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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUCSP
Patrícia Trinta e Farias
INTERVENÇÃO FONOAUDIOLÓGICA AMBULATORIAL
EM CRIAAS PEQUENAS COM DISTÚRBIO
ALIMENTAR: UM ESTUDO DE CASO
MESTRADO EM FONOAUDIOLOGIA
São Paulo
-2008-
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PONTIFICIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUCSP
Patrícia Trinta e Farias
INTERVENÇÃO FONOAUDIOLÓGICA AMBULATORIAL
EM CRIAAS PEQUENAS COM DISTÚRBIO
ALIMENTAR: UM ESTUDO DE CASO
Dissertação apresentada à Banca
Examinadora da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo,
como exigência parcial para
obtenção do Título de Mestre em
Fonoaudiologia, sob a orientação da
Profª. Dra. Suzana Magalhães Maia.
São Paulo
-2008-
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FARIAS, Patrícia Trinta e
Intervenção Fonoaudiológica Ambulatorial em
Crianças Pequenas com Distúrbio Alimentar: um
estudo de caso. /Patrícia Trinta e Farias. São Paulo:
2008.
Dissertação (Mestrado) Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo. Programa de Estudos Pós-
Graduados em Fonoaudiologia.
Orientadora: Profa. Dra. Suzana Magalhães Maia
1.Fonoaudiologia 2.Pediatria 3. Distúrbio Alimentar
4. Winnicott I.Título
PATRÍCIA TRINTA E FARIAS
INTERVENÇÃO FONOAUDIOLÓGICA AMBULATORIAL EM CRIANÇAS
PEQUENAS COM DISTÚRBIO ALIMENTAR: UM ESTUDO DE CASO
BANCA EXAMINADORA
_________________________________________
Profa. Dra. Suzana Magalhães Maia - orientadora
_________________________________________
Profa. Dra. Maria Cláudia Cunha - PUCSP
________________________________________
Profa. Dra. Ana Clélia Rocha - UNICAMP
Autorizo exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a reprodução
parcial ou total desta dissertação através de fotocópias ou meios eletrônicos.
_____________________________________
Patrícia Trinta e Farias
São Paulo, outubro de 2008.
De Umbigo a Umbiguinho
Muito antes de nascer
Na barriga da mamãe já pulsava sem querer
O meu pequenino coração,
Que é sempre o primeiro a ser formado
Nesta linda confusão.
Muito antes de nascer
Na barriga da mamãe já comia pra viver
Cheese salada, bala ou bacalhau.
Vinha tudo pronto e mastigado
No cordão umbilical.
Tanto carinho, quanta atenção.
Colo quentinho, ah! Que tempo bom!
De umbigo a umbiguinho um elo sem fim
Num cordãozinho da mamãe pra mim.
Muito antes de nascer
Na barriga da mamãe começava a conviver
Com as mais estranhas sensações:
Vontade de comer de madrugada
Marmelada ou camarões.
Muito antes de nascer
Na barriga da mamãe me virava pra escolher
A mais confortável posição.
São nove meses sem se fazer nada,
Entre água e escuridão.
Tanto carinho, quanta atenção.
Colo quentinho, ah! Que tempo bom!
De umbigo a umbiguinho um elo sem fim
Num cordãozinho da mamãe pra mim.
(Toquinho & Elifas Andreato)
DEDICATÓRIA
_______________________________________________________________
À,
Regina
AGRADECIMENTOS
_______________________________________________________________
Aos meus pais, José Luiz e Myrthes, pelo AMOR incondicional, confiança,
amizade e ensinamentos.
Ao meu irmão Leonardo por acreditar e torcer junto pela minha carreira
profissional. Desejo-te muito sucesso na caminhada rumo à promotoria...
À minha orientadora, Profa. Dra. Suzana Magalhães Maia, pelo acolhimento,
ensinamentos e paciência ao longo desta caminhada. Muito obrigada.
À Denise Madureira, pela oportunidade de aprendizado que me proporcionou
ao longo dos anos de Santa Casa. Obrigada por tudo que me ensinaste, por
acreditar e confiar na minha atuação junto às crianças e pela tua amizade.
À Iamara Rios, pela confiança e amizade, desde o nosso primeiro encontro.
Obrigada por ter me proporcionado excelentes oportunidades
À Profa. Dra. Maria Cláudia Cunha, pela contribuição indispensável no exame
de qualificação deste estudo.
À Profa. Dra. Ana Clélia, pela valiosa contribuição da qualificação.
Aos pais da Regina: Waldir e Fabiana, pela confiança e respeito.
Às amigas Marcelle Gleyce e Raíssa Lago, que mesmo a quilômetros de
distância, sempre estiveram perto com suas palavras de amizade e carinho.
Às amigas paulistas: Ana Paula Nogutii, Mailda Baldin e
Valkiria Tini, pela amizade desde o nosso primeiro dia de aula. Com
vocês essa passagem por São Paulo foi mais “fácil” e divertida!
Obrigada por tudo.
Aos amigos maranhenses: Ana Teresa Abreu, Anna Karla Garreto, Fabrício
Ryan, Fernanda Abreu, Fernanda Pereira, Raíssa Palhano e Rodrigo Silva,
pelos momentos de alegria, pelo acolhimento e amizade nesta Paulicéia.
Às amigas da SANTA: Michelle Sampaio, Cristiane Ramos e Leila Cabral,
por me ajudarem e incentivarem nesta caminhada. E a todas com quem eu
convivi ao longo desses anos. Aprendi muito com vocês!
Às amigas “puquianas”: Hedilamar Bortoloto e Carina Hahal. Obrigada pelas
horas de alegrias e descontração nos momentos tensos.
À Família Pereira: Tio Toninho, Tia Valda, Vanessa e Raphael por terem me
acolhido em todos os momentos.
À Claudia Perrotta, por suas orientações e correções minuciosas.
À Virginia, pela prontidão de sempre.
A ISCMSP por ter sido a minha escola e permitir a realização desta pesquisa.
Aos meus pacientes, que me fazem aprender a cada atendimento.
A CAPES pela bolsa e incentivo na pesquisa
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO................................................................................................. 19
CAPÍTULO 1: Mecanismo da Alimentação: normal e patológico .............. 27
1.1. As Funções Alimentares......................................................................... 29
1.2. As Alterações das Funções Alimentares................................................ 32
1.3. Outros Distúrbios Alimentares na Infância ............................................. 37
1.4. Problemas Respiratórios e Disfagia ....................................................... 38
CAPÍTULO 2.................................................................................................... 43
2.1. Disfagia Orofaríngea: métodos diagnósticos.......................................... 45
2.2. Disfagia e Nutrição ................................................................................. 48
2.3. Diálogo entre Fonoaudiologia e Psicanálise nos Distúrbios
Alimentares..... .............................................................................................. 51
2.4. Abordagem dos Distúrbios Alimentares na visão Winnicottiana............. 53
CAPÍTULO 3: Método ..................................................................................... 59
3.1. O caso Selecionado ............................................................................... 61
3.2. Perfil do Local da Pesquisa.................................................................... 61
3.3. Rotina de Cuidados................................................................................ 62
3.4. Procedimentos das Etapas de Campo ................................................... 63
3.5. Tratamento do Material Coletado ........................................................... 64
CAPÍTULO 4.................................................................................................... 67
Parte I – Regina: a menina que não podia comer pela boca ........................ 69
4.1. Diagnóstico Inicial .................................................................................. 69
4.2. Primeiras impressões, indicações e procedimentos............................... 70
4.3. Os Encontros com os Pais..................................................................... 71
Parte II – Transformação da Terapeuta: a necessidade de novos olhares ... 77
4.4. Avaliação Funcional da Deglutição: ainda seguindo o protocolo .......... 77
4.5. Inicio da Transformação: oscilação entre paradigmas .......................... 84
4.6. Outro Manejo Clínico: alimentação como oferta de amor e de
possibilidade de crescimento ........................................................................ 87
CONCLUSÃO .................................................................................................. 97
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................................................. 101
ANEXOS ........................................................................................................ 111
RESUMO
O presente estudo teve como objetivo descrever a transformação na
perspectiva clínico-terapêutica ocorrida durante o tratamento fonoaudiológico
ambulatorial de uma criança pequena com problema alimentar que utilizava
uma via de alimentação alternativa exclusiva gastrostomia. A dificuldade em
torno da dinâmica da alimentação foi compreendida para além dos aspectos
orgânicos e funcionais, considerando-se o contexto familiar da paciente. Sendo
a metodologia clínica exploratória, para a coleta dos dados foram utilizados
registros (prontuário) dos atendimentos, incluindo as entrevistas com os pais.
Para refletir sobre a transformação no processo de atendimento, contemplando
a história de vida da criança, foram abordados conceitos da teoria
winnicottiana, a saber: holding, manejo e apresentação de objeto. Por fim, foi
possível concluir que o fonoaudiólogo que atua com problemas alimentares, a
partir de um setting favorável, pode oferecer ao paciente condições para uma
alimentação segura e prazerosa.
Palavras-chave: Fonoaudiologia. Pediatria. Distúrbio da Alimentação.
Winnicott.
ABSTRACT
The present paper had the objective of describing the transformation in the
clinical-therapeutical perspective occurred during the ambulatory speech-
language treatment of a young child with feeding problems that used an
exclusive alternative feeding via – gastrotomy. The difficulty concerning the
feeding dynamic was understood beyond the organical and functional aspects,
considering the patient’s familial context. Being applied a clinical exploratory
methodology, to collect the data there were used registrations (handbooks) of
the attendances, including the parents’ interviews. In order to reflect about the
transformation in the attendance process contemplating the child’s life history,
there were applied concepts of the Winnicottian theory, namely: holding, object
management and presentation. Finally, it was possible to conclude that the
speech-language therapist that deals with feeding problems, based on a
favorable setting, may offer the patient conditions to a safe pleasant feeding.
Key-words: Speech-language therapy. Pediatrics. Feeding Disorders.
Winnicott.
INTRODUÇÃO
_______________________________________________________________
A relação das pessoas com a alimentação vem sendo objeto de estudo
em várias áreas do conhecimento, em muito ultrapassando a dimensão
fisiológica do ato em si.
A Antropologia (CAIUBY, 1993) interessou-se pelo tema e buscou seus
sentidos na diversidade cultural dos povos; as Ciências da Saúde, sobretudo a
área da Nutrição (SÁ, 1990), buscam encontrar modos saudáveis de se
alimentar nas variadas condições enfrentadas pelo ser humano no ciclo de sua
vida. A Psicanálise desempenha papel importante nessa discussão,
salientando que alimentação é um aspecto essencial na comunicação
estabelecida entre a mãe e o bebê (WINNICOTT, 1999)
A Fonoaudiologia, área em que esta pesquisa se circunscreve, também
tem tratado as questões alimentares em grande parte de suas publicações.
Encontramos um grupo de estudos que compreende os distúrbios no processo
alimentar como alterações na dinâmica da deglutição, que geralmente é um
sintoma de uma doença de base, como por exemplo, nos casos de paralisia
cerebral ou de um traumatismo crânio-encefálico.
Esse distúrbio de deglutição é denominado disfagia, sendo definido
como
... um distúrbio da deglutição com sinais e sintomas
específicos, que caracterizam as alterações em qualquer etapa
e/ou entre as etapas da dinâmica da deglutição. A disfagia
pode ser congênita (devido a síndromes ou alterações
anatômicas) ou adquirida (após comprometimento neurológico,
mecânico ou psicológico) e pode gerar prejuízos em diversos
aspectos do indivíduo, tais como: nutricionais, de hidratação,
alterações pulmonares, alterações no prazer alimentar e social
(FURKIM; SILVA, 1999, p.07).
Hoje, porém, encontramos vários estudos que abordam os problemas
alimentares sem se aterem apenas à questão orgânica, e valorizando aspectos
destacados pela Psicanálise, como ambiente familiar, relações entre pais e
filhos, resistência e escuta.
Ferraz (2006), por exemplo, estudou as queixas alimentares de crianças
com distúrbios do apetite no contexto da clínica fonoaudiológica, entendendo
que era preciso ultrapassar um olhar voltado exclusivamente à funcionalidade
do processo alimentar, tendo em vista a hipótese de que acontecimentos de
ordem subjetiva propiciam condições para que os sintomas alimentares se
estabeleçam.
Estamos diante, então, de pontos de vistas diferentes sobre a mesma
questão, que obviamente levam a condutas e procedimentos diversos no
contexto clínico.
Nesse sentido, considero importante trazer um breve relato de meu
percurso na área, que me proponho focar aqui meu fazer clínico diante de
um caso de dificuldade alimentar.
Percurso pessoal: do enfoque orgânico à consideração
do ambiente familiar
O meu interesse pela disfagia teve início ainda na faculdade, durante os
estágios em Fonoaudiologia hospitalar
1
, em que realizávamos atendimentos à
beira do leito com pacientes adultos disfágicos, em sua grande maioria
seqüelados neurologicamente. E também com recém-nascidos prematuros que
tinham dificuldades na coordenação sucção/ deglutição e respiração,
dificultando assim a transição da via alternativa para a via oral de alimentação.
Após o término da graduação, durante a especialização em Motricidade
Oral, com enfoque em disfagia no âmbito hospitalar, e concomitante ao curso
de aprimoramento em disfagia infantil, defini que a população pediátrica seria
meu campo de atuação.
1
Fonoaudiologia Hospitalar: área que atua com o paciente ainda no leito, de forma precoce,
preventiva, intensiva, pré e pós-cirúrgica, dando respaldo técnico e prático à equipe
multiprofissional, sendo que o objetivo maior é impedir ou diminuir as seqüelas nas formas de
comunicação e de alimentação, causadas pela patologia (MARCHESAN, 2001).
A minha inserção na equipe do Setor de Disfagia Infantil da Irmandade
da Santa Casa Misericórdia de São Paulo -ISCMSP teve início três anos,
quando iniciei o Curso de Aprimoramento em Disfagia Infantil. Após a
conclusão do curso, continuei na equipe como aluna em extensão (monitora),
desenvolvendo atendimentos na UTI Pediátrica, ambulatório e enfermaria da
pediatria, com crianças de até 14 anos de idade que apresentam alterações na
dinâmica da deglutição
ou no processo da alimentação.
O trabalho fonoaudiológico desenvolvido na ISCMSP tem como foco o
tratamento/gerenciamento das disfagias orofaríngeas (neurogênica, mecânica
ou psicogênica), com uso de técnicas e manobras voltadas à transição da via
alternativa de alimentação
2
para a via oral, quando possível, bem como à
adequação da função alimentar, visando proporcionar uma melhora na
qualidade de vida dessas crianças.
A grande maioria dos atendimentos é voltada para crianças com déficit
na deglutição advindo de uma doença neurológica. também crianças
sindrômicas ou ainda com seqüelas mecânicas. Porém, algumas chegam ao
ambulatório com problema alimentar sem uma causa aparente; ou seja, a
doença de base não justifica o “não querer comer” ou ainda “não poder comer”.
De fato, nos últimos tempos, temos recebido alguns casos de problemas
alimentares caracterizados como recusa ou seletividade alimentar
3
, e ainda
aversão oral, ou seja, não só a alimentos, mas inclusive a toques na região oral
que, a princípio, não possuem causa aparente.
Então, diante dessa demanda, fui sentindo a necessidade de buscar
referências que me permitissem compreender as possíveis questões
emocionais e ambientais envolvidas - em especial no que diz respeito à
dinâmica familiar, relacionando-as às etapas da transição alimentar. De fato,
meus conhecimentos, ainda pautados no enfoque orgânico, foram se
mostrando limitados para a compreensão da complexidade do problema.
2
As vias alternativas de alimentação são: enteral (SOG- Sonda Orogástrica, SNG- Sonda
Nasogástrica, SNJ- Sonda Nasojejunal, GTM- Gastrostomia e JMT- Jejunostomia) e parenteral
(NPP- Nutrição Parenteral Prolongada; alimentação intravenosa de todos os nutrientes
necessários para o crescimento e desenvolvimento). (STANICH, 1999).
3
Recusa alimentar se caracteriza pela resistência em aceitar qualquer alimento; a
seletividade se expressa por preferências alimentares especificas.
