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FEAD - MINAS CENTRO DE GESTÃO EMPREENDEDORA
NÚCLEO DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA
MESTRADO EM ADMINISTRAÇÃO
MODALIDADE: PROFISSIONALIZANTE
CURSOS DE PUBLICIDADE E PROPAGANDA: A
ARTICULAÇÃO ENTRE ESCOLA E MERCADO
Um estudo coletivo de casos em Belo Horizonte
Alberto Adler
BELO HORIZONTE
2004
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ALBERTO ADLER
CURSOS DE PUBLICIDADE E PROPAGANDA: A
ARTICULAÇÃO ENTRE ESCOLA E MERCADO
Um estudo coletivo de casos em Belo Horizonte
Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em
administração: Modalidade Profissionalizante da FEAD -
Minas - Centro de Gestão Empreendedora, como requisito
parcial à obtenção do título de Mestre em Administração.
Área de Concentração: Gestão Estratégica de Organizações
Orientador: Profa. Dra. Solange Maria Pimenta
BELO HORIZONTE
FEAD-MINAS
2004
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À minha filha, Alice.
Agradecimentos
Pelo incentivo, colaboração e ajuda, manifestados das
mais variadas formas, durante o desenvolvimento deste
trabalho, agradeço
à Profa. Dra. Solange Maria Pimenta, orientadora presente,
atenciosa e crítica, que apesar de assoberbada de trabalho,
me ajudou como se fosse seu único orientando;
à Profa. Dra. Maria Ceres Pimenta Spinola de Castro, pela
sua contribuição para a solidez do projeto em que se
baseou este estudo;
À Profa. Dra. Maria Laetitia Côrrea, pelas observações e
sugestões;
a todos os entrevistados, que cordialmente abriram espaço
em suas agendas para colaborar com esta pesquisa;
a Fernanda, companheira de todas as horas, que soube
incentivar e compreender;
a Myriam Adler e Ricardo Augusto Sacramento, pelo
apoio e confiança incondicionais;
a meus pais, por terem sempre valorizado o saber e a
busca pelo conhecimento.
RESUMO
Nos últimos anos o Brasil vem vivenciando uma rápida expansão do sistema de ensino
superior. Em menos de uma década o número de cursos mais do que duplicou. Numa leitura
mais detalhada deste processo, verifica-se que esta expansão se deu em sua maior parte
através de escolas privadas, e os critérios para a escolha dos novos cursos que estas abriram, e
abrem, estão muito mais ligados ao apelo de mercado que tais cursos teriam junto aos
estudantes, do que à demanda dos variados mercados de trabalho por pessoal com formação
de nível superior. Este comportamento está intimamente ligado ao fato de na sociedade de
consumo as necessidades estarem muito mais ligadas a valores do que aos bens e serviços em
si. O diploma universitário é um símbolo de status e poder. Em Belo Horizonte, cidade em
que o mercado publicitário vem diminuindo em número de anunciantes, nos últimos quatro
anos os cursos de Publicidade e Propaganda de nível superior saltaram de três para onze e
milhares de estudantes buscam em tais cursos as condições para se manterem competitivos em
sua jornada rumo ao mercado de trabalho. Com o intuito de analisar a articulação entre as
faculdades de Publicidade e Propaganda e o mercado publicitário da capital mineira, tendo a
noção de competências como eixo, este estudo usa como pano de fundo a sociedade de
consumo. Inserida numa estratégia de pesquisa qualitativa, a coleta de dados incluiu
informações publicadas acerca do mercado publicitário mineiro, questionários respondidos
por agências e entrevistas feitas com representantes do mercado publicitário e coordenadores
de cursos de Publicidade e Propaganda. Entre os principais resultados, destacam-se a ausência
de um diálogo sistemático entre as duas vertentes - escolas e mercado - e as visões
discrepantes que ambas têm, uma em relação à outra, como resultado deste processo. Desta
forma, este estudo pode representar um ponto de partida para novas pesquisas, e até mesmo
intervenções diretas, envolvendo mecanismos que possam melhorar a articulação entre as
faculdades de Publicidade e Propaganda e o mercado publicitário de Belo Horizonte. Este
estudo abre, ainda, a possibilidade de pesquisas similares em outras cidades que, a exemplo da
capital de Minas Gerais, estejam vivenciando rápidas transformações do seu mercado
publicitário ao mesmo tempo em que experimentam uma rápida proliferação dos cursos de
Publicidade e Propaganda.
ABSTRACT
For the last few years Brazil comes living a fast expansion of it’s superior education system.
In less of one decade the number of courses more than duplicated. Most of this expansion
occurred through private schools, and the criteria for the choice of the new courses that these
schools had opened, and are still opening, are much more based on to the sales appeal that
such courses would have among the students, than on the demand of the various work markets
for people with university degree. This behavior is very much related to the fact that in the
consumption society the necessities are much more related to the values than to the goods and
services themselves. The university diploma is a symbol of status and power. In Belo
Horizonte, city where the advertising market comes diminishing in advertisers number, in the
last four years the number of college courses of Advertising had jumped from three to eleven,
and thousands of students join such courses while searching the conditions to remain
competitive in their route towards work market. With intention to analyze the articulation
between university courses of Advertising and the advertising market of the Minas Gerais
state capital, having the notion of competences as axle, this study uses the consumption
society as scenario. Inserted in a strategy of qualitative research, the collection of data
includes information published concerning the Belo Horizonte’s advertising market,
questionnaires answered by publicity agencies and interviews with representatives of the local
advertising market and coordinators for Advertising college courses. Among the main results,
it is distinguished the absence of a systematic dialogue between the two sources - schools and
market - and the not converging points of view that both have, one in relation to the other, as a
result of this lack of dialogue. In this way, this study it can represent a starting point for new
researches, and even though direct interventions, involving mechanisms that can improve the
articulation between the college courses of advertising and the advertising market of Belo
Horizonte. This study also opens the possibility of similar researches in other cities that, in the
same way, are living deeply fast transformations of its advertising market at the same time
that they experience a fast proliferation of the college Advertising courses.
LISTA DE QUADROS
QUADRO 01 - Perfis dos entrevistados.............................................................................. 26
QUADRO 02 - Distribuição dos investimentos publicitários no Brasil em 2003............... 43
QUADRO 03 - Áreas de atuação das agências e modalidades de contratação de
mão-de-obra .............................................................................................. 63
QUADRO 04 - Ranking de maiores anunciantes de Belo Horizonte por investimento...... 76
QUADRO 05 - Distribuição de mão de obra por modalidade de contrato de trabalho....... 135
LISTA DE FIGURA
FIGURA 01 - Evolução da Taxa de Juros........................................................................... 86
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 11
1.1 O problema e sua relevância.......................................................................................... 13
1.2 Objetivos........................................................................................................................ 21
1.3 Percurso metodológico .................................................................................................. 22
1.3.1 Por que um estudo coletivo de casos? ........................................................................ 23
1.3.2 Estratégia de abordagem............................................................................................. 24
1.3.3 Universo e amostra ..................................................................................................... 25
1.3.4 Coleta de dados........................................................................................................... 28
1.3.5 Tratamento e análise dos dados.................................................................................. 29
2 A SOCIEDADE DE CONSUMO, EDUCAÇÃO E PUBLICIDADE. ....................... 31
2.1 A sociedade de consumo ............................................................................................... 31
2.2 O papel da publicidade na sociedade de consumo......................................................... 34
2.3 A sociedade de consumo e a mercantilização do ensino ............................................... 36
3 MERCADO PUBLICITÁRIO ...................................................................................... 41
3.1 Mas... O que é o mercado publicitário?......................................................................... 41
3.2 2004: o ano da retomada................................................................................................ 45
3.3 O mercado de trabalho para publicitários...................................................................... 48
3.3.1 As agências de propaganda......................................................................................... 50
3.3.1.1 A divisão de departamentos e tarefas nas agências de propaganda......................... 50
3.3.1.2 As possibilidades de inserção via agências de propaganda ..................................... 53
3.3.2 A alternativa de inserção via clientes ......................................................................... 57
3.3.3 As possibilidades de inserção nas empresas de no media .......................................... 59
3.3.3.1 O ciclo da multiplicação das agências..................................................................... 60
3.3.4 Especialização, uma possibilidade ainda não consolidada......................................... 65
3.3.5 A inserção via veículos: um universo muito restrito .................................................. 67
3.4 A Propaganda em Minas Gerais: um breve histórico .................................................... 69
3.5 O mercado publicitário de Belo Horizonte hoje............................................................ 75
3.5.1 O tamanho do bolo publicitário em Belo Horizonte................................................... 75
3.5.2 Os principais setores anunciantes............................................................................... 76
3.5.3 Um mercado que encolheu ......................................................................................... 79
3.5.4 As agências de propaganda de Belo Horizonte: um segmento difícil de mensurar.... 82
3.5.5 A disputa sem fronteiras............................................................................................. 84
3.5.6 Uma disputa sangrenta................................................................................................ 89
4 AS ESCOLAS DE PUBLICIDADE E PROPAGANDA............................................. 93
4.1 A história do ensino de publicidade e propaganda no Brasil......................................... 93
4.2 Os cursos de publicidade e propaganda de Belo Horizonte neste cenário..................... 98
4.3 A escola e a inflação de diplomas.................................................................................. 99
4.4 A universidade é uma sociedade de classes................................................................... 103
4.5 Faculdades operando como empresas............................................................................ 105
4.6 Formação voltada para o mercado de trabalho? ............................................................ 107
4.7 Preparando para a empregabilidade............................................................................... 111
4.8 Desenvolvimento de competências ............................................................................... 116
4.9 Desenvolvendo competências para atuar no mercado publicitário de Belo Horizonte . 118
5 A ARTICULAÇÃO ENTRE ESCOLAS E MERCADO............................................ 122
5.1 Breve resumo da evolução do ensino superior em função do mercado de trabalho...... 123
5.2 Como as escolas de publicidade e propaganda são percebidas pelo mercado
publicitário de Belo Horizonte ............................................................................................ 127
5.3 Não replicar o mercado significa fugir à realidade?...................................................... 131
5.4 A questão dos estágios................................................................................................... 133
5.5 Capital social e a inserção no mercado de trabalho....................................................... 137
5.6 Há diálogo entre as escolas e o mercado de publicidade e propaganda?....................... 143
5.7 Há pontos de consenso .................................................................................................. 148
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS......................................................................................... 152
REFERÊNCIAS................................................................................................................. 158
ANEXO A - Questionário para mapeamento do mercado publicitário de Belo Horizonte. 164
ANEXO B - Roteiro de Entrevista ...................................................................................... 167
11
1 INTRODUÇÃO
Castells (2000, p. 51-52), quando fala da perspectiva teórica na qual se fundamenta
para descrever a sociedade em rede, postula que “as sociedades são organizadas em processos
estruturados por relações historicamente determinadas de produção, experiência e poder”. A
produção é aão do homem sobre a matéria, com o intuito de apropriar-se dela, para
processá-la, obtendo um produto que será consumido em parte e cujo excedente será
acumulado para investimentos conforme objetivos determinados socialmente; a experiência é
a ação do ser humano sobre si mesmo. Estaão é determinada pela interação entre as
identidades biológicas e culturais dos sujeitos em relação aos ambientes sociais e naturais em
que se encontram; e o poder é a relação entre sujeitos humanos que, baseados na produção e na
experiência, acaba por impor “a vontade de alguns sobre os outros pelo emprego potencial ou
real de violência física ou simbólica”. Ainda de acordo com o mesmo autor, as instituições
sociais são constituídas para impor o cumprimento das relações de poder existentes em cada
período histórico, inclusive os controles, limites e contratos sociais conseguidos nas lutas pelo
poder”.
Com o desgaste do modelo keynesiano de crescimento capitalista, que entrou em
crise na década de 1970, governos e organizações começaram um processo de reestruturação
que hoje vem sendo chamado de globalização. Na década de 1990 “houve um esforço mais
decisivo a favor da desregulamentação, da privatização e do desmantelamento do contrato
social entre capital e trabalho, que fundamentou a estabilidade do modelo anterior”
(CASTELLS, 2000, p. 55). As reformas que foram operadas no âmbito das instituições, bem
como nas formas de gestão empresarial, tinham como objetivos básicos:
Aprofundar a lógica capitalista de busca de lucro nas relações capital/trabalho;
12
aumentar a produtividade do trabalho e do capital; globalizar a produção, a
circulação e mercados, aproveitando a oportunidade das condições mais vantajosas
para a realização de lucros em todos os lugares; e direcionar o apoio estatal para
ganhos de produtividade e competitividade das economias nacionais, freqüentemente
em detrimento da proteção social e das normas de interesse público. (CASTELLS,
2000, p. 55).
Com as mudanças feitas, ou iniciadas, sob os mandatos de Fernando Henrique
Cardoso - privatizações, flexibilização de condições trabalhistas, liberalização do comércio,
taxas de juros atraentes aos investidores externos etc. - o Brasil traçou sua rota para inserção
na economia de capitalismo globalizado. O atual governo tem dado continuidade a este
processo.
A inserção do Brasil neste cenário, se por um lado inclui o País na rota dos
investimentos internacionais, por outro, traz toda uma série de comprometimentos. Del
Gáudio (2000) fala que na medida em que as empresas cortam custos (especialmente os
relacionados à mão-de-obra) para se manter competitivas, elas criam uma compressão salarial
e uma perda de garantias legais que acabam por liberalizar o mundo do trabalho. E, enquanto
cortam custos relacionados à força de trabalho, as empresas ainda promovem uma certa
“seleção olímpica de trabalhadores” (Kurz apud Del Gáudio, 2000, p. 34) pela qual as
exigências de cargo e função aumentam em relação muitas vezes proporcionalmente inversa
aos rendimentos.
Dentro deste cenário, descrito por Castells (2000, p. 127) como “uma revolução
tecnológica centralizada em conhecimentos e informação, incorporada em operações de
processamento de símbolos necessariamente ligados à cultura da sociedade e à
educação/qualificação de seu povo”, a educação para o trabalho assume uma importância
crucial.
Assim, enquanto a globalização avança, a sociedade experimenta também o avanço
de outro fenômeno social talvez ainda mais antigo: a sociedade de consumo, que pode ser
13
descrita como a cultura predominante no meio urbano contemporâneo se partirmos da
seguinte descrição de como surgem as culturas e identidades coletivas:
A comunicação simbólica entre os seres humanos e o relacionamento entre esses e a
natureza, com base na produção (e seu complemento, o consumo), experiência e
poder, cristalizam-se ao longo da história em territórios específicos, e assim geram
culturas e identidades coletivas. (CASTELLS, 2000, p. 52). (destaque no original).
É nesta articulação contemporânea entre sociedade, educação e trabalho que esta
pesquisa se insere.
1.1 O problema e sua relevância
Numa das considerações finais sobre a Sociedade de Consumo, Baudrillard (1995)
afirma que a mesma constitui o remate histórico de todo o processo de produtividade
acelerada em função do capital e que, por isso mesmo, também se apresenta como a era da
alienação radical, na qual generalizou-se a lógica da mercadoria, que hoje regula, além dos
processos de trabalho e os produtos materiais, toda a cultura. A publicidade
1
, segundo ele, “é o
hino triunfal desta idéia” (BAUDRILLARD, 1995, p. 208).
Na passagem da sociedade capitalista para a sociedade de consumo no seu estágio
atual (BAUDRILLARD, 1995; CASTELLS, 1999) houve uma mudança de paradigma. Da
sociedade baseada na produção industrial, passamos à sociedade baseada na informação. Hoje
as necessidades estão muito mais relacionadas aos valores do que aos bens e serviços em si “e
1
No mercado publicitário e nas faculdades de Comunicação convencionou-se tratar os dois termos
Publicidade e Propaganda - como duas coisas distintas: a primeira abarca todas as formas de divulgação
voltadas para objetivos de mercado (a própria propaganda, além de merchandising, promoções de vendas,
eventos, marketing direto etc.), enquanto que a segunda é composta pela veiculação de mensagens comerciais
em espaços próprios para isso (anúncios de jornal e revista, comerciais de TV e cinema, outdoors, peças de
rádio etc.). Este é o conceito adotado no desenvolvimento deste trabalho. No Dicionário Aurélio (1986), no
entanto, ambos aparecem como sinônimos.
14
a satisfação de tais necessidades tem, antes de tudo, o sentido de adesão a tais valores”
(BAUDRILLARD, 1995, p. 69). Esta perspectiva invade todas as instâncias do cotidiano e a
publicidade, nas suas mais diversas formas, é fator primordial para o condicionamento das
necessidades.
A lógica da mercadoria a que Baudrillard se refere regula inclusive a educação, que
vem se transformando ela própria num mercado, como ressalta Boaventura Sousa Santos em
entrevista ao Jornal Número Zero (2003).
A educação de nível superior no Brasil, por exemplo, é um mercado promissor e em
franca expansão. Pelos números divulgados pelo próprio Instituto Nacional de Estudos e
Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP, 2003), a evolução deste mercado no Brasil é
firme. Entre 1994 e 2003 saltamos de 7.000 cursos de nível superior para 14.399, o que
equivale à criação de quase dois cursos por dia. Muito mais que a metade deles em escolas
particulares.
A publicidade, dentro deste quadro, apresenta-se, mais uma vez, como o catalisador
que a impressão de harmonizar os produtos com as necessidades dos indivíduos
(BAUDRILLARD, 1995): para tantas vagas disponibilizadas à população, faz-se necessário
que haja outros tantos de indivíduos interessados em investir tempo, esforços e dinheiro na
sua formação profissional. Nunca se falou tanto em investir na própria carreira, educação
continuada e diferenciação frente à concorrência. Não é por acaso que a revista Você S/A,
publicação especializada na gestão individual de carreiras, tem em instituições de ensino um
dos seus principais nichos anunciantes - de 33 anúncios da edição número 49, 14 são de
escolas e, destes, 10 são de faculdades.
Com tanta visibilidade - posto que está presente em tantas instâncias da vida
cotidiana - era de se esperar que a própria publicidade despertasse o interesse tanto do
15
empresariado, que enxergou nas instituições particulares de ensino superior uma boa
oportunidade de negócios, quanto daqueles indivíduos que buscam a diferenciação no
ambiente competitivo da disputa por vagas no mercado de trabalho (MARTENSEN, 1990).
Assim, a combinação desses fatores levou a um quadro em que, nos últimos nove anos, pelo
menos 280 cursos de nível superior de publicidade e propaganda foram lançados em todo o
país (INEP, 2004).
Com o aumento da oferta, milhares de indivíduos se inscreveram para ingressar
nestes cursos. Como as instituições continuam procurando abrir novos cursos, a procura
parece não ter chegado ao nível de saturação. Há, no entanto uma discrepância entre o número
de vagas sendo ofertadas aos estudantes que buscam o ingresso no mercado publicitário e a
demanda real deste mercado por mão de obra especializada. Os 344 cursos de publicidade e
propaganda hoje em atividade no país oferecem, atualmente, mais de 40.000 vagas/ano aos
estudantes interessados em cursar tais faculdades. Pelo lado das agências de propaganda, lócus
natural, embora não único, do trabalho do publicitário, a demanda é muito inferior a este
contingente. No sítio da Associação Brasileira das Agências de Propaganda (ABAP) na
Internet, a organização que congrega as principais agências de propaganda do Brasil, cujos
clientes respondem por 71% de toda a verba publicitária do país, informa que suas associadas
empregam 2.800 profissionais.
A publicidade é uma ferramenta de marketing (KOTLER, 1980) e, hoje, as verbas de
publicidade se espraiam por pelo menos dez diferentes atividades, dentre as quais está a
propaganda (BLECHER, 2003). Estas atividades, apesar do desejo dos anunciantes de
concentrar a coordenação de todas elas sob o comando de uma única agência, não são
operadas de forma concentrada nas mesmas estruturas operacionais. Uma única agência não
assume ao mesmo tempo as atividades de propaganda, promoções, eventos, merchandising,
patrocínios, marketing social etc. Existem empresas especializadas em cada uma destas
16
atividades que operam num modelo que lembra as redes descritas por Castells (1999). O
mercado de trabalho para publicitários, portanto, é bem mais vasto que o universo das
agências de propaganda.
Peça fundamental da sociedade de consumo, a publicidade é um setor importante da
economia brasileira, tendo movimentado no ano de 2002 uma verba que correspondeu a 2%
do Produto Interno Bruto (PIB) nacional (BLECHER, 2003), num total de 23.1 bilhões de
reais e as projeções para 2003, feitas em novembro daquele ano, previam um crescimento de
5% sobre este montante.
Apesar dos números expostos acima soarem imponentes e significativos pelo volume
de investimentos que representam, o setor começa a se recuperar de uma crise que se estendeu
por três anos. Na sua edição de 15 de novembro de 2003, o Meio & Mensagem, jornal
especializado em publicidade e propaganda, publicou uma matéria especial de balanço do ano
que se encerrava intitulada “Um ano que não deixará saudades”. Esta matéria é especialmente
interessante pelos aspectos que levanta de mudanças significativas no que diz respeito ao
direcionamento das verbas no mercado publicitário nacional, com a diversificação das
ferramentas utilizadas, e as perspectivas que tais mudanças suscitam.
O crescimento real esperado pelos publicitários citados na supracitada matéria para
mercado de Propaganda em 2003 era “próximo de zero”, abaixo da inflação. Além das
afirmações de Sérgio Amado (presidente do grupo Ogilvy no país) de que “2003 foi um
desastre para a comunicação nacional” e que “tirando os olhos do maior mercado nacional,
São Paulo - o desastre é ainda maior, atingindo pequenas e médias empresas em todo o Brasil,
gerando um volume de demissões nunca visto na história do nosso negócio” (AUGUSTO,
2003, p. 31), ressaltamos a advertência de Flávio Pestana de que “os tempos de ouro acabaram
e não acredito que voltem mais. Ou seja, ficamos todos mais pobres” (AUGUSTO, 2003, p.
17
30). Dados publicados posteriormente mostraram que, impulsionados por um aumento dos
investimentos nas ações de fim de ano, os números superaram a inflação em algo em torno de
2%, crescimento pífio que, de qualquer forma, confirmou as previsões pessimistas. Entre
outras atividades publicitárias, no entanto, segmentos que vêm experimentando índices
bem superiores de crescimento.
Os dados consolidados dos primeiros meses de 2004, todavia, apontam uma melhora
significativa dos investimentos em propaganda. Isto, porém, não significa que as
oportunidades de trabalho para publicitários recém-formados e estudantes de publicidade e
propaganda estejam em franca expansão, pois boa parte desta recuperação se deve a um
incremento nas verbas de setores atuantes. E quando um anunciante que atua na mídia
aumenta seus investimentos, isso não se reflete necessariamente numa ampliação das equipes
da agência, dos veículos e nem do próprio anunciante. Esta melhora também não significa que
este aumento de investimento seja uniforme em todo o País. Muito desse movimento deve-se
a grandes anunciantes que investiram em ações de mercado ligadas às Olimpíadas. Este
índice, portanto, de uma forma geral, reflete um aumento de volume de investimentos em
mídia por parte de anunciantes que eram grandes. Para o restante do mercado, o quadro
permanece basicamente o mesmo (MEIO & MENSAGEM, 2004).
Mas esta crise não é privilégio do mercado brasileiro. O negócio da Propaganda
passa por um momento difícil em todo o mundo (AUGUSTO, 2003). Este momento difícil a
que o publicitário se referiu é fruto das mudanças, já citadas, que vêm alterando a forma de se
pensar e trabalhar a comunicação empresarial. um novo modelo sendo introduzido no
mercado de comunicação (BLECHER, 2003).
O mercado publicitário, no entanto, ainda está se adaptando às novas demandas e
exigências dos anunciantes (BLECHER, 2003) e diferentes modelos de operação vêm sendo
testados. Esta é uma fase de transição e como tal inspira grandes expectativas sobre o que está
18
por vir.
Todo este quadro até aqui descrito desperta o interesse para um aspecto fundamental
para a evolução do mercado publicitário: nunca houve tantas escolas de nível superior
oferecendo cursos de publicidade e propaganda em nosso País. Nunca houve tanta gente
estudando para exercer a profissão de publicitário (INEP, 2004).
Como mencionado, existem, hoje, 344 cursos de Comunicação Social com
habilitação em Publicidade Propaganda disponibilizando mais de 40.000 vagas/ano para
estudantes em todo o Brasil. Em todas a unidades da Federação pelo menos um curso de
Publicidade e Propaganda (INEP, 2004). Destes, mais de 280 têm menos de oito anos e pelo
menos 142 ainda não têm quatro anos e, portanto, ainda não graduaram a primeira turma. Em
termos quantitativos, é patente que o mercado está caminhando a passos largos para uma
super-oferta de mão de obra.
Ou seja, ao mesmo tempo em que o mercado publicitário vem passando por um
cenário de anos de retração no investimento publicitário (AUGUSTO, 2003) e se ressente de
mudanças significativas que vêem afetando seu modus operandi, temos uma quantidade cada
vez maior de indivíduos se preparando para ingressar - e de fato ingressando - neste mercado.
Sob esta ótica, torna-se extremamente relevante para a sociedade saber quais as perspectivas
para estes indivíduos e para o próprio mercado a partir de vetores tão conflitantes.
Esta pesquisa, na medida em que se propõe a analisar os pontos de articulação - ou a
ausência da mesma - entre as faculdades de Publicidade e Propaganda e o mercado de trabalho
para publicitários, pode fornecer informações importantes para possibilitar às instituições de
ensino melhores formas de diálogo com os potenciais empregadores dos alunos e egressos
desses cursos. Esta articulação, cabe ressaltar, torna-se ainda mais valiosa na medida em que o
mercado publicitário vem passando por tantas e tão marcantes mudanças.
19
Assim, este estudo poderá fornecer informações importantes para que as instituições
de ensino possam analisar e talvez reavaliar seus currículos e projetos pedagógicos, na medida
em que confronta as competências que são demandadas pelo mercado de Belo Horizonte e
como elas estão sendo desenvolvidas nestas instituições. Competências que, certamente,
influenciam o grau de empregabilidade de seus alunos e egressos num cenário de mercado
altamente ofertante.
O conceito de empregabilidade concerne a um conjunto de atitudes, comportamentos,
habilidades, capacidades conceituais, humanas, técnicas, de relações sociais e competências
que o mercado exige e que torna o profissional que os detêm atraente para qualquer
organização (SARSUR, 1999).
Conhecer, saber ser e saber fazer. Este trinômio define, grosso modo, as instâncias
que compõem o conceito de competências. Num momento de transição como o que ora o
negócio da propaganda vem passando em nível internacional, nacional e regional - no qual
sabe-se que o modelo antigo está desgastado, mas ainda não um novo paradigma
devidamente sedimentado e estabelecido - torna-se de grande valia, sob o ponto de vista da
teoria/academia, a pesquisa sobre as competências que ora estão sendo fornecidas aos futuros
profissionais do mercado mineiro de publicidade.
Também é importante ressaltar a relevância acadêmica deste trabalho sob o ponto de
vista de que as mudanças na configuração do sistema brasileiro do ensino superior são
recentes e têm suscitado grande discussão acerca de seus supostos erros e acertos. Debate-se
se a ampliação da rede privada de ensino superior tem aumentado o acesso da classe média a
melhores condições de emprego; questiona-se a adequação dos cursos e números de vagas
oferecidas nas atuais condições do mercado de trabalho (Souza, 2003); discute-se a qualidade
destes cursos; e debate-se a própria contribuição social desta ampliação: seria ela
democratizante ou exclusivista? (INEP, 2003). O presente estudo pretende colaborar com
20
informações para este debate.
A escolha de cursos e do mercado publicitário de Belo Horizonte deu-se por uma
série de motivos. Ao fato do autor do estudo residir na capital mineira, atuando tanto no
mercado publicitário quanto lecionando em uma faculdade de Publicidade e Propaganda desta
cidade, somaram-se os seguintes fatores: 1) Minas Gerais é o segundo estado da união em
número de cursos de nível superior de publicidade e propaganda (INEP, 2004) e Belo
Horizonte, apesar de somar pouco mais de 33% dos cursos do estado, é a praça que concentra
a maior parte dos investimentos em publicidade no estado; 2) Belo Horizonte é bastante
próxima de São Paulo, o principal mercado publicitário do país, onde uma grande
quantidade de cursos de propaganda (INEP, 2004) e um custo de vida superior ao de Belo
Horizonte, fatores que tornam fácil a importação de mão de obra para a capital mineira; 3) O
mercado publicitário de Belo Horizonte tem características bem distintas das do grande centro
publicitário do país, que é São Paulo - poucos anunciantes de porte nacional, poucas indústrias
anunciantes, verbas menores, maior dependência do varejo local - o que demanda estudos
apropriados a esta realidade.
Apesar de a generalização deste estudo não ser possível, por se tratar de um estudo de
caso e por isso mesmo estar sujeito às peculiaridades sócio-econômicas e culturais de Belo
Horizonte, estudos com os mesmos objetivos podem ser feitos em outros locais a partir desta
experiência, permitindo aos cursos e aos estudantes uma maior visualização das suas próprias
realidades e de seus respectivos mercados.
Vale ressaltar que o mercado publicitário de Belo Horizonte tem muito mais
características em comum com os de outras grandes cidades brasileiras (Salvador, Recife,
Porto Alegre, entre outras) do que com São Paulo. Este, apesar de ser o maior centro
publicitário do País (AUGUSTO, 2003), não pode ser a única referência para outras praças
importantes. Volume de verbas, porte das contas, perfil dos anunciantes, ferramentas de
21
pesquisa disponíveis e outros aspectos fazem da capital paulista um mercado peculiar.
O mercado publicitário vem passando por diversas e profundas mudanças, que
implicam em novas oportunidades de trabalho para uma oferta crescente de mão-de-obra
especializada. Na busca pelas competências necessárias à performance profissional, cada vez
mais indivíduos buscam cursos de graduação em publicidade e propaganda, mas, com a
recente proliferação de cursos de nível superior, faz-se necessário verificar se as competências
demandadas por este mercado em transição são as mesmas fornecidas pelas instituições de
ensino que preparam esta mão-de-obra. É nesta perspectiva que se situam os objetivos deste
trabalho.
1.2 Objetivos
Tendo em vista que o mercado publicitário ora vem passando por um período de
transição, o objetivo geral deste estudo é verificar se as competências desenvolvidas pelas
faculdades de Publicidade e Propaganda de Belo Horizonte são congruentes com as
competências demandadas pelo mercado publicitário desta mesma cidade.
Tem-se como objetivos específicos:
Identificar quais os segmentos de mercado, além das agências de propaganda, constituem
o mercado de trabalho para publicitários;
Verificar se - e havendo, como se - diálogo entre as faculdades de Publicidade e
Propaganda e as organizações do mercado publicitário de Belo Horizonte.
Verificar quais as competências que o mercado publicitário de Belo Horizonte demanda
dos profissionais que estão ingressando, ou prestes a ingressar, nele;
22
Verificar quais as competências que as faculdades de Publicidade e Propaganda
localizadas em Belo Horizonte propõem atualmente em seus programas de formação ou
projetos pedagógicos;
Verificar se congruência entre as competências demandadas pelo mercado publicitário
de Belo Horizonte e a qualificação profissional proporcionada pelas faculdades de
Publicidade e Propaganda localizadas nesta mesma cidade.
1.3 Percurso metodológico
Para a elaboração do presente trabalho, foram adotados alguns procedimentos
metodológicos específicos em função do tema, do problema e do referencial teórico, com o
intuito de proporcionar organicidade e consistência científica às suas diversas fases de
execução. Este item destina-se a descrever como foi elaborada e construída esta pesquisa e
estrutura-se da seguinte forma: inicialmente são tratados os argumentos que justificam a opção
por realizar a pesquisa mediante um estudo coletivo de casos, o que inclui o conceito do
mesmo, principais pontos e a natureza da pesquisa. Na seqüência, objetiva-se esclarecer os
critérios de seleção das instituições de ensino que foram pesquisadas, bem como dos
prepostos das instituições e organizações do mercado que foram entrevistados, para que se
compreenda o por que da escolha dos mesmos. Em seguida detalha-se o universo e os
procedimentos amostrais utilizados na pesquisa. A última seção aborda metodologicamente
como foram tratados e analisados os dados coletados.
23
1.3.1 Por que um estudo coletivo de casos?
Richardson (1999) defende que os estudos de ordem qualitativa têm a capacidade de
descrever a complexidade de um determinado problema, analisar a interação de variáveis,
compreender e classificar processos dinâmicos vividos por grupos sociais, contribuir no
processo de mudança de determinado grupo.
Como diz Patton apud Alves-Mazzotti e Gewandsznajder (1999), a principal
característica das pesquisas qualitativas é o fato de que tais estudos seguem a tradição
“compreensiva” ou interpretativa, admitindo que as pessoas agem em função de suas crenças,
percepções, sentimentos e valores e que seu comportamento tem sempre um sentido, um
significado que não se a conhecer de modo imediato, precisando ser desvelado. Nesta
visão, Patton apud Alves-Mazzotti e Gewandsznajder (1999), distingue três características
essenciais aos estudos qualitativos: visão holística, abordagem indutiva e investigação
naturalística.
A visão holística parte do princípio de que a compreensão do significado de um
comportamento ou evento é possível em função da compreensão das inter-
relações que emergem de um dado contexto. A abordagem indutiva pode ser definida
como aquela em que o pesquisador parte de observações mais livres, deixando que
dimensões e categorias de interesse emerjam progressivamente durante os processos
de coleta e análise de dados. Finalmente a investigação naturalística é aquela em que
a intervenção do pesquisador no contexto observado é reduzida ao mínimo.
(PATTON apud ALVES, 1991, p. 54).
Foi nesta abordagem que se construiu a presente pesquisa, pois tratava-se de
compreender um fenômeno, analisar suas interações e os comportamentos observados
(ALVES, 1991), ou seja, a natureza do problema impôs uma abordagem qualitativa.
Dentre as indicações teóricas que caracterizaram esta pesquisa como um estudo de
caso, ressaltamos que Goode e Hatt apud Ludke e André (1986) afirmam que o caso se
destaca por constituir uma unidade dentro de um sistema mais amplo, tal como o mercado de
24
trabalho para publicitários especificamente em Belo Horizonte. Além disso, estudos de caso
são aplicados para compreender melhor a manifestação geral de um problema, em que as
ações, percepções, comportamentos e interações entre pessoas estarão relacionados à situação
específica onde ocorrem ou à problemática específica a que estão ligados. Durante o
desenvolvimento deste estudo, buscamos retratar a realidade de forma completa e profunda,
usando várias fontes de informação e procurando representar os diferentes, e porventura
conflitantes, pontos de vista relativos ao objeto de estudo.
Segundo Stake (1995) apud Pires (2002), três tipos de situações que se adequam
aos estudos de caso: o primeiro é o estudo intrínseco de caso, o segundo é estudo instrumental
de casos e o terceiro - que é o tipo adotado para o presente estudo - é o estudo coletivo de
casos. Para o referido autor, o estudo coletivo de casos se justifica quando, entre cada um dos
estudos individuais, há uma boa coordenação, o que, de fato, ocorre nesta pesquisa.
Com o estudo coletivo de casos procura-se contemplar todas as modalidades de
atuação das escolas de nível superior que ministram cursos de graduação em Publicidade e
Propaganda em Belo Horizonte, bem como organizações de variados portes e áreas de atuação
nas quais os novos publicitários podem vir a se inserir.
1.3.2 Estratégia de abordagem
Pesquisas qualitativas, caracterizadamente, usam uma grande variedade de
procedimentos e instrumentos de coleta de dados. Para cumprirmos os fins a que este estudo
se propunha, foram utilizadas: a análise de documentos, a aplicação de um questionário e a
realização de entrevistas.
A pesquisa documental consistiu no levantamento e análise dos discursos formais das
25
organizações pesquisadas, direcionadas aos públicos interno e externo, a fim de identificar as
posturas oficialmente adotadas pelas mesmas - para posterior comparação com os dados
obtidos nas entrevistas e em outras fontes. Também como parte da pesquisa documental foram
analisadas notícias de veículos diversos, com ênfase em publicações especializadas em
negócios e em publicidade, com a finalidade de acompanhar as variações do mercado. Esta
pesquisa documental ocorreu durante todo o período de realização desse estudo.
A segunda parte, a pesquisa de campo, buscou compreender, mediante a realização
de entrevistas, as posturas das duas vertentes cuja articulação esta pesquisa procura mensurar:
as faculdades de Publicidade e Propaganda de Belo Horizonte e o mercado de trabalho para
publicitários nesta mesma cidade.
Como instrumento de apoio, com a finalidade de ampliar as informações sobre os
quadros funcionais das agências de publicidade e perspectivas de mercado, foi aplicado um
questionário - cujo modelo consta no anexo A deste trabalho - aos associados de um órgão
representante de classe patronal das agências de propaganda. O número de questionários
respondidos foi o equivalente a 30% do total de associados ao referido órgão.
De posse destes elementos foi que se procedeu a investigação sobre os graus de
articulação - e as contradições - entre as escolas de Publicidade e Propaganda e o mercado de
trabalho de Belo Horizonte.
1.3.3 Universo e amostra
Richardson (1999) destaca que se o plano possuir características que definam a
população, é necessário assegurar a presença do sujeito-tipo. Assim, a amostra intencional
apresenta-se como representativa do universo. Nessa técnica de amostragem, o entrevistador
26
tem ampla liberdade de escolha e pode se dirigir intencionalmente aos grupos de indivíduos
dos quais deseja saber a opinião.
O universo pesquisado abrange as faculdades de Publicidade e Propaganda
localizadas em Belo Horizonte, as empresas de comunicação empresarial e associações de
classe localizadas na mesma cidade. As amostras pertencem a estes grupos.
QUADRO 01 - Perfis dos entrevistados
FONTE: dados da pesquisa
Para que a questão da liberdade de escolha da amostra não fosse movida por critérios
subjetivos, que prejudicariam a consistência científica do estudo, a seleção da amostra levou
em consideração alguns critérios que permitiram o estabelecimento de um conjunto de perfis
adequado à consecução dos objetivos da pesquisa:
No universo relativo às faculdades, buscamos entrevistar os coordenadores dos
cursos de propaganda e publicidade de três instituições de ensino, sendo uma pública, uma
Entrevistado Idade
Formação
Coordenadora de curso 27 Graduação em Publicidade e Propaganda;
Mestrado em Comunicação
Dono de agência de propaganda e
Presidente de órgão representante de
classe patronal
50 Graduação em Comunicação Social; Pós
graduação em Marketing
Dono (sócio) de agência de propaganda e
presidente de órgão representante de
classe patronal
54 Graduações em Direito e Jornalismo
Dono de agência de marketing político e
propaganda
43 Graduação em Administração de Empresas
Diretor de marketing e comercialização
de holding de veículos de comunicação
ND Graduação em Administração de Empresas
Dono (sócio) de agência de marketing
promocional
34 Graduação em Publicidade e Propaganda;
Pós Graduação em Marketing
Dona (sócia) de agência de marketing
promocional
32 Graduação em Jornalismo
Coordenador de curso ND Graduação em Jornalismo; Mestrado em
Comunicação Social; Doutorando em
Comunicação Social.
