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CENTRO UNIVERSITÁRIO MOURA LACERDA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
MESTRADO
AFETIVIDADE NA INTERAÇÃO DE PROFESSORES E ALUNOS DO
ENSINO MÉDIO
Ritamar Moreira Jorge
Ribeirão Preto
2008
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CENTRO UNIVERSITÁRIO MOURA LACERDA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
MESTRADO
AFETIVIDADE NA INTERAÇÃO DE PROFESSORES E ALUNOS DO
ENSINO MÉDIO
Ribeirão Preto
2008
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Educação - Mestrado, do Centro
Universitário Moura Lacerda de Ribeirão Preto,
SP, como requisito parcial para obtenção do
título de Mestre em Educação.
Área de Concentração: Educação Escolar
Linha de Pesquisa: Constituição do Sujeito no
Contexto Escolar
Orientadora: Profª. Drª. Marlene Fagundes
Carvalho Gonçalves
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CENTRO UNIVERSITÁRIO MOURA LACERDA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
MESTRADO
AFETIVIDADE NA INTERAÇÃO DE PROFESSORES E ALUNOS DO
ENSINO MÉDIO
Comissão Julgadora
____________________________________________
Profª. Drª. Marlene Fagundes Carvalho Gonçalves
Orientadora
____________________________________________
Profª. Drª. Maria Nazaré da Cruz
2ª Examinadora
____________________________________________
Profª. Drª. Rita de Cássia Pereira Lima
3ª Examinadora
Ribeirão Preto, 11 de Julho de 2008
Dedico este trabalho...
A Jesus e aos meus amigos e benfeitores da espiritualidade, pela
certeza que tenho do auxílio que recebi ao enfrentar e superar as
dificuldades desta caminhada e consequentemente poder atingir o objetivo
almejado da conclusão desse curso de pós-graduação em educação-
mestrado.
Ao meu marido Rubens pela disponibilidade espontânea em
colaborar comigo, assumindo financeiramente este compromisso. Fato este
que me deu suporte para dedicação de tempo de estudo, pesquisa e
preparação que a construção da dissertação do mestrado exige.
A todos, o meu reconhecimento e gratidão, expresso pelo meu
muito obrigada.
AGRADECIMENTOS
Em primeiro lugar a Deus, nosso Pai Maior, que nos ama e tudo provê...
A Jesus nosso Mestre e Amigo de todas as horas que sempre me ampara, protege e ilumina
em todos os momentos da minha vida, em especial nessa difícil trajetória de desafios.
Ao meu marido Rubens pelo apoio e companheirismo, aspectos fundamentais para conquista
e realização do sonho do mestrado.
À Patrícia e ao Neto, filhos queridos e muito amados que Deus me deu, fonte de alegria, de
motivação, razão maior da minha vida. A vocês, o meu afeto, carinho e imensa gratidão.
O meu obrigado especial à minha filha Patrícia pela parceria e colaboração em atividades
necessárias no percurso dos estudos e trabalhos de pesquisa.
A minha amiga Herminzia pelas orações, palavras de ânimo, incentivo e carinho de sempre.
Obrigada por tudo...
Aos professores, alunos, diretor e à coordenadora do colégio no qual foi realizada a pesquisa
de campo. Obrigada a todos pela colaboração, boa vontade e participação neste trabalho tão
importante em minha vida.
À profª. Drª. Rita de Cássia Pereira Lima e à profª. Drª. Maria Nazaré da Cruz, participantes
da banca examinadora, pelas valiosas contribuições.
À profª. Drª. Marlene Fagundes Carvalho Gonçalves pela oportunidade de aprendizado,
crescimento pessoal, amizade e orientação segura na realização dessa pesquisa.
Que Deus abençoe a todos!
O mestre deve viver na comunidade escolar como parte
inalienável dela e, nesse sentido, à suas relações com o aluno podem atingir
tal força, transparência e elevação que não encontrarão nada igual na escala
social das relações humanas.
Vigostki
A constituição biológica da criança ao nascer não será a lei única
do seu futuro destino. Os seus efeitos podem ser amplamente
transformados pelas circunstâncias sociais da sua existência, donde a
escolha pessoal não está ausente.
Wallon
JORGE, Ritamar Moreira. Afetividade na interação de professores e alunos do Ensino
Médio. Ribeirão Preto, SP: CUML, 2007. 141 fls. Dissertação (Mestrado em Educação) –
Centro Universitário Moura Lacerda.
RESUMO
O presente trabalho tem por objetivo identificar e analisar concepções e interações, no campo
da afetividade, na relação professor-aluno do Ensino Médio. Parte do pressuposto de que a
interação social e a dimensão afetiva constituem-se fatores essenciais para o aprendizado e a
constituição do indivíduo durante todo o percurso de sua trajetória existencial. Esta pesquisa
fundamenta-se em dois teóricos sócio-interacionistas: Lev S. Vigotski e Henri Wallon.
Ambos trazem importantes contribuições a respeito da articulação entre o afeto e cognição e a
aquisição de conhecimentos pela interação do sujeito com o meio social e cultural. Esse
estudo foi desenvolvido através de entrevistas gravadas e transcritas, com roteiros semi-
estruturados e análise qualitativa com quatro professores e sete alunos da primeira série do
Ensino Médio de uma escola particular do interior do estado de São Paulo. Foram realizadas
também filmagens em sala de aula, sendo três sessões para cada um dos professores
totalizando doze sessões de filmagens. Estas foram analisadas através da microgenética. Os
resultados obtidos nas entrevistas indicaram que as concepções de alunos e professores sobre
a afetividade denotam presença de dicotomia entre afeto e cognição na escola. Os sujeitos
atribuíram à afetividade manifestações afetivas identificadas por eles como amizade, diálogo,
proximidade, brincadeiras verbais, gestos e outros. Observa-se uma confusão entre conceito
de afetividade (concepção mais ampla e complexa, envolvendo estados diversos, como
emoções, as paixões, os sentimentos, tristeza, alegria, sensações de prazer e dor) e
afetuosidade (que demonstra carinho, meiguice, ternura, abraço etc.) nas falas de alunos e
professores. Destaca-se, porém, que nas interações em sala de aula, observadas a partir da
análise das filmagens, a questão da dicotomia entre afeto e cognição não se sobressai, uma
vez que a maioria dos professores demonstrou, através de suas posturas e procedimentos
didáticos, compromisso com a aprendizagem dos alunos, e a afetividade aparece então como
dimensão existente e articulada com a dimensão cognitiva no contexto da sala de aula,
permeando também os conteúdos escolares.
Palavras-chave: Afetividade; Interação; Professor-Aluno.
ABSTRACT
The present work wants to identify and analyze conceptions and interactions on the affectivity
area in the teacher/student relationship. This relationship comes from the presupposition of
that the social interaction and the affective dimensions constitute essential factors for the
learning and the constitution of the individual during all his/her existential trajectory. This
research is based on two social-interactionists theorists: Lev S. Vigotski and Henri Wallon.
Both of them bring important contributions about the articulation between affection and
cognition and the acquisition of knowledge by the individual interaction with the social and
cultural environment. This study was developed through recorded and transcripted interviews,
with semi-structured directions and a qualitative analysis with four teachers and seven
students of the first grade of High School at a private school in the countryside of the state of
São Paulo. Filming was also done in classroom, with three sessions for each teacher,
totalizing twelve filming sessions. These sessions were analyzed through microgenetics. The
results obtained on interviews indicated that the conceptions of the students and about the
human affectivity denote the presence of a dichotomy between affection and cognition at
school. The individuals attributed to the affectivity some affective demonstrations identified
by them as friendship, dialogue, proximity, verbal jokes, gestures and other things. We can
observe some confusion between the concept of affectivity (larger and complex conception
that involves several conditions like emotions, passions, feelings, sadness, happiness,
sensations of pleasure and pain) and affectuosity (that shows affection, gentleness,
endearment, embrace etc) on students and teachers speech. We can highlight, however, that in
the interactions at the classroom, observed through the filming analyses, the dichotomy
between affection and cognition doesn’t show importance, because the majority of teachers
demonstrated, through their postures and didactic procedures, a commitment with the the
learning of the students. So, the affectivity appears as an existing dimension and articulated
with the cognitive dimension in the classroom context, permeating the school contents too.
Key words: Affectivity; Interaction; Teacher/Student
SUMÁRIO
RESUMO ...................................................................................................................................6
ABSTRACT ...............................................................................................................................7
1 INTRODUÇÃO.....................................................................................................................10
2 AFETIVIDADE NA INTERAÇÃO PROFESSOR-ALUNOS ADOLESCENTES NO
CONTEXTO ESCOLAR .........................................................................................................17
2.1 AFETIVIDADE NO CONTEXTO HISTÓRICO-CULTURAL .......................................18
2.2 ADOLESCÊNCIA NA ABORDAGEM HISTÓRICO-CULTURAL...............................32
2.3 A ESCOLA NA VISÃO DE VIGOTSKI E WALLON.....................................................48
3 METODOLOGIA DA PESQUISA.......................................................................................67
3.1 PROCEDIMENTO DA COLETA DE DADOS ................................................................70
3.2 PROCEDIMENTO DA ANÁLISE DOS DADOS ............................................................72
3.3 CARACTERIZAÇÃO DA INSTITUIÇÃO.......................................................................74
3.4 CARACTERIZAÇÃO DOS PROFESSORES...................................................................75
4 AFETIVIDADE E APRENDIZAGEM: RESULTADOS DA PESQUISA..........................77
4.1 CONCEPÇÕES SOBRE AFETIVIDADE: ENTREVISTAS............................................77
4.1.1 Alunos..............................................................................................................................77
4.1.2 Professor Walter ..............................................................................................................79
4.1.3 Professor Julio .................................................................................................................81
4.1.4 Professora Maura.............................................................................................................83
4.1.5 Professor Lucas ...............................................................................................................84
4.1.6 Reflexões .........................................................................................................................85
4.2 RELAÇÃO ENTRE AFETIVIDADE E APRENDIZAGEM............................................88
4.2.1 Alunos..............................................................................................................................88
4.2.2 Professor Walter ..............................................................................................................90
4.2.3 Professor Julio .................................................................................................................90
4.2.4 Professora Maura.............................................................................................................91
4.2.5 Professor Lucas ...............................................................................................................92
4.2.6 Reflexões .........................................................................................................................93
4.3 DIFICULDADES RELACIONADAS À AFETIVIDADE. ..............................................95
4.3.1 Alunos..............................................................................................................................95
4.3.2 Professor Walter ..............................................................................................................96
4.3.3 Professor Julio .................................................................................................................97
4.3.4 Professora Maura.............................................................................................................99
4.3.5 Professor Lucas .............................................................................................................100
4.3.6 Reflexões .......................................................................................................................101
5 INTERAÇÕES E AFETIVIDADE NA SALA DE AULA.................................................104
5.1 Professor Walter ...............................................................................................................104
5.2 Professor Julio ..................................................................................................................111
5.3 Professora Maura..............................................................................................................116
5.4 Professor Lucas ................................................................................................................122
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ..............................................................................................130
REFERÊNCIAS .....................................................................................................................135
APÊNDICE A - ROTEIRO DE ENTREVISTAS: PROFESSORES E ALUNOS................140
APÊNDICE B – ESCLARECIMENTO AOS SUJEITOS DA PESQUISA - I .....................141
APÊNDICE C – ESCLARECIMENTOS AOS SUJEITOS DA PESQUISA - II..................142
APÊNDICE D – MODELO DO TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E
ESCLARECIDO.....................................................................................................................143
10
1 INTRODUÇÃO
Lembranças do passado remetem ao meu primeiro dia de aula, da série do atual
ensino fundamental. Uma menina tímida, introvertida, teria que enfrentar pela primeira vez
esse mundo novo e desconhecido: a escola (Grupo Escolar Francisco Gomes de Souza”
Guaíra – Estado de São Paulo).
Minha mãe me levou até o portão da escola e veio ao meu encontro a minha primeira
professora, D. Quita, que docilmente me pegou pela mão e me introduziu para o interior da
escola e em seguida à sala de aula.
Inicia uma trajetória que não foi fácil e que os anos sucessivos me mostraram
quantas dificuldades tive que enfrentar e superar para estar aqui hoje, escrevendo minha
dissertação de mestrado.
Dois outros fatos que pessoalmente considero dignos de serem mencionados na
minha experiência de aluna o importantes para que eu mesma, em meus momentos de
reflexão, pudesse compreender o porquê da escolha do meu tema de pesquisa: a afetividade na
interação professor-aluno adolescente. Na quarta série, a professora D. Betinha me chamou à
lousa para que eu respondesse uma questão, a qual não soube. Ela, irritada, puxou-me os
cabelos com as duas mãos sacudindo veementemente a minha cabeça. Este fato me deixou
extremamente envergonhada diante da classe. Sinto que esse episódio marcou-me muito e
acentuou a minha timidez e constrangimento em salas de aula, dificuldades que eu me esforço
para superar até hoje.
Mais tarde mudei-me para Ribeirão Preto e fui estudar no Colégio Nossa Senhora
Auxiliadora para cursar o 1º colegial (1ª série do atual Ensino Médio), nesta época eu tinha 15
anos de idade.
Foi nessa oportunidade que tive o privilégio de conhecer a irmã Clarisse, a minha
professora de psicologia. Seu rosto doce e sereno, sua voz baixa e calma, o seu jeito de falar,
de pedir silêncio para a classe erguendo o braço direito e falando um psiu... bem baixinho
estão presentes em minha memória.
A minha admiração por aquele ser humano foi marcante em minha vida, pois decidi
fazer psicologia e ser uma profissional especial em capacidade e dignidade, o quanto me
parecia ser aquela mestra inesquecível.
11
O tempo passou e hoje, diante dessa oportunidade de estudo e pesquisa, pretendo
investigar um assunto que sempre me despertou interesse que é o de conhecer, identificar,
compreender e analisar, sob alguns aspectos, como está sendo visto na teoria e na prática a
presença de afetividade na interação professor-aluno adolescente no âmbito escolar.
Olhar para esses jovens como pesquisadora que pretende entender a importância dos
vínculos afetivos no mundo da sala de aula, onde professor e aluno estão inseridos,
convivendo, aprendendo e se construindo como seres humanos é uma escolha como pessoa e
profissional, que espera dar sua pequena parcela de contribuição para a educação.
Ao iniciar uma revisão bibliográfica sobre o tema afetividade no âmbito da sala de
aula, no que diz respeito a sua presença na interação professor-aluno, bem como sua
influência no processo ensino-aprendizagem, observa que a existência de teorias e reflexões
sobre assunto aponta para o fato no qual a escola continua priorizando o conhecimento
racional em detrimento da dimensão afetiva.
Monte Serrat (2007, p.16) explica que: “A educação tradicional tem dado ênfase ao
desenvolvimento cognitivo, não reconhecendo a importância da dimensão emocional do ser
humano.” O autor procura discutir as relações entre as emoções e processo ensino e
aprendizagem, utilizando-se de várias vertentes teóricas.
Segundo Almeida (2005, p.11), “o estudo da vida afetiva em sua relação com o
desenvolvimento cognitivo representa ainda hoje uma lacuna nas pesquisas em psicologia. É
crescente o número de trabalhos realizados nessa área, todavia, são ainda pequenas as
contribuições para educação”.
Ainda de acordo com Almeida (2005), atualmente tem-se procurado dar ênfase aos
aspectos cognitivos relegando ao segundo plano o estudo dos aspectos afetivos fundamentais
para a compreensão do comportamento humano em interação social.
Monteserrat Moreno et al. (1999, p.13) informam que
Tudo o que concerne aos sentimentos, os afetos e as relações interpessoais, isto é,
aqueles conhecimentos que continuamente usamos em nossas relações com os
demais, parece não merecer nenhum tipo de educação, sendo dela excluídos e
deixados nas mãos do acaso, que tende a reproduzir as condutas imperantes do meio.
Os autores prosseguem explicando que não nada que justifique a educação
priorizar o aspecto cognitivo com exclusão do afetivo. E nesse sentido sugerem mudanças,
ressaltando-se o trabalho do professor como personagem fundamental na relação professor-
aluno e no processo ensino-aprendizagem.
12
Segundo Codo e Gazzotti (2006, p.50),
Todo trabalho envolve algum investimento afetivo por parte do trabalhador, quer
seja na relação estabelecida com os outros, quer mesmo na relação estabelecida
produto do trabalho.Mas o caso do professor é diferente, a relação afetiva é
obrigatória para o próprio exercício do trabalho, é um pré-requisito. Para que o
trabalho seja efetivo, ou seja, que atinja seus objetivos, a relação afetiva tem que ser
estabelecida.
Codo e Gazotti (2006) são categóricos ao colocar o afeto como elemento
indispensável na atividade de ensinar. Argumentam que para que a aprendizagem ocorra são
necessários muitos fatores: condições intelectuais e boa vontade por parte do aluno,
conhecimento e didática por parte do professor e tanto outros fatores, mas na visão deles a
afetividade concentra-se como fator principal.
O tema afetividade no cenário escolar, principalmente a respeito do dualismo que
separa afeto e cognição na relação educador e educando, traz questionamentos e dúvidas que
instigam, interessam e motivam uma investigação que busca compreender a presença da
afetividade nas interações estabelecidas entre professor e aluno na sala de aula.
Davis e Oliveira (1994, p.81-82), ao elucidar a importância das ligações afetivas,
explicam:
A presença do adulto à criança condições de segurança física e emocional que a
levam a explorar mais o ambiente e, portanto, a aprender. Por outro lado, a interação
humana envolve também a afetividade, a emoção, como elemento básico. Assim, é
através da interação com os indivíduos mais experientes do seu meio social que a
criança constrói as suas funções mentais superiores, como afirma Vygotski ,ou
forma a personalidade, como defende Freud.
Na concepção Vigotskiana, a constituição do sujeito humano, que envolve o seu
desenvolvimento e a construção do conhecimento, ocorre através das constantes interações
com outros membros da espécie, com o meio social e cultural em que vive, desde o seu
nascimento. Compreende-se, assim, que o indivíduo precisa crescer num ambiente social e
interagir com outras pessoas para se humanizar (REGO, 2000).
O tema afetividade no contexto escolar, tendo como foco a interação professor-aluno,
é visto como um assunto que se configura pela complexidade no campo educacional. Nessa
perspectiva, espera-se que esta pesquisa proporcione como contribuição, uma reflexão sobre
qual é o papel da afetividade na interação professor-aluno adolescente.
As relações sociais dos adolescentes são aspectos muito importantes nessa fase da
vida. Estas estão ligadas à tomada de consciência no que diz respeito ao seu papel social, a
afetividade e a interação que ocorre em vários grupos do qual participa: a família, o clube, a
13
escola, os amigos, a sociedade etc. É na escola que o adolescente passa a maior parte do seu
tempo em convivência com professores, amigos, diretores, coordenadores e funcionários.
É neste espaço de interação que o aluno se depara com conflitos, afetos e desafetos,
com facilidades e dificuldades, tanto de relacionamentos como de aprendizagem, e tantos
outros fatores que fazem parte da educação escolar, e, em particular a afetividade no processo
entre professores e alunos adolescentes. Com base na teoria de Vigotski, Rego (2000, p.104)
afirma:
A estrutura fisiológica humana, aquilo que é inato, não é suficiente para produzir o
indivíduo humano, na ausência do ambiente social. As características individuais
(modo de agir, de pensar, de sentir, valores, conhecimentos, visão de mundo etc.)
dependem da interação do ser humano com o meio físico e social.
Essa colocação da autora, baseada em Vigotski, esclarece muitos profissionais da
área da psicologia e da educação, que trabalham com a diversidade e complexidade do
comportamento do homem ligado a sua história de vida.
A teoria de Vigotski nos fornece bases para entender, segundo Rego (2000, p. 105),
que:
O desenvolvimento do sujeito humano e sua singularidade se a partir de
constantes interações com o meio social em que vive [...] Assim, o desenvolvimento
do psiquismo humano é sempre mediado pelo outro (outras pessoas do grupo
cultural) que indica, delimita e atribui significado a realidade. Por intermédio dessas
mediações, os membros imaturos da espécie vão pouco a pouco se apropriando dos
modos de funcionamento psicológico, do comportamento e de cultura, enfim, do
patrimônio da história da humanidade e seu grupo cultural.
Nessa perspectiva, consegue-se dimensionar o valor das interações sociais de forma
geral, mas, principalmente, entre professor e aluno no contexto escolar. Nesse sentido,
destaca-se o papel do professor como mediador principal na interação na qual circulam
informações, conhecimentos, cooperação, valores, experiência e afeto, participando
ativamente do desenvolvimento e da formação do indivíduo.
Sabe-se que a escola é uma imensa instituição social, fundamental na constituição do
aluno adolescente, pois é por meio da interação entre ele e esse companheiro mais experiente
professor ou colega que possui mais conhecimentos que o aluno vai construindo novos
aprendizados, habilidades e significações.
14
Segundo Rego (2000), Vigotski sugere um novo enfoque sobre a gênese humana,
que veio possibilitar um jeito diferente de olhar a escola, o conhecimento, a criança, o
adolescente e a importância da intervenção pedagógica.
É importante ressaltar, também, nesse campo de estudo, a abordagem de Wallon,
para um aprofundamento da visão do ser humano, que se completa e se integra nos aspectos
biológico e social.
Encontramos este enfoque em uma frase conhecida de Wallon, citada por Zazzo
(1978, p. 26):
Jamais pude dissociar o biológico do social, não porque os creia redutíveis um ao
outro, mas porque me parecem, no homem, tão estreitamente complementares desde
o nascimento que é impossível encarar a vida psíquica de outro modo, que não seja
sob a forma de suas relações recíprocas.
Esta idéia representa um dos eixos principais da teoria de Wallon, que é integração
em dois sentidos: integração organismo-meio e integração cognitiva-afetiva-motora.
Segundo Galvão (1995), o autor não aceita selecionar somente um aspecto do ser
humano e isolá-lo do conjunto. Explica que ele propõe o estudo integrado do
desenvolvimento, que envolve os vários campos funcionais presentes na atividade infantil:
afetividade, motricidade e inteligência.
Galvão (1995) afirma que Wallon “vê o desenvolvimento da pessoa como uma
construção progressiva em que se sucedem fases com predominância alternadamente afetiva e
cognitiva” (p. 43). Cada uma dessas fases corresponde a cinco estágios estabelecidos pela
psicogenética de Wallon.
O estágio impulsivo emocional diz respeito ao primeiro ano de vida da criança, no
qual ocorre o predomínio da afetividade que direciona as primitivas reações do bebê às
pessoas à sua volta, as quais por sua vez, fazem a sua intermediação com o mundo físico
(GALVÃO, 1995).
O estágio sensório-motor e projetivo se prolonga até o terceiro ano de vida da
criança, proporcionando a ela maiores recursos no uso e manipulação de objetos e capacidade
de explorar espaços (GALVÃO, 1995). Destaca-se como ponto principal deste estágio, o
desenvolvimento da função simbólica da linguagem.
Informa também Galvão (1995) que o estágio do personalismo, que se estende na
faixa etária dos 3 aos 6 anos, tem como função essencial o processo de formação da
personalidade, a formação da consciência, que ocorre através das interações sociais. Nesse
15
estágio ocorre a retomada do interesse da criança para as pessoas ao seu redor, marcando a
volta da predominância das relações afetivas.
Galvão (1995) ainda esclarece que mais ou menos aos 6 anos de idade inicia-se o
estágio categorial. Nessa etapa, o avanço intelectual comanda o interesse da criança para a
busca e conhecimento do mundo.
A autora corrobora que a puberdade causa uma ruptura no período de tranqüilidade
afetiva que marcou o estágio categorial, passando a solicitar um novo perfil de personalidade,
afetado devido às conseqüências das alterações e modificações corporais e emocionais do pré-
adolescente. Esse é um processo intenso na vida do jovem adolescente que terá que lidar com
aspectos internos de natureza pessoal, moral e existencial, revivendo a predominância da
afetividade.
De acordo com Dantas (1995) esse movimento de alternância no desencadear dos
estágios trata-se do princípio de alternância funcional.
Nesse sentido, argumenta a autora que:
Apesar de alternarem a dominância, afetividade e cognição não se mantêm como
funções exteriores uma a outra. Cada uma ao reaparecer como atividade
predominante num dado estágio, incorpora as conquistas realizadas pela outra, no
estágio anterior, construindo-se reciprocamente, num processo de integração e
diferenciação. (DANTAS, 1995, p. 45).
Compreende-se, assim, que esse processo de alternância entre aspectos cognitivos e
afetivos são essenciais no desenvolvimento do indivíduo do nascimento à adolescência, na
qual a afetividade passa a ser mais racionalizada e os sentimentos mais elaborados.
Interessante se faz sinalizar a observação de Dantas (1995), de que mesmo na vida
adulta, o movimento pendular continua em ação no decorrer da existência de cada ser
humano, que às vezes está mais centrado na realidade do mundo exterior e outras vezes
voltado para si próprio.
Essas informações constituem as bases fundamentais para a compreensão dos
sujeitos do presente estudo: alunos adolescentes e professores do Ensino Médio, no âmbito da
sala de aula, na qual elementos afetivos e intelectuais estão presentes e se interpenetram em
todas as manifestações do conhecimento.
Desse ponto decorre o problema dessa pesquisa: Qual o papel da afetividade na
interação professor-aluno adolescente na sala de aula? Quais elementos fazem parte da
afetividade nesse processo? O vínculo afetivo entre aluno e professor facilita a aprendizagem?
16
Essas indagações levaram ao objetivo desse trabalho de pesquisa: identificar e
analisar concepções e interações, no campo da afetividade, de professores e alunos
adolescentes em sala de aula do Ensino Médio.
Para o desenvolvimento desse estudo optou-se pela abordagem histórico-social de
Vigotski e Wallon, com ênfase na conceituação da afetividade, adolescência e interações
sociais.
No capítulo que se segue são apresentadas as questões teóricas que guiaram esse
trabalho. Na seqüência, o capítulo três trata das questões metodológicas da pesquisa. Os
capítulos quatro e cinco apresentam os resultados com as análises dos dados e as
considerações finais, respectivamente.
17
2 AFETIVIDADE NA INTERAÇÃO PROFESSOR-ALUNOS ADOLESCENTES NO
CONTEXTO ESCOLAR
Percebe-se que o mundo atual atravessa um momento especial, no qual ocorrem
muitas transformações, principalmente pelo uso das novas tecnologias e, como conseqüência,
uma série de relações virtuais.
É por essa e outras razões que são depositadas, no campo educacional, expectativas
de formação das novas gerações, de modo a garantir-lhes a condição de sujeitos autônomos,
participativos, em consonância aos apelos da sociedade democrática que valoriza a
diversidade cultural, social, os direitos individuais, porém, dentro de circunstâncias
limitadoras, tal como a influência política, a qual a escola e a educação sempre viveram e
ainda vivem.
Ser um educador é ter uma profissão na qual a interação pode ser vista como um
motor gerador do relacionamento e da comunicação entre professores e alunos; e a
afetividade, o combustível necessário para que se possa acionar o vínculo entre ambos
(professor/ aluno).
Tudo isso deve estar somado à história individual e experiência adquirida pelos
sujeitos para que se possa atingir o proposto no processo de ensino-aprendizagem, que é a
produção de conhecimentos.
Para que a educação escolar possa adquirir significado na vida do alunado, ela deve
levar em conta a aprendizagem que permeia o cotidiano dos alunos adolescentes, e
aprendizagem se na interação. É nesse sentido que se pretende observar a presença da
afetividade e cognição como aspectos principais da interação entre docentes e alunos.
A dimensão afetiva no âmbito escolar tem se configurado como um tema complexo
pelo fato de trazer à tona muitas dúvidas e questionamentos devido a seu caráter subjetivo.
Talvez este seja apenas um dos motivos para se navegar nas águas misteriosas, às vezes
calmas, outras agitadas e turbulentas, da afetividade.
O universo escolar é dinâmico, rico em informações, conhecimento, interações,
desenvolvimento e crescimento pessoal e coletivo. É importante que os sujeitos desse
universo - professores e alunos - possam reconhecer e compreender durante todo o caminho
de suas vidas seja como aluno ou docente, que a afetividade expressa ou não, valorizada ou
não, vivenciada ou não, existe e pulsa no âmago da sua subjetividade. Para entender a
18
presença dos afetos na subjetividade dos sujeitos e seu processo de interação e “construção
cultural da significação”, usar-se-á, como base fundamental, o aporte teórico histórico-cultural
de Vigotski e a teoria psicogenética de Wallon. Sob a luz das teorias sócio-interacionistas,
serão construídos os pilares de sustentação do papel da afetividade na interação professor-
aluno adolescente.
2.1 AFETIVIDADE NO CONTEXTO HISTÓRICO-CULTURAL
A afetividade pode ser abordada segundo diferentes perspectivas, dentre outras, a
filosófica, a psicológica e pedagógica. Nesse trabalho, a afetividade é abordada no aspecto
psicológico, mas reservando o seu enfoque principal para a perspectiva pedagógica, ou seja,
tendo em vista a interação na relação educativa que se estabelece entre professores e seus
alunos, no contexto da sala de aula.
O conceito de afetividade encontrado no dicionário de psicologia é o seguinte:
“Noção de uma extensão e de uma compreensão muito vagas, englobando estados
tão diversos como as emoções, as paixões, os sentimentos, a ansiedade, a angústia, a tristeza,
a alegria e até as sensações de prazer e dor” (DORON e PAROT, 2001, p. 35).
Dois outros conceitos se fazem complementares para estudo do tema afetividade:
“afeto” e “afetuoso” No Novo Dicionário Aurélio, (2004) encontrou-se: afeto: “afeto por
alguém; inclinação, simpatia, amizade, amor, [...] elemento básico da afetividade.”
“Afetuoso: que demonstra afeto; cheio de afeto; carinhoso; afetuoso abraço;
maneiras afetuosas.” (FERREIRA, p.61, 2004)
O estudo da vida afetiva, de forma geral, requer adotar-se uma terminologia
adequada, uma vez que esta é uma área de estudo subjetiva e complexa, repleta de definições
e conceitos que se aproximam no conteúdo, embora divergentes no ponto de vista de
pensadores e autores com enfoques voltados paras as linhas e abordagens específicas de cada
um.
De acordo com Bock et. al (2002), necessidade do estudo da vida afetiva na
psicologia por ser ela parte integrante da subjetividade humana. Muitas das expressões do
comportamento da pessoa não poderão ser devidamente compreendidas se não for
considerado o seu lado afetivo.
19
Nessa perspectiva, é fundamental saber que em vários momentos e circunstâncias da
vida, são os afetos que determinam o comportamento do indivíduo.
Segundo Bock et. al (2002, p. 192):
Os afetos podem ser produzidos fora do indivíduo, isto é, a partir de um estímulo
externo meio físico ou social ao qual se atribui um significado com tonalidade
afetiva: agradável ou desagradável, por exemplo. A origem dos afetos pode também
nascer, surgir do interior do indivíduo [...].
O prazer e a dor são as matizes psíquicas dos afetos, ou se constituem afetos
originários. Entre estes dois extremos encontram-se inúmeras tonalidades,
intensidades de afetos, que podem ser vagos, difíceis de nomear ou discriminados.
Percebe-se, pela colocação dos autores, que compreender, entender, nomear,
identificar, avaliar a dimensão afetiva é um fenômeno muito complexo. Esta é uma forte razão
para se estudar e pesquisar a vida afetiva com um enfoque específico em um determinado
grupo de sujeitos, como na questão presente, que é o papel da afetividade na interação
professor-aluno adolescente.
É importante acrescentar que Bock et. al (2002) colocam que os afetos têm uma
característica fundamental: o fato deles estarem ligados à consciência do indivíduo, o que
permite às pessoas envolvidas na interação afetiva dizer ao outro o que está sentindo,
expressando pela linguagem suas emoções.
Apesar desse lado importante que é a expressão dos sentimentos afetivos, estes
possuem seu lado enigmático e confuso ao próprio indivíduo. Como, por exemplo, alguém
pode ser grato a uma pessoa de quem se tem raiva, ou gostar de alguém que lhe trate mal, ou
com indiferença, e assim por diante. Basta uma observação mais atenta das pessoas aos
sentimentos e afetos para perceber o quanto confuso e contraditório eles são.
Bock et. al (2002) esclarecem que isto ocorre porque existem motivos na área dos
afetos que estão fora do campo da consciência e por isso, nem mesmo a pessoa que sente e
vivencia esses afetos consegue explicar. A pessoa identifica esses sentimentos como
estranhos, incompreensíveis, contraditórios, como algo que está fora do lugar”, mas que ela
própria não consegue explicar.
Falar de afeto nos remete a outro aspecto fundamental da subjetividade do indivíduo:
as emoções.
Para Bock et. al (2002, p. 194):
As emoções são expressões afetivas acompanhadas de reações intensas e breves do
organismo, em resposta a um acontecimento inesperado ou, às vezes, a um
acontecimento muito aguardado [...].
20
Nas emoções é possível observar uma relação entre os afetos e a organização
corporal, ou seja, as reações orgânicas, as modificações que ocorrem no organismo,
como distúrbios gastrointestinais, cardiorrespiratórios, sudorese, tremor.
Através das experiências adquiridas ao longo da vida, o indivíduo compreende que
várias reações orgânicas acompanham as emoções expressando comportamentos emocionais,
tais como: tremor, riso, choro, lágrimas, expressões faciais e corporais.
A compreensão sobre reações do organismo com relação às emoções favorece
também recursos para que as pessoas possam interpretar com discernimento certos
comportamentos do sujeito. Por exemplo, percebe-se diferença no choro de tristeza, com o
choro de alegria, o riso de alegria, do riso de nervosismo.
Entende-se que as emoções estão ligadas à vida afetiva e podem ser consideradas
como uma forma de linguagem na qual se expressam percepções, sensações, pensamentos,
sentimentos. Estas são muitas: surpresa, raiva, nojo, medo, vergonha, alegria, tristeza,
satisfação e outras. São exemplos de emoções que são muitas vezes intensas, passageiras, e
não de longa duração e nem imutáveis. Uma situação que no momento presente pode
emocionar uma pessoa, no futuro pode não emocionar mais.
É motivo de inquietação para muitos profissionais da área da educação, entre eles,
pedagogos, psicólogos, professores e pesquisadores, observar na prática docente o fato da
escola não considerar devidamente a dimensão afetiva como importante no processo de
ensino - aprendizagem. Com efeito, a escola na maioria das vezes, privilegia o conhecimento
racional e objetivo em detrimento do aspecto afetivo nas interações em sala de aula. Apesar
dessa realidade de dicotomia reivindica-se uma atenção especial a importância da afetividade
na escola.
Arantes (2006, p.02) é defensora da idéia de que não se pode separar dimensão
afetiva e cognitiva, dizendo que:
Partimos da premissa de que no trabalho educativo cotidiano não existe uma
aprendizagem meramente cognitiva ou racional, pois os alunos e as alunas não
deixam os aspectos afetivos que compõem sua personalidade do lado de fora da sala
de aula, quando estão interagindo com os objetos de conhecimento, ou não deixam
“latentes” seus sentimentos, afetos e relações interpessoais enquanto pensam.
As colocações da autora parecem ser adequadas e coerentes, uma vez que, sendo o
homem um indivíduo, é portanto um ser único e indivisível e tanto os aspectos afetivos
quanto os cognitivos relativos ao conhecimento compõem uma unidade.
Explica Arantes (2006) que a presente dicotomia entre afeto e cognição pode ter suas
raízes no passado, onde filósofos da Grécia Antiga, como Platão e Descartes postularam a
21
dicotomia entre razão e emoção, o que é explícito na famosa frase “Penso, logo existo” de
Descartes, que reflete a supremacia e predomínio do pensamento e do raciocínio do homem
na época, como atributo e valor por excelência.
É válido observar que esses enunciados da filosofia venceram a barreira do tempo
permanecendo vivos até hoje, expressos de outras formas de tal maneira que ditados
populares recomendam a jovens e adultos diante de determinadas situações a “agir com a
razão e não com o coração”. Dessa forma, fica subentendido que uma pessoa poderá tomar
uma decisão acertada, caso atenção maior para o racional, deixando de lado as emoções e
sentimentos.
Poder-se-á dizer que emoção e razão são “duas forças” complexas com conteúdos
internos e externos que exercem influência nas ações e comportamentos de naturezas
variadas, tais como individuais, familiares, sociais, religiosas e culturais.
Segundo Arantes (2006), na história da psicologia ocorreu que, por influência da
filosofia, as teorias psicológicas estudaram separadamente os processos cognitivos e afetivos.
Essa separação resultou de certa forma, numa visão distorcida da realidade, trazendo
conseqüências nas pesquisas científicas e principalmente, na educação da atualidade.
De acordo com Arantes (2006), o interesse em desfazer a dicotomia entre razão e
emoção e as dimensões cognitivas e afetivas da função psíquica humana, pode ser identificada
em recentes estudos de neurologia.
