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1
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
INSTITUTO DE LETRAS
MESTRADO EM LÍNGUA PORTUGUESA
WAGNER ALEXANDRE DOS SANTOS COSTA
O CONTRATO DE COMUNICAÇÃO NOS CLASSIFICADOS SEXUAIS:
ESTRATÉGIAS DISCURSIVAS DE LEGITIMAÇÃO DO ENUNCIADOR
NITERÓI
2007
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2
WAGNER ALEXANDRE DOS SANTOS COSTA
O CONTRATO DE COMUNICAÇÃO NOS CLASSIFICADOS SEXUAIS:
ESTRATÉGIAS DISCURSIVAS DE LEGITIMAÇÃO DO ENUNCIADOR
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-Graduação do Instituto de Letras da
Universidade Federal Fluminense, como requisito
parcial para obtenção do Grau de Mestre. Área de
Concentração: Estudos da Linguagem. Subárea:
Língua Portuguesa.
Orientadora: Prof. ª Dr. ª SIGRID GAVAZZI
NITERÓI
Abril / 2007
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3
WAGNER ALEXANDRE DOS SANTOS COSTA
O CONTRATO DE COMUNICAÇÃO NOS CLASSIFICADOS SEXUAIS:
ESTRATÉGIAS DISCURSIVAS DE LEGITIMAÇÃO DO ENUNCIADOR
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-Graduação do Instituto de Letras da
Universidade Federal Fluminense, como requisito
parcial para obtenção do Grau de Mestre. Área de
Concentração: Estudos da Linguagem. Subárea:
Língua Portuguesa.
Aprovada em____________de___________________________________de 2007.
BANCA EXAMINADORA
___________________________________________________________________
Professora Doutora Sigrid Gavazzi (Orientadora)
Universidade Federal Fluminense
___________________________________________________________________
Professora Doutora Vanda Menezes
Universidade Federal Fluminense
___________________________________________________________________
Professor Doutor Décio Rocha
Universidade do Estado do Rio de Janeiro
4
Dedico este trabalho aos alunos, amigos e familiares que,
além de torcerem pela realização dele, compreenderam os momentos
em que estive ausente e desculparam as minhas faltas. Faço particular
homenagem à minha mãe Zélia e ao sempre amigo Francisco,
colaborador incondicional com a realização desta pesquisa, sem o qual
muito mais difícil teria sido esse percurso. A vocês, meu muito
obrigado.
5
Não percorri sozinho esse caminho. Agradeço a contribuição de
meus professores do curso de Mestrado e a de todos os funcionários
da UFF: porteiros, senhoras da limpeza, funcionários da secretaria,
entre outros.
Agora, quero agradecer, especialmente, à orientadora Drª Sigrid
Gavazzi. Mas como expressar meu agradecimento, não apenas pela
orientação, por sua experiência e talento indiscutíveis, mas também
pela confiança depositada, pela sua dedicação e constante incentivo de
que um mestrando tanto precisa quando se sente inseguro, quando
tem dificuldades? Recorro, então, às palavras de Bertold Brecht:
“Se não morre aquele que escreve um livro ou
planta uma árvore, com mais razão não morre o educador
que semeia a vida e escreve na alma.”
Sou grato, Sigrid, por toda a orientação científica que me deu,
mas não posso deixar de fazer menção (e de jamais esquecer) à
pessoa humana que é e à sorte de ter sido seu orientando. Que Deus a
abençoe!
6
A OUTRA PORTA DO PRAZER
A outra porta do prazer,
porta a que se bate suavemente,
seu convite é um prazer ferido a fogo
e, com isso, muito mais prazer.
Amor não é completo se não sabe
coisas que só amor pode inventar.
Procura o estreito átrio do cubículo
aonde não chega a luz, e chega o ardor
de insofrida, mordente
fome de conhecimentos pelo gozo.”
(Carlos Drummond de Andrade)
“TANGO DE NANCY
Quem sou eu para falar de amor
Se o amor me consumiu até a espinha
Dos meus beijos que falar
Dos desejos de queimar
E dos beijos que apagaram os desejos que
eu tinha
Quem sou eu para falar de amor
Se de tanto me entregar nunca fui minha
O amor jamais foi meu
O amor me conheceu
Se esfregou na minha vida
E me deixou assim
(...)”
(Edu Lobo e Chico Buarque)
7
RESUMO
Pretende-se, nesta dissertação, analisar sobretudo pelo ângulo qualitativo
os classificados referentes a “garotas de programa”, denominados “classificados
sexuais”, publicados em jornais do Rio de Janeiro. Em tais classificados,
procuraremos fazer o levantamento de um CONJUNTO DE ESTRATÉGIAS
lingüístico-discursivas utilizado pelo enunciador na construção de sua imagem para
o TU-interpretante/destinatário. Nessa pesquisa, vamos proceder, ainda, à análise
do quadro sociolinguageiro (Charaudeau, 1996) e das condições de legitimidade e
credibilidade que estimulam o emprego das referidas estratégias. Por fim, buscamos
traçar perfis coletivos do enunciador, agrupando-o em categorias socioeconômicas,
segundo dados recolhidos nos anúncios.
8
ABSTRACT
It´s intended this text, analysing especially by the angle which shows quality
(the classifieds about prostitutes) called sexual classifieds, published in periodicals of
Rio de Janeiro. In these classifieds, we will do a survey of the set of linguistic
estrategies used by the speaker in the building of its image to the adressee. In the
current research we will make the analysis of the social and linguistic diagram
(Charaudeau, 1996) also, the conditions of legitimacy and credibility which reinforce
the use of such estrategie. Concluding, we will search for the profile of the speaker,
by grouping it in categories which are socials and economics, according to pieces of
information gathered in the advertisiment.
9
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO............................................................................................ 11
1. A GAROTA DE PROGRAMA NA MÍDIA...................................................15
1.1- O ENUNCIADOR E A INFLUÊNCIA DA MÍDIA ............................... 16
1.2- A MODA COMO RESISTÊNCIA...................................................... 18
1.3- UMA GAROTA DE PROGRAMA NO MEIO MEDIÁTICO................ 20
1.4- O QUE É UM CLASSIFICADO SEXUAL (CS)?............................... 21
1.5- O IMAGINÁRIO SEXUAL MASCULINO........................................... 23
2. METODOLOGIA......................................................................................... 31
2.1- CORPUS LEVANTAMENTO DE DADOS..................................... 31
2.2- OBJETIVOS..................................................................................... 32
2.3- HIPÓTESES..................................................................................... 33
2.4- OBSERVAÇÕES.............................................................................. 34
3. DA TEORIA AO CS: um retrato fragmentado?....................................... 36
3.1- PRESENÇA E IMPORTÂNCIA DOS ADJETIVOS NOS CS............36
3.2- GÊNEROS, TIPOS E MODALIDADES DISCURSIVAS...................48
3.2.1- Considerações gerais....................................................................... 48
3.2.2- A descrição....................................................................................... 60
3.2.3- A linguagem publicitária nos CS.......................................................64
3.3- O QUADRO SOCIOLINGUAGEIRO................................................ 79
3.3.1- O contrato de comunicação nos CS.................................................80
3.3.2- A estruturação sociolinguageira....................................................... 85
3.3.3- Legitimidade e credibilidade............................................................. 97
3.4- O ETOS DO ENUNCIADOR............................................................ 101
3.4.1- A cena da enunciação...................................................................... 111
4. DO CS AO PERFIL SOCIAL DO ENUNCIADOR: um retrato
imaginado?................................................................................................. 120
4.1. TRABALHANDO COM NÚMEROS.................................................. 130
5. CONCLUSÃO..............................................................................................136
6. REFERÊNCIAS.......................................................................................... 140
7. ANEXO....................................................................................................... 145
10
“O CHÃO É CAMA PARA O AMOR URGENTE
O chão é cama para o amor urgente,
Amor que não espera ir para a cama.
Sobre tapete ou duro piso, a gente
compõe de corpo e corpo a úmida trama.
E para repousar do amor, vamos à cama.”
(Carlos Drummond de
Andrade)
11
INTRODUÇÃO
Na publicidade, um anunciante espera que se destaquem as peculiaridades
que há em seu produto para fazê-lo sobressair-se sobre os demais (uma vez que há
produtos em grande número, mas com razoável semelhança entre si na sociedade
em que se vive).
O publicitário, então, produz um anúncio que procura tornar especial (e
necessário) determinado produto ou serviço. Para isso, recorre a diversos
mecanismos, como a singularização e a adjetivação, por exemplo. O texto
publicitário, contudo, não apenas destaca as características da mercadoria: ele
procura criar uma imagem desse produto (que deve aproximar-se o mais possível da
realidade), de forma que se venda não só o objeto, mas todo um desejo, uma falta,
uma necessidade de usufruir daquele bem. Isso é feito apelando-se para o senso
comum, os valores sociais, as ideologias existentes em dado grupo social, como, por
exemplo, o que pode oferecer idéia de status, de beleza, de aspecto saudável, de
sensação de poder, de comando, de juventude, de prazer etc. É, como diz
Sandmann (2000:27), “persuadir alguém, levar alguém a um comportamento”.
Não é sem razão que os jornais dedicam uma de suas partes a um
determinado grupo de anúncios, organizados nos cadernos conhecidos por
“classificados”. O objetivo desses textos é ofertar algum tipo de produto, quase
sempre bens materiais. Na maioria das situações em que ocorrem tais anúncios,
enunciador e produto são elementos distintos. Mas há um caso singular em que a
figura daquele se confunde com a deste: quando, em determinada situação
comunicativa, uma pessoa anuncia-se a si mesma em busca de um parceiro para
relacionamento sexual.
Tal situação envolve, de um lado, a pessoa que anuncia como mercadoria o
seu próprio corpo (e seus serviços) e alguém que lê o referido anúncio, em busca de
uma pessoa que consubstancie, para ele, essa mercadoria. Em resumo: nos
classificados sexuais, alvo desta dissertação, o papel do publicitário é exercido pela
própria pessoa que fornece o produto/serviço, o anunciante, apartir de então,
enunciador. O objeto de troca, ou seja, a garota de programa
1
anunciada, por sua
1
“Mulher que faz sexo profissionalmente.” (DELP, 2001)
12
vez, é a idealização da pessoa real que anuncia o produto/serviço e o incorpora.
Veja-se:
O enunciador joga com a promessa da realização das fantasias do público-
alvo, com os seus desejos, com as suas “necessidades”, como bem destaca
Monnerat (2003:23) ao referir-se à publicidade:
“Como alvo do ato de promoção do produto, o sujeito-destinatário é
colocado, de maneira explícita ou implícita, como se tivesse uma
“necessidade” que deve procurar preencher, sob pena de frustração. Torna-
se, então, “agente de uma busca” da qual será o beneficiário e, uma vez que
essa busca tem sempre um resultado positivo, o sujeito-alvo é apresentado
como “herói” de uma busca que termina com final feliz e da qual ele é o
próprio beneficiário.”
O enunciador apela, ainda, para as idéias da juventude, da beleza e do
prazer, a partir das quais oferece não apenas “sexo”, mas tudo aquilo que supõe
buscar o sujeito-alvo.
Assim, o objetivo deste trabalho é analisar como o EU-comunicante (sujeito
real) constrói a imagem do EU-enunciador (sujeito discursivo), utilizando-se,
principalmente, do recurso lingüístico da adjetivação como base para a criação e
emprego de um conjunto de estratégias discursivas que podem ser fundamentais
para o sucesso do seu projeto de persuasão do TU-interpretante/destinatário.
Para tanto, esta pesquisa terá, como suporte teórico basilar, a Teoria
Semiolingüística de Patrick Charaudeau (1996:5), além de outras teorias, como a do
etos (Maingueneau, 2002 e 2005), que nos auxiliarão nessa tarefa.
Dessa forma, o capítulo 1 trata da presença da garota de programa na mídia
e da sua influência nos classificados sexuais. Também apresentamos, neste
capítulo, o subgênero “classificados sexuais”, oferecendo algumas informações
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13
básicas. Finalmente, relacionamos dados do relatório Hite (1981)
2
à descrição das
“garotas” nos anúncios. Já o capítulo 2 explicita a metodologia utilizada na pesquisa.
O aparato teórico julgado pertinente para esta Dissertação concentra-se no
capítulo 3, que, inicialmente, explana as considerações de eminentes teóricos
acerca da classe dos adjetivos e as aplica ao corpus. Em seguida, apresenta e
discute os conceitos de gênero, tipo e modo discursivo, além de relacioná-los aos
textos em questão. Na seqüência, dá-se destaque à modalidade descritiva e aos
recursos que dela fazem parte.
Discorre-se, no contínuo, sobre o discurso publicitário, vinculando-se sua
linguagem e seus recursos aos dados desta pesquisa. Em seguida, tem-se a análise
semiolingüística dos “classificados sexuais”,
3
destacando a tripla competência
comunicativa do sujeito, sua legitimidade e credibilidade.
Investigam-se, no próximo item, os vários etos criados pelo enunciador. Já no
capítulo 4, procede-se à análise do perfil socioeconômico do enunciador, inferido
das pistas lingüísticas deixadas por ele. Também, a cargo do capítulo 4 está a
categorização numérica dos dados. A este seguem as considerações finais, as
referências utilizadas no trabalho e o anexo.
Pretende-se, enfim, dar conta mesmo que no exíguo espaço de tempo para
uma Dissertação de Mestrado de um universo lingüístico ainda não explorado,
muitas vezes discriminado, eivado de preconceitos sociais, mas que, por sua
existência maciça na mídia, não pode deixar de ser esclarecido, esmiuçado,
detalhado, sob uma perspectiva científica, que se quer desprovida de “pré-
conceitos”. Para tal, vai-se tentar definir como se estrutura o subgênero (3.2), que
ângulos textuais-discursivos são utilizados na construção do quadro sociolinguageiro
(3.3) e, finalmente, chegar a um perfil por meio de um suporte numérico menos
individual e mais coletivo do enunciador, já que as garotas de programa podem,
como se verificará, ser vislumbradas sob categorias (até) previsíveis.
2
Este relatório aborda aspectos ligados à sexualidade masculina.
3
Doravante, CS.
14
“AQUELA
Minha amada é de carne, de pele e pêlo.
Ora é negra, ora é loura, ora é vermelha.
Minha amada é três. É trinta e três.
Minha amada é lisa, é crespa, é salgada, é doce.
(...)
Ela é boazuda e é bela como uma fera.
Minha amada é lúbrica, é casta, é catinguenta.
Minha amada tem bocas e bocas de sorver,
de sugar, de espremer, de comer.
(...)”
(Darcy Ribeiro)
15
1. A GAROTA DE PROGRAMA NA MÍDIA
O cinema e a televisão sempre se valeram de garotas de programa como
personagens, estereotipadas
4
ou não. Cada personagem da ficção (cinema,
televisão, literatura), por ser inspirada naquelas da vida real, reproduz e imita as
suas características.
Ao mesmo tempo, essas personagens passam a representar modelos sociais
(de estética, de comportamento, de estilo etc.). Como exemplo, cite-se o famoso
cruzar de pernas da atriz Sharon Stone em Instinto Selvagem, uma cena fixada no
imaginário dos espectadores. Também a maneira de ser livre da personagem Anita,
interpretada por Mel Lisboa
5
em Presença de Anita, e a sua performance doce e
sensual tornam-se parte do conhecimento compartilhado entre as pessoas. Assim,
algumas personagens do cinema e da televisão merecem lembrança, tais como as
de
a) Audrey Hepburn
6
, ao marcar como a garota de programa que sonhava em
conseguir um milionário para se casar em Bonequinha de Luxo (1961);
b) Catherine Deneuve
7
ao fazer a jovem rica e infeliz que busca suas
realizações sexuais em um bordel no filme A Bela da Tarde (1967);
c) Kim Basinger
8
, em Los Angeles, Cidade Proibida (1997), por representar
uma garota de programa que se envolve com o detetive Bud White, vivido por
Russell Crowe;
d) Julia Roberts
9
, em Uma Linda Mulher (1990), intérprete de Vivian, uma das
mais famosas garotas de programa do cinema;
e) Malu Mader
10
, em Bellini e a Esfinge (2001), ao representar uma misteriosa
garota de programa que se envolve com Bellini (Fábio Assunção);
f) Nicole Kidman
11
, fazendo a principal cortesã de Paris e estrela de uma
badalada boate em Moulin Rouge (2001);
4
Estereótipo é uma caracterização simbólica e esquemática de pessoas ou grupos cujo
comportamento se adapta às expectativas e julgamentos sociais de rotina. (Dicionário Larousse,
1995)
5
As personagens de Mel Lisboa e de Sharon Stone não eram garotas de programa.
6
Foto: www.adorocinema.cidadeinternet.com.br (anexo C1)
7
Foto: www.adorocinema.cidadeinternet.com.br (anexo C2)
8
Foto: cinemacomrapadura.com.Br (anexo C3)
9
Foto: adorocinema.cidadeinternet.com.Br (anexo C4)
10
Foto: www.adorocinema.cidadeinternet.com.br (anexo C5)
11
Foto: www.cineplayers.com (anexo C6)
16
g) Betty Faria
12
, em Tieta do Agreste (1989), que volta à terra natal 26 anos
após ser expulsa pelo pai e ”vencer na vida” como prostituta;
h) Letícia Sabatella
13
, vivendo Thais, que, para ascender socialmente,
começa a se prostituir na novela Dono do Mundo (1991);
i) Ana Paula Arósio
14
, que, ao personificar Hilda, quebrou o estereótipo sexual
de prostituta “clássica” e realizou sua performance com um perfil de menina ingênua
e cheia de candura na minissérie Hilda Furacão (1998);
j) Danielle Winits
15
, vivendo a prostituta Suzette Fontin na minissérie
Chiquinha Gonzaga (1999);
l) Suzana Vieira
16
, atriz que interpretou, também em Chiquinha Gonzaga, a
prostituta Suzette na segunda fase da minissérie; e
m) Giovanna Antonelli,
17
intérprete da garota de programa de classe média
Capitu em Laços de Família (2000).
1.1. O ENUNCIADOR E A INFLUÊNCIA DA MÍDIA
Pode-se conjeturar que, em alguns anúncios, os nomes utilizados para o
enunciador, os “nomes de guerra”
18
, sofrem influência da mídia. Como dissemos,
esta fixa alguns modelos, que são recuperados do imaginário (pelas “garotas”) e
(re)empregados no mundo do discurso, em função de um projeto de persuasão.
O enunciador vale-se não apenas da aparência da atriz (da sua estética), mas
também da magia da personagem, a quem pretende se associar. Confiram-se
alguns exemplos:
a) “Ornela” é uma personagem da novela Belíssima, interpretada por Vera
Holtz e “Safira” , da mesma novela, é personagem de Claudia Raia.
12
Foto: www.terra.com.br/istoe/1663_senhor_da_bahia3.htm (anexo C7)
13
Foto: www.epoca.globo.com (anexo C8)
14
Foto: www.epoca.globo.com (anexo C9)
15
Foto:www.epoca.globo.com (anexo C10)
16
Foto: www.epoca.globo.com (anexo C11)
17
Foto: www.epoca.globo.com (anexo C12)
18
O “nome de guerra” é um pseudônimo que a garota de programa utiliza para fins profissionais.
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17
b) “Mel” não é um nome comum. Acreditamos haver inspiração no nome de
Mel Lisboa, atriz que fez sucesso vivendo Anita. E “Sol” foi a personagem
interpretada por Débora Secco, na novela América.
c) “Anita”, por seu turno, foi a principal personagem da minissérie Presença
de Anita, que lançou Mel Lisboa na TV. Ela é uma adolescente recém-chegada em
uma cidade do interior e se envolve com um homem já maduro.
d) “Sharon”, talvez de Sharon Stone, atriz norte-americana, muito requisitada
para papéis de mulher sexy.
19
19
Consta, no dicionário Larousse (1995), que sexy é um adjetivo do inglês que significa “pessoa
sexualmente atraente. Ou seja, aquela capaz de estimular o desejo sexual do outro.
MEL
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SOL
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a
(sic) corpo
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18
e) “Jad”, da novela O Clone, uma belíssima descendente de árabes,
interpretada por Giovanna Antonelli.
f) “Veluma”, cantora negra de sucesso na década de 70.
1.2. A MODA COMO “RESISTÊNCIA”
Em janeiro de 2006, a grife Daspu desfilou, na Praça Tiradentes, no centro do
Rio de Janeiro, roupas feitas para garotas de programa, algumas específicas para a
“batalha”.
20
Entre as modelos, todas prostitutas, desfilou a atriz Betty Lago,
empolgando a imensa platéia.
No mesmo momento do desfile da Daspu, acontecia em São Paulo um
importante evento mundial de moda, o São Paulo Fashion Week, e quem estava na
passarela era a Top model Gisele Bundchen.
Ainda assim, a BBC de Londres registrou o evento da Praça Tiradentes e
jornais de grande circulação, como O Globo, do Rio de Janeiro, afirmavam, no dia
seguinte, ter sido a Top Gisele ofuscada pelas garotas de programa da Daspu
(trocadilho com o nome Daslu - grife paulistana extremamente elitizada). O tema foi
explorado durante várias semanas por jornais e revistas, em notinhas de colunas
20
O termo batalha (gíria) significa o trabalho, o serviço. Batalhar é, então, trabalhar, fazer ponto,
prostituir-se.
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19
sociais ou entrevistas. Em anexo
21
, pode-se ver a foto da atriz Betty Lago no
primeiro desfile da Daspu, retirada da revista Criativa, de Março de 2006.
Outro evento, cuja foto encontra-se também em anexo
22
, foi o ocorrido em
06/04/2006, ocasião em que as modelos da grife
23
desfilaram no Programa do Jô.
Em 09/06/2006, acontecia mais um desfile da grife Daspu no Rio de Janeiro,
dessa vez no Circo Voador, tradicional espaço do Rock na cidade. Ao mesmo
tempo, na Marina da Glória, realizava-se o Fashion Rio, com a participação das
famosas modelos Gisele Bundchen e Raica
24
. No entanto, a mídia não deixou de
cobrir o evento do Circo Voador, inclusive o JB entrevistou as referidas prostitutas.
25
Estava presente o cineasta Neville D’Almeida responsável por obras como
A dama do lotação (1978) e Navalha na carne (1997) , ora realizando um
documentário sobre a grife em questão.
Ora, todo esse movimento da moda e sua repercussão na mídia não é
gratuito: segundo alguns, especialmente psicanalistas, antropólogos e sociólogos,
faz parte de um processo de resistência e de luta por mais respeito da sociedade,
por meio da profissionalização da categoria.
O próprio termo prostituta é visto pela socióloga e prostituta aposentada (além
de presidente da ong Davida
26
e da grife Daspu
27
), Gabriela Leite, como uma forma
de assumir uma condição que nada tem de vergonhosa, conforme seu parecer.
Segundo ela, a moda pode fazer parte da vida das garotas de programa,
assim como da vida de qualquer outra pessoa. Acrescenta que elas não querem, por
exemplo, falar apenas de preservativos ou DST, querem ser visualizadas como
pessoas da sociedade, como consumidoras, por exemplo.
A estudiosa, então, resume seu pensamento, afirmando ser, nessa luta, que a
moda com inspiração nas garotas de programa torna-se importante ferramenta,
porque levanta a auto-estima delas e protesta contra o preconceito que sofrem. Além
disso, atrai a mídia. (www.daspu.com.br/entrevista) (Os grifos são nossos)
21
Anexo D1.
22
Anexo D2.
23
Conhecidas como Dasputinhas, forma carinhosa de se referir às modelos da Daspu.
24
Raica é modelo internacional e era, à época, namorada do jogador de futebol Ronaldo, vulgo o
“fenômeno”.
25
As fotos dos desfiles foram publicadas no site www.beijodarua.com.br. Veja-se o anexo D3.
26
www.davida.com.br
27
www.daspu.com.br
20
1.3. UMA GAROTA DE PROGRAMA NO MEIO MEDIÁTICO
Bruna Surfistinha foi a garota de programa de maior destaque na mídia, que a
elevou à categoria de “fenômeno”. A “garota” criou um blog
28
(“apenas para
desabafar”, conforme ela mesma explica) que passou a receber milhares de visitas,
10.000 por dia, e a fez famosa na internet, despertando o interesse da mídia.
Publicou O doce veneno do escorpião O diário de uma garota de
programa
29
, um dos mais vendidos do mercado, sendo ainda mais, à época,
assediada pela mídia.
Seu nome real é Raquel Pacheco. Bruna Surfistinha, que é o seu “nome de
guerra”, é a melhor personagem que uma garota de programa poderia inventar para
si mesma.
30
Isto porque em vez de prostituta que, sem opção, faz sexo por dinheiro,
Bruna também buscaria o prazer. Talvez esteja aí a justificativa para que metade do
seu público leitor seja de mulheres
31
. Esta opinião é corroborada pela antropóloga
Miriam Goldenberg, da UFRJ (In: Época, 01/2006): “uma menina de 21 anos vem a
público e diz que transou com mais de mil, de todas as formas, e que além de tudo
sentiu prazer” [logo] “as mulheres podem não querer fazer igual, mas se sentem
mais livres”.
Até o mês de outubro de 2005 data da sua “aposentadoria” , Bruna
Surfistinha afirma que trabalhava cinco dias por semana, fazendo uma média de 30
programas.
Visitamos o seu blog e lá vimos a relação de eventos dos quais diz ter
participado na mídia. São, no total (até 04/2006), 78 atividades, entre reportagens e
entrevistas. O conjunto é chamado pela referida “garota” por “currículo pós-
aposentadoria”.
Em relação a ele, de um modo geral, as experiências apontadas por ela são
pouco relevantes, em termos de projeção mediática. Ora, a maior parte das
atividades é composta de entrevistas em uma rádio local, às vezes, até por telefone
(ao vivo ou não); participação em chats com internautas e entrevistas para jornais
locais.
28
www.brunasurfistinha.com
29
Editora Panda Books, São Paulo, 2005, R$ 23,90.
30
Cf. item 3.3.1.
31
Dados da Editora Panda Books (IN: Revista Época, 01/2006)
21
No entanto, alguns jornais de grande circulação (como O Globo, JB, Folha,
Clarin) e revistas (como Época e Criativa) publicaram algo a seu respeito. Estes
nomes, de fato, deram contribuição à sua projeção na mídia.
Na edição 01/2006, a revista Época apresenta uma reportagem sobre o
crescente número de garotas de programa que, como Bruna, são oriundas da classe
média. A vida de Bruna foi descrita como um exemplo desses milhares de garotas
de programa “de luxo”, conforme a revista mesma qualifica. Assim, apesar de a
reportagem não ser exatamente sobre ela, pode-se afirmar que a revista Época lhe
deu destaque haja vista a sua foto na capa
32
, tratando-a como “símbolo” da
prostituição de luxo.
Não poderia ser diferente. Afinal, a mídia busca audiência. A historinha de
uma garota de programa que largou uma vida e uma família de classe média para se
aventurar na marginalidade social parece atrair muitos curiosos (aliás, mais de
10.000!). É nesse tipo de prosa que o mercado editorial tem investido e lucrado
bastante, o que põe em xeque a sua seriedade. Afinal, se “Bruna Surfistinha” fosse
uma personagem de ficção literária, o livro venderia tanto? E as mazelas (reais) de
Raquel Pacheco, semelhantes às que tantas outras moças vivem em nossa
sociedade, despertariam tanto interesse nos leitores, se tratadas em tom mais sério,
por uma pessoa realmente qualificada? Permanece, então, a dúvida: “Bruna
Surfistinha” existiu, de fato, ou constituiu uma bem construída história veiculada por
algum órgão publicitário visando apenas ao lucro? A referida garota de programa
seria mesmo uma realidade, ou, pelo menos, teria existido e montado, sob seu
prisma pessoal, suas histórias? Cabe aos leitores a decisão. A nós, só a menção,
por (a) não constituir em si o cerne desta pesquisa e (b) apenas contribuir como
exemplificação ao assunto que vínhamos discorrendo.
1.3. O QUE É UM CLASSIFICADO SEXUAL (CS)?
Dos domínios discursivos de que dispõe nossa sociedade, o jornal é talvez o
mais constante na vida da população, pois alcança, diariamente, todos os estratos
sociais e todas as regiões do país. Contém informações sobre diversos aspectos da
nossa vida e do mundo, custando o preço de uma passagem de ônibus,
32
Anexo E.
22
aproximadamente. É escrito em linguagem culta e atual. Isso tudo faz dele fonte
para vários estudos.
É usado também para anunciar produtos e serviços oferecidos por empresas
e por pessoas. Para tal, compõe um caderno específico para publicação desses
anúncios, os “classificados”, onde se anunciam eletrodomésticos, carros,
apartamentos e um sem-número de bens. Anunciam-se, também, inúmeros serviços,
inclusive os sexuais.
Assim, o CS é um tipo de classificado específico para a oferta deste tipo de
serviço. Gênero textual em questão nessa dissertação, ele divide, com outros tipos
de classificados (de imóveis, de veículos), o caderno de nome Classificados, nos
jornais como O Globo, O Dia, Jornal do Brasil ,Extra ,entre outros.
O custo do anúncio varia conforme o número de palavras: até 20, paga-se o
valor mínimo da tabela. Disto decorre a presença abundante de abreviaturas no
texto, a fim de não se ultrapassarem os referidos 20 vocábulos. A esse respeito,
consultamos as agências de classificados O Globo/Extra e O Dia/Meia Hora sobre
os critérios formais identificadores da unidade “palavra”.
Segundo as agências, a presença do espaço em branco é um critério
determinante para demarcar os limites do que se considera “uma palavra”:
abreviaturas combinadas podem, então, formar uma única palavra. Há, por
conseguinte, ocorrências como: “s/restrições”, “cab.lisinhos”, “1.80m.alt”,
“tel:xxxxxxx”, que contam como uma só unidade.
33
Por outro lado, observamos algumas contradições quanto ao critério do
espaço em branco, pois se questiona se ocorrências como “19 aninhos”, “Trat.
terapêutico” teriam valido por duas palavras.
Os valores também variam segundo o dia de publicação, ou seja, os anúncios
de segunda a sábado apresentam custo menor do que os divulgados em dia de
domingo. Por essa razão, publicam-se poucos desses anúncios neste dia, ao
contrário do que ocorre em relação aos classificados de imóveis e de empregos.
Quem se anuncia não pode também utilizar os termos que desejar, pois há
restrições verbais. Palavras consideradas de baixo calão pelas empresas são
33
Transcrevemos os anúncios sem nenhuma adaptação, tal como se encontram nos jornais.
23
proibidas. Então, ele terá de encontrar recursos variados para se caracterizar e, ao
mesmo tempo, seduzir o leitor.
1.5. O IMAGINÁRIO SEXUAL MASCULINO
34
Observando-se os CS, percebe-se que a descrição da forma física das
“garotas” reflete um conceito social de beleza.
Tendo em vista pertencer o destinatário dos anúncios ao sexo masculino (na
maioria dos casos) e o enunciador desejar conquistá-lo através da descrição do seu
corpo e de sua atuação sexual, importa, para este último, estar a par dos
julgamentos daquele.
Para perpassar esse universo, utilizamos as observações de Hite (1981), que
realizou, nos Estados Unidos, uma larga pesquisa sobre a sexualidade do homem,
buscando compreender, de modo geral, como ele se sente a respeito da sua
sexualidade e das suas relações pessoais. No questionário, a pesquisadora faz a
34
Trataremos do imaginário do homem heterossexual tomando-o como referência também para o
imaginário lésbico, pois entendemos não haver diferenças significativas sobre o fascínio que os
atributos físicos de uma mulher exercem sobre pessoas dessas duas orientações sexuais. Esta nota
justifica-se pelo fato de o enunciador, em vários casos, oferecer seu programa, também, a mulheres
ou casais.
FASCÍNIO
Casado, continuo a achar as mulheres
irresistíveis.
Não deveria, dizem.
Me esforço. Aliás,
já nem me esforço.
Abertamente me ponho a admirá-las.
Não estou traindo ninguém, advirto.
Como pode o amor trair o amor?
Amar o amor num outro amor
é um ritual que, amante, me permito.”
(Affonso Romano de Sant’Anna)
24
seguinte pergunta, dentre muitas, aos informantes
35
: “O que os homens admiram
nas mulheres?”
A maioria respondeu em termos das características físicas da mulher, ou
sobre a parte do corpo de que mais gostam. Outros mencionaram a idade,
demonstrando preferência por mulheres mais novas ou mais maduras.