Coordenador de curso ND Graduação em Jornalismo; Mestrado e
Doutorado em Literatura.
Publicitário 47 Graduação em Direito
27
particular confessional e uma particular não-confessional. Duas destas instituições estão entre
as mais antigas da capital mineira, a terceira faz parte do grupo das mais novas. A opção por
estas três instituições deu-se em razão delas cobrirem as características daquelas que
atualmente atuam no mercado de ensino de Belo Horizonte, fornecendo uma amostra daquilo
que ocorre em instituições com origens e orientações diversas em função dos objetivos em
que estão estruturadas.
no que diz respeito ao mercado publicitário, foram entrevistados presidentes de
duas associações representativas das agências de propaganda, sócios-diretores de agências de
publicidade de portes variados, sócios-diretores de agências de promoções e eventos (uma de
grande porte estabelecida e outra, recém-criada e de pequeno porte), o sócio-diretor de uma
agência especializada em marketing político, um funcionário graduado desta mesma agência
(com passagem por grandes organizações do mercado local) e o diretor comercial de um
grande grupo de veículos de comunicação (que reúne emissoras de TV, rádio e jornal
impresso).
Esta última amostragem buscou contemplar: a) as diversas instâncias de mercado em
que os egressos dos cursos de Publicidade e Propaganda tendem a se inserir; b) empresas dos
mais diversos portes, campos e tempo de atuação num mercado tão plural quanto o que ora
existe em Belo Horizonte; c) tanto as posturas das associações de classe quanto as posturas
daqueles que não pertencem a tais associações e; d) as visões que profissionais com as mais
diversas trajetórias e tempo de inserção no mercado têm a respeito do mesmo a partir de
ângulos de observação tão diversos. A capacidade de observação, articulação e de expressão
dos entrevistados também foram levadas em conta (BRUYNE et al., 1991). Para estas
entrevistas adotou-se o roteiro constante do anexo B.
28
1.3.4 Coleta de dados
Como sugere Alves (1991), as entrevistas em profundidade e a análise de
documentos são os principais procedimentos de coleta de dados em pesquisas qualitativas.
As entrevistas foram semi-estruturadas, como forma de manter uma certa unidade de
temas iniciais entre entrevistados de um mesmo grupo e foram gravadas. Anotações de
campo, registrando expressões e até mesmo comentários em off, constituíram um importante
instrumento de apoio para a interpretação de aspectos subjetivos concernentes às gravações.
A opção pelas entrevistas semi-estruturadas deve-se ao fato de que estas, ao mesmo
tempo em que valorizam a presença e participação do investigador, também oferecem as
condições para que os informantes alcancem a liberdade e espontaneidade necessárias,
enriquecendo a investigação. A elaboração dos blocos que orientaram as entrevistas foi fruto
tanto do aprofundamento no referencial teórico, quanto de todas as informações colhidas nas
mais diferentes fontes, sobre o assunto.
Para efeito de mapeamento dos perfis dos profissionais que atualmente trabalham nas
agências de propaganda de Belo Horizonte, encaminhamos questionários às agências afiliadas
ao Sindicato das Agências de Propaganda de Minas Gerais (SINDAPRO-MG) que atuam
nesta capital.
Como fontes secundárias foram utilizados documentos tais como relatórios de
entidades de classe (ABAP-MG, SINDAPRO, etc.), relações de ancias e anunciantes de
veículos de comunicação localizados em Belo Horizonte, matérias jornalísticas, dados
fornecidos pelas próprias agências e informações coletadas de fontes emergentes tais como
sites da Internet.
29
1.3.5 Tratamento e análise dos dados
Pesquisas qualitativas geram um grande volume de dados e estes precisam ser
organizados e compreendidos. Em vista disso, procurou-se identificar dimensões, categorias,
tendências, padrões e relações, interpretando seus significados e interações (ALVES, 1991).
Seguindo a orientação de Guba e Lincoln (1981) apud Lüdke e André (1986),
procedeu-se, primeiramente, o exame do material coletado em busca de aspectos recorrentes.
Verificando a recorrência de temas, observações e/ou comentários em contextos distintos,
provenientes de diferentes fontes e em diferentes situações, esta constituiu a base para o
primeiro agrupamento de informações em categorias.
Dados não agregados, porém considerados interessantes ou intrigantes, foram
classificados num grupo à parte para exame posterior, uma vez que Guba e Lincoln (1981)
apud Lüdke e André (1986) chamam a atenção para o fato de que certas informações
aparentemente isoladas, e até discrepantes, podem vir a ser importantes na elucidação das
questões de estudo. As categorias foram definidas em função da proposta teórico-
metodológica do projeto.
Realizada a pesquisa e analisados os dados, estruturou-se a presente dissertação,
conforme descrito a seguir. Neste capítulo introdutório, abordam-se o problema e sua
relevância, os objetivos da pesquisa e o percurso metodológico percorrido; no capítulo 2,
aborda-se a sociedade de consumo e como a educação e a publicidade se inserem no contexto
da mesma; no capítulo 3 o foco é o mercado publicitário em seu estágio atual e as formas que
os novos publicitários encontram para se inserir no mesmo; o capítulo 4 aborda as faculdades
de Publicidade e Propaganda dentro do contexto de expansão do sistema de ensino de nível
superior e sua postura em relação ao mercado de trabalho; no capítulo 5, trata-se da
30
articulação entre o mercado publicitário e as escolas de Publicidade e Propaganda; No
capítulo 6 são tecidas as considerações finais acerca do que foi constatado pela pesquisa.
31
2 A SOCIEDADE DE CONSUMO, EDUCAÇÃO E PUBLICIDADE
2.1 A sociedade de consumo
“Chegamos ao ponto em que o consumo invade toda a vida”. Com esta frase
Baudrillard (1995, p. 19) o mote daquilo que irá mostrar em sua obra. Ainda de acordo
com o mesmo autor, o consumo, nos dias atuais, se apresenta como um modo ativo de relação
não apenas com os objetos, mas com a coletividade e com o mundo. Mais ainda, serve de base
a todo o nosso sistema cultural.
A sociedade de consumo surge ao mesmo tempo como sociedade de produção de
bens e de produção acelerada de relação. E este último aspecto é que a caracteriza. O conjunto
das relações sociais, porém, não é tanto o laço com nossos semelhantes, mas a recepção e
manipulação de bens e de mensagens. A circulação, a compra, a venda, a apropriação de bens
e de objetos/signos diferenciados constituem a linguagem, o código pelo qual toda a sociedade
se comunica e fala.
De acordo com a lógica da sociedade de consumo, os objetos deixam de ser
adquiridos, ou desejados, pelo uso a que originalmente se destinam, mas pelos aspectos de
diferenciação e inserção que representam. As necessidades estão muito mais relacionadas aos
valores do que aos bens e serviços em si e a satisfação de tais necessidades tem, antes de tudo,
o sentido de adesão a tais valores. E aqui vale ressaltar que, socialmente, o ser humano mede
seu valor tendo os outros como referência (BAUDRILLARD, 1995).
Aliás, saliente-se que, a partir de um certo ponto de socialização urbana, quando todo
universo social se urbaniza e a comunicação se faz total, as necessidades intensificam-se e a
32
concorrência por status torna-se irreversível e ilimitada, crescendo segundo o ritmo de uma
sócio-diferenciação acelerada e de uma interrelatividade generalizada” (BAUDRILLARD,
1995, p. 63). Neste cenário, a concorrência acaba por ser o próprio discurso da sociedade
urbana e o consumo surge como comportamento ativo e coletivo, “como coação e moral,
como instituição”, compondo “todo um sistema de valores, com tudo o que este termo implica
enquanto função de integração do grupo e de controle social” (BAUDRILLARD, 1995, p. 81).
Desta forma, um automóvel não é única e exclusivamente um meio de transporte,
mas um signo de status, que identifica o seu proprietário com um determinado grupo e o
diferencia em relação aos demais. E, mais ainda, o automóvel (para manter o exemplo) por si
não produz o resultado desejado. Para tanto é preciso consumir todo um conjunto de bens e
serviços, cujas marcas e campanhas publicitárias dão-nos uma visão coerente de uma espécie
de cadeia, fazendo-os deixar de aparecer como uma série de objetos simples para se
manifestar como encadeamento de significantes. Assim, tais objetos/serviços se significam
um ao outro, como partes de um superobjeto mais complexo, que arrasta o consumidor para o
consumo em série (BAUDRILLARD, 1995).
Na sociedade contemporânea, os indivíduos são atingidos diariamente pelos revezes
que a divisão do trabalho e sua tarefa parcelar nos processos produtivos traz à produção de
sentido (ROBBINS, 2000). As instituições, por sua vez, através de recursos de comunicação,
procuram modelar estes mesmos indivíduos, ao integrá-los sob “invólucros formais”, fazendo
com pessoas o que o design faz com os objetos (BAUDRILLARD, 1995). Neste cenário,
aquilo que “se procura com mais empenho não é nem uma máquina, nem uma fortuna, nem
uma obra: é a personalidade” (RIESMAN apud BAUDRILLARD, 1995, p. 88).
Esta busca pela personalidade, é a base daquilo que Baudrillard (1995) chama de
Menor Diferença Marginal, ou MDM, que consiste em buscar as pequenas diferenças
33
qualitativas que indicam o status e o estilo de produtos/serviços semelhantes na essência e/ou
proposta, mas diferentes no modo como são percebidos. Este é um conceito essencial ao
objeto deste estudo. Na busca de se diferenciar e assim encontrar a “unicidade” de sua
personalidade, os indivíduos empenham-se em apreender o poder na forma de bens de
consumo.
Relacionando-se a MDM ao processo de consumo, podemos dizer que este último
pode ser analisado sob dois aspectos fundamentais: como processo de significação e
comunicação - através do qual o indivíduo busca “significar” e comunica esta significação aos
que o circundam - e como processo de classificação e diferenciação social, através do qual o
indivíduo se identifica com um determinado grupo ou classe e se diferencia dos demais.
Através do consumo o indivíduo sonha com o grupo com o qual se identifica e cuja presença
consome in abstracto (BAUDRILLARD, 1995).
Esta identificação/diferenciação é possível por ser o campo do consumo um campo
social estruturado, no qual os bens e as próprias necessidades, assim como os diversos
indícios de cultura, trafegam de um grupo de modelo e de uma “elite diretora” para as outras
categorias sociais em conformidade com seu ritmo de “promoção” relativa. Neste movimento,
“as necessidades das classes médias e inferiores são sempre, assim como os objetos, passíveis
de atraso e deslocamento no tempo e no plano cultural, em relação às das classes superiores”
(BAUDRILLARD, 1995, p. 61). Esta observação é extremamente relevante para nos ajudar a
entender o movimento de proliferação de escolas particulares de nível superior. Como observa
Boaventura Sousa Santos (2000), a universidade, que antes era lócus de preparação para os
futuros líderes da sociedade, abrigando os filhos das elites, passou por processos de
reestruturação que a levam a desempenhar outros papéis, dentre os quais o de proporcionar
aos filhos das classes média e operária as chances para alcançar melhores condições de vida.
34
Cabe aqui observarmos que todo o discurso a respeito das necessidades se dá a partir
de uma pressuposta “propensão natural para a felicidade”. Todas as peças publicitárias têm
como pano de fundo a promessa de somar algo, de ser de alguma forma relevante na busca
pela felicidade. A felicidade, aliás, “constitui a referência absoluta da sociedade de consumo”
(BAUDRILLARD, 1995, p. 47).
E como a publicidade “revela-se talvez como o mais notável meio de comunicação
de massas” (BAUDRILLARD, 1995, p. 131) da sociedade de consumo, cabe aqui também
uma análise do papel da publicidade, dos métodos publicitários e sua contribuição para os
comportamentos e relações sociais tais como se apresentam na sociedade de consumo.
2.2 O papel da publicidade na sociedade de consumo
A função de comunicação de massas da publicidade não é fruto dos conteúdos, dos
modos de difusão ou dos seus objetivos econômicos e/ou psicológicos. Não deriva nem do seu
volume nem do seu público real - embora tudo isso seja importante e lhe sirva de suporte. A
função de comunicação de massas da publicidade decorre da própria lógica do meio
autonomizado, que orienta não para objetos reais, para o mundo concreto, “mas de signo para
signo [...] de consumidor para consumidor” (BAUDRILLARD, 1995, p. 131).
Milton Santos (2003, p. 48) chama a atenção para o fato de que para entender o
consumo, faz-se essencial entender que hoje em dia as empresas hegemônicas produzem o
consumidor antes mesmo de produzir os produtos. É o que ele chama de o “despotismo do
consumo”, “império da informação e da publicidade”.
O publicitário de sucesso é mestre na arte de tornar verdadeiras as coisas ao afirmar
que o são. A publicidade então surge como fonte de profecias auto-realizadas. Isto é possível
35
na medida em que a publicidade não ensina nem leva a compreender, mas a esperar. “O que
ela diz não supõe verdade anterior (a do valor de uso do objeto), mas ulterior confirmação por
meio da realidade do signo profético que emite”. A publicidade faz do objeto anunciado um
pseudo-acontecimento “que irá tornar-se o acontecimento real da vida cotidiana através da
adesão do consumidor ao seu discurso” (BAUDRILLARD, 1995, p. 135).
Um aspecto interessante a respeito da publicidade é que a mesma é “gratuita”.
Ninguém, nenhum consumidor, adquire a publicidade. Ela se insere em outros meios e
veículos, anunciando suas profecias auto-realizáveis, dando a sensação de acessibilidade a
quem é por ela atingido. Imorberdorf (1989) afirma que num ambiente urbano devemos travar
contato, diariamente, com algo em torno de 2.000 mensagens publicitárias. Porém,
considerando que esta observação é anterior à disseminação do hábito de uso diário da
Internet tanto como ferramenta de trabalho quanto como meio de correspondência, informação
e passatempo, podemos supor que estes números hoje são ainda maiores.
Este fato tem uma interpretação peculiar por parte de Baudrillard (1995, p. 174),
quando ele salienta que na sociedade de consumo a publicidade “não se manifesta apenas
como promoção das vendas, como sugestão para fins econômicos” e possivelmente nem tem
origem como tal. “A especificidade do discurso publicitário consiste em negar a racionalidade
econômica da troca mercantil sob os auspícios da gratuidade”. Por meio da publicidade, que
em si representa um serviço social, todos os produtos se apresentam como serviços, todos
os processos reais são encenados e reinterpretados socialmente “como efeitos de dom, de
conforto pessoal e de relação afetiva” (BAUDRILLARD, 1995, p. 175).
Além disso, a comunicação que se estabelece ao nível dos anúncios publicitários é
Tanto a comunicação dos indivíduos com os objetos quanto a comunicação
generalizada de todos os indivíduos entre si, não por meio da contemplação dos
próprios objetos, mas através da leitura e do reconhecimento, nos mesmos objetos,
do sistema de signos e do código hierárquico de valores. (BAUDRILLARD, 1995, p.
177).
36
Ao promover tal aculturação, a publicidade promove, de certa forma, a integração
social.
Neste contexto acima descrito, a eficácia política da sociedade de consumo está em,
num quadro de desigualdade e desequilíbrio econômico e social, fazer prevalecer a ótica da
diferença sobre a ótica da contradição. Enquanto a contradição sugere o choque de
antagonismos, a diferença suscita uma situação que pode ser superada - mesmo que apenas em
nível individual (BAUDRILLARD, 1995).
Mas a publicidade exerce um outro papel importante dentro da sociedade de
consumo. Para que novos produtos e/ou novos modelos de produtos existentes continuem
sendo gerados e consumidos, faz-se necessário proceder a obsolescência dos produtos
adquiridos/consumidos.
A publicidade realiza o prodígio de um orçamento considerável gasto com um único
fim, não de acrescentar, mas de tirar o valor de uso dos objetos, de diminuir o seu
valor/tempo, sujeitando-se ao valor/moda e à renovação acelerada [...]. A destruição
permanece como alternativa fundamental da produção: o consumo não passa de
termo intermediário entre as duas. (BAUDRILLARD, 1995, p. 42).
O mesmo “princípio de atualidade” acima descrito invade hoje o domínio
profissional. Assim, ressalta o mesmo autor, os valores de ciência, técnica, qualificação e
competência caem perante os constrangimentos de mobilidade, de status e de perfil de
carreira. Não é por acaso que esta premente “reciclagem dos conhecimentos”, acompanhada
dos discursos de “educação continuada” surge na mesma época em que se fortalece, em nível
mundial, a própria mercantilização do ensino.
2.3 A sociedade de consumo e a mercantilização do ensino
Boaventura Sousa Santos (2003) chama a atenção para a mercantilização da
37
educação, que seria tema da próxima rodada da Organização Mundial do Comércio (OMC), e
de suas imensas possibilidades comerciais. Mesmo com as ressalvas que ele faz a tal processo,
a impressão é de que os argumentos mercadológicos são por demais atraentes para que os
agentes do mercado deixem de apreender tal oportunidade.
Como se comentou anteriormente neste trabalho, no Brasil o processo de
mercantilização já se encontra bastante adiantado. Em um período muito curto o número de
cursos de nível superior passou de 7.000, para 14.000 (INEP, 2003). E praticamente todos
estes cursos foram criados por e em instituições particulares.
Cristovam Buarque, quando ainda ministro da educação, chegou a afirmar que,
devido à predominância das instituições privadas, a universidade estaria privatizada. Na
mesma matéria jornalística o ministro disse termos chegado “Ao ponto de abandono da
universidade pública pelo poder público” (FOLHA ON LINE, 2003).
Criticada por quem viu e vê, nesse movimento o encolhimento do Estado e a
renúncia, mesmo que parcial, daquilo que seria sua obrigação (discussão bastante interessante,
porém que não cabe neste trabalho por fugir aos seus objetivos) esta abertura para criação de
tantos cursos, feita a título de dar acesso ao ensino superior a mais gente e assim melhorar a
qualificação de nossos jovens/trabalhadores sem onerar o Estado, traz em seu bojo a lógica da
sociedade de consumo.
Graças à tensão permanente entre as necessidades concorrenciais e a produção, esta
última prepara-se para suscitar e satisfazer unicamente as necessidades que lhe são adequadas.
Por esta lógica, na ordem do crescimento não há, e nem poderia haver, necessidades
autônomas. O sistema não espaço para finalidades individuais, espaço apenas para as
finalidades do sistema.
Não é difícil entender que os automóveis e autoestradas ‘surjam’ como necessidade
do sistema, mas também o é a formação universitária de quadros médios - portanto a
38
democratização da universidade “surge” da mesma forma e com o mesmo direito que
a produção de automóveis. Em virtude de o sistema produzir apenas para as próprias
necessidades, é de maneira mais sistemática que se entrincheira por detrás das
necessidades individuais. (BAUDRILLARD, 1995, p. 65).
O discurso da abertura de chances a mais indivíduos, assim como o da “reciclagem
dos conhecimentos”, portanto, pode ser interpretado como mais uma manobra retórica para
promover e acelerar o consumo.
De acordo com a pesquisa denominada “Desigualdade de Renda e Gastos Sociais no
Brasil: Algumas Evidências Para o Debate” (POCHMANN, 2003), os gastos do governo
federal com o ensino superior não ultrapassam 0,5% do PIB, enquanto o Chile investe 2,1%
do seu PIB em ensino superior.
Para o Estado, porém, esta grande abertura para a iniciativa privada, no que se refere
às instituições de ensino de vel superior, é muito mais que a passagem de algo que seria de
sua alçada para outrem e assim desonerar a bastante endividada máquina estatal. Como tais
instituições pagam tributos e geram empregos, acabam atuando de forma a atenuar, mesmo
que minimamente, alguns aspectos “contábeis” (BAUDRILLARD, 1995) em que o Estado
brasileiro tem tido nítidas dificuldades: geração de empregos e arrecadação.
Ainda sob o ponto de vista dos números que o Estado e os governantes exibem e até
mesmo são cobrados, as faculdades cumprem com outra função: a de “parque de
estacionamento”. As instituições de ensino desempenham esta função ao “deixar permanecer
em seu seio por um período relativamente prolongado gente que não se arrisca no mercado de
trabalho com credenciais de pouco valor e que se serve da universidade como compasso de
espera entre conjunturas” (SANTOS, 2000, p. 190). Estes indivíduos, sob o ponto de vista
estatístico, não irão engrossar fileiras entre os “desempregados” e/ou “desocupados”.
O autor ainda chama a atenção para o fato de que sob uma forte pressão social no
sentido de expansão do sistema universitário, a universidade pode desempenhar a função
39
latente de “arrefecimento das aspirações dos filhos das classes operárias, reestruturando-se de
modo a dissimular, sob o manto de uma falsa democratização, a continuação do sistema
elitista” (SANTOS, 2000, p. 191). É o que atualmente se discute no Brasil: se de fato, ou
não, democratização. Como argumento em defesa da privatização alega-se que na própria
universidade pública, “cerca de 46% dos recursos do governo central para o ensino superior
beneficiam apenas indivíduos que se encontram entre os 10% mais ricos da população”
(GASTO ..., 2004).
Sob o ponto de vista do consumidor a educação de nível superior tem o mesmo
caráter “coisificado” de poder apreendido. Isso se em função da hierarquia social adotar
como critérios o tipo de trabalho e de responsabilidade, o nível de educação e de cultura. A
lógica do consumo, que leva os indivíduos a consumir determinados objetos pelo status que
representam é a mesma que faz com que idéias, lazer e educação e cultura também sejam
consumidos como signos de diferenciação e poder (BAUDRILLARD, 1995).
Na sociedade de consumo, a escola é instituição de classe. Da mesma forma que nem
todos possuem os mesmos objetos, nem todo mundo tem idênticas possibilidades escolares.
Porém, ainda mais profundamente, há o espectro da “coisificação” do ensino, que o coloca na
mesma categoria de outros objetos cuja posse é signo de status e de poder. Enquanto apenas
uma minoria ascende à “lógica autônoma e racional dos elementos do ambiente (uso
funcional, organização estética, realização cultural)” (BAUDRILLARD, 1995, p. 58), a franca
maioria continua a encarar idéias, saber, cultura pela lógica fetichista que constitui a lógica do
consumo.
Assim como funciona com todos os outros produtos que se apresentam ao público
como parte dessas cadeias de signos de status e poder, no que tange à educação de nível
superior a publicidade também assume papel importante na divulgação dos valores associados
a “ser universitário”, “ter um diploma”, “ser egresso de uma escola reconhecida pelo
40
mercado” etc. Como não podia deixar de ser, este discurso traz a universidade como mais um
elo numa cadeia de símbolos de poder reificado.
Sendo tão importante na articulação entre os diferentes elos das cadeias de signos e
destas cadeias entre si, a publicidade ocupa lugar de destaque na sociedade de consumo - é o
seu “hino triunfal”. Mas o que é e como funciona o mercado publicitário? O próximo capítulo
trata destas e outras questões relativas à publicidade.
41
3 MERCADO PUBLICITÁRIO
3.1 Mas... O que é o mercado publicitário?
O Código de Ética dos Profissionais da Propaganda, de 1957, no seu primeiro
parágrafo, reza que: “A propaganda é a técnica de criar opinião pública favorável a um
determinado produto, serviço, instituição ou idéia, visando orientar o comportamento humano
das massas num determinado sentido”. Enquanto o dicionário Aurélio (1986) coloca os
verbetes “Publicidade” e “Propaganda” como sinônimos, o próprio código de ética acima
citado, no artigo sétimo do item “Definições”, diz que “publicidade remunerada pode ser ou
não propaganda”. O mercado publicitário, portanto, apesar de ter a propaganda como seu
paradigma central, compreende muito mais ferramentas. É com o intuito de clarear esta visão
que se desenvolveu o presente tópico.
Castelo Branco (1990, p. 71) defende que “a verdade é que na economia de mercado
não se compreende crescimento sem propaganda”. E a propaganda, por sua vez, cresce com o
mercado e com a economia. A história típica das comunicações, diz, “é uma cadeia de
interações, na qual a educação, a indústria, a urbanização, a renda nacional, a participação
política e os meios de comunicação em massa avançam juntos, estimulando-se mutuamente”.
Mas nos momentos em que o crescimento real da economia é muito pequeno, a
publicidade se ressente. Uma matéria especial sobre o ano de 2003, publicada pelo jornal
Meio & Mensagem em dezembro do mesmo ano, trouxe como título “Um ano que não
deixará saudades”. Mas não foi somente 2003 que foi ruim. 2001 e 2002 também foram anos
de crise para a economia e os investimentos em publicidade refletiram isso (AUGUSTO,
42
2003).
Como resposta à crise, as empresas enxugam quadros, cortam custos, se
reestruturam, ficam muito mais atentas à rentabilidade dos seus investimentos. E Publicidade
é investimento. “Cada vez mais seletivos, exigentes e obcecados com o retorno de seus
investimentos, os anunciantes estão obrigando a publicidade a se reinventar” (BLECHER,
2003, p. 45).
A primeira mudança que se faz sentir é a premência do retorno. Ou seja “tudo fica
subordinado aos resultados imediatos obtidos para cada real investido pelo anunciante”
(BLECHER, 2003, p. 45). Tenta-se, no entanto, preservar o “branding” - que é a construção e
administração dos conceitos de uma marca, visando a valorização da mesma (AAKER, 1996)
- pois a construção e manutenção de uma marca não se fazem apenas visando o curto prazo.
Pelo contrário, uma visão curta pode “matar” uma marca (MARCONDES, 2003).
Mas a publicidade também vem passando por outras transformações. E essas
mudanças são ainda mais profundas. A mais evidente delas é a fragmentação das atividades
publicitárias. Além da propaganda, outras nove categorias podem, facilmente ser enumeradas
entre as atividades que disputam os investimentos publicitários na composição das estratégias
de comunicação das empresas anunciantes (BLECHER, 2003). De acordo com a consultoria
Interscience, a distribuição das verbas por ferramenta de comunicação com finalidade
comercial dos maiores anunciantes brasileiros, em 2003 ficou assim:
Ferramenta %
Propaganda 48,0
Promoção 16,1
Eventos 7,5
Merchandising 6,7
Marketing Direto 6,0
Pesquisa de Mercado 5,3
Patrocínio 4,5
Internet 3,1
Marketing Social 2,3
43
Outros 0,5
QUADRO 02 - Distribuição dos investimentos publicitários no Brasil em 2003
FONTE: BLECHER, 2003, p. 46.
A propaganda, como pode-se ver, ainda é a detentora da maior fatia do bolo
publicitário nacional, mas as outras ferramentas - a que se convencionou chamar de no media
- juntas já somam uma quantia que chega a 52% deste bolo. Como nenhuma agência domina
todas estas áreas, as verbas estão se espalhando pelo mercado, por empresas especializadas em
cada uma dessas áreas. Esta ampliação abre novas oportunidades de trabalho aos profissionais
- principalmente aos novos entrantes - mas também podem suscitar considerações a respeito
da formação das competências desses profissionais.
Esta mesma pesquisa da Interscience indica que entre as demandas destes
anunciantes há o desejo de que uma única agência coordene todas estas atividades. Esta
coordenação tanto serviria para integrar, e assim fazer valer a sinergia entre as diversas
ferramentas, quanto para reduzir o número de interlocutores assediando a empresa na disputa
por verbas.
Cabe aqui uma breve análise dos motivos que fazem desta tendência de fragmentação
dos investimentos em publicidade uma mudança de caráter duradouro e não apenas um
fenômeno pontual. uma nova visão a respeito de como as pessoas se relacionam com as
marcas. Aliás, a palavra-chave de todo este processo de transformação da publicidade é
relacionamento. “Marketing não é sobre vendas. É sobre criar relacionamentos com
consumidores, que cultivam preferências emocionais pelas marcas” (TRAVYS apud
MARCONDES, 2003, p. 30). E:
Marca não é uma coisa, um produto, uma companhia ou uma organização. Marcas
não existem no mundo físico, são construções mentais. Marcas podem ser mais bem
definidas como a soma total de experiências humanas, percepções e sentimentos
sobre algo em particular, seja um produto ou uma organização. Marcas existem no
âmbito da consciência, seja dos indivíduos seja de um público. (GREGORY apud
MARCONDES, 2003, p. 21).
44
Toda essa ênfase em relacionamentos tem como objetivo a fidelidade do consumidor.
Almeja-se a fidelidade do consumidor porque fazer com que seus clientes já existentes
consumam mais é mais barato que conquistar novos clientes. A fidelização é um dos pilares
estratégicos das ações de mercado para a maioria das companhias e marcas.
Em função dessa forma de pensar dos estrategistas de marketing, a comunicação de
massa tradicionalmente usada pelas companhias vem cedendo cada vez mais espaço a cartas,
folhetos, promoções, eventos, relacionamento interativo via Internet e mais uma vasta gama
de ações de comunicação que privilegiam o contato personalizado com o consumidor sobre
quem a empresa produtora já tem um banco de dados.
Saber o que seu consumidor pensa, o que faz, quanto gasta e quanto pode vir a gastar
e usar tais informações para estreitar laços com ele é muito mais importante do que apenas
enviar-lhe mensagens via mídia de massa e esperar que ele goste - e que esse gostar o induza
ao consumo (MARCONDES, 2003).
Esta é uma tendência mundial que vem abrindo novas perspectivas de mercado para
atividades e empresas antes tidas como meros coadjuvantes no esquema da comunicação
publicitária.
O mercado de marketing promocional, que alguns anos era uma ferramenta usada
apenas em ações pontuais, tem crescido a taxas muito superiores às do mercado publicitário
como um todo. Algumas agências deste ramo crescem entre 20% e 50% ao ano (BLECHER,
2003). A Salem, empresa de marketing promocional de São Paulo, que atende Credicard,
Embratel e Claro, entre outros, cresceu 42% no ano de 2003. Só como parâmetro para
comparação, os investimentos do mercado publicitário em propaganda no ano de 2003
tiveram um crescimento de 12,2% e “tal resultado é considerado positivo diante do quadro de
estagnação econômica pelo qual passa o País” (MEIO & MENSAGEM, 2004, p. 1).
45
3.2 2004: o ano da retomada
Para a indústria da comunicação, o ano de 2003 foi como um tradicional filme de
terror: tensão constante, muitos sustos pelo caminho mas, no final, o vilão é
derrotado e todos (ou quase) se salvam. Ao contrário do esperado - e do que
sinalizava o desempenho do Produto Interno Bruto (PIB), que diminuiu em 0,2% - o
mercado publicitário cresceu 12,2% nominais, tendo fechado o ano em R$14,8
bilhões (contra R$13,2 bilhões de 2002). Levando em conta que a inflação no
período foi de 9,3%, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA),
chega-se a um crescimento real de 2,9%. (PEREIRA, 2004, p. 30).
Apesar do trecho da reportagem descrito no parágrafo anterior referir-se “à indústria
da comunicação”, o Projeto Inter-meios - um relatório de investimento em mídia no País,
tabulado pela Price Waterhouse Coopers - refere-se apenas aos montantes investidos em
propaganda e não leva em conta os investimentos nas demais ferramentas da publicidade. No
entanto, é o melhor parâmetro que o mercado dispõe para verificar o comportamento dos
investidores como um todo.
Como o parágrafo anteriormente transcrito descreve, 2003 foi um ano tenso, em que
as expectativas pessimistas foram superadas por uma retomada dos investimentos no final do
ano. A seguinte análise proporciona um melhor entendimento do que aconteceu:
Os números mostram que o que salvou o ano passado foi o último trimestre, único no
qual os investimentos em mídia superaram, mês a mês, a marca de R$1 bilhão. De
fato, o quarto trimestre registrou desempenho 23,5% superior ao terceiro e, na
comparação dos dois semestres, as verbas investidas no segundo foram 31,4%
maiores que no primeiro - situação que havia sido invertida no ano anterior, quando
os anunciantes puseram o no freio por conta, principalmente, da incerteza em
relação ao resultado da eleição presidencial [...] Com a vitória do PT, 2003 começou
sob o signo da desconfiança, com o mercado praticamente parado para ver qual seria
a linha ser adotada pelo presidente Luís Inácio Lula da Silva. A manutenção de uma
política econômica ortodoxa, como a do governo anterior, deu certa tranqüilidade
aos anunciantes, que aos poucos voltaram a investir. (PEREIRA, 2004, p. 30).
Esta tranqüilidade descrita no trecho transcrito acima, associada a outros indicadores
econômicos, fez com que os números relativos ao primeiro semestre de 2004 superassem as
expectativas iniciais. De acordo com o relatório do Projeto Inter-Meios relativo ao período, o
setor movimentou quase R$ 6 bilhões, volume 25,7% superior ao investido no mesmo período
46
em 2003. É válido ressaltar, porém, que o parâmetro não é dos melhores, uma vez que, pelos
motivos descritos, o primeiro semestre de 2003 foi um dos piores da propaganda brasileira
nos últimos anos, tendo registrado queda real nos investimentos em propaganda quando
descontada a inflação (PEREIRA, 2004).
Xico Castilho, presidente da ABAP-MG, em entrevista ao Meio & Mensagem (2004)
afirma que é só a economia começar a crescer que a propaganda acompanha. Mas se a
propaganda vem crescendo de maneira firme em 2004, os outros setores da publicidade, os
integrantes daqueles segmentos que convencionou-se chamar de no media, que vinham
crescendo acima da média do mercado da propaganda vêm crescendo ainda mais.
A Salem, agência de marketing promocional, até maio de 2004 já havia registrado
um aumento de 32% em relação ao mesmo período no ano anterior. O Banco de Eventos
conseguiu no primeiro semestre de 2004 igualar o faturamento de todo o ano anterior e espera
manter o ritmo até o final do ano, obtendo 100% de crescimento (SÔNEGO, 2004).
No âmbito do marketing direto, a Fábrica Comunicação Dirigida, também de São
Paulo, que atende a clientes de segmentos tão diferentes quanto Redecard, Telefônica
Empresas e Hospital Albert Einstein, entre outros, acredita que seu crescimento este ano pode
chegar a 35%, enquanto a Copyright fala em 30% e a Sun MRM espera algo entre 25% e 40%
(SÔNEGO, 2004).
O mercado de mídia em Internet também cresce muito acima da maioria dos setores
da economia brasileira. No primeiro semestre de 2004, segundo pesquisa da Intermeios
(MEIO & MENSAGEM, 2004), o setor cresceu 60%, movimentando R$103,8 milhões.
Apesar de representar menos de 2% do bolo publicitário investido em propaganda, um
crescimento desta ordem não pode ser desprezado.
No mercado de publicações customizadas, que é um recurso de marketing
47
promocional, porém com uma dinâmica diferente das promoções ao consumidor
convencionais e que movimenta um segmento à parte, também não existe crise: a 4Capas, que
elabora edições one shot - publicações de tiragem única cujo objetivo é complementar
estratégias de comunicação específicas, como a que acompanhou o lançamento do Fiat Stillo -
prevê para 2004 um crescimento da ordem de 50%. Selulloid AG cresceu, em plena
turbulência de 2003, 92%. De acordo com matéria publicada no Meio & Mensagem (2004)
“Não há crise nesse mercado, que cresce já há uns cinco anos, e crescerá mais”.
Todo esse crescimento é possível graças aos anunciantes, que estão voltando a
confiar na publicidade: “no ano passado, muitos empresários nem queriam ouvir falar em
campanha. Estavam céticos quanto à capacidade de gerar resultados... Essa visão mudou: as
empresas querem novas idéias das agências e estão dispostas a investir de novo”, diz Silvio
Matos, presidente da Y&R, detentora da maior verba publicitária do País, a Casas Bahia, além
de outras contas do porte de Bradesco e Vivo (COMIN; GALBRAITH, 2004, p. 27).
Sérgio Amado, presidente da Ogilvy, salienta que os segmentos que vêm,
tradicionalmente, sustentando a propaganda nacional, como varejo, veículos, telefonia, bancos
e contas públicas, têm intensificado investimentos e não devem reverter esta tendência ao
longo dos próximos meses. Além disso, indústrias que antes estavam menos ativas na mídia,
como a de alimentos, estão reforçando suas verbas (COMIN; GALBRAITH, 2004, p. 28).
Em levantamento feito pela agência Lage’Magy, comparando os anos de 1996 e 2003
um outro segmento desponta como grande nicho anunciante: as instituições de ensino
superior. A enorme concorrência que existe hoje no mercado destas instituições as força a
investir em suas marcas (GALBRAITH, 2004). Essa observação é particularmente
interessante para o presente estudo por duas razões: 1) outros segmentos, tais como as
indústrias de automóveis, alimentos e bancos anunciam nacionalmente, a partir de suas
matrizes e raramente tais contas são atendidas por agências regionais enquanto que as
48
instituições de ensino superior têm uma atuação marcadamente regional e por isso mesmo se
utilizam dos serviços de agências locais, obtendo, com isso, uma importância muito maior
dentro do cenário belo horizontino e; 2) este dado reforça a impressão de que as instituições
de ensino superior comportam-se como empresas convencionais no que diz respeito à disputa
pela preferência do seu “consumidor”.
Em declaração feita ao Meio & Mensagem, o presidente da ABAP-MG também
frisou que “O varejo e setor imobiliário também estão mais aquecidos, o que é um reflexo da
recuperação da indústria e da entrada de mais dinheiro na economia”. A DNA, agência da qual
também é presidente, registrou no primeiro semestre de 2004 um crescimento da ordem de
20%.
Todo este crescimento registrado entre o final de 2003 e o primeiro semestre de 2004
dão um novo alento ao mercado publicitário, com algumas empresas inclusive crescendo e
contratando pessoal. Mas será que este crescimento também deve gerar otimismo entre
aqueles que procuram uma colocação - ou recolocação - no mercado de trabalho?
3.3 O mercado de trabalho para publicitários
“A carreira é dependente das aberturas profissionais oferecidas pela sociedade”,
dessa forma Chanlat (1996, p. 125) deixa claro que que existir oportunidade de trabalho
para que as pessoas possam desenvolver seus potenciais e evoluir profissionalmente.
