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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
INSTITUTO DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
SAAD UNTAR
A QUÍMICA NO ENSINO FUNDAMENTAL E OS
CONHECIMENTOS DOS PROFESSORES DAS ESCOLAS
MUNICIPAIS DA CIDADE DE VÁRZEA GRANDE – MT
CUIABÁ – MT
2008
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SAAD UNTAR
A QUÍMICA NO ENSINO FUNDAMENTAL E OS
CONHECIMENTOS DOS PROFESSORES DAS ESCOLAS
MUNICIPAIS DA CIDADE DE VÁRZEA GRANDE – MT
Dissertação apresentada ao Programa
de Pós-Graduação em Educação no
Instituto de Educação da Universidade
Federal de Mato Grosso como requisito
para obtenção do título de Mestre em
Educação na Área de Concentração:
Teorias e Práticas Pedagógicas da
Educação Escolar, Linha de Pesquisa:
Educação em Ciências.
Orientadora
Profa. Dra. Irene Cristina de Mello
Cuiabá – MT
2008
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FICHA CATALOGRÁFICA
Índice para Catálogo Sistemático
1. Conhecimento Docente
2. Ensino Fundamental
3. Ciências Naturais
4. Química
U61 q Untar, Saad
A Química no ensino fundamental e os
conhecimentos dos professores das escolas
municipais da cidade de Várzea grande
MT / Saad Untar. -- Cuiabá: UFMT/IE,
2008.
145 p., il.
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Educação no Instituto
de Educação da Universidade Federal de
Mato Grosso como requisito para obtenção
do título de Mestre em Educação na Área
de Concentração: Teorias e Práticas
Pedagógicas da Educação Escolar, Linha
Saad Untar
Saad UntarSaad Untar
Saad Untar
Professora Efetiva da Escola Estadual “Professora Adalgisa de Barros”, em
Várzea Grande MT. Formada em Licenciatura Plena em Química pela
Universidade Federal de Mato Grosso. Mestranda do Programa de Pós-
Graduação em Educação da Universidade Federal de Mato Grosso.
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho à minha amada filha ANA LUÍSA UNTAR,
amor da minha vida, razão do meu viver, que mesmo com pouca
idade, mas muita paciência, sabedoria e serenidade incentivou-me
no desdobramento deste trabalho. Com muita maturidade soube
compreender a minha ausência, mesmo presente, em muitos
momentos especiais. Que no percurso desta árdua caminhada,
acompanhou-me passo a passo em TODOS os momentos, vibrando
a cada conquista como também somando-se às inúmeras vezes em
que chorei. E foi em seu colinho amigo e aconchegante que
encontrei forças e conforto para seguir esta caminhada. Por isso
dedico este trabalho a você, minha companheira e amada
guerreira.
À minha inesquecível, estudiosa e dedicada mãe NÊDE UNTAR
(
in memorian)
e minha saudosa avó ANA LUÍZA UNTAR – D.
Nana
(in memorian),
que, de onde estiverem sei que estão
orgulhosas por mais uma vitória conquistada. Sinto saudades...
mãe, vó !!!!!
AGRADECIMENTOS
Por trás do sucesso de todos nós,
existe ocultamente uma gama de pessoas maravilhosas
que sempre nos encorajam !
Do fundo do meu coração agradeço ...
A Deus pelo dom da vida, por todas oportunidades
e por ter colocado em minha vida pessoas como as que citarei
abaixo;
À minha amada filha Ana Luísa Untar,
pelo companheirismo, amor, dedicação, compreensão e amizade;
À minha Tia Joana Untar (Tia Santa), que nunca mediu esforços
para me apoiar, orientar e confortar;
À minha queridíssima amiga e Orientadora
Profª Dra. Irene Cristina de Mello,
que dispensou total e irrestrito apoio na realização deste
trabalho, e que proporcionou-me a concretização de um sonho.
A você Profª Irene, meu profundo carinho, admiração,
respeito e gratidão;
Ao Laboratório de Pesquisa e Ensino de Química – LabPEQ/UFMT
pelo espaço físico
e por todo apoio que me foi concedido;
A todos meus professores do Mestrado, em especial à
Profª. Dra. Irene Cristina de Mello,
por ter sido mais que uma professora e orientadora;
Às examinadoras internas,
Profª Dra. Nilza de Oliveira Sguarezi – UFMT,
Profa. Dra. Gladys Denise Wielewski (suplente) - UFMT
e ao examinador externo,
Prof. Dr. Gerson de Souza Mól – UnB,
por terem aceitado o convite
e por enriquecerem este trabalho com suas brilhantes e
certeiras contribuições;
Aos colegas de Mestrado
Maria José da Silva (Jô),
Paulo Oliveira,
Valquíria Martinho e
Vera Lúcia Aragão Tanus,
pela força nos momentos de ansiedade
e pelo companheirismo demonstrado;
À Profª Ms. Leiva Coleta Santiago Matias,
pelas constantes palavras de incentivo;
Aos amigos e companheiros,
Prof. Marcel Thiago Damasceno Ribeiro
e Prof. Ms. Clayte de Paula Azevedo
pela força recebida;
À SMEC-VG/MT,
aos Professores, Coordenadores e Direção das Escolas
pesquisadas, pela simpatia,
disposição, carinho,
e por tornarem possível a realização deste trabalho;
À Secretaria de Educação do Estado de Mato Grosso –
SEDUC/MT, por ter concedido
meu afastamento das salas de aula, para o ingresso no Mestrado;
Às maravilhosas funcionárias da Secretaria do Programa
de Pós-Graduação do Instituto de Educação da UFMT,
Luíza, Mariana e Simone Manduca,
que sempre muito dispostas,
não mediram esforços para me auxiliar;
Ao Diretor, Coordenador e à Secretária da Escola
Estadual Profª Adalgisa de Barros – Várzea Grande/MT,
Prof. Adelson Pereira Lima,
Prof. Juscelino Cerqueira Caldas e
Sra. Maria Nilda Arruda, respectivamente,
pelo apoio e carinho;
Às Bibliotecas;
À UFMT;
Enfim, a TODOS que direta ou indiretamente ajudaram-me a
chegar aonde cheguei !!
Muito Obrigada !
Saad Untar.
RESUMO
Este trabalho tem por finalidade pesquisar os conhecimentos do conteúdo
pedagógico e curricular dos professores que lecionam Ciências Naturais na oitava série
das escolas públicas municipais de Várzea Grande-MT. Ele parte da problematização
que circunda a profissão docente, num panorama em que as dificuldades da profissão
‘podem’ estar também relacionadas aos conhecimentos docentes dos professores de
Ciências das Escolas Municipais de Várzea Grande. Nesse sentido, a questão
fundamental norteadora da pesquisa é investigar: Que conhecimentos possuem os
professores que lecionam Ciências Naturais na oitava série nas escolas municipais de
Várzea Grande, em Mato Grosso? A pesquisa é referenciada a partir dos pressupostos
teóricos propostos por Lee Shulman. Optamos em trabalhar com os conceitos de
Shulman por compactuarmos com este autor no que tange aos conhecimentos
necessários aos professores, a saber: conhecimento do conteúdo, conhecimento
pedagógico e conhecimento curricular. Para analisar a problemática mencionada acima,
optamos em escolher como cenário da pesquisa, dentre as setenta e duas escolas
existentes no município de Várzea Grande, as dez escolas que, segundo dados da
Secretaria Municipal de Educação, são as mais críticas em relação ao baixo rendimento
dos alunos na disciplina enfocada. Os sujeitos da pesquisa foram dez professores que
lecionam Ciências Naturais na oitava série, independentemente de suas formações. Este
trabalho inscreve-se em uma pesquisa de natureza qualitativa, do tipo exploratória, que
privilegia a análise dos discursos dos entrevistados. Os instrumentos utilizados para a
coleta de dados foram dois questionários distintos e uma entrevista semi-estruturada.
Primeiramente, foram aplicados os questionários: um com o objetivo de caracterizar e
contextualizar as escolas e outro com o objetivo de traçar um perfil dos professores
sujeitos da pesquisa. O passo seguinte consituiu-se na aplicação das entrevistas semi-
estruturadas, que foram organizadas e categorizadas à luz dos pressupostos teóricos
propostos por Shulman. Dentre outros, os resultados da pesquisa mostram que a maioria
dos professores de Ciências Naturais das escolas pesquisadas enfatiza o currículo das
instituições de ensino que lecionam, prioriza o conteúdo, utiliza com muita fidelidade o
livro didático, por este fornecer-lhes segurança, por conseguinte, indicando que não
possuem domínio do conteúdo lecionado, sendo que, ainda, classificam o seu
conhecimento dos conteúdos químicos, no máximo, como regular. Vale considerar que
dos dez professores entrevistados somente um professor possui Licenciatura Plena em
Química; os demais, em sua maioria, são formados em Ciências Biológicas pela rede
particular de ensino superior de Mato Grosso. Essa realidade mato-grossense pode ser
entendida, em certa medida, pela alta demanda dos professores de Química pelo ensino
médio no Estado, bem como pela prioridade dada nas escolas aos professores de
Biologia, os quais complementam suas aulas com as disciplinas de Ciências Naturais,
que englobam a Química na oitava série.
Palavras-chave: Conhecimento Docente; Ensino Fundamental; Ciências Naturais; Química.
ABSTRACT
The main purpose of this study is to research the knowledge of the of the
pedagogical contents and background of teachers in charge of teaching Natural Sciences
to the eighth grade in Várzea Grande- MT district schools. We started out at the
difficulties around profession of teaching, in a panorama where the hardships of the
profession may be connected to the knowledge of the Natural Sciences teachers in
Várzea Grande-MT. There fore the guiding thought in the search was to investigate:
What knowledge the Natural Sciences teachers in Várzea Grande-MT have? It was
based upon Lee Shulman’s theory. Shulman was chosen because I share the same
thinking about the knowledge need for the teachers, such as: knowing the contents,
pedagogical and background knowledge. In order to work out the problems mentioned
above ten schools were chosen out of the seventy in Várzea Grande, the more critical
ones towards the performance of the students in the subject according the Bureau of
Education in the district. The subjects of the research were teachers who teach Natural
Sciences which include chemistry in eighth grade, independently of their graduation.
The aim of this study is qualitative, exploratory, in which the interviews of the subjects
are the main focus. The tools used to reach the dada were distinct questionnaires and a
semi-structured interview. Firstly the one to set the traits and pin point the schools
where they were answered and another one to set the profile of the teachers involved in
the research. The following step consisted in having a semi-structured one based on
Schulman’s guidelines answered. Among others, the results of the research show that
the majority of teachers of Natural Sciences in schools emphasize the topics the
institution is teaching, prioritizing the content, sticking to the book when it comes to
content, for it gives solid bases, which shows a lack of mastering over the contents and
it is relevant that they themselves consider their knowledge regular. We also have to
consider that among the ten individuals only one has graduation in chemistry and the
others are majorly graduated in biology in private colleges in Mato Grosso. This reality
of the state of Mato Grosso may be understood to a certain extent due to high demand of
chemistry teachers in high schools in the state, as well as the priority the biology
teachers who complement their classes with Natural Sciences have.
Key words: Teaching knowledge, Elemmentary School, natural science, chemistry.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ......................................................................................................
14
CAPÍTULO I – APRESENTAÇÃO DA PESQUISA ..........................................
1.1. UMA BREVE HISTÓRIA DA PESQUISA ...........................................
1.2. JUSTIFICATIVAS ....................................................................................
1.3. PROPOSIÇÃO E DELIMITAÇÃO DO PROBLEMA .........................
1.4. METODOLOGIA .....................................................................................
1.4.1. Opção Metodológica .......................................................................
1.4.2. Instrumentos de Coleta de Dados .................................................
1.4.3. Universo da Pesquisa ......................................................................
1.4.3.1.Os Cenários da Pesquisa: As Escolas .........................................
1.4.3.2.Os Sujeitos da Pesquisa: Os Professores ....................................
