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A vida privada e a intimidade são direitos individuais considerados de primeira
geração. Ambos são conceitos abertos e, portanto, apresentam extrema dificuldade de
conceituação
215
, pois em muito se relacionam, acabando, por vezes, sendo apresentados como
sinonímia e, freqüentemente, confundidos pelos operadores do direito, na medida em que são
considerados como espécie do gênero “direito ao resguardo” ou direito de privacidade.
De consenso, e tendo em vista os limites traçados para esta investigação, observa-se
que a idéia de intimidade estaria circunscrita pelo conceito de privacidade
216
, constituindo-se
215 José Afonso da Silva (1997, p. 202-203), lembra que “Segundo René Ariel Dotti a intimidade se caracteriza
como ‘a esfera secreta da vida do indivíduo na qual este tem o poder legal de evitar os demais’, o que é
semelhante ao conceito de Adriano de Cupis que define a intimidade (riservatezza) como o modo de ser da
pessoa que consiste na exclusão do conhecimento de outrem de quanto se refira à pessoa mesma”, concluindo
que o direito de intimidade “Abrange, nesse sentido mais restrito, a inviolabilidade do domicílio, o sigilo de
correspondência, o segredo profissional.”
Moraes (2002, p. 80) diferencia as duas garantias ao explicitar que “intimidade relaciona-se às relações
subjetivas e de trato íntimo da pessoa, suas relações familiares e de amizade, enquanto vida privada envolve
todos os demais relacionamentos humanos, inclusive os objetivos, como relações comerciais, de trabalho, de
estudo etc ”.
Bittar (2008, p. 106-108) entende que o direito à intimidade “Consubstancia-se em mecanismo de defesa da
personalidade humana contra injunções, indiscrições ou intromissões alheias.” Observa, ainda, que “Esse direito
vem assumindo, paulatinamente, maior relevo, com a contínua expansão das técnicas de comunicação, como
defesa natural do homem contra as investidas tecnológicas e a ampliação, com a necessidade de locomoção, do
circulo relacional do homem , obrigando-o à exposição permanente perante os mais distintos, em seus diferentes
trajetos, sociais, negociais ou de lazer.” Por último, ao abordar as características, informa que “Esse direito
reveste-se das conotações fundamentais dos direitos da personalidade, devendo-se enfatizar a sua condição de
direito negativo, ou seja, expresso exatamente pela não exposição a conhecimento de terceiros de elementos
particulares da esfera reservada do titular. Nesse sentido, pode-se acentuar que consiste no direito de impedir o
acesso de terceiros aos domínios da confidencialidade. Trata-se de direito, aliás, em que mais se exalça a vontade
do titular, a cujo inteiro arbítrio queda a decisão sobre a divulgação.”
Vogel Neto e Fernando Sogdu Martins (2000, p. 682-683) resgatam que o “vocábulo privacidade é cognato de
privado (do latim privatus, a, um, que significa particular, próprio, reservado; vida própria) acrescido do sufixo –
dade (qualidade, modo de ser, estado propriedade). Pode-se entender, assim, a privacidade como propriedade
daquilo que se refere à vida particular de uma pessoa.
Idéia gêmea de privacidade é a de intimidade. Intimidade provém do latim intimus, a, um (íntimo, interno,
interior, recôndito), seguido do elemento morfológico –dade. Quer dizer: propriedade daquilo que concerne ao
recôndito humano.
[...]
Já que a lei não deve conter palavras ociosas, nem mesmo como reforço de linguagem, procuram os juristas
diferenciar os sentidos peculiares das expressões intimidade e vida privada (privacidade), que, a rigor, se
equivalem, ou que encerram conteúdo análogo.
[...]
Assim sendo, enquanto privacidade exclui a interferência alheia na vida de um ser humano, a intimidade impede
que se procure desvendar o âmago do indivíduo, a face mais esconsa do que ele é do que ele faz”.
216
Nesse sentido, “a teoria alemã, debruçando-se sobre o conteúdo do direito à intimidade, vislumbra a
existência de três esferas: (a) Privatsphärei (esfera da vida privada) – a mais ampla das esferas, abarcando todas
as matérias relacionadas com as notícias e expressões que a pessoa deseja excluir do conhecimento de terceiros.
Ex. imagem física, comportamentos que mesmo situados fora do domicílio, só devem ser conhecidos por aqueles
que travam regularmente contacto com a pessoa. (b) Vertrauensphärei (esfera confidencial) – incluindo aquilo
que o indivíduo leva ao conhecimento de outra pessoa de sua confiança, ficando excluído o público em geral e as
pessoas pertencentes ao ciclo da vida privada e familiar. Ex. correspondência, memoriais, etc. (c)
Geheiemsphärei (esfera do segredo) – compreendendo os assuntos que não devem chegar ao conhecimento dos