Para o exercício da profissão de publicitário o qualquer exigência de diploma.
Esta abertura acaba atraindo para a publicidade profissionais procedentes de outras áreas, além
daqueles que cursam faculdades de comunicação social com habilitação na área, com o
objetivo de melhor se qualificarem.
49
Empresas anunciam para sobrepujar a concorrência. Agências concorrem entre si por
essas verbas. Veículos de comunicação, empresas produtoras de eventos, iniciativas
esportivas, culturais e sociais etc. disputam entre si o direcionamento que as agências darão a
essas verbas. E empresas ligadas à área de produção disputam a confecção daquilo que será
veiculado, oferecido aos consumidores. Essa é, grosso modo, a dinâmica do mercado
publicitário.
Assim como vimos, o mercado publicitário hoje se encontra bastante diversificado e
atomizado - embora centralizado, pois as empresas especializadas, apesar de terem autonomia
- tendem a ser “satélites” das agências de publicidade. O mercado de trabalho para os
publicitários, portanto, tende a ser o mais plural de todos os tempos, com oportunidades de
inserção e crescimento em áreas que há pouco tempo eram marginais.
Porém, se por um lado as oportunidades de trabalho tendem a se apresentar no
mercado mais plural de todos os tempos para os publicitários, a concorrência também se acirra
e tende a piorar: são mais de 40.000 vagas/ano para quem deseja ingressar nos cursos de
graduação com habilitação em Publicidade e Propaganda. no mercado a impressão de que
as escolas vêm formando mais mão de obra que o mercado pode absorver. Como observou um
entrevistado:
O mercado não absorve. O mercado não tem como absorver... O mercado
saturado, tá completamente saturado. (publicitário)
Mesmo assim, quando mudanças o dinâmicas ocorrem no mercado publicitário, a
agência de propaganda ainda é o grande modelo deste mercado. No decorrer do texto de
apresentação do curso da Faculdade Estácio de - Belo Horizonte, por exemplo,
referências às mudanças que vêm ocorrendo na publicidade e à profissionalização dos setores
encarregados da comunicação das empresas. Mas, basta ler o perfil do egresso e a grade
curricular para ver que o modelo do ensino voltado para a agência não parece ter sido
50
superado. O próprio jornal Meio & Mensagem, veículo especializado em propaganda e
publicidade com periodicidade semanal, apesar de cobrir todos os campos de atuação da
publicidade e áreas afins (tais como call centers, feiras, pesquisa etc.), quando se refere ao
crescimento dos investimentos em publicidade, está se referindo ao crescimento dos
investimentos na propaganda convencional (pesquisa Inter-Meios). Por esta razão, a agência
de propaganda é a primeira instância em que este estudo analisa as possibilidades de inserção
dos novos profissionais no mercado publicitário.
É válido ressaltar, porém, que quando o texto deste estudo refere-se a inserção no
mercado de trabalho, isto não significa necessariamente emprego com carteira assinada e
horário de expediente de 8 horas diárias. Como afirma Hewitt apud Castells (1999, p. 339),
“no geral, a forma tradicional de trabalho com base em emprego de horário integral, projetos
profissionais bem delineados e um padrão de carreira ao longo da vida estão sendo extintos de
forma lenta, mas indiscutível”. Este processo, como veremos durante o desenvolvimento dos
próximos tópicos, já se encontra em andamento no mercado publicitário de Belo Horizonte.
3.3.1 As agências de propaganda
3.3.1.1 A divisão de departamentos e tarefas nas agências de propaganda
Antes de analisar as possibilidades de inserção dos novos publicitários no mercado
de trabalho via agências de propaganda modelo arraigado do lócus da atividade publicitária
entre as escolas de comunicação - é interessante analisar-se quais são as diferentes atividades
desenvolvidas dentro destas organizações, posto que há uma certa estratificação decorrente do
status que cada um dos cargos e funções ocupa na agência e no próprio mercado de trabalho.
51
uma seqüência mais ou menos padronizada do tráfego de cada pedido de serviço
(RIBEIRO, 1989) dentro da agência, que seria, grosso modo, a linha de produção deste tipo de
empresa. O cliente da agência relaciona-se com os profissionais da área de atendimento, a
quem passam suas demandas e os prazos em que precisam das soluções para as mesmas
(LUPETTI, 2000), o atendimento, por sua vez, transforma tais demandas num briefing que
dará origem ao job, que é a ordem de serviço propriamente dita. A partir deste ponto, o
briefing circulará dentro do envelope do job.
A primeira parada deste material será no planejamento, onde as estratégias mais
adequadas à demanda do cliente e sua respectiva verba serão decididas dentro das várias
possibilidades de ferramentas à disposição do mercado. Além da propaganda convencional,
veiculada em jornais, revistas, TV, dio e outdoors, por exemplo, promoções de vendas,
marketing esportivo, social e cultural, Internet, marketing direto, assessoria de imprensa,
relações públicas e outras ferramentas que podem ser usadas de acordo com as estratégias
adotadas. Tais ferramentas são chamadas por muitas pessoas do mercado de no media ou
below the line.
Uma vez definidas tais estratégias, o briefing, acrescido do que foi decidido pelo
Planejamento, é encaminhado para os departamentos de Criação e Mídia, além de eventuais
fornecedores externos que cuidam de ferramentas específicas de no media, não dominadas
pelo staff da agência. Isto porque, vale ressaltar, o atingimento dos objetivos do cliente é mais
importante para a manutenção da conta que o fato de manter dentro dos limites da expertise
desta última todas as possibilidades de solução. Além disso, as agências são comissionadas
por tais fornecedores.
Uma vez na Criação, o briefing será encaminhado pelo Diretor desta área específica
para uma dupla composta por um Redator e um Diretor de Arte (cujo cargo tem este nome por
dirigir a parte gráfica dos trabalhos de criação e não porque tenha alguma função executiva de
52
Diretoria), que devecriar as peças publicitárias para cada meio escolhido estrategicamente
pelo Planejamento de acordo com as informações contidas no briefing.
Na Mídia, por sua vez, o mesmo material será encaminhado pelo Diretor do setor
para um profissional, ou equipe (as agências trabalham de forma diferente, cada uma com sua
forma específica), de forma a alocar da melhor forma a verba disponibilizada pelo cliente nos
diferentes meios sugeridos pelo planejamento, de forma a otimizar o uso da mesma,
maximizando resultados através do estudo da relação custo/benefício proporcionada por cada
veículo dentro das possibilidades de negociação que os mesmos oferecem (RIBEIRO et al.,
1989). Na maioria das vezes, tais departamentos lidam apenas com a propaganda dita
convencional, enquanto as ferramentas de no media ficam a cargo de seus fornecedores
específicos.
Uma vez definidas e aprovadas internamente, pelo Diretor de Criação e pelo
atendimento da conta, as soluções de criação são encaminhadas para o departamento de
Produção gráfica e RTVC (rádio, TV e Cinema), que negocia valores e prazos de execução
junto aos diferentes fornecedores - gráficas, produtoras de vídeo, fotógrafos, empresas de
fotolitos etc.
De posse de todo este material, composto por planejamento estratégico e tático da
campanha, soluções de criação devidamente leiautadas, plano de mídia incluindo ferramentas
below the line e os respectivos custos de produção, criação e veiculação, o atendimento vai ao
cliente, muitas vezes acompanhado de representantes de outros departamentos, defender as
soluções da agência para a demanda do mesmo.
53
3.3.1.2 As possibilidades de inserção via agências de propaganda
Ruy Lindenberg, diretor de criação da Leo Burnett, declarou em junho deste ano:
“acabou o tempo em que as agências contratavam alguém apenas para ver qual o potencial que
essa pessoa tinha, porque na atualidade os profissionais precisam ser muito bem escolhidos e
o trabalho ficou muito mais pragmático” (COMIN, 2004, p. 27). Esta declaração foi feita ao
referir-se aos departamentos de criação, a menina dos olhos” da maioria dos candidatos a
publicitário, posto que é a face mais visível do trabalho publicitário.
O presidente de uma grande agência ao falar sobre esta preferência por esta área
específica de uma profissão tão abrangente fez a seguinte análise:
Os alunos privilegiam a agência de publicidade. Eu acho que muito motivados por
um aparente charme ou glamour que a profissão possa ter, especialmente na área
de criação, coisa que eu desmistifico um pouco, porque eu acho que é o setor que
mais trabalha. É o que mais rala, é o que mais vive sob pressão de toda ordem:
pressão de qualidade, pressão de prazo, pressão de custo. E existe a mística de que
o pessoal de criação vive em coquetéis, no meio de modelos maravilhosas e
bacanais inesquecíveis. E não é nada disso! Então tem mil oportunidades em
veículos, em fornecedores, em clientes, em assessoria de comunicação de uma
maneira geral. Agora isso tá caindo um pouco, graças a Deus! Mas antes era
assim: oitenta por cento dos pedidos que a gente recebia de estágio eram pra
criação. Destes, cinco por cento, no máximo dez por cento, tinham algum talento,
algum pendor pra área criativa, os outros setenta por cento se frustravam porque
viam que não era aquilo que realmente eles deveriam fazer. (dono de agência)
Outro entrevistado fez uma análise parecida, porém um pouco mais pessimista, posto
que é a visão de alguém na posição de assalariado e não de dirigente:
Eu acho que as oportunidades hoje, elas tão diluídas, elas tão pulverizadas mesmo.
Primeiro, elas não se concentram no departamento de criação das agências que é a
parte mais charmosa do processo. Eu cansado de ver sujeito do departamento de
criação ganhando uma mixaria e não é nada daquilo que se pinta no mercado,
publicitário bem sucedido com carro importado, com apartamento de cobertura e
não sei o quê [...] E feliz da vida. Eu vejo muita gente de criação que
extremamente infeliz porque era uma coisa que ele sempre sonhou e depois se
decepcionou. (publicitário)
Um entrevistado ainda observou que:
Poucas pessoas quando m para fazer um estágio, por exemplo, procuram pelo
54
comercial. Eles procuram pela criação [...] Procuram glamour. (diretor de
holding de veículos de comunicação)
Esta concentração de candidatos a vagas na criação, apesar de ser tão criticada pelos
publicitários já estabelecidos e dirigentes de empresas de comunicação, de certa forma é
retroalimentada pelo próprio mercado. Na própria agência de um dos entrevistados citados nas
transcrições deste tópico, a seleção de estagiários se da seguinte forma: o candidato se
inscreve mediante a doação de 1 quilo de alimento não perecível e recebe um briefing para
criação de uma peça. Na data marcada todos os candidatos entregam as peças criadas e as
mais criativas ganham as vagas de estágio (MEIO & MENSAGEM, 2004).
No que tange às outras áreas de atuação da agência, pelo dito nas entrevistas pode-se
verificar que há uma busca por profissionais qualificados em planejamento e estudo de
mercado, enquanto que para outras funções, como a de profissional de mídia até um certo
descaso:
A área de planejamento estratégico de comunicação é uma área que hoje, se eu
perder um profissional de planejamento aqui na agência eu vou custar a achar no
mercado. Eu vou ter que tirar de outra agência, coisa que a gente não gosta. Às
vezes tem que tirar, não tem jeito! Porque quando tem talento também a gente vai
buscar. Tem a área de mídia, que ainda é uma área muito carente e na área de
atendimento que também carece e precisa de bons profissionais. (dono de agência)
Olha, eu acho, por exemplo, o pessoal de mídia é pouco valorizado, o pessoal de
estudo de mercado, de análise, são muito pouco valorizados [...] Agora eu tô
falando especificamente do mercado mineiro, porque isso não acontece noutro
mercado. Mídia é muito valorizado no mercado de São Paulo, por exemplo. (diretor
de holding de veículos mídia)
O produtor gráfico, o mídia, o RTV... Tá? Esse pessoal, hoje em dia, é visto como
pessoal de apoio. Publicitário começa a partir da criação e da estratégia. (dono de
agência)
Este último entrevistado, quando questionado se concordava com a visão que
descrevera acerca dos profissionais de mídia, produção gráfica, RTV e afins, respondeu
que:
Ah, concordo plenamente [...] Pro RTV, produtor gráfico, aquele negócio todo...
55
Ah, é difícil chamar de publicitário. (dono de agência)
Com relação a esta desvalorização de algumas funções da atividade publicitária
dentro das agências de propaganda, é válido relembrar Baudrillard, quando o mesmo afirma
que, a partir de um certo ponto de socialização urbana, quando todo universo social se
urbaniza e a comunicação se faz total, as necessidades intensificam-se e a concorrência por
status: “Torna-se irreversível e ilimitada, crescendo segundo o ritmo de uma sócio-
diferenciação acelerada e de uma inter-relatividade generalizada” (BAUDRILLARD, 1995, p.
63). Neste cenário, a concorrência acaba por ser o próprio discurso da sociedade urbana. E a
hierarquia social adota como critérios para valorar os indivíduos o tipo de trabalho e de
responsabilidade, além do nível de educação e de cultura.
Ainda de acordo com o mesmo autor, as instituições, através de recursos de
comunicação, procuram modelar os indivíduos ao integrá-los sob “invólucros formais”,
fazendo com pessoas o que o design faz com os objetos. Neste cenário, aquilo que “Se
procura com mais empenho não é nem uma máquina, nem uma fortuna, nem uma obra: é a
personalidade” (RIESMAN apud BAUDRILLARD, 1995, p. 88). Os alunos e graduandos dos
cursos de publicidade e propaganda, portanto, desejam se diferenciar em relação aos seus
pares da escola e do mercado e na busca de uma personalidade mais valorizada, a grande
maioria anseia ser profissional de criação, independente de suas aptidões, da saturação do
mercado, ausência de oportunidades nesta área específica enquanto outras áreas são carentes e
de outros fatores que, porventura, venham sinalizar em sentido contrário.
Pelo que foi sinalizado nas entrevistas, há, portanto, uma concentração muito grande
do interesse dos estudantes de Publicidade e Propaganda na área de criação, embora o
mercado de trabalho esteja mais propício a abrir oportunidades em outras áreas. Estas outras
áreas, porém, não proporcionam o mesmo status social e, embora este estudo não tenha feito
56
uma pesquisa salarial, os mais de 15 anos de mercado publicitário do autor do mesmo
permitem ao mesmo afirmar que também pagam menos em termos salariais, o que,
possivelmente, também auxilia a fazer com que as oportunidades que surgem nas áreas de
produção gráfica, RTV e mídia, por exemplo, não sejam muito valorizadas pelos estudantes.
Como um dos entrevistados resumiu:
Eu acho que isso acontece por um motivo muito simples, não é? Nós vivemos da
vaidade. (diretor de holding de veículos de comunicação)
Quanto à área de planejamento, pelo que foi verificado, há poucos profissionais neste
mercado trabalhando com esta especialidade. O problema, pelo apreendido durante as
entrevistas, é que esta é uma função que exige experiência:
A área de planejamento estratégico de comunicação é [...] É uma área que hoje
[...] Se eu perder um profissional de planejamento aqui na agência eu vou custar a
achar no mercado. Eu vou ter que tirar de outra agência. (dono de agência)
Ele tem que entender técnicas de comunicação, com todas as ferramentas, porque a
comunicação... E tem que ter uma visão global [...] É o cara que transforma as
necessidades do marketing em comunicação [...] Por exemplo, eu vou deixar bem
claro, o cara tem um pneu... Eu preciso saber se o mercado saturado de pneus,
que tipo de pneus, se o cliente gosta, quem compra aquele tipo de pneu... Esse tipo
de informação você não tem de um dia pro outro. Um estudante de comunicação
nunca vai sair de uma faculdade sabendo disso tudo. (dono de agência)
Acreditamos que, buscando implantar aos poucos essa prática, buscando os poucos
profissionais do mercado que já passaram por várias situações com clientes e,
agora, estão com a mente mais aberta e receptivos a novas idéias. Essa constatação
vem dos contatos que temos no mercado, das agências que viveram situações
adversas e agora trabalham com um profissional de planejamento mais bem
preparado. (dona de agência)
Planejamento é, portanto, uma oportunidade para quem deseja investir numa carreira
a médio ou longo prazo.
Quanto à área de atendimento, que é quem faz a ponte entre a agência e o cliente e,
em última análise, é quem vende o produto da agência, ou veículo também neste caso, para o
cliente, é uma área valorizada pelos empresários e dirigentes, dado o fato de ser a ponta de
contato com o cliente, que faz do relacionamento com o mesmo uma ferramenta de vendas:
57
Pra fazer proposta pro seu cliente, ? Agora, a escola o prepara e eu o sei se
é porque não tem jeito, mas a área de atendimento, é uma área super valorizada e
poucas pessoas quando vêm pra fazer um estágio procuram pelo comercial. (diretor
de holding de veículos de mídia)
Na área de atendimento, que também carece e precisa de bons profissionais.
Profissionais que lêem sobre aquele cliente que ele está atendendo, que conheçam o
mercado daquele cliente, que saiam da agência e vão pro ponto de venda ver o que
está vendendo, o que não está vendendo, conversem com o consumidor. (dono de
agência)
Quando eu preciso de um profissional de operações, um profissional de
atendimento, eu tenho dificuldade. (dono de agência)
É importante ressaltar, porém, que esta é outra função que não paga tão bem quanto a
criação e tampouco exerce o mesmo magnetismo:
Nós da comunicação somos, ou fomos, extremamente vaidosos, né? E o vendedor,
né? Era... Um camelô ambulante. (diretor de holding de veículos de mídia)
3.3.2 A alternativa de inserção via clientes
Em 1990, o presidente da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM)
assinalava que:
De um modo geral, ressalvadas as exceções de praxe, as nossas escolas de
comunicação social (habilitação/propaganda) preparam formandos mais aptos a
exercer funções de atendimento, nas agências, ou de assistentes nos setores de
propaganda dos anunciantes. As exceções são os que acabam ingressando na criação,
mídia, pesquisa e estúdios de produção [...] Segundo pesquisas realizadas pela
ESPM, quase 75% dos jovens que iniciam carreira em agências têm hoje diplomas
de comunicação social. Mas o grande mercado de trabalho desses jovens é a empresa
(industrial ou comercial). No caso da ESPM, por exemplo, cerca de 80% dos
formandos trabalham em departamentos de propaganda e nas várias áreas do
marketing. (GRACIOSO apud MARTENSEN, 1990, p. 38).
Vale ressaltar que a ESPM, da qual o autor das palavras acima transcritas era
presidente, fica em São Paulo, onde muito mais organizações com porte e cultura de
empregar profissionais formados em propaganda para gerir sua comunicação. Em Belo
58
Horizonte, porém, as impressões que os profissionais do mercado têm são diferentes. Alguns
concordam que a inserção pode se dar por este caminho e que é até natural:
Então tem mil oportunidades em veículos, em fornecedores, em clientes, em
assessoria de comunicação de uma maneira geral. (dono de agência)
Veja bem, isso é complexo. O que acontece? As agências estão saturadas, nos
veículos os departamentos comerciais estão saturados. O que tá nascendo sem
parar? Não pára de surgir, ainda mais em países onde, onde é... Existe tanta
iniciativa... No cliente, o... O... O publicitário pode ser um importante parceiro das
agências veículos por estar atuando dentro do cliente. (dono de agência).
Uma entrevistada, quando questionada sobre onde estariam as chances de inserção
para novos publicitários, respondeu que estariam:
Em anunciantes ou em empresas próprias. (coordenadora de curso)
Há, no entanto, quem seja voz dissonante quanto a este assunto. Quando questionado
sobre as possibilidades de inserção de profissionais que estão se graduando em publicidade e
propaganda via clientes, para trabalhar do lado de do balcão, interagindo com a agência, a
resposta de um dos entrevistados foi:
Eu acho que não. Não tem porque não existe a cultura. (publicitário).
A ausência desta cultura, na mesma entrevista surgiu como um problema para um
maior desenvolvimento do mercado local:
Todos clientes deveriam ter no seu quadro de funcionários, no seu departamento de
marketing, de publicidade, promoções, um profissional formado pra poder levar.
Como o cara do desenvolvimento de produto, como o profissional que cuida do
dinheiro... Tem que ter um publicitário, mas você que a cultura não existe. Você
o exemplo da prefeitura: até 1996 o cara que tratava de publicidade era um
jornalista, que tratava publicidade assim: Ah, vamos deixar isso pra depois porque
agora nós temos coisa mais séria para falar. (publicitário)
Outro entrevistado, porém, acostumado a lidar com clientes de maior porte pela sua
posição de diretor comercial de um grande grupo de comunicação, sinalizou que uma
mudança nesse sentido:
59
Todos esses clientes, eles tinham, antigamente, uma predileção pelo pessoal de
jornalismo, que era uma assessoria de imprensa. E hoje você tem, na maioria
desses clientes, assessoria de imprensa e assessoria de comunicação, que são duas
coisas diferentes e separadas. (diretor de holding de veículos de mídia)
Mas o mercado ainda se ressente de poucos clientes terem aderido à
profissionalização de sua comunicação. Uma entrevistada salientou que ainda há:
Escassez de clientes preparados para a publicidade. (coordenadora de curso)
É possível, portanto, deduzir que uma mudança cultural em andamento no que
tange aos anunciantes contratarem publicitários para interagirem com suas agências e outros
fornecedores da área de publicidade. No entanto esta mudança começou pelas organizações de
maior porte e aos poucos tende - até mesmo pelo achatamento dos salários dos publicitários
locais em função da grande oferta desta mão de obra - a se estender a clientes de portes
menores com o passar do tempo.
3.3.3 As possibilidades de inserção nas empresas de no media
Hoje o mercado publicitário da capital mineira conta com empresas especializadas
em promoções, eventos, internet, marketing direto, telemarketing, marketing esportivo,
marketing cultural, marketing social, marketing político, varejo, branding, design,
programação visual, brindes entre outros segmentos. Não há, no entanto, um mapeamento
oficial deste mercado, que é muito vasto e inclui várias ferramentas distintas.
Os índices nacionais de crescimento das empresas especializadas nestas ferramentas
são altos e como os clientes vêm demandando cada vez mais a integração de diferentes
ferramentas para a obtenção de seus objetivos, a tendência de crescimento deve se manter.
a título de ilustração, em matéria intitulada “Expansão de agências de marketing
60
direto impulsiona abertura de vagas”, publicada no Meio & Mensagem, reporta-se que “nos
últimos 18 meses, oito das principais agências de marketing direto instaladas em São Paulo
abriram 125 novos postos de trabalho” (SÔNEGO, 2004, p. 1).
Em Belo Horizonte, apesar de haver algumas ressalvas quanto ao direcionamento que
as agências de propaganda dão às verbas, este mercado também vem crescendo, como é
possível constatar pelos seguintes trechos abaixo transcritos:
Marketing direto, marketing promocional, político, esportivo… A princípio é
mercado que tende a empregar mais, a contratar mais do que a publicidade pura,
ou seja: a agência de propaganda tradicional. Eu vejo isto como um mercado em
que as pessoas tendem a ter mais oportunidades... Porque é o que tá... É o que
em ponto de crescimento, é o que subindo, é o que abrindo, comprando,
adquirindo espaço. A publicidade pura e simples por si , ela foi perdendo um
pouco de espaço, entrou o outro lado da comunicação. Acho que poderia olhar
neste sentido. A tendência é contratar mais. (dono de agência de marketing
promocional)
No entanto entre os pontos fracos do mercado belo horizontino de publicidade e
ameaças ao mesmo, uma das entrevistadas citou que o mesmo é:
Muito voltado para propaganda e pouco integrado com as outras ferramentas de
comunicação [...] Gestão das agências muito focada em mídia e pouco atenta às
necessidades de comunicação além da propaganda tradicional. (coordenadora de
curso)
3.3.3.1 O ciclo da multiplicação das agências
O presidente de uma entidade classista patronal resumiu a situação da seguinte
forma:
O mercado está saturado porque os profissionais não estão arrumando emprego e o
Brasil é, por natureza, um país em que as pessoas têm uma natureza de iniciativa
própria. Daí criou-se uma enormidade de agências de propaganda. (dono de
agência)
Este mesmo entrevistado fez questão de colocar que hoje em Belo Horizonte há mais
61
de seiscentas agências, a maioria das quais prestando péssimos serviços e mal conseguindo se
sustentar.
Este dado é importante porque significa que mesmo abrindo agências, a maioria dos
publicitários não está conseguindo superar as dificuldades de inserção no mercado. Como
foi visto, os clientes rareiam e as agências grassam neste mercado. E estas agências, por sua
vez, por estarem em dificuldades, não se apresentam como opções para absorção de novos
entrantes no mercado de trabalho, fazendo com que o ciclo se repita, ocasionando a abertura
de mais agências.
Outro entrevistado, dono de uma agência com menos de três anos de atuação frisou
que:
Com isso você tem uma briga muito grande por preços, descontos. Uma coisa
ridícula. (dono de agência)
E ainda, ao referir-se à tabela de preços do SINDAPRO-MG, colocou que:
Ela tem distorções incríveis. Como é que você cobra quinhentos reais por uma
faixa? É um preço exorbitante. (dono de agência)
A tabela do SINDAPRO é a tabela de preços a ser cobrada pela criação de cada tipo
de peça publicitária. Apesar do sindicato ter pouco mais de 60 associados em todo o estado, a
tabela é comumente utilizada pelas ancias não afiliadas como forma de estabelecer
parâmetros para seus serviços juntos aos seus respectivos clientes. Como a maioria dos
clientes é de pequeno porte e tende a solicitar com maior freqüência serviços como peças de
papelaria, folhetos, faixas e outras peças sem custo de veiculação - que seria onde, a priori, as
agências ganhariam o percentual que compensaria um preço de criação menor - o sindicato
tenta compensar no preço de criação a ausência de comissionamento, o que acaba fazendo
com que o uso da tabela como parâmetro seja muito mais para frear pedidos de maiores
descontos por partes dos clientes, sob a alegação de que a agência já está cobrando x% abaixo
62
da tabela do SINDAPRO. Inclusive porque apesar desta tabela ser bastante difundida, o
SINDAPRO tem 40 afiliados em Belo Horizonte - a própria agência do entrevistado que
fez a supracitada crítica não é afiliada.
Outro entrevistado salientou que:
O grande problema hoje, em qualquer mercado, quando existe saturação, é você
manter a ética. Porque, pela lei da economia, quanto maior a oferta, menor é o
preço. Mas existe um limite pra isso. (dono de agência)
Nesse momento o entrevistado frisou a importância das associações de classe para
manter, pelo menos entre seus associados, uma certa postura ética, porque:
Depois que vo começa a trabalhar de graça, você está praticando um ato que
prejudica não só a você, mas a todo o mercado. (dono de agência)
Ao referir-se à vasta gama de agências que operam no mercado sem filiação ao
SINDAPRO ou à ABAP, ele observou que: “É cada um por si”, e chamou a atenção para
outros fatores que fazem a concorrência, na sua visão, ainda mais desleal:
Nós não podemos trabalhar com softwares piratas. A gente tem uma série de
responsabilidades, eu não posso, né? Eu tenho clientes importantes, eu não posso
ficar à mercê de uma fiscalização que me dê problema. (dono de agência)
Logo em seguida, o entrevistado mostrou que esta concorrência, apesar de estar, na
sua grande maioria, “na mais completa indigência”, não é inofensiva e incomoda, como
pode-se ver pela seguinte declaração:
Então o que acontece com a concorrência? Se num determinado momento ela der a
sorte de aparecer um cliente, que por alguma determinada razão confia, pode ser
que haja um up grade na vida dessa agência. (dono de agência)
uma outra dimensão do problema do excesso de o-de-obra oferecendo seus
serviços em um mercado em que não há vagas para todos os candidatos a emprego: a
precarização das condições de trabalho. Como citado, grupos sociais que vivenciam
situações de insegurança que inspiram altos níveis de ansiedade quanto ao presente e ao futuro
63
e baixos horizontes de expectativas, acabam por se dispor a suportar grandes encargos em
troca de reduções mínimas dos riscos e inseguranças. O quadro 03 especifica as modalidades
de contratação de mão de obra nas agências que responderam ao questionário:
QUADRO 03 - Áreas de atuação das agências e modalidades de contratação de mão-de-obra
FONTE: dados da pesquisa
Como é possível verificar-se pela Quadro 03, aproximadamente 32% dos
profissionais atuantes nas empresas que responderam ao questionário trabalham sob a forma
de pessoas jurídicas, o que denota uma tendência de precarização das garantias trabalhistas
previstas em lei para trabalhadores assalariados com carteira assinada.
Outra informação importante possível de se extrair da observação deste mesmo
quadro é a diversificação de serviços prestados pelas agências. Nenhuma delas se restringe
unicamente à criação e agenciamento de produção e veiculação de peças publicitárias. Apenas
duas das agências pesquisadas ficam próximas de se encaixar no perfil de agência tradicional,
mas uma delas também trabalha com design e a outra faz produção de vídeos.
Áreas de atuação da agência Estagiários
Carteira
assinada
P
de serviços
(PJ)
Free lancer
Sócios
Trabalhado-
res
Propaganda, Mkt Político, Mkt social 8 30 20 1 -
Propaganda, eventos, Internet, Mkt
Político, Mkt Social, Mkt Cultural,
Design, Produção de vídeos
- - - - 4
Promoções, eventos, Mkt esportivo, Mkt
Político, Mkt Social, Mkt Cultural
3 12 15 - 2
Propaganda, Promoções, Eventos,
Internet, Mkt Político, Mkt Social, Mkt
Cultural, Design, Produção de vídeos
2 10 6 - 1
Propaganda, Promoções, Eventos, Mkt
Cultural, Design,
Não
informou
Não
informou
4
Não
informou
Não
informou
Propaganda, Promoções, Eventos,
Internet, Mkt Político, Mkt Social, Mkt
Cultural, Design, Produção de vídeos
3 10 2 -
Não
Informou
Propaganda, Promoções, Eventos, Design 5 31 7 -
Não
Informou
Propaganda, Internet 0 4 2 - 3
Propaganda, Promoções, Eventos,
Internet, Mkt Político, Mkt Cultural,
Produção de vídeos, Jornais
1 7 10 4 1
Propaganda, Design 1 5 5 Diversos
Não
Informou
Propaganda, Produção de vídeos 2 48 4 1
Não
Informou
64
Como é possível observar ainda no quadro 03, a diversificação das ferramentas de
comunicação para o estreitamento de relacionamento das marcas com seus consumidores
acarretou uma diversificação dos serviços prestados pelas agências de propaganda. No afã de
manter “em casa” os investimentos que seriam canalizados para outras ferramentas que não a
propaganda convencional, as agências passaram a oferecer os mais diversos serviços ligados à
área.
Este leque mais vasto de serviços, porém o significa que todas estas agências
tenham expertise em todas estas áreas. É comum a subcontratação de mão de obra
especializada - tanto de pessoas físicas quanto de pessoas jurídicas - para a produção de
eventos, produção de vídeos, planejamento e execução de campanhas de marketing direto e
outras atividades:
Nossa intenção é prestar serviços para as agências. Eles têm os clientes, eles têm
uma relação com esses caras, nós não estamos querendo disputar o cliente. O que a
gente quer é que na hora de fazer uma promoção, fazer um evento, que a agência
escale a gente. (dona de agência de marketing promocional).
Quando a gente precisa de um serviço de marketing direto, por exemplo, a gente
chama a Exercere, que tem clientes de porte nacional. (dono de agência de
marketing promocional).
Uma empresa de Internet - a Internet é uma das novas ferramentas da publicidade -
que você citou, é até uma fornecedora nossa. Eu considero que uma empresa de
Internet é fornecedora do mercado publicitário. (dono de agência)
Esta combinação de fatores: maior variedade de ferramentas de comunicação sendo
demandadas pelos clientes, precarização das condições de trabalho levando profissionais a
optarem por se arriscarem com seus próprios empreendimentos e a opção de muitas agências
por oferecer serviços mais completos, mesmo que para isso tenham que subcontratar
parceiros, abre mais possibilidades de inserção no mercado de trabalho através da
especialização.
65
3.3.4 Especialização, uma possibilidade ainda não consolidada
anos ouve-se no mercado publicitário que os clientes querem mais que a simples
publicidade. Este é o raciocínio que vem fazendo com que as agências enveredem por novas
atividades, oferecendo aos seus clientes outras ferramentas que não a propaganda tradicional.
agências vendendo serviços de comunicação total”, de “comunicação 360
o”
, de
“comunicação integrada” (MEIO & MENSAGEM, 2004) e por aí vai uma série de nomes que
inspirem nos seus clientes (de fato e em potencial) a sensação de que seriam agências
completas - a tabela 03 mostra muito bem isso - e que, por isso, poderiam nelas concentrar
todos seus investimentos.
Há, no entanto, uma corrente de pensamento que segue no sentido oposto desta
movimentação do mercado. Nizan Guanaes, um dos publicitários mais premiados do País e
presidente da holding YPY, que reúne as agências DM9DDB, África e MPM resume: “O
mercado precisa segmentar-se porque as agências não podem ficar oferecendo tudo para
todos. Elas precisam buscar posicionamentos e nichos claros como fazem bancos,
supermercados e companhias aéreas” (MAXIMÍDIA ..., 2004, p. 14).
Esta mesma opinião é partilhada por gente do mercado publicitário de Belo
Horizonte:
Eu acho que a especialização está voltando a ser uma tendência em alta [...]
Porque você tem que entender. Então quem entende mais de varejo vai ter
possibilidade de dar mais resultado pra varejo. Quem entende mais do setor
imobiliário vai ter mais capacidade de trazer mais retorno, dar mais resultado pro
setor imobiliário. Quem entender mais de desenvolvimento de cidade, de tentar
aumentar capital social de regiões, vai conseguir trazer mais resultados pra eles.
(dono de agência de marketing político)
Eu sou a primeira agência de Belo Horizonte, e isso eu não abro mão, a dizer que
era especialista em varejo. (dono de agência).
Como a tendência à especialização ainda é incipiente, ela ainda não consagrou
66
nenhum formato. A citação que aventa a possibilidade de haver agências especializadas por
setor de atuação de clientes, como o imobiliário, por exemplo, suscita uma questão ética e
prática quanto ao atendimento de clientes conflitantes. Mesmo que os dirigentes da agência
não tenham qualquer dilema ético quanto a fazer campanhas para clientes conflitantes, será
que os clientes não veriam problemas?
O modelo de especialização por tipo de serviço, por outro lado, não levanta as
mesmas questões. Uma agência especialista em varejo, por exemplo, pode atender a clientes
de varejo em diferentes segmentos de mercado, tais como automóveis, vestuário, malas e
bolsas, óticas etc. sem que haja conflitos de interesses em qualquer momento.
As empresas de no media, já focadas por este estudo, são empresas especializadas em
nichos bem específicos do mercado publicitário. Esta observação poderia levar à impressão de
que este tópico está sendo redundante, mas não é este o caso. Pelo contrário, a experiência
bem sucedida destas empresas leva a crer que a especialização vem dando resultados melhores
que a propaganda convencional. A abordagem deste tópico é complementar às dos tópicos que
trataram da inserção via empresas de no media e da proliferação de agências.
O que a leitura de alguns discursos citados nos indica é que ainda nichos a serem
explorados neste movimento de especialização. A especialização em varejo, como já foi
exemplificado, mostra que como conjugar a especialização da empresa com o segmento de
atividade do cliente. A mesma possibilidade aventada para o varejo também se abre para o
agribusiness, como citou um dos entrevistados, por exemplo.
A McCann-Erickson, conforme citado, adquiriu nos últimos oito anos, aqui no
Brasil, além de empresas especializadas em áreas típicas do no media, tais como
relacionamento, promoção, telemarketing, branding e Internet, uma empresa especializada no
segmento de saúde, que abrange o atendimento de comunicação a mercados que exigem
67
conhecimentos altamente específicos de linguagem, legislação e outros pormenores, para
clientes como laboratórios, redes de farmácias, hospitais, planos de saúde, equipamentos
técnicos etc.
Em Belo Horizonte, a Vitória Comunicação é especializada em marketing político,
mas com um enfoque muito distinto das forças tarefas que são mobilizadas exclusivamente
para eleições. O foco da agência é o atendimento a prefeituras de cidades pólo, às quais presta
uma completa assessoria de marketing, incluindo a sua comunicação, mas sem se ater
exclusivamente a ela. A empresa cria e produz campanhas publicitárias, eventos, jornais etc.
Pela afinidade com o meio político e por atender prefeituras da situação, a agência também
desenvolve campanhas eleitorais dos candidatos de seus clientes, mas isso em nome da
continuidade do trabalho que vem sendo feito. Inclusive, por conhecer melhor do que
qualquer outra agência tanto as propostas do cliente quanto a linguagem do público a que este
se dirige.
Há, portanto, espaço para incursões no campo das agências especializadas para
empreendedores que busquem novos nichos de especialização. Troiano (2004, p. 10), afirma
que “não dá mais para manter, em mercado nenhum, o sonho e a vaidade da abrangência total,
da universalidade”. O mesmo autor, porém, chama a atenção para o fato de que não são os
empresários que segmentam o mercado, é o mercado que se segmenta, cabendo aos
empresários a sensibilidade de “identificar ou localizar os segmentos existentes ou em
formação”.
3.3.5 A inserção via veículos: um universo muito restrito
Além das agências de propaganda, das empresas de no media, dos clientes e dos
68
empreendimentos em agências especializadas por segmento, que se citar as possibilidades
de inserção via veículos de comunicação.
Esta possibilidade realmente existe, mas o número de veículos de massa vem se
mantendo estável há anos e isso associado ao fato de que praticamente todos eles já estão com
suas estruturas operando dentro da realidade que o mercado lhes impõe, limita a probabilidade
de inserção de novos entrantes a poucas vagas criadas por ocasião de profissionais
estabelecidos nestas estruturas se retirarem para outras posições na empresa ou fora dela ou,
mais remotamente, à criação de novos veículos. Mesmo assim as vagas neste nicho
continuarão muito limitadas.
Agora você tem uma TV a cabo com quarenta e poucos canais, e esses quarenta e
poucos canais devem empregar menos do que emprega a TV Alterosa. (diretor de
holding de veículos de mídia)
Acredito que os veículos há algum tempo não precisam fazer nenhum esforço
neste sentido, pois cada um sabe que tem seus pacotes comerciais vendidos por mês
e suas estruturas são adequadas a estes faturamentos. (dona de agência de
marketing promocional).