1.4.3.2.1. Características Pessoais ..................................................
1.4.3.2.2. Caracterização da Formação Acadêmica ........................
1.4.3.2.3. Caracterização das Atividades Profissionais ..................
17
17
19
20
21
21
22
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24
26
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26
26
CAPÍTULO II – O ENSINO DE CIÊNCIAS NO BRASIL ...............................
2.1. UMA BREVE HISTÓRIA ........................................................................
2.1.1. O Currículo .....................................................................................
2.1.2. A Experimentação ..........................................................................
2.1.3. Formação de Professores de Ciências ...........................................
2.1.4. Os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino de
Ciências Naturais ...............................................................................
2.2. TEMPOS ATUAIS NO ENSINO DE CIÊNCIAS .................................
2.2.1. Dificuldades do Ensino de Ciências ..............................................
2.2.2. O Ensino de Ciências no Ensino Fundamental ............................
2.3. A FORMAÇÃO CONTINUADA DOS PROFESSORES DE
CIÊNCIAS .................................................................................................
2.4. A QUÍMICA NO ENSINO FUNDAMENTAL ......................................
2.5. AS VERTENTES DO ENSINO DE CIÊNCIAS ....................................
2.6. AS NECESSIDADES FORMATIVAS DOS PROFESSORES DE
CIÊNCIAS NATURAIS ...........................................................................
29
29
35
39
40
41
44
45
46
48
53
54
55
CAPÍTULO III – CONHECIMENTOS DOCENTES ........................................
3.1. CONHECIMENTOS DOCENTES: IDENTIFICANDO ENFOQUES
E TIPOLOGIAS ........................................................................................
3.2. CONHECIMENTOS DOCENTES NA PERSPECTIVA DE
SHULMAN ................................................................................................
3.2.1. O Conhecimento do Conteúdo ......................................................
3.2.2. O Conhecimento Pedagógico .........................................................
58
59
66
66
67
3.2.3.
O Conhecimento Curricular ..........................................................
3.3. REFLEXÕES SOBRE OS CONHECIMENTOS QUÍMICOS NAS
TRÊS VERTENTES DE SHULMAN .....................................................
68
68
CAPÍTULO IV – RESULTADOS E DISCUSSÕES ...........................................
4.1. ANALISANDO OS QUESTIONÁRIOS .................................................
4.1.1. Caracterização das Escolas e dos Sujeitos da Pesquisa ..............
4.2. ANALISANDO AS ENTREVISTAS .......................................................
4.2.1. Bloco A – Sobre os Conhecimentos Curriculares ........................
4.2.2. Bloco B – Quanto ao Conhecimento Pedagógico .........................
4.2.3. Bloco C – Concepções Manifestadas Quanto ao Conhecimento
do Conteúdo ........................................................................................
80
81
81
84
87
96
112
CONSIDERAÇÕES ...............................................................................................
124
REFERÊNCIAS .....................................................................................................
130
APÊNDICES
APÊNDICE A – CARACTERIZAÇÃO DAS ESCOLAS ..................................
APÊNDICE B – CARACTERIZAÇÃO DOS PROFESSORES ........................
APÊNDICE C – ROTEIRO DA ENTREVISTA .................................................
138
140
143
14
INTRODUÇÃO
1
“O grande problema da educação não é discutir se a educação pode ou não pode,
mas é discutir onde pode, como pode, com quem pode, quando pode; é reconhecer o
limite que sua prática impõe. É perceber que o seu trabalho não é individual, é social e se
dá na prática social de que ele faz parte. É reconhecer que a educação, não sendo a
chave, a alavanca da transformação social, como tanto se vem afirmando, é, porém,
indispensável à transformação social”
Paulo Freire
Somos expectadores de um grande avanço na área da pesquisa sobre a formação
de professores, o que denota a importância do tema e, sobretudo, expressa a
preocupação dos pesquisadores. Nesse campo, tem-se também uma grande preocupação
em relação aos conhecimentos docentes, trazendo como conseqüência o
aprofundamento do debate. Comungando com essas preocupações encontramos a
emergente área de ensino de Ciências no Brasil, que pelo desenvolvimento científico e
tecnológico que nos envolve nos dias atuais, tornou-se prioritário e de grande
relevância.
Embora tenhamos esse panorama de reconhecimento da necessidade e
importância do ensino de Ciências, a formação de professores não acompanhou as
mudanças que o currículo e as necessidades dessa disciplina vêm requisitando ao longo
das últimas décadas. Em contrapartida, muitas das ações desenvolvidas para a melhoria
do ensino de Ciências destacam a formação dos professores dessa disciplina.
As pesquisas do meio acadêmico, por exemplo, se detêm em temas como a
atualização de conceitos, novas metodologias, cursos de formação inicial e continuada,
dentre outras questões, sempre numa tentativa de buscar soluções para os problemas e
rompimento de modelos pouco eficazes, no entanto, não têm sido muitas, as mudanças
na formação de professores de Ciências Naturais.
Diante desses aspectos, o presente trabalho se originou de uma variedade de
situações e questionamentos feitos durante minha vida acadêmica, como aluna do curso
de Licenciatura Plena em Química, e profissional como professora da rede estadual de
1
Este Trabalho foi escrito observando as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT)
2006: FURANTÉ, Pedro Augusto. Normas Técnicas para o trabalho científico: elaboração e
formatação. 14.ed. Porto Alegre: [S.ed.], 2007
15
Educação Básica em Mato Grosso. Esses questionamentos estão relacionados ao meu
desejo de melhorar a formação de professores de Ciências e, sobretudo, o ensino de
Química no nível fundamental.
Nessa perspectiva, o objetivo central deste trabalho é investigar a prática
pedagógica dos professores de Química no ensino fundamental, procurando identificar
os conhecimentos do conteúdo, pedagógico e curricular que possuem os professores que
lecionam Ciências Naturais nas oitavas séries
2
. A questão norteadora é que
conhecimentos possuem os professores que lecionam Ciências Naturais na oitava
série nas escolas municipais de Várzea Grande em Mato Grosso?
Dentre muitos autores que investigam os conhecimentos docentes destacamos
Maurice Tardif, Gauthier e Lee Shulman, sendo que esse último constituiu num
importante pressuposto teórico para este trabalho. Essa opção se deu justamente porque
nos afinamos com este autor no que se refere aos conhecimentos dos professores.
Na tentativa de responder a questão norteadora, delineou-se uma pesquisa
qualitativa do tipo exploratória, na qual investigamos os professores da rede pública
municipal da cidade de Várzea Grande, que lecionam na oitava série a disciplina
Ciências Naturais.
Este trabalho foi estruturado em quatro capítulos, a saber:
O primeiro capítulo apresenta a pesquisa desde a sua origem, perpassando por
diversos itens até chegar à opção metodológica, destacando os instrumentos de coleta de
dados utilizados, o universo da pesquisa – o cenário da pesquisa (as escolas), os critérios
que nos valemos para a seleção das mesmas, e os sujeitos da pesquisa (os professores),
destacando suas características pessoais, formação acadêmica e atividades profissionais.
O ensino de Ciências no Brasil é discutido no Capítulo 2, no qual traçamos um
breve histórico sobre sua trajetória até os anos 80, mostrando que até a metade do século
XX este ensino mostrava-se incipiente, ganhando força a partir de um modelo nacional-
desenvolvimentista dos anos 50. Destacamos o currículo, a experimentação, a formação
2
Tendo em vista que no início desta pesquisa o ensino fundamental era entendido como 1ª a 8ª séries, e
no decorrer desta, conforme implementada a Lei Federal nº 11.274 de 06 de Fevereiro de 2006, que
altera a redação dos artigos. 29, 30, 32 e 87 da Lei n
o
9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece
as Diretrizes e Bases da Educação Nacional, ampliou para nove anos o ensino fundamental, este passou
então a ser entendido como 1º ano ao 9º ano. Portanto, através dessa Lei, o ensino fundamental terá
nove anos e não mais oito anos. A nomenclatura também mudou, antes era primeira série até oitava
série, agora será de primeiro ano até ao nono ano. No caso, hoje, oitava série corresponde ao nono ano.
Porém, neste trabalho ainda iremos usar a nomenclatura de oitava série em virtude de que, na época das
entrevistas, as escolas pesquisadas ainda usavam a antiga nomenclatura. Desta forma, em todos os
momentos da pesquisa que nos referirmos à 8ª série do ensino fundamental, entende-se por nono ano.
16
de professores da área, os tempos atuais no ensino de Ciências, as dificuldades do
ensino, a docência de Ciências de a 8ª séries, a formação continuada dos professores,
a Química no ensino fundamental, as vertentes do ensino de Ciências e as necessidades
formativas dos professores de Ciências Naturais.
no Capítulo 3, intitulado de Conhecimentos Docentes, buscamos investigar na
literatura vigente as tipologias e enfoques do conhecimento docente. Além disso,
apresentamos essa temática pela perspectiva de alguns teóricos, para posterior opção
pelos ensinamentos de Shulman que orienta a reflexão sobre os conhecimentos dos
professores investigados nessa vertente selecionada.
Os Resultados e Discussões são apresentados no capítulo 4. Esse capítulo está
dedicado às análises das entrevistas realizadas com os professores envolvidos na
pesquisa.
Na seqüência apresentamos as considerações e as referências utilizadas para
construção deste trabalho.
O presente estudo tem a intenção e a expectativa de que a investigação traga
contribuições favoráveis aos professores de Ciências Naturais, como também àqueles
que ainda estão trilhando a graduação de Química, e que um dia sonham dedicar-se ao
magistério. Que esses professores e futuros professores, possam refletir acerca dos
conhecimentos que possuem, e sobre a responsabilidade docente diante do fato que o
aluno tem início ao estudo de Química tardiamente, na oitava série. Os professores
também devem perceber que a responsabilidade é muito grande, pois essa série é o
momento em que se ensina um conteúdo de Química, que até então era desconhecido!
17
CAPÍTULO I
APRESENTAÇÃO DA PESQUISA
“O caminho mais curto para fazer muitas coisas é fazer uma só de cada vez”
Paulo Freire
1.1. UMA BREVE HISTÓRIA DA PESQUISA
A história desta pesquisa começou a ser delineada quando a assessora
pedagógica da Secretaria Municipal de Educação e Cultura da cidade de Várzea
Grande
3
- MT (SMEC-VG/MT), procurou espontaneamente o Laboratório de Pesquisa e
Ensino de Química (LabPEQ), da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), para
resolver problemas relacionados ao ensino-aprendizagem de Ciências nas escolas do
município supracitado. Tais problemas foram identificados por meio de um estudo que
teria sido realizado pela própria Secretaria de Educação.
Na tentativa de atender à solicitação recebida, o LabPEQ, por meio de um de
seus projetos, a Semana de Minicursos das Práticas de Ensino de Química
4
(SemiPEQ),
designou que os alunos matriculados nas disciplinas de Prática de Ensino I, II e III
5
realizassem, nas escolas de Várzea Grande, as atividades de estágio supervisionado
relacionado ao semestre vigente (2005/01).
3
Cidade cornubada à Cuiabá.
4
O Projeto SemiPEQ busca ampliar espaços no estágio supervisionado, desenvolvendo um movimento
diferenciado que é o deslocamento dos alunos do Ensino Médio em direção a universidade, numa
atividade de extensão. Na sua décima primeira edição o Projeto já atendeu mais de 3.000 alunos da
educação básica, sendo que a avaliação dessa experiência de estágio mostra importantes contribuições
para todos os envolvidos no processo, sobretudo, para os futuros professores de Química (MELLO e
SOARES, 2007-b).
5
Disciplinas de responsabilidades das professoras da Área de Ensino de Química da UFMT.
