urbano de uma cidade é geralmente feito por
acordos entre agências governamentais e empresas privadas, especialmente nos
países desenvolvidos. Nos países subdesenvolvidos, porém, o planejamento urbano
passa por um momento de redefinição. Se, por um lado, tais países atravessaram
longos períodos de planejamento centralizador e autoritário, não raro resultando em
periferias urbanas espraiadas, estruturadas por projetos residenciais movidos mais
pelo caráter quantitativo que pelo qualitativo. Nas últimas décadas, o planejamento
urbano no Brasil, por exemplo, tem procurado colocar-se como possível mediador no
conflito social pelo solo urbano. O foco do planejamento, pelo menos
academicamente, deslocou-se do regulamento do uso e ocupação do solo para o
tratamento dos processos especulativos de produção do espaço urbano, colocando-
se contra ou a favor deles.
Surge d a idéia de planejamento urbano participativo no qual as
decisões são tomadas num processo democrático no qual o profissional não assume
mais o papel de “autor do plano”, mas de “condutor do processo”. Contrariamente a
esta tendência, teóricos internacionais, normalmente associados ao Neoliberalismo,
propõem o que se convencionou chamar de planejamento urbano estratégico, que
procura tratar as cidades sob a lógica da guerra fiscal e de sua localização na
suposta nova rede de cidades globais.
Portanto, para que ocorra realmente um planejamento que atenda as
necessidades da população e visualize enquanto fenômeno social é necessário que
o Estado atue de forma a propiciar os canais de participação da comunidade,
possibilitando que ocorra de forma efetiva o processo de democratização na política
urbana das cidades, em particular, as brasileiras.
2.3 REFLEXÃO SOBRE O ESPAÇO URBANO DE HOJE A PARTIR DA
VISÃO DE HENRI LEFEBVRE
Entender as cidades de hoje parece ser uma missão bastante complexa,
devido à separação que é feita no modo de pensar a cidade: ora como quadro físico,
ora como ambiente urbano. Como a cidade toma forma e conteúdo a partir da
prática sócio-espacial que nela se realiza, o geógrafo, enquanto pesquisador, deve
buscar a compreensão da cidade, tanto do ponto de vista prático, quanto da
teorização que auxilia sobremaneira a interpretação e a elucidação dos fenômenos
decorrentes e permitem o aprofundamento sobre a maneira de como ocorrem as
contradições geradas no processo de acumulação capitalista e que se materializam
na forma de segregação urbana.
Deixando evidente que qualquer que seja o foco da pesquisa, o primeiro
passo para a compreensão das crises no espaço urbano é justamente conciliar a
prática à teoria. Para Lefebvre (2002), “a teorização não suprime a problemática do
mundo moderno ela contribui para colocar as questões com mais força”,
demonstrando que, pensar as cidades hoje é, antes de qualquer coisa, pensar numa
dupla dimensão critica: crise prática e teórica.
O que se propõe então é a construção de uma teoria da prática sócio-
espacial que possa desvendar a realidade urbana mais próxima possível da sua
totalidade. No sentido de uma maior compreensão teórica nos apoiamos
principalmente nas obras de Marx e Lefebvre para fazer uma interpretação da
cidade
3
, a partir da análise da prática social, tomando a realidade em movimento
onde a crise, inerente ao processo de reprodução das relações sociais, torna-se
esclarecedora da realidade que se pretende apreender.
Utilizamos como ponto de partida, para fazer uma “interpretação
geográfica do espaço urbano” que a cidade deva ser encarada como uma obra da
construção humana, ou seja, um produto histórico-social, que se materializa na
relação entre a sociedade e a natureza. Assim, o sentido e a finalidade da cidade
enquanto construção histórica se refere ao homem e a realização da vida humana.
3
É importante ressaltar que não é feita aqui uma análise aprofundada sobre a obra de Marx e
Lefebvre, mas é considerada a contribuição desses autores para o estudo sobre a cidade que se
mostra bastante relevante para a Geografia
Para Carlos (2004) quando se faz uma análise da cidade é importante
salientar que, ao produzir sua materialidade, a sociedade produz e reproduz um
espaço. Enquanto prática sócio-espacial, isso torna indissociável o espaço e a
sociedade, ou seja, as relações sociais se estabelecem num lugar real e concreto.
Esta produção pode ser vista, vivida e percebida, na criação dos diferentes lugares.
O homem se apropria da natureza, enquanto apropriação do espaço tempo
determinado, que possibilita a reprodução da sociedade. Tornando-o assim, aspecto
fundamental da reprodução da vida.
O processo de produção aqui vai além da criação de objetos, mas sim de
um processo real, amplo e profundo, como conjunto de relações diversas
estabelecidas entre os indivíduos da sociedade e, nesse processo, produz um
espaço em sua dimensão prática. Mas a produção se abre para a reprodução e,
nessa direção, sinaliza o processo de desenvolvimento da sociedade, revelando o
profundo dialético homem-natureza.
Nesta perspectiva a noção de produção supera o plano do econômico,
pois a cidade abriga os processos de troca, constituição e ampliação do mundo da
mercadoria. Por meio dos seus fluxos cotidianos apontando, no lugar, a realização
da vida, como prática sócio-espacial. A cidade pode ser entendida então como
produto, condição e meio para a reprodução das relações, produtoras da vida
humana, no sentido amplo de reprodução da sociedade. O que evidencia a
perspectiva de compreensão de uma totalidade que não se restringe ao plano
econômico, possibilitando um entendimento de sociedade que pressupõe uma
totalidade, mudando os termos da análise urbana.
Para Lefebvre (1991) a análise do espaço urbano transcende a análise da
produção de mercadorias ou mesmo a vida do cidadão em seu trabalho, pois
estaria, também, relacionada com a vida cotidiana em todos os seus momentos
trabalho, lazer, vida privada. Desta maneira se pode compreender as relações
sociais a partir de todas as atividades que são desenvolvidas pelo cidadão e que são
indispensáveis para que a cidade possa ter sentido para o individuo, pois é a partir
dessas relações que ele estabelece uma identificação com o lugar. Assim, o cidadão
se apropria da cidade principalmente pelo seu valor de uso.
A análise da reprodução da cidade no mundo moderno sinaliza para a
articulação indissociável de três planos: o econômico, o político e o social. Essas
três dimensões apresentam como pano de fundo o processo de mundialização,
enquanto constituição de uma sociedade urbana. Mostrando a tendência ao
processo de generalização da urbanização, apontando uma contradição entre as
“persistências” e o “novo” é revelado um movimento triádico: preservação
degradação transformação, como característica do processo de formação da
cidade, nos dias atuais. Porém, cabe ressaltar que embora as contradições entre
persistências e o novo; quanto ao movimento triádico não são excludentes entre si,
podendo ocorrer simultaneamente com associações de um ou outro elemento como,
por exemplo, degradação e transformação ou preservação e transformação.
Esse processo de reprodução que hoje ocorre na cidade deve ser
entendido a partir das mudanças, bastante significativas, ocorridas desde a metade
do século XX, com o domínio do capitalismo financeiro que incorporou novos
espaços à economia mundial.
Santos (1999) contribui, de forma significativa, para a compreensão desta
etapa, expondo que a criação de um sistema de integração global, denominado por
ele como meio técnico-científico-informacional, abriu-se a possibilidade para
estabelecer uma relação de dominação que apontou para uma generalização da
produção e do consumo, graças à junção da tecnologia e da ciência, capazes de
organizar a formação de um mercado global. Neste momento, o que ocorreu foi um
processo de reprodução das relações sociais que se estabeleceram no plano
mundial, obedecendo à lógica da reprodução do capital, por meio das técnicas
empregadas na produção e que dominaram o espaço, transformando-o num espaço
de poder.
Nesse contexto, a vida cotidiana se transforma em uma rotina organizada,
no tempo e no espaço, transformando os usos dos espaços, onde passam a
predominar as relações profissionais e institucionais e modificam as relações dos
habitantes com o lugar e no lugar, redefinindo a prática sócio-espacial. Nesta
condição, o espaço visto como mercadoria sofre mudanças e readaptações de usos
e funções que lhe conferem novos valores e possibilitam o desenvolvimento do
capitalismo estendendo-se cada vez mais ao espaço global. O espaço, enquanto
mercadoria propicia um fluxo de capitais, associado a uma nova lógica de
dominação do espaço que se reproduz ordenando e direcionando cada ocupação,
fragmentando e tornando os espaços trocáveis a partir das operações de mercado.
Essa reconfiguração do espaço é denominada por Benko (2001) como:
“deslizamento de escala”, para designar as tensões geradas principalmente a partir
do processo de globalização, que faz com que a sociedade urbana passe por um
processo contraditório onde, ao mesmo tempo em que ocorre uma homogeneização
dos diferentes espaços, se estabelece um processo de fragmentação tanto do
espaço urbano quanto do individuo. Esta fragmentação provoca uma hierarquização
dos lugares e das pessoas, gerando uma articulação entre estrutura espacial e
social, que vai provocar as formas de segregação urbana, aprofundando as
contradições entre o centro e a periferia.
O grande desafio posto pela obra de Lefebvre, no que diz respeito à
análise urbana, é que o caminho para uma possível superação dos problemas
postos pela urbanização devam ser entendidos no campo do processo de
reprodução geral da sociedade. Carlos indica a noção de produção enquanto criação
do ser humano, quando expõe que:
[...] Lefebvre nos coloca diante da idéia de que o modo de produção precisa
se produzir, uma reprodução que não coincide com a produção dos meios
de produção; mas se efetuaria também em outros planos colocando-nos
diante das novas produções capazes de explicitar o mundo moderno: o
espaço, o urbano, o cotidiano (cotidianeidade). (2004, p.28).
Essas novas produções se confrontam com persistências, apontando
para novas possibilidades, pois surge então no seio da sociedade, conflitos e
contradições que se manifestam. Pois, para Lefebvre, o grande desafio de nosso
tempo é, justamente, a dualidade entre as novas relações com permanências de
antigas; mostrando ao mesmo tempo em que ocorre uma certa homogeneização se
reforçam também as diferenças, marcando o fim de uma certa história e o início de
uma historicidade conscientemente dirigida.
Carlos (2004) afirma que o urbano aparece na obra de Lefebvre enquanto
realidade real e concreta e, enquanto virtualidade, onde a crítica confronta o real e o
possível; assim, a cidade, esta indissociavelmente ligada à vida do homem.
Lefebvre (1999) atenta para o fato de que a obra de Marx trata a questão
urbana sob a perspectiva econômica, reduzindo a realidade urbana a assuntos de
renda da terra. Para ele, no entanto, os problemas urbanos a precisam ser
encarados como problemas que devem ser entendidos no processo de reprodução
geral da sociedade, para se chegar a um caminho que torne possível a solução da
problemática da urbanização. O autor nos coloca uma nova idéia de pobreza e
riqueza e as relações sociais na vida cotidiana, onde haja uma intervenção dos
interessados na realização da vida em sua prática sócio-espacial.
O caminho que Lefebvre nos conduz, segundo Carlos (2004) é o de
interpretar o sentido da cidade enquanto obra da humanidade em um amplo sentido,
ou seja, enquanto obra da civilização, permitindo fazer uma leitura através da
história e de nossa condição de mundo moderno, incluindo a idéia de um projeto
para a sociedade. O desafio é pensar a prática sócio-espacial com o sentido das
apropriações reais e possíveis, bem como da luta em torno delas. A cidade é o lugar
das coações, mas também da liberdade, demonstrando que “a cidade é produto do
possível”.
2.4 O URBANISMO
Compreender a dualidade do significado do termo urbanismo
4
é uma das
formas de entender a ambigüidade no modo de interpretá-la, pois esse termo pode
ser entendido como uma realidade muito antiga que se denomina de “arte urbana” e,
portanto, tão velha quanto à civilização urbana. E a outra que se refere a este termo
utilizado a partir do final do século XIX, quando surgiu como uma disciplina que se
apresentava como ciência pretendendo, assim, apresentar uma teoria sobre a
cidade “distinguindo-se das artes urbanas anteriores pelo seu caráter reflexivo e
crítico e pela sua pretensão científica” (CHOAY, 2003).
Dentro desta segunda interpretação, onde o urbanismo é utilizado como
ciência, ele “funciona” como uma atividade de estudo, regulação, controle e
planejamento da cidade (em seu sentido amplo) e da urbanização. O termo nasceu
em decorrência da Revolução Industrial que se iniciou na Inglaterra a partir do
século XVIII, quando foi lançada toda uma população operária nas cidades que não
estavam preparadas para acolhê-las. Resultando, numa proliferação de cortiços,
onde as famílias amontoavam-se em locais sem nenhum conforto e salubridade. O
urbanismo é utilizado, desde então, como uma ciência humana aplicada, inserida no
contexto de um mundo em constante crescimento demográfico e respondendo a
4
Este termo foi utilizado pela primeira vez em 1867 pelo arquiteto espanhol Cerda, na sua Théorie
genérale de L’urbanisation, tradução francesa, Paris, 1979.
uma forte pressão de civilização e urbanidade, enfrentando suas demandas e
problemas (HAROUEL, 1998)
De acordo com Lacaze (1993) sempre que a necessidade de se
intervir no espaço urbano, utilizasse a palavra “Urbanismo”, que em geral é
empregada para denominar uma área de conhecimento ou uma técnica de
intervenção nestes espaços, que se apresenta como uma ciência para planejar e
organizar as cidades, porém, na prática isso não ocorre que faltam elementos
essenciais para solucionar a complexidade do espaço urbano somente por meio da
intervenção técnica utilizada pelo urbanismo.
É comum ouvir falar em “planos de Urbanismo”, “Urbanismo Moderno”,
“Código de Urbanismo e Obras”, etc. Deste modo, o termo sugere uma certa
complexidade e gera distorções em suas diversas aplicações, sem uma discussão
em torno do seu conceito, sua epistemologia. Porém sabe-se que este termo
aparece historicamente, e geralmente, empregado quando há referências à
elaboração de conjunto de propostas de intervenção física no espaço urbano,
especialmente no seu traçado, para o seu embelezamento ou melhoria da infra-
estrutura especialmente, ou para melhorar o saneamento e a circulação, utilizando-
se de técnicas de arquitetura ou de engenharia. Demonstrando haver somente o
emprego de técnicas que se ocupam em tornar as cidades funcionais,
desconsiderando seu aspecto social.
O urbanismo aplicado como ciência teve seu início no final doculo XIX,
utilizando-se de diversos elementos para intervir no espaço urbano. Segundo os
urbanistas (na sua maioria arquitetos), o mesmo alcançou um maior conteúdo e
uma maturidade teórica no final do século XX, adquirindo status de área autônoma
de conhecimento recentemente (BONNET CORRERA, 1989).
O urbanismo enquanto ciência surgiu então para buscar soluções para os
problemas da cidade, porém se tornou ineficiente na medida em que buscava
soluções imediatistas para resolvê-los, trazendo contribuições somente de ordem
estrutural e não visualizando as cidades enquanto fenômeno social, deixando claro
que somente a intervenção no aspecto físico é incapaz de solucionar os problemas
que afetam as cidades.
Existem várias versões para o surgimento do termo “Urbanismo”, porém a
mais difundida é de origem francesa. Segundo BARDET (1990) este termo surgiu
por volta de 1910, na França, no Bulletin de la Societé Geographique para
denominar uma “nova ciência” que se diferenciava das artes urbanas anteriores por
seu caráter crítico e reflexivo e pela sua pretensão científica, sendo
epistemologicamente, o estudo da cidade (urbe, do latim significa cidade). Alfred
Agache, um arquiteto (ou arquiteto-urbanista) se autodenomina como criador do
termo (AGACHE,1931).
O urbanismo se define, oficialmente como a atividade que “traça a
ordenação dos estabelecimentos humanos no território com traços de pedra,
cimento ou de metal”. (LEFEBVRE, 1999, p.139). Porém ele aponta para o fato de
que a prática dos urbanistas aparece como arte e ciência, técnica e conhecimento.
No entanto, demonstra que faltam elementos conceituais que permitem uma critica
radical por parte dos mesmos, demonstrando o seu esvaziamento no plano teórico,
pois na falta de um método dialético, não se pode dominar o duplo processo,
altamente complexo e conflitual: industrialização e urbanização.
Lefebvre (1999) demonstra também que o urbanista pretende substituir a
prática urbana, mas observa que estes não a estudam e atuam por conseqüência
em um campo cego, pois se encontram nele e mesmo assim, não se reconhecem
como tais, deixando evidente que não levam em consideração as representações do
espaço, da vida social, dos grupos e das suas relações. Atuando de forma
puramente técnica, racional sobre o espaço e desprezando a representação
ideológica.
Numa perspectiva simplista, o urbanismo corresponde à ação de projetar
e ordenar as cidades. No entanto, sob um ponto de vista mais amplo, o urbanismo
pode ser entendido tanto como um conjunto de práticas ou de idéias, quanto como
uma forma ideológica que visa reproduzir as condições gerais do modo de produção
capitalista. Segundo este ponto de vista, atualmente tanto o capital quanto o Estado
se apropriam da prática e teoria do urbanismo como um mecanismo gerador de
lucro.
O urbanismo reduz o usuário, morador da cidade, ao simples papel de
habitante, vendo-o somente como uma peça que simplesmente movimenta esse
mecanismo capitalista. Deixando de lado as relações sociais que se estabelecem
nesse espaço e principalmente ignorando a vida social, conferindo a este espaço
somente o valor de troca, possibilitando a estratégia do lucro, tão peculiar no mundo
da mercadoria.
Enquanto representação, o urbanismo não passa de uma ideologia que
se considera e se proclama arte, técnica e ciência, conforme os casos e as
conjunturas. No entanto, o mesmo se apresenta como um modo de intervenção no
espaço urbano, por projetos urbanísticos, em geral mascarado por técnicas e pelo
abuso do tecnicismo que apresenta somente uma gica e coerência imposta pelo
poder do Estado, vazia do ponto de vista do conhecimento da organização social.
Nas palavras de Lefebvre (1999) o urbanismo é tão somente uma superestrutura da
sociedade neo-capitalista, ou seja, ele dirige o consumo do espaço e do habitat.
2.5 O PLANEJAMENTO URBANO
O planejamento urbano é o processo de criação e desenvolvimento de
programas que buscam melhorar ou revitalizar certos aspectos (como a qualidade
de vida da população) dentro de uma área urbana ou do planejamento de uma nova
área urbana em uma região, tendo como objetivo propiciar aos habitantes a melhor
qualidade de vida possível. O planejamento urbano, segundo um ponto de vista
contemporâneo é entendido, tanto como disciplina acadêmica, quanto método de
atuação no ambiente urbano. E lida basicamente com os processos de produção,
estruturação e apropriação do espaço urbano.
A interpretação destes processos, assim como o grau de alteração de seu
encadeamento, varia de acordo com a posição a ser tomada no processo de
planejamento e principalmente com o poder de atuação do órgão planejador (LE
CORBUSIER, 2004).
A urbanização na Europa no século XIX esteve associada ao processo de
industrialização, fato que propiciou um rápido crescimento populacional que gerava
uma grande procura por espaços e o acesso a uma parcela de terra nas cidades
estando mediado, pela compra ou aluguel de terreno, com construções ou não.
Como conseqüência disto, houve um adensamento habitacional muito grande. O
crescimento das cidades tornou centro a área antes compreendida por todo o núcleo
urbano, formando-se ao seu redor uma faixa nova, considerada a periferia. Cem
anos após a Revolução Industrial, o chamado centro guardava a sua estrutura
original com densidade populacional elevadíssima.
A periferia era entendida como uma espécie de território livre da iniciativa
privada onde de forma independente, surgiram bairros de luxo, bairros pobres,
unidades industriais maiores e depósitos. Havendo nesse momento um abandono
das formas de controle público sobre o espaço construído. O Estado não elaborava
mais planos, nem regulamentos e nem fiscalizava as formas pelas quais a cidade
vinha sendo produzida. SPOSITO demonstra a forma pela qual a cidade era
construída, guiada somente pelos interesses do lucro:
Benévolo chama de cidade liberal “… este ambiente desordenado e
inabitável que é o resultado da superposição de muitas iniciativas públicas e
particulares, não-reguladas e não-coordenadas”. (1989, p. 56)
A cidade era a própria desordem e na primeira metade do século XIX
percebia-se a quebra de uma certa homogeneidade do seu padrão arquitetônico, era
o fim da cidade como ambiente comum. O desenvolvimento capitalista e os
inúmeros “problemas” urbanos advindos da rápida industrialização incentivaram o
comportamento individual e a separação espacial das classes sociais dentro da
cidade: os bairros pobres e os bairros ricos.
Os problemas não eram, portanto da cidade, eram do próprio modo de
produção e se manifestava na cidade. Não podendo perdurar por muito tempo
porque começou a incomodar até mesmo os mais ricos. A falta de condições
sanitárias permitiu o alastramento de um surto de cólera pela Europa em 1830.
Todos esses fatores fizeram com que as classes dominantes viessem a pressionar o
Estado a atuar diretamente no espaço urbano que assumiu esta atribuição.
a segunda metade do século XIX foi marcada pela aprovação de leis
sanitárias, implantação de redes de água, esgoto, gás, eletricidade, telefone e de
melhorias nos percursos (ruas, praças, estradas de ferro). O poder público
estabeleceu regulamentos e executou obras. A administração pública passou a
gerir/planejar os espaços urbanos (SPOSITO, 1989).
Harouel (1990) afirma, que com o avanço da técnica e da industrialização,
a visão tradicional é superada, multiplicando-se os problemas com os quais uma
cidade se depara. Crescimento demográfico, condições de habitação da população
operária e enriquecimento global da sociedade que se traduz pelo fato de que cada
um se beneficia de um espaço mínimo cada vez mais significativo, de objetos
materiais cada vez mais numerosos e complexos e de uma quantidade crescente de
prestação de serviços. Com essa configuração e diante desses problemas, se fez
necessário uma política de planejamento urbano que direcionasse ações públicas no
sentido de possibilitar um melhor ordenamento na produção da cidade.
Os planejadores urbanos trabalham tradicionalmente junto das
autoridades locais, geralmente para a municipalidade da cidade, embora nas últimas
décadas tenham se destacado profissionais que trabalham para organizações,
empresas ou grupos comunitários que propõem planos para o governo. O dia-a-dia
de um planejador urbano inclui principalmente melhorias na qualidade de vida dentro
de uma certa comunidade. (CHOAY, 2003).
Uma idéia muito comum, segundo Choay (2003), é a de que os
planejadores urbanos trabalham principalmente com o aspecto físico de uma cidade,
no sentido de sugerir propostas com o objetivo de embelezá-la e fazer com que a
vida urbana seja mais confortável, proveitosa e saudável possível. Porém, o trabalho
de planejamento envolve especialmente o contato com o processo de produção,
estruturação e apropriação do espaço urbano e não apenas sua configuração a
posteriori, como quer a afirmação anterior. Sob este ponto de vista, os planejadores
são atores de um perpétuo conflito de natureza eminentemente política e, por este
motivo, seu trabalho não deve ser considerado neutro. Também precisam prever o
futuro e os possíveis impactos, positivos e negativos, causados por um plano de
desenvolvimento urbano que por vezes não favorecem ou contrariam os interesses
econômicos dos grupos sociais para os quais trabalham.
2.6 URBANISMO VERSUS PLANEJAMENTO URBANO
Uma definição precisa do que seja o planejamento urbano
necessariamente passa pelo trabalho de localizá-lo, enquanto disciplina, em relação
ao urbanismo. Tanto o planejamento urbano quanto o urbanismo são entendidos
como estudos do fenômeno urbano em sua dimensão espacial, mas diferem
notadamente no tocante às formas de atuação no espaço urbano. Desta maneira, o
urbanismo trabalha, historicamente, com o desenho urbano e o projeto das cidades,
em termos genéricos, sem necessariamente considerar a cidade num processo
social conflitivo, enquanto que o planejamento urbano, antes de agir diretamente no
ordenamento físico das cidades, trabalha com os processos que a constroem (ainda
que indiretamente, sempre atue no desenho das cidades) (HALL, 2004).
A questão da definição clara e distinta das duas disciplinas complica-se
de fato quando se procura a sua história. É um consenso, no meio acadêmico, que o
urbanismo seja tratado apenas como disciplina autônoma a partir do século XIX e
que o planejamento urbano surja como matéria de interesse acadêmico apenas no
século XX, mas também é fato que as cidades são planejadas e desenhadas desde
o inicio da civilização.
O planejamento urbano é a atividade, por excelência, multidisciplinar,
enquanto que o urbanismo se caracteriza como disciplina autônoma, especialmente
do ponto de vista profissional. Porém, os limites entre o planejamento urbano e o
urbanismo são pouco claros na prática: intervenções urbanísticas na cidade são
comumente tratadas como “obras de planejamento”, enquanto que atividades típicas
do planejamento (como a criação de um plano diretor), o eventualmente tratadas
como “obras de urbanismo” (CHOAY, 2003).
Souza (2004) demonstra que em países onde existe uma cultura de
planejamento sedimentada, o planejamento urbano se faz por diferentes
profissionais, contribuindo não arquitetos, mas também cientistas sociais de
diversas formações, onde segundo ele destacam-se os geógrafos. No entanto, no
Brasil é comum as pessoas associarem a prática do planejamento das cidades
somente aos arquitetos. Aqui ocorre um equívoco, pois os arquitetos (urbanistas)
formam um dos vários grupos de profissionais ligados ao planejamento urbano e que
praticam uma modalidade especifica dentro deste.
Urbanismo e planejamento urbano não são, portanto, sinônimos, nem o
primeiro esgota o segundo. No Brasil mesmo planejador com um pensamento
socialmente crítico, costumam confundir as duas coisas. O urbanismo pertence de
fato e de direito, essencialmente, à tradição do saber arquitetônico.
O que em relação a esses profissionais é um olhar bastante distinto,
onde o arquiteto com seus conhecimentos técnicos desenvolve uma outra
perspectiva, ressaltando os aspectos funcionais e a dimensão estética; enquanto
que o cientista social focará seu olhar para as relações e processos sociais
(dimensões política, econômica e cultural) buscando caminhos que promovam uma
mudança social qualitativa (SOUZA, 2004).
Estabelecida à diferença entre as duas disciplinas, deve-se considerar
que isso não significa rivalidade e, muito menos, antagonismo, o aprofundamento do
debate entre si contribuirá para um aprendizado mútuo desses profissionais.
Desta maneira, a história das cidades, ou da urbanização, para sermos
mais precisos, ocorre paralelamente com a história do homem em sociedade,
embora o estudo da intervenção do homem na cidade seja mais recente. A partir do
momento em que se considera que o planejamento urbano lida basicamente com o
conjunto de normas que regem o uso do espaço urbano, assim como sua produção
e apropriação, sua história seria bastante diversa daquela referente ao desenho das
cidades. (CHOAY, 2003).
3 A (RE)DEMOCRATIZAÇÃO E A DESCENTRALIZAÇÃO NO BRASIL
De 1964 a 1985, o Brasil atravessou um período sob regime militar,
marcado por atuação bastante rígida e centralizadora do Estado. Nesse período o
Governo Federal era responsável pela formulação e aplicação das políticas de
planejamento. Esse momento em que a ação do Estado foi muito forte é
denominado de Keynesianista, descrita por Mattos (1997) como a “era de ouro do
intervencionismo”, na qual estava embutida uma questão medular: o funcionamento
espontâneo das economias de mercado desembocariam, quase que
inevitavelmente, no desemprego, razão pela qual devia-se questionar o caráter
automático dos ajustes.
Como conseqüência desse processo, o Estado assumiu a formulação e
aplicação de políticas, tendo como objetivo conduzir o país a um período de
desenvolvimento econômico e social, conforme os objetivos pré-estabelecidos e
planejados.
A crença neste postulado gerou um ambiente favorável para que se
criasse diversos planos de desenvolvimento para o país a fim de potencializar a
administração. Acreditava-se que um corpo técnico bem capacitado, inserido dentro
de uma estrutura ministerial ou de secretarias especiais, seria capaz de resolver os
principais problemas socioeconômicos.
