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U F C
U F C
Mestrado em Geografia
Mestrado em Geografia
UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ
UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ
PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
CENTRO DE CIÊNCIAS
CENTRO DE CIÊNCIAS
MESTRADO ACADÊMICO EM GEOGRAFIA
MESTRADO ACADÊMICO EM GEOGRAFIA
José Alegnoberto Leite Fechine
José Alegnoberto Leite Fechine
Fortaleza – Ceará
Fortaleza – Ceará
2007
2007
ALTERAÇÕES NO PERFIL
ALTERAÇÕES NO PERFIL
NATURAL DA ZONA COSTEIRA
NATURAL DA ZONA COSTEIRA
DA CIDADE DE FORTALEZA,
DA CIDADE DE FORTALEZA,
CEARÁ, AO LONGO DO SÉCULO
CEARÁ, AO LONGO DO SÉCULO
XX
XX
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U F C
Mestrado em Geografia
UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ
PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
CENTRO DE CIÊNCIAS
MESTRADO ACADÊMICO EM GEOGRAFIA
José Alegnobeto Leite Fechine
ALTERAÇÕES NO PERFIL NATURAL DA ZONA COSTEIRA DA
CIDADE DE FORTALEZA, CEARÁ, AO LONGO DO SÉCULO XX
Dissertação submetida à Coordenação do
Curso de Mestrado em Geografia, área de
concentração: Dinâmica Territorial e Ambiental
- Estudo Socioambiental da Zona Costeira, da
Universidade Federal do Ceará, como
requisito para obtenção do título de Mestre.
Orientador: Prof. Dr. Jean-Pierre Peulvast
Co-orientadora: Profa. Dra. Vanda de Claudino Sales
Fortaleza-Ceará
2007
2
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FOLHA DE APROVAÇÃO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ – UFC
MESTRADO EM GEOGRAFIA
TÍTULO DO TRABALHO: Alterações no Perfil Natural da Zona Costeira da Cidade
de Fortaleza, Ceará, ao Longo do Século XX.
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: Dinâmica Territorial e Ambiental
LINHA DE PESQUISA: Estudo Socioambiental da Zona Costeira
MESTRE: José Alegnoberto Leite Fechine
DATA DA DEFESA:
NOTA OBTIDA:
CONCEITO OBTIDO:
BANCA EXAMINADORA CONSTITUÍDA PELOS PROFESSORES:
_____________________________________________________
Prof. Dr. Eustógio Wanderley Correia Dantas
Departamento de Geografia (Universidade Federal do Ceará – UFC)
__________________________________________________________
Profª. Dr. Aldo Aloísio Dantas
Departamento de Geografia (Universidade Federal do Rio Grande do Norte – FRN)
__________________________________________________________
Prof. Dr. Jean-Pierre Peulvast (Orientador)
Departamento de Geografia (Universidade Federal do Ceará – UFC)
___________________________________________________
Profa. Dra. Vanda de Claudino Sales (Co – orientadora)
Departamento de Geografia (Universidade Federal do Ceará – UFC)
3
Dedico este trabalho aos meus os meus pais, mestres insubstituíveis.
A minha namorada Geórgia, companheira de todo os momentos.
Aos meus irmãos, pela compreensão.
A minha inesquecível tia Alaíde, pelos conselhos.
À vida que me possibilitou oportunidades e momentos raros.
4
AGRADECIMENTOS
À minha família, em especial aos meus pais, pela força e coragem depositada ao longo desta
caminhada.
A minha namorada Geórgia, por todo amor dedicado, pela ajuda constante e pela paciência
com que me acompanhou nestes anos. Obrigado por não me deixar desistir.
Ao meu orientador Prof. Dr. Jean-Pierre Peulvast, todo meu respeito e admiração. Muito
obrigado por todo aprendizado e orientação, fundamentais à realização deste trabalho.
À minha co-orientadora Profa. Dra. Vanda de Claudino Sales, pelo incentivo, amizade, apoio,
dedicação e valiosa orientação, que contribuíram de forma significativa para realização desta
pesquisa. Por suas generosas colaborações, quaisquer agradecimentos seriam insuficientes
para exprimir todo o meu respeito e toda minha gratidão.
Aos professores do Mestrado em Geografia da UFC, por tudo que me ensinaram,
contribuindo para minha formação nesta nova etapa da vida acadêmica.
À banca da qualificação, nas pessoas do Prof. Dr. Eustógio Wanderley Correia Dantas e Prof.
Dr. Aldo Aloísio Dantas que prontamente aceitaram o convite para avaliar este trabalho,
contribuindo de maneira significativa para sua conclusão.
A todos os meus colegas de turma, pela troca de idéias, discussões, incentivo nos momentos
difíceis e pelos bons momentos que passamos juntos.
Ao Joaquim, secretário do Mestrado, pela ajuda nos momentos burocráticos.
À Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FUNCAP),
pelo apoio financeiro através da concessão da bolsa de estudos, tornando sua concretização
menos difícil.
A todos que direta ou indiretamente contribuíram para que este trabalho se tornasse possível.
5
“Adeus, adeus, só o nome ficou
Adeus Praia de Iracema
Praia dos amores
Que o mar carregou.”
Luiz Assunção
6
RESUMO
O objetivo deste trabalho é analisar as ações dos processos naturais, relacionados com as
mudanças sociais impostas à área costeira de Fortaleza, Nordeste do Brasil, ao longo do
século XX. O estudo está individualizado em duas faixas: Sudeste/ Noroeste (SE/NO) e Leste/
Oeste (L/O). A primeira parte da desembocadura do Rio Cocó até a Ponta do Mucuripe e a
segunda da Ponta do Mucuripe até Foz do Rio Ceará, perfazendo um total de 23 km. Estas
faixas são feições dinâmicas que vêm sofrendo com o avanço e recuo da linha de costa. A sua
posição no espaço geográfico muda constantemente em várias escalas temporais (diárias,
sazonais, decadais, seculares e milenares). Desta forma, a faixa de praia de Fortaleza é afetada
por um número muito grande de fatores, alguns de origens naturais e intrinsecamente
relacionadas à dinâmica costeira (erosão costeira, variação relativa do nível do mar, dispersão
de sedimentos), outros relacionados com as intervenções humanas na zona costeira (obras de
engenharia, drenagens, aterramento de praias, construção de espigões, muros de contenção).
O impacto ambiental e as mudanças, naturais e sociais, nestas áreas, são bastante
consideráveis. Por essas razões, é intenso o avanço da linha de costa na faixa SE NO (Praia
do Futuro, Caça e Pesca e Serviluz), ocorrendo engorda do perfil praial. Na faixa L/0, um
recuo da linha de costa em direção ao continente (Praia do Meireles, Praia de Iracema,
Pirambu, L/O e Barra do Ceará) vem se intensificando. Estas ações se deram de forma mais
intensa posteriormente à construção da grande obra o Porto do Mucuripe, na década de 1940,
que veio alterar drasticamente toda a dinâmica costeira da cidade de Fortaleza, colocando-se
como um marco das mudanças ambientais da área ao longo do século XX.
PALAVRAS CHAVE: Geomorfologia costeira, erosão costeira, mudanças no perfil praial,
Fortaleza.
7
ABSTRACT
The objective of this dissertation is to present a synthesis of the natural processes related with
the social changes of coastal area of Fortaleza city, Northeast of Brazil, along an area of 23
km, during the 20th century. The study area has been individualized in two bands: southeast/
northwest and east/west. The first goes from the mouth of Cocó river until the Mucuripe
headland and the second, from this point until the estuary of Ceará river. These bands are
dynamic features that are suffering with the advance and recession of the shoreline. Its
position changes constantly in many scales (daily and seasonal, but associated with centuries
and millenniums). In such a way, the beach band of Fortaleza is affected by a very great
number of factors, some of natural origins and related to the coastal dynamics (coastal
erosion, relative variation of the sea level, dispersion of sediments), others related with human
interventions in the coastal zone (workmanships of engineering, drainings, nourishement of
beaches, construction of ridges and seawalls ). The envirormental impact and the changes,
natural and artificial, in these areas, are considerable. For these reasons there is an intense
advance of the shoreline in the band southeast/northwest (Futuro beach, Caça e Pesca and
Serviluz), with progradation of the beach profile. In the band east/west occurs an intense
erosion of the shoreline in direction to the continent (Meireles, Iracema, Pirambu, Barra do
Ceará). These processes are more intense after the construction of the Mucuripe harbor, that
modified drastically the coastal dynamics of the studied area and its a marker of the
environmental chauges in the coast of Fortaleza city during the 20th century.
Key words: Coastal Geomorphology, coastal erosion, changes in the shoreline profile,
Fortaleza.
8
LISTA DE FIGURAS
Figura 01 - Localização da Área de Estudo da Cidade de Fortaleza – Ceará -------------------20
Figura 02 – Mapa Geológico do Município de Fortaleza------------------------------------------23
Figura 03 – Mapa Geomorfológico do Município de Fortaleza-----------------------------------25
Figura 04 – Bypass Litorâneo------------------------------------------------------------------------- 33
Figura 05 – Rio Cocó e adjacências------------------------------------------------------------------ 35
Figura 06 – Dunas do Papicu e Mucuripe/Praia do Futuro----------------------------------------36
Figura 07 Extensão de praia na faixa SE/NO em 1920------------------------------------------
38
Figura 08 – Início da Construção do Porto do Mucuripe em 1939-------------------------------39
Figura 09 – Ponta do Mucuripe em 1920 vista de SE/NO-----------------------------------------40
Figura 10 – Ponta do Mucuripe em 1920 vista de L/O---------------------------------------------40
Figura 11 Primeira planta do Porto e Vila de Fortaleza elaborada por Silva Paulet, em
1818--------------------------------------------------------------------------------------------------------41
Figura 12 – Rochas-de-praia, próximo a Ponta do Mucuripe------------------------------------- 41
Figura 13 - Praia do Mucuripe em 1935------------------------------------------------------------- 42
Figura 14 - Volta da Jurema em 1935----------------------------------------------------------------42
Figura 15 - Praia de Iracema na década de 1930----------------------------------------------------43
Figura 16 – Praia de Iracema em 1935---------------------------------------------------------------43
Figura 17 – Praia de Iracema em 1937---------------------------------------------------------------44
Figura 18 - Ponte Metálica na década de 1930------------------------------------------------------44
Figura 19 - Ponte Metálica e antigo porto de Fortaleza (Poço da Draga)------------------------45
Figura 20 / 21 - Praia dos Arpoadores em 1930-----------------------------------------------------45
Figura 22 – Praia Formosa em 1936------------------------------------------------------------------46
Figura 23 - Localização das dunas costeiras de Fortaleza-----------------------------------------
47
9
Figura 24 - Esboço paleogeográfico das dunas costeiras de Fortaleza---------------------------49
Figura 25 Planta Croquis da área do antigo Porto de Fortaleza (Poço da Draga)------------
51
Figura 26 Levantamento batimétricos de 1826, ao longo da área litorânea L/O de
Fortaleza------------------------------------------------------------------------------------------------------
---------52
Figura 27 Levantamento batimétricos realizados ao longo da área litorânea L/O de
Fortaleza em 1981----------------------------------------------------------------------------------------52
Figura 28 – Evolução das isóbatas de 0 m e 5 m, de 1931 a 1946 no Porto do Mucuripe-----55
Figura 29 – Comportamento da batimetria no ano de 1946 no Porto do Mucuripe------------56
Figura 30 Comportamento das isobatimétricas de 0 m e 5 m, em duas épocas no Porto do
Mucuripe--------------------------------------------------------------------------------------------------
56
Figura 31 - Traçado das linhas isobatimétricas no ano de 1956 no Porto do Mucuripe------ 57
Figura 32 – Caminhamento e bypass de areias no Porto do Mucuripe-------------------------- 57
Figura 33 - Construção das instalações do novo porto em Fortaleza, entre 1952 – 1964----- 58
Figura 34 – Comportamento das correntes litorâneas no ano de 1946 na área do Mucuripe- 60
Figura 35 – Comportamento das correntes litorâneas no ano de 1947 na área do Mucuripe- 60
Figura 36 – Comportamento das correntes litorâneas no ano de 1948 na área do Mucuripe- 61
Figura 37 - Comportamento das correntes litorâneas no ano de 1949 na área do Mucuripe--61
Figura 38 Migração da embocadura do Riacho Maceió-----------------------------------------
63
Figura 39 - Praia Mansa em 1960---------------------------------------------------------------------64
Figura 40 - Praia do Futuro na década de 60-------------------------------------------------------- 66
Figura 41 - Praia do Futuro na década de 70 no início da urbanização--------------------------66
Figura 42 – Desembocadura do Riacho Maceió---------------------------------------------------- 69
Figura 43 - Avenida Beira Mar e Avenida Abolição em 1963------------------------------------70
Figura 44 – Volta da Jurema, Praia de Iracema e Avenida Beira Mar em 1970----------------70
10
Figura 45 - Praia de Iracema na década de 1960----------------------------------------------------71
Figura 46 – Espigões costeiros construídos para proteger o litoral da erosão em 1969------- 72
Figura 47 - Ponte inacabada sobre o Rio Cocó------------------------------------------------------73
Figura 48 – Foz do Rio Cocó – Margem Direita, Esquerda e Ponte inacabada-----------------74
Figura 49 - Barracas de praia e ocupação unifamiliar às margens do Rio Cocó----------------75
Figura 50 - Barracas de praia às margens do Rio Cocó e erosão natural------------------------ 75
Figura 51 - Aterro irregular na margem do rio Cocó-----------------------------------------------75
Figura 52 – Barracas de praia a montante da foz do Rio Cocó------------------------------------76
Figura 53 - Ocupação irregular em dunas fixas na Praia do Futuro------------------------------77
Figura 54 - Faixa de praia com mobilização de areia no Caça e Pesca-------------------------- 77
Figura 55 - Barracas de praia sendo invadidas por areias no Caça e Pesca----------------------78
Figura 56 - Faixa de praia e barracas de praia na Praia do Futuro--------------------------------79
Figura 57 Areias avançando sobre as barracas de praia na Praia do Futuro-------------------
79
Figura 58 – Espigão do Titã em 1969---------------------------------------------------------------- 81
Figura 59 - Vista panorâmica da praia do Serviluz-------------------------------------------------82
Figura 60 – Avanço de areias no Serviluz----------------------------------------------------------- 82
Figura 61 - Fotografia do Porto do Mucuripe, praia mansa e Titãzinho, de 2001- ------------
83
Figura 62 – Molhe do Titãzinho-----------------------------------------------------------------------83
Figura 63 - Trecho da Praia Mansa com a orla conservada----------------------------------------84
Figura 64 - Ancoradouro do Porto do Mucuripe----------------------------------------------------86
Figura 65 - Vista panorâmica de parte do trecho da Avenida Beira-Mar------------------------87
Figura 66 - Ocupação da faixa de praia por muros de contenção---------------------------------88
Figura 67 - Praia em forma de arco ao longo da enseada do Mucuripe--------------------------89
Figura 68- Foz do Riacho Maceió--------------------------------------------------------------------89
11
Figura 69 - Faixa de praia ocupada por barracas de alto nível e barcos de pesca no
Mucuripe-----------------------------------------------------------------------------------------------------
----------90
Figura 70 - Rochas-de-praia localizadas na Volta da Jurema-------------------------------------
91
Figura 71 - Aterro da Praia de Iracema---------------------------------------------------------------92
Figura 72 – Verticalização e obras de engenharia costeira na faixa de praia de Fortaleza----93
Figura 73 - Trecho com obras de engenharia costeira na Praia de Iracema---------------------94
Figura 74 – Processo erosivo na Praia de Iracema--------------------------------------------------94
Figura 75 - Ponte Metálica de Fortaleza------------------------------------------------------------- 95
Figura 76 – Ponte dos Ingleses------------------------------------------------------------------------96
Figura 77 - Processo erosivo a oeste da Ponte Metálica------------------------------------------- 96
Figura 78 – Segmento da Avenida leste – oeste-----------------------------------------------------98
Figura 79 - Processo erosivo no Bairro do Pirambu------------------------------------------------99
Figura 80 – Faixa de Praia do Pirambu com espigões--------------------------------------------100
Figura 81 – Faixa de Praia do Pirambu com favelas----------------------------------------------101
Figura 82 - Trecho da Avenida Costa Oeste em processo de degradação----------------------101
Figura 83 - Avenida Costa Oeste no Bairro das Goiabeiras-----------------------------------
102
Figura 84 - Duna da Barra do Ceará em processo de desmonte e favelização-----------------103
Figura 85- Vista panorâmica da duna da Barra do Ceará e ponte sobre o rio Ceará----------104
Figura 86 – Foz do Rio Ceará protegido por muro de contenção de erosão. ------------------105
12
LISTA DE TABELAS
Tabela 01 - Quadro de situação isobatimétrica em frente à cidade de Fortaleza, nos anos de
1909 e 1929 ---------------------------------------------------------------------------------------------- 53
13
LISTA DE SIGLAS
SE: Sudeste
NO: Noroeste
L: Leste
O: Oeste
SO: Sudoeste
NE: Nordeste
IBGE: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
SEINF: Secretaria de Infra-estrutura do Município de Fortaleza
SEMACE: Secretaria de Meio Ambiente do Estado do Ceará
UFC: Universidade Federal do Ceará
LABOMAR: Laboratório de Ciências do Mar da Universidade Federal do Ceará
CPRM: Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais
SEMAM: Secretaria Municipal de Meio ambiente
IBAMA: Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
CDL: Câmara de Dirigentes Logistas
ZICT: Zona de Convergência Intertropical
CAGECE: Companhia de Água e Esgoto do Ceará
PETROBRAS: Petróleo Brasileiro S/A
SUDENE: Superintendência de Desenvolvimento Econômico do Nordeste
INPH: Instituto Nacional de Pesquisas Hidroviárias
BNH: Banco Nacional de Habitação
IML: Instituto Médico Legal
IPLANCE: Instituto de Planejamento do Ceara
PDDU: Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano
14
SUDEC: Superintendência de Desenvolvimento do Estado do Ceará
SUMÁRIO
RESUMO
ABSTRACT
LISTA DE FIGURAS
LISTA DE TABELAS
LISTA DE SIGLAS
1. A ZONA COSTEIRA E LITORÂNEA DE FORTALEZA: OBJETO DE ESTUDO-17
1.1. Introdução -----------------------------------------------------------------------------------17
1.2. Localização e Caracterização da área de Estudo-------------------------------------19
1.3 Metodologia da Pesquisa-------------------------------------------------------------------21
1.3.1 Etapa de Gabinete------------------------------------------------------------------21
1.3.2 Trabalhos de Campo---------------------------------------------------------------22
1.4 Caracterização Geoambiental da Zona Costeira--------------------------------------
22
1.4.1 Contexto Geológico-----------------------------------------------------------------22
1.4.2 Compartimentação Geomorfológica--------------------------------------------25
1.4.2.1 As Praias-------------------------------------------------------------------- 26
1.4.2.2 As Dunas-------------------------------------------------------------------- 26
1.4.2.3 Os Cursos Fluviais---------------------------------------------------------
28
1.4.3 Condições Climáticas--------------------------------------------------------------29
1.4.4 As Forças Marinhas Atuantes no Litoral--------------------------------------30
1.4.4.1 As Marés-------------------------------------------------------------------- 30
1.4.4.2 As Ondas--------------------------------------------------------------------
30
15
1.4.4.3 As Correntes----------------------------------------------------------------31
1.4.4.4 Transporte, Sedimentação e Erosão no Litoral de Fortaleza-----32
2. A ZONA COSTEIRA DE FORTALEZA ENTRE 1900 E 1940---------------------------37
2.1 A Faixa Sudeste – Noroeste----------------------------------------------------------------37
2.2 A Faixa Leste – Oeste-----------------------------------------------------------------------38
2.3 Dunas de Fortaleza: Um Registro mais Antigo----------------------------------------46
3. OS ANOS 1940 E O PORTO DO MUCURIPE----------------------------------------------- 51
3.1. O Porto e as Condições Hidrodinâmicas e Sedimentológicas----------------------59
4. A ZONA COSTEIRA DE FORTALEZA DE 1940 A 2000---------------------------------65
4.1 A Faixa Sudeste /Noroeste-----------------------------------------------------------------65
4.2 A Faixa Leste /Oeste------------------------------------------------------------------------68
5. A ZONA COSTEIRA DE FORTALEZA NA ATUALIDADE-----------------------------73
5.1 A Faixa Sudeste/Noroeste------------------------------------------------------------------73
5.1.1 O Rio Cocó---------------------------------------------------------------------------73
5.1.2 O Caça e Pesca----------------------------------------------------------------------76
5.1.3 A Praia do Futuro------------------------------------------------------------------78
5.1.4 O Serviluz----------------------------------------------------------------------------80
5.2 A Faixa de Praia Leste/Oeste-------------------------------------------------------------
84
5.2.1 O Porto do Mucuripe--------------------------------------------------------------84
5.2.2 A Praia do Meireles ---------------------------------------------------------------88
5.2.3 A Praia de Iracema---------------------------------------------------------------- 91
5.2.4 A Ponte Metálica-------------------------------------------------------------------
94
5.2.5 O Poço da Draga e a Estação de Tratamento da CAGECE---------------97
5.2.6 O Pirambu e o Bairro das Goiabeiras----------------------------------------- 98
5.2.7 A Foz do Rio Ceará---------------------------------------------------------------102
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS--------------------------------------------------------------------106
16
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS----------------------------------------------------------- 111
1. A ZONA COSTEIRA E LITORÂNEA DE FORTALEZA: OBJETO DE ESTUDO
1.1 Introdução
Fortaleza é uma cidade litorânea, banhada a sudeste e ao norte pelo Oceano Atlântico.
