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A análise sobre os calundus e da Dança de Tunda nos permite chegar a algumas
conclusões. A publicidade e popularidade que ganharam, a ponto de serem denunciados, apontam
para a possibilidade de sua reprodução, já que não eram feitos totalmente de forma escondida,
sendo o espaço privado, onde ocorriam, franqueados ao público. Localizavam-se nas periferias de
vilas e cidades, assim como se constituirão os candomblés. A presença de altares, principalmente
no Acotundá, é significativa, pois os primeiros candomblés também apresentarão altares
semelhantes. A presença de espaços profanos, públicos onde todos tinham acesso e de espaços
sagrados, onde só os iniciados tinham acesso
128
. O candomblé se constituirá neste contexto
povoado por calundus, Acotundás, especialistas mágico-religiosos itinerantes, irmandades de
pretos. Os primeiros, como o de Accu, serão localizados nas periferias das cidades, quando
depois irão ganhar o centro urbano, como o da Barroquinha. Eram instituições e pessoas que
ofereciam os mais variados serviços mágico-religiosos como curas, adivinhações sobre o futuro,
trabalhos visando melhoras materiais e amorosas, como também, serviam de apoio para formar
tanto redes de solidariedade como de rivalidades
129
.
No período colonial, os calundus e a Dança de Tunda destacaram-se no cenário das
práticas mágico-religiosas afro-brasileiras por serem práticas coletivas, não somente individuais e
itinerantes. No período Imperial, será o candomblé, também semi-clandestino, que se ocupará do
cenário junto com as irmandades de pretos, estas últimas agindo dentro da legalidade
130
. O
espaço territorial de práticas religiosas afro-brasileiras foi redimensionado com a fundação, pelos
irmãos dos martírios, em espaço urbano, do candomblé da Barroquinha, no começo do século
XIX
131
. O momento histórico já é outro. É o momento da Independência do Brasil e início da era
Imperial.
128
BASTIDE, Roger. O candomblé da Bahia: rito nagô. São Paulo: Companhia das Letras, 2001, pp. 72-78.
129
No depoimento de Benta Teodora de Jesus, para o Sumário da Dança de Tunda, há a seguinte passagem que
mostra a busca por solidariedade: “Caetana, nação Coura, a qual andava sem licença de seu senhor, e esta andava
tirando esmola para se forrar”. As rivalidades são expressas na seguinte passagem da depoente Teresa Rodrigues
falando sobre a visita de Josefa Maria: “Noutra ocasião veio a negra Teresa, Coura, perguntar-lhe porque não ia
adorar o Deus, ao que respondeu-lhe advertindo que não fosse mais lá nem cresse nas razões de seus parentes, e logo
no dia seguinte veio a sua casa Josefa Maria a tomar-lhe uma satisfação e lhe dissera que aquela noite tinha
adivinhado o seu Deus que ela testemunha repreendia aos negros e negras para que não fosse, ver o seu Deus e os
milagres que fazia [...] E vendo a dita Josefa Maria que ela não queria acreditar o que ela dissera, se fora embora e
ficara sua inimiga, e ouviu dizer que ela andava tirando satisfações dos que lá não queriam ir na sua casa ver o Deus
da Costa de Coura que fazia milagres”. MOTT, Luis. Op Cit., 1986, pp. 127-129.
130
SILVEIRA, Renato da. Op Cit., p. 272.
131
Não há uma data correta sobre a fundação do candomblé da Barroquinha. Segundo Renato da Silveira, (2006, p.
374), ele teria sido fundado entre 1820 e 1830.
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