Porém, a partir da década de 1970 predominou um desencanto com o
modelo utilizado até então, questionando a capacidade de intervenção autoritária e
centralizadora do Estado na geração de melhorias para a sociedade. Assim,
debilitou-se a convicção de uma gestão positivista para os sistemas sociais.
Pode ser observado então que, os processos sociais são modulados por
uma multiplicidade de atores que decidem e atuam motivados por diversos valores,
podendo ser contraditórios entre si, mas mostrando que somente ações do Governo
se mostraram incapazes para decidir e atuar sobre sistemas sociais de
complexidade crescente.
nas décadas de 1980 e 1990 aconteceu o processo de
(re)democratização da política brasileira em função do fim do regime militar, fato que
também ocorreu em outros países latino-americanos. Como conseqüência tivemos
uma descentralização na gestão pública, com os municípios passando a atuar de
forma mais direta e efetiva nos problemas relacionados à cidade, fato este que não
ocorria no período anterior (ditadura militar) com forte tendência centralizadora,
marcada pela concentração de poder no executivo federal. Portanto, o
fortalecimento de poder e uma maior autonomia política dos governos estaduais e
municipais, caracterizaram esta nova etapa de (re)democratização do Brasil, que
passou a colocar a descentralização como uma de suas principais bandeiras, no
sentido de assegurar maior eficiência na aplicação das políticas públicas. Após
atravessar um longo período de ausência de transparência na gestão pública, a
sociedade brasileira assistiu, uma crescente demanda por mais participação popular
na administração pública e por mecanismos mais democráticos de gestão.
(HERINGER, 2002).
O cenário no qual se processaram essas mudanças foi influenciado pela
crescente presença de novos atores sociais na cena da política brasileira e
internacional. Principalmente durante a década de 1980 observou-se o surgimento e
a consolidação de diversas organizações da sociedade civil que posteriormente
tiveram importante papel na esfera política brasileira: movimentos sociais
apresentando diferentes tipos de demandas por serviços públicos e equipamentos
urbanos, tais como saúde, educação e moradia; sindicatos de diferentes categorias
procurando influenciar na política tanto dentro quanto fora dos locais de trabalho e
organizações não-governamentais (ONG’s) que se fizeram presentes na luta pela
democratização do espaço público. Essas organizações tiveram um momento de
grande expressão no espaço público durante a Assembléia Constituinte de 1987/88,
quando foi conquistada a garantia de dispositivos importantes na Constituição,
incluindo aí o principio da descentralização (FERNANDES, 1994; LANDIM, 1993).
Nesta etapa de (re)democratização ocorreu o surgimento de um jogo de
poder, em que novos atores sociais passaram a atuar, com a conquista de recursos
políticos e institucionais relevantes – o parlamento, os prefeitos, os governadores, os
movimento populares e as organizações da sociedade civil organizada.
Demonstrando haver a introdução desses novos atores na organização de políticas
públicas, promovendo uma maior dispersão do poder. (SALLUM JR. e
KUGELMANS, 1991).
Podemos observar também que a descentralização acabou por resultar
numa disputa de poder por parte das elites locais, que os recursos institucionais
foram fortalecidos pela retomada da democracia. Anteriormente mesmo quando os
movimentos sociais exerciam suas reivindicações sobre o setor público, não havia
eficácia. O poder público atuava de modo a obter ganhos na execução de obras
públicas sem que houvesse uma prévia discussão com a sociedade, o que tornava
sua atuação pouco transparente. Assim, a descentralização dentro do contexto da
(re)democratização, acabou associada a outros elementos como o aumento do
controle social do Estado, à diminuição do clientelismo, à transparência e maior
democracia no processo decisório e à maior equidade e eficiência na provisão de
serviços públicos (ARRETCHE, 1996).
É importante destacar que, tanto no Brasil, quanto em outros países
latino-americanos a descentralização esteve também relacionada com processos de
crise do chamado estado desenvolvimentista, onde ocorreu a incapacidade do
governo federal de implementar políticas de desenvolvimento, inclusive regionais,
que respondessem as demandas decorrentes dos processos de modernização e
urbanização.
O processo de descentralização está sendo entendido aqui
principalmente no que se refere ao seu aspecto administrativo. Consistindo, nesta
perspectiva, numa estratégia de gestão e execução de políticas de forma a
privilegiar a proximidade entre os executores e o público-alvo atendido.
(ARRETCHE, 1996).
Algumas considerações podem ser feitas no que se refere aos pontos
positivos que a descentralização permite, explicando, justificando e viabilizando sua
implementação, oferecendo vantagens do ponto de vista econômico e social,
destacando-se:
I os benefícios econômicos que a descentralização pode acarretar,
especialmente quando comparado a um estado centralizado cada vez mais incapaz
de satisfazer as necessidades dos cidadãos;
II as alterações tecnológicas, nas técnicas de gestão e nas preferências
reconfigurando o próprio papel do Estado, onde “restam” ou se sobressaem os
serviços que são melhor ofertados por jurisdições municipais e estaduais;
III crescimento da urbanização e das necessidades locais, assim como
da percepção de que a solução destes problemas podem ser melhor resolvidos pela
comunidade.
Porém foi com a constituição de 1988 que o Brasil efetivou o processo de
descentralização política e direcionou para uma nova gestão urbana em nível
nacional. Onde ocorreram debates em torno de propostas para formulação das
mesmas e que tiveram no Estatuto da Cidade e na elaboração dos Planos Diretores,
referências importantes para a gestão democrática do espaço urbano.
Neste capitulo, nos dedicamos então a demonstrar como esse processo
de descentralização política pode (desde que haja interesse dos administradores),
possibilitar uma maior autonomia por parte dos Governos Municipais e como
conseqüência oportunizar um maior debate junto à população nas questões
urbanas, reforçando a democracia e efetivando a cidadania.
Faremos algumas considerações em torno da reforma urbana, trazendo a
tona questões importantes, como os movimentos populares, uma maior politização
do planejamento, abordando temas, como o da função social da propriedade, da
justa distribuição de bens e serviços, da gestão democrática e da recuperação
ambiental das cidades.
Analisaremos também a relevância da Constituição de 1988 como ponto
de partida para elaboração de novos planos diretores que se tornaram ferramentas
indispensáveis para disciplinar o ordenamento e a estruturação do espaço urbano
nos municípios brasileiros. E por fim destacaremos a importância do Estatuto da
Cidade como ferramenta indispensável na elaboração de planos diretores
participativos.
3.1 A DESCENTRALIZAÇÃO POLÍTICA COMO POSSIBILIDADE DE
DESENVOLVIMENTO DOS MUNICÍPIOS
Devido às mudanças bastante significativas ocorridas na política nacional
principalmente a partir da segunda metade da década de 1980, com o fim do regime
militar, ocorreu também uma série de transformações relativas a um período de
(re)democratização das relações sociais que impulsionaram um processo de
descentralização política em todo o país, tendo como traço principal o processo de
redistribuição de poder e, portanto, de prerrogativas, recursos e responsabilidades
do governo para a sociedade civil, da União para os estados e municípios e do
Executivo para o Legislativo e o Judiciário. Iniciou-se, a partir daí, uma nova etapa
no cenário nacional, estabelecendo a conquista de elementos como a
universalização de direitos, incluindo a participação de parcelas da sociedade civil
em discussões sobre diferentes ações públicas e privadas nas mais variadas áreas,
como, educação, habitação, saúde, etc. Tendo na Constituição a sedimentação das
bases jurídicas para um novo modelo de cidadania, garantindo a população à
prestação de diversos serviços (saúde, educação, assistência social) e atribuindo os
mesmos como deveres do Estado.
A universalização dos direitos se configurou como um importante caminho
para a redefinição entre o Estado e a sociedade civil, na medida em que provocou
transformações das relações sociais, políticas e culturais, permitindo uma nova
relação entre as mesmas. É importante ressaltar que esse período se caracterizou
pelo surgimento da chamada cidadania política, que se aproxima da democracia
participativa e apresenta novas alternativas para o exercício político.
Esse processo iniciado na década de 1980 trouxe contribuições bastante
relevantes na questão da descentralização do poder executivo, pois nos anos 90
possibilitou uma maior abertura para a participação da sociedade civil nas decisões
públicas em vários setores de intervenção do Estado.
Conforme Dowbor (1996) é a partir da Constituinte que a descentralização
apresenta-se como palavra de ordem no setor político e administrativo,
representando uma nova ordem política na sociedade brasileira, redimensionando
as relações com o Estado. O discurso pela descentralização está, portanto,
intimamente ligado à reforma do Estado brasileiro.
É possível perceber que a (re)democratização gerou um processo de
redefinição do papel do Estado, estabelecendo uma nova relação de gestão pública
que pode ser percebida diante da exposição de Heringer que assinala:
O processo de (re)democratização do país veio questionar fortemente o
padrão centralizador do Estado, pressionado pela crise econômica, pelas
políticas de ajuste implementadas nos anos 80 e por outros fatores
derivados da crise estatal. É a tensão entre a centralização e a
descentralização que determina a redefinição do papel do Estado na
sociedade (2002, p. 26).
A transição da (re)democratização iniciada nesse período funcionou como
o marco para as transformações para o processo de descentralização do Estado,
possibilitando que as administrações municipais e estaduais iniciassem e
implantassem políticas sociais, que a Constituição mudava as regras
centralizadoras existentes até então. Houve assim uma melhor distribuição das
competências entre o poder central e os poderes regionais e locais, devolvendo
autonomia e a participação a essas instâncias nas decisões e rumos a serem
definidos.
Pode-se entender que o processo de descentralização se deu com a
consolidação da democracia no país. Pois foi a partir daí que se estabeleceu uma
nova relação que aponta para uma possível solução para os problemas
políticos/institucionais do Estado brasileiro. Os problemas referidos são aqueles que
demonstram a incapacidade do Estado em responder às demandas da população,
principalmente nas suas necessidades sociais básicas.
Pode-se dizer que a descentralização pode ser analisada principalmente
sob dois aspectos:
a) Ligada às discussões sobre as ações governamentais; e/ou
b) Associada às ações participativas da sociedade civil nos assuntos
públicos. Se apresentando de diversas formas na literatura.
A descentralização é concebida como a transferência de um governo
central para outras unidades de governo ou corporações semipúblicas, organizações
da sociedade civil, organizações não-governamentais etc., em que ocorre um
processo de transferência de autoridade legal e política para planejar, tomar
decisões e gerir as funções políticas, possibilitando um principio de reforma do
Estado. Isto é, criando novas formas de relação entre a “coisa” pública e a
sociedade civil. (GONDIM, 1988).
Diante deste conceito, admitimos para a descentralização, diferentes
interpretações, a partir de dois enfoques:
a) descentralização governamental que desloca o poder do governo
federal para outras esferas, como a estadual, a municipal ou entidades de caráter
público.
b) deslocamento de poder do Estado para a sociedade civil introduzindo
a participação da sociedade nas decisões.
É necessário ressaltar a importância da participação comunitária no
processo de descentralização e como as organizações da sociedade civil podem
funcionar na aproximação com o poder público, simplificando as ações e quebrando
a burocracia que prejudicam as decisões governamentais, sugerindo novas relações
e o reconhecimento de novos atores políticos.
A partir daí podemos não estabelecer novos padrões de participação
da sociedade como a distribuição de competências e articulações entre os diferentes
níveis de governo, como também avaliar a descentralização como uma ferramenta
para um caminho que leve a maturação política da sociedade.
De acordo com o enfoque da pesquisa a qual me proponho, priorizo a
discussão da descentralização na esfera da municipalização e o surgimento da
participação da sociedade nesse processo.
Desta maneira, concordo com Lobo (1989) quando ao analisar o início da
municipalização, afirma que dele ocorre uma proximidade da sociedade civil com o
Estado; atribuindo a prestação de serviços aos governos municipais que, estando
mais próximos da população, favorecem o estimulo e a articulação entre eles,
propiciando que a prestação de serviços se torne cada vez mais equilibrada.
A municipalização passa então a ser entendida como uma forma de
passagem progressiva de atribuições e competências que possam ser
desenvolvidas mais eficazmente pelos municípios. Passando, portanto, dos estados
e da União para os municípios as responsabilidades e subsídios para que eles
próprios tenham autonomia para executar os serviços públicos que atendam os
interesses da população.
Sendo assim, podemos considerar o município enquanto unidade político-
administrativa como o lugar que apresenta as melhores condições para a prática da
participação popular na gestão pública. Partimos da hipótese que no município
uma maior possibilidade de interação e comunicação efetivadas pela participação e
o controle social.
Na estrutura administrativa do país, o município é a escala mais próxima
e eficaz para a realização de demandas simples como, por exemplo, as de
urbanização, onde ocorre uma escala mais adequada para a sua efetivação, desde
o ponto de vista geográfico, econômico, técnico, financeiro e político. Permitindo que
essas deixem de ser realizadas pelo governo estadual ou pela União.
Transformando-se na essência do poder local que está mais próximo das
necessidades e reivindicações da população. Hoje uma estimativa de que
aproximadamente 80% das demandas da comunidade, como construção de escolas,
política cultural, entre outras, possam ser resolvidas localmente, não necessitando
de instâncias centrais do governo, mostrando a tendência à desburocratização dos
processos (GENRO, 1997).
Quando falamos de descentralização, estamos falando, da relação direta
entre a participação popular e a democracia, procurando demonstrar que municípios
fortes implicam numa política mais racional e com a participação dos atores locais.
Assim, a descentralização existe no momento em que as decisões locais
possuem certa autonomia e emanam de uma comunidade e não do Estado.
(ARRETCHE, 1996).
Portanto, para o presente estudo o ponto central a ser destacado no
processo de descentralização é que ele possa tornar a participação da sociedade
numa ferramenta para estimular e abrir oportunidades do deslocamento dos centros
decisórios, promovendo uma menor burocracia na gestão pública. Não se
esquecendo das dificuldades para a implementação desse processo que pode se
esvaziar quando esse mecanismo funciona como mera função legitimadora aos
participantes desprovidos do direito de deliberar com autonomia, deixando de lado
os reais interesses da população.
3.2 A BUSCA DA JUSTIÇA SOCIAL PELA REFORMA URBANA
A dificuldade do cidadão em ter acesso a terra se configura como um fator
determinante no processo de desigualdade social existente nas cidades, pois o alto
preço do solo urbano impede que as camadas menos favorecidas da população
tenham acesso a ele, estabelecendo assim uma segregação do espaço que se
materializa nas cidades de acordo com a renda dos diferentes estratos da
sociedade.
Essa população de baixa renda se obrigada a buscar seu alojamento
em áreas distantes da área central e na maioria das vezes desprovidas de vários
serviços e equipamentos públicos, arcando com custos mais elevados de transporte
e tendo dificuldades no acesso a bens e serviços urbanos.
Surgindo a denominada “reforma urbana” no Brasil, originada em função
do abismo existente em relação aos espaços reservados aos ricos e pobres em
nossas cidades. Segundo Ermínia Maricato, o ideário da reforma urbana formou-se
a partir “de iniciativas de setores da igreja católica, como a CPT Comissão
Pastoral da Terra”, que assessorava a luta dos trabalhadores rurais e que no início
da década de 1970 passou a promover encontros com o objetivo de auxiliar “a
construção de uma entidade que orientasse também os movimentos
urbanos” (MARICATO, 1997).
Embora, nos últimos vinte anos, as taxas de crescimento populacional
tenham apresentado declínio e venha ocorrendo uma transferência de população
das áreas centrais para as periferias das regiões metropolitanas, bem como nas
cidades médias, é possível observar a precariedade nas condições de vida de
grande parte da população em grandes concentrações urbanas do Brasil, como
característica bastante comum.
Cada vez mais agudas, as carências urbanas propiciaram a formação de
grupos organizados, denominados por “movimentos sociais urbanos” que passaram
a exercer pressão e exigir providências do poder blico, marcando o cenário
metropolitano nas décadas de 1970 e 1980. Isto se deu principalmente em dois
planos: o dos embates sociais e políticos no território concreto da cidade e da
construção de direitos formalmente reconhecidos. Para tanto devemos enfatizar a
importância das lutas sociais para a permanência do ideário de reforma urbana,
podendo esta se tornar mais completa quando são considerados o nível jurídico e as
transformações, em curso, na administração urbana (RIBEIRO, 1993).
De acordo com Souza (2004), o planejamento urbano foi fortemente
rejeitado pela corrente acadêmica marxista ocidental. O autor expõe que o principal
exemplo de utilização do planejamento e gestão urbana pelo pensamento crítico não
se deu no Primeiro Mundo (de onde são importadas as principais idéias e modas
nas ciências sociais em geral), mas no Brasil, com o surgimento da reforma urbana.
Souza (2004) afirma que idéia de reforma urbana, teria surgido de forma
inicial na década de 1960. Embora o autor reconheça que a expressão “reforma
urbana” seja bem mais antiga, destacando que ela tenha incorporado um ideário de
esquerda tardiamente. Souza aponta que a reforma urbana antes da década de 60
e, principalmente, antes dos anos 80, poderia ser considerada como reforma
urbanística. A expressão reforma urbana foi utilizada pelo Estado até a década de
1980, para promover intervenções estatais.
A idéia de instrumentalizar a gestão urbana por meio de uma legislação
especifica precede a Constituição de 1988 e a formação dos movimentos sociais
urbanos estruturados a partir do final da década de 1970. Pois em 1963 ainda no
governo do presidente João Goulart (1961-1964) foi realizado um Seminário de
Habitação e Reforma Urbana, coordenado pelo Instituto de Arquitetos do Brasil
(IAB). Este evento contou com a participação de políticos, intelectuais e técnicos,
enfatizando principalmente, a questão da moradia.
Embora essa luta fosse importante naquele momento, o encontro não
teve a mesma visibilidade da reforma agrária que, na época, agitava o Brasil rural.
Motivo pelo qual a reforma urbana tenha atravessado os anos 60 quase que
desconhecida, principalmente em comparação a reforma agrária.
O relatório final desse encontro, conhecido como "Seminário do
Quitandinha", realizado no hotel Quitandinha em Petrópolis (RJ), incluía a seguinte
proposta: "Que o Poder Executivo enviasse projeto de lei ao Congresso Nacional
corporificando os princípios de Política Habitacional e de Reforma Urbana aprovados
neste seminário" (SERRAN, 1976). O documento chegava a descrever,
detalhadamente, o conteúdo da lei reclamada.
As reivindicações do Quitandinha levaram vinte anos para ser atendidas
e, mesmo assim, o resultado foi pouco animador. Em 1983, o Poder Executivo
enviou ao Congresso Nacional o projeto de Lei 775, espécie de "pai" do Estatuto
da Cidade. Nascida no antigo Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano, e
caracterizada por "certo excesso de centralismo" que fragilizava o papel dos
municípios (GRAZIA, 2002). A proposta buscava dar materialidade jurídica ao
princípio da função social da propriedade e estabelecia diretrizes e instrumentos
para a política urbana.
Nos tempos de regime militar. A Constituição de 1967/69 era
caracterizada por um perfil autoritário, que ignorava naquele momento a natureza
predominantemente urbana do Brasil. A única vez em que a palavra "urbana"
aparecia no texto constitucional era para referir-se, no capítulo do sistema tributário,
ao Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana, o IPTU. Foi, portanto,
uma indiscutível ousadia a elaboração daquele projeto, pois já existia naquele
período a idéia central, em seu conteúdo crítico de buscar por uma maior justiça
social no espaço urbano. No entanto, houve reação dos setores conservadores da
sociedade, e da própria base parlamentar governista, que nunca chegou votar tal
projeto.
Com as modificações ocorridas no país, pelo seu intenso crescimento
urbano (que passou de um terço de população urbana em 1950 para dois terços em
1980) desencadeou-se um crescimento de problemas e conflitos urbanos, que
acabou favorecendo o processo de discussões em torno da bandeira da reforma
urbana. Porém, após o golpe militar, houve uma repressão política que levou o
movimento em fase de nascimento em torno da reforma urbana a não se
desenvolver por, aproximadamente, duas décadas.
Em meados da década de 1980, no final do governo do Presidente
General Figueiredo, a abertura política no país,início a um novo cenário nacional
e com a possível elaboração de uma nova Constituição para o país, gerou-se um
clima favorável para a retomada das discussões em torno da reforma urbana. Isso
se deu em um plano qualitativamente superior: pois novas abordagens haviam sido
incorporadas e embora a moradia ainda fosse fundamental, não monopolizava as
atenções. A reforma urbana estava então em sintonia com a realidade daquele
Brasil mais urbanizado e complexo. A mobilização em prol da reforma urbana tomou
nova proporção, culminando com a criação do Movimento Nacional pela Reforma
Urbana (MNRU).
A produção de um novo quadro jurídico institucional, aberto pelo processo
constituinte, e a possibilidade de redemocratização do país trouxeram à tona a
oportunidade de revisão das formas e conteúdos do planejamento.
O tema da reforma urbana, que ressurge no final da década de 1980 no
bojo do debate constituinte na área das entidades e movimentos populares,
questionando e politizando o planejamento, na medida em que trouxe para o centro
do debate os temas da função social da propriedade, da justa distribuição dos bens
e serviços, da gestão democrática e da recuperação ambiental das cidades. Não
tratou apenas da introdução de novos ingredientes às velhas fórmulas, mas de
reconceituação própria prática e metodologia do planejamento como instrumento de
democratização da gestão (ROLNIK, 1990).
O acúmulo de toda a síntese intelectual produzida no Brasil nas décadas
de 70 e 80 possibilitou o surgimento de importantes análises com reflexão técnica
sobre a experiência dos movimentos sociais e do planejamento, possibilitando que a
temática tivesse maior visibilidade.
Foi nesse contexto, que no final da década de 1980 houve o
amadurecimento da concepção de reforma urbana. Dessa forma, SOUZA (2004) faz
a sua descrição e a caracteriza como:
[...] um conjunto articulado de políticas públicas, de caráter redistributivista e
universalista, voltado para o atendimento do seguinte objetivo primário:
reduzir os níveis de injustiça social no meio urbano e promover uma maior
democratização do planejamento e da gestão das cidades (objetivos
auxiliares ou complementares, como a coibição da especulação imobiliária,
foram e são, também muito enfatizados. (p. 158).
Pode-se observar que a reforma urbana diferencia-se bastante de simples
intervenções urbanísticas, que se preocupam somente com a cidade, enquanto
estética e funcionalidade, deixando de lado a ordem da justiça social, imaginando
que somente com a reorganização espacial ocorrerá uma harmonia espacial.
No que se refere ao desenvolvimento sócio-espacial, a reforma urbana
não teve a mesma capacidade da reforma agrária para gerar renda, por meio da
redistribuição da terra, que para o agricultor, o solo é um meio de produção, o que
não acontece com o trabalhador assalariado urbano. Embora o autor assinale que,
programas específicos de geração de emprego e renda podem e devem ser
acopladas as políticas de reforma urbana, principalmente quando se tratar da
urbanização de favelas e loteamentos (SOUZA, 2004).
Voltando para a década de 1980, na busca de aproveitar a oportunidade
sinalizada pelo Congresso Nacional, que tornava possível a elaboração de emendas
populares, por parte da população civil a serem apresentadas a Assembléia
Constituinte o MNRU elaborou uma emenda popular da reforma urbana, que contou
o apoio de mais de 130.000 eleitores. No entanto, havia a obrigatoriedade do
Congresso receber a proposta, mas não de incorporá-la integralmente.
Com o decorrer dos debates e as votações no Congresso a emenda
perdeu bastante de sua proposta inicial. Restando somente, na nova Constituição de
1988, um conteúdo bastante modificado presente nos artigos 182 e 183, transcritos
abaixo.
Art. 182 A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder
Público Municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo
ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o
bem-estar de seus habitantes.
§ 1.º - O Plano Diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatoriamente
para as cidades com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico da
política de desenvolvimento e de expansão urbana.
§ 2.º - A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às
exigências fundamentais de ordenação da cidade expressa no Plano
Diretor.
§ 3.º - As desapropriações de imóveis urbanos serão feitos com prévia e
justa indenização em dinheiro.
§ 4.º - É facultado ao Poder Público Municipal, mediante lei especifica para
áreas incluídas no Plano Diretor, exigir, nos termos da lei federal, do
proprietário do solo urbano não edificado, sub-utilizado ou não utilizado, que
promova seu adequado aproveitamento sob pena, sucessivamente de:
I – Parcelamento ou edificação compulsórios;
II Imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no
tempo;
III Desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de
emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate
de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o
valor real para indenização e os juros legais.
Art. 183 Aquele que possuir, como sua, área urbana de até duzentos e
cinqüenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem
oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o
domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.
§ 1.º O titulo de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem
ou a mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil.
§ 2.º Esse direito não será reconhecido ao mesmo possuidor por mais de
uma vez.
§ 3.º Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.
(CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL, 1988).
De acordo com Souza (2004) durante a elaboração da Constituição
Federal houve uma derrota estratégica do ponto de vista da amarração da reforma
urbana em escala nacional, uma vez que ficou a cargo de cada município legislar
quanto à política urbana por meio da elaboração de seus planos diretores.
Com a intenção de elaborar planos diretores, denominados por ele, como
“progressistas”, houve certos entraves que prejudicaram de forma acentuada.
Alguns debates bastante relevantes, e ainda não concluídos (a “função social da
propriedade” pode ser citada como exemplo), bem como a falta de um
aprofundamento sobre a dinâmica e a crise dos movimentos sociais, que devido a
um excesso de apego as leis acabaram gerando um tecnocratismo que impediram
de avançar sobre uma análise social mais ampla.
Nesse caso, a participação popular que deveria ser vista como ponto-
chave para o desenvolvimento de uma democratização do planejamento e da
gestão, acabou ficando em segundo plano, ao se comparar à pequena atenção
dedicada ao estudo dos conselhos de desenvolvimento urbano em comparação com
as discussões em torno dos planos diretores progressistas.
Avanço significativo foi alcançado com o Estatuto da Cidade em 2001,
que estabeleceu diretrizes e parâmetros da política urbana no Brasil, oferecendo
mecanismos para que os municípios pudessem elaborar seus planos diretores e
atuar no processo de planejamento conduzindo uma política urbana que permita a
gestão democrática e a realização do acesso e do direito a cidade.
Ressaltando que o Estatuto da Cidade contém mais de trinta instrumentos
municipais de natureza normativa, buscando o desenvolvimento econômico e social
do município. Do ponto de vista social, a inclusão social e espacial da população
marginalizada e a gestão democrática da cidade são referências fundamentais que
devem se amplamente divulgadas junto à população para permitir divulgação dos
instrumentos de direito à cidade (SILVA; FREIRE, 2007).
3.3 O ESTATUTO DA CIDADE E A REALIDADE URBANA BRASILEIRA
Durante 11 anos tramitou entre a Câmara e o Senado Federal, sendo
sancionada em 10 de julho de 2001, a lei 10.257, que estabeleceu as leis gerais
da política urbana no país, mais conhecida como “Estatuto da Cidade”. Essa lei tem
como principal objetivo garantir o pleno desenvolvimento das funções sociais da
cidade e garantir o direito para que as mesmas tornem-se sustentáveis. Esses
direitos são citados em vários artigos e parágrafos, como por exemplo, direito a
terra, a moradia, ao saneamento ambiental, ao transporte, aos serviços públicos, ao
lazer e ao trabalho. A lei propõe, entre outras coisas o ordenamento do uso do solo
de forma a evitar a deterioração de áreas urbanizadas, a poluição e a degradação
ambiental.
Nessa nova lei foram apresentados instrumentos da política urbana, como
os planos nacionais, estaduais e regionais de ordenação do território, de
desenvolvimento social e econômico, os planos diretores, os referendos populares e
plebiscito, entre outros.