A autora cita o neurologista Antonio Damásio, autor do livro O erro de Descartes”,
no qual “postula a existência de uma forte interação entre razão e as emoções, defendendo a
idéia de que os sentimentos e as emoções são uma percepção direta de nossos estados
corporais e constituem um elo essencial entre o corpo e a consciência” (DAMÁSIO, 1996
apud ARANTES, 2006, p.6).
Outras colocações da autora a respeito das pesquisas e observações do médico
pesquisador se associam sempre no sentido de confirmar a importância e principalmente
reconhecer a união inseparável da razão e a emoção.
Em resumo, Arantes (2006) explica que “Damásio rompe também com a idéia
cartesiana de uma mente separada do corpo”. Como ele mesmo já apontou na frase já
conhecida e sempre citada – “Penso, logo existo” devesse ser substituída pela anticartesiana
– “Existo e sinto, logo penso” (p. 08).
Na verdade, pensar e sentir, embora estejam resumidos em dois verbos no infinitivo,
consegue dar a idéia de integração da condição do homem que determina o existir, como
condição básica da vida do ser humano.
22
Sastre e Moreno (2003) expressam também a idéia contrária de uma suposta
oposição entre afetividade e cognição, ao colocarem que tal oposição vem a ser um dos
grandes “mitos culturais”, que influenciaram o comportamento das pessoas, em ambos os
níveis (afetivo e cognitivo) e, como conseqüência, influenciou o modo que as funções
cognitivas e afetivas foram tratadas na educação. Ou seja, que a cognição pode ser uma
função capaz de levar o indivíduo a comportamentos “racionais” e “inteligentes”. Enquanto
que, o espaço das emoções não deve ser ocupado pela educação formal, uma vez que ele
pertence ao lado particular, pessoal e se encontra na polaridade oposta do público e do
racional.
Nessa breve reflexão sobre a dicotomia entre razão e emoção e conseqüentemente,
entre cognição e afetividade, observou-se que se deve evitar a polarização entre a afetividade
e cognição em todos os campos, inclusive na educação.
Surge então uma pergunta pertinente ao assunto em questão: Como, então, superar a
dicotomia entre cognição e afetividade no campo educacional e reivindicar uma educação
integral?
Arantes (2003) sugere idéias que possam envolver um planejamento pedagógico nos
quais possibilite o desenvolvimento de ações que favoreçam os alunos a construírem
personalidades conscientes da importância de seus sentimentos e afetos tanto quanto é o
conhecimento dos conteúdos escolares nas conquistas e realizações tanto na vida pessoal
como profissional.
Nesse sentido, é pertinente a colocação de Araújo (2003, p. 167), que diz:
Sem conhecermos nossos próprios sentimentos e emoções, e sem reconhecer os
sentimentos e emoções das pessoas a nossa volta, por meio da consciência, não
temos como agir eticamente no mundo. É nesse ponto que também aparece o papel
dos valores, como elementos pertencentes à dimensão afetiva e que, se construídos
como centrais a identidade das pessoas, sendo de natureza moral, atuarão regulando
eticamente seus pensamentos e ações. Tais pressupostos nos levam a defender
propostas de uma educação em valores em que a dimensão afetiva, e também a
cognitiva, a biológica e a sociocultural, assim como o universo físico, interpessoal e
sociocultural das relações humanas, são considerados no planejamento curricular e
nos projetos político-pedagógico das escolas.
O autor justifica seu pensamento, argumentando que se a escola que tem por objetivo
formar jovens cidadãos é preciso dar oportunidade aos seus alunos de desenvolverem
habilidades para lidar de forma lúcida e responsável com a diversidade, o conflito de idéias, a
influência do meio, da cultura, que se somam com as emoções presentes nas relações que eles
estabelecem consigo próprio e o mundo ao seu redor.
23
Conclui-se esta reflexão com a citação de Araújo (2003, p. 167), pautada pelo bom
senso:
As propostas apresentadas para se atingir essas finalidades buscam reorganizar os
tempos, os espaços e relações escolares por meio da inserção no currículo de
conteúdos contextualizados na vida dos alunos e alunas relacionados aos
sentimentos, às emoções e a valores éticos desejáveis por nossa cultura.
Ambos os autores, Arantes (2003) e Araújo (2003), acreditam que algumas ações são
possíveis de serem realizadas para que se possam enriquecer os objetivos almejados por
educadores que buscam a edificação de comunidades escolares mais justas, solidárias e
satisfatórias. Tais propostas não são apenas belas e nobres, mas principalmente otimistas.
Porém, sente-se que ainda não estão perto de sua prática, ficando apenas com as alternativas e
a esperança de que suas propostas possam ser colocadas em prática num futuro próximo,
como alternativa viável a toda área educacional.
Independentemente da intenção e do desejo de que estas idéias possam vir fazer parte
da realidade do futuro, espera-se que os professores do presente, no exercício da sua função
não sejam meros transmissores de conhecimento, mas mestres atentos e comprometidos no
sentido de que podem focar o seu olhar na conexão existente entre cognição e afeto no campo
da educação.
Vigotski escreveu textos relacionados à temática da afetividade referindo-se a esse
assunto como estudo das emoções. Ele defendia a idéia de que os sentimentos têm relação
direta com a expressão corporal.
Segundo Vigotski (2004, p. 128) “os sentimentos fortes parecem escritos na testa de
cada um, e ao olharmos para uma pessoa podemos entender sem maiores esclarecimentos se
ela está furiosa ou assustada ou curtindo o ócio”.
Afirma Vigotski (2004) que a emoção é um conjunto de reações que estão inter
relacionadas aos reflexos, que por sua vez, recebem o comando dos estímulos. Ressalta ainda
que, os sentimentos não ocorrem sozinhos em condições normais. Eles surgem antes de um ou
outro estímulo, de uma ou outra causa, que poderá ser externa ou interna. “O que nos faz ter
medo ou sentir alegria é o estímulo de onde começa a resposta” (VIGOTSKI, 2004, p. 131).
De acordo com Vigotski (2004, p.132) a natureza biológica das emoções está
presente em todo ser humano:
24
É especialmente clara a raiz instintiva das emoções nos sentimentos mais primitivos,
mais elementares, os chamados sentimentos inferiores [...] É fácil perceber que todas
as mudanças físicas acompanhadas do medo têm origem biologicamente explicável.
todos os fundamentos para se supor que outrora todas aquelas reações somáticas
e secretórias que integram a emoção como forma integral de comportamento
formavam uma série de reações adaptativas úteis de caráter biológico.
Para Vigotski (2004) as emoções primitivas, tais como o medo e a raiva são
sentimentos ligados à raiz instintiva biológica. Mas, no decorrer do desenvolvimento, as
emoções vão se transformando, afastando-se da origem biológica e se constituindo como um
fenômeno histórico e cultural. Compreende-se que as emoções primitivas são transformadas
na medida em que o homem se apropria dos instrumentos culturais, resultando na modificação
do lugar das emoções na relação do homem com o mundo, ocupando assim, um outro espaço
na dinâmica da personalidade.
Elucida Vigotski (2004, p. 134) que: “O medo e a fúria de um cão são mais fortes e
mais expressivas que a fúria de um selvagem; os mesmos sentimentos no selvagem são mais
impulsos do que na criança; na criança são mais nítidos do que no adulto”. O autor destaca
aqui o processo de transição e transformação da ação das emoções primitivas do animal para
as experiências emocionais mais sutis e elaboradas no homem por influência do meio social e
cultural.
Ao falar sobre educação de sentimentos, Vigotski (2004, p. 143), diz ainda que:
Nenhuma forma de comportamento é tão forte quanto aquela ligada à emoção [...] as
reações emocionais exercem a influência mais substancial sobre todas as formas de
nosso comportamento e os momentos do processo educativo [...] sempre que
comunicamos alguma coisa a algum aluno devemos procurar atingir o seu
sentimento.
Nota-se que o autor ressalta o valor das reações emocionais no processo educativo
não apenas como um recurso a mais para ser usado pelo professor, mas, porque ele acredita
realmente que são as reações emocionais na sua função de estrutura e suporte que podem e
devem ser o alicerce do processo educativo.
Vigotski (2004, p.144) deixa a marca do conhecimento, da sensibilidade e do valor
das emoções no processo ensino-aprendizagem:
São precisamente as reações emocionais que devem constituir a base do processo
educativo. Antes de comunicar esse ou aquele sentido, o mestre deve suscitar a
respectiva emoção do aluno e preocupar-se que essa emoção esteja ligada a um
novo conhecimento. Todo resto é saber morto que extermina qualquer relação viva
com o mundo.
25
É evidente, na visão de Vigotski, a importância do aspecto emocional do sujeito na
aprendizagem, e que este deve ser motivo de interesse na educação, tanto quanto é a
inteligência e a cognição.
Outros apontamentos, dignos de serem mencionados sobre cognição e afetividade,
são feitos por Oliveira e Rego (2003), que dizem que o sistema cognitivo e afetivo, o modo
como cada um pensa e sente, é recheado de conceitos, conhecimentos, idéias, valores, crenças
e inter-relacionamentos sociais.
Tudo isso diz respeito aos signos e instrumentos, os principais elementos mediadores
dos processos psicológicos.
Oliveira e Rego (2003, p. 28):
Nessa perspectiva pode-se afirmar que a afetividade humana é construída
culturalmente. Emoções relacionadas ao ciúme e à traição, por exemplo, são
certamente diferentes em sociedades monogâmicas e poligâmicas; [...]; o medo da
morte terá caráter distinto em grupos em que crença na reencarnação e naqueles
nos quais a vida é concebida como fenômeno biológico que termina com a morte.
As emoções são, portanto, organizadas, concebidas e nomeadas de forma
absolutamente diversa em diferentes grupos culturais.
É necessário compreender também, que no plano da sociogênese (relacionada à
história de cada grupo cultural) a linguagem ocupa uma posição relevante como recurso que
permeia a expressão da afetividade, uma vez que o sujeito pode, através das palavras,
conceituar, identificar, controlar e, principalmente, dividir com os outros seus próprios
sentimentos e emoções.
Sintetizando o entendimento essencial na teoria de Vigotski, com relação à
constituição do sujeito, a sua individualidade começa com as experiências oferecidas pela
cultura, na qual o sujeito está inserido. Sabe-se, portanto, que a longa trajetória do
desenvolvimento do ser humano, acontece do social para o individual.
É fundamental relembrar que esse ser humano aprende através da herança da sua
cultura e na interação com outros seres humanos. “E que também aprende a pensar, a falar, a
agir e a sentir como um latino, como um brasileiro, como um paulista, como um aluno. Nesse
sentido o longo aprendizado sobre emoções e afetos se inicia nas primeiras horas de vida de
uma criança e se prolonga por toda sua existência” (OLIVEIRA e REGO, 2003, p. 23).
Sabe-se através de relatos e estudos de vários autores, como Arantes (2003), que na
própria história da psicologia, as dimensões cognitivas e afetivas do indivíduo foram tratadas
de forma separada.
26
Essa dicotomia tem sido contestada por diversos motivos, discutidos
anteriormente, e atualmente observa-se um movimento crescente de psicólogos e educadores
para que se possa pensar de modo articulado essas duas dimensões o afetivo e cognitivo
conscientes que são do valor insubstituível de cada uma.
É uma busca no sentido de “humanizar” o conhecimento, com o objetivo de que os
professores e educadores, de forma geral possa se esforçar para desenvolver e vivenciar
paralelamente na teoria e na prática a integração afetiva e cognitiva na constituição do ser
humano. (ARANTES, 2003).
Os estudos de Vigotski, no que diz respeito à teoria das emoções, vêm preencher essa
lacuna na qual a educação foi construída, de forma dualista, isto é, uma educação que
fragmenta o homem em corpo e mente, orgânico e social, herdado e adquirido e tratou
também de forma polarizada a relação entre intelecto e afeto. (REGO, 1995)
De acordo com Vigotski (2001, p. 25):
Quien separa desde um comienzo el pensamento del afecto se cierra para sempre la
posibilidad de explicar lãs causas del pensamento, porque um analisis determinista
presupone descubrir sus motivos, las necessidades e enteresses, los impulsos y
tendências que rigen el movimento del pensamiento em uno u outro sentido. De
igual modo, quien sepra el pensamento del afecto niega de antemano la posibilidad
de estudiar la influencia inversa del pensamento em el plano afectivo, volitivo, de la
vida psíquica, porque um analisis determinista de esta ultima excluye tanto atribuir
al pensamento um poder mágico capaz de hacer depender el comportamento
humano única y absolutamente de um sistema interno del individuo, como
transformar el pensamento em um apéndice inútil del comportamiento, em uma
sombra suya innecesaria e impotente.
Para Vigotski (2001), quem separa o pensamento do afeto acaba com a possibilidade
de explicar as causas do pensamento, que estariam ligadas aos motivos, as necessidades e
interesses, os impulsos, enfim, questões ligadas à afetividade. Por outro lado, separar o
pensamento do afeto nega, antecipadamente, a possibilidade de estudar a influência do
pensamento no plano afetivo.
Oliveira (1992) afirma que Vigotski considera a união entre os processos cognitivos
e afetivos. Esclarece, principalmente, que o pensamento tem a sua origem no campo da
motivação que envolve inclinações, necessidades, interesses, impulsos, afeto e emoção. Nesse
contexto, uma compreensão abrangente do pensamento humano, é admissível quando se
compreende sua base afetiva, ou seja, as razões que impulsionam os pensamentos encontram
suas origens nas emoções.
Romper com a polarização entre afetividade e cognição implica em compreender que
essas funções o estão dissociadas no homem, pelo contrário, elas se inter-relacionam e
27
mantêm influências recíprocas durante todo o percurso da história do desenvolvimento do ser
humano. Embora elas sejam diferentes, formam uma unidade no processo dialético do
desenvolvimento psíquico. (REGO, 1995)
Esses fatores explicam porque as funções afetivas e cognitivas não podem ser
compreendidas separadamente. Sendo assim, justifica-se a necessidade de uma abordagem
unificadora das funções intelectuais e afetivas no funcionamento psicológico do homem.
(REGO, 1995)
Gonçalves (2003) nos alerta que é preciso dar atenção ao aspecto afetivo, para não
cometer o engano de se trabalhar apenas com o real (conhecimento), sem levar em conta o
lado no qual se trabalha a constituição do sujeito, importante e necessário para o seu
desenvolvimento completo.
A autora afirma que todo domínio do significado e sentido, embora passe obviamente
por uma ação cognitiva, passa também pelo aspecto afetivo.
Diante de tais afirmações é preciso concordar com Gonçalves (2003, p. 115) quando
diz que: “O trabalho do professor consiste em fazer não só que os alunos pensem e assimilem,
mas que também sintam aquilo que estão aprendendo”.
Essa é uma grande verdade: pensar não basta, é preciso sentir o que se aprende. E
esse sentir pode assumir diferentes características: com o colorido do afeto pode-se realizar
um aprendizado motivado e prazeroso, mas por outro lado Vigotski (2004, p. 143) afirma que
“nenhuma pregação moral educa tanto quanto uma dor viva, um sentimento vivo [...]”.
Destaca-se aqui a presença constante das emoções, e seu papel no aprendizado, seja ele com
que nuance for. E a consciência dessa nuance pelo professor é que pode fazer a diferença.
Paralelamente a Vigotski, faz-se imprescindível conhecer o terreno das emoções e da
afetividade também na abordagem de Wallon, cuja contribuição foi muito relevante.
De acordo com Galvão (1995, p. 61):
As emoções, assim como os sentimentos e os desejos são manifestações da vida
afetiva. Na linguagem comum costuma-se substituir emoção por afetividade,
tratando os termos como sinônimos. Todavia, não oo. A afetividade é um
conceito mais abrangente, no qual inserem várias manifestações.
A autora faz distinção dos termos (emoção/afetividade) que muito comumente são
usados como sinônimos inadequadamente, uma vez que as emoções fazem parte da vida
afetiva, sendo que esta engloba outras expressões e manifestações do comportamento
humano.
28
De acordo com Galvão (1995), as emoções se manifestam através de uma gama de
alterações orgânicas, tais como taquicardia, dificuldade na respiração, digestão, entre outros.
A emoção provoca também mudanças de postura, alteração na expressão facial e
gestual, enfim, diversas reações do corpo físico, que são conseqüências de estados afetivos
bons ou ruins, agradáveis ou desagradáveis.
Almeida (2005) relata o fato da escola ignorar a união entre o afetivo, o cognitivo e o
motor. Apesar da escola ser uma instituição educativa e transmissora de conhecimento mas
que, possivelmente desconheça o fato de que ela lida com vários outros aspectos importantes
além do cognitivo, assim como o afetivo e o motor, de acordo com as teorias de Wallon.
Outro fator também desconhecido da educação sistemática é que existe
reciprocidade, integração e nutrição entre a afetividade e a inteligência.
Almeida (2005) esclarece que é importante entender os processos gradativos da
inteligência, pois à medida que ela alcança novas fases, a afetividade vai se tornando mais
racional. Nesse sentido compreende-se que os êxitos alcançados no terreno da inteligência são
incorporados no terreno da afetividade e vice-versa. Dessa forma, a evolução integral do
indivíduo depende muito da ação recíproca entre a inteligência e a afetividade.
De acordo com Almeida (1999, p. 49-50):
Antes de tudo, devemos saber que a personalidade, para Wallon, é constituída,
basicamente por duas funções: a afetividade e a inteligência [...]
Antes de qualquer separação entre afetividade e a inteligência, existe uma integração
que lhes permite conviver concomitantemente, mesmo quando o período é propício
para a preponderância de apenas uma delas. A afetividade, assim como a
inteligência, não aparece pronta nem permanece imutável. Ambas evoluem ao longo
do desenvolvimento: são consideradas e se modificam de um período a outro, pois, à
medida que o indivíduo se desenvolve, as necessidades afetivas se tornam
cognitivas.
A autora ressalta a integração das duas funções: da afetividade e a inteligência na
dinâmica da personalidade. Coloca também que essa integração, possibilita uma convivência
simultânea entre elas, mesmo quando ocorre o período de predominância de uma delas.
Afetividade e inteligência evoluem no decorrer do processo de desenvolvimento,
sendo construídas e modificadas de uma fase a outra, uma vez que, na proporção que o
indivíduo se desenvolve, as necessidades afetivas vão se tornando cognitivas.
A emoção como componente fundamental da afetividade, destaca-se na teoria
walloniana devido a sua importância e presença marcante a partir do nascimento do indivíduo
(ALMEIDA, 1999).
29
No princípio da vida, elas têm o dever de garantir a sobrevivência da espécie. É
através das emoções que o bebê mobiliza as pessoas a sua volta para atendimento de suas
necessidades.
Almeida (1999) elucida que é através da convivência com o social na interação com
os outros, que as emoções rudimentares, presentes desde o início da vida da criança, vão se
tornando cada vez mais socializadas.
Segundo Almeida (1999, p. 72) as emoções dispõem de certos mecanismos para
atuar no mundo social na concepção de Wallon:
Contagiosidade, capacidade de contaminar o outro, de transmitir-lhe o seu prazer ou
desprazer; a plasticidade, capacidade de refletir no corpo os sinais da emoção, por
exemplo, rubor na face; a contração do músculo; a regressividade, que é a
capacidade da emoção de fazer regredir as atividades de raciocínio e é nesse
mecanismo que se evidenciam as relações com o domínio funcional do
conhecimento; e a labilidade, capacidade de uma emoção se transformar em outra.
Essa passagem pode ocorrer entre duas emoções opostas, tais como alegria e a
cólera.
Essas informações são básicas para compreender a complexidade, a intensidade e as
conseqüências emocionais no ser humano, em vários aspectos. O seu movimento interno se
expressa de várias formas, tendo entre elas, a propriedade de contaminar o outro,
proporcionando-lhe prazer ou desprazer; se expressa também no corpo, podendo provocar-lhe
rubor, tensão muscular. Possui, principalmente, capacidade de afetar o raciocínio que por sua
vez, interfere no conhecimento, pode ainda desencadear emoções contraditórias, assim como
a alegria e a cólera.
Evidencia-se, nesse enfoque a relação da emoção e a inteligência na abordagem de
Wallon. Nesse sentido, Almeida (1999, p. 83) comenta:
A emoção é o colorido necessário, para a vida do indivíduo, é a visita inconveniente,
a surpresa agradável ou desagradável, a expressão mais pura e desenfreada das
preferências ou dos desgostos do indivíduo que rebeldemente cede espaço para a
realização do pensamento. A inteligência, por sua vez, é ponderada, representa as
capacidades gicas do sujeito, submete-se, geralmente, aos caprichos da emoção
que invade toda área corpórea do sujeito, imprimindo-lhe forma e tensão. [...] Essa
parceria entre emoção e inteligência, permanece mesmo em situações de explosão
emocional, [...] Manter seu equilíbrio exige a redução do estado emocional que, por
sua vez, implica o exercício de racionalizar, isto é, desencadear a ação da
inteligência.
Percebe-se que a relação entre a emoção e a inteligência é muitas vezes marcada por
antagonismo, por conflitos, desorganização, desequilíbrio por parte da emoção que em
contrapartida vai buscar a ponderação, o bom-senso, o equilíbrio pela ação da inteligência.
30
Em outras palavras, o desequilíbrio emocional pode ser retomado através dos recursos da
razão, isto é, “desencadear a ação da inteligência”.
Nessa perspectiva, acredita-se, que o grande esforço de um indivíduo é o de manter
nas mais diversas situações o equilíbrio entre a razão e emoção. Caso contrário poderá
prejudicar a realização de tarefas que necessitam de um bom desempenho da atividade
cognitiva. (ALMEIDA, 1999).
Buscando-se compreender outros aspectos essenciais desses dois grandes domínios
da afetividade (emoção e sentimentos) e do conhecimento (inteligência), pontua-se a questão
dos conflitos que normalmente ocorrem entre emoção e razão.
Com base na teoria de Wallon, Almeida (1999) elucida que os conflitos de origem
emocional auxiliam o desenvolvimento da criança e do adolescente, uma vez que a
necessidade de superá-los - dominar a emoção - exige esforço da parte deles, através do uso
da razão. O resultado implica em uma maior maturidade na área da afetividade e da
inteligência.
Compreende-se, portanto, que na abordagem walloniana, o conflito é necessário e
permeia todo o desenvolvimento do indivíduo, ciente de que na dinâmica do psiquismo o seu
movimento de manifestação e expressão é produto e resultado de etapas diferentes.
Um aspecto difícil e polêmico que ocorre no âmbito da sala de aula é o aspecto
motor, normalmente visto e relacionado como ação negativa da inteligência, uma vez que
impossibilita o bom desempenho da cognição.
Como explica Almeida (2005, p. 90):
O movimento é sempre associado à agitação e tumulto, portanto, uma grande
preocupação em excluir o aspecto motor, uma vez que não se sabe lidar com ele em
sala de aula. O movimento é sinônimo de desatenção, e como a atenção é necessária,
passa-se a eliminar ao máximo os movimentos [...] o movimento, geralmente, é
interpretado como indisciplina [...]. Com a preocupação de extinguir o que pode
ameaçar a aprendizagem em sala de aula, ignora-se completamente um importante
atributo do movimento: sua capacidade de responder às emoções.
Observa-se o possível engano que muitos educadores cometem ao interpretar a
agitação e movimento de seus alunos, sejam eles crianças ou adolescentes, como indisciplina,
desrespeito e falta de consideração. Pelo fato de desconhecerem que nos movimentos está a
capacidade de expressar emoções, os docentes repreendem severamente seus alunos trazendo
dificuldade e conflito para a relação.
Baseada em Wallon, Almeida (2005, p. 90) afirma que “os movimentos, como
expressões de natureza afetiva, podem gerar emoções e ser resultado delas”.
31
É fundamental compreender que os movimentos dos adolescentes em sala de aula
são comportamentos normais nessa fase na qual fazem parte a inquietação, as dúvidas e a
insegurança.
Daí a necessidade dos professores terem conhecimento das ações, reações,
movimentos corporais, expressões faciais, entre outras que em menor ou maior grau,
desencadeiam efeitos e resultados de “causas” emocionais.
A autora comenta ainda que, determinadas posturas da criança podem ser vistas
como desatenção. E que há uma grande necessidade pelos professores de educação infantil em
insistir na contenção do movimento, como que se essa atitude no sentido de acabar com os
movimentos pudesse assegurar a aprendizagem da criança.
Essas observações da autora feitas com relação a crianças pequenas podem ser
transportadas para alunos adolescentes do ensino médio que, tal como as crianças, sentem
vontade de conversar e se movimentar pela sala de aula. E também que os professores vêem
esses comportamentos como prejudiciais ao aprendizado e por isso, fazem de tudo para evitar
essa movimentação dos alunos, chamando-lhes a atenção quando isso ocorre.
Almeida (2005) defende a idéia de que compreender o movimento como efeito de
reações emocionais não significa que o professor deve adotar uma postura permissiva onde
não há limites. Os professores devem estar atentos aos movimentos das crianças e dos
adolescentes, uma vez que estes podem ser sinais de alteração e estados da emoção que não
podem ser desprezados ou relegados ao segundo plano, no âmbito da sala de aula.
A pesquisadora traz outra informação relevante quando diz que o excesso de
movimentação, bem como a sua falta, podem ser indicadores da presença de certa emoção.
As emoções são de ordem fisiológica e fazem articulação com expressões corporais e
faciais. Sua ação é rápida, e precisa da presença do outro para sobreviver, enquanto que o
sentimento tem como base o aspecto psicológico e é de natureza subjetiva. Ao contrário da
emoção, sua ação dura mais, sendo que seu caráter reservado não permite sua manifestação
diante das diversas circunstâncias que o indivíduo enfrenta no decorrer da vida (ALMEIDA,
2005).
Ainda de acordo com Almeida (2005, p. 95), “a emoção vem sempre acompanhada
de expressões, mas jamais pode ser reduzidas a estas. Assim, o choro, o riso, o grito e a
contração tônica são apenas formas de expressão da emoção”.
Após estas informações e esclarecimentos sobre as emoções, destaca-se sua
importância para a educação e a prática pedagógica. Elas servirão de referencial para o
professor para que possa melhor interpretar as reações e atitudes de seus alunos. Através
32
destas, ele poderá avaliar o seu próprio desempenho em relação à sua afetividade com a
classe, bem como a didática e técnicas usadas para a administração de suas aulas. E assim,
avaliar, pelas relações de postura, expressões faciais e movimentação dos alunos adolescentes
em sala de aula, até que ponto os conteúdos estão sendo aprendidos, se os temas estão
causando interesse, se os procedimentos usados por ele estão adequados, se os alunos estão
participando das aulas, enfim, entre vários outros motivos essenciais para uma boa aula e o
bom desempenho dos alunos.
Concluindo-se, é necessário que o professor seja um ótimo intérprete dos sinais (os
seus e de seus alunos) expressados pela movimentação do corpo e expressão do rosto. O
professor deve ser um profissional que, entre tantos atributos reservados a ele, deve também
aprender a ler e decodificar as emoções, sabendo que este é um pré-requisito para bem
administrá-las.
Conhecer a realidade dos componentes da emoção inerente a todo ser humano, sem
receio de sua complexidade, é desafio preponderante da ação pedagógica, no sentido de
compreender e ajudar, os protagonistas da relação professor-aluno adolescente.
2.2 ADOLESCÊNCIA NA ABORDAGEM HISTÓRICO-CULTURAL
Como este trabalho enfoca a afetividade na relação professor-aluno adolescente, faz-
se necessário também um olhar mais direcionado sobre esse adolescente.
Adolescência tem sido conceituada do passado ao presente, nas diversas posições
teóricas, como uma fase natural do desenvolvimento humano.
Uma fase especial que se inicia no final da infância e percorre um determinado
período, marcado por uma série de mudanças biológicas, sociais, emocionais e
comportamentais até atingir a vida adulta, na qual se espera que ocorra um “equilíbrio” ao
qual costuma-se referir como maturidade nos aspectos acima citados (biológicos, sociais,
emocionais e comportamentais).
Mas, de acordo com a abordagem histórico-social, a adolescência é analisada e
compreendida sob um novo olhar. Uma visão diferente do ser humano em formação que se
torna um membro integrante em seu meio social num contexto histórico-cultural determinado.
33
O objetivo desse tópico é conceituar e compreender a adolescência dentro da
abordagem histórico-social. No entanto, antes se faz necessário conhecer as informações e
conceituações sobre a adolescência em relação a outras teorias tradicionais importantes.
De acordo com Muuss (1966, p. 14):
A palavra “adolescência” é derivada do verbo latino “adolescere” que significando
“crescer” ou “crescer até a maturidade” [...] sociologicamente, adolescência é o
período de transição da dependência infantil para a auto-suficiência adulta.
Psicologicamente, adolescência é uma “situação marginal” na qual novos
ajustamentos, que distinguem o comportamento da criança do comportamento adulto
em uma determinada sociedade, m que ser feitos. Cronologicamente, é o tempo
que se estende de aproximadamente doze ou treze anos até a casa dos vinte e um,
vinte e dois, com grandes variações individuais e culturais [...].
Nota-se, portanto, que o fenômeno da adolescência é uma etapa de transição em que
já não se é mais criança, mas ainda não se pode ser considerado um indivíduo adulto. De certa
forma, essa etapa deve existir como um tempo de espera que a sociedade permite a seus
membros jovens, enquanto eles se preparam para exercer seu papel de adulto.
Parece amplamente aceito que a preocupação científica contemporânea para com a
adolescência, como período distinto do desenvolvimento humano, iniciou-se com o trabalho
de G. Stanley Hall no início do século XX. Antes desse período, a adolescência não era
percebida como um estágio particular do desenvolvimento.
De acordo com Palacios e Oliva (2004, p. 310):
Durante séculos, até o final do século XIX, as crianças se incorporavam ao mundo
do trabalho em algum momento entre os sete anos e o começo da puberdade [...]
Poucas eram as que estudavam, poucas as que o faziam acima dos 10 ou 12 anos, e
aquelas que o faziam geralmente não estudavam agrupadas em níveis de idade
diferenciados, e nem permaneciam muito tempo no sistema educacional.
Essa situação muda no Ocidente a partir do século XIX com a Revolução industrial.
Através da industrialização, a formação e os estudos passaram a serem considerados
importantes. Embora os filhos de operários tenham continuado a ingressar no mundo do
trabalho precocemente, os filhos de pessoas de classe média e alta permaneciam nas escolas.
Entretanto, com o passar do tempo, foi-se introduzindo o conceito de escolaridade obrigatória
em diversos países ocidentais (PALACIOS e OLIVA, 2004).
Portanto, pode-se compreender que, a partir do momento em que se introduziu a
escolaridade obrigatória e as crianças deixaram de trabalhar é que a adolescência passou a ser
reconhecida como uma fase distinta do desenvolvimento humano.
34
Porém, é necessário, segundo os autores acima citados, fazer uma distinção entre
dois termos diferentes: puberdade e adolescência.
Chamamos de puberdade ao conjunto de mudanças físicas que ao longo da segunda
década de vida transformam o corpo infantil em um corpo adulto capacitado para a
reprodução. Chamamos de adolescência a um período psicossociológico que se
prolonga por vários anos mas se caracteriza pela transição entre a infância e a idade
adulta. (PALACIOS e OLIVA, 2004, p. 311).
Naturalmente, a puberdade é um fenômeno biológico universal para todos os
indivíduos da espécie humana, sendo que sua base está solidificada sobre o fator biológico,
enquanto que a adolescência é um fator psicossociológico não obrigatoriamente universal,
uma vez que não se adota em todas as culturas o mesmo padrão de características de um
determinado país. Estas variam de acordo com os hábitos, valores sociais, morais, religiosos,
crenças e costumes que vão influenciar e configurar a adolescência conhecida e vivenciada de
acordo com a realidade de cada cultura.
De acordo com Palacios e Oliva (2004), na área psicológica, foi o americano Stanley
Hall o primeiro a estudar a adolescência, ao publicar em 1904 sua obra “Adolescence”.
Na teoria de Stanley Hall, considerado “pai da psicologia da adolescência”, essa fase
é compreendida na vida do jovem como o período onde “normalmente” ocorrem dificuldades
e conflitos internos, próprios da natureza do adolescente, que se acentuam frente à família, à
escola, e à sociedade como um todo.
Sigmund Freud (1972) em sua obra “Três ensaios sobre a teoria da sexualidade”
utiliza palavra puberdade e não adolescência. Segundo o mesmo:
Com a chegada da puberdade, operam-se mudanças destinadas a dar a vida sexual
infantil sua forma final normal. O instinto sexual fora aentão predominantemente
auto-erótico; encontra agora um objetivo sexual [...] Agora, contudo, aparece um
novo objetivo sexual e todos os instintos parciais se combinam para atingi-lo, ao
passo que as zonas erógenas ficam subordinadas ao primado da zona genital
(FREUD, 1972, p. 213).
Assim, com o advento da puberdade, o autor assinala um período de transformações
que se inicia com as mudanças físicas e se estende até a escolha do objetivo sexual e a
realização do ato sexual. O uso da palavra puberdade, em detrimento de adolescência, é a
marca do pensamento freudiano na cultura da sua época, pois denota a maturação fisiológica
(crescimento dos órgãos genitais externos) como limite à infância, e não a constatação das
mudanças corporais na identidade sexual.
35
Segundo Oliva (2004), no final da década de 1960, Erik Erikson sinalizou a
formação da identidade pessoal como a principal tarefa que os adolescentes devem resolver.
Descrevendo o pensamento de Erik Erikson, Oliva (2004, p.340) explica que: “após a
puberdade, ocorrerá uma crise de identidade como conseqüência da transição da infância para
a adolescência e de todas as mudanças próprias dessa etapa, que levarão o adolescente a sofrer
um sentimento de despersonalização e de estranhamento consigo mesmo.”
Para Oliva (2004), essa fase de insegurança, dificuldades de relacionamento, dúvidas
e escolha demonstram uma espécie de “moratória” ou tempo de espera, na qual o adolescente
procura encontrar seu lugar na sociedade.
no pensamento de Piaget (2005), na adolescência ocorre um desequilíbrio
provisório normal em todas as passagens de um estágio de desenvolvimento.
Piaget (2005, p.58) afirma que:
As conquistas próprias da adolescência asseguram ao pensamento e à afetividade um
equilíbrio superior ao que existia na segunda infância. Os adolescentes m seus
poderes multiplicados; estes poderes, inicialmente, perturbam a afetividade e o
pensamento, mas, depois, os fortalecem
.
Assim, o mesmo autor elucida que é em torno dos onze a doze anos que acontece a
passagem do pensamento concreto para o “formal” ou “hipotético-dedutivo”, isto é, a criança
é capaz de tirar conclusões baseadas em hipóteses e não só através de uma observação real.
Piaget (2005) ainda esclarece que é posteriormente à formação do pensamento
formal (por volta dos 11 a 12 anos) que se torna concebível a construção dos sistemas que
constituem a adolescência.
As operações formais fornecem ao pensamento um novo poder, que consiste em
destacá-lo e libertá-lo do real, permitindo-lhe, assim, construir a seu modo as
reflexões e teorias. A inteligência formal marca, então, a libertação do pensamento e
não é de admirar que este use e abuse, no começo, do poder imprevisto que lhe é
conferido. Esta é uma das novidades essenciais que opõe a adolescência à infância: a
livre atividade da reflexão espontânea (PIAGET, 2005, p. 60).
Compreende-se, assim, que na visão de Piaget (2005), a aquisição da inteligência
formal e, conseqüentemente, a liberdade de pensar e refletir confere ao adolescente certa
onipotência no seu modo de ver o mundo e a realidade. Essa situação muda e encontra
equilíbrio mais tarde, quando o adolescente, através da reflexão, observa que sua função não é
apenas contradizer, mas, compreender a experiência.
36
Becker (2003) ressalta o fato de olhar para a adolescência não nos aspectos das
transformações biológicas e psicológicas (de importância básica), mas também conhecer a
adolescência dentro de uma visão histórica, social e cultural.
De acordo Becker (2003, p.28) na visão histórica:
O conceito de adolescência, como ele é hoje considerado, é bastante recente. Até o
século XVIII, adolescência foi confundida com a infância. Nas escolas jesuítas,
garotos de 13 a 15 anos eram chamados indistintamente de crianças ou adolescentes.
A noção do limite da infância estava mais ligado à dependência do indivíduo do que
a puberdade.
Foi com o progresso da burguesia que se destacava como classe dominante, que
ocorreram mudanças na organização escolar, com o surgimento da formação primária e
secundária. Nesse contexto, aos poucos se estabeleceu uma relação entre idade e classe
escolar, e a adolescência passou a ser reconhecida como um período distinto de outros.
Atualmente, no entendimento de Becker (2003), a adolescência é foco de atenção de
várias instituições sociais (escolas, igrejas) e meios de comunicação social (mídia).
Ao se referir à visão social o autor coloca que os adolescentes de diversos níveis
sociais, ainda que morem numa cidade, demonstram padrões de conduta diferentes uns dos
outros. Essa situação existe devido às desigualdades sociais que se refletem na adolescência
do jovem, principalmente de classe pobre.