18
Esse trabalho solicitado aos estagiários resultou inicialmente em uma
experiência didática realizada na disciplina de Prática de Ensino de Química, baseada
no estágio de observação com ênfase no Ensino de Ciências na série do Ensino
Fundamental. Por meio de entrevistas com alunos e professores, observações de
ambientes escolares e atividades em aulas, os estagiários revelaram diferentes cenários e
atores nas escolas públicas do município de Várzea Grande. (MELLO e SOARES,
2007-a)
Na seqüência ao estágio de observação, que possibilitou especialmente a
confirmação de problemas conceituais graves junto a alunos das séries, os estagiários
planejaram e executaram a VI Semana de Minicursos das Práticas de Ensino, atentando-
se para a construção de conceitos elementares de Química como, por exemplo, os
conceitos de substância, elemento químico, átomo dentre outros temas.
Nessa parceria entre SMEC-VG/MT e LabPEQ, coube então aos estagiários da
UFMT ministrar os cursos do projeto de extensão (SemiPEQ), exclusivamente a alunos
das turmas de oitavas séries das escolas municipais de Várzea Grande
6
. Em
contrapartida, a Secretaria encarregou-se de deslocar esses alunos até à Universidade,
devidamente uniformizados, além de permitir a realização dos estágios de observação
nessas referidas escolas. (MELLO e SOARES, 2007-a)
A avaliação dessa experiência apontou e fez surgir novas preocupações aos
estagiários e professores de Prática de Ensino de Química da UFMT. Dentre as várias
questões levantadas, destaca-se o fato de que um único curso não seria suficiente para
resolver os problemas relacionados ao ensino-aprendizagem de Ciências daquele
município, sobretudo porque detectaram que os problemas não se relacionavam somente
à percepção dos alunos, fazendo-se necessário investigar a prática dos professores que
ministram essa disciplina na referida cidade.
Aflorado o interesse de pesquisar o que acontecia com o ensino de Ciências, por
ter acompanhado parte desse processo vivenciado pelo grupo do LabPEQ, ao ingressar
no mestrado meu anteprojeto apresentava a proposta de trabalhar o ensino de
Química na 8ª Série em Várzea Grande.
Foi nesta perspectiva que, no dia dezenove de Julho de 2005, realizamos uma
entrevista aberta com a Assessora Pedagógica
7
da SMEC-VG/MT, quando fomos
6
O projeto SemiPEQ normalmente é aberto a todas as escolas públicas e particulares de Mato Grosso,
e as quantidades de vagas são divulgadas na mídia local (Internet, televisão, jornal etc).
7
Representada, na oportunidade, pela Assessora Pedagógica Municipal Professora Catarina Cortêz.
19
informadas que, nos últimos anos, os índices de reprovação das disciplinas consideradas
tradicionalmente como críticas
8
vinham sendo superados pelos da disciplina de Ciências
Naturais. Esse elevado número de reprovação, e as atividades realizadas pelo LabPEQ
anteriormente descritas, instigaram-nos a um olhar mais cuidadoso para o ensino
ministrado nessas escolas, especialmente em relação aos conhecimentos químicos que
os docentes possuem acerca da área.
Não seria possível a esta pesquisa, pelo recorte temporal de dois anos, investigar
as reprovações na disciplina de Ciências neste município, tendo em vista sua
abrangência (5ª a séries). Decidimos então investigar somente as questões
relacionadas à Química no ensino fundamental, nas oitavas séries, com enfoque na
prática docente aos conhecimentos dos professores de Ciências das Escolas
Municipais de Várzea Grande-MT.
1.2. JUSTIFICATIVAS
A realização deste trabalho apresenta três justificativas, a primeira de cunho
pessoal, a segunda de caráter profissional e a terceira de âmbito político-social.
Minha justificativa pessoal é que neste momento, mais do que um sonho, fazer
mestrado na área da Educação, tornou-se condição sine qua non para o êxito,
crescimento, auto-estima, fortalecimento para novos horizontes e promoção como
profissional da educação.
Quanto ao aspecto profissional, investigar o ensino de Química é importante
porque também sou professora de Química da rede pública do Estado de Mato Grosso,
atuando no município de Várzea Grande, onde também tenho residência.
Quanto ao aspecto político-social, o presente trabalho também se justifica pela
importância que representará à SMEC-VG/MT, uma vez que esta reconhece que o
ensino de Ciências nas oitavas séries, apresenta problemas educacionais significativos
que merecem atenção do município.
8
No que se refere ao elevado índice de reprovação dos alunos do ensino fundamental, que são Língua
Portuguesa e Matemática.
20
1.3. PROPOSIÇÃO E DELIMITAÇÃO DO PROBLEMA
Partimos da problematização que circunda a profissão docente, num panorama
em que as dificuldades da profissão ‘podem’ estar também relacionadas aos
conhecimentos docentes dos professores de Ciências das Escolas Municipais de Várzea
Grande. Nesse sentido a questão fundamental norteadora da pesquisa é investigar: Que
conhecimentos possuem os professores que lecionam Ciências Naturais na oitava
série nas escolas municipais de Várzea Grande em Mato Grosso?
Na intenção de responder a questão acima, foram adotados três critérios para
melhor delimitação do problema. O primeiro critério diz respeito à opção de selecionar
dez escolas municipais, entre as setenta e duas existentes no referido município, que,
segundo dados da SMEC-VG/MT são as mais críticas em relação ao baixo rendimento
dos alunos na disciplina de Ciências Naturais.
Como segundo critério adotado, optou-se por investigar somente professores que
lecionam Ciências Naturais nas oitavas séries, independentemente da sua formação
profissional, de forma a garantir menos variáveis nas análises, tendo em vista o tempo
para desenvolvimento do presente estudo. Além disso, considerou-se o fato de que a
disciplina de Ciências Naturais apresenta os conteúdos da área de Química,
formalmente, apenas na série, sendo essa a área de formação da pesquisadora. Foram
investigados, então, dez professores
9
que lecionam Ciências Naturais nas oitavas séries
das escolas Municipais de Várzea Grande.
Finalmente, o terceiro critério refere-se ao fato de pesquisar, dentre os vários
tipos de conhecimentos docentes expostos na literatura científica, somente os
conhecimentos baseados nas categorias propostas pelo autor Lee Shulman
10
, quais
sejam: conhecimento do conteúdo da disciplina, conhecimento pedagógico e
conhecimento curricular. Esta opção deve-se ao fato de este autor apresentar as
categorias do conhecimento docente de forma mais próxima à perspectiva da autora
deste trabalho e, sobretudo, por atender de forma satisfatória aos objetivos da
investigação.
9
De acordo com a SMEC-VG/MT, existe na rede municipal de Educação da cidade de Várzea Grande,
um total de 36 professores de Ciências Naturais, portanto foram investigados aproximadamente 28%
desse total.
10
Filósofo e Pesquisador americano, Mestre e Doutor em Psicologia da Educação pela instituição de
Chicago. É um dos pesquisadores que estudam a relação entre os conhecimentos que os professores
têm. É hoje um dos nomes mais referenciados em revistas de especialidade, sobre formação de
professores.
21
1.4. METODOLOGIA
Este trabalho inscreve-se em uma pesquisa de natureza qualitativa, do tipo
exploratória, que privilegia a análise dos discursos dos entrevistados. Os instrumentos
utilizados para a coleta de dados foram dois questionários distintos e uma entrevista
semi-estruturada. Primeiramente, foram aplicados os questionários: um com o objetivo
de caracterizar e contextualizar as escolas e outro com o objetivo de traçar um perfil dos
professores envolvidos na pesquisa. A seguir aplicaram-se entrevistas semi-estruturadas.
Os caminhos metodológicos tomaram como referência Richardson, Bogdan e Biklen,
Lakatos e Marconi, entre outros.
1.4.1. Opção Metodológica
Este capítulo perpassa por todas as etapas da pesquisa. Na tentativa de
responder a questão norteadora e atingir o objetivo proposto, busca inicialmente a
fundamentação teórica, como afirma Richardson (1999, p. 90),
A pesquisa qualitativa pode ser caracterizada como a tentativa de
uma compreensão detalhada dos significados e características situacionais
apresentadas pelos entrevistados, em lugar da produção de medidas
quantitativas de características ou comportamentos.
A pesquisa qualitativa preocupa-se com a significação e não com a
quantificação, ela envolve-se com os dados descritivos buscando revelar as perspectivas
e convicções dos entrevistados. Logo, pode ser uma forma adequada para a investigação
da natureza ou origem de um fenômeno social. Dessa forma a opção de pesquisa
qualitativa configura-se especialmente adequada à análise compreensiva relacionada aos
dados de formação docente, conhecimentos pedagógicos, percepção de conteúdos e
informações na prática do ensino, circunstâncias especiais da aplicação da disciplina
Ciências Naturais nas oitavas séries do ensino fundamental de Várzea Grande. Segundo
Bogdan e Biklen (1994, p. 47-50), a investigação qualitativa possui cinco
características, que são:
Na investigação qualitativa a fonte direta de dados é o ambiente
natural, constituindo o investigador o instrumento principal o “lócus” da
22
investigação deve ser o mais natural e original possível, ou seja, as ações
podem ser melhor compreendidas quando observadas no seu ambiente
habitual de ocorrência.
A investigação qualitativa é descritiva não se leva em
consideração números, quantidade, mas sim os relatos externados pelos
entrevistados, imagens, anotações, fotografias, vídeos, documentos pessoais,
dentre outros.
Os investigadores qualitativos interessam-se mais pelo processo do
que simplesmente pelos resultados ou produtos o processo como abordará
certo conteúdo é mais importante do que o resultado, o professor pode
utilizar inúmeras vezes esse processo independente do resultado.
Os investigadores qualitativos tendem a analisar os seus dados de
forma indutiva não m a intenção de obter dados para confirmar
hipóteses, porém as abstrações são construídas à medida que os dados
particulares que foram recolhidos vão se agrupando.
O significado é de importância vital na abordagem qualitativa os
investigadores se interessam pelo significado que as pessoas dão às coisas e
às suas vidas.
Quanto ao tipo de pesquisa exploratória, Lakatos e Marconi (1993, p. 188)
traduzem esse tipo de pesquisa como sendo
Investigações de pesquisa empírica cujo objetivo é a formulação de
questões ou de problema, com tripla finalidade: desenvolver hipóteses,
aumentar a familiaridade do pesquisador com um ambiente, fato ou
fenômeno, para a realização de uma pesquisa futura mais precisa ou
modificar e clarificar conceitos.
Dessa forma, esta pesquisa pode ser classificada como exploratória porque
proporciona uma maior familiaridade com o problema investigado, com objetivo de
torná-lo o mais claro possível. A descrição dos instrumentos selecionados para atender a
esse tipo de pesquisa será apresentada no item seguinte.
1.4.2. Instrumentos de Coleta de Dados
Os instrumentos utilizados para a coleta de dados foram dois questionários e
uma entrevista semi-estruturada. Além disso, pode-se considerar como instrumentos de
coleta de dados a entrevista piloto realizada com a assessoria pedagógica e as
observações informais realizadas pela pesquisadora durante o processo.
Em um primeiro momento foram utilizados dois questionários distintos. Um
com o objetivo de caracterizar e contextualizar as escolas (apêndice A) e outro com o
23
objetivo de traçar o perfil dos professores (apêndice B) que lecionam Ciências Naturais
nas oitavas séries.
Como é sabidamente elucidado, o questionário é uma técnica de coleta de dados
que traz em sua estrutura um conjunto de perguntas abertas e fechadas que serão
respondidas pelo sujeitos da pesquisa, em nosso caso pelos professores. É importante
ressaltar que as informações dos professores são usadas nesta dissertação como dados
complementares àquelas coletadas nas entrevistas. Servem, portanto para triangulação,
ou seja, permitem imprimir maior confiabilidade aos resultados.
O questionário destinado à caracterização da escola contém alguns tópicos
básicos, a saber: nome da escola, localização, nome do diretor, tempo de
funcionamento, total de alunos, total de salas de aula, total de professores, total de
professores de Ciências, turnos de funcionamento, quantidade de turmas de oitavas
séries, número de alunos por turma e período de funcionamento destas séries.
o questionário específico para os professores possui os seguintes tópicos:
dados pessoais, formação acadêmica, experiência profissional e questões sobre a
disciplina que ministra.