Conforme Freitag (2001) o Estatuto da Cidade regulamentou os artigos
182 e 183 da Constituição Federal, referentes à política de desenvolvimento urbano
dos municípios. Podendo salientar que esta lei representou um grande avanço nas
questões já citadas, com algumas novidades, dentre as quais, destacamos a do
capítulo IV que propõe a gestão orçamentária participativa. Onde podemos ler
textualmente no art. 45: “Os governos gestores das regiões metropolitanas e
aglomerações urbanas incluirão obrigatória e significativa participação da população
e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade, de modo a
garantir o controle de suas atividades e o pleno exercício da cidadania”.
Esta lei é considerada como um marco progressista, arejada, com
vocação democrática, demonstrando preocupação com as gerações futuras e os
rumos das cidades brasileiras.
No entanto, comentaristas deram destaque ao caráter social do estatuto,
apontando para o fato do mesmo beneficiar os habitantes de favelas e cortiços,
buscando a legalidade do seu direito à moradia. E alguns estariam se perguntando
se esta não seria mais uma lei progressista que não sairia do papel, ao considerar a
realidade urbana enfrentada principalmente nas metrópoles de São Paulo e Rio de
Janeiro, que apresentam sinais catastróficos.
Alguns críticos veementes do Estatuto, dizem não haver competência dos
municípios para que os mesmos possam elaborar e executar os planos diretores
previstos na lei. Foram apontadas críticas principalmente contra os mecanismos
para ordenar e regularizar os caos urbano instaurado nas grandes cidades
brasileiras. Muitos autores apontam para o fato de que, o fracasso de quase todos
os planos diretores e projetos de planejamento urbano parecem ser de ordem
estrutural entre as administrações públicas e as entidades paraestatais, estando
entre elas o setor privado, que dificulta o processo de integração. Eles sinalizaram
que o planejamento urbano no Brasil tem sido utilizado como discurso, servindo para
ocultar e mascarar os problemas urbanos e favorecendo aos interesses das classes
dominantes.
Para Bassul (2002) investir na democratização do acesso a condições
dignas de vida urbana, mais que uma bandeira de luta política, representa um
caminho indispensável no projeto nacional contra a miséria constituindo-se num
atalho indispensável para um projeto nacional de combate à pobreza minimamente
sincero. Possibilitar o acesso à moradia, dotar as cidades de sistemas decentes de
transporte público, assegurar a prestação universal dos serviços de abastecimento
d’água e esgotamento sanitário, tirar crianças da rua e levá-las à escola, qualificar
os espaços comunitários com equipamentos e atividades orientadas de lazer e
recreação são propostas factíveis e relativamente baratas. Resultam, afinal, numa
forma eficaz de melhorar a partilha da renda nacional.
Quando de sua formulação, as principais perguntas relacionadas ao
Estatuto da Cidade eram: Será que ele pegará? Quais seriam as medidas
necessárias para que a lei viesse a funcionar? A resposta a esta e a outras
perguntas seria, que isso se tornaria possível quando o controle da realização das
medidas urbanas estivessem de fato nas mãos dos reais interessados, isto é, nas
mãos dos moradores das cidades. Somente com a participação popular pode-se
propiciar soluções para os problemas que afetam a cidade no dia-a-dia,
possibilitando que ocorra uma mudança de papel em relação aos moradores que
passariam de atores passivos para ativos (como prevê a lei).
No entanto, não é nossa pretensão aqui, avaliar o grau de eficácia do
Estatuto da Cidade em nível nacional, mas sim trazer a discussão e uma reflexão na
relevância dessa lei que orienta e assinala para uma gestão democrática do espaço
urbano. E de nosso interesse avaliar a contribuição dessa lei, junto ao planejamento
urbano de Campo Grande que visa a descentralização como ferramenta para o
estabelecimento da democracia na construção da cidade, integrando a população
nesse processo.
3.4 O ESTATUTO DA CIDADE E AS BASES PARA A FORMULAÇÃO
DE NOVOS PLANOS DIRETORES
A Lei Federal 10.257 de 10 de julho de 2001, denominada como
Estatuto da Cidade, regulamenta os artigos 182 e 183 da Constituição Federal,
estabelecendo parâmetros e diretrizes da política urbana no Brasil, oferecendo
meios para que o município possa intervir nos processos de planejamento, gestão
urbana e territorial para garantir a realização do acesso e do direito à cidade.
É importante ressaltar que a lei 10.257 disponibiliza mais de trinta
instrumentos municipais para auxiliar na gestão urbana, de modo que foram criados
novos instrumentos de planejamento territorial, além daqueles já existentes, para
que seja alcançado o desenvolvimento municipal, nos setores social e econômico.
Do ponto de vista social, deve ocorrer à participação da população marginalizada de
maneira a possibilitar a gestão democrática da cidade com a criação de mecanismos
que possam informá-la de forma ampla sobre o direito no processo de decisão para
os rumos da cidade.
Para tanto, se faz necessário à elaboração do Plano Diretor, que nesta
concepção difere bastante daquela utilizada anteriormente, em que o mesmo era
considerado um mero documento administrativo com a pretensão de resolução de
todos os problemas locais, deixando de considerar as questões sociais cotidianas.
Nessa nova concepção, o Plano Diretor tem a função de ser um instrumento que
possa interferir diretamente no desenvolvimento local e territorial, integrando os
fatores políticos, econômicos, culturais, ambientais, sociais, etc.
Nos termos do Estatuto da Cidade, o Plano Diretor está definido como um
instrumento básico para orientar a política de desenvolvimento e de ordenamento da
expansão urbana do município. Determinando a sua obrigatoriedade para os
municípios com as seguintes características:
Com mais de 20 mil habitantes;
Com áreas de especial interesse turístico;
Integrantes de regiões metropolitanas e aglomerações urbanas;
Situados em áreas de influência de empreendimentos ou atividades;
com significativo impacto ambiental na região ou no país.
De acordo com o Estatuto da Cidade, o Plano Diretor deve ser aprovado
por lei municipal e se constituir em instrumento básico da política de
desenvolvimento e expansão urbana. Como parte de todo o processo de
planejamento municipal, ele deverá estar integrado ao plano plurianual, às diretrizes
orçamentárias e ao orçamento anual.
A proposta de Plano Diretor não é uma proposta pronta acabada, mas um
princípio para a reflexão a ser compartilhada desde o início por todos os cidadãos,
representantes da sociedade civil e da sociedade política (legislativo e executivo).
Do ponto de vista metodológico, é de responsabilidade do município a
formação de uma equipe técnica que dará suporte a prefeitura na organização do
diagnóstico municipal, a partir dos dados apresentados. Essa equipe seria formada
por diferentes profissionais (planejadores urbanistas, geógrafos, sociólogos,
engenheiros, etc.), que atuariam de forma permanente para o desenvolvimento de
uma infra-estrutura no território municipal, deixando de lado aquela proposta de
comprar planos prontos vindos de fora e que não teriam continuidade ao longo do
tempo (SILVA; FREIRE, 2007).
O Plano Diretor deve respeitar as especificidades locais, regionais e
culturais. Indicando que se faça inicialmente a elaboração do plano uma leitura da
cidade, procurando entender e identificar a situação do município a área urbana e
a área rural, seus problemas, seus conflitos e suas potencialidades. Essa leitura
seria feita pela equipe técnica (produzida pelos profissionais da Prefeitura) e por
equipes comunitárias, que seriam organizadas sob o ponto de vista de diferentes
representantes de segmentos socioeconômicos: empresários, profissionais,
trabalhadores, movimentos populares, entre outros.
Vale ressaltar a importância da participação popular na elaboração dos
planos, valorizando o uso de diferentes dinâmicas e materiais para construir mapas
temáticos do município, com elementos trazidos pelos próprios participantes (mapa
de riscos para a ocupação humana, mapa de áreas para preservação cultural,
mapas da estrutura fundiária, mapa histórico da cidade, mapa do território do
município, etc.) contribuindo para melhor visualização dos fatores condicionantes e
as possibilidades físico-ambientais. Identificando as áreas mais expressivas para a
preservação ambientais estabelecidas pelo município, Estado e União, para
atividades rurais e para proteção de mananciais. (MINISTERIO DAS CIDADES,
2005).
Sendo importante identificar as dinâmicas imobiliárias, buscando
reflexões sobre as legislações municipais, estaduais e federais vigentes sobre os
instrumentos urbanísticos e ambientais: leis de uso do solo, parcelamento, códigos
de obras, posturas ambiental e patrimonial. Levar as audiências públicas os planos,
estatutos e projetos existentes sobre o município, reavaliando-os continuamente.
Portanto, é necessário detectar no coletivo os problemas locais em seus diferentes
aspectos, sejam eles, sociais, econômicos, demográficos ou ambientais e
procurando destacar as potencialidades e a vocação do município frente ao seu
papel em nível regional, estadual e nacional.
No processo de elaboração do Plano Diretor se faz necessária à
formulação de um documento que traga o diagnóstico e o prognóstico feito pelos
técnicos, gestores e a comunidade por meio de reuniões, palestras e encontros
realizados para discutir sua elaboração, tornando transparente o confronto, o conflito
e os pactos postos à mesa no intuito de definir as diretrizes e os instrumentos de
planejamento e a política de desenvolvimento traçados a serem cumpridos pelo
município. Caso não haja a participação da comunidade desde o início, pode ocorrer
seu impedimento por parte do legislativo, podendo levar o prefeito a julgamento por
improbidade administrativa (Art. 52 – Estatuto da Cidade).
Com a II Conferência das Cidades foi possível maior divulgação do Plano
Diretor, no entanto, as audiências públicas são as orientações obrigatórias no
processo de discussão para a aprovação do Plano Diretor na Câmara Municipal,
sendo condição para validação da lei municipal que institui o plano. Em alguns
municípios, a Lei Orgânica Municipal determina a quantidade de audiências, que
devem aprovar de acordo com a população e as propostas de participação popular
(SILVA; FREIRE, 2007).
É de responsabilidade da prefeitura a ampla divulgação de modo a
facilitar o acesso aos documentos produzidos durante o processo de elaboração do
Plano Diretor. Através da disponibilidade desses documentos por parte da prefeitura
dá-se à possibilidade aos cidadãos conhecerem as informações indispensáveis para
que parcela significativa da população participe efetivamente nos debates até a
aprovação final do Plano Diretor. Depois de criado na forma de lei, este deve conter
a estrutura pela qual se dará o processo de participação da sociedade no
planejamento, indicando os mecanismos para que ocorra a implementação, atuação
e monitoramento da política de desenvolvimento urbano do município.
Durante um prazo de dez anos, o Plano deverá ser acompanhado com
monitoramento e implementação, sendo avaliado e atualizado com ajustes
permanentes definidos por lei. Dentro do próprio Plano Diretor deverá estar definida
as instâncias que farão parte das discussões no acompanhamento do planejamento
que se realizará por meio de conselhos, com normas previamente estabelecidas
para sua composição e suas respectivas atribuições, possibilitando que ocorra a
permanente participação da população viabilizando a plena gestão democrática do
espaço urbano.
Oliveira (2001) aponta para que as formas de gestão e de planejamento
devam ser monitoradas para garantir o controle social, o que depende de um pacto
previamente construído no período de sua elaboração, devendo estar coerente com
a capacidade de gestão e intervenção do município, que se realizará através dos
conselhos da cidade, auxiliando na gestão e planejamento do município. Mostrando
haver a necessidade de criação (quando não existirem) de secretarias de
planejamento urbano e ambiental com estruturas assemelhadas, atualizando,
permanentemente, os dados quantitativos e qualitativos sobre o território municipal.
De modo que a implementação do Plano Diretor não encerra a questão, somente
inicia um processo permanente de planejamento que deve ocorrer constantemente.
Recomenda-se que os Planos Diretores determine os meios e a
sistemática para a sua revisão, conforme orienta o Estatuto da Cidade, a lei que
instituiu o Plano Diretor estabelecendo que ele ocorra a cada dez anos. A revisão e
os ajustes deverão ser discutidos e acordados de forma integrada com ampla
participação popular, com demais fóruns de discussão atuantes no município,
consolidados em conferências municipais e articulados com as demais ações
aplicadas pelos diferentes níveis de governo.
Espera-se que os Planos Diretores elaborados a partir de bases
responsáveis e prevendo a aplicação dos instrumentos estabelecidos pelo Estatuto
da Cidade, possam se tornar gradativamente uma ferramenta útil na construção de
uma política nacional que privilegie o desenvolvimento urbano dos municípios
brasileiros, promovendo a democracia através da participação dos cidadãos nos
assuntos relacionados à cidade. Porém algumas perguntas devem ser formuladas
para fazermos uma reflexão sobre o assunto. Qual o real interesse dos
administradores municipais em cumprirem tal legislação, que tem como objetivo
principal o processo de democratização na gestão urbana? Até que ponto os
interesses das classes sociais dominantes estariam sendo afetados? Qual a efetiva
participação da população na formulação dos planos diretores e no cumprimento dos
mecanismos previstos no Estatuto da Cidade?
4 A EVOLUÇÃO E AS INTERVENÇÕES NO ESPAÇO URBANO DE
CAMPO GRANDE
Situada no divisor de águas das bacias dos rios Paraná e Paraguai, a
área onde surgiu a cidade de Campo Grande servia de local onde os comerciantes
ambulantes que vinham do extremo sul do estado de Mato Grosso desde o porto de
Concepción, realizavam seus negócios. Para desviarem dos obstáculos físicos
(evitar a travessia de rios), eram utilizados roteiros terrestres estratégicos que
permitiam sua locomoção e o transporte de mercadorias. Outra rota de
comerciantes, oriunda do porto de Corumbá, também utilizava, como ponto de
passagem, as atuais terras de Campo Grande. (LE BOULEGART, 2000).
A região, até então ocupada por alguns criadores de gado, oriundos de
Minas Gerais, passou a servir como rota dos dois fluxos comerciais que se
intensificaram devido a forte dinâmica comercial com os mercados platinos,
possibilitando o fortalecimento do lugar com o acúmulo de novas funções, que
permitiram conferir ao povoado de Campo Grande relevante importância como
entreposto comercial naquele período.
Como aponta Le Bourlegat (2000) devido à vocação comercial do
povoado, numa visita eclesiástica, Dom Carlos Luiz D’amour previu de que poderia
ocorrer um grande futuro naquele local, que ele apresentava um crescimento
espantoso, indicando que em quatro anos o número de moradias havia
quadruplicado
6
. Em 1886 ocorreu a doação das terras do povoado e, somente três
anos depois, ele foi elevado à categoria de vila, como sede do que viria ser o
município de Campo Grande.
6
Em 1882 ocorreu a visita episcopal do frei Mariano Bagnaia oriundo de Corumbá, que, ao chegar em
Campo Grande, deparou-se com um pequeno povoado de apenas 20 casas, embora conseguisse
captar o dinamismo presente, em função do comércio regional catalizado pelo lugar. Em 1886, o
então bispo de Cuiabá Dom Carlos Luiz D ۥamour visitou o povoado que apresentava 86 casas,
embora sem apresentar arruamento.
Cabe ressaltar, que em 1886 quando ficou instituído o povoado
5
, os
coronéis se fizeram representar por meio do partido republicano e quando o primeiro
delegado tomou posse, foi reivindicado o restabelecimento da ordem no povoado,
devido a grande, a solicitação de melhoria nos meios de comunicação (correios e
jornais) e também uma maior disciplina referente às questões urbanas. (GARDIN,
1999).
Mas, foi somente em 1905 que a Câmara Municipal passou a legislar e
decretou o primeiro Código de Posturas da vila de Campo Grande. A lei atentava
para um ordenamento na forma de ocupar o espaço urbano e estabelecia critérios
para construções e utilização de espaços públicos. Para Oliveira Neto (2005) o
Código de Posturas tinha como objetivo estabelecer uma nova relação dos
moradores da vila com o meio em que viviam, apontando também, que ao tratar de
ruas, praças e outros logradouros públicos, mesmo havendo somente uma única rua
com um punhado de ranchos dispostos um do lado do outro, tornava-se evidente a
preocupação em produzir uma cidade naquele lugar.
Outro ponto importante a ser destacado sobre o espaço urbano de
Campo Grande foi o Plano de Alinhamento das ruas da vila, aprovado em 1906 e
não executado. Era um plano de arruamento, para a vila que contava somente com
uma rua, que passaria a contar com uma planta para a cidade, mesmo sem haver
uma mancha urbana definida, que o que existia era somente algumas casas. Este
fato demonstra uma certa preocupação em orientar a forma de crescimento da vila,
estabelecendo padrões e normas a serem seguidas, ficando evidente a tendência a
um controle espacial do meio urbano.
Em 1909 ocorreu a elaboração de uma planta (figura 1) e o primeiro
alinhamento de ruas da cidade de Campo Grande, que foi desenhada segundo dois
critérios bastante importantes na época: o primeiro foi o da lógica capitalista, surgido
após a Revolução Industrial na Europa e que diferenciava áreas de circulação e
concentração (exigência da nova fase de produção e circulação de mercadorias).
5
Em setembro de 1886, quando da visita de Dom Carlos Luíz D ۥamour se observa um número
significativo de pessoas no povoado; e por decisão do fazendeiro Joaquim Silvério Ornellas,
proprietário da antiga sesmaria de Lageado, onde se assentava Campo Grande faz uma doação de
terras visando oficializar a existência do povoado já existente.
O segundo critério a ser considerado, era a situação precária
principalmente das cidades portuárias constantemente assoladas por epidemias que
se alastravam para outras cidades, que levou a necessidade de se estabelecer um
caráter higienizador
6
para a cidade. O traçado de Campo Grande foi definido com a
forma de tabuleiro de xadrez, com largas ruas e calçadas e a construção de amplas
praças. A atual Av. Afonso Pena tinha a forma de bulevar, influência de Haussmann
(criador dos bulevares de Paris), que oferecia bastante espaço arejado,
demonstrando preocupação com a higiene e a saúde da população.
No entanto, é a partir da instalação da Estrada de Ferro Noroeste do
Brasil NOB, em 1914, que Campo Grande passou por uma transformação, tanto
no que se refere às relações sociais, quanto econômicas, como destaca OLIVEIRA
NETO:
A inauguração da ferrovia instaurou, inexoravelmente, na região, uma nova
relação social, ditada, dessa vez, pelo capital monopolista de São Paulo, ao
mesmo tempo em que estabeleceu, no imaginário dos habitantes do lugar,
novos paradigmas em relação ao tempo e às distâncias. O trem
simbolizava, para aqueles moradores do oeste quase inóspito do Brasil, as
insígnias da modernização e do progresso. Ele representava todos os
elementos e fatores que difundiram e faziam desenvolver novas técnicas e
davam sustentabilidade às novas formas de pensar e agir. (2005, p. 99).
Desde então, Campo Grande se firma como a principal cidade do sul de
Mato Grosso, e principal centro de trocas de mercadorias (posição antes ocupada
por Corumbá), sendo influenciada pelas idéias vindas dos principais centros
econômicos do país (São Paulo e Rio de Janeiro) e fortalecendo cada vez mais suas
trocas comerciais, estando definitivamente inserida no mundo da mercadoria. Diante
dessa nova conjuntura econômica, em que a cidade passou a ser o centro nodal do
comércio no sul do estado, foram possíveis mudanças bastante significativas
refletidas em sua estruturação. Pois até mesmo a NOB havia firmado um acordo
com o Governo Federal para adotar uma política de direcionar o ordenamento do
espaço urbano da cidade.
Com a instalação da ferrovia e com o crescimento comercial apresentado
por Campo Grande, a cidade começou a receber grande quantidade de imigrantes,
dentre eles, podemos destacar os japoneses, vindos de Bauru durante a construção
6
OLIVEIRA NETO, Antônio Firmino de. A rua e a cidade ... p. 85. O médico sanitarista Osvaldo Cruz
foi o grande responsável pelo modo de pensar as cidades como um espaço doente e por isso
buscava cura através de um espaço mais propício para a circulação.
da ferrovia e dos libaneses (comerciantes) que deixaram Corumbá para se
estabelecer em Campo Grande que oferecia melhor possibilidade para a sua
atividade.
A chegada do trem foi um importante fator no crescimento econômico
propiciando um grande dinamismo para a cidade e em 1918 foi estabelecida a zona
urbana de Campo Grande com 222 hectares. Com o passar do tempo, no período
compreendido entre 1914 a 1930, a elite da época passou a pressionar cada vez
mais as autoridades locais para a regulamentação sobre a estrutura urbana, com a
criação de novas exigências e a necessidade de se obter alvarás de licença para
construção. Pode-se observar com isso, forte pressão da classe dominante junto ao
poder público municipal, no sentido de criar leis que ordenasse o seu crescimento
(LE BOURLEGAT, 2000).
Na década de 1940, foi aprovado o primeiro Plano Diretor da cidade de
Campo Grande sob a lei 39 de 31 de janeiro de 1941, um código de obras que
“Divide a Cidade em Zonas de construção e dá Outras Providências”. Esta lei fazia a
divisão do espaço urbano de Campo Grande em cinco zonas de uso e ocupação,
definidos conforme quadro abaixo:
Quadro 01 – Zoneamento de Campo Grande proposto pela Lei nº 39/41
ZONA ÁREA DE
CONSTRUÇÃO
RECUOS ALTURA
Central ou
comercial
Construção principal não
podendo ocupar mais de
60% da área do lote
Frente= alinhamento
da via
Fundos = 5m
Altura mínima= 5m
Industrial
Construção industrial não
pode ocupar mais de 70%
da área do lote
livre
Residencial
Construção principal não
pode ocupar mais de 1/3 da
área do lote
Frente= 4m
Lateral = 1,5m
Mista de 1ª categoria
Construção principal não
pode ocupar mais de 50%
da área do lote
Frente= 3m
Fundos = 5m
Mista de 2ª categoria
Construção principal não
pode ocupar mais de 50%
da área do lote
Frente= 3m
Fundos= 5m
Fonte: Decreto-lei nº 39/41
Esta lei de 1941 foi elaborada pelo escritório do engenheiro Saturnino de
Brito que havia elaborado também a proposta de expansão da rede de água e
implementação da rede de esgoto para a cidade. Houve, por meio dela, o
redimensionamento do tamanho dos lotes, que é tratado em seu Art. 7º,
regulamentando os lotes com área mínima de 300 m², observando que na Zona
Central a testada seria de no mínimo 10 m². Nas demais zonas os lotes deveriam ter
área mínima de 360 com 12m de frente, tamanho que predomina até os dias
atuais.
Segundo Ebner (1999), um importante ponto a ser destacado sobre o
primeiro Plano Diretor de Campo Grande é que, salvo algumas exceções, ele
veio consolidar uma realidade existente na cidade que, ainda que fosse em
estágio inicial, havia um processo de fragmentação, ou seja, a divisão das funções
urbanas da cidade, bem como a divisão das classes sociais existentes em sua
produção espacial.
Oliveira Neto (2005) destaca, que embora de 1909 a 1940, quando
Campo grande passou por um crescimento espantoso de mais de 4000% na sua
população, a planta elaborada por Nilo Barem, conseguiu assimilar todo o novo
contingente populacional sem grandes problemas, não havendo graves dificuldades
a serem administradas na época. No entanto, o autor observa que, após 1940, com
o intenso crescimento da populacional do município, havia um esvaziamento de sua
área rural e um inchaço de sua área urbana, representando entre 1940 e 2000, o
dobro do crescimento da cidade em ralação a zona rural.
Quadro 2: Campo Grande: População total, urbana e rural – 1909 a 2000
Total Urbana(%) Rural (%)
1909 1.200
1940 49.629 49,32 50,68
1950 57.033 58,31 41,69
1960 74.249 87,45 12,55
1970 140.233 93,49 6,51
1980 291.777 97,22 2,78
1991 526.126 98,59 1,41
1996 600.069 98,66 1,34
2000 663.621 98,84 1,16
Fonte: IBGE.
Foram constantes, as medidas adotadas pelo poder público municipal,
com intuito de ordenar a ocupação do espaço urbano. Nesse período, podemos
destacar dois momentos que contribuíram de maneira significativa para esse
adensamento populacional de Campo Grande.
O primeiro relacionado ao processo de expansão do sistema de
transportes rodoviários que passou a ser implantado e permitiu a multiplicação do
rendimento por meio dessa modalidade de transporte, integrando o pólo industrial do
Sudeste ao sul do estado de Mato Grosso com ligação à Campo Grande. A cidade
ficou no cruzamento de duas rodovias federais estruturais, fortalecendo ainda mais a
situação de entroncamento. Desse modo, tornou-se o espaço mais fluído, não
para canalizar e exportar a produção do estado para São Paulo, como para distribuir
regionalmente os produtos oriundos daquele pólo industrial, transformando-se na
praça comercial mais dinâmica do estado (LE BOURLEGAT, 2000).
Esse fator associado aos ideais militares do pós-guerra que
demonstravam os fortes laços estabelecidos com os norte-americanos, que
propuseram a ocupação dos vazios demográficos como forma de manter a
segurança e a posse dos territórios nas áreas fronteiriças, promovendo a estratégia
de integração e segurança nacional.
Isso se deu com a expansão e modernização da atividade agropecuária e
a concorrência comercial sobre produtos tradicionais das colônias favorecendo um
forte êxodo rural em favor de Campo Grande, a partir da década de 1950, quando a
cidade então foi equipada de estrutura de comércio e serviços, tornou-se capaz de
atrair para si grande parte da população urbana do que viria a ser o estado de Mato
Grosso do Sul. Em função da infra-estrutura existente naquele momento e da
facilidade de circulação dentro do território, proprietários e empreendedores rurais
passaram a migrar para Campo Grande, com o intuito de serem beneficiados dos
serviços prestados
7
.
O mesmo aconteceu com o grande contingente de trabalhadores
agrícolas, que foram afetados pelo modelo agrícola capitalista adotado naquele
momento, bem como os recém-chegados, que eram atraídos pelo forte dinamismo
econômico apresentado pela cidade.
O segundo ponto a ser destacado é a criação do Estado de Mato Grosso
do Sul em 1977, quando Campo Grande foi escolhida para exercer a função de
capital político-administrativa, recebendo verbas da União para abrigar os novos
aparelhos administrativos e o esperado aumento da população.
A década de 1980 ficou caracterizada como uma das mais marcantes,
com relação à chegada de novos moradores, devido ao processo de modernização
dos cerrados que se processava no norte do estado. De 1980-91, mudaram-se para
7
Na década de 1950-60, Campo Grande registrou a maior perda de população rural entre os
municípios do estado (60,8% da população do campo), seguida por Nioaque (45,5% de perda), Rio
Brilhante (39,9%) e Rochedo (38,5%).
a cidade 235.144 habilitantes, ou seja, 47,4% do total dos novos moradores das
cidades do Mato Grosso do Sul daquele período. Em 1991, na área urbana de
Campo Grande havia 518.033 habitantes, quase duas vezes o montante
apresentado na década anterior. Esse período foi marcado pela forte intervenção do
Estado na construção do espaço urbano, tanto com financiamento de conjuntos
habitacionais, como na construção de grandes obras de equipamentos públicos,
destacando o Parque dos Poderes.
Na década de 1960 os bairros Cascudo e Amambaí, que apresentavam
maiores concentrações populacionais, passaram a desenvolver os primeiros focos
de serviços e comércios locais, principalmente nas principais ruas e avenidas de
acesso
10
. Sobre o crescimento acelerado, observado principalmente a partir desse
momento, EBNER atenta para os vazios urbanos, ocasionados pelo surgimento de
novos bairros, demonstrando:
Torna-se curioso observar que, nesta época, começam a surgir bairros
populares muito afastados do centro da cidade, como por exemplo, os
Bairros Bandeirantes, Taquarussú e Monte Castelo, ou ainda totalmente
descolados do contíguo urbano como os Bairros Tiradentes, Jardim São
Paulo, Vila Guanabara, entre outros. (1999, p.45)
Aqui, no entanto, concordamos com Ebner, pois conforme Corrêa (1998)
o espaço urbano é produzido por diferentes agentes que atuam sobre ele e, nesse
caso, o surgimento dos vazios urbanos foi reflexo da ação dos proprietários e
promotores imobiliários que se beneficiaram de falhas na política urbana da época e
promoveram a especulação, por meio da retenção de terras esperando a sua
valorização ou criando novos loteamentos totalmente distantes da mancha urbana
com o intuito de ampliar sua renda. Posteriormente, o Estado também contribuiu
para a formação dos vazios, na medida em que atuou exercendo forte intervenção
no espaço urbano com financiamentos de conjuntos habitacionais distantes do
centro da cidade.