Becker (2003) evidencia a importância do fator cultural na “civilização ocidental” e a
predominância deste no desenvolvimento e comportamento do adolescente, que na verdade,
são totalmente diversos de outras culturas, nas quais os hábitos, educação, costumes, valores,
regras, papéis sociais são próprios daquela determinada cultura.
Observou-se pela produção das teorias de diversos autores, a maioria estudiosos da
psicologia, que a adolescência é vista como uma fase natural do desenvolvimento, isto é,
todos os seres humanos, na medida em que deixam a infância, passam obrigatoriamente por
uma nova fase, interposta à vida adulta, que é a adolescência. Vários estudos empregaram-se à
caracterização dessa fase e a sociedade tomou posse desses conhecimentos, tornando-se a
adolescência uma fase normal e prevista. Com o crescimento corporal rápido, o aparecimento
dos pelos e das características sexuais, surge a rebeldia, as insatisfações, os conflitos de
geração, o apego aos pares, as alterações de humor, as inseguranças, enfim, tudo que os
estudiosos registraram dessa fase denominada adolescência.
A adolescência na abordagem histórico-cultural é vista, compreendida e avaliada de
forma diferente em relação aos autores tradicionais aqui apontados.
37
De acordo com Bock (2004, p. 39):
[...] A adolescência é vista como uma construção social que tem suas repercussões
na subjetividade e no desenvolvimento do homem moderno e não como um período
natural do desenvolvimento. É um momento significado, interpretado e construído
pelos homens. Estão associadas a ela marcas do desenvolvimento do corpo. Essas
marcas constituem também a adolescência como fenômeno social, mas o fato de
existirem como marcas do corpo não deve fazer da adolescência um fato natural.
A interpretação da autora surge no sentido de pensar a adolescência como um
conceito cultural, embora esteja assentado sobre um conceito biológico, que é a puberdade -
todos os seres humanos passam pela puberdade, amadurecem sexualmente, aparecem
caracteres sexuais secundários possibilitando a reprodução.
A adolescência, como já foi dito, é vivenciada de forma diferente em diversas
culturas, sendo que o jovem se comporta de acordo com os padrões e regras estabelecidas na
sua própria cultura. Nessa perspectiva, o que é considerado adequado, correto e normal na
cultura ocidental, por exemplo, não o é na cultura oriental, e assim sucessivamente. As
culturas diferenciam-se em regras, hábitos e costumes até no mesmo país, em estados
diferentes.
Bock (2004) ainda afirma que a “adolescência foi criada pelo homem”. Argumenta
que eventos sociais foram surgindo nas interações sociais e no mundo da pessoa. Esses
eventos, episódios, acontecimentos, experiências, vão deixando sua marca como um
fenômeno social e manifestando suas ressonâncias psicológicas, e assim, vai sendo elaborado
um significado social para todos esses acontecimentos que vão surgindo dentro de um
processo histórico, gerado na sociedade atual ocidental: a adolescência.
Conforme Oliveira e Rego (2003), para um entendimento mais integral do
comportamento e do funcionamento mental humano, dentro da proposta de análise genética
feita por Vigotski é preciso estudar os quatro planos genéticos explicados pelas autoras da
seguinte forma:
[...] O plano da filogênese (relativo à história da espécie humana), o da ontogênese
(relacionado à história do indivíduo da espécie, do nascimento à morte), o da
sociogênese (relacionado à história de cada grupo cultural) e o da microgênese
(referente à história relativamente de curto prazo, da formação de cada processo
psicológico específico; referente também, à configuração única das experiências
vividas por cada indivíduo em sua própria história singular) (OLIVEIRA e REGO,
2003, p. 24).
38
Segundo Oliveira (1996), o primeiro plano genético é a filogênese, relativo à história
da espécie define limites e possibilidades de funcionamento psicológico. Nesse sentido,
existem coisas que o homem é capaz de fazer e outras não. Por exemplo, o homem é bípede e
anda, mas não voa, tem um formato de mãos e dedos que lhe permite movimentos finos como
agarrar um objeto do tamanho de uma bola de tênis, segurar outros com as pontas dos dedos,
como um lápis ou caneta.
Ainda de acordo com Oliveira (1996), o segundo plano genético, citado por Vigotski,
é a chamada ontogênese, que significa o desenvolvimento de uma determinada espécie, ou
seja, o indivíduo nasce, se desenvolve, se reproduz e morre Na ontogênese, o homem faz um
percurso de desenvolvimento próprio da espécie humana. Por exemplo, a criança nasce e
fica na posição deitada, depois ela aprende a sentar, engatinhar e finalmente, o andar. Esse
processo que segue uma determinada seqüência de desenvolvimento é relativo a esse ser
membro da espécie humana.
O terceiro plano genético postulado por Vigotski explicado por Oliveira (1996) é o
chamado sociogênese ou história cultural, que corresponde à história da cultura em que o
sujeito está inserido. É preciso ressaltar que a sociogênese relaciona-se com as formas
culturais que interferem no funcionamento psicológico do sujeito.
O conhecimento já adquirido pelas culturas passadas vai sendo utilizado para que o
homem possa criar, inventar e produzir em todos os campos, tendo como finalidade melhorar
a vida da humanidade, tais como as descobertas na área da saúde (vacinas, remédios,
transplantes), tecnologia e meios de comunicação (rádio, televisão, computador).
Outro aspecto da história cultural é como cada cultura organiza o desenvolvimento
de uma forma diferente. Isto é, a passagem pelas formas de desenvolvimento é interpretada e
compreendida pelas diversas culturas de forma diferente.
Nesse contexto, pode-se citar a puberdade e a adolescência. A puberdade é um
fenômeno biológico, pois todos os seres humanos passam pela puberdade. Como já foi
mencionado, o conceito de adolescência é um conceito cultural, embora esteja apoiado sobre
um conceito biológico que é a puberdade. Observa-se em nossa cultura que a adolescência é
uma fase que está cada vez mais prolongada do que trinta ou trinta e cinco anos atrás. Na
atualidade, uma menina de 11 ou 12 anos já pode estar preocupada em “ficar” com um garoto,
em ter namorado. As mais velhas, de catorze e quinze anos, podem ter iniciado a vida
sexual, usufruindo uma liberdade que uma jovem de trinta anos atrás não possuía, devido aos
padrões morais e regras exigidas naquela época.
39
O quarto e último plano genético, segundo Oliveira (1996), denominado
microgênese, relaciona-se ao fato de que cada fenômeno psicológico tem a sua própria
história. Na microgênese, é necessário olhar e observar o fato, lembrando que cada pequeno
fenômeno tem a sua história. E como não existem duas pessoas no mundo com história de
vidas iguais, o que vai sobressair nesse fenômeno da singularidade de cada pessoa é a
heterogeneidade entre os seres humanos.
Observando-se duas crianças gêmeas idênticas, de oito anos de idade, do sexo
masculino, vivendo na mesma casa, família de classe média, que estudam na mesma escola,
na mesma série, no qual quase tudo na vida dessas crianças é muito parecido, pode-se afirmar
que elas não iguais? Não. Por quê? Porque elas têm experiências diferentes, um é mais
extrovertido e fala mais, o outro é introvertido e fala pouco, um gosta de estudar e ir à escola,
o outro não, um é nervoso e inquieto, o outro é calmo e assim por diante. (OLIVEIRA, 1996)
Pode-se dizer que existem fatos na história de vida de cada pessoa que vão
determinar a singularidade de cada aspecto da vida do sujeito.
Após conhecer os planos genéticos elaborados por Vigotski, que são fundamentais
para entender suas idéias sobre o processo de desenvolvimento biológico e psicológico
humano, é necessário focar a base principal da teoria deste autor, que vem a ser o fato de
como a cultura define e humaniza o homem.
De acordo com Cole e Scribner (1994) Vigotski “foi o primeiro psicólogo moderno
a sugerir os mecanismos pelos quais a cultura torna-se parte da natureza de cada pessoa
(p.8).
Vigotski ressaltou o papel ativo do homem e da cultura: o homem constrói a cultura
ao mesmo tempo em que é construído por ela. E também que o desenvolvimento biológico e
cultural forma uma unidade, embora cada uma apresente particularidades e especificidades
que determinam diferentes pontos e contrapontos do seu entrelaçamento.
De acordo com Pino (2005, p.18):
Vygotsky chega à conclusão de que faltava aos trabalhos dos psicólogos de seu
tempo entender a natureza do desenvolvimento das formas superiores de conduta,
objetos de sua pesquisa. Mas que natureza é essa? Ao que ele responde: o
desenvolvimento é de natureza cultural. Cabe então perguntar o que é para ele a
Cultura? Mais do que uma definição, ele um lacônico posicionamento: “Cultura
é, simultaneamente, o produto da vida social e da atividade social dos homens
”.
40
Elucida Pino (2005) que, para Vigotski, cultura é um conjunto de obras humanas e
que nesse contexto o homem é, simultaneamente, obra da natureza e agente da sua
transformação.
Existem alguns conceitos na teoria de Vigotski que precisam ser bem explicados
porque eles são profundos por englobarem uma série de outros conteúdos que precisam ser
compreendidos, uma vez que, estão associados numa imensa cadeia de entrelaçamento e
significações.
Nessa mesma trajetória, é imprescindível verificar outras idéias centrais na teoria de
Vigotski (1994, p.72), que dizem respeito ao conceito de mediação e ao uso de signos:
A função do instrumento é servir como um condutor da influência humana sobre o
objeto da atividade; ele é orientado externamente; deve necessariamente levar a
mudança de objetos. Constitui um meio pelo qual a atividade externa é dirigida para
o controle da natureza O signo por outro lado, não modifica em nada o objeto da
operação psicológica. Constitui um meio da atividade interna dirigido para o
controle do próprio indivíduo; o signo é orientado internamente.
Assim, para ele, a relação do homem com o mundo não é uma relação direta, mas é
uma relação mediada através de instrumentos e signos.
Oliveira (1997) diz que o instrumento como mediador é um elemento que fica entre
o trabalhador e o objeto do seu trabalho. Objetivamente, um instrumento é “um objeto social e
mediador da relação entre o indivíduo e o mundo” (OLIVEIRA, 1997, p. 29).
O signo, definido por Vigotski como “instrumento psicológico”, tem a função de
auxiliar o homem na prática de atividades psicológicas.
De acordo com Oliveira (1997, p.30), os signos podem representar objetos, eventos
ou situações. “A palavra mesa, por exemplo, é um signo que representa o objeto mesa; o
símbolo 3 é um signo da quantidade três; o desenho de uma cartola na porta de um sanitário, é
um signo que indica “aqui é um sanitário masculino”.
Existe outro plano, no qual o signo é “orientado internamente”. Esse mecanismo é
chamado por Vigotski de “internalização”, ou seja, “a reconstrução interna de uma operação
externa” (VYGOTSKY, 1994, p. 74).
Ao longo do processo evolutivo e do desenvolvimento do ser humano, o indivíduo
deixa de prescindir demarcações externas e passa a “utilizar signos internos, isto é,
representações mentais que substituem os objetos do mundo real” (OLIVEIRA, 1997, p. 35).
Dessa forma, a idéia de “filho” a uma mulher permite a ela, trazer mentalmente a
imagem real do filho, apesar da ausência dele.
41
Em síntese, Oliveira (1997) explica que o homem possui capacidade de operar
mentalmente sobre o universo ao seu redor, lembrar, imaginar, planejar o futuro, ter metas,
objetivos, desejos. São conteúdos mentais que substituem o lugar dos objetos, situações,
acontecimentos do passado ou do futuro. Por exemplo, ele pode pensar numa tesoura que não
está ali presente, pensar que precisa comprar uma tesoura, imaginar a tesoura cortando um
papel, tecido ou barbante.
Através da autora pode-se concluir que “a relação é mediada pelos signos
internalizados que representam os elementos do mundo, libertando o homem da interação
concreta com os objetos do seu pensamento” (OLIVEIRA, 1997, p. 35).
Oliveira (1997) explica que quando uma pessoa conhece e aprende o significado de
uma palavra tal como “cachorro”, esse conceito passou a ser internalizado pelo sujeito, o que
ocorre por todas as pessoas que falam a mesma língua, no caso, o português. Esse processo
passa a ser uma representação mental, que seutilizada como signo mediador para o sujeito,
para seu conhecimento do mundo e de tudo que faz parte dele.
Um processo interpessoal é transformado num processo intrapessoal. Todas as
funções no desenvolvimento da criança aparecem duas vezes: primeiro, no nível
social, e, depois, no nível individual: primeiro entre as pessoas (interpsicológica) e,
depois, no interior da criança (intrapsicológica) (VYGOTSKY, 1994, p. 75).
Entende-se por internalização, uma série de transformações, principalmente aquela
em que um processo interpessoal (externo, entre as pessoas) converte-se em processo
intrapessoal (interno, dentro do próprio indivíduo). Esses processos vão possibilitando o
próprio desenvolvimento do sujeito.
Facci (2004, p.73) destaca que, para Elkonin “a transição de uma etapa de
desenvolvimento infantil para outra é caracterizada por crises” o que marca a periodização do
desenvolvimento.
Apoiada em Vigotski, Facci (2004) sintetizou as seguintes crises: “crises pós-natal:
primeiro ano (2 meses 1 ano); crise de 1 ano: infância precoce (1 ano 3 anos); crise de 3
anos: idade pré-escolar (3 anos 7 anos); crise dos 7 anos: idade escolar (8 anos 12 anos);
crise dos 13 anos: puberdade (14 anos – 18 anos); Crise dos 17 anos”.
Para autora, os períodos de crises que se intercalam entre uma fase e outra,
configuram-se por pontos críticos, de mudanças no desenvolvimento, explicando outra vez
que o desenvolvimento de uma criança é um processo dialético, e que a passagem de um
42
estado a outro não se realiza por um caminho evolutivo normal, mas sim de formas
alternadas, ousadas, inovadoras e renovadoras.
A adolescência é o período de desenvolvimento mais crítico e nessa idade, segundo
Elkonin (1987), essa atividade especial no estabelecimento de relações pessoais
íntimas entre os adolescentes é uma forma de reproduzir com os companheiros, as
relações existentes entre as pessoas adultas. A interação com os companheiros é
mediatizada por determinadas normas morais e éticas (regras de grupo) [...].
(FACCI, 2004, p.71).
Através da interação comunicação e vivência com outros adolescentes, este elabora
concepções de forma geral sobre o mundo, as relações entre os indivíduos, e principalmente
sobre o seu futuro e assim, gradativamente vai estruturando aspectos essenciais da vida
pessoal.
Faz-se necessário no contexto do mundo do qual o adolescente é parte integrante,
compreender, ainda que em seus aspectos básicos, a questão da formação de conceitos, como
parte do desenvolvimento do adolescente, na visão vigotskiana.
De acordo com Vigotski (2005, p.99):
Os experimentos realizados com objetivo específico de estudar as operações que os
adolescentes efetuam com os conceitos revelam, em primeiro lugar, uma
discrepância surpreendente entre a sua capacidade de formar conceitos e sua
capacidade de defini-los.
O autor esclarece que o adolescente tem condições de formar e utilizar conceitos
com facilidade numa situação concreta, mas expressar esse conceito em palavras, quando este
deve ser formulado num plano totalmente abstrato, sem referência de impressões ou situações
concretas passa a ser uma tarefa que exige mais trabalho do adolescente. Para Vigotski (2006)
todo conteúdo do pensamento se renova e se reestrutura por causa da formação de conceitos,
tão especial na idade de transição.
É importante compreender por conteúdo do pensamento, não apenas os dados
externos que constituem o objeto do pensamento em cada fase da vida do indivíduo, mas
também o que ocorre no processo do desenvolvimento da criança, o que se torna parte
integrante do seu organismo, da sua personalidade e dos vários tipos de comportamento.
Esse modo de agir e expressar-se externamente interesses, valores, modo de ver o
mundo, desejos, ideais, regras e certas formas de pensamento passa a fazer parte do mundo
interior do adolescente, devido ao seu desenvolvimento, maturidade e interação com o meio.
43
Nessa trajetória aparece o trabalho de prevalecer o conteúdo novo que lhe estimulam o
desenvolvimento e o funcionamento formais do seu pensamento (VYGOTSKI, 2006).
Completa o Vigotski que o novo conteúdo não se incorpora mecanicamente no
pensamento do adolescente, ao contrário, ele passa por um longo e complexo processo de
desenvolvimento, “ante el adolescente se abre todo el mundo en su passado y presente, la
natureza, la história y la vida del ser humano” (VYGOTSKI, 2006 p. 64).
Sabe-se que Vigotski (2006) trata a constituição do ser humano como um longo e
complexo processo de desenvolvimento, afirmando que o homem é um ser social e cultural.
Afirma Pino (2000, p.66):
Que o desenvolvimento cultural é um processo pelo qual o mundo adquire
significação para o indivíduo, tornando-se um ser cultural. Fica claro que a
significação é a mediadora universal nesse processo e que o portador dessa
significação é o outro, lugar simbólico da humanidade histórica.
O adolescente, incluído nesse contexto, vive de maneira intensa o processo de
internalização das relações sociais e conseqüentemente, a significação que surge na própria
relação. Isto é, o que realmente é internalizado pelo adolescente é a significação que a outra
pessoa da relação tem e da qual ele incorpora e vai fazer parte do seu eu. Tal interação “dá ao
seu eu as coordenadas para saber quem é ele, que posição social ocupa e o que se espera dele”
(PINO, 2000, p.66).
Em outras palavras, pode-se dizer que é através de - e com o outro - que o eu se
constrói num indivíduo social com a sua subjetividade. É nesse caminho que ocorre a
passagem dos processos interpessoais para o intrapessoal, que o adolescente constrói sua
consciência social e os diversos aspectos da vida cultural.
É principalmente na convivência com os companheiros/as da mesma idade, e nas
demais relações e interações na família e na escola que ele começa a conhecer e compreender
as pessoas, os acontecimentos, as diferenças sociais, individuais e sua própria singularidade
na realidade do mundo em que vive.
Nesse processo de transição biopsicossocial, da infância à idade adulta, estão
presentes influências históricas e culturais, na constituição do sujeito adolescente, com as
quais se estruturarão as suas identidades corporal, social, sexual e afetiva, como indivíduo
integrado no mundo social.
Vale a pena destacar o pensamento de Vigotski sobre a adolescência:
44
Agora as vivências próprias do seu "eu” prendem toda atenção do adolescente, para
na juventude, tornar a ser substituído por um interesse elevado e ampliado pelo
mundo e pelas questões mais radicais da existência, que nessa fase lhe torturam a
consciência. Os olhos do jovem sempre estão amplamente abertos para o mundo, e
isto significa a suprema maturidade do seu ser para a vida. (Vigotski, 2004, p.118).
O pensamento do adolescente ganha espaço e se expande em vários aspectos, mas
principalmente em busca dos seus interesses. De acordo com a teoria de Vigotski, na idade de
transição, ou seja, na adolescência, “ocorre um grande avanço no desenvolvimento biológico
e cultural, quando desabrocha a maturação das necessidades orgânicas e culturais
(VYGOTSKI, 2006, p.22).
Explica o autor que nesse olhar os interesses do adolescente constituem um estado
particularmente humano, (o qual faz a diferença entre os homens e os animais) pois
constituem o crescimento dos interesses nos aspectos subjetivos no desenvolvimento cultural
e psíquico. É próprio dos jovens, em sua formação superior, buscarem recursos para uma
consciência livre diante dos outros, sendo este um desejo consciente, uma motivação para si
mesmo.
De acordo com o Vigotski (2006) é essencial que os estudiosos da adolescência, tais
como ele, saibam evidenciar a diferença no desenvolvimento psíquico do adolescente, do
processo de formação dos hábitos, do processo de desenvolvimento dos interesses. Caso
contrário dificilmente poderá se explicar esse fato – que é fundamental para essa idade – visto
que os bitos não mudam de maneira significativa no decorrer de um ou dois anos. Os
mecanismos dos comportamentos construídos continuam existindo e depois surgem com
base nesses outros comportamentos novos, mas os interesses em desenvolvimento mudam
totalmente (VYGOTSKI, 2006).
O autor é objetivo ao dizer que não sepossível compreender o adolescente se não
se considerar esse fato. No entendimento de Vigotski (2006) caso não se dê consideração a
esse fato, não se poderá entender porque ocorre normalmente no processo de desenvolvimento
do adolescente, em sua fase mais crítica, um abaixar do seu rendimento, uma piora nos seus
comportamentos e outros aspetos relevantes.
É na fase da adolescência que se manifestam, de forma mais nítida, as relações entre
as necessidades biológicas do indivíduo e suas necessidades culturais superiores, chamadas de
interesses. A relação das alterações do subjetivo e do objetivo, na estrutura das atrações e
interesses, as mudanças no sistema interno das necessidades e a força motivadora dos objetos
45
em seu meio se manifestam visivelmente no percurso da história de transição (VYGOTSKI,
2006).
O psicólogo soviético observa também como a maturação e o surgimento de novas
atrações e necessidades internas ampliam a visão do mundo ao seu redor. Este fato apresenta-
se como força motivadora para o adolescente, com um aumento de atividades antes
indiferentes para ele, que agora se transformam em situações fundamentais que decidem seu
comportamento, como parte desse novo universo interno. É assim, que pouco a pouco se
descortina para o adolescente um mundo exterior completamente novo (VYGOTSKI, 2006).
Também os conceitos expressos na teoria de desenvolvimento de Henri Wallon são
conhecimentos que promovem a compreensão do processo de constituição do indivíduo, no
movimento que se inicia com o nascimento do bebê e se estende até a fase adulta.
Wallon (1979) defende a idéia que ao estudar a criança, faz-se necessário estudar
também o meio ambiente no qual ela se desenvolveu, porque para ele é impossível isolar um
desses elementos (organismo/ meio) e compreender todos os fenômenos que fazem parte do
processo de constituição do ser humano.
A sua teoria é conhecida como teoria psicogenética, cujo alicerce principal ocorre em
dois sentidos: “a integração organismo-meio e integração cognitiva-afetiva-motora”.
Para Wallon (1979, p. 66-213)
a puberdade opera a passagem da infância à adolescência. Os seus efeitos
morfológicos e fisiológicos são bem conhecidos: aparecimento dos caracteres
sexuais secundários que acentuam as diferenças dos dois sexos, e reações
especificamente genitais, tais como a menstruação nas raparigas [...] e no rapaz
aparecimento de bigode, barba, modificação da voz [...].
Os aspectos fisiológicos que aparecem na puberdade, citados por Wallon, somam-se
aos aspetos psíquicos e comportamentais, tais como dúvidas, temores, desejos, preocupações,
instabilidade, desorientação, enfim, presença de sensações estranhas em relação a si próprio e
ao meio em que vive.
Em meio a tantas mudanças e alterações, essa criança à caminho da adolescência é
convidada “a refletir sobre a razão e sobre o valor do que a rodeia” (WALLON, 1979, p. 67).
Como em todo processo de desenvolvimento, as metamorfoses ocorrem de forma
dinâmica trazendo à criança dificuldades internas e externas que vão variar de acordo com o
meio e a cultura no qual ela está inserida.
46
Segundo Wallon (1979, p. 68), caberá ao futuro adolescente buscar o equilíbrio entre
“as possibilidades psíquicas ainda confusas e as realidades de amanhã”. Entre o presente e o
futuro estarão as necessidades de melhoria e evolução em relação à formação do caráter e das
capacidades intelectuais.
A vida afetiva na adolescência, de acordo com o autor, destaca uma forte intensidade
no que diz respeito à “ambivalência das atitudes e dos sentimentos” (WALLON, 1979, p.
214).
Compreende-se, através de Wallon (1979), que nesse período surgem necessidades
diferentes e especiais que acontecem no sentido de renovação, aventuras, conquistas, de
liberdade de ação e também a vontade de acabar com sentimentos que de certa forma o
paralisam.
Surge ainda nesta fase da adolescência, o momento de fazer opções relacionadas aos
valores morais, de ordem religiosa e política. Assim, o jovem procura encontrar a sua família
intelectual e espiritual.
Wallon (1979) exprime de forma clara que é preciso aproveitar toda essa energia
presente no adolescente, dando a ele orientações adequadas. Nesse sentido, ele faz referência
ao papel do mestre na vida do jovem, explicando que este, uma vez consciente das
responsabilidades que lhe são confiadas, tem que conhecer a realidade das relações sociais, os
valores morais e para isso devem estar informados de maneira solidária sobre quais são as
condições de vida de seus alunos.
De acordo com Wallon (1979) os professores não devem se preocupar apenas com o
êxito de seus alunos na escola em relação ao seu futuro, uma vez que esta forma de
pensamento é extremamente limitante. Para que assim não seja, o professor deve estar em
interação constante com seus alunos (não entrando nas particularidades da vida pessoal), mas
tanto quanto possível participar, atuando em seu meio junto a eles e ajudando-os a descobrir
as suas escolhas profissionais.
Necessário se faz na teoria psicogenética de Wallon saber que o desenvolvimento do
indivíduo que se inicia com o nascimento e termina com a morte é composto por estágios que
revelam características próprias da espécie humana e toda sua temática está definida pela
história e cultura.
De acordo com Mahoney e Almeida (2006), os estágios na teoria de Wallon, são
vistos como um conjunto completo do próprio indivíduo, ou seja, a sua estruturação e modo
de funcionar expressam a presença de todos os elementos que fazem parte da constituição do
47
sujeito. Essa vivência do bebê até chegar à vida adulta é abordada por Wallon em sua
concepção teórica que diz respeito à afetividade.
No estágio impulsivo-emocional (0 a 1 ano) criança expressa sua afetividade
através de movimentos desordenados, respondendo a sensibilidades corporais:
proprioceptiva e interoceptivas. O recurso de aprendizagem nesse momento é a
fusão com outros.
No 2º estágio – sensório-motor-projetivo (1 a 3 anos) – quando já dispõe da fala e da
marcha, a criança se volta para o mundo externo (sensibilidade exteroceptiva), para
um intenso contato com os objetos e a indagação insistente do que são, como se
chamam, como funcionam.
No estágio personalismo (3 a 6 anos) aparece outro tipo de diferenciação
entre criança e o outro. É a fase de se descobrir diferente das outras crianças e do
adulto.
estágio, o categorial (6 a 11 anos) a diferenciação mais nítida entre o eu e o outro
dá condições mais estáveis para a exploração mental do mundo externo, físico,
mediante atividades cognitivas de agrupamento, classificação em vários níveis de
abstração até chegar ao pensamento categorial.
No estágio puberdade e adolescência (11 anos em diante) vai aparecer a
exploração de si mesmo, na busca de uma identidade autônoma, mediante atividades
de confronto, auto-afirmação, questionamentos e para isso se submete e se apóia nos
pares, contrapondo-se aos valores tal qual interpretados pelos adultos com quem
convive [...].
O recurso principal de aprendizagem do ponto de vista afetivo volta a ser a
oposição, que vai aprofundando e possibilitando a identificação das diferenças entre
idéias, sentimentos, valores próprios e de outro adulto na busca para responder:
Quem sou eu? Quais são os meus valores? Quem serei no futuro?, que é permeada
por muitas ambigüidades. (MAHONEY e ALMEIDA, 2006, p. 62-63).
As ambigüidades tão comuns na fase da adolescência aparecem como forma de atrair
a atenção das pessoas ao seu redor, ao mesmo tempo em que surgem sentimentos de timidez,
insegurança e dúvidas em relação a si próprio.
O adolescente adota, também, atitudes de oposição ao aprendizado adquirido no
passado, que nada mais são do que uma forma de afirmação do eu diante da necessidade de
autonomia, desejo este, que surge em maior ou menor grau.
Dér (2004) explica que a ligação do adolescente com seus pares têm a importante
função de apoiar as atitudes de oposição importantes para ele, de forma que ele tenha com
quem dividir seus problemas, conversar e não se sentir tão sozinho.
Acrescenta também, como outro aspecto digno de ser mencionado sobre o
adolescente, é que nesse período ele demonstra uma personalidade vulnerável que pode
absorver tanto valores positivos como negativos. Os valores morais pelos quais opta e
absorve, são os valores do meio em que vive e estes irão nortear e conduzir o seu projeto de
vida.
De acordo com Wallon , “se foi bem orientado pelos adultos do seu meio, as escolhas
do adolescente podem fazem florescer um comportamento adulto autônomo, que se sustenta
48
em uma consciência moral sensível aos problemas sociais do meio em que está inserido”
(WALLON, 1975a, apud DÉR, 2004, p. 75).
A teoria de Wallon mostra que a consciência moral que foi edificada na adolescência
é resultado dos feitos realizados nos estágios anteriores (especificamente o categorial), para
em seguida encontrar espaço em si mesmo para novas necessidades e desejos em suas
relações com o outro.
Agora com cada vez mais vontade, o adolescente quer ser compreendido, respeitado
e valorizado para que possa se sentir um indivíduo: parte integrante da realidade concreta no
mundo social e cultural a que pertence.
Com esse estudo sobre adolescência na abordagem histórico social na visão
vigotskiana e walloniana, Oliveira (2000) favorece o entendimento sobre a constituição do
psiquismo humano, relacionado à afetividade, à linguagem e à cognição com a vida social.
A autora explica que, para Vigotski e Wallon, a consciência é esculpida na vida
social, através de elementos e recursos culturais, presentes no ambiente: conhecimentos,
instrumentos, signos, informações, técnicas, dos quais eles se apropriam e se tornam “motivos
para as suas ações”. Não esquecendo, portanto, que essas ações irão ser aprendidas na
interação e experiência cotidiana entre os indivíduos num processo dinâmico e contínuo.
A principal conclusão, de acordo com Oliveira (2000), vem a ser no sentido de que
as ações compartilhadas que ocorrem em determinado contexto histórico levam a criança e,
posteriormente o adolescente a se apropriar de um conhecimento construído em uma cultura e
a se transformar, de acordo não somente com as suas necessidades biológicas, “mas as
necessidades psicossociais que são históricas” (p. 63).
2.3 A ESCOLA NA VISÃO DE VIGOTSKI E WALLON
Vigotski (1994) ao evidenciar a relevância das interações sociais traz o conceito de
mediação e de internalização como aspectos básicos para aprendizagem argumentando que a
construção do conhecimento acontece a partir de um acentuado processo de interação entre as
pessoas. A criança é introduzida na cultura através da interação social com as diversas pessoas
que fazem parte da sua convivência e do seu mundo.
O pesquisador aponta como pauta central da sua teoria a internalização das funções
psicológicas superiores (atenção voluntária, memória, formação de conceitos, linguagem e
outros).
49
“Todo processo interpessoal é transformado em intrapessoal” (VYGOTSKY, 1994,
p.75). Os processos interpessoais acontecem em primeiro lugar nas interações sociais do
indivíduo (criança/adolescente) com o outro (social) sendo identificado como “plano
interpsicológico”, e depois no interior do próprio indivíduo (criança/adolescente) identificado
como “plano intrapsicologico” (VYGOTSKY, 1994).
A criança, portanto, está inserida num processo continuo de socialização que se
inicia desde o seu nascimento. Nasce já membro de uma família, pertencente a um grupo
social, que por sua vez integra uma classe de socialização. A família é o primeiro grupo social
da qual se faz parte e é, portanto, mediadora entre o individuo e a sociedade.
Ao nascer e crescer, a criança vai pouco a pouco aprendendo a perceber o mundo e
situar-se nele. Ao interiorizar aquilo que os outros lhe atribuem, incorpora e apropria-se dos
instrumentos culturais. No entanto a criança e o adolescente não são sujeitos passivos nesse
processo de apropriação de aprendizagem e conhecimento. Eles são também agente, na
medida em que sua socialização depende de suas ações, enquanto sujeito que decide, sente,
pensa e interage com o meio que o cerca (REGO, 2005).
Partindo dessas premissas fundamentadas pela abordagem histórico-cultural, a
importância do outro no processo de aprendizagem e na qualidade das interações ganha
evidência preponderante.
No longo processo de desenvolvimento e aprendizagem da criança (que depois se
transforma em adolescente) no universo social, o seu trabalho é ir se constituindo como
sujeito independente e individual.
E isso ocorre quando ela se percebe, deparando-se com a sua diferença em relação ao
outro.
É por intermédio do contato humano que a criança adquire a linguagem e passa, por
meio dela, a se comunicar com outros seres humanos e a organizar seu pensamento.
Vivendo em sociedade, a criança aprende a planejar, direcionar e avaliar sua ação
[...] É também no convívio social através das atividades praticas realizadas, que se
criam as condições para o aparecimento da consciência, que é a capacidade de
distinguir entre as propriedades objetivas e estáveis da realidade e aquilo que é
vivido subjetivamente (DAVIS e OLIVEIRA, 1994, p.17).
É nesse processo rico de interações sociais que surge a consciência e com ela a
capacidade da criança discriminar a realidade concreta e objetiva, daquela que faz parte no
seu mundo subjetivo. Nesse sentido, destaca-se a singularidade da criança/adolescente
reconhecida pelas diferentes maneiras de perceber e compreender o mundo, diferentes
50
significações que se da a um objeto, pessoa ou evento que irão variar de acordo com o grupo
familiar, social, cultural, econômico no qual a criança/adolescente está inserida.
Um dos temas centrais das teorias de Vigotski são funções mentais superiores que
são atividades mediadas por sistemas simbólicos. Nesse contexto a linguagem destaca-se por
se construir o sistema simbólico principal que engloba todos os grupos humanos.
A linguagem, como forma fundamental de comunicação social constrói e define
conceitos que vão atuar nas formas da organização do real, que por sua vez faz o caminho da
mediação entre o sujeito e o objeto do conhecimento (OLIVEIRA, 1992).
A linguagem tem, portanto, a função de organizar e orientar o pensamento. Davis e
Oliveira (1994, p. 72) explicam:
Quando a criança começa a designar objetos e eventos do mundo exterior com
palavras isoladas ou combinação de palavras, esta discriminando objetos, está
prestando atenção em suas características, podendo guardá-las na memória [...]
Pode lidar com objetos, pessoas e fenômenos do ambiente, mesmo quando eles não
se encontram presentes. A linguagem permite, assim, que o ser humano se distancie
da experiência imediata, fato esse que assegura o aparecimento da imaginação e do
ato criativo.
Uma vez mergulhado no mundo das interações e da linguagem, o sujeito constrói os
seus valores e a sua concepção do mundo, as formas de viver e atuar no ambiente ao qual
pertence. Assim, ele aprende a organizar suas próprias ações e até prever os resultados de sua
ação no futuro que terão por base sua experiência anterior. Conclui-se, portanto, que o
alicerce do comportamento voluntário reside na palavra, lembrando acontecimentos passados
e controlando ações no futuro.
Nos seus estudos, Vigotski (2005) discriminou no significado da palavra dois
elementos: o significado propriamente dito e o sentido.
Vigotski (2005, p.181) coloca que Paulham fez distinção entre esses dois termos
explicando da seguinte forma: “[...] o sentido é a soma de todos os eventos psicológicos que a
palavra desperta em nossa consciência. É um todo complexo, fluido e dinâmico que tem
varias zonas de estabilidade desigual. [...] O significado permanece estável ao longo de todas
as alterações do sentido”.
O sentido diz respeito às experiências configuradas na vida e na individualidade de
cada pessoa onde também se registra as diferentes vivências afetivas com toda complexidade
do ser humano.
A aprendizagem tem o seu lado subjetivo, uma vez que este envolve motivação,
interesse, vontade, atenção, afeto e outros por parte do aluno e do professor. Estes fatores
51
assimilados e apropriados no plano interpessoal do sujeito estão agora presentes no plano
intrapsicologico de ambos, vinculados a sua subjetividade.
Como o conhecimento é construído no âmbito das interações sociais entre professor
e aluno, pode-se acreditar que os processos cognitivos unidos aos afetivos emergem e se
estruturam no campo da intersubjetividade. Aspectos afetivos e cognitivos são processos
dinâmicos, intensos, unidos entre si através dos vínculos estabelecidos entre professor e
aluno.
Davis e Oliveira (1994, p.84) ressaltam algumas idéias importantes a esse respeito:
Na interação que professor-aluno estabelecem na escola, os fatores afetivos e
cognitivos de ambos exercem influência decisiva. Na interação, cada parceiro busca
o atendimento de alguns de seus desejos: de proteção, subordinação, de realização
etc. Através dela tanto os alunos quanto o professor vão construindo imagens do seu
interlocutor atribuindo-lhe determinadas características, intenções e significados
[...].
As colocações acima refletem os conteúdos discutidos acerca dos aspectos
cognitivos, afetivos, interação, professor e aluno.
Para Davis e Oliveira (1994), na interação professor aluno supõe-se que o primeiro
ajuda o outro a aprender, o aluno precisa de alguém mais experiente (professor ou colega) que
o ajude a evoluir no processo, para que assim possa construir novos conhecimentos e
habilidades. Na opinião das autoras, é responsabilidade do professor conhecer os alunos,
mantendo proximidade com eles, de forma que ele enquanto professor possa organizar e
adequar a aprendizagem desenvolvendo e trabalhando o conteúdo das disciplinas.