Após o primeiro contato com os professores e a aplicação dos questionários,
iniciou-se a etapa de entrevistas. Inicialmente não foi fácil marcar datas e horários com
os professores, que muitas vezes trabalham e residem em locais distantes e possuem
outras atividades. Alguns não conseguiram cumprir as agendas estabelecidas, e isso
dificultou consideravelmente o andamento da pesquisa.
A entrevista utilizada na segunda etapa de coleta de dados foi individual e semi-
estruturada, sendo gravada com autorização dos entrevistados, que desde o início eram
sabedores da garantia de anonimato quando da utilização dos dados contidos em seus
relatos. A estrutura da entrevista (ver apêndice C) foi elaborada no sentido de buscar
informações para o entendimento da questão de pesquisa, ou seja, quais os
conhecimentos (do conteúdo de Química, pedagógico e curricular) dos professores que
lecionam Ciências Naturais?
Como já informado, as entrevistas eram gravadas e, ao contrário do que se
poderia imaginar, a presença do gravador parece não ter incomodado os entrevistados.
Ao contrário, pareciam sedentos de se manifestarem, tanto que as transcrições tornaram-
se um trabalho ainda mais árduo do que o convencional. Dessa forma, esse instrumento
constituiu-se na principal fonte de coleta de dados da presente investigação.
24
1.4.3. Universo da Pesquisa
1.4.3.1. Os cenários da pesquisa: As Escolas
Foram selecionadas dez, das setenta e duas escolas municipais existentes na
cidade de Várzea Grande. Os critérios adotados para essa seleção foram os seguintes:
escolas que apresentavam maiores índices de baixo rendimento escolar na disciplina
Ciências Naturais (Classificação da SMEC-VG/MT); escolas vinculadas
exclusivamente à rede municipal de ensino de Várzea Grande; e escolas que ofereciam a
oitava série do ensino fundamental.
As escolas municipais selecionadas são referidas na pesquisa pela letra “E” e um
número seqüencial (E
1,
E
2
E
3
etc.) de forma a preservá-las. Elas são em sua maioria de
médio e grande porte
11
, com mais de uma década de existência e localizadas em bairros
distantes do centro da cidade, com clientela exclusivamente de crianças e jovens. Todas
possuem professores de Ciências Naturais, algumas um, outras dois docentes da
disciplina e, em sua maioria, têm uma turma de oitava série, com vinte a trinta e sete
estudantes por sala. As informações sobre as escolas estão expostas no quadro 1.
11
Essa classificação foi utilizada de acordo com a Legislação e Normas da SMEC-VG/MT.
25
Quadro 1: Informações sobre as escolas pesquisadas
12
Distância em quilômetro, tomando como centro da cidade o Terminal de ônibus, ao lado do Ginásio de esportes Fiotão, pois são referências mais conhecidas de
todos que ali moram.
13
Número aproximado.
Escola Categoria Distância
12
(km)
Idade
Turno(s) de
Funcionamento
Número
Alunos
13
Número
professores
Professores Ciências Naturais
Nº Sala de 8ª série /
Nº alunos
E
1
Grande 7 13
Matutino
Vespertino
430 27 02
01
(20 alunos)
E
2
Média 6 14
Matutino
Vespertino
466 22 02
02
(26 alunos por sala)
E
3
Grande 8 11
Matutino
Vespertino
733 26 01
01
(38 alunos)
E
4
Média 4 18
Matutino
Vespertino
Noturno
900 38 01
02
(30 alunos por sala)
E
5
Média 8 14
Matutino
Vespertino
444 19 01
01
(33 alunos)
E
6
Média 8 12
Matutino
Vespertino
425 22 01
01
(25 alunos)
E
7
Grande 7 6
Matutino
Vespertino
Noturno
1.283 38 02
01
(31 alunos)
E
8
Grande 9 32
Matutino
Vespertino
Noturno
410 30 02
01
(37 alunos)
E
9
Pequena 13 58 Matutino/Vespertino
203 12 01
01
(29 alunos)
E
10
Grande 13 10 Matutino/Vespertino
604 22 01
01
(22 alunos)
26
1.4.3.2. Os sujeitos da Pesquisa: Os Professores
As informações contidas nos questionários foram analisadas e nos permitiram
caracterizar os sujeitos desta pesquisas, que são os dez professores que ministram
Ciências Naturais nas oitavas séries das escolas selecionadas. As três categorias que
compuseram a estrutura do questionário nortearam sua análise, são elas: as
características pessoais, acadêmicas e profissionais.
1.4.3.2.1. Características Pessoais
Os professores que lecionam Ciências Naturais no ensino fundamental nas
escolas municipais de Várzea Grande são majoritariamente mulheres, com faixa etária
entre 29 e 51 anos, cuja média de idade é de 40 anos, sendo seis deles naturais de outras
regiões do Brasil, conforme mostra o quadro 3 na página 81.
1.4.3.2.2. Caracterização da Formação Acadêmica
Em relação à formação acadêmica, somente um professor possui Licenciatura
Plena em Química, sendo os demais, com uma exceção, formados em Ciências
Biológicas pela rede particular de ensino superior de Mato Grosso, e 60% são
especialistas, conforme mostra o quadro 4 na página 82.
1.4.3.2.3. Caracterização das Atividades Profissionais
O perfil dos professores de Ciências Naturais apresenta-se da seguinte forma:
40% não possuem vínculo efetivo com as escolas onde trabalham, ou seja, são interinos;
a maioria leciona apenas Ciências, enquanto outros professores lecionam Ciências e
outras disciplinas; possuem um considerável tempo de experiência no ensino de
Ciências e dedicam-se exclusivamente à profissão de professor, conforme mostra o
quadro 2.
27
Quadro 2: Sobre as atividades profissionais dos professores de Ciências Naturais da rede municipal de Várzea Grande
Professor(a)
Vínculo
empregatício
Turno de
trabalho
Disciplina(s) Série(s)
Tempo como
Professor
(anos)
Tempo como
Professor
de Ciências
(anos)
Jornada de
trabalho
semanal
(h)
Exerce outra
profissão
P
1
Efetivo Mat/Vesp/Not
Ciências e
Biologia
6ª,7ª,8ª e 1º
ano
23 10 55 Não
P
2
Efetivo
Vesp.
Ciências
5ª a 8ª
16
11
25
Não
P
3
Efetivo
Vesp.
Ciências
5ª,6ª e 8ª
24
20
25
Não
P
4
Efetivo Mat.
Ciências e
Religião
6ª,7ª e 8ª 14 10 55 Não
P
5
Efetivo
Mat.
Ciências
5ª a 8ª
12
7
21
o
P
6
Interino
Vesp.
Ciências
5ª a 8ª
10
5
15
Não
P
7
Interino
Mat.
Ciências
7ª e 8ª
06
04
6
Não
P
8
Efetivo
Vesp.
Ciências
5ª a 8ª
10
10
8
Não
P
9
Interino
Mat.
Ciências
5ª a 8ª
04
04
12
Não
P
10
Interino Vesp.
Ciências e
Religião
5ª a 8ª 01 01 20 Não
28
Cabe relembrar finalmente que, em setembro de 2006, ao visitar pela primeira
vez os cenários da pesquisa, ou seja, as dez escolas selecionadas, na tentativa de
caracterizar os sujeitos, deparei-me com o seguinte quadro de professores do ensino de
Ciências: um licenciado em Química, dois graduados em Ciências Exatas, seis
graduados em Ciências Biológicas e um formado em Geografia. Naquele momento, o
que mais me chamou atenção foi o fato de ter um professor graduado em Geografia
lecionando Ciências Naturais.
Após esse primeiro contato com os professores, voltei para uma nova tomada de
informações e, em março de 2007, a configuração do quadro de professores havia
mudado, apresentando-se da seguinte forma: um licenciado em Química, uma graduada
em Ciências e oito graduadas em Ciências Biológicas
14
. Se por um lado essa
desconfiguração gerou alguns problemas técnicos ao desenvolvimento do presente
trabalho, que teve que realizar novamente tomadas de informações por meio da
aplicação do questionário de caracterização dos sujeitos, por outro lado, isso permitiu de
pronto identificar que existem, nas escolas municipais de Várzea Grande, uma grande
rotatividade de professores nas oitavas séries do ensino fundamental. Esse fato nos fez
perguntar por que será que isso acontece com a disciplina de Ciências? Será que isso
acontece apenas com a disciplina Ciências Naturais? Estaria isso contribuindo para os
problemas de ensino-aprendizagem identificados pela Secretaria de Educação?
Sendo o objeto de pesquisa deste trabalho, os conhecimentos dos professores de
Ciências Naturais que lecionam Química na oitava série do ensino fundamental no
município de Várzea Grande em Mato Grosso, para situar e contextualizar a Química no
ensino fundamental, sentiu-se necessidade de fazer um resgate histórico do ensino de
Ciências no Brasil. Nesse sentido, o próximo capítulo apresenta uma síntese desse
desenvolvimento histórico.
14
Na área de Ciências Biológicas, os graduados possuem ambas as atribuições de licenciado e bacharel.
29
CAPÍTULO II
O ENSINO DE CIÊNCIAS NO BRASIL
“Nenhum período da história foi mais penetrado pelas ciências naturais,
nem mais dependente delas, do que o século XX”
Eric Hobsbawn
2.1. UMA BREVE HISTÓRIA
Analisando os períodos anteriores ao século XX, fica difícil reconhecer qualquer
iniciativa de ensino de Ciências nas escolas brasileiras. Durante todo o período colonial
até o Império a educação era eminentemente bacharelesca, excluindo do currículo as
Ciências Naturais. Mesmo no início da República até a primeira metade do século XX,
o ensino de Ciências mostra-se incipiente.
No Brasil, o ensino de Ciências ganha força a partir do momento em que se pensa
uma política de desenvolvimento industrial, ou seja, a partir de um modelo nacional-
desenvolvimentista dos anos 50 e, mais acentuadamente, na década de 70, com o projeto
de crescimento acelerado do Regime Militar (1964-1985).
Do início do século XX até o final dos anos 50 predominava um ensino teórico,
tendo na verbalização a forma mais comum de trabalho. Os textos eram estrangeiros e
procuravam destacar as características positivas das Ciências. Os experimentos, quando
realizados, eram úteis apenas para comprovar a teoria exposta pelo professor. Portanto,
os alunos não poderiam inferir nenhuma idéia, muito menos questionar as estruturas
demonstradas pelo professor e pelo experimento (KRASILCHIK, 1987).
30
No período de 1950 a 1960, época profundamente atingida pelos traços da Segunda
Guerra Mundial (1939-1945), e pela industrialização, o desenvolvimento tecnológico e
científico provocou choques no currículo escolar. Hurd (1961)
15
(apud KRASILCHIK,
1987, p. 6), chamava essa fase de “período de crise no ensino de Ciências” em virtude
do surgimento de grandes projetos que alteraram os programas das disciplinas
científicas nos Estados Unidos, em outros países europeus e regiões influenciadas por
esses.
A esse respeito, é importante citar, o contexto da Guerra Fria, da revolução
cubana de 1959 e do lançamento do satélite Sputinik
16
, em 1957, pelos soviéticos, levou
os Estados Unidos da América a criarem um mecanismo de alinhamento do bloco
capitalista no continente Americano. Esse mecanismo foi denominado por Aliança para
o Progresso, e era um acordo de ajuda econômica e social dos Estados Unidos da
América (USA) para os países da América Latina. Em síntese, esse evento do
lançamento do satélite Sputinik gerou nos EUA uma vasta reformulação no ensino de
Ciências, por meio de projetos curriculares, tais como: Biological Science Curriculum
Study (BSCS); Chemical Bond Approach (CBA); Physical Science Study Committee
(PSSC); Introductory Physical Science (IPS). As conseqüências foram a incorporação
do conhecimento científico nos currículos escolares, a formação de elite instruída, e a
substituição dos métodos expositivos pelos ditos ‘ativos’ (laboratório).