Capital do Estado do Ceará, ela concentra atividades urbanas, industriais, comerciais,
turísticas e educacionais, o que a transforma em grande pólo regional e nacionalcom efeito,
ela é a quinta cidade do Brasil em termos de população (IBGE, 2006). Tal situação implica
em grande dinâmica espacial, a qual se projeta de forma intensa no seu sítio natural, de forma
a modificar os atributos naturais do espaço urbano.
A cidade de Fortaleza passou por grandes alterações urbano-ambientais ao longo do
século XX. Com efeito, as primeiras grandes transformações ocorreram na primeira metade
deste século e foram concentradas nos setores centrais da cidade (SOUZA, 1978; SILVA,
1998). A partir dos anos 1940, deu-se grande crescimento demográfico e econômico e a
cidade sofreu expansão urbana em direção a leste, oeste, noroeste e sudeste (SOUZA, 1978).
Desse processo, resultou a incorporação paulatina do espaço litorâneo à malha urbana pré-
existente. Tal incorporação atinge na atualidade toda a extensão do espaço litorâneo
fortalezense.
A zona litorânea corresponde a uma faixa de terra que possui características mistas. Em
primeiro lugar, trata-se de um elemento natural, aqui compreendido como o segmento de terra
17
composta por praias, que sofrem a influência direta do mar e é banhado pelas marés altas,
incorporando a banda de terra emersa imediatamente adjacente. Por zona costeira por outro
lado, entende-se a área de influência indireta do mar, incluindo os setores que sofrem ação das
brisas marítimas e da salinidade - a extensão dessa área é primariamente ditada pela dinâmica
climática e flúvio marinha, sendo variável de um setor a outro (e.g. CLAUDINO SALES,
2002), podendo estender-se por vários quilômetros em direção ao continente.
Além dos atributos naturais, o litoral de Fortaleza representa também um espaço urbano,
que concentra população e interações humanas e conta com a ocorrência de atividades
diversificadas, a maior parte delas estabelecidas por estatuto legal. Santos (2002:153)
considera “espaço urbano” como um conjunto de relações realizadas através de funções e de
forma que se apresentam como testemunhos de uma história escrita por processos do passado
e do presente. Isto é, o espaço se define como um conjunto de formas representativas de
relações sociais do passado e do presente e por uma estrutura representada por relações
sociais que estão acontecendo diante dos nossos olhos e que se manifestam através de
processos e funções. O espaço é, então, verdadeiro campo de forças cuja aceleração é
desigual. Daí porque a evolução espacial não se faz de forma idêntica em todos os lugares.
Do ponto de vista legal, a faixa de praia, elemento fundamental da zona litorânea,
representa um espaço urbano peculiar, pois se trata de um espaço público - isto é, uma área
delimitada como lócus de livre acesso à população em geral, e impregnada por valores
democráticos e de cidadania (GOMES, 2002). Tal espaço público é definido na lei 7.661/88
(Plano de Gerenciamento Costeiro), que preceitua no seu art. 10º que as praias são bens
públicos de uso comum do povo, sendo assegurado sempre livre e franco acesso a elas e ao
mar, em qualquer direção e sentido, ressalvados os trechos considerados de interesse de
segurança nacional ou incluídos em áreas protegidas por legislação específica. Entende-se por
praia, de acordo com o parágrafo dessa lei, a área coberta e descoberta periodicamente
pelas marés, acrescida de faixa subseqüente de material detrítico, tal como areias, cascalhos,
seixos e pedregulhos, até o limite onde se inicie a vegetação natural, ou em sua ausência, onde
comece um outro ecossistema. Dessa forma zona litorânea e praia, bem como orla marítima,
são aqui entendidas como sinônimos.
Em relação às zonas costeira e litorânea de Fortaleza, verifica-se nas últimas décadas
que o processo de valorização urbana para fins habitacionais, comerciais, turísticos, portuários
e industriais, implicando na instalação de ruas, calçadas, edifícios e equipamentos urbanos
diversos, representa uma crescente desqualificação natural desses ambientes. No contexto
urbano da cidade de Fortaleza, tais áreas correspondem a um dos setores que mais sofrem
18
com problemas ambientais decorrentes de construções inadequadas, de especulação
imobiliária, de poluição, de artificialização do espaço. Em termos do território cearense, de
todas as áreas da zona costeira e litorânea, a de Fortaleza é que mais gravemente vem sendo
alterada, incidindo essa alteração, principalmente sobre as dunas, as praias, os recursos
hídricos e a qualidade de vida da população.
A história sobre os fatos do desenvolvimento sócio-econômico e cultural de Fortaleza e
do Estado (e.g. SOUZA, 1978; COSTA, 1988; SILVA, 1992; DANTAS, 2002) não evidencia
que tenha havido preocupação por parte dos agentes de produção do espaço urbano em
proteger a natureza ou utilizar os recursos naturais de forma a não degradá-los, isso tanto em
relação à população de usuários como por parte daqueles que planejaram e geriram a cidade -
mas este não é o caso apenas do Ceará, pois como coloca Santos (2002), a evolução intra-
urbana brasileira é caracterizada pela substituição de paisagem natural por infra-estrutura
urbana.
O presente trabalho tem por objetivo ilustrar essas mudanças ambientais, sobretudo
associadas à dinâmica natural das zonas litorânea e costeira fortalezense, tomando como
marco o século XX. Tal corte histórico baseia-se no fato de terem as principais alterações no
espaço natural da cidade ocorrido ao longo das dez décadas desse século. Nesse recorte
temporal, toma-se ainda como referência o período anterior a 1940 e posterior a 1940 - tal
recorte analítico deve-se ao fato de que as mudanças mais importantes no uso e ocupação do
solo nas zonas costeira e litorânea de Fortaleza terem sido iniciadas nos anos 1940, como será
analisado.
1.2 Localização e Caracterização da Área de Estudo
A área de estudo está localizada na zona costeira do município de Fortaleza, Estado do
Ceará, Brasil, limitado pelas latitudes sul: 38’ e 47’ e pelas longitudes oeste: 38° 23’ e
38º 38’. Têm como limites a norte o Oceano Atlântico, ao sul as serras úmidas de Baturité
(municípios de Pacatuba, Eusébio, Maracanau e Itaitinga), a sudeste Aquiraz e a oeste
Caucaia (figura 01).
A planície costeira e litorânea em estudo possui uma extensão de aproximadamente 23
quilômetros, banhada pelo oceano Atlântico. Situam-se entre as bacias hidrográficas dos rios
Cocó e Ceará.
O litoral de Fortaleza é segmentado em dois setores pela presença da ponta natural,
rochosa, do Mucuripe, de forma tal que a área pode ser dividida em duas faixas: faixa sudeste/
19
noroeste (SE/NO, do Rio Cocó à Ponta do Mucuripe), com uma extensão de
aproximadamente 8 km, e afaixa leste/oeste (L/O, da Ponta do Mucuripe até a foz do Rio
Ceará), com uma extensão aproximada de 15 km de costa. Ecossistemas naturais e estruturas
artificiais encontram-se distribuídos ao longo das duas faixas.
Na faixa SE/NO situa-se a foz do rio Cocó com manguezal e cordões de beach-rocks,
além de praias, dunas, espigões costeiros e o porto do Mucuripe; na faixa L/O, ocorrem
praias com cordões de beach-rocks, fozes de riachos costeiros, dunas, calçadões urbanos,
aterros litorâneos, pontes litorâneas (piers), o Hotel Marina Park, a Estação de tratamento de
esgotos da CAGECE, avenidas, o pólo de lazer da barra e a foz do rio Ceará, tomados ainda
por obras costeiras, tais como espigões e muralhas de proteção.
20
Figura 01 - Localização da Área de Estudo da Cidade de Fortaleza Ceará. Organizado por
José Algnoberto Leite Fechine. Fonte: Aerofotonordeste, 1999
1.3 Metodologia da Pesquisa
A orla marítima foi compartimentada levando em conta a extensão e a complexidade das
paisagens naturais, repletas de ambientes em diferentes estados de degradação ambiental e
envolvendo atividades sócio-econômicas e culturais das mais variadas. Seguimos o princípio
metodológico indicado pela análise geoambiental, que conduz ao estudo das relações de
interdependência existentes entre os componentes do meio natural e social (BERTRAND,
1968).
Os fundamentos metodológicos da analise geoambiental têm como diretriz principal a
análise integrada da paisagem, de forma a permitir uma concepção globalizante e funcional do
espaço, através do estudo das inter-relações entre os diversos elementos que a compõem na
nossa pesquisa em particular, uso e ocupação da faixa litorânea, assoreamento, erosão e
degradação dos atributos naturais do espaço são os principais elementos abordados.
A compartimentação da área de estudo em duas faixas geoambientais foi realizada com
base nos elementos naturais, tomando-se como referência as desembocaduras dos rios
Cocó e Ceará, respectivamente situados a leste e a oeste da área de estudo, tendo o
afloramento na área central da ponta rochosa do Mucuripe. Sistemas ambientais como campos
de dunas, foz dos rios com seus manguezais e faixa de praia, impactados por usos e ocupações
diversas, foram detalhados. Setores relacionados a obras de engenharia costeira e projetos de
uso e ocupação da orla marítima também foram analisados. Nestes termos, para a
21
sistematização da área de estudo perante os problemas definidos foram classificadas duas
faixas de análise: trata-se da faixa litorânea SE/NO (da foz do rio Cocó até Ponta do
Mucuripe) e da faixa litorânea L/O (da Ponta do Mucuripe até a foz do Rio Ceará).
Do ponto de vista técnico, a realização desta pesquisa contou com etapas de gabinete e
de campo a saber:
1.3.1 Etapa de Gabinete
Para o desenvolvimento do trabalho foram realizadas pesquisas bibliográficas, análise
de documentos visuais (mapas em escalas de 1:5 000 a 1:10 000 e idades de 1920 a 2006 e
fotografias comuns e aéreas de 1920 a 2006). Estes documentos foram coletados na SEINF,
SEMACE, BIBLIOTECAS DA UFC, LABOMAR, CPRM, SEMAM, ARQUIVO
PARTICULAR (ARQUIVO DO NIREZ) e IBAMA. Os mapas, fotografias comuns e aéreas
de 1900 1940, 1940 2000 2006, foram identificados, escaneados, comparados e
descritos, na perspectiva de permitir a análise das alterações históricas na orla litorânea de
Fortaleza nos últimos cem anos.
1.3.2 Trabalhos de Campo
A etapa de campo foi realizada entre outubro de 2005 e outubro de 2006, contemplando
os picos de maré alta e baixa ao longo da faixa de praia SE/NO e L/O de Fortaleza. Esse
campo se deu com visitas periódicas e descrições visuais de cada trecho da foz do Rio Cocó a
Ponta do Mucuripe (faixa SE/NO) e da Ponta do Mucuripe até a foz do Rio Ceará (faixa L/O)
acompanhada de fotografias, tiradas sempre dos mesmos trechos visitados e descritos da área
a cada dois meses. Dessa forma, foram obtidos dados referentes à situação ambiental,
incluindo análises sobre o grau de assoreamento e/ou erosão em cada uma das faixas
litorâneas. Os principais aspectos relacionados com degradação ambiental e urbanização
(destruição de dunas e manguezais, poluição por lixo e esgoto, ocupação indevida da faixa de
praia e áreas contíguas, tipos de uso e ocupação da orla marítima) foram identificados através
de visitas e reconhecimento de suas áreas de ocorrência em cada um dos diferentes segmentos
que compõem tanto a faixa SE/NO quanto à faixa L/O da zona costeira e litorânea de
Fortaleza.
Os resultados foram organizados de forma a permitir a produção bibliográfica dessa
dissertação.
22
1.4 Caracterização Geoambiental da Zona Costeira
1.4.1 Contexto Geológico
Os principais depósitos identificados na planície litorânea e costeira em estudo,
levando-se em conta a área de ocorrência o as praias, os depósitos eólicos (dunas fixas e
móveis), seguidos por sedimentos flúvio-marinhos com depósitos de mangues e a formação
tercio-quaternária Barreiras. Registram-se também as rochas-de-praia, ou “beach rocks” e a
ponta rochosa do Mucuripe, sustentada por rochas pré-cambrianas (MORAIS, 1980).
Figura 02 Mapa Geológico do Município de Fortaleza – Ceará. Fonte: Prefeitura Municipal
de Fortaleza, Secretaria Municipal de Desenvolvimento Territorial e Meio Ambiente SMDT,
2002. Legenda: (creme: Aluviões; marron: Areia de Praia; amarelo: Dunas Móveis; dorado:
Dunas Fixas; coral: Grupo Barreira; cinza ardósia: Embassamento Pré-Precambriano
Granítico; Cinza Fosco: Embassamento Pré-Precambriano Granitóide; Cinza Escuro:
Colúvio/Elúvio).
A Formação Barreira, que representa um pacote sedimentar de idade tercioquaternária
distribuído ao longo da borda do continente por todo o Nordeste brasileiro, dispõe-se em
discordância sobre o embasamento pré-cambriano, sendo recobertos pelos sedimentos
quaternários que compõem a planície litorânea. É composto por sedimentos areno-argilosos,
com ocorrências eventuais de arenitos de granulação grosseira com acentuada friabilidade.
23
Tem cores muito variadas e de predominância creme amarelada ou vermelha (MORAIS,
1980). Estes sedimentos não afloram na área de pesquisa, pois se apresentam recobertos pelos
sedimentos da planície litorânea; na zona litorânea submersa ocorrem em diversos setores
como concreções ferruginosas (MORAIS, 1980).
Sobre a Formação Barreiras estão os depósitos quaternários, representados pelas dunas e
faixas de praia que compõem a planície litorânea de Fortaleza e representam as formas
subaéreas. A origem da planície litorânea está relacionada com processos de regressão
marinha durante o Holoceno, disponibilidade de sedimentos na deriva litorânea, ação eólica e
conformação morfológica da zona costeira (CLAUDINO-SALES, 1993; MEIRELES et al,
2001). Sobre a planície litorânea estão dispostas ruas, avenidas e edificações, entre as dunas
fixas e a faixa de praia. Estes depósitos contornam a ponta do Mucuripe e prolongam-se por
toda a faixa litorânea L/O. No segmento central L/O (entre o bairro Meireles e o centro da
cidade) ocorrem morfologias que podem estar associadas a falésias mortas (CLAUDINO
SALES, 1993).
As dunas são constituídas por areias inconsolidadas de granulação fina a média, bem
selecionadas, com coloração variando de cinza clara na superfície a esbranquiçada na
subsuperfície (MORAIS, 1980). São decorrentes da atuação ou presença de alguns fatores,
tais como a ocorrência de depósitos arenosos de praias e da Formação Barreiras, intensidade e
persistência da direção dos ventos alísios, existência de topografia plana e extensa planície
litorânea, além da ocorrência de pequenos obstáculos tais como cobertura vegetal litorânea
junto aos quais a areia se acumula. Representam depósitos geológicos de idade holocênica, os
quais foram formados a partir da ação dos ventos e disponibilidade de areia para a
remobilização. Está localizada na proximidade da área fonte, afastadas da praia atual em
média 500m, zona de migração relativamente curta (MEIRELES et al, 2001).
Os sedimentos flúvio-marinhos ocorrem ao longo do estuário dos rios Cocó e Ceará, e
foram originados a partir da contribuição dos sedimentos transportados pelos rios e marés.
Neles ocorrem manguezais caracterizados por composições florística e faunística próprias.
Nos demais canais, esses depósitos foram completamente alterados tal é o caso dos riachos
Maceió e Pajeú, que não mais conservam em seus leitos unidades geológicas relacionadas
com flutuações de marés, nem formações vegetais do tipo manguezal. Esses canais foram
completamente descaracterizados no que se diz respeito aos aspectos morfológicos,
geológicos e ecológicos, pela construção de aterros e muros de contenção, além de
lançamento de esgotos resultando em poluição das águas.
24
As praias atuais representam um depósito originado pela ação das ondas, marés,
correntes e disponibilidade de sedimentos na zona litorânea, e são formadas por areias
quartzosas de idade quaternária (MAIA, 1998). Ocorrem por toda a extensão do litoral com
larguras variáveis, eventualmente expondo afloramentos de “beach rocks”.
Os “beach rocks” ocorrem na desembocadura dos rios Cocó e Ceará, além de estarem
presentes nas praias do Titã, Volta da Jurema, Poço da Draga e Leste Oeste. Essas rochas
normalmente representam antigas faixas de praias consolidadas; constituem corpos alongados,
dispostos paralelamente à linha de costa, freqüentemente aflorando em dois ambientes praiais,
a zona de estirâncio e a zona de arrebentação (MORAIS, 1980). A presença desses corpos
muitas vezes contribui para atenuar os efeitos da erosão costeira, tendo em vista que ajudam a
absorver grande parte da energia das ondas, diminuindo a remoção de sedimentos da face de
praia (MORAIS, 1980). Outra utilidade foi dada aos arenitos, principalmente do Mucuripe,
Meireles (Volta da Jurema) e Poço da Draga, que são do tipo ferruginoso e foram usados para
a pavimentação de ruas e ordenamento da cidade de Fortaleza (MORAIS, 1980).
Também se observa uma ponta rochosa, a ponta do Mucuripe, formada por rochas
cristalinas pré-cambrianas (quartzitos), resistentes ao processo de erosão. A ponta do
Mucuripe é de pequena dimensão e situa-se praticamente ao nível das marés; no entanto, ela
se projeta em direção ao mar e define uma inflexão na linha de costa, de SE/NO para L/O,
segmentando o litoral fortalezense nas suas duas faixas distintas.
1.4.2 Compartimentação Geomorfológica
A compartimentação geomorfológica dos dois setores da planície litorânea de Fortaleza,
está relacionada com três domínios morfogenéticos distintos: I as praias; II as dunas e III
– os cursos fluviais.
25
Figura 03 Mapa Geomorfológico do Município de Fortaleza Ceará. Fonte: Prefeitura
Municipal de Fortaleza, Secretaria Municipal de Desenvolvimento Territorial e Meio
Ambiente SMDT, 2002. Legenda: (creme: Planície Aluvial; dorado: Planície Litorânea;
coral: Tabuleiro Pré-Litorâneo; Cinza fosco: Colinas Residuais).
1.4.2.1 As Praias
Geomorfologicamente a faixa de praia do setor faixa SE/NO é bem mais larga do que a
da faixa L/O, e mostra contornos suaves. Tal fato deve-se à presença de um grande aporte de
sedimentos trazidos pela corrente litorânea longitudinal, expondo uma área de contato entre o
mar e o continente bastante ampla (MAIA, 1998). a faixa L/O, apresenta problemas de
erosão bastante acentuados, fato responsável pela existência de uma diminuta quantidade de
areia no estirâncio. Areias quartzosas média a grossa caracterizam essa unidade
geomorfológica (MAIA, 1996).
1.4.2.2 As Dunas
Acompanhando a linha da praia, as dunas sendo orientadas pela direção dos ventos
dominantes, desenvolvem-se para O e SO, apresentando um perfil com declive suave a
26
barlavento e abrupto a sotavento. Estão ainda presentes nas praias de Sabiaguaba e Futuro e
apenas localmente, na Barra do Ceará. As dunas, por seus processos genéticos, podem ser
distribuídas em três classes distintas, a saber: dunas móveis, dunas fixas e semi-fixas e dunas
edafizadas.
As dunas móveis acham-se contínuas à linha de costa. Elas migram livremente pela
planície costeira quando não obstáculos estruturais à mobilização de sedimentos tal
migração acha-se bastante comprometida na atualidade, em função da urbanização.
Formavam campos originariamente caracterizados pelas feições barcana (ou meia lua) e
cordões longitudinais, que não existem mais, ou existem apenas localmente (Praia da
Sabiaguaba).
As dunas fixas ou estáveis e semi-fixas, situadas à vanguarda das dunas móveis, acham-
se parcial ou totalmente fixadas por vegetação pioneira, tal como a salsa (Ipomaca pés-
caprae), oró (Phaseus pondeiratus), bredinho-da-praia (Iresine portulacoides), cipó-da-praia
(Remirea maritima), dentre outras (MEIRELES et al, 2001). A vegetação e o cordão de
dunas à retaguarda entravam o trabalho dos ventos, possibilitando o crescimento vertical
destes depósitos em relação às dunas móveis, com as quais por vezes se interpenetram.
As dunas mais antigas edafizadas são mais interiorizadas e foram provavelmente
remobilizadas durante a última transgressão marinha. Essas dunas acham-se rebaixadas e por
vezes recobertas pelas dunas atuais (SOUZA, 1989), na região de Sabiaguaba.
Para a caracterização das gerações de dunas existentes na planície costeira cearense
devem ser levados em conta os aspectos espaços-temporais, geográficos, morfológicos,
climáticos e os processos geológicos relacionados com a dinâmica dos fluxos de energia
gerados pelas oscilações do nível do mar. Tais contextos proporcionaram condições
ambientais ideais para a formação de pelo menos três gerações de dunas (CLAUDINO-
SALES, 2002).
A primeira geração está representada pelas dunas mais antigas, edafizadas, associadas
aos últimos episódios de variações eustáticas e eventualmente anteriores estudos mais
detalhados no futuro podem vir a individualizar diversas gerações nesse longo intervalo de
tempo. Hoje, elas se distribuem de forma relativamente homogênea ao longo de toda a área
urbanizada de Fortaleza, marcadas pelas estruturas urbanas.
