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UNIVERSIDADE DE SANTA CRUZ DO SUL - UNISC
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS - MESTRADO
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO EM LEITURA E COGNIÇÃO
BILINGÜISMO E LETRAMENTO: ANÁLISE DA INTERAÇÃO
ENTRE DUAS LÍNGUAS
Sheila Corrêa Soares
Profª Orientadora: Profª. Dr. Onici Flores
SANTA CRUZ DO SUL
2008
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2
Banca Examinadora
Profª. Orientadora: Profª. Onici Claro Flôres
Profª. Gisela Collischonn
Profª. Rosângela Gabriel
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1
Wer fremde Sprachen nicht kennt,
weiß nichts von seiner eigenen.
(Goethe)
2
SUMÁRIO
RESUMO..................................................................................................................8
ABSTRACT.............................................................................................................10
AGRADECIMENTOS..............................................................................................12
INTRODUÇÃO........................................................................................................13
1 MUNICÍPIO DE VERA CRUZ..............................................................................15
1.1 Histórico............................................................................................................15
1.2 Vera Cruz na atualidade...................................................................................15
1.3 Linha Andreas...................................................................................................16
2 REFERENCIAL TEÓRICO................................................................................17
2.1 Alfabetização e Letramento..............................................................................17
2.2 Conceito de Língua e Empréstimos..................................................................18
2.3 Línguas em contato...........................................................................................21
2.4 Níveis de contato interlingüístico......................................................................24
2.4.1 Alternância de código....................................................................................26
2.5 Bilingüismo e Monolingüismo............................................................................28
2.6 Aquisição de L1 e L2.........................................................................................33
2.7 Aprendizagem de L2.........................................................................................36
3 O PORTUGUÊS BRASILEIRO E O DIALETO ALEMÃO DA REGIÃO DE VERA
CRUZ/RS: DUAS LÍNGUAS E CULTURAS EM CONTATO..................................41
4 METODOLOGIA...............................................................................................52
4.1 A pesquisa........................................................................................................52
4.1.1 Organização dos alunos e das atividades em sala de aula.........................53
4.2 Integrantes da pesquisa....................................................................................53
4.3 Etapas da pesquisa...........................................................................................54
4.4 Atividades propostas.........................................................................................55
4.4.1 Primeira etapa..............................................................................................55
4.4.2 Segunda etapa.............................................................................................57
4.4.3 Terceira etapa..............................................................................................57
5 ANÁLISE DOS DADOS....................................................................................59
5.1 Considerações pontuais sobre situações que se evidenciaram ao longo das
observações gravadas e/ou anotadas pela pesquisadora......................................82
5.1.1 Alongamento do fonema [l]..........................................................................82
5.1.2 Substituição de gêneros...............................................................................83
5.1.3 Apagamento de vogais finais e empréstimos..............................................84
5.1.4 Reparos e auto-reparos...............................................................................85
6 CONCLUSÃO...................................................................................................86
REFERÊNCIAS......................................................................................................94
ANEXO A – Descrição da 1ª atividade coletiva....................................................102
ANEXO B – Quem foi ao piquenique....................................................................116
ANEXO C – O que foi ou não levado ao piquenique............................................117
ANEXO D – Quebra-cabeça da Lola....................................................................118
ANEXO E – Quebra-cabeça do Cocoricó.............................................................119
ANEXO F – Descrição da 2ª atividade coletiva....................................................120
ANEXO G – Pares de Rimas................................................................................127
ANEXO H – Figuras para a elaboração de texto..................................................128
4
MAPAS
Mapa 1 - Rio Grande do Sul.................................................................................100
Mapa 2 - Vera Cruz...............................................................................................101
5
TABELAS
Tabela 1 - Fonética da língua alemã......................................................................42
1.1 Consoantes.......................................................................................................42
1.2 Vogais...............................................................................................................42
Tabela 2 - Fonética da língua portuguesa..............................................................43
2.1 Consoantes.......................................................................................................43
2.2 Vogais...............................................................................................................44
6
QUADROS
Quadro1 Fonemas..................................................................................................60
1.1 Atividades coletivas..........................................................................................60
1.2 Atividades individuais........................................................................................61
Quadro 2 – Léxico...................................................................................................68
2.1 Atividades coletivas..........................................................................................69
2.2 Atividades individuais.......................................................................................69
Quadro 3 - Demonstrativo das frases produzidas pelos participantes...................72
3.1 Frases produzidas somente na L1 (língua alemã)............................................72
3.2 Frases produzidas com a interinfluência da L1 (língua alemã) e da L2 (língua
portuguesa).............................................................................................................74
Quadro 4 - Interlíngua: aluno monolíngüe em alemão...........................................79
RESUMO
Este estudo propôs-se a averiguar a influência de um dialeto alemão falado na
região de Vera Cruz (interior do RS) sobre o processo de letramento em português
brasileiro. A pesquisa investigou os processos de transferência do conhecimento
fonético-fonológico, lexical, sintático, semântico e pragmático do dialeto alemão
dessa região para o português por um participante que começara a desenvolver a
oralidade em português brasileiro na escola, juntamente com colegas bilíngües
(dialeto alemão da região/ português brasileiro) e demais alunos, monolíngües em
português. O estudo buscou analisar se os processos de generalização
observados decorrem do conhecimento da L1 interferindo sobre o aprendizado de
L2, ou se traduz em reforço inadequado de L2, constatando a ocorrência, em
alguns momentos, do reforço inadequado de L2 e também transferências da L1; e,
ainda, se o ambiente de ensino-aprendizagem (professor, metodologia de ensino,
linguagem falada em contextos informais e colegas de turma) auxilia na superação
ou reforça os processos de transferência e generalização. Para obter dados
fidedignos a respeito da fala dos participantes da pesquisa, fez-se necessário
formar um corpus representativo, para o qual foi selecionada uma turma de alunos
do 1
o
ano fundamental composta de 15 crianças, de escola pública, no interior de
Vera Cruz. A investigadora acompanhou a turma durante o ano letivo de 2007,
promovendo situações interativas diversas (clipes, músicas, teatro, jogos no
computador, rimas), dando ênfase especial à oralidade. A coleta de dados foi feita
através de gravações, filmagens e tomada de notas. Ao todo foram realizados
quinze encontros centrados sobretudo sobre os processos de textualização
utilizados pelos participantes. As hipóteses de trabalho foram confirmadas, pois se
comprovou haver transferência da L1 para a L2, em termos fonético- fonológicos,
sintáticos e mesmo lexicais. Por outro lado, também se observou interinfluência de
uma língua sobre a outra, devido ao contato direto e constante entre falantes
nativos e falantes do dialeto. O intercâmbio do aluno monolíngüe no dialeto
alemão local com seus pares, bem como sua adaptação a um novo meio, o
escolar, apresentou os resultados esperados a partir das hipóteses levantadas.
Confirmou-se, então, a hipótese de que o núcleo lingüístico duro, resistente é o
8
fonológico, havendo-se evidenciado, ainda, forte tendência à interpenetração de
L1 e L2 no que diz respeito ao nível pragmático, tal como referido por Arabski
(2007). Ou seja, a contatação adicional diz respeito à alteração da L1, sob a
influência da L2. Ao que tudo indica essa modificação começa a expandir-se a
partir do nível pragmático e vai aos poucos modificando o dialeto local,
transformando-o e deixando-o bastante diferente da língua-padrão falada na
Alemanha.
Palavras-chave: bilingüismo, letramento, transferência, interlíngua, contato
lingüístico
9
ABSTRACT
This research aims at analyzing the influence of a German dialect sponken
in the area of Vera Cruz (countryside of RS) under the process of literacy in
Brazilian Portuguese. The study investigated the process of knowledge tranference
in the phonetic-phonologic, lexical, syntatic, semantic and pragmatic areas among
the uses of a subject who starts to develop his oral competences in Brazilian
Portuguese at school, with other classmates who are also bilingual (German
dialect of the region/ Brazilian Portuguese) and other classmates that can only
speak Portuguese. The research analyzed whether the process of generalization
observed is related to the knowledge of L1 interfering on the learning of L2, or if it
is an inappropriate reinforcement of L2, observing the occurrence, in some
moments, of an inappropriate reinforcement of L2 and also tranferences of L1; and
if the environment of teaching-learning (teacher, methodology of teaching, spoken
language at informal contexts and classmates) helps at exceeding or reinforce the
process of transference and generalization. For having trustworthy results, it was
necessary to have a representative corpus, so there was selected a class of 1st
year Elementary School, at a public school, with fifteen students, in the
countryside of Vera Cruz. The researcher watched the class during the year of
2007 promoting many interactive situations (clips, musics, theater, computer
games, rhymes) enphasysing orality. The data collection made through film
recording and note writing. There happened fifteen meetings focused on the
process of textualization of the participants. The hypothesis of the study were
confirmed because it was proven there are transference of L1 to L2 em phonetic-
phonologic, syntatic and even lexical terms. On the other hand, it was also
observed the interinfluence of one code on the other, due to the direct and
constant contact between native speaker and dialect speakers.
10
The exchange of the monolingual student who speaks German dialect with other
dialect speakers, as well as the adaptation to a new place like school, presented
the expected results. There were confirmed the hypothesis that the hard linguistic
nucleus is the phonological, also being observed the tendence to an interpentration
of L1 and L2 in the pragmatic level, as refered by Arabski (2007). That means that
the additional contactation is related to the alternance of L1 under the influence of
L2. As it is observed this modification starts to expand from the pragmatic level and
goes modifying the local dialect, making the the language different from the
German spoken in Germany (Hochdeutsch).
Key-words: bilingualism, literacy, transference, interlingual, linguistic
contact
11
AGRADECIMENTOS
À professora Dr. Onici Flores, orientadora incansável e comprometida, que
soube me apoiar e incentivar em todos os momentos, apontando-me o caminho,
enriquecendo muito o trabalho, e, também, a mim como pessoa.
À professora Dr. Márcia Zimmer, por despertar em mim o interesse pela
Lingüística e por iniciar este projeto, nele acreditando.
Ao professor Elenor J. Schneider, primeiro incentivador ao meu ingresso na
graduação em Letras.
À professora Jaqueline Bender, pela amizade e valiosas contribuições da
língua alemã.
Aos meus colegas, especialmente Roberto, Ana Júlia e Virgínia, pelo
companheirismo, respeito e dedicação.
À escola José Bonifácio, pela acolhida e colaboração com a realização
desta pesquisa, em especial a vice-diretora, Sandra Koelling, também amiga e
colega de graduação.
Às irmãs e funcionárias da Casa da Criança, pelo auxílio e generosidade.
Aos meus familiares e amigos, principalmente a minha mãe, Elvéti, e a
Sheila Boesel, pelo apoio e incentivo incondicionais.
13
13
INTRODUÇÃO
A aprendizagem da criança na escola está baseada na leitura (KLEIMAN,
1999). Ingressando na escola, a criança tem a oportunidade de expandir seus
conhecimentos e desenvolver a parte oral e escrita do seu idioma. Quando,
porém, sua língua materna for estrangeira, a aprendizagem se tornará mais
complexa, demandando esforços suplementares.
É a influência da língua materna (alemã) no processo de letramento em
português que investigamos, especificamente, durante a implementação da
dissertação aqui apresentada. Crianças que vêm falando alemão para a escola e
que iniciarão o processo de letramento em língua portuguesa tendem a transferir o
conhecimento fonético-fonológico, lexical, sintático, semântico e pragmático do
alemão para o português, em virtude do contato lingüístico estabelecido.
Assim, analisar a produção oral das crianças nos permitirá registrar os
casos específicos em que a língua materna alemã possa ter exercido influência
sobre o letramento em língua portuguesa. Ou seja, o nosso intento foi averiguar a
influência da L1 (língua alemã) sobre a L2 (língua portuguesa), verificando os
processos de transferência do conhecimento fonético-fonológico (alemão para o
português), morfológico, sintático, semântico, bem como a interferência que o
meio possa ter exercido. Todas essas são questões relevantes para o presente
estudo.
Para atingir os objetivos propostos foi selecionado um grupo de crianças da
escola referida, todas do primeiro ano do ensino fundamental, de mesma faixa
etária: crianças monolíngües, falantes do dialeto alemão local, bilíngües, falantes
do alemão e do português, e monolíngües em português. Através de observações
e aplicação de atividades orais ao longo do ano letivo de 2007 foram comparados
o processo e o desempenho dos grupos, quanto ao início do letramento em língua
portuguesa.
14
14
O presente trabalho está distribuído em seis capítulos. No primeiro capítulo
são considerados os aspectos histórico e geográfico do município de Vera Cruz e
também da localidade de Linha Andreas: primeiros imigrantes, localização,
população e também atividade econômica.
O segundo capítulo compreende o embasamento teórico, no qual são
discutidos os conceitos de alfabetização e letramento; conceito de língua e
empréstimos; contato lingüístico, os níveis de contato interlingüístico; bilingüismo e
monolingüismo; aquisição de L1 e L2; e aprendizagem de L2.
no terceiro capítulo são destacadas as tabelas fonéticas do idioma
alemão e do idioma português. A partir da comparação entre ambas, é feita uma
apresentação de algumas particularidades e semelhanças existentes entre um e
outro sistema, sendo ressaltados aspectos relevantes para a análise dos dados
coletados.
No quarto capítulo, por sua vez, a metodologia, incluindo-se os integrantes
e as etapas da pesquisa, e as atividades que foram propostas, o contemplados.
Também julgou-se necessário dar a conhecer, em breves palavras, a organização
das atividades, dos alunos, bem como as prioridades ressaltadas pela professora
regente a partir da orientação recebida da Secretaria Municipal de Educação da
localidade.
A análise dos dados foi desenvolvida no quinto capítulo. Os dados
coletados foram compilados em quadros demonstrativos, de acordo com as
características apresentadas. Após cada quadro, a efetiva apreciação e
constatações realizadas a partir do que foi apurado.
Por fim, o sexto capítulo. A conclusão retoma determinados aspectos
relevantes e ressalta-os para o apoio e justificativa das proposições a que se
chegou. Logo, a seguir, aparecem as referências utilizadas.
1 MUNICÍPIO DE VERA CRUZ
1.1 Histórico
Em 1850, deu-se início à colonização de Faxinal de Dona Josefa, hoje
município de Vera Cruz, com a chegada de Philipe Limberger, juntamente com
outros imigrantes, vindos da Alemanha. Com o crescimento e expansão da
localidade, foi necessário abrir um caminho até a colônia de Santa Cruz a fim de
facilitar a comunicação. Em 1858, isso foi concretizado. A agricultura era
fortalecida dia-a-dia, tornando-se a base da economia local e se constituindo como
infra-estrutura para o desenvolvimento de outros setores de produção. Em 30 de
janeiro de 1859, foi criado, então, o município de Vera Cruz. Os topônimos que
antecederam o atual nome do município foram: Faxinal de Dona Josefa e Vila
Teresa. De acordo com o Álbum de Vera Cruz 20 anos (1979), Teresa era
considerado um nome sem expressão, pela não identificação da sua origem. Vera
Cruz, por sua vez, “[...] além do aspecto estético, lembra os primórdios de nossa
Pátria. A palavra Vera Cruz é uma invocação de fé cristã” (1979, p. 23).
1.2 Vera Cruz na atualidade
Vera Cruz está localizada no Vale do Rio Pardo, à distância de 160 km de Porto
Alegre, tendo como limites ao Norte, Santa Cruz do Sul e Sinimbu; ao Sul, Rio
Pardo; a Leste, Santa Cruz do Sul e Rio Pardo; e a Oeste, Candelária e Vale do
Sol. A principal atividade econômica é a fumicultura e em menor escala estão a
suinocultura, a plantação de arroz, mandioca, milho, feijão, produtos
hortigranjeiros, a criação de gado e a avicultura. A população é de
aproximadamente 20 mil habitantes, sendo que a maioria se concentra na zona
rural. O segmento industrial ainda contempla, com destaque, a metalurgia,
plásticos, vestuário/calçados. Da mesma forma, o setor comercial é bem
diversificado. Ao todo, são mais de mil empresas sediadas no município. Vera
Cruz não chega a ser um pólo tecnológico, mas abriga a maior empresa fabricante
de boliche eletrônico da América Latina e é pioneira na fabricação de sistemas
eletrônicos de votação, entre outras empresas voltadas à produção de placares
16
esportivos, semáforos, painéis publicitários e também de produtos e equipamentos
voltados ao lazer.
1.3 Linha Andreas
Linha Andreas é uma das linhas pertencentes ao município de Vera Cruz.
Foi colonizada em 1853 com a chegada de Luiz Schünke e em 1856 com a vinda
de Carlos Guilherme Köhler, Fernando Köhler, Cornelius Seibert e Pedro
Schwengber, provenientes da Renânia, Alemanha, de acordo com o Relatório de
Cadastramento de colônias apresentado por Trein (1877). Na localidade, habitam
cerca de 900 habitantes e 90% da produção agrícola é baseada no fumo. Linha
Andreas é bastante conhecida na região pelos seus quatro balneários e pela
extração de basalto. A maior parte do Arroio Andreas corta a localidade, onde a
Prefeitura possui uma Estação de Captação de água para abastecer o município.
A população de Linha Andreas conserva uma vida pacata, tranqüila, longe
da agitação dos centros urbanos. Muitos de seus hábitos e costumes ainda
conservados são herança dos antepassados. Freqüentar a missa, aos domingos,
organizar e participar de quermesses, jogar bolão, reunião de mulheres para
conversar e trocar receitas culinárias, encontros de homens também para
conversar e falar sobre a lavoura e criação de animais na propriedade, passeio e
pesca organizados pelos adolescentes e crianças da localidade, são alguns
exemplos. O dialeto local é utilizado por todos os moradores: em casa, com os
vizinhos, no comércio e também na escola, que não o ignora, mas sim permite o
trânsito entre ambos (alemão e português).
2 REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 Alfabetização e Letramento
Os conceitos de alfabetização e letramento são distinguidos pelos autores
como processos diferentes de aprendizagem da ngua. O processo de aquisição
da língua materna, tanto oral quanto escrita, de acordo com Soares (2006), é
permanente, mas pode sofrer interrupções. o processo de desenvolvimento da
língua materna é também permanente, mas jamais será interrompido.
Por isso, justifica, é que ao termo alfabetização não cabe um significado
muito abrangente, pois, etimologicamente considerando-o, é um termo específico,
que “[...] o ultrapassa o significado de levar à aquisição do alfabeto, ensinar o
código da língua escrita, ensinar as habilidades de ler e escrever” (SOARES,
2006, p. 15). Já a definição de letramento é mais abrangente e não tão específica,
como aponta Kleiman: “[...] práticas e eventos relacionados com uso, função e
impacto social da escrita” (1991, p. 181).
Outro argumento apresentado por Kleiman para justificar a utilização do
termo letramento ao invés do tradicional alfabetização, está no fato de em
algumas classes sociais as crianças “[...] possuírem estratégias orais letradas,
antes mesmo de serem alfabetizadas” (1995, p. 18). Ou seja, quando um adulto
estabelece uma comparação com um texto escrito e ela compreende, ela está
participando de um evento de letramento” e está aprendendo uma “prática
discursiva letrada”, mesmo antes de saber ler e escrever.
Isso significa dizer que o fenômeno de letramento ultrapassa os limites da
escrita, da maneira como é tradicionalmente concebida pela escola (aquisição de
código alfabético e numérico). A escola, de acordo com a autora, detém-se
apenas em um tipo de prática de letramento, que é a alfabetização. Daí o
processo ter um caráter individual, no qual o letramento como prática social, como
competência coletiva, assumir uma orientação secundária.
18
18
Essa concepção de letramento empregada pela escola é definida por Street
(1984), e analisada por Kleiman (1995, p. 21) como modelo autônomo. É a noção
de que existe apenas uma maneira pela qual o letramento é desenvolvido e que a
escrita não está vinculada ao contexto de sua produção para ser interpretada, ou
seja, seria “[...] um produto completo em si mesmo” (KLEIMAN, 1995, p. 22). Em
contrapartida, é apresentado o modelo ideológico, que subentende a existência de
inter-relações entre práticas orais e letradas e examina as particularidades dessas
conexões, que
no plural, são social e culturalmente determinadas, e, como tal, os
significados específicos que a escrita assume para um grupo social
dependem dos contextos e instituições em que ela foi adquirida.
(STREET apud KLEIMAN, 1995, p. 21).
Nessa perspectiva, o desenvolvimento do processo de letramento depende
basicamente do contexto social como um todo, pois o código escrito está presente
no cotidiano das pessoas, direta ou indiretamente. Sob esse viés, a escola
assume papel de agente transformador da oralidade dos alunos através da
introdução do código da escrita, impondo as marcas formais da fala letrada, como
aponta Kleiman (1995). a família, por sua vez, seria o agente mais eficiente
para o sucesso escolar, pois é a partir da sua efetiva colaboração e estímulo que a
criança iconhecer o sentido e o papel da escrita em sua vida e a funções das
práticas orais e escritas em seu cotidiano e no cotidiano da escola.
2.2 Conceito de Língua e Empréstimos
No sentido mais habitual, a palavra língua é entendida como “[...] um
sistema de comunicação complexo e altamente desenvolvido” (MONTSERRAT,
1974, p. 37-38). É através dela que uma comunidade lingüística se estrutura,
muito embora existam feixes de variações que coexistem no mesmo tempo
histórico. Essas variações lingüísticas, analisadas na perspectiva sincrônica, têm,
19
19
em princípio, a mesma importância, ou seja, todas são partes constituintes do
sistema de uma dada língua.
Classes sociais, grupos profissionais, categorias étnicas influenciam e
regem o que se convenciona em cada sistema lingüístico. O intercâmbio dessas
diferenças enriquece a possibilidade de comunicação e compreensão entre os
membros da comunidade. E a língua, por sua vez, como afirmam Tarallo e Alkmin
“[...] não somente reflete como também reforça, a cada momento, tais
convenções” (1987, p. 16).
Dessa forma, uma língua somente será alterada se houver necessidade ou
algum interesse na modificação da forma usual de as pessoas se comunicarem.
Essa necessidade ou desejo acaba transformando os usos possíveis, pela
introdução de palavras que afetam a troca intersubjetiva, atendendo a novas
exigências, de acordo com o que assegura Montserrat (1974). E para que a
alteração se efetive, o vocabulário será ampliado através de empréstimos de
palavras estrangeiras e de criações de novas palavras (neologismos) a partir
daquelas já existentes. Geralmente, os empréstimos são introduzidos numa dada
língua por falantes bilíngües que, gradualmente, vão passando adiante para os
demais membros da comunidade certos termos e expressões emprestadas,
multiplicando os seus usuários, como observa Manczak-Wohlfeld (2006).
Os empréstimos, muitas vezes, são necessários para suprir lacunas lexicais
da L1, ou seja, uma palavra estrangeira é introduzida quando inexiste um termo
específico para nomear um objeto num determinado idioma. Nesse caso, faz-se
necessário usar um circunlóquio para definir ou explicar esse objeto. De acordo
com Arabski (2006)
1
, alguns empréstimos são necessários porque eles são nomes
de produtos, instituições ou dispositivos que não existem na L1 ou são adquiridos
para fazer a associação do falar com a cultura da L2. Seguindo ainda com as
considerações desse autor, existem certas razões práticas que levam à
1
Some borrowings are necessary because they are names of products, institutions or gadgets
which do not exist in L1. Others are acquired to associate the speaker with L2 culture” (ARABSKI,
2006, p. 20).
20
20
importação de palavras
2
: novas situações de política e economia;
desenvolvimento tecnológico; novos estilos de vida. Essa situação decorre do
contato cultural que é estabelecido através dos empréstimos realizados, pois não
somente itens lexicais estão sendo incorporados ao idioma, mas também a cultura
estrangeira está sendo assimilada juntamente com as palavras.
.
A influência exercida pela língua estrangeira sobre uma dada comunidade
de fala envolve a compreensão do conceito de domínio lingüístico. De acordo com
Mello, essa noção possibilita
compreender os usos e as funções das línguas em contato, assim como
nos permite identificar o bilíngüe em um continuum situacional no qual
ele alterna seus vários modos de fala, ao invés de caracterizá-lo como
uma espécie rara, cujo “domínio” das nguas se estenderia a todas as
situações. (2001, p. 76).