No Brasil, houve uma expansão da rede pública de ensino, a criação de projetos
de ensino de Ciências com produção de textos, material experimental e treinamento de
professores. Em 1967 foi criada a Fundação Brasileira para o Desenvolvimento do
Ensino de Ciências (FUNBEC).
No Brasil, a finalidade do curso ginasial propedêutico era a formação de futuros
universitários. A carga horária de latim era superior à de Física, Química e História
Natural, que apareciam no currículo do curso colegial.
Uma das transformações pretendidas pelo Manifesto dos Pioneiros da Educação
Nova
17
, de 1932, era de substituir os métodos tradicionais pela metodologia ativa, cujo
15
HURD, P. H. Biological in American Schools. Nº 1 EUA, AIBS, 1961, p. 108.
16
Sputinik 1, o primeiro satélite artificial do mundo. Com o tamanho de uma cesta de basquete, pesando
89,082kg. O SPUTNIK 1 foi lançado em 4 de outubro de 1957 pela União Soviética, levando 98
minutos para orbitar a Terra em seu caminho elíptico. Esse lançamento conduziu a novas descobertas
políticas, militares, tecnológicas e científicas e iniciou a era espacial e a corrida entre EUA e União
Soviética.
17
O Manifesto da Educação Nova defendia os princípios de um sistema educacional público, gratuito,
obrigatório e leigo, que seriam inseridos na Constituição Federal. Também reclamava flexibilidade,
diversidade e delegação do controle administrativo e financeiro aos estados. Buscava, ainda,
31
objetivo era de proporcionar ao aluno maior liberdade e autonomia no tocante ao
conhecimento. A proposta incluía a substituição dos métodos expositivos pelos
chamados métodos ativos (laboratório). As aulas práticas deveriam propiciar atividades
que motivassem e auxiliassem os alunos na compreensão de conceitos. Essa seria uma
didática mais eficiente na “transmissão” das informações do que aquela de mera aula
expositiva, seria fazer com que o aluno pensasse, entendesse e fizesse o experimento, ou
seja, o chamado ‘aprender fazendo’.
Nessa época, o ensino de Ciências era essencialmente teórico, submisso ao livro,
e predominava a memorização, levando o aluno à passividade. As modificações
reclamadas centravam-se em alguns pontos básicos como: os currículos escolares que
não incorporaram o crescimento do conhecimento científico ocorrido durante a guerra e
informações ultrapassadas que eram repassadas aos alunos ignorando as grandes
descobertas nas áreas da Física, Química e Biologia. Com o objetivo de otimizar a
qualidade do ensino àqueles que pretendiam ingressar na Universidade, tornou-se então
urgente incluir no currículo aquilo que era de mais moderno na Ciência, garantindo
assim a formação de profissionais comprometidos com o desenvolvimento industrial,
científico e tecnológico (KRASILCHIK, 1987).
No Brasil, um grupo no Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura
(IBECC), em São Paulo, sob a liderança de Isaias Raw
18
, aspirava a melhoria do ensino
de Ciências. Este grupo contava com professores que buscavam a atualização do
conteúdo ministrado, tanto na teoria como na prática.
O Ministério da Educação também oportunizava cursos de capacitação pela
Campanha de Aperfeiçoamento e Desenvolvimento do Ensino Secundário (CADES). O
principal objetivo desses cursos era capacitar professores não habilitados, uma vez que
os licenciados não se dedicavam ao magistério e as aulas das disciplinas científicas
ficavam sob a responsabilidade de médicos, engenheiros, farmacêuticos e bacharéis.
O grande objetivo do programa oficial e dos textos básicos era transmitir
informações, conceitos, fenômenos, modelos e objetos. Não se discutia, no entanto, a
relação da Ciência com o contexto econômico social e político, nem os aspectos
tecnológicos e suas aplicações práticas.
diagnosticar e sugerir rumos às políticas públicas em matéria de Educação.
18
Professor Emérito da Universidade de São Paulo, com especialização em Ciências Biomédicas.
Liderança científica no Instituto Butantan desde 1985. Fundou e dirigiu o Centro de Biotecnologia
responsável pelas inovações tecnológicas de produção de soros e vacinas, no período de 1985 a 2002,
reconhecidas internacionalmente.
32
No período de 1960 a 1970, as transformações políticas e sociais foram muito
importantes para a estrutura curricular do ensino de Ciências. Os grandes projetos,
segundo Krasilchik (1987, p. 9), passaram a
permitir a vivência do método científico como necessário à formação do
cidadão, não se restringindo mais apenas à preparação do futuro cientista.
Esta nova postura marca uma diferença fundamental, em relação às etapas
anteriores. Começava-se, assim, a se pensar na democratização do ensino
destinado ao homem comum, que tinha que conviver com o produto da
Ciência e da Tecnologia e do qual se requeria conhecimento, não apenas
como especialista, mas também como futuro político, profissional liberal,
operário, cidadão enfim.
Nesse momento, o foco principal das ações passou a ser o homem comum, pois
até então, somente a observação para a constatação de fatos e a manipulação de
equipamentos é que eram enfatizados.
Com o passar do tempo, constatou-se a necessidade da formação de equipes
heterogêneas, diversificando as competências, para elaboração dos projetos curriculares.
Foi então que surgiram os ‘Centros de Ciências’, que eram instituições permanentes que
cuidavam da produção, aplicação e revisão dos materiais.
No período de 1963 a 1965, por meio de convênios específicos, foram criados no
Brasil pelo Ministério da Educação e Cultura, seis Centros de Ciências, nos Estados a
saber: Minas Gerais, Bahia, Pernambuco e São Paulo. Esses centros ficavam situados
nas Universidades, mantendo fortes vínculos com a comunidade acadêmica, apesar de
servirem aos sistemas educacionais de ensino e realizarem programas conjuntos com as
Secretarias da Educação.
Os programas iniciais acreditavam que apenas a qualidade do material poderia
garantir uma bem-sucedida aplicação, enquanto que a transformação do ensino não se
realizava. Além da elaboração do material intensificou-se nesse período os cursos de
atualização e treinamento de professores e houve um maior interesse aos chamados
objetivos educacionais.
Dois marcos tiveram influência nas atividades em desenvolvimento: a
publicação da obra de Bruner
19
, ‘O Processo da Educação’, conferência realizada em
1959; e as conferências realizadas na Universidade de Cornell e Califórnia, em 1964,
denominadas ‘Piaget redescoberto’.
19
Jerome Bruner nasceu em New York, em 1915; graduou-se na Universidade de Duke, em 1937 e
posteriormente em Harvard, em 1941; obteve o título de doutor em Psicologia e tem sido chamado o
pai da Psicologia Cognitiva, pois desafiou o paradigma do Behaviorismo.
33
Na busca de caminhos que propiciassem mudanças curriculares, foi criada uma
nova comunidade acadêmica, a dos educadores em Ciência, que se preocupa com o
significado das disciplinas científicas no currículo. A vitalidade dessa comunidade foi
evidenciada com o aparecimento de revistas que relatam experiências e pesquisas no
campo do ensino de Ciências.
Várias universidades organizavam cursos de graduação, pós-graduação,
produção de material e programas de aperfeiçoamento de docentes.
Nessa época foi promulgada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Lei
4024
20
, de 21 de dezembro de 1961 – que ampliava o currículo de Ciências. Foi
incluída, desde a 1ª série do curso ginasial, a disciplina Iniciação à Ciência; e aumentada
a carga horária das disciplinas científicas Física, Química e Biologia. Os projetos
americanos traduzidos e adaptados ao Brasil pelo IBECC foram usados nos cursos
colegiais brasileiros. Para atender à nova legislação, o IBECC elaborou o projeto
Iniciação à Ciência que enfatizava a investigação dos fenômenos e a elucidação de
problemas. A aula prática era uma importante meta a ser atingida, com o objetivo do
aluno aprender-fazendo.
Em 1968 os universitários reivindicavam o aumento de número de vagas, o que
resultou no crescimento da rede privada de ensino superior. A grande proliferação de
universidades teria resultado na enorme quantidade de profissionais mal-preparados.
No período de 1970 a 1980, tornou-se mais intenso o interesse pela educação
ambiental, em virtude do desenvolvimento industrial acelerado e sua conseqüente
agreção ao ambiente. Isso trouxe mais um objetivo ao ensino de Ciências: “o de fazer
com que os alunos discutissem também as implicações sociais do desenvolvimento
científico” (KRASILCHIK, 1987, p.17).
A promulgação da Lei 5692/71
21
, impõe novo objetivo à escola que passa a
ter como meta servir ao trabalhador e não à formação de cientistas ou profissionais
liberais. O texto da lei valorizou as disciplinas científicas, mas na prática foram bastante
atingidas. As disciplinas instrumentais ou profissionalizantes obstruíram o currículo,
sem nenhum benefício à formação profissional. A desvalorização da escola pública
aconteceu então com a perda de sua identidade. Os cursinhos cresceram e forneciam
20
Lei Ordinária que fixa as Diretrizes e Bases da Educação Nacional.
21
Lei Ordinária que fixa as Diretrizes e Bases para o Ensino Médio e Ensino Fundamental, e dá outras
providências.
34
cursos regulares de Ensino Médio e Ensino Fundamental, com a preocupação de
repassar informações e de preparar o aluno para o vestibular.
Em 1972, o Governo Federal apoiou o ensino de Ciências, por meio do
Programa de Extensão e Melhoria do Ensino (PREMEN), que patrocinou projetos em
instituições como os Centros de Ciências e Universidades. O Ministério da Educação e
Cultura, por meio do PREMEN, apoiou a nova modalidade de licenciatura
regulamentada pela Resolução CFE 30/74, que tinha como um de seus pilares a
proposta de Ciência Integrada, difundida pela United Nations Educational, Scientific
and Cultural Organization (UNESCO).
As manifestações das Sociedades Brasileiras de Física, Química e Matemática e
da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), contra a Resolução 30/74,
representaram um marco no ensino de Ciências e no processo de redemocratização do
País.
No período de 1980 a 1985 os professores, organizados em associações de
classes, e com o objetivo de garantir melhores condições salariais, de trabalho, e maior
participação em decisões, reivindicam um bom ensino de Ciências que não fosse
elitizado. Naquela época, a influência da informática afetou profundamente as
concepções de educação. Os responsáveis pelo ensino de Ciências exigem decisões e
mudanças curriculares, tanto dos conteúdos como na metodologia usada em sala de
aula. Esse período foi marcado também pelo desenvolvimento de materiais que levam
ao exercício de tomada de decisões como jogos e o uso de computadores no ensino.
Em 1983, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
(CAPES), criou o Subprograma de Educação para a Ciência (SPEC), que seria um novo
projeto para melhoria do Ensino de Ciências e Matemática, com o objetivo de
identificar, treinar e apoiar lideranças, aperfeiçoar a formação de professores e
promover a busca de soluções locais para a melhoria do ensino e estimular a pesquisa e
implantação de novas metodologias.
Os anos 80 trouxeram a idéia de um ensino participativo e integrador, em que o
aluno teria participação ativa na construção do conhecimento científico. Correntes da
psicologia demonstram a existência de conceitos científicos intuitivos, espontâneos,
alternativos ou ainda, pré-concepções acerca dos fenômenos naturais na mente das
crianças.
Além disso, a partir dos anos 80 houve no ensino de Ciências a inclusão de
temas relativos ao meio ambiente, saúde, relações entre indústria, agricultura e ciência e
35
tecnologia, que apresenta a abordagem Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS).
Também, a abordagem interdisciplinar no ensino Ciências se deu com maior intensidade
a partir dessa mesma década. É nesse sentido, que posteriormente os Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCN) agregaram aspectos relativos à interdisciplinaridade e
CTS. Sobre esse último, os documentos oficiais argumentam que, pelo fato dos valores
humanos não serem alheios ao aprendizado científico, a Ciência deve ser apreendida em
suas relações com a Tecnologia e com as demais questões sociais (BRASIL, 1998).