A segunda geração é representada pelas dunas fixas e semi-fixas (parabólicas,
transversais e longitudinais, hoje ainda presentes somente nas praias da Sabiaguaba e do
Futuro), as quais foram originadas durante períodos holocênicos mais recentes (pós-
transgressão holocênica), quando havia grandes volumes de areia para o transporte eólico – tal
27
volume é estimado em aproximadamente 270 milhões de m
3
para as dunas da Praia do Futuro
(MEIRELES et al, 2001). No entorno da ponta do Mucuripe e ao longo do segmento L/O, a
dinâmica local representada por bypass de sedimentos impediu a fixação dessas dunas,
criando feições do tipo barcanas e barcanoídes, hoje praticamente ausentes da paisagem em
função da urbanização.
A terceira geração é representada pelas formas atuais móveis e em formação, as quais
estão posicionadas sobre a zona de berma e a planície litorânea, logo após a linha de maré
alta. Podem ser identificadas na Praia do Futuro, localmente recobrindo áreas de barracas, e
em alguns setores mais interiores da praia de Sabiaguaba.
As dunas se estendiam pelos 23 km da linha de costa que hoje correspondem a uma área
praticamente tomada por residências e outros equipamentos urbanos. Apresentam atualmente
um elevado índice de artificialização e uma densidade demográfica de 5.255 hab. /km
2
(IPLANCE, 1997).
Evidências de interferências humanas foram constatadas em toda extensão destes
depósitos, o que caracteriza índices elevados de impermeabilização com efeito, existem
quadras completamente impermeabilizadas por equipamentos urbanos, residências e barracas
de praia. Tal tipo de ocupação influencia diretamente na dinâmica eólica, minimizando ou até
mesmo impedindo o contato dos ventos com os sedimentos, inibindo assim a formação de
novas dunas.
Desta maneira, verifica-se que a expansão urbana ao longo do século XX, como se
desenvolveu, não levou em conta qualquer medida de proteção e preservação dos ambientes
de praia e dos campos de dunas, bem como dos ecossistemas associados.
1.4.2.3 Os Cursos Fluviais
O Rio Cocó é o principal curso fluvial da faixa SE/NO da cidade de Fortaleza. Tem suas
nascentes situadas na serra de Pacatuba, Região Metropolitana de Fortaleza, a partir de onde
realiza um percurso de 47 km até atingir o Oceano Atlântico na Praia do Futuro (praia do
Caça e Pesca – litoral SE/NO). No seu baixo curso, entre 8 km a montante da foz, desenvolve-
se um exuberante manguezal, ocupando uma área de 602 ha (CLAUDINO SALES, 2005).
A área do entorno da desembocadura do rio apresenta-se ainda pouco adensada do
ponto de vista urbano. Os arruamentos laterais à via central são quase inexistentes e os
equipamentos urbanos de grande porte ainda são escassos. Tem-se também nesta área a
presença de residências populares no campo de dunas remanescentes e nos limites da área
28
periodicamente inundável deste rio. O manguezal e o campo de dunas apresentam-se
degradado à margem esquerda do estuário (Praia do Futuro). Nesta área as dunas são do tipo
fixas ou móveis, também bastante ocupadas e degradadas.
Os principais eixos macrodrenantes da faixa L/O são representadas pelos riachos
Maceió, Pajéu, Jacarecanga e Rio Ceará.
O riacho Maceió, situado a leste, nasce na lagoa do Papicu e deságua na Avenida Beira-
Mar; encontrando-se quase todo canalizado e com águas poluídas por esgotos domésticos. O
Pajeú é o riacho às margens do qual a cidade historicamente floresceu. Situa-se no segmento
central da cidade, e de sua várzea natural remanescem somente duas áreas verdes, a primeira
situada na antiga sede da Prefeitura, e a segunda próxima à administração da Câmara de
Dirigentes Logistas - CDL de Fortaleza, no centro da cidade. Hoje este curso fluvial é um
riacho canalizado e poluído. O riacho Jacarecanga, situado a oeste, também se encontra neste
mesmo estado - totalmente canalizado, poluído e descaracterizado.
Na faixa oeste, situa-se o Rio Ceará. As nascentes deste rio estão localizadas em sua
maioria na Serra de Maranguape e o principal rio percorre aproximadamente 60 quilômetros
na direção O-NE, até desembocar no Oceano Atlântico na Barra do Ceará. Sua bacia fluvial
tem cerca de 900 quilômetros quadrados de área total, abrangendo parte dos municípios de
Maranguape, Fortaleza, Caucaia e Maracanaú (SUDEC, 1977). O rio Ceará es incluído no
grupo de pequenos rios litorâneos, possuindo uma planície aluvial composta por manguezais,
além de meandros e pequenas ilhas fluviais (SUDEC, 1977). Em vista da sua localização o rio
Ceará não possui grande importância sedimentar para a área de estudo: os sedimentos que este
rio lança no mar alimentam as praias situadas a oeste de Fortaleza.
1.4.3 Condições Climáticas
As condições climáticas da região de Fortaleza estão relacionadas diretamente com
indicadores meteorológicos definidos por direção e velocidade dos ventos, insolação,
precipitação pluviométrica e temperatura do ar.
As características atmosféricas definem um clima quente, com temperatura média anual
situando-se em torno de 26ºC (BEZERRA, 1989). O regime pluviométrico do município é
definido pela concentração de chuvas, caracterizando-se por uma estação chuvosa e outra
seca. A estação chuvosa está concentrada no primeiro semestre, chegando a tingir 1.196
milímetros, o que corresponde a quase 90% do total anual. Estas condições estão associadas
aos movimentos da Zona de Convergência Intertropical ZICT. A estação chuvosa inicia-se
29
em janeiro prolongando-se até abril, onde alcança o máximo de precipitação, diminuindo
gradativamente até julho.
No segundo semestre encontra-se a estação seca, chegando apenas a 257,9 milímetros de
pluviosidade. Começa em julho indo até dezembro, sendo que o mês de novembro apresenta
uma precipitação média de 12 milímetros. A distribuição mensal das chuvas ocorre de
maneira uniforme com dia de nove dias de chuva em cada mês. Estas chuvas possuem
curta duração e distribuição espacial bastante irregular (PDDU – FORT, 1997).
O regime eólico cearense é controlado basicamente pelos ventos alísios, que atingem o
litoral fortalezense vindos do quadrante leste. No primeiro semestre do ano dominam os
alísios de NE, que se deslocam com velocidade de 4m/s em média; no segundo semestre, com
velocidade média de 7m/s se destacam os alísios de SE (CLAUDINO SALES, 1993; MAIA,
1998). O ano todo também ocorre à penetração de alísios de E. Os três alísios interagindo
entre si e com as brisas marinhas e terrestres que se formam diariamente, com a direção
paralela à linha de costa, produzem uma direção final do vento orientada para leste
(CLAUDINO SALES, 2005).
Os ventos reinantes exercem uma grande influência sobre a costa fortalezense, o que
pode ser confirmado pelas extensas dunas que existiam em alguns sítios, com alinhamento na
direção do vento dominante. Os ventos alísios movimentavam as dunas existentes na praia do
Futuro as quais chegavam através do bypass a atingir as praias localizadas a leste como
Meireles e Praia de Iracema. Hoje, este trânsito se encontra interrompido pelas obras urbanas
ao longo deste setor.
Durante o período de estiagem prolongada (estação seca), ocorre um aumento no
volume de areia transportada pelo vento. Ou seja, nos meses de junho a janeiro, os ventos são
mais intensos e a insolação média é mais elevada, o que caracteriza uma fase de migração de
dunas moveis atuais, devido a um aumento do transporte de sedimentos eólicos. Tal situação
implica na geração de problemas ambientais associados à invasão de areias em residências no
setor litorâneo sudeste da cidade.
1.4.4 As Forças Marinhas Atuantes no Litoral
As ondas, marés e correntes constituem as principais forças atuantes na morfogênese
litorânea. Elas são responsáveis por mecanismos de transporte, deposição e erosão ao longo
da faixa costeira e litorânea, a saber:
30
1.4.4.1 As Marés
A maré do litoral de Fortaleza é semi-diurna, isto é, ocorrendo preamar e baixa-mar
duas vezes em vinte e quatro horas, sendo a média das marés altas da ordem de 2,9m
(GEOPLAN, 1994). Tal contexto caracteriza um ambiente do tipo meso-maré. As marés
praticamente não sofrem influência metereológica, sendo controladas essencialmente pelas
condições cósmicas responsáveis pela sua formação.
Devido à variação da amplitude de maré, largos estirâncios se expõem à ação dos ventos
constantes, fato que favorece a formação de campos de dunas paralelas à linha de costa, como
acontece ainda hoje na Praia do Futuro e Sabiaguaba (CLAUDINO SALES, 1993).
1.4.4.2 As Ondas
As ondas resultam da ação dos ventos, representando a transferência direta da energia
cinética da atmosfera para a superfície oceânica (CHRISTOFOLETTI, 1974).
Quanto maior a velocidade do vento a sua duração e a extensão da área sob influências
eólicas, maiores serão as ondas. Calcula-se que as maiores dimensões são atingidas quando a
extensão do fetch (extensão da superfície sob ação do vento) aproxima-se de 100 milhas
náuticas (CHRISTOFOLETTI, 1974). Entretanto, para cada molécula da água, o movimento é
quase circular, sendo pequeno o deslocamento na direção do movimento da onda, o que
implica em fraca transferência de massa.
As ondas transmitem energia e executam a maior parte do trabalho de esculturação das
paisagens costeiras. A altura da onda determina a energia potencial, enquanto o movimento
das partículas individuais de água, quando a onda passa, é a medida de energia cinética da
onda; os sedimentos do fundo do mar movem-se para frente e para trás e absorve energia da
água em movimento (CHRISTOFOLETTI, 1974). A energia da onda não é distributiva
igualmente ao longo das praias. A influência de pontas, altos ou baixos batimétricos e a
própria orientação da praia diversifica esta energia (CHRISTOFOLETTI, 1974).
As ondas dominantes no litoral de Fortaleza são de direção L e SE (MAIA, 1998). São
de formação local, ou do tipo “sea” – isto é, ondas altamente irregulares, que são produzidas e
influenciadas diretamente pelo vento local soprando sobre a superfície do mar. Elas
apresentam altura média significativa de 1,1m, freqüência de 5s e período de 15m (MAIA,
1998).
31
Ocorrem também ondas do tipo “swell”, que são ondas mais suaves aproximando-se da
forma sinusoidal e se propagam fora do local da ação do vento que as cria (MAIA, 1998).
Elas são formadas no Hemisfério Norte e se propagam até a zona litorânea cearense,
sobretudo durante os meses de dezembro a março, com direção NE (MAIA, 1998).
Desta forma as ondas mais freqüentes do litoral fortalezense, são as do quadrante L – SE
e do tipo “sea”, as menos freqüentes, do quadrante NE do tipo “swell”, e que são as mais
perigosas do ponto de vista erosivo, sendo responsáveis pela maior parte do transporte frontal
de sedimentos (MAIA, 1998). As ondas do quadrante L SE, são as principais responsáveis
pelo caminhamento das areias, no sentido de leste para oeste (MORAIS, 1980).
1.4.4.3 As Correntes
O movimento predominante das águas na área de estudos é o movimento ondulatório.
Há, no entanto, presença constante de deslocamentos, do tipo correntes. (MAIA, 1998).
Com efeito, impulsionada pelos ventos, pelas marés e pelas ondas, ocorre uma forte
corrente marítima, próxima à linha de costa cearense, chamada de deriva litorânea, ou
corrente longitudinal. A deriva litorânea desloca-se com velocidade média de 0,45m/s e
apresenta direção dominante de E e SE (MAIA, 1998). Como esta a corrente marítima ao
longo do litoral cearense é muito atuante e a plataforma continental pouco profunda, a
dinâmica litorânea ocasiona depósitos sedimentares em algumas áreas, enquanto que em
outras significativa erosão (BOTELHO, 2004). As vagas revolvem os sedimentos,
arremessando-os continuamente para as praias, provocando de um lado grande acúmulo de
areia (faixa sudeste/noroeste) e de outro lado, uma intensa erosão (faixa leste/oeste)
(BOTELHO, 2004).
As correntes no entorno do Porto do Mucuripe são de fraca intensidade elas ocorrem
sempre em direção paralela à linha de costa, no sentido de leste para oeste com intensidade
máxima de 0,5 a 0,6 m/s (GEOPLAM, 1994). Morais (1980), define que a corrente resultante
no litoral de Fortaleza é devida unicamente à ação constante dos ventos. Ela é
permanentemente orientada na direção noroeste, tangida pelo vento de 80 graus. Sua
velocidade mantém-se sempre abaixo de 1 (um) nó, mas sofre variações dependendo da
intensidade dos ventos e posicionamento das marés. Foi observado que as velocidades
decrescem com a profundidade, havendo, no entanto uma zona de maior intensidade a 2m de
profundidade, onde alcançam 55 cm/s; na zona superficial permanece a maior parte do tempo
em 40 cm/s (MAIA, 1998).
32
1.4.4.4 Transporte, Sedimentação e Erosão no Litoral de Fortaleza.
O transporte litorâneo é orientado para oeste, em decorrência da direção do vento e das
ondas (MORAIS, 1980; MAIA, 1998). O transporte de sedimentos é unidirecional, conforme
a posição da linha de costa; na Praia do Futuro, ocorre de SE para NO e entre a Praia de
Iracema é de Leste para Oeste (MORAIS, 1980).
Na faixa SE/NO o Rio Cocó funciona como um receptor de material eólico, que é
adicionado ao transporte fluvial e, posteriormente, redistribuído pelo sistema dessa forma
ocorre localmente uma contribuição estuarina de sedimentos para a faixa de praia, em que
pese à pequena contribuição tipicamente fluvial que caracteriza o litoral cearense como um
todo (MAIA, 1998).
A deriva litorânea e as dunas exercem um papel importante no trânsito de sedimentos de
um setor para outro da linha de costa. A configuração da zona litorânea de Fortaleza mostra-
se em diversos trechos, favorável a mobilização de areias pelo vento em direção à linha de
costa, fazendo com que as areias eólicas sejam incorporadas à deriva litorânea, através do
bypass, contribuindo assim para a manutenção do equilíbrio dinâmico das praias a jusante
(CLAUDINO-SALES, 1993) (ver figura 04).
33
Figura 04 - Bypass Litorâneo (Setas Verdes) e Costeiro (Setas Vermelhas). Fonte:
Meireles, Silva & Raventos (2001)
A hidrodinâmica das águas costeira associada às características texturais dos
sedimentos, leva a admitir que os tipos predominantes de transporte de sedimentos na costa de
Fortaleza são o transporte litorâneo e o transporte frontal, sendo o primeiro muito mais
intenso que o segundo (MORAIS, 1980). O transporte litorâneo é o transporte paralelo à
costa, realizado pelas ondas na zona de rebentação, devido à direção oblíqua de incidência
sobre as praias. O transporte frontal é devido à incidência perpendicular das ondas sobre as
praias, levando sedimentos do largo para a praia e vice-versa (MORAIS, 1972).
Para estes dois tipos de transporte de sedimentos, como vimos às ondas desempenham
um papel fundamental de acordo com o seu ângulo de incidência sobre a praia. Quando as
cristas das ondas são paralelas à linha da costa, dá-se o ataque frontal, e o acúmulo das águas
que atravessam esta linha provoca uma carga contrária com o retorno de águas para o largo, a
fim de manter o volume de equilíbrio d’água que passa em ambos os sentidos (MORAIS,
1972). Isto é observado principalmente nos meses de janeiro e fevereiro nas praias de
Meireles e Iracema. Quanto mais forte o ataque, maior possibilidade de retorno intenso das
águas carreando material, provocando erosão e dando lugar a perfis de emagrecimento das
praias (perfil de inverno) (MORAIS, 1980).
Quando as cristas das ondas têm direção obliqua à linha da costa, o movimento
resultante é paralelo à costa, o transporte do sedimento é em dente de serra; a presença de
barras submersas, embocadura de rios, ou mesmo a variação saliente das curvas batimétricas,
provocam o retorno das águas sob forma de correntes de concentração (“rip currents”)
(MORAIS, 1980), as quais removem sedimentos da faixa litorânea em direção ao largo.
Dominguez (1993) advoga que a erosão da linha de costa é, mais adequadamente,
caracterizada como recuo da linha de costa. Isto se deve ao fato de que as praias, porção mais
visível e valiosa da maioria das zonas costeiras, não está na realidade sendo erodida, mas
simplesmente mudando sua posição no espaço. Tal fenômeno não causa danos ao ambiente
praial, que se ajusta continuamente à evolução do traçado litorâneo. Segundo o autor, a
“crise” da erosão costeira é, em certo sentido criado pelo homem, pois se ninguém ocupasse
as áreas próximas à linha de costa, não haveria problema algum.
As principais fontes para os sedimentos presentes no litoral de Fortaleza é a erosão
natural das falésias e das praias que se situam no segmento leste do litoral do Ceará
(CLAUDINO-SALES, 2005). O aporte fornecido pelos rios, normalmente considerável em
34
outras regiões litorâneas, é reduzido no litoral do Ceará, face a tendência à intermitência dos
cursos d’água e a elevada energia das ondas (MAIA, 1998). Tal situação implica em perda de
sedimentos da faixa litorânea para os rios, os quais são inclusive transportados para dentro das
embocaduras fluviais pela ação das ondas e correntes de marés - desta forma, ocorre redução
de areias para alimentação da faixa de praia, mas por outro lado um aumento dos estuários dos
rios pelo acúmulo de sedimentos (MAIA, 1998).
Sendo assim, o setor leste cearense concentra erosão, sendo fonte de sedimentos, e os
setores oeste e central (nesse último, situa-se a cidade de Fortaleza) atuam como área
receptora de sedimentos. Um exemplo prático é a praia do Futuro em Fortaleza, que se
comporta como área receptora destes sedimentos (CLAUDINO SALES, 2005).
No percurso do transporte dos sedimentos da faixa litorânea SE/NO, inúmeros
elementos naturais e sociais, acabam retendo areias nas praias, propiciando a mudança do
trânsito litorâneo. Quando tal fato ocorre, para compensar a perda, as ondas retiram areias de
praias e falésias, alimentando novamente a deriva litorânea. Esses mecanismos produzem
verdadeiras células sedimentares (e.g. CLAUDINO SALES, 2005) no espaço costeiro e
litorâneo. Apesar de relativamente autônomas, as células sedimentares se comunicam através
do transpasse ou mecanismo de bypass de sedimentos, que pode ser tanto costeiro, nesse caso
comandado pelos ventos, como litorâneo, controlados pelas ondas e correntes litorâneas
(CLAUDINO SALES, 2005).
O bypass costeiro de sedimentos ocorre sobre zonas costeiras, e se processa quando se
formam dunas a barlamar de pontas litorâneas; um exemplo prático deste processo é a
passagem das dunas da praia do Futuro (setas vermelhas na figura 04), impulsionada pelo
vento, transpondo a ponta do Mucuripe, até as praias do Meireles, Iracema e Barra do Ceará
em ultimo estágio.
O outro caso é o bypass litorâneo (setas verdes na figura 04) que se processa quando as
areias acumuladas na área submersa a barlamar das pontas, ou espigões, acabam transpondo o
obstáculo. Um exemplo prático é a passagem de sedimentos no setor submerso da Ponta do
Mucuripe em direção à bacia portuária do Mucuripe, produzindo freqüentes assoreamentos
que dificultam a navegação (figura 04, 05 e 06).
35
Figura 05 Rio Cocó e adjacências. As setas em velmelho mostram a configuração dunar,
as curvas de nível com as menores altitudes se distanciando da foz do rio e da praia. Fonte:
Serviço Geográfico do Exército, 1945. Escala: 1:10: 000
36
Figura 06 As setas em azul mostram as dunas do Papicu e Mucuripe realizando o bypass
costeiro Praia do Futuro. A distância das curvas de níveis nos revela um enorme campo de
duna dispersante em direção à ponta do Mucuripe. Fonte: Serviço Geográfico do Exército,
1945. Escala: 1:10: 000
Cabe frisar que tanto o bypass costeiro como o litorâneo que se processavam da faixa
SE/NO para a faixa L/O no litoral de Fortaleza, hoje se encontram interrompido por
construções (barracas, edifícios residenciais, instalações urbanas diversas) e pela interferência
de obras de engenharia mal planejadas, como o porto do Mucuripe e respectivo espigão de
proteção. Tais fatos produziram erosão no segmento litorâneo L/O, por carência de
sedimentos, que ficaram retidos a barlamar.
Para agravar tais problemas erosivos, particularmente na praia de Iracema, um outro
fator deve ser mencionado: o surgimento no litoral do Nordeste brasileiro, a partir de 1990, de
ondas do tipo “swell”, com períodos de até 18s, proveniente do Mar do Norte e com alto
poder destrutivo para o nosso litoral. Essas ondas se manifestam prioritariamente entre os
meses de dezembro e março de cada ano, aumentando o poder erosivo das tempestades de
ressacas sobre as praias (VASCONCELOS, 2005).
2. A ZONA COSTEIRA E LITORÂNEA DE FORTALEZA ENTRE 1900 E 1940
Nas primeiras décadas do século XX, Fortaleza era uma cidade cujos laços econômicos
e culturais eram associados com o interior do Estado (DANTAS, 2002) - nesses termos,
verificava-se a existência de uma cidade que então dava as costas para o mar. Tal situação
reflete-se claramente na ocupação das faixas litorâneas SE/NO e L/O, a saber:
2.1 A Faixa Sudeste - Noroeste
A faixa SE/NO representava uma larga banda de terra praticamente desocupada nas
décadas anteriores a 1940. Propriedade de um único proprietário, Antonio Diogo, que
denominava a área de “Sítio Cocó” (COSTA, 1988), essa banda de terra ocupava toda a área
leste do Mucuripe indo até a foz do rio Cocó, tendo como limite sul o próprio rio, e a norte e
nordeste, o mar.