Foi então que busquei o mestrado, e deparei com alguns estudos
voltados a essa temática que se baseavam na concepção winnicottiana a
respeito do desenvolvimento emocional humano. Winnicott (1999) ressalta em
sua obra a importância da relação mãe-bebê para a constituição do self, ou
seja, para o modo pessoal de ser e conviver da criança, tanto com seu mundo
interno quanto com as pessoas e os objetos fora dele. Safra (2005)
complementa afirmando que, ao nascer, a criança precisa de suporte e de
hospitalidade para que se desenvolva emocionalmente bem.
Para Winnicott (2001), a alimentação é um dos relevantes e vitais
cuidados de que o bebê necessita para se constituir como pessoa humana. Ele
reconhece a importância dos aspectos físicos e bioquímicos da alimentação,
mas volta seu interesse ao estudo dos aspectos pessoais e ambientais, pois
para ele todas as coisas que a mãe faz para seu bebê, em virtude de sua
dedicação, entram nele como um alimento.
O autor afirma ainda que, no caso de o bebê não receber o cuidado de
que necessita, ele passa por um grande sofrimento psíquico que prejudica
diretamente a sua formação vincular. Essas angústias são representadas por
sensações de vazio, de desintegração e dissociações entre o corpo e o
psíquico. Para Winnicott (op. cit.), a amamentação é um dos primeiros meios
de comunicação e formação de vínculo entre a mãe e seu bebê. No entanto,
algumas mães não se sentem aptas a amamentar os filhos
.
E como ajudá-las quando se encontram impedidas de exercer a
maternagem? Sabemos que não podemos ensiná-las (nem saberíamos como)
a serem mães. Cada uma faz sua parte como pode a partir da sua experiência.
Mas podemos compreender em que contexto vive essa família, como é o
ambiente familiar, como a criança em questão se relaciona com o seu mundo e
o que podemos fazer para ajudá-la dentro de nosso limite.
Para algumas crianças o momento da alimentação pode ser uma
experiência frustrante e angustiante. E ficar sem comer, não querer comer
pode ser um momento de alívio. Os sentidos aqui são muito variados e
dependem da biografia de cada um, o que inclui as suas particularidades e o
contexto em que transita.
Sendo assim, as expressões “não querer comer” e “não poder comer
pela boca”, que ouvi durante algumas anamneses, me levaram a buscar
compreender a dificuldade em se alimentar situando-a no contexto da relação
da criança com seu ambiente, principalmente representado pela mãe. Daí a
procura pelos estudos de Winnicott e também pela literatura fonoaudiológica
que vem discutindo possíveis formas de trabalhar com esses pacientes
4
.
A oportunidade de ingressar no mestrado coincidiu, então, com esse
período de busca de conhecimentos voltados para a importância do ambiente
como elemento capaz de potencializar o desenvolvimento da criança e assim
compreendê-la de modo mais integrado na sua individualidade.
Contemplar o ambiente no tratamento fonoaudiológico implica, porém,
em uma mudança significativa na perspectiva clínico-terapêutica. Trata-se de
um processo longo, com idas e vindas, oscilações entre paradigmas até se
tornar possível incorporar ao trabalho procedimentos condizentes com outra
forma de conceber o humano.
A presente pesquisa tem como objetivo então destacar, justamente, o
processo de transformação do manejo clínico terapêutico ocorrido durante o
tratamento fonoaudiológico de uma criança com problema alimentar.
Esse caso clínico foi atendido no ambulatório da Irmandade Santa Casa
Misericórdia de São Paulo. O trabalho teve início quando a criança estava com
02 anos e 05 meses de idade, sendo que, até essa idade, nunca havia
recebido uma dieta pela via principal da alimentação a via oral. Além disso,
essa criança apresentava um comprometimento do aparelho respiratório - com
03 anos e 10 meses havia sido internada muitas vezes por pneumonia, além
das idas e vindas a consultas médicas.
Penso que este estudo pode contribuir não só para a discussão sobre os
problemas alimentares na população pediátrica, como também para uma
reflexão sobre como a Fonoaudiologia vem intervindo junto a esses pacientes.
O trabalho está dividido em quatro capítulos. No primeiro, apresento
uma revisão bibliográfica dos problemas alimentares que podem acometer
crianças na primeira infância. No segundo, trago os estudos da área
fonoaudiológica referentes ao tema. No terceiro, apresento a metodologia
utilizada na pesquisa e como foram coletados os dados. E no quarto capítulo, a
4
Pesquisas desenvolvidas no Programa de Estudos de Pós-Graduados em Fonoaudiologia
pela Dra. Suzana M. Maia, que tem como objetivo discutir princípios e práticas clínicas
fonoaudiológicas à luz da Psicanálise de D.W. Winnicott, como por exemplo, os estudos de
Ferraz (2003), Pego (2005) e Ferraz (2006).
discussão do caso, tendo como foco a transformação no manejo clínico,
refletida a partir de aspectos da concepção winnicottiana. Em seguida
apresento a conclusão do estudo.
CAPITULO 1
Mecanismos da Alimentação: Normal e Patológico
Neste primeiro capítulo apresentamos uma revisão bibliográfica referente às
funções alimentares (sucção, mastigação e deglutição), os distúrbios
alimentares que podem ocorrer na população pediátrica e os problemas
respiratórios advindos com o distúrbio da deglutição.
1.1. As Funções Alimentares
Problemas na alimentação são freqüentes na clínica fonoaudiológica,
sendo trazidos pelas mães de nossos pacientes tanto logo no início do
trabalho, como queixa explícita, como também no decorrer do atendimento.
Trata-se, portanto, de uma questão que merece aprofundamento, não no
que diz respeito à dinâmica alimentar, mas também ao campo da subjetividade.
Iniciamos, então, abordando a complexidade das funções de sucção,
mastigação e deglutição, para assim compreendermos os quadros de
distúrbios alimentares na população pediátrica.
A função da sucção é um reflexo existente desde a vida intra-uterina,
sendo capaz de garantir a nutrição e hidratação desde as primeiras horas de
vida. A ação de sugar depende de uma coordenação da língua, do osso hióide
e dos músculos da mandíbula e lábio inferior. Tudo isso colabora para o
desenvolvimento de vários grupos musculares e da parte óssea da região oral,
favorecendo o equilíbrio entres essas estruturas (TANIGUTE, 1998).
O reflexo de Hooker é identificado no decorrer da
extensão cefálica, o palato se forma, a língua desce, a mão
toca os lábios, a boca se abre e a língua sai para tocar a mão.
Esses movimentos aparecem em torno da décima semana de
vida intra-uterina. Esta seqüência auto-erótica, primeira
manifestação reflexiva da exploração e da tomada de
possessão de seu corpo, permite ao embrião tornar-se feto. A
sucção é a função mais antiga e mais precoce a se colocar em
cena e a se manifestar no gênero humano (THIBAULT, 2006.
p.116).
O padrão inicial de sucção da criança é denominado suckling, e pode
ser definido como “movimento primário da língua”, caracterizando-se por um
movimento anteroposterior dessa estrutura; a protrusão da língua não vai além
da rima da boca. o segundo padrão de sucção na alimentação é
denominado sucking, se desenvolve por volta dos seis aos nove meses de
idade e é considerado o padrão mais maduro de sucção. Aqui, a língua se
movimenta de cima para baixo fortemente; uma atividade da musculatura
intrínseca, e a excursão de mandíbula torna-se mais limitada. A aproximação e
apreensão labial permitem uma maior pressão negativa dentro da cavidade oral
(LEVY; RAINHO, 2004).
Além da função de alimentação, desde o primeiro momento, a sucção
tem outros significados na vida do recém-nascido:
A sucção desempenha um papel fundamental na vida dos
recém-nascidos em seus primeiros meses de vida, seja pela
possibilidade de acalmia propiciada por ela, seja por sua
função primária de obtenção do alimento, e não ao alimento
físico, mas também como instrumento comumente utilizado
pelos bebês com suas mães no estabelecimento de uma
primeira relação amorosa infantil a uma pessoa (HERNANDEZ,
2001, p.8).
Outra função é a mastigação, considerada como a mais importante do
sistema estomatognático. Trata-se de um ato fisiológico complexo, que envolve
atividades neuromusculares e digestivas, sendo caracterizada como a ação de
morder, triturar e mastigar o alimento (TANIGUTE, 1998).
Diferentemente das outras funções do sistema estomatognático, que são
inatas, a mastigação é uma função aprendida e dependente de alguns fatores,
tais como: ansiedade, tipo de oclusão dentária, consistência do alimento, entre
outros (BIANCHINI, 1998).
Por fim, temos a função de deglutição, processo dinâmico e complexo
que requer a contração e o relaxamento coordenado de muitos grupos
musculares, que agem seqüencialmente para propelir o bolo alimentar da
cavidade oral até o estômago e garantir a proteção do trato respiratório
enquanto o alimento é engolido e digerido (SOUZA et al, 2003).
A deglutição envolve o córtex, o tronco cerebral, cerca de 30 músculos e
seis pares de nervos cranianos: V- trigêmio, VII- facial, IX- glossofaríngeo, X-
vago, XI- acessório e XII- hipoglosso (MARCHESAN, 1999).
As etapas da deglutição, de acordo com Furkim e Mattana (2004) e
Souza, Martins et al (2003) são:
Fase antecipatória: ocorre antes de o alimento ser captado.
Compreende uma etapa cognitiva no mecanismo da deglutição, pois
envolve mecanismos organizacionais, como: escolha do alimento,
posição/ postura durante alimentação, administração do alimento e
ambiente (grifo nosso).
Fase oral: é a fase de preparo, em que ocorre a captação e o
processamento do alimento por meio da mastigação (incisão, trituração
e pulverização) e formação de bolo alimentar, qualificando-o,
posicionando-o sobre a língua e ejetando-o para a faringe.
Fase faríngea: é uma fase involuntária na dinâmica da deglutição,
porém consciente. Tem início quando o impacto do alimento sobre os
receptores sensoriais, táteis e de pressão, localizados no palato mole,
na orofaringe, nos arcos fauciais e na porção faríngea da língua que
ativa o complexo motor, sendo propelido para a faringe. O bolo é
direcionado pela contração tônica dos músculos, com movimentos
peristálticos dos constritores, estreitando o lúmen faríngeo
seqüencialmente, separando a faringe em compartimentos a partir das
mudanças nos gradientes de pressão. Ocorrem, então, quatro eventos
seqüenciais estereotipados: contração da faringe, fechamento
velofaringeano, elevação e fechamento da laringe e abertura do
cricofaríngeo ou segmento faringoesofágico.
Fase esofágica: caracteriza-se como uma fase involuntária e
inconsciente. Essa fase tem início quando o alimento passa da faringe
para o esôfago, quando há a abertura do esfíncter superior do esôfago e
posteriormente o seu fechamento, permitindo que não haja refluxo do
alimento do esôfago para a faringe. O peristaltismo esofagiano promove
o transporte do bolo alimentar, por meio do esfíncter esofagiano inferior,
até o estômago, encerrando, assim, o processo de deglutição.
Vale ressaltar que a respiração deve ocorrer de forma harmônica em
todas as funções do sistema estomatognático. Quando respiramos, o ar
ambiente penetra pelas narinas ou cavidade oral (nos respiradores orais),
gerando um fluxo que se dirige à traquéia, passando pela faringe, laringe e
entrando pela glote. Ao nos alimentarmos, no momento em que deglutimos, as
vias aéreas estão protegidas da aspiração por uma variedade de mecanismos:
movimentos superior, inferior e anterior da laringe, aproximação das pregas
vocais, reposicionamento das pregas ariepiglóticas e epiglótica e coordenação
da respiração e deglutição (ISOLA, 2001).
Os atos de comer e respirar estão tão integrados que se torna
indispensável a observação atenta da deglutição do paciente em cada
momento, principalmente naqueles com problemas respiratórios (TOYOSHIMA
et al, 2005).
O fonoaudiólogo que atua com pacientes que apresentam alterações na
dinâmica, no processo de alimentação (caracterizada por alterações em
algumas das funções descritas acima) deve ter, então, um conhecimento
profundo dessas funções para, quando possível, reabilitar o paciente.
1. 2. As Alterações das Funções Alimentares
Vamos priorizar aqui as alterações alimentares que ocorrem na infância
e que caracterizam a disfagia infantil, tomando por base tanto os estudos que
se dedicam ao tema, como a própria experiência da pesquisadora em
atendimento ambulatorial e home care
5
na população pediátrica.
As alterações e dificuldades na dinâmica da alimentação podem ter
diversas etiologias e uma série de comprometimentos. De acordo com
Madureira (2005), os fatores de risco para a DISFAGIA NA CRIANÇA são:
Anomalias craniofaciais;
Uso de drogas pela mãe durante a gestação;
Infecções congênitas (TORCHAS: Toxoplasmose, Rubéola,
Citomegalovirus, Herpes, AIDS e Sífilis);
Idade gestacional inferior a 37 semanas;
Peso de nascimento inferior a 1.500g ou pequeno para a idade
gestacional (PIG);
Asfixia perinatal com APGAR
6
entre 0 e 4 no 1° minuto e/ou 0 a 6 no
minuto;
5
Home-care: Internação Domiciliar com todo e qualquer tratamento multidisciplinar
especializado que requeira atendimento 24 horas de equipe médica-enfermagem na casa do
paciente.
6
APGAR: consiste na avaliação de cinco sinais objetivos do recém-nascido no primeiro e
quinto minuto após o nascimento, atribuindo-se a cada um dos sinais uma pontuação de 0 a 2,
sendo utilizado para avaliar as condições dos recém-nascidos. Os sinais avaliados são:
Distúrbio metabólico da gestante e do recém-nascido;
Ventilação mecânica por mais de 10 dias;
Meningite, principalmente a bacteriana;
Infecções nasais e pulmonares;
Doenças pulmonares;
Distúrbios neurológicos;
Refluxo gastroesofágico (RGE);
Anomalias do sistema digestivo;
Alimentação inadequada do recém-nascido;
Failure to thrive ou perda de peso significativa e repentina;
Mudança repentina no padrão alimentar;
Mudanças de comportamento durante ou após a alimentação;
Escape oral freqüente e abundante (saliva e/ou bolo alimentar);
Tempo de alimentação superior a 30 minutos;
Problemas comportamentais durante oferta do alimento: recusa
alimentar, aversão, etc;
Força de sucção insuficiente e/ou suspeita de acometimento
neurológico;
Presença de tosse e/ou engasgos durante a alimentação;
Alteração no status fisiológico durante/depois da alimentação.
Essas alterações, na maioria das vezes, se repetem na mesma criança.
Uma criança disfágica, por exemplo, pode apresentar de 03 a 09 dessas
alterações, complicando o seu estado clínico.
É fundamental reconhecermos que a disfagia é geralmente um sintoma
de uma doença de base; ou seja, muitas doenças e distúrbios podem causar a
disfagia, e em qualquer idade. Porém, a maioria dos problemas associados à
pediatria é significativamente diferente daqueles que ocorrem em adultos
(SOUZA et al, 2003).
A disfagia pode estar presente em todas as etapas da dinâmica da
deglutição. Nas primeiras fases ela é classificada como disfagia orofaríngea, e
freqüência cardíaca, respiração, nus muscular, irritabilidade reflexa e cor da pele. (ALMEIDA
et al, 2005).
quando atinge a terceira e última fase da deglutição é denominada disfagia
esofagiana, sendo que, nessa fase, só o médico está capacitado para atuar.
Por meio de métodos diagnósticos, é possível determinar a gravidade do
distúrbio da deglutição, o que auxilia o profissional na indicação da consistência
alimentar mais adequada. Segundo Crary et al (2005), as alterações
encontradas na avaliação da disfagia podem ser classificadas em sete níveis,
sendo que essa classificação permite determinar a qualidade e a quantidade do
alimento, bem como a forma de administrá-lo:
Nível 1: nenhum alimento pode ser ingerido por via
oral;
Nível 2: dependente de tubo de alimentação com mínima oferta de
alimentação VO;
Nível 3: dependente de tubo de alimentação com ingesta oral constante
de alimento ou líquido – oferta de dieta VO parcial;
Nível 4: dieta via oral total com apenas uma consistência;
Nível 5: dieta via oral total com múltiplas consistências, mas necessita
de preparação especial ou compensações;
Nível 6: dieta via oral total com consistências múltiplas sem preparação
especial, mas com limitações específicas de alimento;
Nível 7: dieta via oral total, sem restrições.
também a Escala de Severidade da Disfagia “FOIS”: Functional Oral
Intake Scale
(CRARY et al, 2005)
:
Disfagia leve: quando o controle oral é incoordenado e a ejeção oral é
lenta, sem sinais sugestivos de penetração laríngea ou aspiração.
