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OS ADVÉRBIOS DE TEMPO E DE ASPECTO EM -MENTE E
SUA ORDENAÇÃO: UMA ABORDAGEM HISTÓRICA
Eliana Crispim França Luquetti
Rio de Janeiro
Fevereiro de 2008
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Universidade Federal do Rio de Janeiro
Faculdade de Letras
Comissão de Pós-Graduação e Pesquisa
OS ADVÉRBIOS DE TEMPO E DE ASPECTO EM -MENTE E
SUA ORDENAÇÃO: UMA ABORDAGEM HISTÓRICA
Eliana Crispim França Luquetti
Tese de Doutorado submetida ao
Programa de Pós-Graduação em
Lingüística da Universidade Federal do
Rio de Janeiro UFRJ, como parte dos
requisitos necessários para a obtenção do
título de Doutor em Lingüística.
Orientadora: Professora Doutora Maria
Maura da Conceição Cezario
Co-orientador: Professor Doutor Mario
Eduardo Toscano Martelotta
Rio de Janeiro
Fevereiro de 2008
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LUQUETTI, Eliana Crispim França
Os advérbios de tempo e de aspecto em -mente e sua ordenação: uma abordagem histórica/
Eliana Crispim França Luquetti. 2008.
159 fls.
Tese (Doutorado em Lingüística) –
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Faculdade de Letras,
Rio de Janeiro, 2008.
Orientadora: Maria Maura Cezario
Co-Orientador: Mario Eduardo T. Martelotta
1 Advérbios. 2. Ordenação de palavras. 3. Funcionalismo
I. Cezario, Maria Maura (Orientadora) II Martelotta, Mario Eduardo T. III Universidade
Federal do Rio de Janeiro. Faculdade de Letras. IV Título
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Faculdade de Letras
Comissão de Pós-Graduação e Pesquisa
OS ADVÉRBIOS DE TEMPO E DE ASPECTO EM -mente E SUA ORDENAÇÃO:
UMA ABORDAGEM HISTÓRICA
Eliana Crispim França Luquetti
Orientadora: Professora Doutora Maria Maura da Conceição Cezario
Co-Orientador: Professor Doutor Mario Eduardo Martelotta
Tese de Doutorado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Lingüística da
Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos necessários para a
obtenção do título de Doutor em Lingüística.
Aprovada por:
Presidente, Profa. Doutora Maria Maura da Conceição Cezario
Vice-Presidente, Prof.Doutor Mário Eduardo Toscano Martelotta
Profa.Doutora Maria da Conceição Paiva-UFRJ
Profa. Doutora Deize Vieira dos Santos-UFRJ
Prof. Doutor Afrânio Gonçalves Barbosa-UFRJ
Profa. Doutora Mariângela Rios de Oliveira-UFF
Suplentes:
Profa. Doutora Christina Abreu Gomes-UFRJ
Profa. Doutora Maria do Rosário da Silva Roxo- Univ. Estácio de Sá
Tese defendida em 25/02/2008.
Dedicatória
Ao meu querido e amado Deus, pois “O
Senhor é a minha rocha, a minha
cidadela, o meu libertador; o meu Deus,
o meu rochedo em que me refugio; o meu
escudo, a força da minha salvação, o
meu baluarte”. (Sl 18:2,3)
Esperei confiantemente pelo Senhor; ele
se inclinou para mim e me ouviu quando
clamei por socorro. Tirou-me de um poço
de perdição, de um tremedal de lama;
colocou-me os pés sobre uma rocha e me
firmou os passos. E me pôs nos lábios um
novo cântico, um hino de louvor ao nosso
Deus; muitos verão essas coisas, temerão
e confiarão no Senhor. (Salmos 40:1-3)
Agradecimentos
A Deus que sempre cuidou de mim, orientando, confortando e abençoando-me.
À minha querida e amada mãe Suely por ter me ensinado o caminho do bem, da honestidade,
da persistência, da esperança. Enfim, devo-lhe tudo quem sou.
Aos meus filhos, Fernanda e Pedro Henrique pela compreensão, carinho e existência na minha
vida.
Ao meu esposo Wanderson Luquetti, pelo constante incentivo, pela infinita paciência, pelas
palavras de conforto e amizade.
Aos meus irmãos, Patricia, Douglas, Catiane e Viviane que são parte de mim. E,
principalmente as minhas irmãs Catiane e Viviane, pelo apoio e pelas palavras certas nos
momentos certos.
Aos parentes e amigos, pelo acompanhamento interessado. Em especial, Ernesto França, Célia
Viana, Thiara França, Thiago França, Pastor Leopoldo, Lenise Dutra, Ana Lúcia Costa,
Aparecida Azevedo, pelo apoio e carinho constantes.
À Professora Maria Maura Cezario pela grande confiança depositada em mim, pela amizade,
pelo apoio e incentivo constantes e fundamentais. E ainda, por ter me conduzido ao prazeroso
caminho da pesquisa e ensinando-me a importância do nosso papel enquanto professores e
pesquisadores, através do seu exemplo e dedicação.
Ao Professor Mário Eduardo Martelotta pela carinhosa acolhida no projeto Discurso e
Gramática, pela prontidão em ouvir e ajudar, pelo exemplo profissional.
Aos amigos Natália Ilse, Júlia Nunes, Érika Ilogti e Roberto Freitas Jr. Pela colaboração
preciosa nesta pesquisa.
A todos do projeto Discurso e Gramática pela sincera amizade e pelos grandes e inesquecíveis
momentos compartilhados.
SINOPSE
Análise diacrônica da ordenação dos advérbios de tempo e
aspecto em -mente na modalidade escrita do português,
sob a perspectiva funcionalista, buscando investigar
fatores funcionais e estruturais determinantes da
colocação desses advérbios na cláusula.
LUQUETTI, Eliana Crispim França. Os advérbios de tempo e de aspecto em -mente e sua
ordenação: uma abordagem histórica. Rio de Janeiro: UFRJ, Faculdade de Letras, 2008. 159
fls. Tese de Doutorado em Lingüística.
Resumo
Este trabalho tem como objetivo observar as diferentes posições que os advérbios de
tempo e de aspecto em -mente tendem a assumir em diferentes momentos históricos, bem
como analisar a polissemia desses elementos em textos escritos em português nas seguintes
fases históricas: arcaica, séculos XVI, VXII, XVIII e XIX e português contemporâneo.
Esta pesquisa, além de testar novas hipóteses, vem integrar e ampliar uma série de
estudos que visam examinar, de modo mais geral, o processo de mudança de colocação dos
advérbios no decorrer do tempo (Moraes Pinto, 2002; Martelotta, Barbosa & Leitão, 2002;
Martelotta, 2004; Martelotta & Processy, 2006; Andrade, 2005; Albani 2007; Freitas, 2004) e
outros trabalhos sobre o fenômeno em questão. A pesquisa demonstra que fortes indícios
de mudança de posição do advérbio de tempo e aspecto em -mente ao longo da história do
português.
De acordo com a hipótese geral, ao estudarmos cada sincronia devemos encontrar
motivações para as diferentes posições ocupadas pelos advérbios de tempo e aspecto em -
mente na oração. A motivação dá-se por um conjunto de fatores estruturais, semânticos,
cognitivos e/ou discursivos, a saber: a noção semântica; a estrutura sintática da oração em que
está inserido o advérbio; o tipo semântico do verbo que compõe a cláusula, segundo Halliday
(1994) e outros fatores.
LUQUETTI, Eliana Crispim França. Os advérbios de tempo e de aspecto em -mente e sua
ordenação: uma abordagem histórica. Rio de Janeiro: UFRJ, Faculdade de Letras, 2008. 159
fls. Tese de Doutorado em Lingüística.
ABSTRACT
This work aims to observe the different positions that the adverbs of time and look at
mind-tend to take on different historic moments, and examine the polissemia these elements
in texts written in Portuguese on the following historical stages: archaic, XVI, VXII, XVIII
and XIX and Portuguese contemporary.
This research, and test new hypotheses, comes integrate and extend a series of studies
to examine, more generally, the process of changing the placing of adverbs over time (Moraes
Pinto, 2002; Martelotta, Barbosa & Leitao, 2002; Martelotta, 2004; Martelotta & Processy,
2006; Andrade, 2005; Albani 2007; Freitas, 2004) and other works on the phenomenon in
question. The research shows that there are strong indications of a change of position of the
adverb of time and point-in mind throughout history of the Portuguese.
According to the general assumption, by studying each sync must find reasons for the
different positions occupied by adverbs of time and point-in mind in prayer. Motivation
comes about by a number of factors structural, semantic, cognitive and / or discourse, namely
the notion semantics, the syntactic structure of the prayer that is inserted into the adverb; the
kind of semantic word that composes the clause, according Halliday (1994) and others.
LUQUETTI, Eliana Crispim França. Os advérbios de tempo e de aspecto em -mente e sua
ordenação: uma abordagem histórica. Rio de Janeiro: UFRJ, Faculdade de Letras, 2008. 159
fls. Tese de Doutorado em Lingüística.
Résumé
Ce travail vise à observer les différentes positions que les adverbes en –ment de temps
et d'aspect prennent pendant les moments historiques, et d'examiner la polysémie de ces
éléments dans les textes écrits en portugais sur les étapes historiques suivantes: archaïque,
XVI, VXII, XVIII Et XIX et portugais contemporain.
Au délà de tester de nouvelles hypothèses, cette recherche vient d'intégrer et d'étendre
une série d'études pour examiner, de façon plus générale, le processus de modification du
placement des adverbes en –ment dans le temps (2002 2002 2004; Martelotta & Processy,
2006; Andrade, 2005; Albani 2007; Freitas, 2004) et d'autres ouvrages sur le phénomène en
question. La recherche montre qu'il y a fortes indications de changement de position de
l'adverbe en –ment de temps et d’aspect au long de l'histoire portugaise.
Selon l'hypothèse générale, en étudiant chaque synchronisation on doit trouver les
raisons pour lesquelles les différentes positions occupées par les adverbes en –ment de temps
et d’aspect dans la proposition. La motivation est donnée par un certain nombre de facteurs
structurels, sémantiques, cognitives et / ou discursifs, à savoir: la notion sémantique, la
structure syntaxique de la proposition que l’adverbe est inséré, le genre de mot sémantique qui
compose la clause, selon Halliday (1994 ) et les autres.
LISTA DE TABELAS
Tabela 1- Distribuição dos advérbios em -mente quanto à ordem em relação ao verbo.
Tabela 2- Levantamento Geral dos dados dos corpora dos Advérbios de Tempo e de Aspecto
em –mente.
Tabela 3 - Distribuição das posições dos advérbios de tempo e aspecto em –mente X
sincronias.
Tabela 4 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Português Arcaico.
Tabela 5 - A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Século XVI.
Tabela 6 - A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Século XVII.
Tabela 7 - A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Século XVIII.
Tabela 8 - A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Século XIX.
Tabela 9 - A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Português Atual.
Tabela 10 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Português Arcaico.
Tabela 11 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Século XVI.
Tabela 12 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Século XVII.
Tabela 13 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Século XVIII.
Tabela 14 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Século XIX.
Tabela 15 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Português Atual.
Tabela 16 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Português Arcaico.
Tabela 17 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Século XVI.
Tabela 18 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Século XVII.
Tabela 19 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Século XVIII.
Tabela 20 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Século XIX.
Tabela 21 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Português Atual
Tabela 22 - Ocorrência de advérbios no Português Arcaico.
Tabela 23 - Ocorrência de advérbios no Século XVI.
Tabela 24 - Ocorrência de advérbios no Século XVII.
Tabela 25 - Ocorrência de advérbios no Século XVIII.
Tabela 26 - Ocorrência de advérbios no Século XIX.
Tabela 27 - Ocorrência de advérbios no Português Atual
LISTA DE QUADROS
Quadro1 – Distinção entre Advérbio e Pseudo-advérbio
Quadro 2 - Subposições dos Advérbios em -mente
LISTA DE ABREVIATURAS
EC – A essência do cristianismo
OE – Orto do esposo
SUMÁRIO
LISTA DE TABELAS
LISTA DE QUADROS
LISTA DE ABREVIATURAS
1 INTRODUÇÃO.......................................................................................................... 15
1.1 HIPÓTESES............................................................................................................... 18
1.2
O
BJETIVOS
............................................................................................................................................
20
2 REVISÃO DE LITERATURA.................................................................................. 22
2.1
A
QUESTÃO DA CATEGORIZAÇÃO
.........................................................................................................
22
2.2
A
DVÉRBIO
:
ELEMENTO DO LÉXICO OU DA GRAMÁTICA
?....................................................................
26
2.3
A
DVÉRBIOS
:
ESPÉCIES
,
FORMAS E SIGNIFICAÇÃO
...............................................................................
27
2.4
V
ISÃO
T
RADICIONAL DOS
A
DVÉRBIOS
................................................................................................
31
2.5
P
ESQUISAS SOBRE ADVÉRBIOS
,
SOB ORIENTAÇÃO DA
LINGÜÍSTICA
..................
.....................34
2.5.1
T
IPOS DE ADVÉRBIOS
.........................................................................................................................
34
2.5.2
E
STUDOS SOBRE O ADVÉRBIO EM
-
MENTE E SOBRE ORDENAÇÃO DE ADVÉRBIOS
............................
38
2.6
O
S ADVÉRBIOS E A EXPRESSÃO DE TEMPO
...........................................................................................
54
2.
7
O
S ADVÉRBIOS RELACIONADOS À CATEGORIA DE ASPECTO
.....................................................56
2.
8
A
FORMAÇÃO DE ADVÉRBIOS EM
-
MENTE
............................................................................................
60
3 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS................................................................................. 67
3.1
O
S PRINCÍPIOS FUNCIONALISTAS
..........................................................................................................
67
3.2
G
RAMATICALIZAÇÃO E
N
ÍVEIS DE
E
NCAIXAMENTO ENTRE
C
LÁUSULAS
...........................................
70
3.3
G
RAMATICALIZAÇÃO E ESTRUTURA SINTÁTICA
..................................................................................
72
3.4
A
S PRESSUPOSIÇÕES DISCURSIVAS DAS CONSTRUÇÕES SINTÁTICA
.............................................73
3.5
C
LASSIFICAÇÕES DOS VERBOS
,
BASEADA EM
H
ALLIDAY
(1994).........................................................
75
4 METODOLOGIA ....................................................................................................... 80
4.1
C
ORPUS
..................................................................................................................................................
81
4.2
D
ESCRIÇÕES DOS FATORES DA ANÁLISE DOS ADVÉRBIOS DE TEMPO E ASPECTO EM
MENTE
...........
84
5 ANÁLISES DOS DADOS........................................................................................... 89
5.1
A
NÁLISES DE FATORES
..........................................................................................................................
89
5.1.1
O
RDEM DO ADVÉRBIO DE TEMPO E ASPECTO EM
-
MENTE
................................................................
90
5.1.2
P
OSIÇÃO DO ADVÉRBIO
......................................................................................................................
93
5.1.3
N
OÇÃO SEMÂNTICA DO ADVÉRBIO
...................................................................................................
96
5.1.
4
T
IPO SEMÂNTICO DO VERBO
............................................................................................................
105
5.1.5
T
IPO DE SUJEITO
..............................................................................................................................
114
5.1.6
T
IPO DE ORAÇÃO
.............................................................................................................................
122
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................... 133
1 INTRODUÇÃO
Este trabalho tem como objetivo observar as diferentes posições que os advérbios de
tempo e aspecto em -mente tendem a assumir em diferentes momentos históricos, para
verificarmos se houve mudança na ordenação da frase da língua portuguesa com relação a
esses tipos de advérbios. Para isso, coletamos dados de textos do português das seguintes
fases históricas: arcaica, séculos XVI, VXII, XVIII e XIX e português atual.
Este estudo, além de testar novas hipóteses, vem integrar e ampliar uma série de
pesquisas que visam examinar, de modo mais geral, o processo de mudança de colocação dos
advérbios no decorrer do tempo (Moraes Pinto, 2002; Martelotta, Barbosa & Leitão, 2002;
Martelotta, 2004; Martelotta & Processy, 2006; Andrade, 2005; Albani 2007; Freitas, 2004).
A motivação para o presente estudo veio do trabalho realizado na dissertação de
mestrado de França (2002), na qual foi feita uma análise dos adjuntos adverbiais de tempo e
aspecto em narrativas orais e escritas contemporâneas, sob uma perspectiva funcionalista.
Nesse trabalho, procuramos delimitar os valores que esses adjuntos apresentavam no texto
narrativo, assim como as tendências de colocação que eles assumiam nas cláusulas que
compunham o texto.
Esses adjuntos adverbiais de tempo e aspecto, de um modo geral, apresentavam uma
grande mobilidade na cláusula, podendo ter suas tendências de ordenação explicadas por
fatores de caráter sintático e discursivo.
Nessa dissertação (França,2002), utilizamos o corpus Discurso & Gramática (Votre e
Oliveira: 1995), constituído de um conjunto de entrevistas faladas e escritas, concedidas por
informantes de C.A. infantil e adulto, 4
a
e 8
a
séries e 2
o
e 3
o
graus, apresentando os seguintes
tipos de discurso: narrativa de experiência pessoal, narrativa recontada, relato de
procedimento, relato de opinião e descrição de local. Essa análise, entretanto, se restringiu às
narrativas, já que partia do princípio de que os dois planos discursivos, figura e fundo,
apresentavam tendências de ordenação diferentes no que diz respeito aos elementos adverbiais
estudados.
Os resultados obtidos nessa análise mostraram que os adjuntos adverbiais
apresentavam a sua colocação de acordo com a sua função dentro do tipo de discurso (figura
ou fundo) de que faziam parte.
No presente trabalho, um aprofundamento da análise dos advérbios em -mente
(somente os advérbios em -mente, diferentemente da dissertação de mestrado) em vários
aspectos, uma vez que ampliamos os pressupostos teóricos e o número de fatores a serem
testados. Além disso, a distribuição das ordenações possíveis está muito diferente do que foi
feito em França, 2002. O foco agora é o texto escrito e a diacronia. Para isso, analisamos
textos de diferentes gêneros textuais ao longo dos séculos, da fase arcaica do português ao
período atual da Língua.
Eis alguns exemplos de dados analisados nesta tese a partir dos quais é possível
verificar a grande variedade de ordenação:
(1) E porque me consta o mensionado Bacharel Manuyel Pacheco de Paiva, que
atualmente o ocupa, se achar em diligencia fora dessa cidade( culo XVIII ,cartas oficiais,
PHPB).
(2) Quer dizer cana e pena, porque as penas antigamente faziam-se de certas canas
delgadas(Século XVII ,Sermão do Pe. A.Vieira).
(3) Atualmente as coisas estão como costumavam ser mil anos atrás(Português
atual,EC p.9).
(4) ...deixamos boas coisas para trás muito freqüentemente em nome da
independência (Português atual,EC, p.31).
Nota-se que, no exemplo (1), o advérbio atualmente ocorre antes do verbo (ocupa);
no exemplo (2), o advérbio antigamente, ocorre entre o sujeito (as penas) e o verbo (faziam-
se); no exemplo (3), o advérbio atualmente ocorre no início da cláusula (margem esquerda),
antes do sujeito (as coisas) e antes do verbo (estão); e, no exemplo (4), o advérbio
freqüentemente, ocorre depois do verbo (deixamos). Portanto, verificamos que os advérbios
em -mente podem ocorrer antes ou depois do verbo; entre o sujeito e o verbo; no início da
cláusula; no final da cláusula, enfim, diversas possibilidades de posição desse advérbio na
cláusula.
Ao pesquisarmos definições e classificações sobre os advérbios, em gramaticais
tradicionais e nas de orientação lingüística, percebemos que essa é uma classe bastante
complexa e colocada de forma pouco elucidativa, isto é, em geral, é definida e exemplificada
de modo simplista e pouco esclarecedora. Nesta pesquisa, estamos considerando como dados
advérbios que os estudiosos consideram ora como advérbios de tempo (como ultimamente,
primeiramente, antigamente), ora como advérbios de aspecto (freqüentemente, novamente,
constantemente) e ainda como advérbios de modo, como por exemplo, o advérbio
rapidamente, que é classificado tradicionalmente como advérbio de modo. Como também
nesse advérbio traços semânticos ligados ao tempo, também o incluímos na análise (cf. os
resultados do fator “tipo semântico do advérbio).
Entendemos que é necessária uma análise mais profunda sobre os advérbios de tempo
e de aspecto em -mente, abarcando seus usos ou funções; suas posições na cláusula e outras
características. Neste estudo, investigaremos questões como:
a) Por que o advérbio ora aparece no final, ora no início da cláusula, ora em outras
posições?
b) fatores que contribuem para a ordenação desses advérbios num dado lugar da
cláusula?
c) Existe uma posição fixa para determinados usos dos advérbios? Se existe, por que
isso acontece? Seria o tipo semântico do verbo que, com a freqüência de uso,
fixaria o advérbio numa dada posição?
d) relação entre a semântica do advérbio e a posição em que ele aparece mais
freqüentemente na cláusula? Há posições prototípicas para os advérbios em -
mente? Se há, houve alguma diferença de uso ao longo da história do português?
Acreditamos que esta pesquisa contribuirá para o estudo sobre a ordenação dos
advérbios de tempo e de aspecto e suas funções na cláusula na língua portuguesa. Contribuirá
também para melhor compreendermos a organização textual.
1.1 Hipóteses
As hipóteses desse estudo são:
(a) Pressupomos que ocorreram mudanças na posição dos advérbios da sincronia do
português arcaico para o contemporâneo. De acordo com trabalhos anteriores, como os
de Martelotta e Leitão (1999) e de Martelotta, Barbosa e Leitão (2001), a posição pré-
verbal (entre o sujeito e o verbo) era disponível para toda e qualquer espécie de advérbio
e, hoje, ela está disponível para alguns - portanto, houve uma mudança no padrão de
ordenação de alguns advérbios. Com relação aos advérbios de tempo e de aspecto em -
mente, acreditamos que deve haver uma posição prototípica para esse advérbio em
relação ao verbo, ao sujeito e ao complemento verbal nas diferentes sincronias, sendo
que, ao longo da história do português, pode ter havido uma contínua fixação da posição
do advérbio em relação ao verbo, uma vez que estudos diacrônicos demonstram que a
ordenação dos termos foi se tornando cada vez mais fixa.
(b) Seguindo a proposta de Martelotta (2004) para os advérbios qualitativos, estamos
considerando que a mudança de ordenação dos advérbios de tempo e de aspecto em -
mente parece está relacionada ao processo de gramaticalização de certas estruturas
sintáticas. De acordo com Givón (1979), a cláusula principal declarativa, afirmativa,
ativa, neutra é menos pressuposicional, no sentido de que sua interpretação depende de
menos material inferível do que a interpretação das demais estruturas. Isso confere a esse
tipo de cláusula (menos gramaticalizada) uma maior liberdade e variedade de elementos
significativos. Por outro lado, a distribuição dos elementos significativos, em todos os
outros tipos de cláusula (mais gramaticalizadas), é sempre mais restrita visto que esses
outros tipos de cláusula tendem a exibir grande conservadorismo sintático, sobretudo, no
que diz respeito à ordenação vocabular. Portanto, partindo dessa proposta, esperamos
encontrar, no português arcaico, advérbios em posição pré-verbal (posição típica dos
advérbios no latim) ocorrendo mais nas orações mais gramaticalizadas (hipotáticas e
subordinadas) do que nas menos gramaticalizadas, e, no português atual, nossa hipótese
é de que ocorram menos advérbios em posições pré-verbais e que essas ocorrências
envolvam frases estilisticamente marcadas.
(c) deve haver fatores de diferentes ordens que motivam o uso do advérbio em diferentes
posições na frase. Fatores como o papel semântico exercido pelo advérbio em -mente, o
tipo semântico do verbo, a presença ou ausência do sujeito na frase, dentre outros,
devem influenciar a ordem que este ocupa na sentença.
1.2 Objetivos
Pretendemos estudar as posições assumidas pelos advérbios em -mente na cláusula em
textos de diferentes gêneros textuais das seguintes fases do português: português arcaico, dos
séculos XVI, XVII, XVIII, XIX e português atual, observando, principalmente, o papel da
freqüência de ocorrência em dadas posições e a possível gramaticalização desses advérbios
com determinados tipos de verbo. Inicialmente, a opção por textos religiosos foi pela
disponibilidade de textos em documentos escritos em português arcaico, mas, quando
partimos para o levantamento de dados, verificamos que havia uma escassez de dados do
fenômeno em questão, sendo assim, decidimos investigar em outros gêneros textuais.
Mas, ainda assim, procuramos manter uma certa uniformização das tipologias, pois as
diferenças entre os usos dos advérbios encontrados poderiam ser atribuídas a diferenças
textuais e não à mudança lingüística.
Os principais objetivos desse estudo são:
1- analisar detalhadamente o uso dos advérbios de tempo e de aspecto em -mente no
português escrito;
2- acompanhar o uso da ordenação dos advérbios nos tipos de orações ao longo do
tempo, analisando os dados tanto do português arcaico quanto do português atual, para
verificar se as construções mais gramaticalizadas (cláusulas hipotáticas e
subordinadas) são mais conservadoras, isto é, favorecem a ocorrência de advérbios em
posições pré-verbais (posições mais antigas), e se as menos gramaticalizadas
(cláusulas principais e coordenadas) são mais inovadoras, propiciando a ocorrência de
dados com advérbios em –mente em ordenações pós-verbais;
3- verificar se indícios de mudança na sintaxe desse advérbio nas fases estudadas do
português: arcaica, dos séculos XVI, XVII, XVIII, XIX e português atual;
4- caracterizar as posições assumidas pelos advérbios de tempo e aspecto, apresentando
a freqüência de ocorrência de cada ordem assumida;
5- identificar os fatores que influenciam a ordenação desses advérbios em contextos em
que eles podem ocupar posições diferentes nas cláusulas, testando hipóteses
relacionadas à motivação de ordenação.
Para apreciação das questões aqui levantadas, apresentamos, no capítulo 2, uma revisão na
literatura sobre os advérbios, sua ordenação, formação e origem, no capítulo 3, os
pressupostos teóricos que fundamentam esse estudo; no capítulo 4, a metodologia utilizada
para codificação dos dados; no capítulo 5, a análise dos dados, interpretação dos resultados da
análise quantitativa, assim como dos fatores e hipóteses examinados; e, por fim, nos capítulos
6 e 7, seguem algumas considerações finais sobre os advérbios e a bibliografia,
respectivamente.
2 REVISÃO DE LITERATURA
Este capítulo consiste numa breve explanação sobre a questão da categorização e
estrutura da língua, como também, a descrição de algumas abordagens sobre a definição,
classificação e/ou ordenação de advérbios na cláusula. Aqui são apresentados trabalhos de
perspectiva tradicional, bem como os realizados em linhas de pesquisa lingüística que
estudam a Língua em uso.
2.1 A questão da categorização
Antes de apresentarmos as considerações sobre a classe que reúne os advérbios,
apresentaremos uma breve explanação sobre a questão da categorização, uma vez que estamos
reunindo numa mesma classe geral advérbios que os estudiosos ora consideram de tempo
(ultimamente, por exemplo), ora de aspecto (freqüentemente), ora de modo (rapidamente).
Além disso, a própria natureza da classe advérbio é de difícil análise, uma vez que reúne itens
muito diferentes tanto com relação à ordenação, como em relação à semântica.
Tradicionalmente, as classes das palavras têm sido definidas segundo suas
propriedades semânticas, sintáticas e morfológicas. As gramáticas tradicionais privilegiam o
aspecto semântico na conceituação do substantivo, do adjetivo e do verbo, e recorrem ao
aspecto funcional na conceituação da conjunção, da preposição e até mesmo do artigo, dos
pronomes e dos advérbios, que é o foco do nosso trabalho, e, estes últimos são conceituados
ainda pelo seu aspecto semântico, mas a análise apresentada não dá conta da sua imprecisão.
Os autores de um modo geral também chegam à conclusão da imprecisão dessa
categoria. Seja de um ponto de vista mais formal, como o de Camara Jr. (1976) ou o de
Bechara (1999), seja de uma perspectiva mais funcional, como a de Ilari et al. (1990) ou a de
Neves (2000), a categoria dos advérbios é considerada bastante controvertida.
Constituída por tipos de natureza muito diversa, em termos semânticos, sintáticos e
mesmo morfológicos, esse conjunto parece não resistir a uma definição mais geral, capaz de
dar conta da totalidade de seus usos. Nesse sentido, a abordagem categorial prototípica,
segundo Taylor (1995), em conformidade com a concepção funcionalista que nos orienta,
apresenta-se como o tratamento mais adequado para os tipos desse conjunto tão híbrido. De
acordo com tal concepção, podemos admitir que, numa dada classe, encontram-se membros
situados em pontos distintos em relação ao eixo categorial básico, de acordo com o número de
traços compartilhados pelos mesmos.
Assim, encontramos constituintes que de modo mais visível representam essa
categoria; em geral, são termos mais freqüentes e identificados pela comunidade lingüística
como pertencentes à categoria. Por outro lado, podemos registrar também termos que, por
conta da perda de traços categoriais, tendem a ocupar posição periférica ou marginal em
relação ao padrão, situando-se praticamente no limite ou na interseção com outra classe. Dos
advérbios aqui em análise, os de tempo e de aspecto em -mente, conforme a perspectiva
exposta anteriormente, estariam situados em um ponto de maior afastamento em relação ao
eixo da categoria dos advérbios. Segundo Ilari et al. (1990) e Neves (2000), esses tipos de
advérbios caracterizam-se por sua função não-predicativa ou não-modificadora, uma vez que
informações acerca de tempo não incidem sobre ou afetam a predicação, mas os de aspecto
sim. Assim definidos, estariam tais constituintes predispostos a ocorrer em pontos de maior
afastamento em relação ao verbo, conforme prevê o subprincípio de proximidade (Givón,
2001; Furtado da Cunha, Rios de Oliveira e Martellota, 2003), segundo o qual conteúdos
menos integrados são articulados por formas também menos integradas na superfície textual.
Além do aspecto relativo ao status dessa categoria, interessa-nos também mencionar a
questão da polissemia envolvida nos usos desses advérbios. De acordo com a hipótese
localista, podemos dizer que a referência espacial seria a mais primária ou original; a partir
desse sentido mais concreto, teríamos a derivação para tempo, de natureza mais abstrata, e, a
partir daí, os sentidos lógicos ou textuais, como a referência de modo, numa etapa de maior
abstratização. Segundo Pontes (1992, p. 8-9), através do uso dos mesmos elementos
gramaticais, projetamos as categorias de espaço para falar de tempo metaforicamente”;
conforme a autora, trata-se de derivação de sentido desde tempos imemoriais. O interessante
nessa abordagem é que os sentidos originais não são necessariamente descartados diante dos
mais recentes, o que vem a gerar polissemia dos usos adverbiais, principalmente na
articulação dos sentidos aspectuais, modais e temporais, muitas vezes sobrepostos.
Mattoso Câmara formulou na Estrutura da Língua Portuguesa uma classificação
baseada em dois critérios, um misto e outro simples, que é didaticamente satisfatória. Para ele,
os vocábulos formais do português se agrupam, primeiro, segundo a um critério morfo-
semântico, em quatro classes: nome, verbo, pronome e conectivo. As três primeiras classes
são constituídas basicamente de palavras variáveis, a última de palavras invariáveis.
O verbo distingue-se no grupo, nessa primeira divisão, pelo paradigma flexional em
que se enquadra (apresenta variação modo-temporal e número-pessoal). O nome e o pronome,
por sua vez, são vocábulos dotados de número e gênero, exprimíveis em uma e noutra classe
pelo mesmo mecanismo flexional. A distinção entre eles repousa, de um lado, na natureza da
significação, e de outro, em certas propriedades morfossintáticas exclusivas do pronome
(variação em pessoa e em caso)
Semanticamente, o nome ‘nomeia’ e os seres, permitindo que o locutor e o ouvinte os
designem sem o reforço da situação ou do contexto verbal. O pronome por outro lado, efetua
uma referência contextual ou situacional: quem diz aquela roupa estava na minha gaveta’,
está particularizando roupa e gaveta em função de uma situação. Sabe-se apenas, por meio
de aquelae de minha’, que a roupa em questão está distante dos interlocutores e que a
gaveta pertence ao locutor. Essa constatação, todavia, não esclarece tudo, uma vez que as
palavras ‘distante e próximo também significam noções relativas e nem por isso são
pronomes. Basicamente, importa ter em vista a referência à situação em que se encontram os
interlocutores: os pronomes a incluem na significação dos enunciados. Sendo assim, pode-se
dizer ‘Pernambuco fica distante de Santa Catarina em qualquer parte do Brasil, que o
significado da frase será o mesmo; mas quem diz Pernambuco fica distante daqui’ designa
com o ‘aqui’ o lugar em que, na qualidade de Emissor, se encontra. Logo, aquele’, ‘minha’ e
‘aqui’ tem uma significação situacional e são por isso, pronomes. Do ponto de vista mórfico,
boa parte dos pronomes apresenta formas distintas conforme a pessoa do discurso a que se
referem. Entre estes pronomes, os denominados ‘pessoais’ têm formas distintas para cumprir
as funções de sujeito e complemento. Acrescenta-se, quanto ao aspecto mórfico que vários
pronomes apresentam, ao lado das formas masculinas e femininas, uma terceira forma
‘neutra’ (aquilo, em face de aquele/aquela).
O segundo critério de Mattoso, de modo simples, redistribui os nomes, os pronomes e
os conectivos segundo características sintáticas. O nome e o pronome podem ser substantivos,
adjetivos ou advérbios; os conectivos podem ser conjunções ou preposições. Estes papéis
podem ser identificados no contexto da oração ou do sintagma: em ‘meus amigos ingleses’,
amigos é o núcleo da construção, classificado por isso como substantivo, ao passo que
ingleses, constituinte modificador, é um adjetivo; por outro lado, em as crianças amigas’,
crianças é o núcleo e amigas funciona como adjetivo. Na mesma linha de raciocínio, diremos
que elas são meus amigas’, elas, sujeito da oração, é um pronome substantivo, enquanto
minhas, adjunto de amigas, é um pronome adjetivo. Além disso, o nome e o pronome podem
funcionar como advérbios se o termo que acompanham é um verbo e podem dar lugar a
expressões preposicionadas. É o que se passa com alto a aqui em ‘Os garotos conversam alto
(cf. Os garotos conversam com entusiasmo’) e em Os garotos conversavam aqui’ (cf. Os
garotos conversavam nesta sala’).
Quanto aos conectivos, há, segundo Mattoso, os que ligam palavras (preposições) e os
que ligam orações (conjunções). Assim, em ‘casa de pedra’, ‘de’ é uma preposição, cabendo,
porém, a ‘enquanto’ o papel de conjunção em ‘Vilma iria enquanto você chorava’.
Das considerações feitas nas linhas anteriores, depreende-se a necessidade de se
repensar as características sintático-semântico-discursivas dos advérbios para um estudo mais
atento dessa categoria.
2.2 Advérbio: elemento do léxico ou da gramática?
Tradicionalmente, é feita uma separação entre elementos do léxico ou lexemas e
elementos da gramática, ou morfemas propriamente ditos.
Os elementos do léxico configuram imediatamente a realidade extralingüística e os
morfemas gramaticais remetem a uma significação intralingüística (significação externa e
objetiva). Os verbos plenos, substantivos e adjetivos são considerados elementos do léxico e
outras classes como conjunções, preposições, etc. são de modo geral considerados elementos
da gramática, assim como as flexões, prefixos e sufixos. Mas classes que apresentam
características de ambos os níveis. Uma dessas classes é o advérbio, que ora se comporta
como um item do léxico (haja vista a possibilidade de criação de novos advérbios em -mente),
ora se comporta como elemento da gramática.
No que se refere aos vocábulos derivados em -mente, torna-se inadequado, considerá-
los morfemas lexicais ou lexemas fora de um contexto específico, visto que alguns deles,
isoladamente não remetem à realidade extralingüística (valores temporais, sociológicos,
psicológicos etc.), motivo pelo qual se prefere denominá-los vocábulos e não palavras.
Vale ressaltar que Cunha e Cintra (1985) consideram morfemas lexicais os
substantivos, os adjetivos, os verbos e os advérbios de modo e, morfemas gramaticais os
artigos, os pronomes, os numerais, as preposições, as conjunções, os demais advérbios, bem
como as formas indicadoras de número, gênero, tempo, modo ou aspecto verbal.
Além disso, Brinton e Traugott (2005), que utilizam uma perspectiva funcionalista
semelhante à que caracteriza este trabalho, consideram os advérbios, por suas características,
como elementos da gramática.
Verifica-se que, além de apresentarem todos os “advérbios de modo” como morfemas
lexicais, os gramáticos mencionados denominam morfemas gramaticais não os afixos e
desinências (formas presas), como também as formas dependentes, na perspectiva de Câmara
Júnior, estabelecendo entre tais elementos uma relação de igualdade.
Com base nestes pressupostos, pergunta-se:
1) como considerar todos os vocábulos derivados em -mente, inclusive os desgastados pelo
uso automatizado, morfemas lexicais?
e, em conseqüência:
2) como denominar todos os “advérbios” não-marcados pela presença do sufixo -mente,
indistintamente, morfemas gramaticais?
2.3 Advérbios: espécies, formas e significação
Os advérbios são tradicionalmente caracterizados, priorizando os critérios semânticos
e formais. Sob o critério semântico, o advérbio expressa circunstâncias e, por outro lado, sob
o critério formal, eles podem modificar um verbo, um adjetivo, outro advérbio, ou todo o
enunciado.
Começando pelo critério semântico, tem-se a idéia de circunstância. Entendemos
como circunstância determinados indícios ou particularidades que caracterizam o conteúdo
expresso pelo termo ao qual o advérbio se refere. Sendo assim, pode-se entender como
expressando circunstâncias dados informacionais bastante diferentes entre si, como tempo,
lugar, modo, causa e, até mesmo, intensidade. Mas é difícil admitir que determinados tipos de
advérbios expressem circunstâncias, como é o caso, por exemplo, dos advérbios de dúvida, de
afirmação e de negação, respectivamente exemplificados abaixo:
(1) Talvez amanhã chova.
(2) Sim, choveu muito.
(3) Não choveu muito.
Nestes casos, os advérbios destacados não expressam circunstâncias, pelo menos de
acordo com a definição proposta acima, e sim uma atitude ou posicionamento do falante em
relação àquilo que está falando. O mesmo ocorre com os advérbios abaixo:
(4) Com certeza, vai chover amanhã.
(5) Felizmente, não choveu.
(6) Sinceramente, eu não gosto de chuva.
Nestes casos, ocorre nitidamente uma atitude ou posicionamento do falante em relação
ao que fala. Ducrot (1972) propõe que estes advérbios referem-se ao próprio ato ilocucionário
de afirmar, uma vez que qualificam o ato de dizer e não a coisa direta. Para ele, alguns
advérbios têm sua utilização explicada apenas por uma teoria dos atos da fala ou teoria da
enunciação, cuja unidade é o discurso.
Ducrot (1972) também apresenta alguns advérbios que indicam pressuposição: mal,
quase, exceto, também, somente, muito, pouco, entre outros. Embora alguns destes elementos
não sejam considerados tradicionalmente como advérbios, Ducrot (1972) os apresenta como
tal, afirmando que sua introdução no enunciado permite que determinado fato seja
pressuposto:
(7) Ele quase parou de fumar.
Nesta frase, o uso do elemento quase leva à pressuposição de que "ele" tentou parar de
fumar.
Como se pode ver, a visão de que os advérbios exprimem circunstâncias é muito
limitada. determinados tipos de advérbios cujo uso é basicamente determinado por fatores
pragmático-discursivos. E mesmo aqueles que funcionam normalmente como
circunstanciadores (de tempo, de lugar, de modo, de causa, de intensidade) muitas vezes são
usados para direcionar a interpretação do ouvinte, promover a organização das informações
no discurso além de outras funções pragmático-discursivas.
É o caso, por exemplo, do advérbio de tempo já, que pode assumir um papel de
elemento de contra-expectativa, no sentido que Heine et al. (1992) dão ao termo:
(8) A reunião terminou?
Nesta frase, mais que uma noção temporal, o elemento demonstra noção de contra-
expectativa do falante de que a reunião não tivesse terminado. Ou seja, a frase expressa o
contrário da expectativa e o advérbio já é a marca disto: é um elemento de contra-expectativa.
Mas também é de grande relevância pensar no aspecto formal da definição de
advérbio. É correto caracterizar os advérbios como elementos que se referem a um verbo, a
um adjetivo, a outro advérbio ou à oração inteira? autores que tentaram questionar isto,
como, por exemplo, Silva Jr. e Andrade (1907: 155), que afirmaram que os advérbios podem
modificar substantivos:
(9) Gonçalves Dias era verdadeiramente poeta.
Bomfim (1988: 9) questiona esta hipótese, afirmando que o termo poeta, no caso, não
pode ser entendido substantivamente, mas como um conjunto de qualidades atribuídas ao
elemento que recebe a referência. Assim, segundo autora, o elemento verdadeiramente
funciona, na realidade, como intensificador de poeta.
Por outro lado, pode-se pensar em outros exemplos, como os agrupados abaixo:
(10) A reunião na casa de Paulo foi proveitosa.
(11) O exemplo acima demonstra a hipótese.
(12) O país precisa de pessoas assim.
Nestas frases, os termos sublinhados referem-se claramente aos substantivos que os
antecedem e expressam circunstância (lugar nos exemplos 10 e 11 e modo no exemplo 12).
São casos diferentes do exemplo 9, onde o substantivo a que o advérbio se refere desempenha
função de predicativo. Deve-se considerar estes casos advérbio ou não? Mais uma vez se
evidencia a necessidade de se repensar o conceito tradicional de advérbio.
Mas este trabalho se deterá, mais especificamente, na ordenação dos advérbios de
tempo e de aspecto terminados em -mente. Mas é interessante estarmos sempre repensando
seu papel na estrutura da Língua.
Conforme propôs Givón (2001), a classe dos advérbios é a menos homogênea, tanto
do ponto de vista semântico quanto do morfossintático. Essa heterogeneidade é agravada pelo
fato de os advérbios funcionarem num plano de utilização da língua que tramita entre o campo
do léxico e a área da gramática, normalmente composta de elementos que assumem funções
voltadas para a organização interna do texto ou para a orientação argumentativa que se quer
dar a ele. De fato, o rótulo advérbio designa um conjunto muito diferenciado de elementos, e
parece constituir uma categoria fluida, que tende a se adaptar às intenções comunicativas
envolvidas no discurso.
Tradicionalmente, os advérbios são caracterizados como elementos de base nominal
(apenas < a + penas, depressa < de + pressa) ou pronominal (aqui, hoje) que de um ponto de
vista formal, são invariáveis, de um ponto de vista funcional (Câmara Jr: 1983) são termos
determinantes de um verbo ou de um nome (adjetivo e outro advérbio) e, de um ponto de vista
semântico, expressam circunstâncias, como foi explicitado anteriormente, ou seja, o
problema da generalização das definições.
2.4 Visão Tradicional dos Advérbios
Com base no que observamos em Said Ali (1969), Melo (1970), Rocha Lima (1985),
Cunha & Cintra (1985) e Bechara (2000), podemos dizer que os advérbios são
tradicionalmente caracterizados, de um ponto de vista semântico, por expressarem
circunstâncias e, de um ponto de vista formal, por modificarem um verbo, um adjetivo, outro
advérbio, ou toda a declaração, como se pode observar na definição de advérbio proposta por
Rocha Lima:
[...] palavras modificadoras do verbo. Servem para expressar
as várias circunstâncias que cercam a significação verbal (...).
Alguns há, até, que não acompanham a verbos, mas somente a
adjetivos e advérbios. (ROCHA LIMA, 1985: 174).
No que se refere especificamente aos advérbios de tempo, as gramáticas tradicionais
também não dizem muito. Apresentam a noção de tempo como uma das noções
circunstanciais expressas pelos advérbios e elencam uma série de elementos, como: agora,
ainda, amanhã, anteontem, antes, breve, cedo, depois, então, hoje, jamais, logo, nunca,
ontem, sempre, tarde, entre outros. Também não se vê, nas gramáticas tradicionais, uma
relação entre determinadas noções aspectuais e a classe dos advérbios. Aliás, a noção de
aspecto é normalmente deixada de lado nas gramáticas e as diferenças entre as noções
temporais dêiticas e não-dêiticas não são abordadas.
A respeito da ordenação dos advérbios, tema que nos interessa mais, os gramáticos
tradicionais, de um modo geral, nada menciona. Apenas Cunha e Cintra (1985) e Bechara
(2000) falam algo sobre o assunto.
Cunha e Cintra (1985) se referem à colocação adverbial em sua gramática, afirmando
que "os advérbios que modificam um adjetivo, um particípio isolado ou outro advérbio
colocam-se de regra antes destes". Em seguida, propõem que, com relação aos advérbios que
modificam o verbo, ocorre o seguinte:
a) Os advérbios de modo colocam-se normalmente depois do verbo.
b) Os advérbios de tempo e de lugar podem colocar-se antes ou depois do verbo.
c) O advérbio de negação antecede sempre o verbo.
Ainda acrescentam que os advérbios modificadores de outro advérbio, de um adjetivo
ou de um particípio isolado posicionam-se antes destes.
Os autores em questão propõem também que "o realce do adjunto adverbial é
expresso de regra por sua antecipação ao verbo", mas nada dizem em relação à colocação de
cada tipo específico de advérbio para fins de realce, muito menos o que ocorre neste sentido,
com os tipos de advérbios que já tendem a aparecer antes do verbo.
Entretanto, tratam a colocação desses advérbios em linhas muito gerais, uma vez que
se sabe, por exemplo, que os advérbios de modo são muito complexos. Além disso, não dizem
o porquê de tal ordenação. Também não mencionam a posição de outros tipos de advérbios.
Bechara (2000) também menciona a questão da colocação dos advérbios, ao afirmar
que esses elementos não se referem apenas ao verbo, podendo assim aparecer em várias
posições. Considera que a melhor proposta é a de Llorach (2000): o analista deve ater-se “às
relações que cada advérbio contrai dentro do enunciado, quer no seu papel primário de
adjacente circunstancial, quer por sua combinação com outras unidades no interior de um
grupo nominal unitário”. Como analisa Martelotta (2000), essa é a posição tomada por muitos
trabalhos de base funcionalista, em que a colocação dos advérbios está relacionada ao seu
funcionamento no enunciado.
Em Bechara (2001:290), é dito que o advérbio possui certa flexibilidade de posição,
uma vez que sua função não está ligada apenas ao verbo, mas estende-se ao conteúdo
expresso pelo predicado e ao domínio do sujeito, podendo antecedê-lo ou precedê-lo. No
entanto, o autor não especifica em que contextos tais posições podem ocorrer.
Como se pode ver, as gramáticas tradicionais são pouco elucidativas no que se refere
à classificação e, sobretudo, à ordenação de advérbios, apresentando propostas para os
diferentes tipos de advérbios que são bastante controversas: os advérbios de negação, por
exemplo, não antecedem sempre o verbo e podem ocorrer antecedendo o termo, na sentença,
que está sendo negado (Ex.: Eu chamei não a você, mas a seu irmão). E afirmar que os
advérbios de modo colocam-se normalmente depois do verbo é nada dizer diante da
complexidade da colocação deste tipo de advérbio na sentença e a outras propriedades
pertinentes a outros desses elementos.
2.5 Pesquisas sobre advérbios, sob orientação da Lingüística
2.5.1 Tipos de advérbios
Um dos trabalhos que apresenta uma profundidade sobre a ordenação dos advérbios é
o de Ilari et al. (1990), que, em uma análise detalhada dos advérbios e de sua ordenação,
propõem que essa classe de palavras pode dividir-se em dois grandes tipos: predicativos e
não-predicativos.
Os advérbios predicativos caracterizam-se por constituírem argumentos de segunda
ordem. Assim como o verbo e o adjetivo atribuem uma ação ou qualidade ao sujeito, os
advérbios predicativos modificam a ação ou qualidade atribuída ao sujeito. Do ponto de vista
sintático, esses advérbios podem modificar o sentido do verbo, do adjetivo ou de outro
advérbio. São exemplos desse tipo de advérbio: bem, muito, gratuitamente. Os não-
predicativos, por outro lado, não são compatíveis com as idéias de modificação de sentido e
de predicação de segunda ordem, apresentando funções bastante diferentes daquelas que
caracterizam os advérbios predicativos.
Interessam-nos, nesse trabalho, os advérbios predicativos. Nessa classe de advérbios
enquadram-se, segundo os autores, as seguintes subclasses:
a) Qualitativos - paralelos à construção com substantivo, que expressa qualidade (comida
boa), esses advérbios modificam o sentido dos elementos a que se referem: Comer bem,
maravilhosamente bem. Entre esses advérbios encontram-se mal, assim, entre outros.
b) Intensificadores - relacionam-se tipicamente a verbos, adjetivos e advérbios,
intensificando-lhes o sentido: muito, mais, etc.
c) Modalizadores - aplicam-se a sentenças completas e indicam atitude proposicional:
certamente, felizmente, etc.
d) Aspectualizadores - são advérbios cujos traços semânticos correspondem a noções
aspectuais do verbo da sentença em que ocorrem: geralmente, diariamente, de vez em quando,
algumas vezes, etc.
Os qualitativos e os intensificadores apresentam características muito semelhantes
entre si, que podem referir-se ao verbo, ao adjetivo ou a outro advérbio. Isso os diferencia
dos chamados modalizadores, que, segundo os autores, de um modo geral, qualificam a
asserção, relacionando-se à sentença inteira.
Quando se referem ao verbo, os advérbios qualitativos apresentam determinadas
restrições seletivas quanto ao conteúdo do verbo que modificam, tendo, portanto, fundamento
argumental. Assim, alguns advérbios não podem referir-se a determinados verbos: o advérbio
gratuitamente, por exemplo, não pode ser atribuído ao verbo pagar.
Isso diferencia os qualitativos dos advérbios aspectualizadores, cuja restrição seletiva
se refere ao esquema tempo-aspectual do verbo: o advérbio geralmente, por exemplo, não
pode referir-se a uma forma verbal, de aspecto pontual e concluído, como, por exemplo, a
forma verbal caiu.
Curiosamente, Ilari et al. (1990), que propõem um trabalho sobre ordenação, pouco
falam acerca das tendências de colocação dos aspectualizadores. Além disso, não mencionam
uma categoria de advérbios de tempo, mas de advérbios aspectualizadores, que “indicam a
freqüência com que um verbo se reitera”. Dos exemplos apresentados pelos autores, todos se
relacionam a noções tradicionalmente associadas ao conceito de aspecto iterativo: geralmente,
normalmente, diariamente, de vez em quando, às vezes, entre outros. Entretanto, os autores
nada dizem sobre elementos adverbiais associados a outras noções aspectuais, como
pontualidade ou duratividade ou mesmo sobre elementos adverbiais, como ontem, hoje e
amanhã, por exemplo, que expressam informações temporais dêiticas, que não se relacionam
à noção de aspecto, mas à categoria gramatical de tempo, que, por definição, possui natureza
dêitica.
Outros autores, como veremos mais adiante, também acrescentam entre os tipos de
advérbios, termos que indicam noções semanticamente associadas a noções aspectuais. Um
exemplo de outro estudo sobre os advérbios e sua classificação é o de Castilho (1999). Nesse
trabalho, os tradicionalmente chamados advérbios de tempo foram arrolados entre um grupo
de advérbios que o autor classificou como qualificadores aspectualizadores.
O autor define a predicação qualificadora como “um processo semântico-sintático por
meio do qual um operador incide sobre uma classe, modificando ou confirmando sua
intenção, isto é suas propriedades específicas, ou traços semânticos ou semas, na terminologia
da Semântica estrutural”. Em seguida afirma que a qualificação é codificada gramaticalmente
pelos adjetivos, pelos advérbios predicativos e pelos adverbiais, representados por um
sintagma nominal ou por um sintagma preposicionado com valor adverbial.
Quanto aos chamados qualificadores aspectualizadores, o autor relaciona essa classe
de advérbios com a noção de aspecto, que possui natureza composicional, que resulta da
interação do sentido lexical do verbo com o tempo em que foram conjugados, seus
argumentos, os adjuntos adverbiais a ele associados e o padrão sintático em que o verbo está
encaixado.
O autor centra suas análises nas noções de perfectividade vs imperfectividade e
telicidade vs. atelicidade e propõe a existência de aspectualizadores imperfectivos e
perfectivos. Vejamos respectivamente dois exemplos dados pelo próprio autor:
(01)... ela teve escritórios durante... oito anos:: mais ou menos
(02) ajeitou os cabelos de um golpe
A importância desse trabalho está no fato de o autor resgatar uma importante relação
entre aspecto e discurso, relacionando os usos desses advérbios aos dois planos discursivos
característicos da narrativa, propostos em Hopper (1979): figura e fundo. O autor propõe que,
na narrativa por ele analisada, as ações imperfectivas ocorrem em fundo e também em figura,
contrariando a proposta de Hopper (1979), de que a imperfectividade é típica de fundo.
O trabalho de Castilho (1999), portanto, tem o valor de sofisticar mais um pouco a
noção de advérbio aspectual. Mas, além de não mencionar questões relacionadas à ordenação,
ainda não resolve os dois problemas básicos apontados. Não analisa outras noções
aspectuais, além da distinção entre perfectividade vs imperfectividade e as noções
semanticamente próximas a ela. Nada menciona acerca dos elementos adverbiais que
expressam informações temporais dêiticas, que não se relacionam à categoria de aspecto, mas
à de tempo.
Outro trabalho que merece menção é o de Givón (2001), que chama atenção para o
fato de que advérbios podem indicar, no tempo, vários aspectos temporais dos eventos e
caracterizam esses advérbios como advérbios de tempo e aspecto. Para o autor, não é o verbo,
mas a cláusula que constitui o escopo semântico destes advérbios, cujas características
morfossintáticas são muito heterogêneas.
Sem entrar em detalhes de análise, o autor apresenta exemplos do inglês, que são
tipicamente aspectuais, como often, always, again, continuously, on and on, entre outros.
Podemos notar que o autor não se restringiu ao aspecto iterativo, na medida em que
apresenta o caso de continuously e on and on, por exemplo, que se relacionam a outras noções
aspectuais, como imperfectividade e progressividade. Por outro lado, apresentam também
exemplos de advérbios tradicionalmente temporais, como yesterday, tomorrow, entre outros.
Essa é a tendência que seguiremos aqui. Adotaremos uma classificação que leve em
conta as noções de tempo e aspecto, procurando refinar a análise das relações entre advérbios
e as diferentes noções aspectuais. Com base nisso, observaremos o comportamento desses
elementos nas diferentes fases do português, na modalidade escrita, tentando relacionar esses
dados com as diferenças em suas tendências de ordenação.
É importante também ressaltar que estamos lidando apenas com advérbios de tempo
e de aspecto em -mente.
2.5.2 Estudos sobre o advérbio em -mente e sobre ordenação de advérbios
Passamos agora a uma revisão dos estudos feitos sobre advérbios em -mente ou sobre
ordenação _ os dois focos principais desta tese _ sob o ponto de vista da ciência Lingüística.
A tese de Rodrigues (1994) apresenta um estudo de cunho variacionista com uma
perspectiva de comparabilidade funcional que analisa outras possíveis funções dos vocábulos
derivados em -mente, além dos adjuntos adverbiais. Afirma que esses vocábulos não
configuram isoladamente uma classe gramatical.
Ao analisar os dados e pressupostos teóricos de diversos autores, Rodrigues pôde
definir o advérbio como “vocábulo de natureza nominal, modificador do verbo que, em
relação aos outros nomes, caracteriza-se por apresentar invariabilidade de gênero e número”
(1994:159).
A autora estabeleceu uma oposição entre função adverbial e quaisquer outras funções
que os vocábulos derivados em -mente pudessem exercer no corpus analisado.
Assim, adotou o termo “pseudo-advérbio” de Bonfim (1988), para agrupar essas
outras funções, a saber: 1) a discursiva (funcionam como marcadores); 2) a de modificador de
nome; 3) a de modificador de sintagma preposicional; 4) a de modificador de sentença; 5) a
de modificador do pronome.
Representou essa distinção no seguinte quadro:
Quadro1 – Distinção entre Advérbio e Pseudo-advérbio
CLASSE
Nomes derivados
Em -mente
FUNÇÕES
Advérbio
“Pseudo-advérbio”:
–discursivo
-modificador de nome
-modificador do SP
-modificador da sentença
-modificador do pronome
(Rodrigues,1994:161)
A autora descobriu que o tipo do verbo aliado à classe do vocábulo que pertence à
classificação semântica do nome em -mente foram os fatores condicionadores da função dos
vocábulos derivados em -mente, que foram, na maioria das vezes, os “pseudo-advérbios”
(Rodrigues, 1994:162).
Outra pesquisa sobre itens em -mente é a dissertação de Freitas (2004), na qual a
autora trata especificamente dos advérbios temporais e aspectuais em -mente na língua oral
portuguesa, sob uma perspectiva funcionalista. Verifica que a posição mais típica desses
advérbios na oração é a pré-verbal quando ocorrem nas orações formadas pela estrutura
padrão da língua portuguesa SVCo (sujeito, verbo e complemento). Além disso, verifica que a
posição pré-verbal era predominante. Constatou, ainda, que há uma diferença de ordenação da
posição pré-verbal para pós-verbal, ou, pelo menos uma tendência para isso, quando não
um argumento verbal na posição adjacente e posterior ao verbo. Freitas verifica também que
certos itens em -mente como primeiramente e finalmente estão se gramaticalizando. Esses
deixam de expressar somente o tempo dos eventos e passam a organizar os eventos
cronológicos em seqüência textual, funcionando, segundo a autora, como conectivo, vejamos
alguns exemplos dados pela autora:
(1) /.../ o meu filho mais velho tem trinta e dois anos, depois eu tenho um filho de vinte e oito,
ai um intervalo de oito anos, eu tenho uma filha, (e finalmente com outro intervalo de seis
anos tem um garoto) (NURC-RJ, INQ. 084, 1.37).
(2) /.../ E: isso...como...como se faz?
I: primeiramente você pega a calha... pega a calha e ::/ tem um:: lugar de colocar o :: porta
start... aí você tem que furar ... os dois buraquinhos do lado... se for lâmpada de duas... porque
tem lâmpada? Tem luminária de uma lâmpada...de duas... tem lâmpada de vinte/.../ (D&G,
Juiz de Fora, 2
o
grau, relato de procedimento).
Segundo Freitas (2004), nos exemplos (1) e (2) acima, os itens destacados possuem
características de ligação entre sentenças e contextos lingüísticos, funcionando como
elementos de conexão.
Moraes Pinto (2002) fez uma análise da colocação e da polissemia de alguns itens
adverbiais em -mente no português arcaico e no português do século XIX, com atenção aos
seus valores qualitativos e modalizadores.
O objetivo desta pesquisa foi demonstrar que alguns advérbios qualitativos e
modalizadores terminados em -mente sofreram, no decorrer do tempo, mudança na sua
polissemia do português arcaico até os dias atuais. Essa mudança é sucessiva e unidirecional e
consiste num processo de gramaticalização, com esses elementos passando de advérbios
internos à cláusula a advérbios sentenciais. Em certos casos, os valores qualitativos
encontrados no início da trajetória desaparecem e os advérbios passam a assumir funções
pragmático-discursivas.
Os diferentes valores semânticos desses elementos implicam diferentes colocações e
funções na oração. No português arcaico, os advérbios qualitativos possuíam grande
mobilidade na cláusula, podendo ocupar diversas posições, inclusive a de tópico. A partir do
século XIX, algumas posições se tornaram indisponíveis a esses advérbios, pois, com o
processo de gramaticalização, conforme seus valores semânticos se modificavam, eles
passaram a ter um caráter específico e passaram a depender das características gramaticais de
sua nova função. Esse trabalho tem grande relevância para a presente tese, pois nos aponta
alguns caminhos a ser trilhados, como em relação ao processo de gramaticalização, a questão
ordenação no decorrer do tempo, além dos fatores analisados que motivaram sua realização
através dos séculos.
A pesquisa de Andrade (2005), sobre a ordenação das locuções adverbiais de tempo
em 100 editoriais sob o arcabouço teórico funcionalista, demonstrou que as locuções
temporais não têm uma posição prototípica nesse gênero, apresentando apenas uma pequena
tendência de ocorrência na posição pós-verbal (55% dos dados). A autora observou que as
locuções (tanto as pequenas como as mais longas), em editoriais tendem a aparecer nas
posições marginais à cláusula, ou seja, logo no início da cláusula ou no final, como nos
exemplos a seguir:
.
(3) Nas últimas duas eleições, indiretas, não houve sequer desafiante. (12-JB/1999).
(4) É a oportunidade de recuperar o verniz que o partido perdeu ao longo do caminho. (129-
JB/2004).
As locuções, no gênero estudado, aparecem normalmente na posição de sujeito quando
este está ausente (sujeito oculto ou oração sem sujeito) ou está na posição pós-verbal. Neste
caso, ou seja, na ordem VS (verbo-sujeito), 74% das locuções coletadas estão na posição pré-
verbal, como no exemplo:
(5) Nos últimos dois meses, foi roubado o carro blindado do ministro da justiça. (47-
JB/2003).
Mas, quando o sujeito está na sua posição prototípica, ou seja, na ordem SV, as
locuções adverbiais aparecem 68% na posição pós-verbal, como no exemplo a seguir:
(6) A Libéria nasceu em 1822, como pátria de ex-escravos americanos. (JB/2003).
Como Andrade, também verificaremos a posição dos advérbios em -mente e a relação
com a presença ou ausência do sujeito.
Cezario, Ilogti e Costa (2005) verificaram que, em textos religiosos contemporâneos,
as locuções tendem a ocorrer na posição pré-verbal (62% dos dados), como no exemplo:
(7) “minutos depois estava ali apenas a mulher e ele (CSP)
De todos os tipos semânticos estudados (locuções dêiticas, durativas, reiterativas e
simultâneas) pelas autoras, apenas as durativas tendem a ocorrer em posição pós-verbal
(72%).
As autoras observam que as locuções que aparecem inseridas entre o sujeito e o verbo
ou entre o verbo e o complemento/predicativo estão em orações com baixíssima
transitividade, como as com verbo de ligação ou com modal e verbo de ligação:
(8) “A aclamação depois da consagração também pode ser cantada” (p.74, l.11 CEV)
(9)Nossas músicas deverão ser ao mesmo tempo carismáticas e proféticas (p.84, l.28 CEV)
as orações com mais traços positivos de transitividade tendem a ter as locuções em
posições marginais, como abaixo em que a locução A seguir ocorre na margem esquerda de
uma oração altamente transitiva:
(10) “(...) rangeu os dentes, mudou de cor, fez a pior carranca do universo, prendeu as mão e
deu um grito de raiva. A seguir levantou o soldado pela roupa, virou o rosto e disse (...)” (p.
143, CSP).
Essa pesquisa é importante para a presente tese, pois também será testada a relação
entre semântica do elemento adverbial e ordenação. A questão da transitividade será vista
indiretamente ao estudarmos a relação entre tipo semântico do verbo e a posição do advérbio.
Albani (2007) verificou que a posição típica do advérbio sempre era pré-verbal no
português arcaico e pós-verbal no português contemporâneo. Todos os fatores estudados
indicam que, no português arcaico, a ordem era mais livre e mais motivada, enquanto no
português atual a ordem é mais fixa. Segundo ele, há um forte indício de mudança na
ordenação do advérbio sempre em textos religiosos.
Seu trabalho foi importante para esta tese, pois é uma pesquisa de ordem diacrônica e
que traz resultados interessantes quanto à fixação de posição de advérbios. Muitos dos fatores
testados por ele também foram testados por nós, como a relação entre tipo semântico de verbo
e ordenação de advérbio. Com relação a esse fator, Albani destaca que, no português atual, o
advérbio sempre quase que categoricamente se apresenta na posição pós-verbal quando o
verbo é relacional intensivo (verbo de ligação).
Uma pesquisa de grande importância para o nosso trabalho é a realizada por
Martelotta (1994) que; analisa, em uma perspectiva funcional, a ordenação dos
circunstanciadores temporais. Esses compreendem os advérbios, adjuntos, orações adverbiais
e operadores argumentativos que expressam a noção do tempo. O corpus utilizado é
constituído de entrevistas elaboradas pelo Censo de Variação Lingüística, Competências
Básicas de Português e NURC. Para o estudo diacrônico dos operadores argumentativos,
foram utilizados textos antigos, como: “Vigeu da Consolação” (1959), “A demanda do Santo
Graal” (1944), “O Bosco Deleitoso” (1950), dentre outros.
O objetivo do estudo do autor é buscar fatores discursivos que motivem a colocação
desses circunstanciadores na sentença. Em outras palavras, o autor propõe demonstrar que os
argumentadores discursivos seguem leis e tendências de colocação diferentes dos demais
circunstanciadores. A ordenação dos argumentadores discursivos deve-se a dois processos de
mudança semântica: metáfora espaço> (tempo) > texto (Heine et al., 1991) e pressão de
informatividade. ( Traugott e Heine, 1991).
O primeiro processo de mudança consiste em um elemento de valor espacial assumir
um sentido temporal e, depois, passar a expressar relações lógicas no discurso. Por exemplo:
“O operador argumentativo aí, originalmente um dêitico espacial, pode também ser usado
para seqüenciar (temporalmente) os eventos e expressar uma idéia de conseqüência em
relação às sentenças anteriormente mencionadas” (Martelotta 1994:5).
A mudança por pressão de informatividade dá-se quando um elemento lingüístico
adquire um novo valor através de um processo de inferência conversacional em certos
contextos. Um exemplo citado por Martelotta é o do operador argumentativo “ainda cujo uso
de marcador de contra-expectativa, por um processo de inferência passa a assumir um valor
inclusivo semelhante ao do termo também” (1994:6).
O autor ressalta que geralmente esses dois processos de mudança ocorrem juntos
quando se trata do aparecimento de operadores argumentativos que tendem a perder sua
mobilidade original para assumir posições mais fixas na sentença. Esse processo de
gramaticalização foi estudado nos seguintes operadores argumentativos: aí, depois, logo,
então, já e ainda.
Ao apresentar a ordenação dos circunstanciadores temporais, propriamente ditos,
Martelotta adota o princípio de Hopper e Thompson (1980) de que o discurso narrativo
apresenta duas estruturas denominadas figura e fundo, estendendo-o ao discurso não-
narrativo.
Distingue figura e fundo, primeiramente, opondo a intenção do falante ao direcionar o
fluxo do discurso para a narrativa ou para a não-narrativa: se o falante está narrando, eventos
e situações não-narrativas funcionam como fundo; e, ao contrário, se o falante está
comentando ou descrevendo, eventos e situações narrativas funcionam como fundo, servindo
para evidenciar este comentário ou esta descrição (1994:2-3).
Uma outra distinção entre figura e fundo é realizada através da análise de traços
semântico-gramaticais. Assim, na narrativa, os eventos funcionam como figura quando são
marcados pelos traços [=específico], [=perfectivo], [=cinético], [pontual] e funcionam como
fundo quando marcados pelos traços [-específico], [-perfectivo], [-cinético], [-pontual].
no discurso não-narrativo, os eventos que funcionam como figura são marcados
pelos traços [-específico], [+perfectivo], [+cinético], [+pontual] e funcionam como fundo,
aqueles marcadores por [-específico], [-perfectivo], [-cinético], [-pontual].
Com o objetivo de verificar as tendências de posições desses circunstanciadores de
tempo, Martelotta os classificou em:
a)Circunstanciadores de tempo determinado- são aqueles que indicam, de forma precisa, o
momento em que ocorre o evento. Cita como exemplos: ontem, hoje, semana passada,
quando ele chegou etc.
b)Circunstanciadores de tempo indeterminado- expressam a noção de que os eventos e
situações perduram no tempo indeterminadamente. Exemplifica com: sempre, geralmente,
atualmente, nunca etc.
c)Circunstanciadores iterativos- denotam a freqüência com que os eventos não-específicos
ocorrem ao longo do tempo, como às vezes, duas vezes por semana, de vez em quando etc.
d)Circunstanciadores de simultaneidade- expressam a concomitância entre eventos e
situações. Como os exemplos, citam: enquanto isso, ao mesmo tempo etc.
e)Circunstanciadores delimitativos- delimitam os eventos e as situações, indicando o início
e/ou fim de sua permanência no tempo, como: há três anos, até hoje, durante dois meses etc.
O autor conclui que existe uma tendência determinada para a colocação dos
circunstanciadores temporais na sentença. Essa depende da força que a informação, carregada
pelo circunstanciador, assume dentro da estrutura do discurso em que ele ocorre.
O circunstanciador tende a aparecer em posições pré-verbais, “quando traz
informações temporais análogas aos traços semântico-gramaticais do discurso em que ocorre.
Esta relação semântica empurra o circunstanciador para as posições pré-verbais, enfatizando-o
ou topicalizando-o” (1994:201).
No entanto, se não essa relação semântica, o circunstanciador tende a ocorrer nas
posições pós-verbais, ou até não ocorrem “em tipos de discurso cujos traços semântico-
gramaticais são não-análogos ou incompatíveis com a informação temporal por ela expressa”
(1994:201). Dessa forma, os circunstanciadores de tempo determinado tendem a ocupar
posições pré-verbais em figura narrativa e não-narrativa, uma vez que a força informativa que
assumem nestes contextos os leva a ser topicalizados ou enfatizados.
Os circunstanciadores de tempo indeterminado e os circunstanciadores de
simultaneidade têm como tendência o aparecimento na posição pré-verbal em fundo narrativo
e não-narrativo, devido também à força informativa assumida que os leva a topicalização ou
ênfase.
No que se referem aos circunstanciadores iterativos, esses apresentam maior
ocorrência nas posições pré-verbais em fundo narrativo e não-narrativo e em figura não-
narrativa, já que esses tipos de discursos são marcados pelo traço [-específico], estimulando a
iteratividade.
Por fim, os circunstanciadores delimitativos possuem uma mobilidade de colocação
maior, porque apresentam duas características distintas: por um lado, funcionam como um
circunstanciador de tempo determinado (indica o momento específico em que se inicia e/ou
termina o evento). Por outro lado, “expressam a duração de eventos específicos imperfectivos,
ou de eventos não-específicos ao longo do tempo, acrescentando características semântico-
gramaticais típicas de fundo” (1994:229).
Quanto à colocação dos operadores argumentativos, Martelotta afirma que, devido ao
processo de gramaticalização que sofrem, não seguem as mesmas tendências de ordenação
dos circunstanciadores propriamente ditos. A gramaticalização faz com que o elemento exerça
funções argumentativas, restringindo a sua possibilidade de colocação na sentença. Tal
colocação “passa a depender mais das características gramaticais específicas de suas novas
funções, que se manifestam em contextos específicos, assumindo posições mais fixas dentro
da sentença” (1994:229-230).
O trabalho de Martelotta (1994) foi muito importante para presente tese, sobretudo, no
que se refere às posições estabelecidas, como também no que se refere a alguns parâmetros da
transitividade, à análise bastante detalhada dos circunstanciadores de tempo, buscando fatores
que influenciam a sua colocação na sentença à luz da teoria funcional.
Ressaltamos que o autor estuda os advérbios em geral, enquanto, esta tese trata apenas
dos advérbios de tempo e aspecto em -mente.
França (2002) parte da tese de Martelotta e faz uma análise dos adjuntos adverbiais de
tempo e aspecto em narrativas orais e escritas contemporâneas, procurando delimitar os
valores que esses adjuntos apresentavam no texto narrativo, assim como as tendências de
colocação que eles assumiam nas cláusulas que compunham o texto. Esses adjuntos
adverbiais de tempo e aspecto, de um modo geral, apresentam uma grande mobilidade na
cláusula, podendo ter suas tendências de ordenação explicadas por fatores de caráter sintático
e discursivo.
Um dos fatores mais importantes foi o plano discursivo. A autora verificou que
tendiam a serem enfatizados, ocupando posições pré-verbais, os adjuntos que apresentavam
traços semântico-gramaticais análogos aos traços semântico-gramaticais do plano de discurso
em que apareciam; enquanto os adjuntos adverbiais de tempo e aspecto determinados não
apresentaram resultados estatísticos que ratificassem a hipótese postulada; já os adjuntos
adverbiais de tempo e aspecto indeterminados tendiam a ocupar posições pré-verbais em
fundo, porque este tipo de discurso caracteriza-se pela presença de situações não-específicas;
e ainda, os adjuntos adverbiais de tempo e aspecto de simultaneidade tendiam a ocorrer em
fundo e em posições pré-verbais. Isto ocorria porque o discurso de fundo tende a apresentar
traços semântico-gramaticais (não-específicos) marcados pela simultaneidade; os adjuntos
adverbiais delimitativos, embora não tenham apresentado tendência muito forte, pareciam
buscar as posições pós-verbais em figura já que expressavam a duração de eventos específicos
imperfectivos, ou de eventos não-específicos ao longo do tempo, apresentando traços
semântico-gramaticais típicos de fundo; enquanto aos adjuntos adverbiais de tempo e aspecto
iterativos tendiam a ocorrer em posições pré-verbais de fundo, porque este tipo de discurso é
marcado pela presença do traço não-específico; e, além disso, a ordenação vocabular,
portanto, não podia ser explicada por fenômenos estritamente sintáticos.
Portanto, a estrutura organizacional do texto influenciava a colocação dos adjuntos
adverbiais de tempo e aspecto.
O estudo de Pereira (1999) verifica a ordenação das orações adverbiais de tempo,
desenvolvidas e reduzidas, num corpus constituído por 108 cartas pessoais, escritas entre
1937 e 1987. Esse trabalho, baseado nas teorias variacionista e funcionalista, busca identificar
os fatores cognitivos e discursivos que motivam a variação da ordem de algumas dessas
orações, tornando-as fixas na sentença.
Os dados foram separados em dois grupos: 1)orações temporais com ordenação
variável (total ou parcial) e 2) orações temporais de ordem fixa ou categórica. Segundo a
autora, o primeiro grupo foi submetido a uma análise estatística multivariacional através do
pacote de programas VARBRUL. O segundo foi analisado qualitativamente:
Pereira observou as seguintes posições da oração temporal:
a)Anteposição: corresponde às orações temporais situadas na margem esquerda da oração
núcleo.
(11) ”Um dia desses fui pedir uma xícara de chá e só ela estava lá.
Quando pedi que ela fizesse, ela tremeu de alegria e disse...
b) Posição: corresponde às orações temporais situadas na margem direita da oração com que
se combinam.
(12) “Escreva-me contando assim que tiver um tempinho”.
c) Intercalação: corresponde às orações temporais situadas no interior da oração núcleo,
quebrando a fluidez da idéia apresentada nesta oração.
(13) “M. vou parando por aqui senão quando voltar não tenho novidades pra te contar”.
Verificou que não houve diferença marcante entre posposição e anteposição. Percebeu,
também, que muitas das orações temporais intercaladas eram reduzidas de infinitivo e curtas
(cerca de quatro palavras cada uma), o que proporcionava uma melhor fluidez do discurso,
facilitando de certa forma o processo comunicativo.
Dentre os vários fatores analisados, destacamos o que se refere aos tipos de verbo do
segmento temporal. Os verbos foram codificados a partir de três classificações baseadas em
Dik (1989) e Braga (1996):
1-Ação (realização e atividade)
2-Processo (mudança e dinamismo)
3-Situação (posição e estado)
Os resultados mostram que o tipo de verbo do enunciado temporal é mais freqüente
seguido do processo, e o menos freqüente é a situação. A autora relata que “os resultados para
o tipo de verbo das orações isoladas não se mostram eficientes”, portanto considerou “para a
análise a correlação dos tipos de verbos das orações que compõem o enunciado temporal”
(1999:72). Dessa forma, constatou que “as orações com verbos de ação tendem a vir na
segunda posição, independentemente de constituírem o núcleo ou o satélite do enunciado
temporal (...) orações com verbos de situação e processo tendem a vir na primeira posição,
quando associadas a uma oração com verbo de ação, funcionando como pano de fundo para
os eventos mais dinâmicos codificados na segunda oração” (1999:72-73).
Outro fator que também colocamos em evidência é aquele que concerne à distribuição
de informação. Pereira analisou o tipo de informação codificada pela oração núcleo e pela
oração temporal. Ambas as orações foram classificadas conforme as categorias: novo, velho e
inferível, nos termos de Prince (apud Pereira, 1999). Os resultados mostram que orações
temporais que codificam informação velha, mencionadas no discurso anterior, são mais
propensas à anteposição. Sendo assim, ”Orações temporais que codificam informação nova,
não mencionada no contexto e nem inferível dele, são preferencialmente pospostas (...) o
contexto mais favorável à anteposição da oração temporal é aquele em que se relacionam uma
oração núcleo nova e uma oração temporal com informação velha” (1999:88).
No que diz respeito às orações temporais de ordem fixa, verificou que os bloqueios
mais freqüentes à reversibilidade das orações pospostas são: as com o focalizador sozinho e as
que estão ancoradas num constituinte da oração anterior.
Quanto à anteposição da oração temporal, os resultados mostraram que os fatores mais
relevantes para a fixação dessas orações são: em primeiro lugar, as relações anafóricas, em
segundo lugar, as expressões cristalizadas, em terceiro lugar, a seqüência discursiva.
A relevância do trabalho de Pereira para o presente estudo justifica-se por também
investigar fatores que tendem a motivar a ordenação dos elementos em análise.
Lessa (2007) se propôs investigar a ordenação de circunstanciais temporais (advérbios
e sintagmas preposicionados com valor circunstancial) na modalidade escrita do português e
do inglês, levando em conta, principalmente, fatores de ordem discursiva. A autora constatou
que, para se abordar a questão da ordem não marcada, deveria considerar as duas línguas
(português e inglês) de forma distinta.
Quanto aos resultados obtidos nesse estudo, verificou-se que os advérbios tendiam a
ordem não marcada no inglês é a anteposição verbal. Já em relação aos Spreps, não houve
como tirar essa conclusão, devido à grande variabilidade na oração.
Além disso, em relação ao posicionamento mais detalhado dos circunstanciais de
tempo na cláusula, observou-se que os advérbios em português ocupavam as posições ME
(margem esquerda) e PM2 (entre o verbo e objeto) com mais freqüência, enquanto no inglês,
eles preferiam a PM1(entre o sujeito e o verbo). Este fato no inglês pôde ser explicado,
principalmente, em virtude de os advérbios menores possuírem uma ordem mais rígida. Os
Spreps em português possuíam uma clara preferência pela margem direita da oração,
enquanto que, em inglês, os Spreps apresentaram grande variabilidade nas duas margens da
oração.
Portanto, a função discursiva dos circunstanciais possui grande influência na
ordenação de advérbios e Spreps nas duas línguas.
Esse estudo sobre Ordenação de Circunstanciais Temporais em Português e Inglês:
posições e papéis discursivos foram importantes por também investigar as posições que esses
constituintes ocupam na cláusula.
Nesta tese, examinamos os seguintes fatores: a posição dos advérbios, a noção
semântica do advérbio, o tipo semântico do verbo, o tipo de sujeito, o tipo de oração, dentre
outros.
Esta revisão permitiu-nos conhecer, mais profundamente, as questões abordadas
acerca dos advérbios em geral, sobretudo, aquelas referentes à sua classificação e às suas
posições na cláusula e, com certeza, foi esclarecedora ao longo desse estudo.
2.6 Os advérbios e a expressão de tempo
Tempo e aspecto são duas categorias gramaticais que expressam noções temporais. A
categoria de tempo é dêitica, já que sua utilização depende diretamente do momento em que o
enunciado foi proferido. Por outro lado, isso não ocorre com a categoria de aspecto.
As noções de tempo e de espaço são partes substanciais das relações do homem com o
mundo. Os dois são delimitados: o tempo, em minutos, horas, dias, meses, séculos; o espaço,
em centímetros, metros, milhas, etc. Todos são referências necessárias na vida de cada um de
nós. Portanto, a língua que falamos está repleta de recursos, para que possamos situar nossas
ações em relação aos dois: agora, antes, depois, ainda - para tempo; aqui, acolá, além - para o
espaço.
Qualquer ato de comunicação é situado no tempo e no espaço. Na simples situação de
comunicação - o diálogo - o indivíduo que fala refere-se a si mesmo como eu que designa seu
ouvinte como tu/você. Ao referir-se ao espaço em que se encontra o indivíduo que fala
identifica-o como aqui; e ao referir-se ao momento em que fala, pode designá-lo como agora.
Eu, você, aqui e agora não nomeiam indivíduos, lugar e época determinados e
constantes, mas apenas "o indivíduo que fala", alguém a quem ele se dirige, e o "lugar" e
"momento" em que ocorre o diálogo. Seus referentes não são, portanto, objetivos e externos à
fala (como João, Paula, na sala e às 2 horas), mas situacionais e exclusivos do ato de falar,
fora do qual não podem ser reconhecidos e os elementos utilizados para designar a esses
referentes são chamados dêiticos (termo derivado de uma palavra grega que significa "indicar,
mostrar, apontar")
A categoria gramatical de tempo, segundo Lyons (1979) diz respeito às relações
temporais que são expressas por contrastes gramaticais sistemáticos. Os gramáticos
tradicionais, na análise do grego e do latim, apresentam três contrastes dessa natureza:
passado, presente e futuro. A categoria de tempo relaciona o tempo da ação indicada pelo
verbo, em relação ao momento em que o falante produz seu enunciado, o que significa que o
tempo é uma categoria dêitica.
A pessoa que fala, ou escreve, "comanda", por assim dizer, a atividade discursiva,
normalmente transformando-a, ou colaborando para transformá-la, numa complexa rede de
atos de significação que têm no eu, no aqui e no agora do discurso seus pontos de referência.
A indicação do tempo como categoria de linguagem verbal é parte dessa interação
comunicativa, ou ainda dessa atividade discursiva, tempo, que tem no momento da
enunciação seu ponto principal de referência.
Nesse sentido, os advérbios que expressam a categoria de tempo seriam aqueles que
apresentam valor dêitico, localizando os eventos na linha do tempo, em relação ao momento
da produção de enunciado. São eles: ontem, hoje e amanhã, logo mais, quarta-feira passada,
além de depois, anteriormente, posteriormente (em contextos em que está ancorado ao
momento da fala, ou seja: depois, anteriormente ou posteriormente ao momento da fala), etc.
Em alguns casos, os advérbios temporais podem não ser dêiticos, ou seja, podem
localizar na linha do tempo, sem tomar como referência o momento da fala, mas a conclusão
do evento anterior, ou qualquer ponto no tempo mencionado no texto. É o que ocorre, por
exemplo, em depois da aula e antes do jogo, que constituem indicações temporais não-
dêiticas, que localizam o evento na linha do tempo, tomando como ponto de referência
pontos já fixados no tempo, e não o posicionamento dos participantes. Os seqüenciadores em
geral estão nessa categoria: depois, , então, etc.
2.7 Os advérbios relacionados à categoria de aspecto
Para que possamos compreender a noção de advérbio de aspecto, devemos fazer uma
breve reflexão acerca da categoria gramatical de aspecto.
As gramáticas tradicionais falam pouco acerca da categoria de aspecto. São muito
poucos os autores que se preocupam em apresentar o aspecto como uma categoria do verbo e
defini-lo de maneira objetiva. O que mais encontramos são rápidas alusões à noção de
aspecto, espalhadas pelos capítulos referentes ao estudo dos verbos. Said Ali (1969:161), para
citar um exemplo, apresenta uma minuciosa análise do emprego das diferentes formas
verbais, utilizando termos como “iterativo”, “ação durativa” e “ação freqüentativa, mas sem
mencionar a palavra aspecto.
Luft (1978) é um dos poucos gramáticos que trata a categoria de aspecto em uma
seção especial, em que define aspecto como “a categoria verbal que exprime a oposição
término/não-término ou acabado/não-acabado, a duração do processo”. Na seqüência, o autor
afirma que o aspecto pode manifestar-se juntamente com o tempo, como em canto/cantei,
cantara/cantava, onde existe a oposição acabado/não-acabado. Mostra também que esta
categoria pode manifestar-se através de locuções verbais, sufixos, ou pelo próprio radical do
verbo, indicando exemplos de aspectos incoativo, iterativo, cursivo e cessativo.
Luft afirma que os verbos, em oposição aos nomes, caracterizam-se pela “idéia
temporal: o início, a duração ou o resultado de um processo (aspecto) ou o momento de sua
ocorrência (tempo)”. Propõe também, ao comentar as locuções verbais, que as locuções
indicam os aspectos do processo verbal: anterioridade, posterioridade, continuidade,
repetição, progressividade, início, conclusão, etc. Notamos aqui, mais uma vez, uma
inadequação entre as noções aspectuais e a definição proposta, o que nos faz pensar se a
palavra aspecto aqui foi usada no sentido indicado na definição ou naquela acepção
descompromissada que encontramos na maioria das gramáticas.
Podemos ver, na gramática em questão, a preocupação de incorporar de forma
explícita a categoria de aspecto no estudo dos verbos. Mas o resultado ainda está longe de
deixar claro o que significa aspecto verbal, em função da falta de clareza com que é definida a
categoria e, sobretudo, da inadequação com que são propostas as noções a ela ligadas.
Saindo do âmbito das gramáticas tradicionais, podemos citar o estudo de Travaglia
(1994) sobre aspecto verbal. Fazendo uma distinção básica entre tempo (tempo gramatical) e
TEMPO (tempo real ou cronológico), Travaglia (1994) afirma que a categoria de tempo é
dêitica, uma vez que situa o momento da ocorrência da situação em relação ao momento da
fala; ao passo que o aspecto é uma categoria temporal não-dêitica, pois se refere à situação em
si, sem levar em conta o momento da enunciação.
Travaglia (1994) propõe a seguinte definição para a categoria verbal de aspecto:
Aspecto é uma categoria verbal de tempo não-dêitica,
através da qual se marca a duração da situação e/ou suas
fases, sendo que estas podem ser consideradas sob
diferentes pontos de vista, a saber: o do desenvolvimento, o
do completamento e o da realização da situação
. (p. 38)
Com base nisto, Travaglia apresenta um conjunto de noções aspectuais, que
resumiremos a partir de agora, utilizando, para facilitar a compreensão, os exemplos do
próprio autor.
No que se refere à sua duração, uma situação pode ser durativa, quando seu início e
término ocorrem separados por um período de tempo relativamente longo; ou pontual, quando
seu início e término ocorrem no mesmo instante, ou separado por um período de tempo muito
curto. Vejamos, respectivamente, um exemplo de cada ocorrência:
(01) D. Maria passeia todos os dias.
(02) Salto do trampolim há anos.
Afirma ainda o autor que a situação durativa pode ser apresentada como limitada,
quando se indica o seu início, o seu fim ou o valor da sua duração; ou ilimitada, quando o
início e o fim da situação não são conhecidos nem sugeridos. Eis um exemplo de cada uma
respectivamente:
(03) Ele estava nadando desde 6 horas da manhã.
(04) A terra gira em torno do sol.
Tanto a duração limitada quanto a duração ilimitada podem ser contínuas ou
descontínuas. Serão contínuas, quando se apresentarem sem nenhuma interrupção no seu
tempo de existência. Por outro lado, serão descontínuas as situações que apresentarem
interrupções na sua duração:
(05) A terra gira em torno do sol.
(06) De tempos em tempos explodia uma bomba.
Travaglia propõe ainda que as diferentes fases de uma situação estão relacionadas às
informações referentes à realização, ao desenvolvimento ou à complementação da situação.
Vejamos cada um destes casos.
Do ponto de vista da sua realização, temos três fases da situação:
a) Fase em que a situação ainda não começou. Trata-se de um momento anterior à consecução
da situação.
(07) Pedro está para emoldurar o quadro.
b) Fase em que a situação já é começada.
08) Os rapazes continuam jogando apesar da chuva.
c) Fase em que a situação já terminou.
(09) O treinador do time esteve doente.
Do ponto de vista do seu desenvolvimento, temos também três fases da situação:
a) Início - A situação é apresentada como estando em seu ponto de início, ou em seus
primeiros momentos. A esta noção aspectual dá-se o nome de inceptividade ou incepção.
(10) Os marceneiros estão começando a armar o telhado.
b) Meio - A situação é apresentada em andamento. Essa noção é caracterizada pelo termo
cursividade.
(11) Estou lendo um livro muito interessante.
c) Fim - A situação é apresentada em seu ponto terminal. Trata-se da noção aspectual de
terminatividade.
(12) Mamãe terminou de bordar minha blusa hoje ao meio-dia.
Travaglia (Op.cit) ainda observa a situação do ponto de vista do seu complemento.
Assim uma situação pode ser:
a) Completa - A situação é apresentada em sua totalidade, com seu começo, meio e fim
englobados num todo. De acordo com Travaglia, esta é a noção aspectual de perfectividade.
(13) Antônio ouviu música o dia todo.
b) Incompleta - Quando a situação não apresenta uma das fases do seu desenvolvimento.
Temos aqui a noção aspectual de imperfectividade.
(14) Ele estava nadando desde seis horas.
Registrando o fato de que pode ocorrer uma não atualização de aspecto quando a
situação não apresenta referências à sua duração ou às suas fases, Travaglia propõe um quadro
bastante completo das noções aspectuais no português:
Martelotta (1986) propõe que o trabalho de Travaglia, embora bastante completo, não
se mostra eficiente quando aplicado à realidade da língua falada, que o autor parece estar
mais preocupado em adaptar a teoria tradicional dos aspectos à realidade lingüística do que, a
partir de dados reais, questionar as hipóteses tradicionais.
Em função disso, Martelotta (1986) optou por uma proposta mais voltada para o uso
da língua, observando, em seu estudo sobre o presente do indicativo, a relação entre uma série
de propriedades semântico-gramaticais que se associavam às formas verbais por ele
analisadas de acordo com o tipo de discurso em que essas formas verbais ocorriam. Muitas
dessas propriedades estão associadas às noções aspectuais propostas por Travaglia, mas
diferem dessas noções por se apresentarem de modo a refletir a gica organizacional do
texto.
2.8 A formação de advérbios em -mente
Analisando a origem dos advérbios, verificamos que, dos advérbios latinos, a sua
maioria foi originada, de nomes ou pronomes e poucos passaram às línguas românicas.
Enriqueceram-se estas, todavia, com algumas formas oriundas de formações desconhecidas
do latim literário, com grande produtividade e, em especial, com os advérbios em -mente que
se afixam aos adjetivos. Esta terminação nada mais é do que o ablativo do latim mens, v.g. em
bona mente. Com o uso de locuções deste tipo formaram outros tipos, acabado por alterar a
significação primitiva do substantivo mente e passando assumir o valor de um sufixo
derivativo.
O substantivo latino mens, mentis (“mente, alma, espírito, inteligência”) modificado
por um adjetivo refletia o estado de ânimo ou o modo na qual à ação verbal se levava em
consideração. Com passar do tempo, o substantivo foi assimilado a este tipo de estrutura
sintática e semântica e acabou por perder o seu valor original para se converter num sufixo
adverbial. Esta estrutura morfológica (base + mente) é muito produtiva na criação de
advérbios. No levantamento dos dados dos corpora selecionados, verificamos que esse sufixo
é muito produtivo, mesmo nos primórdios da língua, principalmente com as noções de modo,
de qualificador e modalizador. Vejamos alguns exemplos dos corpora estudados:
(1) ... posto que seyam muy grauemete enfermos.(OE, p.47)
(2)... taaes como estes presume no dignamete etender e achar dulçura(OE,p.48)
(3)
P
rimeiramente salvanayque, regedor que agora he, tem de remda hu~u conto e cem mil
pardaos d ouro, este he senhor de charama~odel, e de nagapata~o, e tamgor, e bomgarim, e
dapata~o, e do truguel, e de caullim, e todas estas sa~o cidades (Século XVI/Crônica dos Reis
de Bisnaga)
(4)... por ignorar o motivo se será para falta desaude, ou qualquer acontecimento que
lhesucedese, oque infinitamente sentirey como amigo [ espaço]igualmente tenho sentido
afalta daremeça dadita patente ejulgo omotivo por haver algum embaraço nasecretaría, pois
pela demora que tem havido ja mequerem puxar para ojugo dos auxiliarez os quaes são
bastantemente incomodados(
século XVIII - administração privada/carta de comércio/ PHPB)
(5)... assim cumpri com a Comissão que a minha Bemfeitora (a quem pesso Beijes as mãos
em meu nome) me incumbio, cum prindo igualmente com a comissão da Rainha (Cartas do
PHPB - RJ / séc. XIX)
(6) Deus simplesmente não age assim. Deus é santo - moralmente perfeito. (EC,p.45, Port.
atual)
(7) Jesus era inicialmente homem, depois se tornou Deus. (EC,p.63, Port. atual)
Nos exemplos expostos, observamos as diversas formações derivativas dos advérbios
em -mente (grave+ mente, digna+ mente, primeira+ mente, infinita+ mente, igual+ mente,
bastante+ mente, simples+ mente, moral+ mente e inicial+ mente), além de sua produtividade
e usualidade com as acepções de modo, qualificador, modalizador e temporal, este último não
tanto quanto as noções anteriores.
É interessante acrescentar, ainda, sobre a formação dos advérbios que outros autores,
como Vilela (1979), apresenta-nos algumas considerações acerca dessa categoria gramatical:
o léxico constitui-se de um conjunto de unidades léxicas (palavras lexicais, lexemáticas,
lexemas), ou seja, unidades que representam a realidade extralingüística e que pertencem
tanto à semântica como também à gramática da língua.
Tendo em vista que palavras lexicais concretas contêm, além do valor lexical, uma
significação categorial, o autor considera tais palavras as unidades fundamentais do léxico de
uma língua. Estes podem ser ampliados principalmente através de dois processos: a derivação
e a composição.
A derivação é o processo de formação vocabular em que ocorre a adição de afixos
(prefixos e sufixos) a uma base ou radical e a composição é o recurso de enriquecimento
vocabular que se pela união de dois ou mais radicais, que formam um vocábulo cujo
significado não precisa ser necessariamente a soma dos significados de cada radical. Vale
ressaltar que na composição os vocábulos estabelecem entre si relações sintáticas de
subordinação e/ou coordenação (Cf. Carone (1988).
Vejamos os exemplos:
(8) porta-bandeira, aguardente (subordinação);
(9) vaivém, leva-e-traz (coordenação).
Apesar de serem processos diferentes, derivação e composição não se excluem, o que
será ilustrado a seguir com o vocábulo em -mente.
Os estudos históricos apontavam para o advérbio como um elemento modificador.
Pereira (1932), remontando a Aristóteles, afirma que os advérbios formavam, juntamente com
as preposições e as conjunções, uma das quatro partes do discurso (a quarta era as
interjeições), porém apenas sob o rótulo de “conjunções”.
Mais tarde, os gramáticos gregos de Alexandria redividiram as partes do discurso,
desdobrando as “conjunções” em três categorias: as conjunções propriamente ditas, as
preposições e os advérbios. O autor divide o estudo das categorias gramaticais em lexical ou
taxionômico e sintático ou gico. No primeiro, expressa a idéia geral da categoria e o
segundo a sua função na frase. Neste ponto, o gramático não difere dos outros estudiosos
quanto ao conceito e função dos advérbios.
Pereira (1932) afirma ainda que os advérbios, do tipo que estamos chamando de
qualitativo, formam uma categoria que se assemelha à do adjetivo devido à idéia de
qualificação que o advérbio apresenta. Diz, também, o autor que o processo de formação de
advérbios em -mente a partir de adjetivos é recente e desenvolveu-se no português e em outras
línguas românicas ocidentais. O processo consistiu na aglutinação do adjetivo ao substantivo
feminino mente. A expressão era escrita separadamente desde o latim, entretanto, diz Pereira,
que os dois elementos se uniram na escrita por força da pronúncia e o substantivo -mente,
antes palavra autônoma, passou a ser interpretado como sufixo adverbial, como o vemos nos
dias de hoje e, também, no português arcaico. Mas, segundo Martelotta, Barbosa & Leitão
(2002b), a variação entre a grafia separada ou junta, encontrada no português arcaico, deve ser
interpretada com precaução, pois antes de constituir um processo de gramaticalização, pode
ser apenas opção adotada na impressão gráfica:
Entretanto, não podemos esquecer que não
dependemos da fidedignidade da edição para sabermos se
as palavras estavam de fato juntas no original, mas
também que, mesmo nos manuscritos, muitas vezes a
união, ou separação, entre vocábulos poderia ser usada
para se justificar a mancha gráfica na página. Desse
modo, devemos tomar cuidado ao relacionar a escrita
separada/junta dos elementos com sua gramaticalização,
pois o controle estatístico pode revelar o real avanço
da grafia dos advérbios em -mente como um único
vocábulo.
Pereira (1932.) classifica os advérbios de forma semelhante à que fazem os outros
autores: de acordo com as circunstâncias de afirmação, dúvida, negação, lugar, tempo,
quantidade, modo, ordem, designação, etc.
Carneiro Ribeiro, em seu livro Serões Grammaticaes (1956: 362), faz também uma
analogia entre advérbios e adjetivos: É este elemento do discurso uma espécie de adjectivo,
que tem por função característica modificar os adjectivos, os verbos e qualquer palavra de
sentido atributivo. Modifica-os, como o adjectivo modifica os substantivos”.
O autor continua sua análise observando que o advérbio pode se referir a um
substantivo quando este possui um sentido atributivo. Ele cita o seguinte exemplo: “Deus é
verdadeiramente pai” (1956:363). Nesse caso, de acordo com o autor, o valor semântico do
substantivo equivale ao de um adjetivo. Em suas palavras, o advérbio é “attributo de
attributo”.
Carneiro Ribeiro (1956) afirma que os advérbios são invariáveis e este fato, ao
contrário do que pensam outros autores, torna esses elementos ainda mais semelhantes aos
adjetivos. Segundo ele, os adjetivos expressam conceitos abstratos que, por sua própria
natureza, não são passíveis de variações. O que ocorre é que os adjetivos adéquam em gênero
e número aos substantivos que acompanham apenas por uma questão de sonoridade. Carneiro
Ribeiro diz, ainda, que os advérbios expressam de forma mais resumida e eficiente alguns
pensamentos que, se ditos de outro modo, tornariam a linguagem mais lenta e prolixa. Nesse
sentido, podemos entender que os advérbios contribuem para o princípio de economia
lingüística.
O autor propõe a seguinte classificação para os advérbios: advérbio de lugar, advérbio
de tempo, advérbio de quantidade e advérbio de qualidade ou modo.
No que concerne aos advérbios em -mente, o autor trata de sua formação, qual seja:
este sufixo liga-se, de um modo geral, ao adjetivo no feminino, quando houver duas formas.
Diz, ainda, que alguns advérbios podem ter seus sentidos intensificados, tanto por outros
advérbios quanto por uso no superlativo. Cita como exemplos: “mais docemente, muito
ternamente, bellissimamente,”etc.
Said Ali, em sua Gramática Histórica da Língua Portuguesa (1964: 183), define os
elementos adverbiais como se segue:
O advérbio é um vocábulo determinativo do verbo, do
adjetivo ou de outro advérbio. Acrescenta a outras
palavras o conceito de tempo, lugar, modo, etc. que lhes
delimita ou esclarece o sentido, sem, contudo exercer,
como o acusativo, o dativo e o objeto indireto
circunstancial, função puramente complementar.
Esse autor faz uma análise etimológica de alguns advérbios. Entretanto, em relação
aos advérbios em -mente, apenas afirma que são criações novas nas línguas românicas, i.e.,
não encontradas no latim literário, formadas a partir de adjetivos (Cf. p.183).
Semanticamente, Said Ali (op. cit.) equipara as locuções adverbiais aos advérbios em -
mente afirmando que as primeiras se distinguem destes somente porque são mais longas e
os seguintes exemplos: com prudência = prudentemente, com energia = energicamente, com
brandura = brandamente.
O autor esclarece que esses elementos são classificados de acordo com a semântica de
cada um, dividindo-se em tempo, lugar, modo, negação, afirmação, dúvida, quantidade e
ordem, e expressam circunstâncias definidas ou noções de grau (aumento ou diminuição).
Como se pode notar, as gramáticas históricas tratam bastante superficialmente o tema
em questão. Seus autores não conseguiram definir de maneira mais eficiente o advérbio e nem
observaram mais atentamente outras características que esses elementos apresentariam.
3 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS
Esta tese de doutorado baseia-se em princípios funcionalistas, partindo, portanto, de
que a gramática das línguas se constrói a partir do discurso, ou seja, do uso real, concreto da
língua.
Este capítulo consiste em expor alguns pressupostos da linha funcionalista que foram
importantes para minha análise, sobretudo aqueles relacionados à gramaticalização, à
polissemia, ao conhecimento da relação entre gramaticalização e grau de encaixamento entre
cláusulas, e entre gramaticalização e ordenação. Também apresento uma pesquisa sobre a
ordenação de adverbiais (Votre & Santos, 1984), um estudo sobre a natureza da estrutura da
linguagem humana e sua categorização, assim como a classificação semântica de verbos
proposta por Halliday, 1994.
3.1 Os princípios funcionalistas
A teoria funcionalista concebe a linguagem como um instrumento de interação social e
analisa a estrutura gramatical no seu contexto discursivo a fim de investigar as motivações
para explicá-la, compreendendo que as diferentes formas que um elemento incorpora no
discurso não são meramente estilísticas, mas influenciadas por funções informacionais e
pragmáticas. Por conseguinte, uma relação entre forma e função, conforme o Princípio da
Iconicidade, que é definido como a correlação entre o código lingüístico (forma) e o seu
conteúdo (função).
A corrente funcionalista vem estudando com muita profundidade o processo da
Gramaticalização ocorre quando certas construções lingüísticas sofrem transformações ao
longo do tempo, assumindo outras funções mais gramaticais e tornando-se mais fixos e
regulares no discurso. Essa mudança se dá unidirecionalmente: do discurso para a gramática e
não vice-versa. Várias trajetórias foram traçadas para ilustrar esse caráter unidirecional:
vocábulo>morfema, verbo pleno>verbo auxiliar, advérbio>conectivo, dentre outras. Por
exemplo, o vocábulo mente passou a desempenhar a função de um morfema gramatical, ou
seja, passou a ser um sufixo, formador de advérbio, como a locução em boa hora que se
tornou a conjunção concessiva embora: em boa hora>embora. O foco do nosso trabalho não é
a gramaticalização do substantivo em -mente para sufixo, uma vez que no português arcaico
essa gramaticalização já estava consolidada.
Outra pesquisa que relaciona os termos da oração e a posição do advérbio é a de
Votre & Santos (1984), que trata da investigação de fatores sintáticos, semânticos e
discursivos que influenciam a colocação dos constituintes de natureza adverbial na sentença.
O corpus examinado é formado por redações e entrevistas de alunos da 8ª série.
Os autores partem da seguinte hipótese geral a qual também é à base da nossa
pesquisa:
Os advérbios são constituintes móveis, embora com
tendências bem definidas por determinadas posições
sintáticas. (...) a posição ocupada por cada advérbio é
função da atuação conjunta de diferentes fatores
estruturais e não-estruturais, que cabe identificar e
avaliar(1984:83).
Votre & Santos analisaram 4 posições dos adverbiais, a saber: início da sentença
(posição 1); fim da sentença (posição 4); entre o sujeito e o verbo (posição 2); e entre o verbo
e o complemento (posição3), exemplificadas abaixo:
[Ontem], o ministro [ontem] seguiu [ontem] para Nova York [ontem].
1 2 3 4
Os fatores, a seguir, foram observados através de uma análise quantitativa: a) tipo
semântico do advérbio (tempo, lugar, modo, etc.); b) nível do vínculo semântico do advérbio
(com sentença ou com o verbo); c) tipo sintático do verbo (regência do verbo) ou tipo de
complemento (oracional, objeto direto, objeto indireto); d) constituição morfológica do
advérbio (advérbios oracionais, locucionais, nominais, etc.); e) peso do advérbio (breve ou
longo); e f) tipo do sujeito (oração sem sujeito, oração com sujeito vazio, etc.).
Apresentaremos algumas das hipóteses dos autores referentes a esses fatores:
1) Quanto mais vinculado semanticamente ao verbo, mais próximo desse o verbo estaria.
Todavia, o advérbio vinculado ao nível mais alto da sentença estaria mais livre, podendo se
movimentar para o início da sentença, por exemplo;
2) No que se refere ao tipo de vínculo do sujeito com o verbo. Quanto mais fraco for, mais
favorecerá a inserção de um advérbio entre o sujeito e o verbo. Assim, um verbo de ligação
enfraqueceria o vínculo entre sujeito e verbo, permitindo a colocação de advérbio no meio
deles;
3) No que concerne ao peso do advérbio, a expectativa era a de que os adverbiais breves
(menores) ocorressem nas posições internas e os longos (maiores) nas posições externas,
predominando na posição final;
4) A última hipótese refere-se ao tipo de sujeito. Esperava-se que em orações sem sujeito ou
com sujeito vazio, o adverbial tendesse a ocupar a posição inicial, típica do sujeito. Teríamos
assim uma espécie de arranjo de balanceamento (Votre & Santos op. Cit.,. p. 85).
Os resultados mais relevantes desse estudo são arrolados a seguir: para a colocação do
advérbio nominal na posição 1, contribuíram os fatores referentes ao nível do vínculo
semântico do advérbio (advérbio vinculado à sentença), ao tipo semântico de advérbio
(advérbio de tempo e de opinião) e ao tipo de complemento do verbo (complemento
oracional).
A colocação do advérbio na posição 2, entre o sujeito e o verbo, foi motivada pelo
nível de vínculo semântico do advérbio (advérbio vinculado ao verbo) e pelo tipo semântico
de advérbio (advérbio de tempo e freqüência).
A ordenação do advérbio nominal na posição 3, entre verbo e complemento, deve-se
ao nível do vínculo semântico do advérbio (advérbio vinculado ao verbo), ao tipo semântico
de advérbio (advérbio de intensidade) e ao tipo de complemento (objeto indireto).
Por fim, a colocação do advérbio nominal na posição 4 da sentença foi influenciada
pelo nível do vínculo semântico do advérbio (advérbio vinculado ao verbo), pelo tipo
semântico de advérbio (advérbio de modo e de lugar) e pelo tipo de complemento (não
complemento).
Pretendemos, assim como Votre & Santos, identificar fatores que motivem a
colocação dos advérbios de tempo e aspecto em -mente na cláusula. Dentre eles,
identificaremos a estrutura sintática da oração para verificar se a posição vazia de um
argumento (sujeito ou complemento) tende a ser preenchida com o advérbio.
3.2 Gramaticalização e Níveis de Encaixamento entre Cláusulas
Segundo Hopper & Traugott (2003), os períodos compostos fundamentam-se em um
conjunto de estruturas com diferentes níveis de encaixamento, que vão das menos
gramaticalizadas (menos encaixadas) às mais gramaticalizadas (mais encaixadas):
a) Estruturas Paratáticas possuem independência relativa, ou seja, restrita apenas
pela pragmática (fazer sentido e ser relevante). São as cláusulas justapostas, as principais e as
coordenadas.
b) Estruturas Hipotáticas ou Interdependentes são aquelas em que um núcleo e
uma ou mais cláusulas que são relativamente dependentes (não se incluem em nenhum
constituinte do núcleo, mas não podem ficar “soltas”). São as subordinadas adverbiais e as
adjetivas explicativas.
c) Estruturas Subordinadas ou Encaixadas são as que possuem uma margem
completamente incluída no núcleo e que, portanto, têm dependência completa. São as
subordinadas substantivas e as adjetivas restritivas.
Essas estruturas podem ser representadas através de uma trajetória de
gramaticalização: parataxe hipotaxe subordinação.
De acordo com essa trajetória, as cláusulas paratáticas são menos gramaticalizadas,
isto é, revelam menor grau de dependência semântica e encaixamento que as hipotáticas (que
exibem maior grau de dependência e nível intermediário de encaixamento), que, por sua vez,
são menos gramaticalizadas que as subordinadas (que apresentam maior grau de dependência
e de encaixamento). Segundo Givón (1990), a redução da cláusula subordinada à cláusula
reduzida revela níveis ainda maiores de encaixamento entre cláusula principal e subordinada,
além de exprimir concretamente um dos subprincípios relacionados ao conceito de
iconicidade: o da proximidade. Esse subprincípio trata da relação de correspondência entre
sintaxe e semântica. Na complementação verbal, isso implica dizer que o nível de integração
sintática entre as cláusulas não é arbitrário e sim um reflexo do nível de integração semântica
entre o evento da principal e o da subordinada, ou seja, quanto mais integrados esses eventos
no plano semântico, mais integradas estarão as estruturas que os expressam.
Givón concluiu que, quanto mais encaixada uma oração, mais gramaticalizada ela é.
Estendendo a conclusão do autor, depreendemos que o grau de gramaticalização da cláusula
em que os advérbios em -mente aparecem interfere na colocação desses advérbios, conforme
procuraremos atestar nessa pesquisa.
3.3 Gramaticalização e estrutura sintática
De acordo com Givón (1979), a maior liberdade e variedade de elementos significativos
tendem a ocorrer na cláusula principal, declarativa, afirmativa, ativa. Mas, por outro lado,
tanto no que se refere a itens lexicais quanto a construções sintáticas, a distribuição dos
elementos significativos, em todos os outros tipos de cláusula, é sempre mais restrita.
Isso acontece devido ao uso do fenômeno da pressuposição discursiva, ou seja, o grau
de pressuposicionalidade no qual uma sentença é usada, que, por sua vez, está relacionado ao
nível de dificuldade que o falante considera como obstáculo para o ouvinte em determinar
uma única referência no discurso. E, segundo Givón (1979), a cláusula principal, declarativa,
afirmativa, ativa apresenta a complexidade pressuposicional mais baixa no discurso, se
comparada a todos as outras variantes sintáticas.
Givón (1979) nos mostra várias propriedades formais dessas variantes sintáticas, em
relação ao seu grau de pressuposicionalidade, a saber:
1- Variantes mais pressuposicionais exibem maior complexidade sintática.
2- Variantes mais pressuposicionais apresentam maiores restrições distribucionais do
que os padrões neutros.
3- Variantes mais pressuposicionais são gramaticalizadas mais tarde por crianças, ou
pelo menos sua sintaxe é adquirida mais tarde do que as variantes menos
pressuposicionais.
4- Variantes mais pressuposicionais freqüentemente tendem a exibir grande
conservadorismo sintático, mais comumente na área da mudança de ordenação.
5- A cláusula principal declarativa, afirmativa, ativa, neutra e menos pressuposicional
e também a mais freqüente no discurso.
Das propriedades propostas, as que podemos considerar na nossa pesquisa são os itens
1, 2 e 4, que se propõe aqui que as cláusulas gramaticalizadas, e, portanto, mais restritas
distribucionalmente e mais complexas sintaticamente, tendem a ser mais conservadoras.
3.4 As pressuposições discursivas das construções sintáticas
O sentido de pressuposição está sendo compreendido aqui como um conjunto de
informações que estão fora da sentença e que são assumidas pelo falante como evidentes ou
indiscutíveis, ou seja, aquilo que é pressuposto tende a refletir conhecimentos compartilhados,
crenças comuns ou conhecimento presumido como conhecido.
Neste trabalho, não adotamos a distinção entre pressuposição gica e pressuposição
pragmática, que parte do princípio de que todo fenômeno pressuposicional nas línguas
naturais é pragmático. Assim, segundo Givón (1979), o fenômeno da pressuposição,
relaciona-se com: as hipóteses que o falante assume acerca da habilidade do ouvinte de
identificar unificadamente (‘estabelecer uma única referência para’) um argumento-
referente.” (p. 50)
Diante disso, Givón (1979) mostra as variantes sintáticas que se caracterizam por maior
grau de pressuposicionalidade:
a) Construções estritamente pressuposicionais. Cláusulas relativas, clivadas, pseudo-clivadas
e perguntas QU.
b) Cláusulas encaixadas.
c) Outros atos de fala. Imperativo, interrogativo e negativo.
d) Construções envolvendo graus de definitude-topicalidade dos argumentos.
e) Mudança de tópico, passiva, pronomes anafóricos e outros.
Segundo Givón, essas construções apresentam ordenação mais conservadora dos
elementos argumentais. Mas podemos estender esse pensamento para as características de
ordenação de elementos adverbiais. De fato, como foi mencionado, o nível de
encaixamento ou gramaticalização da cláusula tem influência sobre as tendências de
ordenação de advérbios de tempo e aspecto em -mente.
A fase arcaica do português é caracterizada por uma variação na colocação dos
advérbios, ou seja, apresenta advérbios em -mente nas posições pré e pós-verbais em todos os
tipos de cláusulas, apresentando uma pequena predominância de anteposição nas cláusulas
mais gramaticalizadas. A partir disso, podemos depreender que esses parâmetros de
pressuposicionalidade podem nos auxiliar na descrição de mudanças no comportamento
diacrônico desses elementos em relação a sua ordenação.
3.5 Classificações dos verbos, baseada em Halliday (1994)
O tipo semântico do verbo é um dos fatores considerados neste trabalho para entender
a posição dos advérbios de tempo e de aspecto em -mente, pois trabalhos anteriores, como
Scheibman (2001), Bybee (2003) e Andrade (2005), detectaram que era necessário investigar
se o tipo de verbo poderia influenciar na cláusula de alguma forma no caso de Scheibman
(2001), o tipo de verbo foi usado para se perceber a subjetividade nas relações entre o sujeito
e o verbo; no de Bybee (2003), foi utilizado para perceber a influência na gramaticalização do
verbo can do inglês, e, por fim, no caso de Andrade (2005), o tipo de verbo foi utilizado para
detectar a ordenação de locuções adverbiais temporais.
Sendo assim, consideramos esse fator importante para tentar definir uma motivação
semântica da posição dos advérbios de tempo e de aspecto em -mente. Para isso, utilizamos a
classificação de Halliday (1994), também utilizada em Scheibman (2001) e Andrade (2005).
Nossa hipótese é que determinado verbo acompanhado do advérbio temporal, com a
repetição de uso, possa fixar os advérbios de tempo e de aspecto em -mente numa dada
posição, conforme Bybee (2003). Essa autora conhece a importância da repetição,
caracterizando-a como um processo pelo qual seqüências de palavras ou morfemas
freqüentemente usados tornam-se automáticos como uma única unidade de processamento.
Acreditamos também que determinado tipo semântico do advérbio ocorra com um
determinado tipo semântico do verbo.
Embora haja rias classificações de verbos, trabalharemos com a classificação de
Halliday (1994), por ser um lingüista funcionalista. Segundo esse autor, a oração também
desempenha o papel de modelar a experiência, isto é, representa padrões da experiência. Os
seres humanos, através da linguagem, constroem um quadro mental da realidade e este é
criada por processos.
A oração é um modo de ação, um modo de dar e receber bens e serviços como também
informações. Ela é um modo de reflexão, um modo de impor ordem na variação e no fluxo do
sistema gramatical de transitividade. Esse sistema constrói o mundo a partir da experiência
por meio de conjunto de tipos de processos que estão relacionados à nossa experiência
exterior (ligada ao mundo que nos cerca, como eventos, ações etc.) e à nossa experiência
interior (ligada à consciência, à imaginação, como reflexão, etc.( Halliday,1994:106).
De acordo com o autor, o modelo proposto de representação de experiência,
interpretado no sistema gramatical de transitividade, é um contínuo circular.
Ele afirma que um processo é constituído de três componentes para a interpretação da
nossa experiência do que acontece: a) o próprio processo; b) os participantes no processo; e c)
circunstâncias associadas com o processo (são opcionais).
Esses três conceitos são categorias semânticas que explicam como fenômenos do
mundo real são representados em figuras lingüísticas.
O autor discorre sobre os principais processos no sistema de transitividade da língua
inglesa:
Os processos materiais (processes of doing) estão relacionados ao mundo físico, à
experiência exterior. São processos ‘do fazerque expressam a noção de que uma entidade
‘faz’ alguma coisa que pode ser feita ‘para’ outra entidade. Portanto, esse processo tem um
ator obrigatório e um alvo (goal) opcional. Para Halliday, o termo ator refere-se àquele que
realiza o efeito, já o termo alvo refere-se a alguém para o qual o processo é estendido.
Vejamos um exemplo: The lion[ator] caught[processo] the tourist [alvo] ( O leão pegou o
turista.);
Os processos mentais (processes of sensing) referem-se ao mundo da consciência, à
experiência interior. Para conhecer esses processos, o autor abandona a noção semântica de
ator e alvo (goal) e agrupa as orações que expressam sentimentos (affection), pensamentos
(cognition) e percepção (perceptin) nesse tipo de processo.
O autor acrescenta que os participantes envolvidos nos processos mentais que são
experenciados (senser) a um fenômeno (phenomenon). O primeiro é o ser consciente que
sente, pensa e percebe, o segundo é aquilo que é sentido, pensado ou percebido. Desse
modo, um dos participantes é dotado de consciência, o outro pode ser uma ‘coisa’ ou um fato
(entendido como um metafenômeno, isto é, alguma coisa que é construída como um
participante por projeção).
Obtivemos: Mary [experenciadora dotado de consciência] liked [processo] the gift
[fenômeno/coisa] (Maria gostou do presente). Ou Mary [experenciador dotado de
consciência] was pleased [processo] that she’d got a present [fenômeno/fato] (Maria estava
contente que ganhou um presente);
Os processos relacionais (processes of being) estão ligados ao mundo das abstrações.
Relacionam fragmentos da experiência, classificando-os e identificando-os. Esses processos
estabelecem uma relação entre duas entidades separadas. Uma entidade ‘a’ pode atribuir algo
a uma entidade ‘x’ ou pode identificar uma entidade ‘x’. Sendo assim, subdividem-se em:
Relacionais Intensivos: associados ao mundo das abstrações estabelecem uma relação entre
duas entidades separadas, atribuindo alguma característica a elas; Relacionais Possessivos:
associados ao mundo das abstrações estabelecem uma relação entre duas entidades separadas,
identificando-as ou atribuindo posse de algo ou alguma coisa a elas, e Relacionais
Circunstanciais: associados ao mundo das abstrações estabelecem uma relação entre duas
entidades separadas, identificando-as ou atribuindo alguma circunstância a elas.
O sistema do inglês opera com três tipos principais de construções: a) intensiva
(equativa): ‘x is a ‘ (x é/está a). Ex.: Sarah is wise. (Sara é sábia); b) circunstancial: ‘x is at a’
(em que ‘is at’ pode ser ‘is at, in, on, for, with, about, along, etc.’). c) possessive: (x está em a
). Ex.: Peter has a piano. (Pedro tem um piano)
Na fronteira desses principais processos, outros processos que compartilham
algumas das características daqueles, como:
Os processos comportamentais manifestam os processos de consciência e os estados
fisiológicos. Esses processos são tipicamente de natureza humana, uma vez que se constituem
por comportamentos psicológicos e fisiológicos como respirar, tossir, sorrir, sonhar dentre
outros. Suas características não são claramente definidas, que estão na fronteira entre os
processos materiais e mentais. Um participante é tipicamente um ser consciente, denominado
Behaver. Vejamos o exemplo: No-one[Behaver] is listening [processo]. (Ninguém está
ouvindo);
Os processos verbais expressam relações simbólicas, construídas na consciência
humana, através da linguagem. São processos de ‘dizer’, como em “- O que você disse? -Eu
disse que está barulhento aqui.” No entanto, ‘dizer’ aqui, é interpretado em um sentido amplo,
expressando qualquer tipo de troca simbólica de significado. O participante, nesses processos,
não precisa ser consciente. Esse é denominado Sayer(aquele/aquilo que diz). Eis alguns
exemplos: the notice ( sayer) tells you to keep quiet e my watch (sayer) says it’s half past
ten.(O aviso diz para ficarmos em silêncio e meu relógio diz que são dez e meia,
respectivamente).
Há outras funções de participantes além da do ‘sayer’: ‘Receiver’ (aquele para o qual a
fala é direcionada), Verbiage (o que é dito), Target (a entidade que é objetivada pelo
processo de ‘dizer’). Observemos: She [sayer] praised [processo] him [target] to her friends
[receiver] (Ela elogiou para os amigos dela) ou I [sayer] ordered [processo] a steak
[verbiage] (Eu pedí um bife);
Os processos existenciais detonam a existência, o acontecer. Representam que
alguma coisa existe ou acontece. O elemento que é dito existir é chamado de Existent’. A
princípio, pode existir qualquer tipo de fenômeno que possa ser construído como alguma
‘coisa’: pessoa, objeto, instituição, abstração. Também pode existir uma ação ou um evento.
Freqüentemente, uma oração existencial contém um elemento circunstancial distinto de tempo
ou lugar. Analisemos: There is [processo] a man [existente] at the door [circunstância] (Há
um homem na porta).
O lingüista ainda menciona mais um tipo de processo: os processos meteorológicos
que se encontram na fronteira entre os processos existenciais e materiais. Alguns são
construídos como processos materiais: The wind’s blowing ( o vento está soprando); alguns
como processos existenciais: There was a storm (houve uma tempestade); alguns como
relacionais: it’s cold ( está frio); e alguns sem participantes, constituindo-se apenas pelo
processo: it’s raining ( está chovendo).
Usamos essa classificação na análise dos verbos presentes nas cláusulas com
advérbios de tempo e aspecto em -mente, considerando o tipo semântico do verbo como um
fator possível de motivar a ordem desses advérbios. Esse fator se mostrou relevante na
pesquisa de Andrade (2005) e na de Albani (2007) com relação ao uso de locuções temporais
e aspectuais e do uso do advérbio sempre, respectivamente.
4 METODOLOGIA
A corrente funcionalista prima por uma análise do uso da língua, portanto, torna-se
necessário o estudo de dados reais, isto é, dados (da língua oral ou escrita) produzidos pelos
usuários da língua em contexto de comunicação.
Como mencionado, o presente estudo objetiva-se à análise da ordenação dos
advérbios de tempo e aspecto terminados em -mente sob a perspectiva funcionalista na
modalidade escrita.
Este trabalho, por um lado, utiliza metodologia quantitativa na análise dos advérbios
de tempo e de aspecto em -mente que apresentam diferentes possibilidades de colocação na
frase, mas são aparentemente estáveis no que se refere a seu status semântico. Por outro lado,
também se realizou a uma análise qualitativa que visa observar algumas mudanças semânticas
e, em alguns casos, também sintática, percorrida por certos usos adverbiais.
A pesquisa seguiu as seguintes etapas: levantamento das ocorrências de advérbios em -
mente com algum traço de sentido de tempo e/ou aspecto, nos textos selecionados de
diferentes épocas; classificação dos advérbios, levando-se em consideração o contexto de
cada ocorrência, sua função, posição, etc. (de acordo com os critérios arrolados abaixo);
análise quantitativa e qualitativa das ocorrências dos advérbios de tempo e aspecto; paralelo
entre os resultados das diferentes sincronias; conclusões. O confronto dos dados de diferentes
estágios da língua favoreceu uma visão mais ampla e, conseqüentemente, uma análise mais
abrangente dos possíveis processos de mudança.
Para se observar em diferentes possibilidades de ordenação dos advérbios de tempo e
de aspecto em -mente, foram levados em consideração alguns fatores na classificação e análise
desses elementos, a saber: a ordem, a noção semântica expressa pelo advérbio (aspectual,
cronológico e híbrido); grau de gramaticalização da cláusula em que os advérbios de tempo e
aspecto em -mente se inserem (se mais ou menos gramaticalizada); e tipos de verbos a que
esses se associam, segundo Halliday (1994) e outros, que serão explicitados mais a frente.
4.1 Corpus
Em conformidade com os pressupostos teóricos da teoria funcionalista, os dados
utilizados para a análise da ordenação dos advérbios de tempo e aspecto terminados em -
mente foram extraídos de textos de diferentes gêneros textuais do português arcaico, dos
séculos XVI, XVII, XVIII, XIX e do português atual.
Os materiais constituintes da amostra e os procedimentos teórico-metodológicos
realizados, assim como o controle dos aspectos e fatores que influenciam na ordenação dos
advérbios em -mente, são apresentados e discutidos ao longo desse trabalho.
É importante ressaltar a complexidade que envolve a tarefa de se selecionar textos,
considerando-se um recorte histórico tão amplo. A complexidade dá-se, por um lado, pelo
fato de que esses textos precisam partilhar, ainda que minimamente, características que
permitam que sejam estabelecidas comparações entre os resultados dos dados neles
levantados, sem que haja distorções; por outro lado, pelo leque tão reduzido de opções de
textos de fontes confiáveis, que diminui as possibilidades de escolha.
Sendo assim, como não foi possível analisar exatamente os mesmos tipos de textos em
todas as épocas, foi seguido um roteiro, juntando diferentes tipos textuais, mas mantendo uma
certa coerência na sua distribuição pelos diferentes momentos sincrônicos analisados.
Chegou-se, então, aos seguintes corpora:
a) português arcaico: Testamento de Dom Afonso II; O Orto do Esposo (OE), de Maller
(1956) e Castelo Perigoso(todos esses textos estão disponíveis no site do corpus
informatizado do Português medieval(http://cipm.fcsh.unl.pt/gencontent.jsp?id=4). Esse
corpus (CIPM) foi criado em 1993 e inclui textos latino-romances do século IX ao século XII
e textos portugueses do século XII ao século XVI.
b) português do século XVI: Crônica dos Reis de Bisnaga; Cartas de D.João: são 372 cartas
de D. João III, rei de Portugal, do período entre 13 de outubro de 1523 e 20 de fevereiro de
1557, que também foram extraídas do site do corpus informatizado do Português medieval
(http://cipm.fcsh.unl.pt/gencontent.jsp?id=4).
c) português do século XVII: foram oito sermões do Padre Antônio Vieira:
1
o
sermão: Sermão da terceira quarta-feira da quaresma na Capela Real, 1669 (Assunto: um
remédio para os males de todas as cortes do mundo: a consolação dos mal despachados,
baseando-se no pedido indeferido da mãe dos Zebedeus);
2
o
sermão: Sermão da Sexagésima. Pregado na capela Real. Este sermão pregou o Autor no
ano de 1655, vindo da Missão do Maranhão, onde achou as dificuldades que nele se apontam,
as quais vencidas, com novas ordens reais voltaram logo para a mesma Missão.
3
o
sermão: Sermão de quarta-feira de cinza. Em Roma, na Igreja de S. Antônio dos
Portugueses.Ano de 1670.
4
o
sermão: Sermão do Santíssimo Sacramento. Exposto na lgreja de S. Lourenço, In:
Damaso, nos dias do Carnaval Em Roma. Ano de 1674. Traduzido do italiano.
5
o
sermão: Sermão do Nascimento da Virgem Maria. Debaixo da invocação de N. Senhora da
Luz, título da Igreja e colégio da Companhia de Jesus, na cidade de S. Luís do Maranhão. Ano
de 1657.
6
o
sermão: Sermão de S. Inácio, fundador da Companhia de Jesus, em Lisboa, no Real
Colégio de S. Antão, 1669.
7
o
sermão: Sermão do terceiro domingo da quaresma, na Capela Real, 1655.
8
o
sermão: Sermão da quinta-feira quaresma na misericórdia de Lisboa. ANi nF, 1 669
d) português do século XVIII:
Cartas comerciais da administração pública, representações oficiais do Rio de Janeiro, obtidas
no corpus do Museu da Língua Portuguesa - Estação da Luz. Foram analisadas 13 Cartas.
BARBOSA, Afranio & LOPES, Célia Regina et al. Corpus diacrônico do Rio de Janeiro:
cartas pessoais séculos XVIII-XIX. Rio de Janeiro, UFRJ/PIBIC-CNPq/ Labor-Histórico,
2003 (versão eletrônica
)
e) português do século XIX:
Cartas comerciais da administração pública, representações oficiais do Rio de Janeiro, obtidas
no corpus do Museu da Língua Portuguesa - Estação da Luz. Foram analisadas 12 cartas.
BARBOSA, Afranio & LOPES, Célia Regina et al. Corpus diacrônico do Rio de Janeiro:
cartas pessoais séculos XVIII-XIX. Rio de Janeiro, UFRJ/PIBIC-CNPq/ Labor-Histórico,
2003 (versão eletrônica)
f) português atual:
- Tocar o Senhor, Pe. Leo (TS).
-A essência do cristianismo, de J. Berkeley (EC).
4.2 Descrições dos fatores da análise dos advérbios de tempo e aspecto em –mente
Classificamos os dados a partir de alguns fatores que nos pareceram relevantes ao estudo
dos advérbios de tempo e aspecto em -mente. Utilizamos o modo de coleta e codificação da
sociolingüística variacionista (apesar de não estarmos trabalhando com um fenômeno de
variação propriamente dito).
Todos os dados são analisados a partir de fatores, que assim se configuram:
1. Posição/Ordem do advérbio em relação ao verbo
Verificamos a posição do advérbio de tempo e aspecto, se ocorre antes ou depois do
verbo, independentemente da presença ou ausência de algum elemento interveniente como o
sujeito, ou um outro advérbio, uma expressão, uma oração subordinada, etc.
Inicialmente, estabeleceram-se duas posições gerais nas quais os advérbios de tempo e de
aspecto em -mente poderiam ocorrer:
- Antes do verbo:
(1) que Deus constatemente nos fala (Português atual, TS,p.15)
- Depois do verbo:
(2) abramos os corações à luz , para que more perpetuamente neles(Século XVII, Sermão de
Santo Inácio, Pe A.Vieira)
Dessas ordenações gerais, desmembraram-se subposições, vejamos no quadro abaixo:
Quadro 2- Subposições do Advérbios em -mente
Posições Exemplos:
POSIÇÃO 1 (POS1): (ME) margem
esquerda da oração (tudo que estiver no
início de oração ou depois de conjunção).
(3) Constantemente Jesus vem curar-nos
(Português atual, TS, p.28)
POSIÇÂO 2(POS2): entre o sujeito e o
verbo. (o sujeito pode ser SN, pronome ou
pronome relativo)
(4) que Symão Fernandez novamente fez
(séc.XIV, Carta número 147)
POSIÇÂO 3(POS3): não inserido entre o
sujeito e o verbo, mas fora da margem
esquerda da cláusula.
(5) Agora novamente tem sucedido nas
minas hum levantamento que La fizeram
os povos. (século XVIII, Cartas oficiais).
POSIÇÂO 4(POS4): entre o verbo auxiliar
e o verbo principal.
(6) Precisamos urgentemente encontrar
nosso lugar de oração (Português atual,
TS, p.113)
POSIÇÃO 5(POS5): margem direita da
oração (no final da oração).
(7) Cristo continua do lado de fora de
nosso coração, batendo incessantemente
(Português atual, TS, p.39)
POSIÇÃO 6(POS6): inserido entre o
verbo e o complemento/predicativo.
(8) No entanto, ao oferecer
espontaneamente à igreja o produto da
venda (Português atual, TS, p.97)
POSIÇÃO7(POS7): entre o verbo e o
sujeito.
(9) chegou subitamente h~u~u home(m)
nõ conhecido ~ecima dh~u~u Cavallo e
~entrou pello paaço(Português arcaico
OE, 353)
POSIÇÃO 8(POS8): Não inserido entre o
verbo e o sujeito, ou entre o verbo e o
complemento/predicativo, mas fora da
margem direita(ou, seja, no final da
cláusula)
(10) deixamos boas coisas para trás muito
freqüentemente em nome da
independência (Português atual, EC, p.31)
2) Tempo/sincronias: português arcaico, dos séculos XVI, XVII, XVIII, XIX e português
Atual (cf. na seção anterior a lista de textos que serviram como corpora)
3) A noção semântica expressa pelo advérbio: Em relação às características semânticas que
cada advérbio pode expressar, classificamos em: a) advérbios que expressam tempo real
cronológico: são aqueles que expressam tempo cronológico, como por exemplo, os advérbios
atualmente e ultimamente; b) advérbios que expressam tempo aspectual: são os que se
referem à repetição de algum evento, ou à freqüência com que eventos ocorrem. Sabemos que
é bastante complexo delinearmos os limites entre tempo real e tempo aspectual, mas
decidimos que é possível fazer essa diferenciação, pelo menos até o ponto que nos foi exigido
pela análise. No presente estudo, foi claro observar e definir esses advérbios denominados de
tempo real devido a suas características dêiticas. Portanto, os advérbios cronológicos fazem
referência ao momento da enunciação. Enquanto, os advérbios de tempo aspectual são os que
se referem à repetição de algum evento, ou à freqüência com que os eventos ocorrem como o
advérbio freqüentemente; c) advérbios que são híbridos: são os usos polissêmicos, ou seja,
aqueles que expressão além das noções de tempo e de aspecto, expressam também a noção de
modo (tempo+aspecto/aspecto+modo), isto é, são os advérbios que expressam de alguma
forma duas características, com predominância de uma ou outra, por exemplo, tempo e modo,
como o advérbio rapidamente.
4) O tipo semântico de verbo que compõe a cláusula, segundo Halliday (1994), a saber:
material, mental, comportamental, relacional possessivo, relacional intensivo, atividade verbal
e meteorológico. (cf. seção 3.5).
5) Tipo formal de sujeito - verificamos em cada oração coletada se o sujeito estava (a)
formalmente presente antes do verbo, (b) formalmente presente depois do verbo, (c) presente
na forma de um pronome relativo ou (d) ausente (incluindo neste caso o tradicional sujeito
oculto e a oração sem sujeito).
6) Tipo de oração - observarmos em que tipo de oração, o advérbio de tempo e de aspecto
está inserido, se a oração é (a) paratática, (b) subordinada (substantiva ou adjetiva restritiva),
(c) hipotática (adverbial ou adjetiva explicativa), (d) oração principal ou (e) oração absoluta.
Cruzamos alguns desses fatores entre si para verificarmos os padrões de uso dos
advérbios e para vermos o uso dos mesmos em cada sincronia da língua.
5 ANÁLISES DOS DADOS
Neste capítulo, apresentamos uma análise dos advérbios de tempo e de aspecto
terminados em mente usados em textos escritos em norma culta do português, mais
precisamente em textos do português arcaico, dos séculos XVI, XVII, XVIII, XIX e do
português atual.
Analisamos aqui os resultados encontrados através da codificação dos fatores
controlados, como foi dito: posição do advérbio, noção semântica do advérbio, tipo de
verbo, tipo de sujeito, sincronias e tipo de oração. Destacamos a importância destes para
comprovar a hipótese de que fatores que influenciam o posicionamento dessa categoria em
relação ao verbo e a de que deve ter havido mudanças na ordenação desse advérbio nas
sincronias estudadas.
A seguir, explicitamos a análise dos grupos de fatores pertinentes ao estudo do
fenômeno em questão.
5.1 Análises de fatores
Começamos nossa análise pela apresentação das ordens estabelecidas (cf. capítulo 4),
fator de maior importância para verificarmos a posição prototípica dos advérbios em –mente
em cada sincronia.
5.1.1 Ordem do advérbio de tempo e aspecto em -mente
Inicialmente, a análise consistiu na verificação da posição de cada advérbio na
sentença. Porém, para uma melhor compreensão dos dados, foram estabelecidas duas posições
gerais:
Antes do Verbo
(01) Por uso antigamente havia um conselho chamado dos massarotes (Século XVII,
Sermão do Pe.A. Vieira)
Depois do Verbo
(02) Abramos os corações à luz, para que more perpetuamente neles Século XVII,
Sermão do Pe.A. Vieira)
Encontramos em todos os textos analisados (de todas as sincronias) um total de 180
dados com advérbios de tempo e aspecto em -mente. Estes estavam distribuídos de acordo
com o que pode ser visto na tabela a seguir:
Tabela 1- Distribuição dos advérbios em -mente quanto à ordem em relação ao verbo
Posição antes do
verbo
Posição depois do
verbo
Auxiliar-Adv-
Verbo
Total
Ocorrência % Ocorrência % N
o
de oco
rrência
%
82= 45,5% 88= 48,8% 10= 5,5 180=100%
Na tabela 1, verificamos que não houve diferença significativa, ao compararmos as
duas posições gerais: antes e depois do verbo. Sem levarmos em conta as sincronias, os dados
se distribuem homogeneamente entre as duas posições, como nos exemplos abaixo (os
exemplos 03 e 04, são de advérbios colocados em posição pós-verbal e os exemplos (05) e
(06) são de advérbios em posição pré-verbal). Houve apenas 5,5 % de dados com o advérbio
entre o auxiliar e o verbo (POS 4).
(03) Deu sinal o rei, mandou Moisés a Arão que lançasse a sua vara em terra, e converteu-se
sùbitamente em uma serpente viva e tão temerosa, como aquela de que o mesmo Moisés no
deserto se não dava por seguro (Século XVII, Sermão do Pe. A. Vieira)
(04) Entre estas duas portas se acha subitamente um homem no instante da morte, sem poder
tornar atrás, nem parar, nem fugir... (Século XVII, Sermão do Pe. A. Vieira)
(05) Em conseqüência desta minha lembrança, ordenei à Câmara desta Cidade que
immediatamente passasse a examinar o numero de Embarcaçoens, que tinhão sahido deste
Porto para essa Cidade (Século XVIII, administração Pública/Carta oficial)
(06) ...esta inCerteza menão fez admiração porser muito na= tural o erraremse todos
osCalculos quesefazem SobreCouzaz tão inCertaz. Como aNavegação, finalmente
chegarão Vossamercez muito bonz, que he oque mais estimo, eComamesma felicidade
principiarão asSuas marchaz por terra(Século XVIII, Administração Pública/Carta oficial)
A tabela abaixo apresenta, de um modo geral, o número das ocorrências dos advérbios
de tempo e aspecto em -mente pelas sincronias estudadas.
Tabela 2- Levantamento Geral dos dados dos corpora dos Advérbios de Tempo e de
Aspecto em -mente
Sincronias Total
Port. Arcaico 44
SÉC. XVI 18
SÉC.XVII 34
SÉC.XVIII 18
SÉC.XIX 21
Port. Atual 45
TOTAL
180
Eis alguns exemplos de cada uma das sincronias estudadas:
- Português arcaico:
(07) Quem de ssi meesmo busca paz em out(r)a part(e) ou pobreza ou desp(re)ço, nom a
achara´. Que quem mu(r)mura ou he trist(e) de ssua pobreza, e q(ue)m ha´ door no coraçom e
he descontent(e) e a despreza nom ha´ paz consigo. E po(r) que homem possa vi~ir a esta paz,
deve rroguar a D(eu)s conthinuadament(e), e amehu´de peenssar em sua grande pobreza e
humildade e maravilhossa sofrença. (Castelo Perigoso).
- Século XVI:
(08)
E
ste rey tem continuadamente cimcoenta mil home~es de solldo, em que entra~o seis
mill home~es de cavallo, que sa~o de sua goarda do paço, dos quoaes seis mil sa~o os
duzentos obrigados a cavalgar com elle, e tem mais vimte mill lamceiros e dargueiros, e tres
mil home~es (Século XVI –Crônica dos Reis de Bisnaga)
-Século XVII:
(09) Lêde o Testamento Velho, e achareis que Deus antigamente afogava exércitos, queimava
cidades, alagava mundos, despovoava paraísos. (Sermão do Pe.A. Vieira).
-Século XVIII:
(10) O Antigo Provedor da Fazenda; emque VossaSenhoria mefala, dizendo naõ desceria dos
Sertoens, desceo com efeito, eaqui se acha, segundo metem constado ha dozedias, mas
brevemente hirá para essa cidade, pois...(Século XVII, carta Comercial número 7)
- Século XIX:
(11) Pessolhe novamente de ver os vestidos | que estão na D. Brasilia, e faser | o possível por
m’os ...(Século XIX, Carta Comercial número 2)
- Português Atual
(12) Hoje não damos tanta importância àquilo que Deus constantemente nos fala (TS, p. 15)
5.1.2 Posição do advérbio
A seguir, podemos observar a distribuição dos advérbios analisados pelas posições
arroladas nas sincronias estudadas. Apenas para lembrar (cf. capítulo 4):
a) POS 1 – a posição da margem esquerda;
b) POS 2 – a posição entre o sujeito e o verbo.
c) POS 3 a posição não inserida entre o sujeito e o verbo, mas fora da margem esquerda
da cláusula;
d) POS 4 – a posição entre o verbo auxiliar e o verbo principal;
e) POS 5 – a posição a margem direita da oração (no final da oração);
f) POS 6 – a posição inserida entre o verbo e o complemento/predicativo;
g) POS 7 – a posição entre o verbo e o sujeito.
h) POS 8 – a posição não inserida entre o verbo e o sujeito, ou entre o verbo e o
complemento/predicativo, mas fora da margem direita.
Tabela 3 - Distribuição das posições dos advérbios de tempo e aspecto em –mente X
sincronias
Sincronias POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
ARCAICO 09 02 06 02 10 09 - 06 44
SÉC.XVI
10 02 - - 01 03 01 01 18
SÉC.XVII
18 02 02 - 02 04 01 05 34
S.XVIII. 11 01 - 01 01 02 - 02 18
SÉC.XIX
06 - - 03 04 05 - 03 21
Português
Atual
06 03 04 04 14 07 01 06 45
Total 60 10 12 10 32 30 03 23 180
% 33,3 5,5 6,6 5,5 17,7 16,7 1,6 12,7 100
Ao olharmos o total expresso na última linha da tabela, podemos constatar que a POS1
é mais recorrente. Isso evidencia que os advérbios de tempo e de aspecto em -mente,por
expressarem tais circunstâncias, preferem as posições periféricas da cláusula, sobretudo à
margem esquerda (POS1), e evitam posições mais internas à sentença, posições essas que
rompem com a estrutura padrão da cláusula. Shaer (2004), tratando especificamente da
ordenação dos circunstanciais temporais, relata que não é fácil determinar de forma precisa as
diferenças entre os temporais na margem esquerda ou na margem direita da sentença, ainda
que seja possível determinar distinções funcionais entre eles: a margem esquerda constitui um
ponto de ancoragem, um elo entre a parte do discurso em que se encontra o advérbio e um
ponto do discurso anteriormente mencionado, numa relação nitidamente anafórica, de
conexão discursiva. Tal fenômeno tende a não ocorrer com advérbios que ocupam a margem
direita da oração, associados a um escopo mais restrito, geralmente portador de informação
nova. Como podemos observar nos exemplos 13 e 14 abaixo:
(13) Antigamente convertia-se o mundo; hoje por que se não converte ninguém? Porque hoje
pregam-se palavras e pensamentos (Século XVII, sermão do Pe. A. Vieira).
(14) porque não perdeu o céu e a vista de Deus, mas vai arder no inferno eternamente.
(Século XVII, sermão do Pe. A. Vieira).
Podemos observar, também, através da tabela 3, que, no português arcaico, as posições
típicas são POS 5 (pós-verbal no fim margem direita), 6 (entre o verbo e o complemento) e 8
(pós-verbal fora do fim), mas os dados têm uma boa distribuição em todas as posições, exceto
na posição 7. Ou seja, no português arcaico havia uma ordenação mais livre, apesar das raras
ocorrências de algumas posições.
nas outras fases do português, entre o português do XVI e o português do século
XIX, o uso predominante é a posição 1 (margem esquerda). No século XVI, ainda outras
posições com uma distribuição razoável de dados, que são as posições 6 e 5. Depois, como
dissemos, é a posição marginal à esquerda a preferida pelos autores. Mas, no século XIX,
uma diferença importante: começa a aumentar o uso de uma posição pós-verbal, é a
posição 6. No português atual, verificamos novamente que há uma distribuição de dados em
todas as posições, mas há predomínio da posição 5, ou seja, uma posição pós-verbal.
Nossa análise permite dizer que, nos textos estudados, o advérbio em -mente passa de
um uso relativamente livre para um uso mais fixo na posição marginal à esquerda. Depois no
século XIX, começa a aumentar na posição pós-verbal e no português atual é usado
predominantemente na posição pós-verbal (mais especificamente na posição marginal à
direita, POS 6).
Albani (2007) verificou que a posição típica do advérbio sempre era pré-verbal no
português arcaico e pós-verbal no português contemporâneo. Todos os fatores estudados
indicam que, no português arcaico, a ordem era mais livre, enquanto no português atual a
ordem tende a ser mais fixa. Segundo ele, um forte indício de mudança na ordenação do
advérbio sempre em textos religiosos. Portanto, o autor encontrou um aumento da posição
pós-verbal ao comparar o português arcaico com o atual com relação ao uso de sempre. E o
mesmo constatamos no nosso estudo. Pesquisas futuras devem verificar os indícios de
mudança apontados aqui, comparando textos de diferentes tipos.
5.1.3 Noção semântica do advérbio
O fator noção semântica do advérbio foi investigado com a finalidade de se verificar
se relação entre o valor que o advérbio em -mente expressaria no contexto e a sua posição.
Os valores considerados (com base em Freitas e em Ilari) são:
(a) Cronológico – é aquele que expressa tempo real;
(b) Aspectual é aquele que expressa às noções: iterativo, reiterativo, freqüentativo e
outros;
(c) Híbrido – é aquele que expressa às noções tempo/aspecto + modo.
A categoria noção semântica é de grande relevância para este estudo, pois este é o
momento em que a caracterização semântica do advérbio estudado que poderá ser observada
em uma análise não quantitativa, mas qualitativamente.
Denominamos os advérbios aspectuais aqueles que indicam a freqüência com que os
eventos não-específicos ocorrem ao longo do tempo. Esse tipo de advérbio é eminentemente
aspectual, que interage com a categoria aspectual de iteratividade, como podemos observar
no exemplo abaixo:
(15)... e refletiu sobre aquilo que Deus continuamente nos fala.(Português atual, TS,p.15)
Neste exemplo (15), verificamos que o advérbio cronológico expressa tempo real, ou
seja, é aquele que faz referência ao passado, presente ou futuro, tendo como ponto de
referência o momento da enunciação. no exemplo (16), observamos que o advérbio
apresenta a noção dêitica, aponta para algum momento da enunciação.
(16) Atualmente as coisas estão como costumavam ser mil anos atrás. (Português atual, EC,
p.09)
o advérbio no exemplo (17), observamos que expressa à noção de iteratividade
(aqui também alocamos nos grupos dos advérbios aspectuais) referindo-se à repetição de
algum evento, ou à freqüência com que eventos ocorrem. Vejamos o exemplo:
(17) Para nos resgatar e nos libertar novamente (Português atual, EC, p.61)
De fato, é uma tarefa arriscada determinar os limites entre tempo real e tempo
aspectual, mas decidimos que é possível fazer essa diferenciação, pelo menos até o ponto que
foi exigido pela análise. No presente caso, foi claro observar e definir os itens denominados
de tempo real devido à suas características dêiticas.
Os advérbios que apresentam a noção semântica Híbrida ‘tempo mais modo’ (como,
por exemplo, rapidamente), ou ‘tempo mais aspecto’ (como, por exemplo, normalmente),
nada mais são do que aqueles advérbios que expressam de alguma forma as duas
características, com predominância de uma sobre a outra. O importante aqui é verificar se esta
polissemia influencia a posição do item em relação ao verbo.
Apresentamos aqui mais alguns exemplos para ilustrar o fator noção semânticos
expressa pelo advérbio:
1. Freqüentativo/iterativo- Aspectual:
(18)... repetidamente nós o rejeitamos...(Português atual, EC,p. 44)
2. Expressão de tempo real – cronológico:
(19) Por isso antigamente havia um conselho chamado dos massoretas (Século XVII, Sermão
do Pe. A. Vieira )
3. Tempo aspectual – Aspectual:
(20) para nos resgatar e nos libertar novamente ...(Português atual, EC,p.61)
4. Híbrido tempo/aspecto + modo:
(21) Deus está querendo ficar eternamente conosco. ...(Português atual, TS, p. 49)
Portanto, esse fator leva em consideração a noção semântica que os advérbios em -
mente podem assumir no contexto em que estão inseridos.
A análise dos dados, que se apresentarão a seguir, será feita separando os corpora de
cada sincronia estudada. As tabelas abaixo ilustram a distribuição dos advérbios de acordo
com a posição e noção semântica identificadas, a começar pelo uso dos advérbios no
português arcaico. Ao final da seção, faremos uma conclusão geral relativa a esse fator.
Tabela 4 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no
Português Arcaico
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTA
L
Cronol. 03 - - - 03 02 - 01 09
Aspectual 02 - - 01 - 01 - - 04
Híbrido 04 02 06 01 07 06 - 05 31
Total 09 02 06 02 10 09 - 06 44
% 20,5 4,5 13,6 4,5 22,7 20,5 - 13,6 100
Na tabela 4, em que checamos a ordenação do advérbio e a noção semântica expressa
por ele na cláusula, observamos a predominância da tendência pré-verbal, exceto os advérbios
com os sentidos híbridos que expressam em si mesmos os valores de tempo/aspecto e modo.
É exatamente o fato de apresentar esse valor polissêmico denominado de híbrido na presente
pesquisa que explica o desvio que este advérbio apresenta com relação à tendência da posição
pré-verbal.
Além disso, podemos apontar na tabela acima outras constatações no português
arcaico, como por exemplo, se observarmos os totais expressos na última linha da tabela,
verificamos que as posições 1, 5 e 6 são mais recorrentes do que as demais posições 3, 8, 2 e 4
respectivamente.
Outra questão a ser considerada nessa análise é que as noções cronológicas e aspectual
não são predominantes em relação às demais noções. Entretanto, identificamos que a noção
híbrida é mais freqüente, quanto à sua ordenação, eles ocorrem mais na posição 5(margem
direita da cláusula), que é uma posição pós-verbal.
Na dissertação de Freitas (2004), verificou-se que o tipo polissêmico (que
corresponderia à noção híbrida) ocorria mais na posição pós-verbal, diferindo dos demais
tipos semânticos (cronológico, aspectual e conectivo). A autora justifica que por essa noção
possuir características de um advérbio qualitativo (Ilari et al., 1990), esse advérbio irá tender a
ocupar a posição pós-verbal, uma vez que os advérbios qualitativos têm a predisposição de
ocorrer após o verbo. Já Moraes Pinto (2007:77), ao estudar o uso do advérbio qualitativo em
–mente, constatou que “esses elementos apresentam mudança em seus valores desde
português arcaico ao século XIX”. Ela conclui que, além do processo de gramaticalização
pelo qual passou esse advérbio, exercendo nova função, sua ordenação na cláusula também
sofreu mudanças de acordo com os textos diacrônicos. E, ainda, acrescenta que “a posição
pré-verbal, principalmente entre o sujeito e o verbo, ainda se mostrou disponível, embora em
menor escala, no século XIX”.
Vejamos a análise do mesmo fator nos dados do século XVI:
Tabela 5 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica
Século XVI
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
Cronol. 05 - - - - 01 - - 06
Aspectual 02 01 - - - - - - 03
Híbrido 03 01 - - 01 02 01 01 10
Total 10 02 - - 01 03 01 01 18
% 55,5 11,1 - - 5,5 16,7 5,5 5,5 100
Na análise dos dados desse fator no século XVI, encontramos na relação entre ordem e
noção semântica, maior incidência de dados na posição 1 (margem esquerda da cláusula). As
noções cronológicas e aspectual, principalmente, predominam nessa posição (1), o sentido
híbrido ocorre mais nas posições pós-verbais, como atestam os trabalhos de Freitas (2004) e
Moraes Pinto (2002) em referência a esse tipo de advérbio. Com relação ao século XVII,
temos os seguintes resultados:
Tabela 6 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica
Século XVII
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
Cronol. 10 02 02 - 01 03 - 03 21
Aspectual 01 - - - 01 - - - 02
Híbrido 07 - - - - 01 01 02 11
Total 18 02 02 - 02 04 01 05 34
% 52,9 5,9 5,9 - 5,9 11,8 2,9 14,7 100
No século XVII, observamos que as noções cronológicas e híbridas predominam na
posição 1 (margem esquerda da cláusula). O sentido aspectual é menos freqüente (com
somente 1 dado na posição 1(margem esquerda) e 1 dado na posição 5 (margem direita).
Além disso, verificamos que o tipo híbrido não foi mais recorrente nas posições pós-verbais,
como vimos no português arcaico e no século XVII, mais ainda assim, não foi uma diferença
marcante.
O baixo número de dados não nos permite fazer outras generalizações. O mesmo
acontece com as outras sincronias.
A seguir apresentamos os resultados da análise dos dados do século XVIII.
Tabela 7 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica
Século XVIII
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
Cronol. 03 - - 01 01 01 - 01 07
Aspectual 03 - - - - 01 - 01 05
Híbrido 05 01 - - - - - - 06
Total 11 01 - 01 01 02 - 02 18
É interessante observar que, no século XVIII, todas as noções apresentam-se
predominantemente na posição 1 (margem esquerda da cláusula, pré-verbal). E mesmo o
sentido híbrido é mais freqüente na posição pré-verbal.
Vejamos os resultados acerca da amostra do século XIX.
Tabela 8 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica
Século XIX
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
Cronol. 01 - - 01 - - - - 02
Aspectual 01 - - 02 02 03 - 01 09
Híbrido 04 - - - 02 02 - 02 10
Total 06 - - 03 04 05 - 03 21
% 28,6 - - 14,3 19 23,8 - 14,3 100
Sabe-se que, no século XIX, as transformações na ngua foram decisivas para a
caracterização do português moderno. Na análise dos dados desse século, verificamos que as
posições mais recorrentes são as pós-verbais. Em relação à noção semântica, observamos que
os sentidos aspectual e híbrido são mais incidentes do que o cronológico. Além disso,
identificamos que o sentido híbrido é mais recorrente nas posições pós-verbais, como foi
atestado em outros trabalhos sobre os advérbios já citados.
Tabela 9 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica
Português Atual
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
Cronol. 02 - - 01 05 02 - - 10
Aspectual 02 01 03 03 05 03 - 05 22
Híbrido 02 02 01 - 04 02 01 01 13
Total 06 03 04 04 14 07 01 06 45
% 13,3 6,7 8,9 8,9 31,1 15,6 2,2 13,3 100
Na tabela 9, verificamos uma distribuição entre a posição e a noção semântica do
advérbio de maneira mais homogênea entre os sentidos pelas posições arroladas. Observamos
também que as posições pós-verbais são mais freqüentes do que as posições pré-verbais. E
que o sentido aspectual é mais utilizado nos contextos examinados.
Como vimos, no português atual, predomínio da posição pós-verbal (mais
especificamente a posição marginal à direita). Apenas podemos concluir que, quando a noção
é basicamente aspectual, como em freqüentemente, o advérbio não tem posição predominante,
mas, quando apresenta noção dêitica (temporal) ou noção híbrida, como antigamente,
rapidamente, respectivamente, a posição típica é pós-verbal.
Notamos também que os sentidos do advérbio ligeiramente encontrados no português
arcaico desapareceram e um novo uso surgiu. Isso demonstra que houve uma mudança nos
valores desses elementos.
Assim, podemos apontar que os advérbios do presente estudo assumem valores que
podem ocorrer antes ou depois do verbo, dependendo do valor semântico que assumem. O
advérbio ligeiramente, por exemplo, pode se apresentar como advérbio de modo (com sentido
de “de maneira simples; com simplicidade”) em posição pós-verbal ou começa a ter um
sentido brido quando aparece em posição pré-verbal. Pode ser entendido tanto como “com
simplicidade; com humildade” quanto, por extensão metafórica de significado, com sentido
semelhante a “apenas; só”, como ocorre nos dias de hoje. Nos exemplos dados do português
arcaico, temos:
(22) posso dizer ligeyrame)
))
)te qual cousa dellas he merecedor de mayor cõndenpcõ
(Português arcaico, OE, p.122)
(23) E e)na segu)da coua põõe) hu)a cesta que se çarra legeyrame
)
))
)
te quando a tangem. (Português
arcaico, OE, p.194)
No primeiro exemplo, o advérbio se comporta como advérbio de modo e, no segundo,
é híbrido, ou seja, um sentido se sobrepõe ao outro, resguardando resquícios de sentidos.
5.1.4 Tipo semântico do verbo
Um dos fatores que consideramos importantes para entender a posição dos advérbios
de tempo e de aspecto em -mente é a noção semântica expressa pelo verbo, pois trabalhos
anteriores, como Scheibman (2001), Bybee (2003), Andrade (2005) e Albani (2007), que
constataram que era necessário investigar se o tipo de verbo poderia influenciar na cláusula de
alguma forma, conforme explicamos na seção 3.5. Na presente análise, consideramos esse
fator relevante para tentar identificar se houve uma motivação semântica na ordenação dos
advérbios de tempo e de aspecto em -mente. Para isso, valemo-nos da classificação proposta
por Halliday (1994), também utilizada pelos autores citados nesta seção.
Portanto, o fator tipo semântico do verbo consistiu na classificação proposta para os
verbos da cláusula foi baseada em Halliday (1994), explicitada anteriormente neste
trabalho. Eis alguns exemplos de tipos de verbos encontrados nos corpora analisados:
- Processo material
(24) E quantos mortos subitamente e s~e p~e~endença lançou e enviou a ardideza ao
inferno...(Português arcaico, OE,p. 191).