37
A área era caracterizada pela presença de dunas, praias, lagoas e manguezais. As
margens do Rio Cocó eram exploradas com agricultura de subsistência e pesca pelos
posseiros e pescadores que viviam na área com a criação de gado, agricultura e produção de
sal marinho pelo proprietário (COSTA, 1988). O Rio Cocó provia em sedimentos a faixa de
praia que eram transportados por uma deriva litorânea atuante (MAIA et al, 1998).
Até a década de 40, este segmento mantinha um perfil praial progressivo, configurando
um setor que possuía larga faixa de praia, com um grande aporte de sedimentos e dunas bem
desenvolvidas (MAIA et al, 1998). Esta faixa passou pelo processo de ocupação no inicio
da década de 70 - foi a partir dessa época que o perfil praial urbano começou a ser tecido pela
construção de residências, barracas de praia e clubes recreativos (COSTA, 1988).
A faixa SE/NO era a principal fonte de sedimentos para o setor L/O. Entre elas um
imenso cordão dunar se estendia, adentrando o continente e realizavam o transpasse (bypass)
sobre a ponta rochosa do Mucuripe, indo alimentar as praias a L/O de Fortaleza (figura 07).
Figura 07 Faixa de praia da faixa SE/NO em 1920. A seta vermelha mostra o percurso
das areias, realizando o bypass costeiro. As setas em azul representam o perfil progressivo
da faixa de praia bem alimentada em sedimentos. Fonte: Arquivo Nirez
2.2 A Faixa Leste – Oeste
Com a ocorrência de grandes secas e agravamento da questão agrária ao longo das
primeiras décadas do século XX, o homem do campo cearense migrou para Fortaleza. Surgem
as primeiras favelas, situadas na faixa litorânea (Pirambu, Arraial Moura Brasil e Mucuripe),
38
principalmente a partir da seca de 1932. A população imigrante aloja-se em locais próximos
das indústrias, construindo seus barracos em terrenos públicos e privados que estivessem
desocupados. Fixam-se também na faixa litorânea e nas dunas áreas desprezadas pela
população de mais alta renda (COSTA, 1988).
Entre 1902 e 1906, foi construída na área central desse setor a Ponte Metálica também
denominada Ponte da Alfândega. Esta ponte serviu por longos períodos como o principal
porto da Fortaleza. Outra ponte, a dos Ingleses, que também serviria como porto foi iniciada
em 1922 e logo depois interrompida por evidenciar que não seria seguro para as atividades
portuárias. Ainda nessa época, a cidade de Fortaleza mantinha um desinteresse pela faixa
praiana.
Com efeito, a cidade utilizava a orla marítima apenas para as atividades portuárias e
pesqueiras com rápidas investidas no campo do lazer trazidas por serenatas em noite de luar
ou por banhistas predominantemente masculinos (ROCHA Jr, 1984). Aos poucos, o
fortalezense em geral foi descobrindo a praia como local de lazer e de deleite visual e a
urbanização alcança a Praia de Iracema nos anos 30 e 40 (DANTAS, 2002).
Na época, a Praia de Iracema era constituída por jangadeiros com suas casas de palhas e
com suas areias muito limpas e repletas de coqueiros. Aos poucos, esse cenário foi
despertando a cobiça dos veranistas mais abastados. Um dos pioneiros foi o Coronel Porto,
comerciante vindo de Recife, que em 1926 inaugura um palacete à beira-mar, onde hoje
funciona o restaurante Estoril. Em torno da casa dos Portos, novos pequenos palacetes se
levantaram, formando aos poucos um casario de feições ecléticas (ROCHA JR, 1984). em
1929, o clube Náutico Atlético Cearense se implantava na Praia Formosa nas imediações da
Ponte Metálica, ao mesmo tempo em que a Praia de Iracema marcava o início de sua trajetória
gloriosa como ponto de encontro e recreação da cidade. A ampla faixa de praia passa a ser o
novo ponto de encontro e diversão da cidade (ROCHA JR, 1984).
Apesar de muitas discussões e polêmicas as obras do Porto do Mucuripe foram iniciadas
em 1938, nas adjacências da ponta rochosa natural homônima. O perfil da praia da faixa L/O
esteve estável até a construção dessa primeira grande obra. A partir daí os impactos
ambientais alteraram e vem alterando drasticamente esses ambientes costeiros e litorâneos.
Podemos perceber nitidamente na figura 08 a configuração dos impactos ambientais
causados pela remoção de dunas, o aplainamento e descaracterização da faixa praia e pós-
praia, moradias na faixa de praia configurando como um indicador de ocupação residencial e
um grande movimento de navios, logo no início da construção do Porto do Mucuripe.
39
Figura 08 – Início da Construção do Porto do Mucuripe em 1939. As setas em azul indicam
navios atracados, residências de pescadores, uma estrada central de movimentação de
cargas. Visualiza-se também um aplainamento, possivelmente devido ao desmonte das
dunas para a instalação do canteiro de obras do porto. Fonte: Arquivo Nirez
O segmento L/O era um setor com uma larga faixa de praia. Esta estabilidade era
mantida pelo bypass litorâneo e o costeiro, proveniente da faixa SE/NO. Nas figuras 09 e 10
os sedimentos lançados pela corrente litorânea e pelo aporte do Rio Cocó sobre a faixa SE/NO
são evidenciadas.
Figura 09 – Ponta do Mucuripe em 1920 (vista SE/NO). As setas vermelhas indicam ondas e
ventos atuantes na área. Fonte: Arquivo Nirez
40
Figura 10 Ponta do Mucuripe em 1920 (vista L/O). A seta verde indica uma enseada
progressiva, rasa, praia ampla e dunas bem desenvolvidas a montante. A seta azul indica o
Farol do Mucuripe construído sobre dunas. Fonte: Arquivo Nirez
A figura 11 mostra em detalhes a Enseada do Mucuripe protegida por rochas-de-praia:
a Praia do Meireles, o Riacho Maceió, o Baixo da Prainha e recifes, o Rio Pajeú, o antigo
Porto com seus armazéns, protegidos da erosão natural, o Riacho Jacarecanga e a Praia do
Arpoador. Esta figura nos revela um litoral livre de condições erosivas mais agressivas.
Figura 11 Primeira planta do Porto e Vila de Fortaleza elaborada por Silva Paulet em
1818. Nesta figura podemos perceber como se deu a ocupação do litoral de Fortaleza (área
central da figura), os armazéns de carga e o arruamento da Vila de Fortaleza que logo se
tornou cidade. Fonte: Arquivo Nirez
Na figura 12 observamos um segmento do litoral privilegiado para se construir um
farol. Observa-se também um litoral protegido por rochas-de-praia e pouco profundo.
41
Figura 12 Rochas-de-praia próximo da Ponta do Mucuripe em 1935. As setas em
vermelho mostram as rochas de praia sobre a Enseada do Mucuripe e o Farol construído
sobre um campo dunar. Fonte: Arquivo Nirez
As figuras 13 e 14 evidenciam um litoral suave, protegido por rochas de praia
configurando-se com um ambiente praial progressivo e bem alimentado em sedimentos. Os
coqueiros ocupavam a faixa de pós-praia, pois havia ausência de arruamento - porém se
praticava o lazer através das caminhadas a beira mar.
Figura 13 Praia do Mucuripe em 1935, com coqueiros e uma larga faixa de praia. Fonte:
Arquivo Nirez
42
Figura 14 Volta da Jurema em 1935 com o pós-praia coberto de vegetação rasteira,
configurando-se um ambiente litorâneo protegido e preservado. Fonte: Arquivo Nirez
A figura 15 mostra uma praia larga, suave, com ausência de erosão acentuada,
configurando um perfil praial ainda desenvolvido. Observamos também os níveis de maré
(alta e baixa) e o início da ocupação do litoral fortalezense que se deu principalmente a partir
da Praia de Iracema.
Figura 15 - Praia de Iracema na década de 1930. No início da ocupação, nota-se uma
ampla faixa de praia ao fundo e a elite fortalezense caminhando sobre a areia, além de
diversos casarões nas próximidades. Fonte: Arquivo Nirez
43
Neste segmento paisagístico evidenciado pela figura 16 percebe-se uma praia protegida
por rochas de praia. A zona costeira mostrava-se ocupada por dunas já edafizadas cobertas por
vegetação de coqueiros e palmeiras.
Figura 16 Praia de Iracema em 1935. Seta azul: rochas de praia. A seta vermelha mostra
vegetação litorânea. Fonte: Arquivo Nirez
Na figura 17 pode-se indicar a ausência de arruamento, porém já se nota um processo
de ocupação da orla pela elite fortalezense, com a implantação de algumas residências sobre o
pós-praia.
Figura 17 Coqueiros na Praia de Iracema, pequenas casas de taipa de pescadores e uma
ampla e suave faixa de praia em 1937. Fonte: Arquivo Nirez
A área da Ponte Metálica (figura 18) configura-se como uma área de praia larga, suave,
progressiva e bastante alimentada por sedimentos com ausência de erosão acentuada.
44
Figura 18 - Ponte Metálica na década de 1930, faixa de praia com grande aporte de
sedimentos e larga. Fonte: Arquivo Nirez
A figura 19 mostra um vultuoso processo de ocupação do litoral por armazéns e
residências nas proximidades do Poço da Draga e da Ponte Metálica com a construção de um
espigão para proteger a área que foi utilizado como estrutura portuária por um longo tempo.
Figura 19 - Ponte Metálica ao fundo (seta amarela). A seta vermelha indica o antigo Porto
de Fortaleza (Poço da Draga) e a seta azul indicam armazéns e uma área bastante
urbanizada em 1940. Fonte: Arquivo Nirez
45
Nas figuras 20, 21 e 22 têm-se um ambiente praial progadante com grande formação e
mobilização de areias e dunas além de praias ocupadas por vegetação de coqueiros e
palmeiras.
Figura 20 / 21 - Praia dos Arpoadores, ampla faixa de praia e diversos coqueiros sobre a
faixa de praia, 1930. Fonte: Arquivo Nirez
Figura 22 Praia Formosa. Observam-se dunas barcanoides e uma vegetação bem
desenvolvida sobre a orla Marítima em 1936. Fonte: Arquivo Nirez
O conjunto fotográfico acima exposto demonstra de forma clara que as alterações
urbanas no meio natural relativo à orla marítima de Fortaleza, tanto na faixa SE/NO quanto na
46
faixa L/O eram significativas até meados das décadas de 1930 e 1940. Tal fato ilustra o
interesse do estado e dos investidores no litoral cearense até essa época, pois Fortaleza era
uma cidade comercial, o porto era utilizado para tal fim, o que atesta que as grandes
alterações históricas nesse segmento são relativamente recentes, se comparada a toda a
história urbana da cidade.
2.3 Dunas de Fortaleza: Um Registro mais Antigo
O primeiro registro escrito sobre as dunas de Fortaleza está no diário do comandante da
segunda expedição holandesa no Nordeste brasileiro, que tratou essas feições pela
denominação de “morro”. A segunda ocupação holandesa ocorreu no dia 3 de abril de 1649,
comandada por Matias Beck, que desembarcou na enseada do Mucuripe e estabeleceu-se à
margem esquerda do Riacho Marajaik (Marajaitiba, Pajeú), sobre o “morro” do Marajaik
(Marajaitiba). Na área, os holandeses construíram, com traçado do engenheiro Ricardo Carr,
um forte, batizado-o de “Schoonenborch” (SANTOS, 1988; AZEVEDO, 2001). O Forte
perdura até hoje na paisagem urbana.
No setor a oeste do Morro Marajaitiba situava-se o Morro do Croatá, mencionado nas
Leis Provinciais do Ceará e em Carta de Gonçalves Dias, chefe da sessão de Antropologia da
Comissão Científica de Exploração do governo brasileiro. O Croatá foi descrito como um
cômoro de areia revestido de alguma vegetação que, situado próximo à costa, era facilmente
visualizado por aqueles que se dirigiam ao porto, vindos do mar (BARBOSA et al, 2005).
Além dessas feições, outros campos de dunas ocorriam na cidade, distribuídas entre a foz do
rio Cocó e a foz do rio Ceará. No Centro antigo de Fortaleza localizavam-se também os
“morros” Taliense (T), Pecado ou Alto da Pimenta (AP) e um ‘morro’ que foi ocupado pela
Praça Visconde de Pelotas (VP). No setor a leste da cidade, existia as dunas da Prainha (OP),
Meireles (Me), Mucuripe (Mu) e o Outeiro ou elevação da aldeota (EA) (BARBOSA et al,
2005) (figura 23).
47
Figura 23 - Localização das dunas costeiras (1649 1954). Simbologia: M Marajaitiba ou
Misericórdia, C - Croata, T Taliense, OP Outeiro da Prainha ou Ponta da Prainha, AP
Morro do Pecado ou Alto da Pimenta, VP Morro da Praça Visconde de Pelotas, Me _ Dunas
do Meirelse, Mu- Dunas do Mucuripe, EA Outeiro ou Elevação da Aldeota. Fonte: Barbosa
et al, 2005.
Em Fortaleza, a migração das dunas sobre construções ocorreu ao longo de toda a
história antiga da cidade, em particular durante os séculos XIX e XX. Nas primeiras plantas
urbanas de 1813, elaboradas por Silva Paulet e de 1859, 1863, 1875 e 1888, elaboradas por
Herbster, estão registrados o substrato arenoso e os morros bordejando a linha de praia. no
século XX, Hawkshaw (1909) relata a mobilidade de areia na “Ponta da Areia” a barlamar do
Morro Marajaitiba (foz do rio Pajeú) (COSTA, 1988). Na descrição de Paes Leme (1943:
314), as dunas cavalgavam sobre o tabuleiro no trecho entre a foz do rio Cocó e a Ponta do
Mucuripe. As dunas avançavam na direção da enseada do Mucuripe, da praia do Meireles e da
Prainha, apresentando uma cobertura eólica variável em torno de 17,5 m a 50,0 m de altitude
com 3 km de comprimento. No setor leste, além das dunas muitas bem desenvolvidas,
ocorriam planícies ondulantes (BARBOSA et al, 2005). Este quadro mostra que no setor L/O,
o campo de dunas era exuberante, com maiores altitudes no Mucuripe, devido a colmatagem
das dunas; no setor leste, embora com dunas bem desenvolvidas margeando o litoral, as
planícies arenosas suavemente onduladas se alternavam com zonas úmidas mais baixas para o
interior (BARBOSA et al, 2005).
Os mapas, os registros de Hawkshaw (1909) e a observação de Paes Leme (1943)
apresentam evidências do transporte eólico do setor SE/NO para o L/O (BARBOSA et al,
48
2005). Pelo menos quatro relatórios oficiais, entre 1859 e 1910, indicam a mobilidade das
dunas como inconvenientes para obras portuárias e, por conseguinte, como obstáculo para o
desenvolvimento da vila/cidade. Estes relatórios recomendam a construção de estruturas
rígidas costeiras e o plantio para a fixação das areias. No primeiro, de 1859, o técnico francês
Pierre Florente Berthot recomenda a construção de uma muralha no bairro Meireles, a fim de
obstar a marcha das areias e, igualmente, o revestimento das dunas com determinado tipo de
grama e outros vegetais adequados (BARBOSA et al, 2005). A muralha ficou pronta e
produziu os resultados esperados, assim como o plantio da grama, mas as medidas foram
inutilizadas ao longo do tempo por descontinuidade de sua conservação e ampliação.
No segundo relatório, em 1871, o engenheiro cearense Zózimo Bráulio Barroso
aconselhou a fixação imediata das dunas do Mucuripe, ou seja, do grande reservatório de
areia que vinha inutilizando as pontes utilizadas para embarque portuário, construídas na área
central, em frente à Alfândega, desde 1820. Ele também indicava a conveniência de mudar
essas estruturas portuárias para o Mucuripe (GIRÃO, 1997). O terceiro, em 1875, sugeriu a
fixação das dunas através de um plantio conveniente para impedir o assoreamento do porto. O
quarto, em 1910, refere-se ao plano do engenheiro Manuel Carneiro de Souza Bandeira,
reafirmando a intensificação do plantio de grandes extensões de grama nos Morros do
Mucuripe, bem como de uma área entre o farol e rio Cocó.
Segundo a documentação histórica analisada por Barbosa (2005), no período 1649-1954,
o campo de dunas de Fortaleza foi marcado pelas seguintes características:
Ao longo da costa de Fortaleza ocorria um campo de dunas entre a foz do rio Cocó (no
setor SE/NO) e a foz do rio Ceará (no setor L/O). Os registros e as descrições permitiram
individualizar três segmentos: (I) entre a foz do rio Cocó e a Ponta do Mucuripe, (II) entre a
Ponta do Mucuripe e a foz do rio Pajeú e (III) entre a foz do rio Pajeú e a foz do rio Ceará
(figura 24).
Na costa de Fortaleza, até 1954, a morfologia eólica se apresentava ondulada e as dunas
se tornavam colmatadas na porção mais interna do segmento I. Não é possível definir com
clareza a forma das dunas, todavia os indicadores revelam dunas móveis, em algumas delas
associadas com a vegetação, mostrando lado mais íngreme voltado para as praias do
Mucuripe, Meireles e Prainha, no segmento II. De outra maneira, no segmento III, entre a foz
do rio Pajeú e a foz do rio Ceará, os morros Marajaitiba e Croatá (centro antigo) e aqueles que
ocorriam no setor L/O, se dispunham alongados e mais ou menos paralelos a linha de costa.
Estas características sugerem formas semelhantes às dunas frontais. A altitude no campo de
49
dunas variava de 17,5 nas proximidades da duna de Marajaitiba e 50 m no Mucuripe (figura
24).
Figura 24 - (A) Esboço paleogeográfico das dunas costeiras de Fortaleza. Simbologia: 1 -
Ventos de Leste, 2 – Ventos de Sudeste, 3 – Drenagem, 4 – alagadiços/Mangues, 5 – Dunas,
6 - Dunas citadas nos documentos históricos, 7 Área aproximada da planta da cidade de
Adolfo Herbster (1859). Fonte: Barbosa et al, 2005.
A linha de costa no segmento I apresentava orientação SE/NO. A areia neste setor supria
a formação das dunas. Estas feições alcançavam o topo do tabuleiro e migravam para o
quadrante oeste. No segmento II as praias eram supridas pela areia das dunas. Nos segmentos
II e III, a orientação da linha de costa quase E-O, favoreciam o transporte litorâneo paralelo
ou quase paralelo à linha de costa, desenvolvendo as feições eólicas alongadas no segmento
III.
Embora as intervenções no campo de dunas tenham iniciado desde o século XVII com
os exploradores e colonizadores, os planos de fixação das dunas foram traçados e
implementados entre 1850 e 1910. Para os engenheiros responsáveis pelas obras públicas, a
mobilidade das dunas constituía um grande obstáculo para o desenvolvimento do
povoado/vila/cidade. Desse modo, isto precisava ser contornado com a construção de
estruturas rígidas costeiras (muros, molhes, quebra-mares), com a pavimentação das ruas e
por conseqüência a implantação das pedreiras no Meireles e Mucuripe (extração de arenito
ferruginoso associado à Formação Barreiras), de reordenamento das vias públicas em
50
arruamento retilíneo, realização de aterros e desmontes de morros para o aplainamento da
cidade (BARBOSA et al, 2005).
As mudanças ambientais, devido à formação e à expansão da cidade, foram inicialmente
mais rápidas no segmento III, entre a foz do rio Pajeú e riacho Jacarecanga, principalmente. A
morfologia do segmento I passou por alterações mais severas em dois momentos a partir de
1950, com os loteamentos para a especulação imobiliária na Praia do Futuro. Embora este
segmento tenha sido o último a ser ocupado pelas redes de urbanização, foi o primeiro a sofrer
fixação das dunas. Como conseqüências, as alterações ambientais nos segmentos II e III têm
sido severas, culminando na erosão costeira (MAIA et al., 1998), alterações da morfologia e
destruição das dunas.
3. OS ANOS 1940 E O PORTO DO MUCURIPE
Os primeiros ensaios da construção de um porto na cidade de Fortaleza datam de 1807,
quando se imaginava instalar um equipamento portuário nas feições geomorfológicas da
cidade que melhor oferecessem condições às embarcações (MORAIS, 1981). Os projetos
pesquisados por engenheiros e especialistas indicavam a linha de arenitos ferruginosos
situados a 100 m de distância da praia, na área do Poço da Draga, litoral central, em uma
profundidade dia de 3 m, como a área ideal. Estes arenitos constituíam, de fato, abrigo
parcial para um porto, pois impediam a propagação das vagas em maré baixa até o cais
(MORAIS, 1981). A figura 25 exibe a planta-croqui da área do porto em 1818, evidenciando
51
a linha de recifes perto da Prainha, que servia de ancoradouro e local para onde todas as idéias
de construção de um porto convergiram (MORAIS, 1981).
Figura 25 Planta Croquis da área do antigo Porto de Fortaleza (Poço da Draga) datada de
1818, elaborada pelo Cel. Paulet. Fonte: Morais, 1981
A figura 26 evidencia o fato de que em 1826 a Enseada de Mucuripe era rasa, com a
isóbata de 2 m distanciando-se bastante da praia, e a isóbata de 4 m chegando a se afastar 630
m do litoral. Esta isóbata limitava a parte externa de um banco de areia que se estendia do
local correspondente ao atual Poço da Draga até a Praia de Meireles. Outras cartas
batimétricas consultadas revelaram que estas profundidades persistiram até 1832 quando a
isóbata de 1 m afastava-se 550 m do litoral (figura 27).
