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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Makeliny Oliveira Gomes Nogueira
A presença da dimensão sociopolítica no trabalho de formação do
docente-formador
MESTRADO EM EDUCAÇÃO: PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO
SÃO PAULO
2008
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2
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Makeliny Oliveira Gomes Nogueira
A presença da dimensão sociopolítica no trabalho de formação do
docente-formador
MESTRADO EM EDUCAÇÃO: PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO
Dissertação apresentada à Banca Examinadora
como exigência parcial para obtenção do título de
MESTRE em Educação: Psicologia da Educação
pela Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, sob orientação da Profª. Drª. Ana Mercês
Bahia Bock
SÃO PAULO
2008
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BANCA EXAMINADORA
________________
________________
________________
4
FICHA CATALOGRÁFICA
NOGUEIRA, Makeliny Oliveira Gomes. A presença da dimensão política no trabalho de
formação do docente-formador. São Paulo: 2008. 133p.
Dissertação de MestradoPontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2008.
Área de Concentração: Psicologia da Educação
Orientadora: Profª. Drª. Ana Mercês Bahia Bock
Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou
parcial desta dissertação por processos de fotocopiadoras ou eletrônicos.
5
FOLHA DE APROVAÇÃO
Este exemplar corresponde à redação final da Dissertação
defendida por Makeliny Oliveira Gomes Nogueira e aprovada
pela Comissão Julgadora.
Data: ____/ ____/ _______.
__________________________________________________
Profª. Drª. Ana Mercês Bahia Bock (orientadora)
__________________________________________________
Prof. Dr. Antonio Carlos Caruso Ronca (PUC-SP)
__________________________________________________
Prof. Dr. Antônio Joaquim Severino (Universidade de São
Paulo - USP)
6
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho às minhas primeiras
e eternas MESTRAS, minha mãe Neusa,
minha avó Lucy, minhas tias, Cláudia
Nara e Joana D’arck, minha irmã
Makênia e minha prima Luciana.
7
AGRADECIMENTOS
À Ana Bock, por conduzir-me na travessia entre o otimismo ingênuo e o
otimismo crítico, com suas orientações atentas, provocações constantes e reflexões
valiosas.
Entre as contribuições que recebi para realizar esse trabalho, gostaria de destacar
a dos “mestres” Dr. Antônio Joaquim Severino e Dr. Carlos Caruso Ronca, a quem devo
um agradecimento especial, por contribuírem com o avanço desse estudo, por meio das
orientações generosas e desafiantes.
Às professoras e professores que colaboraram com essa pesquisa respondendo
ao questionário e em especial aos que aceitaram ser entrevistados.
Às professoras Marli André, Wanda Junqueira Aguiar, Laurinda Ramalho,
Mitsuko Makino Antunes, Claudia Davis, Maria Celina Vieira, Melania Moroz e ao
professor Sérgio Luna, interlocutores especiais e “mestres” dedicados que, com seus
ensinamentos, participaram indiretamente da configuração desse trabalho.
À Irene Medeiros, pelo carinho e atenção com todos os alunos do PED.
Aos amigos do mestrado, Ana Cristina Guidi, Marcos de Moura Albertim,
Jéssica Kobayashi, Viviane Moreiras, Vivian Rachman e Flávia Otuka, por dividirem
comigo momentos tão especiais nessa jornada.
Aos meus pais, Neusa e Soares, e aos meus irmãos, Makely, Makênia, Máken e
Makeber pelo amor e pela torcida estimulante.
Tenho ainda um agradecimento mais que especial a fazer, ao meu marido,
Vinicius Corrêa Nogueira, pela força, paciência, parceria, incentivo constante, mas
principalmente, por ter escolhido caminhar ao meu lado, sempre renovando as minhas
esperanças e me fazendo acreditar que os sonhos são possíveis.
Finalmente, mas não menos importante, agradeço a CAPES, pela ajuda
financeira sem a qual nada disso seria possível.
8
RESUMO
O presente estudo teve como objetivo pesquisar a presença da dimensão sociopolítica no
trabalho de formação do docente-formador, trazendo para o debate a reflexão sobre a finalidade
do trabalho educacional. Nessa pesquisa, baseados na perspectiva sócio-histórica e apoiados em
autores que seguem essa linha teórica, partimos do princípio que o trabalho de todo professor
apresenta uma dimensão sociopolítica, pois, em qualquer trabalho de educação implícita ou
explicitamente uma relação entre educação e sociedade, que se expressa na finalidade do
trabalho desenvolvido. A questão que se coloca é identificar, por meio da “voz do
docente-formador, a clareza que ele tem da presença dessa dimensão no trabalho de formação
que realiza em cursos de graduação em Pedagogia, e quais aspectos ele apresenta para
caracterizar essa presença. Para realizar esse estudo, foram aplicados quinze questionários a
docentes de Universidades públicas e privadas dos estados do Paraná e o Paulo, e feitas
entrevistas de aprofundamento com quatro docentes-formadores de três Universidades do estado
do Paraná. Os resultados apontam que o professor não desconhece a presença da dimensão
sociopolítica em seu trabalho, mas ao caracterizar essa dimensão, na maioria das vezes, o faz de
forma genérica e ingênua.
Palavras-Chave: formação docente; trabalho docente; docente-formador; dimensão
sociopolítica; transformação social.
9
ABSTRACT
The present study had as objective researches the presence of the sociopolitical dimension in the
work of formation of the educational-former, bringing for the debate the reflection about the
purpose of the education work. In this research, based on the socio-historical perspective and
according to authors that follow this theoretical line, we started from the idea that every
teacher's work has a sociopolitical dimension, because in any education work there is implicit or
explicit a relationship among education and society, that is expressed in the purpose of the
developed work. The subject raised in this paper work is to identify, through the “voice” of the
educational-former, how clear for them is the presence of that dimension in their formation
work in pedagogy degree courses, and which aspects he demonstrates to characterize that
presence. To accomplish that study, fifteen questionnaires were applied to educationalist of
public and private universities of the states of Paraná and São Paulo, and deeply interviews with
four educational-formers of three universities of the Paraná state. The results pointed out that
the teacher doesn't ignore the presence of the sociopolitical dimension in his work, but when
characterizing that dimension, he makes it in a generic and ingenuous way.
Key-Word: educational formation; educational work; educational-former; sociopolitical
dimension; social development.
10
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 12
Contextualização e relevância do problema 13
Delimitação do problema 15
Estrutura da Dissertação 17
CAPÍTULO I
Educação (Escola) e sociedade 18
Educação (Escola) e a tarefa sociopolítica: “a favor de que?” e
“contra o que formamos?”
26
A perspectiva sócio-hostórica da educação: conflitos, contradições e
mudanças
29
CAPÍTULO II
Formação e trabalho docente: algumas considerações 34
O Processo de formação docente: uma perspectiva 42
O sujeito como parte do processo: a dimensão subjetiva 44
A dimensão técnica 47
A dimensão estética 51
A dimensão ética 52
A dimensão sociopolítica 55
CAPÍTULO III
O caminho metodológico 62
Etapa I – O Questionário 65
Etapa II – A Entrevista 67
CAPÍTULO IV
Apresentação e sistematização dos dados 70
As vozes dos sujeitos: a busca de uma síntese 105
CONCLUSÃO 115
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 120
ANEXO I 125
ANEXO II 127
ANEXO III 129
11
Gosto de ser gente porque, mesmo sabendo que as condições
materiais, econômicas, sociais e políticas, culturais e
ideológicas em que nos achamos geram quase sempre
barreiras de difícil superação para o cumprimento de nossa
tarefa histórica de mudar o mundo, sei também que os
obstáculos não se eternizam.
(Paulo Freire, 1996).
12
INTRODUÇÃO
Nosso interesse pelo processo de formação de professores deu-se a partir do
nosso próprio processo de formação. Como professora licenciada em filosofia e a partir
da nossa experiência como docente, pensávamos em desenvolver nossa pesquisa de
mestrado sobre a questão da formação de professores e, a princípio, nossas
preocupações estavam centradas nas dificuldades e incertezas da profissão docente, no
que concerne ao dia-a-dia da sala de aula. Questões como: as relações interpessoais dos
docentes com os alunos; a questão das aulas tradicionais x aulas construtivistas; ou
ainda, como ser uma professora interdisciplinar; como avaliar o aluno; o que tornaria as
aulas mais interessantes para os alunos; por que alguns alunos têm dificuldade para
aprender e assim por diante.
Ainda que estas questões sejam, a nosso ver extremamente relevantes, nosso
interesse começou a ser despertado para outro viés da questão: a relação da formação
docente e as questões sociopolíticas que envolvem este processo de formação. Esse
interesse veio a ser intensificado ao travar conhecimento com alguns autores em
especial, entre eles, Charlot (1979); Severino (2003, 2001, 1998, 1986); Rios (2007,
2000); Cortella (2006); Saviani (2006, 2005, 2004, 1986); Nosella (2007, 1983); Freire
(2007a, 2007b, 1996); Gadotti (2006, 2005, 2003); Fernandes (1987); Giroux (1997,
1988); Duarte (2000); Rossler (2004); Bock (2008, 2001, 2000, 1999); Placco (2007,
1994), entre outros que estimularam e influenciaram efetivamente os rumos dessa
pesquisa.
Muito se tem pesquisado sobre as dimensões do processo de formação de
professores, mas pouco espaço tem sido dado aos professores para expressarem sua
“voz”. Contudo, tal fato nos parece imprescindível para a compreensão das questões que
envolvem a docência e a educação escolar, que, analisar e compreender o trabalho de
formação docente, por meio de suas experiências, pensamentos, reflexões e ações é um
ponto decisivo na contribuição de uma educação (escola) de melhor qualidade.
Dessa forma, ao nos referirmos à dimensão sociopolítica no trabalho de
formação docente, estamos trazendo para o debate a reflexão sobre a finalidade do
trabalho educacional e caracterizando sua presença nos cursos de formação de
13
Pedagogia, a partir da visão do docente-formador. Neste sentido, acreditamos que as
questões vitais às quais é imprescindível refletir: “quem queremos formar”, “para quê
queremos formar?”, “a favor de que nós formamos?” e “contra o que nós formamos?”,
devem sempre nortear qualquer trabalho de formação docente.
Por outro lado, tais questões têm passado despercebidas, pois a educação tem
sido naturalizada enquanto processo e sua finalidade tem sido definida somente a partir
de parâmetros da Psicologia que se referem ao desenvolvimento dos sujeitos. A relação
do processo educacional com os interesses da sociedade, seus problemas e suas
urgências têm ficado fora dos muros acadêmicos. Isto tem gerado processos
educacionais ideológicos que ocultam a contribuição das instituições de ensino e dos
professores para a manutenção ou transformação da sociedade.
Neste sentido, a presente pesquisa deseja contribuir com o debate sobre o
trabalho de formação inicial de professores, dando voz aos docentes-formadores de
docentes, ou seja, aqueles que educam os educadores
1
, para que expressem seu
pensamento sobre a finalidade de seu trabalho, os aspectos que compõem suas
principais preocupações e diretrizes para a formação que desenvolvem e como vêem a
relação da educação (aquela que realizam e aquela que ensinam) com as necessidades e
urgências da sociedade.
Nossa perspectiva é contribuir para a visibilidade e compreensão da dimensão
sociopolítica do trabalho educacional, fortalecendo sua presença como aspecto
integrante da formação docente.
Contextualização e Relevância do Problema
Com a Lei 5.540/68, conhecida como a Lei da Reforma Universitária, e a Lei
5.692/71 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), a formação de professor
ganha destaque na década de 70. Neste período, desenvolveram-se muitas pesquisas na
área de trabalho e educação, multiplicando os estudos sobre o trabalho do professor,
tendo como temas centrais, segundo Oliveira (apud Mancebo, 2007, p. 467), a natureza
do trabalho docente, a teoria da mais-valia e sua aplicabilidade ou não nas escolas, o
caráter improdutivo do trabalho escolar, e a suposta autonomia e/ ou alienação do
1
Aqui, fazemos alusão à pergunta feita por Karl Marx (1980), tempos atrás: Quem educa o educador?
14
docente. Destaque-se nessa fase uma predominância de orientação marxista,
explicitando a preocupação com o sistema ideológico vigente. Esse movimento vai ao
encontro do conceito de competência técnico-pedagógica trazido pela Escola Nova por
volta de 1930 e atingindo seu auge como tendência educacional presente no cenário
nacional na década de 1960, de acordo com Saviani (2006).
No início da década de 1980, o debate entre a competência cnica e o
compromisso político se acirra:
(...) fervia entre os educadores o debate sobre o compromisso político e a
competência técnica. Polemizava-se contra a dicotomia entre o
educador-político e o educador-técnico. A conjuntura política foi a
oportunidade para a explosão daquele debate: os governos militares,
forçados a passar o poder aos civis, haviam enfatizado a dimensão
tecnológica, as competências específicas e a prática do ensino como
treinamento; ao contrário, a emergente democracia destacava o sentido e a
necessidade do engajamento político da prática científico-pedagógica.
(Nosella, 2007, p. 27).
Ainda no início da década de 1980, Saviani publicou o texto
2
, Competência
Política e Compromisso Técnico ou (o pomo da discórdia e o fruto proibido),
dialogando sobre a polêmica entre a competência técnica e o compromisso político,
suscitado pelo “debate” entre Nosella (1983) e Mello (1982).
Saviani (2005) retomou a discussão afirmando que “(...) o compromisso político
não exclui a competência técnica (...)” (p. 48), pois tais dimensões convergem para um
mesmo ponto se constituindo como unidade dialética. Assim, ao mesmo tempo em que
essas dimensões se opõem, reciprocamente, elas se constituem como unidade na ação
pedagógica.
Saviani advertia ainda, que essa competência técnica defendida por Mello
(1982) não se justapõe à pedagogia tecnicista, mas, ao contrário, “(...) compreende o
domínio teórico e prático dos princípios e conhecimentos que regem a instituição
escolar.” (Saviani, 2005, p. 29).
Na década de 1990, o trabalho docente passa a ser pesquisado e articulado às
investigações sobre a formação docente e sua “profissionalização”. Ocorre uma
2
Texto publicado pela primeira vez na revista Educação e Sociedade. SAVIANI, D. (1983).
Competência política e compromisso técnico ou (o pomo da discórdia e o fruto proibido). Educação &.
Sociedade, nº. 15, v. 5, agosto, p. 111-43.
15
ressignificação da formação docente, de modo que o desenvolvimento das competências
passa a ser a principal tarefa da formação e os "saberes da prática" e "conhecimentos
tácitos" assumem lugar central na definição da própria ação pedagógica, em detrimento
do conhecimento teórico/ científico. (Soares apud Mancebo, 2007, p. 467).
Passados oito anos do século XXI, cabe perguntar-nos, em meio ao complexo
quadro educacional, se existe ainda espaço para retomarmos o debate sobre o
compromisso político no trabalho de formação docente.
Sobre isso, Nosella (2007) provoca:
(...) é necessário reformular a pergunta: de que compromisso político e de
que competência pedagógica estamos falando? (...) o educador de hoje,
concretamente, como poderá exercer seu engajamento político e sua
competência técnica? (p. 31).
Ele prossegue, “quais as características do ato pedagógico de um professor
comprometido politicamente nesta sociedade do século XXI?” (Nosella, 2007, p. 40).
Instigados assim, pela necessidade de retomarmos o debate, nos deparamos com
essas questões, estampadas nas páginas de uma conhecida revista de circulação nacional
(anexo III), acusando os professores de “excesso de ideologização”, por acreditar que a
maioria dos professores brasileiros fazem das aulas um “lugar para a doutrinação
ideológica.
.” 3
Apesar de discordarmos veementemente da opinião da revista,
reconhecemos um ponto positivo: a possibilidade de reacendermos o debate público
sobre o tema, registrando a tensão e o conflito gerados mais uma vez pela suposta
dicotomia entre o ato pedagógico e o ato político. Esse fato demonstra a atualidade da
discussão e registra a existência de movimentos que se contrapõem à opinião da revista.
Delimitação do problema
Nessa pesquisa partimos do princípio que o trabalho de todo professor, seja ele
das séries iniciais, educação básica, ensino médio, ensino superior ou pós-graduação,
apresenta uma dimensão sociopolítica, pois, em qualquer trabalho de educação há
implícita ou explicitamente uma relação entre educação e sociedade, que se expressa na
3
Para ler a reportagem na íntegra, ver o Anexo III desse trabalho.
16
finalidade do trabalho desenvolvido. Neste sentido, acreditamos como Saviani (2005)
na unidade dialética entre ato político e ato pedagógico da ação docente.
mais de duas décadas Fernandes (1987, p. 20) denunciava que não havia
nenhuma matéria no curso de formação de professores que capacitasse politicamente o
educador para enfrentar e compreender o seu papel social. Rios (2007) afirma, vinte
anos depois, que, por tal motivo, os próprios educadores não têm muito interesse ou
clareza da dimensão política de seu trabalho.
A partir disso, a questão que se coloca é identificar e compreender, por meio da
“voz” do docente-formador, a clareza que ele tem da presença da dimensão
sociopolítica no trabalho de formação que realiza na graduação em Pedagogia e como se
caracteriza a sua posição política implícita nesse trabalho. O docente-formador
compreende e relaciona o ato político ao ato pedagógico? Qual a finalidade do trabalho
que realiza enquanto docente-formador em função da compreensão que tem sobre:
“quem quer formar”, “para quê quer formar?”, “a favor de que quer formar?” e “contra
o que quer formar?”,
Dessa forma, sem negar as inúmeras questões que envolvem o processo da
formação inicial de professores, este estudo tem o objetivo de refletir sobre a dimensão
sociopolítica
4
no trabalho de formação docente, nos cursos de Pedagogia de
Universidades públicas e privadas; fazendo um recorte a partir da “voz” do
docente-formador, buscando compreender e dar visibilidade aos aspectos que compõem
essa dimensão.
4
A palavra política pode ser compreendida por nós, hoje, como o resultado de um longo processo
sócio-histórico que se inicia com a criação da polis (cidade-estado) grega. O termo “política” foi cunhado
a partir da atividade social desenvolvida pelos gregos em sua polis, e “remete à cidade, ao coletivo, ao
discurso, à cidadania, à soberania, à lei”. (Maar, 2006, p. p. 30). Podemos falar em outras variações do
termo que foram surgindo ao longo dos séculos para o termo política, tais como: arte de bem governar,
habilidade no trato das relações humanas, poder de persuasão, domínio da retórica, e outros sentidos não
tão positivos que povoam o senso-comum hoje, como: abuso de poder, desvios de verbas, corrupção,
entre tantos outros. No entanto, nos deteremos neste trabalho, a estudar a política como uma das
dimensões necessárias na formação e no trabalho docente. Dessa forma, entendemos por “dimensão
sociopolíticaa práxis consciente do ato educativo que abarca uma formação e uma visão sociocrática da
realidade, pela qual os educadores compreendem não apenas as relações entre a Escola e a Sociedade,
mas também, entre os conteúdos que são ensinados em sala de aula e os reflexos disso fora da instituição
escolar.
17
Estrutura da Dissertação
O primeiro capítulo foi dividido em duas partes. Na primeira parte, abordamos a
questão da inter-relação educação (escola) e sociedade e na segunda, a questão da
educação como tarefa sóciopolítica, numa perspectiva sócio-histórica.
O segundo capítulo consiste em algumas considerações sobre formação e
trabalho docente no Brasil, trazemos também, nesse capítulo, algumas dimensões que
envolvem o processo de formação docente, consideradas, por nós, fundamentais na
formação dos pedagogos; ressaltamos a compreensão da dimensão ciopolítica nessa
formação, como requisito crucial para uma práxis consciente e transformadora.
No terceiro capítulo, apresentamos os procedimentos metodológicos da
pesquisa.
No quarto capítulo trazemos os dados das entrevistas realizadas com os
docentes-formadores e a sistematização desses dados. Em seguida, buscamos produzir
uma síntese, por meio da análise das vozes dos sujeitos.
Finalmente, após o quarto capítulo, apresentamos a conclusão dessa pesquisa.
Para iniciarmos a tarefa de compreender e refletir melhor sobre essas questões,
fez-se necessário aprofundarmos nosso olhar sobre a relação entre a educação (escola) e
a sociedade, no contexto da educação brasileira, sob a luz de alguns autores que se
debruçaram sobre o tema.
18
CAPÍTULO I
Educação (Escola) e Sociedade
A educação é um evento social que se desdobra no tempo histórico. É também
mediação da sociabilidade, sendo sua finalidade inserir as
novas gerações no universo social (...)
.
Severino (2001)
Uma criança ao nascer, não traz consigo, geneticamente, uma programação de
como se comportar socialmente, de como falar, ou usar as técnicas para a sua
subsistência e proteção. É necessário ensinar-lhe a viver em/ na sociedade e a educação,
serve justamente para realizar esse trabalho de formação e assimilação das novas
gerações à sociedade, pois, como bem coloca Freire (2007a) “temos que saber o que
fomos e o que somos, para saber o que seremos.” (p. 33).
Sendo assim, não podemos conceber a educação como algo isolado, sem
vínculos com a economia, a cultura e a sociedade, como se os processos educativos
acontecessem de maneira isolada e desintegrada da realidade social. Por isso, a
necessidade de pensar a educação (escola)
5
ao mesmo tempo em que se pensa a
sociedade.
Severino (2001) corrobora essa idéia quando coloca que “a educação é um
evento social que se desdobra no tempo histórico. É também mediação da sociabilidade,
sendo sua finalidade inserir as novas gerações no universo social, fora do qual não
sobrevivem.” (p. 72).
O universo social do qual nos fala Severino é muito amplo e complexo, são
vários fios que se cruzam e entrecruzam formando o que podemos chamar de “teia
social”. Uma sociedade se compõe de indivíduos que se encontram em relação, ainda
que de maneira indireta. Contudo, nem toda relação entre indivíduos compõe uma
sociedade, já que, viver em sociedade, supõe a convivência com usos, costumes, crenças
e valores comuns desses indivíduos e uma permanência nesse convívio.
5
Nesse estudo, tomamos a escola como a principal instituição educativa da nossa sociedade.
19
Por outro lado, apesar do que tais indivíduos têm em comum, uma sociedade é
composta de indivíduos que também diferem entre si, não somente pela personalidade,
sexo, etnia, raça, mas também, porque esses indivíduos se agrupam segundo sua
condição econômica, condição esta que determina as diferenças de classe. Neste ponto,
surgem as relações de interesse, poder e domínio de alguns indivíduos sobre os outros, e
nessa perspectiva, “(...) na sociedade capitalista, a escola enquanto instituição tem sido
o espaço de inserção dos sujeitos nos valores e crenças da classe dominante.” (Rios,
2007, p. 35). Neste sentido, “a educação é (...) uma atividade humana partícipe da
totalidade da organização social. Essa relação exige que se considere a educação como
historicamente determinada por um modo de produção dominante, em nosso caso, o
capitalismo.” (Cury, 1985, p. 13).
Assim, a sociedade também procura perpetuar-se ao longo da História,
transmitindo de geração a geração seus valores morais, culturais, sociais, usos,
costumes, idéias, sentimentos comuns, mas, sobretudo, suas relações de poder. Essa
transmissão se dá, na sociedade capitalista, na escola.
Aqui podemos nos questionar obviamente: o papel da instituição escolar na
nossa sociedade seria então o de mera transmissora dos valores dominantes? Seria essa
a identidade da escola?
Sobre essa questão, Severino (2001) coloca que:
É íntima a relação entre educação e sociedade. As ciências humanas
atestam historicamente que as práticas informais da educação trazem
implícita uma concepção de sociedade e revelam em qual tipo se inserem.
Quando a educação se formaliza, mantém esse vínculo com a sociedade e,
ao mesmo tempo, elabora uma reflexão justificadora. Ela precisa dar-se
conta de sua identidade, tomando distância em relação à sociedade. (p. 71).
Nesse sentido, apesar da íntima relação entre ambas, escola e sociedade, é
preciso deixar claro que elas não se sobrepõem de maneira alguma. Pois, embora a
sociedade procure perpetuar-se historicamente, através da escola, isso não acontece de
uma forma estática, ao contrário, está sempre em transformação e é repleta de
contradições.
Por tal motivo, a educação é essencial à humanidade como mediadora de
aprendizados, que é por meio dela que o ser humano tem acesso ao conhecimento, à
20
cultura, aprende a ser humano, apreende a humanidade e pode viver em sociedade;
pode, ainda, perpetuar o que já existe nessa sociedade, mas, por outro lado, pode
também transformá-la.
A educação é, da mesma forma, mediada pelo contexto sócio-histórico, pelos
instrumentos simbólicos, tanto na sua construção quanto na sua desconstrução.
Nas palavras de Severino (2001):
A educação é um investimento intergeracional com o objetivo de inserir os
educandos nas forças construtivas do trabalho, da sociabilidade e da
cultura. Entendida a educação como prática real, superam-se as
concepções espiritualizadas do processo. A educação é uma atividade
como qualquer outra, é trabalho e prática social e simbólica. (p. 67). (...) A
educação é efetivamente uma prática cujo instrumental é formado por
instrumentos simbólicos de trabalho e de ação. Dirige-se aos educandos
interpelando sua subjetividade e investindo no desenvolvimento desta. Daí
a importância do conhecimento teórico no trabalho educativo e por isso se
fala do papel conscientizador da educação. (p. 70).
Acreditamos, por isso, na extrema importância da finalidade do trabalho
educativo pelo docente-formador em qualquer nível do ensino, pois ela poderá nortear
questionamentos e trazer contribuições que apontarão caminhos possíveis para a
transformação social. Se assim entendemos a educação (escola) como meio e não como
fim em si mesma, o contexto de atuação docente se efetiva como um movimento
dialético entre o ato político e o ato pedagógico.
Essa unidade dialética de ação e reflexão sobre a finalidade da ação docente
ultrapassa a alienação e instaura a consciência crítica na prática pedagógica, pois amplia
as possibilidades de intervenção social, que se traduzirá em atividade concreta do
docente, permitindo-lhe a junção entre a teoria e a prática e impedindo o discurso vazio.
Esse movimento dialético é que possibilita o compromisso político docente.
Desse modo, a finalidade do trabalho educativo e os interesses que se
propuserem, orientarão o pensamento e a ação docente, desvelando o conflito de
interesses sempre presente na relação entre a educação (escola) e a sociedade.
Nesse contexto, Rios (2007) alerta que
a relação escola-sociedade deve ser analisada de modo crítico, para que se
evidenciem os mecanismos determinantes da prática educativa. A análise
21
crítica nos levará a constatar a existência de posições diferentes no que diz
respeito àquela relação. (p. 36-37).
É por isso que a reflexão sobre o trabalho de formação-docente exige cada vez
mais que nos questionemos sobre os interesses que orientam nossas práticas e
concepções educativas, bem como os meios pelos quais procuramos atingi-los,
deixando claras as finalidades que regem nossas ações no processo de formação
docente.
Desse modo, teremos que escolher entre uma orientação e uma definição de
trabalho docente, por um lado, mais conservadora e mantenedora de uma determinada
ideologia dominante ou, por outro lado, nos colocaremos contra tal ideologia, fazendo
da educação (escola) um instrumento de transformação da sociedade. É essa escolha que
retrata qual o compromisso político de cada docente-formador. Será através da definição
dessa posição que o formador de docentes conduzirá o conteúdo e a forma de tratamento
de suas contribuições.
Sobre as possíveis posições, temos algumas definições concebidas segundo
Cortella (2006), e as quais gostaríamos de esclarecer. Uma delas é
(...) uma concepção da relação entre Escola e Sociedade que é muito
presente, muito comum entre os educadores e que foi dominante no Brasil
e, mesmo com algumas superações, ainda persiste no dia-a-dia
pedagógico; é aquela apelidada por nós como o otimismo ingênuo
6
. (p.
131).
Essa posição, de acordo com Cortella (2006),
(...) atribuir à Escola uma missão salvífica, ou seja, ela teria um caráter
messiânico; nessa concepção, o educador se assemelharia a um sacerdote,
teria uma tarefa quase religiosa e, por isso, seria portador de uma vocação.
(...) Na relação com a sociedade, a compreensão é de que a Educação seria
a alavanca do desenvolvimento e do progresso; a frase que resume isso é
“o Brasil é um país atrasado porque falta Educação; se dermos Escola a
todos os brasileiros, o país sairá do subdesenvolvimento.” (p. 131).
Rios (2007) explicita que esta tendência otimista e ingênua vê a instituição
escolar “como algo fora da dinâmica social, como impulsionadora desta dinâmica e
6
“O ‘otimismo pedagógico’, característica da Escola Nova, ganhou destaque na educação brasileira
particularmente a partir de 1930 e atingiu seu auge por volta de 1960.” (Saviani, 2006, p. 50).
22
acredita que, sendo espaço privilegiado de transmissão de cultura, a escola ‘dá o tom’ à
sociedade.” (p. 37).
Segundo Severino (2001), isso ocorre porque “nossa tradição tende a considerar
a educação como um processo espiritual, comparável à pastoral religiosa.” (p. 67),
porém para este autor:
Essa aproximação é arraigada no imaginário popular, no caso da cultura
ocidental. Isso decorreu da intervenção marcante do cristianismo desde os
tempos medievais no trabalho educacional. Desde o fim do império
Romano, a Igreja incorporou na evangelização a tarefa pedagógica de
“civilizar” os povos que passavam a integrar a sociedade européia. (p.
67-8).
Neste sentido, a escola seria a cura contra os males da sociedade. Seria a
alavanca capaz de mover todo um sistema sociopolítico-econômico, teria o poder de
transformar o mundo.
Essa concepção é otimista porque valoriza a Escola, mas é ingênua, pois
atribui a ela uma autonomia absoluta na sua inserção social e na
capacidade de extinguir a pobreza e a miséria que não foram por ela
originalmente criadas. (Cortella, 2006, p. 132). [grifo do autor]
“Dêem-nos uma boa escola, e teremos a sociedade desejada”, seria o seu slogan,
segundo Rios (2007). Essa concepção de educação como solução aos problemas da
sociedade é “não apenas a concepção dominante em um momento particular da história
da educação brasileira, mas permanece entre nós (...).” (p. 37).
De outro lado, outra concepção contrapõe-se à vertente anterior, apoiando-se “na
noção central de que a Educação tem, isso sim, a tarefa primordial de servir ao Poder e
não a de atuar no âmbito global da Sociedade e, por isso, não é nada mais do que
instrumento da dominação. A esta visão, daremos o apelido de pessimismo ingênuo.”
(Cortella, 2006, p. 133).
Nessa concepção, segundo Cortella (2006) o educador “é um agente da ideologia
dominante, ou seja, um mero funcionário das elites.” (p. 134)
Neste sentido, ele afirma:
(...) a Escola não teria, de forma alguma, autonomia, sendo determinada,
de maneira absoluta, pela classe dominante da Sociedade, que a manejaria
livremente, por deter o poder político e econômico. O educador, veiculado
23
de injustiça social, ficaria com a missão de adequar as pessoas ao modelo
institucionalmente colocado. (Cortella, 2006, p. 135).
Rios (2007) concorda com essa definição, afirmando que:
(...) Seus defensores procuram chamar a atenção apenas para a reprodução
indiscutível, por sinal dos valores no âmbito escolar. ‘Não o que
fazer na escola enquanto a sociedade se apresenta com tantas limitações’,
diriam eles. Um mérito pode ser apontado no interior desta tendência:
percebe-se aí que a escola não se encontra fora da sociedade. Entretanto os
defensores de tal concepção, tanto como os primeiros, são ingênuos, na
medida em que vêem apenas uma das funções desempenhadas pela escola.
(Rios, 2007, p. 38).
Pois, segundo essa autora:
A escola não está nem fora da sociedade, com uma autonomia absoluta
diante dos fatores que estimulam as mudanças sociais, nem muito menos
numa relação de subordinação absoluta, que a converte em mera
reprodutora do que ocorre em nível mais amplo na sociedade. A escola é
parte da sociedade e tem com o todo uma relação dialética uma
interferência recíproca que atravessa todas as instituições que constituem o
social. Além disso, podemos verificar que a escola tem uma função
contraditória ao mesmo tempo em que é fator de manutenção, ela
transforma a cultura. (Rios, 2007, p. 38).
As posturas: ingênuas povoam o senso-comum e não levam à consciência
crítica
7
. Por outro lado, a análise critica do processo educativo, segundo Rios “permite
que este seja reconhecido como um conjunto de práticas que, ao mesmo tempo, mantêm
e transformam a estrutura social.” (Rios, 2007, p. 38).
Com relação à postura ingênua, ou a “consciência ingênua” assim denominadas
por Freire (2007a) é caracterizada como sendo “(...) frágil na discussão de problemas”,
pois, segundo ele, “(...) o ingênuo parte do princípio que sabe tudo. Pretende ganhar a
discussão com argumentos frágeis (...) sua discussão é feita mais de emocionalidades
que de criticidades: não procura a verdade; trata de impô-la e procurar meios históricos
para convencer com suas idéias (...).”. (p. 40).
7
A consciência crítica é aqui compreendida como fenômeno psíquico, como algo que se desenvolve de
modo sócio-histórico e vai se transformando na medida em que o sujeito evolui intelectualmente,
tornando-se capaz de apropriar-se da realidade, questioná-la e contribuir para sua transformação ou
manutenção.
24
Por outro lado, uma postura oposta a essa “consciência ingênua”, é o que Freire
(2007a) denomina de “consciência crítica”, caracterizada, entre outras coisas, pelo
“anseio de profundidade na análise de problemas. o se satisfaz com as aparências
(...).” (Idem, p. 40), reconhecendo que a realidade é algo mutável, “substitui situações
mágicas por princípios de causalidade.”, é indagadora, inquietante, autêntica, dialógica
e por isso mesmo, “face ao novo, não repele o velho por ser velho, nem aceita o novo
por ser novo, mas aceita-os na medida em que são válidos.” (Freire 2007a, p. 40). .
Uma concepção que comporta esse princípio dialético é denominada por
Cortella, como otimismo crítico. Essa postura surge, segundo ele, nos anos 80,
buscando resgatar a positividade das concepções anteriores e “procurando superar tanto
a fragilidade inocente contida no otimismo desenfreado quanto o imobilismo fatal
presente no pessimismo militante.” (Cortella, 2006, p. 135).
Essa concepção deseja apontar a natureza contraditória das instituições
sociais e, aí, a possibilidade de mudanças; a Educação, dessa maneira, teria
uma função conservadora e uma função inovadora ao mesmo tempo. A
Escola pode, sim, servir para reproduzir as injustiças, mas,
concomitantemente, é também capaz de funcionar como instrumento para
mudanças; as elites controlam o sistema educacional, controlando salários,
condições de trabalho, burocracia, etc., estruturando, com isso, a
conservação; porém, mesmo que não queira, a Educação por elas permitida
contêm espaços de inovação a partir das contradições sociais. Não é casual
que as elites evitem ao máximo a universalização qualitativa da Escola em
nosso país. (Idem, p. 136).
Tais colocações de Freire, Severino, Rios e Cortella ajudam-nos a compreender
claramente as categorias prévias com as quais trabalhamos; deixando também explícito
que dentre essas três posturas Otimista Ingênua, Pessimista Ingênua e Otimista Crítica,
apostamos nesta última como a mais acertada ao educador consciente do seu papel
político-pedagógico na sociedade.
Entendemos, portanto, que a construção de uma educação (escola) e de uma
sociedade não depende simplesmente do docente selecionar temas e abordagens teóricas
críticas a serem trabalhados com os futuros professores, mas depende muito da postura
tomada pelo docente-formador diante das finalidades da educação que promove, do
projeto político-pedagógico que defende para a instituição escolar e para a sociedade, e,
acima de tudo, da clareza que tem do seu compromisso sociopolítico, pois, isso norteará
25
as respostas das questões vitais, explicitadas: “quem queremos formar”, “para quê
queremos formar?”, “a favor de que nós formamos?” e “contra o que nós formamos?”.
26
Educação (escola) e a tarefa sociopolítica: “a favor de que?” e
“contra o que formamos?”
A atividade do homem em sociedade tem sempre um
caráter político, na medida em que a organização da
vida material de uma maneira peculiar determina,
ao mesmo tempo, uma maneira peculiar das idéias e
das relações de poder. Não há vida social que não
seja política – é em função de fins específicos,
definidos por certos interesses, que os homens
estabelecem suas relações com a natureza e uns com
os outros, articulando em sua ação sua vontade com
as condições concretas do contexto em que vive. Ser
político é tomar partido (...).
Rios (2007).
A relação educação (escola) e sociedade, tratada no capítulo anteriormente, abre
caminho para uma outra discussão, a saber, a relação entre educação (escola) e política.
Tal relação tem sido abordada por diversos autores, tais como, Bourdieu e Passeron
(1975); Charlot (1979); Gramsci (1982); Freire (2007
a
, 2007b, 1996); Althusser (1985);
Severino (2003, 2001, 1998, 1986); Gadotti (2006, 2005, 2003); Saviani (2006, 2005,
2004, 1986); Rios (2007, 2000), entre outros.
Charlot (1979) chega a afirmar que “educação é política” (p. 11), porém o
mesmo autor adverte:
(...) dizer da educação ou da escola, ou dos programas, ou do controle
pedagógico, etc., que são políticos, não é ainda dizer grande coisa. Tudo é
política, pois a política constitui certa forma de totalização do conjunto das
experiências vividas numa sociedade determinada (...). (Charlot, 1979, p.
13).
Em seguida, o próprio Charlot alerta que “(...) não basta, portanto, afirmar que a
educação é política. O verdadeiro problema é saber em que ela é política.” (Idem, p. 13).