- Processo Mental
(25) E, estando elle deitado em oraçõ em aquele loguar, começou subitamente a dormir...
(Português arcaico, OE,p. 164).
- Processo Relacional Intensivo
(26) Maria é mãe eternamente presente no mundo dos homens (Português atual, TS, p.15).
- Processo Relacional Possessivo
(27) Ele tem o coração constantemente voltado para os miseráveis (Português atual, TS,
p.47).
- Processo Comportamental
(28) E diz outrosy que os b~e~es temporares que veem continuadam~ente h~u~us tempos
outros he certa demonstrãnça de maa v~etura... (Português arcaico, OE).
- Atividade Verbal
(29) e refletiu sobre aquilo que Deus continuamente nos fala
. (Português atual, TS, p.15)
- Processo Existencial
(30) e logo subitam~ete os veras inchar e esqueecer-se da subjeiçõ ....(Português arcaico,
OE,p. 289).
- Processo Meteorológico
(31) e a pompa do m~udo he fumo e v~eto que subpitamente esvace e se sume... (Português
arcaico, OE,p. 227)
Este fator foi levado em consideração para verificar se houve uma fixação de uso. Ou
ainda, se tipos de verbos em que predominância de uma dada ordem do advérbio em
detrimento de outra. Além disso, temos de levar em consideração que essa classificação
semântica verbal é bastante subjetiva, pois os verbos podem apresentar sentidos adversos aos
propostos, dependendo do contexto ou a situação em que estejam configurando. Vejamos um
exemplo dos corpora:
(32) Entõn foy arrevatado subitam~ete em spiritu e levado ante a cadeyra ah~uu juiz...
(Português arcaico, OE, p. 66).
Na exemplificação (32) dada, o verbo “arrebatar”, que significa puxar, arrancar
(Dicionário Houaiss da língua portuguesa, 2004), está sendo usado metaforicamente.
Esperávamos também que o tipo semântico do verbo influenciasse a posição do
advérbio.
Para verificarmos, estabelecermos a relação entre o fator tipo semântica do verbo e a
ordem do advérbio de tempo e aspecto. Vejamos a tabela a seguir:
Tabela 10 –Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Português Arcaico
Tipo de
verbo/Ordem
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
01 - 01 01 02 02 - - 07
Existencial
- - 01 01 01 - 02 05
Material
04 01 03 01 06 02 - 01 18
Mental
- 01 01 - - 01 - 01 04
Relac. Intensivo
02 - - - 01 - - 01 04
Meteorológico
01 - - - - - - 01
Atividade Verbal
01 - - - - 03 - 01 05
Total
09 02 06 02 10 09 - 06 44
% 20,5 4,5 13,6 4,5 24,9 22,7 - 13,6 100
No português arcaico, observamos que o tipo de verbo mais recorrente é de valor
material em detrimentos dos demais valores. Quanto à relação posição e sentido do verbo, o
tipo material ocorre nas posições 1 e 5, que o as posições margens esquerda e direita
respectivamente. Os verbos comportamentais tendem a ocorrer nas posições 5 e 6 e os verbos
de atividade verbal tendem a ocorrer na posição 6. Além disso, verificamos que, em relação à
distribuição geral dos dados nesta sincronia, ela se dá de forma equilibrada. Na última linha
da tabela (total de dados de cada ordenação), constatamos que as posições marginais 1 e
5(esquerda e direita) são mais freqüentes, apesar de haver uma relativa distribuição dos dados
nas demais ordenações.
Além disso, nesta sincronia não houve ocorrência de verbo relacional possessivo.
Agora, vejamos a análise dos dados do século XVI.
Tabela 11 – Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em-
mente do século XVI
Tipo de
verbo/Ordem
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
01 - - - - - - - 01
Material
03 01 - - - - - - 04
Mental
02 - - - - - - 01 04
Relac. Possessivo
01 01 - - - 01 01 - 04
Relac. Intensivo
02 - - - 01 02 - - 05
Atividade Verbal
01 - - - - - - - 01
Total
10 02 - - 01 03 01 01 18
% 55,5 11,1 - - 5,5 16,6 5,5 5,5 100
Nos dados apresentados do século XVI, verificamos que os tipos mais freqüentes são
verbos materiais, mentais e relacionais possessivos. No total de 18 dados, encontramos 4
dados de cada tipo. Quando o verbo tem sentido material ou mental, a tendência é o advérbio
ocorrer na margem esquerda (POS1). Quando o verbo é relacional possessivo não posição
prototípica para o advérbio.
Em relação aos demais sentidos dos verbos, uma distribuição de dados equilibrada,
apenas podemos ressaltar que, verificando a última linha da tabela, a posição 1 (margem
esquerda) é a preferida, independente do tipo semântico do verbo.
Neste século, não houve ocorrências dos tipos de verbos existenciais e meteorológicos.
Vejamos os dados analisados na tabela a seguir.
Tabela 12 - Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em -mente
Século XVII
Tipo de
verbo/Ordem
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
- - - - - 02 - 01 03
Existencial
04 - - - 01 - 02 07
Material
04 02 01 - 01 01 01 - 10
Mental
01 - 01 - - - - - 02
Relac. Possessivo
02 - - - - - - 02
Relac. Intensivo
03 - - - - - 01 04
Atividade
Verbal
04 - - 01 - - 01 06
Total
18 02 02 - 02 04 01 05 34
% 52,9 5,8 5,8 - 5,8 11,8 2,9 14,7 100
Já nos dados do século XVII, observamos que não há uma predileção pelo tipo
material, como vimos nos dados do português arcaico e do século XVI, mas, em relação à
posição e o tipo semântico do verbo em geral, todos são mais recorrentes na posição 1
(margem esquerda), 18 dados de 34, e há uma relativa distribuição nas demais posições, o que
não difere dos séculos anteriores apresentados.
Neste século não houve ocorrência do tipo de verbo meteorológico, por isso não foi
apresentado na tabela.
A seguir, temos os dados analisados do século XVIII.
Tabela 13 – Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em -mente
Século XVIII
Tipo de
verbo/Ordem
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
03 - - 01 01 - - 05
Material
05 - - - 01 01 - 01 08
Mental
02 01 - - - - - 01 04
Relac. Possessivo
- - - - - - - - -
Relac. Intensivo
01 - - - - - - - 01
Total
11 01 - 01 01 02 - 02 18
% 61,1 5,5 - 5,5 5,5 11,1
-
11,1 100
Os dados analisados do século XVIII demonstram que o tipo de verbo material é o
mais freqüente, seguido do tipo comportamental (cada qual com 8 e 5 dados respectivamente).
Independentemente do tipo semântico, o advérbio tende a ocorrer na posição marginal à
esquerda (POS1).
Neste culo não houve ocorrências dos tipos de verbos: existencial, meteorológico e
atividade verbal, por isso não foram listados na tabela.
Vejamos os dados na tabela a seguir.
Tabela 14 - Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em -mente
Século XIX
Tipo de
verbo/Ordem
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
- - - - - - - 01 01
Material
03 - - 02 02 03 - - 10
Mental
- - - - - 01 - 01 02
Relac. Possessivo
02 - - - - 01 - - 03
Relac. Intensivo
01 - - 01 - - - - 02
Atividade
Verbal
- - - - 02 - - 01 03
Total
06 - - 03 04 05 - 03 21
%
28,6 - - 14,3 19,04
23,8 - 14,3 100
No século XIX, constatamos que o tipo de verbo material é o mais freqüente, como
maioria das sincronias. Quanto à relação entre posição e tipo de verbo, observamos que
uma distribuição mais homogênea. Quando o verbo é material, o advérbio em -mente ocorre
mais na posição 1 (3 dados em 10) ou na posição 6 (também 3 dados em 10). Os demais tipos
tiveram poucos dados. Verificamos, também, que os advérbios tendem a ocorrer mais nas
posições pós-verbais (Posições 5, 6, e 8).
Além disso, podemos confirmar na última linha da tabela que os números percentuais
incidem mais nessas posições: POS 5 (19,4%); POS 6 (23,8%); POS 8 (14,3%).
Na análise deste culo também não foram encontrados dados dos tipos de verbos
existenciais e meteorológicos, por isso este não foi listado na tabela.
A seguir, vejamos os dados analisados do português atual.
Tabela 15 – Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em -
mente do Português Atual
Tipo de
verbo/Oração
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
01 - - 01 - 01 - - 03
Existencial
- - - - 03 - - 03
Material
03 01 - 02 03 02 - 02 13
Mental
- - - - 01 - 01 02
Relac. Possessivo
- - 01 - 02 01 - - 04
Relac. Intensivo
02 - 03 - - - - 02 07
Meteorológico
- - - - - - 01 - 01
Atividade
Verbal
- 02 - 01 05 03 - 01 12
Total
06 03 04 04 14 07 01 06 45
% 13,3 6,7 8,9 8,9 31,1 15,6 2,2 13,3 100
De acordo com a tabela 15, verificamos que o tipo de verbo mais freqüente é o verbo
de processo material, seguido dos de atividade verbal. Em relação ao tipo de verbo e a posição
do advérbio, vemos que, quando o verbo é material, o advérbio tende a ocorrer nas posições 1
e 5; quando é de atividade verbal, tende a ocorrer na posição 5.
Nos resultados apresentados, uma tendência para os advérbios em -mente
aparecerem numa posição pré-verbal (no português arcaico, século XVI, XVII e XVII)
principalmente quando o verbo é de processo material, assim com os demais tipos de verbos.
Mas em relação à análise dos dados do século XIX e português atual, verificamos que há uma
predileção às posições pós-verbais. Esse resultado indica mudança na posição do advérbio ao
longo da história do português, o que vai ao encontro de outras pesquisas, como as de
Martelotta (2006) e Albani (2007), que demonstraram que os advérbios m mudando para a
posição pós-verbal, de um modo geral.
5.1.5 Tipo de sujeito
A forma de realização do sujeito da oração, um critério de natureza sintática, é um
fator considerado na presente análise do advérbio de tempo e aspecto em -mente.
Em um trabalho feito sobre a forma de realização do sujeito pronominal, Duarte
(1993) observou que o português do Brasil apresentava índices de preenchimento de sujeito
bastante superiores aos apresentados pelas línguas românicas de sujeito nulo, como o
espanhol, o italiano e a variedade européia do português. A partir desse trabalho, intuímos que
em todos os contextos em que a posição do sujeito está vazia seja pela não realização, a
posposição ou deslocamento do sujeito para a margem direita da oração favoreceria a
ocorrência dos advérbios na margem esquerda da cláusula. De certa forma, a relação entre a
posição do advérbio e a forma de realização do sujeito da cláusula é demonstrada nas
subposições do item I desse capítulo, onde são analisadas as diversas possibilidades
estruturais decorrentes das posições em que os advérbios de tempo e de aspecto ocupam na
oração.
Essa possibilidade fora levantada em pesquisas como os de Kato e Nascimento
(2002:195), que mostraram que “se o sujeito é nulo, o preenchedor pode ser predito como um
adjunto”. Rocha (2001:113) também concorda com essa posição, pois afirma que “a ausência
de argumento concorre para propiciar a presença de preenchedores”. Haveria uma espécie de
equilíbrio sintático.
Porém, os trabalhos recentes apresentam evidências contrárias a essa postura. Duarte
(2003:121), em um estudo que compara amostras da fala carioca dos anos 80 e dos anos 90,
atesta que a ocorrência “de elementos adjuntos ao sujeito, sejam eles resultados de
topicalizações sejam eles adjuntos adverbiais, favorece a expressão plena do sujeito
pronominal”.
Para verificar de que forma se a relação entre a realização do sujeito e a ordem dos
advérbios de tempo e de aspecto em -mente foi feito um controle das possibilidades
exemplificadas a seguir:
a) Sujeito expresso anteposto ao verbo
(80) Lêde o Testamento Velho, e achareis que Deus antigamente afogava exércitos,
queimava cidades, alagava mundos, despovoava paraísos (Século XVII, sermão do Pe.A.
Vieira).
b) Sujeito expresso posposto ao verbo
(81) Comeu Eva o pomo da ciência, e queixava-me eu antigamente desta nossa Mãe; que
comeu o pomo, por que Ihe não guardou as pevides?(Século XVII, sermão do Pe.A. Vieira).
c) Sujeito ausente
(82) abramos os olhos à luz, para que alumie nossos corações; abramos os corações à luz, para
que more perpètuamente neles (Século XVII, sermão do Pe.A. Vieira).
d) Sujeito pronominal (que/quem).
(83) Capitulo como elrey combateo a cidade de Rachol. Estando elrey, como dito he,
combatemdo a cidade de Rachol, lhe veyo novas certas como ydalca~o hera chegado ao ryo
da bamda do norte, e que ally asentava seu arayall; mamdou elrey os espias que sempre
amdassem sobre elle, que vissem ho que fazia, e asym lhe desem o aviso de tudo ho que fazia;
com esta nova ouve no arayal allgu~u allvoroço, primcipalmente na gente baixa, a quem
numca fallta sospeitas, e aymda em sy tinha~o o medo que antigamente tinha~o aos mouros.
(Século XVI, Crônica dos Reis de Bisnaga)
Vejamos como ficou a distribuição do fator tipo de sujeito com a ordem do advérbio -
mente nas sincronias estudadas. As conclusões a respeito da hipótese serão dadas após os
resultados da última sincronia estudada, ao final desta seção.
Tabela 16 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio
Português Arcaico
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
05 - 05 01 06 06 - 06 29
Sujeito presente
antes do verbo
01 02 - 01 03 02 - - 09
Sujeito presente
depois do verbo
- - 01 01 01 - - 03
Sujeito pronome
relativo
03 - - - - - - - 03
Total
09 02 06 02 10 09 - 06 44
% 20,5 4,5 13,6 4,5 22,7 20,5 - 13,6 100
Nos dados do português arcaico, observamos que, quando o sujeito está ausente, o
advérbio tende a vir nas posições 5 (final da oração) e 6 (posição pré-verbal não marginal),
cada qual com 6 dados, no total de 29. Quando o sujeito está presente anteposto ao verbo, o
advérbio tende a ocorrer na posição 5 (final da oração). Ocorre apenas neste último caso uma
espécie de equilíbrio sintático.
Vejamos os dados a seguir do século XVI.
Tabela 17 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio
Século XVI
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
06 - - - - - 01 01 08
Sujeito presente
antes do verbo
03 02 - - 01 01 - - 07
Sujeito presente
depois do verbo
- - - - - 02 - - 02
Sujeito
pronome
relativo
01 - - - - - - - 01
Total
10 02 - - 01 03 01 01 18
%
52,9 11,5 - - 5,5 16,6 5,5 5,5 100
Nos dados do século XVI, quando o sujeito está ausente, o advérbio tende a vir na
posição 1(margem esquerda), o que é esperado para haver equilíbrio sintático. Quando o
sujeito está presente anteposto ao verbo, o advérbio tende a ocorrer também na posição 1
(margem esquerda), não confirmando a hipótese. Além disso, quando o sujeito está posposto,
o advérbio aparece em posição pós-verbal (a posição 6 é uma posição pós-verbal), o que
também não comprova a hipótese de equilíbrio sintático.
A seguir, vejamos os dados do século XVII.
Tabela 18 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio
Século XVII
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
09 01 02 - 01 02 01 04 20
Sujeito presente
antes do verbo
08 01 - - 01 01 - - 11
Sujeito presente
depois do verbo
01 - - - - 01 - 01 03
Sujeito
pronome
relativo
- - - - - - - - -
Total
18 02 02 - 02 04 01 05 34
% 52,9 5,8 5,8 - 5,8 11,7 2,9 14,7 100
Nos dados do século XVII, observamos que, quando o sujeito está ausente, o advérbio
tende a vir nas posições 1, havendo então preenchimento da posição pré-verbal. No entanto,
quando o sujeito está presente anteposto ao verbo, tende a ocorrer na posição 1 (margem
esquerda).
Vejamos os dados a seguir do século XVIII
Tabela 19 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Século XVIII
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
06 - - 01 - 01 - 01 09
Sujeito presente
antes do verbo
02 01 - - 01 01 - 01 06
Sujeito presente
depois do verbo
01 - - - - - - - 01
Sujeito pronome
relativo
02 - - - - - - - 02
Total
11 01 - 01 01 02 - 02 18
% 61,1 5,5 - 5,5 5,5 11,1 - 11,1 100
Na análise dos dados do século XVIII, verificamos que, quando o sujeito está ausente,
o advérbio tende a vir na posição 1(margem esquerda), 6 dados, ou seja, houve o
preenchimento da posição do sujeito pelo advérbio. Quando o sujeito está presente anteposto
ao verbo, o advérbio tende a ocorrer na posição 1 (margem esquerda), mas o número de dados
é extremamente baixo em qualquer posição
Vejamos os dados a seguir do século XIX.
Tabela 20 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio
Século XIX
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
05 - - 01 02 05 - 03 16
Sujeito presente
antes do verbo
01 - - 02 - - - - 03
Sujeito presente
depois do verbo
- - - - 01 - - - 01
Sujeito pronome
relativo
- - - - 01 - - - 01
Total
06 - - 03 04 05 - 03 21
% 28,6 - - 14,2 19,0
4
23,8 - 14,2 100
Nos dados analisados do século XIX, verificamos que, quando o sujeito está ausente, o
advérbio tende a vir nas posições 1 e 6 (cada qual com 5). A hipótese do equilíbrio sintático se
confirma no primeiro caso, pois, quando o sujeito estava ausente, houve maior incidência de
advérbio na margem esquerda (ou seja, posição pré-verbal). Mas a ocorrência relativamente
alta de dados na posição 6 (entre o verbo e o complemento) demonstra que a hipótese não foi
contemplada. (Os demais tipos tiveram baixíssima ocorrência.). Observamos que
independente do sujeito estar ausente ou presente uma tendência a ocorrerem nas posições
pós-verbais (posições 5, 6 e 8).
Vejamos os dados a seguir do português atual.
Tabela 21 - Relação entre o tipo de sujeito e a ordem do advérbio
Português Atual
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
02 01 01 04 07 04 01 02 22
Sujeito presente
antes do verbo
04 01 03 - 04 02 - 04 18
Sujeito presente
depois do verbo
- - - - 01 01 - - 02
Sujeito
pronome
relativo
- 01 - - 02 - - - 03
Total
06 03 04 04 14 07 01 06 45
% 13,3 6,6 8,8 8,8 31,3 15,5 2,2 13,3 100
Nos dados do português atual, verificamos, quando o sujeito está ausente, o advérbio
tende a ocorrer nas posições 5 (final da oração) e 6 (entre o verbo e o complemento). Esse
resultado indica que não tendência ao preenchimento da posição vazia. Quando o sujeito
está presente anteposto ao verbo, o advérbio aparece nas posições 1 (margem esquerda) e 5
(final da oração), o que demonstra que a hipótese do equilíbrio sintático não pôde ser
comprovada, pois ora preenchimento, ora não preenchimento da posição à esquerda do
verbo (com o sujeito à direita).
Nas tabelas apresentadas, se tomarmos as posições pré-verbais de um modo geral, em
oposição às pós-verbais, podemos observar que a ausência de sujeito nas posições pré-verbais
não leva o advérbio a se antepor ao verbo. Nos casos de sujeito ausente, por exemplo, temos
mais advérbios pós-verbais do que pré-verbais. Por outro lado, os casos em que o sujeito está
posposto apresentam mais dados com advérbio pós-verbal do que pré-verbal. Parece não
haver, portanto, nos casos dos advérbios em -mente, algum tipo de compensação ou equilíbrio
no posicionamento dos elementos na estrutura da cláusula.
Se observarmos separadamente a posição 1, ou seja, a que corresponde à margem
esquerda da cláusula e que, por hipótese, seria a que mais atrairia o advérbio, notamos que
isso também não ocorre. De fato, há uma quantidade maior de casos nessa posição.
Entretanto, se observarmos todas as ocorrências pré-verbais, notamos que a margem esquerda,
independentemente da presença ou não do sujeito, é a posição preferencial dos advérbios pré-
verbais.
Em função desses resultados, concluímos que não uma relação mais significativa
entre presença/ ausência de sujeito em posição pré-verbal (marginal ou o) e colocação dos
advérbios aqui estudados. Esse mesmo resultado foi obtido em Martelotta (2006) para os
advérbios qualitativos e em Marques (2008), que estudou a ordenação sujeito/ verbo. Assim
nossos resultados são contrários à hipótese de que adjuntos (pelo menos do tipo que estamos
estudando) são colocados na posição do sujeito vazio.
5.1.6 Tipo de oração
As tabelas abaixo apresentam a distribuição das ocorrências dos advérbios de tempo e
aspecto em -mente pelas diferentes posições observadas, sempre levando em conta o grau de
gramaticalização das cláusulas que contêm essas ocorrências. Essa análise foi feita de acordo
com a metodologia e hipóteses apresentadas nos trabalhos de Martelotta (2006). Sua hipótese
principal, exposta nesta tese no capítulo 1, é a de que as orações mais gramaticalizadas seriam
as mais propícias aos usos mais conservadores dos advérbios.
Tabela 22 - Ocorrência de advérbios no Português Arcaico
Na análise dos dados do Português Arcaico, observamos que um número
significativo de ocorrências de advérbios de tempo e aspecto em -mente em posição pré-
verbal, mostrando que essa posição, assim como a pós-verbal, estava disponível para este tipo
de advérbio na fase arcaica de nossa língua.
É possível observar algumas regularidades interessantes, sobretudo quando se
comparam esses resultados com outras pesquisas referentes à ordenação de outros tipos de
PORT.
ARCAICO
-gramatical.
+Gramatical.
- Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação
Subord. Rel
- NR NR R NR NR
Total
POS1
06 - - - - 03 09
POS 2
02 - - - - - 02
POS 3
02 01 - - 01 01 06
POS 4
- - - - - 02 02
POS 5
07 01 - - 01 01 10
POS 6
06 - - - 01 02 09
POS 7
- - - - - - -
POS 8
03 01 01 - - 01 06
Total
27 03 01 - 03 08 44
advérbios, feitas com base em outros corpora. Pesquisas elaboradas em Martelotta, (2004;
2006) e Martelotta e Vlček (2006) sobre os advérbios qualitativos bem e mal, assim como os
terminados em -mente demonstraram que as posições pré-verbais tipicamente latinas
(Martelotta, Processy e Santos: 2008), hoje praticamente inexistentes no caso desses
advérbios, ainda ocorriam até o século XIX, sobretudo em cláusulas com alto nível de
gramaticalização. Isso ocorre porque essas cláusulas, segundo Givón (1979), o mais
conservadoras em termos de estrutura sintática, sobretudo no que se refere à ordenação de
seus constituintes.
Os resultados da tabela acima não refletem o que ocorreu com os qualitativos: uma
predominância não muito acentuada das posições pós-verbais, mesmo em cláusulas mais
gramaticalizadas.
Temos a seguir dois exemplos que ilustram os tipos de cláusulas em que ocorre o tipo de
advérbio estudado:
(84) E esta sandia subitam~ete foy cega, mas Ella nõ sabia que era cega(OE,p.57)
(85) e a pompa do m~udo he fumo e v~eto que subpitamente esvaece e se sume...(OE, p
227)
No primeiro exemplo, temos uma ocorrência em que o advérbio está inserido numa
cláusula paratática; no segundo exemplo, o advérbio está num contexto de uma cláusula
subordinada adjetiva restritiva.
Análise dos dados referentes ao Século XVI
Na análise dos dados do século XVI, não temos o mesmo número de dados que foi
observado no português arcaico. Por isso, priorizamos uma análise mais qualitativa,
observando as tendências de ordenação em face às outras sincronias estudadas.
Tabela 23 - Ocorrência de advérbios no Século XVI
Apesar da baixa ocorrência de dados nesta fase, de um modo geral, a análise
qualitativa apresentou resultados favoráveis às nossas hipóteses. A posição pré-verbal, por
exemplo, estava presente nesta fase do português em escala menor que a posição pós-verbal.
Também foi possível observar que as orações mais gramaticalizadas elegem a
ordenação pré-verbal, 11 ocorrências distribuídas pelas posições pré-verbais (Pos 1, 2 e 3).
SÉC.XVI
-gramatical.
+Gramatical.
Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação
Subord. Rel
NR NR R NR NR
Total
POS1
01 01 01 - 01 06 10
POS 2
- - - - 01 01 02
POS 3
- - - - - - -
POS 4
- - - - - -
POS 5
01 - - - - - 01
POS 6
01 - - - 01 01 03
POS 7
01 - - - - - 01
POS 8
- - - - - 01 01
Total
04 01 01 - 03 13 18
Tal observação contribui para confirmar a hipótese que adotamos com Givón (1979) de que
esses tipos cláusulas (mais gramaticalizadas) tendem a ser sintaticamente mais conservadoras,
principalmente, no que diz respeito à ordenação dos constituintes da oração.
Ilustrando a ocorrência de cláusulas mais gramaticalizadas nesta sincronia, temos o
caso do exemplo (85), a seguir:
(85) O que ha da bamda d este rio. Esta hu~a cidade edificada que chama~o Senagumdym,
que dizem que antigamente foy cabeça do reyno, e agora vive nella pouca gente (Século
XVI, Crônica dos Reis de Bisnaga)
Outra ressalva interessante é que, ao analisarmos o português arcaico, apresentado
anteriormente, a hipótese de Givón (1979) não foi de todo confirmada, apesar de
encontrarmos uma leve tendência das posições pré-verbais em cláusulas mais
gramaticalizadas. Por outro lado, na análise do século XVI essa hipótese se confirma quando
se relacionam as posições dos advérbios com o grau de gramaticalização da cláusula em que
ele ocorre, segundo a qual a anteposição do advérbio em relação ao verbo, característica do
latim, se mantém em cláusulas com graus mais altos de gramaticalização, que são mais
conservadoras em termos de ordenação.
Pode-se concluir que essa diferença entre as ocorrências do português arcaico e as do
séc.XVI se simplesmente pelo fato de que existem mais cláusulas com altos níveis de
gramaticalização nos textos desse século do que a do outro e que, somente por isso, os
números referentes aos advérbios pré-verbais são mais altos nessas cláusulas.
Análise dos dados referentes ao Século XVII
O número de dados encontrados nos corpora deste século foi de 34 dados, um pouco a
mais do que o século XVI.
Tabela 24 - Ocorrência de advérbios no Século XVII
Podemos observar, na tabela 26, que o advérbio de tempo e aspecto em -mente, maior
incidência na posição pré-verbal, porém como cláusulas menos encaixadas.
SÉC.XVII
-gramatical.
+Gramatical.
- Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação
Subord. Rel
- NR NR R NR NR
Total
POS1
14 02 - - 02 - 18
POS 2
01 - - - 01 - 02
POS 3
- 01 - - 01 02
POS 4
- - - - -
POS 5
02 - - - 02
POS 6
03 - - - 01 04
POS 7
- - - - 01 01
POS 8
03 - - - 01 01 05
Total
23 03 - - 05 03 34
Análise dos dados do Século XVIII
Cabe registrar logo de início a quantidade extremamente pequena de dados de
ocorrências dos advérbios em estudo nesta época. Isso, obviamente, impede qualquer
conclusão mais precisa em relação as suas tendências de ordenação nos corpora analisados no
século XVIII. Entretanto, é possível observar e fazer algumas ponderações em relação aos
resultados encontrados nesse século.
Vejamos a tabela a seguir:
Tabela 25 - Ocorrência de advérbios no Século XVIII
É interessante ressaltar que novamente a nossa hipótese inicial também foi confirmada
de que as orações mais gramaticalizadas elegem a ordenação pré-verbal, 8 ocorrências contra
uma única ocorrência na posição pós-verbal.
SÉC.XVIII
-gramatical.
+Gramatical.
- Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação
Subord. Rel
- NR NR R NR NR
Total
POS1
05 - 03 - 01 02 11
POS 2
- - - - - 01 01
POS 3
- - - - - - -
POS 4
01 - - - - - 01
POS 5
- - - - 01 - 01
POS 6
02 - - - - - 02
POS 7
- - - - - -
POS 8
02 - - - - - 02
Total
10 - 03 - 02 03 18
Por outro lado, 5 ocorrências pré-verbais em cláusulas menos gramaticalizadas em
oposição 4 dados na posição pós-verbal, também em cláusulas menos gramaticalizadas.
Isso é importante, porque pode apontar para o fato de que, até o século XVIII, era mais forte a
inclinação que os advérbios qualitativos apresentavam de ocorrer antes do verbo, o mesmo
acontecendo para os de tempo e de aspecto, reforçando os resultados obtidos em Martelotta e
Vlček (2006), segundo os quais essa tendência começa a enfraquecer no início do século XIX
e acaba por desaparecer na virada para o século XX, os quais mostraremos mais adiante.
Análise dos dados referentes ao século XIX
As ocorrências de advérbios de tempo e aspecto em -mente no século XIX, relacionadas
às variáveis posição na oração e grau de gramaticalização da cláusula, podem ser vistas na
tabela abaixo:
Tabela 26 - Ocorrência de advérbios no Século XIX
No caso do século XIX, há uma quantidade maior de ocorrências de advérbios de tempo
e de aspecto em -mente, embora essas 21 ocorrências estejam longe de constituir a quantidade
necessária para se chegar a constatações mais precisas. Como foi mencionado na análise dos
dados do século XVIII, acredita-se ser possível, apesar do poucos dados, observar
regularidades interessantes, que se tornam significativas, quando comparadas com tendências
detectadas em outras pesquisas referentes à ordenação de outros advérbios, feitas com base
em outros corpora e em outros estágios da história do português.
Assim como aconteceu com o século XVIII, era de se esperar que o século XIX
apresentasse uma relativa predominância das posições pós-verbais. Isso de fato ocorreu: a
tabela apresenta 12 ocorrências nessa posição, total de 21 advérbios. Esses dados refletem a
tendência, mencionada anteriormente, que vem relativamente se delineando desde século
SÉC.XIX
-gramatical.
+Gramatical.
- Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação
Subord. Rel
- NR NR R NR NR
Total
POS1
03 - 02 - 01 - 06
POS 2
- - - - - - -
POS 3
- - - - - - -
POS 4
02 - - - 01 - 03
POS 5
02 - 01 - 01 - 04
POS 6
04 - - 01 - - 05
POS 7
- - - - - -
POS 8
02 01 - - - - 03
Total
13 01 03 01 03 - 21
XVI, uma vez que na fase arcaica do português com esse tipo de advérbio a hipótese não se
confirmou, ou como nos trabalhos de Moraes Pinto, 2002; Martelotta, 2004, a confirmação
dessas tendências foi constatada.
Outro resultado interessante se apresenta quando se relacionam as posições dos
advérbios com o grau de gramaticalização da cláusula em que ele ocorre. Do total de 9 casos
de advérbios pré-verbais, 4 correram em cláusulas mais gramaticalizadas (hipotáticas e
subordinadas). Cabe ressaltar aqui que a diferença entre as ocorrências em cláusulas menos
gramaticalizadas é bastante pequena: 6 dados nas posições (1, 2, 3 e 4) pré-verbais.
Tabela 27 - Ocorrência de advérbios no Português Atual
No português atual, a ocorrência dos dados demonstrou uma propensão, que se
manifesta quase categoricamente, de que esses advérbios ocorressem após o verbo, 28 dados,
SÉC.XIX
-gramatical. +Gramatical.
- Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação Subord. Rel
- NR NR R NR NR
Total
POS1
05 - - 01 - - 06
POS 2
01 - - - - 02 03
POS 3
01 - - 02 01 - 04
POS 4
04 - - - - - 04
POS 5
02 01 - 01 02 02 14
POS 6
03 01 - 02 01 - 07
POS 7
01 - - - - - 01
POS 8
05 01 - - - - 06
Total
28 03 - 06 04 04 45
sendo que 17 em cláusulas menos gramaticalizadas pós-verbais e 10 dados em cláusulas mais
gramaticalizadas. Cabe ressaltar que novamente obtivemos resultados atípicos aos esperados
segundo a hipótese proposta em relação à posição e o grau de gramaticalização das cláusulas.
O quadro a seguir apresenta uma síntese do que já foi exposto.
Nessa sincronia, novamente obtivemos resultados contrários aos esperados segundo a
hipótese proposta em relação à posição e o grau de gramaticalização das cláusulas.
Mas, ressaltamos que os resultados encontrados são significativos, pois alguns apontam
para outras possíveis tendências diferentes dos trabalhos realizados sobre o fenômeno em
questão.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta pesquisa teve como objetivo observar as diferentes posições que os advérbios de
tempo e aspecto em -mente tendem a assumir em diferentes momentos na história da língua
portuguesa, a fim de verificarmos se houve mudança na ordenação desses elementos. Para
isso, coletamos dados de textos do português das seguintes fases históricas: arcaica, dos
séculos XVI, VXII, XVIII e XIX e português atual.
Este estudo, além de testar novas hipóteses, vem integrar e ampliar uma série de
pesquisas que visam examinar, de modo mais geral, o processo de mudança de colocação dos
advérbios no decorrer do tempo (Moraes Pinto, 2002; Martelotta, Barbosa & Leitão, 2002;
Martelotta, 2004 e 2006; Martelotta & Processy, 2006; Andrade, 2005; Albani 2007; Freitas,
2004).
Foram muito poucos os dados encontrados nos corpora analisados, em função de que,
de um modo geral, advérbios de tempo e aspecto em -mente são, de fato, pouco usados no
discurso escrito assim como no falado. Sendo assim, em muitos momentos da pesquisa, foi
difícil chegar a conclusões a respeito dos resultados estatísticos. Entretanto, foi possível
observar, entre esses poucos dados, algumas regularidades interessantes, sobretudo quando
essas regularidades foram localizadas dentro de um processo de mudança mais geral,
observado em outras pesquisas referentes à ordenação de outros tipos de advérbios feitas com
base em outros corpora e em diferentes momentos da história da língua portuguesa..
Partimos do pressuposto de que ocorreram mudanças na posição dos advérbios ao
compararmos a sincronia do português arcaico com o atual. De acordo com trabalhos
anteriores, como os de Martelotta e Leitão (1999) e de Martelotta, Barbosa e Leitão (2001), a
posição pré-verbal (entre o sujeito e o verbo) era disponível para toda espécie de advérbio e,
hoje, ela ainda está disponível para alguns. Portanto, houve uma mudança no padrão de
ordenação de alguns advérbios.
Observamos que não houve diferença significativa, ao compararmos as duas posições,
a pré-verbal e a pós-verbal, quando levamos em consideração todos os dados, ou seja, quando
não separamos as sincronias, pois os dados se distribuíram homogeneamente entre essas
posições gerais.
Porém, ao olharmos a distribuição dos advérbios analisados pelas posições já arroladas
anteriormente nas sincronias estudadas, constatamos que a POS1 (margem esquerda) foi a
mais recorrente, ou seja, os advérbios de tempo e de aspecto em -mente por expressarem tais
circunstâncias preferiram as posições periféricas da cláusula, sobretudo à margem esquerda
(POS1), e pouco se realizaram nas posições mais internas à sentença, posições essas que
rompem com a estrutura padrão da cláusula. Shaer (2004), ao tratar especificamente da
ordenação dos circunstanciais temporais, relata que não é fácil determinar de forma precisa as
diferenças entre os temporais na margem esquerda ou na margem direita da sentença, ainda
que seja possível determinar distinções funcionais entre eles: a margem esquerda constitui um
ponto de ancoragem, um elo entre a parte do discurso em que se encontra o advérbio e um
ponto do discurso anteriormente mencionado, numa relação nitidamente anafórica, de
conexão discursiva. Além disso, pudemos observar, também, que, no português arcaico, as
posições típicas são posição 5 (pós-verbal, mais precisamente margem direita no fim da
oração), posição 6 (entre o verbo e o complemento) e posição 8 (pós-verbal fora do fim), mas
os dados tiveram uma boa distribuição em todas as posições, exceto a posição 7. Ou seja, no
português arcaico havia uma ordenação mais livre.
nas outras fases do português, entre o português do XVI e o português do século
XIX, o uso predominante foi a posição 1 (margem esquerda). No século XVI, ainda houve
outras posições com número razoável de dados, que foram as posições 6 (inserido entre o
verbo e o complemento/predicativo) e 5 (margem direita da oração). Depois, como dissemos,
é a posição marginal à esquerda a preferida pelos autores. Mas, no século XIX, já houve uma
diferença importante: começou a aumentar o uso de uma posição pós-verbal, que foi a posição
6. Já no Português atual, verificamos que houve uma distribuição de dados em todas as
posições, mas houve o predomínio da posição 5, ou seja, uma posição pós-verbal.
Nossa análise permite-nos dizer que, nas amostras estudadas (referentes somente ao
português escrito), o advérbio em -mente de tempo e de aspecto passou de um uso
relativamente livre para um uso mais fixo na posição marginal à esquerda e depois no
português atual passou a ser usado predominantemente na posição pós-verbal (mais
especificamente na posição marginal à direita). Trabalhos como os de Martelotta (2006) e
Albani (2007) também apontam pra o uso predominante da posição pós-verbal para os
advérbios ao longo da história do português.
Outro fator analisado foi a noção semântica do advérbio em que checamos a relação
entre ordenação e tipo semântico. No português arcaico observamos a predominância da
tendência pré-verbal, exceto os advérbios com os sentidos híbridos que expressam em si
mesmos os valores de tempo/aspecto e modo. É exatamente o fato de apresentar esse valor
polissêmico denominado de híbrido na presente pesquisa que explica o desvio que este
advérbio apresenta com relação à tendência da posição pré-verbal.
Outra questão a ser considerada nesta sincronia é que as noções cronológicas e
aspectual não são predominantes em relação às demais. Entretanto, identificamos que a noção
híbrida é mais freqüente, quanto à sua ordenação, eles ocorrem mais na posição 5 (margem
direita da cláusula), que é uma posição pós-verbal.
Na análise dos dados desse fator no século XVI, encontramos na relação entre ordem e
noção semântica, maior incidência de dados na posição 1 (margem esquerda da cláusula). As
noções cronológicas e aspectual, principalmente, predominam nessa posição (1), o sentido
híbrido ocorre mais nas posições pós-verbais, como atestam os trabalhos de Freitas (2004) e
Moraes Pinto (2002) em relação a esse tipo de advérbio.
no século XVII, observamos que as noções cronológicas e bridas predominam na
posição 1 (margem esquerda da cláusula). O sentido aspectual é menos freqüente (com
somente 1 dado na posição 1 (margem esquerda) e 1 dado na posição 5 (margem direita).
Além disso, verificamos que o tipo híbrido não foi mais recorrente nas posições pós-verbais,
como vimos no português arcaico e no século XVII, mais ainda assim, não foi uma diferença
marcante.
O baixo número de dados não nos permite fazer outras generalizações. O mesmo
aconteceu com as outras sincronias.
Em relação à análise dos dados do século XVIII, todas as noções apresentam-se
predominantemente na posição 1 (margem esquerda da cláusula, pré-verbal). E mesmo o
sentido híbrido é mais freqüente na posição pré-verbal.
Na análise dos dados do século XIX, verificamos que as posições mais recorrentes são
as pós-verbais. Em relação à noção semântica do advérbio, observamos que os sentidos
aspectual e híbrido são mais incidentes do que o cronológico. Além disso, identificamos que o
sentido híbrido é mais recorrente nas posições pós-verbais, como foi atestado em outros
trabalhos sobre os advérbios já citados ao longo desse estudo.
No português atual, verificamos uma distribuição entre a posição e a noção semântica
do advérbio de maneira mais homogênea entre os sentidos pelas posições arroladas.
Observamos também que as posições pós-verbais são mais freqüentes do que as posições pré-
verbais. E que o sentido aspectual é mais utilizado nos contextos examinados.
Como vimos, no português atual, predomínio da posição pós-verbal (mais
especificamente a posição marginal à direita). Apenas podemos concluir que, quando a noção
é basicamente aspectual, como em freqüentemente, o advérbio não tem posição predominante,
mas, quando apresenta noção dêitica (temporal) ou noção híbrida, como antigamente,
rapidamente, respectivamente, a posição típica é pós-verbal.
Outra perspectiva da presente pesquisa foi a observação da relação entre a forma de
realização do sujeito da oração, um critério de natureza sintática, e a posição do advérbio.
Para verificar essa relação, fizemos um controle dos seguintes tipos de sujeito: sujeito
expresso anteposto ao verbo; sujeito expresso posposto ao verbo; sujeito ausente e sujeito
pronominal (que/quem). Nessa perspectiva, pressupomos que a presença ou ausência do
sujeito influenciaria a colocação do advérbio de acordo com a noção semântica que o mesmo
venha expressar e, ainda, de acordo com a intencionalidade do escritor em enfatizar ou não
sua informação.
Ao tomarmos as posições pré-verbais de um modo geral, em oposição às pós-verbais,
verificamos que a ausência de sujeito nas posições pré-verbais não levou o advérbio a se
antepor ao verbo, ao contrário da hipótese do que posições vazias tenderiam a ser preenchidas
pelo advérbio.
Parece não haver, portanto, nos casos dos advérbios de tempo e de aspecto em -mente,
algum tipo de compensação ou equilíbrio no posicionamento dos elementos na estrutura da
cláusula. Além disso, ao observarmos separadamente a posição 1, ou seja, a que corresponde
à margem esquerda da cláusula e que, por hipótese, seria a que mais atrairia o advérbio,
notamos que isso também não ocorreu. De fato, houve uma quantidade maior de casos nessa
posição. Entretanto, quando se observam todas as ocorrências pré-verbais, notamos que a
margem esquerda, independentemente da presença ou não do sujeito, era a posição
preferencial dos advérbios pré-verbais.
Em função desses dados, concluímos que não houve uma relação significativa entre
presença/ ausência de sujeito em posição pré-verbal (marginal ou não) e colocação dos
advérbios aqui estudados. Esse mesmo resultado foi obtido em Martelotta (2006) para os
advérbios qualitativos e Marques (2008), que estudou a ordenação sujeito/ verbo. Portanto,
nossos resultados são contrários à hipótese de adjuntos (pelo menos do tipo que estamos
estudando) são colocados na posição do sujeito vazio.
Quanto à relação entre o tipo semântico do verbo e a posição, verificamos que esse
fator não influenciou a posição do mesmo.
O tipo semântico do verbo foi levado em consideração a fim de se testar a hipótese de
que determinado tipo de noção expressa pelo advérbio ocorreria com um determinado tipo de
verbo. Entretanto, essa hipótese não foi confirmada, pelos menos, nos corpora analisados.
Também queríamos verificar a relação entre o tipo semântico do verbo e a posição do
advérbio. Vimos que, quando o verbo é de processo material, o advérbio aparece mais na
posição 1 (margem esquerda da cláusula), os de processos relacionais, tanto intensivo quanto
possessivo, também ocorreram mais na posição 1. Nas outras posições, pelo baixo número de
dados, não foi possível traçar uma tendência para esse advérbio.
No português arcaico, observamos que o tipo de verbo mais recorrente é de valor
material em detrimento dos demais valores. Quanto à relação posição e sentido do verbo, o
tipo material ocorre nas posições 1 e 5, que o as posições margens esquerda e direita
respectivamente. Os verbos comportamentais tendem a ocorrer nas posições 5 e 6 e os verbos
de atividade verbal tendem a ocorrer na posição 6.
Nos dados apresentados, do século XVI, verificamos que os tipos mais freqüentes são
verbos materiais, mentais e relacionais possessivos.. Quando o verbo tem sentido material ou
mental, a tendência é o advérbio ocorrer na margem esquerda (POS1). Quando o verbo é
relacional possessivo não posição prototípica para o advérbio. em relação aos demais
sentidos dos verbos, há uma distribuição de dados equilibrada.
Já nos dados do século XVII, observamos que não há uma predileção pelo tipo
material, como vimos nos dados do português arcaico e do século XVI, mas, em relação à
posição e o tipo semântico do verbo em geral, todos são mais recorrentes na posição1
(margem esquerda) e uma relativa distribuição nas demais posições, o que não difere dos
séculos anteriores apresentados.
Os dados analisados do século XVIII demonstram que o tipo de verbo material é o
mais freqüente, seguido do tipo comportamental. Independentemente do tipo semântico, o
advérbio tende a ocorrer na posição marginal à esquerda (POS1).
No século XIX, constatamos que o tipo de verbo material é o mais freqüente, como
maioria das sincronias estudadas. Quanto à relação entre posição e tipo de verbo, observamos
que uma distribuição mais homogênea. Quando o verbo é material, o advérbio em -mente
ocorre mais na posição 1 ou na posição 6 . Os demais tipos tiveram poucos dados.
Verificamos, também, que os advérbios tendem a ocorrer mais nas posições pós-verbais
(Posições 5, 6, e 8).
nos dados do português atual, verificamos que o tipo de verbo mais freqüente é o
verbo de processo material, seguido dos de atividade verbal. Em relação ao tipo de verbo e a
posição do advérbio, vemos que, quando o verbo é material, o advérbio tende a ocorrer nas
posições 1 e 5; quando é de atividade verbal, tende a ocorrer na posição 5.
Nos resultados apresentados, uma tendência para os advérbios em -mente
aparecerem numa posição pré-verbal (no português arcaico, século XVI, XVII e XVII)
principalmente quando o verbo é de processo material, assim com os demais tipos de verbos.
Mas em relação à análise dos dados do século XIX e português atual, verificamos que há uma
predileção às posições pós-verbais. Esse resultado indica mudança na posição do advérbio ao
longo da história do português, o que vai ao encontro de outras pesquisas, como as de
Martelotta(2006) e Albani (2007), que demonstraram que os advérbios vêm mudando para a
posição pós-verbal, de um modo geral.
Além dessas hipóteses apresentadas, seguindo a proposta de Martelotta (2004) para os
advérbios qualitativos, estávamos considerando que a mudança de ordenação dos advérbios
de tempo e de aspecto em -mente poderia estar relacionada ao processo de gramaticalização
de certas estruturas sintáticas. De acordo com Givón (1979), a cláusula principal declarativa,
afirmativa, ativa, neutra é menos pressuposicional, no sentido de que sua interpretação
depende de menos material inferível do que a interpretação das demais estruturas. Isso
confere a esse tipo de cláusula (menos gramaticalizada) uma maior liberdade e variedade de
elementos significativos. Por outro lado, a distribuição dos elementos significativos, em todos
os outros tipos de cláusula (mais gramaticalizadas), é sempre mais restrita visto que esses
outros tipos de cláusula tendem a exibir grande conservadorismo sintático, sobretudo, no que
diz respeito à ordenação vocabular. Portanto, partindo dessa proposta, esperávamos encontrar,
no português arcaico, advérbios em posição pré-verbal (posição típica dos advérbios no latim)
ocorrendo mais nas orações mais gramaticalizadas (hipotáticas e subordinadas) do que nas
menos gramaticalizadas. E, no português atual, nossa hipótese era de que ocorreriam menos
advérbios em posições pré-verbais e que essas ocorrências envolveriam frases estilisticamente
marcadas.
Na análise dos dados do português arcaico, observamos que houve um número
significativo de ocorrências de advérbios de tempo e aspecto em -mente em posição pré-
verbal, mostrando que essa posição, assim como a pós-verbal, estava disponível para este tipo
de advérbio na fase arcaica de nossa língua.
Observamos que, no português arcaico, houve um pequeno predomínio de posições
pré-verbais em cláusulas gramaticalizadas. Isso pode ser apontado como um leve resquício da
tendência de que as posições pré-verbais têm para ocorrer em cláusulas mais
gramaticalizadas.
No século XVI, apesar da baixa ocorrência de dados nesta fase, de um modo geral, a
análise qualitativa apresentou resultados favoráveis às nossas hipóteses. A posição pré-verbal,
por exemplo, estava presente nesta fase do português em escala menor que a posição pós-
verbal. Além disso, foi possível observar que as orações mais gramaticalizadas elegem a
ordenação pré-verbal, 11 ocorrências distribuídas pelas posições pré-verbais (Pos 1, 2 e 3).
Tal observação contribui para confirmar a hipótese que adotamos com Givón (1979) de que
esses tipos cláusulas (mais gramaticalizadas) tendem a ser sintaticamente mais conservadoras,
principalmente, no que diz respeito à ordenação dos constituintes da oração.
Outra ressalva interessante é que, ao analisarmos o português arcaico, a hipótese de
Givón (1979) não foi de todo confirmada, apesar de encontrarmos uma leve tendência de as
posições pré-verbais ocorrerem em cláusulas mais gramaticalizadas. Por outro lado, na análise
do século XVI essa hipótese se confirmou quando se relacionaram as posições dos advérbios
com o grau de gramaticalização da cláusula em que o advérbio ocorreu.
Pudemos observar, na análise dos dados do século XVII, uma maior incidência de
casos foi na posição pré-verbal, porém, quando se relacionamos posição e grau de
gramaticalização, a hipótese givoniana não se confirmou, o mesmo atestado no português
arcaico com o tipo de advérbio estudado.
É interessante ressaltar que, no século XVIII, a nossa hipótese também foi confirmada:
a de que as orações mais gramaticalizadas elegem a ordenação pré-verba. Nesse caso, foram 8
ocorrências contra uma única ocorrência na posição pós-verbal.
Por outro lado, houve 5 ocorrências pré-verbais em cláusulas menos gramaticalizadas
em oposição a 4 dados na posição pós-verbal, também em cláusulas menos gramaticalizadas.
Isso é importante, porque pode apontar para o fato de que, até o século XVIII, era mais forte a
inclinação que os advérbios qualitativos apresentavam de ocorrer antes do verbo, o mesmo
acontecendo para os de tempo e de aspecto, reforçando os resultados obtidos em Martelotta e
Vlček (2006), segundo os quais essa tendência começa a enfraquecer no início do século XIX
e acaba por desaparecer na virada para o século XX.
No caso do século XIX, houve uma quantidade maior de ocorrências de advérbios de
tempo e de aspecto em -mente, embora as 22 ocorrências encontradas estejam longe de
constituir a quantidade necessária para se chegar a constatações mais precisas.
Assim como aconteceu com o século XVIII, era de se esperar que o século XIX
apresentasse uma relativa predominância das posições pós-verbais. Isso de fato ocorreu:
apresentou 12 ocorrências nessa posição no, total de 22 advérbios. Esses dados refletem a
tendência, mencionada anteriormente, que vem relativamente se delineando desde o século
XVI, uma vez que na fase arcaica do português com esse tipo de advérbio a hipótese não se
confirmou, ou como nos trabalhos de Moraes Pinto, 2002; Martelotta, 2004, a confirmação
dessas tendências foi constatada.
Outro resultado interessante se apresenta quando se relacionam as posições dos
advérbios com o grau de gramaticalização da cláusula em que ele ocorre. Do total de 9 casos
de advérbios pré-verbais, 4 correram em cláusulas mais gramaticalizadas (hipotáticas e
subordinadas). Cabe ressaltar aqui que a diferença entre as ocorrências em cláusulas menos
gramaticalizadas foi bastante pequena, 6 dados pré-verbais. Constatamos que, no século XIX,
se evidenciou uma mudança desses advérbios para as posições pós-verbais, apesar de eles não
serem predominantes em cláusulas com alto grau de gramaticalização, mais conservadoras em
termos de ordenação.
No português atual, a ocorrência dos dados demonstra uma propensão, que se
manifestou quase categoricamente, desses advérbios ocorrerem após o verbo, 28 dados, sendo
que 17 estão em cláusulas menos gramaticalizadas e 10 dados em cláusulas mais
gramaticalizadas. Cabe ressaltar que novamente obtivemos resultados atípicos aos esperados
segundo a hipótese proposta em relação à posição e o grau de gramaticalização das cláusulas.
Portanto, percebemos que houve diferentes fatores que influenciaram a ordenação
desses advérbios nas sentenças e que essa análise possa trazer esclarecimentos em relação ao
comportamento desses elementos no português. Muitos dos nossos resultados não comprovam
algumas das hipóteses apresentadas nesta tese e em outros trabalhos, mas refletem o emprego
real dos advérbios em -mente na história do português escrito. Assim são resultados
importantes inclusive porque apontam para tendências diferentes do que geralmente é dito.
A pesquisa foi realizada tendo em vista muitos fatores, demonstrando que procuramos
de diferentes formas verificar as estratégias discursivas, semânticas e sintáticas para o uso
desses advérbios. Claro que a análise não se esgotou e em muitos momentos. Assim,
apontamos para a necessidade de pesquisas futuras aprofundarem em um ou outro aspecto, ou
para a necessidade de se fazer um recorte diferente da análise, tendo em vista as sincronias e
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Universidade Gama Filho.
VOTRE, Sebastião Josué, CEZARIO, Maria Maura, e MARTELOTTA, Mário Eduardo.
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OS ADVÉRBIOS DE TEMPO E DE ASPECTO EM -MENTE E
SUA ORDENAÇÃO: UMA ABORDAGEM HISTÓRICA
Eliana Crispim França Luquetti
Rio de Janeiro
Fevereiro de 2008
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Faculdade de Letras
Comissão de Pós-Graduação e Pesquisa
OS ADVÉRBIOS DE TEMPO E DE ASPECTO EM -MENTE E
SUA ORDENAÇÃO: UMA ABORDAGEM HISTÓRICA
Eliana Crispim França Luquetti
Tese de Doutorado submetida ao
Programa de Pós-Graduação em
Lingüística da Universidade Federal do
Rio de Janeiro UFRJ, como parte dos
requisitos necessários para a obtenção do
título de Doutor em Lingüística.
Orientadora: Professora Doutora Maria
Maura da Conceição Cezario
Co-orientador: Professor Doutor Mario
Eduardo Toscano Martelotta
Rio de Janeiro
Fevereiro de 2008
LUQUETTI, Eliana Crispim França
Os advérbios de tempo e de aspecto em -mente e sua ordenação: uma abordagem histórica/
Eliana Crispim França Luquetti. 2008.
159 fls.
Tese (Doutorado em Lingüística) –
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Faculdade de Letras,
Rio de Janeiro, 2008.
Orientadora: Maria Maura Cezario
Co-Orientador: Mario Eduardo T. Martelotta
1 Advérbios. 2. Ordenação de palavras. 3. Funcionalismo
I. Cezario, Maria Maura (Orientadora) II Martelotta, Mario Eduardo T. III Universidade
Federal do Rio de Janeiro. Faculdade de Letras. IV Título
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Faculdade de Letras
Comissão de Pós-Graduação e Pesquisa
OS ADVÉRBIOS DE TEMPO E DE ASPECTO EM -mente E SUA ORDENAÇÃO:
UMA ABORDAGEM HISTÓRICA
Eliana Crispim França Luquetti
Orientadora: Professora Doutora Maria Maura da Conceição Cezario
Co-Orientador: Professor Doutor Mario Eduardo Martelotta
Tese de Doutorado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Lingüística da
Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos necessários para a
obtenção do título de Doutor em Lingüística.
Aprovada por:
Presidente, Profa. Doutora Maria Maura da Conceição Cezario
Vice-Presidente, Prof.Doutor Mário Eduardo Toscano Martelotta
Profa.Doutora Maria da Conceição Paiva-UFRJ
Profa. Doutora Deize Vieira dos Santos-UFRJ
Prof. Doutor Afrânio Gonçalves Barbosa-UFRJ
Profa. Doutora Mariângela Rios de Oliveira-UFF
Suplentes:
Profa. Doutora Christina Abreu Gomes-UFRJ
Profa. Doutora Maria do Rosário da Silva Roxo- Univ. Estácio de Sá
Tese defendida em 25/02/2008.
Dedicatória
Ao meu querido e amado Deus, pois “O
Senhor é a minha rocha, a minha
cidadela, o meu libertador; o meu Deus,
o meu rochedo em que me refugio; o meu
escudo, a força da minha salvação, o
meu baluarte”. (Sl 18:2,3)
Esperei confiantemente pelo Senhor; ele
se inclinou para mim e me ouviu quando
clamei por socorro. Tirou-me de um poço
de perdição, de um tremedal de lama;
colocou-me os pés sobre uma rocha e me
firmou os passos. E me pôs nos lábios um
novo cântico, um hino de louvor ao nosso
Deus; muitos verão essas coisas, temerão
e confiarão no Senhor. (Salmos 40:1-3)
Agradecimentos
A Deus que sempre cuidou de mim, orientando, confortando e abençoando-me.
À minha querida e amada mãe Suely por ter me ensinado o caminho do bem, da honestidade,
da persistência, da esperança. Enfim, devo-lhe tudo quem sou.
Aos meus filhos, Fernanda e Pedro Henrique pela compreensão, carinho e existência na minha
vida.
Ao meu esposo Wanderson Luquetti, pelo constante incentivo, pela infinita paciência, pelas
palavras de conforto e amizade.
Aos meus irmãos, Patricia, Douglas, Catiane e Viviane que são parte de mim. E,
principalmente as minhas irmãs Catiane e Viviane, pelo apoio e pelas palavras certas nos
momentos certos.
Aos parentes e amigos, pelo acompanhamento interessado. Em especial, Ernesto França, Célia
Viana, Thiara França, Thiago França, Pastor Leopoldo, Lenise Dutra, Ana Lúcia Costa,
Aparecida Azevedo, pelo apoio e carinho constantes.
À Professora Maria Maura Cezario pela grande confiança depositada em mim, pela amizade,
pelo apoio e incentivo constantes e fundamentais. E ainda, por ter me conduzido ao prazeroso
caminho da pesquisa e ensinando-me a importância do nosso papel enquanto professores e
pesquisadores, através do seu exemplo e dedicação.
Ao Professor Mário Eduardo Martelotta pela carinhosa acolhida no projeto Discurso e
Gramática, pela prontidão em ouvir e ajudar, pelo exemplo profissional.
Aos amigos Natália Ilse, Júlia Nunes, Érika Ilogti e Roberto Freitas Jr. Pela colaboração
preciosa nesta pesquisa.
A todos do projeto Discurso e Gramática pela sincera amizade e pelos grandes e inesquecíveis
momentos compartilhados.
SINOPSE
Análise diacrônica da ordenação dos advérbios de tempo e
aspecto em -mente na modalidade escrita do português,
sob a perspectiva funcionalista, buscando investigar
fatores funcionais e estruturais determinantes da
colocação desses advérbios na cláusula.
LUQUETTI, Eliana Crispim França. Os advérbios de tempo e de aspecto em -mente e sua
ordenação: uma abordagem histórica. Rio de Janeiro: UFRJ, Faculdade de Letras, 2008. 159
fls. Tese de Doutorado em Lingüística.
Resumo
Este trabalho tem como objetivo observar as diferentes posições que os advérbios de
tempo e de aspecto em -mente tendem a assumir em diferentes momentos históricos, bem
como analisar a polissemia desses elementos em textos escritos em português nas seguintes
fases históricas: arcaica, séculos XVI, VXII, XVIII e XIX e português contemporâneo.
Esta pesquisa, além de testar novas hipóteses, vem integrar e ampliar uma série de
estudos que visam examinar, de modo mais geral, o processo de mudança de colocação dos
advérbios no decorrer do tempo (Moraes Pinto, 2002; Martelotta, Barbosa & Leitão, 2002;
Martelotta, 2004; Martelotta & Processy, 2006; Andrade, 2005; Albani 2007; Freitas, 2004) e
outros trabalhos sobre o fenômeno em questão. A pesquisa demonstra que fortes indícios
de mudança de posição do advérbio de tempo e aspecto em -mente ao longo da história do
português.
De acordo com a hipótese geral, ao estudarmos cada sincronia devemos encontrar
motivações para as diferentes posições ocupadas pelos advérbios de tempo e aspecto em -
mente na oração. A motivação dá-se por um conjunto de fatores estruturais, semânticos,
cognitivos e/ou discursivos, a saber: a noção semântica; a estrutura sintática da oração em que
está inserido o advérbio; o tipo semântico do verbo que compõe a cláusula, segundo Halliday
(1994) e outros fatores.
LUQUETTI, Eliana Crispim França. Os advérbios de tempo e de aspecto em -mente e sua
ordenação: uma abordagem histórica. Rio de Janeiro: UFRJ, Faculdade de Letras, 2008. 159
fls. Tese de Doutorado em Lingüística.
ABSTRACT
This work aims to observe the different positions that the adverbs of time and look at
mind-tend to take on different historic moments, and examine the polissemia these elements
in texts written in Portuguese on the following historical stages: archaic, XVI, VXII, XVIII
and XIX and Portuguese contemporary.
This research, and test new hypotheses, comes integrate and extend a series of studies
to examine, more generally, the process of changing the placing of adverbs over time (Moraes
Pinto, 2002; Martelotta, Barbosa & Leitao, 2002; Martelotta, 2004; Martelotta & Processy,
2006; Andrade, 2005; Albani 2007; Freitas, 2004) and other works on the phenomenon in
question. The research shows that there are strong indications of a change of position of the
adverb of time and point-in mind throughout history of the Portuguese.
According to the general assumption, by studying each sync must find reasons for the
different positions occupied by adverbs of time and point-in mind in prayer. Motivation
comes about by a number of factors structural, semantic, cognitive and / or discourse, namely
the notion semantics, the syntactic structure of the prayer that is inserted into the adverb; the
kind of semantic word that composes the clause, according Halliday (1994) and others.
LUQUETTI, Eliana Crispim França. Os advérbios de tempo e de aspecto em -mente e sua
ordenação: uma abordagem histórica. Rio de Janeiro: UFRJ, Faculdade de Letras, 2008. 159
fls. Tese de Doutorado em Lingüística.
Résumé
Ce travail vise à observer les différentes positions que les adverbes en –ment de temps
et d'aspect prennent pendant les moments historiques, et d'examiner la polysémie de ces
éléments dans les textes écrits en portugais sur les étapes historiques suivantes: archaïque,
XVI, VXII, XVIII Et XIX et portugais contemporain.
Au délà de tester de nouvelles hypothèses, cette recherche vient d'intégrer et d'étendre
une série d'études pour examiner, de façon plus générale, le processus de modification du
placement des adverbes en –ment dans le temps (2002 2002 2004; Martelotta & Processy,
2006; Andrade, 2005; Albani 2007; Freitas, 2004) et d'autres ouvrages sur le phénomène en
question. La recherche montre qu'il y a fortes indications de changement de position de
l'adverbe en –ment de temps et d’aspect au long de l'histoire portugaise.
Selon l'hypothèse générale, en étudiant chaque synchronisation on doit trouver les
raisons pour lesquelles les différentes positions occupées par les adverbes en –ment de temps
et d’aspect dans la proposition. La motivation est donnée par un certain nombre de facteurs
structurels, sémantiques, cognitives et / ou discursifs, à savoir: la notion sémantique, la
structure syntaxique de la proposition que l’adverbe est inséré, le genre de mot sémantique qui
compose la clause, selon Halliday (1994 ) et les autres.
LISTA DE TABELAS
Tabela 1- Distribuição dos advérbios em -mente quanto à ordem em relação ao verbo.
Tabela 2- Levantamento Geral dos dados dos corpora dos Advérbios de Tempo e de Aspecto
em –mente.
Tabela 3 - Distribuição das posições dos advérbios de tempo e aspecto em –mente X
sincronias.
Tabela 4 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Português Arcaico.
Tabela 5 - A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Século XVI.
Tabela 6 - A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Século XVII.
Tabela 7 - A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Século XVIII.
Tabela 8 - A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Século XIX.
Tabela 9 - A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Português Atual.
Tabela 10 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Português Arcaico.
Tabela 11 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Século XVI.
Tabela 12 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Século XVII.
Tabela 13 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Século XVIII.
Tabela 14 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Século XIX.
Tabela 15 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Português Atual.
Tabela 16 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Português Arcaico.
Tabela 17 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Século XVI.
Tabela 18 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Século XVII.
Tabela 19 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Século XVIII.
Tabela 20 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Século XIX.
Tabela 21 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Português Atual
Tabela 22 - Ocorrência de advérbios no Português Arcaico.
Tabela 23 - Ocorrência de advérbios no Século XVI.
Tabela 24 - Ocorrência de advérbios no Século XVII.
Tabela 25 - Ocorrência de advérbios no Século XVIII.
Tabela 26 - Ocorrência de advérbios no Século XIX.
Tabela 27 - Ocorrência de advérbios no Português Atual
LISTA DE QUADROS
Quadro1 – Distinção entre Advérbio e Pseudo-advérbio
Quadro 2 - Subposições dos Advérbios em -mente
LISTA DE ABREVIATURAS
EC – A essência do cristianismo
OE – Orto do esposo
SUMÁRIO
LISTA DE TABELAS
LISTA DE QUADROS
LISTA DE ABREVIATURAS
1 INTRODUÇÃO.......................................................................................................... 15
1.1 HIPÓTESES............................................................................................................... 18
1.2
O
BJETIVOS
............................................................................................................................................
20
2 REVISÃO DE LITERATURA.................................................................................. 22
2.1
A
QUESTÃO DA CATEGORIZAÇÃO
.........................................................................................................
22
2.2
A
DVÉRBIO
:
ELEMENTO DO LÉXICO OU DA GRAMÁTICA
?....................................................................
26
2.3
A
DVÉRBIOS
:
ESPÉCIES
,
FORMAS E SIGNIFICAÇÃO
...............................................................................
27
2.4
V
ISÃO
T
RADICIONAL DOS
A
DVÉRBIOS
................................................................................................
31
2.5
P
ESQUISAS SOBRE ADVÉRBIOS
,
SOB ORIENTAÇÃO DA
LINGÜÍSTICA
..................
.....................34
2.5.1
T
IPOS DE ADVÉRBIOS
.........................................................................................................................
34
2.5.2
E
STUDOS SOBRE O ADVÉRBIO EM
-
MENTE E SOBRE ORDENAÇÃO DE ADVÉRBIOS
............................
38
2.6
O
S ADVÉRBIOS E A EXPRESSÃO DE TEMPO
...........................................................................................
54
2.
7
O
S ADVÉRBIOS RELACIONADOS À CATEGORIA DE ASPECTO
.....................................................56
2.
8
A
FORMAÇÃO DE ADVÉRBIOS EM
-
MENTE
............................................................................................
60
3 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS................................................................................. 67
3.1
O
S PRINCÍPIOS FUNCIONALISTAS
..........................................................................................................
67
3.2
G
RAMATICALIZAÇÃO E
N
ÍVEIS DE
E
NCAIXAMENTO ENTRE
C
LÁUSULAS
...........................................
70
3.3
G
RAMATICALIZAÇÃO E ESTRUTURA SINTÁTICA
..................................................................................
72
3.4
A
S PRESSUPOSIÇÕES DISCURSIVAS DAS CONSTRUÇÕES SINTÁTICA
.............................................73
3.5
C
LASSIFICAÇÕES DOS VERBOS
,
BASEADA EM
H
ALLIDAY
(1994).........................................................
75
4 METODOLOGIA ....................................................................................................... 80
4.1
C
ORPUS
..................................................................................................................................................
81
4.2
D
ESCRIÇÕES DOS FATORES DA ANÁLISE DOS ADVÉRBIOS DE TEMPO E ASPECTO EM
MENTE
...........
84
5 ANÁLISES DOS DADOS........................................................................................... 89
5.1
A
NÁLISES DE FATORES
..........................................................................................................................
89
5.1.1
O
RDEM DO ADVÉRBIO DE TEMPO E ASPECTO EM
-
MENTE
................................................................
90
5.1.2
P
OSIÇÃO DO ADVÉRBIO
......................................................................................................................
93
5.1.3
N
OÇÃO SEMÂNTICA DO ADVÉRBIO
...................................................................................................
96
5.1.
4
T
IPO SEMÂNTICO DO VERBO
............................................................................................................
105
5.1.5
T
IPO DE SUJEITO
..............................................................................................................................
114
5.1.6
T
IPO DE ORAÇÃO
.............................................................................................................................
122
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................... 133
1 INTRODUÇÃO
Este trabalho tem como objetivo observar as diferentes posições que os advérbios de
tempo e aspecto em -mente tendem a assumir em diferentes momentos históricos, para
verificarmos se houve mudança na ordenação da frase da língua portuguesa com relação a
esses tipos de advérbios. Para isso, coletamos dados de textos do português das seguintes
fases históricas: arcaica, séculos XVI, VXII, XVIII e XIX e português atual.
Este estudo, além de testar novas hipóteses, vem integrar e ampliar uma série de
pesquisas que visam examinar, de modo mais geral, o processo de mudança de colocação dos
advérbios no decorrer do tempo (Moraes Pinto, 2002; Martelotta, Barbosa & Leitão, 2002;
Martelotta, 2004; Martelotta & Processy, 2006; Andrade, 2005; Albani 2007; Freitas, 2004).
A motivação para o presente estudo veio do trabalho realizado na dissertação de
mestrado de França (2002), na qual foi feita uma análise dos adjuntos adverbiais de tempo e
aspecto em narrativas orais e escritas contemporâneas, sob uma perspectiva funcionalista.
Nesse trabalho, procuramos delimitar os valores que esses adjuntos apresentavam no texto
narrativo, assim como as tendências de colocação que eles assumiam nas cláusulas que
compunham o texto.
Esses adjuntos adverbiais de tempo e aspecto, de um modo geral, apresentavam uma
grande mobilidade na cláusula, podendo ter suas tendências de ordenação explicadas por
fatores de caráter sintático e discursivo.
Nessa dissertação (França,2002), utilizamos o corpus Discurso & Gramática (Votre e
Oliveira: 1995), constituído de um conjunto de entrevistas faladas e escritas, concedidas por
informantes de C.A. infantil e adulto, 4
a
e 8
a
séries e 2
o
e 3
o
graus, apresentando os seguintes
tipos de discurso: narrativa de experiência pessoal, narrativa recontada, relato de
procedimento, relato de opinião e descrição de local. Essa análise, entretanto, se restringiu às
narrativas, já que partia do princípio de que os dois planos discursivos, figura e fundo,
apresentavam tendências de ordenação diferentes no que diz respeito aos elementos adverbiais
estudados.
Os resultados obtidos nessa análise mostraram que os adjuntos adverbiais
apresentavam a sua colocação de acordo com a sua função dentro do tipo de discurso (figura
ou fundo) de que faziam parte.
No presente trabalho, um aprofundamento da análise dos advérbios em -mente
(somente os advérbios em -mente, diferentemente da dissertação de mestrado) em vários
aspectos, uma vez que ampliamos os pressupostos teóricos e o número de fatores a serem
testados. Além disso, a distribuição das ordenações possíveis está muito diferente do que foi
feito em França, 2002. O foco agora é o texto escrito e a diacronia. Para isso, analisamos
textos de diferentes gêneros textuais ao longo dos séculos, da fase arcaica do português ao
período atual da Língua.
Eis alguns exemplos de dados analisados nesta tese a partir dos quais é possível
verificar a grande variedade de ordenação:
(1) E porque me consta o mensionado Bacharel Manuyel Pacheco de Paiva, que
atualmente o ocupa, se achar em diligencia fora dessa cidade( culo XVIII ,cartas oficiais,
PHPB).
(2) Quer dizer cana e pena, porque as penas antigamente faziam-se de certas canas
delgadas(Século XVII ,Sermão do Pe. A.Vieira).
(3) Atualmente as coisas estão como costumavam ser mil anos atrás(Português
atual,EC p.9).
(4) ...deixamos boas coisas para trás muito freqüentemente em nome da
independência (Português atual,EC, p.31).
Nota-se que, no exemplo (1), o advérbio atualmente ocorre antes do verbo (ocupa);
no exemplo (2), o advérbio antigamente, ocorre entre o sujeito (as penas) e o verbo (faziam-
se); no exemplo (3), o advérbio atualmente ocorre no início da cláusula (margem esquerda),
antes do sujeito (as coisas) e antes do verbo (estão); e, no exemplo (4), o advérbio
freqüentemente, ocorre depois do verbo (deixamos). Portanto, verificamos que os advérbios
em -mente podem ocorrer antes ou depois do verbo; entre o sujeito e o verbo; no início da
cláusula; no final da cláusula, enfim, diversas possibilidades de posição desse advérbio na
cláusula.
Ao pesquisarmos definições e classificações sobre os advérbios, em gramaticais
tradicionais e nas de orientação lingüística, percebemos que essa é uma classe bastante
complexa e colocada de forma pouco elucidativa, isto é, em geral, é definida e exemplificada
de modo simplista e pouco esclarecedora. Nesta pesquisa, estamos considerando como dados
advérbios que os estudiosos consideram ora como advérbios de tempo (como ultimamente,
primeiramente, antigamente), ora como advérbios de aspecto (freqüentemente, novamente,
constantemente) e ainda como advérbios de modo, como por exemplo, o advérbio
rapidamente, que é classificado tradicionalmente como advérbio de modo. Como também
nesse advérbio traços semânticos ligados ao tempo, também o incluímos na análise (cf. os
resultados do fator “tipo semântico do advérbio).
Entendemos que é necessária uma análise mais profunda sobre os advérbios de tempo
e de aspecto em -mente, abarcando seus usos ou funções; suas posições na cláusula e outras
características. Neste estudo, investigaremos questões como:
a) Por que o advérbio ora aparece no final, ora no início da cláusula, ora em outras
posições?
b) fatores que contribuem para a ordenação desses advérbios num dado lugar da
cláusula?
c) Existe uma posição fixa para determinados usos dos advérbios? Se existe, por que
isso acontece? Seria o tipo semântico do verbo que, com a freqüência de uso,
fixaria o advérbio numa dada posição?
d) relação entre a semântica do advérbio e a posição em que ele aparece mais
freqüentemente na cláusula? Há posições prototípicas para os advérbios em -
mente? Se há, houve alguma diferença de uso ao longo da história do português?
Acreditamos que esta pesquisa contribuirá para o estudo sobre a ordenação dos
advérbios de tempo e de aspecto e suas funções na cláusula na língua portuguesa. Contribuirá
também para melhor compreendermos a organização textual.
1.1 Hipóteses
As hipóteses desse estudo são:
(a) Pressupomos que ocorreram mudanças na posição dos advérbios da sincronia do
português arcaico para o contemporâneo. De acordo com trabalhos anteriores, como os
de Martelotta e Leitão (1999) e de Martelotta, Barbosa e Leitão (2001), a posição pré-
verbal (entre o sujeito e o verbo) era disponível para toda e qualquer espécie de advérbio
e, hoje, ela está disponível para alguns - portanto, houve uma mudança no padrão de
ordenação de alguns advérbios. Com relação aos advérbios de tempo e de aspecto em -
mente, acreditamos que deve haver uma posição prototípica para esse advérbio em
relação ao verbo, ao sujeito e ao complemento verbal nas diferentes sincronias, sendo
que, ao longo da história do português, pode ter havido uma contínua fixação da posição
do advérbio em relação ao verbo, uma vez que estudos diacrônicos demonstram que a
ordenação dos termos foi se tornando cada vez mais fixa.
(b) Seguindo a proposta de Martelotta (2004) para os advérbios qualitativos, estamos
considerando que a mudança de ordenação dos advérbios de tempo e de aspecto em -
mente parece está relacionada ao processo de gramaticalização de certas estruturas
sintáticas. De acordo com Givón (1979), a cláusula principal declarativa, afirmativa,
ativa, neutra é menos pressuposicional, no sentido de que sua interpretação depende de
menos material inferível do que a interpretação das demais estruturas. Isso confere a esse
tipo de cláusula (menos gramaticalizada) uma maior liberdade e variedade de elementos
significativos. Por outro lado, a distribuição dos elementos significativos, em todos os
outros tipos de cláusula (mais gramaticalizadas), é sempre mais restrita visto que esses
outros tipos de cláusula tendem a exibir grande conservadorismo sintático, sobretudo, no
que diz respeito à ordenação vocabular. Portanto, partindo dessa proposta, esperamos
encontrar, no português arcaico, advérbios em posição pré-verbal (posição típica dos
advérbios no latim) ocorrendo mais nas orações mais gramaticalizadas (hipotáticas e
subordinadas) do que nas menos gramaticalizadas, e, no português atual, nossa hipótese
é de que ocorram menos advérbios em posições pré-verbais e que essas ocorrências
envolvam frases estilisticamente marcadas.
(c) deve haver fatores de diferentes ordens que motivam o uso do advérbio em diferentes
posições na frase. Fatores como o papel semântico exercido pelo advérbio em -mente, o
tipo semântico do verbo, a presença ou ausência do sujeito na frase, dentre outros,
devem influenciar a ordem que este ocupa na sentença.
1.2 Objetivos
Pretendemos estudar as posições assumidas pelos advérbios em -mente na cláusula em
textos de diferentes gêneros textuais das seguintes fases do português: português arcaico, dos
séculos XVI, XVII, XVIII, XIX e português atual, observando, principalmente, o papel da
freqüência de ocorrência em dadas posições e a possível gramaticalização desses advérbios
com determinados tipos de verbo. Inicialmente, a opção por textos religiosos foi pela
disponibilidade de textos em documentos escritos em português arcaico, mas, quando
partimos para o levantamento de dados, verificamos que havia uma escassez de dados do
fenômeno em questão, sendo assim, decidimos investigar em outros gêneros textuais.
Mas, ainda assim, procuramos manter uma certa uniformização das tipologias, pois as
diferenças entre os usos dos advérbios encontrados poderiam ser atribuídas a diferenças
textuais e não à mudança lingüística.
Os principais objetivos desse estudo são:
1- analisar detalhadamente o uso dos advérbios de tempo e de aspecto em -mente no
português escrito;
2- acompanhar o uso da ordenação dos advérbios nos tipos de orações ao longo do
tempo, analisando os dados tanto do português arcaico quanto do português atual, para
verificar se as construções mais gramaticalizadas (cláusulas hipotáticas e
subordinadas) são mais conservadoras, isto é, favorecem a ocorrência de advérbios em
posições pré-verbais (posições mais antigas), e se as menos gramaticalizadas
(cláusulas principais e coordenadas) são mais inovadoras, propiciando a ocorrência de
dados com advérbios em –mente em ordenações pós-verbais;
3- verificar se indícios de mudança na sintaxe desse advérbio nas fases estudadas do
português: arcaica, dos séculos XVI, XVII, XVIII, XIX e português atual;
4- caracterizar as posições assumidas pelos advérbios de tempo e aspecto, apresentando
a freqüência de ocorrência de cada ordem assumida;
5- identificar os fatores que influenciam a ordenação desses advérbios em contextos em
que eles podem ocupar posições diferentes nas cláusulas, testando hipóteses
relacionadas à motivação de ordenação.
Para apreciação das questões aqui levantadas, apresentamos, no capítulo 2, uma revisão na
literatura sobre os advérbios, sua ordenação, formação e origem, no capítulo 3, os
pressupostos teóricos que fundamentam esse estudo; no capítulo 4, a metodologia utilizada
para codificação dos dados; no capítulo 5, a análise dos dados, interpretação dos resultados da
análise quantitativa, assim como dos fatores e hipóteses examinados; e, por fim, nos capítulos
6 e 7, seguem algumas considerações finais sobre os advérbios e a bibliografia,
respectivamente.
2 REVISÃO DE LITERATURA
Este capítulo consiste numa breve explanação sobre a questão da categorização e
estrutura da língua, como também, a descrição de algumas abordagens sobre a definição,
classificação e/ou ordenação de advérbios na cláusula. Aqui são apresentados trabalhos de
perspectiva tradicional, bem como os realizados em linhas de pesquisa lingüística que
estudam a Língua em uso.
2.1 A questão da categorização
Antes de apresentarmos as considerações sobre a classe que reúne os advérbios,
apresentaremos uma breve explanação sobre a questão da categorização, uma vez que estamos
reunindo numa mesma classe geral advérbios que os estudiosos ora consideram de tempo
(ultimamente, por exemplo), ora de aspecto (freqüentemente), ora de modo (rapidamente).
Além disso, a própria natureza da classe advérbio é de difícil análise, uma vez que reúne itens
muito diferentes tanto com relação à ordenação, como em relação à semântica.
Tradicionalmente, as classes das palavras têm sido definidas segundo suas
propriedades semânticas, sintáticas e morfológicas. As gramáticas tradicionais privilegiam o
aspecto semântico na conceituação do substantivo, do adjetivo e do verbo, e recorrem ao
aspecto funcional na conceituação da conjunção, da preposição e até mesmo do artigo, dos
pronomes e dos advérbios, que é o foco do nosso trabalho, e, estes últimos são conceituados
ainda pelo seu aspecto semântico, mas a análise apresentada não dá conta da sua imprecisão.
Os autores de um modo geral também chegam à conclusão da imprecisão dessa
categoria. Seja de um ponto de vista mais formal, como o de Camara Jr. (1976) ou o de
Bechara (1999), seja de uma perspectiva mais funcional, como a de Ilari et al. (1990) ou a de
Neves (2000), a categoria dos advérbios é considerada bastante controvertida.
Constituída por tipos de natureza muito diversa, em termos semânticos, sintáticos e
mesmo morfológicos, esse conjunto parece não resistir a uma definição mais geral, capaz de
dar conta da totalidade de seus usos. Nesse sentido, a abordagem categorial prototípica,
segundo Taylor (1995), em conformidade com a concepção funcionalista que nos orienta,
apresenta-se como o tratamento mais adequado para os tipos desse conjunto tão híbrido. De
acordo com tal concepção, podemos admitir que, numa dada classe, encontram-se membros
situados em pontos distintos em relação ao eixo categorial básico, de acordo com o número de
traços compartilhados pelos mesmos.
Assim, encontramos constituintes que de modo mais visível representam essa
categoria; em geral, são termos mais freqüentes e identificados pela comunidade lingüística
como pertencentes à categoria. Por outro lado, podemos registrar também termos que, por
conta da perda de traços categoriais, tendem a ocupar posição periférica ou marginal em
relação ao padrão, situando-se praticamente no limite ou na interseção com outra classe. Dos
advérbios aqui em análise, os de tempo e de aspecto em -mente, conforme a perspectiva
exposta anteriormente, estariam situados em um ponto de maior afastamento em relação ao
eixo da categoria dos advérbios. Segundo Ilari et al. (1990) e Neves (2000), esses tipos de
advérbios caracterizam-se por sua função não-predicativa ou não-modificadora, uma vez que
informações acerca de tempo não incidem sobre ou afetam a predicação, mas os de aspecto
sim. Assim definidos, estariam tais constituintes predispostos a ocorrer em pontos de maior
afastamento em relação ao verbo, conforme prevê o subprincípio de proximidade (Givón,
2001; Furtado da Cunha, Rios de Oliveira e Martellota, 2003), segundo o qual conteúdos
menos integrados são articulados por formas também menos integradas na superfície textual.
Além do aspecto relativo ao status dessa categoria, interessa-nos também mencionar a
questão da polissemia envolvida nos usos desses advérbios. De acordo com a hipótese
localista, podemos dizer que a referência espacial seria a mais primária ou original; a partir
desse sentido mais concreto, teríamos a derivação para tempo, de natureza mais abstrata, e, a
partir daí, os sentidos lógicos ou textuais, como a referência de modo, numa etapa de maior
abstratização. Segundo Pontes (1992, p. 8-9), através do uso dos mesmos elementos
gramaticais, projetamos as categorias de espaço para falar de tempo metaforicamente”;
conforme a autora, trata-se de derivação de sentido desde tempos imemoriais. O interessante
nessa abordagem é que os sentidos originais não são necessariamente descartados diante dos
mais recentes, o que vem a gerar polissemia dos usos adverbiais, principalmente na
articulação dos sentidos aspectuais, modais e temporais, muitas vezes sobrepostos.
Mattoso Câmara formulou na Estrutura da Língua Portuguesa uma classificação
baseada em dois critérios, um misto e outro simples, que é didaticamente satisfatória. Para ele,
os vocábulos formais do português se agrupam, primeiro, segundo a um critério morfo-
semântico, em quatro classes: nome, verbo, pronome e conectivo. As três primeiras classes
são constituídas basicamente de palavras variáveis, a última de palavras invariáveis.
O verbo distingue-se no grupo, nessa primeira divisão, pelo paradigma flexional em
que se enquadra (apresenta variação modo-temporal e número-pessoal). O nome e o pronome,
por sua vez, são vocábulos dotados de número e gênero, exprimíveis em uma e noutra classe
pelo mesmo mecanismo flexional. A distinção entre eles repousa, de um lado, na natureza da
significação, e de outro, em certas propriedades morfossintáticas exclusivas do pronome
(variação em pessoa e em caso)
Semanticamente, o nome ‘nomeia’ e os seres, permitindo que o locutor e o ouvinte os
designem sem o reforço da situação ou do contexto verbal. O pronome por outro lado, efetua
uma referência contextual ou situacional: quem diz aquela roupa estava na minha gaveta’,
está particularizando roupa e gaveta em função de uma situação. Sabe-se apenas, por meio
de aquelae de minha’, que a roupa em questão está distante dos interlocutores e que a
gaveta pertence ao locutor. Essa constatação, todavia, não esclarece tudo, uma vez que as
palavras ‘distante e próximo também significam noções relativas e nem por isso são
pronomes. Basicamente, importa ter em vista a referência à situação em que se encontram os
interlocutores: os pronomes a incluem na significação dos enunciados. Sendo assim, pode-se
dizer ‘Pernambuco fica distante de Santa Catarina em qualquer parte do Brasil, que o
significado da frase será o mesmo; mas quem diz Pernambuco fica distante daqui’ designa
com o ‘aqui’ o lugar em que, na qualidade de Emissor, se encontra. Logo, aquele’, ‘minha’ e
‘aqui’ tem uma significação situacional e são por isso, pronomes. Do ponto de vista mórfico,
boa parte dos pronomes apresenta formas distintas conforme a pessoa do discurso a que se
referem. Entre estes pronomes, os denominados ‘pessoais’ têm formas distintas para cumprir
as funções de sujeito e complemento. Acrescenta-se, quanto ao aspecto mórfico que vários
pronomes apresentam, ao lado das formas masculinas e femininas, uma terceira forma
‘neutra’ (aquilo, em face de aquele/aquela).
O segundo critério de Mattoso, de modo simples, redistribui os nomes, os pronomes e
os conectivos segundo características sintáticas. O nome e o pronome podem ser substantivos,
adjetivos ou advérbios; os conectivos podem ser conjunções ou preposições. Estes papéis
podem ser identificados no contexto da oração ou do sintagma: em ‘meus amigos ingleses’,
amigos é o núcleo da construção, classificado por isso como substantivo, ao passo que
ingleses, constituinte modificador, é um adjetivo; por outro lado, em as crianças amigas’,
crianças é o núcleo e amigas funciona como adjetivo. Na mesma linha de raciocínio, diremos
que elas são meus amigas’, elas, sujeito da oração, é um pronome substantivo, enquanto
minhas, adjunto de amigas, é um pronome adjetivo. Além disso, o nome e o pronome podem
funcionar como advérbios se o termo que acompanham é um verbo e podem dar lugar a
expressões preposicionadas. É o que se passa com alto a aqui em ‘Os garotos conversam alto
(cf. Os garotos conversam com entusiasmo’) e em Os garotos conversavam aqui’ (cf. Os
garotos conversavam nesta sala’).
Quanto aos conectivos, há, segundo Mattoso, os que ligam palavras (preposições) e os
que ligam orações (conjunções). Assim, em ‘casa de pedra’, ‘de’ é uma preposição, cabendo,
porém, a ‘enquanto’ o papel de conjunção em ‘Vilma iria enquanto você chorava’.
Das considerações feitas nas linhas anteriores, depreende-se a necessidade de se
repensar as características sintático-semântico-discursivas dos advérbios para um estudo mais
atento dessa categoria.
2.2 Advérbio: elemento do léxico ou da gramática?
Tradicionalmente, é feita uma separação entre elementos do léxico ou lexemas e
elementos da gramática, ou morfemas propriamente ditos.
Os elementos do léxico configuram imediatamente a realidade extralingüística e os
morfemas gramaticais remetem a uma significação intralingüística (significação externa e
objetiva). Os verbos plenos, substantivos e adjetivos são considerados elementos do léxico e
outras classes como conjunções, preposições, etc. são de modo geral considerados elementos
da gramática, assim como as flexões, prefixos e sufixos. Mas classes que apresentam
características de ambos os níveis. Uma dessas classes é o advérbio, que ora se comporta
como um item do léxico (haja vista a possibilidade de criação de novos advérbios em -mente),
ora se comporta como elemento da gramática.
No que se refere aos vocábulos derivados em -mente, torna-se inadequado, considerá-
los morfemas lexicais ou lexemas fora de um contexto específico, visto que alguns deles,
isoladamente não remetem à realidade extralingüística (valores temporais, sociológicos,
psicológicos etc.), motivo pelo qual se prefere denominá-los vocábulos e não palavras.
Vale ressaltar que Cunha e Cintra (1985) consideram morfemas lexicais os
substantivos, os adjetivos, os verbos e os advérbios de modo e, morfemas gramaticais os
artigos, os pronomes, os numerais, as preposições, as conjunções, os demais advérbios, bem
como as formas indicadoras de número, gênero, tempo, modo ou aspecto verbal.
Além disso, Brinton e Traugott (2005), que utilizam uma perspectiva funcionalista
semelhante à que caracteriza este trabalho, consideram os advérbios, por suas características,
como elementos da gramática.
Verifica-se que, além de apresentarem todos os “advérbios de modo” como morfemas
lexicais, os gramáticos mencionados denominam morfemas gramaticais não os afixos e
desinências (formas presas), como também as formas dependentes, na perspectiva de Câmara
Júnior, estabelecendo entre tais elementos uma relação de igualdade.
Com base nestes pressupostos, pergunta-se:
1) como considerar todos os vocábulos derivados em -mente, inclusive os desgastados pelo
uso automatizado, morfemas lexicais?
e, em conseqüência:
2) como denominar todos os “advérbios” não-marcados pela presença do sufixo -mente,
indistintamente, morfemas gramaticais?
2.3 Advérbios: espécies, formas e significação
Os advérbios são tradicionalmente caracterizados, priorizando os critérios semânticos
e formais. Sob o critério semântico, o advérbio expressa circunstâncias e, por outro lado, sob
o critério formal, eles podem modificar um verbo, um adjetivo, outro advérbio, ou todo o
enunciado.
Começando pelo critério semântico, tem-se a idéia de circunstância. Entendemos
como circunstância determinados indícios ou particularidades que caracterizam o conteúdo
expresso pelo termo ao qual o advérbio se refere. Sendo assim, pode-se entender como
expressando circunstâncias dados informacionais bastante diferentes entre si, como tempo,
lugar, modo, causa e, até mesmo, intensidade. Mas é difícil admitir que determinados tipos de
advérbios expressem circunstâncias, como é o caso, por exemplo, dos advérbios de dúvida, de
afirmação e de negação, respectivamente exemplificados abaixo:
(1) Talvez amanhã chova.
(2) Sim, choveu muito.
(3) Não choveu muito.
Nestes casos, os advérbios destacados não expressam circunstâncias, pelo menos de
acordo com a definição proposta acima, e sim uma atitude ou posicionamento do falante em
relação àquilo que está falando. O mesmo ocorre com os advérbios abaixo:
(4) Com certeza, vai chover amanhã.
(5) Felizmente, não choveu.
(6) Sinceramente, eu não gosto de chuva.
Nestes casos, ocorre nitidamente uma atitude ou posicionamento do falante em relação
ao que fala. Ducrot (1972) propõe que estes advérbios referem-se ao próprio ato ilocucionário
de afirmar, uma vez que qualificam o ato de dizer e não a coisa direta. Para ele, alguns
advérbios têm sua utilização explicada apenas por uma teoria dos atos da fala ou teoria da
enunciação, cuja unidade é o discurso.
Ducrot (1972) também apresenta alguns advérbios que indicam pressuposição: mal,
quase, exceto, também, somente, muito, pouco, entre outros. Embora alguns destes elementos
não sejam considerados tradicionalmente como advérbios, Ducrot (1972) os apresenta como
tal, afirmando que sua introdução no enunciado permite que determinado fato seja
pressuposto:
(7) Ele quase parou de fumar.
Nesta frase, o uso do elemento quase leva à pressuposição de que "ele" tentou parar de
fumar.
Como se pode ver, a visão de que os advérbios exprimem circunstâncias é muito
limitada. determinados tipos de advérbios cujo uso é basicamente determinado por fatores
pragmático-discursivos. E mesmo aqueles que funcionam normalmente como
circunstanciadores (de tempo, de lugar, de modo, de causa, de intensidade) muitas vezes são
usados para direcionar a interpretação do ouvinte, promover a organização das informações
no discurso além de outras funções pragmático-discursivas.
É o caso, por exemplo, do advérbio de tempo já, que pode assumir um papel de
elemento de contra-expectativa, no sentido que Heine et al. (1992) dão ao termo:
(8) A reunião terminou?
Nesta frase, mais que uma noção temporal, o elemento demonstra noção de contra-
expectativa do falante de que a reunião não tivesse terminado. Ou seja, a frase expressa o
contrário da expectativa e o advérbio já é a marca disto: é um elemento de contra-expectativa.
Mas também é de grande relevância pensar no aspecto formal da definição de
advérbio. É correto caracterizar os advérbios como elementos que se referem a um verbo, a
um adjetivo, a outro advérbio ou à oração inteira? autores que tentaram questionar isto,
como, por exemplo, Silva Jr. e Andrade (1907: 155), que afirmaram que os advérbios podem
modificar substantivos:
(9) Gonçalves Dias era verdadeiramente poeta.
Bomfim (1988: 9) questiona esta hipótese, afirmando que o termo poeta, no caso, não
pode ser entendido substantivamente, mas como um conjunto de qualidades atribuídas ao
elemento que recebe a referência. Assim, segundo autora, o elemento verdadeiramente
funciona, na realidade, como intensificador de poeta.
Por outro lado, pode-se pensar em outros exemplos, como os agrupados abaixo:
(10) A reunião na casa de Paulo foi proveitosa.
(11) O exemplo acima demonstra a hipótese.
(12) O país precisa de pessoas assim.
Nestas frases, os termos sublinhados referem-se claramente aos substantivos que os
antecedem e expressam circunstância (lugar nos exemplos 10 e 11 e modo no exemplo 12).
São casos diferentes do exemplo 9, onde o substantivo a que o advérbio se refere desempenha
função de predicativo. Deve-se considerar estes casos advérbio ou não? Mais uma vez se
evidencia a necessidade de se repensar o conceito tradicional de advérbio.
Mas este trabalho se deterá, mais especificamente, na ordenação dos advérbios de
tempo e de aspecto terminados em -mente. Mas é interessante estarmos sempre repensando
seu papel na estrutura da Língua.
Conforme propôs Givón (2001), a classe dos advérbios é a menos homogênea, tanto
do ponto de vista semântico quanto do morfossintático. Essa heterogeneidade é agravada pelo
fato de os advérbios funcionarem num plano de utilização da língua que tramita entre o campo
do léxico e a área da gramática, normalmente composta de elementos que assumem funções
voltadas para a organização interna do texto ou para a orientação argumentativa que se quer
dar a ele. De fato, o rótulo advérbio designa um conjunto muito diferenciado de elementos, e
parece constituir uma categoria fluida, que tende a se adaptar às intenções comunicativas
envolvidas no discurso.
Tradicionalmente, os advérbios são caracterizados como elementos de base nominal
(apenas < a + penas, depressa < de + pressa) ou pronominal (aqui, hoje) que de um ponto de
vista formal, são invariáveis, de um ponto de vista funcional (Câmara Jr: 1983) são termos
determinantes de um verbo ou de um nome (adjetivo e outro advérbio) e, de um ponto de vista
semântico, expressam circunstâncias, como foi explicitado anteriormente, ou seja, o
problema da generalização das definições.
2.4 Visão Tradicional dos Advérbios
Com base no que observamos em Said Ali (1969), Melo (1970), Rocha Lima (1985),
Cunha & Cintra (1985) e Bechara (2000), podemos dizer que os advérbios são
tradicionalmente caracterizados, de um ponto de vista semântico, por expressarem
circunstâncias e, de um ponto de vista formal, por modificarem um verbo, um adjetivo, outro
advérbio, ou toda a declaração, como se pode observar na definição de advérbio proposta por
Rocha Lima:
[...] palavras modificadoras do verbo. Servem para expressar
as várias circunstâncias que cercam a significação verbal (...).
Alguns há, até, que não acompanham a verbos, mas somente a
adjetivos e advérbios. (ROCHA LIMA, 1985: 174).
No que se refere especificamente aos advérbios de tempo, as gramáticas tradicionais
também não dizem muito. Apresentam a noção de tempo como uma das noções
circunstanciais expressas pelos advérbios e elencam uma série de elementos, como: agora,
ainda, amanhã, anteontem, antes, breve, cedo, depois, então, hoje, jamais, logo, nunca,
ontem, sempre, tarde, entre outros. Também não se vê, nas gramáticas tradicionais, uma
relação entre determinadas noções aspectuais e a classe dos advérbios. Aliás, a noção de
aspecto é normalmente deixada de lado nas gramáticas e as diferenças entre as noções
temporais dêiticas e não-dêiticas não são abordadas.
A respeito da ordenação dos advérbios, tema que nos interessa mais, os gramáticos
tradicionais, de um modo geral, nada menciona. Apenas Cunha e Cintra (1985) e Bechara
(2000) falam algo sobre o assunto.
Cunha e Cintra (1985) se referem à colocação adverbial em sua gramática, afirmando
que "os advérbios que modificam um adjetivo, um particípio isolado ou outro advérbio
colocam-se de regra antes destes". Em seguida, propõem que, com relação aos advérbios que
modificam o verbo, ocorre o seguinte:
a) Os advérbios de modo colocam-se normalmente depois do verbo.
b) Os advérbios de tempo e de lugar podem colocar-se antes ou depois do verbo.
c) O advérbio de negação antecede sempre o verbo.
Ainda acrescentam que os advérbios modificadores de outro advérbio, de um adjetivo
ou de um particípio isolado posicionam-se antes destes.
Os autores em questão propõem também que "o realce do adjunto adverbial é
expresso de regra por sua antecipação ao verbo", mas nada dizem em relação à colocação de
cada tipo específico de advérbio para fins de realce, muito menos o que ocorre neste sentido,
com os tipos de advérbios que já tendem a aparecer antes do verbo.
Entretanto, tratam a colocação desses advérbios em linhas muito gerais, uma vez que
se sabe, por exemplo, que os advérbios de modo são muito complexos. Além disso, não dizem
o porquê de tal ordenação. Também não mencionam a posição de outros tipos de advérbios.
Bechara (2000) também menciona a questão da colocação dos advérbios, ao afirmar
que esses elementos não se referem apenas ao verbo, podendo assim aparecer em várias
posições. Considera que a melhor proposta é a de Llorach (2000): o analista deve ater-se “às
relações que cada advérbio contrai dentro do enunciado, quer no seu papel primário de
adjacente circunstancial, quer por sua combinação com outras unidades no interior de um
grupo nominal unitário”. Como analisa Martelotta (2000), essa é a posição tomada por muitos
trabalhos de base funcionalista, em que a colocação dos advérbios está relacionada ao seu
funcionamento no enunciado.
Em Bechara (2001:290), é dito que o advérbio possui certa flexibilidade de posição,
uma vez que sua função não está ligada apenas ao verbo, mas estende-se ao conteúdo
expresso pelo predicado e ao domínio do sujeito, podendo antecedê-lo ou precedê-lo. No
entanto, o autor não especifica em que contextos tais posições podem ocorrer.
Como se pode ver, as gramáticas tradicionais são pouco elucidativas no que se refere
à classificação e, sobretudo, à ordenação de advérbios, apresentando propostas para os
diferentes tipos de advérbios que são bastante controversas: os advérbios de negação, por
exemplo, não antecedem sempre o verbo e podem ocorrer antecedendo o termo, na sentença,
que está sendo negado (Ex.: Eu chamei não a você, mas a seu irmão). E afirmar que os
advérbios de modo colocam-se normalmente depois do verbo é nada dizer diante da
complexidade da colocação deste tipo de advérbio na sentença e a outras propriedades
pertinentes a outros desses elementos.
2.5 Pesquisas sobre advérbios, sob orientação da Lingüística
2.5.1 Tipos de advérbios
Um dos trabalhos que apresenta uma profundidade sobre a ordenação dos advérbios é
o de Ilari et al. (1990), que, em uma análise detalhada dos advérbios e de sua ordenação,
propõem que essa classe de palavras pode dividir-se em dois grandes tipos: predicativos e
não-predicativos.
Os advérbios predicativos caracterizam-se por constituírem argumentos de segunda
ordem. Assim como o verbo e o adjetivo atribuem uma ação ou qualidade ao sujeito, os
advérbios predicativos modificam a ação ou qualidade atribuída ao sujeito. Do ponto de vista
sintático, esses advérbios podem modificar o sentido do verbo, do adjetivo ou de outro
advérbio. São exemplos desse tipo de advérbio: bem, muito, gratuitamente. Os não-
predicativos, por outro lado, não são compatíveis com as idéias de modificação de sentido e
de predicação de segunda ordem, apresentando funções bastante diferentes daquelas que
caracterizam os advérbios predicativos.
Interessam-nos, nesse trabalho, os advérbios predicativos. Nessa classe de advérbios
enquadram-se, segundo os autores, as seguintes subclasses:
a) Qualitativos - paralelos à construção com substantivo, que expressa qualidade (comida
boa), esses advérbios modificam o sentido dos elementos a que se referem: Comer bem,
maravilhosamente bem. Entre esses advérbios encontram-se mal, assim, entre outros.
b) Intensificadores - relacionam-se tipicamente a verbos, adjetivos e advérbios,
intensificando-lhes o sentido: muito, mais, etc.
c) Modalizadores - aplicam-se a sentenças completas e indicam atitude proposicional:
certamente, felizmente, etc.
d) Aspectualizadores - são advérbios cujos traços semânticos correspondem a noções
aspectuais do verbo da sentença em que ocorrem: geralmente, diariamente, de vez em quando,
algumas vezes, etc.
Os qualitativos e os intensificadores apresentam características muito semelhantes
entre si, que podem referir-se ao verbo, ao adjetivo ou a outro advérbio. Isso os diferencia
dos chamados modalizadores, que, segundo os autores, de um modo geral, qualificam a
asserção, relacionando-se à sentença inteira.
Quando se referem ao verbo, os advérbios qualitativos apresentam determinadas
restrições seletivas quanto ao conteúdo do verbo que modificam, tendo, portanto, fundamento
argumental. Assim, alguns advérbios não podem referir-se a determinados verbos: o advérbio
gratuitamente, por exemplo, não pode ser atribuído ao verbo pagar.
Isso diferencia os qualitativos dos advérbios aspectualizadores, cuja restrição seletiva
se refere ao esquema tempo-aspectual do verbo: o advérbio geralmente, por exemplo, não
pode referir-se a uma forma verbal, de aspecto pontual e concluído, como, por exemplo, a
forma verbal caiu.
Curiosamente, Ilari et al. (1990), que propõem um trabalho sobre ordenação, pouco
falam acerca das tendências de colocação dos aspectualizadores. Além disso, não mencionam
uma categoria de advérbios de tempo, mas de advérbios aspectualizadores, que “indicam a
freqüência com que um verbo se reitera”. Dos exemplos apresentados pelos autores, todos se
relacionam a noções tradicionalmente associadas ao conceito de aspecto iterativo: geralmente,
normalmente, diariamente, de vez em quando, às vezes, entre outros. Entretanto, os autores
nada dizem sobre elementos adverbiais associados a outras noções aspectuais, como
pontualidade ou duratividade ou mesmo sobre elementos adverbiais, como ontem, hoje e
amanhã, por exemplo, que expressam informações temporais dêiticas, que não se relacionam
à noção de aspecto, mas à categoria gramatical de tempo, que, por definição, possui natureza
dêitica.
Outros autores, como veremos mais adiante, também acrescentam entre os tipos de
advérbios, termos que indicam noções semanticamente associadas a noções aspectuais. Um
exemplo de outro estudo sobre os advérbios e sua classificação é o de Castilho (1999). Nesse
trabalho, os tradicionalmente chamados advérbios de tempo foram arrolados entre um grupo
de advérbios que o autor classificou como qualificadores aspectualizadores.
O autor define a predicação qualificadora como “um processo semântico-sintático por
meio do qual um operador incide sobre uma classe, modificando ou confirmando sua
intenção, isto é suas propriedades específicas, ou traços semânticos ou semas, na terminologia
da Semântica estrutural”. Em seguida afirma que a qualificação é codificada gramaticalmente
pelos adjetivos, pelos advérbios predicativos e pelos adverbiais, representados por um
sintagma nominal ou por um sintagma preposicionado com valor adverbial.
Quanto aos chamados qualificadores aspectualizadores, o autor relaciona essa classe
de advérbios com a noção de aspecto, que possui natureza composicional, que resulta da
interação do sentido lexical do verbo com o tempo em que foram conjugados, seus
argumentos, os adjuntos adverbiais a ele associados e o padrão sintático em que o verbo está
encaixado.
O autor centra suas análises nas noções de perfectividade vs imperfectividade e
telicidade vs. atelicidade e propõe a existência de aspectualizadores imperfectivos e
perfectivos. Vejamos respectivamente dois exemplos dados pelo próprio autor:
(01)... ela teve escritórios durante... oito anos:: mais ou menos
(02) ajeitou os cabelos de um golpe
A importância desse trabalho está no fato de o autor resgatar uma importante relação
entre aspecto e discurso, relacionando os usos desses advérbios aos dois planos discursivos
característicos da narrativa, propostos em Hopper (1979): figura e fundo. O autor propõe que,
na narrativa por ele analisada, as ações imperfectivas ocorrem em fundo e também em figura,
contrariando a proposta de Hopper (1979), de que a imperfectividade é típica de fundo.
O trabalho de Castilho (1999), portanto, tem o valor de sofisticar mais um pouco a
noção de advérbio aspectual. Mas, além de não mencionar questões relacionadas à ordenação,
ainda não resolve os dois problemas básicos apontados. Não analisa outras noções
aspectuais, além da distinção entre perfectividade vs imperfectividade e as noções
semanticamente próximas a ela. Nada menciona acerca dos elementos adverbiais que
expressam informações temporais dêiticas, que não se relacionam à categoria de aspecto, mas
à de tempo.
Outro trabalho que merece menção é o de Givón (2001), que chama atenção para o
fato de que advérbios podem indicar, no tempo, vários aspectos temporais dos eventos e
caracterizam esses advérbios como advérbios de tempo e aspecto. Para o autor, não é o verbo,
mas a cláusula que constitui o escopo semântico destes advérbios, cujas características
morfossintáticas são muito heterogêneas.
Sem entrar em detalhes de análise, o autor apresenta exemplos do inglês, que são
tipicamente aspectuais, como often, always, again, continuously, on and on, entre outros.
Podemos notar que o autor não se restringiu ao aspecto iterativo, na medida em que
apresenta o caso de continuously e on and on, por exemplo, que se relacionam a outras noções
aspectuais, como imperfectividade e progressividade. Por outro lado, apresentam também
exemplos de advérbios tradicionalmente temporais, como yesterday, tomorrow, entre outros.
Essa é a tendência que seguiremos aqui. Adotaremos uma classificação que leve em
conta as noções de tempo e aspecto, procurando refinar a análise das relações entre advérbios
e as diferentes noções aspectuais. Com base nisso, observaremos o comportamento desses
elementos nas diferentes fases do português, na modalidade escrita, tentando relacionar esses
dados com as diferenças em suas tendências de ordenação.
É importante também ressaltar que estamos lidando apenas com advérbios de tempo
e de aspecto em -mente.
2.5.2 Estudos sobre o advérbio em -mente e sobre ordenação de advérbios
Passamos agora a uma revisão dos estudos feitos sobre advérbios em -mente ou sobre
ordenação _ os dois focos principais desta tese _ sob o ponto de vista da ciência Lingüística.
A tese de Rodrigues (1994) apresenta um estudo de cunho variacionista com uma
perspectiva de comparabilidade funcional que analisa outras possíveis funções dos vocábulos
derivados em -mente, além dos adjuntos adverbiais. Afirma que esses vocábulos não
configuram isoladamente uma classe gramatical.
Ao analisar os dados e pressupostos teóricos de diversos autores, Rodrigues pôde
definir o advérbio como “vocábulo de natureza nominal, modificador do verbo que, em
relação aos outros nomes, caracteriza-se por apresentar invariabilidade de gênero e número”
(1994:159).
A autora estabeleceu uma oposição entre função adverbial e quaisquer outras funções
que os vocábulos derivados em -mente pudessem exercer no corpus analisado.
Assim, adotou o termo “pseudo-advérbio” de Bonfim (1988), para agrupar essas
outras funções, a saber: 1) a discursiva (funcionam como marcadores); 2) a de modificador de
nome; 3) a de modificador de sintagma preposicional; 4) a de modificador de sentença; 5) a
de modificador do pronome.
Representou essa distinção no seguinte quadro:
Quadro1 – Distinção entre Advérbio e Pseudo-advérbio
CLASSE
Nomes derivados
Em -mente
FUNÇÕES
Advérbio
“Pseudo-advérbio”:
–discursivo
-modificador de nome
-modificador do SP
-modificador da sentença
-modificador do pronome
(Rodrigues,1994:161)
A autora descobriu que o tipo do verbo aliado à classe do vocábulo que pertence à
classificação semântica do nome em -mente foram os fatores condicionadores da função dos
vocábulos derivados em -mente, que foram, na maioria das vezes, os “pseudo-advérbios”
(Rodrigues, 1994:162).
Outra pesquisa sobre itens em -mente é a dissertação de Freitas (2004), na qual a
autora trata especificamente dos advérbios temporais e aspectuais em -mente na língua oral
portuguesa, sob uma perspectiva funcionalista. Verifica que a posição mais típica desses
advérbios na oração é a pré-verbal quando ocorrem nas orações formadas pela estrutura
padrão da língua portuguesa SVCo (sujeito, verbo e complemento). Além disso, verifica que a
posição pré-verbal era predominante. Constatou, ainda, que há uma diferença de ordenação da
posição pré-verbal para pós-verbal, ou, pelo menos uma tendência para isso, quando não
um argumento verbal na posição adjacente e posterior ao verbo. Freitas verifica também que
certos itens em -mente como primeiramente e finalmente estão se gramaticalizando. Esses
deixam de expressar somente o tempo dos eventos e passam a organizar os eventos
cronológicos em seqüência textual, funcionando, segundo a autora, como conectivo, vejamos
alguns exemplos dados pela autora:
(1) /.../ o meu filho mais velho tem trinta e dois anos, depois eu tenho um filho de vinte e oito,
ai um intervalo de oito anos, eu tenho uma filha, (e finalmente com outro intervalo de seis
anos tem um garoto) (NURC-RJ, INQ. 084, 1.37).
(2) /.../ E: isso...como...como se faz?
I: primeiramente você pega a calha... pega a calha e ::/ tem um:: lugar de colocar o :: porta
start... aí você tem que furar ... os dois buraquinhos do lado... se for lâmpada de duas... porque
tem lâmpada? Tem luminária de uma lâmpada...de duas... tem lâmpada de vinte/.../ (D&G,
Juiz de Fora, 2
o
grau, relato de procedimento).
Segundo Freitas (2004), nos exemplos (1) e (2) acima, os itens destacados possuem
características de ligação entre sentenças e contextos lingüísticos, funcionando como
elementos de conexão.
Moraes Pinto (2002) fez uma análise da colocação e da polissemia de alguns itens
adverbiais em -mente no português arcaico e no português do século XIX, com atenção aos
seus valores qualitativos e modalizadores.
O objetivo desta pesquisa foi demonstrar que alguns advérbios qualitativos e
modalizadores terminados em -mente sofreram, no decorrer do tempo, mudança na sua
polissemia do português arcaico até os dias atuais. Essa mudança é sucessiva e unidirecional e
consiste num processo de gramaticalização, com esses elementos passando de advérbios
internos à cláusula a advérbios sentenciais. Em certos casos, os valores qualitativos
encontrados no início da trajetória desaparecem e os advérbios passam a assumir funções
pragmático-discursivas.
Os diferentes valores semânticos desses elementos implicam diferentes colocações e
funções na oração. No português arcaico, os advérbios qualitativos possuíam grande
mobilidade na cláusula, podendo ocupar diversas posições, inclusive a de tópico. A partir do
século XIX, algumas posições se tornaram indisponíveis a esses advérbios, pois, com o
processo de gramaticalização, conforme seus valores semânticos se modificavam, eles
passaram a ter um caráter específico e passaram a depender das características gramaticais de
sua nova função. Esse trabalho tem grande relevância para a presente tese, pois nos aponta
alguns caminhos a ser trilhados, como em relação ao processo de gramaticalização, a questão
ordenação no decorrer do tempo, além dos fatores analisados que motivaram sua realização
através dos séculos.
A pesquisa de Andrade (2005), sobre a ordenação das locuções adverbiais de tempo
em 100 editoriais sob o arcabouço teórico funcionalista, demonstrou que as locuções
temporais não têm uma posição prototípica nesse gênero, apresentando apenas uma pequena
tendência de ocorrência na posição pós-verbal (55% dos dados). A autora observou que as
locuções (tanto as pequenas como as mais longas), em editoriais tendem a aparecer nas
posições marginais à cláusula, ou seja, logo no início da cláusula ou no final, como nos
exemplos a seguir:
.
(3) Nas últimas duas eleições, indiretas, não houve sequer desafiante. (12-JB/1999).
(4) É a oportunidade de recuperar o verniz que o partido perdeu ao longo do caminho. (129-
JB/2004).
As locuções, no gênero estudado, aparecem normalmente na posição de sujeito quando
este está ausente (sujeito oculto ou oração sem sujeito) ou está na posição pós-verbal. Neste
caso, ou seja, na ordem VS (verbo-sujeito), 74% das locuções coletadas estão na posição pré-
verbal, como no exemplo:
(5) Nos últimos dois meses, foi roubado o carro blindado do ministro da justiça. (47-
JB/2003).
Mas, quando o sujeito está na sua posição prototípica, ou seja, na ordem SV, as
locuções adverbiais aparecem 68% na posição pós-verbal, como no exemplo a seguir:
(6) A Libéria nasceu em 1822, como pátria de ex-escravos americanos. (JB/2003).
Como Andrade, também verificaremos a posição dos advérbios em -mente e a relação
com a presença ou ausência do sujeito.
Cezario, Ilogti e Costa (2005) verificaram que, em textos religiosos contemporâneos,
as locuções tendem a ocorrer na posição pré-verbal (62% dos dados), como no exemplo:
(7) “minutos depois estava ali apenas a mulher e ele (CSP)
De todos os tipos semânticos estudados (locuções dêiticas, durativas, reiterativas e
simultâneas) pelas autoras, apenas as durativas tendem a ocorrer em posição pós-verbal
(72%).
As autoras observam que as locuções que aparecem inseridas entre o sujeito e o verbo
ou entre o verbo e o complemento/predicativo estão em orações com baixíssima
transitividade, como as com verbo de ligação ou com modal e verbo de ligação:
(8) “A aclamação depois da consagração também pode ser cantada” (p.74, l.11 CEV)
(9)Nossas músicas deverão ser ao mesmo tempo carismáticas e proféticas (p.84, l.28 CEV)
as orações com mais traços positivos de transitividade tendem a ter as locuções em
posições marginais, como abaixo em que a locução A seguir ocorre na margem esquerda de
uma oração altamente transitiva:
(10) “(...) rangeu os dentes, mudou de cor, fez a pior carranca do universo, prendeu as mão e
deu um grito de raiva. A seguir levantou o soldado pela roupa, virou o rosto e disse (...)” (p.
143, CSP).
Essa pesquisa é importante para a presente tese, pois também será testada a relação
entre semântica do elemento adverbial e ordenação. A questão da transitividade será vista
indiretamente ao estudarmos a relação entre tipo semântico do verbo e a posição do advérbio.
Albani (2007) verificou que a posição típica do advérbio sempre era pré-verbal no
português arcaico e pós-verbal no português contemporâneo. Todos os fatores estudados
indicam que, no português arcaico, a ordem era mais livre e mais motivada, enquanto no
português atual a ordem é mais fixa. Segundo ele, há um forte indício de mudança na
ordenação do advérbio sempre em textos religiosos.
Seu trabalho foi importante para esta tese, pois é uma pesquisa de ordem diacrônica e
que traz resultados interessantes quanto à fixação de posição de advérbios. Muitos dos fatores
testados por ele também foram testados por nós, como a relação entre tipo semântico de verbo
e ordenação de advérbio. Com relação a esse fator, Albani destaca que, no português atual, o
advérbio sempre quase que categoricamente se apresenta na posição pós-verbal quando o
verbo é relacional intensivo (verbo de ligação).
Uma pesquisa de grande importância para o nosso trabalho é a realizada por
Martelotta (1994) que; analisa, em uma perspectiva funcional, a ordenação dos
circunstanciadores temporais. Esses compreendem os advérbios, adjuntos, orações adverbiais
e operadores argumentativos que expressam a noção do tempo. O corpus utilizado é
constituído de entrevistas elaboradas pelo Censo de Variação Lingüística, Competências
Básicas de Português e NURC. Para o estudo diacrônico dos operadores argumentativos,
foram utilizados textos antigos, como: “Vigeu da Consolação” (1959), “A demanda do Santo
Graal” (1944), “O Bosco Deleitoso” (1950), dentre outros.
O objetivo do estudo do autor é buscar fatores discursivos que motivem a colocação
desses circunstanciadores na sentença. Em outras palavras, o autor propõe demonstrar que os
argumentadores discursivos seguem leis e tendências de colocação diferentes dos demais
circunstanciadores. A ordenação dos argumentadores discursivos deve-se a dois processos de
mudança semântica: metáfora espaço> (tempo) > texto (Heine et al., 1991) e pressão de
informatividade. ( Traugott e Heine, 1991).
O primeiro processo de mudança consiste em um elemento de valor espacial assumir
um sentido temporal e, depois, passar a expressar relações lógicas no discurso. Por exemplo:
“O operador argumentativo aí, originalmente um dêitico espacial, pode também ser usado
para seqüenciar (temporalmente) os eventos e expressar uma idéia de conseqüência em
relação às sentenças anteriormente mencionadas” (Martelotta 1994:5).
A mudança por pressão de informatividade dá-se quando um elemento lingüístico
adquire um novo valor através de um processo de inferência conversacional em certos
contextos. Um exemplo citado por Martelotta é o do operador argumentativo “ainda cujo uso
de marcador de contra-expectativa, por um processo de inferência passa a assumir um valor
inclusivo semelhante ao do termo também” (1994:6).
O autor ressalta que geralmente esses dois processos de mudança ocorrem juntos
quando se trata do aparecimento de operadores argumentativos que tendem a perder sua
mobilidade original para assumir posições mais fixas na sentença. Esse processo de
gramaticalização foi estudado nos seguintes operadores argumentativos: aí, depois, logo,
então, já e ainda.
Ao apresentar a ordenação dos circunstanciadores temporais, propriamente ditos,
Martelotta adota o princípio de Hopper e Thompson (1980) de que o discurso narrativo
apresenta duas estruturas denominadas figura e fundo, estendendo-o ao discurso não-
narrativo.
Distingue figura e fundo, primeiramente, opondo a intenção do falante ao direcionar o
fluxo do discurso para a narrativa ou para a não-narrativa: se o falante está narrando, eventos
e situações não-narrativas funcionam como fundo; e, ao contrário, se o falante está
comentando ou descrevendo, eventos e situações narrativas funcionam como fundo, servindo
para evidenciar este comentário ou esta descrição (1994:2-3).
Uma outra distinção entre figura e fundo é realizada através da análise de traços
semântico-gramaticais. Assim, na narrativa, os eventos funcionam como figura quando são
marcados pelos traços [=específico], [=perfectivo], [=cinético], [pontual] e funcionam como
fundo quando marcados pelos traços [-específico], [-perfectivo], [-cinético], [-pontual].
no discurso não-narrativo, os eventos que funcionam como figura são marcados
pelos traços [-específico], [+perfectivo], [+cinético], [+pontual] e funcionam como fundo,
aqueles marcadores por [-específico], [-perfectivo], [-cinético], [-pontual].
Com o objetivo de verificar as tendências de posições desses circunstanciadores de
tempo, Martelotta os classificou em:
a)Circunstanciadores de tempo determinado- são aqueles que indicam, de forma precisa, o
momento em que ocorre o evento. Cita como exemplos: ontem, hoje, semana passada,
quando ele chegou etc.
b)Circunstanciadores de tempo indeterminado- expressam a noção de que os eventos e
situações perduram no tempo indeterminadamente. Exemplifica com: sempre, geralmente,
atualmente, nunca etc.
c)Circunstanciadores iterativos- denotam a freqüência com que os eventos não-específicos
ocorrem ao longo do tempo, como às vezes, duas vezes por semana, de vez em quando etc.
d)Circunstanciadores de simultaneidade- expressam a concomitância entre eventos e
situações. Como os exemplos, citam: enquanto isso, ao mesmo tempo etc.
e)Circunstanciadores delimitativos- delimitam os eventos e as situações, indicando o início
e/ou fim de sua permanência no tempo, como: há três anos, até hoje, durante dois meses etc.
O autor conclui que existe uma tendência determinada para a colocação dos
circunstanciadores temporais na sentença. Essa depende da força que a informação, carregada
pelo circunstanciador, assume dentro da estrutura do discurso em que ele ocorre.
O circunstanciador tende a aparecer em posições pré-verbais, “quando traz
informações temporais análogas aos traços semântico-gramaticais do discurso em que ocorre.
Esta relação semântica empurra o circunstanciador para as posições pré-verbais, enfatizando-o
ou topicalizando-o” (1994:201).
No entanto, se não essa relação semântica, o circunstanciador tende a ocorrer nas
posições pós-verbais, ou até não ocorrem “em tipos de discurso cujos traços semântico-
gramaticais são não-análogos ou incompatíveis com a informação temporal por ela expressa”
(1994:201). Dessa forma, os circunstanciadores de tempo determinado tendem a ocupar
posições pré-verbais em figura narrativa e não-narrativa, uma vez que a força informativa que
assumem nestes contextos os leva a ser topicalizados ou enfatizados.
Os circunstanciadores de tempo indeterminado e os circunstanciadores de
simultaneidade têm como tendência o aparecimento na posição pré-verbal em fundo narrativo
e não-narrativo, devido também à força informativa assumida que os leva a topicalização ou
ênfase.
No que se referem aos circunstanciadores iterativos, esses apresentam maior
ocorrência nas posições pré-verbais em fundo narrativo e não-narrativo e em figura não-
narrativa, já que esses tipos de discursos são marcados pelo traço [-específico], estimulando a
iteratividade.
Por fim, os circunstanciadores delimitativos possuem uma mobilidade de colocação
maior, porque apresentam duas características distintas: por um lado, funcionam como um
circunstanciador de tempo determinado (indica o momento específico em que se inicia e/ou
termina o evento). Por outro lado, “expressam a duração de eventos específicos imperfectivos,
ou de eventos não-específicos ao longo do tempo, acrescentando características semântico-
gramaticais típicas de fundo” (1994:229).
Quanto à colocação dos operadores argumentativos, Martelotta afirma que, devido ao
processo de gramaticalização que sofrem, não seguem as mesmas tendências de ordenação
dos circunstanciadores propriamente ditos. A gramaticalização faz com que o elemento exerça
funções argumentativas, restringindo a sua possibilidade de colocação na sentença. Tal
colocação “passa a depender mais das características gramaticais específicas de suas novas
funções, que se manifestam em contextos específicos, assumindo posições mais fixas dentro
da sentença” (1994:229-230).
O trabalho de Martelotta (1994) foi muito importante para presente tese, sobretudo, no
que se refere às posições estabelecidas, como também no que se refere a alguns parâmetros da
transitividade, à análise bastante detalhada dos circunstanciadores de tempo, buscando fatores
que influenciam a sua colocação na sentença à luz da teoria funcional.
Ressaltamos que o autor estuda os advérbios em geral, enquanto, esta tese trata apenas
dos advérbios de tempo e aspecto em -mente.
França (2002) parte da tese de Martelotta e faz uma análise dos adjuntos adverbiais de
tempo e aspecto em narrativas orais e escritas contemporâneas, procurando delimitar os
valores que esses adjuntos apresentavam no texto narrativo, assim como as tendências de
colocação que eles assumiam nas cláusulas que compunham o texto. Esses adjuntos
adverbiais de tempo e aspecto, de um modo geral, apresentam uma grande mobilidade na
cláusula, podendo ter suas tendências de ordenação explicadas por fatores de caráter sintático
e discursivo.
Um dos fatores mais importantes foi o plano discursivo. A autora verificou que
tendiam a serem enfatizados, ocupando posições pré-verbais, os adjuntos que apresentavam
traços semântico-gramaticais análogos aos traços semântico-gramaticais do plano de discurso
em que apareciam; enquanto os adjuntos adverbiais de tempo e aspecto determinados não
apresentaram resultados estatísticos que ratificassem a hipótese postulada; já os adjuntos
adverbiais de tempo e aspecto indeterminados tendiam a ocupar posições pré-verbais em
fundo, porque este tipo de discurso caracteriza-se pela presença de situações não-específicas;
e ainda, os adjuntos adverbiais de tempo e aspecto de simultaneidade tendiam a ocorrer em
fundo e em posições pré-verbais. Isto ocorria porque o discurso de fundo tende a apresentar
traços semântico-gramaticais (não-específicos) marcados pela simultaneidade; os adjuntos
adverbiais delimitativos, embora não tenham apresentado tendência muito forte, pareciam
buscar as posições pós-verbais em figura já que expressavam a duração de eventos específicos
imperfectivos, ou de eventos não-específicos ao longo do tempo, apresentando traços
semântico-gramaticais típicos de fundo; enquanto aos adjuntos adverbiais de tempo e aspecto
iterativos tendiam a ocorrer em posições pré-verbais de fundo, porque este tipo de discurso é
marcado pela presença do traço não-específico; e, além disso, a ordenação vocabular,
portanto, não podia ser explicada por fenômenos estritamente sintáticos.
Portanto, a estrutura organizacional do texto influenciava a colocação dos adjuntos
adverbiais de tempo e aspecto.
O estudo de Pereira (1999) verifica a ordenação das orações adverbiais de tempo,
desenvolvidas e reduzidas, num corpus constituído por 108 cartas pessoais, escritas entre
1937 e 1987. Esse trabalho, baseado nas teorias variacionista e funcionalista, busca identificar
os fatores cognitivos e discursivos que motivam a variação da ordem de algumas dessas
orações, tornando-as fixas na sentença.
Os dados foram separados em dois grupos: 1)orações temporais com ordenação
variável (total ou parcial) e 2) orações temporais de ordem fixa ou categórica. Segundo a
autora, o primeiro grupo foi submetido a uma análise estatística multivariacional através do
pacote de programas VARBRUL. O segundo foi analisado qualitativamente:
Pereira observou as seguintes posições da oração temporal:
a)Anteposição: corresponde às orações temporais situadas na margem esquerda da oração
núcleo.
(11) ”Um dia desses fui pedir uma xícara de chá e só ela estava lá.
Quando pedi que ela fizesse, ela tremeu de alegria e disse...
b) Posição: corresponde às orações temporais situadas na margem direita da oração com que
se combinam.
(12) “Escreva-me contando assim que tiver um tempinho”.
c) Intercalação: corresponde às orações temporais situadas no interior da oração núcleo,
quebrando a fluidez da idéia apresentada nesta oração.
(13) “M. vou parando por aqui senão quando voltar não tenho novidades pra te contar”.
Verificou que não houve diferença marcante entre posposição e anteposição. Percebeu,
também, que muitas das orações temporais intercaladas eram reduzidas de infinitivo e curtas
(cerca de quatro palavras cada uma), o que proporcionava uma melhor fluidez do discurso,
facilitando de certa forma o processo comunicativo.
Dentre os vários fatores analisados, destacamos o que se refere aos tipos de verbo do
segmento temporal. Os verbos foram codificados a partir de três classificações baseadas em
Dik (1989) e Braga (1996):
1-Ação (realização e atividade)
2-Processo (mudança e dinamismo)
3-Situação (posição e estado)
Os resultados mostram que o tipo de verbo do enunciado temporal é mais freqüente
seguido do processo, e o menos freqüente é a situação. A autora relata que “os resultados para
o tipo de verbo das orações isoladas não se mostram eficientes”, portanto considerou “para a
análise a correlação dos tipos de verbos das orações que compõem o enunciado temporal”
(1999:72). Dessa forma, constatou que “as orações com verbos de ação tendem a vir na
segunda posição, independentemente de constituírem o núcleo ou o satélite do enunciado
temporal (...) orações com verbos de situação e processo tendem a vir na primeira posição,
quando associadas a uma oração com verbo de ação, funcionando como pano de fundo para
os eventos mais dinâmicos codificados na segunda oração” (1999:72-73).
Outro fator que também colocamos em evidência é aquele que concerne à distribuição
de informação. Pereira analisou o tipo de informação codificada pela oração núcleo e pela
oração temporal. Ambas as orações foram classificadas conforme as categorias: novo, velho e
inferível, nos termos de Prince (apud Pereira, 1999). Os resultados mostram que orações
temporais que codificam informação velha, mencionadas no discurso anterior, são mais
propensas à anteposição. Sendo assim, ”Orações temporais que codificam informação nova,
não mencionada no contexto e nem inferível dele, são preferencialmente pospostas (...) o
contexto mais favorável à anteposição da oração temporal é aquele em que se relacionam uma
oração núcleo nova e uma oração temporal com informação velha” (1999:88).
No que diz respeito às orações temporais de ordem fixa, verificou que os bloqueios
mais freqüentes à reversibilidade das orações pospostas são: as com o focalizador sozinho e as
que estão ancoradas num constituinte da oração anterior.
Quanto à anteposição da oração temporal, os resultados mostraram que os fatores mais
relevantes para a fixação dessas orações são: em primeiro lugar, as relações anafóricas, em
segundo lugar, as expressões cristalizadas, em terceiro lugar, a seqüência discursiva.
A relevância do trabalho de Pereira para o presente estudo justifica-se por também
investigar fatores que tendem a motivar a ordenação dos elementos em análise.
Lessa (2007) se propôs investigar a ordenação de circunstanciais temporais (advérbios
e sintagmas preposicionados com valor circunstancial) na modalidade escrita do português e
do inglês, levando em conta, principalmente, fatores de ordem discursiva. A autora constatou
que, para se abordar a questão da ordem não marcada, deveria considerar as duas línguas
(português e inglês) de forma distinta.
Quanto aos resultados obtidos nesse estudo, verificou-se que os advérbios tendiam a
ordem não marcada no inglês é a anteposição verbal. Já em relação aos Spreps, não houve
como tirar essa conclusão, devido à grande variabilidade na oração.
Além disso, em relação ao posicionamento mais detalhado dos circunstanciais de
tempo na cláusula, observou-se que os advérbios em português ocupavam as posições ME
(margem esquerda) e PM2 (entre o verbo e objeto) com mais freqüência, enquanto no inglês,
eles preferiam a PM1(entre o sujeito e o verbo). Este fato no inglês pôde ser explicado,
principalmente, em virtude de os advérbios menores possuírem uma ordem mais rígida. Os
Spreps em português possuíam uma clara preferência pela margem direita da oração,
enquanto que, em inglês, os Spreps apresentaram grande variabilidade nas duas margens da
oração.
Portanto, a função discursiva dos circunstanciais possui grande influência na
ordenação de advérbios e Spreps nas duas línguas.
Esse estudo sobre Ordenação de Circunstanciais Temporais em Português e Inglês:
posições e papéis discursivos foram importantes por também investigar as posições que esses
constituintes ocupam na cláusula.
Nesta tese, examinamos os seguintes fatores: a posição dos advérbios, a noção
semântica do advérbio, o tipo semântico do verbo, o tipo de sujeito, o tipo de oração, dentre
outros.
Esta revisão permitiu-nos conhecer, mais profundamente, as questões abordadas
acerca dos advérbios em geral, sobretudo, aquelas referentes à sua classificação e às suas
posições na cláusula e, com certeza, foi esclarecedora ao longo desse estudo.
2.6 Os advérbios e a expressão de tempo
Tempo e aspecto são duas categorias gramaticais que expressam noções temporais. A
categoria de tempo é dêitica, já que sua utilização depende diretamente do momento em que o
enunciado foi proferido. Por outro lado, isso não ocorre com a categoria de aspecto.
As noções de tempo e de espaço são partes substanciais das relações do homem com o
mundo. Os dois são delimitados: o tempo, em minutos, horas, dias, meses, séculos; o espaço,
em centímetros, metros, milhas, etc. Todos são referências necessárias na vida de cada um de
nós. Portanto, a língua que falamos está repleta de recursos, para que possamos situar nossas
ações em relação aos dois: agora, antes, depois, ainda - para tempo; aqui, acolá, além - para o
espaço.
Qualquer ato de comunicação é situado no tempo e no espaço. Na simples situação de
comunicação - o diálogo - o indivíduo que fala refere-se a si mesmo como eu que designa seu
ouvinte como tu/você. Ao referir-se ao espaço em que se encontra o indivíduo que fala
identifica-o como aqui; e ao referir-se ao momento em que fala, pode designá-lo como agora.
Eu, você, aqui e agora não nomeiam indivíduos, lugar e época determinados e
constantes, mas apenas "o indivíduo que fala", alguém a quem ele se dirige, e o "lugar" e
"momento" em que ocorre o diálogo. Seus referentes não são, portanto, objetivos e externos à
fala (como João, Paula, na sala e às 2 horas), mas situacionais e exclusivos do ato de falar,
fora do qual não podem ser reconhecidos e os elementos utilizados para designar a esses
referentes são chamados dêiticos (termo derivado de uma palavra grega que significa "indicar,
mostrar, apontar")
A categoria gramatical de tempo, segundo Lyons (1979) diz respeito às relações
temporais que são expressas por contrastes gramaticais sistemáticos. Os gramáticos
tradicionais, na análise do grego e do latim, apresentam três contrastes dessa natureza:
passado, presente e futuro. A categoria de tempo relaciona o tempo da ação indicada pelo
verbo, em relação ao momento em que o falante produz seu enunciado, o que significa que o
tempo é uma categoria dêitica.
A pessoa que fala, ou escreve, "comanda", por assim dizer, a atividade discursiva,
normalmente transformando-a, ou colaborando para transformá-la, numa complexa rede de
atos de significação que têm no eu, no aqui e no agora do discurso seus pontos de referência.
A indicação do tempo como categoria de linguagem verbal é parte dessa interação
comunicativa, ou ainda dessa atividade discursiva, tempo, que tem no momento da
enunciação seu ponto principal de referência.
Nesse sentido, os advérbios que expressam a categoria de tempo seriam aqueles que
apresentam valor dêitico, localizando os eventos na linha do tempo, em relação ao momento
da produção de enunciado. São eles: ontem, hoje e amanhã, logo mais, quarta-feira passada,
além de depois, anteriormente, posteriormente (em contextos em que está ancorado ao
momento da fala, ou seja: depois, anteriormente ou posteriormente ao momento da fala), etc.
Em alguns casos, os advérbios temporais podem não ser dêiticos, ou seja, podem
localizar na linha do tempo, sem tomar como referência o momento da fala, mas a conclusão
do evento anterior, ou qualquer ponto no tempo mencionado no texto. É o que ocorre, por
exemplo, em depois da aula e antes do jogo, que constituem indicações temporais não-
dêiticas, que localizam o evento na linha do tempo, tomando como ponto de referência
pontos já fixados no tempo, e não o posicionamento dos participantes. Os seqüenciadores em
geral estão nessa categoria: depois, , então, etc.
2.7 Os advérbios relacionados à categoria de aspecto
Para que possamos compreender a noção de advérbio de aspecto, devemos fazer uma
breve reflexão acerca da categoria gramatical de aspecto.
As gramáticas tradicionais falam pouco acerca da categoria de aspecto. São muito
poucos os autores que se preocupam em apresentar o aspecto como uma categoria do verbo e
defini-lo de maneira objetiva. O que mais encontramos são rápidas alusões à noção de
aspecto, espalhadas pelos capítulos referentes ao estudo dos verbos. Said Ali (1969:161), para
citar um exemplo, apresenta uma minuciosa análise do emprego das diferentes formas
verbais, utilizando termos como “iterativo”, “ação durativa” e “ação freqüentativa, mas sem
mencionar a palavra aspecto.
Luft (1978) é um dos poucos gramáticos que trata a categoria de aspecto em uma
seção especial, em que define aspecto como “a categoria verbal que exprime a oposição
término/não-término ou acabado/não-acabado, a duração do processo”. Na seqüência, o autor
afirma que o aspecto pode manifestar-se juntamente com o tempo, como em canto/cantei,
cantara/cantava, onde existe a oposição acabado/não-acabado. Mostra também que esta
categoria pode manifestar-se através de locuções verbais, sufixos, ou pelo próprio radical do
verbo, indicando exemplos de aspectos incoativo, iterativo, cursivo e cessativo.
Luft afirma que os verbos, em oposição aos nomes, caracterizam-se pela “idéia
temporal: o início, a duração ou o resultado de um processo (aspecto) ou o momento de sua
ocorrência (tempo)”. Propõe também, ao comentar as locuções verbais, que as locuções
indicam os aspectos do processo verbal: anterioridade, posterioridade, continuidade,
repetição, progressividade, início, conclusão, etc. Notamos aqui, mais uma vez, uma
inadequação entre as noções aspectuais e a definição proposta, o que nos faz pensar se a
palavra aspecto aqui foi usada no sentido indicado na definição ou naquela acepção
descompromissada que encontramos na maioria das gramáticas.
Podemos ver, na gramática em questão, a preocupação de incorporar de forma
explícita a categoria de aspecto no estudo dos verbos. Mas o resultado ainda está longe de
deixar claro o que significa aspecto verbal, em função da falta de clareza com que é definida a
categoria e, sobretudo, da inadequação com que são propostas as noções a ela ligadas.
Saindo do âmbito das gramáticas tradicionais, podemos citar o estudo de Travaglia
(1994) sobre aspecto verbal. Fazendo uma distinção básica entre tempo (tempo gramatical) e
TEMPO (tempo real ou cronológico), Travaglia (1994) afirma que a categoria de tempo é
dêitica, uma vez que situa o momento da ocorrência da situação em relação ao momento da
fala; ao passo que o aspecto é uma categoria temporal não-dêitica, pois se refere à situação em
si, sem levar em conta o momento da enunciação.
Travaglia (1994) propõe a seguinte definição para a categoria verbal de aspecto:
Aspecto é uma categoria verbal de tempo não-dêitica,
através da qual se marca a duração da situação e/ou suas
fases, sendo que estas podem ser consideradas sob
diferentes pontos de vista, a saber: o do desenvolvimento, o
do completamento e o da realização da situação
. (p. 38)
Com base nisto, Travaglia apresenta um conjunto de noções aspectuais, que
resumiremos a partir de agora, utilizando, para facilitar a compreensão, os exemplos do
próprio autor.
No que se refere à sua duração, uma situação pode ser durativa, quando seu início e
término ocorrem separados por um período de tempo relativamente longo; ou pontual, quando
seu início e término ocorrem no mesmo instante, ou separado por um período de tempo muito
curto. Vejamos, respectivamente, um exemplo de cada ocorrência:
(01) D. Maria passeia todos os dias.
(02) Salto do trampolim há anos.
Afirma ainda o autor que a situação durativa pode ser apresentada como limitada,
quando se indica o seu início, o seu fim ou o valor da sua duração; ou ilimitada, quando o
início e o fim da situação não são conhecidos nem sugeridos. Eis um exemplo de cada uma
respectivamente:
(03) Ele estava nadando desde 6 horas da manhã.
(04) A terra gira em torno do sol.
Tanto a duração limitada quanto a duração ilimitada podem ser contínuas ou
descontínuas. Serão contínuas, quando se apresentarem sem nenhuma interrupção no seu
tempo de existência. Por outro lado, serão descontínuas as situações que apresentarem
interrupções na sua duração:
(05) A terra gira em torno do sol.
(06) De tempos em tempos explodia uma bomba.
Travaglia propõe ainda que as diferentes fases de uma situação estão relacionadas às
informações referentes à realização, ao desenvolvimento ou à complementação da situação.
Vejamos cada um destes casos.
Do ponto de vista da sua realização, temos três fases da situação:
a) Fase em que a situação ainda não começou. Trata-se de um momento anterior à consecução
da situação.
(07) Pedro está para emoldurar o quadro.
b) Fase em que a situação já é começada.
08) Os rapazes continuam jogando apesar da chuva.
c) Fase em que a situação já terminou.
(09) O treinador do time esteve doente.
Do ponto de vista do seu desenvolvimento, temos também três fases da situação:
a) Início - A situação é apresentada como estando em seu ponto de início, ou em seus
primeiros momentos. A esta noção aspectual dá-se o nome de inceptividade ou incepção.
(10) Os marceneiros estão começando a armar o telhado.
b) Meio - A situação é apresentada em andamento. Essa noção é caracterizada pelo termo
cursividade.
(11) Estou lendo um livro muito interessante.
c) Fim - A situação é apresentada em seu ponto terminal. Trata-se da noção aspectual de
terminatividade.
(12) Mamãe terminou de bordar minha blusa hoje ao meio-dia.
Travaglia (Op.cit) ainda observa a situação do ponto de vista do seu complemento.
Assim uma situação pode ser:
a) Completa - A situação é apresentada em sua totalidade, com seu começo, meio e fim
englobados num todo. De acordo com Travaglia, esta é a noção aspectual de perfectividade.
(13) Antônio ouviu música o dia todo.
b) Incompleta - Quando a situação não apresenta uma das fases do seu desenvolvimento.
Temos aqui a noção aspectual de imperfectividade.
(14) Ele estava nadando desde seis horas.
Registrando o fato de que pode ocorrer uma não atualização de aspecto quando a
situação não apresenta referências à sua duração ou às suas fases, Travaglia propõe um quadro
bastante completo das noções aspectuais no português:
Martelotta (1986) propõe que o trabalho de Travaglia, embora bastante completo, não
se mostra eficiente quando aplicado à realidade da língua falada, que o autor parece estar
mais preocupado em adaptar a teoria tradicional dos aspectos à realidade lingüística do que, a
partir de dados reais, questionar as hipóteses tradicionais.
Em função disso, Martelotta (1986) optou por uma proposta mais voltada para o uso
da língua, observando, em seu estudo sobre o presente do indicativo, a relação entre uma série
de propriedades semântico-gramaticais que se associavam às formas verbais por ele
analisadas de acordo com o tipo de discurso em que essas formas verbais ocorriam. Muitas
dessas propriedades estão associadas às noções aspectuais propostas por Travaglia, mas
diferem dessas noções por se apresentarem de modo a refletir a gica organizacional do
texto.
2.8 A formação de advérbios em -mente
Analisando a origem dos advérbios, verificamos que, dos advérbios latinos, a sua
maioria foi originada, de nomes ou pronomes e poucos passaram às línguas românicas.
Enriqueceram-se estas, todavia, com algumas formas oriundas de formações desconhecidas
do latim literário, com grande produtividade e, em especial, com os advérbios em -mente que
se afixam aos adjetivos. Esta terminação nada mais é do que o ablativo do latim mens, v.g. em
bona mente. Com o uso de locuções deste tipo formaram outros tipos, acabado por alterar a
significação primitiva do substantivo mente e passando assumir o valor de um sufixo
derivativo.
O substantivo latino mens, mentis (“mente, alma, espírito, inteligência”) modificado
por um adjetivo refletia o estado de ânimo ou o modo na qual à ação verbal se levava em
consideração. Com passar do tempo, o substantivo foi assimilado a este tipo de estrutura
sintática e semântica e acabou por perder o seu valor original para se converter num sufixo
adverbial. Esta estrutura morfológica (base + mente) é muito produtiva na criação de
advérbios. No levantamento dos dados dos corpora selecionados, verificamos que esse sufixo
é muito produtivo, mesmo nos primórdios da língua, principalmente com as noções de modo,
de qualificador e modalizador. Vejamos alguns exemplos dos corpora estudados:
(1) ... posto que seyam muy grauemete enfermos.(OE, p.47)
(2)... taaes como estes presume no dignamete etender e achar dulçura(OE,p.48)
(3)
P
rimeiramente salvanayque, regedor que agora he, tem de remda hu~u conto e cem mil
pardaos d ouro, este he senhor de charama~odel, e de nagapata~o, e tamgor, e bomgarim, e
dapata~o, e do truguel, e de caullim, e todas estas sa~o cidades (Século XVI/Crônica dos Reis
de Bisnaga)
(4)... por ignorar o motivo se será para falta desaude, ou qualquer acontecimento que
lhesucedese, oque infinitamente sentirey como amigo [ espaço]igualmente tenho sentido
afalta daremeça dadita patente ejulgo omotivo por haver algum embaraço nasecretaría, pois
pela demora que tem havido ja mequerem puxar para ojugo dos auxiliarez os quaes são
bastantemente incomodados(
século XVIII - administração privada/carta de comércio/ PHPB)
(5)... assim cumpri com a Comissão que a minha Bemfeitora (a quem pesso Beijes as mãos
em meu nome) me incumbio, cum prindo igualmente com a comissão da Rainha (Cartas do
PHPB - RJ / séc. XIX)
(6) Deus simplesmente não age assim. Deus é santo - moralmente perfeito. (EC,p.45, Port.
atual)
(7) Jesus era inicialmente homem, depois se tornou Deus. (EC,p.63, Port. atual)
Nos exemplos expostos, observamos as diversas formações derivativas dos advérbios
em -mente (grave+ mente, digna+ mente, primeira+ mente, infinita+ mente, igual+ mente,
bastante+ mente, simples+ mente, moral+ mente e inicial+ mente), além de sua produtividade
e usualidade com as acepções de modo, qualificador, modalizador e temporal, este último não
tanto quanto as noções anteriores.
É interessante acrescentar, ainda, sobre a formação dos advérbios que outros autores,
como Vilela (1979), apresenta-nos algumas considerações acerca dessa categoria gramatical:
o léxico constitui-se de um conjunto de unidades léxicas (palavras lexicais, lexemáticas,
lexemas), ou seja, unidades que representam a realidade extralingüística e que pertencem
tanto à semântica como também à gramática da língua.
Tendo em vista que palavras lexicais concretas contêm, além do valor lexical, uma
significação categorial, o autor considera tais palavras as unidades fundamentais do léxico de
uma língua. Estes podem ser ampliados principalmente através de dois processos: a derivação
e a composição.
A derivação é o processo de formação vocabular em que ocorre a adição de afixos
(prefixos e sufixos) a uma base ou radical e a composição é o recurso de enriquecimento
vocabular que se pela união de dois ou mais radicais, que formam um vocábulo cujo
significado não precisa ser necessariamente a soma dos significados de cada radical. Vale
ressaltar que na composição os vocábulos estabelecem entre si relações sintáticas de
subordinação e/ou coordenação (Cf. Carone (1988).
Vejamos os exemplos:
(8) porta-bandeira, aguardente (subordinação);
(9) vaivém, leva-e-traz (coordenação).
Apesar de serem processos diferentes, derivação e composição não se excluem, o que
será ilustrado a seguir com o vocábulo em -mente.
Os estudos históricos apontavam para o advérbio como um elemento modificador.
Pereira (1932), remontando a Aristóteles, afirma que os advérbios formavam, juntamente com
as preposições e as conjunções, uma das quatro partes do discurso (a quarta era as
interjeições), porém apenas sob o rótulo de “conjunções”.
Mais tarde, os gramáticos gregos de Alexandria redividiram as partes do discurso,
desdobrando as “conjunções” em três categorias: as conjunções propriamente ditas, as
preposições e os advérbios. O autor divide o estudo das categorias gramaticais em lexical ou
taxionômico e sintático ou gico. No primeiro, expressa a idéia geral da categoria e o
segundo a sua função na frase. Neste ponto, o gramático não difere dos outros estudiosos
quanto ao conceito e função dos advérbios.
Pereira (1932) afirma ainda que os advérbios, do tipo que estamos chamando de
qualitativo, formam uma categoria que se assemelha à do adjetivo devido à idéia de
qualificação que o advérbio apresenta. Diz, também, o autor que o processo de formação de
advérbios em -mente a partir de adjetivos é recente e desenvolveu-se no português e em outras
línguas românicas ocidentais. O processo consistiu na aglutinação do adjetivo ao substantivo
feminino mente. A expressão era escrita separadamente desde o latim, entretanto, diz Pereira,
que os dois elementos se uniram na escrita por força da pronúncia e o substantivo -mente,
antes palavra autônoma, passou a ser interpretado como sufixo adverbial, como o vemos nos
dias de hoje e, também, no português arcaico. Mas, segundo Martelotta, Barbosa & Leitão
(2002b), a variação entre a grafia separada ou junta, encontrada no português arcaico, deve ser
interpretada com precaução, pois antes de constituir um processo de gramaticalização, pode
ser apenas opção adotada na impressão gráfica:
Entretanto, não podemos esquecer que não
dependemos da fidedignidade da edição para sabermos se
as palavras estavam de fato juntas no original, mas
também que, mesmo nos manuscritos, muitas vezes a
união, ou separação, entre vocábulos poderia ser usada
para se justificar a mancha gráfica na página. Desse
modo, devemos tomar cuidado ao relacionar a escrita
separada/junta dos elementos com sua gramaticalização,
pois o controle estatístico pode revelar o real avanço
da grafia dos advérbios em -mente como um único
vocábulo.
Pereira (1932.) classifica os advérbios de forma semelhante à que fazem os outros
autores: de acordo com as circunstâncias de afirmação, dúvida, negação, lugar, tempo,
quantidade, modo, ordem, designação, etc.
Carneiro Ribeiro, em seu livro Serões Grammaticaes (1956: 362), faz também uma
analogia entre advérbios e adjetivos: É este elemento do discurso uma espécie de adjectivo,
que tem por função característica modificar os adjectivos, os verbos e qualquer palavra de
sentido atributivo. Modifica-os, como o adjectivo modifica os substantivos”.
O autor continua sua análise observando que o advérbio pode se referir a um
substantivo quando este possui um sentido atributivo. Ele cita o seguinte exemplo: “Deus é
verdadeiramente pai” (1956:363). Nesse caso, de acordo com o autor, o valor semântico do
substantivo equivale ao de um adjetivo. Em suas palavras, o advérbio é “attributo de
attributo”.
Carneiro Ribeiro (1956) afirma que os advérbios são invariáveis e este fato, ao
contrário do que pensam outros autores, torna esses elementos ainda mais semelhantes aos
adjetivos. Segundo ele, os adjetivos expressam conceitos abstratos que, por sua própria
natureza, não são passíveis de variações. O que ocorre é que os adjetivos adéquam em gênero
e número aos substantivos que acompanham apenas por uma questão de sonoridade. Carneiro
Ribeiro diz, ainda, que os advérbios expressam de forma mais resumida e eficiente alguns
pensamentos que, se ditos de outro modo, tornariam a linguagem mais lenta e prolixa. Nesse
sentido, podemos entender que os advérbios contribuem para o princípio de economia
lingüística.
O autor propõe a seguinte classificação para os advérbios: advérbio de lugar, advérbio
de tempo, advérbio de quantidade e advérbio de qualidade ou modo.
No que concerne aos advérbios em -mente, o autor trata de sua formação, qual seja:
este sufixo liga-se, de um modo geral, ao adjetivo no feminino, quando houver duas formas.
Diz, ainda, que alguns advérbios podem ter seus sentidos intensificados, tanto por outros
advérbios quanto por uso no superlativo. Cita como exemplos: “mais docemente, muito
ternamente, bellissimamente,”etc.
Said Ali, em sua Gramática Histórica da Língua Portuguesa (1964: 183), define os
elementos adverbiais como se segue:
O advérbio é um vocábulo determinativo do verbo, do
adjetivo ou de outro advérbio. Acrescenta a outras
palavras o conceito de tempo, lugar, modo, etc. que lhes
delimita ou esclarece o sentido, sem, contudo exercer,
como o acusativo, o dativo e o objeto indireto
circunstancial, função puramente complementar.
Esse autor faz uma análise etimológica de alguns advérbios. Entretanto, em relação
aos advérbios em -mente, apenas afirma que são criações novas nas línguas românicas, i.e.,
não encontradas no latim literário, formadas a partir de adjetivos (Cf. p.183).
Semanticamente, Said Ali (op. cit.) equipara as locuções adverbiais aos advérbios em -
mente afirmando que as primeiras se distinguem destes somente porque são mais longas e
os seguintes exemplos: com prudência = prudentemente, com energia = energicamente, com
brandura = brandamente.
O autor esclarece que esses elementos são classificados de acordo com a semântica de
cada um, dividindo-se em tempo, lugar, modo, negação, afirmação, dúvida, quantidade e
ordem, e expressam circunstâncias definidas ou noções de grau (aumento ou diminuição).
Como se pode notar, as gramáticas históricas tratam bastante superficialmente o tema
em questão. Seus autores não conseguiram definir de maneira mais eficiente o advérbio e nem
observaram mais atentamente outras características que esses elementos apresentariam.
3 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS
Esta tese de doutorado baseia-se em princípios funcionalistas, partindo, portanto, de
que a gramática das línguas se constrói a partir do discurso, ou seja, do uso real, concreto da
língua.
Este capítulo consiste em expor alguns pressupostos da linha funcionalista que foram
importantes para minha análise, sobretudo aqueles relacionados à gramaticalização, à
polissemia, ao conhecimento da relação entre gramaticalização e grau de encaixamento entre
cláusulas, e entre gramaticalização e ordenação. Também apresento uma pesquisa sobre a
ordenação de adverbiais (Votre & Santos, 1984), um estudo sobre a natureza da estrutura da
linguagem humana e sua categorização, assim como a classificação semântica de verbos
proposta por Halliday, 1994.
3.1 Os princípios funcionalistas
A teoria funcionalista concebe a linguagem como um instrumento de interação social e
analisa a estrutura gramatical no seu contexto discursivo a fim de investigar as motivações
para explicá-la, compreendendo que as diferentes formas que um elemento incorpora no
discurso não são meramente estilísticas, mas influenciadas por funções informacionais e
pragmáticas. Por conseguinte, uma relação entre forma e função, conforme o Princípio da
Iconicidade, que é definido como a correlação entre o código lingüístico (forma) e o seu
conteúdo (função).
A corrente funcionalista vem estudando com muita profundidade o processo da
Gramaticalização ocorre quando certas construções lingüísticas sofrem transformações ao
longo do tempo, assumindo outras funções mais gramaticais e tornando-se mais fixos e
regulares no discurso. Essa mudança se dá unidirecionalmente: do discurso para a gramática e
não vice-versa. Várias trajetórias foram traçadas para ilustrar esse caráter unidirecional:
vocábulo>morfema, verbo pleno>verbo auxiliar, advérbio>conectivo, dentre outras. Por
exemplo, o vocábulo mente passou a desempenhar a função de um morfema gramatical, ou
seja, passou a ser um sufixo, formador de advérbio, como a locução em boa hora que se
tornou a conjunção concessiva embora: em boa hora>embora. O foco do nosso trabalho não é
a gramaticalização do substantivo em -mente para sufixo, uma vez que no português arcaico
essa gramaticalização já estava consolidada.
Outra pesquisa que relaciona os termos da oração e a posição do advérbio é a de
Votre & Santos (1984), que trata da investigação de fatores sintáticos, semânticos e
discursivos que influenciam a colocação dos constituintes de natureza adverbial na sentença.
O corpus examinado é formado por redações e entrevistas de alunos da 8ª série.
Os autores partem da seguinte hipótese geral a qual também é à base da nossa
pesquisa:
Os advérbios são constituintes móveis, embora com
tendências bem definidas por determinadas posições
sintáticas. (...) a posição ocupada por cada advérbio é
função da atuação conjunta de diferentes fatores
estruturais e não-estruturais, que cabe identificar e
avaliar(1984:83).
Votre & Santos analisaram 4 posições dos adverbiais, a saber: início da sentença
(posição 1); fim da sentença (posição 4); entre o sujeito e o verbo (posição 2); e entre o verbo
e o complemento (posição3), exemplificadas abaixo:
[Ontem], o ministro [ontem] seguiu [ontem] para Nova York [ontem].
1 2 3 4
Os fatores, a seguir, foram observados através de uma análise quantitativa: a) tipo
semântico do advérbio (tempo, lugar, modo, etc.); b) nível do vínculo semântico do advérbio
(com sentença ou com o verbo); c) tipo sintático do verbo (regência do verbo) ou tipo de
complemento (oracional, objeto direto, objeto indireto); d) constituição morfológica do
advérbio (advérbios oracionais, locucionais, nominais, etc.); e) peso do advérbio (breve ou
longo); e f) tipo do sujeito (oração sem sujeito, oração com sujeito vazio, etc.).
Apresentaremos algumas das hipóteses dos autores referentes a esses fatores:
1) Quanto mais vinculado semanticamente ao verbo, mais próximo desse o verbo estaria.