52
Figura 26 – Levantamento batimétricos realizados por Boen, 1826, ao longo da área
litorânea L/O de Fortaleza. Fonte: Morais, 1981
Figura 27 Levantamento batimétricos realizados por J. L. Araújo, 1832, ao longo da área
litorânea L/O de Fortaleza. Fonte: Morais, 1981
Apesar dessas investidas para a construção de um porto em Fortaleza, apenas ao final do
século XIX as propostas começam a adquirir materialidade. Assim é que, no ano de 1875 foi
proposta a construção de um quebra-mar sobre os arenitos do Poço da Draga de
aproximadamente 670 m de comprimento. Tal proposta contava em relatório do engenheiro
53
inglês John Hawkshaw, seguindo opiniões do engenheiro Zózimo Bráulio Barroso (MORAIS,
1972). A proposta tendo sido aceita, inicia-se a construção do porto de Fortaleza em 10 de
agosto de 1886, pela companhia Ceará Corporation Limited. Um quebra-mar servindo como
embarque e desembarque foi construído no ano de 1887, mas seu desempenho foi prejudicado
devido à intensidade de sedimentos acumulados no entorno deste empreendimento. Os 610 m
de quebra-mar que constituem a ponte de embarque e desembarque foram submergidos pelas
areias (MENESES, 1992).
Com a construção do quebra-mar Hawkshaw sobre os arenitos de praia presentes na
faixa de praia (figura 25), houve intenso assoreamento, diminuindo as profundidades na parte
interna do molhe e das praias a oeste do mesmo, afastando o antigo forte holandês (Fortaleza
de Nossa Senhora da Assunção), de 160 m na zona de maré alta. Segundo Meyell (1930), as
águas batiam ao da muralha da Fortaleza em 1812, situação que foi totalmente mudada, de
acordo com o que se pode observar na tabela 01: as profundidades aumentaram na Enseada
do Mucuripe e diminuíram na região do Poço da Draga, em frente ao núcleo litorâneo central
da cidade na época (MORAIS, 1981).
Tabela 01 - Quadro de situação isobatimétrica em frente à cidade de Fortaleza, nos anos de
1909 e 1929.
Isóbata Distância da isóbata zero
(Metros)
Avanço para terra (Metros)
1909 1929
- 5
- 6
- 7
- 8
- 9
- 10
256
720
1.120
1.667
2.024
2.336
185
265
480
830
1.330
1.590
71
455
640
834
694
764
Fonte: Instituto Nacional de Pesquisas Hidroviárias (INPH).
Tais condições acabaram por criar problemas para o porto - como a área desse antigo
porto não permitia condições de segurança, tornado as atividades portuárias perigosas e
difíceis, pesquisas foram realizadas em outras áreas que oferecessem condições para a
instalação de novas estruturas portuárias - enquanto isso, a Ponte Metálica, construída entre
1902 e 1906, passava a realizar parte das atividades portuárias da cidade. Em 1908, o
engenheiro Manoel Carneiro de Souza Bandeira executou estudos no Mucuripe a fim de
coletar dados da dinâmica eólica, marinha e sedimentar. O engenheiro publicou informações
54
da pesquisa no ano de 1910 as quais continham, no entanto, como resultado, apenas o
melhoramento do antigo porto (MORAIS, 1981).
As condições de embarque e desembarque estavam ficando tão perigosas no porto
antigo que foi necessário o ministro da viação e obras públicas solicitar a execução de obras
que melhorassem esse equipamento portuário, em 1918. Essa execução tinha como objetivo
seguir o projeto do engenheiro Souza Bandeira, mas foi inviabilizada por motivos econômicos
e logísticos. Entretanto, o diretor da Inspetoria de Portos, o engenheiro Lucas Bicalho,
planejou um projeto semelhante ao do engenheiro John Hawkshaw, no qual viabilizava o
melhoramento do porto. Um decreto de 1920 aprovava o projeto organizado pelo engenheiro
Lucas Bicalho. A empresa Norton Griffths foi contratada para executar as obras em 1922 e
1923 (MORAIS, 1981).
As obras de melhoramento do antigo porto foram, no entanto suspensas em 1923. A
idéia da instalação de um porto na ponta do Mucuripe foi então considerada decisiva no ano
de 1929, por terem sido realizados importantes estudos locais de condições oceanográficas e
sedimentológicas (MORAIS, 1972). Em 20 de dezembro de 1933, foi outorgada pelo governo
federal ao governo do Estado do Ceará a permissão para tal. Finalmente, em meados de 1938,
foi dado inicio à construção do novo porto, aproveitando a geomorfologia do promontório
rochoso da enseada do Mucuripe, que se apresentava como melhor local para sua instalação
de acordo com o Decreto de número 504, de 7 de julho de 1938. Então, dava-se início à
construção de um trecho de cais em torno de 426 metros no Mucuripe, obra executada pela
CIVILHIDRO (Companhia Nacional de Construções Civis e Hidráulicas) (MORAIS, 1972).
As obras continuaram por muito tempo, estendendo-se por quase duas décadas. O ano de
1952 foi também o ano da conclusão do porto. Entretanto as operações portuárias tiveram
realmente seu início em 1953 (MORAIS, 1972).
A situação da batimetria na faixa litorânea L/O de Fortaleza modificou-se bastante a
partir da construção do Porto do Mucuripe. A figura 28 compara as isóbatas de zero e 5 m de
1931 (antes da construção do porto) com as de 1940 - 1946 (período de construção do porto).
Seguindo-se a evolução destas linhas, nota-se que uma progradação dos sedimentos no
sentido de formação de uma praia na parte interior do cais portuário e da própria enseada. No
entanto, uma grande alteração na linha de costa ao L/O de Fortaleza não é mostrada nessa
comparação: trata-se da erosão de mais de cem metros de praia ao longo da Praia de Iracema,
em resposta ao barramento do trânsito litorâneo pelas estruturas portuárias (MORAIS, 1981).
55
Figura 28 Evolução das isóbatas de 0 m e 5 m, de 1931 a 1946 - (Porto do Mucuripe).
Fonte: Morais, 1981
Em 1946, uma comissão de estudos complementares do Porto elaborou a carta
batimétrica da área exposta na figura 29. As linhas batimétricas de 6, 7 e 8 m dentro da
enseada acham-se bem mais afastadas e a Praia de Iracema se encontra protegida
parcialmente por quebra-mares longitudinais, atestando o comportamento sedimentológico
diferente assumido por toda a enseada depois da construção do Porto. As figuras 30 e 31
mostram a que ponto chegou à evolução dos fundos junto ao molhe do Mucuripe no período
de 1947 a 1951 e no ano de 1956, isto é, depois de terminadas as obras do porto. Pode-se
constatar claramente que uma quantidade progressiva de sedimentos passou pela extremidade
do molhe. Uma verdadeira praia foi criada na parte interna do molhe onde inicialmente havia
sido localizado o cais petroleiro. Esses levantamentos sistematizados de 1947 e 1951
permitiram calcular o volume anual de sedimentos movimentados já que a maior parte da
areia transportada depositava-se perto da extremidade do quebra-mar, o volume do transporte
sólido anual era, em média, de cerca de 200.000 m
3
(MORAIS, 1981).
56
Figura 29 Comportamento da batimetria no ano de 1946 - (Porto do Mucuripe). Fonte:
Morais, 1981
Figura 30Comportamento das isobatimétricas de 0 m e 5 m, em duas épocas - (Porto do
Mucuripe). Fonte: Morais, 1981
57
Figura 31 - Traçado das linhas isobatimétricas no ano de 1956 - (Porto do Mucuripe).
Fonte: Morais, 1981
Ocorreram modificações nas instalações do Complexo Portuário do Mucuripe no
decorrer do ano de 1964, com a construção de armazéns e o início da construção de uma
estação de passageiros, do muro de fechamento e de mais um cais com 8 metros de
profundidade. O estudo da progradação das isóbatas no período 1965-1970 revela erosão
progressiva nas batimétricas em frente ao cais com distribuição de sedimentos, ocasionando
áreas de assoreamento locais. O caminhamento de areias vindo da Praia do futuro assoreava o
braço interno do molhe e a bacia de evolução (MORAIS, 1981). As figuras 32 mostram a
evolução da Praia Mansa, formada na parte interna do molhe atual, com o caminhamento das
areias e o remanejamento dos sedimentos.
Figura 32 – Caminhamento e bypass litorâneo de areias na parte interna do molhe do Porto
do Mucuripe, antes da construção do espigão de retenção na Praia do Futuro em 1960.
Fonte: Arquivo Nirez
58
Em 1968, o porto sofre mais uma expansão. São inaugurados outros armazéns e o
prolongamento de um cais com 10 metros de profundidade, além da estação de passageiros do
Porto do Mucuripe (DOCAS DO CEARÁ, 2002). A figura 33 mostra tanto as construções do
porto em 1952, quanto às construções da estação de passageiros em meados do ano de 1964.
Figura 33 - Construção das instalações do novo porto em Fortaleza, entre 1952 1964. a)
Construção do Porto do Mucuripe, 1952. b) Construção da Estação de Passageiros, 1964.
Fonte: Docas do Ceará (2002)
A instalação do novo Porto e a desativação do porto antigo levou à estagnação do
comércio no centro da cidade, com deslocamento dos armazéns e depósitos para as novas
docas.
Entre as décadas de 1950 e 1960, a área nas proximidades do porto do Mucuripe recebeu
um incremento de indústrias associadas aos usos portuários, dependentes do transporte
marítimo com relação às matérias-primas, como os moinhos de trigo e a fábrica de asfalto de
Fortaleza, subsidiária da PETROBRAS, além de estabelecimentos de frigorificação da pesca.
Os incentivos concedidos pela SUDENE à indústria do beneficiamento da pesca contribuíram
para o surgimento de indústrias do ramo, favorecendo assim uma maior ocupação do
Mucuripe pelo setor secundário (SOUZA, 1978). São equipamentos que ocuparam
intensamente esta área, aliando-se à ocupação nos terrenos de marinha por antigos pescadores,
migrantes do sertão e de áreas adversas.
Até os anos 1980, de acordo com Ramos (2003), a instalação do porto do Mucuripe
induziu o crescimento populacional do Grande Mucuripe por moradores de renda
extremamente baixa. Depois de então, verifica-se, precisamente no bairro Mucuripe, o
aparecimento de uma classe média, com rede hoteleira e aumento de equipamentos urbanos,
59
referentes às atividades tanto do complexo petroquímico (conhecido também como parque de
tancagem), como do complexo portuário.
3.1 O Porto e as Condições Hidrodinâmicas e Sedimentológicas
Os ventos, um dos fatores preponderantes na propagação das ondas, têm predominância
de L e SE no litoral de Fortaleza. As vagas que vêm do largo tomam a direção dos ventos que
lhes dão origem e deveriam, portanto, tomar o rumo O-NO. Antes da construção do cais do
porto do Mucuripe, estas ondas sofriam um retardamento ao encontrar a ponta rochosa do
Mucuripe e dirigiam-se para a Praia de Iracema. Depois da construção do cais, os processos
de difração causaram uma direção diferente, de forma a que as ondas e correntes, tanto de
vazante quanto de enchente, passaram a se dirigir para a enseada, produzindo assoreamento na
bacia portuária e carência de sedimentos ao longo da Praia de Iracema (MORAIS, 1981).
A Comissão de Estudos Complementares do Porto do Mucuripe fez um estudo de
correntes e assoreamento logo após a construção do porto. As figuras 34, 35, 36 e 37
mostram a área do porto nos primeiros anos após a construção do molhe. Baseada nos dados
da figura 34 esta comissão chegou à conclusão de que a parte interna do molhe sofreu um
assoreamento de 58.150 m
3
e um aprofundamento de 11.434 m
3
, resultando, portanto em
46.716 m
3
de assoreamento (MORAIS, 1981). Nota-se claramente na seqüência das figuras o
engordamento progressivo da praia em torno do molhe. Observando-se em detalhes nas
figuras 35 e 36 nota-se um recobrimento parcial dos afloramentos de arenitos ferruginosos
existentes ao longo da faixa de praia antiga. Na figura 37 nota-se o descobrimento de bancos
com avanço da isóbata zero sobre a praia. É patente que o comportamento das correntes
mudou bastante depois da construção do porto, passando a penetrar na enseada. Disso
resultou a formação da Praia Mansa no interior da bacia portuária e por outro lado, face à
carência de sedimentos, uma intensa erosão na Praia de Iracema, situada a sotamar do porto
(MORAIS, 1981) (figura 39).
Com a construção do molhe do Mucuripe e conseqüente assoreamento da bacia
portuária e erosão nas praias dispostas a oeste do porto, alguns ensaios de laboratório foram
realizados na perspectiva de encontrar soluções adequadas para esse duplo problema.
Inicialmente foram testados prolongamentos do molhe que serve de cais da ordem de 150,
300, 600 e 700m. Os fenômenos de assoreamento, no entanto, permaneceram os mesmos,
que as forças litorâneas não se haviam modificado (MORAIS, 1981).
60
Figura 34 – Comportamento das correntes no ano de 1946. Fonte: Morais, 1981.
Figura 35 – Comportamento das correntes no ano de 1947. Fonte: Morais, 1981.
61
Figura 36 – Comportamento das correntes no ano de 1948. Fonte: Morais, 1981.
Figura 37 - Comportamento das correntes no ano de 1949. Fonte: Morais, 1981.
62
Mas um modelo reduzido, com escalas horizontais 1: 300 e verticais 1: 100, estudou a
possibilidade de interromper a translação das areias perto da extremidade do molhe. Então
foram executados dois trechos do quebra-mar, um de 150 m de direção N 15º O e outro de
225 m de direção N15º E; esta solução, embora pudesse reter o caminhamento das areias por
um certo tempo, não era aconselhável por provocar agitação na bacia e erosão nas praias a
oeste (MORAIS, 1981).
Foram feitas comparações sucessivas posicionando os espigões pelo lado de fora do
molhe, para identificar a posição mais eficaz. Segundo Morais (1981), a partir destes estudos,
chegou-se à conclusão de que dois tipos de soluções poderiam resolver o problema do
assoreamento do porto: a) interromper da maneira mais eficaz o movimento litorâneo dos
sedimentos, por meio de implantação de espigão a SE/NO da Ponta de Mucuripe; b) fazer
com que os sedimentos transitassem para oeste em processo artificial de recalque hidráulico.
Foi escolhida a primeira hipótese, com instalação, em 1966, do molhe do Titãzinho. O
problema de erosão da Praia de Iracema seria resolvido independente diretamente do
problema de assoreamento, por alimentação artificial das praias e defesa da costa (ver capítulo
4). Tal fato, no entanto nunca ocorreu, e a área foi erodida em mais de cem metros
(MORAIS, 1981).
A execução do molhe do Titãzinho, enraizado a montante do primeiro quebra-mar,
efetivamente atuou no sentido de impedir o intenso assoreamento da bacia portuária. Em uma
primeira fase de trabalho este espigão poderia atingir um comprimento de 300 a 400 m, para
retenção dos sedimentos durante 10 a 20 anos, e seria eventualmente prolongado.
Ao atingir a época estipulada pelos ensaios de laboratório, começou a haver transpasse
das areias, sendo necessário, portanto, o alongamento do espigão. Àquela época, 1974, este
transporte de sedimentos se fez sentir pela migração da embocadura do Riacho Maceió, na
Praia do Meireles, no sentido L/O (MORAIS & PITOMBEIRA, 1974), modificando
completamente a conformação da costa naquela área e a batimetria da praia adjacente. Logo
depois do aumento na extensão do espigão, o que provocou novamente a retenção dos
sedimentos, a migração do Riacho Maceió passou a ser O/L (figura 38).
63
Figura 38 – Migração da embocadura do Rio Maceió (segundo Morais & Pitombeira, 1974).
O prolongamento do molhe do Mucuripe em 400 a 500 metros resolveu em parte a
agitação das águas no porto e foi orientado para o alto-mar relativamente à direção do trecho
final das obras existentes, para que se conservasse o mesmo canal de navegação. Para o
prolongamento das obras seria necessária a criação eventual de fossa na proximidade imediata
da extremidade do lado exterior do molhe, e dragagens definitivas no interior do porto.
(MORAIS, 1981) (figura 39).
Em 1973 houve uma consulta ao INPH (Instituto Nacional de Pesquisas Hidroviárias),
sobre o estudo em modelo reduzido, para melhor localização do terminal petroleiro, que foi
soterrado à época da construção do segundo molhe. Depois de realizados o estudo sobre
agitação, foi decidido à construção do píer na extremidade oeste do cais, perpendicular ao
mesmo. Com esta construção, a batimétrica de 10 metros sofreu um deslocamento em direção
ao largo, revelando assoreamento na zona de atracação de petroleiros, mas o restante do canal
de acesso permaneceu normal (MORAIS, 1981).
A reconstituição histórica da construção do Porto do Mucuripe marca o processo de
industrialização pelo qual passava o estado a partir de meados dos anos 1930 e demonstra
claramente que as preocupações ambientais não fizeram parte do prospecto de problemas a
serem geridos pelos autores dos diversos projetos associados, tanto os de instalação quanto os
de ampliação e reformulação do traçado inicial do equipamento. Na atualidade, ele vem
passando por novas propostas de ampliação, na perspectiva de aumentar sua atuação enquanto
64
porto comercial. Os problemas ambientais produzidos por sua instalação perduram até hoje
(ver capítulos 4 e 5).
O Porto do Mucuripe constitui a primeira grande mudança de caráter geral a ocorrer na
orla marítima de Fortaleza. A partir dessa intervenção histórica, e pari-passu com interesses
econômicos e sociais que paulatinamente passaram a incluir a zona litorânea como área de
crescente urbanização, as mudanças vão se fazendo sentir de forma acentuada, até produzir
uma completa descaracterização da área do ponto de vista natural. Os capítulos seguintes
tratam desses temas.
Figura 39 - A fotografia mostra a Praia Mansa o bairro Serviluz e fluxo de sedimentos em
direção a bacia portuária do Mucuripe em 1960. Fonte: Arquivo Nirez
65
4. A ZONA COSTEIRA DE FORTALEZA DE 1940 A 2000
Dantas (2002) coloca a existência de dois movimentos característicos do processo de
urbanização da cidade de Fortaleza: um na escala local, nas décadas de 1920 e 1930, que
promove a ocupação da orla fortalezense pela população de baixa renda, e um na escala
regional, a partir da década de 70, onde novas práticas marítimas se expandem atingindo o
restante do litoral cearense, tendo Fortaleza como epicentro do movimento direcionando a
cidade para o mar, mas sem enfraquecer-lhe o caráter interiorano. O autor alega que esta
característica marca o início da litoralização do Ceará (e. g. CLAUDINO SALES, 1993), num
processo ligado ao fenômeno de constituição da cidade moderna. Tal fato é visível nas
alterações da zona litorânea de Fortaleza a partir dos anos 1940.
4.1 A Faixa Sudeste - Noroeste
A urbanização e a valorização da Praia do Futuro ocorreram posteriormente ao processo
de urbanização das praias de Iracema e Meireles (DANTAS, 2002). Alterações começaram a
ocorrer a partir da incorporação da área situada entre o Rio Cocó a Praia do Futuro e a
Enseada do Mucuripe, então denominado Sítio Cocó, hoje dividida nos bairros Cocó, Papicu e
Vicente Pinzón (COSTA, 1988). A integração teve inicio em 1945 com a construção e
finalização na Ponta do Mucuripe, extremo leste da área do novo porto da cidade, e
subseqüente instalação em 1950, para melhor circulação das mercadorias, do ramal ferroviário
Parangaba-Porto do Mucuripe.
A instalação do porto e da linha férrea induziu o surgimento de favelas ao longo do leito
do ramal ferroviário e nas dunas da zona portuária (COSTA, 1988). A linha férrea, no
entanto, assim como o Rio Cocó foi considerado por muito tempo como obstáculo a expansão
urbana para as zonas leste de Fortaleza (CLAUDINO SALES, 1993).
A transposição dessas barreiras físicas e a incorporação dos terrenos de praias, dunas e
mangues do Sítio Cocó passaram a ocorrer quando a Prefeitura Municipal de Fortaleza
autorizou em 1954 o processo de parcelamento da área e o loteamento da Praia do Futuro, a
antiga praia Antonio Diogo (COSTA, 1988). Foi a partir de então que, de acordo com Costa
(1988), inicia-se a transposição dos limites da via férrea e, por conseguinte a incorporação dos
terrenos de praias, dunas, seguindo um trajeto até o limite do mangue do Cocó (figura 40).
66
Figura 40 - Praia do Futuro na década de 1960. Algumas personalidades da época
mostram-se no cordão de dunas frontais que caracterizava a orla SE/NO. Fonte: Arquivo
Nirez (1960)
É a partir da década de 60 80 que a área começa a ser tecida do ponto de vista urbano
e ocupada lentamente pela população fortalezense, como se observa na figura 41. Uma faixa
de praia larga e suave caracterizava então a área.
Figura 41 - Praia do Futuro na década de 70. Observa-se o inicio da urbanização barracas
de praia instaladas, automóveis sobre áreas de berma, uma praia extensa, larga e suave.
Fonte: Arquivo Nirez
Em função das políticas habitacionais vigentes a implantação do Conjunto Habitacional
Cidade 2000 no ano de 1972, nas proximidades do Sítio Cocó (COSTA, 1988) permitiu o
67
prolongamento em 1976 da Avenida Santos Dumont em direção à praia do Futuro (Avenida
Zezé Diogo), permitindo uma ampliação urbana no que diz respeito à apropriação, ao uso e
ocupação e geração de novos fluxos na antiga área do Sítio Cocó. A praia do Futuro recebe
então investimentos municipais no que tange à implantação de uma infra-estrutura voltada aos
usos do lazer, ao entretenimento e ao turismo. Por volta da década de 1980, era visível que os
usos e ocupações do solo na área do antigo Sítio Cocó ocorriam de forma distinta: usos
industriais, agrícolas (dado pelos posseiros) e residenciais (favelas, conjunto habitacionais,
edifícios de apartamentos e mansões) (COSTA, 1988, p.135).