Selecionamos algumas respostas, a fim de articulá-las a alguns CS:
Informante 1- “Vamos começar com a parte externa: botas; há alguma coisa
muito sexy nas garotas que usam botas, mesmo com saias compridas. O melhor
efeito é com joelhos descobertos algumas polegadas entre o meio da perna e a
coxa. Cabelos longos são mais sexy do que os curtos, soltos, um pouco sobre os
ombros na frente. A forma da perna de uma mulher mexe conosco de forma que
homem nenhum pode explicar, ou uma mulher entender (...)”. (HITE, 1981)
Amanda, no anúncio a seguir, descreve traços seus, como “cabelos compridos”
36
e “coxas grossas”. Veja-se:
O enunciador só pode entender serem tais características interessantes ao
público idealizado por ele ou não haveria razão para apresentá-las. O “informante 1”,
caso se interessasse em consultar um caderno de classificados de garotas de
programa, poderia selecionar o de Amanda.
Informante 2- “Gosto muito das mulheres que sejam delicadas e carinhosas.
Adoro peitos, é claro, mas sou ligado nos bicos (...)” (HITE, 1981)
35
Homens de diferentes faixas etárias, socioeconômicas e culturais e de regiões variadas dos E.U.A.
36
O substantivo “cabelos” é empregado, na maioria dos casos, acompanhado dos adjetivos “longos”,
“compridos”. Não há ocorrência do adjetivo “curtos”. Este fato nos leva a afirmar que, para a garota de
programa, o cabelo comprido é sexy e, por isso, seduz o homem.
AMANDA VALQUEIRE!!!
Novidade! 18 aninhos, branquinha, cabelos
compridos, coxas grossas! Quadril
empinadinho!!! Extremamente linda! Anúncio
verdadeiro! Cavalheiros/casais. (3H=120,00)
(sábado/domingo). 2426-4248 (24H)
25
Talvez, o “informante 2” fosse atraído por Aiko, pois ela atuaria sobre o seu
imaginário sexual ao descrever seus seios como “pontiagudos”. Confira-se:
Para esse tipo de homem, “os bicos” são fonte de desejo e prazer. Por isso, o
enunciador atinge destinatários que possuem esse mesmo perfil, podendo seduzi-
los.
Informante 3- “Fui condicionado desde muito cedo a roupas sexy saias justas,
suéteres apertados, cintas, ligas, meias, sapatos de salto alto, vestidos, anáguas,
etc., e esse condicionamento nunca mudou nem pode ser mudado. Mulheres
com roupas sensuais femininas me excitam mulheres que usam calças, ternos
ou sapatos baixos me desagradam e me tornam impotente nas minhas relações
com elas.” (HITE, 1981)
Agora, veja-se o anúncio que segue:
O anúncio de Marianne é tematizado a partir de uma linha de roupas
sensuais, as quais ela supõe estarem ligadas, por fetiche, ao desejo sexual
masculino (“(...) todo homem gostaria de despir”). O “informante 3” afirma: “(...)
roupas sensuais femininas me excitam”. Dessa forma, esta representação da
sensualidade feminina, “excitante”, resgatada do imaginário do homem e
AIKO
Exótica japonesinha fogosa, quentíssima,
cabelos negros, seios pontiagudos, beijinhos
ardentes, massagem eloqüente, aparelhos.
Adorando namorar. Centro 2242-3839. Após
11:00h.
MARIANNE (BOTAFOGO)
Lingerie. A roupa que todo homem gostaria de
despir. Fantasias. Somente em hotéis e
residências 8815-2736
26
incorporada no discurso do enunciador, constitui recurso argumentativo-persuasivo
nos CS.
Informante 4- “Só gosto de mulheres mais jovens, se possível uma virgem
intocada, com um ar bem inocente.” (Idade: cinqüenta e um.) (HITE, 1981)
Em alguns casos, como será tratado no capítulo sobre o etos, o enunciador
busca transmitir, através de suas palavras, uma imagem de “ninfeta”. Vejamos:
Enquadrar-se nesse perfil tem o objetivo de apelar aos desejos e fantasias de
um público com preferências tais qual a do “informante 4”.
Informante 5- “Prefiro uma mulher de quarenta, porque pode mostrar a um
homem o que é prazer de verdade. É fato bem conhecido que nunca se pode
montar um potro tão confortavelmente quanto uma boa égua. Treino e
experiência são muito mais desejáveis que uma exuberância juvenil.” (Idade:
cinqüenta e sete.) (HITE, 1981)
O “informante 5” privilegia a maturidade, afirmando estar nela a melhor forma
sexual, porque conta com a experiência. Beth, em seu anúncio, vale-se da
“experiência” como um de seus argumentos:
FERNANDINHA
NOVIDADE
18aninhos Copacabana, gatinha manhosa
lindíssima, corpinho maravilhoso, cabelos
compridos, atendimento relaxante, estimulando
enlouquecedoras fantasias. Privê R$80,00 (24h)
Tel: 3183-5512 Hotéis/residências.
BETH COROA Tijucana
, loiraça
, 40
ª (sic),
carinhosa, audaciosa profissional, experiente c/
habilidades, realizando fantasias, aparelhada,
Local discreto
http:://www.destackk.com.br/bethcoroatijucana
27
Assim, em um universo como o do sexo, em que os gostos são tão variados,
o sujeito responsável pelo anúncio sabe haver uma parcela do mercado à qual ele
pode atender. Por isso, o que as garotas de programa dizem em seus enunciados
coaduna-se ao imaginário dos destinatários, a que Hite (1981) denominou de
informantes”.
Já Mirian Goldenberg, antropóloga da UFRJ, entrevistou 205 homens,
pesquisando o que mais os atraía nas mulheres. Segundo ela (In: Revista O Globo,
10/09/2006), 27% dos homens sentem-se mais excitados pelas nádegas femininas.
Outras partes do corpo da mulher, além de atributos como sensualidade e
inteligência, também foram citadas como atraentes. Veja-se a tabela
37
:
Bunda 27%
Corpo 20,5%
Seios 20,5%
Pernas 12,7%
Sensualidade 6,8
Boca 4,5%
Olhos 4%
Inteligência 2,5%
Os dados dessa pesquisa, assim como os depoimentos do relatório Hite
(1981), corroboram a ênfase dada pelo enunciador a seus seios (“pontiagudos”,
“bicudinhos”, “duríssimos”...), nádegas (“quadril empinadinho”, “enlouquecedor”...) e
corpo como um todo (“escultural”, “parando trânsito”...). As pernas, como
demonstram os 12,7%, também foram bastante cotadas, por isso, nos anúncios, as
atribuições para ela são “coxudíssima”, “grossas”, “torneadas”, entre outras, já que o
enunciador joga com as preferências do seu público.
Chama a atenção a inteligência estar em último lugar, com 2,5%, da
preferência masculina (fora do contexto dos CS). Apenas esse percentual dos
homens entrevistados a tem por mais atrativa. Isto significa que, para a maioria, os
atributos físicos são o mais importante, especialmente as nádegas, e que a mulher
37
Reproduzida integralmente e sem adaptações.
28
inteligente é preterida por um determinado tipo de mulher: aquele que possui
atributos físicos considerados “sexuais”, conforme se afirmou.
Hite (1981) investiga, também, os sentimentos masculinos acerca do
relacionamento com garotas de programa. As perguntas a que se devia responder
eram as seguintes: “Teve alguma vez relações sexuais com uma prostituta? Como
se sentiu a respeito de pagar por sexo?” (idem)
A revelação surpreendente, segundo a autora, foi os homens declararem ter
de pagar por sexo sempre. A maioria dos entrevistados afirmou: “de qualquer modo
você sempre paga” (HITE, 1981).
Para esses homens, a conquista em si já representa um custo, sem lhes
garantir que terão sexo por isso. Alguns chegaram a afirmar que a própria relação
esposo/esposa no casamento seria uma troca em que, de um lado, o homem obteria
benefícios sexuais e, de outro, a mulher receberia vantagens econômicas.
Outra questão abordada por eles, em suas respostas, é a da “pressão” social
sofrida pelo homem em ter de prolongar o ato sexual para melhor dar prazer à
parceira, pois, culturalmente, o orgasmo masculino finda o ato sexual tendo a
mulher também o alcançado (ou não). Assim, com uma “profissional”, eles não
teriam responsabilidade pelo prazer feminino (que para muitos entrevistados é um
problema da mulher), podendo até manter uma atitude passiva.
Alguns disseram que gostavam de sexo com garotas de programa porque só
assim não seriam rejeitados. Outros “homens afirmaram gostar de receber a
estimulação experimentada que uma mulher poderia lhes oferecer” (HITE, 1981) e
que, por isso, procuravam por garotas de programa. Destaque-se que ter sexo em
casa ou não ter dificuldades em consegui-lo não representaria impedimento aos
homens para procurar por sexo pago.
No entanto, pagar, para muitos, seria algo que diminuiria o homem. Vários
deles relataram experiências desagradáveis. Alguns rejeitaram a idéia de pagar por
sexo. Também, muitos outros homens que tiveram sexo com uma garota de
programa acharam a experiência insatisfatória “porque não receberam nenhuma
apreciação de valor ou reconhecimento da prostituta, nenhuma aceitação emocional
e nenhum sentimento de conquista foi apenas uma transação de negócios”. (HITE,
1981)
29
Esses não representam, exatamente, o público-alvo para o qual as “garotas”
produzem seus anúncios, uns porque não tiveram boas experiências com o sexo
pago, outros simplesmente porque não o desejam. Assim, suas respostas revelaram
alguns pontos negativos contra os quais o enunciador dos CS se protege. Talvez
para atender a esses “insatisfeitos”, encontraremos, na descrição das “garotas”,
notas afetivas, como: “carinhosa”, “atenciosa”, “adorando beijar”, entre outras.
Em suma, o homem vai ao encontro de uma garota de programa por diversas
razões, algumas já apresentadas. Também a falta de carinho por parte da
companheira foi mencionada como o motivo da procura por sexo fora de casa. Além
disso, muitos homens casados disseram não poder se expor a um relacionamento
extraconjugal que poderia lhes trazer complicações, ou, simplesmente, não possuir
tempo e paciência para ele.
30
“MISTÉRIO
O mistério começa do joelho para cima.
O mistério começa do umbigo para baixo
e nunca termina.”
(Affonso Romano de Sant’Anna)
31
2. METODOLOGIA
2.1. CORPUS LEVANTAMENTO DE DADOS
O corpus analisado nesta pesquisa constitui-se por classificados retirados de
dois jornais cariocas: O Globo e O Dia. Deles se extraiu certa quantidade de
classificados, totalizando 1000 anúncios, a saber:
O Globo Total de anúncios: 400
O Dia Total de anúncios: 600
Total geral: 1000 anúncios
O primeiro critério para a seleção dos jornais foi a média diária de CS
publicados. Selecionamos as duas maiores médias dentre os jornais: O Globo,
Jornal do Brasil, O Dia, Extra e Meia Hora. Os jornais O Globo e O Dia superaram a
média diária de 60 anúncios, daí terem sido os escolhidos para a recolha do corpus.
O segundo foi a média anual de exemplares vendidos diariamente. Julgamos
mais adequado nos basearmos pelos dados do IVC (Índice Verificador de
Circulação) para este levantamento. Esta instituição é legitimada para tal ofício,
inclusive pelo fato de os dois periódicos a ela serem associados. Assim,
trabalharíamos apenas com os jornais de maior alcance populacional. Entretanto,
apesar de, segundo o IVC, os jornais com média de venda mais expressiva, em
2005, serem O Globo e Extra, nesta pesquisa serão utilizados os jornais O Globo e
O Dia. Isto porque os jornais O Globo e Extra dividem a mesma agência, logo os
anúncios classificados desses dois periódicos obedecem às mesmas restrições
lingüísticas. Por isso, optamos pelo 3º colocado em vendas na cidade do Rio de
Janeiro (O Dia)
38
, o que talvez nos proporcionasse maior variedade lingüística dos
CS em sua apresentação.
A razão dessa possibilidade de “variação” se prenderia, a nosso ver, às áreas
de venda dos jornais: O Globo é o mais vendido na Zona Sul, Norte e parte da Oeste
(Barra da Tijuca, Recreio e Jacarepaguá Freguesia e adjacências). O Dia, por sua
38
Veja-se, no anexo F, a tabela dos jornais com maior circulação do Brasil.
32
vez, apresenta boa circulação na Zona Norte (incluindo os subúrbios), Baixada
Fluminense e Zona Oeste (Jacarepaguá Taquara e adjacências).
39
Também na seleção, por uma questão de delimitação, teve-se o cuidado de
excluir os classificados de garotos de programa e de estabelecimentos comerciais
constituídos textualmente como tais, ou seja, como pessoas jurídicas. São poucos
os anúncios de garotos de programa, por isso não seria interessante ampliar o
objeto de análise e, por conseqüência, a análise desses em razão de seu
quantitativo mostrar-se irrelevante. Já os de empresas, em muitos casos, utilizam-se
de outras estratégias (como fotos de mulheres com as nádegas à mostra, logotipos
da casa noturna, em detrimento da descrição, da adjetivação, um dos focos de
nosso interesse), além de exigirem uma análise mais ampla. Os anúncios repetidos
também não fizeram parte do quantitativo recolhido.
O corpus foi coletado ininterruptamente no período de 01 de fevereiro a 31 de
março de 2006. A data de recolha foi proposital: a proximidade com a festividade do
Carnaval (com o número mais expressivo de turistas na cidade em busca de
diversão, incluindo a sexual) faz aumentar significativamente a procura por sexo
40
e,
talvez por essa razão, multipliquem-se os anúncios de garotas de programa,
41
conforme se notou no ano de 2005 (período embrionário da pesquisa) e se
confirmou no ano de 2006. Em decorrência, este foi o período de referência para a
análise.
2.2. OBJETIVOS
A observação do corpus levou-nos a algumas questões que direcionam os
nossos objetivos. Eles são:
1- Verificar qual seqüência lingüística predomina no subgênero sob crivo;
2- Analisar como é usada a classe dos adjetivos ou a função adjetiva no
processo da descrição;
39
Dados fornecidos pelo IVC, via e-mail, em 29/11/2006, atendendo à solicitação deste pesquisador.
40
Haja vista as inúmeras campanhas contra DSTs nesta época.
41
Outra hipótese é a de que, em teoria, haveria maior facilidade, nesta época, de se conseguir um
encontro sexual com uma mulher “comum”, não profissional (e isto constituiria uma queda de ganhos
para quem vive financeiramente de pagamento por sexo). O fato levaria as garotas de programa a
buscarem outras fontes (como o anúncio) para contatarem outros clientes.
33
3- Explicitar as peculiaridades que tornariam os classificados sexuais um
subgênero;
4- Fazer um levantamento das estratégias lingüístico-discursivas que o eu-
comunicante emprega na construção da imagem do eu-enunciador;
5- Investigar a intencionalidade da utilização das referidas estratégias;
6- Construir, pelo somatório dos itens analisados, o perfil socioeconômico do
enunciador a partir de informações textuais;
2.3. HIPÓTESES
Por decorrência, nossas hipóteses são:
1- A seqüência lingüística predominante nos CS seria a descritiva, que estaria
a serviço da persuasão subjacente ao modo enunciativo;
2- A utilização dos adjetivos faria parte do conjunto de estratégias adotadas.
Aqueles do tipo axiológico (grau máximo de subjetividade) atuariam não
apenas na descrição do enunciador, mas na emoção do TU-interpretante
também.
3- Os CS seriam um subgênero dos classificados por razões como: maior
necessidade de linguagem figurada no texto, por exemplo.
4- Como recurso lingüístico, o enunciador empregaria fartamente a
adjetivação. Como recurso discursivo, a imagem do enunciador seria
construída com base em estereótipos variados de mulher, que, para o EUc,
permeariam o imaginário sexual do TU-interpretante;
34
5- Todas as estratégias utilizadas pelo enunciador fazem parte de um projeto
de sua legitimação e credibilização. Enquanto garota de programa, deve
afirmar, de um lado, as suas qualidades estéticas e parecer sexualmente
liberal; de outro, deve procurar dissociar-se da imagem estigmatizada de
prostituta clássica, a fim de obter credibilidade no curto espaço de que dispõe
para tal.
6- Haveria vários perfis sociais do enunciador, indicadores de diferentes níveis
socioeconômicos, extraídos de informações como local de atendimento, custo
do programa etc.
2.4. OBSERVAÇÕES
Na maior parte das Dissertações de Mestrado, o mestrando opta por separar
metodologicamente a TEORIA dos exemplos, subsídio teórico da PRÁTICA em si.
Daí, observarmos um aparato teórico em uma seção e, em outra, a “análise dos
dados”.
Entretanto, para esta dissertação, como a teoria se divide em vários vértices,
consideramos mais produtivo fazer os dois ângulos caminharem lado a lado. A
separação pareceu-nos artificial. E, com o aval da nossa orientadora, encetamos o
texto com a referida forma.
A análise também privilegia os patamares qualitativos. Apenas na última
seção fazemos uso de percentuais e de números, na tentativa de definir,
numericamente, o perfil social do enunciador. Claro é que poderíamos igualmente
utilizar dados numéricos nas outras análises. Mas tal tipo de categorização só nos
interessou, sobremaneira, no cotejo entre os diferentes perfis utilizados pelo eu-
enunciador.
Além disso, a Banca poderá observar que muito se fala, neste texto, sobre
adjetivos (poderíamos, inclusive fazer deles o cerne desta Dissertação e neles nos
deter). Todavia, a tentativa de melhor recobrir o tema levou-nos à análise de outros
aspectos que, a nosso ver, não poderiam deixar de ser considerados.
35
“A BUNDA, QUE ENGRAÇADA
A bunda, que engraçada.
Está sempre sorrindo, nunca é trágica.
Não lhe importa o que vai
pela frente do corpo. A bunda basta-se.
Existe algo mais? Talvez os seios.
Ora murmura a bunda esses garotos
ainda lhes falta muito que estudar.
A bunda são duas luas gêmeas
em rotundo meneio. Anda por si
na cadência mimosa, no milagre
de ser duas em uma, plenamente
(...)”
(Carlos Drummond de Andrade)
36
3. DA TEORIA AO CS: um retrato fragmentado?
3.1. PRESENÇA E IMPORTÂNCIA DOS ADJETIVOS NOS CS
Os adjetivos são a principal classe gramatical na construção da seqüência
descritiva, visto que representam o elemento caracterizador/qualificador por
excelência. A importância que têm, na elaboração de um CS, determina que
dediquemos este item à análise da sua utilização neste subgênero.
Há três critérios aplicados pelos estudiosos na classificação de uma palavra:
o semântico, que se prende ao significado dela; o mórfico, aquele que diz respeito à
sua forma gramatical; e o sintático ou funcional, sendo este último o que se baseia
na função que cabe a ela na sentença.
Em primeiro lugar, conforme explica Câmara Jr. (2002:78), o critério que
fundamenta a classificação é o morfo-semântico (um critério composto). Este divide,
por exemplo, os “vocábulos formais” (idem et ibidem) em nomes, verbos e
pronomes, segundo algumas oposições.
Posteriormente, o critério funcional subdivide nomes e pronomes de acordo
com a função dessas palavras no texto. Há, então, a função de substantivo “nome
ou pronome tratado como centro de uma expressão” (CÂMARA JR., idem: 79). E há
a função de adjetivo
42
“em que o nome ou pronome é o termo determinante (na
terminologia de Bally) e modifica um nome substantivo ou tratado como
determinado” (idem et ibidem).
O advérbio, apesar de fazer parte da classe dos nomes, é, por excelência,
modificador de verbos (ou de adjetivos e de advérbios), mas não de substantivos.
Também é capaz de modificar a própria sentença (ROSA, 2003:106).
Para Cunha (1972:251) “adjetivo é a espécie de palavra que serve para
caracterizar os seres ou objetos nomeados pelo substantivo”, podendo-lhes indicar:
a) uma qualidade (ou defeito): Loira natural
b) o modo de ser: sedutora, carinhosa, audaciosa
c) o aspecto ou aparência: coxas grossas, cabelos lisinhos, seios bicudinhos
d) o estado: quentíssima
42
A função de adjetivo, por meio da variada configuração formal em que se apresenta, é fundamental
na construção do eu-enunciador nos CS.
37
Bechara (2001:142) define adjetivo como “a classe de lexema que se
caracteriza por constituir a delimitação
43
”. O autor (op.cit.) lista, dentre outras, a
subclasse dos adjetivos delimitadores especificadores, que são os responsáveis por
restringir “as possibilidades de referência de um signo, ajuntando-lhe notas que não
são inerentes ao seu significado.”
Almeida (1950:104), por sua vez, ao apresentar a seguinte noção de adjetivo:
“palavras que vêm sempre acompanhando um substantivo, para indicar-lhe ou uma
qualidade (homem inteligente
44
) ou uma determinação (aquele lápis, casa vinte e
um
45
)”, conclui haver dois subgrupos desta categoria:
a) os adjetivos qualificativos- aqueles que designam uma qualidade do
substantivo, por exemplo, “carol, loiraça sedutora”. Podem, às vezes, ser
explicativos (quando indicam uma qualidade já intrínseca ao substantivo)
ou, ainda, restritivos (quando mencionam uma qualidade que pode existir
ou deixar de existir no substantivo).
b) os adjetivos determinativos- aqueles que modificam a extensão do
substantivo, voltando-se para as suas circunstâncias externas. São os
artigos, os pronomes demonstrativos, os relativos, os numerais, os
interrogativos, os possessivos e os indefinidos.
Interessa o fato de o autor agasalhar sob o rótulo de “adjetivo” as classes hoje
separadas na NGB. Essa visão, ao nosso ver, destaca, acima do critério morfo-
semântico, o funcional, já que pressupõe uma relação gramatical entre um elemento
e outro do sintagma.
O “adjetivo numeral” determinativo, nos termos de Almeida (1950:109)
pode passar, nos classificados sexuais, a qualificativo. No anúncio de “Alice”
43
Grifo do autor
44
Grifo do autor
45
Grifo do autor
BARRA ALICE morena clara, cabelos
longos, 19ª (sic). Viviane morena bronzeada,
man.38. Amanda loirinha mignonzinha. (sic)
Tel.: 2441-2180 Hotéis/ Residências. 24H.
Clientes Exigentes
38
temos o numeral 19 (dezenove), um quantificador do substantivo “anos”. Segundo
Neves (2000:587), os numerais cardinais expressam a quantificação numericamente
definida.
Ora, tal quantificação (indicar o número de anos idade) não se dá à toa, ela
é intencional. Ou seja, seu papel é reforçar a legitimidade do enunciador, já que,
ideologicamente, a juventude está associada ao Lugar de Qualidade
46
, neste
contrato de comunicação. Assim, supervaloriza-se a “garotinha” em detrimento da
“mulher”, já que aquela caracteriza bem a garota de programa, se, além de bonita, é
jovem.
O mesmo se diz a respeito do numeral 38 (trinta e oito), que se refere ao
substantivo “manequim”. Informar a numeração (38) do seu manequim significa
oferecer um dado privilegiado (culturalmente) do seu corpo, fato que, evidentemente,
não acontece sem razão.
Isto posto, além de atribuirmos a esse tipo de numeral a noção de adjetivo
(nesse tipo de ocorrência) com base no critério semântico, para o qual “pertence à
classe do adjetivo toda palavra que exprime qualidade” (MACAMBIRA, 1997:38),
reforçamo-la, também, com o critério funcional.
Também a adjetivação, segundo Carneiro (2001:25), pode assumir várias
formas: adjetivo, locução adjetiva, oração adjetiva, sufixação (além do substantivo
adjetivado por derivação imprópria ou conversão), podendo ser os adjetivos,
conforme o autor, subclassificados em qualificativos, caracterizadores, informativos e
restritivos:
a) qualificativos (aqueles que indicam qualidades, fruto da opinião do sujeito
sobre o objeto)
46
Concebe valor superior a indivíduos bem caracterizados de uma determinada característica
(PERELMAN & OLBRECHTS-TYTECA, 1999:106).
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b) caracterizadores (apresentam traços inerentes ao objeto descrito, sendo fruto
da observação do sujeito)
c) informativos (dependem do conhecimento do sujeito sobre o objeto)
d) restritivos (restringem a significação dos substantivos).
“Mulher”, nesse texto, funciona como adjetivo, pois é substantivo predicando
“Amanda”. Ele vem antecedido pelo advérbio “quase”, modificador daquela palavra
(mulher), delimitando-lhe o sentido. É comum na linguagem popular, quando se quer
dizer que alguém é afeminado, utilizar-se o substantivo “mulher” em referência a ele
“Fulano é mulher”. No caso de “Amanda”, o uso, também popular, da expressão
adjetiva “quase mulher” denota ser a anunciante um travesti. No entanto, “quase
mulher” poderia indicar características adolescentes da anunciante. Em virtude
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40
disso, o adjetivo “mulher” direciona o significado do substantivo em relação a uma
determinada conclusão, e não a outra. Daí ser classificado como restritivo.
Kerbrat-Orecchioni
47
(1993:110) divide os adjetivos em objetivos aqueles
que visam apenas descrever e subjetivos formas indicadoras de subjetividade
enunciativa, que se subdividem em:
a) afetivos são elementos que terminam por enunciar,
simultaneamente, uma propriedade do objeto que determinam e
uma reação emocional do sujeito falante frente a esse objeto;
(idem, 1993:111)
48
b) avaliativos não-axiológicos aqueles cujo emprego depende da
idéia que o enunciador faz da norma de avaliação adequada àquela
categoria de objetos.(idem, 1993:112) Ou seja, o adjetivo, nesta
categoria, ressalta o objeto caracterizado, utilizando núcleos
temáticos mais comuns no dia-a-dia.
47
Optamos pela abordagem teórica desta autora. Cumpre observar, porém, que necessitamos de
teorias auxiliares para, em nossa análise, abarcarmos a variedade de usos dos adjetivos encontrada.
Por isso, recorremos também às classificações de Carneiro (2001) e Neves (2000).
48
A autora cita um texto de pretensa objetividade em que aparecem, por exemplo, “o cruel
assassino”, “o pequeno cadáver” etc.
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41
Na tabela a seguir, encontram-se alguns adjetivos não-axiológicos
empregados no CS e seus respectivos substantivos:
Cabelos Loiros, lisos, longos, negros
Olhos Azuis, verdes
Estatura 1,72; 1,65; 1,75; 1,71
Idade
49
18, 19, 20, 21, 22, 24, 25, 26, 28
Pele
Branquinha, bronzeada (marquinha fio dental), morenaça, morena
clara, mulatinha, negra, branca
Manequim 40, 36, 38
Corpo Musculoso, fofinha, mignon
Cintura Fina, pilão
Pernas Torneadas, saradas
Seios Moranguinho, empinados, duríssimos, médios, fartos, bicudinhos
Coxas Grossas
c) avaliativos axiológicos Aqueles cujo emprego implica uma dupla
norma, relacionada ao objeto a que se aplicam e ao sistema de
avaliação do enunciador, tendo o caráter valorativo mais destacado
do que as características desse objeto.(idem, 1993:119)
Abaixo, vejam-se alguns dos adjetivos axiológicos, de farto emprego nos CS,
e os substantivos aos quais se referem nesse contrato de comunicação:
49
Consideramos, devido ao contrato, adjetivos até 30 anos.
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mignon, sem decepções, sensualíssima, completíssima, lindíssima,
quase-mulher, femininíssima, pura tentação, belíssima, raríssima,
toda maravilhosa, exuberante, (de) “parar trânsito”
50
Nível speack english, discreta, discretíssima, fino trato, elite, modelo, “top
model”, “(capa) de revista”, vip, elegante, exclusiva, educada, culta,
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Seios U.S.A., Exuberantes, esculturais
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Outras observações acerca desta classe podem, ainda, ser levadas em
consideração.
Vários lingüistas desenvolveram suas reflexões sobre os adjetivos, tendo,
como ponto de partida, a oposição objetividade e subjetividade. Nessa malha
teórica, alguns pontos se entrecruzam.
Nota-se, entre Carneiro (2001:25) e Kerbrat-Orecchioni (1993:110), por
exemplo, que as subclasses “não-axiológicos” e “caracterizadores” exprimem noções
muito próximas. Se, para Kerbrat-Orecchioni (idem), os “não-axiológicos” revelam
50
A nosso ver, este último pode também ser categorizado, também, como afetivo.
43
menor compromisso afetivo por parte do sujeito, Carneiro (idem) entende serem os
caracterizadores fruto da observação, sendo, portanto, mais objetivos, denotativos.
Também os “axiológicos” e os “qualificadores” se aproximam à medida que
ambos destacam no substantivo uma característica não relacionada às suas
propriedades basilares, mas influenciadas por aquilo em que o observador crê.
Ambos constituem uma avaliação valorativa a respeito do objeto (que no corpus
pode ser pessoa, traço físico), mais subjetiva, conotativa.
Neves (2000:184), a seu turno, subclassifica os adjetivos em dois grupos:
os qualificadores- São adjetivos que referem ao substantivo determinado
uma propriedade deste que não é essencial em sua definição. Decorre daí
uma característica, em certa medida, subjetiva e vaga. Observe-se:
Incluem-se nesse caso todos os adjetivos com prefixos negativos, como:
Também se incluem os adjetivos com sufixos derivados de verbos, como -do,
-to/-ta, -nte:
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1,65 alt. Man.42 Indecepcionável, homens
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ABSOLUTA KARLINHA quase mulher
linda mineirinha 21ª (sic) bronzeadinha
cabelos longos 1,65 alt. Man.42
Indecepcionável, homens exigentes
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44
os classificadores- São os adjetivos que incluem o substantivo em uma
categoria qualquer, tendo caráter “denominativo” (por exemplo: sistema
filosófico, indústria alimentícia ) (NEVES, 2000:186). Veja-se:
Quanto à subjetividade que se pode atribuir à classificação, os adjetivos
qualificadores são:
graduáveis:
Eles vêm antecedidos de advérbios marcadores desse grau (mais, muito),
sempre de superioridade em relação às demais mulheres. Ainda exprimem tal
noção, aqueles adjetivos formados por sufixos que dão idéia de abundância de
qualidade, como -oso, -udo e -ucha, por exemplo:
intensificáveis:
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45
Esses adjetivos são acompanhados por advérbios que lhes imprimem
intensidade (extremamente, escandalosamente, deliciosamente etc). Certos prefixos
também dão ao adjetivo essa idéia. Veja-se o caso de “super”:
Quanto à semântica, os adjetivos qualificadores podem admitir diversos valores:
a) De modalização epistêmica
51
: os adjetivos exprimem conhecimento ou
opinião do sujeito.
Certeza ou asseveração (evidente, óbvio, certo)
Eventualidade (possível, impossível, provável).
Não há exemplos de adjetivos para esta classificação, pois o domínio da
eventualidade pode ser interpretado, em tal contrato de comunicação, como
incerteza idéia desfavorável, quando a persuasão almejada depende da
informatividade.
b) De modalização deôntica
52
: os adjetivos exprimem consideração de
necessidade e obrigatoriedade.
51
Epistêmica (adj.): Relativo à epistemologia, que é o estudo crítico dos princípios, hipóteses e
resultados das ciências já constituídas e que visa a determinar os fundamentos lógicos, o valor e o
alcance objetivo delas (Dicionário Essencial da língua portuguesa).
AMANDA T.3457
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46
Não há exemplos de adjetivos para esta classificação, o que até se explica
pela intencionalidade dos CS (as moças de nada necessitam, a não ser dos clientes
e nada lhes pode ser obrigado, fora o que está asseverado no próprio anúncio).
c) De avaliação psicológica: os adjetivos exprimem propriedades definidoras do
substantivo, tal como se relacionam com o sujeito: em direção ao enunciador
(1ª pessoa) ou em direção ao objeto (3ª pessoa). A esse respeito, sabe-se
que nos CS tais pessoas têm o mesmo referente.
d) De avaliação de propriedades intensionais
53
: os adjetivos exprimem
propriedades que descrevem o substantivo.
Em qualidade: as propriedades podem ser expressas por adjetivos
eufóricos
54
, disfóricos
55
ou neutros.
52
Deôntica (adj.): Relativo à deontologia, que é o conjunto de regras e deveres que regem uma
profissão, a conduta dos que a exercem, as relações entre eles e seus clientes e o grande público;
ética.
53
Relativo à intensidade.
54
Indicação para o sentido positivo, para o bom.
55
Indicação para o sentido negativo, para o mau.
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47
Destacam-se, nesse caso, apenas os eufóricos, não havendo ocorrências de
disfóricos.