Todavia, o advérbio vinculado ao nível mais alto da sentença estaria mais livre, podendo se
movimentar para o início da sentença, por exemplo;
2) No que se refere ao tipo de vínculo do sujeito com o verbo. Quanto mais fraco for, mais
favorecerá a inserção de um advérbio entre o sujeito e o verbo. Assim, um verbo de ligação
enfraqueceria o vínculo entre sujeito e verbo, permitindo a colocação de advérbio no meio
deles;
3) No que concerne ao peso do advérbio, a expectativa era a de que os adverbiais breves
(menores) ocorressem nas posições internas e os longos (maiores) nas posições externas,
predominando na posição final;
4) A última hipótese refere-se ao tipo de sujeito. Esperava-se que em orações sem sujeito ou
com sujeito vazio, o adverbial tendesse a ocupar a posição inicial, típica do sujeito. Teríamos
assim uma espécie de arranjo de balanceamento (Votre & Santos op. Cit.,. p. 85).
Os resultados mais relevantes desse estudo são arrolados a seguir: para a colocação do
advérbio nominal na posição 1, contribuíram os fatores referentes ao nível do vínculo
semântico do advérbio (advérbio vinculado à sentença), ao tipo semântico de advérbio
(advérbio de tempo e de opinião) e ao tipo de complemento do verbo (complemento
oracional).
A colocação do advérbio na posição 2, entre o sujeito e o verbo, foi motivada pelo
nível de vínculo semântico do advérbio (advérbio vinculado ao verbo) e pelo tipo semântico
de advérbio (advérbio de tempo e freqüência).
A ordenação do advérbio nominal na posição 3, entre verbo e complemento, deve-se
ao nível do vínculo semântico do advérbio (advérbio vinculado ao verbo), ao tipo semântico
de advérbio (advérbio de intensidade) e ao tipo de complemento (objeto indireto).
Por fim, a colocação do advérbio nominal na posição 4 da sentença foi influenciada
pelo nível do vínculo semântico do advérbio (advérbio vinculado ao verbo), pelo tipo
semântico de advérbio (advérbio de modo e de lugar) e pelo tipo de complemento (não
complemento).
Pretendemos, assim como Votre & Santos, identificar fatores que motivem a
colocação dos advérbios de tempo e aspecto em -mente na cláusula. Dentre eles,
identificaremos a estrutura sintática da oração para verificar se a posição vazia de um
argumento (sujeito ou complemento) tende a ser preenchida com o advérbio.
3.2 Gramaticalização e Níveis de Encaixamento entre Cláusulas
Segundo Hopper & Traugott (2003), os períodos compostos fundamentam-se em um
conjunto de estruturas com diferentes níveis de encaixamento, que vão das menos
gramaticalizadas (menos encaixadas) às mais gramaticalizadas (mais encaixadas):
a) Estruturas Paratáticas possuem independência relativa, ou seja, restrita apenas
pela pragmática (fazer sentido e ser relevante). São as cláusulas justapostas, as principais e as
coordenadas.
b) Estruturas Hipotáticas ou Interdependentes são aquelas em que um núcleo e
uma ou mais cláusulas que são relativamente dependentes (não se incluem em nenhum
constituinte do núcleo, mas não podem ficar “soltas”). São as subordinadas adverbiais e as
adjetivas explicativas.
c) Estruturas Subordinadas ou Encaixadas são as que possuem uma margem
completamente incluída no núcleo e que, portanto, têm dependência completa. São as
subordinadas substantivas e as adjetivas restritivas.
Essas estruturas podem ser representadas através de uma trajetória de
gramaticalização: parataxe hipotaxe subordinação.
De acordo com essa trajetória, as cláusulas paratáticas são menos gramaticalizadas,
isto é, revelam menor grau de dependência semântica e encaixamento que as hipotáticas (que
exibem maior grau de dependência e nível intermediário de encaixamento), que, por sua vez,
são menos gramaticalizadas que as subordinadas (que apresentam maior grau de dependência
e de encaixamento). Segundo Givón (1990), a redução da cláusula subordinada à cláusula
reduzida revela níveis ainda maiores de encaixamento entre cláusula principal e subordinada,
além de exprimir concretamente um dos subprincípios relacionados ao conceito de
iconicidade: o da proximidade. Esse subprincípio trata da relação de correspondência entre
sintaxe e semântica. Na complementação verbal, isso implica dizer que o nível de integração
sintática entre as cláusulas não é arbitrário e sim um reflexo do nível de integração semântica
entre o evento da principal e o da subordinada, ou seja, quanto mais integrados esses eventos
no plano semântico, mais integradas estarão as estruturas que os expressam.
Givón concluiu que, quanto mais encaixada uma oração, mais gramaticalizada ela é.
Estendendo a conclusão do autor, depreendemos que o grau de gramaticalização da cláusula
em que os advérbios em -mente aparecem interfere na colocação desses advérbios, conforme
procuraremos atestar nessa pesquisa.
3.3 Gramaticalização e estrutura sintática
De acordo com Givón (1979), a maior liberdade e variedade de elementos significativos
tendem a ocorrer na cláusula principal, declarativa, afirmativa, ativa. Mas, por outro lado,
tanto no que se refere a itens lexicais quanto a construções sintáticas, a distribuição dos
elementos significativos, em todos os outros tipos de cláusula, é sempre mais restrita.
Isso acontece devido ao uso do fenômeno da pressuposição discursiva, ou seja, o grau
de pressuposicionalidade no qual uma sentença é usada, que, por sua vez, está relacionado ao
nível de dificuldade que o falante considera como obstáculo para o ouvinte em determinar
uma única referência no discurso. E, segundo Givón (1979), a cláusula principal, declarativa,
afirmativa, ativa apresenta a complexidade pressuposicional mais baixa no discurso, se
comparada a todos as outras variantes sintáticas.
Givón (1979) nos mostra várias propriedades formais dessas variantes sintáticas, em
relação ao seu grau de pressuposicionalidade, a saber:
1- Variantes mais pressuposicionais exibem maior complexidade sintática.
2- Variantes mais pressuposicionais apresentam maiores restrições distribucionais do
que os padrões neutros.
3- Variantes mais pressuposicionais são gramaticalizadas mais tarde por crianças, ou
pelo menos sua sintaxe é adquirida mais tarde do que as variantes menos
pressuposicionais.
4- Variantes mais pressuposicionais freqüentemente tendem a exibir grande
conservadorismo sintático, mais comumente na área da mudança de ordenação.
5- A cláusula principal declarativa, afirmativa, ativa, neutra e menos pressuposicional
e também a mais freqüente no discurso.
Das propriedades propostas, as que podemos considerar na nossa pesquisa são os itens
1, 2 e 4, que se propõe aqui que as cláusulas gramaticalizadas, e, portanto, mais restritas
distribucionalmente e mais complexas sintaticamente, tendem a ser mais conservadoras.
3.4 As pressuposições discursivas das construções sintáticas
O sentido de pressuposição está sendo compreendido aqui como um conjunto de
informações que estão fora da sentença e que são assumidas pelo falante como evidentes ou
indiscutíveis, ou seja, aquilo que é pressuposto tende a refletir conhecimentos compartilhados,
crenças comuns ou conhecimento presumido como conhecido.
Neste trabalho, não adotamos a distinção entre pressuposição gica e pressuposição
pragmática, que parte do princípio de que todo fenômeno pressuposicional nas línguas
naturais é pragmático. Assim, segundo Givón (1979), o fenômeno da pressuposição,
relaciona-se com: as hipóteses que o falante assume acerca da habilidade do ouvinte de
identificar unificadamente (‘estabelecer uma única referência para’) um argumento-
referente.” (p. 50)
Diante disso, Givón (1979) mostra as variantes sintáticas que se caracterizam por maior
grau de pressuposicionalidade:
a) Construções estritamente pressuposicionais. Cláusulas relativas, clivadas, pseudo-clivadas
e perguntas QU.
b) Cláusulas encaixadas.
c) Outros atos de fala. Imperativo, interrogativo e negativo.
d) Construções envolvendo graus de definitude-topicalidade dos argumentos.
e) Mudança de tópico, passiva, pronomes anafóricos e outros.
Segundo Givón, essas construções apresentam ordenação mais conservadora dos
elementos argumentais. Mas podemos estender esse pensamento para as características de
ordenação de elementos adverbiais. De fato, como foi mencionado, o nível de
encaixamento ou gramaticalização da cláusula tem influência sobre as tendências de
ordenação de advérbios de tempo e aspecto em -mente.
A fase arcaica do português é caracterizada por uma variação na colocação dos
advérbios, ou seja, apresenta advérbios em -mente nas posições pré e pós-verbais em todos os
tipos de cláusulas, apresentando uma pequena predominância de anteposição nas cláusulas
mais gramaticalizadas. A partir disso, podemos depreender que esses parâmetros de
pressuposicionalidade podem nos auxiliar na descrição de mudanças no comportamento
diacrônico desses elementos em relação a sua ordenação.
3.5 Classificações dos verbos, baseada em Halliday (1994)
O tipo semântico do verbo é um dos fatores considerados neste trabalho para entender
a posição dos advérbios de tempo e de aspecto em -mente, pois trabalhos anteriores, como
Scheibman (2001), Bybee (2003) e Andrade (2005), detectaram que era necessário investigar
se o tipo de verbo poderia influenciar na cláusula de alguma forma no caso de Scheibman
(2001), o tipo de verbo foi usado para se perceber a subjetividade nas relações entre o sujeito
e o verbo; no de Bybee (2003), foi utilizado para perceber a influência na gramaticalização do
verbo can do inglês, e, por fim, no caso de Andrade (2005), o tipo de verbo foi utilizado para
detectar a ordenação de locuções adverbiais temporais.
Sendo assim, consideramos esse fator importante para tentar definir uma motivação
semântica da posição dos advérbios de tempo e de aspecto em -mente. Para isso, utilizamos a
classificação de Halliday (1994), também utilizada em Scheibman (2001) e Andrade (2005).
Nossa hipótese é que determinado verbo acompanhado do advérbio temporal, com a
repetição de uso, possa fixar os advérbios de tempo e de aspecto em -mente numa dada
posição, conforme Bybee (2003). Essa autora conhece a importância da repetição,
caracterizando-a como um processo pelo qual seqüências de palavras ou morfemas
freqüentemente usados tornam-se automáticos como uma única unidade de processamento.
Acreditamos também que determinado tipo semântico do advérbio ocorra com um
determinado tipo semântico do verbo.
Embora haja rias classificações de verbos, trabalharemos com a classificação de
Halliday (1994), por ser um lingüista funcionalista. Segundo esse autor, a oração também
desempenha o papel de modelar a experiência, isto é, representa padrões da experiência. Os
seres humanos, através da linguagem, constroem um quadro mental da realidade e este é
criada por processos.
A oração é um modo de ação, um modo de dar e receber bens e serviços como também
informações. Ela é um modo de reflexão, um modo de impor ordem na variação e no fluxo do
sistema gramatical de transitividade. Esse sistema constrói o mundo a partir da experiência
por meio de conjunto de tipos de processos que estão relacionados à nossa experiência
exterior (ligada ao mundo que nos cerca, como eventos, ações etc.) e à nossa experiência
interior (ligada à consciência, à imaginação, como reflexão, etc.( Halliday,1994:106).
De acordo com o autor, o modelo proposto de representação de experiência,
interpretado no sistema gramatical de transitividade, é um contínuo circular.
Ele afirma que um processo é constituído de três componentes para a interpretação da
nossa experiência do que acontece: a) o próprio processo; b) os participantes no processo; e c)
circunstâncias associadas com o processo (são opcionais).
Esses três conceitos são categorias semânticas que explicam como fenômenos do
mundo real são representados em figuras lingüísticas.
O autor discorre sobre os principais processos no sistema de transitividade da língua
inglesa:
Os processos materiais (processes of doing) estão relacionados ao mundo físico, à
experiência exterior. São processos ‘do fazerque expressam a noção de que uma entidade
‘faz’ alguma coisa que pode ser feita ‘para’ outra entidade. Portanto, esse processo tem um
ator obrigatório e um alvo (goal) opcional. Para Halliday, o termo ator refere-se àquele que
realiza o efeito, já o termo alvo refere-se a alguém para o qual o processo é estendido.
Vejamos um exemplo: The lion[ator] caught[processo] the tourist [alvo] ( O leão pegou o
turista.);
Os processos mentais (processes of sensing) referem-se ao mundo da consciência, à
experiência interior. Para conhecer esses processos, o autor abandona a noção semântica de
ator e alvo (goal) e agrupa as orações que expressam sentimentos (affection), pensamentos
(cognition) e percepção (perceptin) nesse tipo de processo.
O autor acrescenta que os participantes envolvidos nos processos mentais que são
experenciados (senser) a um fenômeno (phenomenon). O primeiro é o ser consciente que
sente, pensa e percebe, o segundo é aquilo que é sentido, pensado ou percebido. Desse
modo, um dos participantes é dotado de consciência, o outro pode ser uma ‘coisa’ ou um fato
(entendido como um metafenômeno, isto é, alguma coisa que é construída como um
participante por projeção).
Obtivemos: Mary [experenciadora dotado de consciência] liked [processo] the gift
[fenômeno/coisa] (Maria gostou do presente). Ou Mary [experenciador dotado de
consciência] was pleased [processo] that she’d got a present [fenômeno/fato] (Maria estava
contente que ganhou um presente);
Os processos relacionais (processes of being) estão ligados ao mundo das abstrações.
Relacionam fragmentos da experiência, classificando-os e identificando-os. Esses processos
estabelecem uma relação entre duas entidades separadas. Uma entidade ‘a’ pode atribuir algo
a uma entidade ‘x’ ou pode identificar uma entidade ‘x’. Sendo assim, subdividem-se em:
Relacionais Intensivos: associados ao mundo das abstrações estabelecem uma relação entre
duas entidades separadas, atribuindo alguma característica a elas; Relacionais Possessivos:
associados ao mundo das abstrações estabelecem uma relação entre duas entidades separadas,
identificando-as ou atribuindo posse de algo ou alguma coisa a elas, e Relacionais
Circunstanciais: associados ao mundo das abstrações estabelecem uma relação entre duas
entidades separadas, identificando-as ou atribuindo alguma circunstância a elas.
O sistema do inglês opera com três tipos principais de construções: a) intensiva
(equativa): ‘x is a ‘ (x é/está a). Ex.: Sarah is wise. (Sara é sábia); b) circunstancial: ‘x is at a’
(em que ‘is at’ pode ser ‘is at, in, on, for, with, about, along, etc.’). c) possessive: (x está em a
). Ex.: Peter has a piano. (Pedro tem um piano)
Na fronteira desses principais processos, outros processos que compartilham
algumas das características daqueles, como:
Os processos comportamentais manifestam os processos de consciência e os estados
fisiológicos. Esses processos são tipicamente de natureza humana, uma vez que se constituem
por comportamentos psicológicos e fisiológicos como respirar, tossir, sorrir, sonhar dentre
outros. Suas características não são claramente definidas, que estão na fronteira entre os
processos materiais e mentais. Um participante é tipicamente um ser consciente, denominado
Behaver. Vejamos o exemplo: No-one[Behaver] is listening [processo]. (Ninguém está
ouvindo);
Os processos verbais expressam relações simbólicas, construídas na consciência
humana, através da linguagem. São processos de ‘dizer’, como em “- O que você disse? -Eu
disse que está barulhento aqui.” No entanto, ‘dizer’ aqui, é interpretado em um sentido amplo,
expressando qualquer tipo de troca simbólica de significado. O participante, nesses processos,
não precisa ser consciente. Esse é denominado Sayer(aquele/aquilo que diz). Eis alguns
exemplos: the notice ( sayer) tells you to keep quiet e my watch (sayer) says it’s half past
ten.(O aviso diz para ficarmos em silêncio e meu relógio diz que são dez e meia,
respectivamente).
Há outras funções de participantes além da do ‘sayer’: ‘Receiver’ (aquele para o qual a
fala é direcionada), Verbiage (o que é dito), Target (a entidade que é objetivada pelo
processo de ‘dizer’). Observemos: She [sayer] praised [processo] him [target] to her friends
[receiver] (Ela elogiou para os amigos dela) ou I [sayer] ordered [processo] a steak
[verbiage] (Eu pedí um bife);
Os processos existenciais detonam a existência, o acontecer. Representam que
alguma coisa existe ou acontece. O elemento que é dito existir é chamado de Existent’. A
princípio, pode existir qualquer tipo de fenômeno que possa ser construído como alguma
‘coisa’: pessoa, objeto, instituição, abstração. Também pode existir uma ação ou um evento.
Freqüentemente, uma oração existencial contém um elemento circunstancial distinto de tempo
ou lugar. Analisemos: There is [processo] a man [existente] at the door [circunstância] (Há
um homem na porta).
O lingüista ainda menciona mais um tipo de processo: os processos meteorológicos
que se encontram na fronteira entre os processos existenciais e materiais. Alguns são
construídos como processos materiais: The wind’s blowing ( o vento está soprando); alguns
como processos existenciais: There was a storm (houve uma tempestade); alguns como
relacionais: it’s cold ( está frio); e alguns sem participantes, constituindo-se apenas pelo
processo: it’s raining ( está chovendo).
Usamos essa classificação na análise dos verbos presentes nas cláusulas com
advérbios de tempo e aspecto em -mente, considerando o tipo semântico do verbo como um
fator possível de motivar a ordem desses advérbios. Esse fator se mostrou relevante na
pesquisa de Andrade (2005) e na de Albani (2007) com relação ao uso de locuções temporais
e aspectuais e do uso do advérbio sempre, respectivamente.
4 METODOLOGIA
A corrente funcionalista prima por uma análise do uso da língua, portanto, torna-se
necessário o estudo de dados reais, isto é, dados (da língua oral ou escrita) produzidos pelos
usuários da língua em contexto de comunicação.
Como mencionado, o presente estudo objetiva-se à análise da ordenação dos
advérbios de tempo e aspecto terminados em -mente sob a perspectiva funcionalista na
modalidade escrita.
Este trabalho, por um lado, utiliza metodologia quantitativa na análise dos advérbios
de tempo e de aspecto em -mente que apresentam diferentes possibilidades de colocação na
frase, mas são aparentemente estáveis no que se refere a seu status semântico. Por outro lado,
também se realizou a uma análise qualitativa que visa observar algumas mudanças semânticas
e, em alguns casos, também sintática, percorrida por certos usos adverbiais.
A pesquisa seguiu as seguintes etapas: levantamento das ocorrências de advérbios em -
mente com algum traço de sentido de tempo e/ou aspecto, nos textos selecionados de
diferentes épocas; classificação dos advérbios, levando-se em consideração o contexto de
cada ocorrência, sua função, posição, etc. (de acordo com os critérios arrolados abaixo);
análise quantitativa e qualitativa das ocorrências dos advérbios de tempo e aspecto; paralelo
entre os resultados das diferentes sincronias; conclusões. O confronto dos dados de diferentes
estágios da língua favoreceu uma visão mais ampla e, conseqüentemente, uma análise mais
abrangente dos possíveis processos de mudança.
Para se observar em diferentes possibilidades de ordenação dos advérbios de tempo e
de aspecto em -mente, foram levados em consideração alguns fatores na classificação e análise
desses elementos, a saber: a ordem, a noção semântica expressa pelo advérbio (aspectual,
cronológico e híbrido); grau de gramaticalização da cláusula em que os advérbios de tempo e
aspecto em -mente se inserem (se mais ou menos gramaticalizada); e tipos de verbos a que
esses se associam, segundo Halliday (1994) e outros, que serão explicitados mais a frente.
4.1 Corpus
Em conformidade com os pressupostos teóricos da teoria funcionalista, os dados
utilizados para a análise da ordenação dos advérbios de tempo e aspecto terminados em -
mente foram extraídos de textos de diferentes gêneros textuais do português arcaico, dos
séculos XVI, XVII, XVIII, XIX e do português atual.
Os materiais constituintes da amostra e os procedimentos teórico-metodológicos
realizados, assim como o controle dos aspectos e fatores que influenciam na ordenação dos
advérbios em -mente, são apresentados e discutidos ao longo desse trabalho.
É importante ressaltar a complexidade que envolve a tarefa de se selecionar textos,
considerando-se um recorte histórico tão amplo. A complexidade dá-se, por um lado, pelo
fato de que esses textos precisam partilhar, ainda que minimamente, características que
permitam que sejam estabelecidas comparações entre os resultados dos dados neles
levantados, sem que haja distorções; por outro lado, pelo leque tão reduzido de opções de
textos de fontes confiáveis, que diminui as possibilidades de escolha.
Sendo assim, como não foi possível analisar exatamente os mesmos tipos de textos em
todas as épocas, foi seguido um roteiro, juntando diferentes tipos textuais, mas mantendo uma
certa coerência na sua distribuição pelos diferentes momentos sincrônicos analisados.
Chegou-se, então, aos seguintes corpora:
a) português arcaico: Testamento de Dom Afonso II; O Orto do Esposo (OE), de Maller
(1956) e Castelo Perigoso(todos esses textos estão disponíveis no site do corpus
informatizado do Português medieval(http://cipm.fcsh.unl.pt/gencontent.jsp?id=4). Esse
corpus (CIPM) foi criado em 1993 e inclui textos latino-romances do século IX ao século XII
e textos portugueses do século XII ao século XVI.
b) português do século XVI: Crônica dos Reis de Bisnaga; Cartas de D.João: são 372 cartas
de D. João III, rei de Portugal, do período entre 13 de outubro de 1523 e 20 de fevereiro de
1557, que também foram extraídas do site do corpus informatizado do Português medieval
(http://cipm.fcsh.unl.pt/gencontent.jsp?id=4).
c) português do século XVII: foram oito sermões do Padre Antônio Vieira:
1
o
sermão: Sermão da terceira quarta-feira da quaresma na Capela Real, 1669 (Assunto: um
remédio para os males de todas as cortes do mundo: a consolação dos mal despachados,
baseando-se no pedido indeferido da mãe dos Zebedeus);
2
o
sermão: Sermão da Sexagésima. Pregado na capela Real. Este sermão pregou o Autor no
ano de 1655, vindo da Missão do Maranhão, onde achou as dificuldades que nele se apontam,
as quais vencidas, com novas ordens reais voltaram logo para a mesma Missão.
3
o
sermão: Sermão de quarta-feira de cinza. Em Roma, na Igreja de S. Antônio dos
Portugueses.Ano de 1670.
4
o
sermão: Sermão do Santíssimo Sacramento. Exposto na lgreja de S. Lourenço, In:
Damaso, nos dias do Carnaval Em Roma. Ano de 1674. Traduzido do italiano.
5
o
sermão: Sermão do Nascimento da Virgem Maria. Debaixo da invocação de N. Senhora da
Luz, título da Igreja e colégio da Companhia de Jesus, na cidade de S. Luís do Maranhão. Ano
de 1657.
6
o
sermão: Sermão de S. Inácio, fundador da Companhia de Jesus, em Lisboa, no Real
Colégio de S. Antão, 1669.
7
o
sermão: Sermão do terceiro domingo da quaresma, na Capela Real, 1655.
8
o
sermão: Sermão da quinta-feira quaresma na misericórdia de Lisboa. ANi nF, 1 669
d) português do século XVIII:
Cartas comerciais da administração pública, representações oficiais do Rio de Janeiro, obtidas
no corpus do Museu da Língua Portuguesa - Estação da Luz. Foram analisadas 13 Cartas.
BARBOSA, Afranio & LOPES, Célia Regina et al. Corpus diacrônico do Rio de Janeiro:
cartas pessoais séculos XVIII-XIX. Rio de Janeiro, UFRJ/PIBIC-CNPq/ Labor-Histórico,
2003 (versão eletrônica
)
e) português do século XIX:
Cartas comerciais da administração pública, representações oficiais do Rio de Janeiro, obtidas
no corpus do Museu da Língua Portuguesa - Estação da Luz. Foram analisadas 12 cartas.
BARBOSA, Afranio & LOPES, Célia Regina et al. Corpus diacrônico do Rio de Janeiro:
cartas pessoais séculos XVIII-XIX. Rio de Janeiro, UFRJ/PIBIC-CNPq/ Labor-Histórico,
2003 (versão eletrônica)
f) português atual:
- Tocar o Senhor, Pe. Leo (TS).
-A essência do cristianismo, de J. Berkeley (EC).
4.2 Descrições dos fatores da análise dos advérbios de tempo e aspecto em –mente
Classificamos os dados a partir de alguns fatores que nos pareceram relevantes ao estudo
dos advérbios de tempo e aspecto em -mente. Utilizamos o modo de coleta e codificação da
sociolingüística variacionista (apesar de não estarmos trabalhando com um fenômeno de
variação propriamente dito).
Todos os dados são analisados a partir de fatores, que assim se configuram:
1. Posição/Ordem do advérbio em relação ao verbo
Verificamos a posição do advérbio de tempo e aspecto, se ocorre antes ou depois do
verbo, independentemente da presença ou ausência de algum elemento interveniente como o
sujeito, ou um outro advérbio, uma expressão, uma oração subordinada, etc.
Inicialmente, estabeleceram-se duas posições gerais nas quais os advérbios de tempo e de
aspecto em -mente poderiam ocorrer:
- Antes do verbo:
(1) que Deus constatemente nos fala (Português atual, TS,p.15)
- Depois do verbo:
(2) abramos os corações à luz , para que more perpetuamente neles(Século XVII, Sermão de
Santo Inácio, Pe A.Vieira)
Dessas ordenações gerais, desmembraram-se subposições, vejamos no quadro abaixo:
Quadro 2- Subposições do Advérbios em -mente
Posições Exemplos:
POSIÇÃO 1 (POS1): (ME) margem
esquerda da oração (tudo que estiver no
início de oração ou depois de conjunção).
(3) Constantemente Jesus vem curar-nos
(Português atual, TS, p.28)
POSIÇÂO 2(POS2): entre o sujeito e o
verbo. (o sujeito pode ser SN, pronome ou
pronome relativo)
(4) que Symão Fernandez novamente fez
(séc.XIV, Carta número 147)
POSIÇÂO 3(POS3): não inserido entre o
sujeito e o verbo, mas fora da margem
esquerda da cláusula.
(5) Agora novamente tem sucedido nas
minas hum levantamento que La fizeram
os povos. (século XVIII, Cartas oficiais).
POSIÇÂO 4(POS4): entre o verbo auxiliar
e o verbo principal.
(6) Precisamos urgentemente encontrar
nosso lugar de oração (Português atual,
TS, p.113)
POSIÇÃO 5(POS5): margem direita da
oração (no final da oração).
(7) Cristo continua do lado de fora de
nosso coração, batendo incessantemente
(Português atual, TS, p.39)
POSIÇÃO 6(POS6): inserido entre o
verbo e o complemento/predicativo.
(8) No entanto, ao oferecer
espontaneamente à igreja o produto da
venda (Português atual, TS, p.97)
POSIÇÃO7(POS7): entre o verbo e o
sujeito.
(9) chegou subitamente h~u~u home(m)
nõ conhecido ~ecima dh~u~u Cavallo e
~entrou pello paaço(Português arcaico
OE, 353)
POSIÇÃO 8(POS8): Não inserido entre o
verbo e o sujeito, ou entre o verbo e o
complemento/predicativo, mas fora da
margem direita(ou, seja, no final da
cláusula)
(10) deixamos boas coisas para trás muito
freqüentemente em nome da
independência (Português atual, EC, p.31)
2) Tempo/sincronias: português arcaico, dos séculos XVI, XVII, XVIII, XIX e português
Atual (cf. na seção anterior a lista de textos que serviram como corpora)
3) A noção semântica expressa pelo advérbio: Em relação às características semânticas que
cada advérbio pode expressar, classificamos em: a) advérbios que expressam tempo real
cronológico: são aqueles que expressam tempo cronológico, como por exemplo, os advérbios
atualmente e ultimamente; b) advérbios que expressam tempo aspectual: são os que se
referem à repetição de algum evento, ou à freqüência com que eventos ocorrem. Sabemos que
é bastante complexo delinearmos os limites entre tempo real e tempo aspectual, mas
decidimos que é possível fazer essa diferenciação, pelo menos até o ponto que nos foi exigido
pela análise. No presente estudo, foi claro observar e definir esses advérbios denominados de
tempo real devido a suas características dêiticas. Portanto, os advérbios cronológicos fazem
referência ao momento da enunciação. Enquanto, os advérbios de tempo aspectual são os que
se referem à repetição de algum evento, ou à freqüência com que os eventos ocorrem como o
advérbio freqüentemente; c) advérbios que são híbridos: são os usos polissêmicos, ou seja,
aqueles que expressão além das noções de tempo e de aspecto, expressam também a noção de
modo (tempo+aspecto/aspecto+modo), isto é, são os advérbios que expressam de alguma
forma duas características, com predominância de uma ou outra, por exemplo, tempo e modo,
como o advérbio rapidamente.
4) O tipo semântico de verbo que compõe a cláusula, segundo Halliday (1994), a saber:
material, mental, comportamental, relacional possessivo, relacional intensivo, atividade verbal
e meteorológico. (cf. seção 3.5).
5) Tipo formal de sujeito - verificamos em cada oração coletada se o sujeito estava (a)
formalmente presente antes do verbo, (b) formalmente presente depois do verbo, (c) presente
na forma de um pronome relativo ou (d) ausente (incluindo neste caso o tradicional sujeito
oculto e a oração sem sujeito).
6) Tipo de oração - observarmos em que tipo de oração, o advérbio de tempo e de aspecto
está inserido, se a oração é (a) paratática, (b) subordinada (substantiva ou adjetiva restritiva),
(c) hipotática (adverbial ou adjetiva explicativa), (d) oração principal ou (e) oração absoluta.
Cruzamos alguns desses fatores entre si para verificarmos os padrões de uso dos
advérbios e para vermos o uso dos mesmos em cada sincronia da língua.
5 ANÁLISES DOS DADOS
Neste capítulo, apresentamos uma análise dos advérbios de tempo e de aspecto
terminados em mente usados em textos escritos em norma culta do português, mais
precisamente em textos do português arcaico, dos séculos XVI, XVII, XVIII, XIX e do
português atual.
Analisamos aqui os resultados encontrados através da codificação dos fatores
controlados, como foi dito: posição do advérbio, noção semântica do advérbio, tipo de
verbo, tipo de sujeito, sincronias e tipo de oração. Destacamos a importância destes para
comprovar a hipótese de que fatores que influenciam o posicionamento dessa categoria em
relação ao verbo e a de que deve ter havido mudanças na ordenação desse advérbio nas
sincronias estudadas.
A seguir, explicitamos a análise dos grupos de fatores pertinentes ao estudo do
fenômeno em questão.
5.1 Análises de fatores
Começamos nossa análise pela apresentação das ordens estabelecidas (cf. capítulo 4),
fator de maior importância para verificarmos a posição prototípica dos advérbios em –mente
em cada sincronia.
5.1.1 Ordem do advérbio de tempo e aspecto em -mente
Inicialmente, a análise consistiu na verificação da posição de cada advérbio na
sentença. Porém, para uma melhor compreensão dos dados, foram estabelecidas duas posições
gerais:
Antes do Verbo
(01) Por uso antigamente havia um conselho chamado dos massarotes (Século XVII,
Sermão do Pe.A. Vieira)
Depois do Verbo
(02) Abramos os corações à luz, para que more perpetuamente neles Século XVII,
Sermão do Pe.A. Vieira)
Encontramos em todos os textos analisados (de todas as sincronias) um total de 180
dados com advérbios de tempo e aspecto em -mente. Estes estavam distribuídos de acordo
com o que pode ser visto na tabela a seguir:
Tabela 1- Distribuição dos advérbios em -mente quanto à ordem em relação ao verbo
Posição antes do
verbo
Posição depois do
verbo
Auxiliar-Adv-
Verbo
Total
Ocorrência % Ocorrência % N
o
de oco
rrência
%
82= 45,5% 88= 48,8% 10= 5,5 180=100%
Na tabela 1, verificamos que não houve diferença significativa, ao compararmos as
duas posições gerais: antes e depois do verbo. Sem levarmos em conta as sincronias, os dados
se distribuem homogeneamente entre as duas posições, como nos exemplos abaixo (os
exemplos 03 e 04, são de advérbios colocados em posição pós-verbal e os exemplos (05) e
(06) são de advérbios em posição pré-verbal). Houve apenas 5,5 % de dados com o advérbio
entre o auxiliar e o verbo (POS 4).
(03) Deu sinal o rei, mandou Moisés a Arão que lançasse a sua vara em terra, e converteu-se
sùbitamente em uma serpente viva e tão temerosa, como aquela de que o mesmo Moisés no
deserto se não dava por seguro (Século XVII, Sermão do Pe. A. Vieira)
(04) Entre estas duas portas se acha subitamente um homem no instante da morte, sem poder
tornar atrás, nem parar, nem fugir... (Século XVII, Sermão do Pe. A. Vieira)
(05) Em conseqüência desta minha lembrança, ordenei à Câmara desta Cidade que
immediatamente passasse a examinar o numero de Embarcaçoens, que tinhão sahido deste
Porto para essa Cidade (Século XVIII, administração Pública/Carta oficial)
(06) ...esta inCerteza menão fez admiração porser muito na= tural o erraremse todos
osCalculos quesefazem SobreCouzaz tão inCertaz. Como aNavegação, finalmente
chegarão Vossamercez muito bonz, que he oque mais estimo, eComamesma felicidade
principiarão asSuas marchaz por terra(Século XVIII, Administração Pública/Carta oficial)
A tabela abaixo apresenta, de um modo geral, o número das ocorrências dos advérbios
de tempo e aspecto em -mente pelas sincronias estudadas.
Tabela 2- Levantamento Geral dos dados dos corpora dos Advérbios de Tempo e de
Aspecto em -mente
Sincronias Total
Port. Arcaico 44
SÉC. XVI 18
SÉC.XVII 34
SÉC.XVIII 18
SÉC.XIX 21
Port. Atual 45
TOTAL
180
Eis alguns exemplos de cada uma das sincronias estudadas:
- Português arcaico:
(07) Quem de ssi meesmo busca paz em out(r)a part(e) ou pobreza ou desp(re)ço, nom a
achara´. Que quem mu(r)mura ou he trist(e) de ssua pobreza, e q(ue)m ha´ door no coraçom e
he descontent(e) e a despreza nom ha´ paz consigo. E po(r) que homem possa vi~ir a esta paz,
deve rroguar a D(eu)s conthinuadament(e), e amehu´de peenssar em sua grande pobreza e
humildade e maravilhossa sofrença. (Castelo Perigoso).
- Século XVI:
(08)
E
ste rey tem continuadamente cimcoenta mil home~es de solldo, em que entra~o seis
mill home~es de cavallo, que sa~o de sua goarda do paço, dos quoaes seis mil sa~o os
duzentos obrigados a cavalgar com elle, e tem mais vimte mill lamceiros e dargueiros, e tres
mil home~es (Século XVI –Crônica dos Reis de Bisnaga)
-Século XVII:
(09) Lêde o Testamento Velho, e achareis que Deus antigamente afogava exércitos, queimava
cidades, alagava mundos, despovoava paraísos. (Sermão do Pe.A. Vieira).
-Século XVIII:
(10) O Antigo Provedor da Fazenda; emque VossaSenhoria mefala, dizendo naõ desceria dos
Sertoens, desceo com efeito, eaqui se acha, segundo metem constado ha dozedias, mas
brevemente hirá para essa cidade, pois...(Século XVII, carta Comercial número 7)
- Século XIX:
(11) Pessolhe novamente de ver os vestidos | que estão na D. Brasilia, e faser | o possível por
m’os ...(Século XIX, Carta Comercial número 2)
- Português Atual
(12) Hoje não damos tanta importância àquilo que Deus constantemente nos fala (TS, p. 15)
5.1.2 Posição do advérbio
A seguir, podemos observar a distribuição dos advérbios analisados pelas posições
arroladas nas sincronias estudadas. Apenas para lembrar (cf. capítulo 4):
a) POS 1 – a posição da margem esquerda;
b) POS 2 – a posição entre o sujeito e o verbo.
c) POS 3 a posição não inserida entre o sujeito e o verbo, mas fora da margem esquerda
da cláusula;
d) POS 4 – a posição entre o verbo auxiliar e o verbo principal;
e) POS 5 – a posição a margem direita da oração (no final da oração);
f) POS 6 – a posição inserida entre o verbo e o complemento/predicativo;
g) POS 7 – a posição entre o verbo e o sujeito.
h) POS 8 – a posição não inserida entre o verbo e o sujeito, ou entre o verbo e o
complemento/predicativo, mas fora da margem direita.
Tabela 3 - Distribuição das posições dos advérbios de tempo e aspecto em –mente X
sincronias
Sincronias POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
ARCAICO 09 02 06 02 10 09 - 06 44
SÉC.XVI
10 02 - - 01 03 01 01 18
SÉC.XVII
18 02 02 - 02 04 01 05 34
S.XVIII. 11 01 - 01 01 02 - 02 18
SÉC.XIX
06 - - 03 04 05 - 03 21
Português
Atual
06 03 04 04 14 07 01 06 45
Total 60 10 12 10 32 30 03 23 180
% 33,3 5,5 6,6 5,5 17,7 16,7 1,6 12,7 100
Ao olharmos o total expresso na última linha da tabela, podemos constatar que a POS1
é mais recorrente. Isso evidencia que os advérbios de tempo e de aspecto em -mente,por
expressarem tais circunstâncias, preferem as posições periféricas da cláusula, sobretudo à
margem esquerda (POS1), e evitam posições mais internas à sentença, posições essas que
rompem com a estrutura padrão da cláusula. Shaer (2004), tratando especificamente da
ordenação dos circunstanciais temporais, relata que não é fácil determinar de forma precisa as
diferenças entre os temporais na margem esquerda ou na margem direita da sentença, ainda
que seja possível determinar distinções funcionais entre eles: a margem esquerda constitui um
ponto de ancoragem, um elo entre a parte do discurso em que se encontra o advérbio e um
ponto do discurso anteriormente mencionado, numa relação nitidamente anafórica, de
conexão discursiva. Tal fenômeno tende a não ocorrer com advérbios que ocupam a margem
direita da oração, associados a um escopo mais restrito, geralmente portador de informação
nova. Como podemos observar nos exemplos 13 e 14 abaixo:
(13) Antigamente convertia-se o mundo; hoje por que se não converte ninguém? Porque hoje
pregam-se palavras e pensamentos (Século XVII, sermão do Pe. A. Vieira).
(14) porque não perdeu o céu e a vista de Deus, mas vai arder no inferno eternamente.
(Século XVII, sermão do Pe. A. Vieira).
Podemos observar, também, através da tabela 3, que, no português arcaico, as posições
típicas são POS 5 (pós-verbal no fim margem direita), 6 (entre o verbo e o complemento) e 8
(pós-verbal fora do fim), mas os dados têm uma boa distribuição em todas as posições, exceto
na posição 7. Ou seja, no português arcaico havia uma ordenação mais livre, apesar das raras
ocorrências de algumas posições.
nas outras fases do português, entre o português do XVI e o português do século
XIX, o uso predominante é a posição 1 (margem esquerda). No século XVI, ainda outras
posições com uma distribuição razoável de dados, que são as posições 6 e 5. Depois, como
dissemos, é a posição marginal à esquerda a preferida pelos autores. Mas, no século XIX,
uma diferença importante: começa a aumentar o uso de uma posição pós-verbal, é a
posição 6. No português atual, verificamos novamente que há uma distribuição de dados em
todas as posições, mas há predomínio da posição 5, ou seja, uma posição pós-verbal.
Nossa análise permite dizer que, nos textos estudados, o advérbio em -mente passa de
um uso relativamente livre para um uso mais fixo na posição marginal à esquerda. Depois no
século XIX, começa a aumentar na posição pós-verbal e no português atual é usado
predominantemente na posição pós-verbal (mais especificamente na posição marginal à
direita, POS 6).
Albani (2007) verificou que a posição típica do advérbio sempre era pré-verbal no
português arcaico e pós-verbal no português contemporâneo. Todos os fatores estudados
indicam que, no português arcaico, a ordem era mais livre, enquanto no português atual a
ordem tende a ser mais fixa. Segundo ele, um forte indício de mudança na ordenação do
advérbio sempre em textos religiosos. Portanto, o autor encontrou um aumento da posição
pós-verbal ao comparar o português arcaico com o atual com relação ao uso de sempre. E o
mesmo constatamos no nosso estudo. Pesquisas futuras devem verificar os indícios de
mudança apontados aqui, comparando textos de diferentes tipos.
5.1.3 Noção semântica do advérbio
O fator noção semântica do advérbio foi investigado com a finalidade de se verificar
se relação entre o valor que o advérbio em -mente expressaria no contexto e a sua posição.
Os valores considerados (com base em Freitas e em Ilari) são:
(a) Cronológico – é aquele que expressa tempo real;
(b) Aspectual é aquele que expressa às noções: iterativo, reiterativo, freqüentativo e
outros;
(c) Híbrido – é aquele que expressa às noções tempo/aspecto + modo.
A categoria noção semântica é de grande relevância para este estudo, pois este é o
momento em que a caracterização semântica do advérbio estudado que poderá ser observada
em uma análise não quantitativa, mas qualitativamente.
Denominamos os advérbios aspectuais aqueles que indicam a freqüência com que os
eventos não-específicos ocorrem ao longo do tempo. Esse tipo de advérbio é eminentemente
aspectual, que interage com a categoria aspectual de iteratividade, como podemos observar
no exemplo abaixo:
(15)... e refletiu sobre aquilo que Deus continuamente nos fala.(Português atual, TS,p.15)
Neste exemplo (15), verificamos que o advérbio cronológico expressa tempo real, ou
seja, é aquele que faz referência ao passado, presente ou futuro, tendo como ponto de
referência o momento da enunciação. no exemplo (16), observamos que o advérbio
apresenta a noção dêitica, aponta para algum momento da enunciação.
(16) Atualmente as coisas estão como costumavam ser mil anos atrás. (Português atual, EC,
p.09)
o advérbio no exemplo (17), observamos que expressa à noção de iteratividade
(aqui também alocamos nos grupos dos advérbios aspectuais) referindo-se à repetição de
algum evento, ou à freqüência com que eventos ocorrem. Vejamos o exemplo:
(17) Para nos resgatar e nos libertar novamente (Português atual, EC, p.61)
De fato, é uma tarefa arriscada determinar os limites entre tempo real e tempo
aspectual, mas decidimos que é possível fazer essa diferenciação, pelo menos até o ponto que
foi exigido pela análise. No presente caso, foi claro observar e definir os itens denominados
de tempo real devido à suas características dêiticas.
Os advérbios que apresentam a noção semântica Híbrida ‘tempo mais modo’ (como,
por exemplo, rapidamente), ou ‘tempo mais aspecto’ (como, por exemplo, normalmente),
nada mais são do que aqueles advérbios que expressam de alguma forma as duas
características, com predominância de uma sobre a outra. O importante aqui é verificar se esta
polissemia influencia a posição do item em relação ao verbo.
Apresentamos aqui mais alguns exemplos para ilustrar o fator noção semânticos
expressa pelo advérbio:
1. Freqüentativo/iterativo- Aspectual:
(18)... repetidamente nós o rejeitamos...(Português atual, EC,p. 44)
2. Expressão de tempo real – cronológico:
(19) Por isso antigamente havia um conselho chamado dos massoretas (Século XVII, Sermão
do Pe. A. Vieira )
3. Tempo aspectual – Aspectual:
(20) para nos resgatar e nos libertar novamente ...(Português atual, EC,p.61)
4. Híbrido tempo/aspecto + modo:
(21) Deus está querendo ficar eternamente conosco. ...(Português atual, TS, p. 49)
Portanto, esse fator leva em consideração a noção semântica que os advérbios em -
mente podem assumir no contexto em que estão inseridos.
A análise dos dados, que se apresentarão a seguir, será feita separando os corpora de
cada sincronia estudada. As tabelas abaixo ilustram a distribuição dos advérbios de acordo
com a posição e noção semântica identificadas, a começar pelo uso dos advérbios no
português arcaico. Ao final da seção, faremos uma conclusão geral relativa a esse fator.
Tabela 4 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no
Português Arcaico
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTA
L
Cronol. 03 - - - 03 02 - 01 09
Aspectual 02 - - 01 - 01 - - 04
Híbrido 04 02 06 01 07 06 - 05 31
Total 09 02 06 02 10 09 - 06 44
% 20,5 4,5 13,6 4,5 22,7 20,5 - 13,6 100
Na tabela 4, em que checamos a ordenação do advérbio e a noção semântica expressa
por ele na cláusula, observamos a predominância da tendência pré-verbal, exceto os advérbios
com os sentidos híbridos que expressam em si mesmos os valores de tempo/aspecto e modo.
É exatamente o fato de apresentar esse valor polissêmico denominado de híbrido na presente
pesquisa que explica o desvio que este advérbio apresenta com relação à tendência da posição
pré-verbal.
Além disso, podemos apontar na tabela acima outras constatações no português
arcaico, como por exemplo, se observarmos os totais expressos na última linha da tabela,
verificamos que as posições 1, 5 e 6 são mais recorrentes do que as demais posições 3, 8, 2 e 4
respectivamente.
Outra questão a ser considerada nessa análise é que as noções cronológicas e aspectual
não são predominantes em relação às demais noções. Entretanto, identificamos que a noção
híbrida é mais freqüente, quanto à sua ordenação, eles ocorrem mais na posição 5(margem
direita da cláusula), que é uma posição pós-verbal.
Na dissertação de Freitas (2004), verificou-se que o tipo polissêmico (que
corresponderia à noção híbrida) ocorria mais na posição pós-verbal, diferindo dos demais
tipos semânticos (cronológico, aspectual e conectivo). A autora justifica que por essa noção
possuir características de um advérbio qualitativo (Ilari et al., 1990), esse advérbio irá tender a
ocupar a posição pós-verbal, uma vez que os advérbios qualitativos têm a predisposição de
ocorrer após o verbo. Já Moraes Pinto (2007:77), ao estudar o uso do advérbio qualitativo em
–mente, constatou que “esses elementos apresentam mudança em seus valores desde
português arcaico ao século XIX”. Ela conclui que, além do processo de gramaticalização
pelo qual passou esse advérbio, exercendo nova função, sua ordenação na cláusula também
sofreu mudanças de acordo com os textos diacrônicos. E, ainda, acrescenta que “a posição
pré-verbal, principalmente entre o sujeito e o verbo, ainda se mostrou disponível, embora em
menor escala, no século XIX”.
Vejamos a análise do mesmo fator nos dados do século XVI:
Tabela 5 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica
Século XVI
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
Cronol. 05 - - - - 01 - - 06
Aspectual 02 01 - - - - - - 03
Híbrido 03 01 - - 01 02 01 01 10
Total 10 02 - - 01 03 01 01 18
% 55,5 11,1 - - 5,5 16,7 5,5 5,5 100
Na análise dos dados desse fator no século XVI, encontramos na relação entre ordem e
noção semântica, maior incidência de dados na posição 1 (margem esquerda da cláusula). As
noções cronológicas e aspectual, principalmente, predominam nessa posição (1), o sentido
híbrido ocorre mais nas posições pós-verbais, como atestam os trabalhos de Freitas (2004) e
Moraes Pinto (2002) em referência a esse tipo de advérbio. Com relação ao século XVII,
temos os seguintes resultados:
Tabela 6 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica
Século XVII
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
Cronol. 10 02 02 - 01 03 - 03 21
Aspectual 01 - - - 01 - - - 02
Híbrido 07 - - - - 01 01 02 11
Total 18 02 02 - 02 04 01 05 34
% 52,9 5,9 5,9 - 5,9 11,8 2,9 14,7 100
No século XVII, observamos que as noções cronológicas e híbridas predominam na
posição 1 (margem esquerda da cláusula). O sentido aspectual é menos freqüente (com
somente 1 dado na posição 1(margem esquerda) e 1 dado na posição 5 (margem direita).
Além disso, verificamos que o tipo híbrido não foi mais recorrente nas posições pós-verbais,
como vimos no português arcaico e no século XVII, mais ainda assim, não foi uma diferença
marcante.
O baixo número de dados não nos permite fazer outras generalizações. O mesmo
acontece com as outras sincronias.
A seguir apresentamos os resultados da análise dos dados do século XVIII.
Tabela 7 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica
Século XVIII
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
Cronol. 03 - - 01 01 01 - 01 07
Aspectual 03 - - - - 01 - 01 05
Híbrido 05 01 - - - - - - 06
Total 11 01 - 01 01 02 - 02 18
É interessante observar que, no século XVIII, todas as noções apresentam-se
predominantemente na posição 1 (margem esquerda da cláusula, pré-verbal). E mesmo o
sentido híbrido é mais freqüente na posição pré-verbal.
Vejamos os resultados acerca da amostra do século XIX.
Tabela 8 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica
Século XIX
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
Cronol. 01 - - 01 - - - - 02
Aspectual 01 - - 02 02 03 - 01 09
Híbrido 04 - - - 02 02 - 02 10
Total 06 - - 03 04 05 - 03 21
% 28,6 - - 14,3 19 23,8 - 14,3 100
Sabe-se que, no século XIX, as transformações na ngua foram decisivas para a
caracterização do português moderno. Na análise dos dados desse século, verificamos que as
posições mais recorrentes são as pós-verbais. Em relação à noção semântica, observamos que
os sentidos aspectual e híbrido são mais incidentes do que o cronológico. Além disso,
identificamos que o sentido híbrido é mais recorrente nas posições pós-verbais, como foi
atestado em outros trabalhos sobre os advérbios já citados.
Tabela 9 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica
Português Atual
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
Cronol. 02 - - 01 05 02 - - 10
Aspectual 02 01 03 03 05 03 - 05 22
Híbrido 02 02 01 - 04 02 01 01 13
Total 06 03 04 04 14 07 01 06 45
% 13,3 6,7 8,9 8,9 31,1 15,6 2,2 13,3 100
Na tabela 9, verificamos uma distribuição entre a posição e a noção semântica do
advérbio de maneira mais homogênea entre os sentidos pelas posições arroladas. Observamos
também que as posições pós-verbais são mais freqüentes do que as posições pré-verbais. E
que o sentido aspectual é mais utilizado nos contextos examinados.
Como vimos, no português atual, predomínio da posição pós-verbal (mais
especificamente a posição marginal à direita). Apenas podemos concluir que, quando a noção
é basicamente aspectual, como em freqüentemente, o advérbio não tem posição predominante,
mas, quando apresenta noção dêitica (temporal) ou noção híbrida, como antigamente,
rapidamente, respectivamente, a posição típica é pós-verbal.
Notamos também que os sentidos do advérbio ligeiramente encontrados no português
arcaico desapareceram e um novo uso surgiu. Isso demonstra que houve uma mudança nos
valores desses elementos.
Assim, podemos apontar que os advérbios do presente estudo assumem valores que
podem ocorrer antes ou depois do verbo, dependendo do valor semântico que assumem. O
advérbio ligeiramente, por exemplo, pode se apresentar como advérbio de modo (com sentido
de “de maneira simples; com simplicidade”) em posição pós-verbal ou começa a ter um
sentido brido quando aparece em posição pré-verbal. Pode ser entendido tanto como “com
simplicidade; com humildade” quanto, por extensão metafórica de significado, com sentido
semelhante a “apenas; só”, como ocorre nos dias de hoje. Nos exemplos dados do português
arcaico, temos:
(22) posso dizer ligeyrame)
))
)te qual cousa dellas he merecedor de mayor cõndenpcõ
(Português arcaico, OE, p.122)
(23) E e)na segu)da coua põõe) hu)a cesta que se çarra legeyrame
)
))
)
te quando a tangem. (Português
arcaico, OE, p.194)
No primeiro exemplo, o advérbio se comporta como advérbio de modo e, no segundo,
é híbrido, ou seja, um sentido se sobrepõe ao outro, resguardando resquícios de sentidos.
5.1.4 Tipo semântico do verbo
Um dos fatores que consideramos importantes para entender a posição dos advérbios
de tempo e de aspecto em -mente é a noção semântica expressa pelo verbo, pois trabalhos
anteriores, como Scheibman (2001), Bybee (2003), Andrade (2005) e Albani (2007), que
constataram que era necessário investigar se o tipo de verbo poderia influenciar na cláusula de
alguma forma, conforme explicamos na seção 3.5. Na presente análise, consideramos esse
fator relevante para tentar identificar se houve uma motivação semântica na ordenação dos
advérbios de tempo e de aspecto em -mente. Para isso, valemo-nos da classificação proposta
por Halliday (1994), também utilizada pelos autores citados nesta seção.
Portanto, o fator tipo semântico do verbo consistiu na classificação proposta para os
verbos da cláusula foi baseada em Halliday (1994), explicitada anteriormente neste
trabalho. Eis alguns exemplos de tipos de verbos encontrados nos corpora analisados:
- Processo material
(24) E quantos mortos subitamente e s~e p~e~endença lançou e enviou a ardideza ao
inferno...(Português arcaico, OE,p. 191).
- Processo Mental
(25) E, estando elle deitado em oraçõ em aquele loguar, começou subitamente a dormir...
(Português arcaico, OE,p. 164).
- Processo Relacional Intensivo
(26) Maria é mãe eternamente presente no mundo dos homens (Português atual, TS, p.15).
- Processo Relacional Possessivo
(27) Ele tem o coração constantemente voltado para os miseráveis (Português atual, TS,
p.47).
- Processo Comportamental
(28) E diz outrosy que os b~e~es temporares que veem continuadam~ente h~u~us tempos
outros he certa demonstrãnça de maa v~etura... (Português arcaico, OE).
- Atividade Verbal
(29) e refletiu sobre aquilo que Deus continuamente nos fala
. (Português atual, TS, p.15)
- Processo Existencial
(30) e logo subitam~ete os veras inchar e esqueecer-se da subjeiçõ ....(Português arcaico,
OE,p. 289).
- Processo Meteorológico
(31) e a pompa do m~udo he fumo e v~eto que subpitamente esvace e se sume... (Português
arcaico, OE,p. 227)
Este fator foi levado em consideração para verificar se houve uma fixação de uso. Ou
ainda, se tipos de verbos em que predominância de uma dada ordem do advérbio em
detrimento de outra. Além disso, temos de levar em consideração que essa classificação
semântica verbal é bastante subjetiva, pois os verbos podem apresentar sentidos adversos aos
propostos, dependendo do contexto ou a situação em que estejam configurando. Vejamos um
exemplo dos corpora:
(32) Entõn foy arrevatado subitam~ete em spiritu e levado ante a cadeyra ah~uu juiz...
(Português arcaico, OE, p. 66).
Na exemplificação (32) dada, o verbo “arrebatar”, que significa puxar, arrancar
(Dicionário Houaiss da língua portuguesa, 2004), está sendo usado metaforicamente.
Esperávamos também que o tipo semântico do verbo influenciasse a posição do
advérbio.
Para verificarmos, estabelecermos a relação entre o fator tipo semântica do verbo e a
ordem do advérbio de tempo e aspecto. Vejamos a tabela a seguir:
Tabela 10 –Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Português Arcaico
Tipo de
verbo/Ordem
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
01 - 01 01 02 02 - - 07
Existencial
- - 01 01 01 - 02 05
Material
04 01 03 01 06 02 - 01 18
Mental
- 01 01 - - 01 - 01 04
Relac. Intensivo
02 - - - 01 - - 01 04
Meteorológico
01 - - - - - - 01
Atividade Verbal
01 - - - - 03 - 01 05
Total
09 02 06 02 10 09 - 06 44
% 20,5 4,5 13,6 4,5 24,9 22,7 - 13,6 100
No português arcaico, observamos que o tipo de verbo mais recorrente é de valor
material em detrimentos dos demais valores. Quanto à relação posição e sentido do verbo, o
tipo material ocorre nas posições 1 e 5, que o as posições margens esquerda e direita
respectivamente. Os verbos comportamentais tendem a ocorrer nas posições 5 e 6 e os verbos
de atividade verbal tendem a ocorrer na posição 6. Além disso, verificamos que, em relação à
distribuição geral dos dados nesta sincronia, ela se dá de forma equilibrada. Na última linha
da tabela (total de dados de cada ordenação), constatamos que as posições marginais 1 e
5(esquerda e direita) são mais freqüentes, apesar de haver uma relativa distribuição dos dados
nas demais ordenações.
Além disso, nesta sincronia não houve ocorrência de verbo relacional possessivo.
Agora, vejamos a análise dos dados do século XVI.
Tabela 11 – Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em-
mente do século XVI
Tipo de
verbo/Ordem
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
01 - - - - - - - 01
Material
03 01 - - - - - - 04
Mental
02 - - - - - - 01 04
Relac. Possessivo
01 01 - - - 01 01 - 04
Relac. Intensivo
02 - - - 01 02 - - 05
Atividade Verbal
01 - - - - - - - 01
Total
10 02 - - 01 03 01 01 18
% 55,5 11,1 - - 5,5 16,6 5,5 5,5 100
Nos dados apresentados do século XVI, verificamos que os tipos mais freqüentes são
verbos materiais, mentais e relacionais possessivos. No total de 18 dados, encontramos 4
dados de cada tipo. Quando o verbo tem sentido material ou mental, a tendência é o advérbio
ocorrer na margem esquerda (POS1). Quando o verbo é relacional possessivo não posição
prototípica para o advérbio.
Em relação aos demais sentidos dos verbos, uma distribuição de dados equilibrada,
apenas podemos ressaltar que, verificando a última linha da tabela, a posição 1 (margem
esquerda) é a preferida, independente do tipo semântico do verbo.
Neste século, não houve ocorrências dos tipos de verbos existenciais e meteorológicos.
Vejamos os dados analisados na tabela a seguir.
Tabela 12 - Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em -mente
Século XVII
Tipo de
verbo/Ordem
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
- - - - - 02 - 01 03
Existencial
04 - - - 01 - 02 07
Material
04 02 01 - 01 01 01 - 10
Mental
01 - 01 - - - - - 02
Relac. Possessivo
02 - - - - - - 02
Relac. Intensivo
03 - - - - - 01 04
Atividade
Verbal
04 - - 01 - - 01 06
Total
18 02 02 - 02 04 01 05 34
% 52,9 5,8 5,8 - 5,8 11,8 2,9 14,7 100
Já nos dados do século XVII, observamos que não há uma predileção pelo tipo
material, como vimos nos dados do português arcaico e do século XVI, mas, em relação à
posição e o tipo semântico do verbo em geral, todos são mais recorrentes na posição 1
(margem esquerda), 18 dados de 34, e há uma relativa distribuição nas demais posições, o que
não difere dos séculos anteriores apresentados.
Neste século não houve ocorrência do tipo de verbo meteorológico, por isso não foi
apresentado na tabela.
A seguir, temos os dados analisados do século XVIII.
Tabela 13 – Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em -mente
Século XVIII
Tipo de
verbo/Ordem
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
03 - - 01 01 - - 05
Material
05 - - - 01 01 - 01 08
Mental
02 01 - - - - - 01 04
Relac. Possessivo
- - - - - - - - -
Relac. Intensivo
01 - - - - - - - 01
Total
11 01 - 01 01 02 - 02 18
% 61,1 5,5 - 5,5 5,5 11,1
-
11,1 100
Os dados analisados do século XVIII demonstram que o tipo de verbo material é o
mais freqüente, seguido do tipo comportamental (cada qual com 8 e 5 dados respectivamente).
Independentemente do tipo semântico, o advérbio tende a ocorrer na posição marginal à
esquerda (POS1).
Neste culo não houve ocorrências dos tipos de verbos: existencial, meteorológico e
atividade verbal, por isso não foram listados na tabela.
Vejamos os dados na tabela a seguir.
Tabela 14 - Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em -mente
Século XIX
Tipo de
verbo/Ordem
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
- - - - - - - 01 01
Material
03 - - 02 02 03 - - 10
Mental
- - - - - 01 - 01 02
Relac. Possessivo
02 - - - - 01 - - 03
Relac. Intensivo
01 - - 01 - - - - 02
Atividade
Verbal
- - - - 02 - - 01 03
Total
06 - - 03 04 05 - 03 21
%
28,6 - - 14,3 19,04
23,8 - 14,3 100
No século XIX, constatamos que o tipo de verbo material é o mais freqüente, como
maioria das sincronias. Quanto à relação entre posição e tipo de verbo, observamos que
uma distribuição mais homogênea. Quando o verbo é material, o advérbio em -mente ocorre
mais na posição 1 (3 dados em 10) ou na posição 6 (também 3 dados em 10). Os demais tipos
tiveram poucos dados. Verificamos, também, que os advérbios tendem a ocorrer mais nas
posições pós-verbais (Posições 5, 6, e 8).
Além disso, podemos confirmar na última linha da tabela que os números percentuais
incidem mais nessas posições: POS 5 (19,4%); POS 6 (23,8%); POS 8 (14,3%).
Na análise deste culo também não foram encontrados dados dos tipos de verbos
existenciais e meteorológicos, por isso este não foi listado na tabela.
A seguir, vejamos os dados analisados do português atual.
Tabela 15 – Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em -
mente do Português Atual
Tipo de
verbo/Oração
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
01 - - 01 - 01 - - 03
Existencial
- - - - 03 - - 03
Material
03 01 - 02 03 02 - 02 13
Mental
- - - - 01 - 01 02
Relac. Possessivo
- - 01 - 02 01 - - 04
Relac. Intensivo
02 - 03 - - - - 02 07
Meteorológico
- - - - - - 01 - 01
Atividade
Verbal
- 02 - 01 05 03 - 01 12
Total
06 03 04 04 14 07 01 06 45
% 13,3 6,7 8,9 8,9 31,1 15,6 2,2 13,3 100
De acordo com a tabela 15, verificamos que o tipo de verbo mais freqüente é o verbo
de processo material, seguido dos de atividade verbal. Em relação ao tipo de verbo e a posição
do advérbio, vemos que, quando o verbo é material, o advérbio tende a ocorrer nas posições 1
e 5; quando é de atividade verbal, tende a ocorrer na posição 5.
Nos resultados apresentados, uma tendência para os advérbios em -mente
aparecerem numa posição pré-verbal (no português arcaico, século XVI, XVII e XVII)
principalmente quando o verbo é de processo material, assim com os demais tipos de verbos.
Mas em relação à análise dos dados do século XIX e português atual, verificamos que há uma
predileção às posições pós-verbais. Esse resultado indica mudança na posição do advérbio ao
longo da história do português, o que vai ao encontro de outras pesquisas, como as de
Martelotta (2006) e Albani (2007), que demonstraram que os advérbios m mudando para a
posição pós-verbal, de um modo geral.
5.1.5 Tipo de sujeito
A forma de realização do sujeito da oração, um critério de natureza sintática, é um
fator considerado na presente análise do advérbio de tempo e aspecto em -mente.
Em um trabalho feito sobre a forma de realização do sujeito pronominal, Duarte
(1993) observou que o português do Brasil apresentava índices de preenchimento de sujeito
bastante superiores aos apresentados pelas línguas românicas de sujeito nulo, como o
espanhol, o italiano e a variedade européia do português. A partir desse trabalho, intuímos que
em todos os contextos em que a posição do sujeito está vazia seja pela não realização, a
posposição ou deslocamento do sujeito para a margem direita da oração favoreceria a
ocorrência dos advérbios na margem esquerda da cláusula. De certa forma, a relação entre a
posição do advérbio e a forma de realização do sujeito da cláusula é demonstrada nas
subposições do item I desse capítulo, onde são analisadas as diversas possibilidades
estruturais decorrentes das posições em que os advérbios de tempo e de aspecto ocupam na
oração.
Essa possibilidade fora levantada em pesquisas como os de Kato e Nascimento
(2002:195), que mostraram que “se o sujeito é nulo, o preenchedor pode ser predito como um
adjunto”. Rocha (2001:113) também concorda com essa posição, pois afirma que “a ausência
de argumento concorre para propiciar a presença de preenchedores”. Haveria uma espécie de
equilíbrio sintático.
Porém, os trabalhos recentes apresentam evidências contrárias a essa postura. Duarte
(2003:121), em um estudo que compara amostras da fala carioca dos anos 80 e dos anos 90,
atesta que a ocorrência “de elementos adjuntos ao sujeito, sejam eles resultados de
topicalizações sejam eles adjuntos adverbiais, favorece a expressão plena do sujeito
pronominal”.
Para verificar de que forma se a relação entre a realização do sujeito e a ordem dos
advérbios de tempo e de aspecto em -mente foi feito um controle das possibilidades
exemplificadas a seguir:
a) Sujeito expresso anteposto ao verbo
(80) Lêde o Testamento Velho, e achareis que Deus antigamente afogava exércitos,
queimava cidades, alagava mundos, despovoava paraísos (Século XVII, sermão do Pe.A.
Vieira).
b) Sujeito expresso posposto ao verbo
(81) Comeu Eva o pomo da ciência, e queixava-me eu antigamente desta nossa Mãe; que
comeu o pomo, por que Ihe não guardou as pevides?(Século XVII, sermão do Pe.A. Vieira).
c) Sujeito ausente
(82) abramos os olhos à luz, para que alumie nossos corações; abramos os corações à luz, para
que more perpètuamente neles (Século XVII, sermão do Pe.A. Vieira).
d) Sujeito pronominal (que/quem).
(83) Capitulo como elrey combateo a cidade de Rachol. Estando elrey, como dito he,
combatemdo a cidade de Rachol, lhe veyo novas certas como ydalca~o hera chegado ao ryo
da bamda do norte, e que ally asentava seu arayall; mamdou elrey os espias que sempre
amdassem sobre elle, que vissem ho que fazia, e asym lhe desem o aviso de tudo ho que fazia;
com esta nova ouve no arayal allgu~u allvoroço, primcipalmente na gente baixa, a quem
numca fallta sospeitas, e aymda em sy tinha~o o medo que antigamente tinha~o aos mouros.
(Século XVI, Crônica dos Reis de Bisnaga)
Vejamos como ficou a distribuição do fator tipo de sujeito com a ordem do advérbio -
mente nas sincronias estudadas. As conclusões a respeito da hipótese serão dadas após os
resultados da última sincronia estudada, ao final desta seção.
Tabela 16 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio
Português Arcaico
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
05 - 05 01 06 06 - 06 29
Sujeito presente
antes do verbo
01 02 - 01 03 02 - - 09
Sujeito presente
depois do verbo
- - 01 01 01 - - 03
Sujeito pronome
relativo
03 - - - - - - - 03
Total
09 02 06 02 10 09 - 06 44
% 20,5 4,5 13,6 4,5 22,7 20,5 - 13,6 100
Nos dados do português arcaico, observamos que, quando o sujeito está ausente, o
advérbio tende a vir nas posições 5 (final da oração) e 6 (posição pré-verbal não marginal),
cada qual com 6 dados, no total de 29. Quando o sujeito está presente anteposto ao verbo, o
advérbio tende a ocorrer na posição 5 (final da oração). Ocorre apenas neste último caso uma
espécie de equilíbrio sintático.
Vejamos os dados a seguir do século XVI.
Tabela 17 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio
Século XVI
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
06 - - - - - 01 01 08
Sujeito presente
antes do verbo
03 02 - - 01 01 - - 07
Sujeito presente
depois do verbo
- - - - - 02 - - 02
Sujeito
pronome
relativo
01 - - - - - - - 01
Total
10 02 - - 01 03 01 01 18
%
52,9 11,5 - - 5,5 16,6 5,5 5,5 100
Nos dados do século XVI, quando o sujeito está ausente, o advérbio tende a vir na
posição 1(margem esquerda), o que é esperado para haver equilíbrio sintático. Quando o
sujeito está presente anteposto ao verbo, o advérbio tende a ocorrer também na posição 1
(margem esquerda), não confirmando a hipótese. Além disso, quando o sujeito está posposto,
o advérbio aparece em posição pós-verbal (a posição 6 é uma posição pós-verbal), o que
também não comprova a hipótese de equilíbrio sintático.
A seguir, vejamos os dados do século XVII.
Tabela 18 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio
Século XVII
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
09 01 02 - 01 02 01 04 20
Sujeito presente
antes do verbo
08 01 - - 01 01 - - 11
Sujeito presente
depois do verbo
01 - - - - 01 - 01 03
Sujeito
pronome
relativo
- - - - - - - - -
Total
18 02 02 - 02 04 01 05 34
% 52,9 5,8 5,8 - 5,8 11,7 2,9 14,7 100
Nos dados do século XVII, observamos que, quando o sujeito está ausente, o advérbio
tende a vir nas posições 1, havendo então preenchimento da posição pré-verbal. No entanto,
quando o sujeito está presente anteposto ao verbo, tende a ocorrer na posição 1 (margem
esquerda).
Vejamos os dados a seguir do século XVIII
Tabela 19 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Século XVIII
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
06 - - 01 - 01 - 01 09
Sujeito presente
antes do verbo
02 01 - - 01 01 - 01 06
Sujeito presente
depois do verbo
01 - - - - - - - 01
Sujeito pronome
relativo
02 - - - - - - - 02
Total
11 01 - 01 01 02 - 02 18
% 61,1 5,5 - 5,5 5,5 11,1 - 11,1 100
Na análise dos dados do século XVIII, verificamos que, quando o sujeito está ausente,
o advérbio tende a vir na posição 1(margem esquerda), 6 dados, ou seja, houve o
preenchimento da posição do sujeito pelo advérbio. Quando o sujeito está presente anteposto
ao verbo, o advérbio tende a ocorrer na posição 1 (margem esquerda), mas o número de dados
é extremamente baixo em qualquer posição
Vejamos os dados a seguir do século XIX.
Tabela 20 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio
Século XIX
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
05 - - 01 02 05 - 03 16
Sujeito presente
antes do verbo
01 - - 02 - - - - 03
Sujeito presente
depois do verbo
- - - - 01 - - - 01
Sujeito pronome
relativo
- - - - 01 - - - 01
Total
06 - - 03 04 05 - 03 21
% 28,6 - - 14,2 19,0
4
23,8 - 14,2 100
Nos dados analisados do século XIX, verificamos que, quando o sujeito está ausente, o
advérbio tende a vir nas posições 1 e 6 (cada qual com 5). A hipótese do equilíbrio sintático se
confirma no primeiro caso, pois, quando o sujeito estava ausente, houve maior incidência de
advérbio na margem esquerda (ou seja, posição pré-verbal). Mas a ocorrência relativamente
alta de dados na posição 6 (entre o verbo e o complemento) demonstra que a hipótese não foi
contemplada. (Os demais tipos tiveram baixíssima ocorrência.). Observamos que
independente do sujeito estar ausente ou presente uma tendência a ocorrerem nas posições
pós-verbais (posições 5, 6 e 8).
Vejamos os dados a seguir do português atual.
Tabela 21 - Relação entre o tipo de sujeito e a ordem do advérbio
Português Atual
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
02 01 01 04 07 04 01 02 22
Sujeito presente
antes do verbo
04 01 03 - 04 02 - 04 18
Sujeito presente
depois do verbo
- - - - 01 01 - - 02
Sujeito
pronome
relativo
- 01 - - 02 - - - 03
Total
06 03 04 04 14 07 01 06 45
% 13,3 6,6 8,8 8,8 31,3 15,5 2,2 13,3 100
Nos dados do português atual, verificamos, quando o sujeito está ausente, o advérbio
tende a ocorrer nas posições 5 (final da oração) e 6 (entre o verbo e o complemento). Esse
resultado indica que não tendência ao preenchimento da posição vazia. Quando o sujeito
está presente anteposto ao verbo, o advérbio aparece nas posições 1 (margem esquerda) e 5
(final da oração), o que demonstra que a hipótese do equilíbrio sintático não pôde ser
comprovada, pois ora preenchimento, ora não preenchimento da posição à esquerda do
verbo (com o sujeito à direita).
Nas tabelas apresentadas, se tomarmos as posições pré-verbais de um modo geral, em
oposição às pós-verbais, podemos observar que a ausência de sujeito nas posições pré-verbais
não leva o advérbio a se antepor ao verbo. Nos casos de sujeito ausente, por exemplo, temos
mais advérbios pós-verbais do que pré-verbais. Por outro lado, os casos em que o sujeito está
posposto apresentam mais dados com advérbio pós-verbal do que pré-verbal. Parece não
haver, portanto, nos casos dos advérbios em -mente, algum tipo de compensação ou equilíbrio
no posicionamento dos elementos na estrutura da cláusula.
Se observarmos separadamente a posição 1, ou seja, a que corresponde à margem
esquerda da cláusula e que, por hipótese, seria a que mais atrairia o advérbio, notamos que
isso também não ocorre. De fato, há uma quantidade maior de casos nessa posição.
Entretanto, se observarmos todas as ocorrências pré-verbais, notamos que a margem esquerda,
independentemente da presença ou não do sujeito, é a posição preferencial dos advérbios pré-
verbais.
Em função desses resultados, concluímos que não uma relação mais significativa
entre presença/ ausência de sujeito em posição pré-verbal (marginal ou o) e colocação dos
advérbios aqui estudados. Esse mesmo resultado foi obtido em Martelotta (2006) para os
advérbios qualitativos e em Marques (2008), que estudou a ordenação sujeito/ verbo. Assim
nossos resultados são contrários à hipótese de que adjuntos (pelo menos do tipo que estamos
estudando) são colocados na posição do sujeito vazio.
5.1.6 Tipo de oração
As tabelas abaixo apresentam a distribuição das ocorrências dos advérbios de tempo e
aspecto em -mente pelas diferentes posições observadas, sempre levando em conta o grau de
gramaticalização das cláusulas que contêm essas ocorrências. Essa análise foi feita de acordo
com a metodologia e hipóteses apresentadas nos trabalhos de Martelotta (2006). Sua hipótese
principal, exposta nesta tese no capítulo 1, é a de que as orações mais gramaticalizadas seriam
as mais propícias aos usos mais conservadores dos advérbios.
Tabela 22 - Ocorrência de advérbios no Português Arcaico
Na análise dos dados do Português Arcaico, observamos que um número
significativo de ocorrências de advérbios de tempo e aspecto em -mente em posição pré-
verbal, mostrando que essa posição, assim como a pós-verbal, estava disponível para este tipo
de advérbio na fase arcaica de nossa língua.
É possível observar algumas regularidades interessantes, sobretudo quando se
comparam esses resultados com outras pesquisas referentes à ordenação de outros tipos de
PORT.
ARCAICO
-gramatical.
+Gramatical.
- Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação
Subord. Rel
- NR NR R NR NR
Total
POS1
06 - - - - 03 09
POS 2
02 - - - - - 02
POS 3
02 01 - - 01 01 06
POS 4
- - - - - 02 02
POS 5
07 01 - - 01 01 10
POS 6
06 - - - 01 02 09
POS 7
- - - - - - -
POS 8
03 01 01 - - 01 06
Total
27 03 01 - 03 08 44
advérbios, feitas com base em outros corpora. Pesquisas elaboradas em Martelotta, (2004;
2006) e Martelotta e Vlček (2006) sobre os advérbios qualitativos bem e mal, assim como os
terminados em -mente demonstraram que as posições pré-verbais tipicamente latinas
(Martelotta, Processy e Santos: 2008), hoje praticamente inexistentes no caso desses
advérbios, ainda ocorriam até o século XIX, sobretudo em cláusulas com alto nível de
gramaticalização. Isso ocorre porque essas cláusulas, segundo Givón (1979), o mais
conservadoras em termos de estrutura sintática, sobretudo no que se refere à ordenação de
seus constituintes.
Os resultados da tabela acima não refletem o que ocorreu com os qualitativos: uma
predominância não muito acentuada das posições pós-verbais, mesmo em cláusulas mais
gramaticalizadas.
Temos a seguir dois exemplos que ilustram os tipos de cláusulas em que ocorre o tipo de
advérbio estudado:
(84) E esta sandia subitam~ete foy cega, mas Ella nõ sabia que era cega(OE,p.57)
(85) e a pompa do m~udo he fumo e v~eto que subpitamente esvaece e se sume...(OE, p
227)
No primeiro exemplo, temos uma ocorrência em que o advérbio está inserido numa
cláusula paratática; no segundo exemplo, o advérbio está num contexto de uma cláusula
subordinada adjetiva restritiva.
Análise dos dados referentes ao Século XVI
Na análise dos dados do século XVI, não temos o mesmo número de dados que foi
observado no português arcaico. Por isso, priorizamos uma análise mais qualitativa,
observando as tendências de ordenação em face às outras sincronias estudadas.
Tabela 23 - Ocorrência de advérbios no Século XVI
Apesar da baixa ocorrência de dados nesta fase, de um modo geral, a análise
qualitativa apresentou resultados favoráveis às nossas hipóteses. A posição pré-verbal, por
exemplo, estava presente nesta fase do português em escala menor que a posição pós-verbal.
Também foi possível observar que as orações mais gramaticalizadas elegem a
ordenação pré-verbal, 11 ocorrências distribuídas pelas posições pré-verbais (Pos 1, 2 e 3).
SÉC.XVI
-gramatical.
+Gramatical.
Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação
Subord. Rel
NR NR R NR NR
Total
POS1
01 01 01 - 01 06 10
POS 2
- - - - 01 01 02
POS 3
- - - - - - -
POS 4
- - - - - -
POS 5
01 - - - - - 01
POS 6
01 - - - 01 01 03
POS 7
01 - - - - - 01
POS 8
- - - - - 01 01
Total
04 01 01 - 03 13 18
Tal observação contribui para confirmar a hipótese que adotamos com Givón (1979) de que
esses tipos cláusulas (mais gramaticalizadas) tendem a ser sintaticamente mais conservadoras,
principalmente, no que diz respeito à ordenação dos constituintes da oração.
Ilustrando a ocorrência de cláusulas mais gramaticalizadas nesta sincronia, temos o
caso do exemplo (85), a seguir:
(85) O que ha da bamda d este rio. Esta hu~a cidade edificada que chama~o Senagumdym,
que dizem que antigamente foy cabeça do reyno, e agora vive nella pouca gente (Século
XVI, Crônica dos Reis de Bisnaga)
Outra ressalva interessante é que, ao analisarmos o português arcaico, apresentado
anteriormente, a hipótese de Givón (1979) não foi de todo confirmada, apesar de
encontrarmos uma leve tendência das posições pré-verbais em cláusulas mais
gramaticalizadas. Por outro lado, na análise do século XVI essa hipótese se confirma quando
se relacionam as posições dos advérbios com o grau de gramaticalização da cláusula em que
ele ocorre, segundo a qual a anteposição do advérbio em relação ao verbo, característica do
latim, se mantém em cláusulas com graus mais altos de gramaticalização, que são mais
conservadoras em termos de ordenação.
Pode-se concluir que essa diferença entre as ocorrências do português arcaico e as do
séc.XVI se simplesmente pelo fato de que existem mais cláusulas com altos níveis de
gramaticalização nos textos desse século do que a do outro e que, somente por isso, os
números referentes aos advérbios pré-verbais são mais altos nessas cláusulas.
Análise dos dados referentes ao Século XVII
O número de dados encontrados nos corpora deste século foi de 34 dados, um pouco a
mais do que o século XVI.
Tabela 24 - Ocorrência de advérbios no Século XVII
Podemos observar, na tabela 26, que o advérbio de tempo e aspecto em -mente, maior
incidência na posição pré-verbal, porém como cláusulas menos encaixadas.
SÉC.XVII
-gramatical.
+Gramatical.
- Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação
Subord. Rel
- NR NR R NR NR
Total
POS1
14 02 - - 02 - 18
POS 2
01 - - - 01 - 02
POS 3
- 01 - - 01 02
POS 4
- - - - -
POS 5
02 - - - 02
POS 6
03 - - - 01 04
POS 7
- - - - 01 01
POS 8
03 - - - 01 01 05
Total
23 03 - - 05 03 34
Análise dos dados do Século XVIII
Cabe registrar logo de início a quantidade extremamente pequena de dados de
ocorrências dos advérbios em estudo nesta época. Isso, obviamente, impede qualquer
conclusão mais precisa em relação as suas tendências de ordenação nos corpora analisados no
século XVIII. Entretanto, é possível observar e fazer algumas ponderações em relação aos
resultados encontrados nesse século.
Vejamos a tabela a seguir:
Tabela 25 - Ocorrência de advérbios no Século XVIII
É interessante ressaltar que novamente a nossa hipótese inicial também foi confirmada
de que as orações mais gramaticalizadas elegem a ordenação pré-verbal, 8 ocorrências contra
uma única ocorrência na posição pós-verbal.
SÉC.XVIII
-gramatical.
+Gramatical.
- Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação
Subord. Rel
- NR NR R NR NR
Total
POS1
05 - 03 - 01 02 11
POS 2
- - - - - 01 01
POS 3
- - - - - - -
POS 4
01 - - - - - 01
POS 5
- - - - 01 - 01
POS 6
02 - - - - - 02
POS 7
- - - - - -
POS 8
02 - - - - - 02
Total
10 - 03 - 02 03 18
Por outro lado, 5 ocorrências pré-verbais em cláusulas menos gramaticalizadas em
oposição 4 dados na posição pós-verbal, também em cláusulas menos gramaticalizadas.
Isso é importante, porque pode apontar para o fato de que, até o século XVIII, era mais forte a
inclinação que os advérbios qualitativos apresentavam de ocorrer antes do verbo, o mesmo
acontecendo para os de tempo e de aspecto, reforçando os resultados obtidos em Martelotta e
Vlček (2006), segundo os quais essa tendência começa a enfraquecer no início do século XIX
e acaba por desaparecer na virada para o século XX, os quais mostraremos mais adiante.
Análise dos dados referentes ao século XIX
As ocorrências de advérbios de tempo e aspecto em -mente no século XIX, relacionadas
às variáveis posição na oração e grau de gramaticalização da cláusula, podem ser vistas na
tabela abaixo:
Tabela 26 - Ocorrência de advérbios no Século XIX
No caso do século XIX, há uma quantidade maior de ocorrências de advérbios de tempo
e de aspecto em -mente, embora essas 21 ocorrências estejam longe de constituir a quantidade
necessária para se chegar a constatações mais precisas. Como foi mencionado na análise dos
dados do século XVIII, acredita-se ser possível, apesar do poucos dados, observar
regularidades interessantes, que se tornam significativas, quando comparadas com tendências
detectadas em outras pesquisas referentes à ordenação de outros advérbios, feitas com base
em outros corpora e em outros estágios da história do português.
Assim como aconteceu com o século XVIII, era de se esperar que o século XIX
apresentasse uma relativa predominância das posições pós-verbais. Isso de fato ocorreu: a
tabela apresenta 12 ocorrências nessa posição, total de 21 advérbios. Esses dados refletem a
tendência, mencionada anteriormente, que vem relativamente se delineando desde século
SÉC.XIX
-gramatical.
+Gramatical.
- Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação
Subord. Rel
- NR NR R NR NR
Total
POS1
03 - 02 - 01 - 06
POS 2
- - - - - - -
POS 3
- - - - - - -
POS 4
02 - - - 01 - 03
POS 5
02 - 01 - 01 - 04
POS 6
04 - - 01 - - 05
POS 7
- - - - - -
POS 8
02 01 - - - - 03
Total
13 01 03 01 03 - 21
XVI, uma vez que na fase arcaica do português com esse tipo de advérbio a hipótese não se
confirmou, ou como nos trabalhos de Moraes Pinto, 2002; Martelotta, 2004, a confirmação
dessas tendências foi constatada.
Outro resultado interessante se apresenta quando se relacionam as posições dos
advérbios com o grau de gramaticalização da cláusula em que ele ocorre. Do total de 9 casos
de advérbios pré-verbais, 4 correram em cláusulas mais gramaticalizadas (hipotáticas e
subordinadas). Cabe ressaltar aqui que a diferença entre as ocorrências em cláusulas menos
gramaticalizadas é bastante pequena: 6 dados nas posições (1, 2, 3 e 4) pré-verbais.
Tabela 27 - Ocorrência de advérbios no Português Atual
No português atual, a ocorrência dos dados demonstrou uma propensão, que se
manifesta quase categoricamente, de que esses advérbios ocorressem após o verbo, 28 dados,
SÉC.XIX
-gramatical. +Gramatical.
- Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação Subord. Rel
- NR NR R NR NR
Total
POS1
05 - - 01 - - 06
POS 2
01 - - - - 02 03
POS 3
01 - - 02 01 - 04
POS 4
04 - - - - - 04
POS 5
02 01 - 01 02 02 14
POS 6
03 01 - 02 01 - 07
POS 7
01 - - - - - 01
POS 8
05 01 - - - - 06
Total
28 03 - 06 04 04 45
sendo que 17 em cláusulas menos gramaticalizadas pós-verbais e 10 dados em cláusulas mais
gramaticalizadas. Cabe ressaltar que novamente obtivemos resultados atípicos aos esperados
segundo a hipótese proposta em relação à posição e o grau de gramaticalização das cláusulas.
O quadro a seguir apresenta uma síntese do que já foi exposto.
Nessa sincronia, novamente obtivemos resultados contrários aos esperados segundo a
hipótese proposta em relação à posição e o grau de gramaticalização das cláusulas.
Mas, ressaltamos que os resultados encontrados são significativos, pois alguns apontam
para outras possíveis tendências diferentes dos trabalhos realizados sobre o fenômeno em
questão.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta pesquisa teve como objetivo observar as diferentes posições que os advérbios de
tempo e aspecto em -mente tendem a assumir em diferentes momentos na história da língua
portuguesa, a fim de verificarmos se houve mudança na ordenação desses elementos. Para
isso, coletamos dados de textos do português das seguintes fases históricas: arcaica, dos
séculos XVI, VXII, XVIII e XIX e português atual.
Este estudo, além de testar novas hipóteses, vem integrar e ampliar uma série de
pesquisas que visam examinar, de modo mais geral, o processo de mudança de colocação dos
advérbios no decorrer do tempo (Moraes Pinto, 2002; Martelotta, Barbosa & Leitão, 2002;
Martelotta, 2004 e 2006; Martelotta & Processy, 2006; Andrade, 2005; Albani 2007; Freitas,
2004).
Foram muito poucos os dados encontrados nos corpora analisados, em função de que,
de um modo geral, advérbios de tempo e aspecto em -mente são, de fato, pouco usados no
discurso escrito assim como no falado. Sendo assim, em muitos momentos da pesquisa, foi
difícil chegar a conclusões a respeito dos resultados estatísticos. Entretanto, foi possível
observar, entre esses poucos dados, algumas regularidades interessantes, sobretudo quando
essas regularidades foram localizadas dentro de um processo de mudança mais geral,
observado em outras pesquisas referentes à ordenação de outros tipos de advérbios feitas com
base em outros corpora e em diferentes momentos da história da língua portuguesa..
Partimos do pressuposto de que ocorreram mudanças na posição dos advérbios ao
compararmos a sincronia do português arcaico com o atual. De acordo com trabalhos
anteriores, como os de Martelotta e Leitão (1999) e de Martelotta, Barbosa e Leitão (2001), a
posição pré-verbal (entre o sujeito e o verbo) era disponível para toda espécie de advérbio e,
hoje, ela ainda está disponível para alguns. Portanto, houve uma mudança no padrão de
ordenação de alguns advérbios.
Observamos que não houve diferença significativa, ao compararmos as duas posições,
a pré-verbal e a pós-verbal, quando levamos em consideração todos os dados, ou seja, quando
não separamos as sincronias, pois os dados se distribuíram homogeneamente entre essas
posições gerais.
Porém, ao olharmos a distribuição dos advérbios analisados pelas posições já arroladas
anteriormente nas sincronias estudadas, constatamos que a POS1 (margem esquerda) foi a
mais recorrente, ou seja, os advérbios de tempo e de aspecto em -mente por expressarem tais
circunstâncias preferiram as posições periféricas da cláusula, sobretudo à margem esquerda
(POS1), e pouco se realizaram nas posições mais internas à sentença, posições essas que
rompem com a estrutura padrão da cláusula. Shaer (2004), ao tratar especificamente da
ordenação dos circunstanciais temporais, relata que não é fácil determinar de forma precisa as
diferenças entre os temporais na margem esquerda ou na margem direita da sentença, ainda
que seja possível determinar distinções funcionais entre eles: a margem esquerda constitui um
ponto de ancoragem, um elo entre a parte do discurso em que se encontra o advérbio e um
ponto do discurso anteriormente mencionado, numa relação nitidamente anafórica, de
conexão discursiva. Além disso, pudemos observar, também, que, no português arcaico, as
posições típicas são posição 5 (pós-verbal, mais precisamente margem direita no fim da
oração), posição 6 (entre o verbo e o complemento) e posição 8 (pós-verbal fora do fim), mas
os dados tiveram uma boa distribuição em todas as posições, exceto a posição 7. Ou seja, no
português arcaico havia uma ordenação mais livre.
nas outras fases do português, entre o português do XVI e o português do século
XIX, o uso predominante foi a posição 1 (margem esquerda). No século XVI, ainda houve
outras posições com número razoável de dados, que foram as posições 6 (inserido entre o
verbo e o complemento/predicativo) e 5 (margem direita da oração). Depois, como dissemos,
é a posição marginal à esquerda a preferida pelos autores. Mas, no século XIX, já houve uma
diferença importante: começou a aumentar o uso de uma posição pós-verbal, que foi a posição
6. Já no Português atual, verificamos que houve uma distribuição de dados em todas as
posições, mas houve o predomínio da posição 5, ou seja, uma posição pós-verbal.
Nossa análise permite-nos dizer que, nas amostras estudadas (referentes somente ao
português escrito), o advérbio em -mente de tempo e de aspecto passou de um uso
relativamente livre para um uso mais fixo na posição marginal à esquerda e depois no
português atual passou a ser usado predominantemente na posição pós-verbal (mais
especificamente na posição marginal à direita). Trabalhos como os de Martelotta (2006) e
Albani (2007) também apontam pra o uso predominante da posição pós-verbal para os
advérbios ao longo da história do português.
Outro fator analisado foi a noção semântica do advérbio em que checamos a relação
entre ordenação e tipo semântico. No português arcaico observamos a predominância da
tendência pré-verbal, exceto os advérbios com os sentidos híbridos que expressam em si
mesmos os valores de tempo/aspecto e modo. É exatamente o fato de apresentar esse valor
polissêmico denominado de híbrido na presente pesquisa que explica o desvio que este
advérbio apresenta com relação à tendência da posição pré-verbal.
Outra questão a ser considerada nesta sincronia é que as noções cronológicas e
aspectual não são predominantes em relação às demais. Entretanto, identificamos que a noção
híbrida é mais freqüente, quanto à sua ordenação, eles ocorrem mais na posição 5 (margem
direita da cláusula), que é uma posição pós-verbal.
Na análise dos dados desse fator no século XVI, encontramos na relação entre ordem e
noção semântica, maior incidência de dados na posição 1 (margem esquerda da cláusula). As
noções cronológicas e aspectual, principalmente, predominam nessa posição (1), o sentido
híbrido ocorre mais nas posições pós-verbais, como atestam os trabalhos de Freitas (2004) e
Moraes Pinto (2002) em relação a esse tipo de advérbio.
no século XVII, observamos que as noções cronológicas e bridas predominam na
posição 1 (margem esquerda da cláusula). O sentido aspectual é menos freqüente (com
somente 1 dado na posição 1 (margem esquerda) e 1 dado na posição 5 (margem direita).
Além disso, verificamos que o tipo híbrido não foi mais recorrente nas posições pós-verbais,
como vimos no português arcaico e no século XVII, mais ainda assim, não foi uma diferença
marcante.
O baixo número de dados não nos permite fazer outras generalizações. O mesmo
aconteceu com as outras sincronias.
Em relação à análise dos dados do século XVIII, todas as noções apresentam-se
predominantemente na posição 1 (margem esquerda da cláusula, pré-verbal). E mesmo o
sentido híbrido é mais freqüente na posição pré-verbal.
Na análise dos dados do século XIX, verificamos que as posições mais recorrentes são
as pós-verbais. Em relação à noção semântica do advérbio, observamos que os sentidos
aspectual e híbrido são mais incidentes do que o cronológico. Além disso, identificamos que o
sentido híbrido é mais recorrente nas posições pós-verbais, como foi atestado em outros
trabalhos sobre os advérbios já citados ao longo desse estudo.
No português atual, verificamos uma distribuição entre a posição e a noção semântica
do advérbio de maneira mais homogênea entre os sentidos pelas posições arroladas.
Observamos também que as posições pós-verbais são mais freqüentes do que as posições pré-
verbais. E que o sentido aspectual é mais utilizado nos contextos examinados.
Como vimos, no português atual, predomínio da posição pós-verbal (mais
especificamente a posição marginal à direita). Apenas podemos concluir que, quando a noção
é basicamente aspectual, como em freqüentemente, o advérbio não tem posição predominante,
mas, quando apresenta noção dêitica (temporal) ou noção híbrida, como antigamente,
rapidamente, respectivamente, a posição típica é pós-verbal.
Outra perspectiva da presente pesquisa foi a observação da relação entre a forma de
realização do sujeito da oração, um critério de natureza sintática, e a posição do advérbio.
Para verificar essa relação, fizemos um controle dos seguintes tipos de sujeito: sujeito
expresso anteposto ao verbo; sujeito expresso posposto ao verbo; sujeito ausente e sujeito
pronominal (que/quem). Nessa perspectiva, pressupomos que a presença ou ausência do
sujeito influenciaria a colocação do advérbio de acordo com a noção semântica que o mesmo
venha expressar e, ainda, de acordo com a intencionalidade do escritor em enfatizar ou não
sua informação.
Ao tomarmos as posições pré-verbais de um modo geral, em oposição às pós-verbais,
verificamos que a ausência de sujeito nas posições pré-verbais não levou o advérbio a se
antepor ao verbo, ao contrário da hipótese do que posições vazias tenderiam a ser preenchidas
pelo advérbio.
Parece não haver, portanto, nos casos dos advérbios de tempo e de aspecto em -mente,
algum tipo de compensação ou equilíbrio no posicionamento dos elementos na estrutura da
cláusula. Além disso, ao observarmos separadamente a posição 1, ou seja, a que corresponde
à margem esquerda da cláusula e que, por hipótese, seria a que mais atrairia o advérbio,
notamos que isso também não ocorreu. De fato, houve uma quantidade maior de casos nessa
posição. Entretanto, quando se observam todas as ocorrências pré-verbais, notamos que a
margem esquerda, independentemente da presença ou não do sujeito, era a posição
preferencial dos advérbios pré-verbais.
Em função desses dados, concluímos que não houve uma relação significativa entre
presença/ ausência de sujeito em posição pré-verbal (marginal ou não) e colocação dos
advérbios aqui estudados. Esse mesmo resultado foi obtido em Martelotta (2006) para os
advérbios qualitativos e Marques (2008), que estudou a ordenação sujeito/ verbo. Portanto,
nossos resultados são contrários à hipótese de adjuntos (pelo menos do tipo que estamos
estudando) são colocados na posição do sujeito vazio.
Quanto à relação entre o tipo semântico do verbo e a posição, verificamos que esse
fator não influenciou a posição do mesmo.
O tipo semântico do verbo foi levado em consideração a fim de se testar a hipótese de
que determinado tipo de noção expressa pelo advérbio ocorreria com um determinado tipo de
verbo. Entretanto, essa hipótese não foi confirmada, pelos menos, nos corpora analisados.
Também queríamos verificar a relação entre o tipo semântico do verbo e a posição do
advérbio. Vimos que, quando o verbo é de processo material, o advérbio aparece mais na
posição 1 (margem esquerda da cláusula), os de processos relacionais, tanto intensivo quanto
possessivo, também ocorreram mais na posição 1. Nas outras posições, pelo baixo número de
dados, não foi possível traçar uma tendência para esse advérbio.
No português arcaico, observamos que o tipo de verbo mais recorrente é de valor
material em detrimento dos demais valores. Quanto à relação posição e sentido do verbo, o
tipo material ocorre nas posições 1 e 5, que o as posições margens esquerda e direita
respectivamente. Os verbos comportamentais tendem a ocorrer nas posições 5 e 6 e os verbos
de atividade verbal tendem a ocorrer na posição 6.
Nos dados apresentados, do século XVI, verificamos que os tipos mais freqüentes são
verbos materiais, mentais e relacionais possessivos.. Quando o verbo tem sentido material ou
mental, a tendência é o advérbio ocorrer na margem esquerda (POS1). Quando o verbo é
relacional possessivo não posição prototípica para o advérbio. em relação aos demais
sentidos dos verbos, há uma distribuição de dados equilibrada.
Já nos dados do século XVII, observamos que não há uma predileção pelo tipo
material, como vimos nos dados do português arcaico e do século XVI, mas, em relação à
posição e o tipo semântico do verbo em geral, todos são mais recorrentes na posição1
(margem esquerda) e uma relativa distribuição nas demais posições, o que não difere dos
séculos anteriores apresentados.
Os dados analisados do século XVIII demonstram que o tipo de verbo material é o
mais freqüente, seguido do tipo comportamental. Independentemente do tipo semântico, o
advérbio tende a ocorrer na posição marginal à esquerda (POS1).
No século XIX, constatamos que o tipo de verbo material é o mais freqüente, como
maioria das sincronias estudadas. Quanto à relação entre posição e tipo de verbo, observamos
que uma distribuição mais homogênea. Quando o verbo é material, o advérbio em -mente
ocorre mais na posição 1 ou na posição 6 . Os demais tipos tiveram poucos dados.
Verificamos, também, que os advérbios tendem a ocorrer mais nas posições pós-verbais
(Posições 5, 6, e 8).
nos dados do português atual, verificamos que o tipo de verbo mais freqüente é o
verbo de processo material, seguido dos de atividade verbal. Em relação ao tipo de verbo e a
posição do advérbio, vemos que, quando o verbo é material, o advérbio tende a ocorrer nas
posições 1 e 5; quando é de atividade verbal, tende a ocorrer na posição 5.
Nos resultados apresentados, uma tendência para os advérbios em -mente
aparecerem numa posição pré-verbal (no português arcaico, século XVI, XVII e XVII)
principalmente quando o verbo é de processo material, assim com os demais tipos de verbos.
Mas em relação à análise dos dados do século XIX e português atual, verificamos que há uma
predileção às posições pós-verbais. Esse resultado indica mudança na posição do advérbio ao
longo da história do português, o que vai ao encontro de outras pesquisas, como as de
Martelotta(2006) e Albani (2007), que demonstraram que os advérbios vêm mudando para a
posição pós-verbal, de um modo geral.
Além dessas hipóteses apresentadas, seguindo a proposta de Martelotta (2004) para os
advérbios qualitativos, estávamos considerando que a mudança de ordenação dos advérbios
de tempo e de aspecto em -mente poderia estar relacionada ao processo de gramaticalização
de certas estruturas sintáticas. De acordo com Givón (1979), a cláusula principal declarativa,
afirmativa, ativa, neutra é menos pressuposicional, no sentido de que sua interpretação
depende de menos material inferível do que a interpretação das demais estruturas. Isso
confere a esse tipo de cláusula (menos gramaticalizada) uma maior liberdade e variedade de
elementos significativos. Por outro lado, a distribuição dos elementos significativos, em todos
os outros tipos de cláusula (mais gramaticalizadas), é sempre mais restrita visto que esses
outros tipos de cláusula tendem a exibir grande conservadorismo sintático, sobretudo, no que
diz respeito à ordenação vocabular. Portanto, partindo dessa proposta, esperávamos encontrar,
no português arcaico, advérbios em posição pré-verbal (posição típica dos advérbios no latim)
ocorrendo mais nas orações mais gramaticalizadas (hipotáticas e subordinadas) do que nas
menos gramaticalizadas. E, no português atual, nossa hipótese era de que ocorreriam menos
advérbios em posições pré-verbais e que essas ocorrências envolveriam frases estilisticamente
marcadas.
Na análise dos dados do português arcaico, observamos que houve um número
significativo de ocorrências de advérbios de tempo e aspecto em -mente em posição pré-
verbal, mostrando que essa posição, assim como a pós-verbal, estava disponível para este tipo
de advérbio na fase arcaica de nossa língua.
Observamos que, no português arcaico, houve um pequeno predomínio de posições
pré-verbais em cláusulas gramaticalizadas. Isso pode ser apontado como um leve resquício da
tendência de que as posições pré-verbais têm para ocorrer em cláusulas mais
gramaticalizadas.
No século XVI, apesar da baixa ocorrência de dados nesta fase, de um modo geral, a
análise qualitativa apresentou resultados favoráveis às nossas hipóteses. A posição pré-verbal,
por exemplo, estava presente nesta fase do português em escala menor que a posição pós-
verbal. Além disso, foi possível observar que as orações mais gramaticalizadas elegem a
ordenação pré-verbal, 11 ocorrências distribuídas pelas posições pré-verbais (Pos 1, 2 e 3).
Tal observação contribui para confirmar a hipótese que adotamos com Givón (1979) de que
esses tipos cláusulas (mais gramaticalizadas) tendem a ser sintaticamente mais conservadoras,
principalmente, no que diz respeito à ordenação dos constituintes da oração.
Outra ressalva interessante é que, ao analisarmos o português arcaico, a hipótese de
Givón (1979) não foi de todo confirmada, apesar de encontrarmos uma leve tendência de as
posições pré-verbais ocorrerem em cláusulas mais gramaticalizadas. Por outro lado, na análise
do século XVI essa hipótese se confirmou quando se relacionaram as posições dos advérbios
com o grau de gramaticalização da cláusula em que o advérbio ocorreu.
Pudemos observar, na análise dos dados do século XVII, uma maior incidência de
casos foi na posição pré-verbal, porém, quando se relacionamos posição e grau de
gramaticalização, a hipótese givoniana não se confirmou, o mesmo atestado no português
arcaico com o tipo de advérbio estudado.
É interessante ressaltar que, no século XVIII, a nossa hipótese também foi confirmada:
a de que as orações mais gramaticalizadas elegem a ordenação pré-verba. Nesse caso, foram 8
ocorrências contra uma única ocorrência na posição pós-verbal.
Por outro lado, houve 5 ocorrências pré-verbais em cláusulas menos gramaticalizadas
em oposição a 4 dados na posição pós-verbal, também em cláusulas menos gramaticalizadas.
Isso é importante, porque pode apontar para o fato de que, até o século XVIII, era mais forte a
inclinação que os advérbios qualitativos apresentavam de ocorrer antes do verbo, o mesmo
acontecendo para os de tempo e de aspecto, reforçando os resultados obtidos em Martelotta e
Vlček (2006), segundo os quais essa tendência começa a enfraquecer no início do século XIX
e acaba por desaparecer na virada para o século XX.
No caso do século XIX, houve uma quantidade maior de ocorrências de advérbios de
tempo e de aspecto em -mente, embora as 22 ocorrências encontradas estejam longe de
constituir a quantidade necessária para se chegar a constatações mais precisas.
Assim como aconteceu com o século XVIII, era de se esperar que o século XIX
apresentasse uma relativa predominância das posições pós-verbais. Isso de fato ocorreu:
apresentou 12 ocorrências nessa posição no, total de 22 advérbios. Esses dados refletem a
tendência, mencionada anteriormente, que vem relativamente se delineando desde o século
XVI, uma vez que na fase arcaica do português com esse tipo de advérbio a hipótese não se
confirmou, ou como nos trabalhos de Moraes Pinto, 2002; Martelotta, 2004, a confirmação
dessas tendências foi constatada.
Outro resultado interessante se apresenta quando se relacionam as posições dos
advérbios com o grau de gramaticalização da cláusula em que ele ocorre. Do total de 9 casos
de advérbios pré-verbais, 4 correram em cláusulas mais gramaticalizadas (hipotáticas e
subordinadas). Cabe ressaltar aqui que a diferença entre as ocorrências em cláusulas menos
gramaticalizadas foi bastante pequena, 6 dados pré-verbais. Constatamos que, no século XIX,
se evidenciou uma mudança desses advérbios para as posições pós-verbais, apesar de eles não
serem predominantes em cláusulas com alto grau de gramaticalização, mais conservadoras em
termos de ordenação.
No português atual, a ocorrência dos dados demonstra uma propensão, que se
manifestou quase categoricamente, desses advérbios ocorrerem após o verbo, 28 dados, sendo
que 17 estão em cláusulas menos gramaticalizadas e 10 dados em cláusulas mais
gramaticalizadas. Cabe ressaltar que novamente obtivemos resultados atípicos aos esperados
segundo a hipótese proposta em relação à posição e o grau de gramaticalização das cláusulas.
Portanto, percebemos que houve diferentes fatores que influenciaram a ordenação
desses advérbios nas sentenças e que essa análise possa trazer esclarecimentos em relação ao
comportamento desses elementos no português. Muitos dos nossos resultados não comprovam
algumas das hipóteses apresentadas nesta tese e em outros trabalhos, mas refletem o emprego
real dos advérbios em -mente na história do português escrito. Assim são resultados
importantes inclusive porque apontam para tendências diferentes do que geralmente é dito.
A pesquisa foi realizada tendo em vista muitos fatores, demonstrando que procuramos
de diferentes formas verificar as estratégias discursivas, semânticas e sintáticas para o uso
desses advérbios. Claro que a análise não se esgotou e em muitos momentos. Assim,
apontamos para a necessidade de pesquisas futuras aprofundarem em um ou outro aspecto, ou
para a necessidade de se fazer um recorte diferente da análise, tendo em vista as sincronias e
os gêneros.
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OS ADVÉRBIOS DE TEMPO E DE ASPECTO EM -MENTE E
SUA ORDENAÇÃO: UMA ABORDAGEM HISTÓRICA
Eliana Crispim França Luquetti
Rio de Janeiro
Fevereiro de 2008
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Faculdade de Letras
Comissão de Pós-Graduação e Pesquisa
OS ADVÉRBIOS DE TEMPO E DE ASPECTO EM -MENTE E
SUA ORDENAÇÃO: UMA ABORDAGEM HISTÓRICA
Eliana Crispim França Luquetti
Tese de Doutorado submetida ao
Programa de Pós-Graduação em
Lingüística da Universidade Federal do
Rio de Janeiro UFRJ, como parte dos
requisitos necessários para a obtenção do
título de Doutor em Lingüística.
Orientadora: Professora Doutora Maria
Maura da Conceição Cezario
Co-orientador: Professor Doutor Mario
Eduardo Toscano Martelotta
Rio de Janeiro
Fevereiro de 2008
LUQUETTI, Eliana Crispim França
Os advérbios de tempo e de aspecto em -mente e sua ordenação: uma abordagem histórica/
Eliana Crispim França Luquetti. 2008.
159 fls.
Tese (Doutorado em Lingüística) –
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Faculdade de Letras,
Rio de Janeiro, 2008.
Orientadora: Maria Maura Cezario
Co-Orientador: Mario Eduardo T. Martelotta
1 Advérbios. 2. Ordenação de palavras. 3. Funcionalismo
I. Cezario, Maria Maura (Orientadora) II Martelotta, Mario Eduardo T. III Universidade
Federal do Rio de Janeiro. Faculdade de Letras. IV Título
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Faculdade de Letras
Comissão de Pós-Graduação e Pesquisa
OS ADVÉRBIOS DE TEMPO E DE ASPECTO EM -mente E SUA ORDENAÇÃO:
UMA ABORDAGEM HISTÓRICA
Eliana Crispim França Luquetti
Orientadora: Professora Doutora Maria Maura da Conceição Cezario
Co-Orientador: Professor Doutor Mario Eduardo Martelotta
Tese de Doutorado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Lingüística da
Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos necessários para a
obtenção do título de Doutor em Lingüística.
Aprovada por:
Presidente, Profa. Doutora Maria Maura da Conceição Cezario
Vice-Presidente, Prof.Doutor Mário Eduardo Toscano Martelotta
Profa.Doutora Maria da Conceição Paiva-UFRJ
Profa. Doutora Deize Vieira dos Santos-UFRJ
Prof. Doutor Afrânio Gonçalves Barbosa-UFRJ
Profa. Doutora Mariângela Rios de Oliveira-UFF
Suplentes:
Profa. Doutora Christina Abreu Gomes-UFRJ
Profa. Doutora Maria do Rosário da Silva Roxo- Univ. Estácio de Sá
Tese defendida em 25/02/2008.
Dedicatória
Ao meu querido e amado Deus, pois “O
Senhor é a minha rocha, a minha
cidadela, o meu libertador; o meu Deus,
o meu rochedo em que me refugio; o meu
escudo, a força da minha salvação, o
meu baluarte”. (Sl 18:2,3)
Esperei confiantemente pelo Senhor; ele
se inclinou para mim e me ouviu quando
clamei por socorro. Tirou-me de um poço
de perdição, de um tremedal de lama;
colocou-me os pés sobre uma rocha e me
firmou os passos. E me pôs nos lábios um
novo cântico, um hino de louvor ao nosso
Deus; muitos verão essas coisas, temerão
e confiarão no Senhor. (Salmos 40:1-3)
Agradecimentos
A Deus que sempre cuidou de mim, orientando, confortando e abençoando-me.
À minha querida e amada mãe Suely por ter me ensinado o caminho do bem, da honestidade,
da persistência, da esperança. Enfim, devo-lhe tudo quem sou.
Aos meus filhos, Fernanda e Pedro Henrique pela compreensão, carinho e existência na minha
vida.
Ao meu esposo Wanderson Luquetti, pelo constante incentivo, pela infinita paciência, pelas
palavras de conforto e amizade.
Aos meus irmãos, Patricia, Douglas, Catiane e Viviane que são parte de mim. E,
principalmente as minhas irmãs Catiane e Viviane, pelo apoio e pelas palavras certas nos
momentos certos.
Aos parentes e amigos, pelo acompanhamento interessado. Em especial, Ernesto França, Célia
Viana, Thiara França, Thiago França, Pastor Leopoldo, Lenise Dutra, Ana Lúcia Costa,
Aparecida Azevedo, pelo apoio e carinho constantes.
À Professora Maria Maura Cezario pela grande confiança depositada em mim, pela amizade,
pelo apoio e incentivo constantes e fundamentais. E ainda, por ter me conduzido ao prazeroso
caminho da pesquisa e ensinando-me a importância do nosso papel enquanto professores e
pesquisadores, através do seu exemplo e dedicação.
Ao Professor Mário Eduardo Martelotta pela carinhosa acolhida no projeto Discurso e
Gramática, pela prontidão em ouvir e ajudar, pelo exemplo profissional.
Aos amigos Natália Ilse, Júlia Nunes, Érika Ilogti e Roberto Freitas Jr. Pela colaboração
preciosa nesta pesquisa.
A todos do projeto Discurso e Gramática pela sincera amizade e pelos grandes e inesquecíveis
momentos compartilhados.
SINOPSE
Análise diacrônica da ordenação dos advérbios de tempo e
aspecto em -mente na modalidade escrita do português,
sob a perspectiva funcionalista, buscando investigar
fatores funcionais e estruturais determinantes da
colocação desses advérbios na cláusula.
LUQUETTI, Eliana Crispim França. Os advérbios de tempo e de aspecto em -mente e sua
ordenação: uma abordagem histórica. Rio de Janeiro: UFRJ, Faculdade de Letras, 2008. 159
fls. Tese de Doutorado em Lingüística.
Resumo
Este trabalho tem como objetivo observar as diferentes posições que os advérbios de
tempo e de aspecto em -mente tendem a assumir em diferentes momentos históricos, bem
como analisar a polissemia desses elementos em textos escritos em português nas seguintes
fases históricas: arcaica, séculos XVI, VXII, XVIII e XIX e português contemporâneo.
Esta pesquisa, além de testar novas hipóteses, vem integrar e ampliar uma série de
estudos que visam examinar, de modo mais geral, o processo de mudança de colocação dos
advérbios no decorrer do tempo (Moraes Pinto, 2002; Martelotta, Barbosa & Leitão, 2002;
Martelotta, 2004; Martelotta & Processy, 2006; Andrade, 2005; Albani 2007; Freitas, 2004) e
outros trabalhos sobre o fenômeno em questão. A pesquisa demonstra que fortes indícios
de mudança de posição do advérbio de tempo e aspecto em -mente ao longo da história do
português.
De acordo com a hipótese geral, ao estudarmos cada sincronia devemos encontrar
motivações para as diferentes posições ocupadas pelos advérbios de tempo e aspecto em -
mente na oração. A motivação dá-se por um conjunto de fatores estruturais, semânticos,
cognitivos e/ou discursivos, a saber: a noção semântica; a estrutura sintática da oração em que
está inserido o advérbio; o tipo semântico do verbo que compõe a cláusula, segundo Halliday
(1994) e outros fatores.
LUQUETTI, Eliana Crispim França. Os advérbios de tempo e de aspecto em -mente e sua
ordenação: uma abordagem histórica. Rio de Janeiro: UFRJ, Faculdade de Letras, 2008. 159
fls. Tese de Doutorado em Lingüística.
ABSTRACT
This work aims to observe the different positions that the adverbs of time and look at
mind-tend to take on different historic moments, and examine the polissemia these elements
in texts written in Portuguese on the following historical stages: archaic, XVI, VXII, XVIII
and XIX and Portuguese contemporary.
This research, and test new hypotheses, comes integrate and extend a series of studies
to examine, more generally, the process of changing the placing of adverbs over time (Moraes
Pinto, 2002; Martelotta, Barbosa & Leitao, 2002; Martelotta, 2004; Martelotta & Processy,
2006; Andrade, 2005; Albani 2007; Freitas, 2004) and other works on the phenomenon in
question. The research shows that there are strong indications of a change of position of the
adverb of time and point-in mind throughout history of the Portuguese.
According to the general assumption, by studying each sync must find reasons for the
different positions occupied by adverbs of time and point-in mind in prayer. Motivation
comes about by a number of factors structural, semantic, cognitive and / or discourse, namely
the notion semantics, the syntactic structure of the prayer that is inserted into the adverb; the
kind of semantic word that composes the clause, according Halliday (1994) and others.
LUQUETTI, Eliana Crispim França. Os advérbios de tempo e de aspecto em -mente e sua
ordenação: uma abordagem histórica. Rio de Janeiro: UFRJ, Faculdade de Letras, 2008. 159
fls. Tese de Doutorado em Lingüística.
Résumé
Ce travail vise à observer les différentes positions que les adverbes en –ment de temps
et d'aspect prennent pendant les moments historiques, et d'examiner la polysémie de ces
éléments dans les textes écrits en portugais sur les étapes historiques suivantes: archaïque,
XVI, VXII, XVIII Et XIX et portugais contemporain.
Au délà de tester de nouvelles hypothèses, cette recherche vient d'intégrer et d'étendre
une série d'études pour examiner, de façon plus générale, le processus de modification du
placement des adverbes en –ment dans le temps (2002 2002 2004; Martelotta & Processy,
2006; Andrade, 2005; Albani 2007; Freitas, 2004) et d'autres ouvrages sur le phénomène en
question. La recherche montre qu'il y a fortes indications de changement de position de
l'adverbe en –ment de temps et d’aspect au long de l'histoire portugaise.
Selon l'hypothèse générale, en étudiant chaque synchronisation on doit trouver les
raisons pour lesquelles les différentes positions occupées par les adverbes en –ment de temps
et d’aspect dans la proposition. La motivation est donnée par un certain nombre de facteurs
structurels, sémantiques, cognitives et / ou discursifs, à savoir: la notion sémantique, la
structure syntaxique de la proposition que l’adverbe est inséré, le genre de mot sémantique qui
compose la clause, selon Halliday (1994 ) et les autres.
LISTA DE TABELAS
Tabela 1- Distribuição dos advérbios em -mente quanto à ordem em relação ao verbo.
Tabela 2- Levantamento Geral dos dados dos corpora dos Advérbios de Tempo e de Aspecto
em –mente.
Tabela 3 - Distribuição das posições dos advérbios de tempo e aspecto em –mente X
sincronias.
Tabela 4 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Português Arcaico.
Tabela 5 - A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Século XVI.
Tabela 6 - A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Século XVII.
Tabela 7 - A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Século XVIII.
Tabela 8 - A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Século XIX.
Tabela 9 - A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Português Atual.
Tabela 10 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Português Arcaico.
Tabela 11 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Século XVI.
Tabela 12 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Século XVII.
Tabela 13 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Século XVIII.
Tabela 14 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Século XIX.
Tabela 15 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Português Atual.
Tabela 16 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Português Arcaico.
Tabela 17 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Século XVI.
Tabela 18 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Século XVII.
Tabela 19 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Século XVIII.
Tabela 20 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Século XIX.
Tabela 21 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Português Atual
Tabela 22 - Ocorrência de advérbios no Português Arcaico.
Tabela 23 - Ocorrência de advérbios no Século XVI.
Tabela 24 - Ocorrência de advérbios no Século XVII.
Tabela 25 - Ocorrência de advérbios no Século XVIII.
Tabela 26 - Ocorrência de advérbios no Século XIX.
Tabela 27 - Ocorrência de advérbios no Português Atual
LISTA DE QUADROS
Quadro1 – Distinção entre Advérbio e Pseudo-advérbio
Quadro 2 - Subposições dos Advérbios em -mente
LISTA DE ABREVIATURAS
EC – A essência do cristianismo
OE – Orto do esposo
SUMÁRIO
LISTA DE TABELAS
LISTA DE QUADROS
LISTA DE ABREVIATURAS
1 INTRODUÇÃO.......................................................................................................... 15
1.1 HIPÓTESES............................................................................................................... 18
1.2
O
BJETIVOS
............................................................................................................................................
20
2 REVISÃO DE LITERATURA.................................................................................. 22
2.1
A
QUESTÃO DA CATEGORIZAÇÃO
.........................................................................................................
22
2.2
A
DVÉRBIO
:
ELEMENTO DO LÉXICO OU DA GRAMÁTICA
?....................................................................
26
2.3
A
DVÉRBIOS
:
ESPÉCIES
,
FORMAS E SIGNIFICAÇÃO
...............................................................................
27
2.4
V
ISÃO
T
RADICIONAL DOS
A
DVÉRBIOS
................................................................................................
31
2.5
P
ESQUISAS SOBRE ADVÉRBIOS
,
SOB ORIENTAÇÃO DA
LINGÜÍSTICA
..................
.....................34
2.5.1
T
IPOS DE ADVÉRBIOS
.........................................................................................................................
34
2.5.2
E
STUDOS SOBRE O ADVÉRBIO EM
-
MENTE E SOBRE ORDENAÇÃO DE ADVÉRBIOS
............................
38
2.6
O
S ADVÉRBIOS E A EXPRESSÃO DE TEMPO
...........................................................................................
54
2.
7
O
S ADVÉRBIOS RELACIONADOS À CATEGORIA DE ASPECTO
.....................................................56
2.
8
A
FORMAÇÃO DE ADVÉRBIOS EM
-
MENTE
............................................................................................
60
3 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS................................................................................. 67
3.1
O
S PRINCÍPIOS FUNCIONALISTAS
..........................................................................................................
67
3.2
G
RAMATICALIZAÇÃO E
N
ÍVEIS DE
E
NCAIXAMENTO ENTRE
C
LÁUSULAS
...........................................
70
3.3
G
RAMATICALIZAÇÃO E ESTRUTURA SINTÁTICA
..................................................................................
72
3.4
A
S PRESSUPOSIÇÕES DISCURSIVAS DAS CONSTRUÇÕES SINTÁTICA
.............................................73
3.5
C
LASSIFICAÇÕES DOS VERBOS
,
BASEADA EM
H
ALLIDAY
(1994).........................................................
75
4 METODOLOGIA ....................................................................................................... 80
4.1
C
ORPUS
..................................................................................................................................................
81
4.2
D
ESCRIÇÕES DOS FATORES DA ANÁLISE DOS ADVÉRBIOS DE TEMPO E ASPECTO EM
MENTE
...........
84
5 ANÁLISES DOS DADOS........................................................................................... 89
5.1
A
NÁLISES DE FATORES
..........................................................................................................................
89
5.1.1
O
RDEM DO ADVÉRBIO DE TEMPO E ASPECTO EM
-
MENTE
................................................................
90
5.1.2
P
OSIÇÃO DO ADVÉRBIO
......................................................................................................................
93
5.1.3
N
OÇÃO SEMÂNTICA DO ADVÉRBIO
...................................................................................................
96
5.1.
4
T
IPO SEMÂNTICO DO VERBO
............................................................................................................
105
5.1.5
T
IPO DE SUJEITO
..............................................................................................................................
114
5.1.6
T
IPO DE ORAÇÃO
.............................................................................................................................
122
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................... 133
1 INTRODUÇÃO
Este trabalho tem como objetivo observar as diferentes posições que os advérbios de
tempo e aspecto em -mente tendem a assumir em diferentes momentos históricos, para
verificarmos se houve mudança na ordenação da frase da língua portuguesa com relação a
esses tipos de advérbios. Para isso, coletamos dados de textos do português das seguintes
fases históricas: arcaica, séculos XVI, VXII, XVIII e XIX e português atual.
Este estudo, além de testar novas hipóteses, vem integrar e ampliar uma série de
pesquisas que visam examinar, de modo mais geral, o processo de mudança de colocação dos
advérbios no decorrer do tempo (Moraes Pinto, 2002; Martelotta, Barbosa & Leitão, 2002;
Martelotta, 2004; Martelotta & Processy, 2006; Andrade, 2005; Albani 2007; Freitas, 2004).
A motivação para o presente estudo veio do trabalho realizado na dissertação de
mestrado de França (2002), na qual foi feita uma análise dos adjuntos adverbiais de tempo e
aspecto em narrativas orais e escritas contemporâneas, sob uma perspectiva funcionalista.
Nesse trabalho, procuramos delimitar os valores que esses adjuntos apresentavam no texto
narrativo, assim como as tendências de colocação que eles assumiam nas cláusulas que
compunham o texto.
Esses adjuntos adverbiais de tempo e aspecto, de um modo geral, apresentavam uma
grande mobilidade na cláusula, podendo ter suas tendências de ordenação explicadas por
fatores de caráter sintático e discursivo.
Nessa dissertação (França,2002), utilizamos o corpus Discurso & Gramática (Votre e
Oliveira: 1995), constituído de um conjunto de entrevistas faladas e escritas, concedidas por
informantes de C.A. infantil e adulto, 4
a
e 8
a
séries e 2
o
e 3
o
graus, apresentando os seguintes
tipos de discurso: narrativa de experiência pessoal, narrativa recontada, relato de
procedimento, relato de opinião e descrição de local. Essa análise, entretanto, se restringiu às
narrativas, já que partia do princípio de que os dois planos discursivos, figura e fundo,
apresentavam tendências de ordenação diferentes no que diz respeito aos elementos adverbiais
estudados.
Os resultados obtidos nessa análise mostraram que os adjuntos adverbiais
apresentavam a sua colocação de acordo com a sua função dentro do tipo de discurso (figura
ou fundo) de que faziam parte.
No presente trabalho, um aprofundamento da análise dos advérbios em -mente
(somente os advérbios em -mente, diferentemente da dissertação de mestrado) em vários
aspectos, uma vez que ampliamos os pressupostos teóricos e o número de fatores a serem
testados. Além disso, a distribuição das ordenações possíveis está muito diferente do que foi
feito em França, 2002. O foco agora é o texto escrito e a diacronia. Para isso, analisamos
textos de diferentes gêneros textuais ao longo dos séculos, da fase arcaica do português ao
período atual da Língua.
Eis alguns exemplos de dados analisados nesta tese a partir dos quais é possível
verificar a grande variedade de ordenação:
(1) E porque me consta o mensionado Bacharel Manuyel Pacheco de Paiva, que
atualmente o ocupa, se achar em diligencia fora dessa cidade( culo XVIII ,cartas oficiais,
PHPB).
(2) Quer dizer cana e pena, porque as penas antigamente faziam-se de certas canas
delgadas(Século XVII ,Sermão do Pe. A.Vieira).
(3) Atualmente as coisas estão como costumavam ser mil anos atrás(Português
atual,EC p.9).
(4) ...deixamos boas coisas para trás muito freqüentemente em nome da
independência (Português atual,EC, p.31).
Nota-se que, no exemplo (1), o advérbio atualmente ocorre antes do verbo (ocupa);
no exemplo (2), o advérbio antigamente, ocorre entre o sujeito (as penas) e o verbo (faziam-
se); no exemplo (3), o advérbio atualmente ocorre no início da cláusula (margem esquerda),
antes do sujeito (as coisas) e antes do verbo (estão); e, no exemplo (4), o advérbio
freqüentemente, ocorre depois do verbo (deixamos). Portanto, verificamos que os advérbios
em -mente podem ocorrer antes ou depois do verbo; entre o sujeito e o verbo; no início da
cláusula; no final da cláusula, enfim, diversas possibilidades de posição desse advérbio na
cláusula.
Ao pesquisarmos definições e classificações sobre os advérbios, em gramaticais
tradicionais e nas de orientação lingüística, percebemos que essa é uma classe bastante
complexa e colocada de forma pouco elucidativa, isto é, em geral, é definida e exemplificada
de modo simplista e pouco esclarecedora. Nesta pesquisa, estamos considerando como dados
advérbios que os estudiosos consideram ora como advérbios de tempo (como ultimamente,
primeiramente, antigamente), ora como advérbios de aspecto (freqüentemente, novamente,
constantemente) e ainda como advérbios de modo, como por exemplo, o advérbio
rapidamente, que é classificado tradicionalmente como advérbio de modo. Como também
nesse advérbio traços semânticos ligados ao tempo, também o incluímos na análise (cf. os
resultados do fator “tipo semântico do advérbio).
Entendemos que é necessária uma análise mais profunda sobre os advérbios de tempo
e de aspecto em -mente, abarcando seus usos ou funções; suas posições na cláusula e outras
características. Neste estudo, investigaremos questões como:
a) Por que o advérbio ora aparece no final, ora no início da cláusula, ora em outras
posições?
b) fatores que contribuem para a ordenação desses advérbios num dado lugar da
cláusula?
c) Existe uma posição fixa para determinados usos dos advérbios? Se existe, por que
isso acontece? Seria o tipo semântico do verbo que, com a freqüência de uso,
fixaria o advérbio numa dada posição?
d) relação entre a semântica do advérbio e a posição em que ele aparece mais
freqüentemente na cláusula? Há posições prototípicas para os advérbios em -
mente? Se há, houve alguma diferença de uso ao longo da história do português?
Acreditamos que esta pesquisa contribuirá para o estudo sobre a ordenação dos
advérbios de tempo e de aspecto e suas funções na cláusula na língua portuguesa. Contribuirá
também para melhor compreendermos a organização textual.
1.1 Hipóteses
As hipóteses desse estudo são:
(a) Pressupomos que ocorreram mudanças na posição dos advérbios da sincronia do
português arcaico para o contemporâneo. De acordo com trabalhos anteriores, como os
de Martelotta e Leitão (1999) e de Martelotta, Barbosa e Leitão (2001), a posição pré-
verbal (entre o sujeito e o verbo) era disponível para toda e qualquer espécie de advérbio
e, hoje, ela está disponível para alguns - portanto, houve uma mudança no padrão de
ordenação de alguns advérbios. Com relação aos advérbios de tempo e de aspecto em -
mente, acreditamos que deve haver uma posição prototípica para esse advérbio em
relação ao verbo, ao sujeito e ao complemento verbal nas diferentes sincronias, sendo
que, ao longo da história do português, pode ter havido uma contínua fixação da posição
do advérbio em relação ao verbo, uma vez que estudos diacrônicos demonstram que a
ordenação dos termos foi se tornando cada vez mais fixa.
(b) Seguindo a proposta de Martelotta (2004) para os advérbios qualitativos, estamos
considerando que a mudança de ordenação dos advérbios de tempo e de aspecto em -
mente parece está relacionada ao processo de gramaticalização de certas estruturas
sintáticas. De acordo com Givón (1979), a cláusula principal declarativa, afirmativa,
ativa, neutra é menos pressuposicional, no sentido de que sua interpretação depende de
menos material inferível do que a interpretação das demais estruturas. Isso confere a esse
tipo de cláusula (menos gramaticalizada) uma maior liberdade e variedade de elementos
significativos. Por outro lado, a distribuição dos elementos significativos, em todos os
outros tipos de cláusula (mais gramaticalizadas), é sempre mais restrita visto que esses
outros tipos de cláusula tendem a exibir grande conservadorismo sintático, sobretudo, no
que diz respeito à ordenação vocabular. Portanto, partindo dessa proposta, esperamos
encontrar, no português arcaico, advérbios em posição pré-verbal (posição típica dos
advérbios no latim) ocorrendo mais nas orações mais gramaticalizadas (hipotáticas e
subordinadas) do que nas menos gramaticalizadas, e, no português atual, nossa hipótese
é de que ocorram menos advérbios em posições pré-verbais e que essas ocorrências
envolvam frases estilisticamente marcadas.
(c) deve haver fatores de diferentes ordens que motivam o uso do advérbio em diferentes
posições na frase. Fatores como o papel semântico exercido pelo advérbio em -mente, o
tipo semântico do verbo, a presença ou ausência do sujeito na frase, dentre outros,
devem influenciar a ordem que este ocupa na sentença.
1.2 Objetivos
Pretendemos estudar as posições assumidas pelos advérbios em -mente na cláusula em
textos de diferentes gêneros textuais das seguintes fases do português: português arcaico, dos
séculos XVI, XVII, XVIII, XIX e português atual, observando, principalmente, o papel da
freqüência de ocorrência em dadas posições e a possível gramaticalização desses advérbios
com determinados tipos de verbo. Inicialmente, a opção por textos religiosos foi pela
disponibilidade de textos em documentos escritos em português arcaico, mas, quando
partimos para o levantamento de dados, verificamos que havia uma escassez de dados do
fenômeno em questão, sendo assim, decidimos investigar em outros gêneros textuais.
Mas, ainda assim, procuramos manter uma certa uniformização das tipologias, pois as
diferenças entre os usos dos advérbios encontrados poderiam ser atribuídas a diferenças
textuais e não à mudança lingüística.
Os principais objetivos desse estudo são:
1- analisar detalhadamente o uso dos advérbios de tempo e de aspecto em -mente no
português escrito;
2- acompanhar o uso da ordenação dos advérbios nos tipos de orações ao longo do
tempo, analisando os dados tanto do português arcaico quanto do português atual, para
verificar se as construções mais gramaticalizadas (cláusulas hipotáticas e
subordinadas) são mais conservadoras, isto é, favorecem a ocorrência de advérbios em
posições pré-verbais (posições mais antigas), e se as menos gramaticalizadas
(cláusulas principais e coordenadas) são mais inovadoras, propiciando a ocorrência de
dados com advérbios em –mente em ordenações pós-verbais;
3- verificar se indícios de mudança na sintaxe desse advérbio nas fases estudadas do
português: arcaica, dos séculos XVI, XVII, XVIII, XIX e português atual;
4- caracterizar as posições assumidas pelos advérbios de tempo e aspecto, apresentando
a freqüência de ocorrência de cada ordem assumida;
5- identificar os fatores que influenciam a ordenação desses advérbios em contextos em
que eles podem ocupar posições diferentes nas cláusulas, testando hipóteses
relacionadas à motivação de ordenação.
Para apreciação das questões aqui levantadas, apresentamos, no capítulo 2, uma revisão na
literatura sobre os advérbios, sua ordenação, formação e origem, no capítulo 3, os
pressupostos teóricos que fundamentam esse estudo; no capítulo 4, a metodologia utilizada
para codificação dos dados; no capítulo 5, a análise dos dados, interpretação dos resultados da
análise quantitativa, assim como dos fatores e hipóteses examinados; e, por fim, nos capítulos
6 e 7, seguem algumas considerações finais sobre os advérbios e a bibliografia,
respectivamente.
2 REVISÃO DE LITERATURA
Este capítulo consiste numa breve explanação sobre a questão da categorização e
estrutura da língua, como também, a descrição de algumas abordagens sobre a definição,
classificação e/ou ordenação de advérbios na cláusula. Aqui são apresentados trabalhos de
perspectiva tradicional, bem como os realizados em linhas de pesquisa lingüística que
estudam a Língua em uso.
2.1 A questão da categorização
Antes de apresentarmos as considerações sobre a classe que reúne os advérbios,
apresentaremos uma breve explanação sobre a questão da categorização, uma vez que estamos
reunindo numa mesma classe geral advérbios que os estudiosos ora consideram de tempo
(ultimamente, por exemplo), ora de aspecto (freqüentemente), ora de modo (rapidamente).
Além disso, a própria natureza da classe advérbio é de difícil análise, uma vez que reúne itens
muito diferentes tanto com relação à ordenação, como em relação à semântica.
Tradicionalmente, as classes das palavras têm sido definidas segundo suas
propriedades semânticas, sintáticas e morfológicas. As gramáticas tradicionais privilegiam o
aspecto semântico na conceituação do substantivo, do adjetivo e do verbo, e recorrem ao
aspecto funcional na conceituação da conjunção, da preposição e até mesmo do artigo, dos
pronomes e dos advérbios, que é o foco do nosso trabalho, e, estes últimos são conceituados
ainda pelo seu aspecto semântico, mas a análise apresentada não dá conta da sua imprecisão.
Os autores de um modo geral também chegam à conclusão da imprecisão dessa
categoria. Seja de um ponto de vista mais formal, como o de Camara Jr. (1976) ou o de
Bechara (1999), seja de uma perspectiva mais funcional, como a de Ilari et al. (1990) ou a de
Neves (2000), a categoria dos advérbios é considerada bastante controvertida.
Constituída por tipos de natureza muito diversa, em termos semânticos, sintáticos e
mesmo morfológicos, esse conjunto parece não resistir a uma definição mais geral, capaz de
dar conta da totalidade de seus usos. Nesse sentido, a abordagem categorial prototípica,
segundo Taylor (1995), em conformidade com a concepção funcionalista que nos orienta,
apresenta-se como o tratamento mais adequado para os tipos desse conjunto tão híbrido. De
acordo com tal concepção, podemos admitir que, numa dada classe, encontram-se membros
situados em pontos distintos em relação ao eixo categorial básico, de acordo com o número de
traços compartilhados pelos mesmos.
Assim, encontramos constituintes que de modo mais visível representam essa
categoria; em geral, são termos mais freqüentes e identificados pela comunidade lingüística
como pertencentes à categoria. Por outro lado, podemos registrar também termos que, por
conta da perda de traços categoriais, tendem a ocupar posição periférica ou marginal em
relação ao padrão, situando-se praticamente no limite ou na interseção com outra classe. Dos
advérbios aqui em análise, os de tempo e de aspecto em -mente, conforme a perspectiva
exposta anteriormente, estariam situados em um ponto de maior afastamento em relação ao
eixo da categoria dos advérbios. Segundo Ilari et al. (1990) e Neves (2000), esses tipos de
advérbios caracterizam-se por sua função não-predicativa ou não-modificadora, uma vez que
informações acerca de tempo não incidem sobre ou afetam a predicação, mas os de aspecto
sim. Assim definidos, estariam tais constituintes predispostos a ocorrer em pontos de maior
afastamento em relação ao verbo, conforme prevê o subprincípio de proximidade (Givón,
2001; Furtado da Cunha, Rios de Oliveira e Martellota, 2003), segundo o qual conteúdos
menos integrados são articulados por formas também menos integradas na superfície textual.
Além do aspecto relativo ao status dessa categoria, interessa-nos também mencionar a
questão da polissemia envolvida nos usos desses advérbios. De acordo com a hipótese
localista, podemos dizer que a referência espacial seria a mais primária ou original; a partir
desse sentido mais concreto, teríamos a derivação para tempo, de natureza mais abstrata, e, a
partir daí, os sentidos lógicos ou textuais, como a referência de modo, numa etapa de maior
abstratização. Segundo Pontes (1992, p. 8-9), através do uso dos mesmos elementos
gramaticais, projetamos as categorias de espaço para falar de tempo metaforicamente”;
conforme a autora, trata-se de derivação de sentido desde tempos imemoriais. O interessante
nessa abordagem é que os sentidos originais não são necessariamente descartados diante dos
mais recentes, o que vem a gerar polissemia dos usos adverbiais, principalmente na
articulação dos sentidos aspectuais, modais e temporais, muitas vezes sobrepostos.
Mattoso Câmara formulou na Estrutura da Língua Portuguesa uma classificação
baseada em dois critérios, um misto e outro simples, que é didaticamente satisfatória. Para ele,
os vocábulos formais do português se agrupam, primeiro, segundo a um critério morfo-
semântico, em quatro classes: nome, verbo, pronome e conectivo. As três primeiras classes
são constituídas basicamente de palavras variáveis, a última de palavras invariáveis.
O verbo distingue-se no grupo, nessa primeira divisão, pelo paradigma flexional em
que se enquadra (apresenta variação modo-temporal e número-pessoal). O nome e o pronome,
por sua vez, são vocábulos dotados de número e gênero, exprimíveis em uma e noutra classe
pelo mesmo mecanismo flexional. A distinção entre eles repousa, de um lado, na natureza da
significação, e de outro, em certas propriedades morfossintáticas exclusivas do pronome
(variação em pessoa e em caso)
Semanticamente, o nome ‘nomeia’ e os seres, permitindo que o locutor e o ouvinte os
designem sem o reforço da situação ou do contexto verbal. O pronome por outro lado, efetua
uma referência contextual ou situacional: quem diz aquela roupa estava na minha gaveta’,
está particularizando roupa e gaveta em função de uma situação. Sabe-se apenas, por meio
de aquelae de minha’, que a roupa em questão está distante dos interlocutores e que a
gaveta pertence ao locutor. Essa constatação, todavia, não esclarece tudo, uma vez que as
palavras ‘distante e próximo também significam noções relativas e nem por isso são
pronomes. Basicamente, importa ter em vista a referência à situação em que se encontram os
interlocutores: os pronomes a incluem na significação dos enunciados. Sendo assim, pode-se
dizer ‘Pernambuco fica distante de Santa Catarina em qualquer parte do Brasil, que o
significado da frase será o mesmo; mas quem diz Pernambuco fica distante daqui’ designa
com o ‘aqui’ o lugar em que, na qualidade de Emissor, se encontra. Logo, aquele’, ‘minha’ e
‘aqui’ tem uma significação situacional e são por isso, pronomes. Do ponto de vista mórfico,
boa parte dos pronomes apresenta formas distintas conforme a pessoa do discurso a que se
referem. Entre estes pronomes, os denominados ‘pessoais’ têm formas distintas para cumprir
as funções de sujeito e complemento. Acrescenta-se, quanto ao aspecto mórfico que vários
pronomes apresentam, ao lado das formas masculinas e femininas, uma terceira forma
‘neutra’ (aquilo, em face de aquele/aquela).
O segundo critério de Mattoso, de modo simples, redistribui os nomes, os pronomes e
os conectivos segundo características sintáticas. O nome e o pronome podem ser substantivos,
adjetivos ou advérbios; os conectivos podem ser conjunções ou preposições. Estes papéis
podem ser identificados no contexto da oração ou do sintagma: em ‘meus amigos ingleses’,
amigos é o núcleo da construção, classificado por isso como substantivo, ao passo que
ingleses, constituinte modificador, é um adjetivo; por outro lado, em as crianças amigas’,
crianças é o núcleo e amigas funciona como adjetivo. Na mesma linha de raciocínio, diremos
que elas são meus amigas’, elas, sujeito da oração, é um pronome substantivo, enquanto
minhas, adjunto de amigas, é um pronome adjetivo. Além disso, o nome e o pronome podem
funcionar como advérbios se o termo que acompanham é um verbo e podem dar lugar a
expressões preposicionadas. É o que se passa com alto a aqui em ‘Os garotos conversam alto
(cf. Os garotos conversam com entusiasmo’) e em Os garotos conversavam aqui’ (cf. Os
garotos conversavam nesta sala’).
Quanto aos conectivos, há, segundo Mattoso, os que ligam palavras (preposições) e os
que ligam orações (conjunções). Assim, em ‘casa de pedra’, ‘de’ é uma preposição, cabendo,
porém, a ‘enquanto’ o papel de conjunção em ‘Vilma iria enquanto você chorava’.
Das considerações feitas nas linhas anteriores, depreende-se a necessidade de se
repensar as características sintático-semântico-discursivas dos advérbios para um estudo mais
atento dessa categoria.
2.2 Advérbio: elemento do léxico ou da gramática?
Tradicionalmente, é feita uma separação entre elementos do léxico ou lexemas e
elementos da gramática, ou morfemas propriamente ditos.
Os elementos do léxico configuram imediatamente a realidade extralingüística e os
morfemas gramaticais remetem a uma significação intralingüística (significação externa e
objetiva). Os verbos plenos, substantivos e adjetivos são considerados elementos do léxico e
outras classes como conjunções, preposições, etc. são de modo geral considerados elementos
da gramática, assim como as flexões, prefixos e sufixos. Mas classes que apresentam
características de ambos os níveis. Uma dessas classes é o advérbio, que ora se comporta
como um item do léxico (haja vista a possibilidade de criação de novos advérbios em -mente),
ora se comporta como elemento da gramática.
No que se refere aos vocábulos derivados em -mente, torna-se inadequado, considerá-
los morfemas lexicais ou lexemas fora de um contexto específico, visto que alguns deles,
isoladamente não remetem à realidade extralingüística (valores temporais, sociológicos,
psicológicos etc.), motivo pelo qual se prefere denominá-los vocábulos e não palavras.
Vale ressaltar que Cunha e Cintra (1985) consideram morfemas lexicais os
substantivos, os adjetivos, os verbos e os advérbios de modo e, morfemas gramaticais os
artigos, os pronomes, os numerais, as preposições, as conjunções, os demais advérbios, bem
como as formas indicadoras de número, gênero, tempo, modo ou aspecto verbal.
Além disso, Brinton e Traugott (2005), que utilizam uma perspectiva funcionalista
semelhante à que caracteriza este trabalho, consideram os advérbios, por suas características,
como elementos da gramática.
Verifica-se que, além de apresentarem todos os “advérbios de modo” como morfemas
lexicais, os gramáticos mencionados denominam morfemas gramaticais não os afixos e
desinências (formas presas), como também as formas dependentes, na perspectiva de Câmara
Júnior, estabelecendo entre tais elementos uma relação de igualdade.
Com base nestes pressupostos, pergunta-se:
1) como considerar todos os vocábulos derivados em -mente, inclusive os desgastados pelo
uso automatizado, morfemas lexicais?
e, em conseqüência:
2) como denominar todos os “advérbios” não-marcados pela presença do sufixo -mente,
indistintamente, morfemas gramaticais?
2.3 Advérbios: espécies, formas e significação
Os advérbios são tradicionalmente caracterizados, priorizando os critérios semânticos
e formais. Sob o critério semântico, o advérbio expressa circunstâncias e, por outro lado, sob
o critério formal, eles podem modificar um verbo, um adjetivo, outro advérbio, ou todo o
enunciado.
Começando pelo critério semântico, tem-se a idéia de circunstância. Entendemos
como circunstância determinados indícios ou particularidades que caracterizam o conteúdo
expresso pelo termo ao qual o advérbio se refere. Sendo assim, pode-se entender como
expressando circunstâncias dados informacionais bastante diferentes entre si, como tempo,
lugar, modo, causa e, até mesmo, intensidade. Mas é difícil admitir que determinados tipos de
advérbios expressem circunstâncias, como é o caso, por exemplo, dos advérbios de dúvida, de
afirmação e de negação, respectivamente exemplificados abaixo:
(1) Talvez amanhã chova.
(2) Sim, choveu muito.
(3) Não choveu muito.
Nestes casos, os advérbios destacados não expressam circunstâncias, pelo menos de
acordo com a definição proposta acima, e sim uma atitude ou posicionamento do falante em
relação àquilo que está falando. O mesmo ocorre com os advérbios abaixo:
(4) Com certeza, vai chover amanhã.
(5) Felizmente, não choveu.
(6) Sinceramente, eu não gosto de chuva.
Nestes casos, ocorre nitidamente uma atitude ou posicionamento do falante em relação
ao que fala. Ducrot (1972) propõe que estes advérbios referem-se ao próprio ato ilocucionário
de afirmar, uma vez que qualificam o ato de dizer e não a coisa direta. Para ele, alguns
advérbios têm sua utilização explicada apenas por uma teoria dos atos da fala ou teoria da
enunciação, cuja unidade é o discurso.
Ducrot (1972) também apresenta alguns advérbios que indicam pressuposição: mal,
quase, exceto, também, somente, muito, pouco, entre outros. Embora alguns destes elementos
não sejam considerados tradicionalmente como advérbios, Ducrot (1972) os apresenta como
tal, afirmando que sua introdução no enunciado permite que determinado fato seja
pressuposto:
(7) Ele quase parou de fumar.
Nesta frase, o uso do elemento quase leva à pressuposição de que "ele" tentou parar de
fumar.
Como se pode ver, a visão de que os advérbios exprimem circunstâncias é muito
limitada. determinados tipos de advérbios cujo uso é basicamente determinado por fatores
pragmático-discursivos. E mesmo aqueles que funcionam normalmente como
circunstanciadores (de tempo, de lugar, de modo, de causa, de intensidade) muitas vezes são
usados para direcionar a interpretação do ouvinte, promover a organização das informações
no discurso além de outras funções pragmático-discursivas.
É o caso, por exemplo, do advérbio de tempo já, que pode assumir um papel de
elemento de contra-expectativa, no sentido que Heine et al. (1992) dão ao termo:
(8) A reunião terminou?
Nesta frase, mais que uma noção temporal, o elemento demonstra noção de contra-
expectativa do falante de que a reunião não tivesse terminado. Ou seja, a frase expressa o
contrário da expectativa e o advérbio já é a marca disto: é um elemento de contra-expectativa.
Mas também é de grande relevância pensar no aspecto formal da definição de
advérbio. É correto caracterizar os advérbios como elementos que se referem a um verbo, a
um adjetivo, a outro advérbio ou à oração inteira? autores que tentaram questionar isto,
como, por exemplo, Silva Jr. e Andrade (1907: 155), que afirmaram que os advérbios podem
modificar substantivos:
(9) Gonçalves Dias era verdadeiramente poeta.
Bomfim (1988: 9) questiona esta hipótese, afirmando que o termo poeta, no caso, não
pode ser entendido substantivamente, mas como um conjunto de qualidades atribuídas ao
elemento que recebe a referência. Assim, segundo autora, o elemento verdadeiramente
funciona, na realidade, como intensificador de poeta.
Por outro lado, pode-se pensar em outros exemplos, como os agrupados abaixo:
(10) A reunião na casa de Paulo foi proveitosa.
(11) O exemplo acima demonstra a hipótese.
(12) O país precisa de pessoas assim.
Nestas frases, os termos sublinhados referem-se claramente aos substantivos que os
antecedem e expressam circunstância (lugar nos exemplos 10 e 11 e modo no exemplo 12).
São casos diferentes do exemplo 9, onde o substantivo a que o advérbio se refere desempenha
função de predicativo. Deve-se considerar estes casos advérbio ou não? Mais uma vez se
evidencia a necessidade de se repensar o conceito tradicional de advérbio.
Mas este trabalho se deterá, mais especificamente, na ordenação dos advérbios de
tempo e de aspecto terminados em -mente. Mas é interessante estarmos sempre repensando
seu papel na estrutura da Língua.
Conforme propôs Givón (2001), a classe dos advérbios é a menos homogênea, tanto
do ponto de vista semântico quanto do morfossintático. Essa heterogeneidade é agravada pelo
fato de os advérbios funcionarem num plano de utilização da língua que tramita entre o campo
do léxico e a área da gramática, normalmente composta de elementos que assumem funções
voltadas para a organização interna do texto ou para a orientação argumentativa que se quer
dar a ele. De fato, o rótulo advérbio designa um conjunto muito diferenciado de elementos, e
parece constituir uma categoria fluida, que tende a se adaptar às intenções comunicativas
envolvidas no discurso.
Tradicionalmente, os advérbios são caracterizados como elementos de base nominal
(apenas < a + penas, depressa < de + pressa) ou pronominal (aqui, hoje) que de um ponto de
vista formal, são invariáveis, de um ponto de vista funcional (Câmara Jr: 1983) são termos
determinantes de um verbo ou de um nome (adjetivo e outro advérbio) e, de um ponto de vista
semântico, expressam circunstâncias, como foi explicitado anteriormente, ou seja, o
problema da generalização das definições.
2.4 Visão Tradicional dos Advérbios
Com base no que observamos em Said Ali (1969), Melo (1970), Rocha Lima (1985),
Cunha & Cintra (1985) e Bechara (2000), podemos dizer que os advérbios são
tradicionalmente caracterizados, de um ponto de vista semântico, por expressarem
circunstâncias e, de um ponto de vista formal, por modificarem um verbo, um adjetivo, outro
advérbio, ou toda a declaração, como se pode observar na definição de advérbio proposta por
Rocha Lima:
[...] palavras modificadoras do verbo. Servem para expressar
as várias circunstâncias que cercam a significação verbal (...).
Alguns há, até, que não acompanham a verbos, mas somente a
adjetivos e advérbios. (ROCHA LIMA, 1985: 174).
No que se refere especificamente aos advérbios de tempo, as gramáticas tradicionais
também não dizem muito. Apresentam a noção de tempo como uma das noções
circunstanciais expressas pelos advérbios e elencam uma série de elementos, como: agora,
ainda, amanhã, anteontem, antes, breve, cedo, depois, então, hoje, jamais, logo, nunca,
ontem, sempre, tarde, entre outros. Também não se vê, nas gramáticas tradicionais, uma
relação entre determinadas noções aspectuais e a classe dos advérbios. Aliás, a noção de
aspecto é normalmente deixada de lado nas gramáticas e as diferenças entre as noções
temporais dêiticas e não-dêiticas não são abordadas.
A respeito da ordenação dos advérbios, tema que nos interessa mais, os gramáticos
tradicionais, de um modo geral, nada menciona. Apenas Cunha e Cintra (1985) e Bechara
(2000) falam algo sobre o assunto.
Cunha e Cintra (1985) se referem à colocação adverbial em sua gramática, afirmando
que "os advérbios que modificam um adjetivo, um particípio isolado ou outro advérbio
colocam-se de regra antes destes". Em seguida, propõem que, com relação aos advérbios que
modificam o verbo, ocorre o seguinte:
a) Os advérbios de modo colocam-se normalmente depois do verbo.
b) Os advérbios de tempo e de lugar podem colocar-se antes ou depois do verbo.
c) O advérbio de negação antecede sempre o verbo.
Ainda acrescentam que os advérbios modificadores de outro advérbio, de um adjetivo
ou de um particípio isolado posicionam-se antes destes.
Os autores em questão propõem também que "o realce do adjunto adverbial é
expresso de regra por sua antecipação ao verbo", mas nada dizem em relação à colocação de
cada tipo específico de advérbio para fins de realce, muito menos o que ocorre neste sentido,
com os tipos de advérbios que já tendem a aparecer antes do verbo.
Entretanto, tratam a colocação desses advérbios em linhas muito gerais, uma vez que
se sabe, por exemplo, que os advérbios de modo são muito complexos. Além disso, não dizem
o porquê de tal ordenação. Também não mencionam a posição de outros tipos de advérbios.
Bechara (2000) também menciona a questão da colocação dos advérbios, ao afirmar
que esses elementos não se referem apenas ao verbo, podendo assim aparecer em várias
posições. Considera que a melhor proposta é a de Llorach (2000): o analista deve ater-se “às
relações que cada advérbio contrai dentro do enunciado, quer no seu papel primário de
adjacente circunstancial, quer por sua combinação com outras unidades no interior de um
grupo nominal unitário”. Como analisa Martelotta (2000), essa é a posição tomada por muitos
trabalhos de base funcionalista, em que a colocação dos advérbios está relacionada ao seu
funcionamento no enunciado.
Em Bechara (2001:290), é dito que o advérbio possui certa flexibilidade de posição,
uma vez que sua função não está ligada apenas ao verbo, mas estende-se ao conteúdo
expresso pelo predicado e ao domínio do sujeito, podendo antecedê-lo ou precedê-lo. No
entanto, o autor não especifica em que contextos tais posições podem ocorrer.
Como se pode ver, as gramáticas tradicionais são pouco elucidativas no que se refere
à classificação e, sobretudo, à ordenação de advérbios, apresentando propostas para os
diferentes tipos de advérbios que são bastante controversas: os advérbios de negação, por
exemplo, não antecedem sempre o verbo e podem ocorrer antecedendo o termo, na sentença,
que está sendo negado (Ex.: Eu chamei não a você, mas a seu irmão). E afirmar que os
advérbios de modo colocam-se normalmente depois do verbo é nada dizer diante da
complexidade da colocação deste tipo de advérbio na sentença e a outras propriedades
pertinentes a outros desses elementos.
2.5 Pesquisas sobre advérbios, sob orientação da Lingüística
2.5.1 Tipos de advérbios
Um dos trabalhos que apresenta uma profundidade sobre a ordenação dos advérbios é
o de Ilari et al. (1990), que, em uma análise detalhada dos advérbios e de sua ordenação,
propõem que essa classe de palavras pode dividir-se em dois grandes tipos: predicativos e
não-predicativos.
Os advérbios predicativos caracterizam-se por constituírem argumentos de segunda
ordem. Assim como o verbo e o adjetivo atribuem uma ação ou qualidade ao sujeito, os
advérbios predicativos modificam a ação ou qualidade atribuída ao sujeito. Do ponto de vista
sintático, esses advérbios podem modificar o sentido do verbo, do adjetivo ou de outro
advérbio. São exemplos desse tipo de advérbio: bem, muito, gratuitamente. Os não-
predicativos, por outro lado, não são compatíveis com as idéias de modificação de sentido e
de predicação de segunda ordem, apresentando funções bastante diferentes daquelas que
caracterizam os advérbios predicativos.
Interessam-nos, nesse trabalho, os advérbios predicativos. Nessa classe de advérbios
enquadram-se, segundo os autores, as seguintes subclasses:
a) Qualitativos - paralelos à construção com substantivo, que expressa qualidade (comida
boa), esses advérbios modificam o sentido dos elementos a que se referem: Comer bem,
maravilhosamente bem. Entre esses advérbios encontram-se mal, assim, entre outros.
b) Intensificadores - relacionam-se tipicamente a verbos, adjetivos e advérbios,
intensificando-lhes o sentido: muito, mais, etc.
c) Modalizadores - aplicam-se a sentenças completas e indicam atitude proposicional:
certamente, felizmente, etc.
d) Aspectualizadores - são advérbios cujos traços semânticos correspondem a noções
aspectuais do verbo da sentença em que ocorrem: geralmente, diariamente, de vez em quando,
algumas vezes, etc.
Os qualitativos e os intensificadores apresentam características muito semelhantes
entre si, que podem referir-se ao verbo, ao adjetivo ou a outro advérbio. Isso os diferencia
dos chamados modalizadores, que, segundo os autores, de um modo geral, qualificam a
asserção, relacionando-se à sentença inteira.
Quando se referem ao verbo, os advérbios qualitativos apresentam determinadas
restrições seletivas quanto ao conteúdo do verbo que modificam, tendo, portanto, fundamento
argumental. Assim, alguns advérbios não podem referir-se a determinados verbos: o advérbio
gratuitamente, por exemplo, não pode ser atribuído ao verbo pagar.
Isso diferencia os qualitativos dos advérbios aspectualizadores, cuja restrição seletiva
se refere ao esquema tempo-aspectual do verbo: o advérbio geralmente, por exemplo, não
pode referir-se a uma forma verbal, de aspecto pontual e concluído, como, por exemplo, a
forma verbal caiu.
Curiosamente, Ilari et al. (1990), que propõem um trabalho sobre ordenação, pouco
falam acerca das tendências de colocação dos aspectualizadores. Além disso, não mencionam
uma categoria de advérbios de tempo, mas de advérbios aspectualizadores, que “indicam a
freqüência com que um verbo se reitera”. Dos exemplos apresentados pelos autores, todos se
relacionam a noções tradicionalmente associadas ao conceito de aspecto iterativo: geralmente,
normalmente, diariamente, de vez em quando, às vezes, entre outros. Entretanto, os autores
nada dizem sobre elementos adverbiais associados a outras noções aspectuais, como
pontualidade ou duratividade ou mesmo sobre elementos adverbiais, como ontem, hoje e
amanhã, por exemplo, que expressam informações temporais dêiticas, que não se relacionam
à noção de aspecto, mas à categoria gramatical de tempo, que, por definição, possui natureza
dêitica.
Outros autores, como veremos mais adiante, também acrescentam entre os tipos de
advérbios, termos que indicam noções semanticamente associadas a noções aspectuais. Um
exemplo de outro estudo sobre os advérbios e sua classificação é o de Castilho (1999). Nesse
trabalho, os tradicionalmente chamados advérbios de tempo foram arrolados entre um grupo
de advérbios que o autor classificou como qualificadores aspectualizadores.
O autor define a predicação qualificadora como “um processo semântico-sintático por
meio do qual um operador incide sobre uma classe, modificando ou confirmando sua
intenção, isto é suas propriedades específicas, ou traços semânticos ou semas, na terminologia
da Semântica estrutural”. Em seguida afirma que a qualificação é codificada gramaticalmente
pelos adjetivos, pelos advérbios predicativos e pelos adverbiais, representados por um
sintagma nominal ou por um sintagma preposicionado com valor adverbial.
Quanto aos chamados qualificadores aspectualizadores, o autor relaciona essa classe
de advérbios com a noção de aspecto, que possui natureza composicional, que resulta da
interação do sentido lexical do verbo com o tempo em que foram conjugados, seus
argumentos, os adjuntos adverbiais a ele associados e o padrão sintático em que o verbo está
encaixado.