Sobre essa questão, Saviani (2006) indaga: “Educação e política se equivalem,
se identificam? São diferentes, em que consiste a diferença?.” (p. 82). O autor
demonstra que educação e política, embora inseparáveis, não são idênticas. “Trata-se de
práticas distintas, dotadas cada uma de especificidade própria.” (Idem, p. 82).
27
Saviani (2006) explicita que esse problema de se determinar a especificidade da
educação e sua relação com a política, coincide com o problema do desvelar a natureza
própria do fenômeno educativo. No entanto, para ele “tal tarefa implica (...) um projeto
mais ambicioso, impossível de ser desenvolvido a curto prazo.” (Idem, p. 82).
Ainda assim, Saviani (2006) aponta alguns elementos relativos à natureza da
prática educativa por confronto com a especificidade da prática política, no que
denomina de Onze teses sobre educação e política, cuja 11ª sintetiza as demais, uma
conclusão das teses anteriores, que operam como suas premissas:
A função política da educação cumpre-se na medida em que ela se realiza
como prática especificamente pedagógica. (...) Esta tese afirma a
autonomia relativa da educação em face da política como condição mesma
da realização de sua contribuição política. (...) se a educação for dissolvida
na política, não cabe mais falar de prática pedagógica restando apenas a
prática política. Desaparecendo a educação como falar de sua função
política?.” (Saviani, 2006, p. 88-90).
Ainda, à luz das teses de Saviani (2006), é interessante apresentar uma situação
em que para esse autor, a afirmação “a educação é política” pode ser levada em conta.
Neste caso, a afirmação procede se o adjetivo “político” não se identificar com a prática
social global, como ocorre na afirmação Aristotélica: “o homem é um animal político”.
Pois, Saviani nos adverte que neste caso corre-se o risco de tautologia e indiferenciação.
Onde “tudo” é política e “tudo” é educação. Com relação a essa questão, ele afirma que
na medida em que se pretende evidenciar a dimensão política da educação:
(...) dizer que educação é sempre um ato político não significa outra coisa
senão sublinhar que a educação possui sempre uma dimensão política,
independentemente de se ter ou não consciência disso (...). E aqui vale
lembrar que a recíproca também é verdadeira e que esse sentido não pode
ser evidenciado senão quando se preserva a especificidade de cada uma
dessas práticas (...). Com efeito, eu posso afirmar que educação é um
ato político (contém uma dimensão política) na medida em que eu capto
determinada prática como sendo primordialmente educativa e
secundariamente política. (Saviani, 2006, p. 91).
Assim como explicitamos a impossibilidade de se justapor educação e
sociedade, acreditamos, como Saviani, que educação e política são coisas distintas,
porém em estreita relação, na medida em que, o que se faz ou se deixa de fazer numa
sala de aula, por exemplo, lecionando seja em que nível for, é um ato
28
político-pedagógico. Se o professor não tem consciência disso, pode cair na armadilha
da reprodução do senso comum, reiterando a dominação do sistema vigente, seja ele
bom ou ruim, sem questioná-lo. Dessa forma, o ato pedagógico continua sendo ato
político, porém, não se tem clareza da dimensão política desse ato.
Assim, a intencionalidade, ou seja, o compromisso político do educador retrata,
a nosso ver, as concepções que orientam seu trabalho, desvelado ou não, esse
compromisso sempre está relacionado com as questões apontadas: “a favor de que?e
“contra o que formamos?”
Neste sentido, a educação sempre terá uma direção: educamos para uma
determinada sociedade. Toda prática pedagógica é sustentada por uma concepção de
sociedade e de sujeito. Nenhuma prática é neutra; ou ela favorece a sociedade que
temos, reproduzindo-a, ou ela se contrapõe apresentando um novo projeto social.
Por isso, um posicionamento crítico frente às leis, regulamentos, pareceres,
normas da educação ou a qualquer mediação educativa é facilitada quando procuramos
situa-los no contexto do pensamento pedagógico brasileiro, nas tendências da educação
no Brasil.
Nessa linha de raciocínio, Rios (2007) acrescenta que:
É preciso, portanto refletir sobre os objetivos específicos da educação, não
para a distinguirmos da prática política propriamente dita, mas para
podermos ver claramente a presença da dimensão política na prática
educativa. Pois é com relação à sua intencionalidade que se evidencia nas
práticas sociais sua dimensão política. (p. 40).
Isso posto, investigamos, no processo de formação de docentes-formadores
como se apresenta a dimensão sociopolítica e quais os aspectos são apresentados pelos
professores para explicitar e caracterizar esta dimensão.
29
A perspectiva sócio-histórica da educação: conflitos,
contradições e mudanças
O embasamento desse estudo está ancorado na perspectiva cio-histórica, a
qual considera a educação, especialmente a escolar, como um fenômeno social e
político, conforme exposto anteriormente.
No teor dessa abordagem, encontramos um núcleo de reflexão muito importante,
já que, temos em vista que a formação de professores tem conseqüências que se
vinculam às finalidades objetivas ou subjetivas que norteiam as ações desses
docentes-formadores. Portanto, se o docente-formador não tem nítida consciência das
conseqüências políticas do ato pedagógico que realiza, oculta em sua prática os
conflitos, as contradições e a possibilidade de mudar a sociedade, assim como, a
capacidade da instituição escolar de contribuir para esse fim.
Para compreendermos melhor esse núcleo de reflexão, é preciso adentrar na
perspectiva sócio-histórica da educação, como faremos a seguir.
Na perspectiva sócio-histórica entende-se que o ser humano se constitui a partir
de suas relações com os outros seres humanos, através de uma constituição histórica e
social. Essa concepção fundamenta-se no materialismo histórico-dialético de Marx e
concebe o homem como um ser ativo, social e histórico e a sociedade como produção
histórica dos homens que através do trabalho, produzem sua vida material e suas idéias.
Dessa forma, o homem é originariamente, para Marx, constituído por relações com a
natureza e com os outros homens.
Segundo Bock (1999):
Na concepção sócio-histórica, crítica à visão positivista, o homem pode
ser compreendido em sua inserção num mundo social. As determinações
humanas são sociais. Sua natureza ou sua condição biológica se insere e se
desenvolve num meio social. O que a natureza ao homem não é
suficiente para garantir sua vida em sociedade. O homem precisará
adquirir formas de satisfazer suas necessidades e, para isso, deverá se
apropriar das formas socialmente construídas de satisfação das
necessidades. (Bock, 1999, p. 13).
30
A concepção sócio-histórica traz assim, em seu bojo, o entendimento que, todo
homem se constitui como ser humano pelas relações que estabelece com os outros.
Desde o nascimento somos socialmente dependentes dos outros e entramos em um
processo histórico que nos oferece os dados e visões sobre mundo.
(...) de muito pouco nos serve a identificação do homem com a natureza.
De muito pouco nos serve a idéia de que o homem é um ser natural e,
como tal, possuidor de uma natureza humana que o distingui e o identifica
como ser humano (...) essa idéia tem servido para ocultar as determinações
sociais do humano e, nesse sentido, cumpre um papel ideológico. Em
nossa concepção, o homem é sempre social, fruto de relações sociais, e
qualquer idéia que não contribua para desvendar essa determinação será
considerada como ideológica. (Bock, 1999, p. 13).
Neste sentido, as idéias que dissimulam e camuflam as múltiplas determinações
socioculturais e ignoram a dialética das relações indivíduo/ sociedade, educação/
sociedade, educação/ política e a constituição dos conflitos de classes e ideologias
provenientes desse conflito de interesses, mascaram a participação da educação na
reprodução da ideologia da classe dominante.
Sobre isso, Severino nos diz:
Pode-se constatar pela história da formação do conceito de ideologia, não
se estabelecer-se nenhuma relação explícita no decorrer dessa história
entre o processo ideológico e o processo educacional. A questão da
ideologia, qualquer que seja a concepção de seu significado, surge sempre
em relação ao pensamento e à ação político-social. É como se a práxis
educacional não estivesse intimamente vinculada ao processo
político-social mais amplo. Isto se explica até certo ponto porque,
sobretudo no que se refere à educação formal, à educação escolar, entendia
se tratar de um processo neutro, puramente objetivo. Quando muito
admitia-se que a educação informal era portadora de conteúdo ideológico,
mas este era um processo que se diluía no processo sociocultural (...).
(Severino, 1986, p. 39).
Com essas definições compreendemos que a ideologia serve para ocultar e
dicotomizar a realidade social, construindo uma visão teórica da situação e separando
essa visão do que de fato ocorre no meio social. A palavra ideologia é trazida pelo
dicionário Aurélio
8
com os significados: 1. ciência da formação de idéias; 2. sistema de
8
HOLLANDA. A. B. de. (1988). Novo dicionário básico de Língua Portuguesa – Aurélio/ Folha. São
Paulo: Nova Fronteira.
31
idéias. Porém, Gadotti (2005) caracteriza de maneira mais abrangente o termo, dizendo
que:
Existem numerosas opções de ideologia. Empregando o termo “ideologia”
para designar um pensamento teórico estruturado, exprimindo uma falsa
visão da história, cuja finalidade é ocultar um projeto social, político e
econômico da classe dominante. A ocultação, dentro desta acepção
operacional de ideologia, é, portanto um elemento fundamental de sua
compreensão. Essa ocultação exprimi-se dentro de uma sociedade dada,
através de distorções, de manifestações, de dominação e repressão. Esse
pensamento não é um pensamento puramente teórico”, mas
profundamente ligado a uma prática social e política. (Gadotti, 2005, p.
31).
A partir deste ponto retomamos a discussão proposta inicialmente, saber em
que a educação é política.”. Para Charlot (1979), “a educação é política na medida em
que é encargo da escola, instituição social cuja organização e funcionamento dependem
das relações de força sociais e políticas.” (p. 19).
A escola desempenha um papel político na medida em que propaga uma
educação que tem, ela própria, um sentido político. Assim os grupos
sociais e as classes sociais procuram fazer da escola o instrumento de suas
finalidades, de seus interesses e da difusão de suas idéias. A escola é o
campo de lutas que traduzem as tensões e os conflitos que atravessam a
sociedade, a começar pela luta de classes. A escola (...) serve, antes de
tudo, aos interesses da classe dominante apesar de não ser totalmente
fechada aos modelos, aos ideais e às idéias das outras classes sociais. É, ao
mesmo tempo, vítima e fonte de propagação da ideologia dominante (...).
(Charlot, 1979, p. 20).
Neste sentido, a presença dessa ideologia dominante na escola cria uma
educação mais do que social, uma educação política, mas também partidária, ou seja,
uma política de cartas marcadas, onde supostamente o indivíduo é livre para escolher o
que estudar, onde trabalhar, o que “vai ser quando crescer”, mas esconde o outro lado da
questão, já que dependendo da condição socioeconômica deste indivíduo, ele se
submetido a uma competição feroz onde suas chances de realmente ser livre para
escolher, são mínimas.
Assim, nos colocamos diante da função reprodutivista da escola, resgatando a
noção de escola como reprodutora da estrutura de classes e do pensamento burguês, de
acordo com Bourdieu e Passeron (1975), ou Althusser (1985) e sua visão de escola
como aparelho ideológico do Estado, na qual a educação presta-se a uma política
32
mistificadora que, veiculando idéias descoladas da realidade sociopolítica da qual
provém, apresentando-se como algo verdadeiro, autônomo, mas que na verdade camufla
a realidade. Neste viés, a escola se encontra a serviço da classe dominante, perpetuando
seus interesses.
Nesta perspectiva, Rios (2007) afirma que:
(...) a escola da sociedade capitalista não tem cumprido a finalidade da
educação que desejamos, de caráter democrático, socializando
efetivamente o saber e os recursos para apreendê-lo e transformá-lo. Isso
porque, como outras instituições sociais, ela tem estado a serviço da classe
dominante, veiculando a ideologia dessa classe. (p. 43).
Mas, se por um lado a instituição escolar veicula a ideologia das classes
dominantes, por outro lado, é preciso resgatar o sentido da escola como espaço de
conflitos, contradições e luta, tal qual nos coloca Gramsci (1982), e Freire (2007a)
quando esse nos fala da escola como “lócus” de mudança.
Em consonância com Gramsci e Freire, Gadotti (2005) observa que a
educação não pode ser reduzida apenas às suas ligações com o sistema. Pois, apesar do
ato educativo ser ato político, também é ato social, mas não se limita a isto.
O encontro que caracteriza o ato educativo guarda algo de original que não
pode ser destruído nem reduzido pela ideologia. A educação, sendo práxis,
porque ela é práxis é que pode escapar à ideologia. A ideologia não
consegue dominar inteiramente o ato educativo; sempre fica um espaço
livre. E é justamente esse canteiro que deve ser cultivado, esse espaço livre
que o educador deve alargar. Mesmo numa educação da dominação,
guiada por uma pedagogia opressiva, o educador ainda tem a chance de
plantar neste espaço a semente da libertação. (Gadotti, 2005, p. 35).
Neste sentido, a escola como espaço de conflitos, contradições e mudanças,
ainda que mergulhada na ambigüidade de suas funções reprodutora e transformadora,
precisa ser alvo de discussões e debates como o que aqui nos propomos, para que
possamos avançar cada vez mais no exercício da reflexão, da crítica e da transformação
da sociedade. Por isso, torna-se fundamental a presença de professores que tenham uma
formação e uma atuação político-pedagógica, para que possam ampliar o olhar crítico e
escapar da alienação imposta por tal ideologia das classes dominantes. Já que,
a “tarefa
33
de educador consiste justamente em tornar esse espaço livre, reduzido pela dominação, espaço
dominante: fazer com que a liberdade triunfe sobre a dominação.” (Gadotti, 2005, p. 35).
34
CAPÍTULO II
Formação e trabalho docente: algumas considerações
9
As questões que envolvem a formação e o trabalho docente vêm tomando corpo
e estão atualmente no foco das discussões educacionais, não só no Brasil, como também
em toda a América Latina e em vários países do mundo, tais como: Portugal, França,
Suíça, Canadá, Estados Unidos, entre outros. A crise mundial pela qual passamos com
relação à profissão docente tem repercutido na definição, ou melhor, na indefinição da
especificidade de ser professor, ou ainda, na indefinição do papel docente perante os
desafios e tensões da pós-modernidade.
Gadotti (2003) alerta que “(...) para entender a crise de identidade dessa
profissão é preciso colocar em evidência as características atuais da profissão
docente.”
10
(p. 11), que, estamos, segundo ele, “diante de uma profissão
massificada, o que realça o grande alcance dessa profissão e sua importância
estratégica.”. (Idem, 2003, p. 11)
O processo de profissionalização-desprofissionalização docente “alterna-se na
história dos professores desde o século XIX” (Nóvoa apud Roldão, 2007, p. 4),
permeado por conflitos de interesses: "A afirmação profissional dos professores é um
percurso repleto de lutas e de conflitos, de hesitações e de recuos." (Idem, 2007, p. 04).
Percebe-se neste contexto a fragilidade e a indefinição do trabalho docente. Isso
acontece devido não às políticas educacionais impostas às instituições escolares, mas
também pelos próprios professores como atores principais da profissão docente,
perdidos em meio à crescente massificação do magistério em todos os níveis.
Por outro lado, segundo dados da Unesco (2007) 60 milhões de professores
no mundo. Fato que torna a classe de professores “a empresa” mais numerosa no
9
Parte desse capítulo foi apresentada na Conferência Internacional: Educação, Globalização e Cidadania,
realizada em João Pessoa entre os dias 19 a 22 de fevereiro de 2008. NOGUEIRA, M. O. G.; GUIDI, A.
C. (2008). Formação e trabalho docente: algumas considerações. In: Conferência Internacional
Educação, Globalização e Cidadania: Novas Perspectivas da Sociologia da Educação, 1., 2008, João
Pessoa. Anais ... João Pessoa: Universidade Federal da Paraíba, 2008. 1CD/ROM.
10
Grifos da autora.
35
ranking mundial, nos proporcionando assim, uma percepção sobre a dimensão e
importância desta categoria.
No Brasil, o resultado do censo escolar 2006 realizado pelo MEC/ INEP (Brasil,
2007)
11
constatou um número total de 2.647.414 docentes somente da rede básica de
ensino; onde praticamente 50% deles, 1.146.505, atuam no sistema municipal de ensino;
e uma pequena parcela 14.825 no sistema federal. Em relação a 2003 observamos uma
pequena diminuição de número de funções docentes, e em contrapartida uma ampliação
na educação infantil e ensino médio, indicando uma expansão de oferta nesses níveis de
ensino.
Tabela 1
Número de funções docentes atuando por dependência
administrativa, nível e modalidade de ensino - Brasil -
2003-2006
BRASIL
Dependência Administrativa
Ano
Total
Federal
Estadual
Municipal
Privado
2003
2.861.536
16.160
989.351
1.341.001
515.024
2006
2.647.414
14.825
958.593
1.146.505
527.491
Fonte: MEC/ INEP 2003/ 2006
12
Tabela 1: Número de funções docentes atuando por dependência
administrativa, nível e modalidade de ensino - Brasil - 2003-2006.
A partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, promulgada em
1996 (Lei 9.394/96) volta a se constituir a formação dos professores, como pauta
explícita das políticas públicas dos governos federal, estaduais e municipais. A LDBEN
9394/96 utiliza-se do termo “Profissionais da educação”, repetidas vezes ao longo do
texto, indicando assim, uma possível orientação da própria lei para tratar mais
profissionalmente os professores, educadores ou mestres que trabalham nos diferentes
níveis do magistério. Além disso, essa Lei determina no art. 62 que a formação de
docentes para atuar na educação básica seja realizada em nível superior, de graduação
plena, em universidades e institutos superiores de educação.
11
MEC/INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Para maiores
detalhes sobre dependências administrativas/censo escolar; acessar:< http://www.inep.
gov.br/basica/censo/escolar/sinopse/sinopse.asp>.
12
Idem.
36
Além da nova LDBEN, alguns fatores contribuíram para que houvesse um
impulso em torno da discussão sobre a formação de professores no contexto brasileiro.
Dentre eles, podemos destacar: a elaboração dos “Parâmetros Curriculares Nacionais” -
PCN, a elaboração das “Diretrizes Curriculares para a Formação de Professores para a
Educação Básica” e a elaboração de “Diretrizes Curriculares Nacionais” para os
diversos cursos de graduação em modalidade de licenciatura plena.
Podemos destacar também, alguns fatos mais recentes que vêm contribuindo
com o cenário de formação e trabalho docente no Brasil e, portanto, com o avanço da
educação brasileira de modo geral. Entre eles estão a criação do “Fundo de
Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação”
FUNDEB
13
, aprovado em dezembro de 2006, que veio substituir o “Fundo de
Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do
Magistério” FUNDEF, em vigor no governo anterior, que investia somente no ensino
fundamental, ao passo que o FUNDEB contempla também o infantil e o médio, ou seja,
a educação básica como um todo. A alteração introduzida pelo FUNDEB no
financiamento da educação básica poderá ter significativo impacto sobre a oferta e a
qualidade da educação brasileira
Um plano importante de se destacar refere-se ao Plano Nacional da Educação
PNE, que retira o processo de escolarização do isolamento social e da responsabilidade
individual, insistindo na dimensão coletiva do trabalho pedagógico e no caráter
democrático de seus propósitos, de sua execução e avaliação. Expõe a redescoberta do
valor da escola, do professor e da participação da sociedade.
O PNE estabelece, para os professores, entre outras atribuições, a sua
participação na elaboração da proposta pedagógica (art. 13, I) e garante-lhes tempo
remunerado para preparação e avaliação do trabalho pedagógico (art. 67, V), no
contexto de progressivos graus de autonomia da escola (art. 15).
Fazendo-se uma análise dessa legislação, percebe-se que existe uma valorização
do papel do professor e de sua responsabilidade no processo educacional, inclusive com
a oferta de condições necessárias para o seu exercício profissional.
Outro plano lançado pelo MEC, o “Plano de Desenvolvimento da Educação”
PDE, em abril do ano de 2007 anunciando a prioridade da educação como política do
13
Para maiores informações sobre o FUNDEB, o PNE e o PDE, acessar: http://portal.mec.gov.br
37
Estado, traz, em seu bojo, as bases e a concepção de valorização dos profissionais da
Educação que regem os atuais programas de formação de professores do governo
federal. Dessa forma, o PDE é um conjunto de programas que tem como objetivo buscar
atingir as metas quantitativas estabelecidas pelo Plano Nacional da Educação – PNE.
No entanto, além de ser um plano com ações específicas para essa finalidade, o
mesmo possui uma concepção própria sobre a Educação, na medida em que concebe a
Educação por meio de uma visão sistêmica em que o ciclo educacional é visto de
maneira integral.
Assim, os programas propostos pelo PDE têm seu foco na integração entre
níveis e modalidades de ensino, dando ênfase a uma situação em que não ocorra a
dicotomização entre educação básica e ensino superior. Pelo contrário, a concepção
apresentada pelo PDE é a de que para que ocorra a melhoria da qualidade da educação
básica, vai depender da formação dos seus professores, formação essa que, por lei
(LDBEN - 9394/96) deve ser de nível superior.
É preciso registrar ainda, dois marcos históricos que concretizaram um avanço
extremamente significativo em relação às políticas públicas do setor educacional no
Brasil. Pela primeira vez, sociedade civil, entidades de classe, profissionais e pais se
reunirão em torno da discussão pela melhoria da qualidade do ensino a partir da
construção de um sistema nacional articulado de educação. O primeiro deles, A
Conferência Nacional da Educação Básica (Coneb)
14
que ocorreu entre os dias 14 e
18 de abril de 2008, em Brasília, tendo como foco de discussões, dezenas de temas que
dizem respeito à educação básica pública e privada, reunindo 1.420 delegados (as)
escolhidos (as) em todos os estados da federação e no Distrito Federal, pra discutirem o
tema: Os desafios da construção de um Sistema Nacional Articulado de Educação.
O segundo grande marco dessa conferência foi a fixação do piso salarial para o
magistério público
15
, a instituição do piso salarial nacional para os profissionais do
magistério público da educação básica de R$950,00 está regulamentado pela Lei
14
Para ter acesso aos documentos e informações completas sobre A Conferência Nacional da Educação
Básica, acesse o portal do MEC no endereço eletrônico:
<http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&task=view&id=8986&Itemid=&sistemas=1>,
acesso em 20 de jun. 2008.
15 Para ter acesso aos documentos e informações completas sobre o pisosalarial para o magistério
público da educação básica, acesse o site:
<
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&task=view&id=10875>, acesso em 10 set.
2008.
38
n.º1.738, de 16/7/2008 (DOU 17/7/2008), em face o art.60, alínea e, do Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias (EC n.º 53, de 19/12/2006) e da Lei n.º
11.494/2007. A lei do piso salarial sancionada se constitui em um grande passo para a
educação brasileira, por ser uma reivindicação histórica da categoria. É a primeira
categoria a ter um piso salarial nacional definido na Constituição Federal. Os
professores da educação básica pública dos estados, municípios, do Distrito Federal e da
União serão beneficiados com a entrada em vigor do piso.
Em 1994, o compromisso de estabelecimento do piso foi firmado no Palácio do
Planalto, entre o Ministério da Educação, “Conselho Nacional de Secretários de
Educação” (Consed), “União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação”
(Undime), “Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação” (CNTE) e outros.
Diante da demanda, a definição do piso salarial nacional encaminhada pelo governo
federal à Câmara dos Deputados em março de 2007 significou o resgate do “Pacto
Nacional pela Valorização do Magistério e Qualidade da Educação”.
Podemos dizer que houve avanços extremamente significativos no que concerne
à educação como um todo, assim como em relação à formação e ao trabalho docentes,
no entanto, muito ainda precisa ser feito, principalmente no que diz respeito à Formação
Inicial dos Professores. Já que, a despeito dos avanços nas discussões, os dados do
último senso, divulgados pelo “Instituto Nacional Anísio Teixeira” - INEP, demonstram
números significativos e preocupantes, pois, ainda, muitos professores em atividade
sem a titulação necessária; como observamos nas tabelas abaixo:
Tabela 2
Descrição dos níveis de formação dos professores por nível de ensino,
2003-2006
Funções Docentes em creche
Urbana e Rural
Ano
Total Fundamental
Incompleto
Completo
Médio completo Superior Completo
2003
80.177
3.344 6.077 57.215 13.541
2006
94.038
1.204 3.714 57.133 31.987
Fonte: MEC/ INEP 2003/ 2006
Tabela 2 - Descrição dos níveis de formação dos professores por nível de ensino,
2003-2006 - Funções Docentes em creche – Urbana e rural
39
Tabela 3
Descrição dos níveis de formação dos professores por nível de ensino,
2003-2006
Funções Docentes na Pré-Escola
Urbana e Rural
Ano Total Fundamental
Incompleto
Completo
Médio completo Superior Completo
2003
317.022
2.837
9.350
215.953
88.882
2006
309.881
1.173
5.170
162.124
141.414
Fonte: MEC/ INEP 2003/ 2006
T
abela 3 - Descrição dos níveis de formação dos professores por nível de ensino,
2003-2006 - Funções docentes na pré-escola
Tabela 4
Descrição dos níveis de formação dos professores por nível de ensino,
2003-2006
Funções Docentes no Ensino Fundamental 1ªa 4ª séries
Urbana e Rural
Ano Total Fundamental
Incompleto
Completo
Médio completo
Superior Completo
2003
1.022.133
5.972
18.648
678.201
319.312
2006
840.185
1.675
6.863
346.855
484.792
Fonte: MEC/ INEP 2003/ 2006
Tabela 4 - Descrição dos níveis de formação dos professores por nível de ensino,
2003-2006 – Funções docentes no Ensino Fundamental 1ª. A 4ª. séries.
Tabela 5
Descrição dos níveis de formação dos professores por nível de ensino,
2003-2006
Funções Docentes no Ensino Fundamental 5ªa 8ª séries
Urbana e Rural
Ano Total Fundamental
Incompleto
Completo
Médio completo Superior Completo
2003
918.822
288
1.893
238.361
678.280
2006
865.655
70
448
125.473
739.664
Fonte: MEC/ INEP 2003/ 2006
Tabela 5 - Descrição dos níveis de formação dos professores por nível de ensino,
2003-2006 – Funções docentes no Ensino Fundamental 5ª. e 8ª. séries
40
Tabela 6
Descrição dos níveis de formação dos professores por nível de ensino,
2003-2006
Funções Docentes no Ensino Médio
Urbana e Rural
Ano Total Fundamental
Incompleto
Completo
Médio completo Superior Completo
2003
499.868
41
204
49.930
449.693
2006
519.935
2
20
23.704
496.209
Fonte: MEC/ INEP 2003/ 2006
Tabela 6 - Descrição dos níveis de formação dos professores por nível de ensino,
2003-2006 - Funções Docentes no Ensino Médio
Fazendo uma breve análise dos dados observamos que, em 2006, houve uma
melhoria do vel de formação dos professores. Ao mesmo tempo, tais dados refletem
que a formação de professores no Brasil ainda está longe de ser satisfatória, já que, mais
de 730 mil professores da educação básica ainda não possuem o nível superior de
formação. Dessa forma, apesar da LDBEN (9394/96) trazer um capítulo especial
intitulado Dos Profissionais da Educação, onde docente que pretende ensinar na
educação básica deverá ter nível superior, através de curso de licenciatura, de graduação
plena, em universidades e instituições superiores de educação, admitindo-se, porém,
como formação mínima, a oferecida nas Escolas Normais de nível médio, é alarmante a
precariedade da formação docente depois de mais de 10 anos da promulgação da
LDBEN.
Em relação ao ensino superior, verifica-se um aumento do nível de qualificação dos
profissionais em relação ao censo de 2003 para o censo de 2005
16
; todavia, constatamos
a existência de docentes sem graduação atuando no ensino superior; bem como
professores lecionando no ensino superior sem mestrado ou doutorado.
Quantitativamente somos milhões, mas qualitativamente esses milhões sofrem uma
baixa estarrecedora, conforme os dados INEP:
16 Último censo disponível no site do MEC/ INEP:
< http://www.inep.gov.br/imprensa/noticias/outras/news03_37.htm>. até 19 nov. 2007.Acesso em: 20
fev.2008.
41
Tabela 7
Funções docentes por titulação, segundo categoria administrativa das IES - Brasil
2003-2005
Total Pública Privada
Ano Grau de Formação
Nº. % Nº. % Nº. %
Sem graduação 23
0,03
3
0,02
20
0,04
Graduação 35.641
14,02
12.807
14,42
22.834
13,8
Especialização 74.714
29,39
16.726
18,83
57.988
35,06
Mestrado 89.288
35,13
24.229
27,28
65.059
39,34
Doutorado 54.487
21,43
35.030
39,45
19.457
11,76
2003
Total 254.153
100
88.795
100
165.358
100
Sem graduação 47
0,04
30
0,05
17
0,03
Graduação 37.156
12,7
13.596
13,86
23.560
12,11
Especialização 86.893
29,7
18.059
18,42
68.834
35,39
Mestrado 105.114
35,93
27.023
27,56
78.091
40,15
Doutorado 63.294
21,63
39.325
40,11
23.969
12,32
2005
Total 292.504
100
98.033
100
194.471
100
Fonte: MEC/INEP 2003/2005
Tabela 7 – Funções docentes por titulação, segundo categoria administrativa das IES-Brasil 2003-2005.
Os dados do INEP demonstram a existência da necessidade de movimentos a
favor da educação brasileira, como a já citada Conferência Nacional da Educação
Básica, na tentativa de criar possibilidades de avanços significativos que nos levem a
conquistar o acesso a uma educação de qualidade para todos no Brasil. Só assim,
poderemos “construir um sentido social e ético para a escola e, quiçá, para a sociedade.”
(Mancebo, 2007, p. 474).
42
O Processo de formação docente: uma perspectiva
Como pudemos observar nas colocações anteriores, ainda temos muito a
conquistar em relação à formação docente no Brasil, e talvez por isso, este é um assunto
de grande importância no contexto educacional, despertando o interesse de rios
pesquisadores não só no âmbito nacional, mas também, internacional.
No Brasil, de acordo com as “Diretrizes Nacionais para a Educação”, no que
concerne a “Formação Superior para a Docência na Educação Básica”, a partir da
Resolução CNE/CP Nº. 1, de 15 de maio de 2006, que institui as “Diretrizes
Curriculares Nacionais para o curso de graduação em Pedagogia”, licenciatura
17
; em seu
Art. 3º:
O estudante de Pedagogia trabalhará com um repertório de informações e
habilidades composto por pluralidade de conhecimentos teóricos e
práticos, cuja consolidação será proporcionada no exercício da profissão,
fundamentando-se em princípios de interdisciplinaridade,
contextualização, democratização, pertinência e relevância social, ética e
sensibilidade afetiva e estética.
Em seguida, seu Parágrafo único, acrescenta que “Para a formação do
licenciado em Pedagogia é central: o conhecimento da escola como organização
complexa que tem a função de promover a educação para e na cidadania.”
Assim, a idéia de educação vincula-se de forma direta à idéia de cidadania, para
“garantir a todos os indivíduos, sem discriminação, condições de serem produtores e
fruidores dos bens naturais, sociais e simbólicos de sua sociedade (...).” (Severino,
2001, p. 90).
Por esse motivo, ao se falar da formação docente, na perspectiva definida pelo
Parecer CNE/CP nº. 01/2006, pressupõe-se uma formação complexa, fundamentada nos
princípios sugeridos, os quais tentaremos abarcar a partir de suas dimensões.
Acreditamos que essas dimensões podem contribuir de maneira decisiva para que o
professor seja capaz de promover a educação para e na cidadania.
17
BRASIL. “Formação Superior para a Docência na Educação Básica”. Resolução CNE/CP Nº. 1, de 15
de maio de 2006 . Diretrizes Nacionais para a Educação: Diretrizes Curriculares Nacionais para o
curso de graduação em Pedagogia. Art. 3º. Disponível em:
<
http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/rcp01_06.pdf>. Acesso em: 20 fev. 2008.
43
Embora a nossa perspectiva do processo de formação docente se fundamente em
diferentes teóricos, utilizamos como referência básica, a perspectiva de valores
educacionais apontadas por Severino (2001): formação técnica, política, ética e a
sensibilidade estética; agregando a essas dimensões, uma outra, a subjetiva. Tais
dimensões são apresentadas aqui, de modo separado, contudo, é mister ressaltar que a
divisão desses conhecimentos não faz dessas dimensões algo estanque e
des-sincronizado, ao contrário, essa divisão é apenas de caráter didático, pois, na
verdade, elas não são isoladas entre si, pois se constituem dialeticamente; fazendo parte
do processo de formação crítica dos educadores.
Sobre isso, Placco (2007)
18
explicita que:
As dimensões são não-compartimentadas, não isoladas, nem meramente
complementares. (...) Propô-las especificadamente não significa que sejam
separadas, nem que tenham expressão em si mesmas. Elas só têm sentido
se compreendidas em sua co-ocorrência ou simultaneidade, nas relações
dialéticas que estabelecem umas com as outras (...). Quando identifico que
todas as dimensões do formar são igualmente significativas, e que as
questões teóricas, políticas, humanas e técnicas necessitam ser vivenciadas
em equilíbrio dinâmico, eu tenho consciência dessa sincronicidade
19
e,
portanto, posso transformar minhas ações e meu trabalho docente e posso
me transformar. (Placco, 2007).
Nesta perspectiva, procuraremos dar enfoque a algumas dimensões da formação
docente, às quais consideramos essenciais e que também participam dessa
sincronicidade. Apesar disso, em consonância com André (1995), não desconhecemos
nem ignoramos “a existência de outras dimensões eventualmente tão importantes
quanto essas” e reconhecemos a necessidade de considerá-las em sua complexidade e
em suas inter-relações.” (p. 44).
18
Palestra proferida pela Prof. ª Drª. Vera Maria Nigro de Souza Placco durante o VII Congresso
Nacional de Educação – EDUCERE. PUCPR, Curitiba, Paraná, 08 de novembro de 2007.
19
Segundo Placco (2007) A sincronicidade é a Ocorrência crítica de componentes políticos,
humano-interacionais e técnicos, e estes se traduzem em movimento que é ação de e entre
professor-aluno-realidade. Essas relações possibilitam a construção de um espaço individual e coletivo
de desenvolvimento de cada um – alunos e professores”. (p. 18)
44
O sujeito como parte do processo: a dimensão subjetiva
Segundo Bock e Gonçalves (2005, p. 123), a dimensão subjetiva é uma
configuração dos sujeitos a partir de suas experiências no mundo social” e completam
“é a dimensão dos registros simbólicos e emocionais que o sujeito vai construindo no
decorrer de suas vivências; é o mundo psicológico propriamente dito”.
Ainda em consonância com essas autoras:
(...) a noção de subjetividade tem, de acordo com a concepção
sócio-histórica, um conteúdo histórico que deve ser considerado. O
conteúdo das experiências subjetivas expressa os lugares e posições
contraditórias a partir das quais o sujeito vivencia a realidade e utiliza suas
capacidades. A subjetividade, então, tem contornos compatíveis com a
realidade histórica que a engendrou; por isso, devemos falar desde sempre
em subjetividades para designar os aspectos psicológicos dos sujeitos,
salientando o caráter processual e complexo desses aspectos. (Bock e
Gonçalves, 2005, p. 115).
Assim “os sujeitos vão construindo sentidos e significados para o mundo
(construções simbólicas e emocionais).” (Bock, 2008).
20
Segundo esta autora, a
dimensão subjetiva não é uma coisa que vem enfeitar a realidade. Ela parte da realidade,
ela é a realidade.”
21
Dessa forma, com base na perspectiva cio-histórica por nós
defendida, temos como convicção a idéia de que ao sermos concebidos, não recebemos
como “dom” a condição humana, mas ao contrário, somos seres históricos, interagindo
com a cultura e com a sociedade, é que vamos nos constituindo humanos.
Neste contexto, a dimensão subjetiva da formação docente é o que consideramos
o alicerce desta construção de ser professor. Acreditamos que essa dimensão da
formação pode também ser compreendida como a dimensão pessoal, quando nos
referimos ao professor como sujeito do trabalho e do processo, mas precisamos destacar
que a subjetividade não está localizada apenas no sujeito. Segundo González Rey (2005,
p. 24), ela “está constituída tanto no sujeito individual, como nos diferentes espaços
sociais em que este vive.” A subjetividade individual não pode ser compreendida de
modo descolado da subjetividade social, embora uma não se sobreponha na outra. A
20
Palestra proferida pela prof. ª Drª. Ana Mercês Bahia Bock durante a participação na Mesa Temática:
Escola, Convivência e Violência, durante a Conferência Internacional: Educação, Globalização e
Cidadania. João Pessoa, Paraíba, 19 a 22 de março de 2008. (Anotações pessoais).
21
Ibidem.
45
subjetividade individual e a subjetividade social constituem uma configuração dialética
e complexa, produzindo os processos psicológicos do sujeito.
O sujeito individual está inserido, de forma constante, em espaços da
subjetividade social, e sua condição de sujeito atualiza-se
permanentemente na tensão produzida a partir das contradições entre suas
configurações subjetivas individuais e os sentidos subjetivos produzidos
em seu trânsito pelas atividades compartilhadas nos diferentes espaços
sociais. (González Rey, 2005, p. 25).
Assim, a dimensão subjetiva está presente em qualquer curso de graduação de
qualquer faculdade, seja na área de humanas, exatas ou biológicas. Ela faz parte do
processo de constituição histórico-social do sujeito em sua “versão moderna”, restando
aos formadores compreenderem essa dimensão na formação dos futuros mestres, em
suas respectivas singularidades.
Por outro lado, essa “versão moderna” faz parte do contexto ideológico burguês,
o qual pressupõe um modelo de homem, denominado por Bock (2000) de Barão de
Munchhausen, referendando o conto infantil em que um cavaleiro segura seu cavalo
com os próprios joelhos e puxa a si mesmo pelos próprios cabelos, escapando de um
pântano.