A partir da década de 1960 ocorre uma grande explosão do tecido urbano
da cidade. Esse crescimento se deu com o intenso processo migratório que a cidade
recebeu e que teve como conseqüência o surgimento de grandes loteamentos
destinados às populações de baixa renda.
10
Prova disto foi a criação da Lei nº 687 aprovada em 1960 que ampliava a área estabelecida para o
comercio , delimitada pelo Plano Diretor de 1941.
Esses novos bairros apresentavam somente uma via de acesso ao centro
da cidade, que normalmente eram as próprias rodovias. Esta ligação entre os bairros
distantes e o centro, foi responsável pela configuração urbana radial onde todos os
acessos convergem para o centro, reforçando a centralidade comercial e de
atividades de serviços que eram existentes na área central. EBNER demonstra a
realidade da cidade ao comparar as duas áreas (o centro e a periferia), pontuando:
Esta centralidade é enfatizada ainda mais pela contribuição de uma boa
infra-estrutura na área central: asfalto em ruas largas; rede de água e
esgotamento sanitário; iluminação pública e rede elétrica; arborização;
além de uma rede de serviços e equipamentos de uso coletivo, em
contraposição a bairros totalmente desassistidos, localizados em regiões
desprovidas destes confortos e conseqüentemente, dependentes do centro
e dos serviços que este oferece. (1999, p. 46)
Diante do crescimento acelerado mencionado foi adotada em 1965, a
Lei Legislativa nº 26 para a regulamentação de uma série de equipamentos públicos,
dentre as quais podem ser ressaltadas a subdivisão da Zona Comercial em Principal
e Secundária e a definição dos tipos de rua, diferenciando-as em três funções:
habitação, trabalho e lazer.
No final de década de 1960 e início de 1970 a Prefeitura Municipal
encomendou a Hidroservice
11
a elaboração de um Plano Diretor de Desenvolvimento
Integrado do Município PDDI. Era mais uma tentativa do Poder Público Municipal
de diagnosticar a estruturação urbana daquele período e a partir daí planejar ações
para ordenar a ocupação do espaço urbano. Oliveira Neto (2005) aponta que o
plano elaborado pela Hidroservice fazia projeções para os quinze anos seguintes,
visando à concretização de um modelo territorial de estrutura urbana.
O levantamento da Hidroservice fez algumas revelações da situação
urbana, como por exemplo, o adensamento urbano, que demonstrava que a área
geral edificada estava excepcionalmente baixa, se agravando principalmente pelo
incremento de novas áreas loteadas e praticamente desocupadas. De acordo com o
levantamento de 1938 a 1970, enquanto a população urbana aumentou seis vezes,
a área loteada cresceu dez vezes, apresentando índices de densidade de 36 hab/ha
em 1938 para 20,6 hab/ha em 1970 (HIDROSERVICE, 1970: 2.1.4). Isso se dava
pelo crescimento de novas áreas periféricas, que apresentavam baixíssimas
densidades, que eram de 5 a 50 hab/ha, somente na área central havia maiores
densidades devido a um crescimento vertical.
11
Empresa sediada em São Paulo, sob responsabilidade técnica de Henri Maksoud.
A empresa observou também uma preocupação em relação ao grande
perímetro urbano da cidade, que se reflete com a seguinte análise: “Estima-se em
mais de 400.000 pessoas a capacidade da área loteada, sendo que a capacidade da
zona inteira em processo de loteamento ultrapassa a espantosa cifra de dois
milhões de habitantes” (HIDROSERVICE, 1970: 2.1.1). Destacando que nessa
época a população de Campo Grande era de 131.110 habitantes.
Sob o ponto de vista de planejamento e de implementação de
equipamentos e serviços públicos a grande expansão da mancha urbana da cidade
dificultava bastante na distribuição dos mesmos, que essa dispersão fazia com
que os custos crescessem de forma astronômica, prejudicando diretamente a
população de menor poder aquisitivo. Ressaltando também que a Hidroservice em
sua análise demonstrou a dificuldade de se alocar os equipamentos de uso coletivo
como praças, escolas, postos de saúde etc., nesses novos bairros, pois de acordo
com os dados da empresa dos 114 novos loteamentos aprovados na década de
1960, quase a metade não previa áreas livres. (HIDROSERVICE, 1970: 2.1.3).
No entanto, o estudo da Hidroservice diagnosticou que mesmo com “o
intenso grau de desenvolvimento alcançado pela cidade, não se observou à
especialização em zonas, embora reconhecesse que esse processo estava em
curso” (HIDROSERVICE, 1970: 2.2.6).
Oliveira Neto (2005) destaca que o Plano Hidroservice estabelecia como
meta para 1985:
1) A definição da área de aglomeração e
2) A distribuição das funções por seis Grandes Zonas Homogêneas:
Centro Principal; Área Atacadista; Área Comercial Mista; Zona Industrial e Zonas
Residenciais de média e baixa densidades. Eram estabelecidas também zonas de
planejamento, definidas como: Centro principal de negócios e comércio; Zona
residencial em geral; Zona comercial mista, de expansão do centro principal; Zona
industrial e atacadista; e Zona de proteção paisagística.
O Plano da Hidroservice apresentou uma proposta audaciosa para a
região central da cidade, propondo a formação de um padrão de arquitetura que
tornasse harmoniosa sua paisagem, constituindo “blocos de comércio” com a
fachada mantendo a altura constante de 7 m; formando um conjunto de “torres”.
Cabe, porém, salientar em relação ao Plano alguns exageros propostos pela
Hidroservice, conforme destaca Oliveira Neto (2005):
Observa-se um rasgo de devaneio, somente imaginado na conjuntura
política e econômica em que estava mergulhado o país no final dos anos
sessenta. Pois, somente num ambiente de falta de liberdades e forte apelo
ao planejamento, como se encontrava o Brasil naquele momento, seria
possível imaginar total reformulação, inclusive física, de uma estrutura
urbana sedimentada, como era o centro de Campo Grande naquela
época. Esse tipo de proposição é a expressão do que poderia ser concebido
em planos elaborados por técnicos que não vivenciavam a realidade da
sociedade que produzia e se apropriava do lugar que estavam planejando.
(2005, p.130).
Houve excessos por parte do Plano na formulação das propostas a serem
executadas na cidade, mas o projeto previa a concretização de um plano viário com
obras que deveriam ser executadas em diversas ruas e avenidas. Parte dessas
obras foram realizadas no segundo mandato do prefeito Antônio Mendes Canale de
1970 a 1973, sendo continuado pelo prefeito Levy Dias de 1973 a 1977.
No ano de 1978 na gestão do prefeito Marcelo Miranda Soares ocorreu a
contratação do Escritório do arquiteto Jaime Lerner para a elaboração de uma nova
proposta de planejamento do espaço urbano de Campo Grande. Denominada de
Plano de Estrutura Urbana o projeto de Lerner propunha uma nova lei de uso do
solo, reestruturação viária e do transporte coletivo, como também reformulações de
algumas áreas públicas. No levantamento elaborado pelo escritório de Jaime Lerner
ficou constatado que tanto os principais equipamentos e serviços públicos, ainda se
concentravam fortemente na área central, sobrecarregando essa região e
ocasionando congestionamentos.
O plano promoveu uma tendência existente de descentralização das
atividades de comércio e serviços se localizarem nos corredores viários que
constituem as saídas da cidade. A Lei de Uso do Solo 1.747, de 1978,
estabeleceu para as avenidas Bandeirantes, Costa e Silva e Coronel Antonino, o
mesmo tratamento dado ao centro da cidade. Promovendo um maior adensamento
fora da área central e promovendo um maior fluxo de transporte e diversificação de
atividades. Essa diversificação proposta iria possibilitar a constituição de alguns
corredores naturais de expansão urbana, permitindo a concentração de habitação e
serviços nesses locais. Oliveira Neto ressalta, que de todos os planos e projetos
desenvolvidos o de Lerner foi o que previa a maior intervenção pública no espaço
urbano da cidade.
Desse modo, podemos observar que Campo Grande ao longo de sua
história e evolução urbana passou por uma série de transformações e por diversos
Planos e intervenções por parte do Poder Público no sentido de orientar a
estruturação de seu espaço urbano, porém na maioria das vezes esses projetos não
respeitavam as reais necessidades da população, pois eram propostos por técnicos
que desconheciam a realidade do seu cotidiano e realizavam planos que eram
impostos sem que houvesse uma discussão sobre sua viabilidade.
Isto se dava pela conjuntura política existente na época, onde o havia
liberdade para uma ampla discussão sobre os rumos da cidade. Essa pode ser uma
causa para não aceitação por parte da comunidade e um fator para que os mesmos
não tenham alcançado o resultado esperado, esses fatores e o crescimento cada
vez maior da cidade contribuíram para a criação da Unidade de Planejamento
Urbano de Campo Grande (PLANURB) que será ser abordado posteriormente.
4.1 A ADMINISTRAÇÃO DO PREFEITO JUVÊNCIO E O INÍCIO DA
DESCENTRALIZAÇÃO NA POLÍTICA URBANA EM CAMPO GRANDE
No ano de 1985, Juvêncio César da Fonseca foi eleito o primeiro dirigente
da capital do estado de Mato Grosso do Sul pelo voto direto após a
redemocratização política do país, exercendo o cargo de de janeiro de 1986 a 31
de dezembro de 1988.
Conforme citado, anteriormente, a década de 1980 foi marcada pelo fim
do regime militar e o processo de redemocratização do país e é nesse contexto que
Juvêncio assume o cargo de prefeito. A cidade apresentava uma posição estratégica
para o desenvolvimento, tinha uma população entre 350 e 370 mil habitantes,
apresentava uma taxa de crescimento da ordem de 7 a 8% ao ano e, no que se
refere à estrutura urbana, com diversos planos de intervenção para o ordenamento
urbano
12
, já mencionados anteriormente.
12
Projeto de Uso do Solo serefeito. Correio do Estado, Campo Grande, p.01 e 11, 31 de jan. 1986.
O prefeito Juvêncio César da Fonseca deverá retirar da Câmara e reelaborar o novo projeto de uso
do solo, retomando do ponto inicial, um trabalho que se estendeu durante mais de nove meses,
promovido na administração passada.
De acordo com relato do próprio prefeito da época, havia que se elaborar
uma estrutura legal que permitisse organizar um planejamento urbano, que
respondesse de forma adequada aquele crescimento. Para ele, era necessário
adotar medidas urgentes para minimizar o quadro de desorganização na estrutura
urbana da cidade.
Conforme Ebner (1999) Campo Grande é uma cidade espacialmente
dispersa, tal fato deve-se à ausência de barreiras físicas de grandes dimensões,
aliada às condições geológicas que facilitam a construção, viabilizando o
crescimento em todas as direções. Porém, é importante salientar que tal dispersão
espacial não se deve necessariamente à ausência de barreiras físicas, mas sim pela
política urbana adotada pelo poder público municipal e também pela forte influência
dos proprietários fundiários e dos promotores imobiliários que atuaram com o
propósito de obterem lucro, gerando especulação imobiliária. Isso contribuiu para o
aumento de vazios urbanos ocasionados pelo crescimento acelerado da cidade.
Os vazios foram aumentados também, em parte, pela política nacional de
habitação com implementação de conjuntos habitacionais em todo o país sem
nenhuma orientação, demonstrando falta de coerência no planejamento para a
ocupação dos vazios existentes. Naquele momento existia as Moreninhas com
aproximadamente 15 km de distância do centro e a Coophavilla II, quase nas
mesmas condições.
A existência dos vazios urbanos se caracterizava como um grande
problema para a administração municipal, que fazia crescer a prestação de
serviços e equipamentos públicos, como transporte coletivo, coleta de lixo, rede de
água, etc. e forçava os servidores públicos (professores, médicos, dentistas,
assistentes sociais) a se deslocarem para regiões de difícil acesso. Esses são
alguns elementos que demonstram as grandes dificuldades da prefeitura em cumprir
a missão de elaborar uma forma de trabalho capaz de ordenar o crescimento da
cidade naquele momento.
Buainain (2006) destaca que, naquele período, os programas de governo
eram elaborados mais para atrair a simpatia do eleitorado, do que para atender as
reais necessidades da cidade. Demonstrando a necessidade de se elaborar uma
legislação capaz de disciplinar o crescimento da cidade.
Entre os anos de 1982 e 1983 estava em execução o programa federal
criado para atender as “Cidades de Porte Médio”, onde eram oferecidos recursos
para institucionalizar o planejamento nesses municípios. Isso demonstrava que,
no início dos anos 80 havia, por parte da União, uma preocupação com o
crescimento acentuado das cidades no Brasil, principalmente pelo processo de
migração das pequenas cidades e áreas rurais para as cidades de porte médio.
Campo Grande se enquadrava perfeitamente nessa categoria de cidade com
crescimento populacional acentuado. Diante desta conjuntura os vereadores da
época, entre eles Fausto Matogrosso e o próprio Juvêncio, encaminharam na
Câmara de vereadores o projeto para a criação do Instituto de Planejamento Urbano
de Campo Grande.
Para compreender a realidade das cidades brasileiras nesse período,
desencadeado pelo processo de urbanização, recorremos a SANTOS (1994) que
descrevia as cidades, observando que, com diferença de grau e intensidade, todas
as cidades brasileiras exibiam problemáticas parecidas. O seu tamanho, tipo de
atividade, região em que se inserem etc., são elementos de diferenciação, mas em
todas elas problemas como: ausências de emprego, habitação, transportes, lazer,
água, esgotos, educação e saúde, são genéricos e revelam enormes carências. Daí
a necessidade das cidades em estabelecer critérios de ocupação e uma legislação
para ordenar esse crescimento e possibilitar uma melhor qualidade de vida para a
sua população.
Ainda no ano de 1983 foi realizada em Campo Grande uma “Semana de
Estudos Sobre os Problemas de Campo Grande”, onde foi inserida a discussão
sobre a necessidade de um instituto de planejamento para a cidade, demonstrando
a urgência para a realização desse trabalho.
Assim, na gestão do prefeito Juvêncio, de acordo com a lei nº 2.383 de 11
de Maio de 1987, foi criada na Estrutura Básica da Secretaria Municipal do
Planejamento, a Unidade de Planejamento Urbano de Campo Grande (PLANURB) e
dava outras providências.
De acordo com a lei:
Art. - A unidade de Planejamento Urbano de Campo grande (PLANURB),
é o órgão municipal encarregado de formular a política de desenvolvimento
urbano, tendo por finalidade:
I – a coleta, análise, sistematização e divulgação de informações
estatísticas, geográficas, cartográficas, conjunturais, de infra-estrutura, entre
outras;
II a elaboração, coordenação e acompanhamento de estudos, pesquisas,
planos físicos globais e setoriais, programas e projetos de natureza
urbanística, inclusive sua legislação;
III a análise e avaliação do desempenho da situação física,
socioeconômica e conjuntura, de natureza global ou setorial, no âmbito
externo e interno da Administração Municipal.
Art. 3º - A PLANURB tem a seguinte estrutura organizacional básica:
I – Órgão de Direção Superior:
a) Diretoria Executiva.
II – Órgãos de Assessoramento Técnico:
a) Centro de Documentação Técnica;
b) Assessoria Jurídica.
III – Órgãos de Atuação Programática:
a) Coordenadoria de Informações para o Planejamento;
b) Coordenadoria de Planejamento Global;
c) Coordenadoria de Monitoramento e Avaliação.
IV – Órgão de Apoio Técnico:
a) Núcleo de Editoração. (Lei nº 2.383 de 11 de maio de 1987)
A partir da criação do PLANURB foi montada uma equipe que era liderada
por José Marcos da Fonseca e Ângelo Marcos Vieira de Arruda, que organizaram
um grupo para criar, naquela gestão, o início de uma cultura de preocupação com o
futuro da cidade. Procurava-se também, possibilitar um processo para promover a
descentralização na gestão urbana da cidade, de modo que a população tivesse um
canal de participação nas decisões relacionadas à estruturação, pois se sabia dos
riscos de se encomendar pacotes prontos vindos de fora, por experiências próprias
como o plano de Jaime Lerner. Seria necessário realizar um trabalho que formasse
uma cultura, com a participação, com a inteligência, com a experiência e
principalmente com a história local.
De acordo com Ferrari (1991) todo planejamento deve ser politicamente
aceitável, isto é, quando atende aos justos anseios do povo. O simples crescimento
econômico de um país não deve ser confundido com desenvolvimento, que
pressupõe mudanças qualitativas ao lado do crescimento quantitativo dos valores
materiais. O homem deve ser valorizado dentro da comunidade, permitindo também
que ocorra, no campo social, um desenvolvimento que deve ser entendido,
qualitativamente, como “mudança de valores sociais”, para melhor.
Em um sentido amplo, planejamento urbano é um método de aplicação,
continua e permanente, destinado a resolver, racionalmente, os problemas
que afetam uma sociedade situada em determinado espaço, em
determinada época, através de uma previsão ordenada capaz de antecipar
suas ulteriores conseqüências; o planejamento é o processo de ordenação -
territorial - e previsão para conseguir a utilização ótima dos recursos de uma
sociedade – eficiência. (FERRARI 1991, p.03)
13
.
Diante dessa orientação e estimulados com o apoio da Associação dos
Engenheiros e Arquitetos, pela Associação dos Geógrafos e pelo Instituto de
Arquitetos do Brasil, foi realizado na cidade um seminário, cujo título foi “Um
seminário na busca de um órgão de Planejamento Urbano para Campo Grande”,
para efetivar o instituto criado na mara de Vereadores
14
. No entanto, havia a
preocupação de que aquela unidade tivesse uma estrutura que não permitisse os
vícios de outras.
No seminário estiveram presentes autoridades responsáveis por institutos
de outras cidades (de Curitiba, de Goiânia e de Florianópolis) que deram a sua
contribuição com idéias e possibilidades a serem utilizadas em Campo Grande, pois
cada um tinha a sua experiência na implantação desse modelo de Instituto. De
acordo com o prefeito era necessário a criação de um órgão leve e ágil que
representasse uma inovação na forma de trabalho para o país.
Pensava-se, desta forma em possibilitar a expansão da cidade de
maneira ordenada, tendo uma prática moderna de planejamento urbano. O grande
desafio era mostrar que a equipe montada era suficientemente capaz de produzir um
modelo de planejamento em condições de atender as necessidades locais e criar
projetos de lei sobre o espaço urbano, disciplinando a sua expansão.
Para que mais uma etapa de trabalho fosse elaborada, foram trazidas
para a cidade diversas autoridades, na época bastante respeitadas e que tinham
obras executadas nessa área de atuação. Uma das autoridades contratadas foi o
arquiteto Sérgio Zaratin
15
que, com sua experiência, escutava as proposições da
13
Definição da Carta dos Andes, elaborada em outubro de 1958, Colômbia, pelo “Seminário de
Técnicos e funcionários em Planejamento Urbano” promovido pelo CINVA – Centro Interamericano de
Vivenda e Planejamento
14
Prefeitura cria Conselho Urbano. Correio do Estado, Campo Grande, p.11, 04 agosto 1986. Até o
final do mês o prefeito Juvêncio César da Fonseca vai criar um Conselho Comunitário de
Planejamento Urbano, integrado por representantes de todos os segmentos sociais e que terá caráter
consultivo. A proposta de criação do Conselho foi uma das conclusões tiradas durante o recente
seminário promovido pela Secretaria de Controle Urbanístico, que discutiu a implantação de um órgão
especifico para o planejamento urbano em Campo Grande.
15
Arquiteto e Urbanista formado pela FAU/USP, em 1960, Sérgio Zaratin era assessor de
Programação e Planejamento da EMPLASA/SP e tido como das grandes autoridades na área.
equipe e depois passava orientações no sentido organizar as ações a serem
desenvolvidas.
Um importante ponto a ser destacado é que ele era pago por hora e não
mais por pacote como acontecia anteriormente. Este profissional vinha, ouvia as
sugestões apresentava suas propostas que, posteriormente, eram discutidas e,
quando aceitas, cabia à equipe de trabalho executar as tarefas para depois serem
feitas às avaliações dos objetivos alcançados. Dessa forma, passou a se
desenvolver, naquela equipe de trabalho, uma cultura própria estabelecendo uma
importante etapa para o amadurecimento profissional dos envolvidos.
No ano de 1988, foi alterada a lei do Uso e Ocupação do Solo
16
, que
antecedeu o Plano Diretor, porém, era necessária a criação de uma lei que
permitisse viabilizar o crescimento da cidade, que a lei anterior era tida como uma
camisa de força que impedia sua expansão, sem citar as inúmeras irregularidades
que ocorriam nos licenciamentos e estabelecimentos.
Sobre a criação da lei de Uso e Ocupação ser anterior ao Plano Diretor o
arquiteto Sérgio Zaratin deu uma entrevista minutos após a cerimônia de sanção da
nova lei, para defender sua tese:
Zaratin, muitos afirmam que um Plano Diretor deveria proceder à
elaboração de uma lei de Uso do Solo, e acaba de ocorrer o inverso: foi sancionada
a Lei de Uso do Solo para posterior elaboração do Plano Diretor. Como é isto?
[...] Na lei de Uso do Solo de Campo Grande existem concretamente as
diretrizes para a elaboração do Plano Diretor. Essas diretrizes são apoiadas
na visão econômica e social baseada fundamentalmente no fato de que
Campo Grande cresceu 6% ao ano de 1960
a 1970, cresceu 8% de 70 a 80
e vai chegar em 90 tendo crescido 8% da população. Com essas taxas,
Campo Grande vai chegar no ano 2000 com 1,5 milhão de habitantes.
Então, que emprego será necessário? E que previsões você tem que fazer
de espaço para que as atividades que vão prover esse emprego possam se
instalar? E todo um processo de industrialização calcado no setor
primário e também a atividade de serviços. Outra coisa claramente no
Plano Diretor a idéia de que a Constituição Civil deve ser estimulada porque
nós queremos realmente que o empresário entre na produção de habitação
para as faixas de renda inferiores. Isso tudo, evidentemente, especialmente
direcionado. E tudo isso está na base desta lei
17
.
16
CAMPO GRANDE. Lei 2567, 08 de dezembro de 1988. Dispõe sobre o Ordenamento do Uso e
Ocupação do Solo do Município de Campo Grande MS e outras providências. Diário Oficial de
MS, 12 dez. 1988. nº 2453.
17
Trecho da entrevista O pai da matéria: Sérgio Zaratin; 1ª parte. Custos e obras, v. 02, nº 22, p. 3-5,
1989.
Com a lei de Uso do Solo anterior, ocorria que o comércio não podia se
expandir, por ser zona residencial. A cidade estava impedida de crescer
verticalmente, pois também havia restrições na lei. O projeto de Lerner estabelecia
os corredores de transporte, criando as zonas de alta, média e baixa densidade.
Segundo Zaratin a cidade era tratada de forma linear, pois previa o
adensamento, de acordo com a criação de eixos de transporte de massa (que não
se viabilizaram por falta de recursos).
Esta lei foi fundamental, tanto no sentido de avançar um pouco mais os
limites do perímetro urbano, ao mesmo tempo, estabelecendo uma política voltada à
ocupação dos interstícios e vazios não loteados. Padrões menores de loteamento
foram constituídos, visando o barateamento dos mesmos, para abrigar o
expressivo contingente de trabalhadores excedentes do campo, despejados na
cidade. Esse tipo de intervenção contribuiu no surgimento de focos de maior
adensamento urbano.
A nova lei seria uma ferramenta para monitorar de forma mais apropriada
a vocação natural que se estabelecia nos diferentes pontos da cidade, como por
exemplo, a vocação para o comércio de implementos agrícolas e de autopeças na
av. Calógeras.
Sobre a lei do Uso do Solo o então prefeito argumentou que a nova lei foi
elaborada para um determinado momento, pois as cidades não são estáticas e que
é impossível adotar um planejamento definindo a direção e a vocação de cada uma
de suas regiões. É preciso respeitar e possibilitar uma certa autonomia de expansão
urbana. Pois ela deve ser direcionada e não autoritariamente estabelecida
(BUAIANAIN, 2006).
Durante o processo de elaboração da lei de Uso e Ocupação do Solo,
houve a preocupação de mobilizar os segmentos da sociedade, principalmente o
CMDU – Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano.
O CMDU foi criado de acordo com o decreto 5.484 de 09, de março de
1987, considerando a necessidade de assegurar a ampla discussão no âmbito da
Administração e da Comunidade, das políticas, das diretrizes e planos de
desenvolvimento municipal. Também diante do interesse do Poder Executivo de
estimular e garantir a participação da comunidade no processo de tomada de
decisões sobre o desenvolvimento e a organização físico-territorial do município.
De acordo com o Art. do decreto, compete ao (CMDU) dar parecer
sobre planos, programas e projetos globais ou setoriais, que visem o
desenvolvimento urbano integrado, encaminhados prévia e obrigatoriamente pelo
Executivo Municipal, a título de consulta, demonstrando que o CMDU foi criado
como conselho consultivo.
No que se refere aos conselhos de desenvolvimento urbano, SOUZA
(2004) destaca que, ao lado dos conselhos de orçamento participativo, são as
instituições-simbolo de um esforço consistente de democratização da cidade.
Segundo o autor, os conselhos de desenvolvimento urbano são instâncias
participativas referentes ao planejamento da cidade: definição, elaboração e
acompanhamento da implementação de políticas públicas e intervenções diversas,
tais como planos diretores, políticas setoriais de transportes e meio ambiente,
programas de urbanização de favelas, e outros.
Embora tenha sido institucionalizado em 1987, o CMDU foi implantado
no final de 1988, devido a uma articulação para definir sua composição, gerando um
ambiente de parceria e estabelecendo sintonia com a Constituição Federal de 1988,
que estabelecia a formação de um sistema de gestão democrática em várias áreas
da administração pública. Dentre elas, o planejamento participativo firma a
cooperação no planejamento local das associações representativas como um
preceito a ser observado pelos municípios (Art. 29, XII). Os fatos demonstram uma
abertura na gestão pública municipal e a firmação do processo de descentralização,
marcando o fim do período da administração autoritária. Esse era o caminho para se
compatibilizar as decisões tomadas pelo executivo com a vontade da população.
Daqui por diante pretendemos fazer algumas considerações sobre a
atuação do CMDU na política urbana municipal estruturação urbana de Campo
Grande e analisar a sua contribuição nesses quase vinte anos, verificando os
diferentes momentos, onde existiram épocas de efetiva participação e outras menos
expressivas.
Procuramos demonstrar que houve diferentes gestões dos diretores-
executivos do PLANURB, que na sua maioria eram arquitetos e apresentavam uma
visão bem mais urbanística visualizando a cidade em seu aspecto funcional, com
ações denominadas corporativistas. Houve mudança a partir do momento que
assumiu a direção do Instituto uma profissional cuja formação esta voltada para as
ciências humanas e dando um novo foco de trabalho para este órgão vislumbrando
a cidade enquanto fenômeno social.
4.2 O PROCESSO DE DISCUSSÕES PARA A IMPLANTAÇÃO DO
PLANO DIRETOR
Para subsidiar os trabalhos na elaboração do Plano Diretor de Campo
Grande, foi elaborado um documento que serviu de suporte para direcionar as
etapas referentes às discussões e possibilitar a participação popular e o processo de
discussões que deveriam ser conduzidos pela Unidade de Planejamento Urbano
PLANURB e Prefeitura Municipal, contando com a assessoria do Instituto Brasileiro
de Administração municipal – IBAM.