O autor centra suas análises nas noções de perfectividade vs imperfectividade e
telicidade vs. atelicidade e propõe a existência de aspectualizadores imperfectivos e
perfectivos. Vejamos respectivamente dois exemplos dados pelo próprio autor:
(01)... ela teve escritórios durante... oito anos:: mais ou menos
(02) ajeitou os cabelos de um golpe
A importância desse trabalho está no fato de o autor resgatar uma importante relação
entre aspecto e discurso, relacionando os usos desses advérbios aos dois planos discursivos
característicos da narrativa, propostos em Hopper (1979): figura e fundo. O autor propõe que,
na narrativa por ele analisada, as ações imperfectivas ocorrem em fundo e também em figura,
contrariando a proposta de Hopper (1979), de que a imperfectividade é típica de fundo.
O trabalho de Castilho (1999), portanto, tem o valor de sofisticar mais um pouco a
noção de advérbio aspectual. Mas, além de não mencionar questões relacionadas à ordenação,
ainda não resolve os dois problemas básicos apontados. Não analisa outras noções
aspectuais, além da distinção entre perfectividade vs imperfectividade e as noções
semanticamente próximas a ela. Nada menciona acerca dos elementos adverbiais que
expressam informações temporais dêiticas, que não se relacionam à categoria de aspecto, mas
à de tempo.
Outro trabalho que merece menção é o de Givón (2001), que chama atenção para o
fato de que advérbios podem indicar, no tempo, vários aspectos temporais dos eventos e
caracterizam esses advérbios como advérbios de tempo e aspecto. Para o autor, não é o verbo,
mas a cláusula que constitui o escopo semântico destes advérbios, cujas características
morfossintáticas são muito heterogêneas.
Sem entrar em detalhes de análise, o autor apresenta exemplos do inglês, que são
tipicamente aspectuais, como often, always, again, continuously, on and on, entre outros.
Podemos notar que o autor não se restringiu ao aspecto iterativo, na medida em que
apresenta o caso de continuously e on and on, por exemplo, que se relacionam a outras noções
aspectuais, como imperfectividade e progressividade. Por outro lado, apresentam também
exemplos de advérbios tradicionalmente temporais, como yesterday, tomorrow, entre outros.
Essa é a tendência que seguiremos aqui. Adotaremos uma classificação que leve em
conta as noções de tempo e aspecto, procurando refinar a análise das relações entre advérbios
e as diferentes noções aspectuais. Com base nisso, observaremos o comportamento desses
elementos nas diferentes fases do português, na modalidade escrita, tentando relacionar esses
dados com as diferenças em suas tendências de ordenação.
É importante também ressaltar que estamos lidando apenas com advérbios de tempo
e de aspecto em -mente.
2.5.2 Estudos sobre o advérbio em -mente e sobre ordenação de advérbios
Passamos agora a uma revisão dos estudos feitos sobre advérbios em -mente ou sobre
ordenação _ os dois focos principais desta tese _ sob o ponto de vista da ciência Lingüística.
A tese de Rodrigues (1994) apresenta um estudo de cunho variacionista com uma
perspectiva de comparabilidade funcional que analisa outras possíveis funções dos vocábulos
derivados em -mente, além dos adjuntos adverbiais. Afirma que esses vocábulos não
configuram isoladamente uma classe gramatical.
Ao analisar os dados e pressupostos teóricos de diversos autores, Rodrigues pôde
definir o advérbio como “vocábulo de natureza nominal, modificador do verbo que, em
relação aos outros nomes, caracteriza-se por apresentar invariabilidade de gênero e número”
(1994:159).
A autora estabeleceu uma oposição entre função adverbial e quaisquer outras funções
que os vocábulos derivados em -mente pudessem exercer no corpus analisado.
Assim, adotou o termo “pseudo-advérbio” de Bonfim (1988), para agrupar essas
outras funções, a saber: 1) a discursiva (funcionam como marcadores); 2) a de modificador de
nome; 3) a de modificador de sintagma preposicional; 4) a de modificador de sentença; 5) a
de modificador do pronome.
Representou essa distinção no seguinte quadro:
Quadro1 – Distinção entre Advérbio e Pseudo-advérbio
CLASSE
Nomes derivados
Em -mente
FUNÇÕES
Advérbio
“Pseudo-advérbio”:
–discursivo
-modificador de nome
-modificador do SP
-modificador da sentença
-modificador do pronome
(Rodrigues,1994:161)
A autora descobriu que o tipo do verbo aliado à classe do vocábulo que pertence à
classificação semântica do nome em -mente foram os fatores condicionadores da função dos
vocábulos derivados em -mente, que foram, na maioria das vezes, os “pseudo-advérbios”
(Rodrigues, 1994:162).
Outra pesquisa sobre itens em -mente é a dissertação de Freitas (2004), na qual a
autora trata especificamente dos advérbios temporais e aspectuais em -mente na língua oral
portuguesa, sob uma perspectiva funcionalista. Verifica que a posição mais típica desses
advérbios na oração é a pré-verbal quando ocorrem nas orações formadas pela estrutura
padrão da língua portuguesa SVCo (sujeito, verbo e complemento). Além disso, verifica que a
posição pré-verbal era predominante. Constatou, ainda, que há uma diferença de ordenação da
posição pré-verbal para pós-verbal, ou, pelo menos uma tendência para isso, quando não
um argumento verbal na posição adjacente e posterior ao verbo. Freitas verifica também que
certos itens em -mente como primeiramente e finalmente estão se gramaticalizando. Esses
deixam de expressar somente o tempo dos eventos e passam a organizar os eventos
cronológicos em seqüência textual, funcionando, segundo a autora, como conectivo, vejamos
alguns exemplos dados pela autora:
(1) /.../ o meu filho mais velho tem trinta e dois anos, depois eu tenho um filho de vinte e oito,
ai um intervalo de oito anos, eu tenho uma filha, (e finalmente com outro intervalo de seis
anos tem um garoto) (NURC-RJ, INQ. 084, 1.37).
(2) /.../ E: isso...como...como se faz?
I: primeiramente você pega a calha... pega a calha e ::/ tem um:: lugar de colocar o :: porta
start... aí você tem que furar ... os dois buraquinhos do lado... se for lâmpada de duas... porque
tem lâmpada? Tem luminária de uma lâmpada...de duas... tem lâmpada de vinte/.../ (D&G,
Juiz de Fora, 2
o
grau, relato de procedimento).
Segundo Freitas (2004), nos exemplos (1) e (2) acima, os itens destacados possuem
características de ligação entre sentenças e contextos lingüísticos, funcionando como
elementos de conexão.
Moraes Pinto (2002) fez uma análise da colocação e da polissemia de alguns itens
adverbiais em -mente no português arcaico e no português do século XIX, com atenção aos
seus valores qualitativos e modalizadores.
O objetivo desta pesquisa foi demonstrar que alguns advérbios qualitativos e
modalizadores terminados em -mente sofreram, no decorrer do tempo, mudança na sua
polissemia do português arcaico até os dias atuais. Essa mudança é sucessiva e unidirecional e
consiste num processo de gramaticalização, com esses elementos passando de advérbios
internos à cláusula a advérbios sentenciais. Em certos casos, os valores qualitativos
encontrados no início da trajetória desaparecem e os advérbios passam a assumir funções
pragmático-discursivas.
Os diferentes valores semânticos desses elementos implicam diferentes colocações e
funções na oração. No português arcaico, os advérbios qualitativos possuíam grande
mobilidade na cláusula, podendo ocupar diversas posições, inclusive a de tópico. A partir do
século XIX, algumas posições se tornaram indisponíveis a esses advérbios, pois, com o
processo de gramaticalização, conforme seus valores semânticos se modificavam, eles
passaram a ter um caráter específico e passaram a depender das características gramaticais de
sua nova função. Esse trabalho tem grande relevância para a presente tese, pois nos aponta
alguns caminhos a ser trilhados, como em relação ao processo de gramaticalização, a questão
ordenação no decorrer do tempo, além dos fatores analisados que motivaram sua realização
através dos séculos.
A pesquisa de Andrade (2005), sobre a ordenação das locuções adverbiais de tempo
em 100 editoriais sob o arcabouço teórico funcionalista, demonstrou que as locuções
temporais não têm uma posição prototípica nesse gênero, apresentando apenas uma pequena
tendência de ocorrência na posição pós-verbal (55% dos dados). A autora observou que as
locuções (tanto as pequenas como as mais longas), em editoriais tendem a aparecer nas
posições marginais à cláusula, ou seja, logo no início da cláusula ou no final, como nos
exemplos a seguir:
.
(3) Nas últimas duas eleições, indiretas, não houve sequer desafiante. (12-JB/1999).
(4) É a oportunidade de recuperar o verniz que o partido perdeu ao longo do caminho. (129-
JB/2004).
As locuções, no gênero estudado, aparecem normalmente na posição de sujeito quando
este está ausente (sujeito oculto ou oração sem sujeito) ou está na posição pós-verbal. Neste
caso, ou seja, na ordem VS (verbo-sujeito), 74% das locuções coletadas estão na posição pré-
verbal, como no exemplo:
(5) Nos últimos dois meses, foi roubado o carro blindado do ministro da justiça. (47-
JB/2003).
Mas, quando o sujeito está na sua posição prototípica, ou seja, na ordem SV, as
locuções adverbiais aparecem 68% na posição pós-verbal, como no exemplo a seguir:
(6) A Libéria nasceu em 1822, como pátria de ex-escravos americanos. (JB/2003).
Como Andrade, também verificaremos a posição dos advérbios em -mente e a relação
com a presença ou ausência do sujeito.
Cezario, Ilogti e Costa (2005) verificaram que, em textos religiosos contemporâneos,
as locuções tendem a ocorrer na posição pré-verbal (62% dos dados), como no exemplo:
(7) “minutos depois estava ali apenas a mulher e ele (CSP)
De todos os tipos semânticos estudados (locuções dêiticas, durativas, reiterativas e
simultâneas) pelas autoras, apenas as durativas tendem a ocorrer em posição pós-verbal
(72%).
As autoras observam que as locuções que aparecem inseridas entre o sujeito e o verbo
ou entre o verbo e o complemento/predicativo estão em orações com baixíssima
transitividade, como as com verbo de ligação ou com modal e verbo de ligação:
(8) “A aclamação depois da consagração também pode ser cantada” (p.74, l.11 CEV)
(9)Nossas músicas deverão ser ao mesmo tempo carismáticas e proféticas (p.84, l.28 CEV)
as orações com mais traços positivos de transitividade tendem a ter as locuções em
posições marginais, como abaixo em que a locução A seguir ocorre na margem esquerda de
uma oração altamente transitiva:
(10) “(...) rangeu os dentes, mudou de cor, fez a pior carranca do universo, prendeu as mão e
deu um grito de raiva. A seguir levantou o soldado pela roupa, virou o rosto e disse (...)” (p.
143, CSP).
Essa pesquisa é importante para a presente tese, pois também será testada a relação
entre semântica do elemento adverbial e ordenação. A questão da transitividade será vista
indiretamente ao estudarmos a relação entre tipo semântico do verbo e a posição do advérbio.
Albani (2007) verificou que a posição típica do advérbio sempre era pré-verbal no
português arcaico e pós-verbal no português contemporâneo. Todos os fatores estudados
indicam que, no português arcaico, a ordem era mais livre e mais motivada, enquanto no
português atual a ordem é mais fixa. Segundo ele, há um forte indício de mudança na
ordenação do advérbio sempre em textos religiosos.
Seu trabalho foi importante para esta tese, pois é uma pesquisa de ordem diacrônica e
que traz resultados interessantes quanto à fixação de posição de advérbios. Muitos dos fatores
testados por ele também foram testados por nós, como a relação entre tipo semântico de verbo
e ordenação de advérbio. Com relação a esse fator, Albani destaca que, no português atual, o
advérbio sempre quase que categoricamente se apresenta na posição pós-verbal quando o
verbo é relacional intensivo (verbo de ligação).
Uma pesquisa de grande importância para o nosso trabalho é a realizada por
Martelotta (1994) que; analisa, em uma perspectiva funcional, a ordenação dos
circunstanciadores temporais. Esses compreendem os advérbios, adjuntos, orações adverbiais
e operadores argumentativos que expressam a noção do tempo. O corpus utilizado é
constituído de entrevistas elaboradas pelo Censo de Variação Lingüística, Competências
Básicas de Português e NURC. Para o estudo diacrônico dos operadores argumentativos,
foram utilizados textos antigos, como: “Vigeu da Consolação” (1959), “A demanda do Santo
Graal” (1944), “O Bosco Deleitoso” (1950), dentre outros.
O objetivo do estudo do autor é buscar fatores discursivos que motivem a colocação
desses circunstanciadores na sentença. Em outras palavras, o autor propõe demonstrar que os
argumentadores discursivos seguem leis e tendências de colocação diferentes dos demais
circunstanciadores. A ordenação dos argumentadores discursivos deve-se a dois processos de
mudança semântica: metáfora espaço> (tempo) > texto (Heine et al., 1991) e pressão de
informatividade. ( Traugott e Heine, 1991).
O primeiro processo de mudança consiste em um elemento de valor espacial assumir
um sentido temporal e, depois, passar a expressar relações lógicas no discurso. Por exemplo:
“O operador argumentativo aí, originalmente um dêitico espacial, pode também ser usado
para seqüenciar (temporalmente) os eventos e expressar uma idéia de conseqüência em
relação às sentenças anteriormente mencionadas” (Martelotta 1994:5).
A mudança por pressão de informatividade dá-se quando um elemento lingüístico
adquire um novo valor através de um processo de inferência conversacional em certos
contextos. Um exemplo citado por Martelotta é o do operador argumentativo “ainda cujo uso
de marcador de contra-expectativa, por um processo de inferência passa a assumir um valor
inclusivo semelhante ao do termo também” (1994:6).
O autor ressalta que geralmente esses dois processos de mudança ocorrem juntos
quando se trata do aparecimento de operadores argumentativos que tendem a perder sua
mobilidade original para assumir posições mais fixas na sentença. Esse processo de
gramaticalização foi estudado nos seguintes operadores argumentativos: aí, depois, logo,
então, já e ainda.
Ao apresentar a ordenação dos circunstanciadores temporais, propriamente ditos,
Martelotta adota o princípio de Hopper e Thompson (1980) de que o discurso narrativo
apresenta duas estruturas denominadas figura e fundo, estendendo-o ao discurso não-
narrativo.
Distingue figura e fundo, primeiramente, opondo a intenção do falante ao direcionar o
fluxo do discurso para a narrativa ou para a não-narrativa: se o falante está narrando, eventos
e situações não-narrativas funcionam como fundo; e, ao contrário, se o falante está
comentando ou descrevendo, eventos e situações narrativas funcionam como fundo, servindo
para evidenciar este comentário ou esta descrição (1994:2-3).
Uma outra distinção entre figura e fundo é realizada através da análise de traços
semântico-gramaticais. Assim, na narrativa, os eventos funcionam como figura quando são
marcados pelos traços [=específico], [=perfectivo], [=cinético], [pontual] e funcionam como
fundo quando marcados pelos traços [-específico], [-perfectivo], [-cinético], [-pontual].
no discurso não-narrativo, os eventos que funcionam como figura são marcados
pelos traços [-específico], [+perfectivo], [+cinético], [+pontual] e funcionam como fundo,
aqueles marcadores por [-específico], [-perfectivo], [-cinético], [-pontual].
Com o objetivo de verificar as tendências de posições desses circunstanciadores de
tempo, Martelotta os classificou em:
a)Circunstanciadores de tempo determinado- são aqueles que indicam, de forma precisa, o
momento em que ocorre o evento. Cita como exemplos: ontem, hoje, semana passada,
quando ele chegou etc.
b)Circunstanciadores de tempo indeterminado- expressam a noção de que os eventos e
situações perduram no tempo indeterminadamente. Exemplifica com: sempre, geralmente,
atualmente, nunca etc.
c)Circunstanciadores iterativos- denotam a freqüência com que os eventos não-específicos
ocorrem ao longo do tempo, como às vezes, duas vezes por semana, de vez em quando etc.
d)Circunstanciadores de simultaneidade- expressam a concomitância entre eventos e
situações. Como os exemplos, citam: enquanto isso, ao mesmo tempo etc.
e)Circunstanciadores delimitativos- delimitam os eventos e as situações, indicando o início
e/ou fim de sua permanência no tempo, como: há três anos, até hoje, durante dois meses etc.
O autor conclui que existe uma tendência determinada para a colocação dos
circunstanciadores temporais na sentença. Essa depende da força que a informação, carregada
pelo circunstanciador, assume dentro da estrutura do discurso em que ele ocorre.
O circunstanciador tende a aparecer em posições pré-verbais, “quando traz
informações temporais análogas aos traços semântico-gramaticais do discurso em que ocorre.
Esta relação semântica empurra o circunstanciador para as posições pré-verbais, enfatizando-o
ou topicalizando-o” (1994:201).
No entanto, se não essa relação semântica, o circunstanciador tende a ocorrer nas
posições pós-verbais, ou até não ocorrem “em tipos de discurso cujos traços semântico-
gramaticais são não-análogos ou incompatíveis com a informação temporal por ela expressa”
(1994:201). Dessa forma, os circunstanciadores de tempo determinado tendem a ocupar
posições pré-verbais em figura narrativa e não-narrativa, uma vez que a força informativa que
assumem nestes contextos os leva a ser topicalizados ou enfatizados.
Os circunstanciadores de tempo indeterminado e os circunstanciadores de
simultaneidade têm como tendência o aparecimento na posição pré-verbal em fundo narrativo
e não-narrativo, devido também à força informativa assumida que os leva a topicalização ou
ênfase.
No que se referem aos circunstanciadores iterativos, esses apresentam maior
ocorrência nas posições pré-verbais em fundo narrativo e não-narrativo e em figura não-
narrativa, já que esses tipos de discursos são marcados pelo traço [-específico], estimulando a
iteratividade.
Por fim, os circunstanciadores delimitativos possuem uma mobilidade de colocação
maior, porque apresentam duas características distintas: por um lado, funcionam como um
circunstanciador de tempo determinado (indica o momento específico em que se inicia e/ou
termina o evento). Por outro lado, “expressam a duração de eventos específicos imperfectivos,
ou de eventos não-específicos ao longo do tempo, acrescentando características semântico-
gramaticais típicas de fundo” (1994:229).
Quanto à colocação dos operadores argumentativos, Martelotta afirma que, devido ao
processo de gramaticalização que sofrem, não seguem as mesmas tendências de ordenação
dos circunstanciadores propriamente ditos. A gramaticalização faz com que o elemento exerça
funções argumentativas, restringindo a sua possibilidade de colocação na sentença. Tal
colocação “passa a depender mais das características gramaticais específicas de suas novas
funções, que se manifestam em contextos específicos, assumindo posições mais fixas dentro
da sentença” (1994:229-230).
O trabalho de Martelotta (1994) foi muito importante para presente tese, sobretudo, no
que se refere às posições estabelecidas, como também no que se refere a alguns parâmetros da
transitividade, à análise bastante detalhada dos circunstanciadores de tempo, buscando fatores
que influenciam a sua colocação na sentença à luz da teoria funcional.
Ressaltamos que o autor estuda os advérbios em geral, enquanto, esta tese trata apenas
dos advérbios de tempo e aspecto em -mente.
França (2002) parte da tese de Martelotta e faz uma análise dos adjuntos adverbiais de
tempo e aspecto em narrativas orais e escritas contemporâneas, procurando delimitar os
valores que esses adjuntos apresentavam no texto narrativo, assim como as tendências de
colocação que eles assumiam nas cláusulas que compunham o texto. Esses adjuntos
adverbiais de tempo e aspecto, de um modo geral, apresentam uma grande mobilidade na
cláusula, podendo ter suas tendências de ordenação explicadas por fatores de caráter sintático
e discursivo.
Um dos fatores mais importantes foi o plano discursivo. A autora verificou que
tendiam a serem enfatizados, ocupando posições pré-verbais, os adjuntos que apresentavam
traços semântico-gramaticais análogos aos traços semântico-gramaticais do plano de discurso
em que apareciam; enquanto os adjuntos adverbiais de tempo e aspecto determinados não
apresentaram resultados estatísticos que ratificassem a hipótese postulada; já os adjuntos
adverbiais de tempo e aspecto indeterminados tendiam a ocupar posições pré-verbais em
fundo, porque este tipo de discurso caracteriza-se pela presença de situações não-específicas;
e ainda, os adjuntos adverbiais de tempo e aspecto de simultaneidade tendiam a ocorrer em
fundo e em posições pré-verbais. Isto ocorria porque o discurso de fundo tende a apresentar
traços semântico-gramaticais (não-específicos) marcados pela simultaneidade; os adjuntos
adverbiais delimitativos, embora não tenham apresentado tendência muito forte, pareciam
buscar as posições pós-verbais em figura já que expressavam a duração de eventos específicos
imperfectivos, ou de eventos não-específicos ao longo do tempo, apresentando traços
semântico-gramaticais típicos de fundo; enquanto aos adjuntos adverbiais de tempo e aspecto
iterativos tendiam a ocorrer em posições pré-verbais de fundo, porque este tipo de discurso é
marcado pela presença do traço não-específico; e, além disso, a ordenação vocabular,
portanto, não podia ser explicada por fenômenos estritamente sintáticos.
Portanto, a estrutura organizacional do texto influenciava a colocação dos adjuntos
adverbiais de tempo e aspecto.
O estudo de Pereira (1999) verifica a ordenação das orações adverbiais de tempo,
desenvolvidas e reduzidas, num corpus constituído por 108 cartas pessoais, escritas entre
1937 e 1987. Esse trabalho, baseado nas teorias variacionista e funcionalista, busca identificar
os fatores cognitivos e discursivos que motivam a variação da ordem de algumas dessas
orações, tornando-as fixas na sentença.
Os dados foram separados em dois grupos: 1)orações temporais com ordenação
variável (total ou parcial) e 2) orações temporais de ordem fixa ou categórica. Segundo a
autora, o primeiro grupo foi submetido a uma análise estatística multivariacional através do
pacote de programas VARBRUL. O segundo foi analisado qualitativamente:
Pereira observou as seguintes posições da oração temporal:
a)Anteposição: corresponde às orações temporais situadas na margem esquerda da oração
núcleo.
(11) ”Um dia desses fui pedir uma xícara de chá e só ela estava lá.
Quando pedi que ela fizesse, ela tremeu de alegria e disse...
b) Posição: corresponde às orações temporais situadas na margem direita da oração com que
se combinam.
(12) “Escreva-me contando assim que tiver um tempinho”.
c) Intercalação: corresponde às orações temporais situadas no interior da oração núcleo,
quebrando a fluidez da idéia apresentada nesta oração.
(13) “M. vou parando por aqui senão quando voltar não tenho novidades pra te contar”.
Verificou que não houve diferença marcante entre posposição e anteposição. Percebeu,
também, que muitas das orações temporais intercaladas eram reduzidas de infinitivo e curtas
(cerca de quatro palavras cada uma), o que proporcionava uma melhor fluidez do discurso,
facilitando de certa forma o processo comunicativo.
Dentre os vários fatores analisados, destacamos o que se refere aos tipos de verbo do
segmento temporal. Os verbos foram codificados a partir de três classificações baseadas em
Dik (1989) e Braga (1996):
1-Ação (realização e atividade)
2-Processo (mudança e dinamismo)
3-Situação (posição e estado)
Os resultados mostram que o tipo de verbo do enunciado temporal é mais freqüente
seguido do processo, e o menos freqüente é a situação. A autora relata que “os resultados para
o tipo de verbo das orações isoladas não se mostram eficientes”, portanto considerou “para a
análise a correlação dos tipos de verbos das orações que compõem o enunciado temporal”
(1999:72). Dessa forma, constatou que “as orações com verbos de ação tendem a vir na
segunda posição, independentemente de constituírem o núcleo ou o satélite do enunciado
temporal (...) orações com verbos de situação e processo tendem a vir na primeira posição,
quando associadas a uma oração com verbo de ação, funcionando como pano de fundo para
os eventos mais dinâmicos codificados na segunda oração” (1999:72-73).
Outro fator que também colocamos em evidência é aquele que concerne à distribuição
de informação. Pereira analisou o tipo de informação codificada pela oração núcleo e pela
oração temporal. Ambas as orações foram classificadas conforme as categorias: novo, velho e
inferível, nos termos de Prince (apud Pereira, 1999). Os resultados mostram que orações
temporais que codificam informação velha, mencionadas no discurso anterior, são mais
propensas à anteposição. Sendo assim, ”Orações temporais que codificam informação nova,
não mencionada no contexto e nem inferível dele, são preferencialmente pospostas (...) o
contexto mais favorável à anteposição da oração temporal é aquele em que se relacionam uma
oração núcleo nova e uma oração temporal com informação velha” (1999:88).
No que diz respeito às orações temporais de ordem fixa, verificou que os bloqueios
mais freqüentes à reversibilidade das orações pospostas são: as com o focalizador sozinho e as
que estão ancoradas num constituinte da oração anterior.
Quanto à anteposição da oração temporal, os resultados mostraram que os fatores mais
relevantes para a fixação dessas orações são: em primeiro lugar, as relações anafóricas, em
segundo lugar, as expressões cristalizadas, em terceiro lugar, a seqüência discursiva.
A relevância do trabalho de Pereira para o presente estudo justifica-se por também
investigar fatores que tendem a motivar a ordenação dos elementos em análise.
Lessa (2007) se propôs investigar a ordenação de circunstanciais temporais (advérbios
e sintagmas preposicionados com valor circunstancial) na modalidade escrita do português e
do inglês, levando em conta, principalmente, fatores de ordem discursiva. A autora constatou
que, para se abordar a questão da ordem não marcada, deveria considerar as duas línguas
(português e inglês) de forma distinta.
Quanto aos resultados obtidos nesse estudo, verificou-se que os advérbios tendiam a
ordem não marcada no inglês é a anteposição verbal. Já em relação aos Spreps, não houve
como tirar essa conclusão, devido à grande variabilidade na oração.
Além disso, em relação ao posicionamento mais detalhado dos circunstanciais de
tempo na cláusula, observou-se que os advérbios em português ocupavam as posições ME
(margem esquerda) e PM2 (entre o verbo e objeto) com mais freqüência, enquanto no inglês,
eles preferiam a PM1(entre o sujeito e o verbo). Este fato no inglês pôde ser explicado,
principalmente, em virtude de os advérbios menores possuírem uma ordem mais rígida. Os
Spreps em português possuíam uma clara preferência pela margem direita da oração,
enquanto que, em inglês, os Spreps apresentaram grande variabilidade nas duas margens da
oração.
Portanto, a função discursiva dos circunstanciais possui grande influência na
ordenação de advérbios e Spreps nas duas línguas.
Esse estudo sobre Ordenação de Circunstanciais Temporais em Português e Inglês:
posições e papéis discursivos foram importantes por também investigar as posições que esses
constituintes ocupam na cláusula.
Nesta tese, examinamos os seguintes fatores: a posição dos advérbios, a noção
semântica do advérbio, o tipo semântico do verbo, o tipo de sujeito, o tipo de oração, dentre
outros.
Esta revisão permitiu-nos conhecer, mais profundamente, as questões abordadas
acerca dos advérbios em geral, sobretudo, aquelas referentes à sua classificação e às suas
posições na cláusula e, com certeza, foi esclarecedora ao longo desse estudo.
2.6 Os advérbios e a expressão de tempo
Tempo e aspecto são duas categorias gramaticais que expressam noções temporais. A
categoria de tempo é dêitica, já que sua utilização depende diretamente do momento em que o
enunciado foi proferido. Por outro lado, isso não ocorre com a categoria de aspecto.
As noções de tempo e de espaço são partes substanciais das relações do homem com o
mundo. Os dois são delimitados: o tempo, em minutos, horas, dias, meses, séculos; o espaço,
em centímetros, metros, milhas, etc. Todos são referências necessárias na vida de cada um de
nós. Portanto, a língua que falamos está repleta de recursos, para que possamos situar nossas
ações em relação aos dois: agora, antes, depois, ainda - para tempo; aqui, acolá, além - para o
espaço.
Qualquer ato de comunicação é situado no tempo e no espaço. Na simples situação de
comunicação - o diálogo - o indivíduo que fala refere-se a si mesmo como eu que designa seu
ouvinte como tu/você. Ao referir-se ao espaço em que se encontra o indivíduo que fala
identifica-o como aqui; e ao referir-se ao momento em que fala, pode designá-lo como agora.
Eu, você, aqui e agora não nomeiam indivíduos, lugar e época determinados e
constantes, mas apenas "o indivíduo que fala", alguém a quem ele se dirige, e o "lugar" e
"momento" em que ocorre o diálogo. Seus referentes não são, portanto, objetivos e externos à
fala (como João, Paula, na sala e às 2 horas), mas situacionais e exclusivos do ato de falar,
fora do qual não podem ser reconhecidos e os elementos utilizados para designar a esses
referentes são chamados dêiticos (termo derivado de uma palavra grega que significa "indicar,
mostrar, apontar")
A categoria gramatical de tempo, segundo Lyons (1979) diz respeito às relações
temporais que são expressas por contrastes gramaticais sistemáticos. Os gramáticos
tradicionais, na análise do grego e do latim, apresentam três contrastes dessa natureza:
passado, presente e futuro. A categoria de tempo relaciona o tempo da ação indicada pelo
verbo, em relação ao momento em que o falante produz seu enunciado, o que significa que o
tempo é uma categoria dêitica.
A pessoa que fala, ou escreve, "comanda", por assim dizer, a atividade discursiva,
normalmente transformando-a, ou colaborando para transformá-la, numa complexa rede de
atos de significação que têm no eu, no aqui e no agora do discurso seus pontos de referência.
A indicação do tempo como categoria de linguagem verbal é parte dessa interação
comunicativa, ou ainda dessa atividade discursiva, tempo, que tem no momento da
enunciação seu ponto principal de referência.
Nesse sentido, os advérbios que expressam a categoria de tempo seriam aqueles que
apresentam valor dêitico, localizando os eventos na linha do tempo, em relação ao momento
da produção de enunciado. São eles: ontem, hoje e amanhã, logo mais, quarta-feira passada,
além de depois, anteriormente, posteriormente (em contextos em que está ancorado ao
momento da fala, ou seja: depois, anteriormente ou posteriormente ao momento da fala), etc.
Em alguns casos, os advérbios temporais podem não ser dêiticos, ou seja, podem
localizar na linha do tempo, sem tomar como referência o momento da fala, mas a conclusão
do evento anterior, ou qualquer ponto no tempo mencionado no texto. É o que ocorre, por
exemplo, em depois da aula e antes do jogo, que constituem indicações temporais não-
dêiticas, que localizam o evento na linha do tempo, tomando como ponto de referência
pontos já fixados no tempo, e não o posicionamento dos participantes. Os seqüenciadores em
geral estão nessa categoria: depois, , então, etc.
2.7 Os advérbios relacionados à categoria de aspecto
Para que possamos compreender a noção de advérbio de aspecto, devemos fazer uma
breve reflexão acerca da categoria gramatical de aspecto.
As gramáticas tradicionais falam pouco acerca da categoria de aspecto. São muito
poucos os autores que se preocupam em apresentar o aspecto como uma categoria do verbo e
defini-lo de maneira objetiva. O que mais encontramos são rápidas alusões à noção de
aspecto, espalhadas pelos capítulos referentes ao estudo dos verbos. Said Ali (1969:161), para
citar um exemplo, apresenta uma minuciosa análise do emprego das diferentes formas
verbais, utilizando termos como “iterativo”, “ação durativa” e “ação freqüentativa, mas sem
mencionar a palavra aspecto.
Luft (1978) é um dos poucos gramáticos que trata a categoria de aspecto em uma
seção especial, em que define aspecto como “a categoria verbal que exprime a oposição
término/não-término ou acabado/não-acabado, a duração do processo”. Na seqüência, o autor
afirma que o aspecto pode manifestar-se juntamente com o tempo, como em canto/cantei,
cantara/cantava, onde existe a oposição acabado/não-acabado. Mostra também que esta
categoria pode manifestar-se através de locuções verbais, sufixos, ou pelo próprio radical do
verbo, indicando exemplos de aspectos incoativo, iterativo, cursivo e cessativo.
Luft afirma que os verbos, em oposição aos nomes, caracterizam-se pela “idéia
temporal: o início, a duração ou o resultado de um processo (aspecto) ou o momento de sua
ocorrência (tempo)”. Propõe também, ao comentar as locuções verbais, que as locuções
indicam os aspectos do processo verbal: anterioridade, posterioridade, continuidade,
repetição, progressividade, início, conclusão, etc. Notamos aqui, mais uma vez, uma
inadequação entre as noções aspectuais e a definição proposta, o que nos faz pensar se a
palavra aspecto aqui foi usada no sentido indicado na definição ou naquela acepção
descompromissada que encontramos na maioria das gramáticas.
Podemos ver, na gramática em questão, a preocupação de incorporar de forma
explícita a categoria de aspecto no estudo dos verbos. Mas o resultado ainda está longe de
deixar claro o que significa aspecto verbal, em função da falta de clareza com que é definida a
categoria e, sobretudo, da inadequação com que são propostas as noções a ela ligadas.
Saindo do âmbito das gramáticas tradicionais, podemos citar o estudo de Travaglia
(1994) sobre aspecto verbal. Fazendo uma distinção básica entre tempo (tempo gramatical) e
TEMPO (tempo real ou cronológico), Travaglia (1994) afirma que a categoria de tempo é
dêitica, uma vez que situa o momento da ocorrência da situação em relação ao momento da
fala; ao passo que o aspecto é uma categoria temporal não-dêitica, pois se refere à situação em
si, sem levar em conta o momento da enunciação.
Travaglia (1994) propõe a seguinte definição para a categoria verbal de aspecto:
Aspecto é uma categoria verbal de tempo não-dêitica,
através da qual se marca a duração da situação e/ou suas
fases, sendo que estas podem ser consideradas sob
diferentes pontos de vista, a saber: o do desenvolvimento, o
do completamento e o da realização da situação
. (p. 38)
Com base nisto, Travaglia apresenta um conjunto de noções aspectuais, que
resumiremos a partir de agora, utilizando, para facilitar a compreensão, os exemplos do
próprio autor.
No que se refere à sua duração, uma situação pode ser durativa, quando seu início e
término ocorrem separados por um período de tempo relativamente longo; ou pontual, quando
seu início e término ocorrem no mesmo instante, ou separado por um período de tempo muito
curto. Vejamos, respectivamente, um exemplo de cada ocorrência:
(01) D. Maria passeia todos os dias.
(02) Salto do trampolim há anos.
Afirma ainda o autor que a situação durativa pode ser apresentada como limitada,
quando se indica o seu início, o seu fim ou o valor da sua duração; ou ilimitada, quando o
início e o fim da situação não são conhecidos nem sugeridos. Eis um exemplo de cada uma
respectivamente:
(03) Ele estava nadando desde 6 horas da manhã.
(04) A terra gira em torno do sol.
Tanto a duração limitada quanto a duração ilimitada podem ser contínuas ou
descontínuas. Serão contínuas, quando se apresentarem sem nenhuma interrupção no seu
tempo de existência. Por outro lado, serão descontínuas as situações que apresentarem
interrupções na sua duração:
(05) A terra gira em torno do sol.
(06) De tempos em tempos explodia uma bomba.
Travaglia propõe ainda que as diferentes fases de uma situação estão relacionadas às
informações referentes à realização, ao desenvolvimento ou à complementação da situação.
Vejamos cada um destes casos.
Do ponto de vista da sua realização, temos três fases da situação:
a) Fase em que a situação ainda não começou. Trata-se de um momento anterior à consecução
da situação.
(07) Pedro está para emoldurar o quadro.
b) Fase em que a situação já é começada.
08) Os rapazes continuam jogando apesar da chuva.
c) Fase em que a situação já terminou.
(09) O treinador do time esteve doente.
Do ponto de vista do seu desenvolvimento, temos também três fases da situação:
a) Início - A situação é apresentada como estando em seu ponto de início, ou em seus
primeiros momentos. A esta noção aspectual dá-se o nome de inceptividade ou incepção.
(10) Os marceneiros estão começando a armar o telhado.
b) Meio - A situação é apresentada em andamento. Essa noção é caracterizada pelo termo
cursividade.
(11) Estou lendo um livro muito interessante.
c) Fim - A situação é apresentada em seu ponto terminal. Trata-se da noção aspectual de
terminatividade.
(12) Mamãe terminou de bordar minha blusa hoje ao meio-dia.
Travaglia (Op.cit) ainda observa a situação do ponto de vista do seu complemento.
Assim uma situação pode ser:
a) Completa - A situação é apresentada em sua totalidade, com seu começo, meio e fim
englobados num todo. De acordo com Travaglia, esta é a noção aspectual de perfectividade.
(13) Antônio ouviu música o dia todo.
b) Incompleta - Quando a situação não apresenta uma das fases do seu desenvolvimento.
Temos aqui a noção aspectual de imperfectividade.
(14) Ele estava nadando desde seis horas.
Registrando o fato de que pode ocorrer uma não atualização de aspecto quando a
situação não apresenta referências à sua duração ou às suas fases, Travaglia propõe um quadro
bastante completo das noções aspectuais no português:
Martelotta (1986) propõe que o trabalho de Travaglia, embora bastante completo, não
se mostra eficiente quando aplicado à realidade da língua falada, que o autor parece estar
mais preocupado em adaptar a teoria tradicional dos aspectos à realidade lingüística do que, a
partir de dados reais, questionar as hipóteses tradicionais.
Em função disso, Martelotta (1986) optou por uma proposta mais voltada para o uso
da língua, observando, em seu estudo sobre o presente do indicativo, a relação entre uma série
de propriedades semântico-gramaticais que se associavam às formas verbais por ele
analisadas de acordo com o tipo de discurso em que essas formas verbais ocorriam. Muitas
dessas propriedades estão associadas às noções aspectuais propostas por Travaglia, mas
diferem dessas noções por se apresentarem de modo a refletir a gica organizacional do
texto.
2.8 A formação de advérbios em -mente
Analisando a origem dos advérbios, verificamos que, dos advérbios latinos, a sua
maioria foi originada, de nomes ou pronomes e poucos passaram às línguas românicas.
Enriqueceram-se estas, todavia, com algumas formas oriundas de formações desconhecidas
do latim literário, com grande produtividade e, em especial, com os advérbios em -mente que
se afixam aos adjetivos. Esta terminação nada mais é do que o ablativo do latim mens, v.g. em
bona mente. Com o uso de locuções deste tipo formaram outros tipos, acabado por alterar a
significação primitiva do substantivo mente e passando assumir o valor de um sufixo
derivativo.
O substantivo latino mens, mentis (“mente, alma, espírito, inteligência”) modificado
por um adjetivo refletia o estado de ânimo ou o modo na qual à ação verbal se levava em
consideração. Com passar do tempo, o substantivo foi assimilado a este tipo de estrutura
sintática e semântica e acabou por perder o seu valor original para se converter num sufixo
adverbial. Esta estrutura morfológica (base + mente) é muito produtiva na criação de
advérbios. No levantamento dos dados dos corpora selecionados, verificamos que esse sufixo
é muito produtivo, mesmo nos primórdios da língua, principalmente com as noções de modo,
de qualificador e modalizador. Vejamos alguns exemplos dos corpora estudados:
(1) ... posto que seyam muy grauemete enfermos.(OE, p.47)
(2)... taaes como estes presume no dignamete etender e achar dulçura(OE,p.48)
(3)
P
rimeiramente salvanayque, regedor que agora he, tem de remda hu~u conto e cem mil
pardaos d ouro, este he senhor de charama~odel, e de nagapata~o, e tamgor, e bomgarim, e
dapata~o, e do truguel, e de caullim, e todas estas sa~o cidades (Século XVI/Crônica dos Reis
de Bisnaga)
(4)... por ignorar o motivo se será para falta desaude, ou qualquer acontecimento que
lhesucedese, oque infinitamente sentirey como amigo [ espaço]igualmente tenho sentido
afalta daremeça dadita patente ejulgo omotivo por haver algum embaraço nasecretaría, pois
pela demora que tem havido ja mequerem puxar para ojugo dos auxiliarez os quaes são
bastantemente incomodados(
século XVIII - administração privada/carta de comércio/ PHPB)
(5)... assim cumpri com a Comissão que a minha Bemfeitora (a quem pesso Beijes as mãos
em meu nome) me incumbio, cum prindo igualmente com a comissão da Rainha (Cartas do
PHPB - RJ / séc. XIX)
(6) Deus simplesmente não age assim. Deus é santo - moralmente perfeito. (EC,p.45, Port.
atual)
(7) Jesus era inicialmente homem, depois se tornou Deus. (EC,p.63, Port. atual)
Nos exemplos expostos, observamos as diversas formações derivativas dos advérbios
em -mente (grave+ mente, digna+ mente, primeira+ mente, infinita+ mente, igual+ mente,
bastante+ mente, simples+ mente, moral+ mente e inicial+ mente), além de sua produtividade
e usualidade com as acepções de modo, qualificador, modalizador e temporal, este último não
tanto quanto as noções anteriores.
É interessante acrescentar, ainda, sobre a formação dos advérbios que outros autores,
como Vilela (1979), apresenta-nos algumas considerações acerca dessa categoria gramatical:
o léxico constitui-se de um conjunto de unidades léxicas (palavras lexicais, lexemáticas,
lexemas), ou seja, unidades que representam a realidade extralingüística e que pertencem
tanto à semântica como também à gramática da língua.
Tendo em vista que palavras lexicais concretas contêm, além do valor lexical, uma
significação categorial, o autor considera tais palavras as unidades fundamentais do léxico de
uma língua. Estes podem ser ampliados principalmente através de dois processos: a derivação
e a composição.
A derivação é o processo de formação vocabular em que ocorre a adição de afixos
(prefixos e sufixos) a uma base ou radical e a composição é o recurso de enriquecimento
vocabular que se pela união de dois ou mais radicais, que formam um vocábulo cujo
significado não precisa ser necessariamente a soma dos significados de cada radical. Vale
ressaltar que na composição os vocábulos estabelecem entre si relações sintáticas de
subordinação e/ou coordenação (Cf. Carone (1988).
Vejamos os exemplos:
(8) porta-bandeira, aguardente (subordinação);
(9) vaivém, leva-e-traz (coordenação).
Apesar de serem processos diferentes, derivação e composição não se excluem, o que
será ilustrado a seguir com o vocábulo em -mente.
Os estudos históricos apontavam para o advérbio como um elemento modificador.
Pereira (1932), remontando a Aristóteles, afirma que os advérbios formavam, juntamente com
as preposições e as conjunções, uma das quatro partes do discurso (a quarta era as
interjeições), porém apenas sob o rótulo de “conjunções”.
Mais tarde, os gramáticos gregos de Alexandria redividiram as partes do discurso,
desdobrando as “conjunções” em três categorias: as conjunções propriamente ditas, as
preposições e os advérbios. O autor divide o estudo das categorias gramaticais em lexical ou
taxionômico e sintático ou gico. No primeiro, expressa a idéia geral da categoria e o
segundo a sua função na frase. Neste ponto, o gramático não difere dos outros estudiosos
quanto ao conceito e função dos advérbios.
Pereira (1932) afirma ainda que os advérbios, do tipo que estamos chamando de
qualitativo, formam uma categoria que se assemelha à do adjetivo devido à idéia de
qualificação que o advérbio apresenta. Diz, também, o autor que o processo de formação de
advérbios em -mente a partir de adjetivos é recente e desenvolveu-se no português e em outras
línguas românicas ocidentais. O processo consistiu na aglutinação do adjetivo ao substantivo
feminino mente. A expressão era escrita separadamente desde o latim, entretanto, diz Pereira,
que os dois elementos se uniram na escrita por força da pronúncia e o substantivo -mente,
antes palavra autônoma, passou a ser interpretado como sufixo adverbial, como o vemos nos
dias de hoje e, também, no português arcaico. Mas, segundo Martelotta, Barbosa & Leitão
(2002b), a variação entre a grafia separada ou junta, encontrada no português arcaico, deve ser
interpretada com precaução, pois antes de constituir um processo de gramaticalização, pode
ser apenas opção adotada na impressão gráfica:
Entretanto, não podemos esquecer que não
dependemos da fidedignidade da edição para sabermos se
as palavras estavam de fato juntas no original, mas
também que, mesmo nos manuscritos, muitas vezes a
união, ou separação, entre vocábulos poderia ser usada
para se justificar a mancha gráfica na página. Desse
modo, devemos tomar cuidado ao relacionar a escrita
separada/junta dos elementos com sua gramaticalização,
pois o controle estatístico pode revelar o real avanço
da grafia dos advérbios em -mente como um único
vocábulo.
Pereira (1932.) classifica os advérbios de forma semelhante à que fazem os outros
autores: de acordo com as circunstâncias de afirmação, dúvida, negação, lugar, tempo,
quantidade, modo, ordem, designação, etc.
Carneiro Ribeiro, em seu livro Serões Grammaticaes (1956: 362), faz também uma
analogia entre advérbios e adjetivos: É este elemento do discurso uma espécie de adjectivo,
que tem por função característica modificar os adjectivos, os verbos e qualquer palavra de
sentido atributivo. Modifica-os, como o adjectivo modifica os substantivos”.
O autor continua sua análise observando que o advérbio pode se referir a um
substantivo quando este possui um sentido atributivo. Ele cita o seguinte exemplo: “Deus é
verdadeiramente pai” (1956:363). Nesse caso, de acordo com o autor, o valor semântico do
substantivo equivale ao de um adjetivo. Em suas palavras, o advérbio é “attributo de
attributo”.
Carneiro Ribeiro (1956) afirma que os advérbios são invariáveis e este fato, ao
contrário do que pensam outros autores, torna esses elementos ainda mais semelhantes aos
adjetivos. Segundo ele, os adjetivos expressam conceitos abstratos que, por sua própria
natureza, não são passíveis de variações. O que ocorre é que os adjetivos adéquam em gênero
e número aos substantivos que acompanham apenas por uma questão de sonoridade. Carneiro
Ribeiro diz, ainda, que os advérbios expressam de forma mais resumida e eficiente alguns
pensamentos que, se ditos de outro modo, tornariam a linguagem mais lenta e prolixa. Nesse
sentido, podemos entender que os advérbios contribuem para o princípio de economia
lingüística.
O autor propõe a seguinte classificação para os advérbios: advérbio de lugar, advérbio
de tempo, advérbio de quantidade e advérbio de qualidade ou modo.
No que concerne aos advérbios em -mente, o autor trata de sua formação, qual seja:
este sufixo liga-se, de um modo geral, ao adjetivo no feminino, quando houver duas formas.
Diz, ainda, que alguns advérbios podem ter seus sentidos intensificados, tanto por outros
advérbios quanto por uso no superlativo. Cita como exemplos: “mais docemente, muito
ternamente, bellissimamente,”etc.
Said Ali, em sua Gramática Histórica da Língua Portuguesa (1964: 183), define os
elementos adverbiais como se segue:
O advérbio é um vocábulo determinativo do verbo, do
adjetivo ou de outro advérbio. Acrescenta a outras
palavras o conceito de tempo, lugar, modo, etc. que lhes
delimita ou esclarece o sentido, sem, contudo exercer,
como o acusativo, o dativo e o objeto indireto
circunstancial, função puramente complementar.
Esse autor faz uma análise etimológica de alguns advérbios. Entretanto, em relação
aos advérbios em -mente, apenas afirma que são criações novas nas línguas românicas, i.e.,
não encontradas no latim literário, formadas a partir de adjetivos (Cf. p.183).
Semanticamente, Said Ali (op. cit.) equipara as locuções adverbiais aos advérbios em -
mente afirmando que as primeiras se distinguem destes somente porque são mais longas e
os seguintes exemplos: com prudência = prudentemente, com energia = energicamente, com
brandura = brandamente.
O autor esclarece que esses elementos são classificados de acordo com a semântica de
cada um, dividindo-se em tempo, lugar, modo, negação, afirmação, dúvida, quantidade e
ordem, e expressam circunstâncias definidas ou noções de grau (aumento ou diminuição).
Como se pode notar, as gramáticas históricas tratam bastante superficialmente o tema
em questão. Seus autores não conseguiram definir de maneira mais eficiente o advérbio e nem
observaram mais atentamente outras características que esses elementos apresentariam.
3 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS
Esta tese de doutorado baseia-se em princípios funcionalistas, partindo, portanto, de
que a gramática das línguas se constrói a partir do discurso, ou seja, do uso real, concreto da
língua.
Este capítulo consiste em expor alguns pressupostos da linha funcionalista que foram
importantes para minha análise, sobretudo aqueles relacionados à gramaticalização, à
polissemia, ao conhecimento da relação entre gramaticalização e grau de encaixamento entre
cláusulas, e entre gramaticalização e ordenação. Também apresento uma pesquisa sobre a
ordenação de adverbiais (Votre & Santos, 1984), um estudo sobre a natureza da estrutura da
linguagem humana e sua categorização, assim como a classificação semântica de verbos
proposta por Halliday, 1994.
3.1 Os princípios funcionalistas
A teoria funcionalista concebe a linguagem como um instrumento de interação social e
analisa a estrutura gramatical no seu contexto discursivo a fim de investigar as motivações
para explicá-la, compreendendo que as diferentes formas que um elemento incorpora no
discurso não são meramente estilísticas, mas influenciadas por funções informacionais e
pragmáticas. Por conseguinte, uma relação entre forma e função, conforme o Princípio da
Iconicidade, que é definido como a correlação entre o código lingüístico (forma) e o seu
conteúdo (função).
A corrente funcionalista vem estudando com muita profundidade o processo da
Gramaticalização ocorre quando certas construções lingüísticas sofrem transformações ao
longo do tempo, assumindo outras funções mais gramaticais e tornando-se mais fixos e
regulares no discurso. Essa mudança se dá unidirecionalmente: do discurso para a gramática e
não vice-versa. Várias trajetórias foram traçadas para ilustrar esse caráter unidirecional:
vocábulo>morfema, verbo pleno>verbo auxiliar, advérbio>conectivo, dentre outras. Por
exemplo, o vocábulo mente passou a desempenhar a função de um morfema gramatical, ou
seja, passou a ser um sufixo, formador de advérbio, como a locução em boa hora que se
tornou a conjunção concessiva embora: em boa hora>embora. O foco do nosso trabalho não é
a gramaticalização do substantivo em -mente para sufixo, uma vez que no português arcaico
essa gramaticalização já estava consolidada.
Outra pesquisa que relaciona os termos da oração e a posição do advérbio é a de
Votre & Santos (1984), que trata da investigação de fatores sintáticos, semânticos e
discursivos que influenciam a colocação dos constituintes de natureza adverbial na sentença.
O corpus examinado é formado por redações e entrevistas de alunos da 8ª série.
Os autores partem da seguinte hipótese geral a qual também é à base da nossa
pesquisa:
Os advérbios são constituintes móveis, embora com
tendências bem definidas por determinadas posições
sintáticas. (...) a posição ocupada por cada advérbio é
função da atuação conjunta de diferentes fatores
estruturais e não-estruturais, que cabe identificar e
avaliar(1984:83).
Votre & Santos analisaram 4 posições dos adverbiais, a saber: início da sentença
(posição 1); fim da sentença (posição 4); entre o sujeito e o verbo (posição 2); e entre o verbo
e o complemento (posição3), exemplificadas abaixo:
[Ontem], o ministro [ontem] seguiu [ontem] para Nova York [ontem].
1 2 3 4
Os fatores, a seguir, foram observados através de uma análise quantitativa: a) tipo
semântico do advérbio (tempo, lugar, modo, etc.); b) nível do vínculo semântico do advérbio
(com sentença ou com o verbo); c) tipo sintático do verbo (regência do verbo) ou tipo de
complemento (oracional, objeto direto, objeto indireto); d) constituição morfológica do
advérbio (advérbios oracionais, locucionais, nominais, etc.); e) peso do advérbio (breve ou
longo); e f) tipo do sujeito (oração sem sujeito, oração com sujeito vazio, etc.).
Apresentaremos algumas das hipóteses dos autores referentes a esses fatores:
1) Quanto mais vinculado semanticamente ao verbo, mais próximo desse o verbo estaria.
Todavia, o advérbio vinculado ao nível mais alto da sentença estaria mais livre, podendo se
movimentar para o início da sentença, por exemplo;
2) No que se refere ao tipo de vínculo do sujeito com o verbo. Quanto mais fraco for, mais
favorecerá a inserção de um advérbio entre o sujeito e o verbo. Assim, um verbo de ligação
enfraqueceria o vínculo entre sujeito e verbo, permitindo a colocação de advérbio no meio
deles;
3) No que concerne ao peso do advérbio, a expectativa era a de que os adverbiais breves
(menores) ocorressem nas posições internas e os longos (maiores) nas posições externas,
predominando na posição final;
4) A última hipótese refere-se ao tipo de sujeito. Esperava-se que em orações sem sujeito ou
com sujeito vazio, o adverbial tendesse a ocupar a posição inicial, típica do sujeito. Teríamos
assim uma espécie de arranjo de balanceamento (Votre & Santos op. Cit.,. p. 85).
Os resultados mais relevantes desse estudo são arrolados a seguir: para a colocação do
advérbio nominal na posição 1, contribuíram os fatores referentes ao nível do vínculo
semântico do advérbio (advérbio vinculado à sentença), ao tipo semântico de advérbio
(advérbio de tempo e de opinião) e ao tipo de complemento do verbo (complemento
oracional).
A colocação do advérbio na posição 2, entre o sujeito e o verbo, foi motivada pelo
nível de vínculo semântico do advérbio (advérbio vinculado ao verbo) e pelo tipo semântico
de advérbio (advérbio de tempo e freqüência).
A ordenação do advérbio nominal na posição 3, entre verbo e complemento, deve-se
ao nível do vínculo semântico do advérbio (advérbio vinculado ao verbo), ao tipo semântico
de advérbio (advérbio de intensidade) e ao tipo de complemento (objeto indireto).
Por fim, a colocação do advérbio nominal na posição 4 da sentença foi influenciada
pelo nível do vínculo semântico do advérbio (advérbio vinculado ao verbo), pelo tipo
semântico de advérbio (advérbio de modo e de lugar) e pelo tipo de complemento (não
complemento).
Pretendemos, assim como Votre & Santos, identificar fatores que motivem a
colocação dos advérbios de tempo e aspecto em -mente na cláusula. Dentre eles,
identificaremos a estrutura sintática da oração para verificar se a posição vazia de um
argumento (sujeito ou complemento) tende a ser preenchida com o advérbio.
3.2 Gramaticalização e Níveis de Encaixamento entre Cláusulas
Segundo Hopper & Traugott (2003), os períodos compostos fundamentam-se em um
conjunto de estruturas com diferentes níveis de encaixamento, que vão das menos
gramaticalizadas (menos encaixadas) às mais gramaticalizadas (mais encaixadas):
a) Estruturas Paratáticas possuem independência relativa, ou seja, restrita apenas
pela pragmática (fazer sentido e ser relevante). São as cláusulas justapostas, as principais e as
coordenadas.
b) Estruturas Hipotáticas ou Interdependentes são aquelas em que um núcleo e
uma ou mais cláusulas que são relativamente dependentes (não se incluem em nenhum
constituinte do núcleo, mas não podem ficar “soltas”). São as subordinadas adverbiais e as
adjetivas explicativas.
c) Estruturas Subordinadas ou Encaixadas são as que possuem uma margem
completamente incluída no núcleo e que, portanto, têm dependência completa. São as
subordinadas substantivas e as adjetivas restritivas.
Essas estruturas podem ser representadas através de uma trajetória de
gramaticalização: parataxe hipotaxe subordinação.
De acordo com essa trajetória, as cláusulas paratáticas são menos gramaticalizadas,
isto é, revelam menor grau de dependência semântica e encaixamento que as hipotáticas (que
exibem maior grau de dependência e nível intermediário de encaixamento), que, por sua vez,
são menos gramaticalizadas que as subordinadas (que apresentam maior grau de dependência
e de encaixamento). Segundo Givón (1990), a redução da cláusula subordinada à cláusula
reduzida revela níveis ainda maiores de encaixamento entre cláusula principal e subordinada,
além de exprimir concretamente um dos subprincípios relacionados ao conceito de
iconicidade: o da proximidade. Esse subprincípio trata da relação de correspondência entre
sintaxe e semântica. Na complementação verbal, isso implica dizer que o nível de integração
sintática entre as cláusulas não é arbitrário e sim um reflexo do nível de integração semântica
entre o evento da principal e o da subordinada, ou seja, quanto mais integrados esses eventos
no plano semântico, mais integradas estarão as estruturas que os expressam.
Givón concluiu que, quanto mais encaixada uma oração, mais gramaticalizada ela é.
Estendendo a conclusão do autor, depreendemos que o grau de gramaticalização da cláusula
em que os advérbios em -mente aparecem interfere na colocação desses advérbios, conforme
procuraremos atestar nessa pesquisa.
3.3 Gramaticalização e estrutura sintática
De acordo com Givón (1979), a maior liberdade e variedade de elementos significativos
tendem a ocorrer na cláusula principal, declarativa, afirmativa, ativa. Mas, por outro lado,
tanto no que se refere a itens lexicais quanto a construções sintáticas, a distribuição dos
elementos significativos, em todos os outros tipos de cláusula, é sempre mais restrita.
Isso acontece devido ao uso do fenômeno da pressuposição discursiva, ou seja, o grau
de pressuposicionalidade no qual uma sentença é usada, que, por sua vez, está relacionado ao
nível de dificuldade que o falante considera como obstáculo para o ouvinte em determinar
uma única referência no discurso. E, segundo Givón (1979), a cláusula principal, declarativa,
afirmativa, ativa apresenta a complexidade pressuposicional mais baixa no discurso, se
comparada a todos as outras variantes sintáticas.
Givón (1979) nos mostra várias propriedades formais dessas variantes sintáticas, em
relação ao seu grau de pressuposicionalidade, a saber:
1- Variantes mais pressuposicionais exibem maior complexidade sintática.
2- Variantes mais pressuposicionais apresentam maiores restrições distribucionais do
que os padrões neutros.
3- Variantes mais pressuposicionais são gramaticalizadas mais tarde por crianças, ou
pelo menos sua sintaxe é adquirida mais tarde do que as variantes menos
pressuposicionais.
4- Variantes mais pressuposicionais freqüentemente tendem a exibir grande
conservadorismo sintático, mais comumente na área da mudança de ordenação.
5- A cláusula principal declarativa, afirmativa, ativa, neutra e menos pressuposicional
e também a mais freqüente no discurso.
Das propriedades propostas, as que podemos considerar na nossa pesquisa são os itens
1, 2 e 4, que se propõe aqui que as cláusulas gramaticalizadas, e, portanto, mais restritas
distribucionalmente e mais complexas sintaticamente, tendem a ser mais conservadoras.
3.4 As pressuposições discursivas das construções sintáticas
O sentido de pressuposição está sendo compreendido aqui como um conjunto de
informações que estão fora da sentença e que são assumidas pelo falante como evidentes ou
indiscutíveis, ou seja, aquilo que é pressuposto tende a refletir conhecimentos compartilhados,
crenças comuns ou conhecimento presumido como conhecido.
Neste trabalho, não adotamos a distinção entre pressuposição gica e pressuposição
pragmática, que parte do princípio de que todo fenômeno pressuposicional nas línguas
naturais é pragmático. Assim, segundo Givón (1979), o fenômeno da pressuposição,
relaciona-se com: as hipóteses que o falante assume acerca da habilidade do ouvinte de
identificar unificadamente (‘estabelecer uma única referência para’) um argumento-
referente.” (p. 50)
Diante disso, Givón (1979) mostra as variantes sintáticas que se caracterizam por maior
grau de pressuposicionalidade:
a) Construções estritamente pressuposicionais. Cláusulas relativas, clivadas, pseudo-clivadas
e perguntas QU.
b) Cláusulas encaixadas.
c) Outros atos de fala. Imperativo, interrogativo e negativo.
d) Construções envolvendo graus de definitude-topicalidade dos argumentos.
e) Mudança de tópico, passiva, pronomes anafóricos e outros.
Segundo Givón, essas construções apresentam ordenação mais conservadora dos
elementos argumentais. Mas podemos estender esse pensamento para as características de
ordenação de elementos adverbiais. De fato, como foi mencionado, o nível de
encaixamento ou gramaticalização da cláusula tem influência sobre as tendências de
ordenação de advérbios de tempo e aspecto em -mente.
A fase arcaica do português é caracterizada por uma variação na colocação dos
advérbios, ou seja, apresenta advérbios em -mente nas posições pré e pós-verbais em todos os
tipos de cláusulas, apresentando uma pequena predominância de anteposição nas cláusulas
mais gramaticalizadas. A partir disso, podemos depreender que esses parâmetros de
pressuposicionalidade podem nos auxiliar na descrição de mudanças no comportamento
diacrônico desses elementos em relação a sua ordenação.
3.5 Classificações dos verbos, baseada em Halliday (1994)
O tipo semântico do verbo é um dos fatores considerados neste trabalho para entender
a posição dos advérbios de tempo e de aspecto em -mente, pois trabalhos anteriores, como
Scheibman (2001), Bybee (2003) e Andrade (2005), detectaram que era necessário investigar
se o tipo de verbo poderia influenciar na cláusula de alguma forma no caso de Scheibman
(2001), o tipo de verbo foi usado para se perceber a subjetividade nas relações entre o sujeito
e o verbo; no de Bybee (2003), foi utilizado para perceber a influência na gramaticalização do
verbo can do inglês, e, por fim, no caso de Andrade (2005), o tipo de verbo foi utilizado para
detectar a ordenação de locuções adverbiais temporais.
Sendo assim, consideramos esse fator importante para tentar definir uma motivação
semântica da posição dos advérbios de tempo e de aspecto em -mente. Para isso, utilizamos a
classificação de Halliday (1994), também utilizada em Scheibman (2001) e Andrade (2005).
Nossa hipótese é que determinado verbo acompanhado do advérbio temporal, com a
repetição de uso, possa fixar os advérbios de tempo e de aspecto em -mente numa dada
posição, conforme Bybee (2003). Essa autora conhece a importância da repetição,
caracterizando-a como um processo pelo qual seqüências de palavras ou morfemas
freqüentemente usados tornam-se automáticos como uma única unidade de processamento.
Acreditamos também que determinado tipo semântico do advérbio ocorra com um
determinado tipo semântico do verbo.
Embora haja rias classificações de verbos, trabalharemos com a classificação de
Halliday (1994), por ser um lingüista funcionalista. Segundo esse autor, a oração também
desempenha o papel de modelar a experiência, isto é, representa padrões da experiência. Os
seres humanos, através da linguagem, constroem um quadro mental da realidade e este é
criada por processos.
A oração é um modo de ação, um modo de dar e receber bens e serviços como também
informações. Ela é um modo de reflexão, um modo de impor ordem na variação e no fluxo do
sistema gramatical de transitividade. Esse sistema constrói o mundo a partir da experiência
por meio de conjunto de tipos de processos que estão relacionados à nossa experiência
exterior (ligada ao mundo que nos cerca, como eventos, ações etc.) e à nossa experiência
interior (ligada à consciência, à imaginação, como reflexão, etc.( Halliday,1994:106).
De acordo com o autor, o modelo proposto de representação de experiência,
interpretado no sistema gramatical de transitividade, é um contínuo circular.
Ele afirma que um processo é constituído de três componentes para a interpretação da
nossa experiência do que acontece: a) o próprio processo; b) os participantes no processo; e c)
circunstâncias associadas com o processo (são opcionais).
Esses três conceitos são categorias semânticas que explicam como fenômenos do
mundo real são representados em figuras lingüísticas.
O autor discorre sobre os principais processos no sistema de transitividade da língua
inglesa:
Os processos materiais (processes of doing) estão relacionados ao mundo físico, à
experiência exterior. São processos ‘do fazerque expressam a noção de que uma entidade
‘faz’ alguma coisa que pode ser feita ‘para’ outra entidade. Portanto, esse processo tem um
ator obrigatório e um alvo (goal) opcional. Para Halliday, o termo ator refere-se àquele que
realiza o efeito, já o termo alvo refere-se a alguém para o qual o processo é estendido.
Vejamos um exemplo: The lion[ator] caught[processo] the tourist [alvo] ( O leão pegou o
turista.);
Os processos mentais (processes of sensing) referem-se ao mundo da consciência, à
experiência interior. Para conhecer esses processos, o autor abandona a noção semântica de
ator e alvo (goal) e agrupa as orações que expressam sentimentos (affection), pensamentos
(cognition) e percepção (perceptin) nesse tipo de processo.
O autor acrescenta que os participantes envolvidos nos processos mentais que são
experenciados (senser) a um fenômeno (phenomenon). O primeiro é o ser consciente que
sente, pensa e percebe, o segundo é aquilo que é sentido, pensado ou percebido. Desse
modo, um dos participantes é dotado de consciência, o outro pode ser uma ‘coisa’ ou um fato
(entendido como um metafenômeno, isto é, alguma coisa que é construída como um
participante por projeção).
Obtivemos: Mary [experenciadora dotado de consciência] liked [processo] the gift
[fenômeno/coisa] (Maria gostou do presente). Ou Mary [experenciador dotado de
consciência] was pleased [processo] that she’d got a present [fenômeno/fato] (Maria estava
contente que ganhou um presente);
Os processos relacionais (processes of being) estão ligados ao mundo das abstrações.
Relacionam fragmentos da experiência, classificando-os e identificando-os. Esses processos
estabelecem uma relação entre duas entidades separadas. Uma entidade ‘a’ pode atribuir algo
a uma entidade ‘x’ ou pode identificar uma entidade ‘x’. Sendo assim, subdividem-se em:
Relacionais Intensivos: associados ao mundo das abstrações estabelecem uma relação entre
duas entidades separadas, atribuindo alguma característica a elas; Relacionais Possessivos:
associados ao mundo das abstrações estabelecem uma relação entre duas entidades separadas,
identificando-as ou atribuindo posse de algo ou alguma coisa a elas, e Relacionais
Circunstanciais: associados ao mundo das abstrações estabelecem uma relação entre duas
entidades separadas, identificando-as ou atribuindo alguma circunstância a elas.
O sistema do inglês opera com três tipos principais de construções: a) intensiva
(equativa): ‘x is a ‘ (x é/está a). Ex.: Sarah is wise. (Sara é sábia); b) circunstancial: ‘x is at a’
(em que ‘is at’ pode ser ‘is at, in, on, for, with, about, along, etc.’). c) possessive: (x está em a
). Ex.: Peter has a piano. (Pedro tem um piano)
Na fronteira desses principais processos, outros processos que compartilham
algumas das características daqueles, como:
Os processos comportamentais manifestam os processos de consciência e os estados
fisiológicos. Esses processos são tipicamente de natureza humana, uma vez que se constituem
por comportamentos psicológicos e fisiológicos como respirar, tossir, sorrir, sonhar dentre
outros. Suas características não são claramente definidas, que estão na fronteira entre os
processos materiais e mentais. Um participante é tipicamente um ser consciente, denominado
Behaver. Vejamos o exemplo: No-one[Behaver] is listening [processo]. (Ninguém está
ouvindo);
Os processos verbais expressam relações simbólicas, construídas na consciência
humana, através da linguagem. São processos de ‘dizer’, como em “- O que você disse? -Eu
disse que está barulhento aqui.” No entanto, ‘dizer’ aqui, é interpretado em um sentido amplo,
expressando qualquer tipo de troca simbólica de significado. O participante, nesses processos,
não precisa ser consciente. Esse é denominado Sayer(aquele/aquilo que diz). Eis alguns
exemplos: the notice ( sayer) tells you to keep quiet e my watch (sayer) says it’s half past
ten.(O aviso diz para ficarmos em silêncio e meu relógio diz que são dez e meia,
respectivamente).
Há outras funções de participantes além da do ‘sayer’: ‘Receiver’ (aquele para o qual a
fala é direcionada), Verbiage (o que é dito), Target (a entidade que é objetivada pelo
processo de ‘dizer’). Observemos: She [sayer] praised [processo] him [target] to her friends
[receiver] (Ela elogiou para os amigos dela) ou I [sayer] ordered [processo] a steak
[verbiage] (Eu pedí um bife);
Os processos existenciais detonam a existência, o acontecer. Representam que
alguma coisa existe ou acontece. O elemento que é dito existir é chamado de Existent’. A
princípio, pode existir qualquer tipo de fenômeno que possa ser construído como alguma
‘coisa’: pessoa, objeto, instituição, abstração. Também pode existir uma ação ou um evento.
Freqüentemente, uma oração existencial contém um elemento circunstancial distinto de tempo
ou lugar. Analisemos: There is [processo] a man [existente] at the door [circunstância] (Há
um homem na porta).
O lingüista ainda menciona mais um tipo de processo: os processos meteorológicos
que se encontram na fronteira entre os processos existenciais e materiais. Alguns são
construídos como processos materiais: The wind’s blowing ( o vento está soprando); alguns
como processos existenciais: There was a storm (houve uma tempestade); alguns como
relacionais: it’s cold ( está frio); e alguns sem participantes, constituindo-se apenas pelo
processo: it’s raining ( está chovendo).
Usamos essa classificação na análise dos verbos presentes nas cláusulas com
advérbios de tempo e aspecto em -mente, considerando o tipo semântico do verbo como um
fator possível de motivar a ordem desses advérbios. Esse fator se mostrou relevante na
pesquisa de Andrade (2005) e na de Albani (2007) com relação ao uso de locuções temporais
e aspectuais e do uso do advérbio sempre, respectivamente.
4 METODOLOGIA
A corrente funcionalista prima por uma análise do uso da língua, portanto, torna-se
necessário o estudo de dados reais, isto é, dados (da língua oral ou escrita) produzidos pelos
usuários da língua em contexto de comunicação.
Como mencionado, o presente estudo objetiva-se à análise da ordenação dos
advérbios de tempo e aspecto terminados em -mente sob a perspectiva funcionalista na
modalidade escrita.
Este trabalho, por um lado, utiliza metodologia quantitativa na análise dos advérbios
de tempo e de aspecto em -mente que apresentam diferentes possibilidades de colocação na
frase, mas são aparentemente estáveis no que se refere a seu status semântico. Por outro lado,
também se realizou a uma análise qualitativa que visa observar algumas mudanças semânticas
e, em alguns casos, também sintática, percorrida por certos usos adverbiais.
A pesquisa seguiu as seguintes etapas: levantamento das ocorrências de advérbios em -
mente com algum traço de sentido de tempo e/ou aspecto, nos textos selecionados de
diferentes épocas; classificação dos advérbios, levando-se em consideração o contexto de
cada ocorrência, sua função, posição, etc. (de acordo com os critérios arrolados abaixo);
análise quantitativa e qualitativa das ocorrências dos advérbios de tempo e aspecto; paralelo
entre os resultados das diferentes sincronias; conclusões. O confronto dos dados de diferentes
estágios da língua favoreceu uma visão mais ampla e, conseqüentemente, uma análise mais
abrangente dos possíveis processos de mudança.
Para se observar em diferentes possibilidades de ordenação dos advérbios de tempo e
de aspecto em -mente, foram levados em consideração alguns fatores na classificação e análise
desses elementos, a saber: a ordem, a noção semântica expressa pelo advérbio (aspectual,
cronológico e híbrido); grau de gramaticalização da cláusula em que os advérbios de tempo e
aspecto em -mente se inserem (se mais ou menos gramaticalizada); e tipos de verbos a que
esses se associam, segundo Halliday (1994) e outros, que serão explicitados mais a frente.
4.1 Corpus
Em conformidade com os pressupostos teóricos da teoria funcionalista, os dados
utilizados para a análise da ordenação dos advérbios de tempo e aspecto terminados em -
mente foram extraídos de textos de diferentes gêneros textuais do português arcaico, dos
séculos XVI, XVII, XVIII, XIX e do português atual.
Os materiais constituintes da amostra e os procedimentos teórico-metodológicos
realizados, assim como o controle dos aspectos e fatores que influenciam na ordenação dos
advérbios em -mente, são apresentados e discutidos ao longo desse trabalho.
É importante ressaltar a complexidade que envolve a tarefa de se selecionar textos,
considerando-se um recorte histórico tão amplo. A complexidade dá-se, por um lado, pelo
fato de que esses textos precisam partilhar, ainda que minimamente, características que
permitam que sejam estabelecidas comparações entre os resultados dos dados neles
levantados, sem que haja distorções; por outro lado, pelo leque tão reduzido de opções de
textos de fontes confiáveis, que diminui as possibilidades de escolha.
Sendo assim, como não foi possível analisar exatamente os mesmos tipos de textos em
todas as épocas, foi seguido um roteiro, juntando diferentes tipos textuais, mas mantendo uma
certa coerência na sua distribuição pelos diferentes momentos sincrônicos analisados.
Chegou-se, então, aos seguintes corpora:
a) português arcaico: Testamento de Dom Afonso II; O Orto do Esposo (OE), de Maller
(1956) e Castelo Perigoso(todos esses textos estão disponíveis no site do corpus
informatizado do Português medieval(http://cipm.fcsh.unl.pt/gencontent.jsp?id=4). Esse
corpus (CIPM) foi criado em 1993 e inclui textos latino-romances do século IX ao século XII
e textos portugueses do século XII ao século XVI.
b) português do século XVI: Crônica dos Reis de Bisnaga; Cartas de D.João: são 372 cartas
de D. João III, rei de Portugal, do período entre 13 de outubro de 1523 e 20 de fevereiro de
1557, que também foram extraídas do site do corpus informatizado do Português medieval
(http://cipm.fcsh.unl.pt/gencontent.jsp?id=4).
c) português do século XVII: foram oito sermões do Padre Antônio Vieira:
1
o
sermão: Sermão da terceira quarta-feira da quaresma na Capela Real, 1669 (Assunto: um
remédio para os males de todas as cortes do mundo: a consolação dos mal despachados,
baseando-se no pedido indeferido da mãe dos Zebedeus);
2
o
sermão: Sermão da Sexagésima. Pregado na capela Real. Este sermão pregou o Autor no
ano de 1655, vindo da Missão do Maranhão, onde achou as dificuldades que nele se apontam,
as quais vencidas, com novas ordens reais voltaram logo para a mesma Missão.
3
o
sermão: Sermão de quarta-feira de cinza. Em Roma, na Igreja de S. Antônio dos
Portugueses.Ano de 1670.
4
o
sermão: Sermão do Santíssimo Sacramento. Exposto na lgreja de S. Lourenço, In:
Damaso, nos dias do Carnaval Em Roma. Ano de 1674. Traduzido do italiano.
5
o
sermão: Sermão do Nascimento da Virgem Maria. Debaixo da invocação de N. Senhora da
Luz, título da Igreja e colégio da Companhia de Jesus, na cidade de S. Luís do Maranhão. Ano
de 1657.
6
o
sermão: Sermão de S. Inácio, fundador da Companhia de Jesus, em Lisboa, no Real
Colégio de S. Antão, 1669.
7
o
sermão: Sermão do terceiro domingo da quaresma, na Capela Real, 1655.
8
o
sermão: Sermão da quinta-feira quaresma na misericórdia de Lisboa. ANi nF, 1 669
d) português do século XVIII:
Cartas comerciais da administração pública, representações oficiais do Rio de Janeiro, obtidas
no corpus do Museu da Língua Portuguesa - Estação da Luz. Foram analisadas 13 Cartas.
BARBOSA, Afranio & LOPES, Célia Regina et al. Corpus diacrônico do Rio de Janeiro:
cartas pessoais séculos XVIII-XIX. Rio de Janeiro, UFRJ/PIBIC-CNPq/ Labor-Histórico,
2003 (versão eletrônica
)
e) português do século XIX:
Cartas comerciais da administração pública, representações oficiais do Rio de Janeiro, obtidas
no corpus do Museu da Língua Portuguesa - Estação da Luz. Foram analisadas 12 cartas.
BARBOSA, Afranio & LOPES, Célia Regina et al. Corpus diacrônico do Rio de Janeiro:
cartas pessoais séculos XVIII-XIX. Rio de Janeiro, UFRJ/PIBIC-CNPq/ Labor-Histórico,
2003 (versão eletrônica)
f) português atual:
- Tocar o Senhor, Pe. Leo (TS).
-A essência do cristianismo, de J. Berkeley (EC).
4.2 Descrições dos fatores da análise dos advérbios de tempo e aspecto em –mente
Classificamos os dados a partir de alguns fatores que nos pareceram relevantes ao estudo
dos advérbios de tempo e aspecto em -mente. Utilizamos o modo de coleta e codificação da
sociolingüística variacionista (apesar de não estarmos trabalhando com um fenômeno de
variação propriamente dito).
Todos os dados são analisados a partir de fatores, que assim se configuram:
1. Posição/Ordem do advérbio em relação ao verbo
Verificamos a posição do advérbio de tempo e aspecto, se ocorre antes ou depois do
verbo, independentemente da presença ou ausência de algum elemento interveniente como o
sujeito, ou um outro advérbio, uma expressão, uma oração subordinada, etc.
Inicialmente, estabeleceram-se duas posições gerais nas quais os advérbios de tempo e de
aspecto em -mente poderiam ocorrer:
- Antes do verbo:
(1) que Deus constatemente nos fala (Português atual, TS,p.15)
- Depois do verbo:
(2) abramos os corações à luz , para que more perpetuamente neles(Século XVII, Sermão de
Santo Inácio, Pe A.Vieira)
Dessas ordenações gerais, desmembraram-se subposições, vejamos no quadro abaixo:
Quadro 2- Subposições do Advérbios em -mente
Posições Exemplos:
POSIÇÃO 1 (POS1): (ME) margem
esquerda da oração (tudo que estiver no
início de oração ou depois de conjunção).
(3) Constantemente Jesus vem curar-nos
(Português atual, TS, p.28)
POSIÇÂO 2(POS2): entre o sujeito e o
verbo. (o sujeito pode ser SN, pronome ou
pronome relativo)
(4) que Symão Fernandez novamente fez
(séc.XIV, Carta número 147)
POSIÇÂO 3(POS3): não inserido entre o
sujeito e o verbo, mas fora da margem
esquerda da cláusula.
(5) Agora novamente tem sucedido nas
minas hum levantamento que La fizeram
os povos. (século XVIII, Cartas oficiais).
POSIÇÂO 4(POS4): entre o verbo auxiliar
e o verbo principal.
(6) Precisamos urgentemente encontrar
nosso lugar de oração (Português atual,
TS, p.113)
POSIÇÃO 5(POS5): margem direita da
oração (no final da oração).
(7) Cristo continua do lado de fora de
nosso coração, batendo incessantemente
(Português atual, TS, p.39)
POSIÇÃO 6(POS6): inserido entre o
verbo e o complemento/predicativo.
(8) No entanto, ao oferecer
espontaneamente à igreja o produto da
venda (Português atual, TS, p.97)
POSIÇÃO7(POS7): entre o verbo e o
sujeito.
(9) chegou subitamente h~u~u home(m)
nõ conhecido ~ecima dh~u~u Cavallo e
~entrou pello paaço(Português arcaico
OE, 353)
POSIÇÃO 8(POS8): Não inserido entre o
verbo e o sujeito, ou entre o verbo e o
complemento/predicativo, mas fora da
margem direita(ou, seja, no final da
cláusula)
(10) deixamos boas coisas para trás muito
freqüentemente em nome da
independência (Português atual, EC, p.31)
2) Tempo/sincronias: português arcaico, dos séculos XVI, XVII, XVIII, XIX e português
Atual (cf. na seção anterior a lista de textos que serviram como corpora)
3) A noção semântica expressa pelo advérbio: Em relação às características semânticas que
cada advérbio pode expressar, classificamos em: a) advérbios que expressam tempo real
cronológico: são aqueles que expressam tempo cronológico, como por exemplo, os advérbios
atualmente e ultimamente; b) advérbios que expressam tempo aspectual: são os que se
referem à repetição de algum evento, ou à freqüência com que eventos ocorrem. Sabemos que
é bastante complexo delinearmos os limites entre tempo real e tempo aspectual, mas
decidimos que é possível fazer essa diferenciação, pelo menos até o ponto que nos foi exigido
pela análise. No presente estudo, foi claro observar e definir esses advérbios denominados de
tempo real devido a suas características dêiticas. Portanto, os advérbios cronológicos fazem
referência ao momento da enunciação. Enquanto, os advérbios de tempo aspectual são os que
se referem à repetição de algum evento, ou à freqüência com que os eventos ocorrem como o
advérbio freqüentemente; c) advérbios que são híbridos: são os usos polissêmicos, ou seja,
aqueles que expressão além das noções de tempo e de aspecto, expressam também a noção de
modo (tempo+aspecto/aspecto+modo), isto é, são os advérbios que expressam de alguma
forma duas características, com predominância de uma ou outra, por exemplo, tempo e modo,
como o advérbio rapidamente.
4) O tipo semântico de verbo que compõe a cláusula, segundo Halliday (1994), a saber:
material, mental, comportamental, relacional possessivo, relacional intensivo, atividade verbal
e meteorológico. (cf. seção 3.5).
5) Tipo formal de sujeito - verificamos em cada oração coletada se o sujeito estava (a)
formalmente presente antes do verbo, (b) formalmente presente depois do verbo, (c) presente
na forma de um pronome relativo ou (d) ausente (incluindo neste caso o tradicional sujeito
oculto e a oração sem sujeito).
6) Tipo de oração - observarmos em que tipo de oração, o advérbio de tempo e de aspecto
está inserido, se a oração é (a) paratática, (b) subordinada (substantiva ou adjetiva restritiva),
(c) hipotática (adverbial ou adjetiva explicativa), (d) oração principal ou (e) oração absoluta.
Cruzamos alguns desses fatores entre si para verificarmos os padrões de uso dos
advérbios e para vermos o uso dos mesmos em cada sincronia da língua.
5 ANÁLISES DOS DADOS
Neste capítulo, apresentamos uma análise dos advérbios de tempo e de aspecto
terminados em mente usados em textos escritos em norma culta do português, mais
precisamente em textos do português arcaico, dos séculos XVI, XVII, XVIII, XIX e do
português atual.
Analisamos aqui os resultados encontrados através da codificação dos fatores
controlados, como foi dito: posição do advérbio, noção semântica do advérbio, tipo de
verbo, tipo de sujeito, sincronias e tipo de oração. Destacamos a importância destes para
comprovar a hipótese de que fatores que influenciam o posicionamento dessa categoria em
relação ao verbo e a de que deve ter havido mudanças na ordenação desse advérbio nas
sincronias estudadas.
A seguir, explicitamos a análise dos grupos de fatores pertinentes ao estudo do
fenômeno em questão.
5.1 Análises de fatores
Começamos nossa análise pela apresentação das ordens estabelecidas (cf. capítulo 4),
fator de maior importância para verificarmos a posição prototípica dos advérbios em –mente
em cada sincronia.
5.1.1 Ordem do advérbio de tempo e aspecto em -mente
Inicialmente, a análise consistiu na verificação da posição de cada advérbio na
sentença. Porém, para uma melhor compreensão dos dados, foram estabelecidas duas posições
gerais:
Antes do Verbo
(01) Por uso antigamente havia um conselho chamado dos massarotes (Século XVII,
Sermão do Pe.A. Vieira)
Depois do Verbo
(02) Abramos os corações à luz, para que more perpetuamente neles Século XVII,
Sermão do Pe.A. Vieira)
Encontramos em todos os textos analisados (de todas as sincronias) um total de 180
dados com advérbios de tempo e aspecto em -mente. Estes estavam distribuídos de acordo
com o que pode ser visto na tabela a seguir:
Tabela 1- Distribuição dos advérbios em -mente quanto à ordem em relação ao verbo
Posição antes do
verbo
Posição depois do
verbo
Auxiliar-Adv-
Verbo
Total
Ocorrência % Ocorrência % N
o
de oco
rrência
%
82= 45,5% 88= 48,8% 10= 5,5 180=100%
Na tabela 1, verificamos que não houve diferença significativa, ao compararmos as
duas posições gerais: antes e depois do verbo. Sem levarmos em conta as sincronias, os dados
se distribuem homogeneamente entre as duas posições, como nos exemplos abaixo (os
exemplos 03 e 04, são de advérbios colocados em posição pós-verbal e os exemplos (05) e
(06) são de advérbios em posição pré-verbal). Houve apenas 5,5 % de dados com o advérbio
entre o auxiliar e o verbo (POS 4).
(03) Deu sinal o rei, mandou Moisés a Arão que lançasse a sua vara em terra, e converteu-se
sùbitamente em uma serpente viva e tão temerosa, como aquela de que o mesmo Moisés no
deserto se não dava por seguro (Século XVII, Sermão do Pe. A. Vieira)
(04) Entre estas duas portas se acha subitamente um homem no instante da morte, sem poder
tornar atrás, nem parar, nem fugir... (Século XVII, Sermão do Pe. A. Vieira)
(05) Em conseqüência desta minha lembrança, ordenei à Câmara desta Cidade que
immediatamente passasse a examinar o numero de Embarcaçoens, que tinhão sahido deste
Porto para essa Cidade (Século XVIII, administração Pública/Carta oficial)
(06) ...esta inCerteza menão fez admiração porser muito na= tural o erraremse todos
osCalculos quesefazem SobreCouzaz tão inCertaz. Como aNavegação, finalmente
chegarão Vossamercez muito bonz, que he oque mais estimo, eComamesma felicidade
principiarão asSuas marchaz por terra(Século XVIII, Administração Pública/Carta oficial)
A tabela abaixo apresenta, de um modo geral, o número das ocorrências dos advérbios
de tempo e aspecto em -mente pelas sincronias estudadas.
Tabela 2- Levantamento Geral dos dados dos corpora dos Advérbios de Tempo e de
Aspecto em -mente
Sincronias Total
Port. Arcaico 44
SÉC. XVI 18
SÉC.XVII 34
SÉC.XVIII 18
SÉC.XIX 21
Port. Atual 45
TOTAL
180
Eis alguns exemplos de cada uma das sincronias estudadas:
- Português arcaico:
(07) Quem de ssi meesmo busca paz em out(r)a part(e) ou pobreza ou desp(re)ço, nom a
achara´. Que quem mu(r)mura ou he trist(e) de ssua pobreza, e q(ue)m ha´ door no coraçom e
he descontent(e) e a despreza nom ha´ paz consigo. E po(r) que homem possa vi~ir a esta paz,
deve rroguar a D(eu)s conthinuadament(e), e amehu´de peenssar em sua grande pobreza e
humildade e maravilhossa sofrença. (Castelo Perigoso).
- Século XVI:
(08)
E
ste rey tem continuadamente cimcoenta mil home~es de solldo, em que entra~o seis
mill home~es de cavallo, que sa~o de sua goarda do paço, dos quoaes seis mil sa~o os
duzentos obrigados a cavalgar com elle, e tem mais vimte mill lamceiros e dargueiros, e tres
mil home~es (Século XVI –Crônica dos Reis de Bisnaga)
-Século XVII:
(09) Lêde o Testamento Velho, e achareis que Deus antigamente afogava exércitos, queimava
cidades, alagava mundos, despovoava paraísos. (Sermão do Pe.A. Vieira).
-Século XVIII:
(10) O Antigo Provedor da Fazenda; emque VossaSenhoria mefala, dizendo naõ desceria dos
Sertoens, desceo com efeito, eaqui se acha, segundo metem constado ha dozedias, mas
brevemente hirá para essa cidade, pois...(Século XVII, carta Comercial número 7)
- Século XIX:
(11) Pessolhe novamente de ver os vestidos | que estão na D. Brasilia, e faser | o possível por
m’os ...(Século XIX, Carta Comercial número 2)
- Português Atual
(12) Hoje não damos tanta importância àquilo que Deus constantemente nos fala (TS, p. 15)
5.1.2 Posição do advérbio
A seguir, podemos observar a distribuição dos advérbios analisados pelas posições
arroladas nas sincronias estudadas. Apenas para lembrar (cf. capítulo 4):
a) POS 1 – a posição da margem esquerda;
b) POS 2 – a posição entre o sujeito e o verbo.
c) POS 3 a posição não inserida entre o sujeito e o verbo, mas fora da margem esquerda
da cláusula;
d) POS 4 – a posição entre o verbo auxiliar e o verbo principal;
e) POS 5 – a posição a margem direita da oração (no final da oração);
f) POS 6 – a posição inserida entre o verbo e o complemento/predicativo;
g) POS 7 – a posição entre o verbo e o sujeito.
h) POS 8 – a posição não inserida entre o verbo e o sujeito, ou entre o verbo e o
complemento/predicativo, mas fora da margem direita.
Tabela 3 - Distribuição das posições dos advérbios de tempo e aspecto em –mente X
sincronias
Sincronias POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
ARCAICO 09 02 06 02 10 09 - 06 44
SÉC.XVI
10 02 - - 01 03 01 01 18
SÉC.XVII
18 02 02 - 02 04 01 05 34
S.XVIII. 11 01 - 01 01 02 - 02 18
SÉC.XIX
06 - - 03 04 05 - 03 21
Português
Atual
06 03 04 04 14 07 01 06 45
Total 60 10 12 10 32 30 03 23 180
% 33,3 5,5 6,6 5,5 17,7 16,7 1,6 12,7 100
Ao olharmos o total expresso na última linha da tabela, podemos constatar que a POS1
é mais recorrente. Isso evidencia que os advérbios de tempo e de aspecto em -mente,por
expressarem tais circunstâncias, preferem as posições periféricas da cláusula, sobretudo à
margem esquerda (POS1), e evitam posições mais internas à sentença, posições essas que
rompem com a estrutura padrão da cláusula. Shaer (2004), tratando especificamente da
ordenação dos circunstanciais temporais, relata que não é fácil determinar de forma precisa as
diferenças entre os temporais na margem esquerda ou na margem direita da sentença, ainda
que seja possível determinar distinções funcionais entre eles: a margem esquerda constitui um
ponto de ancoragem, um elo entre a parte do discurso em que se encontra o advérbio e um
ponto do discurso anteriormente mencionado, numa relação nitidamente anafórica, de
conexão discursiva. Tal fenômeno tende a não ocorrer com advérbios que ocupam a margem
direita da oração, associados a um escopo mais restrito, geralmente portador de informação
nova. Como podemos observar nos exemplos 13 e 14 abaixo:
(13) Antigamente convertia-se o mundo; hoje por que se não converte ninguém? Porque hoje
pregam-se palavras e pensamentos (Século XVII, sermão do Pe. A. Vieira).
(14) porque não perdeu o céu e a vista de Deus, mas vai arder no inferno eternamente.
(Século XVII, sermão do Pe. A. Vieira).
Podemos observar, também, através da tabela 3, que, no português arcaico, as posições
típicas são POS 5 (pós-verbal no fim margem direita), 6 (entre o verbo e o complemento) e 8
(pós-verbal fora do fim), mas os dados têm uma boa distribuição em todas as posições, exceto
na posição 7. Ou seja, no português arcaico havia uma ordenação mais livre, apesar das raras
ocorrências de algumas posições.
nas outras fases do português, entre o português do XVI e o português do século
XIX, o uso predominante é a posição 1 (margem esquerda). No século XVI, ainda outras
posições com uma distribuição razoável de dados, que são as posições 6 e 5. Depois, como
dissemos, é a posição marginal à esquerda a preferida pelos autores. Mas, no século XIX,
uma diferença importante: começa a aumentar o uso de uma posição pós-verbal, é a
posição 6. No português atual, verificamos novamente que há uma distribuição de dados em
todas as posições, mas há predomínio da posição 5, ou seja, uma posição pós-verbal.
Nossa análise permite dizer que, nos textos estudados, o advérbio em -mente passa de
um uso relativamente livre para um uso mais fixo na posição marginal à esquerda. Depois no
século XIX, começa a aumentar na posição pós-verbal e no português atual é usado
predominantemente na posição pós-verbal (mais especificamente na posição marginal à
direita, POS 6).
Albani (2007) verificou que a posição típica do advérbio sempre era pré-verbal no
português arcaico e pós-verbal no português contemporâneo. Todos os fatores estudados
indicam que, no português arcaico, a ordem era mais livre, enquanto no português atual a
ordem tende a ser mais fixa. Segundo ele, um forte indício de mudança na ordenação do
advérbio sempre em textos religiosos. Portanto, o autor encontrou um aumento da posição
pós-verbal ao comparar o português arcaico com o atual com relação ao uso de sempre. E o
mesmo constatamos no nosso estudo. Pesquisas futuras devem verificar os indícios de
mudança apontados aqui, comparando textos de diferentes tipos.
5.1.3 Noção semântica do advérbio
O fator noção semântica do advérbio foi investigado com a finalidade de se verificar
se relação entre o valor que o advérbio em -mente expressaria no contexto e a sua posição.
Os valores considerados (com base em Freitas e em Ilari) são:
(a) Cronológico – é aquele que expressa tempo real;
(b) Aspectual é aquele que expressa às noções: iterativo, reiterativo, freqüentativo e
outros;
(c) Híbrido – é aquele que expressa às noções tempo/aspecto + modo.
A categoria noção semântica é de grande relevância para este estudo, pois este é o
momento em que a caracterização semântica do advérbio estudado que poderá ser observada
em uma análise não quantitativa, mas qualitativamente.
Denominamos os advérbios aspectuais aqueles que indicam a freqüência com que os
eventos não-específicos ocorrem ao longo do tempo. Esse tipo de advérbio é eminentemente
aspectual, que interage com a categoria aspectual de iteratividade, como podemos observar
no exemplo abaixo:
(15)... e refletiu sobre aquilo que Deus continuamente nos fala.(Português atual, TS,p.15)
Neste exemplo (15), verificamos que o advérbio cronológico expressa tempo real, ou
seja, é aquele que faz referência ao passado, presente ou futuro, tendo como ponto de
referência o momento da enunciação. no exemplo (16), observamos que o advérbio
apresenta a noção dêitica, aponta para algum momento da enunciação.
(16) Atualmente as coisas estão como costumavam ser mil anos atrás. (Português atual, EC,
p.09)
o advérbio no exemplo (17), observamos que expressa à noção de iteratividade
(aqui também alocamos nos grupos dos advérbios aspectuais) referindo-se à repetição de
algum evento, ou à freqüência com que eventos ocorrem. Vejamos o exemplo:
(17) Para nos resgatar e nos libertar novamente (Português atual, EC, p.61)
De fato, é uma tarefa arriscada determinar os limites entre tempo real e tempo
aspectual, mas decidimos que é possível fazer essa diferenciação, pelo menos até o ponto que
foi exigido pela análise. No presente caso, foi claro observar e definir os itens denominados
de tempo real devido à suas características dêiticas.
Os advérbios que apresentam a noção semântica Híbrida ‘tempo mais modo’ (como,
por exemplo, rapidamente), ou ‘tempo mais aspecto’ (como, por exemplo, normalmente),
nada mais são do que aqueles advérbios que expressam de alguma forma as duas
características, com predominância de uma sobre a outra. O importante aqui é verificar se esta
polissemia influencia a posição do item em relação ao verbo.
Apresentamos aqui mais alguns exemplos para ilustrar o fator noção semânticos
expressa pelo advérbio:
1. Freqüentativo/iterativo- Aspectual:
(18)... repetidamente nós o rejeitamos...(Português atual, EC,p. 44)
2. Expressão de tempo real – cronológico:
(19) Por isso antigamente havia um conselho chamado dos massoretas (Século XVII, Sermão
do Pe. A. Vieira )
3. Tempo aspectual – Aspectual:
(20) para nos resgatar e nos libertar novamente ...(Português atual, EC,p.61)
4. Híbrido tempo/aspecto + modo:
(21) Deus está querendo ficar eternamente conosco. ...(Português atual, TS, p. 49)
Portanto, esse fator leva em consideração a noção semântica que os advérbios em -
mente podem assumir no contexto em que estão inseridos.
A análise dos dados, que se apresentarão a seguir, será feita separando os corpora de
cada sincronia estudada. As tabelas abaixo ilustram a distribuição dos advérbios de acordo
com a posição e noção semântica identificadas, a começar pelo uso dos advérbios no
português arcaico. Ao final da seção, faremos uma conclusão geral relativa a esse fator.
Tabela 4 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no
Português Arcaico
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTA
L
Cronol. 03 - - - 03 02 - 01 09
Aspectual 02 - - 01 - 01 - - 04
Híbrido 04 02 06 01 07 06 - 05 31
Total 09 02 06 02 10 09 - 06 44
% 20,5 4,5 13,6 4,5 22,7 20,5 - 13,6 100
Na tabela 4, em que checamos a ordenação do advérbio e a noção semântica expressa
por ele na cláusula, observamos a predominância da tendência pré-verbal, exceto os advérbios
com os sentidos híbridos que expressam em si mesmos os valores de tempo/aspecto e modo.
É exatamente o fato de apresentar esse valor polissêmico denominado de híbrido na presente
pesquisa que explica o desvio que este advérbio apresenta com relação à tendência da posição
pré-verbal.
Além disso, podemos apontar na tabela acima outras constatações no português
arcaico, como por exemplo, se observarmos os totais expressos na última linha da tabela,
verificamos que as posições 1, 5 e 6 são mais recorrentes do que as demais posições 3, 8, 2 e 4
respectivamente.
Outra questão a ser considerada nessa análise é que as noções cronológicas e aspectual
não são predominantes em relação às demais noções. Entretanto, identificamos que a noção
híbrida é mais freqüente, quanto à sua ordenação, eles ocorrem mais na posição 5(margem
direita da cláusula), que é uma posição pós-verbal.
Na dissertação de Freitas (2004), verificou-se que o tipo polissêmico (que
corresponderia à noção híbrida) ocorria mais na posição pós-verbal, diferindo dos demais
tipos semânticos (cronológico, aspectual e conectivo). A autora justifica que por essa noção
possuir características de um advérbio qualitativo (Ilari et al., 1990), esse advérbio irá tender a
ocupar a posição pós-verbal, uma vez que os advérbios qualitativos têm a predisposição de
ocorrer após o verbo. Já Moraes Pinto (2007:77), ao estudar o uso do advérbio qualitativo em
–mente, constatou que “esses elementos apresentam mudança em seus valores desde
português arcaico ao século XIX”. Ela conclui que, além do processo de gramaticalização
pelo qual passou esse advérbio, exercendo nova função, sua ordenação na cláusula também
sofreu mudanças de acordo com os textos diacrônicos. E, ainda, acrescenta que “a posição
pré-verbal, principalmente entre o sujeito e o verbo, ainda se mostrou disponível, embora em
menor escala, no século XIX”.
Vejamos a análise do mesmo fator nos dados do século XVI:
Tabela 5 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica
Século XVI
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
Cronol. 05 - - - - 01 - - 06
Aspectual 02 01 - - - - - - 03
Híbrido 03 01 - - 01 02 01 01 10
Total 10 02 - - 01 03 01 01 18
% 55,5 11,1 - - 5,5 16,7 5,5 5,5 100
Na análise dos dados desse fator no século XVI, encontramos na relação entre ordem e
noção semântica, maior incidência de dados na posição 1 (margem esquerda da cláusula). As
noções cronológicas e aspectual, principalmente, predominam nessa posição (1), o sentido
híbrido ocorre mais nas posições pós-verbais, como atestam os trabalhos de Freitas (2004) e
Moraes Pinto (2002) em referência a esse tipo de advérbio. Com relação ao século XVII,
temos os seguintes resultados:
Tabela 6 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica
Século XVII
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
Cronol. 10 02 02 - 01 03 - 03 21
Aspectual 01 - - - 01 - - - 02
Híbrido 07 - - - - 01 01 02 11
Total 18 02 02 - 02 04 01 05 34
% 52,9 5,9 5,9 - 5,9 11,8 2,9 14,7 100
No século XVII, observamos que as noções cronológicas e híbridas predominam na
posição 1 (margem esquerda da cláusula). O sentido aspectual é menos freqüente (com
somente 1 dado na posição 1(margem esquerda) e 1 dado na posição 5 (margem direita).
Além disso, verificamos que o tipo híbrido não foi mais recorrente nas posições pós-verbais,
como vimos no português arcaico e no século XVII, mais ainda assim, não foi uma diferença
marcante.
O baixo número de dados não nos permite fazer outras generalizações. O mesmo
acontece com as outras sincronias.
A seguir apresentamos os resultados da análise dos dados do século XVIII.
Tabela 7 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica
Século XVIII
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
Cronol. 03 - - 01 01 01 - 01 07
Aspectual 03 - - - - 01 - 01 05
Híbrido 05 01 - - - - - - 06
Total 11 01 - 01 01 02 - 02 18
É interessante observar que, no século XVIII, todas as noções apresentam-se
predominantemente na posição 1 (margem esquerda da cláusula, pré-verbal). E mesmo o
sentido híbrido é mais freqüente na posição pré-verbal.
Vejamos os resultados acerca da amostra do século XIX.
Tabela 8 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica
Século XIX
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
Cronol. 01 - - 01 - - - - 02
Aspectual 01 - - 02 02 03 - 01 09
Híbrido 04 - - - 02 02 - 02 10
Total 06 - - 03 04 05 - 03 21
% 28,6 - - 14,3 19 23,8 - 14,3 100
Sabe-se que, no século XIX, as transformações na ngua foram decisivas para a
caracterização do português moderno. Na análise dos dados desse século, verificamos que as
posições mais recorrentes são as pós-verbais. Em relação à noção semântica, observamos que
os sentidos aspectual e híbrido são mais incidentes do que o cronológico. Além disso,
identificamos que o sentido híbrido é mais recorrente nas posições pós-verbais, como foi
atestado em outros trabalhos sobre os advérbios já citados.
Tabela 9 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica
Português Atual
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
Cronol. 02 - - 01 05 02 - - 10
Aspectual 02 01 03 03 05 03 - 05 22
Híbrido 02 02 01 - 04 02 01 01 13
Total 06 03 04 04 14 07 01 06 45
% 13,3 6,7 8,9 8,9 31,1 15,6 2,2 13,3 100
Na tabela 9, verificamos uma distribuição entre a posição e a noção semântica do
advérbio de maneira mais homogênea entre os sentidos pelas posições arroladas. Observamos
também que as posições pós-verbais são mais freqüentes do que as posições pré-verbais. E
que o sentido aspectual é mais utilizado nos contextos examinados.
Como vimos, no português atual, predomínio da posição pós-verbal (mais
especificamente a posição marginal à direita). Apenas podemos concluir que, quando a noção
é basicamente aspectual, como em freqüentemente, o advérbio não tem posição predominante,
mas, quando apresenta noção dêitica (temporal) ou noção híbrida, como antigamente,
rapidamente, respectivamente, a posição típica é pós-verbal.
Notamos também que os sentidos do advérbio ligeiramente encontrados no português
arcaico desapareceram e um novo uso surgiu. Isso demonstra que houve uma mudança nos
valores desses elementos.
Assim, podemos apontar que os advérbios do presente estudo assumem valores que
podem ocorrer antes ou depois do verbo, dependendo do valor semântico que assumem. O
advérbio ligeiramente, por exemplo, pode se apresentar como advérbio de modo (com sentido
de “de maneira simples; com simplicidade”) em posição pós-verbal ou começa a ter um
sentido brido quando aparece em posição pré-verbal. Pode ser entendido tanto como “com
simplicidade; com humildade” quanto, por extensão metafórica de significado, com sentido
semelhante a “apenas; só”, como ocorre nos dias de hoje. Nos exemplos dados do português
arcaico, temos:
(22) posso dizer ligeyrame)
))
)te qual cousa dellas he merecedor de mayor cõndenpcõ
(Português arcaico, OE, p.122)
(23) E e)na segu)da coua põõe) hu)a cesta que se çarra legeyrame
)
))
)
te quando a tangem. (Português
arcaico, OE, p.194)
No primeiro exemplo, o advérbio se comporta como advérbio de modo e, no segundo,
é híbrido, ou seja, um sentido se sobrepõe ao outro, resguardando resquícios de sentidos.
5.1.4 Tipo semântico do verbo
Um dos fatores que consideramos importantes para entender a posição dos advérbios
de tempo e de aspecto em -mente é a noção semântica expressa pelo verbo, pois trabalhos
anteriores, como Scheibman (2001), Bybee (2003), Andrade (2005) e Albani (2007), que
constataram que era necessário investigar se o tipo de verbo poderia influenciar na cláusula de
alguma forma, conforme explicamos na seção 3.5. Na presente análise, consideramos esse
fator relevante para tentar identificar se houve uma motivação semântica na ordenação dos
advérbios de tempo e de aspecto em -mente. Para isso, valemo-nos da classificação proposta
por Halliday (1994), também utilizada pelos autores citados nesta seção.
Portanto, o fator tipo semântico do verbo consistiu na classificação proposta para os
verbos da cláusula foi baseada em Halliday (1994), explicitada anteriormente neste
trabalho. Eis alguns exemplos de tipos de verbos encontrados nos corpora analisados:
- Processo material
(24) E quantos mortos subitamente e s~e p~e~endença lançou e enviou a ardideza ao
inferno...(Português arcaico, OE,p. 191).
- Processo Mental
(25) E, estando elle deitado em oraçõ em aquele loguar, começou subitamente a dormir...
(Português arcaico, OE,p. 164).
- Processo Relacional Intensivo
(26) Maria é mãe eternamente presente no mundo dos homens (Português atual, TS, p.15).
- Processo Relacional Possessivo
(27) Ele tem o coração constantemente voltado para os miseráveis (Português atual, TS,
p.47).
- Processo Comportamental
(28) E diz outrosy que os b~e~es temporares que veem continuadam~ente h~u~us tempos
outros he certa demonstrãnça de maa v~etura... (Português arcaico, OE).
- Atividade Verbal
(29) e refletiu sobre aquilo que Deus continuamente nos fala
. (Português atual, TS, p.15)
- Processo Existencial
(30) e logo subitam~ete os veras inchar e esqueecer-se da subjeiçõ ....(Português arcaico,
OE,p. 289).
- Processo Meteorológico
(31) e a pompa do m~udo he fumo e v~eto que subpitamente esvace e se sume... (Português
arcaico, OE,p. 227)
Este fator foi levado em consideração para verificar se houve uma fixação de uso. Ou
ainda, se tipos de verbos em que predominância de uma dada ordem do advérbio em
detrimento de outra. Além disso, temos de levar em consideração que essa classificação
semântica verbal é bastante subjetiva, pois os verbos podem apresentar sentidos adversos aos
propostos, dependendo do contexto ou a situação em que estejam configurando. Vejamos um
exemplo dos corpora:
(32) Entõn foy arrevatado subitam~ete em spiritu e levado ante a cadeyra ah~uu juiz...
(Português arcaico, OE, p. 66).
Na exemplificação (32) dada, o verbo “arrebatar”, que significa puxar, arrancar
(Dicionário Houaiss da língua portuguesa, 2004), está sendo usado metaforicamente.
Esperávamos também que o tipo semântico do verbo influenciasse a posição do
advérbio.
Para verificarmos, estabelecermos a relação entre o fator tipo semântica do verbo e a
ordem do advérbio de tempo e aspecto. Vejamos a tabela a seguir:
Tabela 10 –Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Português Arcaico
Tipo de
verbo/Ordem
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
01 - 01 01 02 02 - - 07
Existencial
- - 01 01 01 - 02 05
Material
04 01 03 01 06 02 - 01 18
Mental
- 01 01 - - 01 - 01 04
Relac. Intensivo
02 - - - 01 - - 01 04
Meteorológico
01 - - - - - - 01
Atividade Verbal
01 - - - - 03 - 01 05
Total
09 02 06 02 10 09 - 06 44
% 20,5 4,5 13,6 4,5 24,9 22,7 - 13,6 100
No português arcaico, observamos que o tipo de verbo mais recorrente é de valor
material em detrimentos dos demais valores. Quanto à relação posição e sentido do verbo, o
tipo material ocorre nas posições 1 e 5, que o as posições margens esquerda e direita
respectivamente. Os verbos comportamentais tendem a ocorrer nas posições 5 e 6 e os verbos
de atividade verbal tendem a ocorrer na posição 6. Além disso, verificamos que, em relação à
distribuição geral dos dados nesta sincronia, ela se dá de forma equilibrada. Na última linha
da tabela (total de dados de cada ordenação), constatamos que as posições marginais 1 e
5(esquerda e direita) são mais freqüentes, apesar de haver uma relativa distribuição dos dados
nas demais ordenações.
Além disso, nesta sincronia não houve ocorrência de verbo relacional possessivo.
Agora, vejamos a análise dos dados do século XVI.
Tabela 11 – Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em-
mente do século XVI
Tipo de
verbo/Ordem
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
01 - - - - - - - 01
Material
03 01 - - - - - - 04
Mental
02 - - - - - - 01 04
Relac. Possessivo
01 01 - - - 01 01 - 04
Relac. Intensivo
02 - - - 01 02 - - 05
Atividade Verbal
01 - - - - - - - 01
Total
10 02 - - 01 03 01 01 18
% 55,5 11,1 - - 5,5 16,6 5,5 5,5 100
Nos dados apresentados do século XVI, verificamos que os tipos mais freqüentes são
verbos materiais, mentais e relacionais possessivos. No total de 18 dados, encontramos 4
dados de cada tipo. Quando o verbo tem sentido material ou mental, a tendência é o advérbio
ocorrer na margem esquerda (POS1). Quando o verbo é relacional possessivo não posição
prototípica para o advérbio.
Em relação aos demais sentidos dos verbos, uma distribuição de dados equilibrada,
apenas podemos ressaltar que, verificando a última linha da tabela, a posição 1 (margem
esquerda) é a preferida, independente do tipo semântico do verbo.
Neste século, não houve ocorrências dos tipos de verbos existenciais e meteorológicos.
Vejamos os dados analisados na tabela a seguir.
Tabela 12 - Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em -mente
Século XVII
Tipo de
verbo/Ordem
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
- - - - - 02 - 01 03
Existencial
04 - - - 01 - 02 07
Material
04 02 01 - 01 01 01 - 10
Mental
01 - 01 - - - - - 02
Relac. Possessivo
02 - - - - - - 02
Relac. Intensivo
03 - - - - - 01 04
Atividade
Verbal
04 - - 01 - - 01 06
Total
18 02 02 - 02 04 01 05 34
% 52,9 5,8 5,8 - 5,8 11,8 2,9 14,7 100
Já nos dados do século XVII, observamos que não há uma predileção pelo tipo
material, como vimos nos dados do português arcaico e do século XVI, mas, em relação à
posição e o tipo semântico do verbo em geral, todos são mais recorrentes na posição 1
(margem esquerda), 18 dados de 34, e há uma relativa distribuição nas demais posições, o que
não difere dos séculos anteriores apresentados.
Neste século não houve ocorrência do tipo de verbo meteorológico, por isso não foi
apresentado na tabela.
A seguir, temos os dados analisados do século XVIII.
Tabela 13 – Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em -mente
Século XVIII
Tipo de
verbo/Ordem
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
03 - - 01 01 - - 05
Material
05 - - - 01 01 - 01 08
Mental
02 01 - - - - - 01 04
Relac. Possessivo
- - - - - - - - -
Relac. Intensivo
01 - - - - - - - 01
Total
11 01 - 01 01 02 - 02 18
% 61,1 5,5 - 5,5 5,5 11,1
-
11,1 100
Os dados analisados do século XVIII demonstram que o tipo de verbo material é o
mais freqüente, seguido do tipo comportamental (cada qual com 8 e 5 dados respectivamente).
Independentemente do tipo semântico, o advérbio tende a ocorrer na posição marginal à
esquerda (POS1).
Neste culo não houve ocorrências dos tipos de verbos: existencial, meteorológico e
atividade verbal, por isso não foram listados na tabela.
Vejamos os dados na tabela a seguir.
Tabela 14 - Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em -mente
Século XIX
Tipo de
verbo/Ordem
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
- - - - - - - 01 01
Material
03 - - 02 02 03 - - 10
Mental
- - - - - 01 - 01 02
Relac. Possessivo
02 - - - - 01 - - 03
Relac. Intensivo
01 - - 01 - - - - 02
Atividade
Verbal
- - - - 02 - - 01 03
Total
06 - - 03 04 05 - 03 21
%
28,6 - - 14,3 19,04
23,8 - 14,3 100
No século XIX, constatamos que o tipo de verbo material é o mais freqüente, como
maioria das sincronias. Quanto à relação entre posição e tipo de verbo, observamos que
uma distribuição mais homogênea. Quando o verbo é material, o advérbio em -mente ocorre
mais na posição 1 (3 dados em 10) ou na posição 6 (também 3 dados em 10). Os demais tipos
tiveram poucos dados. Verificamos, também, que os advérbios tendem a ocorrer mais nas
posições pós-verbais (Posições 5, 6, e 8).
Além disso, podemos confirmar na última linha da tabela que os números percentuais
incidem mais nessas posições: POS 5 (19,4%); POS 6 (23,8%); POS 8 (14,3%).
Na análise deste culo também não foram encontrados dados dos tipos de verbos
existenciais e meteorológicos, por isso este não foi listado na tabela.
A seguir, vejamos os dados analisados do português atual.
Tabela 15 – Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em -
mente do Português Atual
Tipo de
verbo/Oração
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
01 - - 01 - 01 - - 03
Existencial
- - - - 03 - - 03
Material
03 01 - 02 03 02 - 02 13
Mental
- - - - 01 - 01 02
Relac. Possessivo
- - 01 - 02 01 - - 04
Relac. Intensivo
02 - 03 - - - - 02 07
Meteorológico
- - - - - - 01 - 01
Atividade
Verbal
- 02 - 01 05 03 - 01 12
Total
06 03 04 04 14 07 01 06 45
% 13,3 6,7 8,9 8,9 31,1 15,6 2,2 13,3 100
De acordo com a tabela 15, verificamos que o tipo de verbo mais freqüente é o verbo
de processo material, seguido dos de atividade verbal. Em relação ao tipo de verbo e a posição
do advérbio, vemos que, quando o verbo é material, o advérbio tende a ocorrer nas posições 1
e 5; quando é de atividade verbal, tende a ocorrer na posição 5.
Nos resultados apresentados, uma tendência para os advérbios em -mente
aparecerem numa posição pré-verbal (no português arcaico, século XVI, XVII e XVII)
principalmente quando o verbo é de processo material, assim com os demais tipos de verbos.
Mas em relação à análise dos dados do século XIX e português atual, verificamos que há uma
predileção às posições pós-verbais. Esse resultado indica mudança na posição do advérbio ao
longo da história do português, o que vai ao encontro de outras pesquisas, como as de
Martelotta (2006) e Albani (2007), que demonstraram que os advérbios m mudando para a
posição pós-verbal, de um modo geral.
5.1.5 Tipo de sujeito
A forma de realização do sujeito da oração, um critério de natureza sintática, é um
fator considerado na presente análise do advérbio de tempo e aspecto em -mente.
Em um trabalho feito sobre a forma de realização do sujeito pronominal, Duarte
(1993) observou que o português do Brasil apresentava índices de preenchimento de sujeito
bastante superiores aos apresentados pelas línguas românicas de sujeito nulo, como o
espanhol, o italiano e a variedade européia do português. A partir desse trabalho, intuímos que
em todos os contextos em que a posição do sujeito está vazia seja pela não realização, a
posposição ou deslocamento do sujeito para a margem direita da oração favoreceria a
ocorrência dos advérbios na margem esquerda da cláusula. De certa forma, a relação entre a
posição do advérbio e a forma de realização do sujeito da cláusula é demonstrada nas
subposições do item I desse capítulo, onde são analisadas as diversas possibilidades
estruturais decorrentes das posições em que os advérbios de tempo e de aspecto ocupam na
oração.
Essa possibilidade fora levantada em pesquisas como os de Kato e Nascimento
(2002:195), que mostraram que “se o sujeito é nulo, o preenchedor pode ser predito como um
adjunto”. Rocha (2001:113) também concorda com essa posição, pois afirma que “a ausência
de argumento concorre para propiciar a presença de preenchedores”. Haveria uma espécie de
equilíbrio sintático.
Porém, os trabalhos recentes apresentam evidências contrárias a essa postura. Duarte
(2003:121), em um estudo que compara amostras da fala carioca dos anos 80 e dos anos 90,
atesta que a ocorrência “de elementos adjuntos ao sujeito, sejam eles resultados de
topicalizações sejam eles adjuntos adverbiais, favorece a expressão plena do sujeito
pronominal”.
Para verificar de que forma se a relação entre a realização do sujeito e a ordem dos
advérbios de tempo e de aspecto em -mente foi feito um controle das possibilidades
exemplificadas a seguir:
a) Sujeito expresso anteposto ao verbo
(80) Lêde o Testamento Velho, e achareis que Deus antigamente afogava exércitos,
queimava cidades, alagava mundos, despovoava paraísos (Século XVII, sermão do Pe.A.
Vieira).
b) Sujeito expresso posposto ao verbo
(81) Comeu Eva o pomo da ciência, e queixava-me eu antigamente desta nossa Mãe; que
comeu o pomo, por que Ihe não guardou as pevides?(Século XVII, sermão do Pe.A. Vieira).
c) Sujeito ausente
(82) abramos os olhos à luz, para que alumie nossos corações; abramos os corações à luz, para
que more perpètuamente neles (Século XVII, sermão do Pe.A. Vieira).
d) Sujeito pronominal (que/quem).
(83) Capitulo como elrey combateo a cidade de Rachol. Estando elrey, como dito he,
combatemdo a cidade de Rachol, lhe veyo novas certas como ydalca~o hera chegado ao ryo
da bamda do norte, e que ally asentava seu arayall; mamdou elrey os espias que sempre
amdassem sobre elle, que vissem ho que fazia, e asym lhe desem o aviso de tudo ho que fazia;
com esta nova ouve no arayal allgu~u allvoroço, primcipalmente na gente baixa, a quem
numca fallta sospeitas, e aymda em sy tinha~o o medo que antigamente tinha~o aos mouros.
(Século XVI, Crônica dos Reis de Bisnaga)
Vejamos como ficou a distribuição do fator tipo de sujeito com a ordem do advérbio -
mente nas sincronias estudadas. As conclusões a respeito da hipótese serão dadas após os
resultados da última sincronia estudada, ao final desta seção.
Tabela 16 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio
Português Arcaico
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
05 - 05 01 06 06 - 06 29
Sujeito presente
antes do verbo
01 02 - 01 03 02 - - 09
Sujeito presente
depois do verbo
- - 01 01 01 - - 03
Sujeito pronome
relativo
03 - - - - - - - 03
Total
09 02 06 02 10 09 - 06 44
% 20,5 4,5 13,6 4,5 22,7 20,5 - 13,6 100
Nos dados do português arcaico, observamos que, quando o sujeito está ausente, o
advérbio tende a vir nas posições 5 (final da oração) e 6 (posição pré-verbal não marginal),
cada qual com 6 dados, no total de 29. Quando o sujeito está presente anteposto ao verbo, o
advérbio tende a ocorrer na posição 5 (final da oração). Ocorre apenas neste último caso uma
espécie de equilíbrio sintático.
Vejamos os dados a seguir do século XVI.
Tabela 17 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio
Século XVI
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
06 - - - - - 01 01 08
Sujeito presente
antes do verbo
03 02 - - 01 01 - - 07
Sujeito presente
depois do verbo
- - - - - 02 - - 02
Sujeito
pronome
relativo
01 - - - - - - - 01
Total
10 02 - - 01 03 01 01 18
%
52,9 11,5 - - 5,5 16,6 5,5 5,5 100
Nos dados do século XVI, quando o sujeito está ausente, o advérbio tende a vir na
posição 1(margem esquerda), o que é esperado para haver equilíbrio sintático. Quando o
sujeito está presente anteposto ao verbo, o advérbio tende a ocorrer também na posição 1
(margem esquerda), não confirmando a hipótese. Além disso, quando o sujeito está posposto,
o advérbio aparece em posição pós-verbal (a posição 6 é uma posição pós-verbal), o que
também não comprova a hipótese de equilíbrio sintático.
A seguir, vejamos os dados do século XVII.
Tabela 18 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio
Século XVII
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
09 01 02 - 01 02 01 04 20
Sujeito presente
antes do verbo
08 01 - - 01 01 - - 11
Sujeito presente
depois do verbo
01 - - - - 01 - 01 03
Sujeito
pronome
relativo
- - - - - - - - -
Total
18 02 02 - 02 04 01 05 34
% 52,9 5,8 5,8 - 5,8 11,7 2,9 14,7 100
Nos dados do século XVII, observamos que, quando o sujeito está ausente, o advérbio
tende a vir nas posições 1, havendo então preenchimento da posição pré-verbal. No entanto,
quando o sujeito está presente anteposto ao verbo, tende a ocorrer na posição 1 (margem
esquerda).
Vejamos os dados a seguir do século XVIII
Tabela 19 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Século XVIII
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
06 - - 01 - 01 - 01 09
Sujeito presente
antes do verbo
02 01 - - 01 01 - 01 06
Sujeito presente
depois do verbo
01 - - - - - - - 01
Sujeito pronome
relativo
02 - - - - - - - 02
Total
11 01 - 01 01 02 - 02 18
% 61,1 5,5 - 5,5 5,5 11,1 - 11,1 100
Na análise dos dados do século XVIII, verificamos que, quando o sujeito está ausente,
o advérbio tende a vir na posição 1(margem esquerda), 6 dados, ou seja, houve o
preenchimento da posição do sujeito pelo advérbio. Quando o sujeito está presente anteposto
ao verbo, o advérbio tende a ocorrer na posição 1 (margem esquerda), mas o número de dados
é extremamente baixo em qualquer posição
Vejamos os dados a seguir do século XIX.
Tabela 20 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio
Século XIX
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
05 - - 01 02 05 - 03 16
Sujeito presente
antes do verbo
01 - - 02 - - - - 03
Sujeito presente
depois do verbo
- - - - 01 - - - 01
Sujeito pronome
relativo
- - - - 01 - - - 01
Total
06 - - 03 04 05 - 03 21
% 28,6 - - 14,2 19,0
4
23,8 - 14,2 100
Nos dados analisados do século XIX, verificamos que, quando o sujeito está ausente, o
advérbio tende a vir nas posições 1 e 6 (cada qual com 5). A hipótese do equilíbrio sintático se
confirma no primeiro caso, pois, quando o sujeito estava ausente, houve maior incidência de
advérbio na margem esquerda (ou seja, posição pré-verbal). Mas a ocorrência relativamente
alta de dados na posição 6 (entre o verbo e o complemento) demonstra que a hipótese não foi
contemplada. (Os demais tipos tiveram baixíssima ocorrência.). Observamos que
independente do sujeito estar ausente ou presente uma tendência a ocorrerem nas posições
pós-verbais (posições 5, 6 e 8).
Vejamos os dados a seguir do português atual.
Tabela 21 - Relação entre o tipo de sujeito e a ordem do advérbio
Português Atual
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
02 01 01 04 07 04 01 02 22
Sujeito presente
antes do verbo
04 01 03 - 04 02 - 04 18
Sujeito presente
depois do verbo
- - - - 01 01 - - 02
Sujeito
pronome
relativo
- 01 - - 02 - - - 03
Total
06 03 04 04 14 07 01 06 45
% 13,3 6,6 8,8 8,8 31,3 15,5 2,2 13,3 100
Nos dados do português atual, verificamos, quando o sujeito está ausente, o advérbio
tende a ocorrer nas posições 5 (final da oração) e 6 (entre o verbo e o complemento). Esse
resultado indica que não tendência ao preenchimento da posição vazia. Quando o sujeito
está presente anteposto ao verbo, o advérbio aparece nas posições 1 (margem esquerda) e 5
(final da oração), o que demonstra que a hipótese do equilíbrio sintático não pôde ser
comprovada, pois ora preenchimento, ora não preenchimento da posição à esquerda do
verbo (com o sujeito à direita).
Nas tabelas apresentadas, se tomarmos as posições pré-verbais de um modo geral, em
oposição às pós-verbais, podemos observar que a ausência de sujeito nas posições pré-verbais
não leva o advérbio a se antepor ao verbo. Nos casos de sujeito ausente, por exemplo, temos
mais advérbios pós-verbais do que pré-verbais. Por outro lado, os casos em que o sujeito está
posposto apresentam mais dados com advérbio pós-verbal do que pré-verbal. Parece não
haver, portanto, nos casos dos advérbios em -mente, algum tipo de compensação ou equilíbrio
no posicionamento dos elementos na estrutura da cláusula.
Se observarmos separadamente a posição 1, ou seja, a que corresponde à margem
esquerda da cláusula e que, por hipótese, seria a que mais atrairia o advérbio, notamos que
isso também não ocorre. De fato, há uma quantidade maior de casos nessa posição.
Entretanto, se observarmos todas as ocorrências pré-verbais, notamos que a margem esquerda,
independentemente da presença ou não do sujeito, é a posição preferencial dos advérbios pré-
verbais.
Em função desses resultados, concluímos que não uma relação mais significativa
entre presença/ ausência de sujeito em posição pré-verbal (marginal ou o) e colocação dos
advérbios aqui estudados. Esse mesmo resultado foi obtido em Martelotta (2006) para os
advérbios qualitativos e em Marques (2008), que estudou a ordenação sujeito/ verbo. Assim
nossos resultados são contrários à hipótese de que adjuntos (pelo menos do tipo que estamos
estudando) são colocados na posição do sujeito vazio.
5.1.6 Tipo de oração
As tabelas abaixo apresentam a distribuição das ocorrências dos advérbios de tempo e
aspecto em -mente pelas diferentes posições observadas, sempre levando em conta o grau de
gramaticalização das cláusulas que contêm essas ocorrências. Essa análise foi feita de acordo
com a metodologia e hipóteses apresentadas nos trabalhos de Martelotta (2006). Sua hipótese
principal, exposta nesta tese no capítulo 1, é a de que as orações mais gramaticalizadas seriam
as mais propícias aos usos mais conservadores dos advérbios.
Tabela 22 - Ocorrência de advérbios no Português Arcaico
Na análise dos dados do Português Arcaico, observamos que um número
significativo de ocorrências de advérbios de tempo e aspecto em -mente em posição pré-
verbal, mostrando que essa posição, assim como a pós-verbal, estava disponível para este tipo
de advérbio na fase arcaica de nossa língua.
É possível observar algumas regularidades interessantes, sobretudo quando se
comparam esses resultados com outras pesquisas referentes à ordenação de outros tipos de
PORT.
ARCAICO
-gramatical.
+Gramatical.
- Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação
Subord. Rel
- NR NR R NR NR
Total
POS1
06 - - - - 03 09
POS 2
02 - - - - - 02
POS 3
02 01 - - 01 01 06
POS 4
- - - - - 02 02
POS 5
07 01 - - 01 01 10
POS 6
06 - - - 01 02 09
POS 7
- - - - - - -
POS 8
03 01 01 - - 01 06
Total
27 03 01 - 03 08 44
advérbios, feitas com base em outros corpora. Pesquisas elaboradas em Martelotta, (2004;
2006) e Martelotta e Vlček (2006) sobre os advérbios qualitativos bem e mal, assim como os
terminados em -mente demonstraram que as posições pré-verbais tipicamente latinas
(Martelotta, Processy e Santos: 2008), hoje praticamente inexistentes no caso desses
advérbios, ainda ocorriam até o século XIX, sobretudo em cláusulas com alto nível de
gramaticalização. Isso ocorre porque essas cláusulas, segundo Givón (1979), o mais
conservadoras em termos de estrutura sintática, sobretudo no que se refere à ordenação de
seus constituintes.
Os resultados da tabela acima não refletem o que ocorreu com os qualitativos: uma
predominância não muito acentuada das posições pós-verbais, mesmo em cláusulas mais
gramaticalizadas.
Temos a seguir dois exemplos que ilustram os tipos de cláusulas em que ocorre o tipo de
advérbio estudado:
(84) E esta sandia subitam~ete foy cega, mas Ella nõ sabia que era cega(OE,p.57)
(85) e a pompa do m~udo he fumo e v~eto que subpitamente esvaece e se sume...(OE, p
227)
No primeiro exemplo, temos uma ocorrência em que o advérbio está inserido numa
cláusula paratática; no segundo exemplo, o advérbio está num contexto de uma cláusula
subordinada adjetiva restritiva.
Análise dos dados referentes ao Século XVI
Na análise dos dados do século XVI, não temos o mesmo número de dados que foi
observado no português arcaico. Por isso, priorizamos uma análise mais qualitativa,
observando as tendências de ordenação em face às outras sincronias estudadas.
Tabela 23 - Ocorrência de advérbios no Século XVI
Apesar da baixa ocorrência de dados nesta fase, de um modo geral, a análise
qualitativa apresentou resultados favoráveis às nossas hipóteses. A posição pré-verbal, por
exemplo, estava presente nesta fase do português em escala menor que a posição pós-verbal.
Também foi possível observar que as orações mais gramaticalizadas elegem a
ordenação pré-verbal, 11 ocorrências distribuídas pelas posições pré-verbais (Pos 1, 2 e 3).
SÉC.XVI
-gramatical.
+Gramatical.
Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação
Subord. Rel
NR NR R NR NR
Total
POS1
01 01 01 - 01 06 10
POS 2
- - - - 01 01 02
POS 3
- - - - - - -
POS 4
- - - - - -
POS 5
01 - - - - - 01
POS 6
01 - - - 01 01 03
POS 7
01 - - - - - 01
POS 8
- - - - - 01 01
Total
04 01 01 - 03 13 18
Tal observação contribui para confirmar a hipótese que adotamos com Givón (1979) de que
esses tipos cláusulas (mais gramaticalizadas) tendem a ser sintaticamente mais conservadoras,
principalmente, no que diz respeito à ordenação dos constituintes da oração.
Ilustrando a ocorrência de cláusulas mais gramaticalizadas nesta sincronia, temos o
caso do exemplo (85), a seguir:
(85) O que ha da bamda d este rio. Esta hu~a cidade edificada que chama~o Senagumdym,
que dizem que antigamente foy cabeça do reyno, e agora vive nella pouca gente (Século
XVI, Crônica dos Reis de Bisnaga)
Outra ressalva interessante é que, ao analisarmos o português arcaico, apresentado
anteriormente, a hipótese de Givón (1979) não foi de todo confirmada, apesar de
encontrarmos uma leve tendência das posições pré-verbais em cláusulas mais
gramaticalizadas. Por outro lado, na análise do século XVI essa hipótese se confirma quando
se relacionam as posições dos advérbios com o grau de gramaticalização da cláusula em que
ele ocorre, segundo a qual a anteposição do advérbio em relação ao verbo, característica do
latim, se mantém em cláusulas com graus mais altos de gramaticalização, que são mais
conservadoras em termos de ordenação.
Pode-se concluir que essa diferença entre as ocorrências do português arcaico e as do
séc.XVI se simplesmente pelo fato de que existem mais cláusulas com altos níveis de
gramaticalização nos textos desse século do que a do outro e que, somente por isso, os
números referentes aos advérbios pré-verbais são mais altos nessas cláusulas.
Análise dos dados referentes ao Século XVII
O número de dados encontrados nos corpora deste século foi de 34 dados, um pouco a
mais do que o século XVI.
Tabela 24 - Ocorrência de advérbios no Século XVII
Podemos observar, na tabela 26, que o advérbio de tempo e aspecto em -mente, maior
incidência na posição pré-verbal, porém como cláusulas menos encaixadas.
SÉC.XVII
-gramatical.
+Gramatical.
- Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação
Subord. Rel
- NR NR R NR NR
Total
POS1
14 02 - - 02 - 18
POS 2
01 - - - 01 - 02
POS 3
- 01 - - 01 02
POS 4
- - - - -
POS 5
02 - - - 02
POS 6
03 - - - 01 04
POS 7
- - - - 01 01
POS 8
03 - - - 01 01 05
Total
23 03 - - 05 03 34
Análise dos dados do Século XVIII
Cabe registrar logo de início a quantidade extremamente pequena de dados de
ocorrências dos advérbios em estudo nesta época. Isso, obviamente, impede qualquer
conclusão mais precisa em relação as suas tendências de ordenação nos corpora analisados no
século XVIII. Entretanto, é possível observar e fazer algumas ponderações em relação aos
resultados encontrados nesse século.
Vejamos a tabela a seguir:
Tabela 25 - Ocorrência de advérbios no Século XVIII
É interessante ressaltar que novamente a nossa hipótese inicial também foi confirmada
de que as orações mais gramaticalizadas elegem a ordenação pré-verbal, 8 ocorrências contra
uma única ocorrência na posição pós-verbal.
SÉC.XVIII
-gramatical.
+Gramatical.
- Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação
Subord. Rel
- NR NR R NR NR
Total
POS1
05 - 03 - 01 02 11
POS 2
- - - - - 01 01
POS 3
- - - - - - -
POS 4
01 - - - - - 01
POS 5
- - - - 01 - 01
POS 6
02 - - - - - 02
POS 7
- - - - - -
POS 8
02 - - - - - 02
Total
10 - 03 - 02 03 18
Por outro lado, 5 ocorrências pré-verbais em cláusulas menos gramaticalizadas em
oposição 4 dados na posição pós-verbal, também em cláusulas menos gramaticalizadas.
Isso é importante, porque pode apontar para o fato de que, até o século XVIII, era mais forte a
inclinação que os advérbios qualitativos apresentavam de ocorrer antes do verbo, o mesmo
acontecendo para os de tempo e de aspecto, reforçando os resultados obtidos em Martelotta e
Vlček (2006), segundo os quais essa tendência começa a enfraquecer no início do século XIX
e acaba por desaparecer na virada para o século XX, os quais mostraremos mais adiante.
Análise dos dados referentes ao século XIX
As ocorrências de advérbios de tempo e aspecto em -mente no século XIX, relacionadas
às variáveis posição na oração e grau de gramaticalização da cláusula, podem ser vistas na
tabela abaixo:
Tabela 26 - Ocorrência de advérbios no Século XIX
No caso do século XIX, há uma quantidade maior de ocorrências de advérbios de tempo
e de aspecto em -mente, embora essas 21 ocorrências estejam longe de constituir a quantidade
necessária para se chegar a constatações mais precisas. Como foi mencionado na análise dos
dados do século XVIII, acredita-se ser possível, apesar do poucos dados, observar
regularidades interessantes, que se tornam significativas, quando comparadas com tendências
detectadas em outras pesquisas referentes à ordenação de outros advérbios, feitas com base
em outros corpora e em outros estágios da história do português.
Assim como aconteceu com o século XVIII, era de se esperar que o século XIX
apresentasse uma relativa predominância das posições pós-verbais. Isso de fato ocorreu: a
tabela apresenta 12 ocorrências nessa posição, total de 21 advérbios. Esses dados refletem a
tendência, mencionada anteriormente, que vem relativamente se delineando desde século
SÉC.XIX
-gramatical.
+Gramatical.
- Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação
Subord. Rel
- NR NR R NR NR
Total
POS1
03 - 02 - 01 - 06
POS 2
- - - - - - -
POS 3
- - - - - - -
POS 4
02 - - - 01 - 03
POS 5
02 - 01 - 01 - 04
POS 6
04 - - 01 - - 05
POS 7
- - - - - -
POS 8
02 01 - - - - 03
Total
13 01 03 01 03 - 21
XVI, uma vez que na fase arcaica do português com esse tipo de advérbio a hipótese não se
confirmou, ou como nos trabalhos de Moraes Pinto, 2002; Martelotta, 2004, a confirmação
dessas tendências foi constatada.
Outro resultado interessante se apresenta quando se relacionam as posições dos
advérbios com o grau de gramaticalização da cláusula em que ele ocorre. Do total de 9 casos
de advérbios pré-verbais, 4 correram em cláusulas mais gramaticalizadas (hipotáticas e
subordinadas). Cabe ressaltar aqui que a diferença entre as ocorrências em cláusulas menos
gramaticalizadas é bastante pequena: 6 dados nas posições (1, 2, 3 e 4) pré-verbais.
Tabela 27 - Ocorrência de advérbios no Português Atual
No português atual, a ocorrência dos dados demonstrou uma propensão, que se
manifesta quase categoricamente, de que esses advérbios ocorressem após o verbo, 28 dados,
SÉC.XIX
-gramatical. +Gramatical.
- Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação Subord. Rel
- NR NR R NR NR
Total
POS1
05 - - 01 - - 06
POS 2
01 - - - - 02 03
POS 3
01 - - 02 01 - 04
POS 4
04 - - - - - 04
POS 5
02 01 - 01 02 02 14
POS 6
03 01 - 02 01 - 07
POS 7
01 - - - - - 01
POS 8
05 01 - - - - 06
Total
28 03 - 06 04 04 45
sendo que 17 em cláusulas menos gramaticalizadas pós-verbais e 10 dados em cláusulas mais
gramaticalizadas. Cabe ressaltar que novamente obtivemos resultados atípicos aos esperados
segundo a hipótese proposta em relação à posição e o grau de gramaticalização das cláusulas.
O quadro a seguir apresenta uma síntese do que já foi exposto.
Nessa sincronia, novamente obtivemos resultados contrários aos esperados segundo a
hipótese proposta em relação à posição e o grau de gramaticalização das cláusulas.
Mas, ressaltamos que os resultados encontrados são significativos, pois alguns apontam
para outras possíveis tendências diferentes dos trabalhos realizados sobre o fenômeno em
questão.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta pesquisa teve como objetivo observar as diferentes posições que os advérbios de
tempo e aspecto em -mente tendem a assumir em diferentes momentos na história da língua
portuguesa, a fim de verificarmos se houve mudança na ordenação desses elementos. Para
isso, coletamos dados de textos do português das seguintes fases históricas: arcaica, dos
séculos XVI, VXII, XVIII e XIX e português atual.
Este estudo, além de testar novas hipóteses, vem integrar e ampliar uma série de
pesquisas que visam examinar, de modo mais geral, o processo de mudança de colocação dos
advérbios no decorrer do tempo (Moraes Pinto, 2002; Martelotta, Barbosa & Leitão, 2002;
Martelotta, 2004 e 2006; Martelotta & Processy, 2006; Andrade, 2005; Albani 2007; Freitas,
2004).
Foram muito poucos os dados encontrados nos corpora analisados, em função de que,
de um modo geral, advérbios de tempo e aspecto em -mente são, de fato, pouco usados no
discurso escrito assim como no falado. Sendo assim, em muitos momentos da pesquisa, foi
difícil chegar a conclusões a respeito dos resultados estatísticos. Entretanto, foi possível
observar, entre esses poucos dados, algumas regularidades interessantes, sobretudo quando
essas regularidades foram localizadas dentro de um processo de mudança mais geral,
observado em outras pesquisas referentes à ordenação de outros tipos de advérbios feitas com
base em outros corpora e em diferentes momentos da história da língua portuguesa..
Partimos do pressuposto de que ocorreram mudanças na posição dos advérbios ao
compararmos a sincronia do português arcaico com o atual. De acordo com trabalhos
anteriores, como os de Martelotta e Leitão (1999) e de Martelotta, Barbosa e Leitão (2001), a
posição pré-verbal (entre o sujeito e o verbo) era disponível para toda espécie de advérbio e,
hoje, ela ainda está disponível para alguns. Portanto, houve uma mudança no padrão de
ordenação de alguns advérbios.
Observamos que não houve diferença significativa, ao compararmos as duas posições,
a pré-verbal e a pós-verbal, quando levamos em consideração todos os dados, ou seja, quando
não separamos as sincronias, pois os dados se distribuíram homogeneamente entre essas
posições gerais.
Porém, ao olharmos a distribuição dos advérbios analisados pelas posições já arroladas
anteriormente nas sincronias estudadas, constatamos que a POS1 (margem esquerda) foi a
mais recorrente, ou seja, os advérbios de tempo e de aspecto em -mente por expressarem tais
circunstâncias preferiram as posições periféricas da cláusula, sobretudo à margem esquerda
(POS1), e pouco se realizaram nas posições mais internas à sentença, posições essas que
rompem com a estrutura padrão da cláusula. Shaer (2004), ao tratar especificamente da
ordenação dos circunstanciais temporais, relata que não é fácil determinar de forma precisa as
diferenças entre os temporais na margem esquerda ou na margem direita da sentença, ainda
que seja possível determinar distinções funcionais entre eles: a margem esquerda constitui um
ponto de ancoragem, um elo entre a parte do discurso em que se encontra o advérbio e um
ponto do discurso anteriormente mencionado, numa relação nitidamente anafórica, de
conexão discursiva. Além disso, pudemos observar, também, que, no português arcaico, as
posições típicas são posição 5 (pós-verbal, mais precisamente margem direita no fim da
oração), posição 6 (entre o verbo e o complemento) e posição 8 (pós-verbal fora do fim), mas
os dados tiveram uma boa distribuição em todas as posições, exceto a posição 7. Ou seja, no
português arcaico havia uma ordenação mais livre.
nas outras fases do português, entre o português do XVI e o português do século
XIX, o uso predominante foi a posição 1 (margem esquerda). No século XVI, ainda houve
outras posições com número razoável de dados, que foram as posições 6 (inserido entre o
verbo e o complemento/predicativo) e 5 (margem direita da oração). Depois, como dissemos,
é a posição marginal à esquerda a preferida pelos autores. Mas, no século XIX, já houve uma
diferença importante: começou a aumentar o uso de uma posição pós-verbal, que foi a posição
6. Já no Português atual, verificamos que houve uma distribuição de dados em todas as
posições, mas houve o predomínio da posição 5, ou seja, uma posição pós-verbal.
Nossa análise permite-nos dizer que, nas amostras estudadas (referentes somente ao
português escrito), o advérbio em -mente de tempo e de aspecto passou de um uso
relativamente livre para um uso mais fixo na posição marginal à esquerda e depois no
português atual passou a ser usado predominantemente na posição pós-verbal (mais
especificamente na posição marginal à direita). Trabalhos como os de Martelotta (2006) e
Albani (2007) também apontam pra o uso predominante da posição pós-verbal para os
advérbios ao longo da história do português.
Outro fator analisado foi a noção semântica do advérbio em que checamos a relação
entre ordenação e tipo semântico. No português arcaico observamos a predominância da
tendência pré-verbal, exceto os advérbios com os sentidos híbridos que expressam em si
mesmos os valores de tempo/aspecto e modo. É exatamente o fato de apresentar esse valor
polissêmico denominado de híbrido na presente pesquisa que explica o desvio que este
advérbio apresenta com relação à tendência da posição pré-verbal.
Outra questão a ser considerada nesta sincronia é que as noções cronológicas e
aspectual não são predominantes em relação às demais. Entretanto, identificamos que a noção
híbrida é mais freqüente, quanto à sua ordenação, eles ocorrem mais na posição 5 (margem
direita da cláusula), que é uma posição pós-verbal.
Na análise dos dados desse fator no século XVI, encontramos na relação entre ordem e
noção semântica, maior incidência de dados na posição 1 (margem esquerda da cláusula). As
noções cronológicas e aspectual, principalmente, predominam nessa posição (1), o sentido
híbrido ocorre mais nas posições pós-verbais, como atestam os trabalhos de Freitas (2004) e
Moraes Pinto (2002) em relação a esse tipo de advérbio.
no século XVII, observamos que as noções cronológicas e bridas predominam na
posição 1 (margem esquerda da cláusula). O sentido aspectual é menos freqüente (com
somente 1 dado na posição 1 (margem esquerda) e 1 dado na posição 5 (margem direita).
Além disso, verificamos que o tipo híbrido não foi mais recorrente nas posições pós-verbais,
como vimos no português arcaico e no século XVII, mais ainda assim, não foi uma diferença
marcante.
O baixo número de dados não nos permite fazer outras generalizações. O mesmo
aconteceu com as outras sincronias.
Em relação à análise dos dados do século XVIII, todas as noções apresentam-se
predominantemente na posição 1 (margem esquerda da cláusula, pré-verbal). E mesmo o
sentido híbrido é mais freqüente na posição pré-verbal.
Na análise dos dados do século XIX, verificamos que as posições mais recorrentes são
as pós-verbais. Em relação à noção semântica do advérbio, observamos que os sentidos
aspectual e híbrido são mais incidentes do que o cronológico. Além disso, identificamos que o
sentido híbrido é mais recorrente nas posições pós-verbais, como foi atestado em outros
trabalhos sobre os advérbios já citados ao longo desse estudo.
No português atual, verificamos uma distribuição entre a posição e a noção semântica
do advérbio de maneira mais homogênea entre os sentidos pelas posições arroladas.
Observamos também que as posições pós-verbais são mais freqüentes do que as posições pré-
verbais. E que o sentido aspectual é mais utilizado nos contextos examinados.
Como vimos, no português atual, predomínio da posição pós-verbal (mais
especificamente a posição marginal à direita). Apenas podemos concluir que, quando a noção
é basicamente aspectual, como em freqüentemente, o advérbio não tem posição predominante,
mas, quando apresenta noção dêitica (temporal) ou noção híbrida, como antigamente,
rapidamente, respectivamente, a posição típica é pós-verbal.
Outra perspectiva da presente pesquisa foi a observação da relação entre a forma de
realização do sujeito da oração, um critério de natureza sintática, e a posição do advérbio.
Para verificar essa relação, fizemos um controle dos seguintes tipos de sujeito: sujeito
expresso anteposto ao verbo; sujeito expresso posposto ao verbo; sujeito ausente e sujeito
pronominal (que/quem). Nessa perspectiva, pressupomos que a presença ou ausência do
sujeito influenciaria a colocação do advérbio de acordo com a noção semântica que o mesmo
venha expressar e, ainda, de acordo com a intencionalidade do escritor em enfatizar ou não
sua informação.
Ao tomarmos as posições pré-verbais de um modo geral, em oposição às pós-verbais,
verificamos que a ausência de sujeito nas posições pré-verbais não levou o advérbio a se
antepor ao verbo, ao contrário da hipótese do que posições vazias tenderiam a ser preenchidas
pelo advérbio.
Parece não haver, portanto, nos casos dos advérbios de tempo e de aspecto em -mente,
algum tipo de compensação ou equilíbrio no posicionamento dos elementos na estrutura da
cláusula. Além disso, ao observarmos separadamente a posição 1, ou seja, a que corresponde
à margem esquerda da cláusula e que, por hipótese, seria a que mais atrairia o advérbio,
notamos que isso também não ocorreu. De fato, houve uma quantidade maior de casos nessa
posição. Entretanto, quando se observam todas as ocorrências pré-verbais, notamos que a
margem esquerda, independentemente da presença ou não do sujeito, era a posição
preferencial dos advérbios pré-verbais.
Em função desses dados, concluímos que não houve uma relação significativa entre
presença/ ausência de sujeito em posição pré-verbal (marginal ou não) e colocação dos
advérbios aqui estudados. Esse mesmo resultado foi obtido em Martelotta (2006) para os
advérbios qualitativos e Marques (2008), que estudou a ordenação sujeito/ verbo. Portanto,
nossos resultados são contrários à hipótese de adjuntos (pelo menos do tipo que estamos
estudando) são colocados na posição do sujeito vazio.
Quanto à relação entre o tipo semântico do verbo e a posição, verificamos que esse
fator não influenciou a posição do mesmo.
O tipo semântico do verbo foi levado em consideração a fim de se testar a hipótese de
que determinado tipo de noção expressa pelo advérbio ocorreria com um determinado tipo de
verbo. Entretanto, essa hipótese não foi confirmada, pelos menos, nos corpora analisados.
Também queríamos verificar a relação entre o tipo semântico do verbo e a posição do
advérbio. Vimos que, quando o verbo é de processo material, o advérbio aparece mais na
posição 1 (margem esquerda da cláusula), os de processos relacionais, tanto intensivo quanto
possessivo, também ocorreram mais na posição 1. Nas outras posições, pelo baixo número de
dados, não foi possível traçar uma tendência para esse advérbio.
No português arcaico, observamos que o tipo de verbo mais recorrente é de valor
material em detrimento dos demais valores. Quanto à relação posição e sentido do verbo, o
tipo material ocorre nas posições 1 e 5, que o as posições margens esquerda e direita
respectivamente. Os verbos comportamentais tendem a ocorrer nas posições 5 e 6 e os verbos
de atividade verbal tendem a ocorrer na posição 6.
Nos dados apresentados, do século XVI, verificamos que os tipos mais freqüentes são
verbos materiais, mentais e relacionais possessivos.. Quando o verbo tem sentido material ou
mental, a tendência é o advérbio ocorrer na margem esquerda (POS1). Quando o verbo é
relacional possessivo não posição prototípica para o advérbio. em relação aos demais
sentidos dos verbos, há uma distribuição de dados equilibrada.
Já nos dados do século XVII, observamos que não há uma predileção pelo tipo
material, como vimos nos dados do português arcaico e do século XVI, mas, em relação à
posição e o tipo semântico do verbo em geral, todos são mais recorrentes na posição1
(margem esquerda) e uma relativa distribuição nas demais posições, o que não difere dos
séculos anteriores apresentados.
Os dados analisados do século XVIII demonstram que o tipo de verbo material é o
mais freqüente, seguido do tipo comportamental. Independentemente do tipo semântico, o
advérbio tende a ocorrer na posição marginal à esquerda (POS1).
No século XIX, constatamos que o tipo de verbo material é o mais freqüente, como
maioria das sincronias estudadas. Quanto à relação entre posição e tipo de verbo, observamos
que uma distribuição mais homogênea. Quando o verbo é material, o advérbio em -mente
ocorre mais na posição 1 ou na posição 6 . Os demais tipos tiveram poucos dados.
Verificamos, também, que os advérbios tendem a ocorrer mais nas posições pós-verbais
(Posições 5, 6, e 8).
nos dados do português atual, verificamos que o tipo de verbo mais freqüente é o
verbo de processo material, seguido dos de atividade verbal. Em relação ao tipo de verbo e a
posição do advérbio, vemos que, quando o verbo é material, o advérbio tende a ocorrer nas
posições 1 e 5; quando é de atividade verbal, tende a ocorrer na posição 5.
Nos resultados apresentados, uma tendência para os advérbios em -mente
aparecerem numa posição pré-verbal (no português arcaico, século XVI, XVII e XVII)
principalmente quando o verbo é de processo material, assim com os demais tipos de verbos.
Mas em relação à análise dos dados do século XIX e português atual, verificamos que há uma
predileção às posições pós-verbais. Esse resultado indica mudança na posição do advérbio ao
longo da história do português, o que vai ao encontro de outras pesquisas, como as de
Martelotta(2006) e Albani (2007), que demonstraram que os advérbios vêm mudando para a
posição pós-verbal, de um modo geral.
Além dessas hipóteses apresentadas, seguindo a proposta de Martelotta (2004) para os
advérbios qualitativos, estávamos considerando que a mudança de ordenação dos advérbios
de tempo e de aspecto em -mente poderia estar relacionada ao processo de gramaticalização
de certas estruturas sintáticas. De acordo com Givón (1979), a cláusula principal declarativa,
afirmativa, ativa, neutra é menos pressuposicional, no sentido de que sua interpretação
depende de menos material inferível do que a interpretação das demais estruturas. Isso
confere a esse tipo de cláusula (menos gramaticalizada) uma maior liberdade e variedade de
elementos significativos. Por outro lado, a distribuição dos elementos significativos, em todos
os outros tipos de cláusula (mais gramaticalizadas), é sempre mais restrita visto que esses
outros tipos de cláusula tendem a exibir grande conservadorismo sintático, sobretudo, no que
diz respeito à ordenação vocabular. Portanto, partindo dessa proposta, esperávamos encontrar,
no português arcaico, advérbios em posição pré-verbal (posição típica dos advérbios no latim)
ocorrendo mais nas orações mais gramaticalizadas (hipotáticas e subordinadas) do que nas
menos gramaticalizadas. E, no português atual, nossa hipótese era de que ocorreriam menos
advérbios em posições pré-verbais e que essas ocorrências envolveriam frases estilisticamente
marcadas.
Na análise dos dados do português arcaico, observamos que houve um número
significativo de ocorrências de advérbios de tempo e aspecto em -mente em posição pré-
verbal, mostrando que essa posição, assim como a pós-verbal, estava disponível para este tipo
de advérbio na fase arcaica de nossa língua.
Observamos que, no português arcaico, houve um pequeno predomínio de posições
pré-verbais em cláusulas gramaticalizadas. Isso pode ser apontado como um leve resquício da
tendência de que as posições pré-verbais têm para ocorrer em cláusulas mais
gramaticalizadas.
No século XVI, apesar da baixa ocorrência de dados nesta fase, de um modo geral, a
análise qualitativa apresentou resultados favoráveis às nossas hipóteses. A posição pré-verbal,
por exemplo, estava presente nesta fase do português em escala menor que a posição pós-
verbal. Além disso, foi possível observar que as orações mais gramaticalizadas elegem a
ordenação pré-verbal, 11 ocorrências distribuídas pelas posições pré-verbais (Pos 1, 2 e 3).
Tal observação contribui para confirmar a hipótese que adotamos com Givón (1979) de que
esses tipos cláusulas (mais gramaticalizadas) tendem a ser sintaticamente mais conservadoras,
principalmente, no que diz respeito à ordenação dos constituintes da oração.
Outra ressalva interessante é que, ao analisarmos o português arcaico, a hipótese de
Givón (1979) não foi de todo confirmada, apesar de encontrarmos uma leve tendência de as
posições pré-verbais ocorrerem em cláusulas mais gramaticalizadas. Por outro lado, na análise
do século XVI essa hipótese se confirmou quando se relacionaram as posições dos advérbios
com o grau de gramaticalização da cláusula em que o advérbio ocorreu.
Pudemos observar, na análise dos dados do século XVII, uma maior incidência de
casos foi na posição pré-verbal, porém, quando se relacionamos posição e grau de
gramaticalização, a hipótese givoniana não se confirmou, o mesmo atestado no português
arcaico com o tipo de advérbio estudado.
É interessante ressaltar que, no século XVIII, a nossa hipótese também foi confirmada:
a de que as orações mais gramaticalizadas elegem a ordenação pré-verba. Nesse caso, foram 8
ocorrências contra uma única ocorrência na posição pós-verbal.
Por outro lado, houve 5 ocorrências pré-verbais em cláusulas menos gramaticalizadas
em oposição a 4 dados na posição pós-verbal, também em cláusulas menos gramaticalizadas.
Isso é importante, porque pode apontar para o fato de que, até o século XVIII, era mais forte a
inclinação que os advérbios qualitativos apresentavam de ocorrer antes do verbo, o mesmo
acontecendo para os de tempo e de aspecto, reforçando os resultados obtidos em Martelotta e
Vlček (2006), segundo os quais essa tendência começa a enfraquecer no início do século XIX
e acaba por desaparecer na virada para o século XX.
No caso do século XIX, houve uma quantidade maior de ocorrências de advérbios de
tempo e de aspecto em -mente, embora as 22 ocorrências encontradas estejam longe de
constituir a quantidade necessária para se chegar a constatações mais precisas.
Assim como aconteceu com o século XVIII, era de se esperar que o século XIX
apresentasse uma relativa predominância das posições pós-verbais. Isso de fato ocorreu:
apresentou 12 ocorrências nessa posição no, total de 22 advérbios. Esses dados refletem a
tendência, mencionada anteriormente, que vem relativamente se delineando desde o século
XVI, uma vez que na fase arcaica do português com esse tipo de advérbio a hipótese não se
confirmou, ou como nos trabalhos de Moraes Pinto, 2002; Martelotta, 2004, a confirmação
dessas tendências foi constatada.
Outro resultado interessante se apresenta quando se relacionam as posições dos
advérbios com o grau de gramaticalização da cláusula em que ele ocorre. Do total de 9 casos
de advérbios pré-verbais, 4 correram em cláusulas mais gramaticalizadas (hipotáticas e
subordinadas). Cabe ressaltar aqui que a diferença entre as ocorrências em cláusulas menos
gramaticalizadas foi bastante pequena, 6 dados pré-verbais. Constatamos que, no século XIX,
se evidenciou uma mudança desses advérbios para as posições pós-verbais, apesar de eles não
serem predominantes em cláusulas com alto grau de gramaticalização, mais conservadoras em
termos de ordenação.
No português atual, a ocorrência dos dados demonstra uma propensão, que se
manifestou quase categoricamente, desses advérbios ocorrerem após o verbo, 28 dados, sendo
que 17 estão em cláusulas menos gramaticalizadas e 10 dados em cláusulas mais
gramaticalizadas. Cabe ressaltar que novamente obtivemos resultados atípicos aos esperados
segundo a hipótese proposta em relação à posição e o grau de gramaticalização das cláusulas.
Portanto, percebemos que houve diferentes fatores que influenciaram a ordenação
desses advérbios nas sentenças e que essa análise possa trazer esclarecimentos em relação ao
comportamento desses elementos no português. Muitos dos nossos resultados não comprovam
algumas das hipóteses apresentadas nesta tese e em outros trabalhos, mas refletem o emprego
real dos advérbios em -mente na história do português escrito. Assim são resultados
importantes inclusive porque apontam para tendências diferentes do que geralmente é dito.
A pesquisa foi realizada tendo em vista muitos fatores, demonstrando que procuramos
de diferentes formas verificar as estratégias discursivas, semânticas e sintáticas para o uso
desses advérbios. Claro que a análise não se esgotou e em muitos momentos. Assim,
apontamos para a necessidade de pesquisas futuras aprofundarem em um ou outro aspecto, ou
para a necessidade de se fazer um recorte diferente da análise, tendo em vista as sincronias e
os gêneros.