Com relação aos jornais de bairro, que é um setor em que a cada momento surgem
novos títulos, é um segmento que não foi sequer lembrado pelos representantes do mercado,
posto que dependem de anunciantes de pequeno porte, normalmente estabelecimentos
comerciais dos bairros onde são distribuídos e por isso mesmo têm estruturas extremamente
enxutas, onde pessoas acumulam funções e nem sempre a formação acadêmica é demandada.
Talvez até mesmo por este perfil muitas destas publicações enfrentem problemas para atrair
novos e maiores anunciantes, ampliar suas áreas de distribuição e crescer de uma maneira
geral, podendo vir a constituir um espaço para inserção de profissionais da publicidade, mas
não com o modo de atuação que estes veículos hoje apresentam.
Tendo sido analisadas as possibilidades de inserção dos estudantes, graduandos e
recém formados dos cursos de publicidade e propaganda de Belo Horizonte nas diferentes
69
estruturas que compõem o mercado publicitário desta cidade, o próximo tópico deste estudo
enfoca como se dão os contatos para que esta inserção ocorra.
3.4 A Propaganda em Minas Gerais: um breve histórico
A exemplo do que aconteceu em várias capitais brasileiras, no rastro do que
ocorria em São Paulo e no Rio de Janeiro, na década de 1930 surgiu em Belo Horizonte a
figura do corretor de anúncios (MELO; REIS, 1990).
Autônomos ou comissionados, esses indivíduos funcionavam como intermediários
que iam de porta em porta, nos locais de maior concentração de estabelecimentos comerciais
da cidade, angariando “reclames” para os jornais que então circulavam - e que eram
praticamente os únicos veículos de comunicação, além dos cartazes de rua (MELO; REIS,
1990).
Logo depois dos corretores, veio a época dos estúdios de desenhos comerciais. Estes
estabelecimentos funcionavam como estúdios de arte independentes, sem vínculo com os
corretores. Os clientes iam a tais estúdios e solicitavam papéis de carta, rótulos etc. Melo e
Reis (1990) destacam dessa época a atuação de Antonio Rocha, que tinha atuado e até sido
sócio de uma agência no Rio de Janeiro, onde havia ido estudar. Rocha, que era redator chefe
da rádio Alterosa, abriu um estúdio que posteriormente, em 1942, viria a se transformar na
Rocha Publicidade, a primeira agência de propaganda de Minas Gerais.
Em 1949 a Standard Propaganda abriu aquela que pode ser chamada de a primeira
agência com moldes realmente profissionais em Belo Horizonte. Esta iniciativa deveu-se à
solicitação de Carlos Vaz de Carvalho, dono da Casa Guanabara, que insistiu junto a Cícero
Leuenroth, proprietário da Standard, que precisava veicular freqüentemente seus anúncios, ao
70
contrário das campanhas isoladas em datas promocionais.
A Casa Guanabara, aliás, aparece como grande propulsora da propaganda em Minas
e a migração da sua conta podia determinar, como de fato o fez algumas vezes, o fechamento
ou a abertura de uma agência. Era o maior anunciante do estado. Aos domingos publicava
cinco páginas inteiras, uma para cada departamento do magazine, nos jornais e tinha um
programa diário, com uma hora de duração, na Rádio Inconfidência (MELO; REIS, 1990).
A década de 50 foi marcada pela instalação de várias agências em Belo Horizonte:
Alfa, JMM, Danilo do Vale, Lente, Starlight e as grandes Norton, de porte nacional, e a
McCann Erickson, multinacional. Em fins de 1955 foi inaugurada a primeira emissora de
televisão do estado, TV Itacolomy, de Belo Horizonte, e no seu rastro veio o estouro do
mercado de eletrodomésticos, impulsionado pelas vendas dos próprios aparelhos de TV. Era
época das vendas a crédito e o forte da propaganda mineira passou a ser o varejão. Este
cenário pavimentou o crescimento das atividades publicitárias.
No início da década de 1960, época que em Minas Gerais floresceram diversos
setores, como o financeiro e os grandes varejistas, a propaganda mineira viveu o seu boom.
Além das grandes nacionais como Denison, Standard, Norton, Alcântara Machado e da
multinacional McCann-Erickson, agências locais de porte razoável atendiam a clientes como
os bancos da Lavoura de Minas Gerais, Nacional, Crédito Real, Comércio e Indústria e
grandes varejistas como Casa Guanabara, Bemoreira, Inglesa-Levy e Pep´s. Todos grandes
anunciantes (MELO; REIS, 1990).
Citado por Melo e Reis (1990, p. 453), Walter Andrade recorda que:
Por volta da metade da década de 60, outras modificações se impuseram à economia
mineira. Foi a época das fusões no varejo, como aparecimento de grandes
conglomerados como os da Embrava e Bemoreira, o que limitou bastante o campo
de atuação das agências de menor porte.
71
Mais uma vez, observa-se a grande importância da variedade de grandes anunciantes
locais, posto que o domínio de mercado por parte de poucos grandes anunciantes limita as
oportunidades de negócios para agências de menor porte e até de grande porte, como viu-se no
caso da McCann-Erickson, que fechou seu escritório local com a saída da conta da Casa
Guanabara, em 1963, quando esta foi para a Denison.
Na seqüência, no mesmo texto citado anteriormente, o próprio Walter Andrade
também sinaliza que “Sobreveio, a seguir um período de recesso, amenizado, em parte, pelo
aparecimento de bons anunciantes na área estatal” (MELO; REIS, 1990, p. 453). Esta
observação a perfeita idéia de quão longínqua é a dependência da publicidade mineira dos
anunciantes estatais - fato citado diversas vezes durante as entrevistas pelos prepostos de
agências e veículos de comunicação que participaram deste estudo.
Com a decisão da McCann de sair de Minas, dois de seus principais profissionais
decidiram abrir sua própria agência. Como durante o período de desligamento da McCann eles
trabalhavam para esta durante o dia e somente após o expediente é que podiam se dedicar aos
clientes de sua incipiente agência, Edgard de Melo e Hélio Faria decidiram chamar a nova
empresa de ASA, que é a sigla formada pelas iniciais de After Six Agency (MELO; REIS,
1990). O ano era 1964.
A ASA é importante, sob o ponto de vista histórico, pelo fato de ter sido a primeira
agência genuinamente mineira a dominar o mercado local de propaganda. Confirmando a
importância do varejo para o desenvolvimento dos negócios publicitários, posto que a
freqüência com que anuncia garante o fluxo de caixa, a ASA teve como primeiro cliente o
Mobiliário Fiel, mas o crescimento para agência de grande porte começou com a conquista da
conta da Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) e continuou com a conta da Companhia Elétrica
de Minas Gerais (CEMIG).
72
Aliás, confirmando também a importância do setor estatal no cenário publicitário de
Minas, o próprio Edgard de Melo destaca que: “Em um mercado onde o governo sempre foi
um cliente forte, a ASA se posicionou muito bem e passou a deter várias contas no setor, além
da PBH e da CEMIG, a Caixa Econômica Estadual, a Hidrominas e várias outras” (MELO;
REIS, 1990, p. 454).
É também importante ressaltar que devido à ausência de escolas de propaganda em
Belo Horizonte, na época, a ASA, pelo seu porte, constituiu uma “grande escola prática de
propaganda, dando oportunidade a dezenas de jovens mineiros, especialmente redatores,
artistas e homens de mídia” (MELO; REIS, 1990, p. 455).
Das agências surgidas nos anos 60, somente a ASA ainda continua em atuação. A
década de 1970, porém, também viu surgir várias agências em Belo Horizonte. São dessa
época a RC, a Setembro, a L&F e a Hoje. A MPM, de São Paulo e à época uma das maiores
agências do País também chegou a Minas por esta época.
A lista dos primeiros clientes de algumas destas agências confirma a grande
dependência de setores como o varejo, o financeiro e o estatal, mas também demonstra que o
setor industrial começa a mostrar sua força e importância para os negócios publicitários no
estado.
A L&F, que em três anos e meio chegou ao segundo lugar no ranking mineiro de
agências (REIS; MAGYAR, 1976 apud MELO; REIS, 1990), teve como principais contas, em
seu início, a Cimetal Siderúrgica, a Acesita, a Itambé, a CAMIG, a Loteria do Estado e o
Banco Mercantil do Brasil.
A MPM, se instalou exclusivamente em função de atender à Fiat, cuja fábrica
acabava de ser instalada em Betim, mas seu crescimento local se deveu à conquista de contas
como a da Secretaria da Indústria e Comércio do Estado e das Lojas Arapuã, cuja rede de
73
varejo tinha dezenas de lojas no estado.
A Skema, que surgiu da fusão de duas outras agências, a Meta e a Starlight, cresceu
rapidamente atendendo à Loteria do Estado de Minas Gerais, o Grupo Petronorte (comercial
de tratores e implementos agrícolas) e a Promovendas. Esta agência foi o embrião de onde se
originou a Setembro Propaganda.
Na década de 1980 surgiram outras tantas agências de destaque no cenário local,
dentre as quais a AZJ, a Contacto, a Facta, a Enfoque, a Insight, a DP, a Ação & Promoção e
duas que ganharam destaque no cenário nacional e que permanecem entre as maiores do país
até hoje: a SMP&B e a DNA.
A SMP&B, por uma questão de composição societária (MELO; REIS, 1990), desde o
final dos anos 80 apresentava em sua estrutura aquilo que poderia ser considerado uma
agência de promoção, merchandising e design dentro da agência de propaganda, antecipando
uma tendência que viria a se sedimentar nas décadas seguintes. Dentre as principais contas
que alavancaram o seu crescimento, destacam-se o Banco do Estado de Minas Gerais,
BEMGE, a Associação Brasileira dos Bancos Comerciais Estaduais, o Governo do Estado de
Minas Gerais e o BH Shopping.
A DNA, criada no final de 1982 por dois ex-sócios da Setembro Propaganda e mais
um sócio, também teve seu sucesso inicial ligado a contas de varejo, tais como a Elmo
Calçados, à época segunda maior rede varejista de calçados do país e da indústria, com contas
como Itatiaia, maior fabricante de móveis de aço da América do Sul na época.
Tanto a DNA quanto a SMP&B, porém, devem muito do seu crescimento às contas
de origem política. Ambas atuaram juntas na campanha do então senador Itamar Franco ao
governo do Estado de Minas, que acabou lhes rendendo contas no mandato deste. A DNA
também foi uma das responsáveis, junto com a Setembro Propaganda, pela campanha
74
vitoriosa de Fernando Collor de Mello à presidência da República.
Nos anos 90, surgiram muito mais agências novas do que ocorria aentão. Muito
desse boom no número de agências tem muito mais a ver com o investimento relativamente
baixo para se montar uma estrutura inicial em função das facilidades da informática, do que
com o aparecimento de numerosos anunciantes. Mesmo assim, nomes como Lápis Raro,
Sofia, Bros. Comunicação & Design, Espontânea e Solution, entre outros, conseguiram algum
destaque e se descolaram da multidão, passando a concorrer por contas com as grandes do
mercado.
Entre o final dos anos 1990 e início dos anos 2000, a SMPB - que é a nova marca da
SMP&B - e a DNA realizaram uma operação de troca de ações interessante: ambas continuam
a operar de forma independente, mas como os sócios são comuns a ambas, os resultados de
cada uma das duas interessam a todos. Por terem mantido suas identidades, estruturas e
inclusive quadros societários distintos, as duas agências habilitam-se a atender clientes
conflitantes, tais como o Banco do Brasil (atendido pela DNA) e o Banco Rural (atendido pela
SMPB). Este expediente também multiplica as possibilidades de conquistas de contas
públicas sem que caia sobre o Estado a acusação de concentrar verbas demasiadas numa única
agência.
Os sócios da DNA e SMPB são ainda sócios MultiAction, empresa criada em 2000,
que constitui o braço promocional do grupo e cujos principais clientes são das carteiras dos
seus stake holders (acionistas), como Banco do Brasil, varejo da Fiat, Telemig Celular e
Centauro Esportes, cujas contas de propaganda são atendidas pela DNA e Telemig Celular
Empresas, Instituto Telemig Celular e Usiminas, cujas contas publicitárias são atendidas pela
SMPB.
75
3.5 O mercado publicitário de Belo Horizonte hoje
3.5.1 O tamanho do bolo publicitário em Belo Horizonte
O mercado publicitário de Minas Gerais, estima um dos entrevistados neste estudo,
ligado a uma associação de classe de agências de propaganda, gira em torno de um bilhão de
reais ano (estimativa de um entrevistado - base 2003).
Tomando como base a pesquisa feita pelo IBOPE Monitor e publicada no caderno
regional do Meio & Mensagem (2004, p. 10), os 10 maiores veículos de comunicação do
estado, juntos, somaram em 2003 investimentos da ordem de 932.291.650,00 reais. O que de
certa forma confirma a estimativa supracitada, posto que estes números referem-se apenas aos
dez veículos de maior faturamento em Belo Horizonte.
No entanto, é válido ressaltar que a pesquisa do IBOPE Monitor, citada neste estudo,
apura dados com base na tabela cheia dos veículos, sem levar em conta os eventuais descontos
concedidos a cada cliente em cada negociação (MEIO & MENSAGEM, Regional Minas
Gerais, 2004, p. 10). Os números resultantes deste estudo, portanto estão majorados frente à
realidade de mercado, mas esta, mesmo assim, ainda constitui a fonte mais fidedigna
disponível para o desenvolvimento desta pesquisa.
Ainda de acordo com a mesma pesquisa, reunindo-se os montantes investidos pelos
15 principais anunciantes na praça de Belo Horizonte, chega-se a um total de 175.291,15
milhões de reais. Levando-se em consideração que na capital mineira centenas de
anunciantes dos mais diversos portes em atividade - entre os clientes cadastrados no jornal
Estado de Minas constam mais de 4.900 pessoas jurídicas - é provável que esta quantia
estimada em 1 bilhão esteja próxima da realidade, pelo menos no que diz respeito aos
76
montantes investidos em mídia.
Chamamos a atenção, porém, para o fato de que estes mesmos dados não indicam os
investimentos feitos em ferramentas de comunicação no media - que, como o próprio nome
sugere, são aquelas formas de comunicação que não utilizam os meios de comunicação da
propaganda convencional. Ações promocionais, marketing direto, eventos, material de ponto
de vendas e outros recursos encaixam-se nesta definição - que é onde mais crescem os
investimentos publicitários no momento. Esse universo não mensurado deixa espaço para
especulações sobre esta quantia estimada em 1 bilhão ser subestimada se considerados os
montantes investidos em todas as ferramentas de publicidade.
3.5.2 Os principais setores anunciantes
De acordo com a pesquisa citada do IBOPE Monitor, grandes empresas e redes
nacionais ocupam os primeiros lugares no ranking de anunciantes do setor privado na capital
mineira. Apenas três entre os dez maiores investidores em mídia em Belo Horizonte são de
Minas Gerais:
Anunciante Investimento em R$ (000) Janeiro a dezembro/2003)
Casas Bahia 38.355,50
Unilever Brasil 21.877,63
Ricardo Eletro 13.741,62
Ponto Frio 12.556,40
Telemig Celular 12.308,83
Carrefour 9.886,45
Fiat 9.068,00
Tim Brasil 8.225,91
Liderança 7.919,19
Ford 7.259,64
QUADRO 04 -Ranking de maiores anunciantes de Belo Horizonte por investimento
FONTE: MEIO & MENSAGEM, Regional Minas Gerais, 2004, p. 10.
77
Entre os anunciantes locais, o que aparece com maior investimento é a rede varejista
Ricardo Eletro que, com um investimento de 13,7 milhões de reais, ficou em terceiro lugar no
ranking, atrás de Casas Bahia e Unilever Brasil, empresas internacionais (MEIO &
MENSAGEM, Regional Minas Gerais, 2004). Os outros dois representantes de Minas neste
ranking são a Telemig Celular, que aparece na quinta colocação, e a Fiat Automóveis, que
aparece em sétimo.
Os dados relativos aos setores anunciantes apresentam algumas surpresas. De acordo
com a pesquisa, o setor que mais anunciou em 2003 foi o de lojas de departamento, com um
investimento da ordem de 78,8 milhões de reais, quase o dobro dos investimentos das
campanhas públicas, que tradicionalmente são as maiores do estado.
Apesar do segmento ter aumentado sobremaneira o seu volume de investimentos, as
agências do mercado pouco sentiram este aumento dado o fato de que boa parte dos
anunciantes deste setor ser de fora de Minas. Clientes nacionais e internacionais, como Ponto
Frio e Casas Bahia anunciam via agências de São Paulo, que concentram os investimentos
nacionais de seus clientes.
Como disse um dos entrevistados, sócio de uma das maiores agências do estado:
Minas ainda é dependente da publicidade oficial, governamental, né? O Estado de
Minas Gerais ainda é o maior anunciante de Minas e, apesar dessa relação ter
diminuído nos últimos anos, Minas é um estado que a gente fala que o tem
produto, pela característica da nossa economia. É uma economia de base, de
transformação, é minério, é aço, é gusa... Que não são muito dependentes de
publicidade. (dono de agência)
A mesma visão é compartilhada por outros seus companheiros de mercado. O dono
de uma agência de marketing político observou que o mercado de propaganda em Minas
É governo, governo e governo. E sobra pouca coisa. (dono de agência)
Outros setores que aparecem em destaque são as revendas de automóveis, as
78
campanhas sociais e as empresas de construção e incorporação. Este último, aliás, surpreende
pelo volume dos investimentos, da ordem de 32 milhões de reais, uma vez que o mercado de
construção civil atravessa uma crise que dura dez anos (MEIO & MENSAGEM, Regional
Minas Gerais, 2004, p. 10).
No entanto, vários entrevistados foram taxativos ao citar como pontos fracos do
mercado belo horizontino a grande concentração de indústrias de base em detrimento de
outros segmentos que sejam mais afeitos a anunciar mais e o encolhimento do número de
empresas anunciantes:
Um Jornal Nacional em São Paulo equivale a uma campanha enorme em Belo
Horizonte. Uma única inserção. E eles m clientes pra isso porque eles têm
indústrias de bens de consumo... O que não existe em Minas, ? Nós temos aqui
indústria de bens de capital... Exportamos bens de capital e importamos o produto.
O produto já vem com a propaganda. (dono de agência)
É um estado que por vocação tem uma indústria de base mais forte e pouco
comércio, pouco varejo, uma desproporção, desequilíbrio. Você tem muita
siderurgia, muita coisa, mineração, siderurgia, o sei o que mais. E agravando
isso, de dez anos pra todo segmento de varejo de mercado, de bancos regionais
desapareceu [...] Se voobservar houve um esvaziamento do mercado. (dono de
agência)
O que eu acho que a gente tem de mais fraco é o pouco empresariado mineiro
trabalhando no segmento de varejo. E não é nem por culpa deles, porque recebem
ofertas que valem à pena de você fazer uma fusão, né? (diretor de holding de
varejo)
Além do fato de grandes anunciantes no mercado mineiro serem empresas de fora,
preocupa o empresariado local o fato delas, como forma de entrar em Minas com mais força e
conquistar mercado mais rapidamente, optarem pela compra de empresas regionais, causando
uma drástica redução no número de anunciantes locais.
79
3.5.3 Um mercado que encolheu
Kotler (2000, p. 49) chamava a atenção para o fato de que: “Os varejistas estão
sofrendo devido a uma supersaturação do varejo. Pequenos comerciantes estão sucumbindo ao
poder cada vez maior das superlojas e ‘dominadores de categorias’ (category killers)”. Em
Minas, este “sucumbir” muitas vezes se traduziu na venda dos ativos para grandes varejistas
de porte nacional e internacional.
Redes varejistas inteiras, com ampla tradição de mercado foram englobadas,
“fagocitadas” pelas grandes redes e este movimento trouxe - e continua a trazer - sérias
conseqüências para o mercado publicitário local.
A Casa Guanabara, por exemplo, que tanta influência exerceu sobre o mercado
publicitário de Belo Horizonte, sendo peça-chave para sua profissionalização e
desenvolvimento técnico e qualitativo, deixou de existir. O mesmo aconteceu com Cidagio,
Casa do Rádio e outros.
Um dos entrevistados, dirigente de uma holding de veículos de comunicação que
atuam nos mais diversos meios, cuja carreira se estende mais de 30 anos neste mercado,
salientou que:
Nós vamos falar aqui de no mínimo, no mínimo trinta clientes que a gente o tem
mais hoje no varejo. (Diretor de holding de veículos)
No setor financeiro, outro setor que historicamente foi grande propulsor da
publicidade mineira - e não podemos esquecer que em nosso país os bancos têm uma
conotação bastante próxima do setor varejista, com grandes corporações do setor sendo
chamadas de “bancos de varejo” - deixaram de existir: Banco Nacional, BEMGE, Minascaixa,
Credireal, entre outros.
80
Outro entrevistado fez questão de enumerar entre os pontos fracos do mercado de
Belo Horizonte a fuga desses investimentos. Além dos bancos, ele enumera que no varejo não
foram somente as lojas de departamentos, ou de eletrodomésticos que foram incorporadas
pelos grandes de fora, cita também supermercados locais que passaram pelo mesmo processo
sem, no entanto, citar nomes.
Um terceiro entrevistado, dono de uma agência especializada em marketing político,
lembrou ainda a transferência da sede da construtora Andrade Gutierrez para São Paulo e a
perda que significou a aquisição da telefonia fixa da extinta Telemig - que era grande
anunciante - pela Telemar, posto que a conta desta é atendida por agências de fora de Belo
Horizonte. E outro entrevistado ainda citou a rede de supermercados Bom Marché entre os
clientes que desapareceram ao serem incorporados aos ativos de outras marcas.
Para os veículos de comunicação, a depender do meio em que atuam, esta fuga é
menos sentida. O entrevistado que é preposto de holding de veículos fez uma análise bem
sucinta deste cenário:
Na verdade é o seguinte: no jornal, essa queda, ela é menor porque aonde esse cara
vai? Ele vai ser cliente de jornal, né? É. No rádio, também, aonde ele for, você não
tem muito problema porque ele continua. Agora o caso da televisão é mais
complicado, porque nós somos afiliadas de uma emissora. Então quando esse
cliente vai embora e é fechado pela cabeça de rede, esse dinheiro normalmente vai
pra cabeça de rede. Então o mercado de televisão deve ter sentido isso mais.
(diretor de holding de veículos)
Como pode-se ver pelo comentário, o cliente, mesmo anunciando via agências de
fora, para o meio jornal e para o meio rádio, pelo fato dos veículos serem caracterizadamente
locais, continua rendendo o mesmo montante que renderia se o fizesse por intermédio de
agências locais. Para o meio TV, porém, essa fuga é mais sentida, pois a cabeça de rede,
que é a matriz da rede, fica com a maior parte daquilo que é fechado por seu intermédio para
veiculação em emissoras afiliadas, repassando a estas últimas apenas um percentual pelo uso
do seu espaço. As perdas, porém, são ainda maiores para o segmento de agências e,
81
conseqüentemente, há também uma redução das oportunidades de trabalho para publicitários.
Outro fator de redução no número de anunciantes citado durante uma entrevista foi o
avanço dos shopping centers:
O que acontece no shopping center? Eles, o grupo de empresas que compõem o
shopping, ele faz o investimento na marca ‘shopping’, não faz investimentos nas
marcas individuais de cada um. Então todo mundo que dentro do shopping, que
virou opção quase que obrigatória pra permanecer no comércio durante um tempo,
porque o shopping virou uma febre [...] Então, onde entra a propaganda da loja?
Ao invés de investir na marca dela, ela investe, ela entrega o dinheiro para o
shopping investir no ponto [...] Então muitas empresas que parecem que sumiram
não sumiram, estão aí, estão tudo dentro dos shoppings e quem anuncia é o
shopping, quem aparece é o shopping que, aliás, é um péssimo cliente que paga
muito mal. (dono de agência)
Outra análise interessante, que ajuda a compreender a retração do mercado de
propaganda em Belo Horizonte é a seguinte:
Hoje é um mercado extremamente disputado que diminuiu muito. O que acontece
com a propaganda é o resultado direto da economia [...] Então vamos ver o que
aconteceu com a economia: os produtos ficaram cada vez mais parecidos, as
margens diminuíram significativamente, isso significa que a possibilidade de
investimento do cliente, do produto, hoje é menor. Antigamente eu tinha clientes que
faziam televisão com uma facilidade incrível, compravam Jornal Nacional. Hoje, o
cliente comprar Jornal Nacional é uma festa. A gente compra bolo, estoura
champanhe, entendeu? Se você olhar a televisão hoje, você vai ver que uma
tendência muito grande, principalmente a Globo, que é o padrão, ? E você
propaganda nacional. Minas tem um defeito terrível, cruel, é... os paulistas, as vezes
nos julgam mal, falam da nossa... do nosso tradicionalismo e você o paulista
aqui literalmente cavando minhoca no asfalto como nós fazemos. Porque um Jornal
Nacional em São Paulo equivale a uma campanha enorme em Belo Horizonte. Uma
única inserção. E eles têm clientes pra isso porque eles m industrias de bens de
consumo. (dono de agência)
Então, pelo exposto aaqui, pode-se ver que a retração afeta todo o mercado, mas
para as agências, o problema é ainda maior, pois além de contar com menos clientes, a disputa
é cada vez mais acirrada posto que a concorrência é cada vez mais numerosa e agressiva,
incluindo desde corretores e pequenas agências locais e indo até mesmo a grandes grupos
vindos de fora.
Um dos coordenadores de curso entrevistados, em poucas palavras, resumiu o
cenário:
82
Na verdade, o mercado pequeno é um mercado em transformação, quer dizer, nos
anos 80 você tinha uma expectativa muito grande de expansão do mercado
publicitário, em dez anos ele encolheu... Grandes anunciantes mudaram de lugar...
Há uma concentração de agências, inclusive, né? (coordenador de curso).
3.5.4 As agências de propaganda de Belo Horizonte: um segmento difícil de mensurar
Hoje, segundo dados fornecidos pelo jornal Estado de Minas (2004), o mercado
mineiro conta com mais de 1.200 agências, sendo que pelo menos 700 destas ficam em Belo
Horizonte.
Aliás, cabe aqui outra ressalva: na ausência de um banco de dados comum a todos os
representantes do mercado publicitário e à baixa adesão das agências às associações de classe
como ABAP-MG e SINDAPRO-MG, convencionou-se, para este estudo que o jornal Estado
de Minas - por ser o segundo maior veículo de comunicação do estado em faturamento, de
acordo com pesquisa IBOPE Monitor publicada no Meio & Mensagem (Regional Minas
Gerais, 2004, p. 10) e pelo perfil do meio jornal reunir o maior número de anunciantes dos
mais diversos portes - constituiria o ponto de referência para dimensionamento do mercado
publicitário de Belo Horizonte no que tange a quantidades de agências, corretores, clientes
diretos e outros dados afins.
A mesma fonte indica que o número de agências diminuiu aproximadamente 10%
nos últimos três anos, o que reflete o período de recessão pelo qual o mercado publicitário
nacional passou entre 2001 e 2003 e já abordado anteriormente. Esta diminuição não significa
necessariamente que todas estas agências tenham se retirado do mercado. A fusão entre
agências, com a intenção de ganhar, ou recuperar, forças é comum - conforme visto no breve
histórico da propaganda em Minas. A Sofia Propaganda juntou-se à Contexto Propaganda no
início de 2004 (MEIO & MENSAGEM, Regional Minas Gerais, 2004, p. 6) com esta
83
intenção. E durante as entrevistas surgiu um caso semelhante:
Só que o mercado tá tão maluco, tão pesado, que mesmo eles tendo clientes eles não
conseguiam se manter. Precisava de uma estrutura. E eu tenho a estrutura, eles
tinham os clientes, então fizemos um acordo. (Dono de agência)
Além das fusões acontece outro movimento de mercado: agências pequenas que não
deram certo fecham, mas em seu rastro outras tantas abrem, em função de uma dinâmica que
será melhor analisada mais adiante neste estudo.
Dentre os 1.200 cadastrados no Estado de Minas, pelo menos 360 são corretores
autônomos, que no mercado local costuma-se chamar de “eugências”, dado o fato de que estes
indivíduos costumam ser agências de um homem só. Estes corretores são responsáveis por
algo em torno de 8% do faturamento do jornal que serviu de fonte para este estudo. Este dado,
quando cruzado com a pesquisa IBOPE Monitor, publicada no caderno regional do Meio &
Mensagem (2004, p. 10), resulta num montante de mais de 14,4 milhões de reais canalizados,
no ano de 2003, por corretores somente no jornal Estado de Minas.
Entre os dados passados pelo jornal Estado de Minas, está a informação de que as
agências de publicidade e propaganda são responsáveis por 83% do montante faturado via
pessoas jurídicas. Excluindo-se os clientes que anunciam por meio das lojas e via telefone.
Então, se 83% do faturamento ocorre via agências e 8% via corretores, deduz-se que 9% dos
clientes anunciam diretamente, isto é: sem corretagem por parte de nenhum agenciador,
negociando diretamente com o veículo.
Na maior parte das vezes em que um cliente opta por anunciar diretamente, ocorre do
mesmo o fazer de olho em transformar em desconto para si o percentual de comissionamento
pago à agência de propaganda. Apesar de alguns anunciantes antigos terem por hábito este
recurso, é muito comum anunciantes neófitos recorrerem a este expediente quando começam a
anunciar e, mais tarde, quando aumentam seus investimentos, acabam por se convencer da
84
necessidade de contratar especialistas para assessorá-los. Dito isto, é possível deduzir que
dentre estes anunciantes ditos diretos, que em 2003 responderam por 9% do faturamento do
jornal Estado de Minas - o que equivale a R$16.231 milhões, somente em um veículo do
mercado, conforme a pesquisa IBOPE/Monitor - espaço de manobra para que agências e
corretores prospectem novos clientes para suas carteiras.
Ainda de acordo com os dados do Estado de Minas, aproximadamente 30% do total
faturado pelo veículo via agências é procedente de agências de fora de Minas Gerais. Dos
70% restantes, o jornal alegou não ter como distinguir o que é procedente de Belo Horizonte e
o que é procedente de agências de outras praças do estado.
Este é um dado importante. A preocupação com relação aos montantes cada vez
maiores de investimentos publicitários canalizados para os veículos locais por agências de
fora de Belo Horizonte é uma constante no mercado, que foi mencionada por vários dos
entrevistados que participaram deste estudo.
As preocupações com relação às agências de fora, porém, não param por aí. A
disputa pelas contas que permanecem no estado atrai não somente as agências e corretores de
Belo Horizonte e/ou de outras localidades de Minas. Agências de São Paulo e de outros
estados também andam rondando o mercado local e, ocasionalmente, “beliscando” contas
tidas como importantes para as agências mineiras.
3.5.5 A disputa sem fronteiras
No início de 2004, o BH Shopping, o shopping center mais antigo e tradicional de
Belo Horizonte transferiu sua conta publicitária da mineira SMPB, com quem havia
permanecido por 15 anos, para a paulista Loducca. Já o Shopping Del Rey, que atuava com a
85
agência local Lápis Raro, transferiu sua conta para a Rezende & Rezende, do Rio de Janeiro
(MEIO & MENSAGEM, Regional Minas Gerais, 2004, p. 3). Esta movimentação causou
alvoroço no mercado e fez vir à baila um assunto que incomodava os publicitários locais: a
disputa interestadual de contas publicitárias.
Ao referir-se à “sociedade em rede”, Castells (1999) observa que o próprio
capitalismo vem passando por um processo de profunda reestruturação, caracterizada por uma
maior flexibilidade de gerenciamento, descentralização das empresas e a organização das
mesmas em redes, tanto interna quanto externamente.
Ainda de acordo com o mesmo autor:
Para aumentar os lucros em um determinado ambiente financeiro e com os preços
ajustados pelo mercado, quatro caminhos principais: reduzir os custos de
produção (começando pelos custos de mão de obra); aumentar a produtividade;
ampliar o mercado; e acelerar o giro do capital. (CASTELLS, 1999, p. 137).
Os custos de mão-de-obra na atividade publicitária foram drasticamente reduzidos
com a introdução e evolução da informática. Várias atividades que compunham o processo de
produção, tanto dentro da agência quanto em fornecedores, foram extintas, substituídas por
recursos de computador e periféricos. Paste-up, desenhistas de tipos, “leiautistas”,
fotocomposição, entre outros, são custos que não mais existem. Esta evolução tecnológica
também acarretou uma redução no tempo de criação e execução dos leiautes, aumentando a
produtividade - o que se traduz em ganhos reais.
Os custos de mão-de-obra nas funções que não foram substituídas pela tecnologia
também já se reduziram bastante. A quantidade de profissionais disponíveis no mercado,
devido ao grande número de cursos, é um dos fatores primordiais desta redução. Um dos
entrevistados, coordenador de curso de uma faculdade de Belo Horizonte, chamou a atenção
para o fato de que:
Se todos os alunos pensam em emprego dentro das agências, teremos um
86
batalhão de desempregados. (coordenadora de curso)
Esta pressão de candidatos a empregos certamente empurra os salários para baixo.
Outro entrevistado, publicitário com mais de 15 anos de mercado e atuando em agência frisou
que:
Pra profissionais de mercado, a valorização é muito difícil. (publicitário)
Um entrevistado, chegou a dizer, ao se referir a profissionais de publicidade, que
sabe que:
Muita gente também tá morrendo de fome. (coordenador de curso)
E, além de colaborar para reduzir o valor nominal dos salários, esta pressão também
acarreta a precarização das garantias trabalhistas, conforme ver-se-á adiante.
Com relação a acelerar o giro do capital, o próprio mercado de propaganda exige
muito pouca imobilização de capital de giro. Não há, praticamente, a necessidade de grandes
estoques de insumos caros, o que permite inclusive acelerar os ganhos de capital no mercado
financeiro aproveitando que os juros pagos no Brasil são espetaculares, conforme é possível
constatar observando-se na figura 01:
FIGURA 01 - Evolução da Taxa de Juros
FONTE: Banco Central apud RIBEIRO, 2004.
Tudo isso, claro, contribuiu para aumentar a lucratividade do setor. Mas aumentar a
lucratividade, sozinha, não representa crescimento. Para que a mesma se traduza em
crescimento, principalmente num mercado tão populoso, coalhado de concorrentes de todos os
87
tamanhos, é preciso que haja competitividade. E competitividade, no que diz respeito a
empresas, “significa simplesmente a capacidade de conquistar fatias de mercado”
(CASTELLS, 1999, p. 141).
Chandler (1990, p. 330-331), em seus Ensaios para uma Teoria Histórica da Grande
Empresa, observa que a empresa industrial (e a publicidade é uma indústria) cresce de quatro
maneiras: adquirindo ou associando-se a outras empresas que utilizam os mesmos processos,
no dito crescimento por associação horizontal; incorporando unidades que exercem trabalhos
de etapas anteriores e posteriores no processo de fabricação de seu produto, no crescimento
por integração vertical; expandindo-se geograficamente; aproveitando as tecnologias ou os
mercados de que a empresa dispõe para criar novos produtos. As duas primeiras formas,
segundo o autor, são defensivas. Nas outras duas, as empresas aproveitam “os investimentos
existentes e sobretudo a capacidade organizacional existente para ingressar em novos
mercados e novas atividades”. O que vem ocorrendo com a publicidade nacional encaixa-se
perfeitamente nestes dois últimos casos.
Com relação ao oferecimento de novos produtos, este tema será abordado mais à
frente, quando dos comentários acerca do crescimento das ferramentas de no media. Mas no
que diz respeito à expansão geográfica das agências de propaganda, este é um movimento de
duas mãos no mercado mineiro: agências de fora, a exemplo da Loducca e da Rezende e
Rezende, citadas no início deste tópico, buscam crescer entrando em novos mercados
geográficos, tais como Belo Horizonte. E agências de Belo Horizonte buscam o crescimento
expandindo suas operações a outros mercados geográficos.
Entre as onze agências de Belo Horizonte, sendo nove afiliadas ao Sindapro, que
responderam ao questionário enviado via Internet, nove operam em outras praças. O interior
de Minas, Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Pernambuco, Espírito Santo, Bahia e
até o longínquo Acre aparecem como alvos das agências locais.
88
As formas de inserção das agências em outros mercados que não os seus de origem é
tema recorrente nas publicações especializadas. As opções mais comuns são: o trabalho à
distância, aproveitando as ferramentas de comunicação hoje disponíveis, como a Loducca
hoje faz com o BH Shopping (MEIO & MENSAGEM, Regional Minas Gerais, 2004, p. 3); os
acordos operacionais, em que a agência que tem uma conta nacional, por exemplo,
subcontrata agências locais para o atendimento local daquela conta, a exemplo do que a
Almap faz com a DNA em relação ao varejo da Fiat; a abertura de um escritório local para
atendimento e negociações com veículos e fornecedores locais, mantendo, porém, os trabalhos
de criação e planejamento na matriz e; a abertura de uma estrutura completa (mesmo que
enxuta) no local em que o cliente se encontra, como fez inicialmente a Publivendas, baiana de
origem que abriu uma estrutura em Belo Horizonte para atender à TIM Celular e hoje é uma
agência de destaque no mercado local.
Esta expansão geográfica das agências de propaganda em busca de novos mercados é
um fenômeno internacional de longa data. É antiga a relação de grandes nomes da propaganda
mundial, como McCann-Erickson e J. W. Thompson com outros mercados que não os seus de
origem, inclusive o brasileiro. Elas atuam décadas em nosso país usando suas próprias
marcas e em estruturas próprias. E, mesmo nacionalmente, movimentos nesse sentido foram
feitos e desfeitos de acordo com a situação da economia e dos mercados locais. Na própria
história da propaganda mineira foram determinantes as contribuições de Standard, Norton,
McCann-Erickson e outras.
O que é novo nessa movimentação de expansão geográfica é a iniciativa das agências
tradicionalmente locais, originárias de mercados tipicamente regionais, de buscarem contas
em outras praças que não as suas de origem - o que antes acontecia com contas públicas,
devido a ligações políticas - e isso porque está difícil crescer em mercados limitados em
termos de contas.
89
3.5.6 Uma disputa sangrenta
Henderson (1999, p. 4) diz que: “Se todos os negócios pudessem crescer
indefinidamente, o mercado total cresceria até uma dimensão infinita em um planeta finito.
Isso nunca aconteceu - concorrentes em número crescente acabam sempre por eliminar uns
aos outros”.
O princípio de Gause apud Henderson (1999, p. 4) reza que: “Competidores que
conseguem seu sustento de maneira idêntica não podem coexistir”. Os competidores podem
até se parecer, mas aplicam estratégias distintas, que os tornam únicos.