- Achados: alteração de esfíncter labial, incoordenação de língua,
alteração no reflexo de deglutição, ausência de tosse, sem
redução acentuada da elevação da laringe, sem alteração do
comportamento vocal após a deglutição e ausculta cervical
normal.
Disfagia moderada: quando o controle e a ejeção oral do bolo alimentar
estão lentos, com sinais sugestivos de penetração laríngea e aspiração.
- Achados: alteração de esfíncter labial, incoordenação de língua,
alteração ou ausência do reflexo de deglutição, ausência de tosse,
presença de tosse antes, durante ou após a deglutição, redução
na elevação da laringe, alteração do comportamento vocal após a
deglutição e ausculta cervical alterada.
Disfagia grave: quando presença de aspiração substancial e
ausência ou falha na deglutição completa do bolo alimentar.
- Achados: atraso ou ausência do reflexo de deglutição, redução na
elevação da laringe, ausência de tosse, presença de tosse durante
ou após a deglutição, alteração do comportamento vocal após a
deglutição, alteração respiratória evidente, ausculta cervical
alterada e deglutição incompleta.
Importante destacar que essas classificações se tornam possíveis
após a avaliação clínica e realização dos exames complementares, como a
Nasofibroscopia da deglutição e o Videodeglutograma, sendo este
considerado um exame de “padrão ouro”, pois permite visualizar, de forma
clara e objetiva, as etapas da deglutição em tempo real; nele, observamos
desde a entrada do alimento na boca até a chegada ao estômago.
No ambulatório de disfagia infantil da ISCMSP, para avaliar uma criança,
é dada a preferência sempre pelos alimentos que o ofertados em casa
pela cuidadora, como também pelos utensílios com os quais a criança está
familiarizada e, quando possível, pela mesma forma como é alimentada - se
na cadeira adaptada, no colo da mãe ou sentada à cadeira.
Os seguintes aspectos são então observados:
Aceitação do alimento pela criança;
Captação do utensílio utilizado – mamadeira, colher ou copo;
Vedamento labial;
Sucção; mastigação;
Presença de reflexos patológicos: gag, mordida fásica e protrusão
de língua;
Se há escape anterior do alimento; caso ocorra, é importante
observar se é em pequena, média ou grande quantidade;
Se preparação do bolo alimentar; é necessário observar se a
criança mantém o alimento na boca, sendo possível verificar a
ação da musculatura supra-hióidea, a lateralização e a rotação da
mandíbula na mastigação;
Tempo de trânsito oral – se é prolongado, diminuído;
Elevação laríngea;
Deglutição – eficiente ou ineficiente;
Se resíduos na cavidade oral após a deglutição ou ainda se
refluxo nasal;
Ausculta cervical: negativa ou positiva.
Tempo de oferta da alimentação.
Presença de sinais clínicos sugestivos de penetração laríngea
e/ou aspiração orotraqueal, tais como: tosse, cianose, engasgo,
sonolência, fadiga ou dispnéia.
A ausculta cervical é uma forma de se ouvir os sons da deglutição
mediante um instrumento de amplificação, o estetoscópio. Esse procedimento
ajuda a avaliar a fase faríngea da deglutição, sendo que os principais itens que
devem ser escutados são: a determinação da integridade do mecanismo de
proteção das vias aéreas e o timing desses sons associados à deglutição
(MCKAIG, 2001).
1.3. Outros Distúrbios Alimentares na Infância
Há, porém, outros problemas que podem prejudicar a dinâmica alimentar
da criança, como: a forma de alimentar, alguns utensílios inapropriados, a
postura da criança, dentre outros. Sendo assim, para que haja uma
alimentação segura e prazerosa, esses fatores devem estar harmônicos entre
si.
Temos também alguns distúrbios alimentares que são manifestações de
recusa ou seletividade alimentar.
A etiologia da recusa alimentar, na maioria das vezes, correlaciona-se
com as etapas de crescimento e desenvolvimento e com o papel dos pais no
cumprimento do ritual da alimentação (NOVA, 1986). O quadro pode ocorrer
tanto em crianças saudáveis quanto naquelas com desordens gastrointestinais,
com alterações neurológicas ou mecânicas, por exemplo.
No que diz respeito às causas orgânicas, as condições desfavoráveis
para a aceitação alimentar são: Refluxo gastroesofágico (RGE), problemas
respiratórios, desordens da motilidade intestinal, intolerância, alergias,
distúrbios do paladar, deficiências nutricionais (especialmente de zinco), lesões
orais e o próprio apontar dos dentes (LIFSCHITZ, 2001).
Quanto à seletividade alimentar, podemos caracterizá-la pela tríade:
recusa alimentar, pouco apetite e desinteresse pelo alimento (ABREU;
FISBERG, 2003).
O início da seletividade alimentar costuma coincidir com o período de
introdução dos alimentos sólidos, próximo dos 8-10 meses de idade, ou por
vezes antes, com a introdução da sopa, aos 5-6 meses. Trata-se de um quadro
muitas vezes transitório, correspondendo à fase de adaptação a novos
alimentos ou de reação frente a pequenas infecções de vias reas superiores
(SKINNER et al, 2002).
Porém, é importante ressaltar que muitos dos problemas alimentares
não dizem respeito ao ato de alimentar em si, mas são decorrentes de conflitos
oriundos de relações intrafamiliares. Refiro-me a crianças que têm uma
estrutura orgânica e funcional adequada para desempenhar a função alimentar,
porém não desempenham com êxito tal função - engasgam, tossem e chegam
a ficar sufocadas com o alimento na presença da mãe ou do cuidador; ou ainda
só comem por algo em troca, com alguém ou lugar específicos.
Portanto, é importante avaliar a relação da família com a criança por
intermédio da alimentação (ABREU; FISBERG, 2003).
1.4. Problemas Respiratórios e Disfagia
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), as doenças
respiratórias representam cerca de 8% do total de mortes em países
desenvolvidos e 5% em países em desenvolvimento. No Brasil, estima-se que
as doenças respiratórias sejam responsáveis por cerca de 16% de todas as
internações do Sistema Único de Saúde (SUS) (Ministério da Saúde, 2001).
Estudos revelam que, em países em desenvolvimento, ocorrem,
anualmente, cerca de 4 milhões de mortes em menores de cinco anos de idade
tendo como principal causa a pneumonia (FISS et al, 2000). As manifestações
respiratórias mais acentuadas na população infantil são: asma, síndromes
aspirativas, criança sibilante (bebê chiador), pneumonias e manifestações em
vias aéreas superiores (FUCCIO; PEREIRA, 2000; SOC. BRAS. ALERGIA E
IMONOPATOLOGIA,1998).
Os sistemas digestório e respiratório têm a mesma origem embrionária,
possuem conexão anatômica e correlação fisiológica e suprem o organismo de
substâncias essenciais à vida. Entretanto, durante a vigência de doenças,
alterações fisiopatológicas de um sistema podem refletir no outro (FISCHER;
PILZ, 2004):
Durante a respiração o ar utiliza, em parte do seu
trajeto, a mesma passagem que o alimento (cavidade oral e
faringe), exigindo precisão na vedação laríngea, no momento
da deglutição, para proteção da via aérea. Essa integração
entre os dois sistemas, digestivo e respiratório, faz com que
exista risco de aspiração mesmo para crianças com estruturas
e funções normais. O aumento da freqüência respiratória, a
modificação nos tempos de inspiração e expiração e a
diminuição do tempo de apnéia para a deglutição elevam
consideravelmente a possibilidade de aspiração (p.126-127).
Quaisquer alterações de natureza anatômica, funcional ou neurológica
podem determinar discinesias de caráter intermitente ou persistente no
progresso do bolo alimentar, desencadeando processos aspirativos de
alimentos deglutidos ou regurgitados (RODRIGUES et al, 1992).
As fontes mais comuns de aspiração são as secreções orofaríngeas
contaminadas por organismos patogênicos, o refluxo gastroesofágico e os
alimentos sólidos e líquidos (SOUZA et al, 2003).
As aspirações repetidas ou crônicas podem ter seu diagnóstico
retardado, pois em algumas crianças o reflexo de tosse pode estar ausente ou
reduzido, configurando as aspirações silenciosas, ou silentes, sendo estas
mais freqüentes em crianças com comprometimento neurológico (FISCHER;
PILZ, 2004).
Um processo aspirativo pode levar a um quadro de pneumonia. E ao
pensarmos em pneumonia aspirativa
7
, infecção ria que pode evoluir para a
morte do paciente, é comum caracterizarmos o distúrbio de deglutição como
causa, e a alteração pulmonar como conseqüência. Mas, de acordo com
Khoshoo e Edell (1999), a relação entre ambos não é unidirecional; ou seja,
7
Este tipo de pneumonia é decorrente da entrada de líquidos, secreções do próprio corpo ou
de outras substâncias da via aérea superior ou do estômago para dentro dos pulmões.
problemas respiratórios também podem ocasionar alteração em uma das fases
da deglutição.
Portanto, os profissionais que lidam com esses pacientes devem ficar
atentos também para a ocorrência de complicações durante as crises
respiratórias, que podem afetar o processo digestório, levando a um quadro de
disfagia.
De acordo com Souza et al (op.cit), é mais provável ocorrer aspiração
freqüente e de grandes quantidades de material em pessoas com disfagia,
tornando-as mais vulneráveis à pneumonia. Sendo assim, a disfagia é um risco
direto e indireto para a pneumonia.
uma instabilidade importante no processo de deglutição das crianças
com doença pulmonar e qualquer inadequação na maneira de alimentá-las,
tais como inadequações de postura, utensílio e/ou a consistência do
alimento, pode causar broncoaspiração.
Madureira e Farias (2006) fizeram um estudo que teve como objetivo de
investigar o padrão alimentar e relacioná-lo com possíveis sintomatologias
respiratórias, em uma população que se encontrava internada na pediatria da
Irmandade Santa Casa de Misericórdia de São Paulo- ISCMSP. Os dados
foram obtidos por meio de questionário aplicado diretamente ao cuidador.
Participaram desse estudo 21 crianças, sendo 12 do sexo masculino e
09 do sexo feminino, com faixa etária variando entre 04 e 18 meses, que
estiveram internadas na enfermaria da pediatria da ISCMSP, no período de
fevereiro a julho de 2006, com alguma sintomatologia respiratória do tipo:
pneumonias prolongadas, bronquiectasias, broncoespasmo, asma, crianças
sibilantes e síndromes aspirativas. Foram excluídas as crianças que nasceram
com síndromes, com doenças no Sistema Nervoso Central (SNC), com
patologias de esôfago, faringe e/ou doenças cardíacas.
As autoras concluíram que pode haver uma relação entre as
manifestações respiratórias e o padrão alimentar das crianças investigadas,
ressaltando que disfunções respiratórias podem ocasionar alterações na
deglutição, estando mais presentes em crianças que foram alimentadas por
mamadeira (furo do bico aumentado), mesmo que sentadas com apoio.
Ressaltam a necessidade de desenvolver a consciência, entre os membros da
equipe que atuam com tais crianças, para que as queixas respiratórias não
constituam um dado isolado na história delas e que essas queixas sejam
analisadas também em associação com o seu padrão alimentar.
A postura durante as refeições, o tipo de bico da madeira e o tamanho
do seu furo, o tipo de colher, a temperatura, a textura, a necessidade de
pausas durante a alimentação e o fracionamento da dieta são algumas das
intervenções que o fonoaudiólogo pode orientar ao cuidador e à equipe em um
caso de uma criança com desconforto respiratório importante (MADUREIRA;
FARIAS, 2006).
As orientações aos cuidadores durante a alimentação são fundamentais
para as crianças com doença pulmonar, mesmo para aquelas que o
apresentam queixas ou sinais de disfagia.
CAPITULO 2
______________________________________________________________
Neste capitulo apresento a literatura fonoaudiológica que se dedica aos
distúrbios alimentares na infância, tanto aquela voltada aos aspectos
organicistas como a que envolve conceitos da área psicanalítica.
2.1. Disfagia Orofaríngea: métodos diagnósticos
Na literatura fonoaudiológica uma quantidade maior de estudos
voltados aos distúrbios alimentares provenientes de alterações anatômicas e
funcionais, bem como aos procedimentos técnicos utilizados nos tratamentos.
A grande maioria desses estudos é realizada com crianças prematuras
ou com atraso no desenvolvimento global, geralmente associado a uma
encefalopatia crônica não evolutiva (E.C.N.E).
Os avanços tecnológicos e médicos nas três últimas décadas m
aumentado as chances de vida de crianças pré-termo e de baixo peso,
surgindo, então, novos desafios para os profissionais que com elas atuam.
Sabe-se que de 39% a 56% das crianças com problemas crônicos do
desenvolvimento, dentre eles a paralisia cerebral (P.C.), apresentam ou irão
desenvolver um distúrbio da deglutição, ou seja, uma disfagia (AURÉLIO et al,
2002).
As desordens da função motora oral podem gerar um espectro de
incapacidades em cada etapa do processo de deglutição com potenciais
interações simultâneas. Em um número significativo de crianças, as alterações
crônicas da deglutição resultam em desnutrição, desidratação, aspiração e
pneumonia. Os sintomas usualmente observados nesses casos o
regurgitação, dificuldade de deglutir a própria saliva, tosse no momento da
alimentação e instabilidade respiratória ou apnéia, dentre outros, que podem
gerar aversão para comer determinados alimentos, grande tempo despendido
com a alimentação e a necessidade de dieta especial, diferente da utilizada
pelo restante da família. Estes sintomas acabam gerando uma situação de
tensão e ansiedade nos pais, o que torna o ato de comer difícil, cansativo e de
pouco prazer (AURÉLIO et al, 2002).
Vários trabalhos abordam a disfagia em termos gerais, através de
métodos diagnósticos, como a Videofluoroscopia e Videoendoscopia da
Deglutição, em comparação com a avaliação clínica, e o prognóstico em cada
patologia de base. Outros relacionam o distúrbio a problemas pulmonares,
mais voltados à incidência de pneumonias aspirativas em pacientes com
disfagia.
Em relação especificamente ao universo infantil, também encontramos
na literatura fonoaudiológica vários estudos dentro desses parâmetros.
Paula et al (2002), em estudo clínico prospectivo randomizado,
realizaram avaliação objetiva através da videoendoscopia da deglutição
juntamente com uma equipe de fonoaudiólogas, auxiliando-as não no
diagnóstico como nas estratégias terapêuticas para a reabilitação da criança
com disfagia.
A avaliação foi realizada de forma dinâmica (funcional), em um grupo de
10 crianças entre 45 dias e 5 anos de idade, com média de 1 ano e 9 meses,
prematuras ou apresentando queixas de distúrbios da deglutição de origem
neurológica. Durante a avaliação, foram observadas alterações na fase
faríngea, que são mais bem identificadas com o exame, como distúrbios da
sensibilidade e motricidade faríngea, assim como a ocorrência de penetração
laríngea, que foi dividida em alta ou baixa, aspiração, ou déficits de clearance
8
após cada movimento de deglutição; foi também avaliada a coordenação
respiração-sucção-deglutição. Os autores concluíram que a videoendoscopia
da deglutição é um exame ágil e com alto grau de precisão, praticamente sem
riscos para a população pediátrica, norteando com segurança o trabalho de
terapia fonoaudiológica.
Furkim, Behlau e Wechx (2003) realizaram uma pesquisa cujo objetivo
foi caracterizar e comparar a deglutição em 32 crianças com paralisia cerebral,
pela avaliação clínica fonoaudiológica e videofluoroscópica, com ênfase na
aspiração traqueal.
Os resultados mostraram importante comprometimento da fase oral. Na
fase faríngea, a aspiração, a incompetência velofaríngea e o resíduo em
recessos faríngeos foram os mais encontrados. A aspiração foi encontrada
mais freqüentemente com líquidos, antes e durante a deglutição. Na avaliação
clínica e na videofluoroscopia, a hiperextensão cervical foi a anormalidade
8
Clearance: eficiência de limpeza após movimentos de deglutição.
postural mais encontrada. A videofluoroscopia confirmou a presença de
aspiração na maioria dos casos que apresentaram sinais sugestivos de
aspiração na avaliação clínica da deglutição.
As autoras concluíram que a avaliação clínica e a videofluoroscópica são
complementares na avaliação da deglutição; juntas podem indicar a conduta
mais adequada na reabilitação.