O autor citado conceitua domínio lingüístico como sendo uma dada situação
comunicativa na qual acontece uma interação verbal. Citando Fishman (1968),
Mello aponta a família, a escola, a igreja, o trabalho e a vizinhança como os
principais domínios lingüísticos. Nesses contextos, pode ser requerido o domínio
de uma ou mais línguas, de acordo com a interação entre os falantes e com a
formalidade ou informalidade da situação. A partir disso, Mello ressalta que “[...]
todas as relações psico-sociais que permeiam a comunicação entre as pessoas
[...]” (2001, p. 77) são constitutivas da concepção de domínio lingüístico, não
sendo tal conceito restrito apenas ao local em que ocorrem as interações.
Somados aos domínios lingüísticos, a motivação e as atitudes lingüísticas
também são elementos cruciais ao contexto bilíngüe. A influência das pessoas
que cercam o aprendiz de uma segunda língua pode ser positiva ou negativa,
como aponta McGroaty (1996), também nos estudos de Mello, pois dela resulta o
julgamento que ele faz de si mesmo com relação aos outros, uma vez que o seu
modo de falar também é avaliado pelas pessoas próximas, íntimas:
2
“[...] new political and economic situations; technological developments; new styles of life” (ARABSKI,
2006, p. 16).
21
21
se os colegas, os pais ou professores têm uma atitude positiva em
relação à língua que está sendo adquirida, o aprendiz, certamente, irá
desenvolver uma atitude também positiva, predispondo-o para a
aprendizagem ou o contrário também pode ocorrer. (MELLO, 2001, p.
77).
2.3 Línguas em contato
Num mesmo contexto geográfico cidade, vila, bairro - pode ocorrer
contato entre línguas, ou seja, duas ou mais línguas vivas são utilizadas,
concomitantemente, pelos indivíduos dessa comunidade de falantes. O
plurilingüismo possibilita diversidade de comunicação, em se tratando de opções
de língua, pois dependendo da situação que se estabelece entre os interlocutores,
um dos sistemas é escolhido, sem que os demais percam seu espaço.
De outra parte, as circunstâncias de emprego do bilingüismo, no caso de
duas línguas ou de multilingüismo, mais de duas línguas, são de ordem histórica,
social e também política, segundo a visão de Tarallo e Alkmin (1987). Os domínios
que cada sistema possui em uma comunidade são estabelecidos a partir de
determinações de variada natureza, sobretudo, históricas, as quais “[...] geram a
arbitrariedade entre o significante e o significado” (TARALLO e ALKMIN, 1987, p.
65). A arbitrariedade, por sua vez, decorre das convenções sociais, que,
geralmente, são impostas pelo grupo de maior poder político e econômico.
A dominação de uma língua sobre outra, numa mesma comunidade
lingüística, produzirá diferentes atitudes nos falantes que dela participam. Haverá
integração ou segregação nesse conjunto formado, pois cada falante avaliará sua
condição na sociedade, considerando sua identidade cultural, étnica e,
principalmente, lingüística, como foi afirmado por Tarallo e Alkmin (1987).
Essa preponderância de uma língua sobre outra pode ser caracterizada
como diglossia. Duas línguas distintas se mantêm vivas numa mesma comunidade
22
22
de fala, mas em função da situação política e social, uma delas sobrepõe-se à
outra. É o caso do Canadá, onde o inglês tem privilégio sobre o francês, como
exemplifica o mesmo autor, apesar de em todas as instituições existirem escritos
em inglês e francês, pela ordem. Em outras circunstâncias pode acontecer a
mescla de dois sistemas, questão muito mais complexa de ser avaliada, que
não se conhece uma ngua misturada, mas a emergência de uma terceira ngua,
surgida a partir das duas primeiras.
O contato direto entre duas línguas pode manifestar a interferência de um
código sobre outro, ou seja, a troca de digo. O Code-switching, ao contrário da
diglossia, não é ditado por domínios de discurso, como apontam Tarallo e Alkmin
(1987), mas pela mescla dos dois sistemas em nível de sentença, e governada
pela situação, na qual o código é alternado. No contato existente entre duas
línguas o que ocorre é mais do que transmissão de estruturas de linguagem. A
troca de código é, de acordo com Arabski (2006), apenas uma parte do processo,
porque ocorre também e principalmente uma transferência cultural que se
estabelece a partir do que passa a ser comum a ambos os idiomas, isto é, daquilo
que advém de um sistema e é apropriado pelo outro.
Há a possibilidade ainda de ocorrer, num contexto de duas línguas distintas,
o surgimento de uma terceira língua, em função do contato das duas. Ou seja,
falantes de grupos lingüísticos diferentes podem criar uma língua comum para um
fim específico, como por exemplo, o comércio. A mescla é realizada pelos dois
grupos, da qual resultará uma nova língua que irá prevalecer nesse meio
comunicativo.
Tarallo e Alkmin, citando Hall (1972), afirmam que “[...] uma língua pidgin é,
por definição, aquela cujas estruturas e léxico foram drasticamente reduzidos, e
que não é nativa de nenhuma das pessoas que a utilizam” (1987, p. 86-87). Dessa
maneira, pode ser caracterizada como sendo uma segunda língua dos falantes,
por servir de comunicação entre os grupos diferenciados, apenas para finalidades
23
23
específicas; mas, também, pode ser considerada língua materna no momento em
que for a primeira língua aprendida pelos filhos desses pais que usavam a pidgin
para fins específicos. Os filhos, no entanto, passaram a utilizá-la como língua
natural, nas mais diversas situações.
Como características compartilhadas pelas línguas pidgin, Tarallo aponta
duas principais, a saber: possuem caráter auxiliar e secundário para os dois
grupos envolvidos, pois cada um manterá sua própria língua no seu contexto
habitual; e preenchem funções sociais limitadas, especialmente as que tangem a
atividades comerciais ou religiosas. A principal causa de surgimento dos pidgins é,
de acordo com Tarallo (op. cit.), o choque entre tradições culturais e
lingüisticasmente distintas, em situações de ocupação militar, invasões,
dominação política e, como foi citado anteriormente, nos contatos comerciais e
religiosos - evangelização.
Uma outra língua surgida do contato entre culturas é a língua crioula que se
constitui de um conjunto de línguas ligado a uma situação de contato entre
populações lingüísticas, cultural e etnicamente distintas. Esse tipo de língua de
contato possui uma comunidade de falantes nativos e exerce uma função social
ampla, como qualquer outra língua. Isso, na verdade, é o que distingue uma língua
crioula de uma língua pidgin.
Ainda Tarallo, corroborando as assertivas de Hall Jr (1966), declara que
“[...] os crioulos são descendentes de pidgin, ou seja, a evolução natural de um
pidgin é sua transformação em crioulo (relação de pai para filho), mas nem todo
pidgin, necessariamente, se transforma num crioulo” (1987, p. 97). Caracteriza-se
como crioula, uma língua cuja história é conhecida, deixando transparecer sua
herança lexical advinda da língua-fonte, como bem o observa Tarallo (1987). Seu
nascimento acontece no ambiente em que dois pólos sociais, dominante e
dominado, estruturam o tipo e a ordem da relação mantida.
24
24
2.4 Níveis de contato interlingüístico
Em contatos interlingüísticos, o empréstimo de palavras, comumente, não
interfere no sistema da L1 (importador). Do ponto de vista do idioma exportador, a
estabilidade está assegurada de antemão, uma vez que o empréstimo não afeta o
sistema do idioma do qual foi feito o empréstimo (L2) porque os itens léxicos que
foram apropriados funcionam como sinônimos ou variantes léxicas estilísticas,
segundo o afirma Arabski (2007). Caso seja realizado um empréstimo de regra
gramatical, porém, novas estruturas serão geradas e, conseqüentemente,
mudanças nos itens léxicos individuais, pois as estruturas fonológicas e as
estruturas sintáticas poderão ser adotadas pelo idioma que fez o empréstimo.
Ainda segundo as considerações do mesmo autor, as características salientes da
L1 (estruturas fonológicas) não sofrerão qualquer interferência, mas a estrutura
fonológica original sofrerá transferência e adotará as regras do idioma que pediu
algum item lexical emprestado. Sendo assim, nas influências interculturais, o nível
lingüístico que costuma sofrer menor impacto do contato entre as línguas é o
fonológico, como o sugere Arabski (2006), através do gráfico a seguir estruturado
com base nas pesquisas já empreendidas nessa área: o nível mais suscetível ao
impacto é o pragmático (A); logo após o nível sintático (B); seguido pelo
morfológico (C) e, finalmente, aparece o nível fonológico (D), que está mais
fortemente arraigado e, portanto, menos sujeito a alterações, como demostrado
visualmente logo em seguida:
A
B
C
D
25
25
Por sua vez, Voese (1975), através de sua pesquisa com falantes nativos
do dialeto alemão, na comunidade de Rio Pequeno/ RS, a 30 Km de Vera Cruz, ao
discutir a influência do dialeto sobre o aprendizado da língua portuguesa do Brasil
(LE), partiu do pressuposto de que “[...] se o sistema fonológico da língua se
constrói a partir de oposições entre traços distintivos, a inobservância de uma
oposição atingiria o sistema, não fonemas isolados apenas” (1975, p. 6). O autor
comprovou esse dado, a partir da constatação de que com relação às consoantes
plosivas do dialeto estudado, a oposição entre vozeado e desvozeado não era
fonológica. Essa peculiaridade, de não ter valor distintivo, foi transferida para a
língua portuguesa, a qual utiliza justamente esse traço distintivo para estabelecer
diferenças de significados entre palavras.
Conforme McClelland (2001), citado por Alves e Zimmer: “[...] o aprendizado
não pode acontecer se o aprendiz não conseguir discriminar os detalhes fonéticos
distintivos presentes no input, pois enquanto tal distinção não ocorrer, somente o
padrão da L1 será reforçado” (2006, p. 132). E para que não ocorram reforços
indevidos na L1, evitando possíveis erros na compreensão de significados
advindos da impercepção dos aspectos fonéticos /fonológicos, segundo Alves e
Zimmer (2006), faz-se necessário o falar do nativo, e não somente do professor, e
a sistematização dos detalhes para que o aprendiz perceba as particularidades
fonéticas da língua-alvo.
Para Mori (2001), o conhecimento em fonologia também é relevante na
aprendizagem de uma L2, porque, justifica, “[...] é comum, ao aprender uma língua
estrangeira, usar os fones da língua materna na pronúncia daquela que se está
aprendendo” (p.151). No caso de duas línguas diferirem quanto aos seus
componentes fonológicos, a tendência de ocorrerem interferências
problemáticas na prática oral desta língua. Daí a importância, como ainda aponta
o autor, de o professor considerar os sistemas fonológicos das nguas em
questão, para “[...] resolver os problemas de interferência, desenvolvendo
26
26
estratégias que auxiliem o estudante a superar a tendência a transpor o sistema
fônico de sua língua materna para a língua estrangeira” (p.151).
A partir do trabalho de (re)conhecimento do sistema fonológico da língua, o
desenvolvimento da consciência lingüística seria estimulado, uma vez que “[...] é a
consciência lingüística que permite ao sujeito atentar à expressão lingüística,
dissociando-a do conteúdo da mensagem, sendo um tipo de processamento
psicolingüístico lento e intencional”, conforme Cielo e Poersch (1998, p. 101). Isso
contribuiria tanto para a aprendizagem da leitura em L1 como também para o
aprendizado de uma L2, o que, por sua vez, proporcionaria um maior
conhecimento da própria língua materna.
As transferências advindas da L1 para a L2, envolvendo traços distintivos
de consoantes plosivas do dialeto alemão falado na região e do português
brasileiro, podem perdurar por um longo período, sendo, em vista disso,
caracterizados como exemplares típicos de fossilização, de acordo com a
definição de Percegona (2005, p. 1): “Quando um erro se torna permanente e
estável no processo de aquisição de segunda ngua, ocorre o que chamamos de
fossilização” (2005, p. 1). Ainda segundo os mesmos estudos, esse fenômeno
tanto pode ter cunho individual como social, isto é, tanto ocorre a fossilização
como um processo particular, isolado, no qual o indivíduo produz formas que são
internalizadas e difíceis de serem eliminadas, como também ocorre como reflexo
de normas criadas pela comunidade da qual faz parte o falante, em que as formas
são comuns a todos.
2.4.1 Alternância de códigos
Calvet (2002) afirma que a passagem de um ponto do discurso de uma para
outra ngua acontece no momento em que “[...] um indivíduo se confronta com
duas línguas que utiliza vez ou outra, podendo ocorrer que elas se misturem em
seu discurso e que ele produza enunciados bilíngües” (2002, p. 43). Como
exemplo, pode-se citar o contato da língua alemã com a língua portuguesa do
27
27
Brasil, no qual o falante pode dizer: A cor da minha blusa é rot, querendo dizer que
a cor da sua blusa é vermelha. A esse respeito, Milroy e Muysken, citados por
Oliveira (2002, p. 92) acrescentam:
É no estudo da alternância de códigos que reside o aspecto mais
importante da pesquisa bilíngüe. A alternância de códigos é o uso
alternativo de duas ou mais línguas na mesma situação de conversação.
Sob esse termo genérico, perspectivam-se diferentes formas de
bilingüismo. A alternância pode ocorrer nos actos de fala de vários
indivíduos durante uma conversação, nas elocuções dentro de um único
ato de fala e ainda dentro de uma simples elocução. (MILROY e
MUYSKEN, 1995).
A alternância de códigos é uma habilidade de dupla competência, a qual vai
aumentando conforme a freqüência com que é produzida. Segundo a mesma
autora, esse fenômeno é caracterizado “[...] como um índice de uma elevada
competência comunicativa em cada uma das duas línguas” (2002, p. 95). Esse
processo é, normalmente, consciente e os bilíngües ágeis o bastante para
distinguir um sistema do outro vão justapondo palavras que obedecem cada uma
a sua regra de acordo com a língua.
Diferentemente, a interferência é caracterizada como sendo um “[...]
cruzamento involuntário [...]” (OLIVEIRA, 2002, p.95) entre dois códigos, que
pressupõe uma aquisição incompleta e uma integração através de empréstimos
da L2, submetidos com freqüência às mesmas regras da L1, citando Hagége,
(1996). Ainda sobre interferência, faz-se relevante considerar o apontamento feito
por Rocca (2003) sobre os estudos de Grosjean a respeito das falas de bilíngües:
[...] interferência como a influência involuntária de uma língua na outra,
de modo a distingui-la de outras características freqüentemente
presentes na fala de bilíngües, como empréstimo e mudança de digo
(codeswitching), que o menos involuntários. Esses dois últimos são
traços do bilíngüe quando se endereçando a um outro bilíngüe,
enquanto interferência é um traço proeminente na fala de bilíngües
quando se endereçando a monolíngues. (1982, p. 229).
28
28
2.5 Bilingüismo e Monolingüismo
Definir bilingüismo é muito complexo, uma vez que o vários os aspectos
envolvidos a serem considerados. Nos estudos de contato entre línguas,
Weinreich, em 1953, concluiu que, do fenômeno de interferência no contato
interlingüístico, resulta o bilingüismo, que é a utilização da prática alternada de
duas línguas. Quanto a esse estudo, referido por Simões (2006), muitos
problemas foram apontados: a definição é geral e superficial, por não considerar
as condições individuais dos falantes (por que e de que forma a escolha entre um
ou outro idioma acontece na comunicação); não é mencionado o quanto o
indivíduo deve saber sobre as duas línguas; e também não é feito qualquer
comentário sobre o grau de proficiência nos dois idiomas em relação às quatro
habilidades lingüísticas: ouvir, falar, ler e escrever.
Alguns pesquisadores acreditam, de acordo com Simões (2006), que um
indivíduo, para ser considerado bilíngüe, precise ter o mesmo domínio dessas
quatro habilidades nas duas línguas, mas outros consideram desnecessária a
mesma competência. Para Grosjean (1998), mencionado no estudo de Simões
(2006, p. 16), bilíngüe é aquele que “[...] utiliza constantemente duas (ou mais)
línguas (ou dialetos) com diferentes pessoas em diversas situações do cotidiano
de acordo com seu propósito”. Em outras palavras, bilingüismo não é apenas um
processo de aquisição de línguas em que deva haver o domínio pleno e o uso de
estruturas idênticas as da L1, devendo o indivíduo possuir capacidade similar ao
falante nativo.
.
Por outro lado, o bilingüismo pode ser tratado sob uma perspectiva
individual ou social, como comenta Simões (2006), ao analisar as pesquisas
interdisciplinares já realizadas. No que se refere ao caráter individual, o indivíduo é
considerado isoladamente dentro de um contexto social, onde são consideradas
questões referentes às línguas, como por exemplo, função, alternação e
interferências. No que diz respeito ao caráter social, os olhares voltam-se para as
29
29
comunidades, pois se entende que a relação entre o indivíduo e a comunidade é
estrita.
.
Independentemente do caráter do bilingüismo tido em conta, outro fator que
sempre foi motivo de muitas investigações refere-se à idade de aquisição de L2,
isso porque muitos estudiosos acreditam que a faixa etária é fundamental ao
estudo do processo: Nesse caso, considera-se que a idade pode influenciar na
organização cerebral e no desenvolvimento da lateralidade, definindo, assim, o
papel dos dois hemisférios no processamento da linguagem” (SIMÕES, 2006, p.
17).
A partir de alguns estudos referidos por Simões (2006), é possível fazer
uma distinção entre bilingüismo precoce, no qual a aquisição de L2 acontece até a
fase pré-adolescente, e bilingüísmo adquirido ou tardio, em que o processo inicia
após os 11 anos de idade. De acordo com Fegle (1998, apud ROCCA 2003),
mencionado por Simões (2006), os bilíngües cuja aquisição aconteceu num
momento posterior, ou tardio, como convencionado designar, são mais fortemente
influenciados pela sua L1 no uso da L2, quanto à acentuação, ao ritmo, à
entonação e aos sons da fala, por exemplo.
O contexto no qual a L2 é adquirida também se constitui num ponto a ser
considerado. Simões (2006) refere os trabalhos de Kaplan, Bohn e Vandresen e
Widdowson (1989; 1989; 1990), de acordo com os quais a forma de aquisição de
L2 pode acontecer de maneira natural ou espontânea. Assim, esses autores viram
a necessidade de averiguar a função da L1 no processo e a metodologia mais
apropriada em cada situação. Além disso, incluíram a idade, os motivos da
aprendizagem e a utilização dos idiomas em seus estudos.
Simões (2006) menciona, além disso, o trabalho de Savedra e Heye (1995),
que considera o ambiente e as condições de aquisição de L2 fundamentais para a
investigação. Nesse sentido, esses autores apresentam uma distinção entre
bilingüismo e bilingualidade. O bilingüismo consistiria na presença simultânea de
30
30
duas línguas num contexto de comunicação. A bilingualidade seria composta por
etapas do bilingüismo, ou seja, fases pelas quais um sujeito bilíngüe passa ao
longo da vida, desenvolvendo suas habilidades lingüística, comunicativa e cultural
nos dois idiomas.
De acordo ainda com o que é destacado por Simões (2006), nos estudos de
Heye (1979) e Hamers e Blanc (1989), alguns elementos se tornam essenciais
para a identificação de diferentes situações de bilingüismo, a citar: a sociedade e a
situação de comunicação em que os idiomas são utilizados, a posição que os
falantes e as línguas ocupam, as relações sociais e as interações, e também a
finalidade a que se destina o uso das línguas. Essas situações de bilingüismo são
determinadas pelos estágios da bilingualidade, conforme ainda Savedra e Heye
(1995).
Assim, dentro das dimensões de bilingualidade, os autores comentados por
Simões (2006) e, em sua ótica, consideram três situações que podem originar o
bilingüismo:
1) Lab (Língua “a” e Língua “b”): uma língua é adquirida simultaneamente à
outra, sendo ambas consideradas L1;
2) La + Lb (Língua “a” + Língua “b”): quando uma língua é adquirida depois da
outra, antes da primeira ter sido internalizada,
3) LM + LE (Língua materna + Língua estrangeira): quando uma língua é
adquirida depois da outra, após a primeira ter sido internalizada.
Essas situações de aquisição e aprendizagem podem ocorrer em diferentes
fases da vida dos bilíngües, sendo alteradas pelo uso funcional das línguas. Por
exemplo, a aquisição ocorrendo na infância, tanto a situação 1 (Lab) como a 2 (La
+ Lb) pode se apresentar; se acontecer na adolescência, as situações 2 (La + Lb)
e 3 (LM + LE) são possíveis; e no caso da fase adulta, a situação 3 (LM + LE)
poderá prevalecer.
31
31
O predomínio ou a igualdade de ambas as línguas dependerá do histórico
de vida dos bilíngües. De acordo com Heye (1995), também referido nos estudos
de Dück (2005), retomados por Simões (2006), pode haver um estado equilibrado
como também um estado dominante/subordinado. No primeiro caso, as línguas
são mantidas paralela e constantemente, numa situação na qual as duas são
utilizadas. Já no estado subordinado, a predominância de uma língua sobre a
outra, devido a situações de funcionalidade nos ambientes familiar, social, escolar
e profissional:
o processo de aquisição formal de segunda língua (AFL2) constitui uma
situação de bilingüismo. Nesse caso, os estágios de bilingualidade,
definidos pelo uso das línguas em determinados ambientes
comunicativos, caracterizam os diferentes estágios de bilingüismo, isto
é, a bilingualidade. Sendo assim, segundo os autores, os seguintes
elementos adquirem relevância: faixa etária, maturidade lingüística de
L1, status de L2, domínio social e lingüístico de ambas as línguas,
motivação para a aprendizagem, utilização de L2, grau de domínio
lingüístico {+dominante} das nguas nos estágios de bilingualidade no
momento em que se dá o processo de AFL2. (SAVEDRA e HEYE (1995)
apud SIMÕES, 2006, p. 21).
Embora o bilingüismo esteja presente em quase todos os países do mundo,
de acordo com Romaine (1995), mencionado por Cavalcanti (1999), é o
monolingüismo que representa a norma, que é a base dos estudos lingüísticos.
Conforme ainda sua concepção, o bilingüismo deveria representar a norma e não
um caso especial ou desvio, porque: “Há cerca de trinta vezes mais línguas do
que países. Isso implica a presença do bilingüismo em praticamente todos os
países do mundo” (CAVALCANTI, 1999, p. 388).
No cenário brasileiro, persiste o mito de monolingüismo, de acordo com
Cavalcanti (1999). A concepção monolingüística exclui todas as comunidades
falantes de variações desprestigiadas do português estando relacionada à
esteriotipação do bilingüismo, o qual está ligado às línguas de prestígio; por outro
lado, a atitude assumida torna invisíveis e naturalizados os contextos bilíngües da
maioria, que são tratados como minorias, isso por parte da sociedade e dos
32
32
próprios falantes dessas comunidades, porque as línguas são de tradição oral e
estigmatizadas por isso, como bem explica Cavalvanti:
No Brasil, não se pode ignorar os contextos bilíngües de minorias, uma
vez que no mapa do país pode-se localizar em uma pincelada não
exaustiva: i. comunidades indígenas em quase todo o território,
principalmente, na região norte e centro-oeste; ii. comunidades
imigrantes (alemãs, italianas, japonesas, polonesas, ucranianas, etc) na
região Sudeste e Sul, que mantém ou o sua língua de origem; iii.
comunidades de brasileiros descendentes de imigrantes e de brasileiros
não-descendentes de imigrantes em regiões de fronteira, em sua grande
maioria, com países hispano-falantes. (1999, p. 388).
Mesmo em comunidades consideradas monolíngües diversidade
lingüística, porque ali existem “[...] variedades regionais, sociais e estilísticas
dentro do que é considerado como uma “língua” (Romaine, 1995 apud Cavalcanti:
1999, p. 393). Essas variedades o, muitas vezes, desconsideradas e passam a
ser tratadas como se fossem “[...] monoculturais e monolíngües [...]“, (JUNG,
1997), mencionado por Cavalcanti (1999, p, 396). Ainda segundo as mesmas
considerações: “As escolas o oficialmente monolíngües, mas, em comunidades
bilíngües, é natural que haja trânsito entre uma e outra língua” (CAVALCANTI,
1999, p. 396), ou seja, a língua da escola convive com a língua da comunidade,
mesmo que não a reconheça.
O papel exercido pelas línguas numa dada comunidade de fala ultrapassa a
compreensão de domínios lingüísticos, como referido antes, e atinge a sociedade
como um todo. De acordo com Mello, essa noção possibilita:
compreender os usos e as funções das línguas em contato, assim como
nos permite identificar o bilíngüe em um continuum situacional no qual
ele alterna seus vários modos de fala, ao invés de caracterizá-lo como
uma espécie rara, cujo “domínio” das nguas se estenderia a todas as
situações. (2001, p. 76).
