indivíduos. Neste sentido cabe perguntar a qual cidadão o Estado pretende afiançar? Não
podemos deixar de lado o termo “ansiedade”, insistentemente repetido por Agostinho Neto no
poema “Sábado nos musseques”, como sentimento revelador do drama das populações
periféricas angolanas diante, dentre outras coisas, dos abusos policiais. Nem mesmo do verso
dos Racionais MC’s em “Fim de semana no parque” -“Polícia a morte, polícia socorro”.
No documentário Até quando
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, gravado pela Giro Produções, projeto do Observatório
das Favelas
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em parceria com a UNICEF, em 2005, ao abordar a temática da violência nas
periferias e bairros populares das cidades do Rio de Janeiro e do Recife, o professor e
pesquisador Jailson de Souza
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denuncia que as práticas de extermínio têm sido utilizadas
como solução para as crises sociais:
A violência arraigada no Brasil das mais variadas formas, se manifesta de
diferentes formas. Agora ela está se expressando nos grandes centros urbanos de
uma forma pior nos últimos tempos. É cada vez mais a naturalização da forma de
enfrentar a questão da crise social, do conflito social, através do extermínio físico
dos adolescentes e jovens. E são adolescentes e jovens específicos. São
adolescentes pretos, pardos e moradores das periferias e favelas.
Nos relatos e imagens sobrepostas na película, fica a sensação de que estamos vivendo
num contexto de guerra. Contudo não é uma guerra espalhada pelo país. Ela parece estar
localizada em determinadas áreas da cidade e afeta indivíduos com idade específica e cor de
pele determinada. Como Souza afirma, “são adolescestes e jovens pretos, pardos e moradores
de periferia e favelas”.
A defesa do extermínio como solução para a instauração da paz não é uma idéia nova.
Não podemos esquecer a máxima veiculada pelo policial Sivuca – “Bandido bom é bandido
morto”. Sivuca fez parte do grupo denominado “Homens de Ouro da Polícia Carioca”, que
surge no ano de 1964 com o intuito de contribuir com a já institucionalizada violência
policial. Segundo Zuenir Ventura (1997: 35), estes homens de ouro, também conhecidos
como “Esquadrão da Morte” ou “Turma da Pesada”, tinham uma meta: limpar a cidade. Para
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O filme, que mescla imagens de ações policiais, depoimentos de moradores e de estudiosos sobre o fenômeno
da violência urbana, tem como objetivo mostrar como é a vida de pessoas que vivem nas periferias das capitais,
acima citadas. Assumindo um caráter de denúncia, revela as dificuldades na entrada para o mercado de trabalho.
O tráfico é apresentado como uma falta de alternativa para algumas pessoas. Boa parte do documentário é
dedicada a um aspecto que não aparece em dados estatísticos: a dor de parentes e amigos daqueles que foram
vítimas da violência urbana.
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O projeto Observatório Social de Favelas , nome utilizado de janeiro de 2002 até janeiro de 2004, mudando
para Observatório de Favelas, a partir de 2004, tem como um dos objetivos articular o Fórum de Estudos dos
Espaços Populares, que organizará encontros, seminários e atividades educacionais/culturais que contribuam
para uma melhor compreensão do fenômeno da favelização.
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Doutor em Sociologia pela PUC-Rio; professor da Universidade Federal Fluminense, Coordenador Geral do
Observatório das Favelas; Diretor de Projetor do Centro de Educação e Ações Solidárias da Maré – Ceam.