O Município de Fortaleza investe na construção de calçadões e pólos de lazer nas zonas
de praia com o objetivo de atender as demandas de lazer e turismo. Na década de 1980 foi
construído o calçadão da Praia do Futuro e feito o alargamento da Avenida Zezé Diogo.
Como observa Costa (1988), a Praia do Futuro foi a última zona de praia incorporada à zona
urbana de Fortaleza. Antes dessa incorporação, na área predominavam usos tradicionais e, a
exemplo de outras praias, incorporou-se ao espaço urbano, ora como periferia de zona
portuária (o Porto de Mucuripe), ora como lugar ocupado para responder à demanda das
classes abastadas que antes freqüentavam a Praia do Meireles.
Dantas (2002) assinala que a construção das avenidas Santos Dumont e Zezé Diogo
geraram novos fluxos. O crescimento de bairros populares mais ao sul do Vicente Pinzón
reforça a área como tal, cada vez mais relacionada a atores vinculados à pesca, ao porto e ao
comércio ambulante de praia. A construção de conjuntos habitacionais pelo antigo BNH
(Conjunto Habitacional Nossa Senhora da Paz ou Santa Terezinha), bem como o surgimento
de favelas, representa esta tendência de ocupação. Com exceção dos terrenos da marinha, os
clubes instalaram-se. Ao mesmo tempo, sobre as dunas, as classes abastadas erguem suas
mansões dotadas de sistema de segurança.
A construção dos calçadões nos anos 1980 e a edificação do pólo de lazer na Praia do
Futuro são fatores de atração para a população e demarca o início do boom turístico que
caracteriza a história recente da cidade. Para Dantas (2002), a atração exercida por esse pólo
conduz à constituição de paisagem singular nessa região. No mencionado pólo são construídas
barracas populares especializadas na venda de bebidas e ocupando parte da faixa de praia. O
comércio ambulante também tem presença marcante com os contingentes de homens,
mulheres e crianças que oferecem seus produtos aos consumidores potenciais.
As políticas públicas adotadas entre 1980 e 1990 referendam ações privadas com a
construção de hotéis, pousadas, restaurantes, barracas e estações aquáticas, bem como os
loteamentos, e constroem uma cidade litorânea capaz de responder à demanda crescente por
68
espaços de lazer e turismo - a primeira relativa ao lazer, resulta de demanda interna de uma
classe privilegiada; a segunda referente ao turismo origina-se de demanda externa que
aumenta no transcorrer dos anos (DANTAS, 2002, p.65).
4.2 A Faixa Leste – Oeste
A partir de 1940, fugindo da poluição das indústrias e da proximidade das favelas, a
população de mais alto padrão de vida transferiu-se para a Aldeota, que a época não passava
de uma extensa área de dunas (COSTA, 1988). Tal processo delineia com visibilidade a
constituição de novos espaços burgueses em Fortaleza reforçando assim a segregação sócio
espacial entre ricos e pobres na cidade (PONTES, 2000).
Na década de 1950, surge um novo vetor de expansão em direção à zona leste: os
pequenos sítios do Meireles e a Praia de Iracema foram sendo gradativamente substituídos por
residências de médio e grande porte; os clubes abandonaram o centro da cidade e se
instalaram nas praias do bairro do Meireles; em torno dos clubes são construídos os primeiros
blocos de apartamentos de 3 a 4 andares no fim dos anos 50 (DANTAS, 2002). A valorização
que teve início com a prática de banhos terapêuticos agora se consolida, e a “cidade dos
abastados” se volta para o mar e para sua faixa de praia até então ocupada pelos pescadores e
migrantes. Estes vão sendo gradativamente deslocados para os arredores, para os subúrbios ou
para as faixas de praia próxima à área portuária. A expansão nesta área da “mancha” de
valorização imobiliária é barrada ao nível do Porto do Mucuripe, no extremo leste da
cidade.
Porém a retenção dos sedimentos na bacia portuária do Mucuripe a partir da instalação
dos equipamentos portuários é responsável pelo surgimento de um processo erosivo a partir
dos anos 1950 na praia de Iracema. O equilíbrio litorâneo foi rompido, provocando a erosão e
a entrada do mar na faixa L/O, tendo a praia de Iracema perdido 200m de areia em 50 anos
enquanto isso a praia do Futuro ganhou no segmento SE/NO 500m (BOTELHO, 2004).
O Riacho Maceió foi o recurso hídrico que em princípio mais sentiu o processo de
ocupação da zona L/O de Fortaleza. Com o aumento do adensamento populacional naquela
área, houve uma gradativa redução da calha de seu leito que passou a receber uma quantidade
cada vez maior de esgoto e lixo. A desembocadura do riacho Maceió fica exatamente no
ponto de maior resistência da comunidade de pescadores, encontrando-se quase que
totalmente canalizado e degradado (DANTAS, 2002) (figura 42).
69
Figura 42 - Desembocadura do Riacho Maceió. Degradada e parcialmente protegida.
Fonte: Fechine, março de 2006
Um grande marco referencial de transformação na configuração da paisagem urbana na
faixa litorânea L/O foi à implantação das grandes avenidas Beira-Mar em 1963 e Abolição em
1967 (figura 43 e 44). Com a valorização da Varjota e do Mucuripe e a conseqüente
verticalização a partir da década de 1970, as antigas casas de taipa e palha foram sendo
retiradas para dar lugar à construção de pequenos edifícios residenciais. À proporção que os
lotes ficavam mais caros, novos edifícios eram construídos com um maior número de
pavimentos, embora houvesse uma redução no tamanho da área construída.
A Avenida Beira-Mar cumpriu um papel fundamental na inserção do turismo em
Fortaleza. A construção de edifícios supervalorizou esta área - aproveitar todos os espaços
possíveis para maximizar os lucros é uma estratégia usada pelos agentes imobiliários que
tornaram o Mucuripe e a Praia de Iracema um constante alvo da ação especulativa.
A avenida acompanha a nova ordem urbana surgida, que invertera a área residencial de
alto poder aquisitivo de oeste para leste e torna-se a região de mais alto valor imobiliário da
cidade, uma vez que a praia de Iracema destruída, perdera seus atrativos. A Avenida Beira
Mar e a Avenida Abolição não citada por Dantas em seus trabalhos, também passam a
oferecer o valor recreativo e paisagístico compreendido entre a avenida e o mar (DANTAS,
2002) (figura 43 e 44).
70
Figura 43 - A seta em vermelho indica a Avenida Beira Mar e a orlabastante urbanizada.
A seta em azul mostra a Avenida Abolição, acompanhando o adensamento urbano. Fonte:
Serviço Geográfico do Exército, 1963. Escala: 1:5 000
Figura 44 Volta da Jurema e Avenida Beira Mar, 1990. A seta em azul indica uma praia
progressiva, larga e com grande aporte de sedimentos. Uma orla verticalizada e ocupada por
edifícios de vários andares (seta vermelha). Fonte: Arquivo Nirez
71
Outro elemento urbano que representou grande alteração no perfil natural da orla
marítima L/O foi a construção de um hotel de luxo, o Marina Park em 1975, sobre a zona
costeira, à revelia do poder público.
A realização das obras do Porto do Mucuripe e dos espigões alterou grande parte do
litoral da cidade, marcada pela presença de praias famosas, como a de Iracema, parcialmente
destruída em decorrência de alteração ocorrida na direção das ondas.
Para conter a erosão costeira, foi construído um espigão costeiro na Praia de Iracema em
1969 (figura 45). A situação amenizou a erosão na área, porém, reproduziu a oeste o mesmo
efeito que o porto produziu: os sedimentos ficaram retidos a barlamar do espigão, produzindo
carência de sedimentos a sotamar, o que provocou erosão em direção a Barra do Ceará. Tal
processo propiciou a instalação de novas estruturas de contenção.
Figura 45 - Praia de Iracema na década de 1960, evidenciando os enrocamentos rochosos
construídos para inibir a erosão provocada pelo porto do Mucuripe. Fonte: Arquivo Nirez
Após esta obra, foram construídos mais 11 espigões e enrocamentos na faixa praial com
extensão superior a 1.800 m e que se estendem da praia de Iracema até a foz do Rio Ceará.
(VASCONCELOS, 2005) (figura 46).
72
Figura 46 Espigões costeiros construídos para proteger o litoral da erosão a partir de
1969, indicando pelas setas (setas azul), ao fundo o Farol do Mucuripe (seta verde). Fonte:
Arquivo Nirez
O objetivo destas obras foi de proteger o litoral do processo erosivo, mas elas têm como
principal impacto negativo o fato de transferir o problema da erosão para as praias a jusante
do sistema, já no litoral de Caucaia (BOTELHO, 2004).
Assim, as praias localizadas na faixa L/O estão protegidas por obras de contenção do
recuo da linha de costa - são os espigões e enrocamentos que foram construídos para impedir
o avanço do mar sobre o continente. Desta forma, a erosão atinge o litoral das cidades a oeste
de Fortaleza, produzindo perdas de mais de 8 m de praia em alguns setores (MAIA, 1998).
73
5. A ZONA COSTEIRA DE FORTALEZA NA ATUALIDADE
5.1 A Faixa Sudeste/Noroeste
A faixa SE/NO, de ocupação mais recente que a faixa litorânea L/O e de caráter distinto,
apresenta uma maior unidade em termos físicos. Por seguir diretrizes urbanísticas, conta com
uma maior unidade em termos urbanos, apresentando baixa densidade habitacional alta e
baixa (PDDU - FORT, 1997). A faixa foi subdividida em diversos setores, a saber:
5.1.1 O Rio Cocó
A margem direita do rio se concentra o sistema dunar da Praia da Sabiaguaba - trata-se
de uma área de interesse especial, dada à presença de ecossistema manguezal e de um campo
de dunas móveis e fixas. Sobre o rio, registra-se a presença de uma ponte inacabada, que iria
interligar a Praia do Futuro à Praia da Sabiaguaba (figura 47). As obras de construção desta
ponte se iniciaram em dezembro de 2002 pela Prefeitura de Fortaleza. Ela teria uma extensão
de 1,5km, tendo as obras de construção desmatando, aterrando e terraplanando um trecho de
700m de extensão por 150m de largura de mangue (CLAUDINO SALES, 2005). O
empreendimento sofreu várias sanções, devido à falta de um estudo detalhado dos
principais impactos ambientais.
Figura 47 Ponte inacabada (seta vermelha). Um banco de areia sobre o leito central do
rio, vestígio da sedimentação fluvial decorrente do assoreamento da foz (seta amarela).
Complexo dunar Sabiaguaba ao fundo (seta azul). Fonte: Peulvast, outubro de 2005
74
A construção dessa ponte implica em potencialização do processo de ocupação das
áreas naturais e de preservação (dunas, lagoas costeiras e interdunares, manguezal e faixa de
praia), através de especulação imobiliária induzida em direção à praia da Sabiaguaba. No
momento, mesmo com as obras da ponte paralisadas, o processo de especulação já é notório
do entorno desse equipamento, com arruamentos, aplainamento e desmonte de dunas, além da
construção de edifícios nas imediações da foz do rio (figuras 48).
Figura 48 - Processo de ocupação do campo dunar de Sabiaguaba, do lado direito do Rio
Cocó (seta azul). Verifica-se um conjunto de edifícios no contato com o manguezal nas
proximidades da foz do rio (seta preta). Ocorre ainda uma ponte inacabada sobre o rio (seta
vermelha). Fonte: Ernandy Vasconcelos, novembro de 2004
À margem esquerda do rio (figura 49) encontra-se uma grande concentração
habitacional de baixa renda, com ocupação densa de barracas voltadas para o lazer ocupando
a beira do rio, as quais, durante a cheia pelas marés altas, ficam alagadas, possivelmente
devido ao assoreamento do leito do rio (figura 50). Para se protegerem alguns barraqueiros
aterram a margem do rio, no intuito de barrar a cheia da maré (figura 50 e 51). Neste setor
observamos loteamentos e arruamentos. Ocorrem também ocupações irregulares em área de
preservação permanente, ou seja, ocupando uma pequena parte remanescente de manguezal.
A área apresenta-se, portanto ocupada, porém com urbanização desordenada, com
construções horizontais e verticais regulares e irregulares.
75
Figura 49 - Presença de barracas de praia sobre o leito do rio e ocupação unifamiliar a
montante – Rio Cocó. Fonte: Fechine, dezembro de 2005
Figura 50 - No entorno da foz do Rio Cocó, presença de barracas de praia sem infra-
estrutura adequada, erodida pela cheia do rio na maré alta. Fonte: Peulvast, outubro de
2005
Figura 51 - Aterro irregular na margem do rio Cocó, construído para proteger as barracas
de praia de uma possível subida da maré sobre a foz do rio, evidenciando um processo de
assoreamento da foz. Fonte: Fechine, agosto de 2006
76
Na desembocadura do rio à margen esquerda, ocorrem rochas de praias, que protegem a
praia e o rio da ação direta das ondas. Nas proximidades do rio Cocó a dinâmica costeira
associada ao transporte de sedimentos pelas ondas e marés ocasionou a formação de bancos e
flechas de areia no estirâncio.
5.1.2 O Caça e Pesca
Situa-se entre a foz do Rio Cocó e o extremo Sudeste do litoral. Nesta área as dunas
foram ocupadas com predomínio residencial unifamiliar de alta renda, ao lado de habitações
populares. Vêem-se também edifícios de apartamentos, clubes e hotéis. A urbanização torna-
se incipiente com a proximidade da foz do rio, embora a terra esteja loteada.
O setor localizado nas proximidades da foz da Foz do Rio Cocó se apresenta com
inúmeras barracas dispostas de forma sucessiva, sem passeios ou vias de acesso
pavimentadas, implantadas à revelia do poder municipal, sem nenhuma infra-estrutura
litorânea adequada e de baixo padrão instaladas nas faixas de praia e pós-praia. Estas barracas
são freqüentadas pela população de baixa renda, porém à medida que se distancia da foz do
rio, elas ganham infra-estrutura e atendem à clientela de média a alta. Ambas estão, no
entanto privatizando áreas públicas e dificultando o acesso à faixa de praia por parte do
conjunto da população (figura 52).
Figura 52 Barracas ocupando a faixa de praia a montante da foz do Rio Cocó. Estas
barracas não têm nenhuma infra-estrutura de atendimento e são freqüentadas pela
população de baixa renda. Fonte: Peulvast, outubro de 2005
77
Verifica-se ainda ocupação urbana irregular, nas áreas de preservação representadas
pelas dunas fixas e móveis que ocorrem nas proximidades da margem esquerda do Rio Cocó
(figura 53) com descaracterização e desmonte dessas dunas.
Figura 53 - Parte da Praia do Futuro, demonstrando a ocupação irregular sobre dunas fixas
em processo de desmonte e aplainamento. Fonte: Fechine, maio de 2006
Em todo o percurso a faixa de praia é linear, larga e exposta, com acesso direto (figura
54). Nota-se também que à medida que nos distanciamos da foz, inicia-se o processo de
verticalização urbana. Ocorrem também dunas de pequeno porte relacionadas com os
anteparos provocados pelas barracas de praia (figura 55).
Figura 54 - Larga faixa de praia com mobilização de areia pelo vento na direção da pós-
praia e área urbanizada ao fundo. Fonte: Fechine, maio de 2006
78
Figura 55 - Barracas de praia sendo invadidas por areias. Estas barracas funcionam como
obstáculo, interrompendo a passagem das areias. Fonte: Fechine, março de 2006
5.1.3 A Praia do Futuro
A Praia do Futuro, com uma extensão aproximada de 8 km está limitada a sudeste pelo
Rio Cocó e a noroeste pelo molhe do Titãzinho, tendo como limite interior à linha divisória
das bacias do rio Cocó e as bacias hidrográficas da vertente litorânea (isto é, formada pelos
cursos fluviais que deságuam na faixa L/O).
Está faixa de praia constitui um grande pólo de atração e utilização para o turismo e o
lazer do município. Neste setor encontram-se calçadões e barracas espaçadas, ocupando a
faixa de praia (estirâncio). A praia do Futuro tem grande importância para a cidade de
Fortaleza, em primeiro lugar como pólo de lazer para a população, em segundo lugar tem
grande importância para a economia local dada a grande atividade turística que se desenvolve
nessa praia, que conjuga beleza natural com a presença de uma importante infra-estrutura de
hotéis, bares e barracas à beira mar, ocupando áreas de estirâncio e berma.
Este segmento caracteriza-se pela presença de edifícios residenciais, de lazer e de
turismo (clube e hotéis). Ocorrem inúmeras barracas na faixa de praia. Destacam-se o uso
comercial e residencial, nesse último caso marcando um início de verticalização em alguns
setores. A faixa de praia é linear, larga e com acesso direto (figura 56).
79
Figura 56 Faixa de praia larga, suave, exposta, progressiva e com barracas de praia na
Praia do Futuro. Indica também o inicio da verticalização da área (seta amarela). Fonte:
Peulvast, outubro de 2006
Esta faixa de praia vem passando por um processo de engorda, com acumulação de areia
pela ação dos ventos sobre as barracas localizadas na zona de berma, pois elas funcionam
como um obstáculo para a passagem de areia para o continente, impedindo a alimentação das
dunas à sua retaguarda (figura 57).
Figura 57 Areia avançando sobre as barracas de praia na Praia do Futuro, evidenciando a
ocupação na área de praia e pós-praia. Fonte: Peulvast, outubro de 2006
80
Ao longo da orla, percebe-se a ocorrência de pontos de drenagem pluvial com
evidências de ligações clandestinas, associado a efluentes e esgotos domiciliares lançado
sobre a faixa de praia.
Assim a área começa a sofrer com a poluição ambiental, através do lançamento
clandestino de esgotos domésticos na rede de escoamento pluvial. Os poluentes são
transportados de leste para oeste pela corrente de deriva litorânea, distribuindo a poluição pela
orla marítima.
5.1.4 O Serviluz
Encontra-se no divisor das faixas litorâneas SE/NO e L/O. Caracteriza-se pela presença
do Porto do Mucuripe, Companhia Docas do Ceará, Moinho de Fortaleza e depósitos de
armazenamento de derivados de petróleo, cuja localização configura a área como zona de
segurança. O uso residencial é, portanto inadequado, sendo que as favelas do Mucuripe e
Castelo Encantado e Serviluz são áreas de risco, pois são zonas críticas, onde o risco de
incêndio é eminente.
A comunidade do Serviluz apresenta-se bastante consolidada, com ocupações
espontâneas e irregulares em áreas particulares e da União (zona de praia). Esta população
instalou-se nas imediações do porto do Mucuripe onde está localizado o distrito industrial do
Mucuripe. Neste trecho, existe uma população de mais de 20.000 habitantes (IBGE, 2000)
(figura 60). A origem dessa ocupação se deu em meados do século XX, tendo como vetor as
obras do porto do Mucuripe, produzindo a problemática da ocupação irregular da faixa de
praia, que compromete a balneabilidade em função do precário saneamento público.
Mas com a construção do Porto e do respectivo espigão de proteção, construído em
1966, para diminuir o assoreamento do porto, a área passa a sofrer algumas mudanças
ambientais, como engordamento excessivo do prisma praial nas proximidades do Bairro do
Serviluz (figura 58). O transporte de sedimentos foi interceptado pelas barracas de praia e
pelas avenidas, ruas e edificações, impedindo a reposição de material para o sistema dunar,
suprimindo, permanentemente, o acesso de areia para a planície litorânea e as dunas.
81
Figura 58 Espigão do Titã ao fundo em 1969. A seta em azul mostra o acúmulo e
interrupção dos sedimentos pelo Espigão do Titã. Fonte: Arquivo Nirez
Com efeito, a obra de construção do molhe do Titã, iniciada em 1966, vem produzindo
até hoje acúmulo de sedimentos transportados pela corrente de deriva litorânea na praia do
Futuro e a montante da obra. O equipamento vem cumprindo, portanto sua finalidade de
retenção de areias para evitar o assoreamento da bacia portuária do Mucuripe, mas vem
trazendo conseqüências ambientais graves.
O volume de sedimentos acumulados pelo Porto do Mucuripe é da ordem de 860.000 m
3
por ano, (MAIA, 1998). A partir da construção do espigão do Titânzinho, a praia a barlamar
do Mucuripe passou da condição de estável à progressiva. A progradação da praia aumenta a
superfície de deflação na zona intermaré e aumenta o poder de transporte de sedimentos pelo
vento em direção ao continente para edificar dunas. Na caminhada em direção ao continente,
os sedimentos encontram como obstáculo as construções residenciais e comerciais situadas à
beira mar, pois acabam sendo invadidas pela areia. Os sedimentos derrubam muros e casas,
invadem as vias públicas causando transtornos à circulação de veículos, inclusive os de coleta
de lixo urbano (PITOMBEIRA, 1995).
Na praia do Titãzinho, o assoreamento dificulta o desenvolvimento econômico local,
causa prejuízo aos proprietários pela desvalorização dos imóveis, provoca danos ambientais e
à saúde dos habitantes desta praia. A situação vem se agravando ao longo do tempo, exigindo
uma solução para este problema enfrentado pelas famílias residentes na área (figuras 59).