33
33
2.6 Aquisição de L1 e L2
Tanto a fala quanto a escrita compõem um conjunto de práticas sociais, nos
termos de Marcuschi (2001). A fala é adquirida em contextos informais, nas
relações interpessoais e sociais com fins comunicativos, e se constitui em uma
necessidade social de “[...] inserção cultural e de socialização” (MARCUSCHI,
2001, p. 18). a escrita é adquirida em contextos formais, como a escola, por
exemplo, existindo um estreito vínculo entre o contexto escolar e as práticas
iniciais de leitura e escrita.
De outra parte, o homem só pode ser concebido a partir do meio do qual faz
parte. De acordo com Sirgado (2000, p. 46), que faz essa observação com base
em Vygotsky “[...] o homem é um ser social [...]. Um agregado de relações sociais
encarnadas num indivíduo [...] um membro de um grupo social específico [...] um
ser em si, para os outros, para si mesmo”. Em outras palavras, isso significa
pensar, como observa Sirgado, que a pessoa possui uma natureza biológica e
social, que significa para os outros e, que através deles, obtém significado para si
mesmo.
Nessa perspectiva, Tomasello também considera a junção entre o individual
e o cultural no desenvolvimento humano. Conforme sua interpretação, “[...] a linha
do desenvolvimento cognitivo [...] concerne àquelas coisas que o organismo
conhece e aprende por conta própria sem a influência direta de outras pessoas ou
dos seus artefatos” (2003, p. 71). o desenvolvimento cognitivo cultural está
relacionado [...] àquelas coisas que o organismo conhece e aprende por meio de
atos nos quais tenta ver o mundo através da perspectiva de outras pessoas
(incluindo as perspectivas incorporadas nos artefatos)” (2003, p. 71).
A transição de categoria da natureza para a categoria da cultura consiste na
transformação do homem e constitui a sua história. De acordo com Vygotsky
34
34
(1989), as funções biológicas juntamente com a manifestação das funções
culturais fornecem uma nova forma de existência, daí serem incorporadas na
história humana, como aponta Sirgado (2000). Se o desenvolvimento humano é
cultural, é também histórico, uma vez que o homem age na natureza e em si
mesmo como participante dessa natureza, tornando-se assim “[...] o artífice de si
mesmo [...]” (SIRGADO, 2000, p. 51).
Mas, contrariamente ao que ocorre no mundo biológico, a sociabilidade
humana não é simplesmente dada pela natureza, mas assumida pelo
homem que procura formas variadas de concretizá-la. Estas formas
circunscrevem o campo do que entendemos por organização social ou
sociedade. O homem cria suas próprias condições de existência social
da mesma forma que cria suas condições de existência material.
(SIRGADO, 2000, p. 54).
Nas relações sociais, a participação do outro é fundamental, pois “Nós nos
tornamos nós mesmos através dos outros” (SIRGADO, 2000, p. 65). A partir dessa
definição, o outro não se configura somente como um mediador instrumental, mas
assume um papel mais importante, imprescindível: o outro é a condição para o
desenvolvimento. Essa distinção conferida ao outro é apontada por Tomasello
(2003) como uma característica que o ser humano desenvolveu filogeneticamente,
ou seja, a capacidade de “identificar-se” com os seus co-específicos,
compreendendo-os como “[...] seres mentais e intencionais [...]” assim como ele
(2003, p. 13).
. De acordo com Vygotsky (1989), o desenvolvimento cultural passa por três
momentos: o desenvolvimento em si, o desenvolvimento para os outros e o
desenvolvimento para si. O desenvolvimento em si está relacionado ao aspecto
biológico, natural, geneticamente herdado pela criança. É o momento teórico,
anterior ao surgimento do estado de cultura. O segundo, desenvolvimento para os
outros, é o momento no qual o que foi fornecido passa a ter significação para os
outros. “É o momento histórico da emergência do estado de cultura” (SIRGADO,
2000, p. 65), da consciência, da representação da realidade. o terceiro,
consiste na composição cultural do homem, da significação que atribui a si
35
35
mesmo, resultante da significação que os outros atribuíram ao que foi fornecido
naturalmente. “É o momento da constituição cultural do indivíduo quando, através
desse outro, ele internaliza a significação do mundo transformado pela atividade
produtiva, o que chamamos de mundo cultural” (SIRGADO, 2000, p. 66).
Na perspectiva cultural, o que é internalizado é o significado das coisas e
essa significação provém das relações sociais. O que é incorporado é aquilo que o
outro passa a exprimir a respeito do eu, situação a partir da qual o indivíduo passa
a configurar seu papel na sociedade: quem sou eu, que posição social ocupo e o
que de mim é esperado. É através do outro que o eu se constitui como ser social
com aquilo que lhe é mais particular, subjetivo. O outro é, concomitantemente,
objeto e agente no processo de internalização, de acordo com o mesmo Sirgado
(op. cit.).
Por outro lado, é pela atribuição da significação que a condição humana é
conferida pelo social, transformando a sociabilidade animal (organização natural
do convívio entre indivíduos de uma mesma espécie) numa sociabilidade humana
(maneira como as pessoas se organizam). Como foi apontado por Sirgado (2000),
tal evidência equivale a dizer que não o os aspectos naturais ou biológicos que
regem a convivência humana, mas sim as leis históricas. História aqui, definida
por Vygotsky, e retomada por Sirgado (2000), como uma produção das condições
sociais de existência produzidas pelos homens:
As formas humanas de organização social, em que a sociabilidade
natural se concretiza, são obra do homem e, como tal, obedecem a leis
históricas que determinam as condições concretas de sua produção. É o
caráter histórico dessa produção que define o social humano.
(SIRGADO, 2000, p. 61).
De acordo com Marx (1972), constante nos estudos de Sirgado, a história
humana se constitui numa dupla e simultânea transformação: da natureza e do
homem. Uma não acontece independentemente da outra. Isso é possível,
segundo ele, porque na atividade humana ocorre a mediação técnica e a
36
36
semiótica. A primeira mediação possibilita uma transformação da natureza, a
criação de uma forma nova, construída pelo homem; enquanto a segunda lhe
permite atribuir uma significação a essa nova forma.
2.7 Aprendizagem de L2
A aprendizagem de uma segunda língua também pode ser considerada sob
o prisma lingüístico, implicando um processo, pois a compreensão antecede a
produção, de acordo com Silva (1981), e a “[...] relação entre a compreensão e
produção é fundamental para o entendimento da aquisição de estruturas da L2”
(ALVES E ZIMMER, 2006, p. 124). Em se tratando de idiomas de destino
totalmente diferentes da L1, Ringbom (2006) destaca que uma pequena parte
da transferência será visível em compreensão e aprendizagem. A transferência da
maior parte acontecerá em produção, sem que o falante perceba.
O aprendizado em L2 se processa de maneira muito parecida com a
aquisição de L1, ou seja, pela exposição a regularidades do input presentes no
meio a que está exposto o falante. Quanto maior o estímulo, maior a chance de
aprendizado, uma vez que as conexões entre os neurônios serão reforçadas e
mais rapidamente as informações poderão ser acessadas. O reforço das sinapses,
através da repetição e do desenvolvimento da consciência lingüística, favorecem a
automatização e, conseqüentemente, o aprendizado da leitura.
Apesar da aprendizagem da L2 ser um processo tão longo e complexo
como a da L1, a transferência dos padrões lingüísticos da L1 para L2 é uma das
características distintivas entre um e outro processo. Os padrões da L1, mais
antigos e fortemente estabelecidos, influenciam os novos, da L2, ainda não
suficientemente reforçados. Isso significa dizer que o aprendiz tende a utilizar sua
língua materna como base de referência, durante o processo de aquisição da L2,
pois as operações na L1 estão mais fortemente arraigadas pelas práticas
constantes, como também aponta Schütz (2006).
37
37
A capacidade de generalização também integra esse aprendizado. As
experiências lingüísticas prévias do falante e a detecção de similaridades entre os
traços ou de diferenças entre os inputs da L1 e da L2 podem gerar
generalizações, padrões, ou seja, transferências interlingüísticas, da L1 para a L2,
e intralingüísticas, supergeneralizações advindas do input da L2, de acordo com
as pesquisas de Alves e Zimmer (2006).
As interferências no processo de aprendizagem da L2 vão desde fatores
biológicos até os do meio a que o aprendiz está exposto, justificando o sucesso ou
o insucesso de seu desempenho, conforme ainda Alves e Zimmer (2006) e citando
Zimmer: “[...] a aprendizagem se mostra dependente não somente do input, mas
também do conhecimento prévio, que compreende informações tanto de caráter
lingüístico como não-lingüístico” (2004, p. 25). Para o professor de língua
estrangeira, principalmente, essas informações são pertinentes, determinantes e
comprometedoras, à medida que contemplam e valorizam a criança como um
todo, quanto a sua individualidade e a seu conhecimento prévio.
A esse respeito, reportando-se a transferências no processo de
aprendizagem de uma segunda língua, Arabski (2006) define transferência como
um processo inerente ao estudo de uma linguagem estrangeira por meio do qual
os estudantes levam consigo o que sabem a respeito do seu idioma materno para
o desempenho do idioma novo. Essa tendência pode ser de dois tipos:
transferência positiva e negativa. A transferência positiva refere-se à adequada
performance do aprendiz de L2, dada a similaridade estrutural entre L1 e L2. a
negativa refere-se às diferenças entre a L1 e a L2. A transferência, de modo geral,
possui um caráter facilitador/simplificador, usado para justamente simplificar
estruturas da língua alvo sob a influência da L1, resultando às vezes em erros, os
quais também podem ser chamados de interferências, como refere o autor
3
,
quando afirma que as semelhnaças entre L1 e L2 causam transferências positivas
3
Similarities between L1 and L2 cause “positive transfer” and the differences between them cause
“negative transfer” which is also referred to as “interference” (ARABSKI, 2007, p. 12).
38
38
e as diferenças entre elas causam transferências negativas, as quais são também
chamadas de intererência.
Ainda segundo Arabski, as transferências positivas facilitam e promovem a
aquisição da linguagem, através das semelhanças entre os sistemas fonológicos,
de vocabulário, de sintaxe etc. Quanto às transferências negativas, ou seja, nas
situações em que os padrões dos dois idiomas o coincidem, Corder (1973),
citado por Arabski (2006), enumera as seguintes categorias: Underproduction:
evitação de estruturas da L2 que não existem na L1 do aprendiz, ou seja, na sua
língua-mãe; Overproduction: é a situação oposta à primeira; consiste no emprego
das estruturas adequadas em L2 por causa da influência da L1; Production errors:
são os empregos inadequados de certos itens lexicais da L1 para suprir um
vocabulário deficitário de L2; Calques: uso direto da estrutura da língua-mãe na
L2. Normalmente nesses casos, a ordem usual das palavras nas sentenças do
idioma estrangeiro L2 é violada; Hypercorrections: são erros cometidos para
evitar um erro supostamente existente, isto é, querendo muito acertar, para não
fazer figura, o usuário da L2 segue uma regra de uso inadequada sem dar-se
conta do que está fazendo; e Misinterpretation: consiste num mal-entendido ou
numa interpretação. O aprendiz deduz equivocadamente o que algum falante
nativo quis dizer, ou infere algo a partir do que apareceu escrito em algum texto de
forma inadequada com base em uma interpretação errada do que foi dito ou lido.
Essas situações são muito comuns, ao serem interpretadas piadas e outros textos
que exigem bom conhecimento cultural e lingüístico, integradamente.
De acordo com as pesquisas de Arabski (2006, 2007), o maior problema
enfrentado por aprendizes de uma segunda língua é a superação das diferenças
entre a L1 e a L2, em relação às estruturas lingüísticas. Os erros cometidos
evidenciam o evoluir do domínio sobre a segunda língua, sendo produzidos a
partir de hipóteses, de tentativas de acerto quanto à pertinência da estrutura
produzida. Nesse processo de aprendizagem, um novo sistema poderá ser criado.
A interlíngua ou a construção sistêmica provisória é denominada por Selinker,
citado por Arabski (2007), como “dialeto idiossincrático”, particular do aprendiz,
39
39
que não pode ser considerado L1 e nem L2, ainda. Com relação à constituição
desse dialeto de transição, Selinker, referido por OrtízAlvarez, o define como: “[...]
sistema lingüístico próprio baseado na produção observável do aprendiz resultado
da tentativa que faz de produzir a norma de língua-alvo” (2002, p. 6).
Assim, por ser um sistema de transição criado paulatinamente no decorrer
de todo o processo de apropriação da segunda língua, a interlíngua mostra os
caminhos e descaminhos da aprendizagem realizada. Segundo ainda Selinker
(1972), como referido por OrtízAlvarez (2002), a interlíngua pode apresentar as
seguintes características: transferência prática, ou seja, inclusões resultantes de
aplicações de novas estruturas, por exemplo, um termo retirado de uma terceira
língua para nomear algo, temporariamente, na L2; estratégias de aprendizagem
de L2 (usar o dicionário, repetir a pronúncia das palavras etc.); tendência à
simplificação dos termos, pronunciando-os de acordo com o sistema da L1, ou
adaptando-os ao modo de produção da L1 (prosódia); emprego de estratégias de
comunicação diversificadas, usualmente mobilizadas para suprir carências na
comunicação em L2 (gestos, troca de código, longas explicações etc.);
supergeneralizações de padrões da língua alvo, ou seja, padrões transferidos de
modo muito abrangente acabam transformando-se em inadequações lingüísticas
constantes. Cabe salientar que a interlíngua, ainda de acordo com o mesmo autor,
pode ser identificada desde o início do processo de aprendizagem de uma
segunda língua, a partir do momento em que o aprendiz faz suas primeiras
tentativas de significar na L2.
Cabe destacar, ainda, que a interlíngua também é passível de fossilização.
Desse modo, caso certas maneiras de pronunciar as palavras e modos de
produzir sentenças sejam internalizados e se mantenham ativos por períodos
longos, sendo recorrentes e permanecendo inalterados por mais de cinco anos,
“[...] a fossilização é irreversível e, mesmo com uma grande quantidade de
insumo, ela pode ocorrer em aprendizes de segunda língua adultos em níveis
avançados, ou com proficiência próxima de um falante nativo” (SELINKER e HAN
apud PERCEGONA, 2005, p. 1).
40
40
Por outro lado, a aprendizagem de uma segunda língua possibilita um
conhecimento maior da língua materna, pois coloca frente a frente os dois
sistemas, L1 e L2. Ao confrontar-se com o diferente, transferindo seu sistema de
signicados para a L2 e recebendo desta estímulos para a compreensão, a
consciência dos fenômenos lingüísticos acaba se manifestando, como afirma
Vigotski: “A criança aprende a ver sua ngua como um sistema específico entre
muitos, a conceber os seus fenômenos à luz de categorias mais gerais, e isso leva
à consciência das suas operações lingüísticas” (1996, p. 94).
41
41
3 O PORTUGUÊS BRASILEIRO E O DIALETO ALEMÃO DA REGIÃO DE VERA
CRUZ/RS: DUAS LÍNGUAS E CULTURAS EM CONTATO
Para explicitar melhor a proposta de investigação deste trabalho, vai-se
fazer uma comparação entre o sistema fonético dos dois idiomas considerados. O
sistema do alemão e do português brasileiro serão cotejados através das
produções dos participantes do estudo e, por isso, neste subitem serão feitos
comentários sobre as características dos dois sistemas em relação a certas
especificidades que se constatou serem comuns entre os usuários bilíngües e o
monolíngüe do dialeto falado na região, manifestando-se freqüentemente na
produção oral do grupo pesquisado. A intenção não é analisar cada sistema em
sua totalidade, exaustivamente, mas somente pinçar certas marcas diferenciais
produzidas tanto pelo monolingüe no dialeto quanto pelos alunos bilíngües no que
respeita à fala dos descendentes de alemães, que em geral apresentam certas
marcas de produção facilmente perceptíveis para os falantes monolíngües do
português.
Por exemplo, dentre as consoantes existem algumas que fazem parte do
sistema português e não existem em alemão. Dentre elas citam-se: d
e t,
e
.
Por outro lado, o sistema de vogais e ditongos também é distinto numa e noutra
língua. Dentre as distinções evidentes está a do ditongo nasal [ãυ] muito comum
em português. A diferença de pronúncia evidencia-se inúmeras vezes na emissão
oral dos participantes, que não produzem esse ditongo como o fazem os
monolíngües do português.
42
42
TABELAS FONÉTICAS
1 - TABELA FONETICA DA LÍNGUA ALEMÃ
4
1.1 Consoantes
Bilabial
ο
Labio-
Dental
ο
Dental-
Alveolar
ο
Alveolar
ο
Palatal
ο
Velar
ο
Uvular
ο
Glotal
ο
Yerschluβ
ββ
β
b p
d t g k
Fricativ v f z s
j ç
Y x
h
Nasal m n
ŋ
Lateral
Vibrans r R
Schlag
1.2 Vogais
stellung
Höhe
vorn
mittel
hinten
hoch
i
Ι
У
Y
u
U
mittel
e
є
Ø
œ
ə
ο
Ɔ
tief
a
α
4
http://spzwww.uni-muenster.de/~griesha/spw/pho/vok-dt-tabelle.html
43
43
2- TABELA FONÉTICA DA LÍNGUA PORTUGUESA
5
2.1 Consoantes
Articulação
Maneira Lugar
Bilabial
Labiodental
Dental
ou
Alveolar
Alveopalatal
Palatal
Velar
Glotal
Oclusiva desv
voz
p
b
t
d
k
g
Africativa desv
voz
t
d
Fricativa desv
voz
f
v
s
z
X
h
Nasal voz
m n
()
Tepe voz
Vibrante voz
ř
Retroflexa voz
Lateral voz
l()
(lƆ)
5
Tabela fonética da Língua Portuguesa (consoantes e vogais) conforme Silva (1999).
44
44
2.2 Vogais
anterior
arred não-arred
central
arred não-arred
posterior
arred não-arred
alta
i I
u υ
média-alta
e
o
média-baixa
ε
ə
baixa
a
Se estabelecermos uma comparação entre o sistema fonético da língua
alemã e o sistema fonético da língua portuguesa, apresentados acima,
verificaremos semelhanças e diferenças entre ambos.
Ao observarmos a tabela fonética da língua alemã, pode-se perceber que a
posição das consoantes plosivas [p] e [b] estão dispostas diferentemente da tabela
fonética da língua portuguesa. Nesta, a ordem em que são encontradas é [p] e [b],
ou seja, primeiro a desvozeada e depois a vozeada. Em contrapatida, na tabela
fonética alemã a consoante plosiva [b] é apresentada primeiramente. Na língua
portuguesa, a distinção dos fones [p] e [b] representa também distinção de
significado, enquanto que no dialeto alemão em questão, tais diferenças parecem
não constituir alteração à significação, se tomarmos como exemplos a seguir: se a
palavra bata for pronunciada ['pat
ə
] o sentido mudará completamente (de vestido
para fêmea do pato), mas se a pronúncia da palavra Bier for ['pi:r], no dialeto da
região, o significado não será alterado, pois no dialeto alemão as variações de [b]
e [p] são possíveis e os falantes compreenderão que, nesse caso, se trata de
cerveja. Ainda, em palavras cuja terminação for a consoante ‘b’ ou se estiver
acompanhada do prefixo [ab], no idioma alemão, o fonema correspondente,
45
45
nesses casos, será [p], ex. Mond (lua): ['mo:nt], Mund (boca): ['mu:nt]; e abholen
(retirar): ['apho:l
ə
n], comum nos dialetos alemães.
O caso dos fones [t] e [d] é semelhante ao anterior. Na tabela fonética
alemã a disposição também apresenta diferença se comparada com a tabela
fonética do português. Na língua portuguesa não existe palavra cuja última
consoante seja [d] ou [t]. Isso ocorrendo no idioma alemão, o fone predominante
será [t], mesmo em situações em que a última consoante seja representada na
escrita [d] ou [dt], como em Bild (quadro): ['bi:lt] e Stadt (cidade): ['tat],
exemplificados na gramática de língua alemã para estrangeiros Genaudas
(SCHUMACHER, 2006). Variações quanto aos fonemas em questão, /t/ e /d/, são
característicos somente da língua portuguesa. É o caso do [t] e [d],
apresentados na tabela fonética consonantal acima disposta. Para a pronúncia de
palavras como tia e dica, por exemplo, são possíveis as seguintes falas,
respectivamente, ['ti
ə
] ou ['ti
ə
] e ['dik
ə
] ou ['dik
ə
]. Nos casos em que há encontro
de consoantes, como [dv] e [dm], por exemplo, a tendência é a utilização de uma
vogal de apoio para a realização oral da palavra, como a seguir: advogado:
[advo'gad
υ
] passa a ser pronunciado [adevo'gad
υ
]; assim como em admirado:
[admi'
ad
υ
] tende a ser realizado como [adimi'
ad
υ
] ou ainda [adimi'
ad
υ
].
Os fonemas [k] e [g], por sua vez, também apresentam características
próprias nos dois sistemas analisados. Na língua alemã, a letra ‘g’ representa o
som de [g], correspondente ao som de (gue) em português: como em Geld ['gεlt],
por exemplo. Nos casos de terminação da consoante (g), a pronúncia poderá ser
[k], como nos casos de Berg (montanha): ['bεrk]; e de Weg (caminho): ['vεk]; [ç],
desconhecido na língua portuguesa, em vocábulos como Honig (mel): ['ho:niç]; e
Essig (vinagre): ['εsiç]; ou ainda pode não haver som correspondente, como no
exemplo fornecido pelo Dicionário Langenscheidt (2001): lang (longo): ['laŋ]. as
palavras grafadas com a letra ‘k’ ou com ‘ck’, permanecem com o fone [k],
exemplos: Kino (cinema): ['ki:no] e Ecke (esquina): ['
ε
k
ə
]. No sistema da língua
46
46
portuguesa, as palavras grafadas com g’ seguidas de a’, ‘o’ ou ‘u’ permanecerão
com o som correspondente a ‘g’, como em gato ['gat
υ
]; gota ['got
ə
]; gula ['gul
ə
];
guerra ['gεh
ə
]; e guitarra [gi'tah
ə
]. Os vocábulos escritos com a letra ‘c’
acompanhados das vogais ‘a’, o’ ou ‘u’ terão a realização em [k], exemplos: cama
['kam
ə
]; colar [ko'la
] e cuca ['kuk
ə
]. Se a letra ‘c’ for seguida por ‘e’ ou ‘i’ a
representação fonética bem como o som produzido será [s] como em cedro
['sεdr
υ
] e cidade [si'dadΙ].
As palavras grafadas com ‘g’, na língua portuguesa, seguidas pelas vogais
‘e’ e i’ o realizadas com []: viagem [vi'a
ẽΙ
] e girafa [i'
af
ə
], bem como
palavras grafadas com a letra “j”: jaca ['ak
ə
]; jejum [e'
ũ
]; jipe ['ipΙ]; jogo
['og
υ
] e juba ['ub
ə
]. O mesmo som também consta na tabela fonética da língua
alemã para realizar empréstimo do francês como Garage (garagem): [ga'ra:
ə
]; e
Regie (direção): ['re:i:], geralmente empréstimos lingüísticos. Em contrapartida, o
fone [] é a realização do dígrafo ‘sch’: Fisch (peixe): ['fi]; e Schein (aparência):
['ain]; e da consoante ‘s’ antes de p’ e ‘t’: Spiegel (espelho): ['pi:g
ə
l]; e Stein
(pedra): ['tain]. Na língua portuguesa, o [] é representado pelo dígrafo ‘ch’: chá
['a]; e choque ['
kΙ], ou pela letra ‘x’, como em xarope [a'

pΙ], por exemplo.
Nos casos em que as palavras são grafadas com a letra ‘s’, no idioma
alemão, a posição na qual se encontra poderá apresentar diferença quanto ao
fonema correspondente. Nos vocábulos Sonne (sol): ['z
n
ə
]; e Hose (calça):
['ho:z
ə
], como pode ser observado nesses casos, pela posição em que se
encontra, ou seja, no início e no meio, entre vogais, da palavra, o som
correspondente a letra é o ‘z’ da língua portuguesa, Se s’ estiver como última
consoante e a palavra for analisada isoladamente, o som corresponde ao [s]: Haus
(casa): ['haus]; e Kurs (curso): ['kurs]; ou nos casos em que houver
β
(es-zett),
representando o som estendido de [s], ou seja a geminada [ss]: Wei
β
(branco):
['vais]; e Messer (faca): ['m
ε
s
ə
r]. Nos casos em que ‘s’ for encontrada
47
47
antecedendo as consoantes ‘k’, ‘l’ e ‘m’, no início das palavras, o som será [s],
como em Sklave (escravo): [s'kla:v
ə
]; slawisch (eslavo): [s'la:vi]; e Smaragd
(esmeralda): [sma'rakt]. Quanto à letra z’: no idioma alemão, ela representa o [ts],
como em: Zeit (tempo): ['tsait]; Katze (gata): ['kats
ə
]; Skizze (rascunho): [s'kits
ə
].