Nesse documento foi feita uma análise pela socióloga Linda Gondim,
chefe do Centro de Estudos e Pesquisas Urbanas CPU, do IBAM, que se baseou
em pesquisas sobre os seguintes pontos:
a) Levantamento da bibliografia e documentação existentes;
b) Leitura e análise da legislação e das atas das reuniões do Conselho
Municipal de Desenvolvimento Urbano – CMDU;
c) Observação de uma reunião do CMDU;
d) Conversas e entrevistas informais com técnicos da prefeitura, membros
do CMDU e de participantes de associações de moradores;
e) Entrevistas com uma amostra de sete conselheiros (dois
representantes do poder blico, dois representantes do setor imobiliário, dois
representantes de associações profissionais e um representante da sociedade civil).
O primeiro passo para a elaboração do documento foi à formulação de
diretrizes na qual se definiu um quadro conceitual e um quadro institucional amplo,
complementado por uma visão sociopolitica local. Essas diretrizes estavam apoiadas
na realidade político-administrativa identificada e procurando aproveitar ao máximo a
experiência e as sugestões apresentadas, tanto pelos técnicos e dirigentes
municipais ouvidos, quanto por aqueles que eram os agentes dos processos
participativos de Campo Grande naquele momento.
No quadro conceitual foi realizada uma reflexão sobre a utilização, nos
dez anos anteriores da expressão “participação comunitária”, mostrando que a
mesma havia se tornado quase que comum nos planos e programas
governamentais brasileiros. Nele, Linda Gondim demonstra a ambigüidade com que
a “participação comunitária” vinha sendo utilizada para designar práticas díspares e,
por vezes, contraditórias. Demonstrando que era preciso evitar confundir a
participação com mecanismos manipuladores da população, como o processo de
cooptação de determinados grupos, por meio de comissões e conselhos que tinham
como única função legitimar as decisões tomadas pelo poder público sem o
conhecimento e controle popular.
Para Gondim (1988) não se deve, tampouco, confundir participação com
consulta para a identificação de necessidades, ou com a criação de canais para que
o poder público receba reivindicações. Nestes casos, pode-se até dizer que a
comunidade participou da identificação de problemas, mas tal participação é
insuficiente, na medida em que cessa justamente nos momentos mais importantes,
ou seja, quando se trata de encontrar soluções para os problemas, implementá-las e
avaliá-las.
A participação genuína requer o envolvimento em todas as etapas do
processo decisório. Quem participa não se limita a referendar, executar e dar
sugestões; deve haver condições para apresentar e debater propostas, deliberar
sobre elas e, sobretudo, mudar o curso de ação estabelecido pelos dirigentes e
formular cursos de ação alternativos. (GONDIM, 1988).
O exercício democrático, porém, pressupõe a convivência de grupos de
interesse que divergem não somente quanto aos meios, mas também quanto aos
próprios objetivos a serem atingidos pela sociedade e o governo. Neste contexto,
se torna viável falar de participação quando se reconhece que o planejamento é uma
atividade não técnica, como política. Na linha que propõe uma definição mais
política para o planejamento, parece coerente aceitar a noção de Plano Diretor como
um pacto ou compromisso do governo com a população.
Sobre o quadro institucional, Linda Gondim chamou a atenção para o fato
de que o debate sobre a participação popular na administração pública acompanhou
o processo de abertura democrática do sistema político brasileiro, iniciado na
década de 1980. E que, com a promulgação da Constituição Federal em 1988, ficou
evidente a preocupação em garantir à população um papel de maior participação no
processo decisório.
Segundo Linda Gondim a constituição Federal, como não poderia deixar
de ser, não especificou qual a natureza dos planos diretores, nem deu dicas para a
metodologia de sua elaboração. A Constituição do Estado de Mato Grosso do Sul,
por sua vez, foi sucinta na caracterização da política urbana e do plano diretor.
Desse modo, esperava-se que as leis orgânicas municipais fornecessem diretrizes
mais precisas para adequar as exigências constitucionais às realidades locais.
Dentro da visão sociopolitica, Campo Grande capital do estado de Mato
Grosso do Sul, destacava-se como pólo econômico e de atração de migrantes,
sendo locus de decisões e disputas de natureza político-administrativa. A formação
do espaço urbano de Campo Grande, sua expansão e as modificações no seu uso,
eram o reflexo da atuação de múltiplos agentes, dentre os quais se destacavam: o
poder público; os empresários dos setores imobiliário, industrial, comercial e de
prestação de serviços; e os moradores. Dentre estes últimos, os grupos de baixa
renda apresentavam papel importante pois, na medida em que não tinham acesso à
habitação, criavam formas alternativas de ocupação do espaço, como invasões e
favelas, que escapavam ao controle do poder público.
Era imprescindível, então pensar formas de garantir a participação
democrática no planejamento da cidade, identificando seus interesses e as formas
de atuação, com a identificação de organizações e lideranças.
Para viabilizar as ações dentro das limitações existentes, adotou-se como
estratégia, partir da análise de um campo de forças previamente delimitado e cuja
importância para o desenvolvimento de Campo Grande era conhecida de antemão:
o Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano – CMDU.
Com base nos documentos obtidos, foi feita uma breve análise das
associações de moradores, sendo complementada com depoimentos. Pode-se dizer
que o movimento de moradores era ainda incipiente e frágil, pois havia reduzida
participação e a dependência de suas organizações quanto a recursos e iniciativas
do poder público pareciam ser problemas crônicos na trajetória do movimento.
Não constam informações sobre a atuação desse tipo de entidades na
primeira metade da década de 1980, mas sabe-se que, no final de 1985, lideranças
comunitárias com o intuito de revitalizar as questões relacionadas aos movimentos
comunitários, elegeram uma junta governativa para a Federação, denominada de
FAMEMS (Federação das Associações de Moradores do Estado de Mato Grosso do
Sul).
Vale mencionar ainda a União Campo-grandense de Associação de
Moradores de Favelas – UCAF, criada na administração Juvêncio César da Fonseca
(1986-1989).
Além da pouca participação dos moradores de bairros e das divisões
internas, a cooptação pelo poder público era um fator que enfraquecia o movimento.
Sobre isso, deve-se mencionar que havia o recrutamento de dirigentes de
associações para trabalhar como funcionários municipais.
Era evidente o distanciamento das associações com a administração
municipal, mas existia o interesse em dinamizar e democratizar o funcionamento das
organizações de moradores, inclusive na estrutura interna das associações com a
organização de diretorias colegiadas. O fato de o movimento de bairros contar com
apenas um representante no CMDU, limitava as possibilidades de sua participação
nas discussões e decisões sobre o desenvolvimento da cidade. Esta limitação era
preocupante na medida em que apesar da fragilidade citada e de outros problemas
já apontados, as entidades que congregavam as associações de bairros, que eram o
único canal orgânico possível de expressar diretamente os interesses do morador
das áreas mais carentes de Campo Grande.
No iniciar do processo de discussão e elaboração do Plano Diretor de
Campo Grande considerou-se importante a realização de palestras, eventos e
consultorias, que direta ou indiretamente contribuíssem para a renovação das
discussões com toda a comunidade, acerca do planejamento urbano, meio
ambiente, desenvolvimento, justiça social e gestão democrática da cidade,
possibilitando assim a formulação de uma metodologia de trabalho que permitisse a
efetiva participação popular nas decisões do Poder Executivo.
Neste sentido, realizou-se em parceria com a Associação dos Geógrafos
Brasileiros – AGB/Campo Grande e Instituto de Arquitetos do Brasil-MS o ciclo de
palestras: Cidades Brasileiras: desejos e possibilidades. Programa de estudos
urbanos que foi realizado em seis finais de semana, visando instrumentalizar
técnicos e cidadãos para a discussão ampla e permanente das conseqüências do
desenvolvimento da cidade. Participaram como palestrantes profissionais
experientes, conhecedores da realidade urbana brasileira, como o Arquiteto Sérgio
Zaratin, a Geógrafa Ana Maria Marangoni, o Sociólogo Luis César Queiróz, o
Arquiteto Rafael Derly, o economista Paul Singer e os ex-prefeitos de fortaleza
Juraci Vieira de Magalhães, de Goiânia Nion Albernaz, de Porto Alegre Olívio de
Oliveira Dutra e de Campo Grande Juvêncio César da Fonseca. Além disso, foram
realizadas consultorias especificas sobre drenagem urbana, ocupação de fundos de
vale, análises de impacto ambiental, parques urbanos e direito urbanístico.
Do final da primeira administração do prefeito Juvêncio César da Fonseca
(quando foram criados o PLANURB e o CMDU) para o início da segunda (espaço
compreendido do ano de 1989 a 1993), os quatro anos da administração do prefeito
Lúdio Coelho não apresentaram nenhuma melhoria significativa na estruturação
urbana da cidade, ressaltando que foi enviado para a Câmara dos vereadores um
projeto para a elaboração do Plano Diretor que, no entanto, nem chegou a ser
discutido. Isso se deu, devido à falta de continuidade da política urbana iniciada e
que não foi mantida, devido à prática bastante utilizada até os dias atuais, onde
mesmo os projetos que apresentam resultados satisfatórios são interrompidos ou
mudados totalmente porque pertencem a um outro partido ou é de autoria de outro
prefeito. Isto fez com que se interrompesse o processo inicial de fomentação de uma
cultura voltada a pensar a cidade de modo a ordenar o seu crescimento. O ponto
principal para o desmantelamento desse trabalho foi à demissão de várias pessoas
ligadas ao PLANURB, propiciando a ruptura daquela equipe formada inicialmente e
que deveria permanecer unida para avançar com proposições que efetivassem a
participação da população nas questões relacionadas à cidade.
Em seu segundo mandato o prefeito Juvêncio retomou as questões
urbanas, transformando a Unidade de Planejamento (PLANURB) em Instituto
18
. O
motivo para essa mudança era possibilitar uma qualificação dos profissionais
envolvidos e sedimentar uma cultura no pensar a cidade que se tornasse
permanente, adquirindo uma personalidade própria, apresentando autonomia e
independência política para agir. A preocupação era poder desvencilhar o Instituto
de Planejamento Urbano da Secretaria de Planejamento, pois dessa forma ficaria
mais difícil manipulá-lo.
Sob o ponto de vista do planejamento urbano, o grande desafio a ser
superado era de dar continuidade ao trabalho iniciado na primeira administração do
prefeito Juvêncio César da Fonseca e, a partir daí, possibilitar as discussões para a
18
CAMPO GRANDE. Lei 3.183, de agosto de 1995. Cria o Instituto Municipal de Planejamento
Urbano de Campo Grande – PLANURB – e dá outras providências.
elaboração do Plano Diretor da cidade, que era o documento mais importante a ser
criado.
Foram realizadas diversas reuniões públicas com a temática: “Campo
grande e o Plano Diretor. Que cidade queremos?”, nessas reuniões eram discutidos
os principais problemas enfrentados por cada um dos bairros visitados. Inicialmente
havia uma discussão sobre a realidade daquele bairro e as reivindicações da
comunidade. Depois eram feitas algumas questões que serviam para nortear o
trabalho.
Essas questões descritas aqui foram retiradas da reunião pública
realizada no clube de mães “Lindo Jardim do Éden”, no bairro Guanandy:
1) Da discussão da manhã, cite os pontos positivos e negativos que se
destacaram.
2) Do que você discorda?
3) com o que você concorda?
4) O que você não entendeu?
5) Dos problemas citados, quais você conhece muito bem? No seu bairro,
ou na sua cidade?
6) O que faltou discutir?
7) O que você acha muito importante para a cidade?
De acordo com as respostas do questionário aplicado foi traçado um perfil
da real necessidade da população, que demonstrava um interesse nas causas
sociais, como pode ser observado na fala da representante do clube de mães do
bairro Guanandy que, na época, se mostrava contrária à compra de um terreno onde
estava situado o Banco do Brasil, por parte da prefeitura municipal, localizada na rua
25 de Dezembro com a Maracaju, para a construção de uma praça pública num
bairro nobre da cidade, cujo valor estimado seria capaz de comprar 800 carros Uno
zero km:
[...] em nome do Clube de Mães do Guanandy, peço as autoridades que
dêem apoio para as crianças, profissionalizando-as a nível de capital,
usando o prédio do Banco do Brasil para implantação de um centro
profissionalizante, onde essas crianças de rua possam aprender uma
profissão e as empresas possam admiti-las sem problemas, como qualquer
outro profissional. Antes, porém, seria interessante que essas crianças de
rua, passassem por um psicólogo, porque podem estar na rua por um
problema emocional e todos tem a sua história e se não tirarmos da rua,
com certa urgência, a tendência é que eles mergulhem no mundo das trocas
por se sentirem desprezadas de tudo e de todos. (Trecho da reivindicação
da representante do clube de mães do bairro Guanandy, 24 dez. 1993).
Apesar de Campo Grande contar, naquele momento, com um conjunto
de leis urbanísticas (Lei de Uso e Ocupação do Solo, Lei sobre habitação de
Interesse Social, entre outras) e de possuir o Conselho Municipal de
Desenvolvimento Urbano CMDU, as matérias referentes ao Direito Urbanístico
eram sistematicamente prejudicadas no que se referia à discussão, por falta, dentre
outras coisas, de difusão e aprofundamento dos conhecimentos disciplinares
referentes ao assunto.
Mesmo as legislações existentes, vistas de regra, foram geradas com a
participação de especialistas de outras cidades. Por isso foi proposta a realização do
Curso de Direito Urbanístico. O curso foi realizado de 18 a 22 de julho de 1994,
tendo a participação das professoras Mirian Fontenelle (advogada) e Nídia Inês
Albeza de Rabi (arquiteta), ambas técnicas do IBAM.
Depois da realização de várias reuniões públicas, seminários,
capacitações e estudos realizados pela comunidade com o intermédio do
PLANURB, o processo de discussão foi encaminhado para o CMDU para que esse
conselho apresentasse seu parecer.
4.3 A IMPORTÂNCIA DO CMDU COMO INSTRUMENTO DE
PARTICIPAÇÃO POPULAR NO PLANEJAMENTO URBANO DE
CAMPO GRANDE
A criação do CMDU veio de encontro a um movimento de profissionais
ligados à área do urbanismo e do planejamento urbano, utilizado para estabelecer
um canal de comunicação mais direto entre o poder público e a população, tendo
como principal objetivo atuar junto ao planejamento urbano de Campo Grande.
Diante desta motivação, um fato específico parece ter influenciado na decisão do
então prefeito Juvêncio César da Fonseca de criar, em março de 1987, o Conselho:
a elaboração de uma nova lei de uso e ocupação do solo para substituir a que
estava em vigor.
O CMDU foi formulado a partir do decreto 5.484, de 09 de março de
1987, o CMDU então denominado de Conselho Municipal de Desenvolvimento
Urbano tinha como atribuição dar “parecer sobre planos, programas e projetos
globais setoriais, que visavam o desenvolvimento urbano integrado, encaminhados
prévia e obrigatoriamente pelo Executivo Municipal, a título de consulta” (art. 5º).
Esse conselho reuniu-se pela primeira vez em 08 de dezembro de 1987, e em seu
primeiro ano de funcionamento teve a seguinte composição:
a) O Prefeito Municipal de Campo Grande (MS);
b) O Secretário Municipal de Planejamento e respectivo suplente;
c) O Secretário de Estado de Planejamento e Coordenação Geral de Moto
Grosso do Sul e respectivo suplente;
d) Um representante da Secretaria Especial de Meio Ambiente de Mato
Grosso do Sul e respectivo suplente;
e) Um representante da Fundação de Cultura de Mato Grosso do Sul e
respectivo suplente;
f) Um representante da Associação Comercial de Campo Grande e
respectivo suplente;
g) Um representante da Associação dos proprietários de Imóveis de
Campo Grande e respectivo suplente;
h) Um representante do Sindicato das Empresas de Compra e Venda,
Locação e Administração de Imóveis Residenciais e Comerciais do Estado de Mato
Grosso do Sul – SECOVI e respectivo suplente;
i) Um representante do Sindicato da Construção Civil e do Mobiliário de
Campo Grande e respectivo suplente;
j) Um representante do Sindicato dos Corretores de Imóveis no Estado de
Mato Grosso do Sul e respectivo suplente;
k) Um representante do Sindicato dos Empregados no Comércio de
Campo Grande/MS e respectivo suplente;
l) Um representante do Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Mato
Grosso do Sul e respectivo suplente;
m) Um representante da União das Associações de Moradores de Campo
Grande – UMAM e respectivo suplente;
n) Um representante do Instituto dos Arquitetos do Brasil IAB
Departamento de Mato Grosso do Sul e respectivo suplente;
o) Um representante da Associação dos Engenheiros e Arquitetos de
Campo Grande e respectivo suplente;
p) Um representante da Associação dos Economistas de Mato Grosso do
Sul e respectivo suplente;
q) Um representante da Associação dos Advogados de Campo Grande e
respectivo suplente;
r) Um representante da Associação dos Geógrafos Brasileiro Seção
Campo Grande/MS e respectivo suplente.
Analisando a composição do CMDU, pode-se observar que os setores
mais diretamente ligados à produção do espaço urbano estavam super-
representados. Fazendo parte do conselho quatro representantes de entidades do
setor imobiliário e dois representantes de entidades de profissionais de arquitetura e
engenharia.
Importante ressaltar que na medida em que o conselho foi concebido para
tratar assuntos relacionados com o desenvolvimento urbano, tornava-se difícil
justificar a presença e a inclusão de entidades de interesse mais genéricos como, o
Sindicato dos Jornalistas Profissionais e a Associação dos Advogados de Campo
Grande.
Em 04 de julho de 1988, com a Lei 2.503, o CMDU sofreu uma
alteração, passando a ser denominado como Conselho Municipal de
Desenvolvimento e Urbanização que dispôs sobre o processo de planejamento e
participação comunitária no desenvolvimento do Município de Campo Grande, tendo
como intenção ampliar a atuação e a composição do CMDU, que passou a ter como
objetivo “emitir pareceres sobre quaisquer planos, programas, projetos globais ou
específicos” (e não setoriais – “caput” do art. 3º).
Além disto, teve ampliadas suas atribuições na área de desenvolvimento
urbano, cabendo a partir de então “emitir pareceres sobre matéria relacionada com a
preservação do Patrimônio Natural e Cultural, bem como sobre áreas de Proteção
Ambiental” (art. 3º, § 2º).
Quanto à composição, a lei 2.503 previu a possibilidade de aumentar o
número de conselheiros para um máximo de 23 pessoas, distribuídas da seguinte
forma:
a) 5 (cinco) representantes da administração municipal e estadual;
b) 12 (doze) representantes das Associações e Sindicatos da Sociedade
Civil;
c) 6 (seis) representantes dos Institutos ou Associações Profissionais
(art. 3º, § 1º).
A mudança prevista incidiu, efetivamente, sobre os representantes de
associações e Sindicatos da Sociedade Civil, que contava com sete representantes
podendo acrescer até cinco conselheiros.
Naquele momento existiam críticas quanto a composição do CMDU que
continuava fortemente influenciado pelo objetivo que havia lhe dado origem, ou seja,
a discussão da Lei de Uso e Ocupação do Solo.
Demonstrando que a prática do CMDU estava somente voltada para as
questões urbanísticas, e observando a ausência de representantes de determinadas
entidades, considerando a necessidade de haver um maior número de
representantes dos moradores de baixa renda, além da inclusão de um número
maior de entidades de trabalhadores, sendo citados alguns sindicatos, como por
exemplo, dos Trabalhadores de Construção Civil, dos Bancários, dos Transportes
Coletivos e dos Correios e Telégrafos.
Havia aqueles que apontavam lacunas nas áreas representadas pelo
CMDU, que deveria contar com a participação de profissionais de todas as áreas em
que atuava a administração municipal. Porém, era necessário ter em mente que o
objetivo do conselho não era o de funcionar como um órgão técnico multidisciplinar,
papel este desempenhado pelo PLANURB. O que se buscava era um órgão
representativo dos interesses da população pertinentes ao desenvolvimento urbano
e para isto devia-se buscar diversificação, mas principalmente visão de conjunto dos
problemas da cidade.
Estava claro que o que ocorria então, era um trabalho voltado para o
urbanismo e o desenvolvimento urbano e que no curso desse processo privilegiava-
se o papel dos produtores do espaço urbano e do saber técnico, sendo necessário
modificar esta situação e incluir outros aspectos do desenvolvimento, como também,
contemplar formas mais eqüitativas dos interesses dos outros agentes que atuam na
cidade.
O CMDU foi criado para ser um órgão eminentemente político, que devia,
sim, lançar mão do conhecimento técnico, mas não produzi-lo. O conselho foi criado
“para ser uma válvula de acesso ao poder público” e ser o intermediário entre a
população e a Prefeitura, na formulação de projetos antes destes serem
encaminhados para a Câmara de Vereadores.
Mesmo antes da elaboração do Plano Diretor de Campo Grande
haviam sinalizações no sentido de o CMDU não ser o único fórum aberto à
participação direta da população. Indicando a necessidade do surgimento de
conselhos, que permitissem a descentralização espacial do processo decisório,
através da criação, por exemplo, de conselhos distritais e conselhos por bairros ou
regiões administrativas.
E, esse novo mecanismo de participação da sociedade, foi criado a partir
da elaboração do Plano Diretor de Campo Grande de 1995, que estabeleceu a
divisão por regiões urbanas da cidade, sinalizando para a implementação dos
conselhos que fossem representativos de cada região urbana, conforme se
abordado posteriormente.
Nesses quase vinte anos o CMDU sofreu algumas mudanças em sua
composição como veremos adiante, porém deve-se ressaltar que, nesse período de
existência, foram muitas as contribuições do CMDU em projetos de urbanização
negociada: Critérios para emissão, critérios para emissão de Guias de Diretrizes
urbanísticas, criação dos Conselhos Regionais, Hierarquização do Sistema Viário,
alteração do Código de Obras, desafetação de áreas públicas, Plano Plurianual
l998/2001, Plano de Gestão Integrada do Transporte e Trânsito de Campo Grande,
Hierarquização do Sistema Viário, Política municipal de Habitação, Sistema
Municipal de Licenciamento Ambiental, Revisão da Lei de Uso e Ocupação do Solo,
Projetos de Lei de Diretrizes Orçamentárias, Outorga Onerosa de Construção,
legislação de loteamentos fechados (condomínios horizontais), construção da
penitenciária de segurança máxima, Projeto Novos Bairros, entre outros.
As reuniões do CMDU acontecem uma vez ao mês na Plenária
Engenheiro Nilo Javari Barem (auditório do Planurb) e extraordinariamente quando
necessário.
4.4 O PROCESSO DE DISCUSSÃO NO CONSELHO MUNICIPAL DE
DESENVOLVIMENTO URBANO, DO PROJETO DE ELABORAÇÃO DO
PLANO DIRETOR
Com base nos resultados das reuniões públicas, dos seminários e outros
estudos realizados pela PLANURB, no dia 10 de maio de 1994, em reunião
extraordinária, a Prefeitura Municipal de Campo Grande remeteu ao Conselho
Municipal de Desenvolvimento e Urbanização CMDU o anteprojeto de lei sobre “a
Política de Desenvolvimento do Município de Campo Grande, o Plano Diretor
Urbano” (documento nº 17) para discussão e parecer, de acordo com as disposições
previstas na Lei 2.503.
Na ocasião foram indicados como relatores os conselheiros Marcos
Augusto Netto e Cleonice Le Bourlegat, respectivamente representantes do
Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis
Residenciais e Comerciais SECOVI e da Associação dos Geógrafos Brasileiros
AGB/Campo Grande.
Foram então realizadas entre os dias 18 de maio a 21 de junho de 1994,
sete reuniões para discussão da matéria, nas quais a Unidade de Planejamento
Urbano de Campo Grande PLANURB participou como convidada, para prestar
esclarecimentos e fornecer as informações necessárias.
No dia 05 de agosto de 1994 foi entregue, conforme o regulamento do
CMDU, o Relatório-Voto
19
(documento nº 18).
Nos dias 17, 24 e 31 de agosto de 1994, o Relatório-Voto foi exposto em
plenário e colocado em discussão.
Dada a abrangência das matérias contidas no anteprojeto de lei e as
proposições e recomendações apresentadas no Relatório-Voto e nas próprias
discussões empreendidas, no dia 31 de agosto de 1994, o CMDU constituiu um
grupo de acompanhamento, que se responsabilizou em discutir com a equipe do
PLANURB, as eventuais alterações feitas em conseqüência do processo de
discussão realizado até então.
Este grupo foi composto pelos conselheiros Marcos Augusto Netto,
Cleonice Le Bourlegat, Alex Maymone da Silva, Ângelo Marcos Vieira de Arruda e
Fernando Madeira que se reuniram em oito oportunidades, entre os dias 06 de
outubro e 08 de novembro de 1994, na sede do PLANURB para discussão do
projeto de lei reformulado (documento 19), quando os trabalhos foram dados
como concluídos e o PLANURB elaborou a versão do Projeto de Lei a ser enviada à
Câmara Municipal de Campo Grande.
19
Relatório-voto é o parecer sintetizando o resultado dos trabalhos realizados no Conselho Municipal
de Desenvolvimento e Urbanização sobre determinado assunto que tenha sido discutido.
Ficou estabelecido que os Relatores apresentariam, em plenário, o
Relatório-Voto, também complementado pelo processo de discussão, para votação
final (documento nº 25).
À guia de sistematização, pode-se dizer que o anteprojeto de lei foi
discutido principalmente:
Quanto à sua estrutura legislativa, em relação à Lei Orgânica de
Campo Grande e à Constituição Federal.
2º Quanto ao seu conteúdo, em relação aos dispostos na Lei Orgânica de
Campo Grande e na Constituição Federal.
Quanto ao seu conteúdo, em relação às especificidades de Campo
Grande, suas características e problemas e ás formas de enfrentamento.
Assim como o processo de discussão exigiu empenho e paciência, as
próprias discussões foram, muitas vezes, complexas e difíceis. Até pelo caráter do
anteprojeto de lei, composto de matérias de conhecimento multidisciplinar, com
mútuas influências. As discussões, por isso, não se limitaram ao texto encaminhado
pela Prefeitura Municipal de Campo Grande, nem ao contido no Relatório-Voto
produzido, tratando desde questões de encaminhamento administrativo, passando
por discussões relativas ao processo de globalização econômica, e se estendendo
ate às relações entre a legislação ambiental e o direito urbanístico. Entre inúmeras
outras.
Neste amplo processo de discussão foram investidos esforços de estudo
e participação que demandaram mais de 40 horas de reunião.
4.5 O PLANO DIRETOR COMO FERRAMENTA DE ORDENAMENTO E
DESCENTRALIZAÇÃO NA POLÍTICA URBANA DE CAMPO GRANDE
De acordo com a Constituição Federal de 1988 o plano diretor é uma lei
municipal que deve ser elaborada pelas cidades que tenham população superior a
vinte mil habitantes, como instrumento básico da política de desenvolvimento e
expansão urbana. Tendo como principal objetivo ordenar o desenvolvimento das
funções sociais da cidade e a garantia do bem-estar de seus habitantes.
O plano diretor é um instrumento cujo objetivo principal é dar
transparência e democratizar a política urbana. De acordo com BRAGA (1995) para
entender melhor o papel do Plano Diretor, devemos observar três pontos que
auxiliam a compreensão sobre a sua importância para as cidades.
O primeiro é a sua característica política. Anteriormente, o Plano Diretor
era vendido como um produto eminentemente técnico que deveria ficar a cargo de
especialistas em urbanismo, na qual a participação do agente político era visto como
algo que deveria ser evitado a todo custo, para o bem da racionalidade do plano.
Não devemos ignorar o papel da técnica que é fundamental no planejamento, mas
não é tudo. Para que os planos obtenham sucesso é necessário que haja equilíbrio
entre os aspectos técnicos e políticos do planejamento, lembrando que em última
instância, planejar é fazer política.
O segundo ponto a ser observado é o da transparência. Podendo ser
apontado como o mais importante, pois o plano diretor é o instrumento que
possibilita a transparência na política urbana, na medida que este é exposto num
documento público (uma lei). Tornar públicas as diretrizes e prioridades do
ordenamento urbano, para possibilitar a crítica e a avaliação dos agentes sociais,
esta é a principal virtude de um bom plano diretor. Este deve tornar claras as
prioridades para a expansão urbana e ter o papel de um livro de regras no jogo da
cidadania, que até então sempre privilegiou a lei do mais forte.