Em quantidade: os adjetivos são, em princípio, neutros:
i. Com substantivos concretos: os adjetivos indicam dimensão
ou medida
ii. Com substantivos abstratos indicam, principalmente,
intensificação:
e) De autenticação: o substantivo é qualificado como legítimo em seu uso. Os
adjetivos são, nesse sentido, epilinguísticos
56
.
56
Segundo Travaglia (2003), “As atividades epilingüísticas são aquelas que suspendem o
desenvolvimento do tópico discursivo (ou do tema ou do assunto), para, no curso da interação
comunicativa, tratar dos próprios recursos lingüísticos que estão sendo utilizados, ou de aspectos da
interação.”
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48
Enfim, apresentamos os conceitos teóricos sobre a classe dos adjetivos e as
devidas demonstrações em exemplos do corpus. A partir de então, simultaneamente
às demais considerações epistemológicas, analisaremos, em um quadro ao lado, as
subcategorias de adjetivos nos anúncios usados em exemplos no decorrer do
trabalho.
3.2. GÊNEROS, TIPOS E MODALIDADES DISCURSIVAS
3.2.1. Considerações gerais
“A noção de gênero remonta à Antiguidade. Volta-se a encontrá-la na
tradição da crítica literária que assim classifica as produções escritas segundo
certas características; no uso corrente, no qual ela é um meio para o
indivíduo localizar-se no conjunto das produções textuais; finalmente, mas
ainda submetida a debates, nas análises de discurso e análises textuais.”
(CHARAUDEAU & MAINGUENEAU, 2004)
São inúmeras as possibilidades de atuação do homem na sociedade. E,
sendo a língua uma forma de ação social e histórica, ela serve ao homem de
maneira específica em cada situação sócio-comunicativa.
Bakhtin (2003:261) entende que a própria língua se realiza em forma de
enunciados (orais e escritos). Segundo ele (idem: 282), “Falamos apenas através de
determinados gêneros do discurso, isto é, todos os nossos enunciados possuem
formas relativamente estáveis e típicas de construção do todo
57
. Isto significa que
não nos comunicamos simplesmente por palavras ou orações, mas por frases e
textos destinados a situações interlocutivas que os determinam.
Utilizamos, por exemplo, no dia-a-dia, formas como anúncios, avisos, pedidos,
cumprimentos, agradecimentos, cartas, e-mails, bate-papos (seja por telefone, seja
pela Internet, seja pessoalmente). Algumas dessas formas, como o cumprimento,
integram outras, como as cartas; outras sofrem variações (adaptações, evoluções)
em função do dispositivo em que são usadas. Os e-mails representam um desses
casos, visto que se assemelham às cartas em usos e finalidades, diferenciando-se
quanto ao dispositivo e às estratégias discursivas. O mesmo se aplica aos
57
Grifos do autor.
49
“torpedos”, formas muito próximas do e-mail, que estariam, dentro de uma escala
(talvez evolutiva), em posição posterior a ele (cartas > e-mails > torpedos). Os
torpedos são mensagens enviadas de telefone celular para telefone celular.
Tais enunciados evidenciam determinadas atividades humanas, refletindo as
condições em que ocorrem e a sua finalidade, segundo o seu conteúdo, o seu estilo
de linguagem e, também, a sua construção composicional. Nesse sentido, parece
não haver discordâncias entre autores de diferentes correntes de estudo sobre a
noção de gênero aplicar-se a textos realizados.
Entretanto, coexistem variadas definições, filiadas, cada uma, a determinada
perspectiva teórica.
Assim, um ponto de vista voltado para o discurso considera GÊNERO
DISCURSIVO como “tipos relativamente estáveis de enunciados”, que se
caracterizam pelos seus conteúdos e pelos meios lingüísticos que eles utilizam
(BAKHTIN, 2003:62). O gênero resulta, de acordo com essa visão, da fusão entre
conteúdo temático, estilo, e construção composicional. Com isso, na esfera da
argumentação, por exemplo, temos o texto de opinião, carta do leitor, editorial,
debate, entre outros.
Já aqueles cuja atenção se volta para o texto, de um modo geral, consideram
GÊNERO TEXTUAL como as inúmeras realizações empíricas do texto editorial,
carta, notícia, telegrama etc.
58
Marcuschi (2002), concordando com Bakhtin (2003), faz a seguinte
observação a respeito dos gêneros
“Caracterizam-se muito mais por suas funções comunicativas,
cognitivas e institucionais do que por suas peculiaridades lingüísticas e
estruturais. São de difícil definição formal, devendo ser contemplados em
seus usos e condicionamentos sócio-pragmáticos caracterizados como
práticas sócio-discursivas. Quase inúmeros em diversidade de formas, obtêm
denominações nem sempre unívocas e, assim como surgem, podem
desaparecer.” (MARCUSCHI, 2002:20)
Assim, um aviso pode possuir características estruturais e lingüísticas de um
conto; um convite pode adquirir formas de aviso: “Avisamos a todos que o circo X
estará nesta cidade no próximo final de semana” e um anúncio pode apresentar
58
Neste ponto de vista, tipo é definido como um construto teórico capaz de determinar formas básicas
para a constituição de um texto (MARCUSCHI, 2000, APUD, DIONISIO & BEZERRA, 2002). Sendo
assim, diferente de Bakhtin, divide-se estrutura (tipo) e uso (gênero).
50
inúmeras configurações, segundo seu objetivo, seu campo de atuação e seu
dispositivo (ou suporte), integrando, inclusive, vários tipos de semioses: signos
verbais, sons, imagens e formas em movimentos (MARCUSCHI, 2002:21).
Esta plasticidade atende aos objetivos da publicidade, que, para dar ênfase a
seus produtos, apela a recursos estilísticos “inovadores”. Conforme observa
Sandmann (2000:12) ,
“Prender a atenção do leitor ou ouvinte parece ser a porfia maior. Por
isso a criatividade incansável do propagandista ou publicitário na busca
incessante de meios estilísticos que façam com que o leitor ou ouvinte preste
atenção ao seu texto, chocando-o até se for necessário.”
Visto que são incontáveis os produtos da publicidade e as mídias por meio
das quais podem ser promovidos, é vasto o campo de atuação dela. Em decorrência
disto, são vastos, também, os diferentes moldes de anúncios publicitários.
No entanto, os anúncios “classificados” (de jornais) costumam preservar
certas características gramaticais e composicionais (em termos semiolingüísticos).
Eles apresentam estruturas parecidas. Vejam-se exemplos de classificados de
imóveis, de veículos e de serviços afetivos, respectivamente:
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Tópico do anúncio, lugar em que se apresenta o produto. É comum, nos anúncios de
imóveis, aparecer, nesse espaço, o seu bairro. O leitor sabe que se trata de um
imóvel.
Corpo do texto. Espaço para a descrição resumida do produto, destacando as suas
características mais relevantes.
Meios de contato: telefone, site ou e-mail.
51
Entretanto, ao contrário dos anúncios publicitários híbridos, que costumam
aparecer em outras mídias (ou mesmo em outras partes do jornal), os anúncios
citados pouco apelam para utilização de signos que não sejam o lingüístico.
Também sua ocorrência se restringe aos cadernos denominados “classificados” (isto
não significa que outras variedades de anúncios não possam figurar nesse caderno),
o que os particulariza e os diferencia dos múltiplos anúncios existentes. Ou seja, os
demais anúncios publicitários podem aparecer em qualquer parte do jornal, mas isso
não acontece com os classificados. Para eles, existe um caderno específico que lhes
dá o nome “classificados”.
Tal dualidade, portanto, a nosso ver, ocasionaria a existência de gêneros
distintos: o de anúncios da publicidade comercial comum (que operariam com
diferentes semioses e em diferentes mídias) e o de anúncios de classificados que
operariam predominantemente com material lingüístico, pois, segundo Charaudeau
(2005:11), “são as características situacionais e discursivas que constituem um
gênero discursivo.” Assim, uma publicidade comercial comum, uma declaração
política ou um classificado sexual pertencem, com efeito, ao discurso
propagandístico, mas só a publicidade comercial estaria situada no campo do
discurso publicitário.
59
No entanto, entendemos que os CS sob análise servem a um tipo de
transação comercial e apresentam recursos discursivos típicos da publicidade, por
isso propomos incluí-los no contrato de comunicação publicitário.
No gênero em questão, não apenas a estrutura e a composição do texto
caracterizariam-no como “classificado”, mas também o próprio dispositivo
(especificamente, o caderno “classificados”) o faria. Esta possibilidade vaticinou
Marcuschi (2002:21) ao dizer: “(...) haverá casos em que será o próprio suporte ou o
ambiente em que os textos aparecem que determinam o gênero presente.”
Além disso, a situação de comunicação que envolve os CS determina um
contrato de comunicação específico, e, simultaneamente, leva a um gênero textual
também particular, em relação aos demais tipos de classificados. Para Oliveira
(2003:36), “o conjunto de restrições e liberdades ligado a um ato de linguagem
59
Pois, como se verá no item 3.2.3, o termo propaganda pode ser usado em sentido amplo para
propagar idéias, não necessariamente comerciais; já publicidade é específico para transação
comercial.
52
enquadra-o ao mesmo tempo num contrato de comunicação
60
e num gênero
textual.”
Sendo assim, quais diferenças entre os classificados comuns
61
e os CS
determinariam serem estes um subgênero?
- Nos classificados de imóveis ou de automóveis, enunciador e produto são
entidades claramente distintas, diferente do que ocorre nos CS.
- O produto, a garota de programa, não é um bem (patrimônio) a ser
comprado (levado, consumido), mas uma pessoa. Mesmo que se fale em aluguel de
imóvel, veículo ou corpo, este último sempre será diferente, pois tem consigo a
inteligência, a personalidade. Presume-se que o cliente não queira somente o corpo,
mas também a interação (daí, a existência de um etos do envolvimento
emocional
62
).
- Categorização sexual do TU-destinatário, como “cavalheiros”, “damas” ou
“casais”. Isto não é necessário na negociação de um veículo ou imóvel.
- TU-destinatário não declarado, socialmente omitido. O contato do sujeito
(instituído como leitor ou já como cliente) com a garota de programa é feito
discretamente, até porque, embora a atividade não constitua crime
63
, é socialmente
estigmatizada para ambas as partes. Isto não se pode afirmar em relação aos dois
outros produtos.
- Maior necessidade de linguagem figurada na descrição do produto, em
virtude de restrições vocabulares. Por exemplo, pode-se dizer de um automóvel:
excelente desempenho, motor X ou Y; de um apartamento: cômodos confortáveis,
sala arejada; mas, no caso da garota de programa ou, principalmente do que ela faz,
diz-se, comumente, “beijos atrevidos”, “U.S.A exuberante”, “quadril insaciável” etc.
(apela-se a um duplo sentido).
- A leitura do anúncio é proibida (pelo jornal) para menores de 18 anos.
Tem-se, nesse caso, uma estratégia de preservação da face positiva
64
do jornal
(GOFFMAN, 1974, APUD, MANGUENEAU, 2002:38), pois este poderia ser acusado
60
Grifo da autora.
61
Não faremos referência aos classificados de empregos, porque lá não se negocia um produto (não
há comércio), daí sua natureza discursiva não pertencer ao domínio publicitário. Também
desprezaremos aqueles classificados ditos diversos, dada a sua irregularidade.
62
Cf. item 3.4.
63
Lei 11.106, de 28 de março de 2005.
64
Corresponde à “fachada” social, à nossa própria imagem valorizante que tentamos apresentar aos
outros.
53
de incitar menores a lerem anúncios com conteúdo erótico ou, em alguns casos, até
pornográfico.
Isto posto, confirma-se, dessa forma, a nossa hipótese de que tais
classificados seriam um subgênero dos “classificados” comuns. Após essa
constatação, podemos resumir o desdobramento do gênero anúncio até a
subcategorização do CS:
1-
2- 2-
3-
A Teoria Semiolingüística, que procura ancorar o discurso no social, em uma
filiação mais psicossociológica, determina os gêneros, conforme Charaudeau (2001),
entre uma tripla articulação: as restrições situacionais (determinadas pelo “contrato
de comunicação”), as estratégias da organização discursiva e as características das
formas textuais (submetidas ao marco situacional). Obedecendo a essa perspectiva,
os gêneros do discurso são “gêneros situacionais”. (CHARAUDEAU &
MANGUENEAU, 2004)
Ressalte-se que o termo gêneros textuais aparece em Langage et Discours
(CHARAUDEAU, 1983) referindo-se aos ramos de atividade humana (literário,
jornalístico, publicitário...); já na Grammaire du Sens et de l’Expression
(CHARAUDEAU, 1992), o autor utiliza-o para indicar as subcategorias desses
GÊNERO ANÚNCIO
ANÚNCIO
PUBLICITÁRIO EM
GERAL (admite
subgêneros
também)
CLASSIFICADOS
SUBGÊNERO
CLASSIFICADOS
SEXUAIS
54
ramos
65
. Elas são a poesia, o teatro, a notícia, o editorial, o prospecto, o anúncio etc.
É com esse sentido (da Grammaire du Sens) que o termo gênero textual é
empregado nesse trabalho.
Em relação às modalidades discursivas, vale lembrar que um texto se define
pela sua finalidade situacional - todo ato de linguagem tem uma intencionalidade e
submete-se a condições particulares de produção, o que exige do falante
determinadas estratégias de construção textual (CHARAUDEAU, 1992). Em cada
texto, portanto, podem combinar-se diferentes recursos (narrativos, descritivos,
dissertativos, enunciativos), em função do tipo de interação que se estabelece entre
os interlocutores.
É ampla a bibliografia que discute as classificações para as formas textuais
empíricas e suas seqüências discursivas de base. Optaremos pelo quadro
terminológico de Charaudeau (1992) por sua abordagem estar, evidentemente, mais
afinada com a Teoria Semiolingüística.
Assim, os modos de organização do discurso são, para o referido autor
(1992), “o conjunto dos procedimentos de colocação em cena do ato de
comunicação, que correspondem a algumas finalidades, como narrar, descrever...”
Charaudeau (1992) propõe distinguir, então, quatro modos de organização do
discurso: o modo enunciativo, o modo descritivo, o modo narrativo e o modo
argumentativo:
a) O ”modo enunciativo é testemunha de como o sujeito falante age sobre a
mis em scène do ato de comunicação”. Em outras palavras, ele pertence à ordem do
discurso e revela o processo de apropriação da língua, por parte do enunciador, ao
organizá-la em discurso.
Com efeito, durante o ato de comunicação, o enunciador utiliza determinados
elementos da língua e os organiza de forma particular. Este processo traduz a
posição que o sujeito ocupa em relação ao destinatário, ao que ele diz e ao que diz
o outro.
Assim, temos as três funções do modo enunciativo:
65
Estes ramos são denominados, na referida obra, de tipos textuais.
55
i. estabelecer uma relação de influência entre os protagonistas;
ii. revelar o ponto de vista do enunciador;
iii. testemunhar a palavra de um terceiro (outros discursos).
A primeira função corresponde ao comportamento alocutivo; a segunda, ao
elocutivo e a terceira ao delocutivo.
Dessa forma, o modo enunciativo refere-se aos sujeitos do dizer, tendo,
assim, a função metadiscursiva de gerir os outros três, deles sendo o fio condutor.
Tal modo de organização do discurso se configura através da língua das
formas mais variadas. Tanto ele pode se manifestar de maneira direta através de
sistemas semiolingüísticos (pronomes pessoais, demonstrativos, tempos verbais
etc.) , como de maneira indireta, de modo mais discreto através de um adjetivo,
de um advérbio ou da própria organização do discurso em particular.
b) No modo narrativo, há, de maneira geral, segundo Charaudeau (1992), a
construção de um universo onde as ações, ligadas umas às outras, encadeiam-se
progressivamente, segundo uma lógica.
Ao mesmo tempo, no narrativo, há a construção de um “universo narrado”
realizada por um sujeito narrador, que está ligado ao destinatário através de um
contrato de comunicação.
c) O descritivo se distingue do narrativo por apresentar uma forte tendência a
nomear, localizar e qualificar os seres do universo.
A atividade descritiva é, por assim dizer, essencialmente classificatória. E esta
classificação reflete em si a maneira como o homem percebe e constrói o mundo,
podendo apresentar um grau maior ou menor de subjetividade.
d) A argumentação, para Charaudeau (1992), é uma atividade linguageira que
implica diversos procedimentos discursivos, onde reine a lógica e o princípio da não-
contradição.
Nesta perspectiva, ele define a situação de argumentação pela existência
obrigatória:
de uma proposição acerca do mundo, legitimamente concebida por
alguém.
56
de um sujeito argumentador que tem uma convicção e que desenvolve
uma explicação racional com o intuito de persuadir e de modificar o
comportamento do interlocutor com a sua proposição.
de um sujeito-alvo, que corresponde ao interlocutor do sujeito
argumentador, e que pode aceitar ou recusar a argumentação no
processo de persuasão ao qual ele é submetido.
Na visão semiolingüística, a argumentação, do ponto de vista do sujeito
argumentador, inscreve-se em uma dupla busca: uma de racionalidade, para atingir
a um ideal de verdade; e outra de influência, para atingir a um ideal de persuasão
(através do raciocínio ou da sedução).
Veja-se o seguinte quadro sintético das modalidades discursivas, suas
funções de base e princípios da organização:
Modo de
organização
Função de base Princípio da organização
Enunciativo Relacionamento de influência (EU?
TU)
Ponto de vista situacional (EU
?ELE)
Testemunha sobre o mundo (ELE)
•Posição em relação ao
interlocutor
•Posição em relação ao dito
•Posição em relação aos
outros discursos
Descritivo Identificar a sucessão de seres do
mundo de maneira objetiva/subjetiva
•Organização da construção
descritiva (nomear localizar
qualificar)
•A colocação (em cena) da
descrição (efeitos e
procedimentos)
Narrativo Construir a sucessão das ações de
uma história no tempo
•Organização da lógica
narrativa (actantes e
processos)
•A colocação em narração
(identidades e estatutos do
narrador)
57
Argumentativo Explicar uma verdade em uma visão
racional para influenciar o
interlocutor
•Organização da lógica
argumentativa
•A colocação em
argumentação (procedimentos
semânticos e discursivos)
Importante observar que Charaudeau (1992), nossa opção teórica, distingue
modos de organização de tipos textuais. O termo tipos textuais é empregado por ele
em referência aos diferentes campos de atuação humana (o literário, o jornalístico, o
publicitário etc., como já se disse), vinculando-se, dessa forma, à situação de
comunicação, a aspectos extratextuais; já os modos de organização do discurso
são maneiras de estruturar o texto, sua natureza é, portanto, intratextual.
66
Os tipos textuais, que são contratos de comunicação mais amplos, admitem
subcategorias, os gêneros textuais, e estes, da mesma forma, podem ser
subdivididos em subgêneros. Veja-se o quadro abaixo:
CHARAUDEAU
66
Note-se que o rótulo modos de organização do discurso é utilizado por Charaudeau (1992)
para as construções ligadas à estrutura básica do texto, que, para Marcuschi, são denominadas tipos
textuais. Este autor utiliza, ainda, o termo domínio discursivo para se referir a campos de atividades
humanas, que propiciam o surgimento de discursos bastante específicos. A esta noção Charaudeau
aplica o termo “tipo textual”.
Modos de organização
do discurso
Tipos textuais (Contratos
de comunicação)
Gêneros
textuais
Subgêneros
- enunciativo
- descritivo
- narrativo
- argumentativo
- literário
- jornalístico
- publicitário
- etc.
- notícia
- editorial
- poesia
- classificado.
- notícia policial
- notícia política
- notícia econômica
- Classificado sexual
- etc.
67
58
Mesmo que outros teóricos apresentem denominações diversas, a maioria
concorda que um gênero raramente apresenta uma só modalidade discursiva.
Marcuschi (2002:25), por exemplo, explica que “um texto é em geral tipologicamente
variado (heterogêneo).” Carneiro (2005:72) registra que dificilmente ocorrerá uma
seqüência textual somente e Serafini (2004:163) observa que “vários tipos de
discursos podem ser encontrados em diferentes medidas em todos os textos.”
Então, um texto é formado por seqüências lingüísticas, sendo uma delas
predominante, de acordo com a finalidade do ato de linguagem.
Os CS também apresentam diversidade de seqüências lingüísticas de base
em sua constituição. Observemos estes anúncios:
67
Marcuschi (2002:19) oferece outra classificação para as noções apresentadas. Na
verdade, trata-se de denominações diferentes em relação ao mesmo fenômeno. Por isso, preferimos
não nos alongar na apresentação do referido autor, já que nossa escolha recaiu sobre Charaudeau.
GÊNERO TEXTUAL: ANÚNCIO
a) SOL MORENAÇA, corpasso (sic), linda!
Cabelos compridos, man. 38 cintura fininha,
100cm quadril,
S/ decepções, s/frescuras mesmo.
At. Hotel/prive- 8/23h tel. 2238-6330 /2570-
9510.
ac/cartões.
_____________________________________
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SEQUÊNCIAS TIPOLÓGICAS
Descritiva
Descritiva
Expositiva
_____________________________________
Argumentativa
_____________________________________
Expositiva
b) VIVIANE TIJUCANA Morenaça sexy
carinhosa cintura fininha man.38 quadril
exuberante marquinha biquíni pernas grossas
super sensual.
Prive luxo.
Tel: 2565-7118
Comprove!
_____________________________________
Descritiva
_____________________________________
Argumentativa
_____________________________________
Expositiva
Argumentativa
_____________________________________
59
A modalidade discursiva predominante, no subgênero sob crivo (CS), é a
descritiva, que está a serviço de toda uma sedução, de todo um apelo ao desejo do
leitor, ou seja, atende, lato sensu, à argumentação. Estará presente,
obrigatoriamente, a exposição, uma vez que é preciso informar ao possível cliente
um meio de contato. Também, o tipo enunciativo facilmente fará parte dessa
organização textual, já que o sujeito pode implicar seu interlocutor no discurso ou
exprimir-se ante o objeto.
A narração, embora ocorra com menos freqüência nos CS, também pode
compor o anúncio, como nestes casos:
a)
b)
c) CRISTINA LINDÍSSIMA 22ª (sic) corpo
escultural 1,72alt
___________________________________
Atendimento [a] executivos [de] alto nível (sic)
realizando fantasias.
_____________________________________
Condução própria.
Cachê R$400,00 Barra Tel. 9323-2643.
___________________________________
Descritiva
Descritiva
_____________________________________
Descritiva
__________________________________
Argumentativa
Expositiva
MEL, ANGELITA
-
Amigas Barra, ambas
balzaquianas, uniram-se p/ levar você
homem classe AA ao delírio (fantasias com
aparelhos). Totalmente dedicadas. Tel.9737-
0184
BRUNA LINDA, linda mesmo
vou enfeitiçar
você! 20ª (sic) man.38, 1.65m alt. Morena
clarinha, cabelos compridos. Comprove. Tel:
2238-6330/2570-9510 Ac.cartões Prive /
hotel 24H (sic) www.ritamodels.com.br
1
-
amigas, balzaquianas, dedicadas,
AA- adjetivos axiológicos
1
-
linda, clarinha
-
adjetivos axiológicos;
2- linda (mesmo)- adjetivo qualificador
de autenticação; 3- 20, 38, 1,65,
morena, compridos- adjetivos não-
axiológicos.
60
Os tempos verbais são importantes para a identificação da tipologia dos
segmentos textuais. No anúncio “a”, a forma verbal “uniram-se” (pretérito perfeito)
remete o leitor a uma ação passada, temporalmente anterior ao tempo presente do
anúncio, evidenciando uma narração.
Diferentemente do anuncio “a”, o anúncio “b” apresenta uma locução verbal,
“vou enfeitiçar”, equivalente ao tempo futuro do presente, representando ação
posterior (futura) ao tempo (presente) em que se baseia o enunciado.
Nestes casos, temos, então, sucessões temporais (marcas determinantes do
modo narrativo) do tempo passado para o presente e deste para o futuro,
respectivamente nos anúncios “a” e “b”.
3.2.2. A descrição
Descrição, segundo Garcia (1969:215), “é a representação verbal de um
objeto sensível (ser, coisa, paisagem), através da indicação dos seus aspectos mais
característicos, dos pormenores que o individualizam, que o distinguem”. Se a
narração apresenta os fatos organizados sucessivamente no tempo, dando enfoque
às relações lógicas entre eles, a descrição opera uma suspensão do curso temporal,
sublinhando as características, as qualidades ou as especificidades do objeto
descrito.
Carneiro (2003:51) aponta os elementos fundamentais de todo texto
descritivo: 1º) um observador; 2º) um tema-núcleo, que pode ser um objeto, uma
pessoa etc.; 3º) um conjunto de dados pertinentes ao tema-núcleo selecionado.
Os CS não fogem a esta regra, podendo-se observar neles essas mesmas
propriedades. No exemplo a seguir
LENITA
Morena gatíssima, bronzeada praia,
marquinha fio-dental, corpo exuberante,
1.70m, estilo mulherão, 28ª (sic), realizando
seus desejos. Privê discreto. 2542-2908.
Copacabana
1
-
morena, 1.70, 28
-
adjetivos não
-
axiológicos; 2- gatíssima, bronzeada,
exuberante, mulherão, discreto-
adjetivos axiológicos.
61
Lenita, enunciador, constitui o observador e, também, o próprio objeto da
observação (tema-núcleo). São importantes para a sua descrição, elementos como:
gatíssima, bronzeada, exuberante, mulherão etc., que correspondem à seleção de
dados pertinentes ao propósito do anunciante: formar, para o interpretante, a
imagem de “mulher(ão)” que possui requisitos físicos e habilidades para realizar os
seus desejos. Ela deve ser, desta forma, especial, assim como deve sê-lo, também,
cada leitor, pois é para ele (em especial) que o enunciador/produto é construído.
A descrição, neste contrato de comunicação, objetiva exaltar as qualidades da
garota de programa. Algumas informações, de ordem descritiva, podem, inclusive,
dialogar entre si. É o que se verifica nos exemplos abaixo:
Pela descrição realizada, podemos inferir que Mytiko possui traços de etnia
japonesa, ou chinesa, ou de outro povo oriental. Ela se diz linda, sensual, carinhosa,
atributos apresentados por todas as outras garotas anunciantes. Mas o diferencial
de Mytiko é ser “oriental”. Além disso, ela possui “olhos de gueixa”, o que significa
muito, pois é a imagem da gueixa (símbolo de sensualidade da mulher oriental) que
será ativada na memória quando a garota for imaginada pelo sujeito interpretante
(cliente efetivo). Os olhos são, por isso, elementos centrais na descrição a partir
deles a enunciadora sobreleva o produto. Enfim, aqui, o grupo nominal “olhos de
gueixa” possui muito mais força persuasiva do que, por exemplo, “olhos
puxadinhos”, que põe no mesmo nível todas as orientais que possuem esse formato
de olhos.
Todavia, a modalidade descritiva ainda nos fornece outros elementos a
investigar. Vejamos:
BELÍSSIMA
ORIENTAL
Mytiko
-
Verdadeira
sansei linda! Branquinha 23ª (sic), olhos de
gueixa, cabelos lisinhos! Corpo sensual!
Elegante, carinhosa. Atendimento
inesquecível! Tel: (21)9246-6684
1
-
belíssima, linda, de gueixa (loc.),
sensual, elegante, carinhosa, inesquecível-
adjetivos axiológicos; 2- branquinha, 23,
lisinhos- adjetivos não-axiológicos; 3-
oriental- adjetivo informativo; 4-
(verdadeira) sansei- adjetivo qualificador
de autenticação
62
A - Ponto de vista
Garcia (1969:216) explica que a descrição, por um lado, pode apresentar uma
consideração predominantemente física pelo sujeito em face do objeto; por outro,
pode demonstrar a sua perspectiva psicológica, o seu ânimo em relação ao que
descreve:
Os elementos descritivos “alegre”, “de bem c/ a vida”, “provocante”, “delicada”
e “s/restrições” não representam caracterização física a respeito de Lívia, mas
constituem descrição que parte de um ponto de vista psicológico do enunciador. A
este tipo de adjetivação, Neves (2000) chama de qualificação de avaliação
psicológica, semelhantes àqueles denominados axiológicos por Orecchioni (1993).
68
Este ponto de vista é de suma importância para que a descrição seja
eficiente, sobretudo nos anúncios em questão: neles, o enunciador necessita (para
atender sua intencionalidade e atingir sua finalidade) emitir opiniões e julgamentos
sobre si. Lívia, por exemplo, se autodescreve como pessoa “de bem com a vida”,
“delicada”, isto é, companhia agradável para homens que buscam momentos de
prazer.
Na descrição, pode-se adotar duas perspectivas: a subjetiva e a objetiva. A
subjetiva reflete, predominantemente, a “predisposição afetiva” (idem) do
enunciador, ou seja, seu estado de espírito, suas particularidades, suas
preferências, aquilo que faz com que ressalte apenas o que quer. Na objetiva, os
detalhes são destacados, nítidos em forma, cor, peso, tamanho, cheiro etc.
Na verdade, a subjetividade (em maior ou em menor grau) na descrição,
assim como a seleção dos dados a serem descritos, depende bastante do objeto.
Esta situação aproxima-se do que Carneiro (2003:54) chama de “limitação do
68
Cf. item 3.1.
LÍVIA LOIRA
alegre
de bem c/ a vida
sua
beleza encanta! Corpinho esculpido,
provocante, delicada. Porém s/ restrições
Tel. 2255-4532/ 2255-4983
1
-
loira
-
adjetivo não
-
axiológico; 2
-
alegre, esculpido, provocante, delicada,
sem restrições (loc.)- adjetivos
axiológicos
63
referente”. Por exemplo, falar sobre o desempenho de um determinado carro é
diferente de falar sobre o seu modelo (o que supõe mais objetividade).
Também, a intencionalidade do ato de linguagem vai influenciar no grau de
subjetividade da descrição, visto que esta representa, ao mesmo tempo, uma
avaliação (que atende a certos interesses). Daí, um vendedor não descreveria um
apartamento da mesma maneira que uma empregada doméstica (se um vai dizer
que o piso é vitrificado, outro dirá que é escorregadio), as qualidades do imóvel
seriam vistas ou informadas de perspectivas diferentes, segundo o ânimo de
cada um diante do objeto.
-se, então, que a garota de programa possui um objeto de descrição
singular, pois, para descrevê-lo, será influenciada pela percepção subjetiva de seus
próprios traços físicos. Nesse processo, usará sua racionalidade, mas também seus
sentidos, seus sentimentos. Além disso, tal como o vendedor, deverá despertar no
cliente efetivo o desejo da aquisição, no seu caso, do serviço. Para Garcia
(1969:218), “é o elemento subjetivo que determina a impressão pessoal, a
interpretação”.
Além disso, a caracterização de seres humanos, conforme Carneiro
(2003:15), pode ser: a) física (quando ressalta as características físicas da pessoa,
por exemplo, “alt.1.70”); b) psíquica (aquela que destaca, no indivíduo, o seu
caráter, segundo o seu modo de agir e de ser em relação aos outros, suas atitudes,
seu estado de alma etc., por exemplo, “carinhosa”) e c) psico-física (o observador
associa a descrição física ao estado psicológico, indicando este por meio daquela,
por exemplo, “quadril insaciável”). Segundo o autor (op.cit.), pode haver, ainda, outro
tipo de caracterização, a sociológica, que se baseia não em traços físicos ou
psíquicos, mas na posição social do sujeito, na sua atividade profissional etc.
Observe-se o exemplo deste último tipo:
COROA VILMA mulherona volumosa 55ª (sic)
bonitona conservadíssima USA grandões quadril
(140 cm) afagos desejos masculinos beijando
curiosamente s/preconceitos
www.sexlog.com.br/coroa53 Tel. 3908-1033
9311-5918
1
-
coroa, mulherona, bonitona,
conservadíssima, grandões, sem
preconceitos (loc.)- adjetivos axiológicos;
2- volumosa, 55, 140- adjetivos não-
axiológicos
64
Foi observado, há pouco, que o eu-enunciador seleciona, convenientemente,
os dados da descrição. Sua seleção, inclusive, pode ser orientada pelos sentidos
físicos (Carneiro, 2003:58) que lhe servem de base. Assim, neste gênero textual,
ocorre, freqüentemente, o apelo a elementos: (a) visuais, (b) táteis e (c) olfativos.
a) visuais: “corpo desenhado”, “USA empinadinhos”, “marquinha de biquíni”
etc.
b) táteis: “seios duríssimos”, “toques maliciosos”, massagista habilidosa etc.
c) olfativos: “cheirosa”.