Aurélio et al (2002) compararam os padrões de deglutição em crianças
com paralisia cerebral e crianças sem distúrbios neurológicos, relacionando a
disfunção motora oral, a quadriplegia e a consistência dos alimentos com o
tempo de deglutição. Participaram desse estudo 76 crianças com idades
variando de 1 a 5 anos, das quais 57 eram portadoras de paralisia cerebral e
19 não apresentavam distúrbios neurológicos. Foram examinadas três
consistências de alimentos: líquida (suco), pastosa (iogurte) e sólida (bolacha),
sendo cronometrado o tempo gasto para deglutir cada uma delas, durante o
horário normal de lanche das crianças.
Os resultados mostraram que:
1) O grupo com P.C levou até 14,2 vezes mais tempo para deglutir os
alimentos que o outro grupo;
2) Quanto maior era a disfunção motora oral das crianças, maior o
tempo gasto para deglutir os alimentos;
3) Das três consistências pesquisadas, o alimento pastoso foi aquele em
que os tempos de deglutição obtidos de cada grupo estiveram mais próximos.
O grupo quadriplégico foi o de pior desempenho em relação à função
motora oral e aos tempos de deglutição dos alimentos, sendo o que necessita
de maior atenção no tocante às questões da deglutição.
do estudo de Rosado et al (2005) participaram 55 crianças na faixa
etária de 1 a 13 anos, internadas na UTI e enfermaria do Hospital João XXIII
em Belo Horizonte – MG, sendo o objetivo avaliar a ocorrência e a classificação
de disfagia nos pacientes pediátricos vítimas de TCE, bem como descrever as
alterações fonoaudiológicas. Dentre estas, as mais freqüentes foram: alteração
do vedamento labial, aumento do tempo de trânsito oral e faríngeo, escape oral
anterior do alimento, mastigação lenta e incoordenada, ejeção oral fraca,
diminuição na elevação da laringe, deglutições múltiplas, penetração e
aspiração laríngea. Dos 55 pacientes, 20 foram classificados como disfágicos,
assim distribuídos: 29,1% disfagia leve; 5,3% disfagia moderada; 3,6%
disfagia grave. Portanto, os autores concluíram que a disfagia mais comum foi
a de grau leve, e a maioria da amostra não necessitava de vias alternativas de
alimentação.
A utilização de técnicas específicas para se estabelecer um claro
diagnóstico sobre o distúrbio da deglutição contribui para o desenvolvimento de
protocolos de tratamento criativos e realistas. A observação da função de
deglutição colabora para a previsão de um desenvolvimento sadio e uma
melhor qualidade de vida das crianças com disfagia.
2.2. Disfagia e Nutrição
A disfagia pode conduzir o indivíduo a um quadro de desnutrição, uma
vez que redução ou restrição da ingesta alimentar. O estado nutricional
comprometido pode ser resultado da dificuldade de ingerir alimentos lidos e
líquidos, ou ainda devido à anorexia ou ao medo de comer (SOUZA et al,
2003).
Em alguns casos, quando a fase oral está bem comprometida, o
paciente apresenta uma dificuldade maior em alimentar-se, pois uma grande
parte do alimento escapa para fora da boca (escape anterior do alimento).
Nesses pacientes o tempo de refeição é prolongado, e isso também é um fator
para a desnutrição.
A desnutrição é um risco estabelecido para a
pneumonia, pois: torna a pessoa suscetível à colonização
alterada na orofaringe e reduz a resistência à infecção pela
depressão do sistema imunológico; pode levar à letargia,
fraqueza e redução na condição de alerta, situações que
podem aumentar a probabilidade de aspiração; pode reduzir a
força empregada para tossir e o clareamento mecânico dos
pulmões (SOUZA et al, 2003, p.14).
Na literatura, encontramos a descrição de dois tipos sicos de
desnutrição: a desnutrição protéico-calórica (DPC) ou de Kwashiorkor e a
desnutrição protéico-energética (DPE), também denominada marasmo. Ambas
são causadas por uma ingestão inadequada de calorias, resultando em uma
deficiência de proteínas e micronutrientes (nutrientes necessários em
quantidades pequenas, como vitaminas e alguns minerais).
Mas, de acordo com Monte (2000), a desnutrição grave pode
apresentar-se ainda de uma terceira forma, que seria a Marasmo-Kwashiorkor.
O autor assim descreve esses três quadros de desnutrição:
1. Marasmo: criança fica com baixa atividade, pequena para a idade, com
membros delgados devido à atrofia muscular e subcutânea, costelas
proeminentes, pele solta e enrugada na região das nádegas; apresenta
ainda infecções constantes, comumente é irritadiça e seu apetite é
variável;
2. Kwashiorkor: déficit importante de estatura, massa muscular
consumida, tecido gorduroso subcutâneo preservado, alterações de pele
dos membros inferiores, alterações dos cabelos, hepatomegalia, face de
lua, anasarca e baixa concentração sérica de proteínas e albumina, área
perineal freqüentemente irritada com dermatites e escoriações devido a
diarréias. A criança mostra apatia exagerada, raramente responde a
estímulos e não apresenta apetite.
3. Marasmo-Kwashiorkor: essa desnutrição pode advir de um marasmo
que entrou em déficit protéico ou de um Kwashiorkor que passou a
sofrer ficit energético. Estão presentes: retardo da estatura, do
desenvolvimento neuropsicomotor e queda da resistência imunológica.
A perda de peso também pode ser causada ou exacerbada pelo uso de
alguns medicamentos que causam anorexia, infecção, alterações no paladar,
náuseas e desconforto abdominal, tais como: antineopláticos; inibidores da
captação seletiva da serotonina; estimulantes; antiinflamatórios não-
esteroidais; descongestionantes e analgésicos narcóticos. Alopurinol, anti-
histamínicos e griseofulvina, entre outros, podem alterar o paladar; enquanto
fármacos como captopril, lítio e claritromicina podem produzir paladar metálico
(BRANDT, 1999).
Em alguns pacientes desnutridos, mesmo com uma deglutição eficiente,
é então sugerida uma via alternativa de alimentação para aporte nutricional.
O suporte nutricional compreende a administração de nutrientes por via
enteral ou parenteral. Essa escolha irá depender dos objetivos do tratamento e
das perspectivas de reabilitação do paciente disfágico. As vias de nutrição são:
Enteral: a nutrição enteral pode ser definida como a
administração de dietas líquidas especializadas, com uma fórmula
química definida, pela via oral, por meio de cateteres
nasoentéricos ou enterostomia (LAMEU; ANDRADE, 2003).
Parenteral: compreende a administração de nutrientes por meio
de um acesso venoso feito por cateteres. É indicada quando
impossibilidade de utilização do trato gastrointestinal, ou quando
é necessária uma recuperação rápida do estado nutricional de
pacientes hospitalizados. As soluções são preparadas com
produtos farmacológicos, e a administração exige o
acompanhamento constante da equipe de enfermagem
(STANICH, 1999).
Assim, um paciente com disfagia para líquidos pode ser beneficiado
recebendo suplementação líquida pela via enteral, pelas sondas SOG - sonda
orogástrica, SNG - sonda nasogástrica ou SNE - sonda naosoentaral. Essas
vias alternativas de alimentação são indicadas por um período de tempo não
tão prolongado.
Nas disfagias severas a indicação do suporte nutricional enteral
mais prolongado é inevitável, podendo se optar pela
localização mais adequada ao estado clínico do paciente:
gastrostomia (orifício em nível gástrico) ou jejunostomia (orifício
em nível intestinal) (STANICH, 1999. P.135).
A gastrostomia pode ser realizada de duas maneiras, via endoscópica e
via cirurgia. Atualmente, a gastrostomia via endoscópica é o método mais
utilizado para o acesso prolongado ao trato entérico (LAMEU; ANDRADE,
2003).
O acompanhamento nutricional do paciente disfágico deve ser
individualizado, procurando-se, dentro do possível, adequar a oferta de
nutrientes às condições clínicas, junto com a evolução terapêutica do paciente.
Além desses estudos, encontramos também, ainda que em menor
quantidade, pesquisadores e clínicos da área que buscam outras formas de
abordagem do problema alimentar, em especial por meio de um diálogo com a
Psicanálise, como veremos no próximo item.
2. 3. Diálogo entre Fonoaudiologia e Psicanálise
nos Distúrbios Alimentares
alguns anos, Cunha (1997) analisou as possibilidades de articular
Fonoaudiologia e Psicanálise, a partir do pressuposto de que o estudo do
psiquismo humano é indispensável ao método clínico fonoaudiológico. Hoje,
alguns estudos seguem essa linha de raciocínio, trazendo princípios da teoria
psicanalítica para o entendimento de vários campos de atuação do
fonoaudiólogo. Abordamos aqui o campo dos distúrbios alimentares.
Duarte (2006) discutiu os aspectos orgânicos, psíquicos e sociais que
influenciaram nos processos de reabilitação de dois pacientes disfágicos,
atendidos no âmbito hospitalar. De acordo com a autora, os subsídios teórico-
práticos abordados pela literatura fonoaudiológica voltada para a reabilitação
do paciente disfágico não se mostraram suficientes para explicar por que esses
pacientes resistiam à aceitação da dieta pela via oral, mesmo quando
apresentavam condições de retirar as vias alternativas de alimentação.
Então, embasando-se na teoria psicanalítica, a autora pôde analisar e
compreender as questões subjetivas presentes nos casos, as quais interferiam
no processo de reabilitação, como medos e angústias. E concluiu que o
fonoaudiólogo pode articular as dimensões orgânicas e psíquicas no
tratamento da disfagia, realizando uma terapia que envolva as duas
perspectivas.
Também Steinberg (2007) discutiu a articulação entre cnicas
fonoaudiológicas específicas para o tratamento de pacientes disfágicos e a
escuta terapêutica dos conteúdos psíquicos subjacentes ao sintoma. Em seu
estudo com um adulto disfágico, concluiu que a escuta, aliada à competência
técnica do fonoaudiólogo, constitui-se no dispositivo fundamental para a
efetividade do método clínico fonoaudiológico.
Para Machado (2007), os aspectos funcionais e fisiológicos da
alimentação são tão importantes quanto considerar a dimensão subjetiva dos
sintomas alimentares, pela função constitutiva que a alimentação tem para o
sujeito. Em sua dissertação, a autora discutiu as possíveis relações entre os
problemas alimentares e os de linguagem oral, a partir do ponto de vista
biopsíquico. A teoria psicanalítica forneceu o embasamento necessário para
estabelecer a relação entre alimentação e linguagem oral, a partir do conceito
de oralidade.
Machado (op. cit.) sugere, ainda, que faça parte da rotina dos
profissionais que trabalham com a linguagem de crianças uma investigação de
seu comportamento alimentar, mesmo quando não existirem queixas referentes
à alimentação.
Com relação à população pediátrica, Mariotto (2003) discutiu os
distúrbios alimentares em bebês portadores de refluxo gastroesofágico,
articulando a noção de sujeito para a Psicanálise e a importância da oralidade
no estabelecimento do laçoe-bebê, principalmente no que se refere à
experiência de frustração.
Em sua dissertação de mestrado, Ferraz (2006) buscou compreender os
significados das queixas alimentares de duas crianças com distúrbio do apetite
que serviram de amostra da pesquisa, baseando-se na teoria do
desenvolvimento emocional de Winnicott:
A breve retrospectiva da história dos dois pacientes
que serviram de amostra nos levou a conhecer importantes
fatores ambientais que interferiram na constituição de seus
sintomas, sendo que, ao longo da investigação, foi possível
consolidar a idéia de que a dimensão psíquica e as funções
orais do processo alimentar são fenômenos inerentes à
condição humana e nunca devem ser dissociados (Ferraz, op.
cit., p. 123).
A autora nos alerta para a necessidade de irmos adiante, não nos
restringindo a uma atuação clínica voltada exclusivamente para a função da
alimentação, pois algumas falhas no ambiente podem propiciar condições para
que sintomas alimentares se estabeleçam.
2. 4. Abordagem dos Distúrbios Alimentares na
Visão Winnicottiana
Como também nos utilizamos do referencial teórico winnicottiano neste
estudo, optamos por apresentar brevemente aqui conceitos que nos parecem
fundamentais não para compreender os problemas alimentares em outra
dimensão, como também no que se refere ao manejo clínico fonoaudiológico,
aqui em foco.
D.W.Winnicott (1896 1971) foi um importante psicanalista inglês que
dedicou particular importância ao ambiente humano na constituição de uma
pessoa, daí derivando um modo muito singular de compreender o
desenvolvimento emocional. Para o autor, o relacionamento entre a mãe e o
bebê, em suas primeiras semanas ou meses de vida, é decisivo.
Winnicott (1975) nos diz que cada ser humano traz um potencial inato
para amadurecer, para se integrar. Porém, o fato de essa tendência ser inata
não garante que ela realmente ocorrer, pois dependerá de um ambiente
facilitador que forneça cuidados suficientemente bons. E, no início, esse
ambiente é representado pela mãe:
Nas primeiras fases do desenvolvimento emocional do bebê
humano, um papel vital é desempenhado pelo meio ambiente,
que, de fato, o bebê ainda não separou de si mesmo.
Gradativamente, a separação entre o não-eu e o eu se afetua,
e o ritmo dela varia de acordo com o bebê e com o meio
ambiente. As modificações principais realizam-se quanto à
separação da mãe como aspecto ambiental objetivamente
percebido. Se ninguém ali está para ser, a tarefa
desenvolvimental do bebê torna-se infinitivamente complicada
(op. cit., p. 153).
O bebê precisa mais do que nascer em termos biológicos; ele precisa
sentir que nasceu em uma família, em uma comunidade. Todos temos a
necessidade de nascer no mundo humano para que possamos nos constituir
(SAFRA, 2005):
(...) o corpo tocado, o corpo tratado, o corpo cuidado, é
banhado de inúmeras formas estéticas significativas que
permitem que este corpo se organize como linguagem. É esse
corpo, transfigurado pela presença materna, que carrega em si
uma elaboração das funções em termos de imagens e
significações que possibilitará que o psiquismo possa se
originar e se estabelecer na corporeidade (SAFRA, 2005, p.17).
O desempenho da função materna descrito por Winnicott (1999) é
possível de acontecer porque a mãe encontra-se num estado psicológico
especial, ao qual ele denominou preocupação materna primária. Nesse
período, verifica-se nela um aumento de sensibilidade, o qual se estende do
final da gravidez até algumas semanas depois do parto. Essa sensibilidade lhe
permite identificar-se com o bebê, o que facilita atender as suas necessidades
de modo adequado. Para viver esse estado, a mulher necessita do apoio do pai
da criança, para que este realize aquilo que, no momento, ela não está em
condições de realizar, já que se encontra ocupada com o filho.
Importante destacar que, na visão winnicottiana, a capacidade de
reconhecer e atender às necessidades de um bebê, conhecida como função
materna, pode ser desempenhada por qualquer pessoa que esteja disponível
para exercê-la.
A expressão primeira mamada teórica é representada na vida real pela
soma das experiências reais de muitas mamadas
.
Ela é importante por
estabelecer o primeiro contato do bebê com a realidade e a constituição do si
mesmo.
Após a primeira mamada teórica, o bebê começa a ter material com o
qual pode criar, alucinar o mamilo, no momento em que a mãe está pronta para
oferecê-lo.
Essas memórias são construídas a partir de inúmeras impressões
sensoriais, associadas à atividade de amamentação e ao encontro do objeto
(mãe) (WINNICOTT, 1999).
A função de mãe exige, no entanto, firmeza e limites claros, para que
seja possível discriminar o eu do outro. Pessoas que não puderam ter uma boa
matriz desses limites entre o eu e o outro podem vir a apresentar diversas
dificuldades emocionais, inclusive com sintomatologia alimentar.
Ao se oferecer o leite para o bebê, desencadeia-se uma sensação de
prazer, conforto, proteção e aconchego além de saciar a fome. Dessa forma,
imprime-se um elo entre o alimento e os sentimentos. Obviamente, os bebês
não choram só quando estão com fome e se sempre forem atendidos com o
oferecimento de alimento para aplacar o seu desconforto emocional, podem vir
a construir relações negativas ou equivocadas entre alimento e afeto
(WINNICOTT, 1999) .
Muitos dos aspectos importantes da situação de
amamentação também estão presentes quando se utiliza a
mamadeira. Por exemplo, o fato de a mãe e seu bebê olharem-
se nos olhos, que é uma característica do estágio inicial, é algo
que absolutamente não depende do uso do verdadeiro seio.