O terceiro ponto é o da democratização da política urbana, que é
fundamental, pois ela garante a transparência necessária das regras do jogo. Essa
democratização é garantida ao menos em tese, que a Constituição Federal, torna
obrigatória a participação das entidades representativas no processo de
planejamento municipal.
No processo de elaboração do plano diretor de Campo Grande foram
realizadas diversas reuniões, com o intuito de aproximar a comunidade das
discussões sobre os rumos da cidade. Foram realizadas mais de vinte reuniões
públicas e temáticas em lugares estratégicos da cidade, visando abranger todos os
bairros da capital. Isso ocorreu procurando fazer uma leitura mais próxima possível
da realidade urbana da cidade e suas necessidades, fornecendo elementos que
possibilitassem a formulação de propostas para enfrentar os problemas urbanos.
Em 22 de Novembro de 1995, ocorreu a criação da Lei Complementar n.º
05, que se refere ao Plano Diretor, instituindo a Política Urbana e a Política de
Desenvolvimento do Município. O Plano Diretor de Campo Grande é um conjunto de
diretrizes e meios instituídos para implementação da Política Urbana do Município.
Segundo a PREFEITURA MUNICIPAL DE CAMPO GRANDE - PMCG
(2001, p. 01), por Política Urbana do Município de Campo Grande entende-se “... o
conjunto de princípios instituídos para o cumprimento da função social da cidade e
da propriedade, integrante da Política de Desenvolvimento do Município de Campo
Grande”.
E, Política de Desenvolvimento do Município de Campo Grande:
[...] é o conjunto de diretrizes, meios de participação comunitária e de
controle social das ações públicas, instituídas para viabilização da gestão
democrática do Município, visando a melhoria da qualidade de vida, a
justiça social, o crescimento econômico e a proteção ambiental” (Ibidem, p.
01).
A Política Municipal do Meio Ambiente e de Saneamento estabeleceu as
diretrizes que viabilizaram formas para garantir o desenvolvimento sustentável e
qualificar ambientalmente as ações da Prefeitura, à luz das resoluções enunciadas
pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente-CONAMA e pela Lei Orgânica do
Município. No que se refere a Política Urbana, dada a multiplicidade de interesses
existentes na dinâmica da cidade e os conflitos decorrentes exigiu, além das
diretrizes estabelecidas na Lei, os instrumentos de sua materialização.
Os princípios estabelecidos foram os seguintes: a democratização da
gestão da cidade, a descentralização do planejamento e a qualificação do espaço
urbano; e o seu instrumento básico de efetivação foi a criação do Plano Diretor do
Município de Campo Grande.
Por ser o instrumento básico da mediação dos conflitos da cidade, o
Plano Diretor estabeleceu critérios para o cumprimento da função social da
propriedade imobiliária urbana e mecanismos de descentralização das ações de
planejamento, de desconcentração dos serviços públicos e de proteção do meio
ambiente urbano.
Para a implementação do Plano Diretor, procurou-se estabelecer, ainda
duas prioridades essenciais ao atendimento do direito à cidade: promoção do
acesso à moradia da população menos favorecida e ampliação dos serviços de
transporte coletivo.
Portanto, as ações de planejamento urbano e a busca do
desenvolvimento do município passaram, a partir desta lei, a ser buscadas no dia-a-
dia e de responsabilidade comum do Poder Público Municipal e da comunidade.
Com o intuito de ampliar a discussão sobre a política urbana e para
facilitar a participação da comunidade nesse processo foi feita a divisão de Campo
Grande em regiões urbanas partindo, segundo a Prefeitura Municipal, de dois
pontos: a descentralização e a gestão ambiental urbana. O primeiro advém do
reconhecimento de que a cidade tem vários centros e, portanto, as ações de
planejamento teriam que ser descentralizadas, tendo em vista uma distribuição mais
racional e eqüitativa dos serviços urbanos. O segundo parte do princípio de que as
ações de planejamento, desenvolvimento e ocupação urbana devem basear-se em
um entendimento do meio físico, sobre o qual se intervém.
Embora o Plano Diretor de Campo Grande tenha sido criado em 1995,
isto é, antes da lei 10.257 (denominada de Estatuto da Cidade) que é de 10 de
julho de 2001, muitos pontos como a participação popular e a questão ambiental
foram estabelecidas tendo uma certa consonância com a mesma (pois essa lei
demorou dez anos para ficar pronta), permitindo que o Plano Diretor da cidade
tivesse então uma abrangência maior no que se refere à política urbana como um
todo, não abordando somente as questões estruturais(vias de circulação).
Em 2005, o Plano Diretor completou dez anos e por isso foi submetido a
alterações conforme cronograma contido na própria lei e em conformidade com o
Estatuto da Cidade que estabelece esse período como prazo limite para revisão dos
planos.
A Prefeitura Municipal de Campo Grande realizou em março de 2006, o 1º
Ciclo de Conferências Locais do Programa Comunidade Viva, com três reuniões
públicas que percorreu todas as regiões urbanas da cidade, tendo como objetivo
colher subsídios para a Revisão do Plano Diretor do município, essas reuniões
foram organizadas pelo Instituto Municipal de Planejamento Urbano PLANURB em
parceria com a participação de vários segmentos da sociedade, de conselheiros
regionais (de cada região urbana), de lideranças políticas, além de servidores
municipais.
Os trabalhos nas reuniões foram divididos em cinco grandes temas:
estrutura urbana, aspectos ambientais, atividades econômicas, gestão democrática,
infra-estrutura física e serviços públicos. No início, os participantes apontavam dois
aspectos positivos, ou seja, o que eles achavam que era satisfatório na sua região,
na seqüência os participantes tinham de elencar os pontos negativos, que eram
insuficientes ou não existiam. Por fim, os participantes tinham de destacar dois
desejos, o que eles gostariam que fosse implantado ou aperfeiçoado na Região
Urbana que residem.
Para Marta Lúcia da Silva Martinez, diretora de Urbanismo do PLANURB
e coordenadora da Revisão do Plano Diretor, essas reuniões serviram para fazer
uma leitura comunitária, ouvindo quem vive a cidade no seu dia a dia para saber
como eles querem Campo Grande para os próximos dez anos.
No Ciclo de Conferências Locais do Programa Comunidade Viva, foi
abordada a questão relativa à atividade econômica de cada região urbana, nesta
reunião os participantes respondiam a seguinte pergunta: Na sua Região Urbana,
que tipo de atividade econômica pode ser fortalecida? Esse questionamento foi feito
tendo por base um dos aspectos principais a serem discutidos pela população das
Regiões Urbanas, que é a de oportunizar a geração de renda.
Nos dias 20, 21 e 22 de julho de 2005, foi realizado a Conferência da
Cidade de Campo Grande, onde ocorreram diversas oficinas de trabalho para
produzir material que subsidiasse a revisão do Plano Diretor. Essas oficinas foram
divididas em doze temas, sendo eles: o papel do município na
região/desenvolvimento regional; desenvolvimento econômico do município;
interface das zonas urbanas e rural; tendências da expansão urbana; instrumentos
urbanísticos; política habitacional; regularização fundiária; função social da
propriedade urbana; patrimônio cultural do município; gestão democrática e controle
social; transporte, trânsito e mobilidade urbana e saneamento ambiental e recursos
hídricos. Dentre todos esses temas discutidos, o que nos interessa são dois
especificamente: o de controle e participação social, que aprovou em plenária as
seguintes propostas:
1. estabelecer uma política de desenvolvimento urbano com a
participação da sociedade civil organizada tais como: conselhos regionais,
movimentos sociais e populares, entidades de classes, culturais, sindicais, etc.;
promover integração das políticas públicas nas três esferas de governo na
formulação de planos, programas projetos, serviços e benefícios na política de
desenvolvimento urbano; criar uma rede de interlocução entre a política urbana e as
demais políticas públicas nas três esferas de governo.
2. que o orçamento público nas três esferas de governo seja construído
com a participação das comunidades, em nível municipal, através de suas
associações de moradores e demais entidades organizadas, conselhos regionais e
conselho de desenvolvimento e urbanização; realização de sessões itinerantes da
câmara municipal, de forma regionalizada, duas vezes por ano oportunizando a
participação da sociedade na sessão; que o município de Campo Grande crie um
plano de capacitação dos diferentes representantes da sociedade organizada, para
qualificar a participação social e, assim, fortalecer a gestão democrática e elevação
da qualidade de vida.
3. estabelecer mecanismos de comunicação entre conselheiros e o
segmento que representa de modo a garantir a informação do que acontece quanto
a sua atuação no conselho e o levantamento das aspirações da base, alimentando,
desta forma, sua representatividade; criar mecanismos de ampla divulgação da
política de desenvolvimento urbano e das demais políticas públicas (tais como a
mídia eletrônica, impressa); quanto à natureza, alterar a denominação do atual
CMDU Conselho Municipal de Desenvolvimento e Urbanização para Conselho
Municipal de Campo Grande CMCG/MS e acrescentar a atribuição eventualmente
deliberativa além de proponente e consultiva: quanto à composição, incluir
representação dos conselhos setoriais; quanto às atribuições, reestudar a inclusão
de atribuições mais amplas, com base na nova composição.
No grupo temático referente à política urbana municipal, as propostas
aprovadas em plenária foram as seguintes:
1. Fortalecer o sistema municipal de planejamento e ações coordenadas;
buscar eqüidade entre as regiões através das políticas públicas e privadas com
gestão participativa e controle social, bem como a reestruturação do Conselho
Municipal de Desenvolvimento e Urbanização (CMDU), com caráter deliberativo em
questões específicas definidas em lei própria;
2. Criar programa de avaliação ambiental para o município, com o objetivo
de instrumentalizar a legislação e projetos de desenvolvimento urbano, e um plano
de coleta seletiva, tratamento, transporte e disposição final de resíduos sólidos
urbanos; incluir a área rural nas políticas públicas municipais e inserir as dimensões
ambiental e cultural como parte indissociável do desenvolvimento municipal;
3. que o crescimento de Campo Grande se dê dentro dos atuais limites do
perímetro urbano com adensamento da área urbanizada, ocupação das áreas vazias
e combate à especulação imobiliária; redesenhar o sistema de circulação urbana
privilegiando o transporte coletivo, os não motorizados e os privados visando
minimizar deslocamentos de pessoas e bens;
Na revisão do Plano Diretor, no título III sobre o Sistema Municipal de
Planejamento a lei ficou organizada da seguinte maneira:
Capítulo I – Conceito e estrutura
Art. 9 - O Sistema Municipal de Planejamento é a estrutura formada pelo
Poder Executivo Municipal e pela comunidade, baseada em um conjunto de órgãos,
normas, recursos humanos e técnicos, objetivando a coordenação das ações dos
setores público e privado e da sociedade em geral, responsável pela promoção da
Política de Desenvolvimento e pelo monitoramento do Plano Diretor de Campo
Grande, visando a integração dos diversos programas setoriais e a dinamização e
modernização da ação governamental.
Art. 10 A atuação do Poder Executivo Municipal, no que se refere à
gestão e execução de ações no Sistema Municipal de Planejamento, dar-se-á por
meio:
I da Secretaria Municipal do Planejamento e Controladoria Geral
SEPLAC;
II – do Instituto Municipal de Planejamento Urbano – PLANURB;
III da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Desenvolvimento
Sustentável – SEMADES;
IV representantes dos demais órgãos e entidades da administração
direta e indireta do Poder Executivo Municipal.
Art. 11 Para garantir a gestão democrática da cidade com a efetiva
participação da comunidade no Sistema Municipal de Planejamento serão utilizados,
entre outros, os seguintes instrumentos:
I – Conselho Municipal de Desenvolvimento e Urbanização – CMDU;
II – demais Conselhos Municipais;
III – Conselhos Regionais;
IV debates, audiências e consultas públicas, inclusive quanto ao
disposto no art. 44, da Lei Federal n. 10.257/2001;
V – conferencia sobre assuntos de interesse urbano;
VI iniciativa popular de projeto de lei e de planos, programas e projetos
de desenvolvimento urbano;
§ - o Conselho Municipal de Desenvolvimento e Urbanização CMDU
tem como objetivo:
I possibilitar a participação da sociedade civil nas discussões referentes
à Politica de Desenvolvimento do Município;
II debater, avaliar, propor, definir e fiscalizar programas, projetos, a
Politica de Desenvolvimento e as políticas de gestão do solo, habitação,
saneamento ambiental, transporte e mobilidade urbana.
§ 2º - O CMDU terá a seguinte composição:
I – o Prefeito Municipal de Campo Grande, que o presidirá;
II – representantes do poder público;
III representantes das concessionárias dos serviços públicos municipais;
IV – representantes de entidades classistas e da sociedade civil
organizada, movimentos populares, entidades profissionais, acadêmicas e de
pesquisa, ficando garantido um assento para cada Conselho Regional.
§ 3º - Ficam criados no CMDU os Comitês de:
I – Habitação;
II – Saneamento Ambiental;
III – Transporte, Trânsito e Mobilidade Urbana;
IV – Planejamento e Gestão do Solo Urbano.
§ 4º - Os demais Conselhos Municipais, previstos nos arts. 78,79 e 80, da
Lei Orgânica de Campo Grande, passam, em conformidade com suas atribuições, a
subsidiar complementarmente o CMDU, no que ser refere aos objetivos e diretrizes
desta Lei Complementar.
§ - Os Conselhos Regionais, compostos por conselheiros titulares e
respectivos suplentes terão caráter consultivo, sendo formados por representantes
de entidades legalmente constituídas com sede e atuação no âmbito do município
de Campo Grande, as quais deverão se inscrever no cadastro permanente do
Sistema Municipal de Planejamento.
§ - Aos Conselhos Regionais competirá, no âmbito da respectiva
Região Urbana, entre outras atribuições: acompanhar a aplicação das diretrizes do
Plano Diretor e legislações pertinentes, sugerindo modificações e prioridades,
inclusive no que se refere às obras e serviços; acompanhar a discussão do Plano
Plurianual, Lei de Diretrizes Orçamentárias e o Orçamento Anual; e, acompanhar a
elaboração dos Planos Locais.
§ - O CMDU poderá ser deliberativo nas matérias definidas em lei
especifica.
§ 8º - O executivo Municipal regulamentará, no que couber, as
disposições deste capítulo.
Art. 12 O Sistema Municipal de Planejamento é operacionalizado por
meio de processo permanente devendo ser estabelecido um conjunto de
procedimentos segundo os quais se encaminham e se divulgam as propostas e
discussões referentes ao desenvolvimento urbano, visando à gestão democrática do
Município.
§ - Compete ao Instituto Municipal de Planejamento Urbano
PLANURB divulgar as informações sobres estas propostas e discussões, com o
objetivo de possibilitar o controle pela sociedade civil.
§ - O Poder Executivo Municipal atuará junto aos Conselhos Regionais
de forma permanente no processo de planejamento e na discussão do plano
plurianual, da lei de diretrizes orçamentárias e do orçamento anual, bem como da
distribuição das obras e serviços públicos nas respectivas regiões (Lei n.º 94/2006).
Alguns pontos reivindicados na Conferência da Cidade de Campo
Grande, não foram inclusos na revisão do Plano Diretor como, por exemplo, a
realização de sessões itinerantes da Câmara Municipal e a mudança da
denominação do CMDU para CMCG/MS, porém deve ser destacado que de acordo
com a revisão da lei o CMDU, passará a ser deliberativo nas matérias definidas em
lei específica (que ainda está em processo de normatização) devendo ser aprovado
em breve e representando um grande ganho para este Conselho. Quanto a política
urbana municipal, boa parte dos subsídios produzidos na Conferência foram
incluídos na revisão da lei que procurou se adequar ao Estatuto da Cidade e
contemplar a participação da sociedade no planejamento.
Sobre a revisão do Plano Diretor de Campo Grande alguns pontos
tiveram prioridade como, por exemplo, pelos próximos dez anos manter o perímetro
urbano que possui hoje, passando a se preocupar em preencher os vazios formados
ao longo de sua história. Promovendo o adensamento demográfico das regiões
dotadas de aparelhos públicos, incentivar a descentralização econômica, promover
mecanismos que garantam a preservação de áreas de interesse ambiental e
cultural, além da readequação do CMDU aos moldes das diretrizes do Estatuto da
Cidade.
4.6 A REGIONALIZAÇÃO DE CAMPO GRANDE EM SETE ÁREAS
URBANAS
Em 08 de dezembro de 1988, conforme a Lei 2.567, ficou
compreendida dentro do perímetro urbano de Campo Grande, a divisão setorial da
cidade em 05 zonas e 67 setores. Esta lei foi criada, considerando a necessidade de
dotar o perímetro urbano de Campo Grande de uma divisão setorial para fins de
pesquisa e planejamento, a fim de identificar, classificar e mensurar os
equipamentos urbanos, visando sua melhor adequação na cidade, bem como
reconhecer os pólos geradores capazes de definir a expansão urbana.
Segundo a Prefeitura Municipal de Campo Grande, essa setorização foi
elaborada considerando a necessidade de adequar uma nova divisão da cidade,
buscando a definição das funções básicas dos setores e provê-los de bens e
serviços, objetivando o desenvolvimento econômico e sua evolução urbana.
A cidade de Campo Grande ficou dividida a partir de então com as
seguintes zonas, conforme a (figura 2).
A) Zona Central área da poligonal compreendida dentro dos seguintes
limites: confluência da Av. Mascarenhas de Moraes com a Av. Cel. Antonino, Rua
São Borja, Vila Rica, Rua Itajaí, Rua Dona Ambrosina, Av. Eduardo Elias Zahran,
Av. Salgado Filho, Av. Tiradentes, Rua João Nepomuceno Costa, Av. Tamandaré e
Mascarenhas de Moraes, totalizando uma área de 20,13 km².
B) Zona Norte área da poligonal compreendida dentro dos seguintes
limites: Ponte do Córrego Botas com Av. Cel. Antonino, Av. Mascarenhas de
Moraes, Av. Tamandaré, Rua Dr. Euler de Azevedo, Rua Teodoro de Carvalho,
antiga estrada para Rochedo, linha do perímetro urbano a a ponte do Córrego
Botas, totalizando uma área de 45,35 km².
C) Zona Sul área da poligonal compreendida dentro dos seguintes
limites: confluência da Av. Tiradentes com a Av. Salgado Filho, Av. Eduardo Elias
Zahran, Av. Três Barras, contorno do Jardim Lagoa Dourada, trilhos da R.F.F.S.A.,
linha do perímetro urbano, Av. Marechal Deodoro até a Av. Tiradentes, totalizando
uma área de 97,26 km².
d) Zona Oeste área da poligonal compreendida dentro dos seguintes
limites: confluência da Rua Teodoro de Carvalho com a Rua Dr. Euler
de Azevedo, Av. Tamandaré, Rua João Nepomuceno Costa, Av.
Tiradentes, Rua Marechal Deodoro, linha do perímetro urbano até a
Rua Teodoro de Carvalho, totalizando uma área de 96,75 km².
e) Zona leste área da poligonal compreendida dentro dos seguintes
limites: confluência da linha do perímetro urbano com a Cel. Antonino,
trilhos da R.F.F.S.A., contorno do Jardim Lagoa Dourada, Av. Três
Barras, Rua Dona Ambrosina, Rua Itajaí, Rua Ceará, Rua Vila Rica,
Rua São Borja até a Av. Cel. Antonino, totalizando uma área de 96,75
km².
Nesta setorização a cidade foi dividida não apresentando um critério
específico, reconhecendo somente a zona central e a partir daí foi feito um recorte
que estabeleceu outras quatro zonas para fins administrativos, identificadas de
acordo com sua posição geográfica, norte, sul, leste e oeste.
Quando da elaboração do Plano Diretor ficou estabelecida uma nova
divisão da cidade em sete regiões urbanas, onde segundo a Prefeitura Municipal,
Campo Grande, por ter a peculiaridade de apresentar um sistema hidrográfico que
banha a área urbana composto de quatro micro-bacias formadas por vários córregos
que atravessam a cidade, fato imprescindível para organizar a gestão urbana
referenciada pelas micro-bacias.
Assim, a partir desse entendimento, a Prefeitura Municipal optou por
dividir a área urbana em sete regiões (figura 3), tendo como base às micro-bacias
hidrográficas locais e como limite as principais saídas da cidade, estabelecidas
como importantes corredores viários, sem deixar de reconhecer a região central.
Desta forma, Campo Grande passou a contar com sete áreas urbanas,
sendo elas: Regiões Urbanas do Centro (figura 4); Segredo (figura 5); Prosa (figura
6); Bandeira (figura 7); Anhanduizinho (figura 8); Lagoa (figura 9) e do Imbirussú
(figura 10).
Pode-se observar que o critério adotado para essa nova regionalização foi
o das micro-bacias, sendo que comparado à carta de drenagem (em anexo)
fornecida pela própria Prefeitura Municipal, os limites das bacias apresentam
diferenças bastante significativas em relação à definição das regiões urbanas e não
sendo percebidas mudanças significativas na Zona Norte que passou a ser
denominada como Região Urbana do Segredo.
Sobre a divisão da cidade em regiões urbanas o que parece ter ocorrido é
simplesmente a divisão setorial que permitisse facilitar a descentralização da política
urbana e não uma regionalização baseada nos critérios físicos, que de acordo
com Corrêa (1991) é possível utilizar o termo região em diferentes situações, pois
para ele a região é o meio para se conhecer a realidade, quer num aspecto espacial
especifico, quer numa dimensão totalizante.
No entanto, é necessário que seja explicitado o que se está querendo e
ter um quadro territorial adequado. Parte-se do pressuposto que para efetuar uma
regionalização deva haver um critério, e no caso especifico de Campo Grande a
divisão por regiões urbanas não apresenta nenhum critério, que a delimitação das
bacias hidrográficas não correspondem a definição proposta.
Se for observada a figura 11, em que foi feita a sobreposição da
setorização de 1988, com as regiões urbanas estabelecidas pelo Plano Diretor de
1995, podemos constatar que foram criadas novas regiões, que os limites da
setorização anterior foram praticamente mantidos.
A geógrafa Cleonice Alexandre Le Bourlegat (membro do CMDU desde
sua criação) mencionou que: Essa divisão foi elaborada pelos arquitetos do
PLANURB e não foi utilizado um critério especifico para defini-la, apontando, que
naquele momento os arquitetos formavam uma classe bastante corporativista e que
o propósito de tal regionalização era dividir a cidade, tendo em vista que diferentes
escritórios de arquitetura pudessem prestar serviços de planejamento nas Regiões
Urbanas recém criadas por intermédio dos Planos Locais, então em discussão para
serem implementados.
Observando a figura 12 que mostra as saídas da cidade, podemos notar
que a regionalização foi estabelecida de acordo com as avenidas, tendo estas
praticamente utilizadas como limite entre as regiões urbanas da cidade.
O IBGE não reconhece esta regionalização para fins de pesquisa, fato
que torna difícil organizar dados estatísticos sobre qualquer uma das regiões,
dificultando pesquisas quando se procura analisar somente uma das Regiões
Urbanas organizada pelo PLANURB. Os dados mais recentes sobre a população de
cada região urbana são de 1996, estando, portanto desatualizado.
5 A PARTICIPAÇÃO COMUNITÁRIA NA POLÍTICA URBANA DE
CAMPO GRANDE POR MEIO DOS CONSELHOS REGIONAIS
Com o propósito de possibilitar maior participação da sociedade desde a
implantação do Plano Diretor, foi adotada uma Política de Desenvolvimento para
toda a cidade, como também criou-se especificamente uma Política Urbana. Ambas
complementadas pela Política de Meio Ambiente que pudesse garantir a
sustentabilidade da proposta desenvolvimentista. De acordo com a Prefeitura
Municipal, essas políticas foram estabelecidas sob a forma de indicação de grandes
diretrizes ou de princípios a serem observados.
Para promover essas políticas de forma planejada e democrática, na
mesma lei e regulamentada pelo decreto nº 7.361 de dezembro de 1996, o Município
também instituiu um Sistema Municipal de Planejamento, baseado numa estrutura
em que o Poder Executivo passou a contar permanentemente com a participação da
comunidade, somente sob a forma de consulta. O canal de participação das
comunidades passou a ser os Conselhos Regionais, ou seja, órgãos de participação
coletiva, onde a comunidade pode participar das discussões, assim como fazer
proposições referentes às políticas para o município. Todas essas políticas seriam
discutidas pela sociedade civil e depois apresentadas sob a forma de programas,
projetos, planos e projetos de lei, que contariam com a assessoria técnica do
Instituto de Planejamento Urbano de Campo Grande PLANURB e coordenados
por um colegiado constituído por esse órgão, a Secretaria Municipal de
Planejamento e o Secretario Chefe do Gabinete do Prefeito.
Com a finalidade de implementar a Política Urbana, foi instituído também
na lei complementar 5, o Plano Diretor de Campo Grande, que além de definir a
função social da propriedade para a cidade, estabeleceu, sob a forma de diretrizes,
os critérios e os instrumentos jurídicos para a gestão dessa política, assim como os
instrumentos para descentralizar a administração e as ações do planejamento
urbano. A lei previa também a criação dos Conselhos Regionais.
Conforme o Art. da Lei, os Conselhos Regionais, integrariam o Sistema
Municipal de Planejamento SMP, devendo ser criados em até um ano após a
sanção do Plano Diretor. Os Conselhos foram criados para atuarem de forma
consultiva e seriam formados por pessoas da comunidade. No entanto, uma crítica
pode ser feita ao Plano Diretor por instituir esse conselho sem nenhuma capacidade
deliberativa. Pressupondo que, para que um conselho possa atuar efetivamente na
política urbana, ele deve ser consultivo em algumas matérias e deliberativo em
outras para que possa funcionar plenamente e tornar-se um mecanismo de
descentralização, promovendo a democratização na gestão urbana.
Entretanto, por integrarem o Sistema Municipal de Planejamento, os
Conselhos Regionais, assim como o Conselho Municipal de Desenvolvimento e
Urbanização CMDU, foram criados com o propósito de participar das discussões
da implementação da Política de Desenvolvimento do Município de Campo Grande e
da Política Urbana do Município, bem como da elaboração da Política de Meio
Ambiente e de Saneamento do Município, conforme as diretrizes estabelecidas em
Lei.
Os Conselhos Regionais surgiram, segundo a Prefeitura Municipal, da
necessidade de possibilitar uma maior descentralização na gestão urbana, de modo
a garantir um canal de participação dos setores mais populares da comunidade,
junto à administração blica. A idéia básica era potencializar o planejamento,
promover a cidadania e elencar prioridades a serem realizadas, partindo do
pressuposto de que o cidadão tem uma visão mais próxima dos problemas do seu
bairro, pois diariamente convive com as necessidades do local que habita.
A instalação dos Conselhos Regionais procurava a descentralização no
processo de planejamento urbano em Campo Grande e para que fosse alcançado
os resultados esperados era necessário ter implicitamente a presença de dois
princípios básicos:
O primeiro seria concernente à descentralização administrativa que
possibilitaria a abertura à participação popular no processo administrativo,
fomentando o diálogo, a argumentação racional, a informação técnica e a
proposição dos representantes de entidades civil, dos mais diversificados interesses.
Expressando-se aí, interesses que poderiam antes passar inadvertidos e que trazem
prejuízos a certos segmentos da sociedade, assim como propostas que viessem de
encontro às reais necessidades da sociedade. Este é um modelo que deve ter por
principio tomar forma de uma democracia representativa de cidadãos, tendo nas
suas distintas organizações, uma forma de intermediação, com abertura à
participação da comunidade em geral (reuniões e audiências públicas). Assim o bem
estar de todos necessitaria da participação de um número diversificado de atores da
comunidade. Esse é um princípio de descentralização de competências do Poder
Municipal, encerrando menos os poderes em suas mãos, buscando um maior
aprofundamento com relação às questões a serem solucionadas e repassando parte
da responsabilidade das ações administrativas à participação popular.