O que diferencia os competidores em negócios pode ser o preço de venda, as
funções, a utilização do tempo, ou a vantagem da localização... Ou pode não ser
nada disso, mas apenas a percepção que o cliente tem de um produto e de seu
fornecedor. E, sem dúvida alguma, a percepção é freqüentemente a única base de
comparação entre alternativas semelhantes. (HENDERSON, 1999, p. 5).
E o próprio Henderson (1999, p. 5) arremata, afirmando que num ambiente
competitivo “o objetivo deve ser aumentar o escopo de sua vantagem, o que só pode acontecer
se alguém perder com isso”.
Usando estas observações como ponto de referência para uma breve reflexão acerca
do mercado Belo Horizontino de propaganda - com cada vez menos anunciantes de porte,
mais de 700 agências e mais de 300 corretores - é possível imaginar o quão tumultuado está
este ambiente de negócios. A título de ilustração, cabe a observação de um dos entrevistados,
dono de agência, que começou como corretor:
Belo Horizonte hoje tem... Alguma coisa em torno de seiscentas agências de
propaganda. Oitenta por cento na mais completa indigência. Prestando serviços de
quinta categoria. (dono de agência)
Mais adiante, na mesma entrevista, ele faz questão de frisar que a questão é a postura
da agência e não o porte da mesma, salientando que:
90
Muitos que estão aí, no mercado, prestam um trabalho muito importante que é o
primeiro contato do cliente com a comunicação. É aquele cara que vai na lojinha
que acabou de abrir e faz ela anunciar pro público. (dono de agência)
Um entrevistado, também dono de agência, chamou a atenção para o fato de que:
É um grande número de pequenas agências, aonde uma dupla de criação abre uma
pequena agência e atende também. Eu vejo o mercado muito confuso ainda, o
mercado mineiro. (dono de agência de marketing político)
Pelo visto até aqui, é fácil concluir que este cenário, repleto de agências e corretores,
é muito mais decorrente de outros fatores que não das oportunidades que se apresentam, posto
que o mercado, em termos de clientes com capacidade de impulsionar e manter agências de
propaganda vem se reduzindo.
Em entrevista com os donos de uma pequena agência que acaba de abrir, foi possível
deduzir algumas dessas razões que, combinadas, fazem com que profissionais da área optem
por abrir seu próprio negócio.
A maioria das razões que levam profissionais a optarem por abrir sua própria agência
em lugar de buscar emprego nas existentes está ligada ao excesso de mão-de-obra
disponível no mercado. Quanto maior a oferta, menor é o preço, diz a “lei” da oferta e da
procura. Os salários, como foi citado, baixaram sobremaneira. Uma entrevistada, graduada
em jornalismo, com pelo menos oito anos de mercado publicitário, com a experiência de já ter
dirigido o departamento de promoções de uma das maiores rádios FM de Belo Horizonte e
egressa de uma agência de promoções desabafou:
Você sabe quanto eu ganhava pra produzir tudo quanto é evento da Telemig
Celular? Mil e duzentos reais por mês. (dona de agência de promoções)
Santos apud Frigotto (2001) alerta para o fato de que grupos sociais vulnerabilizados
pela precariedade do trabalho e que apresentam altos níveis de ansiedade e insegurança quanto
ao presente e ao futuro e baixos horizontes de expectativas, dispõem-se a suportar grandes
encargos em trocas de reduções mínimas de riscos e inseguranças. Tudo isso se traduz na
91
precarização das condições de trabalho. Na mesma agência da qual a entrevistada citada no
parágrafo anterior trabalhou, apenas o pessoal de recepção, serviços gerais e auxiliares do
administrativo/financeiro têm carteira assinada, todos os outros são pessoas jurídicas que
recebem pagamento mediante apresentação de notas fiscais. Esse dado foi confirmado em
conversa com o presidente da empresa, que entre suas justificativas frisou que:
Em São Paulo todo mundo trabalha assim... Aqui, na (ele citou o nome de uma
das maiores agências de BH), também, é todo mundo pessoa jurídica. (dono de
agência de promoções)
No que diz respeito a esta prática em Belo Horizonte, o que é possível constatar, com
base nos questionários respondidos, é que a mesma é bastante difundida. Há agências de todos
os portes trabalhando com altos índices de indivíduos trabalhando sob regime de prestador de
serviços. agência com 27 funcionários e 15 destes sob tal regime; com 10 funcionários e 5
sob tal regime; com 50 funcionários, sendo 20 prestadores de serviços; e até agências com
6 funcionários, sendo 2 prestadores de serviços. Apesar dos índices variarem, é factível
deduzir que a prática é, realmente, bastante disseminada neste mercado.
A entrevistada chamou a atenção, ainda, para o fato de que ao ser demitida sem justa
causa
Eles me pagaram apenas o aviso prévio, férias e décimo terceiro proporcionais.
Quando eu questionei o não pagamento do montante equivalente a 40% do que
seria o meu FGTS no período e salário desemprego pelo período que eu ficasse
inativa, o (nome de um dos sócios da agência) mandou me dizer, então, que eles
não iam me pagar nada e que eu entrasse na justiça para receber aquilo que eu
achava a que tinha direito... Como eu precisava do dinheiro e fiquei com medo de
que eles me queimassem no mercado, topei a proposta deles, mas ainda não me
decidi se vou colocar eles na justiça ou não. (dona de agência de promoções)
Mas dificuldades em conseguir uma colocação - ou recolocação - no mercado não são
as únicas razões apontadas para se abrir uma agência: os baixos custos de entrada e de saída
desse mercado fazem com que os entrantes arrisquem suas chances:
Nós quatro estamos, na verdade, montando uma parceria... Nós somos parceiros...
Cada um de nós está trazendo aquilo que pode. Eu trouxe meu computador, minha
92
sócia e um dos cios, cada um trouxe o seu... O frigobar é meu, de casa, que eu
trouxe, os aparelhos de telefone, também, cada um trouxe um... Essa bancada a
gente ganhou [...] O aluguel, luz, telefone e o Velox a gente divide. (dona de agência
de promoções)
Para que possamos entender um pouco melhor esta “parceria” citada pela
entrevistada, ela é jornalista, mas trabalha como produtora de promoções e eventos, um dos
sócios, graduado em propaganda, é diretor de arte, com passagem por uma agência de porte
médio, uma sócia é recém-graduada em propaganda e publicidade, que já atuou como
“tráfego” em uma agência de grande porte de BH e cujo pai é um sujeito tido por eles como
influente que pode indicar a gente para alguns clientes e o quarto e último sócio é um
primo da primeira, que tem nível superior incompleto em turismo e hotelaria e é “uma espécie
de faz tudo. É um cara que pode supervisionar a montagem de uma estrutura, ou
supervisionar uma promoção enquanto nós estamos tocando outras coisas”.
Enquanto o mercado de propaganda vem encolhendo em números de anunciantes e
conta com uma enorme quantidade de agências disputando este bolo, outros segmentos do
mercado publicitário que vêm demonstrando uma pujança que poucos setores da economia
nacional estão habituados a vivenciar. O setor de marketing promocional, por exemplo, é um
deles. Esta afirmação, apesar de simples e fácil de comprovar com dados, como será feito no
próximo tópico, levanta algumas questões bastante procedentes, pois enquanto a agência de
propaganda convencional segue como o paradigma das organizações de publicidade, a
atividade se espalha pelas mais diversas ferramentas de comunicação e suscita maiores
discussões acerca da manutenção de tal conceito - especialmente no que diz respeito às
escolas.
93
4 AS ESCOLAS DE PUBLICIDADE E PROPAGANDA
4.1 A história do ensino de publicidade e propaganda no Brasil
As informações do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio
Teixeira (INEP) indicam que havia cursos de Publicidade e Propaganda no Brasil em 1934.
Apesar de constar no sítio de um órgão pertencente ao Ministério da Educação, para alguns
autores esta informação está equivocada (MELO; FADUL; SILVA, 1979; MARTENSEN,
1990).
Independente desta discussão, pelo menos duas formas de contar a história do
ensino da publicidade no País: uma sob o ponto de vista da academia, que dá ênfase à criação
e implantação de cursos de nível superior; e outra sob o ponto de vista do mercado, que se
importa mais com o como a propaganda tem sido ensinada/aprendida no País, independente
de em qual tipo de organização se deu esta passagem de conhecimentos.
Melo, Fadul e Silva (1979), ao descrever a trajetória de criação e evolução dos cursos
de comunicação social no Brasil, atribui a Cásper Libero a criação da primeira escola para a
formação de comunicadores do País, em São Paulo, no início da década de 1940. Antes dele,
ainda na década de 30, Anísio Teixeira havia tentado implantar um projeto pioneiro na
Universidade do Distrito Federal, mas não foi bem sucedido.
A iniciativa de Cásper Libero visava a formação de jornalistas. Durante algum
tempo, os cursos de comunicação existentes no País eram cursos de jornalismo. Apenas na
década de 60 as escolas de jornalismo se tornaram escolas de comunicação “abrindo um leque
muito mais extenso de alternativas para as novas funções criadas pelo desenvolvimento
94
urbano-industrial” (MELO; FADUL; SILVA, 1979, p. 36).
Martensen (1990), porém, nos apresenta uma outra visão, que se poderia descrever
como uma leitura a partir do mercado. Esta história do ensino da propaganda, em seu início
pelo menos, confunde-se com a história da propaganda no Brasil. “Na pré-história publicitária
do Brasil não se ensinava propaganda. Aprendia-se” (MARTENSEN, 1990, p. 32). Desde
1824, quando Pierre Plancher instituiu os anúncios classificados nas publicações O
Espectador Brasileiro e Almanaque dos Negociantes, podemos dizer que havia
publicitários no País. Pouco tempo depois, em Pernambuco havia um jornal, o Diário de
Pernambuco, que se apresentava como “Um diário de Anúncios” e que contava com sete
“agênciasde recolhimento de reclames. No entanto não informações sobre quem criava
tais anúncios, muito menos sobre qual formação estes “publicitários” teriam.
Na década de 1910 alguns grandes ilustradores, escritores e poetas de destaque no
cenário nacional, apesar de não terem qualquer formação voltada para esta profissão,
arriscavam seus passos na atividade publicitária. Entre estes autodidatas, destacamos a
presença de Olavo Bilac.
A partir de 1926, porém, a atividade publicitária começou a ser ensinada no País.
Não através de escolas, mas através do exemplo de quem dominava as técnicas da época: data
deste ano a instalação do Departamento de Propaganda da General Motors no Brasil.
Convivendo com todo o know how do competitivo mercado norte-americano de propaganda,
os profissionais brasileiros que trabalharam nesta unidade foram os primeiros que aprenderam
as modernas técnicas para se criar, produzir e veicular anúncios verdadeiramente produtivos.
Esta experiência serviu de base a todo o desenvolvimento da publicidade no Brasil
(MARTENSEN, 1990).
Ainda na década de 1920, a J. Walter Thompson foi a primeira agência de
95
propaganda estrangeira a abrir seu escritório no País. Logo em seguida, para atender a conta
da Ford, veio a Ayer. Ambas abriram seus escritórios em São Paulo, mas a Ayer abriu uma
filial no Rio de Janeiro, onde também atuava Armando D´Almeida, que associado à Foreign
Advertising fundou a Inter-Americana. Estes núcleos eram, nas palavras de Martensen (1990,
p. 33) “autênticos navios-escola da propaganda”.
Como o crescimento da J. Walter Thompson se deu de maneira vertiginosa, a agência
“viu-se forçada a recrutar e desenvolver talentos com extrema velocidade”. Em função desta
necessidade, desenvolveu o sistema de trainees, cujo programa era um verdadeiro curso
prático, que passava por todos os departamentos da agência (MARTENSEN, 1990, p. 33).
Com a chegada de outras multinacionais, como McCann-Erickson e Lintas, e o
desenvolvimento de grandes agências nacionais como a Norton, a Inter-Americana e a
Standard, e todas elas sentindo a necessidade premente de preparar mão-de-obra, os
programas de estágio se multiplicaram.
À essa altura já existiam, no Rio de Janeiro e em São Paulo, associações de classe.
Estas entidades, principalmente a Associação Brasileira de Propaganda e a Associação
Paulista de Propaganda, promoviam, esporadicamente, cursos de curta duração, no sentido de
auxiliar as agências na formação de novos profissionais para este negócio que crescia
rapidamente.
Com o passar do tempo, todavia, alguns empresários do ramo
Não se conformaram em transformar seus negócios em casas de ensino e passaram a
oferecer salários tentadores a elementos treinados pela concorrência. Travou-se,
então, a luta do ‘Quem dá mais?’. Surgiu o vedetismo. A inflação dos salários
atingiu cifras absurdas. Alguma coisa precisaria ser feita. (MARTENSEN, 1990, p.
35).
Em dezembro de 1950, devido à importância que a propaganda havia adquirido no
mercado brasileiro, o Museu de Arte de São Paulo (MASP) organizou o Primeiro Salão
96
Brasileiro de Propaganda, cujo público foi tão numeroso que despertou no MASP a intenção
de incluir a Arte Publicitária no currículo do seu Instituto de Arte Contemporânea.
Convidado para montar tal curso, Rodolfo Lima Martensen, ao analisar a questão,
concluiu que um curso de arte publicitária seria insuficiente. Era preciso ensinar também,
além das técnicas de criação, as técnicas de planejamento, pesquisa de mercado, veiculação,
promoção de vendas, produção gráfica e eletrônica e passar noções realistas das
responsabilidades sócio-econômicas da publicidade e do publicitário... Era preciso uma
faculdade.
Após visitar os cursos da Federation Française de la Publicité e da British
Advertising Association, Lima Martensen desenvolveu e, em outubro de 1951, apresentou a
Assis Chateaubriand - o mecenas desta iniciativa pioneira - o projeto da primeira escola de
propaganda no Brasil.
Em março de 1952 foi lançado o primeiro curso, com duração de dois anos. Os
principais nomes de destaque em cada área constituíam o corpo docente. A seleção dos
mesmos deu-se pelos seus conhecimentos práticos e não pela formação acadêmica ou
capacidade didática. Ensinavam o que sabiam fazer. Eram os diretores e presidentes das
maiores agências, veículos e anunciantes. Linneu Schützer e Oswaldo Sangiorgi, da USP,
ajudaram com sua experiência pedagógica e participaram da seleção das primeiras turmas. O
“lar” desta escola era o MASP.
O sucesso foi imediato e em 1955 Pietro Maria Bardi, diretor do MASP, decretou
que “a Escola de Propaganda cresceu demais” e que, devido às proporções que tomara, teria
que sair do museu. Com o apoio financeiro de agências, veículos, anunciantes e fornecedores,
a Escola assumiu sua auto-suficiência. Com a mudança, a instituição passou a se denominar
Escola de Propaganda de São Paulo.
97
A escola, que desde 1961 se denominou Escola Superior de Propaganda de São Paulo
(ESPSP), foi a única a ensinar propaganda no País até 1968, quando foi lançada a semente do
que viria a ser a Faculdade de Comunicação Social Anhembi. Neste mesmo ano a ESPSP
mudou seu nome para Escola Superior de Propaganda e Marketing, ou ESPM.
Nesta mesma época a USP e a ESPM fizeram uma tentativa de levar esta última, com
toda sua experiência e corpo docente, para dentro de sua Faculdade de Comunicação. Apesar
da experiência não ter sido duradoura, resultou dela a criação da Escola de Comunicação e
Artes (ECA) da Universidade de São Paulo. No rastro dessas experiências surgiram as
faculdades de comunicação da Fundação Álvares Penteado, Alcântara Machado, Curso
Objetivo e outras, tanto em São Paulo quanto em outros pontos do Brasil. Houve uma
verdadeira “explosão do ensino da comunicação no Brasil” (SCHERB apud MARTENSEN,
1990, p. 36). A comunicação realmente “estourou” no País e em 1976 havia 53 faculdades
de comunicação espalhadas pelo Brasil (11 públicas e 42 particulares). De acordo com Otto
Scherb, então presidente da ESPM, tal quantidade de instituições de ensino da comunicação
em nível superior, à época, não encontrava paralelo em nenhum lugar do mundo.
O pragmatismo dos primeiros dias de ensino da propaganda no país havia cedido
lugar ao que Scherb chamou de “hábil aproveitamento das condições de mercado por parte
dos empresários do ensino” (MARTENSEN, 1990, p. 36).
Em 1990, Martensen já observava que
É certo que nada de condenável existe em obter lucro com o ensino de qualquer
matéria. O magistério é um esforço dos mais dignos e penosos, merecendo ser bem
remunerado. O que preocupa é esta comercialização ter promovido exageradamente
as oportunidades de emprego que o negócio da propaganda brasileira pode oferecer
a essa multidão de comunicólogos que as faculdades lançam anualmente no
mercado. (MARTENSEN, 1990, p. 36).
É importante observar que, se em 1990, quando ainda não existia nem a metade dos
cursos de publicidade e propaganda que hoje grassam pelo País (INEP, 2004), já se chamava a
98
atenção para os perigos da falta de correspondência entre o número de vagas oferecidas nos
cursos disponíveis e a capacidade do mercado de trabalho absorver estes novos profissionais,
a questão hoje assume uma nova dimensão.
4.2 Os cursos de publicidade e propaganda de Belo Horizonte neste cenário
Como vimos, atualmente existem no Brasil 344 cursos de graduação em
Publicidade e Propaganda, oferecendo mais de 40.000 vagas/ano
2
(INEP, 2004). Destes
cursos, 280 foram criados após 1995. Hoje não unidade da União que não tenha pelo
menos um curso de Comunicação Social com Habilitação em Publicidade Propaganda.
Pelo menos 142 destes cursos iniciaram suas atividades em 2000, ou depois disso, o
que implica em duas questões: a) há um contingente imenso de estudantes “represados” nessas
instituições e prestes a engrossar os números de egressos à procura de oportunidades no
mercado de trabalho e; b) como ainda não graduaram a primeira turma, estes cursos ainda não
foram avaliados, portanto não temos como saber das qualidades destes futuros egressos, suas
competências e limitações.
São Paulo é a unidade da Federação que mais cursos tem: 121.
Minas Gerais é o segundo estado com mais cursos, com 31 cursos funcionando em
2004. Dos 11 que funcionam em Belo Horizonte, apenas três são anteriores a 1998: o da
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG), o da Universidade Federal de
Minas Gerais (UFMG) e o do Centro Universitário de Belo Horizonte (UNI-BH). Dos oito
2
Nas informações sobre algumas instituições o número de vagas autorizadas não está disponível; também não
estão disponíveis as informações sobre número de processos seletivos por ano para as instituições autorizadas
a funcionar em caráter semestral, portanto contabilizou-se apenas um processo seletivo por ano por
instituição, mesmo sabendo-se que este critério subdimensionaria o universo em questão.
99
cursos restantes, sete iniciaram suas atividades no ano 2000 ou depois disso.
Os estudantes interessados em cursar Publicidade e Propaganda em Belo Horizonte,
no início de 2004 terão à sua disposição 1.045 vagas. Como a maior parte das instituições
privadas realiza mais de um processo seletivo por ano, este número praticamente duplicará,
aumentando o represamento de candidatos ao ingresso no mercado de trabalho.
Outro problema que se aproxima é que este mesmo fenômeno do represamento se
repete no interior de Minas, que conta com 22 cursos; em São Paulo que conta com 121
cursos e no Rio de Janeiro, que conta com 26 cursos. Todas estas localidades são muito
próximas de Belo Horizonte e será inevitável, com a inundação de egressos que se espera para
daqui a poucos anos, a invasão de profissionais de outros centros cujos mercados tenha
atingido determinado nível de saturação. Vale ressaltar que após a graduação da primeira
turma, a cada novo semestre uma nova turma graduará, num crescendo cujo ritmo dificilmente
será igualado pelo mercado mesmo que haja uma grande retomada do crescimento econômico.
Neste contexto, as competências desenvolvidas pelas faculdades da capital mineira podem se
apresentar como o diferencial para concorrer no mercado altamente competitivo em que estão
inseridas.
4.3 A escola e a inflação de diplomas
As estratégias de reprodução e, em particular, as estratégias de reconversão pelas
quais os indivíduos ou as famílias visam a manter ou melhorar sua posição no espaço
social, mantendo ou aumentando seu capital ao preço de uma reconversão de uma
espécie de capital numa outra mais rentável e/ou mais legítima (por exemplo, do
capital econômico em capital cultural), dependem das oportunidades objetivas de
lucro que são oferecidas aos seus investimentos num estado determinado dos
instrumentos institucionalizados de reprodução (estado da tradição e da lei
sucessorial, do mercado de trabalho, do sistema escolar etc.) e do capital que ela tem
para reproduzir. As transformações recentes das relações entre diferentes classes
sociais e o sistema de ensino, com a conseqüente explosão escolar e todas as
transformações da estrutura social que resultam (pelo menos em parte) da
100
transformação de relações estabelecidas entre os diplomas e os cargos, são o
resultado de uma intensificação da concorrência pelos títulos escolares, para a qual,
sem dúvida, tem contribuído muito o fato de que, para assegurar sua reprodução, as
frações da classe dominante (empresários da indústria e do comércio) e das classes
médias (artesãos e comerciantes), as mais ricas em capital econômico, tiveram que
intensificar fortemente a utilização que faziam do sistema de ensino. (BOURDIEU,
1998, p. 147).
Em breves palavras Bourdieu traduz o mecanismo que resulta na corrida das diversas
parcelas da sociedade às escolas. A entrada de um número cada vez maior de representantes
das classes menos favorecidas na escola, em suas diversas instâncias, tem pressionado as
classes dominantes, que antes tinham sua reprodução assegurada principalmente pela
escolaridade, a investir de forma mais intensiva para manter a “raridade relativa de seus
diplomas e, correlativamente, sua posição na estrutura de classes”. Com isso, os diplomas e o
sistema escolar tornam-se objeto e lócus, respectivamente, privilegiados de uma concorrência
entre classes sociais que gera um crescimento geral e contínuo da demanda por educação e
uma conseqüente inflação de títulos escolares (BOURDIEU, 1998, p. 148).
Esta demanda crescente e contínua acabou sendo apreendida pelos agentes do
mercado como oportunidade de negócio. Boaventura Sousa Santos (2003) chama a atenção
para a mercantilização da educação e dos riscos inerentes às suas imensas possibilidades
comerciais. Mesmo com as ressalvas que ele faz a tal processo, os argumentos
mercadológicos são por demais atraentes para que os agentes do mercado deixem de
apreender tal oportunidade. Mas, como diz Becker apud Adorno (1995, p. 139):
Toda ampliação quantitativa de nossa estrutura escolar implica imediatamente
conseqüências qualitativas. O exemplo mais prático é o da propaganda educacional,
objetivando levar à escola superior a maior quantidade de pessoas. Nestes termos
também se modifica a escola superior do ponto de vista do conteúdo. Nesta medida
parece-me urgente incluir na discussão a questão do o que é e a questão do para que
é a educação, o que não significa excluir considerações quantitativas, mas situá-las
no contexto geral a que pertencem necessariamente.
Apesar de ressalvas como a que se transcreveu acima, o Governo Federal vem se
esforçando no sentido de ampliar quantitativamente o acesso às escolas de nível superior. O
101
programa Universidade Para Todos, a adoção de sistemas de cotas, programas de
financiamento de cursos de vel superior etc. são faces de uma movimentação no sentido de
aumentar a população universitária e, conseqüentemente, o número de diplomados. Como tais
iniciativas vêm a reboque de uma expansão efetivada, porém ainda em andamento, da rede
de ensino superior, com ênfase nas instituições privadas, a discussão proposta por Becker e
Adorno, sobre o que é e para que é a educação, continua a ser deixada de lado em prol de uma
ótica quantitativa. O próprio nome “Universidade Para Todos” sugere um enfoque
quantitativo e não em qualidade do ensino, conhecimento, adequação às oportunidades etc.
Sob este prisma, pode-se dizer que o próprio governo adota uma postura que corrobora esta
visão “coisificada” do ensino, como se ao aparecer em censos e estatísticas grandes números
de população universitária venham significar uma melhoria na qualidade de vida, ou nos
índices de desenvolvimento humano do País e de suas respectivas regiões.
É o espectro da “coisificação” do ensino, que o coloca na mesma categoria de outros
objetos cuja posse é signo de status e de poder. Enquanto apenas uma minoria ascende à
“lógica autônoma e racional dos elementos do ambiente (uso funcional, organização estética,
realização cultural)”, a franca maioria continua a encarar idéias, saber, cultura pela lógica
fetichista que constitui a lógica do consumo (BAUDRILLARD, 1995, p. 58), ou seja,
buscando o capital cultural no seu estado institucionalizado. Como diz Adorno (1995, p. 143),
“a organização do mundo converteu-se a si mesma imediatamente em sua própria ideologia.
Ela exerce uma pressão tão imensa sobre as pessoas, que supera toda a educação”, ou seja, a
própria educação acaba por reproduzir, dentro da universidade, a sociedade de classes em que
está inserida. Mas nesta mesma sociedade em que o capital é poder, o conhecimento pode ser
uma espécie de capital.
O capital cultural pode existir sob três formas: no estado incorporado, ou seja, sob a
forma de disposições duráveis do organismo; no estado objetivado, sob a forma de
bens culturais - quadros, livros, dicionários, instrumentos, máquinas, que constituem
indícios ou a realização de teorias ou de críticas dessas teorias, de problemáticas,
102
etc.; e, enfim, no estado institucionalizado, forma de objetivação que é preciso
colocar à parte porque, como se observa em relação ao certificado escolar, ela
confere ao capital cultural - de que é, supostamente, a garantia - propriedades
inteiramente originais. (BOURDIEU, 1998, p. 174). (destaque no original).
A corrida às faculdades que ora vivenciamos, portanto, tem mais características de
busca pelo capital cultural no seu estado institucionalizado, posto que os indivíduos estão a
buscar o diploma como um certificado de poder apreendido. Não é por acaso que ao anunciar
seus cursos, uma universidade de Belo Horizonte usava outdoors com os dizeres: “não adianta
contar com a sorte, é preciso um bom diploma”, relegando o conhecimento a ser adquirido
pelos mestrandos a algo secundário, sequer mencionado na peça publicitária.
Com a postura quase omissa do Estado em relação ao ensino de nível superior e a
ótica consumista de boa parte dos estudantes, a iniciativa privada vem gerindo as instituições
de ensino como se gerencia empresas. Em Salvador, professores e alunos de jornalismo da
Faculdade 2 de Julho se uniram contra a direção da instituição em função da decisão desta de
reduzir o número de docentes com titulações de mestre e doutor de 65% para os 30% mínimos
exigidos pela Lei de Diretrizes Básicas (LDB). A razão apresentada pela diretoria: redução de
custos (BRAGA; GOMES, 2003).
Por ocasião da divulgação da notícia de que, segundo a Ordem dos Advogados do
Brasil, apenas 28% dos cursos de Direito em todo o País têm a qualidade recomendada, o
presidente nacional da entidade afirmou que “não adianta criar faculdades para o País ter
mais universitários. A Ordem é contra o estelionato educacional”. Ressalte-se aqui que entre
2001 e 2003 o Conselho Nacional de Educação (CNE) autorizou a criação de 222 novos
cursos de Direito, contrariando uma recomendação da própria OAB, para quem apenas 19
cursos deveriam ter sido criados neste período (GASTO ..., 2004). São discrepâncias como
estas que têm suscitado o debate acerca desta rápida expansão da rede de ensino superior do
País.
103
Como foi observado pelos coordenadores de cursos entrevistados ao serem
questionados sobre a visão deles em relação à educação de nível superior no Brasil:
Eu acho ela ao mesmo tempo sem rumo e preocupante. Ela é sem rumo porque a
gente tava num modelo, num processo de implantação de um modelo no período do
Fernando Henrique Cardoso, pra o termos uma privatização do ensino superior,
instituiu-se uma lógica privada do ensino superior. Então vo abre e abre
faculdades, você expande o mercado, aumenta o número de vagas através de
faculdades privadas, de institutos privados e deixa que o mercado inclusive regule
essas faculdades e o Estado fica aí apenas como uma instância de avaliação. Mas a
grande pressão para abrir faculdades vem do próprio mercado. Isso me apavora...
[...] A educação não é um produto comercial como outro qualquer... Acho que ela
não é um produto comercial, o se passa informação a indivíduos cidadãos ou
pessoas, e não pode ser tratado como mercadoria. Ela pode aser uma dimensão
de mercadoria, uma vez que você tem uma lógica privada, onde a faculdade teria os
clientes, os alunos. Mas a educação não é mercadoria, ela é outra coisa, muito mais
séria. (coordenador de curso)
Essa proliferação das instituições de ensino é terrível, é absolutamente danosa,
jogando pra baixo. (coordenador de curso)
Muito negativa, muito negativa, porque ela não é uma expansão enfática... A
expansão do ponto de vista... A expansão precisa de ser... É... Qualificada, né?
(coordenador de curso)
Obviamente que tem coisas complicadas, como as instituições de ensino se
transformarem em negócios. muita escola que basicamente o tem nenhuma
responsabilidade com a formação desse profissional. (coordenadora de curso).
Por um lado, a expansão permite que um número maior de pessoas se
profissionalize, por outro, criou espaço para que escolas oportunistas, mais
preocupadas com o faturamento do que com a formação superior, se
estabelecessem. Porém, acredito que o próprio mercado publicitário saberá
reconhecer e valorizar o profissional que teve um bom percurso acadêmico do
profissional mal formado. (coordenadora de curso).
Ao chamar a atenção para a distinção entre as escolas “oportunistas” das escolas
supostamente preocupadas com a “formação superior”, a observação acima transcrita remete à
questão de como as diferentes instituições de ensino são percebidas pela sociedade.
4.4 A universidade é uma sociedade de classes
Além da mercantilização e dos perigos da visão da educação como mercadoria, a
104
multiplicação de cursos implica em outras questões. A “universidade é uma sociedade de
classes” (SANTOS, 2000, p. 211) e os dualismos entre universidades de elite e universidades
de massas, entre cursos de grande prestígio e cursos desvalorizados são definidos, entre outras
coisas, segundo a composição social da população escolar. O que remete, mais uma vez, ao
conceito de Menor Diferença Marginal e ao consumo como instrumento de inclusão e
diferenciação (BAUDRILLARD, 1995). Principalmente quando é lembrada a situação do
mercado de trabalho como mercado que “consome” mão-de-obra e, como tal, também
“consome” esta distinção entre escolas de elite e universidades de massa.
O raciocínio é simples: da mesma forma que nem todos possuem os mesmos objetos,
nem todo mundo tem idênticas possibilidades escolares. Quanto mais raro um diploma, maior
o seu valor. O valor de um diploma não reside no número de detentores do mesmo, mas no
capital social de que tais detentores “são providos e que acumulam em decorrência da
distinção que os constitui objetivamente como grupo e pode servir também de base para
agrupamentos intencionais (associações de antigos alunos, clubes, etc.)” (BOURDIEU, 1998,
p. 136-137). Desta forma os alunos das escolas de maior renome, enquanto grupo, devem a
força do seu diploma ao capital social possuído por seus membros precisamente em função do
seu número reduzido e, portanto, à sua raridade.
No entanto, um dos argumentos mais usados em prol da multiplicação dos cursos e
das faculdades é a suposta necessidade de ampliar as possibilidades de acesso à faculdade a
mais gente. Universidade para todos”, é a denominação da proposta que o governo federal
vem defendendo para a reforma universitária que ora se discute no País (SCHWARTZMAN,
2004). Na atual fase daquilo que Bourdieu (1998) chama de “explosão escolar”, que acarreta o
que ele denomina “inflação de diplomas”, quanto mais populares as faculdades, quanto menos
raros os diplomas, menor o valor de seus detentores no mercado de trabalho. Esta
desvalorização é um dos pontos de origem da
105
Desilusão coletiva que resulta da defasagem estrutural entre as aspirações e
oportunidades, entre a identidade social que o sistema de ensino parece prometer ou
aquela que propõe a título provisório [...] e a identidade social que oferece
realmente, para quem sai da escola, o mercado de trabalho. (BOURDIEU, 1998, p.
162).
Como o mercado de trabalho também é fortemente influenciado pelo capital social
(conceito a ser desenvolvido pouco mais adiante neste mesmo estudo) de seus agentes, a
proposta de ampliar o acesso dos filhos das classes média e operária à universidade pode surtir
o efeito de aumentar ainda mais a diferenciação entre os diplomados das escolas tidas como
“de elite” daqueles graduados pelas escolas mais populares. Como diz Bourdieu (1998, p.
221; 223):
Os alunos ou estudantes provenientes das famílias mais desprovidas culturalmente
têm todas as chances de obter, ao fim de uma longa escolaridade, muitas vezes paga
com pesados sacrifícios, um diploma desvalorizado.
Eis um dos mecanismos que, acrescentando-se à lógica da transmissão do capital
cultural, fazem com que as mais altas instituições escolares e, em particular, aquelas
que conduzem às posições de poder econômico e político, continuem sendo
exclusivas como foram no passado. E fazem com que o sistema de ensino,
amplamente aberto a todos e, no entanto, estritamente reservado a alguns, consiga a
façanha de reunir as aparências da ‘democratizaçãocom a realidade da reprodução
que se realiza em um grau superior de dissimulação, portanto com um efeito
acentuado de legitimação social.
4.5 Faculdades operando como empresas
Também é válido ressaltar dois outros aspectos interessantes em relação à confusão
que se pode fazer entre a quantidade de matriculados e graduandos e a eficácia do sistema
educacional:
1. A “superprodução” de diplomados, em número muito superior ao que é demandado pelo
mercado de trabalho leva ao rebaixamento das perspectivas de inserção no mercado de
trabalho; precarização das condições de trabalho; redução dos pisos de remuneração da
categoria e; multiplicação de iniciativas próprias precárias por parte de novos entrantes no
106
mercado que não conseguem inserir-se de outra forma, conforme abordado em maior
profundidade no capítulo sobre mercado, nos tópicos referentes a mercado de trabalho para
publicitários em Belo Horizonte.
2. Na sociedade contemporânea, o produto industrial constitui o arquétipo do produto social
definido quantitativamente. Uma indústria competitiva é aquela que produz muito e com
custos unitários inversamente proporcionais à escala da produção. Conceber o produto da
universidade como um produto industrial implica em conceber a universidade como uma
organização empresarial. Dentro desta concepção corre-se o risco de se proceder de forma
errada em relação tanto ao ciclo do produto quanto ao próprio processo de produção. O
perigo reside no fato de o produto industrial ter um ciclo muito mais curto que o produto
universitário deveria ter. A lógica da rentabilidade do investimento tende a favorecer o
curto prazo em detrimento do longo prazo e a aplicação desta lógica à universidade tende a
favorecer utilidades de curto prazo tais como “formações unidirecionadas em detrimento de
formações complexas” (SANTOS, 2000, p. 217). E aqui cabe ressaltar que o empresariado
brasileiro tem uma propensão a focar perspectivas de proveito material cujo retorno se
no curto prazo (FREITAS, 1997, p. 53).
Este problema se verifica na prática no mercado publicitário de Belo Horizonte:
O mercado, muitas vezes, valoriza mais o aspecto técnico (domínio de softwares,
por exemplo) do que a capacidade intelectual e potencial de crescimento dos
alunos. (coordenadora de curso).
Outro aspecto inerente à administração de faculdades sob o paradigma da produção
industrial num mercado tão pulverizado reside no fato de que a disputa por novas fatias de
mercado pode levar ao surgimento de “produtos” similares, porém sem a mesma qualidade.
De acordo com um estudo realizado pela consultoria Hoper, a mensalidade média das
faculdades de administração nas regiões Sul e Sudeste caiu 22% nos últimos cinco anos. O
mesmo estudo indica que o mercado universitário para as classes A e B está saturado e que
107
as instituições precisam atrair a classe C. O problema é que isso é possível com
mensalidades mais baixas e para conseguir praticar tais preços “é inevitável que o número de
alunos por sala aumente e que as universidades optem por contratar professores menos
qualificados por salários mais baixos” (KOSTMAN, 2004, p. 62).
De fato, como em todo mercado empresas que buscam a diferenciação pelos mais
diversos argumentos, inclusive o preço (CHANDLER, 1992), o mercado de ensino superior
em Belo Horizonte não é diferente:
A gente vê outdoor de algumas faculdades aí que parece que tão vendendo sapato,
vamos dizer assim, se oferecem pelo preço, é uma coisa meio assustadora. Então me
preocupa muito isso. (coordenador de curso)
Também é curioso e vale ressaltar que, entre as escolas procuradas para colaborarem
neste estudo, a Faculdade Estácio de Sá, de Belo Horizonte, recusou-se e apresentou como
justificativa para tal negativa o fato de que as questões levantadas pelo roteiro de entrevistas
revelariam posições estratégicas de mercado. Esta postura demonstra o paradoxo a que chegou
o mercado de ensino superior: os objetivos de mercado das empresas que vendem educação de
nível superior contrapõem-se aos objetivos de busca do conhecimento científico, que
supostamente deveria residir na origem de toda universidade.
A observação feita no final do parágrafo anterior nos remete de volta às questões
propostas por Boaventura Sousa Santos (2000), sobre a formação universitária ser voltada, ou
não, para o mercado de trabalho - ou para o conhecimento - e a capacidade do sistema de
ensino superior se adaptar às demandas de tal mercado.
4.6 Formação voltada para o mercado de trabalho?
Parece haver uma certa confusão entre uma formação superior que também enfoque o
108
mercado e uma formação tecnicista que, supostamente, facilitaria o ingresso no mercado de
trabalho.
Uma formação superior voltada para o mercado pode abranger diversos enfoques: a
publicidade enquanto negócio e a gestão deste tipo de empresa; as diversas faces do mercado
publicitário, enfocando fornecedores, clientes, agências e veículos; a integração das diversas
ferramentas etc. Tudo isso é relacionado a mercado, mas não é, necessariamente o que se quer
dizer quando se anuncia um ensino voltado para o mercado, ou um ensino que une, na medida
certa (isto no discurso dos outdoors de faculdades), a teoria com a prática. Na visão dos
coordenadores de cursos entrevistados, esta é uma visão tecnicista do mercado.
Esta formação dita tecnicista tem bastante a ver com a preocupação dos estudantes
com sua inserção no mercado de trabalho, uma vez que tanta concorrência. A promessa de
facilitar a inserção nesta arena tão disputada, portanto, tem forte apelo e o problema para com
ela não é apenas o fato de que mais publicitário se formando do que o mercado, com a sua
estrutura atual, comporta, mas as limitações que tal formação impõe aos indivíduos que a
adquirem.