A idéia de autonomia individual, do homem deslocado das condições
sociais e da possibilidade de autodeterminação de cada um de nós,
movidos por uma força interior dada pela semente que está dentro de nós e
que nos empurra (natureza humana), é algo muito forte em nossas
concepções liberais e positivistas. (p. 18).
Portanto, essa visão de homem, abstrato, autodeterminado, auto-suficiente,
difunde o ideário neoliberal que dicotomiza indivíduo/ sociedade, atribuindo
exclusivamente ao indivíduo toda a responsabilidade em satisfazer suas necessidades,
única e exclusivamente a partir de sua vontade.
Neste sentido, Bock e Gonçalves afirmam que:
O sujeito é o homem que pode dominar a natureza, produzir e consumir, e
pode fazê-lo por si só. O sujeito é a nova possibilidade de existência do
homem moderno, senhor de si mesmo, por suas próprias possibilidades e
capacidades. A gênese desse homem moderno está, então, no
desenvolvimento de novas forças produtivas, as forças produtivas
46
capitalistas e no surgimento de novas relações sociais de produção, entre
burguesia e proletariado. Esse contexto histórico produz também uma
ideologia, o liberalismo, que delimita a compreensão do homem como
sujeito nesses contornos: o sujeito é racional, individual, natural. (Bock e
Gonçalves, 2005, p. 112).
Contudo, surgem possibilidades históricas concretas e concepções
correspondentes, de outra forma de realização do homem como sujeito
,
por ser a
subjetividade um processo de experiências individuais dúbias, onde ao mesmo tempo
em que são condições, são também conseqüências dessas experiências.
“De acordo com
a concepção sócio-histórica, a subjetividade é constituída em relação dialética com a
objetividade e tem caráter histórico.” (Idem,2005, p. 113).
Essa concepção permite romper com a ingenuidade do “sujeito burguês”, em sua
alienação naturalizante. Assim, podemos avançar e ir além da visão abstrata da
subjetividade neoliberal, para uma perspectiva contextualizada onde o sujeito é
individual, social e histórico ao mesmo tempo. Dessa forma, o homem precisa ser
compreendido em seu movimento contraditório, em sua relação ‘multideterminada’ com
o mundo e consigo mesmo.
No processo histórico de constituição do sujeito, as experiências
contraditórias que lhe são possíveis implicam o aparecimento de
concepções também contraditórias de sujeito. Ao sujeito do liberalismo,
indivíduo contraditoriamente limitado pela realidade social, opõe-se o
sujeito histórico, compreendido como determinado pelo processo social,
mas, ao mesmo tempo, determinante dele, a partir de sua possibilidade de
agir sobre a realidade e transformá-la. (Bock e Gonçalves, 2005, p. 114).
Desenvolvendo nosso trabalho nessa perspectiva, podemos compreender então,
pelo prisma da concepção materialista da história, que o processo de constituição do
sujeito pode ser entendido através da análise do contexto sócio-histórico da
sociedade em que esse sujeito está inserido.
Essa compreensão do sujeito é possível a partir de uma leitura dialética da
história, reconhecendo-se que a contradição da realidade social implica em
superação e transformação. Essa leitura dialética, aliada a uma abordagem
materialista da história, permite reconhecer que as ações e relações
humanas são resultado de um processo ativo, que pode ser conhecido e
identificado em suas leis materiais e, consequentemente, alterado (Bock e
Gonçalves, 2005, p. 114).
47
Estamos aqui apontando que a educação é um dos processos mais importantes
de formação social do sujeito; é processo de singularização que permite a construção de
subjetividade. O sujeito estará no processo, como ser ativo de sua própria formação e
será, ao mesmo tempo, objetivo maior de todo trabalho educacional.
Nesta perspectiva, na educação um processo de formação de sujeitos e a
dimensão subjetiva a que nos referimos aqui é, exatamente, o reconhecimento de que o
sujeito é parte do processo educacional e deverá ser percebido e tomado pelo educador
como tal.
A Dimensão técnica
O termo técnica” é usado para indicar, segundo Cunha (apud Rios, 2000, p.
104) o “conjunto dos processos de uma arte” ou a “maneira ou habilidade especial de
executar ou fazer algo”, reportando assim, a uma ação a certa forma de fazer algo, a um
ofício.
Essa dimensão é bem explorada no campo educacional, pois está diretamente
ligada à idéia de produção, do domínio de algo, da especialização profissional,
adquirindo destaque em qualquer área de trabalho no mundo moderno. Essa
supervalorização da técnica como meio de produção, corre o risco de empobrecer o
significado real dessa dimensão, pois acaba separando-a, isolando-a como apenas um
fazer e a descola do “pensar para fazer”. Isso gera uma mecanização do ato em si,
causando um processo de alienação
22
, formatando o fazer como mera repetição
burocrática da ação, reprodução sem reflexão, desembocando no tecnicismo
reprodutivista.
Neste sentido, Freire (2007a), coloca que “(...) um profissional alienado é um ser
inautêntico. Seu pensar não está comprometido consigo mesmo, não é responsável. O
ser alienado não olha para a realidade com critério pessoal, mas com olhos alheios. Por
isso vive uma realidade imaginária e não a sua própria realidade objetiva.” (p. 33), e
22
“Etimologicamente a palavra ‘alienação’ deriva do adjetivo latino alius, alia, aliud. Alius significa,
simplesmente ‘outro’. Deste adjetivo deriva ‘alienar’, ‘alienação’, ‘alienado’. E são essas expressões que
tanto podem significar ‘tornar outro’, ‘tornado outro’, isto é objetivar, ‘objetivação’, ’objetivado’, como
‘passar para outro’, ‘passado para outro’ ou ‘apropriado por outro’.” (Saviani, apud Duarte, 2004, p. 29).
Nesta pesquisa utilizaremos o segundo sentido atribuído à alienação, a saber: “para referirmo-nos àqueles
que perderam sua condição de sujeitos da história, aqueles que perderam sua condição de sujeitos de seus
próprios atos, de suas próprias obras” (Idem).
48
esse profissional reproduz constantemente, imita, sem nenhuma autenticidade, tudo que
lhe é imposto, sem qualquer análise crítica.
Essa reprodução é bem conhecida nas nossas salas de aula, onde se utiliza livros
didáticos “pré-fabricados” ano após ano, sem se importar em questionar “quem
produziu o livro”, “por que usar determinado livro” ou a finalidade de se ensinar
determinados conteúdos. Não se muita importância ao significado que isso tem para
os estudantes ou ainda, se a aprendizagem destes livros é relevante ou mesmo
pertinente. Nesse contexto, o professor acaba por representar o que de pior tem o ensino
a oferecer, que não nenhuma interação entre esse e os estudantes; apenas
transmite-se conteúdos para a “domesticação”, através do que Freire denomina de
“educação bancária”. Assim, a educação (escola), ao invés de ajudar no
desenvolvimento de alunos críticos e autônomos apenas automatiza o processo de
ensino, fragmentando o processo educacional e desmotivando os estudantes, já que
desconsidera seus interesses, sua maneira de aprender e pensar, como também, seu
contexto social e histórico. Nas palavras de Freire (2007b) “(...) a educação para a
domesticação é um ato de transferência de ‘conhecimento’.” (p. 105).
Dessa forma, a dimensão técnica transforma-se em dimensão mecânica de uma
prática que não utiliza engajamento intelectual e desconsidera a realidade em que o
método é aplicado, apenas reproduzindo (faz-de-conta) uma ação continuamente como
se uma única técnica fosse eficiente em qualquer meio social.
Como repetidor de aulas o professor perde a dimensão de educador e nem
se questiona o porquê de ensinar, o que ensina. Torna-se parte passiva no
processo e faz o mesmo com seu aluno. Superar isto é compreender seu
papel e do seu aluno, sabendo situar no plano social geral o conteúdo
específico de cada curso. Isto é uma parte importante do processo
pedagógico, da qual o professor raramente está consciente, porque ele esta
hoje diante de um desafio para o qual não está preparado. É preciso
prepará-lo. (Menezes, 1987, p. 121).
Subjacente a essa racionalidade tecnicista e às decorrentes distorções a respeito
da razão e da natureza, está, segundo Giroux (1988), o apelo para uma separação entre
concepção e execução e para uma padronização do conhecimento, que facilite o seu
gerenciamento e o seu controle, “desvalorizando o trabalho intelectual crítico, em
benefício de considerações de ordem prática.” (p. 12-3).
49
Giroux (1988) acrescenta que
O treinamento de professores é um campo no qual o domínio da
racionalidade técnica tem se manifestado (...) os programas de educação de
professores (...) têm sido dominados por uma orientação behaviorista, em
que se persegue a especialização e o refinamento metodológico como
bases para o desenvolvimento da competência do professor. (...) Dentro
desse modelo behaviorista de educação, os professores são considerados
mais como obedientes servidores civis, desempenhando ordens ditadas por
outros, e menos como pessoas criativas e dotadas de imaginação, que
podem transcender a ideologia dos métodos e meios a fim de avaliar
criticamente o propósito do discurso e da prática em educação. (p. 13-14).
Por outro lado, na contramão dessa orientação tecnicista, sabemos da
necessidade de um domínio técnico e científico na área à qual o professor atua, pois,
sem essa competência técnica fica impossível exercer seu papel profissional. Pois, “se o
professor estiver engajado socialmente, mas não souber Matemática, Português,
Filosofia, História, Biologia ou o que quer que lecione, será impossível para ele ser
professor, inviabilizando seu papel social pela própria incompetência.” (Menezes, 1987,
p. 119).
Daí a necessidade de distinguir entre educação técnica e tecnicista. A
primeira se refere ao processo de manipulação do mundo material, a outra
enfatiza a predominância da mecanicidade dos mesmos, como se
pudessem atuar independentemente de qualquer outra intencionalidade
além da eficácia funcional. (Severino, 2001, p. 85).
Neste sentido, a dimensão técnica não se restringe ao conceito técnico/
científico, apesar de haver a necessidade do domínio dessa competência, como bem
coloca Mello (1982). Por outro lado, o compromisso político do qual nos fala Nosella
(1983) deve estar sempre arraigado a essa competência. através dessa correlação se
uma educação emancipadora, capaz de formar para e na cidadania. Uma educação
que
(...) deve incorporar a crítica às formas degradantes de produção e de
consumo e clarear a significação do trabalho na existência humana. Daí o
equívoco de políticas educacionais que se dedicam apenas a habilitar
tecnicamente para o trabalho, submetendo o aprendiz à lógica opressiva do
mercado. (Severino, 2001, p. 87).
50
Assim, é necessário estar atento, repensar e reestruturar o conceito de técnica no
trabalho docente, considerando o perigo de se cair na armadilha do tecnicismo que
desautoriza o professor enquanto sujeito crítico e autônomo e o rebaixa à categoria de
reprodutor de uma ideologia neoliberal, adotando uma pedagogia padronizada,
automática e, sobretudo alienada, formando assim, estudantes também alienados; e
consequentemente uma sociedade alienada.
Conforme afirma Severino (2001, p. 86),
(...) embora fundamental, o exercício da profissão técnica é uma dentre as
várias práticas mediadoras da existência histórica. A humanização
pressupõe mediações que impõem à educação exigências para além da
competência técnica e científica.
Logo, a dimensão cnica (considerada como o aspecto pedagógico da
docência), a nosso ver, impõe um grande desafio à formação docente, pois, requer uma
formação acadêmica mais centrada no “saber fazer” na prática e na análise das práticas.
Segundo Nóvoa (2006) “a formação do professor é, por vezes, excessivamente teórica,
outras vezes excessivamente metodológica, mas um déficit de práticas, de refletir
sobre as práticas, de trabalhar sobre as práticas, de saber como fazer.” (p. 7).
Para tanto, além da formação teórico-prática, é necessária a reflexão sobre essa
prática, ou seja, a práxis
23
, para que se concretize, além da competência técnica, o
compromisso político.
Nesta perspectiva, o docente-formador e os docentes, de modo geral, precisam
considerar que lecionar envolve o domínio de técnicas pedagógicas específicas, e que
envolve, além disso, um compromisso político. Essa visão dialética da função docente
deve ser ensinada e desenvolvida na formação inicial dos professores, por meio da
relação teoria-prática. Isso envolve desde a reformulação curricular dos cursos de
formação em Pedagogia, até uma nova postura frente ao ato político-pedagógico, por
parte do docente-formador.
23
Entendemos a práxis como atividade prático-crítica, inspirada em Marx (1980), na primeira das Teses
Contra Feuerbach.
51
A Dimensão Estética
A palavra estética vem do grego aesthesis e indica uma percepção sensível da
realidade. Nas palavras de Galeffi (s/d)
24
:
De modo imediato, a palavra estética refere-se ao sensível, ao perceptível,
ao sensual. Falar, então, de educação estética, ou melhor, de educação
estética na formação docente, é o mesmo que falar em educação da
sensibilidade humana aprendente. Nitidamente, isso não é qualquer coisa.
Pelo contrário, é algo que toca o cerne da condição humana vivente e
vivida. Portanto, algo da ordem dos acontecimentos implicados e não
apenas daqueles hipotéticos e fantasiosos. (Idem).
Nesse sentido, a educação estética ou a dimensão estética da formação e do
trabalho docente trará luz à sensibilidade do educador, para que esse tenha um olhar
mais humano e sensível às diferentes “belezas” de seus educandos. Referimo-nos à
“belezas” como sinônimo das múltiplas formas de se ver e interpretar o mundo, assim
como, as múltiplas formas de criar e recriar os sentidos da vida. Para desenvolver
melhor tal idéia, recorremos novamente a Galeffi (s/d):
Penso que se deva começar por reconhecer a multiplicidade da espécie
humana, em todas as suas dimensões e sentidos. Assim, não há como dizer
ou afirmar apenas uma ou algumas formas de beleza ou realização sensível
dos seres humanos. São infinitas as formas de dizer e de sentir o mundo, e
não motivos para se acreditar em hegemonias axiológicas de nenhuma
espécie. Aliás, qualquer que seja a hegemonia, ela é indicativo de uma
única coisa: dominação e prepotência de uns sobre outros. Nesta medida,
uma educação estética haverá de fundar-se no primado da diferença do
ente-espécie humanidade, e não em uma ou apenas algumas de suas
formas de ser. Toda forma de ser, afinal, é modo de ser sensível, e não
razão suficiente que explique ou justifique a prepotência ideológica de
alguns em querer impor seus modelos estéticos a todos, como se fossem os
únicos autorizados pelos deuses para tal fim. (Idem)
Por essa razão que é crucial a dimensão estética na formação e no trabalho
docente. Não se trata de um aprofundamento no sentido de uma estética da arte, tal
como brilhantemente refletiram os filósofos Platão, Kant, Schiller, Hegel, Benjamim, só
para citar alguns. Mas sim, de uma estética do respeito às diferenças, do olhar
24
GALEFFI, D. A. (s/d). Estética e formação docente: uma compreensão implicada. Disponível em
<http://www.faced.ufba.br/rascunho_digital/
>. Acesso em 12 fev. 2008.
52
humanizador, trata-se de uma dimensão da existência humana, da criação humana em
toda sua subjetividade e singularidade. É ter consciência de que na inter-relação
educador-educando há de se valorizar a experiência do outro, seus conhecimentos
prévios, seus saberes, afetos, meio sociocultural, história de vida... É sensibilizar e
humanizar o trabalho docente e não se limitar à transmissão da cultura de uma ideologia
dominante, que estabelece um modelo único, um padrão a ser seguido; excluindo tudo e
todos que não se encaixam nesse perfil.
De acordo com Rios (2000) “afirmar uma dimensão estética na prática docente é
trazer a luz para a subjetividade do professor, subjetividade construída na vivência
concreta do processo de formação e de prática profissional.” (p. 109).
É também, a nosso ver, trazer a luz à subjetividade do estudante, num
movimento dialético educando-educador, onde a educação, além de um ato racional e
consciente se torna também um ato sensível e afetivo. Portanto, segundo Severino
(2001, p. 96) “a emotividade e a subjetividade desejante são fatores dinâmicos
indiscutíveis quando se trata das opções valorativas sobre o nosso agir.”. Dessa forma,
somente articulando o sensível e o inteligível, poderemos ser mais do que profissionais
da educação, para nos tornarmos profissionais do humano.
Freire (1996) destaca que a “(...) promoção da ingenuidade à criticidade não
pode ou não deve ser feita à distância de uma rigorosa formação ética ao lado sempre da
estética.” (p. 32).
A Dimensão Ética
O ser humano se diferencia do restante dos seres vivos por ter consciência de
suas ações, apesar de nem sempre agir com bom senso ou, muitas vezes, agir
mecanicamente; no entanto, sempre existe a possibilidade de pensar sobre tais ações
antes ou depois de tê-las realizado.
Porém, é evidente que o sujeito não pode controlar tudo que lhe acontece
simplesmente pensando sobre tais coisas, que muitos fatos lhe escapam
completamente ao controle e acontecem independentemente de seu desejo ou da sua
vontade. Ainda assim, o sujeito pode pensar sobre tais acontecimentos. Nisso consiste a
liberdade humana, a liberdade de livre pensamento.
Segundo Severino (2001):
53
Se todos os fatores dependessem deterministicamente de fatores alheios à
vontade livre, as pessoas não se sentiriam responsáveis por elas. Contudo,
apesar dos condicionamentos que as cercam, margem para uma
avaliação e tomada de decisão. Nós gozamos de um campo de liberdade,
vontade livre e autonomia, não podendo alegar que houve total
determinação de fatores externos. (p. 92).
A vontade livre e autônoma da qual nos fala Severino é a possibilidade de
discernir sobre as coisas, os fatos, ações e atitudes; valorando estes, ou seja, criando
valores ao se relacionar com o mundo. Nisso consiste a ética, que vem do grego ethos,
podendo ser traduzido como caráter.
Sabe-se que em sua origem mais arcaica ethos significou “morada” ou
“guarida” dos animais, e que mais tarde, por extensão, se referirá ao
âmbito humano, conservando, de algum modo, esse primeiro sentido de
“lugar de resguardo”, de refúgio ou proteção; de espaço vital seguro,
resguardado da “intempérie” e no qual se costuma “habitar”. O sentido de
“habitar” ou morar” está certamente entranhado no ethos humano: remete
à idéia de morada interior. O ethos é lugar humano de segurança
existencial. (Gonzáles, apud Rios, 2000, p. 112).
O ethos designa, assim, o espaço da cultura – do mundo transformado e valorado
pelos seres humanos. Nesse sentido, é impossível não falar da moral, que em latim,
designa ‘costume’, mores. De acordo com Rios (2000) “a significação originária
comum dos termos ethos e mores tem levado a uma identificação entre os conceitos de
ética e moral.” (p. 112). Porém, essa autora ressalta que o termo ética, .passa a designar,
historicamente, não mais o costume, mas a reflexão sobre o costume, o questionamento
do costume, a busca de seu fundamento, dos princípios que o sustentam.” (Idem, 2000,
p. 112).
Contudo, sabemos que a ética “só encontra referências na dimensão
especificamente humana.” (Severino, 2001, p. 94). O que quer dizer que “o sujeito se
encontra sob as injunções de sua realidade natural e histórico-social, que até certo ponto
o conduzem e determinam seu comportamento.” (Idem, 2001, p. 94).
Por outro lado:
(...) a realidade também é constituída pelo sujeito, não mais entendido
como entidade substancial e absolutamente livre, nem como sujeito
empírico puramente natural. Ele existe concretamente nos dois registros,
54
na medida em que é histórico-social, cultural. O homem é uma entidade
natural histórica, determinada pelas condições objetivas e que atua sobre
elas por meio de sua práxis. (Severino, 2001, p. 94)
Neste sentido, o educador deve refletir constantemente sobre sua prática e sobre
os princípios que a sustentam, respeitando os educandos. assim, pode exercer de
maneira sensível, consciente, criativa e crítica seu papel, habitando seu lugar como
humanizador social.
Nas palavras de Severino:
O respeito e a sensibilidade com relação à dignidade da pessoa não tornam
idealizada e alienada a nossa postura ética. Ao contrário, exigem o
aguçamento de nossa sensibilidade às condições históricas e concretas da
existência, afinal, suas únicas mediações reais. Esse aguçamento exige o
pleno compromisso de aplicar na orientação de nossas vidas a única
ferramenta: o conhecimento. Este deve tornar-se, então, competente,
criativo e crítico. (Severino, 2001, p. 95).
Porém, o próprio Severino adverte que:
Esse compromisso ético, que se estende ao exercício profissional dos
educadores, se acirra nas coordenadas sócio-históricas. Isto porque as
forças de alienação se consolidaram nas estruturas sociais. As condições de
trabalho são degradantes, as relações de poder opressivas e a vivência
cultural precária. A distribuição dos bens naturais, políticos e simbólicos é
muito desigual. As condições atuais de existência da humanidade, em suas
mediações objetivas, são injustas e desumanizadoras. (Idem, p. 156).
É preciso “tomar partido”, que, “(...) escolhas, exigências de caráter
social (...) e essas escolhas têm implicações ético-políticas.” (Rios, 2007, p. 56).
Dessa forma, a prática educativa requer uma postura ética do educador, requer
uma tomada de posição, uma intencionalidade que favoreça a construção de uma
educação cidadã, capaz de emancipar o sujeito, destruindo as relações de classe que
efetivam a alienação e dominação, privando o ser humano de seu pleno
desenvolvimento. Neste sentido, mais que um compromisso ético, de se ter um
compromisso estético, técnico e sóciopolítico no exercício da docência.
Neste sentido, Severino (2001) destaca que “a mais radical exigência ética
contemporânea para os sujeitos envolvidos na educação é o compromisso de aplicar o
conhecimento na construção da cidadania” (p. 95).
55
A Dimensão sociopolítica
(...) a dimensão política revela-se pela relação
ética do educador com a realidade social mais
ampla; pela busca de um relacionamento entre o
que faz e a realidade do aluno; pela percepção
de seu papel social e do papel social do aluno;
pela busca em conhecer e analisar criticamente
a realidade; buscando contextualizar o conteúdo
programático e as formas de trabalho que
desenvolve, para garantir a pertinência social de
seus objetivos educacionais e sua
responsabilidade diante da formação.
Placco (1994)
A educação (escola) tem proporcionado uma visão parcial das coisas, ao longo
de sua história, e quem vem determinando o que, quando, como, onde e porque educar é
a classe dominante, por meio do poder e do controle dos aparelhos ideológicos, como
por exemplo, a imprensa, as instituições penais, o sistema de partidos, o exército, a
mídia, as religiões, a família, os aparelhos jurídicos e é claro, a instituição escolar.
Neste sentido, faz-se urgente e necessária a discussão e compreensão dos
fenômenos que causam essa condição.
Gadotti (2005) explicita que apesar do problema central continuar sendo a
relação da Educação com a Sociedade, é necessário colocar a questão política que,
segundo ele, significa também afrontar as questões anteriormente explicitadas: “para
que serve o que aprendemos? Para quem é e contra quem é? Para que serve a escola?”
(p. 78). Segundo ele, “a formação do novo educador se dará a partir de uma sólida
formação política e social.” (p. 79).
Neste sentido, pensar a dimensão sociopolítica da formação docente é pensar
num educador otimista-crítico, com consciência pessoal daquilo que se espera da
educação e da contribuição que ele pode dar a partir de seu trabalho docente, para a
realização da transformação social. Pensar a dimensão sóciopolítica da formação é
pensar a relação que se pretende entre a educação e a sociedade; é escolher uma
sociedade e um tipo de sujeito para incentivar como o trabalho educativo.
Quando o trabalho de docentes-formadores é formar outros docentes condição
dos professores que participaram desse estudo -, deve ser considerada esta dupla tarefa:
56
ter clareza da dimensão sóciopolítica do trabalho que se realiza e, ao mesmo tempo,
formar o docente capaz de realizar seu trabalho imbuído dessa mesma clareza.
Deste modo, a formação do educador, deve prepará-lo para que ele possa,
“mediante o exercício de sua função, estender essa consciência aos educandos,
contribuindo para que vivenciem a dimensão coletiva e solidária de sua existência.”
(Severino, 2003, p. 78). O autor afirma ainda que:
A educação precisa garantir aos educandos clara percepção das relações de
poder na realidade histórica da sociedade. Sem tal compreensão, os
sujeitos não entenderão o significado de seu existir. Daí que o trabalho
educativo deve subsidiar os estudantes para desvendar os vieses
ideológicos do processo. Mediante a crítica aos sentidos falseados, a
educação pode contribuir para a formação de nova consciência social nos
educandos. Só assim a educação evitará a reprodução social e atuará como
força de transformação, contribuindo para extirpar os focos de alienação.
(
Severino, 2001,
p. 89).
Neste viés, surge a necessidade do “educador ser um agente político que deve
afirmar-se como sujeito na construção de sua cidadania e de seus educandos” (Idem,
2001, p. 89).
Porém, em geral, na formação de professores, temos um currículo que abrange
geralmente as dimensões teóricas e técnico-pedagógicas da formação docente, deixando
de lado as outras dimensões necessárias à constituição de uma formação e de um
trabalho docente realmente efetivo, que todas as dimensões têm um papel
extremamente importante na educação do educador.
Acreditamos que a dimensão sociopolítica é a que diz respeito à relação da
educação com um projeto de sociedade e de sujeito que se quer incentivar com ela; é
aqui o âmbito da construção, pelo educador, de seu projeto de transformação social.
Sem se dar conta da presença dessa dimensão, o educador assume um papel ingênuo de
mero transmissor do conhecimento, sem contribuir com uma mudança qualitativa na
sociedade, que a mudança, segundo Fernandes (1987), em qualquer sociedade é um
processo político.
Fernandes coloca que “(...) para o educador pensar em mudança, tem que pensar
politicamente, pois, os educadores, mais até que os políticos, são pessoas que convivem
com os problemas essenciais da sociedade ao nível político.” (Idem, 1987, p. 27).
57
(...) daí a necessidade de o professor, no seu cotidiano, ter uma consciência
política aguda e aguçada, firme e exemplar (...) ele precisa ter instrumentos
intelectuais para ser crítico diante da realidade e para nessa realidade,
desenvolver uma nova prática, que vá além da escola. (Idem, p. 30).
Tais colocações demonstram, a priori, a necessidade de uma formação
sociopolítica na formação docente, porém, segundo Giroux (1988):
As instituições de treinamento de professores (...) têm, historicamente, se
omitido em seu papel de educar os docentes como intelectuais. Em parte,
isto se deve à absorção da crescente racionalidade tecnocrática que separa
teoria e prática e contribui para o desenvolvimento de formas de pedagogia
que ignoram a criatividade e o discernimento do professor. Aquela
omissão também é resultado da predominância de teorias e formas de
liderança e organização escolar que dão aos docentes pouco controle sobre
a natureza de seu trabalho. (...) Na maior parte dos programas de formação
para o magistério, a ênfase em se obter, dos futuros educadores, o domínio
de técnicas pedagógicas, geralmente evita questões sobre os objetivos e
anula o discurso da crítica e da possibilidade. (p. 23-24)
Nesta perspectiva, consideramos que se torna fundamental, superar a
consciência ingênua e fazer emergir a consciência crítica e política, vinculada à
formação sociopolítica do educador. Para isso, o educador deverá estar comprometido
com uma perspectiva de transformação da sociedade em que vive, o que quer dizer, se
dedicar a oferecer condições para a formação de cidadãos conscientes, através da
docência.
Ainda de acordo com Fernandes:
O professor precisa estar armado com uma consciência política exemplar.
Ele é uma pessoa que está em tensão política permanente com a realidade e
pode atuar sobre essa realidade se for capaz de perceber isso
politicamente (...) O professor precisa se colocar na situação de um
cidadão de uma sociedade capitalista subdesenvolvida e com problemas
especiais, nesse quadro, reconhecer que tem um amplo conjunto de
potencialidades, que poderão ser dinamizadas se ele agir politicamente
se conjugar uma prática pedagógica eficiente a uma ação política da
mesma qualidade. (Fernandes, 1987, p. 31).
58
Giroux (1997), analisando o trabalho e a formação de professores norte
americanos, também aponta essa necessidade de termos o educador como intelectual
25
,
crítico e transformador. De acordo com ele, o educador com tais características,
reconhece-se como sujeito capaz de provocar mudanças, pois, além de manifestar-se
contra as injustiças econômicas, políticas e sociais dentro e fora da escola, também
trabalha para criar condições que em aos estudantes a oportunidade de tornarem-se
cidadãos também críticos e transformadores.
Esses intelectuais transformadores têm, para esse autor, “(...) a tarefa central (...)
de tornar o pedagógico mais político e o político mais pedagógico.” (Giroux, 1988. p.
32).
Nesse contexto, o conceito de intelectual para Giroux:
(...) fornece a base teórica para o questionamento das condições
ideológicas e econômicas sob as quais os intelectuais, como um grupo
social, precisam trabalhar a fim de funcionarem como seres críticos,
reflexivos e criativos. Este último ponto reveste-se de uma dimensão
normativa e política e parece especialmente relevante para professores,
pois, se acreditamos que o papel da docência não pode ser reduzido ao
mero treino em habilidades práticas, mas envolve a educação de uma
classe de intelectuais vital para o desenvolvimento de uma sociedade
democrática, então a categoria de intelectual, torna-se uma forma de
integrar o objetivo da educação do professor, a escola e o treinamento em
serviço àqueles mesmos princípios necessários para o desenvolvimento de
uma sociedade e de uma ordem democráticas. (Idem, 1988, p. 23)
Porém, ainda segundo esse autor:
Muito freqüentemente, os programas de formação de professores perdem a
visão da necessidade de educar os estudantes para se tornarem
profissionais críticos, mas desenvolvem cursos que focalizam os
problemas imediatos da escola e que substituem, pelo discurso do
gerenciamento e da eficiência, a análise crítica das condições subjacentes à
estrutura da vida escolar. (Giroux, 1988, p. 14).
Repezza (1993) adverte que apesar de uma formação política permitir a crítica à
sociedade, não significa que ela transformá-la, ou seja, a formação política, segundo
25
Intelectual é alguém que conhece seu campo e tem uma larga visão sobre outros aspectos do mundo;
alguém que usa sua experiência para desenvolver teorias e questões e que volta a interrogar a teoria com
base em maior experiência. Intelectual é também alguém que tem coragem para questionar a autoridade e
que se recusa a agir contra sua própria vivência e julgamento (Kohl, apud Giroux, 1988, p. 27)
59
ela, não é suficiente para atingir os objetivos políticos da sociedade e mudá-la. Ela
argumenta que o educador não será transformador da sociedade, pois, é necessário, no
seu ponto de vista, muito mais do que proporcionar uma formação política, é necessária
uma educação política
26
. (p. 44-5).
No mesmo sentido, Ribeiro (1983) reafirma que a formação política dos
educadores tem que ser explicitada e aprimorada constantemente na prática e pela
prática, e denuncia que a formação política de uma significativa parcela dos professores
só se concretiza dessa forma.
Por outro lado, Saddi (1996, p. 5) discorda da idéia da formação política dos
educadores restrita à prática, pois, para ele essa visão se mostra insuficiente, que, a
formação política ficaria solta e dicotomizada em relação a uma idéia de base teórica.
Com relação a essa questão, concordamos com a solução de Silva (1992, p. 14),
para esse impasse, quando este aponta que o educador deve ser um “intelectual
dirigente”
27
, marcado pela consciência política, capaz de pensar criticamente a realidade
e, em vista disso, ele precisa estar instrumentalizado, não apenas com os recursos
pedagógicos, mas com o “exercício da prática política”. Acreditamos, portanto, que a
dicotomização entre a concepção política da formação de educadores e a prática
pedagógica em si impedem a viabilidade da práxis educativa.
Por outro lado, se os professores têm uma visão sócio-crítica sobre a prática
pedagógica e sobre o conhecimento que possuem, os “instrumentos simbólicos”
28
podem efetivamente tornarem-se instrumentos de emancipação e humanização, por
meio de uma práxis transformadora, visando à construção de uma sociedade mais justa
com um sujeito mais humanizado.
Nessa perspectiva, um conteúdo crucial na formação de qualquer cidadão é a
formação política, principalmente se estivermos tratando da formação de educadores,
algo mais necessário ainda. Quando esses cidadãos contribuem para a formação de
26
Repezza (1993, p. 45) entende a “educação política” como o modo gerado pela prática do exercício
político, que não se dá de forma imediata na instituição de ensino, mas sim nos exercícios da prática
especificamente políticos.
27
Na visão de Silva (1992) o intelectual dirigente é aquele capaz de conjugar a formação técnica e a
formação política, desempenhando uma função político-social plena. (p. 20-1).
28
Segundo Severino, 2001, p. 59) “(...) os homens desenvolvem práticas cujas ferramentas são
fundamentalmente símbolos. Suas ações utilizam o equipamento de cultura simbólica. Dentre essas ações
se destaca a educação.”
60
outros, como é o caso dos profissionais da educação, pois como bem adverte Fernandes
(1987, p. 14) o caráter político do que o educador faz ou deixa de fazer influencia
sensivelmente o meio social.
Assim, o preparo político é uma das responsabilidades inevitáveis da
universidade, devendo esta ser, além de formadora, gestora e crítica do pensamento
político de seus docentes, alunos, ex-alunos e da sociedade em geral, dado o caráter
universal dos conhecimentos que, por missão, deve construir.
Concordamos com Giroux (1988), quando esse autor coloca que:
Os professores devem responsabilizar-se ativamente por levantar questões
sérias sobre o que ensinam, como devem desempenhar papel importante na
definição dos propósitos e das condições da escolarização. Tal tarefa é
impossível dentro da divisão de trabalho, onde os docentes têm pouca
influência sobre as condições econômicas e ideológicas de sua atividade.
também uma crescente tendência política e ideológica (...) para afastar
os professores e os alunos de seu contexto e de suas experiências culturais,
em nome de abordagens pedagógicas que tornarão o processo escolar mais
instrumental (...). O conceito do professor como intelectual pode
fundamentar uma postura teórica para a luta contra esse tipo de imposição
ideológica e pedagógica. (Giroux, 1988, p. 22).
Sob esta ótica, mais que um compromisso pessoal e profissional de se ter um
compromisso político-social na docência, já que, o despertar da dimensão política
contribui significativamente com o papel profissional em seu exercício para a
transformação social. Essa consciência política docente deve gerar uma ação-reflexão
(práxis) que não se restringe à ‘sala de aula’, mas que deve fazer-se presente no seio da
instituição escolar e do trabalho docente, permeando todas as suas atividades. Dessa
forma, o educador “fazendo ‘prática social’, está exercendo seu papel específico na
sociedade, que é vincular o ato educativo ao ato político, a teoria e a prática da
transformação.” (Gadotti, 2005, p. 54). (grifos do autor)
Acreditamos que neste sentido, ao politizar o conceito de formação e trabalho
docente e ao desvelar a natureza ideológica por detrás do processo educativo, torna-se
possível questionar qual a tarefa sociopolítica da educação enquanto categoria de
transformação social, e ainda, qual a função social do próprio trabalho docente.
Importante salientar que esta tarefa transformadora não é exclusividade da
educação, pois existem condicionantes que incidem sobre ela. Mas, em seu papel, a
61
educação precisa encontrar sua função formadora, transformadora, histórica, capaz de
levar o indivíduo longe do individualismo, com um ideal humano superior, coletivo,
consciente e livre.
62
CAPÍTULO III
O Caminho Metodológico
Planejar investigações "progressistas",
"engajadas" ou simplesmente "diferentes", não
consiste apenas na escolha do assunto ou
tema. A radicalidade, a relevância
sociopolítica de uma pesquisa também é
determinada pelas condições de obtenção dos
dados e os procedimentos aos quais são
submetidos - numa palavra, pelo dispositivo
metodológico. Assim, contra a ilusão de
neutralidade, é preciso salientar que os
métodos e técnicas de pesquisa são, ao lado
dos conceitos e teorias, instrumentos de
produção do conhecimento concreto radical e
crítico.
Thiollent (1982).
A construção do caminho metodológico foi, certamente, complexa. Quase todos
os estudos pesquisados na revisão de literatura apontam uma investigação
teórico-bibliográfica acerca das questões sociopolíticas na educação, entre eles, Rios
(2007), Silva (1992), Ribeiro (1983), Saddi (1996). Apenas a pesquisa de Repezza
(1993) apresenta como instrumento de investigação a entrevista, contudo seu foco de
análise são diretores, especialistas e professores da pré-escola, ensino fundamental e
médio de escolas públicas e particulares da cidade de Uberlândia.
Dessa forma, o desafio de dar “voz” ao docente universitário neste estudo
tornou-se tarefa árdua, porém necessária para que pudéssemos contribuir de maneira
significativa com os estudos já realizados.
Eis que desenvolvemos essa pesquisa de mestrado, com o propósito de nos
possibilitar reflexões aprofundadas sobre a seguinte indagação: quais são os aspectos
que o docente-formador apresenta em seu discurso para caracterizar a presença da
dimensão sociopolítica no trabalho de formação que realiza?
Neste sentido, muitas questões surgiram na tentativa de encontrar os melhores
meios para dar vez e voz aos docentes-formadores, como parte imprescindível na
construção dessa pesquisa e no avanço dos estudos anteriores. Para tanto, elaboramos e
reelaboramos nosso instrumento, fazendo e refazendo nosso roteiro de questionário, até
63
percebermos que este não seria suficiente para dar conta do que procurávamos, como
explicitamos, “investigar a presença da dimensão sociopolítica no processo de formação
de professores a partir da visão dos docentes-formadores de Pedagogia.”.