Nos exemplos a seguir, pode ser verificada a diferença fonêmica quanto aos sons
citados acima: reisen: (viajar): ['
aiz
ə
n]; reißen (rasgar): ['
ais
ə
n]; e reizen
(irritar): ['
aits
ə
n] . Já na língua portuguesa, o fonema [z] pode ser escrito com ‘z’,
zebra ['zeb
ə
], por exemplo, como também ser grafado com ‘s’, no caso de estar
entre duas vogais, mas a pronúncia ainda corresponder ao [z]: casa ['kaz
ə]
; e
também pode ser grafado com a letra ‘z’, entre vogais, e o som corresponder ao
[z], como em fazer [fa'ze
].
Nas tabelas fonéticas dos dois sistemas em questão, o som /r/ e /R/ são os
que mais apresentam variações. Se estabelecermos uma comparação,
perceberemos que fonemas correspondentes e outros específicos em cada um
dos idiomas. As semelhanças, como pode ser verificado nos quadros
consonantais acima, dizem respeito às vibrantes alveolares: no alemão
representada pelo som /r/ e no português pelo fonema /ř/; as fricativas glotais
desvozeadas: ambas pelo fonema /h/; fricativas velares vozeadas: [Y] e [
],
respectivamente; fricativas velares desvozeadas: ambos pelo fonema [x]; e tepes
alveolares: ambas pelo fonema /
/. As uvulares, tanto vibrante [
] quanto tepe
[
]
,
o características do sistema alemão, não sendo encontradas na língua
portuguesa, como pode ser verificado nas tabelas consonantais situadas nas
páginas 42 e 43, respectivamente. No sistema português, por sua vez, podem ser
identificados, com exclusividade, a fricativa glotal vozeada [] e a retroflexa
alveolar [
], conforme também nas tabelas citadas anteriormente.
Em função da presente pesquisa, faz-se necessária a análise das fricativas
glotais desvozeadas e também das tepes alveolares, respectivamente [h] e [
].
48
48
Isso pode ser justificado pela grande incidência desses fones nos dados
coletados, como demonstrado no capítulo 5. No dialeto em análise, em palavras
iniciadas com a letra ‘r’, o som representativo é o /
/: como em reisen (viajar):
['
aiz
ə
n]. Mesmo algumas grafadas com ‘rr’ o som continua sendo [
]:
Überreichen (surpresa): [y:be'
aiç
ə
n], por exemplo. na língua portuguesa, a
diferença entre ‘r’ e ‘rr’ não é apenas fonética, mas também e, principalmente,
fonológica o que produz uma alteração quanto ao significado. Por exemplo:
aranha e arranha; carro e caro. Com relação às fricativas glotais desvozeadas,
representadas em ambas as tabelas pelo fonema [h], pode-se constatar que: na
língua alemã, palavras grafadas no início com a letra ‘h’ representam o som [h],
como em haben (ter): ['ha:b
ə
n]; helfen (ajudar): ['hεlf
ə
n]; hier (aqui): ['hia]; holen (ir
buscar): ['ho:l
ə
n]; Hund (cachorro): ['hunt]. Caso a letra esteja no meio da palavra,
o som correspondente será o mesmo, por exemplo, behaupten (afirmar):
[be'haupt
ə
n]; ou não haverá nenhum som correspondente, como também
acontece na língua portuguesa: horta ['

t
ə
]. No caso de haver troca de fonema
[
] por [h], na língua alemã, também haverá alteração quanto ao significado e não
somente alteração fonética, como pode ser confirmado nos vocábulos: Reis
(arroz): ['rais], e hei
β
(quente): ['hais]. Na língua portuguesa, nas situações em que
a letra h’ estiver precedida de ‘n’ ou l’, o som representado será
[
], como em
banha ['
a
]
, e [] no caso de malha ['ma
a]. Neste idioma não nenhuma
palavra que inicie com ‘nh’ ou ‘lh’, sendo dispostas [...] apenas em posição
intervocálica”, como ressalta Silva (1999, p.60 e p. 64). No idioma alemão, no
entanto, a letra ‘h’ precedendo outra consoante indicará alongamento do som
vocálico: Lehrerin (professora): ['le:rerin] e os dígrafos ‘nh’ e ‘lh’ não fazem parte
do sistema de escrita desta língua.
Quanto às vogais, os sistemas mostram-se semelhantes em alguns
aspectos e em outros não. No dialeto alemão, o sistema de correspondência
fonema/grafema é bastante regular e as vogais são classificadas em curtas e
longas. Se analisarmos sob a perpesctiva do código oral do dialeto considerado,
49
49
na pronúncia das palavras, parece não haver comprometimento quanto ao
encurtamento ou alongamento das vogais produzidas oralmente. Por exemplo,
para a palavra Bild (quadro), a pronúncia possível tanto poderá ser realizada com
a vogal [i] curta, ['bilt], ou com o alongamento desta vogal [i:], ['bi:lt]. Em se
tratando da formalidade e dos aspectos que regem o sistema do idioma alemão,
as vogais são classificadas em curtas, como citado anteriormente, antecedendo
duas consoantes, como em Ball (bola): ['bal]; Bett (cama): ['b
ε
t]; Pille (pílula):
['pil
ə
]; Tonne (tonelada): ['t
n
ə
]; Puppe (boneca): ['pup
ə
]; kämme (pentes): ['kεm
ə
];
Löffel (colher): ['lœfel]; Hütte (cabana): ['hУt
ə
]; e longas, o que se representa na
escrita com a vogal acompanhada por outra vogal igual, ex. Aal (enguia): ['a:l];
Klee (trevo): ['kle:]; Boot (barco): ['bo:t] ( em que está antes de duas consoantes
diferentes, ex. Palme (palmeira): ['pa:lm
ə
]; bunt (colorido): ['b:unt]) ou através da
consoante h’: Fahne (bandeira): ['fa:n
ə
]; Lehne (encosto): ['le:n
ə
]; também o
emprego da vogal tremada, desde que não seguida por duas consoantes iguais:
Käfer (besouro): ['k
ε
:f
ə
]; Flöte (flauta): ['flØt
ə
]; Tüte (saco de papel): ['ty:t
ə
]; e o
dígrafo ‘ie’: Sieben (sete): ['zi:ben]; Biene (abelha): ['bi:n
ə
], como apresentadas no
Genaudas (SCHUMACHER, 2006). no idioma português, as vogais curtas são
predominantes, mas, em caso de a pronúncia de palavras como sul, em que, de
acordo com Cagliari (2001), algumas pessoas utilizam apenas uma vogal longa
[su:], acontece uma expansão sonora. Nos casos de hiato com vogais iguais, a
pronúncia de ambas as vogais é bem definida e não ocorre, como no sistema
alemão, um alongamento da vogal. Pode-se exemplificar isso com a palavra
coordenar [ko/o
/de/'na
],
por exemplo.
O sistema alemão, como pode ser observado nas tablelas fonéticas das
vogais, nas páginas 42 e 44, possui três sons desconhecidos na língua
portuguesa: [У], [Ø] e [œ]. De acordo com o dicionário Langenscheidt (2001), o
fonema [У] é uma vogal fechada, que pode ser curta [У] ou longa [У:]
6
. É grafada
6
É produzida na tentativa de pronunciar o [i:], mas com a boca disposta para pronunciar [u:] sem modificar a
posição da boca.
50
50
‘ü’. Exemplo: com [У]: dünn (fino, delgado): ['dУn]; e com [У:]: üben (treinar):
['У:b
ə
n]. O segundo som desconhecido, [Ø], é uma vogal fechada e longa, grafada
‘ö’, ‘oe’ seguida pela letra ‘h’, ‘öh’, conforme Genaudas (SCHUMACHER, 2006)
7
.
o som [œ] e a realização representada por ‘ö’ e ‘oe’ seguidas de duas
consoantes
8
.
Os ditontos orais são comuns nos dois sistemas. No idioma alemão, como
apresenta o dicionário Langenscheidt (2001), constam os seguintes ditongos,
todos abertos e breves: [aΙ]: Mai (maio): ['maΙ]; Reise (viagem): ['
aiz
ə
]; [a
υ
]:
Aufbau (construção): ['a
υ
fba
υ
]; Baum (árvore): ['ba
υ
m]; e [
y]: Beutel (bolsa):
['b
yt
ə
l]; Eule (coruja): ['
yl
ə
]. O sistema português, por sua vez, além de
apresentar ditongos orais crescentes e decrescentes também possui ditongos
nasais com término em [Ι] e [
υ
]: [ãΙ]: mãe ['mãΙ]; [õΙ]: põe ['põΙ]; [
ũ
Ι]: muito
['m
ũ
Ιt
υ
]; [Ι]: bem ['bΙ];
υ
]: pão ['pã
υ
], os quais não existem no
sistema fonético alemão.
Quanto à morfologia, sintaxe, léxico, semântica e pragmática a comparação
entre os dois sistema não vai ser sistemática, uma vez que o presente estudo
propõe-se apenas a explorar as ocorrências efetivamente observadas, fazendo-se
alguns comentários pontuais. Assim, serão referidas as ocorrências que
evidenciem diferenças entre o dialeto local e o português, não se discutindo o
modo de constituição antecipado de cada um dos sistemas.
7
Ela é produzida na tentativa de pronunciar [e:] com a boca em posição para pronunciar [o:] sem modificar a
posição da boca.
8
Sua produção parte da tentativa de pronunciar [] com a boca em posição de pronúncia do [o], sem
modificar a posição indicada da boca. Exemplos: öffnen (abrir): ['œfnən]; Hölle (inferno): ['hœlə].
52
52
4 METODOLOGIA
Com o objetivo de averiguar a influência da língua materna alemã sobre o
processo de letramento em português brasileiro, a presente pesquisa foi realizada.
De acordo com as hipóteses consideradas, os processos de transferência do
conhecimento fonético-fonológico, morfológico, sintático, semântico da língua
alemã para a língua portuguesa, e também as interferências que o meio possa
exercer neste contexto, foram consfirmadas. Os dados considerados foram
aqueles nos quais a pesquisadora identificou uma transferência, pois se pretendia
verificar a influência de um código sobre o outro.
4.1 A Pesquisa
A pesquisa intitulada Bilingüismo e letramento: análise da interação entre
duas línguas foi realizada durante o ano letivo de 2007, na Escola Municipal de
Ensino Fundamental José Bonifácio, em Linha Andreas, interior do município de
Vera Cruz. Conforme a orientação recebida da Secretaria Municipal de Educação
da localidade, o primeiro ano do currículo vigente em 2007, constituído de nove
anos, tem como objetivos principais o desenvolvimento de trabalhos de
habilidades motoras, de organização e de relacionamento interpessoal. Paralelo a
isso, as atividades que possibilitem a aprendizagem da língua portuguesa a fim de
iniciar e facilitar o processo de letramento nesse idioma deveriam também ser
contempladas. A proposta é justificada pela grande incidência de alunos que
chegam às escolas falando exclusivamente a língua alemã ou, até então, tendo
pouco contato com o idioma português, e também porque muitos não
freqüentaram a pré-escola, iniciando sua vida escolar já no primeiro ano do ensino
fundamental.
53
53
4.1.1 Organização dos alunos e das atividades em sala de aula
Através do que fora estabelecido como objetivos do primeiro ano, a professora
titular organizou os alunos e as atividades da seguinte maneira:
Os alunos eram dispostos em trios, em mesas redondas. Periodicamente,
eram trocados de grupos. O monolíngüe em alemão e o seu colega “tradutor”
bilíngüe, sempre sentavam no mesmo grupo, no início do ano letivo. No
segundo semestre, o aluno monolíngüe em alemão participava de outros
grupos sozinho, sem o “tradutor”.
As atividades eram variadas: meia tarde sempre é dedicada à pracinha, à
educação física ou a brincadeiras em sala de aula ou no ginásio. Nas
segundas-feiras, era feita a “Hora do conto”, em que as crianças iam à
biblioteca ouvir a leitura de um livro feita pela vice-diretora. A professora titular
também fazia leitura de histórias em sala de aula (depois fazia perguntas sobre
o que foi lido e pedia para desenharem sobre a leitura);
O material que utilizavam (cola, tesoura, lápis de cor...) eram comuns a
todos.
Os trabalhos que faziam eram expostos na sala ou colados no caderno;
Os alunos faziam o lanche na sala de aula, coletivamente. Após, a
professora costumava sortear alguma coisa que traziam de casa e supunham
ser do interesse dos colegas: pirulito, brinquedo, fruta... Quando retornavam do
recreio, escovavam os dentes, iam ao banheiro e lavavam as mãos.
4.2 Integrantes da pesquisa
Todos os alunos participantes da pesquisa faziam parte no primeiro ano
letivo de 2007. Dos 16 alunos, 15 participaram da coleta de dados, pois um aluno
foi transferido para outro município, no início do ano escolar. Todos ingressaram
54
54
no primeiro ano com 06 anos de idade completos. A maioria era filho de pais
agricultures e todos residiam na localidade desde o nascimento.
Outras características pertinentes:
Quanto ao sexo:
- 09 alunos eram meninos e 06 eram meninas;
Quanto à língua:
- 01 aluno monolíngüe em alemão
- 05 alunos monolíngües em português
- 09 alunos bilíngües, sendo 08 alunos cuja L1 é a língua alemã e L2 é
a língua portuguesa; e 01 aluno em que a L1 é a língua portuguesa e a
L2 língua alemã.
Pré-escola
- 12 alunos já haviam freqüentado a pré-escola
- 03 alunos não haviam freqüentado a pré-escola, sendo desses 02
alunos bilíngües (ambos com L1 língua alemã) e o aluno monolíngüe em
alemão.
4.3 Etapas da pesquisa
A coleta de dados foi realizada em três momentos: a 1
a
em junho/07,
a 2
a
em agosto/07 e a 3
a
etapa em dezembro/07. Inicialmente a intenção
era de começar a coleta dos dados no mês de abril, considerando que as
aulas iniciassem em março e assim haveria um mês para os primeiros
contatos com os alunos. Isso não foi possível porque a etapa de
reconhecimento da escola e dos alunos na José Bonifácio iniciou em
meados do mês de abril e foi preciso mais de um mês para a adaptação do
aluno monolíngüe com a pesquisadora. Essa adaptação era imprescindível
para a coleta de dados, uma vez que as atividades propostas tinham
caráter quase naturalístico, ou seja, fala espontânea dos participantes, para
manter a espontaneidade, a partir de estímulos da pesquisadora. Isso pôde
55
55
ser constatado na primeira tentativa de coleta, na qual a pesquisadora, com
o intuito de verificar se os alunos, principalmente o monolíngüe em alemão,
estavam à vontade com ela para participar da coleta dos dados, para
posteriormente, fazer a identificação das vozes, apresentou a seguinte
proposta: no computador, as duplas poderiam brincar com alguns jogos
previamente selecionados (Memória e Completar os pontinhos). Enquanto
iam jogando, numa conversa informal, a pesquisadora fazia algumas
perguntas pessoais, como por exemplo: nome; idade; se falava a língua
alemã e/ou a portuguesa, com quem, aonde; se gostava de vir para a
escola; o que mais gostava de fazer na escola, por que... Tudo foi gravado
em áudio e depois transcrito. O aluno monolíngüe em alemão não se
manifestou oralmente em nenhum momento. A interação da pesquisadora
com as crianças foi na ngua portuguesa e com o aluno monolíngüe em
alemão, na língua alemã.
4.4 Atividades propostas
Foram propostas, além da citada anteriormente, 06 atividades ao longo do
ano letivo: três atividades coletivas, que foram gravadas em áudio e vídeo, e três
atividades individuais, gravadas em áudio apenas. A aplicação se deu da seguinte
maneira: para cada atividade coletiva, foi elaborada uma atividade individual
diferente, mas com a mesma temática. Essas atividades paralelas foram aplicadas
logo após a realização da atividade coletiva correspondente.
4.4.1 1
a
etapa – mês de junho/2007
Atividade coletiva (descrição da atividade vide ANEXO A)
Assistir ao clip Piquenique no quintal (Turma do Cocoricó)
Conversar sobre o piquenique:
- O que é um piquenique?
- Você já participou de um?
- O que podemos levar num piquenique?
56
56
- Onde podemos fazer um piquenique?
Conhecer os personagens do clip:
- Quem foi ao piquenique? (vide ANEXO B)
- Como é o nome de cada um?
- O que levaram para o piquenique?
Apresentação de algumas figuras de objetos: identicar cada um deles e
dizer se foi levado ou não para o piquenique do Cocoricó (vide ANEXO C).
Cantar a música do Piquenique.
Conversar sobre o cocô:
- Quem sentiu vontade de fazer cocô?
- Onde fizeram?
- O cocô dos animais tem alguma utilidade? Qual?
Cantar a música do cocô.
Quebra-cabeça:
- Desenho da galinha Lola: pintar, recortar, montar e colar (vide
ANEXO D).
Inventário do lanche que trouxeram para o piquenique.
Fazer o piquenique.
Atividade paralela
Quebra- cabeça da Turma do Cocoricó (Vide ANEXO E).
É apresentado, primeiramente, um quebra-cabeça para cada participante:
- Quem aparece nessa figura que você montou?
- Como é o nome deles? Você lembra?
Após, é apresentada outra figura:
- E nesta aqui, o que eles estão fazendo?
- Quem não aparece nessa figura e está na primeira?
57
57
4.4.2 2
a
etapa – mês de agosto/2007
Atividade coletiva (descrição da atividade vide ANEXO F)
Assistir ao clip Sopa (Palavra cantada)
Sentados em grupos.
Relembrar o que havia na sopa, considerando a rima presente:
espinafre/tomate; feijão/agrião; rabanete/sorvete; berinjela/panela; caqui/javali;
palmito/pirulito. A pesquisadora apresenta cada um dos ingredientes que foram
colocados na sopa do clip, trazendo o alimento ou objeto real ou em forma de
figura (se quiserem, poderão experimentar o que pode ser comido, como
espinafre, tomate, sorvete...).
O que poderíamos colocar na nossa sopa? (cada um dirá duas coisas que
gostariam de colocar na panela – atenção para a rima).
Cada um desenhará o que quer colocar na sopa; recortará e colará no
“panelão”. Cada um apresenta o que fez para contribuir.
Rostinho do neném: com os materiais (feijão, massa, arroz...)
confeccionarão o “rostinho do neném”.
Atividade individual.
Rimas: são dispostas na mesa várias figuras espalhadas. Todas elas têm
um par, com o qual rima. Olhando para as figuras, as crianças terão que
identificar cada uma delas e, em seguida, formar os pares de acordo com a
rima e colocar dentro da panela. As figuras apresentadas foram:
pomba/bomba; panela/berinjela; ninho/passarinho; jacaré/pé; beijo/queijo;
pato/sapo; mandioca/minhoca; xampu/chuchu; sorvete/rabanete; balão/feijão;
chaleira/mamadeira (vide ANEXO G).
4.4.3 3
a
etapa – mês de dezembro/2007
Atividade coletiva
Fantoches assistir à apresentação da história O lobo e os sete
cabritinhos, de Aurélio de Oliveira (1997) e mais trava-línguas: Pinto; O sapo
58
58
no saco; Tatu presentes na obra O livro do trava-língua, de Zélio Ciça (1986),
bem como o versinho que gostavam muito de dizer: Um/dois, feijão com arroz;
três/quatro, feijão no prato; cinco/seis, bolo inglês; sete/oito, comer biscoito;
nove/dez, comer pastéis.
Em trios, utilizando os fantoches, criarão uma história para apresentar aos
colegas. Tema livre.
Atividade individual
Figuras: são apresentadas quatro figuras: cabrito, lobo, grama e churrasco
(vide ANEXO H). Os participantes são convidados a identificar cada uma das
figuras e, em seguida, criar uma história com as quatro figuras. É permitido
envolver outros personagens e outros elementos na narrativa criada, mas é
imprescindível a presença dos quatro acima citados.
59
59
5 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS
Neste capítulo, será realizada a análise dos dados coletados dipostos da
seguinte maneira: 1- Quadro dos Fonemas, nos quais são apresentados os itens
lexicais que foram produzidos com trocas de fonemas; 2- Quadro Lexical, em que
houve a substituição de léxicos na fala em L2 (língua portuguesa, para o aluno
monolíngüe no dialeto alemão e para os alunos bilíngües cuja L1 é também o
dialeto alemão local) por itens léxicos da L1 (língua alemã, para o aluno bilíngüe
cuja L1 é a língua portuguesa e para os monolíngües em português). No quadro 3-
Quadro demonstrativo das frases produzidas pelos participantes, são
apresentados duas divisões; a primeira corresponde às Frases produzidas
somente na L1 (língua alemã), e a segunda às Frases produzidas com a
interinfluência da L1 (língua alemã) e da L2 (língua portuguesa). Por fim, o quadro
da interlíngua, produzida pelo aluno monolíngüe no dialeto alemão (4- Interlíngua
aluno monolíngüe em alemão). Após os quadros citados, são feitas
Considerações pontuais sobre situações que se evidenciaram ao longo das
observações gravadas e/ou anotadas pela pesquisadora, os quais são divididos
em subitens: Velarização do fonema [l]; Substituição de gêneros; Apagamento de
vogais finais e empréstimos; e Reparos e auto-reparos.
60
60
1 - QUADRO DOS FONEMAS
A partir do áudio gravado, a pesquisadora selecionava as ocorrências de
trocas de fonemas e as registrava compondo os quadros a seguir referidos. Eles
estão divididos quanto à atividade realizada, ou seja, atividades coletivas e
individuais.
