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Nietzsche, seu endeusamento de Wagner e sua hostilidade posterior contra ele...”
(TP, VI, p. 405-406).
Aquilo que se nomeou Deus e designado pela fórmula bem supremo
significa, como o próprio termo o diz, o valor psicológico supremo. Em outras
palavras, “é um conceito ao qual se atribui, ou realmente possui, a maior e mais
geral importância na determinação de nossos pensamentos e ações. Na linguagem
da Psicologia Analítica o conceito de Deus se confunde com o complexo
representativo que, segundo a definição anterior, concentra em si a maior soma de
libido (energia psíquica)” (TP, VI, p. 58). A partir dessa perspectiva, o conceito de
Deus pode ser diferente nas diversas pessoas, pois, “como se sabe, o valor atuante
mais alto da alma humana está localizado bem diversamente. Há pessoas “cujo
Deus é a barriga” (Fil. 3,19) e, para outras, ele é o dinheiro, a ciência, o poder, o
sexo, etc.” (TP, VI, p. 58), variando conforme a localização do bem supremo e
indicando com isso a psicologia do indivíduo.
Salvar-se a si mesmo, tornar-se aquele que se é, isto os deixam,
Jung e Nietzsche, como ensinamento de suas obras. Em outras palavras, o que
Jung chama de salvação pode ser pensado como união de opostos ou processo de
individuação, enquanto Nietzsche chama de “redenção” (Z, II, p. 151ss) aquilo que
“pode conduzir o homem a tornar-se aquele que se é” (Z, II, p. 126).
Porém, como já se teve oportunidade de acompanhar com Jung,
Nietzsche é esta identidade inflacionada, não diferenciada de Zaratustra. Se, porém,
lermos o que diz Zaratustra em A Saudação (Z, IV, p. 279), ver-se-á que ele aponta
para essa não identidade ou, ainda, para um outro modo de ser de tal identidade
que não é experimentada no sentido inflacionado indicado por Jung. Zaratustra diz:
“Para mim, ou seja, para o ser inexorável que, em mim, guarda silêncio [...] ainda
pode vir gente melhor, aqueles últimos restos de Deus, ou seja, todos os homens do
grande anseio, que não querem viver sem que aprendam de novo a ter esperança, a
grande esperança!” (Z, IV, p. 283).
Quando Zaratustra refere-se “ao ser inexorável” (Z, IV, p. 283) que,
em si, “guarda silêncio” (Z, IV, p. 283) deixa claro a presença dos “dois”, isto é, do
algo ou alguém que, “em mim” (Z, IV, p. 283), guarda silêncio. Também Zaratustra
aponta para essa distinção em Do amigo (Z, I, p. 72): “Eu e mim estamos sempre em
colóquio por demais acalorado” (Z, I, p. 72). Jung não chegou em seus Seminários a
essa parte quatro do Zaratustra, o que talvez justifique, em parte, ele não ter