O questionário, apesar de nos trazer uma série de aspectos, não possibilitava
esclarecimentos e aprofundamento das respostas. Passamos então a utilizá-los como
uma primeira etapa do trabalho, organizando as respostas e destacando a que se referia à
relação entre educação e sociedade, classificando-os em ‘otimistas ingênuos’,
‘pessimistas ingênuos’ e ‘otimistas críticos’. A partir desta etapa e destas classificações,
considerando ainda o tipo de instituição de vínculo do professor, partimos para uma
segunda etapa do trabalho. Optamos por realizar entrevistas com quatro professores,
para aprofundarmos o entendimento acerca da questão de pesquisa.
Na primeira etapa algumas decisões de procedimentos são importantes de serem
esclarecidas:
Uma vez decidido o caminho metodológico, escolhemos seis Universidades
brasileiras, situadas nos estados de São Paulo e do Paraná. Os critérios de seleção dessas
Universidades escolhidas foram os seguintes:
- A existência de curso de Pedagogia na Universidade.
- Os resultados do Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade)
29
,
que integra o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes), do
Ministério da Educação (MEC). As Universidades selecionadas para essa
pesquisa obtiveram IDD superior ou igual a três, portanto os cursos superiores
de Pedagogia dessas instituições atingiram os índices considerados bons ou
excelentes pelo MEC. Esta decisão metodológica se justifica pelo argumento de
que buscávamos boas escolas, onde houvesse bons professores que pudessem
expressar as posições mais avançadas deste momento.
29
O ENADE tem como objetivo aferir o rendimento dos alunos dos cursos de graduação em relação aos
conteúdos programáticos, suas habilidades e competências. Faz parte desse exame a avaliação do
Indicador de Diferença de Desempenho (IDD), que mede, analisa e avalia o conhecimento agregado pelos
cursos, em função do crescimento intelectual e cultural do estudante. Nesse item, a avaliação é feita numa
escala de um a cinco, os cursos que tenham conseguido apenas notas 1 ou 2 estão passiveis de ações
administrativas que deverão ser reavaliados em aspectos importantes, como contratação de professores,
bibliotecas atualizadas, currículos mais pertinentes à realidade de hoje no Brasil e no mundo. Foram
utilizados nesse estudo os dados do ENADE 2005, onde foram avaliados cursos de graduação em todo o
país, por ser o único que faz referência ao curso de Pedagogia. Maiores informações sobre o ENADE
podem ser obtidas no site:
<http://www.inep. gov.br/imprensa/noticias/edusuperior/enade/arquivo08.htm
>.
64
- As Universidades indicadas foram escolhidas também, para que pudéssemos
ter uma amostra de professores de Universidades públicas e privadas,
dividindo-se as privadas em dois blocos: as que têm fins lucrativos e as que são
comunitárias ou confessionais.
- Além desses critérios, na escolha, buscou-se a facilidade de acesso às
Universidades e aos professores como também, no caso das Universidades
particulares, a diferença no tipo de alunos que cada uma possui, tendo em vista
os diferentes conceitos obtidos por tais Universidades no ENADE.
A escolha dos professores se deu pela diversidade tanto no tempo de experiência
docente no ensino superior, quanto na disciplina que esses professores lecionavam. Os
quinze professores participantes da primeira etapa desse estudo têm entre 03 e 34 anos
de experiência no Ensino Superior e lecionam diferentes disciplinas. Dessa forma,
acreditamos estar atingindo um campo bastante diversificado com relação à experiência
docente, podendo assim, ter um olhar mais abrangente sobre a dimensão sociopolítica
no trabalho desses docentes-formadores. Além disso, outro critério utilizado é a
formação para docência no ensino superior, dessa forma, selecionamos apenas
professores com Mestrado, Doutorado e Pós-Doutorado.
A primeira etapa consistiu em responder a um questionário enviado via e-mail
para os professores de Pedagogia das seis Universidades escolhidas, dos quais tivemos
retorno efetivo de quinze, entregues, depois de respondidos, via e-mail ou pessoalmente.
Nessa etapa também foi pedido o envio dos programas das respectivas disciplinas
lecionadas por esses professores, porém como alguns não enviaram os programas junto
com o questionário respondido, fomos obrigados a abandonar a idéia inicial de análise
dos programas e retomá-la somente na Etapa II (os 04 professores entrevistados
forneceram os programas).
Com as respostas em mãos, pudemos escolher quatro professores para serem
entrevistados em uma segunda etapa da pesquisa.
Para maior compreensão do processo, passaremos agora a uma análise mais
minuciosa sobre essas etapas.
65
Etapa I - O Questionário
Para a produção dos dados da primeira etapa construiu-se um questionário
(anexo I) com perguntas abertas e fechadas. Os aspectos do questionário dizem respeito
à caracterização do docente; a sua formação para docência em ensino superior; sua
posição sobre o “ser professor” e sobre o programa e os temas abordados nas disciplinas
que leciona; o tipo de aluno (professor) que o docente-formador deseja formar a partir
da docência e suas preocupações e as finalidades do seu trabalho, trazendo à tona sua
compreensão sobre a relação entre a instituição escolar e a sociedade.
Nessa etapa, foram enviados questionários a 135 docentes-formadores das seis
Universidades eleitas, sendo que três delas encontram-se no estado de São Paulo e as
outras três no estado do Paraná. Dessas, duas são públicas e estaduais (Universidade
Estadual de Campinas - UNICAMP e Universidade Estadual de Londrina - UEL); duas
são particulares (Universidade Paulista - UNIP, Universidade Positivo UP/PR) e duas
confessionais/comunitárias (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP e
Pontifícia Universidade Católica do Paraná - PUC/PR). Dos questionários enviados,
como explicitamos anteriormente, apenas 15 foram respondidos e devolvidos à
pesquisadora. Como demonstra o quadro a seguir:
Nº. de questionários enviados aos Professores 135
Nº. total de questionários respondidos 15
Porcentagem Nº. de questionários respondidos em % 11%
O questionário foi aplicado com a intenção de permitir a escolha dos sujeitos a
serem entrevistados. Nosso intuito foi selecionar sujeitos com posições diferentes sobre
a relação educação-sociedade, de instituições dos dois seguimentos (público e privado),
com formações também diferenciadas. Oferecemos no questionário (ver anexo I) três
alternativas para o professor escolher uma que melhor representasse sua visão sobre a
relação educação-sociedade. Utilizamos como recurso as categorias explicitadas no
Capítulo 1 desse trabalho: Otimista Ingênuo, Otimista Crítico e Pessimista Ingênuo.
Pudemos classificá-los em uma das três categorias.
66
A questão se apresentava da seguinte forma: “Considerando suas preocupações e
as finalidades do seu trabalho, escolha dentre as alternativas abaixo a que melhor
representa seu pensamento sobre a instituição escolar e a formação dos pedagogos.”.
Após o enunciado da questão, seguiam as três alternativas possíveis para que
professor pudesse escolher, a saber:
a) a instituição escolar tem capacidade de mudar e melhorar a
sociedade, na medida em que forma profissionais qualificados
que com seu trabalho transformam a realidade social;
b) a instituição escolar reproduz a desigualdade social,
prepara a força de trabalho necessária para o capital e reforça
a ideologia dominante em nossa sociedade;
c) a instituição escolar contém contradições, contribuindo
para melhorar a sociedade ao mesmo tempo em que reproduz
o que está estabelecido.
A partir dessa classificação prévia dos docentes-formadores, obtivemos um
resultado onde 67% dos 15 sujeitos escolheram a alternativa a, que corresponde a
categoria Otimista Crítico; 27% dos sujeitos escolheram a alternativa b, que
corresponde a categoria Otimista Ingênuo e nenhum deles escolheu a alternativa c, que
corresponde a categoria Pessimista Ingênuo.
Esse resultado nos levou a entrevistar 03 docentes-formadores que escolheram a
alternativa a e 01 docente-formador que escolheu a alternativa b, garantindo a
proporcionalidade da presença das posições. Como a alternativa c não foi escolhida por
nenhum deles, não foi possível entrevistar docentes classificados dentro da categoria
Pessimista Ingênuo. Esses dados podem ser melhor visualizados na tabela a seguir:
CATEGORIAS DE ANÁLISE
Nº. de educadores
por Categoria
Porcentagem
Amostragem
25%
Nº. de educadores
a serem
entrevistados
1
Otimista Crítico
(alternativa a)
2
Otimista Ingênuo
(alternativa b)
3
Pessimista Ingênuo
(alternativa c)
4 Não se posicionou
Nº. de docentes-formadores a serem entrevistados
Delimitando isso, partimos para entrevistas com uma amostragem de 25%, ou
seja, 04 educadores. Esses 25% foram selecionados de forma a representar a proporção
67
em que os educadores se apresentaram dentro das categorias pré-estabelecidas nesta
pesquisa e enunciadas anteriormente.
Em seguida, buscamos aprofundar a investigação, como será relatado a seguir,
na segunda etapa da pesquisa.
Etapa II - A Entrevista
Após a primeira etapa, como explicitamos anteriormente, buscamos a
participação de 04 professores dos dois seguimentos Universitários (público e privado).
As entrevistas ocorreram fora do período letivo, durante as férias de julho, por
tal motivo, foi necessário conciliar a escolha dos 04 sujeitos à disponibilidade dos
mesmos para serem entrevistados durante esse período. Assim, como um dos critérios,
foi preciso delimitar o campo de pesquisa.
Para tanto, nos restringimos a entrevistar professores de apenas um dos estados,
o Paraná, pelo fato da pesquisadora residir nesse estado, o que facilitou o contato e os
encontros. Tomada essa decisão, foram entrevistados 02 professores da Universidade
estadual, 01 professor da Universidade particular e 01 professor da Universidade
confessional/comunitária. Apesar da dificuldade inicial de agendarmos as entrevistas
com os 04 professores, marcamos o dia, local e horário para cada um deles e as
entrevistas ocorreram, sem maiores problemas, em duas cidades do Paraná: Londrina e
Curitiba.
Dessa forma, os dados utilizados neste trabalho de pesquisa referem-se a relatos
verbais. São dados obtidos a partir de entrevista (anexo II) individual.
O detalhamento do processo de obtenção e análise dos dados dessa pesquisa
aconteceu de forma sistemática e pode ser assim sintetizado:
1. Criação de um roteiro com questões abertas sobre temas relevantes para
esse estudo (as questões foram elaboradas para nortear a investigação e
favorecerem a análise, possibilitando a articulação entre as respostas
obtidas nos questionários Etapa I, os pressupostos teóricos dessa
pesquisa e os dados da realidade, explicitados nesse estudo);
2. Realização de entrevistas individuais com 04 docentes-formadores;
68
3. Transcrição das entrevistas realizadas;
4. Leitura das entrevistas;
5. Destaque dos conteúdos principais das entrevistas (nessa etapa
organizamos as respostas dos entrevistados em frases numeradas para
que pudéssemos captar os principais conteúdos que aparecem no discurso
de cada um deles - organizando as frases na seqüência original em que
aparecem no discurso);
6. A partir dos conteúdos selecionados, destacamos as idéias que
apareciam ao longo do discurso e selecionamos novamente,
agrupando-os em pré-indicadores (diante das inúmeras possibilidades
apresentadas pelos temas para a construção dos pré-indicadores, as idéias
principais sublinhadas, foram apreendidas de acordo com importância
enfatizada nas falas dos sujeitos, pela carga emocional presente, pelas
ambivalências ou contradições etc.). Seguimos nessa etapa, a proposta de
Aguiar e Ozella (2006) que consideram como critério fundamental a
construção dos pré-indicadores para a compreensão do objetivo da
investigação;
7. Após destacarmos os pré-indicadores (sublinhados), selecionamos
dentre esses as palavras chave e/ou conteúdos temáticos chave abordados
pelos entrevistados, aglutinando-os em indicadores (nessa etapa
destacamos das idéias principais - pré-indicadores - as palavras-chave em
negrito);
8. Constituídos os indicadores (negrito) em conteúdos e palavras-chave,
inferimos e sistematizamos os núcleos de significação para cada um dos
04 sujeitos entrevistados (a organização dos núcleos de significação
configura-se como um processo de articulação dos indicadores e seus
conteúdos-chave, presentes no modo de pensar, sentir e agir do sujeito);
9. A partir dessa sistematização, partimos para a análise individual dos
dados obtidos em cada uma das entrevistas.
69
Sistematizados os núcleos de significação, passamos para uma nova fase da
pesquisa, esta mais complexa e profunda. É quando acontece o aprofundamento da
análise e o avanço em relação ao empírico. É nessa fase, portanto, que o pesquisador
supera o nível de descrição empírica e caminha na direção do concreto. Trata-se de um
procedimento em que o pesquisador busca apreender os elementos que constituem o
sujeito no seu modo de pensar, sentir e agir subjetivamente.
Importante ressaltar nesse momento que esse recorte da realidade não abarca
obviamente a totalidade do pensamento dos sujeitos entrevistados. Contudo,
acreditamos que sintetiza suas idéias principais num determinado momento
histórico-social e por isso, apesar das limitações de seu alcance, revelaram fatos
significativos para subsidiar nossa pesquisa que contribuíram para o diálogo teoria x
prática, tão profícuo e necessário à formação e ao trabalho docente. Com este
procedimento de análise, pudemos desvelar fatos e fenômenos, explicitar contradições
e assim, ousar apontar caminhos mais críticos, menos naturalizantes e ideológicos.”
(Aguiar e Ozella, 2006, p. 243).
70
CAPÍTULO IV
Apresentação e sistematização dos dados
Para caracterizar a presença da dimensão sociopolítica no trabalho de formação
do docente-formador, chegamos, como foi anteriormente exposto nos quadros de dados,
em cinco categorias centrais de análise:
1. Formação e trabalho docente;
2. Papel como Docente-Formador;
3. Visão sobre Educação;
4. Finalidade da Educação;
5. Relação Educação X Sociedade.
A partir dessas categorias, inferiu-se e sistematizou-se os núcleos de significação
para cada um dos docentes-formadores. O critério para se chegar aos núcleos, de acordo
com Aguiar e Ozella (2006), é que eles “devem expressar os pontos centrais e
fundamentais que trazem implicações para o sujeito, que o envolvem emocionalmente,
que revelam as determinações constitutivas do sujeito.” (p. 235).
Desse modo, pudemos interpretar a “voz” de cada docente-formador, buscando
compreender se esses docentes-formadores compreendem e concebem o ato
pedagógico como um ato político; qual a finalidade do trabalho que realizam enquanto
docentes-formadores em função da compreensão que têm sobre: “quem querem
formar”, “para quê querem formar?”, “a favor de que querem formar?” e “contra o que
querem formar?”,
Assim, apresentamos aqui a caracterização de cada um dos
docentes-formadores, levantada a partir dos questionários, dos programas e das
entrevistas desses 04 docentes.
71
DADOS - PROFESSOR 1
O primeiro sujeito aqui tratado é Graduado em Pedagogia, pelo Centro de
Estudos Superiores de Londrina, tem 16 anos de experiência docente no Ensino
Superior e trabalha numa instituição pública estadual, ministrando a disciplina:
“Trabalho Pedagógico Docente” na graduação em Pedagogia, com oito aulas semanais
para um total de 60 alunos. Sua formação para docência em ensino superior inclui:
Especialização em Metodologia do Ensino Superior, Mestrado, Doutorado e
Pós-Doutorado em Educação.
DADOS DA ENTREVISTA
CATEGORIA DE ANÁLISE: 1) Formação de Professor e Trabalho Docente.
Dados da Entrevista
(Pré-indicadores –
sublinhados e
Indicadores em
negrito)
F 54: Estamos num momento que a gente precisa investir na qualidade do
professor, a qualidade do profissional que está na educação, eu acho que as
discussões já estão acontecendo nesse nível.
F55.1: E investir em políticas públicas de capacitação e de qualificação desse
profissional no sentido de reconhecimento que ele é uma vida e precisa ter o
tempo necessário.
F25: A partir do momento que a gente traz da própria vida de todo mundo que
chega... Eu lido com os calouros... Então isso também é uma dificuldade, por um
lado, não é? Porque primeiro ano de uma Universidade está todo mundo caindo de
pára-quedas, está todo mundo pensando na formatura e se sentindo a pessoa
mais importante do mundo por estar no ensino superior, já começa por aí... Isso às
vezes é um problema porque você tem que trazer o pessoal para a terra... “Desce
do balãozinho, desce... Foguetinho vem pra terra!” Mais por outro lado, essa
abertura de vida também é legal para a gente trabalhar. Então, a gente começa
falando exatamente dessas condições de cada um.
F46: Você consegue movimentar a vida das pessoas, você planta uma semente na
vida das pessoas, mas nem sempre você consegue mobilizar a tal ponto que a
pessoa queira mudar efetivamente. Você deixou a semente, agora o cultivo não
está garantido.
F26: chamar a atenção da pessoa para o que ela seja sujeito da história é ponto
pacífico. Então olha vocês aqui estão escrevendo uma nova história, vocês aqui,
vão estar daqui a pouco, assumindo este lugar...
F34: Eu costumo dizer que professor, até CARAS, com um olhar, com óculos
pedagógico. Qualquer besteira que você vai ler, qualquer porcaria você vai ler com
um olhar diferente porque de alguma forma está retratando o que somos. De
alguma forma está retratando o que devemos melhorar.
F40: Então este exercício de rigor, com a situação do ler, do interpretar, do
falar, do pensar, do contextualizar: “Como é que o fulano escreveu aquilo?
Naquele momento, quem era o fulano, por que escreveu isso?Eu acho que isso é
uma coisa que nós precisamos colocar para os nossos alunos... Desde a própria
imprensa... A gente não faz isso, a gente é sempre muito movido, especialmente
pela mídia televisiva... Eles criam um clima e o pessoal entra dentro... E você
esquece do resto do mundo, você fica naquela situação.
F41: Eu tenho que ser rigorosa, está acontecendo isso, mas também está
acontecendo aquilo, aquele outro, aquele outro, aquele outro... E eu preciso dar
conta de algumas dessas coisas.
F43: Então eu não posso ficar desatenta à formação de vida pelos próprios veículos
que estão sendo postos para mim, então eu acho que o pedagógico, o educativo
está exatamente nisso. Porque eu olho para CARAS diferente? Porque eu vou
ver uma série de futilidades, uma série de inverdades... Você pega uma revista
72
como essa, e aí você pode pegar outra, as mulheres são lindas, maravilhosas,
perfeitas, cheirosas; as comidas que aparecem são de deixar qualquer um com água
na boca; os carros são... Toda a situação é muito perfeita, como é com as novelas,
por exemplo. Mas será que a hora que eu acordo de manhã é isso que eu encontro?
Será que na minha mesa é isso que tem todo dia, ou mesmo que seja de vez em
quando?
F55.2: Acho que professor, e luto por isso, professor não pode ter 20 horas,
professor não é trabalhador de meio período, professor é trabalhador de período
integral... Ele tem que trabalhar as 8 horas... Não é 8 horas que determina a
maioria das profissões? Então é oito horas. Ele tem que estar 4 na sala de aula, e 4
pensando nessa sala de aula que ele está. Nós das universidades públicas, nós
temos esse tipo e mesmo assim a gente não conta de muitas coisas. Votem o
equivalente de preparação, então eu acho que isso deveria ser estendido para todos
os professores.
F57: Numa escala de salários, o primeiro é de Juiz, de médico é o quinto, de
professor de ensino superior está pelo nono ou décimo e de professor da escola
básica é o último.
F58: A desvalorização do professor está exatamente numa concepção
equivocada que a gente tem de educação.
F59: Por isso o plano de cargos e salários terem que ser discutidos e ter que
viabilizar uma condição para esse profissional trabalhar.
F65: Qual é o devido respeito que a gente está dando para uma categoria
profissional enquanto sociedade?
F68: Tenho minhas dúvidas em relação a esse piso nacional que foi colocado.
Então, o professor de Alagoas que era o que menos ganhava, ele ganhava em
média R$420 mensais... O professor do DF que é o que mais ganha, professor de
escola básica, R$1.800. Aí, você joga R$950, vai ficar um pouco complicado,
porque o custo de vida é diferente, o custo de cada estado... Mas, eu acho que é o
primeiro pontapé para a gente começar a discutir. Então, vai melhorar muito para
esse que estava embaixo, mas o outro corre o risco, se não se articular
enquanto categoria... Dizer: “Olha, não dá para voltar a isso”. Se é mínimo
significa que a gente pode crescer daqui para lá... A defasagem é muito grande.
Cada lugar que você vai é um tipo de situação... Então eu acho que a gente precisa
sim começar a pensar numa certa... Não gosto da palavra padronização, mas se nós
tivéssemos índices norteadores, alguma coisa desse jeito para que tivesse certa
equiparação, de estado, por estado, talvez instituições estaduais... Tem que ter este
jogo em termos de salário.
F69: o investimento na carreira sim.
F70: Esse professor não tem de buscar o título, ele tem que buscar o
aprofundamento do conhecimento o título é decorrente desse aprofundamento. Isso
também tem que fazer parte de um plano de cargos e salários, porque o professor
paga para estudar, o professor estuda no horário que dá, (...) então o tempo tem que
ser colocado em que ele tem que ser colocado não no tempo administrativo...
F72: O tempo pedagógico o é tempo administrativo. Isso precisa ser colocado
para os planos de carreira, acho que isso é importantíssimo.
CATEGORIA DE ANÁLISE: 2) Papel como Docente Formador.
Dados da Entrevista
(Pré-indicadores –
sublinhados e
Indicadores em
negrito)
F76: Só posso pensar na docência quando tenho o plural, o múltiplo, o conjunto.
F77: Exercer o magistério, independente do nível de atuação é acreditar no
potencial do grupo, é ter certeza de que nas contradições da vida e, portanto da
educação, há possibilidades de transformação.
F77: Por isso mesmo as dificuldades são muitas e não há receitas a serem
executadas.
F78: É nessa toada que trabalha o professor: nas relações que envolvem a
transformação das naturezas e dos homens, dos homens com os homens e dos
homens com a natureza... sempre no coletivo...
F67: Você entender a profissão de professor enquanto uma profissão, é um ofício,
é um trabalho, que você vai se dedicar como qualquer outro, necessita de
investimento público, necessita de investimento na autonomia, e eu penso que
73
são coisas simples. A gente tem que lutar sim, por planos de cargos e salários
sejam coerentes com as instituições que a gente trabalha.
F66: o professor é aquele... Qualquer um pode ser, especialmente as mulheres.
Então, se pode parir, naturalmente ela pode parir, se ela pode parir, ela cuida de um
e se ela cuida de um, pode cuidar de muitos. Então está tudo errado, está tudo
errado...
F12: A gente está formando gente para lidar com tantos outros grupos e
reconhecer o outro, a diferença do outro, o que é igual para no outro... faz parte
do processo de educação.
F33: (...) para que a gente deixe de entender o trabalho do professor como aquele
que entra em sala de aula, passa alguns exercícios, fala alguma coisa, verifica o
que o aluno aprendeu e até longo... Mas mostrar que nessa situação da organização
da ação docente existem teias de outras relações que são formadas.
F47: o professor é esse jardineiro. A idéia que ele tem de educativo está na
cabeça dele. Ele pode deseducar também, com certeza. Ele pode querer olhar para
o jardim e ver um deserto, naquele lugar e não vai fazer nada. Então quando gente
tem na cabeça formação de vidas, de novas gerações, não novas para o futuro
distante, novas para o hoje e amanhã. A partir do hoje, eu penso que a gente está
trabalhando com esse educativo sim, nos mínimos detalhes, (...)
F60: Aquela historinha de que um médico quando erra mata um e o professor
quando erra mata 40, ela precisa ser trazida um pouco mais para a terra, para a
realidade mesmo.
F61: Existe um poder na mão do professor de formação humana muito grande e
precisa ser investido nisso, mas quem é que vai dar aula?
F62: Você entra em uma licenciatura para dar aula e ninguém está ali para ser
professor.
F63: vai se dar conta de que ele vai ser um professor quando inevitavelmente
numa curva da vida é a única opção que resta para ele. Então ele vai atrás de um
emprego ai, ele acha o emprego de professor... ele começa a desenvolver a
concepção de trabalho de professor e muitos ficam para o resto da vida... eles
começam a se formar enquanto professores... E eles voltam atrás da gente:
“Professora, não lembra disso, eu falei daquilo, aquele outro...” então você não
professor desempregado, você vê professor mal pago, mas desempregado não.
Então começa por aí.
CATEGORIA DE ANÁLISE: 3) Visão sobre Educação.
Dados da Entrevista
(Pré-indicadores –
sublinhados e
Indicadores em
negrito)
F13: Eu acho que elas incentivam (as práticas educativas incentivam um tipo de
sociedade), acho que elas não determinam necessariamente porque determinar tem
a conotação, muitas vezes, a palavra em si, determinar, tem a conotação de
submissão, de falta de crítica...
F28: quando eu falo de educação estou falando de respeito com o outro. Quando eu
falo de sociedade estou falando de respeito com o outro. Quando eu falo de
escola, especificamente nessa caso, da disciplina, eu estou falando de respeito com
o outro.
F16: Então, eu penso que os processos educativos vão nos ensinando da
necessidade de sobrevivência da própria espécie com essas práticas, então, é
nessa hora que você discute, que você coloca como um espelho o que você está
fazendo, você é capaz de dizer não, mas não é isso que eu quero...
F21: a educação, apesar de ela ter uma série de determinações, de valores, de
imposições até mesmo por ser infelizmente entendida enquanto um serviço e não
enquanto bem social, ela ainda permite, ela é tão contraditório em si que ela
permiti que a gente fale: "não eu vou usar isso aqui como motivo de alforria,
como motivo de autonomia e não como motivo de submissão".
F50: a gente tem uma educação que foi massificada, mais que eu acho que foi um
ganho não resta dúvida (...) F51: A educação era para uma elite e hoje a gente tem
uma educação escolarizada para grande parte da população. Estive agora em
Brasília na CONEB e alguns dos dados que foram apresentados para a gente que
98% dos brasileiros de 7 a 14 anos estão na escola, que esses 2% que sobram
representam a 800.000 crianças fora da escola, é muita gente ainda. Com ensino
74
superior que a gente tinha uma porcentagem de vinte anos atrás de mais ou menos
1% hoje a gente já tem 15% das pessoas no ensino superior. Então houve sim um
avanço, a massificação está atingindo patamares cada vez que maiores, mas o
cuidado com essa educação escolarizada não está chegando na mesma proporção.
F48: a gente está vivendo um momento que é muito triste pelo fato do
entendimento da educação ser um serviço.
F49: Eu acho que quando ela (a educação) deixa de ser bem, ela perdeu
muito, vamos dizer 60%... E a gente está correndo o risco de ver com a educação
um quadro pior do que o que a gente está vendo com a saúde. Existem coisas que
fazem parte do bem de uma nação, nesse sentido que a gente está falando, um bem
social. Uma nação para existir precisa minimamente comer, ter acesso ao serviço
médico, ter acesso a uma educação que seja de qualidade, de boa qualidade, o
próprio serviço de saúde também de boa qualidade. O que a gente está fazendo? A
gente está matando muita gente, sem perceber.
CATEGORIA DE ANÁLISE: 4) Finalidade da Educação.
Dados da Entrevista
(Pré-indicadores –
sublinhados e
Indicadores em
negrito)
F5: Na formação de pessoas em grupo.
F6: A educação que acontece tanto do ponto de vista formal como do ponto de
vista informal, ou não formal, ela permite que a gente seja tratado no grupo.
F7: são essas as percepções de mundo que são ampliadas e que a educação tem um
papel muito grande... O pedagógico é inerente ao educativo.
F15: A educação pode mostrar, e aí ela colocada de uma maneira ampla o que é
que a gente vai querer.
F19: que a grande utopia da educação é exatamente essa, é vo ter uma
condição de vida, de qualidade de vida boa para todo mundo.
F4: a educação ainda tem na escola seu maior veículo considerando os problemas
todos que acham que a escola tem. A escola tem, mais todas as outras instituições
sociais também têm... Eu penso que a gente fica um pouco a parte... Não para
ficar dentro da caverna e a escola é um jeito da gente sair da caverna.
F53: Que tipo de relações acontecem? A correria que é o tempo inteiro nessas
escolas... Eu acho que para os dias de hoje a gente tinha que repensar, retomar uma
discussão de escola integral... A escola é um espaço muito importante hoje para
a retomada da vivência de pessoas com pessoas.
F55: pensar a instituição escolar de uma maneira educativa é o próximo passo que
a gente precisa dar, mas nós não estamos fazendo isso.
F56: Não para dizer que eu vou largar e é problema da escola. Não, em
hipótese alguma, mas é necessário entender o significado que essa instituição tem
enquanto um bem da sociedade na formação dessa geração.
CATEGORIA DE ANÁLISE: 5) Relação Educação x Sociedade.
Dados da Entrevista
(Pré-indicadores –
sublinhados e
Indicadores em
negrito)
F1: Conforme a sociedade vai colocando uma série de exigências, uma série de
limitações, de possibilidades sobre as novas gerações que vão sendo formadas, a
própria educação segue como mecanismo de se contrapor a alguma dessas
coisas e assimilar outras tantas.
F2: eu acho que ela (a educação) é uma das molas propulsoras sim da
sociedade em que a gente vai tendo transformações sempre.
F3: são modificações contextuais e não para desvincular das relações escola e
sociedade.
INDICADORES NÚCLEOS
F 54: qualidade do professor
F55.1: é uma vida
F25: essa abertura de vida
F34: olhar pedagógico
F40: rigor, ler, do interpretar, do falar, do pensar, do contextualizar:
F41: rigorosa
F43 olho diferente
1) O trabalho de formar é
plantar uma semente, mas o
cultivo não está garantido.
75
F46: você planta uma semente na vida das pessoas, consegue
mobilizar, o cultivo não está garantido.
F55.2: professor é trabalhador de período integral.
F57: Numa escala de salários professor da escola básica é o último.
F58: A desvalorização do professor, concepção equivocada que a gente
tem de educação.
F59: plano de cargos e salários, condição para esse profissional
trabalhar.
F65: respeito
F68: dúvidas em relação a esse piso nacional, se articular enquanto
categoria
F76: docência, o plural, o múltiplo, o conjunto.
F77: acreditar no potencial do grupo, nas contradições da vida e,
portanto da educação, transformação.
F77: as dificuldades, não há receitas.
F78: transformação das naturezas e dos homens, sempre no coletivo...
F67: profissão de professor, trabalho, investimento público,
autonomia, coisas simples.
F66: Qualquer um pode ser, está tudo errado.
F12: formando gente para lidar com tantos outros grupos e
reconhecer o outro.
F33: o trabalho do professor, ação docente existem teias de outras
relações .
F47: o professor é esse jardineiro, formação de vidas, novas para o
hoje e amanhã,
F61: poder na mão do professor de formação humana
2) O docente é um jardineiro
que trabalha na formação de
vidas e na transformação das
naturezas e dos homens,
sempre no coletivo.
F13: as práticas educativas incentivam um tipo de sociedade,
submissão, falta de crítica...
F28: respeito com o outro
F16: processos educativos vão nos ensinando da necessidade de
sobrevivência da própria espécie
F21: bem social, alforria, autonomia, submissão.
F50: massificada,
F48: educação ser um serviço.
F49: quando ela deixa de ser bem, ela já perdeu muito.
3) Educação alforria e
autonomia.
F5 formação de pessoas
F6: permite que a gente seja tratado no grupo.
F19: utopia da educação, é você ter uma condição de vida, vida boa
para todo mundo.
F4: a escola é um jeito de a gente sair da caverna.
F53: A escola é um espaço muito importante hoje para a retomada da
vivência de pessoas com pessoas.
F56: formação dessa geração.
4) Educação é ter uma
condição de vida boa para todo
mundo.
F1: limitações, possibilidades, mecanismo de se contrapor a alguma
dessas coisas e assimilar outras tantas.
F2: ela (a educação) é uma das molas propulsoras sim da sociedade
5) Educação é mola propulsora
de transformação da sociedade.
DADOS DO PROGRAMA
DISCIPLINA
Didática: Trabalho Pedagógico Docente
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EMENTA
Conceito de educação, pedagogia, educação escolar e didática. Teorias pedagógicas e
caracterização de trabalho docente. Formação profissional e constituição da
docência. A escola como “lócus” do trabalho docente.
OBJETIVO GERAL
Adquirir conhecimentos básicos a respeito de Educação, Pedagogia e Didática,
concebendo a ação pedagógica docente como derivada de um referencial teórico
implícito ou explícito, para desenvolver uma maneira crítica de compreender a
realidade escolar.
OBJETIVOS
ESPECÍFICOS
- Conceituar educação, pedagogia, educação escolar e didática.
- Caracterizar o trabalho docente em relação aos processos de ensinar e aprender.
- Compreender o trabalho docente à luz das diversas teorias pedagógicas.
CONTEÚDO
PROGRAMÁTICO
- Educação e Pedagogia.
- Educação escolar e Didática: a constituição da docência e os processos de ensinar e
aprender.
- O trabalho pedagógico sob o enfoque das diversas teorias pedagógicas.
BIBLIOGRAFIA
BÁSICA
BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O que é educação? São Paulo: Brasiliense, 1981.
DÍAZ BORDENAVE, Juan; PEREIRA, Adair Martins. Estratégias de
ensino-aprendizagem. Petrópolis: Vozes, 1994.
FELDMAN, Daniel. Ajudar a ensinar: relações entre didática e ensino. Porto
Alegre: Artmed, 2001.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática
educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1998.
LIBÂNEO, José Carlos. Didática. São Paulo: Cortez, 1994.
RIOS, Terezinha Azeredo. Compreender e ensinar: por uma docência da melhor
qualidade. São Paulo: Cortez, 2001.
ANÁLISE - PROFESSOR 1
Para o Professor 1 o trabalho em educação é de transformação e formação de
pessoas. Mas estes objetivos são afirmados de modo genérico. A idéia de formar
pessoas é posta a partir de conceitos como: movimentar a vida, mobilizar, cultivar,
plantar semente.
Segundo seu relato, no trabalho para formar o professor, é preciso construir um
"olhar pedagógico”, esse olhar se torna um eixo, ou seja, para ele, se o professor tiver
esse olhar pedagógico conseguirá fazer uma boa formação. O olhar pedagógico é,
segundo sua fala, perceber inverdades, futilidades, é a uma leitura rigorosa da realidade
que interpreta, que pensa, que contextualiza. Dessa forma, o professor deve se formar
com essa possibilidade, de olhar “diferente” para poder cumprir sua tarefa. Segundo ele,
essa tarefa é realizada sem receita. Mas não indica o projeto para essa formação.
Entende e importância ao coletivo e a questão da transformação. Esses são os
dois eixos principais do seu pensamento. a educação como uma atividade coletiva e
de relação de “uns com os outros”. Fala também de formação de gerações. A
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transformação referida é de adoção do “olhar pedagógico” que reduz a ingenuidade e
permite a crítica.
Contudo, não há qualquer indicação da direção dessa transformação. Apesar dele
colocar que a educação traz a possibilidade, a utopia de "ter vida boa para todos", não
esclarece como. Destaca o respeito ao outro e a autonomia como possibilidades obtidas
pela educação. Relaciona a transformação da natureza e dos homens à educação, mas
não esclarece porque a educação tem essa possibilidade, parece uma coisa natural da
educação. Como se ela em si tivesse o potencial de transformar tudo.
Dessa forma, o único aspecto desta transformação que poderia compor um
projeto é de garantir “vida boa para todo mundo”, mas, ele não chega a caracterizar o
que entende por esta “vida boa”.
Aparece ainda, em seu discurso, a idéia de respeito ao outro que poderia compor
um esboço de projeto, mas também não é levada adiante.
Defende que as práticas educativas não determinam e sim incentivam um tipo de
sociedade. Nesse contexto, contrapõe determinar x incentivar. Contrapõe também
educação como serviço x educação como um bem social, colocando que na primeira
existe submissão, massificação, deixando de ser um bem, para ser um serviço, uma
mercadoria; na segunda, a educação está associada à alforria e autonomia. Todos esses
conceitos estão reunidos em sua visão sobre educação.
Ao associar a educação com alforria, autonomia, liberdade do sujeito em si,
naturaliza a educação. Demonstrando com essa naturalização, um discurso ingênuo,
pois, acredita que a educação por natureza produz alforria, autonomia e liberdade do
sujeito em si, mas apesar de contrapor a educação como um serviço x a educação como
um bem social, coloca a educação como se fosse algo puro e absoluto, como se não
houvesse contradição no processo educacional e como se houvesse apenas um projeto
válido para a educação.
A relação com a sociedade é afirmada “educação é mola propulsora da
sociedade”; educação “incentiva um tipo de sociedade”, mas não explicita nada sobre
como isto se dá. Assim, nos parece que educação e sociedade se relacionam na
concepção do Professor 1 havendo inclusive uma valorização dessa relação, mas ela é
efetivamente superficial e genericamente afirmada.
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O Professor 1 não se posiciona, naturalizando o papel transformador da
educação e a principal finalidade dessa transformação. Não articula nenhum ideal de
sociedade ou de sujeito. Talvez esse último esteja referido como alguém que respeita o
outro e olha criticamente a realidade, vendo a sociedade como lugar de bem estar para
todos. A construção desses ideais tem a ver com a educação, mas como se fosse mágica.
Evidencia-se no discurso do Professor 1, que ele tem uma receita, mas ele
próprio não percebe. Apesar de dizer que ser professor é uma tarefa difícil porque não
há receitas, apresenta a sua receita carregada de valores morais. Dessa forma, simplifica
a finalidade da educação, está posta na moralidade. Ele não percebe que esses elementos
(respeito, autonomia, alforria) que segundo ele, a educação deve almejar, são valores
dominantes na mesma sociedade que transforma a educação em serviço, demonstrando
com isso um pensamento pouco crítico em seu discurso.