É oportuna a colocação de Davis e Oliveira (1994) a respeito da troca de influências
presente nessa interação na qual o professor deve procurar através do bom-senso,
compreender as dificuldades dos alunos movidos pelos mais diversos motivos, que
correspondem ao modo particular de agir, sentir e falar de cada aluno. O importante é não
perder o foco das interações em sala de aula, para que elas caminhem de modo produtivo,
para atingir o seu objetivo que vem a ser a construção compartilhada de conhecimentos.
Vários recursos podem ser usados pelo professor em sala de aula, tais como:
perguntar, expor, incentivar, explicar, coordenar etc., motivando os alunos a participarem,
usando o diálogo e a comunicação para a construção do conhecimento.
“A interação em sala de aula envolve, pois, ajuste de ações que levam à construção
partilhada (ou seja, conjunta) de significados nas situações de aprendizagem. Nesse processo,
mestres e aprendizes se respeitam como pessoas como sujeitos únicos que possuem
experiências diversas dentro de uma mesma cultura” (DAVIS E OLIVEIRA, 1994, p.90).
52
O papel mediador do professor não é, portanto, só ensinar, instruir e construir
conhecimentos. Nesse sentido, é importante que o professor respeite a maneira diferente de
pensar e de agir de seus alunos adolescentes, que implica no respeito à individualidade e a
experiência de vida de cada aluno.
Vigotski não se refere ao termo afeto ou afetividade em suas teorias, mas deixa
evidente na subjetividade da palavra emoção e sentimento a “marca” do valor por ele
atribuído à presença do afeto no processo educativo.
Como o próprio Vigotski (2004, p.143) diz:
Daí abre-se para o pedagogo nas emoções um meio sumamente rico de educação
dessas ou daquelas reações. Nenhuma forma de comportamento é tão forte quanto
aquela ligada a uma emoção. Por isso se quisermos suscitar no aluno as formas de
comportamento de que necessitamos teremos sempre de nos preocupar com que
essas reações deixem um vestígio emocional no aluno [...] As reações emocionais
exercem influência mais substancial sobre todas as formas do nosso
comportamento e os momentos do processo educativo. Queremos atingir uma
melhor memorização por parte do aluno ou trabalho melhor sucedido do
pensamento, seja como for devemos nos preocupar que tanto uma quanto outra
atividade seja estimulada emocionalmente. [...] Sempre que comunicamos alguma
coisa a algum aluno devemos procurar atingir o seu sentimento.
O pesquisador soviético falava dos afetos como condição vital e essencial que existe
na interação entre professor e aluno. Imprescindível, portanto, não esquecer que Vigotski
delega ao professor a responsabilidade de, ao se trabalhar com os alunos, tenha consciência do
universo das emoções, dos sentimentos e afetos dos educandos estão tão presentes quanto os
processos cognitivos. “[...] São precisamente as reações emocionais que devem constituir a
base do processo educativo [...]” (VIGOTSKI, 2004, p.144).
Outro aspecto essencial da teoria de Vigotski é com relação a seu ponto de vista
acerca do desenvolvimento, uma vez que este deve ser olhado de maneira prospectiva e não
retrospectiva, isto é, deve se olhado para frente, para aquilo que ainda não aconteceu.
Normalmente, as pessoas olham para aquilo que aconteceu, que já passou. Dessa
forma, o interesse das pessoas é perguntar se a criança senta, se sabe andar, quais
palavras ela sabe falar, se ela já sabe ler e escrever. Então, o desejo normal das pessoas é com
relação àquilo que já está consolidado, ao que terminou, ou melhor, àquilo que está
pronto na criança. No entanto, a teoria de Vigotski apresenta uma visão diferente a esse
respeito. Ele vai olhar para aquilo que está em processo, que está por acontecer. É nessa
circunstância que pode ocorrer a intervenção pedagógica, ou seja, é o momento propício no
53
qual o professor ou educador (ou outra pessoa) atua no processo de desenvolvimento de cada
sujeito, promovendo a aprendizagem, que por sua vez, promove o desenvolvimento.
Essa idéia central da teoria de Vigotski vai encontrar sua fundamentação e
explicação na zona de desenvolvimento proximal ou potencial.
Para compreender a zona de desenvolvimento proximal é necessário conhecer dois
outros conceitos, os quais são também citados por Vigotski: o nível de desenvolvimento real e
o nível de desenvolvimento potencial.
Oliveira (1997, p. 59) explica esse dois níveis da seguinte forma:
[...] Para ser considerada como possuidora de certa capacidade, a criança tem que
demonstrar que pode cumprir a tarefa sem nenhum tipo de ajuda. Vygotsky
denomina essa capacidade de realizar tarefas de forma independente de nível de
desenvolvimento real. [...] São resultados de processos de desenvolvimento já
completados, já consolidados.
Esse nível refere-se ao desenvolvimento passado, aquele no qual se chegou, ou
seja, as conquistas já realizadas. Na outra extremidade está o nível de desenvolvimento
potencial, que diz respeito àquilo que a criança ainda não conseguiu, mas que se pode supor
que está próximo de acontecer.
Oliveira (1997, p. 59) refere-se às condições da criança “no seu nível de
desenvolvimento potencial, isto é sua capacidade de desempenhar tarefas com a ajuda de
adultos ou de companheiros mais capazes”.
Existem atividades que uma criança não é capaz de desempenhar sozinha, mas se ela
tiver assistência, ou seja, se alguém lhe ensinar, demonstrar-lhe como faz, lhe dar explicações
e ajuda, ela será capaz de realizar a atividade ou tarefa que antes não conseguia fazer sozinha.
Por exemplo, um quebra-cabeça que se ensina à criança como ela deve montar
aquela figura do “menino” exatamente como àquela da gravura do modelo, explicando que
este brinquedo é feito de pequenas peças que ela pode ir juntando até completar totalmente a
gravura. Depois pode ser feita uma demonstração e a pessoa vai lentamente ajudando a
criança a montar o quebra-cabeça, ensinando-lhe como juntar as peças a que ela consiga
terminar o quebra-cabeça que deve conter o número de peças, de acordo com a idade da
criança. É um processo gradativo, até que a criança consiga realizar sozinha a atividade de
montar o quebra-cabeça.
É muito oportuna a colocação de Oliveira (1997) ao dizer que a mudança no
desempenho de um sujeito pela intervenção de outro é básico na teoria de Vigotski, porque
representa um determinado momento do desenvolvimento. Como ela própria diz, “não é
54
qualquer indivíduo que pode, a partir da ajuda de outro, realizar qualquer tarefa” (OLIVEIRA,
1997, p. 59).
O que a autora quer dizer é que, para que uma pessoa (criança ou adolescente) possa
realmente aproveitar e se beneficiar da ajuda do outro (de um companheiro mais experiente),
deve ocorrer num certo momento propício do desenvolvimento, nunca antes. Então, uma
criança de quatro anos não será capaz, por exemplo, de montar um quebra-cabeça de cem
peças sozinho, mas o conseguirá com a ajuda de alguém, enquanto que uma criança de dois
anos não conseguirá faze-lo nem mesmo com a ajuda de outro, porque não irá entender como
se monta o quebra-cabeça de cem peças.
Essa parceria do sujeito com o companheiro mais experiente e capaz auxiliando o
primeiro identifica que essa ação pertence a um plano de desenvolvimento que está próximo
de se consolidar. Nessa circunstância ocorreu a ação da zona de desenvolvimento proximal. É
preciso entender que esse é conceito explicativo e não instrumental. Ou seja, ele não pode ser
medido, sendo também, um conceito flexível e complexo, porque ele não é claramente visível
na prática, uma vez que sofre transformações a toda hora.
Cita-se como exemplo, quando um professor entra na sala de aula com quarenta
alunos e vai trabalhar a adição com reserva. Ele terá quarenta zonas proximais em
movimento, porque cada vez que ele falar uma coisa estará alternado a zona proximal de
criança ou parte delas, pelo menos. (OLIVEIRA, 1997).
Portanto, pode-se definir de acordo com Oliveira (1997, p. 60), a zona de
desenvolvimento proximal:
A zona de desenvolvimento proximal refere-se, assim, ao caminho que o indivíduo
vai percorrer para desenvolver funções que estão em processo de amadurecimento e
que se tornarão funções consolidadas, estabelecidas no seu nível de
desenvolvimento real. A zona de desenvolvimento proximal é, pois, um domínio
psicológico em constante transformação: aquilo que uma criança é capaz de fazer
com a ajuda de alguém de hoje, ela conseguirá fazer sozinha amanhã.
Vigotski (1994) traz à tona uma discussão importante sobre aprendizado e
desenvolvimento da criança na fase escolar. Ele defende a idéia de qualquer que seja a
situação de aprendizado que a criança enfrente, ao dar início aos seus primeiros passos na
vida pré-escolar, ela traz consigo uma experiência anterior.
Então, como o próprio Vigotski diz: “Por exemplo, as crianças começam a estudar
aritmética na escola, mas muito antes elas tiveram alguma experiência com quantidades
55
tiveram que lidar com operações de divisão, adição, subtração e determinação de tamanho”
(VYGOTSKY, 1994, p. 110).
Ele quis dizer com isso, que as crianças, de forma geral, trazem na bagagem da curta
experiência de vida, a matemática na pré-escolar. Esse fato remete a outro, ou seja, de que o
aprendizado e desenvolvimento caminham juntos num processo de inter-relacionamento,
desde o início da vida da criança.
Vigotski (1994) refere-se a outros pesquisadores, como Koffka entre outros, que
aceitam o pensamento de que a desigualdade entre a forma do aprendizado pré-escolar e o
escolar está no motivo no qual o pré-escolar não é sistematizado e o escolar se trata de um
aprendizado sistematizado. Mas Vigotski argumenta que a sistematização não é o único
motivo que faz a diferença entre essas formas de aprendizado.
Ele afirma que existe outro motivo especial um conceito novo, de extrema
importância para completar o entendimento sobre as formas de aprendizado (o não
sistematizado aquele que aprendido fora da escola e o sistematizado aquele que é
aprendido dentro da própria escola) – que é a zona de desenvolvimento proximal.
Vigotski (1994) reflete para o fato de muitos pesquisadores jamais terem trazido à
tona de suas pesquisas e estudos, a idéia sobre a condição de a criança realizar tarefas com
ajuda de outras pessoas.
Segundo Vigotski (1994, p.112), a zona de desenvolvimento proximal:
[...] é a distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma determinar
através da solução independente de problemas, e o nível de desenvolvimento
potencial, determinado através da solução de problemas sob a orientação de um
adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes.
Assim, de acordo com Vigotski (1994), a zona de desenvolvimento proximal pode
ser usada como um recurso ou método para psicólogos e educadores para levantar
possibilidades num futuro próximo, das condições da criança e do seu desenvolvimento, não
por aquilo que a criança consegue realizar, como principalmente aquelas possibilidades
que estão a caminho de serem realizadas.
A zona de desenvolvimento proximal (ZDP) é considerada, segundo Newman e
Holzman (2002), a descoberta psicológica-metodológica mais importante de Vigotski.
No dizer dos autores:
Assim, foi crucial para descoberta-em-uso da ZDP a preocupação de Vygotsky com
o caráter da relação entre processos “maduros” e “em maturação” e, o que parece
56
totalmente ligado a isso (seguramente, assim pareceu a Vygotsky), a relação entre o
que a criança pode fazer independentemente e em colaboração com os outros
(NEWMAN e HOLZMAN, 2002, p. 72).
Na opinião dos autores, uma criança é capaz de produzir mais, com ajuda ou auxílio
do que sozinha, mas Vigotski percebeu um detalhe importante: a potencialidade da criança é
limitada em sua opinião, ainda que ela tenha ajuda de um adulto.
Newman e Holzman (2002) citam o exemplo da imitação infantil, explicando que
esta tem sido entendida como um processo mecânico pelo qual a criança tem condições para
imitar qualquer coisa. Esse modo de pensar está errado, na opinião de Vigotski, porque a
criança poderá imitar aquilo que consegue, ou seja, aquilo que está ao seu alcance dentro
do grau do seu desenvolvimento (zona de desenvolvimento proximal).
De acordo com Veer e Valsiner (2001), Vigotski coloca que as crianças têm
condições de ir mais longe com relação ao seu potencial pessoal, enquanto que os animais
estão estritamente limitados à zona de desenvolvimento real.
Vigotski deixou evidente que, embora fosse possível ensinar para os animais alguns
comportamentos que se encontram fora de suas ações normais, não significa que eles
pudessem possuir de alguma forma uma zona de desenvolvimento proximal. Esclarecendo
esse fato, afirma:
Neste caso, a operação seria executada simplesmente de uma forma automática e
mecânica, como um hábito sem significado, e não como uma decisão inteligente e
sensata [...] o animal, mesmo o mais inteligente, não pode desenvolver suas
possibilidades intelectuais por meio de imitação ou instrução. Ele não pode adquirir
nada essencialmente novo em relação ao que ele tem à sua disposição [...] Neste
sentido, pode ser dito que o animal não é capaz de aprender de fato, se entendermos
aprendizagem no sentido especificamente humano [...] O animal pode ser
treinado. Ele pode adquirir novos hábitos. Ele pode aperfeiçoar seu intelecto por
meio de exercícios e combinações, mas não é capaz de obter desenvolvimento
mental por meio de instrução no verdadeiro sentido da palavra. (VIGOTSKI, 1934,
apud VEER e VALSINER, 2001, p. 372).
Veer e Valsiner (2001) informam que Vigotski salienta a diferença entre humanos e
animais, e que neste caso, ele demonstra que esta diferença está na forma de aprendizagem:
uma que ocorre de forma consciente e a outra que ocorre por tentativa e erro. Em outras
palavras, no caso em questão, que se refere à imitação, deve ser feita uma separação que se
faz entre a imitação não-inteligente do comportamento observado no animal (que pode
imitar aquelas ações que, de uma maneira ou de outra são acessíveis a ele mesmo) e a
imitação lúcida e inteligente do comportamento da criança.
57
Segundo Vigotski (1994, p. 115), “[...] os animais são incapazes de aprendizado no
sentido humano do termo; o aprendizado humano pressupõe uma natureza social específica e
um processo através dos quais as crianças penetram na vida intelectual daquelas que as
cercam”.
Veer e Valsiner (2001) destacam que Vigotski demonstrou em seus estudos um
visível interesse a respeito da imitação, tendo sugerido que o brinquedo também pode
propiciar a zona de desenvolvimento proximal:
[...] O brinquedo também cria a zona de desenvolvimento proximal da criança. Na
brincadeira, a criança está sempre se comportando acima de sua idade, acima de seu
comportamento usual do dia-a-dia; na brincadeira ela está, por assim dizer, um
pouco adiante dela mesma. O brinquedo contém, de uma forma concentrada, como
no foco de uma lupa, todas as tendências de desenvolvimento; é como se a criança
tentasse pular acima de seu nível usual. A relação entre brinquedo e
desenvolvimento pode ser comparada com a relação entre instrução e
desenvolvimento... O brinquedo é uma fonte de desenvolvimento e cria a zona de
desenvolvimento proximal. (VIGOTSKI, 1933; 1966 apud VEER e VALSINER,
2001, p. 373).
Vigotski salientou a importância da brincadeira nas várias fases do desenvolvimento
cognitivo infantil. Nesse sentido, atribuía valor especial à imitação, ou à representação de
papéis, na qual a criança imita um modelo já conhecido, tal como brincar de ser “professora”,
de ser “mãe”, “médica” e outros. Essas atividades são benéficas, uma vez que, podem
estimular o aprendizado da criança e conseqüentemente, o desenvolvimento cognitivo.
O conceito de zona de desenvolvimento proximal e outras idéias importantes na
teoria de Vigotski oferecem informações básicas e fundamentais para o entendimento de
como acontece a integração entre ensino, aprendizagem e desenvolvimento.
Sabe-se que Vigotski uma atenção especial à escola e tudo que ela tem a oferecer
para o sujeito humano, uma vez que ela exerce um papel de destaque e insubstituível na
apropriação pelo indivíduo da experiência cultural construída através do tempo (REGO,
1995).
A escola oferece à criança, ao adolescente e ao adulto o conhecimento sistematizado.
Esse procedimento leva os sujeitos, à aquisição de informações, conhecimentos, idéias,
formas de pensar, raciocinar, conceber e conhecer o mundo com uma visão diferente, ampla, e
outros tantos benefícios que somente os sujeitos que passam pela escola podem usufruir.
Ao interagir com esses conhecimentos, o ser humano se transforma: aprender a ler e
a escrever, obter o domínio de formas complexas de cálculos, construir significados
a partir de informações descontextualizadas, ampliar seus conhecimentos, lidar com
58
conceitos científicos hierarquicamente relacionados, são atividades extremamente
importantes e complexas, que possibilitam novas formas de pensamento, de inserção
e atuação em seu meio. (REGO, 1995, p. 104).
A visão que se tem é a de que a criança, ao entrar na escola, inicia um caminho que
se alarga e clareia na medida em que vence etapas e progride. Os conhecimentos aprendidos
na escola são denominados por Vigotski de conceitos científicos, e são eles os responsáveis
por novas formas de operação intelectual, assim como as generalizações que vão interferir,
modificar e compreender a realidade ao redor da criança e do adolescente. A criança
gradativamente aumenta seus conhecimentos e conseqüentemente transforma a sua interação
com o mundo.
A escola é provavelmente o núcleo principal transformador de sujeitos, não
simplesmente pela enorme gama de conhecimentos que se obtêm através dela, mas
principalmente pela sua capacidade de transformar consciências, pelo desafio que ela propõe
de buscas externas, que trazem questões, dúvidas, dificuldades que acionam constantemente
novas necessidades cognitivas e afetivas que se renovam incessantemente.
Esse é um processo complexo da construção da criança e do adolescente, uma vez
que as fases ou etapas são próprias de cada indivíduo não se podendo dizer onde exatamente
começa uma e termina outra. Percebe-se que é um processo crescente, que evolui à medida
que as aquisições e experiências adequadas o feitas e, estas preparam e impulsionam o
indivíduo a seguir em frente, trabalhando pela sua própria constituição, que terá a marca de
sua singularidade e integridade individual.
É importante dizer que não se tem a pretensão de discutir como cada instituição
escolar trabalha, investe, cuida e favorece a formação de seus alunos, com suas limitações e
seus múltiplos problemas econômicos, sociais, políticos, organizacionais, curriculares e de
formação de professores.
O que se pretende aqui é deixar evidente que, na abordagem histórico-cultural de
Vigotski, a escola como fonte de aprendizagem e cultura forma o ser humano oferecendo-lhe
oportunidades de desenvolvimento e evolução que não seria possível de outra forma.
Assim, segundo Rego (1995, p. 107) “Vygotsky afirma que o bom ensino é aquele
que se adianta ao desenvolvimento, ou seja, que se dirige às funções psicológicas que estão
em vias de se completarem”.
Essa visão a respeito do desenvolvimento psicológico é extremamente significativa
para a educação, uma vez que abre as portas para o entendimento sobre os processos de
desenvolvimento que, embora latentes na criança e no adolescente, precisam de intervenção,
59
do auxílio e da colaboração de companheiros mais experientes e preparados em termos de
conhecimento e cultura para se efetivarem. Dessa forma, a intervenção pedagógica vista até
então como um aspecto formal do ensino aprendizagem, ganha um grande valor na educação,
na visão vigotskiana (REGO,1995).
O professor, à medida que intervém trabalhando na zona de desenvolvimento
proximal de seus educandos, motiva a ação de processos internos que produzirão resultados
construtivos na aprendizagem que irão suceder novas e constantes aprendizagens.
Rego (1995) ressalta como oportunas as colocações dos pressupostos de Vigotski
feita pelo russo Davidov, no que diz respeito ao ensino que impulsiona o desenvolvimento das
capacidades dos alunos. Para ele, a escola não deve ficar restrita à transmissão de conteúdos,
mas ensinar o aluno a pensar, refletir, elaborar conteúdos externos e internos para que ele
próprio encontre as vias de acesso e de aquisição do conhecimento construído, para que assim
possa fazer uso de todas essas conquistas no decorrer de sua existência.
Nas concepções de Vigotski, a construção de conhecimentos é possível através de
uma ação partilhada, o papel do outro nesta questão é fundamental, porque é através “dos
outros que as relações entre sujeito e objeto de conhecimento são estabelecidas” (REGO,
1995, p. 110).
O modelo principal dessas idéias indica um foco especial às interações sociais, que
se destacam nos sujeitos, professor e alunos, no âmbito escolar. As interações entre ambos os
sujeitos são priorizadas como condição imprescindível para a construção do conhecimento
por parte dos alunos.
Nesse processo interacional, as trocas de informações, os diálogos, a divergência de
opiniões, o confronto de idéias, as necessidades individuais, os afetos, desafetos, interesses,
enfim, a grande diversidade que se concentra no núcleo de uma sala de aula resulta num
complexo de conhecimentos, aprendizagem e experiência que se somarão na vida de alunos e
professores (REGO,1995).
No entanto, é importante salientar que cabe ao professor consciente compreender e
aceitar a presença dessa grande rede de interações em seus mais diversos aspectos, tais como
cognitivos, afetivos, sociais, culturais e inclusive, as dificuldades e conflitos de
relacionamento tão comuns entre docentes e alunos.
De acordo com Rego (1995), as diferenças individuais, que se expressam de forma
marcante em todos os grupos sociais, são as responsáveis pelo fato de que as interações em
sala de aula sejam olhadas e reconhecidas como um dos aspectos essenciais no contexto
escolar. Nesse sentido, cada professor e cada aluno trazem para o mundo da sala de aula, a sua
60
história pessoal, familiar, as experiências, os comportamentos, necessidades, gostos, desejos,
interesses, valores e conhecimentos.
Cada aluno, seja ele criança ou adolescente e cada professor vão realizar
possibilidades de trocas, de ajuda mútua e aprendizado.Cada um, dentro da sua singularidade
e individualidade, influenciará um ao outro, através da interação, num movimento crescente,
dinâmico e enriquecedor de vivências humanas.
Sabe-se que a abordagem histórico-cultural compreende o sujeito como ativo e
interativo no seu processo de conhecimento, uma vez que ele não é aquele indivíduo que
recebe passivamente todas as informações que vem do meio externo (REGO, 1995).
O aluno adolescente, em sua trajetória escolar, quando deu os primeiros passos na
busca pela aprendizagem sistematizada, passou por rias etapas importantes, devido a
necessidades de conhecimentos que deveriam ser apropriados. Estes não seriam possíveis sem
a intervenção e colaboração do professor (reconhecido como pessoa mais experiente, em nível
de cultura) e também um sujeito digno de todo o valor, respeito e consideração pelo trabalho
de relevância na educação de crianças e jovens do passado, presente e futuro.
Segundo Vigotski (1994), o aspecto relevante do aprendizado se resume no fato dele
dar origem à zona de desenvolvimento proximal. Isto significa que o aprendizado desencadeia
muitos processos internos do desenvolvimento, que ocorrem através da interação da criança
com adultos e outros companheiros mais capazes, que fazem parte do seu cotidiano. Estes
processos, uma vez internalizados, farão parte das conquistas do desenvolvimento da criança.
Assim, pelas colocações de Vigotski (1994, p. 118):
Desse ponto de vista, aprendizado não é desenvolvimento; entretanto, o aprendizado
adequadamente organizado resulta em desenvolvimento mental e põe em
desenvolvimento vários processos de desenvolvimento que, de outra forma, seriam
impossíveis de acontecer. Assim, o aprendizado é um aspecto necessário e universal
do processo de desenvolvimento das funções psicológicas culturalmente organizadas
e especificamente humanas.
É importante saber que Vigotski (1994) entende que o processo de desenvolvimento
caminha e progride lentamente, seguindo atrás do processo de aprendizado.
Compreender e analisar o processo educacional por esse prisma é mostrar que a
criança, tendo feito uma determinada aquisição na aprendizagem, (por exemplo, o domínio da
adição e subtração), vai possuir bases para o desenvolvimento de outros processos e
habilidades que poderão ser trabalhados em seqüência, na zona de desenvolvimento proximal.
61
A aprendizagem segue sempre à frente do desenvolvimento e ambos, embora não coincidam,
estão unidos desde o início da vida da criança.
Assim, se pode esclarecer um pouco mais as idéias de Vigotski (1994), em seus
pressupostos sobre o processo de aprendizado e desenvolvimento, tendo o conhecimento da
unidade e não a identidade entre ambos, e que naturalmente um seja transformado no outro.
Outro aspecto relevante desse pressuposto explica que, apesar do aprendizado estar
envolvido numa relação direta no transcurso do desenvolvimento infantil, os dois não se
concretizam em igual medida ou em paralelo.
Em Vigotski (1994, p. 119), “[...] O desenvolvimento nas crianças nunca acompanha
o aprendizado escolar da mesma maneira como uma sombra acompanha o objeto que o
projeta”.
Em resumo, todas essas informações e pesquisas do autor tinham como objetivo
principal demonstrar como ocorre o processo de internalização do conhecimento que vem de
fora, por intermédio do outro social presente na vida da criança, desde o seu nascimento. E,
também, compreender e reconhecer a importância da zona de desenvolvimento proximal
como elemento de interação social fundamental de construção das funções psicológicas
humanas.
Na concepção vigotskiana, o biológico e social exercem influência recíproca, o
homem constitui-se através das interações sociais, transforma e é transformado nas relações
produzidas em uma determinada cultura.
Assim, o desenvolvimento do ser humano é entendido como um processo de
apropriação e construção do sujeito na sua experiência histórica e cultural.
De acordo com Almeida (2004), Wallon também demonstrou um imenso respeito
pela instituição escolar e que esta deve abrir muitos caminhos para o alunado.
No Plano Langevin-Wallon, deixou registrado seu pressuposto, no qual a escola deve
oferecer aos alunos, de forma geral, uma estrutura sólida para que eles possam realizar os
estudos do amanhã. De acordo com este plano, a instituição escolar deve oferecer ainda,
oportunidade para as crianças e jovens adolescentes desenvolverem suas potencialidades,
aptidões, interesses e também serem reconhecidos em suas carências.
Nas palavras de Almeida (2004, p. 121), “[...] Wallon vai enfatizar que a criança e o
jovem se formam na cultura; que a escola é uma das responsáveis pela expansão da cultura;
que todos os alunos têm direito à cultura, independentemente de sua origem étnica, religiosa
ou social”.
62
A autora deixa explícito o pensamento de Wallon, que estabelece um vínculo
primordial entre escola e cultura. Esse nculo deve ser cuidado e trabalhado na instituição
escolar, que deve ter por objetivo não apenas a construção do conhecimento, mas também a
constituição da pessoa.
Na visão de Wallon, a escola jamais deve ficar limitada à instrução do aluno, mas ir
bem mais longe, olhando e considerando esse aluno como um sujeito em desenvolvimento,
que detém determinados conhecimentos, possibilidades e necessidades. E outro aspecto que
não pode deixado de lado é que o conhecimento ocorre durante a vida escolar do aluno, não
podendo ficar separado do ambiente físico e social. Pelo contrário, todos esses elementos
devem estar unidos, aproveitando todas as possibilidades e recursos que esse meio oferece
(ALMEIDA, 2004).
Outro ponto extremamente significativo apontado no Plano Langevin-Wallon é que a
escola deve formar o homem-cidadão, onde se subentende que é preciso cuidar da criança e
do jovem, oferecendo-lhes um bom alicerce para o seu desenvolvimento motor-afetivo-
cognitivo.
Almeida (2004, p. 123) argumenta que:
Para Wallon, o desenvolvimento da inteligência, na pessoa, está ligado ao
desenvolvimento de sua personalidade total, o que significa que a escola, para
possibilitar ao aluno as várias oportunidades para o conhecimento, deverá fazê-lo
levando em conta a pessoa completa, em processo de desenvolvimento, com as
dimensões cognitivas, afetiva e motora numa rede de intrincadas relações.
O desenvolvimento da pessoa no aspecto integral, ou seja, no aspecto motor-afetivo-
cognitivo implica em formação de valores, pessoais e grupais. Cabe à instituição escolar
juntamente com os conteúdos escolares, trabalhar também para dar formação aos seus alunos
valores de responsabilidade, uma consciência ética (desenvolvendo respeito por si mesmo e
pelo próximo) o respeito pelos direitos das pessoas, a ajuda mútua, principalmente para
aquelas que integram o mesmo grupo no contexto do mundo em que vivem.
Ao difundir as concepções de Wallon, Almeida (2004), explica que a psicogênese no
ser humano está ligada a dois fatores: ao orgânico e ao meio ambiente.
Afirma que o desenvolvimento é um suceder contínuo de mudanças e transformações
que acontecem pela interação de elementos que estão predispostos devido aos aspectos
genéticos e pelos fatores presentes no meio-ambiente. Isto é, de acordo com as condições
biológicas de cada pessoa, o sujeito encontrará no ambientes condições para promover e
realizar suas potencialidades ou não. É através desse meio e no confronto freqüente com as
63
novas situações, possibilidades, dificuldades e necessidades, que vão ocorrer consecutivas
aprendizagens (ALMEIDA, 2004).
Devido a essa forma de conceber e compreender o sujeito na teoria de Wallon
entende-se que ela faz parte da abordagem sócio-histórica. Por este enfoque entende-se que o
fenômeno psicológico é constituído através da interação com o outro, na história e na
sociedade, da qual o sujeito humano está integrado desde o seu nascimento.
O aluno é visto por Wallon como uma pessoa completa nos aspectos cognitivos,
afetivos e motor. Estes estão totalmente interligados, e por esta razão cada aspecto torna-se
parte constituinte do outro. A atividade pedagógica envolve todos esses aspectos, tendo por
meta o desenvolvimento de todos eles (ALMEIDA, 2004).
Wallon (1975) interpreta a individualidade e a realidade do aluno com relação a sua
parte biológica e o momento histórico no qual está inserido. É de acordo com essa realidade
que, o aluno vai efetivar o desenvolvimento dos aspectos cognitivo, afetivo e motor, levando-
se em conta as condições que o meio-ambiente possa oferecer para o sujeito aluno. É preciso
lembrar que este desenvolvimento não acontece de forma regular e uniforme. Pelo contrário, a
trajetória normal é feita de movimentos dinâmicos que progridem e avançam, mas que
também retrocedem.
É importante saber que a série de estágios com relação ao desenvolvimento, na
concepção de Wallon, ocorre com a predominância de determinados comportamentos, que
acontecem em função das possibilidades e oportunidades do momento (ALMEIDA, 2004).
Segundo Almeida (2004), nos estudos de Wallon o professor tem um papel
fundamental na constituição do sujeito aluno. Nas palavras da autora:
Como a teoria enfatiza a pessoa com as dimensões afetiva, cognitiva e motora
integradas e se nutrindo reciprocamente, o professor deve buscar sua ação
fundamentada no pressuposto de que o que o aluno conquista no plano afetivo é um
lastro para o desenvolvimento cognitivo, e vice-versa. A teoria pressupõe uma
íntima relação entre emoção e cognição, logo o professor precisa criar condições
afetivas para o aluno atingir a plena utilização do funcionamento cognitivo e vice-
versa. (ALMEIDA, 2004, p.126).
A autora ressalta na teoria de Wallon a forte conexão entre emoção e cognição. E
nessa perspectiva, o papel primordial do professor ocorre no sentido de ter clareza sobre as
relações afetivas que propicia, para que o aluno tenha condições de utilizar da melhor forma
possível as funções cognitivas e estas por sua vez favorecem a expressão da afetividade.
Nesse contexto, é importante lembrar que todos os acontecimentos que envolvem a
vida de uma pessoa têm o peso afetivo, sendo que este está fundamentado na emoção. E a
64
emoção se faz visível na expressão corporal. Devido a esse recurso, o professor pode fazer a
leitura corporal de seu aluno, percebendo a motivação, a indiferença, a falta de atenção, o
cansaço, o modo de falar, a postura corporal (tônus), a participação ou não da aula. Enfim,
todos esses fatores são indicadores de como os alunos estão interpretando o professor e qual o
procedimento de ensino que está sendo administrado (ALMEIDA, 2004).
Almeida (2004) coloca que o professor tem a função de mediador entre o aluno e o
conhecimento. E nessa mediação participam os aspectos afetivo e cognitivo. Nesse trabalho, é
responsabilidade do professor o uso da afetividade para gerar conhecimento, na relação
professor-aluno e entre os próprios alunos.
Uma vez consciente da importância da afetividade, o professor deverá propiciar um
melhor ambiente afetivo na sala de aula, para motivar o interesse dos alunos.
Informa a autora que Wallon entende que a criança (e, naturalmente o adolescente
também) necessita de um educador para ajudá-la a utilizar suas aptidões e potencialidades:
[...] O professor, por conhecer o processo de desenvolvimento e aprendizagem, está
capacitado para reconhecer e atender às necessidades e possibilidades dos alunos.
Ele representa o entorno humano ordenado, sistematizado, para dar apoio às crianças
em suas tarefas de desenvolvimento. O professor é, portanto, um elemento
privilegiado do meio constituinte do seu aluno. (ALMEIDA, 2004, p. 127).
É interessante observar que a visão de Wallon sobre o professor é de alguém
realmente especial no âmbito escolar. É o sujeito que conhece o caminho do desenvolvimento
e aprendizagem que o aluno vai percorrer. Ele sabe que esse caminho é preenchido de
facilidades e de dificuldades, de limitações a serem superadas, de problemas a serem
resolvidos, de desafios e etapas a serem vencidas, que exigem a tarefa do aprendizado.
Na escola se concentra o lugar de encontros pessoais e grupais. O lugar de
relacionamentos de professor-aluno, alunos e seus pares e todos os outros membros que fazem
parte da instituição escolar.
Nesses encontros ocorre a formação de vínculos que marcam a lembrança de
crianças e jovens, os quais se perpetuam pelo resto da vida.
Expressando ainda o pensamento de Wallon através de Almeida (2004), sobre a
figura do professor, a autora argumenta ser ele o sujeito capaz para compreender e atender “as
necessidades e possibilidades dos alunos.” Olhando em um nível mais profundo, o professor é
realmente o sujeito especial de todo contexto escolar para dar suporte, orientação, referência,
informação, conhecimento para o desenvolvimento e aprendizado do aluno. Caberá a ele,
principalmente, a responsabilidade de contribuir para a constituição e construção desse
65
sujeito-aluno, criança ou jovem que, na concepção de Wallon, devem formar o homem-
cidadão.
Almeida (2004) elucida com clareza a finalidade da vida na escola para o aluno e
razão principal de sua existência:
Nosso objetivo, como o de Wallon, é formar o homem-cidadão, e acreditamos que,
ao lado dos conteúdos escolares, os métodos empregados, a postura dos professores,
a estrutura e a gestão da escola são instrumentos fortemente formadores.
Reconhecemos, com ele, que o desenvolvimento motor-afetivo-cognitivo deve levar
a formação de valores de responsabilidade, de cooperação, de solidariedade, de
respeito, e conseqüentemente, a projetos de vida éticos. (ALMEIDA, 2004, 136).
Observa-se que a autora atribui relevância substancial à instituição escolar, aos
conteúdos escolares e ao papel do professor, o qual colabora com elementos essenciais na
formação e constituição do sujeito aluno, que tem por base o desenvolvimento-motor-afetivo-
cognitivo. E o mestre tem, por sua vez, a oportunidade de influir na formação do caráter de
todo homem digno, responsável e íntegro “pela mais importante das aprendizagens – a
aprendizagem de ser homem-cidadão” (ALMEIDA, 2004, p. 138).
Supõe-se que muitos docentes não sejam conscientes da responsabilidade, da
oportunidade especial que têm nas mãos, no sentido de participar, trabalhar e influenciar a
formação da personalidade de crianças e jovens, através da interação afetiva entre professor-
aluno na sala de aula.
Sob esse prisma, se faz importante conhecer e admitir a colocação de Almeida (2005,
p. 107):
A escola ainda não descobriu que a mudança deve ocorrer não no tipo de relação
aliás, a única que deve prevalecer é a original (professor-aluno) – mas, na atuação do
professor, assumida como a de um observador, intérprete perspicaz, capaz de
identificar os entraves que se estabelecem entre o par professor-aluno, para melhor
saber lidar com a teia das relações que se criam na apropriação do conhecimento.
Percebe-se que o foco central no cenário escolar continua sendo o mesmo: a relação
professor-aluno. Porém, a diferença quem faz é o professor, através da sua postura, de sua
capacidade de observar, interpretar e compreender os aspectos presentes na interação, de
forma que possa administrar adequadamente a gama de fatores que influenciam a relação
professor-aluno, mantendo a meta de sempre: a construção do conhecimento, sem esquecer
que a relação professor-aluno é uma relação entre duas pessoas e nela o afeto está sempre
presente.