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OS ADVÉRBIOS DE TEMPO E DE ASPECTO EM -MENTE E
SUA ORDENAÇÃO: UMA ABORDAGEM HISTÓRICA
Eliana Crispim França Luquetti
Rio de Janeiro
Fevereiro de 2008
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Faculdade de Letras
Comissão de Pós-Graduação e Pesquisa
OS ADVÉRBIOS DE TEMPO E DE ASPECTO EM -MENTE E
SUA ORDENAÇÃO: UMA ABORDAGEM HISTÓRICA
Eliana Crispim França Luquetti
Tese de Doutorado submetida ao
Programa de Pós-Graduação em
Lingüística da Universidade Federal do
Rio de Janeiro UFRJ, como parte dos
requisitos necessários para a obtenção do
título de Doutor em Lingüística.
Orientadora: Professora Doutora Maria
Maura da Conceição Cezario
Co-orientador: Professor Doutor Mario
Eduardo Toscano Martelotta
Rio de Janeiro
Fevereiro de 2008
LUQUETTI, Eliana Crispim França
Os advérbios de tempo e de aspecto em -mente e sua ordenação: uma abordagem histórica/
Eliana Crispim França Luquetti. 2008.
159 fls.
Tese (Doutorado em Lingüística) –
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Faculdade de Letras,
Rio de Janeiro, 2008.
Orientadora: Maria Maura Cezario
Co-Orientador: Mario Eduardo T. Martelotta
1 Advérbios. 2. Ordenação de palavras. 3. Funcionalismo
I. Cezario, Maria Maura (Orientadora) II Martelotta, Mario Eduardo T. III Universidade
Federal do Rio de Janeiro. Faculdade de Letras. IV Título
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Faculdade de Letras
Comissão de Pós-Graduação e Pesquisa
OS ADVÉRBIOS DE TEMPO E DE ASPECTO EM -mente E SUA ORDENAÇÃO:
UMA ABORDAGEM HISTÓRICA
Eliana Crispim França Luquetti
Orientadora: Professora Doutora Maria Maura da Conceição Cezario
Co-Orientador: Professor Doutor Mario Eduardo Martelotta
Tese de Doutorado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Lingüística da
Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos necessários para a
obtenção do título de Doutor em Lingüística.
Aprovada por:
Presidente, Profa. Doutora Maria Maura da Conceição Cezario
Vice-Presidente, Prof.Doutor Mário Eduardo Toscano Martelotta
Profa.Doutora Maria da Conceição Paiva-UFRJ
Profa. Doutora Deize Vieira dos Santos-UFRJ
Prof. Doutor Afrânio Gonçalves Barbosa-UFRJ
Profa. Doutora Mariângela Rios de Oliveira-UFF
Suplentes:
Profa. Doutora Christina Abreu Gomes-UFRJ
Profa. Doutora Maria do Rosário da Silva Roxo- Univ. Estácio de Sá
Tese defendida em 25/02/2008.
Dedicatória
Ao meu querido e amado Deus, pois “O
Senhor é a minha rocha, a minha
cidadela, o meu libertador; o meu Deus,
o meu rochedo em que me refugio; o meu
escudo, a força da minha salvação, o
meu baluarte”. (Sl 18:2,3)
Esperei confiantemente pelo Senhor; ele
se inclinou para mim e me ouviu quando
clamei por socorro. Tirou-me de um poço
de perdição, de um tremedal de lama;
colocou-me os pés sobre uma rocha e me
firmou os passos. E me pôs nos lábios um
novo cântico, um hino de louvor ao nosso
Deus; muitos verão essas coisas, temerão
e confiarão no Senhor. (Salmos 40:1-3)
Agradecimentos
A Deus que sempre cuidou de mim, orientando, confortando e abençoando-me.
À minha querida e amada mãe Suely por ter me ensinado o caminho do bem, da honestidade,
da persistência, da esperança. Enfim, devo-lhe tudo quem sou.
Aos meus filhos, Fernanda e Pedro Henrique pela compreensão, carinho e existência na minha
vida.
Ao meu esposo Wanderson Luquetti, pelo constante incentivo, pela infinita paciência, pelas
palavras de conforto e amizade.
Aos meus irmãos, Patricia, Douglas, Catiane e Viviane que são parte de mim. E,
principalmente as minhas irmãs Catiane e Viviane, pelo apoio e pelas palavras certas nos
momentos certos.
Aos parentes e amigos, pelo acompanhamento interessado. Em especial, Ernesto França, Célia
Viana, Thiara França, Thiago França, Pastor Leopoldo, Lenise Dutra, Ana Lúcia Costa,
Aparecida Azevedo, pelo apoio e carinho constantes.
À Professora Maria Maura Cezario pela grande confiança depositada em mim, pela amizade,
pelo apoio e incentivo constantes e fundamentais. E ainda, por ter me conduzido ao prazeroso
caminho da pesquisa e ensinando-me a importância do nosso papel enquanto professores e
pesquisadores, através do seu exemplo e dedicação.
Ao Professor Mário Eduardo Martelotta pela carinhosa acolhida no projeto Discurso e
Gramática, pela prontidão em ouvir e ajudar, pelo exemplo profissional.
Aos amigos Natália Ilse, Júlia Nunes, Érika Ilogti e Roberto Freitas Jr. Pela colaboração
preciosa nesta pesquisa.
A todos do projeto Discurso e Gramática pela sincera amizade e pelos grandes e inesquecíveis
momentos compartilhados.
SINOPSE
Análise diacrônica da ordenação dos advérbios de tempo e
aspecto em -mente na modalidade escrita do português,
sob a perspectiva funcionalista, buscando investigar
fatores funcionais e estruturais determinantes da
colocação desses advérbios na cláusula.
LUQUETTI, Eliana Crispim França. Os advérbios de tempo e de aspecto em -mente e sua
ordenação: uma abordagem histórica. Rio de Janeiro: UFRJ, Faculdade de Letras, 2008. 159
fls. Tese de Doutorado em Lingüística.
Resumo
Este trabalho tem como objetivo observar as diferentes posições que os advérbios de
tempo e de aspecto em -mente tendem a assumir em diferentes momentos históricos, bem
como analisar a polissemia desses elementos em textos escritos em português nas seguintes
fases históricas: arcaica, séculos XVI, VXII, XVIII e XIX e português contemporâneo.
Esta pesquisa, além de testar novas hipóteses, vem integrar e ampliar uma série de
estudos que visam examinar, de modo mais geral, o processo de mudança de colocação dos
advérbios no decorrer do tempo (Moraes Pinto, 2002; Martelotta, Barbosa & Leitão, 2002;
Martelotta, 2004; Martelotta & Processy, 2006; Andrade, 2005; Albani 2007; Freitas, 2004) e
outros trabalhos sobre o fenômeno em questão. A pesquisa demonstra que fortes indícios
de mudança de posição do advérbio de tempo e aspecto em -mente ao longo da história do
português.
De acordo com a hipótese geral, ao estudarmos cada sincronia devemos encontrar
motivações para as diferentes posições ocupadas pelos advérbios de tempo e aspecto em -
mente na oração. A motivação dá-se por um conjunto de fatores estruturais, semânticos,
cognitivos e/ou discursivos, a saber: a noção semântica; a estrutura sintática da oração em que
está inserido o advérbio; o tipo semântico do verbo que compõe a cláusula, segundo Halliday
(1994) e outros fatores.
LUQUETTI, Eliana Crispim França. Os advérbios de tempo e de aspecto em -mente e sua
ordenação: uma abordagem histórica. Rio de Janeiro: UFRJ, Faculdade de Letras, 2008. 159
fls. Tese de Doutorado em Lingüística.
ABSTRACT
This work aims to observe the different positions that the adverbs of time and look at
mind-tend to take on different historic moments, and examine the polissemia these elements
in texts written in Portuguese on the following historical stages: archaic, XVI, VXII, XVIII
and XIX and Portuguese contemporary.
This research, and test new hypotheses, comes integrate and extend a series of studies
to examine, more generally, the process of changing the placing of adverbs over time (Moraes
Pinto, 2002; Martelotta, Barbosa & Leitao, 2002; Martelotta, 2004; Martelotta & Processy,
2006; Andrade, 2005; Albani 2007; Freitas, 2004) and other works on the phenomenon in
question. The research shows that there are strong indications of a change of position of the
adverb of time and point-in mind throughout history of the Portuguese.
According to the general assumption, by studying each sync must find reasons for the
different positions occupied by adverbs of time and point-in mind in prayer. Motivation
comes about by a number of factors structural, semantic, cognitive and / or discourse, namely
the notion semantics, the syntactic structure of the prayer that is inserted into the adverb; the
kind of semantic word that composes the clause, according Halliday (1994) and others.
LUQUETTI, Eliana Crispim França. Os advérbios de tempo e de aspecto em -mente e sua
ordenação: uma abordagem histórica. Rio de Janeiro: UFRJ, Faculdade de Letras, 2008. 159
fls. Tese de Doutorado em Lingüística.
Résumé
Ce travail vise à observer les différentes positions que les adverbes en –ment de temps
et d'aspect prennent pendant les moments historiques, et d'examiner la polysémie de ces
éléments dans les textes écrits en portugais sur les étapes historiques suivantes: archaïque,
XVI, VXII, XVIII Et XIX et portugais contemporain.
Au délà de tester de nouvelles hypothèses, cette recherche vient d'intégrer et d'étendre
une série d'études pour examiner, de façon plus générale, le processus de modification du
placement des adverbes en –ment dans le temps (2002 2002 2004; Martelotta & Processy,
2006; Andrade, 2005; Albani 2007; Freitas, 2004) et d'autres ouvrages sur le phénomène en
question. La recherche montre qu'il y a fortes indications de changement de position de
l'adverbe en –ment de temps et d’aspect au long de l'histoire portugaise.
Selon l'hypothèse générale, en étudiant chaque synchronisation on doit trouver les
raisons pour lesquelles les différentes positions occupées par les adverbes en –ment de temps
et d’aspect dans la proposition. La motivation est donnée par un certain nombre de facteurs
structurels, sémantiques, cognitives et / ou discursifs, à savoir: la notion sémantique, la
structure syntaxique de la proposition que l’adverbe est inséré, le genre de mot sémantique qui
compose la clause, selon Halliday (1994 ) et les autres.
LISTA DE TABELAS
Tabela 1- Distribuição dos advérbios em -mente quanto à ordem em relação ao verbo.
Tabela 2- Levantamento Geral dos dados dos corpora dos Advérbios de Tempo e de Aspecto
em –mente.
Tabela 3 - Distribuição das posições dos advérbios de tempo e aspecto em –mente X
sincronias.
Tabela 4 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Português Arcaico.
Tabela 5 - A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Século XVI.
Tabela 6 - A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Século XVII.
Tabela 7 - A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Século XVIII.
Tabela 8 - A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Século XIX.
Tabela 9 - A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Português Atual.
Tabela 10 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Português Arcaico.
Tabela 11 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Século XVI.
Tabela 12 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Século XVII.
Tabela 13 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Século XVIII.
Tabela 14 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Século XIX.
Tabela 15 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Português Atual.
Tabela 16 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Português Arcaico.
Tabela 17 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Século XVI.
Tabela 18 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Século XVII.
Tabela 19 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Século XVIII.
Tabela 20 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Século XIX.
Tabela 21 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Português Atual
Tabela 22 - Ocorrência de advérbios no Português Arcaico.
Tabela 23 - Ocorrência de advérbios no Século XVI.
Tabela 24 - Ocorrência de advérbios no Século XVII.
Tabela 25 - Ocorrência de advérbios no Século XVIII.
Tabela 26 - Ocorrência de advérbios no Século XIX.
Tabela 27 - Ocorrência de advérbios no Português Atual
LISTA DE QUADROS
Quadro1 – Distinção entre Advérbio e Pseudo-advérbio
Quadro 2 - Subposições dos Advérbios em -mente
LISTA DE ABREVIATURAS
EC – A essência do cristianismo
OE – Orto do esposo
SUMÁRIO
LISTA DE TABELAS
LISTA DE QUADROS
LISTA DE ABREVIATURAS
1 INTRODUÇÃO.......................................................................................................... 15
1.1 HIPÓTESES............................................................................................................... 18
1.2
O
BJETIVOS
............................................................................................................................................
20
2 REVISÃO DE LITERATURA.................................................................................. 22
2.1
A
QUESTÃO DA CATEGORIZAÇÃO
.........................................................................................................
22
2.2
A
DVÉRBIO
:
ELEMENTO DO LÉXICO OU DA GRAMÁTICA
?....................................................................
26
2.3
A
DVÉRBIOS
:
ESPÉCIES
,
FORMAS E SIGNIFICAÇÃO
...............................................................................
27
2.4
V
ISÃO
T
RADICIONAL DOS
A
DVÉRBIOS
................................................................................................
31
2.5
P
ESQUISAS SOBRE ADVÉRBIOS
,
SOB ORIENTAÇÃO DA
LINGÜÍSTICA
..................
.....................34
2.5.1
T
IPOS DE ADVÉRBIOS
.........................................................................................................................
34
2.5.2
E
STUDOS SOBRE O ADVÉRBIO EM
-
MENTE E SOBRE ORDENAÇÃO DE ADVÉRBIOS
............................
38
2.6
O
S ADVÉRBIOS E A EXPRESSÃO DE TEMPO
...........................................................................................
54
2.
7
O
S ADVÉRBIOS RELACIONADOS À CATEGORIA DE ASPECTO
.....................................................56
2.
8
A
FORMAÇÃO DE ADVÉRBIOS EM
-
MENTE
............................................................................................
60
3 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS................................................................................. 67
3.1
O
S PRINCÍPIOS FUNCIONALISTAS
..........................................................................................................
67
3.2
G
RAMATICALIZAÇÃO E
N
ÍVEIS DE
E
NCAIXAMENTO ENTRE
C
LÁUSULAS
...........................................
70
3.3
G
RAMATICALIZAÇÃO E ESTRUTURA SINTÁTICA
..................................................................................
72
3.4
A
S PRESSUPOSIÇÕES DISCURSIVAS DAS CONSTRUÇÕES SINTÁTICA
.............................................73
3.5
C
LASSIFICAÇÕES DOS VERBOS
,
BASEADA EM
H
ALLIDAY
(1994).........................................................
75
4 METODOLOGIA ....................................................................................................... 80
4.1
C
ORPUS
..................................................................................................................................................
81
4.2
D
ESCRIÇÕES DOS FATORES DA ANÁLISE DOS ADVÉRBIOS DE TEMPO E ASPECTO EM
MENTE
...........
84
5 ANÁLISES DOS DADOS........................................................................................... 89
5.1
A
NÁLISES DE FATORES
..........................................................................................................................
89
5.1.1
O
RDEM DO ADVÉRBIO DE TEMPO E ASPECTO EM
-
MENTE
................................................................
90
5.1.2
P
OSIÇÃO DO ADVÉRBIO
......................................................................................................................
93
5.1.3
N
OÇÃO SEMÂNTICA DO ADVÉRBIO
...................................................................................................
96
5.1.
4
T
IPO SEMÂNTICO DO VERBO
............................................................................................................
105
5.1.5
T
IPO DE SUJEITO
..............................................................................................................................
114
5.1.6
T
IPO DE ORAÇÃO
.............................................................................................................................
122
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................... 133
1 INTRODUÇÃO
Este trabalho tem como objetivo observar as diferentes posições que os advérbios de
tempo e aspecto em -mente tendem a assumir em diferentes momentos históricos, para
verificarmos se houve mudança na ordenação da frase da língua portuguesa com relação a
esses tipos de advérbios. Para isso, coletamos dados de textos do português das seguintes
fases históricas: arcaica, séculos XVI, VXII, XVIII e XIX e português atual.
Este estudo, além de testar novas hipóteses, vem integrar e ampliar uma série de
pesquisas que visam examinar, de modo mais geral, o processo de mudança de colocação dos
advérbios no decorrer do tempo (Moraes Pinto, 2002; Martelotta, Barbosa & Leitão, 2002;
Martelotta, 2004; Martelotta & Processy, 2006; Andrade, 2005; Albani 2007; Freitas, 2004).
A motivação para o presente estudo veio do trabalho realizado na dissertação de
mestrado de França (2002), na qual foi feita uma análise dos adjuntos adverbiais de tempo e
aspecto em narrativas orais e escritas contemporâneas, sob uma perspectiva funcionalista.
Nesse trabalho, procuramos delimitar os valores que esses adjuntos apresentavam no texto
narrativo, assim como as tendências de colocação que eles assumiam nas cláusulas que
compunham o texto.
Esses adjuntos adverbiais de tempo e aspecto, de um modo geral, apresentavam uma
grande mobilidade na cláusula, podendo ter suas tendências de ordenação explicadas por
fatores de caráter sintático e discursivo.
Nessa dissertação (França,2002), utilizamos o corpus Discurso & Gramática (Votre e
Oliveira: 1995), constituído de um conjunto de entrevistas faladas e escritas, concedidas por
informantes de C.A. infantil e adulto, 4
a
e 8
a
séries e 2
o
e 3
o
graus, apresentando os seguintes
tipos de discurso: narrativa de experiência pessoal, narrativa recontada, relato de
procedimento, relato de opinião e descrição de local. Essa análise, entretanto, se restringiu às
narrativas, já que partia do princípio de que os dois planos discursivos, figura e fundo,
apresentavam tendências de ordenação diferentes no que diz respeito aos elementos adverbiais
estudados.
Os resultados obtidos nessa análise mostraram que os adjuntos adverbiais
apresentavam a sua colocação de acordo com a sua função dentro do tipo de discurso (figura
ou fundo) de que faziam parte.
No presente trabalho, um aprofundamento da análise dos advérbios em -mente
(somente os advérbios em -mente, diferentemente da dissertação de mestrado) em vários
aspectos, uma vez que ampliamos os pressupostos teóricos e o número de fatores a serem
testados. Além disso, a distribuição das ordenações possíveis está muito diferente do que foi
feito em França, 2002. O foco agora é o texto escrito e a diacronia. Para isso, analisamos
textos de diferentes gêneros textuais ao longo dos séculos, da fase arcaica do português ao
período atual da Língua.
Eis alguns exemplos de dados analisados nesta tese a partir dos quais é possível
verificar a grande variedade de ordenação:
(1) E porque me consta o mensionado Bacharel Manuyel Pacheco de Paiva, que
atualmente o ocupa, se achar em diligencia fora dessa cidade( culo XVIII ,cartas oficiais,
PHPB).
(2) Quer dizer cana e pena, porque as penas antigamente faziam-se de certas canas
delgadas(Século XVII ,Sermão do Pe. A.Vieira).
(3) Atualmente as coisas estão como costumavam ser mil anos atrás(Português
atual,EC p.9).
(4) ...deixamos boas coisas para trás muito freqüentemente em nome da
independência (Português atual,EC, p.31).
Nota-se que, no exemplo (1), o advérbio atualmente ocorre antes do verbo (ocupa);
no exemplo (2), o advérbio antigamente, ocorre entre o sujeito (as penas) e o verbo (faziam-
se); no exemplo (3), o advérbio atualmente ocorre no início da cláusula (margem esquerda),
antes do sujeito (as coisas) e antes do verbo (estão); e, no exemplo (4), o advérbio
freqüentemente, ocorre depois do verbo (deixamos). Portanto, verificamos que os advérbios
em -mente podem ocorrer antes ou depois do verbo; entre o sujeito e o verbo; no início da
cláusula; no final da cláusula, enfim, diversas possibilidades de posição desse advérbio na
cláusula.
Ao pesquisarmos definições e classificações sobre os advérbios, em gramaticais
tradicionais e nas de orientação lingüística, percebemos que essa é uma classe bastante
complexa e colocada de forma pouco elucidativa, isto é, em geral, é definida e exemplificada
de modo simplista e pouco esclarecedora. Nesta pesquisa, estamos considerando como dados
advérbios que os estudiosos consideram ora como advérbios de tempo (como ultimamente,
primeiramente, antigamente), ora como advérbios de aspecto (freqüentemente, novamente,
constantemente) e ainda como advérbios de modo, como por exemplo, o advérbio
rapidamente, que é classificado tradicionalmente como advérbio de modo. Como também
nesse advérbio traços semânticos ligados ao tempo, também o incluímos na análise (cf. os
resultados do fator “tipo semântico do advérbio).
Entendemos que é necessária uma análise mais profunda sobre os advérbios de tempo
e de aspecto em -mente, abarcando seus usos ou funções; suas posições na cláusula e outras
características. Neste estudo, investigaremos questões como:
a) Por que o advérbio ora aparece no final, ora no início da cláusula, ora em outras
posições?
b) fatores que contribuem para a ordenação desses advérbios num dado lugar da
cláusula?
c) Existe uma posição fixa para determinados usos dos advérbios? Se existe, por que
isso acontece? Seria o tipo semântico do verbo que, com a freqüência de uso,
fixaria o advérbio numa dada posição?
d) relação entre a semântica do advérbio e a posição em que ele aparece mais
freqüentemente na cláusula? Há posições prototípicas para os advérbios em -
mente? Se há, houve alguma diferença de uso ao longo da história do português?
Acreditamos que esta pesquisa contribuirá para o estudo sobre a ordenação dos
advérbios de tempo e de aspecto e suas funções na cláusula na língua portuguesa. Contribuirá
também para melhor compreendermos a organização textual.
1.1 Hipóteses
As hipóteses desse estudo são:
(a) Pressupomos que ocorreram mudanças na posição dos advérbios da sincronia do
português arcaico para o contemporâneo. De acordo com trabalhos anteriores, como os
de Martelotta e Leitão (1999) e de Martelotta, Barbosa e Leitão (2001), a posição pré-
verbal (entre o sujeito e o verbo) era disponível para toda e qualquer espécie de advérbio
e, hoje, ela está disponível para alguns - portanto, houve uma mudança no padrão de
ordenação de alguns advérbios. Com relação aos advérbios de tempo e de aspecto em -
mente, acreditamos que deve haver uma posição prototípica para esse advérbio em
relação ao verbo, ao sujeito e ao complemento verbal nas diferentes sincronias, sendo
que, ao longo da história do português, pode ter havido uma contínua fixação da posição
do advérbio em relação ao verbo, uma vez que estudos diacrônicos demonstram que a
ordenação dos termos foi se tornando cada vez mais fixa.
(b) Seguindo a proposta de Martelotta (2004) para os advérbios qualitativos, estamos
considerando que a mudança de ordenação dos advérbios de tempo e de aspecto em -
mente parece está relacionada ao processo de gramaticalização de certas estruturas
sintáticas. De acordo com Givón (1979), a cláusula principal declarativa, afirmativa,
ativa, neutra é menos pressuposicional, no sentido de que sua interpretação depende de
menos material inferível do que a interpretação das demais estruturas. Isso confere a esse
tipo de cláusula (menos gramaticalizada) uma maior liberdade e variedade de elementos
significativos. Por outro lado, a distribuição dos elementos significativos, em todos os
outros tipos de cláusula (mais gramaticalizadas), é sempre mais restrita visto que esses
outros tipos de cláusula tendem a exibir grande conservadorismo sintático, sobretudo, no
que diz respeito à ordenação vocabular. Portanto, partindo dessa proposta, esperamos
encontrar, no português arcaico, advérbios em posição pré-verbal (posição típica dos
advérbios no latim) ocorrendo mais nas orações mais gramaticalizadas (hipotáticas e
subordinadas) do que nas menos gramaticalizadas, e, no português atual, nossa hipótese
é de que ocorram menos advérbios em posições pré-verbais e que essas ocorrências
envolvam frases estilisticamente marcadas.
(c) deve haver fatores de diferentes ordens que motivam o uso do advérbio em diferentes
posições na frase. Fatores como o papel semântico exercido pelo advérbio em -mente, o
tipo semântico do verbo, a presença ou ausência do sujeito na frase, dentre outros,
devem influenciar a ordem que este ocupa na sentença.
1.2 Objetivos
Pretendemos estudar as posições assumidas pelos advérbios em -mente na cláusula em
textos de diferentes gêneros textuais das seguintes fases do português: português arcaico, dos
séculos XVI, XVII, XVIII, XIX e português atual, observando, principalmente, o papel da
freqüência de ocorrência em dadas posições e a possível gramaticalização desses advérbios
com determinados tipos de verbo. Inicialmente, a opção por textos religiosos foi pela
disponibilidade de textos em documentos escritos em português arcaico, mas, quando
partimos para o levantamento de dados, verificamos que havia uma escassez de dados do
fenômeno em questão, sendo assim, decidimos investigar em outros gêneros textuais.
Mas, ainda assim, procuramos manter uma certa uniformização das tipologias, pois as
diferenças entre os usos dos advérbios encontrados poderiam ser atribuídas a diferenças
textuais e não à mudança lingüística.
Os principais objetivos desse estudo são:
1- analisar detalhadamente o uso dos advérbios de tempo e de aspecto em -mente no
português escrito;
2- acompanhar o uso da ordenação dos advérbios nos tipos de orações ao longo do
tempo, analisando os dados tanto do português arcaico quanto do português atual, para
verificar se as construções mais gramaticalizadas (cláusulas hipotáticas e
subordinadas) são mais conservadoras, isto é, favorecem a ocorrência de advérbios em
posições pré-verbais (posições mais antigas), e se as menos gramaticalizadas
(cláusulas principais e coordenadas) são mais inovadoras, propiciando a ocorrência de
dados com advérbios em –mente em ordenações pós-verbais;
3- verificar se indícios de mudança na sintaxe desse advérbio nas fases estudadas do
português: arcaica, dos séculos XVI, XVII, XVIII, XIX e português atual;
4- caracterizar as posições assumidas pelos advérbios de tempo e aspecto, apresentando
a freqüência de ocorrência de cada ordem assumida;
5- identificar os fatores que influenciam a ordenação desses advérbios em contextos em
que eles podem ocupar posições diferentes nas cláusulas, testando hipóteses
relacionadas à motivação de ordenação.
Para apreciação das questões aqui levantadas, apresentamos, no capítulo 2, uma revisão na
literatura sobre os advérbios, sua ordenação, formação e origem, no capítulo 3, os
pressupostos teóricos que fundamentam esse estudo; no capítulo 4, a metodologia utilizada
para codificação dos dados; no capítulo 5, a análise dos dados, interpretação dos resultados da
análise quantitativa, assim como dos fatores e hipóteses examinados; e, por fim, nos capítulos
6 e 7, seguem algumas considerações finais sobre os advérbios e a bibliografia,
respectivamente.
2 REVISÃO DE LITERATURA
Este capítulo consiste numa breve explanação sobre a questão da categorização e
estrutura da língua, como também, a descrição de algumas abordagens sobre a definição,
classificação e/ou ordenação de advérbios na cláusula. Aqui são apresentados trabalhos de
perspectiva tradicional, bem como os realizados em linhas de pesquisa lingüística que
estudam a Língua em uso.
2.1 A questão da categorização
Antes de apresentarmos as considerações sobre a classe que reúne os advérbios,
apresentaremos uma breve explanação sobre a questão da categorização, uma vez que estamos
reunindo numa mesma classe geral advérbios que os estudiosos ora consideram de tempo
(ultimamente, por exemplo), ora de aspecto (freqüentemente), ora de modo (rapidamente).
Além disso, a própria natureza da classe advérbio é de difícil análise, uma vez que reúne itens
muito diferentes tanto com relação à ordenação, como em relação à semântica.
Tradicionalmente, as classes das palavras têm sido definidas segundo suas
propriedades semânticas, sintáticas e morfológicas. As gramáticas tradicionais privilegiam o
aspecto semântico na conceituação do substantivo, do adjetivo e do verbo, e recorrem ao
aspecto funcional na conceituação da conjunção, da preposição e até mesmo do artigo, dos
pronomes e dos advérbios, que é o foco do nosso trabalho, e, estes últimos são conceituados
ainda pelo seu aspecto semântico, mas a análise apresentada não dá conta da sua imprecisão.
Os autores de um modo geral também chegam à conclusão da imprecisão dessa
categoria. Seja de um ponto de vista mais formal, como o de Camara Jr. (1976) ou o de
Bechara (1999), seja de uma perspectiva mais funcional, como a de Ilari et al. (1990) ou a de
Neves (2000), a categoria dos advérbios é considerada bastante controvertida.
Constituída por tipos de natureza muito diversa, em termos semânticos, sintáticos e
mesmo morfológicos, esse conjunto parece não resistir a uma definição mais geral, capaz de
dar conta da totalidade de seus usos. Nesse sentido, a abordagem categorial prototípica,
segundo Taylor (1995), em conformidade com a concepção funcionalista que nos orienta,
apresenta-se como o tratamento mais adequado para os tipos desse conjunto tão híbrido. De
acordo com tal concepção, podemos admitir que, numa dada classe, encontram-se membros
situados em pontos distintos em relação ao eixo categorial básico, de acordo com o número de
traços compartilhados pelos mesmos.
Assim, encontramos constituintes que de modo mais visível representam essa
categoria; em geral, são termos mais freqüentes e identificados pela comunidade lingüística
como pertencentes à categoria. Por outro lado, podemos registrar também termos que, por
conta da perda de traços categoriais, tendem a ocupar posição periférica ou marginal em
relação ao padrão, situando-se praticamente no limite ou na interseção com outra classe. Dos
advérbios aqui em análise, os de tempo e de aspecto em -mente, conforme a perspectiva
exposta anteriormente, estariam situados em um ponto de maior afastamento em relação ao
eixo da categoria dos advérbios. Segundo Ilari et al. (1990) e Neves (2000), esses tipos de
advérbios caracterizam-se por sua função não-predicativa ou não-modificadora, uma vez que
informações acerca de tempo não incidem sobre ou afetam a predicação, mas os de aspecto
sim. Assim definidos, estariam tais constituintes predispostos a ocorrer em pontos de maior
afastamento em relação ao verbo, conforme prevê o subprincípio de proximidade (Givón,
2001; Furtado da Cunha, Rios de Oliveira e Martellota, 2003), segundo o qual conteúdos
menos integrados são articulados por formas também menos integradas na superfície textual.
Além do aspecto relativo ao status dessa categoria, interessa-nos também mencionar a
questão da polissemia envolvida nos usos desses advérbios. De acordo com a hipótese
localista, podemos dizer que a referência espacial seria a mais primária ou original; a partir
desse sentido mais concreto, teríamos a derivação para tempo, de natureza mais abstrata, e, a
partir daí, os sentidos lógicos ou textuais, como a referência de modo, numa etapa de maior
abstratização. Segundo Pontes (1992, p. 8-9), através do uso dos mesmos elementos
gramaticais, projetamos as categorias de espaço para falar de tempo metaforicamente”;
conforme a autora, trata-se de derivação de sentido desde tempos imemoriais. O interessante
nessa abordagem é que os sentidos originais não são necessariamente descartados diante dos
mais recentes, o que vem a gerar polissemia dos usos adverbiais, principalmente na
articulação dos sentidos aspectuais, modais e temporais, muitas vezes sobrepostos.
Mattoso Câmara formulou na Estrutura da Língua Portuguesa uma classificação
baseada em dois critérios, um misto e outro simples, que é didaticamente satisfatória. Para ele,
os vocábulos formais do português se agrupam, primeiro, segundo a um critério morfo-
semântico, em quatro classes: nome, verbo, pronome e conectivo. As três primeiras classes
são constituídas basicamente de palavras variáveis, a última de palavras invariáveis.
O verbo distingue-se no grupo, nessa primeira divisão, pelo paradigma flexional em
que se enquadra (apresenta variação modo-temporal e número-pessoal). O nome e o pronome,
por sua vez, são vocábulos dotados de número e gênero, exprimíveis em uma e noutra classe
pelo mesmo mecanismo flexional. A distinção entre eles repousa, de um lado, na natureza da
significação, e de outro, em certas propriedades morfossintáticas exclusivas do pronome
(variação em pessoa e em caso)
Semanticamente, o nome ‘nomeia’ e os seres, permitindo que o locutor e o ouvinte os
designem sem o reforço da situação ou do contexto verbal. O pronome por outro lado, efetua
uma referência contextual ou situacional: quem diz aquela roupa estava na minha gaveta’,
está particularizando roupa e gaveta em função de uma situação. Sabe-se apenas, por meio
de aquelae de minha’, que a roupa em questão está distante dos interlocutores e que a
gaveta pertence ao locutor. Essa constatação, todavia, não esclarece tudo, uma vez que as
palavras ‘distante e próximo também significam noções relativas e nem por isso são
pronomes. Basicamente, importa ter em vista a referência à situação em que se encontram os
interlocutores: os pronomes a incluem na significação dos enunciados. Sendo assim, pode-se
dizer ‘Pernambuco fica distante de Santa Catarina em qualquer parte do Brasil, que o
significado da frase será o mesmo; mas quem diz Pernambuco fica distante daqui’ designa
com o ‘aqui’ o lugar em que, na qualidade de Emissor, se encontra. Logo, aquele’, ‘minha’ e
‘aqui’ tem uma significação situacional e são por isso, pronomes. Do ponto de vista mórfico,
boa parte dos pronomes apresenta formas distintas conforme a pessoa do discurso a que se
referem. Entre estes pronomes, os denominados ‘pessoais’ têm formas distintas para cumprir
as funções de sujeito e complemento. Acrescenta-se, quanto ao aspecto mórfico que vários
pronomes apresentam, ao lado das formas masculinas e femininas, uma terceira forma
‘neutra’ (aquilo, em face de aquele/aquela).
O segundo critério de Mattoso, de modo simples, redistribui os nomes, os pronomes e
os conectivos segundo características sintáticas. O nome e o pronome podem ser substantivos,
adjetivos ou advérbios; os conectivos podem ser conjunções ou preposições. Estes papéis
podem ser identificados no contexto da oração ou do sintagma: em ‘meus amigos ingleses’,
amigos é o núcleo da construção, classificado por isso como substantivo, ao passo que
ingleses, constituinte modificador, é um adjetivo; por outro lado, em as crianças amigas’,
crianças é o núcleo e amigas funciona como adjetivo. Na mesma linha de raciocínio, diremos
que elas são meus amigas’, elas, sujeito da oração, é um pronome substantivo, enquanto
minhas, adjunto de amigas, é um pronome adjetivo. Além disso, o nome e o pronome podem
funcionar como advérbios se o termo que acompanham é um verbo e podem dar lugar a
expressões preposicionadas. É o que se passa com alto a aqui em ‘Os garotos conversam alto
(cf. Os garotos conversam com entusiasmo’) e em Os garotos conversavam aqui’ (cf. Os
garotos conversavam nesta sala’).
Quanto aos conectivos, há, segundo Mattoso, os que ligam palavras (preposições) e os
que ligam orações (conjunções). Assim, em ‘casa de pedra’, ‘de’ é uma preposição, cabendo,
porém, a ‘enquanto’ o papel de conjunção em ‘Vilma iria enquanto você chorava’.
Das considerações feitas nas linhas anteriores, depreende-se a necessidade de se
repensar as características sintático-semântico-discursivas dos advérbios para um estudo mais
atento dessa categoria.
2.2 Advérbio: elemento do léxico ou da gramática?
Tradicionalmente, é feita uma separação entre elementos do léxico ou lexemas e
elementos da gramática, ou morfemas propriamente ditos.
Os elementos do léxico configuram imediatamente a realidade extralingüística e os
morfemas gramaticais remetem a uma significação intralingüística (significação externa e
objetiva). Os verbos plenos, substantivos e adjetivos são considerados elementos do léxico e
outras classes como conjunções, preposições, etc. são de modo geral considerados elementos
da gramática, assim como as flexões, prefixos e sufixos. Mas classes que apresentam
características de ambos os níveis. Uma dessas classes é o advérbio, que ora se comporta
como um item do léxico (haja vista a possibilidade de criação de novos advérbios em -mente),
ora se comporta como elemento da gramática.
No que se refere aos vocábulos derivados em -mente, torna-se inadequado, considerá-
los morfemas lexicais ou lexemas fora de um contexto específico, visto que alguns deles,
isoladamente não remetem à realidade extralingüística (valores temporais, sociológicos,
psicológicos etc.), motivo pelo qual se prefere denominá-los vocábulos e não palavras.
Vale ressaltar que Cunha e Cintra (1985) consideram morfemas lexicais os
substantivos, os adjetivos, os verbos e os advérbios de modo e, morfemas gramaticais os
artigos, os pronomes, os numerais, as preposições, as conjunções, os demais advérbios, bem
como as formas indicadoras de número, gênero, tempo, modo ou aspecto verbal.
Além disso, Brinton e Traugott (2005), que utilizam uma perspectiva funcionalista
semelhante à que caracteriza este trabalho, consideram os advérbios, por suas características,
como elementos da gramática.
Verifica-se que, além de apresentarem todos os “advérbios de modo” como morfemas
lexicais, os gramáticos mencionados denominam morfemas gramaticais não os afixos e
desinências (formas presas), como também as formas dependentes, na perspectiva de Câmara
Júnior, estabelecendo entre tais elementos uma relação de igualdade.
Com base nestes pressupostos, pergunta-se:
1) como considerar todos os vocábulos derivados em -mente, inclusive os desgastados pelo
uso automatizado, morfemas lexicais?
e, em conseqüência:
2) como denominar todos os “advérbios” não-marcados pela presença do sufixo -mente,
indistintamente, morfemas gramaticais?
2.3 Advérbios: espécies, formas e significação
Os advérbios são tradicionalmente caracterizados, priorizando os critérios semânticos
e formais. Sob o critério semântico, o advérbio expressa circunstâncias e, por outro lado, sob
o critério formal, eles podem modificar um verbo, um adjetivo, outro advérbio, ou todo o
enunciado.
Começando pelo critério semântico, tem-se a idéia de circunstância. Entendemos
como circunstância determinados indícios ou particularidades que caracterizam o conteúdo
expresso pelo termo ao qual o advérbio se refere. Sendo assim, pode-se entender como
expressando circunstâncias dados informacionais bastante diferentes entre si, como tempo,
lugar, modo, causa e, até mesmo, intensidade. Mas é difícil admitir que determinados tipos de
advérbios expressem circunstâncias, como é o caso, por exemplo, dos advérbios de dúvida, de
afirmação e de negação, respectivamente exemplificados abaixo:
(1) Talvez amanhã chova.
(2) Sim, choveu muito.
(3) Não choveu muito.
Nestes casos, os advérbios destacados não expressam circunstâncias, pelo menos de
acordo com a definição proposta acima, e sim uma atitude ou posicionamento do falante em
relação àquilo que está falando. O mesmo ocorre com os advérbios abaixo:
(4) Com certeza, vai chover amanhã.
(5) Felizmente, não choveu.
(6) Sinceramente, eu não gosto de chuva.
Nestes casos, ocorre nitidamente uma atitude ou posicionamento do falante em relação
ao que fala. Ducrot (1972) propõe que estes advérbios referem-se ao próprio ato ilocucionário
de afirmar, uma vez que qualificam o ato de dizer e não a coisa direta. Para ele, alguns
advérbios têm sua utilização explicada apenas por uma teoria dos atos da fala ou teoria da
enunciação, cuja unidade é o discurso.
Ducrot (1972) também apresenta alguns advérbios que indicam pressuposição: mal,
quase, exceto, também, somente, muito, pouco, entre outros. Embora alguns destes elementos
não sejam considerados tradicionalmente como advérbios, Ducrot (1972) os apresenta como
tal, afirmando que sua introdução no enunciado permite que determinado fato seja
pressuposto:
(7) Ele quase parou de fumar.
Nesta frase, o uso do elemento quase leva à pressuposição de que "ele" tentou parar de
fumar.
Como se pode ver, a visão de que os advérbios exprimem circunstâncias é muito
limitada. determinados tipos de advérbios cujo uso é basicamente determinado por fatores
pragmático-discursivos. E mesmo aqueles que funcionam normalmente como
circunstanciadores (de tempo, de lugar, de modo, de causa, de intensidade) muitas vezes são
usados para direcionar a interpretação do ouvinte, promover a organização das informações
no discurso além de outras funções pragmático-discursivas.
É o caso, por exemplo, do advérbio de tempo já, que pode assumir um papel de
elemento de contra-expectativa, no sentido que Heine et al. (1992) dão ao termo:
(8) A reunião terminou?
Nesta frase, mais que uma noção temporal, o elemento demonstra noção de contra-
expectativa do falante de que a reunião não tivesse terminado. Ou seja, a frase expressa o
contrário da expectativa e o advérbio já é a marca disto: é um elemento de contra-expectativa.
Mas também é de grande relevância pensar no aspecto formal da definição de
advérbio. É correto caracterizar os advérbios como elementos que se referem a um verbo, a
um adjetivo, a outro advérbio ou à oração inteira? autores que tentaram questionar isto,
como, por exemplo, Silva Jr. e Andrade (1907: 155), que afirmaram que os advérbios podem
modificar substantivos:
(9) Gonçalves Dias era verdadeiramente poeta.
Bomfim (1988: 9) questiona esta hipótese, afirmando que o termo poeta, no caso, não
pode ser entendido substantivamente, mas como um conjunto de qualidades atribuídas ao
elemento que recebe a referência. Assim, segundo autora, o elemento verdadeiramente
funciona, na realidade, como intensificador de poeta.
Por outro lado, pode-se pensar em outros exemplos, como os agrupados abaixo:
(10) A reunião na casa de Paulo foi proveitosa.
(11) O exemplo acima demonstra a hipótese.
(12) O país precisa de pessoas assim.
Nestas frases, os termos sublinhados referem-se claramente aos substantivos que os
antecedem e expressam circunstância (lugar nos exemplos 10 e 11 e modo no exemplo 12).
São casos diferentes do exemplo 9, onde o substantivo a que o advérbio se refere desempenha
função de predicativo. Deve-se considerar estes casos advérbio ou não? Mais uma vez se
evidencia a necessidade de se repensar o conceito tradicional de advérbio.
Mas este trabalho se deterá, mais especificamente, na ordenação dos advérbios de
tempo e de aspecto terminados em -mente. Mas é interessante estarmos sempre repensando
seu papel na estrutura da Língua.
Conforme propôs Givón (2001), a classe dos advérbios é a menos homogênea, tanto
do ponto de vista semântico quanto do morfossintático. Essa heterogeneidade é agravada pelo
fato de os advérbios funcionarem num plano de utilização da língua que tramita entre o campo
do léxico e a área da gramática, normalmente composta de elementos que assumem funções
voltadas para a organização interna do texto ou para a orientação argumentativa que se quer
dar a ele. De fato, o rótulo advérbio designa um conjunto muito diferenciado de elementos, e
parece constituir uma categoria fluida, que tende a se adaptar às intenções comunicativas
envolvidas no discurso.
Tradicionalmente, os advérbios são caracterizados como elementos de base nominal
(apenas < a + penas, depressa < de + pressa) ou pronominal (aqui, hoje) que de um ponto de
vista formal, são invariáveis, de um ponto de vista funcional (Câmara Jr: 1983) são termos
determinantes de um verbo ou de um nome (adjetivo e outro advérbio) e, de um ponto de vista
semântico, expressam circunstâncias, como foi explicitado anteriormente, ou seja, o
problema da generalização das definições.
2.4 Visão Tradicional dos Advérbios
Com base no que observamos em Said Ali (1969), Melo (1970), Rocha Lima (1985),
Cunha & Cintra (1985) e Bechara (2000), podemos dizer que os advérbios são
tradicionalmente caracterizados, de um ponto de vista semântico, por expressarem
circunstâncias e, de um ponto de vista formal, por modificarem um verbo, um adjetivo, outro
advérbio, ou toda a declaração, como se pode observar na definição de advérbio proposta por
Rocha Lima:
[...] palavras modificadoras do verbo. Servem para expressar
as várias circunstâncias que cercam a significação verbal (...).
Alguns há, até, que não acompanham a verbos, mas somente a
adjetivos e advérbios. (ROCHA LIMA, 1985: 174).
No que se refere especificamente aos advérbios de tempo, as gramáticas tradicionais
também não dizem muito. Apresentam a noção de tempo como uma das noções
circunstanciais expressas pelos advérbios e elencam uma série de elementos, como: agora,
ainda, amanhã, anteontem, antes, breve, cedo, depois, então, hoje, jamais, logo, nunca,
ontem, sempre, tarde, entre outros. Também não se vê, nas gramáticas tradicionais, uma
relação entre determinadas noções aspectuais e a classe dos advérbios. Aliás, a noção de
aspecto é normalmente deixada de lado nas gramáticas e as diferenças entre as noções
temporais dêiticas e não-dêiticas não são abordadas.
A respeito da ordenação dos advérbios, tema que nos interessa mais, os gramáticos
tradicionais, de um modo geral, nada menciona. Apenas Cunha e Cintra (1985) e Bechara
(2000) falam algo sobre o assunto.
Cunha e Cintra (1985) se referem à colocação adverbial em sua gramática, afirmando
que "os advérbios que modificam um adjetivo, um particípio isolado ou outro advérbio
colocam-se de regra antes destes". Em seguida, propõem que, com relação aos advérbios que
modificam o verbo, ocorre o seguinte:
a) Os advérbios de modo colocam-se normalmente depois do verbo.
b) Os advérbios de tempo e de lugar podem colocar-se antes ou depois do verbo.
c) O advérbio de negação antecede sempre o verbo.
Ainda acrescentam que os advérbios modificadores de outro advérbio, de um adjetivo
ou de um particípio isolado posicionam-se antes destes.
Os autores em questão propõem também que "o realce do adjunto adverbial é
expresso de regra por sua antecipação ao verbo", mas nada dizem em relação à colocação de
cada tipo específico de advérbio para fins de realce, muito menos o que ocorre neste sentido,
com os tipos de advérbios que já tendem a aparecer antes do verbo.
Entretanto, tratam a colocação desses advérbios em linhas muito gerais, uma vez que
se sabe, por exemplo, que os advérbios de modo são muito complexos. Além disso, não dizem
o porquê de tal ordenação. Também não mencionam a posição de outros tipos de advérbios.
Bechara (2000) também menciona a questão da colocação dos advérbios, ao afirmar
que esses elementos não se referem apenas ao verbo, podendo assim aparecer em várias
posições. Considera que a melhor proposta é a de Llorach (2000): o analista deve ater-se “às
relações que cada advérbio contrai dentro do enunciado, quer no seu papel primário de
adjacente circunstancial, quer por sua combinação com outras unidades no interior de um
grupo nominal unitário”. Como analisa Martelotta (2000), essa é a posição tomada por muitos
trabalhos de base funcionalista, em que a colocação dos advérbios está relacionada ao seu
funcionamento no enunciado.
Em Bechara (2001:290), é dito que o advérbio possui certa flexibilidade de posição,
uma vez que sua função não está ligada apenas ao verbo, mas estende-se ao conteúdo
expresso pelo predicado e ao domínio do sujeito, podendo antecedê-lo ou precedê-lo. No
entanto, o autor não especifica em que contextos tais posições podem ocorrer.
Como se pode ver, as gramáticas tradicionais são pouco elucidativas no que se refere
à classificação e, sobretudo, à ordenação de advérbios, apresentando propostas para os
diferentes tipos de advérbios que são bastante controversas: os advérbios de negação, por
exemplo, não antecedem sempre o verbo e podem ocorrer antecedendo o termo, na sentença,
que está sendo negado (Ex.: Eu chamei não a você, mas a seu irmão). E afirmar que os
advérbios de modo colocam-se normalmente depois do verbo é nada dizer diante da
complexidade da colocação deste tipo de advérbio na sentença e a outras propriedades
pertinentes a outros desses elementos.
2.5 Pesquisas sobre advérbios, sob orientação da Lingüística
2.5.1 Tipos de advérbios
Um dos trabalhos que apresenta uma profundidade sobre a ordenação dos advérbios é
o de Ilari et al. (1990), que, em uma análise detalhada dos advérbios e de sua ordenação,
propõem que essa classe de palavras pode dividir-se em dois grandes tipos: predicativos e
não-predicativos.
Os advérbios predicativos caracterizam-se por constituírem argumentos de segunda
ordem. Assim como o verbo e o adjetivo atribuem uma ação ou qualidade ao sujeito, os
advérbios predicativos modificam a ação ou qualidade atribuída ao sujeito. Do ponto de vista
sintático, esses advérbios podem modificar o sentido do verbo, do adjetivo ou de outro
advérbio. São exemplos desse tipo de advérbio: bem, muito, gratuitamente. Os não-
predicativos, por outro lado, não são compatíveis com as idéias de modificação de sentido e
de predicação de segunda ordem, apresentando funções bastante diferentes daquelas que
caracterizam os advérbios predicativos.
Interessam-nos, nesse trabalho, os advérbios predicativos. Nessa classe de advérbios
enquadram-se, segundo os autores, as seguintes subclasses:
a) Qualitativos - paralelos à construção com substantivo, que expressa qualidade (comida
boa), esses advérbios modificam o sentido dos elementos a que se referem: Comer bem,
maravilhosamente bem. Entre esses advérbios encontram-se mal, assim, entre outros.
b) Intensificadores - relacionam-se tipicamente a verbos, adjetivos e advérbios,
intensificando-lhes o sentido: muito, mais, etc.
c) Modalizadores - aplicam-se a sentenças completas e indicam atitude proposicional:
certamente, felizmente, etc.
d) Aspectualizadores - são advérbios cujos traços semânticos correspondem a noções
aspectuais do verbo da sentença em que ocorrem: geralmente, diariamente, de vez em quando,
algumas vezes, etc.
Os qualitativos e os intensificadores apresentam características muito semelhantes
entre si, que podem referir-se ao verbo, ao adjetivo ou a outro advérbio. Isso os diferencia
dos chamados modalizadores, que, segundo os autores, de um modo geral, qualificam a
asserção, relacionando-se à sentença inteira.
Quando se referem ao verbo, os advérbios qualitativos apresentam determinadas
restrições seletivas quanto ao conteúdo do verbo que modificam, tendo, portanto, fundamento
argumental. Assim, alguns advérbios não podem referir-se a determinados verbos: o advérbio
gratuitamente, por exemplo, não pode ser atribuído ao verbo pagar.
Isso diferencia os qualitativos dos advérbios aspectualizadores, cuja restrição seletiva
se refere ao esquema tempo-aspectual do verbo: o advérbio geralmente, por exemplo, não
pode referir-se a uma forma verbal, de aspecto pontual e concluído, como, por exemplo, a
forma verbal caiu.
Curiosamente, Ilari et al. (1990), que propõem um trabalho sobre ordenação, pouco
falam acerca das tendências de colocação dos aspectualizadores. Além disso, não mencionam
uma categoria de advérbios de tempo, mas de advérbios aspectualizadores, que “indicam a
freqüência com que um verbo se reitera”. Dos exemplos apresentados pelos autores, todos se
relacionam a noções tradicionalmente associadas ao conceito de aspecto iterativo: geralmente,
normalmente, diariamente, de vez em quando, às vezes, entre outros. Entretanto, os autores
nada dizem sobre elementos adverbiais associados a outras noções aspectuais, como
pontualidade ou duratividade ou mesmo sobre elementos adverbiais, como ontem, hoje e
amanhã, por exemplo, que expressam informações temporais dêiticas, que não se relacionam
à noção de aspecto, mas à categoria gramatical de tempo, que, por definição, possui natureza
dêitica.
Outros autores, como veremos mais adiante, também acrescentam entre os tipos de
advérbios, termos que indicam noções semanticamente associadas a noções aspectuais. Um
exemplo de outro estudo sobre os advérbios e sua classificação é o de Castilho (1999). Nesse
trabalho, os tradicionalmente chamados advérbios de tempo foram arrolados entre um grupo
de advérbios que o autor classificou como qualificadores aspectualizadores.
O autor define a predicação qualificadora como “um processo semântico-sintático por
meio do qual um operador incide sobre uma classe, modificando ou confirmando sua
intenção, isto é suas propriedades específicas, ou traços semânticos ou semas, na terminologia
da Semântica estrutural”. Em seguida afirma que a qualificação é codificada gramaticalmente
pelos adjetivos, pelos advérbios predicativos e pelos adverbiais, representados por um
sintagma nominal ou por um sintagma preposicionado com valor adverbial.
Quanto aos chamados qualificadores aspectualizadores, o autor relaciona essa classe
de advérbios com a noção de aspecto, que possui natureza composicional, que resulta da
interação do sentido lexical do verbo com o tempo em que foram conjugados, seus
argumentos, os adjuntos adverbiais a ele associados e o padrão sintático em que o verbo está
encaixado.
O autor centra suas análises nas noções de perfectividade vs imperfectividade e
telicidade vs. atelicidade e propõe a existência de aspectualizadores imperfectivos e
perfectivos. Vejamos respectivamente dois exemplos dados pelo próprio autor:
(01)... ela teve escritórios durante... oito anos:: mais ou menos
(02) ajeitou os cabelos de um golpe
A importância desse trabalho está no fato de o autor resgatar uma importante relação
entre aspecto e discurso, relacionando os usos desses advérbios aos dois planos discursivos
característicos da narrativa, propostos em Hopper (1979): figura e fundo. O autor propõe que,
na narrativa por ele analisada, as ações imperfectivas ocorrem em fundo e também em figura,
contrariando a proposta de Hopper (1979), de que a imperfectividade é típica de fundo.
O trabalho de Castilho (1999), portanto, tem o valor de sofisticar mais um pouco a
noção de advérbio aspectual. Mas, além de não mencionar questões relacionadas à ordenação,
ainda não resolve os dois problemas básicos apontados. Não analisa outras noções
aspectuais, além da distinção entre perfectividade vs imperfectividade e as noções
semanticamente próximas a ela. Nada menciona acerca dos elementos adverbiais que
expressam informações temporais dêiticas, que não se relacionam à categoria de aspecto, mas
à de tempo.
Outro trabalho que merece menção é o de Givón (2001), que chama atenção para o
fato de que advérbios podem indicar, no tempo, vários aspectos temporais dos eventos e
caracterizam esses advérbios como advérbios de tempo e aspecto. Para o autor, não é o verbo,
mas a cláusula que constitui o escopo semântico destes advérbios, cujas características
morfossintáticas são muito heterogêneas.
Sem entrar em detalhes de análise, o autor apresenta exemplos do inglês, que são
tipicamente aspectuais, como often, always, again, continuously, on and on, entre outros.
Podemos notar que o autor não se restringiu ao aspecto iterativo, na medida em que
apresenta o caso de continuously e on and on, por exemplo, que se relacionam a outras noções
aspectuais, como imperfectividade e progressividade. Por outro lado, apresentam também
exemplos de advérbios tradicionalmente temporais, como yesterday, tomorrow, entre outros.
Essa é a tendência que seguiremos aqui. Adotaremos uma classificação que leve em
conta as noções de tempo e aspecto, procurando refinar a análise das relações entre advérbios
e as diferentes noções aspectuais. Com base nisso, observaremos o comportamento desses
elementos nas diferentes fases do português, na modalidade escrita, tentando relacionar esses
dados com as diferenças em suas tendências de ordenação.
É importante também ressaltar que estamos lidando apenas com advérbios de tempo
e de aspecto em -mente.
2.5.2 Estudos sobre o advérbio em -mente e sobre ordenação de advérbios
Passamos agora a uma revisão dos estudos feitos sobre advérbios em -mente ou sobre
ordenação _ os dois focos principais desta tese _ sob o ponto de vista da ciência Lingüística.
A tese de Rodrigues (1994) apresenta um estudo de cunho variacionista com uma
perspectiva de comparabilidade funcional que analisa outras possíveis funções dos vocábulos
derivados em -mente, além dos adjuntos adverbiais. Afirma que esses vocábulos não
configuram isoladamente uma classe gramatical.
Ao analisar os dados e pressupostos teóricos de diversos autores, Rodrigues pôde
definir o advérbio como “vocábulo de natureza nominal, modificador do verbo que, em
relação aos outros nomes, caracteriza-se por apresentar invariabilidade de gênero e número”
(1994:159).
A autora estabeleceu uma oposição entre função adverbial e quaisquer outras funções
que os vocábulos derivados em -mente pudessem exercer no corpus analisado.
Assim, adotou o termo “pseudo-advérbio” de Bonfim (1988), para agrupar essas
outras funções, a saber: 1) a discursiva (funcionam como marcadores); 2) a de modificador de
nome; 3) a de modificador de sintagma preposicional; 4) a de modificador de sentença; 5) a
de modificador do pronome.
Representou essa distinção no seguinte quadro:
Quadro1 – Distinção entre Advérbio e Pseudo-advérbio
CLASSE
Nomes derivados
Em -mente
FUNÇÕES
Advérbio
“Pseudo-advérbio”:
–discursivo
-modificador de nome
-modificador do SP
-modificador da sentença
-modificador do pronome
(Rodrigues,1994:161)
A autora descobriu que o tipo do verbo aliado à classe do vocábulo que pertence à
classificação semântica do nome em -mente foram os fatores condicionadores da função dos
vocábulos derivados em -mente, que foram, na maioria das vezes, os “pseudo-advérbios”
(Rodrigues, 1994:162).
Outra pesquisa sobre itens em -mente é a dissertação de Freitas (2004), na qual a
autora trata especificamente dos advérbios temporais e aspectuais em -mente na língua oral
portuguesa, sob uma perspectiva funcionalista. Verifica que a posição mais típica desses
advérbios na oração é a pré-verbal quando ocorrem nas orações formadas pela estrutura
padrão da língua portuguesa SVCo (sujeito, verbo e complemento). Além disso, verifica que a
posição pré-verbal era predominante. Constatou, ainda, que há uma diferença de ordenação da
posição pré-verbal para pós-verbal, ou, pelo menos uma tendência para isso, quando não
um argumento verbal na posição adjacente e posterior ao verbo. Freitas verifica também que
certos itens em -mente como primeiramente e finalmente estão se gramaticalizando. Esses
deixam de expressar somente o tempo dos eventos e passam a organizar os eventos
cronológicos em seqüência textual, funcionando, segundo a autora, como conectivo, vejamos
alguns exemplos dados pela autora:
(1) /.../ o meu filho mais velho tem trinta e dois anos, depois eu tenho um filho de vinte e oito,
ai um intervalo de oito anos, eu tenho uma filha, (e finalmente com outro intervalo de seis
anos tem um garoto) (NURC-RJ, INQ. 084, 1.37).
(2) /.../ E: isso...como...como se faz?
I: primeiramente você pega a calha... pega a calha e ::/ tem um:: lugar de colocar o :: porta
start... aí você tem que furar ... os dois buraquinhos do lado... se for lâmpada de duas... porque
tem lâmpada? Tem luminária de uma lâmpada...de duas... tem lâmpada de vinte/.../ (D&G,
Juiz de Fora, 2
o
grau, relato de procedimento).
Segundo Freitas (2004), nos exemplos (1) e (2) acima, os itens destacados possuem
características de ligação entre sentenças e contextos lingüísticos, funcionando como
elementos de conexão.
Moraes Pinto (2002) fez uma análise da colocação e da polissemia de alguns itens
adverbiais em -mente no português arcaico e no português do século XIX, com atenção aos
seus valores qualitativos e modalizadores.
O objetivo desta pesquisa foi demonstrar que alguns advérbios qualitativos e
modalizadores terminados em -mente sofreram, no decorrer do tempo, mudança na sua
polissemia do português arcaico até os dias atuais. Essa mudança é sucessiva e unidirecional e
consiste num processo de gramaticalização, com esses elementos passando de advérbios
internos à cláusula a advérbios sentenciais. Em certos casos, os valores qualitativos
encontrados no início da trajetória desaparecem e os advérbios passam a assumir funções
pragmático-discursivas.
Os diferentes valores semânticos desses elementos implicam diferentes colocações e
funções na oração. No português arcaico, os advérbios qualitativos possuíam grande
mobilidade na cláusula, podendo ocupar diversas posições, inclusive a de tópico. A partir do
século XIX, algumas posições se tornaram indisponíveis a esses advérbios, pois, com o
processo de gramaticalização, conforme seus valores semânticos se modificavam, eles
passaram a ter um caráter específico e passaram a depender das características gramaticais de
sua nova função. Esse trabalho tem grande relevância para a presente tese, pois nos aponta
alguns caminhos a ser trilhados, como em relação ao processo de gramaticalização, a questão
ordenação no decorrer do tempo, além dos fatores analisados que motivaram sua realização
através dos séculos.
A pesquisa de Andrade (2005), sobre a ordenação das locuções adverbiais de tempo
em 100 editoriais sob o arcabouço teórico funcionalista, demonstrou que as locuções
temporais não têm uma posição prototípica nesse gênero, apresentando apenas uma pequena
tendência de ocorrência na posição pós-verbal (55% dos dados). A autora observou que as
locuções (tanto as pequenas como as mais longas), em editoriais tendem a aparecer nas
posições marginais à cláusula, ou seja, logo no início da cláusula ou no final, como nos
exemplos a seguir:
.
(3) Nas últimas duas eleições, indiretas, não houve sequer desafiante. (12-JB/1999).
(4) É a oportunidade de recuperar o verniz que o partido perdeu ao longo do caminho. (129-
JB/2004).
As locuções, no gênero estudado, aparecem normalmente na posição de sujeito quando
este está ausente (sujeito oculto ou oração sem sujeito) ou está na posição pós-verbal. Neste
caso, ou seja, na ordem VS (verbo-sujeito), 74% das locuções coletadas estão na posição pré-
verbal, como no exemplo:
(5) Nos últimos dois meses, foi roubado o carro blindado do ministro da justiça. (47-
JB/2003).
Mas, quando o sujeito está na sua posição prototípica, ou seja, na ordem SV, as
locuções adverbiais aparecem 68% na posição pós-verbal, como no exemplo a seguir:
(6) A Libéria nasceu em 1822, como pátria de ex-escravos americanos. (JB/2003).
Como Andrade, também verificaremos a posição dos advérbios em -mente e a relação
com a presença ou ausência do sujeito.
Cezario, Ilogti e Costa (2005) verificaram que, em textos religiosos contemporâneos,
as locuções tendem a ocorrer na posição pré-verbal (62% dos dados), como no exemplo:
(7) “minutos depois estava ali apenas a mulher e ele (CSP)
De todos os tipos semânticos estudados (locuções dêiticas, durativas, reiterativas e
simultâneas) pelas autoras, apenas as durativas tendem a ocorrer em posição pós-verbal
(72%).
As autoras observam que as locuções que aparecem inseridas entre o sujeito e o verbo
ou entre o verbo e o complemento/predicativo estão em orações com baixíssima
transitividade, como as com verbo de ligação ou com modal e verbo de ligação:
(8) “A aclamação depois da consagração também pode ser cantada” (p.74, l.11 CEV)
(9)Nossas músicas deverão ser ao mesmo tempo carismáticas e proféticas (p.84, l.28 CEV)
as orações com mais traços positivos de transitividade tendem a ter as locuções em
posições marginais, como abaixo em que a locução A seguir ocorre na margem esquerda de
uma oração altamente transitiva:
(10) “(...) rangeu os dentes, mudou de cor, fez a pior carranca do universo, prendeu as mão e
deu um grito de raiva. A seguir levantou o soldado pela roupa, virou o rosto e disse (...)” (p.
143, CSP).
Essa pesquisa é importante para a presente tese, pois também será testada a relação
entre semântica do elemento adverbial e ordenação. A questão da transitividade será vista
indiretamente ao estudarmos a relação entre tipo semântico do verbo e a posição do advérbio.
Albani (2007) verificou que a posição típica do advérbio sempre era pré-verbal no
português arcaico e pós-verbal no português contemporâneo. Todos os fatores estudados
indicam que, no português arcaico, a ordem era mais livre e mais motivada, enquanto no
português atual a ordem é mais fixa. Segundo ele, há um forte indício de mudança na
ordenação do advérbio sempre em textos religiosos.
Seu trabalho foi importante para esta tese, pois é uma pesquisa de ordem diacrônica e
que traz resultados interessantes quanto à fixação de posição de advérbios. Muitos dos fatores
testados por ele também foram testados por nós, como a relação entre tipo semântico de verbo
e ordenação de advérbio. Com relação a esse fator, Albani destaca que, no português atual, o
advérbio sempre quase que categoricamente se apresenta na posição pós-verbal quando o
verbo é relacional intensivo (verbo de ligação).
Uma pesquisa de grande importância para o nosso trabalho é a realizada por
Martelotta (1994) que; analisa, em uma perspectiva funcional, a ordenação dos
circunstanciadores temporais. Esses compreendem os advérbios, adjuntos, orações adverbiais
e operadores argumentativos que expressam a noção do tempo. O corpus utilizado é
constituído de entrevistas elaboradas pelo Censo de Variação Lingüística, Competências
Básicas de Português e NURC. Para o estudo diacrônico dos operadores argumentativos,
foram utilizados textos antigos, como: “Vigeu da Consolação” (1959), “A demanda do Santo
Graal” (1944), “O Bosco Deleitoso” (1950), dentre outros.
O objetivo do estudo do autor é buscar fatores discursivos que motivem a colocação
desses circunstanciadores na sentença. Em outras palavras, o autor propõe demonstrar que os
argumentadores discursivos seguem leis e tendências de colocação diferentes dos demais
circunstanciadores. A ordenação dos argumentadores discursivos deve-se a dois processos de
mudança semântica: metáfora espaço> (tempo) > texto (Heine et al., 1991) e pressão de
informatividade. ( Traugott e Heine, 1991).
O primeiro processo de mudança consiste em um elemento de valor espacial assumir
um sentido temporal e, depois, passar a expressar relações lógicas no discurso. Por exemplo:
“O operador argumentativo aí, originalmente um dêitico espacial, pode também ser usado
para seqüenciar (temporalmente) os eventos e expressar uma idéia de conseqüência em
relação às sentenças anteriormente mencionadas” (Martelotta 1994:5).
A mudança por pressão de informatividade dá-se quando um elemento lingüístico
adquire um novo valor através de um processo de inferência conversacional em certos
contextos. Um exemplo citado por Martelotta é o do operador argumentativo “ainda cujo uso
de marcador de contra-expectativa, por um processo de inferência passa a assumir um valor
inclusivo semelhante ao do termo também” (1994:6).
O autor ressalta que geralmente esses dois processos de mudança ocorrem juntos
quando se trata do aparecimento de operadores argumentativos que tendem a perder sua
mobilidade original para assumir posições mais fixas na sentença. Esse processo de
gramaticalização foi estudado nos seguintes operadores argumentativos: aí, depois, logo,
então, já e ainda.
Ao apresentar a ordenação dos circunstanciadores temporais, propriamente ditos,
Martelotta adota o princípio de Hopper e Thompson (1980) de que o discurso narrativo
apresenta duas estruturas denominadas figura e fundo, estendendo-o ao discurso não-
narrativo.
Distingue figura e fundo, primeiramente, opondo a intenção do falante ao direcionar o
fluxo do discurso para a narrativa ou para a não-narrativa: se o falante está narrando, eventos
e situações não-narrativas funcionam como fundo; e, ao contrário, se o falante está
comentando ou descrevendo, eventos e situações narrativas funcionam como fundo, servindo
para evidenciar este comentário ou esta descrição (1994:2-3).
Uma outra distinção entre figura e fundo é realizada através da análise de traços
semântico-gramaticais. Assim, na narrativa, os eventos funcionam como figura quando são
marcados pelos traços [=específico], [=perfectivo], [=cinético], [pontual] e funcionam como
fundo quando marcados pelos traços [-específico], [-perfectivo], [-cinético], [-pontual].
no discurso não-narrativo, os eventos que funcionam como figura são marcados
pelos traços [-específico], [+perfectivo], [+cinético], [+pontual] e funcionam como fundo,
aqueles marcadores por [-específico], [-perfectivo], [-cinético], [-pontual].
Com o objetivo de verificar as tendências de posições desses circunstanciadores de
tempo, Martelotta os classificou em:
a)Circunstanciadores de tempo determinado- são aqueles que indicam, de forma precisa, o
momento em que ocorre o evento. Cita como exemplos: ontem, hoje, semana passada,
quando ele chegou etc.
b)Circunstanciadores de tempo indeterminado- expressam a noção de que os eventos e
situações perduram no tempo indeterminadamente. Exemplifica com: sempre, geralmente,
atualmente, nunca etc.
c)Circunstanciadores iterativos- denotam a freqüência com que os eventos não-específicos
ocorrem ao longo do tempo, como às vezes, duas vezes por semana, de vez em quando etc.
d)Circunstanciadores de simultaneidade- expressam a concomitância entre eventos e
situações. Como os exemplos, citam: enquanto isso, ao mesmo tempo etc.
e)Circunstanciadores delimitativos- delimitam os eventos e as situações, indicando o início
e/ou fim de sua permanência no tempo, como: há três anos, até hoje, durante dois meses etc.
O autor conclui que existe uma tendência determinada para a colocação dos
circunstanciadores temporais na sentença. Essa depende da força que a informação, carregada
pelo circunstanciador, assume dentro da estrutura do discurso em que ele ocorre.
O circunstanciador tende a aparecer em posições pré-verbais, “quando traz
informações temporais análogas aos traços semântico-gramaticais do discurso em que ocorre.
Esta relação semântica empurra o circunstanciador para as posições pré-verbais, enfatizando-o
ou topicalizando-o” (1994:201).
No entanto, se não essa relação semântica, o circunstanciador tende a ocorrer nas
posições pós-verbais, ou até não ocorrem “em tipos de discurso cujos traços semântico-
gramaticais são não-análogos ou incompatíveis com a informação temporal por ela expressa”
(1994:201). Dessa forma, os circunstanciadores de tempo determinado tendem a ocupar
posições pré-verbais em figura narrativa e não-narrativa, uma vez que a força informativa que
assumem nestes contextos os leva a ser topicalizados ou enfatizados.
Os circunstanciadores de tempo indeterminado e os circunstanciadores de
simultaneidade têm como tendência o aparecimento na posição pré-verbal em fundo narrativo
e não-narrativo, devido também à força informativa assumida que os leva a topicalização ou
ênfase.
No que se referem aos circunstanciadores iterativos, esses apresentam maior
ocorrência nas posições pré-verbais em fundo narrativo e não-narrativo e em figura não-
narrativa, já que esses tipos de discursos são marcados pelo traço [-específico], estimulando a
iteratividade.
Por fim, os circunstanciadores delimitativos possuem uma mobilidade de colocação
maior, porque apresentam duas características distintas: por um lado, funcionam como um
circunstanciador de tempo determinado (indica o momento específico em que se inicia e/ou
termina o evento). Por outro lado, “expressam a duração de eventos específicos imperfectivos,
ou de eventos não-específicos ao longo do tempo, acrescentando características semântico-
gramaticais típicas de fundo” (1994:229).
Quanto à colocação dos operadores argumentativos, Martelotta afirma que, devido ao
processo de gramaticalização que sofrem, não seguem as mesmas tendências de ordenação
dos circunstanciadores propriamente ditos. A gramaticalização faz com que o elemento exerça
funções argumentativas, restringindo a sua possibilidade de colocação na sentença. Tal
colocação “passa a depender mais das características gramaticais específicas de suas novas
funções, que se manifestam em contextos específicos, assumindo posições mais fixas dentro
da sentença” (1994:229-230).
O trabalho de Martelotta (1994) foi muito importante para presente tese, sobretudo, no
que se refere às posições estabelecidas, como também no que se refere a alguns parâmetros da
transitividade, à análise bastante detalhada dos circunstanciadores de tempo, buscando fatores
que influenciam a sua colocação na sentença à luz da teoria funcional.
Ressaltamos que o autor estuda os advérbios em geral, enquanto, esta tese trata apenas
dos advérbios de tempo e aspecto em -mente.
França (2002) parte da tese de Martelotta e faz uma análise dos adjuntos adverbiais de
tempo e aspecto em narrativas orais e escritas contemporâneas, procurando delimitar os
valores que esses adjuntos apresentavam no texto narrativo, assim como as tendências de
colocação que eles assumiam nas cláusulas que compunham o texto. Esses adjuntos
adverbiais de tempo e aspecto, de um modo geral, apresentam uma grande mobilidade na
cláusula, podendo ter suas tendências de ordenação explicadas por fatores de caráter sintático
e discursivo.
Um dos fatores mais importantes foi o plano discursivo. A autora verificou que
tendiam a serem enfatizados, ocupando posições pré-verbais, os adjuntos que apresentavam
traços semântico-gramaticais análogos aos traços semântico-gramaticais do plano de discurso
em que apareciam; enquanto os adjuntos adverbiais de tempo e aspecto determinados não
apresentaram resultados estatísticos que ratificassem a hipótese postulada; já os adjuntos
adverbiais de tempo e aspecto indeterminados tendiam a ocupar posições pré-verbais em
fundo, porque este tipo de discurso caracteriza-se pela presença de situações não-específicas;
e ainda, os adjuntos adverbiais de tempo e aspecto de simultaneidade tendiam a ocorrer em
fundo e em posições pré-verbais. Isto ocorria porque o discurso de fundo tende a apresentar
traços semântico-gramaticais (não-específicos) marcados pela simultaneidade; os adjuntos
adverbiais delimitativos, embora não tenham apresentado tendência muito forte, pareciam
buscar as posições pós-verbais em figura já que expressavam a duração de eventos específicos
imperfectivos, ou de eventos não-específicos ao longo do tempo, apresentando traços
semântico-gramaticais típicos de fundo; enquanto aos adjuntos adverbiais de tempo e aspecto
iterativos tendiam a ocorrer em posições pré-verbais de fundo, porque este tipo de discurso é
marcado pela presença do traço não-específico; e, além disso, a ordenação vocabular,
portanto, não podia ser explicada por fenômenos estritamente sintáticos.
Portanto, a estrutura organizacional do texto influenciava a colocação dos adjuntos
adverbiais de tempo e aspecto.
O estudo de Pereira (1999) verifica a ordenação das orações adverbiais de tempo,
desenvolvidas e reduzidas, num corpus constituído por 108 cartas pessoais, escritas entre
1937 e 1987. Esse trabalho, baseado nas teorias variacionista e funcionalista, busca identificar
os fatores cognitivos e discursivos que motivam a variação da ordem de algumas dessas
orações, tornando-as fixas na sentença.
Os dados foram separados em dois grupos: 1)orações temporais com ordenação
variável (total ou parcial) e 2) orações temporais de ordem fixa ou categórica. Segundo a
autora, o primeiro grupo foi submetido a uma análise estatística multivariacional através do
pacote de programas VARBRUL. O segundo foi analisado qualitativamente:
Pereira observou as seguintes posições da oração temporal:
a)Anteposição: corresponde às orações temporais situadas na margem esquerda da oração
núcleo.
(11) ”Um dia desses fui pedir uma xícara de chá e só ela estava lá.
Quando pedi que ela fizesse, ela tremeu de alegria e disse...
b) Posição: corresponde às orações temporais situadas na margem direita da oração com que
se combinam.
(12) “Escreva-me contando assim que tiver um tempinho”.
c) Intercalação: corresponde às orações temporais situadas no interior da oração núcleo,
quebrando a fluidez da idéia apresentada nesta oração.
(13) “M. vou parando por aqui senão quando voltar não tenho novidades pra te contar”.
Verificou que não houve diferença marcante entre posposição e anteposição. Percebeu,
também, que muitas das orações temporais intercaladas eram reduzidas de infinitivo e curtas
(cerca de quatro palavras cada uma), o que proporcionava uma melhor fluidez do discurso,
facilitando de certa forma o processo comunicativo.
Dentre os vários fatores analisados, destacamos o que se refere aos tipos de verbo do
segmento temporal. Os verbos foram codificados a partir de três classificações baseadas em
Dik (1989) e Braga (1996):
1-Ação (realização e atividade)
2-Processo (mudança e dinamismo)
3-Situação (posição e estado)
Os resultados mostram que o tipo de verbo do enunciado temporal é mais freqüente
seguido do processo, e o menos freqüente é a situação. A autora relata que “os resultados para
o tipo de verbo das orações isoladas não se mostram eficientes”, portanto considerou “para a
análise a correlação dos tipos de verbos das orações que compõem o enunciado temporal”
(1999:72). Dessa forma, constatou que “as orações com verbos de ação tendem a vir na
segunda posição, independentemente de constituírem o núcleo ou o satélite do enunciado
temporal (...) orações com verbos de situação e processo tendem a vir na primeira posição,
quando associadas a uma oração com verbo de ação, funcionando como pano de fundo para
os eventos mais dinâmicos codificados na segunda oração” (1999:72-73).
Outro fator que também colocamos em evidência é aquele que concerne à distribuição
de informação. Pereira analisou o tipo de informação codificada pela oração núcleo e pela
oração temporal. Ambas as orações foram classificadas conforme as categorias: novo, velho e
inferível, nos termos de Prince (apud Pereira, 1999). Os resultados mostram que orações
temporais que codificam informação velha, mencionadas no discurso anterior, são mais
propensas à anteposição. Sendo assim, ”Orações temporais que codificam informação nova,
não mencionada no contexto e nem inferível dele, são preferencialmente pospostas (...) o
contexto mais favorável à anteposição da oração temporal é aquele em que se relacionam uma
oração núcleo nova e uma oração temporal com informação velha” (1999:88).
No que diz respeito às orações temporais de ordem fixa, verificou que os bloqueios
mais freqüentes à reversibilidade das orações pospostas são: as com o focalizador sozinho e as
que estão ancoradas num constituinte da oração anterior.
Quanto à anteposição da oração temporal, os resultados mostraram que os fatores mais
relevantes para a fixação dessas orações são: em primeiro lugar, as relações anafóricas, em
segundo lugar, as expressões cristalizadas, em terceiro lugar, a seqüência discursiva.
A relevância do trabalho de Pereira para o presente estudo justifica-se por também
investigar fatores que tendem a motivar a ordenação dos elementos em análise.
Lessa (2007) se propôs investigar a ordenação de circunstanciais temporais (advérbios
e sintagmas preposicionados com valor circunstancial) na modalidade escrita do português e
do inglês, levando em conta, principalmente, fatores de ordem discursiva. A autora constatou
que, para se abordar a questão da ordem não marcada, deveria considerar as duas línguas
(português e inglês) de forma distinta.
Quanto aos resultados obtidos nesse estudo, verificou-se que os advérbios tendiam a
ordem não marcada no inglês é a anteposição verbal. Já em relação aos Spreps, não houve
como tirar essa conclusão, devido à grande variabilidade na oração.
Além disso, em relação ao posicionamento mais detalhado dos circunstanciais de
tempo na cláusula, observou-se que os advérbios em português ocupavam as posições ME
(margem esquerda) e PM2 (entre o verbo e objeto) com mais freqüência, enquanto no inglês,
eles preferiam a PM1(entre o sujeito e o verbo). Este fato no inglês pôde ser explicado,
principalmente, em virtude de os advérbios menores possuírem uma ordem mais rígida. Os
Spreps em português possuíam uma clara preferência pela margem direita da oração,
enquanto que, em inglês, os Spreps apresentaram grande variabilidade nas duas margens da
oração.
Portanto, a função discursiva dos circunstanciais possui grande influência na
ordenação de advérbios e Spreps nas duas línguas.
Esse estudo sobre Ordenação de Circunstanciais Temporais em Português e Inglês:
posições e papéis discursivos foram importantes por também investigar as posições que esses
constituintes ocupam na cláusula.
Nesta tese, examinamos os seguintes fatores: a posição dos advérbios, a noção
semântica do advérbio, o tipo semântico do verbo, o tipo de sujeito, o tipo de oração, dentre
outros.
Esta revisão permitiu-nos conhecer, mais profundamente, as questões abordadas
acerca dos advérbios em geral, sobretudo, aquelas referentes à sua classificação e às suas
posições na cláusula e, com certeza, foi esclarecedora ao longo desse estudo.
2.6 Os advérbios e a expressão de tempo
Tempo e aspecto são duas categorias gramaticais que expressam noções temporais. A
categoria de tempo é dêitica, já que sua utilização depende diretamente do momento em que o
enunciado foi proferido. Por outro lado, isso não ocorre com a categoria de aspecto.
As noções de tempo e de espaço são partes substanciais das relações do homem com o
mundo. Os dois são delimitados: o tempo, em minutos, horas, dias, meses, séculos; o espaço,
em centímetros, metros, milhas, etc. Todos são referências necessárias na vida de cada um de
nós. Portanto, a língua que falamos está repleta de recursos, para que possamos situar nossas
ações em relação aos dois: agora, antes, depois, ainda - para tempo; aqui, acolá, além - para o
espaço.
Qualquer ato de comunicação é situado no tempo e no espaço. Na simples situação de
comunicação - o diálogo - o indivíduo que fala refere-se a si mesmo como eu que designa seu
ouvinte como tu/você. Ao referir-se ao espaço em que se encontra o indivíduo que fala
identifica-o como aqui; e ao referir-se ao momento em que fala, pode designá-lo como agora.
Eu, você, aqui e agora não nomeiam indivíduos, lugar e época determinados e
constantes, mas apenas "o indivíduo que fala", alguém a quem ele se dirige, e o "lugar" e
"momento" em que ocorre o diálogo. Seus referentes não são, portanto, objetivos e externos à
fala (como João, Paula, na sala e às 2 horas), mas situacionais e exclusivos do ato de falar,
fora do qual não podem ser reconhecidos e os elementos utilizados para designar a esses
referentes são chamados dêiticos (termo derivado de uma palavra grega que significa "indicar,
mostrar, apontar")
A categoria gramatical de tempo, segundo Lyons (1979) diz respeito às relações
temporais que são expressas por contrastes gramaticais sistemáticos. Os gramáticos
tradicionais, na análise do grego e do latim, apresentam três contrastes dessa natureza:
passado, presente e futuro. A categoria de tempo relaciona o tempo da ação indicada pelo
verbo, em relação ao momento em que o falante produz seu enunciado, o que significa que o
tempo é uma categoria dêitica.
A pessoa que fala, ou escreve, "comanda", por assim dizer, a atividade discursiva,
normalmente transformando-a, ou colaborando para transformá-la, numa complexa rede de
atos de significação que têm no eu, no aqui e no agora do discurso seus pontos de referência.
A indicação do tempo como categoria de linguagem verbal é parte dessa interação
comunicativa, ou ainda dessa atividade discursiva, tempo, que tem no momento da
enunciação seu ponto principal de referência.
Nesse sentido, os advérbios que expressam a categoria de tempo seriam aqueles que
apresentam valor dêitico, localizando os eventos na linha do tempo, em relação ao momento
da produção de enunciado. São eles: ontem, hoje e amanhã, logo mais, quarta-feira passada,
além de depois, anteriormente, posteriormente (em contextos em que está ancorado ao
momento da fala, ou seja: depois, anteriormente ou posteriormente ao momento da fala), etc.
Em alguns casos, os advérbios temporais podem não ser dêiticos, ou seja, podem
localizar na linha do tempo, sem tomar como referência o momento da fala, mas a conclusão
do evento anterior, ou qualquer ponto no tempo mencionado no texto. É o que ocorre, por
exemplo, em depois da aula e antes do jogo, que constituem indicações temporais não-
dêiticas, que localizam o evento na linha do tempo, tomando como ponto de referência
pontos já fixados no tempo, e não o posicionamento dos participantes. Os seqüenciadores em
geral estão nessa categoria: depois, , então, etc.
2.7 Os advérbios relacionados à categoria de aspecto
Para que possamos compreender a noção de advérbio de aspecto, devemos fazer uma
breve reflexão acerca da categoria gramatical de aspecto.
As gramáticas tradicionais falam pouco acerca da categoria de aspecto. São muito
poucos os autores que se preocupam em apresentar o aspecto como uma categoria do verbo e
defini-lo de maneira objetiva. O que mais encontramos são rápidas alusões à noção de
aspecto, espalhadas pelos capítulos referentes ao estudo dos verbos. Said Ali (1969:161), para
citar um exemplo, apresenta uma minuciosa análise do emprego das diferentes formas
verbais, utilizando termos como “iterativo”, “ação durativa” e “ação freqüentativa, mas sem
mencionar a palavra aspecto.
Luft (1978) é um dos poucos gramáticos que trata a categoria de aspecto em uma
seção especial, em que define aspecto como “a categoria verbal que exprime a oposição
término/não-término ou acabado/não-acabado, a duração do processo”. Na seqüência, o autor
afirma que o aspecto pode manifestar-se juntamente com o tempo, como em canto/cantei,
cantara/cantava, onde existe a oposição acabado/não-acabado. Mostra também que esta
categoria pode manifestar-se através de locuções verbais, sufixos, ou pelo próprio radical do
verbo, indicando exemplos de aspectos incoativo, iterativo, cursivo e cessativo.
Luft afirma que os verbos, em oposição aos nomes, caracterizam-se pela “idéia
temporal: o início, a duração ou o resultado de um processo (aspecto) ou o momento de sua
ocorrência (tempo)”. Propõe também, ao comentar as locuções verbais, que as locuções
indicam os aspectos do processo verbal: anterioridade, posterioridade, continuidade,
repetição, progressividade, início, conclusão, etc. Notamos aqui, mais uma vez, uma
inadequação entre as noções aspectuais e a definição proposta, o que nos faz pensar se a
palavra aspecto aqui foi usada no sentido indicado na definição ou naquela acepção
descompromissada que encontramos na maioria das gramáticas.
Podemos ver, na gramática em questão, a preocupação de incorporar de forma
explícita a categoria de aspecto no estudo dos verbos. Mas o resultado ainda está longe de
deixar claro o que significa aspecto verbal, em função da falta de clareza com que é definida a
categoria e, sobretudo, da inadequação com que são propostas as noções a ela ligadas.
Saindo do âmbito das gramáticas tradicionais, podemos citar o estudo de Travaglia
(1994) sobre aspecto verbal. Fazendo uma distinção básica entre tempo (tempo gramatical) e
TEMPO (tempo real ou cronológico), Travaglia (1994) afirma que a categoria de tempo é
dêitica, uma vez que situa o momento da ocorrência da situação em relação ao momento da
fala; ao passo que o aspecto é uma categoria temporal não-dêitica, pois se refere à situação em
si, sem levar em conta o momento da enunciação.
Travaglia (1994) propõe a seguinte definição para a categoria verbal de aspecto:
Aspecto é uma categoria verbal de tempo não-dêitica,
através da qual se marca a duração da situação e/ou suas
fases, sendo que estas podem ser consideradas sob
diferentes pontos de vista, a saber: o do desenvolvimento, o
do completamento e o da realização da situação
. (p. 38)
Com base nisto, Travaglia apresenta um conjunto de noções aspectuais, que
resumiremos a partir de agora, utilizando, para facilitar a compreensão, os exemplos do
próprio autor.
No que se refere à sua duração, uma situação pode ser durativa, quando seu início e
término ocorrem separados por um período de tempo relativamente longo; ou pontual, quando
seu início e término ocorrem no mesmo instante, ou separado por um período de tempo muito
curto. Vejamos, respectivamente, um exemplo de cada ocorrência:
(01) D. Maria passeia todos os dias.
(02) Salto do trampolim há anos.
Afirma ainda o autor que a situação durativa pode ser apresentada como limitada,
quando se indica o seu início, o seu fim ou o valor da sua duração; ou ilimitada, quando o
início e o fim da situação não são conhecidos nem sugeridos. Eis um exemplo de cada uma
respectivamente:
(03) Ele estava nadando desde 6 horas da manhã.
(04) A terra gira em torno do sol.
Tanto a duração limitada quanto a duração ilimitada podem ser contínuas ou
descontínuas. Serão contínuas, quando se apresentarem sem nenhuma interrupção no seu
tempo de existência. Por outro lado, serão descontínuas as situações que apresentarem
interrupções na sua duração:
(05) A terra gira em torno do sol.
(06) De tempos em tempos explodia uma bomba.
Travaglia propõe ainda que as diferentes fases de uma situação estão relacionadas às
informações referentes à realização, ao desenvolvimento ou à complementação da situação.
Vejamos cada um destes casos.
Do ponto de vista da sua realização, temos três fases da situação:
a) Fase em que a situação ainda não começou. Trata-se de um momento anterior à consecução
da situação.
(07) Pedro está para emoldurar o quadro.
b) Fase em que a situação já é começada.
08) Os rapazes continuam jogando apesar da chuva.
c) Fase em que a situação já terminou.
(09) O treinador do time esteve doente.
Do ponto de vista do seu desenvolvimento, temos também três fases da situação:
a) Início - A situação é apresentada como estando em seu ponto de início, ou em seus
primeiros momentos. A esta noção aspectual dá-se o nome de inceptividade ou incepção.
(10) Os marceneiros estão começando a armar o telhado.
b) Meio - A situação é apresentada em andamento. Essa noção é caracterizada pelo termo
cursividade.
(11) Estou lendo um livro muito interessante.
c) Fim - A situação é apresentada em seu ponto terminal. Trata-se da noção aspectual de
terminatividade.
(12) Mamãe terminou de bordar minha blusa hoje ao meio-dia.
Travaglia (Op.cit) ainda observa a situação do ponto de vista do seu complemento.
Assim uma situação pode ser:
a) Completa - A situação é apresentada em sua totalidade, com seu começo, meio e fim
englobados num todo. De acordo com Travaglia, esta é a noção aspectual de perfectividade.
(13) Antônio ouviu música o dia todo.
b) Incompleta - Quando a situação não apresenta uma das fases do seu desenvolvimento.
Temos aqui a noção aspectual de imperfectividade.
(14) Ele estava nadando desde seis horas.
Registrando o fato de que pode ocorrer uma não atualização de aspecto quando a
situação não apresenta referências à sua duração ou às suas fases, Travaglia propõe um quadro
bastante completo das noções aspectuais no português:
Martelotta (1986) propõe que o trabalho de Travaglia, embora bastante completo, não
se mostra eficiente quando aplicado à realidade da língua falada, que o autor parece estar
mais preocupado em adaptar a teoria tradicional dos aspectos à realidade lingüística do que, a
partir de dados reais, questionar as hipóteses tradicionais.
Em função disso, Martelotta (1986) optou por uma proposta mais voltada para o uso
da língua, observando, em seu estudo sobre o presente do indicativo, a relação entre uma série
de propriedades semântico-gramaticais que se associavam às formas verbais por ele
analisadas de acordo com o tipo de discurso em que essas formas verbais ocorriam. Muitas
dessas propriedades estão associadas às noções aspectuais propostas por Travaglia, mas
diferem dessas noções por se apresentarem de modo a refletir a gica organizacional do
texto.
2.8 A formação de advérbios em -mente
Analisando a origem dos advérbios, verificamos que, dos advérbios latinos, a sua
maioria foi originada, de nomes ou pronomes e poucos passaram às línguas românicas.
Enriqueceram-se estas, todavia, com algumas formas oriundas de formações desconhecidas
do latim literário, com grande produtividade e, em especial, com os advérbios em -mente que
se afixam aos adjetivos. Esta terminação nada mais é do que o ablativo do latim mens, v.g. em
bona mente. Com o uso de locuções deste tipo formaram outros tipos, acabado por alterar a
significação primitiva do substantivo mente e passando assumir o valor de um sufixo
derivativo.
O substantivo latino mens, mentis (“mente, alma, espírito, inteligência”) modificado
por um adjetivo refletia o estado de ânimo ou o modo na qual à ação verbal se levava em
consideração. Com passar do tempo, o substantivo foi assimilado a este tipo de estrutura
sintática e semântica e acabou por perder o seu valor original para se converter num sufixo
adverbial. Esta estrutura morfológica (base + mente) é muito produtiva na criação de
advérbios. No levantamento dos dados dos corpora selecionados, verificamos que esse sufixo
é muito produtivo, mesmo nos primórdios da língua, principalmente com as noções de modo,
de qualificador e modalizador. Vejamos alguns exemplos dos corpora estudados:
(1) ... posto que seyam muy grauemete enfermos.(OE, p.47)
(2)... taaes como estes presume no dignamete etender e achar dulçura(OE,p.48)
(3)
P
rimeiramente salvanayque, regedor que agora he, tem de remda hu~u conto e cem mil
pardaos d ouro, este he senhor de charama~odel, e de nagapata~o, e tamgor, e bomgarim, e
dapata~o, e do truguel, e de caullim, e todas estas sa~o cidades (Século XVI/Crônica dos Reis
de Bisnaga)
(4)... por ignorar o motivo se será para falta desaude, ou qualquer acontecimento que
lhesucedese, oque infinitamente sentirey como amigo [ espaço]igualmente tenho sentido
afalta daremeça dadita patente ejulgo omotivo por haver algum embaraço nasecretaría, pois
pela demora que tem havido ja mequerem puxar para ojugo dos auxiliarez os quaes são
bastantemente incomodados(
século XVIII - administração privada/carta de comércio/ PHPB)
(5)... assim cumpri com a Comissão que a minha Bemfeitora (a quem pesso Beijes as mãos
em meu nome) me incumbio, cum prindo igualmente com a comissão da Rainha (Cartas do
PHPB - RJ / séc. XIX)
(6) Deus simplesmente não age assim. Deus é santo - moralmente perfeito. (EC,p.45, Port.
atual)
(7) Jesus era inicialmente homem, depois se tornou Deus. (EC,p.63, Port. atual)
Nos exemplos expostos, observamos as diversas formações derivativas dos advérbios
em -mente (grave+ mente, digna+ mente, primeira+ mente, infinita+ mente, igual+ mente,
bastante+ mente, simples+ mente, moral+ mente e inicial+ mente), além de sua produtividade
e usualidade com as acepções de modo, qualificador, modalizador e temporal, este último não
tanto quanto as noções anteriores.
É interessante acrescentar, ainda, sobre a formação dos advérbios que outros autores,
como Vilela (1979), apresenta-nos algumas considerações acerca dessa categoria gramatical:
o léxico constitui-se de um conjunto de unidades léxicas (palavras lexicais, lexemáticas,
lexemas), ou seja, unidades que representam a realidade extralingüística e que pertencem
tanto à semântica como também à gramática da língua.
Tendo em vista que palavras lexicais concretas contêm, além do valor lexical, uma
significação categorial, o autor considera tais palavras as unidades fundamentais do léxico de
uma língua. Estes podem ser ampliados principalmente através de dois processos: a derivação
e a composição.
A derivação é o processo de formação vocabular em que ocorre a adição de afixos
(prefixos e sufixos) a uma base ou radical e a composição é o recurso de enriquecimento
vocabular que se pela união de dois ou mais radicais, que formam um vocábulo cujo
significado não precisa ser necessariamente a soma dos significados de cada radical. Vale
ressaltar que na composição os vocábulos estabelecem entre si relações sintáticas de
subordinação e/ou coordenação (Cf. Carone (1988).
Vejamos os exemplos:
(8) porta-bandeira, aguardente (subordinação);
(9) vaivém, leva-e-traz (coordenação).
Apesar de serem processos diferentes, derivação e composição não se excluem, o que
será ilustrado a seguir com o vocábulo em -mente.
Os estudos históricos apontavam para o advérbio como um elemento modificador.
Pereira (1932), remontando a Aristóteles, afirma que os advérbios formavam, juntamente com
as preposições e as conjunções, uma das quatro partes do discurso (a quarta era as
interjeições), porém apenas sob o rótulo de “conjunções”.
Mais tarde, os gramáticos gregos de Alexandria redividiram as partes do discurso,
desdobrando as “conjunções” em três categorias: as conjunções propriamente ditas, as
preposições e os advérbios. O autor divide o estudo das categorias gramaticais em lexical ou
taxionômico e sintático ou gico. No primeiro, expressa a idéia geral da categoria e o
segundo a sua função na frase. Neste ponto, o gramático não difere dos outros estudiosos
quanto ao conceito e função dos advérbios.
Pereira (1932) afirma ainda que os advérbios, do tipo que estamos chamando de
qualitativo, formam uma categoria que se assemelha à do adjetivo devido à idéia de
qualificação que o advérbio apresenta. Diz, também, o autor que o processo de formação de
advérbios em -mente a partir de adjetivos é recente e desenvolveu-se no português e em outras
línguas românicas ocidentais. O processo consistiu na aglutinação do adjetivo ao substantivo
feminino mente. A expressão era escrita separadamente desde o latim, entretanto, diz Pereira,
que os dois elementos se uniram na escrita por força da pronúncia e o substantivo -mente,
antes palavra autônoma, passou a ser interpretado como sufixo adverbial, como o vemos nos
dias de hoje e, também, no português arcaico. Mas, segundo Martelotta, Barbosa & Leitão
(2002b), a variação entre a grafia separada ou junta, encontrada no português arcaico, deve ser
interpretada com precaução, pois antes de constituir um processo de gramaticalização, pode
ser apenas opção adotada na impressão gráfica:
Entretanto, não podemos esquecer que não
dependemos da fidedignidade da edição para sabermos se
as palavras estavam de fato juntas no original, mas
também que, mesmo nos manuscritos, muitas vezes a
união, ou separação, entre vocábulos poderia ser usada
para se justificar a mancha gráfica na página. Desse
modo, devemos tomar cuidado ao relacionar a escrita
separada/junta dos elementos com sua gramaticalização,
pois o controle estatístico pode revelar o real avanço
da grafia dos advérbios em -mente como um único
vocábulo.
Pereira (1932.) classifica os advérbios de forma semelhante à que fazem os outros
autores: de acordo com as circunstâncias de afirmação, dúvida, negação, lugar, tempo,
quantidade, modo, ordem, designação, etc.
Carneiro Ribeiro, em seu livro Serões Grammaticaes (1956: 362), faz também uma
analogia entre advérbios e adjetivos: É este elemento do discurso uma espécie de adjectivo,
que tem por função característica modificar os adjectivos, os verbos e qualquer palavra de
sentido atributivo. Modifica-os, como o adjectivo modifica os substantivos”.
O autor continua sua análise observando que o advérbio pode se referir a um
substantivo quando este possui um sentido atributivo. Ele cita o seguinte exemplo: “Deus é
verdadeiramente pai” (1956:363). Nesse caso, de acordo com o autor, o valor semântico do
substantivo equivale ao de um adjetivo. Em suas palavras, o advérbio é “attributo de
attributo”.
Carneiro Ribeiro (1956) afirma que os advérbios são invariáveis e este fato, ao
contrário do que pensam outros autores, torna esses elementos ainda mais semelhantes aos
adjetivos. Segundo ele, os adjetivos expressam conceitos abstratos que, por sua própria
natureza, não são passíveis de variações. O que ocorre é que os adjetivos adéquam em gênero
e número aos substantivos que acompanham apenas por uma questão de sonoridade. Carneiro
Ribeiro diz, ainda, que os advérbios expressam de forma mais resumida e eficiente alguns
pensamentos que, se ditos de outro modo, tornariam a linguagem mais lenta e prolixa. Nesse
sentido, podemos entender que os advérbios contribuem para o princípio de economia
lingüística.
O autor propõe a seguinte classificação para os advérbios: advérbio de lugar, advérbio
de tempo, advérbio de quantidade e advérbio de qualidade ou modo.
No que concerne aos advérbios em -mente, o autor trata de sua formação, qual seja:
este sufixo liga-se, de um modo geral, ao adjetivo no feminino, quando houver duas formas.
Diz, ainda, que alguns advérbios podem ter seus sentidos intensificados, tanto por outros
advérbios quanto por uso no superlativo. Cita como exemplos: “mais docemente, muito
ternamente, bellissimamente,”etc.
Said Ali, em sua Gramática Histórica da Língua Portuguesa (1964: 183), define os
elementos adverbiais como se segue:
O advérbio é um vocábulo determinativo do verbo, do
adjetivo ou de outro advérbio. Acrescenta a outras
palavras o conceito de tempo, lugar, modo, etc. que lhes
delimita ou esclarece o sentido, sem, contudo exercer,
como o acusativo, o dativo e o objeto indireto
circunstancial, função puramente complementar.
Esse autor faz uma análise etimológica de alguns advérbios. Entretanto, em relação
aos advérbios em -mente, apenas afirma que são criações novas nas línguas românicas, i.e.,
não encontradas no latim literário, formadas a partir de adjetivos (Cf. p.183).
Semanticamente, Said Ali (op. cit.) equipara as locuções adverbiais aos advérbios em -
mente afirmando que as primeiras se distinguem destes somente porque são mais longas e
os seguintes exemplos: com prudência = prudentemente, com energia = energicamente, com
brandura = brandamente.
O autor esclarece que esses elementos são classificados de acordo com a semântica de
cada um, dividindo-se em tempo, lugar, modo, negação, afirmação, dúvida, quantidade e
ordem, e expressam circunstâncias definidas ou noções de grau (aumento ou diminuição).
Como se pode notar, as gramáticas históricas tratam bastante superficialmente o tema
em questão. Seus autores não conseguiram definir de maneira mais eficiente o advérbio e nem
observaram mais atentamente outras características que esses elementos apresentariam.
3 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS
Esta tese de doutorado baseia-se em princípios funcionalistas, partindo, portanto, de
que a gramática das línguas se constrói a partir do discurso, ou seja, do uso real, concreto da
língua.
Este capítulo consiste em expor alguns pressupostos da linha funcionalista que foram
importantes para minha análise, sobretudo aqueles relacionados à gramaticalização, à
polissemia, ao conhecimento da relação entre gramaticalização e grau de encaixamento entre
cláusulas, e entre gramaticalização e ordenação. Também apresento uma pesquisa sobre a
ordenação de adverbiais (Votre & Santos, 1984), um estudo sobre a natureza da estrutura da
linguagem humana e sua categorização, assim como a classificação semântica de verbos
proposta por Halliday, 1994.
3.1 Os princípios funcionalistas
A teoria funcionalista concebe a linguagem como um instrumento de interação social e
analisa a estrutura gramatical no seu contexto discursivo a fim de investigar as motivações
para explicá-la, compreendendo que as diferentes formas que um elemento incorpora no
discurso não são meramente estilísticas, mas influenciadas por funções informacionais e
pragmáticas. Por conseguinte, uma relação entre forma e função, conforme o Princípio da
Iconicidade, que é definido como a correlação entre o código lingüístico (forma) e o seu
conteúdo (função).
A corrente funcionalista vem estudando com muita profundidade o processo da
Gramaticalização ocorre quando certas construções lingüísticas sofrem transformações ao
longo do tempo, assumindo outras funções mais gramaticais e tornando-se mais fixos e
regulares no discurso. Essa mudança se dá unidirecionalmente: do discurso para a gramática e
não vice-versa. Várias trajetórias foram traçadas para ilustrar esse caráter unidirecional:
vocábulo>morfema, verbo pleno>verbo auxiliar, advérbio>conectivo, dentre outras. Por
exemplo, o vocábulo mente passou a desempenhar a função de um morfema gramatical, ou
seja, passou a ser um sufixo, formador de advérbio, como a locução em boa hora que se
tornou a conjunção concessiva embora: em boa hora>embora. O foco do nosso trabalho não é
a gramaticalização do substantivo em -mente para sufixo, uma vez que no português arcaico
essa gramaticalização já estava consolidada.
Outra pesquisa que relaciona os termos da oração e a posição do advérbio é a de
Votre & Santos (1984), que trata da investigação de fatores sintáticos, semânticos e
discursivos que influenciam a colocação dos constituintes de natureza adverbial na sentença.
O corpus examinado é formado por redações e entrevistas de alunos da 8ª série.
Os autores partem da seguinte hipótese geral a qual também é à base da nossa
pesquisa:
Os advérbios são constituintes móveis, embora com
tendências bem definidas por determinadas posições
sintáticas. (...) a posição ocupada por cada advérbio é
função da atuação conjunta de diferentes fatores
estruturais e não-estruturais, que cabe identificar e
avaliar(1984:83).
Votre & Santos analisaram 4 posições dos adverbiais, a saber: início da sentença
(posição 1); fim da sentença (posição 4); entre o sujeito e o verbo (posição 2); e entre o verbo
e o complemento (posição3), exemplificadas abaixo:
[Ontem], o ministro [ontem] seguiu [ontem] para Nova York [ontem].
1 2 3 4
Os fatores, a seguir, foram observados através de uma análise quantitativa: a) tipo
semântico do advérbio (tempo, lugar, modo, etc.); b) nível do vínculo semântico do advérbio
(com sentença ou com o verbo); c) tipo sintático do verbo (regência do verbo) ou tipo de
complemento (oracional, objeto direto, objeto indireto); d) constituição morfológica do
advérbio (advérbios oracionais, locucionais, nominais, etc.); e) peso do advérbio (breve ou
longo); e f) tipo do sujeito (oração sem sujeito, oração com sujeito vazio, etc.).
Apresentaremos algumas das hipóteses dos autores referentes a esses fatores:
1) Quanto mais vinculado semanticamente ao verbo, mais próximo desse o verbo estaria.
Todavia, o advérbio vinculado ao nível mais alto da sentença estaria mais livre, podendo se
movimentar para o início da sentença, por exemplo;
2) No que se refere ao tipo de vínculo do sujeito com o verbo. Quanto mais fraco for, mais
favorecerá a inserção de um advérbio entre o sujeito e o verbo. Assim, um verbo de ligação
enfraqueceria o vínculo entre sujeito e verbo, permitindo a colocação de advérbio no meio
deles;
3) No que concerne ao peso do advérbio, a expectativa era a de que os adverbiais breves
(menores) ocorressem nas posições internas e os longos (maiores) nas posições externas,
predominando na posição final;
4) A última hipótese refere-se ao tipo de sujeito. Esperava-se que em orações sem sujeito ou
com sujeito vazio, o adverbial tendesse a ocupar a posição inicial, típica do sujeito. Teríamos
assim uma espécie de arranjo de balanceamento (Votre & Santos op. Cit.,. p. 85).
Os resultados mais relevantes desse estudo são arrolados a seguir: para a colocação do
advérbio nominal na posição 1, contribuíram os fatores referentes ao nível do vínculo
semântico do advérbio (advérbio vinculado à sentença), ao tipo semântico de advérbio
(advérbio de tempo e de opinião) e ao tipo de complemento do verbo (complemento
oracional).
A colocação do advérbio na posição 2, entre o sujeito e o verbo, foi motivada pelo
nível de vínculo semântico do advérbio (advérbio vinculado ao verbo) e pelo tipo semântico
de advérbio (advérbio de tempo e freqüência).
A ordenação do advérbio nominal na posição 3, entre verbo e complemento, deve-se
ao nível do vínculo semântico do advérbio (advérbio vinculado ao verbo), ao tipo semântico
de advérbio (advérbio de intensidade) e ao tipo de complemento (objeto indireto).
Por fim, a colocação do advérbio nominal na posição 4 da sentença foi influenciada
pelo nível do vínculo semântico do advérbio (advérbio vinculado ao verbo), pelo tipo
semântico de advérbio (advérbio de modo e de lugar) e pelo tipo de complemento (não
complemento).
Pretendemos, assim como Votre & Santos, identificar fatores que motivem a
colocação dos advérbios de tempo e aspecto em -mente na cláusula. Dentre eles,
identificaremos a estrutura sintática da oração para verificar se a posição vazia de um
argumento (sujeito ou complemento) tende a ser preenchida com o advérbio.
3.2 Gramaticalização e Níveis de Encaixamento entre Cláusulas
Segundo Hopper & Traugott (2003), os períodos compostos fundamentam-se em um
conjunto de estruturas com diferentes níveis de encaixamento, que vão das menos
gramaticalizadas (menos encaixadas) às mais gramaticalizadas (mais encaixadas):
a) Estruturas Paratáticas possuem independência relativa, ou seja, restrita apenas
pela pragmática (fazer sentido e ser relevante). São as cláusulas justapostas, as principais e as
coordenadas.
b) Estruturas Hipotáticas ou Interdependentes são aquelas em que um núcleo e
uma ou mais cláusulas que são relativamente dependentes (não se incluem em nenhum
constituinte do núcleo, mas não podem ficar “soltas”). São as subordinadas adverbiais e as
adjetivas explicativas.
c) Estruturas Subordinadas ou Encaixadas são as que possuem uma margem
completamente incluída no núcleo e que, portanto, têm dependência completa. São as
subordinadas substantivas e as adjetivas restritivas.
Essas estruturas podem ser representadas através de uma trajetória de
gramaticalização: parataxe hipotaxe subordinação.
De acordo com essa trajetória, as cláusulas paratáticas são menos gramaticalizadas,
isto é, revelam menor grau de dependência semântica e encaixamento que as hipotáticas (que
exibem maior grau de dependência e nível intermediário de encaixamento), que, por sua vez,
são menos gramaticalizadas que as subordinadas (que apresentam maior grau de dependência
e de encaixamento). Segundo Givón (1990), a redução da cláusula subordinada à cláusula
reduzida revela níveis ainda maiores de encaixamento entre cláusula principal e subordinada,
além de exprimir concretamente um dos subprincípios relacionados ao conceito de
iconicidade: o da proximidade. Esse subprincípio trata da relação de correspondência entre
sintaxe e semântica. Na complementação verbal, isso implica dizer que o nível de integração
sintática entre as cláusulas não é arbitrário e sim um reflexo do nível de integração semântica
entre o evento da principal e o da subordinada, ou seja, quanto mais integrados esses eventos
no plano semântico, mais integradas estarão as estruturas que os expressam.
Givón concluiu que, quanto mais encaixada uma oração, mais gramaticalizada ela é.
Estendendo a conclusão do autor, depreendemos que o grau de gramaticalização da cláusula
em que os advérbios em -mente aparecem interfere na colocação desses advérbios, conforme
procuraremos atestar nessa pesquisa.
3.3 Gramaticalização e estrutura sintática
De acordo com Givón (1979), a maior liberdade e variedade de elementos significativos
tendem a ocorrer na cláusula principal, declarativa, afirmativa, ativa. Mas, por outro lado,
tanto no que se refere a itens lexicais quanto a construções sintáticas, a distribuição dos
elementos significativos, em todos os outros tipos de cláusula, é sempre mais restrita.
Isso acontece devido ao uso do fenômeno da pressuposição discursiva, ou seja, o grau
de pressuposicionalidade no qual uma sentença é usada, que, por sua vez, está relacionado ao
nível de dificuldade que o falante considera como obstáculo para o ouvinte em determinar
uma única referência no discurso. E, segundo Givón (1979), a cláusula principal, declarativa,
afirmativa, ativa apresenta a complexidade pressuposicional mais baixa no discurso, se
comparada a todos as outras variantes sintáticas.
Givón (1979) nos mostra várias propriedades formais dessas variantes sintáticas, em
relação ao seu grau de pressuposicionalidade, a saber:
1- Variantes mais pressuposicionais exibem maior complexidade sintática.
2- Variantes mais pressuposicionais apresentam maiores restrições distribucionais do
que os padrões neutros.
3- Variantes mais pressuposicionais são gramaticalizadas mais tarde por crianças, ou
pelo menos sua sintaxe é adquirida mais tarde do que as variantes menos
pressuposicionais.
4- Variantes mais pressuposicionais freqüentemente tendem a exibir grande
conservadorismo sintático, mais comumente na área da mudança de ordenação.
5- A cláusula principal declarativa, afirmativa, ativa, neutra e menos pressuposicional
e também a mais freqüente no discurso.
Das propriedades propostas, as que podemos considerar na nossa pesquisa são os itens
1, 2 e 4, que se propõe aqui que as cláusulas gramaticalizadas, e, portanto, mais restritas
distribucionalmente e mais complexas sintaticamente, tendem a ser mais conservadoras.
3.4 As pressuposições discursivas das construções sintáticas
O sentido de pressuposição está sendo compreendido aqui como um conjunto de
informações que estão fora da sentença e que são assumidas pelo falante como evidentes ou
indiscutíveis, ou seja, aquilo que é pressuposto tende a refletir conhecimentos compartilhados,
crenças comuns ou conhecimento presumido como conhecido.
Neste trabalho, não adotamos a distinção entre pressuposição gica e pressuposição
pragmática, que parte do princípio de que todo fenômeno pressuposicional nas línguas
naturais é pragmático. Assim, segundo Givón (1979), o fenômeno da pressuposição,
relaciona-se com: as hipóteses que o falante assume acerca da habilidade do ouvinte de
identificar unificadamente (‘estabelecer uma única referência para’) um argumento-
referente.” (p. 50)
Diante disso, Givón (1979) mostra as variantes sintáticas que se caracterizam por maior
grau de pressuposicionalidade:
a) Construções estritamente pressuposicionais. Cláusulas relativas, clivadas, pseudo-clivadas
e perguntas QU.
b) Cláusulas encaixadas.
c) Outros atos de fala. Imperativo, interrogativo e negativo.
d) Construções envolvendo graus de definitude-topicalidade dos argumentos.
e) Mudança de tópico, passiva, pronomes anafóricos e outros.
Segundo Givón, essas construções apresentam ordenação mais conservadora dos
elementos argumentais. Mas podemos estender esse pensamento para as características de
ordenação de elementos adverbiais. De fato, como foi mencionado, o nível de
encaixamento ou gramaticalização da cláusula tem influência sobre as tendências de
ordenação de advérbios de tempo e aspecto em -mente.
A fase arcaica do português é caracterizada por uma variação na colocação dos
advérbios, ou seja, apresenta advérbios em -mente nas posições pré e pós-verbais em todos os
tipos de cláusulas, apresentando uma pequena predominância de anteposição nas cláusulas
mais gramaticalizadas. A partir disso, podemos depreender que esses parâmetros de
pressuposicionalidade podem nos auxiliar na descrição de mudanças no comportamento
diacrônico desses elementos em relação a sua ordenação.
3.5 Classificações dos verbos, baseada em Halliday (1994)
O tipo semântico do verbo é um dos fatores considerados neste trabalho para entender
a posição dos advérbios de tempo e de aspecto em -mente, pois trabalhos anteriores, como
Scheibman (2001), Bybee (2003) e Andrade (2005), detectaram que era necessário investigar
se o tipo de verbo poderia influenciar na cláusula de alguma forma no caso de Scheibman
(2001), o tipo de verbo foi usado para se perceber a subjetividade nas relações entre o sujeito
e o verbo; no de Bybee (2003), foi utilizado para perceber a influência na gramaticalização do
verbo can do inglês, e, por fim, no caso de Andrade (2005), o tipo de verbo foi utilizado para
detectar a ordenação de locuções adverbiais temporais.
Sendo assim, consideramos esse fator importante para tentar definir uma motivação
semântica da posição dos advérbios de tempo e de aspecto em -mente. Para isso, utilizamos a
classificação de Halliday (1994), também utilizada em Scheibman (2001) e Andrade (2005).
Nossa hipótese é que determinado verbo acompanhado do advérbio temporal, com a
repetição de uso, possa fixar os advérbios de tempo e de aspecto em -mente numa dada
posição, conforme Bybee (2003). Essa autora conhece a importância da repetição,
caracterizando-a como um processo pelo qual seqüências de palavras ou morfemas
freqüentemente usados tornam-se automáticos como uma única unidade de processamento.
Acreditamos também que determinado tipo semântico do advérbio ocorra com um
determinado tipo semântico do verbo.
Embora haja rias classificações de verbos, trabalharemos com a classificação de
Halliday (1994), por ser um lingüista funcionalista. Segundo esse autor, a oração também
desempenha o papel de modelar a experiência, isto é, representa padrões da experiência. Os
seres humanos, através da linguagem, constroem um quadro mental da realidade e este é
criada por processos.
A oração é um modo de ação, um modo de dar e receber bens e serviços como também
informações. Ela é um modo de reflexão, um modo de impor ordem na variação e no fluxo do
sistema gramatical de transitividade. Esse sistema constrói o mundo a partir da experiência
por meio de conjunto de tipos de processos que estão relacionados à nossa experiência
exterior (ligada ao mundo que nos cerca, como eventos, ações etc.) e à nossa experiência
interior (ligada à consciência, à imaginação, como reflexão, etc.( Halliday,1994:106).
De acordo com o autor, o modelo proposto de representação de experiência,
interpretado no sistema gramatical de transitividade, é um contínuo circular.
Ele afirma que um processo é constituído de três componentes para a interpretação da
nossa experiência do que acontece: a) o próprio processo; b) os participantes no processo; e c)
circunstâncias associadas com o processo (são opcionais).
Esses três conceitos são categorias semânticas que explicam como fenômenos do
mundo real são representados em figuras lingüísticas.
O autor discorre sobre os principais processos no sistema de transitividade da língua
inglesa:
Os processos materiais (processes of doing) estão relacionados ao mundo físico, à
experiência exterior. São processos ‘do fazerque expressam a noção de que uma entidade
‘faz’ alguma coisa que pode ser feita ‘para’ outra entidade. Portanto, esse processo tem um
ator obrigatório e um alvo (goal) opcional. Para Halliday, o termo ator refere-se àquele que
realiza o efeito, já o termo alvo refere-se a alguém para o qual o processo é estendido.
Vejamos um exemplo: The lion[ator] caught[processo] the tourist [alvo] ( O leão pegou o
turista.);
Os processos mentais (processes of sensing) referem-se ao mundo da consciência, à
experiência interior. Para conhecer esses processos, o autor abandona a noção semântica de
ator e alvo (goal) e agrupa as orações que expressam sentimentos (affection), pensamentos
(cognition) e percepção (perceptin) nesse tipo de processo.
O autor acrescenta que os participantes envolvidos nos processos mentais que são
experenciados (senser) a um fenômeno (phenomenon). O primeiro é o ser consciente que
sente, pensa e percebe, o segundo é aquilo que é sentido, pensado ou percebido. Desse
modo, um dos participantes é dotado de consciência, o outro pode ser uma ‘coisa’ ou um fato
(entendido como um metafenômeno, isto é, alguma coisa que é construída como um
participante por projeção).
Obtivemos: Mary [experenciadora dotado de consciência] liked [processo] the gift
[fenômeno/coisa] (Maria gostou do presente). Ou Mary [experenciador dotado de
consciência] was pleased [processo] that she’d got a present [fenômeno/fato] (Maria estava
contente que ganhou um presente);
Os processos relacionais (processes of being) estão ligados ao mundo das abstrações.
Relacionam fragmentos da experiência, classificando-os e identificando-os. Esses processos
estabelecem uma relação entre duas entidades separadas. Uma entidade ‘a’ pode atribuir algo
a uma entidade ‘x’ ou pode identificar uma entidade ‘x’. Sendo assim, subdividem-se em:
Relacionais Intensivos: associados ao mundo das abstrações estabelecem uma relação entre
duas entidades separadas, atribuindo alguma característica a elas; Relacionais Possessivos:
associados ao mundo das abstrações estabelecem uma relação entre duas entidades separadas,
identificando-as ou atribuindo posse de algo ou alguma coisa a elas, e Relacionais
Circunstanciais: associados ao mundo das abstrações estabelecem uma relação entre duas
entidades separadas, identificando-as ou atribuindo alguma circunstância a elas.
O sistema do inglês opera com três tipos principais de construções: a) intensiva
(equativa): ‘x is a ‘ (x é/está a). Ex.: Sarah is wise. (Sara é sábia); b) circunstancial: ‘x is at a’
(em que ‘is at’ pode ser ‘is at, in, on, for, with, about, along, etc.’). c) possessive: (x está em a
). Ex.: Peter has a piano. (Pedro tem um piano)
Na fronteira desses principais processos, outros processos que compartilham
algumas das características daqueles, como:
Os processos comportamentais manifestam os processos de consciência e os estados
fisiológicos. Esses processos são tipicamente de natureza humana, uma vez que se constituem
por comportamentos psicológicos e fisiológicos como respirar, tossir, sorrir, sonhar dentre
outros. Suas características não são claramente definidas, que estão na fronteira entre os
processos materiais e mentais. Um participante é tipicamente um ser consciente, denominado
Behaver. Vejamos o exemplo: No-one[Behaver] is listening [processo]. (Ninguém está
ouvindo);
Os processos verbais expressam relações simbólicas, construídas na consciência
humana, através da linguagem. São processos de ‘dizer’, como em “- O que você disse? -Eu
disse que está barulhento aqui.” No entanto, ‘dizer’ aqui, é interpretado em um sentido amplo,
expressando qualquer tipo de troca simbólica de significado. O participante, nesses processos,
não precisa ser consciente. Esse é denominado Sayer(aquele/aquilo que diz). Eis alguns
exemplos: the notice ( sayer) tells you to keep quiet e my watch (sayer) says it’s half past
ten.(O aviso diz para ficarmos em silêncio e meu relógio diz que são dez e meia,
respectivamente).
Há outras funções de participantes além da do ‘sayer’: ‘Receiver’ (aquele para o qual a
fala é direcionada), Verbiage (o que é dito), Target (a entidade que é objetivada pelo
processo de ‘dizer’). Observemos: She [sayer] praised [processo] him [target] to her friends
[receiver] (Ela elogiou para os amigos dela) ou I [sayer] ordered [processo] a steak
[verbiage] (Eu pedí um bife);
Os processos existenciais detonam a existência, o acontecer. Representam que
alguma coisa existe ou acontece. O elemento que é dito existir é chamado de Existent’. A
princípio, pode existir qualquer tipo de fenômeno que possa ser construído como alguma
‘coisa’: pessoa, objeto, instituição, abstração. Também pode existir uma ação ou um evento.
Freqüentemente, uma oração existencial contém um elemento circunstancial distinto de tempo
ou lugar. Analisemos: There is [processo] a man [existente] at the door [circunstância] (Há
um homem na porta).
O lingüista ainda menciona mais um tipo de processo: os processos meteorológicos
que se encontram na fronteira entre os processos existenciais e materiais. Alguns são
construídos como processos materiais: The wind’s blowing ( o vento está soprando); alguns
como processos existenciais: There was a storm (houve uma tempestade); alguns como
relacionais: it’s cold ( está frio); e alguns sem participantes, constituindo-se apenas pelo
processo: it’s raining ( está chovendo).
Usamos essa classificação na análise dos verbos presentes nas cláusulas com
advérbios de tempo e aspecto em -mente, considerando o tipo semântico do verbo como um
fator possível de motivar a ordem desses advérbios. Esse fator se mostrou relevante na
pesquisa de Andrade (2005) e na de Albani (2007) com relação ao uso de locuções temporais
e aspectuais e do uso do advérbio sempre, respectivamente.
4 METODOLOGIA
A corrente funcionalista prima por uma análise do uso da língua, portanto, torna-se
necessário o estudo de dados reais, isto é, dados (da língua oral ou escrita) produzidos pelos
usuários da língua em contexto de comunicação.
Como mencionado, o presente estudo objetiva-se à análise da ordenação dos
advérbios de tempo e aspecto terminados em -mente sob a perspectiva funcionalista na
modalidade escrita.
Este trabalho, por um lado, utiliza metodologia quantitativa na análise dos advérbios
de tempo e de aspecto em -mente que apresentam diferentes possibilidades de colocação na
frase, mas são aparentemente estáveis no que se refere a seu status semântico. Por outro lado,
também se realizou a uma análise qualitativa que visa observar algumas mudanças semânticas
e, em alguns casos, também sintática, percorrida por certos usos adverbiais.
A pesquisa seguiu as seguintes etapas: levantamento das ocorrências de advérbios em -
mente com algum traço de sentido de tempo e/ou aspecto, nos textos selecionados de
diferentes épocas; classificação dos advérbios, levando-se em consideração o contexto de
cada ocorrência, sua função, posição, etc. (de acordo com os critérios arrolados abaixo);
análise quantitativa e qualitativa das ocorrências dos advérbios de tempo e aspecto; paralelo
entre os resultados das diferentes sincronias; conclusões. O confronto dos dados de diferentes
estágios da língua favoreceu uma visão mais ampla e, conseqüentemente, uma análise mais
abrangente dos possíveis processos de mudança.
Para se observar em diferentes possibilidades de ordenação dos advérbios de tempo e
de aspecto em -mente, foram levados em consideração alguns fatores na classificação e análise
desses elementos, a saber: a ordem, a noção semântica expressa pelo advérbio (aspectual,
cronológico e híbrido); grau de gramaticalização da cláusula em que os advérbios de tempo e
aspecto em -mente se inserem (se mais ou menos gramaticalizada); e tipos de verbos a que
esses se associam, segundo Halliday (1994) e outros, que serão explicitados mais a frente.
4.1 Corpus
Em conformidade com os pressupostos teóricos da teoria funcionalista, os dados
utilizados para a análise da ordenação dos advérbios de tempo e aspecto terminados em -
mente foram extraídos de textos de diferentes gêneros textuais do português arcaico, dos
séculos XVI, XVII, XVIII, XIX e do português atual.
Os materiais constituintes da amostra e os procedimentos teórico-metodológicos
realizados, assim como o controle dos aspectos e fatores que influenciam na ordenação dos
advérbios em -mente, são apresentados e discutidos ao longo desse trabalho.
É importante ressaltar a complexidade que envolve a tarefa de se selecionar textos,
considerando-se um recorte histórico tão amplo. A complexidade dá-se, por um lado, pelo
fato de que esses textos precisam partilhar, ainda que minimamente, características que
permitam que sejam estabelecidas comparações entre os resultados dos dados neles
levantados, sem que haja distorções; por outro lado, pelo leque tão reduzido de opções de
textos de fontes confiáveis, que diminui as possibilidades de escolha.
Sendo assim, como não foi possível analisar exatamente os mesmos tipos de textos em
todas as épocas, foi seguido um roteiro, juntando diferentes tipos textuais, mas mantendo uma
certa coerência na sua distribuição pelos diferentes momentos sincrônicos analisados.
Chegou-se, então, aos seguintes corpora:
a) português arcaico: Testamento de Dom Afonso II; O Orto do Esposo (OE), de Maller
(1956) e Castelo Perigoso(todos esses textos estão disponíveis no site do corpus
informatizado do Português medieval(http://cipm.fcsh.unl.pt/gencontent.jsp?id=4). Esse
corpus (CIPM) foi criado em 1993 e inclui textos latino-romances do século IX ao século XII
e textos portugueses do século XII ao século XVI.
b) português do século XVI: Crônica dos Reis de Bisnaga; Cartas de D.João: são 372 cartas
de D. João III, rei de Portugal, do período entre 13 de outubro de 1523 e 20 de fevereiro de
1557, que também foram extraídas do site do corpus informatizado do Português medieval
(http://cipm.fcsh.unl.pt/gencontent.jsp?id=4).
c) português do século XVII: foram oito sermões do Padre Antônio Vieira:
1
o
sermão: Sermão da terceira quarta-feira da quaresma na Capela Real, 1669 (Assunto: um
remédio para os males de todas as cortes do mundo: a consolação dos mal despachados,
baseando-se no pedido indeferido da mãe dos Zebedeus);
2
o
sermão: Sermão da Sexagésima. Pregado na capela Real. Este sermão pregou o Autor no
ano de 1655, vindo da Missão do Maranhão, onde achou as dificuldades que nele se apontam,
as quais vencidas, com novas ordens reais voltaram logo para a mesma Missão.
3
o
sermão: Sermão de quarta-feira de cinza. Em Roma, na Igreja de S. Antônio dos
Portugueses.Ano de 1670.
4
o
sermão: Sermão do Santíssimo Sacramento. Exposto na lgreja de S. Lourenço, In:
Damaso, nos dias do Carnaval Em Roma. Ano de 1674. Traduzido do italiano.
5
o
sermão: Sermão do Nascimento da Virgem Maria. Debaixo da invocação de N. Senhora da
Luz, título da Igreja e colégio da Companhia de Jesus, na cidade de S. Luís do Maranhão. Ano
de 1657.
6
o
sermão: Sermão de S. Inácio, fundador da Companhia de Jesus, em Lisboa, no Real
Colégio de S. Antão, 1669.
7
o
sermão: Sermão do terceiro domingo da quaresma, na Capela Real, 1655.
8
o
sermão: Sermão da quinta-feira quaresma na misericórdia de Lisboa. ANi nF, 1 669
d) português do século XVIII:
Cartas comerciais da administração pública, representações oficiais do Rio de Janeiro, obtidas
no corpus do Museu da Língua Portuguesa - Estação da Luz. Foram analisadas 13 Cartas.
BARBOSA, Afranio & LOPES, Célia Regina et al. Corpus diacrônico do Rio de Janeiro:
cartas pessoais séculos XVIII-XIX. Rio de Janeiro, UFRJ/PIBIC-CNPq/ Labor-Histórico,
2003 (versão eletrônica
)
e) português do século XIX:
Cartas comerciais da administração pública, representações oficiais do Rio de Janeiro, obtidas
no corpus do Museu da Língua Portuguesa - Estação da Luz. Foram analisadas 12 cartas.
BARBOSA, Afranio & LOPES, Célia Regina et al. Corpus diacrônico do Rio de Janeiro:
cartas pessoais séculos XVIII-XIX. Rio de Janeiro, UFRJ/PIBIC-CNPq/ Labor-Histórico,
2003 (versão eletrônica)
f) português atual:
- Tocar o Senhor, Pe. Leo (TS).
-A essência do cristianismo, de J. Berkeley (EC).
4.2 Descrições dos fatores da análise dos advérbios de tempo e aspecto em –mente
Classificamos os dados a partir de alguns fatores que nos pareceram relevantes ao estudo
dos advérbios de tempo e aspecto em -mente. Utilizamos o modo de coleta e codificação da
sociolingüística variacionista (apesar de não estarmos trabalhando com um fenômeno de
variação propriamente dito).
Todos os dados são analisados a partir de fatores, que assim se configuram:
1. Posição/Ordem do advérbio em relação ao verbo
Verificamos a posição do advérbio de tempo e aspecto, se ocorre antes ou depois do
verbo, independentemente da presença ou ausência de algum elemento interveniente como o
sujeito, ou um outro advérbio, uma expressão, uma oração subordinada, etc.
Inicialmente, estabeleceram-se duas posições gerais nas quais os advérbios de tempo e de
aspecto em -mente poderiam ocorrer:
- Antes do verbo:
(1) que Deus constatemente nos fala (Português atual, TS,p.15)
- Depois do verbo:
(2) abramos os corações à luz , para que more perpetuamente neles(Século XVII, Sermão de
Santo Inácio, Pe A.Vieira)
Dessas ordenações gerais, desmembraram-se subposições, vejamos no quadro abaixo:
Quadro 2- Subposições do Advérbios em -mente
Posições Exemplos:
POSIÇÃO 1 (POS1): (ME) margem
esquerda da oração (tudo que estiver no
início de oração ou depois de conjunção).
(3) Constantemente Jesus vem curar-nos
(Português atual, TS, p.28)
POSIÇÂO 2(POS2): entre o sujeito e o
verbo. (o sujeito pode ser SN, pronome ou
pronome relativo)
(4) que Symão Fernandez novamente fez
(séc.XIV, Carta número 147)
POSIÇÂO 3(POS3): não inserido entre o
sujeito e o verbo, mas fora da margem
esquerda da cláusula.
(5) Agora novamente tem sucedido nas
minas hum levantamento que La fizeram
os povos. (século XVIII, Cartas oficiais).
POSIÇÂO 4(POS4): entre o verbo auxiliar
e o verbo principal.
(6) Precisamos urgentemente encontrar
nosso lugar de oração (Português atual,
TS, p.113)
POSIÇÃO 5(POS5): margem direita da
oração (no final da oração).
(7) Cristo continua do lado de fora de
nosso coração, batendo incessantemente
(Português atual, TS, p.39)
POSIÇÃO 6(POS6): inserido entre o
verbo e o complemento/predicativo.
(8) No entanto, ao oferecer
espontaneamente à igreja o produto da
venda (Português atual, TS, p.97)
POSIÇÃO7(POS7): entre o verbo e o
sujeito.
(9) chegou subitamente h~u~u home(m)
nõ conhecido ~ecima dh~u~u Cavallo e
~entrou pello paaço(Português arcaico
OE, 353)
POSIÇÃO 8(POS8): Não inserido entre o
verbo e o sujeito, ou entre o verbo e o
complemento/predicativo, mas fora da
margem direita(ou, seja, no final da
cláusula)
(10) deixamos boas coisas para trás muito
freqüentemente em nome da
independência (Português atual, EC, p.31)
2) Tempo/sincronias: português arcaico, dos séculos XVI, XVII, XVIII, XIX e português
Atual (cf. na seção anterior a lista de textos que serviram como corpora)
3) A noção semântica expressa pelo advérbio: Em relação às características semânticas que
cada advérbio pode expressar, classificamos em: a) advérbios que expressam tempo real
cronológico: são aqueles que expressam tempo cronológico, como por exemplo, os advérbios
atualmente e ultimamente; b) advérbios que expressam tempo aspectual: são os que se
referem à repetição de algum evento, ou à freqüência com que eventos ocorrem. Sabemos que
é bastante complexo delinearmos os limites entre tempo real e tempo aspectual, mas
decidimos que é possível fazer essa diferenciação, pelo menos até o ponto que nos foi exigido
pela análise. No presente estudo, foi claro observar e definir esses advérbios denominados de
tempo real devido a suas características dêiticas. Portanto, os advérbios cronológicos fazem
referência ao momento da enunciação. Enquanto, os advérbios de tempo aspectual são os que
se referem à repetição de algum evento, ou à freqüência com que os eventos ocorrem como o
advérbio freqüentemente; c) advérbios que são híbridos: são os usos polissêmicos, ou seja,
aqueles que expressão além das noções de tempo e de aspecto, expressam também a noção de
modo (tempo+aspecto/aspecto+modo), isto é, são os advérbios que expressam de alguma
forma duas características, com predominância de uma ou outra, por exemplo, tempo e modo,
como o advérbio rapidamente.
4) O tipo semântico de verbo que compõe a cláusula, segundo Halliday (1994), a saber:
material, mental, comportamental, relacional possessivo, relacional intensivo, atividade verbal
e meteorológico. (cf. seção 3.5).
5) Tipo formal de sujeito - verificamos em cada oração coletada se o sujeito estava (a)
formalmente presente antes do verbo, (b) formalmente presente depois do verbo, (c) presente
na forma de um pronome relativo ou (d) ausente (incluindo neste caso o tradicional sujeito
oculto e a oração sem sujeito).
6) Tipo de oração - observarmos em que tipo de oração, o advérbio de tempo e de aspecto
está inserido, se a oração é (a) paratática, (b) subordinada (substantiva ou adjetiva restritiva),
(c) hipotática (adverbial ou adjetiva explicativa), (d) oração principal ou (e) oração absoluta.
Cruzamos alguns desses fatores entre si para verificarmos os padrões de uso dos
advérbios e para vermos o uso dos mesmos em cada sincronia da língua.
5 ANÁLISES DOS DADOS
Neste capítulo, apresentamos uma análise dos advérbios de tempo e de aspecto
terminados em mente usados em textos escritos em norma culta do português, mais
precisamente em textos do português arcaico, dos séculos XVI, XVII, XVIII, XIX e do
português atual.
Analisamos aqui os resultados encontrados através da codificação dos fatores
controlados, como foi dito: posição do advérbio, noção semântica do advérbio, tipo de
verbo, tipo de sujeito, sincronias e tipo de oração. Destacamos a importância destes para
comprovar a hipótese de que fatores que influenciam o posicionamento dessa categoria em
relação ao verbo e a de que deve ter havido mudanças na ordenação desse advérbio nas
sincronias estudadas.
A seguir, explicitamos a análise dos grupos de fatores pertinentes ao estudo do
fenômeno em questão.
5.1 Análises de fatores
Começamos nossa análise pela apresentação das ordens estabelecidas (cf. capítulo 4),
fator de maior importância para verificarmos a posição prototípica dos advérbios em –mente
em cada sincronia.
5.1.1 Ordem do advérbio de tempo e aspecto em -mente
Inicialmente, a análise consistiu na verificação da posição de cada advérbio na
sentença. Porém, para uma melhor compreensão dos dados, foram estabelecidas duas posições
gerais:
Antes do Verbo
(01) Por uso antigamente havia um conselho chamado dos massarotes (Século XVII,
Sermão do Pe.A. Vieira)
Depois do Verbo
(02) Abramos os corações à luz, para que more perpetuamente neles Século XVII,
Sermão do Pe.A. Vieira)
Encontramos em todos os textos analisados (de todas as sincronias) um total de 180
dados com advérbios de tempo e aspecto em -mente. Estes estavam distribuídos de acordo
com o que pode ser visto na tabela a seguir:
Tabela 1- Distribuição dos advérbios em -mente quanto à ordem em relação ao verbo
Posição antes do
verbo
Posição depois do
verbo
Auxiliar-Adv-
Verbo
Total
Ocorrência % Ocorrência % N
o
de oco
rrência
%
82= 45,5% 88= 48,8% 10= 5,5 180=100%
Na tabela 1, verificamos que não houve diferença significativa, ao compararmos as
duas posições gerais: antes e depois do verbo. Sem levarmos em conta as sincronias, os dados
se distribuem homogeneamente entre as duas posições, como nos exemplos abaixo (os
exemplos 03 e 04, são de advérbios colocados em posição pós-verbal e os exemplos (05) e
(06) são de advérbios em posição pré-verbal). Houve apenas 5,5 % de dados com o advérbio
entre o auxiliar e o verbo (POS 4).
(03) Deu sinal o rei, mandou Moisés a Arão que lançasse a sua vara em terra, e converteu-se
sùbitamente em uma serpente viva e tão temerosa, como aquela de que o mesmo Moisés no
deserto se não dava por seguro (Século XVII, Sermão do Pe. A. Vieira)
(04) Entre estas duas portas se acha subitamente um homem no instante da morte, sem poder
tornar atrás, nem parar, nem fugir... (Século XVII, Sermão do Pe. A. Vieira)
(05) Em conseqüência desta minha lembrança, ordenei à Câmara desta Cidade que
immediatamente passasse a examinar o numero de Embarcaçoens, que tinhão sahido deste
Porto para essa Cidade (Século XVIII, administração Pública/Carta oficial)
(06) ...esta inCerteza menão fez admiração porser muito na= tural o erraremse todos
osCalculos quesefazem SobreCouzaz tão inCertaz. Como aNavegação, finalmente
chegarão Vossamercez muito bonz, que he oque mais estimo, eComamesma felicidade
principiarão asSuas marchaz por terra(Século XVIII, Administração Pública/Carta oficial)
A tabela abaixo apresenta, de um modo geral, o número das ocorrências dos advérbios
de tempo e aspecto em -mente pelas sincronias estudadas.
Tabela 2- Levantamento Geral dos dados dos corpora dos Advérbios de Tempo e de
Aspecto em -mente
Sincronias Total
Port. Arcaico 44
SÉC. XVI 18
SÉC.XVII 34
SÉC.XVIII 18
SÉC.XIX 21
Port. Atual 45
TOTAL
180
Eis alguns exemplos de cada uma das sincronias estudadas:
- Português arcaico:
(07) Quem de ssi meesmo busca paz em out(r)a part(e) ou pobreza ou desp(re)ço, nom a
achara´. Que quem mu(r)mura ou he trist(e) de ssua pobreza, e q(ue)m ha´ door no coraçom e
he descontent(e) e a despreza nom ha´ paz consigo. E po(r) que homem possa vi~ir a esta paz,
deve rroguar a D(eu)s conthinuadament(e), e amehu´de peenssar em sua grande pobreza e
humildade e maravilhossa sofrença. (Castelo Perigoso).
- Século XVI:
(08)
E
ste rey tem continuadamente cimcoenta mil home~es de solldo, em que entra~o seis
mill home~es de cavallo, que sa~o de sua goarda do paço, dos quoaes seis mil sa~o os
duzentos obrigados a cavalgar com elle, e tem mais vimte mill lamceiros e dargueiros, e tres
mil home~es (Século XVI –Crônica dos Reis de Bisnaga)
-Século XVII:
(09) Lêde o Testamento Velho, e achareis que Deus antigamente afogava exércitos, queimava
cidades, alagava mundos, despovoava paraísos. (Sermão do Pe.A. Vieira).
-Século XVIII:
(10) O Antigo Provedor da Fazenda; emque VossaSenhoria mefala, dizendo naõ desceria dos
Sertoens, desceo com efeito, eaqui se acha, segundo metem constado ha dozedias, mas
brevemente hirá para essa cidade, pois...(Século XVII, carta Comercial número 7)
- Século XIX:
(11) Pessolhe novamente de ver os vestidos | que estão na D. Brasilia, e faser | o possível por
m’os ...(Século XIX, Carta Comercial número 2)
- Português Atual
(12) Hoje não damos tanta importância àquilo que Deus constantemente nos fala (TS, p. 15)
5.1.2 Posição do advérbio
A seguir, podemos observar a distribuição dos advérbios analisados pelas posições
arroladas nas sincronias estudadas. Apenas para lembrar (cf. capítulo 4):
a) POS 1 – a posição da margem esquerda;
b) POS 2 – a posição entre o sujeito e o verbo.
c) POS 3 a posição não inserida entre o sujeito e o verbo, mas fora da margem esquerda
da cláusula;
d) POS 4 – a posição entre o verbo auxiliar e o verbo principal;
e) POS 5 – a posição a margem direita da oração (no final da oração);
f) POS 6 – a posição inserida entre o verbo e o complemento/predicativo;
g) POS 7 – a posição entre o verbo e o sujeito.
h) POS 8 – a posição não inserida entre o verbo e o sujeito, ou entre o verbo e o
complemento/predicativo, mas fora da margem direita.
Tabela 3 - Distribuição das posições dos advérbios de tempo e aspecto em –mente X
sincronias
Sincronias POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
ARCAICO 09 02 06 02 10 09 - 06 44
SÉC.XVI
10 02 - - 01 03 01 01 18
SÉC.XVII
18 02 02 - 02 04 01 05 34
S.XVIII. 11 01 - 01 01 02 - 02 18
SÉC.XIX
06 - - 03 04 05 - 03 21
Português
Atual
06 03 04 04 14 07 01 06 45
Total 60 10 12 10 32 30 03 23 180
% 33,3 5,5 6,6 5,5 17,7 16,7 1,6 12,7 100
Ao olharmos o total expresso na última linha da tabela, podemos constatar que a POS1
é mais recorrente. Isso evidencia que os advérbios de tempo e de aspecto em -mente,por
expressarem tais circunstâncias, preferem as posições periféricas da cláusula, sobretudo à
margem esquerda (POS1), e evitam posições mais internas à sentença, posições essas que
rompem com a estrutura padrão da cláusula. Shaer (2004), tratando especificamente da
ordenação dos circunstanciais temporais, relata que não é fácil determinar de forma precisa as
diferenças entre os temporais na margem esquerda ou na margem direita da sentença, ainda
que seja possível determinar distinções funcionais entre eles: a margem esquerda constitui um
ponto de ancoragem, um elo entre a parte do discurso em que se encontra o advérbio e um
ponto do discurso anteriormente mencionado, numa relação nitidamente anafórica, de
conexão discursiva. Tal fenômeno tende a não ocorrer com advérbios que ocupam a margem
direita da oração, associados a um escopo mais restrito, geralmente portador de informação
nova. Como podemos observar nos exemplos 13 e 14 abaixo:
(13) Antigamente convertia-se o mundo; hoje por que se não converte ninguém? Porque hoje
pregam-se palavras e pensamentos (Século XVII, sermão do Pe. A. Vieira).
(14) porque não perdeu o céu e a vista de Deus, mas vai arder no inferno eternamente.
(Século XVII, sermão do Pe. A. Vieira).
Podemos observar, também, através da tabela 3, que, no português arcaico, as posições
típicas são POS 5 (pós-verbal no fim margem direita), 6 (entre o verbo e o complemento) e 8
(pós-verbal fora do fim), mas os dados têm uma boa distribuição em todas as posições, exceto
na posição 7. Ou seja, no português arcaico havia uma ordenação mais livre, apesar das raras
ocorrências de algumas posições.
nas outras fases do português, entre o português do XVI e o português do século
XIX, o uso predominante é a posição 1 (margem esquerda). No século XVI, ainda outras
posições com uma distribuição razoável de dados, que são as posições 6 e 5. Depois, como
dissemos, é a posição marginal à esquerda a preferida pelos autores. Mas, no século XIX,
uma diferença importante: começa a aumentar o uso de uma posição pós-verbal, é a
posição 6. No português atual, verificamos novamente que há uma distribuição de dados em
todas as posições, mas há predomínio da posição 5, ou seja, uma posição pós-verbal.
Nossa análise permite dizer que, nos textos estudados, o advérbio em -mente passa de
um uso relativamente livre para um uso mais fixo na posição marginal à esquerda. Depois no
século XIX, começa a aumentar na posição pós-verbal e no português atual é usado
predominantemente na posição pós-verbal (mais especificamente na posição marginal à
direita, POS 6).
Albani (2007) verificou que a posição típica do advérbio sempre era pré-verbal no
português arcaico e pós-verbal no português contemporâneo. Todos os fatores estudados
indicam que, no português arcaico, a ordem era mais livre, enquanto no português atual a
ordem tende a ser mais fixa. Segundo ele, um forte indício de mudança na ordenação do
advérbio sempre em textos religiosos. Portanto, o autor encontrou um aumento da posição
pós-verbal ao comparar o português arcaico com o atual com relação ao uso de sempre. E o
mesmo constatamos no nosso estudo. Pesquisas futuras devem verificar os indícios de
mudança apontados aqui, comparando textos de diferentes tipos.
5.1.3 Noção semântica do advérbio
O fator noção semântica do advérbio foi investigado com a finalidade de se verificar
se relação entre o valor que o advérbio em -mente expressaria no contexto e a sua posição.
Os valores considerados (com base em Freitas e em Ilari) são:
(a) Cronológico – é aquele que expressa tempo real;
(b) Aspectual é aquele que expressa às noções: iterativo, reiterativo, freqüentativo e
outros;
(c) Híbrido – é aquele que expressa às noções tempo/aspecto + modo.
A categoria noção semântica é de grande relevância para este estudo, pois este é o
momento em que a caracterização semântica do advérbio estudado que poderá ser observada
em uma análise não quantitativa, mas qualitativamente.
Denominamos os advérbios aspectuais aqueles que indicam a freqüência com que os
eventos não-específicos ocorrem ao longo do tempo. Esse tipo de advérbio é eminentemente
aspectual, que interage com a categoria aspectual de iteratividade, como podemos observar
no exemplo abaixo:
(15)... e refletiu sobre aquilo que Deus continuamente nos fala.(Português atual, TS,p.15)
Neste exemplo (15), verificamos que o advérbio cronológico expressa tempo real, ou
seja, é aquele que faz referência ao passado, presente ou futuro, tendo como ponto de
referência o momento da enunciação. no exemplo (16), observamos que o advérbio
apresenta a noção dêitica, aponta para algum momento da enunciação.
(16) Atualmente as coisas estão como costumavam ser mil anos atrás. (Português atual, EC,
p.09)
o advérbio no exemplo (17), observamos que expressa à noção de iteratividade
(aqui também alocamos nos grupos dos advérbios aspectuais) referindo-se à repetição de
algum evento, ou à freqüência com que eventos ocorrem. Vejamos o exemplo:
(17) Para nos resgatar e nos libertar novamente (Português atual, EC, p.61)
De fato, é uma tarefa arriscada determinar os limites entre tempo real e tempo
aspectual, mas decidimos que é possível fazer essa diferenciação, pelo menos até o ponto que
foi exigido pela análise. No presente caso, foi claro observar e definir os itens denominados
de tempo real devido à suas características dêiticas.
Os advérbios que apresentam a noção semântica Híbrida ‘tempo mais modo’ (como,
por exemplo, rapidamente), ou ‘tempo mais aspecto’ (como, por exemplo, normalmente),
nada mais são do que aqueles advérbios que expressam de alguma forma as duas
características, com predominância de uma sobre a outra. O importante aqui é verificar se esta
polissemia influencia a posição do item em relação ao verbo.
Apresentamos aqui mais alguns exemplos para ilustrar o fator noção semânticos
expressa pelo advérbio:
1. Freqüentativo/iterativo- Aspectual:
(18)... repetidamente nós o rejeitamos...(Português atual, EC,p. 44)
2. Expressão de tempo real – cronológico:
(19) Por isso antigamente havia um conselho chamado dos massoretas (Século XVII, Sermão
do Pe. A. Vieira )
3. Tempo aspectual – Aspectual:
(20) para nos resgatar e nos libertar novamente ...(Português atual, EC,p.61)
4. Híbrido tempo/aspecto + modo:
(21) Deus está querendo ficar eternamente conosco. ...(Português atual, TS, p. 49)
Portanto, esse fator leva em consideração a noção semântica que os advérbios em -
mente podem assumir no contexto em que estão inseridos.
A análise dos dados, que se apresentarão a seguir, será feita separando os corpora de
cada sincronia estudada. As tabelas abaixo ilustram a distribuição dos advérbios de acordo
com a posição e noção semântica identificadas, a começar pelo uso dos advérbios no
português arcaico. Ao final da seção, faremos uma conclusão geral relativa a esse fator.
Tabela 4 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no
Português Arcaico
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTA
L
Cronol. 03 - - - 03 02 - 01 09
Aspectual 02 - - 01 - 01 - - 04
Híbrido 04 02 06 01 07 06 - 05 31
Total 09 02 06 02 10 09 - 06 44
% 20,5 4,5 13,6 4,5 22,7 20,5 - 13,6 100
Na tabela 4, em que checamos a ordenação do advérbio e a noção semântica expressa
por ele na cláusula, observamos a predominância da tendência pré-verbal, exceto os advérbios
com os sentidos híbridos que expressam em si mesmos os valores de tempo/aspecto e modo.
É exatamente o fato de apresentar esse valor polissêmico denominado de híbrido na presente
pesquisa que explica o desvio que este advérbio apresenta com relação à tendência da posição
pré-verbal.
Além disso, podemos apontar na tabela acima outras constatações no português
arcaico, como por exemplo, se observarmos os totais expressos na última linha da tabela,
verificamos que as posições 1, 5 e 6 são mais recorrentes do que as demais posições 3, 8, 2 e 4
respectivamente.
Outra questão a ser considerada nessa análise é que as noções cronológicas e aspectual
não são predominantes em relação às demais noções. Entretanto, identificamos que a noção
híbrida é mais freqüente, quanto à sua ordenação, eles ocorrem mais na posição 5(margem
direita da cláusula), que é uma posição pós-verbal.
Na dissertação de Freitas (2004), verificou-se que o tipo polissêmico (que
corresponderia à noção híbrida) ocorria mais na posição pós-verbal, diferindo dos demais
tipos semânticos (cronológico, aspectual e conectivo). A autora justifica que por essa noção
possuir características de um advérbio qualitativo (Ilari et al., 1990), esse advérbio irá tender a
ocupar a posição pós-verbal, uma vez que os advérbios qualitativos têm a predisposição de
ocorrer após o verbo. Já Moraes Pinto (2007:77), ao estudar o uso do advérbio qualitativo em
–mente, constatou que “esses elementos apresentam mudança em seus valores desde
português arcaico ao século XIX”. Ela conclui que, além do processo de gramaticalização
pelo qual passou esse advérbio, exercendo nova função, sua ordenação na cláusula também
sofreu mudanças de acordo com os textos diacrônicos. E, ainda, acrescenta que “a posição
pré-verbal, principalmente entre o sujeito e o verbo, ainda se mostrou disponível, embora em
menor escala, no século XIX”.
Vejamos a análise do mesmo fator nos dados do século XVI:
Tabela 5 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica
Século XVI
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
Cronol. 05 - - - - 01 - - 06
Aspectual 02 01 - - - - - - 03
Híbrido 03 01 - - 01 02 01 01 10
Total 10 02 - - 01 03 01 01 18
% 55,5 11,1 - - 5,5 16,7 5,5 5,5 100
Na análise dos dados desse fator no século XVI, encontramos na relação entre ordem e
noção semântica, maior incidência de dados na posição 1 (margem esquerda da cláusula). As
noções cronológicas e aspectual, principalmente, predominam nessa posição (1), o sentido
híbrido ocorre mais nas posições pós-verbais, como atestam os trabalhos de Freitas (2004) e
Moraes Pinto (2002) em referência a esse tipo de advérbio. Com relação ao século XVII,
temos os seguintes resultados:
Tabela 6 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica
Século XVII
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
Cronol. 10 02 02 - 01 03 - 03 21
Aspectual 01 - - - 01 - - - 02
Híbrido 07 - - - - 01 01 02 11
Total 18 02 02 - 02 04 01 05 34
% 52,9 5,9 5,9 - 5,9 11,8 2,9 14,7 100
No século XVII, observamos que as noções cronológicas e híbridas predominam na
posição 1 (margem esquerda da cláusula). O sentido aspectual é menos freqüente (com
somente 1 dado na posição 1(margem esquerda) e 1 dado na posição 5 (margem direita).
Além disso, verificamos que o tipo híbrido não foi mais recorrente nas posições pós-verbais,
como vimos no português arcaico e no século XVII, mais ainda assim, não foi uma diferença
marcante.
O baixo número de dados não nos permite fazer outras generalizações. O mesmo
acontece com as outras sincronias.
A seguir apresentamos os resultados da análise dos dados do século XVIII.
Tabela 7 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica
Século XVIII
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
Cronol. 03 - - 01 01 01 - 01 07
Aspectual 03 - - - - 01 - 01 05
Híbrido 05 01 - - - - - - 06
Total 11 01 - 01 01 02 - 02 18
É interessante observar que, no século XVIII, todas as noções apresentam-se
predominantemente na posição 1 (margem esquerda da cláusula, pré-verbal). E mesmo o
sentido híbrido é mais freqüente na posição pré-verbal.
Vejamos os resultados acerca da amostra do século XIX.
Tabela 8 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica
Século XIX
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
Cronol. 01 - - 01 - - - - 02
Aspectual 01 - - 02 02 03 - 01 09
Híbrido 04 - - - 02 02 - 02 10
Total 06 - - 03 04 05 - 03 21
% 28,6 - - 14,3 19 23,8 - 14,3 100
Sabe-se que, no século XIX, as transformações na ngua foram decisivas para a
caracterização do português moderno. Na análise dos dados desse século, verificamos que as
posições mais recorrentes são as pós-verbais. Em relação à noção semântica, observamos que
os sentidos aspectual e híbrido são mais incidentes do que o cronológico. Além disso,
identificamos que o sentido híbrido é mais recorrente nas posições pós-verbais, como foi
atestado em outros trabalhos sobre os advérbios já citados.
Tabela 9 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica
Português Atual
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
Cronol. 02 - - 01 05 02 - - 10
Aspectual 02 01 03 03 05 03 - 05 22
Híbrido 02 02 01 - 04 02 01 01 13
Total 06 03 04 04 14 07 01 06 45
% 13,3 6,7 8,9 8,9 31,1 15,6 2,2 13,3 100
Na tabela 9, verificamos uma distribuição entre a posição e a noção semântica do
advérbio de maneira mais homogênea entre os sentidos pelas posições arroladas. Observamos
também que as posições pós-verbais são mais freqüentes do que as posições pré-verbais. E
que o sentido aspectual é mais utilizado nos contextos examinados.
Como vimos, no português atual, predomínio da posição pós-verbal (mais
especificamente a posição marginal à direita). Apenas podemos concluir que, quando a noção
é basicamente aspectual, como em freqüentemente, o advérbio não tem posição predominante,
mas, quando apresenta noção dêitica (temporal) ou noção híbrida, como antigamente,
rapidamente, respectivamente, a posição típica é pós-verbal.
Notamos também que os sentidos do advérbio ligeiramente encontrados no português
arcaico desapareceram e um novo uso surgiu. Isso demonstra que houve uma mudança nos
valores desses elementos.
Assim, podemos apontar que os advérbios do presente estudo assumem valores que
podem ocorrer antes ou depois do verbo, dependendo do valor semântico que assumem. O
advérbio ligeiramente, por exemplo, pode se apresentar como advérbio de modo (com sentido
de “de maneira simples; com simplicidade”) em posição pós-verbal ou começa a ter um
sentido brido quando aparece em posição pré-verbal. Pode ser entendido tanto como “com
simplicidade; com humildade” quanto, por extensão metafórica de significado, com sentido
semelhante a “apenas; só”, como ocorre nos dias de hoje. Nos exemplos dados do português
arcaico, temos:
(22) posso dizer ligeyrame)
))
)te qual cousa dellas he merecedor de mayor cõndenpcõ
(Português arcaico, OE, p.122)
(23) E e)na segu)da coua põõe) hu)a cesta que se çarra legeyrame
)
))
)
te quando a tangem. (Português
arcaico, OE, p.194)
No primeiro exemplo, o advérbio se comporta como advérbio de modo e, no segundo,
é híbrido, ou seja, um sentido se sobrepõe ao outro, resguardando resquícios de sentidos.
5.1.4 Tipo semântico do verbo
Um dos fatores que consideramos importantes para entender a posição dos advérbios
de tempo e de aspecto em -mente é a noção semântica expressa pelo verbo, pois trabalhos
anteriores, como Scheibman (2001), Bybee (2003), Andrade (2005) e Albani (2007), que
constataram que era necessário investigar se o tipo de verbo poderia influenciar na cláusula de
alguma forma, conforme explicamos na seção 3.5. Na presente análise, consideramos esse
fator relevante para tentar identificar se houve uma motivação semântica na ordenação dos
advérbios de tempo e de aspecto em -mente. Para isso, valemo-nos da classificação proposta
por Halliday (1994), também utilizada pelos autores citados nesta seção.
Portanto, o fator tipo semântico do verbo consistiu na classificação proposta para os
verbos da cláusula foi baseada em Halliday (1994), explicitada anteriormente neste
trabalho. Eis alguns exemplos de tipos de verbos encontrados nos corpora analisados:
- Processo material
(24) E quantos mortos subitamente e s~e p~e~endença lançou e enviou a ardideza ao
inferno...(Português arcaico, OE,p. 191).
- Processo Mental
(25) E, estando elle deitado em oraçõ em aquele loguar, começou subitamente a dormir...