O segundo principio diz respeito muito mais a uma descentralização do
tipo territorial e político, com a criação das Regiões Urbanas, e os respectivos
Conselhos Regionais. A implantação desses instrumentos de consulta e de
proposição, deveriam criar maiores condições de participação e de fiscalização do
Poder Público, por parte dos administrados, transformando o processo num jogo
sutil de equilíbrio, para apaziguar interesses conflitantes dentro do mesmo espaço e
promover complementaridades criativas na comunidade. Nesse particular, o Poder
Público, ao menos em tese, deveria privilegiar as especificidades territoriais, no
sentido de localidade.
Pois o lugar, como espaço de convivência, se torna elemento
individualizado do espaço urbano, na totalidade das conexões das interações da
cidade, o verdadeiro intermediário entre o individuo e o mundo num sistema social.
Com isso tenta-se redescobrir na totalidade, a dimensão do local, buscando
encontrar os significados da realidade vivida por seus usuários, no cotidiano, a partir
das relações intersubjetivas que a caracterizam e que dão sentido à vida dos
cidadãos que a vivenciam.
É no lugar de experiências comuns que os pontos de vista são, até certo
ponto, compartidos, construídos coletivamente com diversas interpretações das
situações objetivas vividas por cada um, por cada grupo. Esse espaço de
convivência e de mesmo conteúdo histórico tem suas próprias formas espaciais e
sociais, que o particularizam. Portanto, é na realidade do cotidiano vivido pelos
vários grupos da comunidade que o Poder Público Municipal deve buscar subsídios
para o planejamento urbano, visando o bem estar social de interesse geral da
sociedade local.
Nesse contexto, a participação do Poder Público local, representado pelo
Governo Municipal, é decisiva na formulação de ações públicas que privilegiem a
construção do espaço da cidadania, com a mobilização dos recursos humanos e
patrimoniais, num pacto territorial local. A participação da sociedade civil na
construção da cidadania adquire um papel decisivo nas articulações locais,
obrigando o poder público a deixar de se guiar pela lógica imediatista que, via de
regra, permeia as açõesblicas locais divididas entre a autonomia e a cooptação
– para buscar a melhor tradução dos interesses dos interlocutores transformadas em
políticas consistentes de longo prazo (COELHO, 1996).
Segundo a PMCG (2001), o Plano Diretor de Campo Grande estabeleceu
também a criação de instrumentos para descentralizar a administração e as ações
do planejamento urbano definindo, territorialmente na área do perímetro urbano,
além do centro, mais seis regiões (Segredo, Prosa, Bandeira, Anhanduizinho,
Lagoa, Imbirussu). Além dessas, também instituiu mais duas, ligadas às áreas
urbanas de dois distritos: Rochedinho e Anhanduí. Ao todo, portanto, foram criadas
nove regiões urbanas. E cada região deveria instituiur um Plano Local especifico,
visando distribuir de modo equilibrado as atividades administrativas e possibilitando
um melhor desenvolvimento para cada região urbana.
Boisier (1998) contribuiu bastante no entendimento das premissas
básicas a respeito do desenvolvimento regional quando, segundo ele, é necessária a
existência de condições institucionais e sociais favoráveis ao desenvolvimento
regional, em regime de interdependência. Para tanto, a região depende de sua
participação relativa ao uso dos recursos nacionais inclusive financeiros dos
efeitos das políticas macroeconômicas e setoriais. Desta forma, pensa-se na não-
neutralidade de qualquer política econômica e, por fim, do conjunto de elementos
políticos, institucionais e sociais sintetizados no poder de articulação dessas forças
para o desenvolvimento.
Choguill (1993) assinala que o Estado precisa envolver a comunidade no
processo de planejamento e ser o facilitador de melhorias comunitárias, mas para
isso é necessário que haja sensibilidade da autoridade municipal na aplicabilidade
dos recursos e que elas reflitam as verdadeiras aspirações e desejos da
comunidade, gerando a otimização dos investimentos municipais. Segundo ele
estabelecer um processo de “cooperação” entre Estado e comunidade é o primeiro
passo para o alcance do desenvolvimento urbano sustentável.
Dowbor (1987) destaca que a participação comunitária e o planejamento
descentralizado permitem assegurar a racionalidade de um conjunto de atividades
econômicas que estão diretamente ligadas ao espaço de vida do habitante. A
extensão da participação comunitária e do planejamento descentralizado é
defendida por quem quer democratizar a sociedade, assegurando maiores
benefícios para a base da população brasileira.
O aumento do espaço de decisão local significa um aumento de decisões
em que os indivíduos da comunidade sabem de que se trata, quem é responsável,
quais são os interesses em jogo. O cidadão tem o direito de contribuir para a
orientação do seu desenvolvimento e a descentralização representa a devolução do
espaço de decisão ao seu habitante. Recupera-se a tão necessária dimensão
participativa por meio do local de residência e de convívio que representam o
município, o bairro, a comunidade.
Mas, é no capital social, como expressão máxima do poder de
articulações sociais e econômicas locais, que inúmeros estudos vêm sendo
realizados no Brasil e no mundo. Também são importantes as experiências
realizadas em várias partes do mundo e, em especial, na América Latina: nas
comunidades campesinas de Chiquimula na Guatemala, Villa El Salvador no Peru,
Barquisimeto na Venezuela, em Porto Alegre, Brasil. Essas experiências
demonstram que a mobilização dos estoques de capital social como agentes de
desenvolvimento local não são meras utopias, mas o resultado de amplas
articulações entre o Estado e a sociedade civil.
Nesse sentido, é de fundamental importância possibilitar a participação
popular de forma organizada no processo de construção e desenvolvimento da
cidade nos dias de hoje, já que a valorização do capital social, enquanto conjunto de
normas, instituições e organizações que promovem a confiança e a cooperação em
uma comunidade local, tem demonstrando ser bastante eficiente na busca pelo
desenvolvimento.
Diante dessa forma de participação popular na política de planejamento
urbano de Campo Grande se faz necessário compreender o processo para a
instalação dos Conselhos Regionais, bem como analisar as dificuldades
encontradas para promover sua implantação, além de analisar a sua estrutura de
funcionamento e as principais atribuições dos conselheiros. Outro ponto importante
a ser destacado é a atuação dos Conselhos junto ao PLANURB, verificando os
diferentes níveis de articulação de cada conselho e respectivamente sua atuação.
5.1 O PROCESSO DE INSTALAÇÃO E COMPOSIÇÃO DOS
CONSELHOS REGIONAIS
De acordo com o Sistema Municipal de Planejamento e com as políticas e
instrumentos estabelecidos pelo Plano Diretor, deveriam ser instituídos e
constituídos os Conselhos na estrutura formal. Desse modo, ficou estabelecido que
os conselhos deveriam estar organizados em três modalidades que seriam divididos
da seguinte maneira:
1. Conselho Municipal de Desenvolvimento e Urbanização (que havia
sido criado desde 1988, e sofreu alteração em sua composição para se adaptar a
esse sistema) um conselho único, de caráter consultivo e proponente, com relação
à Política de Desenvolvimento do Município, à Política Urbana, à Política de Meio
Ambiente, ao Orçamento Anual e às Diretrizes Orçamentárias. Foi constituído para
facilitar a participação da sociedade civil organizada e de entidades classistas, ao
lado de representantes da administração pública e de concessionárias dos serviços
públicos municipais, assim como de representantes dos conselhos regionais.
2. Conselhos Municipais previstos na Lei Orgânica de Campo
Grande, também com caráter consultivo e proponente (alguns até deliberam) para
temas considerados relevantes para o Município, relativa a cada área saúde,
educação, etc., e constituídos por membros da sociedade civil organizada e de
entidades classistas relacionadas com cada tema tratado, subsidiando
complementarmente o Conselho Municipal de Desenvolvimento e Urbanização
CMDU.
3. Conselhos Regionais deveriam ser criados com base na lei
complementar nº 5/95 e no Decreto Número 7.361/96. Devendo ser ao todo, nove
Conselhos Regionais, um para cada Região Urbana. Tendo caráter consultivo,
sendo constituídos por pessoas da comunidade (sociedade civil organizada,
entidades classistas e aquelas que desenvolvem papel social relevante), mas que a
atuação estivesse no âmbito da Região Urbana que representa. Além de ter assento
junto ao CMDU, teria como atribuição especifica na Região Urbana que representa,
as discussões do CMDU no nível da sua região, acompanhamento na elaboração do
Plano Local e na aplicação das diretrizes do Plano Diretor e legislações pertinentes,
inclusive sugerindo modificações e prioridades no que se refere a obras e serviços.
Sobre a composição dos Conselhos Regionais, procurou-se estabelecer
uma reflexão a respeito das características que estes deveriam conter para que
houvesse a representatividade de todos os atores locais, de modo que fosse
contemplado os diferentes pontos de vista dos agentes de cada Região Urbana. A
partir dessas considerações ficou estabelecido que os conselhos contariam com a
seguinte representação:
- dos moradores organizados em unidades de vizinhança, como aqueles
organizados por temas específicos vivenciados no lugar (saúde, educação, lazer,
ambiente, creches) e por grupos locais de manifestação cultural. Os interesses,
nesse caso, estariam agrupados não por temas de relevância, como por
necessidades especificas de cada espaço de moradia.
- dos empreendedores (não de entidades produtivas, mas também as
ligadas ao comércio e serviços), que nesse caso poderiam fazer parte de três tipos
de circuitos econômicos:
A) pequenos empreendedores do lugar para o atendimento dos
consumidores também locais (comércio e serviços principalmente). Ex. Associação
dos Feirantes, Associação dos Comerciantes, horticultores, etc.
B) pequenos empreendedores (nem sempre do lugar) para o atendimento
externo ao lugar.
C) grandes empreendedores para o atendimento externo ao lugar.
- das instituições que não estavam diretamente vinculadas à vida dos
moradores locais, mas que possuíam presença relevante na Região Urbana, tanto
pelo porte ou espaço que ocupa, pelo tipo de serviços prestados. Que possuíssem
interesses específicos e pudessem interferir no espaço de convivência.
Com relação a esses agentes, deveriam ser observadas algumas
particularidades, tais como:
A) O que todos tinham em comum era o fato de partilharem o mesmo
espaço físico, sofrendo carências e problemas similares com relação à infra-
estrutura e ao ambiente.
B) As empresas e os moradores poderiam ter em comum a relação de
emprego e de trabalho. Mas, nem sempre a comunidade do entorno satisfaz as
necessidades das empresas em termos de qualidade requerida como força de
trabalho, como também a presença de uma grande empresa ou de várias pequenas
não significa fonte de emprego para a população vizinha. Havendo de se buscar, na
medida do possível, essa compatibilização.
C) As pequenas empresas de atendimento local estariam mais
diretamente relacionadas com o lugar de vivência e com o consumo das unidades
de vizinhança.
D) Existiam as instituições que surgiam diretamente ligadas aos
interesses dos moradores, do local de vivência, como aquelas que diretamente nada
tinham a ver. Mas, era importante lembrar que, algumas, como as religiosas e as de
lazer, poderiam atuar como verdadeiros pontos de coesão de vários segmentos da
sociedade.
Dessa forma, cada Conselho Regional estaria constituído de 03 grupos de
agentes do desenvolvimento:
1) Grupo de desenvolvimento sócio-ambiental constituído por
representantes da sociedade civil organizada, com a finalidade de discutir e propor
soluções a assuntos ligados ao “espaço de viver” das comunidades da Região
Urbana, tanto no tocante à qualidade de vida do ambiente construído, onde se inclui
a moradia, infra-estrutura física (água, luz, esgoto, asfalto, transporte, telefone, etc),
social (saúde, educação, segurança, lazer, creches, etc), como em relação ao
ambiente natural.
2) Grupo do desenvolvimento econômico constituído por
representantes da sociedade civil organizada, tanto ao nível do empresariado como
do trabalhador, com a finalidade de discutir e propor soluções para assuntos ligados
ao “desenvolvimento econômico” da região.
3) Grupo Institucional e de Identificação Cultural constituído por
representantes de instituições e da sociedade civil organizada, de caráter científico,
cultural, religioso ou de grande relevância no lugar (ex. os militares na Região
Urbana do Imbirussu).
Esses grupos foram organizados de forma a contemplar e respeitar os
interesses particularizados, assim como conhecer a base de percepção comum a
todos, notificar-se do que era conflitivo e o que poderia unir ou complementar as
necessidades desses usuários do mesmo território, no tocante à dinamização
econômica e social do lugar.
Os Conselhos Regionais representariam grande diversidade de pontos de
vista presente em cada comunidade, na busca do bem comum e de decisões
coletivas. Quando não chegasse a encerrar todas as heterogeneidades e não fosse
bastante o fórum de debates, para conseguir canalizar os interesses de forma
diferenciada, para se chegar a propostas comuns. Seriam criadas também as
Câmaras Temáticas que poderiam exercer esse papel de super-representação das
entidades menores, numa primeira instância, oferecendo garantias a qualquer tipo
de minoria. O seu número e modalidade dependeriam da relevância que cada lugar
daria a determinados temas, que congregam interesses mais emergentes. Também
seria nas Câmaras Temáticas que deveriam surgir de forma criativa, as propostas de
projetos e programas específicos. Essas Câmaras elegeriam os seus representantes
para os Conselhos e criaria seus próprios regimentos.
Em uma fase preliminar, um termo de Referência sobre a instalação dos
conselhos passou pela consulta popular, por intermédio do CMDU e de “Reuniões
Públicas” e o processo de escolha dos conselheiros representantes, foi feito por:
- cadastramento das entidades que atuariam em cada Região Urbana e
que participariam do Sistema Municipal de Planejamento, incluindo-as ao Grupo
afim, quando se definiriam também as câmaras (número e modalidades);
- convocação de reuniões públicas, quando as Câmaras, encaminhadas
pelo Planurb, discutiriam e elaborariam o seu Regimento Interno, e definiriam os
critérios de escolha de seus membros para compor o Conselho Regional;
- eleição dos conselheiros em Assembléia Geral, a que deveria ser
realizada em cada Região Urbana, convocada pelo Planurb, dentro de cada
Câmara, onde seria eleito o representante para compor o Conselho Regional por 02
anos;
- preparação dos conselheiros e aberto aos representantes das Câmaras
Temáticas, por técnicos do Planurb, ao exercício de suas funções, com um
“Programa de Informações” sobre o Sistema Municipal de Planejamento e a
Legislação pertinente.
- instalação dos Conselhos, que se deu com a nomeação das entidades
eleitas e com os conselheiros preparados, dando início às reuniões, com a definição
do Regimento Interno.
Desta maneira, no dia 31 de maio de 1998, foi realizada a primeira eleição
para a escolha dos representantes dos Conselhos Regionais em cada Região
Urbana. A instalação dos primeiros representantes seguiu a composição descrita
anteriormente e contou com três grupos de agentes de desenvolvimento, sendo
eles: o Grupo de Desenvolvimento Sócio-ambiental, o Grupo do Desenvolvimento
Econômico e o Grupo Institucional e de Identificação Cultural.
O primeiro passo foi a elaboração do regimento interno orientar as ações
dos conselheiros. Praticamente todos os Conselhos Regionais apresentam em seu
regimento as mesmas características que é composto de quatorze capítulos
abordando os seguintes assuntos:
Da finalidade, das competências, da composição, das normas, da perda
de mandato, da competência dos conselheiros, da competência do conselheiro
suplente, da estrutura, da plenária, da presidência, da vice-presidência, da secretaria
executiva, das eleições e das disposições finais e transitórias.
Todo o regimento interno trata do funcionamento das atribuições e
normas que devem ser seguidas pelos membros dos Conselhos Regionais,
ressaltando que possíveis mudanças no regimento serão aprovadas, em votação
nominal, por maioria de 2/3 dos Conselheiros Regionais presentes.
na segunda eleição para os Conselhos Regionais a composição inicial
da primeira eleição foi alterada, os três grupos deram lugar a duas entidades, que se
dividiram em: local e regional. A entidade local ficou dividida em três segmentos:
saúde, educação e comunitária. a entidade regional foi organizada atendendo os
seguintes interesses: econômico, cultural, ambiental, Assistência Social e afins.
Embora tenha ocorrido mudança na nomenclatura, basicamente o que ocorreu foi à
retirada do grupo institucional que contemplava os órgãos de caráter científico e
religioso, pois a área cultural passou a compor a entidade regional.
E de acordo com o próprio regimento dos conselhos, para o
preenchimento das vagas aos assentos de conselheiros referentes às Entidades
Locais, devem concorrer entre si às entidades cadastradas pertencentes ao mesmo
bairro, ficando assegurado, no mínimo, um assento para as entidades de educação,
saúde e um assento para as entidades comunitárias, ficando com as vagas as
entidades mais votadas. Um aspecto importante a ser mencionado é que conforme o
regimento interno às entidades devem ser escolhidas por voto secreto, sendo
permitida a reeleição sucessiva e ilimitada.
Em 2006, foi realizada a quarta eleição para o biênio de 2006-2008 dos
Conselhos Regionais. Em 10 de junho de 2006, foi realizado no Tatersal de Elite do
Parque Laucídio Coelho o termo de posse e compromisso dos membros
representantes os Conselhos Regionais das Regiões Urbanas de Campo Grande.
As eleições das Entidades que formaram os Conselhos Regionais de cada Região
Urbana do Município para um mandato de dois anos foram realizadas por meio da
Coordenação Geral do Sistema Municipal de Planejamento. Sendo eleitas 161
Entidades, nas áreas de Saúde, Comunitária, Educação e Entidades Regionais. Que
ficaram organizadas do seguinte modo:
● 10 entidades na Região Urbana do Centro
● 17 entidades na Região Urbana do Segredo
● 16 entidades na Região Urbana do Prosa
● 26 entidades na Região Urbana do Bandeira
● 40 entidades na Região Urbana do Anhanduizinho
● 25 entidades na Região Urbana do Lagoa
● 22 entidades na Região Urbana do Imbirussu
● 06 entidades na Região Urbana do Distrito de Anhanduí
Como pode ser observado, algumas regiões contam com um número
maior de conselheiros que outros, por exemplo, a Região Urbana do Anhanduizinho
é a maior, com quarenta membros, em contrapartida, a Região Urbana do Centro
tem dez representantes. Sobre a região do Anhanduizinho os técnicos do PLANURB
informaram que desde a instalação dos primeiros conselheiros esta região é a que
conta com maior representatividade.
Isso pode ser atribuído a dois fatores: o primeiro seria a grande
quantidade de população dessa região urbana que é a mais populosa da cidade e o
segundo seria relacionada às condições socioeconômicas da população, que
apresenta maior carência nos equipamentos públicos e serviços de infra-estrutura e
conseqüentemente sentindo maior necessidade de mobilização para reivindicar
melhorias por parte do Poder Público Municipal.
Nesse quarto biênio tomaram posse então 161 conselheiros titulares e
151 conselheiros suplentes num total de 312 conselheiros que estão auxiliando na
administração municipal.
Desde sua primeira composição a presença da comunidade se faz
presente por meio dos Conselhos Regionais nas discussões sobre os rumos da
estruturação urbana de Campo Grande, contando com reuniões que integram os
Planos Locais e que servem para elaborar em fase inicial os subsídios que serão
encaminhados para o CMDU com as reivindicações de cada região urbana para
discussão da proposta orçamentária do ano posterior.
5.2 AS ATRIBUIÇÕES E A ATUAÇÃO DOS CONSELHOS REGIONAIS
Os Conselhos Regionais foram implantados possuindo as mesmas
atribuições do CMDU, no entanto, com discussões e propostas que se iniciam no
âmbito de suas Regiões Urbanas. Sua finalidade é dar subsídios para as discussões
e propostas do CMDU, tanto em relação às políticas (do Desenvolvimento Municipal
Urbano e do Meio Ambiente), como à sua implementação, por intermédio do Plano
Diretor, da mesma forma, em relação ao Plano Plurianual, Orçamento Anual e
Diretrizes Orçamentárias. Além disso, especificamente, devem acompanhar a
elaboração dos Planos Locais nas suas respectivas Regiões Urbanas.
No entanto, por manter uma maior proximidade com o lugar, com o
espaço de vivência, esses Conselhos Regionais se relacionam muito mais que os
outros conselhos com o lado pragmático das políticas a serem implementadas, com
as ações a serem empreendidas.
Sedo assim, nas diretrizes estabelecidas pela Política de
Desenvolvimento do Município e pela Política de Meio Ambiente na Lei
Complementar 05/95, merecem atenção mais especial, no âmbito das Regiões
Urbanas:
- O estimulo à legalização das atividades econômicas do setor informal e
à formação de organizações produtivas comunitárias;
- O fenômeno às atividades de comércio de vizinhança;
- O incentivo à implantação de indústrias, próximas às concentrações
habitacionais;
- A criação de mecanismos institucionais de capacitação técnica dos
recursos humanos da comunidade;
- A promoção do acesso à informação sobre os avanços científicos e
tecnológicos de interesse da comunidade, bem como a difusão de tecnologias
existentes ou alternativas para o incremento das atividades produtivas locais;
- A proteção do Patrimônio Cultural e Ambiental;
- O fomento a estudos e pesquisas, acerca do Meio Ambiente;
- Definição de critérios para auto-gestão de prestação de serviços de
abastecimento de água e saneamento básico, pelas comunidades.
É importante que os Conselhos Regionais sejam apoiados por alguns
instrumentos específicos, que permitam a consolidação dessas intervenções no
espaço e na sociedade, de forma a dotar as Regiões Urbanas de maior dinamismo.
Ao colegiado (Planurb, Seplan e Secretário Chefe do Gabinete do Prefeito), por ser
o coordenador dos programas, projetos, planos e projetos de lei do Sistema
Municipal de Planejamento, cabe também a função de coordenar a ação desses
instrumentos:
- Centro de Dinamização Econômica e Social CEDES um órgão,
composto de uma pequena equipe técnica (integrante do Planurb), com a função de:
sensibilizar e animar os diferentes segmentos da sociedade civil,
componentes das Câmaras Temáticas, expondo as idéias, metas e caminhos do
projeto de desenvolvimento e dos programas para o município, buscando adesões
(propostas de projetos e programas locais ou de cada categoria).
analisar a proposta da comunidade, articulando os agentes de
desenvolvimento e a estrutura existente do município para facilitar as ações e
intermediar a busca de recursos financeiros, as parcerias que forem propostas com
outros segmentos da sociedade, ou mesmo as organizações comunitárias.
acionar instituições de ciência, pesquisa, tecnologia e cultura, capazes
de difundir os modelos de inovação (informação sobre os avanços científicos e
tecnológicos), realizar diagnósticos, monitorar a elaboração dos projetos e
programas de desenvolvimento e capacitar recursos humanos (pequenos
empresários e mão de obra).
- Centro de Estudos e Pesquisas do Município CEPEM um órgão de
apoio aos programas, projetos e planos da comunidade, constituído pelas
universidades, instituições de ciência, pesquisa, difusão tecnológica e cultural locais,
conveniadas com o Município, para atuar:
● fomentando a inovação com projetos de pesquisa;
contribuindo no melhor conhecimento das características do meio
(físico, social, econômico e cultural) e no ordenamento territorial;
na promoção de empreendedores e na capacitação dos recursos
humanos.
No regimento interno dos Conselhos Regionais de cada Região Urbana,
compete no âmbito de sua atuação:
I acompanhar a aplicação do Plano Diretor sugerindo prioridades e
modificações inclusive em relação às obras e serviços na Região Urbana que
pertença;
II acompanhar a discussão do orçamento anual da respectiva Região
Urbana;
III – acompanhar a elaboração do Plano Local de sua região;
IV propor ao Conselho Municipal de Desenvolvimento e Urbanização
medidas que venham beneficiar a região;
V indicar entre os eleitos titulares, os representantes: um titular e dois
suplentes, para compor o Conselho Municipal de Desenvolvimento e Urbanização
CMDU;
VI manifestar-se sobre os projetos de interesse da comunidade da sua
região;
VII participar da elaboração e acompanhamento de Programas de
Educação, Saúde, Habitação, Lazer e outros de interesse da comunidade da região;
VIII estimular a participação comunitária para o desenvolvimento da
Região Urbana;
IX elaborar aprovar ou modificar seu regimento interno, em
conformidade com suas normas de organização e funcionamento;
X solicitar pareceres dos órgãos municipais, quanto a projetos ou
programas que intervenham na Região Urbana.
A atuação dos Conselhos Regionais se processa respeitando algumas
etapas que são fundamentais para aproximar a população das discussões em torno
dos problemas que afetam cada região. Um primeiro passo para ordenar os
trabalhos dos conselheiros são os cursos de capacitação que são oferecidos desde
a primeira composição dos conselheiros até os dias atuais com o intuito de
possibilitar uma visão mais precisa sobre o mecanismo de funcionamento e as
atribuições dos conselhos.
Atualmente o Instituto Municipal de Planejamento Urbano PLANURB,
juntamente com o Centro Universitário de Campo Grande – UNAES, está
oferecendo para os Conselheiros Regionais um curso de capacitação.
Nesse curso que tem cinco turmas de 45 alunos, totalizando 245
conselheiros, é prestada uma capacitação que tem como objetivo fazer com que os
conselheiros exerçam suas atribuições de forma produtiva, ampliando sua
capacidade de argumentar para desempenhar corretamente suas funções. Estando
mais preparados para resolver de forma democrática os conflitos de interesses
comuns. A ampliação dos conhecimentos sobre o território e seus elementos de
identidade, facilitam ações integradas de políticas públicas, além de desenvolver a
capacidade de comunicação, criando motivação pessoal para participação nas
ações coletivas.
Esses cursos apresentam relevância na medida em que, como os
Conselhos Regionais representam diferentes segmentos e estratos da sociedade.
Alguns conselheiros têm pouca educação formal (escolar), atuando somente com o
senso comum e sem conhecimento técnico, não que esse conhecimento seja
necessário para os conselheiros, mas conhecer as competências dos diferentes
conselhos e órgãos que atuam nesse processo facilita na identificação do papel dos
conselheiros.
A atuação dos Conselhos Regionais se processa por etapas que devem
ser respeitadas para possibilitar ao máximo as discussões sobre as prioridades a
serem elencadas para cada Região Urbana.
A primeira etapa é a realização de sessões que ocorrem uma vez por mês
nas regiões urbanas, que contam com a presença de interlocutores municipais e
com a coordenação do PLANURB para que possam acompanhar os trabalhos.
Essas reuniões fazem parte do programa implantado em maio de 2005, denominado
de Rede Viva, que tem como finalidade criar condições para a participação da
comunidade local na democratização da política urbana do município e fortalecer o
Sistema Municipal de Planejamento SMP. Essas reuniões são o espaço para a
efetivação das prioridades a serem elencadas nos Planos Locais e que serão
levadas para discussão nas sessões plenárias dos Conselhos Regionais.
A segunda etapa da atuação dos Conselhos Regionais se por meio
das sessões plenárias, na qual são estudadas, analisadas, discutidas e decididas as
prioridades de cada região urbana, em um trabalho que deve prevalecer à parceria e
a integração. Essas atividades são coordenadas pela Mesa Diretora dos Conselhos
Regionais que nesse momento contam com os subsídios produzidos na
realização das sessões locais para organizar a ordem das prioridades de cada
região para serem encaminhadas ao CMDU e posteriormente para ser votada na
Câmara Municipal.
Nas plenárias, porém, podem ser observadas algumas dificuldades para
direcionar o que realmente é prioridade para a região, pois alguns conselheiros
vêem o conselho como um espaço de solicitações e querem ter suas reivindicações
atendidas. O problema é justamente a falta de coletividade, pois cada um se
interessa em buscar, por exemplo, a melhoria para a entidade que representa,
tornando esta tarefa uma briga de interesses particulares deixando de lado a
coletividade.