66
Almeida (2005) elucida que mesmo quando o professor acredita manter uma relação
“afetuosa” com seus alunos, normalmente existe uma limitação na noção de afeto. Ou seja,
são reconhecidas apenas como afetivas aquelas manifestações que envolvem contato físico,
não levando em consideração outros aspectos presentes numa relação de afeto.
Sobre o assunto em questão, Almeida (2005, p. 90) argumenta:
O professor desconhece que a afetividade evolui, isto é, à medida que se
desenvolvem cognitivamente, as necessidades afetivas da criança tornam-se mais
exigentes. Por conseguinte, passar afeto, inclui não apenas beijar, abraçar, mas
também, conhecer, ouvir, conversar, admirar a criança. Conforme a idade da
criança, faz-se mister ultrapassar os limites do afeto epidérmico, exercendo uma
ação mais cognitiva no nível, por exemplo, da linguagem.
É de vital importância que os professores, tanto da educação infantil, quanto do
Ensino Médio, tenham conhecimento a respeito da afetividade, e que esta, dependendo da
idade do aluno (no caso, alunos adolescentes) solicita uma nutrição afetiva mais cognitiva e
racionalizada, assim como os adultos.
Assim, para um aluno, receber um elogio, uma conversa, uma atenção especial da
parte do professor, e principalmente perceber que ele se interessa pela sua vida e seu
aprendizado, são formas de demonstração afetiva. (ALMEIDA, 2005).
Conclui-se esse assunto, deixando explícito o papel do professor na visão de Wallon:
Na raiz do pensamento pedagógico walloniano uma especificidade assinalada ao
professor: ele é o eixo da atividade pedagógica. Ao se incumbir da função do
conhecimento, o professor deverá atuar como um arguto observador, no sentido de
articular, sempre que possível, os aspectos afetivo e intelectual, ambos inseparáveis
e presentes na atividade pedagógica. (ALMEIDA, 2005, p. 103).
67
3 METODOLOGIA DA PESQUISA
Em um trabalho científico faz-se imprescindível compreender o conceito de
pesquisa. De acordo com Rudio (1986, p. 09):
“Pesquisa”, no sentido mais amplo, é um conjunto de atividades orientadas para a
busca de um determinado conhecimento. A fim de merecer o qualificativo de
científica, a pesquisa deve ser feita de modo sistematizado, utilizando para isto um
método próprio e técnicas específicas e procurando um conhecimento que se refira à
realidade empírica.
A definição deixa evidente que para a realização de uma pesquisa é fundamental a
reunião de uma série de atividades que têm por foco principal buscar o conhecimento sobre
um determinado assunto, o que traz dúvidas e questionamentos. Além disso, os
procedimentos adequados para a pesquisa científica devem ser organizados, sistematizados e
estruturados com base em recursos e técnicas especiais que dizem respeito à realidade
empírica.
Rudio (1986) esclarece ainda que “realidade empírica” pode ser entendida como tudo
aquilo que existe na experiência concreta, que pode ser conhecido através da experiência e
que se mostra para o homem por intermédio dos fatos.
Ressalta o autor, que grande parte dos trabalhos realizados pela ciência, busca o
conhecimento de fatos, que o homem conhece, mas existem outros que o homem
desconhece, ou ainda não pode supor a abrangência de suas implicações. Nessa situação, a
pesquisa é apropriada para fazer “descobertas” (RUDIO, 1986).
Não se trata de apenas de realizar descobertas, um dos trabalhos importantes em um
plano de pesquisa é definir os fatores que estão presentes e influenciam a situação (RUDIO,
1986).
Assim, determinado assunto que sucinta um questionamento, traz consigo inúmeras
nuances e aspectos do tema (problema) que poderão ser abordados, sendo que todos eles
poderão trazer contribuições novas ou ainda que possa aprofundar e esclarecer o assunto da
pesquisa a ser desenvolvida e trabalhada.
A pesquisa qualitativa é a mais apropriada aos interesses e propósitos desse estudo.
Argumenta Minayo (1994, p. 22) que:
A pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares. Ela se preocupa, nas
ciências sociais, com um nível de realidade que não pode ser quantificado. Ou seja,
68
ela trabalha com um universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores,
e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos
processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos a operações de variáveis.
Percebe-se, portanto, que a pesquisa qualitativa busca a realidade dos fenômenos que
não podem ser medidos, quantificados, mas que devido à ausência de dados concretos, ela
pode ocupar-se em transitar para um mundo de valores, significados, ciências, interesses,
motivações e comportamentos, adentrando-se em um nível mais fundo no campo das ações e
relações humanas.
De acordo com Freitas (2002, p.26):
O
s estudos qualitativos com o olhar da perspectiva sócio-histórica, ao valorizar os
aspectos descritivos e as percepções pessoais, devem focalizar o particular como
instância da totalidade social procurando compreender os sujeitos envolvidos e, por
seu intermédio, compreender também o contexto
.
A autora argumenta que a pesquisa qualitativa sócio-histórica solicita uma visão do
fenômeno em sua totalidade, devendo-se considerar todos os elementos que envolvem uma
situação, bem como suas interações e influências recíprocas.
Ressalta Freitas (2002), que o tipo de pesquisa em questão não acontece com base
nos resultados, mas o que se deseja conseguir é o entendimento da conduta dos sujeitos
investigados a partir de suas concepções, estando esta relacionada ao meio específico do qual
são partes integrantes.
Reafirmando as idéias de Freitas (2002), a pesquisa qualitativa que tem como
alicerce a abordagem histórico cultural, tem por meta a compreensão dos fenômenos
investigados e suas relações à constante integração do individual com o social.
A partir do enunciado sico das teorias de Vigotski de que as funções psicológicas
superiores são construídas no social, através do processo de interação, facultado pela
linguagem, e concretizados na apropriação individual, “Vygotsky também vê a pesquisa como
uma relação entre sujeitos, relação esta que se torna promotora de desenvolvimento por um
outro” (Freitas, 2002, p.25). Nesse sentido, percebe-se a importância do pesquisador como
elemento mediador na situação da pesquisa, não sendo possível a ele uma postura de
neutralidade.
O apontamento de Rudio (1986), sobre o método da pesquisa científica deve ser
levado em consideração pela objetividade como é descrito.
69
[...] O método é o caminho a ser percorrido, demarcado, do começo ao fim, por
fases ou etapas. E como a pesquisa tem por objetivo um problema a ser resolvido, o
método serve de guia para o estudo sistemático do enunciado, compreensão e busca
de solução do referido problema. (RUDIO, 1986, p. 17).
Assim sendo, compreende-se que o método é o roteiro principal que vai nortear o
rumo da pesquisa, favorecendo segurança no decorrer das etapas, que se sucedem
gradativamente até o final, no qual espera-se que ocorra a solução (parcial ou total) do
problema chave, que se constitui o motivo principal da pesquisa.
Vigotski (1994) estabeleceu em seus estudos e pesquisas, métodos apropriados às
suas idéias e concepções, e com eles, uma original estrutura analítica.
Nesse enfoque, priorizou alguns procedimentos metodológicos como fundamentais
para a experimentação e análise do comportamento humano e das funções psicológicas
superiores.
O primeiro princípio teve como idéia central a importância de se analisar os
processos e não os objetos.
Vigotski argumenta que “[...] Qualquer processo psicológico, seja o desenvolvimento
do pensamento ou do comportamento voluntário, é um processo que sofre mudanças a olhos
vistos” (VYGOTSKY, 1994, p.81).
Decorre da necessidade de analisar o processo, acompanhando as suas mudanças
naturais que permeiam toda história dos processos psicológicos.
O segundo princípio da abordagem analítica de Vigotski, diz respeito à explicação
versus descrição. Este consiste em buscar explicar os fenômenos e não apenas descrevê-los.
“[...] A mera descrição não revela as relações dinâmico-causais reais subjacentes ao
fenômeno. [...] chamamos análise genotípica, através da qual um fenômeno é explicado com
base na sua origem, e não na sua aparência externa” (VYGOTSKY, 1994, p. 82).
O terceiro princípio básico da abordagem analítica de Vigotski fala do problema do
“comportamento fossilizado”. Estes são reconhecidos por “processos psicológicos
automatizados ou mecanizados”, que por esta razão criam muitas limitações e dificuldades
para a análise psicológica e por isso, devem ser evitados pelo pesquisador.
Vigotski apresentou, nestas teorias, uma visão crítica à maioria dos pesquisadores
que estudam o desenvolvimento da criança. Para eles, estudar um assunto historicamente
significa estudar um evento que ocorreu no passado, enquanto que, para Vigotski:
Estudar alguma coisa historicamente significa estudá-la no processo de mudança:
esse é o requisito básico do método dialético. Numa pesquisa, abranger o processo
de desenvolvimento de uma determinada coisa, em todas as suas fases e mudanças –
70
do nascimento à morte significa, fundamentalmente, descobrir sua natureza, sua
essência, uma vez que “é somente em movimento que um corpo mostra o que é”.
Assim, o estudo histórico do comportamento não é um aspecto auxiliar do estudo
teórico, mas sim sua verdadeira base. (VYGOTSKY, 1994, p. 85-86).
Isto significa que, no enfoque do método dialético de Vigotski, os fenômenos
necessitam ser estudados no seu processo de mudança, portanto, na sua história.
Ao optar pela metodologia qualitativa, pretende-se enfatizar um trabalho que prioriza
mais os processos que os produtos, de acordo com a perspectiva histórico-cultural de Vigotski
(VYGOTSKY, 1994).
Acredita-se que o enfoque histórico-cultural permite o conhecimento, o
entendimento, que amplia a visão trazendo a convicção da importância vital da relação do
indivíduo com o social.
3.1 PROCEDIMENTO DA COLETA DE DADOS
Primeiramente, entrou-se em contato com a coordenadora do colégio responsável
pelo ensino médio, para solicitar a permissão para a realização da pesquisa. No primeiro
contato, no dia 14/08/2006, com a coordenadora, foram explicados o projeto da pesquisa e a
necessidade da entrevista com os professores e alunos, bem como a filmagem em sala de aula
da primeira série do ensino médio.
A coordenadora informou que a da realização da pesquisa era viável, desde que
houvesse autorização por parte do diretor do colégio.
No mesmo dia, entrou-se em contato por telefone com o diretor do colégio, que
pediu um tempo para pensar e conversar com a coordenadora do ensino médio e dar um
retorno assim que possível.
Foi feito um segundo encontro em 17/08/2006, entre a pesquisadora, o diretor do
colégio e a coordenadora do ensino médio e fundamental.
Nesta ocasião, o diretor solicitou à pesquisadora que explicasse para todos o
procedimento da pesquisa com maiores informações.
Assim foi feita a explicação da proposta sobre a realização do trabalho de pesquisa,
sendo que este deveria ocorrer através de entrevistas e filmagens com professores e alunos. E
para isso, seria necessário que houvesse a aceitação de todos.
71
Nessa oportunidade, foi explicado a respeito do sigilo em que estariam envolvidos
todos os participantes da pesquisa: a identidade da instituição, dos alunos e professores seria
completamente preservada.
A proposta foi aceita por todos. Após essa etapa inicial, a pesquisadora solicitou à
coordenadora permissão para entrar em contato com alguns docentes da primeira rie do
ensino médio, para que pudesse encontrar quatro professores que aceitassem participar da
pesquisa.
Uma vez feita essa definição, foi feito um contato breve com cada um, com a
finalidade de explicar com mais detalhes sobre o trabalho de pesquisa a ser realizado. Para
tanto, seria necessária a colaboração deles para uma entrevista individual e após esta, haveria
as filmagens em sala de aula. A pesquisadora informou também aos professores, que seriam
feitas três sessões de filmagens para cada um dos quatro professores do ensino médio
(totalizando doze sessões de filmagens).
O trabalho com a entrevista de professores, realizados no mês de setembro de 2006
foi desenvolvido dentro de uma abordagem qualitativa através de entrevistas semi-
estruturadas com as quais se buscou identificar aspectos da afetividade apontados por
professores que trabalham com adolescentes. O roteiro é apresentado no anexo.
Na primeira fase de coleta de dados, foram realizadas entrevistas com quatro
docentes, apresentados aqui com nomes fictícios: professor Walter (língua portuguesa), de 57
anos, com formação em mestrado e doutorado; professora Maura (técnicas de redação), 53
anos, com vinte anos de experiência docente, formação acadêmica em Letras; professor Lucas
(geografia), 36 anos, quatro anos de experiência docente, formação acadêmica em Direito;
professor Julio, 51 anos (química), com trinta e dois anos de experiência docente e com
formação em Engenharia Mecânica.
As entrevistas foram gravadas e transcritas para a análise.
Na segunda fase, foram feitas sessões de filmagens, uma vez por semana, com
duração de 50 minutos, com cada um dos quatro professores. O período das filmagens
aconteceu entre 30 de outubro a 20 de novembro de 2006. As filmagens foram realizadas em
parceria entre a pesquisadora e a técnica de filmagem. A câmera foi fixada em um canto sobre
um grande degrau situado na parte da frente da sala. Esse ponto estratégico permitiu focar da
melhor forma a exposição da aula, a movimentação corporal, a postura, a expressão facial dos
professores e alunos. Nesse sentido, a câmera procurou focos de aproximação da classe como
um todo e dos alunos individualmente, mas principalmente do professor. As filmagens foram
transcritas na íntegra, para posterior análise.
72
A terceira e última etapa metodológica foram as entrevistas com os alunos. Estas
buscaram conhecer e identificar a opinião dos alunos sobre a concepção de afetividade e a
relação desta com a aprendizagem e as dificuldades observadas na interação afetiva. Os
alunos foram selecionados com a ajuda da coordenadora, que sugeriu alguns nomes. Entrou-
se em contato pessoalmente com nove alunos, fazendo o convite e explicando particularmente
como seria a entrevista: o assunto, o conteúdo das perguntas, a finalidade das entrevistas e
que estas seriam feitas e gravadas individualmente. Todos foram informados que a identidade
ficaria sobre sigilo, através do anonimato de seus nomes.
Sete alunos aceitaram participar da entrevista que foi agendada de acordo com a
disponibilidade de cada um. Estas foram realizadas no próprio colégio no qual estudam, sendo
iniciadas no mês de novembro e terminadas na primeira semana de dezembro de 2006.
Entre os alunos, quatro, são do sexo feminino (Roberta, 15 anos; Laura, 16 anos;
Ângela, 15 anos e Anita, 15 anos) e três do sexo masculino (Renato, 15 anos; Marcos, 16 anos
e Daniel, 16 anos). Todos os nomes aqui apresentados são fictícios.
O conteúdo das questões feitas aos professores foi o mesmo apresentado aos alunos.
Tendo sido solicitado ainda aos alunos que indicassem na opinião deles o professor mais
afetivo. As entrevistas foram transcritas e analisadas.
3.2 PROCEDIMENTO DA ANÁLISE DOS DADOS
É importante compreender o propósito da fase da análise de acordo com a premissa
de Gomes (1994) que se resume em três etapas, sendo que a primeira deve buscar a
compreensão dos dados coletados, a segunda visa responder as questões formuladas, e a
terceira e última pretende ampliar o quanto possível o conhecimento sobre o assunto
pesquisado.
O procedimento da organização para análise dos dados teve como suporte os vários
recursos utilizados para o desenvolvimento da pesquisa, tais como anotações feitas no diário
de campo, as transcrições das gravações das entrevistas do grupo de sujeitos, as filmagens
realizadas em sala de aula (que passaram pelas etapas de descrição), análises das descrições
abrangendo o macro-contexto das filmagens, seleção de episódios, transcrição dos episódios
selecionados e, finalmente, a análise microgenética destes episódios.
73
Evidencia-se que na entrevista de uma pesquisa qualitativa de caráter sócio-cultural
se sobressai, além da subjetividade e singularidade dos sujeitos, a extensão da herança social e
cultural que envolvem os mesmos, nos mais diversos aspectos.
Como afirma Freitas (2002, p. 29): “Na entrevista é o sujeito que se expressa, mas
sua voz carrega o tom de outras vozes, refletindo a realidade de seu grupo, gênero, etnia,
classe, momento histórico e social.”
Gomes (1994) propõe uma análise e interpretação dos dados, que a seu ver estão
unidas no mesmo movimento e direção, que é olhar cuidadosamente para os dados da
pesquisa, sugerindo a construção de categorias analíticas para identificar e analisar fatores
fundamentais a serem compreendidos na questão a ser investigada.
Explicita Gomes (1994) que o objetivo de se trabalhar com categorias implica em
reunir elementos, idéias ou formas de expressões, que dizem respeito a um conceito que possa
englobar toda essa reunião.
As categorias empíricas construídas com base nas entrevistas realizadas estão
relacionadas com os conteúdos provenientes do embasamento teórico, no sentido de buscar
uma relação analítica entre eles.
Tendo por base tais informações efetuou-se a seleção de conteúdos relevantes
auferidos nas respostas dos sujeitos dos quais se buscou identificar e compreender concepções
e interações sobre o tema principal abordado: a questão da afetividade no espaço da sala de
aula.
Em seguida foram apresentados e analisados os dados referentes aos registros das
filmagens. Góes (2000, p.14) esclarece através de Wertsch (1985) que a pesquisa de Vigotski
“define a análise microgenética como aquela que envolve o acompanhamento minucioso da
formação de um processo, detalhando as ações dos sujeitos e suas relações interpessoais,
dentro de um curto espaço de tempo”.
Destaca-se, assim, nesse tipo de análise, que o termo micro requer observar as
minúcias, os detalhes dos eventos e genética, focaliza o movimento do comportamento dos
sujeitos e suas formas de relacionamentos com outras pessoas em reduzido espaço de tempo.
Explicita ainda Góes (2000), que genética em pesquisa de base histórico-cultural,
implica no fato dela significar condições históricas, que têm por objetivo focar o movimento
do sujeito que ocorre durante os processos. E através destes, relacioná-los a condições
passadas e presentes, na tentativa de explorar aquilo que no presente é apresentado como
comportamento importante a ser observado e analisado, para que assim, seja possível
estabelecer projeções futuras.
74
Considera-se, portanto, que o recurso da análise microgenética possibilita entender,
como os sujeitos analisados estão interagindo, se posicionando e elaborando seu
procedimento no espaço da sala de aula, imersos em determinado contexto social e cultural.
Enfatiza-se que o núcleo dessa análise concentra-se na intersubjetividade presente, na
singularidade e constituição dos sujeitos com a finalidade de interpretar e compreender o
papel mediador do docente e a questão da afetividade no processo ensino-aprendizagem.
De acordo com o exposto, a análise deste trabalho foi organizada por etapas.
Primeiro elaborou-se a definição das categorias para análise das entrevistas, identificadas
como: 1. Concepções sobre afetividade; 2. Relação entre afetividade e aprendizagem; 3.
Dificuldades relacionadas à afetividade. Em seguida, procedeu-se às análises a partir das
filmagens, nos quais foram analisados episódios extraídos das aulas dos professores Walter;
Julio; Maura e Lucas.
Na seqüência são apresentadas as caracterizações da Instituição onde se desenvolveu
a pesquisa e dos professores foco do estudo, para uma melhor compreensão dos aspectos
sócio-históricos no quais os sujeitos se inserem.
3.3 CARACTERIZAÇÃO DA INSTITUIÇÃO
O local da pesquisa situa-se na área central da cidade do interior do Estado de São
Paulo com mais ou menos 50 mil habitantes. O prédio é antigo e grande tendo uma área de
mais de 16.000 m². Surgiu como internato, em 1925, fundado por freiras. Após o fechamento
do internato, o estabelecimento foi usado para outras finalidades de estudo e formação de
vários cursos, tais como os de técnico em contabilidade, habilitação para magistério, ensino
supletivo e outros. Foi a partir de 1990 que se instaurou o funcionamento da escola nos
moldes atuais: educação infantil, ensino fundamental e médio.
Atualmente está restaurado, principalmente na parte externa (fachada da frente) e
outras dependências, mas sua estrutura interna foi conservada.
A escola é uma instituição particular que conta com 300 alunos e funciona em dois
períodos distintos: período da manhã, para o atendimento dos alunos da pré-escola, ensino
fundamental e médio e a noite o curso preparatório para o vestibular (cursinho).
75
A escola conta com uma área de lazer ampla, campo de futebol, banheiros
masculinos e femininos, cantina, diretoria, secretaria, sala dos professores, sala da
coordenação, biblioteca, sala de informática, sala de ciências, sala de vídeo e salão nobre para
festas e formaturas (antiga capela).
O colégio particular é conveniado a uma grande rede de “colégios padrão” mais
de quinze anos e o material utilizado pelos alunos do ensino médio é apostilado.
Seu alunado provem de famílias de classe média da cidade e região.
3.4 CARACTERIZAÇÃO DOS PROFESSORES
Com os dados obtidos por meio das entrevistas, observações, conversas e filmagens
foi possível elaborar uma caracterização de cada um dos professores sujeitos desta pesquisa.
Tal caracterização se faz importante para a compreensão do sujeito contextualizado, inserido
num ambiente histórico-cultural específico.
Walter é um professor de língua portuguesa, tem 57 anos e sua experiência docente é
de 20 anos, leciona no ensino médio há 10 anos. Sua formação acadêmica é Letras, fez quatro
anos de especialização. Tem mestrado e doutorado em sua área de atuação. O docente
normalmente usa roupa e sapato social, apresentando-se com uma postura elegante, gestos
finos, denotando simpatia e educação. Seu tom de voz não é alto, porém, o seu discurso é
nítido e claro, marcado pela facilidade de expressão.
O docente Julio tem 51 anos e ministra aulas desde 1974, lecionando em diversas
escolas em vários estados brasileiros, até fixar moradia definitiva nessa cidade do interior do
estado de São Paulo. Sempre trabalhou lecionando disciplina de Química, apesar de ter ser
formado em Engenharia Mecânica. Fez pós-graduação em Engenharia de Segurança no
Trabalho, pensando em trabalhar com engenharia, mas uma vez envolvido com o papel
docente acabou por deixar completamente a idéia de trabalhar como engenheiro e fez
licenciatura de Química, uma exigência das escolas para que ficasse legalmente habilitado
para lecionar essa disciplina. Sua experiência na profissão de docente é de 32 anos, a qual fez
questão de afirmar que sempre gostou. O docente tem uma postura descontraída que se revela
pelo ser modo de ser bem esportivo, usando calça jeans e camiseta. Seu tom de voz é normal
76
(nem baixo, nem alto), sua fala é pausada, calma, porém, algumas vezes não é possível ouvir
e compreender e o que ele fala.
A docente Maura tem 53 anos e já esta aposentada como professora do Ensino Médio
em uma cidade do interior do Estado de São Paulo na qual lecionou por 20 anos. Graduou-se
no curso de Letras (Português). Atualmente leciona apenas para alunos do Ensino Médio em
Técnicas de Redação no Colégio no qual foi realizada a pesquisa. O seu tempo de experiência
docente é de 20 anos. A professora veste-se com simplicidade, usando normalmente calça
comprida e blusa. É simpática, agradável e atenciosa nos relacionamentos de uma forma
geral.
O docente Lucas tem 36 anos, leciona disciplina de Geografia, é professor do Ensino
Médio apenas quatro anos, sendo formado em Direito. O professor Lucas veste-se
seguindo estilo esportivo, com calça jeans e camiseta. Seu tom de voz é alto e grave e sua fala
é perfeitamente compreensível.
77
4 AFETIVIDADE E APRENDIZAGEM: RESULTADOS DA PESQUISA.
Os resultados são apresentados da seguinte maneira: 1. Concepções sobre
afetividade: entrevistas, elaborado a partir análise das entrevistas realizadas com alunos e
professores, e suas respectivas categorias; e 2. Interações e afetividade na sala de aula,
análise microgenética dos episódios selecionados das filmagens de cada professor em sala de
aula.
4.1 CONCEPÇÕES SOBRE AFETIVIDADE: ENTREVISTAS
4.1.1 Alunos
Nas falas a seguir, os alunos explicam suas concepções sobre afetividade:
... é a maneira como professor e aluno se entendem, se eles conversam
de maneira agradável...” (aluno Renato).
... eu acho que é quando o professor meio que ser amigo do aluno...
(aluno Marcos).
... eu acho que quando você tem um diálogo, uma conversa, o
professor é mais amigo da sala... (aluna Ângela).
Segundo Almeida (2005), “O adolescente experimenta para consigo e para com o
outro uma gama de sentimentos que se alteram e se combinam” (p. 49).
O aluno adolescente, nesta fase, em que ocorre a predominância do fator afetivo,
coloca que a afetividade existe quando entendimento e diálogo agradável entre professor e
aluno.
Segundo Dér (2004), no adolescente,
O sentimento de amizade também pode se deslocar para adultos estranhos à família
e com os quais ele se identifica [...]. Os adultos-modelo que o adolescente imita
pode ser personagens mais próximos (pais, professores) ou mais distantes (ídolos da
78
música, cinema e televisão) e são figuras importantes para a formação da
consciência moral. (p. 74).
A colocação da autora traz informações significativas que contribuem na
compreensão da formação da consciência moral do adolescente.
Nessa perspectiva destaca-se a figura próxima do professor que muitas vezes pode se
tornar um adulto-modelo para o adolescente, dependendo da interação afetiva que se
estabelece entre eles.
Dér (2004) explica também que o adolescente demonstra uma personalidade que
recebe influência a todo tipo de valores que o meio oferece, bons ou ruins. E que ao imitar os
adultos-modelo, o jovem se apropria dos valores morais como se fossem seus.
“Os valores morais que o adolescente escolhe e assume são, portanto, a expressão de
valores do seu meio e vão orientar o seu projeto de vida” (DÉR, 2004, p. 75).
Essas informações são importantes aos docentes de alunos adolescentes, que deverão
estar conscientes da responsabilidade de sua postura pessoal e profissional na área
educacional, uma vez que esta não só influencia direta ou indiretamente através das interações
entre professor e aluno que se estabelecem na sala de aula, mas principalmente, participa,
colabora ativamente na construção de valores morais do adolescente de hoje e do adulto do
futuro.
“Toda ação educativa pressupõe um tipo de adulto que se quer construir”
(AMARAL, 2004, p. 77).
O projeto educativo busca várias estratégias e caminhos dentro do ensino
sistematizado para trabalhar o conhecimento. Assim, é necessário reconhecer a importância e
a presença do diálogo na dimensão afetiva em que são traduzidos os significados e sentidos
das palavras expressas pelo sujeito.
Observa-se nas falas dos alunos, o enfoque da palavra “amizade” e “amigo” para
expressar suas concepções sobre afetividade:
... tendo mais amizade com o professor (aluna Roberta).
“... eu acho que assim, o professor demonstra que é amigo do aluno,
antes mesmo de ser professor, ajuda mais a você se interessar mais
pela matéria, conversa com você assunto sem ser da matéria... “você
foi naquela festa e tal?”... seria isso para mim. Acho que não precisa
ser aquele amigo, mas chegar e conversar um pouco fora da matéria,
eu acho que isso é um bom começo [...] Deixar de ser só o
79
professor e começar a ser amigo, entendeu? É mais interessante,
porque daí é mais de você aprender alguma coisa, porque geralmente,
se você não gosta do professor, você não gosta da matéria, então você
gostando do professor, é meio caminho andado, fica mais fácil, eu
acho” (aluna Anita).
Na opinião da aluna, a amizade na relação entre professor-aluno estimula o interesse
e promove facilidade para o aprendizado do aluno.
Outro ponto destacado na fala da aluna é o gostar do professor, que vem a ser a
condição para gostar da disciplina que o professor leciona, porque caso contrário, quando o
aluno não gosta do professor, conseqüentemente não gosta da matéria que ele administra.
Diante de tais colocações, destaca-se a concepção de afetividade que os alunos
trazem, muito ligadas à visão do senso comum de que afetividade é amizade, tendo uma
conotação de algo bom, positivo. Essa questão pode trazer algumas reflexões aos docentes,
como coloca Prandini (2004, p. 43):
Para o professor , reconhecer o princípio da integração funcional implica reconhecer
que não se trabalha nunca apenas com funções e conteúdos puramente cognitivos,
mas sempre participação de condições orgânicas e afetivas que colaboram ou se
opõem ao processo de aprendizagem. Cabe a ele, reconhecer as condições de seus
alunos, em especial seus afetos, seus desejos, a fim de procurar canalizá-los para que
colaborem na produção de conhecimento.
No processo constante e contínuo das atividades cotidianas na sala de aula, o
professor pode abrir espaço na relação afetiva com seus alunos adolescentes, procurando ser
receptivo aos desejos deles de ter um professor amigo condição esta, indispensável para a
produção de conhecimentos, de acordo com parecer expresso no discurso dos sujeitos alunos.
Resta ao docente avaliar o que significa o “professor ser amigo” dos alunos, e como canalizar
isso para a produção do conhecimento que se pretende alcançar em sala de aula.
4.1.2 Professor Walter
Destaca-se, na fala de Walter, sua concepção sobre afetividade:
Olha, eu entendo que a afetividade é um dos traços mais importantes.
Nós temos alunos, por exemplo, que não tem ou não encontram esse
afeto entre os pais, então eles procuram essa afetividade nos
professores. Eu percebo isso, às vezes, que um simples passar de mão
80
na cabeça é um afeto muito grande para o aluno e também essa
proximidade que nós temos com os alunos, que dizer, não existe
aquela distância do professor que ficava em um pedestal. Hoje não,
hoje o professor é mais amigo, conversa mais, dialoga mais com o
aluno, então se torna amigo, mais afetuoso. (professor Walter).
Na fala acima pode-se identificar que o professor compreende a afetividade como um
conjunto de características que envolvem proximidade, diálogo e afeto que expressa carinho.
O professor justifica sua fala acerca da afetividade explicando que gestos como
“passar a mão na cabeça” implicam numa real proximidade entre professor e aluno, que se
somados ao diálogo vão conferir essa interação dos aspectos afetivos.
Segundo Vigotski (2004, p. 143), “Nenhuma forma de comportamento é tão forte
quanto aquela ligada a emoção. Por isso se quisermos suscitar no aluno as formas de
comportamento de que necessitamos, temos que nos preocupar que estas deixem um vestígio
emocional no aluno”.
Acredita-se que para o autor são as formas de comportamento especificamente
ligados à didática que o professor usa através de suas atitudes e postura como expressões
emocional de afeto, o meio adequado para “tocar o sentimento do aluno”, sendo
possivelmente este, caminho adequado para produzir no aluno o comportamento esperado ou
desejado, que vem a ser a apropriação do conhecimento. Pode-se entender que o gesto
indicado, como passar a mão na cabeça, pode ter, para Walter, o papel desse vestígio
emocional.
Indagado sobre os seus sentimentos na sala de aula, o professor afirma:
... então o fato de se aproximar do aluno, faz com que ele se
aproxime mais do professor e com isso a gente consegue desenvolver
mais a disciplina. (professor Walter).
Novamente a palavra “aproximar” sugere indicativos relevantes à interação entre
professor e aluno. O contexto abordado pelo professor sugere aspectos da “ação e reação”, ou
seja, o movimento de proximidade que o mestre faz em relação ao educando, recebe resposta
em igual medida ou proporção. O professor que cultiva a proximidade com seus alunos pode
na visão do professor Walter, mantê-los próximas dele próprio.
No cotidiano da sala de aula, comumente os alunos observam o comportamento do
professor: atitudes, posturas, gestos, expressões faciais e corporais que são muitas vezes
interpretados pelos alunos e assim vão de certa forma “construindo” a imagem desse
81
professor e irão reagir a ela de acordo com o modo como essa interpretação foi feita. Nesse
olhar, professores e alunos estabelecem formas de interação que serão decodificadas por
ambos, como atitudes afetivas.
Davis e Oliveira (1994) comentam a respeito de uma rede de expectativas recíprocas
entre professor e aluno:
Para que a interação professor e aluno possa levar a construção de conhecimentos, a
interpretação que o professor faz do comportamento dos alunos é fundamental. Ele
precisa estar atento ao fato de que existem muitas significações possíveis para os
comportamentos assumidos por seus alunos, buscando verificar quais deles melhor
traduzem intenções originais. (DAVIS E OLIVEIRA, 1994, p. 84).
As autoras completam essas idéias dizendo que ao professor cabe observar a si
mesmo, percebendo seus desejos, preocupações, atitudes que normalmente influem no seu
comportamento nas interações em sala de aula, que conseqüentemente refletirão nos alunos.
4.1.3 Professor Julio
O docente fala da sua concepção sobre afetividade:
... olha, eu acho que ela se manifesta de várias maneiras, desde um
tratamento com diálogo, um comentário como foi o final e semana ou
como foi o feriado ou um dia de férias, coisa espontânea deles que
acabam contando um pouco do que eles fazem... (Professor Julio).
A fala acima explicita a idéia de que a afetividade por ser encontrada no
comportamento do docente, mais precisamente no diálogo. Esse pode surgir na forma de
cumprimentar e se interessar pela vida do aluno fora da escola, enfim, uma fala que além de
demonstrar interesse pela vida pessoal do aluno a eles oportunidades de contarem um
pouco das suas atividades extra-escolares.
A escola, enquanto instituição educativa, desempenha um papel fundamental, na
interação professor-aluno, sendo o lugar onde ocorrem diversas situações que propiciam essa
interação, principalmente, no que diz respeito a sua dimensão socializante, a qual prepara o
sujeito para a convivência em grupo e na sociedade. O diálogo, como forma principal de
comunicação encontra destaque mais uma vez no discurso do professor em questão.
82
No novo dicionário Aurélio (2004, p. 672), a palavra “diálogo” encontra a seguinte
conceituação: Fala entre duas ou mais pessoas; conversação, colóquio [...]; Troca ou
discussão de idéias, e opiniões, de conceitos, com vistas à solução de problemas ao
entendimento ou à harmonia; comunicação: [...]”.
A sugestiva conceituação mostra a essência dessa palavra no ambiente de sala de
aula. A conhecida frase popular: “É dialogando que a gente se entende”, confere com as
colocações do dicionário que surgem como troca de idéias, opiniões com o objetivo implícito
que é a busca pelo entendimento a partir da aceitação - e respeito - de diferentes pontos de
vista.
O professor Julio indica em sua fala que a presença do diálogo é importante para se
comunicar, conhecer e interagir com seus alunos.
O diálogo facilita a comunicação, abrindo espaço para o contato, a aproximação, o
entendimento, tendo por base o vínculo afetivo entre professor e aluno. E o professor, por sua
vez, favorecerá, assim, a elaboração do conhecimento pelo aluno.
Araújo (2003, p. 166) complementa: “Acreditamos que o ser humano constrói sua
inteligência, sua identidade, seus valores, seus afetos pelo diálogo estabelecido com seus
pares, com os professores e com a cultura, na própria realidade cotidiana no mundo em que
vive”.
A abordagem histórico-social compreende que o indivíduo precisa nascer e crescer
em um ambiente social e cultural e interagir com outras pessoas para se humanizar (REGO,
1995). Nessa perspectiva, a linguagem, o conhecimento, os valores, a identidade, os afetos
são compreendidos como construções sucessivas do indivíduo em sua relação com o meio, em
especial com o ambiente escolar.
O projeto educativo busca várias estratégias e caminhos dentro do ensino
sistematizado para trabalhar o conhecimento. Nesse sentido, é necessário reconhecer a
essência e a presença do diálogo na dimensão afetiva em que são traduzidos os significados e
sentidos das palavras expressas pelo sujeito.
Diante da questão sobre suas próprias atitudes em relação aos alunos, professor Julio
explica que, a seu ver, uma atitude afetiva envolve consideração e respeito por seus alunos:
Olha, eu acho que da parte do professor é você entrar numa sala que
tem pessoas que você tem uma conversa... não simplesmente entrar
falando da matéria, saindo de dentro da sala de aula, mas dando
um tempo, dando atenção para eles... entender uma música que eles
83
curtem, você vai tentar ouvir o que eles estão ouvindo para saber
como eles estão se comportando... (professor Julio).
Embora transpareça uma dificuldade do professor em ser objetivo nas respostas da
entrevista, fica claro que, no seu modo de pensar, ele acha importante dar atenção e conversar
com seus alunos e não simplesmente entrar na sala de aula, despejar o conteúdo da matéria e
ir embora. O professor Julio percebe como atitude incorreta e inadequada não conversar com
seus alunos e, principalmente, aquele docente que entra para sala de aula, limitando-se a
passar o conteúdo da matéria e ir embora.
Para garantir o êxito do ensino e da aprendizagem, o mestre deve assegurar não
todas as condições do desenvolvimento correto das reações, mas, o que é mais
importante, uma atitude correta [...]. As regras mais simples e banais da polidez
pedagógica, segundo as quais uma aula não deve ser demasiado longa e o professor
não devem falar como metralhadora traduz essencialmente na forma mais primitiva
a mesma coisa: a correspondência do material às relações adaptativas do aluno
.(VIGOTSKI, 2004, p.168).
Destaca-se aqui, através de Vigotski, a importância da postura adequada de um
professor na classe, que deve ser pautada pelo bom-senso e discernimento, como no exemplo
citado de que o professor não deve falar exageradamente e nem extrapolar no horário da aula.