Adorno (1995, p. 143), afirma que a educação seria
Impotente e ideológica se ignorasse o objetivo de adaptação e não preparasse os
homens para se orientarem no mundo. Porém ela seria igualmente questionável se
ficasse nisto, produzindo nada além de well adjusted people, pessoas bem ajustadas,
em conseqüência do que a situação existente se impõe precisamente no que tem de
pior.
De fato, os coordenadores de cursos entrevistados revelaram que uma
preocupação deles no sentido de evitar uma formação mais tecnicista. No entanto todos
revelaram achar que outras escolas, que não as suas, que operam exatamente no sentido
oposto:
Temo com a visão de que educação superior tenha virado um “bom negócio”,
quando na verdade é uma missão e vocação com muito compromisso social.
Particularmente para a área de propaganda, acho prejudicial uma formação muito
tecnicista de alguns cursos superiores. A formação sólida, crítica, é a única capaz
109
de ensinar o profissional a pensar e não a fazer sempre igual. (coordenador de
curso)
É assim, o que é mais valorizado hoje é a famosa competência para o mercado. Eu
acho que não é o que deve ser mais valorizado. O que deve ser valorizado é essa
capacidade de compreensão e flexibilidade. (coordenador de curso).
Eu acho que elas são percebidas, no mercado, como teoria e prática. O lugar da
prática é no mercado e a universidade é o lugar da teoria [...] Então o olhar do
mercado inclusive é que quem na universidade quer ir para o mercado [...] Não
é, essa divisão de teoria e prática é muito limitadora, para qualquer processo de
formação. E, segundo, nem sempre as pessoas que estão se formando num curso
superior querem estar no lugar dos profissionais que estão no mercado, porque elas
podem estar buscando outras formas de inserção, em outros mercados, então nem
sempre quem forma está a fim de participar de criação de anúncio. (coordenador de
curso).
É... Eu entendo que a formação de graduação não é uma formação técnica... Ainda
que profissionalizante, mas ela não é técnica. (coordenador de curso).
Meio mecânico demais, é: aprenda a fazer, faz, faz se puder fazer, faz, faz bem feito
e não precisa mais do que isso. (coordenador de curso).
Eu acho que essa é uma das maiores falácias que operam dentro das instituições.
Porque efetivamente o mercado é uma entidade abstrata, uma reificação, não
existe um “mercado” [...] Então eu acho que isso é uma grande bobagem, essa
coisa das escolas clonarem o mercado, e reproduzir esse mercado e fazer o que o
mercado está fazendo. (Coordenador de curso).
Cabe aqui observar que esta visão tecnicista parece encontrar respaldo no mercado,
posto que o empresariado brasileiro é muito mais focado em iniciativas cujo retorno se no
curto prazo (FREITAS, 1997), o que, neste caso, significa que os donos de agências e outros
estabelecimentos estão muito mais preocupados com o máximo aproveitamento da mão-de-
obra contratada ao menor custo e não com as possibilidades de desenvolvimento dos
indivíduos que venham a integrar seus quadros:
Claro, treinar pessoas é muito difícil, por isso o mercado seleciona os “mais
prontos”, mas nesse processo acaba às vezes colocando a questão técnica na frente
da competência e da capacidade de compreensão do negócio da propaganda.
(coordenadora de curso).
Me preocupa muito a questão do estágio, porque o estágio, ele tem sido um certo
entrave para o nosso projeto pedagógico na medida que ele tira o aluno muito cedo
110
de dentro da sala de aula e, freqüentemente, ele não é estágio no sentido mais
extremo, ele acaba sendo, assim, uma utilização pelo mercado de uma mão-de-obra
barata, relativamente qualificada. (coordenador de curso).
Alguns dos donos de agências entrevistados, entre eles representantes de órgãos
patronais, apesar de reconhecerem que é importante o conhecimento dito teórico, deixaram
transparecer que valorizam esta visão dita tecnicista:
As agências particularmente, os fornecedores e os veículos foram buscar nas
escolas, estão querendo buscar nas escolas profissionais que conheçam um pouco
mais de teoria publicitária e a escola por sua vez está mais voltada para o mercado
porque sabe que só a teoria sem a prática não vale muita coisa. (dono de agência)
Eu me lembro que quando eu saí da faculdade, a faculdade me deu... Uma visão
muito crítica do mundo da comunicação, mas ela não me deu as ferramentas não.
Eu fui buscar dentro do próprio mercado, entendeu? Eu acredito que continua mais
ou menos a mesma coisa, a meninada sai de lá sem saber muito bem de sua
ferramenta de trabalho. (dono de agência)
Questionado se achava uma formação mais generalista boa ou ruim, a resposta deste
entrevistado foi:
É ruim [...] Se voé estudante de odontologia, o cara fala, você faz um buraco,
tira a cárie, põe determinado cimento, espera três minutos, pronto, tá fechado. Olha
a radiografia, se tiver preta, cariado, se tiver branca, não cariado.
Matemática: dois mais dois é igual a quatro, se for cinco é por aproximação, mas...
E na publicidade, o que eu aprendi na publicidade, hein? [...] As escolas têm
passado muitas informações para eles. São as mesmas que passavam no nosso
tempo, mas evidentemente acrescidas das modernidades, computadores... (dono de
agência)
E a repetição, a cada semestre, deste discurso das faculdades prometendo, em suas
propagandas, “preparar o aluno para o mercado”, acaba fazendo com que os alunos cheguem
aos cursos com uma certa ansiedade de “colocar a mão na massa”:
A gente tem uma dificuldade muito grande de mostrar para eles que antes deles
operarem máquinas, eles precisam desenvolver a competência, quer dizer, a
percepção crítica do que está envolvido. (coordenador de curso).
Apesar de todo o discurso de “preparar para o mercado”, ou de a união da teoria
com a prática”, um dos coordenadores entrevistados conseguiu resumir bem uma dicotomia
que faz desses discursos uma falácia:
111
A formação acadêmica não dá conta de tudo, é precária, por exemplo, em oferecer
a experiência que a prática do estágio oferece. (coordenadora de curso).
A visão tecnicista, apesar de encontrar ressonância no mercado de trabalho, é uma
ótica limitadora para os alunos dos cursos de publicidade e propaganda posto que as práticas
do mercado e até o próprio mercado estão passando por profundas transformações:
Um mercado em constante transformação, né? Exatamente porque a comunicação é
uma área muito dinâmica. Não tem como a gente trabalhar com uma imagem de
mercado onde o profissional voltado pro mercado X aí, porque no período de
quatro anos esse mercado pode modificar. (coordenador de curso).
No nosso entender, a formação em graduação o é, ainda que ela tenha uma
dimensão profissionalizante muito grande, ela não deve vir atrelada a uma imagem
muito, ahn... precisa de mercado, em parte porque é... O mercado para a
publicidade, pro jornalismo, RP, ou para RTV, em Minas Gerais é um mercado
muito reduzido. E, mais ainda, um mercado em constante transformação.
(coordenador de curso).
Quando a escola propõe uma formação voltada diretamente para o mercado, é uma
coisa que me preocupa profundamente, em parte porque esse mercado aí, ele vira
uma imagem muito estável, muito cristalizada e, na minha opinião, muito limitada.
(coordenador de curso).
Exatamente porque as escolas têm que preparar para o mercado em constante
mudança é que a formação precisa ter forte base humana, generalista, e ainda dar
uma visão de cada área em que é possível especializar-se em publicidade e
propaganda. (coordenadora de curso).
O mercado publicitário depende que a economia seja industrializada. Então a gente
tem uma situação de mercado mineiro muito delicada, por isso que a gente tem uma
preocupação muito grande deo atrelar a formação em graduação a uma imagem
de ser habilitado pro mercado. (coordenador de curso).
4.7 Preparando para a empregabilidade
Becker apud Adorno (1995, p. 153) sustenta que a “educação para suportar as
contínuas mudanças é aquilo que confere um novo significado ao indivíduo”. Em tempos de
mudanças tão drásticas e ininterruptas no que se refere tanto ao mercado publicitário, quanto
112
ao conceito de trabalho, a educação de nível superior ganha uma nova dimensão, que é a de
preparar os indivíduos para a adaptabilidade a novas situações de mercado e assim se
manterem competitivos no que diz respeito a conseguir trabalho.
“A esperança de um emprego estável a longo prazo, com aumento de salário, e
associado a uma gama de benefícios sociais se tornou ultrapassada” (LANCEY apud
CHANLAT, 1996, p. 120).
O modelo tradicional de carreira vigorava num contexto de estabilidade, onde as
organizações tinham diversos níveis hierárquicos e os empregados aspiravam alcançar o
sucesso mediante a ascensão pela hierarquia. Com as mudanças que vêm ocorrendo nas
organizações e nas relações contratuais, essa possibilidade torna-se cada vez mais difícil e a
questão da carreira passou a ser vista sob novas perspectivas (TOLFO, 2002).
Neste sentido, adotou-se para este trabalho a definição de London e Stumph apud
TOLFO, (2002, p. 43-44) que configura carreira como:
As seqüências de posições ocupadas e de trabalhos realizados durante a vida de uma
pessoa. A carreira envolve uma série de estágios e a ocorrência de transições que
refletem necessidades, motivos e aspirações individuais e expectativas e imposições
das organizações. Engloba políticas, procedimentos e decisões ligadas a espaços
ocupacionais, níveis organizacionais, compensação e movimento de pessoas. Estas
perspectivas são conciliadas pela carreira num contexto de constante ajuste,
desenvolvimento e mudança.
O modelo tradicional, cujo modelo visual era o de uma escada pela qual o sujeito
ascendia na carreira ao subir degrau por degrau, deu vez a outro modelo mais moderno e que
apresenta como características: “diversificação de carreiras, instabilidade, menor linearidade,
descontinuidade e horizontalidade” (CHANLAT, 1995 apud TOLFO, 2002, p. 51). Hoje, fala-
se numa perspectiva de carreira horizontalizada, em zigue-zague, ou em espiral, possibilitada
pelo desenvolvimento de competências. Ao invés de uma longa carreira em uma única
empresa, fala-se cada vez mais no desenvolvimento de diversas trajetórias ao longo do tempo
113
ou mesmo paralelamente (TOLFO, 2002).
No mercado publicitário, a troca de empregos é, muito tempo, considerada uma
movimentação normal de mercado. Da mesma forma que jogadores de futebol mudam de
times, publicitários mudam seus locais de trabalho com relativa frequência. No jornal Meio &
Mensagem anos existe uma coluna chamada “Acontece no Meio”, destinada
exclusivamente a cobrir semanalmente estas movimentações.
Nas próprias entrevistas para este estudo foi possível verificar que nenhum dos
entrevistados teve uma carreira desenvolvida numa única empresa. A falta de linearidade
também foi verificada com bastante freqüência. No entanto, entre os entrevistados com mais
de 50 anos os intervalos para as mudanças aconteciam em períodos de tempo mais dilatados e
uma carreira longeva numa mesma empresa, após um início mais errante, sempre acabou se
confirmando:
Eu sou de Belo Horizonte, tenho cinqüenta e quatro anos, a minha formação
acadêmica é direito e depois eu fiz jornalismo, mas advoguei quatro anos. O
jornalismo nunca exerci, e cansei de direito e me tornei publicitário em mil
novecentos e setenta e nove comecei como redator, fiquei algum tempo em criação e
hoje estou mais voltado para a área executiva apesar de acompanhar sempre o que
está sendo criado na agência [...] Eu comecei numa agência pequena que não
existe mais, que se chamava Projeção. Na época tinha conta do Bemge, que era a
grande conta deles. Em oitenta e um eu fui para RC, fiquei quase dois anos, em
oitenta e três fiquei seis meses na LF e no início de oitenta e quatro vim pra (nome
da agência). fiz vinte anos de (nome da agência) [...] Minha origem é de redator
mesmo. Era o que eu gostava de fazer, eu tinha muita facilidade para escrever , mas
a Projeção era uma agência pequena, então a gente fazia de tudo um pouco. Na RC
já era uma agência maior, era uma grande agência em Minas, então já tinha
departamentos mais organizados como RTV, como produção gráfica, então eu
ficava mais na parte de criação mesmo. E quando eu fui para a (nome da agência),
a (nome da agência) estava começando, em oitenta e... a (nome da agência) nasceu
em oitenta e dois e eu fui para em fevereiro de oitenta e quatro, a (nome da
agência) também tinha essa característica de cada um fazer um pouco [...] Depois
de algum tempo eu passei a diretor de criação, depois eu passei a... vice-presidente
de criação e, com o falecimento do Daniel. Depois eu me tornei sócio, né? Com o
falecimento do Daniel, me tornei o presidente da agência numa circunstância que
eu jamais gostaria. (dono de agência)
A minha área é de comercial e marketing. Eu comecei a minha carreira em mil
novecentos e setenta e um, como Office boy da McCann-Ericsson, uma agência
norte americana. Na época era uma das maiores agências do mundo e acredito que
ainda deve fazer parte desse contexto. Eu tenho uma formação, que é Administração
de Empresas, que não tem nada a ver com a publicidade, mas a minha vida toda eu
114
trabalhei em propaganda [...] Trabalhei de setenta e um a setenta e três na
McCann, de setenta e três a setenta e cinco, eu fui para a LF. Eu trabalhei como
boy, depois eu fui auxiliar de mídia. Depois eu fui para a JMM, trabalhei como
mídia durante dois anos. Da JMM eu fui para a PIB, que era uma empresa de
editoria de revistas especializadas na área de mineração e na área de construção
pesada, era a revista Empreiteira e Minério. Trabalhei de setenta e sete a setenta
e nove. Fui para a Globo em setenta e nove e trabalhei na Globo até mil novecentos
e oitenta e seis. Em mil novecentos oitenta e seis eu montei um escritório de
representação própria, fiquei no escritório anoventa e um. Em noventa e um eu
fui chamado para assumir a superintendência comercial da (nome de uma empresa
do grupo), e estou no grupo até hoje, há quatorze anos. Essa é a minha experiência.
(diretor de holding de veículos de comunicação)
Eu tenho cinqüenta anos, eu sou formado em Comunicação Social: jornalismo,
publicidade e relações publicas, pós-graduado em marketing. Eu me formei na
Fafich, Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, da UFMG, em setenta e sete.
Em mil novecentos e noventa e nove agora, com quase cinqüenta anos, descobri que
eu tinha que estudar um pouquinho mais e fiz pós-graduação em marketing pela
Fundação Getúlio Vargas. Atuo com comunicação desde os quinze anos de idade,
fui ator de televisão na Itacolomy, apresentador, produtor de programas, fui
cinegrafista da Super 8 [...] Trabalhei como publicitário, como RTVCine, como
produtor gráfico, como contato, como auxiliar de mídia e um dia resolvi caminhar
por conta própria e abri uma agência chamada (nome da agência). tinha sido
corretor autônomo. Como corretor autônomo fui o maior faturamento autônomo da
Rede Globo de Televisão, durante determinado período, e o décimo sétimo do
faturamento da emissora, como autônomo. Montei a agência em mil novecentos e
oitenta e três. Sempre fui uma agência de pequeno porte, mais fui agência de alguns
dos nomes que foram ícones do mercado. Alguns continuam meus clientes, fui
responsável pelas imagens deles como: (nomes de clientes), todos enquanto eu
atendi foram líderes do mercado. (dono de agência)
Já entre os mais novos, as mudanças foram mais constantes e, ao mudarem de
organização, sempre houve mudança nas funções que exerciam e nas capacidades exigidas nas
novas posições. As características descritas por Chanlat: “Diversificação de carreiras,
instabilidade, menor linearidade, descontinuidade e horizontalidade” tornam-se ainda mais
evidentes, bem como a perspectiva de carreira horizontalizada, em zigue-zague, ou em espiral
e o desenvolvimento de diversas trajetórias ao longo do tempo ou em paralelo:
Tenho quarenta e três anos, sou seu conterrâneo Soteropolitano. Me formei em
Administração de Empresas, comecei minha carreira profissional no Baneb, lá
entrei na área de comunicação [...] Depois fui pra Arthur Andersen, fui auditor.
Depois, aqui em Minas, eu militei na área blica e na área privada, andei de
passagem pelo Governo de Estado. Como veículo de comunicação: Jornal Hoje em
Dia, Tv Record, dio Cidade... Fiz muitos contatos, com praticamente todas as
grandes agências mineiras na época. Depois eu passei um tempo na área da
construção civil, reciclagem de lixo, que é uma coisa que tenho hoje ainda e, nos
dois últimos anos, estou com uma agência de propaganda mais focada em
marketing político. (dono de agência de marketing político)
115
Tenho trinta e dois anos, sou bacharel em Comunicação Social, com habilitação em
jornalismo, formada pela PUC, em dezembro de 1995. Comecei como repórter do
jornal O Tempo, depois fui para a rádio 98 FM, onde comecei como contato da
área de promoções, mas, para vender, eu também acabava criando as promoções e
ainda escrevia as chamadas. Depois acabei dirigindo o departamento de promoções
da rádio. De fui para a Sofia Propaganda, onde atuei como mídia. Com o fim da
Sofia, que se fundiu com outra agência, fui para a MultiAction, que é uma empresa
de promoções e eventos... eu fazia atendimento, planejamento de promoções e
eventos, supervisionava ações promocionais e eventos e, por fim, abri, junto com
mais três sócios, uma empresa de criação e produção de eventos e promoções.
(dona de agência de marketing promocional)
Vinte e sete anos [...] Estágio, redatora júnior na DNA Propaganda, Redatora na
Hoje Comunicação, Professora de Linguagem Publicitária, Coordenadora do
Curso de Publicidade na (nome da faculdade). (coordenadora de curso)
Bom, eu sou jornalista [...] Fui jornalista temporão, porque eu fiz engenharia antes
de fazer jornalismo. Tive uma experiência significativa [...] Trabalhei no Diário do
Comércio, no jornal O Globo, na revista Veja e depois voltei para projeto inicial do
Hoje em Dia. Depois teve um período de interrupção de alguns anos, eu fui pra fora
do país com uma bolsa do Conselho Britânico, fiz meu mestrado e estou em
processo de conclusão do doutoramento agora. E, nesse período, também fiz alguns
trabalhos free-lance pra agências de publicidade, fui redator. (coordenador de
curso)
Pela nova perspectiva, a carreira é mutável e isso pode implicar tanto na ampliação
das oportunidades de treinamento e compensação financeira, quanto no aumento do grau de
riscos e incertezas e nas exigências permanentes para demonstrar a aprendizagem e as
competências (TOLFO, 2002). A palavra de ordem, então, deixa de ser emprego e passa a ser
empregabilidade, o que alimenta a idéia de instabilidade. Neste sentido, empregabilidade é:
Uma ação individual, que pode ser estimulada ou não pelas organizações, que faz
com que profissionais de todos os níveis busquem estar melhor preparados para
enfrentar o mercado de trabalho e suas mutações, pressupondo uma postura proativa,
no sentido de capacitar-se e qualificar-se permanentemente, em termos de
habilidades e capacidades técnicas, humanas, conceituais e de relações sociais.
(SARSUR, 1999, p. 40).
Esta capacitação constante pode ser conseguida por quem entende a dinâmica do
mercado em que está inserido de forma macro, numa perspectiva mais abrangente que a
dimensão meramente operacional, posto que num mercado em constante mudança o contexto
operacional, sob diversos aspectos, é efêmero: mudam softwares, mudam as ferramentas a
serem utilizadas, surgem novos meios, ferramentas antes relegadas a segundo plano ganham
116
maior importância etc. Neste sentido os coordenadores de cursos entrevistados declararam:
Se em determinados momentos o lugar de mercado é a agência, pra fazer slogan,
em outro momento pode ser o planejamento ou o web design, isso varia muito. E
varia inclusive da competência e das trajetórias individuais dos profissionais.
(coordenador de curso)
O que não significa que daqui a dez anos a gente tenha essa mesma face de
mercado, ao mesmo tempo em que o mercado, do ponto de vista de agência, ele
encolhe, ele se diversifica em outros lugares. Ele se diversifica uma vez que você
tem a demanda pra profissionais que dominam a Internet, você tem demanda pra
profissionais que usam determinadas tecnologias, você tem, então, uma mudança da
face do mercado... Uma mudança que acontece, com isso você tem um delineamento
muito curioso, porque o perfil do profissional de publicidade e de jornalismo que
não é mais aquele profissional que vai migrar dentro da sua profissão
especificamente [...] Ele migra para áreas de interfaces próximas de suas
habilitações [...] Uma vez que o profissional muitas vezes adquire competências de
habilidades específicas, capaz de ser readaptado em diferentes níveis de diferentes
produtos e diferentes processos. (coordenador de curso)
Independente de ser da área de linguagem ou de planejamento, tem que saber
enxergar as mudanças do mercado, perceber oportunidades. (coordenadora de
curso)
Este conceito de carreira não-linear passa aos indivíduos o desafio de gestão da sua
própria carreira e preconiza a atualização constante no que se refere ao desenvolvimento de
qualificações, formação ou competências (TOLFO, 2002). A esse respeito, autores como
Chanlat (1995, 1996) apud Tolfo (2002) e Evans (1996) apud Tolfo (2002) referem-se a
carreira como planejamento e desenvolvimento de competências individuais.
4.8 Desenvolvimento de competências
O conceito de desenvolvimento de competências está nitidamente associado à
emergência de um modelo organizacional e de trabalho diferente daquele conhecido como
taylorista/fordista. Este novo modelo enfatiza o uso crescente dos trabalhos em grupo, das
redes e das novas tecnologias da informação e comunicação (ZARIFIAN, 2001; FLEURY;
FLEURY, 2001) e tem como base as exigências do posto de trabalho, no qual a colaboração, o
117
engajamento e a mobilidade passam a ser qualidades dominantes (HIRATA, 1994).
Enquanto o modelo antigo era baseado no conceito de qualificações, que refletia
principalmente a formação adquirida pelos trabalhadores no sistema formal de educação, o
novo modelo busca expressar e valorizar o conjunto de saberes e competências consolidados
na trajetória de vida profissional do indivíduo.
Não uma unanimidade acerca das definições de competências, pois o termo é
utilizado em diferentes contextos e com diferentes significados. Barato apud Luz (2001, p. 52)
cita duas linhas principais. A escola francesa, que enfatiza os vínculos entre trabalho e
educação e considera as competências como resultado da educação sistemática, e valoriza o
modo como as escolas enriquecem o repertório de habilidades dos alunos. E a escola
britânica, que define competências a partir do mercado de trabalho e ênfase a fatores e
aspectos ligados a “descritores de desempenhos requeridos pelas organizações produtivas,
privilegiando os comportamentos observáveis”.
Apesar das diferenças descritas, as duas escolas entendem competência como a
“capacidade pessoal de articular saberes com fazeres característicos de situações concretas de
trabalho” (BARATO, 1998 apud LUZ, 2001, p. 52).
Luz (2001) destaca que o conceito de competências articula os conhecimentos
formais, traduzíveis em fatos e regras, o saber-fazer, pertencente à esfera dos procedimentos
empíricos, tais como as receitas, os truques de ofício, e que se desenvolvem no cotidiano da
prática de uma ocupação ou profissão, e envolve, ainda, o saber-ser, “compreendido como
saber social ou do senso comum, que mobiliza estratégias e raciocínios complexos,
interpretações e visões de mundo” (LUZ, 2001, p. 54).
O conceito de competência pode ser focalizado tanto em termos de pessoas
(competências dos indivíduos), quanto em termos de organizações (core competences) e de
118
países (sistemas de educação e formação de competências). Para este estudo, o foco são as
competências pessoais:
As competências pessoais são definidas como a capacidade da pessoa de agregar
valor ao patrimônio de conhecimentos da organização A agregação de valor é algo
que a pessoa entrega à organização de forma efetiva. Assim, a agregação de valor
não diz respeito a atingir metas de produção, mas à melhoria em um processo ou
introdução de nova tecnologia. E a competência é visualizada pelo desempenho.
(KILIMNIK; CASTILHO; MACIEL, 2002).
Le Boterf (1995) apud Luz (2001) considera as competências como contingenciais,
ou seja, são exercidas de acordo com um contexto em particular, mediadas por limitações e
recursos e sofrem interferências diretas da situação. Ser competente, de acordo com Luz
(2001) implica em saber transferir, saber combinar e integrar e supõe a capacidade de
aprendizagem e de adaptação.
Fleury (2000, p. 4) destaca que a noção de competências aparece associada a
expressões tais como saber agir, mobilizar recursos, integrar saberes múltiplos e complexos,
saber aprender, saber se engajar, assumir responsabilidades, ter visão estratégica”.
Para Bittencourt (2001, p. 30) o desenvolvimento de competências pode ser definido
como:
o processo contínuo e articulado de formação e desenvolvimento de conhecimentos,
habilidades e atitudes de gestores a partir da interação com outras pessoas no
ambiente de trabalho, tendo em vista o aprimoramento de sua capacitação, podendo
dessa forma, adicionar valor às atividades da organização e da sociedade.
E, ainda de acordo com a mesma autora, no processo de desenvolvimento das
competências “a experiência relaciona-se diretamente à formação, no sentido de capacitação,
que implica visão pessoal, educacional e profissional” (BITTENCOURT, 2001, p. 41).
4.9 Desenvolvendo competências para atuar no mercado publicitário de Belo Horizonte
119
Para os coordenadores de cursos entrevistados para este trabalho uma certa
vulgarização do termo “competências” que acaba causando alguma confusão:
assim, uma coisa é separar a competência de competências. Todo mundo fala
que é importante ter competência, a competência é um “ser competente” e isso que
eu tou falando é absolutamente vazio, porque um “ser competente” muitas vezes
significa fazer aquilo que o patrão quer, nas condições que o patrão te dá, ou seja,
sofrer horrores. Essa competência aí eu acho muito prejudicial inclusive pro fígado,
pros cabelos brancos e pra pele. Agora, do ponto de vista de competência, aí sim
[...] A competência primeira de qualquer profissional de publicidade, qualquer
profissional de comunicação, é uma visão ampla da sua área de atuação.
(coordenador de curso)
Eu gosto de pensar que a ‘competência’ é a desvalorização da palavra ‘prática’
[...] É que tem todo um conhecimento teórico e acadêmico. Mas quando se fala em
competência, você também pegando mercado consumidor - entre aspas, né? Que
é o pessoal que vendo essa linguagem, esse linguajar, esse uso banalizado do
termo competência. (coordenador de curso)
Apesar da banalização citada, causada pelo uso indiscriminado do termo, que esvazia
o conteúdo do vocábulo “competências” para torná-lo apenas mais uma expressão de efeito,
os coordenadores entrevistados entendem que
Isso faz parte do projeto pedagógico, com suas diretrizes e metas, isso é muito tido
como uma dupla, o eixo competências e habilidades. (coordenador de curso)
Quando questionados sobre quais as competências que o mercado publicitário de
Belo Horizonte demanda dos profissionais que atuam, ou desejam atuar, nele, os
coordenadores entrevistados não foram muito precisos, nem enumeraram propriedades que
parecessem exclusivas ao mercado Belo Horizontino. Privilegiaram competências que valem
para profissionais de publicidade em geral, o que reforça, mais uma vez, a opção por uma
educação de cunho generalista:
Profissional bem informado, em constante aperfeiçoamento, com formação sólida.
Alguém que saiba pensar antes de saber fazer. Deve ter uma base forte em humanas
- política, economia, sociologia, artes... Antes de tudo ser bem informado sobre o
mundo. Depois, ter informação especializada sobre as áreas de planejamento
(marketing e gestão da comunicação) e/ou áreas de linguagem (criação, produção
audiovisual) e, independente de ser da área de linguagem ou planejamento,
perceber oportunidades, desenvolver e gerir projetos. (coordenadora de curso)
A competência primeira de qualquer profissional de publicidade, qualquer
120
profissional de comunicação, é uma visão ampla da sua área de atuação.
(coordenador de curso)
Conseguir ver a atividade de um modo mais uno é uma competência importante,
porque envolve, inclusive, a capacidade do profissional sobreviver. (coordenador de
curso)
Desde que fosse formado em uma boa escola, preocupada em conciliar a
capacidade crítica e reflexiva com a formação profissional, acredito que o lugar
onde se forma faz pouca diferença. As especificidades do mercado se aprende
praticando, desde que se tenha a bagagem de uma formação que o tenha ensinado a
pensar antes de fazer. (coordenadora de curso)
A capacidade de adaptação, a flexibilidade e a capacidade de perceber oportunidades,
associadas a uma visão ampla da atividade publicitária, citadas, remetem à questão das
mudanças que vêm ocorrendo no mercado publicitário - já citadas neste trabalho. Estas
mudanças abrem espaço para possibilidades de inserção em posições que antes o mercado não
contemplava e/ou em empresas cujas áreas de atuação antes eram relegadas a segundo plano,
ou sequer existiam. E, ainda, em empresas e posições que hoje ainda não existem - conforme
abordado no capítulo referente ao mercado.
Neste sentido, vale à pena ressaltar que os coordenadores de curso entrevistados
acham que:
No período de quatro anos esse mercado pode modificar. Então um dos objetivos da
estrutura flexibilizada, por um lado, foi de tentar criar um aluno com diferentes
possibilidades de entrar no mercado e, mais ainda, a possibilidade do aluno de
constituir mercado, do aluno poder criar ferramentas no sentido de conceber as
suas atividades de modo a identificar nichos de mercado, de modos a identificar
áreas de atuação não previstas, não dadas de antemão. (coordenador de curso)
O aluno dentro da academia tem que experimentar. Obviamente a experimentação
leva em conta os moldes operantes de como se faz no mercado. (coordenador de
curso)
(As melhores oportunidades para os novos publicitários se inserirem no mercado
estão) Em anunciantes ou em empresas próprias, criadas em um formato diferente
das agências tradicionais, especializadas em algum nicho de mercado. Porque nas
agências tradicionais o mercado é muito fechado e vem se restringindo ano após
ano [...] Precisamos de gente com perfil de gestor, que saiba criar e executar
projetos em parceria com as empresas de comunicação, prestando serviços de
qualidade de acordo com a demanda do mercado. (Coordenadora de curso)
121
A tendência de especialização, portanto, como foi abordado no capítulo sobre
mercado, também foi captada pelas escolas estudadas como forma de evolução do mercado.
Mas será que isso é fruto de uma boa articulação entre escolas e mercado? Ou será apenas
uma constatação paralela, feita por educadores que observam o mercado? Os graus em que
esta articulação existe e/ou deixa de existir é o tema a ser abordado no próximo capítulo.
122
5 A ARTICULAÇÃO ENTRE ESCOLAS E MERCADO
Como já visto no capítulo anterior, a expansão do sistema de ensino superior que o
País vem experimentando nos últimos anos é marcadamente uma expansão das instituições
privadas, cujos donos viram no ensino universitário a oportunidade de um mercado promissor.
As razões que os levaram a esta conclusão foram abordadas, portanto não serão de novo
discutidas. O que torna esta observação relevante para a questão a ser discutida neste capítulo
é o uso que se faz, ou deixa-se de fazer, das ferramentas e mecanismos de informação e
inteligência de marketing.
Kotler (1980, p. 491) define o sistema de inteligência de marketing como “a maneira
pela qual os executivos da empresa se mantêm atualizados e informados sobre modificações
de condições no macro-ambiente e no ambiente-tarefa”.
Segundo a definição de Kotler, as faculdades que se propõem a formar mão de obra
para o mercado de trabalho deveriam estar atentas às variações que ocorrem nos ambientes,
em seus variados níveis, como forma de otimizar seus serviços e maximizar seus resultados,
especialmente no que diz respeito à adequação dos seus cursos às exigências que seus
estudantes e egressos enfrentam e/ou enfrentarão, no mercado de trabalho - o que irá se refletir
no conceito que o mercado fará dos cursos.
Vale ressaltar que formar mão-de-obra para o mercado de trabalho não significa
necessariamente formar uma mão-de-obra meramente técnica e/ou replicar as práticas que
acontecem no mercado num determinado momento, mas a formação de indivíduos que
atuarão na arena de trocas de capital, produtos e serviços não somente e nem sempre como
mão-de-obra. Muitos estudantes e formandos de hoje serão os líderes do mercado de amanhã.
123
Nesta perspectiva, cabe uma breve revisão da evolução do ensino superior em função do
mercado de trabalho.
5.1 Breve resumo da evolução do ensino superior em função do mercado de trabalho
Sousa Santos (2000) chama a atenção para a dificuldade da universidade de planificar
adequadamente o sistema educativo em função das necessidades de mão-de-obra no mercado
de trabalho, o que acarreta o deficiente desempenho de suas funções econômicas e
instrumentais. Nesta perspectiva, faz-se útil uma pequena revisão histórica da relação entre a
universidade e o mercado de trabalho.
No primeiro período de desenvolvimento capitalista, a universidade e o mercado de
trabalho eram dois mundos com muito pouca, ou nenhuma comunicação entre si (SANTOS,
2000). Já no período do capitalismo organizado, porém, a relação entre ambos passou a
significar a separação temporal entre dois mundos intercomunicáveis.
A seqüência educação-trabalho estabeleceu uma relação que transformou
internamente os dois mundos. A educação universitária, que antes era a transmissão da alta
cultura, formação de caráter, modo de aculturação e socialização adequado ao desempenho da
direção da sociedade, tornou-se, também, educação para o trabalho, ensino de conhecimentos
utilitários, de aptidões técnicas especializadas capazes de responder aos desafios do
desenvolvimento tecnológico no espaço da produção. E, no campo do trabalho, que antes era
majoritariamente o desempenho de força física no manuseio dos meios de produção, passou a
ser também trabalho intelectual, qualificado, produto de uma formação profissional mais ou
menos prolongada (SANTOS, 2000).
A resposta da universidade a esta transformação consistiu em compatibilizar a
124
educação humanística e a formação profissional, tentando compensar a “perda da centralidade
cultural provocada pela emergência da cultura de massas com o reforço da centralidade na
formação da força de trabalho especializada” (SANTOS, 2000, p. 196).
Este movimento (assumido de forma mais aberta, em todo o mundo, durante a década
de 1960) trouxe a diferenciação interna do ensino superior: “ao lado das universidades
tradicionais surgiram ou desenvolveram-se outras instituições especificamente vocacionadas
para a formação profissional”. As universidades então se multiplicaram e passaram a conhecer
novas formas de diferenciação e estratificação entre as faculdades tradicionais (direito e
medicina), as novas ou ampliadas faculdades de especialização profissional (engenharias,
ciências e tecnologia, economia, administração) e as faculdades “culturais” (letras e ciências
sociais) (SANTOS, 2000).
Esta ordenação seqüencial, aqui descrita, pressupõe uma correspondência estável
entre a oferta de educação e a oferta de trabalho, entre titulação e ocupação. As mudanças
sociais, políticas, econômicas e tecnológicas, porém, ocorridas nos últimos trinta anos, têm
mostrado a inviabilidade de tal correspondência. O mesmo autor analisa que a universidade,
em sua rigidez institucional, tem dificuldade para captar antecipadamente os sinais do
mercado e agir em conformidade com o mesmo. Como conseqüência, ora escassez, ora
excesso de determinados perfis profissionais, sem que as demandas de profissionalização
tenham o mínimo de estabilidade que permita esboçar uma resposta (SANTOS, 2000).
Como a universidade brasileira lançou mais de 7.000 cursos em menos de oito anos,
percebe-se que é a mentalidade de mercado das faculdades privadas, e não a rigidez citada por
Santos, que vem causar o desequilíbrio entre as demandas do mercado de trabalho por
profissionais titulados e o desaguar incessante e cada vez maior de profissionais graduados
nas mais diversas áreas de atuação. Esta constatação é importante, pois enquanto o
desequilíbrio é causado pela demora da universidade em responder às demandas do mercado
125
de trabalho, vislumbra-se, pelo menos, uma busca pela adequação. Quando há apenas a
preocupação em obter lucro ao atender a demanda por educação superior como símbolo de
status e de poder apreendido, as perspectivas de equilíbrio entre demandas do mercado de
trabalho e a geração de mão-de-obra tornam-se quase nulas.
Entre os entrevistados, inclusive os coordenadores de cursos, é possível verificar que
esta expansão, visando abrir cursos o mais rapidamente possível e com ênfase naqueles que já
têm grande demanda, é vista com desconfiança:
O ritmo de expansão que se deu nas universidades privadas, é um ritmo de
expansão que me pareceu desordenado [...] A gente tem onze cursos superiores e a
gente que não há necessidade desse tanto de curso [...] Não profissionais que
dêem conta de dar aula e de formar bons alunos, e você não tem, nessas possíveis
quinhentas vagas, que é um número hipotético, quinhentas pessoas que se adequem,
e que vão ser bons profissionais publicitários, é que a situação do mercado do
ensino superior fica numa lógica muito imediatista: quais os cursos mais
procurados numa universidade pública? Comunicação, então o sucesso de mercado
é associado ao curso de comunicação, quer dizer você não tem uma pesquisa [...]
Quais outras possibilidades de formação que uma Federal não tem, que uma
Católica não tem e que a nossa faculdade pode dando? A gente acaba vendo
quinhentas novas faculdades de Direito, Administração e Comunicação [...] E você
continua não tendo demanda para esse tanto de profissionais de comunicação.