Esta afirmação, porém, deixa margem a dúvidas, uma vez que
o gosto, o cheiro e a experiência sensual da amamentação
estão ausentes quando o bebê se às voltas com o bico de
borracha da mamadeira (WINNICOTT, 1999; pp. 24-25).
Para Winnicott, a função ambiental deve envolver, basicamente: o
segurar, o manejar e a apresentação dos objetos. O segurar, denominado
holding, diz respeito tanto ao segurar físico como emocional, levando à
integração pessoal do bebê no tempo e no espaço, resultando em experiências
relacionadas com a estabilidade, assiduidade e autenticidade dos cuidados
maternos. Segundo Winnicott, o essencial reside na maneira de ser da mãe,
em seu estado de devoção ao seu filho, que, por sua vez, lhe confere certa
qualidade no cuidar (WINNICOTT 1982; SAFRA, 2006).
O holding exerce diferentes funções nos distintos momentos da vida de
um sujeito, sendo importante durante toda a vida, uma vez que sustentação e
reconhecimento são elementos imprescindíveis do permanente processo de
subjetivação.
Quanto ao manejar, denominado handling, trata-se do favorecimento do
meio ambiente ao alojamento da psique no corpo, proporcionado pela interação
mãe-bebê, mediada pelo contato corporal, e também pelas compreensões
maternas das manifestações corporais do filho como comunicações pessoais
(WINNICOTT, 1982).
É através do cuidado com o corpo do bebê, da satisfação de suas
necessidades de movimento e expressão corporal e da facilitação de
satisfações cutâneas e musculares que a mãe oferece experiências afetivas e
físicas ao bebê e demonstra todo o seu amor, que aqui significa aceitá-lo e a
seu corpo sem restrições. (CELERI, 2005).
Por fim, a apresentação de objetos diz respeito ao benefício resultante
das relações objetais iniciais entre mãe-bebê, em que a mãe, em estado de
devoção, fornece o objeto necessitado pela criança, no momento mesmo de
sua necessidade, o que confere ao gesto materno a qualidade de precisão. Tal
cuidado é guiado não por uma cnica artificialmente compreendida e aplicada,
mas pelo reconhecimento das necessidades do bebê em um período de vida
pré-verbal. Por intermédio da apresentação de objetos, Winnicott (1982)
postulou o estabelecimento gradual da realidade compartilhada e o senso de
realização pessoal.
Segundo Safra (2006), as necessidades de um bebê não são apenas
corporais; também a necessidade de experiências que podem ser
propiciadas pela relação com um objeto e que favorecem o estabelecimento de
estruturas psíquicas e a integração de aspectos do eu.
Um ambiente suficientemente bom pode ser definido em termos da
segurança e continência com que consegue se apresentar frente às crises e
testes pelo qual passará e pela capacidade de permitir que estes aconteçam e,
mesmo assim, continuar estável (WINNICOTT, 1999).
Ao mesmo tempo em que a mãe facilita, de forma especializada, cada
uma das tarefas do bebê, o conjunto dos cuidados maternos constitui o
ambiente total, e o modo de ser da totalidade dos cuidados configura um
mundo para o bebê.
De acordo com sua teoria, neste começo de desenvolvimento psíquico
mãe é sinônimo de ambiente. Muito embora, no geral, ela seja apta a funcionar
como um ambiente facilitador ao desenvolvimento dos processos emocionais
do bebê, casos em que uma mulher nunca consegue sê-lo ou, se consegue
com um filho, pode falhar no cuidado em relação a outro. Partindo dessa
premissa, o ambiente pode ser ou não facilitador dos processos de maturação
(WINNICOTT, 1971).
Dos conceitos aqui apresentados da teoria winnicottiana, três deles
fizeram parte do tratamento de Regina. A saber: holding, manejo e
apresentação de objeto. O holding, como maneira de "sustentar" e de cuidar
da paciente, sempre no sentido de aproximação de suas necessidades. O
manejo foi desenvolvido como uma condição importante para que,
gradativamente, a paciente pudesse ser apresentada a novos objetos, no caso
a alimentação, sem sentir-se invadida (Maia, 2006).
CAPITULO 3
Método
Utilizamos nesta pesquisa a metodologia clínica qualitativa,
apresentando registros e análise do manejo clínico ao longo do atendimento de
uma criança que apresentava problemas com a alimentação.
3. 1. O caso selecionado
A criança selecionada para o presente estudo chama-se Regina
9
, e
tinha, na ocasião, 02 anos e 05 meses de idade. Os pais, Fabiana e Valdir,
levaram-na ao ambulatório de Disfagia Infantil da Irmandade Santa Casa
Misericórdia de São Paulo (ISCMSP) porque ela “não podia comer pela boca”,
sendo alimentada via gastrostomia desde o segundo mês de vida. Segundo a
mãe, Regina nunca havia recebido tratamento fonoterápico, sendo que, desde
o seu nascimento, esperavam vaga em outra instituição, que recentemente
havia então contatado os pais para encaminhá-la ao local desta pesquisa.
3. 2. Perfil do local da pesquisa
A pesquisa foi realizada na Irmandade Santa Casa Misericórdia de São
Paulo ISCMSP, em São Paulo, especificamente no ambulatório de Disfagia
Infantil, que está inserido nos serviços dos ambulatórios das especialidades
pediátricas. Esse ambulatório faz parte do setor de Fonoaudiologia: Disfagia
Infantil, que também realiza atendimentos no berçário, UTIN (Unidade de
Terapia Intensiva Neonatal), Alojamento Conjunto, UTI - Pediátrica e
Enfermaria da Pediatria (leitos), sendo o trabalho voltado para os distúrbios da
deglutição em crianças de até 14 anos de idade. Também são realizados, em
parceria com o médico otorrinolaringologista, exames objetivos da deglutição,
como a nasofibroscopia da deglutição e o videodeglutograma.
Para os atendimentos ambulatoriais de crianças disfágicas, a Instituição
conta com seis fonoaudiólogas: a supervisora, uma aluna de extensão (a
pesquisadora) e quatro alunas do curso de Aprimoramento em Disfagia Infantil.
Cada aluna atende, em média, quatro pacientes, uma vez por semana, durante
9
Conforme pedido da mãe da paciente, serão mantidos os nomes verdadeiros dos familiares.
40 minutos. Para esse trabalho, a Instituição dispõe de três salas, compostas
de mesa, cadeiras, pia, e em duas delas há uma maca.
3. 3 Rotina de cuidados
Os pacientes chegam até a equipe por encaminhamentos de médicos
(pneumologista, gastroenterologista, neurologista, cardiologistas, fisiatras,
dentre outros) e profissionais da saúde que fazem parte da ISCMSP. Mas há
também pacientes encaminhados de outras instituições.
Quando o paciente é chamado para o atendimento ambulatorial (há uma
lista de espera), são marcados previamente o horário, o dia da semana e
designada a fonoaudióloga que atenderá o caso.
No primeiro encontro é realizada uma anamnese com o cuidador
responsável pela criança, sendo levantada toda a história clínica desta, bem
como informações que indiquem o distúrbio alimentar. De acordo com esses
dados, é marcada uma avaliação funcional da alimentação para a sessão
seguinte. Todos os dados da anamnese e da avaliação são registrados em
formulários específicos. Caso essa criança apresente alterações na dinâmica
da alimentação, ela é inserida nos atendimentos fonoterápicos que visam uma
adequação ou melhora do padrão alimentar.
Todos os dados são registrados em formulários, que ficam em pastas
individuais do setor e no prontuário do Hospital. A cada sessão de atendimento,
é registrado todo o procedimento, assim como os resultados de exames e de
encaminhamentos.
Os cuidados desse ambulatório são voltados para a melhora do padrão
alimentar, gerenciamento das disfagias orofaríngeas e transição da via
alternativa de alimentação para via oral, desde que esse procedimento seja
possível. Para isso, o usadas técnicas, manobras e orientações de cuidados
quanto à oferta, utensílios e postura durante as refeições.
Caso haja necessidade de acompanhamento de dieta ofertada pelos
pais (após treinamento) em casa, é fornecido um formulário (Formulário de
Acompanhamento de Dieta) para que os mesmos anotem todos os dados
solicitados.
O fonoaudiólogo responsável pelo caso participa das discussões clínicas
com a supervisora do setor e com a equipe multidisciplinar.
Se os dados fornecidos pelos pais são considerados incompletos para o
esclarecimento do caso, o fonoaudiólogo realiza uma pesquisa detalhada para
levantar toda a história clínica do paciente, por meio do prontuário da
Instituição.
Para esta pesquisa, o procedimento da rotina de atendimento
ambulatorial seguiu o esquema acima descrito.
3. 4 Procedimento das Etapas de Campo
Os dados referentes à paciente selecionada e ao manejo terapêutico da
pesquisadora-fonoaudióloga foram coletados durante os atendimentos no
ambulatório da disfagia infantil da ISCMSP, durante o período de fevereiro de
2006 a julho de 2007, na forma de anamnese e encontros com os pais,
avaliação funcional e objetiva da deglutição e atendimento individual com a
criança.
Após cada sessão, a pesquisadora-fonoaudióloga fazia relatos por
escrito no prontuário. O mesmo acontecia quando as sessões tinham a
participação dos pais da criança.
Os recursos materiais usados durante o processo terapêutico foram,
basicamente: brinquedos na forma de miniaturas dos utensílios domésticos
(fogão, geladeira, liquidificador, panelas, pratos, xícaras, copo, colher, garfo,
faca, mamadeira e cesta de compras) e de alimentos (biscoito, verduras e
frutas), e uma boneca.
Também foram usados alimentos na consistência líquida, pastosa e
sólida, levados pelos responsáveis de acordo com a preferência da criança,
para as sessões de transição da via alternativa para a via oral de alimentação.
A pesquisa foi submetida à aprovação do Comitê de Ética e Pesquisa
(CEP) da ISCMSP (Projeto n°005/07) / (ANEXO A). Além disso, foi
apresentado aos pais da criança o Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido (ANEXO B), conforme os fundamentos do CEP, no qual constam o
objetivo e as etapas da pesquisa. Os responsáveis pela criança concordaram
com as informações que lhe foram apresentadas, e assinaram duas vias, uma
que ficou com eles e outra com a pesquisadora
10
.
3. 5 Tratamento do Material Coletado
Na apresentação do caso, trazemos trechos das sessões realizadas
com os pais e com a criança, bem como as impressões inicias da equipe.
Na análise, a partir dos pressupostos teóricos de Winnicott, enfocamos
as mudanças ocorridas nos procedimentos terapêuticos adotados pela
fonoaudióloga, privilegiando temas como: a necessidade de acolhimento da
criança e de seus familiares, a importância dos cuidados ambientais na fase
inicial da vida, o lugar do brincar no processo de atendimento.
10
Os pais da criança foram informados pela fonoaudióloga-pesquisadora, e concordaram com
a divulgação do trabalho terapêutico no âmbito acadêmico.
É Bom Ser Criança
É bom ser criança,
Ter de todos atenção.
Da mamãe carinho,
Do papai a proteção.
É tão bom se divertir
E não ter que trabalhar.
Só comer, crescer, dormir, brincar.
É bom ser criança,
Isso às vezes nos convém.
Nós temos direitos
Que gente grande não tem.
Só brincar, brincar, brincar,
Sem pensar no boletim.
Bem que isso podia nunca mais ter fim.
É bom ser criança
E não ter que se preocupar
Com a conta no banco
Nem com filhos pra criar.
É tão bom não ter que ter
Prestações pra se pagar.
Só comer, crescer, dormir, brincar.
É bom ser criança,
Ter amigos de montão.
Fazer cross saltando,
Tirando as rodas do chão.
Soltar pipas lá no céu,
Deslizar sobre patins.
Bem que isso podia nunca mais ter fim.
Toquinho
CAPITULO 4
_______________________________________________________________
Neste capítulo apresento uma análise do processo terapêutico vivido com
Regina, sendo que a intenção é identificar e compreender as transformações
ocorridas no percurso, pois, à medida que compreendia as necessidades de
minha paciente, a perspectiva clínico-terapêutica se alterava.
Inicio com uma apresentação do caso (Parte I), no sentido de
contextualizar e situar o leitor no processo de atendimento. Em seguida (Parte
II), apresento episódios clínicos e algumas questões que foram ganhando
corpo durante o trabalho realizado com Regina.
Parte I
Regina: a menina que
não podia comer pela boca
4.1 Diagnóstico inicial
De acordo com os dados coletados nos documentos de resumo de alta,
Regina nasceu a termo, de parto cesárea, adequada para a idade gestacional,
pesando 3.070kg, com 49 cm de estatura e APGAR: 9’10.
Durante a gestação, o ginecologista que acompanhou o pré-natal
detectou oito miomas uterinos na e, e por isso indicou um parto prematuro,
para que o bebê não entrasse em sofrimento fetal. Mas a mãe não aceitou
essa indicação e levou a gestação até o final. Além dos miomas, ao final dos
sete meses de gestação, um exame clínico evidenciou polidrâmnio - ou seja,
excesso de líquido amniótico. Com esse dado, é possível supor que, desde a
vida intra-uterina, Regina apresentava um distúrbio de deglutição, pois uma
das causas desse quadro clínico é, justamente, a redução da deglutição fetal
(CABRAL, 2001).
De fato, quando nasceu, Regina não apresentou sucção. A equipe de
neonatologia que acompanhava o caso fez uma avaliação minuciosa da
criança para descobrir a origem de tal disfunção, com vários encaminhamentos
e realização de exames. Porém, não foi encontrada a origem do problema,
que os resultados estavam dentro dos padrões de normalidade. No resumo de
alta, o diagnóstico permaneceu em aberto: “síndrome a esclarecer”.
Parece,
então, que a equipe procurava encontrar uma causa para a disfunção
apresentada pelo bebê, mas, por esse tipo de investigação, não chegou a
nenhuma conclusão definitiva.
Nessa ocasião, foi realizada também uma avaliação fonoaudiológica e
comprovada a ausência de sucção. A partir desse dado, a fonoaudióloga
sugeriu uma via alternativa de alimentação, e a criança, com 01 mês e 25 dias
de vida, recebeu alta hospitalar com gastrostomia, sem um processo
terapêutico prévio para a estimulação da sucção, antes da colocação dessa via
alternativa de alimentação.
4.2 Primeiras impressões, indicações e procedimentos
O caso de Regina despertou muita curiosidade em toda a equipe do
ambulatório. Tratava-se de uma criança de olhar expressivo, embora fosse
acanhada e de semblante triste. Aparentemente, ela não apresentava uma
fisionomia de doente, de frágil ou sindrômica.
Então, para maior compreensão do caso, fomos ouvindo os pais,
integrando as informações que nos traziam com os dados que íamos colhendo
em discussões clínicas, exames objetivos da deglutição e encaminhamentos
para outras especialidades, tais como: nutrição, psicologia, gastroenterologia e
pneumologia.
Apesar das indicações, os pais optaram por levar adiante apenas o
tratamento fonoaudiológico, não aderindo ao acompanhamento psicológico.
Segundo eles, o horário deste não lhes era adequado, mesmo quando a
psicóloga se dispôs a reagendar as sessões para o mesmo dia da terapia
fonoaudiológica. Quanto ao acompanhamento gastroenterológico, após a
avaliação, o médico afirmou que não havia necessidade de intervenção. E a
equipe de pneumologia optou por não acompanhar o caso, pelo fato de Regina
estar recebendo acompanhamento pneumológico em outra instituição.
Então, Regina iniciou o atendimento fonoaudiológico no ambulatório de
disfagia infantil da ISCMSP em fevereiro de 2006, sendo as sessões realizadas
uma vez por semana, com duração de 40 minutos
11
.
11
Como já foi referido, apresentamos e discutimos aqui o trabalho realizado durante o período
de fevereiro de 2006 a julho de 2007.
No início deste estudo, a criança ainda estava em atendimento, com
uma freqüência espaçada de 15 em 15 dias, pois, como veremos mais adiante,
já se alimentava parcialmente pela via oral (a via alternativa de alimentação era
usada como complemento alimentar), sem apresentar intercorrências.
Os atendimentos ambulatoriais eram realizados sempre pela mesma
terapeuta. Porém, em algumas sessões, a supervisora do ambulatório também
permanecia na sala, para auxiliar na conscientização dos pais para que
seguissem as orientações fonoaudiológicas. Trata-se de um procedimento
comum neste ambulatório, visto que o mesmo é formado por uma equipe de
alunas em aprimoramento em disfagia infantil.