Isto significa que o docente deve ter cuidado, prestar atenção em suas atitudes e no seu
procedimento didático em aula, para propiciar um melhor processo de ensino-aprendizagem.
4.1.4 Professora Maura
Com referência à concepção da afetividade a docente se expressa da seguinte forma:
Olha, eu acredito que a afetividade é uma relação, não vamos dizer
plena confiança, porque eu acho que até é impossível chegar, mas o
mais próximo possível da confiança entre os dois... (professora
Maura).
Na opinião da docente a palavra confiança é destacada, no sentido de que essa possa
representar aspectos de afetividade na relação.
Davis e Oliveira (1994) fazem referência aos valores morais que poderão ser vistos e
considerados como roteiros que irão nortear o comportamento do homem e que os valores têm
84
a finalidade de orientar o comportamento individual no ambiente cultural, além de ajudar o
indivíduo a perceber, compreender e dar significados nas experiências vividas.
No que diz respeito às suas próprias atitudes com relação aos alunos afirma:
... a gente percebe que um aluno com quem a gente tem essa
aproximação maior, ele é mais interessado e acho que
conseqüentemente, isso facilita a aprendizagem... (professora Maura).
A docente confirma a fala de seus colegas de profissão ao apontar também a
aproximação do professor como seus alunos como uma atitude (postura afetiva) que mobiliza
o interesse dos alunos.
4.1.5 Professor Lucas
Ao relatar sobre a sua concepção de afetividade, informa:
“Eu vejo com bastante preocupação, porque me a sensação de
que se a afetividade for uma relação muito próxima, você acaba se
distanciando do professor, do papel do professor...” (professor
Lucas).
É evidente a preocupação do professor Lucas em limitar uma aproximação afetiva
com seus alunos com receio que esse fato prejudique seu papel de professor.
Esse enfoque, apontado pelo professor pode estar ligado às suas próprias
características e experiências, à sua subjetividade, que envolve valores, crenças, visões do
mundo etc.
De igual forma, os jovens alunos trazem consigo suas experiências de vida no
sentido pessoal, afetivo, cognitivo e social. Apesar de estarem na posição em que um ensina e
outro aprende, ambos devem estar do mesmo lado numa parceria permanente de troca,
aprendizado, crescimento, afeto e, principalmente de construção do sujeito humano.
Solicitado a expor a sua forma de pensar quanto às suas atitudes em relação aos seus
alunos ele relatou:
85
... você tem que ter uma relação de mais amizade... e o professor, em
minha opinião, tem que ter sim, certa autoridade dentro da sala de
aula [...] O aluno dispersa, sabe, se você não controlar muito bem
com a disciplina, saindo um pouco desse controle, o aluno começa a
dispersar e você começa a perder rendimento da aula mesmo.
(professor Lucas).
O professor Lucas valoriza a autoridade em sala de aula; ele acredita que pelo fato de
dar aula para os alunos adolescentes, necessidade de usar a disciplina para controlar a
classe, para não se dispersar e cair o rendimento da aprendizagem.
Observa-se que, para o professor, a concepção de afetividade parece estar ligada a
uma relação com poucos limites, onde a liberdade é maior e, dessa forma este perde o seu
papel, na qual a autoridade e a disciplina devem estar presentes. É uma visão de afetividade
ligada ao senso comum, que aparece então, para Lucas, como sendo algo incompatível com
autoridade de professor.
4.1.6 Reflexões
Os alunos adolescentes, sujeitos da presente pesquisa, demonstraram espontaneidade
e coerência ao colocar suas idéias sobre o assunto em questão: a afetividade na interação
professor-aluno no âmbito da sala de aula.
Ao expressarem suas concepções sobre afetividade, destacaram-se as palavras
“amigo” e “amizade”, as quais identificam como fundamentais na relação professor-aluno.
Associadas a ela as palavras diálogo, conversa ou conversar se sobressaíram no discurso dos
alunos, obtido nas entrevistas.
Ficou claro, na visão dos alunos que o professor afetivo é amigo do aluno e
demonstra essa amizade, principalmente através do diálogo, do entendimento, da
comunicação verbal entre eles.
Quando se fala de alunos adolescentes é importante lembrar que essa fase é recheada
de necessidades, desejos e transformações, na qual a infância, pouco a pouco vai sendo
deixada para trás e o jovem segue em direção ao mundo dos adultos.
De acordo com Dér e Ferrari (2007), o jovem quer tornar-se independente do adulto,
mas ainda precisa de sua orientação para fazer escolhas necessárias a sua vida. É um
movimento de alternância obrigatório para que possa continuar o trabalho interno de
construção da sua pessoa, de sua identidade.
86
Diante de tantos desafios e edificações, o jovem precisa de pessoas nas quais confia e
se identifica, sejam eles colegas da mesma idade ou adultos, pais, professores, líderes
religiosos. Nessa empreitada, um companheiro, como um professor-amigo poderá ajudar de
forma construtiva nessa passagem do mundo adolescente para o mundo dos adultos.
Os alunos foram unânimes ao manifestar suas opiniões a respeito da relação entre
afetividade e aprendizagem. Todos comungaram do mesmo ponto de vista ao afirmar que o
fato de gostar do professor estimula o interesse, a motivação para estudar e conseqüentemente
maior facilidade na aprendizagem.
Afirma Almeida (2007, p. 85) que:
A sala de aula tem de ser uma oficina de convivência e o professor, um profissional
das relações. Este é um imperativo de sua prática. Além disso, ele queira ou não, é
um modelo para o aluno e como tal, será imitado em suas atividades, em suas
convicções, em seu entusiasmo.
A afirmação da autora demonstra o papel relevante do professor no campo das
interações no contexto escolar.
O aluno quando gosta e se identifica com um professor pode perfeitamente adotá-lo
como um modelo, o qual poderá exercer significativa influência na vida do aluno. Por esse
prisma, fica fácil compreender a fala dos alunos que argumentam o fato de que quando têm
afeto pelo professor, sentem-se mais motivados a estudar, a aprender, indo ao encontro do
objetivo das práticas pedagógicas, que é construção do conhecimento. Esse dado traz para
reflexão a importância da afetividade na relação professor-aluno.
Os alunos colocam como dificuldade na afetividade a falta de interesse, de afeto, de
consideração e respeito para com os alunos.
Os apontamentos feitos pelos alunos vão ao encontro das colocações de Almeida
(2007), quando diz que a base do trabalho do professor é o respeito pelo aluno. E que a ajuda
que o professor dará ao aluno, nesse caminho a ser percorrido da infância à fase adulta, terá
maior ou menor peso dependendo de vários fatores. Para isso, será necessário que ele avalie
seu próprio comportamento como docente, que olhe para seu aluno com muita consideração,
sem esquecer que a criança do presente é o adulto do futuro, preste atenção nos seus recursos
de aprendizagem e o meio pelo qual está inserido esse aluno. Além disso, deve lembrar-se de
que ele (aluno) caminha de acordo com seu ritmo de desenvolvimento e da sua
individualidade dentro da respectiva fase de sua formação.
87
No que se refere às concepções sobre a afetividade, cada professor abordou esse
tema por um ângulo diferente, mas que estabelecem relações entre si.
O professor Walter deu relevância em sua concepção sobre afetividade na
proximidade, amizade e diálogo. O professor Julio salientou a importância da afetividade
através do diálogo entre professor-aluno. A professora Maura deu ênfase à palavra confiança,
que deve permear a relação entre ambos. Já o professor Lucas, apontou a amizade como
expressão da afetividade.
Nesse sentido, observa-se que o professor Walter e o professor Lucas apresentaram a
mesma idéia, ao compreenderem a afetividade como sinônimo de amizade. Ao mesmo tempo,
os docentes Walter e Julio se identificaram com a palavra diálogo, na concepção de
afetividade. Foi analisada a visão de cada professor sobre as suas próprias atitudes, na qual
encontrou-se a palavra aproximação na fala do docente Walter, como postura afetiva. Com
relação ao professor Julio, notou-se o destaque nas palavras atenção, diálogo e consideração,
como atitude adequada com o alunado.
A professora Maura deu preponderância à palavra aproximação para expressar o seu
pensamento no que diz respeito a uma atitude afetiva.
No conceito do professor Lucas, a autoridade surge como postura fundamental na
relação com os seus alunos.
Nesta questão, encontraram-se como pontos em comum o docente Walter e a docente
Maura, ao colocarem a palavra aproximação como atitude afetiva.
Com base nas falas e colocações dos sujeitos alunos é fundamental esclarecer que o
ponto de vista deles sobre afetividade é compreendido dentro do conceito da afetuosidade, ou
seja, manifestações do afeto, que podem ser identificadas pelas demonstrações de carinho,
maneiras afetuosas de expressar afeto, isto é, por meio de atitudes ou palavras.
Os alunos relacionaram a afetividade na interação professor-aluno com relações
harmoniosas, na qual, deverão estar inseridas simpatia, amizade, diálogo, entendimento etc.
As concepções da afetividade na visão dos professores seguiram na mesma linha de
pensamento dos alunos, uma vez que os docentes também salientaram a importância da
amizade, diálogo e aproximação.
Os apontamentos feitos pelos alunos e professores sobre afetividade, são dignos de
valor e respeito, considerando a subjetividade e experiências individuais de cada um dos
sujeitos. Entretanto, pode-se olhar e compreender a afetividade na sala de aula por outro
ângulo, o da abordagem histórico-cultural.
88
Como referido no capítulo dois, as dimensões cognitivas e afetivas do
funcionamento psicológico tem sido abordadas histórica e culturalmente de forma separadas.
Vigotski (2001) é um dos autores que rejeita essa separação, argumentando que o
pensamento tem origem no campo da motivação, considerando necessidades, interesses,
impulsos, afeto e emoção. Segundo o autor, a compreensão do pensamento humano é
possível quando se analisa sua base afetiva. Também para Wallon (1979) a afetividade
constitui um domínio tão importante quanto a inteligência para o desenvolvimento humano.
Numa perspectiva histórico-cultural, os indivíduos aprendem a pensar, a falar, a
sentir e se constituir no processo de interação com o outro e com a cultura no qual estão
inseridos. Observa-se que as concepções apresentadas pelos alunos e professores são
marcadas pelas teorias que separam afetividade e cognição, na escola. Essa forma de pensar
dicotomizada foi construída através do tempo e está presente nas falas dos sujeitos dessa
pesquisa.
Ambos assumem que o docente para ser afetivo deve se deslocar do seu lugar de
professor, para ser “amigo”, “bonzinho”, “brincar”, falar de assunto fora da matéria etc. Nesse
olhar, percebe-se que a afetividade pode ser reconhecida naquilo que não é propriamente
escolar. Sendo assim, o que é considerado comportamento afetivo pelos alunos e professores
são comportamentos acessórios na interação professor-aluno e não centrais no processo
ensino aprendizagem.
A afetividade, como dimensão existente e plenamente articulada com a dimensão
cognitiva no psiquismo humano, deve passar também pelos conteúdos escolares. Caso
contrário corre-se o risco de continuar cultivando a dicotomia entre afeto e cognição na
educação.
4.2 RELAÇÃO ENTRE AFETIVIDADE E APRENDIZAGEM
4.2.1 Alunos
Para aprender qualquer conteúdo de uma disciplina escolar, é importante que o aluno
adolescente o queira. Observa-se que o fator afetivo pode fazer essa ponte entre vontade-
estudo-aprendizagem, levando a efeito o objetivo da ação pedagógica que é propiciar a
construção do conhecimento. É o que transparece na fala dos adolescentes:
89
... o aluno começa a gostar do professor, começa a se interessar pela
matéria, a estudar mais para não desapontar o professor... (aluno
Daniel).
... se a gente é amiga, a gente tem um interesse um pouco maior em
querer aprender, se você gosta, se faz uma brincadeirinha, fica mais
fácil de você aprender ou começar a se interessar em aprender... (aluna
Anita)
Pontos em comum são observados nas falas dos alunos quando se referem ao fato de
que gostar do professor desencadeia interesse em estudar.
Nessa perspectiva, surge um parecer de Vigotski que vem ampliar a compreensão
sobre essas falas expressadas pelos alunos: “Toda emoção é um chamamento à ação ou uma
renúncia a ela. Nenhum sentimento pode permanecer indiferente e infrutífero no
comportamento” (VIGOTSKI, 2004, p. 139).
A emoção se traduz na afetividade como forma de ação que requer um movimento
que reflete no comportamento do professor ou do aluno com a finalidade de produzir ações e
reações no campo do sentimento. Esse momento emocional e afetivo é identificado através da
vontade, da motivação, do gosto e interesses, presentes no discurso dos alunos adolescentes.
É importante lembrar a afirmação de Vigotski (2006) com relação aos interesses do
adolescente, de que estes são constituídos nos aspectos subjetivos no desenvolvimento dessa
fase, que tem por base o meio e a cultura, no qual o adolescente está inserido.
Ele informa também que é na fase da adolescência, particularmente, que surge com
nitidez as relações entre as necessidades biológicas do adolescente com as suas necessidades
culturais, chamadas de interesses (VYGOTSKY, 2006).
Sobre a questão da relação entre afetividade e aprendizagem, os alunos opinam da
seguinte maneira:
... eu acho que quando o professor se dá melhor com a sala, os alunos
gostam mais do professor, eu acho que ele se melhor na matéria,
porque ele vai ter mais vontade de estar estudando, mais vontade de
estar perguntando, de estar aprendendo. (aluna Ângela).
O aluno entende melhor quando o professor faz as brincadeiras,
sabe... vai distraindo, porque o aluno lembra, ele aprende mesmo.
(aluno Renato).
90
Destaca-se a escola como espaço de interações sociais que proporciona a constituição
do indivíduo como ser humano, nesse contexto do cenário escolar, especialmente na interação
professor-aluno, nos quais aspectos afetivos se fazem presentes, permeando essa relação
juntamente com os aspectos intelectuais, uma vez que são inseparáveis, e assim, atuando no
processo de conhecimento da ação educativa.
4.2.2 Professor Walter
Sobre a relação entre afetividade e aprendizagem, o professor Walter é seguro ao
dizer:
... antes eu acho que primeiro ele, precisa ter esse sentimento de
afetividade, de gostar do professor, de ser amigo do professor, para
também gostar mais da matéria... (Professor Walter).
Para o docente Walter, o sentimento de afeto e amizade por parte do aluno deve vir
em primeiro lugar, para que depois este possa permear o segundo que vem a ser o fato do
aluno gostar da disciplina.
4.2.3 Professor Julio
Perguntado sobre a questão da afetividade e aprendizagem o professor Julio
respondeu:
Eu acho que é a melhor forma de conseguir a atenção e o interesse
deles. A gente percebe que a vezes têm algumas sala com algumas
escolas que exigem, assim uma postura mais rígida entendeu? Que
não permite essa abertura, não entende que você pode parar um
minutinho a aula, deixar eles jogarem papel, jogar peteca, brincar
com qualquer coisa que eles queiram... (professor Julio).
Em sua resposta, o professor argumenta que a afetividade é a melhor forma de
conseguir a atenção e o interesse dos alunos, mas que para isso é preciso (quando a instituição
permite) dar um pouco mais de liberdade aos alunos, abrindo um espaço para que eles possam
ficar mais a vontade para usar um pouco do tempo da aula para fazer o que quiserem.
Nas respostas encontradas pelo professor ressaltam-se alguns pontos relevantes. O
professor Julio entende que às vezes é preciso “parar” um pouco a aula para deixar os alunos
91
mais descontraídos dando a eles um tempo livre para brincar, conversar ou fazer o que
quiserem.
“Tudo no homem pode ser educado e reeducado sob uma correspondente
interferência social” (VIGOTSKI, 2004, p.284). Sob esse prisma pode-se compreender que o
professor como um agente socializador na educação de crianças e adolescentes dispõem de
muitos recursos dos quais ele pode lançar mão para conseguir a aprendizagem de seus alunos.
Através de recursos didáticos o professor pode adotar uma postura em que respeita as
necessidades dos alunos e que trabalha para que haja mais interesse e atenção por parte deles
e assim atingir seu objetivo principal, que vem a ser a construção do conhecimento.
4.2.4 Professora Maura
Solicitada a comunicar a sua visão sobre a relação entre afetividade e aprendizagem a
docente explicou:
Eu percebo que se existe uma afetividade, eu acho que ela contribui
para a aprendizagem,... Eu percebo que é cada vez mais difícil de
existir, porque primeiro por trabalhar em uma escola particular, cujo
objetivo é preparar os alunos para se sair bem em um vestibular...
Existe um lado meu que é a responsabilidade de passar a
conhecimento... (professora Maura).
Observa-se pela colocação da professora, a preocupação em passar conhecimento
para os alunos, admitindo de que por esta razão a afetividade não encontra espaço para existir,
ficando “esquecida ou ausente” na interação professor – aluno.
Segundo Sastre e Moreno (2003), o sistema educativo atual, referente ao ensino
obrigatório, trabalha investindo na bagagem cultural que toda pessoa deve possuir. Está
voltado ao conhecimento de diversas áreas e as matérias curriculares que cada pessoa
necessita para se desenvolver e se preparar para a vida profissional. Nesse sentido, não é
responsabilidade do sistema educativo preparar os alunos para a vida pessoal, deseja-se sim,
prepará-los para que tenham uma boa formação cognitiva. Focando apenas nesse objetivo,
pouco se faz para que os alunos também tenham uma boa formação emocional.
92
Ainda que reconhecendo a importância dos aspectos emocionais e afetivos na
aprendizagem, o objetivo da escola não é resolver desajustes e desequilíbrios emocionais dos
alunos. O principal objetivo da instituição escolar é propiciar a aquisição dos conhecimentos
elaborados por uma determinada sociedade e cultura (DAVIS E OLIVEIRA, 1994).
Espera-se, assim, que a escola ofereça um ambiente bom, estável e seguro, que
contenha uma equipe de profissionais responsáveis e capacitados na direção da escola e
principalmente no corpo docente para que os alunos possam sentir-se bem. Estes fatores
favorecem um melhor desempenho e apropriação do conhecimento.
A responsabilidade primeira da escola é com a aprendizagem dos alunos. E nesse
sentido é necessário levar em conta a relevância e o valor dos aspectos emocionais dos alunos
e professores que devem ser canalizados e orientados para auxiliar no processo ensino-
aprendizagem.
4.2.5 Professor Lucas
Ao abordar o assunto sobre a relação entre afetividade e aprendizagem o docente
pontuou:
... se você consegue manter uma relação de afetividade boa, em um
nível bom, eu acho que melhora o aprendizado, por essa questão de
que o aluno fica mais aberto às tuas idéias, ao que você esta falando e
fica mais disposto a prestar atenção na aula. (professor Lucas).
O professor admite a afetividade como um elemento que pode contribuir para a
aprendizagem, explicando que o fator afetivo permite que o aluno fique mais disponível e
receptivo para prestar atenção nas idéias e no discurso do professor durante as aulas.
Segundo Vigotski (2004, p.144):
Quem entre nós já pensou que fonte inesgotável de excitações emocionais radica em
um curso comum de geografia, astronomia ou história, considerando que as aulas
desses objetos devem ir além dos secos esquemas lógicos e tornar-se objeto de
trabalho não só do pensamento, mas também do sentimento.
Vigotski afirma que existe uma fonte permanente de motivações emocionais a serem
descobertas em muitas disciplinas que são consideradas monótonas, por muitos alunos como é
93
o caso da geografia ou da história. Nesse sentido, ele defende a idéia que uma atuação
adequada do professor implica em descobrir essa fonte de motivações e utilizá-la como objeto
de trabalho, procurando atingir não só o pensamento dos alunos, mas também suas emoções.
4.2.6 Reflexões
Abordada a relação entre afetividade e aprendizagem, o professor Walter deixou
claro que o aluno precisa gostar e ser amigo do professor para depois gostar da disciplina que
ele leciona. Para o docente Julio, a afetividade e aprendizagem estão relacionadas à
flexibilidade do professor, que admite dar um pouco de liberdade aos alunos para que
realizem atividades (conversar, brincar entre outras) que não estejam relacionadas às
obrigações dos estudos na classe.
Na visão da professora Maura, a afetividade e aprendizagem são dois aspectos que
possivelmente podem estar unidas explicando que “se existe uma afetividade ela ocorre
através da aproximação do aluno com o professor que se mostra mais interessado e
consequentemente esse fato vai facilitar a aprendizagem dele.
Para o professor Lucas, quando o professor consegue manter uma relação afetiva em
um nível bom, ela resulta em um melhor aprendizado para os alunos, uma vez que dentro
desse contexto eles ficam mais dispostos a prestar atenção na aula.
Observou-se que três docentes Walter, Julio e Lucas acreditam (cada um a sua
maneira) que a afetividade pode contribuir para a aprendizagem. A professora Maura, percebe
que a presença afetividade em sala de aula é cada vez mais difícil de existirna interação
professor-aluno, mas quando existe o fator afetivo na relação, este contribui para a
aprendizagem.
As idéias dos professores acima descritas mostram, outra vez, a presença da
dicotomia entre afeto e cognição, no modo de ver e compreender a afetividade na interação
professor-aluno no espaço da sala de aula.
Percebe-se, que a afetividade insiste em aparecer desfocada dos conteúdos escolares,
como por exemplo, na visão do professor Julio que acredita que ela pode estar relacionada a
outras atividades que não estejam ligadas as atividades de estudo na classe.
94
O professor Walter pontua que a afetividade e aprendizagem deve estar dependente
da condição do “aluno gostar e ser amigo do professor” para depois gostar da disciplina que
ele leciona.
A professora Maura coloca em dúvida a existência da afetividade, bem como a união
da afetividade e aprendizagem, mas “se” existe afetividade na interação ela ocorre através da
aproximação do professor com o aluno.
O professor Lucas ressalta como importante a responsabilidade do professor manter a
“relação afetiva em nível bom” e que dentro dessa circunstância ela pode favorecer o
aprendizado dos alunos.
O processo ensino-aprendizagem que envolve educador e educando pode ocorrer em
condições difíceis para ambos. Com relação aos alunos destacam-se problemas econômicos,
necessidade de esforço e atenção para aprender, pouca vontade de estudar, dificuldade para
aprender, tempo que o aluno deve dispor para permanecer na sala de aula, cumprimento de
tarefa, trabalhos escolares etc., e, na outra polaridade os professores enfrentam também
dificuldades no exercício da profissão docente, como salários baixos, classes numerosas,
cansaço, sobrecarga de horas-aula, conflitos de relacionamento com alunos, colegas de
trabalho etc., e mesmo assim ambos podem superar essas e outras dificuldades não
relacionadas, uma vez que se deve levar em conta que o processo ensino-aprendizagem,
ocorre através da inter-subjetvidades do professor e do aluno, cuja motivação para estudar
(aluno) e para trabalhar (professor) pode estar ligado a diversos fatores, superando
adversidades, limitações pessoais e conflitos inerentes do campo emocional da afetividade.
Gostar ou não do professor; interessar-se ou não pela matéria, apreciar ou não
atitudes do professor, ter sensações agradáveis ou desagradáveis, enfim, irritações, mágoas,
decepções, frustrações, apatia, todos são componentes emocionais que fazem parte da
afetividade e consequentemente da interação professor-aluno.
A maioria das pessoas, incluindo leigos (pais de alunos), professores, pedagogos,
psicólogos, educadores de forma geral, não raro, cometem o mesmo engano: de olhar para
afetividade em sala de aula como se ela tivesse que conter somente componentes bons,
agradáveis, cheios de satisfação, prazer, alegria, bom humor.
Essa é uma forma equivocada de compreender a dimensão afetiva na sala de aula.
Nesta dimensão estão presentes as emoções, sendo estas, as grandes responsáveis na maioria
das vezes pelos conflitos intra e interpessoais que se estabelecem no espaço escolar. Nessa
perspectiva é necessário ter consciência de que os conflitos de ordem emocional, de acordo
com Wallon (1994) citado por Almeida (1999), favorecem o desenvolvimento dos indivíduos
95
na medida em que eles (alunos e professores) se esforçam para superá-los, buscando
estabelecer relações entre razão e emoção. Segundo os autores, o resultado desses conflitos
são benéficos para os indivíduos, uma vez que proporciona maior desenvolvimento.
Almeida (1999, p. 85) argumenta com precisão que “só existe conflito onde há
diferenças. [...]. O conflito atinge os planos sociais, morais, intelectuais e orgânicos”.
Assim, compreende-se que os conflitos de ordem emocional atingem os diversos
planos da vida, e compete à ação da inteligência, o controle e o equilíbrio das desordens
emocionais, tendo esta última necessidade dos conflitos emocionais para se desenvolver.
Resta complementar que tanto professor como aluno são suscetíveis as alterações e
instabilidades emocionais que ocorrem durante o processo de ensino-aprendizagem.
4.3 DIFICULDADES RELACIONADAS À AFETIVIDADE.
4.3.1 Alunos
Na visão dos alunos, as dificuldades encontradas relacionadas à afetividade referem-
se à:
... falta de criatividade, falta de interesse para com o aluno e afeto.
(aluno Daniel).
... eu acho que atrapalha a frieza do professor, a falta de respeito com
o aluno, e tem alguns professores que se colocam num pedestal.
(aluna Anita).
Os alunos colocam como dificuldade na afetividade, a falta de interesse, de afeto,
como também a frieza e a falta de respeito do professor pelos alunos.
Outros procedimentos nas atitudes dos professores são considerados ruins, do ponto
de vista dos alunos, que dizem:
... a maioria é bem afetiva, descontraem a aula, mas alguns são
meio... já chega, dá a sua aula e vão embora... (aluno Marcos).
96
... às vezes tem professor que chega, passa a matéria e sai, não
conversa, não faz uma brincadeira e isso dificulta. (aluna Laura).
Destaca-se, portanto, nas falas dos alunos, a necessidade do diálogo, da atenção, da
consideração na relação do professor com seus alunos.
Segundo Vallejo (1998), é oportuno levar em consideração que os alunos têm
“necessidades”, apesar de nem sempre terem consciência delas, e se têm, na maioria das
vezes, não as expressam. Desse ponto de vista, torna-se importante que os professores
prestem atenção a essas “necessidades”, que provavelmente não estão reduzidas apenas à
necessidade de ser aprovado na matéria, ou seja, é algo de natureza afetiva, relacionado com
às suas necessidades internas, tais como: atenção, respeito, consideração, interesse, entre
outros.
No parecer de Vallejo (1998, p. 54):
A qualidade das relações interpessoais manifesta-se de muitas maneiras: dedicar
tempo para a comunicação com os alunos, a manifestar afeto e interesse (expressar
que eles importam para nós), a elogiar com sinceridade, a interagir com os alunos
com prazer... o oposto é a rejeição, a distância, a simples ignorância a respeito dos
aluno, o desinteresse... (mostrado ao menos por omissão).
As idéias expressadas pelo autor vão ao encontro daquelas colocadas pelos alunos,
nas quais identificam como professor não-afetivo, aquele que entra na sala de aula, despeja o
conteúdo da aula e vai embora, assumindo uma postura de indiferença, desinteresse e
distância dos alunos, que com razão os desagradam.
4.3.2 Professor Walter
Em relação aos aspectos das dificuldades relacionadas à afetividade vividas por ele
em sala de aula, diz:
... eu percebo que quando você não conversa com aluno você não
dialoga, ele fica mais distante. (professor Walter).
O docente relata como dificuldade presente na interação quando o professor não
conversa com o aluno. Explica que esse procedimento da parte do professor distancia o aluno.
97
De fato, o diálogo como fonte principal da comunicação verbal é um ponto marcante da
interação social.
Davis e Oliveira (1994) apontam os diversos comportamentos afetivos que podem
ser vividos na interação de professores e alunos onde o diálogo é meio de comunicação
insubstituível no âmbito escolar.
Assim, comportamentos como perguntar, expor, incentivar, escutar, coordenar e
participar de debates, ilustrar e outros podem ser expressos pelos alunos e pelo
professor uma rede de participações onde os indivíduos consideram-se,
reciprocamente, como interlocutores que constroem o conhecimento pelo diálogo.
(DAVIS E OLIVEIRA, 1994, p. 90).
A citação descreve a função e eficácia do diálogo, enquanto que sua “ausência” pode
trazer dificuldades na relação entre professor e aluno na sala de aula. Nesse contexto, supõe-
se que os aspectos subjetivos ao professor se o fio condutor que irá favorecer ou não a
interação e comunicação entre os sujeitos.
Ao salientar a importância do outro na visão de Wallon, Gulassa (2004) argumenta:
Assim, este par dialético eu-outro passa a ser constitutivo do mundo psíquico,
funcionando como uma repartição íntima entre os dois termos em que um não pode
viver sem o outro, e ambos mantêm entre si um constante movimento de diálogo,
debate, interlocução. (GULASSA, 2004, p. 97).
4.3.3 Professor Julio
Quanto às dificuldades da afetividade vivenciada pelo professor Julio, ele explica
que percebe que muitos alunos não gostam da disciplina de Química. No entanto ele diz que
compreende esse lado do alunado explicando-lhes que não precisam gostar, basta aprender o
necessário para um bom desempenho na disciplina. Argumenta também que embora ele saiba
dessa realidade, faz questão de tratar a todos da mesma maneira e pela mesma razão procura
ajudar os alunos de todas as formas: incentivando, motivando, exemplificando e
principalmente simplificando o conteúdo das matérias.
Diante da situação descrita acima ele diz:
98
Ah! É porque eu não gosto dessa matéria, porque eu não gosto do
professor, então eu não gosto, não vou estudar essa matéria”. “Então
você não pode deixar uma coisa interferir, a melhor maneira é essa
aí, você ser simpático, ser educado, ser agradável com os
alunos...(professor Julio).
Observa-se que o docente indica uma dificuldade que se revela no fato de perceber
que os alunos não gostam da disciplina que administra. Assim, ele procura minimizar essa
situação ajudando-os através de recursos do qual dispõe motivação, explicação, simplificação
dos conteúdos, etc. No entanto, sua maior preocupação reside no fato de que este problema
possa interferir na aprendizagem dos jovens, e por isso procura contornar essa dificuldade
sendo simpático, educado e agradável com os alunos.
O professor parece agir de forma coerente com a afirmação de Davis e Oliveira
(1994, p. 94):
É importante, pois, que o professor tenha disposição para conhecer e interagir com
os alunos. Ao lado das atitudes de intensidade pessoal e de respeito aos alunos, a
abertura para interagir colabora para que o comportamento do professor em sala de
aula seja flexível e adequado. Afinal é na interação de professor aluno e aluno
aluno que o conhecimento e as formas de expressá-la se constroem e se
transformam.
Depende de ambos, professor e aluno para que a interação se estabeleça na sala de
aula. Entretanto, para que isto ocorra de forma construtiva necessidade da abertura do
docente, que conhece seus alunos em sua etapa de formação, que respeita a sua
individualidade e singularidade. Cabe ainda ao docente o esquecer que no processo de
ensino-aprendizagem, é sua a responsabilidade de mediar e ajudar seus jovens alunos a
adentrarem cada vez mais no mundo da cultura e da sociedade.
Essa realidade solicita um professor cuja postura de empatia e compreensão poderá
facilitar a interação afetiva em sala de aula, que também deve ser construída. Sabe-se que a
ação docente é uma ação socialmente construída. Ela é ampla e profunda, uma vez que
colabora na construção da identidade do aluno. Necessário se faz que o professor não se
esqueça que é neste espaço de interação, de intersubjetividade, que crianças e jovens vão ao
longo de sua vida se apropriando de valores éticos, morais, sociais e culturais.
99
4.3.4 Professora Maura
Com referência às dificuldades da afetividade vivenciadas ela argumenta:
... Então o que acontece, o fato de eu ter que manter o mínimo de
disciplina na sala de aula, me impede de eu me aprofundar em
relação a esse relacionamento afetivo... porque eu vou prejudicar o
outro lado, que é o da minha responsabilidade de passar o
conhecimento... (professora Maura).
Maura argumenta que a maior responsabilidade dela como professora é passar
conhecimento, e para isso é preciso manter a disciplina, em detrimento de um relacionamento
afetivo.
A fala da professora nos remete a Vigotski (2004), que afirma que na sociedade atual
formou-se um conceito único da personalidade do homem no qual a maioria das pessoas
valoriza o talento apenas quando este está ligado à inteligência. No entanto, diz o pesquisador
que é importante:
Não só pensar com o talento, mas, sobretudo sentir com o talento. O aspecto
emocional do indivíduo não tem menos importância do que outros aspectos e é
objeto de preocupação da educação, nas mesmas proporções em que são a
inteligência e a vontade. O amor pode vir a ser um talento tanto quanto a
genialidade, quanto a descoberta do cálculo diferencial. Em ambos os casos, o
comportamento humano assume formas exclusivas e grandiosas. (VIGOTSKI,
2004, p.146).
O texto de Vigotski (2004), suscita significativas reflexões desencadeando uma
busca de entendimento do real sentido das palavras expressas. Elas sugerem idéias de alguém
preocupado com concepções unilaterais a respeito da personalidade humana influenciada pela
sociedade formada no curso do tempo. Explica a forma limitada das pessoas de interpretar o
talento, isto é, as capacidades, competências e habilidades do indivíduo como se estas
devessem estar ligadas apenas a inteligência.
É interessante perceber que Vigotski (2004) alerta para a necessidade das pessoas
superarem a visão dicotomizada do afeto e cognição na escola, olhando para dimensão afetiva
como condição fundamental no campo da educação.
Declara, nesse sentido, o valor do afeto como elemento básico do psiquismo humano
devendo, portanto, permear e participar ativamente no desenvolvimento de capacidades,
100
potencialidades e habilidades do indivíduo, tanto quanto a dimensão cognitiva também
permeia e participa de igual forma na construção de todos os talentos de um homem dotado de
extraordinária capacidade intelectual.
A seu ver, a inteligência e a afetividade são dimensões integradas no funcionamento
psicológico do ser humano, propiciando ao homem aprendizados, comportamentos e
experiências que promovem e edificam o processo educativo na trajetória existencial do
sujeito, seja ele professor ou aluno.
4.3.5 Professor Lucas
Uma vez questionado sobre as suas dificuldades na interação afetiva com seus alunos
o professor analisado salientou:
...então você cria um laço de afetividade, mas tem que dosar bastante,
porque você pode ganhar um amigo, mas perder o aluno. (professor
Lucas).
Nota-se no decorrer do discurso desse professor um conflito no qual o termo
afetividade apresenta-se como um assunto difícil e complexo.
Existe um receio evidente de que a afetividade na interação implica em “ser amigo”
do aluno, e nessa posição o docente acredita que irá se distanciar do seu papel de professor.
Então, como ele próprio diz, não adianta “ter um amigo e perder o aluno”, pois a seu ver esses
dois papéis são distintos e não podem estar unidos, porque um poderá prejudicar o outro.
Em outro momento ele diz:
... essa questão de afetividade, porque você acaba, mesmo que você
não tenha no começo do ano, você tenha uma relação distante, a
afetividade nem parece que existe, mas o dia-a-dia, o contato diário
vai criar laços afetivos entre professor e aluno inevitavelmente. Então
você tem que manter esse equilíbrio para que a afetividade não
atrapalhe e que seja um fator que traga benefícios, para o aluno e
para o professor. (professor Lucas).
O professor admite que a convivência diária com os alunos inevitavelmente vai criar
laços afetivos, mas necessidade de cuidado e equilíbrio da parte do professor para que a
afetividade não venha realmente prejudicar a relação professor-aluno.
101
Oliveira e Rego (2003) enfatizam que dois elementos têm importância fundamental
no desenvolvimento do indivíduo: a linguagem e a interação social. É através desses dois
elementos que o ser humano se comunica, baseado em conceitos que foram construídos
através da cultura das gerações que se sucedem. Uma vez construídos, esses conceitos
culturais representam e expressam não apenas os pensamentos do indivíduo, mas também
suas emoções.
Compreende-se assim, que os aspectos cognitivos e afetivos, o modo de pensar e
sentir de cada sujeito estão impregnados de conceitos e de ações sociais que constituem o
sujeito dentro do seu contexto histórico e cultural.
As emoções são, portanto, organizadas, concebidas e nomeadas de forma
absolutamente diversa em diferentes grupos culturais. Nesse plano da sociogênese,
a linguagem ocupa papel de destaque como instrumento para a constituição do
campo da afetividade. Dispor de palavras para dar nome às emoções nos permite
identificá-las, compreendê-las, compartilhá-las (OLIVEIRA E REGO, 2003, p. 28).
Nesse olhar, pode-se reconhecer que a afetividade é construída culturalmente, no
qual valores, interesses, opiniões, gostos, padrões, regras, costumes, concepção do mundo,
estarão estreitamente relacionadas à vivência, a experiência e a subjetividade de cada sujeito
imerso no seu grupo social e cultural.
4.3.6 Reflexões
Nos comentários feitos pelos docentes a respeito das dificuldades relacionadas a
afetividade permanece a questão da dicotomia no modo de compreender a afetividade.