Percebemos que a finalidade da educação está posta de forma absolutizada,
naturalizada e descontextualizada. O Professor 1 não contextualiza, não fala da nossa
sociedade hoje, da realidade do Terceiro Mundo, da desigualdade entre os sujeitos, não
apresenta uma análise da conjuntura, tem um discurso completamente abstrato. Durante
toda a sua fala, o Professor 1 apresenta idéias abstratas sobre a educação, tais como, as
idéias de “formação de vidas”, “felicidade”, “vida boa para todo mundo”; não faz
nenhum paralelo com a educação brasileira, apresentando um discurso completamente
ingênuo.
Além disso, o Professor 1 coloca a necessidade de uma formação moral para os
futuros educadores. Através de seu discurso evidencia a necessidade de impor valores
na formação, questiona gostos pessoais, como por exemplo, o musical e associa tais
gostos pessoais a uma suposta superficialidade dos estudantes comparando os a “caixas
de sabão em vazias” ou “bombons com belas embalagens mais como um gosto de
fel”. Dessa forma, não percebe que sua visão é uma” visão e acaba impondo-a como
verdade absoluta.
Apesar de sua alta qualificação/ formação para docência em ensino superior
(pós-doutorado), o professor apresenta uma clara indefinição de qual projeto social
pretende em seu trabalho como docente-formador. Coloca a educação como
mola-propulsora da sociedade, mas não esclarece a idéia, apenas coloca que esses dois
processos “se relacionam”.
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O estudo de seu programa de disciplina confirma essa análise, pois nele aparece
uma ênfase e uma forte crença na capacidade das teorias pedagógicas de permitirem
uma compreensão crítica da realidade. Não apresenta em nenhum momento da proposta
uma visão que indique o necessário debate sobre a relação educação-sociedade ou a
apresentação dos diversos projetos sociais para a educação. Acredita que a teoria seja
ferramenta suficiente para a criticidade.
O professor não parece negar a dimensão sociopolítica da educação, mas não a
caracteriza e nem mesmo a enfatiza como constitutiva de posições críticas em educação.
DADOS - PROFESSOR 2
O segundo sujeito é Graduado em História e Pedagogia, pela Universidade
Estadual de Londrina, tem 10 anos de experiência docente no Ensino Superior e trabalha
numa instituição pública estadual, ministrando a disciplina: “Trabalho Pedagógico
Docente” na graduação em Pedagogia, com oito aulas semanais para um total de 75
alunos. Sua formação para docência em ensino superior inclui: Especialização em
Filosofia, Mestrado e Doutorado em Educação.
DADOS DA ENTREVISTA
CATEGORIA DE ANÁLISE: 1) Formação de Professor e Trabalho Docente.
Dados da Entrevista
(Pré-indicadores –
sublinhados e
Indicadores em
negrito)
F45: É importante a gente pensar que toda a formação tem zonas de lacunas, tem
coisas que você não atinge ou mesmo que você trabalhe muito essas questões e
nada é garantia de que elas realmente estão sendo... saindo com essa cabeça...
porque todo trabalho formativo tem que ter essa consciência de que ele é um
aspecto da formação.
F46: o tempo todo, todos os elementos estão interferindo, inclusive a própria
personalidade, a própria história de vida da pessoa, as concepções que ela já tem
e que às vezes esses discursos passam pela pessoa, mas a postura dela não é essa.
F47: Mas mesmo assim a dimensão que esse trabalho muitas vezes surte esse
efeito esperado, mesmo assim eu acho que tem que ter essa postura.
F48: se você não tiver essa consciência e não fizer um trabalho para colocar o
aluno também o mais possível neste nível de consciência então, não é o trabalho
formativo, não é um trabalho formativo de professor.
F49: formar o professor eu acho que está implícito essa formação humana, essa
formação política e essa consciência política, porque se não, não está formando
professor na acepção que a gente tem de ser professor.
F20: Eu não sei se no programa isso fica tão claro. Até porque, na verdade,
quando você pensa no trabalho educativo os elementos que não estão no programa,
o que acontece no cotidiano, muitas vezes eles são muito fortes e olhando
simplesmente o programa você o tem como descobrir qual é o
comportamento, qual é a atitude, qual é a maneira de ver a educação de um
professor.
F21: Na verdade isso acontece especialmente nas discussões, porque a participação
é bem grande na nossa disciplina. Eles (alunos) vêem do ensino médio onde isso
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não acontece... então eles são chamados o tempo todo a se manifestar.
F23: Muitas vezes a gente faz um círculo e vamos debater o assunto, todo
mudo fala e você vai lançando questões, perguntas... e o que eles comentam muito
é que eles aprendem muito com essa situação coletiva...
F24: As dinâmicas elas possibilitam realmente uma manifestação do aluno, uma
participação efetiva mesmo, de ele ter voz na sala de aula. Então em alguns
momentos a gente faz uma exposição também, comenta o assunto de uma forma
mais geral, mas tudo é muito estudado.
F25: Essa possibilidade, esse tipo de aula é que dá essa oportunidade de trabalhar
com esses outros elementos que são os aspectos mais humanos, de formação
humana. Porque os conteúdos em si, embora eles até tratem disso, alguns textos
estão dizendo isso, mas eu acho que é na dinâmica do tipo de aula é que isso pode
se efetivar.
F30: Então eu acho que tanto a disciplina ela possibilita essa chamada de atenção
para esse norte que é da vida, quanto a própria concepção de educação que tem,
ela está permeando essa forma de trabalhar.
CATEGORIA DE ANÁLISE: 2) Papel como Docente Formador.
Dados da Entrevista
(Pré-indicadores –
sublinhados e
Indicadores em
negrito)
F50: O professor é algo muito, muito complexo, muito difícil.
F51: É exatamente o contrário da concepção geral que se tem de que qualquer
um pode ser professor, que é o que acontece na verdade.
F52 Ser professor é algo muito complexo
F54: Porque abrange aspectos tão diferentes, como eu coloquei no questionário,
do cognitiva, do social, do político, do ético, que trabalhar nessa posição é muito
difícil.
F55: É muito difícil mesmo...
F56: exige um esforço constante, um estudo constante, uma preparação
constante e o principal é um compromisso muito forte...
F57: A gente pensa assim como às vezes a gente tem pessoas que não tem nada
haver com a profissão de professor, sendo professor; ou sem essa mínima
consciência que é do seu próprio papel, do que seja ser professor.
F58: Então acho que isso é algo que prejudica assim na raiz, todo o trabalho. Quer
dizer, que é que essa pessoa pensa que é ser professor? Essa é a primeira
pergunta, grande, para qualquer professor e depois tudo é decorrência,
conseqüência disso não que ele seja o responsável pelo fracasso escolar, nem é
essa perspectiva ingênua, mas que existe realmente muito professor sem essa
consciência do que seja ser professor, isso é um fato.
F41: Algumas vezes me sinto nadando contra a corrente...
F42: Quem está na universidade pública é, digamos assim, tem um respaldo...
tem companheiros... É também nossa postura, nossa posição de como encarar a
educação.
F43: Mas eu tenho a impressão que nas escolas particulares em muitos lugares
isso é muito mais nadar contra a corrente, é quase que impossível
determinados discursos.
F11: dependendo do que você está fazendo em sua prática cotidiana você poderá
estar reforçando uma atitude conformista, uma atitude de o questionar,
então você está influindo num determinado tipo de comportamento, um tipo
de sujeito.
F12: Em outras práticas poderá estar estimulando uma autonomia intelectual,
respeitando o pensamento de um outro, incentivando a criatividade desse
pensamento, incentivando que essa pessoa pense por si própria,
F13: eu creio que as práticas educativas influenciam muito na formação dos
sujeitos de forma tanto explícitas quanto implícitas.
F14: eu acho que ela (a prática educativa) não é assim determinante, mas eu
creio que ela é reforçadora, ela é estimuladora de determinados tipos de
comportamento que combinam mais com o tipo de sociedade ou com outro
tipo de sociedade, com certeza.
F20: Eu não sei se no programa isso fica tão claro. Até porque, na verdade, quando
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você pensa no trabalho educativo os elementos que não estão no programa, o que
acontece no cotidiano, muitas vezes eles são muito fortes e olhando simplesmente
o programa você não tem como descobrir qual é o comportamento, qual é a
atitude, qual é a maneira de ver a educação de um professor.
F28: alguma coisa que sempre destaco é se esse trabalho educativo não estivesse
vinculado a uma concepção de mundo em termos de para onde é que a gente
quer ir?”, quer dizer, “que tipo de pessoas a gente quer que exista no mundo,
que tipo de mundo deve existir, ou com que pessoas você gostaria de se
relacionar, como é que você imagina um mundo melhor do que esse, ou você está
satisfeito?” Se você não está, “o que você acha que deveria ter nesse mundo e para
que serve o trabalho educativo?”
F29: Sempre enfatizando assim que esse trabalho, essa formação não é
profissional, porque o aluno vem muito para a universidade assim... "Eu quero ter
essa profissão, esse diploma porque eu quero trabalhar." Tudo bem ele vai ter, ele
vai trabalhar, mas, tem algo além disso, quer dizer, a universidade não está para
ser uma formadora de profissionais.
F15: a minha maneira de ver é muito mais a de formar uma pessoa mais crítica
mesmo, com autonomia intelectual, do que alguém que concordar comigo,
repetir conceitos...
F16: na minha postura é muito presente uma formação de uma pessoa que seja
crítica e que seja ética, que possa se preocupar em assumir um papel de
responsabilidade na construção deste mundo que ela está vivendo.
CATEGORIA DE ANÁLISE: 3) Visão sobre Educação.
Dados da Entrevista
(Pré-indicadores –
sublinhados e
Indicadores em
negrito)
F17: Por trás de qualquer conteúdo de qualquer discussão, de qualquer texto que
estamos lendo, discutindo, procurar o estimular este lado, de que a educação não é
uma formação de profissionais, ela é uma formação de pessoas.
F19: essa é a minha postura de não estar preocupada com o conhecimento
digamos, mas até de uma forma bem enfática mesmo com a formação humana,
com os aspectos humanos desta formação. Essa é uma preocupação constante
minha.
F31: Então eu acho que essa vinculação nunca pode ser perdida, da formação
humana...
F32: Porque no fundo, quer dizer, todos os conhecimentos já resolveram muitas
coisas, mas não trabalham com questões que são mais da vida das pessoas
mesmo...
.F38: E nós estamos indo de uma forma assim, s estamos sendo engolidos por
essas demandas, mas alguns estão gritando, esperneando no meio disso, mas está
sendo muito forte essas demandas da sociedade na atualidade, no Brasil e em
outros lugares do mundo ocidental elas estão praticamente comandando a
educação. Esse é o problema da educação.
F39: E ao mesmo tempo em que ela (educação) é engolida, que ela tem de gritar
contra isso, mas ela está sendo muito tragada por essa demanda da sociedade. E
nesse momento eu creio que seja muito importante que haja pessoas que estejam
nadando contra essa corrente, mesmo que vencidos muitas vezes, mas não
entregando esse ouro assim, de forma o passiva como tem acontecido em outras
instâncias.
F40: Então é claro que existem organismos, órgãos, associações que contrapõe, as
associações de professores que pensam essa formação de uma outra maneira mais
o tempo todo tem que ter uma luta uma resistência muito forte porque essas
demandas (da sociedade) estão assim, praticamente determinando os rumos da
educação.
CATEGORIA DE ANÁLISE: 4) Finalidade da Educação.
Dados da Entrevista
(Pré-indicadores –
F7: a educação sempre pode ser vista sob dois ângulos: O como uma socialização
no sentido de incluir o indivíduo nessa situação que já está instituída e
prepará-lo para continuar nessa situação instituída, ou ainda ela pode ir numa
outra direção de esclarecimento dos indivíduos de como é a dinâmica da
82
sublinhados e
Indicadores em
negrito)
sociedade em termos de conscientização para que eles apossam ser sujeitos de
mudança na sua própria história, quer dizer, influir no destino dessa sociedade
F9: ela (a educação) realmente é muito importante, ela pode caminhar em sentidos
diversos, tanto ela pode ser a domesticadora, quanto ela pode ter uma perspectiva
mais transformadora, uma perspectiva mais crítica.
F18: esse lado formativo da universidade, que é uma preocupação minha mesmo,
que mesmo que você esteja no ensino superior ainda você está formando pessoas,
você tem essa responsabilidade de formar pessoas que tenham uma consciência
do mundo, da sua participação neste mundo.
F26: Essa é de fato uma discussão que a gente tem na sala de aula, mesmo porque
não tem como você não se perguntar para que essa educação, porque essa
formação e porque a educação de forma geral?
F27: Então é uma pergunta que tem que ser colocada o tempo todo, para os alunos,
na formação, quer dizer, porque trabalhar com educação, porque a educação,
para que, você está almejando o que?
F33: “para que tudo isso? Se não for para trabalhar em prol de uma vida
melhor para todas as pessoas? Acho que esse é o compromisso do educador, o
maior.
F37: Todas as pessoas se referem a essa finalidade da educação, então a educação
realmente está hoje sendo chamada e está atendendo muito esse chamado, do
mercado de trabalho.
CATEGORIA DE ANÁLISE: 5) Relação Educação x Sociedade.
Dados da Entrevista
(Pré-indicadores –
sublinhados e
Indicadores em
negrito)
F1: na verdade eu nem sei se é uma relação, mais é uma simbiose, quer dizer que a
educação e a sociedade, elas, nem é que elas se relacionam, elas são praticamente o
fruto de uma mesma vivência
F2: o processo de se tornar alguém que vive em sociedade é um processo
educativo. Então na constituição da própria sociedade está a educação.
F3: A própria instituição escolar surgiu de uma situação social específica, da
sociedade burguesa e da necessidade de uma educação para várias pessoas
digamos assim.
F4: a instituição escolar ela tem essa relação muito profunda com o tipo de
sociedade naquele contexto que existe.
F5: essa instituição escola, com esse formato que a gente conhece hoje? Surge
exatamente da situação social, econômica, política de uma sociedade capitalista
emergente, que com a burguesia que está nascendo sente essa necessidade de um
preparo maior de conhecimento das classes trabalhadoras.
F6: a própria existência da escola tem uma relação muito profunda com a
constituição de um tipo de sociedade. Para nós, com o que a gente vive aqui, é a
sociedade realmente capitalista.
F8: a educação é muito importante nesse sentido não que ela seja a transformadora
ou aquela que vai resolver todos os problemas sociais, mas ela tem esse poder essa
participação nessa forma de entender, da pessoa se entender como sujeito
dentro dessa sociedade, nesse coletivo da sociedade.
F10: não sei se elas (as práticas educativas) determinam, mas elas contribuem, elas
referendam, ou elas, digamos reforçam algum tipo de sociedade, porque é claro
que você tem práticas que você reforça, por exemplo, o conformismo.
F36: é claro que essas demandas (da sociedade) são muito fortes na educação
atualmente... Elas quase que sufocam a educação neste sentido que estava
dizendo antes de formação mais plena, humana... A demanda pelo trabalho ou pelo
famoso mercado de trabalho, essa entidade, é muito forte.
INDICADORES NÚCLEOS
F45: a formação tem zonas de lacunas nada é garantia, todo trabalho
formativo tem que ter essa consciência de que ele é um aspecto da
formação
F46: todos os elementos estão interferindo, personalidade, história de
vida, concepções
1) No trabalho formativo do
professor está implícita a
formação humana, a formação
política, a consciência política.
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F48: consciência, trabalho para colocar o aluno neste nível de
consciência, trabalho formativo de professor
F49: formação humana, formação política, consciência política
F20: no programa isso não fica tão claro, você não tem como descobrir
qual é o comportamento, qual é a atitude, qual é a maneira de ver a
educação de um professor
F23: debater o assunto, aprendem muito com essa situação coletiva
F24: manifestação do aluno, participação efetiva, ter voz na sala de
aula, tudo é muito estudado
F25: trabalhar com os aspectos mais humanos, de formação humana
F30: norte que é da vida
F50: O professor é algo muito, muito complexo, muito difícil.
F51: o contrário da concepção geral que se tem de que qualquer um
pode ser professor.
F54: abrange aspectos cognitiva, do social, do político, do ético.
F56: exige esforço constante, estudo, compromisso.
F57: tem pessoas que não tem nada haver com a profissão de
professor, sendo professor; sem consciência do seu papel, do ser
professor.
F58: que é ser professor? primeira pergunta, grande, para qualquer
professor existe realmente muito professor sem consciência do ser
professor.
F42: na universidade pública tem um respaldo, companheiros.
F43: nas escolas particulares é nadar contra a corrente,
F16: na minha postura é muito presente uma formação de uma pessoa
que seja crítica e que seja ética, que possa se preocupar em assumir um
papel de responsabilidade na construção deste mundo que ela está
vivendo.
F33: vida melhor para todas as pessoas, compromisso do educador
2) Ser professor é algo muito
complexo e difícil.
F11: prática cotidiana poderá estar reforçando uma atitude
conformista, não questionar, influindo num determinado tipo de
comportamento, um tipo de sujeito.
F12: Em outras práticas poderá estar estimulando uma autonomia
intelectual, respeitando o pensamento de um outro, incentivando a
criatividade desse pensamento, incentivando que essa pessoa pense
por si própria,
F13: práticas educativas influenciam muito na formação dos sujeitos
F14: ela (a prática educativa) não determinante, é reforçadora,
estimuladora de determinados tipos de comportamento que
combinam mais com o tipo de sociedade ou com outro tipo de
sociedade.
F17: a educação não é uma formação de pessoas.
F20: no programa você o tem como descobrir qual é o
comportamento, a atitude, a maneira de ver a educação de um
professor.
F28: trabalho educativo vinculado a uma concepção de mundo para
onde é que a gente quer ir?”, “que tipo de pessoas quer que exista no
mundo, que tipo de mundo deve existir, para que serve o trabalho
educativo?
F29: esse trabalho, essa formação não é só profissional,
.F38: demandas da sociedade comandando a educação, problema da
educação.
F39: luta
F40: resistência demandas (da sociedade) estão determinando os
rumos da educação.
3) As práticas educativas
influenciam muito na formação
dos sujeitos; de determinados
tipos de sujeito.
F7: incluir o indivíduo nessa situação que já está instituída, prepará-lo
para continuar nessa situação, outra, direção de esclarecimento dos
4) A educação pode formar
uma pessoa mais crítica, com
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indivíduos conscientização ser sujeitos de mudança, influir no destino
dessa sociedade.
F15: a minha maneira de ver é muito mais a de formar uma pessoa mais
crítica mesmo, com autonomia intelectual, do que alguém que
concordar comigo, repetir conceitos...
F18: responsabilidade de formar pessoas que tenham consciência do
mundo, da sua participação neste mundo
F9: sentidos diversos, domesticadora, transformadora, perspectiva
mais crítica.
F26: para que essa educação, porque essa formação e porque a
educação de forma geral
F27: porque trabalhar com educação, você está almejando o que?
F33: “para que tudo isso? Se não for para trabalhar em prol de uma
vida melhor para todas as pessoas? Acho que esse é o compromisso do
educador, o maior.
F37: chamado, do mercado de trabalho.
autonomia intelectual
(transformadora) ou pode
formar noutro sentido
(domesticadora).
F2: se tornar alguém, processo educativo, na constituição da própria
sociedade está a educação.
F3: instituição escolar surgiu de uma situação social específica,
necessidade de uma educação para várias pessoas
F4: a instituição escolar tem relação profunda com o tipo de sociedade
que existe.
F5: F6: escola tem relação profunda com constituição de um tipo de
sociedade.
F8: poder, participação nessa forma da pessoa se entender como
sujeito dentro dessa sociedade, nesse coletivo da sociedade.
F36: demandas (da sociedade) são muito fortes na educação, quase
que sufocam a educação
5) A escola tem relação
profunda com constituição de
um tipo de sociedade.
DADOS DO PROGRAMA
DISCIPLINA
Didática: Trabalho Pedagógico Docente
EMENTA
Conceito de educação, pedagogia, educação escolar e didática. Teorias pedagógicas e
caracterização de trabalho docente. Formação profissional e constituição da
docência. A escola como “lócus” do trabalho docente.
OBJETIVO GERAL
Adquirir conhecimentos básicos a respeito de Educação, Pedagogia e Didática,
concebendo a ação pedagógica docente como derivada de um referencial teórico
implícito ou explícito, para desenvolver uma maneira crítica de compreender a
realidade escolar.
OBJETIVOS
ESPECÍFICOS
- Conceituar educação, pedagogia, educação escolar e didática.
- Caracterizar o trabalho docente em relação aos processos de ensinar e aprender.
- Compreender o trabalho docente à luz das diversas teorias pedagógicas.
CONTEÚDO
PROGRAMÁTICO
- Educação e Pedagogia.
- Educação escolar e Didática: a constituição da docência e os processos de ensinar e
aprender.
- O trabalho pedagógico sob o enfoque das diversas teorias pedagógicas.
BIBLIOGRAFIA
BÁSICA
BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O que é educação? São Paulo: Brasiliense, 1981.
DÍAZ BORDENAVE, Juan; PEREIRA, Adair Martins. Estratégias de
ensino-aprendizagem. Petrópolis: Vozes, 1994.
FELDMAN, Daniel. Ajudar a ensinar: relações entre didática e ensino. Porto Alegre:
Artmed, 2001.
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FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia:
saberes necessários à prática educativa.
São Paulo: Paz e Terra, 1998.
LIBÂNEO, José Carlos. Didática. São Paulo: Cortez, 1994.
RIOS, Terezinha Azeredo. Compreender e ensinar: por uma docência da melhor
qualidade. São Paulo: Cortez, 2001.
ANÁLISE – PROFESSOR 2
Para o Professor 2 a formação do professor tem zonas de lacunas, tem coisas que
não se atinge, além disso, nada é garantia de que o trabalho docente irá surtir o efeito
esperado, que uma série de fatores interferindo, personalidade, história de vida,
concepções. Mas, mesmo assim, segundo ele, muitas vezes surte o efeito esperado. O
Professor 2 tem clareza de que as escolhas começam nas decisões sobre a forma do
trabalho educativo. Não simplifica; afirma a interferência de muitos elementos.
Outro destaque presente em todo o seu discurso, é que no trabalho do professor
está implícita a formação humana, a formação política, a consciência política, porque,
caso contrário, não se está formando professor na acepção que se deve ter de ser
professor. Assim, formação humana e formação política estão relacionadas para o
Professor 2.
Em sua concepção a educação forma sujeitos, mas as práticas educativas
direcionam para tipos diferentes sujeitos. Podem-se estimular sujeitos mais autônomos
ou sujeitos menos críticos e dependentes. As práticas podem ser transformadoras ou
domesticadoras. O professor deve responder com seu trabalho ao tipo de sujeito e de
sociedade que quer incentivar. Por isto, considera o trabalho do professor muito difícil e
complexo; exatamente o contrário da concepção geral que se tem de que qualquer um
pode ser professor, pois abrange aspectos muito diferentes, tais como: o cognitivo, o
social, o político, o ético, exigindo esforço, estudo e preparação constantes e
principalmente um compromisso muito forte.
Que tipo de sujeito o professor quer que exista no mundo? O trabalho do
professor deve partir dessa resposta.
O Professor 2 apresenta clareza de que o papel político da educação se coloca na
relação da educação com a sociedade; na formação de determinado sujeito para uma
determinada sociedade.
Valoriza as formas coletivas de trabalho e a organização profissional; voz ao
aluno; busca a consciência crítica e o compromisso; e insiste na pergunta: “com o
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trabalho em educação se almeja o que? Pontua o risco de se responder apenas ao
mercado de trabalho. Faz a crítica e reafirma como projeto o aluno crítico que percebe
seu papel histórico e ativo no mundo.
Contudo, explicita que essas idéias não ficam claras em seu programa porque,
para ele, quando se pensa no trabalho educativo, os elementos que não estão no
programa, ou seja, o que acontece no cotidiano, muitas vezes é muito forte e olhando
simplesmente o programa não como descobrir qual é o comportamento, a atitude, a
maneira de ver a educação de um professor.
O compromisso do educador, segundo ele, é formar uma pessoa mais crítica,
com autonomia intelectual, é formar uma pessoa que seja crítica e que seja ética, que
possa se preocupar em assumir um papel de responsabilidade na construção deste
mundo. Assim, defende que o compromisso do educador é com uma vida melhor para
todas as pessoas.
Em sua visão sobre educação, a possibilidade de estimular este lado, de que a
educação não é uma formação de profissionais, mas sim, uma formação de pessoas, uma
formação humana, com os aspectos humanos desta formação. Mas, segundo ele, as
demandas da sociedade no Brasil e em outros lugares do mundo ocidental estão
determinando os rumos da educação e é preciso lutar, resistir a essas demandas que
estão praticamente determinando os rumos educação. Assim, o Professor 2
contextualiza a educação.
Ele percebe as contradições presentes na relação entre a educação e a sociedade,
afirmando que a educação pode ser vista como uma socialização no sentido de incluir o
indivíduo na situação que já está instituída e prepará-lo para continuar nessa situação,
ou, por outro lado, ir numa outra direção de esclarecimento do indivíduo,
conscientizando-o para que possa ser sujeito de mudança de sua própria história e influir
no destino da sociedade. Nesta perspectiva, a educação pode ser domesticadora, por um
lado, como pode ter, por outro lado, uma perspectiva mais transformadora e crítica.
Assim, na concepção do Professor 2, a instituição escolar tem uma relação muito
profunda com o tipo de sociedade e por isso, a educação se torna muito importante, mas
ela não é “a transformadora” ou aquela que vai resolver todos os problemas sociais.
O Professor 2, segundo nossa análise, possui clareza da dimensão sociopolítica
da educação, sobretudo, percebendo a tarefa que lhe cabe na formação de fazer a ponte
87
entre o seu trabalho como docente-formador, a política, a educação e a sociedade.
Apresenta em sua fala a percepção das dimensões que compõem o trabalho de formação
docente e as contradições presentes na educação (escola). Reconhece as dificuldades do
processo, mas não é pessimista quanto às possibilidades e o alcance da educação em
relação à transformação da sociedade. Sua posição pode ser reconhecida como o que
Cortella chama de Otimismo Crítico.
Cabe destacar que o Professor 2 apesar de apresentar posição clara sobre a
dimensão sociopolítica da educação, apresenta o mesmo programa de curso que o
Professor 1. Talvez o reconhecimento da distância entre seu pensamento e seu programa
o tenha levado a afirmar e reafirmar que o programa não reflete o que se faz na prática.
DADOS - PROFESSOR 3
O terceiro sujeito é Graduado em Pedagogia, pela Universidade Federal do
Paraná, tem 9 anos de experiência docente no Ensino Superior e trabalha numa
instituição privada, ministrando as disciplinas: “Escola e Currículo”; “Metodologia de
Ensino de História e Geografia” e “Estágio Supervisionado I” na graduação em
Pedagogia, com doze aulas semanais para um total de 170 alunos. Sua formação para
docência em ensino superior inclui: Especialização em Organização do Trabalho
Pedagógico, Mestrado em Educação: Políticas e Gestão da Educação.
DADOS DA ENTREVISTA
CATEGORIA DE ANÁLISE: 1) Formação de Professor e Trabalho Docente.
Dados da Entrevista
(Pré-indicadores –
sublinhados e
Indicadores em
negrito)
F70: O que eu considero mais importante para a formação de professor e para sua
abertura de visão de um mundo é exatamente que ele compreenda essa relação
entre o que a sociedade espera, o que a sociedade hegemônica espera, o que é
bom para a população como um todo e o que a escola faz com isso.
F71: Então que esse professor, esses pedagogos não sejam simplesmente pessoas
que recebem as determinações legais, ou as orientações como no caso os
parâmetros curriculares e digam ok, então agora vamos pensar no melhor jeito de
colocar isso na prática. Que eles tenham assim, condições de ler esses materiais,
essas orientações e determinações com uma visão mais aberta, com uma
percepção do quanto a escola e o currículo contribuem para formar um
determinado tipo de pessoa.
F33: fica cada vez mais difícil formar professores que tenham condições de
interferir, que tenham condições de compreender de maneira mais ampliada a
educação e portanto, educarem de verdade.
F34: Eu arrisco dizer que o mais democrático hoje seria ensinar. Por incrível que
pareça isso, o mais revolucionário é fazer com que as pessoas aprendam e
infelizmente a gente não tem conseguido.
F35: infelizmente, eu não sei se é velheira, eu ando um pouquinho mais
88
desanimada com a minha possibilidade de interferir, de contribuir para a
construção de professores que junto comigo e com outros colegas pudessem
contribuir para uma sociedade mais justa. Não desisti ainda, mas está cada vez
mais difícil.
F53: que a gente pode dizer assim: "muitas sementes caem no asfalto,
algumas caem em solo fértil e essas germinam, mas têm muitas que estão se
perdendo.
F89: Cada vez mais, com a democratização do ensino superior, estão chegando a
este nível, alunos com origens sócio-culturais as mais diversas possíveis, que
trazem ao professor o desafio de partir da diversidadee tentar chegar a uma
“igualdade” de condições de assimilação do conhecimento necessário à vida
profissional e à cidadania. Esse é, na verdade, o grande desafio da docência no
ensino superior na atualidade.
F22: Eu acho que a gente não pode dizer que as práticas educativas determinam
(um tipo de sujeito, de sociedade)
F23: Acho que seria muito forte dizer que as práticas educativas determinam, mas
elas têm um papel sim no mundo, eu acho que um papel até importante,
principalmente se nós entendermos educação não só como a educação formal, mas
também, a educação não formal, a educação tem todos os espaços sejam eles
família, seja a mídia...
F26: Infelizmente está tão difícil!
F31: Eu já nem me arisco mais a dizer que eu luto pela superação de uma
sociedade capitalista, mas que pelo menos a gente conseguisse maior justiça
social que eu sei que no horizonte final do capitalismo é difícil, mas em outras
épocas foi menos carrasco, menos cruel... A gente está vendo uma regressão de
tudo isso.
F41: Então a gente continua insistindo, mas cada vez menos...
F42: Então, cada vez mais está mais difícil, embora, eu continuem insistindo nessa
questão de sempre trazer a posição... Eu diria assim, não sou nem um pouco
pós-moderna, ainda sou da tese que tem que ensinar sim, que existem alguns
conteúdos que tem que ser apreendidos sim, que esses conceitos é que permitem
que você compreenda o mundo de uma maneira mais ampliada, que cada
vez mais está mais difícil que os alunos compreendam esses conceitos.
CATEGORIA DE ANÁLISE: 2) Papel como Docente Formador.
Dados da Entrevista
(Pré-indicadores –
sublinhados e
Indicadores em
negrito)
F87: No Ensino Superior é organizar de maneira adequada aos níveis de
aprendizagem dos alunos, os conteúdos a serem aprendidos.
F88: Para ser um bom professor de Ensino Superior é preciso ter domínio do
conteúdo, da didática (que é diferente da didática para com crianças) e das
relações que se estabelecem em grupos.
F65: O estabelecimento de uma relação professor- aluno, que seja uma relação não
de amiguinho, mais que tenham conhecimento como objetivo, sempre traz muito
retorno, sempre traz muitas possibilidades
F66: Os alunos reconhecem, eles percebem o professor que tenta entender a sua
situação, que tenta ajudar, que tenta contribuir sem facilitar, sem abrir mão da
exigência, do rigor...
F67: quanto mais a gente consegue mostrar para o aluno que é extremamente
respeitoso com ele exigir que ele aprenda, não permitir a coisa dá satisfação
fácil, do prazer simplesmente pelo prazer da aula lúdica e sim lutar pelo prazer do
aprendizado, pela satisfação de descobrir que eu dei conta... Num primeiro
momento eles até reagem negativamente, mas no decorrer do tempo reconhecem e
gostam.
F68: o importante para o nosso desenvolvimento é que as pessoas nos exijam,
respeitosamente. Então eu acho que sempre um retorno e um retorno muito
bacana.
F58: Como eu vivi com muita ênfase, com muita força esse período da
redemocratização, porque eu já passei dos meus 40, me dói muito ver que a gente
não conseguiu... Também não vamos ser ingênuos de achar que uma andorinha faz
verão, mas havia movimentos coletivos e mesmo assim essa ideologia se
89
sobrepõe e a gente não está conseguindo lutar contra ela. Isso vai cansando, vai
desanimando.
F85: Eu acho que a grande urgência é voltar a um trabalho coletivo. Os
professores têm trabalhado de maneira muito isolada. Existem muitas boas
práticas, muito boas iniciativas, mas elas estão isoladas a uma escola, a um
profissional, a uma instituição. Não estamos no momento conseguindo um
movimento mais coletivo de organização...
F86: Eu sei que tem os fóruns em defesa da escola pública, tem várias instâncias
que tentam fazer isso, mas é um movimento que está enfraquecido e acho que o
primeiro passo é lutar para um movimento mais coletivo de conscientização,
embora isso pareça já superado, pareça que ... já é defesa de Paulo Freire lá dos
anos 50, do Saviani nos anos 80, mas infelizmente nós temos que retomar essa
coisa da conscientização, e da compreensão da possibilidade de um outro
mundo que não necessariamente as coisas têm que ser como são. Então eu acho
que é urgente a luta da organização coletiva, contra a naturalização de tudo
que é social e daí, quem sabe o resto aconteça?
CATEGORIA DE ANÁLISE: 3) Visão sobre Educação.
Dados da Entrevista
(Pré-indicadores –
sublinhados e
Indicadores em
negrito)
F16: Quando estou falando ensino não estou me referindo só a escola, porque tanto
pode haver o ensino de valores, o ensino daquelas regras básicas de
convivência, mas também, e principalmente para as funções psicológicas
superiores, aquilo que a escola oficialmente e formalmente induz... ... induz,
ensina, puxa...
F27: Infelizmente o que a gente tem visto é assim... Por um lado é uma coisa
positiva é o acesso de muitas pessoas que antes não tinham acesso ao nível
universitário e nem a pós-graduação... Então é um público completamente
diferente...
F28: O ensino superior ainda está estruturado para o estudante que tem
condições, que tem tempo, teve acesso a todo um capital cultural, que vem de
uma camada sócio econômica privilegiada...
F29: E o estudante que nós estamos recebendo cada vez mais, que é aquele que
tem dificuldades de leitura e escrita, não que ele não leia o texto, mas daí a
conseguir compreender é bastante difícil... Que tem limitações grandes na
compreensão do texto, na compreensão das notícias, que são bastante presas do
senso comum, da mídia.
F30: eu percebo um recuo da possibilidade de contribuir rumo a construção de
uma sociedade mais justa, que seria o objetivo.
F32: E por conta de nós recebermos cada vez mais estudantes, que apesar da boa
vontade, tem limites muito grandes de compreensão do mundo.
F54: meus alunos que por tanto também são vítimas dessa pressão... Muitos
trabalham no próprio grupo que é a mantenedor... A coisa é assim: "não adianta eu
preciso de emprego, se eu quiser ter emprego, eu vou me adaptar e para me
adaptar, qualquer tipo de discordâncias, de dissonância não é bem vinda".
F24: se nós pensarmos o espaço formal chamado escola, indiferente de que o nível,
eu acho que elas m uma contribuição importante, mas não posso dizer que são
determinantes.
F25: Porque se não estaria recorrendo àquilo que eu mesma agora pouco falei que
considero um equívoco, que considerar que a educação formal pode resolver os
problemas, ou criar, sei lá... desenvolvimento econômico, coisas que não
competem à educação.
F69: (...), mais de qualquer forma o que a escola faz é transmitir, e eu vou usar
esse termo mesmo, embora esteja lá fora de moda, não faz mal... Já estamos fora
de moda também... É transmitir uma visão de mundo, um conhecimento,
valores...
F74: Eu acho que existem demandas bastante contraditórias
F75: Então uma primeira contradição: você tem o interesse dos grupos
hegemônicos, dos empresários e eles têm... a gente sabe que por meio dos lobis
tem uma grande influência na estruturação da legislação que depois acaba tendo
que ser cumprida pela escola.
90
F60: eu considero que a universidade, qualquer uma delas, não está preparada
para o tipo de aluno que recebem hoje. A maioria dos estudantes hoje trabalha,
mesmo que eles estudem de manhã, eles trabalham à tarde e a noite.
F61: as pessoas geralmente têm pouco tempo para estudo fora da instituição, tem
um... É feio usar essa palavra... Mas, tem um déficit de acesso aos bens culturais
e, portanto, tem muita dificuldade para compreender os conceitos.
F62: Acho que a universidade precisa repensar toda a sua estratégia de trabalho,
porque a gente cansa de ver alunos que estão lá na última aula do dia e estão
lutando para ficar acordados e não conseguem e percebo vários colegas que não
respeitam isso. (...) muitos professores não conseguem entender, não conseguem
ver...
F63: Tem gente que não tem dinheiro para a xérox, para comida e a universidade
está fazendo de conta que não está vendo isso. E ao mesmo tempo você tem a
situação de outros alunos na turma que têm acesso aos bens culturais, a
alimentação... E fica uma dificuldade até de se constituir grupos, coisa que eu não
percebia há anos atrás que percebo hoje, é muito forte a construção de grupinhos
dentro da sala , porque a gente tem turmas grandes, aliás esse é outro problema...
F64: Então grupinhos que se constituem de uma maneira tão forte, porque o
individualismo está muito presente na sociedade atual, (...) esse individualismo
exacerbado, esse raciocínio da mercadoria que é uma coisa assim, bom que eu
trato... do hedonismo... eu trato de conseguir a nota, se eu aprendi isso é uma outra
questão, mas é preciso passar por que me custa de muito caro reprovar, porque eu
preciso me formar. Então eu acho que a situação da sociedade hoje está
dificultando muito o trabalho educativo
F83: em relação às dificuldades, são essas: a questão da educação como
mercadoria, a mudança do perfil do estudante não sendo compreendida pela
universidade, a idéia do prazer imediato (...)