(Português arcaico, OE,p. 164).
- Processo Relacional Intensivo
(26) Maria é mãe eternamente presente no mundo dos homens (Português atual, TS, p.15).
- Processo Relacional Possessivo
(27) Ele tem o coração constantemente voltado para os miseráveis (Português atual, TS,
p.47).
- Processo Comportamental
(28) E diz outrosy que os b~e~es temporares que veem continuadam~ente h~u~us tempos
outros he certa demonstrãnça de maa v~etura... (Português arcaico, OE).
- Atividade Verbal
(29) e refletiu sobre aquilo que Deus continuamente nos fala
. (Português atual, TS, p.15)
- Processo Existencial
(30) e logo subitam~ete os veras inchar e esqueecer-se da subjeiçõ ....(Português arcaico,
OE,p. 289).
- Processo Meteorológico
(31) e a pompa do m~udo he fumo e v~eto que subpitamente esvace e se sume... (Português
arcaico, OE,p. 227)
Este fator foi levado em consideração para verificar se houve uma fixação de uso. Ou
ainda, se tipos de verbos em que predominância de uma dada ordem do advérbio em
detrimento de outra. Além disso, temos de levar em consideração que essa classificação
semântica verbal é bastante subjetiva, pois os verbos podem apresentar sentidos adversos aos
propostos, dependendo do contexto ou a situação em que estejam configurando. Vejamos um
exemplo dos corpora:
(32) Entõn foy arrevatado subitam~ete em spiritu e levado ante a cadeyra ah~uu juiz...
(Português arcaico, OE, p. 66).
Na exemplificação (32) dada, o verbo “arrebatar”, que significa puxar, arrancar
(Dicionário Houaiss da língua portuguesa, 2004), está sendo usado metaforicamente.
Esperávamos também que o tipo semântico do verbo influenciasse a posição do
advérbio.
Para verificarmos, estabelecermos a relação entre o fator tipo semântica do verbo e a
ordem do advérbio de tempo e aspecto. Vejamos a tabela a seguir:
Tabela 10 –Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Português Arcaico
Tipo de
verbo/Ordem
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
01 - 01 01 02 02 - - 07
Existencial
- - 01 01 01 - 02 05
Material
04 01 03 01 06 02 - 01 18
Mental
- 01 01 - - 01 - 01 04
Relac. Intensivo
02 - - - 01 - - 01 04
Meteorológico
01 - - - - - - 01
Atividade Verbal
01 - - - - 03 - 01 05
Total
09 02 06 02 10 09 - 06 44
% 20,5 4,5 13,6 4,5 24,9 22,7 - 13,6 100
No português arcaico, observamos que o tipo de verbo mais recorrente é de valor
material em detrimentos dos demais valores. Quanto à relação posição e sentido do verbo, o
tipo material ocorre nas posições 1 e 5, que o as posições margens esquerda e direita
respectivamente. Os verbos comportamentais tendem a ocorrer nas posições 5 e 6 e os verbos
de atividade verbal tendem a ocorrer na posição 6. Além disso, verificamos que, em relação à
distribuição geral dos dados nesta sincronia, ela se dá de forma equilibrada. Na última linha
da tabela (total de dados de cada ordenação), constatamos que as posições marginais 1 e
5(esquerda e direita) são mais freqüentes, apesar de haver uma relativa distribuição dos dados
nas demais ordenações.
Além disso, nesta sincronia não houve ocorrência de verbo relacional possessivo.
Agora, vejamos a análise dos dados do século XVI.
Tabela 11 – Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em-
mente do século XVI
Tipo de
verbo/Ordem
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
01 - - - - - - - 01
Material
03 01 - - - - - - 04
Mental
02 - - - - - - 01 04
Relac. Possessivo
01 01 - - - 01 01 - 04
Relac. Intensivo
02 - - - 01 02 - - 05
Atividade Verbal
01 - - - - - - - 01
Total
10 02 - - 01 03 01 01 18
% 55,5 11,1 - - 5,5 16,6 5,5 5,5 100
Nos dados apresentados do século XVI, verificamos que os tipos mais freqüentes são
verbos materiais, mentais e relacionais possessivos. No total de 18 dados, encontramos 4
dados de cada tipo. Quando o verbo tem sentido material ou mental, a tendência é o advérbio
ocorrer na margem esquerda (POS1). Quando o verbo é relacional possessivo não posição
prototípica para o advérbio.
Em relação aos demais sentidos dos verbos, uma distribuição de dados equilibrada,
apenas podemos ressaltar que, verificando a última linha da tabela, a posição 1 (margem
esquerda) é a preferida, independente do tipo semântico do verbo.
Neste século, não houve ocorrências dos tipos de verbos existenciais e meteorológicos.
Vejamos os dados analisados na tabela a seguir.
Tabela 12 - Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em -mente
Século XVII
Tipo de
verbo/Ordem
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
- - - - - 02 - 01 03
Existencial
04 - - - 01 - 02 07
Material
04 02 01 - 01 01 01 - 10
Mental
01 - 01 - - - - - 02
Relac. Possessivo
02 - - - - - - 02
Relac. Intensivo
03 - - - - - 01 04
Atividade
Verbal
04 - - 01 - - 01 06
Total
18 02 02 - 02 04 01 05 34
% 52,9 5,8 5,8 - 5,8 11,8 2,9 14,7 100
Já nos dados do século XVII, observamos que não há uma predileção pelo tipo
material, como vimos nos dados do português arcaico e do século XVI, mas, em relação à
posição e o tipo semântico do verbo em geral, todos são mais recorrentes na posição 1
(margem esquerda), 18 dados de 34, e há uma relativa distribuição nas demais posições, o que
não difere dos séculos anteriores apresentados.
Neste século não houve ocorrência do tipo de verbo meteorológico, por isso não foi
apresentado na tabela.
A seguir, temos os dados analisados do século XVIII.
Tabela 13 – Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em -mente
Século XVIII
Tipo de
verbo/Ordem
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
03 - - 01 01 - - 05
Material
05 - - - 01 01 - 01 08
Mental
02 01 - - - - - 01 04
Relac. Possessivo
- - - - - - - - -
Relac. Intensivo
01 - - - - - - - 01
Total
11 01 - 01 01 02 - 02 18
% 61,1 5,5 - 5,5 5,5 11,1
-
11,1 100
Os dados analisados do século XVIII demonstram que o tipo de verbo material é o
mais freqüente, seguido do tipo comportamental (cada qual com 8 e 5 dados respectivamente).
Independentemente do tipo semântico, o advérbio tende a ocorrer na posição marginal à
esquerda (POS1).
Neste culo não houve ocorrências dos tipos de verbos: existencial, meteorológico e
atividade verbal, por isso não foram listados na tabela.
Vejamos os dados na tabela a seguir.
Tabela 14 - Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em -mente
Século XIX
Tipo de
verbo/Ordem
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
- - - - - - - 01 01
Material
03 - - 02 02 03 - - 10
Mental
- - - - - 01 - 01 02
Relac. Possessivo
02 - - - - 01 - - 03
Relac. Intensivo
01 - - 01 - - - - 02
Atividade
Verbal
- - - - 02 - - 01 03
Total
06 - - 03 04 05 - 03 21
%
28,6 - - 14,3 19,04
23,8 - 14,3 100
No século XIX, constatamos que o tipo de verbo material é o mais freqüente, como
maioria das sincronias. Quanto à relação entre posição e tipo de verbo, observamos que
uma distribuição mais homogênea. Quando o verbo é material, o advérbio em -mente ocorre
mais na posição 1 (3 dados em 10) ou na posição 6 (também 3 dados em 10). Os demais tipos
tiveram poucos dados. Verificamos, também, que os advérbios tendem a ocorrer mais nas
posições pós-verbais (Posições 5, 6, e 8).
Além disso, podemos confirmar na última linha da tabela que os números percentuais
incidem mais nessas posições: POS 5 (19,4%); POS 6 (23,8%); POS 8 (14,3%).
Na análise deste culo também não foram encontrados dados dos tipos de verbos
existenciais e meteorológicos, por isso este não foi listado na tabela.
A seguir, vejamos os dados analisados do português atual.
Tabela 15 – Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em -
mente do Português Atual
Tipo de
verbo/Oração
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
01 - - 01 - 01 - - 03
Existencial
- - - - 03 - - 03
Material
03 01 - 02 03 02 - 02 13
Mental
- - - - 01 - 01 02
Relac. Possessivo
- - 01 - 02 01 - - 04
Relac. Intensivo
02 - 03 - - - - 02 07
Meteorológico
- - - - - - 01 - 01
Atividade
Verbal
- 02 - 01 05 03 - 01 12
Total
06 03 04 04 14 07 01 06 45
% 13,3 6,7 8,9 8,9 31,1 15,6 2,2 13,3 100
De acordo com a tabela 15, verificamos que o tipo de verbo mais freqüente é o verbo
de processo material, seguido dos de atividade verbal. Em relação ao tipo de verbo e a posição
do advérbio, vemos que, quando o verbo é material, o advérbio tende a ocorrer nas posições 1
e 5; quando é de atividade verbal, tende a ocorrer na posição 5.
Nos resultados apresentados, uma tendência para os advérbios em -mente
aparecerem numa posição pré-verbal (no português arcaico, século XVI, XVII e XVII)
principalmente quando o verbo é de processo material, assim com os demais tipos de verbos.
Mas em relação à análise dos dados do século XIX e português atual, verificamos que há uma
predileção às posições pós-verbais. Esse resultado indica mudança na posição do advérbio ao
longo da história do português, o que vai ao encontro de outras pesquisas, como as de
Martelotta (2006) e Albani (2007), que demonstraram que os advérbios m mudando para a
posição pós-verbal, de um modo geral.
5.1.5 Tipo de sujeito
A forma de realização do sujeito da oração, um critério de natureza sintática, é um
fator considerado na presente análise do advérbio de tempo e aspecto em -mente.
Em um trabalho feito sobre a forma de realização do sujeito pronominal, Duarte
(1993) observou que o português do Brasil apresentava índices de preenchimento de sujeito
bastante superiores aos apresentados pelas línguas românicas de sujeito nulo, como o
espanhol, o italiano e a variedade européia do português. A partir desse trabalho, intuímos que
em todos os contextos em que a posição do sujeito está vazia seja pela não realização, a
posposição ou deslocamento do sujeito para a margem direita da oração favoreceria a
ocorrência dos advérbios na margem esquerda da cláusula. De certa forma, a relação entre a
posição do advérbio e a forma de realização do sujeito da cláusula é demonstrada nas
subposições do item I desse capítulo, onde são analisadas as diversas possibilidades
estruturais decorrentes das posições em que os advérbios de tempo e de aspecto ocupam na
oração.
Essa possibilidade fora levantada em pesquisas como os de Kato e Nascimento
(2002:195), que mostraram que “se o sujeito é nulo, o preenchedor pode ser predito como um
adjunto”. Rocha (2001:113) também concorda com essa posição, pois afirma que “a ausência
de argumento concorre para propiciar a presença de preenchedores”. Haveria uma espécie de
equilíbrio sintático.
Porém, os trabalhos recentes apresentam evidências contrárias a essa postura. Duarte
(2003:121), em um estudo que compara amostras da fala carioca dos anos 80 e dos anos 90,
atesta que a ocorrência “de elementos adjuntos ao sujeito, sejam eles resultados de
topicalizações sejam eles adjuntos adverbiais, favorece a expressão plena do sujeito
pronominal”.
Para verificar de que forma se a relação entre a realização do sujeito e a ordem dos
advérbios de tempo e de aspecto em -mente foi feito um controle das possibilidades
exemplificadas a seguir:
a) Sujeito expresso anteposto ao verbo
(80) Lêde o Testamento Velho, e achareis que Deus antigamente afogava exércitos,
queimava cidades, alagava mundos, despovoava paraísos (Século XVII, sermão do Pe.A.
Vieira).
b) Sujeito expresso posposto ao verbo
(81) Comeu Eva o pomo da ciência, e queixava-me eu antigamente desta nossa Mãe; que
comeu o pomo, por que Ihe não guardou as pevides?(Século XVII, sermão do Pe.A. Vieira).
c) Sujeito ausente
(82) abramos os olhos à luz, para que alumie nossos corações; abramos os corações à luz, para
que more perpètuamente neles (Século XVII, sermão do Pe.A. Vieira).
d) Sujeito pronominal (que/quem).
(83) Capitulo como elrey combateo a cidade de Rachol. Estando elrey, como dito he,
combatemdo a cidade de Rachol, lhe veyo novas certas como ydalca~o hera chegado ao ryo
da bamda do norte, e que ally asentava seu arayall; mamdou elrey os espias que sempre
amdassem sobre elle, que vissem ho que fazia, e asym lhe desem o aviso de tudo ho que fazia;
com esta nova ouve no arayal allgu~u allvoroço, primcipalmente na gente baixa, a quem
numca fallta sospeitas, e aymda em sy tinha~o o medo que antigamente tinha~o aos mouros.
(Século XVI, Crônica dos Reis de Bisnaga)
Vejamos como ficou a distribuição do fator tipo de sujeito com a ordem do advérbio -
mente nas sincronias estudadas. As conclusões a respeito da hipótese serão dadas após os
resultados da última sincronia estudada, ao final desta seção.
Tabela 16 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio
Português Arcaico
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
05 - 05 01 06 06 - 06 29
Sujeito presente
antes do verbo
01 02 - 01 03 02 - - 09
Sujeito presente
depois do verbo
- - 01 01 01 - - 03
Sujeito pronome
relativo
03 - - - - - - - 03
Total
09 02 06 02 10 09 - 06 44
% 20,5 4,5 13,6 4,5 22,7 20,5 - 13,6 100
Nos dados do português arcaico, observamos que, quando o sujeito está ausente, o
advérbio tende a vir nas posições 5 (final da oração) e 6 (posição pré-verbal não marginal),
cada qual com 6 dados, no total de 29. Quando o sujeito está presente anteposto ao verbo, o
advérbio tende a ocorrer na posição 5 (final da oração). Ocorre apenas neste último caso uma
espécie de equilíbrio sintático.
Vejamos os dados a seguir do século XVI.
Tabela 17 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio
Século XVI
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
06 - - - - - 01 01 08
Sujeito presente
antes do verbo
03 02 - - 01 01 - - 07
Sujeito presente
depois do verbo
- - - - - 02 - - 02
Sujeito
pronome
relativo
01 - - - - - - - 01
Total
10 02 - - 01 03 01 01 18
%
52,9 11,5 - - 5,5 16,6 5,5 5,5 100
Nos dados do século XVI, quando o sujeito está ausente, o advérbio tende a vir na
posição 1(margem esquerda), o que é esperado para haver equilíbrio sintático. Quando o
sujeito está presente anteposto ao verbo, o advérbio tende a ocorrer também na posição 1
(margem esquerda), não confirmando a hipótese. Além disso, quando o sujeito está posposto,
o advérbio aparece em posição pós-verbal (a posição 6 é uma posição pós-verbal), o que
também não comprova a hipótese de equilíbrio sintático.
A seguir, vejamos os dados do século XVII.
Tabela 18 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio
Século XVII
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
09 01 02 - 01 02 01 04 20
Sujeito presente
antes do verbo
08 01 - - 01 01 - - 11
Sujeito presente
depois do verbo
01 - - - - 01 - 01 03
Sujeito
pronome
relativo
- - - - - - - - -
Total
18 02 02 - 02 04 01 05 34
% 52,9 5,8 5,8 - 5,8 11,7 2,9 14,7 100
Nos dados do século XVII, observamos que, quando o sujeito está ausente, o advérbio
tende a vir nas posições 1, havendo então preenchimento da posição pré-verbal. No entanto,
quando o sujeito está presente anteposto ao verbo, tende a ocorrer na posição 1 (margem
esquerda).
Vejamos os dados a seguir do século XVIII
Tabela 19 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Século XVIII
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
06 - - 01 - 01 - 01 09
Sujeito presente
antes do verbo
02 01 - - 01 01 - 01 06
Sujeito presente
depois do verbo
01 - - - - - - - 01
Sujeito pronome
relativo
02 - - - - - - - 02
Total
11 01 - 01 01 02 - 02 18
% 61,1 5,5 - 5,5 5,5 11,1 - 11,1 100
Na análise dos dados do século XVIII, verificamos que, quando o sujeito está ausente,
o advérbio tende a vir na posição 1(margem esquerda), 6 dados, ou seja, houve o
preenchimento da posição do sujeito pelo advérbio. Quando o sujeito está presente anteposto
ao verbo, o advérbio tende a ocorrer na posição 1 (margem esquerda), mas o número de dados
é extremamente baixo em qualquer posição
Vejamos os dados a seguir do século XIX.
Tabela 20 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio
Século XIX
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
05 - - 01 02 05 - 03 16
Sujeito presente
antes do verbo
01 - - 02 - - - - 03
Sujeito presente
depois do verbo
- - - - 01 - - - 01
Sujeito pronome
relativo
- - - - 01 - - - 01
Total
06 - - 03 04 05 - 03 21
% 28,6 - - 14,2 19,0
4
23,8 - 14,2 100
Nos dados analisados do século XIX, verificamos que, quando o sujeito está ausente, o
advérbio tende a vir nas posições 1 e 6 (cada qual com 5). A hipótese do equilíbrio sintático se
confirma no primeiro caso, pois, quando o sujeito estava ausente, houve maior incidência de
advérbio na margem esquerda (ou seja, posição pré-verbal). Mas a ocorrência relativamente
alta de dados na posição 6 (entre o verbo e o complemento) demonstra que a hipótese não foi
contemplada. (Os demais tipos tiveram baixíssima ocorrência.). Observamos que
independente do sujeito estar ausente ou presente uma tendência a ocorrerem nas posições
pós-verbais (posições 5, 6 e 8).
Vejamos os dados a seguir do português atual.
Tabela 21 - Relação entre o tipo de sujeito e a ordem do advérbio
Português Atual
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
02 01 01 04 07 04 01 02 22
Sujeito presente
antes do verbo
04 01 03 - 04 02 - 04 18
Sujeito presente
depois do verbo
- - - - 01 01 - - 02
Sujeito
pronome
relativo
- 01 - - 02 - - - 03
Total
06 03 04 04 14 07 01 06 45
% 13,3 6,6 8,8 8,8 31,3 15,5 2,2 13,3 100
Nos dados do português atual, verificamos, quando o sujeito está ausente, o advérbio
tende a ocorrer nas posições 5 (final da oração) e 6 (entre o verbo e o complemento). Esse
resultado indica que não tendência ao preenchimento da posição vazia. Quando o sujeito
está presente anteposto ao verbo, o advérbio aparece nas posições 1 (margem esquerda) e 5
(final da oração), o que demonstra que a hipótese do equilíbrio sintático não pôde ser
comprovada, pois ora preenchimento, ora não preenchimento da posição à esquerda do
verbo (com o sujeito à direita).
Nas tabelas apresentadas, se tomarmos as posições pré-verbais de um modo geral, em
oposição às pós-verbais, podemos observar que a ausência de sujeito nas posições pré-verbais
não leva o advérbio a se antepor ao verbo. Nos casos de sujeito ausente, por exemplo, temos
mais advérbios pós-verbais do que pré-verbais. Por outro lado, os casos em que o sujeito está
posposto apresentam mais dados com advérbio pós-verbal do que pré-verbal. Parece não
haver, portanto, nos casos dos advérbios em -mente, algum tipo de compensação ou equilíbrio
no posicionamento dos elementos na estrutura da cláusula.
Se observarmos separadamente a posição 1, ou seja, a que corresponde à margem
esquerda da cláusula e que, por hipótese, seria a que mais atrairia o advérbio, notamos que
isso também não ocorre. De fato, há uma quantidade maior de casos nessa posição.
Entretanto, se observarmos todas as ocorrências pré-verbais, notamos que a margem esquerda,
independentemente da presença ou não do sujeito, é a posição preferencial dos advérbios pré-
verbais.
Em função desses resultados, concluímos que não uma relação mais significativa
entre presença/ ausência de sujeito em posição pré-verbal (marginal ou o) e colocação dos
advérbios aqui estudados. Esse mesmo resultado foi obtido em Martelotta (2006) para os
advérbios qualitativos e em Marques (2008), que estudou a ordenação sujeito/ verbo. Assim
nossos resultados são contrários à hipótese de que adjuntos (pelo menos do tipo que estamos
estudando) são colocados na posição do sujeito vazio.
5.1.6 Tipo de oração
As tabelas abaixo apresentam a distribuição das ocorrências dos advérbios de tempo e
aspecto em -mente pelas diferentes posições observadas, sempre levando em conta o grau de
gramaticalização das cláusulas que contêm essas ocorrências. Essa análise foi feita de acordo
com a metodologia e hipóteses apresentadas nos trabalhos de Martelotta (2006). Sua hipótese
principal, exposta nesta tese no capítulo 1, é a de que as orações mais gramaticalizadas seriam
as mais propícias aos usos mais conservadores dos advérbios.
Tabela 22 - Ocorrência de advérbios no Português Arcaico
Na análise dos dados do Português Arcaico, observamos que um número
significativo de ocorrências de advérbios de tempo e aspecto em -mente em posição pré-
verbal, mostrando que essa posição, assim como a pós-verbal, estava disponível para este tipo
de advérbio na fase arcaica de nossa língua.
É possível observar algumas regularidades interessantes, sobretudo quando se
comparam esses resultados com outras pesquisas referentes à ordenação de outros tipos de
PORT.
ARCAICO
-gramatical.
+Gramatical.
- Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação
Subord. Rel
- NR NR R NR NR
Total
POS1
06 - - - - 03 09
POS 2
02 - - - - - 02
POS 3
02 01 - - 01 01 06
POS 4
- - - - - 02 02
POS 5
07 01 - - 01 01 10
POS 6
06 - - - 01 02 09
POS 7
- - - - - - -
POS 8
03 01 01 - - 01 06
Total
27 03 01 - 03 08 44
advérbios, feitas com base em outros corpora. Pesquisas elaboradas em Martelotta, (2004;
2006) e Martelotta e Vlček (2006) sobre os advérbios qualitativos bem e mal, assim como os
terminados em -mente demonstraram que as posições pré-verbais tipicamente latinas
(Martelotta, Processy e Santos: 2008), hoje praticamente inexistentes no caso desses
advérbios, ainda ocorriam até o século XIX, sobretudo em cláusulas com alto nível de
gramaticalização. Isso ocorre porque essas cláusulas, segundo Givón (1979), o mais
conservadoras em termos de estrutura sintática, sobretudo no que se refere à ordenação de
seus constituintes.
Os resultados da tabela acima não refletem o que ocorreu com os qualitativos: uma
predominância não muito acentuada das posições pós-verbais, mesmo em cláusulas mais
gramaticalizadas.
Temos a seguir dois exemplos que ilustram os tipos de cláusulas em que ocorre o tipo de
advérbio estudado:
(84) E esta sandia subitam~ete foy cega, mas Ella nõ sabia que era cega(OE,p.57)
(85) e a pompa do m~udo he fumo e v~eto que subpitamente esvaece e se sume...(OE, p
227)
No primeiro exemplo, temos uma ocorrência em que o advérbio está inserido numa
cláusula paratática; no segundo exemplo, o advérbio está num contexto de uma cláusula
subordinada adjetiva restritiva.
Análise dos dados referentes ao Século XVI
Na análise dos dados do século XVI, não temos o mesmo número de dados que foi
observado no português arcaico. Por isso, priorizamos uma análise mais qualitativa,
observando as tendências de ordenação em face às outras sincronias estudadas.
Tabela 23 - Ocorrência de advérbios no Século XVI
Apesar da baixa ocorrência de dados nesta fase, de um modo geral, a análise
qualitativa apresentou resultados favoráveis às nossas hipóteses. A posição pré-verbal, por
exemplo, estava presente nesta fase do português em escala menor que a posição pós-verbal.
Também foi possível observar que as orações mais gramaticalizadas elegem a
ordenação pré-verbal, 11 ocorrências distribuídas pelas posições pré-verbais (Pos 1, 2 e 3).
SÉC.XVI
-gramatical.
+Gramatical.
Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação
Subord. Rel
NR NR R NR NR
Total
POS1
01 01 01 - 01 06 10
POS 2
- - - - 01 01 02
POS 3
- - - - - - -
POS 4
- - - - - -
POS 5
01 - - - - - 01
POS 6
01 - - - 01 01 03
POS 7
01 - - - - - 01
POS 8
- - - - - 01 01
Total
04 01 01 - 03 13 18
Tal observação contribui para confirmar a hipótese que adotamos com Givón (1979) de que
esses tipos cláusulas (mais gramaticalizadas) tendem a ser sintaticamente mais conservadoras,
principalmente, no que diz respeito à ordenação dos constituintes da oração.
Ilustrando a ocorrência de cláusulas mais gramaticalizadas nesta sincronia, temos o
caso do exemplo (85), a seguir:
(85) O que ha da bamda d este rio. Esta hu~a cidade edificada que chama~o Senagumdym,
que dizem que antigamente foy cabeça do reyno, e agora vive nella pouca gente (Século
XVI, Crônica dos Reis de Bisnaga)
Outra ressalva interessante é que, ao analisarmos o português arcaico, apresentado
anteriormente, a hipótese de Givón (1979) não foi de todo confirmada, apesar de
encontrarmos uma leve tendência das posições pré-verbais em cláusulas mais
gramaticalizadas. Por outro lado, na análise do século XVI essa hipótese se confirma quando
se relacionam as posições dos advérbios com o grau de gramaticalização da cláusula em que
ele ocorre, segundo a qual a anteposição do advérbio em relação ao verbo, característica do
latim, se mantém em cláusulas com graus mais altos de gramaticalização, que são mais
conservadoras em termos de ordenação.
Pode-se concluir que essa diferença entre as ocorrências do português arcaico e as do
séc.XVI se simplesmente pelo fato de que existem mais cláusulas com altos níveis de
gramaticalização nos textos desse século do que a do outro e que, somente por isso, os
números referentes aos advérbios pré-verbais são mais altos nessas cláusulas.
Análise dos dados referentes ao Século XVII
O número de dados encontrados nos corpora deste século foi de 34 dados, um pouco a
mais do que o século XVI.
Tabela 24 - Ocorrência de advérbios no Século XVII
Podemos observar, na tabela 26, que o advérbio de tempo e aspecto em -mente, maior
incidência na posição pré-verbal, porém como cláusulas menos encaixadas.
SÉC.XVII
-gramatical.
+Gramatical.
- Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação
Subord. Rel
- NR NR R NR NR
Total
POS1
14 02 - - 02 - 18
POS 2
01 - - - 01 - 02
POS 3
- 01 - - 01 02
POS 4
- - - - -
POS 5
02 - - - 02
POS 6
03 - - - 01 04
POS 7
- - - - 01 01
POS 8
03 - - - 01 01 05
Total
23 03 - - 05 03 34
Análise dos dados do Século XVIII
Cabe registrar logo de início a quantidade extremamente pequena de dados de
ocorrências dos advérbios em estudo nesta época. Isso, obviamente, impede qualquer
conclusão mais precisa em relação as suas tendências de ordenação nos corpora analisados no
século XVIII. Entretanto, é possível observar e fazer algumas ponderações em relação aos
resultados encontrados nesse século.
Vejamos a tabela a seguir:
Tabela 25 - Ocorrência de advérbios no Século XVIII
É interessante ressaltar que novamente a nossa hipótese inicial também foi confirmada
de que as orações mais gramaticalizadas elegem a ordenação pré-verbal, 8 ocorrências contra
uma única ocorrência na posição pós-verbal.
SÉC.XVIII
-gramatical.
+Gramatical.
- Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação
Subord. Rel
- NR NR R NR NR
Total
POS1
05 - 03 - 01 02 11
POS 2
- - - - - 01 01
POS 3
- - - - - - -
POS 4
01 - - - - - 01
POS 5
- - - - 01 - 01
POS 6
02 - - - - - 02
POS 7
- - - - - -
POS 8
02 - - - - - 02
Total
10 - 03 - 02 03 18
Por outro lado, 5 ocorrências pré-verbais em cláusulas menos gramaticalizadas em
oposição 4 dados na posição pós-verbal, também em cláusulas menos gramaticalizadas.
Isso é importante, porque pode apontar para o fato de que, até o século XVIII, era mais forte a
inclinação que os advérbios qualitativos apresentavam de ocorrer antes do verbo, o mesmo
acontecendo para os de tempo e de aspecto, reforçando os resultados obtidos em Martelotta e
Vlček (2006), segundo os quais essa tendência começa a enfraquecer no início do século XIX
e acaba por desaparecer na virada para o século XX, os quais mostraremos mais adiante.
Análise dos dados referentes ao século XIX
As ocorrências de advérbios de tempo e aspecto em -mente no século XIX, relacionadas
às variáveis posição na oração e grau de gramaticalização da cláusula, podem ser vistas na
tabela abaixo:
Tabela 26 - Ocorrência de advérbios no Século XIX
No caso do século XIX, há uma quantidade maior de ocorrências de advérbios de tempo
e de aspecto em -mente, embora essas 21 ocorrências estejam longe de constituir a quantidade
necessária para se chegar a constatações mais precisas. Como foi mencionado na análise dos
dados do século XVIII, acredita-se ser possível, apesar do poucos dados, observar
regularidades interessantes, que se tornam significativas, quando comparadas com tendências
detectadas em outras pesquisas referentes à ordenação de outros advérbios, feitas com base
em outros corpora e em outros estágios da história do português.
Assim como aconteceu com o século XVIII, era de se esperar que o século XIX
apresentasse uma relativa predominância das posições pós-verbais. Isso de fato ocorreu: a
tabela apresenta 12 ocorrências nessa posição, total de 21 advérbios. Esses dados refletem a
tendência, mencionada anteriormente, que vem relativamente se delineando desde século
SÉC.XIX
-gramatical.
+Gramatical.
- Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação
Subord. Rel
- NR NR R NR NR
Total
POS1
03 - 02 - 01 - 06
POS 2
- - - - - - -
POS 3
- - - - - - -
POS 4
02 - - - 01 - 03
POS 5
02 - 01 - 01 - 04
POS 6
04 - - 01 - - 05
POS 7
- - - - - -
POS 8
02 01 - - - - 03
Total
13 01 03 01 03 - 21
XVI, uma vez que na fase arcaica do português com esse tipo de advérbio a hipótese não se
confirmou, ou como nos trabalhos de Moraes Pinto, 2002; Martelotta, 2004, a confirmação
dessas tendências foi constatada.
Outro resultado interessante se apresenta quando se relacionam as posições dos
advérbios com o grau de gramaticalização da cláusula em que ele ocorre. Do total de 9 casos
de advérbios pré-verbais, 4 correram em cláusulas mais gramaticalizadas (hipotáticas e
subordinadas). Cabe ressaltar aqui que a diferença entre as ocorrências em cláusulas menos
gramaticalizadas é bastante pequena: 6 dados nas posições (1, 2, 3 e 4) pré-verbais.
Tabela 27 - Ocorrência de advérbios no Português Atual
No português atual, a ocorrência dos dados demonstrou uma propensão, que se
manifesta quase categoricamente, de que esses advérbios ocorressem após o verbo, 28 dados,
SÉC.XIX
-gramatical. +Gramatical.
- Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação Subord. Rel
- NR NR R NR NR
Total
POS1
05 - - 01 - - 06
POS 2
01 - - - - 02 03
POS 3
01 - - 02 01 - 04
POS 4
04 - - - - - 04
POS 5
02 01 - 01 02 02 14
POS 6
03 01 - 02 01 - 07
POS 7
01 - - - - - 01
POS 8
05 01 - - - - 06
Total
28 03 - 06 04 04 45
sendo que 17 em cláusulas menos gramaticalizadas pós-verbais e 10 dados em cláusulas mais
gramaticalizadas. Cabe ressaltar que novamente obtivemos resultados atípicos aos esperados
segundo a hipótese proposta em relação à posição e o grau de gramaticalização das cláusulas.
O quadro a seguir apresenta uma síntese do que já foi exposto.
Nessa sincronia, novamente obtivemos resultados contrários aos esperados segundo a
hipótese proposta em relação à posição e o grau de gramaticalização das cláusulas.
Mas, ressaltamos que os resultados encontrados são significativos, pois alguns apontam
para outras possíveis tendências diferentes dos trabalhos realizados sobre o fenômeno em
questão.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta pesquisa teve como objetivo observar as diferentes posições que os advérbios de
tempo e aspecto em -mente tendem a assumir em diferentes momentos na história da língua
portuguesa, a fim de verificarmos se houve mudança na ordenação desses elementos. Para
isso, coletamos dados de textos do português das seguintes fases históricas: arcaica, dos
séculos XVI, VXII, XVIII e XIX e português atual.
Este estudo, além de testar novas hipóteses, vem integrar e ampliar uma série de
pesquisas que visam examinar, de modo mais geral, o processo de mudança de colocação dos
advérbios no decorrer do tempo (Moraes Pinto, 2002; Martelotta, Barbosa & Leitão, 2002;
Martelotta, 2004 e 2006; Martelotta & Processy, 2006; Andrade, 2005; Albani 2007; Freitas,
2004).
Foram muito poucos os dados encontrados nos corpora analisados, em função de que,
de um modo geral, advérbios de tempo e aspecto em -mente são, de fato, pouco usados no
discurso escrito assim como no falado. Sendo assim, em muitos momentos da pesquisa, foi
difícil chegar a conclusões a respeito dos resultados estatísticos. Entretanto, foi possível
observar, entre esses poucos dados, algumas regularidades interessantes, sobretudo quando
essas regularidades foram localizadas dentro de um processo de mudança mais geral,
observado em outras pesquisas referentes à ordenação de outros tipos de advérbios feitas com
base em outros corpora e em diferentes momentos da história da língua portuguesa..
Partimos do pressuposto de que ocorreram mudanças na posição dos advérbios ao
compararmos a sincronia do português arcaico com o atual. De acordo com trabalhos
anteriores, como os de Martelotta e Leitão (1999) e de Martelotta, Barbosa e Leitão (2001), a
posição pré-verbal (entre o sujeito e o verbo) era disponível para toda espécie de advérbio e,
hoje, ela ainda está disponível para alguns. Portanto, houve uma mudança no padrão de
ordenação de alguns advérbios.
Observamos que não houve diferença significativa, ao compararmos as duas posições,
a pré-verbal e a pós-verbal, quando levamos em consideração todos os dados, ou seja, quando
não separamos as sincronias, pois os dados se distribuíram homogeneamente entre essas
posições gerais.
Porém, ao olharmos a distribuição dos advérbios analisados pelas posições já arroladas
anteriormente nas sincronias estudadas, constatamos que a POS1 (margem esquerda) foi a
mais recorrente, ou seja, os advérbios de tempo e de aspecto em -mente por expressarem tais
circunstâncias preferiram as posições periféricas da cláusula, sobretudo à margem esquerda
(POS1), e pouco se realizaram nas posições mais internas à sentença, posições essas que
rompem com a estrutura padrão da cláusula. Shaer (2004), ao tratar especificamente da
ordenação dos circunstanciais temporais, relata que não é fácil determinar de forma precisa as
diferenças entre os temporais na margem esquerda ou na margem direita da sentença, ainda
que seja possível determinar distinções funcionais entre eles: a margem esquerda constitui um
ponto de ancoragem, um elo entre a parte do discurso em que se encontra o advérbio e um
ponto do discurso anteriormente mencionado, numa relação nitidamente anafórica, de
conexão discursiva. Além disso, pudemos observar, também, que, no português arcaico, as
posições típicas são posição 5 (pós-verbal, mais precisamente margem direita no fim da
oração), posição 6 (entre o verbo e o complemento) e posição 8 (pós-verbal fora do fim), mas
os dados tiveram uma boa distribuição em todas as posições, exceto a posição 7. Ou seja, no
português arcaico havia uma ordenação mais livre.
nas outras fases do português, entre o português do XVI e o português do século
XIX, o uso predominante foi a posição 1 (margem esquerda). No século XVI, ainda houve
outras posições com número razoável de dados, que foram as posições 6 (inserido entre o
verbo e o complemento/predicativo) e 5 (margem direita da oração). Depois, como dissemos,
é a posição marginal à esquerda a preferida pelos autores. Mas, no século XIX, já houve uma
diferença importante: começou a aumentar o uso de uma posição pós-verbal, que foi a posição
6. Já no Português atual, verificamos que houve uma distribuição de dados em todas as
posições, mas houve o predomínio da posição 5, ou seja, uma posição pós-verbal.
Nossa análise permite-nos dizer que, nas amostras estudadas (referentes somente ao
português escrito), o advérbio em -mente de tempo e de aspecto passou de um uso
relativamente livre para um uso mais fixo na posição marginal à esquerda e depois no
português atual passou a ser usado predominantemente na posição pós-verbal (mais
especificamente na posição marginal à direita). Trabalhos como os de Martelotta (2006) e
Albani (2007) também apontam pra o uso predominante da posição pós-verbal para os
advérbios ao longo da história do português.
Outro fator analisado foi a noção semântica do advérbio em que checamos a relação
entre ordenação e tipo semântico. No português arcaico observamos a predominância da
tendência pré-verbal, exceto os advérbios com os sentidos híbridos que expressam em si
mesmos os valores de tempo/aspecto e modo. É exatamente o fato de apresentar esse valor
polissêmico denominado de híbrido na presente pesquisa que explica o desvio que este
advérbio apresenta com relação à tendência da posição pré-verbal.
Outra questão a ser considerada nesta sincronia é que as noções cronológicas e
aspectual não são predominantes em relação às demais. Entretanto, identificamos que a noção
híbrida é mais freqüente, quanto à sua ordenação, eles ocorrem mais na posição 5 (margem
direita da cláusula), que é uma posição pós-verbal.
Na análise dos dados desse fator no século XVI, encontramos na relação entre ordem e
noção semântica, maior incidência de dados na posição 1 (margem esquerda da cláusula). As
noções cronológicas e aspectual, principalmente, predominam nessa posição (1), o sentido
híbrido ocorre mais nas posições pós-verbais, como atestam os trabalhos de Freitas (2004) e
Moraes Pinto (2002) em relação a esse tipo de advérbio.
no século XVII, observamos que as noções cronológicas e bridas predominam na
posição 1 (margem esquerda da cláusula). O sentido aspectual é menos freqüente (com
somente 1 dado na posição 1 (margem esquerda) e 1 dado na posição 5 (margem direita).
Além disso, verificamos que o tipo híbrido não foi mais recorrente nas posições pós-verbais,
como vimos no português arcaico e no século XVII, mais ainda assim, não foi uma diferença
marcante.
O baixo número de dados não nos permite fazer outras generalizações. O mesmo
aconteceu com as outras sincronias.
Em relação à análise dos dados do século XVIII, todas as noções apresentam-se
predominantemente na posição 1 (margem esquerda da cláusula, pré-verbal). E mesmo o
sentido híbrido é mais freqüente na posição pré-verbal.
Na análise dos dados do século XIX, verificamos que as posições mais recorrentes são
as pós-verbais. Em relação à noção semântica do advérbio, observamos que os sentidos
aspectual e híbrido são mais incidentes do que o cronológico. Além disso, identificamos que o
sentido híbrido é mais recorrente nas posições pós-verbais, como foi atestado em outros
trabalhos sobre os advérbios já citados ao longo desse estudo.
No português atual, verificamos uma distribuição entre a posição e a noção semântica
do advérbio de maneira mais homogênea entre os sentidos pelas posições arroladas.
Observamos também que as posições pós-verbais são mais freqüentes do que as posições pré-
verbais. E que o sentido aspectual é mais utilizado nos contextos examinados.
Como vimos, no português atual, predomínio da posição pós-verbal (mais
especificamente a posição marginal à direita). Apenas podemos concluir que, quando a noção
é basicamente aspectual, como em freqüentemente, o advérbio não tem posição predominante,
mas, quando apresenta noção dêitica (temporal) ou noção híbrida, como antigamente,
rapidamente, respectivamente, a posição típica é pós-verbal.
Outra perspectiva da presente pesquisa foi a observação da relação entre a forma de
realização do sujeito da oração, um critério de natureza sintática, e a posição do advérbio.
Para verificar essa relação, fizemos um controle dos seguintes tipos de sujeito: sujeito
expresso anteposto ao verbo; sujeito expresso posposto ao verbo; sujeito ausente e sujeito
pronominal (que/quem). Nessa perspectiva, pressupomos que a presença ou ausência do
sujeito influenciaria a colocação do advérbio de acordo com a noção semântica que o mesmo
venha expressar e, ainda, de acordo com a intencionalidade do escritor em enfatizar ou não
sua informação.
Ao tomarmos as posições pré-verbais de um modo geral, em oposição às pós-verbais,
verificamos que a ausência de sujeito nas posições pré-verbais não levou o advérbio a se
antepor ao verbo, ao contrário da hipótese do que posições vazias tenderiam a ser preenchidas
pelo advérbio.
Parece não haver, portanto, nos casos dos advérbios de tempo e de aspecto em -mente,
algum tipo de compensação ou equilíbrio no posicionamento dos elementos na estrutura da
cláusula. Além disso, ao observarmos separadamente a posição 1, ou seja, a que corresponde
à margem esquerda da cláusula e que, por hipótese, seria a que mais atrairia o advérbio,
notamos que isso também não ocorreu. De fato, houve uma quantidade maior de casos nessa
posição. Entretanto, quando se observam todas as ocorrências pré-verbais, notamos que a
margem esquerda, independentemente da presença ou não do sujeito, era a posição
preferencial dos advérbios pré-verbais.
Em função desses dados, concluímos que não houve uma relação significativa entre
presença/ ausência de sujeito em posição pré-verbal (marginal ou não) e colocação dos
advérbios aqui estudados. Esse mesmo resultado foi obtido em Martelotta (2006) para os
advérbios qualitativos e Marques (2008), que estudou a ordenação sujeito/ verbo. Portanto,
nossos resultados são contrários à hipótese de adjuntos (pelo menos do tipo que estamos
estudando) são colocados na posição do sujeito vazio.
Quanto à relação entre o tipo semântico do verbo e a posição, verificamos que esse
fator não influenciou a posição do mesmo.
O tipo semântico do verbo foi levado em consideração a fim de se testar a hipótese de
que determinado tipo de noção expressa pelo advérbio ocorreria com um determinado tipo de
verbo. Entretanto, essa hipótese não foi confirmada, pelos menos, nos corpora analisados.
Também queríamos verificar a relação entre o tipo semântico do verbo e a posição do
advérbio. Vimos que, quando o verbo é de processo material, o advérbio aparece mais na
posição 1 (margem esquerda da cláusula), os de processos relacionais, tanto intensivo quanto
possessivo, também ocorreram mais na posição 1. Nas outras posições, pelo baixo número de
dados, não foi possível traçar uma tendência para esse advérbio.
No português arcaico, observamos que o tipo de verbo mais recorrente é de valor
material em detrimento dos demais valores. Quanto à relação posição e sentido do verbo, o
tipo material ocorre nas posições 1 e 5, que o as posições margens esquerda e direita
respectivamente. Os verbos comportamentais tendem a ocorrer nas posições 5 e 6 e os verbos
de atividade verbal tendem a ocorrer na posição 6.
Nos dados apresentados, do século XVI, verificamos que os tipos mais freqüentes são
verbos materiais, mentais e relacionais possessivos.. Quando o verbo tem sentido material ou
mental, a tendência é o advérbio ocorrer na margem esquerda (POS1). Quando o verbo é
relacional possessivo não posição prototípica para o advérbio. em relação aos demais
sentidos dos verbos, há uma distribuição de dados equilibrada.
Já nos dados do século XVII, observamos que não há uma predileção pelo tipo
material, como vimos nos dados do português arcaico e do século XVI, mas, em relação à
posição e o tipo semântico do verbo em geral, todos são mais recorrentes na posição1
(margem esquerda) e uma relativa distribuição nas demais posições, o que não difere dos
séculos anteriores apresentados.
Os dados analisados do século XVIII demonstram que o tipo de verbo material é o
mais freqüente, seguido do tipo comportamental. Independentemente do tipo semântico, o
advérbio tende a ocorrer na posição marginal à esquerda (POS1).
No século XIX, constatamos que o tipo de verbo material é o mais freqüente, como
maioria das sincronias estudadas. Quanto à relação entre posição e tipo de verbo, observamos
que uma distribuição mais homogênea. Quando o verbo é material, o advérbio em -mente
ocorre mais na posição 1 ou na posição 6 . Os demais tipos tiveram poucos dados.
Verificamos, também, que os advérbios tendem a ocorrer mais nas posições pós-verbais
(Posições 5, 6, e 8).
nos dados do português atual, verificamos que o tipo de verbo mais freqüente é o
verbo de processo material, seguido dos de atividade verbal. Em relação ao tipo de verbo e a
posição do advérbio, vemos que, quando o verbo é material, o advérbio tende a ocorrer nas
posições 1 e 5; quando é de atividade verbal, tende a ocorrer na posição 5.
Nos resultados apresentados, uma tendência para os advérbios em -mente
aparecerem numa posição pré-verbal (no português arcaico, século XVI, XVII e XVII)
principalmente quando o verbo é de processo material, assim com os demais tipos de verbos.
Mas em relação à análise dos dados do século XIX e português atual, verificamos que há uma
predileção às posições pós-verbais. Esse resultado indica mudança na posição do advérbio ao
longo da história do português, o que vai ao encontro de outras pesquisas, como as de
Martelotta(2006) e Albani (2007), que demonstraram que os advérbios vêm mudando para a
posição pós-verbal, de um modo geral.
Além dessas hipóteses apresentadas, seguindo a proposta de Martelotta (2004) para os
advérbios qualitativos, estávamos considerando que a mudança de ordenação dos advérbios
de tempo e de aspecto em -mente poderia estar relacionada ao processo de gramaticalização
de certas estruturas sintáticas. De acordo com Givón (1979), a cláusula principal declarativa,
afirmativa, ativa, neutra é menos pressuposicional, no sentido de que sua interpretação
depende de menos material inferível do que a interpretação das demais estruturas. Isso
confere a esse tipo de cláusula (menos gramaticalizada) uma maior liberdade e variedade de
elementos significativos. Por outro lado, a distribuição dos elementos significativos, em todos
os outros tipos de cláusula (mais gramaticalizadas), é sempre mais restrita visto que esses
outros tipos de cláusula tendem a exibir grande conservadorismo sintático, sobretudo, no que
diz respeito à ordenação vocabular. Portanto, partindo dessa proposta, esperávamos encontrar,
no português arcaico, advérbios em posição pré-verbal (posição típica dos advérbios no latim)
ocorrendo mais nas orações mais gramaticalizadas (hipotáticas e subordinadas) do que nas
menos gramaticalizadas. E, no português atual, nossa hipótese era de que ocorreriam menos
advérbios em posições pré-verbais e que essas ocorrências envolveriam frases estilisticamente
marcadas.
Na análise dos dados do português arcaico, observamos que houve um número
significativo de ocorrências de advérbios de tempo e aspecto em -mente em posição pré-
verbal, mostrando que essa posição, assim como a pós-verbal, estava disponível para este tipo
de advérbio na fase arcaica de nossa língua.
Observamos que, no português arcaico, houve um pequeno predomínio de posições
pré-verbais em cláusulas gramaticalizadas. Isso pode ser apontado como um leve resquício da
tendência de que as posições pré-verbais têm para ocorrer em cláusulas mais
gramaticalizadas.
No século XVI, apesar da baixa ocorrência de dados nesta fase, de um modo geral, a
análise qualitativa apresentou resultados favoráveis às nossas hipóteses. A posição pré-verbal,
por exemplo, estava presente nesta fase do português em escala menor que a posição pós-
verbal. Além disso, foi possível observar que as orações mais gramaticalizadas elegem a
ordenação pré-verbal, 11 ocorrências distribuídas pelas posições pré-verbais (Pos 1, 2 e 3).
Tal observação contribui para confirmar a hipótese que adotamos com Givón (1979) de que
esses tipos cláusulas (mais gramaticalizadas) tendem a ser sintaticamente mais conservadoras,
principalmente, no que diz respeito à ordenação dos constituintes da oração.
Outra ressalva interessante é que, ao analisarmos o português arcaico, a hipótese de
Givón (1979) não foi de todo confirmada, apesar de encontrarmos uma leve tendência de as
posições pré-verbais ocorrerem em cláusulas mais gramaticalizadas. Por outro lado, na análise
do século XVI essa hipótese se confirmou quando se relacionaram as posições dos advérbios
com o grau de gramaticalização da cláusula em que o advérbio ocorreu.
Pudemos observar, na análise dos dados do século XVII, uma maior incidência de
casos foi na posição pré-verbal, porém, quando se relacionamos posição e grau de
gramaticalização, a hipótese givoniana não se confirmou, o mesmo atestado no português
arcaico com o tipo de advérbio estudado.
É interessante ressaltar que, no século XVIII, a nossa hipótese também foi confirmada:
a de que as orações mais gramaticalizadas elegem a ordenação pré-verba. Nesse caso, foram 8
ocorrências contra uma única ocorrência na posição pós-verbal.
Por outro lado, houve 5 ocorrências pré-verbais em cláusulas menos gramaticalizadas
em oposição a 4 dados na posição pós-verbal, também em cláusulas menos gramaticalizadas.
Isso é importante, porque pode apontar para o fato de que, até o século XVIII, era mais forte a
inclinação que os advérbios qualitativos apresentavam de ocorrer antes do verbo, o mesmo
acontecendo para os de tempo e de aspecto, reforçando os resultados obtidos em Martelotta e
Vlček (2006), segundo os quais essa tendência começa a enfraquecer no início do século XIX
e acaba por desaparecer na virada para o século XX.
No caso do século XIX, houve uma quantidade maior de ocorrências de advérbios de
tempo e de aspecto em -mente, embora as 22 ocorrências encontradas estejam longe de
constituir a quantidade necessária para se chegar a constatações mais precisas.
Assim como aconteceu com o século XVIII, era de se esperar que o século XIX
apresentasse uma relativa predominância das posições pós-verbais. Isso de fato ocorreu:
apresentou 12 ocorrências nessa posição no, total de 22 advérbios. Esses dados refletem a
tendência, mencionada anteriormente, que vem relativamente se delineando desde o século
XVI, uma vez que na fase arcaica do português com esse tipo de advérbio a hipótese não se
confirmou, ou como nos trabalhos de Moraes Pinto, 2002; Martelotta, 2004, a confirmação
dessas tendências foi constatada.
Outro resultado interessante se apresenta quando se relacionam as posições dos
advérbios com o grau de gramaticalização da cláusula em que ele ocorre. Do total de 9 casos
de advérbios pré-verbais, 4 correram em cláusulas mais gramaticalizadas (hipotáticas e
subordinadas). Cabe ressaltar aqui que a diferença entre as ocorrências em cláusulas menos
gramaticalizadas foi bastante pequena, 6 dados pré-verbais. Constatamos que, no século XIX,
se evidenciou uma mudança desses advérbios para as posições pós-verbais, apesar de eles não
serem predominantes em cláusulas com alto grau de gramaticalização, mais conservadoras em
termos de ordenação.
No português atual, a ocorrência dos dados demonstra uma propensão, que se
manifestou quase categoricamente, desses advérbios ocorrerem após o verbo, 28 dados, sendo
que 17 estão em cláusulas menos gramaticalizadas e 10 dados em cláusulas mais
gramaticalizadas. Cabe ressaltar que novamente obtivemos resultados atípicos aos esperados
segundo a hipótese proposta em relação à posição e o grau de gramaticalização das cláusulas.
Portanto, percebemos que houve diferentes fatores que influenciaram a ordenação
desses advérbios nas sentenças e que essa análise possa trazer esclarecimentos em relação ao
comportamento desses elementos no português. Muitos dos nossos resultados não comprovam
algumas das hipóteses apresentadas nesta tese e em outros trabalhos, mas refletem o emprego
real dos advérbios em -mente na história do português escrito. Assim são resultados
importantes inclusive porque apontam para tendências diferentes do que geralmente é dito.
A pesquisa foi realizada tendo em vista muitos fatores, demonstrando que procuramos
de diferentes formas verificar as estratégias discursivas, semânticas e sintáticas para o uso
desses advérbios. Claro que a análise não se esgotou e em muitos momentos. Assim,
apontamos para a necessidade de pesquisas futuras aprofundarem em um ou outro aspecto, ou
para a necessidade de se fazer um recorte diferente da análise, tendo em vista as sincronias e
os gêneros.
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OS ADVÉRBIOS DE TEMPO E DE ASPECTO EM -MENTE E
SUA ORDENAÇÃO: UMA ABORDAGEM HISTÓRICA
Eliana Crispim França Luquetti
Rio de Janeiro
Fevereiro de 2008
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Faculdade de Letras
Comissão de Pós-Graduação e Pesquisa
OS ADVÉRBIOS DE TEMPO E DE ASPECTO EM -MENTE E
SUA ORDENAÇÃO: UMA ABORDAGEM HISTÓRICA
Eliana Crispim França Luquetti
Tese de Doutorado submetida ao
Programa de Pós-Graduação em
Lingüística da Universidade Federal do
Rio de Janeiro UFRJ, como parte dos
requisitos necessários para a obtenção do
título de Doutor em Lingüística.
Orientadora: Professora Doutora Maria
Maura da Conceição Cezario
Co-orientador: Professor Doutor Mario
Eduardo Toscano Martelotta
Rio de Janeiro
Fevereiro de 2008
LUQUETTI, Eliana Crispim França
Os advérbios de tempo e de aspecto em -mente e sua ordenação: uma abordagem histórica/
Eliana Crispim França Luquetti. 2008.
159 fls.
Tese (Doutorado em Lingüística) –
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Faculdade de Letras,
Rio de Janeiro, 2008.
Orientadora: Maria Maura Cezario
Co-Orientador: Mario Eduardo T. Martelotta
1 Advérbios. 2. Ordenação de palavras. 3. Funcionalismo
I. Cezario, Maria Maura (Orientadora) II Martelotta, Mario Eduardo T. III Universidade
Federal do Rio de Janeiro. Faculdade de Letras. IV Título
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Faculdade de Letras
Comissão de Pós-Graduação e Pesquisa
OS ADVÉRBIOS DE TEMPO E DE ASPECTO EM -mente E SUA ORDENAÇÃO:
UMA ABORDAGEM HISTÓRICA
Eliana Crispim França Luquetti
Orientadora: Professora Doutora Maria Maura da Conceição Cezario
Co-Orientador: Professor Doutor Mario Eduardo Martelotta
Tese de Doutorado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Lingüística da
Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos necessários para a
obtenção do título de Doutor em Lingüística.
Aprovada por:
Presidente, Profa. Doutora Maria Maura da Conceição Cezario
Vice-Presidente, Prof.Doutor Mário Eduardo Toscano Martelotta
Profa.Doutora Maria da Conceição Paiva-UFRJ
Profa. Doutora Deize Vieira dos Santos-UFRJ
Prof. Doutor Afrânio Gonçalves Barbosa-UFRJ
Profa. Doutora Mariângela Rios de Oliveira-UFF
Suplentes:
Profa. Doutora Christina Abreu Gomes-UFRJ
Profa. Doutora Maria do Rosário da Silva Roxo- Univ. Estácio de Sá
Tese defendida em 25/02/2008.
Dedicatória
Ao meu querido e amado Deus, pois “O
Senhor é a minha rocha, a minha
cidadela, o meu libertador; o meu Deus,
o meu rochedo em que me refugio; o meu
escudo, a força da minha salvação, o
meu baluarte”. (Sl 18:2,3)
Esperei confiantemente pelo Senhor; ele
se inclinou para mim e me ouviu quando
clamei por socorro. Tirou-me de um poço
de perdição, de um tremedal de lama;
colocou-me os pés sobre uma rocha e me
firmou os passos. E me pôs nos lábios um
novo cântico, um hino de louvor ao nosso
Deus; muitos verão essas coisas, temerão
e confiarão no Senhor. (Salmos 40:1-3)
Agradecimentos
A Deus que sempre cuidou de mim, orientando, confortando e abençoando-me.
À minha querida e amada mãe Suely por ter me ensinado o caminho do bem, da honestidade,
da persistência, da esperança. Enfim, devo-lhe tudo quem sou.
Aos meus filhos, Fernanda e Pedro Henrique pela compreensão, carinho e existência na minha
vida.
Ao meu esposo Wanderson Luquetti, pelo constante incentivo, pela infinita paciência, pelas
palavras de conforto e amizade.
Aos meus irmãos, Patricia, Douglas, Catiane e Viviane que são parte de mim. E,
principalmente as minhas irmãs Catiane e Viviane, pelo apoio e pelas palavras certas nos
momentos certos.
Aos parentes e amigos, pelo acompanhamento interessado. Em especial, Ernesto França, Célia
Viana, Thiara França, Thiago França, Pastor Leopoldo, Lenise Dutra, Ana Lúcia Costa,
Aparecida Azevedo, pelo apoio e carinho constantes.
À Professora Maria Maura Cezario pela grande confiança depositada em mim, pela amizade,
pelo apoio e incentivo constantes e fundamentais. E ainda, por ter me conduzido ao prazeroso
caminho da pesquisa e ensinando-me a importância do nosso papel enquanto professores e
pesquisadores, através do seu exemplo e dedicação.
Ao Professor Mário Eduardo Martelotta pela carinhosa acolhida no projeto Discurso e
Gramática, pela prontidão em ouvir e ajudar, pelo exemplo profissional.
Aos amigos Natália Ilse, Júlia Nunes, Érika Ilogti e Roberto Freitas Jr. Pela colaboração
preciosa nesta pesquisa.
A todos do projeto Discurso e Gramática pela sincera amizade e pelos grandes e inesquecíveis
momentos compartilhados.
SINOPSE
Análise diacrônica da ordenação dos advérbios de tempo e
aspecto em -mente na modalidade escrita do português,
sob a perspectiva funcionalista, buscando investigar
fatores funcionais e estruturais determinantes da
colocação desses advérbios na cláusula.
LUQUETTI, Eliana Crispim França. Os advérbios de tempo e de aspecto em -mente e sua
ordenação: uma abordagem histórica. Rio de Janeiro: UFRJ, Faculdade de Letras, 2008. 159
fls. Tese de Doutorado em Lingüística.
Resumo
Este trabalho tem como objetivo observar as diferentes posições que os advérbios de
tempo e de aspecto em -mente tendem a assumir em diferentes momentos históricos, bem
como analisar a polissemia desses elementos em textos escritos em português nas seguintes
fases históricas: arcaica, séculos XVI, VXII, XVIII e XIX e português contemporâneo.
Esta pesquisa, além de testar novas hipóteses, vem integrar e ampliar uma série de
estudos que visam examinar, de modo mais geral, o processo de mudança de colocação dos
advérbios no decorrer do tempo (Moraes Pinto, 2002; Martelotta, Barbosa & Leitão, 2002;
Martelotta, 2004; Martelotta & Processy, 2006; Andrade, 2005; Albani 2007; Freitas, 2004) e
outros trabalhos sobre o fenômeno em questão. A pesquisa demonstra que fortes indícios
de mudança de posição do advérbio de tempo e aspecto em -mente ao longo da história do
português.
De acordo com a hipótese geral, ao estudarmos cada sincronia devemos encontrar
motivações para as diferentes posições ocupadas pelos advérbios de tempo e aspecto em -
mente na oração. A motivação dá-se por um conjunto de fatores estruturais, semânticos,
cognitivos e/ou discursivos, a saber: a noção semântica; a estrutura sintática da oração em que
está inserido o advérbio; o tipo semântico do verbo que compõe a cláusula, segundo Halliday
(1994) e outros fatores.
LUQUETTI, Eliana Crispim França. Os advérbios de tempo e de aspecto em -mente e sua
ordenação: uma abordagem histórica. Rio de Janeiro: UFRJ, Faculdade de Letras, 2008. 159
fls. Tese de Doutorado em Lingüística.
ABSTRACT
This work aims to observe the different positions that the adverbs of time and look at
mind-tend to take on different historic moments, and examine the polissemia these elements
in texts written in Portuguese on the following historical stages: archaic, XVI, VXII, XVIII
and XIX and Portuguese contemporary.
This research, and test new hypotheses, comes integrate and extend a series of studies
to examine, more generally, the process of changing the placing of adverbs over time (Moraes
Pinto, 2002; Martelotta, Barbosa & Leitao, 2002; Martelotta, 2004; Martelotta & Processy,
2006; Andrade, 2005; Albani 2007; Freitas, 2004) and other works on the phenomenon in
question. The research shows that there are strong indications of a change of position of the
adverb of time and point-in mind throughout history of the Portuguese.
According to the general assumption, by studying each sync must find reasons for the
different positions occupied by adverbs of time and point-in mind in prayer. Motivation
comes about by a number of factors structural, semantic, cognitive and / or discourse, namely
the notion semantics, the syntactic structure of the prayer that is inserted into the adverb; the
kind of semantic word that composes the clause, according Halliday (1994) and others.
LUQUETTI, Eliana Crispim França. Os advérbios de tempo e de aspecto em -mente e sua
ordenação: uma abordagem histórica. Rio de Janeiro: UFRJ, Faculdade de Letras, 2008. 159
fls. Tese de Doutorado em Lingüística.
Résumé
Ce travail vise à observer les différentes positions que les adverbes en –ment de temps
et d'aspect prennent pendant les moments historiques, et d'examiner la polysémie de ces
éléments dans les textes écrits en portugais sur les étapes historiques suivantes: archaïque,
XVI, VXII, XVIII Et XIX et portugais contemporain.
Au délà de tester de nouvelles hypothèses, cette recherche vient d'intégrer et d'étendre
une série d'études pour examiner, de façon plus générale, le processus de modification du
placement des adverbes en –ment dans le temps (2002 2002 2004; Martelotta & Processy,
2006; Andrade, 2005; Albani 2007; Freitas, 2004) et d'autres ouvrages sur le phénomène en
question. La recherche montre qu'il y a fortes indications de changement de position de
l'adverbe en –ment de temps et d’aspect au long de l'histoire portugaise.
Selon l'hypothèse générale, en étudiant chaque synchronisation on doit trouver les
raisons pour lesquelles les différentes positions occupées par les adverbes en –ment de temps
et d’aspect dans la proposition. La motivation est donnée par un certain nombre de facteurs
structurels, sémantiques, cognitives et / ou discursifs, à savoir: la notion sémantique, la
structure syntaxique de la proposition que l’adverbe est inséré, le genre de mot sémantique qui
compose la clause, selon Halliday (1994 ) et les autres.
LISTA DE TABELAS
Tabela 1- Distribuição dos advérbios em -mente quanto à ordem em relação ao verbo.
Tabela 2- Levantamento Geral dos dados dos corpora dos Advérbios de Tempo e de Aspecto
em –mente.
Tabela 3 - Distribuição das posições dos advérbios de tempo e aspecto em –mente X
sincronias.
Tabela 4 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Português Arcaico.
Tabela 5 - A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Século XVI.
Tabela 6 - A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Século XVII.
Tabela 7 - A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Século XVIII.
Tabela 8 - A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Século XIX.
Tabela 9 - A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Português Atual.
Tabela 10 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Português Arcaico.
Tabela 11 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Século XVI.
Tabela 12 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Século XVII.
Tabela 13 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Século XVIII.
Tabela 14 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Século XIX.
Tabela 15 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Português Atual.
Tabela 16 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Português Arcaico.
Tabela 17 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Século XVI.
Tabela 18 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Século XVII.
Tabela 19 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Século XVIII.
Tabela 20 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Século XIX.
Tabela 21 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Português Atual
Tabela 22 - Ocorrência de advérbios no Português Arcaico.
Tabela 23 - Ocorrência de advérbios no Século XVI.
Tabela 24 - Ocorrência de advérbios no Século XVII.
Tabela 25 - Ocorrência de advérbios no Século XVIII.
Tabela 26 - Ocorrência de advérbios no Século XIX.
Tabela 27 - Ocorrência de advérbios no Português Atual
LISTA DE QUADROS
Quadro1 – Distinção entre Advérbio e Pseudo-advérbio
Quadro 2 - Subposições dos Advérbios em -mente
LISTA DE ABREVIATURAS
EC – A essência do cristianismo
OE – Orto do esposo
SUMÁRIO
LISTA DE TABELAS
LISTA DE QUADROS
LISTA DE ABREVIATURAS
1 INTRODUÇÃO.......................................................................................................... 15
1.1 HIPÓTESES............................................................................................................... 18
1.2
O
BJETIVOS
............................................................................................................................................
20
2 REVISÃO DE LITERATURA.................................................................................. 22
2.1
A
QUESTÃO DA CATEGORIZAÇÃO
.........................................................................................................
22
2.2
A
DVÉRBIO
:
ELEMENTO DO LÉXICO OU DA GRAMÁTICA
?....................................................................
26
2.3
A
DVÉRBIOS
:
ESPÉCIES
,
FORMAS E SIGNIFICAÇÃO
...............................................................................
27
2.4
V
ISÃO
T
RADICIONAL DOS
A
DVÉRBIOS
................................................................................................
31
2.5
P
ESQUISAS SOBRE ADVÉRBIOS
,
SOB ORIENTAÇÃO DA
LINGÜÍSTICA
..................
.....................34
2.5.1
T
IPOS DE ADVÉRBIOS
.........................................................................................................................
34
2.5.2
E
STUDOS SOBRE O ADVÉRBIO EM
-
MENTE E SOBRE ORDENAÇÃO DE ADVÉRBIOS
............................
38
2.6
O
S ADVÉRBIOS E A EXPRESSÃO DE TEMPO
...........................................................................................
54
2.
7
O
S ADVÉRBIOS RELACIONADOS À CATEGORIA DE ASPECTO
.....................................................56
2.
8
A
FORMAÇÃO DE ADVÉRBIOS EM
-
MENTE
............................................................................................
60
3 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS................................................................................. 67
3.1
O
S PRINCÍPIOS FUNCIONALISTAS
..........................................................................................................
67
3.2
G
RAMATICALIZAÇÃO E
N
ÍVEIS DE
E
NCAIXAMENTO ENTRE
C
LÁUSULAS
...........................................
70
3.3
G
RAMATICALIZAÇÃO E ESTRUTURA SINTÁTICA
..................................................................................
72
3.4
A
S PRESSUPOSIÇÕES DISCURSIVAS DAS CONSTRUÇÕES SINTÁTICA
.............................................73
3.5
C
LASSIFICAÇÕES DOS VERBOS
,
BASEADA EM
H
ALLIDAY
(1994).........................................................
75
4 METODOLOGIA ....................................................................................................... 80
4.1
C
ORPUS
..................................................................................................................................................
81
4.2
D
ESCRIÇÕES DOS FATORES DA ANÁLISE DOS ADVÉRBIOS DE TEMPO E ASPECTO EM
MENTE
...........
84
5 ANÁLISES DOS DADOS........................................................................................... 89
5.1
A
NÁLISES DE FATORES
..........................................................................................................................
89
5.1.1
O
RDEM DO ADVÉRBIO DE TEMPO E ASPECTO EM
-
MENTE
................................................................
90
5.1.2
P
OSIÇÃO DO ADVÉRBIO
......................................................................................................................
93
5.1.3
N
OÇÃO SEMÂNTICA DO ADVÉRBIO
...................................................................................................
96
5.1.
4
T
IPO SEMÂNTICO DO VERBO
............................................................................................................
105
5.1.5
T
IPO DE SUJEITO
..............................................................................................................................
114
5.1.6
T
IPO DE ORAÇÃO
.............................................................................................................................
122
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................... 133
1 INTRODUÇÃO
Este trabalho tem como objetivo observar as diferentes posições que os advérbios de
tempo e aspecto em -mente tendem a assumir em diferentes momentos históricos, para
verificarmos se houve mudança na ordenação da frase da língua portuguesa com relação a
esses tipos de advérbios. Para isso, coletamos dados de textos do português das seguintes
fases históricas: arcaica, séculos XVI, VXII, XVIII e XIX e português atual.
Este estudo, além de testar novas hipóteses, vem integrar e ampliar uma série de
pesquisas que visam examinar, de modo mais geral, o processo de mudança de colocação dos
advérbios no decorrer do tempo (Moraes Pinto, 2002; Martelotta, Barbosa & Leitão, 2002;
Martelotta, 2004; Martelotta & Processy, 2006; Andrade, 2005; Albani 2007; Freitas, 2004).
A motivação para o presente estudo veio do trabalho realizado na dissertação de
mestrado de França (2002), na qual foi feita uma análise dos adjuntos adverbiais de tempo e
aspecto em narrativas orais e escritas contemporâneas, sob uma perspectiva funcionalista.
Nesse trabalho, procuramos delimitar os valores que esses adjuntos apresentavam no texto
narrativo, assim como as tendências de colocação que eles assumiam nas cláusulas que
compunham o texto.
Esses adjuntos adverbiais de tempo e aspecto, de um modo geral, apresentavam uma
grande mobilidade na cláusula, podendo ter suas tendências de ordenação explicadas por
fatores de caráter sintático e discursivo.
Nessa dissertação (França,2002), utilizamos o corpus Discurso & Gramática (Votre e
Oliveira: 1995), constituído de um conjunto de entrevistas faladas e escritas, concedidas por
informantes de C.A. infantil e adulto, 4
a
e 8
a
séries e 2
o
e 3
o
graus, apresentando os seguintes
tipos de discurso: narrativa de experiência pessoal, narrativa recontada, relato de
procedimento, relato de opinião e descrição de local. Essa análise, entretanto, se restringiu às
narrativas, já que partia do princípio de que os dois planos discursivos, figura e fundo,
apresentavam tendências de ordenação diferentes no que diz respeito aos elementos adverbiais
estudados.
Os resultados obtidos nessa análise mostraram que os adjuntos adverbiais
apresentavam a sua colocação de acordo com a sua função dentro do tipo de discurso (figura
ou fundo) de que faziam parte.
No presente trabalho, um aprofundamento da análise dos advérbios em -mente
(somente os advérbios em -mente, diferentemente da dissertação de mestrado) em vários
aspectos, uma vez que ampliamos os pressupostos teóricos e o número de fatores a serem
testados. Além disso, a distribuição das ordenações possíveis está muito diferente do que foi
feito em França, 2002. O foco agora é o texto escrito e a diacronia. Para isso, analisamos
textos de diferentes gêneros textuais ao longo dos séculos, da fase arcaica do português ao
período atual da Língua.
Eis alguns exemplos de dados analisados nesta tese a partir dos quais é possível
verificar a grande variedade de ordenação:
(1) E porque me consta o mensionado Bacharel Manuyel Pacheco de Paiva, que
atualmente o ocupa, se achar em diligencia fora dessa cidade( culo XVIII ,cartas oficiais,
PHPB).
(2) Quer dizer cana e pena, porque as penas antigamente faziam-se de certas canas
delgadas(Século XVII ,Sermão do Pe. A.Vieira).
(3) Atualmente as coisas estão como costumavam ser mil anos atrás(Português
atual,EC p.9).
(4) ...deixamos boas coisas para trás muito freqüentemente em nome da
independência (Português atual,EC, p.31).
Nota-se que, no exemplo (1), o advérbio atualmente ocorre antes do verbo (ocupa);
no exemplo (2), o advérbio antigamente, ocorre entre o sujeito (as penas) e o verbo (faziam-
se); no exemplo (3), o advérbio atualmente ocorre no início da cláusula (margem esquerda),
antes do sujeito (as coisas) e antes do verbo (estão); e, no exemplo (4), o advérbio
freqüentemente, ocorre depois do verbo (deixamos). Portanto, verificamos que os advérbios
em -mente podem ocorrer antes ou depois do verbo; entre o sujeito e o verbo; no início da
cláusula; no final da cláusula, enfim, diversas possibilidades de posição desse advérbio na
cláusula.
Ao pesquisarmos definições e classificações sobre os advérbios, em gramaticais
tradicionais e nas de orientação lingüística, percebemos que essa é uma classe bastante
complexa e colocada de forma pouco elucidativa, isto é, em geral, é definida e exemplificada
de modo simplista e pouco esclarecedora. Nesta pesquisa, estamos considerando como dados
advérbios que os estudiosos consideram ora como advérbios de tempo (como ultimamente,
primeiramente, antigamente), ora como advérbios de aspecto (freqüentemente, novamente,
constantemente) e ainda como advérbios de modo, como por exemplo, o advérbio
rapidamente, que é classificado tradicionalmente como advérbio de modo. Como também
nesse advérbio traços semânticos ligados ao tempo, também o incluímos na análise (cf. os
resultados do fator “tipo semântico do advérbio).
Entendemos que é necessária uma análise mais profunda sobre os advérbios de tempo
e de aspecto em -mente, abarcando seus usos ou funções; suas posições na cláusula e outras
características. Neste estudo, investigaremos questões como:
a) Por que o advérbio ora aparece no final, ora no início da cláusula, ora em outras
posições?
b) fatores que contribuem para a ordenação desses advérbios num dado lugar da
cláusula?
c) Existe uma posição fixa para determinados usos dos advérbios? Se existe, por que
isso acontece? Seria o tipo semântico do verbo que, com a freqüência de uso,
fixaria o advérbio numa dada posição?
d) relação entre a semântica do advérbio e a posição em que ele aparece mais
freqüentemente na cláusula? Há posições prototípicas para os advérbios em -
mente? Se há, houve alguma diferença de uso ao longo da história do português?
Acreditamos que esta pesquisa contribuirá para o estudo sobre a ordenação dos
advérbios de tempo e de aspecto e suas funções na cláusula na língua portuguesa. Contribuirá
também para melhor compreendermos a organização textual.
1.1 Hipóteses
As hipóteses desse estudo são:
(a) Pressupomos que ocorreram mudanças na posição dos advérbios da sincronia do
português arcaico para o contemporâneo. De acordo com trabalhos anteriores, como os
de Martelotta e Leitão (1999) e de Martelotta, Barbosa e Leitão (2001), a posição pré-
verbal (entre o sujeito e o verbo) era disponível para toda e qualquer espécie de advérbio
e, hoje, ela está disponível para alguns - portanto, houve uma mudança no padrão de
ordenação de alguns advérbios. Com relação aos advérbios de tempo e de aspecto em -
mente, acreditamos que deve haver uma posição prototípica para esse advérbio em
relação ao verbo, ao sujeito e ao complemento verbal nas diferentes sincronias, sendo
que, ao longo da história do português, pode ter havido uma contínua fixação da posição
do advérbio em relação ao verbo, uma vez que estudos diacrônicos demonstram que a
ordenação dos termos foi se tornando cada vez mais fixa.
(b) Seguindo a proposta de Martelotta (2004) para os advérbios qualitativos, estamos
considerando que a mudança de ordenação dos advérbios de tempo e de aspecto em -
mente parece está relacionada ao processo de gramaticalização de certas estruturas
sintáticas. De acordo com Givón (1979), a cláusula principal declarativa, afirmativa,
ativa, neutra é menos pressuposicional, no sentido de que sua interpretação depende de
menos material inferível do que a interpretação das demais estruturas. Isso confere a esse
tipo de cláusula (menos gramaticalizada) uma maior liberdade e variedade de elementos
significativos. Por outro lado, a distribuição dos elementos significativos, em todos os
outros tipos de cláusula (mais gramaticalizadas), é sempre mais restrita visto que esses
outros tipos de cláusula tendem a exibir grande conservadorismo sintático, sobretudo, no
que diz respeito à ordenação vocabular. Portanto, partindo dessa proposta, esperamos
encontrar, no português arcaico, advérbios em posição pré-verbal (posição típica dos
advérbios no latim) ocorrendo mais nas orações mais gramaticalizadas (hipotáticas e
subordinadas) do que nas menos gramaticalizadas, e, no português atual, nossa hipótese
é de que ocorram menos advérbios em posições pré-verbais e que essas ocorrências
envolvam frases estilisticamente marcadas.
(c) deve haver fatores de diferentes ordens que motivam o uso do advérbio em diferentes
posições na frase. Fatores como o papel semântico exercido pelo advérbio em -mente, o
tipo semântico do verbo, a presença ou ausência do sujeito na frase, dentre outros,
devem influenciar a ordem que este ocupa na sentença.
1.2 Objetivos
Pretendemos estudar as posições assumidas pelos advérbios em -mente na cláusula em
textos de diferentes gêneros textuais das seguintes fases do português: português arcaico, dos
séculos XVI, XVII, XVIII, XIX e português atual, observando, principalmente, o papel da
freqüência de ocorrência em dadas posições e a possível gramaticalização desses advérbios
com determinados tipos de verbo. Inicialmente, a opção por textos religiosos foi pela
disponibilidade de textos em documentos escritos em português arcaico, mas, quando
partimos para o levantamento de dados, verificamos que havia uma escassez de dados do
fenômeno em questão, sendo assim, decidimos investigar em outros gêneros textuais.
Mas, ainda assim, procuramos manter uma certa uniformização das tipologias, pois as
diferenças entre os usos dos advérbios encontrados poderiam ser atribuídas a diferenças
textuais e não à mudança lingüística.
Os principais objetivos desse estudo são:
1- analisar detalhadamente o uso dos advérbios de tempo e de aspecto em -mente no
português escrito;
2- acompanhar o uso da ordenação dos advérbios nos tipos de orações ao longo do
tempo, analisando os dados tanto do português arcaico quanto do português atual, para
verificar se as construções mais gramaticalizadas (cláusulas hipotáticas e
subordinadas) são mais conservadoras, isto é, favorecem a ocorrência de advérbios em
posições pré-verbais (posições mais antigas), e se as menos gramaticalizadas
(cláusulas principais e coordenadas) são mais inovadoras, propiciando a ocorrência de
dados com advérbios em –mente em ordenações pós-verbais;
3- verificar se indícios de mudança na sintaxe desse advérbio nas fases estudadas do
português: arcaica, dos séculos XVI, XVII, XVIII, XIX e português atual;
4- caracterizar as posições assumidas pelos advérbios de tempo e aspecto, apresentando
a freqüência de ocorrência de cada ordem assumida;
5- identificar os fatores que influenciam a ordenação desses advérbios em contextos em
que eles podem ocupar posições diferentes nas cláusulas, testando hipóteses
relacionadas à motivação de ordenação.
Para apreciação das questões aqui levantadas, apresentamos, no capítulo 2, uma revisão na
literatura sobre os advérbios, sua ordenação, formação e origem, no capítulo 3, os
pressupostos teóricos que fundamentam esse estudo; no capítulo 4, a metodologia utilizada
para codificação dos dados; no capítulo 5, a análise dos dados, interpretação dos resultados da
análise quantitativa, assim como dos fatores e hipóteses examinados; e, por fim, nos capítulos
6 e 7, seguem algumas considerações finais sobre os advérbios e a bibliografia,
respectivamente.
2 REVISÃO DE LITERATURA
Este capítulo consiste numa breve explanação sobre a questão da categorização e
estrutura da língua, como também, a descrição de algumas abordagens sobre a definição,
classificação e/ou ordenação de advérbios na cláusula. Aqui são apresentados trabalhos de
perspectiva tradicional, bem como os realizados em linhas de pesquisa lingüística que
estudam a Língua em uso.
2.1 A questão da categorização
Antes de apresentarmos as considerações sobre a classe que reúne os advérbios,
apresentaremos uma breve explanação sobre a questão da categorização, uma vez que estamos
reunindo numa mesma classe geral advérbios que os estudiosos ora consideram de tempo
(ultimamente, por exemplo), ora de aspecto (freqüentemente), ora de modo (rapidamente).
Além disso, a própria natureza da classe advérbio é de difícil análise, uma vez que reúne itens
muito diferentes tanto com relação à ordenação, como em relação à semântica.
Tradicionalmente, as classes das palavras têm sido definidas segundo suas
propriedades semânticas, sintáticas e morfológicas. As gramáticas tradicionais privilegiam o
aspecto semântico na conceituação do substantivo, do adjetivo e do verbo, e recorrem ao
aspecto funcional na conceituação da conjunção, da preposição e até mesmo do artigo, dos
pronomes e dos advérbios, que é o foco do nosso trabalho, e, estes últimos são conceituados
ainda pelo seu aspecto semântico, mas a análise apresentada não dá conta da sua imprecisão.
Os autores de um modo geral também chegam à conclusão da imprecisão dessa
categoria. Seja de um ponto de vista mais formal, como o de Camara Jr. (1976) ou o de
Bechara (1999), seja de uma perspectiva mais funcional, como a de Ilari et al. (1990) ou a de
Neves (2000), a categoria dos advérbios é considerada bastante controvertida.
Constituída por tipos de natureza muito diversa, em termos semânticos, sintáticos e
mesmo morfológicos, esse conjunto parece não resistir a uma definição mais geral, capaz de
dar conta da totalidade de seus usos. Nesse sentido, a abordagem categorial prototípica,
segundo Taylor (1995), em conformidade com a concepção funcionalista que nos orienta,
apresenta-se como o tratamento mais adequado para os tipos desse conjunto tão híbrido. De
acordo com tal concepção, podemos admitir que, numa dada classe, encontram-se membros
situados em pontos distintos em relação ao eixo categorial básico, de acordo com o número de
traços compartilhados pelos mesmos.
Assim, encontramos constituintes que de modo mais visível representam essa
categoria; em geral, são termos mais freqüentes e identificados pela comunidade lingüística
como pertencentes à categoria. Por outro lado, podemos registrar também termos que, por
conta da perda de traços categoriais, tendem a ocupar posição periférica ou marginal em
relação ao padrão, situando-se praticamente no limite ou na interseção com outra classe. Dos
advérbios aqui em análise, os de tempo e de aspecto em -mente, conforme a perspectiva
exposta anteriormente, estariam situados em um ponto de maior afastamento em relação ao
eixo da categoria dos advérbios. Segundo Ilari et al. (1990) e Neves (2000), esses tipos de
advérbios caracterizam-se por sua função não-predicativa ou não-modificadora, uma vez que
informações acerca de tempo não incidem sobre ou afetam a predicação, mas os de aspecto
sim. Assim definidos, estariam tais constituintes predispostos a ocorrer em pontos de maior
afastamento em relação ao verbo, conforme prevê o subprincípio de proximidade (Givón,
2001; Furtado da Cunha, Rios de Oliveira e Martellota, 2003), segundo o qual conteúdos
menos integrados são articulados por formas também menos integradas na superfície textual.
Além do aspecto relativo ao status dessa categoria, interessa-nos também mencionar a
questão da polissemia envolvida nos usos desses advérbios. De acordo com a hipótese
localista, podemos dizer que a referência espacial seria a mais primária ou original; a partir
desse sentido mais concreto, teríamos a derivação para tempo, de natureza mais abstrata, e, a
partir daí, os sentidos lógicos ou textuais, como a referência de modo, numa etapa de maior
abstratização. Segundo Pontes (1992, p. 8-9), através do uso dos mesmos elementos
gramaticais, projetamos as categorias de espaço para falar de tempo metaforicamente”;
conforme a autora, trata-se de derivação de sentido desde tempos imemoriais. O interessante
nessa abordagem é que os sentidos originais não são necessariamente descartados diante dos
mais recentes, o que vem a gerar polissemia dos usos adverbiais, principalmente na
articulação dos sentidos aspectuais, modais e temporais, muitas vezes sobrepostos.
Mattoso Câmara formulou na Estrutura da Língua Portuguesa uma classificação
baseada em dois critérios, um misto e outro simples, que é didaticamente satisfatória. Para ele,
os vocábulos formais do português se agrupam, primeiro, segundo a um critério morfo-
semântico, em quatro classes: nome, verbo, pronome e conectivo. As três primeiras classes
são constituídas basicamente de palavras variáveis, a última de palavras invariáveis.
O verbo distingue-se no grupo, nessa primeira divisão, pelo paradigma flexional em
que se enquadra (apresenta variação modo-temporal e número-pessoal). O nome e o pronome,
por sua vez, são vocábulos dotados de número e gênero, exprimíveis em uma e noutra classe
pelo mesmo mecanismo flexional. A distinção entre eles repousa, de um lado, na natureza da
significação, e de outro, em certas propriedades morfossintáticas exclusivas do pronome
(variação em pessoa e em caso)
Semanticamente, o nome ‘nomeia’ e os seres, permitindo que o locutor e o ouvinte os
designem sem o reforço da situação ou do contexto verbal. O pronome por outro lado, efetua
uma referência contextual ou situacional: quem diz aquela roupa estava na minha gaveta’,
está particularizando roupa e gaveta em função de uma situação. Sabe-se apenas, por meio
de aquelae de minha’, que a roupa em questão está distante dos interlocutores e que a
gaveta pertence ao locutor. Essa constatação, todavia, não esclarece tudo, uma vez que as
palavras ‘distante e próximo também significam noções relativas e nem por isso são
pronomes. Basicamente, importa ter em vista a referência à situação em que se encontram os
interlocutores: os pronomes a incluem na significação dos enunciados. Sendo assim, pode-se
dizer ‘Pernambuco fica distante de Santa Catarina em qualquer parte do Brasil, que o
significado da frase será o mesmo; mas quem diz Pernambuco fica distante daqui’ designa
com o ‘aqui’ o lugar em que, na qualidade de Emissor, se encontra. Logo, aquele’, ‘minha’ e
‘aqui’ tem uma significação situacional e são por isso, pronomes. Do ponto de vista mórfico,
boa parte dos pronomes apresenta formas distintas conforme a pessoa do discurso a que se
referem. Entre estes pronomes, os denominados ‘pessoais’ têm formas distintas para cumprir
as funções de sujeito e complemento. Acrescenta-se, quanto ao aspecto mórfico que vários
pronomes apresentam, ao lado das formas masculinas e femininas, uma terceira forma
‘neutra’ (aquilo, em face de aquele/aquela).
O segundo critério de Mattoso, de modo simples, redistribui os nomes, os pronomes e
os conectivos segundo características sintáticas. O nome e o pronome podem ser substantivos,
adjetivos ou advérbios; os conectivos podem ser conjunções ou preposições. Estes papéis
podem ser identificados no contexto da oração ou do sintagma: em ‘meus amigos ingleses’,
amigos é o núcleo da construção, classificado por isso como substantivo, ao passo que
ingleses, constituinte modificador, é um adjetivo; por outro lado, em as crianças amigas’,
crianças é o núcleo e amigas funciona como adjetivo. Na mesma linha de raciocínio, diremos
que elas são meus amigas’, elas, sujeito da oração, é um pronome substantivo, enquanto
minhas, adjunto de amigas, é um pronome adjetivo. Além disso, o nome e o pronome podem
funcionar como advérbios se o termo que acompanham é um verbo e podem dar lugar a
expressões preposicionadas. É o que se passa com alto a aqui em ‘Os garotos conversam alto
(cf. Os garotos conversam com entusiasmo’) e em Os garotos conversavam aqui’ (cf. Os
garotos conversavam nesta sala’).
Quanto aos conectivos, há, segundo Mattoso, os que ligam palavras (preposições) e os
que ligam orações (conjunções). Assim, em ‘casa de pedra’, ‘de’ é uma preposição, cabendo,
porém, a ‘enquanto’ o papel de conjunção em ‘Vilma iria enquanto você chorava’.
Das considerações feitas nas linhas anteriores, depreende-se a necessidade de se
repensar as características sintático-semântico-discursivas dos advérbios para um estudo mais
atento dessa categoria.
2.2 Advérbio: elemento do léxico ou da gramática?
Tradicionalmente, é feita uma separação entre elementos do léxico ou lexemas e
elementos da gramática, ou morfemas propriamente ditos.
Os elementos do léxico configuram imediatamente a realidade extralingüística e os
morfemas gramaticais remetem a uma significação intralingüística (significação externa e
objetiva). Os verbos plenos, substantivos e adjetivos são considerados elementos do léxico e
outras classes como conjunções, preposições, etc. são de modo geral considerados elementos
da gramática, assim como as flexões, prefixos e sufixos. Mas classes que apresentam
características de ambos os níveis. Uma dessas classes é o advérbio, que ora se comporta
como um item do léxico (haja vista a possibilidade de criação de novos advérbios em -mente),
ora se comporta como elemento da gramática.
No que se refere aos vocábulos derivados em -mente, torna-se inadequado, considerá-
los morfemas lexicais ou lexemas fora de um contexto específico, visto que alguns deles,
isoladamente não remetem à realidade extralingüística (valores temporais, sociológicos,
psicológicos etc.), motivo pelo qual se prefere denominá-los vocábulos e não palavras.
Vale ressaltar que Cunha e Cintra (1985) consideram morfemas lexicais os
substantivos, os adjetivos, os verbos e os advérbios de modo e, morfemas gramaticais os
artigos, os pronomes, os numerais, as preposições, as conjunções, os demais advérbios, bem
como as formas indicadoras de número, gênero, tempo, modo ou aspecto verbal.
Além disso, Brinton e Traugott (2005), que utilizam uma perspectiva funcionalista
semelhante à que caracteriza este trabalho, consideram os advérbios, por suas características,
como elementos da gramática.
Verifica-se que, além de apresentarem todos os “advérbios de modo” como morfemas
lexicais, os gramáticos mencionados denominam morfemas gramaticais não os afixos e
desinências (formas presas), como também as formas dependentes, na perspectiva de Câmara
Júnior, estabelecendo entre tais elementos uma relação de igualdade.
Com base nestes pressupostos, pergunta-se:
1) como considerar todos os vocábulos derivados em -mente, inclusive os desgastados pelo
uso automatizado, morfemas lexicais?
e, em conseqüência:
2) como denominar todos os “advérbios” não-marcados pela presença do sufixo -mente,
indistintamente, morfemas gramaticais?
2.3 Advérbios: espécies, formas e significação
Os advérbios são tradicionalmente caracterizados, priorizando os critérios semânticos
e formais. Sob o critério semântico, o advérbio expressa circunstâncias e, por outro lado, sob
o critério formal, eles podem modificar um verbo, um adjetivo, outro advérbio, ou todo o
enunciado.
Começando pelo critério semântico, tem-se a idéia de circunstância. Entendemos
como circunstância determinados indícios ou particularidades que caracterizam o conteúdo
expresso pelo termo ao qual o advérbio se refere. Sendo assim, pode-se entender como
expressando circunstâncias dados informacionais bastante diferentes entre si, como tempo,
lugar, modo, causa e, até mesmo, intensidade. Mas é difícil admitir que determinados tipos de
advérbios expressem circunstâncias, como é o caso, por exemplo, dos advérbios de dúvida, de
afirmação e de negação, respectivamente exemplificados abaixo:
(1) Talvez amanhã chova.
(2) Sim, choveu muito.
(3) Não choveu muito.
Nestes casos, os advérbios destacados não expressam circunstâncias, pelo menos de
acordo com a definição proposta acima, e sim uma atitude ou posicionamento do falante em
relação àquilo que está falando. O mesmo ocorre com os advérbios abaixo:
(4) Com certeza, vai chover amanhã.
(5) Felizmente, não choveu.
(6) Sinceramente, eu não gosto de chuva.
Nestes casos, ocorre nitidamente uma atitude ou posicionamento do falante em relação
ao que fala. Ducrot (1972) propõe que estes advérbios referem-se ao próprio ato ilocucionário
de afirmar, uma vez que qualificam o ato de dizer e não a coisa direta. Para ele, alguns
advérbios têm sua utilização explicada apenas por uma teoria dos atos da fala ou teoria da
enunciação, cuja unidade é o discurso.
Ducrot (1972) também apresenta alguns advérbios que indicam pressuposição: mal,
quase, exceto, também, somente, muito, pouco, entre outros. Embora alguns destes elementos
não sejam considerados tradicionalmente como advérbios, Ducrot (1972) os apresenta como
tal, afirmando que sua introdução no enunciado permite que determinado fato seja
pressuposto:
(7) Ele quase parou de fumar.
Nesta frase, o uso do elemento quase leva à pressuposição de que "ele" tentou parar de
fumar.
Como se pode ver, a visão de que os advérbios exprimem circunstâncias é muito
limitada. determinados tipos de advérbios cujo uso é basicamente determinado por fatores
pragmático-discursivos. E mesmo aqueles que funcionam normalmente como
circunstanciadores (de tempo, de lugar, de modo, de causa, de intensidade) muitas vezes são
usados para direcionar a interpretação do ouvinte, promover a organização das informações
no discurso além de outras funções pragmático-discursivas.
É o caso, por exemplo, do advérbio de tempo já, que pode assumir um papel de
elemento de contra-expectativa, no sentido que Heine et al. (1992) dão ao termo:
(8) A reunião terminou?
Nesta frase, mais que uma noção temporal, o elemento demonstra noção de contra-
expectativa do falante de que a reunião não tivesse terminado. Ou seja, a frase expressa o
contrário da expectativa e o advérbio já é a marca disto: é um elemento de contra-expectativa.
Mas também é de grande relevância pensar no aspecto formal da definição de
advérbio. É correto caracterizar os advérbios como elementos que se referem a um verbo, a
um adjetivo, a outro advérbio ou à oração inteira? autores que tentaram questionar isto,
como, por exemplo, Silva Jr. e Andrade (1907: 155), que afirmaram que os advérbios podem
modificar substantivos:
(9) Gonçalves Dias era verdadeiramente poeta.
Bomfim (1988: 9) questiona esta hipótese, afirmando que o termo poeta, no caso, não
pode ser entendido substantivamente, mas como um conjunto de qualidades atribuídas ao
elemento que recebe a referência. Assim, segundo autora, o elemento verdadeiramente
funciona, na realidade, como intensificador de poeta.
Por outro lado, pode-se pensar em outros exemplos, como os agrupados abaixo:
(10) A reunião na casa de Paulo foi proveitosa.
(11) O exemplo acima demonstra a hipótese.
(12) O país precisa de pessoas assim.
Nestas frases, os termos sublinhados referem-se claramente aos substantivos que os
antecedem e expressam circunstância (lugar nos exemplos 10 e 11 e modo no exemplo 12).
São casos diferentes do exemplo 9, onde o substantivo a que o advérbio se refere desempenha
função de predicativo. Deve-se considerar estes casos advérbio ou não? Mais uma vez se
evidencia a necessidade de se repensar o conceito tradicional de advérbio.
Mas este trabalho se deterá, mais especificamente, na ordenação dos advérbios de
tempo e de aspecto terminados em -mente. Mas é interessante estarmos sempre repensando
seu papel na estrutura da Língua.
Conforme propôs Givón (2001), a classe dos advérbios é a menos homogênea, tanto
do ponto de vista semântico quanto do morfossintático. Essa heterogeneidade é agravada pelo
fato de os advérbios funcionarem num plano de utilização da língua que tramita entre o campo
do léxico e a área da gramática, normalmente composta de elementos que assumem funções
voltadas para a organização interna do texto ou para a orientação argumentativa que se quer
dar a ele. De fato, o rótulo advérbio designa um conjunto muito diferenciado de elementos, e
parece constituir uma categoria fluida, que tende a se adaptar às intenções comunicativas
envolvidas no discurso.
Tradicionalmente, os advérbios são caracterizados como elementos de base nominal
(apenas < a + penas, depressa < de + pressa) ou pronominal (aqui, hoje) que de um ponto de
vista formal, são invariáveis, de um ponto de vista funcional (Câmara Jr: 1983) são termos
determinantes de um verbo ou de um nome (adjetivo e outro advérbio) e, de um ponto de vista
semântico, expressam circunstâncias, como foi explicitado anteriormente, ou seja, o
problema da generalização das definições.
2.4 Visão Tradicional dos Advérbios
Com base no que observamos em Said Ali (1969), Melo (1970), Rocha Lima (1985),
Cunha & Cintra (1985) e Bechara (2000), podemos dizer que os advérbios são
tradicionalmente caracterizados, de um ponto de vista semântico, por expressarem
circunstâncias e, de um ponto de vista formal, por modificarem um verbo, um adjetivo, outro
advérbio, ou toda a declaração, como se pode observar na definição de advérbio proposta por
Rocha Lima:
[...] palavras modificadoras do verbo. Servem para expressar
as várias circunstâncias que cercam a significação verbal (...).
Alguns há, até, que não acompanham a verbos, mas somente a
adjetivos e advérbios. (ROCHA LIMA, 1985: 174).
No que se refere especificamente aos advérbios de tempo, as gramáticas tradicionais
também não dizem muito. Apresentam a noção de tempo como uma das noções
circunstanciais expressas pelos advérbios e elencam uma série de elementos, como: agora,
ainda, amanhã, anteontem, antes, breve, cedo, depois, então, hoje, jamais, logo, nunca,
ontem, sempre, tarde, entre outros. Também não se vê, nas gramáticas tradicionais, uma
relação entre determinadas noções aspectuais e a classe dos advérbios. Aliás, a noção de
aspecto é normalmente deixada de lado nas gramáticas e as diferenças entre as noções
temporais dêiticas e não-dêiticas não são abordadas.
A respeito da ordenação dos advérbios, tema que nos interessa mais, os gramáticos
tradicionais, de um modo geral, nada menciona. Apenas Cunha e Cintra (1985) e Bechara
(2000) falam algo sobre o assunto.
Cunha e Cintra (1985) se referem à colocação adverbial em sua gramática, afirmando
que "os advérbios que modificam um adjetivo, um particípio isolado ou outro advérbio
colocam-se de regra antes destes". Em seguida, propõem que, com relação aos advérbios que
modificam o verbo, ocorre o seguinte:
a) Os advérbios de modo colocam-se normalmente depois do verbo.
b) Os advérbios de tempo e de lugar podem colocar-se antes ou depois do verbo.
c) O advérbio de negação antecede sempre o verbo.
Ainda acrescentam que os advérbios modificadores de outro advérbio, de um adjetivo
ou de um particípio isolado posicionam-se antes destes.
Os autores em questão propõem também que "o realce do adjunto adverbial é
expresso de regra por sua antecipação ao verbo", mas nada dizem em relação à colocação de
cada tipo específico de advérbio para fins de realce, muito menos o que ocorre neste sentido,
com os tipos de advérbios que já tendem a aparecer antes do verbo.
Entretanto, tratam a colocação desses advérbios em linhas muito gerais, uma vez que
se sabe, por exemplo, que os advérbios de modo são muito complexos. Além disso, não dizem
o porquê de tal ordenação. Também não mencionam a posição de outros tipos de advérbios.
Bechara (2000) também menciona a questão da colocação dos advérbios, ao afirmar
que esses elementos não se referem apenas ao verbo, podendo assim aparecer em várias
posições. Considera que a melhor proposta é a de Llorach (2000): o analista deve ater-se “às
relações que cada advérbio contrai dentro do enunciado, quer no seu papel primário de
adjacente circunstancial, quer por sua combinação com outras unidades no interior de um
grupo nominal unitário”. Como analisa Martelotta (2000), essa é a posição tomada por muitos
trabalhos de base funcionalista, em que a colocação dos advérbios está relacionada ao seu
funcionamento no enunciado.
Em Bechara (2001:290), é dito que o advérbio possui certa flexibilidade de posição,
uma vez que sua função não está ligada apenas ao verbo, mas estende-se ao conteúdo
expresso pelo predicado e ao domínio do sujeito, podendo antecedê-lo ou precedê-lo. No
entanto, o autor não especifica em que contextos tais posições podem ocorrer.
Como se pode ver, as gramáticas tradicionais são pouco elucidativas no que se refere
à classificação e, sobretudo, à ordenação de advérbios, apresentando propostas para os
diferentes tipos de advérbios que são bastante controversas: os advérbios de negação, por
exemplo, não antecedem sempre o verbo e podem ocorrer antecedendo o termo, na sentença,
que está sendo negado (Ex.: Eu chamei não a você, mas a seu irmão). E afirmar que os
advérbios de modo colocam-se normalmente depois do verbo é nada dizer diante da
complexidade da colocação deste tipo de advérbio na sentença e a outras propriedades
pertinentes a outros desses elementos.
2.5 Pesquisas sobre advérbios, sob orientação da Lingüística
2.5.1 Tipos de advérbios
Um dos trabalhos que apresenta uma profundidade sobre a ordenação dos advérbios é
o de Ilari et al. (1990), que, em uma análise detalhada dos advérbios e de sua ordenação,
propõem que essa classe de palavras pode dividir-se em dois grandes tipos: predicativos e
não-predicativos.
Os advérbios predicativos caracterizam-se por constituírem argumentos de segunda
ordem. Assim como o verbo e o adjetivo atribuem uma ação ou qualidade ao sujeito, os
advérbios predicativos modificam a ação ou qualidade atribuída ao sujeito. Do ponto de vista
sintático, esses advérbios podem modificar o sentido do verbo, do adjetivo ou de outro
advérbio. São exemplos desse tipo de advérbio: bem, muito, gratuitamente. Os não-
predicativos, por outro lado, não são compatíveis com as idéias de modificação de sentido e
de predicação de segunda ordem, apresentando funções bastante diferentes daquelas que
caracterizam os advérbios predicativos.
Interessam-nos, nesse trabalho, os advérbios predicativos. Nessa classe de advérbios
enquadram-se, segundo os autores, as seguintes subclasses:
a) Qualitativos - paralelos à construção com substantivo, que expressa qualidade (comida
boa), esses advérbios modificam o sentido dos elementos a que se referem: Comer bem,
maravilhosamente bem. Entre esses advérbios encontram-se mal, assim, entre outros.
b) Intensificadores - relacionam-se tipicamente a verbos, adjetivos e advérbios,
intensificando-lhes o sentido: muito, mais, etc.
c) Modalizadores - aplicam-se a sentenças completas e indicam atitude proposicional:
certamente, felizmente, etc.
d) Aspectualizadores - são advérbios cujos traços semânticos correspondem a noções
aspectuais do verbo da sentença em que ocorrem: geralmente, diariamente, de vez em quando,
algumas vezes, etc.
Os qualitativos e os intensificadores apresentam características muito semelhantes
entre si, que podem referir-se ao verbo, ao adjetivo ou a outro advérbio. Isso os diferencia
dos chamados modalizadores, que, segundo os autores, de um modo geral, qualificam a
asserção, relacionando-se à sentença inteira.
Quando se referem ao verbo, os advérbios qualitativos apresentam determinadas
restrições seletivas quanto ao conteúdo do verbo que modificam, tendo, portanto, fundamento
argumental. Assim, alguns advérbios não podem referir-se a determinados verbos: o advérbio
gratuitamente, por exemplo, não pode ser atribuído ao verbo pagar.
Isso diferencia os qualitativos dos advérbios aspectualizadores, cuja restrição seletiva
se refere ao esquema tempo-aspectual do verbo: o advérbio geralmente, por exemplo, não
pode referir-se a uma forma verbal, de aspecto pontual e concluído, como, por exemplo, a
forma verbal caiu.
Curiosamente, Ilari et al. (1990), que propõem um trabalho sobre ordenação, pouco
falam acerca das tendências de colocação dos aspectualizadores. Além disso, não mencionam
uma categoria de advérbios de tempo, mas de advérbios aspectualizadores, que “indicam a
freqüência com que um verbo se reitera”. Dos exemplos apresentados pelos autores, todos se
relacionam a noções tradicionalmente associadas ao conceito de aspecto iterativo: geralmente,
normalmente, diariamente, de vez em quando, às vezes, entre outros. Entretanto, os autores
nada dizem sobre elementos adverbiais associados a outras noções aspectuais, como
pontualidade ou duratividade ou mesmo sobre elementos adverbiais, como ontem, hoje e
amanhã, por exemplo, que expressam informações temporais dêiticas, que não se relacionam
à noção de aspecto, mas à categoria gramatical de tempo, que, por definição, possui natureza
dêitica.
Outros autores, como veremos mais adiante, também acrescentam entre os tipos de
advérbios, termos que indicam noções semanticamente associadas a noções aspectuais. Um
exemplo de outro estudo sobre os advérbios e sua classificação é o de Castilho (1999). Nesse
trabalho, os tradicionalmente chamados advérbios de tempo foram arrolados entre um grupo
de advérbios que o autor classificou como qualificadores aspectualizadores.
O autor define a predicação qualificadora como “um processo semântico-sintático por
meio do qual um operador incide sobre uma classe, modificando ou confirmando sua
intenção, isto é suas propriedades específicas, ou traços semânticos ou semas, na terminologia
da Semântica estrutural”. Em seguida afirma que a qualificação é codificada gramaticalmente
pelos adjetivos, pelos advérbios predicativos e pelos adverbiais, representados por um
sintagma nominal ou por um sintagma preposicionado com valor adverbial.
Quanto aos chamados qualificadores aspectualizadores, o autor relaciona essa classe
de advérbios com a noção de aspecto, que possui natureza composicional, que resulta da
interação do sentido lexical do verbo com o tempo em que foram conjugados, seus
argumentos, os adjuntos adverbiais a ele associados e o padrão sintático em que o verbo está
encaixado.
O autor centra suas análises nas noções de perfectividade vs imperfectividade e
telicidade vs. atelicidade e propõe a existência de aspectualizadores imperfectivos e
perfectivos. Vejamos respectivamente dois exemplos dados pelo próprio autor:
(01)... ela teve escritórios durante... oito anos:: mais ou menos
(02) ajeitou os cabelos de um golpe
A importância desse trabalho está no fato de o autor resgatar uma importante relação
entre aspecto e discurso, relacionando os usos desses advérbios aos dois planos discursivos
característicos da narrativa, propostos em Hopper (1979): figura e fundo. O autor propõe que,
na narrativa por ele analisada, as ações imperfectivas ocorrem em fundo e também em figura,
contrariando a proposta de Hopper (1979), de que a imperfectividade é típica de fundo.
O trabalho de Castilho (1999), portanto, tem o valor de sofisticar mais um pouco a
noção de advérbio aspectual. Mas, além de não mencionar questões relacionadas à ordenação,
ainda não resolve os dois problemas básicos apontados. Não analisa outras noções
aspectuais, além da distinção entre perfectividade vs imperfectividade e as noções
semanticamente próximas a ela. Nada menciona acerca dos elementos adverbiais que
expressam informações temporais dêiticas, que não se relacionam à categoria de aspecto, mas
à de tempo.
Outro trabalho que merece menção é o de Givón (2001), que chama atenção para o
fato de que advérbios podem indicar, no tempo, vários aspectos temporais dos eventos e
caracterizam esses advérbios como advérbios de tempo e aspecto. Para o autor, não é o verbo,
mas a cláusula que constitui o escopo semântico destes advérbios, cujas características
morfossintáticas são muito heterogêneas.
Sem entrar em detalhes de análise, o autor apresenta exemplos do inglês, que são
tipicamente aspectuais, como often, always, again, continuously, on and on, entre outros.
Podemos notar que o autor não se restringiu ao aspecto iterativo, na medida em que
apresenta o caso de continuously e on and on, por exemplo, que se relacionam a outras noções
aspectuais, como imperfectividade e progressividade. Por outro lado, apresentam também
exemplos de advérbios tradicionalmente temporais, como yesterday, tomorrow, entre outros.
Essa é a tendência que seguiremos aqui. Adotaremos uma classificação que leve em
conta as noções de tempo e aspecto, procurando refinar a análise das relações entre advérbios
e as diferentes noções aspectuais. Com base nisso, observaremos o comportamento desses
elementos nas diferentes fases do português, na modalidade escrita, tentando relacionar esses
dados com as diferenças em suas tendências de ordenação.
É importante também ressaltar que estamos lidando apenas com advérbios de tempo
e de aspecto em -mente.
2.5.2 Estudos sobre o advérbio em -mente e sobre ordenação de advérbios
Passamos agora a uma revisão dos estudos feitos sobre advérbios em -mente ou sobre
ordenação _ os dois focos principais desta tese _ sob o ponto de vista da ciência Lingüística.
A tese de Rodrigues (1994) apresenta um estudo de cunho variacionista com uma
perspectiva de comparabilidade funcional que analisa outras possíveis funções dos vocábulos
derivados em -mente, além dos adjuntos adverbiais. Afirma que esses vocábulos não
configuram isoladamente uma classe gramatical.
Ao analisar os dados e pressupostos teóricos de diversos autores, Rodrigues pôde
definir o advérbio como “vocábulo de natureza nominal, modificador do verbo que, em
relação aos outros nomes, caracteriza-se por apresentar invariabilidade de gênero e número”
(1994:159).
A autora estabeleceu uma oposição entre função adverbial e quaisquer outras funções
que os vocábulos derivados em -mente pudessem exercer no corpus analisado.
Assim, adotou o termo “pseudo-advérbio” de Bonfim (1988), para agrupar essas
outras funções, a saber: 1) a discursiva (funcionam como marcadores); 2) a de modificador de
nome; 3) a de modificador de sintagma preposicional; 4) a de modificador de sentença; 5) a
de modificador do pronome.
Representou essa distinção no seguinte quadro:
Quadro1 – Distinção entre Advérbio e Pseudo-advérbio
CLASSE
Nomes derivados
Em -mente
FUNÇÕES
Advérbio
“Pseudo-advérbio”:
–discursivo
-modificador de nome
-modificador do SP
-modificador da sentença
-modificador do pronome
(Rodrigues,1994:161)
A autora descobriu que o tipo do verbo aliado à classe do vocábulo que pertence à
classificação semântica do nome em -mente foram os fatores condicionadores da função dos
vocábulos derivados em -mente, que foram, na maioria das vezes, os “pseudo-advérbios”
(Rodrigues, 1994:162).
Outra pesquisa sobre itens em -mente é a dissertação de Freitas (2004), na qual a
autora trata especificamente dos advérbios temporais e aspectuais em -mente na língua oral
portuguesa, sob uma perspectiva funcionalista. Verifica que a posição mais típica desses
advérbios na oração é a pré-verbal quando ocorrem nas orações formadas pela estrutura
padrão da língua portuguesa SVCo (sujeito, verbo e complemento). Além disso, verifica que a
posição pré-verbal era predominante. Constatou, ainda, que há uma diferença de ordenação da
posição pré-verbal para pós-verbal, ou, pelo menos uma tendência para isso, quando não
um argumento verbal na posição adjacente e posterior ao verbo. Freitas verifica também que
certos itens em -mente como primeiramente e finalmente estão se gramaticalizando. Esses
deixam de expressar somente o tempo dos eventos e passam a organizar os eventos
cronológicos em seqüência textual, funcionando, segundo a autora, como conectivo, vejamos
alguns exemplos dados pela autora:
(1) /.../ o meu filho mais velho tem trinta e dois anos, depois eu tenho um filho de vinte e oito,
ai um intervalo de oito anos, eu tenho uma filha, (e finalmente com outro intervalo de seis
anos tem um garoto) (NURC-RJ, INQ. 084, 1.37).
(2) /.../ E: isso...como...como se faz?
I: primeiramente você pega a calha... pega a calha e ::/ tem um:: lugar de colocar o :: porta
start... aí você tem que furar ... os dois buraquinhos do lado... se for lâmpada de duas... porque
tem lâmpada? Tem luminária de uma lâmpada...de duas... tem lâmpada de vinte/.../ (D&G,
Juiz de Fora, 2
o
grau, relato de procedimento).
Segundo Freitas (2004), nos exemplos (1) e (2) acima, os itens destacados possuem
características de ligação entre sentenças e contextos lingüísticos, funcionando como
elementos de conexão.
Moraes Pinto (2002) fez uma análise da colocação e da polissemia de alguns itens
adverbiais em -mente no português arcaico e no português do século XIX, com atenção aos
seus valores qualitativos e modalizadores.
O objetivo desta pesquisa foi demonstrar que alguns advérbios qualitativos e
modalizadores terminados em -mente sofreram, no decorrer do tempo, mudança na sua
polissemia do português arcaico até os dias atuais. Essa mudança é sucessiva e unidirecional e
consiste num processo de gramaticalização, com esses elementos passando de advérbios
internos à cláusula a advérbios sentenciais. Em certos casos, os valores qualitativos
encontrados no início da trajetória desaparecem e os advérbios passam a assumir funções
pragmático-discursivas.
Os diferentes valores semânticos desses elementos implicam diferentes colocações e
funções na oração. No português arcaico, os advérbios qualitativos possuíam grande
mobilidade na cláusula, podendo ocupar diversas posições, inclusive a de tópico. A partir do
século XIX, algumas posições se tornaram indisponíveis a esses advérbios, pois, com o
processo de gramaticalização, conforme seus valores semânticos se modificavam, eles
passaram a ter um caráter específico e passaram a depender das características gramaticais de
sua nova função. Esse trabalho tem grande relevância para a presente tese, pois nos aponta
alguns caminhos a ser trilhados, como em relação ao processo de gramaticalização, a questão
ordenação no decorrer do tempo, além dos fatores analisados que motivaram sua realização
através dos séculos.
A pesquisa de Andrade (2005), sobre a ordenação das locuções adverbiais de tempo
em 100 editoriais sob o arcabouço teórico funcionalista, demonstrou que as locuções
temporais não têm uma posição prototípica nesse gênero, apresentando apenas uma pequena
tendência de ocorrência na posição pós-verbal (55% dos dados). A autora observou que as
locuções (tanto as pequenas como as mais longas), em editoriais tendem a aparecer nas
posições marginais à cláusula, ou seja, logo no início da cláusula ou no final, como nos
exemplos a seguir:
.
(3) Nas últimas duas eleições, indiretas, não houve sequer desafiante. (12-JB/1999).
(4) É a oportunidade de recuperar o verniz que o partido perdeu ao longo do caminho. (129-
JB/2004).
As locuções, no gênero estudado, aparecem normalmente na posição de sujeito quando
este está ausente (sujeito oculto ou oração sem sujeito) ou está na posição pós-verbal. Neste
caso, ou seja, na ordem VS (verbo-sujeito), 74% das locuções coletadas estão na posição pré-
verbal, como no exemplo:
(5) Nos últimos dois meses, foi roubado o carro blindado do ministro da justiça. (47-
JB/2003).
Mas, quando o sujeito está na sua posição prototípica, ou seja, na ordem SV, as
locuções adverbiais aparecem 68% na posição pós-verbal, como no exemplo a seguir:
(6) A Libéria nasceu em 1822, como pátria de ex-escravos americanos. (JB/2003).
Como Andrade, também verificaremos a posição dos advérbios em -mente e a relação
com a presença ou ausência do sujeito.
Cezario, Ilogti e Costa (2005) verificaram que, em textos religiosos contemporâneos,
as locuções tendem a ocorrer na posição pré-verbal (62% dos dados), como no exemplo:
(7) “minutos depois estava ali apenas a mulher e ele (CSP)
De todos os tipos semânticos estudados (locuções dêiticas, durativas, reiterativas e
simultâneas) pelas autoras, apenas as durativas tendem a ocorrer em posição pós-verbal
(72%).
As autoras observam que as locuções que aparecem inseridas entre o sujeito e o verbo
ou entre o verbo e o complemento/predicativo estão em orações com baixíssima
transitividade, como as com verbo de ligação ou com modal e verbo de ligação:
(8) “A aclamação depois da consagração também pode ser cantada” (p.74, l.11 CEV)
(9)Nossas músicas deverão ser ao mesmo tempo carismáticas e proféticas (p.84, l.28 CEV)
as orações com mais traços positivos de transitividade tendem a ter as locuções em
posições marginais, como abaixo em que a locução A seguir ocorre na margem esquerda de
uma oração altamente transitiva:
(10) “(...) rangeu os dentes, mudou de cor, fez a pior carranca do universo, prendeu as mão e
deu um grito de raiva. A seguir levantou o soldado pela roupa, virou o rosto e disse (...)” (p.
143, CSP).
Essa pesquisa é importante para a presente tese, pois também será testada a relação
entre semântica do elemento adverbial e ordenação. A questão da transitividade será vista
indiretamente ao estudarmos a relação entre tipo semântico do verbo e a posição do advérbio.
Albani (2007) verificou que a posição típica do advérbio sempre era pré-verbal no
português arcaico e pós-verbal no português contemporâneo. Todos os fatores estudados
indicam que, no português arcaico, a ordem era mais livre e mais motivada, enquanto no
português atual a ordem é mais fixa. Segundo ele, há um forte indício de mudança na
ordenação do advérbio sempre em textos religiosos.
Seu trabalho foi importante para esta tese, pois é uma pesquisa de ordem diacrônica e
que traz resultados interessantes quanto à fixação de posição de advérbios. Muitos dos fatores
testados por ele também foram testados por nós, como a relação entre tipo semântico de verbo
e ordenação de advérbio. Com relação a esse fator, Albani destaca que, no português atual, o
advérbio sempre quase que categoricamente se apresenta na posição pós-verbal quando o
verbo é relacional intensivo (verbo de ligação).
Uma pesquisa de grande importância para o nosso trabalho é a realizada por
Martelotta (1994) que; analisa, em uma perspectiva funcional, a ordenação dos
circunstanciadores temporais. Esses compreendem os advérbios, adjuntos, orações adverbiais
e operadores argumentativos que expressam a noção do tempo. O corpus utilizado é
constituído de entrevistas elaboradas pelo Censo de Variação Lingüística, Competências
Básicas de Português e NURC. Para o estudo diacrônico dos operadores argumentativos,
foram utilizados textos antigos, como: “Vigeu da Consolação” (1959), “A demanda do Santo
Graal” (1944), “O Bosco Deleitoso” (1950), dentre outros.
O objetivo do estudo do autor é buscar fatores discursivos que motivem a colocação
desses circunstanciadores na sentença. Em outras palavras, o autor propõe demonstrar que os
argumentadores discursivos seguem leis e tendências de colocação diferentes dos demais
circunstanciadores. A ordenação dos argumentadores discursivos deve-se a dois processos de
mudança semântica: metáfora espaço> (tempo) > texto (Heine et al., 1991) e pressão de
informatividade. ( Traugott e Heine, 1991).
O primeiro processo de mudança consiste em um elemento de valor espacial assumir
um sentido temporal e, depois, passar a expressar relações lógicas no discurso. Por exemplo:
“O operador argumentativo aí, originalmente um dêitico espacial, pode também ser usado
para seqüenciar (temporalmente) os eventos e expressar uma idéia de conseqüência em
relação às sentenças anteriormente mencionadas” (Martelotta 1994:5).
A mudança por pressão de informatividade dá-se quando um elemento lingüístico
adquire um novo valor através de um processo de inferência conversacional em certos
contextos. Um exemplo citado por Martelotta é o do operador argumentativo “ainda cujo uso
de marcador de contra-expectativa, por um processo de inferência passa a assumir um valor
inclusivo semelhante ao do termo também” (1994:6).
O autor ressalta que geralmente esses dois processos de mudança ocorrem juntos
quando se trata do aparecimento de operadores argumentativos que tendem a perder sua
mobilidade original para assumir posições mais fixas na sentença. Esse processo de
gramaticalização foi estudado nos seguintes operadores argumentativos: aí, depois, logo,
então, já e ainda.
Ao apresentar a ordenação dos circunstanciadores temporais, propriamente ditos,
Martelotta adota o princípio de Hopper e Thompson (1980) de que o discurso narrativo
apresenta duas estruturas denominadas figura e fundo, estendendo-o ao discurso não-
narrativo.
Distingue figura e fundo, primeiramente, opondo a intenção do falante ao direcionar o
fluxo do discurso para a narrativa ou para a não-narrativa: se o falante está narrando, eventos
e situações não-narrativas funcionam como fundo; e, ao contrário, se o falante está
comentando ou descrevendo, eventos e situações narrativas funcionam como fundo, servindo
para evidenciar este comentário ou esta descrição (1994:2-3).
Uma outra distinção entre figura e fundo é realizada através da análise de traços
semântico-gramaticais. Assim, na narrativa, os eventos funcionam como figura quando são
marcados pelos traços [=específico], [=perfectivo], [=cinético], [pontual] e funcionam como
fundo quando marcados pelos traços [-específico], [-perfectivo], [-cinético], [-pontual].
no discurso não-narrativo, os eventos que funcionam como figura são marcados
pelos traços [-específico], [+perfectivo], [+cinético], [+pontual] e funcionam como fundo,
aqueles marcadores por [-específico], [-perfectivo], [-cinético], [-pontual].
Com o objetivo de verificar as tendências de posições desses circunstanciadores de
tempo, Martelotta os classificou em:
a)Circunstanciadores de tempo determinado- são aqueles que indicam, de forma precisa, o
momento em que ocorre o evento. Cita como exemplos: ontem, hoje, semana passada,
quando ele chegou etc.
b)Circunstanciadores de tempo indeterminado- expressam a noção de que os eventos e
situações perduram no tempo indeterminadamente. Exemplifica com: sempre, geralmente,
atualmente, nunca etc.
c)Circunstanciadores iterativos- denotam a freqüência com que os eventos não-específicos
ocorrem ao longo do tempo, como às vezes, duas vezes por semana, de vez em quando etc.
d)Circunstanciadores de simultaneidade- expressam a concomitância entre eventos e
situações. Como os exemplos, citam: enquanto isso, ao mesmo tempo etc.
e)Circunstanciadores delimitativos- delimitam os eventos e as situações, indicando o início
e/ou fim de sua permanência no tempo, como: há três anos, até hoje, durante dois meses etc.
O autor conclui que existe uma tendência determinada para a colocação dos
circunstanciadores temporais na sentença. Essa depende da força que a informação, carregada
pelo circunstanciador, assume dentro da estrutura do discurso em que ele ocorre.
O circunstanciador tende a aparecer em posições pré-verbais, “quando traz
informações temporais análogas aos traços semântico-gramaticais do discurso em que ocorre.
Esta relação semântica empurra o circunstanciador para as posições pré-verbais, enfatizando-o
ou topicalizando-o” (1994:201).
No entanto, se não essa relação semântica, o circunstanciador tende a ocorrer nas
posições pós-verbais, ou até não ocorrem “em tipos de discurso cujos traços semântico-
gramaticais são não-análogos ou incompatíveis com a informação temporal por ela expressa”
(1994:201). Dessa forma, os circunstanciadores de tempo determinado tendem a ocupar
posições pré-verbais em figura narrativa e não-narrativa, uma vez que a força informativa que
assumem nestes contextos os leva a ser topicalizados ou enfatizados.
Os circunstanciadores de tempo indeterminado e os circunstanciadores de
simultaneidade têm como tendência o aparecimento na posição pré-verbal em fundo narrativo
e não-narrativo, devido também à força informativa assumida que os leva a topicalização ou
ênfase.
No que se referem aos circunstanciadores iterativos, esses apresentam maior
ocorrência nas posições pré-verbais em fundo narrativo e não-narrativo e em figura não-
narrativa, já que esses tipos de discursos são marcados pelo traço [-específico], estimulando a
iteratividade.
Por fim, os circunstanciadores delimitativos possuem uma mobilidade de colocação
maior, porque apresentam duas características distintas: por um lado, funcionam como um
circunstanciador de tempo determinado (indica o momento específico em que se inicia e/ou
termina o evento). Por outro lado, “expressam a duração de eventos específicos imperfectivos,
ou de eventos não-específicos ao longo do tempo, acrescentando características semântico-
gramaticais típicas de fundo” (1994:229).
Quanto à colocação dos operadores argumentativos, Martelotta afirma que, devido ao
processo de gramaticalização que sofrem, não seguem as mesmas tendências de ordenação
dos circunstanciadores propriamente ditos. A gramaticalização faz com que o elemento exerça
funções argumentativas, restringindo a sua possibilidade de colocação na sentença. Tal
colocação “passa a depender mais das características gramaticais específicas de suas novas
funções, que se manifestam em contextos específicos, assumindo posições mais fixas dentro
da sentença” (1994:229-230).
O trabalho de Martelotta (1994) foi muito importante para presente tese, sobretudo, no
que se refere às posições estabelecidas, como também no que se refere a alguns parâmetros da
transitividade, à análise bastante detalhada dos circunstanciadores de tempo, buscando fatores
que influenciam a sua colocação na sentença à luz da teoria funcional.
Ressaltamos que o autor estuda os advérbios em geral, enquanto, esta tese trata apenas
dos advérbios de tempo e aspecto em -mente.
França (2002) parte da tese de Martelotta e faz uma análise dos adjuntos adverbiais de
tempo e aspecto em narrativas orais e escritas contemporâneas, procurando delimitar os
valores que esses adjuntos apresentavam no texto narrativo, assim como as tendências de
colocação que eles assumiam nas cláusulas que compunham o texto. Esses adjuntos
adverbiais de tempo e aspecto, de um modo geral, apresentam uma grande mobilidade na
cláusula, podendo ter suas tendências de ordenação explicadas por fatores de caráter sintático
e discursivo.
Um dos fatores mais importantes foi o plano discursivo. A autora verificou que
tendiam a serem enfatizados, ocupando posições pré-verbais, os adjuntos que apresentavam
traços semântico-gramaticais análogos aos traços semântico-gramaticais do plano de discurso
em que apareciam; enquanto os adjuntos adverbiais de tempo e aspecto determinados não
apresentaram resultados estatísticos que ratificassem a hipótese postulada; já os adjuntos
adverbiais de tempo e aspecto indeterminados tendiam a ocupar posições pré-verbais em
fundo, porque este tipo de discurso caracteriza-se pela presença de situações não-específicas;
e ainda, os adjuntos adverbiais de tempo e aspecto de simultaneidade tendiam a ocorrer em
fundo e em posições pré-verbais. Isto ocorria porque o discurso de fundo tende a apresentar
traços semântico-gramaticais (não-específicos) marcados pela simultaneidade; os adjuntos
adverbiais delimitativos, embora não tenham apresentado tendência muito forte, pareciam
buscar as posições pós-verbais em figura já que expressavam a duração de eventos específicos
imperfectivos, ou de eventos não-específicos ao longo do tempo, apresentando traços
semântico-gramaticais típicos de fundo; enquanto aos adjuntos adverbiais de tempo e aspecto
iterativos tendiam a ocorrer em posições pré-verbais de fundo, porque este tipo de discurso é
marcado pela presença do traço não-específico; e, além disso, a ordenação vocabular,
portanto, não podia ser explicada por fenômenos estritamente sintáticos.
Portanto, a estrutura organizacional do texto influenciava a colocação dos adjuntos
adverbiais de tempo e aspecto.
O estudo de Pereira (1999) verifica a ordenação das orações adverbiais de tempo,
desenvolvidas e reduzidas, num corpus constituído por 108 cartas pessoais, escritas entre
1937 e 1987. Esse trabalho, baseado nas teorias variacionista e funcionalista, busca identificar
os fatores cognitivos e discursivos que motivam a variação da ordem de algumas dessas
orações, tornando-as fixas na sentença.
Os dados foram separados em dois grupos: 1)orações temporais com ordenação
variável (total ou parcial) e 2) orações temporais de ordem fixa ou categórica. Segundo a
autora, o primeiro grupo foi submetido a uma análise estatística multivariacional através do
pacote de programas VARBRUL. O segundo foi analisado qualitativamente:
Pereira observou as seguintes posições da oração temporal:
a)Anteposição: corresponde às orações temporais situadas na margem esquerda da oração
núcleo.
(11) ”Um dia desses fui pedir uma xícara de chá e só ela estava lá.
Quando pedi que ela fizesse, ela tremeu de alegria e disse...
b) Posição: corresponde às orações temporais situadas na margem direita da oração com que
se combinam.
(12) “Escreva-me contando assim que tiver um tempinho”.
c) Intercalação: corresponde às orações temporais situadas no interior da oração núcleo,
quebrando a fluidez da idéia apresentada nesta oração.
(13) “M. vou parando por aqui senão quando voltar não tenho novidades pra te contar”.
Verificou que não houve diferença marcante entre posposição e anteposição. Percebeu,
também, que muitas das orações temporais intercaladas eram reduzidas de infinitivo e curtas
(cerca de quatro palavras cada uma), o que proporcionava uma melhor fluidez do discurso,
facilitando de certa forma o processo comunicativo.
Dentre os vários fatores analisados, destacamos o que se refere aos tipos de verbo do
segmento temporal. Os verbos foram codificados a partir de três classificações baseadas em
Dik (1989) e Braga (1996):
1-Ação (realização e atividade)
2-Processo (mudança e dinamismo)
3-Situação (posição e estado)
Os resultados mostram que o tipo de verbo do enunciado temporal é mais freqüente
seguido do processo, e o menos freqüente é a situação. A autora relata que “os resultados para
o tipo de verbo das orações isoladas não se mostram eficientes”, portanto considerou “para a
análise a correlação dos tipos de verbos das orações que compõem o enunciado temporal”
(1999:72). Dessa forma, constatou que “as orações com verbos de ação tendem a vir na
segunda posição, independentemente de constituírem o núcleo ou o satélite do enunciado
temporal (...) orações com verbos de situação e processo tendem a vir na primeira posição,
quando associadas a uma oração com verbo de ação, funcionando como pano de fundo para
os eventos mais dinâmicos codificados na segunda oração” (1999:72-73).
Outro fator que também colocamos em evidência é aquele que concerne à distribuição
de informação. Pereira analisou o tipo de informação codificada pela oração núcleo e pela
oração temporal. Ambas as orações foram classificadas conforme as categorias: novo, velho e
inferível, nos termos de Prince (apud Pereira, 1999). Os resultados mostram que orações
temporais que codificam informação velha, mencionadas no discurso anterior, são mais
propensas à anteposição. Sendo assim, ”Orações temporais que codificam informação nova,
não mencionada no contexto e nem inferível dele, são preferencialmente pospostas (...) o
contexto mais favorável à anteposição da oração temporal é aquele em que se relacionam uma
oração núcleo nova e uma oração temporal com informação velha” (1999:88).
No que diz respeito às orações temporais de ordem fixa, verificou que os bloqueios
mais freqüentes à reversibilidade das orações pospostas são: as com o focalizador sozinho e as
que estão ancoradas num constituinte da oração anterior.
Quanto à anteposição da oração temporal, os resultados mostraram que os fatores mais
relevantes para a fixação dessas orações são: em primeiro lugar, as relações anafóricas, em
segundo lugar, as expressões cristalizadas, em terceiro lugar, a seqüência discursiva.
A relevância do trabalho de Pereira para o presente estudo justifica-se por também
investigar fatores que tendem a motivar a ordenação dos elementos em análise.
Lessa (2007) se propôs investigar a ordenação de circunstanciais temporais (advérbios
e sintagmas preposicionados com valor circunstancial) na modalidade escrita do português e
do inglês, levando em conta, principalmente, fatores de ordem discursiva. A autora constatou
que, para se abordar a questão da ordem não marcada, deveria considerar as duas línguas
(português e inglês) de forma distinta.
Quanto aos resultados obtidos nesse estudo, verificou-se que os advérbios tendiam a
ordem não marcada no inglês é a anteposição verbal. Já em relação aos Spreps, não houve
como tirar essa conclusão, devido à grande variabilidade na oração.
Além disso, em relação ao posicionamento mais detalhado dos circunstanciais de
tempo na cláusula, observou-se que os advérbios em português ocupavam as posições ME
(margem esquerda) e PM2 (entre o verbo e objeto) com mais freqüência, enquanto no inglês,
eles preferiam a PM1(entre o sujeito e o verbo). Este fato no inglês pôde ser explicado,
principalmente, em virtude de os advérbios menores possuírem uma ordem mais rígida. Os
Spreps em português possuíam uma clara preferência pela margem direita da oração,
enquanto que, em inglês, os Spreps apresentaram grande variabilidade nas duas margens da
oração.
Portanto, a função discursiva dos circunstanciais possui grande influência na
ordenação de advérbios e Spreps nas duas línguas.
Esse estudo sobre Ordenação de Circunstanciais Temporais em Português e Inglês:
posições e papéis discursivos foram importantes por também investigar as posições que esses
constituintes ocupam na cláusula.
Nesta tese, examinamos os seguintes fatores: a posição dos advérbios, a noção
semântica do advérbio, o tipo semântico do verbo, o tipo de sujeito, o tipo de oração, dentre
outros.
Esta revisão permitiu-nos conhecer, mais profundamente, as questões abordadas
acerca dos advérbios em geral, sobretudo, aquelas referentes à sua classificação e às suas
posições na cláusula e, com certeza, foi esclarecedora ao longo desse estudo.
2.6 Os advérbios e a expressão de tempo
Tempo e aspecto são duas categorias gramaticais que expressam noções temporais. A
categoria de tempo é dêitica, já que sua utilização depende diretamente do momento em que o
enunciado foi proferido. Por outro lado, isso não ocorre com a categoria de aspecto.
As noções de tempo e de espaço são partes substanciais das relações do homem com o
mundo. Os dois são delimitados: o tempo, em minutos, horas, dias, meses, séculos; o espaço,
em centímetros, metros, milhas, etc. Todos são referências necessárias na vida de cada um de
nós. Portanto, a língua que falamos está repleta de recursos, para que possamos situar nossas
ações em relação aos dois: agora, antes, depois, ainda - para tempo; aqui, acolá, além - para o
espaço.
Qualquer ato de comunicação é situado no tempo e no espaço. Na simples situação de
comunicação - o diálogo - o indivíduo que fala refere-se a si mesmo como eu que designa seu
ouvinte como tu/você. Ao referir-se ao espaço em que se encontra o indivíduo que fala
identifica-o como aqui; e ao referir-se ao momento em que fala, pode designá-lo como agora.
Eu, você, aqui e agora não nomeiam indivíduos, lugar e época determinados e
constantes, mas apenas "o indivíduo que fala", alguém a quem ele se dirige, e o "lugar" e
"momento" em que ocorre o diálogo. Seus referentes não são, portanto, objetivos e externos à
fala (como João, Paula, na sala e às 2 horas), mas situacionais e exclusivos do ato de falar,
fora do qual não podem ser reconhecidos e os elementos utilizados para designar a esses
referentes são chamados dêiticos (termo derivado de uma palavra grega que significa "indicar,
mostrar, apontar")
A categoria gramatical de tempo, segundo Lyons (1979) diz respeito às relações
temporais que são expressas por contrastes gramaticais sistemáticos. Os gramáticos
tradicionais, na análise do grego e do latim, apresentam três contrastes dessa natureza:
passado, presente e futuro. A categoria de tempo relaciona o tempo da ação indicada pelo
verbo, em relação ao momento em que o falante produz seu enunciado, o que significa que o
tempo é uma categoria dêitica.
A pessoa que fala, ou escreve, "comanda", por assim dizer, a atividade discursiva,
normalmente transformando-a, ou colaborando para transformá-la, numa complexa rede de
atos de significação que têm no eu, no aqui e no agora do discurso seus pontos de referência.
A indicação do tempo como categoria de linguagem verbal é parte dessa interação
comunicativa, ou ainda dessa atividade discursiva, tempo, que tem no momento da
enunciação seu ponto principal de referência.
Nesse sentido, os advérbios que expressam a categoria de tempo seriam aqueles que
apresentam valor dêitico, localizando os eventos na linha do tempo, em relação ao momento
da produção de enunciado. São eles: ontem, hoje e amanhã, logo mais, quarta-feira passada,
além de depois, anteriormente, posteriormente (em contextos em que está ancorado ao
momento da fala, ou seja: depois, anteriormente ou posteriormente ao momento da fala), etc.
Em alguns casos, os advérbios temporais podem não ser dêiticos, ou seja, podem
localizar na linha do tempo, sem tomar como referência o momento da fala, mas a conclusão
do evento anterior, ou qualquer ponto no tempo mencionado no texto. É o que ocorre, por
exemplo, em depois da aula e antes do jogo, que constituem indicações temporais não-
dêiticas, que localizam o evento na linha do tempo, tomando como ponto de referência
pontos já fixados no tempo, e não o posicionamento dos participantes. Os seqüenciadores em
geral estão nessa categoria: depois, , então, etc.
2.7 Os advérbios relacionados à categoria de aspecto
Para que possamos compreender a noção de advérbio de aspecto, devemos fazer uma
breve reflexão acerca da categoria gramatical de aspecto.
As gramáticas tradicionais falam pouco acerca da categoria de aspecto. São muito
poucos os autores que se preocupam em apresentar o aspecto como uma categoria do verbo e
defini-lo de maneira objetiva. O que mais encontramos são rápidas alusões à noção de
aspecto, espalhadas pelos capítulos referentes ao estudo dos verbos. Said Ali (1969:161), para
citar um exemplo, apresenta uma minuciosa análise do emprego das diferentes formas
verbais, utilizando termos como “iterativo”, “ação durativa” e “ação freqüentativa, mas sem
mencionar a palavra aspecto.
Luft (1978) é um dos poucos gramáticos que trata a categoria de aspecto em uma
seção especial, em que define aspecto como “a categoria verbal que exprime a oposição
término/não-término ou acabado/não-acabado, a duração do processo”. Na seqüência, o autor
afirma que o aspecto pode manifestar-se juntamente com o tempo, como em canto/cantei,
cantara/cantava, onde existe a oposição acabado/não-acabado. Mostra também que esta
categoria pode manifestar-se através de locuções verbais, sufixos, ou pelo próprio radical do
verbo, indicando exemplos de aspectos incoativo, iterativo, cursivo e cessativo.
Luft afirma que os verbos, em oposição aos nomes, caracterizam-se pela “idéia
temporal: o início, a duração ou o resultado de um processo (aspecto) ou o momento de sua
ocorrência (tempo)”. Propõe também, ao comentar as locuções verbais, que as locuções
indicam os aspectos do processo verbal: anterioridade, posterioridade, continuidade,
repetição, progressividade, início, conclusão, etc. Notamos aqui, mais uma vez, uma
inadequação entre as noções aspectuais e a definição proposta, o que nos faz pensar se a
palavra aspecto aqui foi usada no sentido indicado na definição ou naquela acepção
descompromissada que encontramos na maioria das gramáticas.
Podemos ver, na gramática em questão, a preocupação de incorporar de forma
explícita a categoria de aspecto no estudo dos verbos. Mas o resultado ainda está longe de
deixar claro o que significa aspecto verbal, em função da falta de clareza com que é definida a
categoria e, sobretudo, da inadequação com que são propostas as noções a ela ligadas.
Saindo do âmbito das gramáticas tradicionais, podemos citar o estudo de Travaglia
(1994) sobre aspecto verbal. Fazendo uma distinção básica entre tempo (tempo gramatical) e
TEMPO (tempo real ou cronológico), Travaglia (1994) afirma que a categoria de tempo é
dêitica, uma vez que situa o momento da ocorrência da situação em relação ao momento da
fala; ao passo que o aspecto é uma categoria temporal não-dêitica, pois se refere à situação em
si, sem levar em conta o momento da enunciação.
Travaglia (1994) propõe a seguinte definição para a categoria verbal de aspecto:
Aspecto é uma categoria verbal de tempo não-dêitica,
através da qual se marca a duração da situação e/ou suas
fases, sendo que estas podem ser consideradas sob
diferentes pontos de vista, a saber: o do desenvolvimento, o
do completamento e o da realização da situação
. (p. 38)
Com base nisto, Travaglia apresenta um conjunto de noções aspectuais, que
resumiremos a partir de agora, utilizando, para facilitar a compreensão, os exemplos do
próprio autor.
No que se refere à sua duração, uma situação pode ser durativa, quando seu início e
término ocorrem separados por um período de tempo relativamente longo; ou pontual, quando
seu início e término ocorrem no mesmo instante, ou separado por um período de tempo muito
curto. Vejamos, respectivamente, um exemplo de cada ocorrência:
(01) D. Maria passeia todos os dias.
(02) Salto do trampolim há anos.
Afirma ainda o autor que a situação durativa pode ser apresentada como limitada,
quando se indica o seu início, o seu fim ou o valor da sua duração; ou ilimitada, quando o
início e o fim da situação não são conhecidos nem sugeridos. Eis um exemplo de cada uma
respectivamente:
(03) Ele estava nadando desde 6 horas da manhã.
(04) A terra gira em torno do sol.
Tanto a duração limitada quanto a duração ilimitada podem ser contínuas ou
descontínuas. Serão contínuas, quando se apresentarem sem nenhuma interrupção no seu
tempo de existência. Por outro lado, serão descontínuas as situações que apresentarem
interrupções na sua duração:
(05) A terra gira em torno do sol.
(06) De tempos em tempos explodia uma bomba.
Travaglia propõe ainda que as diferentes fases de uma situação estão relacionadas às
informações referentes à realização, ao desenvolvimento ou à complementação da situação.
Vejamos cada um destes casos.
Do ponto de vista da sua realização, temos três fases da situação:
a) Fase em que a situação ainda não começou. Trata-se de um momento anterior à consecução
da situação.
(07) Pedro está para emoldurar o quadro.
b) Fase em que a situação já é começada.
08) Os rapazes continuam jogando apesar da chuva.
c) Fase em que a situação já terminou.
(09) O treinador do time esteve doente.
Do ponto de vista do seu desenvolvimento, temos também três fases da situação:
a) Início - A situação é apresentada como estando em seu ponto de início, ou em seus
primeiros momentos. A esta noção aspectual dá-se o nome de inceptividade ou incepção.
(10) Os marceneiros estão começando a armar o telhado.
b) Meio - A situação é apresentada em andamento. Essa noção é caracterizada pelo termo
cursividade.
(11) Estou lendo um livro muito interessante.
c) Fim - A situação é apresentada em seu ponto terminal. Trata-se da noção aspectual de
terminatividade.
(12) Mamãe terminou de bordar minha blusa hoje ao meio-dia.
Travaglia (Op.cit) ainda observa a situação do ponto de vista do seu complemento.
Assim uma situação pode ser:
a) Completa - A situação é apresentada em sua totalidade, com seu começo, meio e fim
englobados num todo. De acordo com Travaglia, esta é a noção aspectual de perfectividade.
(13) Antônio ouviu música o dia todo.
b) Incompleta - Quando a situação não apresenta uma das fases do seu desenvolvimento.
Temos aqui a noção aspectual de imperfectividade.
(14) Ele estava nadando desde seis horas.
Registrando o fato de que pode ocorrer uma não atualização de aspecto quando a
situação não apresenta referências à sua duração ou às suas fases, Travaglia propõe um quadro
bastante completo das noções aspectuais no português:
Martelotta (1986) propõe que o trabalho de Travaglia, embora bastante completo, não
se mostra eficiente quando aplicado à realidade da língua falada, que o autor parece estar
mais preocupado em adaptar a teoria tradicional dos aspectos à realidade lingüística do que, a
partir de dados reais, questionar as hipóteses tradicionais.
Em função disso, Martelotta (1986) optou por uma proposta mais voltada para o uso
da língua, observando, em seu estudo sobre o presente do indicativo, a relação entre uma série
de propriedades semântico-gramaticais que se associavam às formas verbais por ele
analisadas de acordo com o tipo de discurso em que essas formas verbais ocorriam. Muitas
dessas propriedades estão associadas às noções aspectuais propostas por Travaglia, mas
diferem dessas noções por se apresentarem de modo a refletir a gica organizacional do
texto.
2.8 A formação de advérbios em -mente
Analisando a origem dos advérbios, verificamos que, dos advérbios latinos, a sua
maioria foi originada, de nomes ou pronomes e poucos passaram às línguas românicas.
Enriqueceram-se estas, todavia, com algumas formas oriundas de formações desconhecidas
do latim literário, com grande produtividade e, em especial, com os advérbios em -mente que
se afixam aos adjetivos. Esta terminação nada mais é do que o ablativo do latim mens, v.g. em
bona mente. Com o uso de locuções deste tipo formaram outros tipos, acabado por alterar a
significação primitiva do substantivo mente e passando assumir o valor de um sufixo
derivativo.
O substantivo latino mens, mentis (“mente, alma, espírito, inteligência”) modificado
por um adjetivo refletia o estado de ânimo ou o modo na qual à ação verbal se levava em
consideração. Com passar do tempo, o substantivo foi assimilado a este tipo de estrutura
sintática e semântica e acabou por perder o seu valor original para se converter num sufixo
adverbial. Esta estrutura morfológica (base + mente) é muito produtiva na criação de
advérbios. No levantamento dos dados dos corpora selecionados, verificamos que esse sufixo
é muito produtivo, mesmo nos primórdios da língua, principalmente com as noções de modo,
de qualificador e modalizador. Vejamos alguns exemplos dos corpora estudados:
(1) ... posto que seyam muy grauemete enfermos.(OE, p.47)
(2)... taaes como estes presume no dignamete etender e achar dulçura(OE,p.48)
(3)
P
rimeiramente salvanayque, regedor que agora he, tem de remda hu~u conto e cem mil
pardaos d ouro, este he senhor de charama~odel, e de nagapata~o, e tamgor, e bomgarim, e
dapata~o, e do truguel, e de caullim, e todas estas sa~o cidades (Século XVI/Crônica dos Reis
de Bisnaga)
(4)... por ignorar o motivo se será para falta desaude, ou qualquer acontecimento que
lhesucedese, oque infinitamente sentirey como amigo [ espaço]igualmente tenho sentido
afalta daremeça dadita patente ejulgo omotivo por haver algum embaraço nasecretaría, pois
pela demora que tem havido ja mequerem puxar para ojugo dos auxiliarez os quaes são
bastantemente incomodados(
século XVIII - administração privada/carta de comércio/ PHPB)
(5)... assim cumpri com a Comissão que a minha Bemfeitora (a quem pesso Beijes as mãos
em meu nome) me incumbio, cum prindo igualmente com a comissão da Rainha (Cartas do
PHPB - RJ / séc. XIX)
(6) Deus simplesmente não age assim. Deus é santo - moralmente perfeito. (EC,p.45, Port.
atual)
(7) Jesus era inicialmente homem, depois se tornou Deus. (EC,p.63, Port. atual)
Nos exemplos expostos, observamos as diversas formações derivativas dos advérbios
em -mente (grave+ mente, digna+ mente, primeira+ mente, infinita+ mente, igual+ mente,
bastante+ mente, simples+ mente, moral+ mente e inicial+ mente), além de sua produtividade
e usualidade com as acepções de modo, qualificador, modalizador e temporal, este último não
tanto quanto as noções anteriores.
É interessante acrescentar, ainda, sobre a formação dos advérbios que outros autores,
como Vilela (1979), apresenta-nos algumas considerações acerca dessa categoria gramatical:
o léxico constitui-se de um conjunto de unidades léxicas (palavras lexicais, lexemáticas,
lexemas), ou seja, unidades que representam a realidade extralingüística e que pertencem
tanto à semântica como também à gramática da língua.
Tendo em vista que palavras lexicais concretas contêm, além do valor lexical, uma
significação categorial, o autor considera tais palavras as unidades fundamentais do léxico de
uma língua. Estes podem ser ampliados principalmente através de dois processos: a derivação
e a composição.
A derivação é o processo de formação vocabular em que ocorre a adição de afixos
(prefixos e sufixos) a uma base ou radical e a composição é o recurso de enriquecimento
vocabular que se pela união de dois ou mais radicais, que formam um vocábulo cujo
significado não precisa ser necessariamente a soma dos significados de cada radical. Vale
ressaltar que na composição os vocábulos estabelecem entre si relações sintáticas de
subordinação e/ou coordenação (Cf. Carone (1988).
Vejamos os exemplos:
(8) porta-bandeira, aguardente (subordinação);
(9) vaivém, leva-e-traz (coordenação).
Apesar de serem processos diferentes, derivação e composição não se excluem, o que
será ilustrado a seguir com o vocábulo em -mente.
Os estudos históricos apontavam para o advérbio como um elemento modificador.
Pereira (1932), remontando a Aristóteles, afirma que os advérbios formavam, juntamente com
as preposições e as conjunções, uma das quatro partes do discurso (a quarta era as
interjeições), porém apenas sob o rótulo de “conjunções”.
Mais tarde, os gramáticos gregos de Alexandria redividiram as partes do discurso,
desdobrando as “conjunções” em três categorias: as conjunções propriamente ditas, as
preposições e os advérbios. O autor divide o estudo das categorias gramaticais em lexical ou
taxionômico e sintático ou gico. No primeiro, expressa a idéia geral da categoria e o
segundo a sua função na frase. Neste ponto, o gramático não difere dos outros estudiosos
quanto ao conceito e função dos advérbios.
Pereira (1932) afirma ainda que os advérbios, do tipo que estamos chamando de
qualitativo, formam uma categoria que se assemelha à do adjetivo devido à idéia de
qualificação que o advérbio apresenta. Diz, também, o autor que o processo de formação de
advérbios em -mente a partir de adjetivos é recente e desenvolveu-se no português e em outras
línguas românicas ocidentais. O processo consistiu na aglutinação do adjetivo ao substantivo
feminino mente. A expressão era escrita separadamente desde o latim, entretanto, diz Pereira,
que os dois elementos se uniram na escrita por força da pronúncia e o substantivo -mente,
antes palavra autônoma, passou a ser interpretado como sufixo adverbial, como o vemos nos
dias de hoje e, também, no português arcaico. Mas, segundo Martelotta, Barbosa & Leitão
(2002b), a variação entre a grafia separada ou junta, encontrada no português arcaico, deve ser
interpretada com precaução, pois antes de constituir um processo de gramaticalização, pode
ser apenas opção adotada na impressão gráfica:
Entretanto, não podemos esquecer que não
dependemos da fidedignidade da edição para sabermos se
as palavras estavam de fato juntas no original, mas
também que, mesmo nos manuscritos, muitas vezes a
união, ou separação, entre vocábulos poderia ser usada
para se justificar a mancha gráfica na página. Desse
modo, devemos tomar cuidado ao relacionar a escrita
separada/junta dos elementos com sua gramaticalização,
pois o controle estatístico pode revelar o real avanço
da grafia dos advérbios em -mente como um único
vocábulo.
Pereira (1932.) classifica os advérbios de forma semelhante à que fazem os outros
autores: de acordo com as circunstâncias de afirmação, dúvida, negação, lugar, tempo,
quantidade, modo, ordem, designação, etc.
Carneiro Ribeiro, em seu livro Serões Grammaticaes (1956: 362), faz também uma
analogia entre advérbios e adjetivos: É este elemento do discurso uma espécie de adjectivo,
que tem por função característica modificar os adjectivos, os verbos e qualquer palavra de
sentido atributivo. Modifica-os, como o adjectivo modifica os substantivos”.
O autor continua sua análise observando que o advérbio pode se referir a um
substantivo quando este possui um sentido atributivo. Ele cita o seguinte exemplo: “Deus é
verdadeiramente pai” (1956:363). Nesse caso, de acordo com o autor, o valor semântico do
substantivo equivale ao de um adjetivo. Em suas palavras, o advérbio é “attributo de
attributo”.
Carneiro Ribeiro (1956) afirma que os advérbios são invariáveis e este fato, ao
contrário do que pensam outros autores, torna esses elementos ainda mais semelhantes aos
adjetivos. Segundo ele, os adjetivos expressam conceitos abstratos que, por sua própria
natureza, não são passíveis de variações. O que ocorre é que os adjetivos adéquam em gênero
e número aos substantivos que acompanham apenas por uma questão de sonoridade. Carneiro
Ribeiro diz, ainda, que os advérbios expressam de forma mais resumida e eficiente alguns
pensamentos que, se ditos de outro modo, tornariam a linguagem mais lenta e prolixa. Nesse
sentido, podemos entender que os advérbios contribuem para o princípio de economia
lingüística.
O autor propõe a seguinte classificação para os advérbios: advérbio de lugar, advérbio
de tempo, advérbio de quantidade e advérbio de qualidade ou modo.
No que concerne aos advérbios em -mente, o autor trata de sua formação, qual seja:
este sufixo liga-se, de um modo geral, ao adjetivo no feminino, quando houver duas formas.
Diz, ainda, que alguns advérbios podem ter seus sentidos intensificados, tanto por outros
advérbios quanto por uso no superlativo. Cita como exemplos: “mais docemente, muito
ternamente, bellissimamente,”etc.
Said Ali, em sua Gramática Histórica da Língua Portuguesa (1964: 183), define os
elementos adverbiais como se segue:
O advérbio é um vocábulo determinativo do verbo, do
adjetivo ou de outro advérbio. Acrescenta a outras
palavras o conceito de tempo, lugar, modo, etc. que lhes
delimita ou esclarece o sentido, sem, contudo exercer,
como o acusativo, o dativo e o objeto indireto
circunstancial, função puramente complementar.
Esse autor faz uma análise etimológica de alguns advérbios. Entretanto, em relação
aos advérbios em -mente, apenas afirma que são criações novas nas línguas românicas, i.e.,
não encontradas no latim literário, formadas a partir de adjetivos (Cf. p.183).
Semanticamente, Said Ali (op. cit.) equipara as locuções adverbiais aos advérbios em -
mente afirmando que as primeiras se distinguem destes somente porque são mais longas e
os seguintes exemplos: com prudência = prudentemente, com energia = energicamente, com
brandura = brandamente.
O autor esclarece que esses elementos são classificados de acordo com a semântica de
cada um, dividindo-se em tempo, lugar, modo, negação, afirmação, dúvida, quantidade e
ordem, e expressam circunstâncias definidas ou noções de grau (aumento ou diminuição).
Como se pode notar, as gramáticas históricas tratam bastante superficialmente o tema
em questão. Seus autores não conseguiram definir de maneira mais eficiente o advérbio e nem
observaram mais atentamente outras características que esses elementos apresentariam.
3 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS
Esta tese de doutorado baseia-se em princípios funcionalistas, partindo, portanto, de
que a gramática das línguas se constrói a partir do discurso, ou seja, do uso real, concreto da
língua.
Este capítulo consiste em expor alguns pressupostos da linha funcionalista que foram
importantes para minha análise, sobretudo aqueles relacionados à gramaticalização, à
polissemia, ao conhecimento da relação entre gramaticalização e grau de encaixamento entre
cláusulas, e entre gramaticalização e ordenação. Também apresento uma pesquisa sobre a
ordenação de adverbiais (Votre & Santos, 1984), um estudo sobre a natureza da estrutura da
linguagem humana e sua categorização, assim como a classificação semântica de verbos
proposta por Halliday, 1994.
3.1 Os princípios funcionalistas
A teoria funcionalista concebe a linguagem como um instrumento de interação social e
analisa a estrutura gramatical no seu contexto discursivo a fim de investigar as motivações
para explicá-la, compreendendo que as diferentes formas que um elemento incorpora no
discurso não são meramente estilísticas, mas influenciadas por funções informacionais e
pragmáticas. Por conseguinte, uma relação entre forma e função, conforme o Princípio da
Iconicidade, que é definido como a correlação entre o código lingüístico (forma) e o seu
conteúdo (função).
A corrente funcionalista vem estudando com muita profundidade o processo da
Gramaticalização ocorre quando certas construções lingüísticas sofrem transformações ao
longo do tempo, assumindo outras funções mais gramaticais e tornando-se mais fixos e
regulares no discurso. Essa mudança se dá unidirecionalmente: do discurso para a gramática e
não vice-versa. Várias trajetórias foram traçadas para ilustrar esse caráter unidirecional:
vocábulo>morfema, verbo pleno>verbo auxiliar, advérbio>conectivo, dentre outras. Por
exemplo, o vocábulo mente passou a desempenhar a função de um morfema gramatical, ou
seja, passou a ser um sufixo, formador de advérbio, como a locução em boa hora que se
tornou a conjunção concessiva embora: em boa hora>embora. O foco do nosso trabalho não é
a gramaticalização do substantivo em -mente para sufixo, uma vez que no português arcaico
essa gramaticalização já estava consolidada.
Outra pesquisa que relaciona os termos da oração e a posição do advérbio é a de
Votre & Santos (1984), que trata da investigação de fatores sintáticos, semânticos e
discursivos que influenciam a colocação dos constituintes de natureza adverbial na sentença.
O corpus examinado é formado por redações e entrevistas de alunos da 8ª série.
Os autores partem da seguinte hipótese geral a qual também é à base da nossa
pesquisa:
Os advérbios são constituintes móveis, embora com
tendências bem definidas por determinadas posições
sintáticas. (...) a posição ocupada por cada advérbio é
função da atuação conjunta de diferentes fatores
estruturais e não-estruturais, que cabe identificar e
avaliar(1984:83).
Votre & Santos analisaram 4 posições dos adverbiais, a saber: início da sentença
(posição 1); fim da sentença (posição 4); entre o sujeito e o verbo (posição 2); e entre o verbo
e o complemento (posição3), exemplificadas abaixo:
[Ontem], o ministro [ontem] seguiu [ontem] para Nova York [ontem].
1 2 3 4
Os fatores, a seguir, foram observados através de uma análise quantitativa: a) tipo
semântico do advérbio (tempo, lugar, modo, etc.); b) nível do vínculo semântico do advérbio
(com sentença ou com o verbo); c) tipo sintático do verbo (regência do verbo) ou tipo de
complemento (oracional, objeto direto, objeto indireto); d) constituição morfológica do
advérbio (advérbios oracionais, locucionais, nominais, etc.); e) peso do advérbio (breve ou
longo); e f) tipo do sujeito (oração sem sujeito, oração com sujeito vazio, etc.).
Apresentaremos algumas das hipóteses dos autores referentes a esses fatores:
1) Quanto mais vinculado semanticamente ao verbo, mais próximo desse o verbo estaria.
Todavia, o advérbio vinculado ao nível mais alto da sentença estaria mais livre, podendo se
movimentar para o início da sentença, por exemplo;
2) No que se refere ao tipo de vínculo do sujeito com o verbo. Quanto mais fraco for, mais
favorecerá a inserção de um advérbio entre o sujeito e o verbo. Assim, um verbo de ligação
enfraqueceria o vínculo entre sujeito e verbo, permitindo a colocação de advérbio no meio
deles;
3) No que concerne ao peso do advérbio, a expectativa era a de que os adverbiais breves
(menores) ocorressem nas posições internas e os longos (maiores) nas posições externas,
predominando na posição final;
4) A última hipótese refere-se ao tipo de sujeito. Esperava-se que em orações sem sujeito ou
com sujeito vazio, o adverbial tendesse a ocupar a posição inicial, típica do sujeito. Teríamos
assim uma espécie de arranjo de balanceamento (Votre & Santos op. Cit.,. p. 85).