O docente Walter informou que a ausência do diálogo, distancia o aluno. Supõe-se que
esse diálogo no qual se refere o professor, conforme informações obtidas na entrevista, deve
acontecer após o horário do término da aula, quando ele diz que procura seus alunos para
dialogar ao perceber que algum deles não está bem.
O professor Julio, ao salientar que conhece o fato de que vários alunos não gostam da
disciplina que ele leciona, se preocupando para que este fato não interfira na aprendizagem
dos alunos, parece mostrar nessa situação que a afetividade pode passar pelos conteúdos
escolares, para que esta alcance seus objetivos de auxiliar na aquisição de conhecimentos.
102
É visível ainda a dicotomia no pensamento da professora Maura que acredita que deve
priorizar a disciplina em detrimento da afetividade. Na realidade ela “desconhece” que
disciplina é também elemento afetivo que pode favorecer ou não o processo ensino-
aprendizagem.
O docente Lucas ao argumentar a sua preocupação de que os laços afetivos devem ser
bem dosados para não prejudicar a relação de ambos, reforça a dicotomia entre afetividade e
cognição, explicando que o professor deve dar mais importância para o conhecimento, e que
nesse contexto é preciso cuidado na prática docente, para que a afetividade não venha
prejudicar o aprendizado dos alunos.
O tema afetividade permeou o discurso dos quatro docentes do ensino médio.
Observa-se que, embora eles demonstrem estar conscientes da importância da afetividade na
interação professor-aluno e, sobretudo, bem intencionados, responsáveis e compromissados
com o seu papel docente que é o aprendizado dos alunos, ficou evidente a presença da
confusão entre afetividade (que tem uma concepção mais ampla e complexa, envolvendo
estados diversos, como as emoções, as paixões, os sentimentos, ansiedade, tristeza, alegria,
sensações de prazer e dor), afeto (simpatia, amizade, amor) e afetuosidade (manifestações de
carinho, meiguice, ternura), tendo sido a afetividade compreendida por eles como diálogo,
amizade, proximidade, gestos carinhosos, brincadeiras etc.
Faz-se necessário discriminar esses conceitos, porque eles contribuem para aumentar a
complexidade do tema e prevalecer a dicotomia entre afeto e cognição na escola. Acredita-se
que os docentes de forma geral, membros desse grupo cultural, social, com formação na área
educacional, tem em suas concepções a forma dicotomizada de pensar as dimensões
cognitivas e afetivas.
Durante muitos anos valorizou-se apenas a dimensão cognitiva na escola em
detrimento da dimensão afetiva, que sempre esteve presente, mas não compreendida e
priorizada na apropriação do conhecimento.
É importante que professores e educadores possam aprender a pensar afeto e cognição
de forma articulada; isto significa deixar explícito que o professor pode ser afetivo, falando
daquilo que ensina. Não há intenção em minimizar ou desvalorizar as concepções sobre
afetividade e aprendizagem abordadas pelos sujeitos da pesquisa. Pelo contrário, ao
expressarem suas idéias, contribuíram para o entendimento de que os indivíduos expressam
seus pensamentos, sentimentos e suas emoções, tendo por alicerce conceitos construídos
culturalmente e representados pela linguagem, contextualizados em um grupo histórico
cultural específico (OLIVEIRA E REGO, 2003).
103
Os conceitos ressaltados pelos sujeitos, como amizade, diálogo, confiança,
proximidade, consideração e outros, são “categorias elaboradas pela cultura” perfeitamente
compreendidas pelo grupo social e cultural do qual são membros integrantes, o que lhes
possibilita compartilhar de palavras, significados e modo de construção da afetividade
dicotomizada, construída na interação social e herança cultural no decorrer da história
pessoal, subjetiva e singular de cada aluno e professor, inseridos no mesmo contexto social e
cultural (OLIVEIRA E REGO, 2003).
104
5 INTERAÇÕES E AFETIVIDADE NA SALA DE AULA
A sala de aula é um imenso campo de interações, e nela encontram-se numa
convivência diária professor e aluno vivendo um processo de interações afetivas que não
podem ser esquecidas ou negligenciadas. Muito pelo contrário, é necessário observar como
essas são construídas na relação dos sujeitos, uma vez que as dimensões afetivas e cognitivas
são inseparáveis e permeiam todo processo ensino-aprendizagem.
Em busca dessa compreensão foram feitas observações e filmagens em sala de aula,
analisadas pelo seguinte processo: foram realizadas descrição e análise das descrições das
sessões de filmagens; posteriormente foram realizadas transcrições de episódios selecionados,
que por sua vez, passaram pela análise microgenética.
Os episódios foram escolhidos, no sentido de possibilitarem uma interpretação do
fenômeno correspondente ao interesse dessa pesquisa.
A ênfase foi dada nos componentes da afetividade presente nos sujeitos professores
expressas através comunicação verbal e movimentos (comportamentos, gestos, posturas e
atitudes).
5.1 Professor Walter
Diante dos registros obtidos através das filmagens das aulas, pode-se destacar que o
docente Walter é um homem educado, calmo, e simpático, conversa com os alunos na maior
parte do tempo, focado no conteúdo da matéria.
É importante destacar que as falas do professor durante a entrevista, ressaltam a
afetividade como um dos aspectos mais importantes na interação professor-aluno. Walter
argumenta ainda que o aspecto afetivo é um fator fundamental para a aprendizagem e ajuda
no bom desempenho dos alunos, citando como exemplos, gestos, como um “simples passar de
mão na cabeça”, um bom dia”, piadinhas, aproximação do aluno no final da aula, caso
perceba que ele (aluno) esteja com algum problema.
Algumas dessas demonstrações de afetividade relatadas pelo professor, puderam ser
observadas em episódios das aulas filmadas.
105
Dá-se início à filmagem na aula do professor Walter. O barulho de vozes dos alunos
no início da aula é alto. O professor explica rapidamente a eles o motivo da presença da
pesquisadora e das filmagens que serão realizadas no decorrer da aula. Pede aos alunos para
que fiquem tranqüilos e se comportem naturalmente.
EPISÓDIO 1
ASSUNTO: Esclarecimento da pesquisa
TEMPO: 16 segundos
P W: Professor Walter
PW: Eu gostaria que vocês ficassem à vontade, normal, se tiver
que perguntar alguma coisa para o colega, assim como a Ângela que
conversa com a da frente, com a de trás, ela vai continuar
conversando.
(O professor W. ao dizer essa frase sorri e brinca com uma aluna
(Ângela), e em seguida aproxima-se dela passando a mão na sua
cabeça).
Esse gesto do professor corresponde às colocações do docente obtidas na entrevista
sob sua concepção de afetividade quando disse: que um simples passar de mão na cabeça
é um afeto muito grande para o aluno”.
Portanto, esse episódio apresenta um elemento afetivo relacionado ao gesto do
professor, que também brinca e sorri com expressão de carinho e amizade com a aluna.
Este é um episódio no qual se podem encontrar conceitos wallonianos relacionados à
afetividade, o ato motor e a parte cognitiva. Todos os aspectos integrantes do
desenvolvimento e constituição do indivíduo no contexto de suas relações com o meio social
e cultural.
Importante se faz verificar a colocação seguinte que diz Prandine (2004, p. 37):
Na verdade, entender afetividade e ato motor como constitutivos da aprendizagem,
tanto quanto o conhecimento, significa considerar a pessoa do aluno, acolher a
afetividade, sentimentos e emoções manifestos e latentes; reconhecer a necessidade
de movimento e as manifestações corpóreas dos sentimentos e emoções como
atitudes provocadas e mobilizadas pelo processo ensino-aprendizagem; e a partir
daí, considerar a possibilidade de canalizá-los a fim de colaborarem na construção
do conhecimento, na aprendizagem.
O docente afirma na entrevista que “um simples passar de mão na cabeça é um
afeto muito grande para o aluno”, esse parece ser um dos elementos da afetividade. Essa
106
afetividade apontada por ele transpareceu não no movimento de passar a mão na cabeça da
aluna, mas também com a expressão afetuosa do professor, que sorri e brinca com a aluna,
registrando nesse momento um comportamento de interação afetiva.
De acordo com o ponto de vista de Prandini (2004), é fundamental para o professor
que considera seus alunos, compreender a necessidade do movimento, das expressões do
corpo que revelam sentimentos e desencadeiam atitudes que vão influir no processo ensino-
aprendizagem dos alunos, de forma que adequadamente canalizados possam contribuir na
produção de conhecimento.
EPISÓDIO 2
ASSUNTO: interesse e motivação
TEMPO: 4 minutos e 30 segundos
O professor apresenta-se nesse início de aula bem humorado, conversando e sorrindo
com dois alunos sentados na primeira carteira, das duas primeiras fileiras à direita do
professor.
Inicia a aula explicando a importância da análise sintática. Pede aos alunos para
localizarem a página 70 da apostila, o assunto da aula a ser visto: orações coordenadas.
Identificam-se na transcrição as seguintes falas:
PW: Professor Walter
A: Alunos (vozes de vários alunos)
L: Laura (fala da aluna)
PW: Qual a importância da sintaxe que nós temos visto até hoje?
Quando eu vou escrever, eu preciso saber sintaxe ou não?
(O professor está de pé, de frente para a classe, próximo aos alunos
sentados nas primeiras carteiras).
PW: Para ver se eu faço ligações entre as orações, se eu uso
conectivo ou não, se uma oração vai depender da outra ou não.
Certo?Além da escrita, nós temos o quê? A compreensão dos textos.
Quantas vezes eu leio um texto, um poema, então eu entendo por quê?
Porque eu tenho sintaxe. Muita gente pergunta por que eu preciso
saber sintaxe. Não é para analisar uma oração. Então guardem
basicamente duas coisas: leitura de texto para escrever corretamente
um bom texto.
(O professor explica o conteúdo da aula com um tom de voz claro e
compreensível. Movimenta-se andando na frente da classe, olhando
atentamente para os alunos e gesticulando um pouco com as mãos. Os
alunos, em silêncio, olham para o professor).
107
PW: Então, voltando: orações coordenadas. O que é mesmo uma
oração coordenada? O que quer dizer coordenada? Diferente da
subordinada ela é...
A: independente
(Alunos respondem em seguida).
PW: Isso. Independente. Associem sempre com o prefixo in. Não é
dependente. Não é dependente da outra oração. E a outra oração, a
função qual é?
A: Não têm função sintática.
(Vários alunos respondem)
(PW escreve na lousa): Orações Coordenadas:
- independentes;
- não tem função sintática.
PW: O que quer dizer: não têm função sintática?
L: Não funcionam como sujeito e objeto de outra oração.
PW: Ótimo. Não funciona como sujeito de outra oração, não funciona
como objeto. E todas essas funções nós vamos encontrar em que
oração?
A: Na subordinada.
(Vários alunos respondem).
PW: É isso mesmo. Então, vamos explicar um exemplo bem simples.
Vamos dizer que vocês estão fazendo uma narrativa e dizem assim:
(PW escreve na lousa).
PW: Fomos à cidade, fizemos compra e voltamos à fazenda. Quantas
orações? Por onde eu começo?
L: Pelo verbo.
PW: Fomos... fizemos... voltamos.
(O professor fala e grifa as palavras na lousa. Alunos acompanham,
fazendo-se nítida e voz deles na palavra voltamos).
PW: Então, temos quantos verbos?
A: Três.
(Vários alunos respondem ao mesmo tempo).
PW: Então, se eu tenho três verbos, são quantas orações?
108
A: Três.
(A classe unida responde ao mesmo tempo).
PW: Três orações. Onde eu separo?
A: Fomos à cidade/ fizemos compra/ e voltamos à fazenda.
(Os alunos vão falando e o professor vai repetindo, fazendo na lousa
as separações da frase: Fomos à cidade primeira, fizemos compra
segunda, e voltamos à fazenda – terceira).
PW: Perfeito! O e é o conectivo que liga, tudo bem? Eu posso afirmar
que essas três orações são independentes? Se eu disser: Fomos à
cidade, vocês vão entender ou não?
A: sim!
(Os alunos motivados e participativos respondem alto: Sim!)
PW: Nós fizemos compras?
A: Sim!
(A classe unida em coro responde).
PW: Nós Voltamos à fazenda?
A: Sim!
(A classe unida em coro responde).
PW: Essas orações são coordenadas.
No episódio acima, observa-se um momento especial de interação entre professor e
alunos, envolvidos através do interesse, motivação e participação na aula, em busca do
mesmo objetivo: a construção do conhecimento.
Observou-se nesse episódio, que o professor Walter demonstra com calma e
paciência, aspectos básicos de sua postura como professor - indicando ser esta uma das
formas como ele constrói a afetividade em sala de aula - que consegue obter a atenção e
participação da maioria dos alunos.
Na opinião de Davis e Oliveira (1994), um dos trabalhos mais significativos a serem
desenvolvidos pelo professor junto de seus alunos é a motivação.
Para as autoras, o professor competente procura fazer com que o processo de
aprendizagem seja motivador em si mesmo. O prazer deve vir da própria aprendizagem, de
produzir no aluno sentimentos de capacidade pessoal e habilidade para resolver problemas.
109
A motivação humana deve ser compreendida na relação entre aspectos cognitivos e
afetivos da personalidade, ambos largamente dependentes do meio social [...]. Pode-
se assim dizer, que uma pessoa motivada para aprender constrói o conhecimento
mais prontamente do que uma sem motivação. (DAVIS e OLIVEIRA, 1994, p. 85).
No episódio transcrito, notou-se que o professor conseguiu motivar a classe,
encontrando uma boa receptividade e participação dos alunos no tema abordado (análise
sintática).
Durante a maior parte das filmagens notou-se uma busca por parte do professor na
comunicação, no sentido de motivar os alunos a participarem da aula. Estes, por sua vez,
apresentavam posturas apáticas, com expressão facial denotando desinteresse, sonolentos,
com as mãos apoiadas na cabeça e outros deitados sobre a carteira. Nesse contexto, segue o
episódio a seguir.
EPISÓDIO 3
ASSUNTO: aluna sonolenta
TEMPO: 2 MINUTOS
PW: Professor Walter
AR: Aluno Renato
(Uma aluna sonolenta deita sobre os dois braços apoiando a cabeça do
lado esquerdo por algumas vezes).
PW: Todos entenderam o que é “operante”? É o que tem mais de uma
sílaba? Qual a função sintática? Ajunto adverbial de lugar.
(O professor se dirige à lousa e repete a frase: adjunto adverbial de
lugar).
PW: Essa é a função sintática.
(Um aluno levanta a mão, provavelmente pedindo permissão para sair
da sala. O professor acena afirmativamente com a cabeça num sinal de
consentimento. O aluno levanta-se e sai. O professor continua a
exposição da aula).
PW: “Visitamos a família do refugiado. A família do refugiado nos
agradeceu pela atenção”. Então, qual é a palavra repetida?
A: “A família do refugiado”.
(Som da voz de vários alunos).
PW: “A família do refugiado”. Então grifem “A família do
refugiado”. Nós vamos manter a primeira e grifar a segunda, certo?
Qual é a função sintática da segunda?
110
A R: O sujeito.
PW: Isso. Então, mantendo a primeira, como é que fica? Visitamos,
visitamos...
(O professor olha e se dirige a aluna sonolenta que está sentada na
segunda carteira com a cabeça apoiada sobre os dois braços, de olhos
fechados, parecendo dormir. O professor, com um gesto de mão toca
suavemente o braço dela. Imediatamente, a aluna levanta a cabeça e
olha para o professor que aponta a apostila como um sinal de atenção,
para que acordasse e voltasse a acompanhar a explicação feita por ele
em relação ao conteúdo da apostila que estava sendo discutido).
PW: Visitamos a família do refugiado...
Nesse episódio, observa-se a postura discreta e educada do professor Walter, ao
chamar a atenção da aluna, para que voltasse a prestar atenção na aula.
No modo de agir do docente, percebe-se claramente a predominância de uma postura
calma, de respeito e compreensão com os alunos, mesmo que, no decorrer da aula, eles
demonstrassem desinteresse, indiferença e pouca participação na aula.
Salienta-se que as atitudes de indiferença, apatia e desinteresse dos alunos percebido
nessa e outras filmagens são elementos que também fazem parte da afetividade, nesse caso
atuando de forma desfavorável à aprendizagem. Nesse olhar desponta uma questão a ser
observada e refletida pelos educadores: por que o conhecimento muitas vezes é tão
desinteressante para os alunos adolescentes? Quais meios, recursos didáticos ou posturas
poderiam ser adotados pelo professor para que o aluno possa se sentir interessado e motivado
pelo conteúdo desenvolvido e trabalhado durante as aulas? Essas e outras questões talvez
necessitem de uma investigação direcionada especialmente nesse sentido, de forma que possa
abordar por diferentes ângulos a visão dos alunos do ensino médio sobre as maneiras ou
procedimentos de como os alunos possam ser “tocados” ou essencialmente motivados e
envolvidos para aquisição dos conteúdos escolares no cotidiano da sala de aula.
Durante as entrevistas aos alunos, perguntou-se qual professor é considerado mais
afetivo e Walter foi apontado como professor afetivo por todos os alunos entrevistados. A
partir da análise dos episódios citados das filmagens, é possível compreender a indicação dos
alunos, considerando o ambiente e as interações estabelecidas nas aulas.
Interessante se faz conhecer a versão de Vallejo (1998, p. 60) sobre a conduta do
professor e percepção dos alunos:
111
Não basta o que o professor faz; é necessário que o aluno perceba o interesse do
professor. O trato do professor com alunos concretos (ou com todos, cada um em
seu momento) tem um impacto muito poderoso nos alunos.
Talvez nós, professores, não trata pensemos no que supõe para alguns alunos ver
que o professor se fixou neles, que sabem que existem, que não passam
despercebidos. A disponibilidade, o interesse, etc. têm de ser comunicados aos
alunos. E tal comunicação afeta a percepção que eles m do professor, e
conseqüentemente, influi em sua dedicação às tarefas de aprendizado.
Vallejo aponta para um aspecto aparentemente simples, porém, relevante na relação
professor-aluno; que é o fato de que qualquer aluno não quer ser apenas mais um no meio de
tantos. Ele quer ser visto, percebido, reconhecido, quer também receber a atenção do
professor e provavelmente um pouco mais que isso: ele quer sentir que é importante, que ele
conquistou um espaço pessoal dentro da sala de aula.
Observou-se que o docente Walter, como foi dito, parece manifestar aspectos
essenciais da afetividade na relação com seus alunos, que se revelaram pela sua maneira de
ser, pela atenção dispensada aos alunos (episódio 1 e 3) e pelo compromisso com a
aprendizagem dos mesmos (episódio 2). Entretanto, faz-se necessário pontuar a questão da
afetividade que se mistura e confunde com afetuosidade na visão do professor promovendo a
dicotomia.
Sabe-se que a dimensão afetiva na escola, é uma dimensão existente, devendo, por
parte do professor, ser olhada, direcionada e trabalhada através dos conteúdos escolares.
Embora a forma confusa do professor compreender a dimensão afetiva na sala de aula,
expressos em suas concepções sobre afetividade, as filmagens demonstraram um professor
comprometido com a aprendizagem dos alunos, que no exercício de sua função manteve-se
focado no conteúdo da matéria trabalhada em sala de aula, sem que a afetividade estivesse
fora desse contexto.
5.2 Professor Julio
Na sala de aula observa-se, pelas filmagens, que o professor Julio apresenta um
modo de ser em que aparenta tranqüilidade, espontaneidade, competência e experiência
profissional.
A primeira atitude como elemento de interação é o “bom dia!”, com o qual
cumprimenta a classe.
112
O professor fala e gesticula bastante ao explicar a matéria da aula, faz perguntas aos
alunos sobre o assunto estudado, que ele próprio responde, uma vez que os alunos raramente
o fazem. O trabalho em grupo proposto pelo professor em uma das aulas foi motivo de
interação e ânimo entre os pares, que conversavam e riam, modificando o ambiente na sala de
aula. O docente circulava entre os grupos, passando orientações e explicações sobre os
exercícios.
Observa-se o esforço que faz ao repetir determinados assuntos (gás, molécula,
transformação do gás, pressão e volume, pressão e temperatura) parecendo ter como objetivo
que os alunos compreendam e memorizem o conteúdo da matéria. Percebe-se também, que
ele insiste em determinados assuntos, fazendo a mesma pergunta aos alunos sobre pressão e
volume por três vezes. O episódio a seguir descreve o fato citado:
EPISÓDIO 1
ASSUNTO: didática
TEMPO: 2 minutos e 30 segundos
PJ: Professor Julio
A: Alunos
PJ: O gás oxigênio é formado por moléculas com atomicidade dois.
Pessoal, é isso que faz a diferença. Coisinha mínima que eu comecei
no início do ano, no meio e agora no final.
(O professor se desloca continuamente da lousa, até próximo à carteira
dos alunos).
PJ: São questões que caem na Fuvest, Unicamp...
(Professor pára de falar por alguns instantes enquanto faz anotações na
lousa).
PJ: Na mesma temperatura, portanto, a transformação é isotérmica.
Temperatura, também é constante e vão variar o quê? Pressão e
volume. Pessoal, vou repetir: pressão e volume são grandezas
inversamente proporcionais. Eu quero que vocês racionem além dessa
minha resposta... Quando se dobra a pressão sobre uma amostra de
gás, o que acontece com o volume?
(O professor gesticula com as mãos uma em frente a outra,
diminuindo e aumentando o espaço entre elas para explicar o conteúdo
da matéria).
A: reduz pela metade.
(Alunos respondem).
113
PJ: Reduz pela metade. Pronto! Cinqüenta por cento da sala está
percebendo... Vou fazer pela terceira vez a mesma pergunta. Cem por
cento agora, cem por cento? Pressão e volume são grandezas...?
(Professor aguarda por alguns instantes as respostas dos alunos).
A: Inversamente proporcionais.
(Alunos respondem ao mesmo tempo).
PJ: Quer dizer que se você dobra a pressão sobre uma amostra de
gás, o volume vai diminuir pela metade.
Para passar informações do conteúdo da matéria, o professor Julio normalmente usa
a lousa, para anotar e explicar as fórmulas, como também utiliza os gestos e a linguagem para
trabalhar com os alunos.
Ele pede aos alunos que não tenham pressa ao fazer os exercícios e, que façam com
calma e tranqüilidade. Pergunta se existe alguém que não sabe por onde começar, ao mesmo
tempo em que brinca e sorri, dizendo não saber por que, naquele dia, não estavam falando de
churrasco e festas.
Eu não sei o que está acontecendo com vocês hoje? Ninguém tá
falando de clube, que vão fazer churrasco no clube, na casa dos
amigos, que vão à festa à fantasia... (professor Julio).
Eventualmente pede silêncio para que possa ser ouvido, sempre mantendo o mesmo
tom de voz calmo, sem se alterar. Solícito, pergunta se os alunos têm dúvidas e atende ao
chamado dos mesmos com atenção e interesse. Após o término da aula, ele vai até um grupo
atender ao chamado de uma aluna.
Na apresentação deste episódio, nota-se a preocupação do professor Julio com o
aprendizado dos alunos. Ele parece incentivá-los a memorizarem o assunto, fazendo a mesma
pergunta por três vezes sobre pressão e volume. Observa-se nesse sentido, que os alunos são
receptivos e interativos no processo de construção do conhecimento.
Os dados dão indícios de que a aprendizagem ocorreu em função das interações que
se estabeleceram entre os alunos e seu mediador (professor) que construíram o conhecimento.
As atividades educativas (exercícios) proporcionaram o desenvolvimento dos alunos,
motivando-os e auxiliando-os através de mediações adequadas, como no episódio citado, no
qual o professor trabalha os conteúdos de química, fazendo questão de que os alunos se
114
apropriem da informação de que “pressão e volume são grandezas inversamente
proporcionais”.
Esse processo de conhecimento acontece por intermédio das ações partilhadas, uma
vez que é através dos outros que as relações entre indivíduo o objeto de conhecimento o
estabelecidas (REGO, 1995).
Percebe-se ainda que a didática desenvolvida pelo professor que, juntamente com as
explicações do assunto trabalhado, conversa, sorri e brinca com os alunos, propicia meios
para favorecer a qualidade na interação, fundamentais para a aprendizagem e o
desenvolvimento cognitivo e afetivo dos alunos.
Numa outra sessão, o assunto da aula é a revisão da matéria para a avaliação,
composta por provas objetivas, discursivas e resolução de exercícios. A classe conversa
bastante e o barulho de vozes é predominante.
EPISÓDIO 2
ASSUNTO: O gesto
TEMPO: 1 minuto e 25 segundos
PJ: Professor Julio
PJ: Para começar a revisão, vamos falar de gás. Vou colocar alguns
tópicos na lousa para revisão. O que é estado gasoso? Psiu!!!
(O professor pede silêncio à classe, parecendo perceber que não está
conseguindo ser ouvido. Depois, dá continuidade à aula).
PJ: O que é estado sólido? Pessoas presas, onde ninguém consegue se
mexer...
(Ao dizer isso, o professor ergue o braço e fecha a mão esquerda,
explicando com o gesto).
PJ: E o líquido, elas se afastam, se soltam, exige movimento. E o
gasoso... pessoal, chega, né?
(Professor interrompe a aula, pedindo silêncio, colocando a mão
esquerda na própria boca, dirigindo-se principalmente para os alunos
que estão sentados no fundo da sala de aula. Fala algumas palavras em
tom baixo, que não foram possíveis compreender.Em seguida continua
a aula).
PJ: E o estado gasoso, as moléculas se dispersam, elas não têm
nenhuma atração.
115
A atitude do professor no presente episódio é feita sem demonstração de irritação ou
nervosismo de sua parte.
Observa-se que o docente apresentou aspectos de natureza afetiva na interação com
os alunos através do olhar expressivo e atento, demonstrando preocupação com o aprendizado
dos mesmos, apesar da indiferença, desinteresse, falta de atenção dos alunos adolescentes na
maior parte do tempo das aulas expositivas.
Os gestos usados como forma de didática para explicação e compreensão do
conteúdo da matéria, sorrisos, tom de voz, comunicação e diálogo com os alunos de forma
geral e individualmente (observados principalmente durante a realização do trabalho em
grupo), indicam aspectos de interação afetiva.
Uma vez consciente das dificuldades de aprendizagem que os alunos apresentam na
sua disciplina, esforçou-se nas explicações, usando os recursos disponíveis para que o
conteúdo da matéria fosse assimilado, procurando como ele próprio disse ser “simpático,
educado e agradável com os alunos”. O professor Julio foi indicado por três dos sete alunos
entrevistados, como professor afetivo.
De acordo com Gulassa (2004), Wallon privilegia o grupo como espaço e encontro
das pessoas através das interações que obedecem a interesses diversos.
É nesse encontro do eu-outro e do indivíduo-meio, que se constroem e edificam as
identidades, na qual se estruturam a personalidade do aluno adolescente que vai descobrindo
gradativamente quem ele é e qual é o seu lugar no mundo. Sem dúvida, a sala de aula sempre
será um grupo especial, onde professor e alunos passam a maior parte do seu tempo.
De um lado o professor mediador, que deve estimular e valorizar a cooperação no
grupo, do outro os alunos e seus pares em processo enriquecedor de interação e construção do
conhecimento, mas principalmente de humanização do sujeito aluno (ontem criança, hoje
adolescente, amanhã adulto) e talvez um adulto professor (GULASSA, 2004).
A autora, embasada no pensamento de Wallon afirma: “O professor precisa ter
clareza de para que está educando seus alunos, e tais objetivos permeiam toda sua ão. Em
sua concepção, o professor deve educar para maior humanização, incentivando a cooperação,
a solidariedade, a justiça social” (GULASSA, 2004, p.117).
No desafio do professor, em seu papel de mediador da aprendizagem, do
conhecimento e da cultura está a responsabilidade de contribuir para a formação de
consciências e personalidade do aluno, as quais incluem o respeito, a responsabilidade, a
solidariedade, a consideração por si mesmo e pelo outro, assim como a igualdade de deveres e
direitos.
116
O professor Julio demonstra certa contradição entre as suas falas na entrevista sobre
concepções da afetividade e aprendizagem, nas quais nota-se aspectos da dicotomia entre
afetividade e cognição. Sua postura de atenção, interesse e preocupação com aprendizagem
dos alunos identificadas no procedimento do professor nas filmagens realizadas (episódio 1 e
2), pelo empenho que fez para conseguir que os alunos se apropriassem do conteúdo da aula
administrado, no entanto, parecem não evidenciar aquela contradição apontada em sua fala.
5.3 Professora Maura
Os dados das filmagens mostram que a professora Maura tem uma postura séria na
maior parte do tempo das aulas. Seu tom de voz é alto, firme, claro e compreensível.
No episódio 1 ela os textos da apostilas e explica seu conteúdo: “discurso interior,
monólogo e solilóquio”. Os alunos trabalham em silêncio e demonstram falta de motivação e
interesse, pois raramente fazem perguntas à professora e quando ela faz a pergunta: “quem
está no papel do personagem do monólogo e do solilóquio?” as respostas não são ouvidas
com clareza.
A docente transmite a impressão de uma profissional segura, que conhece e domina a
disciplina administrada, percebe-se também que o foco principal da professora é o conteúdo
da aula a ser transmitida e levada até o final da mesma. Observa-se uma preocupação especial
da professora no que diz respeito à disciplina, não permitindo conversas paralelas e chamando
atenção quando isso ocorre.
Nessa circunstância, apresenta-se o seguinte episódio:
EPISÓDIO 1
ASSUNTO: “disciplina”
TEMPO: 2 minutos
PM: Professora Maura
A: Alunos
AR: Aluna Roberta
PM: Prestem atenção nesta questão. É fácil, prestem atenção... Das
falas transcritas abaixo, qual a única que não caracteriza o monólogo
da personagem principal?
117
(Ouvem-se pequenos rumores da fala dos alunos e não compreensível)
A: “Ela”.
PM: A resposta d diz assim: “É um veneno terrível. Como é que você
está viva?” Quem está falando? Quem fala?
A: “Antônio”.
PM: “Antônio”.
PM: A pergunta diz: “Nas falas abaixo, qual é o que não caracteriza
monólogo da personagem, ou seja, uma parte que ela fala?” Qual dos
trechos não é uma transcrição da fala dela? É esse? Esse trecho aqui
foi dito por Antônio, marido dela. Então, coloquem um x na
alternativa d e justifiquem em baixo. Essa fala é do personagem
Antônio, marido da personagem central.
(PM silencia por mais ou menos vinte segundos, dirigindo o seu olhar
para dois alunos que conversavam no fundo da sala. A professora está
parada, com a mão direita sobre a cintura, até que faz uma pergunta).
PM: Para variar, qual é o problema aí?
(As alunas da frente olham para trás. Ela está se referindo a dois
alunos que estão conversando. Um dos dois responde algo, que não foi
possível compreender).
PM: E o Seu Daniel?
O episódio mostra a preocupação da professora com relação à disciplina da classe,
ela é exigente, colocando limites, principalmente, em conversas paralelas.
A sua postura séria e enérgica, o modo como desenvolve o trabalho, o conteúdo das
aulas administradas, confirmam os pontos de vista argumentados na entrevista, na qual
ressalta o valor da disciplina como instrumento imprescindível para uma boa aprendizagem.
Não resta dúvida no que diz respeito à importância da disciplina em sala de aula. No
entanto, é oportuno refletir o parecer de Davis e Oliveira (1994), ao apontar aspectos
relevantes no comportamento dos alunos com relação à disciplina na sala de aula.
Argumentam as autoras que a indisciplina pode simplesmente significar um desejo
de independência e oposição diante do adulto. E que esse problema poderia ser discutido, para
se chegar ao entendimento, da forma mais adequada do aluno solicitar autonomia e também
avaliar normas e regras na sala de aula, de modo a encontrar acordos que beneficiarão a
ambos.
118
Esse tipo de atuação docente é de vital importância. Na verdade, ao fazer os alunos
refletirem sobre a sua própria conduta, relacionando-a com as outras, o professor
contribui eficazmente para a integração entre cognição, afetividade e mecanismo de
autocontrole do comportamento. (DAVIS e OLIVEIRA, 1994, p. 97).
Numa sessão de filmagem dessa professora foi realizada a aula teórica de técnicas de
redação, na qual foram trabalhados vários textos (Vidas Secas e outros). Ela desenvolveu o
texto da apostila, que contém respostas certas e erradas. As conversas paralelas ocorrem
eventualmente e muito rapidamente. Na aula prática, os alunos fazem exercícios que valem
pontos e depois são entregues à professora.
Na entrevista, a docente deixou claro que percebe a presença da afetividade pela
aproximação de alguns alunos com ela e, quando isso acontece, o aluno tem mais interesse e
que este fator facilita a aprendizagem. Entretanto, afirma que também pode ocorrer o inverso:
alunos que não tem uma aproximação maior com o professor e que mesmo assim têm uma
boa aprendizagem. Atribui esse fato às características de alunos que, independentemente da
aproximação com o professor, têm interesse próprio nos estudos.
Nas falas da professora, através da entrevista, ela admite que “percebe que a
afetividade é cada vez mais difícil de existir” na interação professor-aluno afirmando que a
“sua responsabilidade é passar conhecimento para que os alunos estejam preparados para o
vestibular”. Em seu procedimento como professora, a prioridade é manter a disciplina, para
obter uma boa aprendizagem dos alunos, delegando ao segundo plano o que ela considera
como interação afetiva.
EPISÓDIO 2
ASSUNTO: postura docente
TEMPO: 7 minutos
PM: Professora Maura
AL: Aluna Laura
A professora inicia a aula dando “Bom dia” aos alunos, que não
respondem. O rumor das vozes dos alunos é bastante acentuado nesse
início da aula.
A professora aguarda um pouco e começa a dizer que, uma vez
terminada a apostila, irá fazer uma revisão da matéria dada para que
eles estejam mais preparados para a prova.
Uma aluna pergunta se a prova vai ser difícil. A professora responde
que não, dizendo: Para quem estuda, a prova é sempre fácil”. Em
seguida, ela vai repassando vários assuntos trabalhados em aulas
anteriores: síndeto, pleonasmo, hipérbole, subsídios para dirigir um
bom texto usando conectores adequados, conjunções etc.
119
O tom de voz da professora é forte e alto, enquanto explica e faz
perguntas aos alunos, incentivando-os a participar da aula. Eles, por
sua vez, parecem estar prestando atenção, mas pouco participativos.
PM: Em termos formais, como nós trabalhamos a carta? O que é que
determina o tipo de linguagem de uma carta?
AL: O fim a que se destina e o destinatário.
PM: O quê?
AL: O fim a que se destina e o destinatário.
PM: O fim a que se destina e o destinatário.
PM: O fim a que se destina e o destinatário. Exatamente. Se o emissor
da carta for escrever para uma pessoa formal, que ocupa um cargo
bastante elevado, cuja comunicação entre eles é formal, ele pode
utilizar qualquer e tipo de linguagem.
A: Não
(Aluno não identificado responde).
PM: Norma culta, linguagem formal, uso de pronome de tratamento
específicos para aquele tipo de destinatário. Por exemplo, vamos
escrever para o Presidente da República, diremos: “Excelentíssimo
Presidente da República!”, Vossa Excelência!”. Se nós estivermos
entrando em contato com um grande amigo, uma grande amiga, que
tipo de linguagem podemos utilizar?
(Professora mantém-se de pé, na frente, no centro da sala de aula,
gesticulando com ambas as mãos).
A: Uma linguagem simples... você...
(Aluna não identificada responde).
PM: Uma linguagem informal, coloquial, que inclusive nessa situação
pode conter gírias, uso de palavras, não é? Até vulgares, se o uso
dessa linguagem for adequado ao contexto. Mas, o que eu disse para
vocês de mais importante nessa aula é que todos nós... eu me lembro
que quando eu dava aula para alunos do colégio técnico agrícola,
eles me perguntavam porque eles tinham que aprender esse tipo de
linguagem, se eles iam lidar com peão, com pessoas de trabalho
braçal.
(PM está de pé, olhando atentamente e falando com os alunos
enquanto mantém o braço direito atrás das costas).
PM: Então, eu expliquei para eles assim: que eles terão patrão, e que
provavelmente esse patrão poderia ser um agrônomo, um veterinário,
zootecnista e aí, como você vai fazer para conversar com esse patrão,
ele não é um peão. E que também, ele poderia ser convidado a
120
participar de uma reunião com esses profissionais, e, como ele iria
conversar com eles? Então, é o mais importante, inclusive no caso de
vocês que terão o segundo grau completo e que muito provavelmente,
irão para a faculdade não é? o que acontece? Nós que temos esse
nível de escolaridade temos que dominar a norma culta, tá?
A linguagem formal. Isso é o mais importante. Aí vocês poderão
dizer: bom, Maura, porque eu domino a norma culta, eu vou ter
que falar desse jeito com todo mundo? Claro que não!