(coordenador de curso)
Criou espaço para que escolas oportunistas, mais preocupadas com o faturamento
do que com a formação superior, se estabelecessem. (coordenador de curso)
A gente tem uma quantidade de profissões, ou de áreas de atração de conhecimento,
que não existem em Minas Gerais, que não existem em Belo Horizonte, que eu
penso que uma dessas onze faculdades de comunicação poderia muito bem abrir um
curso desses, ao invés de abrir jornalismo, publicidade. Abre, sei , abre e cria-se
o mercado, né? Isso aí [...] Porque se houvesse de fato essa pesquisa, a gente teria
o lançamento de cursos novos. Por exemplo, a respeito de um curso de engenharia
de alimentos, tem um curso na cidade. (coordenador de curso)
Como fica patente nos últimos trechos transcritos, constata-se que o empresariado
que investiu na implantação de cursos o fez focando naqueles que fossem populares entre
os vestibulandos e que tivessem chances de preencher vagas rapidamente. Esta postura
contradiz a noção de inteligência de marketing definida por Kotler, pois quando a oferta é
muita, o valor percebido cai - o que denota uma opção por um caminho que levaria
rapidamente a uma mudança no ambiente-tarefa das faculdades. Como um entrevistado
126
definiu:
O mercado saturado significa uma maior oferta e um menor valor percebido,
porque você começa a achar que pode pagar qualquer porcaria. (dono de agência)
Ao agir desta forma, sem se preocupar com o valor percebido que o profissional que
forma terá/tem no mesmo mercado de trabalho que é o um dos principais argumentos de
vendas dos seus vestibulares, as faculdades podem estar, a médio e/ou longo prazo
prejudicando a si próprias. Em termos nacionais: “nos últimos três anos, enquanto o número
de interessados em estudar em uma faculdade privada cresceu 38%, o número de vagas
oferecidas aumentou 60%” (KOSTMAN, 2004, p. 62). O resultado desta equação é que de
cada 100 vagas oferecidas pelas instituições privadas, 36 ficam ociosas. Esta constatação
reforça a noção de que o empresariado brasileiro tem propensão a visar iniciativas que dêem
retorno no curto prazo (FREITAS, 1995). Um dos entrevistados, inclusive, explicitou sua
percepção da seguinte forma:
É uma característica do brasileiro, do mineiro, do brasileiro em geral, é a falta de
planejamento da área pública, da área privada [...] Então, se não tem
planejamento, você não tem um cronograma, então fica muito na base do
imediatismo, do achismo [...] Não se investe em pesquisa. (dono de agência de
marketing político)
No entanto, como abordado anteriormente, a expansão do número de faculdades
provoca visões diferenciadas, conforme é possível verificar pelos depoimentos a seguir:
Acredito que o próprio mercado publicitário saberá reconhecer e valorizar o
profissional que teve um bom percurso acadêmico do profissional mal formado.
(coordenadora de curso)
Eu não conheço todos esses cursos, eu, na verdade, em algum momento eu perdi a
conta. Eu, outro dia, estava assim: quais são os cursos de comunicação em Belo
Horizonte? Você começa a contar, você se perde. E eu não conheço o espaço, a
estrutura curricular, muito menos a estrutura física desses cursos [...] A gente tem
praticamente três centros formadores em comunicação em Belo Horizonte: Federal,
Católica e Uni-BH, não chega a quatro. Você tinha a Newton Paiva com relações
públicas, de uns cinco ou seis anos pra surgiu uma quantidade muito grande,
você pega a Fumec, Izabela Hendrix, Metropolitana, Estácio, tem essa Salgado de
Oliveira [...] Você perde o controle. (coordenador de curso)
127
O ensino acadêmico, a universidade, a procura do conhecimento como um cunho
em si, ela não é pro conjunto da sociedade. o que? efetivamente a predição
de um certificado vendido em várias modalidades, enquanto que aquele que você
poderia dizer que é conquistado pelo mérito, está muito dentro das instituições mais
credenciadas, fundamentalmente instituições publicas, onde efetivamente não se
paga, ou se paga com os impostos, mas não é percebida essa relação de compra e
venda que se presencia em outros lugares. E você tem instituições que ainda que
tenham uma lógica, uma racionalidade econômica - elas dependem da mensalidade
dos alunos - elas objetivam esse saber acadêmico. Eu gosto de pensar que a gente
faz parte desse grupo, e você tem um grupo de instituições que estão fagocitando-se,
porque efetivamente estão num processo de canibalização, quer dizer, vale tudo,
que utilizam estratégias escusas. (coordenador de curso)
Como fica claro nos depoimentos acima, realmente entre os coordenadores de
cursos uma tendência a classificar as faculdades de Publicidade e Propaganda. Os critérios
podem mudar de um entrevistado para outro, mas a tendência é a mesma. Enquanto um dos
entrevistados coloca as instituições mais antigas como os “centros de referência”, outro - que
coordena um curso mais recente - pretende incluir a instituição que coordena no rol das que
buscam o “saber acadêmico” que caracterizaria as faculdades de primeiro time. Ambos, no
entanto, reforçam a institucionalização de classes entre as escolas.
Esta noção de hierarquia entre as instituições de ensino desperta atenção para as
questões: como a escola é percebida pelo mercado? E quais as razões desta percepção?
5.2 Como as escolas de publicidade e propaganda são percebidas pelo mercado publicitário
de Belo Horizonte
Partindo do fato de que para a prática publicitária não exigência legal de um
diploma, mas mesmo assim um grande número de escolas de Publicidade e Propaganda,
faz-se mister detectar como o mercado publicitário percebe estas escolas e seus alunos e
egressos. A primeira questão que surge, então, é a seguinte: o mercado acha essenciais as
escolas de Publicidade e Propaganda para a formação do publicitário? As transcrições que se
128
seguem nos dão uma pequena mostra do que donos de agências, presidentes de órgãos
patronais e publicitários com mais de dez - alguns com quase trinta - anos de mercado acham:
Apesar de eu ser jornalista, eu acho que o precisa ser jornalista (formado) para
ser um bom jornalista. Como eu acho que não precisa ser publicitário (formado)
para ser um bom publicitário. Agora, que existe escola de publicidade, a
faculdade de publicidade, o curso superior de publicidade, vamos tentar fazer com
que essas faculdades aprimorem os ensinamentos para formar bons publicitários.
(dono de agência)
Eu acho que alguns o cursos que sabem que tem que ter uma divulgação legal
[...] Formação eu não conheço bem. Agora, eu acredito que existem instituições em
Belo Horizonte que até pela tradição, ou mesmo pela inovação, são bem
percebidos. (publicitário)
Eu acho que ainda é muito fraco o que eu vejo. No meu caso, quando eu estudei, eu
achei que eu aprendi muito mais dentro da agência, da empresa que eu trabalhei do
que... Do que na escola. Tenho que confessar isto, mas acho que está melhorando, e
muito. (dono de agência)
Eu acho que transcende o curso específico de publicidade. Por exemplo, o
administrador de empresas que nunca foi publicitário (de formação). O Nizan
Guanaes é administrador de empresas, o é publicitário (de formação). Eu
conheço, eu tenho aqui na minha agência pessoas que não são publicitários (de
formação). (dono de agência de marketing político)
Eu dou um valor enorme à questão da experiência, da vivência. Tenho profissionais
que atuam comigo que não têm graduação. (dono de agência de marketing
promocional)
Qualquer profissão pra mim pode ser um bom publicitário; sobretudo na área de
criação [...] Se o cara é médico, se o cara tem uma boa noção espacial, tem bom
gosto, se sabe expor uma imagem, se é criativo pra buscar uma imagem pra ilustrar
alguma coisa, esse médico pode ser também um diretor de arte. Se o cara estuda
filosofia, gosta de escrever, sabe fazer um texto, é criativo, sabe fazer um título,
sabe como aliar texto com título, texto com a imagem, título com a imagem, ele
pode ser excelente redator de publicidade. (dono de agência)
Os coordenadores de cursos entrevistados fazem um contraponto que traduz o
posicionamento da academia frente a esta ótica mais tecnicista, colocando a importância da
escola por um outro ângulo:
O diploma, ele hoje, na minha opinião, ele é uma questão meio acessória, porque o
fundamental é a formação. Porque efetivamente a gente sabe que você pode se
tornar um jornalista ou um publicitário simplesmente freqüentando uma redação ou
uma agência. Vovai aprender as rotinas, você vai saber usar a tecnologia [...] O
publicitário, ele hoje, efetivamente tem que dar conta de uma teoria sofisticada [...]
129
As possibilidades, as identidades, os valores, eles estão em permanente processo de
atritos, erosão e construção que fazem da profissão do publicitário algo muito
complicado, muito solicitado. Então ele precisa ter uma formação especificada.
(coordenador de curso)
A dicotomia entre as visões do mercado sobre a escola de Publicidade e Propaganda
e o modo como um representante da academia enxerga a mesma escola denota um
descompasso entre as duas instituições quanto ao papel da segunda. Enquanto ambos
concordam que a escola não substitui a experiência prática adquirida na lida cotidiana, os
representantes da academia enxergam uma outra função, mais voltada para uma formação
mais humanista, que escapa à visão tecnicista dos representantes do mercado.
Como a multiplicação de escolas de Publicidade e Propaganda em Belo Horizonte se
deu no bojo de um movimento mais abrangente, decorrente da política do Ministério da
Educação do governo Fernando Henrique Cardoso, a maioria destes cursos é muito nova e
ainda não formou as primeiras turmas. As percepções que os representantes do mercado
entrevistados têm, portanto, muito a ver com a quantidade de cursos e nem sempre com a
formação específica que cada uma dessas escolas proporciona. Ou seja: enquanto no universo
das faculdades as mesmas se percebem diferentes, para o mercado publicitário o conjunto de
escolas é que aparece com muito mais destaque.
O número de cursos certamente assusta os publicitários, posto que aumenta a
concorrência tanto no que tange a vagas de trabalho, quanto no que se refere a novas agências
concorrendo no mercado, como visto no capítulo referente ao mercado. Por isso esta
quantidade de cursos é um ponto importante a ser abordado. Os seguintes trechos transcritos
de entrevistas com representantes do mercado dão uma idéia de como esta expansão dos
cursos é percebida:
Houve uma perda de qualidade patente, porque não é possível, na minha cabeça,
ter tanto curso aberto com qualidade de corpo docente e de estudante. Nas duas
pontas eu vejo uma perda de qualidade. (dono de agência de marketing
promocional)
130
Eu não conheço, por exemplo, a qualidade desses cursos. Agora, que certamente,
com o volume desses que nós estamos no mercado, com uma economia nossa que
cresce a passo de gado, com a transferência que houve aqui, das grandes
empresas que saíram daqui, perdemos decisões de propaganda e de marketing pra
outros estados. Eu acho muito complicado. E ainda tem a xima de que mineiro é
calado, de que a gente é fechado entre montanhas, entre outras coisas. Quer dizer,
vai ser uma guerra de foice. (dono de agência de marketing político).
A escola assusta o mercado. Você escolas despejando três mil alunos que tão
sendo preparados e no ano passado morreram dois publicitários (risos). (dono de
agência)
Eu acho que eu tenho, do ponto de vista do marketing, é cercar os novos entrantes.
Dependendo do meu ponto de vista, fechava escola de comunicação. Veja bem, a
minha entidade é patronal, é pra defender o negócio da propaganda [...] Nós não
somos carrascos. Mas você veja bem, o pessoal de Direito fazendo tudo pra
fechar as faculdades de Direito. A Ordem dos Advogados do Brasil briga
violentamente pra impedir que se abram novos cursos. O pessoal da Medicina
fazendo a mesma coisa. Eu, como representante de órgão patronal, eu quero mais é
que feche as portas de Comunicação [...] Porque o mercado tá saturado. E o
mercado saturado significa uma maior oferta e um menor valor percebido. (Dono
de agência)
O pessimismo radical, no entanto não é partilhado por todos. alguns
representantes do mercado entrevistados - uma minoria, ressalte-se - que, apesar de não serem
otimistas, acham que:
Eu acho que o excesso de cursos quem faz, ou quem regula, é o próprio mercado. É,
eu não sou tão neoliberal, mas eu acho que é a lei da oferta e da procura. Se você
tem oferta, vão formar gente até que sature. Uma hora... E aí... Eu acho... E você
começa a diminuir. (dono de agência)
Esse boom que aconteceu, isso é sazonal também, é periódico. Na época em que eu
fazia vestibular, a moda era fazer administração de empresas. Depois a gente
chegou à conclusão que o cara que não tinha empresa do pai para administrar, de
quê que adiantava ser mais um no mercado? E daí foi Medicina, Odontologia, o
próprio Direito, Comunicação, de uns tempos pra [...] Então essa sazonalidade
também, ela depende muito do mercado, na medida que tem muitos profissionais
disputando o mercado que é de um determinado tamanho. (publicitário)
É lógico que o mercado não comporta tudo isso, mas também nunca comportou.
Mesmo quando eu comecei a trabalhar em propaganda, quando o curso o existia
[...] Em todo momento, em qualquer curso, você vai ter o que se dedica mais, né? E
o que se dedica menos. O que dedica mais vai ser um grande engenheiro, vai ser um
grande médico. Hoje você a medicina aí, passando por momentos difíceis
também, os grandes médicos é que estão numa posição melhor. Você tem uma
série de médicos que nem exerce a profissão [...] Você tem advocacia, você tem
pra todo o lado. Agora, os que fazem o que gostam e os que colocam como objetivo
ser um grande profissional, ele vai ser, indiferente desse número. (diretor de holding
de veículos de mídia)
131
Apesar de não ter sido observado pelo entrevistado que falou o último trecho
transcrito, a situação de precariedade que ele cita, envolvendo profissões tradicionais e antes
tidas como sinônimos de boas carreiras, como advocacia e medicina, possivelmente estão
passando pela situação descrita também em função do grande número de profissionais
disponíveis no mercado. Não é à toa que outro entrevistado citou os esforços da OAB e de
órgãos de classe representantes dos médicos contra a proliferação de cursos em suas
respectivas áreas. O seguinte trecho é bastante elucidativo quanto à percepção que
publicitários têm sobre a relação entre o número de cursos e a precarização das condições de
trabalho:
Uma quantidade muito grande de profissionais. É por culpa exatamente disso .
Esses profissionais existem pra baratear o preço. Prova que os profissionais mais
competentes são os mais baratos, tá? Isso está acontecendo em todas as áreas [...]
Não é de comunicação não, eu estou falando de economia, de todas as áreas.
(dono de agência)
Questionado se esta situação acima descrita seria decorrente do grande número de
escolas de nível superior, a resposta do entrevistado foi taxativa: “claro”.
5.3 Não replicar o mercado significa fugir à realidade?
Como citado por um entrevistado, a escola “assusta o mercado”. Mas além de
“assustar”, a escola também pressiona o mercado de diversas formas, seja gerando uma grande
quantidade de mão-de-obra para concorrer no mercado de trabalho e/ou com as agências
estabelecidas ao abrir novas agências, o que significa maior oferta e todas as conseqüências
dessa concorrência, conforme analisado; ou incutindo nos alunos formas de percepção da
Comunicação Social, e mais precisamente da propaganda, se não diferentes, pelo menos mais
amplas que a visão tecnicista que o mercado espera dela. Esta diversidade nas formas de
enxergar o mercado incomoda o status quo estabelecido.
132
A estrutura seqüencial que pressupõe que a escola prepara para o mercado de
trabalho que a sucederá (SANTOS, 1995) foi traduzida, por um dos coordenadores
entrevistados, da seguinte forma: a escola, sob a ótica dos publicitários estabelecidos, é o
lugar da teoria e o mercado é o local da prática. Esta ótica é também o ponto nevrálgico de
uma das maiores críticas que se faz às escolas: a de que a teoria seria muito diferente da
prática e que isto se daria porque os professores supostamente vivem a realidade da academia
e não a realidade do mercado:
No nosso mercado, desde da época de estudante, sempre observei uma diferença
entre o estudante de medicina e o publicitário, na área de comunicação, vamos
falar assim. Por quê? Porque para um médico, normalmente você lecionar tem um
valor dentro do seu consultório, da sua clínica, do seu hospital, muito maior do que
o publicitário bem sucedido, um profissional de marketing bem sucedido. O que
agrega à sua carreira, do ponto de vista de currículo, de visibilidade, não é a
mesma proporção de uma entidade federal de Medicina, de Direito. Isso eu acho
que é um grande diferencial. O que tem, que agrava isto no nosso negócio é que ele
demanda muito tempo. É noite, fim-de-semana, madrugada, e tudo mais. E é uma
profissão em que não existe muito horário para as coisas começarem, terminarem,
eu acho que isto acaba sacrificando o profissional que tem disponibilidade, por
mais que tenha interesse, e eu me incluo nesse caso, pra lecionar com qualidade
com tempo para preparar material e com condição de para dar aula. Então
acho que o nosso negócio na Educação ele sofre um pouco neste sentido. O quê que
eu vejo? Eu vejo profissionais que na carreira acadêmica se destacaram e
rapidamente começam a lecionar porque são consistentes do ponto de vista de
formação acadêmica e profissionais mais maduros, que já não estão vivendo o
melhor momento da sua carreira, por isto cabe, têm encontrado espaço. Eu
vejo que à elite da comunicação não acomete lecionar em graduação. Então você
vai trabalhar e você já começa a ter acesso realmente a profissionais que fazem a
diferença. (dono de agência de marketing promocional)
Eu acho que uma auto-suficiência muito grande porque os professores - me
perdoe, você é professor de Comunicação - não são homens do mercado. Não são
pessoas de mercado, são teóricos. Na prática, se eu focasse na teoria estaria
perdendo meu tempo. Eu conheço só um publicitário que é professor, eu só conheço
esse, agora se existem outros, eu não sei [...] Seria o ideal isso, do mesmo modo que
o mercado deveria exigir que todo profissional fosse formado, toda escola deveria
exigir do professor uma experiência profissional, pra não ficar naquele mundo de
ilusão. (dono de agência)
No entanto esta crítica aos professores, que supõe serem eles alheios, de certa forma,
à realidade é antiga e não é privilégio das faculdades mineiras. Em função de críticas
semelhantes, Adorno (1995, p. 109-110) refere-se aos professores em geral da seguinte forma:
Eles encontram-se em permanente suspeição de estarem fora da realidade. Ao que
tudo indica, não estão mais longe da realidade do que, por exemplo, os juízes, para
133
quem o distanciamento da realidade seria uma característica fundamental, conforme
as análises de Karl Kraus a partir dos processos judiciais no plano dos costumes.
A observação de Adorno, portanto remete a um distanciamento saudável, que
permitiria um olhar crítico sobre o mercado, como os coordenadores entrevistados julgam ser
de bom tom manter na academia e também passar aos seus alunos, como fica claro nos
seguintes trechos transcritos:
Acho que a escola precisa preparar o aluno para o entendimento do negócio da
comunicação, e mais especificamente da propaganda, em primeiro lugar. Mas
acredito que o mercado, muitas vezes, valoriza mais o aspecto técnico (domínio de
softwares, por exemplo) do que a capacidade intelectual e potencial de crescimento
dos alunos. (coordenadora de curso)
As vezes um péssimo profissional é um excelente professor, a relação - e eu,
pessoalmente, entendo que um professor de instituição universitária é outra coisa.
Eu entendo que a formação de graduação não é uma formação técnica, ainda que
profissionalizante, mas ela não é técnica. (coordenador de curso)
Por outro lado, como visto, entre os coordenadores de cursos houve quem
admitisse que a academia não pode dar conta de tudo e que a prática, tão cobrada no e pelo
mercado, seria função do estágio. O que desperta o interesse pelas questões referentes a esta
forma de contato do estudante com o mercado de trabalho e vice-versa.
5.4 A questão dos estágios
O estágio é ponto fundamental da articulação entre as escolas e o mercado de
trabalho, posto que é através desta prática que os estudantes processam o intercâmbio entre os
conhecimentos que adquirem na academia e o modus operandi do ambiente profissional.
Além de enriquecer seu repertório de competências e práticas, através das
experiências vividas no ambiente do estágio, o estudante leva estes conhecimentos para a sala
de aula, na forma de comentários, adendos e dúvidas quanto ao que é ensinado,
134
proporcionando, de certa forma, aos seus colegas e até aos professores, usufruir desta sua
experiência.
Pelo lado do mercado, o estágio é a chance de convívio com novos talentos que, além
de estarem “com a cabeça fresca pras idéias, sem autocensura” e com o vigor e entusiasmo
próprio de quem é neófito, como frisaram alguns dos entrevistados, possivelmente também
trazem uma bagagem de teoria da comunicação mais atualizada, ou, como fez questão de
salientar um entrevistado:
Sabendo muito de tecnologia e ambientados em uma nova forma de pensar a
comunicação, descentrada e mais fluida. (coordenador de curso)
Mas como é que o estágio é encarado realmente no mercado publicitário de Belo
Horizonte? Entre os coordenadores, há a crença de que
Em propaganda, o estágio é muito importante e, paradoxalmente, poucas agências
e empresas da área oferecem esses programas de estágio. (coordenadora de curso).
Há, ainda, também entre os coordenadores de cursos, uma preocupação em relação ao
estágio por conta do mesmo tirar o aluno muito cedo da sala de aula, ou seja: o aluno acaba
tomando contato com certas práticas antes de ter uma noção mais aprofundada de elementos
de teoria da comunicação. E o que pode ser ainda mais grave:
O estágio na habilitação publicidade e propaganda não integraliza a carga horária
do curso. Portanto, o é obrigatório. Nossa leitura é que o estágio hoje se tornou
um problema para a universidade, uma vez em que o mercado tem utilizado o aluno
como mão-de-obra barata, cada vez mais cedo. Isso tem como conseqüência a
precarização do mercado de trabalho e da formação do aluno. (coordenador de
curso)
Por parte do mercado publicitário, no entanto, o quadro é bastante heterogêneo, no
que tange às formas de seleção e utilização dos estagiários nas diversas organizações. O grau
de organização dos programas de estágios está diretamente ligado ao porte das organizações,
quanto maior a empresa, mais organizado é o seu programa de estágio.
135
Analisando-se os questionários respondidos pelas agências de Belo Horizonte,
constata-se que não um padrão quanto ao número de estagiários em relação ao número de
funcionários. Este percentual varia de zero estagiários até o equivalente a 25% do quadro de
funcionários e prestadores de serviços, conforme o quadro 05:
Sócios K
Trabalho
Funcionários
Prestadores
de serviços
Free lancers Estagiários
% do quadro
(estagiários)
NI 48 04 01 02 3,8
NI 05 05
Vários sob
demanda
01 10
NI 07 10 04 01 5,9
03 04 02 0 0 0
NI 31 07 0 05 13,2
NI 10 02 0 03 25
NI 13 04 0 0 0
NI 10 06 0 02 12,5
02 12 15 Sob demanda
03 11,1
NI 30 20 01 08 16
04 0 0 0 0 0
QUADRO 05 - Distribuição de mão de obra por modalidade de contrato de trabalho
FONTE: dados da pesquisa
Observação: para efeito de contagem de percentual, os sócios e free lancers não foram
contabilizados.
Observação: as iniciais NI significam “Não Informado”.
Números tão díspares também suscitam questões com relação aos programas de
estágio. Dos representantes do mercado entrevistados, somente dois admitiram ter em suas
respectivas empresas algum tipo de programa de estágio:
Olha, nas nossas empresas s temos um projeto de estágio que é feito com as
escolas. Nós temos dois recrutamentos por ano. Um que a gente faz no mês de
outubro, em que a pessoa trabalha de janeiro a junho, e outro é no mês de maio, em
que a pessoa trabalha de julho a dezembro. Então s temos uma relação estreita
com a escola. (diretor de holding de veículos de comunicação).
A gente, aqui na agência, tem um programa de estágio que eu considero super
legal, porque ele é monitorado, e o estudante - a gente brinca e fala, mas é sério - o
estagiário aqui não passa fax, o atende telefonema, não traz café e não compra
cigarro na esquina pro veterano que tá aqui. Ele faz exatamente o que o veterano
fazendo. O pedido de serviço que chega pro profissional de criação, se ele tiver
estagiário do lado dele, o mesmo pedido chega pra ele e ele vai tentar fazer. O
estagiário de mídia é a mesma coisa, o mesmo pedido chega pra ele. Porque ele
fazendo, tentando fazer, é que ele vai conseguir aprender. Antes, o estagiário virava
136
um boy de luxo. Hoje isso acabou, o estudante é mais respeitado e quanto mais
escola e a agência do mercado publicitário como um todo se aproximarem, melhor
vai ser para todo mundo. (dono de agência)
Vale à pena ressaltar que estas organizações, retratadas pelas últimas transcrições,
pertencem a dois dos maiores grupos de empresas do mercado publicitário mineiro e,
portanto, tendem a ser muito mais assediados por candidatos e em função disto precisam estar
melhor estruturados. Mesmo assim, a sua estruturação diz respeito apenas à seleção e não ao
programa a ser cumprido dentro da empresa após a admissão:
Não dá para atender todo mundo, por isso que... É... Dos milhares e milhares,
muitos ficam fora [...] Mesmo pra (nome da agência) e pro somatório de agências,
não dá também para atender a todo mundo. A gente tem um programa de estágio
que dura noventa dias, e a partir do sexto período para frente, exatamente pra
dar oportunidade pra mais pessoas. Porque se juntar a lista de pedidos que nós
temos, dá uma volta nesse quarteirão aqui. (dono de agência)
Mesmo entre as agências de pequeno porte, a procura por estágios é imensa:
Eu recebo, eu posso mostrar pra você agora, pelo menos oitenta currículos de
pessoas que tentam entrar no mercado. (dono de agência)
Estas agências, no entanto, não têm um programa de estágios estruturado:
Nosso negócio é promoção. O estagiário entra e vai trabalhar com o pessoal da
promoção, que é o negócio da empresa. Então ele entra e vai ajudar, dar uma
assistência, a quem estiver precisando e assim vai pegando o traquejo. (dono de
agência de marketing promocional)
Por exemplo, uma agência que tem um programa de estágios organizado, que tem
uma sinalização clara que você vai entrar aqui, vai passar um período, vai fazer
isso, aquilo, aquilo outro. Eu ouço e vejo, em alguns casos, em São Paulo, de
coisas um pouco mais estruturadas, organizadas. Aqui ainda é muito caseiro. (dono
de agência de marketing promocional)
A enorme quantidade de candidatos para um número limitado de vagas para estágios
e a ausência de programas, ou a existência de programas de estágio sem o necessário diálogo
com as escolas - uma vez que a não obrigatoriedade do estágio reduz a influência da escola
neste processo - se apresentam como questões que merecem uma maior atenção quanto à
articulação entre escolas e mercado.
137
5.5 Capital social e a inserção no mercado de trabalho
É interessante observar que durante o desenvolvimento deste estudo uma contradição
apareceu com uma certa freqüência: por um lado, os entrevistados colocam que os estudantes
que realmente tiverem talento, obstinação e vontade de serem bons profissionais o
conseguir se destacar da multidão, como atestam os seguintes depoimentos:
Na medida que tem muitos profissionais disputando o mercado de um determinado
tamanho, esses profissionais vão se destacar a medida em eles procurem este tipo
de atitude mesmo, que ele desempenhe esse tipo de posição. Aqui, por exemplo, tem
estagiários aqui na agência que conseguem imaginar aquilo que vai dar certo, que
vai dar errado. Você vê pela postura da pessoa que tem tudo pra dar certo.
(publicitário)
Olhando sobretudo jovens talentos, estudantes ou formandos, que querem entrar no
mercado publicitário, eu costumo dizer que o mercado publicitário ainda não está
saturado, que a crise é de competência. Apesar de milhares e milhares de
formandos entrarem, quererem entrar, a cada ano nesse mercado e não ter vaga
pra todo mundo, os competentes certamente vão achar colocação nesse mercado.
(dono de agência)
Os mesmos entrevistados, no entanto, em outros trechos de suas entrevistas
contradizem esta visão ao citar uma série de fatores que influenciam/influenciarão as chances
de inserção e destaque dos novos publicitários no mercado de trabalho. Um desses fatores é o
capital social.
Bourdieu (1995, p. 67) define o capital social como sendo:
O conjunto de recursos atuais ou potenciais que estão ligados à posse de uma rede
durável de relações mais ou menos institucionalizadas de interconhecimento e de
inter-reconhecimento ou, em outros termos, à vinculação a um grupo, como conjunto
de agentes que não somente são dotados de propriedades comuns (passíveis de serem
percebidas pelo observador, pelos outros ou por eles mesmos), mas também são
unidos por ligações permanentes e úteis. Essas ligações são irredutíveis às relações
objetivas de proximidade no espaço físico (geográfico) ou no espaço econômico e
social porque são fundadas em trocas inseparavelmente materiais e simbólicas cuja
instauração e perpetuação supõem o re-conhecimento dessa proximidade. O volume
de capital que um agente individual possui depende então da extensão da rede de
relações que ele pode efetivamente mobilizar e do volume de capital (econômico,
cultural ou simbólico) que é posse exclusiva de cada um daqueles a quem está
ligado. Isso significa que, embora seja relativamente irredutível ao capital
econômico e cultural possuído por um agente determinado ou mesmo pelo conjunto
de agentes a quem está ligado (como bem se no caso do novo rico), o capital
138
social não é jamais completamente independente deles pelo fato de que as trocas que
instituem o inter-reconhecimento supõem o reconhecimento de um mínimo de
homogeneidade ‘objetiva’ e de que ele exerce um efeito multiplicador sobre o capital
possuído com exclusividade.
Ainda de acordo com Bourdieu (1995, p. 67), os lucros que o pertencimento a um
grupo proporciona estão na base da solidariedade que os torna possível”. Este capital social é
produto de investimento social, mesmo que inconsciente em alguns casos, orientado para a
instauração, manutenção e reprodução de relações sociais que podem vir a ser utilizadas a
qualquer hora para gerar lucros simbólicos ou materiais. Este processo se mediante uma
política de trocas (de palavras, de presentes, de favores etc.) como instrumento de
comunicação que produz o conhecimento e o reconhecimento:
A troca transforma as coisas trocadas em signos de reconhecimento e, mediante o
reconhecimento mútuo e o reconhecimento da inclusão no grupo que ela implica,
produz o grupo e determina ao mesmo tempo os seus limites, isto é, os limites além
dos quais a troca constitutiva, comércio, comensalidade, não pode ocorrer.
(BOURDIEU, 1995, p. 68).
É por isso que a reprodução do capital social se dá, basicamente, em duas instâncias:
a) nas instituições que visam favorecer as trocas “legítimas”, isto é, as trocas entre membros
reconhecidamente do grupo, e que por isso produzem ocasiões (recepções, cruzeiros, leilões
etc.), lugares (bairros chiques, escolas de elite, clubes etc.) e/ou práticas (esportes chiques,
cerimônias culturais, hobbies caros etc.) e; b) no trabalho de sociabilidade desenvolvido pelos
diferentes membros do grupo, através das trocas contínuas que visam afirmar e reafirmar,
incessantemente, o reconhecimento - o que supõe o conhecimento das relações e ligações e
também da arte de mobilizá-las e da disposição para obter e manter essa competência - o que
demanda dispêndio de tempo e esforços (que têm sua equivalência em capital econômico),
além de capital econômico propriamente dito, não raras vezes. Os rendimentos deste trabalho
de estabelecimento e manutenção do capital social são tanto maiores quanto mais importante
for tal capital.
139
Durante as entrevistas ficou patente que o capital social influencia fortemente as
chances de inserção numa vaga de estágio no mercado publicitário:
Eu vejo muito cliente pegar o telefone e dizer assim: minha filha formando em
Comunicação ano que vem. Arruma um estágio pra mim, pra ela [...] Um amigo
seu, um cliente seu, um fornecedor, um veículo, um parceiro seu ligar e encaminhar.
O “Quem Indica” hoje ainda é o melhor caminho [...] A maioria você pode saber
que foi indicação de alguém pra alguém ou alguma coisa desse tipo. (publicitário)
Eu acho que o mercado dois nomes, um pejorativo e um bacana: Q.I. e network
(risos)... Mas é fundamental. É. É super comum, você tá numa final, num
processo de seleção - não na agência, mas em grandes empresas - em que existe
um profissional que te recomendou e uma situação que não. A tendência é fechar
com quem tem. (dono de agência de marketing promocional)
Mesmo entre as maiores e mais estruturadas em termos de programa de estágio, e que
pelo porte também são mais visadas em termos de uma “cobrança” por parte das instituições
de ensino, também verificou-se a ocorrência dos privilégios de inserção por indicação:
Nós temos duas formas: uma que é a inscrição por internet, o envio de currículos
que entra numa fila natural e desses seis que sempre estão estagiando, normalmente
quatro entram pela fila e a gente deixa duas, que é o que a gente chama de reserva
técnica, que é o famoso Q.I. É o “quem indica”, porque a gente tem clientes, a
gente tem amigos, a gente tem fornecedores que muitas vezes pedem: tem uma
vaga? Aí a gente deixa sempre duas vagas pra isso. (dono de agência)
Esta contradição torna patente que as chances não são iguais e que possibilidades
reais de um bom estudante, esforçado e talentoso o conseguir o estágio que lhe
proporcionaria o ingresso no mercado de trabalho, enquanto, por outro lado, estudantes
mesmo sem grandes talentos, ou a relapsos, por deterem um certo capital social, podem
encontrar tais oportunidades.
Também é interessante frisar que durante o período de desenvolvimento do presente
estudo, esta mesma agência de grande porte, cujo presidente citou a “fila natural para
obtenção de estágios”, mas não especificou como que as vagas eram definidas entre os
ocupantes desta fila que daria a volta no quarteirão”, lançou o seu programa de estágio
solidário”. Este estágio solidário consiste na inscrição para estágio mediante a entrega de
140
alimentos não perecíveis para doação a instituições de caridade. Depois de encerradas as
inscrições, todos os candidatos recebem um briefing para criar uma peça publicitária e aqueles
que apresentarem as melhores criações ganham o estágio. Este mecanismo suscita outra
contradição, esta sobre a importância de ampliar o foco, fazendo com que os estudantes se
interessem por outras áreas que não a criação. Como o próprio presidente desta agência foi
categórico ao afirmar que antigamente 80% dos pedidos de estágio eram para a criação, mas
que agora este quadro estaria se revertendo.
Outras formas de recrutamento e seleção de estagiários em uso foram citadas:
Quando é necessário, eu olho na lista dos currículos, faço algumas entrevistas e
vejo nos meus departamentos qual está precisando mais, então eu pego a pessoa
mais adequada para aquele departamento. A estagiária que eu tenho aqui agora,
ela tem um perfil excelente de... De atendimento. Era o que eu tava precisando.
(dono de agência)
(Nas) Páginas de propaganda dos jornais locais. A gente coloca, a gente sempre
tem uma notinha, tem alguma coisa. (dono de agência de marketing político)
Quando você mexe diretamente com uma faculdade, a gente o consegue filtrar,
então engarrafa muito [...] Houve de colocar em quadro de avisos. Faltou, digamos
assim, talvez, conversar mais diretamente com a própria faculdade. (dono de
agência de marketing político)
E uma outra, que se destaca pelo uso de instrumentos que visam fazer o
direcionamento dos novos admitidos para as suas áreas de maior aptidão, buscando, assim, um
melhor aproveitamento do período do estágio para ambas as partes, estagiário e organização:
É lógico que nesse estágio tem uma seleção. Aqui a gente pratica um instrumento
que chama P.I., de recrutamento, de seleção. É um instrumento que te indica, dentro
do perfil traçado pela empresa aonde esta pessoa vai se adaptar melhor: ou na
criação, ou na produção, ou na mídia, ou na contabilidade... aonde for. Então o que a
gente tem é um programa de estágio muito bem definido, muito bem feito. E
esperamos que a gente esteja contribuindo da melhor forma possível. (diretor de
holding de veículos de mídia)
O lado que se pode criticar nesta forma de seleção de estagiários recém descrita é que
o direcionamento para uma área específica não permite ao estagiário passar por outras áreas,
ver como as mesmas funcionam, ampliando seus horizontes de entendimento da atividade
141
publicitária como um todo, o que eventualmente poderia despertar, inclusive, o interesse do
estagiário por outra área que não aquela de seu interesse inicial.
Outras formas de seleção de estagiários, porém, ainda foram sugeridas:
Devia ser feito a partir do momento que ela criasse um banco de estagiários. Esse
banco de estagiários seria selecionado de alguma forma, de acordo com o critério
de cada agência e não com critério de indicação e dentro das agências houvesse um
programa de desenvolvimento mesmo. Alguma coisa que orientasse, que o fosse
tão na base do achismo mesmo. Porque você o tem como avaliar [...] Entra um
estagiário pra trabalhar de redator e começa a fazer coisas que, se ele não foi
indicado pelo diretor de criação, ele vai ser de alguma forma, julgado [...] O
processo, eu acho que o processo é errado. (publicitário)
Há, portanto, várias formas de recrutamento de estagiários em voga no mercado
publicitário de Belo Horizonte. Poucas são as que envolvem as faculdades e a própria empresa
onde se dará o estágio. Dentre os entrevistados, somente um citou alguma espécie de ligação
entre sua empresa e as faculdades no sentido de captação de estagiários:
Olha, eu vou te dizer, mas acho que o mais. Eu tenho certeza que temos com a
Católica, temos com a Newton Paiva e, se não me engano, com a Federal, mas, se
não me engano, são cinco no total. (diretor de holding de veículos de mídia)
Este programa, apesar de ser o mais articulado com as escolas, abarca apenas algo em
torno de três a cinco faculdades, de um total de onze e a dita articulação entre faculdades e
empresa limita-se ao encaminhamento dos candidatos aos estágios. O programa de estágio em
si, por sua vez, não é discutido com as faculdades. O programa de estágio, aliás, em qualquer
área de atuação, é inerente à política interna das empresas que os implementam. O que se
questiona em relação a uma possível abertura para o diálogo teria como objetivo a discussão e
o aprimoramento destes programas, buscando maximizar os benefícios tanto para as
organizações que oferecem os estágios quanto para os estudantes.
Pelo menos uma iniciativa neste sentido foi tentada no mercado publicitário de
Belo Horizonte:
Eu tive uma experiência muito boa quando a Casablanca foi comprada. Quando
142
houve a aquisição da Casablanca [...] E uma pessoa da PUC, Thaís Leão, ela
trabalhava com a gente, ela desenvolveu um projeto que nós tínhamos na época lá,
acho que oito ou dez estagiários. Um projeto: Emprego no Mercado, em parceria
com a PUC. Existia uma funcionária, paga pela empresa, pela Casablanca, que
fazia o link e administrava esse programa [...] Fazendo estagiário circular em
várias áreas. Não tinha aquele aluno que - Puxa, eu sou criativo, minha e falou
que eu sou criativo, eu vou trabalhar na criação. Ele chegava como um aluno
que queria aprender como funcionava a agência [...] Só que não foi à frente,
porque com o passar do tempo quem fazia o investimento se desinteressou. Na
verdade, o dono. (publicitário)
A ausência de programas de estágio mais elaborados, feitos a quatro mãos com as
faculdades ocasiona inclusive visões muito diferentes sobre um mesmo ponto. Enquanto um
dono de agência orgulha-se de dizer que os estágios em sua empresa duram três meses, para
poder dar chances a mais estudantes de vivenciar o dia-a-dia de uma agência, um publicitário
com mais de quinze anos de mercado é enfático ao afirmar que:
Não tem como julgar um estagiário num período de três meses. (publicitário)
O entrevistado acredita que este modelo de programa de estágios deveria ser sugerido
ao mercado pelas escolas:
Tinha que ser desenvolvido. Eu acho que a escola, ela tem até por dever sugerir
alguma coisa, tentar mudar alguma coisa, tentar apresentar pro mercado alguma
coisa que seja viável. (publicitário)
Nos últimos anos, portanto, houve um grande aumento no número de cursos de
Publicidade e Propaganda e, conseqüentemente, também do número de estudantes. Este
quadro tem como pano de fundo um mercado publicitário cada vez mais disputado tanto pelo
número crescente de agências - de propaganda e especializadas em outras ferramentas -
quanto pela escassez de contas de grande porte.