Nas últimas décadas, estudos sobre CTS vêm recebendo muita atenção e
influenciando a elaboração de currículos de Ciências do mundo inteiro. O movimento
CTS busca, portanto, enfocar as interações entre Ciência, tecnologia e sociedade.
Educadores dos mais diferentes níveis vêm colocando como um dos objetivos essenciais
para a educação formal, a questão para a formação para a cidadania. É inconcebível a
idéia da Ciência pela Ciência, sem considerar seus efeitos e aplicações. É por isso que
não faz sentido concebermos uma educação científica que não contemple os problemas
sociais, fechando-se num compartimento isolado onde existem conceitos, fórmulas,
algoritmos, fenômenos e processos a serem memorizados acriticamente pelos
educandos.
Nos anos 2000, muitos são os projetos de ensino de Ciências, tais como:
experimentoteca do ensino médio,; Mão na Massa,; Pró-Ciências Capacitação e
atualização de professores, Programa de Valorização da Educação Científica, dentre
outros.
2.1.1. O Currículo
No período compreendido entre os anos de 1950 a 1960, as disciplinas
científicas apareciam tardiamente apenas no curso colegial, pois no curso ginasial
predominava o latim. O currículo era tradicional e impossibilitava o professor de efetuar
mudanças, favorecendo a memorização dos conteúdos estudados. Porém, haviam idéias
de mudança deste cenário que propunham a substituição do método expositivo pelo
ativo, inclusive com ênfase no uso de laboratório e incluindo no currículo as últimas
novidades científicas e tecnológicas, visando formar profissionais aptos para
acompanhar e contribuir o desenvolvimento industrial pelo qual o País passava
(KRASILCHIK, 1987).
36
O Currículo no período de 1960 a 1970 adotava o método científico, que se
preocupava também com a formação científica do cidadão comum e não em tratá-lo
como um futuro cientista. Foram desenvolvidos projetos curriculares destinados a
promover mudanças no ensino de Ciências. As disciplinas: Física, Química, Matemática
e Biologia foram contempladas com materiais pedagógicos elaborados por cientistas e
professores secundários.
no período de 1970 a 1980, agregou-se ao currículo a preocupação com a
questões ambientais, promovendo discussões acerca das implicações sociais do
desenvolvimento científico. Com a promulgação da Lei 5692/71, o currículo sofreu
alterações em relação à carga horária das disciplinas científicas, e a introdução das
disciplinas denominadas como profissionalizantes.
No período de 1980 a 1985 tornou-se evidente a influência da tecnologia no
currículo escolar, principalmente no ramo da informática. Os responsáveis pelo ensino
de Ciências defenderam alterações curriculares, tanto em nível de conteúdos como na
metodologia adotada, que contemplasse o desenvolvimento tecnológico para formar
cidadão trabalhador.
Na tentativa de construir um currículo de Ciências que de fato atendesse as
expectativas dos alunos, seria necessário o apoio das Equipes cnicas das Secretarias
de Educação como também da Instituição Universitária, que forma profissionais, idéias
e produz materiais. Deveria, portanto, ser um trabalho participativo, onde todos os
segmentos opinassem, ficando o currículo caracterizado pelas peculiaridades de cada
sociedade.
Os conteúdos das Ciências devem ser relevantes e estarem em sintonia,
harmonia com outras disciplinas do currículo; as modificações metodológicas devem
enfatizar as atividades práticas que permitam a participação dos alunos no sentido de
solucionar problemas.
A participação de professores na mudança curricular depende daqueles que
pretendem inovar o ensino de Ciências, possibilitarem essa oportunidade. Os cursos de
atualização são os mais comuns, destinados apenas e tão-somente ao repasse de
informações teóricas e/ou práticas, não favorecendo mudanças com relação à postura e
atitudes tomadas pelo professor em sala de aula. Nos cursos de ‘imitação’ os professores
desenvolvem atividades preestabelecidas em um projeto curricular como se fossem os
alunos, ou seja, os professores fazem o papel do aluno ao participar das atividades
contidas no projeto curricular. Já os cursos analítico-participativos envolvem trabalho
37
coletivo, discussões, elaboração de materiais, técnicas que propiciam a transformação e
desenvolvimento dos profissionais, analisa a postura adotada pelo professor em sala de
aula com o objetivo de mudar para melhor as sua atitude.
Krasilchik (1987), cita sete condições que favorecem o êxito dos cursos, a saber:
1) Participação voluntária – quando o professor tem o prazer de estar envolvido em um
curso, caso contrário, não terá motivação para enfrentá-lo; 2) Existência de material de
apoio – na existência deste, a equipe que irá ministrar o curso adota uma só postura, fala
a mesma língua sem entrar em contradição, pois tem o material como orientador das
atividades a serem desenvolvidas; 3) Coerência e integração conteúdo-metodológica
é preciso que os cursos atentem para que o conteúdo seja compatível com a
metodologia, oportunizando um melhor aperfeiçoamento aos professores; 4) Grupos de
professores de uma mesma escola é preferível que saia para um curso, um certo grupo
de professores de uma mesma instituição, do que um grupo de muitos professores de
diferentes escolas; isto porque fica mais fácil fazer as discussões, partindo de um grupo
grande que participou do evento em lugar de apenas um professor tentar colocar as
idéias, modificações e ser barrado pelos demais; isto pode tornar-se impraticável quando
se defronta com uma equipe que teme ‘o novo’, daí a desmotivação e acomodação por
parte de um único professor, igualando-se ao comportamento dos demais; 5)
Atendimento reiterado essa condição fica mais fácil e produtiva quando o grupo de
professores for da mesma escola, pois atinge muitas pessoas ao mesmo tempo; o
atendimento é feito por parte da equipe que ministra o curso àqueles que dele
participoaram, e que com mais confiança e maturidade podem colocar em prática o que
aprenderam; 6) Atividades dos praticantes os praticantes fazem parte do processo, o
curso não proporciona a passividade dos professores; 7) Acompanhamento o objetivo
do curso não se encerra ao término deste. A missão continua! O assessoramento pode
ser feito de várias maneiras: constantes reuniões com objetivo de discutir o que vem
acontecendo nas aulas; através de visitas, boletins noticiosos, dentre outros.Vale
destacar que em todas essas maneiras de contato podem aparecer fatos novos,
informações, sugestões etc.
Quanto à preparação, adaptação e utilização de materiais, para muitos
professores, o livro-texto determina tanto o conteúdo quanto a metodologia a ser
trabalhada com os alunos. Por outro lado, os projetos curriculares produziam material
para ajudar o professor no momento de ministrar assuntos novos. Mesmo sendo gratuita
a distribuição do material, os professores sentem dificuldades na introdução de assuntos
38
inovadores em suas aulas. Os professores se sentem inseguros ao lidar com o
desconhecido. Daí nasce a necessidade deles próprios criarem o material curricular que
se encaixe na sua realidade e de sua região.
A participação da Universidade na mudança curricular fica aquém, pois ela não
conhece a realidade das escolas de ensino fundamental e médio. É preciso que aqueles
que queiram elaborar o currículo conheçam a escola e a sala de aula.
Portanto é de suma importância a interação entre os segmentos da escola com os
órgãos que sugerem as transformações curriculares, com um único objetivo, o de
melhorar o ensino das Ciências.
Em tempos mais recentes, os currículos de ensino de Ciências com ênfase em
CTS, segundo Santos e Mortimer (2002, p. 1), “apresentam como objetivo central
preparar os alunos para o exercício da cidadania e caracterizam-se por uma abordagem
dos conteúdos científicos no seu contexto social”.
Roberts
22
(1991) (apud SANTOS e MORTIMER, 2002, p. 3), define currículo
com ênfase em CTS como “aquele que trata das inter-relações entre aplicação científica,
planejamento tecnológico e solução de problemas práticos de importância social”.
Ainda segundo Roberts (1991), tais currículos apresentam uma concepção de:
(i) ciência como atividade humana que tenta controlar o ambiente e
a nós mesmos, e que é intimamente relacionada à tecnologia e às questões
sociais; (ii) sociedade que busca desenvolver, no público em geral e também
nos cientistas, uma visão operacional sofisticada de como são tomadas
decisões sobre problemas sociais relacionados à ciência e tecnologia; (iii)
aluno como alguém que seja preparado para tomar decisões inteligentes e
que compreenda a base científica da tecnologia e a base prática das decisões;
e (iv) professor como aquele que desenvolve o conhecimento de e o
comprometimento com as inter-relações complexas entre ciência, tecnologia
e decisões. (ROBERTS, 1991 apud SANTOS e MORTIMER, 2002, p. 3)
Os trabalhos curriculares com ênfase em CTS surgiram como decorrência da
necessidade de formar cidadão em Ciência e tecnologia, visto que esse fato não estava
sendo alcançado adequadamente pelo ensino convencional de Ciências.
Para Fourez
23
(1995) (apud SANTOS e MORTIMER, 2002, p. 2), não se trata
de mostrar as maravilhas da Ciência, assim como faz a mídia, mas de disponibilizar as
representações que possibilitam ao cidadão agir, tomar decisão e compreender o que
22
ROBERTS, D. A (1991). What counts as science education? In: FENSHAM, P. J. (Ed.). Revelopment
and dilemmas in science education. . Barcombe: The Falmer Press, p. 27-55.
23
FOUREZ, G.(1995). A construção das Ciências : introdução à filosofia e à ética das Ciências. São
Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista.
39
está em jogo no discurso dos especialistas. Essa tem sido a principal proposição dos
currículos com ênfase em CTS.
2.1.2. A Experimentação
É sabidamente elucidado que a experimentação quase sempre desperta
curiosidade e interesse entre os alunos de qualquer nível de escolarização. Os alunos
atribuem à experimentação um enorme valor, principalmente como uma forma
motivadora de aprender. Da mesma forma, é comum ouvir certos professores dizendo
que a experimentação aumenta a capacidade de aprendizado, pois envolve o aluno com
o tema ministrado em sala de aula.
Ainda que os professores enfatizem a importância do ensino experimental para
manter a melhoria do ensino em geral, eles reclamam da carência para sua efetivação
como: turmas grandes, falta de espaço físico e/ou material, carga horária reduzida,
dentre outros problemas. Por outro lado, não levam em consideração a importância da
dimensão que o papel da experimentação representa para a aprendizagem dos alunos.
Silva e Zanon (2000, p. 124), pressupõem que a prática de “aulas experimentais
não assegura por si só, a promoção de aprendizagens significativas e o estabelecimento
de relações entre teoria e prática”. As aulas práticas não podem ser consideradas
capazes de comprovar a teoria ou vice-versa. Ainda hoje se tem visto a experimentação
como mera atividade de constatação, isto é, o momento em que o aluno apenas
manipula e comprova a teoria. Vale destacar aqui a necessidade e a importância da
intervenção do professor, no sentido de que os alunos reflitam sobre o que estão fazendo
e efetivamente entendam, em vez de fazerem mecanicamente.
Ainda, as mesmas autoras argumentam que muitos professores atribuem à
experimentação a “comprovar a teoria no laboratório” (p. 121). Já, outros professores
imaginam que no laboratório os alunos podem chegar, por meio da descoberta, a uma
teoria, sem ter o professor como orientador. Por isso Silva e Zanon (2002, p. 123),
apontam “a visão indutivista da ciência como um dos principais obstáculos para o
ensino de qualidade”.
Giordan (1999, p. 44) argumenta que indução “é o processo de formular
enunciados gerais à custa de observações e coleta de dados sobre o particular,
contextualizado no experimento”.
40
Agindo dessa forma, ou seja sem supervisão e exposição teórica, as aulas
práticas ficarão apenas e tão-somente na ‘experimentação pela experimentação’, sem
qualquer interpretação, investigação e discussão acerca daquilo que foi visto em
laboratório.
A experimentação no ensino de Ciências é escassa e infrutífera na maioria das
vezes por não ser adequada e capaz de favorecer o progresso de aprendizados claros,
objetivos, expressivos e de grande valor para o aluno.
