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terra estaria no centro e o sol girando em torno dela, para o sol no centro e a terra
girando em torno dele; ele, Kant, centrou no próprio sujeito cognoscente a
possibilidade do conhecimento a priori teórico – um sujeito ativo, que exercia sua
atividade no transcurso de algo dado, então sua espontaneidade nada mais era do que
o reverso de sua passividade.
O kantismo mantinha, pois, o esquema cartesiano básico da contraposição
de um sujeito a um objeto como ponto de partida legítima da reflexão filosófica e,
com isso, uma série de dualismo: matéria-forma, sensibilidade-entendimento,
intuição-conceito, fenômeno-coisa em si.
O idealismo pós-kantiano entenderá este pressuposto como ilegítimo e,
mais ainda, como contraditório com um idealismo conseqüente. A idéia central e
dominante passa a ser a da “espontaneidade” do espírito (Geist) que se autoconstrói .
Por um lado, o idealismo alemão tende a dissolver todos os dualismos kantianos,
considerando-os pré-críticos e exigindo totalidade e sistema. A idéia da unidade da
Razão passa a ser decisiva. Por outro lado, a ciência, ao invés de ser o ponto de
partida da reflexão, deve mostrar-se como momento de um processo que a
transcende. A aspiração totalizadora acaba por levar a filosofia a um conflito com a
ciência, que segue seu caminho sem importar-se com o que a filosofia tem a dizer a
seu respeito.
Em seu desenvolvimento autônomo, a ciência obtém êxitos inegáveis, e não
só resiste a ser submetida à filosofia, como também exige uma cosmovisão oposta à
do idealismo. A física funda o “materialismo” ou, de modo mais genérico, o
“naturalismo”. Uma importante derivação do naturalismo será o “psicologismo”. Se
no idealismo o pensamento criava uma realidade e o proceder da filosofia era
totalmente a priori, trata-se agora de corrigir esta “deformidade” partindo do que o
pensamento realmente é. A conseqüência será uma variante do relativismo
antropológico.
Segundo PENNA (2001 ob cit.) ainda e citando Husserl “a filosofia hegeliana teve por
efeito enfraquecer o impulso filosófico-científico, com sua doutrina da legitimidade relativa
de toda e qualquer filosofia, para respectiva época” Contra esta postura hegeliana –
relativismo - foram os neokantistas que resistiram significantemente:
O quadro marcado pelo historicismo e pelo relativismo, obviamente
agravava-se com o predomínio do psicologismo e do naturalismo; o primeiro
totalmente dominante no final do século XIX e do qual participavam Brentano,
tirada suas raízes de Hume e de Berkeley.
No levantamento do quadro em que se praticava a psicologia no final do
século XIX, vale que se ponha em destaque, em primeiro lugar, a preocupação com
a medida dos processos sensoriais, efetuada por Ernst Heinrich Weber (A lei de
Weber – 1834; O sentido de tato e a sensibilidade comum - 1846; Os círculos
sensoriais e a percepção cutânea do espaço – 1852) e Gustav Theodor Fechner (A
lei de Fechner – 1860); em segundo lugar, o entusiasmo com que foi acolhido o
método experimental, na verdade decorrente do processo de conceituação da
psicologia como ciência natural; em terceiro lugar, desqualificação da consciência,
apenas definida como um epifenômeno e, em decorrência, a negação de toda a
subjetividade que, já no século XX, consagra-se com o behaviorismo. Bem avaliado,
este último aspecto consagra o fechamento de um silogismo histórico, cuja premissa
maior foi enunciada por Descartes, quando afirmou que os animais seriam
autômatos; a premissa menor, com Darwin, afirmando que o homem é um animal e,
logo, emitindo-se a conclusão com Watson, ao declarar que, em decorrência lógica,
o homem é um autômato, criando-se a partir daí, a ciência do comportamento – a
Psicologia.