3.2.3. A linguagem publicitária nos classificados sexuais
A - Preliminares
No século XVII, na Inglaterra, o surgimento da classe média favoreceu a
existência da publicidade, conforme a entendemos hoje. Naquela época, os
anúncios eram dirigidos aos clientes dos cafés, onde se liam jornais e revistas. Os
produtos ofertados nesses veículos eram considerados supérfluos: chás, cafés,
livros, cosméticos, perucas etc. Com parte dos clientes vivendo acima do nível de
subsistência, a propaganda passa, então, a adquirir sentido. Somente nessas
condições os industriais poderiam criar estratégias para venderem os seus produtos
(MONNERAT, 2003:12).
Nos dias atuais, os jornais, as revistas e as muitas mídias ofertam supérfluos
de naturezas bem diversas. Além de cosméticos, carros, brinquedos, que são
produtos de interesse geral, outros se inserem na esfera sexual: próteses de silicone
de seios (masculina e feminina), por exemplo, fazem parte da lista de bens de
consumo desejados por algumas pessoas. Citem-se, também, os estabelecimentos
comerciais especializados em produtos para o sexo, os sex shops, com uma
infinidade de itens (cremes e óleos perfumados, preservativos exóticos,
roupas/fantasias eróticas, filmes). Tudo isso precisa ser anunciado
69
. O
produto/serviço sexual (a negociação do próprio corpo ou do corpo alheio), que faz
69
Os anúncios são encontrados sempre em revistas ou seções especializadas.
65
parte desse amplo mercado do sexo
70
, também faz uso do discurso da publicidade.
É o que esse capítulo pretende demonstrar.
Mas cumpre antes ressaltar que os termos publicidade e propaganda, muitas
vezes empregados indistintamente, não têm exatamente o mesmo significado.
Publicidade, segundo Sandmann (2000:9), deriva de “público”, do latim publicus,
designando a qualidade do que é público. Assim, publicar é divulgar, tornar pública
uma idéia. O termo propaganda, por sua vez, deriva do latim propagare e foi extraído
do nome Congregatio de propaganda fide
71
, congregação criada em 1622, em
Roma, com o objetivo de cuidar da propagação da fé.
Publicidade, em português, é usado em referência à venda de produtos ou
serviços. Já propaganda aplica-se tanto ao sentido de propagação de idéias quanto
ao de publicidade, logo é um termo mais amplo e pode ser empregado em todos os
sentidos.
B - Uma linguagem peculiar
A publicidade é uma das várias forças de comunicação que deve levar o
consumidor através de vários níveis (desconhecimento conhecimento
compreensão convicção ação) ao objetivo visado que é a compra do produto
(resultado final / ação). Para tanto, explora o universo particular dos desejos.
(MONNERAT, 2003:15)
Nesse percurso (do conhecimento à ação), a mensagem publicitária oferece
ao destinatário o mundo dos sonhos, ou seja, ela cria e exibe um mundo perfeito,
ideal. Neste espaço, não cabe a guerra, o crime, a doença nem a pobreza.
Oportunamente, o anúncio de Letícia exemplifica essa linguagem “positivada”,
“idealizada”:
70
Em sua obscuridade (excetuando-se os sex shops) movimenta considerável soma de dinheiro, sem
qualquer controle fiscal.
71
Em tradução literal teríamos “Congregação da fé que deve ser propagada”.
LETÍCIA (BARRA/COPA)!!!
Linda Morenaça, 1.70alt.19; Seios fartos, lábios
atrevidos, e abilidosos (sic). Perfeição de mulher.
Indecepcionável. (s/frescura) Casais 24hs. Tel:
9169--6170
1
-
linda, morenaça, fartos, atrevidos,
abilidosos (sic), indecepcionável,
s/frescura (loc): adjetivos axiológicos; 2-
1.70, 19: adjetivos não-axiológicos
66
Nenhuma informação que possa levar o público-efetivo a reavaliar a sua
intenção de procurar pela garota de programa é fornecida. Os riscos de um encontro
com uma pessoa desconhecida, as possibilidades de se adquirirem DST, por
exemplo, ficam de fora desse mundo em que a mulher é uma “perfeição”,
transmitindo-se sempre a imagem de saudável, pois é “linda”, possui “seios fartos”,
somados, ainda, a outros predicados implícitos.
Assim, em vez da objetividade informativa, teremos a linguagem da sedução,
da persuasão, aquela que manipula os símbolos para fazer a mediação entre
objetos e pessoas. Nesse universo, os produtos/serviços não são meros objetos,
tampouco eles precisam do homem. Ao contrário, o homem é que necessita deles
para compor sua personalidade, embelezar-se, sentir-se desejado, feliz...
Ora, consumir produtos (objetos, serviços) passa, então, a representar
felicidade. Conforme diz Carvalho (1996:12), “os artefatos e produtos proporcionam
a salvação do homem, representam bem-estar e êxito.
O erotismo também, além de cercear as pessoas nas academias, nas praias,
nas coreografias sensuais das bandas pela TV, no Carnaval, está presente na
publicidade, atrelado ao prazer e à felicidade. Ele pode ser usado, por exemplo, para
tornar uma cerveja, como outra qualquer, em “cerveja do verão”, por estar associada
ao apelo sexual da atriz Juliana Paes
72
, símbolo sexual, que protagonizou
comerciais da marca Antártica. Em tais comerciais, a cerveja ocupa o centro do
anúncio, nela a câmera focaliza, endeusando-a. A garrafa surge associada à mulher,
erotizada, seduzindo o público masculino que é o maior consumidor de cervejas.
Com efeito, é o discurso publicitário que confere à bebida essa auréola mitificadora,
sem a qual não seria mais que uma simples “coisa”. Nesse sentido, até mesmo um
corpo humano pode ser retratado objetivamente ou, esmaltado pelo discurso da
sedução, adquirir status de escultura grega (por exemplo, corpo escultural, bumbum
exuberante, rosto encantador, como nos exemplos de nosso corpus), transformando-
se, assim, no ELEx (CHARAUDEAU, 1983).
73
Ao centrar o destinatário em si próprio, nos seus desejos, de modo egoísta, a
publicidade se caracteriza por reforçar o individualismo. Sob esse ângulo, Williamson
(1994, apud Pinto, 1997) explica que o sujeito cria uma “imagem imaginária” de si
próprio que possui a “totalidade” que ele ainda não consegue ter. Tal imagem torna-
72
Atualmente, a atriz desfila no Carnaval carioca como “rainha de bateria”.
73
Cf. explanação no item 3.3.1.
67
se objeto de seu desejo, pois o sujeito ambiciona fundir-se com esse “ego-ideal”, que
é a sua própria imagem refletida no espelho. O que faz a publicidade, ao confrontá-
lo com essa versão idealizada do seu “eu”, é propor uma troca de identidades, em
que a nova é perfeita, mais completa.
Dessa forma, o sujeito compra muito mais do que bens de consumo, ele
compra as suas próprias identidades, visto que seres ideológicos que são, acabam
por ter forjada tal necessidade. Essa dependência é constantemente alimentada
pela publicidade, porque é dela que esta sobrevive. E, se pensarmos na publicidade
dos CS, ela oferece uma gama de anúncios diariamente aos leitores, que não terão
tempo de esquecer-se deles, ou seja, aquela seção torna-se parte da sua rota de
leitura. Além disso, são tantas as “garotas”, com estéticas tão variadas, associadas a
“talentos” tão diferenciados (substituídos ou renovados todos os dias) que haverá
sempre espaço para discursos como “experimente essa novidade”, “você nunca viu”,
entre outros.
É por meio do gênero anúncio que a publicidade estabelece a conexão entre
quem procura e quem oferece. Na publicidade em geral, ele será divulgado de
maneira a atingir o maior número de pessoas interessantes, atendendo ao objetivo
de (a) criar desejos e (b) transformá-los em necessidades. Essa lógica se altera,
todavia, em relação aos classificados sob foco. Neles, não se cria exatamente um
desejo/necessidade, pois isso preexiste ao anúncio, oferece-se uma realização
desse desejo já existente.
Para Carvalho (1996:18), a palavra é tão poderosa que “ela possui o poder de
criar e destruir, de prometer e negar”. Sua força persuasiva, no discurso publicitário,
é fazer crer ao destinatário que lhe falta algo na vida para torná-lo completo, seja
prestígio, sucesso, amor, diversão ou sexo, desejo/necessidade de alto grau de
individualismo. Assim, o sujeito interpretante dos CS tem, diante de si, inúmeras
possibilidades de realização dos seus desejos, cada uma delas erigida pela
linguagem, que promete, evidentemente, a garantia da satisfação. Veja-se o
exemplo:
LAÍS N. IGUAÇU T. 3101
-
5280
(9762-6965). Loira, bronzeadíssima, experiente.
Fazendo massagem relaxante, adorando brincar.
Especialista aparelhos. Prazer garantido.
Hotéis/Condução Grátis. (3066-1511).
1
-
bronzeadíssima, experiente, relaxante,
especialista: adjetivos axiológicos; 2- loira:
adjetivo não-axiológico; 3- garantido: adjetivo
de modalização epistêmica
68
C - A criação de “inimigos”
Criar “inimigos” da saúde mental e física é também uma preocupação do
enunciador nos CS. Carrascoza (2002:42) afirma que, no discurso publicitário, é
muito importante estar em combate contra algum opositor. Segundo o autor (op.cit),
decorrem daí os anúncios como os de detergentes que lutam contra a sujeira, os de
aspiradores de pó, contra os ácaros, os de analgésicos, contra a dor de cabeça.
No anúncio abaixo, de Eduarda, o inimigo implícito é o estresse. Contra ele se
opõe a “massagem relaxante” que ela oferece. Confira-se:
Curiosamente, esse anúncio pode ser dividido em três partes: a primeira, das
“preliminares”, em que ela é “atraente” e oferece um “show de sensualidade”; a
segunda, a do sexo em si, “fazendo 7 posições do amor” ; e a terceira, a parte da
finalizadora “massagem relaxante”, talvez em uma tentativa de oferecer
“atendimento completo”.
D - As funções da linguagem nos CS
Outra característica que envolve o texto publicitário é a função que a
linguagem pode desempenhar na mensagem.
Segundo Jakobson (1969:118-129), as funções da linguagem podem ser:
a) Referencial: quando enfoca o objeto, o contexto, deixando de lado o
emissor e o receptor;
b) Emotiva: quando o enfoque recai sobre o próprio eu e este dá vazão
aos seus sentimentos etc.
c) Apelativa: quando a ênfase se dá sobre o receptor;
COROA EDUARDA
Morenaça, show sensualidade, 115quadril,
atraente, estilo mulherão, engarrafando trânsito,
fazendo 7 posições do amor, massagem
relaxante. Centro. Tel.:3852-8138. Confira.
1
-
coroa, morenaça, show, atraente,
mulherão, relaxante: adjetivos
axiológicos; 2- 115: adjetivo não-
axiológico
69
d) Fática: quando o enunciado pretende verificar se o contato com o
interlocutor se mantém;
e) Metalingüística: quando a mensagem tem por objeto outra
mensagem;
f) Poética: quando o enfoque recai sobre a forma da mensagem,
tendo-se preocupação com a sua estética.
Tais funções podem ser associadas ao modo enunciativo de Charaudeau
(1992) também como estratégias discursivas no discurso publicitário.
74
Num primeiro momento, elas podem ser resumidas a três, visto que: 1) não se
pode negar que na função poética também se encontra a expressão do sujeito, na
sua maneira de expressar-se; 2) a função fática é, na verdade, uma atuação sobre o
outro (o TU) e 3) na função metalingüística, o enfoque recairá também sobre um
referente: o código.
Isto posto, o ato elocutivo, em que se estabelece uma posição em relação ao
dito, vincula-se, pelo elo da subjetividade, às funções emotiva e poética; o ato
alocutivo, por sua vez, refere-se à posição do sujeito em relação ao interlocutor, na
qual ocorre o apelo que o caracteriza, assemelhando-se, por isso, às funções
conativa e fática; no ato delocutivo, por fim, encontra-se a posição do sujeito em
relação aos outros discursos, estando os interlocutores textualmente apagados, sob
a pretensa objetividade. Dessa forma, ele está ligado às funções referencial e
metalingüística. Em síntese, temos:
JAKOBSON
CHARAUDEAU
EMOTIVA
POÉTICA
SUBJETIVIDADE ATO ELOCUTIVO
CONATIVA
FÁTICA
APELO ATO ALOCUTIVO
REFERENCIAL
METALINGUÍSTICA
OBJETIVIDADE ATO DELOCUTIVO
74
O modo enunciativo foi descrito anteriormente, no item 3.2, pela perspectiva da modalidade
discursiva. Dada a sua importância no contexto dessa pesquisa, será posteriormente vislumbrado no
item 3.3.2, ocasião em que se discute as estratégias da competência discursiva.
70
Importa lembrar que as funções (atos enunciativos para Charaudeau) não se
excluem, ou seja, em uma mesma mensagem podem ocorrer várias funções
sobrepostas, predominando uma delas. Para Carrascoza (2002:39), “como o texto
publicitário é deliberativo, objetiva aconselhar, é natural que prevaleça a função
conativa, centrada no interlocutor, alvo do aconselhamento.” A função fática, aquela
que faz sentir a ilusão do diálogo, evidentemente, será cara ao discurso publicitário,
ao auxiliar a função conativa. Também a função expressiva estará fatalmente
presente, associada à função fática (função predominante, se considerarmos o
objetivo do gênero), uma vez que o sujeito realiza, como vimos antes, uma descrição
persuasiva que não está isenta de subjetividade.
Munido da experiência cotidiana, o sujeito comunicante, ora enunciador,
muitas vezes faz pressupor que há “programas” em que as “garotas” não satisfazem
o cliente por diversas razões: por não serem habilidosas, por não realizarem as
preferências do cliente ou por não serem carinhosas. Esse saber psicossocial é
expresso, normalmente, por frases impactantes
75
, imbuídas de certa “vocalidade”
(MANGUENEAU, 2002) fundamentalmente persuasiva. O enunciador, então, atribui
a si a qualidade que diz faltar nos demais, tornando-se ele o único (dentre todos os
enunciadores) possuidor do poder de oferecer ao sujeito interpretante (o sujeito real)
o prazer que ele procura. Para ilustrar, selecionamos algumas ocorrências dessa
função apelativa do discurso publicitário dos CS:
Ø O enunciador atua sobre o destinatário, diferenciando-se dos demais pelo
seu alto nível de especialização (evidentemente na esfera sexual):
a)
75
Em muitos casos, frases feitas, às vezes, adaptadas, às vezes, não, como “Lavo, passo e cozinho.
Venha provar meu tempero!!!” que veremos adiante.
ABALOU 2265
-
1731
Sob Nova Direção. Carla morena, “seios
empinados”...Linda... Carinhosa... Fera entre
quatro paredes... Privê. Largo Machado.
(R$10,00). Admite-se (sic) moças!!
1
-
morena: adjetivo não
-
axiológico
; 2
-
empinados, linda, carinhosa, fera:
adjetivos axiológicos
71
b)
Ø O enunciador apela ao íntimo do destinatário, como se o conhecesse e
soubesse exatamente o que lhe dá prazer:
Ø O enunciador convida o destinatário a experimentar o seu “serviço”
variado, “completo”:
Ø O enunciador deprecia as outras “profissionais”, singularizando-se:
a)
ADRIANA (CENTRO
-
RJ)
Mulherão!! Cinturinha, seios grandes belíssimos,
lindas pernas! Faço o que você gosta!
Irresistível!! Privê discreto. 2263-8540/ 2203-
1565. www.destack.com.br/adrianapinheiro.htm
BÁRBARA
Lindíssima mulata, 103quadril. Corpaço violão
1.70altura. Rosto impecável, sensacional.
Mostrando que um bom rebolado faz diferença.
2275-6554/ 2275-6953
DÉBORA!!!
Morena Escândalo 19ª (sic) U.S.A Bomba. Sem
frescura, Lavo, Passo e Cozinho. Venha provar meu
tempero!!! 2244-6788/ 8638-7951 Copacabana.
PRIVÊ Hotéis/ Residências.
MEL N.IGUAÇU
Moreninha jambo, 1,68m, 20ª (sic), manequim
38, bonita corpo/rosto, quadril enlouquecedor,
deliciosa!!! Fazendo o que as outras não
gostam!!! Telefone: 9692-7024
1
-
lindíssima, violão, impecável,
sensacional: adjetivos axiológicos; 2-
mulata, 103, 1.70: adjetivos não-
axiológicos
1
-
Mulherão, belíssimos, lindas,
irressistível: adjetivos axiológicos; 2-
grandes: adjetivo não-axiológico
1
-
escândalo, bomba, sem frescura:
adjetivos axiológicos; 2- morena, 19:
adjetivos não-axiológicos
1
-
moreninha (jambo), bonita,
enlouquecedor, deliciosa: adjetivos
axiológicos; 2- 1.68, 20, 38: adjetivos
não-axiológicos
72
b)
E - A presença da linguagem figurada
Na publicidade, é muito comum a presença de figuras de linguagem na
composição da mensagem. Tais formas de exploração dessas figuras, por não terem
uso cotidiano, são consideradas criativas, valor que se transfere ao texto publicitário.
As figuras de maior produtividade na publicidade são, conforme Sandmann
(2000:85), a metáfora, a metonímia e a personificação. Nos CS, além dessas três,
merece destaque, pela relevante presença, a hipérbole.
I. A Metáfora
Segundo Garcia (1969:76),
“a existência de similitudes no mundo objetivo, a
incapacidade de abstração absoluta, a pobreza relativa do
vocabulário em contraste com a riqueza das idéias a transmitir e,
ainda, o prazer estético da caracterização pitoresca constituem as
fontes da metáfora.”
Ocorre o emprego de um significante de signo para designar um outro
significado do mundo, em virtude de uma semelhança. Geralmente, afirma-se que a
metáfora advém de uma comparação destituída dos elementos comparativos. Ela
seria o produto de uma operação mental mais rápida que a comparação.
No anúncio abaixo, Isadora compõe a metáfora utilizando-se da associação
da loba à mulher madura. O animal de hábitos noturnos uiva à noite produzindo
certo som associado a um lamento, mas, muitas vezes, ao prazer. Culturalmente, a
mulher madura é associada à loba, pois estaria sexualmente plena. Veja-se:
NITERÓI GABRIELA!!
Loira, corpo sedutor, meiga como nenhuma
outra. Você irá pedir bis!!! Atendimento 24hs.
Tels: 2722-1640/ 9893-6362.
1
-
loira: adjetivo não
-
axiológico; 2
-
sedutor, meiga: adjetivos axiológicos
73
a)
Neste outro, o enunciador, que se identifica como “Mulher Madura”, percebe
uma relação entre as características do felino pantera (os olhos de contorno negro,
as garras, a agilidade, o encanto que o animal desperta pelos seus movimentos
precisos...) que está em um plano imaginário , conforme Garcia (1969:77), e as
atribui a si, a ela, que representa uma idéia nova, pertencente ao plano real (idem).
Veja-se:
b)
Esse raciocínio que gera a metáfora também pode ser observado por
exemplos abaixo:
c)
Os seios de Vanessa constituem a idéia a ser expressa, situada no plano real. O que
a imaginação do enunciador percebeu ter alguma relação com ela (com os seios) é o
formato da pêra, idéia situada no plano imaginário. Assim, fundem-se as duas,
designando-se a primeira (o conceito seios) com o significante (pêra) da segunda.
Mulher Madura!!! 39 anos... Ruiva!!!
Panterona!!! Lisinha... Massagem Relaxante
Erótica... Sensual... Gostosa... (Aparelhos /
Dominação) Complemento Total... (R$30,00).
2220-4255. (Cinelândia.) Confira!!!
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22
a
(sic). Morena clara 1.70a. 108quadril. Seios
perã (sic), estilo mulherão. Educada, carinhosa.
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mulher madura, perfeita para você!!! Sem
frescuras!!! Uma loba Manhosa, Carinhosa!!!
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1
-
loiraça, madura, perfeita, sem
frescuras, manhosa, carinhosa:
adjetivos axiológicos;
2- verdes: adjetivo não-axiológico
1
-
madura, panterona, relaxante, erótica,
sensual, gostosa: adjetivos axiológicos;
2- ruiva, 39, lisinha: adjetivos não-
axiológicos
1
-
tijucana; adjetivo informativo; 2
-
morena clara, 22, 1.70, 108: adjetivos
não-axiológicos; 3- perã (sic), mulherão,
educada, carinhosa, sensual, discreto:
adjetivos axiológicos
74
Há anúncios igualmente interessantes, ainda no campo metafórico: em um
deles o enunciador, de naturalidade gaúcha, diz-se “picanha na brasa”; em outro, a
“garota” afirma ter “rostinho porcelana”.
II. A Metonímia
Na metonímia (etimologicamente, “mudança de nome”), o processo não se
desenvolve em diferentes campos sêmicos
76
, como na metáfora, mas em apenas
um, pois os termos que se relacionam pertencem ao mesmo campo, um substituindo
o outro na expressão.
Ela se baseia, dessa forma, em uma relação de contigüidade, o que não
acontece na metáfora, cuja relação se dá por similaridade. Decorrem, daí, infinitas
relações, do tipo: causa / efeito; matéria / objeto; autor / obra; abstrato / concreto etc.
No anúncio que segue, transfere-se para as mãos a qualificação de
“carinhosa”. Ora, Ângela é carinhosa, no entanto é com as mãos que ela expressa
esse carinho. Aliás, oportunamente, pois se diz “massoterapeuta” Veja-se:
a)
Destaque-se que se dizer “massoterapeuta” será, também, um recurso expressivo
que se enquadra na idéia de metonímia, pois a massagem seria algo que faria parte,
se fosse o desejo do cliente, do “contrato” tácito entre ele e a garota de programa. O
serviço desta incluiria, então, também, a prática da massagem. Nesse universo,
“massoterapeuta” e “massagista” seriam hipônimos de garota de programa, qual
cardiologista, dermatologista são de médico. O processo dá-se por metonímia, pois
a profissão não é cardiologista, que é uma especialização, mas médico (daí
especialização pela profissão).
76
Traço significativo.
ÂNGELA
MASSOTERAPEUTA
Adeus stress! Recreio/jacarepaguá (sic) / Barra.
44ª (sic), experiente, massagem bioenergética,
relaxamento total! Mãos carinhosas c/ toques
especiais! 2490-4068/ 8238-4512. Damas/
Cavalheiros
1
-
experiente, bioenergética,
carinhosas, especiais: adjetivos
axiológicos
75
Em (b), Vitória afirma ser “escultural”. O raciocínio também é metonímico,
porque não é ela (pessoa como um todo), mas o seu corpo que pode receber tal
adjetivação. Confira-se:
b)
A metonímia pode ser encontrada, também, em usos como “morena” (cor pela
pele); “loiraça” (cor pelo cabelo). No entanto, eles não representam, a rigor, um
recurso expressivo, pois estão saturados pelo emprego cotidiano, tornando-se
banais.
III. A Hipérbole
A hipérbole, sendo uma figura de pensamento que representa um exagero na
mensagem, é um recurso bastante utilizado nos CS. Nesse gênero publicitário, em
particular, como o enunciador joga com o sentimento do prazer sexual do sujeito
interpretante, utiliza constantemente uma linguagem hiperbólica, que o mantém (ele,
enunciador) no auge, no ápice. Para o outro, a quem visa excitar, é uma linguagem
“orgásmica”. Tomem-se, como exemplos, os anúncios de Bia e Cristiane:
a)
VITÓRIA
Copacabana
(novidade) morenaça
bronzeada verdadeiramente escultural
(S/lindíssimos) cheirosa carinhosa. Beijinhos
alucinantes. Realizando suas fantasias.
Atendimento inesquecível. Sozinha! (24hs) (sic)
3285-9292
BIA INDIAZINHA!
Absurdamente gostosa!!! Quadril enlouquecedor
,
bem torneado, lábios carnudos, beijando muito
gostoso!!! Atendimento carinhoso!! Privê/ hotéis
Tels: 3852-2148/ 2232-0348/ 9878-0511.
(R$20,00/ R$35,00/ R$50,00). (Admite-se (sic)
loiras)
1
-
morenaça, escultural, lindíssimos,
cheirosa, carinhosa, alucinantes,
inesquecível: adjetivos axiológicos; 2-
bronzeada: adjetivo não-axiológico
1
-
indiazinha: adjetivo não
-
axiológico; 2
-
gostosa, enlouquecedor, torneado,
carnudos, gostoso, carinhoso: adjetivos
axiológicos; 3- (absurdamente) gostosa,
(muito) gostoso: adjetivos qualificadores
de intensidade
76
b)
Observando as qualificações, elas são sempre em proporções inimagináveis:
absurdamente gostosa”, “corpinho enlouquecedor”, “morena insaciável”.
IV. A Prosopopéia
A prosopopéia consiste na atribuição de ações ou qualidades humanas a
seres inanimados, abstratos. Garcia (1969:80) observa que “há uma infinidade de
metáforas constituídas por palavras que denotam ações, atitudes ou sentimentos
próprios do homem, mas aplicadas a seres ou coisas inanimadas.” Este é outro
recurso de hábil expressividade nesse gênero, refletindo a criatividade do sujeito
comunicante. Ele oferece a oportunidade de o enunciador expressar significados
que seriam extensos demais (o que os tornam inviáveis) ou proibidos pela censura
das agências. Observe-se:
a)
O substantivo “trânsito”, nesse anúncio, é o objeto de “enlouquecendo”, verbo
que expressa um significado possível somente de referir-se, em sentido literal, a
seres vivos, jamais a seres abstratos. Resulta, pois, em uma personificação.
Abaixo, Anita descreve seu quadril como “atrevido”:
CRISTIANE ILHA!!!
/Bonsucesso. Morena insaciável! Corpinho
enlouquecedor, mignonzinha (sic), fogosa,
apaixonante! Confira! Hotéis/ Residência 24hs.
(sic) R$50,00=1 hora/ R$ 100,00=3 horas. Tel.:
2465-3464/ 9772-5584
ABA CRISTIANE!!!
Quase mulher, morena bronzeada, feminina
rosto/corpo, 105quadril enlouquecendo o trânsito!!!
24 motivos insaciáveis!!! Hotéis/privê Centro. Tels:
2215-0794/ 9357-1806.
1
-
insaciável, enlouquecedor,
fogosa,
apaixonante: adjetivos axiológicos; 2-
morena, mignonzinha: adjetivos não-
axiológicos
1
-
(quase) mulher: adjetivo qualificador
de intensidade; 2- morena, bronzeada,
105, 24: adjetivos não-axiológicos; 3-
feminina, insaciáveis: adjetivos
axiológicos
77
b)
O enunciador emprega o termo “quadril” em referência à sua genitália ou
nádegas (construindo uma metonímia, um eufemismo). Depois, vale-se de um
adjetivo subjetivo avaliativo axiológico “atrevido”, para qualificá-lo, que equivale
àquele que possui atrevimento, qualidade propriamente humana.
F - A gradação
O discurso publicitário utiliza, freqüentemente, a gradação
77
para valorizar os
seus produtos, denotando sempre a superioridade deles, o que a torna um recurso
argumentativo eficaz.
Há, conforme Bechara (2001:148), três tipos de gradação na qualidade
expressa pelo adjetivo: positivo, comparativo e superlativo.
No positivo, enuncia-se, simplesmente, a qualidade. No comparativo, a
qualidade de dois seres é comparada, de modo a estabelecer uma igualdade, uma
superioridade ou uma inferioridade. Já no superlativo, pode-se:
a) ressaltar a qualidade em relação ou comparação do ser a outros
seres. Diz-se que o superlativo é relativo.
b) ressaltar a qualidade do ser, indicando a intensidade elevada dessa
qualidade, sem relacioná-lo a outros seres. Nesse caso, o
superlativo é absoluto. Este pode subdividir-se em: analítico e
sintético.
77
Basílio (2004:67) chama de gradação “o processo de expressar na estrutura lingüística o grau de
intensidade de uma qualidade ou da dimensão de um objeto”. Em português, ela se expressa por
mecanismos sintáticos ou morfológicos.
ANITA APAIXONE
-
SE!!!
19ª (sic) “morena clara” rosto dengoso (seios
bicudinhos) Barriguinha sarada. Cabelo Cintura
(quadril atrevido) Novidade. Bom atendimento.
Copacabana 2244-6424
1
-
morena clara, 19, bicudinhos:
adjetivos não-axiológicos; 2- dengoso,
sarada, atrevido, bom: adjetivos
axiológicos
78
O analítico é formado com a anteposição de palavras indicadoras de
intensidade (muito, extremamente, absurdamente):
Pode-se encontrar na repetição do adjetivo forma de expressar um analítico
“afetivo”:
Obtém-se o sintético por meio do acréscimo de sufixo (-íssimo, -érrimo) ao adjetivo:
Nos CS, há um emprego farto de adjetivos acrescidos de sufixos superlativos
sintéticos (“quentíssima, cheirosíssima, belíssima, carinhosíssima”, entre outros)
com o objetivo de convencer o leitor de que a garota-produto é sempre mais e
melhor do que as demais ou atribuir valores máximos à “garota” enunciadora, em
relação à coletividade anônima das garotas de programa. Para Basílio (2004:73),
este grau consiste em uso “fundamentalmente expressivo”. A autora exemplifica
essa subjetividade do superlativo ao comparar um enunciado no superlativo absoluto
analítico e sintético, partindo do grau positivo: “João é inteligente” (positivo). “João é
BIA JACAREPAGUÁ
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1
-
loirinha, 18, morena: adj
etivos não
-
axiológicos; 2- empinadinhos, escultural,
indecepcionável, douradinha, sapequinha,
discreto: adjetivos axiológicos
1
-
tijucana: adjetivo informativo; 2
-
branquinha, 18, 38, 1.65, lisinhos: adjetivos
não-axiológicos; 3- gatinha, linda, exigentes:
adjetivos axiológicos; 4- linda (mesmo):
adjetivo qualificador de autenticação
1
-
catarinense: adjetivo informativo; 2
-
iniciante, s/USA (loc.), lindíssimo, torneadas,
completíssima, s/frescuras (loc.): adjetivos
axiológicos; 3- fininha: adjetivo não-
axiológico
79
muito inteligente” (superlativo absoluto analítico). “João é inteligentíssimo”
(superlativo absoluto sintético maior subjetividade). O exemplo abaixo confirma o
asseverado pela estudiosa:
3.3- O QUADRO SOCIOLINGUAGEIRO
Para Charaudeau (1995), a comunicação se dá a partir de um duplo processo
de atribuição de sentido aos seres/objetos, que é o processo de semiotização do
mundo, e envolve dois parceiros em uma troca. O primeiro processo, transformação,
refere-se à utilização que o sujeito faz da linguagem para representar o mundo real
(a significar); o segundo, transação, é aquele em que o sujeito emitente do ato de
linguagem troca esse objeto (o mundo significado) com um sujeito destinatário.
Nesse duplo processo, o mundo significado, semiotizado, adquire sentido na
transação, conforme a intencionalidade do sujeito falante, a identidade dos parceiros
do ato de linguagem, seus objetivos e a situação em que ocorre a troca. O processo
de transformação subordina-se, dessa forma, ao de transação, base do contrato de
comunicação.
Por exemplo: diante de um enunciado como “Fulano não é flor que se
cheire”, pode-se perguntar que sentido possui a palavra “flor”. A resposta a essa
pergunta requer do interpretante ativar conhecimentos de ordem lingüística e
psicossocial.
Assim, em primeiro lugar, apenas conhecer o sentido de língua da palavra em
questão não é suficiente. Conforme consta em Ferreira
78
, “flor” é o órgão reprodutor
das angiospermas, e que, geralmente, tem cores vivas e cheiro agradável. Então,
78
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Minidicionário da língua portuguesa. 3ªed. Rio de
Janeiro: Nova Fronteira, 1993.
ISABELA NEGRA T.2221
-
0127
(Dominadora) 1,73alt, empinadíssima, peitão
bicudíssimo, coxudíssima, lábios
quentíssimos, cheirosíssima. Realizando
sonhos + desejos (especialista/aparelhos)
Sozinha (www.eliterio.com/isadoranegra).
9663-2430. Centro
1
-
negra, 1.73: adjetivos não
-
axiológicos;
2- sozinha: adjetivo informativo; 3-
dominadora: adjetivo classificador; 4-
empinadíssima, bicudíssimo, coxudíssima,
quentíssimos, cheirosíssima, especialista:
adjetivos axiológicos
80
“flor”, apenas como material verbal, desprovida de qualquer contexto, teria somente
o significado comumente empregado, que, grosso modo, é o de vegetal.