(PM continua de parada mantendo a mão direita atrás das costas,
enquanto conversa com os alunos).
PM: é o importante: quem domina a norma culta sabe adequar a
linguagem ao contexto que ele estará presente. Vou me colocar, como
exemplo de professora de português. Como professora de português,
vou cometer erros, porque ninguém é perfeito. Evidentemente que eu
cometo erros de português, que é minha especialização,
provavelmente menos que outros que não tenham essa formação.
Agora seria uma situação muito constrangedora, um professor de
português cometer erros freqüentemente na sua área. Ele está aqui
para ensinar. Ele pode cometer erros? Pode! Mas não pode ser
freqüentemente, erros constantes, senão ele não pode ser professor de
português. Eu me preocupo em falar e escrever corretamente,
evidente que eu procuro. Eu presto atenção na redação de vocês, se
estão escrevendo corretamente ou não. Claro que sim! Se não que
raio de professora de português eu sou? Eu tenho que me preocupar
tanto com a linguagem oral como com a escrita de vocês. Então, isso
é uma adequação que eu faço como professora.
No presente episódio, percebe-se que a professora comunica-se normalmente com
seus alunos através da exposição da aula. Porém, observa-se através do seu discurso, uma fala
pessoal onde relata sua experiência como professora de outros alunos e o que ela fez para que
eles compreendessem a importância de falar corretamente, fazendo uma ponte para explicar
para seus alunos ali presentes, que estão a caminho de concluir o segundo grau e,
provavelmente a faculdade no futuro, também a importância de falar e escrever corretamente.
Nessa oportunidade, faz questão de explicar aos alunos a sua postura como pessoa e
como professora de português, que pode errar como ser humano, mas não freqüentemente. E
que na sua função de passar conhecimento, deve estar atenta ao desempenho deles na
linguagem oral e escrita, sendo este, o seu compromisso fundamental: ser professora e agir
adequadamente nesse papel. Essa fala da docente é bem significativa, procura explicar, de
certa forma, o seu modo de ser e agir, o porquê de sua postura enérgica, a importância que
ao seu papel docente, cuja responsabilidade é levar os seus alunos a se apropriarem do
conhecimento. Observou-se ainda, a sinceridade e coerência em admitir suas limitações
enquanto professora, mas também como ser humano que comete erros. Mas deixou claro
121
principalmente os valores construídos do que é ser professora: alguém que está ali para
ensinar e preparar seus alunos a construírem conhecimento, preparando-se para darem
continuidade às etapas seguintes de seus estudos.
Acredita-se que esta é a maneira pela qual a docente interage com seus alunos, na
qual a seriedade, a firmeza, a exigência da sua postura como docente, mas também a sua
intenção de dar seu melhor como professora. Esse fato fica evidente no discurso do episódio
relatado, que é a sua maneira de construir vínculos afetivos com seus alunos: a sinceridade, a
disciplina, a boa vontade, a responsabilidade, o interesse e a preocupação com seus alunos,
em ajudá-los a se preparar como pessoas e profissionais no futuro. Destaca-se que a
professora Maura foi indicada como professora afetiva por quatro dos sete alunos
entrevistados. É válido considerar a importância da individualidade e subjetividade da
professora analisada, que deve ser respeitada e valorizada, porque é na intersubjetividade do
docente e do aluno que ambos, através de suas experiências, aprendem a enfrentar e a lidar
com as formas específicas de se relacionar com a realidade.
Nessa perspectiva, Almeida (2004, p.128), sustentada pelas idéias de Wallon e
Macarenko diz:
Acreditando que a personalidade é resultante da interação com o meio social, nele
devendo ser desenvolvida, [...]. Entende que a teoria pode fornecer as diretrizes
básicas, mas no campo das relações humanas, que é o da educação, a ação do
educador é em ato singular, impossível de ser repetido, porque cada ser é único e
vive num momento que não se repete.
Ao defender os pressupostos de Wallon, Mahoney e Almeida (2006, p.65),
argumentam: “Ser adulto significa ter desenvolvido uma consciência moral: reconhecer e
assumir com clareza seus valores e dirigir suas decisões e escolha de acordo com eles”.
O professor consciente não reconhece os seus valores, suas qualidades e virtudes,
mas também seus defeitos, dificuldades e limitações, esforçando-se por superar-se, porque
diante dos seus olhos concentram-se vários olhares (atentos ou aparentemente indiferentes) de
jovens se apropriando daquilo que o outro (professor) está lhe oferecendo. E esse outro
(aluno) necessita pensar para aprender, mas também necessita pensar e sentir para ser sujeito
humano, com progressos efetivos no seu processo de aprendizagem.
Importa reconhecer que na postura da professora Maura sobressai o seu compromisso
com a aprendizagem dos alunos, observado nos registros das aulas filmadas (episódio 1 e 2).
Novamente se infere que a dicotomia entre afeto e cognição, limita-se às suas concepções
sobre afetividade e aprendizagem e não no seu procedimento. Afinal, a afetividade se
122
configura e se concretiza no seu objetivo principal, no trabalho do professor e no processo
ensino-aprendizagem.
5.4 Professor Lucas
Na análise dos registros feitos através das entrevistas e filmagens destacou-se que o
professor Lucas tem uma postura descontraída como professor. Na primeira filmagem, ele
brinca com os alunos dizendo que as gravações seriam mostradas aos pais para que eles
vissem o comportamento dos seus filhos em sala de aula e também que estas imagens
virariam matéria do “Jornal Nacional”. Os alunos riram e retrucaram dizendo saber que isso
não era verdade.
Sobre esse assunto segue o próximo episódio.
EPISÓDIO 1
ASSUNTO: brincadeira verbal
TEMPO: 2 minutos e 3 segundos
PL: Professor Lucas
A: alunos
PL: Turma, estas filmagens estão sendo feitas para mostrar para os
pais. Isso é pra ver como vocês se comportam em sala de aula. E
depois vai passar no “Jornal Nacional”.
(Nesse momento o professor fala andando de um lado para o outro, na
parte central da sala de aula. Segura a apostila com a mão direita,
enquanto gesticula com a mão esquerda. Os alunos riem muito com a
brincadeira do professor. Em meio ao barulho das vozes e risadas,
ouve-se a voz de um deles que disse: “É mentira!”. E o professor
continua falando e brincando com os alunos por mais alguns minutos,
dizendo:).
PL: todo mundo vai ver realmente quem “apronta”. Não vai ter
como fugir. Então vamos acionar a polícia, o Ministério da
Educação...
(Os alunos adolescentes continuam rindo e falando ao mesmo tempo,
envolvidos com o clima de descontração e alegria. Percebe-se que o
professor deseja controlar o barulho da classe para que possa dar
início à aula. Ele continua:).
123
PL: Pessoal, vamos lá! Vamos fingir que vocês são pessoas educadas,
façam perguntas inteligentes, não vão fazer aquelas perguntas que
não tem nada a ver, senão vai ficar chato.
Percebe-se pelas reações dos alunos como são receptivos às brincadeiras que o
professor faz nesse episódio.
Os alunos adolescentes parecem valorizar esses momentos de alegria e descontração,
que envolvem a classe proporcionando um clima agradável entre o professor e os alunos.
Este episódio confirma a fala de alguns alunos, os quais se referem à importância do
professor que “brinca” com os alunos, relacionando essa atitude ao professor afetivo que
compreende a necessidade de “brincar” como um recurso para descontrair a aula e para
facilitar a aprendizagem dos alunos adolescentes.
De acordo com Almeida (2007, p. 80):
O professor não pode esquecer sua função no grupo, como coordenador: é aquele
que observa os processos grupais e intervém, apoiando e dando ao grupo condições
de achar seu caminho. Seu objetivo não é trazer conhecimento novo, mas ver
como o processo de aprendizagem se desenvolve no grupo: aprendizagem de
conceitos, de fatos, de valores e de comportamentos.
A autora, embasada na teoria de Wallon, ressalta o papel do professor como
coordenador de um grupo de alunos, que não está ali unicamente para proporcionar a
aquisição de conhecimentos, mas também de valores, tais como: respeito, responsabilidade,
cooperação, discernimento de idéias, compreensão entre o certo e o errado e experiências
necessárias à construção da “personalidade e da inteligência” do jovem aluno. Este tem diante
do seu futuro muitas conquistas a serem realizadas nos aspectos morais, pessoais, cognitivos,
afetivos, sociais, culturais, etc. É por esta e outras razões importantes que o professor é um
personagem principal, é o outro especial na história de vida desses alunos.
Daí a necessidade que esse outro (professor) descubra vários caminhos para interagir
com seus alunos, seja dialogando, ensinando, aprendendo, amando, colocando limites,
superando problemas e dificuldades, movimentando-se num trabalho intenso, constante e
contínuo de convivência diária com seus alunos, colaborando no processo de formação do ser
humano.
Sabe-se, através da entrevista, que o professor Lucas, prioriza a autoridade como
forma de manter a disciplina da classe e procura agir assim, por pensar que com adolescentes
124
esta postura é necessária. Acredita que laços afetivos são criados entre professor aluno, mas
devem ser bem dosados, porque segundo ele “pode ganhar um amigo, mas perder um aluno”.
O professor Lucas intercala uma postura de autoridade e outra mais descontraída
com os alunos, mas faz questão de manter a disciplina, chamando atenção, pedindo silêncio, e
repreendendo aqueles que estão conversando.
O episódio relatado a seguir demonstra a atitude do professor diante dessa situação.
EPISÓDIO 2
ASSUNTO: autoridade e disciplina
TEMPO: 1minuto e 45 segundos
PL: Professor Lucas
PL: Vira duas páginas e vamos para a página quarenta e cinco.
Temos um mapinha , dos relevos dessa região da Europa Central e
Oriental. É uma grande planície, né? Planície da Europa Oriental
que vem dos Montes Urais, que atravessa a Europa inteira. É quase
que uma planície, é uma reta que facilita os rios navegáveis, certo?
São rios bons para navegação. É uma área, é uma que transporta...
(Nesse momento, o professor interrompe a aula e se dirige até o fundo
da sala, apontando o dedo indicador para dois alunos que estão
conversando: o aluno da carteira da frente com o de trás e diz:).
PL: Vamos mudar de carteira? Senta aqui!
(O professor aponta o lugar da sala, onde o aluno deve se sentar, um
espaço no centro da sala. O aluno, em silêncio, sem questionar ou
reclamar, imediatamente levanta-se e leva sua cadeira até o lugar
indicado pelo professor. Este aguarda até que o aluno se acomode e
continuidade a aula sem fazer nenhum comentário).
PL: E alguns acidentes geográficos... É isso que eu acho mais
importante que eu falei pra vocês. Temos que saber da Europa
Oriental, os Montes Urais. Tem que olhar no mapa e saber onde
ficam os Montes Urais. Não para decorar. É olhar no mapa e
saber onde fica. Por quê? Os Urais é a fronteira. Ali acaba a Europa
e começa a Ásia.
No episódio em questão, observa-se que o professor colocou limite na conversa
paralela dos alunos de uma forma que ele acredita ser adequada. Sua atitude foi calma, sem
reações que expressassem irritação, nervosismo, agressividade verbal ou comportamental.
Segundo Mahoney e Almeida (2006), ao tratar dos diferentes estágios de
desenvolvimento que compõem a teoria de Wallon, o funcionamento dos estágios revela a
125
existência de todos os componentes que constituem o sujeito. Nesse sentido, surge um ponto
extremamente significativo:
Não esquecer que todos os estágios, a forma de afetividade facilitadora se expressa
no processo ensino – aprendizagem exige existência, a colocação de limites. Limites
que facilitam o bem estar de todos os envolvidos são também uma expressão de
afetividade. (MAHONEY E ALMEIDA, 2006, p.63).
Necessário se faz refletir nas atitudes do docente analisado, que se preocupa com a
imposição de limites, no caso ligados à disciplina, no contexto da sala de aula.
É do conhecimento dos professores, sejam eles da educação infantil, do ensino
fundamental ou do ensino médio, a necessidade da imposição de limites com relação aos
alunos. Cabe ao professor na função de organizador de grupos e ambiente, intervir ou
interferir em atitudes ou comportamentos inadequados dos alunos em sala de aula. É evidente
que esta postura de professor deve ser permeada pelo bom senso, pelo respeito e consideração
pelo aluno, seja ele criança, adolescente ou adulto.
Na fase da adolescência, existe uma necessidade racional nas relações afetivas, nas
quais o jovem deseja respeito pelas suas idéias, direitos, pelo seu modo de ser e agir.
(ALMEIDA, 2007).
No caso do professor Lucas, supõe-se que os recursos usados são a forma encontrada
para fazer uso da disciplina em benefício da aprendizagem dos alunos e também dos limites
que devem existir na ligação afetiva entre professor e aluno que, a seu ver, devem ser bem
dosados, para não prejudicar a relação entre ambos.
No episódio apresentado a seguir, o professor Lucas está atrasado para sua aula.
Procedimento este que eventualmente ocorre, segundo informação de uma aluna para a
pesquisadora, enquanto aguardava-se a chegada do professor. Nesse espaço de tempo, os
alunos espalhados pela classe, conversavam em grupos de dois ou três.
EPISÓDIO 3
ASSUNTO: cumprimentar os alunos
TEMPO: 57 segundos
O professor chega segurando a apostila em uma das mãos e o
apagador em outra.
Um aluno, sentado no fundo da classe, levanta-se, indo sentar-se na
primeira carteira da segunda fileira (da direita do professor) que
estava vazia.
126
O professor se dirige a este aluno e cumprimenta-o, dando-lhe a mão.
Em seguida, cumprimenta também a classe com um bom dia”.
O professor conversa alguns instantes com este aluno e depois
conversa com vários alunos de forma geral (principalmente com
aqueles que ocupam as carteiras da frente) sobre a prova e a matéria
desta.
O barulho das vozes dos alunos é alto e intenso, não sendo possível
ouvir e compreender o que eles estão falando nitidamente.
O professor caminha até o meio da sala, onde está uma aluna (Laura),
que mexe nos próprios cabelos, fazendo uma trança.
A aluna diz alguma coisa para o professor que não foi possível
registrar no áudio do filme.
Em seguida, ele estende a mão para ela também, cumprimentando-a.
Ela sorri, para de mexer nos cabelos, estende o braço apertando a
mão do professor, correspondendo ao seu cumprimento.
Dar a mão a um aluno, cumprimentando-o. Um gesto simples, porém significativo.
Almeida (2007) destaca que a ação pedagógica na instituição escolar deve ter como
objetivo o desenvolvimento da pessoa e a estruturação do “eu”. Nesse sentido é compromisso
do professor auxiliar o aluno a aumentar sua auto-estima, a aprender a ter confiança em si
mesmo e nos outros e, principalmente, a valorizar-se tendo respeito próprio.
Nesse olhar, pode-se interpretar como significativo o gesto do professor em relação a
esse dois alunos. Algum motivo, para nós desconhecido, desencadeou o movimento de
dirigir-se a esses dois alunos e cumprimentá-los. Percebeu-se pela expressão de satisfação
desses alunos que essa atitude do professor trouxe prazer a eles que, através deste gesto,
receberam uma atenção especial do professor.
São muitas vezes estes gestos, aparentemente insignificantes, que o professor executa
em relação aos seus alunos, que fazem com que eles se sintam valorizados, melhorando sua
autoconfiança e sua auto-estima.
O episódio relatado a seguir sugere elementos de como o professor constrói a
interação afetiva com seus alunos.
EPISÓDIO 4
ASSUNTO: hora do recreio
TEMPO: 1 minuto e 40segundos
PL: professor Lucas
Aproxima-se o término da aula e o professor Lucas continua o seu
procedimento normal da aula, ditando e explicando a matéria.
127
No decorrer da aula, ele anda por toda a classe, indo da frente até o
fundo da sala e vice-versa e outras vezes, circula por entre os alunos,
sempre com a apostila nas mãos. Os alunos acompanham a aula com
pouco interesse, rostos e olhares desanimados, expressões de apatia são
manifestadas pelos estudantes.
PL: Influência extra territorial, ou seja, serviram a superpotências o
poderio bélico, produção e capacidade de mobilização comunitária e
influenciar países que estão fora do seu território. Isso é uma
característica das superpotências que existiam na época.
(Antes mesmo de o professor terminar o assunto da aula, percebe-se a
agitação dos alunos, guardando o material e se preparando para sair.
Logo a seguir o professor encerrou a aula, ergueu o braço esquerdo e
disse:).
PL: Agora, corram para comer o salgadinho!!!
As aulas do professor Lucas parecem ser um pouco cansativas pelo procedimento
normal usado por ele, ditando o conteúdo da matéria para que os alunos anotem. É visível o
pouco interesse e motivação pela exposição na aula. Rostos e olhares desanimados,
expressões de apatia são expressos pelos estudantes que raramente fazem perguntas ou outro
tipo de participação.
No episódio citado, a frase do professor (Corram para comer o salgadinho) parece
ser até um momento de “alívio”, tanto para os alunos como para o professor.
Almeida (2007) esclarece que para o professor compreender, racionalizar suas
emoções é importante que ele oportunidade de ponderar e refletir sobre suas ações e a do
aluno, permitindo que ele expresse seus sentimentos.
O professor observará atentamente as relações das crianças com o seu meio e os
momentos mais propícios à explosão de conflitos (o professor fora da classe,
cansaço acumulado, ausência de tarefas, fome, são alguns deles). Entra o seu
papel de organizador do ambiente, transformando um frio ambiente físico em um
ambiente acolhedor, cheio de atrativos, que desperte o interesse da criança e
proporcione atividades significativas, demonstrando que o professor está percebendo
as necessidades de seus alunos naquele momento (ALMEIDA, 2007, p. 84).
A autora fala da importância do professor observar seus alunos, crianças ou
adolescentes e suas necessidades do momento.
O episódio registrado demonstra que a frase do professor “Agora, corram para
comer o salgadinho!” revela que o professor identifica o intervalo do recreio como um
momento esperado pelos alunos.
128
Necessário se faz também comentar que do professor depende organizar o ambiente
na sala de aula, proporcionando aos adolescentes um ambiente que desperte interesse e
motivação pelas aulas, para uma efetiva construção do conhecimento.
Almeida (2007, p.81) argumenta com precisão neste aspecto quando diz que:
Tanto a seleção dos saberes como sua transposição didática aos alunos dependem do
compromisso e da competência do professor. O aluno está à mercê dele. E quando o
professor transmite uma informação, está construindo a inteligência e desenvolvendo
a personalidade.
As palavras “compromisso” e “competência”, ao se referirem ao professor merecem
destaque para o exercício de uma profissão que envolve muita responsabilidade, dedicação,
doação e afeto no processo fundamental de interação entre professor e aluno.
Observa-se que o professor Lucas apresenta, nos episódios transcritos, alguns
componentes de interação com seus alunos através das brincadeiras verbais (episódio 1 e 4),
da forma de cumprimentar os alunos dando-lhes a mão (episódio 3), de colocar limites nas
conversas dos alunos com respeito e calma (episódio 2). Porém, percebe-se ambivalência nas
atitudes do professor, uma mais espontânea e descontraída e outra mais séria uma vez que, na
maior parte do tempo das aulas filmadas ele manteve uma postura autoritária, que se explica
pelo seu modo de pensar expresso na entrevista, na qual o docente prioriza a disciplina em
sala de aula, e também a preocupação de que os laços afetivos (que para ele devem ser bem
dosados) com os alunos não venham prejudicar a sua relação com eles.
É interessante pontuar que no discurso do professor Lucas, expresso nas entrevistas,
observa-se a presença da dicotomia entre afeto e cognição, compreendido por ele como
dimensões separadas na escola. Para ele, ser afetivo no exercício de sua profissão, significa
sair de seu lugar de professor, atribuindo a essa relação uma situação perigosa, na qual pode
“perder” seu papel na sala de aula. Isto significa que ele desconhece o fato de que a
afetividade é uma dimensão existente e articulada com a dimensão cognitiva e que a primeira,
pode permear a interação professor-aluno através daquilo que ele ensina na disciplina de
geografia.
Diante de tais observações, notou-se que a questão da dicotomia entre afeto e
cognição aparece mais nas concepções sobre afetividade e conhecimento eo tanto no
comportamento do professor, percebido principalmente pelas atitudes de interação observados
em alguns episódios das filmagens, nos quais percebe-se a presença de elementos afetivos de
129
atenção, respeito e paciência no modo de exigir disciplina dos alunos, diálogo sobre assunto
da aula, esclarecimento sobre as provas mediando a relação professor-aluno.
130
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Sob a fundamentação da teoria histórico-cultural, procurou-se construir os pilares nos
quais buscou-se saber qual é o papel da afetividade na interação professor-aluno na sala de
aula e quais aspectos afetivos estão presentes nesse processo interativo.
Nessa difícil construção, enfrentaram-se sombras de dúvidas, incertezas e
dificuldades. Entretanto, à medida que se deu início à construção dessa pesquisa, essas
sombras diluíram-se e clarearam-se através de informações coerentes e seguras advindas dos
pressupostos vigotskianos e wallonianos.
Ambos atribuem valor substancial às interações sociais e à herança cultural na
construção e constituição do sujeito humano.
No processo das interações sociais, destaca-se a consciência afetiva como elemento
fundamental da interação, tendo ela surgido da conexão entre o biológico e o social,
encontrando passagem ao mundo da cultura, construído pelos homens, no percurso de sua
evolução e história (DANTAS, 1992).
Sob essa perspectiva, pode-se entender que a afetividade humana é uma construção
cultural. Nesse contexto, a afetividade recebe diversas conceituações, identificações,
nomeações de formas diferentes, próprias de cada cultura (OLIVEIRA e REGO, 2003).
Assim, sempre amparado pela cultura, o homem encontrou recursos para dar nome às
emoções. Este fato lhe permitiu identificar, compreender e compartilhar com outros membros
da espécie humana todos os conceitos, conteúdos, significados e sentidos atribuídos a elas:
amor, amizade, afeto, saudade, alegria, tristeza, entendimento, atenção, interesse, entre outros.
Segundo Oliveira e Rego (2003, p. 32), “O primordial no entendimento da formação
do sujeito humano é que a sua individuação se inicia nas experiências propiciadas pela
cultura”.
Essa formação do sujeito ocorre na interação com o outro social, através da
internalização das funções psicológicas superiores. “A transformação de um processo
interpessoal num processo intrapessoal é o resultado de uma longa série de eventos ocorridos
ao longo do desenvolvimento” (VYGOTSKY, 1994, p. 75).
Assim, o conhecimento, a atenção, a memória, a linguagem, a formação de
conceitos, significados, sentidos e a afetividade estão presentes em todos os seres humanos.
131
Esses componentes do funcionamento psicológico são inseparáveis, se interpenetram
e mantém relações recíprocas, influenciando o comportamento do homem como um todo.
A dimensão afetiva, de natureza pessoal, subjetiva e singular, é difícil de ser
observada e analisada, principalmente na interação professor-aluno no contexto escolar.
Porém, as suas manifestações sutis ou evidentes deixam marcas nos sujeitos, afetando-os
direta ou indiretamente. A afetividade é uma dimensão sempre presente em todos os
processos interativos, especialmente nas dinâmicas da sala de aula na qual a interação social é
indispensável para aquisição de novos conhecimentos.
Sob esse prisma, pode-se inferir com base na pesquisa desenvolvida que o papel da
afetividade na interação professor-aluno é fazer a ponte vincular entre ambos e propiciar a
aquisição do conhecimento, bem como a motivação para o aprendizado.
Em outras palavras, entende-se que a afetividade está relacionada com a motivação
necessária para que a estrutura cognitiva passe a funcionar, influenciando a rapidez com que
se constrói o conhecimento, porque quando os alunos estão mais motivados, interessados,
aprendem com mais facilidade (DAVIS e OLIVEIRA, 1994).
É essencial salientar que a afetividade na abordagem histórico-cultural deve estar
diretamente relacionada com a produção de conhecimentos que ocorre na relação que se
estabelece entre professor-aluno e o objeto de conhecimentos (conteúdos escolares), que não é
somente cognitivo, mas também afetivo.
Ter consciência dessa realidade vem mostrar ainda mais a importância das práticas
pedagógicas desenvolvidas pelo professor, pois as mesmas estarão mediando a interação que
ocorre entre o aluno e os diversos objetos de conhecimento envolvidos. Pressupõe, portanto,
que o êxito da aprendizagem dependerá em grande parte da qualidade dessa mediação, ou
seja, do compromisso que o professor estabelece com a aprendizagem dos alunos.
Nesse sentido, observou-se, que os componentes afetivos identificados nos docentes,
focos centrais dessa pesquisa, sobressaem-se por intermédio da comunicação verbal (diálogo)
e dos vários recursos didáticos usados por eles, demonstrados em seus procedimentos e
posturas direcionados para o trabalho pedagógico.
O referencial teórico vigotskiano pontua que os trabalhos pedagógicos são processos
intencionais direcionados não somente à aquisição de conhecimentos, mas também a
constituição de indivíduos que são membros de grupo cultural específico (Oliveira, 2000).
Através da abordagem histórico-cultural de Vigotski (2001) e Wallon (2007)
acredita-se que toda interação está permeada de componentes de ordem afetiva entre o sujeito
e o ambiente de relações humanas “bons ou ruins, agradáveis ou desagradáveis”, que se
132
revelam na subjetividade e singularidade de como cada sujeito pensa, sente, interpreta e reage
às mais diversas situações no espaço da sala de aula. Como? Pelo complexo entrelaçamento
das dimensões cognitivo-afetivas, que não atuam como categorias separadas que se
influenciam, mas como unidades indissociáveis. Assim, nas palavras de Oliveira (2000, p.
74): “A cognição não é apenas mental, mas parte da ação e dos significados que ela aponta, ou
seja, dos desejos, objetivos, concepções, sendo, portanto, plena de afetividade”.
Diante de tais informações, compreende-se que os sujeitos da presente pesquisa
(alunos e professores) expressam modos historicamente construídos de falar, pensar, sentir,
gostar, agir, memorizar etc., dentro do contexto do grupo cultural específico no qual estão
integrados. Por esse prisma, os alunos explicaram que a figura real do professor “não” afetivo
é aquele que demonstra frieza, falta de atenção e consideração pelos alunos, ou seja, aquele
que entra na sala de aula, olha, mas não enxerga, fala, mas não conversa, ouve, mas não
escuta. Dessa forma, pode-se entender esse tipo de professor como uma máquina de passar
conhecimentos, isto é, o professor desinteressado e descompromissado com a aprendizagem
dos alunos. Na entrevista com os alunos, nenhum dos professores pesquisados foi apontado
com esse tipo de comportamento e procedimento.
Wallon (1975) postula ao professor responsável, conhecedor das tarefas importantes
que lhe serão atribuídas, que existe o dever de estar envolvido pelos interesses de contexto da
época e do ambiente no qual está inserido. Assim sendo, o professor deve procurar questionar
a si mesmo, a respeito da sua capacidade e compromisso na educação de crianças e jovens.
Para tanto, é importante que ele seja solidário na interação com seus alunos, conhecendo-os, e
interessando-se por eles para que possa auxiliá-los na orientação da sua escolha profissional.
Para Wallon (1975) o professor deve se adequar dentro de uma realidade que sofre
modificações com o tempo, tendo sempre como finalidade atender os interesses e
necessidades dos alunos e dele próprio como professor, posto que ambos devam ser vistos
como “pessoas completas com afeto, cognição e movimento”, para que o e seu trabalho
resulte em uma prática educativa eficaz.
Observou-se no discurso dos professores a noção da importância da afetividade na
aprendizagem dos alunos; porém, percebeu-se que estes estavam invadidos por dúvidas,
inseguranças e preocupação quanto à sua presença nas práticas escolares.
Supõe-se que esse fato se deva aos aspectos marcantes da herança da dicotomia
entre afeto e cognição na escola, que influencia o modo de pensar confuso e desorganizado
das concepções dos professores do ensino médio. Estes desvinculam a função afetiva da
função cognitiva, por compreenderem a afetividade pelo prisma da afetuosidade, ou seja, uma
133
relação especial, baseada unicamente em aspectos bons e agradáveis, tais como “amizade,
carinho, aconchego, empatia, bondade, brincadeiras, conversas fora do assunto da matéria,
etc”, que também são aspectos válidos na ampla dimensão da afetividade e na opinião dos
sujeitos, mas não representam o todo daquilo que a afetividade comporta.
Na realidade, a afetividade é uma dimensão que envolve também aspectos
desagradáveis inerentes a ela, tais como raiva, irritação, medo, tristeza, insegurança,
sofrimento, apatia, cansaço, indiferença etc. Todos esses componentes permeiam a interação
professor-aluno, na elaboração do conhecimento.
As atividades pedagógicas que se constituem a partir da interação professor-aluno,
promovem a construção do conhecimento e também vão marcando afetivamente a relação
com o objeto a ser conhecido.
Os dados da presente pesquisa apontam que os alunos consideraram como mais
afetivas as interações relativas aos docentes Walter e Maura e menos afetivas aos docentes
Lucas e Julio.
Ainda assim, os alunos demonstraram, na maior parte das aulas filmadas, com todos
os professores, comportamento apáticos, indiferença e pouco interesse pelo conteúdo
trabalhado em classe. Esse dado instigante e preocupante expressa uma marca significativa
que não pode ser negligenciada no contexto dos sujeitos da presente pesquisa. Compreende-
se, que embora os alunos considerem os professores afetivos, os sujeitos (alunos) sentem-se
pouco motivados e participativos diante dos conteúdos das disciplinas administradas em sala
de aula. Esse dado da pesquisa merece atenção e reflexão de pesquisadores e educadores da
atualidade e do futuro, no sentido de buscar entender as possíveis razões que tornam o
conhecimento ser tão pouco motivador para alunos adolescentes e posteriormente auxiliar a
melhorar esse aspecto fundamental no processo ensino-aprendizagem.
Finalizando, faz-se importante destacar que a questão da dicotomia presente nas
concepções dos professores não aparece tanto nas práticas pedagógicas desenvolvidas pelos
docentes, observadas nas filmagens em sala de aula, tendo em vista que o trabalho concreto
dos professores (suas formas de interação com os alunos, tipos de atividades propostas,
postura e procedimentos) demonstrou compromisso com a aprendizagem dos alunos, embora
com pouca receptividade dos mesmos.
Reafirma-se, entretanto, a importância dos docentes aprenderem a pensar a
afetividade e cognição como dimensões sempre presentes e indissociáveis no movimento
dialético de ensinar e aprender.
134
Deseja-se, sobretudo, ressaltar que o papel da afetividade presente na interação
professor-aluno é permear seus objetivos, metas, organização de conteúdos, escolha de
métodos, didática e as demais atividades nas práticas escolares no processo ensino-
aprendizagem. Isto significa que o profissional da área da educação pode exercer sua função
docente consciente do valor da dimensão afetiva na mediação pedagógica no cenário escolar.
A presente pesquisa procurou identificar e analisar concepções e formas de
interações afetivas de um grupo de docentes no âmbito da sala de aula, levando em
consideração o contexto da realidade no qual esse grupo estava inserido, pois de acordo com
Vigotski (1994, p. 118): “Toda pesquisa tem por objetivo explorar alguma esfera da
realidade”.
Este resultado contribui para aprofundar a discussão e reflexão sobre a práxis
docente e o seu papel como responsável pela qualidade da afetividade presente na interação
professor-aluno.
Vale a pena refletir sobre a colocação de Vigotski (2004, p. 449): “Assim, a mais
importante exigência que se faz a um professor nas novas condições é a de que ele deixe
inteiramente a condição de estojo e desenvolva todos os aspectos que respiram dinamismo e
vida”.
Acredita-se que, para os docentes se livrarem de posturas fechadas e tradicionais do
passado, é necessário estudar para compreender e reconhecer a importância da dimensão
afetiva tanto quanto da cognitiva no processo ensino-aprendizagem.
Esta escolha implica em buscar meios adequados para superar a questão da
dicotomia na escola, herança cultural limitadora dos pressupostos vigotskianos e wallonianos
que propõem uma abordagem abrangente, que possa entender o sujeito como uma totalidade
(Rego, 1995). E principalmente apropriar-se do verdadeiro sentido da afetividade,
explorando-a nas mediações da sala de aula por meio dos procedimentos didáticos, nos quais
o prazer, o interesse, a motivação, a responsabilidade, e outros possam deixar registrado o
compromisso do professor com a aprendizagem dos alunos. E assim, alcançar o objetivo
principal dessa relação que é a construção do conhecimento compartilhado.
135
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Wallon: Psicologia e Marxismo. Lisboa: Vega, 1978.p.17-34
140
APÊNDICE A - ROTEIRO DE ENTREVISTAS: PROFESSORES E ALUNOS
1 - O que é afetividade na interação professor-aluno adolescente?
2 - Como se pode identificar a afetividade na interação professor-aluno adolescente?
3 - Como você vê a relação entre afetividade e aprendizagem dos alunos adolescentes?
4 - Como você sente essa questão da afetividade em sala de aula?
5 – Quais professores você considera mais afetivos? (só para os alunos)
141
APÊNDICE B – ESCLARECIMENTO AOS SUJEITOS DA PESQUISA - I
CENTRO UNIVERSITÁRIO MOURA LACERDA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO
EM EDUCAÇÃO - MESTRADO
A - ESCLARECIMENTO AOS SUJEITOS DA PESQUISA - I
Pesquisa: Afetividade na interação professor-aluno: um estudo com adolescentes
Pesquisador (a): Ritamar Moreira Jorge
Orientadora responsável: Profª. Drª. Marlene F. Carvalho Gonçalves
Aos senhores pais: seu filho está sendo convidado (a) para participar de um estudo, que
pretende através de entrevistas, observações e filmagens, conhecer a visão sobre o
desenvolvimento da “afetividade na interação professor-aluno: um estudo com adolescente”.
As entrevistas serão gravadas e haverá filmagens em sala de aula com a sua anuência, e
utilizadas somente para estudo nesta pesquisa de forma a não identificar-lhe. O nome de seu
filho não será divulgado, no caso de publicação ou exposição do referido trabalho. Não
previsão de desconfortos e riscos para esta modalidade de estudo, no entanto, você poderá se
retirar da atividade a qualquer momento, sem prejuízo da mesma.
[Cidade], _________ de ____________________ de _________
Ritamar Moreira Jorge
Pesquisadora
142
APÊNDICE C – ESCLARECIMENTOS AOS SUJEITOS DA PESQUISA - II
CENTRO UNIVERSITÁRIO MOURA LACERDA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO
EM EDUCAÇÃO - MESTRADO
B - ESCLARECIMENTOS AOS SUJEITOS DA PESQUISA - II
Pesquisa: Afetividade na interação professor-aluno: um estudo com adolescentes.
Pesquisador (a): Ritamar Moreira Jorge
Orientador Responsável: Profª. Drª. Marlene Fagundes Carvalho Gonçalves
Professor, o senhor está sendo convidado (a) para participar de um estudo, que pretende
através de entrevistas, observações, trabalhos e filmagens, conhecer a visão sobre o
desenvolvimento da “afetividade na interação professor-aluno: um estudo com adolescentes”.
As entrevistas com professores serão gravadas e haverá filmagens em sala de aula com a sua
anuência e utilizadas somente para estudo nesta pesquisa de forma a não identificar-lhe. Seu
nome não será divulgado, no caso de publicação ou exposição do referido trabalho. Não
previsão de desconfortos e riscos para esta modalidade de estudo, no entanto, você poderá se
retirar da atividade a qualquer momento, sem prejuízo da mesma.
[Cidade], _______ de __________________ de ________
____________________________
Ritamar Moreira Jorge
Pesquisadora
143
APÊNDICE D – MODELO DO TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E
ESCLARECIDO
CENTRO UNIVERSITÁRIO MOURA LACERDA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO
EM EDUCAÇÃO – MESTRADO
C – MODELO DO TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Eu, _______________________________________________________, abaixo assinado,
tendo sido esclarecido sobre todas as condições que constam do documento "Esclarecimentos
aos Sujeitos da Pesquisa", de que trata o projeto intitulado: "Afetividade na interação
professor-aluno: um estudo com adolescentes", que tem como pesquisadora responsável
Ritamar Moreira Jorge declara que tenho pleno conhecimento dos direitos e das condições
que me foram asseguradas, relacionadas a seguir:
1. A garantia de receber esclarecimentos a qualquer etapa do trabalho;
2. A liberdade de retirar meu consentimento a qualquer momento sem que isso traga prejuízo
a continuidade do trabalho;
3. A segurança de que eu não serei identificado e que será mantido o caráter confidencial de
informação relacionada com a minha privacidade.
Declaro ainda que concordo inteiramente com as condições que me foram apresentadas e que
aceito, voluntariamente, a participar deste projeto, não tendo sofrido nenhuma forma de
pressão para isso.
[Cidade], _________ de _________________ de _________
Assinatura
Eu Ritamar Moreira Jorge, como pesquisadora responsável, declaro que estarei respeitando
todos os termos supra mencionados.
[Cidade], _________ de ____________________ de _________
Assinatura
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