F84: Deslocar o prazer para daqui a pouco, tem que ser tudo agora! E como as
famílias, os pais, não estão sabendo colocar os limites. Essas pessoas chegam ao
mundo, em todos os níveis de ensino, nós estamos falando agora de ensino
superior, com bem mais dificuldade para resistir a uma frustração, para receber
uma correção que com certeza a sua orientadora fez no seu referencial teórico
umas 27.000 vezes! Isso, as pessoas não conseguem mais aceitar, como sendo
parte do processo.
CATEGORIA DE ANÁLISE: 4) Finalidade da Educação.
Dados da Entrevista
(Pré-indicadores –
sublinhados e
Indicadores em
negrito)
F6: eu acho que é muito importante fazer um movimento contra hegemônico no
sentido de não somente corresponder àquilo que a sociedade espera, porque isso
quem espera é um grupo, não é a sociedade como um todo.
F7.1:Então, a educação tem a possibilidade tanto de confirmar e sedimentar isso
que já existe, esses status quo, como ela tem a potencialidade de contribuir para
a reflexão e até para a transformação disso (...)
F8: mas não caindo no engodo de achar que a educação transforma tudo que é
uma das manias que a gente tem visto ai na mídia hoje e que é uma coisa
extremamente perigosa.
F17: eu considero que a educação é muito importante desde que as pessoas
saibam o que estão fazendo
F21: considero que há uma importância grande da educação, mas não do jeito
que está sendo posto hoje pela mídia, como se educação fosse assim, resolver o
problema do desemprego, resolver o problema da gravidez precoce, resolver todos
os problemas que na verdade não são do âmbito da educação e sim da
organização social como um todo.
F73: Então, porque ela tem o grande poder, tanto para contribuir na
manutenção como na transformação do que existe, a educação tem um grande
papel, embora não seja redentora...
F79: Mas tem uma outra demanda que é "precisamos de educação exatamente para
mudar essa visão, exatamente para perceber que não é só pelo trabalho, que é
porque ela nos forma nos ajuda a desenvolver a nossa inteligência, a nossa
capacidade de pensar, de raciocinar, de estabelecer relações, comparações, etc.
91
F14: existem outras (demandas) que eu particularmente considero muito maiores
que são as de ajudar a pessoa a ser cada vez mais pessoa... lutar e trabalhar no
sentido da humanização
F15: o ser humano quando nasce é um candidato à humanidade, ele não é tudo
aquilo que poderia ser desde que tenha a oportunidade, de que sejam
desenvolvidos nele elementos que na verdade o ensino é que consegue.
F18: infelizmente a gente vive num momento hoje em que estão muito fortes as
pedagogias... não é nem não diretivas... as pedagogias que eu chamaria de
negativas, que entendem que a questão é muito o aluno construir, o aluno
descobrir, a aprendizagem constante, o aprender a aprender... Então retirasse da
educação um pouco seu papel de ser um elemento que pode contribuir na
humanização das pessoas.
CATEGORIA DE ANÁLISE: 5) Relação Educação x Sociedade.
Dados da Entrevista
(Pré-indicadores –
sublinhados e
Indicadores em
negrito)
F2: Toda sociedade gera a educação que combina com ela, só que isso o
significa que seja algo claro, límpido e sem conflitos.
F3: A educação vai acompanhar essa concepção de sociedade.
F4: existe uma concepção (de sociedade) que se torna hegemônica e que vai
interferir na forma como se faz educação.
F5: eu considero que é necessário no momento atual, quer dizer, no sistema
capitalista que continua muito forte hoje, embora tanto se fale em sociedade do
conhecimento, reestruturação produtiva, a gente sabe que a base ainda continua a
mesma.
F7: Então eu acho que existe uma relação muito próxima, embora dialética...
F10: Em todas as sociedades a educação é muito importante porque ela ajuda a
formar o tipo de pessoa que aquela sociedade precisa.
F11: e na fala de vários empresários, a idéia que caberia a educação formar as
pessoas para o mercado de trabalho...
F12: digo na legislação porque de maneira implícita isso está na legislação também
como você vê, por exemplo, nas diretrizes para o ensino médio colocando que a
referência privilegiada para os currículos seria o mercado de trabalho ou, não é
nem o mundo do trabalho e sim a necessidade da produção.
F13: há um grupo que quer formar as pessoas que são necessárias para
produzir nesse sistema e se adaptar a ele, essa é uma demanda da sociedade, é
uma das importâncias
F55: Por isso que eu disse para você bem no começo que toda sociedade gera a
educação que lhe interessa, embora isso não interesse para todos daquela
sociedade.
F56: se você observar o modelo neoliberal que a gente tem, tudo está se tornando
mercadoria, é claro que a educação infelizmente está entrando nisso também...
F59: ... Essa idéia da educação como mercadoria, portanto, vem associado aí toda a
questão de compra e venda, de produto fechado, de satisfação do cliente, etc. e
tal, que é um raciocínio absolutamente torto para a educação.
F80: Por outro lado a sociedade, se a gente pensar em mídia, em senso comum,
têm empurrado para a educação todas as demandas.
F81: Tem problema de violência, a escola é que não deu conta; tem gravidez na
adolescência, a escola não deu conta; tem desemprego, a escola não deu conta...
Isso me parece que é um discurso ideológico, de lavar as mãos do estado e de
outras instituições empurrando para uma só delas, a escola, e também de alguma
forma para o indivíduo...
F82: Então como que não vai para a escola hoje em dia?" Então você inclui todo
mundo... a Cássia Kuenzer chama isso de inclusão excludente”. Inclui todo
mundo na educação! Todo mundo na escola! Mas não necessariamente uma boa
educação! Com uma boa aprendizagem! Então você acaba excluindo no decorrer
do processo por evasão, ou repetência, ou até porque mesmo tendo diploma essa
pessoa não tem condições de competir pelos postos de trabalho.
92
INDICADORES NÚCLEOS
F70: abertura de visão de um mundo, compreenda relação entre o que
a sociedade espera, o que a sociedade hegemônica espera, o que é bom
para a população como um todo e o que a escola faz com isso.
F71: visão mais aberta, percepção do quanto a escola contribuem para
formar um determinado tipo de pessoa.
F33: difícil formar professores que tenham condições de interferir,
compreender de maneira ampliada a educação, educarem de verdade.
F34: o mais democrático seria ensinar. o mais revolucionário fazer
com que as pessoas aprendam não tem conseguido.
F35: desanimada possibilidade de interferir, contribuir a construção
de professores, sociedade mais justa.
F53: "muitas sementes caem no asfalto, algumas caem em solo fértil e
essas germinam, mas têm muitas que estão se perdendo.
1) O mais importante para a
formação de professor é que
ele compreenda essa relação
entre o que a sociedade
hegemônica espera, o que é
bom para a população como
um todo e o que a escola faz
com isso.
F87: organizar os conteúdos a serem aprendidos.
F88: bom professor é preciso ter domínio do conteúdo, da didática, das
relações em grupos.
F65: conhecimento como objetivo
F66: exigência, do rigor...
F67: é extremamente respeitoso exigir que ele aprenda
F68: exijam, respeitosamente
F58: movimentos coletivos, ideologia se sobrepõe , não está
conseguindo lutar contra ela.
F85: a grande urgência trabalho coletivo. Os professores têm
trabalhado de maneira isolada. movimento mais coletivo de
organização...
F86: está enfraquecido o primeiro passo é lutar para um movimento
mais coletivo de conscientização, retomar conscientização,
compreensão da possibilidade de um outro mundo, urgente a luta da
organização coletiva, contra a naturalização de tudo que é social
F89: alunos com origens sócio-culturais as mais diversas possíveis, o
desafio departir da diversidadechegar a uma “igualdade” de
condições de assimilação do conhecimento necessário à vida
profissional e à cidadania.
F31: superação de uma sociedade capitalista, maior justiça social é
difícil.
F42: está mais difícil, tem que ensinar sim, conteúdos, conceitos
permitem que compreenda o mundo de uma maneira mais ampliada,
está mais difícil que os alunos compreendam esses conceitos.
2) O papel do docente é lutar
para um movimento mais
coletivo de conscientização.
F16: ensino de valores, o ensino regras básicas de convivência, escola
oficialmente induz, ensina, puxa.
F27: acesso de muitas pessoas ao nível universitário
F28: O ensino superior estruturado para o estudante que tem
condições, tempo, capital cultural, camada sócio econômica
privilegiada...
F29: E o estudante tem dificuldades de leitura e escrita, tem limitações
grandes na compreensão do texto, notícias, presas do senso comum, da
mídia.
F30: recuo rumo a construção de uma sociedade mais justa,
F32: estudantes, tem limites muito grandes de compreensão do
mundo.
F24: escola têm contribuição importante, mas não são determinantes.
F25: equívoco, a educação formal pode resolver os problemas, ou
criar, desenvolvimento econômico, coisas que não competem à
educação.
F69: o que a escola faz é transmitir uma visão de mundo, um
conhecimento, valores
F75: o interesse dos grupos hegemônicos, empresários, lobis influência
3) A escola transmite uma
visão de mundo, um
conhecimento, valores.
93
na estruturação da legislação cumprida pela escola.
F60: a universidade, não está preparada para o tipo de aluno que
recebem estudantes trabalha
F61: pouco tempo para estudo déficit de acesso aos bens dificuldade
para compreender os conceitos.
F63: turmas grandes,
F64: individualismo, raciocínio da mercadoria, hedonismo,
dificultando muito o trabalho educativo
F83: educação como mercadoria, a mudança do perfil do estudante
não sendo compreendida pela universidade,
F6: movimento contra hegemônico
F7.1: possibilidade tanto de confirmar e sedimentar status quo,
potencialidade de contribuir para a reflexão para a transformação
F8: engodo achar que a educação transforma tudo.
F17: eu considero que a educação é muito importante desde que as
pessoas saibam o que estão fazendo
F21: há uma importância grande da educação, mas não do jeito que
está sendo posto hoje pela mídia, como se educação fosse assim,
resolver problemas que não são do âmbito da educação e sim da
organização social como um todo.
F73: grande poder, contribuir na manutenção como na transformação
do que existe, não seja redentora...
F79 ela nos forma inteligência, capacidade de pensar, raciocinar,
estabelecer relações, comparações.
F14 ajudar a pessoa a ser cada vez mais pessoa... lutar e trabalhar no
sentido da humanização
F15: o ser humano quando nasce é um candidato à humanidade.
F18: retirasse da educação um pouco seu papel de ser um elemento
que pode contribuir na humanização das pessoas.
4) A educação tem a
possibilidade de confirmar e
sedimentar o status quo, ou a
potencialidade de contribuir
para a transformação.
F2: Toda sociedade gera a educação que combina com ela, não
significa que seja algo claro, límpido e sem conflitos.
F3: A educação vai acompanhar essa concepção de sociedade.
F4: concepção (de sociedade) que se torna hegemônica vai interferir
na forma como se faz educação.
F7: a relação dialética...
F10: a educação ajuda a formar o tipo de pessoa que aquela sociedade
precisa.
F11: empresários, educação formar para o mercado de trabalho...
F12: necessidade da produção.
F13: grupo que quer formar as pessoas que são necessárias para
produzir nesse sistema e se adaptar a ele.
F55: toda sociedade gera a educação que lhe interessa.
F56: modelo neoliberal mercadoria, a educação infelizmente está
entrando nisso também...
F59: compra e venda, de produto fechado, de satisfação do cliente,
raciocínio absolutamente torto para a educação.
F80: a sociedade, m empurrado para a educação todas as demandas.
5) A educação vai acompanhar
a concepção de sociedade.
DADOS DO PROGRAMA
DISCIPLINA
Escola e Currículo
EMENTA
Fundamentos e conceitos da área de currículo e sua articulação com a didática e
organização do trabalho pedagógico. Relações entre organização, produção,
94
distribuição de saber, poder e identidades sociais. Disciplinas escolares e áreas de
referências de organização dos saberes. Procedimentos para a organização da
produção curricular.
OBJETIVOS
GERAIS
- Relacionar as teorias do currículo ao contexto social, político e histórico que as
gerou;
- Identificar e refletir sobre as diversas concepções de currículo e suas relações com a
seleção e organização do conhecimento escolar;
- Conhecer e avaliar com criticidade as formas mais usuais de organização curricular
tendo em vista as necessidades do mundo atual;
- Compreender a íntima relação entre a concepção de educação e de currículo e a
prática docente.
- Examinar o processo curricular em seu fazer-se na escola e o impacto na
organização do trabalho pedagógico, possibilitando a reflexão sobre as relações entre
currículo, poder, identidade social e cultura escolar. Identificar a relação existente
entre economia e educação.
OBJETIVOS
ESPECÍFICOS
- Discutir o plano de ensino, as datas, a sistemática de avaliação e papel desta
disciplina na formação do pedagogo;
- Iniciar a discussão sobre o conceito de currículo que as alunas trazem;
- Conceituar currículo;
- Compreender que o currículo em ação se faz na escola, sob influência do currículo
prescrito e do currículo oculto;
- Compreender que a escola é um conjunto de culturas (crítica, acadêmica,
institucional, social e experiencial) e que estas são influenciadas e influenciam o
currículo da escola;
- Examinar as relações entre currículo e a organização dos tempos, espaços, sujeitos
e relações de poder na escola;
- Compreender o currículo como "espaço de conflito", construído de acordo com o
momento histórico;
- Refletir a respeito das teorias curriculares e suas relações com as discussões
curriculares atuais;
- Compreender as discussões geradas pela crítica à compartimentalização do saber;
- Analisar criticamente as propostas de um currículo integrado;
- Examinar criticamente os fundamentos das propostas curriculares do Governo
Federal: avaliação escolar x currículo x neoliberalismo;
- Analisar as críticas efetuadas aos currículos nacionais e os caminhos/críticas
encontradas na prática de currículos locais;
- Analisar criticamente as propostas curriculares do Estado do Paraná e do Município
de Curitiba tendo por referência os estudos realizados;
- Refletir a respeito das teorias curriculares e suas relações com as discussões
curriculares atuais;
- Compreender e saber utilizar em análises e discussões escolares, os conceitos
curriculares essenciais desenvolvidos por cada teoria estudada;
- Compreender a diferença entre as teorias tradicionais de currículo, as teorias
críticas e as chamadas teorias pós-críticas e suas influências na elaboração de
currículos estaduais e municipais;
- Analisar aspectos sociológicos, históricos e psicológicos presentes nas estruturas
curriculares;
- Compreender como se dá a conversão do saber científico em saber escolar
CONTEÚDO
PROGRAMÁTICO
- Fundamentos do currículo numa perspectiva crítica.
- Aspectos históricos da constituição do currículo.
- A crítica à compartimentalização do saber e as propostas de currículo integrado:
Interdisciplinaridade, transdisciplinaridade, transversalidade; O trabalho por projetos/
temas geradores.
- As propostas curriculares do Governo Federal: Os PCNs e os RCNEF.
- Análise crítica das propostas curriculares da Rede Estadual de Ensino do Paraná e
da Rede Municipal de Curitiba.
- Saberes, Currículo e Didática.
- Conversão do saber científico em saber escolar – As disciplinas escolares e as áreas
95
de referência.
- Princípios norteadores para o currículo: tendências atuais
BIBLIOGRAFIA
BÁSICA
COSTA, Marisa Vorraber. Escola Básica na virada do século. São Paulo: Cortez,
2000.
CURITIBA, SMED. Diretrizes Curriculares para a Educação Municipal de
Curitiba. Vol 1, 2 e 3. Curitiba, 2006.
EDUCAÇÃO, Secretaria de Estado da; DEPARTAMENTO DE ENSINO DE
PRIMEIRO GRAU; SUPERINTENDÊNCIA DA EDUCAÇÃO. Currículo Básico
para a Escola Pública do Paraná. Curitiba: 1990.
GIMENO SACRISTAN, José. Poderes instáveis em educação. Porto Alegre:
Artmed, 1999
KRAMER, S. ‘Propostas Pedagógicas ou Curriculares: subsídios para uma leitura
crítica.’ In: KRAMER, S. Currículo: políticas e práticas. Campinas: Papirus, 1999.
KUENZER, Acácia Zeneida. “Trabalho Pedagógico: da fragmentação à unitariedade
possível.” In: FERREIRA, Naura Syria & AGUIAR, Márcia Ângela da Silva (Orgs.)
Para onde vão a Orientação e a Supervisão Educacional? São Paulo: Papirus, 2002.
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E DO DESPORTO; SECRETARIA DO ENSINO
FUNDAMENTAL. Parâmetros Curriculares Nacionais: Primeiro e segundo ciclo
do ensino fundamental. Brasil: 1997.
MOREIRA, Antonio Flavio. Currículo: políticas e práticas. 2 ed. SP: Papirus, 1999.
PARO, Vitor Henrique. “A Natureza do Trabalho Pedagógico.” In: PARO, Vitor
Henrique. Gestão Democrática da Escola Pública. São Paulo: Ática, 2004.
SAVIANI, Dermeval. Pedagogia Histórico-Crítica: primeiras aproximações. São
Paulo: Cortez, Autores Associados, 1991.
ANÁLISE – PROFESSOR 3
O Professor 3 apresenta uma visão bastante negativa e crítica da educação
brasileira hoje. Aponta muitos aspectos que dificultam a tarefa da educação: estrutura
para alunos privilegiados, que não trabalham, que não tem déficit de acesso aos bens
culturais. Além disso, aponta que a educação tem sido vista como mercadoria e
responde a interesses de grupos hegemônicos. Fala da falta de qualidade e da formação
precária dos professores. E afirma que os valores dominantes na sociedade também
dificultam o trabalho educacional.
Ele considera que o mais importante para a formação docente é a compreensão
da relação entre o que a sociedade hegemônica espera, o que é bom para a população
como um todo e o que a escola faz com isso. Defende a idéia do professor ter uma visão
mais aberta, uma percepção do quanto a escola e o currículo contribuem para formar um
determinado tipo de pessoa.
Segundo sua fala, está cada vez mais difícil formar professores que tenham
condições de interferir, de compreender de maneira mais ampla a educação e portanto,
educarem de verdade. O mais democrático hoje, segundo ele, seria ensinar, fazer com
que as pessoas aprendam e infelizmente os professores não tem conseguido, em sua
opinião.
96
O professor demonstrou-se desanimado com a possibilidade de contribuir para a
formação de professores que possam trabalhar para a construção de uma sociedade mais
justa. Na sua concepção está cada vez mais difícil lutar pela superação de uma
sociedade capitalista e pela justiça social. Acredita que alguns conteúdos e conceitos
devem ser ensinados, permitindo que o aluno compreenda o mundo de uma maneira
mais ampliada, mas que está mais difícil para que os alunos compreendam esses
conceitos. Pensa que nesse quadro muitas “sementes caem no asfalto e não frutificam.”
Para ele, o papel da escola é transmitir uma visão de mundo, valores e
conhecimento, o que considera uma contribuição importante a escola humanizar. Partir
da diversidade para chegar na igualdade. Mas ressalta que a educação não é redentora;
não é determinante. Em sua opinião, toda sociedade gera a educação que combina com
ela, mas não sem conflitos.
No seu ponto de vista, no período da redemocratização havia movimentos
coletivos, porém, acredita que hoje os professores têm trabalhado de maneira isolada,
não conseguindo um movimento coletivo de organização. Dessa forma, considera que o
papel do docente é lutar para um movimento mais coletivo de conscientização e para a
compreensão da possibilidade de um outro mundo contra a naturalização de tudo que é
social.
Assim, a educação está, segundo ele, se tornando uma mercadoria. Por outro
lado, considera ser muito importante fazer um movimento contra hegemônico, pois, em
sua opinião, a educação tem a possibilidade tanto de confirmar e sedimentar o que
existes, status quo, como tem também a potencialidade de contribuir para a reflexão e
até para a transformação disso. Porém adverte que não se deve cair no engodo de achar
que a educação transforma tudo. O grande poder da educação é, segundo ele,
contraditório, pois, tanto pode contribuir na manutenção como na transformação do que
existe.
A educação forma, ajuda a desenvolver a inteligência, a capacidade de pensar,
de raciocinar, de estabelecer relações, comparações; ajuda a pessoa a ser cada vez mais
pessoa. Para tanto, acredita que o professor precisa lutar e trabalhar no sentido da
humanização, porque, o ser humano quando nasce é um candidato à humanidade e o
ensino é que pode contribuir na humanização das pessoas.
97
Para o professor 3, toda sociedade gera a educação que combina com ela, que
isso não significa que seja algo claro, mpido e sem conflitos. Para ele, a educação vai
acompanhar essa concepção de sociedade que se torna hegemônica e que vai interferir
na forma como se faz educação. Então, na sua concepção, existe uma relação muito
próxima, embora dialética entre educação e sociedade. Considera, dessa forma, que em
todas as sociedades a educação é muito importante porque ela ajuda a formar o tipo de
pessoa que aquela sociedade precisa.
No contexto atual, vários empresários pregam a idéia de que caberia a educação
formar as pessoas para o mercado de trabalho, pela necessidade da produção. Assim,
esse grupo quer formar as pessoas que são necessárias para produzir nesse sistema e se
adaptar a ele, essa é uma demanda da sociedade, segundo o Professor 3, é uma das
importâncias no modelo neoliberal. Tudo está se tornando mercadoria, e em sua
opinião, a educação, infelizmente, está entrando nisso também.
O relato do Professor 3 demonstra certa dificuldade de equacionar educação
sociedade sujeito. Segundo sua visão, educação é força humanizadora, mas a
sociedade e as condições desencaminham essa função; assim, a sociedade produz a
educação que precisa, mas é hoje mercadoria e não acolhe os sujeitos.
O Professor 3 indica com seu discurso a existência de projetos em disputa para a
educação; mas naturaliza ao afirmar a humanização como finalidade sem caracterizá-la
socialmente. um sujeito ideal para ser formado e condições objetivas parecem estar
impedindo. O projeto do Professor 3 recua do conflito para lugar de fracasso e
desesperança, não só do ponto de vista institucional, mas também, com relação aos
alunos que se tem na universidade hoje, explicitando certo pessimismo. Assim, apesar
de apontar a importância e a necessidade do trabalho coletivo na luta contra a
naturalização de tudo que é social, não se reconhece nessa luta em seu trabalho atual
como docente-formador.
Seu discurso apresenta uma ambivalência importante: é pessimista na avaliação
das possibilidades atuais da educação, mas acredita nela como ferramenta de
transformação. De certa forma, ao fazer a crítica à situação atual da educação, carrega
suas palavras de credibilidade nela. Seu desânimo se constrói exatamente neste espaço:
a educação é ferramenta importante, mas hoje está sendo utilizada de forma a não se
apresentar como tal. Lhe escapa a possibilidade de análise das contradições da educação
98
hoje e de poder com esta análise encontrar as “brechas” para a transformação. Isto, a
nosso ver, acontece porque a concepção de educação apresenta resquícios de
naturalização e da perspectiva otimista ingênua. A análise do programa da disciplina
demonstra importância atribuída à relação educação-sociedade, quando relaciona
currículo com a condição histórica e social em que esse se desenvolve, quando
apresenta as políticas nacionais e do estado do Paraná, quando enfatiza a busca de uma
perspectiva crítica para olhar o currículo. Mas, pode-se dizer também que todo o
discurso do Professor 3 carece de uma afirmação sobre um projeto social que defenda e
busque construir com sua prática. A crítica fica então carente de uma posição e de um
projeto a ser afirmado e desenvolvido.
DADOS - PROFESSOR 4
O quarto sujeito é Graduado em Ciências Sociais, pela Universidade Federal do
Paraná, tem 18 anos de experiência docente no Ensino Superior e trabalha numa
instituição particular (comunitária/confessional), ministrando as disciplinas: “Sociologia
e Antropologia da Educação I e II”, na graduação em Pedagogia, com duas hora/aula
semanais para um total de 50 alunos. Sua formação para docência em ensino superior
inclui: Especialização em Pesquisa Educacional e Mestrado em Educação.
DADOS DA ENTREVISTA
CATEGORIA DE ANÁLISE: 1) Formação de Professor e Trabalho Docente.
Dados da Entrevista
(Pré-indicadores –
sublinhados e
Indicadores em
negrito)
F21: É complicado, não é?
F22: a gente fica esperando encontrar alunos... Porque a minha matéria é no
primeiro ano. No primeiro período é Sociologia Geral, e no segundo período
Sociologia Especifica... É interessante porque o aluno ainda chega sem a base
reflexiva, porque o ensino médio não contribui para isso.
F23: nós temos ainda que trabalhar com esse aspecto. De contribuir para que o
aluno tenha esse tipo de atividade de uma forma... Veja este tipo de atividade de
uma maneira mais natural e espontânea... Que ele pode ter opiniões, que pode
expressar opiniões.
F24: Então realmente é muito complicado.
F27: Falta de preparo no ensino Médio...
F28: Alunos que às vezes a gente fica pensando, elesm para a universidade e
aí sim é que vão pensar em ser um cidadão, em ser alguém pensante.. Antes
parece que não existiam dentro de uma visão mais política e crítica
F29: Então é complicado, é complicado até que os alunos realmente percebam
qual é o seu objetivo dentro da universidade e se comprometam (...)
F30: eu acho que a maior dificuldade é essa... falta de comprometimento de
alguns alunos; não sabem exatamente o que querem... Então daí eles têm um
comportamento assim que não é adequado... Então não são motivados para
pesquisa, não são motivados, não tem interesse em ler...
F31: essa é a maior dificuldade, motivar, despertar o interesse do aluno para a
99
universidade.
F41: é uma sociedade muitas vezes que trabalha mais com o aspecto da
informação e não do conhecimento. Não busca aprofundar certos temas, certos
assuntos... Isso para mim é um problema bem complicado que a gente vai ter ainda
que trabalhar muito bem com isso.
F42: A tecnologia contribuindo e ao mesmo tempo dificultando o
desenvolvimento intelectual, a busca realmente pelo... não a informação pura e
simplesmente, mas o conhecimento.
CATEGORIA DE ANÁLISE: 2) Papel como Docente Formador.
Dados da Entrevista
(Pré-indicadores –
sublinhados e
Indicadores em
negrito)
F43: É ser mediador. Mediar o conhecimento...
F44: Antigamente a visão do professor era uma visão muito positiva... Então o
detentor do conhecimento, alguém que...
F45: Eu vejo de uma forma diferente, é aquele indivíduo que vai contribuir, mediar
realmente o conhecimento e provocar uma motivação para que esse indivíduo
cresça.
F46: Eu vejo o professor assim, ele vai contribuir com uma formação plena do
indivíduo, de forma integral. Ele vai trazer o conhecimento, mas ele vai
contribuir para que esse indivíduo veja além.
F47: Ele (professor) tem uma postura crítica, política, essa postura política que
não é partidária, mas que todos nós deveríamos ter de atitude diante da vida,
observando direitos, deveres, já que a gente vive numa sociedade diante de um
sistema de obrigações, esse indivíduo tem de ser consciente dos seus direitos, dos
seus deveres.
F12: A possibilidade de um professor ter uma participação mais política, mais
consciente, mais crítica, vai refletir num tipo de prática.
F48: Então o professor precisa ter esse tipo de comportamento, de desenvolver
esse interesse no aluno, em busca de sua participação mais plena e não tão
parcial como nós observamos hoje em dia.
F7: Dentro da visão sociológica, das aulas de sociologia, o que a gente procura
fazer é promover uma visão mais crítica.
F13: Eu sempre tenho a preocupação de dizer e de praticar na verdade a formação
do indivíduo mais crítico.
F14: E como é que a gente pode fazer isso? É muito complicado você chegar e
falar para alguém: "Você a partir de amanhã vai ser mais crítico". Então é claro
que tem que ser dentro de uma prática, de uma proposição metodológica. Por
isso a gente usa muita leitura de texto, discussão em sala de aula e
principalmente essa discussão no sentido de uma formação realmente crítica, de
estar consciente de problemas de organização da sociedade, opinar a
respeito...
F15: Eu acredito que o objetivo maior da minha disciplina é esse, é contribuir com
essa formação crítica mesmo.
F16: Então, na medida do possível favorecer, por parte do aluno, um
desenvolvimento mais crítico; um senso mais crítico a respeito da sociedade,
da realidade.
F17: uma estratégia seria através de leituras de textos, de livros e
posteriormente discussão. Então nas aulas de sociologia a gente sempre propõe
momentos de discussão, mas tendo em vista uma leitura prévia... Isso é um
procedimento...
F18: Tentando discutir a questão da ideologia, a questão das classes sociais, da
educação...
F19: Então aproveitando o conteúdo tanto da educação, dentro de uma abordagem
sociológica mais crítica... Dentro dessa perspectiva crítica.
F20: Nós temos, por exemplo, eu me lembrei agora, temas como: "A formação do
cidadão"; "O que é cidadania?"; "Exclusão social e inclusão social"... São vários
temas que são propostos para que aconteça essa formação mais crítica.
F36: o meu objetivo maior é a conscientização, a formação crítica realmente
desse indivíduo e contribuir para que ele consiga realmente analisar o contexto
de atuação.
100
F37: Então como é que todas essas áreas que contribuem para sua formação vão
realmente influenciar um novo tipo de homem na sociedade, vão contribuir
com uma formação de um indivíduo crítico também.
F1: A educação faz parte de um contexto e nós temos que fazer toda essa relação
com os alunos.
F2: Principalmente tentando observar quais são os objetivos que a sociedade
organizada pretende e d informar aos alunos quais são esses objetivos e qual
é a finalidade de educação.
CATEGORIA DE ANÁLISE: 3) Visão sobre Educação.
Dados da Entrevista
(Pré-indicadores –
sublinhados e
Indicadores em
negrito)
------------------------------------------------------------
CATEGORIA DE ANÁLISE: 4) Finalidade da Educação.
Dados da Entrevista
(Pré-indicadores –
sublinhados e
Indicadores em
negrito)
F4: A educação é fundamental no sentido de esclarecer, conscientizar e
principalmente de emancipar o cidadão.
F5: Fazer com que ele realmente fique sensibilizado com relação a sua
participação na sociedade.
CATEGORIA DE ANÁLISE: 5) Relação Educação x Sociedade.
Dados da Entrevista
(Pré-indicadores –
sublinhados e
Indicadores em
negrito)
F3: A relação é direta. A gente não pode não discutir essa contextualização, essa
relação toda que existe.
F6: o que a gente observa é que por muito tempo a educação foi muito positivada,
fragmentada, aquela visão da adequação pura e simplesmente.
F8: em cada tipo de sistema político, cada tipo de sistema de governo, a gente
vai observar a reflexão em torno de uma prática educativa.
F9: Se você observar como foi, que tipo de educação nós tínhamos na época do
regime militar e hoje em dia... Eu mesmo sou fruto desse sistema... Tinha aula de
ciências sociais e de política, onde eu tinha que decorar assuntos e não dar a minha
opinião a respeito.
F10: Então é muito complicado.
F11: Conforme o tipo de sistema político a gente vai observar que vai
influenciar na organização da educação, do sistema educacional. E com isso
diretamente na prática.
INDICADORES NÚCLEOS
F22: aluno sem a base reflexiva, ensino médio não contribui.
F23: ter opiniões, expressar opiniões.
F28: m para a universidade e aí sim é que vão pensar em ser um
cidadão, em ser alguém pensante.. Antes parece que não existiam
dentro de uma visão mais política e crítica
F29: é complicado até que os alunos realmente percebam qual é o seu
objetivo dentro da universidade e se comprometam (...)
F30: a maior dificuldade é falta de comprometimento de alguns alunos;
não sabem e o que querem, comportamento não é adequado não são
motivados, não tem interesse em ler...
F31: dificuldade, motivar, despertar o interesse do aluno para a
universidade.
F41: sociedade trabalha mais com o aspecto da informação e não do
conhecimento.
F42: A tecnologia contribuindo e ao mesmo tempo dificultando o
desenvolvimento intelectual.
1) A maior dificuldade é a falta
de comprometimento por parte
dos alunos.
101
F43: Mediar o conhecimento.
F45: provocar uma motivação.
F46: contribuir com uma formação plena, integral. trazer o
conhecimento, veja além
F47: postura crítica, política, ser consciente dos seus direitos, deveres,
F12: ter participação mais política, consciente, crítica, vai refletir num
tipo de prática.
F48: o professor precisa ter esse tipo de comportamento, de
desenvolver esse interesse no aluno, em busca de sua participação
mais plena e não tão parcial.
F7: promover uma visão mais crítica.
F13: formação do indivíduo mais crítico.
F14: dentro de uma prática, de uma proposição metodológica. leitura
de texto, discussão em sala de aula formação realmente crítica, de
estar consciente de problemas de organização da sociedade, opinar a
respeito...
F16: desenvolvimento mais crítico; um senso mais crítico a respeito da
sociedade, da realidade.
F17: estratégia, leituras de textos, de livros e posteriormente discussão.
F18: discutir a questão da ideologia, a questão das classes sociais, da
educação...
F19: abordagem sociológica mais crítica... perspectiva crítica.
F20: "A formação do cidadão"; "O que é cidadania?"; "Exclusão social
e inclusão social"... temas propostos para formação mais crítica.
F36: objetivo maior é a conscientização, formação crítica contribuir
para que ele consiga realmente analisar o contexto de atuação.
F37 influenciar um novo tipo de homem na sociedade, contribuir com
uma formação de um indivíduo crítico
F2: observar os objetivos que a sociedade organizada pretende
informar aos alunos quais são esses objetivos e qual é a finalidade de
educação.
2) O professor deve contribuir
com a formação de uma visão
crítica.
-------------- 3) --------
F4: A educação é fundamental esclarecer, conscientizar e emancipar o
cidadão.
F5: sensibilizado participação na sociedade.
4) A educação é fundamental
para esclarecer, conscientizar e
emancipar o cidadão.
F3: A relação é direta.
F8:cada tipo de sistema político, cada tipo de sistema de governo, a
reflexão em torno de uma prática educativa.
F11: Conforme o tipo de sistema político vai influenciar na
organização da educação, do sistema educacional na prática.
5) Cada tipo de sistema
político influencia no sistema
educacional, na prática.
DADOS DO PROGRAMA
DISCIPLINA
Sociologia e Antropologia da Educação II
EMENTA
Sociologia. Estado, política e Educação. O papel do Estado na Educação. A
Sociedade do século XXI.
OBJETIVO(S)
GERAL
O conhecimento da realidade social, estabelecer relações entre os processos sociais e
o pensamento sociológico. Desenvolver o juízo crítico quanto a relação educação e
sociedade.
OBJETIVOS
ESPECÍFICOS
- Conhecer conceitos básicos de Sociologia.
- Ler criticamente a realidade social.
102
- Conhecer teorias sociológicas relacionadas a Educação.
- Relacionar os conceitos Sociológicos à Educação.
- Discutir o papel do Estado na Educação.
- Compreender a Educação como controle social.
- Analisar a Educação para a transformação social.
- Discutir o papel da educação na sociedade do século XXI.
CONTEÚDO
PROGRAMÁTICO
1. Sociologia
-
Conceitos.
-
Objeto.
-
Temas de estudo)
2. Estado, política e Educação:
-
O papel do Estado na Educação.
-
Neoliberalismo e Educação.
-
Educação e Controle Social.
-
Educação para a transformação Social.
-
A Origem da Família da Propriedade Privada e do Estado.
3.
A Sociedade do século XXI.
-
O pensamento de alguns sociólogos sobre a sociedade do séc. XXI.
-
Globalização.
-
O cidadão do mundo.
-
Educação e Sociedade.
BIBLIOGRAFIA
BÁSICA
FERREIRA, Nilda Teves F. Cidadania: Uma questão para a educação.
Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993.
FREITAG, B. Escola ,Estado e Sociedade. São Paulo: EDART, 1977.
GHIRALDELLI Jr. , Paulo. Infância, Escola e Modernidade. São Paulo:
Cortez, 1996.
LENHARD, Rudolf. Sociologia Educacional. São Paulo: Pioneira, 1973.
ANÁLISE – PROFESSOR 4
Na visão do Professor 4, o aluno chega sem a base reflexiva, porque o ensino
médio não contribui para isso e os professores têm que trabalhar com esse aspecto, para
que o aluno tenha esse tipo de atividade de uma maneira mais natural e espontânea, e
possa expressar suas opiniões. Então, segundo ele, é muito complicado, pois, falta uma
visão mais política e crítica no ensino Médio. Por isso, em sua opinião, fica complicado
para os alunos se comprometerem, pois, não percebem qual é o seu objetivo dentro da
universidade.
Sendo assim, ele considera que a maior dificuldade é a falta de
comprometimento de alguns alunos que não sabem exatamente o que querem e têm um
comportamento que não é adequado na universidade. Além disso, denuncia que eles não
são motivados para pesquisa, não tem interesse em ler e isso se torna a maior
dificuldade para o professor.
103
Nesta perspectiva, o Professor 4 considera que o papel do professor é mediar o
conhecimento, provocar motivação e contribuir com uma formação plena do indivíduo,
de forma integral, trazendo o conhecimento e contribuindo para que o indivíduo veja
além.
Para ele o futuro professor tem que ter uma postura crítica, política, tem que ser
consciente dos seus direitos, dos seus deveres. Considera ainda, que a possibilidade de
um professor ter uma participação mais política, mais consciente, mais crítica, reflete
num tipo de prática.
Assim, o Professor 4 afirma a finalidade da educação para emancipar e
conscientizar; entende essa meta como a formação de sujeitos críticos e politizados.
Porém, pouco esclarece sobre isto.
Segundo o Professor 4 o sujeito crítico analisa o contexto e a educação oferece
instrumentos: leituras, discussões. O sujeito político é consciente de seus direitos e
deveres. A educação oferece formas e informações.