Mas isso não satisfaz, pois somente esse conhecimento não daria coerência
ao que foi dito. Há de se associá-lo (o conhecimento) a dados das condições de
produção, ou seja, “para que haja sentido, é preciso que o dito esteja vinculado ao
conjunto das condições dentro das quais o dito está dito” (CHARAUDEAU,
2001:13).
Seria necessário saber por que se diz tal frase (e em que situações) para
chegar-se ao sentido de discurso atribuído à palavra “flor”, que, no enunciado em
questão, não significa “vegetal”, mas assume o sentido de pessoa não confiável.
Nesse caso, “não ser flor que se cheire” significa ser indigno de confiança.
Assim, conforme Charaudeau (1996:6), o sentido é obtido através do diálogo
entre os elementos formais da língua, que representam aquilo que o sujeito
comunica e a situação de interlocução, que envolve as dimensões social,
psicossocial e cognitiva. Mas o quadro sociolinguageiro necessita de expansão para
melhor recobrir os dados: é preciso verificar os conceitos acerca do contrato de
comunicação e as noções de legitimidade e credibilidade.
3.3.1. O contrato de comunicação nos CS
A abrangência do ato de linguagem, que se realiza em um duplo espaço de
significância, o externo e o interno, determina, conforme Charaudeau (1996:5), dois
tipos de sujeitos da linguagem: os parceiros, que são os sujeitos do fazer social,
seres reais, chamados de EUc (EU comunicante) e de TUi (TU interpretante); e os
protagonistas, que são os sujeitos do dizer, seres hipotéticos, denominados de EUe
(EU enunciador) e de TUd (TU destinatário). Ou seja, no circuito interno, encontram-
se os seres da palavra (EUe, TUd, ELEx) e no circuito externo os seres agentes
(EUc,TUi, ELEº).
No processo de produção, o EUe corresponde ao papel discursivo que o EUc
(produtor do ato de linguagem) constrói dele mesmo enquanto ser do discurso em
cena. Tal papel é idealizado em função das intenções comunicacionais do sujeito
situado no plano do fazer.
Na esfera da publicidade, procura-se transformar o objeto de troca, o “ELEº”
(Charaudeau, 1983), que é o produto real desprovido de qualquer simbolismo ou
81
destituído de qualquer idealização decorrente da subjetividade mesma do
comunicante, em “ELEx” (Charaudeau, 1983), que, de modo geral, significa uma
projeção daquele ELEº, dessa vez imbuída de toda carga simbólica e subjetiva que
possa veicular.
Por isso, no espaço do dizer (no mundo das representações), o sujeito, por
exemplo, beberia uma Coca-cola, ou seja, beberia a marca, muitas vezes um
símbolo de prazer, de saúde (como no slogan desse produto pode-se observar:
Viva o que é bom”). Já no espaço do fazer (no mundo real), ele beberia apenas um
refrigerante.
O cerne da questão está no mundo do discurso, em que se pode ressaltar
somente a marca, o símbolo, e apagar o substantivo comum (o objeto), eliminando-
o. Processo semelhante ocorre nos CS.
79
Para iniciar a exemplificação do que foi exposto, tomemos o anúncio a seguir:
Nele, o enunciador Adriane é constituído discursivamente como garota de programa,
visto que há, na situação comunicativa, vários elementos que assim ajudam a
identificá-lo:
a) o anúncio foi publicado em uma seção destinada a esse tipo de serviço;
b) o enunciador enumera atributos de seu corpo, privilegiando-o;
c) o enunciador informa os meios de contato e o custo do “serviço” (que ele
anunciou): “R$200”.
Embora o enunciador não faça referência direta ao serviço tratado, o conjunto
das informações acima aponta para a interpretação de que quem anuncia
80
é uma
garota de programa.
79
A referida idealização foi discutida com maior profundidade no item 3.2.3, ocasião em que se
aborda o discurso publicitário nos CS.
ADRIANE
-
Um show de beleza, morena
bronzeada, alto nível, idade 28ª, altura 1.65.
Um mulherão nota 10.
www.hotside.com.br/adriane.htm Tel.: 8839-
7159 (R$200).
1
-
Bronzeada,
28, 1.65
: adjetivos não
-
axiológicos;
2- nota 10: adjetivo axiológico; 3- Alto:
adjetivo qualificador de avaliação de
propriedades intensionais
82
Há, necessariamente, um sujeito empírico responsável pela produção do
anúncio do qual Adriane é o enunciador e esse sujeito é o EUc: pessoa de
existência e intenções reais, situada no plano do fazer, ou seja, além de Adriane
anunciante, sujeito discursivo, há uma garota de programa (que pode ou não se
chamar Adriane) que realiza efetivamente o programa oferecido no jornal, ou uma
agência ou o próprio local (“casa de massagem”, termas) onde se realizam os
encontros sexuais. Assim, ela pode constituir o EUc, entretanto este sujeito pode ser
um dos referidos responsáveis pelo local/agência ao qual Adriane poderia estar
vinculada, sendo uma de suas atendentes. Diferenciam-se, portanto, nos CS, dois
tipos de sujeitos do processo de produção: EUe e EUc.
O EUc constrói, ainda, a imagem hipotética do TUd, a quem ele dirige seu
enunciado. O destinatário representa a figura do leitor, que é um cliente em
potencial, à medida que é alvo do anúncio, estando sujeito à influência que o EUc
tenta exercer sobre ele.
Temos, por exemplo, no anúncio abaixo, elementos para ilustrar a referida
idealização:
O TUd, nesse anúncio, é imaginado como um sujeito que possui desejos
íntimos ainda não realizados e que está em busca de prazer, de aventuras ou de
emoções fortes (“de ser levado à loucura”). Nossas inferências a esse respeito
partem dos elementos lingüísticos “enlouquecedor” (adjetivo valorativo), “realizando
desejos íntimos” e “prazer garantido”.
A imagem do TUd construída pelo EUc pode, ainda, ser mais explícita,
atendendo a outras intenções do EUc:
80
Quando dizemos “quem anuncia” fazemos referência ao EUe, que é diferente de “quem se anuncia”
em que há referência direta ao EUc.
MELISSA (CENTRO
-
RJ) Morenaça
maravilhosa,
rostinho delicado, cabelão, corpinho sedutor,
(privilegiada) Atendimento enlouquecedor!
(Completíssima!) Realizando desejos íntimos!
(prazer garantido) www.
Destack.com.Br/melissa.htm Tel.: (oxx21) 2223-
1057/9833-3230
1
-
Morenaça, maravilhosa, delicado, sedutor,
privilegiada, enlouquecedor, íntimos ,
completíssima: adjetivos axiológicos
2- garantido: adjetivo qualificador de
modalização epistêmica
83
O TUd, nesse exemplo, é construído como um “homem de negócios”, homem
de importância social, com certo poder econômico, ou, como diz o enunciador,
“executivo”. Flavinha classifica, ainda, o destinatário por pessoa de “bom gosto” que,
como tal, mereceria os seus serviços especiais e, é claro, que não questionaria o
“cachê” de R$ 200,00.
Em se tratando de uma hipótese, o trabalho realizado pelo EUc pode (ou não)
obter o resultado desejado, conforme sua hipótese seja avaliada pelo TUi. Este
pode, por exemplo, aceitar a imagem dele feita por aquele. Mas pode, por outro
lado, negá-la. Isto porque também faz de si próprio uma imagem discursiva, sendo
esta o TUd. Além disso, pode questionar-se sobre o papel do comunicante. É o que
ocorre em enunciados como Quem é x para falar assim comigo? Ou seja, tanto mais
o EUc obterá êxito, quanto maior for a proximidade entre a hipótese criada por ele
sobre o TUd e a referida imagem deste construída pelo TUi.
Assim, o TUi pode não concordar com a imagem de pessoa disposta a pagar
R$200,00 e preferir um programa de custo reduzido, fartamente ofertado por
"garotas” que se dizem, também, “esculturais”, “lindíssimas” etc. Nesse caso, falhou
o projeto de fala
81
(CHARAUDEAU, 1996) do EUc que, dotado de intencionalidade,
objetivava a identificação do TUi com o TUd elaborado por ele. Evidencia-se, assim,
a assimetria entre os processos de produção e de interpretação do ato de
linguagem.
Em resumo: nos CS em questão, o EUc representará sempre uma garota de
programa real; o EUe representará um ser fictício, ou seja, o sujeito do discurso que
divulga um produto para um determinado público, apresentando-se pelo seu nome
(Andressa, Fernandinha, Tatiana, Melissa, Milla, Lolita etc.). Importa reforçar que tal
81
“O projeto de fala é o resultado de um “ato conjunto”, que se faz em um movimento de vai-e-vem
constante entre o espaço externo e interno da cena comunicativa” (CHARAUDEAU, 1996:29)
FLAVINHA LINDÍSSIMA 19ª
(sic) rosto
encantador, cabelos lisos compridos, corpo
escultural marquinha de biquíni. Atendimento/
Executivos [de] bom gosto. Cachê: R$200,00
Tel: 9939-5043.
1
-
lindíssima, encantador, escultural, [de]
bom gosto (loc.): adjetivos axiológicos; 2-
compridos, lisos, 19: adjetivos não-
axiológicos; 3- de biquíni (loc.): adjetivo
restritivo
84
enunciador pode estar na condição de “servidora” de sua agência, no caso das
casas especializadas em oferecer serviços sexuais
82
.
O produto anunciado, o ELEx, por sua vez, assemelha-se ao próprio EUe,
como podemos demonstrar nos anúncios abaixo:
a) O enunciador deste anúncio é Ana Luiza, que descreve a si própria em 3ª
pessoa, conforme encontra-se topicalizada. Ao final, por meio das frases “Novidade!”
e “Nunca anunciada.”, confirma-se a hipótese (dado o caráter reflexivo que essas
frases assumem no contexto) de a moça (ou alguém por ela responsável) ser
entendida como o próprio produto.
b) Temos, no caso seguinte, a reincidência da 3ª pessoa na descrição do
produto. No entanto, nota-se, no anúncio de Daniele, a passagem para a 1ª pessoa,
“moro só”, que evidencia o fato de o EUe (Daniele) desempenhar, simultaneamente,
o papel de ELEx (o produto Daniele).
Nesse sentido é que dizemos ser o EUe semelhante ao produto (ELEx),
objeto da troca.
O ELEx, finalmente, representa o ELEº idealizado, visto que se resume pelos
seus “méritos” apenas, ou seja, apresenta-se enaltecido. O leitor é conduzido, então,
82
Como informamos no capítulo referente à metodologia, não estamos trabalhando com anúncios de
agências ou de casas especializadas, mas ainda assim, não descartamos, dado o “terreno movediço”
em que se situam nossos dados, a possibilidade de tal vínculo.
ANA LUIZA
(Barra) 8189
-
7920 lindíssima
gata loira 20ª (sic), 1.65alt, man.38,
cabelos lisos cintura. Rosto perfeito, corpo
sarado. Novidade! Nunca anunciada. R$
130,00 (2h)
DANIELE
BARRA 9465
-
7334 loira natural
18
a
(sic) 1,75alt. Maq.40 rosto invejável
gaúcha corpo desenhado mão (sic)
cinturinha pilão olhos verdes moro só.
1
-
lindíssima, perfeito, sarado: adjetivos
axiológicos; 2- loira, 20, lisos, 1.65, 38: não-
axiológicos; 3- nunca anunciada: adjetivo
qualificador graduável
1
-
Loira, 18, verdes, 1.75, 40: adjetivos não
-
axiológicos; 2- natural: adjetivo restritivo; 3-
gaúcha: adjetivo informativo; 4- invejável,
desenhado [a] mão, pilão: adjetivos axiológicos
85
a entrar em contato com uma imagem “floreada” o ELEx , como: “rosto invejável”,
“corpo desenhado [a] mão”, tal como no caso da marca Coca-cola (já referenciada
anteriormente). O ELEº, por sua vez, é a garota de programa instituída como produto
real.
Assim, por aquela imagem (ELEx) não coincidir com a real, ela seria uma
cópia dissimulada, já que existe uma estratégia enunciativa de captação que subjaz
à sua descrição. Logo, devemos reforçar a distinção entre a figura real (EUc) e a
figura discursiva (EUe), que se apresenta como enunciador e, também, produto
(ELEx), porque o EUc emprega vários recursos para desfazer a hipótese da
assimetria existente entre os dois elementos (ELEº e ELEx) e entre os dois sujeitos
(EUc e EUe).
Para melhor compreensão, visualizemos os circuitos da fala:
3.3.2. A estruturação sociolinguageira
Ao definir o ato de linguagem como originário de uma situação concreta de
troca, Charaudeau (2005) entende que a significação é obtida pela articulação de
dois espaços: um de restrições, que compreende as condições mínimas às quais é
necessário atender para que o ato de linguagem seja válido e outro, de estratégias,
circuito externo (FAZER)
Garota Público
de programa real efetivo
(consumidor)
ou agenciador TUi
EUc
ELEº
ELEº= produto real (objeto de troca comercial: representa lucro para o EUc e benefício
para o TUi (consumidor)
circuito interno (DIZER)
EUe TUd
(enunciador) Público virtual
(leitor)
ELEx
(objeto da troca verbal produto idealizado)
86
que compreende as escolhas possíveis à disposição dos sujeitos na mise-en-scène
do ato de linguagem.
O autor elabora, então, um modelo de estruturação sócio-linguageira em três
níveis: o situacional, o discursivo e o semiolingüístico. A esses níveis correspondem,
respectivamente, três tipos de competências: a situacional, a discursiva e a
semiolingüística (CHARAUDEAU, 2001:13).
A - Competência situacional
De acordo com esta competência, o sujeito que se comunica deverá construir
o seu discurso considerando alguns elementos da situação de comunicação e, em
função deles, estruturá-lo. Tais elementos são, para Charaudeau
83
, a finalidade do
intercâmbio e o seu propósito, a identidade dos parceiros atuantes, e o dispositivo,
constituído pelas circunstâncias materiais da troca. Veja-se o seguinte esquema
84
:
Situação
83
idem.
84
Esquema apresentado por Charaudeau em conferência realizada na UFRJ, em 10/10/2005.
(tu) EU
(quem?)
(identidade)
Mundo
(a propósito de quê)
(tematização)
TU (eu)
(a quem?)
(identidade)
Meios
(como?)
Meios
discursivos
Meios
lingüísticos
87
Ora, quem anuncia nos classificados de um jornal objetiva, normalmente,
vender um produto, ofertar um serviço. Deve ter em mente esse objetivo e saber,
portanto, por que anunciar, já que não se anuncia um produto à toa, em vão. No
caso dos CS, a “garota” que se anuncia pretende conquistar os leitores do jornal,
fazer deles seus clientes efetivos. Eis a sua finalidade.
O seu discurso deve ser organizado, dessa forma, em conformidade ao seu
propósito, ou seja, no referido ato de linguagem ela falará acerca do objeto de troca
(que ela idealiza, que ela cria), isto é, o seu corpo, os seus serviços, enfim, o produto
(ELEx). Obedecerá à Máxima da Relação (Relevância), de Grice (1975, apud KOCH,
2001:27) “diga somente o que é relevante”. Então, não seria pertinente, por
exemplo, oferecer outros tipos de serviços desvinculados do interesse do seu
público-alvo. Comparem-se estes dois anúncios:
a)
F7
b)
No primeiro, Christina enumera serviços ligados à sua área, a de
investigação, que é o tema principal do texto, dividido em diversos subtemas. Nesse
anúncio e situação comunicativa, a investigadora não pode ser confundida com uma
garota de programa, prestadora de outro tipo de serviço profissional, visto que estas
não oferecem serviços de “gravações telefônicas”, “provas fotográficas”, “filmagens”
etc. de infidelidades conjugais. Por oferecer os serviços citados, o anúncio de
CHRISTINA INVESTIGAÇÕES. Infidelidade
conjugal. Acompanhamentos, flagrantes, provas
fotográficas, filmagens. Localizamos endereços,
telefones, documentos. Relatório. Dossiês.
Gravações telefônicas. Tels.3292-7291/3313-
0870/9739-9990.
ISABELA LOIRAÇA Deslumbrante realmente
lindíssima 19aninhos. Corpinho escultural,
maravilhosa, carinhosa, discreta, habilidosa c/
massagem. Relaxantex (sic) prive/ hotéis
R$80,00 Tel:3183-5512/22571718
Copacabana
1
-
Loiraça, deslumbrante, lindíssima,
escultural, maravilhosa, carinhosa,
discreta, habilidosa, relaxantex (sic):
adjetivos axiológicos; 2- (realmente)
lindíssima: adjetivo qualificador de
autenticação; 3- 19: adjetivo não-
axiológico
88
Christina direciona-se a um público específico: pessoas ávidas por descobrir
detalhes ou confirmar uma suposta infidelidade conjugal, dela obtendo provas.
Também o anúncio de Isabela não foge ao seu propósito. Os elementos nele
constantes são relevantes conforme a finalidade da comunicação. Ela apresenta, no
anúncio, atributos (para não dizer requisitos) pertinentes (para não dizer
imprescindíveis) a garotas de programa, oferece um contato telefônico, informa o
custo do serviço e a localidade onde atende. Entre os dois, pode-se observar, ainda,
a predominância de substantivos no anúncio da investigadora (já que lista os seus
serviços) e de adjetivos no da garota de programa (já que qualifica seus dotes e
serviços).
Portanto, não seria pertinente Isabela, que pretende anunciar suas qualidades
e seus serviços sexuais, dizer, por exemplo, “localizamos endereços, telefones...”,
pois fugiria ao propósito da comunicação.
Ainda tratando do problema da relevância, pode haver casos em que, à
primeira vista, poderiam ser considerados impertinentes. Mas não é o que ocorre em
alguns. Veja-se:
O anúncio de Flávia não apresenta a mesma estrutura
85
da maioria. Ela não
se descreve, nem se anuncia explicitamente. Põe em destaque as “fantasias”, que é
o produto textualmente oferecido. Flávia nem mesmo se diz, como as outras,
“carinhosa”; ao contrário, ela é “bastante exigente”.
Para Grice
86
:
“Pode ocorrer, também, que o locutor infrinja intencionalmente uma
das máximas, cabendo, então, ao interlocutor fazer um cálculo para descobrir
o motivo da desobediência: tem-se nesses casos, uma implicatura
conversacional.”
85
Cf. item 3.2.
86
Grice (1975, apud KOCH, 2001:27)
FLÁVIA
FANTASIAS
Secretas 8833
-
2790.
Atendo cavalheiros experientes ou não. Sou
paciente e atenciosa, mas ao mesmo tempo
bastante exigente (Copacabana).
1
-
Secretas, experientes, paciente,
atenciosa e exigente: adjetivos axiológicos;
2- (bastante) exigente: adjetivo qualificador
de intensidade
89
O sentido que do referido anúncio depreendemos (haja vista a violação intencional
ocorrida) aponta para a possibilidade de Flávia ser uma “dominadora”
87
, uma vez
que ela se diz “paciente” (o que seria sua obrigação, já que deve atender da melhor
maneira possível o cliente que “não estaria” ali para ser maltratado). Também diz ser
“bastante exigente”. Ora, no contrato de comunicação vigente essas informações
não resultariam em um efeito favorável à Flávia. Isto nos revela que, ao contrário do
que se poderia pensar, tais transgressões causam um bom efeito no anúncio, dando
a ele o sentido depreendido, pois esse é o comportamento discursivo que seus
clientes específicos, a saber, “homens escravos”, esperam dela.
A competência situacional envolve um saber sobre a identidade dos
protagonistas do intercâmbio. Charaudeau (2001:13) explica que “a identidade do
sujeito falante determina e justifica seu ‘direito à palavra’”. Ter consciência, então, de
quem fala a quem é fundamental, ou seja, Flávia (dominadora) fala a um homem
submisso, nesse caso, “escravo”.
Faz-se necessário, ainda, que o anunciante fale a partir do lugar de garota de
programa a um público supostamente interessado em seus serviços profissionais,
público que busca, além do prazer, segurança e discrição. Conhecer o público-alvo
é, dessa forma, fundamental. Observem-se, também, estes dois exemplos:
a)
b)
87
A dominadora é a mulher que submete o homem, fazendo dele seu escravo sexual. A ela, ele deve
obediência irrestrita.
IZABELA SENSUALIDADE na medida
certa, 19ª (sic) gosta de transformar o
visual! Maravilhosa, você merece ficar
feliz! Tels.: 2255-1709
ANDRESSA TIJUCA, linda mulher, 33 anos,
cheirosa, carinhosa, corpo escultural, quadril
irresistível. Atendimento indecepcionável!
Realizando fantasias, s/decepções.
Discretíssima. 2288-4752/ 8826-3704
www.hotside.com.br/andressa.htm
1
-
Certa: adjetivo qualificador de
modalização epistêmica (certeza ou
asseveração); 2- 19: adjetivo não-axiológico;
3- maravilhosa, feliz: adjetivo axiológico
1
-
Linda, cheirosa, ca
rinhosa,
escultural, irresistível,
indecepcionável, s/decepções (loc.),
discretíssima: adjetivos axiológicos;
90
Como já afirmado anteriormente, o outro (o leitor), neste caso, é um cliente
em potencial, aquele que poderá contratar os seus serviços. Sem ele, além de não
haver comunicação, não haverá qualquer tipo de serviço. Por isso, deve reconhecer
nela a “garota” que vai entendê-lo e satisfazer suas fantasias sem lhe oferecer
riscos.
Ser reconhecida por este como parceira do ato de linguagem, requer que a
“garota” reflita sobre quais meios lingüísticos utilizar, no como dizer. Assim, é
importante saber quais “papéis linguageiros” deve assumir (...“você merece ficar
feliz”, “discretíssima”...), ou seja, estabelecer-se na comunicação como quem quer
anunciar e não como quem deseja adquirir um produto ou serviço. E mais, anunciar
um produto que irá satisfazer as necessidades do TUi, o que motiva o enunciador,
por exemplo, a implicar o seu interlocutor, atribuindo a este o adjetivo axiológico
“feliz”.
Este comportamento lingüístico evidenciará sua identidade social de garota
de programa, que lhe permite abordar o leitor por meio do anúncio de serviços
sexuais, o que lhe autoriza dizer, por exemplo, “realizo suas fantasias”. Porém a uma
secretária que estivesse anunciando seus serviços tal enunciado não seria
permitido.
Charaudeau (2001:14) postula, ainda, mais uma aptidão que deve ter o
sujeito nessa competência: trata-se de saber organizar o discurso de acordo com as
circunstâncias materiais em que ocorre a troca. Tais situações podem ser
interlocutivas (falante/escritor passa a ouvinte/leitor e vice-versa, havendo troca de
turno da palavra) ou monolocutivas (apenas um dos participantes conduz a
comunicação, não tomando o outro o turno da palavra).
Assim, um anúncio de classificados constitui uma situação monolocutiva
escrita. Nesse caso, a “garota” (EUe) não se encontra face a face com o leitor (TUd)
que, por não estar presente fisicamente, apenas lê o seu anúncio, não podendo
interatuar de imediato (seja de modo oral, seja de modo escrito). Por isso, resta-lhe
ser solicitado conforme a posição a ele atribuída.
Além disso, devido ao leitor encontrar-se em ambiente físico (de espaço e de
tempo) diferente do qual se encontra o enunciador, este não presenciará as reações
91
daquele ao seu anúncio. Daí, ressalta Charaudeau
88
, “a justificação do direito de
falar já não tem razão de ser, e a luta discursiva, sempre possível, não poderá se dar
senão por simulação (antecipar ou imaginar as reações-objeções do outro)”. Por
exemplo:
Silvia ressalta o que lhe convém, não podendo ser interpelada sobre aquilo
que decidiu não dizer (talvez por não poder qualificar), como: altura, peso e cor dos
olhos. Para ela, mais importante do que as características que deixou de detalhar
(exemplificadas há pouco) seriam a cor dos seus cabelos (“louríssima”), a idade (“36
aninhos”
89
), o quadril (“110 cms, quentíssimo, com marquinha audaciosa”). Esses
são os atributos que ela supõe causarem impacto no seu cliente efetivo, o TUi.
Então, uma vez que não há, ao menos imediatamente, “luta discursiva”, Silvia
impõe (ao leitor) sua organização temática com base em suas hipóteses sobre o que
interessaria ao outro, selecionando sobre si informações valorativas.
B - Competência discursiva
A competência discursiva requer, de cada sujeito, comunicante ou
interpretante, o domínio das estratégias discursivas postas em cena no ato de
comunicação: o EUc deve estar apto a manipular e o TUi a reconhecer tais
88
Idem.
89
As anunciantes que se dizem “coroas” revelam idades acima de 36 anos: 40, 44...Algumas,
inclusive nem a divulgam. Qual o critério para julgar a mulher como “coroa”? A juventude (idade
cronológica)? A jovialidade (humor, disposição) ? Silvia pretenderia enquadrar-se em um grupo de
faixa etária superior, anunciando a idade de 36 anos, já que não faria mais parte da faixa de 20/30
anos? Ela conseguiria atribuir ao adjetivo “coroa” o efeito da juventude, dizendo ter 36 “aninhos” e,
dentro desse grupo, destacar-se?
COROA SILVIA
! Louríssima
! (Espetáculo d/ mulher
!)
36 aninhos, (U.S.A grandões!) (110cms quadril)
completamente quentíssimo! C/marquinha audaciosa!
Proporcionando profundas emoções! (Apaixone-se!
S/frescuras! (www.sensualidade.com/ariolla) Tel:
(0xx21) 2530-2630.
1
-
Louríssima, coroa, espetáculo,
quentíssimo, com marquinha
audaciosa (loc.), sem frescuras (loc.),
profundas: adjetivos axiológicos; 2-
110, grandões: adjetivos não-
axiológicos
92
estratégias depreendidas do nível situacional. Charaudeau (2001:15) as ordena em
três tipos: enunciativo, enunciatório e semântico.
O primeiro tipo (as estratégias de ordem enunciativas) refere-se, como explica
Charaudeau (1992:647), à aptidão do sujeito em ordenar as categorias de língua de
forma que dêem conta da posição que o sujeito falante assume em relação ao seu
interlocutor, a si mesmo e ao seu próprio enunciado. Temos, assim, três tipos de
atos enunciativos: alocutivo, elocutivo e delocutivo.
O ato alocutivo revela a maneira como o locutor age sobre o interlocutor. O
enunciador convida o destinatário a realizar fantasias secretas, interpela, sugere um
comportamento, orienta seu pensamento e as suas ações etc., ou seja, o interlocutor
é solicitado a responder, a reagir. Observem-se alguns exemplos.
a) O enunciador pode dirigir-se explicitamente ao destinatário e aconselhá-lo,
utilizando um imperativo “convidativo” (ordem modalizada, atenuada):
b) O enunciador pode implicar o destinatário fazendo-lhe um convite e/ou
uma pergunta:
MONIQUE MULATA Tentação, mulherão
arrazando (sic) quarteirão, 25ª (sic), 1,72m
Alt, man.42, toda maravilhosa s/frescuras,
libere sua imaginação
KAREN/VIVIANE (Flamengo Lgº do Machado)
deslumbrantes. Realmente lindas p/clientes
exigentes. Ambiente discreto higiênico.
Atendimento impecável confira! S/ compromisso
atendemos sábado. Tel.: 2265-6419/ 3235-3783
1
-
Mulata, 25, 1,72, 4
2: adjetivos não
-
axiológicos;
2- Tentação, mulherão, maravilhosa, s/
frescuras (loc.): adjetivos axiológicos; 3- (toda)
maravilhosa: adjetivo qualificador de
intensidade
1
-
Deslumbrantes, lindas, exigentes,
discreto, higiênico, impecável, s/
compromisso (loc.): adjetivos axiológicos; 2-
(realmente) lindas: adjetivo qualificador de
autenticação
93
c) O enunciador pode fazer julgamentos sobre o ânimo do destinatário:
Assim, o sujeito comunicante representa alguém que vai satisfazer a busca do
sujeito interpretante, idealmente construído como aquele que necessita de carinho,
de prazer e de dar vazão aos seus sonhos, às suas fantasias, pois é merecedor da
felicidade. Este deverá ser o agente nesse processo, do qual será o beneficiário
(tendo a garota de programa como beneficiadora, aquela que lhe dará a felicidade).
Nos procedimentos elocutivos, o enunciador deixa perceber o seu ponto de
vista sobre o que diz a respeito do referente, neste caso, o objeto de troca. O
interlocutor não é solicitado a participar da locução: ele é mantido em uma posição
de observador da apreciação do enunciador sobre a garota-produto, como se pode
verificar em:
Neste anúncio, não há marcas de 2ª pessoa (os pronomes sua, você; verbos
no imperativo: confira (você) etc.) que indiquem a atuação do EU sobre o TU. O que
ALÉXIA (LEBLON) simplesmente especial,
cabelos pretos compridos, 1.70alt.,
morena clara, simpática, inesquecível.
Venha viver um sonho. Quer namorar
comigo? (sic) 9397-4480
IZABELA SENSUALID
ADE na medida
certa, 19ª (sic) gosta de transformar o
visual! Maravilhosa, você merece ficar
feliz! Tels.: 2255-0363/ 2255-1709
ANA LUIZA (Barra) 8189
-
7920
Lindíssima
gata loira 20ª (sic), 1.65alt, man.38, cabelos
lisos cintura. Rosto perfeito, corpo sarado.
Novidade! Nunca anunciada. R$ 130,00
(2h).
1
-
Especial, simpática, inesquecível:
adjetivos axiológicos; 2- pretos, compridos,
1,70, morena clara: adjetivos não axiológicos
Texto já analisado na página 89.
1
-
Lindíssima, perfeito, sarado: adjetivos
axiológicos; 2- loira, 20, 1,65, 38, lisos:
adjetivos não-axiológicos; 3- (nunca)
anunciada: adjetivo qualificador graduável
94
se destaca são as impressões do enunciador diante do ELE, ao mesmo tempo em
que emite sua opinião e avaliação, seu parecer, seu saber etc., expressos,
principalmente, por adjetivos de ordem axiológica.
Ainda, a atitude eufórica do EUe diante do que fala perpassa um conteúdo
reflexivo que contribui para a própria idealização de si, uma vez que, em sentido
amplo, é o próprio produto. Tal estratégia objetivaria, portanto, despertar no TUi o
desejo do encontro, além de justificar a idéia da necessidade que o TUi teria da
garota-produto (ELEx), já que esta lhe oferece tantas possibilidades de fruição. Veja-
se:
“Um show de beleza” e “Um mulherão nota 10” são notas subjetivas do EUe
que transmitem ao TUi o aspecto de admiração em que se encontra na enunciação.
Já o ato delocutivo ocorre quando há um afastamento do EU em relação ao
que ele diz. Da mesma forma, não há marcas lingüísticas que revelem a solicitação
ao outro para que ele também realize a locução. Tem-se uma enunciação
descomprometida com o posicionamento pessoal do locutor, de certa forma objetiva.
Este tipo de comportamento pode ser observado nos anúncios de agências
de garotas de programa, por exemplo: “Seven Mulheres para todos os gostos”
90
e
“Bia massagem ‘Um toque de classe’”.
As estratégias de ordem enunciatória retomam o que Charaudeau (1992:631)
denominou “modos de organização do discurso”: (a) o modo descritivo, que trata de
um saber “atribuir características a um determinado referente, a fim de localizá-lo,
identificá-lo ou qualificá-lo, segundo os objetivos do texto”, como diz Carneiro
(2003:50), de maneira objetiva e/ou subjetiva; (b) o modo narrativo, que consiste em
um saber relatar os acontecimentos do mundo; e (c) o modo argumentativo, que
90
Recorde-se do filme Seven - os sete pecados capitais, título que remete à luxúria, o sétimo pecado,
exaltado e oferecido pela agência, corporificado na garota de programa.
ADRIANE
-
Um show de beleza
, morena
bronzeada, alto nível, idade 28ª (sic), altura 1.65.
Um mulherão nota 10.
www.hotside.com.br/adriane.htm Tel: 8839-7159
(R$200)
Texto já analisado na página 81.
95
consiste em um saber organizar as relações de causalidade que explicam os
acontecimentos, assim como as provas do que é verdadeiro e do que é falso ou
verossímil, como explica Charaudeau (2001:15) e que, para Carneiro (2003:106),
resume-se em defender uma idéia, apoiando-se em argumentos, a fim de convencer
um público-alvo.