2.1.3. Formação de Professores de Ciências
Segundo as experiências vividas por Schnetzler (2000), ao longo de sua vida
como formadora de professores de Química, ainda encontra nos cursos de licenciatura
em Química praticamente “as mesmas organizações, valores e padrões de conduta dos
professores universitários com relação à formação docente” (2000, p. 14).
A autora enfatiza que deve haver interação entre o conhecimento acadêmico de
Química com o conhecimento pedagógico, pois os licenciados precisam aprender sobre
‘o que’, ‘como’ e ‘por que’ da necessidade de ensinar certo conteúdo químico nas
escolas de ensino médio e fundamental, e isso não é de interesse do curso de
bacharelado. Aponta a separação das disciplinas específicas e pedagógicas como uma
das razões responsáveis pela falta de eficiência e eficácia da formação docente nos
cursos de licenciatura.
Desta forma, “os currículos de formação profissional tendem a separar o mundo
acadêmico do mundo prático” (SCHNETZLER, 2000, p. 21). Isto porque não uma
interligação entre ambos, configurando o modelo de formação docente nas licenciaturas.
As disciplinas específicas/científicas são em especial destinadas ao curso de
bacharelado, que pouco ou nada se preocupa com a parte da pedagogia destinada ao
futuro professor. E é justamente este, o docente, que sai em desvantagem.
Enfatiza Schnetzler (2000, p. 22), que “as licenciaturas deixam de ser o lugar
quer de início quer de término do processo de formação docente”. Para a autora, esta
não pára, a formação é contínua e está presente em toda a vida profissional do professor.
Por outro lado, é lamentável perceber que os cursos de licenciatura não são capazes de
formar bons professores.
41
Porém, comumente a formação continuada se restringe erroneamente a meras
ações de capacitação, que tentam sanar resquícios das deficiências deixadas pela
formação inicial, ações essas que a academia considera eficazes. Entretanto, atualmente
os olhares estão declinados para a idéia de formar o professor-reflexivo/pesquisador.
Neste contexto, é importante ressaltar que tipo de reflexão os formadores
propiciam aos futuros professores. Não se pode refletir por refletir, ou seja, não
interessa qualquer tipo de reflexão. Essa reflexão deve estar voltada para o ensino/
aprendizagem/escolarização. Uma reflexão necessária ao desenvolvimento profissional
docente e à melhoria da qualidade educativa (SCHNETZLER, 2000, p. 24-5). Porém,
tornou-se um slogan dos inúmeros cursos de formação inicial ou continuada auto-
rotularem-se dessa forma, com o objetivo de atrair e atingir o público-alvo.
2.1.4. Os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino de Ciências Naturais
Como vimos anteriormente, a importância da educação para o
desenvolvimento das pessoas e das sociedades ampliou-se no sentido de construir uma
escola que vise a formação de cidadãos. Tal demanda requisitou uma revisão dos
currículos e foi nesse sentido que os PCN foram elaborados, com vistas a um
direcionamento específico à diversidade regional, cultural e política do país.
Nessa perspectiva, os PCN são diretrizes para nortear a ação docente. Tais
orientações “podem funcionar como elemento catalisador de ações na busca de uma
melhoria da qualidade da educação brasileira”, como está posto no documento
introdutório (BRASIL, 1998, p.13). Contudo, a melhoria da qualidade impõe a
necessidade de investimentos em diferentes frentes, como a formação inicial e
continuada de professores, uma política de salários dignos, um plano de carreira, a
qualidade do livro didático, de recursos televisivos e de multimídia, a disponibilidade de
materiais didáticos. (Idem, p. 13-14).
A reflexão que fazemos é por que as orientações dos Parâmetros continuam em
níveis documentais, não se efetivam na sala de aula, mesmo sendo o professor
constantemente cobrado para colocá-las em prática? A formação do professor seria o
principal problema? Dentre os muitos fatores, podemos ousar contribuir nesse debate
afirmando que a própria elaboração dos Parâmetros seria um aspecto importante para
refletir sobre o assunto, haja vista esse processo ter ocorrido com pouca participação dos
42
professores. Ademais, o fato de apresentar-se como algo ‘inovador’, por sua vez, pode
causar ao docente ‘resistência’ ao processo de mudança. Segundo Santos (2002, p.354),
“as inovações trazem insegurança e inquietação porque se propõem a romper com
práticas já instaladas”.
A intenção descrita nos Parâmetros é a de criar condições nas escolas, que
permitam aos estudantes terem acesso ao conjunto de conhecimentos elaborados e
reconhecidos como necessários ao exercício da cidadania. Assim, os Parâmetros
Curriculares de Ciências Naturais são dirigidos aos educadores, e nele se propõe como
objetivo aprofundar a prática pedagógica no ensino fundamental, bem como contribuir
para o planejamento de trabalho e para o projeto pedagógico da escola.
Segundo informações nos documentos oficiais (BRASIL, 1998), os Parâmetros
servem para apoiar as discussões e o desenvolvimento do projeto educativo, refletir
pedagogicamente, planejar as aulas e analisar os materiais didáticos e recursos
tecnológicos.
Os objetivos gerais de Ciências Naturais para o ensino fundamental são descritos
nos Parâmetros Curriculares no sentido de desenvolver competências que permitam
compreender o mundo e atuar como indivíduo, utilizando conhecimentos de natureza
científica e tecnológica (BRASIL, 1998).
Quanto às capacidades que os alunos podem desenvolver, os PCN apresentam,
por exemplo, compreender a Ciência como um processo de produção de conhecimento
humano; formular questões, diagnosticar e propor soluções para problemas reais a partir
de elementos das Ciências Naturais; saber utilizar conceitos científicos básicos; saber
combinar leituras, observações, experimentações e registros de coleta; valorizar o
trabalho em grupo, sendo capaz de ação crítica e cooperativa para a construção do
conhecimento; compreender saúde pessoal, social e ambiental como bens coletivos e
individuais.
Os critérios estabelecidos para seleção de conteúdos propostos nos Parâmetros,
dentre outros, são: promover as relações entre diferentes fenômenos naturais e objetivos
da tecnologia; os conteúdos devem ser relevantes do ponto de vista social, cultural e
científico, permitindo que o estudante compreenda a realidade à sua volta; devem se
construir em fatos, conceitos, procedimento, atitudes e valores a serem promovidos de
forma compatível com as possibilidades e necessidades de aprendizagem do estudante;
todos os conteúdos mencionados e os critérios utilizados nas seleções dos conteúdos dos
43
eixos temáticos, também serão úteis para o professor organizador de currículos e planos
de ensino decidir sobre perspectivas, enfoques e assuntos a trabalhar em sala de aula.
Os conteúdos curriculares de Ciências foram organizados nos Parâmetros em
quatro eixos temáticos, quais sejam: terra e universo, vida e ambiente, ser humano e
saúde, tecnologia e sociedade. No entanto, o que se nos livros didáticos é a mesma
estrutura apresentada nas propostas curriculares dos Estados e Municípios que foram
analisadas pela Fundação Carlos Chagas, e que subsidiaram a elaboração dos PCN para
o ensino de Ciências, ou seja, na rie o conteúdo abordado é solo, ar, água e meio
ambiente; na série os seres vivos; na série corpo humano e na série Química e
Física, separadamente.
Um aspecto que merece destaque, ainda relacionado à estrutura curricular, é que
os temas transversais, que são: meio ambiente, saúde e orientação sexual, que deveriam
permear o currículo transversalmente em todas as disciplinas, quando muito são
abordados pelos professores de Ciências, não sendo assumidos pelas outras disciplinas
do currículo escolar em um caráter de interdisciplinaridade.
Quanto às orientações didáticas, os Parâmetros trazem muitas sugestões e
inovações para a melhoria do ensino de Ciências, podemos citar: o trabalho com a
pedagogia de projetos; o ensino mediante a problematização; o uso de várias fontes de
informação; experimentação; trabalhos de campo, dentre outros. No entanto, por que
será que essas orientações didáticas não se efetivam em sala de aula? No contexto desta
pesquisa, uma das possibilidades estaria relacionada ao preparo dos professores para
trabalhar numa perspectiva diferenciada, uma vez que esses possuem uma formação
para o ensino de Ciências ainda enfatizado pelo conteúdo específico, em detrimento ao
conteúdo pedagógico.
Os Parâmetros apregoam que os temas de estudo e as atividades de Ciências
Naturais devem ser organizados para que os alunos adquiram, progressivamente,
capacidades. Nos terceiro e quarto ciclos deverão valorizar a disseminação de
informação socialmente relevantes aos membros da sua comunidade; valorizar a vida
em sua diversidade e a conservação dos ambientes; confrontar as diferenças individuais
e coletivas, para reelaboração de idéias e interpretações. De acordo com os PCN
(BRASIL, 1998), no último ciclo do ensino fundamental, o correspondente à série, é
importante que o professor reflita sobre os objetivos e conteúdos escolhidos, orientando
a classe para a aquisição de capacidades expressas nos objetivos gerais de Ciências
Naturais. Tais objetivos são, por exemplo: compreender e exemplificar como as
44
necessidades humanas beneficiam-se desse conhecimento; associar os processos de
transformação de energia, dos materiais e da vida; valorizar a disseminação de
informações socialmente relevantes aos membros da sociedade; elaborar
individualmente ou em grupo relatórios acerca do tema em estudo; caracterizar as
transformações, tanto naturais como induzidas, pelas atividades humanas, reconhecendo
a necessidade de investimento para preservar o ambiente em geral e, particularmente,
em sua região.
Após uma década de oficialização dos PCN para o ensino de Ciências, percebe-
se que esse ensino sofreu poucas alterações na maioria das escolas brasileiras.
2.2. TEMPOS ATUAIS NO ENSINO DE CIÊNCIAS
Ainda nos dias de hoje, é muito comum encontrar em resultados de pesquisas
sobre o ensino de Ciências a existência uma prática baseada no ensino tradicional, que é
fundamentado no simples repasse de informações. Não há preocupação se o que o aluno
aprende na sala de aula está ou não relacionado com a experiência de vida dele e com
sua realidade social. Os conteúdos são assimilados pelos alunos como verdades
absolutas, e com pouco questionamento. Na disciplina de Ciências, principalmente,
estão presentes ainda muitos textos e questionários retirados desses textos, para que o
aluno memorize, para uma simples reprodução nas provas e aquisição de notas, sem,
contudo contextualizar, sistematizar de forma conveniente o que o aluno está tentando
aprender. O aluno memoriza, mas não aprende, porque não entende a essência do
conteúdo. Sustento este propósito nas palavras de Bizzo (2002, p. 136): “[...] depois de
algum tempo, os alunos não se lembram mais do que memorizaram, e é como se não
tivessem estudado nada. Portanto, além de ser muito chata para o aluno e angustiante
para o professor, essa decoreba é rigorosamente inútil.”
Nesse sentido, Hansen (2006, p. 19) argumenta que “o ensino trabalhado de
forma tradicional tem sido criticado como uma das causas da má qualidade de ensino”.
Diz ainda que “apesar do ensino ainda ser realizado de modo compartimentalizado,
desconectado do cotidiano do aluno, aos poucos o Ensino de Ciências vem se
modificando”.
O que se tem buscado atualmente no ensino de Ciências, é que este seja feito de
forma sistematizada e contextualizada, trazendo para sala de aula problemas
45
encontrados no dia-a-dia e procurando resolvê-los segundo conceitos técnicos e
científicos. Sendo assim o aluno podesair da passividade, passando a ser atuante no
processo, deixando de enxergar os conceitos científicos como algo distante de si e
exclusivo dos cientistas. Bizzo (2002, p. 136) complementa que “levar o aluno a
aprender a aprender é, de certa forma, a tarefa mais importante da escola”. O mesmo
autor ainda argumenta que:
Modificar a preparação das aulas, proporcionar momentos de auto-
reflexão aos estudantes, oferecer oportunidades para testar explicações e
refletir sobre sua propriedade, limites e possibilidades são atividades que
ensejarão uma forma muito diferente de ensinar e aprender ciências. Essa
nova forma de ensinar ciências demanda mudanças difíceis de serem
realizadas, mas que certamente valerão a pena. (BIZZO, 2002, p. 137)
Valerá a pena sim, se o ensino-aprendizagem for beneficiado, se o aluno souber
do que e o que está falando, e como está fazendo, pois a prática de sistematizar faz com
que o aluno internalize com mais facilidade os conteúdos ministrados em sala de aula.