O Professor 4 beira a generalização, mas escapa indicando que cada sistema
político influencia a educação. No entanto, sem explicitar o conflito, os projetos em
disputa, a educação aparece naturalizada. Os sistema e governo aparecem como
interferências na organização que “desencaminham”, como se houvesse um caminho
pré-determinado para seguir. Não indica interferência na finalidade.
Apresentando durante toda a entrevista um discurso superficial, o Professor 4
não se aprofunda nas questões. Suas respostas sugerem um discurso vazio no qual
repete conceitos os quais não parecem estar realmente inseridos em seu trabalho como
docente-formador.
Tal postura o condiz com uma práxis consciente da tarefa sociopolítica do
educador, mas procura fazer na prática a perpetuação de palavras e conceitos vazios em
torno de significados sem raiz. Sua prática parece se reduzir ao discurso que não
apresenta um real pensamento crítico-reflexivo acerca da formação de professores, ou
mesmo da educação.
O programa apresentado pelo Professor 4 traz alguns itens importantes: relação
processo social e pensamento sociológico; relação educação e sociedade; papel da
educação na sociedade do século XXI. Estes aspectos podem ser tomados como
indicação da percepção que o Professor 4 tem da relação existente entre educação e
104
sociedade, mas a relação fica indicada e não caracterizada. Não há elementos que
complementem, nem no programa nem no discurso, a análise desta relação. Há a relação
mas sem caracterizações e defesas de um projeto.
105
AS VOZES DOS SUJEITOS: A BUSCA DE UMA SÍNTESE
A pesquisa qualitativa, apoiada na
epistemologia qualitativa, não se orienta
para a produção de resultados finais que
possam ser tomados como referências
universais e invariáveis sobre o estudado,
mas a produção de novos momentos teórico
que se integrem organicamente ao processo
geral de construção de conhecimentos.
Gonzalez Rey (2005).
Na análise inter-sujeitos buscamos uma síntese da visão dos quatro
docentes-formadores acerca da prática que exercem e da clareza que esses
docentes-formadores têm da presença da dimensão sociopolítica, assim como, os
aspectos que caracterizam essa dimensão a partir da relação entre educação (escola) e
sociedade.
Ao investigar o trabalho dos docentes-formadores, partimos do pressuposto de
que a dimensão sociopolítica está sempre presente nas práticas educacionais, apontando
para um determinado tipo de sociedade; incentivando determinado tipo de sujeito, de
cidadão. Ou seja, o docente, ao construir seu projeto
30
de formação e desenvolvê-lo,
sempre estará indicando para uma direção social; seu trabalho estará sempre vinculado a
um dos projetos sociais existentes e em disputa na sociedade. Mas ele pode não ter
clareza desta relação e desta presença, tornando-se um profissional acrítico, que sem
perceber, reforça, com seu trabalho, concepções dominantes.
A análise das falas dos docentes-formadores tornou possível identificar alguns
aspectos que mereceram destaque por permitirem caminharmos para a conclusão de
nossa pesquisa. Procuramos então retomar o objetivo da pesquisa, a abordagem teórica
construída nos capítulos anteriores e as análises individuais de cada sujeito. Do
cruzamento desses dados, chegamos a algumas considerações:
A palavra educação é usada, pelos professores 1, 3 e 4, somente para designar
algo que eles consideram positivo; eles restringem as palavras educação/ educativo
30
Aqui, nos apoiamos em Severino (1998), quando define que projeto é “(...) um conjunto articulado de
propostas e programas de ação, delimitados, planejados, executados e avaliados em função de uma
finalidade, que se pretende alcançar e que é previamente delineada mediante a representação simbólica de
valores a serem efetivados” (p. 85).
106
vinculando-as à finalidades que concordam e defendem. Ou seja, quando se referem a
algum tipo de finalidade social ou prática que não concordam ou defendem, eles não as
denominam “educativa”. Com isso os professores acabam absolutizando uma
determinada relação entre educação e sociedade, como se sempre fizéssemos referência
a uma determinada visão ao utilizarmos os termos educação/ educativo. Na visão destes
professores, a educação é educação e tem valor se ela atender àquela finalidade
colocada por eles, qual seja, o sujeito ser crítico, consciente, etc. É como se a educação
para o sujeito ser obediente, submisso e acrítico não fosse um tipo de educação, com
uma certa finalidade. Esta posição, de certa maneira maniqueísta, desses professores
dificulta que percebam os diversos projetos em disputa na sociedade, o que, por sua vez,
impede que escolham com clareza um projeto para defender, pois a defesa do projeto
que acreditam fica naturalizada e absolutizada. Como se fosse o único projeto a ser
defendido. Os professores 1 e 4 são os que menos se apercebem disso, em seus
depoimentos, não luta de classes, não conflito, não outras formas de educar,
não outros fins sociais. O que para eles é uma educação que deve
obrigatoriamente se direcionar para a finalidade que eles consideram adequada.
Dessa forma, os docentes entrevistados (professores 1,3 e 4) não compreendem
que ambas são educação, tanto a que eles consideram adequada, quanto as outras. Não
percebem que educação para o mercado de trabalho, por exemplo, também é educação.
Quando não se compreende isso e se parte do princípio que somente a educação crítica,
conscientizadora, humanizadora é que é educação, se absolutiza, se naturaliza o
processo educacional.
A dimensão sociopolítica da educação indica a relação entre educação e
sociedade e esta relação toma, historicamente e no interior de cada sociedade formatos
distintos. Os grupos sociais, em um determinado momento histórico, defendem
diferentes projetos para a sociedade e, portanto, a educação se torna campo de disputa
política; lugar de embate entre várias definições e projetos para a sociedade e
expectativas e exigências distintas para a educação. Ao se defender uma educação
emancipadora ou libertadora se escolhe um projeto para defender, mas não bastará a
escolha; será preciso defendê-lo; participar da disputa social que acontece entre os
diferentes projetos. Assim, a partir de uma visão sobre a educação, se construirá um
papel político para o educador.
Neste sentido, os professores 1 e 4 absolutizam e naturalizam a educação, pois,
107
não analisam os projetos educacionais em conflito existentes na sociedade e afirmam
um determinado projeto carregando-o de uma verdade que não existe. Esta posição os
coloca claramente na categoria de otimistas ingênuos, (apesar de que somente um deles,
o Professor 4, optou por essa resposta no questionário), que acreditam de modo otimista
no papel da educação, mas são ingênuos porque não percebem a disputa, as
contradições e a historicidade do campo.
O Professor 3 chega a apontar a existência de projetos em disputa para a
educação, porém, naturaliza ao afirmar a humanização como finalidade, sem
caracterizá-la socialmente como um dos projetos existentes. Dessa forma ele apresenta
um discurso que indica um caminho crítico, porém acaba caindo na absolutização e
naturalização. Assim, apesar do Professor 3 apontar um certo conflito social por
diferentes educações, acaba absolutizando quando diz que o outro projeto, ao qual ele
não reconhece como educação, não é educação, assim como os professores 1 e 4.
Esses professores são timas das armadilhas teóricas e políticas no campo da
Pedagogia. Aderem à posições pedagogicamente críticas - e nisto está seu valor - que
buscam afirmar uma educação emancipadora. Mas tomam essa emancipação como algo
abstrato que emana de uma condição natural do humano. Como se estivéssemos
predestinados à emancipação e uma sociedade perversa nos impede de alcançar esse
objetivo. Falta perspectiva histórica a esses docentes, para que possam compreender que
querer uma educação emancipadora é uma escolha política.
O Professor 2 apresenta um olhar diferente, pois coloca com clareza o papel
político da educação na relação entre educação e sociedade. Afirma a necessidade de se
buscar uma formação de determinados” sujeitos para uma determinada” sociedade,
dividindo os projetos em transformadores e domesticadores.
No caso do Professor 2, a prática educativa é tomada como uma das
modalidades da prática social, pois é concretizada nessa prática uma ação
intencionalmente crítica, programada e conduzida com clareza, através de um projeto
direcionado com a finalidade de formar um professor mais consciente e crítico; ele
assume dessa forma, uma postura oposta a que aqui caracterizamos como otimista
ingênua, pois parece promover efetivamente tal formação.
Segundo Severino (1998):
108
O projeto educacional pode ser metaforicamente representado pelo campo
de força gravitacional criado por um imã. O núcleo, no caso, é uma
intencionalidade, ou seja, um sentido, uma significação, que articula todas
as ações, todas as medidas, todas as práticas, desenvolvidas por todos os
sujeitos que se encontram no mesmo campo. (p. 85).
Essa intencionalidade é que ao docente a possibilidades de romper com a
visão unilateral da realidade e com a passividade no processo educativo, criando
instrumentos preciosos de luta contra projetos sociais acríticos, limitados e apolíticos e
possibilitando que o professor se torne realmente um educador
31
, no sentido pleno do
termo.
A partir da análise, entendemos que os professores 1, 3 e 4 têm um olhar
ingênuo sobre a educação e o processo educativo, pois apesar de não lhes faltar a
compreensão da dimensão sociopolítica que envolve o trabalho docente, falta-lhes algo
que lhes torne agentes políticos capazes de colocar em prática essa dimensão. Falta-lhes
compreender que diferentes concepções (projetos) educacionais em conflito, com
diferentes ideologias, diferentes interesses sociais e finalidades.
As falas dos docentes-formadores denunciam um desconhecimento do seu
próprio poder de transformação política, pois, apesar de revelarem o desejo de
contribuir com a formação crítica dos educandos, não apresentam nenhum projeto claro
de trabalho contra-hegemônico, a favor de uma nova hegemonia social e política.
De acordo com Severino (1998):
Mesmo quando as condições histórico-sociais de uma determinada
sociedade estão deterioradas, marcadas pela degradação, pela
opressão e pela alienação, como é o caso da sociedade brasileira, o
projeto educacional se faz ainda mais necessário, devendo se
construir então como projeto fundamentalmente contra-ideológico,
ou seja, desmascarando, denunciando e criticando o projeto político
opressor e anunciando as exigências de um projeto político libertador.
(p. 86).
31
Nosella (2007) distingui professor de educador, colocando que o segundo se sobrepõe ao primeiro,
“justamente porque educador semanticamente explicita a necessidade do engajamento ético-político dos
professores. Com efeito, o conceito de educador transcende o de professor. Este se refere às
competências específicas adquiridas por uma pessoa, que as transmite a outras, ensinando-as e
treinando-as. Aquele se refere à responsabilidade de ensinar a leitura do mundo, para restringir-se a
leitura das palavras utilizando expressões freirianas -, é considerado um técnico asséptico, reducionista,
que reedita na prática pedagógica a velha tese da neutralidade científica” (p. 30).
109
Dessa forma, como se revela nas entrevistas, a tarefa sócio política da educação
é algo claro para todos os professores (1, 2, 3 e 4), contudo, a necessidade de buscar
novos elementos que possam alicerçar o trabalho de formação docente e construir um
outro caminho não se faz presente no discurso dos docentes 1, 3 e 4. Apesar dessa
dimensão estar presente em todas as práticas educativas, como afirmamos ao longo
desse estudo, muitas vezes ela é ingenuamente compreendida e concretamente
desvirtuada, disseminando, quando muito, um olhar unilateral, como é o caso dos
professores 1 e 3; ou em situações mais graves, um diálogo esvaziado e acrítico, no caso
do Professor 4.
Consideramos que na educação, dentro de uma sociedade, existem
permanentemente, conflitos de interesses: eu quero uma educação, você quer outra, o
outro quer outra, os empresários querem uma educação para o trabalho, outros querem
uma educação para consumir, outros querem educação para ser crítico e consciente,
outros querem educação religiosa porque acham que isso vai salvar o mundo, etc., assim
temos vários projetos educacionais em conflito na sociedade. Esses diferentes quereres
representam visões distintas de sociedade e de projeto futuro para a humanidade.
Neste contexto, os professores 1, 3 e 4, fazem a crítica, mas não caracterizam
bem os projetos que criticam e também não apresentam seus próprios projetos, passam
superficialmente, e soam como um slogan, porque não apresentam conteúdos para
caracterizar esses projetos, não contrapõe claramente aos outros projetos existentes
porque não caracterizam seus próprios projetos, o máximo que eles chegam a dizer que
é uma educação humanizadora como se existisse um ser humano ideal, pronto, que se
deve atingir. Eles não polemizam isso questionando “que ser humano é esse que querem
formar”. Eles falam de formar a consciência crítica sem explicitar “o que esperam desse
sujeito consciente”, também não explicitam “para que querem formar esses sujeitos com
consciência crítica”, nem “para qual sociedade”. Dessa forma, não fazem a ponte entre a
educação humanizadora, o sujeito consciente/ crítico e a sociedade que se deseja que
estes sujeitos construam.
As possibilidades e limitações destas visões (expressas por nosso quatro sujeitos
docentes) estão postas em nosso momento histórico e indicam um caminhar importante
de nossa sociedade. De uma visão conservadora de educação, carregada de moralismos
e autoritarismo, para uma visão progressista. Sem dúvida, as posições expressas
indicam este caminhar. Mas apontam ainda limitações, na medida em que o discurso da
110
educação emancipadora aparece forte, mas ainda abstrato e, de certa forma,
naturalizado.
Percebe-se as influências pós ditadura militar, a abertura, o acesso a leituras que
defendem a formação de sujeitos mais conscientes críticos, principalmente nos
programas dos quatro docentes-formadores, tais como Paulo Freire, Dermeval Saviani,
Terezinha Rios, Bárbara Freitag,
etc. Tudo isso, com certeza, auxilia, e muito, o
discurso do professor. É evidente que hoje, se estabelece para esses
docentes-formadores, uma relação entre a educação que se faz e a sociedade, o que a
sociedade precisa, que a educação pode contribuir com essa sociedade, porém, o
“como”, é muito pouco vislumbrado, ainda é muito tênue. De qualquer modo, já se
estabelece uma relação.
Contudo, 3 dos 4 professores ainda não conseguem trazer para sua análise as
contradições, os conflitos sociais, os diferentes projetos educacionais existentes na
sociedade, que a educação que está posta é um resultado desse confronto, de conflito de
interesses, dessa disputa social. Não percebem que a lei é imposta, é resultado de
diferentes grupos querendo garantir uma determinada educação. Não percebem que são
visões diferentes de educação, de sociedade, de sujeitos; os professores não chegam a
isso, mas já percebem uma relação, percebem a existência de formas diferentes do que o
que eles estão denominando como educação, mas não as concebem como outros
projetos existentes.
Por outro lado, o fato de perceberem (não com tanta clareza) uma sociedade, um
sujeito numa determinada direção; quando dizem como o aluno chega à universidade
hoje e que a educação deles pretende romper com isso. Porém, não percebem isso
claramente e, então, não assumem com clareza e com positividade a necessidade de
construir um projeto e de se aliar a pessoas que têm um projeto semelhante para fazer
um determinado trabalho em educação, pois dessa forma, transformam a educação
numa coisa técnica, como se a questão fosse apenas de se qualificar para fazer uma boa
educação como se fosse um problema cnico (Professora 1); ou de juntar gente para
discutir (Professora 3), virou uma técnica.
A necessidade dos sujeitos se exporem, serem ativos, o processo pedagógico,
tudo isso está resumido numa idéia técnica de trabalhar em grupo, de o sujeito encontrar
o grupo. Criticam o sujeito que chega para ser formado sem perceber com clareza que
111
aquele sujeito foi formado (Professor 4), foi educado numa sociedade, de que o projeto
dessa sociedade é um projeto que rompe com seus ideais de educação, pois tem outros
interesses. Não compreendem que não é que o aluno chegue mal educado, mas sim que
ele chega educado de outra forma. Assim os professores não percebem que eles é que
são diferentes.
Dessa forma, são ingênuos na política que defendem, porque não compreendem
que estão disputando, que têm de se aliar a quem tem o mesmo projeto, que eles têm de
criticar o projeto de educação do qual estão discordando.
Caminham assim, na direção da naturalização, mas ao mesmo tempo,
contraditoriamente, percebem que é necessário trabalho coletivo, apontam o trabalho
coletivo como uma saída viável (Professores 1, 2 e 3).
As aproximações e contradições presentes no discurso dos docentes-formadores
entrevistados podem ser assim sintetizadas:
Todos os professores entrevistados enaltecem a educação apesar de
ressaltarem seus limites;
A educação é utilizada para a finalidade da qual concordam, no caso dos
professores 1, 3 e 4. Quando não concordam, indicam como “descaminho”. Neste
sentido, absolutizam a educação como humanizadora;
Os professores 1, 3 e 4, esperam algo do sujeito consciente e crítico, mas
não especificam “consciente e crítico de que?”;
Os professores 1 e 4 não formulam (e nisso não se dão conta da existência
de projetos em conflito) um projeto social para a educação. Generalizam apenas como
um trabalho para humanizar e conscientizar;
Para os Professores 1, 3 e 4 a imposição de outro “projeto” é vista como
fracasso de seu trabalho ou da educação como um todo;
O Professor 2 coloca com clareza o papel político da educação na relação
entre educação e sociedade;
O Professor 2 divide os projetos em transformadores e domesticadores.
112
Sem dúvida, são inúmeros os fatores que estão envolvidos na construção das
posições aqui expressas: a pressão das empresas educacionais onde alguns deles
trabalham, a falta de trabalho coletivo como recurso de qualificação, o excesso de
alunos por classe observado em alguns casos, o pouco acesso á literatura mais
atualizada (a julgar pelos programas), a falta de espaços de debate e de embate, todos
são fatores que impedem o avanço mais rápido na direção do desenvolvimento de suas
posições mais progressistas.
Sem dúvida, a Pedagogia, campo desses profissionais, também apresenta em
suas teorizações limites semelhantes aos que encontramos em nossos dados. As visões
atuais no campo da Pedagogia ainda naturalizam os humanos. As visões que defendem
o “aprender a aprender” têm sido alvo de críticas exatamente pelo esvaziamento e
conseqüente naturalização que fazem dos sujeitos. Valorizam a atividade de aprender,
como se ela se justificasse por si mesma. Aprendemos a aprender a partir de conteúdos
aprendidos. “Nesse contexto, defender o ‘aprender a aprender’ é decretar a derrota do
saber e contribuir decisivamente para o processo de esvaziamento dos indivíduos (...).”
(Duarte, 2000, p. 147). Ou ainda, contribuindo para “(...) a manutenção da hegemonia
da concepção liberal-burguesa de homem, de sociedade e de educação.” (Idem, p. 24).
São muitos os determinantes que contribuem para compreender as visões que aqui
encontramos.
Para Duarte (2000) o ideário "aprender a aprender":
(...) reside na desvalorização da transmissão do saber objetivo, na
diluição do papel da escola em transmitir esse saber, na
descaracterização do papel do professor como alguém que detém um
saber a ser transmitido a seus alunos, na própria negação do ato de
ensinar (...) Em última instância o lema "aprender a aprender" é a
expressão, no terreno educacional da crise cultural da sociedade atual.
(Duarte, 2000, p.08-9).
Essa crise cultural da sociedade atual, da qual nos fala Duarte, reflete-se nas
normas legais postas e impostas à educação (escola) e aos profissionais das instituições
escolares; nas mediações e práticas educativas; nas tendências sóciopolíticas e em suas
decorrências para a educação atual; e também refletindo drasticamente no trabalho de
formação docente, como constatamos em nossa análise.
113
Apesar de compreendermos que os docentes-formadores não compactuam
conscientemente com as determinações impostas pela ideologia e demandas da
sociedade capitalista contemporânea, reduzem sua participação à criticar tal ideologia,
sem efetivamente apresentar posições objetivas ou ferramentas práticas para lutar e
transformar esse quadro (professores 1, 3 e 4). Neste aspecto, não dão sua parcela de
contribuição e perdem de vista os limites objetivos da ação político-pedagógica docente,
caindo no engodo de oposições que são contraditórias com o tipo se sociedade por eles
mesmos desejada.
É evidente que esses docentes-formadores são capazes de contribuir efetivamente e
radicalmente com uma sociedade e uma educação que se relacione de maneira mais
humanizadora, garantindo aos homens a possibilidade de viverem uma vida mais feliz,
consciente e crítica, como eles mesmos colocam. No entanto, o que impede que isso
aconteça?
Segundo Rossler (2004):
Infelizmente, a apologia retórica e fraseológica da educação, que
acaba por afastar os indivíduos da verdadeira luta social por
condições de vida humanizadas e humanizadoras, é realmente uma
marca registrada do universo ideológico contemporâneo. Os
discursos oficiais e não oficiais, veiculados pela mídia no presente,
colocam a educação no centro das preocupações políticas e sociais,
isto é, como a chave para o desenvolvimento tecnológico, científico,
econômico e cultural de nosso país. Em contrapartida, como tudo isso
se trata de mera retórica, ou seja, de mera fraseologia ideológica, na
prática convivemos com uma determinada política e uma dada
realidade educacional objetiva que em nada se aproximam do que
defende o discurso em voga. De fato, convivemos dia a dia com uma
situação digna de sérias preocupações. Principalmente no que diz
respeito às escolas e as salas de aula, onde o reflexo do quadro
político, econômico e social do país é mais visível e crítico. (p. 82).
Essa fraseologia ideológica da qual nos fala Rossler, desqualifica a educação e o
educador, retirando-lhes a capacidade de enxergar sua real função política, pedagógica e
social, posto que, camufla os interesses políticos e econômicos por traz dos discursos
oficiais e não oficiais, subtraindo a força e minimizando a responsabilidade da educação
(escola) como instrumento de transformação social. O enfraquecimento se dá, devido a
sedução do discurso e com isso o esvaziamento da ação concreto, ou seja, repete-se
como “papagaio” o discurso ideológico da educação (escola) para todos, frisando “um
114
mundo melhor” e vincula-se a isso, a alienação e a ilusão de estar se contrapondo ao
tipo de sociedade que não se deseja. Contudo, contraditoriamente se perde o foco não
sabendo mais “contra que” e “contra quem”, ou a favor de que e de quem” realmente
se deveria lutar.
Por esse motivo, o educador não pode fugir ao compromisso de escolher o lado
em que está, “contra quem” e a “favor de quem”. Tem de ter muito claro o seu
compromisso sóciopolítico na luta ou na manutenção da realidade social atual, e a partir
dessa escolha, evidenciar sua opção ideológica.
115
CONCLUSÃO
Torna-se explícito para nós, por meio desta pesquisa, que o docente-formador,
que não tem clara a finalidade da ação educativa que promove, assume uma posição
ingênua em relação ao papel político da educação e da sua tarefa como educador;
perdendo totalmente a capacidade de agir politicamente.
Neste contexto, promovem e são resultado de uma formação de professores
totalmente despossuídos de um verdadeiro olhar crítico sobre o trabalho docente.
Ingênuos e impossibilitados de um questionamento acerca do seu próprio trabalho, os
professores apenas reproduzem as demandas do sistema, impedidos que estão de
expressar ou mesmo compreender o ensino como uma prática docente autêntica e
autônoma que se articule ao contexto social mais amplo.
Limitados dessa forma às suas concepções unilaterais, disseminam, ainda que
involuntariamente, uma visão completamente fragmentada da educação e da sociedade,
pois acreditam piamente que só o seu modelo e sua visão sobre a educação são trabalhos
de formação da sociedade. Não compreendem que, o que existe, são vários modelos e
visões em disputa e que se unindo em torno de uma causa comum, num trabalho
coletivo, poderiam se contrapor aos modelos massificadores e alienantes. Chegam até a
falar da importância desse trabalho coletivo, porém desacreditam dele quando falam de
si mesmos e de seus contextos de trabalho.
Nesse movimento, os futuros pedagogos vão se formando e se orientando por
meio de um processo de ensino-aprendizagem de sala de aula descomprometido com
uma posição política intrínseca ao ato pedagógico. Por outro lado, essa capacidade de
vincular o pedagógico ao político é imprescindível ao educador para que se efetive no
cotidiano da sala de aula, a cada momento, a cada procedimento, por mais simples que
seja, a tarefa sociopolítica da educação.
Para tanto, é necessário um trabalho coletivo a fim de superar o discurso
ingênuo, individualizado, o olhar unilateral, a desvalorização, a descrença e a
desesperança tão presentes no trabalho docente hoje. Faz-se necessário o
docente-formador se auto pensar como um agente de transformação social, a qual se
apresenta de forma insatisfatória. É importante criar movimentos de resistência conjunta
nas Universidades, sejam elas públicas ou privadas e isso se faz possível no meio
116
acadêmico se desenvolvermos iniciativas que envolvam a organização e a participação
coletiva dos professores, diretores, coordenadores, alunos e de todos os demais
envolvidos no processo educativo.
Assim, as reflexões deste trabalho partiram do desafio da formação crítica do
educador para sua tarefa sociopolítica, procurando demonstrar que o educador tem,
socialmente, a responsabilidade da práxis
32
educativa, ultrapassando o discurso ingênuo
e atuando em direção a real transformação da realidade. Não como “salvador da pátria”,
mas como um profissional crítico e consciente de seu papel no contexto sociocultural.
Essa é uma condição sine qua non para o docente-formador desenvolver uma prática
educativa comprometida com a modificação do status quo. Dessa forma, “o pedagogo,
fazendo ‘prática social’, está exercendo seu papel específico na sociedade, que é
vincular o ato educativo e o ato político, a teoria e a prática da transformação.”
(Gadotti, 2005, p. 54).
Neste sentido, acreditamos que uma das tarefas básicas na formação crítica do
educador seja a presença consciente e clara da dimensão sociopolítica no trabalho que
os docentes-formadores desenvolvem, contudo, vinculada a um projeto concreto de
atuação, ou seja, vinculada ao ato pedagógico.
Nesta perspectiva, retomamos a pergunta de Nosella (2007), posta logo no início
desse trabalho: “quais as características do ato pedagógico de um professor
comprometido politicamente nesta sociedade do século XXI?.” (p. 40).
Essa não é uma pergunta fácil e as respostas serão muitas, pois dependerão do
que se quer para o século XXI. Nossa defesa é por um compromisso político do
educador deste século, que ultrapasse as barreiras da alienação e do discurso vazio para
tornar-se algo vivo e concreto em nossos fazeres pedagógicos. À medida que esta ação
pedagógica se aliar à consciência crítica, os instrumentos didático-pedagógicos serão
realmente atos políticos de transformação social, engajados num projeto maior de
educação e de valorização do trabalho docente e da instituição escolar em qualquer
nível. através desse viés crítico se desvelará a ingenuidade no processo educativo e
32
Entendemos a práxis como atividade prático-crítica, inspirados em Marx (1980), na primeira das Teses
Contra Feuerbach.
117
se poderá ad-mirar
33
novos horizontes e possibilidades de ser e estar na educação, na
instituição escolar e na sociedade.
Aqui, fazemos nossas, as palavras de Freire (2007b):
Para o ponto de vista crítico que aqui defendemos, a operação de mirar
implica outra a de “ad-mirar”. Ad-miramos e ao adentrar-nos no
ad-mirado o miramos de dentro e desde dentro, o que nos faz ver. Na
ingenuidade, que é uma forma desarmada de enfrentamento com a
realidade, miramos apenas e, porque não ad-miramos, não podemos mirar
o mirado em sua intimidade, o que não nos leva a ver o que foi puramente
mirado. (p. 43-4).
Portanto, o maior desafio para o professor em sua prática profissional é mirar e
ad-mirar criticamente seu trabalho vinculado a uma finalidade: a tarefa sociopolítica da
educação e do educar, que, (...) faz parte de sua tarefa docente não apenas ensinar
conteúdos, mas também ensinar a pensar (...).” (Freire, 1996, p. 26-7).
Assim, por mais que se tenha clareza da dimensão sociopolítica da educação, é
preciso ultrapassar essa concepção teórica ingênua, e fazer dessa concepção ato
pedagógico e projeto político de trabalho.
Por outro lado, tal dificuldade em ultrapassar o discurso e vincular esse discurso
a uma prática cotidiana é, a nosso ver, o grande desafio desse século e suscita não
outras pesquisas, mas, outros encontros, questionamentos, conferências, seminários,
debates e reflexões que preparem o educador para além da discussão, fazer valer a sua
voz, concretizando seu discurso no seu próprio trabalho de formação-docente. Pois, é
imprescindível que o educador se aperceba do mecanismo político inerente ao ato
pedagógico para transformar e reelaborar sua própria ação docente, em função dos fins a
que se propõe em seu discurso. Já que, pode-se ensinar de várias formas, mas essas
formas de ensinar são mais adequadas ou menos adequadas a determinados fins sociais,
fins os quais, precisam estar claros aos docentes, como também, sua posição e sua
contribuição para com estes.
Neste sentido, o trabalho educativo não pode permanecer apenas no vel da
negação ideológica do que está posto, pois, é preciso ir além da negação, gerando algo
novo a partir do que existe. A negação pela negação gera o imobilismo, a
desesperança, um sentimento de impotência frente ao trabalho docente e a finalidade
33
Termo cunhado por Freire (2007b, p. 43).
118
maior da educação, norteando a prática pedagógica pelo senso comum, embora nem
sempre isso é percebido. Neste contexto, é necessário aprender a dirigir
intencionalmente a dimensão sociopolítica intrínseca ao trabalho educativo à relação e a
forma concretas desse trabalho.
Para um otimismo crítico, o educador é alguém que tem um papel político
pedagógico, ou seja, nossa atividade não é neutra nem absolutamente
circunscrita. A educação escolar e os educadores têm, assim, uma
autonomia relativa; podemos representá-la com a inserção da Escola no
interior da Sociedade, com uma via de mão dupla e não como na primeira
concepção (otimismo ingênuo), com a Escola totalmente independente,
nem como na segunda (pessimismo ingênuo), com ela dominada
inteiramente. Nós educadores, estamos, dessa forma, mergulhados nessa
dupla faceta; nossa autonomia é relativa e, evidentemente, nossa
determinação também o é. Por isso, não é uma questão menor o pensar
nossa prática nessa contradição; o prioritário, para aqueles que discordam
da forma como a nossa Sociedade se organiza, é construir coletivamente os
espaços efetivos de inovação na prática educativa que cada um desenvolve
na sua própria instituição. (Cortella, 2006, p. 136-7).
Severino (2001) corrobora essas idéias, acrescentando que dependendo do
esclarecimento crítico dos agentes educacionais e de seu compromisso político, estes
podem criticar uma ideologia vigente, desmascará-la e gerar uma nova consciência entre
os cidadãos.
Nesse sentido, há uma relação visceral entre o processo educacional e o da
sociedade. Existe uma pulsação no jogo entre as forças sociais e a
educação. Isso ocorre de tal modo que, de um lado, a forma de organizar a
educação reproduz integralmente a estruturação da sociedade; de outro
lado, a atuação educacional pode ter efeitos desestruturadores, tornando-se
fator de mudança social. Isso significa que o processo histórico depende
também das ações dos sujeitos, sendo a educação uma mediação criadora
e transformadora da história
34
. (Severino, 2001, p. 72).
Portanto, nesta perspectiva, qual o olhar dos docentes-formadores sobre seu
papel político-pedagógico?
Para Cortella (2006), a resposta a essa questão “está na dependência da
compreensão política que tivermos da finalidade de nosso trabalho pedagógico, isto é,
na concepção sobre a relação entre Sociedade e Escola que adotarmos.” (p. 130).
34
Grifos nossos.
119
Em consonância com esse autor, consideramos que a compreensão da dimensão
sociopolítica do trabalho docente depende de maneira direta da finalidade a que se
propõe o docente em seu trabalho e de como ele percebe a relação entre a educação
(escola) e a sociedade. Se o docente tem uma visão ingênua dessa relação e não
direciona intencionalmente seu trabalho para a transformação social, corre o risco de
reproduzir as demandas sociais impostas pela ideologia dominante e pelo senso-comum.
Por outro lado, se tem clara a finalidade da ação pedagógica e direciona essa
ação, considerando as contradições e os projetos educacionais existentes e em disputa
na sociedade, questionando-se sobre a finalidade do trabalho que realiza enquanto
docente-formador em função da compreensão que tem sobre: “quem quer formar?”,
“para quê quer formar?”, “a favor de quê quer formar?” e “contra o quê quer formar?”;
torna-se capaz de vincular o ato educativo ao ato político. Apesar disso não bastar para
transformar a sociedade, resolver os problemas econômicos e as desigualdades sociais,
enfim, mudar o mundo; é um caminho para transformar a educação (escola) e esse é um
passo enorme rumo a uma formação humana mais integral, consciente e crítica.
Acreditamos que nossa contribuição com essa pesquisa foi indicar em nossos
debates que é preciso, ao pensar o avanço da educação na direção do que queremos,
considerar as concepções que os professores apresentam hoje. É preciso partir dessas
noções, sem ignorá-las ou desvalorizá-las. É preciso compreender que a educação, como
teoria e como prática em nossa sociedade, possui uma dimensão subjetiva que está nas
concepções que os professores apresentam sobre ela.
O avanço exige que tomemos conta desta dimensão. É preciso fazer avançar as
concepções que os professores, estes trabalhadores do cotidiano e que fazem a
educação, têm de suas tarefas na sociedade. Avançar não pode ser pensado como criar
novas teorias e técnicas em educação ou formular novas políticas apenas. Avançar é um
processo que inclui, a todos e a todas, as dimensões que a educação apresenta. A
formação e qualificação dos professores devem ser tomadas como uma tarefa urgente.
120
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UNESCO (United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization). (2007).
Disponível em:
<http://www.portal.unesco.org/education/en/ev.php-URLID=33859&URLDO=DOTOP
IC&URLsection=201.htm>. Acesso em 11/11/2007.
125
ANEXO I
126
Prezado (a) Professor (a)
Este questionário é parte integrante de uma pesquisa de mestrado em realização no programa de
Educação: Psicologia da Educação da PUC/SP. Essa pesquisa visa ampliar nossa compreensão sobre a
formação e o trabalho docente. Pedimos sua colaboração, no sentido de responder a todas as questões
propostas e, caso aceite, participar posteriormente de uma entrevista de aprofundamento. Para tanto,
preencha os campos abaixo.
Obrigada por sua colaboração!
Makeliny Nogueira
makeliny@gmail.com
A. Caracterização do docente
1. Ano de nascimento: ______________ 2. Sexo:__________________________________
3. Anos de experiência docente no Ensino Superior: ___________________________________
4. Natureza da(s) instituição(s) na qual trabalha: ______________________________________
5. Disciplina(s) que ministra em curso de Pedagogia: __________________________________
6. Número de aulas que ministra em curso de Pedagogia por semana: _____________________
7. Número total de alunos que possui no momento? ___________________________________
B. Formação para docência em ensino superior
1. Graduado (a) em: ____________________________________________________________
2. Instituição __________________________________________________________________
3. Sua formação para exercer a docência em ensino superior:
( ) Especialização em: _______________________________________________________
( ) Mestrado em: ___________________________________________________________
( ) Doutorado em: __________________________________________________________
( ) Pós-Doutorado em: _______________________________________________________
QUESTIONÁRIO
1. O que é ser professor?
2. Quem determina o Programa da disciplina? Como você lida com ele?
3. No desenvolvimento do programa quais os principais temas que você trabalha?
4. Qual a relação do que você ensina no seu programa com as demandas da sociedade brasileira?
5. Que tipo de aluno (professor) deseja formar a partir do seu trabalho como formador de docentes?
6. Considerando suas preocupações e as finalidades do seu trabalho, escolha dentre as alternativas
abaixo a que melhor representa seu pensamento sobre a instituição escolar e a formação dos
pedagogos:
a) a instituição escolar tem capacidade de mudar e melhorar a sociedade, na medida em que forma
profissionais qualificados que com seu trabalho transformam a realidade social.
b) a instituição escolar reproduz a desigualdade social, prepara a força de trabalho necessária para o
capital e reforça a ideologia dominante em nossa sociedade.
c) a instituição escolar contém contradições, contribuindo para melhorar a sociedade ao mesmo
tempo em que reproduz o que está estabelecido.
Por favor, justifique sua resposta.
Nome: ____________________________________________________________________________
Fone (s): _________________________________ e-mail: __________________________________
127
ANEXO II
128
ROTEIRO PARA ENTREVISTA
1. Como você enquanto professor-formador (a) de professores (as) compreende a
relação Educação x Sociedade?
2. Qual a importância da educação para a sociedade?
3. As práticas educativas incentivam ou determinam um tipo de sociedade? De
sujeito?
4. Você enquanto educador (a) coloca que intenções ou objetivos para seu trabalho
no sentido do incentivo de um tipo de cidadão e um tipo de sociedade?
5. Como isso aparece no seu programa de ensino? Comente seu programa na relação
com essas questões anteriores.
6. Qual sua avaliação sobre os resultados de seu trabalho, nesse sentido?
7. Quais são as dificuldades que encontra?
8. Quais as facilidades?
9. Especificando um pouco mais, qual a finalidade da sua disciplina na formação dos
futuros professores? Qual a finalidade do trabalho educacional na formação da
sociedade?
10. Como as demandas/urgências/interesses/problemas da sociedade interferem na
educação?