Por fim, no âmbito da competência discursiva, o sujeito falante deve dominar,
também, estratégias de ordem semântica, que se referem ao que cognitivistas, como
Sperber (1989, apud Charaudeau, 2001), chamam de “entorno cognitivo
mutuamente partilhado”. De fato, no ato de linguagem, para que possamos nos
compreender uns aos outros, faz-se necessário o domínio de certos saberes
comuns, que são:
a) saberes de conhecimento, que correspondem às percepções e às definições
mais ou menos objetivas do mundo. São conhecimentos adquiridos pela
experiência cotidiana, aprendidos nos livros e na escola, armazenados na memória
em blocos, chamados de “modelos cognitivos” (frames, esquemas, planos,
etc)(KOCH, 2003 b:72).
b) saberes de crença, que correspondem aos sistemas de valores, mais ou menos
estabelecidos, que circulam em um dado grupo social, conhecimentos que
alimentam os julgamentos dos membros desse grupo social e que, ao mesmo
tempo, conferem a este sua identidade. Nesse sentido, a compreensão do anúncio
a seguir dependeria de inferências associadas a saberes de ordem cultural.
Assim, para o sujeito interpretante atribuir coerência ao anúncio deverá mobilizar
um conhecimento relativo a ditos populares
91
. Se o interpretante não o detiver,
91
Como no caso de “Raimunda”, por exemplo.
Raimunda T.2265
-
9
674
Adivinhe por que? (sic) Rebolado enlouquecedor!
Folgosa (sic) cheia de fantasias! (Aparelhos)
Amanda, estilo boazuda, quentíssima! Faço spring
love.
(R$20,00)
1
-
Enlouquecedor, folgosa (sic),
boazuda, quentíssima, cheia (de
fantasias): adjetivos axiológicos
96
dificilmente compreenderá o caráter sugestivo da pergunta, condizente ao contrato
em que se insere.
C - Competência semiolingüística
Segundo esta competência, todo sujeito que se comunica e interpreta deve
saber manipular-reconhecer a forma dos signos, suas regras de combinação e seu
sentido, tendo consciência de que são usados para expressar uma intenção de
comunicação.
Se o texto pode ser entendido como resultante de uma atividade sócio-
comunicativa realizada por um sujeito e tendo uma forma específica, é no nível
semiolingüístico, como precisa Charaudeau (2001:17), que ele se concretiza. Para
tanto, é necessário que o sujeito possua aptidão para adequar a formulação do
mesmo à determinada intenção, em função dos dados da situação comunicativa e
das exigências da organização do discurso. Essa formulação compreende três
níveis e cada um requer um saber-fazer:
a) um saber-fazer relativo à composição do texto, àquilo que a ele é externo,
mas que o ancora em uma situação comunicativa determinada, auxiliando na sua
leitura, por exemplo, as margens, a diagramação das páginas, a organização dos
capítulos, a localização no jornal (em um caderno ou página) etc. Portanto, a
disposição de um classificado na seção “serviços pessoais” ou “diversos”, dentro
deste mesmo caderno, contribui para atribuir sentidos a tal anúncio.
b) um saber-fazer que se refere à construção gramatical, ou seja, ao uso
adequado dos diferentes tipos de construção (ativa, passiva, impessoal), das
classes gramaticais (no caso dos CS, em especial, dos adjetivos) dos articuladores
sintáticos, do sistema dos pronomes, enfim, de tudo aquilo relativo ao aparelho
formal da enunciação. Com efeito, o emprego dos elementos coesivos relaciona-se,
segundo Charolles (1988:48-49), diretamente à coerência textual, considerando o
autor que um fenômeno reclama o outro. Esta opinião é compartilhada por Koch
(2003b:49) ao dizer que “os elementos da superfície lingüística é que servem de
pistas, de ponto de partida para o estabelecimento da coerência” e também por
Marcuschi (1983, apud Koch, 2003b:54) para quem esses mecanismos formais
97
tornam possível estabelecer relações de sentido entre os elementos lingüísticos do
texto.
c) a formulação do texto exige, ainda, de todo sujeito, que dê conta de um
saber-fazer relacionado ao uso adequado das palavras e do léxico, segundo o valor
social que transmitem. Para Charaudeau (2001:17), haveria um “mercado social das
palavras”, em que estas identificariam aqueles que as usam como pertencentes a
certo grupo social (familiar, profissional, etc.). Por exemplo, certas expressões como
“a propósito de”, “considerando que” denotariam estilo acadêmico, administrativo.
Também aquelas utilizadas nos CS, tais como: “sem frescuras”, privé
92
,
“atendimento com aparelhos” de muito que são usadas nesse contexto específico,
acabam por remeterem, “forçosamente”, a ele. Veja-se o anúncio de Laís:
Esta tripla competência da linguagem é o resultado de um movimento de ida
e volta permanente entre a aptidão para: a) reconhecer as condições sociais de
comunicação; b) manejar as estratégias do discurso e c) reconhecer/manejar os
sistemas semiolingüísticos, nos quais os enunciados se encontram interligados.
3.3.3. Legitimidade e credibilidade
O ato de linguagem se concretiza nos níveis discursivo e semiolingüístico,
que se situam no interior do processo comunicativo, o espaço interno à linguagem.
A esse espaço correspondem as estratégias a serem adotadas pelo (agora)
enunciador. Este precisa ter em mente que o ato comunicativo, antes de qualquer
92
Do idioma francês. Corresponde a “particular”, a “privado” (local privativo).
LAÍS JACAREPAGUA
Mulata cheirosa, 26 anos, 102 quadril empinadinho,
coxas grossas, estilo mulherão!! S/frescuras,
comprove! Atendimento c/ aparelhos. Prive R$30,00.
(3H (sic) =100,00 hotéis). 2427-0780/9691-9636.
1
-
Cheirosa, empinadinho, mulherão, sem
frescuras (loc.): adjetivos axiológicos; 2-
mulata, 26, 102, grossas: adjetivos não-
axiológicos; 3- com aparelhos (loc.):
adjetivo classificador
98
coisa, é uma conquista e pressupõe, para que haja comunicação, que os partícipes
reconheçam mutuamente o seu direito à palavra.
Aquele que fala deve, também, ser acreditado, a fim de conseguir do outro a
sua atenção, já que “é a relação com o outro que fundamenta esse direito”
(CHARAUDEAU, 1996:25). Assim, é necessária a satisfação das condições de
legitimidade e de credibilidade, que fundamentam o direito à fala. Por esta razão,
temos, em alguns anúncios, expressões do tipo “anúncio verdadeiro”, “realmente
muito bonita” e “realmente sem frescuras”, que contêm adjetivos modalizadores de
autenticação, ou seja, no mesmo enunciado, reforça-se o que foi dito, tentando
atribuir a ele o valor de verdade. Outros elementos lingüísticos, como “comprove”,
“indecepcionável”, também têm por objetivo induzir o outro a acreditar no que é
afirmado. Esse crédito é o “passaporte” para o estabelecimento da interlocução.
A - A legitimidade
Importa ressaltar que a legitimidade é adquirida pelo sujeito e reconhecida por
uma entidade exterior a ele. Ela depende da atuação do sujeito nos domínios do
SABER e do PODER, que serão discutidos a seguir.
O domínio do SABER trata da atuação do indivíduo no espaço social, onde
circulam os discursos de conhecimentos e opiniões sobre o mundo, discursos
partilhados. É necessário que o comunicante saiba demonstrar sua capacidade de
abordar tais discursos sem simplesmente reproduzir um já dito e, ainda, organizá-los
segundo suas necessidades e intenções comunicacionais, enquadrando-os em
determinados esquemas textuais, o que dará ao interlocutor pistas importantes para
a interpretação do texto. Ele deve, também, dar importância à questão da
informatividade, que não deve ser excessiva, nem redundante. Isto, nos referidos
anúncios, traduz-se, por exemplo, em não utilizar abreviaturas em demasia, de modo
que torne difícil a compreensão do que se quer dizer, como neste anúncio:
GISELE GAUCHINHA
(s.r)
Loura 18
a
(sic) cab.lisos, pele pêssego, rosto
invejável, corpo perfeito p/trânsito
(mignhonzinha) (sic) s/frescura nunca
anunciada. Barra 3185-5059.
1
-
(s.r.), pêssego, in
vejável, perfeito, s/
frescura (loc.), mignonzinha: adjetivos
axiológicos; 2- loura, 18, lisos: adjetivos não-
axiológicos; 3- gauchinha: adjetivo
informativo; 4- p/trânsito: adjetivo afetivo ou
restritivo
99
Nele, os elementos assinalados, “(s.r)” e “p/trânsito”, geram falta de clareza, pois se
o primeiro pode significar “sem restrições”, pode, também, fazer referência à palavra
“senhor”; já o segundo poderia remeter à atuação da garota nas ruas, no “trânsito”,
porque a abreviatura “p/” é comumente empregada para substituir a preposição
“para”, o que geraria “para trânsito”, mas, no caso, equivale a um verbo (pára). No
entanto, se o interpretante recuperar a expressão “de parar trânsito” para se referir a
uma mulher muito bonita, poderá fazer a devida associação e posterior atribuição de
sentido ao enunciado “É tão bonita que é de parar trânsito”.
Em função do reconhecimento do SABER, afirma o autor (op.cit.), o
enunciador será avaliado, em um primeiro patamar, na interlocução.
Já o domínio do PODER é aquele em que pode ser conferida autoridade ao
sujeito em decorrência, também, das condições socioinstitucionais. A posição social
do falante (e na qual ele atua no momento da fala) remete a características
discursivas típicas, já introjetadas pelos membros da sociedade. Assim, as pessoas
assumem diferentes papéis sociais e linguageiros no decorrer do dia: um advogado,
por exemplo, deve falar como tal em uma audiência; em casa, com sua mulher, seu
papel representado não é de um profissional, mas de “esposo, marido”; com os
filhos, representa o papel de pai. Portanto, em situação familiar, deverá utilizar-se de
outras estratégias comunicativas adequadas a esses papéis.
A um professor de Língua portuguesa é conferida a autoridade de fazer uma
análise metalingüística de um fato lingüístico; da mesma forma dá-se a um médico o
poder de receitar remédios contra gripe a um paciente; a um advogado o poder de
representar um cliente e a uma garota de programa a autoridade de dizer “sensual,
carinhosa e sem decepções” ou “realizo suas fantasias”. Charaudeau (1996:27)
chama este reconhecimento de poder de legitimidade socioinstitucional.
O reconhecimento do PODER
93
, no que se refere às profissionais do sexo
94
,
vai além do lingüístico e do enciclopédico e alcança o estético (que, devido à
atividade, torna-se o pressuposto e o mais importante). O sujeito do fazer terá de
possuir atributos físicos que lhe confiram legitimidade para atuar como garota de
programa, ou seja, um corpo considerado atraente, “impecável”, “lindíssimo”
93
Neste caso, um reconhecimento não exatamente socioinstitucional, mas social.
94
Termo utilizado pelo Ministério do Trabalho e Emprego na CBO Classificação Brasileira de
Ocupações. Veja-se o anexo G.
100
(conforme podemos observar em inúmeros anúncios, as descrições das medidas da
anunciada, “man. 40”, “man.38”, “106cm. quadril” , entre outras, medidas
socialmente privilegiadas), ou a candidata ao “serviço” não terá a qualificação
exigida. Além disso, segundo o senso comum, ela deverá ser experimentada o
suficiente para possuir habilidades práticas de atendimento.
B - A credibilidade
Tendo o sujeito reconhecida a sua legitimidade de SABER e de PODER, falta
a ele o reconhecimento de um outro saber, para que, de fato, tenha direito à fala: o
do SABER FAZER. É em função desse conhecimento que ele será considerado
qualificado ou desqualificado para ser ouvido, sendo este, por conseguinte, uma
ratificação ou uma retificação da legitimidade ao sujeito conferida. Essa conquista do
reconhecimento desse saber chama-se credibilidade.
Para adquiri-la, o sujeito deve, então, planejar seu projeto de fala com
competência, ou seja, em conformidade com as informações situacionais e
comunicacionais de que dispõe. Isto corresponde às atividades discursivas de:
a- informar: transmitir ao outro uma informação nova (FAZER SABER), o que
corresponde ao enunciador dos CS descrever as suas características que
mais interessem ao público-efetivo;
b- persuadir: fazer com que o outro participe do seu universo de discurso,
atuando no nível do racional (FAZER CRER), organizando argumentos já
referidos, como “realmente muito bonita”,”sem decepções”;
c- seduzir: transmitir ao outro um estado emocional eufórico, atuando no
nível do emocional (FAZER PRAZER), sensibilizando-o em suas
carências, em seus desejos e expectativas, por exemplo, “apaixone-se”,
101
“lindíssima”, “atendimento delirante” e outros que visam aumentar a ânsia
do TUi;
d- incitar: fazer com que o outro realize uma ação, mesmo sem ser obrigado
a isso (FAZER FAZER). Podemos exemplificar com alguns comandos:
“confira!”, “realizo suas fantasias”, “agora tente me esquecer” e outros.
No gênero sob crivo, duas dessas atividades sobressaem-se às demais, a de
informar e a de seduzir. A primeira (a de informar) vai valer-se da adjetivação
(sobretudo a axiológica) a fim de reconhecer o estatudo do PODER do sujeito (que
inclui o reconhecimento social, velado ou não, dos atributos necessários à atividade).
Assim, o enunciador é descrito como “coxudíssima, escultural, bronzeada, seios
USA”, entre outros; a segunda (a de seduzir) consistirá na utilização de argumentos
que objetivam atuar no nível emocional do TUi. Tais argumentos, utilizados pelo eu-
enunciador, fazem referência ao atendimento sexual executado pelo eu-
comunicante. Daí termos descrições como “quentíssima”, “rebolando
inesgotavelmente”, “beijos atrevidos” etc.
Enfim, será o lugar de credibilidade (espaço interno) que construirá o lugar de
legitimidade (espaço externo). A eficácia do enunciador, por conseguinte, tanto será
maior quanto mais conseguir transmitir no anúncio um ideal de legitimidade que
corresponda à procura do TUi.
3.4. O ETOS DO ENUNCIADOR
A profissional do sexo, como qualquer profissional, é uma pessoa comum nas
horas em que não está trabalhando, podendo representar papéis sociais (e
discursivos) diferentes da garota de programa, ou seja, de consumidora (no
supermercado), de cliente (no salão de cabeleireiros), de mãe (se tiver um filho), de
mulher (se tiver um companheiro, namorado, marido, entre outras categorias) etc.
Quando sujeito do dizer, nos CS, no entanto, ela corresponde a um papel
discursivo elaborado pelo EUc (o sujeito do fazer), disposta, na cena da enunciação,
somente como garota de programa. Conforme dissemos anteriormente, essa noção
102
corresponde ao que Charaudeau (1996:5) denomina EUe. Ela se refere ao papel
discursivo do sujeito que toma a palavra, posição que pode ser recuperada pelas
marcas da enunciação. Opõe-se, assim, o enunciador à pessoa (real) do sujeito da
comunicação.
Qualquer ato de tomar a palavra, segundo Amossy (2005:9), leva à
construção de uma imagem de si. Não é preciso, para isto, o enunciador descrever-
se ou elevar suas qualidades, como pode ocorrer nos CS. Nestes, ele costuma fazer
auto-elogios, tornando-se o próprio conteúdo do discurso.
Assim, não estamos tratando das coisas que o orador poderia dizer sobre si,
seu corpo e suas habilidades sexuais, visto que estas informações diriam respeito ao
sujeito comunicante (sujeito do fazer), e não ao sujeito da enunciação (sujeito do
dizer). Referimo-nos, por exemplo, à sua maneira de estruturar as frases, à sua
seleção vocabular, a seus conhecimentos enciclopédicos demonstrados no discurso
e ao seu estilo, que podem fornecer informações sobre a sua pessoa, podem “falar”
por ele.
Por isso, importa verificar, também, além do estatuto (do papel) discursivo, a
instância subjetiva que se manifesta como ”voz” e como “corpo enunciante”, como
sublinha Maingueneau (apud Amossy, 2005:70). Ela pode ser recuperada a partir de
indícios textuais variados que formam o etos, que é “a imagem de si que o locutor
constrói em seu discurso para exercer uma influência sobre seu alocutário”.
(CHARAUDEAU & MANGUENEAU, 2004)
Os antigos já se dedicavam ao estudo do etos. Eggs (apud Amossy, 2005:32),
retomando Aristóteles, lembra que os oradores inspiram confiança “(a) se seus
argumentos e conselhos são sábios e razoáveis, (b) se argumentam honesta e
sinceramente, e (c) se são solidários e amáveis com seus ouvintes”. Para tanto, o
sujeito falante precisa tomar conhecimento das idéias e valores pertencentes ao
imaginário do destinatário. Somente assim poderá eleger a maneira mais apropriada
de se expressar, condizente com o seu projeto de fala. Dessa forma, o etos
corresponderá à imagem necessária ao locutor para conquistar credibilidade junto ao
seu interlocutor.
Perelman & Tyteca (1999) resumem etos “à impressão que o orador, por suas
palavras, dá de si mesmo”. Maingueneau (2002), por sua vez, reconhece-o como o
fenômeno em que, “por meio da enunciação, revela-se a personalidade do
enunciador” e Barthes (1966, apud Maingueneau, 2002) destaca que
103
“São os traços de caráter que o orador deve mostrar ao auditório
(pouco importa sua sinceridade) para causar boa impressão: são os ares que
assume ao se apresentar [...] O orador enuncia uma informação, e ao mesmo
tempo diz: eu sou isto, eu não sou aquilo”.
95
Assim, segundo Maingueneau (2005, apud Amossy), nossa opção teórica, a
eficácia do etos deve-se ao fato de que, sem estar explicitado no enunciado, ele
envolve de alguma forma a enunciação. Trata-se das escolhas das palavras, dos
argumentos, do ritmo e da entonação de seu discurso.
De um modo geral, já que as “profissionais” oferecem serviços sexuais, a
descrição do seu corpo (da forma que é feita) e a referência ao atendimento são, em
si, um comportamento discursivo que transmite um etos necessário de liberalidade e
de objetividade diante do sexo, identidade compatível ao mundo construído no seu
enunciado. No anúncio a seguir,
a maneira de se descrever utilizando os adjetivos axiológicos assanhadíssima,
durinhos, enlouquecedor, suculentíssimos e “finalizador” valida a finalidade do
gênero textual negociar sexo. Além disso, apela-se aos sentimentos do seu
público-alvo, visando atingi-lo em seus desejos e completar a sua busca (como que
a finalizá-la), pois é oferecida como “isca” a descrição de “um serviço de qualidade”,
bem como a oração reduzida de gerúndio “Rebolando inesgotavelmente!”.
Observe-se, ainda, neste outro, a construção do etos de liberalidade sexual a
partir dos adjetivos (extremamente) “safada” e (quadril) “guloso”.
95
Grifos do autor.
CLAUDINHA JACAREPAGUÁ
Morena assanhadíssima! Seios durinhos, cinturinha
pilão, quadrilzão enlouquecedor! Escultural!
Fernanda morenaça! Lábios suculentíssimos
(finalizador)! Rebolando inesgotavelmente! Privê/
R$35,00. 9967-6824/ 9842-5314.
1
-
Assanhadíssima, durinhos, pilão,
enlouquecedor, ecultural, morenaça,
suculentíssimos, finalizador: adjetivos
axiológicos; 2- morena: adjetivo não-
axiológico
104
Poder-se-ia afirmar a existência de um tom que conduziria a um etos de garota de
programa. Esse tom é o que daria, como explica Maingueneau (2002) “autoridade ao
que é dito” , conferindo ao enunciador um status de “fiador” desse dito. Segundo ele,
todo discurso, mesmo os escritos, possui uma vocalidade específica que o vincula a
uma fonte enunciativa.
Entretanto, o etos (maior) da sensualidade e sexo, que pode ser adquirido
como produto, é reforçado por vários outros que se desdobram a partir dele. Notam-
se, a saber, etos de ninfeta, da discrição, do ineditismo, do envolvimento emocional
e de celebridade. Vejam-se, respectivamente, os classificados em questão:
1) Etos de ninfeta
a)
O próprio nome do enunciador remete a uma personagem infantil do cinema
(filme Lolita) ao qual se soma o sintagma “18 aninhos”, donde se destaca o sufixo
inho (constante no vocabulário infantil).
b)
LOLITA
18 ANINHOS
(Novidade) Belez
a jamais
anunciada estilo namoradinha, completamente
inesquecível, carinhosa, discretíssima
apartamento aconchegante. Atendimento
relaxante. Tel. (0xx21) 3903-0916/ 9445-9099
24hs Copacabana
IOKO!!!
Princesinha oriental, 19, cabelos longos, toda
delicada, combinando beleza/ sensualidade!!!
Agrada com seu jeitinho carinhoso!!!
Verdadeiramente linda!!! 2255-4983/ 22554532
1
-
Lindíssima, safada, gostosa, mulherão,
carinhoso: adjetivos axiológicos; 2- 20,
mulata, 1.70, grandões, 103: adjetivos não-
axiológicos; 3- (extremamente) safada:
adjetivo qualificador de intensidade
1
-
Namoradinha, inesquecível,
carinhosa, discretíssima, aconchegante,
relaxante: adjetivos axiológicos; 2- 18:
adjetivo não-axiológico; 3- (jamais)
anunciada: adjetivo qualificador
graduável
1
-
D
elicada, carinhoso, linda: adjetivos
axiológicos; 2- oriental: adjetivo
informativo; 3- 19, longos: adjetivos
não-axiológicos; 4- (verdadeiramente)
linda: adjetivo qualificador de
autenticação
GABRIELA LINDÍSSIMA!!!
“Extremamente safada”, 20 aninhos, mulata
gostosa!!! 1.70alt. (seios grandes) estilo mulherão
(103 quadril guloso)!!! Atendimento carinhoso
R$20,00. Copacabana 3820-9887.
105
Destaque-se que Ioko é uma “princesinha” (-inha), além de ser delicada e de
ter “jeitinho” carinhoso. O substantivo princesa remete a algo que está aquém da
maturidade, sentido acentuado pelo sufixo inha. Princesinha também é uma forma
carinhosa de se tratar uma criança linda (“Verdadeiramente linda!”).
2) Etos da discrição
Ser discreta, na atividade da prostituição, é qualidade fundamental para a
“garota”, pois, socialmente, o sexo pago não é bem-visto e, também, o homem (por
diversas razões) não se admite como cliente. Segundo Hite (1981), vários homens
disseram: “ter de pagar por sexo torna o homem um ‘perdedor’”. Esse aspecto
reflete-se no discurso do enunciador ao construir o etos da discrição. Veja-se:
a)
O fato de o enunciador afirmar-se como “discreta” não é o que nos conduz ao etos
apresentado. A própria utilização da maioria das palavras no seu grau normal, sem
exagerar no emprego dos sufixos -íssimo, -aça, confere ao texto certa simplicidade.
Outra pista textual é a descrição do serviço como “Massagem relaxante”, que
adquire um tom eufemístico (se cotejada com outras como “rebolado gostoso” ou
“quadril guloso”, por exemplo). Além disso, dizer que atende o cliente no escritório
(de dia, no horário do almoço), e não apenas em privè ou hotéis, faz inferir uma
aparência comum, discreta.
A discrição pode ser observada, ainda, em casos que a “garota” enuncia
como massagista:
b)
LAÍS N.IGUAÇU!!!
(3066-1511/ 9762-6965/ 3101-5280). Loiraça,
1.70 altura, marquinha biquíni, bonita carinhosa,
discreta, 25ª (sic). Massagem relaxante.
Indecepcionável!! Atendimento hotéis/
Escritórios.
MARIA LUIZA Massagista.
Sinta benefícios de técnicas altamente relaxantes.
Essas são apenas algumas de muitas qualidades.
Privacidade. (Também p/ 3ª idade) Z. Sul Tel.
2542
-
4297
1
-
Loiraça, bonita, carinhosa, discreta,
relaxante, indecepcionável: adjetivos
axiológicos; 2- 1.70, 25: adjetivos não-
axiológicos
1
-
(altamente) relaxantes: adjetivo
qualificador de intensidade
106
Não se pode negar que quem anuncia em b oferece o serviço de massagem.
Outro fato é que o EUc pode negar estar anunciando serviços sexuais. No entanto, é
justamente na conjugação desses dois fatos que se apega o enunciador do anúncio
para ser discreto.
A oferta de sexo só pode ser inferida a partir de “Essas são apenas algumas
de muitas qualidades”. Isto porque “muitas qualidades”, ao nosso ver, refere-se ao
enunciador, visto que, em relação ao serviço de massagem, “muitas qualidades”
poderia recuperar “higiene”, “conforto”, “qualificação” algo que, possivelmente,
atenderia, ainda, ao segmento “também para a 3ª idade”. Assim, a construção do
etos da discrição, nesse caso, é feita por meio de um anúncio sexual implícito,
textualmente mascarado, mas pragmaticamente claro, porque resultante de um
acordo social tácito.
3) Etos do ineditismo
Comumente, nos CS, notam-se expressões como “recém-chegada”, “jamais
anunciada”, “novidade” e adjetivos gentílicos (informativos, nos termos de Carneiro)
como “gaúcha”, “catarinense”
96
etc. O objetivo do seu emprego é indicar, por
exemplo, que a garota de programa a) está no “mercado” há pouco tempo; b) é
novata na profissão ou c) que sua imagem na localidade não está gasta. Tudo isso
se relaciona ao fator novidade, caro ao universo do sexo.
Note-se, porém, que ela não diz explicitamente ser “inédita”, “nova na área”,
ou para usar uma expressão coloquial, “nova no pedaço”. O que constrói
discursivamente o referido etos é a inclusão de tais expressões na sua fala, com o
objetivo de transmitir sobre as “garotas” a impressão de não pertencerem a esse
meio (o da prostituição), ou seja, de provirem de outro universo
97
, o que parece ser
atraente para o cliente. Assim, esses sentidos, depreendidos a partir do anúncio,
compõem o etos do ineditismo. Veja-se:
96
Considere-se que os jornais analisados circulam no Rio de Janeiro.
97
Tentando, assim, afastar de si a idéia de já possuírem supostas malícias e vícios da atividade.
107
a)
b)
4) Etos do envolvimento emocional
Este tipo de etos comporta certos enunciados (como “adoro beijar” e “beijos
ardentes”), que conferem à garota de programa uma aura de sinceridade a respeito
do “serviço” que presta como se estivesse igualmente envolvida pela emoção na
relação. “Adorar beijar” faz significar envolvimento, em oposição a uma atitude de
frieza e passividade sexual. Está implícita, também, a paixão que ela oferece (por 1
ou 3h) ao cliente, prometendo torná-lo único e desejado naquele período. Nos
exemplos seguintes, apresentamos duas dessas ocorrências:
a)
b)
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O!!!
Bárbara Morenaça. Andréia Loirinha sensual,
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1
-
Morenaça, sensual, gatinha, sarada:
adjetivos axiológicos; 2- loirinha, 38:
adjetivos não-axiológicos; 3- (jamais)
anunciadas: adjetivo qualificador
graduável
1
-
Iniciante, s/USA (loc.), lindíssimo,
completíssima, torneadas, s/frescuras
(loc.): adjetivos axiológicos; 2-
catarinense: adjetivo informativo; 3-
fininha: adjetivo não-axiológico
1
-
Ardentes, bonita, apaixonan
te,
escultural: adjetivos axiológicos; 2-
loirinha, fina, grossas, 19: adjetivos não-
axiológicos
1
-
Passista: adjetivo classificador; 2
-
quentíssima, escultural, especialista:
adjetivos axiológicos; 2- mulata, 30,
1.82, longos: adjetivos não-axiológicos
108
O beijo representa um tabu na prostituição, algo interditado. Diferente da
comunhão dos sexos, da cópula, ele não é apenas a necessidade, mas também o
sentimento (no caso, constituiria o supérfluo, o luxuoso), o que forneceria mais uma
situação envolvente no campo das emoções.
Por esse motivo, para não se envolver (não se apaixonar) pelo cliente (para
não ocasionar prejuízos de ordem financeira) a personagem Vivian, interpretada
pela atriz Julia Roberts, no filme Uma linda mulher, não beija, não oferece esse
“complemento” no programa.
Contrariando esse tipo de personagem, os enunciadores de a e b constroem
um etos de envolvimento emocional, inferido com base nos elementos destacados
nos anúncios. Tal imagem é um forte recurso de persuasão/sedução porque rompe
com uma idéia negativa ao projeto de fala do enunciador: a de que “prostituta não
beija”.
98
5) Etos de celebridade
Por vezes, o enunciador coloca em primeiro plano o seu “currículo” , que lhe
dá um estilo, uma personalidade, um ar de pessoa importante, um etos de
celebridade. Isso é feito, às vezes, paralelamente à descrição; outras, com
apagamento desta. Observem-se os exemplos:
a)
Caren, logo de início, desfila o seu currículo de “capa de revista”, embora não
diga de qual veículo mediático. Reconhece-se nisto certa maneira de dizer típica
daquelas pessoas públicas pretensiosamente vips. Ela informa, ainda, localidades
onde atua (Brasília e São Paulo, no Brasil, além do exterior) e delimita o seu público-
alvo: “elite”, “R$400,00” (reforçando o seu ar de importância). Evidentemente possui
98
Cf., no item 1.5, o que os homens pensam sobre o sexo com garotas de programa.
CAREN
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1
-
sensualíssima, impecável: adjetivos
axiológicos; 2- 1.72, 40: adjetivos não-
axiológicos; 3- alto: adjetivo
qualificador de propriedades
intensionais
109
carro (“condução própria”) ou pode arcar com a despesa de um táxi. A descrição,
mesmo sendo discreta, não é deixada de lado em função da apresentação das
atividades já realizadas.
O custo do programa é alto, se comparado a outros anunciados, e ela o
divulga como “cachê”, ou seja, trata-se de uma artista, não de uma garota de
programa (como as outras, tantas no mercado).
b)
Note-se que Antonela é “Top model”, é “modelo”, faz “desfiles”. Dessa forma,
não é uma simples “garota” que faz o programa, nem possui uma beleza prosaica,
caso contrário não faria esse tipo de trabalho. Assim ser “Top model”, além de
reforçar a beleza que ela descreve (todas se dizem lindas, mas uma “top model” só
pode mesmo o ser), enquadra-a em um grupo social e esteticamente privilegiado,
conferindo-lhe, então, um ar de importância e de destaque dentre as demais.
c)
Joyce se julga “famosa” por ser “destaque” em “revistas”, por ter participações
na “TV” e por ter atuado em filmes pornô. Não há preocupação com a descrição do
seu corpo (não há adjetivos axiológicos e não-axiológicos), como na maioria dos
casos, porque, pelo mesmo motivo que em b, o currículo faz a sua apresentação.
Além disso, se ela é famosa, todos conhecem a sua beleza (descrever-se seria
redundância). Destaque-se que ela estará no Rio em “curta temporada” (tal como os
espetáculos são anunciados) e atenderá “somente [a] executivos”, aqueles poucos
ANTONELA (CENTRO
-
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1
-
Lindíssima, cinematográfico,
escultural, exuberantes, lindíssimo,
espetáculo: adjetivos axiológicos; 2-
branquinha, 1.77: adjetivos não-
axiológicos
1
-
Famosa, pornô: adjetivos
classificadores; 2- (quase) mulher:
adjetivo qualificador de intensidade; 3-
recém-chegada: adjetivo informativo
110
que conseguirem contar com os “seus serviços”. Joyce , na verdade, será uma
aparição, um evento. É esta a impressão a que nos referimos.
Nesses anúncios, constrói-se, dessa forma, um etos de personalidade, de
pessoa incomum, de celebridade, já que elas dizem atuar (ou atuam) no mundo
artístico e algumas (como “Joyce”) seriam “famosas”. Isto justifica o “cachê” de
R$200,00, R$400,00 e até mesmo de R$1.000, 00 que uma anônima não poderia
cobrar por mais bela que fosse.
Necessário se faz explicar que é através do seu modo de dizer que
especulamos uma personalidade acentuadamente egótica. Esta impõe a
necessidade de se autocongratular, à maneira afetada que estereotipa alguns
famosos.
Maingueneau (2002 e 2005) privilegia a visão aristotélica
99
de etos, segundo a
qual ele decorreria de um efeito discursivo, e não de um juízo prévio sobre o caráter
do orador.
Com efeito, segundo Maingueneau (idem), a noção de etos abarca, além da
vocalidade, as características físicas e psicológicas atribuídas ao enunciador a partir
de representações coletivas, que participam de um conhecimento compartilhado.