1.1 Atividades coletivas
LÉXICO DO
PORTUGUÊS
BRASILEIRO
TROCA
DE
SONS
POSIÇÃO
NA
PALAVRA
Nºde
OCORRÊNCIAS
ALUNOS
TRANSCRIÇÃO
DA FALA
TRANSCRIÇÃO
DA LÍNGUA-
ALVO
(Português
Brasileiro)
agora [g] por [k]
meio 01 B [a'kə] [a'gə]
bico [b] por [p]
início 01 B
['pikυ] ['bikυ]
cachorro [h] por
[]
fim 03 B
[ka'oo] [ka'oho]
galinha [g] por [k]
início 01 B [ka'liə] [ga'liə]
jarra [h] por
[]
fim 01 B ['aə] ['ahə]
Total de ocorrências: 07
[h] por [] : 04 ocorrências (todas no fim da palavra)
[g] por [k] : 02 ocorrências (01 no início da palavra; 01 no meio da palavra)
[b] por [p] : 01 ocorrência (no início da palavra )
Legenda:
Na coluna ALUNOS foi considerado:
B= bilíngüe, sendo L1 língua alemã e L2 língua portuguesa
61
61
1.2 Atividades individuais
LÉXICO DO
PORTUGUÊS
BRASILEIRO
E DO
DIALETO
LOCAL
TROCA
DE
SONS
POSIÇÃO
ALTERADA
OCORRÊNCIA
ALUNOS
TRANSCRIÇÃO
DA
FALA
TRANSCRIÇÃO
DA LÍNGUA
PORTUGUESA
DO BRASIL
OU DO
DIALETO
LOCAL
agora [g] por [k]
meio 01 B [a'kə] [a'gə]
balão* [b] por [p]
υ] por
[õn]
início
fim
03
01
B, MP;
B
[pa'lãυ]
[pa'lõn]
[ba'lãυ]
barriga [h] por
[]
meio 01 B [ba'igə] [ba'higə]
beijo [b] por [p]
início 02 B, MP
['peIυ] ['beIυ] ou
['be]
berinjela [b] por [p]
início 01 B
[pein'εlə] [bein'εlə]
bicho [b] por [p]
início 01 MA
['piυ] ['biυ]
bolo [b] por [p]
início 01 B
['polυ] ['bolυ]
bomba [b] por [p]
início
fim
07
01
B,B(L1P)MP;
B
['põmbə]
['bõmpə]
['bõmbə]
botar [b] por [p]
início 01 B ['ptə] ['botə] ou
['btə]
brincar [b] por [p]
início 01 B [pi'
ŋ kə] [bin'kə] ou
[bin'kə]
cabrito [k] por [g]
[b] por [p]
início
meio
01
02
B
B
[ga'bitυ]
[ka'pitu]
[ka'bitυ]
cachorro [h] por
[]
fim 02 B
[ka'oυ] [ka'ohυ]
chaleira
[] por
[]
início 02 B, MP [a'leə]
[a'leIə]
ou [a'leə]
churrasco *
[] por
[]
[h] por
[]
início
meio
02
07
B, B(L1P);
B, B(L1P),MP
[u'askυ]
[u'asko]
[u'haskυ]
comer [k] por [g]
início 01 B
[go'me] [ko'me] ou
['kome]
deixar [d] por [t]
início 01 B
['teə]
[deI'ə] ou
[de'ə]
depois [d] por [t]
início 02 B
[te'poIs] [de'poIs]
Diva [d] por [t]
início 01 B ['tivə] ['divə] ou
['divə]
62
62
escorregador
[h] por
[]
meio 01 B [eskoega'do
]
[
eskohega'do
]
feijão
υ] por
[õn]
fim 01 MA
[f`eI'õn] [feI'ãυ]
ou [fe'ãυ]
Gabriel
[g] por [k]
[b] por [p]
início
meio
01
01
B
B
[kabi'εl]
[gapi'εl]
[gabi'ευ] ou
[gabi'εł]
galinha [g] por [k]
início 03 B, MP [ka'liə] [ga'liə]
ganhei [g] por [k]
início 01 B
[ka'eI] [ga'eI]
grama [g] por [k]
início 02 B ['kãmə] ['gãmə]
jacaré [] por
[h]
fim 01 B
[aka'hε] [aka'ε]
jogo
[] por []
início 01 MA
['ogə]
['ogυ]
Julinho [] por
[]
início 01 MP
[u'liυ]
[u'liυ]
morreu [h] por
[]
fim 01 B
[mõeυ] [mõ'heυ]
Paum [b] por [p]
início 01 B ['paum] ['baum]
pomba [b] por [p]
fim 04 B,B(L1P),MP
['põmpə] ['põmbə]
queijo [] por
[]
fim 01 MA
['keIo]
['keIυ] ou
['keυ]
rabanete [h] por
[]
início 01 B
[aba'ntI]
[haba'n
tI]
ou
[haba'ntI]
rainha [h] por
[]
início 01 MP [a'iə] [ha'iə]
Rais [] por
[h]
início 01 MP ['hais] ['rais]
Romeu [h] por
[]
início 01 MP
[o'meυ] [ho'meυ]
terra [h] por
[]
fim 01 B
['tεə] ['tεhə]
tropeçou [t] por [d]
início 01 B [adope'so]
[tope'soυ]
varrer [h] por
[]
fim 01 B [va'e] [va'he]
xampu
[] por
[]
início 01 B
[ãm'pυ]
[ãm'pυ]
Total de ocorrências: 70
[b] por [p]: 26 ocorrências (19 no início; 01 no meio; 06 no fim da palavra)
[h] por []: 17 ocorrências (03 no início; 09 no meio; 05 no fim da palavra)
[g] por [k]: 08 ocorrências (07 no início; 01 no meio da palavra)
63
63
[] por []: 05 ocorrências (todas no início da palavra)
[d] por [t]: 04 ocorrências (todas no início da palavra)
[] por []: 03 ocorrências (02 no início; 01 no fim da palavra)
[] por [h]: 02 ocorrências (01 no início; 01 no fim da palavra)
υ] por [õn]: 02 ocorrências (todas no fim da palavra)
[k] por [g]: 02 ocorrências (todas no início da palavra)
[t] por [d]: 01 ocorrência (no meio da palavra)
Legenda:
Na coluna ALUNOS foi considerado:
- B= bilíngüe, sendo L1 língua alemã e L2 língua portuguesa
- B (L1P)= bilíngüe, sendo L1 língua portuguesa e L2 língua alemã
- MA= monolíngüe em língua alemã
- MP= monolíngüe em língua portuguesa
Na coluna Nºde OCORRÊNCIAS foi considerado:
- quanto ao léxico balão: a troca de [b] e [p], realizada em [pa'lõn], foi
considerada juntamente com o léxico [pa'lãυ] (01 ocorrência);
- quanto ao léxico churrasco: a troca de [h] por [], realizada em
[u'askυ], foi considerada juntamente com o léxico [u'asko] (02
ocorrências).
Nas atividades coletivas, todos os alunos que apresentaram alguma
substituição de sons são bilíngües, enquanto que nas atividades individuais, o
conjunto de substituições atingiu 53 ocorrências, sendo ainda constatadas
substituições de fala no aluno monolíngüe alemão (04 ocorrências: [b] por [p];
υ
] por [õn]; [
] por [], sendo 01 ocorrência no início da palavra e 01 no fim da
palavra) e os monolíngües em português (13 ocorrências: 05 em [b] por [p]: 04
ocorrências no início da palavra e 01 no fim; 01 em [] por [], no início; 04 em [h]
por [
]: 02 ocorrências no início e 02 no meio da palavra; [g] por [k]: 01 ocorrência
no início; [] por []: 01 ocorrência no início; e [
] por [h]: 01 ocorrência no início).
As incidências mais freqüentes, no experimento coletivo, foram os da troca dos
64
64
fonemas [h] por [
], seguidos de [g] por [k] e [b] por [p]. Já nas atividades
individuais a incidência maior foi a troca de [b] por [p], com 26 ocorrências; em
seguida aparecem as trocas de [h] por [
], 17 casos, de [g] por [k], 08, de [] por
[], 05, de [d] por [t], 04, de [] por [], 03, de [
] por [h], 02, de [k] por [g], 02, de
υ
] por [õn], 02, e de [t] por [d], 01 ocorrência.
Na troca dos sons [h] por [
], nossa conclusão foi a de que houve uma
supergeneralização quanto à pronúncia do fonema /
/, do dialeto alemão. Além
da questão da escrita, que pode confundir os iniciantes no aprendizado, em
português existe uma variação muito grande de pronúncias dos sons de r’. No
idioma alemão, a predominância do fonema [
], constitui uma característica do
dialeto em todas as posições da palavra, ex. der Reis (arroz); lernen (aprender,
estudar); lehren (ensinar, dar aula). São poucos os casos de pronúncia do ‘r’ forte,
mas mesmo neste caso, o fonema representativo é [
]. Exemplo: überreichen
(entregar; presentear): [y:b
ə
'
aiç
ə
n]. na língua portuguesa, há contraste no
sistema fonológico da língua, ex. aranha/arranha; caro/carro. A transferência de
fonemas realizada da L1 (idioma alemão) para a L2 (idioma português) pode ser
caracterizada como uma transferência negativa, uma subprodução de estrutura,
ou seja, o falante evita a estrutura da L2 que não efetua na L1
9
. Da mesma forma,
um aluno monolíngüe em português optou pelo som [h] para falar uma palavra da
língua alemã em que a pronúncia seria [
]. Embora em sua L1 existam os dois
fonemas, [h] e [
], empregou [h] tomando por base a posição do fonema na L2. A
pronúncia de palavras inicadas com a letra [r], na língua portuguesa, na maioria
das vezes, será como [h] e não [
]. Daí a transferência: Reis: ['ra:is] por ['ha:is].
a ocorrência de uma transferência fonêmica de [
] por [h], feita por um aluno
bilíngüe, pode ser considerada como uma supercorreção, segundo o mesmo
autor. A tentativa de produção foi realizada, possivelmente na tentativa de
9
“[...] avoidance of L2 structures which do not exist in the L1 of a learner or are very rare in the mother
tongue” (ARABSKI, 2007, p. 14).
65
65
evitação de um erro supostamente possível, com base em outras situações, até
então constantes, nas quais sua pronúncia era corrigida. A grande incidência
destas correções acarretou uma generalização da regra: se caro pronuncia-se
carro; caroça é carroça, então jacaré é jacarré.
Os sons lingüísticos [g] e [k] são muito similarmente produzidos, sua
diferença refere-se à questão da sonoridade: [g] é vozeado e [k] é desvozeado. Os
termos desvozeado e vozeado são utilizados por Silva (1999), e também neste
trabalho, para designar a vibração ou ausência dela durante a produção de som:
“Diremos que o estado da glote é vozeado (ou sonoro) quando as cordas vocais
estiverem vibrando durante a produção de um determinado som. [...] Em oposição,
denominamos o estado da glote de desvozeado (ou surdo) quando o houver
vibração das cordas vocais” (1999, p. 27). No alemão, quando o ‘g’ for grafado no
início da palavra, o som permanecerá [g], como em gut ['gu:t] (bom), mas se estiver
na posição final o som passa a ser de [k]: Berg (montanha): ['bεrk]; Weg
(caminho): ['vεk], Ring (anel): ['rink]. Nos dados coletados, apresentados na tabela
acima, páginas 61 e 62, houve a realização do som de [k] no início de palavras
iniciadas por g’, como em Gabriel - [kab'iεl]; galinha - [ka'li
ə
]; ganhei -
[ka'eI]; e grama - ['k
ãm
ə
].
Outra grande incidência de trocas se deu com relação aos sons [b] e [p]. Se
estabelecermos uma comparação entre os fonemas [b] e [p] na língua alemã
perceberemos que algumas palavras produzidas com o som [p], são grafadas com
‘b’, geralmente na primeira sílaba. Ex: abgeben (entregar; dar): [ap'ge:b
ə
n];
abschneiden (cortar fora): [ap'na:id
ə
n]. O mesmo acontece em palavras
terminadas com [b]: Dieb (ladrão): ['di:p]; Laub (folhagem): ['laup]. na língua
portuguesa não é encontrada nenhuma palavra cuja última letra seja [b] ou [p],
além do que os dois sons não são usados alternadamente.
Da mesma forma, podemos considerar a substituição dos sons [d] por [t]
realizadas pelos participantes da pesquisa. No idioma alemão, em palavras
66
66
grafadas com [d], no fim da palavra, a pronúncia é predominantemente [t], ex. Bild
(quadro): ['bilt]; Bad (banho): ['ba:t]; Rad (roda): ['
a:t]; ou em situações em que a
terminação seja grafada com ‘dt’, exemplo Stadt (cidade): ['tat]. Essas ocorrências
não são encontradas no idioma português, pois vocábulos cuja terminação seja
consoante [d] ou [t] não fazem parte do sistema, havendo sempre uma vogal de
apoio, como em pneu por exemplo, cuja tendência é a pronúncia de [pe'ne
υ
].
No dialeto alemão falado pelos participantes da pesquisa, a oposição entre
os fonemas vozeados, /g/, /d/ e /b/, e desvozeados, /k/, /t/ e /p/, não ocorre
exatamente da mesma forma, enquanto que na língua portuguesa esses traços
são utilizados para diferenciar significados, conforme Voese (1975), como nos
exemplos: Gabel (garfo) se pronunciado ['ka:b
ə
l] por falante do dialeto em
alemão será perfeitamente compreendido pelos demais falantes, porque o
significado não sofreu nenhuma modificação. na língua portuguesa, uma
alteração dessa natureza poderá mudar completamente o sentido da palavra, ex.
tia por dia. A transferência do sistema fonológico do dialeto alemão para o idioma
português pode ser confirmada a partir das trocas que ocorreram no sistema e não
isoladamente, o que confirmaram as conclusões de Voese (1975, p. 11) em sua
pesquisa realizada também com nativos falantes de dialeto alemão, na localidade
de Rio Pequeno: “[...] se os fonemas se constituem a partir de sistemas em que se
manifestam determinadas características quanto à presença de diferentes traços
distintivos, a influência, a nível fonológico, de uma língua sobre a outra, far-se-á
sentir exatamente sobre as características gerais do sistema”. Isso significa
dizer
que a oposição entre os fonemas vozeados e desvozeados, que é própria da
língua portuguesa, nesse caso, está sendo eliminada pelos falantes do estudo em
todo o sistema lingüístico e não em fonemas isolados, pela transferência
fonológica que fazem da sua L1 para a L2. Sobre as influências no contato entre
duas línguas, Arabski (2007), numa escala de A a D, aponta o nível fonológico
como o que sofre menor impacto
10
, e a fonologia (D) o, nesta ordem, mais
1
0
“[...] phonology (D) are (in this order) more resistant to foreign influence, phonology being the most
resistant” (ARABSKI, 2007, p. 18).
67
67
resistentes para a influência estrangeira, a fonológica é a mais resistente.. Essa
resistência pode perdurar por muito tempo podendo inclusive ser fossilizada, o
que, de acordo com Percegona [...] denota a recorrência, durante o desempenho
da L2, de uma forma que não é somente desviada da forma correta da língua em
estudo, mas também "inalterável/imutável", não importando o grau de exposição
ao qual o aprendiz se encontra, mesmo sendo ele falante fluente da L2” (2005, p.
8).
As trocas do fonema /
/ por // realizadas pelo monolíngüe em alemão,
indicam que ele buscou na sua L1 um modelo para a produção de um fonema
utilizado, [
], na L2. Não conseguindo identificá-lo, porque no sistema fonético
alemão o som [
] é muito pouco utilizado, só no caso de empréstimos, por
exemplo die Garage [ga'
a
ə
], esse falante optou pela utilização do fonema mais
próximo. Nesses casos, quando o falante nativo não consegue produzir um
fonema, utiliza o fonema mais próximo, //. Daí a pronúncia de jogo - ['og
ə
]; queijo
- ['keio] . Essa busca de suprimento da necessidade de um fonema existente na
L2 que inexiste na L1 ou que não é comumente utilizado, gera uma subprodução e
uma conseqüente produção de erros, uma vez que o fonema procurado não é
encontrado na L1. Ocorre, então, que o falante evita o seu uso. Geralmente, ele
substitui itens, tratando de evitar palavras que tragam os fonemas que lhe causam
dificuldade, dada a diferença existente entre a sua língua mãe e a língua alvo, o
que é considerado como sendo uma transferência negativa por Arabski (2007.),
que além disso remete a leituras de Corder (1973) e Crystal (1980)
11
, onde os
padrões dos dois idiomas não coincidem. Quanto às incidências de [
] por [],
como já foi apontado anteriormente, e de acordo com Arabski, as mesmas podem
ser identificadas como supercorreções, tipo de ocorrência na qual um erro é
cometido para evitar outro que na verdade não existe, como nos casos de “xampo”
1
1
“[...] where the patterns of the two languages do not coincide” (ARABSKI, 2007, p. 12).
68
68
- [ã'pu]; “chaleira” – [a'ler
ə
]; “churrasco” – [u'
asco]: hipercorreções são
muitas ações para a L2
12
.
As ocorrências de troca de
υ
] por
ŋ
] no final das palavras, por seu
turno, remetem à generalização de uma regra da L1 para a L2. A questão de
generalização integra o aprendizado lingüístico, porque as experiências
lingüísticas prévias do falante e a detecção de similaridades dos traços dos
fonemas ou de diferenças entre os inputs da L1 e da L2 podem gerar
generalizações e padrões de desempenho, ou seja, transferências
interlingüísticas, da L1 para a L2, advindas do input da L2, de acordo com as
pesquisas de Alves e Zimmer (2006). Se, na L1, não existe o elemento que é
necessário para a L2, o falante busca em sua língua materna o que julga ser mais
próximo do que lhe é exigido. Essa produção de erros, conforme a classificação
de Arabski (2007), pode ser justificada pela inexistência do ditongo nasal υ] no
idioma alemão, o que faz com que os aprendizes de L2 (português) transfiram o
fonema
ŋ
] para a posição de ocorrência do ditongo nasal
υ
]. Os ditongos
nasais da língua portuguesa, com término em [І] e [
υ
], são: І], Ι], [ũΙ],
[Ι] e [ã
υ
].
2 - QUADRO LEXICAL
Os quadros a seguir foram organizados a partir da fala dos alunos durante
as atividades coletivas e também individuais. Na produção dessas falas ocorreu a
troca de itens léxicos, ou seja, enquanto o diálogo era realizado em língua
portuguesa foram feitas trocas, substituições, por itens léxicos do dialeto alemão
local.
2.1 Atividades coletivas
1
2
“Hypercorrections are overactions to the rules of L2” (ARABSKI, 2007, p. 15).
69
69
LÉXICO
(L1)
DIALETO
LÉXICO (L2)
PORTUGUÊS
HOCHDEUTSCH
OCORRÊNCIAS
ALUNOS
TRANSCRIÇÃO
LÉXICO (L1)
TRANSCRIÇÃ
O
LÉXICO (L2)
Muta die Großmutter
02 B
['mũtə]
['v]
Redícia rabanete
das
Radieschen
01 B
[e'disIa]
[haba'ntI]
Schmédelin borboleta der
Schmetterling
02 B
['mεdelin]
[bobo'letə]
Total de ocorrências: 05
Legenda:
Na coluna ALUNOS foi considerado:
- B= bilíngüe, sendo L1 língua alemã e L2 língua portuguesa
2.2 Atividades individuais
LÉXICO
(L1)
DIALETO
LOCAL
LÉXICO (L2)
PORTUGUÊS
BRASILEIRO
HOCHDEUTSCH
OCORRÊNCIAS
ALUNOS
TRANSCRIÇÃ
O
LÉXICO (L1)
TRANSCRIÇÃO
LÉXICO
(L2)
água * Wassa * das Wasser 01 B(L1P) ['vasə]
['agυa]
Ai ovo das Ei 01 B
['aI] ['ovυ]
Apfel maçã der Apfel 01 MA
['apfεl]
[ma'sã]
batata * Catófãl * die Kartoffel 01 B(L1P) [ka'tfəl] [ba'tatə]
Baum árvore der Baum 01 MA ['baum]
['avoI]
End pato die Ente 01 B
['nd] ['patυ]
Flauma ameixa die Pflaume 01 B
['flaυmə]
[a'meIə]
ou [a'meə]
Fôha passarinho der Vogel 03 B; MA ['fohə]
[pasa'iυ
]
der Fuß 02 MA ['fu]
['pε]
Grót sapo die Kröte 01 B ['gt]
['sapυ]
Hina galinha die Henne 01 B ['hinə] [ga'liə]
Iétz agora jetzt 01 B
[i'εts]
[a'gə]
Katz gato die Katze 01 MP ['kats]
['gatυ]
Kóp cabeça der Kopf 01 MA ['kp] [ka'besə]
Man homem der Mann 02 MA ['mãn]
['omI]
Manhóca
mandioca der Maniok 05 B [mã'kə] [mãn'di
kə]
ovo * Aia * das Ei 01 MP
['aIə] ['ovυ]
Ráin raio der Blitz 01 B
['aIn] ['haIυ]
Ratécia rabanete das Radieschen 01 B
[a'tεsIa]
[haba'nt
I
]
ou
[
haba'ntI]
Tiga mamadeira die Flasche 02 B, MA ['tigə]
[mama'deIə]
70
70
ou
[mama'deə]
Total de ocorrências: 29
Legenda:
Na coluna ALUNOS foi considerado:
- B= bilíngüe, sendo L1 língua alemã e L2 língua portuguesa
- B (L1P)= bilíngüe, sendo L1 língua portuguesa e L2 língua alemã
- MA= monolíngüe em língua alemã
- MP= monolíngüe em língua portuguesa
Na coluna LÉXICO L1 (DIALETO LOCAL), as palavras água, ovo, e batata foram
consideradas palavras da L1 (língua portuguesa) e Wassa, Aia e Catófãl palavras
pertencentes ao léxico da L2 (língua alemã) por se tratar de aluno bilíngüe, cuja L1 é
língua portuguesa e L2 língua alemã.
Durante as atividades coletivas, desenvolvidas ao longo do período, os
alunos bilíngües demonstravam uma preocupação especial com o colega
monolíngüe em alemão. Em sala de aula, na maior parte do tempo, falavam em
português, mas para que o colega pudesse entender e eles pudessem ser
entendidos por ele, muitas vezes, traduziam para o dialeto local o que falavam em
português. o aluno monolíngüe em alemão, no início das atividades, somente
falava no seu dialeto, sem fazer nenhuma tentativa em L2. Nas atividades
individuais, mesmo assim, teve uma participação ativa, o que não aconteceu nas
atividades propostas coletivamente. O fato dele ter uma participação mais efetiva
em contextos informais e nas relações interpessoais vem ao encontro do que
Marcuschi (2001) afirma: a fala é uma necessidade social de se fazer parte de um
grupo, de ser inserido e de ser socializado. Portanto, através da fala ou da
tentativa de fala, é que o aluno monolíngüe em alemão revelava seu desejo de
participar do grupo escolar no qual estava inserido, obtendo apoio efetivo dos seus
colegas.
Os alunos bilíngües, por sua vez, muitas vezes, buscavam palavras da L1
para utilizar na L2, demonstrando maior habilidade e conhecimento na L1, numa
71
71
tentativa de confirmar o que haviam dito (falavam em L2 e, logo após, repetiam na
sua L1), o que corrobora a declaração de
Ricardo Schütz (2006, p. 1): “[...] as
operações relativas à língua mãe estão profundamente enraizadas pela prática
constante, sendo por isso muito difíceis de serem evitadas”. Os alunos bilíngües,
através deste ato, desenvolveram uma atitude solidária, de cooperação, pois
mediavam a comunicação, oferecendo exemplos nas duas línguas.
De outra parte, se observarmos a palavra ratécia tal como empregada pelos
participantes do estudo, perceberemos semelhança entre esse termo utilizado no
dialeto alemão e a palavra radite da língua portuguesa. O fato de alguns bilíngües
utilizarem a palavra radite para designar tanto rabanete quanto radite, demonstra
que o termo ratécia indica uma dedução equivocada dos falantes bilíngües
porque, na língua portuguesa, os dois termos representam produtos diferentes e
não a mesma coisa como no dialeto. Radite é uma folha amarga e, portanto, um
vegetal, e rabanete é uma legume, uma raiz que é arrancada da terra. O que
de comum entre os dois alimentos é que ambos podem ser utilizados para fazer
salada. Essa evidência confirma os estudos de Ringbom
13
(2006) que afirma que a
semelhança pode ser percebida entre a existência de palavras e as estruturas em
efeito geral, facilitando para a compreensão e acontecendo a aprendizagem,
embora em alguns casos, notadamente cognatos enganosos, a semelhança
formal pode conduzir a erros. Também Arabski
14
destaca esse tipo de ocorrência,
em sua classificação, considerando-o um mal entendido ou uma interpretação,
quando, por exemplo, aprendizes deduzem somente as diferenças que o falante
da língua estudada iria inferir.
3 QUADRO DEMONSTRATIVO DAS FRASES PRODUZIDAS PELOS
PARTICIPANTES
13
Where similarity can be perceived between existing words and structures a general facilitating effect for
comprehension and learning occurs, though in some cases, notably deceptive cognates, formal similarity can
lead to errors.” (RINGBOM, 2006, p.41).
1
4
“Misinterpretation – when for example “learners infer something different from what speakers of the target
language would infer” (ARABSKI, 2007, p. 15).
72
72
Os quadros demostrativos abaixo representados são frases produzidas
pelos alunos participantes da pesquisa. No primeiro quadro são apresentadas
frases produzidas somente na língua alemã (L1 dos falantes), durante as
atividades individuais. Já, os dois quadros demonstrativos que seguem, são frases
relativas às atividades coletivas e também às individuais.
3.1 Frases produzidas somente na L1 (língua alemã)
Atividades individuais
(L1)-
LÍNGUA
ALEMÃ
(L2)
- LÍNGUA
PORTUGUESA
HOCHDEUTSCH
OCORRÊNCIAS
ALUNOS
“Ain, ain, Búia,
vás êss?
Paum”.
Um, um, Búia, o
que é? Árvore.
Ein, ein, Buia, was
ist? Baum.
01 B
“Búia, nich ai
maha.
“Búia, não faz
ai”.
Buia, nicht ,,ai”
machen.
01 B
“Búia, sam
Marciel.”
“Búia, fala
Marciel.”
Buia, sag Marciel. 01 B
“Búia, sô,
maha.”
“Búia, assim, faz
assim.”
Buia, so so machen. 01 B
“Fassen auch.” “Pega também.” Hol auch. 01 B
“Fôha in
Hand. Fôha.”
“Passarinho na
mão.
Passarinho.”
Vogel in der Hand.
Vogel.
01 B
“Fóia baum me
thâm.”
“Tem fogo na
árvore.”
Es ist Feuer im Baum.
01 MA
“Iba, na.” “Pra cima,
então.”
Nach oben dann. 01 B
“I han guê los.”
“Eu deixei.” Ich habe gelassen. 01 B
“Lobi, habi
lobi.”
“Lobo, tem
lobo.”
Wolf. Es gibt einen
Wolf.
01 B
“Schmédelin.