Como visto, o grande número de estudantes e as limitações das oportunidades de
estágio e de emprego, além da precarização das condições deste último, acaba por ocasionar
um aumento ainda maior do número de agências e afins (tais como corretores). Este é um
cenário que, como comentado, “assusta o mercado” que, de acordo com representantes
143
entrevistados acreditam, caminha para a saturação e tende a ser desfavorável para todos os
atores envolvidos.
Todo este quadro visto até aqui levanta, portanto, questões relativas às instâncias, os
pontos de contato em que há, ou poderia haver, o diálogo entre as faculdades e os atores do
mercado publicitário - agências de propaganda, agências de no media, veículos, órgãos de
classe etc.
5.6 Há diálogo entre as escolas e o mercado de publicidade e propaganda?
Pelo visto aaqui, nota-se que nenhuma das duas vertentes - escola ou mercado -
tem uma visão muito clara de como a outra a enxerga, de como gostaria que o outro se
comportasse em relação a ela e/ou de como estas lacunas afetam a ambas reciprocamente.
Se por um lado, as escolas enxergam que o mercado valoriza mais uma visão
tecnicista, quando acham que o enfoque da academia deve ser mais abrangente, ela não busca
o diálogo para esclarecer o mercado quanto aos seus objetivos e compromissos.
Esta busca seria importante posto que os representantes do mercado, donos de
agências, executivos, publicitários e representantes de órgãos de classe têm, pelas posições
que ocupam, uma grande credibilidade junto à sociedade, inclusive junto aos seus alunos, e
que os prejudicam sobremaneira quando eles dão declarações pouco favoráveis aos cursos -
que são percebidos como um conjunto, em função da proliferação súbita, que ainda não
permite a quem não está diretamente envolvido no meio acadêmico diferenciá-los.
Também é importante verificar que os estudantes, o mercado de trabalho, assim
como boa parte da sociedade, entendem que há, como descreve Sousa Santos (1995), uma
144
relação seqüencial de preparação técnica entre escola e mercado de trabalho. Esta relação
seqüencial pode não implicar numa visão tecnicista, mas esta mesma ocorre - decorrente de
um processo de simplificação reducionista que confunde a preparação para o trabalho com a
preparação técnica que capacitaria o estudante a operar máquinas e replicar os processos de
produção em voga hoje no mercado - e não pode ser ignorada.
Pelo lado do mercado, por sua vez, este diálogo teria a função de autoproteção, uma
vez que os alunos destes cursos podem tanto vir a ser mão-de-obra em suas empresas, quanto
prestadores de serviços, parceiros e até mesmo concorrentes, em um futuro muito próximo. E
que o entendimento que estes indivíduos têm do negócio da propaganda é fator preponderante
para definir os rumos que o mercado publicitário de Belo Horizonte tomará, à medida que eles
forem se inserindo no cenário. Em última análise, os estudantes e recém-formados de hoje
serão o mercado de amanhã.
No entanto, apesar de serem escolas de comunicação e empresas de comunicação, as
vertentes não se comunicam. É pertinente dizer que hoje as percepções divergentes dão-se
muito mais pela ausência de diálogo do que pela crença em valores divergentes. Isto não
significa que os valores divergentes não existam, ou que deixarão de existir caso venha
ocorrer tal diálogo, mas hoje não conhecimento mútuo que permita que opiniões
devidamente fundamentadas possam ser formadas. E isso se pela falta de diálogo, como
fica patente nas transcrições que se seguem:
Esse número que você falou de cursos, eu não sabia que tinha tantos no estado,
trinta e três... Pois é, eu não sabia disso, é um dado novíssimo pra mim. Pra você
ver, nós não temos um norte [...] Quais os profissionais que estão disponíveis e em
quais cursos que eles estão? [...] Quer dizer, se as faculdades tivessem, por
exemplo, se elas falassem... Se o próprio Sindicato das Agências de Propaganda, se
a gente conversasse mais. (dono de agência de marketing político)
Hoje é uma loucura. Hoje você vê oito, dez, doze placas falando de faculdades, uma
ao lado da outra... E todas elas incertas, e todas elas tentando vender o seu peixe.
(dono de agência)
145
Também é eventual, raro uma escola procurar uma empresa de forma bem
organizada. (dono de agência).
O nosso mercado percebe a escola como uma coisa um pouco aquém do que
poderia ser dado aos estudantes preparados. (dono de agência de marketing
promocional)
Poucas o as escolas que têm essa preocupação [...] Pouco movimento também a
gente faz. Poucas são as escolas que vêm até a gente e pouco é o nosso movimento
de... Ir até elas. Muito pouco. (diretor de holding de veículos de mídia)
É interessante frisar que os representantes das organizações do mercado têm idéias a
dar e discutir com os representantes dos cursos. Mas há uma certa inércia, em que os
representantes do mercado esperam que as escolas os procurem, e vice-versa, o que acaba por
postergar indefinidamente a discussão das mesmas. E aqui é válido ressaltar que o simples
fato de haver uma discussão com ambos os lados apresentando seus argumentos seria um
fator importante para um maior conhecimento e integração entre ambas. A seguir são
transcritas algumas idéias que representantes do mercado levantaram quando surgiu a
discussão sobre esta falta de diálogo:
A formação acadêmica, ela não consegue é, direcionar o estudante, enquanto
estudante ainda pra melhor função que ele tem de perfil. o adianta eu botar um
cara que é extremamente analítico, pra vender, esse cara não vai se sentir bem
vendendo, ele quer é ficar fazendo análise do mundo. Então eu acho que o que
acontece é o seguinte: na escola todo aluno é igual, só que os perfis das pessoas são
diferentes. O criativo sim, ele tem que direcionado pra criação, o analítico pro
mercado. Eu acho que a escola poderia fazer essa diferenciação [...] Durante os
dois primeiros períodos pra selecionar, falar: ó, sua cara é de criação, o seu perfil,
sua cara, não [...] Se a gente usar dentro da escola os instrumentos que a gente tem
de Recursos Humanos, pra recrutamento de pessoal, eu acho que você consegue
formatar dentro da sala de aula esses grupos. É como se a faculdade estivesse
selecionando o aluno pra ser funcionário dela. (diretor de holding de veículos de
mídia)
É, eu vejo muito um negócio, por exemplo essas agências experimentais que estão
surgindo, cada vez mais, nas próprias universidades, o próprio trabalho que elas
vêm desenvolvendo, [...] Os veículos daqui poderiam dar mais, dar mais espaço pra
eles. Essa linha de intercâmbio. Eu acho que falta muitos encontros, seminários,
fóruns... São muito pouco disseminados. Os que você tem são caros, com pessoas
que vêm de fora. (dono de agência)
Não se busca neste estudo a defesa das idéias apresentadas nas últimas transcrições.
Mas ao transcrevê-las, demonstra-se que pessoas inseridas em posição de destaque no
146
mercado têm idéias a oferecer e discutir com o mercado caso haja canal de comunicação para
tal.
Até agora, neste tópico, mostrou-se a forma como o mercado enxerga as escolas e
algumas idéias que representantes desta vertente têm em relação à escola e à articulação da
mesma com o mercado. A seguir mostrar-se-á como a escola enxerga esta articulação:
Acho que esse conflito é natural. fui de agência e costumava exigir da escola
muitas coisas que, hoje, acredito que também são de responsabilidade do mercado.
Esse jogo é comum, o equilíbrio dele deve ser perseguido por mercado e escolas,
mas um gap que enxergo como natural. A escola sempre vai ter preocupações
pedagógicas, com uma formação humana, que o mercado não conhece ou exige.
Mas, por mais que a gente negue, não dúvidas de que o exercício intelectual
dentro da escola tem frutos sobre a atuação profissional no mercado. E vice-versa.
Também não se pode formar alguém que se feche sobre os livros e não saiba como
retribuir para o mercado com soluções práticas. É nesse delicado jogo de ir e vir,
de pensar e fazer, que a escola e o mercado devem equilibrar suas expectativas.
(coordenadora de curso)
A formação sólida, crítica, é a única capaz de ensinar o profissional a pensar, e não
a fazer sempre igual. Essa deve ser a meta de qualquer curso superior, apenas
assim estaremos contribuindo para a mudança do mercado [...] o apenas como
professora, mas acima de tudo como publicitária, sei da importância de uma
formação ética e crítica para a atuação no mercado. (coordenadora de curso)
Não pode haver, por parte das escolas, uma submissão ou uma dependência, ou um
compromisso direto com o mercado. A relação tem que ser mais complexa. O
mercado tem que alimentar a universidade, tem que alimentar a graduação, é
preciso ter essa leitura, do quê que está acontecendo, do que as pessoas estão
fazendo, quais as ferramentas, o que está sendo feito na profissão... Mas é preciso
também que essa leitura, esse diálogo, essa absorção, ela seja feita de modo
bastante cuidadosa e que se questione: isso sendo feito por que? Isso vai dar
aonde? Essa leitura me parece fundamental. (coordenador de curso)
Eu estou seis meses na coordenação do curso e eu não fui procurado [...] É
engraçado, na área de publicidade... Eu estou seis meses na coordenação de um
curso. Eu fui procurado pelo Sindicato dos Jornalistas - e mais de uma vez -
pra... Nem só pra fornecer dados, só pra divulgar, mas pra fazer parceria, pra levar
aluno, pra chamar aluno... E foi cobrado pelo CONRERP, Conselho Regional de
Relações Públicas, inclusive tem uma carta em cima da minha mesa, onde eles estão
querendo saber quem são os professores? O que eles tão dando? Qual a formação
desses professores? Eu consigo perceber isso muito forte nessas duas habilitações,
em Publicidade não... Em Publicidade, eu não sei se os professores aqui, de
publicidade, vêm, m essa demanda para ver o que pode. Pode ser que eles
procurem diretamente a eles, mas ao curso, a instituição, não. (coordenador de
curso)
Não adianta ter uma coluna de jornal que dá uns dois ou três anúncios por
semana... Não reflete... Você afixar um anúncio no quadro de avisos da faculdade
também é uma coisa... Eu acho que a Internet está sendo mal utilizada. Os sites
147
dessas... O banco de dados da própria universidade, quer dizer, o mercado não
conversa. Eu acho que o mercado de comunicação de Minas não conversa. (dono
de agência de marketing político)
A articulação entre a escola e o mercado, pode se dar tanto a partir de organizações
isoladas, quanto de um conjunto de organizações em nome da instituição escola, ou em nome
da instituição mercado. Este tema, da articulação entre as escolas para daí buscar o contato
com o mercado, ou de órgãos representantes de classe do mercado em direção às escolas, foi
analisado da seguinte forma:
Não me parece que tem (articulação entre os cursos [...] De uns cinco ou seis anos
pra surgiu uma quantidade muito grande [...] E daí as possibilidades de
articulação também elas ficam difíceis uma vez que você tem uma quantidade
grande, é preciso fórum, é preciso de focos maiores e tal. (coordenador de curso)
Com relação às escolas, mesmo que de forma isolada, procurarem órgãos
representantes das agências de propaganda, o seguinte cenário foi descrito:
Não. Não tem. É, seria muito bom se acontecesse porque, acho que o mercado
publicitário é o termômetro de necessidades que eles têm para serem passadas pras
escolas. Mas não existe uma busca desses programas, ou uma interação, uma
integração entre escola e faculdades nesse sentido. (Dono de agência e presidente
de órgão de classe)
Não há, portanto, um diálogo entre as instituições de ensino e do mercado, num
esforço de articulação entre os objetivos de ambas as vertentes. Isso, porém, não significa que
não haja pontos de contato. Como será visto nos trechos transcritos a seguir, esforços
isolados e unilaterais que partem dos professores, alunos e mesmo das instituições de ensino,
e que consistem em buscar profissionais do mercado para rápidas incursões no meio
acadêmico:
A (nome da instituição), além de manter contato com profissionais do mercado
através do seu Conselho de Ex-Alunos, tem um programa semestral, uma disciplina
chamada Seminários, que traz profissionais do mercado para dentro da escola, em
palestras, mini-cursos e oficinas, focando temas da demanda dos alunos.
(coordenadora de curso)
Primeiro, uma preocupação de boa parte, de alguns professores, de boa parte
deles, de olhar o que o mercado está fazendo... Saber o que o mercado está fazendo.
148
Segundo, fazer pessoas que a gente acha interessantes no mercado passarem por
aqui [...] É, então a gente convida as pessoas para estarem aqui, para
participarem, para participarem de banca, para participarem de projetos, pra...
Falar de profissão com os alunos [...] E a gente convida (órgãos de classe ABAP ou
SINDAPRO)? Não [...] De maneira geral, indivíduos vinculados a determinadas
áreas. (coordenador de curso)
Em setembro, por exemplo, os nossos alunos de Publicidade e Propaganda
tomaram a iniciativa na agência modelo, de convidar inclusive colegas de outras
instituições, para pensar a dimensão ética da Publicidade e Propaganda.
(coordenador de curso)
5.7 Há pontos de consenso
Apesar da ausência de diálogo sistemático e do caráter incipiente das medidas que
visam estabelecer pontos de contato, as escolas de Publicidade e Propaganda e o mercado
publicitário têm impressões convergentes acerca de alguns assuntos.
Ambas as vertentes, escola e mercado, concordam que o mercado de Belo Horizonte
tende para uma especialização cada vez maior no que diz respeito ao perfil das empresas que o
compõem:
Eu acho que a especialização está voltando a ser uma tendência em alta [...] É uma
coisa que o Nizan vem tentando fazer um pouco com as empresas dele. Tem a
África, que é uma grande agência, que atende grandes contas aonde o cliente tem
uma sala própria lá dentro e ele tem uma sala dentro da empresa do cara. Tem uma
que é pro agronegócio, que ele tá abrindo. Tem uma, que é a DM9, que atende tudo
[...] Tem a MPM, que é voltada mais pra política, ou para contas sob uma
perspectiva política, que é para regionalizar contas. Então eu acho que nós estamos
caminhando pra volta do especialista. (dono de agência de propaganda e marketing
político)
Acho que é uma coisa que os mais antenados, ou preocupados com seus negócios,
têm se mexido nesse sentido mais para não perder espaços extra, porque a verba
tem se movimentado, tem diluído, tem saído da propaganda pública. (dono de
agência de marketing promocional)
Eu vejo um amadurecimento do negócio no media e, que eu tenho um domínio
maior da... Especificamente do marketing promocional, que está sendo tratado cada
vez mais profissionalmente por esses clientes de maior porte. (dono de agência de
marketing promocional)
149
Os novos, novos entre aspas, com a questão da Internet, do marketing direto,
marketing promocional, político, esportivo, a princípio é mercado que tende a
empregar mais, a contratar mais do que a publicidade pura, ou seja, a agência de
propaganda tradicional. Eu vejo isso como um mercado onde as pessoas tendem a
ter mais oportunidades [...] Porque é o que em ponto de crescimento, é o que
subindo, é o que abrindo, comprando, adquirindo espaço. (dono de agência de
marketing promocional)
Eu tendo a achar que esse mercado ele, não é que ele aumente, mas ele aumenta em
diversidade e conseqüentemente a gente não consegue delinear com muita clareza
um perfil de um profissional, um perfil... A gente consegue delinear diferentes
perfis. (coordenador de curso)
Essa especialização eu consigo ver como um ponto possível e que tende a ser forte
aqui. (coordenador de curso)
A gente tem, por exemplo, muitos alunos que estudam publicidade e que se dedicam
muito à produção de imagem eletrônica, vídeo, televisão. A gente tem muito aluno
de publicidade que está voltado para gestão em comunicação. (coordenador de
curso)
Esta convergência de opiniões pode significar que os cursos têm uma certa sintonia
com as tendências do mercado. Outro ponto interessante é que, apesar dos donos de agências
tradicionais não terem se manifestado claramente sobre esta tendência, pelo menos um dos
entrevistados que se encaixa nesta categoria é também sócio de uma agência de marketing
promocional e outro fez questão de salientar ter sido a sua “a primeira agência especializada
em varejo de Belo Horizonte”.
Outro ponto em que convergência é quanto à importância do capital cultural
necessário para o desenvolvimento das competências na carreira de publicitário.
Becker apud Bourdieu (1995, p. 73), afirma que a aptidão ou o “dom” é produto de
um investimento em capital cultural. Embora diploma seja ambicionado na sociedade de
consumo como capital cultural em estado institucionalizado, para o desenvolvimento da
carreira de publicitário é o capital cultural em seu estado incorporado - ou seja, “sob a forma
de disposições duráveis do organismo” (BOURDIEU, 1995, p. 74) - que conta como
diferencial de competitividade:
150
Deve ter uma base forte em humanas: política, economia, sociologia, artes... Antes
de tudo ser bem informado sobre o mundo. Depois, ter informação especializada
sobre as áreas de planejamento (marketing e gestão da comunicação) e/ou áreas de
linguagem (criação/produção audiovisual). (coordenadora de curso)
(entre os pontos fracos desses alunos, destaco que são) Em geral, pessoas com
menos bagagem cultural, mais alienados da sociedade, cada vez lêem menos e
escrevem pior, o que dramático na área de comunicação. (coordenadora de curso)
A gente tem uma dificuldade muito grande de mostrar pra eles que antes deles
operarem máquinas, eles precisam desenvolver a competência, quer dizer, a
percepção crítica do que está envolvido. (coordenador de curso)
Ele tem que ser seduzido pela informação [...] Se não houver esse, esse estímulo
intelectual, a paixão intelectual pela, pela linguagem, pela cultura, pela
informação, eu acho complicado. (coordenador de curso)
Buscar o conhecimento acima de tudo, estar sempre bem informado. (Dono de
agência)
Eu junto competência a outra série de fatores que podem não estar ligadas
intrinsecamente ao talento nato e pessoal de cada um, mas que fazem parte desse
conjunto como interesse, leitura... Generalismo. (dono de agência e presidente de
órgão de classe)
Eu tenho que entender de economia, de política, tenho que entender de
administração, é fundamental hoje em dia pro publicitário. Ele tem que entender de
técnicas de comunicação, com todas as ferramentas, porque a comunicação está
cada vez mais complexa. E tem que ter uma visão global e uma abertura muito
grande pra conhecimentos. (dono de agência e presidente de órgão de classe)
Estes mesmos trechos transcritos anteriormente remetem à questão das competências.
Le Boterf (1995) apud Luz (2001) considera as competências como contingenciais, ou seja,
são exercidas de acordo com um contexto em particular, mediadas por limitações e recursos e
sofrem interferências diretas da situação. Ser competente, de acordo com Luz (2001), implica
em saber transferir, saber combinar e integrar e supõe capacidade de aprendizagem e de
adaptação.
Os depoimentos colhidos durante o desenvolvimento deste estudo apontam para um
consenso entre escolas e mercado também no que tange a esta noção de que as competências
são decorrentes da articulação entre o saber fazer, o saber ser e os conhecimentos e as
151
limitações que o ambiente e a situação impõem. É importante, porém, salientar que apesar dos
pontos de contato com as definições acadêmicas do tema competências, nenhuma das
definições apresentadas seria considerada completa sob o ponto de vista da academia:
Eu acho que competência tem a ver com pertinência. Em outras palavras, é você ter
o tamanho certo para o cliente certo. E isso é ser competente. É muito mais fácil
você fazer um filme usando uma atriz maravilhosa, usando equipamentos de última
geração, entendeu? É muito mais fácil, o filme fica maravilhoso. Agora faça um
filme de mil reais que consiga fazer o cliente vender cento e quarenta carros, como
a gente faz com a (nome de uma concessionária de automóveis). (dono de agência)
Tem que ser muito prático. Não adianta querer uma coisa muito rebuscada e o cara
inventa a porta do banheiro. Você chega na porta de um banheiro de um
restaurante desses e você não sabe qual é masculino e qual é feminino, pô!
Masculino e feminino. Então as vezes é melhor o inventar moda, fazer coisas que
sejam simples, objetivas, diretas, que gerem resultado para o cliente. (dono de
agência)
Uma coisa que é fundamental para uma carreira que não tem teto baixo que é esta
questão de informação... Buscar, não se limitar a entender e fazer as coisas
tecnicamente, o que está sendo proposto. Eu vou montar uma promoção de vendas,
que é a cupom, é... Entrega, troca nota e não sei mais o que... O qque tem por
trás disso? Ah, tem um shopping center! Como é que ele funciona? (dono de agência
de marketing promocional)
O profissional, muitas vezes ele adquire competências de habilidades específicas,
capaz de ser readaptado em diferentes níveis de diferentes produtos e diferentes
processos. (coordenador de cursos)
O bom gosto para o cliente da classe alta não é o bom gosto pro cliente da
periferia. Pra saber olhar, ter inclusive o repertório pra lembrar... Que conta de
fazer estas adaptações, então, às vezes, a competência está muito ligada à
flexibilidade e a uma visão capaz de conquistar esta flexibilidade ao mesmo tempo
com o domínio técnico, né? Não só capaz de dizer: ah, isso é possível! Mas de
sentar e fazer [...] Talvez ele não tenha a competência para fazer, mas tem a
competência pra dialogar com o outro. (coordenador de curso)
Independente de ser da área de linguagem ou de planejamento, tem que saber
enxergar as mudanças do mercado, perceber oportunidades, desenvolver e gerir
projetos. (coordenadora de curso)
152
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com base nos resultados e análises da pesquisa, é possível tecer algumas
considerações. No entanto, é preciso levar em conta que, como todo estudo de caso, a sua
generalização não é possível.
O mercado publicitário de Belo Horizonte vem se ressentindo da redução no número
de anunciantes de portes grande e médio, em função das aquisições e fusões que ocorreram e
ainda ocorrem em setores que, historicamente, sempre foram celeiros de grandes anunciantes.
Além do desaparecimento de grandes contas, o mercado publicitário da capital
mineira também vem experimentando uma concorrência exacerbada. centenas de agências
e corretores disputando, inclusive com agências de outras cidades e estados, um bolo de
investimentos cuja destinação também é mais heterogênea que no passado.
A grande proliferação de agências e corretores está ligada diretamente à grande oferta
de mão-de-obra. A abertura acelerada de vários cursos de Publicidade e Propaganda na capital
mineira nos últimos anos acarretou uma superoferta de estudantes, graduandos e recém-
formados que não pára de crescer. Esta expansão do contingente de candidatos ao ingresso no
mercado de trabalho também trouxe conseqüências como o agravamento da precarização das
condições de trabalho e uma redução nos valores de remuneração. Como os custos de abrir e
fechar uma agência de publicidade são baixos, muitos publicitários optam por arriscar abrir
seu próprio negócio ao invés de trabalhar em condições precárias. Estas agências, a grande
maioria de pequeno porte, não são filiadas a nenhum sindicato ou órgão de classe e trabalham
dentro dos seus próprios critérios de remuneração, preocupando as agências que operam
dentro dos critérios do Sindapro, ABAP e CENP, que temem que este comportamento venha
nivelar em um piso muito baixo também a sua remuneração.
153
Também percebe-se que o mercado publicitário encontra-se em um momento de
transição, no qual a propaganda dita “tradicional”, cujo modelo são as campanhas veiculadas
nos meios de comunicação de massa, vem perdendo espaço nos planos de comunicação dos
anunciantes. Ferramentas antes consideradas secundárias, denominadas de no media, vêem
conquistando um espaço cada vez maior em função das marcas hoje buscarem se relacionar
com seus clientes, ao invés de simplesmente anunciarem. Esta tendência se reflete no mercado
e as agências especializadas nestes serviços vêem obtendo índices de crescimento muito
superiores aos da economia. Os anunciantes, no entanto, preferem concentrar em uma única
agência as suas demandas. Cabe, nestes casos, à agência que centraliza a conta - normalmente
uma agência com ênfase na propaganda convencional - cercar-se de fornecedores das
ferramentas que não domina para suprir as demandas que as estratégias de seus clientes, por
ventura, venham suscitar. Nesta perspectiva, a rede de relações é muito importante para que as
agências de serviços no media consigam se inserir no mercado.
Em paralelo a este cenário tão conturbado, a questão da proliferação das
faculdades de Publicidade e Propaganda, conseqüência direta de uma política do Governo
Federal que fez mais do que duplicar, em todo o País, o número de cursos de vel superior
em menos de oito anos. Nos últimos quatro anos foram abertos oito cursos de Publicidade e
Propaganda em Belo Horizonte. Os critérios para um incremento tão acelerado no número de
cursos têm muito mais a ver com oportunidades de negócios apreendidas por empresários do
setor de ensino do que propriamente de uma demanda latente por profissionais desta área.
O diploma universitário é almejado por indivíduos das classes menos favorecidas
como símbolo de poder apreendido, uma forma de multiplicar o capital financeiro investido
na sua aquisição e assim melhorar a posição social que ocupam. Seguindo este raciocínio,
alunos dos cursos de Publicidade e Propaganda engrossam as fileiras de candidatos ao
ingresso no mercado publicitário. No entanto a inserção neste mercado de trabalho vem
154
ficando cada vez mais dependente de laços e relações sociais, inclusive em função da
superoferta de candidatos, o que contradiz a suposição de que o diploma teria o poder de
catalisar uma ascensão social. Neste sentido, o próprio diploma - a depender da escola que o
concede - deixa de ser um símbolo de classe.
A rápida proliferação de cursos de Publicidade e Propaganda e a grande quantidade
destes cursos que ainda não formou a primeira turma fazem com que o mercado perceba tais
faculdades como um conjunto, discernindo muito pouco as diferenças entre as diversas
escolas. Apenas as mais antigas são percebidas como diferentes e, por isso, são um pouco
mais valorizadas. Dentre as escolas, porém, a disputa para serem bem percebidas
individualmente no mercado existe, o que é saudável, mas apresenta alguns riscos. O
mercado, nas figuras dos seus representantes, desenvolveu uma visão bastante tecnicista
daquilo que seria a função das escolas e faculdades que anunciam exatamente esta
adequação às demandas do mercado como sua grande qualidade. No entanto, coordenadores
de curso, engajados numa visão mais humanista, ou generalista, acreditam que esta é uma
postura extremamente perigosa, exatamente pelo fato do mercado publicitário ser mutável e
mutante. Preparar seus alunos para aquilo que o mercado demanda hoje pode significar uma
obsolescência rápida daquilo que não deveria ficar obsoleto: o conhecimento.
Esta divergência entre aquilo que o mercado espera da universidade e aquilo que a
universidade acredita ser a sua missão é fruto, entre outros fatores, de uma falta de articulação
entre as duas instituições. O diálogo entre escolas e mercado é parco e se resume a palestras,
bate-papos e seminários promovidos unilateralmente e individualmente por algumas escolas,
ou professores em suas aulas isoladamente. o qualquer programa de maior amplitude,
nem mesmo sob o ponto de vista de escolas isoladas. Da parte do mercado, há menos
iniciativas ainda. Nenhuma organização representante de classe do mercado publicitário
busca, ou buscou, interagir com as escolas no sentido de efetivarem algum esforço conjunto
155
ou integrado. Entre as empresas do mercado publicitário, a única interface com as escolas são
os programas de estágios que algumas poucas organizações de maior porte mantêm e, mesmo
nessas, a interface se resume a contar com as escolas como fonte de recursos humanos para o
programa. Uma vez dentro das organizações, não mais qualquer ponto de contato entre a
escola e o local do estágio. Nas agências e organizações de porte médio ou pequeno, os
estágios não obedecem a qualquer programa e muitas vezes nem são estágios profissionais na
verdadeira acepção do termo, tendendo mais a ser uma forma de contratação de mão-de-obra
relativamente qualificada tecnicamente a um custo baixo. Em praticamente todas as
organizações pesquisadas, o capital social surgiu como fator importante para se conseguir uma
vaga de estágio, o que confirma a observação de que, para os integrantes das classes mais
baixas, o ingresso na faculdade não significa o ingresso numa nova classe social ou a melhoria
“automática” de suas perspectivas.
Esta divergência quanto ao papel das faculdades de Publicidade e Propaganda e a
falta de articulação entre mercado e escola, porém, não impedem que ambas as vertentes
compartilhem percepções comuns acerca de uma série de fatores. O primeiro ponto em que
ocorre tal convergência, vale assinalar, é quanto à falta de diálogo entre ambas as instituições.
Cada uma das partes, no entanto, espera que a outra se manifeste e a procure.
Outro ponto em que consenso é a tendência à especialização das empresas, a
exemplo do que vem ocorrendo com as agências de no media, marketing esportivo,
marketing político e outras. Ainda há muita indefinição quanto a quais os formatos, ou
mercados que surgirão dentro desta tendência - e esta incerteza acaba por ser outro ponto de
convergência.
Também é partilhada por ambas as vertentes a certeza de que um capital cultural em
seu estado incorporado é essencial para a formação de um bom publicitário. E, neste ponto,
tanto os coordenadores de cursos quanto os representantes do mercado concordam que a atual
156
geração de universitários carece de boa cultura geral, de hábitos de leitura, de entendimento da
sociedade e seus mecanismos, o que torna ainda mais difícil formar bons profissionais.
Há, ainda, o consenso sobre o caráter contingencial das competências: sobre a
capacidade de adaptação dos conhecimentos e do próprio indivíduo às situações que se lhe
apresentam e às condições que lhe são oferecidas. No entanto, enquanto os representantes do
mercado estão focados na questão técnica, de as escolas prepararem pessoal tecnicamente
qualificado para exercer trabalho nas agências e outras empresas do ramo publicitário, as
escolas pesquisadas têm uma visão mais ampla e visam fornecer, além das capacidades
técnicas, competências mais abrangentes, qualificando seus alunos e egressos para que tenham
uma maior compreensão do negócio da publicidade, permitindo-lhes inclusive criar/formar
mercado, o que coaduna com a tendência de especializações e com o próprio momento de
transição e mudanças.
Em síntese, apesar da falta de diálogo e de esforços em prol de uma articulação entre
as faculdades de Publicidade e Propaganda de Belo Horizonte e o mercado publicitário desta
cidade, as escolas pesquisadas fornecem, ou buscam fornecer, as competências necessárias
para que seus alunos e egressos possam se inserir no mercado de trabalho. É importante,
porém, salientar-se que os representantes do mercado partilham de uma visão extremamente
tecnicista enquanto que os coordenadores dos cursos pesquisados privilegiam uma visão mais
generalista, ou humanista, que é exatamente o que lhes permite fornecer as competências
necessárias à inserção em um mercado publicitário que vem passando por tantas e tão
profundas transformações. Obviamente o distanciamento entre as partes - escola e mercado - é
fator preponderante para que existam tantos pontos de divergência e até de desconfiança, mas
não acarreta, pelo menos entre os cursos pesquisados, danos estruturais à formação que é
pretendida. As organizações do mercado, porém, estão um tanto atrasadas na forma como
percebem os cursos e sua função, pois enquanto acham que as faculdades existem para formar
157
mão-de-obra para trabalhar nas organizações do mercado, a universidade prepara também, ou
busca preparar, indivíduos capazes de perceber tendências e a partir daí transformarem o
próprio mercado publicitário.
Dentre as perspectivas que este estudo abre, destacam-se: as possibilidades de
realização de estudos mais voltados para a possibilidade da instituição do estágio se tornar um
elemento articulador entre o mercado publicitário e a universidade; a possibilidade de
intervenções mais diretas neste espaço, que hoje se encontra vazio, entre o mercado e as
faculdades de Publicidade e Propaganda no sentido de aproximar a ambos; e a realização de
estudos semelhantes em outras praças que estejam vivenciando situações similares de redução
no número de anunciantes e a ampliação do número de faculdades de Publicidade e
Propaganda.
158
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TOLFO, Suzana da Rosa. A carreira profissional e seus movimentos: revendo conceitos e
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VOCÊ S/A, São Paulo, Ed. Abril, n. 49, jul. 2002. (Contagem do número de anúncios de
faculdades na revista).
YIN, Robert K. Estudo de caso: planejamento e métodos. Porto Alegre: Bookman, 2001.
164
ANEXO A - Questionário para mapeamento do mercado publicitário de Belo Horizonte
Nome da Empresa (fictício):
Cargo/função que ocupa na empresa:
1. Atividade profissional em que a empresa atua:
Atividade
Assinale todas as alternativas que se
adequarem
Agência de Propaganda
Promoções
Eventos
Internet
Marketing Político
Marketing Esportivo
Marketing Cultural
Marketing Social
Design de produtos e/ou embalagens
Produção de vídeos
Veículo de comunicação (que tipo )
Outros (quais )
2. Tempo que a empresa tem de mercado:
0 a 1 ano
1 ano a 3 anos
3 a 5 anos
5 a 8 anos
8 a 10 anos
10 a 15 anos
mais de 15 anos
3. Tempo que atua no mercado de Belo Horizonte:
0 a 1 ano
1 ano a 3 anos
3 a 5 anos
5 a 8 anos
8 a 10 anos
10 a 15 anos
mais de 15 anos
4. Quantos profissionais trabalham na empresa?
165
5. Quantos profissionais trabalham diretamente na empresa sob cada um dos regimes abaixo
descrito
Regime Quantidade
Estagiário
Carteira assinada
Prestador de serviços
Free lancer
6. Escolaridade. Quantos funcionários (C LT ou não) tem cada um dos graus de escolaridade
abaixo relacionados:
Escolaridade
Departamento
1
o
. Grau
completo
2
o
. Grau
completo
Nível
superior
incompleto
Nível
superior
completo
Pós
graduação
Mestrado
Doutorado
Criação
Mídia
Planejamento
Atendimento
Estúdio
Administrativo/Financeiro
Outros
7. Quantos funcionários há em cada um dos departamentos abaixo relacionados e quantos são
formados ou cursam faculdades de Publicidade e Propaganda?
Departamento
Número de funcionários no
departamento
Funcionários do departamento
cursando ou formados em
Propaganda
Criação
Mídia
Planejamento
Atendimento
Estúdio
Administrativo/Financeiro
Outros
8. Outras praças em que a empresa atua:
Praça(s) Assinale todas que se aplicam
Interior de Minas Gerais
São Paulo Capital
São Paulo Interior
Rio de Janeiro
Outras Quais?
166
9. A empresa é afiliada de alguma das entidades de mercado abaixo relacionadas (assinale
todas as respostas que procederem)
Entidade
ABAP
Sindapro
Outras Quais
10. Faturamento mensal médio da agência:
11. Faturamento da agência em 2003:
12. Faturamento da agência em 2002:
13. Em 2004 você espera aumentar seu faturamento?
Sim em quantos %?
Não, espero manter o do ano anterior
Não, espero um certo decréscimo em quantos %?
14. Em 2004 você contratou, algum novo profissional para sua equipe?
Quantos Departamentos
Sim
Não. Mantive a mesma equipe
Não, pelo contrário, demiti
Não, mas espero contratar ao longo do ano
167
ANEXO B - Roteiro de Entrevista
1. Dados Pessoais
Nome
Idade
Família
De onde é?
2. Trajetória Profissional
Empresas em que já atuou?
Cargos e funções que já exerceu?
Cidades em que já atuou?
Maiores feitos como profissional?
3. Qual o seu conceito de mercado publicitário?
4. Quais as referências que você tem de mercado publicitário?
5. Análise que faz do Mercado publicitário na atual conjuntura
No mundo
No Brasil
Em Minas Gerais
Em Belo Horizonte
No caso de BH, o que você considera como pontos fortes e pontos fracos deste
mercado.
E quais as principais ameaças e oportunidades no mercado de BH? Por que?
6. Quais as empresas que compõem, hoje, o mercado publicitário de BH?
7. Quais as características essenciais das empresas que compõem o mercado publicitário de
BH?
8. Em quais destas empresas estão as maiores chances para que os estudantes/formandos de
publicidade venham ingressar no mercado? Por que?
9. Qual o conceito que você faz de “competências”?
Quais as competências que o mercado publicitário de BH demanda dos profissionais
que atuam, ou desejam atuar, nele?
Como ele deve ser? Características pessoais - Saber Ser - e por que?
O que ele deve saber? Conhecer - e por que?
O que ele deve saber fazer? e por que?
Como deve ser a capacidade de adaptar estes conhecimentos e habilidades às
demandas do dia-a-dia?
10. Quais os pontos fortes e fracos que você identifica nos novos profissionais que estão
entrando no mercado publicitário de BH?
168
11. E quais os impactos positivos e negativos que estes pontos fortes e fracos causam no
mercado?
12. Qual a formação ideal para que um sujeito venha se tornar um bom publicitário?
E no mercado mineiro em particular?
Formação sócio-cultural (esportes, família, gosto musical e artístico, hobbies etc.)
Formação escolar (qual tipo de formação acadêmica? Educação Superior?
13. Qual a sua visão da educação superior no Brasil?
Qual a sua visão da educação superior voltada para a formação de publicitários? Por
que?
Qual o tipo de contato que tem com estudantes/formandos de cursos de publicidade de
BH? E de outras praças? Quais?
14. Como você vê esta expansão do ensino de nível superior?
E a expansão dos cursos de Publicidade e Propaganda em Belo Horizonte?
Qual o contato que sua empresa tem com as escolas de comunicação de BH?
Ou
Qual o contato que sua escola tem com o mercado publicitário de BH?
15. Como você enxerga a relação mercado/escola (escola/mercado)?
Você acha que as escolas têm que preparar o profissional para o mercado?
Você acha que a formação dos estudantes de publicidade e propaganda deve ser mais
generalista ou especializada?
16. Qual a sua visão dos cursos de Publicidade e Propaganda de BH? Quais os pontos fortes e
fracos deles?
Que é mais valorizado na formação acadêmica dos novos publicitários: o
conhecimento técnico, o entendimento do negócio da propaganda como um todo ou a
parte prática? Por que?
Há, na sua visão, diferença entre o que é mais valorizado e que deveria ser mais
valorizado nesta formação?
Existem aspectos que a formação acadêmica não consegue contemplar? Quais? Por
que?
Qual a diferença entre o profissional graduado e aquele que domina este(s) aspecto(s)?
17. Um profissional formado por escolas de outro mercado teria chances iguais, melhores ou
piores que os de Belo Horizonte para ingressar no mercado da capital Mineira? Por que?
18. Para escolas: Você acha que diferenças entre o que a escola propõe e como ela é
percebida pelo mercado?
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