Ressalte-se, entretanto, que o enfoque dado pelo autor (op.cit.), não recai sobre a
dimensão sociológica em que se situa o sujeito (inserido em um grupo social, em um
tipo físico e em determinada ideologia), em detrimento da linguagem, tal como o faz
Bourdieu (2005), já que, para este (1982, apud Amossy, 2005: 138), a linguagem
apenas simbolizaria a autoridade institucional do sujeito.
Ora, se a pessoa do orador pode exercer alguma influência na opinião do co-
enunciador a seu respeito, o discurso, por sua vez, poderá validá-la ou não. É nele
que está a conquista da credibilidade, portanto é nele que se faz reconhecer a
legitimidade.
Observando o anúncio de Vanessa, o modo como ela elabora o seu dizer
apresenta pistas textuais de seu caráter e de sua corporalidade. Mangueneau (2002
e 2005), para quem o grau de precisão do caráter e da corporalidade varia conforme
os textos, define os dois conceitos: “O ‘caráter’
100
corresponde a uma gama de
99
Retórica II, 1365a
100
Grifos do autor.
111
traços psicológicos. Já a ‘corporalidade’ corresponde a uma compleição
101
corporal,
mas também a uma maneira de se vestir e de se movimentar no espaço social.”
Dessa forma, caráter e corporalidade do enunciador, nos CS, fundam-se em
representações sociais compartilhadas (sempre valorativas), às quais o destinatário
é remetido. Nas palavras de Amossy (2005:126), “o orador adapta sua apresentação
de si aos esquemas coletivos que ele crê interiorizados e valorizados por seu
público-alvo.” Veja-se o referido anúncio:
b)
Vanessa se diz “exclusividade”, ou seja, somente “p/ alta burguesia”,
restringindo, assim, o seu público-alvo, especificando-o, o burguês, e qualifica a sua
beleza de “raríssima” “cinematográfica”, pois crê ser tal qualificação compatível ao
estrato social do cliente ao qual se oferece.
Tudo isso somado à recomendação de “ligar após conferência” produz um
sentido de que o custo de seu serviço é alto e que os seus “prodígios” justificam-no,
sendo, por isso, imprescindível o público efetivo vê-la antes para saber com quem
fala (e compreender o seu “valor”).
Além do caráter de pessoa objetiva, mas nada modesta, confere-se a ela uma
corporalidade (um estilo) “alto nível”, “glamuroso” de ser e viver.
3.4.1. A cena de enunciação
Para Maingueneau (2002), “um texto não é um conjunto de signos inertes,
mas o rastro deixado por um discurso em que cada fala é encenada.
102
” Assim, o
discurso pressupõe uma cena de enunciação, tripartida pelo autor em cena
englobante, cena genérica e cenografia.
101
Constituição do corpo de alguém
102
Grifo do autor.
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1
-
Raríssima, cinematográficos:
adjetivos axiológicos;
112
A cena englobante refere-se ao tipo de discurso, dando a ele seu estatuto
pragmático (literário, religioso, publicitário...), ao qual se vincula. A cena genérica é
aquela que diz respeito ao gênero discursivo (poema, carta, anúncio...). Essas duas
cenas (englobante e genérica) compõem o que o autor (op.cit.) chama de quadro
cênico do texto. A cenografia, por seu turno, fica a cargo do estilo do enunciador, ela
é particular e faz parte da sua estratégia. Ele pode realizar uma “conversão” no
interior do quadro cênico e enunciá-lo, sub-repticiamente, de um lugar enunciativo
diferente do habitual.
Um político, por exemplo, pode falar ao povo como um conselheiro (Tenham
cuidado ao escolher em quem vão votar...); como um trabalhador igual a todos (Eu
também sou trabalhador como você, estou aqui para representar a nossa classe x
ou y).
De fato, determinados gêneros apresentam maior flexibilidade em relação à
cenografia, como os panfletos políticos ou o discurso de palanque ou televisão. A
publicidade também possui gêneros bastante variáveis quanto à cenografia:
anúncios, out-doors... Como diz Maingueneau (2002), discursos como o político e o
publicitário mobilizam cenografias variadas, já que desejam persuadir seu co-
enunciador. Sendo assim, “devem captar seu imaginário e atribuir-lhe uma
identidade, por meio de uma cena de fala valorizada.”
No entanto, os classificados, em geral, têm uma cenografia mais restrita. No
caso específico dos CS, as possibilidades de alterações são maiores, ainda que não
muito amplas. No corpus, a cena englobante, a nosso ver, é a do discurso
publicitário e a cena genérica é a dos CS, não havendo distinção entre um anúncio e
outro, apresentando-se ela muito básica.
Para validar o discurso, o enunciador vale-se de estereótipos para compor a
cenografia. Estereótipos, segundo Carrascoza (2002) são fórmulas já consagradas,
empregadas tanto nos códigos visuais (uma mulher bonita, de avental, remete a uma
zelosa dona-de-casa), quanto ao lingüístico (“a união faz a força”, “ser mãe é
padecer no paraíso” etc.).
Quanto à cenografia, destacamos várias estratégias de construção pela
“garota” de uma cenografia em que ora é uma gatinha shopping, ora é uma
namoradinha ou uma mulher adúltera, entre outras mais.
113
a) A “adúltera”
Esta mulher se torna fascinante para o público-alvo porque enlaça a fantasia
que habita o seu imaginário (satisfazer-se com a mulher do outro). O cliente, por sua
vez, não deverá esquecer-se de que, mesmo assim, ela é uma mulher
“comprometida”. O enunciador tenta enunciar, então, fora da qualidade de prostituta.
Vejam-se os exemplos:
a)
b)
Nestes, a mulher do vizinho, a casada, é aquela que evoca, por oposição à
prostituta, a família, em que representa a “mulher direita”. Além de mulher que não
despreza sua sensualidade, é mãe e esposa. O fetiche será, então, um metonímico
desejo pela parte (mãe/ esposa) de um todo (mulher). Ela também representa o
proibido, já que é a posse do outro (homem): se for objeto de desejo, deverá sê-lo
veladamente. Importa ressaltar que é a adjetivação pela locução adjetiva restritiva,
no caso a, que direciona o sentido para o proibido, pois Agatha é “do vizinho”.
Situação semelhante ocorre em b com o adjetivo classificador “casada”.
Nos dois anúncios, o destinatário é interpelado como “o outro”, como o
amante, e não como um cliente de uma garota de programa. Os enunciadores
propõem, dessa forma, um segredo, uma traição, explicitada no anúncio b.
ÁGATHA
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1
-
Bonit
ona: adjetivo axiológico; 2
-
30:
adjetivo não-axiológico; 3- do vizinho
(loc.): adjetivo restritivo
1
-
Linda, carinhosa, bom: adjetivos
axiológicos; 2- casada: adjetivo
classificador; 3- 1.65, 26, 38:
adjetivos não-axiológicos
114
b) A “gatinha da praia”
Configura uma mulher muito natural e informal. O lugar que freqüenta, a praia,
é onde se reúne a juventude, onde se encontram risos, conversas descontraídas,
corpos seminus, além de muita sensualidade. Ela ainda possui mais atributos: sua
pele é bronzeada e, nela, deve-se ver a marquinha do fio dental, possivelmente
sedutora para o público. Este tipo de mulher possui, em geral, um corpo saudável e
bonito, resultado da prática de exercícios e de esportes na praia. Apresentamos o
seguinte exemplo:
Cabe observar que, nesses dois exemplos (também em outras cenografias),
não se recorre a uma cenografia para pura descrição do ambiente. O leitor terá de
possuir informações que caracterizem tal mulher (inserida em determinado
contexto), ou os sentidos pretendidos não serão reconstruídos. Só se pode pensar
na gata praia, em primeiro lugar, em uma cena “na praia”, ou seja, o co-enunciador
vai formar imagens da cenografia (porque já as tem na memória) em que Cindy , por
exemplo, emerge dentre as ondas, exibe-se tomando sol na areia etc., variando,
nesse aspecto, conforme as experiências que o interpretante vivenciou e que
formam seus modelos cognitivos. Koch (2002) esclarece o termo:
“Os modelos constituem, pois, conjuntos de conhecimentos
socioculturalmente determinados e vivencialmente adquiridos, que contêm
tanto conhecimentos declarativos
103
sobre cenas, situações e eventos, como
conhecimentos procedurais sobre como agir em situações particulares e
realizar atividades específicas.”
103
Grifos da autora.
CINDY LINDA
gatinha de praia
loira cab.
cacheados 18
a
(sic). (USA) corpo malhado
definido pele dourada, delicada carinhosa at.
Completo (perfeita) 8222-3341 Barra 24h.
1
-
Linda, gatinha, malhado,
definido,
dourada, delicada, carinhosa, completo,
perfeita: adjetivos axiológicos; 2- loira,
cacheados, 18: adjetivos não-axiológicos
115
c) A “namoradinha “
Ela representa a moça de família, moça honesta (até virgem!). O tipo
“namoradinha” é a garota meiga e companheira na qual se confia, com quem se
pode passear, ir ao cinema. Confira-se:
Realmente, a namoradinha parece envolver uma cenografia mais calma,
diferente da patricinha, que nos remete a situações de agito. Nesse particular, não
seria aconselhável, por exemplo, que uma “garota” optasse por uma cenografia de
patricinha e categorizasse o seu público como “senhores” (qual o faz Lívia), pois
correria o risco de não obter êxito. Já Lívia, em seu anúncio, enquadra-se em uma
cenografia coerente com o perfil do seu público-alvo, já que cria a ilusão do
companheirismo, perfil típico da namoradinha. Ainda, a doçura é transmitida pelo
tom de delicadeza que os sufixos inho(a) dão ao enunciado.
d) A “patricinha”
Esta se parece com a namoradinha, mas se diferencia dela em alguns pontos.
A patricinha é a garota sempre vestida de roupinha (de grife) rosa ou com detalhes
dessa cor. Mais espalhafatosa, ela recupera bem a idéia da adolescente de classe
média. Sua aparência é bem saudável, ela é chique e perfumada (perfume caro!).
Este tipo de garota também é de “família”, tem boa educação, bom estudo etc.
Temos, então, o seguinte anúncio:
LÍVIA TIJUCA loirinha , 22aninhos, olhos verdes,
namoradinha, carinhosa, paciente, envolvente,
excelente companhia, especialmente senhores
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BIANCA GAÚCHA (olhos verdes naturais)
Rio /25
a
(sic) loirinha, patricinha Z.Sul,
marquinha de biquíni. Linda! T. 2259-3516
/2259-3526 Ac/cartões Leblon (Speack
English) www.ellegance.com.br
1
-
Loirinha, 22, verdes: adjetivos não
-
axiológicos; 2- namoradinha, carinhosa,
paciente, envolvente, excelente: adjetivos
axiológicos
1
-
Gaúcha: adjetivo informativo; 2
-
naturais:
adjetivo restritivo; 3- verdes, 25, loirinha:
adjetivos não-axiológicos; 4- patricinha,
linda: adjetivos axiológicos
116
Nele, tem-se um cenário carioca para acomodar a enunciação de Bianca, que é
gaúcha, mas se apropria de alguns símbolos da cidade do “Rio” (a própria cidade já
o é) que traduzem (e lhe conferem) sensualidade: a Zona Sul, o bairro do Leblon, a
marquinha de biquíni... Assim, quem fala é a Bianca patricinha (e não a garota de
programa), que se insere em um campo semântico de luxo, juventude e prazer.
Aliás, é justamente o que ela oferece. Para finalizar, uma patricinha, obviamente,
falaria o inglês
104
e estaria na Internet; daí, “www...”.
e) O “mulherão/-ona “
Corresponde à idéia de mulheraça (segundo o dicionário Larousse Cultural, p.
644: “mulher alta e forte”). É um modelo de mulher muito vistosa, chamativa, que,
por onde passa, é percebida por ser, além de grande, formosa e sensual. O
mulherão apresenta seus atributos no aumentativo
105
. Essa pode ser a cenografia a
que o enunciador, no referido contrato, visa a conduzir o leitor. Por outro lado,
mulherão pode ser também uma mulher (bem feita de corpo) já madura que possui
essas formas de medidas maiores que a da média das mulheres. Veja-se o exemplo
a seguir:
a)
f) A “boazuda”
Para o adjetivo boa, o dicionário Larousse, p.148, diz: “mulher de físico
atraente, de formas agradáveis à vista”. Ora, some-se a este adjetivo o sufixo -
(z)uda, que acrescenta ao significado da palavra boa o impacto que tal mulher
104
Citem-se, como exemplos, personagens da novela vespertina Malhação. Direcionada ao público
adolescente, ela apresenta algumas meninas (que se denominam patricinhas) as quais incluem,
constantemente, várias palavras e expressões do inglês em sua fala.
105
Como popularmente se afirma: quadrilzão, pernão, cabelão, corpão etc.
EDUARDA 28 anos
mulherão
parando
trânsito (alt.1,74 m.40/42) loira branca como
neve. Porte elegância, discrição. Altíssimo
nível para senhores exigentes 3681-4512
1
-
28, 1.74, 40/42, loira: adjetivos não
-
axiológicos; 2- mulherão, branca (como
neve), altíssimo, exigentes: adjetivos
axiológicos
117
provoca no desejo masculino. Ela é uma mulher de formas consideradas ideais:
seios rígidos, curvas acentuadas e bem feitas, coxas e nádegas torneadas, não
necessariamente grandes. Difere-se do mulherão, que é uma mulher de bonitas
formas também, mas as têm avantajadas. Enfim, a boazuda é o tipo para o qual
todos os homens viram, literalmente, o pescoço. Confira-se:
g) A “sereia”
A Principal característica dessa mulher é ter o cabelo comprido e bonito. O
tipo sereia possui, também, cinturinha fina e quadril largo. Além dessas
características, ela conta, ainda, com olhos enigmáticos: “de ressaca”,
arrebatadores, que arrastam os homens. Ela é mais do que misteriosa, é
sobrenatural. Do seu campo semântico fazem parte: o mar, a praia, as ondas, as
conchas e búzios, as pedras, a areia, a nudez, a sensualidade, o enigma, a
sedução... Por exemplo:
3.6.2.8. A “gatinha shopping”
h) A “gatinha shopping”
A gatinha shopping é aquela garota que circula pelos shoppings da cidade.
São muito parecidas as garotas desse estilo, pois são comprometidas com a moda
COROA VALENTINE cortesã 46a., 1.70alt
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1
-
Coroa, loiraça, esverdeados, pilão,
boazuda, ousada, deliciosa, sem frescuras
(loc.), enlouquecedora, envolvente: adjetivos
axiológicos
1
-
Coroa, cortesã, [de] sereia, dourado,
exclusivo, cinquentões: adjetivos axiológicos;
2- 1.70: adjetivo não-axiológico; 3- alto:
adjetivo qualificador de propriedades
intensionais
118
vigente, desde o corte de cabelo até o modelo de sapato. Trata-se da mulher de
faixa etária entre 15 e 25 anos. Pirce (no umbigo e à mostra) e celular (sempre o de
última geração, pois é atualizadíssima) compõem o seu visual e a sua
personalidade. É um tipo que traduz a idéia de juventude, saúde e alegria.
Exemplos:
a)
b)
A exemplo do que se observou na cenografia da gatinha de praia, o elemento
shopping, em vez de ser meramente decorativo, articula-se ao discurso de
Alessandra credibilizando-o (porque faz saber, faz crer, faz prazer)
106
e,
simultaneamente, legitimando-a (por fazer reconhecer seu estatuto de poder),
consoante informações contextuais recuperáveis pelo leitor.
Enfim, a cenografia representará um processo circular em que ela objetiva
legitimar o discurso do enunciador e, ao mesmo tempo, é pelo próprio discurso que
ela será validada.
106
Cf. item 3.3.3.
JULIANA (IPANEMA) loirinha 19 aninhos rostinho
e n c a n t a d o r , s/ empinadinhos, cinturinha
fininha, gatinha shopping, c o m p l e t í s s i m a, s/
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Loirinha 19ª (sic) man.38 Milena clarinha gatinha
de shopping. Bárbara morenaça 106cm quadril. 3H
(sic) =R$100,00 24H Tel.:3881-4319
www.hotvip.com.br/felinas Clientes exigentes
1
-
Loirinha, 19, fininha: adjetivos não
-
axiológicos; 2- encantador,
empinadinhos:, completíssima,
s/frescuras (loc.): adjetivos axiológicos
1
-
Tijucana: adjetivo informativo; 2
-
loirinha, 19, 38, clarinha, 106: adjetivos
não-axiológicos; 3- morenaça,
exigentes: adjetivos axiológicos
119
“A MOÇA MOSTRAVA A COXA
A moça mostrava a coxa,
a moça mostrava a nádega,
só não mostrava aquilo
concha, berilo, esmeralda
que se entreabre, quatrifólio,
e encerra o gozo mais lauto,
aquela zona hiperbórea,
misto de mel e de asfalto,
porta hermética nos gonzos
de zonzos sentidos presos,
ara sem sangue de ofícios,
a moça não me mostrava.
(...)”
(Carlos Drummond de Andrade)
120
4. DO CS AO PERFIL SOCIAL DO ENUNCIADOR: um retrato imaginado?
O enunciador dos CS costuma divulgar o local de atendimento e o custo do
programa. Também ressalta suas qualidades, como foi visto, apresentando-se como
“exclusiva”, ou anuncia-se junto a outras “garotas”. Esses dados são recebidos pelo
TUd que os processa cognitivamente através de inferências, pressuposições,
associações etc., atribuindo coerência e crédito (ou não) ao dito. Muitas vezes, as
informações se associam. Ser “capa de revista”, por exemplo, está comumente
relacionado a um custo alto do programa sexual e, por conseqüência, a um tipo de
cliente qualificado por “vip”.
Avaliando o conjunto dessas características, é possível agrupar, então, as
“profissionais do sexo” como pertencendo a um protótipo específico, com um
determinado perfil social, pinçado das descrições que cada uma faz de si Grupo A,
Grupo B e Grupo C. Logo a cada grupo corresponde uma maneira de se apresentar/
oferecer, conforme classificação a seguir:
107
Grupo A
Apresenta-se como sendo capa de revista, atriz/modelo;
Atende a pessoas vip’s, especiais, “exigentes”;
Aponta, como áreas de atuação, bairros nobres: Barra, Ipanema;
Custo: alto, por vezes chamado de “cachê”;
Atribui-
se grau de cultura e educação, inclusive com conhecimento de outros
idiomas;
Para as que se anunciam como massagistas, citação do nº do RG.
Grupo B
Referência a um atendimento “sem frescuras”;
Aponta como área de atuação Centro, Tijuca, Jacaré;
Custo: “valor de mercado”.
Grupo C
Aponta, como áreas de atuação, Centro, Baixada, Zona Norte, Zona Oeste e, às
vezes, Copacabana;
107
Tais peculiaridades podem aparecer em um CS, em sua totalidade ou perfazerem um percentual
de 70% por anúncio.
121
Custo: abaixo do valor de mercado, há promoções ou oferece condução (daí,
normalmente, estarem vinculadas a uma “casa” especializada);
Idade superior a trinta anos;
Anuncia associando-se a outra pessoa;
Aproveita o anúncio para “recrutar” outras pessoas para a atividade;
Reforça que o anúncio é verdadeiro.
A categorização (A, B e C) dos anúncios obedece aos critérios listados acima
e suas combinações. Cada quesito foi determinado pela comparação empírica
108
entre os próprios anúncios do corpus, tendo, como medida, a sofisticação do
preço ao local, passando por variantes que a descrição evidenciaria.
Contudo, devido a uma não homogeneidade das descrições, é possível que
uma ou outra pessoa seja classificada como pertencendo ao grupo A e, ao mesmo
tempo, apresente características típicas do grupo B. Será, então, enquadrada num
subgrupo: AB. Da mesma forma, as pessoas que forem agrupadas no grupo B, mas
que apresentarem características do grupo C, serão enquadradas como
pertencendo ao subgrupo BC. Diferentemente, as pessoas do grupo A que
apresentarem todas ou muitas características desse referido grupo, caracterizando-
se como ”prototípicas”, receberão a referência do subgrupo AA.
Grupo A
O enunciador:
1- Apresenta-se como sendo “capa de revista, atriz/modelo”.
Ora, para a “profissional” que oferece seu serviço remunerado de programa, ter
realizado trabalho como atriz de filmes eróticos representa uma valorização no seu
currículo. Significa não ser anônima, ao contrário, é ser quase uma estrela. Uma
capa de revista é praticamente um atestado de beleza. Atriz/modelo correspondem
(no imaginário social) a títulos.
O objetivo maior de citar tais atividades nos parece ser o de sobrepor (ao serviço
sexual) a capa de profissões socialmente privilegiadas e que estão ligadas ao corpo
108
Não se utilizou nenhuma ferramenta teórica para tal, a não ser o cotejo entre as características.
122
e a beleza. Daí resultaria a impressão de que o usuário do serviço não iria se
encontrar com uma garota de programa, mas com uma atriz ou modelo (a isto
corresponde a realização do desejo provocado pela edição/divulgação da capa da
revista). Contratar o serviço de uma “profissional-capa de revista”, “atriz”, “modelo”
seria usufruir o nível mais alto de representação do estético, do desejado, do
possível. Veja-se o exemplo:
2- Atende a pessoas vip, especiais, exigentes, de bom gosto.
Quando o anunciante diz atender a pessoas vips (exigentes), impõe limites
para o possível grupo de pessoas interessadas em seu serviço. Essa restrição busca
provocar no TUi, sujeito que atua nas relações sociais, um desejo de corresponder
àquela imagem de seleta pessoa capaz de ser alvo daquele anúncio. No entanto,
enaltecer o possível usuário seria uma técnica que refletiria no ELEx toda a
qualidade que, aparentemente, haveria sido direcionada ao TU. Na verdade, para o
enunciador, aquele produto é que possui qualidade, é especial e foi oferecido para
pessoas que podem financeiramente apreciá-lo. Poder utilizá-lo, ter essa honra, é
figurar entre alguns (poucos) ditosos, ou seja, favorecidos financeiramente.
Pessoas exigentes desejam um bom serviço, mas ao cliente vip é destinado o
melhor. Dessa forma, ofertar um produto/serviço a esse segmento social privilegiado
economicamente significa afirmar, sem receios, sua qualidade. Confira-se:
CAREN
CAPA DE REVISTA
Brasilia/SP
exterior elite 172/m.40 sensualíssima
impecável! Fetiche. At.Alto nível. Cachê
R$400,00 Barra condução própria Tel
(021)9788-8318
RENATA
VIP
A melhor companhia para homens
exigentes/ discretos. Muito carinhosa,
educada, rosto encantador. Atendimento
Barra/Zona Sul/ Centro. 8228-5850.
www.escortgirl.com/renata
1
-
vip, melhor, exigentes, discretos,
carinhosa, educada, encantador:
adjetivos axiológicos
Texto já analisado na página 108.
123
3- Aponta como áreas de atuação bairros nobres, especialmente Ipanema e
Barra.
Estes dois bairros são aqueles freqüentados por pessoas jovens. Apresentam
grande número de sofisticadas casas noturnas do Rio. Abrigam as classes média e
alta da sociedade, uma vez que seus preços de moradia e serviços são elevados.
Assim, a garota de programa que atua nessa área atenderia a clientes de nível
sócio-econômico e cultural mais elevado. Essa constatação também nos leva a
atribuir à profissional um determinado nível de qualidade/sofisticação que dê conta
de satisfazer seus clientes. Tome-se como exemplo:
4- Destaca, por vezes, seu alto custo introduzido pela palavra “cachê”.
A palavra cachê nos remete à remuneração pelo serviço prestado por artistas,
pois o que os profissionais “comuns” recebem é “pagamento”. A idéia que
acompanha essa palavra reforça a importância que o “profissional” se atribui, além
de contribuir para diminuir o estigma da “profissão” em que está atuando.
Há casos de anúncios em que os valores expressos são altíssimos (de
R$400,00 a R$1.000,00), muito acima do valor cobrado no mercado, em média de
R$50,00 a R$80,00/hora. Quem exige esse custo confirma a auto-atribuição de ser
de alto nível. O cliente que adquire o “serviço”, por sua vez, paga não apenas pela
estética (que, para ser coerente com o preço, deve ser impecável), mas pela
discrição, pela educação... Veja-se:
GEOVANA GAÚCHA loiríssima sensual.
Fino trato. 1,65.alt man38 corpo impecável
at: pessoas exigentes! Prive, Hotel,
Residência. Ipanema-24H (sic) Tel.:2513-
1007
www.destack.com.br/geovanasensual.htm
PATRÍCIA BELEZA raríssi
ma! Nível,
elegância, sensualidade, loura 1,70alt maneq.
40 exclusiva executivo bom gosto Cachê
500,00 8195-3374
www.barraelite.com
1
-
gaúcha: adjetivo informativo; 2
-
loirí
ssima,
sensual, fino, impecável, exigentes: adjetivos
axiológicos; 2-1.65, 38: adjetivos não-
axiológicos
1
-
raríssima, exclusiva, bom: adjetivos
axiológicos; 2- 1.70, 40: adjetivos não-
axiológicos
124
5- Atribui-se grau de cultura e educação, inclusive com conhecimento de
outros idiomas.
Em alguns anúncios, a profissional se apresenta como culta e refinada. Isto
significa que o programa não promete apenas sexo: uma conversa inteligente e
agradável fará parte do pacote caríssimo a ser pago pelo cliente. As garotas de
programa fazem questão de destacar em seus anúncios esse item a mais, porque,
em alguns casos, os clientes desejam acompanhantes para eventos antes de
terminar a noite em um hotel. Temos, então:
6- Cita, como massagista, o número do RG (fictício ou não).
Nos casos em que a “profissional” se anuncia como massagista, é comum
alguma delas citar o número da licença profissional (de massagem). Em comparação
àquelas que não possuem ou não citaram, o RG adquire valor de legitimidade e, por
hipótese, deve elevar o custo do serviço. Tome-se como exemplo:
Grupo B
O grupo B não difere muito do A na descrição. Muitas vezes, uma única
característica pertencente ao grupo B desqualifica o anunciado para o A. São
características deste grupo:
NICOLE, LOIRINHA, natural, 21ª (sic),
branquinha, rosadinha, interior catarinense.
Meiga, culta, educada. Realmente encontro alto
nível. Pessoas especiais R$400,00
Tel.(048)9137-3488 (021) 9799-4373
ROSANA
MASSOTERAPEUTA
Tel.: 3477
-
8892/9771-3999 Técnicas:combinadas,
shiatsu, indiana, anti-stress, reflexologia,
revigore suas energias. Especialmente para
senhores bom gosto. REG. 2197 Consultório,
local, domicílio. Flamengo.
1
-
loirinha, branquinha, rosadinha:
adjetivos não-axiológicos; 2- natural:
adjetivo restritivo; 3- catarinense:
adjetivo informativo; 4- meiga, culta,
educada, especiais: adjetivos
axiológicos; 5- alto: adjetivo qualificador
de avaliação de propriedades
intensionais
1
-
massoterapeuta, indiana: adjetivos
classificadores; 2- combinadas, anti-stress:
adjetivo axiológico
125
1- Referência a um atendimento “sem frescuras”.
Os anunciantes do grupo A não teriam necessidade de dizer que seus
atendimentos seriam sem qualquer tipo de restrição. Isto somente se tornaria
necessário em um meio em que, de fato, houvesse situações de restrição na
prestação do serviço sexual acopladas a um determinado custo. O cliente paga um
valor alto porque deseja um atendimento que satisfaça os seus
desejos/necessidades. Então esta hipótese (“sem frescuras”) sequer seria cogitada.
Portanto, tal referência produz efeito contrário, pois em vez de excluir a
profissionaldaquele (suposto) grupo em que o serviço não é plenamente realizado,
e, por conseguinte, levá-la a figurar no grupo de mais alto nível, vai incluí-la no B
(grupo mediano). Veja-se:
2- Apontar como área de atuação Copacabana, Centro e Zona Norte.
Copacabana é um bairro menos nobre se comparado a Ipanema e Barra,
bairros preferidos pelos atuantes do grupo A. A presença de muitos estrangeiros e
de casas noturnas torna movimentado o comércio sexual. As “garotas” que atuam
nesse bairro, então, não teriam tanto status como as de Ipanema e da Barra. O
Centro
109
também possui muitas “casas de massagem” e uma movimentação maior
de clientes. Os bairros da Zona Norte são mais afastados das áreas nobres,
tornando esse comércio mais acessível à classe menos abastada. Assim, essas
áreas de atuação desqualificam o anunciado a figurar no grupo mais sofisticado.
Tome-se como exemplo:
109
O Centro também constitui grande área de atuação de anunciantes do grupo C.
ELIANA MORENAÇA 20ª (sic) Man.38
1,70m.alt bonita, carinhosa s/frescuras.
Realizo suas fantasias! Prive-R$80,00/H (sic)
(Casal sh/R$150,00 Hotel) (sic) Tel.:2570-
9510/ 2238-6330 Tijuca Ac. Cartões (24H)
ABAFA GOSTOSÍSSIMA Vicky...Quase
mulher, morenaça, cabelos longos, sarada,
feminina, 115 quadrilzão. Realizando
completamente... que fêmea não faz... (sic)
Maracanã. 2284-6109 (Apaixone-se)
1
-
morenaça, bonita, carinhosa,
s/frescuras (loc.): adjetivos axiológicos;
2- 20, 38, 1.70: adjetivos não-axiológicos
1
-
gostosíssima, morenaç
a, sarada,
feminina: adjetivos axiológicos; 2- (quase)
mulher: adjetivo qualificador de
intensidade; 3- longos, 115: adjetivo não-
axiológico
126
3- Custo do “trabalho”: valor de mercado.
O quesito custo do programa é determinante para distribuir o anunciante
pelos grupos. O custo do “serviço” observado nos anúncios situados no grupo B
corresponde ao valor de mercado, entre R$50,00 e R$80,00/h. As “profissionais” que
representam esse custo, ainda que atendam em bairros nobres ou se digam de alto
nível, não podem figurar no grupo A. Mas há possibilidade de se enquadrarem no
grupo C, caso ao “valor de mercado” some-se, por exemplo, um recrutamento de
outros profissionais ou atendimento em dupla (de profissionais) pelo mesmo valor.
Confira-se o anúncio que segue, incluído no grupo B:
Grupo C
O grupo C destoa bastante do grupo A. Em relação ao B, a diferença não é
grande, podendo estes dois grupos apresentar pontos em comum, como área de
atuação, faixa etária superior a 30... Para figurar neste grupo é necessário:
1- Atuar nas seguintes áreas: Centro, Zona Norte, Zona Oeste, Baixada e, às
vezes, Copacabana.
Este critério não é determinante para enquadrar o anunciante como B ou C.
Apenas sua associação a outro quesito é que pode gerar uma classificação: caso o
profissional atenda em Copa, mas seu programa custe 40,00/2h, ele pertencerá ao
grupo C; se atender no Centro ao preço de 80,00/1h, será grupo B. Temos, então:
ÍNDIA POTIRA Recém
-
chegad
a, 22ª (sic), 105
quadril, coxas grossas irresistíveis, Super
carinhosa, realiza fantasias. (Damas, casais,
cavalheiros). Prive Copacabana. R$100,00/2h
3183-2778/9708-8063
RAIMUNDA T. 2265
-
9674
Adivinhe por que? (sic) Rebolado
enlouquecedor! Folgosa (sic) cheia de
fantasias! (Aparelhos) Amanda, estilo
boazuda, quentíssima! Faço spring love.
Catete. (R$20,00)
1
-
índia, 22, 105, grossas: adjetivos não
-
axiológicos; 2- recém-chegada: adjetivo
informativo; 3- irresistíveis, carinhosa:
adjetivos axiológicos
Texto já analisado na página 95.
127
2- Ter o custo do programa abaixo do valor de mercado.
Valores como R$ 20,00 ou 40,00, por exemplo, são determinantes para situar
o anunciante neste grupo, ainda que associado a quesitos de outros grupos. Por
exemplo:
3- Anunciar idade superior a trinta anos.
Não são todos os anunciantes deste grupo que têm idade superior a trinta
anos. Ao contrário, são em muito menor número. Este critério, então, só será
aplicado àqueles que afirmam textualmente ter mais de trinta. Veja-se:
4- Anunciar associando-se a uma outra pessoa.
Se realizarem juntas as fantasias dos clientes pelo valor de mercado, há uma
desvalorização desse profissional que, atendendo em dupla, cobra o mesmo que
outro, sozinho. Às vezes, apenas utilizam o mesmo espaço do anúncio sem a
proposta de atender em dupla. Tome-se como exemplo:
LIA MORENAÇA!!!... 19ª (sic) pele clara, 24h.
corpaço sarado, rostinho encantador, cabelos
negros, toda maravilhosa, (Atendimento
Delirante). R$20,00. Prive Copacabana 2295-
9972
COROA/ SAMIRAH
44a
. descendência libaneza
(sic) (Barra 8784-4365), surpreenda-se
conhecer! Mulherão 1.80alt. corpão/ pernas
saradíssimos. Agora tente esquecer!