Os resultados mais relevantes desse estudo são arrolados a seguir: para a colocação do
advérbio nominal na posição 1, contribuíram os fatores referentes ao nível do vínculo
semântico do advérbio (advérbio vinculado à sentença), ao tipo semântico de advérbio
(advérbio de tempo e de opinião) e ao tipo de complemento do verbo (complemento
oracional).
A colocação do advérbio na posição 2, entre o sujeito e o verbo, foi motivada pelo
nível de vínculo semântico do advérbio (advérbio vinculado ao verbo) e pelo tipo semântico
de advérbio (advérbio de tempo e freqüência).
A ordenação do advérbio nominal na posição 3, entre verbo e complemento, deve-se
ao nível do vínculo semântico do advérbio (advérbio vinculado ao verbo), ao tipo semântico
de advérbio (advérbio de intensidade) e ao tipo de complemento (objeto indireto).
Por fim, a colocação do advérbio nominal na posição 4 da sentença foi influenciada
pelo nível do vínculo semântico do advérbio (advérbio vinculado ao verbo), pelo tipo
semântico de advérbio (advérbio de modo e de lugar) e pelo tipo de complemento (não
complemento).
Pretendemos, assim como Votre & Santos, identificar fatores que motivem a
colocação dos advérbios de tempo e aspecto em -mente na cláusula. Dentre eles,
identificaremos a estrutura sintática da oração para verificar se a posição vazia de um
argumento (sujeito ou complemento) tende a ser preenchida com o advérbio.
3.2 Gramaticalização e Níveis de Encaixamento entre Cláusulas
Segundo Hopper & Traugott (2003), os períodos compostos fundamentam-se em um
conjunto de estruturas com diferentes níveis de encaixamento, que vão das menos
gramaticalizadas (menos encaixadas) às mais gramaticalizadas (mais encaixadas):
a) Estruturas Paratáticas possuem independência relativa, ou seja, restrita apenas
pela pragmática (fazer sentido e ser relevante). São as cláusulas justapostas, as principais e as
coordenadas.
b) Estruturas Hipotáticas ou Interdependentes são aquelas em que um núcleo e
uma ou mais cláusulas que são relativamente dependentes (não se incluem em nenhum
constituinte do núcleo, mas não podem ficar “soltas”). São as subordinadas adverbiais e as
adjetivas explicativas.
c) Estruturas Subordinadas ou Encaixadas são as que possuem uma margem
completamente incluída no núcleo e que, portanto, têm dependência completa. São as
subordinadas substantivas e as adjetivas restritivas.
Essas estruturas podem ser representadas através de uma trajetória de
gramaticalização: parataxe hipotaxe subordinação.
De acordo com essa trajetória, as cláusulas paratáticas são menos gramaticalizadas,
isto é, revelam menor grau de dependência semântica e encaixamento que as hipotáticas (que
exibem maior grau de dependência e nível intermediário de encaixamento), que, por sua vez,
são menos gramaticalizadas que as subordinadas (que apresentam maior grau de dependência
e de encaixamento). Segundo Givón (1990), a redução da cláusula subordinada à cláusula
reduzida revela níveis ainda maiores de encaixamento entre cláusula principal e subordinada,
além de exprimir concretamente um dos subprincípios relacionados ao conceito de
iconicidade: o da proximidade. Esse subprincípio trata da relação de correspondência entre
sintaxe e semântica. Na complementação verbal, isso implica dizer que o nível de integração
sintática entre as cláusulas não é arbitrário e sim um reflexo do nível de integração semântica
entre o evento da principal e o da subordinada, ou seja, quanto mais integrados esses eventos
no plano semântico, mais integradas estarão as estruturas que os expressam.
Givón concluiu que, quanto mais encaixada uma oração, mais gramaticalizada ela é.
Estendendo a conclusão do autor, depreendemos que o grau de gramaticalização da cláusula
em que os advérbios em -mente aparecem interfere na colocação desses advérbios, conforme
procuraremos atestar nessa pesquisa.
3.3 Gramaticalização e estrutura sintática
De acordo com Givón (1979), a maior liberdade e variedade de elementos significativos
tendem a ocorrer na cláusula principal, declarativa, afirmativa, ativa. Mas, por outro lado,
tanto no que se refere a itens lexicais quanto a construções sintáticas, a distribuição dos
elementos significativos, em todos os outros tipos de cláusula, é sempre mais restrita.
Isso acontece devido ao uso do fenômeno da pressuposição discursiva, ou seja, o grau
de pressuposicionalidade no qual uma sentença é usada, que, por sua vez, está relacionado ao
nível de dificuldade que o falante considera como obstáculo para o ouvinte em determinar
uma única referência no discurso. E, segundo Givón (1979), a cláusula principal, declarativa,
afirmativa, ativa apresenta a complexidade pressuposicional mais baixa no discurso, se
comparada a todos as outras variantes sintáticas.
Givón (1979) nos mostra várias propriedades formais dessas variantes sintáticas, em
relação ao seu grau de pressuposicionalidade, a saber:
1- Variantes mais pressuposicionais exibem maior complexidade sintática.
2- Variantes mais pressuposicionais apresentam maiores restrições distribucionais do
que os padrões neutros.
3- Variantes mais pressuposicionais são gramaticalizadas mais tarde por crianças, ou
pelo menos sua sintaxe é adquirida mais tarde do que as variantes menos
pressuposicionais.
4- Variantes mais pressuposicionais freqüentemente tendem a exibir grande
conservadorismo sintático, mais comumente na área da mudança de ordenação.
5- A cláusula principal declarativa, afirmativa, ativa, neutra e menos pressuposicional
e também a mais freqüente no discurso.
Das propriedades propostas, as que podemos considerar na nossa pesquisa são os itens
1, 2 e 4, que se propõe aqui que as cláusulas gramaticalizadas, e, portanto, mais restritas
distribucionalmente e mais complexas sintaticamente, tendem a ser mais conservadoras.
3.4 As pressuposições discursivas das construções sintáticas
O sentido de pressuposição está sendo compreendido aqui como um conjunto de
informações que estão fora da sentença e que são assumidas pelo falante como evidentes ou
indiscutíveis, ou seja, aquilo que é pressuposto tende a refletir conhecimentos compartilhados,
crenças comuns ou conhecimento presumido como conhecido.
Neste trabalho, não adotamos a distinção entre pressuposição gica e pressuposição
pragmática, que parte do princípio de que todo fenômeno pressuposicional nas línguas
naturais é pragmático. Assim, segundo Givón (1979), o fenômeno da pressuposição,
relaciona-se com: as hipóteses que o falante assume acerca da habilidade do ouvinte de
identificar unificadamente (‘estabelecer uma única referência para’) um argumento-
referente.” (p. 50)
Diante disso, Givón (1979) mostra as variantes sintáticas que se caracterizam por maior
grau de pressuposicionalidade:
a) Construções estritamente pressuposicionais. Cláusulas relativas, clivadas, pseudo-clivadas
e perguntas QU.
b) Cláusulas encaixadas.
c) Outros atos de fala. Imperativo, interrogativo e negativo.
d) Construções envolvendo graus de definitude-topicalidade dos argumentos.
e) Mudança de tópico, passiva, pronomes anafóricos e outros.
Segundo Givón, essas construções apresentam ordenação mais conservadora dos
elementos argumentais. Mas podemos estender esse pensamento para as características de
ordenação de elementos adverbiais. De fato, como foi mencionado, o nível de
encaixamento ou gramaticalização da cláusula tem influência sobre as tendências de
ordenação de advérbios de tempo e aspecto em -mente.
A fase arcaica do português é caracterizada por uma variação na colocação dos
advérbios, ou seja, apresenta advérbios em -mente nas posições pré e pós-verbais em todos os
tipos de cláusulas, apresentando uma pequena predominância de anteposição nas cláusulas
mais gramaticalizadas. A partir disso, podemos depreender que esses parâmetros de
pressuposicionalidade podem nos auxiliar na descrição de mudanças no comportamento
diacrônico desses elementos em relação a sua ordenação.
3.5 Classificações dos verbos, baseada em Halliday (1994)
O tipo semântico do verbo é um dos fatores considerados neste trabalho para entender
a posição dos advérbios de tempo e de aspecto em -mente, pois trabalhos anteriores, como
Scheibman (2001), Bybee (2003) e Andrade (2005), detectaram que era necessário investigar
se o tipo de verbo poderia influenciar na cláusula de alguma forma no caso de Scheibman
(2001), o tipo de verbo foi usado para se perceber a subjetividade nas relações entre o sujeito
e o verbo; no de Bybee (2003), foi utilizado para perceber a influência na gramaticalização do
verbo can do inglês, e, por fim, no caso de Andrade (2005), o tipo de verbo foi utilizado para
detectar a ordenação de locuções adverbiais temporais.
Sendo assim, consideramos esse fator importante para tentar definir uma motivação
semântica da posição dos advérbios de tempo e de aspecto em -mente. Para isso, utilizamos a
classificação de Halliday (1994), também utilizada em Scheibman (2001) e Andrade (2005).
Nossa hipótese é que determinado verbo acompanhado do advérbio temporal, com a
repetição de uso, possa fixar os advérbios de tempo e de aspecto em -mente numa dada
posição, conforme Bybee (2003). Essa autora conhece a importância da repetição,
caracterizando-a como um processo pelo qual seqüências de palavras ou morfemas
freqüentemente usados tornam-se automáticos como uma única unidade de processamento.
Acreditamos também que determinado tipo semântico do advérbio ocorra com um
determinado tipo semântico do verbo.
Embora haja rias classificações de verbos, trabalharemos com a classificação de
Halliday (1994), por ser um lingüista funcionalista. Segundo esse autor, a oração também
desempenha o papel de modelar a experiência, isto é, representa padrões da experiência. Os
seres humanos, através da linguagem, constroem um quadro mental da realidade e este é
criada por processos.
A oração é um modo de ação, um modo de dar e receber bens e serviços como também
informações. Ela é um modo de reflexão, um modo de impor ordem na variação e no fluxo do
sistema gramatical de transitividade. Esse sistema constrói o mundo a partir da experiência
por meio de conjunto de tipos de processos que estão relacionados à nossa experiência
exterior (ligada ao mundo que nos cerca, como eventos, ações etc.) e à nossa experiência
interior (ligada à consciência, à imaginação, como reflexão, etc.( Halliday,1994:106).
De acordo com o autor, o modelo proposto de representação de experiência,
interpretado no sistema gramatical de transitividade, é um contínuo circular.
Ele afirma que um processo é constituído de três componentes para a interpretação da
nossa experiência do que acontece: a) o próprio processo; b) os participantes no processo; e c)
circunstâncias associadas com o processo (são opcionais).
Esses três conceitos são categorias semânticas que explicam como fenômenos do
mundo real são representados em figuras lingüísticas.
O autor discorre sobre os principais processos no sistema de transitividade da língua
inglesa:
Os processos materiais (processes of doing) estão relacionados ao mundo físico, à
experiência exterior. São processos ‘do fazerque expressam a noção de que uma entidade
‘faz’ alguma coisa que pode ser feita ‘para’ outra entidade. Portanto, esse processo tem um
ator obrigatório e um alvo (goal) opcional. Para Halliday, o termo ator refere-se àquele que
realiza o efeito, já o termo alvo refere-se a alguém para o qual o processo é estendido.
Vejamos um exemplo: The lion[ator] caught[processo] the tourist [alvo] ( O leão pegou o
turista.);
Os processos mentais (processes of sensing) referem-se ao mundo da consciência, à
experiência interior. Para conhecer esses processos, o autor abandona a noção semântica de
ator e alvo (goal) e agrupa as orações que expressam sentimentos (affection), pensamentos
(cognition) e percepção (perceptin) nesse tipo de processo.
O autor acrescenta que os participantes envolvidos nos processos mentais que são
experenciados (senser) a um fenômeno (phenomenon). O primeiro é o ser consciente que
sente, pensa e percebe, o segundo é aquilo que é sentido, pensado ou percebido. Desse
modo, um dos participantes é dotado de consciência, o outro pode ser uma ‘coisa’ ou um fato
(entendido como um metafenômeno, isto é, alguma coisa que é construída como um
participante por projeção).
Obtivemos: Mary [experenciadora dotado de consciência] liked [processo] the gift
[fenômeno/coisa] (Maria gostou do presente). Ou Mary [experenciador dotado de
consciência] was pleased [processo] that she’d got a present [fenômeno/fato] (Maria estava
contente que ganhou um presente);
Os processos relacionais (processes of being) estão ligados ao mundo das abstrações.
Relacionam fragmentos da experiência, classificando-os e identificando-os. Esses processos
estabelecem uma relação entre duas entidades separadas. Uma entidade ‘a’ pode atribuir algo
a uma entidade ‘x’ ou pode identificar uma entidade ‘x’. Sendo assim, subdividem-se em:
Relacionais Intensivos: associados ao mundo das abstrações estabelecem uma relação entre
duas entidades separadas, atribuindo alguma característica a elas; Relacionais Possessivos:
associados ao mundo das abstrações estabelecem uma relação entre duas entidades separadas,
identificando-as ou atribuindo posse de algo ou alguma coisa a elas, e Relacionais
Circunstanciais: associados ao mundo das abstrações estabelecem uma relação entre duas
entidades separadas, identificando-as ou atribuindo alguma circunstância a elas.
O sistema do inglês opera com três tipos principais de construções: a) intensiva
(equativa): ‘x is a ‘ (x é/está a). Ex.: Sarah is wise. (Sara é sábia); b) circunstancial: ‘x is at a’
(em que ‘is at’ pode ser ‘is at, in, on, for, with, about, along, etc.’). c) possessive: (x está em a
). Ex.: Peter has a piano. (Pedro tem um piano)
Na fronteira desses principais processos, outros processos que compartilham
algumas das características daqueles, como:
Os processos comportamentais manifestam os processos de consciência e os estados
fisiológicos. Esses processos são tipicamente de natureza humana, uma vez que se constituem
por comportamentos psicológicos e fisiológicos como respirar, tossir, sorrir, sonhar dentre
outros. Suas características não são claramente definidas, que estão na fronteira entre os
processos materiais e mentais. Um participante é tipicamente um ser consciente, denominado
Behaver. Vejamos o exemplo: No-one[Behaver] is listening [processo]. (Ninguém está
ouvindo);
Os processos verbais expressam relações simbólicas, construídas na consciência
humana, através da linguagem. São processos de ‘dizer’, como em “- O que você disse? -Eu
disse que está barulhento aqui.” No entanto, ‘dizer’ aqui, é interpretado em um sentido amplo,
expressando qualquer tipo de troca simbólica de significado. O participante, nesses processos,
não precisa ser consciente. Esse é denominado Sayer(aquele/aquilo que diz). Eis alguns
exemplos: the notice ( sayer) tells you to keep quiet e my watch (sayer) says it’s half past
ten.(O aviso diz para ficarmos em silêncio e meu relógio diz que são dez e meia,
respectivamente).
Há outras funções de participantes além da do ‘sayer’: ‘Receiver’ (aquele para o qual a
fala é direcionada), Verbiage (o que é dito), Target (a entidade que é objetivada pelo
processo de ‘dizer’). Observemos: She [sayer] praised [processo] him [target] to her friends
[receiver] (Ela elogiou para os amigos dela) ou I [sayer] ordered [processo] a steak
[verbiage] (Eu pedí um bife);
Os processos existenciais detonam a existência, o acontecer. Representam que
alguma coisa existe ou acontece. O elemento que é dito existir é chamado de Existent’. A
princípio, pode existir qualquer tipo de fenômeno que possa ser construído como alguma
‘coisa’: pessoa, objeto, instituição, abstração. Também pode existir uma ação ou um evento.
Freqüentemente, uma oração existencial contém um elemento circunstancial distinto de tempo
ou lugar. Analisemos: There is [processo] a man [existente] at the door [circunstância] (Há
um homem na porta).
O lingüista ainda menciona mais um tipo de processo: os processos meteorológicos
que se encontram na fronteira entre os processos existenciais e materiais. Alguns são
construídos como processos materiais: The wind’s blowing ( o vento está soprando); alguns
como processos existenciais: There was a storm (houve uma tempestade); alguns como
relacionais: it’s cold ( está frio); e alguns sem participantes, constituindo-se apenas pelo
processo: it’s raining ( está chovendo).
Usamos essa classificação na análise dos verbos presentes nas cláusulas com
advérbios de tempo e aspecto em -mente, considerando o tipo semântico do verbo como um
fator possível de motivar a ordem desses advérbios. Esse fator se mostrou relevante na
pesquisa de Andrade (2005) e na de Albani (2007) com relação ao uso de locuções temporais
e aspectuais e do uso do advérbio sempre, respectivamente.
4 METODOLOGIA
A corrente funcionalista prima por uma análise do uso da língua, portanto, torna-se
necessário o estudo de dados reais, isto é, dados (da língua oral ou escrita) produzidos pelos
usuários da língua em contexto de comunicação.
Como mencionado, o presente estudo objetiva-se à análise da ordenação dos
advérbios de tempo e aspecto terminados em -mente sob a perspectiva funcionalista na
modalidade escrita.
Este trabalho, por um lado, utiliza metodologia quantitativa na análise dos advérbios
de tempo e de aspecto em -mente que apresentam diferentes possibilidades de colocação na
frase, mas são aparentemente estáveis no que se refere a seu status semântico. Por outro lado,
também se realizou a uma análise qualitativa que visa observar algumas mudanças semânticas
e, em alguns casos, também sintática, percorrida por certos usos adverbiais.
A pesquisa seguiu as seguintes etapas: levantamento das ocorrências de advérbios em -
mente com algum traço de sentido de tempo e/ou aspecto, nos textos selecionados de
diferentes épocas; classificação dos advérbios, levando-se em consideração o contexto de
cada ocorrência, sua função, posição, etc. (de acordo com os critérios arrolados abaixo);
análise quantitativa e qualitativa das ocorrências dos advérbios de tempo e aspecto; paralelo
entre os resultados das diferentes sincronias; conclusões. O confronto dos dados de diferentes
estágios da língua favoreceu uma visão mais ampla e, conseqüentemente, uma análise mais
abrangente dos possíveis processos de mudança.
Para se observar em diferentes possibilidades de ordenação dos advérbios de tempo e
de aspecto em -mente, foram levados em consideração alguns fatores na classificação e análise
desses elementos, a saber: a ordem, a noção semântica expressa pelo advérbio (aspectual,
cronológico e híbrido); grau de gramaticalização da cláusula em que os advérbios de tempo e
aspecto em -mente se inserem (se mais ou menos gramaticalizada); e tipos de verbos a que
esses se associam, segundo Halliday (1994) e outros, que serão explicitados mais a frente.
4.1 Corpus
Em conformidade com os pressupostos teóricos da teoria funcionalista, os dados
utilizados para a análise da ordenação dos advérbios de tempo e aspecto terminados em -
mente foram extraídos de textos de diferentes gêneros textuais do português arcaico, dos
séculos XVI, XVII, XVIII, XIX e do português atual.
Os materiais constituintes da amostra e os procedimentos teórico-metodológicos
realizados, assim como o controle dos aspectos e fatores que influenciam na ordenação dos
advérbios em -mente, são apresentados e discutidos ao longo desse trabalho.
É importante ressaltar a complexidade que envolve a tarefa de se selecionar textos,
considerando-se um recorte histórico tão amplo. A complexidade dá-se, por um lado, pelo
fato de que esses textos precisam partilhar, ainda que minimamente, características que
permitam que sejam estabelecidas comparações entre os resultados dos dados neles
levantados, sem que haja distorções; por outro lado, pelo leque tão reduzido de opções de
textos de fontes confiáveis, que diminui as possibilidades de escolha.
Sendo assim, como não foi possível analisar exatamente os mesmos tipos de textos em
todas as épocas, foi seguido um roteiro, juntando diferentes tipos textuais, mas mantendo uma
certa coerência na sua distribuição pelos diferentes momentos sincrônicos analisados.
Chegou-se, então, aos seguintes corpora:
a) português arcaico: Testamento de Dom Afonso II; O Orto do Esposo (OE), de Maller
(1956) e Castelo Perigoso(todos esses textos estão disponíveis no site do corpus
informatizado do Português medieval(http://cipm.fcsh.unl.pt/gencontent.jsp?id=4). Esse
corpus (CIPM) foi criado em 1993 e inclui textos latino-romances do século IX ao século XII
e textos portugueses do século XII ao século XVI.
b) português do século XVI: Crônica dos Reis de Bisnaga; Cartas de D.João: são 372 cartas
de D. João III, rei de Portugal, do período entre 13 de outubro de 1523 e 20 de fevereiro de
1557, que também foram extraídas do site do corpus informatizado do Português medieval
(http://cipm.fcsh.unl.pt/gencontent.jsp?id=4).
c) português do século XVII: foram oito sermões do Padre Antônio Vieira:
1
o
sermão: Sermão da terceira quarta-feira da quaresma na Capela Real, 1669 (Assunto: um
remédio para os males de todas as cortes do mundo: a consolação dos mal despachados,
baseando-se no pedido indeferido da mãe dos Zebedeus);
2
o
sermão: Sermão da Sexagésima. Pregado na capela Real. Este sermão pregou o Autor no
ano de 1655, vindo da Missão do Maranhão, onde achou as dificuldades que nele se apontam,
as quais vencidas, com novas ordens reais voltaram logo para a mesma Missão.
3
o
sermão: Sermão de quarta-feira de cinza. Em Roma, na Igreja de S. Antônio dos
Portugueses.Ano de 1670.
4
o
sermão: Sermão do Santíssimo Sacramento. Exposto na lgreja de S. Lourenço, In:
Damaso, nos dias do Carnaval Em Roma. Ano de 1674. Traduzido do italiano.
5
o
sermão: Sermão do Nascimento da Virgem Maria. Debaixo da invocação de N. Senhora da
Luz, título da Igreja e colégio da Companhia de Jesus, na cidade de S. Luís do Maranhão. Ano
de 1657.
6
o
sermão: Sermão de S. Inácio, fundador da Companhia de Jesus, em Lisboa, no Real
Colégio de S. Antão, 1669.
7
o
sermão: Sermão do terceiro domingo da quaresma, na Capela Real, 1655.
8
o
sermão: Sermão da quinta-feira quaresma na misericórdia de Lisboa. ANi nF, 1 669
d) português do século XVIII:
Cartas comerciais da administração pública, representações oficiais do Rio de Janeiro, obtidas
no corpus do Museu da Língua Portuguesa - Estação da Luz. Foram analisadas 13 Cartas.
BARBOSA, Afranio & LOPES, Célia Regina et al. Corpus diacrônico do Rio de Janeiro:
cartas pessoais séculos XVIII-XIX. Rio de Janeiro, UFRJ/PIBIC-CNPq/ Labor-Histórico,
2003 (versão eletrônica
)
e) português do século XIX:
Cartas comerciais da administração pública, representações oficiais do Rio de Janeiro, obtidas
no corpus do Museu da Língua Portuguesa - Estação da Luz. Foram analisadas 12 cartas.
BARBOSA, Afranio & LOPES, Célia Regina et al. Corpus diacrônico do Rio de Janeiro:
cartas pessoais séculos XVIII-XIX. Rio de Janeiro, UFRJ/PIBIC-CNPq/ Labor-Histórico,
2003 (versão eletrônica)
f) português atual:
- Tocar o Senhor, Pe. Leo (TS).
-A essência do cristianismo, de J. Berkeley (EC).
4.2 Descrições dos fatores da análise dos advérbios de tempo e aspecto em –mente
Classificamos os dados a partir de alguns fatores que nos pareceram relevantes ao estudo
dos advérbios de tempo e aspecto em -mente. Utilizamos o modo de coleta e codificação da
sociolingüística variacionista (apesar de não estarmos trabalhando com um fenômeno de
variação propriamente dito).
Todos os dados são analisados a partir de fatores, que assim se configuram:
1. Posição/Ordem do advérbio em relação ao verbo
Verificamos a posição do advérbio de tempo e aspecto, se ocorre antes ou depois do
verbo, independentemente da presença ou ausência de algum elemento interveniente como o
sujeito, ou um outro advérbio, uma expressão, uma oração subordinada, etc.
Inicialmente, estabeleceram-se duas posições gerais nas quais os advérbios de tempo e de
aspecto em -mente poderiam ocorrer:
- Antes do verbo:
(1) que Deus constatemente nos fala (Português atual, TS,p.15)
- Depois do verbo:
(2) abramos os corações à luz , para que more perpetuamente neles(Século XVII, Sermão de
Santo Inácio, Pe A.Vieira)
Dessas ordenações gerais, desmembraram-se subposições, vejamos no quadro abaixo:
Quadro 2- Subposições do Advérbios em -mente
Posições Exemplos:
POSIÇÃO 1 (POS1): (ME) margem
esquerda da oração (tudo que estiver no
início de oração ou depois de conjunção).
(3) Constantemente Jesus vem curar-nos
(Português atual, TS, p.28)
POSIÇÂO 2(POS2): entre o sujeito e o
verbo. (o sujeito pode ser SN, pronome ou
pronome relativo)
(4) que Symão Fernandez novamente fez
(séc.XIV, Carta número 147)
POSIÇÂO 3(POS3): não inserido entre o
sujeito e o verbo, mas fora da margem
esquerda da cláusula.
(5) Agora novamente tem sucedido nas
minas hum levantamento que La fizeram
os povos. (século XVIII, Cartas oficiais).
POSIÇÂO 4(POS4): entre o verbo auxiliar
e o verbo principal.
(6) Precisamos urgentemente encontrar
nosso lugar de oração (Português atual,
TS, p.113)
POSIÇÃO 5(POS5): margem direita da
oração (no final da oração).
(7) Cristo continua do lado de fora de
nosso coração, batendo incessantemente
(Português atual, TS, p.39)
POSIÇÃO 6(POS6): inserido entre o
verbo e o complemento/predicativo.
(8) No entanto, ao oferecer
espontaneamente à igreja o produto da
venda (Português atual, TS, p.97)
POSIÇÃO7(POS7): entre o verbo e o
sujeito.
(9) chegou subitamente h~u~u home(m)
nõ conhecido ~ecima dh~u~u Cavallo e
~entrou pello paaço(Português arcaico
OE, 353)
POSIÇÃO 8(POS8): Não inserido entre o
verbo e o sujeito, ou entre o verbo e o
complemento/predicativo, mas fora da
margem direita(ou, seja, no final da
cláusula)
(10) deixamos boas coisas para trás muito
freqüentemente em nome da
independência (Português atual, EC, p.31)
2) Tempo/sincronias: português arcaico, dos séculos XVI, XVII, XVIII, XIX e português
Atual (cf. na seção anterior a lista de textos que serviram como corpora)
3) A noção semântica expressa pelo advérbio: Em relação às características semânticas que
cada advérbio pode expressar, classificamos em: a) advérbios que expressam tempo real
cronológico: são aqueles que expressam tempo cronológico, como por exemplo, os advérbios
atualmente e ultimamente; b) advérbios que expressam tempo aspectual: são os que se
referem à repetição de algum evento, ou à freqüência com que eventos ocorrem. Sabemos que
é bastante complexo delinearmos os limites entre tempo real e tempo aspectual, mas
decidimos que é possível fazer essa diferenciação, pelo menos até o ponto que nos foi exigido
pela análise. No presente estudo, foi claro observar e definir esses advérbios denominados de
tempo real devido a suas características dêiticas. Portanto, os advérbios cronológicos fazem
referência ao momento da enunciação. Enquanto, os advérbios de tempo aspectual são os que
se referem à repetição de algum evento, ou à freqüência com que os eventos ocorrem como o
advérbio freqüentemente; c) advérbios que são híbridos: são os usos polissêmicos, ou seja,
aqueles que expressão além das noções de tempo e de aspecto, expressam também a noção de
modo (tempo+aspecto/aspecto+modo), isto é, são os advérbios que expressam de alguma
forma duas características, com predominância de uma ou outra, por exemplo, tempo e modo,
como o advérbio rapidamente.
4) O tipo semântico de verbo que compõe a cláusula, segundo Halliday (1994), a saber:
material, mental, comportamental, relacional possessivo, relacional intensivo, atividade verbal
e meteorológico. (cf. seção 3.5).
5) Tipo formal de sujeito - verificamos em cada oração coletada se o sujeito estava (a)
formalmente presente antes do verbo, (b) formalmente presente depois do verbo, (c) presente
na forma de um pronome relativo ou (d) ausente (incluindo neste caso o tradicional sujeito
oculto e a oração sem sujeito).
6) Tipo de oração - observarmos em que tipo de oração, o advérbio de tempo e de aspecto
está inserido, se a oração é (a) paratática, (b) subordinada (substantiva ou adjetiva restritiva),
(c) hipotática (adverbial ou adjetiva explicativa), (d) oração principal ou (e) oração absoluta.
Cruzamos alguns desses fatores entre si para verificarmos os padrões de uso dos
advérbios e para vermos o uso dos mesmos em cada sincronia da língua.
5 ANÁLISES DOS DADOS
Neste capítulo, apresentamos uma análise dos advérbios de tempo e de aspecto
terminados em mente usados em textos escritos em norma culta do português, mais
precisamente em textos do português arcaico, dos séculos XVI, XVII, XVIII, XIX e do
português atual.
Analisamos aqui os resultados encontrados através da codificação dos fatores
controlados, como foi dito: posição do advérbio, noção semântica do advérbio, tipo de
verbo, tipo de sujeito, sincronias e tipo de oração. Destacamos a importância destes para
comprovar a hipótese de que fatores que influenciam o posicionamento dessa categoria em
relação ao verbo e a de que deve ter havido mudanças na ordenação desse advérbio nas
sincronias estudadas.
A seguir, explicitamos a análise dos grupos de fatores pertinentes ao estudo do
fenômeno em questão.
5.1 Análises de fatores
Começamos nossa análise pela apresentação das ordens estabelecidas (cf. capítulo 4),
fator de maior importância para verificarmos a posição prototípica dos advérbios em –mente
em cada sincronia.
5.1.1 Ordem do advérbio de tempo e aspecto em -mente
Inicialmente, a análise consistiu na verificação da posição de cada advérbio na
sentença. Porém, para uma melhor compreensão dos dados, foram estabelecidas duas posições
gerais:
Antes do Verbo
(01) Por uso antigamente havia um conselho chamado dos massarotes (Século XVII,
Sermão do Pe.A. Vieira)
Depois do Verbo
(02) Abramos os corações à luz, para que more perpetuamente neles Século XVII,
Sermão do Pe.A. Vieira)
Encontramos em todos os textos analisados (de todas as sincronias) um total de 180
dados com advérbios de tempo e aspecto em -mente. Estes estavam distribuídos de acordo
com o que pode ser visto na tabela a seguir:
Tabela 1- Distribuição dos advérbios em -mente quanto à ordem em relação ao verbo
Posição antes do
verbo
Posição depois do
verbo
Auxiliar-Adv-
Verbo
Total
Ocorrência % Ocorrência % N
o
de oco
rrência
%
82= 45,5% 88= 48,8% 10= 5,5 180=100%
Na tabela 1, verificamos que não houve diferença significativa, ao compararmos as
duas posições gerais: antes e depois do verbo. Sem levarmos em conta as sincronias, os dados
se distribuem homogeneamente entre as duas posições, como nos exemplos abaixo (os
exemplos 03 e 04, são de advérbios colocados em posição pós-verbal e os exemplos (05) e
(06) são de advérbios em posição pré-verbal). Houve apenas 5,5 % de dados com o advérbio
entre o auxiliar e o verbo (POS 4).
(03) Deu sinal o rei, mandou Moisés a Arão que lançasse a sua vara em terra, e converteu-se
sùbitamente em uma serpente viva e tão temerosa, como aquela de que o mesmo Moisés no
deserto se não dava por seguro (Século XVII, Sermão do Pe. A. Vieira)
(04) Entre estas duas portas se acha subitamente um homem no instante da morte, sem poder
tornar atrás, nem parar, nem fugir... (Século XVII, Sermão do Pe. A. Vieira)
(05) Em conseqüência desta minha lembrança, ordenei à Câmara desta Cidade que
immediatamente passasse a examinar o numero de Embarcaçoens, que tinhão sahido deste
Porto para essa Cidade (Século XVIII, administração Pública/Carta oficial)
(06) ...esta inCerteza menão fez admiração porser muito na= tural o erraremse todos
osCalculos quesefazem SobreCouzaz tão inCertaz. Como aNavegação, finalmente
chegarão Vossamercez muito bonz, que he oque mais estimo, eComamesma felicidade
principiarão asSuas marchaz por terra(Século XVIII, Administração Pública/Carta oficial)
A tabela abaixo apresenta, de um modo geral, o número das ocorrências dos advérbios
de tempo e aspecto em -mente pelas sincronias estudadas.
Tabela 2- Levantamento Geral dos dados dos corpora dos Advérbios de Tempo e de
Aspecto em -mente
Sincronias Total
Port. Arcaico 44
SÉC. XVI 18
SÉC.XVII 34
SÉC.XVIII 18
SÉC.XIX 21
Port. Atual 45
TOTAL
180
Eis alguns exemplos de cada uma das sincronias estudadas:
- Português arcaico:
(07) Quem de ssi meesmo busca paz em out(r)a part(e) ou pobreza ou desp(re)ço, nom a
achara´. Que quem mu(r)mura ou he trist(e) de ssua pobreza, e q(ue)m ha´ door no coraçom e
he descontent(e) e a despreza nom ha´ paz consigo. E po(r) que homem possa vi~ir a esta paz,
deve rroguar a D(eu)s conthinuadament(e), e amehu´de peenssar em sua grande pobreza e
humildade e maravilhossa sofrença. (Castelo Perigoso).
- Século XVI:
(08)
E
ste rey tem continuadamente cimcoenta mil home~es de solldo, em que entra~o seis
mill home~es de cavallo, que sa~o de sua goarda do paço, dos quoaes seis mil sa~o os
duzentos obrigados a cavalgar com elle, e tem mais vimte mill lamceiros e dargueiros, e tres
mil home~es (Século XVI –Crônica dos Reis de Bisnaga)
-Século XVII:
(09) Lêde o Testamento Velho, e achareis que Deus antigamente afogava exércitos, queimava
cidades, alagava mundos, despovoava paraísos. (Sermão do Pe.A. Vieira).
-Século XVIII:
(10) O Antigo Provedor da Fazenda; emque VossaSenhoria mefala, dizendo naõ desceria dos
Sertoens, desceo com efeito, eaqui se acha, segundo metem constado ha dozedias, mas
brevemente hirá para essa cidade, pois...(Século XVII, carta Comercial número 7)
- Século XIX:
(11) Pessolhe novamente de ver os vestidos | que estão na D. Brasilia, e faser | o possível por
m’os ...(Século XIX, Carta Comercial número 2)
- Português Atual
(12) Hoje não damos tanta importância àquilo que Deus constantemente nos fala (TS, p. 15)
5.1.2 Posição do advérbio
A seguir, podemos observar a distribuição dos advérbios analisados pelas posições
arroladas nas sincronias estudadas. Apenas para lembrar (cf. capítulo 4):
a) POS 1 – a posição da margem esquerda;
b) POS 2 – a posição entre o sujeito e o verbo.
c) POS 3 a posição não inserida entre o sujeito e o verbo, mas fora da margem esquerda
da cláusula;
d) POS 4 – a posição entre o verbo auxiliar e o verbo principal;
e) POS 5 – a posição a margem direita da oração (no final da oração);
f) POS 6 – a posição inserida entre o verbo e o complemento/predicativo;
g) POS 7 – a posição entre o verbo e o sujeito.
h) POS 8 – a posição não inserida entre o verbo e o sujeito, ou entre o verbo e o
complemento/predicativo, mas fora da margem direita.
Tabela 3 - Distribuição das posições dos advérbios de tempo e aspecto em –mente X
sincronias
Sincronias POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
ARCAICO 09 02 06 02 10 09 - 06 44
SÉC.XVI
10 02 - - 01 03 01 01 18
SÉC.XVII
18 02 02 - 02 04 01 05 34
S.XVIII. 11 01 - 01 01 02 - 02 18
SÉC.XIX
06 - - 03 04 05 - 03 21
Português
Atual
06 03 04 04 14 07 01 06 45
Total 60 10 12 10 32 30 03 23 180
% 33,3 5,5 6,6 5,5 17,7 16,7 1,6 12,7 100
Ao olharmos o total expresso na última linha da tabela, podemos constatar que a POS1
é mais recorrente. Isso evidencia que os advérbios de tempo e de aspecto em -mente,por
expressarem tais circunstâncias, preferem as posições periféricas da cláusula, sobretudo à
margem esquerda (POS1), e evitam posições mais internas à sentença, posições essas que
rompem com a estrutura padrão da cláusula. Shaer (2004), tratando especificamente da
ordenação dos circunstanciais temporais, relata que não é fácil determinar de forma precisa as
diferenças entre os temporais na margem esquerda ou na margem direita da sentença, ainda
que seja possível determinar distinções funcionais entre eles: a margem esquerda constitui um
ponto de ancoragem, um elo entre a parte do discurso em que se encontra o advérbio e um
ponto do discurso anteriormente mencionado, numa relação nitidamente anafórica, de
conexão discursiva. Tal fenômeno tende a não ocorrer com advérbios que ocupam a margem
direita da oração, associados a um escopo mais restrito, geralmente portador de informação
nova. Como podemos observar nos exemplos 13 e 14 abaixo:
(13) Antigamente convertia-se o mundo; hoje por que se não converte ninguém? Porque hoje
pregam-se palavras e pensamentos (Século XVII, sermão do Pe. A. Vieira).
(14) porque não perdeu o céu e a vista de Deus, mas vai arder no inferno eternamente.
(Século XVII, sermão do Pe. A. Vieira).
Podemos observar, também, através da tabela 3, que, no português arcaico, as posições
típicas são POS 5 (pós-verbal no fim margem direita), 6 (entre o verbo e o complemento) e 8
(pós-verbal fora do fim), mas os dados têm uma boa distribuição em todas as posições, exceto
na posição 7. Ou seja, no português arcaico havia uma ordenação mais livre, apesar das raras
ocorrências de algumas posições.
nas outras fases do português, entre o português do XVI e o português do século
XIX, o uso predominante é a posição 1 (margem esquerda). No século XVI, ainda outras
posições com uma distribuição razoável de dados, que são as posições 6 e 5. Depois, como
dissemos, é a posição marginal à esquerda a preferida pelos autores. Mas, no século XIX,
uma diferença importante: começa a aumentar o uso de uma posição pós-verbal, é a
posição 6. No português atual, verificamos novamente que há uma distribuição de dados em
todas as posições, mas há predomínio da posição 5, ou seja, uma posição pós-verbal.
Nossa análise permite dizer que, nos textos estudados, o advérbio em -mente passa de
um uso relativamente livre para um uso mais fixo na posição marginal à esquerda. Depois no
século XIX, começa a aumentar na posição pós-verbal e no português atual é usado
predominantemente na posição pós-verbal (mais especificamente na posição marginal à
direita, POS 6).
Albani (2007) verificou que a posição típica do advérbio sempre era pré-verbal no
português arcaico e pós-verbal no português contemporâneo. Todos os fatores estudados
indicam que, no português arcaico, a ordem era mais livre, enquanto no português atual a
ordem tende a ser mais fixa. Segundo ele, um forte indício de mudança na ordenação do
advérbio sempre em textos religiosos. Portanto, o autor encontrou um aumento da posição
pós-verbal ao comparar o português arcaico com o atual com relação ao uso de sempre. E o
mesmo constatamos no nosso estudo. Pesquisas futuras devem verificar os indícios de
mudança apontados aqui, comparando textos de diferentes tipos.
5.1.3 Noção semântica do advérbio
O fator noção semântica do advérbio foi investigado com a finalidade de se verificar
se relação entre o valor que o advérbio em -mente expressaria no contexto e a sua posição.
Os valores considerados (com base em Freitas e em Ilari) são:
(a) Cronológico – é aquele que expressa tempo real;
(b) Aspectual é aquele que expressa às noções: iterativo, reiterativo, freqüentativo e
outros;
(c) Híbrido – é aquele que expressa às noções tempo/aspecto + modo.
A categoria noção semântica é de grande relevância para este estudo, pois este é o
momento em que a caracterização semântica do advérbio estudado que poderá ser observada
em uma análise não quantitativa, mas qualitativamente.
Denominamos os advérbios aspectuais aqueles que indicam a freqüência com que os
eventos não-específicos ocorrem ao longo do tempo. Esse tipo de advérbio é eminentemente
aspectual, que interage com a categoria aspectual de iteratividade, como podemos observar
no exemplo abaixo:
(15)... e refletiu sobre aquilo que Deus continuamente nos fala.(Português atual, TS,p.15)
Neste exemplo (15), verificamos que o advérbio cronológico expressa tempo real, ou
seja, é aquele que faz referência ao passado, presente ou futuro, tendo como ponto de
referência o momento da enunciação. no exemplo (16), observamos que o advérbio
apresenta a noção dêitica, aponta para algum momento da enunciação.
(16) Atualmente as coisas estão como costumavam ser mil anos atrás. (Português atual, EC,
p.09)
o advérbio no exemplo (17), observamos que expressa à noção de iteratividade
(aqui também alocamos nos grupos dos advérbios aspectuais) referindo-se à repetição de
algum evento, ou à freqüência com que eventos ocorrem. Vejamos o exemplo:
(17) Para nos resgatar e nos libertar novamente (Português atual, EC, p.61)
De fato, é uma tarefa arriscada determinar os limites entre tempo real e tempo
aspectual, mas decidimos que é possível fazer essa diferenciação, pelo menos até o ponto que
foi exigido pela análise. No presente caso, foi claro observar e definir os itens denominados
de tempo real devido à suas características dêiticas.
Os advérbios que apresentam a noção semântica Híbrida ‘tempo mais modo’ (como,
por exemplo, rapidamente), ou ‘tempo mais aspecto’ (como, por exemplo, normalmente),
nada mais são do que aqueles advérbios que expressam de alguma forma as duas
características, com predominância de uma sobre a outra. O importante aqui é verificar se esta
polissemia influencia a posição do item em relação ao verbo.
Apresentamos aqui mais alguns exemplos para ilustrar o fator noção semânticos
expressa pelo advérbio:
1. Freqüentativo/iterativo- Aspectual:
(18)... repetidamente nós o rejeitamos...(Português atual, EC,p. 44)
2. Expressão de tempo real – cronológico:
(19) Por isso antigamente havia um conselho chamado dos massoretas (Século XVII, Sermão
do Pe. A. Vieira )
3. Tempo aspectual – Aspectual:
(20) para nos resgatar e nos libertar novamente ...(Português atual, EC,p.61)
4. Híbrido tempo/aspecto + modo:
(21) Deus está querendo ficar eternamente conosco. ...(Português atual, TS, p. 49)
Portanto, esse fator leva em consideração a noção semântica que os advérbios em -
mente podem assumir no contexto em que estão inseridos.
A análise dos dados, que se apresentarão a seguir, será feita separando os corpora de
cada sincronia estudada. As tabelas abaixo ilustram a distribuição dos advérbios de acordo
com a posição e noção semântica identificadas, a começar pelo uso dos advérbios no
português arcaico. Ao final da seção, faremos uma conclusão geral relativa a esse fator.
Tabela 4 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no
Português Arcaico
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTA
L
Cronol. 03 - - - 03 02 - 01 09
Aspectual 02 - - 01 - 01 - - 04
Híbrido 04 02 06 01 07 06 - 05 31
Total 09 02 06 02 10 09 - 06 44
% 20,5 4,5 13,6 4,5 22,7 20,5 - 13,6 100
Na tabela 4, em que checamos a ordenação do advérbio e a noção semântica expressa
por ele na cláusula, observamos a predominância da tendência pré-verbal, exceto os advérbios
com os sentidos híbridos que expressam em si mesmos os valores de tempo/aspecto e modo.
É exatamente o fato de apresentar esse valor polissêmico denominado de híbrido na presente
pesquisa que explica o desvio que este advérbio apresenta com relação à tendência da posição
pré-verbal.
Além disso, podemos apontar na tabela acima outras constatações no português
arcaico, como por exemplo, se observarmos os totais expressos na última linha da tabela,
verificamos que as posições 1, 5 e 6 são mais recorrentes do que as demais posições 3, 8, 2 e 4
respectivamente.
Outra questão a ser considerada nessa análise é que as noções cronológicas e aspectual
não são predominantes em relação às demais noções. Entretanto, identificamos que a noção
híbrida é mais freqüente, quanto à sua ordenação, eles ocorrem mais na posição 5(margem
direita da cláusula), que é uma posição pós-verbal.
Na dissertação de Freitas (2004), verificou-se que o tipo polissêmico (que
corresponderia à noção híbrida) ocorria mais na posição pós-verbal, diferindo dos demais
tipos semânticos (cronológico, aspectual e conectivo). A autora justifica que por essa noção
possuir características de um advérbio qualitativo (Ilari et al., 1990), esse advérbio irá tender a
ocupar a posição pós-verbal, uma vez que os advérbios qualitativos têm a predisposição de
ocorrer após o verbo. Já Moraes Pinto (2007:77), ao estudar o uso do advérbio qualitativo em
–mente, constatou que “esses elementos apresentam mudança em seus valores desde
português arcaico ao século XIX”. Ela conclui que, além do processo de gramaticalização
pelo qual passou esse advérbio, exercendo nova função, sua ordenação na cláusula também
sofreu mudanças de acordo com os textos diacrônicos. E, ainda, acrescenta que “a posição
pré-verbal, principalmente entre o sujeito e o verbo, ainda se mostrou disponível, embora em
menor escala, no século XIX”.
Vejamos a análise do mesmo fator nos dados do século XVI:
Tabela 5 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica
Século XVI
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
Cronol. 05 - - - - 01 - - 06
Aspectual 02 01 - - - - - - 03
Híbrido 03 01 - - 01 02 01 01 10
Total 10 02 - - 01 03 01 01 18
% 55,5 11,1 - - 5,5 16,7 5,5 5,5 100
Na análise dos dados desse fator no século XVI, encontramos na relação entre ordem e
noção semântica, maior incidência de dados na posição 1 (margem esquerda da cláusula). As
noções cronológicas e aspectual, principalmente, predominam nessa posição (1), o sentido
híbrido ocorre mais nas posições pós-verbais, como atestam os trabalhos de Freitas (2004) e
Moraes Pinto (2002) em referência a esse tipo de advérbio. Com relação ao século XVII,
temos os seguintes resultados:
Tabela 6 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica
Século XVII
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
Cronol. 10 02 02 - 01 03 - 03 21
Aspectual 01 - - - 01 - - - 02
Híbrido 07 - - - - 01 01 02 11
Total 18 02 02 - 02 04 01 05 34
% 52,9 5,9 5,9 - 5,9 11,8 2,9 14,7 100
No século XVII, observamos que as noções cronológicas e híbridas predominam na
posição 1 (margem esquerda da cláusula). O sentido aspectual é menos freqüente (com
somente 1 dado na posição 1(margem esquerda) e 1 dado na posição 5 (margem direita).
Além disso, verificamos que o tipo híbrido não foi mais recorrente nas posições pós-verbais,
como vimos no português arcaico e no século XVII, mais ainda assim, não foi uma diferença
marcante.
O baixo número de dados não nos permite fazer outras generalizações. O mesmo
acontece com as outras sincronias.
A seguir apresentamos os resultados da análise dos dados do século XVIII.
Tabela 7 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica
Século XVIII
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
Cronol. 03 - - 01 01 01 - 01 07
Aspectual 03 - - - - 01 - 01 05
Híbrido 05 01 - - - - - - 06
Total 11 01 - 01 01 02 - 02 18
É interessante observar que, no século XVIII, todas as noções apresentam-se
predominantemente na posição 1 (margem esquerda da cláusula, pré-verbal). E mesmo o
sentido híbrido é mais freqüente na posição pré-verbal.
Vejamos os resultados acerca da amostra do século XIX.
Tabela 8 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica
Século XIX
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
Cronol. 01 - - 01 - - - - 02
Aspectual 01 - - 02 02 03 - 01 09
Híbrido 04 - - - 02 02 - 02 10
Total 06 - - 03 04 05 - 03 21
% 28,6 - - 14,3 19 23,8 - 14,3 100
Sabe-se que, no século XIX, as transformações na ngua foram decisivas para a
caracterização do português moderno. Na análise dos dados desse século, verificamos que as
posições mais recorrentes são as pós-verbais. Em relação à noção semântica, observamos que
os sentidos aspectual e híbrido são mais incidentes do que o cronológico. Além disso,
identificamos que o sentido híbrido é mais recorrente nas posições pós-verbais, como foi
atestado em outros trabalhos sobre os advérbios já citados.
Tabela 9 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica
Português Atual
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
Cronol. 02 - - 01 05 02 - - 10
Aspectual 02 01 03 03 05 03 - 05 22
Híbrido 02 02 01 - 04 02 01 01 13
Total 06 03 04 04 14 07 01 06 45
% 13,3 6,7 8,9 8,9 31,1 15,6 2,2 13,3 100
Na tabela 9, verificamos uma distribuição entre a posição e a noção semântica do
advérbio de maneira mais homogênea entre os sentidos pelas posições arroladas. Observamos
também que as posições pós-verbais são mais freqüentes do que as posições pré-verbais. E
que o sentido aspectual é mais utilizado nos contextos examinados.
Como vimos, no português atual, predomínio da posição pós-verbal (mais
especificamente a posição marginal à direita). Apenas podemos concluir que, quando a noção
é basicamente aspectual, como em freqüentemente, o advérbio não tem posição predominante,
mas, quando apresenta noção dêitica (temporal) ou noção híbrida, como antigamente,
rapidamente, respectivamente, a posição típica é pós-verbal.
Notamos também que os sentidos do advérbio ligeiramente encontrados no português
arcaico desapareceram e um novo uso surgiu. Isso demonstra que houve uma mudança nos
valores desses elementos.
Assim, podemos apontar que os advérbios do presente estudo assumem valores que
podem ocorrer antes ou depois do verbo, dependendo do valor semântico que assumem. O
advérbio ligeiramente, por exemplo, pode se apresentar como advérbio de modo (com sentido
de “de maneira simples; com simplicidade”) em posição pós-verbal ou começa a ter um
sentido brido quando aparece em posição pré-verbal. Pode ser entendido tanto como “com
simplicidade; com humildade” quanto, por extensão metafórica de significado, com sentido
semelhante a “apenas; só”, como ocorre nos dias de hoje. Nos exemplos dados do português
arcaico, temos:
(22) posso dizer ligeyrame)
))
)te qual cousa dellas he merecedor de mayor cõndenpcõ
(Português arcaico, OE, p.122)
(23) E e)na segu)da coua põõe) hu)a cesta que se çarra legeyrame
)
))
)
te quando a tangem. (Português
arcaico, OE, p.194)
No primeiro exemplo, o advérbio se comporta como advérbio de modo e, no segundo,
é híbrido, ou seja, um sentido se sobrepõe ao outro, resguardando resquícios de sentidos.
5.1.4 Tipo semântico do verbo
Um dos fatores que consideramos importantes para entender a posição dos advérbios
de tempo e de aspecto em -mente é a noção semântica expressa pelo verbo, pois trabalhos
anteriores, como Scheibman (2001), Bybee (2003), Andrade (2005) e Albani (2007), que
constataram que era necessário investigar se o tipo de verbo poderia influenciar na cláusula de
alguma forma, conforme explicamos na seção 3.5. Na presente análise, consideramos esse
fator relevante para tentar identificar se houve uma motivação semântica na ordenação dos
advérbios de tempo e de aspecto em -mente. Para isso, valemo-nos da classificação proposta
por Halliday (1994), também utilizada pelos autores citados nesta seção.
Portanto, o fator tipo semântico do verbo consistiu na classificação proposta para os
verbos da cláusula foi baseada em Halliday (1994), explicitada anteriormente neste
trabalho. Eis alguns exemplos de tipos de verbos encontrados nos corpora analisados:
- Processo material
(24) E quantos mortos subitamente e s~e p~e~endença lançou e enviou a ardideza ao
inferno...(Português arcaico, OE,p. 191).
- Processo Mental
(25) E, estando elle deitado em oraçõ em aquele loguar, começou subitamente a dormir...
(Português arcaico, OE,p. 164).
- Processo Relacional Intensivo
(26) Maria é mãe eternamente presente no mundo dos homens (Português atual, TS, p.15).
- Processo Relacional Possessivo
(27) Ele tem o coração constantemente voltado para os miseráveis (Português atual, TS,
p.47).
- Processo Comportamental
(28) E diz outrosy que os b~e~es temporares que veem continuadam~ente h~u~us tempos
outros he certa demonstrãnça de maa v~etura... (Português arcaico, OE).
- Atividade Verbal
(29) e refletiu sobre aquilo que Deus continuamente nos fala
. (Português atual, TS, p.15)
- Processo Existencial
(30) e logo subitam~ete os veras inchar e esqueecer-se da subjeiçõ ....(Português arcaico,
OE,p. 289).
- Processo Meteorológico
(31) e a pompa do m~udo he fumo e v~eto que subpitamente esvace e se sume... (Português
arcaico, OE,p. 227)
Este fator foi levado em consideração para verificar se houve uma fixação de uso. Ou
ainda, se tipos de verbos em que predominância de uma dada ordem do advérbio em
detrimento de outra. Além disso, temos de levar em consideração que essa classificação
semântica verbal é bastante subjetiva, pois os verbos podem apresentar sentidos adversos aos
propostos, dependendo do contexto ou a situação em que estejam configurando. Vejamos um
exemplo dos corpora:
(32) Entõn foy arrevatado subitam~ete em spiritu e levado ante a cadeyra ah~uu juiz...
(Português arcaico, OE, p. 66).
Na exemplificação (32) dada, o verbo “arrebatar”, que significa puxar, arrancar
(Dicionário Houaiss da língua portuguesa, 2004), está sendo usado metaforicamente.
Esperávamos também que o tipo semântico do verbo influenciasse a posição do
advérbio.
Para verificarmos, estabelecermos a relação entre o fator tipo semântica do verbo e a
ordem do advérbio de tempo e aspecto. Vejamos a tabela a seguir:
Tabela 10 –Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Português Arcaico
Tipo de
verbo/Ordem
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
01 - 01 01 02 02 - - 07
Existencial
- - 01 01 01 - 02 05
Material
04 01 03 01 06 02 - 01 18
Mental
- 01 01 - - 01 - 01 04
Relac. Intensivo
02 - - - 01 - - 01 04
Meteorológico
01 - - - - - - 01
Atividade Verbal
01 - - - - 03 - 01 05
Total
09 02 06 02 10 09 - 06 44
% 20,5 4,5 13,6 4,5 24,9 22,7 - 13,6 100
No português arcaico, observamos que o tipo de verbo mais recorrente é de valor
material em detrimentos dos demais valores. Quanto à relação posição e sentido do verbo, o
tipo material ocorre nas posições 1 e 5, que o as posições margens esquerda e direita
respectivamente. Os verbos comportamentais tendem a ocorrer nas posições 5 e 6 e os verbos
de atividade verbal tendem a ocorrer na posição 6. Além disso, verificamos que, em relação à
distribuição geral dos dados nesta sincronia, ela se dá de forma equilibrada. Na última linha
da tabela (total de dados de cada ordenação), constatamos que as posições marginais 1 e
5(esquerda e direita) são mais freqüentes, apesar de haver uma relativa distribuição dos dados
nas demais ordenações.
Além disso, nesta sincronia não houve ocorrência de verbo relacional possessivo.
Agora, vejamos a análise dos dados do século XVI.
Tabela 11 – Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em-
mente do século XVI
Tipo de
verbo/Ordem
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
01 - - - - - - - 01
Material
03 01 - - - - - - 04
Mental
02 - - - - - - 01 04
Relac. Possessivo
01 01 - - - 01 01 - 04
Relac. Intensivo
02 - - - 01 02 - - 05
Atividade Verbal
01 - - - - - - - 01
Total
10 02 - - 01 03 01 01 18
% 55,5 11,1 - - 5,5 16,6 5,5 5,5 100
Nos dados apresentados do século XVI, verificamos que os tipos mais freqüentes são
verbos materiais, mentais e relacionais possessivos. No total de 18 dados, encontramos 4
dados de cada tipo. Quando o verbo tem sentido material ou mental, a tendência é o advérbio
ocorrer na margem esquerda (POS1). Quando o verbo é relacional possessivo não posição
prototípica para o advérbio.
Em relação aos demais sentidos dos verbos, uma distribuição de dados equilibrada,
apenas podemos ressaltar que, verificando a última linha da tabela, a posição 1 (margem
esquerda) é a preferida, independente do tipo semântico do verbo.
Neste século, não houve ocorrências dos tipos de verbos existenciais e meteorológicos.
Vejamos os dados analisados na tabela a seguir.
Tabela 12 - Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em -mente
Século XVII
Tipo de
verbo/Ordem
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
- - - - - 02 - 01 03
Existencial
04 - - - 01 - 02 07
Material
04 02 01 - 01 01 01 - 10
Mental
01 - 01 - - - - - 02
Relac. Possessivo
02 - - - - - - 02
Relac. Intensivo
03 - - - - - 01 04
Atividade
Verbal
04 - - 01 - - 01 06
Total
18 02 02 - 02 04 01 05 34
% 52,9 5,8 5,8 - 5,8 11,8 2,9 14,7 100
Já nos dados do século XVII, observamos que não há uma predileção pelo tipo
material, como vimos nos dados do português arcaico e do século XVI, mas, em relação à
posição e o tipo semântico do verbo em geral, todos são mais recorrentes na posição 1
(margem esquerda), 18 dados de 34, e há uma relativa distribuição nas demais posições, o que
não difere dos séculos anteriores apresentados.
Neste século não houve ocorrência do tipo de verbo meteorológico, por isso não foi
apresentado na tabela.
A seguir, temos os dados analisados do século XVIII.
Tabela 13 – Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em -mente
Século XVIII
Tipo de
verbo/Ordem
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
03 - - 01 01 - - 05
Material
05 - - - 01 01 - 01 08
Mental
02 01 - - - - - 01 04
Relac. Possessivo
- - - - - - - - -
Relac. Intensivo
01 - - - - - - - 01
Total
11 01 - 01 01 02 - 02 18
% 61,1 5,5 - 5,5 5,5 11,1
-
11,1 100
Os dados analisados do século XVIII demonstram que o tipo de verbo material é o
mais freqüente, seguido do tipo comportamental (cada qual com 8 e 5 dados respectivamente).
Independentemente do tipo semântico, o advérbio tende a ocorrer na posição marginal à
esquerda (POS1).
Neste culo não houve ocorrências dos tipos de verbos: existencial, meteorológico e
atividade verbal, por isso não foram listados na tabela.
Vejamos os dados na tabela a seguir.
Tabela 14 - Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em -mente
Século XIX
Tipo de
verbo/Ordem
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
- - - - - - - 01 01
Material
03 - - 02 02 03 - - 10
Mental
- - - - - 01 - 01 02
Relac. Possessivo
02 - - - - 01 - - 03
Relac. Intensivo
01 - - 01 - - - - 02
Atividade
Verbal
- - - - 02 - - 01 03
Total
06 - - 03 04 05 - 03 21
%
28,6 - - 14,3 19,04
23,8 - 14,3 100
No século XIX, constatamos que o tipo de verbo material é o mais freqüente, como
maioria das sincronias. Quanto à relação entre posição e tipo de verbo, observamos que
uma distribuição mais homogênea. Quando o verbo é material, o advérbio em -mente ocorre
mais na posição 1 (3 dados em 10) ou na posição 6 (também 3 dados em 10). Os demais tipos
tiveram poucos dados. Verificamos, também, que os advérbios tendem a ocorrer mais nas
posições pós-verbais (Posições 5, 6, e 8).
Além disso, podemos confirmar na última linha da tabela que os números percentuais
incidem mais nessas posições: POS 5 (19,4%); POS 6 (23,8%); POS 8 (14,3%).
Na análise deste culo também não foram encontrados dados dos tipos de verbos
existenciais e meteorológicos, por isso este não foi listado na tabela.
A seguir, vejamos os dados analisados do português atual.
Tabela 15 – Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em -
mente do Português Atual
Tipo de
verbo/Oração
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
01 - - 01 - 01 - - 03
Existencial
- - - - 03 - - 03
Material
03 01 - 02 03 02 - 02 13
Mental
- - - - 01 - 01 02
Relac. Possessivo
- - 01 - 02 01 - - 04
Relac. Intensivo
02 - 03 - - - - 02 07
Meteorológico
- - - - - - 01 - 01
Atividade
Verbal
- 02 - 01 05 03 - 01 12
Total
06 03 04 04 14 07 01 06 45
% 13,3 6,7 8,9 8,9 31,1 15,6 2,2 13,3 100
De acordo com a tabela 15, verificamos que o tipo de verbo mais freqüente é o verbo
de processo material, seguido dos de atividade verbal. Em relação ao tipo de verbo e a posição
do advérbio, vemos que, quando o verbo é material, o advérbio tende a ocorrer nas posições 1
e 5; quando é de atividade verbal, tende a ocorrer na posição 5.
Nos resultados apresentados, uma tendência para os advérbios em -mente
aparecerem numa posição pré-verbal (no português arcaico, século XVI, XVII e XVII)
principalmente quando o verbo é de processo material, assim com os demais tipos de verbos.
Mas em relação à análise dos dados do século XIX e português atual, verificamos que há uma
predileção às posições pós-verbais. Esse resultado indica mudança na posição do advérbio ao
longo da história do português, o que vai ao encontro de outras pesquisas, como as de
Martelotta (2006) e Albani (2007), que demonstraram que os advérbios m mudando para a
posição pós-verbal, de um modo geral.
5.1.5 Tipo de sujeito
A forma de realização do sujeito da oração, um critério de natureza sintática, é um
fator considerado na presente análise do advérbio de tempo e aspecto em -mente.
Em um trabalho feito sobre a forma de realização do sujeito pronominal, Duarte
(1993) observou que o português do Brasil apresentava índices de preenchimento de sujeito
bastante superiores aos apresentados pelas línguas românicas de sujeito nulo, como o
espanhol, o italiano e a variedade européia do português. A partir desse trabalho, intuímos que
em todos os contextos em que a posição do sujeito está vazia seja pela não realização, a
posposição ou deslocamento do sujeito para a margem direita da oração favoreceria a
ocorrência dos advérbios na margem esquerda da cláusula. De certa forma, a relação entre a
posição do advérbio e a forma de realização do sujeito da cláusula é demonstrada nas
subposições do item I desse capítulo, onde são analisadas as diversas possibilidades
estruturais decorrentes das posições em que os advérbios de tempo e de aspecto ocupam na
oração.
Essa possibilidade fora levantada em pesquisas como os de Kato e Nascimento
(2002:195), que mostraram que “se o sujeito é nulo, o preenchedor pode ser predito como um
adjunto”. Rocha (2001:113) também concorda com essa posição, pois afirma que “a ausência
de argumento concorre para propiciar a presença de preenchedores”. Haveria uma espécie de
equilíbrio sintático.
Porém, os trabalhos recentes apresentam evidências contrárias a essa postura. Duarte
(2003:121), em um estudo que compara amostras da fala carioca dos anos 80 e dos anos 90,
atesta que a ocorrência “de elementos adjuntos ao sujeito, sejam eles resultados de
topicalizações sejam eles adjuntos adverbiais, favorece a expressão plena do sujeito
pronominal”.
Para verificar de que forma se a relação entre a realização do sujeito e a ordem dos
advérbios de tempo e de aspecto em -mente foi feito um controle das possibilidades
exemplificadas a seguir:
a) Sujeito expresso anteposto ao verbo
(80) Lêde o Testamento Velho, e achareis que Deus antigamente afogava exércitos,
queimava cidades, alagava mundos, despovoava paraísos (Século XVII, sermão do Pe.A.
Vieira).
b) Sujeito expresso posposto ao verbo
(81) Comeu Eva o pomo da ciência, e queixava-me eu antigamente desta nossa Mãe; que
comeu o pomo, por que Ihe não guardou as pevides?(Século XVII, sermão do Pe.A. Vieira).
c) Sujeito ausente
(82) abramos os olhos à luz, para que alumie nossos corações; abramos os corações à luz, para
que more perpètuamente neles (Século XVII, sermão do Pe.A. Vieira).
d) Sujeito pronominal (que/quem).
(83) Capitulo como elrey combateo a cidade de Rachol. Estando elrey, como dito he,
combatemdo a cidade de Rachol, lhe veyo novas certas como ydalca~o hera chegado ao ryo
da bamda do norte, e que ally asentava seu arayall; mamdou elrey os espias que sempre
amdassem sobre elle, que vissem ho que fazia, e asym lhe desem o aviso de tudo ho que fazia;
com esta nova ouve no arayal allgu~u allvoroço, primcipalmente na gente baixa, a quem
numca fallta sospeitas, e aymda em sy tinha~o o medo que antigamente tinha~o aos mouros.
(Século XVI, Crônica dos Reis de Bisnaga)
Vejamos como ficou a distribuição do fator tipo de sujeito com a ordem do advérbio -
mente nas sincronias estudadas. As conclusões a respeito da hipótese serão dadas após os
resultados da última sincronia estudada, ao final desta seção.
Tabela 16 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio
Português Arcaico
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
05 - 05 01 06 06 - 06 29
Sujeito presente
antes do verbo
01 02 - 01 03 02 - - 09
Sujeito presente
depois do verbo
- - 01 01 01 - - 03
Sujeito pronome
relativo
03 - - - - - - - 03
Total
09 02 06 02 10 09 - 06 44
% 20,5 4,5 13,6 4,5 22,7 20,5 - 13,6 100
Nos dados do português arcaico, observamos que, quando o sujeito está ausente, o
advérbio tende a vir nas posições 5 (final da oração) e 6 (posição pré-verbal não marginal),
cada qual com 6 dados, no total de 29. Quando o sujeito está presente anteposto ao verbo, o
advérbio tende a ocorrer na posição 5 (final da oração). Ocorre apenas neste último caso uma
espécie de equilíbrio sintático.
Vejamos os dados a seguir do século XVI.
Tabela 17 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio
Século XVI
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
06 - - - - - 01 01 08
Sujeito presente
antes do verbo
03 02 - - 01 01 - - 07
Sujeito presente
depois do verbo
- - - - - 02 - - 02
Sujeito
pronome
relativo
01 - - - - - - - 01
Total
10 02 - - 01 03 01 01 18
%
52,9 11,5 - - 5,5 16,6 5,5 5,5 100
Nos dados do século XVI, quando o sujeito está ausente, o advérbio tende a vir na
posição 1(margem esquerda), o que é esperado para haver equilíbrio sintático. Quando o
sujeito está presente anteposto ao verbo, o advérbio tende a ocorrer também na posição 1
(margem esquerda), não confirmando a hipótese. Além disso, quando o sujeito está posposto,
o advérbio aparece em posição pós-verbal (a posição 6 é uma posição pós-verbal), o que
também não comprova a hipótese de equilíbrio sintático.
A seguir, vejamos os dados do século XVII.
Tabela 18 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio
Século XVII
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
09 01 02 - 01 02 01 04 20
Sujeito presente
antes do verbo
08 01 - - 01 01 - - 11
Sujeito presente
depois do verbo
01 - - - - 01 - 01 03
Sujeito
pronome
relativo
- - - - - - - - -
Total
18 02 02 - 02 04 01 05 34
% 52,9 5,8 5,8 - 5,8 11,7 2,9 14,7 100
Nos dados do século XVII, observamos que, quando o sujeito está ausente, o advérbio
tende a vir nas posições 1, havendo então preenchimento da posição pré-verbal. No entanto,
quando o sujeito está presente anteposto ao verbo, tende a ocorrer na posição 1 (margem
esquerda).
Vejamos os dados a seguir do século XVIII
Tabela 19 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Século XVIII
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
06 - - 01 - 01 - 01 09
Sujeito presente
antes do verbo
02 01 - - 01 01 - 01 06
Sujeito presente
depois do verbo
01 - - - - - - - 01
Sujeito pronome
relativo
02 - - - - - - - 02
Total
11 01 - 01 01 02 - 02 18
% 61,1 5,5 - 5,5 5,5 11,1 - 11,1 100
Na análise dos dados do século XVIII, verificamos que, quando o sujeito está ausente,
o advérbio tende a vir na posição 1(margem esquerda), 6 dados, ou seja, houve o
preenchimento da posição do sujeito pelo advérbio. Quando o sujeito está presente anteposto
ao verbo, o advérbio tende a ocorrer na posição 1 (margem esquerda), mas o número de dados
é extremamente baixo em qualquer posição
Vejamos os dados a seguir do século XIX.
Tabela 20 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio
Século XIX
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
05 - - 01 02 05 - 03 16
Sujeito presente
antes do verbo
01 - - 02 - - - - 03
Sujeito presente
depois do verbo
- - - - 01 - - - 01
Sujeito pronome
relativo
- - - - 01 - - - 01
Total
06 - - 03 04 05 - 03 21
% 28,6 - - 14,2 19,0
4
23,8 - 14,2 100
Nos dados analisados do século XIX, verificamos que, quando o sujeito está ausente, o
advérbio tende a vir nas posições 1 e 6 (cada qual com 5). A hipótese do equilíbrio sintático se
confirma no primeiro caso, pois, quando o sujeito estava ausente, houve maior incidência de
advérbio na margem esquerda (ou seja, posição pré-verbal). Mas a ocorrência relativamente
alta de dados na posição 6 (entre o verbo e o complemento) demonstra que a hipótese não foi
contemplada. (Os demais tipos tiveram baixíssima ocorrência.). Observamos que
independente do sujeito estar ausente ou presente uma tendência a ocorrerem nas posições
pós-verbais (posições 5, 6 e 8).
Vejamos os dados a seguir do português atual.
Tabela 21 - Relação entre o tipo de sujeito e a ordem do advérbio
Português Atual
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
02 01 01 04 07 04 01 02 22
Sujeito presente
antes do verbo
04 01 03 - 04 02 - 04 18
Sujeito presente
depois do verbo
- - - - 01 01 - - 02
Sujeito
pronome
relativo
- 01 - - 02 - - - 03
Total
06 03 04 04 14 07 01 06 45
% 13,3 6,6 8,8 8,8 31,3 15,5 2,2 13,3 100
Nos dados do português atual, verificamos, quando o sujeito está ausente, o advérbio
tende a ocorrer nas posições 5 (final da oração) e 6 (entre o verbo e o complemento). Esse
resultado indica que não tendência ao preenchimento da posição vazia. Quando o sujeito
está presente anteposto ao verbo, o advérbio aparece nas posições 1 (margem esquerda) e 5
(final da oração), o que demonstra que a hipótese do equilíbrio sintático não pôde ser
comprovada, pois ora preenchimento, ora não preenchimento da posição à esquerda do
verbo (com o sujeito à direita).
Nas tabelas apresentadas, se tomarmos as posições pré-verbais de um modo geral, em
oposição às pós-verbais, podemos observar que a ausência de sujeito nas posições pré-verbais
não leva o advérbio a se antepor ao verbo. Nos casos de sujeito ausente, por exemplo, temos
mais advérbios pós-verbais do que pré-verbais. Por outro lado, os casos em que o sujeito está
posposto apresentam mais dados com advérbio pós-verbal do que pré-verbal. Parece não
haver, portanto, nos casos dos advérbios em -mente, algum tipo de compensação ou equilíbrio
no posicionamento dos elementos na estrutura da cláusula.
Se observarmos separadamente a posição 1, ou seja, a que corresponde à margem
esquerda da cláusula e que, por hipótese, seria a que mais atrairia o advérbio, notamos que
isso também não ocorre. De fato, há uma quantidade maior de casos nessa posição.
Entretanto, se observarmos todas as ocorrências pré-verbais, notamos que a margem esquerda,
independentemente da presença ou não do sujeito, é a posição preferencial dos advérbios pré-
verbais.
Em função desses resultados, concluímos que não uma relação mais significativa
entre presença/ ausência de sujeito em posição pré-verbal (marginal ou o) e colocação dos
advérbios aqui estudados. Esse mesmo resultado foi obtido em Martelotta (2006) para os
advérbios qualitativos e em Marques (2008), que estudou a ordenação sujeito/ verbo. Assim
nossos resultados são contrários à hipótese de que adjuntos (pelo menos do tipo que estamos
estudando) são colocados na posição do sujeito vazio.
5.1.6 Tipo de oração
As tabelas abaixo apresentam a distribuição das ocorrências dos advérbios de tempo e
aspecto em -mente pelas diferentes posições observadas, sempre levando em conta o grau de
gramaticalização das cláusulas que contêm essas ocorrências. Essa análise foi feita de acordo
com a metodologia e hipóteses apresentadas nos trabalhos de Martelotta (2006). Sua hipótese
principal, exposta nesta tese no capítulo 1, é a de que as orações mais gramaticalizadas seriam
as mais propícias aos usos mais conservadores dos advérbios.
Tabela 22 - Ocorrência de advérbios no Português Arcaico
Na análise dos dados do Português Arcaico, observamos que um número
significativo de ocorrências de advérbios de tempo e aspecto em -mente em posição pré-
verbal, mostrando que essa posição, assim como a pós-verbal, estava disponível para este tipo
de advérbio na fase arcaica de nossa língua.
É possível observar algumas regularidades interessantes, sobretudo quando se
comparam esses resultados com outras pesquisas referentes à ordenação de outros tipos de
PORT.
ARCAICO
-gramatical.
+Gramatical.
- Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação
Subord. Rel
- NR NR R NR NR
Total
POS1
06 - - - - 03 09
POS 2
02 - - - - - 02
POS 3
02 01 - - 01 01 06
POS 4
- - - - - 02 02
POS 5
07 01 - - 01 01 10
POS 6
06 - - - 01 02 09
POS 7
- - - - - - -
POS 8
03 01 01 - - 01 06
Total
27 03 01 - 03 08 44
advérbios, feitas com base em outros corpora. Pesquisas elaboradas em Martelotta, (2004;
2006) e Martelotta e Vlček (2006) sobre os advérbios qualitativos bem e mal, assim como os
terminados em -mente demonstraram que as posições pré-verbais tipicamente latinas
(Martelotta, Processy e Santos: 2008), hoje praticamente inexistentes no caso desses
advérbios, ainda ocorriam até o século XIX, sobretudo em cláusulas com alto nível de
gramaticalização. Isso ocorre porque essas cláusulas, segundo Givón (1979), o mais
conservadoras em termos de estrutura sintática, sobretudo no que se refere à ordenação de
seus constituintes.
Os resultados da tabela acima não refletem o que ocorreu com os qualitativos: uma
predominância não muito acentuada das posições pós-verbais, mesmo em cláusulas mais
gramaticalizadas.
Temos a seguir dois exemplos que ilustram os tipos de cláusulas em que ocorre o tipo de
advérbio estudado:
(84) E esta sandia subitam~ete foy cega, mas Ella nõ sabia que era cega(OE,p.57)
(85) e a pompa do m~udo he fumo e v~eto que subpitamente esvaece e se sume...(OE, p
227)
No primeiro exemplo, temos uma ocorrência em que o advérbio está inserido numa
cláusula paratática; no segundo exemplo, o advérbio está num contexto de uma cláusula
subordinada adjetiva restritiva.
Análise dos dados referentes ao Século XVI
Na análise dos dados do século XVI, não temos o mesmo número de dados que foi
observado no português arcaico. Por isso, priorizamos uma análise mais qualitativa,
observando as tendências de ordenação em face às outras sincronias estudadas.
Tabela 23 - Ocorrência de advérbios no Século XVI
Apesar da baixa ocorrência de dados nesta fase, de um modo geral, a análise
qualitativa apresentou resultados favoráveis às nossas hipóteses. A posição pré-verbal, por
exemplo, estava presente nesta fase do português em escala menor que a posição pós-verbal.
Também foi possível observar que as orações mais gramaticalizadas elegem a
ordenação pré-verbal, 11 ocorrências distribuídas pelas posições pré-verbais (Pos 1, 2 e 3).
SÉC.XVI
-gramatical.
+Gramatical.
Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação
Subord. Rel
NR NR R NR NR
Total
POS1
01 01 01 - 01 06 10
POS 2
- - - - 01 01 02
POS 3
- - - - - - -
POS 4
- - - - - -
POS 5
01 - - - - - 01
POS 6
01 - - - 01 01 03
POS 7
01 - - - - - 01
POS 8
- - - - - 01 01
Total
04 01 01 - 03 13 18
Tal observação contribui para confirmar a hipótese que adotamos com Givón (1979) de que
esses tipos cláusulas (mais gramaticalizadas) tendem a ser sintaticamente mais conservadoras,
principalmente, no que diz respeito à ordenação dos constituintes da oração.
Ilustrando a ocorrência de cláusulas mais gramaticalizadas nesta sincronia, temos o
caso do exemplo (85), a seguir:
(85) O que ha da bamda d este rio. Esta hu~a cidade edificada que chama~o Senagumdym,
que dizem que antigamente foy cabeça do reyno, e agora vive nella pouca gente (Século
XVI, Crônica dos Reis de Bisnaga)
Outra ressalva interessante é que, ao analisarmos o português arcaico, apresentado
anteriormente, a hipótese de Givón (1979) não foi de todo confirmada, apesar de
encontrarmos uma leve tendência das posições pré-verbais em cláusulas mais
gramaticalizadas. Por outro lado, na análise do século XVI essa hipótese se confirma quando
se relacionam as posições dos advérbios com o grau de gramaticalização da cláusula em que
ele ocorre, segundo a qual a anteposição do advérbio em relação ao verbo, característica do
latim, se mantém em cláusulas com graus mais altos de gramaticalização, que são mais
conservadoras em termos de ordenação.
Pode-se concluir que essa diferença entre as ocorrências do português arcaico e as do
séc.XVI se simplesmente pelo fato de que existem mais cláusulas com altos níveis de
gramaticalização nos textos desse século do que a do outro e que, somente por isso, os
números referentes aos advérbios pré-verbais são mais altos nessas cláusulas.
Análise dos dados referentes ao Século XVII
O número de dados encontrados nos corpora deste século foi de 34 dados, um pouco a
mais do que o século XVI.
Tabela 24 - Ocorrência de advérbios no Século XVII
Podemos observar, na tabela 26, que o advérbio de tempo e aspecto em -mente, maior
incidência na posição pré-verbal, porém como cláusulas menos encaixadas.
SÉC.XVII
-gramatical.
+Gramatical.
- Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação
Subord. Rel
- NR NR R NR NR
Total
POS1
14 02 - - 02 - 18
POS 2
01 - - - 01 - 02
POS 3
- 01 - - 01 02
POS 4
- - - - -
POS 5
02 - - - 02
POS 6
03 - - - 01 04
POS 7
- - - - 01 01
POS 8
03 - - - 01 01 05
Total
23 03 - - 05 03 34
Análise dos dados do Século XVIII
Cabe registrar logo de início a quantidade extremamente pequena de dados de
ocorrências dos advérbios em estudo nesta época. Isso, obviamente, impede qualquer
conclusão mais precisa em relação as suas tendências de ordenação nos corpora analisados no
século XVIII. Entretanto, é possível observar e fazer algumas ponderações em relação aos
resultados encontrados nesse século.
Vejamos a tabela a seguir:
Tabela 25 - Ocorrência de advérbios no Século XVIII
É interessante ressaltar que novamente a nossa hipótese inicial também foi confirmada
de que as orações mais gramaticalizadas elegem a ordenação pré-verbal, 8 ocorrências contra
uma única ocorrência na posição pós-verbal.
SÉC.XVIII
-gramatical.
+Gramatical.
- Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação
Subord. Rel
- NR NR R NR NR
Total
POS1
05 - 03 - 01 02 11
POS 2
- - - - - 01 01
POS 3
- - - - - - -
POS 4
01 - - - - - 01
POS 5
- - - - 01 - 01
POS 6
02 - - - - - 02
POS 7
- - - - - -
POS 8
02 - - - - - 02
Total
10 - 03 - 02 03 18
Por outro lado, 5 ocorrências pré-verbais em cláusulas menos gramaticalizadas em
oposição 4 dados na posição pós-verbal, também em cláusulas menos gramaticalizadas.
Isso é importante, porque pode apontar para o fato de que, até o século XVIII, era mais forte a
inclinação que os advérbios qualitativos apresentavam de ocorrer antes do verbo, o mesmo
acontecendo para os de tempo e de aspecto, reforçando os resultados obtidos em Martelotta e
Vlček (2006), segundo os quais essa tendência começa a enfraquecer no início do século XIX
e acaba por desaparecer na virada para o século XX, os quais mostraremos mais adiante.
Análise dos dados referentes ao século XIX
As ocorrências de advérbios de tempo e aspecto em -mente no século XIX, relacionadas
às variáveis posição na oração e grau de gramaticalização da cláusula, podem ser vistas na
tabela abaixo:
Tabela 26 - Ocorrência de advérbios no Século XIX
No caso do século XIX, há uma quantidade maior de ocorrências de advérbios de tempo
e de aspecto em -mente, embora essas 21 ocorrências estejam longe de constituir a quantidade
necessária para se chegar a constatações mais precisas. Como foi mencionado na análise dos
dados do século XVIII, acredita-se ser possível, apesar do poucos dados, observar
regularidades interessantes, que se tornam significativas, quando comparadas com tendências
detectadas em outras pesquisas referentes à ordenação de outros advérbios, feitas com base
em outros corpora e em outros estágios da história do português.
Assim como aconteceu com o século XVIII, era de se esperar que o século XIX
apresentasse uma relativa predominância das posições pós-verbais. Isso de fato ocorreu: a
tabela apresenta 12 ocorrências nessa posição, total de 21 advérbios. Esses dados refletem a
tendência, mencionada anteriormente, que vem relativamente se delineando desde século
SÉC.XIX
-gramatical.
+Gramatical.
- Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação
Subord. Rel
- NR NR R NR NR
Total
POS1
03 - 02 - 01 - 06
POS 2
- - - - - - -
POS 3
- - - - - - -
POS 4
02 - - - 01 - 03
POS 5
02 - 01 - 01 - 04
POS 6
04 - - 01 - - 05
POS 7
- - - - - -
POS 8
02 01 - - - - 03
Total
13 01 03 01 03 - 21
XVI, uma vez que na fase arcaica do português com esse tipo de advérbio a hipótese não se
confirmou, ou como nos trabalhos de Moraes Pinto, 2002; Martelotta, 2004, a confirmação
dessas tendências foi constatada.
Outro resultado interessante se apresenta quando se relacionam as posições dos
advérbios com o grau de gramaticalização da cláusula em que ele ocorre. Do total de 9 casos
de advérbios pré-verbais, 4 correram em cláusulas mais gramaticalizadas (hipotáticas e
subordinadas). Cabe ressaltar aqui que a diferença entre as ocorrências em cláusulas menos
gramaticalizadas é bastante pequena: 6 dados nas posições (1, 2, 3 e 4) pré-verbais.
Tabela 27 - Ocorrência de advérbios no Português Atual
No português atual, a ocorrência dos dados demonstrou uma propensão, que se
manifesta quase categoricamente, de que esses advérbios ocorressem após o verbo, 28 dados,
SÉC.XIX
-gramatical. +Gramatical.
- Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação Subord. Rel
- NR NR R NR NR
Total
POS1
05 - - 01 - - 06
POS 2
01 - - - - 02 03
POS 3
01 - - 02 01 - 04
POS 4
04 - - - - - 04
POS 5
02 01 - 01 02 02 14
POS 6
03 01 - 02 01 - 07
POS 7
01 - - - - - 01
POS 8
05 01 - - - - 06
Total
28 03 - 06 04 04 45
sendo que 17 em cláusulas menos gramaticalizadas pós-verbais e 10 dados em cláusulas mais
gramaticalizadas. Cabe ressaltar que novamente obtivemos resultados atípicos aos esperados
segundo a hipótese proposta em relação à posição e o grau de gramaticalização das cláusulas.
O quadro a seguir apresenta uma síntese do que já foi exposto.
Nessa sincronia, novamente obtivemos resultados contrários aos esperados segundo a
hipótese proposta em relação à posição e o grau de gramaticalização das cláusulas.
Mas, ressaltamos que os resultados encontrados são significativos, pois alguns apontam
para outras possíveis tendências diferentes dos trabalhos realizados sobre o fenômeno em
questão.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta pesquisa teve como objetivo observar as diferentes posições que os advérbios de
tempo e aspecto em -mente tendem a assumir em diferentes momentos na história da língua
portuguesa, a fim de verificarmos se houve mudança na ordenação desses elementos. Para
isso, coletamos dados de textos do português das seguintes fases históricas: arcaica, dos
séculos XVI, VXII, XVIII e XIX e português atual.
Este estudo, além de testar novas hipóteses, vem integrar e ampliar uma série de
pesquisas que visam examinar, de modo mais geral, o processo de mudança de colocação dos
advérbios no decorrer do tempo (Moraes Pinto, 2002; Martelotta, Barbosa & Leitão, 2002;
Martelotta, 2004 e 2006; Martelotta & Processy, 2006; Andrade, 2005; Albani 2007; Freitas,
2004).
Foram muito poucos os dados encontrados nos corpora analisados, em função de que,
de um modo geral, advérbios de tempo e aspecto em -mente são, de fato, pouco usados no
discurso escrito assim como no falado. Sendo assim, em muitos momentos da pesquisa, foi
difícil chegar a conclusões a respeito dos resultados estatísticos. Entretanto, foi possível
observar, entre esses poucos dados, algumas regularidades interessantes, sobretudo quando
essas regularidades foram localizadas dentro de um processo de mudança mais geral,
observado em outras pesquisas referentes à ordenação de outros tipos de advérbios feitas com
base em outros corpora e em diferentes momentos da história da língua portuguesa..
Partimos do pressuposto de que ocorreram mudanças na posição dos advérbios ao
compararmos a sincronia do português arcaico com o atual. De acordo com trabalhos
anteriores, como os de Martelotta e Leitão (1999) e de Martelotta, Barbosa e Leitão (2001), a
posição pré-verbal (entre o sujeito e o verbo) era disponível para toda espécie de advérbio e,
hoje, ela ainda está disponível para alguns. Portanto, houve uma mudança no padrão de
ordenação de alguns advérbios.
Observamos que não houve diferença significativa, ao compararmos as duas posições,
a pré-verbal e a pós-verbal, quando levamos em consideração todos os dados, ou seja, quando
não separamos as sincronias, pois os dados se distribuíram homogeneamente entre essas
posições gerais.
Porém, ao olharmos a distribuição dos advérbios analisados pelas posições já arroladas
anteriormente nas sincronias estudadas, constatamos que a POS1 (margem esquerda) foi a
mais recorrente, ou seja, os advérbios de tempo e de aspecto em -mente por expressarem tais
circunstâncias preferiram as posições periféricas da cláusula, sobretudo à margem esquerda
(POS1), e pouco se realizaram nas posições mais internas à sentença, posições essas que
rompem com a estrutura padrão da cláusula. Shaer (2004), ao tratar especificamente da
ordenação dos circunstanciais temporais, relata que não é fácil determinar de forma precisa as
diferenças entre os temporais na margem esquerda ou na margem direita da sentença, ainda
que seja possível determinar distinções funcionais entre eles: a margem esquerda constitui um
ponto de ancoragem, um elo entre a parte do discurso em que se encontra o advérbio e um
ponto do discurso anteriormente mencionado, numa relação nitidamente anafórica, de
conexão discursiva. Além disso, pudemos observar, também, que, no português arcaico, as
posições típicas são posição 5 (pós-verbal, mais precisamente margem direita no fim da
oração), posição 6 (entre o verbo e o complemento) e posição 8 (pós-verbal fora do fim), mas
os dados tiveram uma boa distribuição em todas as posições, exceto a posição 7. Ou seja, no
português arcaico havia uma ordenação mais livre.
nas outras fases do português, entre o português do XVI e o português do século
XIX, o uso predominante foi a posição 1 (margem esquerda). No século XVI, ainda houve
outras posições com número razoável de dados, que foram as posições 6 (inserido entre o
verbo e o complemento/predicativo) e 5 (margem direita da oração). Depois, como dissemos,
é a posição marginal à esquerda a preferida pelos autores. Mas, no século XIX, já houve uma
diferença importante: começou a aumentar o uso de uma posição pós-verbal, que foi a posição
6. Já no Português atual, verificamos que houve uma distribuição de dados em todas as
posições, mas houve o predomínio da posição 5, ou seja, uma posição pós-verbal.
Nossa análise permite-nos dizer que, nas amostras estudadas (referentes somente ao
português escrito), o advérbio em -mente de tempo e de aspecto passou de um uso
relativamente livre para um uso mais fixo na posição marginal à esquerda e depois no
português atual passou a ser usado predominantemente na posição pós-verbal (mais
especificamente na posição marginal à direita). Trabalhos como os de Martelotta (2006) e
Albani (2007) também apontam pra o uso predominante da posição pós-verbal para os
advérbios ao longo da história do português.
Outro fator analisado foi a noção semântica do advérbio em que checamos a relação
entre ordenação e tipo semântico. No português arcaico observamos a predominância da
tendência pré-verbal, exceto os advérbios com os sentidos híbridos que expressam em si
mesmos os valores de tempo/aspecto e modo. É exatamente o fato de apresentar esse valor
polissêmico denominado de híbrido na presente pesquisa que explica o desvio que este
advérbio apresenta com relação à tendência da posição pré-verbal.
Outra questão a ser considerada nesta sincronia é que as noções cronológicas e
aspectual não são predominantes em relação às demais. Entretanto, identificamos que a noção
híbrida é mais freqüente, quanto à sua ordenação, eles ocorrem mais na posição 5 (margem
direita da cláusula), que é uma posição pós-verbal.
Na análise dos dados desse fator no século XVI, encontramos na relação entre ordem e
noção semântica, maior incidência de dados na posição 1 (margem esquerda da cláusula). As
noções cronológicas e aspectual, principalmente, predominam nessa posição (1), o sentido
híbrido ocorre mais nas posições pós-verbais, como atestam os trabalhos de Freitas (2004) e
Moraes Pinto (2002) em relação a esse tipo de advérbio.
no século XVII, observamos que as noções cronológicas e bridas predominam na
posição 1 (margem esquerda da cláusula). O sentido aspectual é menos freqüente (com
somente 1 dado na posição 1 (margem esquerda) e 1 dado na posição 5 (margem direita).
Além disso, verificamos que o tipo híbrido não foi mais recorrente nas posições pós-verbais,
como vimos no português arcaico e no século XVII, mais ainda assim, não foi uma diferença
marcante.
O baixo número de dados não nos permite fazer outras generalizações. O mesmo
aconteceu com as outras sincronias.
Em relação à análise dos dados do século XVIII, todas as noções apresentam-se
predominantemente na posição 1 (margem esquerda da cláusula, pré-verbal). E mesmo o
sentido híbrido é mais freqüente na posição pré-verbal.
Na análise dos dados do século XIX, verificamos que as posições mais recorrentes são
as pós-verbais. Em relação à noção semântica do advérbio, observamos que os sentidos
aspectual e híbrido são mais incidentes do que o cronológico. Além disso, identificamos que o
sentido híbrido é mais recorrente nas posições pós-verbais, como foi atestado em outros
trabalhos sobre os advérbios já citados ao longo desse estudo.
No português atual, verificamos uma distribuição entre a posição e a noção semântica
do advérbio de maneira mais homogênea entre os sentidos pelas posições arroladas.
Observamos também que as posições pós-verbais são mais freqüentes do que as posições pré-
verbais. E que o sentido aspectual é mais utilizado nos contextos examinados.
Como vimos, no português atual, predomínio da posição pós-verbal (mais
especificamente a posição marginal à direita). Apenas podemos concluir que, quando a noção
é basicamente aspectual, como em freqüentemente, o advérbio não tem posição predominante,
mas, quando apresenta noção dêitica (temporal) ou noção híbrida, como antigamente,
rapidamente, respectivamente, a posição típica é pós-verbal.
Outra perspectiva da presente pesquisa foi a observação da relação entre a forma de
realização do sujeito da oração, um critério de natureza sintática, e a posição do advérbio.
Para verificar essa relação, fizemos um controle dos seguintes tipos de sujeito: sujeito
expresso anteposto ao verbo; sujeito expresso posposto ao verbo; sujeito ausente e sujeito
pronominal (que/quem). Nessa perspectiva, pressupomos que a presença ou ausência do
sujeito influenciaria a colocação do advérbio de acordo com a noção semântica que o mesmo
venha expressar e, ainda, de acordo com a intencionalidade do escritor em enfatizar ou não
sua informação.
Ao tomarmos as posições pré-verbais de um modo geral, em oposição às pós-verbais,
verificamos que a ausência de sujeito nas posições pré-verbais não levou o advérbio a se
antepor ao verbo, ao contrário da hipótese do que posições vazias tenderiam a ser preenchidas
pelo advérbio.
Parece não haver, portanto, nos casos dos advérbios de tempo e de aspecto em -mente,
algum tipo de compensação ou equilíbrio no posicionamento dos elementos na estrutura da
cláusula. Além disso, ao observarmos separadamente a posição 1, ou seja, a que corresponde
à margem esquerda da cláusula e que, por hipótese, seria a que mais atrairia o advérbio,
notamos que isso também não ocorreu. De fato, houve uma quantidade maior de casos nessa
posição. Entretanto, quando se observam todas as ocorrências pré-verbais, notamos que a
margem esquerda, independentemente da presença ou não do sujeito, era a posição
preferencial dos advérbios pré-verbais.
Em função desses dados, concluímos que não houve uma relação significativa entre
presença/ ausência de sujeito em posição pré-verbal (marginal ou não) e colocação dos
advérbios aqui estudados. Esse mesmo resultado foi obtido em Martelotta (2006) para os
advérbios qualitativos e Marques (2008), que estudou a ordenação sujeito/ verbo. Portanto,
nossos resultados são contrários à hipótese de adjuntos (pelo menos do tipo que estamos
estudando) são colocados na posição do sujeito vazio.
Quanto à relação entre o tipo semântico do verbo e a posição, verificamos que esse
fator não influenciou a posição do mesmo.
O tipo semântico do verbo foi levado em consideração a fim de se testar a hipótese de
que determinado tipo de noção expressa pelo advérbio ocorreria com um determinado tipo de
verbo. Entretanto, essa hipótese não foi confirmada, pelos menos, nos corpora analisados.
Também queríamos verificar a relação entre o tipo semântico do verbo e a posição do
advérbio. Vimos que, quando o verbo é de processo material, o advérbio aparece mais na
posição 1 (margem esquerda da cláusula), os de processos relacionais, tanto intensivo quanto
possessivo, também ocorreram mais na posição 1. Nas outras posições, pelo baixo número de
dados, não foi possível traçar uma tendência para esse advérbio.
No português arcaico, observamos que o tipo de verbo mais recorrente é de valor
material em detrimento dos demais valores. Quanto à relação posição e sentido do verbo, o
tipo material ocorre nas posições 1 e 5, que o as posições margens esquerda e direita
respectivamente. Os verbos comportamentais tendem a ocorrer nas posições 5 e 6 e os verbos
de atividade verbal tendem a ocorrer na posição 6.
Nos dados apresentados, do século XVI, verificamos que os tipos mais freqüentes são
verbos materiais, mentais e relacionais possessivos.. Quando o verbo tem sentido material ou
mental, a tendência é o advérbio ocorrer na margem esquerda (POS1). Quando o verbo é
relacional possessivo não posição prototípica para o advérbio. em relação aos demais
sentidos dos verbos, há uma distribuição de dados equilibrada.
Já nos dados do século XVII, observamos que não há uma predileção pelo tipo
material, como vimos nos dados do português arcaico e do século XVI, mas, em relação à
posição e o tipo semântico do verbo em geral, todos são mais recorrentes na posição1
(margem esquerda) e uma relativa distribuição nas demais posições, o que não difere dos
séculos anteriores apresentados.
Os dados analisados do século XVIII demonstram que o tipo de verbo material é o
mais freqüente, seguido do tipo comportamental. Independentemente do tipo semântico, o
advérbio tende a ocorrer na posição marginal à esquerda (POS1).
No século XIX, constatamos que o tipo de verbo material é o mais freqüente, como
maioria das sincronias estudadas. Quanto à relação entre posição e tipo de verbo, observamos
que uma distribuição mais homogênea. Quando o verbo é material, o advérbio em -mente
ocorre mais na posição 1 ou na posição 6 . Os demais tipos tiveram poucos dados.
Verificamos, também, que os advérbios tendem a ocorrer mais nas posições pós-verbais
(Posições 5, 6, e 8).
nos dados do português atual, verificamos que o tipo de verbo mais freqüente é o
verbo de processo material, seguido dos de atividade verbal. Em relação ao tipo de verbo e a
posição do advérbio, vemos que, quando o verbo é material, o advérbio tende a ocorrer nas
posições 1 e 5; quando é de atividade verbal, tende a ocorrer na posição 5.
Nos resultados apresentados, uma tendência para os advérbios em -mente
aparecerem numa posição pré-verbal (no português arcaico, século XVI, XVII e XVII)
principalmente quando o verbo é de processo material, assim com os demais tipos de verbos.
Mas em relação à análise dos dados do século XIX e português atual, verificamos que há uma
predileção às posições pós-verbais. Esse resultado indica mudança na posição do advérbio ao
longo da história do português, o que vai ao encontro de outras pesquisas, como as de
Martelotta(2006) e Albani (2007), que demonstraram que os advérbios vêm mudando para a
posição pós-verbal, de um modo geral.
Além dessas hipóteses apresentadas, seguindo a proposta de Martelotta (2004) para os
advérbios qualitativos, estávamos considerando que a mudança de ordenação dos advérbios
de tempo e de aspecto em -mente poderia estar relacionada ao processo de gramaticalização
de certas estruturas sintáticas. De acordo com Givón (1979), a cláusula principal declarativa,
afirmativa, ativa, neutra é menos pressuposicional, no sentido de que sua interpretação
depende de menos material inferível do que a interpretação das demais estruturas. Isso
confere a esse tipo de cláusula (menos gramaticalizada) uma maior liberdade e variedade de
elementos significativos. Por outro lado, a distribuição dos elementos significativos, em todos
os outros tipos de cláusula (mais gramaticalizadas), é sempre mais restrita visto que esses
outros tipos de cláusula tendem a exibir grande conservadorismo sintático, sobretudo, no que
diz respeito à ordenação vocabular. Portanto, partindo dessa proposta, esperávamos encontrar,
no português arcaico, advérbios em posição pré-verbal (posição típica dos advérbios no latim)
ocorrendo mais nas orações mais gramaticalizadas (hipotáticas e subordinadas) do que nas
menos gramaticalizadas. E, no português atual, nossa hipótese era de que ocorreriam menos
advérbios em posições pré-verbais e que essas ocorrências envolveriam frases estilisticamente
marcadas.
Na análise dos dados do português arcaico, observamos que houve um número
significativo de ocorrências de advérbios de tempo e aspecto em -mente em posição pré-
verbal, mostrando que essa posição, assim como a pós-verbal, estava disponível para este tipo
de advérbio na fase arcaica de nossa língua.
Observamos que, no português arcaico, houve um pequeno predomínio de posições
pré-verbais em cláusulas gramaticalizadas. Isso pode ser apontado como um leve resquício da
tendência de que as posições pré-verbais têm para ocorrer em cláusulas mais
gramaticalizadas.
No século XVI, apesar da baixa ocorrência de dados nesta fase, de um modo geral, a
análise qualitativa apresentou resultados favoráveis às nossas hipóteses. A posição pré-verbal,
por exemplo, estava presente nesta fase do português em escala menor que a posição pós-
verbal. Além disso, foi possível observar que as orações mais gramaticalizadas elegem a
ordenação pré-verbal, 11 ocorrências distribuídas pelas posições pré-verbais (Pos 1, 2 e 3).
Tal observação contribui para confirmar a hipótese que adotamos com Givón (1979) de que
esses tipos cláusulas (mais gramaticalizadas) tendem a ser sintaticamente mais conservadoras,
principalmente, no que diz respeito à ordenação dos constituintes da oração.
Outra ressalva interessante é que, ao analisarmos o português arcaico, a hipótese de
Givón (1979) não foi de todo confirmada, apesar de encontrarmos uma leve tendência de as
posições pré-verbais ocorrerem em cláusulas mais gramaticalizadas. Por outro lado, na análise
do século XVI essa hipótese se confirmou quando se relacionaram as posições dos advérbios
com o grau de gramaticalização da cláusula em que o advérbio ocorreu.
Pudemos observar, na análise dos dados do século XVII, uma maior incidência de
casos foi na posição pré-verbal, porém, quando se relacionamos posição e grau de
gramaticalização, a hipótese givoniana não se confirmou, o mesmo atestado no português
arcaico com o tipo de advérbio estudado.
É interessante ressaltar que, no século XVIII, a nossa hipótese também foi confirmada:
a de que as orações mais gramaticalizadas elegem a ordenação pré-verba. Nesse caso, foram 8
ocorrências contra uma única ocorrência na posição pós-verbal.
Por outro lado, houve 5 ocorrências pré-verbais em cláusulas menos gramaticalizadas
em oposição a 4 dados na posição pós-verbal, também em cláusulas menos gramaticalizadas.
Isso é importante, porque pode apontar para o fato de que, até o século XVIII, era mais forte a
inclinação que os advérbios qualitativos apresentavam de ocorrer antes do verbo, o mesmo
acontecendo para os de tempo e de aspecto, reforçando os resultados obtidos em Martelotta e
Vlček (2006), segundo os quais essa tendência começa a enfraquecer no início do século XIX
e acaba por desaparecer na virada para o século XX.
No caso do século XIX, houve uma quantidade maior de ocorrências de advérbios de
tempo e de aspecto em -mente, embora as 22 ocorrências encontradas estejam longe de
constituir a quantidade necessária para se chegar a constatações mais precisas.
Assim como aconteceu com o século XVIII, era de se esperar que o século XIX
apresentasse uma relativa predominância das posições pós-verbais. Isso de fato ocorreu:
apresentou 12 ocorrências nessa posição no, total de 22 advérbios. Esses dados refletem a
tendência, mencionada anteriormente, que vem relativamente se delineando desde o século
XVI, uma vez que na fase arcaica do português com esse tipo de advérbio a hipótese não se
confirmou, ou como nos trabalhos de Moraes Pinto, 2002; Martelotta, 2004, a confirmação
dessas tendências foi constatada.
Outro resultado interessante se apresenta quando se relacionam as posições dos
advérbios com o grau de gramaticalização da cláusula em que ele ocorre. Do total de 9 casos
de advérbios pré-verbais, 4 correram em cláusulas mais gramaticalizadas (hipotáticas e
subordinadas). Cabe ressaltar aqui que a diferença entre as ocorrências em cláusulas menos
gramaticalizadas foi bastante pequena, 6 dados pré-verbais. Constatamos que, no século XIX,
se evidenciou uma mudança desses advérbios para as posições pós-verbais, apesar de eles não
serem predominantes em cláusulas com alto grau de gramaticalização, mais conservadoras em
termos de ordenação.
No português atual, a ocorrência dos dados demonstra uma propensão, que se
manifestou quase categoricamente, desses advérbios ocorrerem após o verbo, 28 dados, sendo
que 17 estão em cláusulas menos gramaticalizadas e 10 dados em cláusulas mais
gramaticalizadas. Cabe ressaltar que novamente obtivemos resultados atípicos aos esperados
segundo a hipótese proposta em relação à posição e o grau de gramaticalização das cláusulas.
Portanto, percebemos que houve diferentes fatores que influenciaram a ordenação
desses advérbios nas sentenças e que essa análise possa trazer esclarecimentos em relação ao
comportamento desses elementos no português. Muitos dos nossos resultados não comprovam
algumas das hipóteses apresentadas nesta tese e em outros trabalhos, mas refletem o emprego
real dos advérbios em -mente na história do português escrito. Assim são resultados
importantes inclusive porque apontam para tendências diferentes do que geralmente é dito.
A pesquisa foi realizada tendo em vista muitos fatores, demonstrando que procuramos
de diferentes formas verificar as estratégias discursivas, semânticas e sintáticas para o uso
desses advérbios. Claro que a análise não se esgotou e em muitos momentos. Assim,
apontamos para a necessidade de pesquisas futuras aprofundarem em um ou outro aspecto, ou
para a necessidade de se fazer um recorte diferente da análise, tendo em vista as sincronias e
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OS ADVÉRBIOS DE TEMPO E DE ASPECTO EM -MENTE E
SUA ORDENAÇÃO: UMA ABORDAGEM HISTÓRICA
Eliana Crispim França Luquetti
Rio de Janeiro
Fevereiro de 2008
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Faculdade de Letras
Comissão de Pós-Graduação e Pesquisa
OS ADVÉRBIOS DE TEMPO E DE ASPECTO EM -MENTE E
SUA ORDENAÇÃO: UMA ABORDAGEM HISTÓRICA
Eliana Crispim França Luquetti
Tese de Doutorado submetida ao
Programa de Pós-Graduação em
Lingüística da Universidade Federal do
Rio de Janeiro UFRJ, como parte dos
requisitos necessários para a obtenção do
título de Doutor em Lingüística.
Orientadora: Professora Doutora Maria
Maura da Conceição Cezario
Co-orientador: Professor Doutor Mario
Eduardo Toscano Martelotta
Rio de Janeiro
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LUQUETTI, Eliana Crispim França
Os advérbios de tempo e de aspecto em -mente e sua ordenação: uma abordagem histórica/
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Orientadora: Maria Maura Cezario
Co-Orientador: Mario Eduardo T. Martelotta
1 Advérbios. 2. Ordenação de palavras. 3. Funcionalismo
I. Cezario, Maria Maura (Orientadora) II Martelotta, Mario Eduardo T. III Universidade
Federal do Rio de Janeiro. Faculdade de Letras. IV Título
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Faculdade de Letras
Comissão de Pós-Graduação e Pesquisa
OS ADVÉRBIOS DE TEMPO E DE ASPECTO EM -mente E SUA ORDENAÇÃO:
UMA ABORDAGEM HISTÓRICA
Eliana Crispim França Luquetti
Orientadora: Professora Doutora Maria Maura da Conceição Cezario
Co-Orientador: Professor Doutor Mario Eduardo Martelotta
Tese de Doutorado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Lingüística da
Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos necessários para a
obtenção do título de Doutor em Lingüística.
Aprovada por:
Presidente, Profa. Doutora Maria Maura da Conceição Cezario
Vice-Presidente, Prof.Doutor Mário Eduardo Toscano Martelotta
Profa.Doutora Maria da Conceição Paiva-UFRJ
Profa. Doutora Deize Vieira dos Santos-UFRJ
Prof. Doutor Afrânio Gonçalves Barbosa-UFRJ
Profa. Doutora Mariângela Rios de Oliveira-UFF
Suplentes:
Profa. Doutora Christina Abreu Gomes-UFRJ
Profa. Doutora Maria do Rosário da Silva Roxo- Univ. Estácio de Sá
Tese defendida em 25/02/2008.
Dedicatória
Ao meu querido e amado Deus, pois “O
Senhor é a minha rocha, a minha
cidadela, o meu libertador; o meu Deus,
o meu rochedo em que me refugio; o meu
escudo, a força da minha salvação, o
meu baluarte”. (Sl 18:2,3)
Esperei confiantemente pelo Senhor; ele
se inclinou para mim e me ouviu quando
clamei por socorro. Tirou-me de um poço
de perdição, de um tremedal de lama;
colocou-me os pés sobre uma rocha e me
firmou os passos. E me pôs nos lábios um
novo cântico, um hino de louvor ao nosso
Deus; muitos verão essas coisas, temerão
e confiarão no Senhor. (Salmos 40:1-3)
Agradecimentos
A Deus que sempre cuidou de mim, orientando, confortando e abençoando-me.
À minha querida e amada mãe Suely por ter me ensinado o caminho do bem, da honestidade,
da persistência, da esperança. Enfim, devo-lhe tudo quem sou.
Aos meus filhos, Fernanda e Pedro Henrique pela compreensão, carinho e existência na minha
vida.
Ao meu esposo Wanderson Luquetti, pelo constante incentivo, pela infinita paciência, pelas
palavras de conforto e amizade.
Aos meus irmãos, Patricia, Douglas, Catiane e Viviane que são parte de mim. E,
principalmente as minhas irmãs Catiane e Viviane, pelo apoio e pelas palavras certas nos
momentos certos.
Aos parentes e amigos, pelo acompanhamento interessado. Em especial, Ernesto França, Célia
Viana, Thiara França, Thiago França, Pastor Leopoldo, Lenise Dutra, Ana Lúcia Costa,
Aparecida Azevedo, pelo apoio e carinho constantes.
À Professora Maria Maura Cezario pela grande confiança depositada em mim, pela amizade,
pelo apoio e incentivo constantes e fundamentais. E ainda, por ter me conduzido ao prazeroso
caminho da pesquisa e ensinando-me a importância do nosso papel enquanto professores e
pesquisadores, através do seu exemplo e dedicação.
Ao Professor Mário Eduardo Martelotta pela carinhosa acolhida no projeto Discurso e
Gramática, pela prontidão em ouvir e ajudar, pelo exemplo profissional.
Aos amigos Natália Ilse, Júlia Nunes, Érika Ilogti e Roberto Freitas Jr. Pela colaboração
preciosa nesta pesquisa.
A todos do projeto Discurso e Gramática pela sincera amizade e pelos grandes e inesquecíveis
momentos compartilhados.
SINOPSE
Análise diacrônica da ordenação dos advérbios de tempo e
aspecto em -mente na modalidade escrita do português,
sob a perspectiva funcionalista, buscando investigar
fatores funcionais e estruturais determinantes da
colocação desses advérbios na cláusula.
LUQUETTI, Eliana Crispim França. Os advérbios de tempo e de aspecto em -mente e sua
ordenação: uma abordagem histórica. Rio de Janeiro: UFRJ, Faculdade de Letras, 2008. 159
fls. Tese de Doutorado em Lingüística.
Resumo
Este trabalho tem como objetivo observar as diferentes posições que os advérbios de
tempo e de aspecto em -mente tendem a assumir em diferentes momentos históricos, bem
como analisar a polissemia desses elementos em textos escritos em português nas seguintes
fases históricas: arcaica, séculos XVI, VXII, XVIII e XIX e português contemporâneo.
Esta pesquisa, além de testar novas hipóteses, vem integrar e ampliar uma série de
estudos que visam examinar, de modo mais geral, o processo de mudança de colocação dos
advérbios no decorrer do tempo (Moraes Pinto, 2002; Martelotta, Barbosa & Leitão, 2002;
Martelotta, 2004; Martelotta & Processy, 2006; Andrade, 2005; Albani 2007; Freitas, 2004) e
outros trabalhos sobre o fenômeno em questão. A pesquisa demonstra que fortes indícios
de mudança de posição do advérbio de tempo e aspecto em -mente ao longo da história do
português.
De acordo com a hipótese geral, ao estudarmos cada sincronia devemos encontrar
motivações para as diferentes posições ocupadas pelos advérbios de tempo e aspecto em -
mente na oração. A motivação dá-se por um conjunto de fatores estruturais, semânticos,
cognitivos e/ou discursivos, a saber: a noção semântica; a estrutura sintática da oração em que
está inserido o advérbio; o tipo semântico do verbo que compõe a cláusula, segundo Halliday
(1994) e outros fatores.
LUQUETTI, Eliana Crispim França. Os advérbios de tempo e de aspecto em -mente e sua
ordenação: uma abordagem histórica. Rio de Janeiro: UFRJ, Faculdade de Letras, 2008. 159
fls. Tese de Doutorado em Lingüística.
ABSTRACT
This work aims to observe the different positions that the adverbs of time and look at
mind-tend to take on different historic moments, and examine the polissemia these elements
in texts written in Portuguese on the following historical stages: archaic, XVI, VXII, XVIII
and XIX and Portuguese contemporary.
This research, and test new hypotheses, comes integrate and extend a series of studies
to examine, more generally, the process of changing the placing of adverbs over time (Moraes
Pinto, 2002; Martelotta, Barbosa & Leitao, 2002; Martelotta, 2004; Martelotta & Processy,
2006; Andrade, 2005; Albani 2007; Freitas, 2004) and other works on the phenomenon in
question. The research shows that there are strong indications of a change of position of the
adverb of time and point-in mind throughout history of the Portuguese.
According to the general assumption, by studying each sync must find reasons for the
different positions occupied by adverbs of time and point-in mind in prayer. Motivation
comes about by a number of factors structural, semantic, cognitive and / or discourse, namely
the notion semantics, the syntactic structure of the prayer that is inserted into the adverb; the
kind of semantic word that composes the clause, according Halliday (1994) and others.
LUQUETTI, Eliana Crispim França. Os advérbios de tempo e de aspecto em -mente e sua
ordenação: uma abordagem histórica. Rio de Janeiro: UFRJ, Faculdade de Letras, 2008. 159
fls. Tese de Doutorado em Lingüística.
Résumé
Ce travail vise à observer les différentes positions que les adverbes en –ment de temps
et d'aspect prennent pendant les moments historiques, et d'examiner la polysémie de ces
éléments dans les textes écrits en portugais sur les étapes historiques suivantes: archaïque,
XVI, VXII, XVIII Et XIX et portugais contemporain.
Au délà de tester de nouvelles hypothèses, cette recherche vient d'intégrer et d'étendre
une série d'études pour examiner, de façon plus générale, le processus de modification du
placement des adverbes en –ment dans le temps (2002 2002 2004; Martelotta & Processy,
2006; Andrade, 2005; Albani 2007; Freitas, 2004) et d'autres ouvrages sur le phénomène en
question. La recherche montre qu'il y a fortes indications de changement de position de
l'adverbe en –ment de temps et d’aspect au long de l'histoire portugaise.
Selon l'hypothèse générale, en étudiant chaque synchronisation on doit trouver les
raisons pour lesquelles les différentes positions occupées par les adverbes en –ment de temps
et d’aspect dans la proposition. La motivation est donnée par un certain nombre de facteurs
structurels, sémantiques, cognitives et / ou discursifs, à savoir: la notion sémantique, la
structure syntaxique de la proposition que l’adverbe est inséré, le genre de mot sémantique qui
compose la clause, selon Halliday (1994 ) et les autres.
LISTA DE TABELAS
Tabela 1- Distribuição dos advérbios em -mente quanto à ordem em relação ao verbo.
Tabela 2- Levantamento Geral dos dados dos corpora dos Advérbios de Tempo e de Aspecto
em –mente.
Tabela 3 - Distribuição das posições dos advérbios de tempo e aspecto em –mente X
sincronias.
Tabela 4 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Português Arcaico.
Tabela 5 - A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Século XVI.
Tabela 6 - A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Século XVII.
Tabela 7 - A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Século XVIII.
Tabela 8 - A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Século XIX.
Tabela 9 - A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no Português Atual.
Tabela 10 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Português Arcaico.
Tabela 11 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Século XVI.
Tabela 12 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Século XVII.
Tabela 13 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Século XVIII.
Tabela 14 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Século XIX.
Tabela 15 - A relação o tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Português Atual.
Tabela 16 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Português Arcaico.
Tabela 17 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Século XVI.
Tabela 18 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Século XVII.
Tabela 19 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Século XVIII.
Tabela 20 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Século XIX.
Tabela 21 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Português Atual
Tabela 22 - Ocorrência de advérbios no Português Arcaico.
Tabela 23 - Ocorrência de advérbios no Século XVI.
Tabela 24 - Ocorrência de advérbios no Século XVII.
Tabela 25 - Ocorrência de advérbios no Século XVIII.
Tabela 26 - Ocorrência de advérbios no Século XIX.
Tabela 27 - Ocorrência de advérbios no Português Atual
LISTA DE QUADROS
Quadro1 – Distinção entre Advérbio e Pseudo-advérbio
Quadro 2 - Subposições dos Advérbios em -mente
LISTA DE ABREVIATURAS
EC – A essência do cristianismo
OE – Orto do esposo
SUMÁRIO
LISTA DE TABELAS
LISTA DE QUADROS
LISTA DE ABREVIATURAS
1 INTRODUÇÃO.......................................................................................................... 15
1.1 HIPÓTESES............................................................................................................... 18
1.2
O
BJETIVOS
............................................................................................................................................
20
2 REVISÃO DE LITERATURA.................................................................................. 22
2.1
A
QUESTÃO DA CATEGORIZAÇÃO
.........................................................................................................
22
2.2
A
DVÉRBIO
:
ELEMENTO DO LÉXICO OU DA GRAMÁTICA
?....................................................................
26
2.3
A
DVÉRBIOS
:
ESPÉCIES
,
FORMAS E SIGNIFICAÇÃO
...............................................................................
27
2.4
V
ISÃO
T
RADICIONAL DOS
A
DVÉRBIOS
................................................................................................
31
2.5
P
ESQUISAS SOBRE ADVÉRBIOS
,
SOB ORIENTAÇÃO DA
LINGÜÍSTICA
..................
.....................34
2.5.1
T
IPOS DE ADVÉRBIOS
.........................................................................................................................
34
2.5.2
E
STUDOS SOBRE O ADVÉRBIO EM
-
MENTE E SOBRE ORDENAÇÃO DE ADVÉRBIOS
............................
38
2.6
O
S ADVÉRBIOS E A EXPRESSÃO DE TEMPO
...........................................................................................
54
2.
7
O
S ADVÉRBIOS RELACIONADOS À CATEGORIA DE ASPECTO
.....................................................56
2.
8
A
FORMAÇÃO DE ADVÉRBIOS EM
-
MENTE
............................................................................................
60
3 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS................................................................................. 67
3.1
O
S PRINCÍPIOS FUNCIONALISTAS
..........................................................................................................
67
3.2
G
RAMATICALIZAÇÃO E
N
ÍVEIS DE
E
NCAIXAMENTO ENTRE
C
LÁUSULAS
...........................................
70
3.3
G
RAMATICALIZAÇÃO E ESTRUTURA SINTÁTICA
..................................................................................
72
3.4
A
S PRESSUPOSIÇÕES DISCURSIVAS DAS CONSTRUÇÕES SINTÁTICA
.............................................73
3.5
C
LASSIFICAÇÕES DOS VERBOS
,
BASEADA EM
H
ALLIDAY
(1994).........................................................
75
4 METODOLOGIA ....................................................................................................... 80
4.1
C
ORPUS
..................................................................................................................................................
81
4.2
D
ESCRIÇÕES DOS FATORES DA ANÁLISE DOS ADVÉRBIOS DE TEMPO E ASPECTO EM
MENTE
...........
84
5 ANÁLISES DOS DADOS........................................................................................... 89
5.1
A
NÁLISES DE FATORES
..........................................................................................................................
89
5.1.1
O
RDEM DO ADVÉRBIO DE TEMPO E ASPECTO EM
-
MENTE
................................................................
90
5.1.2
P
OSIÇÃO DO ADVÉRBIO
......................................................................................................................
93
5.1.3
N
OÇÃO SEMÂNTICA DO ADVÉRBIO
...................................................................................................
96
5.1.
4
T
IPO SEMÂNTICO DO VERBO
............................................................................................................
105
5.1.5
T
IPO DE SUJEITO
..............................................................................................................................
114
5.1.6
T
IPO DE ORAÇÃO
.............................................................................................................................
122
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................... 133
1 INTRODUÇÃO
Este trabalho tem como objetivo observar as diferentes posições que os advérbios de
tempo e aspecto em -mente tendem a assumir em diferentes momentos históricos, para
verificarmos se houve mudança na ordenação da frase da língua portuguesa com relação a
esses tipos de advérbios. Para isso, coletamos dados de textos do português das seguintes
fases históricas: arcaica, séculos XVI, VXII, XVIII e XIX e português atual.
Este estudo, além de testar novas hipóteses, vem integrar e ampliar uma série de
pesquisas que visam examinar, de modo mais geral, o processo de mudança de colocação dos
advérbios no decorrer do tempo (Moraes Pinto, 2002; Martelotta, Barbosa & Leitão, 2002;
Martelotta, 2004; Martelotta & Processy, 2006; Andrade, 2005; Albani 2007; Freitas, 2004).
A motivação para o presente estudo veio do trabalho realizado na dissertação de
mestrado de França (2002), na qual foi feita uma análise dos adjuntos adverbiais de tempo e
aspecto em narrativas orais e escritas contemporâneas, sob uma perspectiva funcionalista.
Nesse trabalho, procuramos delimitar os valores que esses adjuntos apresentavam no texto
narrativo, assim como as tendências de colocação que eles assumiam nas cláusulas que
compunham o texto.
Esses adjuntos adverbiais de tempo e aspecto, de um modo geral, apresentavam uma
grande mobilidade na cláusula, podendo ter suas tendências de ordenação explicadas por
fatores de caráter sintático e discursivo.
Nessa dissertação (França,2002), utilizamos o corpus Discurso & Gramática (Votre e
Oliveira: 1995), constituído de um conjunto de entrevistas faladas e escritas, concedidas por
informantes de C.A. infantil e adulto, 4
a
e 8
a
séries e 2
o
e 3
o
graus, apresentando os seguintes
tipos de discurso: narrativa de experiência pessoal, narrativa recontada, relato de
procedimento, relato de opinião e descrição de local. Essa análise, entretanto, se restringiu às
narrativas, já que partia do princípio de que os dois planos discursivos, figura e fundo,
apresentavam tendências de ordenação diferentes no que diz respeito aos elementos adverbiais
estudados.
Os resultados obtidos nessa análise mostraram que os adjuntos adverbiais
apresentavam a sua colocação de acordo com a sua função dentro do tipo de discurso (figura
ou fundo) de que faziam parte.
No presente trabalho, um aprofundamento da análise dos advérbios em -mente
(somente os advérbios em -mente, diferentemente da dissertação de mestrado) em vários
aspectos, uma vez que ampliamos os pressupostos teóricos e o número de fatores a serem
testados. Além disso, a distribuição das ordenações possíveis está muito diferente do que foi
feito em França, 2002. O foco agora é o texto escrito e a diacronia. Para isso, analisamos
textos de diferentes gêneros textuais ao longo dos séculos, da fase arcaica do português ao
período atual da Língua.
Eis alguns exemplos de dados analisados nesta tese a partir dos quais é possível
verificar a grande variedade de ordenação:
(1) E porque me consta o mensionado Bacharel Manuyel Pacheco de Paiva, que
atualmente o ocupa, se achar em diligencia fora dessa cidade( culo XVIII ,cartas oficiais,
PHPB).
(2) Quer dizer cana e pena, porque as penas antigamente faziam-se de certas canas
delgadas(Século XVII ,Sermão do Pe. A.Vieira).
(3) Atualmente as coisas estão como costumavam ser mil anos atrás(Português
atual,EC p.9).
(4) ...deixamos boas coisas para trás muito freqüentemente em nome da
independência (Português atual,EC, p.31).
Nota-se que, no exemplo (1), o advérbio atualmente ocorre antes do verbo (ocupa);
no exemplo (2), o advérbio antigamente, ocorre entre o sujeito (as penas) e o verbo (faziam-
se); no exemplo (3), o advérbio atualmente ocorre no início da cláusula (margem esquerda),
antes do sujeito (as coisas) e antes do verbo (estão); e, no exemplo (4), o advérbio
freqüentemente, ocorre depois do verbo (deixamos). Portanto, verificamos que os advérbios
em -mente podem ocorrer antes ou depois do verbo; entre o sujeito e o verbo; no início da
cláusula; no final da cláusula, enfim, diversas possibilidades de posição desse advérbio na
cláusula.
Ao pesquisarmos definições e classificações sobre os advérbios, em gramaticais
tradicionais e nas de orientação lingüística, percebemos que essa é uma classe bastante
complexa e colocada de forma pouco elucidativa, isto é, em geral, é definida e exemplificada
de modo simplista e pouco esclarecedora. Nesta pesquisa, estamos considerando como dados
advérbios que os estudiosos consideram ora como advérbios de tempo (como ultimamente,
primeiramente, antigamente), ora como advérbios de aspecto (freqüentemente, novamente,
constantemente) e ainda como advérbios de modo, como por exemplo, o advérbio
rapidamente, que é classificado tradicionalmente como advérbio de modo. Como também
nesse advérbio traços semânticos ligados ao tempo, também o incluímos na análise (cf. os
resultados do fator “tipo semântico do advérbio).
Entendemos que é necessária uma análise mais profunda sobre os advérbios de tempo
e de aspecto em -mente, abarcando seus usos ou funções; suas posições na cláusula e outras
características. Neste estudo, investigaremos questões como:
a) Por que o advérbio ora aparece no final, ora no início da cláusula, ora em outras
posições?
b) fatores que contribuem para a ordenação desses advérbios num dado lugar da
cláusula?
c) Existe uma posição fixa para determinados usos dos advérbios? Se existe, por que
isso acontece? Seria o tipo semântico do verbo que, com a freqüência de uso,
fixaria o advérbio numa dada posição?
d) relação entre a semântica do advérbio e a posição em que ele aparece mais
freqüentemente na cláusula? Há posições prototípicas para os advérbios em -
mente? Se há, houve alguma diferença de uso ao longo da história do português?
Acreditamos que esta pesquisa contribuirá para o estudo sobre a ordenação dos
advérbios de tempo e de aspecto e suas funções na cláusula na língua portuguesa. Contribuirá
também para melhor compreendermos a organização textual.
1.1 Hipóteses
As hipóteses desse estudo são:
(a) Pressupomos que ocorreram mudanças na posição dos advérbios da sincronia do
português arcaico para o contemporâneo. De acordo com trabalhos anteriores, como os
de Martelotta e Leitão (1999) e de Martelotta, Barbosa e Leitão (2001), a posição pré-
verbal (entre o sujeito e o verbo) era disponível para toda e qualquer espécie de advérbio
e, hoje, ela está disponível para alguns - portanto, houve uma mudança no padrão de
ordenação de alguns advérbios. Com relação aos advérbios de tempo e de aspecto em -
mente, acreditamos que deve haver uma posição prototípica para esse advérbio em
relação ao verbo, ao sujeito e ao complemento verbal nas diferentes sincronias, sendo
que, ao longo da história do português, pode ter havido uma contínua fixação da posição
do advérbio em relação ao verbo, uma vez que estudos diacrônicos demonstram que a
ordenação dos termos foi se tornando cada vez mais fixa.
(b) Seguindo a proposta de Martelotta (2004) para os advérbios qualitativos, estamos
considerando que a mudança de ordenação dos advérbios de tempo e de aspecto em -
mente parece está relacionada ao processo de gramaticalização de certas estruturas
sintáticas. De acordo com Givón (1979), a cláusula principal declarativa, afirmativa,
ativa, neutra é menos pressuposicional, no sentido de que sua interpretação depende de
menos material inferível do que a interpretação das demais estruturas. Isso confere a esse
tipo de cláusula (menos gramaticalizada) uma maior liberdade e variedade de elementos
significativos. Por outro lado, a distribuição dos elementos significativos, em todos os
outros tipos de cláusula (mais gramaticalizadas), é sempre mais restrita visto que esses
outros tipos de cláusula tendem a exibir grande conservadorismo sintático, sobretudo, no
que diz respeito à ordenação vocabular. Portanto, partindo dessa proposta, esperamos
encontrar, no português arcaico, advérbios em posição pré-verbal (posição típica dos
advérbios no latim) ocorrendo mais nas orações mais gramaticalizadas (hipotáticas e
subordinadas) do que nas menos gramaticalizadas, e, no português atual, nossa hipótese
é de que ocorram menos advérbios em posições pré-verbais e que essas ocorrências
envolvam frases estilisticamente marcadas.
(c) deve haver fatores de diferentes ordens que motivam o uso do advérbio em diferentes
posições na frase. Fatores como o papel semântico exercido pelo advérbio em -mente, o
tipo semântico do verbo, a presença ou ausência do sujeito na frase, dentre outros,
devem influenciar a ordem que este ocupa na sentença.
1.2 Objetivos
Pretendemos estudar as posições assumidas pelos advérbios em -mente na cláusula em
textos de diferentes gêneros textuais das seguintes fases do português: português arcaico, dos
séculos XVI, XVII, XVIII, XIX e português atual, observando, principalmente, o papel da
freqüência de ocorrência em dadas posições e a possível gramaticalização desses advérbios
com determinados tipos de verbo. Inicialmente, a opção por textos religiosos foi pela
disponibilidade de textos em documentos escritos em português arcaico, mas, quando
partimos para o levantamento de dados, verificamos que havia uma escassez de dados do
fenômeno em questão, sendo assim, decidimos investigar em outros gêneros textuais.
Mas, ainda assim, procuramos manter uma certa uniformização das tipologias, pois as
diferenças entre os usos dos advérbios encontrados poderiam ser atribuídas a diferenças
textuais e não à mudança lingüística.
Os principais objetivos desse estudo são:
1- analisar detalhadamente o uso dos advérbios de tempo e de aspecto em -mente no
português escrito;
2- acompanhar o uso da ordenação dos advérbios nos tipos de orações ao longo do
tempo, analisando os dados tanto do português arcaico quanto do português atual, para
verificar se as construções mais gramaticalizadas (cláusulas hipotáticas e
subordinadas) são mais conservadoras, isto é, favorecem a ocorrência de advérbios em
posições pré-verbais (posições mais antigas), e se as menos gramaticalizadas
(cláusulas principais e coordenadas) são mais inovadoras, propiciando a ocorrência de
dados com advérbios em –mente em ordenações pós-verbais;
3- verificar se indícios de mudança na sintaxe desse advérbio nas fases estudadas do
português: arcaica, dos séculos XVI, XVII, XVIII, XIX e português atual;
4- caracterizar as posições assumidas pelos advérbios de tempo e aspecto, apresentando
a freqüência de ocorrência de cada ordem assumida;
5- identificar os fatores que influenciam a ordenação desses advérbios em contextos em
que eles podem ocupar posições diferentes nas cláusulas, testando hipóteses
relacionadas à motivação de ordenação.
Para apreciação das questões aqui levantadas, apresentamos, no capítulo 2, uma revisão na
literatura sobre os advérbios, sua ordenação, formação e origem, no capítulo 3, os
pressupostos teóricos que fundamentam esse estudo; no capítulo 4, a metodologia utilizada
para codificação dos dados; no capítulo 5, a análise dos dados, interpretação dos resultados da
análise quantitativa, assim como dos fatores e hipóteses examinados; e, por fim, nos capítulos
6 e 7, seguem algumas considerações finais sobre os advérbios e a bibliografia,
respectivamente.
2 REVISÃO DE LITERATURA
Este capítulo consiste numa breve explanação sobre a questão da categorização e
estrutura da língua, como também, a descrição de algumas abordagens sobre a definição,
classificação e/ou ordenação de advérbios na cláusula. Aqui são apresentados trabalhos de
perspectiva tradicional, bem como os realizados em linhas de pesquisa lingüística que
estudam a Língua em uso.
2.1 A questão da categorização
Antes de apresentarmos as considerações sobre a classe que reúne os advérbios,
apresentaremos uma breve explanação sobre a questão da categorização, uma vez que estamos
reunindo numa mesma classe geral advérbios que os estudiosos ora consideram de tempo
(ultimamente, por exemplo), ora de aspecto (freqüentemente), ora de modo (rapidamente).
Além disso, a própria natureza da classe advérbio é de difícil análise, uma vez que reúne itens
muito diferentes tanto com relação à ordenação, como em relação à semântica.
Tradicionalmente, as classes das palavras têm sido definidas segundo suas
propriedades semânticas, sintáticas e morfológicas. As gramáticas tradicionais privilegiam o
aspecto semântico na conceituação do substantivo, do adjetivo e do verbo, e recorrem ao
aspecto funcional na conceituação da conjunção, da preposição e até mesmo do artigo, dos
pronomes e dos advérbios, que é o foco do nosso trabalho, e, estes últimos são conceituados
ainda pelo seu aspecto semântico, mas a análise apresentada não dá conta da sua imprecisão.
Os autores de um modo geral também chegam à conclusão da imprecisão dessa
categoria. Seja de um ponto de vista mais formal, como o de Camara Jr. (1976) ou o de
Bechara (1999), seja de uma perspectiva mais funcional, como a de Ilari et al. (1990) ou a de
Neves (2000), a categoria dos advérbios é considerada bastante controvertida.
Constituída por tipos de natureza muito diversa, em termos semânticos, sintáticos e
mesmo morfológicos, esse conjunto parece não resistir a uma definição mais geral, capaz de
dar conta da totalidade de seus usos. Nesse sentido, a abordagem categorial prototípica,
segundo Taylor (1995), em conformidade com a concepção funcionalista que nos orienta,
apresenta-se como o tratamento mais adequado para os tipos desse conjunto tão híbrido. De
acordo com tal concepção, podemos admitir que, numa dada classe, encontram-se membros
situados em pontos distintos em relação ao eixo categorial básico, de acordo com o número de
traços compartilhados pelos mesmos.
Assim, encontramos constituintes que de modo mais visível representam essa
categoria; em geral, são termos mais freqüentes e identificados pela comunidade lingüística
como pertencentes à categoria. Por outro lado, podemos registrar também termos que, por
conta da perda de traços categoriais, tendem a ocupar posição periférica ou marginal em
relação ao padrão, situando-se praticamente no limite ou na interseção com outra classe. Dos
advérbios aqui em análise, os de tempo e de aspecto em -mente, conforme a perspectiva
exposta anteriormente, estariam situados em um ponto de maior afastamento em relação ao
eixo da categoria dos advérbios. Segundo Ilari et al. (1990) e Neves (2000), esses tipos de
advérbios caracterizam-se por sua função não-predicativa ou não-modificadora, uma vez que
informações acerca de tempo não incidem sobre ou afetam a predicação, mas os de aspecto
sim. Assim definidos, estariam tais constituintes predispostos a ocorrer em pontos de maior
afastamento em relação ao verbo, conforme prevê o subprincípio de proximidade (Givón,
2001; Furtado da Cunha, Rios de Oliveira e Martellota, 2003), segundo o qual conteúdos
menos integrados são articulados por formas também menos integradas na superfície textual.
Além do aspecto relativo ao status dessa categoria, interessa-nos também mencionar a
questão da polissemia envolvida nos usos desses advérbios. De acordo com a hipótese
localista, podemos dizer que a referência espacial seria a mais primária ou original; a partir
desse sentido mais concreto, teríamos a derivação para tempo, de natureza mais abstrata, e, a
partir daí, os sentidos lógicos ou textuais, como a referência de modo, numa etapa de maior
abstratização. Segundo Pontes (1992, p. 8-9), através do uso dos mesmos elementos
gramaticais, projetamos as categorias de espaço para falar de tempo metaforicamente”;
conforme a autora, trata-se de derivação de sentido desde tempos imemoriais. O interessante
nessa abordagem é que os sentidos originais não são necessariamente descartados diante dos
mais recentes, o que vem a gerar polissemia dos usos adverbiais, principalmente na
articulação dos sentidos aspectuais, modais e temporais, muitas vezes sobrepostos.
Mattoso Câmara formulou na Estrutura da Língua Portuguesa uma classificação
baseada em dois critérios, um misto e outro simples, que é didaticamente satisfatória. Para ele,
os vocábulos formais do português se agrupam, primeiro, segundo a um critério morfo-
semântico, em quatro classes: nome, verbo, pronome e conectivo. As três primeiras classes
são constituídas basicamente de palavras variáveis, a última de palavras invariáveis.
O verbo distingue-se no grupo, nessa primeira divisão, pelo paradigma flexional em
que se enquadra (apresenta variação modo-temporal e número-pessoal). O nome e o pronome,
por sua vez, são vocábulos dotados de número e gênero, exprimíveis em uma e noutra classe
pelo mesmo mecanismo flexional. A distinção entre eles repousa, de um lado, na natureza da
significação, e de outro, em certas propriedades morfossintáticas exclusivas do pronome
(variação em pessoa e em caso)
Semanticamente, o nome ‘nomeia’ e os seres, permitindo que o locutor e o ouvinte os
designem sem o reforço da situação ou do contexto verbal. O pronome por outro lado, efetua
uma referência contextual ou situacional: quem diz aquela roupa estava na minha gaveta’,
está particularizando roupa e gaveta em função de uma situação. Sabe-se apenas, por meio
de aquelae de minha’, que a roupa em questão está distante dos interlocutores e que a
gaveta pertence ao locutor. Essa constatação, todavia, não esclarece tudo, uma vez que as
palavras ‘distante e próximo também significam noções relativas e nem por isso são
pronomes. Basicamente, importa ter em vista a referência à situação em que se encontram os
interlocutores: os pronomes a incluem na significação dos enunciados. Sendo assim, pode-se
dizer ‘Pernambuco fica distante de Santa Catarina em qualquer parte do Brasil, que o
significado da frase será o mesmo; mas quem diz Pernambuco fica distante daqui’ designa
com o ‘aqui’ o lugar em que, na qualidade de Emissor, se encontra. Logo, aquele’, ‘minha’ e
‘aqui’ tem uma significação situacional e são por isso, pronomes. Do ponto de vista mórfico,
boa parte dos pronomes apresenta formas distintas conforme a pessoa do discurso a que se
referem. Entre estes pronomes, os denominados ‘pessoais’ têm formas distintas para cumprir
as funções de sujeito e complemento. Acrescenta-se, quanto ao aspecto mórfico que vários
pronomes apresentam, ao lado das formas masculinas e femininas, uma terceira forma
‘neutra’ (aquilo, em face de aquele/aquela).
O segundo critério de Mattoso, de modo simples, redistribui os nomes, os pronomes e
os conectivos segundo características sintáticas. O nome e o pronome podem ser substantivos,
adjetivos ou advérbios; os conectivos podem ser conjunções ou preposições. Estes papéis
podem ser identificados no contexto da oração ou do sintagma: em ‘meus amigos ingleses’,
amigos é o núcleo da construção, classificado por isso como substantivo, ao passo que
ingleses, constituinte modificador, é um adjetivo; por outro lado, em as crianças amigas’,
crianças é o núcleo e amigas funciona como adjetivo. Na mesma linha de raciocínio, diremos
que elas são meus amigas’, elas, sujeito da oração, é um pronome substantivo, enquanto
minhas, adjunto de amigas, é um pronome adjetivo. Além disso, o nome e o pronome podem
funcionar como advérbios se o termo que acompanham é um verbo e podem dar lugar a
expressões preposicionadas. É o que se passa com alto a aqui em ‘Os garotos conversam alto
(cf. Os garotos conversam com entusiasmo’) e em Os garotos conversavam aqui’ (cf. Os
garotos conversavam nesta sala’).
Quanto aos conectivos, há, segundo Mattoso, os que ligam palavras (preposições) e os
que ligam orações (conjunções). Assim, em ‘casa de pedra’, ‘de’ é uma preposição, cabendo,
porém, a ‘enquanto’ o papel de conjunção em ‘Vilma iria enquanto você chorava’.
Das considerações feitas nas linhas anteriores, depreende-se a necessidade de se
repensar as características sintático-semântico-discursivas dos advérbios para um estudo mais
atento dessa categoria.
2.2 Advérbio: elemento do léxico ou da gramática?
Tradicionalmente, é feita uma separação entre elementos do léxico ou lexemas e
elementos da gramática, ou morfemas propriamente ditos.
Os elementos do léxico configuram imediatamente a realidade extralingüística e os
morfemas gramaticais remetem a uma significação intralingüística (significação externa e
objetiva). Os verbos plenos, substantivos e adjetivos são considerados elementos do léxico e
outras classes como conjunções, preposições, etc. são de modo geral considerados elementos
da gramática, assim como as flexões, prefixos e sufixos. Mas classes que apresentam
características de ambos os níveis. Uma dessas classes é o advérbio, que ora se comporta
como um item do léxico (haja vista a possibilidade de criação de novos advérbios em -mente),
ora se comporta como elemento da gramática.
No que se refere aos vocábulos derivados em -mente, torna-se inadequado, considerá-
los morfemas lexicais ou lexemas fora de um contexto específico, visto que alguns deles,
isoladamente não remetem à realidade extralingüística (valores temporais, sociológicos,
psicológicos etc.), motivo pelo qual se prefere denominá-los vocábulos e não palavras.
Vale ressaltar que Cunha e Cintra (1985) consideram morfemas lexicais os
substantivos, os adjetivos, os verbos e os advérbios de modo e, morfemas gramaticais os
artigos, os pronomes, os numerais, as preposições, as conjunções, os demais advérbios, bem
como as formas indicadoras de número, gênero, tempo, modo ou aspecto verbal.
Além disso, Brinton e Traugott (2005), que utilizam uma perspectiva funcionalista
semelhante à que caracteriza este trabalho, consideram os advérbios, por suas características,
como elementos da gramática.
Verifica-se que, além de apresentarem todos os “advérbios de modo” como morfemas
lexicais, os gramáticos mencionados denominam morfemas gramaticais não os afixos e
desinências (formas presas), como também as formas dependentes, na perspectiva de Câmara
Júnior, estabelecendo entre tais elementos uma relação de igualdade.
Com base nestes pressupostos, pergunta-se:
1) como considerar todos os vocábulos derivados em -mente, inclusive os desgastados pelo
uso automatizado, morfemas lexicais?
e, em conseqüência:
2) como denominar todos os “advérbios” não-marcados pela presença do sufixo -mente,
indistintamente, morfemas gramaticais?
2.3 Advérbios: espécies, formas e significação
Os advérbios são tradicionalmente caracterizados, priorizando os critérios semânticos
e formais. Sob o critério semântico, o advérbio expressa circunstâncias e, por outro lado, sob
o critério formal, eles podem modificar um verbo, um adjetivo, outro advérbio, ou todo o
enunciado.
Começando pelo critério semântico, tem-se a idéia de circunstância. Entendemos
como circunstância determinados indícios ou particularidades que caracterizam o conteúdo
expresso pelo termo ao qual o advérbio se refere. Sendo assim, pode-se entender como
expressando circunstâncias dados informacionais bastante diferentes entre si, como tempo,
lugar, modo, causa e, até mesmo, intensidade. Mas é difícil admitir que determinados tipos de
advérbios expressem circunstâncias, como é o caso, por exemplo, dos advérbios de dúvida, de
afirmação e de negação, respectivamente exemplificados abaixo:
(1) Talvez amanhã chova.
(2) Sim, choveu muito.
(3) Não choveu muito.
Nestes casos, os advérbios destacados não expressam circunstâncias, pelo menos de
acordo com a definição proposta acima, e sim uma atitude ou posicionamento do falante em
relação àquilo que está falando. O mesmo ocorre com os advérbios abaixo:
(4) Com certeza, vai chover amanhã.
(5) Felizmente, não choveu.
(6) Sinceramente, eu não gosto de chuva.
Nestes casos, ocorre nitidamente uma atitude ou posicionamento do falante em relação
ao que fala. Ducrot (1972) propõe que estes advérbios referem-se ao próprio ato ilocucionário
de afirmar, uma vez que qualificam o ato de dizer e não a coisa direta. Para ele, alguns
advérbios têm sua utilização explicada apenas por uma teoria dos atos da fala ou teoria da
enunciação, cuja unidade é o discurso.
Ducrot (1972) também apresenta alguns advérbios que indicam pressuposição: mal,
quase, exceto, também, somente, muito, pouco, entre outros. Embora alguns destes elementos
não sejam considerados tradicionalmente como advérbios, Ducrot (1972) os apresenta como
tal, afirmando que sua introdução no enunciado permite que determinado fato seja
pressuposto:
(7) Ele quase parou de fumar.
Nesta frase, o uso do elemento quase leva à pressuposição de que "ele" tentou parar de
fumar.
Como se pode ver, a visão de que os advérbios exprimem circunstâncias é muito
limitada. determinados tipos de advérbios cujo uso é basicamente determinado por fatores
pragmático-discursivos. E mesmo aqueles que funcionam normalmente como
circunstanciadores (de tempo, de lugar, de modo, de causa, de intensidade) muitas vezes são
usados para direcionar a interpretação do ouvinte, promover a organização das informações
no discurso além de outras funções pragmático-discursivas.
É o caso, por exemplo, do advérbio de tempo já, que pode assumir um papel de
elemento de contra-expectativa, no sentido que Heine et al. (1992) dão ao termo:
(8) A reunião terminou?
Nesta frase, mais que uma noção temporal, o elemento demonstra noção de contra-
expectativa do falante de que a reunião não tivesse terminado. Ou seja, a frase expressa o
contrário da expectativa e o advérbio já é a marca disto: é um elemento de contra-expectativa.
Mas também é de grande relevância pensar no aspecto formal da definição de
advérbio. É correto caracterizar os advérbios como elementos que se referem a um verbo, a
um adjetivo, a outro advérbio ou à oração inteira? autores que tentaram questionar isto,
como, por exemplo, Silva Jr. e Andrade (1907: 155), que afirmaram que os advérbios podem
modificar substantivos:
(9) Gonçalves Dias era verdadeiramente poeta.
Bomfim (1988: 9) questiona esta hipótese, afirmando que o termo poeta, no caso, não
pode ser entendido substantivamente, mas como um conjunto de qualidades atribuídas ao
elemento que recebe a referência. Assim, segundo autora, o elemento verdadeiramente
funciona, na realidade, como intensificador de poeta.
Por outro lado, pode-se pensar em outros exemplos, como os agrupados abaixo:
(10) A reunião na casa de Paulo foi proveitosa.
(11) O exemplo acima demonstra a hipótese.
(12) O país precisa de pessoas assim.
Nestas frases, os termos sublinhados referem-se claramente aos substantivos que os
antecedem e expressam circunstância (lugar nos exemplos 10 e 11 e modo no exemplo 12).
São casos diferentes do exemplo 9, onde o substantivo a que o advérbio se refere desempenha
função de predicativo. Deve-se considerar estes casos advérbio ou não? Mais uma vez se
evidencia a necessidade de se repensar o conceito tradicional de advérbio.
Mas este trabalho se deterá, mais especificamente, na ordenação dos advérbios de
tempo e de aspecto terminados em -mente. Mas é interessante estarmos sempre repensando
seu papel na estrutura da Língua.
Conforme propôs Givón (2001), a classe dos advérbios é a menos homogênea, tanto
do ponto de vista semântico quanto do morfossintático. Essa heterogeneidade é agravada pelo
fato de os advérbios funcionarem num plano de utilização da língua que tramita entre o campo
do léxico e a área da gramática, normalmente composta de elementos que assumem funções
voltadas para a organização interna do texto ou para a orientação argumentativa que se quer
dar a ele. De fato, o rótulo advérbio designa um conjunto muito diferenciado de elementos, e
parece constituir uma categoria fluida, que tende a se adaptar às intenções comunicativas
envolvidas no discurso.
Tradicionalmente, os advérbios são caracterizados como elementos de base nominal
(apenas < a + penas, depressa < de + pressa) ou pronominal (aqui, hoje) que de um ponto de
vista formal, são invariáveis, de um ponto de vista funcional (Câmara Jr: 1983) são termos
determinantes de um verbo ou de um nome (adjetivo e outro advérbio) e, de um ponto de vista
semântico, expressam circunstâncias, como foi explicitado anteriormente, ou seja, o
problema da generalização das definições.
2.4 Visão Tradicional dos Advérbios
Com base no que observamos em Said Ali (1969), Melo (1970), Rocha Lima (1985),
Cunha & Cintra (1985) e Bechara (2000), podemos dizer que os advérbios são
tradicionalmente caracterizados, de um ponto de vista semântico, por expressarem
circunstâncias e, de um ponto de vista formal, por modificarem um verbo, um adjetivo, outro
advérbio, ou toda a declaração, como se pode observar na definição de advérbio proposta por
Rocha Lima:
[...] palavras modificadoras do verbo. Servem para expressar
as várias circunstâncias que cercam a significação verbal (...).
Alguns há, até, que não acompanham a verbos, mas somente a
adjetivos e advérbios. (ROCHA LIMA, 1985: 174).
No que se refere especificamente aos advérbios de tempo, as gramáticas tradicionais
também não dizem muito. Apresentam a noção de tempo como uma das noções
circunstanciais expressas pelos advérbios e elencam uma série de elementos, como: agora,
ainda, amanhã, anteontem, antes, breve, cedo, depois, então, hoje, jamais, logo, nunca,
ontem, sempre, tarde, entre outros. Também não se vê, nas gramáticas tradicionais, uma
relação entre determinadas noções aspectuais e a classe dos advérbios. Aliás, a noção de
aspecto é normalmente deixada de lado nas gramáticas e as diferenças entre as noções
temporais dêiticas e não-dêiticas não são abordadas.
A respeito da ordenação dos advérbios, tema que nos interessa mais, os gramáticos
tradicionais, de um modo geral, nada menciona. Apenas Cunha e Cintra (1985) e Bechara
(2000) falam algo sobre o assunto.
Cunha e Cintra (1985) se referem à colocação adverbial em sua gramática, afirmando
que "os advérbios que modificam um adjetivo, um particípio isolado ou outro advérbio
colocam-se de regra antes destes". Em seguida, propõem que, com relação aos advérbios que
modificam o verbo, ocorre o seguinte:
a) Os advérbios de modo colocam-se normalmente depois do verbo.
b) Os advérbios de tempo e de lugar podem colocar-se antes ou depois do verbo.
c) O advérbio de negação antecede sempre o verbo.
Ainda acrescentam que os advérbios modificadores de outro advérbio, de um adjetivo
ou de um particípio isolado posicionam-se antes destes.
Os autores em questão propõem também que "o realce do adjunto adverbial é
expresso de regra por sua antecipação ao verbo", mas nada dizem em relação à colocação de
cada tipo específico de advérbio para fins de realce, muito menos o que ocorre neste sentido,
com os tipos de advérbios que já tendem a aparecer antes do verbo.
Entretanto, tratam a colocação desses advérbios em linhas muito gerais, uma vez que
se sabe, por exemplo, que os advérbios de modo são muito complexos. Além disso, não dizem
o porquê de tal ordenação. Também não mencionam a posição de outros tipos de advérbios.
Bechara (2000) também menciona a questão da colocação dos advérbios, ao afirmar
que esses elementos não se referem apenas ao verbo, podendo assim aparecer em várias
posições. Considera que a melhor proposta é a de Llorach (2000): o analista deve ater-se “às
relações que cada advérbio contrai dentro do enunciado, quer no seu papel primário de
adjacente circunstancial, quer por sua combinação com outras unidades no interior de um
grupo nominal unitário”. Como analisa Martelotta (2000), essa é a posição tomada por muitos
trabalhos de base funcionalista, em que a colocação dos advérbios está relacionada ao seu
funcionamento no enunciado.
Em Bechara (2001:290), é dito que o advérbio possui certa flexibilidade de posição,
uma vez que sua função não está ligada apenas ao verbo, mas estende-se ao conteúdo
expresso pelo predicado e ao domínio do sujeito, podendo antecedê-lo ou precedê-lo. No
entanto, o autor não especifica em que contextos tais posições podem ocorrer.
Como se pode ver, as gramáticas tradicionais são pouco elucidativas no que se refere
à classificação e, sobretudo, à ordenação de advérbios, apresentando propostas para os
diferentes tipos de advérbios que são bastante controversas: os advérbios de negação, por
exemplo, não antecedem sempre o verbo e podem ocorrer antecedendo o termo, na sentença,
que está sendo negado (Ex.: Eu chamei não a você, mas a seu irmão). E afirmar que os
advérbios de modo colocam-se normalmente depois do verbo é nada dizer diante da
complexidade da colocação deste tipo de advérbio na sentença e a outras propriedades
pertinentes a outros desses elementos.
2.5 Pesquisas sobre advérbios, sob orientação da Lingüística
2.5.1 Tipos de advérbios
Um dos trabalhos que apresenta uma profundidade sobre a ordenação dos advérbios é
o de Ilari et al. (1990), que, em uma análise detalhada dos advérbios e de sua ordenação,
propõem que essa classe de palavras pode dividir-se em dois grandes tipos: predicativos e
não-predicativos.
Os advérbios predicativos caracterizam-se por constituírem argumentos de segunda
ordem. Assim como o verbo e o adjetivo atribuem uma ação ou qualidade ao sujeito, os
advérbios predicativos modificam a ação ou qualidade atribuída ao sujeito. Do ponto de vista
sintático, esses advérbios podem modificar o sentido do verbo, do adjetivo ou de outro
advérbio. São exemplos desse tipo de advérbio: bem, muito, gratuitamente. Os não-
predicativos, por outro lado, não são compatíveis com as idéias de modificação de sentido e
de predicação de segunda ordem, apresentando funções bastante diferentes daquelas que
caracterizam os advérbios predicativos.
Interessam-nos, nesse trabalho, os advérbios predicativos. Nessa classe de advérbios
enquadram-se, segundo os autores, as seguintes subclasses:
a) Qualitativos - paralelos à construção com substantivo, que expressa qualidade (comida
boa), esses advérbios modificam o sentido dos elementos a que se referem: Comer bem,
maravilhosamente bem. Entre esses advérbios encontram-se mal, assim, entre outros.
b) Intensificadores - relacionam-se tipicamente a verbos, adjetivos e advérbios,
intensificando-lhes o sentido: muito, mais, etc.
c) Modalizadores - aplicam-se a sentenças completas e indicam atitude proposicional:
certamente, felizmente, etc.
d) Aspectualizadores - são advérbios cujos traços semânticos correspondem a noções
aspectuais do verbo da sentença em que ocorrem: geralmente, diariamente, de vez em quando,
algumas vezes, etc.
Os qualitativos e os intensificadores apresentam características muito semelhantes
entre si, que podem referir-se ao verbo, ao adjetivo ou a outro advérbio. Isso os diferencia
dos chamados modalizadores, que, segundo os autores, de um modo geral, qualificam a
asserção, relacionando-se à sentença inteira.
Quando se referem ao verbo, os advérbios qualitativos apresentam determinadas
restrições seletivas quanto ao conteúdo do verbo que modificam, tendo, portanto, fundamento
argumental. Assim, alguns advérbios não podem referir-se a determinados verbos: o advérbio
gratuitamente, por exemplo, não pode ser atribuído ao verbo pagar.
Isso diferencia os qualitativos dos advérbios aspectualizadores, cuja restrição seletiva
se refere ao esquema tempo-aspectual do verbo: o advérbio geralmente, por exemplo, não
pode referir-se a uma forma verbal, de aspecto pontual e concluído, como, por exemplo, a
forma verbal caiu.
Curiosamente, Ilari et al. (1990), que propõem um trabalho sobre ordenação, pouco
falam acerca das tendências de colocação dos aspectualizadores. Além disso, não mencionam
uma categoria de advérbios de tempo, mas de advérbios aspectualizadores, que “indicam a
freqüência com que um verbo se reitera”. Dos exemplos apresentados pelos autores, todos se
relacionam a noções tradicionalmente associadas ao conceito de aspecto iterativo: geralmente,
normalmente, diariamente, de vez em quando, às vezes, entre outros. Entretanto, os autores
nada dizem sobre elementos adverbiais associados a outras noções aspectuais, como
pontualidade ou duratividade ou mesmo sobre elementos adverbiais, como ontem, hoje e
amanhã, por exemplo, que expressam informações temporais dêiticas, que não se relacionam
à noção de aspecto, mas à categoria gramatical de tempo, que, por definição, possui natureza
dêitica.
Outros autores, como veremos mais adiante, também acrescentam entre os tipos de
advérbios, termos que indicam noções semanticamente associadas a noções aspectuais. Um
exemplo de outro estudo sobre os advérbios e sua classificação é o de Castilho (1999). Nesse
trabalho, os tradicionalmente chamados advérbios de tempo foram arrolados entre um grupo
de advérbios que o autor classificou como qualificadores aspectualizadores.
O autor define a predicação qualificadora como “um processo semântico-sintático por
meio do qual um operador incide sobre uma classe, modificando ou confirmando sua
intenção, isto é suas propriedades específicas, ou traços semânticos ou semas, na terminologia
da Semântica estrutural”. Em seguida afirma que a qualificação é codificada gramaticalmente
pelos adjetivos, pelos advérbios predicativos e pelos adverbiais, representados por um
sintagma nominal ou por um sintagma preposicionado com valor adverbial.
Quanto aos chamados qualificadores aspectualizadores, o autor relaciona essa classe
de advérbios com a noção de aspecto, que possui natureza composicional, que resulta da
interação do sentido lexical do verbo com o tempo em que foram conjugados, seus
argumentos, os adjuntos adverbiais a ele associados e o padrão sintático em que o verbo está
encaixado.
O autor centra suas análises nas noções de perfectividade vs imperfectividade e
telicidade vs. atelicidade e propõe a existência de aspectualizadores imperfectivos e
perfectivos. Vejamos respectivamente dois exemplos dados pelo próprio autor:
(01)... ela teve escritórios durante... oito anos:: mais ou menos
(02) ajeitou os cabelos de um golpe
A importância desse trabalho está no fato de o autor resgatar uma importante relação
entre aspecto e discurso, relacionando os usos desses advérbios aos dois planos discursivos
característicos da narrativa, propostos em Hopper (1979): figura e fundo. O autor propõe que,
na narrativa por ele analisada, as ações imperfectivas ocorrem em fundo e também em figura,
contrariando a proposta de Hopper (1979), de que a imperfectividade é típica de fundo.