129
ANEXO III
130
> Revista Veja, Edição 2073
Prontos para o século XIX
Muitos professores e seus compêndios enxergam o mundo de hoje como ele era no tempo dos tílburis. Com a
justificativa de "incentivar a cidadania", incutem ideologias anacrônicas e preconceitos esquerdistas nos alunos
Monica Weinberg e Camila Pereira
Tema para reflexão: vale a pena usar
chocadeiras artificiais para acelerar a
produção de frango? Deu-se com
isso o início de uma das aulas de
geografia no Colégio Ateneu
Salesiano Dom Bosco, de Goiânia,
escola particular que aparece entre as
melhores do país em rankings
oficiais. Da platéia, formada por
alunos às vésperas do vestibular,
alguém diz: "Com as chocadeiras, o
homem altera o ritmo da vida pelo
lucro". O professor Márcio Santos
vibra. "Você disse tudo! O homem
se perdeu na necessidade de fazer
negócio, ter lucro, exportar." E
põe-se a cantar freneticamente
Homem Primata / Capitalismo
Selvagem / Ôôô (dos Titãs), no que é
acompanhado por um enérgico coro
de estudantes. Cena muito parecida
teve lugar em uma classe do Colégio
Anchieta, de Porto Alegre, outro que
figura entre os melhores do país. Lá,
a aula de história era animada por
um jogral. No comando, o professor
Paulo Fiovaranti. Ele pergunta:
"Quem provoca o desemprego dos
trabalhadores, gurizada?".
Respondem os alunos: "A máquina".
Indaga, mais uma vez, o professor:
"Quem são os donos das máquinas?"
E os estudantes: "Os empresários!".
É a deixa para Fiovaranti encerrar
com a lição de casa: "Então, quem
tem pai empresário aqui deve
questionar se ele está fazendo isso".
Fim de aula.
Os dois episódios, ambos
presenciados por VEJA, não são
raridade nas escolas brasileiras. Ao
contrário. Eles exemplificam uma
tendência prevalente entre os
professores brasileiros de
esquerdizar a cabeça das crianças.
Parece bobagem, uma curiosidade
até pitoresca num mundo em que a
empregabilidade e o sucesso na vida
profissional dependem cada vez
explicar mas de mudar o mundo para
melhor, acelerando a marcha da
história rumo a uma sociedade sem
classes. Bem, estamos no século
XXI, o comunismo destruiu a si
próprio em miséria, assassinatos e
injustiças durante suas experiências
reais no século passado. É
embaraçoso que o
marxismo-leninismo sobreviva
apenas em Cuba, na Coréia do Norte
e nas salas de aula de escolas
brasileiras. As chocadeiras
produzem os frangos vendidos a
menos de 5 reais nos supermercados
brasileiros, e isso propicia a dose
mínima de proteína a famílias que,
de outra forma, estariam mal
nutridas. A realidade não interessa
nas aulas como a do professor
Márcio Santos. O que interessa?
Passar a idéia de que as máquinas
tiram empregos. Elas tiram? Tiraram
no começo dos processos de
robotização e automação de fábricas
nos anos 90. Hoje, sem robôs e
máquinas, os empregos nem sequer
seriam criados. Mas dizer isso pode
desagradar ao espírito do velho
barbudo enterrado no novo
Cemitério de Highgate, em Londres.
Os professores esquerdistas veneram
muito aquele senhor que viveu à
custa de um amigo industrial, fez um
filho na empregada da casa e,
atacado pela furunculose, sofreu
como um mártir boa parte da
existência. Gostam muito dele,
fariam tudo por ele, menos, é claro,
lê-lo – pois Karl Marx é um autor
rigoroso, complexo, profundo que,
mesmo tendo apenas uma de suas
idéias ainda levada a sério hoje – a
Teoria da Alienação –, exige muito
esforço para ser compreendido. "A
salada ideológica resulta da leitura
de resumos dos grandes
pensadores", diz o filósofo Roberto
Romano. Gente que vê maldade em
chocadeiras e mal em empresários
aula e acham isso normal. Os
professores, em maior proporção,
reconhecem que doutrinam mesmo as
crianças e acham que isso é sua missão
principal – algo muito mais vital do que
ensinar a interpretar um texto ou ser um
bamba em matemática. Para 78% dos
professores, o discurso engajado faz
sentido, uma vez que atribuem à escola,
antes de tudo, a função de "formar
cidadãos" – à frente de "ensinar a
matéria" ou "preparar as crianças para o
futuro". Muito bonito se não estivessem
nesse processo preparando os alunos
para um mundo que acabou e
diminuindo suas chances de enfrentar a
realidade da vida depois que saírem do
ambiente escolar. Para atacar um
problema, o primeiro passo é
reconhecer sua existência. Esse é o
mérito da pesquisa CNT/Sensus.
Adversária do exercício intelectual, a
ideologização do ensino pode ser
resultado em parte também do
despreparo dos professores para o
desempenho da função. No ensino
básico, 52% lecionam matérias para as
quais não receberam formação
específica – 22% deles nunca
freqüentaram faculdade. Para esses, os
chavões de esquerda servem como uma
espécie de muleta, um recurso a que se
recorre na falta de informação. "Repetir
meia dúzia de slogans é muito mais
fácil do que estudar e ler grandes obras.
Por isso, a ideologização é mais comum
onde impera a ignorância", diz o
historiador Marco Antonio Villa. A
questão não é exatamente nova na
educação. Meio século atrás, a filósofa
alemã Hannah Arendt já alertava para o
equívoco de fazer das aulas um lugar
para a doutrinação ideológica, qualquer
que fosse o matiz. Em A Crise na
Educação, ela dizia: "Em vez de (o
professor) juntar-se a seus iguais,
assumindo o esforço da persuasão e
correndo o risco do fracasso, há a
intervenção ditatorial, baseada na
absoluta superioridade do adulto". Ao
131
mais do desempenho técnico, do
rigor intelectual, da atualização do
pensamento e do conhecimento. Não
é bobagem. A doutrinação
esquerdista é predominante em todo
o sistema escolar privado e
particular. É algo que os professores
levam mais a sério do que o ensino
das matérias em classe, conforme
revela a pesquisa CNT/Sensus
encomendada por VEJA. Pobres
alunos.
Eles estão sendo preparados para
viver no fim do século XIX, quando
o marxismo surgiu como uma
ideologia modernizante, capaz não
apenas de
que usam máquinas em suas fábricas
no século XXI não pode ter lido
Karl Marx. É de supor que não
tenham lido muito, quase nada. Mas
são esses senhores que ensinam
nossos filhos nas melhores escolas
brasileiras – sem, diga-se, que os
pais se incomodem com isso.
A pesquisa CNT/Sensus ouviu 3 000
pessoas de 24 estados brasileiros,
entre pais, alunos e professores de
escolas públicas e particulares. Sua
conclusão nesse particular é
espantosa. Os pais (61%) sabem que
os professores fazem discursos
politicamente engajados em sala de
refletirem sobre o atual cenário, os
especialistas concordam com a idéia
central da filósofa. Está claro, e a
própria experiência mostra isso, que o
viés político retira da escola aquilo que
deveria, afinal, ser seu atributo número
1: ensinar a pensar – verbo cuja origem,
do latim, significa justamente pesar.
Diz o sociólogo Simon Schwartzman:
"O verdadeiro exercício intelectual se
faz ao colocar as idéias e os juízos
numa balança, algo que só é possível
com uma ampla liberdade de
investigação e de crítica".
Não é o caso na maioria das salas de
aula. Muitos professores brasileiros
se encantam com personagens que
em classe mereceriam um tratamento
mais crítico, como o guerrilheiro
argentino Che Guevara, que na
pesquisa aparece com 86% de
citações positivas, 14% de neutras e
zero, nenhum ponto negativo. Ou
idolatram personagens arcanos sem
contribuição efetiva à civilização
ocidental, como o educador Paulo
Freire, autor de um método de
doutrinação esquerdista disfarçado
de alfabetização. Entre os
professores brasileiros ouvidos na
pesquisa, Freire goleia o físico
teórico alemão Albert Einstein,
talvez o maior gênio da história da
humanidade. Paulo Freire 29 x 6
Einstein. Só isso já seria evidência
suficiente de que se está diante de
uma distorção gigantesca das
prioridades educacionais dos
senhores docentes, de uma
deformação no espaço-tempo tão
poderosa que talvez ajude a explicar
o fato de eles viverem no passado.
Entre as figuras históricas e da
atualidade mais citadas em classe
está, como não poderia deixar de ser,
o presidente Luiz Inácio Lula da
Silva. As referências a Lula são
contidas. O presidente brasileiro
obtém aprovação menor entre os
professores, segundo relatam os
estudantes, do que aquela com que a
sociedade brasileira em geral o
brinda. Ele tem 70% de avaliação
positiva dos brasileiros, mas na boca
dos professores esse índice cai para
30% – com 27% de citações
negativas e 43% de neutras.
Ressalte-se aqui que é um ponto
louvável para os mestres o fato de,
como mostram os números relativos
a Lula, eles não fazerem
proselitismo eleitoral em classe
mesmo que seja preciso relevar o
fato de o ditador venezuelano Hugo
Chávez ter merecido 51% de
citações positivas. A neutralidade e
o comedimento em relação a Lula
desautorizam a interpretação de que
os professores tentam direcionar o
voto dos alunos, o que seria
desastroso. É sinal de que sua
pregação, mesmo equivocada, se
mantém no nível das idéias – o que é
excelente.
"Eu e todos os meus colegas
professores temos, sim, uma visão
de esquerda – e seria impossível isso
não aparecer em nossos livros. Faço
esforço para mostrar o outro lado",
diz a geógrafa Sonia Castellar, que
há vinte anos dá aulas na faculdade
de pedagogia da Universidade de
São Paulo (USP) e escreveu
Geografia, um dos best-sellers nas
escolas particulares (livro que tem
dois de seus trechos comentados por
VEJA na reportagem seguinte).
"Reconheço o viés esquerdista nos
livros e apostilas, fruto da formação
marxista dos professores. Mas não
temos nenhuma intenção de formar
uma
geração de jovens socialistas", diz
Miguel Cerezo, responsável pelo
conteúdo publicado nas apostilas do
COC (de onde foram extraídos quatro
trechos comentados pela revista). À luz
de outra pesquisa em profundidade feita
pelo Ibope em colaboração com a
revista Nova Escola, editada pela
Fundação Victor Civita, os professores
da rede pública revelam que, para eles,
o principal problema da sala de aula é,
de longe (77%), a ausência dos pais no
processo educativo. Repousam na
colaboração entre pais e professores a
correção dos rumos do ensino no país e
a aceleração da curva de melhora de
desempenho que começa a se desenhar.
A questão do excesso de ideologização
é um desses problemas que podem ser
abordados em conjunto por pais e
professores. Demanda para o diálogo
existe. O advogado Miguel Nagib
fundou, há quatro anos, em Brasília, a
ONG Escola Sem Partido, com o
objetivo de chamar atenção para a
ideologização do ensino na sala de aula.
Nagib se incomodou com os sinais do
problema na escola particular de sua
filha, então com 15 anos, onde o
professor de história gostava de
comparar Che Guevara a São Francisco
de Assis. Foi ao colégio reclamar. Diz
Nagib: "As escolas precisam ficar
sabendo que muitos pais não
concordam com essa visão". Com
reportagem de Camila Antunes e
Marcos Todeschini
132
> Revista Veja, Edição 2073
A neutralidade como dever
"A pesquisa CNT/Sensus publicada nesta edição corrobora esse quadro: só 18% dos professores da escola pública
dizem que seu discurso em sala de aula é politicamente neutro. Setenta e quatro por cento escolhem ‘formar cidadãos’
como missão do professor – apenas 8,4% dizem que é ‘ensinar a matéria’. Os resultados são praticamente idênticos
nas escolas particulares"
Gustavo Ioschpe
Sabendo que, em uma população de
190 milhões de habitantes, temos
mais de 50 milhões de alunos no
ensino básico e aproximadamente
100 milhões de pais desses alunos e
apenas 2 milhões de professores, e
sabendo que vivemos em uma
democracia, a pergunta que se impõe
a todo professor, diretor, secretário
municipal, estadual ou ministro da
Educação do país de agora em diante
é: como se pode justificar que uma
minoria imponha sobre a maioria a
sua visão da educação? Em uma
sociedade democrática, quem decide
que tipo de educação será oferecido
no sistema público: o público ou as
corporações do setor? Como se
justifica que professores e
administradores escolares ditem uma
política educacional à revelia dos
desejos expressos da sociedade
brasileira? A educação para a
cidadania não pressupõe, afinal, o
respeito à vontade coletiva e a
valorização da sabedoria popular?
Quando se discutem as razões pelas
quais nosso sistema escolar não
consegue ensinar a maioria dos
alunos a ler e a escrever ou a realizar
operações aritméticas simples,
muitos supostos fatores vêm à baila:
o salário dos professores, a condição
da infra-estrutura das escolas, o
descaso da sociedade etc. Essa
análise parte do pressuposto de que
todos os atores do processo
educacional estão engajados no
mesmo projeto, o que não é verdade.
Seguimos ignorando um problema
que me parece cada vez mais crucial:
o ensino acadêmico é percebido
pelos nossos professores como uma
tarefa desimportante do processo
educacional. Quando instado, em
pesquisa da Unesco, a apontar as
finalidades mais importantes da
educação, o professorado brasileiro
disse o seguinte: com 72% dos
votos, a campeã foi "formar cidadãos
conscientes". A segunda mais
lembrada foi "desenvolver a
atualizados e relevantes" (17%). No
mesmo levantamento, 73% dos
professores concordaram com a
afirmação que segue: "O professor
deve desenvolver a consciência
social e política das novas
gerações". Cinqüenta e cinco por
cento rejeitam a idéia de que "a
atividade docente deve reger-se pelo
princípio da neutralidade política".
Mais de 75% dos professores acham
que a igualdade é um valor superior
à liberdade. A pesquisa CNT/Sensus
publicada nesta edição corrobora
esse quadro: só 18% dos professores
da escola pública dizem que seu
discurso em sala de aula é
politicamente neutro. Setenta e
quatro por cento escolhem "formar
cidadãos" como missão do professor
– apenas 8,4% dizem que é "ensinar
a matéria". Os resultados são
praticamente idênticos nas escolas
particulares.
É triste constatar que o pendor
atingiu o nível de formação de
políticas públicas e, como tal, virou
uma questão sistêmica. Na avaliação
que o MEC faz dos livros didáticos
que serão escolhidos para todas as
escolas do país, a obra ganha pontos
se mostrar preocupação com a
questão da cidadania. Não apenas na
área de humanas, mas também em
ciências e matemática. Na avaliação
de livros didáticos de ciências do
ensino fundamental, por exemplo, há
seis itens. Um deles é "cidadania e
ética". Lá está dito que o livro deve
incentivar a "valorização do debate
sobre direitos do trabalhador e do
cidadão" e que se deve atentar
relação entre conhecimento popular
e científico, com respeito e
valorização de ambos". Não sei
muito bem o que isso quer dizer,
mas imagino que, se perguntarem a
um aluno numa prova a razão da
existência das chamadas "estrelas
cadentes", ele tirará 10 se responder
que é para atender aos três desejos
cada um é sua prerrogativa individual,
sujeita apenas à interferência dos pais.
Não é para ser condenada ou legitimada
na escola. Mesmo que os pais não
pratiquem sua prerrogativa, isso não dá
ao professor o direito de se assenhorear
da tarefa. Não acredito que a maioria
dos professores brasileiros, com seu
baixo preparo intelectual, tenha
condições de oferecer ao aluno a
exposição complexa e multifacetada
que as questões inerentes à formação da
cidadania exigem. Vira panfletagem.
Também não acredito no poder do
discurso dissociado da prática. Se essas
razões são válidas para qualquer tipo de
escola, creio que as regras devessem ser
ainda mais rigorosas para as escolas
públicas, nas quais o aluno não tem
condições de optar por escola diferente.
Aqui o texto de referência é de Max
Weber, em "Wissenschaft als Beruf" (A
Ciência como Vocação). Falando sobre
o dever de neutralidade dos professores
universitários – creio que não lhe
passaria pela cabeça que pudesse
ocorrer como no Brasil de hoje a
politização de alunos de 10 anos de
idade –, Weber disse: "Só se pode
exigir do professor que tenha a
integridade intelectual para ver que
uma coisa é declarar fatos, determinar
as relações matemáticas ou lógicas ou a
estrutura interna de valores culturais;
outra coisa é responder a questões sobre
o valor da cultura e seus componentes
individuais e como alguém deve agir na
comunidade cultural e em associações
políticas. Se ele perguntar por que não
deve lidar com os dois tipos de
problema em sala de aula, a resposta é:
porque o profeta e o demagogo não
pertencem ao espaço acadêmico. (...)"
Uma discussão político-ideológica
profícua pressupõe a igualdade de
poder entre os participantes. A relação
professor-aluno é totalmente
assimétrica: se o aluno questionar as
convicções de seu mestre, correrá o
risco de sofrer represálias, enquanto o
oposto é impossível. Pela mesma razão
que o estado é laico, as aulas do estado
133
criatividade e o espírito crítico"
(60,5%). Lá atrás, na rabeira,
apareceram "proporcionar
conhecimentos básicos" (8,9%) e
"transmitir conhecimentos
da vizinha. Se complementar
dizendo que os três desejos são uma
conquista da cidadania, aí então será
10 com louvor. Acho que a
formação política de
também deveriam ser politicamente
neutras.
Fonte: <
http://veja.abril.uol.com.br/200808/p_087.shtml>, acesso em 20 agost. 2008.
125
ANEXO I
126
Prezado (a) Professor (a)
Este questionário é parte integrante de uma pesquisa de mestrado em realização no programa de
Educação: Psicologia da Educação da PUC/SP. Essa pesquisa visa ampliar nossa compreensão sobre a
formação e o trabalho docente. Pedimos sua colaboração, no sentido de responder a todas as questões
propostas e, caso aceite, participar posteriormente de uma entrevista de aprofundamento. Para tanto,
preencha os campos abaixo.
Obrigada por sua colaboração!
Makeliny Nogueira
makeliny@gmail.com
A. Caracterização do docente
1. Ano de nascimento: ______________ 2. Sexo:__________________________________
3. Anos de experiência docente no Ensino Superior: ___________________________________
4. Natureza da(s) instituição(s) na qual trabalha: ______________________________________
5. Disciplina(s) que ministra em curso de Pedagogia: __________________________________
6. Número de aulas que ministra em curso de Pedagogia por semana: _____________________
7. Número total de alunos que possui no momento? ___________________________________
B. Formação para docência em ensino superior
1. Graduado (a) em: ____________________________________________________________
2. Instituição __________________________________________________________________
3. Sua formação para exercer a docência em ensino superior:
( ) Especialização em: _______________________________________________________
( ) Mestrado em: ___________________________________________________________
( ) Doutorado em: __________________________________________________________
( ) Pós-Doutorado em: _______________________________________________________
QUESTIONÁRIO
1. O que é ser professor?
2. Quem determina o Programa da disciplina? Como você lida com ele?
3. No desenvolvimento do programa quais os principais temas que você trabalha?
4. Qual a relação do que você ensina no seu programa com as demandas da sociedade brasileira?
5. Que tipo de aluno (professor) deseja formar a partir do seu trabalho como formador de docentes?
6. Considerando suas preocupações e as finalidades do seu trabalho, escolha dentre as alternativas
abaixo a que melhor representa seu pensamento sobre a instituição escolar e a formação dos
pedagogos:
a) a instituição escolar tem capacidade de mudar e melhorar a sociedade, na medida em que forma
profissionais qualificados que com seu trabalho transformam a realidade social.
b) a instituição escolar reproduz a desigualdade social, prepara a força de trabalho necessária para o
capital e reforça a ideologia dominante em nossa sociedade.
c) a instituição escolar contém contradições, contribuindo para melhorar a sociedade ao mesmo
tempo em que reproduz o que está estabelecido.
Por favor, justifique sua resposta.
Nome: ____________________________________________________________________________
Fone (s): _________________________________ e-mail: __________________________________
127
ANEXO II
128
ROTEIRO PARA ENTREVISTA
1. Como você enquanto professor-formador (a) de professores (as) compreende a
relação Educação x Sociedade?
2. Qual a importância da educação para a sociedade?
3. As práticas educativas incentivam ou determinam um tipo de sociedade? De
sujeito?
4. Você enquanto educador (a) coloca que intenções ou objetivos para seu trabalho
no sentido do incentivo de um tipo de cidadão e um tipo de sociedade?
5. Como isso aparece no seu programa de ensino? Comente seu programa na relação
com essas questões anteriores.
6. Qual sua avaliação sobre os resultados de seu trabalho, nesse sentido?
7. Quais são as dificuldades que encontra?
8. Quais as facilidades?
9. Especificando um pouco mais, qual a finalidade da sua disciplina na formação dos
futuros professores? Qual a finalidade do trabalho educacional na formação da
sociedade?
10. Como as demandas/urgências/interesses/problemas da sociedade interferem na
educação?
129
ANEXO III
130
> Revista Veja, Edição 2073
Prontos para o século XIX
Muitos professores e seus compêndios enxergam o mundo de hoje como ele era no tempo dos tílburis. Com a
justificativa de "incentivar a cidadania", incutem ideologias anacrônicas e preconceitos esquerdistas nos alunos
Monica Weinberg e Camila Pereira
Tema para reflexão: vale a pena usar
chocadeiras artificiais para acelerar a
produção de frango? Deu-se com
isso o início de uma das aulas de
geografia no Colégio Ateneu
Salesiano Dom Bosco, de Goiânia,
escola particular que aparece entre as
melhores do país em rankings
oficiais. Da platéia, formada por
alunos às vésperas do vestibular,
alguém diz: "Com as chocadeiras, o
homem altera o ritmo da vida pelo
lucro". O professor Márcio Santos
vibra. "Você disse tudo! O homem
se perdeu na necessidade de fazer
negócio, ter lucro, exportar." E
põe-se a cantar freneticamente
Homem Primata / Capitalismo
Selvagem / Ôôô (dos Titãs), no que é
acompanhado por um enérgico coro
de estudantes. Cena muito parecida
teve lugar em uma classe do Colégio
Anchieta, de Porto Alegre, outro que
figura entre os melhores do país. Lá,
a aula de história era animada por
um jogral. No comando, o professor
Paulo Fiovaranti. Ele pergunta:
"Quem provoca o desemprego dos
trabalhadores, gurizada?".
Respondem os alunos: "A máquina".
Indaga, mais uma vez, o professor:
"Quem são os donos das máquinas?"
E os estudantes: "Os empresários!".
É a deixa para Fiovaranti encerrar
com a lição de casa: "Então, quem
tem pai empresário aqui deve
questionar se ele está fazendo isso".
Fim de aula.
Os dois episódios, ambos
presenciados por VEJA, não são
raridade nas escolas brasileiras. Ao
contrário. Eles exemplificam uma
tendência prevalente entre os
professores brasileiros de
esquerdizar a cabeça das crianças.
Parece bobagem, uma curiosidade
até pitoresca num mundo em que a
empregabilidade e o sucesso na vida
profissional dependem cada vez
explicar mas de mudar o mundo para
melhor, acelerando a marcha da
história rumo a uma sociedade sem
classes. Bem, estamos no século
XXI, o comunismo destruiu a si
próprio em miséria, assassinatos e
injustiças durante suas experiências
reais no século passado. É
embaraçoso que o
marxismo-leninismo sobreviva
apenas em Cuba, na Coréia do Norte
e nas salas de aula de escolas
brasileiras. As chocadeiras
produzem os frangos vendidos a
menos de 5 reais nos supermercados
brasileiros, e isso propicia a dose
mínima de proteína a famílias que,
de outra forma, estariam mal
nutridas. A realidade não interessa
nas aulas como a do professor
Márcio Santos. O que interessa?
Passar a idéia de que as máquinas
tiram empregos. Elas tiram? Tiraram
no começo dos processos de
robotização e automação de fábricas
nos anos 90. Hoje, sem robôs e
máquinas, os empregos nem sequer
seriam criados. Mas dizer isso pode
desagradar ao espírito do velho
barbudo enterrado no novo
Cemitério de Highgate, em Londres.
Os professores esquerdistas veneram
muito aquele senhor que viveu à
custa de um amigo industrial, fez um
filho na empregada da casa e,
atacado pela furunculose, sofreu
como um mártir boa parte da
existência. Gostam muito dele,
fariam tudo por ele, menos, é claro,
lê-lo – pois Karl Marx é um autor
rigoroso, complexo, profundo que,
mesmo tendo apenas uma de suas
idéias ainda levada a sério hoje – a
Teoria da Alienação –, exige muito
esforço para ser compreendido. "A
salada ideológica resulta da leitura
de resumos dos grandes
pensadores", diz o filósofo Roberto
Romano. Gente que vê maldade em
chocadeiras e mal em empresários
aula e acham isso normal. Os
professores, em maior proporção,
reconhecem que doutrinam mesmo as
crianças e acham que isso é sua missão
principal – algo muito mais vital do que
ensinar a interpretar um texto ou ser um
bamba em matemática. Para 78% dos
professores, o discurso engajado faz
sentido, uma vez que atribuem à escola,
antes de tudo, a função de "formar
cidadãos" – à frente de "ensinar a
matéria" ou "preparar as crianças para o
futuro". Muito bonito se não estivessem
nesse processo preparando os alunos
para um mundo que acabou e
diminuindo suas chances de enfrentar a
realidade da vida depois que saírem do
ambiente escolar. Para atacar um
problema, o primeiro passo é
reconhecer sua existência. Esse é o
mérito da pesquisa CNT/Sensus.
Adversária do exercício intelectual, a
ideologização do ensino pode ser
resultado em parte também do
despreparo dos professores para o
desempenho da função. No ensino
básico, 52% lecionam matérias para as
quais não receberam formação
específica – 22% deles nunca
freqüentaram faculdade. Para esses, os
chavões de esquerda servem como uma
espécie de muleta, um recurso a que se
recorre na falta de informação. "Repetir
meia dúzia de slogans é muito mais
fácil do que estudar e ler grandes obras.
Por isso, a ideologização é mais comum
onde impera a ignorância", diz o
historiador Marco Antonio Villa. A
questão não é exatamente nova na
educação. Meio século atrás, a filósofa
alemã Hannah Arendt já alertava para o
equívoco de fazer das aulas um lugar
para a doutrinação ideológica, qualquer
que fosse o matiz. Em A Crise na
Educação, ela dizia: "Em vez de (o
professor) juntar-se a seus iguais,
assumindo o esforço da persuasão e
correndo o risco do fracasso, há a
intervenção ditatorial, baseada na
absoluta superioridade do adulto". Ao
131
mais do desempenho técnico, do
rigor intelectual, da atualização do
pensamento e do conhecimento. Não
é bobagem. A doutrinação
esquerdista é predominante em todo
o sistema escolar privado e
particular. É algo que os professores
levam mais a sério do que o ensino
das matérias em classe, conforme
revela a pesquisa CNT/Sensus
encomendada por VEJA. Pobres
alunos.
Eles estão sendo preparados para
viver no fim do século XIX, quando
o marxismo surgiu como uma
ideologia modernizante, capaz não
apenas de
que usam máquinas em suas fábricas
no século XXI não pode ter lido
Karl Marx. É de supor que não
tenham lido muito, quase nada. Mas
são esses senhores que ensinam
nossos filhos nas melhores escolas
brasileiras – sem, diga-se, que os
pais se incomodem com isso.
A pesquisa CNT/Sensus ouviu 3 000
pessoas de 24 estados brasileiros,
entre pais, alunos e professores de
escolas públicas e particulares. Sua
conclusão nesse particular é
espantosa. Os pais (61%) sabem que
os professores fazem discursos
politicamente engajados em sala de
refletirem sobre o atual cenário, os
especialistas concordam com a idéia
central da filósofa. Está claro, e a
própria experiência mostra isso, que o
viés político retira da escola aquilo que
deveria, afinal, ser seu atributo número
1: ensinar a pensar – verbo cuja origem,
do latim, significa justamente pesar.
Diz o sociólogo Simon Schwartzman:
"O verdadeiro exercício intelectual se
faz ao colocar as idéias e os juízos
numa balança, algo que só é possível
com uma ampla liberdade de
investigação e de crítica".
Não é o caso na maioria das salas de
aula. Muitos professores brasileiros
se encantam com personagens que
em classe mereceriam um tratamento
mais crítico, como o guerrilheiro
argentino Che Guevara, que na
pesquisa aparece com 86% de
citações positivas, 14% de neutras e
zero, nenhum ponto negativo. Ou
idolatram personagens arcanos sem
contribuição efetiva à civilização
ocidental, como o educador Paulo
Freire, autor de um método de
doutrinação esquerdista disfarçado
de alfabetização. Entre os
professores brasileiros ouvidos na
pesquisa, Freire goleia o físico
teórico alemão Albert Einstein,
talvez o maior gênio da história da
humanidade. Paulo Freire 29 x 6
Einstein. Só isso já seria evidência
suficiente de que se está diante de
uma distorção gigantesca das
prioridades educacionais dos
senhores docentes, de uma
deformação no espaço-tempo tão
poderosa que talvez ajude a explicar
o fato de eles viverem no passado.
Entre as figuras históricas e da
atualidade mais citadas em classe
está, como não poderia deixar de ser,
o presidente Luiz Inácio Lula da
Silva. As referências a Lula são
contidas. O presidente brasileiro
obtém aprovação menor entre os
professores, segundo relatam os
estudantes, do que aquela com que a
sociedade brasileira em geral o
brinda. Ele tem 70% de avaliação
positiva dos brasileiros, mas na boca
dos professores esse índice cai para
30% – com 27% de citações
negativas e 43% de neutras.
Ressalte-se aqui que é um ponto
louvável para os mestres o fato de,
como mostram os números relativos
a Lula, eles não fazerem
proselitismo eleitoral em classe
mesmo que seja preciso relevar o
fato de o ditador venezuelano Hugo
Chávez ter merecido 51% de
citações positivas. A neutralidade e
o comedimento em relação a Lula
desautorizam a interpretação de que
os professores tentam direcionar o
voto dos alunos, o que seria
desastroso. É sinal de que sua
pregação, mesmo equivocada, se
mantém no nível das idéias – o que é
excelente.
"Eu e todos os meus colegas
professores temos, sim, uma visão
de esquerda – e seria impossível isso
não aparecer em nossos livros. Faço
esforço para mostrar o outro lado",
diz a geógrafa Sonia Castellar, que
há vinte anos dá aulas na faculdade
de pedagogia da Universidade de
São Paulo (USP) e escreveu
Geografia, um dos best-sellers nas
escolas particulares (livro que tem
dois de seus trechos comentados por
VEJA na reportagem seguinte).
"Reconheço o viés esquerdista nos
livros e apostilas, fruto da formação
marxista dos professores. Mas não
temos nenhuma intenção de formar
uma
geração de jovens socialistas", diz
Miguel Cerezo, responsável pelo
conteúdo publicado nas apostilas do
COC (de onde foram extraídos quatro
trechos comentados pela revista). À luz
de outra pesquisa em profundidade feita
pelo Ibope em colaboração com a
revista Nova Escola, editada pela
Fundação Victor Civita, os professores
da rede pública revelam que, para eles,
o principal problema da sala de aula é,
de longe (77%), a ausência dos pais no
processo educativo. Repousam na
colaboração entre pais e professores a
correção dos rumos do ensino no país e
a aceleração da curva de melhora de
desempenho que começa a se desenhar.
A questão do excesso de ideologização
é um desses problemas que podem ser
abordados em conjunto por pais e
professores. Demanda para o diálogo
existe. O advogado Miguel Nagib
fundou, há quatro anos, em Brasília, a
ONG Escola Sem Partido, com o
objetivo de chamar atenção para a
ideologização do ensino na sala de aula.
Nagib se incomodou com os sinais do
problema na escola particular de sua
filha, então com 15 anos, onde o
professor de história gostava de
comparar Che Guevara a São Francisco
de Assis. Foi ao colégio reclamar. Diz
Nagib: "As escolas precisam ficar
sabendo que muitos pais não
concordam com essa visão". Com
reportagem de Camila Antunes e
Marcos Todeschini
132
> Revista Veja, Edição 2073
A neutralidade como dever
"A pesquisa CNT/Sensus publicada nesta edição corrobora esse quadro: só 18% dos professores da escola pública
dizem que seu discurso em sala de aula é politicamente neutro. Setenta e quatro por cento escolhem ‘formar cidadãos’
como missão do professor – apenas 8,4% dizem que é ‘ensinar a matéria’. Os resultados são praticamente idênticos
nas escolas particulares"
Gustavo Ioschpe
Sabendo que, em uma população de
190 milhões de habitantes, temos
mais de 50 milhões de alunos no
ensino básico e aproximadamente
100 milhões de pais desses alunos e
apenas 2 milhões de professores, e
sabendo que vivemos em uma
democracia, a pergunta que se impõe
a todo professor, diretor, secretário
municipal, estadual ou ministro da
Educação do país de agora em diante
é: como se pode justificar que uma
minoria imponha sobre a maioria a
sua visão da educação? Em uma
sociedade democrática, quem decide
que tipo de educação será oferecido
no sistema público: o público ou as
corporações do setor? Como se
justifica que professores e
administradores escolares ditem uma
política educacional à revelia dos
desejos expressos da sociedade
brasileira? A educação para a
cidadania não pressupõe, afinal, o
respeito à vontade coletiva e a
valorização da sabedoria popular?
Quando se discutem as razões pelas
quais nosso sistema escolar não
consegue ensinar a maioria dos
alunos a ler e a escrever ou a realizar
operações aritméticas simples,
muitos supostos fatores vêm à baila:
o salário dos professores, a condição
da infra-estrutura das escolas, o
descaso da sociedade etc. Essa
análise parte do pressuposto de que
todos os atores do processo
educacional estão engajados no
mesmo projeto, o que não é verdade.
Seguimos ignorando um problema
que me parece cada vez mais crucial:
o ensino acadêmico é percebido
pelos nossos professores como uma
tarefa desimportante do processo
educacional. Quando instado, em
pesquisa da Unesco, a apontar as
finalidades mais importantes da
educação, o professorado brasileiro
disse o seguinte: com 72% dos
votos, a campeã foi "formar cidadãos
conscientes". A segunda mais
lembrada foi "desenvolver a
atualizados e relevantes" (17%). No
mesmo levantamento, 73% dos
professores concordaram com a
afirmação que segue: "O professor
deve desenvolver a consciência
social e política das novas
gerações". Cinqüenta e cinco por
cento rejeitam a idéia de que "a
atividade docente deve reger-se pelo
princípio da neutralidade política".
Mais de 75% dos professores acham
que a igualdade é um valor superior
à liberdade. A pesquisa CNT/Sensus
publicada nesta edição corrobora
esse quadro: só 18% dos professores
da escola pública dizem que seu
discurso em sala de aula é
politicamente neutro. Setenta e
quatro por cento escolhem "formar
cidadãos" como missão do professor
– apenas 8,4% dizem que é "ensinar
a matéria". Os resultados são
praticamente idênticos nas escolas
particulares.
É triste constatar que o pendor
atingiu o nível de formação de
políticas públicas e, como tal, virou
uma questão sistêmica. Na avaliação
que o MEC faz dos livros didáticos
que serão escolhidos para todas as
escolas do país, a obra ganha pontos
se mostrar preocupação com a
questão da cidadania. Não apenas na
área de humanas, mas também em
ciências e matemática. Na avaliação
de livros didáticos de ciências do
ensino fundamental, por exemplo, há
seis itens. Um deles é "cidadania e
ética". Lá está dito que o livro deve
incentivar a "valorização do debate
sobre direitos do trabalhador e do
cidadão" e que se deve atentar
relação entre conhecimento popular
e científico, com respeito e
valorização de ambos". Não sei
muito bem o que isso quer dizer,
mas imagino que, se perguntarem a
um aluno numa prova a razão da
existência das chamadas "estrelas
cadentes", ele tirará 10 se responder
que é para atender aos três desejos
cada um é sua prerrogativa individual,
sujeita apenas à interferência dos pais.
Não é para ser condenada ou legitimada
na escola. Mesmo que os pais não
pratiquem sua prerrogativa, isso não dá
ao professor o direito de se assenhorear
da tarefa. Não acredito que a maioria
dos professores brasileiros, com seu
baixo preparo intelectual, tenha
condições de oferecer ao aluno a
exposição complexa e multifacetada
que as questões inerentes à formação da
cidadania exigem. Vira panfletagem.
Também não acredito no poder do
discurso dissociado da prática. Se essas
razões são válidas para qualquer tipo de
escola, creio que as regras devessem ser
ainda mais rigorosas para as escolas
públicas, nas quais o aluno não tem
condições de optar por escola diferente.
Aqui o texto de referência é de Max
Weber, em "Wissenschaft als Beruf" (A
Ciência como Vocação). Falando sobre
o dever de neutralidade dos professores
universitários – creio que não lhe
passaria pela cabeça que pudesse
ocorrer como no Brasil de hoje a
politização de alunos de 10 anos de
idade –, Weber disse: "Só se pode
exigir do professor que tenha a
integridade intelectual para ver que
uma coisa é declarar fatos, determinar
as relações matemáticas ou lógicas ou a
estrutura interna de valores culturais;
outra coisa é responder a questões sobre
o valor da cultura e seus componentes
individuais e como alguém deve agir na
comunidade cultural e em associações
políticas. Se ele perguntar por que não
deve lidar com os dois tipos de
problema em sala de aula, a resposta é:
porque o profeta e o demagogo não
pertencem ao espaço acadêmico. (...)"
Uma discussão político-ideológica
profícua pressupõe a igualdade de
poder entre os participantes. A relação
professor-aluno é totalmente
assimétrica: se o aluno questionar as
convicções de seu mestre, correrá o
risco de sofrer represálias, enquanto o
oposto é impossível. Pela mesma razão
que o estado é laico, as aulas do estado
133
criatividade e o espírito crítico"
(60,5%). Lá atrás, na rabeira,
apareceram "proporcionar
conhecimentos básicos" (8,9%) e
"transmitir conhecimentos
da vizinha. Se complementar
dizendo que os três desejos são uma
conquista da cidadania, aí então será
10 com louvor. Acho que a
formação política de
também deveriam ser politicamente
neutras.
Fonte: <
http://veja.abril.uol.com.br/200808/p_087.shtml>, acesso em 20 agost. 2008.
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