82
Figura 59 - Vista panorâmica da praia do Serviluz. As flechas indicam a direção preferencial
dos ventos e o transporte de sedimentos para o interior da zona urbanizada. Fonte:
Ernandy Vasconcelos, novembro de 2004
Figura 60 Areia avançando sobre as residencias de baixa infraestrutura sob a faixa de
praia, exemplificando os problemas associados à invasão das areias nas vias de acesso e
residências. Evidenciando, ocupações irregulares em áreas de engorda de faixa de praia.
Fonte: Peulvast, Outubro de 2005
As areias não retidas pelo espigão vão assorear o cais do Porto, aonde existe o molhe de
proteção e a Praia Mansa formada, em conseqüência dos sedimentos que acabam passando
pelo molhe do Titâzinho e molhe de proteção (figuras 61 e 62).
83
Figura 61 Indica a retenção de sedimentos pelo molhe do Titãzinho e a Praia Mansa
formada (setas vermelhas), com o cais portuário (seta amarela). Fotografia aérea do Porto
do Mucuripe, praia mansa e espigão do Titãzinho de 2001. Fonte: PMF/SEMAM
Figura 62 Molhe do Titãzinho, observa-se areia acumulada sobre ele. Fonte: Fechine,
outubro de 2005
A Praia Mansa (figura 63) tem cerca de 108.000m² de área, e acha-se sob a
responsabilidade da Companhia Docas do Ceará (PROJETO ORLA, 2005). O setor está
situado em uma área cujas atividades básicas (industriais, portuárias e residenciais), acarretam
poluição da zona litorânea. Existe enorme pressão imobiliária no sentido de ocupar a área
com atividades voltadas para o turismo e o lazer. Neste trecho, ocorrem pequenas barracas de
84
taipas utilizadas como apoio na atividade de pesca artesanal e local. Existe também a
presença de três aerogeradores para produção de energia eólica. O acesso é restrito pelo
interior do porto ou por via marítima.
Figura 63 - Trecho da Praia Mansa com a orla conservada. Ao fundo os geradores de
energia eólica e parte dos equipamentos de engenharia costeira. Fonte: Projeto Orla,
agosto de 2005
5.2 A Faixa de Praia Leste/Oeste
A faixa L/O apresenta-se extremamente urbanizada, sendo a foz do Rio Ceará a maior
ocorrência natural. Apresenta elevada densidade habitacional, sendo ocupada por segmentos
de renda média e alta em alguns setores e por população de baixa renda em outros. De forma
geral, as características sócio - ambientais e de uso e ocupação do solo nesta área, de acordo
com cada bairro, são:
5.2.1 O Porto do Mucuripe
A faixa de praia encontra-se em quase sua totalidade delimitada pela avenida presidente
Kennedy ou Beira-mar. Esta é a zona de maior interesse econômico da região litorânea de
Fortaleza. Nela estão localizados, além do porto do Mucuripe, os moinhos de trigo que são
responsáveis pela moagem de 12% do trigo brasileiro; as instalações da refinaria de Fortaleza
85
e de um conjunto de tanques de estocagem de derivados de petróleo; o porto pesqueiro
destinado à pesca industrial, com uma frota principalmente composta de barcos lagosteiros; o
porto de jangada de pesca artesanal; pequenos estaleiros, uma importante infra-estrutura
turística composta de hotéis de todas as categorias, mas com predominâncias dos de luxo.
Ocorrem ainda pousadas, bares e restaurantes, alem de uma rede de estabelecimentos de
serviços composta de super mercados, bancos, casas de câmbio, agencias de viagens,
concessionárias e locadoras de veículos, oficinas e lavanderias, dentre outros (PDDU FORT,
1997).
Até alguns anos atrás, a área apresentava uma feição típica de pólo de lazer, com
predomínio gastronômico hoteleiro. A ação imobiliária promoveu a mudança do uso e da
paisagem com a verticalização sucessiva dos grandes edifícios residenciais, que avançam
rapidamente em direção ao final da orla, no Mucuripe. Estas obras vêm pressionando os
restaurantes remanescentes. Tal processo ocorre em todo o Bairro do Meireles e Parte do
Mucuripe, ameaçando e expulsado a colônia de pescadores do Mcuripe, que acabou migrando
para a Praia do Futuro (PDDU FORT, 1997). O conjunto forma um verdadeiro paredão que
dificulta a comunicação dos ventos entre os ambientes marítimo e continental.
A área apresenta, em geral, condições de balneabilidade duvidosa, apesar da existência
de rede coletora de esgoto; a tubulação de drenagem de águas pluviais nesta área está
interconectada a ligações clandestinas de esgoto.
O porto de Fortaleza, localizado na área do Mucuripe, atualmente não se encontra em
condições de receber navios de grande porte por apresentar um baixo calado em decorrência
da pouca profundidade do local e da deposição de sedimentos, além da ocorrência de
equipamentos ultrapassados e ineficientes (figura 64) cabendo esta função ao Porto do
Pecém. Ele possui instalações com armazéns, pátios e infra-estrutura básica, que em boa
parte estão terceirizadas. O cais de pesca carece de infra-estrutura de apoio para os
pescadores e seus produtos. Atualmente é utilizado precariamente como receptor turístico de
embarque e desembarque, necessitando de investimentos para atender à demanda turística
crescente. Existe também um píer petroleiro que atende as indústrias de transformação local e
indústrias químicas e de derivados de petróleo, localizadas nas proximidades do porto,
especialmente a tancagem que oferecem grande perigo à população ali residente, com riscos
de incêndios e explosões (PROJETO ORLA, 2005).
O Plano Diretor de Desenvolvimento do Porto, previsto para o período 2003-2008,
busca obter o atendimento às demandas comerciais através do melhoramento das instalações
existentes com reforço estrutural e aprofundamento dos diversos trechos de cais acostável.
86
Propõe também novas organizações espaciais, evitando-se a construção de novos terminais,
preservando as áreas ao longo do molhe de abrigo, principalmente a praia Mansa, para usos
alternativos ao atendimento de navios de transporte de cargas (PROJETO ORLA, 2005).
A praia no local é semi-abrigada e a dinâmica costeira é regida em grande parte pela
presença de obras de engenharia costeira (espigões). As faixas de areia são reduzidas; o que
sugere a não deposição de sedimentos. comprometimento da balneabilidade, por causa do
óleo jogado pelos navios durante a lavagem dos seus tanques. A faixa de praia é ditada como
zona de segurança, com multiplicidade de usos industrial e comercial.
Figura 64 - Ancoradouro do Porto do Mucuripe. Fonte: Projeto Orla, agosto de 2005
Mais a leste do porto tem-se uma área onde ocorre a presença de empreendimentos
comerciais, multifamiliares e turísticos de alto poder aquisitivo privatizando a faixa de praia,
inclusive com existência de píer para atracamentos de embarcações particulares no clube
social de alta renda “Iate Clube de Fortaleza”. Ao mesmo tempo, residem populações
voltadas para atividades tradicionais de pesca, utilizando jangadas, barcos e pequenas lanchas
neste setor desenvolve-se atividade comercial através do Mercado dos Peixes do Mucuripe
(comercialização de peixes e crustáceos in natura”), destituído de infra-estrutura para os
trabalhadores e clientes.
Nesta área existem embarcações desativadas abandonadas no mar e em terra e barracos
comerciais na faixa de praia, colocados em áreas impróprias e sem cuidados adequados
87
(figura 65). Existe também nas proximidades deste segmento uma comunidade consolidada,
com construções de baixo padrão sobre o Morro de Santa Terezinha - na verdade uma duna
com elevado índice de impermeabilização do solo, degradada pelo adensamento populacional.
(PROJETO ORLA, 2005).
Figura 65 - Vista panorâmica de parte do trecho. Em primeiro plano a existência de porto
de barcos e jangadas evidenciando atividades tradicionais de pesca. Ao fundo a
verticalização da orla. Fonte: Projeto Orla, outubro de 2005
A orla é semi-abrigada, associada a obras de engenharia costeira, com muros de
concreto e espigões. Este setor apresenta alto adensamento de construções irregulares na faixa
de praia, em área de domínio das marés, com equipamentos urbanos submetidos ao ataque das
ondas. As praias acham-se privatizadas, com variações nos índices de balneabilidade,
ocorrendo poluição sanitária e visual. Nesta área observa-se o descaso dos gestores e dos
moradores com as leis ambientais, pois é um ambiente praial frágil e de beleza natural
relevante que deveria ser protegida e conservada. As leis ambientais existem, porém não são
aplicadas. Identificam-se edifícios de vários andares sobre a faixa de praia e outros sendo
construídos sem interrupções legais e aprovadas pelos órgãos ambientais competentes
(figura 66).
88
Figura 66 - Estreita faixa de praia com a presença de muro de concreto e edificação na
faixa de praia. Trecho com déficit de areia e com acesso indireto à zona intermaré.
Privatização da orla através da construção de edifícios multifamiliares e hotéis. Fonte:
Jeovah Meireles, janeiro de 2005
5.2.2 A Praia do Meireles
Área praial em forma de arco, ocupada por obras residenciais, hoteleiras e costeiras
(figura 67). Nesta área observa-se o Riacho Maceió desaguando na avenida Beira-Mar. O
riacho acha-se parcialmente canalizado no setor, com sua várzea representando a última área
verde não ocupada da orla marítima L/O de Fortaleza. No entanto, o grau elevado de
poluição, assoreamento e degradação paisagística elevado, compromete a permanência dessa
área enquanto recurso natural (figura 68 e 69). Pois, hoje este riacho se configura como
válvula de escape para instalações sanitárias irregulares, lançando grande parte de esgotos
clandestinos no mar. Em diversos setores, para além do riacho Maceió, verifica-se a
insuficiência de saneamento básico com lançamento de dejetos a céu aberto embora parcela
da orla marítima seja servida por esgotamento sanitário adequado.
89
Figura 67 - Praia em forma de arco ao longo da enseada do Mucuripe. Observa-se que a
faixa de praia se mantém protegida pelas obras portuárias. Fonte: Peulvast, outubro de
2005
Figura 68 Saída para o mar do Riacho Maceió com muros de arrimo protegendo a foz
presença de contaminação hídrica por esgotos clandestinos. Fonte: Fechine, maio de 2006
90
Figura 69 - Faixa de praia ocupada por barracas de alto nível e barcos de pesca, uma
diminuta faixa de praia e muros de contenção de erosão. Fonte: Peulvast, outubro de 2005
Também podemos encontrar barracas de praia, com incorporação da faixa de praia e
pós-praia ao espaço urbano. Nesta área ocorrem diversas obras de engenharia costeira
(espigões e quebra-mares, paralelos à linha de costa). intenso processo de verticalização
na zona litorânea por hotéis de alto padrão. A faixa de praia acha-se poluída pelo lançamento
de lixo e efluentes nas galerias pluviais e por ligações clandestinas de esgotos. A área
apresenta grande potencial turístico e de lazer, onde uma forte exploração hoteleira,
associada às atividades econômicas relacionadas com o turismo.
Neste setor existe uma pequena faixa de praia que se inicia no lado direito do riacho
Maceió e se estende por metros até a Volta da Jurema. Na Volta da Jurema podemos observar
rochas de praia que se prolongam mar adentro, as quais contribuem para proteger a faixa de
praia do processo erosivo. Cabe observar que é uma área de rochas de praia que ainda se
mantem intacta, sem processos agressivos de destruição humana ou marinha (figura 70).
91
Figura 70 - Rochas-de-praia se estendendo por vários metros mar adentro, localizadas na
Volta da Jurema (seta vermelha). Fonte: Fechine, setembro de 2006
5.2.3 A Praia de Iracema
Originalmente foi um bairro de veraneio a Beira-Mar. Nas últimas décadas, diante da
grande procura pelo mar a partir de 1970, a praia de Iracema recebeu fortes investimentos em
infra-estrutura turística pela iniciativa privada, que propiciou a instalação de hotéis, bares e
restaurantes de alto nível sobre a faixa de praia, às vistas do poder público. Hoje é uma área
em franca mudança de uso pela introdução de um pólo gastronômico, de hospedagem e
diversão, alguns serviços e instituições, afora grandes unidades residenciais multifamiliares de
luxo.
Ocorrem nesta área molhes e quebra mares em pedra para proteger o litoral do ataque
das ondas que ocasiona erosão. Em função destas obras costeiras e da erosão provocada,
esta faixas de praia dispõem de um diminuto trecho passível de ser utilizada pela população.
Ao longo de quase todo este setor, erosão da faixa de praia, mesmo em trechos
associados a obras de engenharia costeira para contenção do problema. Com o intenso
processo erosivo instalado na Praia de Iracema, o poder público municipal no ano de 2000, no
intuito de amenizar esse avanço do mar, iniciou uma obra que consistiu em um aterro
hidráulico, com 100 metros de largura ao longo de 1.110 metros de litoral, e com a construção
de um espigão (molhe) com 450 metros de extensão adentrando o mar. Teve como objetivo,
92
de acordo com a Prefeitura, a recuperação da beira-mar, visando o acréscimo da área de praia
e contenção do avanço do mar.
O início da construção do aterro se deu em meados de 2000, mas a obra não levou em
consideração a necessidade de uma barreira à ação frontal das ondas. Como resultado, forte
ressaca que atingiu a Praia de Iracema logo no início de 2001 evidenciou o erro no projeto
original, feito pelo Instituto Nacional de Pesquisas Hidroviárias (INPH; PROJETO ORLA,
2005).
Durante o período das marés de tempestade (ressacas), as ondas atingem os passeios
marítimos, avenidas e edifícios e o aterro da praia de Iracema. Isso indica que a área
construída foi implantada em uma zona de domínio das ondas e de intensa mobilidade de
areia, permitindo a ação de processos erosivos (figura 71).
Figura 71 - Aterro da Praia de Iracema construído em 2000. Fonte: Fechine, março de
2006
Estudos realizados nesta área (VASCONCELOS, 2005) indicam que a praia está
recuando, perdendo constantemente os sedimentos da recarga artificial. Na verdade, dada à
conjuntura dos diversos elementos da dinâmica costeira, é natural que esta praia esteja sendo
erodida, pois é um fato que vem ocorrendo desde a construção do porto do Mucuripe 60
anos. Enquanto a dinâmica costeira não sofrer alteração, o processo tende a perdurar.
A solução sugerida para a regeneração da praia de Iracema aplicada pela Prefeitura
Municipal de Fortaleza, foi a construção de um quebra-mar ao largo, na cota de 10 m de
profundidade com blocos de pedra que impediriam a chegada das ondas à costa. Segundo o
projeto, se esta obra fosse construída, ela resolveria o problema da erosão da praia de Iracema,
93
pois bloquearia a chegada das ondas até a praia, criando uma zona de sombra que seria
propícia à conservação dos sedimentos na praia (VASCONCELOS, 2005). Tal projeto ainda
não saiu do papel, desta forma o aterro continua sendo consumido.
Logo depois do aterro da Praia de Iracema em direção a oeste tem-se uma área onde
ocorre ocupação irregular da faixa praial com restaurantes e barracas instaladas diretamente
sobre as areias. A especulação imobiliária é intensa e muitos edifícios antigos estão sendo
substituídos por edifícios de luxo de alto padrão e com mais de 20 andares, formando
verdadeiros paredões, que acabam interferindo no clima de toda a cidade (figura 72).
Observa-se também que os restaurantes e os hotéis que estão ocupando a orla marítima
são verdadeiros complexos de luxo, bem estruturados para atender o ramo turístico regional e
internacional.
Figura 72 - Verticalização, obras de engenharia costeira, faixa de praia descaracterizada
pelas construções e pelo intenso processo erosivo. Fonte: Peulvast, outubro de 2005
A orla da praia de Iracema está toda tomada por obras costeiras de contenção de erosão,
por ser uma área de intensa especulação imobiliária e bastante ocupada, principalmente a
faixa de praia que vem passando por sérios problemas erosivos. Os muros e espigões são
soluções agressoras, impactantes, porém amenizam os problemas erosivos, mas sem a
manutenção necessária, estes problemas se agravam a cada dia.
A faixa de praia é muito estreita ou quase inexiste e com acesso direto pelo calçadão da
Beira Mar, que se inicia na Enseada do Mucuripe e se estende a a Ponte Metálica. O
94
Calçadão da Praia de Iracema é um dos ícones turísticos da cidade de Fortaleza (figura 73 e
74).
Figura 73 - Trecho com obras de engenharia costeira para contenção da erosão ao longo
da orla marítima na Praia de Iracema. Verificar a verticalização e o déficit de areia na faixa
de praia e o calçadão da Praia de Iracema protegido por muralhas. Fonte: Fechine, outubro
de 2006
Figura 74 Intenso processo erosivo com muros de contenção de erosão na Praia de
Iracema. Ao fundo a Ponte Metálica. Fonte: Fechine, julho de 2006
5.2.4 A Ponte Metálica
Neste segmento tem-se a ponte metálica e de concreto datando de 1906 e 1923,
respectivamente, o ramal ferroviário da alfândega de 1879, bem como o estaleiro naval de
Fortaleza e grandes armazéns.
95
A ponte Metálica, também denominada Ponte da Alfândega, teve como intuito servir de
área portuária para cidade de Fortaleza (figura 75). Ela atendeu à cidade como porto até a
construção do Porto do Mucuripe. O local passou a ser freqüentado pela população local para
ver o por do sol e curtir as noites de luar, mas ao longo do tempo a área foi se deteriorando.
Em 1994 com a reurbanização da Praia de Iracema, foi reconstruída parte da ponte com ferro
e madeira, com 130 metros de comprimento e 5 metros de largura. A ponte Metálica foi
reinaugurada no dia 4 de outubro de 1994, restaurada e urbanizada (BENEDITO, 1999). Hoje
continua sendo local de visitação de turistas e pessoas para contemplar o pôr-do-sol. Esta área
vem passando por um intenso processo erosivo, devido ao constante ataque das ondas.
A orla da praia da Ponte Metálica também está toda tomada por obras costeiras de
contenção de erosão. É uma área bastante ocupada, principalmente na faixa de praia, e vem
passando pelos mesmos problemas erosivos da Praia de Iracema. Comparando a figura 18
(página 44) com a figura 75 podemos observar a descaracterização da faixa de praia pela
perda de sedimentos devido à intensa erosão instalada.
Figura 75 - Ponte Metálica, área de intenso processo erosivo. Faixa de praia inexistente.
Fonte: Fechine, maio de 2006
Outra Ponte, a dos Ingleses (figura 76) foi iniciada em 1923 e logo depois interrompida.
Ela acha-se situada a oeste da Ponte Metálica.
96
Figura 76 – Ponte dos Ingleses (seta vermelha) e ao fundo o Poço da Draga (seta azul).
Fonte: Peulvast, outubro de 2005
Na figura 77 a faixa de praia também é inexistente e o que podemos observar são
muralhas de proteção contra a erosão e edifícios construídos sobre a faixa praia. O intenso
processo erosivo vem desgastando este ambiente, tornando-o inacessível à população e aos
banhistas; e as obras urbanas que existem, resistem à fúria da erosão. A muralha de pedras é
uma tentativa drástica, agressora, desesperada de barrar o processo erosivo que se acentua a
cada dia, a cada ano.
Figura 77 - Intenso processo erosivo a oeste da Ponte Metálica com muros de contenção
de erosão. Fonte: Fechine, julho de 2006
97
5.2.5 O Poço da Draga e a Estação de Tratamento da CAGECE.
Este setor guarda implicações históricas pela construção ao longo do tempo de
edificações, obras de arte ou viárias, que são barreiras à utilização da faixa de praia pela
população. Como exemplo, tem-se o quebra mar da praia formosa, atual Poço da draga, feito
em 1886.
Nesta área a oeste da Ponte dos Ingleses (figura 76) existe uma comunidade de baixa-
renda, com residências irregulares e desordenadas. Em diversos setores da praia, existem
espigões costeiros instalados para proteger os equipamentos urbanos. Nesta área inicia-se o
bairro do Pirambu, o maior bairro popular de Fortaleza, caracterizando-se por dunas e praias.
O bairro do Pirambu é um bairro de baixa renda, localizado sobre ambientes litorâneos, e boa
parte das residências localizam-se sobre o ambiente praial.
Este segmento (figura 78) apresenta, portanto, ocupação regular e irregular, com
processo de verticalização para uso misto. Ocorre privatização do espaço público, com o
equipamento particular do Marina Park e a Companhia de Água e Esgoto do Ceará
CAGECE.
A área é considerada de interesse especial por conter um prédio tombado, a capela de
Santa Edwirges. Além disso, representa o espaço histórico inicial da cidade, contendo a
Fortaleza de Nossa Senhora de Assunção, construída em 1649, e em torno da qual a cidade
cresceu. Representa, com efeito, a paisagem costeira onde ocorreram as primeiras
intervenções urbanas na cidade. Neste segmento encontra-se ainda o baixo curso do riacho
Pajeú, que se apresenta completamente poluído e descaracterizado.
Nesta área (figura 78) observa-se que alguns trechos da faixa de praia estão acessíveis à
população. Neste segmento ocorre também grande concentração de equipamentos públicos
a estação de tratamento de esgotos que se acha atrelada ao interceptor oceânico, o IML
(Instituto Medico Legal), áreas militares (Bombeiros e Marinha do Brasil) e equipamentos
religiosos. Encontram-se, também, áreas de praia de difícil acesso aos banhistas devido aos
molhes de pedra. Verifica-se também no local uma diminuta faixa de praia poluída por
esgotos domésticos e industriais e por um conjunto de barracas que é freqüentada por banhista
nos finais de semana para tomar banho de sol e de mar.