O trabalho de Castilho (1999), portanto, tem o valor de sofisticar mais um pouco a
noção de advérbio aspectual. Mas, além de não mencionar questões relacionadas à ordenação,
ainda não resolve os dois problemas básicos apontados. Não analisa outras noções
aspectuais, além da distinção entre perfectividade vs imperfectividade e as noções
semanticamente próximas a ela. Nada menciona acerca dos elementos adverbiais que
expressam informações temporais dêiticas, que não se relacionam à categoria de aspecto, mas
à de tempo.
Outro trabalho que merece menção é o de Givón (2001), que chama atenção para o
fato de que advérbios podem indicar, no tempo, vários aspectos temporais dos eventos e
caracterizam esses advérbios como advérbios de tempo e aspecto. Para o autor, não é o verbo,
mas a cláusula que constitui o escopo semântico destes advérbios, cujas características
morfossintáticas são muito heterogêneas.
Sem entrar em detalhes de análise, o autor apresenta exemplos do inglês, que são
tipicamente aspectuais, como often, always, again, continuously, on and on, entre outros.
Podemos notar que o autor não se restringiu ao aspecto iterativo, na medida em que
apresenta o caso de continuously e on and on, por exemplo, que se relacionam a outras noções
aspectuais, como imperfectividade e progressividade. Por outro lado, apresentam também
exemplos de advérbios tradicionalmente temporais, como yesterday, tomorrow, entre outros.
Essa é a tendência que seguiremos aqui. Adotaremos uma classificação que leve em
conta as noções de tempo e aspecto, procurando refinar a análise das relações entre advérbios
e as diferentes noções aspectuais. Com base nisso, observaremos o comportamento desses
elementos nas diferentes fases do português, na modalidade escrita, tentando relacionar esses
dados com as diferenças em suas tendências de ordenação.
É importante também ressaltar que estamos lidando apenas com advérbios de tempo
e de aspecto em -mente.
2.5.2 Estudos sobre o advérbio em -mente e sobre ordenação de advérbios
Passamos agora a uma revisão dos estudos feitos sobre advérbios em -mente ou sobre
ordenação _ os dois focos principais desta tese _ sob o ponto de vista da ciência Lingüística.
A tese de Rodrigues (1994) apresenta um estudo de cunho variacionista com uma
perspectiva de comparabilidade funcional que analisa outras possíveis funções dos vocábulos
derivados em -mente, além dos adjuntos adverbiais. Afirma que esses vocábulos não
configuram isoladamente uma classe gramatical.
Ao analisar os dados e pressupostos teóricos de diversos autores, Rodrigues pôde
definir o advérbio como “vocábulo de natureza nominal, modificador do verbo que, em
relação aos outros nomes, caracteriza-se por apresentar invariabilidade de gênero e número”
(1994:159).
A autora estabeleceu uma oposição entre função adverbial e quaisquer outras funções
que os vocábulos derivados em -mente pudessem exercer no corpus analisado.
Assim, adotou o termo “pseudo-advérbio” de Bonfim (1988), para agrupar essas
outras funções, a saber: 1) a discursiva (funcionam como marcadores); 2) a de modificador de
nome; 3) a de modificador de sintagma preposicional; 4) a de modificador de sentença; 5) a
de modificador do pronome.
Representou essa distinção no seguinte quadro:
Quadro1 – Distinção entre Advérbio e Pseudo-advérbio
CLASSE
Nomes derivados
Em -mente
FUNÇÕES
Advérbio
“Pseudo-advérbio”:
–discursivo
-modificador de nome
-modificador do SP
-modificador da sentença
-modificador do pronome
(Rodrigues,1994:161)
A autora descobriu que o tipo do verbo aliado à classe do vocábulo que pertence à
classificação semântica do nome em -mente foram os fatores condicionadores da função dos
vocábulos derivados em -mente, que foram, na maioria das vezes, os “pseudo-advérbios”
(Rodrigues, 1994:162).
Outra pesquisa sobre itens em -mente é a dissertação de Freitas (2004), na qual a
autora trata especificamente dos advérbios temporais e aspectuais em -mente na língua oral
portuguesa, sob uma perspectiva funcionalista. Verifica que a posição mais típica desses
advérbios na oração é a pré-verbal quando ocorrem nas orações formadas pela estrutura
padrão da língua portuguesa SVCo (sujeito, verbo e complemento). Além disso, verifica que a
posição pré-verbal era predominante. Constatou, ainda, que há uma diferença de ordenação da
posição pré-verbal para pós-verbal, ou, pelo menos uma tendência para isso, quando não
um argumento verbal na posição adjacente e posterior ao verbo. Freitas verifica também que
certos itens em -mente como primeiramente e finalmente estão se gramaticalizando. Esses
deixam de expressar somente o tempo dos eventos e passam a organizar os eventos
cronológicos em seqüência textual, funcionando, segundo a autora, como conectivo, vejamos
alguns exemplos dados pela autora:
(1) /.../ o meu filho mais velho tem trinta e dois anos, depois eu tenho um filho de vinte e oito,
ai um intervalo de oito anos, eu tenho uma filha, (e finalmente com outro intervalo de seis
anos tem um garoto) (NURC-RJ, INQ. 084, 1.37).
(2) /.../ E: isso...como...como se faz?
I: primeiramente você pega a calha... pega a calha e ::/ tem um:: lugar de colocar o :: porta
start... aí você tem que furar ... os dois buraquinhos do lado... se for lâmpada de duas... porque
tem lâmpada? Tem luminária de uma lâmpada...de duas... tem lâmpada de vinte/.../ (D&G,
Juiz de Fora, 2
o
grau, relato de procedimento).
Segundo Freitas (2004), nos exemplos (1) e (2) acima, os itens destacados possuem
características de ligação entre sentenças e contextos lingüísticos, funcionando como
elementos de conexão.
Moraes Pinto (2002) fez uma análise da colocação e da polissemia de alguns itens
adverbiais em -mente no português arcaico e no português do século XIX, com atenção aos
seus valores qualitativos e modalizadores.
O objetivo desta pesquisa foi demonstrar que alguns advérbios qualitativos e
modalizadores terminados em -mente sofreram, no decorrer do tempo, mudança na sua
polissemia do português arcaico até os dias atuais. Essa mudança é sucessiva e unidirecional e
consiste num processo de gramaticalização, com esses elementos passando de advérbios
internos à cláusula a advérbios sentenciais. Em certos casos, os valores qualitativos
encontrados no início da trajetória desaparecem e os advérbios passam a assumir funções
pragmático-discursivas.
Os diferentes valores semânticos desses elementos implicam diferentes colocações e
funções na oração. No português arcaico, os advérbios qualitativos possuíam grande
mobilidade na cláusula, podendo ocupar diversas posições, inclusive a de tópico. A partir do
século XIX, algumas posições se tornaram indisponíveis a esses advérbios, pois, com o
processo de gramaticalização, conforme seus valores semânticos se modificavam, eles
passaram a ter um caráter específico e passaram a depender das características gramaticais de
sua nova função. Esse trabalho tem grande relevância para a presente tese, pois nos aponta
alguns caminhos a ser trilhados, como em relação ao processo de gramaticalização, a questão
ordenação no decorrer do tempo, além dos fatores analisados que motivaram sua realização
através dos séculos.
A pesquisa de Andrade (2005), sobre a ordenação das locuções adverbiais de tempo
em 100 editoriais sob o arcabouço teórico funcionalista, demonstrou que as locuções
temporais não têm uma posição prototípica nesse gênero, apresentando apenas uma pequena
tendência de ocorrência na posição pós-verbal (55% dos dados). A autora observou que as
locuções (tanto as pequenas como as mais longas), em editoriais tendem a aparecer nas
posições marginais à cláusula, ou seja, logo no início da cláusula ou no final, como nos
exemplos a seguir:
.
(3) Nas últimas duas eleições, indiretas, não houve sequer desafiante. (12-JB/1999).
(4) É a oportunidade de recuperar o verniz que o partido perdeu ao longo do caminho. (129-
JB/2004).
As locuções, no gênero estudado, aparecem normalmente na posição de sujeito quando
este está ausente (sujeito oculto ou oração sem sujeito) ou está na posição pós-verbal. Neste
caso, ou seja, na ordem VS (verbo-sujeito), 74% das locuções coletadas estão na posição pré-
verbal, como no exemplo:
(5) Nos últimos dois meses, foi roubado o carro blindado do ministro da justiça. (47-
JB/2003).
Mas, quando o sujeito está na sua posição prototípica, ou seja, na ordem SV, as
locuções adverbiais aparecem 68% na posição pós-verbal, como no exemplo a seguir:
(6) A Libéria nasceu em 1822, como pátria de ex-escravos americanos. (JB/2003).
Como Andrade, também verificaremos a posição dos advérbios em -mente e a relação
com a presença ou ausência do sujeito.
Cezario, Ilogti e Costa (2005) verificaram que, em textos religiosos contemporâneos,
as locuções tendem a ocorrer na posição pré-verbal (62% dos dados), como no exemplo:
(7) “minutos depois estava ali apenas a mulher e ele (CSP)
De todos os tipos semânticos estudados (locuções dêiticas, durativas, reiterativas e
simultâneas) pelas autoras, apenas as durativas tendem a ocorrer em posição pós-verbal
(72%).
As autoras observam que as locuções que aparecem inseridas entre o sujeito e o verbo
ou entre o verbo e o complemento/predicativo estão em orações com baixíssima
transitividade, como as com verbo de ligação ou com modal e verbo de ligação:
(8) “A aclamação depois da consagração também pode ser cantada” (p.74, l.11 CEV)
(9)Nossas músicas deverão ser ao mesmo tempo carismáticas e proféticas (p.84, l.28 CEV)
as orações com mais traços positivos de transitividade tendem a ter as locuções em
posições marginais, como abaixo em que a locução A seguir ocorre na margem esquerda de
uma oração altamente transitiva:
(10) “(...) rangeu os dentes, mudou de cor, fez a pior carranca do universo, prendeu as mão e
deu um grito de raiva. A seguir levantou o soldado pela roupa, virou o rosto e disse (...)” (p.
143, CSP).
Essa pesquisa é importante para a presente tese, pois também será testada a relação
entre semântica do elemento adverbial e ordenação. A questão da transitividade será vista
indiretamente ao estudarmos a relação entre tipo semântico do verbo e a posição do advérbio.
Albani (2007) verificou que a posição típica do advérbio sempre era pré-verbal no
português arcaico e pós-verbal no português contemporâneo. Todos os fatores estudados
indicam que, no português arcaico, a ordem era mais livre e mais motivada, enquanto no
português atual a ordem é mais fixa. Segundo ele, há um forte indício de mudança na
ordenação do advérbio sempre em textos religiosos.
Seu trabalho foi importante para esta tese, pois é uma pesquisa de ordem diacrônica e
que traz resultados interessantes quanto à fixação de posição de advérbios. Muitos dos fatores
testados por ele também foram testados por nós, como a relação entre tipo semântico de verbo
e ordenação de advérbio. Com relação a esse fator, Albani destaca que, no português atual, o
advérbio sempre quase que categoricamente se apresenta na posição pós-verbal quando o
verbo é relacional intensivo (verbo de ligação).
Uma pesquisa de grande importância para o nosso trabalho é a realizada por
Martelotta (1994) que; analisa, em uma perspectiva funcional, a ordenação dos
circunstanciadores temporais. Esses compreendem os advérbios, adjuntos, orações adverbiais
e operadores argumentativos que expressam a noção do tempo. O corpus utilizado é
constituído de entrevistas elaboradas pelo Censo de Variação Lingüística, Competências
Básicas de Português e NURC. Para o estudo diacrônico dos operadores argumentativos,
foram utilizados textos antigos, como: “Vigeu da Consolação” (1959), “A demanda do Santo
Graal” (1944), “O Bosco Deleitoso” (1950), dentre outros.
O objetivo do estudo do autor é buscar fatores discursivos que motivem a colocação
desses circunstanciadores na sentença. Em outras palavras, o autor propõe demonstrar que os
argumentadores discursivos seguem leis e tendências de colocação diferentes dos demais
circunstanciadores. A ordenação dos argumentadores discursivos deve-se a dois processos de
mudança semântica: metáfora espaço> (tempo) > texto (Heine et al., 1991) e pressão de
informatividade. ( Traugott e Heine, 1991).
O primeiro processo de mudança consiste em um elemento de valor espacial assumir
um sentido temporal e, depois, passar a expressar relações lógicas no discurso. Por exemplo:
“O operador argumentativo aí, originalmente um dêitico espacial, pode também ser usado
para seqüenciar (temporalmente) os eventos e expressar uma idéia de conseqüência em
relação às sentenças anteriormente mencionadas” (Martelotta 1994:5).
A mudança por pressão de informatividade dá-se quando um elemento lingüístico
adquire um novo valor através de um processo de inferência conversacional em certos
contextos. Um exemplo citado por Martelotta é o do operador argumentativo “ainda cujo uso
de marcador de contra-expectativa, por um processo de inferência passa a assumir um valor
inclusivo semelhante ao do termo também” (1994:6).
O autor ressalta que geralmente esses dois processos de mudança ocorrem juntos
quando se trata do aparecimento de operadores argumentativos que tendem a perder sua
mobilidade original para assumir posições mais fixas na sentença. Esse processo de
gramaticalização foi estudado nos seguintes operadores argumentativos: aí, depois, logo,
então, já e ainda.
Ao apresentar a ordenação dos circunstanciadores temporais, propriamente ditos,
Martelotta adota o princípio de Hopper e Thompson (1980) de que o discurso narrativo
apresenta duas estruturas denominadas figura e fundo, estendendo-o ao discurso não-
narrativo.
Distingue figura e fundo, primeiramente, opondo a intenção do falante ao direcionar o
fluxo do discurso para a narrativa ou para a não-narrativa: se o falante está narrando, eventos
e situações não-narrativas funcionam como fundo; e, ao contrário, se o falante está
comentando ou descrevendo, eventos e situações narrativas funcionam como fundo, servindo
para evidenciar este comentário ou esta descrição (1994:2-3).
Uma outra distinção entre figura e fundo é realizada através da análise de traços
semântico-gramaticais. Assim, na narrativa, os eventos funcionam como figura quando são
marcados pelos traços [=específico], [=perfectivo], [=cinético], [pontual] e funcionam como
fundo quando marcados pelos traços [-específico], [-perfectivo], [-cinético], [-pontual].
no discurso não-narrativo, os eventos que funcionam como figura são marcados
pelos traços [-específico], [+perfectivo], [+cinético], [+pontual] e funcionam como fundo,
aqueles marcadores por [-específico], [-perfectivo], [-cinético], [-pontual].
Com o objetivo de verificar as tendências de posições desses circunstanciadores de
tempo, Martelotta os classificou em:
a)Circunstanciadores de tempo determinado- são aqueles que indicam, de forma precisa, o
momento em que ocorre o evento. Cita como exemplos: ontem, hoje, semana passada,
quando ele chegou etc.
b)Circunstanciadores de tempo indeterminado- expressam a noção de que os eventos e
situações perduram no tempo indeterminadamente. Exemplifica com: sempre, geralmente,
atualmente, nunca etc.
c)Circunstanciadores iterativos- denotam a freqüência com que os eventos não-específicos
ocorrem ao longo do tempo, como às vezes, duas vezes por semana, de vez em quando etc.
d)Circunstanciadores de simultaneidade- expressam a concomitância entre eventos e
situações. Como os exemplos, citam: enquanto isso, ao mesmo tempo etc.
e)Circunstanciadores delimitativos- delimitam os eventos e as situações, indicando o início
e/ou fim de sua permanência no tempo, como: há três anos, até hoje, durante dois meses etc.
O autor conclui que existe uma tendência determinada para a colocação dos
circunstanciadores temporais na sentença. Essa depende da força que a informação, carregada
pelo circunstanciador, assume dentro da estrutura do discurso em que ele ocorre.
O circunstanciador tende a aparecer em posições pré-verbais, “quando traz
informações temporais análogas aos traços semântico-gramaticais do discurso em que ocorre.
Esta relação semântica empurra o circunstanciador para as posições pré-verbais, enfatizando-o
ou topicalizando-o” (1994:201).
No entanto, se não essa relação semântica, o circunstanciador tende a ocorrer nas
posições pós-verbais, ou até não ocorrem “em tipos de discurso cujos traços semântico-
gramaticais são não-análogos ou incompatíveis com a informação temporal por ela expressa”
(1994:201). Dessa forma, os circunstanciadores de tempo determinado tendem a ocupar
posições pré-verbais em figura narrativa e não-narrativa, uma vez que a força informativa que
assumem nestes contextos os leva a ser topicalizados ou enfatizados.
Os circunstanciadores de tempo indeterminado e os circunstanciadores de
simultaneidade têm como tendência o aparecimento na posição pré-verbal em fundo narrativo
e não-narrativo, devido também à força informativa assumida que os leva a topicalização ou
ênfase.
No que se referem aos circunstanciadores iterativos, esses apresentam maior
ocorrência nas posições pré-verbais em fundo narrativo e não-narrativo e em figura não-
narrativa, já que esses tipos de discursos são marcados pelo traço [-específico], estimulando a
iteratividade.
Por fim, os circunstanciadores delimitativos possuem uma mobilidade de colocação
maior, porque apresentam duas características distintas: por um lado, funcionam como um
circunstanciador de tempo determinado (indica o momento específico em que se inicia e/ou
termina o evento). Por outro lado, “expressam a duração de eventos específicos imperfectivos,
ou de eventos não-específicos ao longo do tempo, acrescentando características semântico-
gramaticais típicas de fundo” (1994:229).
Quanto à colocação dos operadores argumentativos, Martelotta afirma que, devido ao
processo de gramaticalização que sofrem, não seguem as mesmas tendências de ordenação
dos circunstanciadores propriamente ditos. A gramaticalização faz com que o elemento exerça
funções argumentativas, restringindo a sua possibilidade de colocação na sentença. Tal
colocação “passa a depender mais das características gramaticais específicas de suas novas
funções, que se manifestam em contextos específicos, assumindo posições mais fixas dentro
da sentença” (1994:229-230).
O trabalho de Martelotta (1994) foi muito importante para presente tese, sobretudo, no
que se refere às posições estabelecidas, como também no que se refere a alguns parâmetros da
transitividade, à análise bastante detalhada dos circunstanciadores de tempo, buscando fatores
que influenciam a sua colocação na sentença à luz da teoria funcional.
Ressaltamos que o autor estuda os advérbios em geral, enquanto, esta tese trata apenas
dos advérbios de tempo e aspecto em -mente.
França (2002) parte da tese de Martelotta e faz uma análise dos adjuntos adverbiais de
tempo e aspecto em narrativas orais e escritas contemporâneas, procurando delimitar os
valores que esses adjuntos apresentavam no texto narrativo, assim como as tendências de
colocação que eles assumiam nas cláusulas que compunham o texto. Esses adjuntos
adverbiais de tempo e aspecto, de um modo geral, apresentam uma grande mobilidade na
cláusula, podendo ter suas tendências de ordenação explicadas por fatores de caráter sintático
e discursivo.
Um dos fatores mais importantes foi o plano discursivo. A autora verificou que
tendiam a serem enfatizados, ocupando posições pré-verbais, os adjuntos que apresentavam
traços semântico-gramaticais análogos aos traços semântico-gramaticais do plano de discurso
em que apareciam; enquanto os adjuntos adverbiais de tempo e aspecto determinados não
apresentaram resultados estatísticos que ratificassem a hipótese postulada; já os adjuntos
adverbiais de tempo e aspecto indeterminados tendiam a ocupar posições pré-verbais em
fundo, porque este tipo de discurso caracteriza-se pela presença de situações não-específicas;
e ainda, os adjuntos adverbiais de tempo e aspecto de simultaneidade tendiam a ocorrer em
fundo e em posições pré-verbais. Isto ocorria porque o discurso de fundo tende a apresentar
traços semântico-gramaticais (não-específicos) marcados pela simultaneidade; os adjuntos
adverbiais delimitativos, embora não tenham apresentado tendência muito forte, pareciam
buscar as posições pós-verbais em figura já que expressavam a duração de eventos específicos
imperfectivos, ou de eventos não-específicos ao longo do tempo, apresentando traços
semântico-gramaticais típicos de fundo; enquanto aos adjuntos adverbiais de tempo e aspecto
iterativos tendiam a ocorrer em posições pré-verbais de fundo, porque este tipo de discurso é
marcado pela presença do traço não-específico; e, além disso, a ordenação vocabular,
portanto, não podia ser explicada por fenômenos estritamente sintáticos.
Portanto, a estrutura organizacional do texto influenciava a colocação dos adjuntos
adverbiais de tempo e aspecto.
O estudo de Pereira (1999) verifica a ordenação das orações adverbiais de tempo,
desenvolvidas e reduzidas, num corpus constituído por 108 cartas pessoais, escritas entre
1937 e 1987. Esse trabalho, baseado nas teorias variacionista e funcionalista, busca identificar
os fatores cognitivos e discursivos que motivam a variação da ordem de algumas dessas
orações, tornando-as fixas na sentença.
Os dados foram separados em dois grupos: 1)orações temporais com ordenação
variável (total ou parcial) e 2) orações temporais de ordem fixa ou categórica. Segundo a
autora, o primeiro grupo foi submetido a uma análise estatística multivariacional através do
pacote de programas VARBRUL. O segundo foi analisado qualitativamente:
Pereira observou as seguintes posições da oração temporal:
a)Anteposição: corresponde às orações temporais situadas na margem esquerda da oração
núcleo.
(11) ”Um dia desses fui pedir uma xícara de chá e só ela estava lá.
Quando pedi que ela fizesse, ela tremeu de alegria e disse...
b) Posição: corresponde às orações temporais situadas na margem direita da oração com que
se combinam.
(12) “Escreva-me contando assim que tiver um tempinho”.
c) Intercalação: corresponde às orações temporais situadas no interior da oração núcleo,
quebrando a fluidez da idéia apresentada nesta oração.
(13) “M. vou parando por aqui senão quando voltar não tenho novidades pra te contar”.
Verificou que não houve diferença marcante entre posposição e anteposição. Percebeu,
também, que muitas das orações temporais intercaladas eram reduzidas de infinitivo e curtas
(cerca de quatro palavras cada uma), o que proporcionava uma melhor fluidez do discurso,
facilitando de certa forma o processo comunicativo.
Dentre os vários fatores analisados, destacamos o que se refere aos tipos de verbo do
segmento temporal. Os verbos foram codificados a partir de três classificações baseadas em
Dik (1989) e Braga (1996):
1-Ação (realização e atividade)
2-Processo (mudança e dinamismo)
3-Situação (posição e estado)
Os resultados mostram que o tipo de verbo do enunciado temporal é mais freqüente
seguido do processo, e o menos freqüente é a situação. A autora relata que “os resultados para
o tipo de verbo das orações isoladas não se mostram eficientes”, portanto considerou “para a
análise a correlação dos tipos de verbos das orações que compõem o enunciado temporal”
(1999:72). Dessa forma, constatou que “as orações com verbos de ação tendem a vir na
segunda posição, independentemente de constituírem o núcleo ou o satélite do enunciado
temporal (...) orações com verbos de situação e processo tendem a vir na primeira posição,
quando associadas a uma oração com verbo de ação, funcionando como pano de fundo para
os eventos mais dinâmicos codificados na segunda oração” (1999:72-73).
Outro fator que também colocamos em evidência é aquele que concerne à distribuição
de informação. Pereira analisou o tipo de informação codificada pela oração núcleo e pela
oração temporal. Ambas as orações foram classificadas conforme as categorias: novo, velho e
inferível, nos termos de Prince (apud Pereira, 1999). Os resultados mostram que orações
temporais que codificam informação velha, mencionadas no discurso anterior, são mais
propensas à anteposição. Sendo assim, ”Orações temporais que codificam informação nova,
não mencionada no contexto e nem inferível dele, são preferencialmente pospostas (...) o
contexto mais favorável à anteposição da oração temporal é aquele em que se relacionam uma
oração núcleo nova e uma oração temporal com informação velha” (1999:88).
No que diz respeito às orações temporais de ordem fixa, verificou que os bloqueios
mais freqüentes à reversibilidade das orações pospostas são: as com o focalizador sozinho e as
que estão ancoradas num constituinte da oração anterior.
Quanto à anteposição da oração temporal, os resultados mostraram que os fatores mais
relevantes para a fixação dessas orações são: em primeiro lugar, as relações anafóricas, em
segundo lugar, as expressões cristalizadas, em terceiro lugar, a seqüência discursiva.
A relevância do trabalho de Pereira para o presente estudo justifica-se por também
investigar fatores que tendem a motivar a ordenação dos elementos em análise.
Lessa (2007) se propôs investigar a ordenação de circunstanciais temporais (advérbios
e sintagmas preposicionados com valor circunstancial) na modalidade escrita do português e
do inglês, levando em conta, principalmente, fatores de ordem discursiva. A autora constatou
que, para se abordar a questão da ordem não marcada, deveria considerar as duas línguas
(português e inglês) de forma distinta.
Quanto aos resultados obtidos nesse estudo, verificou-se que os advérbios tendiam a
ordem não marcada no inglês é a anteposição verbal. Já em relação aos Spreps, não houve
como tirar essa conclusão, devido à grande variabilidade na oração.
Além disso, em relação ao posicionamento mais detalhado dos circunstanciais de
tempo na cláusula, observou-se que os advérbios em português ocupavam as posições ME
(margem esquerda) e PM2 (entre o verbo e objeto) com mais freqüência, enquanto no inglês,
eles preferiam a PM1(entre o sujeito e o verbo). Este fato no inglês pôde ser explicado,
principalmente, em virtude de os advérbios menores possuírem uma ordem mais rígida. Os
Spreps em português possuíam uma clara preferência pela margem direita da oração,
enquanto que, em inglês, os Spreps apresentaram grande variabilidade nas duas margens da
oração.
Portanto, a função discursiva dos circunstanciais possui grande influência na
ordenação de advérbios e Spreps nas duas línguas.
Esse estudo sobre Ordenação de Circunstanciais Temporais em Português e Inglês:
posições e papéis discursivos foram importantes por também investigar as posições que esses
constituintes ocupam na cláusula.
Nesta tese, examinamos os seguintes fatores: a posição dos advérbios, a noção
semântica do advérbio, o tipo semântico do verbo, o tipo de sujeito, o tipo de oração, dentre
outros.
Esta revisão permitiu-nos conhecer, mais profundamente, as questões abordadas
acerca dos advérbios em geral, sobretudo, aquelas referentes à sua classificação e às suas
posições na cláusula e, com certeza, foi esclarecedora ao longo desse estudo.
2.6 Os advérbios e a expressão de tempo
Tempo e aspecto são duas categorias gramaticais que expressam noções temporais. A
categoria de tempo é dêitica, já que sua utilização depende diretamente do momento em que o
enunciado foi proferido. Por outro lado, isso não ocorre com a categoria de aspecto.
As noções de tempo e de espaço são partes substanciais das relações do homem com o
mundo. Os dois são delimitados: o tempo, em minutos, horas, dias, meses, séculos; o espaço,
em centímetros, metros, milhas, etc. Todos são referências necessárias na vida de cada um de
nós. Portanto, a língua que falamos está repleta de recursos, para que possamos situar nossas
ações em relação aos dois: agora, antes, depois, ainda - para tempo; aqui, acolá, além - para o
espaço.
Qualquer ato de comunicação é situado no tempo e no espaço. Na simples situação de
comunicação - o diálogo - o indivíduo que fala refere-se a si mesmo como eu que designa seu
ouvinte como tu/você. Ao referir-se ao espaço em que se encontra o indivíduo que fala
identifica-o como aqui; e ao referir-se ao momento em que fala, pode designá-lo como agora.
Eu, você, aqui e agora não nomeiam indivíduos, lugar e época determinados e
constantes, mas apenas "o indivíduo que fala", alguém a quem ele se dirige, e o "lugar" e
"momento" em que ocorre o diálogo. Seus referentes não são, portanto, objetivos e externos à
fala (como João, Paula, na sala e às 2 horas), mas situacionais e exclusivos do ato de falar,
fora do qual não podem ser reconhecidos e os elementos utilizados para designar a esses
referentes são chamados dêiticos (termo derivado de uma palavra grega que significa "indicar,
mostrar, apontar")
A categoria gramatical de tempo, segundo Lyons (1979) diz respeito às relações
temporais que são expressas por contrastes gramaticais sistemáticos. Os gramáticos
tradicionais, na análise do grego e do latim, apresentam três contrastes dessa natureza:
passado, presente e futuro. A categoria de tempo relaciona o tempo da ação indicada pelo
verbo, em relação ao momento em que o falante produz seu enunciado, o que significa que o
tempo é uma categoria dêitica.
A pessoa que fala, ou escreve, "comanda", por assim dizer, a atividade discursiva,
normalmente transformando-a, ou colaborando para transformá-la, numa complexa rede de
atos de significação que têm no eu, no aqui e no agora do discurso seus pontos de referência.
A indicação do tempo como categoria de linguagem verbal é parte dessa interação
comunicativa, ou ainda dessa atividade discursiva, tempo, que tem no momento da
enunciação seu ponto principal de referência.
Nesse sentido, os advérbios que expressam a categoria de tempo seriam aqueles que
apresentam valor dêitico, localizando os eventos na linha do tempo, em relação ao momento
da produção de enunciado. São eles: ontem, hoje e amanhã, logo mais, quarta-feira passada,
além de depois, anteriormente, posteriormente (em contextos em que está ancorado ao
momento da fala, ou seja: depois, anteriormente ou posteriormente ao momento da fala), etc.
Em alguns casos, os advérbios temporais podem não ser dêiticos, ou seja, podem
localizar na linha do tempo, sem tomar como referência o momento da fala, mas a conclusão
do evento anterior, ou qualquer ponto no tempo mencionado no texto. É o que ocorre, por
exemplo, em depois da aula e antes do jogo, que constituem indicações temporais não-
dêiticas, que localizam o evento na linha do tempo, tomando como ponto de referência
pontos já fixados no tempo, e não o posicionamento dos participantes. Os seqüenciadores em
geral estão nessa categoria: depois, , então, etc.
2.7 Os advérbios relacionados à categoria de aspecto
Para que possamos compreender a noção de advérbio de aspecto, devemos fazer uma
breve reflexão acerca da categoria gramatical de aspecto.
As gramáticas tradicionais falam pouco acerca da categoria de aspecto. São muito
poucos os autores que se preocupam em apresentar o aspecto como uma categoria do verbo e
defini-lo de maneira objetiva. O que mais encontramos são rápidas alusões à noção de
aspecto, espalhadas pelos capítulos referentes ao estudo dos verbos. Said Ali (1969:161), para
citar um exemplo, apresenta uma minuciosa análise do emprego das diferentes formas
verbais, utilizando termos como “iterativo”, “ação durativa” e “ação freqüentativa, mas sem
mencionar a palavra aspecto.
Luft (1978) é um dos poucos gramáticos que trata a categoria de aspecto em uma
seção especial, em que define aspecto como “a categoria verbal que exprime a oposição
término/não-término ou acabado/não-acabado, a duração do processo”. Na seqüência, o autor
afirma que o aspecto pode manifestar-se juntamente com o tempo, como em canto/cantei,
cantara/cantava, onde existe a oposição acabado/não-acabado. Mostra também que esta
categoria pode manifestar-se através de locuções verbais, sufixos, ou pelo próprio radical do
verbo, indicando exemplos de aspectos incoativo, iterativo, cursivo e cessativo.
Luft afirma que os verbos, em oposição aos nomes, caracterizam-se pela “idéia
temporal: o início, a duração ou o resultado de um processo (aspecto) ou o momento de sua
ocorrência (tempo)”. Propõe também, ao comentar as locuções verbais, que as locuções
indicam os aspectos do processo verbal: anterioridade, posterioridade, continuidade,
repetição, progressividade, início, conclusão, etc. Notamos aqui, mais uma vez, uma
inadequação entre as noções aspectuais e a definição proposta, o que nos faz pensar se a
palavra aspecto aqui foi usada no sentido indicado na definição ou naquela acepção
descompromissada que encontramos na maioria das gramáticas.
Podemos ver, na gramática em questão, a preocupação de incorporar de forma
explícita a categoria de aspecto no estudo dos verbos. Mas o resultado ainda está longe de
deixar claro o que significa aspecto verbal, em função da falta de clareza com que é definida a
categoria e, sobretudo, da inadequação com que são propostas as noções a ela ligadas.
Saindo do âmbito das gramáticas tradicionais, podemos citar o estudo de Travaglia
(1994) sobre aspecto verbal. Fazendo uma distinção básica entre tempo (tempo gramatical) e
TEMPO (tempo real ou cronológico), Travaglia (1994) afirma que a categoria de tempo é
dêitica, uma vez que situa o momento da ocorrência da situação em relação ao momento da
fala; ao passo que o aspecto é uma categoria temporal não-dêitica, pois se refere à situação em
si, sem levar em conta o momento da enunciação.
Travaglia (1994) propõe a seguinte definição para a categoria verbal de aspecto:
Aspecto é uma categoria verbal de tempo não-dêitica,
através da qual se marca a duração da situação e/ou suas
fases, sendo que estas podem ser consideradas sob
diferentes pontos de vista, a saber: o do desenvolvimento, o
do completamento e o da realização da situação
. (p. 38)
Com base nisto, Travaglia apresenta um conjunto de noções aspectuais, que
resumiremos a partir de agora, utilizando, para facilitar a compreensão, os exemplos do
próprio autor.
No que se refere à sua duração, uma situação pode ser durativa, quando seu início e
término ocorrem separados por um período de tempo relativamente longo; ou pontual, quando
seu início e término ocorrem no mesmo instante, ou separado por um período de tempo muito
curto. Vejamos, respectivamente, um exemplo de cada ocorrência:
(01) D. Maria passeia todos os dias.
(02) Salto do trampolim há anos.
Afirma ainda o autor que a situação durativa pode ser apresentada como limitada,
quando se indica o seu início, o seu fim ou o valor da sua duração; ou ilimitada, quando o
início e o fim da situação não são conhecidos nem sugeridos. Eis um exemplo de cada uma
respectivamente:
(03) Ele estava nadando desde 6 horas da manhã.
(04) A terra gira em torno do sol.
Tanto a duração limitada quanto a duração ilimitada podem ser contínuas ou
descontínuas. Serão contínuas, quando se apresentarem sem nenhuma interrupção no seu
tempo de existência. Por outro lado, serão descontínuas as situações que apresentarem
interrupções na sua duração:
(05) A terra gira em torno do sol.
(06) De tempos em tempos explodia uma bomba.
Travaglia propõe ainda que as diferentes fases de uma situação estão relacionadas às
informações referentes à realização, ao desenvolvimento ou à complementação da situação.
Vejamos cada um destes casos.
Do ponto de vista da sua realização, temos três fases da situação:
a) Fase em que a situação ainda não começou. Trata-se de um momento anterior à consecução
da situação.
(07) Pedro está para emoldurar o quadro.
b) Fase em que a situação já é começada.
08) Os rapazes continuam jogando apesar da chuva.
c) Fase em que a situação já terminou.
(09) O treinador do time esteve doente.
Do ponto de vista do seu desenvolvimento, temos também três fases da situação:
a) Início - A situação é apresentada como estando em seu ponto de início, ou em seus
primeiros momentos. A esta noção aspectual dá-se o nome de inceptividade ou incepção.
(10) Os marceneiros estão começando a armar o telhado.
b) Meio - A situação é apresentada em andamento. Essa noção é caracterizada pelo termo
cursividade.
(11) Estou lendo um livro muito interessante.
c) Fim - A situação é apresentada em seu ponto terminal. Trata-se da noção aspectual de
terminatividade.
(12) Mamãe terminou de bordar minha blusa hoje ao meio-dia.
Travaglia (Op.cit) ainda observa a situação do ponto de vista do seu complemento.
Assim uma situação pode ser:
a) Completa - A situação é apresentada em sua totalidade, com seu começo, meio e fim
englobados num todo. De acordo com Travaglia, esta é a noção aspectual de perfectividade.
(13) Antônio ouviu música o dia todo.
b) Incompleta - Quando a situação não apresenta uma das fases do seu desenvolvimento.
Temos aqui a noção aspectual de imperfectividade.
(14) Ele estava nadando desde seis horas.
Registrando o fato de que pode ocorrer uma não atualização de aspecto quando a
situação não apresenta referências à sua duração ou às suas fases, Travaglia propõe um quadro
bastante completo das noções aspectuais no português:
Martelotta (1986) propõe que o trabalho de Travaglia, embora bastante completo, não
se mostra eficiente quando aplicado à realidade da língua falada, que o autor parece estar
mais preocupado em adaptar a teoria tradicional dos aspectos à realidade lingüística do que, a
partir de dados reais, questionar as hipóteses tradicionais.
Em função disso, Martelotta (1986) optou por uma proposta mais voltada para o uso
da língua, observando, em seu estudo sobre o presente do indicativo, a relação entre uma série
de propriedades semântico-gramaticais que se associavam às formas verbais por ele
analisadas de acordo com o tipo de discurso em que essas formas verbais ocorriam. Muitas
dessas propriedades estão associadas às noções aspectuais propostas por Travaglia, mas
diferem dessas noções por se apresentarem de modo a refletir a gica organizacional do
texto.
2.8 A formação de advérbios em -mente
Analisando a origem dos advérbios, verificamos que, dos advérbios latinos, a sua
maioria foi originada, de nomes ou pronomes e poucos passaram às línguas românicas.
Enriqueceram-se estas, todavia, com algumas formas oriundas de formações desconhecidas
do latim literário, com grande produtividade e, em especial, com os advérbios em -mente que
se afixam aos adjetivos. Esta terminação nada mais é do que o ablativo do latim mens, v.g. em
bona mente. Com o uso de locuções deste tipo formaram outros tipos, acabado por alterar a
significação primitiva do substantivo mente e passando assumir o valor de um sufixo
derivativo.
O substantivo latino mens, mentis (“mente, alma, espírito, inteligência”) modificado
por um adjetivo refletia o estado de ânimo ou o modo na qual à ação verbal se levava em
consideração. Com passar do tempo, o substantivo foi assimilado a este tipo de estrutura
sintática e semântica e acabou por perder o seu valor original para se converter num sufixo
adverbial. Esta estrutura morfológica (base + mente) é muito produtiva na criação de
advérbios. No levantamento dos dados dos corpora selecionados, verificamos que esse sufixo
é muito produtivo, mesmo nos primórdios da língua, principalmente com as noções de modo,
de qualificador e modalizador. Vejamos alguns exemplos dos corpora estudados:
(1) ... posto que seyam muy grauemete enfermos.(OE, p.47)
(2)... taaes como estes presume no dignamete etender e achar dulçura(OE,p.48)
(3)
P
rimeiramente salvanayque, regedor que agora he, tem de remda hu~u conto e cem mil
pardaos d ouro, este he senhor de charama~odel, e de nagapata~o, e tamgor, e bomgarim, e
dapata~o, e do truguel, e de caullim, e todas estas sa~o cidades (Século XVI/Crônica dos Reis
de Bisnaga)
(4)... por ignorar o motivo se será para falta desaude, ou qualquer acontecimento que
lhesucedese, oque infinitamente sentirey como amigo [ espaço]igualmente tenho sentido
afalta daremeça dadita patente ejulgo omotivo por haver algum embaraço nasecretaría, pois
pela demora que tem havido ja mequerem puxar para ojugo dos auxiliarez os quaes são
bastantemente incomodados(
século XVIII - administração privada/carta de comércio/ PHPB)
(5)... assim cumpri com a Comissão que a minha Bemfeitora (a quem pesso Beijes as mãos
em meu nome) me incumbio, cum prindo igualmente com a comissão da Rainha (Cartas do
PHPB - RJ / séc. XIX)
(6) Deus simplesmente não age assim. Deus é santo - moralmente perfeito. (EC,p.45, Port.
atual)
(7) Jesus era inicialmente homem, depois se tornou Deus. (EC,p.63, Port. atual)
Nos exemplos expostos, observamos as diversas formações derivativas dos advérbios
em -mente (grave+ mente, digna+ mente, primeira+ mente, infinita+ mente, igual+ mente,
bastante+ mente, simples+ mente, moral+ mente e inicial+ mente), além de sua produtividade
e usualidade com as acepções de modo, qualificador, modalizador e temporal, este último não
tanto quanto as noções anteriores.
É interessante acrescentar, ainda, sobre a formação dos advérbios que outros autores,
como Vilela (1979), apresenta-nos algumas considerações acerca dessa categoria gramatical:
o léxico constitui-se de um conjunto de unidades léxicas (palavras lexicais, lexemáticas,
lexemas), ou seja, unidades que representam a realidade extralingüística e que pertencem
tanto à semântica como também à gramática da língua.
Tendo em vista que palavras lexicais concretas contêm, além do valor lexical, uma
significação categorial, o autor considera tais palavras as unidades fundamentais do léxico de
uma língua. Estes podem ser ampliados principalmente através de dois processos: a derivação
e a composição.
A derivação é o processo de formação vocabular em que ocorre a adição de afixos
(prefixos e sufixos) a uma base ou radical e a composição é o recurso de enriquecimento
vocabular que se pela união de dois ou mais radicais, que formam um vocábulo cujo
significado não precisa ser necessariamente a soma dos significados de cada radical. Vale
ressaltar que na composição os vocábulos estabelecem entre si relações sintáticas de
subordinação e/ou coordenação (Cf. Carone (1988).
Vejamos os exemplos:
(8) porta-bandeira, aguardente (subordinação);
(9) vaivém, leva-e-traz (coordenação).
Apesar de serem processos diferentes, derivação e composição não se excluem, o que
será ilustrado a seguir com o vocábulo em -mente.
Os estudos históricos apontavam para o advérbio como um elemento modificador.
Pereira (1932), remontando a Aristóteles, afirma que os advérbios formavam, juntamente com
as preposições e as conjunções, uma das quatro partes do discurso (a quarta era as
interjeições), porém apenas sob o rótulo de “conjunções”.
Mais tarde, os gramáticos gregos de Alexandria redividiram as partes do discurso,
desdobrando as “conjunções” em três categorias: as conjunções propriamente ditas, as
preposições e os advérbios. O autor divide o estudo das categorias gramaticais em lexical ou
taxionômico e sintático ou gico. No primeiro, expressa a idéia geral da categoria e o
segundo a sua função na frase. Neste ponto, o gramático não difere dos outros estudiosos
quanto ao conceito e função dos advérbios.
Pereira (1932) afirma ainda que os advérbios, do tipo que estamos chamando de
qualitativo, formam uma categoria que se assemelha à do adjetivo devido à idéia de
qualificação que o advérbio apresenta. Diz, também, o autor que o processo de formação de
advérbios em -mente a partir de adjetivos é recente e desenvolveu-se no português e em outras
línguas românicas ocidentais. O processo consistiu na aglutinação do adjetivo ao substantivo
feminino mente. A expressão era escrita separadamente desde o latim, entretanto, diz Pereira,
que os dois elementos se uniram na escrita por força da pronúncia e o substantivo -mente,
antes palavra autônoma, passou a ser interpretado como sufixo adverbial, como o vemos nos
dias de hoje e, também, no português arcaico. Mas, segundo Martelotta, Barbosa & Leitão
(2002b), a variação entre a grafia separada ou junta, encontrada no português arcaico, deve ser
interpretada com precaução, pois antes de constituir um processo de gramaticalização, pode
ser apenas opção adotada na impressão gráfica:
Entretanto, não podemos esquecer que não
dependemos da fidedignidade da edição para sabermos se
as palavras estavam de fato juntas no original, mas
também que, mesmo nos manuscritos, muitas vezes a
união, ou separação, entre vocábulos poderia ser usada
para se justificar a mancha gráfica na página. Desse
modo, devemos tomar cuidado ao relacionar a escrita
separada/junta dos elementos com sua gramaticalização,
pois o controle estatístico pode revelar o real avanço
da grafia dos advérbios em -mente como um único
vocábulo.
Pereira (1932.) classifica os advérbios de forma semelhante à que fazem os outros
autores: de acordo com as circunstâncias de afirmação, dúvida, negação, lugar, tempo,
quantidade, modo, ordem, designação, etc.
Carneiro Ribeiro, em seu livro Serões Grammaticaes (1956: 362), faz também uma
analogia entre advérbios e adjetivos: É este elemento do discurso uma espécie de adjectivo,
que tem por função característica modificar os adjectivos, os verbos e qualquer palavra de
sentido atributivo. Modifica-os, como o adjectivo modifica os substantivos”.
O autor continua sua análise observando que o advérbio pode se referir a um
substantivo quando este possui um sentido atributivo. Ele cita o seguinte exemplo: “Deus é
verdadeiramente pai” (1956:363). Nesse caso, de acordo com o autor, o valor semântico do
substantivo equivale ao de um adjetivo. Em suas palavras, o advérbio é “attributo de
attributo”.
Carneiro Ribeiro (1956) afirma que os advérbios são invariáveis e este fato, ao
contrário do que pensam outros autores, torna esses elementos ainda mais semelhantes aos
adjetivos. Segundo ele, os adjetivos expressam conceitos abstratos que, por sua própria
natureza, não são passíveis de variações. O que ocorre é que os adjetivos adéquam em gênero
e número aos substantivos que acompanham apenas por uma questão de sonoridade. Carneiro
Ribeiro diz, ainda, que os advérbios expressam de forma mais resumida e eficiente alguns
pensamentos que, se ditos de outro modo, tornariam a linguagem mais lenta e prolixa. Nesse
sentido, podemos entender que os advérbios contribuem para o princípio de economia
lingüística.
O autor propõe a seguinte classificação para os advérbios: advérbio de lugar, advérbio
de tempo, advérbio de quantidade e advérbio de qualidade ou modo.
No que concerne aos advérbios em -mente, o autor trata de sua formação, qual seja:
este sufixo liga-se, de um modo geral, ao adjetivo no feminino, quando houver duas formas.
Diz, ainda, que alguns advérbios podem ter seus sentidos intensificados, tanto por outros
advérbios quanto por uso no superlativo. Cita como exemplos: “mais docemente, muito
ternamente, bellissimamente,”etc.
Said Ali, em sua Gramática Histórica da Língua Portuguesa (1964: 183), define os
elementos adverbiais como se segue:
O advérbio é um vocábulo determinativo do verbo, do
adjetivo ou de outro advérbio. Acrescenta a outras
palavras o conceito de tempo, lugar, modo, etc. que lhes
delimita ou esclarece o sentido, sem, contudo exercer,
como o acusativo, o dativo e o objeto indireto
circunstancial, função puramente complementar.
Esse autor faz uma análise etimológica de alguns advérbios. Entretanto, em relação
aos advérbios em -mente, apenas afirma que são criações novas nas línguas românicas, i.e.,
não encontradas no latim literário, formadas a partir de adjetivos (Cf. p.183).
Semanticamente, Said Ali (op. cit.) equipara as locuções adverbiais aos advérbios em -
mente afirmando que as primeiras se distinguem destes somente porque são mais longas e
os seguintes exemplos: com prudência = prudentemente, com energia = energicamente, com
brandura = brandamente.
O autor esclarece que esses elementos são classificados de acordo com a semântica de
cada um, dividindo-se em tempo, lugar, modo, negação, afirmação, dúvida, quantidade e
ordem, e expressam circunstâncias definidas ou noções de grau (aumento ou diminuição).
Como se pode notar, as gramáticas históricas tratam bastante superficialmente o tema
em questão. Seus autores não conseguiram definir de maneira mais eficiente o advérbio e nem
observaram mais atentamente outras características que esses elementos apresentariam.
3 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS
Esta tese de doutorado baseia-se em princípios funcionalistas, partindo, portanto, de
que a gramática das línguas se constrói a partir do discurso, ou seja, do uso real, concreto da
língua.
Este capítulo consiste em expor alguns pressupostos da linha funcionalista que foram
importantes para minha análise, sobretudo aqueles relacionados à gramaticalização, à
polissemia, ao conhecimento da relação entre gramaticalização e grau de encaixamento entre
cláusulas, e entre gramaticalização e ordenação. Também apresento uma pesquisa sobre a
ordenação de adverbiais (Votre & Santos, 1984), um estudo sobre a natureza da estrutura da
linguagem humana e sua categorização, assim como a classificação semântica de verbos
proposta por Halliday, 1994.
3.1 Os princípios funcionalistas
A teoria funcionalista concebe a linguagem como um instrumento de interação social e
analisa a estrutura gramatical no seu contexto discursivo a fim de investigar as motivações
para explicá-la, compreendendo que as diferentes formas que um elemento incorpora no
discurso não são meramente estilísticas, mas influenciadas por funções informacionais e
pragmáticas. Por conseguinte, uma relação entre forma e função, conforme o Princípio da
Iconicidade, que é definido como a correlação entre o código lingüístico (forma) e o seu
conteúdo (função).
A corrente funcionalista vem estudando com muita profundidade o processo da
Gramaticalização ocorre quando certas construções lingüísticas sofrem transformações ao
longo do tempo, assumindo outras funções mais gramaticais e tornando-se mais fixos e
regulares no discurso. Essa mudança se dá unidirecionalmente: do discurso para a gramática e
não vice-versa. Várias trajetórias foram traçadas para ilustrar esse caráter unidirecional:
vocábulo>morfema, verbo pleno>verbo auxiliar, advérbio>conectivo, dentre outras. Por
exemplo, o vocábulo mente passou a desempenhar a função de um morfema gramatical, ou
seja, passou a ser um sufixo, formador de advérbio, como a locução em boa hora que se
tornou a conjunção concessiva embora: em boa hora>embora. O foco do nosso trabalho não é
a gramaticalização do substantivo em -mente para sufixo, uma vez que no português arcaico
essa gramaticalização já estava consolidada.
Outra pesquisa que relaciona os termos da oração e a posição do advérbio é a de
Votre & Santos (1984), que trata da investigação de fatores sintáticos, semânticos e
discursivos que influenciam a colocação dos constituintes de natureza adverbial na sentença.
O corpus examinado é formado por redações e entrevistas de alunos da 8ª série.
Os autores partem da seguinte hipótese geral a qual também é à base da nossa
pesquisa:
Os advérbios são constituintes móveis, embora com
tendências bem definidas por determinadas posições
sintáticas. (...) a posição ocupada por cada advérbio é
função da atuação conjunta de diferentes fatores
estruturais e não-estruturais, que cabe identificar e
avaliar(1984:83).
Votre & Santos analisaram 4 posições dos adverbiais, a saber: início da sentença
(posição 1); fim da sentença (posição 4); entre o sujeito e o verbo (posição 2); e entre o verbo
e o complemento (posição3), exemplificadas abaixo:
[Ontem], o ministro [ontem] seguiu [ontem] para Nova York [ontem].
1 2 3 4
Os fatores, a seguir, foram observados através de uma análise quantitativa: a) tipo
semântico do advérbio (tempo, lugar, modo, etc.); b) nível do vínculo semântico do advérbio
(com sentença ou com o verbo); c) tipo sintático do verbo (regência do verbo) ou tipo de
complemento (oracional, objeto direto, objeto indireto); d) constituição morfológica do
advérbio (advérbios oracionais, locucionais, nominais, etc.); e) peso do advérbio (breve ou
longo); e f) tipo do sujeito (oração sem sujeito, oração com sujeito vazio, etc.).
Apresentaremos algumas das hipóteses dos autores referentes a esses fatores:
1) Quanto mais vinculado semanticamente ao verbo, mais próximo desse o verbo estaria.
Todavia, o advérbio vinculado ao nível mais alto da sentença estaria mais livre, podendo se
movimentar para o início da sentença, por exemplo;
2) No que se refere ao tipo de vínculo do sujeito com o verbo. Quanto mais fraco for, mais
favorecerá a inserção de um advérbio entre o sujeito e o verbo. Assim, um verbo de ligação
enfraqueceria o vínculo entre sujeito e verbo, permitindo a colocação de advérbio no meio
deles;
3) No que concerne ao peso do advérbio, a expectativa era a de que os adverbiais breves
(menores) ocorressem nas posições internas e os longos (maiores) nas posições externas,
predominando na posição final;
4) A última hipótese refere-se ao tipo de sujeito. Esperava-se que em orações sem sujeito ou
com sujeito vazio, o adverbial tendesse a ocupar a posição inicial, típica do sujeito. Teríamos
assim uma espécie de arranjo de balanceamento (Votre & Santos op. Cit.,. p. 85).
Os resultados mais relevantes desse estudo são arrolados a seguir: para a colocação do
advérbio nominal na posição 1, contribuíram os fatores referentes ao nível do vínculo
semântico do advérbio (advérbio vinculado à sentença), ao tipo semântico de advérbio
(advérbio de tempo e de opinião) e ao tipo de complemento do verbo (complemento
oracional).
A colocação do advérbio na posição 2, entre o sujeito e o verbo, foi motivada pelo
nível de vínculo semântico do advérbio (advérbio vinculado ao verbo) e pelo tipo semântico
de advérbio (advérbio de tempo e freqüência).
A ordenação do advérbio nominal na posição 3, entre verbo e complemento, deve-se
ao nível do vínculo semântico do advérbio (advérbio vinculado ao verbo), ao tipo semântico
de advérbio (advérbio de intensidade) e ao tipo de complemento (objeto indireto).
Por fim, a colocação do advérbio nominal na posição 4 da sentença foi influenciada
pelo nível do vínculo semântico do advérbio (advérbio vinculado ao verbo), pelo tipo
semântico de advérbio (advérbio de modo e de lugar) e pelo tipo de complemento (não
complemento).
Pretendemos, assim como Votre & Santos, identificar fatores que motivem a
colocação dos advérbios de tempo e aspecto em -mente na cláusula. Dentre eles,
identificaremos a estrutura sintática da oração para verificar se a posição vazia de um
argumento (sujeito ou complemento) tende a ser preenchida com o advérbio.
3.2 Gramaticalização e Níveis de Encaixamento entre Cláusulas
Segundo Hopper & Traugott (2003), os períodos compostos fundamentam-se em um
conjunto de estruturas com diferentes níveis de encaixamento, que vão das menos
gramaticalizadas (menos encaixadas) às mais gramaticalizadas (mais encaixadas):
a) Estruturas Paratáticas possuem independência relativa, ou seja, restrita apenas
pela pragmática (fazer sentido e ser relevante). São as cláusulas justapostas, as principais e as
coordenadas.
b) Estruturas Hipotáticas ou Interdependentes são aquelas em que um núcleo e
uma ou mais cláusulas que são relativamente dependentes (não se incluem em nenhum
constituinte do núcleo, mas não podem ficar “soltas”). São as subordinadas adverbiais e as
adjetivas explicativas.
c) Estruturas Subordinadas ou Encaixadas são as que possuem uma margem
completamente incluída no núcleo e que, portanto, têm dependência completa. São as
subordinadas substantivas e as adjetivas restritivas.
Essas estruturas podem ser representadas através de uma trajetória de
gramaticalização: parataxe hipotaxe subordinação.
De acordo com essa trajetória, as cláusulas paratáticas são menos gramaticalizadas,
isto é, revelam menor grau de dependência semântica e encaixamento que as hipotáticas (que
exibem maior grau de dependência e nível intermediário de encaixamento), que, por sua vez,
são menos gramaticalizadas que as subordinadas (que apresentam maior grau de dependência
e de encaixamento). Segundo Givón (1990), a redução da cláusula subordinada à cláusula
reduzida revela níveis ainda maiores de encaixamento entre cláusula principal e subordinada,
além de exprimir concretamente um dos subprincípios relacionados ao conceito de
iconicidade: o da proximidade. Esse subprincípio trata da relação de correspondência entre
sintaxe e semântica. Na complementação verbal, isso implica dizer que o nível de integração
sintática entre as cláusulas não é arbitrário e sim um reflexo do nível de integração semântica
entre o evento da principal e o da subordinada, ou seja, quanto mais integrados esses eventos
no plano semântico, mais integradas estarão as estruturas que os expressam.
Givón concluiu que, quanto mais encaixada uma oração, mais gramaticalizada ela é.
Estendendo a conclusão do autor, depreendemos que o grau de gramaticalização da cláusula
em que os advérbios em -mente aparecem interfere na colocação desses advérbios, conforme
procuraremos atestar nessa pesquisa.
3.3 Gramaticalização e estrutura sintática
De acordo com Givón (1979), a maior liberdade e variedade de elementos significativos
tendem a ocorrer na cláusula principal, declarativa, afirmativa, ativa. Mas, por outro lado,
tanto no que se refere a itens lexicais quanto a construções sintáticas, a distribuição dos
elementos significativos, em todos os outros tipos de cláusula, é sempre mais restrita.
Isso acontece devido ao uso do fenômeno da pressuposição discursiva, ou seja, o grau
de pressuposicionalidade no qual uma sentença é usada, que, por sua vez, está relacionado ao
nível de dificuldade que o falante considera como obstáculo para o ouvinte em determinar
uma única referência no discurso. E, segundo Givón (1979), a cláusula principal, declarativa,
afirmativa, ativa apresenta a complexidade pressuposicional mais baixa no discurso, se
comparada a todos as outras variantes sintáticas.
Givón (1979) nos mostra várias propriedades formais dessas variantes sintáticas, em
relação ao seu grau de pressuposicionalidade, a saber:
1- Variantes mais pressuposicionais exibem maior complexidade sintática.
2- Variantes mais pressuposicionais apresentam maiores restrições distribucionais do
que os padrões neutros.
3- Variantes mais pressuposicionais são gramaticalizadas mais tarde por crianças, ou
pelo menos sua sintaxe é adquirida mais tarde do que as variantes menos
pressuposicionais.
4- Variantes mais pressuposicionais freqüentemente tendem a exibir grande
conservadorismo sintático, mais comumente na área da mudança de ordenação.
5- A cláusula principal declarativa, afirmativa, ativa, neutra e menos pressuposicional
e também a mais freqüente no discurso.
Das propriedades propostas, as que podemos considerar na nossa pesquisa são os itens
1, 2 e 4, que se propõe aqui que as cláusulas gramaticalizadas, e, portanto, mais restritas
distribucionalmente e mais complexas sintaticamente, tendem a ser mais conservadoras.
3.4 As pressuposições discursivas das construções sintáticas
O sentido de pressuposição está sendo compreendido aqui como um conjunto de
informações que estão fora da sentença e que são assumidas pelo falante como evidentes ou
indiscutíveis, ou seja, aquilo que é pressuposto tende a refletir conhecimentos compartilhados,
crenças comuns ou conhecimento presumido como conhecido.
Neste trabalho, não adotamos a distinção entre pressuposição gica e pressuposição
pragmática, que parte do princípio de que todo fenômeno pressuposicional nas línguas
naturais é pragmático. Assim, segundo Givón (1979), o fenômeno da pressuposição,
relaciona-se com: as hipóteses que o falante assume acerca da habilidade do ouvinte de
identificar unificadamente (‘estabelecer uma única referência para’) um argumento-
referente.” (p. 50)
Diante disso, Givón (1979) mostra as variantes sintáticas que se caracterizam por maior
grau de pressuposicionalidade:
a) Construções estritamente pressuposicionais. Cláusulas relativas, clivadas, pseudo-clivadas
e perguntas QU.
b) Cláusulas encaixadas.
c) Outros atos de fala. Imperativo, interrogativo e negativo.
d) Construções envolvendo graus de definitude-topicalidade dos argumentos.
e) Mudança de tópico, passiva, pronomes anafóricos e outros.
Segundo Givón, essas construções apresentam ordenação mais conservadora dos
elementos argumentais. Mas podemos estender esse pensamento para as características de
ordenação de elementos adverbiais. De fato, como foi mencionado, o nível de
encaixamento ou gramaticalização da cláusula tem influência sobre as tendências de
ordenação de advérbios de tempo e aspecto em -mente.
A fase arcaica do português é caracterizada por uma variação na colocação dos
advérbios, ou seja, apresenta advérbios em -mente nas posições pré e pós-verbais em todos os
tipos de cláusulas, apresentando uma pequena predominância de anteposição nas cláusulas
mais gramaticalizadas. A partir disso, podemos depreender que esses parâmetros de
pressuposicionalidade podem nos auxiliar na descrição de mudanças no comportamento
diacrônico desses elementos em relação a sua ordenação.
3.5 Classificações dos verbos, baseada em Halliday (1994)
O tipo semântico do verbo é um dos fatores considerados neste trabalho para entender
a posição dos advérbios de tempo e de aspecto em -mente, pois trabalhos anteriores, como
Scheibman (2001), Bybee (2003) e Andrade (2005), detectaram que era necessário investigar
se o tipo de verbo poderia influenciar na cláusula de alguma forma no caso de Scheibman
(2001), o tipo de verbo foi usado para se perceber a subjetividade nas relações entre o sujeito
e o verbo; no de Bybee (2003), foi utilizado para perceber a influência na gramaticalização do
verbo can do inglês, e, por fim, no caso de Andrade (2005), o tipo de verbo foi utilizado para
detectar a ordenação de locuções adverbiais temporais.
Sendo assim, consideramos esse fator importante para tentar definir uma motivação
semântica da posição dos advérbios de tempo e de aspecto em -mente. Para isso, utilizamos a
classificação de Halliday (1994), também utilizada em Scheibman (2001) e Andrade (2005).
Nossa hipótese é que determinado verbo acompanhado do advérbio temporal, com a
repetição de uso, possa fixar os advérbios de tempo e de aspecto em -mente numa dada
posição, conforme Bybee (2003). Essa autora conhece a importância da repetição,
caracterizando-a como um processo pelo qual seqüências de palavras ou morfemas
freqüentemente usados tornam-se automáticos como uma única unidade de processamento.
Acreditamos também que determinado tipo semântico do advérbio ocorra com um
determinado tipo semântico do verbo.
Embora haja rias classificações de verbos, trabalharemos com a classificação de
Halliday (1994), por ser um lingüista funcionalista. Segundo esse autor, a oração também
desempenha o papel de modelar a experiência, isto é, representa padrões da experiência. Os
seres humanos, através da linguagem, constroem um quadro mental da realidade e este é
criada por processos.
A oração é um modo de ação, um modo de dar e receber bens e serviços como também
informações. Ela é um modo de reflexão, um modo de impor ordem na variação e no fluxo do
sistema gramatical de transitividade. Esse sistema constrói o mundo a partir da experiência
por meio de conjunto de tipos de processos que estão relacionados à nossa experiência
exterior (ligada ao mundo que nos cerca, como eventos, ações etc.) e à nossa experiência
interior (ligada à consciência, à imaginação, como reflexão, etc.( Halliday,1994:106).
De acordo com o autor, o modelo proposto de representação de experiência,
interpretado no sistema gramatical de transitividade, é um contínuo circular.
Ele afirma que um processo é constituído de três componentes para a interpretação da
nossa experiência do que acontece: a) o próprio processo; b) os participantes no processo; e c)
circunstâncias associadas com o processo (são opcionais).
Esses três conceitos são categorias semânticas que explicam como fenômenos do
mundo real são representados em figuras lingüísticas.
O autor discorre sobre os principais processos no sistema de transitividade da língua
inglesa:
Os processos materiais (processes of doing) estão relacionados ao mundo físico, à
experiência exterior. São processos ‘do fazerque expressam a noção de que uma entidade
‘faz’ alguma coisa que pode ser feita ‘para’ outra entidade. Portanto, esse processo tem um
ator obrigatório e um alvo (goal) opcional. Para Halliday, o termo ator refere-se àquele que
realiza o efeito, já o termo alvo refere-se a alguém para o qual o processo é estendido.
Vejamos um exemplo: The lion[ator] caught[processo] the tourist [alvo] ( O leão pegou o
turista.);
Os processos mentais (processes of sensing) referem-se ao mundo da consciência, à
experiência interior. Para conhecer esses processos, o autor abandona a noção semântica de
ator e alvo (goal) e agrupa as orações que expressam sentimentos (affection), pensamentos
(cognition) e percepção (perceptin) nesse tipo de processo.
O autor acrescenta que os participantes envolvidos nos processos mentais que são
experenciados (senser) a um fenômeno (phenomenon). O primeiro é o ser consciente que
sente, pensa e percebe, o segundo é aquilo que é sentido, pensado ou percebido. Desse
modo, um dos participantes é dotado de consciência, o outro pode ser uma ‘coisa’ ou um fato
(entendido como um metafenômeno, isto é, alguma coisa que é construída como um
participante por projeção).
Obtivemos: Mary [experenciadora dotado de consciência] liked [processo] the gift
[fenômeno/coisa] (Maria gostou do presente). Ou Mary [experenciador dotado de
consciência] was pleased [processo] that she’d got a present [fenômeno/fato] (Maria estava
contente que ganhou um presente);
Os processos relacionais (processes of being) estão ligados ao mundo das abstrações.
Relacionam fragmentos da experiência, classificando-os e identificando-os. Esses processos
estabelecem uma relação entre duas entidades separadas. Uma entidade ‘a’ pode atribuir algo
a uma entidade ‘x’ ou pode identificar uma entidade ‘x’. Sendo assim, subdividem-se em:
Relacionais Intensivos: associados ao mundo das abstrações estabelecem uma relação entre
duas entidades separadas, atribuindo alguma característica a elas; Relacionais Possessivos:
associados ao mundo das abstrações estabelecem uma relação entre duas entidades separadas,
identificando-as ou atribuindo posse de algo ou alguma coisa a elas, e Relacionais
Circunstanciais: associados ao mundo das abstrações estabelecem uma relação entre duas
entidades separadas, identificando-as ou atribuindo alguma circunstância a elas.
O sistema do inglês opera com três tipos principais de construções: a) intensiva
(equativa): ‘x is a ‘ (x é/está a). Ex.: Sarah is wise. (Sara é sábia); b) circunstancial: ‘x is at a’
(em que ‘is at’ pode ser ‘is at, in, on, for, with, about, along, etc.’). c) possessive: (x está em a
). Ex.: Peter has a piano. (Pedro tem um piano)
Na fronteira desses principais processos, outros processos que compartilham
algumas das características daqueles, como:
Os processos comportamentais manifestam os processos de consciência e os estados
fisiológicos. Esses processos são tipicamente de natureza humana, uma vez que se constituem
por comportamentos psicológicos e fisiológicos como respirar, tossir, sorrir, sonhar dentre
outros. Suas características não são claramente definidas, que estão na fronteira entre os
processos materiais e mentais. Um participante é tipicamente um ser consciente, denominado
Behaver. Vejamos o exemplo: No-one[Behaver] is listening [processo]. (Ninguém está
ouvindo);
Os processos verbais expressam relações simbólicas, construídas na consciência
humana, através da linguagem. São processos de ‘dizer’, como em “- O que você disse? -Eu
disse que está barulhento aqui.” No entanto, ‘dizer’ aqui, é interpretado em um sentido amplo,
expressando qualquer tipo de troca simbólica de significado. O participante, nesses processos,
não precisa ser consciente. Esse é denominado Sayer(aquele/aquilo que diz). Eis alguns
exemplos: the notice ( sayer) tells you to keep quiet e my watch (sayer) says it’s half past
ten.(O aviso diz para ficarmos em silêncio e meu relógio diz que são dez e meia,
respectivamente).
Há outras funções de participantes além da do ‘sayer’: ‘Receiver’ (aquele para o qual a
fala é direcionada), Verbiage (o que é dito), Target (a entidade que é objetivada pelo
processo de ‘dizer’). Observemos: She [sayer] praised [processo] him [target] to her friends
[receiver] (Ela elogiou para os amigos dela) ou I [sayer] ordered [processo] a steak
[verbiage] (Eu pedí um bife);
Os processos existenciais detonam a existência, o acontecer. Representam que
alguma coisa existe ou acontece. O elemento que é dito existir é chamado de Existent’. A
princípio, pode existir qualquer tipo de fenômeno que possa ser construído como alguma
‘coisa’: pessoa, objeto, instituição, abstração. Também pode existir uma ação ou um evento.
Freqüentemente, uma oração existencial contém um elemento circunstancial distinto de tempo
ou lugar. Analisemos: There is [processo] a man [existente] at the door [circunstância] (Há
um homem na porta).
O lingüista ainda menciona mais um tipo de processo: os processos meteorológicos
que se encontram na fronteira entre os processos existenciais e materiais. Alguns são
construídos como processos materiais: The wind’s blowing ( o vento está soprando); alguns
como processos existenciais: There was a storm (houve uma tempestade); alguns como
relacionais: it’s cold ( está frio); e alguns sem participantes, constituindo-se apenas pelo
processo: it’s raining ( está chovendo).
Usamos essa classificação na análise dos verbos presentes nas cláusulas com
advérbios de tempo e aspecto em -mente, considerando o tipo semântico do verbo como um
fator possível de motivar a ordem desses advérbios. Esse fator se mostrou relevante na
pesquisa de Andrade (2005) e na de Albani (2007) com relação ao uso de locuções temporais
e aspectuais e do uso do advérbio sempre, respectivamente.
4 METODOLOGIA
A corrente funcionalista prima por uma análise do uso da língua, portanto, torna-se
necessário o estudo de dados reais, isto é, dados (da língua oral ou escrita) produzidos pelos
usuários da língua em contexto de comunicação.
Como mencionado, o presente estudo objetiva-se à análise da ordenação dos
advérbios de tempo e aspecto terminados em -mente sob a perspectiva funcionalista na
modalidade escrita.
Este trabalho, por um lado, utiliza metodologia quantitativa na análise dos advérbios
de tempo e de aspecto em -mente que apresentam diferentes possibilidades de colocação na
frase, mas são aparentemente estáveis no que se refere a seu status semântico. Por outro lado,
também se realizou a uma análise qualitativa que visa observar algumas mudanças semânticas
e, em alguns casos, também sintática, percorrida por certos usos adverbiais.
A pesquisa seguiu as seguintes etapas: levantamento das ocorrências de advérbios em -
mente com algum traço de sentido de tempo e/ou aspecto, nos textos selecionados de
diferentes épocas; classificação dos advérbios, levando-se em consideração o contexto de
cada ocorrência, sua função, posição, etc. (de acordo com os critérios arrolados abaixo);
análise quantitativa e qualitativa das ocorrências dos advérbios de tempo e aspecto; paralelo
entre os resultados das diferentes sincronias; conclusões. O confronto dos dados de diferentes
estágios da língua favoreceu uma visão mais ampla e, conseqüentemente, uma análise mais
abrangente dos possíveis processos de mudança.
Para se observar em diferentes possibilidades de ordenação dos advérbios de tempo e
de aspecto em -mente, foram levados em consideração alguns fatores na classificação e análise
desses elementos, a saber: a ordem, a noção semântica expressa pelo advérbio (aspectual,
cronológico e híbrido); grau de gramaticalização da cláusula em que os advérbios de tempo e
aspecto em -mente se inserem (se mais ou menos gramaticalizada); e tipos de verbos a que
esses se associam, segundo Halliday (1994) e outros, que serão explicitados mais a frente.
4.1 Corpus
Em conformidade com os pressupostos teóricos da teoria funcionalista, os dados
utilizados para a análise da ordenação dos advérbios de tempo e aspecto terminados em -
mente foram extraídos de textos de diferentes gêneros textuais do português arcaico, dos
séculos XVI, XVII, XVIII, XIX e do português atual.
Os materiais constituintes da amostra e os procedimentos teórico-metodológicos
realizados, assim como o controle dos aspectos e fatores que influenciam na ordenação dos
advérbios em -mente, são apresentados e discutidos ao longo desse trabalho.
É importante ressaltar a complexidade que envolve a tarefa de se selecionar textos,
considerando-se um recorte histórico tão amplo. A complexidade dá-se, por um lado, pelo
fato de que esses textos precisam partilhar, ainda que minimamente, características que
permitam que sejam estabelecidas comparações entre os resultados dos dados neles
levantados, sem que haja distorções; por outro lado, pelo leque tão reduzido de opções de
textos de fontes confiáveis, que diminui as possibilidades de escolha.
Sendo assim, como não foi possível analisar exatamente os mesmos tipos de textos em
todas as épocas, foi seguido um roteiro, juntando diferentes tipos textuais, mas mantendo uma
certa coerência na sua distribuição pelos diferentes momentos sincrônicos analisados.
Chegou-se, então, aos seguintes corpora:
a) português arcaico: Testamento de Dom Afonso II; O Orto do Esposo (OE), de Maller
(1956) e Castelo Perigoso(todos esses textos estão disponíveis no site do corpus
informatizado do Português medieval(http://cipm.fcsh.unl.pt/gencontent.jsp?id=4). Esse
corpus (CIPM) foi criado em 1993 e inclui textos latino-romances do século IX ao século XII
e textos portugueses do século XII ao século XVI.
b) português do século XVI: Crônica dos Reis de Bisnaga; Cartas de D.João: são 372 cartas
de D. João III, rei de Portugal, do período entre 13 de outubro de 1523 e 20 de fevereiro de
1557, que também foram extraídas do site do corpus informatizado do Português medieval
(http://cipm.fcsh.unl.pt/gencontent.jsp?id=4).
c) português do século XVII: foram oito sermões do Padre Antônio Vieira:
1
o
sermão: Sermão da terceira quarta-feira da quaresma na Capela Real, 1669 (Assunto: um
remédio para os males de todas as cortes do mundo: a consolação dos mal despachados,
baseando-se no pedido indeferido da mãe dos Zebedeus);
2
o
sermão: Sermão da Sexagésima. Pregado na capela Real. Este sermão pregou o Autor no
ano de 1655, vindo da Missão do Maranhão, onde achou as dificuldades que nele se apontam,
as quais vencidas, com novas ordens reais voltaram logo para a mesma Missão.
3
o
sermão: Sermão de quarta-feira de cinza. Em Roma, na Igreja de S. Antônio dos
Portugueses.Ano de 1670.
4
o
sermão: Sermão do Santíssimo Sacramento. Exposto na lgreja de S. Lourenço, In:
Damaso, nos dias do Carnaval Em Roma. Ano de 1674. Traduzido do italiano.
5
o
sermão: Sermão do Nascimento da Virgem Maria. Debaixo da invocação de N. Senhora da
Luz, título da Igreja e colégio da Companhia de Jesus, na cidade de S. Luís do Maranhão. Ano
de 1657.
6
o
sermão: Sermão de S. Inácio, fundador da Companhia de Jesus, em Lisboa, no Real
Colégio de S. Antão, 1669.
7
o
sermão: Sermão do terceiro domingo da quaresma, na Capela Real, 1655.
8
o
sermão: Sermão da quinta-feira quaresma na misericórdia de Lisboa. ANi nF, 1 669
d) português do século XVIII:
Cartas comerciais da administração pública, representações oficiais do Rio de Janeiro, obtidas
no corpus do Museu da Língua Portuguesa - Estação da Luz. Foram analisadas 13 Cartas.
BARBOSA, Afranio & LOPES, Célia Regina et al. Corpus diacrônico do Rio de Janeiro:
cartas pessoais séculos XVIII-XIX. Rio de Janeiro, UFRJ/PIBIC-CNPq/ Labor-Histórico,
2003 (versão eletrônica
)
e) português do século XIX:
Cartas comerciais da administração pública, representações oficiais do Rio de Janeiro, obtidas
no corpus do Museu da Língua Portuguesa - Estação da Luz. Foram analisadas 12 cartas.
BARBOSA, Afranio & LOPES, Célia Regina et al. Corpus diacrônico do Rio de Janeiro:
cartas pessoais séculos XVIII-XIX. Rio de Janeiro, UFRJ/PIBIC-CNPq/ Labor-Histórico,
2003 (versão eletrônica)
f) português atual:
- Tocar o Senhor, Pe. Leo (TS).
-A essência do cristianismo, de J. Berkeley (EC).
4.2 Descrições dos fatores da análise dos advérbios de tempo e aspecto em –mente
Classificamos os dados a partir de alguns fatores que nos pareceram relevantes ao estudo
dos advérbios de tempo e aspecto em -mente. Utilizamos o modo de coleta e codificação da
sociolingüística variacionista (apesar de não estarmos trabalhando com um fenômeno de
variação propriamente dito).
Todos os dados são analisados a partir de fatores, que assim se configuram:
1. Posição/Ordem do advérbio em relação ao verbo
Verificamos a posição do advérbio de tempo e aspecto, se ocorre antes ou depois do
verbo, independentemente da presença ou ausência de algum elemento interveniente como o
sujeito, ou um outro advérbio, uma expressão, uma oração subordinada, etc.
Inicialmente, estabeleceram-se duas posições gerais nas quais os advérbios de tempo e de
aspecto em -mente poderiam ocorrer:
- Antes do verbo:
(1) que Deus constatemente nos fala (Português atual, TS,p.15)
- Depois do verbo:
(2) abramos os corações à luz , para que more perpetuamente neles(Século XVII, Sermão de
Santo Inácio, Pe A.Vieira)
Dessas ordenações gerais, desmembraram-se subposições, vejamos no quadro abaixo:
Quadro 2- Subposições do Advérbios em -mente
Posições Exemplos:
POSIÇÃO 1 (POS1): (ME) margem
esquerda da oração (tudo que estiver no
início de oração ou depois de conjunção).
(3) Constantemente Jesus vem curar-nos
(Português atual, TS, p.28)
POSIÇÂO 2(POS2): entre o sujeito e o
verbo. (o sujeito pode ser SN, pronome ou
pronome relativo)
(4) que Symão Fernandez novamente fez
(séc.XIV, Carta número 147)
POSIÇÂO 3(POS3): não inserido entre o
sujeito e o verbo, mas fora da margem
esquerda da cláusula.
(5) Agora novamente tem sucedido nas
minas hum levantamento que La fizeram
os povos. (século XVIII, Cartas oficiais).
POSIÇÂO 4(POS4): entre o verbo auxiliar
e o verbo principal.
(6) Precisamos urgentemente encontrar
nosso lugar de oração (Português atual,
TS, p.113)
POSIÇÃO 5(POS5): margem direita da
oração (no final da oração).
(7) Cristo continua do lado de fora de
nosso coração, batendo incessantemente
(Português atual, TS, p.39)
POSIÇÃO 6(POS6): inserido entre o
verbo e o complemento/predicativo.
(8) No entanto, ao oferecer
espontaneamente à igreja o produto da
venda (Português atual, TS, p.97)
POSIÇÃO7(POS7): entre o verbo e o
sujeito.
(9) chegou subitamente h~u~u home(m)
nõ conhecido ~ecima dh~u~u Cavallo e
~entrou pello paaço(Português arcaico
OE, 353)
POSIÇÃO 8(POS8): Não inserido entre o
verbo e o sujeito, ou entre o verbo e o
complemento/predicativo, mas fora da
margem direita(ou, seja, no final da
cláusula)
(10) deixamos boas coisas para trás muito
freqüentemente em nome da
independência (Português atual, EC, p.31)
2) Tempo/sincronias: português arcaico, dos séculos XVI, XVII, XVIII, XIX e português
Atual (cf. na seção anterior a lista de textos que serviram como corpora)
3) A noção semântica expressa pelo advérbio: Em relação às características semânticas que
cada advérbio pode expressar, classificamos em: a) advérbios que expressam tempo real
cronológico: são aqueles que expressam tempo cronológico, como por exemplo, os advérbios
atualmente e ultimamente; b) advérbios que expressam tempo aspectual: são os que se
referem à repetição de algum evento, ou à freqüência com que eventos ocorrem. Sabemos que
é bastante complexo delinearmos os limites entre tempo real e tempo aspectual, mas
decidimos que é possível fazer essa diferenciação, pelo menos até o ponto que nos foi exigido
pela análise. No presente estudo, foi claro observar e definir esses advérbios denominados de
tempo real devido a suas características dêiticas. Portanto, os advérbios cronológicos fazem
referência ao momento da enunciação. Enquanto, os advérbios de tempo aspectual são os que
se referem à repetição de algum evento, ou à freqüência com que os eventos ocorrem como o
advérbio freqüentemente; c) advérbios que são híbridos: são os usos polissêmicos, ou seja,
aqueles que expressão além das noções de tempo e de aspecto, expressam também a noção de
modo (tempo+aspecto/aspecto+modo), isto é, são os advérbios que expressam de alguma
forma duas características, com predominância de uma ou outra, por exemplo, tempo e modo,
como o advérbio rapidamente.
4) O tipo semântico de verbo que compõe a cláusula, segundo Halliday (1994), a saber:
material, mental, comportamental, relacional possessivo, relacional intensivo, atividade verbal
e meteorológico. (cf. seção 3.5).
5) Tipo formal de sujeito - verificamos em cada oração coletada se o sujeito estava (a)
formalmente presente antes do verbo, (b) formalmente presente depois do verbo, (c) presente
na forma de um pronome relativo ou (d) ausente (incluindo neste caso o tradicional sujeito
oculto e a oração sem sujeito).
6) Tipo de oração - observarmos em que tipo de oração, o advérbio de tempo e de aspecto
está inserido, se a oração é (a) paratática, (b) subordinada (substantiva ou adjetiva restritiva),
(c) hipotática (adverbial ou adjetiva explicativa), (d) oração principal ou (e) oração absoluta.
Cruzamos alguns desses fatores entre si para verificarmos os padrões de uso dos
advérbios e para vermos o uso dos mesmos em cada sincronia da língua.
5 ANÁLISES DOS DADOS
Neste capítulo, apresentamos uma análise dos advérbios de tempo e de aspecto
terminados em mente usados em textos escritos em norma culta do português, mais
precisamente em textos do português arcaico, dos séculos XVI, XVII, XVIII, XIX e do
português atual.
Analisamos aqui os resultados encontrados através da codificação dos fatores
controlados, como foi dito: posição do advérbio, noção semântica do advérbio, tipo de
verbo, tipo de sujeito, sincronias e tipo de oração. Destacamos a importância destes para
comprovar a hipótese de que fatores que influenciam o posicionamento dessa categoria em
relação ao verbo e a de que deve ter havido mudanças na ordenação desse advérbio nas
sincronias estudadas.
A seguir, explicitamos a análise dos grupos de fatores pertinentes ao estudo do
fenômeno em questão.
5.1 Análises de fatores
Começamos nossa análise pela apresentação das ordens estabelecidas (cf. capítulo 4),
fator de maior importância para verificarmos a posição prototípica dos advérbios em –mente
em cada sincronia.
5.1.1 Ordem do advérbio de tempo e aspecto em -mente
Inicialmente, a análise consistiu na verificação da posição de cada advérbio na
sentença. Porém, para uma melhor compreensão dos dados, foram estabelecidas duas posições
gerais:
Antes do Verbo
(01) Por uso antigamente havia um conselho chamado dos massarotes (Século XVII,
Sermão do Pe.A. Vieira)
Depois do Verbo
(02) Abramos os corações à luz, para que more perpetuamente neles Século XVII,
Sermão do Pe.A. Vieira)
Encontramos em todos os textos analisados (de todas as sincronias) um total de 180
dados com advérbios de tempo e aspecto em -mente. Estes estavam distribuídos de acordo
com o que pode ser visto na tabela a seguir:
Tabela 1- Distribuição dos advérbios em -mente quanto à ordem em relação ao verbo
Posição antes do
verbo
Posição depois do
verbo
Auxiliar-Adv-
Verbo
Total
Ocorrência % Ocorrência % N
o
de oco
rrência
%
82= 45,5% 88= 48,8% 10= 5,5 180=100%
Na tabela 1, verificamos que não houve diferença significativa, ao compararmos as
duas posições gerais: antes e depois do verbo. Sem levarmos em conta as sincronias, os dados
se distribuem homogeneamente entre as duas posições, como nos exemplos abaixo (os
exemplos 03 e 04, são de advérbios colocados em posição pós-verbal e os exemplos (05) e
(06) são de advérbios em posição pré-verbal). Houve apenas 5,5 % de dados com o advérbio
entre o auxiliar e o verbo (POS 4).
(03) Deu sinal o rei, mandou Moisés a Arão que lançasse a sua vara em terra, e converteu-se
sùbitamente em uma serpente viva e tão temerosa, como aquela de que o mesmo Moisés no
deserto se não dava por seguro (Século XVII, Sermão do Pe. A. Vieira)
(04) Entre estas duas portas se acha subitamente um homem no instante da morte, sem poder
tornar atrás, nem parar, nem fugir... (Século XVII, Sermão do Pe. A. Vieira)
(05) Em conseqüência desta minha lembrança, ordenei à Câmara desta Cidade que
immediatamente passasse a examinar o numero de Embarcaçoens, que tinhão sahido deste
Porto para essa Cidade (Século XVIII, administração Pública/Carta oficial)
(06) ...esta inCerteza menão fez admiração porser muito na= tural o erraremse todos
osCalculos quesefazem SobreCouzaz tão inCertaz. Como aNavegação, finalmente
chegarão Vossamercez muito bonz, que he oque mais estimo, eComamesma felicidade
principiarão asSuas marchaz por terra(Século XVIII, Administração Pública/Carta oficial)
A tabela abaixo apresenta, de um modo geral, o número das ocorrências dos advérbios
de tempo e aspecto em -mente pelas sincronias estudadas.
Tabela 2- Levantamento Geral dos dados dos corpora dos Advérbios de Tempo e de
Aspecto em -mente
Sincronias Total
Port. Arcaico 44
SÉC. XVI 18
SÉC.XVII 34
SÉC.XVIII 18
SÉC.XIX 21
Port. Atual 45
TOTAL
180
Eis alguns exemplos de cada uma das sincronias estudadas:
- Português arcaico:
(07) Quem de ssi meesmo busca paz em out(r)a part(e) ou pobreza ou desp(re)ço, nom a
achara´. Que quem mu(r)mura ou he trist(e) de ssua pobreza, e q(ue)m ha´ door no coraçom e
he descontent(e) e a despreza nom ha´ paz consigo. E po(r) que homem possa vi~ir a esta paz,
deve rroguar a D(eu)s conthinuadament(e), e amehu´de peenssar em sua grande pobreza e
humildade e maravilhossa sofrença. (Castelo Perigoso).
- Século XVI:
(08)
E
ste rey tem continuadamente cimcoenta mil home~es de solldo, em que entra~o seis
mill home~es de cavallo, que sa~o de sua goarda do paço, dos quoaes seis mil sa~o os
duzentos obrigados a cavalgar com elle, e tem mais vimte mill lamceiros e dargueiros, e tres
mil home~es (Século XVI –Crônica dos Reis de Bisnaga)
-Século XVII:
(09) Lêde o Testamento Velho, e achareis que Deus antigamente afogava exércitos, queimava
cidades, alagava mundos, despovoava paraísos. (Sermão do Pe.A. Vieira).
-Século XVIII:
(10) O Antigo Provedor da Fazenda; emque VossaSenhoria mefala, dizendo naõ desceria dos
Sertoens, desceo com efeito, eaqui se acha, segundo metem constado ha dozedias, mas
brevemente hirá para essa cidade, pois...(Século XVII, carta Comercial número 7)
- Século XIX:
(11) Pessolhe novamente de ver os vestidos | que estão na D. Brasilia, e faser | o possível por
m’os ...(Século XIX, Carta Comercial número 2)
- Português Atual
(12) Hoje não damos tanta importância àquilo que Deus constantemente nos fala (TS, p. 15)
5.1.2 Posição do advérbio
A seguir, podemos observar a distribuição dos advérbios analisados pelas posições
arroladas nas sincronias estudadas. Apenas para lembrar (cf. capítulo 4):
a) POS 1 – a posição da margem esquerda;
b) POS 2 – a posição entre o sujeito e o verbo.
c) POS 3 a posição não inserida entre o sujeito e o verbo, mas fora da margem esquerda
da cláusula;
d) POS 4 – a posição entre o verbo auxiliar e o verbo principal;
e) POS 5 – a posição a margem direita da oração (no final da oração);
f) POS 6 – a posição inserida entre o verbo e o complemento/predicativo;
g) POS 7 – a posição entre o verbo e o sujeito.
h) POS 8 – a posição não inserida entre o verbo e o sujeito, ou entre o verbo e o
complemento/predicativo, mas fora da margem direita.
Tabela 3 - Distribuição das posições dos advérbios de tempo e aspecto em –mente X
sincronias
Sincronias POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
ARCAICO 09 02 06 02 10 09 - 06 44
SÉC.XVI
10 02 - - 01 03 01 01 18
SÉC.XVII
18 02 02 - 02 04 01 05 34
S.XVIII. 11 01 - 01 01 02 - 02 18
SÉC.XIX
06 - - 03 04 05 - 03 21
Português
Atual
06 03 04 04 14 07 01 06 45
Total 60 10 12 10 32 30 03 23 180
% 33,3 5,5 6,6 5,5 17,7 16,7 1,6 12,7 100
Ao olharmos o total expresso na última linha da tabela, podemos constatar que a POS1
é mais recorrente. Isso evidencia que os advérbios de tempo e de aspecto em -mente,por
expressarem tais circunstâncias, preferem as posições periféricas da cláusula, sobretudo à
margem esquerda (POS1), e evitam posições mais internas à sentença, posições essas que
rompem com a estrutura padrão da cláusula. Shaer (2004), tratando especificamente da
ordenação dos circunstanciais temporais, relata que não é fácil determinar de forma precisa as
diferenças entre os temporais na margem esquerda ou na margem direita da sentença, ainda
que seja possível determinar distinções funcionais entre eles: a margem esquerda constitui um
ponto de ancoragem, um elo entre a parte do discurso em que se encontra o advérbio e um
ponto do discurso anteriormente mencionado, numa relação nitidamente anafórica, de
conexão discursiva. Tal fenômeno tende a não ocorrer com advérbios que ocupam a margem
direita da oração, associados a um escopo mais restrito, geralmente portador de informação
nova. Como podemos observar nos exemplos 13 e 14 abaixo:
(13) Antigamente convertia-se o mundo; hoje por que se não converte ninguém? Porque hoje
pregam-se palavras e pensamentos (Século XVII, sermão do Pe. A. Vieira).
(14) porque não perdeu o céu e a vista de Deus, mas vai arder no inferno eternamente.
(Século XVII, sermão do Pe. A. Vieira).
Podemos observar, também, através da tabela 3, que, no português arcaico, as posições
típicas são POS 5 (pós-verbal no fim margem direita), 6 (entre o verbo e o complemento) e 8
(pós-verbal fora do fim), mas os dados têm uma boa distribuição em todas as posições, exceto
na posição 7. Ou seja, no português arcaico havia uma ordenação mais livre, apesar das raras
ocorrências de algumas posições.
nas outras fases do português, entre o português do XVI e o português do século
XIX, o uso predominante é a posição 1 (margem esquerda). No século XVI, ainda outras
posições com uma distribuição razoável de dados, que são as posições 6 e 5. Depois, como
dissemos, é a posição marginal à esquerda a preferida pelos autores. Mas, no século XIX,
uma diferença importante: começa a aumentar o uso de uma posição pós-verbal, é a
posição 6. No português atual, verificamos novamente que há uma distribuição de dados em
todas as posições, mas há predomínio da posição 5, ou seja, uma posição pós-verbal.
Nossa análise permite dizer que, nos textos estudados, o advérbio em -mente passa de
um uso relativamente livre para um uso mais fixo na posição marginal à esquerda. Depois no
século XIX, começa a aumentar na posição pós-verbal e no português atual é usado
predominantemente na posição pós-verbal (mais especificamente na posição marginal à
direita, POS 6).
Albani (2007) verificou que a posição típica do advérbio sempre era pré-verbal no
português arcaico e pós-verbal no português contemporâneo. Todos os fatores estudados
indicam que, no português arcaico, a ordem era mais livre, enquanto no português atual a
ordem tende a ser mais fixa. Segundo ele, um forte indício de mudança na ordenação do
advérbio sempre em textos religiosos. Portanto, o autor encontrou um aumento da posição
pós-verbal ao comparar o português arcaico com o atual com relação ao uso de sempre. E o
mesmo constatamos no nosso estudo. Pesquisas futuras devem verificar os indícios de
mudança apontados aqui, comparando textos de diferentes tipos.
5.1.3 Noção semântica do advérbio
O fator noção semântica do advérbio foi investigado com a finalidade de se verificar
se relação entre o valor que o advérbio em -mente expressaria no contexto e a sua posição.
Os valores considerados (com base em Freitas e em Ilari) são:
(a) Cronológico – é aquele que expressa tempo real;
(b) Aspectual é aquele que expressa às noções: iterativo, reiterativo, freqüentativo e
outros;
(c) Híbrido – é aquele que expressa às noções tempo/aspecto + modo.
A categoria noção semântica é de grande relevância para este estudo, pois este é o
momento em que a caracterização semântica do advérbio estudado que poderá ser observada
em uma análise não quantitativa, mas qualitativamente.
Denominamos os advérbios aspectuais aqueles que indicam a freqüência com que os
eventos não-específicos ocorrem ao longo do tempo. Esse tipo de advérbio é eminentemente
aspectual, que interage com a categoria aspectual de iteratividade, como podemos observar
no exemplo abaixo:
(15)... e refletiu sobre aquilo que Deus continuamente nos fala.(Português atual, TS,p.15)
Neste exemplo (15), verificamos que o advérbio cronológico expressa tempo real, ou
seja, é aquele que faz referência ao passado, presente ou futuro, tendo como ponto de
referência o momento da enunciação. no exemplo (16), observamos que o advérbio
apresenta a noção dêitica, aponta para algum momento da enunciação.
(16) Atualmente as coisas estão como costumavam ser mil anos atrás. (Português atual, EC,
p.09)
o advérbio no exemplo (17), observamos que expressa à noção de iteratividade
(aqui também alocamos nos grupos dos advérbios aspectuais) referindo-se à repetição de
algum evento, ou à freqüência com que eventos ocorrem. Vejamos o exemplo:
(17) Para nos resgatar e nos libertar novamente (Português atual, EC, p.61)
De fato, é uma tarefa arriscada determinar os limites entre tempo real e tempo
aspectual, mas decidimos que é possível fazer essa diferenciação, pelo menos até o ponto que
foi exigido pela análise. No presente caso, foi claro observar e definir os itens denominados
de tempo real devido à suas características dêiticas.
Os advérbios que apresentam a noção semântica Híbrida ‘tempo mais modo’ (como,
por exemplo, rapidamente), ou ‘tempo mais aspecto’ (como, por exemplo, normalmente),
nada mais são do que aqueles advérbios que expressam de alguma forma as duas
características, com predominância de uma sobre a outra. O importante aqui é verificar se esta
polissemia influencia a posição do item em relação ao verbo.
Apresentamos aqui mais alguns exemplos para ilustrar o fator noção semânticos
expressa pelo advérbio:
1. Freqüentativo/iterativo- Aspectual:
(18)... repetidamente nós o rejeitamos...(Português atual, EC,p. 44)
2. Expressão de tempo real – cronológico:
(19) Por isso antigamente havia um conselho chamado dos massoretas (Século XVII, Sermão
do Pe. A. Vieira )
3. Tempo aspectual – Aspectual:
(20) para nos resgatar e nos libertar novamente ...(Português atual, EC,p.61)
4. Híbrido tempo/aspecto + modo:
(21) Deus está querendo ficar eternamente conosco. ...(Português atual, TS, p. 49)
Portanto, esse fator leva em consideração a noção semântica que os advérbios em -
mente podem assumir no contexto em que estão inseridos.
A análise dos dados, que se apresentarão a seguir, será feita separando os corpora de
cada sincronia estudada. As tabelas abaixo ilustram a distribuição dos advérbios de acordo
com a posição e noção semântica identificadas, a começar pelo uso dos advérbios no
português arcaico. Ao final da seção, faremos uma conclusão geral relativa a esse fator.
Tabela 4 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica no
Português Arcaico
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTA
L
Cronol. 03 - - - 03 02 - 01 09
Aspectual 02 - - 01 - 01 - - 04
Híbrido 04 02 06 01 07 06 - 05 31
Total 09 02 06 02 10 09 - 06 44
% 20,5 4,5 13,6 4,5 22,7 20,5 - 13,6 100
Na tabela 4, em que checamos a ordenação do advérbio e a noção semântica expressa
por ele na cláusula, observamos a predominância da tendência pré-verbal, exceto os advérbios
com os sentidos híbridos que expressam em si mesmos os valores de tempo/aspecto e modo.
É exatamente o fato de apresentar esse valor polissêmico denominado de híbrido na presente
pesquisa que explica o desvio que este advérbio apresenta com relação à tendência da posição
pré-verbal.
Além disso, podemos apontar na tabela acima outras constatações no português
arcaico, como por exemplo, se observarmos os totais expressos na última linha da tabela,
verificamos que as posições 1, 5 e 6 são mais recorrentes do que as demais posições 3, 8, 2 e 4
respectivamente.
Outra questão a ser considerada nessa análise é que as noções cronológicas e aspectual
não são predominantes em relação às demais noções. Entretanto, identificamos que a noção
híbrida é mais freqüente, quanto à sua ordenação, eles ocorrem mais na posição 5(margem
direita da cláusula), que é uma posição pós-verbal.
Na dissertação de Freitas (2004), verificou-se que o tipo polissêmico (que
corresponderia à noção híbrida) ocorria mais na posição pós-verbal, diferindo dos demais
tipos semânticos (cronológico, aspectual e conectivo). A autora justifica que por essa noção
possuir características de um advérbio qualitativo (Ilari et al., 1990), esse advérbio irá tender a
ocupar a posição pós-verbal, uma vez que os advérbios qualitativos têm a predisposição de
ocorrer após o verbo. Já Moraes Pinto (2007:77), ao estudar o uso do advérbio qualitativo em
–mente, constatou que “esses elementos apresentam mudança em seus valores desde
português arcaico ao século XIX”. Ela conclui que, além do processo de gramaticalização
pelo qual passou esse advérbio, exercendo nova função, sua ordenação na cláusula também
sofreu mudanças de acordo com os textos diacrônicos. E, ainda, acrescenta que “a posição
pré-verbal, principalmente entre o sujeito e o verbo, ainda se mostrou disponível, embora em
menor escala, no século XIX”.
Vejamos a análise do mesmo fator nos dados do século XVI:
Tabela 5 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica
Século XVI
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
Cronol. 05 - - - - 01 - - 06
Aspectual 02 01 - - - - - - 03
Híbrido 03 01 - - 01 02 01 01 10
Total 10 02 - - 01 03 01 01 18
% 55,5 11,1 - - 5,5 16,7 5,5 5,5 100
Na análise dos dados desse fator no século XVI, encontramos na relação entre ordem e
noção semântica, maior incidência de dados na posição 1 (margem esquerda da cláusula). As
noções cronológicas e aspectual, principalmente, predominam nessa posição (1), o sentido
híbrido ocorre mais nas posições pós-verbais, como atestam os trabalhos de Freitas (2004) e
Moraes Pinto (2002) em referência a esse tipo de advérbio. Com relação ao século XVII,
temos os seguintes resultados:
Tabela 6 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica
Século XVII
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
Cronol. 10 02 02 - 01 03 - 03 21
Aspectual 01 - - - 01 - - - 02
Híbrido 07 - - - - 01 01 02 11
Total 18 02 02 - 02 04 01 05 34
% 52,9 5,9 5,9 - 5,9 11,8 2,9 14,7 100
No século XVII, observamos que as noções cronológicas e híbridas predominam na
posição 1 (margem esquerda da cláusula). O sentido aspectual é menos freqüente (com
somente 1 dado na posição 1(margem esquerda) e 1 dado na posição 5 (margem direita).
Além disso, verificamos que o tipo híbrido não foi mais recorrente nas posições pós-verbais,
como vimos no português arcaico e no século XVII, mais ainda assim, não foi uma diferença
marcante.
O baixo número de dados não nos permite fazer outras generalizações. O mesmo
acontece com as outras sincronias.
A seguir apresentamos os resultados da análise dos dados do século XVIII.
Tabela 7 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica
Século XVIII
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
Cronol. 03 - - 01 01 01 - 01 07
Aspectual 03 - - - - 01 - 01 05
Híbrido 05 01 - - - - - - 06
Total 11 01 - 01 01 02 - 02 18
É interessante observar que, no século XVIII, todas as noções apresentam-se
predominantemente na posição 1 (margem esquerda da cláusula, pré-verbal). E mesmo o
sentido híbrido é mais freqüente na posição pré-verbal.
Vejamos os resultados acerca da amostra do século XIX.
Tabela 8 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica
Século XIX
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
Cronol. 01 - - 01 - - - - 02
Aspectual 01 - - 02 02 03 - 01 09
Híbrido 04 - - - 02 02 - 02 10
Total 06 - - 03 04 05 - 03 21
% 28,6 - - 14,3 19 23,8 - 14,3 100
Sabe-se que, no século XIX, as transformações na ngua foram decisivas para a
caracterização do português moderno. Na análise dos dados desse século, verificamos que as
posições mais recorrentes são as pós-verbais. Em relação à noção semântica, observamos que
os sentidos aspectual e híbrido são mais incidentes do que o cronológico. Além disso,
identificamos que o sentido híbrido é mais recorrente nas posições pós-verbais, como foi
atestado em outros trabalhos sobre os advérbios já citados.
Tabela 9 – A relação entre a ordem do advérbio e a noção semântica
Português Atual
Noção
semântica
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
TOTAL
Cronol. 02 - - 01 05 02 - - 10
Aspectual 02 01 03 03 05 03 - 05 22
Híbrido 02 02 01 - 04 02 01 01 13
Total 06 03 04 04 14 07 01 06 45
% 13,3 6,7 8,9 8,9 31,1 15,6 2,2 13,3 100
Na tabela 9, verificamos uma distribuição entre a posição e a noção semântica do
advérbio de maneira mais homogênea entre os sentidos pelas posições arroladas. Observamos
também que as posições pós-verbais são mais freqüentes do que as posições pré-verbais. E
que o sentido aspectual é mais utilizado nos contextos examinados.
Como vimos, no português atual, predomínio da posição pós-verbal (mais
especificamente a posição marginal à direita). Apenas podemos concluir que, quando a noção
é basicamente aspectual, como em freqüentemente, o advérbio não tem posição predominante,
mas, quando apresenta noção dêitica (temporal) ou noção híbrida, como antigamente,
rapidamente, respectivamente, a posição típica é pós-verbal.
Notamos também que os sentidos do advérbio ligeiramente encontrados no português
arcaico desapareceram e um novo uso surgiu. Isso demonstra que houve uma mudança nos
valores desses elementos.
Assim, podemos apontar que os advérbios do presente estudo assumem valores que
podem ocorrer antes ou depois do verbo, dependendo do valor semântico que assumem. O
advérbio ligeiramente, por exemplo, pode se apresentar como advérbio de modo (com sentido
de “de maneira simples; com simplicidade”) em posição pós-verbal ou começa a ter um
sentido brido quando aparece em posição pré-verbal. Pode ser entendido tanto como “com
simplicidade; com humildade” quanto, por extensão metafórica de significado, com sentido
semelhante a “apenas; só”, como ocorre nos dias de hoje. Nos exemplos dados do português
arcaico, temos:
(22) posso dizer ligeyrame)
))
)te qual cousa dellas he merecedor de mayor cõndenpcõ
(Português arcaico, OE, p.122)
(23) E e)na segu)da coua põõe) hu)a cesta que se çarra legeyrame
)
))
)
te quando a tangem. (Português
arcaico, OE, p.194)
No primeiro exemplo, o advérbio se comporta como advérbio de modo e, no segundo,
é híbrido, ou seja, um sentido se sobrepõe ao outro, resguardando resquícios de sentidos.
5.1.4 Tipo semântico do verbo
Um dos fatores que consideramos importantes para entender a posição dos advérbios
de tempo e de aspecto em -mente é a noção semântica expressa pelo verbo, pois trabalhos
anteriores, como Scheibman (2001), Bybee (2003), Andrade (2005) e Albani (2007), que
constataram que era necessário investigar se o tipo de verbo poderia influenciar na cláusula de
alguma forma, conforme explicamos na seção 3.5. Na presente análise, consideramos esse
fator relevante para tentar identificar se houve uma motivação semântica na ordenação dos
advérbios de tempo e de aspecto em -mente. Para isso, valemo-nos da classificação proposta
por Halliday (1994), também utilizada pelos autores citados nesta seção.
Portanto, o fator tipo semântico do verbo consistiu na classificação proposta para os
verbos da cláusula foi baseada em Halliday (1994), explicitada anteriormente neste
trabalho. Eis alguns exemplos de tipos de verbos encontrados nos corpora analisados:
- Processo material
(24) E quantos mortos subitamente e s~e p~e~endença lançou e enviou a ardideza ao
inferno...(Português arcaico, OE,p. 191).
- Processo Mental
(25) E, estando elle deitado em oraçõ em aquele loguar, começou subitamente a dormir...
(Português arcaico, OE,p. 164).
- Processo Relacional Intensivo
(26) Maria é mãe eternamente presente no mundo dos homens (Português atual, TS, p.15).
- Processo Relacional Possessivo
(27) Ele tem o coração constantemente voltado para os miseráveis (Português atual, TS,
p.47).
- Processo Comportamental
(28) E diz outrosy que os b~e~es temporares que veem continuadam~ente h~u~us tempos
outros he certa demonstrãnça de maa v~etura... (Português arcaico, OE).
- Atividade Verbal
(29) e refletiu sobre aquilo que Deus continuamente nos fala
. (Português atual, TS, p.15)
- Processo Existencial
(30) e logo subitam~ete os veras inchar e esqueecer-se da subjeiçõ ....(Português arcaico,
OE,p. 289).
- Processo Meteorológico
(31) e a pompa do m~udo he fumo e v~eto que subpitamente esvace e se sume... (Português
arcaico, OE,p. 227)
Este fator foi levado em consideração para verificar se houve uma fixação de uso. Ou
ainda, se tipos de verbos em que predominância de uma dada ordem do advérbio em
detrimento de outra. Além disso, temos de levar em consideração que essa classificação
semântica verbal é bastante subjetiva, pois os verbos podem apresentar sentidos adversos aos
propostos, dependendo do contexto ou a situação em que estejam configurando. Vejamos um
exemplo dos corpora:
(32) Entõn foy arrevatado subitam~ete em spiritu e levado ante a cadeyra ah~uu juiz...
(Português arcaico, OE, p. 66).
Na exemplificação (32) dada, o verbo “arrebatar”, que significa puxar, arrancar
(Dicionário Houaiss da língua portuguesa, 2004), está sendo usado metaforicamente.
Esperávamos também que o tipo semântico do verbo influenciasse a posição do
advérbio.
Para verificarmos, estabelecermos a relação entre o fator tipo semântica do verbo e a
ordem do advérbio de tempo e aspecto. Vejamos a tabela a seguir:
Tabela 10 –Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em –mente no
Português Arcaico
Tipo de
verbo/Ordem
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
01 - 01 01 02 02 - - 07
Existencial
- - 01 01 01 - 02 05
Material
04 01 03 01 06 02 - 01 18
Mental
- 01 01 - - 01 - 01 04
Relac. Intensivo
02 - - - 01 - - 01 04
Meteorológico
01 - - - - - - 01
Atividade Verbal
01 - - - - 03 - 01 05
Total
09 02 06 02 10 09 - 06 44
% 20,5 4,5 13,6 4,5 24,9 22,7 - 13,6 100
No português arcaico, observamos que o tipo de verbo mais recorrente é de valor
material em detrimentos dos demais valores. Quanto à relação posição e sentido do verbo, o
tipo material ocorre nas posições 1 e 5, que o as posições margens esquerda e direita
respectivamente. Os verbos comportamentais tendem a ocorrer nas posições 5 e 6 e os verbos
de atividade verbal tendem a ocorrer na posição 6. Além disso, verificamos que, em relação à
distribuição geral dos dados nesta sincronia, ela se dá de forma equilibrada. Na última linha
da tabela (total de dados de cada ordenação), constatamos que as posições marginais 1 e
5(esquerda e direita) são mais freqüentes, apesar de haver uma relativa distribuição dos dados
nas demais ordenações.
Além disso, nesta sincronia não houve ocorrência de verbo relacional possessivo.
Agora, vejamos a análise dos dados do século XVI.
Tabela 11 – Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em-
mente do século XVI
Tipo de
verbo/Ordem
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
01 - - - - - - - 01
Material
03 01 - - - - - - 04
Mental
02 - - - - - - 01 04
Relac. Possessivo
01 01 - - - 01 01 - 04
Relac. Intensivo
02 - - - 01 02 - - 05
Atividade Verbal
01 - - - - - - - 01
Total
10 02 - - 01 03 01 01 18
% 55,5 11,1 - - 5,5 16,6 5,5 5,5 100
Nos dados apresentados do século XVI, verificamos que os tipos mais freqüentes são
verbos materiais, mentais e relacionais possessivos. No total de 18 dados, encontramos 4
dados de cada tipo. Quando o verbo tem sentido material ou mental, a tendência é o advérbio
ocorrer na margem esquerda (POS1). Quando o verbo é relacional possessivo não posição
prototípica para o advérbio.
Em relação aos demais sentidos dos verbos, uma distribuição de dados equilibrada,
apenas podemos ressaltar que, verificando a última linha da tabela, a posição 1 (margem
esquerda) é a preferida, independente do tipo semântico do verbo.
Neste século, não houve ocorrências dos tipos de verbos existenciais e meteorológicos.
Vejamos os dados analisados na tabela a seguir.
Tabela 12 - Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em -mente
Século XVII
Tipo de
verbo/Ordem
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
- - - - - 02 - 01 03
Existencial
04 - - - 01 - 02 07
Material
04 02 01 - 01 01 01 - 10
Mental
01 - 01 - - - - - 02
Relac. Possessivo
02 - - - - - - 02
Relac. Intensivo
03 - - - - - 01 04
Atividade
Verbal
04 - - 01 - - 01 06
Total
18 02 02 - 02 04 01 05 34
% 52,9 5,8 5,8 - 5,8 11,8 2,9 14,7 100
Já nos dados do século XVII, observamos que não há uma predileção pelo tipo
material, como vimos nos dados do português arcaico e do século XVI, mas, em relação à
posição e o tipo semântico do verbo em geral, todos são mais recorrentes na posição 1
(margem esquerda), 18 dados de 34, e há uma relativa distribuição nas demais posições, o que
não difere dos séculos anteriores apresentados.
Neste século não houve ocorrência do tipo de verbo meteorológico, por isso não foi
apresentado na tabela.
A seguir, temos os dados analisados do século XVIII.
Tabela 13 – Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em -mente
Século XVIII
Tipo de
verbo/Ordem
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
03 - - 01 01 - - 05
Material
05 - - - 01 01 - 01 08
Mental
02 01 - - - - - 01 04
Relac. Possessivo
- - - - - - - - -
Relac. Intensivo
01 - - - - - - - 01
Total
11 01 - 01 01 02 - 02 18
% 61,1 5,5 - 5,5 5,5 11,1
-
11,1 100
Os dados analisados do século XVIII demonstram que o tipo de verbo material é o
mais freqüente, seguido do tipo comportamental (cada qual com 8 e 5 dados respectivamente).
Independentemente do tipo semântico, o advérbio tende a ocorrer na posição marginal à
esquerda (POS1).
Neste culo não houve ocorrências dos tipos de verbos: existencial, meteorológico e
atividade verbal, por isso não foram listados na tabela.
Vejamos os dados na tabela a seguir.
Tabela 14 - Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em -mente
Século XIX
Tipo de
verbo/Ordem
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
- - - - - - - 01 01
Material
03 - - 02 02 03 - - 10
Mental
- - - - - 01 - 01 02
Relac. Possessivo
02 - - - - 01 - - 03
Relac. Intensivo
01 - - 01 - - - - 02
Atividade
Verbal
- - - - 02 - - 01 03
Total
06 - - 03 04 05 - 03 21
%
28,6 - - 14,3 19,04
23,8 - 14,3 100
No século XIX, constatamos que o tipo de verbo material é o mais freqüente, como
maioria das sincronias. Quanto à relação entre posição e tipo de verbo, observamos que
uma distribuição mais homogênea. Quando o verbo é material, o advérbio em -mente ocorre
mais na posição 1 (3 dados em 10) ou na posição 6 (também 3 dados em 10). Os demais tipos
tiveram poucos dados. Verificamos, também, que os advérbios tendem a ocorrer mais nas
posições pós-verbais (Posições 5, 6, e 8).
Além disso, podemos confirmar na última linha da tabela que os números percentuais
incidem mais nessas posições: POS 5 (19,4%); POS 6 (23,8%); POS 8 (14,3%).
Na análise deste culo também não foram encontrados dados dos tipos de verbos
existenciais e meteorológicos, por isso este não foi listado na tabela.
A seguir, vejamos os dados analisados do português atual.
Tabela 15 – Relação tipo de verbo e ordem do advérbio de tempo e aspecto em -
mente do Português Atual
Tipo de
verbo/Oração
POS
1
POS
2
POS
3
POS
4
POS
5
POS
6
POS
7
POS
8
Total
Comportamental
01 - - 01 - 01 - - 03
Existencial
- - - - 03 - - 03
Material
03 01 - 02 03 02 - 02 13
Mental
- - - - 01 - 01 02
Relac. Possessivo
- - 01 - 02 01 - - 04
Relac. Intensivo
02 - 03 - - - - 02 07
Meteorológico
- - - - - - 01 - 01
Atividade
Verbal
- 02 - 01 05 03 - 01 12
Total
06 03 04 04 14 07 01 06 45
% 13,3 6,7 8,9 8,9 31,1 15,6 2,2 13,3 100
De acordo com a tabela 15, verificamos que o tipo de verbo mais freqüente é o verbo
de processo material, seguido dos de atividade verbal. Em relação ao tipo de verbo e a posição
do advérbio, vemos que, quando o verbo é material, o advérbio tende a ocorrer nas posições 1
e 5; quando é de atividade verbal, tende a ocorrer na posição 5.
Nos resultados apresentados, uma tendência para os advérbios em -mente
aparecerem numa posição pré-verbal (no português arcaico, século XVI, XVII e XVII)
principalmente quando o verbo é de processo material, assim com os demais tipos de verbos.
Mas em relação à análise dos dados do século XIX e português atual, verificamos que há uma
predileção às posições pós-verbais. Esse resultado indica mudança na posição do advérbio ao
longo da história do português, o que vai ao encontro de outras pesquisas, como as de
Martelotta (2006) e Albani (2007), que demonstraram que os advérbios m mudando para a
posição pós-verbal, de um modo geral.
5.1.5 Tipo de sujeito
A forma de realização do sujeito da oração, um critério de natureza sintática, é um
fator considerado na presente análise do advérbio de tempo e aspecto em -mente.
Em um trabalho feito sobre a forma de realização do sujeito pronominal, Duarte
(1993) observou que o português do Brasil apresentava índices de preenchimento de sujeito
bastante superiores aos apresentados pelas línguas românicas de sujeito nulo, como o
espanhol, o italiano e a variedade européia do português. A partir desse trabalho, intuímos que
em todos os contextos em que a posição do sujeito está vazia seja pela não realização, a
posposição ou deslocamento do sujeito para a margem direita da oração favoreceria a
ocorrência dos advérbios na margem esquerda da cláusula. De certa forma, a relação entre a
posição do advérbio e a forma de realização do sujeito da cláusula é demonstrada nas
subposições do item I desse capítulo, onde são analisadas as diversas possibilidades
estruturais decorrentes das posições em que os advérbios de tempo e de aspecto ocupam na
oração.
Essa possibilidade fora levantada em pesquisas como os de Kato e Nascimento
(2002:195), que mostraram que “se o sujeito é nulo, o preenchedor pode ser predito como um
adjunto”. Rocha (2001:113) também concorda com essa posição, pois afirma que “a ausência
de argumento concorre para propiciar a presença de preenchedores”. Haveria uma espécie de
equilíbrio sintático.
Porém, os trabalhos recentes apresentam evidências contrárias a essa postura. Duarte
(2003:121), em um estudo que compara amostras da fala carioca dos anos 80 e dos anos 90,
atesta que a ocorrência “de elementos adjuntos ao sujeito, sejam eles resultados de
topicalizações sejam eles adjuntos adverbiais, favorece a expressão plena do sujeito
pronominal”.
Para verificar de que forma se a relação entre a realização do sujeito e a ordem dos
advérbios de tempo e de aspecto em -mente foi feito um controle das possibilidades
exemplificadas a seguir:
a) Sujeito expresso anteposto ao verbo
(80) Lêde o Testamento Velho, e achareis que Deus antigamente afogava exércitos,
queimava cidades, alagava mundos, despovoava paraísos (Século XVII, sermão do Pe.A.
Vieira).
b) Sujeito expresso posposto ao verbo
(81) Comeu Eva o pomo da ciência, e queixava-me eu antigamente desta nossa Mãe; que
comeu o pomo, por que Ihe não guardou as pevides?(Século XVII, sermão do Pe.A. Vieira).
c) Sujeito ausente
(82) abramos os olhos à luz, para que alumie nossos corações; abramos os corações à luz, para
que more perpètuamente neles (Século XVII, sermão do Pe.A. Vieira).
d) Sujeito pronominal (que/quem).
(83) Capitulo como elrey combateo a cidade de Rachol. Estando elrey, como dito he,
combatemdo a cidade de Rachol, lhe veyo novas certas como ydalca~o hera chegado ao ryo
da bamda do norte, e que ally asentava seu arayall; mamdou elrey os espias que sempre
amdassem sobre elle, que vissem ho que fazia, e asym lhe desem o aviso de tudo ho que fazia;
com esta nova ouve no arayal allgu~u allvoroço, primcipalmente na gente baixa, a quem
numca fallta sospeitas, e aymda em sy tinha~o o medo que antigamente tinha~o aos mouros.
(Século XVI, Crônica dos Reis de Bisnaga)
Vejamos como ficou a distribuição do fator tipo de sujeito com a ordem do advérbio -
mente nas sincronias estudadas. As conclusões a respeito da hipótese serão dadas após os
resultados da última sincronia estudada, ao final desta seção.
Tabela 16 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio
Português Arcaico
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
05 - 05 01 06 06 - 06 29
Sujeito presente
antes do verbo
01 02 - 01 03 02 - - 09
Sujeito presente
depois do verbo
- - 01 01 01 - - 03
Sujeito pronome
relativo
03 - - - - - - - 03
Total
09 02 06 02 10 09 - 06 44
% 20,5 4,5 13,6 4,5 22,7 20,5 - 13,6 100
Nos dados do português arcaico, observamos que, quando o sujeito está ausente, o
advérbio tende a vir nas posições 5 (final da oração) e 6 (posição pré-verbal não marginal),
cada qual com 6 dados, no total de 29. Quando o sujeito está presente anteposto ao verbo, o
advérbio tende a ocorrer na posição 5 (final da oração). Ocorre apenas neste último caso uma
espécie de equilíbrio sintático.
Vejamos os dados a seguir do século XVI.
Tabela 17 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio
Século XVI
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
06 - - - - - 01 01 08
Sujeito presente
antes do verbo
03 02 - - 01 01 - - 07
Sujeito presente
depois do verbo
- - - - - 02 - - 02
Sujeito
pronome
relativo
01 - - - - - - - 01
Total
10 02 - - 01 03 01 01 18
%
52,9 11,5 - - 5,5 16,6 5,5 5,5 100
Nos dados do século XVI, quando o sujeito está ausente, o advérbio tende a vir na
posição 1(margem esquerda), o que é esperado para haver equilíbrio sintático. Quando o
sujeito está presente anteposto ao verbo, o advérbio tende a ocorrer também na posição 1
(margem esquerda), não confirmando a hipótese. Além disso, quando o sujeito está posposto,
o advérbio aparece em posição pós-verbal (a posição 6 é uma posição pós-verbal), o que
também não comprova a hipótese de equilíbrio sintático.
A seguir, vejamos os dados do século XVII.
Tabela 18 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio
Século XVII
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
09 01 02 - 01 02 01 04 20
Sujeito presente
antes do verbo
08 01 - - 01 01 - - 11
Sujeito presente
depois do verbo
01 - - - - 01 - 01 03
Sujeito
pronome
relativo
- - - - - - - - -
Total
18 02 02 - 02 04 01 05 34
% 52,9 5,8 5,8 - 5,8 11,7 2,9 14,7 100
Nos dados do século XVII, observamos que, quando o sujeito está ausente, o advérbio
tende a vir nas posições 1, havendo então preenchimento da posição pré-verbal. No entanto,
quando o sujeito está presente anteposto ao verbo, tende a ocorrer na posição 1 (margem
esquerda).
Vejamos os dados a seguir do século XVIII
Tabela 19 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio no Século XVIII
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
06 - - 01 - 01 - 01 09
Sujeito presente
antes do verbo
02 01 - - 01 01 - 01 06
Sujeito presente
depois do verbo
01 - - - - - - - 01
Sujeito pronome
relativo
02 - - - - - - - 02
Total
11 01 - 01 01 02 - 02 18
% 61,1 5,5 - 5,5 5,5 11,1 - 11,1 100
Na análise dos dados do século XVIII, verificamos que, quando o sujeito está ausente,
o advérbio tende a vir na posição 1(margem esquerda), 6 dados, ou seja, houve o
preenchimento da posição do sujeito pelo advérbio. Quando o sujeito está presente anteposto
ao verbo, o advérbio tende a ocorrer na posição 1 (margem esquerda), mas o número de dados
é extremamente baixo em qualquer posição
Vejamos os dados a seguir do século XIX.
Tabela 20 - Relação ente o tipo de sujeito e a ordem do advérbio
Século XIX
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
05 - - 01 02 05 - 03 16
Sujeito presente
antes do verbo
01 - - 02 - - - - 03
Sujeito presente
depois do verbo
- - - - 01 - - - 01
Sujeito pronome
relativo
- - - - 01 - - - 01
Total
06 - - 03 04 05 - 03 21
% 28,6 - - 14,2 19,0
4
23,8 - 14,2 100
Nos dados analisados do século XIX, verificamos que, quando o sujeito está ausente, o
advérbio tende a vir nas posições 1 e 6 (cada qual com 5). A hipótese do equilíbrio sintático se
confirma no primeiro caso, pois, quando o sujeito estava ausente, houve maior incidência de
advérbio na margem esquerda (ou seja, posição pré-verbal). Mas a ocorrência relativamente
alta de dados na posição 6 (entre o verbo e o complemento) demonstra que a hipótese não foi
contemplada. (Os demais tipos tiveram baixíssima ocorrência.). Observamos que
independente do sujeito estar ausente ou presente uma tendência a ocorrerem nas posições
pós-verbais (posições 5, 6 e 8).
Vejamos os dados a seguir do português atual.
Tabela 21 - Relação entre o tipo de sujeito e a ordem do advérbio
Português Atual
Tipo de
sujeito/ordem
1 2 3 4 5 6 7 8 Total
Sujeito ausente
02 01 01 04 07 04 01 02 22
Sujeito presente
antes do verbo
04 01 03 - 04 02 - 04 18
Sujeito presente
depois do verbo
- - - - 01 01 - - 02
Sujeito
pronome
relativo
- 01 - - 02 - - - 03
Total
06 03 04 04 14 07 01 06 45
% 13,3 6,6 8,8 8,8 31,3 15,5 2,2 13,3 100
Nos dados do português atual, verificamos, quando o sujeito está ausente, o advérbio
tende a ocorrer nas posições 5 (final da oração) e 6 (entre o verbo e o complemento). Esse
resultado indica que não tendência ao preenchimento da posição vazia. Quando o sujeito
está presente anteposto ao verbo, o advérbio aparece nas posições 1 (margem esquerda) e 5
(final da oração), o que demonstra que a hipótese do equilíbrio sintático não pôde ser
comprovada, pois ora preenchimento, ora não preenchimento da posição à esquerda do
verbo (com o sujeito à direita).
Nas tabelas apresentadas, se tomarmos as posições pré-verbais de um modo geral, em
oposição às pós-verbais, podemos observar que a ausência de sujeito nas posições pré-verbais
não leva o advérbio a se antepor ao verbo. Nos casos de sujeito ausente, por exemplo, temos
mais advérbios pós-verbais do que pré-verbais. Por outro lado, os casos em que o sujeito está
posposto apresentam mais dados com advérbio pós-verbal do que pré-verbal. Parece não
haver, portanto, nos casos dos advérbios em -mente, algum tipo de compensação ou equilíbrio
no posicionamento dos elementos na estrutura da cláusula.
Se observarmos separadamente a posição 1, ou seja, a que corresponde à margem
esquerda da cláusula e que, por hipótese, seria a que mais atrairia o advérbio, notamos que
isso também não ocorre. De fato, há uma quantidade maior de casos nessa posição.
Entretanto, se observarmos todas as ocorrências pré-verbais, notamos que a margem esquerda,
independentemente da presença ou não do sujeito, é a posição preferencial dos advérbios pré-
verbais.
Em função desses resultados, concluímos que não uma relação mais significativa
entre presença/ ausência de sujeito em posição pré-verbal (marginal ou o) e colocação dos
advérbios aqui estudados. Esse mesmo resultado foi obtido em Martelotta (2006) para os
advérbios qualitativos e em Marques (2008), que estudou a ordenação sujeito/ verbo. Assim
nossos resultados são contrários à hipótese de que adjuntos (pelo menos do tipo que estamos
estudando) são colocados na posição do sujeito vazio.
5.1.6 Tipo de oração
As tabelas abaixo apresentam a distribuição das ocorrências dos advérbios de tempo e
aspecto em -mente pelas diferentes posições observadas, sempre levando em conta o grau de
gramaticalização das cláusulas que contêm essas ocorrências. Essa análise foi feita de acordo
com a metodologia e hipóteses apresentadas nos trabalhos de Martelotta (2006). Sua hipótese
principal, exposta nesta tese no capítulo 1, é a de que as orações mais gramaticalizadas seriam
as mais propícias aos usos mais conservadores dos advérbios.
Tabela 22 - Ocorrência de advérbios no Português Arcaico
Na análise dos dados do Português Arcaico, observamos que um número
significativo de ocorrências de advérbios de tempo e aspecto em -mente em posição pré-
verbal, mostrando que essa posição, assim como a pós-verbal, estava disponível para este tipo
de advérbio na fase arcaica de nossa língua.
É possível observar algumas regularidades interessantes, sobretudo quando se
comparam esses resultados com outras pesquisas referentes à ordenação de outros tipos de
PORT.
ARCAICO
-gramatical.
+Gramatical.
- Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação
Subord. Rel
- NR NR R NR NR
Total
POS1
06 - - - - 03 09
POS 2
02 - - - - - 02
POS 3
02 01 - - 01 01 06
POS 4
- - - - - 02 02
POS 5
07 01 - - 01 01 10
POS 6
06 - - - 01 02 09
POS 7
- - - - - - -
POS 8
03 01 01 - - 01 06
Total
27 03 01 - 03 08 44
advérbios, feitas com base em outros corpora. Pesquisas elaboradas em Martelotta, (2004;
2006) e Martelotta e Vlček (2006) sobre os advérbios qualitativos bem e mal, assim como os
terminados em -mente demonstraram que as posições pré-verbais tipicamente latinas
(Martelotta, Processy e Santos: 2008), hoje praticamente inexistentes no caso desses
advérbios, ainda ocorriam até o século XIX, sobretudo em cláusulas com alto nível de
gramaticalização. Isso ocorre porque essas cláusulas, segundo Givón (1979), o mais
conservadoras em termos de estrutura sintática, sobretudo no que se refere à ordenação de
seus constituintes.
Os resultados da tabela acima não refletem o que ocorreu com os qualitativos: uma
predominância não muito acentuada das posições pós-verbais, mesmo em cláusulas mais
gramaticalizadas.
Temos a seguir dois exemplos que ilustram os tipos de cláusulas em que ocorre o tipo de
advérbio estudado:
(84) E esta sandia subitam~ete foy cega, mas Ella nõ sabia que era cega(OE,p.57)
(85) e a pompa do m~udo he fumo e v~eto que subpitamente esvaece e se sume...(OE, p
227)
No primeiro exemplo, temos uma ocorrência em que o advérbio está inserido numa
cláusula paratática; no segundo exemplo, o advérbio está num contexto de uma cláusula
subordinada adjetiva restritiva.
Análise dos dados referentes ao Século XVI
Na análise dos dados do século XVI, não temos o mesmo número de dados que foi
observado no português arcaico. Por isso, priorizamos uma análise mais qualitativa,
observando as tendências de ordenação em face às outras sincronias estudadas.
Tabela 23 - Ocorrência de advérbios no Século XVI
Apesar da baixa ocorrência de dados nesta fase, de um modo geral, a análise
qualitativa apresentou resultados favoráveis às nossas hipóteses. A posição pré-verbal, por
exemplo, estava presente nesta fase do português em escala menor que a posição pós-verbal.
Também foi possível observar que as orações mais gramaticalizadas elegem a
ordenação pré-verbal, 11 ocorrências distribuídas pelas posições pré-verbais (Pos 1, 2 e 3).
SÉC.XVI
-gramatical.
+Gramatical.
Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação
Subord. Rel
NR NR R NR NR
Total
POS1
01 01 01 - 01 06 10
POS 2
- - - - 01 01 02
POS 3
- - - - - - -
POS 4
- - - - - -
POS 5
01 - - - - - 01
POS 6
01 - - - 01 01 03
POS 7
01 - - - - - 01
POS 8
- - - - - 01 01
Total
04 01 01 - 03 13 18
Tal observação contribui para confirmar a hipótese que adotamos com Givón (1979) de que
esses tipos cláusulas (mais gramaticalizadas) tendem a ser sintaticamente mais conservadoras,
principalmente, no que diz respeito à ordenação dos constituintes da oração.
Ilustrando a ocorrência de cláusulas mais gramaticalizadas nesta sincronia, temos o
caso do exemplo (85), a seguir:
(85) O que ha da bamda d este rio. Esta hu~a cidade edificada que chama~o Senagumdym,
que dizem que antigamente foy cabeça do reyno, e agora vive nella pouca gente (Século
XVI, Crônica dos Reis de Bisnaga)
Outra ressalva interessante é que, ao analisarmos o português arcaico, apresentado
anteriormente, a hipótese de Givón (1979) não foi de todo confirmada, apesar de
encontrarmos uma leve tendência das posições pré-verbais em cláusulas mais
gramaticalizadas. Por outro lado, na análise do século XVI essa hipótese se confirma quando
se relacionam as posições dos advérbios com o grau de gramaticalização da cláusula em que
ele ocorre, segundo a qual a anteposição do advérbio em relação ao verbo, característica do
latim, se mantém em cláusulas com graus mais altos de gramaticalização, que são mais
conservadoras em termos de ordenação.
Pode-se concluir que essa diferença entre as ocorrências do português arcaico e as do
séc.XVI se simplesmente pelo fato de que existem mais cláusulas com altos níveis de
gramaticalização nos textos desse século do que a do outro e que, somente por isso, os
números referentes aos advérbios pré-verbais são mais altos nessas cláusulas.
Análise dos dados referentes ao Século XVII
O número de dados encontrados nos corpora deste século foi de 34 dados, um pouco a
mais do que o século XVI.
Tabela 24 - Ocorrência de advérbios no Século XVII
Podemos observar, na tabela 26, que o advérbio de tempo e aspecto em -mente, maior
incidência na posição pré-verbal, porém como cláusulas menos encaixadas.
SÉC.XVII
-gramatical.
+Gramatical.
- Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação
Subord. Rel
- NR NR R NR NR
Total
POS1
14 02 - - 02 - 18
POS 2
01 - - - 01 - 02
POS 3
- 01 - - 01 02
POS 4
- - - - -
POS 5
02 - - - 02
POS 6
03 - - - 01 04
POS 7
- - - - 01 01
POS 8
03 - - - 01 01 05
Total
23 03 - - 05 03 34
Análise dos dados do Século XVIII
Cabe registrar logo de início a quantidade extremamente pequena de dados de
ocorrências dos advérbios em estudo nesta época. Isso, obviamente, impede qualquer
conclusão mais precisa em relação as suas tendências de ordenação nos corpora analisados no
século XVIII. Entretanto, é possível observar e fazer algumas ponderações em relação aos
resultados encontrados nesse século.
Vejamos a tabela a seguir:
Tabela 25 - Ocorrência de advérbios no Século XVIII
É interessante ressaltar que novamente a nossa hipótese inicial também foi confirmada
de que as orações mais gramaticalizadas elegem a ordenação pré-verbal, 8 ocorrências contra
uma única ocorrência na posição pós-verbal.
SÉC.XVIII
-gramatical.
+Gramatical.
- Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação
Subord. Rel
- NR NR R NR NR
Total
POS1
05 - 03 - 01 02 11
POS 2
- - - - - 01 01
POS 3
- - - - - - -
POS 4
01 - - - - - 01
POS 5
- - - - 01 - 01
POS 6
02 - - - - - 02
POS 7
- - - - - -
POS 8
02 - - - - - 02
Total
10 - 03 - 02 03 18
Por outro lado, 5 ocorrências pré-verbais em cláusulas menos gramaticalizadas em
oposição 4 dados na posição pós-verbal, também em cláusulas menos gramaticalizadas.
Isso é importante, porque pode apontar para o fato de que, até o século XVIII, era mais forte a
inclinação que os advérbios qualitativos apresentavam de ocorrer antes do verbo, o mesmo
acontecendo para os de tempo e de aspecto, reforçando os resultados obtidos em Martelotta e
Vlček (2006), segundo os quais essa tendência começa a enfraquecer no início do século XIX
e acaba por desaparecer na virada para o século XX, os quais mostraremos mais adiante.
Análise dos dados referentes ao século XIX
As ocorrências de advérbios de tempo e aspecto em -mente no século XIX, relacionadas
às variáveis posição na oração e grau de gramaticalização da cláusula, podem ser vistas na
tabela abaixo:
Tabela 26 - Ocorrência de advérbios no Século XIX
No caso do século XIX, há uma quantidade maior de ocorrências de advérbios de tempo
e de aspecto em -mente, embora essas 21 ocorrências estejam longe de constituir a quantidade
necessária para se chegar a constatações mais precisas. Como foi mencionado na análise dos
dados do século XVIII, acredita-se ser possível, apesar do poucos dados, observar
regularidades interessantes, que se tornam significativas, quando comparadas com tendências
detectadas em outras pesquisas referentes à ordenação de outros advérbios, feitas com base
em outros corpora e em outros estágios da história do português.
Assim como aconteceu com o século XVIII, era de se esperar que o século XIX
apresentasse uma relativa predominância das posições pós-verbais. Isso de fato ocorreu: a
tabela apresenta 12 ocorrências nessa posição, total de 21 advérbios. Esses dados refletem a
tendência, mencionada anteriormente, que vem relativamente se delineando desde século
SÉC.XIX
-gramatical.
+Gramatical.
- Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação
Subord. Rel
- NR NR R NR NR
Total
POS1
03 - 02 - 01 - 06
POS 2
- - - - - - -
POS 3
- - - - - - -
POS 4
02 - - - 01 - 03
POS 5
02 - 01 - 01 - 04
POS 6
04 - - 01 - - 05
POS 7
- - - - - -
POS 8
02 01 - - - - 03
Total
13 01 03 01 03 - 21
XVI, uma vez que na fase arcaica do português com esse tipo de advérbio a hipótese não se
confirmou, ou como nos trabalhos de Moraes Pinto, 2002; Martelotta, 2004, a confirmação
dessas tendências foi constatada.
Outro resultado interessante se apresenta quando se relacionam as posições dos
advérbios com o grau de gramaticalização da cláusula em que ele ocorre. Do total de 9 casos
de advérbios pré-verbais, 4 correram em cláusulas mais gramaticalizadas (hipotáticas e
subordinadas). Cabe ressaltar aqui que a diferença entre as ocorrências em cláusulas menos
gramaticalizadas é bastante pequena: 6 dados nas posições (1, 2, 3 e 4) pré-verbais.
Tabela 27 - Ocorrência de advérbios no Português Atual
No português atual, a ocorrência dos dados demonstrou uma propensão, que se
manifesta quase categoricamente, de que esses advérbios ocorressem após o verbo, 28 dados,
SÉC.XIX
-gramatical. +Gramatical.
- Hipotaxe
Hipot. Rel.
Subordinação Subord. Rel
- NR NR R NR NR
Total
POS1
05 - - 01 - - 06
POS 2
01 - - - - 02 03
POS 3
01 - - 02 01 - 04
POS 4
04 - - - - - 04
POS 5
02 01 - 01 02 02 14
POS 6
03 01 - 02 01 - 07
POS 7
01 - - - - - 01
POS 8
05 01 - - - - 06
Total
28 03 - 06 04 04 45
sendo que 17 em cláusulas menos gramaticalizadas pós-verbais e 10 dados em cláusulas mais
gramaticalizadas. Cabe ressaltar que novamente obtivemos resultados atípicos aos esperados
segundo a hipótese proposta em relação à posição e o grau de gramaticalização das cláusulas.
O quadro a seguir apresenta uma síntese do que já foi exposto.
Nessa sincronia, novamente obtivemos resultados contrários aos esperados segundo a
hipótese proposta em relação à posição e o grau de gramaticalização das cláusulas.
Mas, ressaltamos que os resultados encontrados são significativos, pois alguns apontam
para outras possíveis tendências diferentes dos trabalhos realizados sobre o fenômeno em
questão.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta pesquisa teve como objetivo observar as diferentes posições que os advérbios de
tempo e aspecto em -mente tendem a assumir em diferentes momentos na história da língua
portuguesa, a fim de verificarmos se houve mudança na ordenação desses elementos. Para
isso, coletamos dados de textos do português das seguintes fases históricas: arcaica, dos
séculos XVI, VXII, XVIII e XIX e português atual.
Este estudo, além de testar novas hipóteses, vem integrar e ampliar uma série de
pesquisas que visam examinar, de modo mais geral, o processo de mudança de colocação dos
advérbios no decorrer do tempo (Moraes Pinto, 2002; Martelotta, Barbosa & Leitão, 2002;
Martelotta, 2004 e 2006; Martelotta & Processy, 2006; Andrade, 2005; Albani 2007; Freitas,
2004).
Foram muito poucos os dados encontrados nos corpora analisados, em função de que,
de um modo geral, advérbios de tempo e aspecto em -mente são, de fato, pouco usados no
discurso escrito assim como no falado. Sendo assim, em muitos momentos da pesquisa, foi
difícil chegar a conclusões a respeito dos resultados estatísticos. Entretanto, foi possível
observar, entre esses poucos dados, algumas regularidades interessantes, sobretudo quando
essas regularidades foram localizadas dentro de um processo de mudança mais geral,
observado em outras pesquisas referentes à ordenação de outros tipos de advérbios feitas com
base em outros corpora e em diferentes momentos da história da língua portuguesa..
Partimos do pressuposto de que ocorreram mudanças na posição dos advérbios ao
compararmos a sincronia do português arcaico com o atual. De acordo com trabalhos
anteriores, como os de Martelotta e Leitão (1999) e de Martelotta, Barbosa e Leitão (2001), a
posição pré-verbal (entre o sujeito e o verbo) era disponível para toda espécie de advérbio e,
hoje, ela ainda está disponível para alguns. Portanto, houve uma mudança no padrão de
ordenação de alguns advérbios.
Observamos que não houve diferença significativa, ao compararmos as duas posições,
a pré-verbal e a pós-verbal, quando levamos em consideração todos os dados, ou seja, quando
não separamos as sincronias, pois os dados se distribuíram homogeneamente entre essas
posições gerais.
Porém, ao olharmos a distribuição dos advérbios analisados pelas posições já arroladas
anteriormente nas sincronias estudadas, constatamos que a POS1 (margem esquerda) foi a
mais recorrente, ou seja, os advérbios de tempo e de aspecto em -mente por expressarem tais
circunstâncias preferiram as posições periféricas da cláusula, sobretudo à margem esquerda
(POS1), e pouco se realizaram nas posições mais internas à sentença, posições essas que
rompem com a estrutura padrão da cláusula. Shaer (2004), ao tratar especificamente da
ordenação dos circunstanciais temporais, relata que não é fácil determinar de forma precisa as
diferenças entre os temporais na margem esquerda ou na margem direita da sentença, ainda
que seja possível determinar distinções funcionais entre eles: a margem esquerda constitui um
ponto de ancoragem, um elo entre a parte do discurso em que se encontra o advérbio e um
ponto do discurso anteriormente mencionado, numa relação nitidamente anafórica, de
conexão discursiva. Além disso, pudemos observar, também, que, no português arcaico, as
posições típicas são posição 5 (pós-verbal, mais precisamente margem direita no fim da
oração), posição 6 (entre o verbo e o complemento) e posição 8 (pós-verbal fora do fim), mas
os dados tiveram uma boa distribuição em todas as posições, exceto a posição 7. Ou seja, no
português arcaico havia uma ordenação mais livre.
nas outras fases do português, entre o português do XVI e o português do século
XIX, o uso predominante foi a posição 1 (margem esquerda). No século XVI, ainda houve
outras posições com número razoável de dados, que foram as posições 6 (inserido entre o
verbo e o complemento/predicativo) e 5 (margem direita da oração). Depois, como dissemos,
é a posição marginal à esquerda a preferida pelos autores. Mas, no século XIX, já houve uma
diferença importante: começou a aumentar o uso de uma posição pós-verbal, que foi a posição
6. Já no Português atual, verificamos que houve uma distribuição de dados em todas as
posições, mas houve o predomínio da posição 5, ou seja, uma posição pós-verbal.
Nossa análise permite-nos dizer que, nas amostras estudadas (referentes somente ao
português escrito), o advérbio em -mente de tempo e de aspecto passou de um uso
relativamente livre para um uso mais fixo na posição marginal à esquerda e depois no
português atual passou a ser usado predominantemente na posição pós-verbal (mais
especificamente na posição marginal à direita). Trabalhos como os de Martelotta (2006) e
Albani (2007) também apontam pra o uso predominante da posição pós-verbal para os
advérbios ao longo da história do português.
Outro fator analisado foi a noção semântica do advérbio em que checamos a relação
entre ordenação e tipo semântico. No português arcaico observamos a predominância da
tendência pré-verbal, exceto os advérbios com os sentidos híbridos que expressam em si
mesmos os valores de tempo/aspecto e modo. É exatamente o fato de apresentar esse valor
polissêmico denominado de híbrido na presente pesquisa que explica o desvio que este
advérbio apresenta com relação à tendência da posição pré-verbal.
Outra questão a ser considerada nesta sincronia é que as noções cronológicas e
aspectual não são predominantes em relação às demais. Entretanto, identificamos que a noção
híbrida é mais freqüente, quanto à sua ordenação, eles ocorrem mais na posição 5 (margem
direita da cláusula), que é uma posição pós-verbal.
Na análise dos dados desse fator no século XVI, encontramos na relação entre ordem e
noção semântica, maior incidência de dados na posição 1 (margem esquerda da cláusula). As
noções cronológicas e aspectual, principalmente, predominam nessa posição (1), o sentido
híbrido ocorre mais nas posições pós-verbais, como atestam os trabalhos de Freitas (2004) e
Moraes Pinto (2002) em relação a esse tipo de advérbio.
no século XVII, observamos que as noções cronológicas e bridas predominam na
posição 1 (margem esquerda da cláusula). O sentido aspectual é menos freqüente (com
somente 1 dado na posição 1 (margem esquerda) e 1 dado na posição 5 (margem direita).
Além disso, verificamos que o tipo híbrido não foi mais recorrente nas posições pós-verbais,
como vimos no português arcaico e no século XVII, mais ainda assim, não foi uma diferença
marcante.
O baixo número de dados não nos permite fazer outras generalizações. O mesmo
aconteceu com as outras sincronias.
Em relação à análise dos dados do século XVIII, todas as noções apresentam-se
predominantemente na posição 1 (margem esquerda da cláusula, pré-verbal). E mesmo o
sentido híbrido é mais freqüente na posição pré-verbal.
Na análise dos dados do século XIX, verificamos que as posições mais recorrentes são
as pós-verbais. Em relação à noção semântica do advérbio, observamos que os sentidos
aspectual e híbrido são mais incidentes do que o cronológico. Além disso, identificamos que o
sentido híbrido é mais recorrente nas posições pós-verbais, como foi atestado em outros
trabalhos sobre os advérbios já citados ao longo desse estudo.
No português atual, verificamos uma distribuição entre a posição e a noção semântica
do advérbio de maneira mais homogênea entre os sentidos pelas posições arroladas.
Observamos também que as posições pós-verbais são mais freqüentes do que as posições pré-
verbais. E que o sentido aspectual é mais utilizado nos contextos examinados.
Como vimos, no português atual, predomínio da posição pós-verbal (mais
especificamente a posição marginal à direita). Apenas podemos concluir que, quando a noção
é basicamente aspectual, como em freqüentemente, o advérbio não tem posição predominante,
mas, quando apresenta noção dêitica (temporal) ou noção híbrida, como antigamente,
rapidamente, respectivamente, a posição típica é pós-verbal.
Outra perspectiva da presente pesquisa foi a observação da relação entre a forma de
realização do sujeito da oração, um critério de natureza sintática, e a posição do advérbio.
Para verificar essa relação, fizemos um controle dos seguintes tipos de sujeito: sujeito
expresso anteposto ao verbo; sujeito expresso posposto ao verbo; sujeito ausente e sujeito
pronominal (que/quem). Nessa perspectiva, pressupomos que a presença ou ausência do
sujeito influenciaria a colocação do advérbio de acordo com a noção semântica que o mesmo
venha expressar e, ainda, de acordo com a intencionalidade do escritor em enfatizar ou não
sua informação.
Ao tomarmos as posições pré-verbais de um modo geral, em oposição às pós-verbais,
verificamos que a ausência de sujeito nas posições pré-verbais não levou o advérbio a se
antepor ao verbo, ao contrário da hipótese do que posições vazias tenderiam a ser preenchidas
pelo advérbio.
Parece não haver, portanto, nos casos dos advérbios de tempo e de aspecto em -mente,
algum tipo de compensação ou equilíbrio no posicionamento dos elementos na estrutura da
cláusula. Além disso, ao observarmos separadamente a posição 1, ou seja, a que corresponde
à margem esquerda da cláusula e que, por hipótese, seria a que mais atrairia o advérbio,
notamos que isso também não ocorreu. De fato, houve uma quantidade maior de casos nessa
posição. Entretanto, quando se observam todas as ocorrências pré-verbais, notamos que a
margem esquerda, independentemente da presença ou não do sujeito, era a posição
preferencial dos advérbios pré-verbais.
Em função desses dados, concluímos que não houve uma relação significativa entre
presença/ ausência de sujeito em posição pré-verbal (marginal ou não) e colocação dos
advérbios aqui estudados. Esse mesmo resultado foi obtido em Martelotta (2006) para os
advérbios qualitativos e Marques (2008), que estudou a ordenação sujeito/ verbo. Portanto,
nossos resultados são contrários à hipótese de adjuntos (pelo menos do tipo que estamos
estudando) são colocados na posição do sujeito vazio.
Quanto à relação entre o tipo semântico do verbo e a posição, verificamos que esse
fator não influenciou a posição do mesmo.
O tipo semântico do verbo foi levado em consideração a fim de se testar a hipótese de
que determinado tipo de noção expressa pelo advérbio ocorreria com um determinado tipo de
verbo. Entretanto, essa hipótese não foi confirmada, pelos menos, nos corpora analisados.
Também queríamos verificar a relação entre o tipo semântico do verbo e a posição do
advérbio. Vimos que, quando o verbo é de processo material, o advérbio aparece mais na
posição 1 (margem esquerda da cláusula), os de processos relacionais, tanto intensivo quanto
possessivo, também ocorreram mais na posição 1. Nas outras posições, pelo baixo número de
dados, não foi possível traçar uma tendência para esse advérbio.
No português arcaico, observamos que o tipo de verbo mais recorrente é de valor
material em detrimento dos demais valores. Quanto à relação posição e sentido do verbo, o
tipo material ocorre nas posições 1 e 5, que o as posições margens esquerda e direita
respectivamente. Os verbos comportamentais tendem a ocorrer nas posições 5 e 6 e os verbos
de atividade verbal tendem a ocorrer na posição 6.
Nos dados apresentados, do século XVI, verificamos que os tipos mais freqüentes são
verbos materiais, mentais e relacionais possessivos.. Quando o verbo tem sentido material ou
mental, a tendência é o advérbio ocorrer na margem esquerda (POS1). Quando o verbo é
relacional possessivo não posição prototípica para o advérbio. em relação aos demais
sentidos dos verbos, há uma distribuição de dados equilibrada.
Já nos dados do século XVII, observamos que não há uma predileção pelo tipo
material, como vimos nos dados do português arcaico e do século XVI, mas, em relação à
posição e o tipo semântico do verbo em geral, todos são mais recorrentes na posição1
(margem esquerda) e uma relativa distribuição nas demais posições, o que não difere dos
séculos anteriores apresentados.
Os dados analisados do século XVIII demonstram que o tipo de verbo material é o
mais freqüente, seguido do tipo comportamental. Independentemente do tipo semântico, o
advérbio tende a ocorrer na posição marginal à esquerda (POS1).
No século XIX, constatamos que o tipo de verbo material é o mais freqüente, como
maioria das sincronias estudadas. Quanto à relação entre posição e tipo de verbo, observamos
que uma distribuição mais homogênea. Quando o verbo é material, o advérbio em -mente
ocorre mais na posição 1 ou na posição 6 . Os demais tipos tiveram poucos dados.
Verificamos, também, que os advérbios tendem a ocorrer mais nas posições pós-verbais
(Posições 5, 6, e 8).
nos dados do português atual, verificamos que o tipo de verbo mais freqüente é o
verbo de processo material, seguido dos de atividade verbal. Em relação ao tipo de verbo e a
posição do advérbio, vemos que, quando o verbo é material, o advérbio tende a ocorrer nas
posições 1 e 5; quando é de atividade verbal, tende a ocorrer na posição 5.
Nos resultados apresentados, uma tendência para os advérbios em -mente
aparecerem numa posição pré-verbal (no português arcaico, século XVI, XVII e XVII)
principalmente quando o verbo é de processo material, assim com os demais tipos de verbos.
Mas em relação à análise dos dados do século XIX e português atual, verificamos que há uma
predileção às posições pós-verbais. Esse resultado indica mudança na posição do advérbio ao
longo da história do português, o que vai ao encontro de outras pesquisas, como as de
Martelotta(2006) e Albani (2007), que demonstraram que os advérbios vêm mudando para a
posição pós-verbal, de um modo geral.
Além dessas hipóteses apresentadas, seguindo a proposta de Martelotta (2004) para os
advérbios qualitativos, estávamos considerando que a mudança de ordenação dos advérbios
de tempo e de aspecto em -mente poderia estar relacionada ao processo de gramaticalização
de certas estruturas sintáticas. De acordo com Givón (1979), a cláusula principal declarativa,
afirmativa, ativa, neutra é menos pressuposicional, no sentido de que sua interpretação
depende de menos material inferível do que a interpretação das demais estruturas. Isso
confere a esse tipo de cláusula (menos gramaticalizada) uma maior liberdade e variedade de
elementos significativos. Por outro lado, a distribuição dos elementos significativos, em todos
os outros tipos de cláusula (mais gramaticalizadas), é sempre mais restrita visto que esses
outros tipos de cláusula tendem a exibir grande conservadorismo sintático, sobretudo, no que
diz respeito à ordenação vocabular. Portanto, partindo dessa proposta, esperávamos encontrar,
no português arcaico, advérbios em posição pré-verbal (posição típica dos advérbios no latim)
ocorrendo mais nas orações mais gramaticalizadas (hipotáticas e subordinadas) do que nas
menos gramaticalizadas. E, no português atual, nossa hipótese era de que ocorreriam menos
advérbios em posições pré-verbais e que essas ocorrências envolveriam frases estilisticamente
marcadas.
Na análise dos dados do português arcaico, observamos que houve um número
significativo de ocorrências de advérbios de tempo e aspecto em -mente em posição pré-
verbal, mostrando que essa posição, assim como a pós-verbal, estava disponível para este tipo
de advérbio na fase arcaica de nossa língua.
Observamos que, no português arcaico, houve um pequeno predomínio de posições
pré-verbais em cláusulas gramaticalizadas. Isso pode ser apontado como um leve resquício da
tendência de que as posições pré-verbais têm para ocorrer em cláusulas mais
gramaticalizadas.
No século XVI, apesar da baixa ocorrência de dados nesta fase, de um modo geral, a
análise qualitativa apresentou resultados favoráveis às nossas hipóteses. A posição pré-verbal,
por exemplo, estava presente nesta fase do português em escala menor que a posição pós-
verbal. Além disso, foi possível observar que as orações mais gramaticalizadas elegem a
ordenação pré-verbal, 11 ocorrências distribuídas pelas posições pré-verbais (Pos 1, 2 e 3).
Tal observação contribui para confirmar a hipótese que adotamos com Givón (1979) de que
esses tipos cláusulas (mais gramaticalizadas) tendem a ser sintaticamente mais conservadoras,
principalmente, no que diz respeito à ordenação dos constituintes da oração.
Outra ressalva interessante é que, ao analisarmos o português arcaico, a hipótese de
Givón (1979) não foi de todo confirmada, apesar de encontrarmos uma leve tendência de as
posições pré-verbais ocorrerem em cláusulas mais gramaticalizadas. Por outro lado, na análise
do século XVI essa hipótese se confirmou quando se relacionaram as posições dos advérbios
com o grau de gramaticalização da cláusula em que o advérbio ocorreu.
Pudemos observar, na análise dos dados do século XVII, uma maior incidência de
casos foi na posição pré-verbal, porém, quando se relacionamos posição e grau de
gramaticalização, a hipótese givoniana não se confirmou, o mesmo atestado no português
arcaico com o tipo de advérbio estudado.
É interessante ressaltar que, no século XVIII, a nossa hipótese também foi confirmada:
a de que as orações mais gramaticalizadas elegem a ordenação pré-verba. Nesse caso, foram 8
ocorrências contra uma única ocorrência na posição pós-verbal.
Por outro lado, houve 5 ocorrências pré-verbais em cláusulas menos gramaticalizadas
em oposição a 4 dados na posição pós-verbal, também em cláusulas menos gramaticalizadas.
Isso é importante, porque pode apontar para o fato de que, até o século XVIII, era mais forte a
inclinação que os advérbios qualitativos apresentavam de ocorrer antes do verbo, o mesmo
acontecendo para os de tempo e de aspecto, reforçando os resultados obtidos em Martelotta e
Vlček (2006), segundo os quais essa tendência começa a enfraquecer no início do século XIX
e acaba por desaparecer na virada para o século XX.
No caso do século XIX, houve uma quantidade maior de ocorrências de advérbios de
tempo e de aspecto em -mente, embora as 22 ocorrências encontradas estejam longe de
constituir a quantidade necessária para se chegar a constatações mais precisas.
Assim como aconteceu com o século XVIII, era de se esperar que o século XIX
apresentasse uma relativa predominância das posições pós-verbais. Isso de fato ocorreu:
apresentou 12 ocorrências nessa posição no, total de 22 advérbios. Esses dados refletem a
tendência, mencionada anteriormente, que vem relativamente se delineando desde o século
XVI, uma vez que na fase arcaica do português com esse tipo de advérbio a hipótese não se
confirmou, ou como nos trabalhos de Moraes Pinto, 2002; Martelotta, 2004, a confirmação
dessas tendências foi constatada.
Outro resultado interessante se apresenta quando se relacionam as posições dos
advérbios com o grau de gramaticalização da cláusula em que ele ocorre. Do total de 9 casos
de advérbios pré-verbais, 4 correram em cláusulas mais gramaticalizadas (hipotáticas e
subordinadas). Cabe ressaltar aqui que a diferença entre as ocorrências em cláusulas menos
gramaticalizadas foi bastante pequena, 6 dados pré-verbais. Constatamos que, no século XIX,
se evidenciou uma mudança desses advérbios para as posições pós-verbais, apesar de eles não
serem predominantes em cláusulas com alto grau de gramaticalização, mais conservadoras em
termos de ordenação.
No português atual, a ocorrência dos dados demonstra uma propensão, que se
manifestou quase categoricamente, desses advérbios ocorrerem após o verbo, 28 dados, sendo
que 17 estão em cláusulas menos gramaticalizadas e 10 dados em cláusulas mais
gramaticalizadas. Cabe ressaltar que novamente obtivemos resultados atípicos aos esperados
segundo a hipótese proposta em relação à posição e o grau de gramaticalização das cláusulas.
Portanto, percebemos que houve diferentes fatores que influenciaram a ordenação
desses advérbios nas sentenças e que essa análise possa trazer esclarecimentos em relação ao
comportamento desses elementos no português. Muitos dos nossos resultados não comprovam
algumas das hipóteses apresentadas nesta tese e em outros trabalhos, mas refletem o emprego
real dos advérbios em -mente na história do português escrito. Assim são resultados
importantes inclusive porque apontam para tendências diferentes do que geralmente é dito.
A pesquisa foi realizada tendo em vista muitos fatores, demonstrando que procuramos
de diferentes formas verificar as estratégias discursivas, semânticas e sintáticas para o uso
desses advérbios. Claro que a análise não se esgotou e em muitos momentos. Assim,
apontamos para a necessidade de pesquisas futuras aprofundarem em um ou outro aspecto, ou
para a necessidade de se fazer um recorte diferente da análise, tendo em vista as sincronias e
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