4. 3 Os encontros com os pais
Em meu primeiro encontro com os pais Fabiana e Valdir –, na
anamnese, eles relataram que eram consangüíneos, primos de primeiro grau, e
haviam tido um filho antes de Regina, que faleceu aos 06 meses de idade por
complicações de uma cardiopatia congênita. Antes, a mãe havia sofrido dois
abortos espontâneos, pois, segundo ela: não conseguia segurar os bebês.
Mais adiante, pude compreender como seria difícil para a mãe seguir a
orientação do médico para um parto prematuro e o tipo de relação que
imediatamente passou a desenvolver com a filha, assim que ela nasceu.
Ainda nessa ocasião, a mãe informou que Regina não podia comer pela
boca porque, se não, vai para o pulmão, e então a ensinou a cuspir, para que
nem a saliva fosse broncoaspirada. Contou ainda que, por duas vezes, tentou
alimentá-la pela boca, mas houve engasgos seguidos de cianose, sendo
necessário levá-la ao hospital.
Além do uso prolongado de via alternativa de alimentação, o número de
internações devido a pneumonias de repetições chamou a atenção. Até o
momento da anamnese, perfaziam um total de 43 pneumonias, todas com
resumo de alta por um Hospital - Escola da cidade de São Paulo. Pela pouca
idade que tinha, era como se, a cada 15 dias, a menina tivesse outra
pneumonia, uma seguida da outra. Durante as permanências no hospital,
Regina ficava na enfermaria pediátrica sob os cuidados da equipe médica;
Fabiana permanecia ao lado da filha, e Valdir as visitava sempre. A menina
nunca havia necessitado dos cuidados intensivos de uma UTI, e nas
internações recebia medicamentos para o controle da febre, inalação e
antibióticos para a infecção pulmonar.
Ao longo do tratamento, fui percebendo o quanto esses dias de
hospitalizações eram difíceis para aquela família, em especial para Regina. As
crises respiratórias haviam começado aos 06 meses de vida, e segundo os
pais, a partir desse momento foram mais dias no hospital do que em casa.
Segundo relato da mãe, após um ano e meio de constantes idas e vindas, por
conta própria, eles suspenderam o uso de antibióticos, bem como os
procedimentos de nebulizações e aspirações. Depois dessa decisão, durante
sete meses Regina permaneceu em um bom estado geral, sem apresentar
intercorrências. Os pais acreditaram, então, que haviam se livrado do problema
respiratório da filha. Mas as crises voltaram e, com elas, novas internações.
De acordo com os pais, os médicos atribuíam essas inúmeras
pneumonias a uma disfunção da deglutição, afirmando que a criança não
poderia comer nada pela boca. Mas durante todas as internações, Regina
ainda não havia recebido tratamento fonoaudiológico, o que me parece
paradoxal, pois era evidente a necessidade de uma avaliação clínica da função
da deglutição, inclusive com procedimentos objetivos, como por exemplo, os
exames: videofluoroscopia e nasofibroscopia da deglutição. Uma vez que o
fonoaudiólogo é o profissional responsável por essa reabilitação, penso que
deveria ter sido consultado.
Ainda nesse primeiro encontro, Fabiana e Valdir contaram que a criança
gostava de brincar de boneca na companhia da prima de 05 anos e de assistir
televisão com o pai, pois, como a mãe trabalhava durante o dia todo, era ele
quem ficava diariamente com a filha. Regina não freqüentava escola, porque,
segundo eles, não era aceita devido ao uso da gastrostomia, situação que eles
consideravam natural.
Diante das peculiaridades do caso, optei então por conversar com os
pais a todo final de sessão, para que eles compartilhassem como havia
transcorrido a semana, fundamentalmente a situação de alimentação, o que
incluía a disponibilidade de Regina e deles para enfrentarem a experiência da
alimentação por via oral.
Afinal, nossa filha poderá se
alimentar naturalmente?
O clima dos atendimentos, no início do tratamento, era de ansiedade. Os
pais esperavam por uma resposta: afinal, a filha poderia e iria comer pela
boca? Ela iria tirar a gastrostomia?
No início da terapia, os pais entravam na sala com Regina, pois ela
ainda não havia estabelecido um vínculo comigo, estranhava o ambiente,
chorava, queria ir embora. Pude então observar que a e ficava muito
ansiosa e falava bastante sobre a história da menina, enquanto o pai, Valdir,
pouco se manifestava. Regina, aos poucos, acalmou-se e conseguiu ficar na
sala brincando comigo.
Fabiana era uma mulher de expressão forte e voz grave, e relatava o
seu sofrimento com o fato de a filha não poder comer pela boca:
Quando ela nasceu e a médica falou que ela não sugava, que não sabia sugar,
eu não acreditei. Ela falou que a Regina tinha nascido com uma síndrome que
ainda não sabiam qual era, e que podia ser porque eu e o Valdir somos primos.
E para ela ter alta do hospital eles colocaram a gastro [gastrostomia - via
alternativa de alimentação]. Mas minha filha fez todos os exames que os
médicos pedem e todos dão normais. Ela não tem síndrome nenhuma.
A Regina sentou com 06 meses de vida, andou com 01 ano e falou com 01ano
e 04 meses. Como ela não é normal? O problema dela é a pneumonia. Que ela
tem uma atrás da outra, e os médicos dizem que ela tem pneumonia porque
não pode comer pela boca.
De acordo com o relato dos pais e com documentos de alta do Hospital
onde Regina ficou internada por diversas vezes, o diagnóstico era: distúrbio de
deglutição, o que justificava, para eles, que a criança não poderia comer pela
boca, pois o alimento iria para o pulmão, agravando seu quadro respiratório.
Porém, até esse momento, a criança nunca havia sido alimentada pela boca e
nem passado por um acompanhamento fonoaudiológico.
No dia em que deram alta para ela, no hospital, eles me deram uma carta
dizendo que ela precisava fazer fisioterapia, fonoaudiologia e terapia
ocupacional. Mas nunca conseguimos um lugar para ela ter o tratamento e
também nem tinha como levá-la, pois ela ficou por muito tempo internada, nem
ia mais para casa.
Algumas questões me intrigavam: por que os pais procuraram
atendimento após vários anos? Como eles relataram, Regina ficou por muito
tempo no hospital sob cuidados médicos. E o hospital? Por que não solicitou
uma avaliação fonoaudiológica? Afinal, de acordo com um determinado modelo
de clínica, que visa ao estabelecimento ou restabelecimento da função, é
consenso que, quanto antes se intervém, melhores são as chances de uma
reabilitação, ou uma habilitação.
O descontentamento de Fabiana em relação à via alternativa de
alimentação era evidente. O fato de não ter amamentado e não poder ofertar
alimentos por via oral - as comidinhas - para a filha a angustiava, além das
inúmeras intervenções hospitalares durante os dois primeiros anos de vida,
quando não pôde exercer sua função de mãe completamente. Nessa época,
percebia essa evidência e começava a identificar certa ambigüidade entre o
que a mãe dizia e como lidava com a situação: Fabiana lamentava, mas, ao
mesmo tempo, a manutenção daquela situação parecia ter algum sentido para
ela; porém, neste momento, eu ainda não atentava para a importância do que
a mãe ia me revelando.
Após alguns encontros, Fabiana me surpreendeu com o seguinte relato:
Teve uma dia, ela era bem bebê ainda, tinha uns 06 meses...eu acho. E eu
tava comendo um Bis
®
, aquele biscoito de chocolate, e ela pediu...aí eu dei
para ela. Dei um pouquinho. Mas ela se engasgou, fiquei tão nervosa que
quem acudiu ela foi o pai. Mas eu dei porque eu vi que ela tava com
vontade de comer. E teve outra vez também que eu dei comida para ela...foi
um pedaço de salsicha. E dessa fez foi pior, bem pior...(a mãe faz uma pausa,
me olha atentamente e fica com os olhos cheio de lágrimas)... ela foi parar no
hospital entalada com o pedaço de salsicha na garganta. Daí nunca dei mais
nada pra ela...fiquei com medo de acontecer de novo.
Diante desse comentário, o pai relatou:
Uma vez eu dei suco na mamadeira para ela e ela tomou uns dois goles e se
engasgou. Mas foi dessa vez...eu sempre ofereço, mas ela não aceita,
porque ela sabe que não pode comer pela boca, daí já fica com medo.
A atitude da mãe me surpreendeu. Mesmo dizendo a todo o momento
que Regina tinha pneumonias de repetição por apresentar distúrbio de
deglutição, ofertou alimentos para a criança sabendo do risco. Além do mais,
uma criança que não havia passado pelas fases de transição alimentar não
poderia ter bom desempenho no processo de deglutição ao colocarem em sua
boca um pedaço de chocolate ou de salsicha.
Interessante observar como, nesse primeiro momento do processo de
intervenção, eu ainda transitava, como terapeuta, na linha das evidências,
como se o fato de a mãe saber do problema garantisse um procedimento
adequado junto à menina.
Regina cresceu ouvindo e acreditando que não podia comer pela boca,
pois o alimento via oral poderia prejudicá-la. Quando chegou ao ambulatório,
usava um babador (que era trocado várias vezes ao dia) e cuspia a saliva o
tempo inteiro. A mãe relatou que havia ensinado a criança a cuspir, para
prevenir as internações, porque os médicos diziam que ela tinha pneumonias
de repetições devido à saliva que ia para o pulmão. Embora de início este
detalhe tivesse sido acolhido por mim com estranheza, persistia concebendo
a alimentação apenas como uma função.
Para Fabiana, era muito triste não poder ofertar uma refeição para
Regina pela boca e ter de explicar para os familiares e amigos que ela não
podia se alimentar dessa forma:
Não gosto que os outros saibam que ela não come pela boca. Meu sonho é
que um dia ela coma pela boca, como as outras crianças da minha família. Se
bem que ela mesma fala que não pode comer pela boca quando alguém
oferece alguma comida para ela.
Os pais relataram que, quando chegava a hora da dieta, Regina sabia
e permanecia colaborativa durante toda a infusão do alimento. Nunca
reclamava ou questionava por que deveria ser alimentada daquela forma, o
que também foi se mostrando, no decorrer do trabalho, algo surpreendente. As
refeições eram infundidas pela gastrostomia de 03 em 03 horas, todos os dias,
sendo que os pais se revezavam durante a madrugada para dar continuidade
ao procedimento; como a filha dormia no quarto com eles, os mesmos
relataram que não era tão incômodo.
Em razão das inúmeras internações, Fabiana contou que a filha era
conhecida no hospital por todo mundo:
Todo mundo da pediatria conhece a Regina e eu também. Ela é estudada
por eles, porque ela é a única no mundo que tem esse problema do pulmão,
eles pesquisaram em tudo que é lugar, em livros, Internet e não acham
ninguém com esse mesmo problema. Ela é a única.
Ela passou até no Fantástico, o Dr. Dráuzio Varella mostrou o caso dela no
quadro do programa em que mostrava as doenças que eram uma incógnita
para a Medicina.
Aos poucos, fui percebendo que aquela situação de muito sofrimento
parecia trazer algum prazer secundário à mãe, que parecia se proteger de
entrar em contato com a realidade vivida pela filha, valorizando o fato de ser
um caso raro, por ela ser estudada por um Hospital-Escola reconhecido e ainda
ter aparecido na televisão.
Parte II
Transformação da Terapeuta:
a necessidade de novos olhares
4.4 Avaliação funcional da deglutição:
ainda seguindo o protocolo...
Após o período inicial de trabalho, em que pude conhecer as questões
que envolviam os problemas alimentares de Regina, seguindo o protocolo da
instituição procurei realizar o procedimento de avaliação, para mapear as
condições funcionais da deglutição da paciente, uma vez que, como vimos, ela
não apresentava boas experiências pela via oral.
De acordo com a literatura da área, a avaliação funcional da
alimentação
12
tem como objetivo observar a dinâmica da deglutição durante a
oferta dos alimentos. Então, o fonoaudiólogo deverá classificar o grau de
comprometimento do processo de alimentação e concluir se ou não
necessidade de intervenção terapêutica, de exames complementares
(nasofibroscopia da deglutição ou videodeglutograma), mudança da
consistência alimentar e/ou utensílios. Se necessário, os pais são orientados
sobre os cuidados com a postura durante e após a alimentação, bem como é
feito encaminhamento para outras especialidades ou sugestão de uma via
alternativa de alimentação.
Porém, no caso de Regina, surgiu uma questão: ela apresentou
resistência para realizar a avaliação funcional da alimentação no ambulatório,
recusando-se a ingerir todos os alimentos que lhe eram ofertados, dizendo que
não podia comer pela boca.
Sendo assim, a necessidade de avaliá-la me fez pensar em tirá-la do
ambiente hospitalar e levá-la para um lugar onde pudesse ter contato com
outras crianças e brinquedos. Quem sabe em uma nova situação Regina
aceitaria comer? Então, para a avaliação funcional da deglutição, junto com
minha supervisora, promovi um piquenique no parquinho da Instituição,
disponibilizado para as crianças que ficam hospitalizadas.
Além de Regina, convidamos outra paciente, aqui chamada Caroline,
que tinha uma via alternativa de alimentação jejunostomia
13
, mas que
12
Importante lembrar que, antes de realizarmos a avaliação funcional, é necessário avaliar a
estrutura dos órgãos fonoarticulatórios.
13
Trata-se de uma operação que consiste em criar uma boca no jejuno para alimentar o
paciente com retração do estômago. Na jejunostomia, se pratica uma abertura artificial, através
da parede abdominal, no jejuno. (ANDY, 1986).
estava com a alimentação por via oral liberada. Também contamos com a
presença de Eduarda, nome fictício de uma criança de 03 anos de idade,
mesma faixa etária das outras duas, que estava internada e a e a havia
levado ao parquinho.
Ao chegarmos ao pátio de diversões, onde há alguns brinquedos, do
tipo: escorregador, velocípede, mesas com cadeiras infantis, dentre outros,
arrumamos uma mesa com Danoninho
14
e utensílios para o nosso piquenique.
As crianças sentaram-se em volta da mesa, manipulando o alimento, com as
terapeutas (T1/supervisora e T2/fonoaudióloga-pesquisadora) ao redor delas:
T1 - Tá comendo? – pergunta, olhando para Caroline.
T2 Caroline comendo ... pra onde está indo esse Danone? - nesse momento,
Caroline aponta para a barriga, e a terapeuta diz: ... para a barriga!!!
T1 – Hum ... eu também quero!
T2 Quem comendo? a Caroline comendo? Mostra a boca, Caroline
Caroline mostra a boca cheia de Danoninho - Ah....tem tudo na boca, tem que
engolir... engole com força!
Regina estava sentada em frente à Caroline, com sua boneca, a quem
chamava Nina, ao lado, e manipulava a colher enquanto observava
atentamente a outra menina comer. Regina parecia impressionada com o fato
de também Caroline ter uma via alternativa de alimentação e, mesmo assim,
comer pela boca.
T2 Muito bem, Caroline. Tem que comer tudinho! Não pode ficar com a comida na
boca.
C Tia... chama, mostrando que está passando o dedo no Danoninho e levando à
boca.
T2 – Não, Caroline, o dedo tá sujo! Tem que comer na colherzinha. Enche a colher!
Nesse momento, enquanto Caroline leva a colher até a boca, Regina também o faz,
porém a colher estava vazia; permanece assim por um certo tempo, como se
estivesse brincando com a colher.
T2 - Hum....que gostoso!!! Tá gostoso, Regina?
14
Um queijo petit suisse com polpa de fruta formulado para fazer parte de uma alimentação
equilibrada de crianças pré-escolares.
A expressão de Regina, durante todo o tempo, era de quem estava
muito assustada. Aquela situação, claramente, não estava lhe agradando. Para
tudo que lhe era ofertado ela só tinha uma resposta: NÃO! Quero a minha mãe.
Mas as outras crianças, Caroline e Eduarda, não deixaram de brincar e
convocar Regina para dividirem aquele momento.
R - Quero minha mãe.
T2 – Mamãe tá ali, ela já vem. Tem gosto de quê?
R – Minha mãe?! – pergunta, olhando para a terapeuta com expressão de surpresa.
T1 – Ela já vem, está subindo.
T2 – Ela está naquele elevador que a gente veio, lembra? Eita, Carol, que gostoso!
Melou o nariz, né? Deixa eu limpar. - e limpa o nariz de Caroline - Pronto!