98
Figura 78 Segmento situado à oeste da Estação da Cagece. Observam-se barracas de
praia, espigões costeiros e a estação da CAGECE, ocupando áreas que deveriam ser
protegidas. Fonte: Peulvast, outubro de 2005
Trata-se de uma área de dunas com grande adensamento populacional de baixa renda e
isolado da faixa de praia pela Avenida Presidente Castelo Branco ou Leste Oeste. A área de
praia de uso público tem 450 metros de extensão com alguns trechos sem acesso aos banhistas
devido aos molhes de pedra.
5.2.6 O Pirambu e o Bairro das Goiabeiras
Constitui o setor de maior densidade populacional da orla, com média de 246 habitantes
por hectare (PDDU. FORT, 1997). Trata-se de uma área de duna ocupada, de maneira
espontânea, pela população de baixa renda que avançou na faixa de praia, deixando-a estreita
e sem vias de acesso.
Em função da inexistência de rede pública de esgoto e de coleta sistemática de lixo, a
área encontra-se degradada e com a balneabilidade comprometida, com lançamento “in
natura” de despejos domésticos no mar. É comum também o despejo de lixo doméstico nas
estreitas faixas de praia que não oferecem acesso ao carro coletor.
Nos bairros do Pirambu e Goiabeiras, as dunas atualmente estão provocando
soterramento parcial de residências e originando riscos de deslizamentos. Ocorre ainda nas
vertentes das dunas deposição de lixo, avalanches, trânsito de pedestres, escoamento pluvial e
emissão de esgotos a céu aberto.
99
Neste trecho tem-se a presença da Avenida Leste-Oeste, em torno da qual ocorrem áreas
residenciais irregulares de baixa-renda, em particular o bairro Pirambu. Neste setor ocorrem
sérios problemas de balneabilidade da faixa litorânea e de saneamento básico, com
antropização da faixa de praia pela presença de espigões costeiros, alternados com praias
pouco desenvolvidas. Trata-se de uma paisagem degradada, apesar de sua elevada
potencialidade para o turismo.
O Pirambu e os bairros adjacentes como Moura Brasil, Goiabeira e Barra do Ceará, são
bairros pobres e carentes de infra-estrutura, postos de saúde e escolas, e são discriminados
socialmente. Em adição, a população que mora sobre esse segmento vem sofrendo com a
erosão intensa, devido ao recuo da faixa de praia. Observa-se nitidamente na figura 79 que a
praia está sendo erodida, configurando um perfil praial profundo e bastante erosionado.
Neste local as casas se amontoam sobre uma área de intenso processo erosivo e de risco
eminente com a subida da maré, com queda de barrancos devido à força da abrasão marinha,
que erode as áreas expostas. As residências são desprovidas de infraestrutura urbana
adequada e também não são beneficiadas adequadamente com os serviços de coleta de lixo e
de esgoto que são precários ou ineficientes, como podemos observar na imagem abaixo.
Figura 79 - Intenso processo erosivo instalado no Bairro do Pirambu, atingindo áreas de
aterros irregulares e faixa de praia. Fonte: Fechine, setembro de 2006
Verifica-se o predomínio de construções horizontais dispostas sobre áreas de
preservação permanente e espaços públicos, produzindo intensa descaracterização
100
paisagística de dunas e falésias. Ocorrem problemas sócio-ambientais de elevada magnitude
associados ao precário saneamento básico, com esgotos na faixa de praia e pós-praia e
disposição irregulares de resíduos sólidos. A faixa de praia é caracterizada por elevada
densidade de obras de engenharia costeira como muros e espigões, para contenção de erosão
acelerada são treze espigões entre a Praia de Iracema e a Barra do Ceará. Nos setores entre
espigões evidencia-se a ocorrência de erosão, com praias estreitas e deficitárias em areia
(figura 80).
Figura 80 Faixa de Praia do Pirambu descaracterização do ambiente praial por obras
costeiras (Espigões) e poluição. Fonte: Fechine, setembro de 2006
A maioria das construções nesta área é em alvenaria de barro (taipa), com a presença de
barracos de papelão. As ruas, em sua maioria, são estreitas e sem pavimentação, contam com
precários serviços de água, luz e iluminação pública e transporte públicos, bastantes
deficientes (figura 81). A área se encontra bantante erosionada, com uma diminuta faixa de
praia, protegida por obras costeiras para barrar o processo erosivo e que se mostra bastante
intenso neste local, devido à falta de gestão pública e da precariedade urbana, pois é uma área
de ocupação e de conflitos de Fortaleza. Neste local as casas ou cortiços se amontoam,
desprovidas de infraestrutura urbana e também não são beneficiadas adequadamente com os
serviços de coleta de lixo e de esgoto, que são precários ou ineficientes.
101
Figura 81Faixa de Praia do Pirambu favelização, descaracterização da faixa de praia e
poluição hídrica provocada pela rede de esgoto clandestina. Fonte: Peulvast, outubro de
2005
A última grande obra litorânea nessa área corresponde à Avenida Costa-Oeste,
interligando o litoral oeste ao leste, iniciada em 2000 e embargada em 2002 pelo Ministério
Público Estadual. Este projeto pretendia requalificar a orla, retirando boa parte da população
pobre dos bairros Moura Brasil, Prirambu, Goiabeiras e Barra do Ceará.
A Avenida Costa Oeste (figura 82) está em processo de degradação por ter sido
instalado em área de domínio das marés e em uma faixa de praia submetida ao processo
erosivo acelerado.
Figura 82 - Trecho da Avenida Costa Oeste sendo consumida pelo processo erosivo.
Fonte: Projeto Orla, fevereiro de 2006
102
No trecho associado às intervenções do projeto Avenida Costa Oeste (praia das
Goiabeiras) (figura 83) verifica-se a degradação do calçadão recém-construído por abrasão
marinha e a deficiência de sedimentos cobertos pela obra ao longo da faixa de praia. Tais
fatos acabam deixando a área exposta, com o avanço da maré e a falta de proteção natural do
ambiente praial que vem sendo destruído e erosionado.
Figura 83 Praia das Goiabeiras obras da Avenida Costa Oeste e o intenso processo
erosivo instalado. Fonte: Peulvast, outubro de 2006
5.2.7 A Foz do Rio Ceará
Constitui a praia de convergência de grande parte da população de baixa renda que
habita a zona leste da cidade, na busca dos banhos de sol, mar e recreação nos finais de
semana. O lazer na área é apoiado pelo antigo pólo de lazer da Barra do Ceará e um conjunto
de barracas espaçadas, sem nenhuma infra-estrutura adequada.
Essa área não apresenta condições de balneabilidade por receber os resíduos de esgotos
residenciais e industriais e lixo doméstico. Tomando-se a orla como a faixa territorial
delimitada pela Avenida Leste Oeste, têm-se um trecho de dunas em processo de desmonte
para uso comercial e um trecho com ocupação residencial unifamiliar de baixa renda (figura
84).
Foram nas imediações da Barra do Ceará que foram edificados os fortes de São Tiago
(1603) e São Sebastião (1612), que representam as primeiras construções da cidade. Estes
103
monumentos não mais fazem parte da paisagem atual, resguardam somente seus registros em
textos históricos e em cartografias antigas.
Esta área concentra a foz do rio Ceará, que abriga rico manguezal, e acha-se segmentada
pela construção de uma ponte cruzando o rio e permitindo acesso à cidade vizinha - Caucaia.
A área é amplamente utilizada para o lazer da população de baixa-renda, que encontra abrigo
em equipamentos voltados para a recreação como o pólo de lazer da Barra do Ceará e
barracas na faixa de praia.
A orla é fortemente impactada com muros e pequenos espigões costeiros visando o
controle do processo erosivo. ocorrência de ocupações irregulares - são barracas e
pequenos comércios e residências espontâneas com tipologias de favelas ocupando áreas de
preservação permanente dunas, deconfigurando totalmente o ambiente praial. Também é
grande o movimento de areias sobre os pequenos cortiços que se amontoam no sopé das
dunas. Estes cortiços funcionam como obstáculos para a fixação de novas dunas. Desta forma,
a população vem reclamando da quantidade de areia que adentram e aterram suas casas,
colocando em risco a vida e a saúde de seus familiares que moram no local, porém, cabe
frizar que as dunas não estão ocupando espaços alheios a elas, estes espaços sempre foi delas.
O que está acontecendo é que as ações humanas, imbuídas pela falta de gestão pública, vêm
destruindo ambientes naturais em prol da urbanização (figura 84, 85 e 86).
Figura 84 - Duna da Barra do Cea em processo de desmonte e favelização. Fonte:
Projeto Orla, outubro de 2001.
104
As ocupações de baixa renda se dão nos espaços públicos e setores de preservação. Essa
situação é explicada pela pressão urbana, além da política habitacional historicamente
deficiente e fiscalização ineficiente, transformando o setor em segmento de elevada
vulnerabilidade ambiental, com descaracterização litorânea, ocupação irregular da faixa de
praia e pós praia. A área se encontra total ou parcialmente ocupada por obras costeiras e
urbanas, são casas, barracos sem nenhuma infraestrutura urbana, ocupando áreas praiais de
relevância ambiental ímpar, e que vem sendo descaracterizada pelo avanço descontrolado da
urbanização.
A figura 79 nos revela um amontoado de residências sobre a faixa praial, a margem da
foz do Rio Ceará, ocupada por barracas de praia e obras de proteção de erosão, denotando um
ambiente praial drasticamente alterado por obras urbanas. Verifica-se também no local uma
diminuta faixa de praia poluída por esgotos domésticos e pelos banhistas que freqüentam
estes locais nos finais de semana para tomar banho de sol e de mar.
A ponte construída sobre o Rio Ceará para facilitar o acesso à cidade de Caucaia,
também vem causando interrupção do fluxo sedimentar, ou seja, os sedimentos não mais são
lançados no mar como deveriam, boa parte deles se acumulam no leito do rio, nas
proximidades dos pilares de sustentação e na foz, assoreando-a. Desta forma o rio está
procurando uma nova saída, o que acaba erodindo suas margens como podemos observar nas
figuras (figura 85 e 86).
Figura 85 - Vista panorâmica da duna e ponte sobre o rio Ceará, evidenciando o
adensamento populacional em áreas de risco e de preservação permanente. Fonte: Jeovah
Meireles, março de 2005.
105
Figura 86 Indica a Foz do Rio Ceará protegido por muro de contenção de erosão (seta
vermelha). Ao fundo a Ponte sobre o Rio Ceará (seta azul), bares e residências (seta
amarela). Fonte: Fechine, julho de 2006
106
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O final do século XX demarca o início do processo de transformação da zona litorânea
de Fortaleza em espaço construído e urbanizado. A primeira grande investida nesse sentido
acha-se associada à construção no setor litorâneo central em 1886 do primeiro porto da
cidade, o porto do Poço das Dragas. As primeiras mudanças no perfil natural estão associadas
a esta obra que resultou em assoreamento de mais de 600m de largura no entorno do Forte de
Nossa Senhora de Assunção, que até então era banhada pelo mar e a partir dessa construção,
virou equipamento costeiro e não mais litorâneo.
No início do século XX, a consolidação da área litorânea central enquanto zona
portuária foi sendo confirmada com a construção entre 1902 e 1906 da Ponte da Alfândega ou
Ponte Metálica a barlamar do quebra-mar do Poço da Draga.
A Ponte Metálica atuou por várias décadas como porto alternativo de Fortaleza. Tal
atividade fomentou na zona costeira adjacente ao entorno das estruturas portuárias uma série
de atividades especializadas, como a instalação de entrepostos e armazéns de estocagem. A
partir desse momento histórico, portanto, o litoral de Fortaleza até então desassociado da
cidade, passa a exercer funções econômicas e portuárias, trazendo consigo usos e ocupações
urbanas as mais diversas. Tal incorporação econômico-urbana foi a princípio localizada,
permanecendo o restante da área litorânea sem usos, exceto para atividades ligadas à pesca
artesanal.
Por volta de meados das décadas de 1930 e 1940, a zona costeira central apresentava-se
bastante urbanizada em contínuo com o centro histórico da cidade. Desse período histórico
resulta também a instalação de moradias subnormais adjacentes à área central; tal forma de
ocupação urbana, do tipo favelas, vai representar um elemento característico da zona litorânea
de Fortaleza por todo o século XX até a atualidade. Ao mesmo tempo, tem início a descoberta
da praia e do mar, enquanto fonte de lazer e veraneio com a ocupação da praia de Iracema e
do segmento central litorâneo, lócus dessas atividades.
Ao final da década de 1930, tem início a construção do Porto do Mucuripe na área do
promotório rochoso homônimo que segmenta a zona litorânea nas faixas SE/NO e L/O. Este
equipamento demarca o início da ocupação do litoral nordeste e leste, pois os armazéns e
atividades associadas com áreas portuárias para se transferem. A construção da linha de
trem Parangaba Mucuripe em 1950 reforça essa tendência e traz consigo a instalação de
favelas ao longo do seu leito.
107
No entanto, a faixa SE/NO do litoral fortalezense permaneciam ainda como vazios
urbanos. Só passa realmente a ser objeto de urbanização intensa a partir das décadas de 1970 e
1980, quando a praia e o mar foram completamente incorporados como lugar de lazer e ócio,
em resposta ao crescimento vertiginoso da atividade turística associada à busca por espaços
litorâneos para o lazer.
Assim, percebe-se que as primeiras investidas econômicas e urbanas no litoral de
Fortaleza foram ditadas por atividades portuárias, fato que imperou por toda a primeira
metade do século XX e as primeiras décadas da segunda metade desse século. A ocupação
para outros fins, se totalmente no decorrer dos períodos mais recentes, pela imposição
do turismo litorâneo e do lazer à beira mar.
Pari-passu a esse processo crescente e vertiginoso nos últimos 30 anos de incorporação
da zona litorânea e costeira à malha urbana e econômico-cultural da cidade, foram ocorrendo
alterações na dinâmica natural da área, com a produção de áreas de intensa erosão, alternadas
com áreas de assoreamento acentuado, intercalados por estruturas de contenção de erosão
costeira.
As feições litorâneas mais comuns - as dunas, os manguezais em pequenos estuários, as
lagoas, os cursos fluviais costeiros - foram completamente ou parcialmente removidos do
espaço urbano, através quer de aterros e canalização, quer de aplainamentos, estando os
remanescentes em estágio avançado de degradação e poluição. Salienta-se que tal degradação
foi ocorrendo com omissão, conveniência ou interferência direta dos órgãos municipais e
estaduais que fiscalizam o cumprimento das leis ambientais e urbanas nesse segmento do
território fortalezense.
Assim, Fortaleza encontra-se inserida em uma planície costeira em avançado estágio de
antropização, denotado pela configuração de uma linha de costa repleta de equipamentos de
engenharia, para o controle da erosão e controle urbano os mais diversos. Com efeito, a zona
litorânea e costeira de Fortaleza apresenta-se extremamente urbanizada, expondo alterações
drásticas nos seus traçados e dinâmica natural. Ainda, parcela dessa área legalmente definida
como espaço público, acha-se apropriada por equipamentos públicos e privados, os quais
foram instalados mediante a omissão ou a concordância dos órgãos públicos responsáveis
pelo gerenciamento e monitoramento da área.
Heterogênea, essa orla marítima apresenta características econômicas e sociais díspares,
representadas pela ocorrência de áreas de extremo valor imobiliário o mais elevado da
cidade, ao longo da Avenida Beira-Mar e Praia de Iracema - alternando com áreas de extrema
108
pobreza e déficit urbano generalizado – os bairros do Pirambu e Poço das Dragas e as áreas de
favelas do Mucuripe, Vicente Pinzón, Cocó e Barra do Ceará.
Em toda a extensão dos 23 km de zona costeira e litorânea analisadas, foram
encontradas os mais diversos tipos de construções e equipamentos, desde zona portuárias,
espigões, muros de contenção, hotéis, restaurantes, calçadões, barracas de praia, edifícios para
habitação da alta e dia classe, emissário submarino e favelas. Diante de tal contexto,
verifica-se claramente o fato de não haver em Fortaleza faixa litorânea homogênea e natural.
Em seu lugar, ocorre um ambiente marítimo extremamente antropogenizado e heterogêneo do
ponto de vista social.
Os principais problemas ambientais detectados ao longo da orla marítima da cidade são
resultantes da ocupação da faixa praial, da construção sobre o campo de dunas e da realização
de obras costeiras que determinaram alterações na dinâmica local com conseqüências
ambientais desastrosas. A canalização e poluição dos recursos hídricos costeiros e litorâneos
são também situações que agravam a descaracterização natural.
Com efeito, em Fortaleza toda a zona de berma e o campo de dunas adjacente foram
ocupados pela população. Foram realizadas mais de 20 obras importantes nos 23 km de litoral
ao longo do século XX. Estas obras contribuiram para modificar o perfil praial e o equilíbrio
dinâmico existente, além de expulsar a população mais pobre para outros ambientes.
Constata-se, portanto que ao longo do século XX o perfil litorâneo da cidade alterou-se
bastante - o litoral deixou de ser uma área desocupada e sem interesse econômico ou social
para se transformar em um espaço requisitado e em um setor imobiliário de alta lucratividade
e interesse econômico. Do ponto de vista natural a área deixou de ser uma planície litorânea
bordejada por largas faixas de praias e campos de dunas e estuários com manguezais para se
transformar em espaços impermeabilizados ocupados por toda sorte de construções artificiais.
Pode-se atestar ainda que, a faixa litorânea da cidade não apresenta as mesmas
características ao longo de todos os seus 23 km. Efetivamente, Fortaleza tem dois lados para o
mar, as faixas L/O e SE/NO, ambas com características sócio-espaciais diferenciadas em seus
traços mais amplos.
A faixa SE/NO possui uma orla ainda pouco ocupada, uma faixa praial bem
desenvolvida, algumas dunas que resistem à especulação imobiliária, barracas espaçadas -
mas ocupando a faixa de praia. No entorno da foz do Rio Cocó, a área é ocupada por barracas
sem infra-estrutura adequada de funcionamento, e por habitação de baixa renda. À medida
que nos distanciamos do rio, em direção ao norte, o cenário das alterações históricas se
diversifica inicia nesses setores o processo de verticalização da praia do Futuro. Nessa área,
109
as barracas ganham infra-estrutura e equipamentos voltados para o turismo litorâneo sem
concorrência com habitação ou outros tipos de serviços e atividades, além daqueles voltados
para o turismo e o lazer de média e alta renda.
No segmento em torno da ponta/porto do Mucuripe, têm-se novamente ocupações
desordenadas e precárias ocupando a faixa praial que se acha em processo avançado de
progradação com intenso avanço das areias sobre as áreas de favelas. Verifica-se também, uso
industrial e portuário ao longo de cujos espaços são ocupados pela população de baixa renda.
Para essa faixa existe projeto do governo do estado no sentido de promover a retirada da
população e realizar a padronização e requalificação dos barracos que estão ocupando área da
união. Existem também discussões em torno da possibilidade de transformar o segmento do
entorno do Porto do Mucuripe em área voltada igualmente para o turismo e o lazer com
eventual deslocamento das atividades industriais ali existentes para a praia do Pecém, onde
outro porto foi instalado ao final dos anos 1990.
A faixa L/O, por sua vez, é ao contrário, densamente ocupada desde o Porto do
Mucuripe até a foz do Rio Ceará. Nesta área encontramos um litoral bastante desgastado pela
erosão, praias inacessíveis e pouco desenvolvidas tomadas por obras costeiras, como espigões
e muros de contenção. paridade com a faixa SE/NO, no entanto em termos sociais. Dentro
dessa faixa existem dois ambientes urbanos distintos: o Meireles e a Praia de Iracema, que são
bairros de ricos; Varjota, o Pirambu, as Goiabeiras e a Barra do Ceará representam bairros de
pobres.
Ao contrário da faixa SE/NO, a faixa L/O apresenta concorrência de diversos tipos de
atividades urbanas, da portuária à militar, passando pela turística, comercial, industrial e
residencial, fato que cria um ambiente heterogêneo e desigual. A área da praia do Mucuripe
até a Ponte Metálica é exclusiva da elite fortalezense, dos hotéis, das barracas de luxo, dos
passeios à beira mar e do lazer. Da Ponte Metálica até a Barra do Ceará esse quadro se
inverte, configurando-se como área de moradia da classe menos abastada, onde podemos
encontrar as favelas e as ocupações irregulares.
Para essa faixa, existe projeto do governo do estado prevendo a retirada, a padronização
e a requalificação dos barracos que estão ocupando área da união. Para essa faixa existem
ainda os projetos da construção do Museu do Mar, do Centro de Feiras e Eventos, de
ampliação da Avenida Leste-Oeste e de requalificação da orla marítima através do chamado
“Projeto Orla”.
Do ponto de vista natural é inevitável pensar no agravamento das condições ambientais
para o futuro próximo, em função da pressão sobre os recursos naturais ainda existentes e da
110
descaracterização dos atributos naturais litorâneos sempre em crescente processo. Do ponto
de vista social e econômico, parece haver tendência nas próximas décadas para que toda a
zona marítima se transforme em área de elevado valor imobiliário, ocupada por hotéis e
edifícios de luxo, a fim de atender a demanda turística e habitacional de alta renda. A
elitização e degradação ambiental parecem ser esses os retratos básicos das alterações
históricas na orla marítima de Fortaleza ao longo do século XX.
No entanto, as disparidades sociais são de tal vulto na cidade de Fortaleza, que os ricos
são “obrigados” a conviver com os segmentos sociais mais pobres da população que se
amontoam em favelas ao longo de toda a zona costeira e litorânea - prevalecerá efetivamente
a elitização? O tempo talvez venha com novos marcos. A partir da conjugação de forças,
dentre elas a violência urbana que desponta como nova variável social, o tempo nos dirá.
111
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