Outros conselheiros utilizam os Conselhos Regionais como um possível
trampolim para uma carreira política (esse é o caso principalmente dos
representantes das associações de moradores), alguns tentam fazer com que a
função lhe garanta um emprego em algum órgão da própria prefeitura municipal. E
outros, quando percebem que não remuneração e não podem ter beneficio
próprios acabam se desinteressando, demonstrando que algumas dificuldades se
tornam grandes obstáculos para se chegar a um ponto de unanimidade para eleger
as prioridades da Região Urbana, mesmo porque é difícil que todos entendam que
as propostas sejam para melhorar a região e não seu bairro isoladamente. Embora
com o passar do tempo algumas dessas características estejam sendo minimizadas
em prol do bem estar comum.
Sobre a instalação dos Conselhos Regionais e a evolução de sua atuação
o prefeito da época, André Puccinelii, fez o seguinte comentário, conforme aponta
BUAINAIN:
Em 1997, fizemos a estruturação dos Conselhos Regionais e, em 1998, 166
Conselheiros Regionais foram empossados. De um início incipiente, hoje se
que os conselheiros têm uma noção melhor. Não é pedir: “Ah! Eu
quero uma escola”, “Eu quero uma creche”, “Eu quero um posto de saúde”.
Não é isso. É ter conhecimento para, ouvindo o que o povo diz em seu
local, seu bairro, em sua região, como conselheiro regional, trazer o elenco
de prioridades para que, junto com o nosso Instituto de Planejamento, que
tem o conhecimento e, portanto, detém o poder, possa conceber o que se
necessário. (2006, p. 402)
Para que ocorra o bom funcionamento das sessões plenárias, algumas
regras básicas devem ser obedecidas:
1. Mesa Diretora
- tem como competência à operacionalização de todo o funcionamento do
conselho e para concepção deste objetivo deverá estar em consonância com o
presidente, vice-presidente e secretário executivo.
- ter conhecimento profundo do regimento interno.
Caso alguma discussão não seja esgotada são acionadas as Câmaras
Temáticas que são constituídas para sintetizar assuntos que não tenham sido
esgotados, outro mecanismo adotado atualmente são as comissões especificas que
abordam assuntos específicos tais como, saúde, etc., auxiliados pelos técnicos da
PLANURB e contribuem com elementos para o melhor entendimento sobre a
discussão do tema em questão.
As plenárias ocorrem de acordo com a natureza da sessão e o
definidas como:
- ordinária aquela prevista em calendário de reuniões, discutida e
aprovada pela plenária, observando que ao final de uma reunião fica o tema a ser
discutido na próxima;
- extraordinária aquela que não está prevista no calendário de reuniões,
destinada à aprovação de matérias especificas e de tramitação urgente. Nesse caso,
é pautado somente um assunto para discussão.
Após a realização das plenárias são elaborados os subsídios que são
encaminhados para a proposta orçamentária do município no ano seguinte, essas
solicitações são apresentadas em reuniões públicas e elencadas em ordem de
prioridade. Segue aqui as reivindicações para o ano de 2008, conforme cada região
urbana:
- do Anhanduizinho:
1º - ceinf – jd. Das hortênsias
2º - ceinf – Paulo Coelho Machado
- Asfalto Jd Nhá-nhá e Nova Esperança, passarela ligando Marcos
Roberto e Taquarussú, construção de praça no Jd marajoara, asfalto no Aero
Rancho, construção de telecentro no B. Jóquei Clube no antigo CEINF, construção
de escola no Vespasiano Martins.
- praça residencial Anhaduí, construção de praça no Alves Pereira,
asfalto B. Nashville, ampliação do centro de saúde Alves Pereira, CEINF Jd das
Mansões.
- limpeza de ruas e calçadas no conjunto Parati, instalação de rede de
esgoto no Pq do Sol, desativação da estação de tratamento da rede de esgoto,
ampliação e pavimentação da Av. Marajoara, complexo de esporte e lazer B. Parque
do Sóter, asfalto na linha de ônibus no Jd marajoara, asfalto nas vias do Los
Angeles, asfalto no Campo Nobre, asfalto na linha de ônibus Parque do Lageado,
asfalto no Jd das Mansões, campo poliesportivo gramado no B. Los Angeles, campo
de futebol gramado Parque do Lageado, praça poliesportiva Jd Centro-Oeste,
construção da sede do idoso Jd Macaúba, melhoramento do posto de saúde do B.
Pioneiros, ambulatório medico Jd Pênfigo, construção de CEINF Jd Centro-Oeste,
ceinf Jd Pênfigo, ceinf Jd Parati, ceinf Dom Antonio Barbosa, centro de convivência
do idoso Jd Bálsamo, micro-onibus Av. dos cafezais e região, sinalização de todas
as vias do Aero Rancho.
- do Bandeira:
1º - asfalto na região do Bandeira;
2º - ceinf na região do Bandeira;
3º - escola na região do Bandeira;
- ligação das Moreninhas via Rouxinóis (Guaicurus), pólo empresarial
sul;
5º - PSF e área de lazer na região do Bandeira.
- do Centro:
1º - centro de educação infantil/creche (área central);
2º - unidade básica de saúde na área central;
3º - unidade básica de saúde na região do B. Cruzeiro;
4º - centro poliesportivo na vila Planalto.
- do Imbirussú:
-
1º - ceinf para a região do Imbirussú;
2º - implantação de escola técnica industrial na região do Imbirussú;
3º - PSF na rua Vanderley Pavão com a Júlio de Castilho;
- construção de CEMA nos bairros Santo Antonio e Nova Campo
Grande; construção da sede da Associação de moradores Santo Antonio;
- pavimentação e drenagem Jd Aeroporto e Belinate, sinalização
vertical e horizontal de semáforos na rua Yokoama e Pres. Antonio Carlos, asfalto,
drenagem esgoto no Jd Aeroporto, criação de espaços (Box) nas praças dos bairros,
construção de escolas no Jd Inapolis e Santa Mônica, reitalização da praça da Nova
Campo Grande, área de lazer no Jd das Reginas, quadra poliesportiva no Jd
Panamá, reforma da praça associação de moradores Coophatrabalho, construção
de área de lazer no Jd Sayonara, revitalização de área de lazer no centro
comunitário Santa Carmélia, atendimento 24 h no posto Serradinho.
- do Lagoa:
1º - ponte rua Poética/Pedro Gomes;
2º - asfalto rua Ilha de Marajó/ CEMA Jd Mato Grosso;
3º - urbanização do Córrego Lagoa;
4º - praça da Coophavilla I;
- asfalto Ouro Fino, Tatiana e V. Vilma, linha de ônibus União II, São
Conrado, segurança pública Caiobá I, pronto socorro distrito oeste, praças no Tijuca
e Ouro Fino;
- praça no lagoa parque, praça no Jd Batistão com revitalização da
quadra de esportes, ceinf Tijuca I e Oliveira I, Rede de esgoto Oliveira I e II, Tarumã
e São Conrado.
- do Prosa:
1º - centro técnico de capacitação profissional no Veraneio;
2º - asfalto no prolongamento da rua Turvo, abaixo da Uniderp;
3º - ceinf na região do Veraneio;
4º - centro de convivência do idoso;
5º - centro social no Paulo VI e Vila Limão.
- do Segredo:
1º - implantação de PSF Vida Nova;
- pavimentação asfáltica na rua Hanna Anache, rua Dallas e rua
Francisco P. Coutinho;
- ceinf no Jd Presidente, construção de PSF no Jd Campo Novo, PSF
no bairro Nossa Senhora das Graças, pavimentação asfáltica na rua Marie, Av.
Carumã e na Av. Uraça no Jd Columbia, campo de futebol gramado e cercado no Jd
Presidente, Área de lazer no bairro Nossa Senhora das Graças, entre a rua Cotegipe
e a rua Maria Izabel Couto Fortes, área de lazer no Jd Imperial entre os bairros Jd
Guanabara e Morada Verde.
Essas são as solicitações produzidas em cada região urbana para a
elaboração do orçamento anual de 2008, sobre elas algumas considerações podem
ser feitas como a grande quantidade requerida pela Região Urbana do
Anhanduizinho. Segundo os técnicos do PLANURB um dos fatores que explica essa
grande demanda de reivindicações é a falta de síntese no momento de eleger as
prioridades da região.
Porém uma consideração deve ser feita em relação a essa região, pois
ela conta com a maior população e com isso tem maior atenção dos políticos
municipais em geral nos últimos anos sempre ficando com a maior parte dos gastos
da Prefeitura. o Conselho da Região Urbana do Bandeira elegeu somente seis
pontos como prioridades, isto se deve a maior articulação política entres seus
conselheiros aliado a um maior conhecimento dos mecanismos de funcionamento
para organizar essas diretrizes, pois na eleição das prioridades existe um verdadeiro
jogo democrático onde os conselheiros fazem acordos para determinar que
prioridade seja eleita como principal. O Conselho Regional do Centro ultimamente
tem pressionado as autoridades para projetos de revitalização de algumas áreas,
podendo ser citadas, um trecho de rua XV de novembro, ponto de prostituição e
venda de drogas e na área da atual rodoviária com as mesmas características da
rua XV.
Existe o compromisso da Prefeitura Municipal de que com base no
documento produzido, as três primeiras reivindicações de cada Região Urbana,
passe pelo CMDU e seja votado na Câmara de Vereadores, quando muito sofrendo
algumas emendas, mas na maioria das vezes seja atendida pela Prefeitura, fato que
estimula o interesse dos conselheiros em posicionar bem suas prioridades na ordem
de solicitações.
Esses subsídios são então encaminhados para o CMDU que produz o
relatório-voto sobre a minuta do projeto de lei que estima a receita e fixa a despesa
do município de Campo Grande para o exercício financeiro do ano posterior. Esse
relatório sintetiza os trabalhos realizados pelos relatores do CMDU, durante o
processo de planejamento que foi subsidiado e discutido junto aos técnicos do
Executivo Municipal e os conselheiros das regiões urbanas.
Esse documento é composto de partes nas quais se dividiram os
trabalhos para que fosse capaz produzi-lo: proposta orçamentária, dedução de
receitas e despesas orçamentárias previstas, obras e instalações previstas para
execução no ano posterior, discussões junto aos Conselhos Regionais Urbanos que
são organizados seguindo uma ordem de prioridades que são organizadas em:
educação, saúde, infra-estrutura, lazer e esporte, assistência social e outros
encaminhamentos. É possível perceber que os Conselhos Regionais auxiliam e
atuam de forma a possibilitar uma participação efetiva no planejamento e na
estruturação do espaço urbano de Campo Grande.
No mês de agosto de 2007, em que o município completa mais um
aniversário, foi lançado um pacote de obras pela Prefeitura Municipal, denominado
de “200 obras”, com um investimento orçado em R$ 250 milhões, das quais 70%,
são creditadas ao processo de discussões junto aos Conselhos Regionais Urbanos.
São obras na área de saúde, educação desenvolvimento urbano, assistência social,
pavimentação asfáltica, habitação, urbanização e controle de enchentes, construção
e revitalização de praças e áreas verdes e transporte coletivo.
5.3 OS CONSELHOS REGIONAIS COMO FERRAMENTA DE
FORTALECIMENTO DO CAPITAL SOCIAL
Qualquer sociedade que tenha se desenvolvido teve que solucionar, com
diferente grau de complexidade, os problemas relacionados com o processo de
cooperação econômica entre seus indivíduos. A maioria dos teóricos
institucionalistas atribuem que o grau de crescimento econômico dessas sociedades
dependeu também da eficiência com que elas construíram suas instituições e, com
isso, reduziram seus custos de transação, possibilitando que os indivíduos desse
grupo tornassem-se mais interdependentes uns dos outros, aproveitando, assim as
vantagens do processo da divisão social do trabalho.
Podemos constatar que foi a sociedade capitalista quem criou as bases
mais elaboradas de divisão do trabalho e, como conseqüência, atingiu um nível sem
precedentes de crescimento econômico, apesar de desigual social e territorialmente.
Num primeiro momento imaginava-se que o que havia acontecido nas áreas rurais
dos países desenvolvidos, pudesse ocorrer naturalmente nos países em estágios
inferiores de desenvolvimento, por meio da adaptação das instituições mais
eficientes existentes no centro do sistema.
Assim, ocorreria um sistema de fluxo de capitais que acabariam por
direcionar os excedentes crescentes de capital para a periferia do mundo capitalista,
de modo a amenizar a concentração acentuada nos países desenvolvidos. Algo não
se concretizou. a partir da década de 1960, imaginou-se que a transferência de
recursos dos países desenvolvidos para os subdesenvolvidos pudesse provocar um
avanço significativo dos segundos, propiciando a transformação institucional
desejada. Porém, as taxas de transferências de recursos dos países ricos não
apresentaram os resultados esperados, estando muito distantes do retorno
desejado. Na maioria das vezes esses recursos acabaram sendo empregados em
projetos de retorno duvidoso, quando não eram desviados para fins particulares.
Isso demonstra que os investimentos nos países subdesenvolvidos tiveram efeitos
positivos, no entanto, a transformação ficou abaixo do esperado. Em especial pelos
países não terem conseguido modificar suas estruturas institucionais, demonstrando
que os recursos foram empregados na prática de forma bem menos produtiva do
que o esperado pela teoria.
O Banco Mundial avaliou que somente a transferência de aportes de
capital, embora necessária não é suficiente para induzir a transformações
necessárias para elevar a taxa de crescimento dos países pobres, sendo preciso
realizar transformações institucionais para que possam ser eficientemente utilizados
os recursos financeiros. Tornando clara a preocupação de viabilizar mecanismos
que promovam a sedimentação de instituições que possam assegurar o uso mais
racional do capital nesses países, pensando nessas instituições antes mesmos de
definições técnicas dos projetos de investimento. Essa preocupação pode ser
observada, conforme BUENO que sinaliza ser:
Essa é a razão de o tema da construção de instituições tornar-se tão crucial,
não apenas no nível teórico, em que a nova economia institucional tem
apresentado inúmeras contribuições de grande valor, mas também no nível
essencialmente prático do delineamento de projetos de desenvolvimento
nos países subdesenvolvidos. Tornou-se impossível, hoje, obter qualquer
financiamento para projetos de irrigação, por exemplo, sem especificar,
claramente, como se espera ser alcançada a organização necessária dos
usuários no que diz respeito, entre inúmeras outras questões, a utilização
da água e à manutenção do equipamento. (2002, p.137,138).
Diante do exposto aqui, fazemos algumas considerações sobre o papel
dos Conselhos Regionais de Campo Grande na fomentação de bases sólidas para o
estabelecimento do capital social comunitário, partindo da participação dos atores
locais no processo de planejamento urbano da cidade e discutindo propostas que
não venham melhorar a estruturação do espaço urbano, como também sinalizar
para a necessidade de implementação de políticas de incentivo na promoção da
geração de renda. DUSTON (1999) refere-se ao capital social comunitário como
aquele que abrange o conteúdo informal das instituições voltado para o bem comum.
Destacando dúvidas sobre a possibilidade de construir este capital onde não exista
este lastro, o autor cita o exemplo dos grupos camponeses da Guatemala, que
mostravam uma cultura relativamente individualista, de dependência e de
dominação, sem instituições de capital social, mas que paradoxalmente, tinham um
amplo e dinâmico repertório de normas diversas, capazes de dar suporte simbólico a
práticas solidárias e recíprocas. Com o resgate de práticas institucionais do passado
surgiram contextos e oportunidades para desenvolver novas estratégias no grupo,
permitindo a construção de novos atores sociais, considerando que as normas
culturais de confiança e as redes de relações de reciprocidade funcionaram como
precursores de instituições mais complexas e orientadas para o bem estar comum.
No caso de Campo Grande, já no processo de discussões sobre a revisão
do Plano Diretor da cidade, foi sugerido por alguns dos Conselhos Regionais
medidas que promovessem a geração de renda nas regiões urbanas, sinalizando
que ocorra um processo de descentralização também no aspecto econômico,
permitindo a desconcentração das atividades econômicas por toda a cidade, com o
incentivo, por exemplo, da implantação de um pólo industrial na zona sul da cidade,
próximo ao bairro das Moreninhas. Essa mobilização por parte dos moradores e a
participação nas discussões em torno dessas questões reforçam a importância dos
líderes comunitários e toda a comunidade em estabelecer um pacto em prol da
ampliação de oportunidades de emprego para a população.
KLIKSBERG (1999) afirma que a inclusão do capital social complexifica a
busca de estratégias de desenvolvimento, ao mesmo tempo em que a sua não-
inclusão implica em muitas limitações. O autor propõe um novo debate sobre este
tema, analisando o fracasso dos atuais modelos de desenvolvimento que abrem
espaço para a discussão sobre o capital social e sua relação com o
desenvolvimento.
Segundo o Banco Mundial, existem quatro formas de capital:
a) O natural (recursos naturais);
b) O construído (infra-estrutura, bens de capital, financeiro e comercial);
c) O humano (graus de nutrição, saúde, educação etc.);
d) E o social de inclusão recente.
O capital social é o único que não se esgota com o uso, mas se fortalece,
diferentemente do capital construído. A prática da cooperação tende a aumentar o
grau de confiança entre os indivíduos, desencadeando ciclos eficazes em países
onde a estrutura de incentivos pune comportamentos oportunistas. O estimulo a
valores como a solidariedade e a cooperação se traduzem em uma sociedade mais
eqüitativa, com menos corrupção. Observando a importância da ação voluntária
enquanto fator educativo. Constatando que países como Canadá, países nórdicos e
Israel (parte considerável da população realiza atividades voluntárias) valorizam este
tipo de atividade mostrando que a participação das pessoas quando jovens em
práticas voluntárias, associativas e extracurriculares, determinam o engajamento,
quando adultas, em atividades similares. KLIKSBERG (1999)
Boisier (1998) aborda o conceito de capital sinergético, como o capital
mais importante em uma comunidade. Atribuindo a este termo, a capacidade social
de promover ações em conjunto, dirigidas com fins coletivos e democraticamente
aceitos, tendo em vista obter um produto final que beneficie a maior soma de
componentes. Sendo uma capacidade normalmente latente em nas sociedades
organizadas.
O conceito de capital social diz respeito à estrutura de incentivos e
sanções ao comportamento individual, definido por um conjunto preexistente de
regras formais e informais, comportamentos organizados e organizações que
promovem a confiança e a cooperação entre as pessoas. Engloba, assim, em
primeiro lugar, a rede de contatos sociais que um individuo típico mantém,
implicando, portanto, comportamentos sociais relativamente estáveis no tempo e,
por isso, confiáveis. Inclui também uma dimensão de bem coletivo, no sentido de
que, se determinado número crítico de indivíduos pertence a essas redes, a
comunidade como um todo se beneficiará, à medida que emerge um ambiente geral
de confiança e segurança, o qual incentiva as pessoas e melhora a eficiência
econômica da sociedade. (BUENO, 2002)
A consolidação e a efetiva participação da população por intermédio dos
Conselhos Regionais pode funcionar como um avanço rumo ao fortalecimento do
capital social em Campo Grande, já que foi criado para estabelecer um
estreitamento nas relações de reciprocidade e confiança entre os membros da
comunidade, que apresenta objetivos comuns para o local em que residem.
Os Conselhos Regionais Urbanos são novos (vão completar dez anos de
existência) e tem muito para contribuir e podem ser utilizados como uma ferramenta
bastante eficiente no acompanhamento da população junto ao Executivo Municipal
pelos mecanismos que se tornaram fortes na consolidação de diretrizes para o início
do processo de democratização da política urbana brasileira.
Representando um fator importante para a população na conquista desse
direito como possibilidade de desenvolvimento e melhor estruturação do espaço,
principalmente naquelas regiões que carecem de maior infra-estrutura e serviços e
que tem populações de baixo poder aquisitivo que necessitam de geração de renda
por meio do emprego.
Nesses lugares pode ser observado uma maior mobilização, ainda que
pareça ser desorganizada pode e deve ser o principio de um período em que a
população utilize cada vez mais esse fórum de debates e construção da cidadania
na luta por uma melhor qualidade de vida. No entanto, para que isso ocorra é
preciso que os próprios cidadãos tenham interesse e as informações necessárias
para poderem atuar e fazer valer os seus direitos, pois grande parte da população é
mal informada e nem sequer conhece os mecanismos de organização social que o
permitam reivindicar seus direitos para atingir uma vida digna.
6 CONCLUSÃO
Ao longo deste trabalho foram desvendadas as formas pelas quais
ocorreu o processo de planejamento urbano adotado em Campo Grande. Analisou-
se desde o momento em que se processaram alterações no cenário político
nacional, com o restabelecimento da democracia, que possibilitou a existência de
um novo paradigma de gestão que permitisse a participação da sociedade como
forma de promover a melhoria da qualidade de vida dos moradores das cidades.
Nesse contexto, foi necessário analisar a forma de planejamento, adotada pela
municipalidade, em que transformações puderam ocorrer por meio da
descentralização. Este foi o caminho adotado para que as decisões sobre a
utilização dos recursos do município não fossem tomadas de forma centralizada
somente por um grupo de técnicos, considerando, no processo de planejamento,
algo que oportunizasse as discussões em nível local, incluindo as pessoas que vão
gerir os recursos.
A descentralização se apresenta hoje como uma das principais condições
para formular uma efetiva democratização do Poder Executivo. Do ponto de vista
conceitual, o termo define uma transferência ou delegação de autoridade legal e
política aos poderes locais para planejar, tomar decisões e gerir funções públicas do
governo central.
A análise e a interpretação dos dados e informações, à luz dos
referenciais teóricos de suporte, conduziram a questão norteadora da pesquisa:
analisar até que ponto o processo de descentralização na política urbana, por
intermédio dos Conselhos Regionais, promoveram a democratização na gestão
pública de Campo Grande. Além de analisar a contribuição desses conselhos na
estruturação e otimização na aplicação dos recursos em nível local, ou seja, das
regiões urbanas. E sob à luz desses referenciais, podemos em grande parte,
confirmar as hipóteses levantadas no início da pesquisa.
Desde a década de 1980 com o processo de redemocratização na política
nacional, observou-se um processo de descentralização em que o Executivo Federal
transferiu maior autonomia para os estados e municípios efetuarem as intervenções
em seus territórios. A partir daí a houve uma redefinição no papel do Estado e uma
reorganização da participação social, em que os agentes sociais passaram a atuar
mais efetivamente, rompendo com o modo tradicional e centralizador adotado pelo
Estado até então. Isso permitiu a aproximação entre o poder público e a sociedade,
apontando para um novo modo de pensar as cidades que, a partir dessa prática,
pode romper com alguns vícios existentes e minimizar a segregação espacial
urbana.
Na cidade de Campo Grande podemos notar que, desde a criação do
PLANURB, tem sido realizado um trabalho de desenvolvimento da cidade, criando
diretrizes e mecanismos que permitam a participação da sociedade nos assuntos
relacionados a estruturação do seu espaço urbano. O primeiro passo para esse
novo modo de gestão foi à criação do Conselho Municipal de Desenvolvimento e
Urbanização CMDU, que desde 1988 transformou-se num fórum para a discussão
sobre o futuro da cidade, tendo contribuído muito nesses anos de atuação. Dentre
essas contribuições podemos citar a participação na elaboração do Plano Diretor da
cidade, de 1995, que permitiu haver uma visão voltada para o futuro, direcionando o
crescimento da cidade, além de colocar em pauta assuntos bastante relevantes,
como a questão ambiental, o acesso à moradia, e a gestão democrática com a
participação dos diferentes agentes sociais.
Devemos considerar que o exercício democrático pressupõe a
convivência de grupos de interesses que divergem não somente quanto aos meios,
mas também quanto aos próprios objetivos a serem atingidos. Neste contexto, é
possível falar de participação quando se reconhece que o planejamento é uma
atividade não técnica, mas também política. Essa realidade pode ser constatada
no funcionamento dos Conselhos Regionais, que estabelece que as três primeiras
reivindicações elencadas no documento produzido para a elaboração dos subsídios,
sejam realizadas no ano posterior. Demonstrando haver então, uma articulação
onde cada membro do conselho atua para convencer os demais conselheiros a
votarem na sua reivindicação, e, quanto maior for o nível de negociação maior se
a possibilidade de posicionar bem sua reivindicação e conseqüentemente conseguir
o atendimento da solicitação proposta.
Outro fato que deve ser mencionado é que os Conselhos Regionais
incluem no debate pessoas de toda a região urbana, dos mais variados níveis de
instrução, que em várias vezes necessitam do auxílio de técnicos que esclarecem as
dúvidas sobre assuntos específicos. Portanto, a descentralização o pode ser
percebida apenas como um movimento do Estado em relação à sociedade. Um dos
desafios postos para sua consolidação consiste em dividir o protagonismo político
com a sociedade civil nas regiões, a partir de formas efetivas de educação,
participação e transparência de informação.
Desde quando se iniciou esse processo uma grande dificuldade para
encaminhar os debates é a falta de visão dos conselheiros em relação a região
urbana como um todo, trazendo a discussão para o problema específico de seu
bairro. Mesmo nesse ambiente onde deveria prevalecer o consenso ocorrem muitas
divergências, dominando o “eu”, mas que o sempre solucionadas de forma
democrática. Porém, a dificuldade dos moradores de elencarem as prioridades do
que realmente é melhor para a região se caracteriza como o principal problema para
a efetiva distribuição dos equipamentos e serviços públicos. Devemos considerar
que essa é uma prática democrática e que permite que todos os envolvidos se
posicionem e atuem diretamente nos debates fortalecendo a cidadania.
Quanto à mobilização por parte dos moradores, ela se apresenta
fortalecida nas áreas mais pobres, que devido à falta de infra-estrutura os moradores
sentem a necessidade de se mobilizarem para reclamar pela prestação dos serviços
públicos. Já nas regiões urbanas onde se observa uma melhor condição
socioeconômica a mobilização se mostra bem menos efetiva. Isso pode ser
exemplificado pela Região Urbana do Anhanduizinho que, desde a criação dos
Conselhos Regionais, sempre teve maior número de conselheiros e apresenta
grande volume de solicitações, pois se trata da região menos privilegiada
economicamente da cidade, carecendo de maior intervenção do poder público
municipal. Observando que como esse é um processo eminentemente político, as
autoridades locais na maioria das vezes vem disponibilizando grande quantidade de
investimentos para essa região, que por ser a mais populosa também representa
maior quantidade de votos.
No que se refere às questões relativas a implementação das
reivindicações populares, em que as mesmas acabam de certa forma atendidas,
essas funcionam também com o objetivo específico de amenizar as tensões sociais.
Os conflitos que poderiam gerar mudanças estruturais acabam amenizados por
práticas que fortalecem a participação dos grupos locais, em que o papel do Estado
passa a ser importante na administração e condução de políticas que permitam uma
participação mais ampla das massas, embora os eixos centrais de dominação de
classe não sejam abalados. Isso permite que políticas descentralizadoras sejam
implementadas, mas sem abalar a estrutura central de poder.
Em conversa, um membro do Conselho Municipal de Desenvolvimento e
Urbanização comentou que, após a criação dos Conselhos Regionais, de certo
modo o CMDU havia perdido importância em determinados assuntos, manifestando
o desejo de se desligar do conselho, sendo incentivado a permanecer pela diretora-
presidente do PLANURB, com a proposta de reformulação do CMDU que, de acordo
com a revisão do Plano Diretor de Campo Grande, deve tornar-se deliberativo.
Embora ainda ocorra a necessidade de uma maior divulgação, nos meios
de comunicação, em relação aos Conselhos Regionais e que às vezes esses sejam
utilizados para poder tirar benefício próprio, como empregos na própria prefeitura ou
vislumbrar o conselho como uma ponte para a carreira política, os Conselhos
Regionais vem se constituindo num mecanismo que promove o debate e a melhor
aplicação dos recursos municipais.
De posse desses elementos podemos considerar a atuação dos
Conselhos Regionais significativa no processo permanente de planejamento do
município e que a descentralização na política urbana trouxe maior democratização
na gestão do município. Além de destacar que os debates e a mobilização entre os
representantes da comunidade podem promover o fortalecimento do capital social e
funcionar como um fator endógeno para potencializar esses espaços em possíveis
lugares para a instalação de projetos que estimulem a geração de renda para a
população, sinalizando de forma concreta para o desenvolvimento da cidade.
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