Continuamos nessa situação, até que ocorreu algo inesperado: após
várias tentativas de oferta do alimento à Regina, a pequena Eduarda colocou
uma colher cheia de Danoninho na boca de minha paciente. Ficamos então
olhando para ela na expectativa do que iria acontecer. Ela iria engolir? Iria se
engasgar? Iria broncoaspirar aquele alimento?
C.- Você quer Danone, quer? Rezim Rezim.. – fala, preparando uma colherada e indo
em direção à Regina.
T2 – Você vai dar para quem?
C Pra boneca. Toma boneca - vai até a boneca de Regina e faz de conta que dá
Danone para ela.
T1 – Agora, come você, Carol - e ela o faz. Isso!!! E agora dá pra Regina.
T2 – Vai lá, Regina, come! Não quer da Carol? A Caroline come, oh... - Regina fica
olhando para Caroline, Eduarda se aproxima de Regina, que agora fica olhando para
ela.
C – Pera aí... - faz de conta que vai dar para Regina e come.
T1 – Tem que engolir, Carol. Engole. Engole bem bonito.
T2 – Dá para boneca, então, Regina, a boneca que comer, não?
R – Não.
T2 – Mas ela tá sentada na mesa, e quem tá sentada tem que comer!
Eduarda pega uma colher, enche de Danoninho e coloca na boca de Regina.
Após alguns segundos com o alimento parado na boca, atônita, Regina
deglutiu sem apresentar quaisquer sinais clínicos sugestivos de penetração
laríngea e/ou aspiração traqueal. Conseguimos alcançar nosso objetivo com
êxito; sabíamos, agora, que Regina apresentava condições para receber
alimentos pela via oral.
Enquanto estávamos comemorando a situação, Regina só pedia pela
mãe. Atendemos ao seu pedido e fomos ao encontro de Fabiana, que, em
companhia do pai, Valdir, a esperava ansiosa.
T1 – É gostoso, Regina?
R – Não. Quero minha mãe – levanta-se e vai em direção à saída.
Todas se levantam e vão atrás de Regina, e ainda no parquinho:
T2 – Quer ir embora, Regina? Então chama a tia para ir embora!
R - Vamos tia, emboa!
E – Fica calma, neném...
R – Queio i emboa.
Embora a mãe soubesse que usaríamos alimentos para avaliar Regina,
ao nos aproximarmos, surpreendeu-se com a boca da filha, toda suja de
Danone: Meu Deus!!! a Regina comeu? Mas ela não pode comer!!!. Essa
reação de surpresa me fez pensar o quanto estava diante de uma situação
bastante delicada. Afinal, Fabiana havia procurado o ambulatório para um
tratamento que tinha como objetivo, se possível, a oferta de alimento por via
oral. Por que, então, insistia em dizer que a filha não poderia receber alimentos
pela boca? As evidências indicavam que o comportamento da mãe não era
guiado pela lógica que, na ocasião, eu julgava ser determinante nesse tipo de
situação: “tenho um problema, vou em busca de uma solução, não resisto a
isto”.
Ao ouvir a mãe, Regina começou a tossir muito, chegando a ficar
vermelha. Percebi, imediatamente, que a conduta de Fabiana desencadeou na
filha o mal-estar que aparecia pela tosse, e que isto não estava diretamente
relacionado ao alimento ingerido. Ou seja, havia elementos na relação e e
filha que certamente não facilitavam a aquisição de novas experiências no que
se refere à alimentação. Mas como trabalhar com essa questão? Como incluí-
la no protocolo de avaliação e tratamento que ainda norteava minhas ações?
Como já escrito anteriormente, quando uma criança chega para ser
avaliada no ambulatório, o primeiro passo é levantar toda sua história e, em
seguida, é feita a avaliação funcional da deglutição. E com Regina não poderia
ser diferente; porém, esse modelo clínico não estava sendo suficiente para que
eu compreendesse e lidasse com as necessidades da menina.
Sempre trabalhava pautando minha conduta clínica da avaliação da
função da deglutição que não estava íntegra, para, a partir desses dados,
elaborar o processo terapêutico e dar a devolutiva aos pais. Lembro-me de que
a supervisora do ambulatório de Disfagia Infantil me perguntava se eu havia
avaliado Regina, e por muito tempo minha resposta foi: Ainda não. Ela não
deixa que eu oferte nada para ela, nem água ela aceita. Ela sabe dizer que
não pode comer. Não sei o que eu faço mais para conseguir avaliá-la.
Foi nesse contexto que a situação lúdica se configurou, pois imaginei
que, fora da situação formal de avaliação, Regina poderia cooperar e assim a
avaliação seria possível. O brincar ainda não era explorado por mim em sua
potencialidade para o atendimento terapêutico de crianças nessa situação, mas
já representava uma abertura para que eu criasse uma condição mais favorável
para que as experiências pudessem ocorrer.
Como vimos, a interação com outras crianças e principalmente a
participação de Eduarda foi fundamental, pois, de algum modo, tornou natural a
situação que era impensável e apavorante para minha paciente. Ao colocar a
colher na boca de Regina, sem receio do que poderia ocorrer, Eduarda abriu
um espaço novo para que ela experimentasse o alimento. Não foi simples para
a menina, que oscilava entre a vontade de experimentar e a necessidade da
presença da mãe que a protegeria daquilo tudo.
E também outro aspecto importante a ser considerado e que diz
respeito a essa resistência da paciente para realizar a avaliação. De acordo
com uma pesquisa realizada em 2007
15
, é raro um paciente que o tenha
comprometimento ser encaminhado ao ambulatório de Disfagia Infantil da
15
Pesquisa realizada em 2007 para o VI Simpósio Brasileiro sobre Motilidade Digestiva e VI
Encontro Brasileiro sobre Disfagia, com o titulo: Perfil dos Pacientes Atendidos no Ambulatório
de Disfagia Infantil da ISCMSP.
ISCMSP. De fato, nossos pacientes, geralmente, apresentam múltiplas
deficiências.
Diante disso, como proceder quando a criança não se encaixa nesse
perfil, como era o caso de Regina? Não que as outras não tenham vontades e
se mostrem passivas diante de qualquer intervenção. As mães, o cuidador
sempre conseguem identificar se uma situação é ou não incômoda para a
criança, seja através de choro, gemido ou expressão facial. Mas Regina ia me
ensinando a importância de trilhar pela singularidade de cada pessoa e não
mais pela questão da função. Não era pouca coisa para mim, pois necessitava
buscar outro modelo de clínica, outra forma de considerar a relação terapeuta-
paciente-família.
Além disso, minha experiência no ambulatório estava voltada para
crianças com disfagia orofaríngea neurogênica ou mecânica; nelas uma
dificuldade no processo da alimentação advinda de um problema orgânico.
Mas, a partir do trabalho com Regina, fui me perguntando: Uma relação familiar
conturbada pode interferir na alimentação de uma criança? Será que a
dimensão psíquica não está sempre associada à questão orgânica? É possível
trabalhar separando uma dimensão da outra?
A partir dessas interrogações, fui me aproximando da teoria psicanalítica
de D. W. Winnicott (1896-1971) sobre o desenvolvimento emocional infantil,
para que pudesse compreender algumas questões que me pareciam presentes
no caso de Regina; a saber - o vínculo e o ambiente.
4. 5 Início da transformação: oscilação entre paradigmas
Após essa situação de avaliação, e de todas as minhas descobertas, o
manejo clínico foi se transformando. Passei a pensar que outros aspectos
necessitavam ser considerados, para que eu pudesse sensibilizar a mãe e
ajudá-la, sem julgamento, a mudar de posição na relação que vinha
desenvolvendo com a filha. A relação das duas precisava ser incluída no
processo terapêutico; caso contrário, a menina permaneceria impossibilitada de
se alimentar e retomar seu processo de amadurecimento.
Na sessão seguinte à avaliação, voltamos ao parquinho, e Regina
parecia estar mais à vontade. Levou um pacote de biscoito de polvilho, que ela
mesma havia escolhido, e no decorrer das brincadeiras, colocou o alimento na
boca e comeu um pedacinho, bem pequeno, mas o suficiente para eu pensar
que ela tinha vontade de novamente viver essa experiência.
Depois do biscoito de polvilho, Regina tomou pequenos goles de água e
novamente não apresentou quaisquer sinais clínicos sugestivos de penetração
laríngea e/ou aspiração traqueal. Diante disso, orientei os pais a lhe ofertar
alimentos, de início, na consistência pastosa, por via oral, antes da infusão da
dieta pela gastrostomia. Porém, Regina recusava-se a comer em casa.
Com a oferta de alimento por via oral, mesmo em pequena quantidade,
não houve alteração do seu quadro clínico - Regina continuava tendo
pneumonia, porém, num intervalo de tempo maior entre um episódio e outro da
doença. Se voltarmos a pensar no diagnóstico que ela havia recebido em outra
instituição, a ingestão de alimentos poderia ter lhe causado mais pneumonias,
já que tudo que ela ingeria poderia ir para o pulmão.
Esse dado me fez levantar a hipótese de que receber dieta por via oral
não piorava o quadro respiratório da paciente, o que foi confirmado com os
exames objetivos da deglutição nasofibroscopia da deglutição e
videodeglutograma - ambos compatíveis com a normalidade. Mas percebi que
o modo como a alimentação acontecia, isto é, como a situação se configurava
levava Regina a comer ou a recusar alimentos por via oral. Essa situação me
intrigava, indicando-me a necessidade de me aproximar dos pais de minha
paciente, como extensão do próprio trabalho que vinha desenvolvendo com
ela.
A rapidez com que Regina respondeu à experiência de alimentar-se me
fez pensar também na vontade que ela mostrava de resolver o problema, de
alguma maneira. Porém, ainda vinculada ao paradigma organicista, comecei a
orientar os pais no sentido do que Regina deveria comer, sem ainda articular a
questão com os aspectos relacionais que envolvem a alimentação - tipo do
alimento ofertado, como é ofertado, como a mãe apresentaria os objetos
comestíveis para a filha. De fato, foi difícil sair do modelo em que me
encontrava.
Lembro quando Regina chegava às sessões. Ela não gostava de ficar na
recepção esperando para ser chamada percorria o corredor das salas de
atendimento, chegava na nossa e batia na porta, algumas vezes abria, para
anunciar que já estava lá.
As primeiras vezes em que ela aceitou alimento por via oral, durante a
fonoterapia, foi com o Danoninho ofertado na colher. Nesse momento, ela
ainda tinha uma dificuldade em abrir a boca para que a colher fosse introduzida
e ficava um tempo prolongado com o alimento na boca até engolir, o que me
fazia lembrar o episódio no parquinho. Talvez Regina o tivesse confiança de
que poderia engolir, que a experiência, naquele momento, ainda havia sido
breve.
Portanto, durante as fonoterapias, tentava proporcionar experiência
alimentares à Regina, de acordo com as possibilidades de aceitação que ela
manifestava. Porém, via-me explicando que a boca era o órgão responsável
pela nossa fala e pela alimentação, que ela estava ali para aprender a comer
como as outras crianças e até aquele momento havia necessitado da
gastrostomia, mas que estava em treino e tinha condições clínicas de comer
pela boca. Regina me ouvia atentamente.
Analisando essa minha conduta, concluo o quanto me era difícil mudar
de posição, pois, mesmo começando a perceber as necessidades de minha
paciente, o que implicava considerar que a alimentação não poderia ser
significada exclusivamente pela função, ainda falava sobre o órgão, como se
estivesse dando uma aula!
Após as sessões, como relatei, chamava os pais para relatar como
havia sido a terapia. Mas, ao mesmo tempo em que percebia ser fundamental
aproximar-me deles para ajudá-los a sustentar as experiências vividas pela
menina, acabava seguindo um modelo de atendimento que não favorecia a
compreensão, e sim a orientação.
Como desdobramento dessa postura, acabava não configurando um
espaço exclusivo para os pais, sem a presença de Regina, para que eles se
percebessem sendo tratados e acompanhados. Nessas ocasiões, o pai, Valdir,
mostrava-se sempre atento às minhas orientações e concordava passivamente
com as atitudes da esposa. E Regina ficava falando, brincando, sempre
tentando chamar a atenção da mãe, assinalando, com isso, que minha
condução deveria ser outra.
Aos poucos, as orientações deixaram de se restringir à alimentação e
pudemos abordar outros aspectos, como o lugar em que a família vinha
mantendo a menina, bloqueando o seu amadurecimento. Começou a ficar
evidente para mim a dificuldade da mãe em se separar de Regina, e foram
surgindo temas como o uso da fralda descartável, que, naquela idade, não era
mais necessário; o processo de retirá-la da cama dos pais e todo um manejo
para que a menina pudesse vir a dormir em sua própria cama. A possibilidade
de freqüentar uma escolinha também começou a ser pontuada, como
decorrência natural de todo esse processo de crescimento. Considerava
fundamental que Regina se socializasse e tivesse contato com outras crianças.
Enfim, fui entrando em contato com uma realidade maior que a questão
do comer: Regina era tratada como um bebê.
Durante essas conversas, a mãe costumava dizer para a filha algo
como: Está ouvindo, né, Regina?! Vai dormir hoje no teu quarto. Mais uma vez
aqui, fica claro o quanto eu não me dava conta da inadequação de conversar
com os pais na presença da menina, sem atentar para o fato de que a mãe
fazia uso da situação, como se minha paciente pudesse ajudar nesse aspecto.
Na ocasião, li várias referências sobre doenças psicossomáticas, e fui
compreendendo as pneumonias de repetições a partir do quadro asmático que
a paciente apresentava; mas e a alimentação? Nada do que eu lia nesse
momento explicava o distúrbio alimentar. Talvez eu ainda estivesse procurando
uma justificativa, naquele corpo, para minhas indagações.
Era óbvio que existia uma questão emocional envolvida no caso, e a
cada conversa com a mãe, isso ia ficando mais claro; era nítida a simbiose na
díade mãe-filha. Lembro-me de uma cena, Fabiana estava relatando o
diagnóstico médico:
Eles falam que ela não vai poder comer nunca pela boca. Eles querem tirar
parte do pulmão direito dela...isso eu não vou deixar! (choro).
Regina, que escutava tudo na sala, correu para o colo da mãe e
começou a chorar também, limpando o seu rosto, como se dissesse: “eu estou
aqui e bem!”.
Mesmo oscilando entre paradigmas opostos, com o tempo, fui trazendo
os pais para o processo terapêutico, pois eles também precisavam mudar de
posição frente à filha. Junto a isso, fui procurando proporcionar à paciente
condições para que vivesse a experiência de crescer e sair da posição de
doente, merecedora de cuidados especiais.
4.6 Outro manejo clínico: alimentação como
oferta de amor e de possibilidade de crescimento
Ao longo do tratamento, Regina faltou por várias semanas seguidas às
fonoterapias, e os pais sempre ligavam avisando: Patrícia, hoje não vamos
levar a Regina porque ela continua hospitalizada. Está melhorando, mas os
médicos ainda não sabem quando o dar alta e eles dizem que é pneumonia
aspirativa, viu?!
Ouvia-os e pedia que, assim que Regina tivesse alta, voltássemos ao
trabalho. Esse ciclo de idas e vindas foi diminuindo de acordo com a
quantidade de volume de alimento aceito por Regina. Mas não deveria ocorrer
o contrário?! Foi o que eu ouvi de Fabiana certa vez, ao observar que as
pneumonias estavam sendo espaçadas. E realmente deveria ocorrer o inverso,
segundo a equipe médica que a acompanhava, mas nós sabíamos que Regina
não apresentava um distúrbio de deglutição e que estava no processo de
transição da gastrostomia para via oral com êxito.
De fato, durante as ofertas de alimento, Regina não apresentava indícios
de ser uma criança disfágica. Embora se “atrapalhasse” na fase antecipatória
oral da deglutição, o processo como um todo indicava que a questão central
não era essa, o que também era comprovado pela ausculta cervical.
As pneumonias de repetição passaram a ter, então, um novo sentido,
pois a experiência terapêutica evidenciava que elas não eram decorrentes de
aspiração do conteúdo da via oral, e nem de resíduos ascendentes, pois havia
integridade da válvula anti-refluxo.