Búia, sam
Schmédelin.”
“Borboleta.
Búia, fala
borboleta.”
Schmetterling. Buia,
sag Schmetterling.
01 B
“Was ês das?
Ich wais nich.
Fôha!”
“O que é isso?
Eu não sei.
Passarinho.”
Was ist das? Ich weiß
nicht. Vogel.
01 B
“Was tass
hia?”
“O que é isto
aqui?”
Was ist das hier? 01 B
73
73
Total de ocorrências: 13
Legenda:
Na coluna ALUNOS foi considerado:
- B= bilíngüe, sendo L1 língua alemã e L2 língua portuguesa
- MA= monolíngüe em língua alemã
As falas produzidas exclusivamente no dialeto da região fazem parte do
contexto no qual o aluno bilíngüe traduzia para o aluno monolíngüe em alemão o
que estava sendo solicitado, para que ele compreendesse e participasse das
atividades. O aluno monolíngüe, por sua vez, aceitando e querendo participar,
manifestava-se falando em seu dialeto materno. Integrar-se ao grupo ao qual
pertence revela, como observado por Vygotsky, uma necessidade social do ser
humano. É pela convivência com os outros que o indivíduo vai se estabelecendo
como membro de um grupo constituído por co-específicos, tal como referido por
Tomasello (2003), e juntos assumem a condição de agentes constituintes para o
desenvolvimento cultural.
Outro aluno bilíngüe da turma, ao participar da atividade individual com a
pesquisadora, fez uso, exclusivamente, de sua língua materna no momento em
que estava elaborando uma história a respeito de personagens indicados. A
atividade consistia, primeiramente, na identificação de quatro figuras (cabrito, lobo,
grama e churrasco); após foi solicitado ao participante a colocação dessas figuras
numa ordem em que pudesse criar uma história com os elementos apresentados,
podendo acrescentar outras figuras livremente, mas sem deixar de incluir os
indicados pela pesquisadora . Aaquele momento, o aluno falara em português,
mas no instante em que foi questionado sobre a seqüência dos fatos da história
ele falou na sua L1 (I han gue los) e, logo após, continuou utilizando o português.
Nesse contexto, fica evidente a influência da L1 sobre a L2, enquanto
estrutura-base para o contínuo processo de aprendizagem da segunda língua, ou
seja, mesmo que a comunicação aconteça na língua estrangeira em alguns
momentos, retomadas do dialeto local, que é utilizado de maneira natural e
74
74
espontânea. Isso significa dizer que os padrões da L1, mais antigos e fortemente
arraigados, influenciam os novos, da L2, ainda não suficientemente internalizados.
De fato, os aprendizes tendem a utilizar sua língua materna como base de
referência, durante o processo de aquisição da L2, conforme Zimmer (2006)
enfatiza.
3.2 Frases produzidas com a interinfluência da L1 (língua alemã) e da L2
(língua portuguesa)
Atividades Coletivas
FRASE ( L2+ L1)
NºOCORRÊNCIA
ALUNO
“Eu tenho lá na minha Muta.” 01 B
Total de ocorrência: 01
Legenda:
Na coluna ALUNO foi considerado:
B= bilíngüe, sendo L1 língua alemã e L2 língua portuguesa
Atividades Individuais
L1 + L2
NºOCORRÊNCIAS
ALUNOS
“A Man.” 01 (der por a) MA
“Ain píchu.” 01 (Tier por píchu) MA
“Entãum tava boum esse churrascu?” “Tava
muito boum uma vez.”
01 (uma vez) MP
“É baaum.” 01 (ist por é) MA
“É schmédelin, eli falô.” 01 (borboleta por
schmédelin)
B (T)
“Elis tavaum nu pinicu sentadu.” 01 (estrutura frasal) B
“Hia, hia, Búia, naum, naum é. Iétz rêg. Da is
ia tang, sind, hia, hia, naum, vai agora, vai,
acha, vai, vai, naum.”
04 (nicht por naum)
04 (gehen por vai)
01 (ist por é)
01 (jetzt por agora)
01 (finden por acha)
B (T)
“Na, na. Issu é... ai, num sei falá. Pôlo.” 01 (não, não por na, na) B (T)
“Naum. Was êst? 01 (nicht por não) B (T)
“Naum sei. Ah, Búia, sach épfel.” 01 (fala por sach)
01 (maçã por épfel)
B (T)
“Púia, savich schmédelin. Fala.” 01 (sprechen por fala) B (T)
75
75
“Sam: queiju.” 01 (fala por sam) B (T)
“Tu kanst in di figura.” 01 (Figur por figura) B (T)
“Was êstas? Grót. Sapu.” 01 (sapo por Grót) B (T)
“Was êst di lobu? 01 (Wolf por lobo) B (T)
Total de ocorrências: 25
Legenda:
Na coluna “L1+L2” foi considerado:
L1= língua alemã
L2= língua portuguesa
Na coluna ALUNOS foi considerado:
B= bilíngüe, sendo L1 língua alemã e L2 língua portuguesa
B (T)= bilíngüe tradutor, sendo L1 língua alemã e L2 língua portuguesa
MA= monolíngüe na língua alemã
MP= monolíngüe na língua portuguesa
As interferências da L1 na L2 podem ser claramente observadas nas falas
dos alunos bilíngües. Durante as atividades individuais com o aluno monolíngüe
em alemão, o bilíngüe-tradutor transitava ora na L1 ora na L2. Isso para fazer com
que o seu colega monolíngüe compreendesse e participasse das atividades e para
que a pesquisadora entendesse o que estava sendo dito. A respeito disso,
podemos constatar, no quadro 3.2, das atividades coletivas acima expostas, as
situações de transitividade nas quais foram utilizados elementos do dialeto local
nas falas realizadas em ngua portuguesa. As substituições ocorrem em nível
pragmático, ou seja, nos diálogos em que alguns elementos da L1 substituiram
elementos da L2, como nos exemplos em que houve 01 ocorrência para cada
caso a ser considerado: borboleta por schmédelin (substantivo); não, não por na,
na (advérbio de negação); fala por sách/sam (verbo); maçã por épfel (substantivo).
A esse respeito, Arabski considera a existência de uma ordem de aquisição, que
estabelece quais estruturas são adquiridas antes e depois de outras, porque todo
o sistema da L1 e da L2, segundo ele, estão em contato, porque
15
uma ordem
1
5
“There is an order of acquisition which determines which structures are acquired before and after other
structures in spite of the fact the entire systems are in contact” (ARABSKI, 2006, p. 20).
76
76
de aquisição que determina quais estruturas são adquiridas antes e depois de
outras estruturas em despeito ao fato de que os sistemas inteiros estão em
contato.
O contrário também pôde ser observado: substituições de elementos da L2
em situações de comunicação em L1, tanto na fala do aluno bilíngüe quanto na do
monolíngüe em alemão. Foram três as transferências realizadas pelo monolíngüe
em alemão: quanto ao artigo: der por a; quanto ao substantivo: Tier por píchu; e
quanto ao verbo: ist por é. o aluno bilíngüe-tradutor, representado na tabela 3.2
das atividades individuais por B (T), efetuou 20 substituições: 07 relativas a
verbos: gehen por vai (04 ocorrências); ist por é (01 ocorrência); finden por acha
(01 ocorrência); sprechen por fala (01 ocorrência); 06 quanto a advérbios:
advérbio de negação nicht por não (05 ocorrências); e advérbio de tempo: jetzt por
agora (01 ocorrência); e 03 relativas a substantivos: Figur por figura; Kröte por
sapo; Wolf por lobo.
A fala utilizada pelo monolíngüe em português Tava muitu boum uma vez...
apresenta uma estrutura sintática peculiar da língua alemã, apesar de à primeira
vista não o evidenciar. A expressão einmal é muito comum na língua alemã, não
significando somente uma quantidade (uma vez), mas remetendo ao decurso de
um determinado espaço de tempo, por exemplo: Ich bin einmal nach Deutschland
gegangen. ou Die Deutsch waren einmal so. Se for traduzida, literalmente, para a
língua portuguesa a expressão tal como proferida pelo aluno, como o foi, através
de uma expressão fechada, sem realmente significar uma vez que se fez alguma
coisa, o estranhamento é inevitável e o significado alterado. O uso freqüente
dessa expressão entre os alunos bilíngües e monolíngües reflete o contato e a
interferência de um código pelo outro, ou seja, o bilíngüe, cuja L1 é o dialeto
alemão, traz para a L2 uma expressão característica da sua L1; o monolíngüe em
português, por sua vez, dado o contato direto e freqüente, também passa a utilizar
essa expressão, adotada involuntariamente. Essa comunicação entre idiomas
estrangeiros (L2 para o monolíngüe em alemão e os bilíngües é o português e
para o monolíngüe em português é o alemão) opõe duas formas de ver a
77
77
realidade, duas maneiras de conceber o mundo e a situação de uso evidencia isso
pois
16
a situação difere porque não representa os sistemas do contato lingüístico
mas o contato de culturas.
Outro caso de comprovação de interferência foi quanto à estrutura frasal.
Na língua alemã, a estrutura mais típica consiste em geral, na presença do verbo
como segundo elemento frasal, não importando se a frase inicia com sujeito ou
pelo adjunto, e se está no tempo presente ou no tempo passado. na língua
portuguesa, a estrutura é sujeito, verbo e complemento, o que não chega a
diferenciar totalmente o português do alemão, mas também não torna as duas
línguas idênticas. No caso apresentado Elis tavaum nu pinicu sentadu temos um
exemplo de frase em ngua portuguesa, L2, mas com a estrutura da L1, língua
alemã. O pretérito perfeito da língua alemã é constituído por uma forma verbal
composta - verbo ser ou verbo haver, mais o particípio do verbo principal: Sie
haben auf dem Nachttopf gesessen. Se fosse traduzido pela ordem em que
aparece na estrutura de superfície teríamos: “Eles estavam no pinico sentados”,
da mesma maneira como foi produzida pelo bilíngüe. Essa ocorrência pode ser
caracterizada como sendo uma cópia ou decalque, que reflete a estrutura da
língua-mãe, violando a ordem das palavras da língua alvo. De acordo com as
palavras de Arabski
17
as Cópias refletema estrutura da língua-mãe para, por
exemplo, palavra por palavra traduzida para a estrutura da língua-mãe, violando o
objetivo da ordem da palavra na linguagem nas sentenças regulares e nas frases
do idioma. Com relação ao modo de tratamento utilizado pelos falantes do dialeto,
destacamos uma situação interessante que traduz, segundo o entendemos, uma
influência da L2 sobre o dialeto local (L1). Assim, percebemos ao longo de todo o
contato com os alunos a predominância do uso de tu (pronome pessoal de 2
a
16
“[...] situation differs because it represents not the contact of language systems but the contact of cultures.”
(ARABSKI, 2007, p. 20).
1
7
“Calques reflect mother tongue structure by for example word for word translations of mother tongues
structures violating target language word order in regular sentences and in idiomatic phrases “(2007, p. 15).
78
78
pessoa do singular) entre os bilíngües e, também, na fala do monolíngüe em
alemão. O uso foi constante mesmo referindo-se às professoras, às pessoas mais
velhas da família, à direção da escola e assim por diante. A informalidade foi geral
e irrestrita. Certas nuances de tratamento expressas em razão do respeito à
autoridade ou à distância entre adultos/crianças não foi evidenciada em nenhuma
circunstância. Isso talvez se deva ao fato de no dialeto considerado não haver
pronome de tratamento formal, como no Hochdeutsch (Sie e Ihnen) e na língua
portuguesa (senhor/ senhora). Por outro lado, em português brasileiro, observa-se
atualmente uma acentuada tendência à uniformidade de tratamento e à
informalidade. A característica mais marcante dessa propensão é a de eliminar o
tratamento mais respeitoso senhor/senhora em circunstâncias que anteriormente o
exigiam. Essa circunstância talvez se reflita nas escolhas dos alunos que falam,
em casa, o dialeto alemão. Nas situações informais, entre os próprios alunos, nas
quais a utilização de Du e tu praticamente se equivalem no Hochdeutsch e na
língua portuguesa, ou seja, no uso dos pronomes pessoais dirigidos a pessoas
mais próximas, íntimas, em circunstâncias em que a formalidade não se faz
necessária, não se observou diversidade de emprego. Essa influência intercultural,
seguindo o conceito proposto por Arabski (2007), pode ser caracterizada como
uma superprodução na qual a forma tu é empregada corretamente: ela é freqüente
na L1 e também é constante na L2. Ainda considerando os estudos e
constatações realizadas pelo mesmo autor, o nível lingüístico que costuma sofrer
maior impacto e influência de uma ngua sobre outra é o pragmático. Sendo
assim, nesse caso, os fatores contextuais determinaram os usos lingüísticos nas
várias situações interlocutivas, levando os falantes a utilizarem o que lhes era
mais próximo e mais significativo
19
: os léxicos em geral são mais flutuantes de
uma linguagem para outra, sem também muitos obstáculos. Outras estruturas
como a pragmática (A), sintaxe (B), morfologia (C) e fonologia (D) são, nesta
ordem, mais resistentes para a influência estrangeira. Da observação do autor
resulta que, em se tratando de influências sobre hábitos e atitudes, nível
19
Lexis in general floats from language to language without too many obstacles. Other structures like
pragmatics (A), syntax (B), morphology (C) and phonology (D) are (in this order) more resistant to foreign
influence, phonology being the most resistant (ARABSKI, 2007, p. 18).
79
79
pragmático, a influência da L2 sobre a L1 pode acontecer e acontece. Em outras
palavras, no Brasil, a tendência à informalidade é acentuada e provavelmente, a
influência do português sobre o dialeto alemão da região considerada, tenha-se
manifestado através da expansão do uso de Du com o apagamento de Sie/Ihnen,
em situações em que essas formas seriam requeridas. Como o afirma Arabski, no
nível pragmático a influência interlingüística é mais fácil de ocorrer, então, nossa
hipótese é de que esse tipo de troca ou alteração de uso, decorrente da influência
do português brasileiro sobre o dialeto local, seja muito mais numerosa do que se
concebia anteriormente.
4 INTERLÍNGUA – ALUNO MONOLÍNGÜE EM ALEMÃO
No quadro Interlíngua está exposta a produção oral do aluno monolíngüe
em alemão durante a coleta de dados. São vocábulos que traduzem tentativas de
comunicação em sua L2 (língua portuguesa) com os colegas e também com a
pesquisadora.
L1 INTERLÍNGUA
L2
TRANSCRIÇÃO
L1
TRANSCRIÇÃO
INTERLÍNGUA
TRANSCRIÇÃO
L2
das Wasser águ água ['vas]
['agυ] ['agυa]
Alipirô Alípio
[alipi'o]
[a'lipiυ]
das Spiel chôga jogo
['pi:l] ['ogə]
['ogυ]
das
Kürbisgemüse
chlû chuchu [kurbisge:'myse:]
['lu] [u'u]
der Kaiman dagaré jaca ['kaiman]
[daga'ε] [aka'ε]
der Pfeil hécha flecha [p'fai:l]
['hεə] ['flεə]
Jôla Lola
['olə] ['lolə]
Júia Júlio
['uIə] ['uυ]
das Zicklein marpitu cabrito ['tsiklai:n]
[ma'pitυ] [ka'bitυ]
das
Radieschen
nêti rabanete
[ra'di:en]
['ntI] [haba' ntI]
[haba'ntI]
die Kröte racu sapo
['krØ:te:] ['akυ] ['sapυ]
rascu churrasco
['askυ]
[u'haskυ]
der Wolf róbi lobo ['volf]
['bI] ['lobυ]
die Burg télu castelo ['burk]
['tεlυ] [kas'tεlυ]
das Pferd valu cavalo
[p'fεrt]
['valυ] [ka'valυ]
der Kessel zalíra chaleira
['kεse:l]
[za'liə]
[a'leIə]
[a'leə]
80
80
das Eis zoret sorvete ['ai:s] [zo'et]
[so'vetI]
[so'vetI]
Durante o processo de aquisição de uma segunda ngua, a língua materna
constitui-se na estrutura-base, que servirá como referência primeira ao longo de
toda a aprendizagem. A busca constante nas estruturas da L1 faz com que as
interferências aconteçam e sejam utilizadas pelos aprendizes também na sua L2.
Estas transferências da L1 para a L2 podem conduzir a erros, ou seja, levar o
aprendiz a generalizar, aplicando regras da L1 na L2, sem levar em consideração
as particularidades do sistema que está aprendendo. No entanto, os próprios erros
podem ser úteis no aprendizado da segunda ngua ou da língua estrangeira, em
questão, pois a partir do erro é possível fazer uma análise, uma reflexão, acerca
do equívoco e a partir disso realizar uma nova tentativa de acerto, ou como afirma
Arabski
20
, ao cometer erros evidencia-se o progresso da aquisição da linguagem
estrangeira.
O fato é que, experimentando novas possibilidades ao longo do
aprendizado de uma L2, cada aprendiz cria um novo sistema, particular e
idiossincrático, mas que não pode ser considerado L1 e nem L2: é a interlíngua.
Este sistema de transição é criado paulatinamente no decorrer de todo o processo
de apropriação da segunda língua. De acordo com Selinker (1972), citado por
OrtízAlvarez (2002), a interlíngua pode apresentar as seguintes possibilidades:
transferência prática, na qual o falante retira da L1 um termo para nomear outro na
L2 e este passa a ser utilizado temporariamente, ex. flauma para designar ameixa;
estatégias de aprendizagem para a L2: repetição de itens léxicos no intuito de
acertar a pronúncia, ex: a autocorreção e a correção realizada pelos participantes
da pesquisa; tendência à simplificação dos termos a partir da interlinguagem
apresentada pelo aluno monolíngüe em alemão, no quadro acima, podemos
identificar uma simplificação dos léxicos da ngua alvo, como no caso de rascu
referindo-se a churrasco; telu - castelo e valu - cavalu. Comumente, acontece o
20
“They make errors which give evidence of their progress in foreign language acquisition” (2007, p. 12).
81
81
mesmo fenômeno com crianças mais jovens, falantes nativas do português. A
palavra polissílaba ou mesmo trissílaba é diminuída, cortada porque, nesses
casos, a criança não consegue fazer a síntese silábica. Outra característica
apontada faz menção às estratégias de comunicação simplificada, como, por
exemplo, a troca de código numa mesma sentença, demostrado no quadro L1+L2:
É schmédelin. Supergeneralizações de padrões da língua alvo também são
consideradas no processo de interlíngua, conforme Selinker.
O fato de o aluno estar exposto à L2 de forma constante e direta através
dos contatos mantidos com falantes nativos, e a sua necessidade de interação
com seu ambiente escolar, propicia uma freqüente produção de linguagem em sua
L2, que lhe é exigida e não apenas ouvida (por ele). A exposição e a regularidade
do input presente no meio são fatores que contribuem para a evolução do
conhecimento da L2, de uma maneira muito parecida com a aquisição de L1.
“Motivação é o fator de maior responsabilidade do sucesso na aprendizagem de
uma língua“
21
. O incentivo dos colegas aliado à necessidade de comunicação e
interação com o grupo de pares gera um ambiente favorável à aprendizagem que
abarca não somente a compreensão e a produção lingüística, mas principalmente
a inserção numa nova cultura, o que se reflete no seu modo de falar e de construir
sua interlíngua. Apesar disso, é importante destacar que a interlíngua pode
perdurar por um período de tempo maior ou menor, tendendo a se manter, ou
seja, o falante conseguindo se comunicar adequadamente para os seus fins, tende
a conservar regras que não existem na L2. Conforme Schütz:
Se a intensidade de exposição à língua estrangeira for insuficiente, a
interlíngua persistirá por mais tempo, causando uma tendência maior à
fossilização dos desvios. Isto porque as necessidades de comunicação
na língua estrangeira enfrentadas pelo aluno podem exigir uma
freqüente produção de linguagem imprecisa, que se não for
contrabalançada e sobrepujada por input autêntico, acabacausando
uma internalização prematura de formas da interlíngua, isto é, a
fossilização dos desvios que a caracterizam. (2006, p. 1).
21
Motivation is one of the key factors responsible for successful language learning. L2 structures which are
filtered in by a language learner are acquired” (ARABSKI, 2006, p. 20).
82
82
5.1Considerações pontuais sobre situações que se evidenciaram ao longo
das observações gravadas e/ou anotadas pela pesquisadora
O contato com os alunos participantes deste estudo e com descendentes
de alemães da região ainda nos permite formular algumas observações relevantes
sobre o dialeto alemão falado nessa região e sobre o português produzido por
esses falantes. Na verdade, muitos falantes de português apresentam traços de
uma interlíngua plena de características fonológicas, morfológicas e sintáticas do
alemão (L1). Dentre elas, pode-se citar:
5.1.1 Velarização do fonema [l]
Durante as observações realizadas, o fonema [l] pronunciado
alongadamente estava muito presente na fala dos bilíngües. Isso talvez se deva
ao fato de na língua alemã o fonema [l] ser pronunciado [l:]- mais alongado do que
em português brasileiro-, e não ser substituído, em nenhum momento, por outro
som, ex. elf. Já na língua portuguesa, o [l] pode ser também pronunciado com som
vocálico [u], como nos exemplos de uso de ditongos, sobretudo no fim da palavra :
[le'gał] por [le'gaw]; e de fonemas: [fił'mand
υ
] por [fiw'mand
υ
]. Essa situação
poderia, então, ser classificada como uma subprodução, na categorização
proposta por Arabski (2007), dado que a estrutura da L2, substituição do fonema
[u] pelo [l], não é efetuada na L1, cuja pronúncia do [l] sempre será [l:].
5.1.2 Substituição de gêneros
Em alemão três gêneros masculino, feminino e neutro. Em português
dois, mas existem substantivos comuns de dois gêneros, sobrecomuns etc.
O que constatamos, em decorrência, foi a troca de palavras masculinas por
83
83
femininas bastante comumente. As substituições foram feitas por alunos
bilíngües e pelo monolíngüe em alemão. Vejamos alguns exemplos: a chôga
o jogo, Júia Júlio; o cabrita a cabrita. Nesse caso, podemos considerar a
diferença entre os dois sistemas, alemão e português, quanto aos gêneros e
ao uso dos próprios artigos, questão que envolve aspectos morfossintáticos
das línguas envolvidas. No idioma alemão são três artigos definidos: der
(masculino), die (feminino) e das (neutro) e no português são dois: a (feminino)
e o (masculino). Muitas vezes, os artigos num dos idiomas considerados não
corresponde aos mesmos no outro, o que pode ser a causa dessas
substituições. Comprovamos a ocorrência do fenômeno em análise nos
exemplos a seguir da língua alemã e da língua portuguesa: das Fesnter a
janela; der Tisch a mesa; das Bild o quadro; die Einladung o convite; der
Mund a boca; das Haar o cabelo. A esse respeito, Ringbom considera
relevante a diferença entre os idiomas e a hipótese de equivalência
simplificada que acontece na compreensão e aprendizagem, na qual, segundo
ele, os significados ou funções dos artigos da L2 são transferidos para a L1, e
também na produção, artigos da L1 para artigos da L2, como podemos
verificar
22
Inicialmente, estudantes reduzem sua carga de trabalho fazendo uso de
uma hipótese de equivalência simplificada demais: L1=L2, trançando os
significados ou funções de artigos na L2 diretamente para artigos
existentes na L1, em compreensão, e artigos da L1 para artigos da L2 na
produção.
5.1.3 Apagamento de vogais finais e empréstimos
Os falantes do dialeto estudado, em geral, eliminam a nasalidade da vogal
final de certas palavras, interrompendo a pronúncia da palavra na última
22
Initially, learners reduce their workload by making use of an oversimplified equivalence hypothesis
L2=L1, mapping the meanings or functions of L2-items directly on to existing L1-items in comprehension
and L1-items on to L2-items in production (2006, p. 40). In target languages totally different from the L1
there will be little visible transfer in comprehension and learning, but transfer will occur in production, when
the learner does not perceive, but merely assumes that items and
systems in the target language will work
more or less in the same way as in L1. (RINGBOM, 2006, p. 41).
84
84
consoante, como por exemplo: Schule (escola): ['ul]; Katze (gato): ['katz]; Brille
(óculos): ['bril]. Nesse dialeto, especificamente, não é pronunciada a última vogal
das palavras, principalmente dos verbos, como nos exemplos: esse ['
s]; trinke
– ['tik]; komme['km]; e também em substantivos, como nos exemplos citados
acima. No caso observado, em português, o substantivo sorvete foi pronunciado
como sorvet. Esse substantivo é utilizado no dialeto para dizer sorvete, ou seja,
uma palavra da língua portuguesa que foi adaptada à língua alemã, através do
contato e influência diretos daquela, com as mesmas regras utilizadas, sem
exceção. Esse pode ser considerado um caso de subprodução, observando ainda
as categorias de Arabski, pois a adaptação feita não considera a estrutura da L2
(português), com a pronúncia da última vogal, da qual foi retirada, mas sim a da L1
(alemão), na qual se subtraiu a vogal final.