At.cinquentões a.a www.hotside.com.br
DELÍCIAS BAIXADA!!
Mel loiraça, fofinha, encantadora!! Rubi loirinha
sapequinha!! Karla/ Aline, gatas quentíssimas!!
Garotas de alto nível!! (24h) (2H (sic) =70,00).
T.:2761-1666/ 3048-3501
1
-
morenaça, sarado, encantador,
maravilhosa, delirante: adjetivos
axiológicos; 2- clara, negros, 19: adjetivos
não-axiológicos
1
-
1.80: adjetivo não
-
axiológico; 2
-
libanesa:
adjetivo informativo; 3- mulherão,
saradíssimos, coroa: adjetivos axiológicos
1
-
loiraça, encantadora, sapequinha,
quentíssima, fofinha: adjetivos axiológicos;
2- loirinha: adjetivos não-axiológicos; 3-
alto: adjetivo qualificador de avaliação de
propriedades intensionais
128
5- Aproveitar o anúncio para recrutar outras pessoas para a atividade.
Neste caso, o anúncio assim se configura: título-nome; descrição e objetivos
e, no fim, o recrutamento. Ocorre que há uma dupla mensagem e um duplo
destinatário em um mesmo espaço, gerando confusão, além de má impressão. Isso
porque não sabemos se é uma garota se anunciando ou a agência que o faz e
também recruta outras profissionais. Se for a segunda opção, a imagem da(s)
garota(s) anunciada fica prejudicada, além de gerar a idéia de que a “casa” passa
por um momento de pouca variedade de atendentes. Confira-se:
6- Reforçar que o anúncio é verdadeiro.
Quando a anunciante diz ser o anúncio verdadeiro, ela pretende qualificar-se
diante das demais, apresentando-se como se fosse de fato bonita. Há o
conhecimento comum (compartilhado) de que, nessas situações em que uma
pessoa se descreve, pode acontecer dela imaginar-se (propositalmente ou não) mais
qualificada do que realmente é (ou assim colocar-se para atrair mais o cliente).
Dessa forma, eventual decepção poderia ocorrer, mas talvez, por isso, o efeito
pretendido possa não ocorrer.
Há, então, sempre o risco de obter-se, realmente, o contrário do desejado: em
vez de afastar qualquer possibilidade de uma profissional mentir, pode aproximar a
referida idéia (“Por que tal adendo foi colocado?”). Ou seja, sublinearmente, a idéia
de um eventual “embuste” estaria sendo colocada. Veja-se:
DANI MULATINHA!!!
Show...1.65m, seios empinadinhos, 100%
gostosona (toda liberal), Adorando
tudinho/sem limites. R$20,00 Copacabana
prive/ 24h. 2542-6688. Precisa-se moças. (sic)
LETÍCIA MORENA Tijucana
-
19ª cabelos lindos
longos 1,70m man.38 Corpo escultural. Realmente
muito bonita. Anuncio verdadeiro. Super carinhosa.
Prive- R$40,00 Tel.:2587-2846
www.annemassagens.cjb.net
1
-
mulatinha, 1.65:adjetiv
os não
-
axiológicos;
2- show, empinadinhos, 100% gostosona,
liberal, sem limites (loc.): adjetivos
axiológicos
1
-
morena, 19, longos, 1.70, 38:
adjetivos não-axiológicos; 2- tijucana:
adjetivo informativo; 3- lindos,
escultural, bonita, verdadeiro,
carinhosa: adjetivos axiológicos; 4-
(muito) bonita: adjetivo de intensidade
129
Qual desses perfis, então, prevaleceria em relação aos demais? Quem são
realmente as profissionais que se anunciam nos CS?
Para responder a essas perguntas, aliando, inclusive, a imagem propagada
ao veículo mediático que a divulga, passamos, então, a fazer uso de coeficientes
numéricos e percentagens. Tentamos, assim, recobrir o perfil, já alinhavado em
termos qualitativos, com uma visão mais objetiva, alicerçada em patamares
quantitativos. É o que se trabalhará no próximo item.
130
4.1. TRABALHANDO COM NÚMEROS
A tabela que segue demonstra a quantidade de anúncios encontrados para
cada tipo de cenografia depreendida do corpus. Nela, pode-se ver, também, na
terceira coluna, o percentual dessas ocorrências em relação ao total do corpus (1000
anúncios).
CENOGRAFIA QUANTIDADE PERCENTUAL
Mulherão 52 5,2%
Namoradinha 40 4%
Gatinha shopping 15 1,5%
Gatinha praia 9 0,9%
Patricinha 8 0,8%
Boazuda 7 0,7%
Sereia 4 0,4%
Adúltera 4 0,4%
Somatório 139 ocorrências 13,9% de 1000 anúncios
Tendo como referência o corpus de 1000 anúncios não repetidos, a
cenografia mais empregada, como consta acima, foi aquela em que a garota
enuncia como “mulherão”, totalizando 52 ocorrências. Vale lembrar que contamos o
anúncio apenas uma vez, desprezando as suas recorrências, ou seja, esses 52
anúncios podem ter ocorrido três ou quatro vezes mais o seu número, durante o
período de dois meses de coleta do corpus. Outra cenografia com alta utilização é a
da “namoradinha”, seguida (com certa distância) pela da “gatinha shopping”. As
demais contam com menos de 1%.
Encontramos as referidas cenografias em 13,9% do corpus, que
correspondem a 139 anúncios do total de 1000.
Veja-se o gráfico referente a esses dados:
131
Mulherão
namoradinha
Gatinha Shopping
Gatinha praia
Patricinha
Boazuda
sereia
-se, no desenho, a predominância das cenografias do “mulherão” e da
“namoradinha”. Então, com a primeira, talvez o enunciador creia causar impacto ou
qualificar as suas medidas de “quadril 102”, “105”, “seios USA” etc. Com a segunda,
ele se enquadra no perfil romântico: aquele da mocinha atenciosa que será
conduzida pelo homem. Essa cenografia atende, como já dissemos, ao propósito de
a) criar a ilusão do envolvimento emocional e b) dissociar o ELE da imagem
estigmatizada de prostituta que permeia o imaginário comum.
Além disso, todos os anúncios analisados foram enquadrados em um dos
grupos/subgrupos de perfis sociais, segundo os critérios expostos anteriormente.
110
Abaixo, temos a relação dos grupos e a quantidade de anúncios para cada um
deles, seguida do seu percentual em relação ao total do corpus.
GRUPOS QUANTIDADE
PERCENTUAL
A 10 1%
AA 6 0,6%
B 270 27%
BC 150 15%
C 564 56,4%
Total 1000 100%
110
Cf. capítulo 4.
132
Logo, há uma acentuada tendência à predominância do Grupo C. Isto
significa que um pouco mais da metade dos leitores predispõe-se a pagar menos
que o valor de mercado (R$50,00 R$80,00) por um “programa” sexual. Assim,
esse segmento do mercado sexual atenderia não somente a uma minoria
privilegiada economicamente, mas também a extratos menos favorecidos da
sociedade (em quantidade até coerente à divisão econômica desta).
Se expusermos a quantificação das ocorrências por grupo/subgrupo em
relação a cada jornal pesquisado, teremos:
111
GRUPOS O DIA % O GLOBO %
A 4 0,666 6 1,5
AA 0 0% 6 1,5
B 112 18, 666 158 39,5
BC 75 12,5 75 18,75
C 409 68,166 155 38,75
Total 600 100% 400 100%
Há um equilíbrio entre os percentuais obtidos com relação aos grupos B e C
no jornal O Globo. Isto significa que o veículo mediático atende, praticamente, a todo
o município do Rio de Janeiro e deve abarcar, como seu público-leitor, uma fatia
maior da classe média.
Já o grupo B conta com 39,5% das ocorrências no O Globo, contra 18,66 no
O Dia. Outra discrepância está, ainda, no grupo C: 68,16 para O Dia e 38,75 para O
Globo. Também, foi pouca a quantidade de ocorrências A e AA, sem qualquer deste
último grupo no O Dia.
Portanto, os resultados confirmam ser o leitor do O Dia imaginado como uma
pessoa de menor poder financeiro, visto que o preço do exemplar do O Globo
solicita quase o dispêndio do dobro em espécie para sua aquisição.
Abaixo, podemos conferir, nos gráficos, a fatia que cada grupo ocupa nos
jornais.
111
Base de cálculo para o jornal O Dia: 600 anúncios, para o jornal O Globo: 400.
133
Em suma, a garota de programa que anuncia em jornais cariocas preocupa-
se em recorrer, indiferentemente ao seu perfil socioeconômico, a técnicas ou
estratégias de tornar mais atraente o seu produto, por meio da adjetivação, da
criação de etos, cenografia e, às vezes, utilizando-se de frases feitas (como se faz
na publicidade). Também elogia o cliente e promete a satisfação dos seus desejos e
fantasias. Ela seleciona o veículo, convenientemente, segundo o perfil
socioeconômico que pressupõe para o TU-interpretante e adapta o conteúdo textual
em função disto.
A
AA
B
BC
C
GRÁFICO O DIA
A
AA
B
BC
C
GRÁFICO O GLOBO
134
De modo geral, afirma ser jovem (entre 18 e 30 anos), freqüenta praias e
shoppings da cidade e pode, até mesmo, atuar na mídia (em produções eróticas ou
não).
Nesse caso, será alto o custo de seu “serviço sexual”. A maioria, entretanto,
realiza programas por custo financeiro freqüentemente inferior à média (que é de
R$50,00 a R$80,00) e deve, por hipótese, atender a vários clientes no decorrer do
dia.
Seus serviços são prestados em diferentes pontos da cidade, em casas
especializadas ou em locais privados.
135
“ARTE-FINAL
Não basta um grande amor
para fazer poemas.
E o amor dos artistas, não se enganem,
Não é mais belo
que o amor da gente.
O grande amante é aquele que silente
se aplica a escrever com o corpo
o que seu corpo deseja e sente.
Uma coisa é a letra,
e outra o ato,
- quem toma uma por outra
confunde a mente.”
(Affonso Romano de Sant’Anna)
136
5. CONCLUSÃO
Neste trabalho, pudemos demonstrar que as palavras não fazem referência
apenas a uma única designação no mundo. Elas possuem o seu sentido de língua,
aquele emprego mais recorrente da palavra, mais comum entre os falantes; mas
possuem também o seu sentido de discurso, aquele possível de acordo com fatores
contextuais, nos quais o falante se apóia para interpretá-la. Sendo assim, recuperar
os sentidos propostos em um texto requer do interpretante o reconhecimento não
apenas das formas lingüísticas que o constituem, mas também do contrato de
comunicação em que a situação comunicativa se insere.
No discurso de garotas de programa, encontramos um campo farto em efeitos
de sentido, a nosso ver, inusitados, materializados por usos muito particulares da
classe dos adjetivos. Por essa razão, investigamos o comportamento da referida
classe de palavras na seqüência lingüística predominante, considerando a
intencionalidade do CS. O propósito era investigar a construção da imagem do
enunciador. Passaremos, então, a expor os nossos resultados.
A modalidade discursiva predominante no subgênero em questão, segundo o
corpus analisado, é a descritiva, no interior da qual o enunciador realiza atos
enunciativos elocutivos e alocutivos, por meio, principalmente, da qualificação
axiológica. Ela, através da organização enunciativa, dá conta da subjetividade do
enunciador em relação a ele mesmo, expressando, por exemplo, o seu estado
eufórico diante do ELEx; dá conta, ainda, do ato de implicar o destinatário no
discurso quando referir a ele atributos como “exigente”, “vip”, entre outros. O
enunciador conta com outras qualificações também importantes, como a de
autenticação e a de intensificação, que, de modo geral, denunciam o seu ponto de
vista (sua orientação argumentativa), sendo outra maneira (mais sucinta) de atuação
do modo enunciativo.
Assim, a descrição, nos CS, será sempre perpassada por este modo
discursivo e terá os adjetivos como o recurso de base para a elaboração de um
conjunto de estratégias, que são: a criação de um etos discursivo, a inclusão do
enunciador em uma cenografia, a apropriação do discurso publicitário e a própria
adjetivação stricto sensu, por meio da qual se pode realizar tanto a qualificação,
como a caracterização.
137
A adjetivação (valorativa) tem por objetivo ressaltar os atributos (relacionados
ao enunciador ou ao atendimento sexual) capazes de provocar no público-alvo o
desejo de contratar os serviços do anunciante, por meio da atuação sobre o seu
emocional, ou seja, sobre suas carências afetivas e sexuais. Cada adjetivo atende,
por outro lado, à finalidade de tornar única a garota de programa idealizada
construída no espaço interior do ato de comunicação , diferente das demais e
melhor, exaltando-a. Para tal, o sujeito tenta notabilizar-se pela intensificação do
sentido do próprio adjetivo, como em “extremamente safada” e “muito bonita” e, em
algumas ocorrências, simultaneamente, ratificará sua afirmação (caso de “muito
bonita mesmo”), acentuando-a.
A utilização de tais recursos evidencia o conhecimento que tem o EU-
comunicante do contrato de comunicação e das estratégias de persuasão possíveis
e pertinentes a ele. Além disso, leva-nos a inferir que o comunicante espera que o
interpretante (o público-alvo do anúncio) detenha algum conhecimento sobre a
situação de comunicação da qual participa, ou não entenderá um enunciado como
“beijos atrevidos”.
Ainda sobre a adjetivação, concluímos que formas como 1,70m e 18 anos são
adjetivos (ou numerais adjetivos) neste contexto analisado. O que as diferencia dos
adjetivos canônicos é a estrutura formal, mas não a sua função. Classificamo-las por
adjetivos não-axiológicos (KERBRAT-ORECCHIONI, 1993:112) e também por
adjetivos caracterizadores (CARNEIRO, 2001:25). Tais adjetivos se caracterizam por
menor compromisso afetivo por parte do enunciador, mas isso não significa que
estejam ausentes do seu projeto de persuasão/sedução, já que, a nosso ver, são
usados também para qualificar.
Defendemos, nessa dissertação, a tese de que os CS seriam um subgênero,
correspondendo, então, a um contrato de comunicação mais específico do que os
classificados “comuns”. Sustentamos tal convicção com argumentos como a)
proibição da leitura do anúncio por menores de 18 anos e b) categorização sexual
do destinatário por “homens”, ‘mulheres” ou “casais”. Nosso principal argumento foi a
presença de variada linguagem figurada na descrição do produto nos anúncios,
sobretudo da linguagem hiperbólica (“morena insaciável, absurdamente gostosa”
etc.).
Pela perspectiva semiolingüística, o recurso da adjetivação objetivará
legitimar o estatuto do PODER do enunciador, pois ressaltará
138
características/qualidades (segundo o imaginário sexual “masculino” e as
apreciações subjetivas do enunciador) desejáveis a uma garota de programa. Com
esse recurso lingüístico, o enunciador tenta, também, satisfazer o ideal de mulher
que o destinatário busca, a partir do gosto sexual que pressupõe este ter. Para isso,
veiculará, discursivamente, diferentes imagens de mulher, baseadas em estereótipos
privilegiados.
Dentre estas estratégias utilizadas, ressaltamos a construção de vários etos
discursivos para o enunciador, aqueles como: o de ninfeta, o da discrição, o do
ineditismo (para o qual corresponde a adjetivação informativa e também a de
qualificação graduável), o do envolvimento emocional e o de celebridade.
Destacamos, ainda no campo discursivo, o artifício da criação de cenografias em
que o enunciador aborda o destinatário a partir de lugares enunciativos como: o da
mulher casada, o da gatinha da praia, o da namoradinha, o da patricinha, o do
mulherão, o da boazuda, o da sereia e o da gatinha shopping. Quanto aos etos,
verificou-se que o do envolvimento emocional é o mais caro ao enunciador porque
apóia, em primeiro lugar, o seu projeto de fala, no qual ele promete, além de sexo,
aquilo que salienta: carinho e paixão. Já as cenografias empregadas visam,
primeiramente, à dissociação do enunciador da imagem tradicional de prostituta
presente no imaginário social (haveria, por conseguinte, um conceito menos
estigmatizado de prostituta: o da GAROTA DE PROGRAMA, por aparentar uma
mulher “comum”, sem traços/marcas que evidenciem a prostituição). Ao mesmo
tempo, auxiliam na tarefa da descrição, oferecendo uma referência quanto à sua
aparência. Ou seja, o EU-comunicante forma a imagem do seu EU-enunciador,
conforme um perfil presente no imaginário comum (a namoradinha, a patricinha),
eficazmente reproduzido e incorporado por ele nos anúncios e materializado,
principalmente, pelas formas subjetivas axiológicas. Os etos de ninfeta e ineditismo
associam-se a cenografias como a da namoradinha, a da gatinha da praia, a da
gatinha shopping etc. O etos do envolvimento emocional embasa variadas
cenografias, é um tipo de etos necessário, que se superpõe aos demais, exceto ao
de celebridade em que o enunciador adota uma estratégia diferente de
persuasão/sedução do destinatário a da autocongratulação.
A quantificação de dados referentes à cena da enunciação revelou que é a
cenografia do mulherão a mais adotada pelo enunciador dos CS, seguida da
cenografia da namoradinha. Então, já que grande parte dos enunciadores ressalta
139
dados relativos às dimensões do seu corpo ou enunciam como mulherão para
afirmar exuberância, concluímos ser o biótipo da mulher brasileira a preferência
“masculina”, isto é, segundo os CS, o brasileiro/carioca preferiria mulheres de
nádegas e seios proeminentes, qualidades ditas sexuais.
Quanto à análise do perfil socioeconômico do enunciador, chegamos a três
grupos, segundo inferências a partir de dados levantados nos próprios anúncios: A,
B e C e a dois subgrupos intermediários: AA e BC. Na quantificação desses
grupos/subgrupos em relação à sua ocorrência em cada jornal, verificamos serem os
CS do jornal O Dia compostos por 68,16% de grupo C, contra as seguintes
ocorrências para o jornal O Globo: 39,5 de grupo B e 38,75 de grupo C. Portanto, o
custo do programa sexual nos anúncios deste jornal serão maiores do que naquele e
a quantidade de “garotas” que atendem em zonas mais afastadas do centro do
município, como a Zona Oeste (exceto Barra da Tijuca e Jacarepaguá) e Baixada
Fluminense, será pequena, ao contrário do O Dia. Neste corpus, ocorrências de
sofisticação AA somente foram encontradas no jornal O Globo. Verificou-se,
também, entre os dois jornais, diferenças em relação ao grau de formalismo da
linguagem empregada pelo enunciador. Nesse sentido, os CS do O Globo são mais
brios, pois fazem menos referência ao atendimento sexual, tratando mais
especificamente da descrição da garota de programa e empregam menor
quantidade de sufixos superlativos. Já os do O Dia, apesar de apelarem bastante ao
recurso da linguagem figurada, utilizam termos mais informais como “bunda”,
“peitos”, além da presença da palavra “oral”, em resumo a “sexo oral”. Neste mesmo
jornal, observou-se maior freqüência de ocorrências de frases feitas no intento da
persuasão.
Finalmente, fora qualquer outro conceito de caráter conclusivo, é importante
destacar nossa esperança de que este trabalho constitua uma contribuição aos
estudos lingüísticos em geral e aos de AD, em particular.
Claro é que nosso objeto de estudo, a princípio, era polêmico: haveria
possibilidade (real) de se explorar, em uma pesquisa acadêmica, um classificado
sexual?
Esperamos, então, que nossa análise dos referidos anúncios tenha
comprovado que sim. Ou seja, que não há documentos “certos” ou “errados”,
“adequados” ou “inadequados”. O que existe, de fato, são subgêneros que, a nosso
ver, carecem de observação mais consistente. Entra a teoria, sai o preconceito.
140
6. REFERÊNCIAS
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Paulo: Saraiva, 1950.
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2001.
BOURDIEU, Pierre. A Dominação Masculina. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2005.
CÂMARA JR., Joaquim Mattoso. Estrutura da língua portuguesa. Petrópolis:
Vozes, 2002.
__________. Dicionário de Filologia e gramática. Rio de Janeiro: J. Ozon Editor,
1969.
CARNEIRO, Agostinho Dias (org.). O discurso da mídia. Rio de Janeiro: Oficina do
autor, 1996.
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__________Uma sinopse de uma Gramática textual. IN: GAVAZZI, Sigrid &
PAULIUKONIS, Maria Aparecida Lino (orgs.). Da língua ao discurso. Rio de
Janeiro: Lucerna, 2005.
CARRASCOZA, J.A. A evolução do texto literário. São Paulo: Futura, 2002.
CARVALHO, Nelly. Publicidade a linguagem da sedução. São Paulo: Ática,
1996.
CHARAUDEAU, Patrick. Grammaire du sens et de l’expression. Paris: Hachette,
141
1992.
__________. Para uma nova análise do discurso. IN: CARNEIRO, Agostinho Dias
(org.). O discurso da mídia. Rio de Janeiro: Oficina do autor, 1996.
__________. Uma análise semiolingüística do texto e do discurso. IN: GAVAZZI,
Sigrid & PAULIUKONIS, Maria Aparecida Lino (orgs.). Da língua ao discurso. Rio
de Janeiro: Lucerna, 2005.
__________. “De la Competencia Social de Comunicación a las Competencias
Discursivas”. IN: Revista Latinoamericana de Estudios del Discurso. Caracas,
1(1): 7-22, ago. 2001.
__________. Langage et discours: elements de sémiolinguistique (théorie et
pratique). Paris: Hachette, 1983.
CHAROLLES, Michel. Introdução aos problemas da coerência dos textos. IN:
GALVES, Charlotte; ORLANDI, Eni & OTONI, Paulo (orgs). O texto escrita e
leitura. Campinas: pontes, 1988.
CUNHA, Celso. Gramática da língua portuguesa. Rio de Janeiro: FENAME, 1972.
DIONISIO, Ângela P. & BEZERRA, Maria A. (orgs.). O Livro Didático de Português
múltiplos olhares. Rio de Janeiro, Lucerna, 2001.
GARCIA, Othon Moacyr. Comunicação em prosa moderna. Rio de Janeiro:
Fundação Getúlio Vargas: 1969.
GAVAZZI, Sigrid & PAULIUKONIS, M.A.Lino (orgs.). Da língua ao discurso. Rio de
Janeiro: Lucerna, 2005.
HITE, Shere. O relatório Hite sobre a sexualidade masculina. Edição integral. São
Paulo: Círculo do Livro S.A, 1981.
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KERBRAT-ORECCHIONI, Caterine. La enunciación: de la subjetividade en el
lenguaje. Buenos Aires: Edicial, 1993.
KOCH, Ingedore. O texto e a construção dos sentidos. São Paulo: Contexto, 2003
a.
__________. A inter-ação pela linguagem. São Paulo: Contexto, 2001.
__________& TRAVAGLIA, Luiz Carlos. A coerência Textual. São Paulo: Contexto,
2003 b.
__________. Desvendando os segredos do texto. São Paulo: Cortez, 2002.
MACAMBIRA, José Rebouças. A estrutura morfo-sintática do português. São
Paulo: Pioneira, 1997.
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Cortez, 2002.
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DIONISIO, Ângela Paiva et al. (orgs.). Gêneros textuais e ensino. Rio de Janeiro:
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MEURER, José Luiz & MOTTA-ROTH, Désirée (orgs.) Gêneros textuais e práticas
discursivas. São Paulo:EDUSC, 2002.
MONNERAT, Rosane Mauro. A publicidade pelo avesso Propaganda e
publicidade, ideologias e mitos e a expressão da idéia o processo de criação
da palavra publicitária. Niterói, EDUFF: 2003.
NEVES, Maria Helena de Moura. Gramática de Usos do Português. São Paulo:
Unesp, 2000.
OLIVEIRA, Ieda de. O contrato de comunicação da literatura infantil e juvenil.
Rio de Janeiro: Lucerna, 2003.
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PERELMAN, C. & OLBRECHTS-TYTECA, L. Tratado da Argumentação A nova
retórica. São Paulo: Martins Fontes, 1999.
PINTO, Alexandra Guedes. Publicidade: um discurso de sedução. Portugal: Porto
Editora, 1997.
ROSA, Maria Carlota. Introdução à morfologia. São Paulo: Contexto, 2003.
SANDMANN, Antônio. Linguagem da propaganda. São Paulo: Contexto, 2000.
SERAFIN, Maria Teresa. Como escrever textos. São Paulo: Globo, 2003.
SURFISTINHA, Bruna. O doce veneno do escorpião O diário de uma garota de
programa. São Paulo: Panda Books, 2005.
TRAVAGLIA, Luiz Carlos. Gramática e interação: uma proposta para o ensino de
gramática. São Paulo: Cortez, 2003.
DICIONÁRIOS CONSULTADOS
CHARAUDEAU. Patrick & MAINGUENEAU, Dominique. Dicionário de Análise do
discurso. São Paulo: Contexto, 2004.
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Minidicionário da língua portuguesa. 3ª
ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993.
Dicionário essencial da língua portuguesa (DELP). Coord. Volnyr Santos. Porto
Alegre: Rígel, 2001.
GRANDE DICIONÁRIO LAROUSSE CULTURAL DA LÍNGUA PORTUGUESA. Ed.
Organizada pela Editora Nova Cultural. São Paulo: Nova Cultural, 1995.
144
REVISTAS CONSULTADAS
Revista Época Bruna & sua tribo, nº 402, de 30 de janeiro de 2006.
Revista Língua Especial Sexo & linguagem, junho de 2006.
Revista O Globo Loucos por sexo, nº111, de 10 de setembro de 2006.
Revista Opinião pública, Campinas, vol..12, nº1 abril/maio, 2006, p.88 113.
145
7. ANEXO
ANEXO A - GLOSSÁRIO DE TERMOS
ACESSÓRIOS: 1-Objetos (vibradores, algemas, roupas para fantasias etc.) a serem
utilizados no ato sexual, a fim de obter-se mais prazer; 2- Aparelhos.
APARELHOS: Ver Acessórios. APARELHADA: 1-Mulher munida de aparelhos
sexuais.
ATENDIMENTO COMPLETO: 1-Prestação de “serviço” sexual satisfatório em lugar
confortável; 2- Utilizado em referência a um “serviço” sexual de qualidade; 3- Sem
restrições.
ATENDIMENTO IMPECÁVEL: Ver Atendimento completo.
ATENDIMENTO QUENTÍSSIMO: 1- Utilizado com sentido de a “garota” ser ativa no
ato sexual, demonstrar-se sexualmente excitada. 2: Prestação de “serviço” sexual
excitante.
BEIJOS ATREVIDOS: 1- Empregado em referência a sexo oral. 2- Sexo oral.
BEIJANDO CURIOSAMENTE: Ver Beijos atrevidos.
BRINCANDO JUNTAS: 1- Programa sexual executado por duas “garotas” ao
mesmo tempo.
CINTURINHA PILÃO: 1- Cintura de medida pequena, somada a um quadril largo.
COMPLETÍSSIMA: 1- Diz-se quando a garota de programa é bonita de rosto e de
corpo e executa o programa sexual satisfatório para o cliente, sem apresentar
restrições.
CORPO ESCULTURAL: 1- Corpo moldado por exercícios físicos; 2- Corpo bonito.
146
CORPO SARADO: 1- Corpo em boa forma física.
ESCANDALOSAMENTE LINDA: 1- Garota de programa que possui beleza
impressionante.
INDECEPCIONÁVEL: 1- Empregado para dizer que não haverá assimetria entre a
garota de programa imaginada pelo cliente e aquela com quem ele realizará o
programa sexual. 2- Conjunto de características que não pode decepcionar.
LÁBIOS SUCULENTÍSSIMOS: 1- Referência a sexo oral; 2- Referência à qualidade
do sexo oral.
MARQUINHA AUDACIOSA: Diz-se da marca de biquíni que fica à mostra, mesmo
se a garota de programa estiver vestida.
MIGNHONZINHA: 1- Mulher pequena e bonita; 2- Mulher delicada.
PRIVÊ: 1- Apartamento privado para execução do programa sexual.
PRIVILEGIADA: 1- Garota de programa que possui beleza incomum.
QUADRIL EMPINADINHO: 1- Diz-se de nádegas proeminentes; 2- Quadril em boa
forma física.
QUADRIL EXUBERANTE: Ver Quadril empinadinho
QUADRIL IRRESISTÍVEL: 1- Diz-se das nádegas, quando consideradas excitantes,
bonitas.
QUALIFICADA: Ver Privilegiada.
QUASE MULHER: 1- Travesti; 2- Transexual.
147
REBOLANDO INESGOTAVELMENTE: 1- Empregado para dizer que a garota de
programa realiza o programa sexual disposta fisicamente, sendo atuante.
SEM DECEPÇÕES: Ver Indecepcionável.
SEM FRESCURAS: 1- Prestação de “serviço” sexual irrestrito. 2- Programa sexual
realizado a gosto do cliente.
SEM RESTRIÇÕES: Ver Sem frescuras.
SPRING LOVE (amor de primavera; amor rápido): 1- Referência a sexo oral.
VOLUMOSA: 1- Corpo avantajado. 2- Fofa.
148
ANEXO B - LISTA DE ABREVIATURAS
3 h = R$ 100,00: O custo do “serviço”, para um período de três horas, é de R$
100,00.
24 h: Disponível por 24 horas para atendimento.
AC. Cartões: Aceitamos cartões (na casa de “massagem”).
Alt.: Altura.
At.: Atendimento.
c/: Com (“c/ aparelhos”,”c/ suave atendimento”).
h. comercial: Horário comercial
Man.: Manequim
P/ trânsito: De parar o trânsito.
Resid.: Residência.
S/: Sem (“s/ frescuras”, “s/ restrições”)
(seg/sáb): Atendimento de segunda a sábado.
(s.r): Sem restrições.
USA: 1- Seios fartos, como aqueles das atrizes do cinema pornô americano; ou
seios com silicone.
149
ANEXO C - FOTOS DAS PERSONAGENS DE CINEMA E TELEVISÃO
C1) Audrey Hepburn C2) Catherine Deneuve
C3) Kim Basinger C4) Julia Roberts
C5) Malu Mader C6) Nicole Kidman
150
C7) Betty Faria C8) Letícia Sabatella
C9) Ana Paula Arósio C10) Danielle Winits
C11) Suzana Vieira C12) Giovanna Antonelli
151
ANEXO D - FOTOS DE DESFILES DA GRIFE DASPU
D1) Atriz Beth Lago D2) Programa Jô Onze e Meia
D3) Desfiles da Marina da Glória e do Circo Voador, ocorridos no dia 09-06-2006. À
esquerda, Gisele Bundchen e, à direita, modelo da grife Daspu.
152
ANEXO E - REVISTA ÉPOCA (01/2006)
153
ANEXO F - JORNAIS DE MAIOR CIRCULAÇÃO DO BRASIL (2005)
112
Jornais Média anual (milhares)
Folha de S. Paulo (SP) 307,9
O Globo (RJ) 274,9
Extra (RJ) 271,8
O Estado de S. Paulo
(SP)
230,9
Zero Hora (RS) 178,2
Correio do Povo (RS) 167,7
Diário Gaúcho (RS) 152,5
O Dia (RJ) 152,3
Lance (RJ) 116,4
Agora (SP) 80,6
112
Balanço anual do IVC. In: Opinião pública, Campinas, vol..12, nº1 abril/maio, 2006, p.88 113.
154
ANEXO G - CBO Classificação Brasileira de Ocupações (Ministério do Trabalho e
Emprego)
113
Profissional do sexo - Garota de programa , Garoto de programa , Meretriz
,
Messalina , Michê , Mulher da vida , Prostituta , Puta , Quenga , Rapariga
,
Trabalhador do sexo , Transexual (profissionais do sexo) ,
Travesti (profissionais
do sexo)
Descrição sumária
Batalham programas sexuais em locais privados, vias públicas e garimpos;
atendem e acompanham clientes homens e mulheres, de orientações sexuais
diversas; administram orçamentos individuais e familiares; promovem a
organização da categoria. Realizam ações educativas no campo da sexualidad
e;
propagandeiam os serviços prestados
114
. As atividades são exercidas
seguindo normas e procedimentos que minimizam as vulnerabilidades da
profissão.
113
Fonte: www.mtcbo.gov.br
114
Grifo nosso
Livros Grátis
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Milhares de Livros para Download:
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