A partir das minhas intervenções com os pais, eles passaram a ofertar a
comida pela boca em todas as refeições. Por várias semanas, chegavam
contando que Regina brincava com o alimento e dificilmente o engolia. Parecia
clara a necessidade de lhe oferecer uma relação lúdica com o alimento, para
que, depois, pudesse se sentir livre para engoli-lo. Era imprescindível persistir e
sustentar essa situação, e foi o que os pais fizeram, até que um dia chegaram
com uma novidade:
A Regina comeu na casa da avó dela! Acredita? Foi assim....fomos almoçar na
casa da minha mãe e fizemos uma prato para Regina comer junto com os primos dela
e deixei ela lá na mesa com eles, e ela comeu. Não comeu tudo, mas comeu.
Diante desse relato, voltei-me para minha paciente e perguntei: Tava
boa a comida da vovó, Regina? Sorrindo, ela balançou a cabeça, respondendo
que sim. Nesse momento, minha paciente evidenciou que poderia
compartilhar as situações de alimentação com outras crianças, além do settting
terapêutico.
E assim se iniciaram as experiências de aproximação com os alimentos,
até que, em sua última internação hospitalar por pneumonia ocorreu um
episódio significativo, relatado por Valdir: na hora do jantar, no mesmo dia em
que Regina havia se engasgado com uma bala de goma, ela disse olhando
para a sopa da garotinha com quem dividia o quarto da enfermaria:
- Papai, eu quero!
- Mas, Regina, essa sopa não é sua. E também você não vai querer comer o
pai advertiu
- Eu quero, papai. Agora eu só vou comer pela boca.
Ou seja, a partir daquele momento, Regina passou a poder desejar
comer. Importante destacar aqui que, na perspectiva winnicottiana, a
possibilidade de desejar é uma aquisição posterior ao atendimento de algumas
necessidades fundamentais, o que remete à importância do ambiente na
constituição da pessoa.
Depois de ouvir o pedido de Regina, a senhora que acompanhava a
garotinha permitiu que Valdir ofertasse a sopa para a filha, que comeu tudo.
Emocionado, o pai me contou que nem ele e nem os médicos da enfermaria
acreditavam no que havia acontecido.
A partir desse dia, de fato, Regina começou a pedir comida e recusava-
se a deixar passar alimentos pela via alternativa de alimentação, o que deixou
os pais muito felizes - eles também haviam perdido o medo de ofertar comida
à filha. O fantasma do distúrbio de deglutição os havia abandonado.
Parecia que Regina havia despertado para uma nova vida, nascido
novamente. Todo o trabalho feito para que a alimentação pudesse ser sentida
como oferta de amor e também oferta de possibilidade de crescimento havia
sido muito bem aproveitado pela paciente. O manejo clínico que finalmente
pude utilizar, compartilhando o processo com minha paciente e seus pais,
havia criado as condições para que Regina ousasse correr o risco de comer.
Para os pais o problema passou então a ser outro: o peso de Regina,
pois, nestes momentos iniciais, ela aceitava a comida por via oral, mas em uma
quantidade pequena, e não permitia mais que passassem a dieta pela
gastrostomia. Fui então procurando sustentar essa angústia, ponderando que
se tratava de um processo natural e que todos estaríamos atentos ao peso e
empenhados em criar as condições para Regina internalizar e se assegurar,
pela experiência, que poderia comer uma quantidade maior.
Esses relatos foram ficando mais freqüentes, e, o melhor de tudo: era a
própria Regina quem, cada vez mais, pedia os alimentos. Só restava um
“probleminha”, como relatou Valdir: Agora ela quer comer sopa! É no café
da manhã, é no lanche, é toda hora que tem que comer ela pede para eu fazer
sopa para ela. Não quer comer outra coisa a não ser a sopa que eu faço.
Nessa fase do tratamento, Fabiana precisou trabalhar fora de casa e
passou a tarefa de alimentar a filha para Valdir, que ficava o dia todo com a
menina: Agora a Regina sabe comer pela boca, não precisa mais de mim.
Agora quem vai tomar conta e fazer comida para ela vai ser o pai dela.
Percebia que, aos poucos, Fabiana ia se afastando do tratamento,
enquanto o pai se mostrava cada vez mais envolvido e disposto a ajudar na
transição alimentar, além de ofertar outros cuidados, como dar banho, colocar
para dormir, levar à fonoterapia, quando me relatava como estava a aceitação
de minha paciente em relação à comida.
E assim, aquele pai calado, que apenas acompanhava a esposa e a filha
no início do tratamento, saiu de cena, dando lugar a um pai dedicado que foi
extremamente importante no processo de transição da via alternativa de
alimentação de Regina. Devido à dedicação de Valdir, o processo terapêutico
avançou bastante, com a possibilidade de deixá-la crescer.
Durante algum tempo, almoçávamos juntas. eu e Regina, uma diante
da outra - era como se eu fosse um espelho, um modelo de como ela deveria
se comportar durante as refeições. Cada uma levava sua comida; algumas
vezes, ela pedia um pouco da minha e eu a atendia de imediato. Houve dias
em que ela ia se aproximando, eu a pegava no colo para ajudá-la a cortar os
alimentos e ali ela permanecia, aconchegada, durante toda a refeição.
Nessa fase, a paciente se encontrava em transição do alimento pastoso
para o sólido, com treino da mastigação, e vinha tendo boa evolução - comia
biscoito, mascava chiclete. A dificuldade maior ainda era com a comida de
casa...
No começo dos nossos almoços, por vezes, eu ainda me via prestando
muita atenção nos aspectos mais orgânicos, como movimentos de boca, de
língua; depois, fui integrando a essa observação mais objetiva a dimensão
afetiva, dando a devida importância ao nosso vínculo, à relação de confiança
que ia cada vez mais se estabelecendo entre nós.
Interessante observar ainda que, no momento inicial do atendimento,
mais focada nos aspectos orgânicos, me era inconcebível finalizar a sessão
sem que Regina experimentasse algum alimento. Utilizava então de
brincadeiras, mas sempre com um objetivo: a paciente deveria receber
alimento por via oral. Vejamos então este trecho de sessão que ilustra essa
minha preocupação:
- Regina, vamos dar comidinha para a Linda [boneca], ela está com fome
sugiro.
A paciente pega a colher de brinquedo e finge dar comida à boneca.
- E tu? Não queres comer? Vai dar comida só para a Linda? – pergunto.
- Quero não.
- Come, Regina....só uma pouquinho, tua mãe trouxe um Danone tão gostoso...
– insisto.
- Não.
Regina continua a dar a comidinha para a boneca e não aceita o alimento.
Tento ofertá-lo, mas ela vira o rosto.
Quando isso acontecia, ainda na ocasião em que Regina não aceitava
alimento por V.O., acreditava que a terapia o havia surtido efeito, e que o
processo de retirada da via alternativa de alimentação estava, ou poderia estar,
distante. Aqui, eu não via o brincar como uma experiência que envolvia todos
os sentidos, e que, na perspectiva winnicottiana, tinha uma importância por si
mesmo. Tratava-se de uma estratégia para ofertar alimentos e assim criar
condições para que a criança os aceitasse, preparando as estruturas para um
bom desempenho durante a alimentação. Ou seja, via um único sentido: o
gustativo! Aos poucos, fui me dando conta da importância do brincar de
Regina, pois, na brincadeira, ela ia experimentando a possibilidade de comer
enquanto alimentava sua boneca num plano de faz de conta; e isso,
certamente, a ajudou a experimentar a situação concretamente, tempos depois.
Ao longo dos atendimentos realizados no ambulatório de disfagia infantil
da ISCMSP, fui me dando conta de que era preciso mudar minha postura, tanto
com os pacientes como com seus familiares. não me importava em passar
os 40 minutos de terapia sem vivenciarmos alguma situação que envolvesse
alimentação. O importante passou a ser entrar em sintonia com o ritmo das
crianças e de seus pais, exercendo a função de reconhecer e trabalhar com as
necessidades deles.
Assim, ao contrário do que fazia antes, hoje, antes de oferecer um
alimento ao paciente, sempre pergunto: Tu queres comer? Posso abrir teu
lanche? Vais querer comer? E quanto ao aspecto lúdico: em vez de sempre
escolher miniaturas relacionadas à comida, deixei de “impor” como e com o
que vamos brincar em cada sessão.
Quanto às mães e pais, ouvi-los em suas angústias, ansiedades foi se
tornando algo cada vez mais freqüente. Trata-se de uma forma de acolhimento,
e também de saber mais do caso e de como posso trabalhar com as famílias.
Através do holding oferecido pelo terapeuta, penso que os familiares, e em
especial a mãe, podem vir a sustentar essa experiência fundamental para
constituição e desenvolvimento do psiquismo de seus filhos, fornecendo-lhes
elementos para estabelecer novos laços afetivos no decorrer de suas vidas.
Nessa perspectiva, de acordo com Maia (2006), o setting oferecido tem
importância fundamental, e é a postura de holding que permitirá a constituição
de um ambiente humano favorável.
Enfim, Regina me fez rever o que é ser terapeuta. A partir do trabalho
que realizamos, pude ver meus pacientes com outros olhos...
Aquarela
“E o futuro é uma astronave
Que tentamos pilotar
Não tem tempo nem piedade
Nem tem hora de chegar
Sem pedir licença muda nossa vida
E depois convida a rir ou chorar
Nessa estrada não nos cabe
Conhecer ou ver o que virá
O fim dela ninguém sabe
Bem ao certo onde vai dar
Vamos todos numa linda passarela
De uma aquarela que um dia enfim
Descolorirá”.
Vinicius de Moraes / Toquinho / Guido Morra / Maurizio Fabrizio )
CONCLUSÃO
_______________________________________________________________
Como foi possível observar, a partir da questão inicial formulada no caso
aqui em foco, pude repensar minha forma de atuação diante das dificuldades
alimentares de meus pacientes. Inicialmente, baseava-me exclusivamente em
um paradigma organicista, que embasa a formação tradicional dos profissionais
da saúde, mas com o tempo e a partir de novas referências teóricas, fui
expandindo meu olhar para abarcar aspectos da subjetividade humana,
reconhecendo a integração da linguagem, corpo e psiquismo durante o
processo de atendimento.
Partindo dos pressupostos da teoria de Winnicott (1982), pude conceber
a alimentação não somente como sustentação do corpo físico, mas também
como sustentação para a constituição da maneira de ser da criança. Além da
alimentação para o corpo, existe também uma alimentação imaginativa que
deve ser considerada na clínica dos distúrbios alimentares.
O fonoaudiólogo que atua nesse campo precisa ter consciência de que
casos em que sintomas como recusa e seletividade alimentar indicam a
presença de conflitos oriundos de relações familiares, e não apenas uma
alteração funcional e objetiva na dinâmica da deglutição (caracterizando a
disfagia). Diante disso, é importante compreendermos a questão
acrescentando ao aspecto funcional uma outra faceta, que se refere às
condições que a criança vivencia no ambiente familiar.
Durante os atendimentos de Regina, fui percebendo que a relação de
minha paciente com a mãe era extremamente delicada. Como elas teriam
vivido as primeiras experiências emocionais e sensórias que fazem parte do
ato da amamentação? Fui com o tempo me dando conta de que conhecer a
história de vida da criança, a história de suas primeiras relações ambientais, é
fundamental para compreendermos a demanda para a clínica fonoaudiológica,
ainda que a questão se apresente, em um primeiro momento, como puramente
funcional.
O ato da alimentação representa para a criança uma forma de se
relacionar com o mundo, o que vai contribuir para que possa se constituir em
fonte de prazer, de desprazer, de socialização, de exclusão, enfim vários são
os seus sentidos, só apreendidos na história singular de cada um. Sendo
assim, lembramos que o fonoaudiólogo é um terapeuta; portanto, necessita
entrar em contato com o sofrimento do paciente dito disfágico ou ainda com as
angústias daqueles que não querem se alimentar, para ajudá-los a sair dessa
condição.
Para tanto, exercer a função de holding e também realizar o manejo
terapêutico o aspectos fundamentais para que nossos pacientes possam se
fortalecer, viver novas experiências, sendo apresentados a condições e
potencialidades até então desconhecidas.
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_______________________________________________________________
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Ed. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
ANEXOS
_______________________________________________________________
ANEXO A
ANEXO B
CARTA PARA OBTENÇÃO DO TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E
ESCLARECIDO
Caro(a) Senhor(a)
Eu, Patricia Trinta e Farias, fonoaudiólogo(a), portadora do CIC
64321886368, RG 492604959, estabelecido(a) na Rua Barão de Tatuí, nº186,
Apt 63, CEP 01226030, na cidade de São Paulo, cujo telefones de contato são
(11) 82663530 e (11) 36675162, vou desenvolver uma pesquisa cujo título é:
INTERVENÇÃO FONOAUDIOLÓGICA AMBULATORIAL EM CRIANÇAS
PEQUENAS COM DISTÚRBIOS ALIMENTARES: Um Estudo de Caso.
O objetivo deste estudo é relatar o quadro clínico do(a) seu(sua) filho(a),
incluindo os dados retirados da história, registros da terapia, exames objetivos
da deglutição, além das informações obtidas através de exame
clínico/miofuncionais das avaliações fonoaudiológicas.
A participação do(a) seu (sua) filho(a) nesta pesquisa é voluntária e não
determinará qualquer risco.
A participação do(a) seu(sua) filho(a) não trará qualquer benefício direto
mas proporcionará um melhor conhecimento à respeito do atendimento
ambulatorial com crianças pequenas portadores de distúrbios alimentares, que
em futuros tratamentos fonoaudiológicos poderão beneficiar outras crianças ou,
então, somente no final do estudo poderemos concluir a presença de algum
benefício.
Não existe outra forma de obter dados com relação ao procedimento em
questão e que possa ser mais vantajoso.
Informo que o Sr(a). tem a garantia de acesso, em qualquer etapa do
estudo, sobre qualquer esclarecimento de eventuais dúvidas. Se tiver alguma
consideração ou dúvida sobre a ética da pesquisa, entre em contato com o
Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Irmandade Santa Casa Misericórdia de
São Paulo, situado na
Rua Cesário Motta Júnior, 112 - Vila Buarque - Telefone: (0xx11) 2176-7000
.
Também é garantida a liberdade da retirada de consentimento a
qualquer momento e deixar de participar do estudo, sem qualquer prejuízo.
O Sr(a). tem o direito de ser mantido atualizado sobre os resultados
parciais das pesquisas e caso seja solicitado, darei todas as informações que
solicitar.
Não existirá despesas ou compensações pessoais para o participante
em qualquer fase do estudo, incluindo exames e consultas. Também não
compensação financeira relacionada à participação do(a) seu(sua) filho(a). Se
existir qualquer despesa adicional, ela será absorvida pelo orçamento da
pesquisa.
Eu me comprometo a utilizar os dados coletados somente para pesquisa
e os resultados serão veiculados através de artigos científicos em revistas
especializadas e/ou em encontros científicos e congressos.
A não identificação do(a) seu(sua) filho(a) o poderá ser garantida
pois os dados serão relacionados unicamente à ele(a). Entretanto, será
resguardado o nome, endereço e filiação.
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
Acredito ter sido suficiente informado a respeito das informações que li ou que
foram lidas para mim, descrevendo o estudo INTERVENÇÃO
FONOAUDIOLÓGICA AMBULATORIAL EM CRIANÇAS PEQUENAS COM
DISTÚRBIOS ALIMENTARES: Um Estudo de Caso.
Eu discuti com o(a) fonoaudiólogo(a) Patricia Trinta e Farias sobre a
minha decisão em permitir a participação de meu(minha) filho(a) nesse estudo.
Ficaram claros para mim quais são os propósitos do estudo, os procedimentos
a serem realizados, seus desconfortos e riscos, a garantia de esclarecimentos
permanentes.
Ficou claro que a não identificação de meu (minha) filho(a) o será
possível pois os dados se referem unicamente a ele(a). Entretanto, o
endereço, nome e filiação permanecerão em sigilo absoluto.
Ficou claro também que a participação do(a) meu(minha) filho(a) é
isenta de despesas e que tenho garantia do acesso aos resultados e de
esclarecer minhas dúvidas a qualquer tempo. Concordo voluntariamente em
permitir a participação do(a) meu(minha) filho(a) deste estudo e poderei retirar
o meu consentimento a qualquer momento, antes ou durante o mesmo, sem
penalidade ou prejuízo ou perda de qualquer benefício que eu possa ter
adquirido.
___________________________________ Data
_______/______/______
Assinatura do pai (mãe) ou responsável
Nome:
Endereço:
RG.
Fone: ( )
__________________________________ Data
_______/______/______
Assinatura do(a) pesquisador(a)
Nome da criança:
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