O léxico sorvet foi tomado como empréstimo da língua portuguesa porque
na L1, dialeto alemão local, não havia nenhuma palavra que designasse a iguaria
doce e gelada, feita à base de leite ou suco de fruta. Esse contato lingüístico abriu
margem para outras apropriações, como por exemplo: computador, celular e
televisão, mencionados pelos participantes bilíngües ao longo das observações, o
que reflete também o contato cultural entre ambos os sistemas, assim como
definiu Arabski
23
: o caráter dos empréstimos reflete o caráter de contato cultural.
Passando, então, a constituir o vocabulário do dialeto alemão local, esses e outros
empréstimos foram sendo apropriados pela população local, tornando-se, por esse
motivo, o processo dinâmico, no qual palavras da L2 foram introduzidas na L1 e se
tornaram estáveis, assim como aponta Manczak-Wohlfeld
24
: como é geralmente
conhecido, empréstimos são introduzidos por falantes bilíngües e é primeiro usado
por eles e, então, gradualmente esparramados ao redor. Então nós podemos falar
23
“The character of the loans reflects the character cultural contact” (2007, p. 16)
24
“As is generally known, loans are introduced by bilingual speakers and are first used only by them and
then gradually spread around. Therefore, we can speak of a dynamic process which ends at the introduction of
the loanword to the language system” (2006, p. 47).
85
85
de um processo dinâmico que termina na introdução de palavras estrangeiras no
sistema de linguagem.
5.1.4 Reparos e auto-reparos
Através do contato direto e constante dos dois idiomas, alemão e
português, a interferência de um sobre o outro é inevitável. A influência de um
idioma sobre o outro se reflete na produção língüística dos falantes, provocando
dúvidas nos alunos quanto à pronúncia de determinadas palavras. A consciência
lingüística manifestava-se, em tais circunstâncias, no momento em que os alunos
se autocorrigiam ou eram corrigidos pelos colegas, como nos exemplos abaixo:
1) Cachô... chô... jô... cachorro; cachoro... cachorro. (bilíngüe autocorrigindo-
se)
2) Queijo...chô...queijo. (monolíngüe em alemão autocorrigindo-se)
3) Po... bomba (monolíngüe em português autocorrigindo-se)
4) Paum, diz um aluno bilíngüe. É Báaaum, corrige o outro (aluno monolíngüe
em alemão).
5) Ráis ['haIs], diz um aluno bilíngüe querendo dizer arroz, cuja L1 é a
portuguesa. Não, é is ['
aIs]. (corrige um aluno monolíngüe em
português).
86
86
CONCLUSÃO
O presente estudo propôs-se a verificar a influência da língua materna
(alemã) no processo de letramento em português brasileiro. Pela análise feita
pôde-se constatar a influência direta (transferência) e constante da L1 sobre o
processo de letramento em um participante monolíngüe em alemão, e nos
participantes bilíngües (alemão-português). Os padrões da L1, mais antigos e
fortemente arraigados, influenciam, sem dúvida, as aquisições mais recentes do
português, ainda não suficientemente internalizadas, daí a tendência dos
participantes a utilizarem sua língua materna como base de referência, durante o
processo de aprendizagem da L2, o que corrobora os estudos de Alves e Zimmer
(2006).
As transferências fonológicas realizadas pelos falantes do dialeto alemão
durante o período de observação e coleta dos dados, dentre as quais se destaca a
eliminação da oposição entre os fonemas vozeados [b], [g] e [d] e desvozeados
[p], [k] e [t], ficaram evidentes em todas as circunstâncias, sendo, aliás, previsível
a sua expansão para todo o sistema lingüístico. O que implica admitir que outros
aspectos dessa oposição devam ser investigados, pois o fenômeno, quando
acontece, não se circunscreve somente aos fonemas isolados, como o afirmava
Voese (1975). Assim, é de cogitar estudos sobre a oposição não apenas entre as
consoantes plosivas. Isso porque no contato interlingüístico todo o sistema está
em contato, segundo Arabski (2007).
Por outro lado, mesmo que o sotaque seja o aspecto mais facilmente
apreensível, já que captado pelo ouvido do falante nativo do português, sem
necessidade de nenhum aparelho, nem sempre é possível, na ausência de
instrumentos adequados, verificar o espectro da pronúncia de certos fonemas -
que apesar de existentes nas duas línguas - apresentam notórias diferenças
qualitativas de produção. É o caso do fonema [l], tal como produzido por falantes
bilíngües e monolíngües em português (se descendentes de alemães), cuja
87
87
produção diferenciada foi devidamente comprovada pela pesquisadora, sendo
apontada na transcrição fonética feita. Contudo, embora a diferença tenha sido
observada e registrada, ela necessita de análise mais acurada através de recursos
técnicos específicos, pois é difícil a mensuração de determinados elementos da
fala sem o auxílio de tecnologia especializada no tratamento de tais questões.
. Assim, é certo que o nível fonológico é dentre os níveis considerados
aquele perceptivelmente mais revelador da diferença entre os sistemas das
línguas existentes, sendo também o mais resistente à alteração. Porém isso não
implica dizer que os demais níveis lingüísticos não sejam influenciáveis, ou que
não propiciem transferências de um para outro sistema. Essa constatação leva a
considerar dois aspectos dessa questão: se para a L1 o sistema fonológico é o
mais determinante da transferência para a L2, o contrário acontece em relação à
L2 que começa a influenciar o falante nativo de outra língua desde fora, a partir
das questões vinculadas à pragmática. Como antes referido, Arabski (2007)
estabelece uma ordem de transferência da L1 para a L2, em termos de maior
resistência à mudança entre línguas em contato, como a seguir se discrimina:
fonológico, morfológico, sintático e pragmático.
Por outro lado, os empréstimos de palavras da língua portuguesa não
interferiram no sistema da L1 (língua alemã), porque os itens lexicais que foram
apropriados funcionaram como sinônimos ou variantes estilísticas, como foi o caso
de televisão. Porém no caso de empréstimo de regra gramatical, nova estrutura foi
gerada, a partir da construção, por exemplo, de Elis tavam nu pinicu sentadu.
Nesse caso, houve mudança nos itens lexicais, sobretudo no que se refere à
ordem das palavras, pois as estruturas fonológicas e sintáticas foram adotadas
pelo idioma que fez o empréstimo, ou seja, a língua portuguesa.
O que se observou é que através do contato entre os habitantes da
localidade em que o estudo foi feito, ocorreu não só a transmissão de estruturas
lingüísticas, mas, principalmente, transferência cultural, a partir do que passou a
88
88
ser constituído um lastro cultural comum para ambos os idiomas. Palavras como
computador, celular e sorvete, que entraram no dialeto via língua portuguesa,
passaram a figurar no vocabulário dos falantes do dialeto alemão daquela região,
inclusive daqueles falantes que não usavam o português. Isso se justifica, uma
vez que faltavam no dialeto local palavras que referissem esses objetos e, assim,
o contato direto e constante dos idiomas propiciou a utilização desses termos no
dialeto local, evidenciando as interinfluências de um sobre o outro. Nesse caso,
aconteceu que uma das línguas envolvidas, no caso a língua portuguesa, utilizou
um termo emprestado do inglês para emprestar ao outro, o dialeto alemão, para
designar determinado objeto ainda não nomeado.
Outra questão pertinente à análise realizada foi quanto à generalização.
Conforme os dados coletados, as supergeneralizações foram determinadas pelo
conhecimento da L1 interferindo na aprendizagem da L2. Os participantes da
pesquisa utilizaram regras próprias da língua alemã na etapa inicial do
aprendizado de leitura e escrita em língua portuguesa. Esse foi o caso do
emprego da vogal nasal [õ] ao invés do ditongo nasal
υ
], não existente na
língua alemã. Em palavras como fogão e balão, por exemplo, que exigiam tal
ditongo, os bilíngües e o monolíngüe em alemão dialetal, optavam por um som
aproximado, [õ], e generalizaram esse uso para todos os casos em que
aparecesse o ditongo nasal, em questão.
De outra parte, uma questão de uso em português brasileiro e, portanto, um
dado pragmático parece indicar um movimento inverso da transferência, o que
reforçaria a proposta feita por Arabski de que o nível pragmático é mais
permeável. Nesse caso específico a hipótese é a de que tenha ocorrido uma
transferência de uso do português para o alemão. O caso é que os falantes
bilíngües utilizaram somente o pronome de tratamento tu na fala em L2, pois, no
dialeto alemão daquela região, as formas referentes ao tratamento formal
inexistem (Sie/Ihnen), na atualidade. A questão, na verdade, diz respeito à
hipótese de as formas de tratamento dialetais poderem ter importado essa
89
89
característica lingüística da L2 e alterado seu sistema por influência da L2
(português), que a forma utilizada pelos falantes nativos da língua portuguesa
do Brasil também é, na maior parte do tempo, a informal, ou seja, tu, o que
reforçou o uso desse pronome. Como os falantes do dialeto reduziram o seu
quadro de pronomes, uma conclusão possível é a de esses falantes transferiram
para o alemão (L1) sua forma de tratamento na L2.
Os estudos de Kahmann (1987) também constataram transferências, termo
utilizado em sua pesquisa, tanto da L1 influenciando na L2 quanto desse naquela.
Essa conclusão embasou-se na análise de dados coletados entre 1985 e 1986, na
localidade de Sinimbu/RS. A autora desse estudo verificou a ausência do fonema
átono no final de vocábulos, citando exemplos como: “[...] erzälen (falar): [er'tsε:l];
lachen (rir): ['lax]; Löffel (colher): ['lØfl] (KAHMANN, 1987, p. 76). Nesses casos
específicos, ela atribuiu à influência da língua portuguesa sobre o dialeto alemão
local a não pronúncia da vogal átona, porque corriqueiramente, no idioma
português, nos vocábulos falar, rir e colher a pronúncia utilizada é [fala], [ri] e
[colhε]. Daí sua conclusão: interferência, ou transferência como foi adotado, da L2
para a L1.
Outras situações semelhantes às que foram referidas são as seguintes:
substituição de gêneros, ou como classificado por ela “Erros de concordância e de
regência”, no caso de os vaca” ( op. cit. p. 73); transferência sintática: Ich habe ein
Kilo Fleisch gekauft von Schwein (p.77); troca interna: Meu vizinho está com...
com... so leicht...; transferência morfossemântica: Minha querida Mutter... (p. 77);
e transferência fonológica: Ele foi sexta-feira ao dico e voltou ondem de tarde
(p.73). Os achados da autora vêm reforçar as palavras de Arabski quando ele
afirma que a L1 exportadora não sofre influência, porém o mesmo não acontece
com a língua importadora: as estruturas fonológicas da L1, no caso o dialeto
alemão local, não sofreram qualquer interferência, mas a estrutura fonológica da
língua portuguesa, em estruturação, como foi o caso apresentado na atual
90
90
pesquisa e o caso acima citado, sofreu transferência e passou a usar as regras do
idioma do qual tomou de empréstimo os itens lexicais arrolados.
Diante dessas e de outras conclusões de seu trabalho, Kahmann (1987)
ressaltou a urgência e a relevância de haver o ensino sistemático ou não,
curricular ou extra-escolar, da língua alemã (L1) que contemple também a forma
escrita padrão, “[...] sob pena de, em caso contrário, o dialeto sofrer interferências
cada vez maiores e de ordem não fonológica, mas também morfossintática e
semântica, terminando por alterar completamente o idioma herdado dos
ancestrais” (KAHMANN, 1987, p. 79). Acrescenta-se a isso também a
necessidade de manter-se preservado o dialeto local e, conseqüentemente, a
identidade da comunidade que dele faz uso.
Uma situação que pôs em destaque o reforço inadequado na produção
lingüística da L2 diz respeito ao uso do [r]. Na língua alemã, as variações fonéticas
quanto a essa consoante podem comprometer o significado da palavra, assim
como na língua portuguesa a mesma troca pode representar alteração do
significado do vocábulo. Se houver generalização do uso do /r/ (forte) pelo /r/
(fraco), como foi o caso de jacarré por jacaré, é possível que frente a palavras em
que o significado seja alterado pela troca dessas consoantes, essa generalização
também ocorra, ocasionando mais produções que causem estranhamento entre
falantes do português.
Diante disso, considera-se que o ambiente de ensino-aprendizagem
desempenhou um papel importante, pois propiciou e auxiliou a superação dos
processos de transferência e generalização, concentrando o trabalho no
desenvolvimento da consciência lingüística. A professora contemplou a leitura e
interpretação de histórias, conversação e interação dos alunos entre si e com a
professora, bem como a introdução à alfabetização, relacionando som lingüístico
(fonema) e grafema (letra). Os alunos, por sua vez, contribuíram também para a
evolução na aprendizagem da língua portuguesa, todos juntos, monolíngües em
91
91
português, o monolíngüe em alemão dialetal e os bilíngües. Embora ocorresse,
em alguns momentos, o reforço inadequado da L2 e transferências da L1, o
contato entre os alunos, principalmente, em contextos informais, propiciou
momentos de aprendizagem, porque ao participarem ativamente dos diálogos, das
brincadeiras e das trocas de experiências, a consciência lingüística e a habilidade
metalingüística desses alunos deram evidências de terem sido mobilizadas e,
através delas, a superação das transferências e generalizações.
A interação entre os participantes foi, então, fundamental para o processo
de aprendizagem da L2, principalmente para o aluno monolíngüe em alemão.
Através do seu colega-tradutor ele foi, gradativamente, construindo uma relação
mais próxima com a professora e com os demais colegas. O esforço mútuo, dos
alunos bilíngües e dos monolíngües em português, despertou no aluno
monolingüe em alemão o desejo de participar do grupo, interagindo com todos
através da fala: ele, falando alemão, mas disposto a aprender português, e os
monolíngües falando português, mas também querendo entender o colega.
A exposição à língua alvo e a regularidade do input presente no meio são
fatores que contribuem para a evolução do conhecimento de L2. Isso pode ser
comprovado, neste estudo, pelos progressos do aluno monolíngüe em alemão e
dos próprios alunos bilíngües em alemão dialetal e em português. No início do ano
letivo, o aluno monolíngüe em alemão não realizava nenhuma tentativa de fala em
L2. A convivência diária, o contato próximo com falantes nativos e também a sua
necessidade de interação com o grupo, fez com que ele se manifestasse,
principalmente através da sua interlíngua, no idioma português. Daí o processo de
aprendizagem adquirir significado, ou seja, obter um sentido, um objetivo, a partir
do contexto no qual estava inserido e da necessidade que lhe era imposta: fazer
parte ativa do grupo.
A escola, por sua vez, não ignorou o contexto bilíngüe no qual está inserida.
Sendo, oficialmente, considerada um contexto monolíngüe, mas, de fato, num
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92
ambiente bilíngüe, proporcionava espaços para a transitividade entre uma língua e
outra, convivendo harmoniosamente com a língua da comunidade, dialeto alemão,
e com a língua oficial do país, o idioma português. Diante de tal postura, a
aprendizagem da L2, no caso o português, foi influenciada positivamente, porque
houve a valorização do aprendiz como um todo, ou seja, ele foi valorizado
integralmente como ser humano e como indivíduo participante ativo da
comunidade da qual faz parte.
E para que o trabalho realizado tenha êxito e seja totalmente efetivado, a
sugestão vai ao encontro do que Kahmann havia mencionado, anteriormente. O
ensino da língua alemã, na região, deve ser uma opção real de aprendizagem a
toda a comunidade, sendo contemplado sistematicamente pelas escolas. Essa
iniciativa, de fato, contribuiria não para a preservação do idioma alemão local e
para a valorização da identidade da comunidade e das pessoas que a compõem,
mas também auxiliaria no aprimoramento da própria língua falada. Se a
valorização do aluno na sua individualidade e no seu conhecimento prévio, a
aprendizagem de uma L2 será influenciada por esses elementos, como afirma
Arabski. Essas influências, por sua vez, podem ser de dois tipos: transferência
positiva e transferência negativa.
Ambas as tranferências contribuem para a aprendizagem, mas de maneiras
distintas. A transferência positiva facilita e promove a aquisição da linguagem
através da ênfase nas semelhanças entre os sistemas. Já a transferência negativa
aponta para as diferenças existentes entre os idiomas e entre os padrões
lingüísticos não coincidentes. A diferença, segundo Arabski, é a maior dificuldade
a ser enfrentada pelos aprendizes de L2. Superá-las, através de hipóteses e
tentativas de acerto, comparando um e outro idioma, foi a estratégia utilizada
pelos aprendizes bilíngües e pelo aluno monolíngüe em alemão os quais foram
acompanhados nesta pesquisa.
93
93
Além disso, constatou-se outro aspecto de suma importância na
aprendizagem de L1 e L2, talvez ainda não consciente para os partipantes-
aprendizes da língua portuguesa. O fato de durante o processo terem realizado
tentativas de entendimento, transferências, generalizações os levou a fazerem
comparações entre um sistema e outro, o que lhes propiciou experiências
lingüísticas além das comuns nessa fase de seu aprendizado. Essa reflexão, esse
conhecimento mais profundo acerca da sua própria ngua não aconteceria se não
estivessem tentando entender um outro idioma, assim como afirma Vygotsky,
citando Goethe: “[...] aquele que não conhece nenhuma língua estrangeira não
conhece verdadeiramente a sua própria” [língua] (1996, p. 94).
94
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99
99
ANEXOS
100
100
Mapa 1 - Rio Grande do Sul
Mapa 2 – Vera Cruz – Linha Andreas
101
101
ANEXO A – Descrição da 1
a
atividade coletiva
Assistindo ao clip do Cocoricó – “Piquenique”
102
102
P1: Prô, ta filmandu?
P2: Prô, ta fiumandu?
P3: Cassôru.
P4: É pra olha ali. Ali ó.
P2: Ô prô, disliga as luis.
P1: Prô, disliga a Luis, naum dá pra vê.
P5: Ali a galinha dentru du pinicu.
P3: Piu-piu.
P1: Prô, num teim otru desenhu pra olha? teim issu dali? Tamu aparecendu
ali?
Na sala de aula
P: Vocêis gostarum du desenhu qui vecêis viraum?
T: Siiiiim!
P: Qui mais vocêis gostarum?
P5: Eu gostei quandu. Elis tavaum nu pinicu sentandu.
P: Du pinicu? U que qui Elis tavaum fazendu nu pinicu?
P4: Botandu ovu.
P: Botandu ovu dentru du pinicu?
P5: Cagandu.
P: Fazendu ...
T: Cocô.
P: Quandu vocêis eraum piquininhus,vocêis num faziam cocô nu pinicu?
T: Siiiim.
P: As galinha tambéim: comeraum muintu i ficaraum cum dor di barriga i
correraum ligeru lá pra senta nu pinicu i faze co-cô.
T: risos
P: Intaum, olha aqui: essis aqui eraum us bichinhus qui estavaum i u gurizinhu, né,
qui tavaum nu piquiniqui. Vocêis sabeim u qui é um piquiniqui?
T- Siiiim.
P: Que qui é um piquiniqui?
103
103
P2: Todus teim qui traze coisa pra cume.
P: Todu mundu traz coisa pra come... i daí?
P5: Teim qui te um lugar bunitinhu pra i. Bota uma toalha, umas cumidas....
P4: Pra si diverti.
P: Pra si diverti, i daí, cada um comi u seu ou todu mundu comi di todu mundu?
P1: Naum, eli repartum.
P: Ah, a genti reparti u qui a genti trais, né? Intaum ta, Elis foraum faze um
piquiniqui nu quintau. U que qui é quintau? U pátiu da casa, da fazenda ondi Elis
moraum,, u tiu. Intaum, fórum essis aqui. Vamu um por um agora. Vocêis
reconheceim essis aqui?
T- Siiiim.
P: Essi foi pru piquiniqui, né?
T: Siiiim.
P: Vocêis si lembraum du nomi deli?
P5: Eu num escutei nada.
P: Naum? Alguéim lembra?
P1: Neim eu.
P: Júliu.
T: Júliu.
P: Julinhu, Elis chamavaum eli. U Julinhu foi tambéim nu piquiniqui. Olha, queim
mais foi? Qui bichu é essi?
T: Galinha.
P: U nomi dessa galinha é Zazá.
T: Za-zá.
P: A Zazá é a galinha mais velha das trêis. Ela é mais velha i pricisa usa óculus
pra... porque ela num enxergava direitinhu. A única que teim óculus é a Zazá. A
outra galinha.... ela teim um colar.... quandu ela foi pru piquiniqui ela uso um
colar. Essa é a Lilica.
T: Lilica.
P1: É u nomi da minha vó.
P: É? Vocêis teim galinha im casa?
104
104
T: Siiiim.
P1: Só a minha vó, môta.
P: Vocêis botaum nomi nas galinha?
P5: Nas galinha naum.
P: Olha essa outra aqui: essa tava cum um chapeuzinhu. U nomi dela é Lola.
P4: Chapeuzinhu Vermelhu. (r = caipira)
P: Intaum, foi u Júliu, a Zazá....
P-T: A Lilica ia Lola.
P: Mas fauta mais alguéim.
P5: Fauta u cavalu.
P: U cavalu...
P5: I u porquinhu.
P: U porquinhu só apareceu naqueli otru qui num foi nu piquiniqui. foi, intaum,
essi aqui i u cavalu. Vocêis lembraum u nomi du cavalu?
T: Naaaaum.
P: Comu era? Alípiu.
P-T: A-lí-piu.
P: Ta, i vocêis lembraum u qui elis levaraum nu piquiniqui?
P5: Comida.
P: Qui comida?
P5: sanduíche.
P: Sanduíche. I u qui u cavalu e as galinha comeraum?
P6: Pepsi.
P: PSIU, u Julinhu tomô u sucu, u refri lá. U que qui as galinha to....comeraum?
Purque Elis naum comeraum sanduíchi i num tomaraum sucu. Vocêis si lembraum
qui tinha um potinhu i Elis uhuhuhuhu?
P2: Cumida.
P: Vocêis si lembraum... mas qui cumida?
P2: Maçã, essas coisas.
P5: Milhu.
P: Naum, era uma fruta.
105
105
P4: Pasta.
P: Naum, naum era uma pasta. Vocêis si lembraum da musiquinha qui u Alípiu
canto?
Alguns: Naum.
P: Naum? Eli canto assim: “Amexa, amexa, xá, xá, xá, xá, xá”. Que qui elis
comeraum?
T- Amexa.
P: Vamu vê si vocêis si lembraum di otras coisas qui Elis levaraum pru piquiniqui.
Que qui é issu?
T- Dadu.
P- Elis levaraum dadu pru piquiniqui?
T: Naum.
P: Naum, né? I issu aqui?
T: Toalha.
P: Elis levaraum uma toalha pru piquiniqui?
T: Siiiiim.
P:Elis colocaraum a toalha, as coisas im cima pra come, né? I issu aqui?
T: Borboleta.
P: Borboleta. P13, comu é issu aui qui tu falo essis dias qui era u nomi dissu?
P5: Schmédelin.
P: Schmédelin. Vocêis conhecerauma Schmédelin? Tinha schmédelin nu
piquiniqui?
T: Naum.
P7: Si naum Elis comeraum tudu a comida.
P: Ela naum foi convidada, intaum ela naum foi. A schmédelin naum foi.
P2: Sanduíchi.
P: Olha u tamanhu dessi sanduíchi!
P2: Eu vô come tudu.
P: I queim é qui comeu u sanduíchi?
T: Eu.
P: Nu piquiniqui delis.?
106
106
P5: U Júliu.
P: U Júliu comeu u sanduíche.
P2: Ah, eu queru come.
P: Tu qué come tambéim?
P7: Eu tambéim.
P: Tinha sucu?
T: Siiiim.
P: Queim tomo u sucu?
T: U Júliu.
P: As galinhas Nahum tomaraum i neim u Alípiu. u Julinhu. Que qui é issu
aqui?
T: Chalera.
P: Comu?
T: Chalera.
P: Tinha chalera un piquiniqui?
T: Naum.
P: Neim uma?
P6: Uma sim.
P: Tu viu uma chalera? Ondi tinha uma chalera?
P7: Naum tinha chalera.
P: Naum tinha chalera. Tesoura?
P1: Naum tinha tesora.
T: Naum.
P- Naum levaraum?
T: Naum.
P: Que qui Elis iam faze cum uma tesora nu piquiniqui, né?
P5: So si cortassi um paum.
P1: Tinha.
P: Para aí, primeru a genti teim qui vê u que qui é issu aqui.
P5: Caneca.
T: Pinicu.
107
107
P: Pareci uma caneca? Mas é um pinicu.
P5: Pra galinha faze cocô dentru.
P: Pur que qui elas fizeraum cocô aquela hora?
P4: Purqui elas cumeraum muintu.
P5: Purqui elas cumeraum muintu i ficaraum cum dor di barriga.
P: Elas ficaraum cum dor di barriga i foraum ligeiru faze cocô nu pinicu. I será qui
vocêis fazeim cocô tambéim?
T: Siiiim.
P: U que qui u Julinhu falo qui eli fez cocô? Si lembraum du qui eli falo? Eli dissi
qui eli feiz cocô di manhã. Daí a Lilica dissi qui ela faz cocô todus us dias. Vocêis
fazeim cocô todus us dias tambéim?
T- Siiiim.P: Será qui u cocô teim alguma utilidade, eli servi pra alguma coisa? U
cocô da galinha, u cocô du cavalu....
P5: Naum.
P: Naum?
P2: U cocô du cavalu faiz estercu.
P: Istercu! Prá bota aondi?
P2: Nas flors pra elas cresce.
P: Issu.
P6: I nas planta.
P: Nas plantas... Vocêis num teim horta im casa?
Alguns: Sim.
P: Queim teim galinha, cavalu im casa, pega u cocô delis i mistura...
P2: Eu tenhu um gatu.
P: É?
P6: Eu tenhu um porcu.
P: Porcu?
P3: Eu tambéim.
P: P5, fala.
P5: Quandu meus boi fazeim cocô, as galinha sempri vaum lá i tiraum us milhu.
P: Ah, é? Elas teim qui tira. Intaum assim, ó, u P8 teim galinha im casa?
108
108
P8: Galu naum teim.
P: Só galinha? P13, pergunta pra eli, P8, si eli teim galinha.
P1: Eu tambéim só tenhu... porcu.
P8: Teim calinha.
P: Teim? I essi cocô...
P8: Teim cachoro.
P: Teim cachorro?
P7: Teim um monti di cachoro, né?
P1: Prô, prô, teim cachorro, gatu i porcu.
P8: Eli teim assim, ó (mostra com as mãos o número).
P4: Eu tambéim tenhu trêis.
P7: Eu tenhu assim (mostra com a mão 5).
P: U quê, galinha?
P7: Cincu cachoro.
P: Ah, cachorro.
P4: Eu tambéim tenhu assim (mostra cum a mão). Prô, eu tenhu galinha, cacho,
cho, jô, cachoro i boi.
P: Intaum, vamu assim, vamu faze assim: comu todu mundu teim bichinhu im
casa, cada um vai dize u qui teim. Cada um, di vagar, vai dize u qui teim. P4, u
que qui tu teim im casa, qui bichinhu?
P4: Eu tenhu galinha, cachorro, cachoro i mais boi.
P: boi. I tu, u que qui tu teim P8?
P8: Eu tenhu calinha...
P: Gatu, cachorru...
P4: Eu tambéim tenhu um gatu.
P8: Patu, eu tambéim tenhu dois patu. Eu criei patu acora.
P: P13, qui bichinhus tu teim?
P8: Ó, falo aqui. Eli teim cachoru.
P: Cachorru. Galinha nain, P13? Hingel.
P4: Das hina.
P: Teim?
109
109
P4: Teim.
P: Quantus, P8? Quantus eli teim?
P8:Ih, assim, assim (mostrou com as mãos).
P: Bãh, bastanti. I tu Natãn, teim algum bichinhu?
P8: Eu tenhu assim tambéim.
P9: Eu tenhu gatu, cachorro, cavalo...
P: Cavalu?
P9: Porcu.
P: Porcu... i é só.
P4: Eu tambéim tenhu porcu.
P: I a P10, teim algum bichinhu, P10? Que qui tu teim?
P10: Galinha, cachorru, gatu, patu...
P: Patu?
P9: Eu tambéim tenhu patu.
P8: U P13 ttambéim teim patu, assim.
P: É. I porcu. P11.
P11: Eu tambéim tenhu porcu, gatu, cachoru, pata.
P: Pata tambéim?
P11: Porcu.
P: Porcu tambéim? I a P5?
P5: Eu tenhu um cachoru, patu. Eu tenhu boi, eu tenhu vaca, eu tenhu porcu i
galinha.
P: Tu, P12 .
P12: Eu tenhu gatu, eu tenhu cachorru,eu tenhu boi, porcu i gatu.
P5: Naum teim vaca?
P12: Ah, vaca tambéim.
P: P3, vamu escuta... vaca tambéim? P3, qui bichinhu tu teim?
P3: Sôru.
P: Cachorru. I u que qui mais? Galinha naum?
P3: faz que sim.
P: I u que qui mais? Vaca?
110
110
P3: Aca.
P: Vaca teim? Ta. P7, quaul bichinhu tu teim im casa?
P7: Eu tenhu cassôru, teim um otru cassôru, teim...
P: Dois cachorrus?
P7: Teim um gatu.
P: I um gatu? Hum, P6, u que qui tu teim im casa? Qui bichinhus qui tu teim?
P6: Dois cachorrus.
P: Dois cachorrus? P2.
P2: Eu tenhu um porcu, uma galinha...
P6: Ah, i um porcu.
P2: Um boi, duas, qué dize, galinha, dois cavalu i uma zebra.
P: Zebra? Teim zebra im casa? Issu eu quiria vê. I tu, P1, qui bichinhus qui tu
teim?
P1: Porcu...
P2: Saum beim brancu.
P1: Dexa eu fala. Porcu, cachorru, um gatu i... i... só issu.
P: Só issu? Intaum assim...
P10: Prô, eu tambéim tenhu ovelha.
P: É! Olha intaum: u cocô da galinha, u cocô du porcu, cocô da vaca, cocô da
ovelha, cocô du cavalu, issu tudu a genti podi mistura na terra, na horta, nas
plantações pra faze adubu, estercu, qui neim dissi u P2. Pra que qui é issu? Pra
terra fica beim fofinha, as minhocas beim gordinhas.
P6: Prus passarinhus come minhoca.
P: Prus passarinhus come as minhocas qui vaum fica beim gordinhos por causa
du cocô qui vocêis botaraum lá, pras plantas crescerem mais bonitas...
P2: U ratu, u ratu só trasmiti venenu.
P6: Meu pai já boto uns 15 venenu i naum morreim.
P4: Teu pai neim teim issu, P6.
P: Ta, i u que qui é issu?
P1: Chupeta.
P: Chupeta ou... I comu a genti podi chama a chupeta?
111
111
P1: Bicu.
P8: Picu.
P: Issu, um bicu. Essis dias u P7 trouxe uma chupeta di pirulitu, né. Intaum eu mi
lembrei deli. Ta, i tinha chupeta nu piquiniqui?
T: Naum.
P: U que qui Elis iam faze com uma chupeta nu piquiniqui, né?
T: Garfu tinha.
P: Garfu tinha, né.
P7: Pra come cumida.
P: Issu, pra cume. Tambéim usa im casa pra almoça, pra janta...
P1: Eu tenhu.
P: Teim?
T: Bola.
P5: Naum.
P12: Naum.
P1: Eu tenhu uma bola im casa.
P4: Eu tenhu inguau essa.
P6: Eu tenhu duas.
P: Duas?
P6: Eu tenhu uma bola da Alemanha.
P: Da Alemanha? Queim é qui ti deu uma bola da Alemanha?
P6: Meu pai.
P: É, qui legau! Essa bola naum tinha nu piquiniqui delis mas...
P7: Essa bola aí dá pra joga vôlei?
P: Essa daqui acho qui é mais de futiboul. Mas quandu a genti vai num piquiniqui a
genti podi leva uma bola juntu, pra brinca, pra si diverti.
P5: Elis naum levaraum.
P: Elis naum levaraum, mas a genti podi leva juntu. Vamu vê quau é a outra coisa.
Alguns: Menina.
P5: Buneca.
P: Uma buneca. Vocêis qui gostaum di brinca: tinha buneca nu piquiniqui?
112
112
T: Naum.
P: Naum. Mas a boneca Elis naum levaram nu piquiniqui. Ta eu mostru pra vocês,
sentaum lá pra vê se tinha a boneca.
P1: Naum, prô, tu já mostro issu.
P: Pois é, mas teim genti qui teim dúvida si tinha boneca ou naum. Teim boneca
aqui?
T: Naum.
P: Elas naum levaraum a boneca delas. Elas só levaraum...
P2: U estercu pra terra fica beim forti.
P: Issu, as minhoca beim gordinha i as plantas beim saudáveis. Intaum, boneca
num tava.
T- Cachorro.
P1: Eu tenhu cachorro.
P: Quase todus teim cachorru im casa.
P2: Eu tenhu um dessa cor aí.
P: Marronzinha.
P6: U nomi deli é Ispaiqui.
P4: U meu é todu marroum.
P: U cachorru foi convidadu pru piquiniqui?
T: Naum.
P: Naum, u cachorru naum foi. Agora, a genti vai fala de uma coisa muitu legau.
Da cumida qui Elis levaraum. Seis viraum antis qui u Julinhu comeu um...
T: Sanduíchi.
P: I tomo sucu. eu perguntei pra vocêis si vocêis lembravaum u que qui as
galinhas i u cavalu tinhaum comido.
P7: Prô, eli dissi sanduíssi.
P1: Massa.
P4: Uma maçã.
P: Ameixa.
P7: Ameissa.
P: U Alípiu, a Zazá, a Lilica e a Lola adoraraum a ameixa.
113
113
P1: Eu tambéim adoro amexa.
P: É? Vocêis já experimentaraum uma ameixa?
A: Sim.
A: Naum.
P: Queim experimento amexa levanta u dedu. Queim comeu amexa? I queim
naum comeu ainda? Eu trouxe uma ameixa pra vocês experimenta. Essi é... essa
é aquela fruta qui vocêis disseraum qui experimentarum.
P4: Eu num experimentei.
P: Intaum agora, vocêis vaum experimenta.
P7: É grandi.
P: É grandi. Boum, issu aqui é uma amexa di verdadi. Vocêis viraum pelo
clipizinhu delis. Intaum, issu Elis comeraum. qui nu clipizinhu tinha amexa
vermelha i tinha ameixa na cor...
T: Laranja.
P: Naum.
Alguns: Amarela.
P: Amarela. “Amexa, amexa....” Si lembraum da musiquinha? “Amexa, amexa,
podi vermelha, podi amarela tantu faiz, eu jogu na guela.” Intaum, assim, eu
trouxe uma amexa pra vocês. Eu naum trouxe um pra cada um. Intaum, eu
passa pur aqui, intaum a Melissa vai morde um pedacinhu i vai pru P8 pra eli
experimenta tambéim pra vê si vocêis comeraum. uma mordidinha i vai
passandu.
Todos experimentaram.
P: Daí, já tinhaum experimentadu?
A: Sim.
P7: Eu naum.
P: Queim acha qui já comeu issu? P1, tu teim um im casa ou a tua maim
compro?
P12: Eu nunca comi.
P: Naum?
P12: É boum!
114
114
P: Teim duas amexas aqui. A prô vai sorteá depois. U caroçu naum posi inguli,
porque si naum vaum fica cum dor di barriga qui neim as galinha. Essa fruta aqui,
Elis chamaum di amexa, mas ela teim um otru nomi tambéim. Im Santa Cruz, im
Vera Cruz, essa fruta teim um otru nomi.
P1: Eu tenhu lá na minha Muta.
P: Achu qui teim nu mercadu. A genti compra nu mercadu. Muitas pessoas naum
sabeim qui u nomi dessa fruta é amexa.
P6: O prô, depois eu possu fala u nomi?
P: Podi fala, si tu sabi.
P6: Númeru.
P: Númeru?
P6: U númeru.
P: Depois sim. Essa fruta aqui, genti, escuteim u nomi pra vê si vocêis já ouviraum
fala. Vocêis já ouviraum fala im “flauma”?
P5: Flauma? Hãhã, a minha vó sempri fala issu aí.
P: Flauma vocêis conheceim du alemaum i im português é amexa. Vocêis si
lembraum da musiquinha quandu Elis tavaum indu pru piquiniqui? Qual era a
musiquinha? Vamu tenta lembra?
P-T: “Piquiniqui, piquiniqui, piquiniqui nu quintau.”
P: Aí, u Julinhu dizia assim: “Agora cum “o” “. Aí, tudu Elis falavaum cum “o”.
P-T: “Poconoco, poconoco, poconoco no conô”.
P: Agora cum “u”.
P-T: “Pucunucu, pucunucu, pucunucu nucu nu”.
P: Aprenderaum? Vamu di novu agora? Primero normau, depois com o” i depois
com “u”.
P-T: cantaram de novo
P: Vocêis si lembraum da musiquinha du cocô?
P2: Cocozinhu, cocozinhu...
P: Naum, naum era issu. Si lembraum? “Todu dia a genti faiz...” Naum, pera aí.
P-T: “Todu dia a genti canta Cocoricó, todu dia a genti faiz Cocoricô.
P- Vamu di novu?
115
115
Todos cantam.
P: Tá, intaum agora, eu trouxe pra vocês... Vocêis reconheceim essa daqui?
Olheim.
P5: A Lola.
P: Queim é ela?
P12: A Lilica.
P: Essa teim um chapéu. A Lo...
T: Lola.
P: Intaumassim, a Lola, cada um vai ganha uma Lola.
P7: Pur quê, prô?
P: Purque nós vamus faze um trabalhinhu cum a Lola.
Legenda:
A: alguns
P: pesquisadora
P1 a P13: participantes da pesquisa
T: todos
ANEXO B – Quem foi ao piquenique
116
116
Menino Júlio
Galinha Zazá Galinha Lilica Galinha Lola
Cavalo Alípio
117
117
ANEXO C – O que foi ou não levado ao piquenique
Borboleta Sanduíche
Suco Chaleira Tesoura
Penico Chupeta Garfo
Bola Cachorro Ameixa
118
118
ANEXO D – Quebra-cabeça da Lola
119
119
ANEXO E – Quebra-cabeças do Cocoricó
120
120
ANEXO F – Descrição da 2
a
atividade coletiva
2
a
atividade – Sopa – 27/08/07
P: Vocêis gostaraum du clipi?
T- Siiiim.
P: Vocêis si lembraum u qui tinha na sopa du nenéim?
P6: Agriaum.
P7: Tomati.
P: Agriaum, tomati....
P5: Fejaum.
P: Fejaum. Agriaum/ fejaum; tomati?
P2: Tinha sopa tambéim.
P: O que qui combinava cum tomati?
P8: Eu naum comi, prô.
P: Ta, intaum eu mostra pra vocêis u que tinha. Vocêis conheceim issu aqui?
Essa folinha? Es-pi-na-fre. Issu tinha na sopa du nenéim tambéim. Eu passa i
vocêis vaum ixperimentá. Podi come, ta? U que qui tinha mais na sopa du
nenéim? Espinafre combinava cum u quê?
P6: Feijaum.
P: To...
A: ma-ti.
P: Tomati vocêis conheceim, né?
P7: A genti podi come essi daí?
P: Sim, vocêis nunca comeraum salada di tomati? Vai passa u tomati tambéim si
vocêis nunca comeraum tomati podi experimenta. Podi experimenta. U espinafri,
podi come uma folinha. P1, tu qué? Si naum, passa ali pra outra mesinha ali.
Vaum experimentandu.
P5: É boum.
P: Vai passandu: u tomati , u espinafri. I u que qui mais tinha lá? Antis u P2 falo
“fejaum”. Essi aquí realmenti num ta cozido. A genti fejaum quandu é cozidu.
121
121
Intaum issu aqui é pra genti vê. Vocês conheceim, né? I u que qui combinava
cum fejaum?
P6: passa aqui pra nóis.
P4: Fui.
P: Naum gostaraum du espinafri? Ta aqui, ó, u que qui tava combinandu cum u
feijaum? Vocêis si lembraum?
Wellington: Agriaum.
P: Issu, P2, agriaum! U agriaum tambéim é uma folha verdinha I a genti podi come
comu salada. Ta, podeim experimenta.
P4: Fui.
P6: Ardi, Ardi.
P: Ta, sentaum agora. Outra coisa aqui apareceu na sopa du nenéim foi issu aqui.
Sabeim u que qui é issu aqui?
P4: Redícia.
P2: Rabaneti.
P: Rabaneti. Vocêis já comeraum rabaneti?
P4: A minha mãim teim uma iscada dessi cumpridu.
P: A genti precisa faze salada, corta direitinhu, coloca um temperu daí a genti podi
come. Eu trouxe pra vocês vereim. Rabaneti....issu aqui sim. Vai vim uma coisa
melhor agora. Rabaneti, lá na sopa du nenéim, combinava cum u quê? Rabaneti...
P14: Covi.
P: Teim rima. Qui vocêis gostaum. Sor...
P4: Veti.
P: Aaa!
P3: Rabaneti com sorveti.
P: Rabaneti/sorveti.
P14: Eu dissi sorveti.
P8: Sorveti seco.
P: Comu a genti ta nu invernu, eu trouxe um sorvete seco. Já comeraum?
P1: Naum.
122
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P: É beim boum. Teim casquinha di sorveti, teim um cremi ali, qui naum é
geladu.
P1: Sortia.
P: Naum, depois cada um vai ganha um sorveti cum balaum. Depois. Essi aqui é
só pra amostra. Vocêis conheceim issu aqui?
P5: Berinjela.
P: Issu, é uma berinjela. Já comeraum berinjela?
T: Naum.
P: Issu servi pra faze bolinhu.
P14: Assim a genti num podi come.
P: É, a genti neim podi cume ainda purque naum ta preparadu. Qué, P13? Comu é
issu aquí?
P1: Eli dissi “dadu”.
P: I berinjela combina cum u quê lá na sopa du nenéim? O que é issu aqui?
A: Panela.
P: A berinjela combina com panela. Vocêis viraum a panela? Ta. Vamu u que
qui mais. Palmitu, vocêis já cumeraum?
Melissa: Palmitu, palmitu.
A: Naum.
P: Palmitu é tipu um cauli qui a genti podi come.
P2: É proibidu corta.
P: Issu, teim alguns lugaris qui as pessoas naum podi corta, mas teim otrus qui
saum plantadus só pra consumu pra Elis faze i a genti compra nu mercadu. Ta, i
palmitu combinava cum u quê?
A: Pirulitu.
P: Agora vocêis vaum experimenta u palmitu. É beim boum, beim azedinhu.
P: Carlus, comi sentadinhu.
P: Teim genti qui gosta e genti qui naum gosta. Naum gostaraum? U palmitu
combino cum pirulitu. Que qui é issu aqui?
P1: Jaca...
T: Ré.
123
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P: Cum u que qui u jacaré podia combina na sopa?
P6: Pêxi.
P: Uma palavrinha qui combina cum jacaré. Ó, u pirulitu combinô cum palmitu; u
agriaum combinô cum u feijaum. I u jacaré?
P4: Jara.
P14: Cum pirulitu.
P: Naum.
P2: Covi. Covi.
P: Fui.
P12: Meia.
P2: Combino cum a meia.
P: Jacaré cum chu...
A: Lé.
P:Querim cherá u chulé?
A: Siiim.
Outros: Naum.
P: Naum teim chulé. Olheim issu. Olheim essi bichinhu aqui. Eli apareceu nu
clipi du nenéim. Pareci um porcu grandi qui eli teim umas guampinhas aqui du
ladu.
P1: Podi sê porcu tambéim.
P: Issu é um javali. Porcu naum teim guampa. Essi aqui é um javali. Javali podi
combina cum u quê?
P7: Jarra.
P14: Jarra.
P: Olha aqui pru desenhu. Essi javali a genti poderia combina cum u quê? Vocêis
ouviraum fala numa fruta chamada caqui? Javali, caqui. Cáqui é u nomi da cor.
Caqui é u nomi da fruta. Javali / caqui.
P14: Cáqui.
P: qui comu eu naum achei caqui, eu trouxe uma outra coisa qui tambéim
combina cum javali...
P1: Uva.
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124
P: Uva rubi. Ta, eu passa. Queim naum qué, naum precisa. É beim docinha.
Comeraum? Gostaraum da uva?
A: Siim.
P: Ta, agora atençaum numa coisa: vocêis viraum qui todas as coisas qui foraum
na sopa du nenéim elas combinavaum, rimavaum, qui neim u agriaum i u feijaum.
U que qui mais: u rabaneti, sorveti... pirulitu, palmitu. Tudu rimo. Intaum assim, ó,
vamu vê u que qui a genti podi faze. Vamu faze uma sopa du primeiru anu? U que
qui a genti poderia bota dentru? Cada um pensa umas duas coisas, mas teim qui
rima, teim qui combina.
P4: cenora.
P: cenora i u que qui mais?
P7: Sása.
P: Ta, mas teim qui te assim: cenora cum u quê?
P7: Carni.
P: Ta, mas carni combina cum u quê?
P6: Cum arroiz.
P: Naum, as palavras. Eu possu bota um balaum i um caminhaum.
P4: Água veim dentru.
P: Naum, u que qui a genti poderia coloca?
P14: Caminhaum.
P6: Balaum.
P: caminhaum / balaum. Que qui mais?
P12: Di leitaum.
P: É, di leitaum.
P6: Cabeça di porcu.
P: U chuchu a genti poderia bota na sopa.
P8: Pipinu.
P5: Pipinu cum sinu.
P: Pipinu cum sinu. Olha u que qui ela mi falo, escuta qui ta certu. Fala, P5.
P5: Pipinu cum sinu.
P: Issu a genti podi bota na nossa sopa.
125
125
P2: Mas teim qui bota cumida na hora di bota na sopa.
P: Mas naum é sopa pra come, P2.
P7: Sino.
P: Termina com “o”: sino / pepino.
Atividade
P: P6, veim aqui. Mostra u qui qui tu fez.
P6: Eu fiz tábua i cadera.
P: Podi i bota na panela. Veim P12. Que qui tu fez, P12?
P12: Ratu cum patu.
P: Podi bota lá. P1, veim aqui i diz u que qui tu fez.
P1: Balaum i feijaum.
P: Ta, podi i cola na panela. Veim, P11. Que qui u fez, P11?
P11: Eu fiz panela, coraçaum, janela i maum.
P: Tudu beim. Podi cola. Veim, P10. U que qui tu fez, P10?
P10: Pé cum chulé.
P: Cola na panela. Veim, P15. Quê tu fez?
P15: Um pé i um chulé.
P: Ta. Podi cola lá. P2, que tu fez, P2? P2, u que qui tu fez? Veim aqui i diz u que
qui tu fez. Que qui tu fez?
P2: Paum cum limaum.
P: Mostra u desenhu. Issu, podi i lá termina. P7, u que qui tu fez, P7?
P7: Maum i limaum.
P: Issu, i termina si naum terminô. P9, que qui tu fez, P9?
P9: Maum i limaum. U P7 dissi qui tinha fazidu otra fruta. Eu naum sei quau.
P2: Agriaum, eli disse.
P: Achu qui eli feiz um mamamum. P4, u que qui tu fez, P4? Veim aqui apresenta.
P4: Maum....
P: Maum i....
P4: Coraçãum.
P: Ta, podi por lá. Queim ta faltandu? Veim 14.
P14: Maum cum paum.
126
126
P: Maum cum paum. Muintu beim! I P13. Mostra u teu desenhu. Deixa eu u
teu desenhu: é um tatu. I u otru? I um chuchu. Muintu beim! Que qui tu fez, P8?
P8: Sou i flor.
P: I um girassou? P5.
P5: Passarinhu cum ninhu. P’cum chulé.
P: I u P3? Que tu feiz, P3? Maum i u qui mais?
P3: Cão.
P: I coraçãum. Ta. Essa é a panela.
Legenda:
A: alguns
P: pesquisadora
P1 a P15: participantes da pesquisa
T: todos
127
127
ANEXO G - Pares de Rimas
Pomba Bomba Panela Berinjela
Ninho Passarinho Jaca
Beijo Queijo Pato Sapo
Mandioca Minhoca Xampu Chuchu
Sorvete Rabanete Balão Feijão Chaleira
Mamadeira
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128
ANEXO H – Figuras para a elaboração de texto
CABRITO LOBO
GRAMA CHURRASCO
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