2.2.1. Dificuldades do Ensino de Ciências
Segundo os PCN “o ensino de Ciências Naturais tem sido freqüentemente
conduzido de forma desinteressante e pouco compreensível”. (BRASIL, 1998, p. 26)
Certos alunos, por não conseguirem perceber o significado ou o valor daquilo
que estão estudando, principalmente quando o tema não é contextualizado, adquirem
dificuldades e até mesmo aversão à disciplina, chegando ao desinteresse, reprovação e
até mesmo ao abandono da escola. Dentre muitos, um dos principais problemas
relacionados ao ensino de Ciências é o elevado grau de abstração que os alunos têm que
adquirir para tentar aprender certas teorias e/ou modelos, distantes das idéias do senso
comum. E também, a não realização de experimentos que enfatizem ou ajudem na
construção de conceitos é evidenciada pela falta de espaço físico, de materiais, de
reagentes, de textos interessantes que tragam algo acerca das evoluções das idéias
científicas, com o passar dos tempos.
Destacamos ainda a dificuldade de o professor relacionar a matéria ministrada
em sala de aula ao cotidiano, ou com experiências trazidas pelo aluno, tendo este que
memorizar o conteúdo. uma desconexão entre as disciplinas; parece que uma não
depende da outra, e os professores também não levam isso em consideração. Não se
pode esquecer também que o ensino de Ciências é essencialmente efetivado de forma
46
livresca, não conferindo sentido à natureza e à Ciência, sonegando as inúmeras
interações existentes com o mundo do aluno, dando prioridade apenas e tão-somente a
um conteúdo desconectado da realidade social de quem irá usar o livro. Nesse sentido,
Carvalho e Gil-Pérez (2003, p. 21), corroboram, destacando que: Todos os trabalhos
investigados existentes mostram a gravidade de uma carência de conhecimentos da
matéria, o que transforma o professor em um transmissor mecânico dos conteúdos do
livro texto”.
É por esse motivo que se diz que o ensino de Ciências é efetivado de forma
livresca. O professor se refém do livro justamente por encontrar-se em uma posição
desconfortável em virtude da insuficiência em relação ao conhecimento da matéria.
2.2.2. O Ensino de Ciências no Ensino Fundamental
A história do ensino de Ciências no ensino fundamental no Brasil é
consideravelmente recente, é talvez por esse motivo que a formação de professores
desse nível de ensino, ainda hoje, se apresenta pouco assumida pelas universidades
brasileiras. O resultado é um momento histórico que leva a educação brasileira a
desempenhar baixíssimos resultados frente às outras nações. Em especial, podemos
notar que o ensino de Ciências passa, por situação bem pior, afinal, somos expectadores
de um ensino deficiente de Ciências, que leva o nosso país às últimas posições no
Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA)
24
.
Como vimos anteriormente, a disciplina de Ciências passou a ser obrigatória
no Brasil a partir da LDB 4.024/61, mas a formação inicial de professores para esse
nível de ensino passou a ser discutida e realizada na década de 70. O modelo de
formação de professores de Ciências sugerido na época foi o de curta duração, que foi
posteriormente alterado para licenciatura plena nas áreas das Ciências. Segundo
24
De acordo com a pesquisa da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico
(OCDE), que compara a qualidade da educação em 57 países, o desempenho médio dos estudantes
brasileiros de 15 anos, deixa o País em 52º lugar no ranking, em relação ao aprendizado em ciências.
As informações são do jornal Folha de S.Paulo (30 de novembro de 2007). Segundo a lista de 2007, a
Finlândia apresenta o melhor desempenho, seguida por Hong Kong e Canadá. O Brasil ficou à frente
apenas da Colômbia, Tunísia, Azerbaijão, Qatar e Quirguistão - que é o pior. Folha de São Paulo, 30 de
novembro de 2007.Disponível em:
<
http://noticias.terra.com.br/brasil/interna/0,,OI2114185-EI306,00.html>. Acesso em: 19 nov. 2007.
47
Krasilchik (1987), isso não proporcionou uma boa formação de professores para
lecionar no ensino fundamental.
A partir da década de 90, com o advento da Lei de Diretrizes e Bases da
Educação 9.394/96, dentre outros objetivos, tornou-se obrigatória a formação em
nível superior de cursos plenos para profissionais da educação (BRASIL, 1998). Com
isso, tem-se o encerramento de cursos de licenciaturas curtas, o que por si só não
resultou numa formação específica para os professores de Ciências para atuação no
ensino fundamental.
Não existindo mais uma formação de professores de Ciências, o ensino dessa
disciplina curricular passou a ser exercida pelo licenciado em Química, Física ou
Biologia, ou ainda, por profissionais de outras áreas afins como Nutrição, Engenharia,
Enfermagem, dentre outras. Esses profissionais são habilitados para a docência
mediante cursos de formação pedagógica. Os cursos de licenciatura em Química, Física
e Biologia, muitas vezes ocorrem de forma desarticulada da realidade e o professor,
geralmente, é formado para o ato de ensinar, que é visto como um momento e não como
um processo. Sobre isso, Durkheim (1975, p. 71) afirma que “para que compreendamos
o sistema de nosso tempo, não bastará considerá-lo tal como ele hoje se apresenta,
porque todo e qualquer sistema educativo é produto histórico, que a história pode
explicar”.
A situação nacional, em relação à formação de professores de Química e Física,
e também de outras disciplinas, não é muito diferente da do Estado de Mato Grosso. A
formação de licenciados em Química e Física, em relação a outras disciplinas do
currículo escolar brasileiro tende a não suprir a demanda para a função docente, o que
também ocorre com Biologia. No tocante a Mato Grosso, especificamente, observa-se
que a função docente para o ensino de Ciências no ensino fundamental de a série é
atribuída prioritariamente ao biólogo, eximindo dessa função o químico e o físico; no
entanto, esses profissionais também podem ensinar Ciências no ensino fundamental,
haja vista que a grade curricular desses dois cursos
25
apresenta disciplinas que garantem
formação condizente com o ensino de Ciências no ensino fundamental
26
.
Como é de conhecimento comum, embora todas as áreas sofram com a falta de
profissionais, as áreas de Química, Física e Matemática são as mais carentes. Em muitas
escolas mato-grossenses temos presenciado professores ministrando aulas não
25
Baseado no currículo da Licenciatura em Química e Física da Universidade Federal de Mato Grosso.
26
Dentre as disciplinas: Mineralogia, Bromatologia, Física, Biologia etc.
48
diretamente ligadas à sua formação; outros, com carga horária excessiva e alunos de
ensino médio se formando sem cursar Química ou Física, por falta de docentes para
assumirem a cadeira.
Nessa perspectiva, podemos então afirmar dentre esse processo histórico que o
ensino de Ciências no Brasil é recente, e que passou e continua passando por muitas
transformações.
Outro aspecto a ser considerado é o fato do ensino de Ciências estar muito
voltado ao livro didático, fazendo que o aluno estude de forma dirigida, sem poder
expressar suas vontades e/ou experiências vividas. Sabe-se também que de acordo com
o currículo escolar atual das escolas, em apenas um semestre da oitava série do ensino
fundamental o aluno começa a estudar formalmente a Química, embora muitos de seus
conceitos tenham sido superficialmente abordados em séries anteriores, na disciplina
de Ciências.
Para registrar a importância do estudo da Química nas séries anteriores à oitava
série, Chassot
27
(1992) (apud ZANON e PALHARINI, 1995, p.15) afirma que: “O
conhecimento químico deve permear toda a área de Ciências de a séries, e não se
restringir a um semestre isolado, no final do primeiro grau, onde em geral se antecipam
conteúdos do segundo grau”.
Neste contexto, aflora a necessidade de discutir a formação continuada do
professor, mostrando a importância de sua atualização profissional que o tornaria cada
vez mais preparado para o ensino e para o mercado de trabalho. Essa questão é discutida
no item seguinte.
2.3. A FORMAÇÃO CONTINUADA DOS PROFESSORES DE CIÊNCIAS
Conforme o panorama apresentado sobre a docência de Ciências no ensino
fundamental, podemos observar que atualmente existe um desinteresse generalizado
pelos cursos de licenciatura e pela carreira docente. Em pesquisa realizada no
Laboratório de Pesquisa em Ensino de Química (MELLO et al., 2008), sobre a
perspectiva dos calouros do curso de Licenciatura Plena em Química da UFMT, sobre a
profissão docente, obteve-se resultados preocupantes. A maioria dos licenciandos em
27
CHASSOT, A. I. Para que(m) é útil o ensino de química. Espaço da Escola. Ijuí: UNIJUÍ, n.5, p. 43-
51, 1992.
49
início de curso declara que a intenção não é ser professor no futuro e que o fato de
fazerem uma licenciatura vincula-se a uma segunda opção na carreira profissional. Em
outros termos, os licenciados desejam trabalhar na área técnica em Química, mas caso o
mercado não esteja ‘aquecido’ nessa área, então a opção é ‘dar aula’. Baseados nessa
realidade mato-grossense, a pergunta que fazemos é a seguinte: a que se deve esse
desinteresse pela Licenciatura em Química e pela carreira docente?
Devemos reconhecer que a profissão docente não tem se mostrado atraente de
modo geral, tal fato decorre certamente de situações como: formação inadequada,
baixos salários, precária condição de trabalho, carga horária excessiva, além de falta de
condições para a formação continuada. Gatti (2000), ao se referir à evasão nos cursos de
Licenciatura afirma que, se por um lado podemos pensar que essa evasão se deve a
problemas ligados à forma como estes cursos são oferecidos, por outro, esse fator,
associado às péssimas perspectivas de carreira, potencializa em muito a verdadeira
deserção que se opera nos cursos de formação de professores, a intensificação da baixa
procura pelos mesmos e as desistências quando já estão no exercício da profissão.
Ademais, a falta de uma política voltada para a formação de professores e para a
educação em geral contribui para o agravamento da situação.
Nos discursos políticos tais temas aparecem como meta prioritária, mas o que se
vê, e ouve mesmo é a falta de interesse para com a educação e a profissionalização
docente. O fato é que a profissionalização docente se inicia com a formação e continua
no exercício da profissão, sendo uma conquista gradativa e coletiva; no entanto, também
depende da possibilidade dos professores construírem “um saber pedagógico que não
seja puramente instrumental” (NÓVOA, 1999, p. 15).
Diante da incapacidade das Licenciaturas em formar adequadamente o professor
de Ciências, para lidar com as situações de sala de aula, surgem movimentos que
buscam completar essa formação inicial. Assim, na década de 80 vimos ser dada grande
ênfase à formação continuada ou contínua de professores, sendo promovidos cursos que
foram denominados de reciclagem”, ‘capacitação’ e ’treinamento’, criando uma visão
de que esses cursos seriam a solução para os problemas enfrentados no cotidiano da sala
de aula. No entanto, o que se verificou foi que esses cursos ocorriam de forma
aligeirada e não tinham continuidade, tornando-se momentos estanques. Segundo Gatti
(2000), os cursos de formação continuada deveriam servir para ampliar os horizontes de
conhecimento dos professores, habilitando-os para lidarem com inovações de sua área,
mas o que acontece na verdade é que ela serve para ‘aprimorar’ a má formação inicial.
50
É ainda persistente entre muitos docentes e profissionais, a idéia de que basta ter
um curso superior que a vaga estaria garantida nas áreas de trabalho, e isso seria
suficiente para desempenhar as ações com competência. Sabe-se, porém, que as coisas
não são assim. Se não houver constante atualização, o profissional corre o risco de se
tornar inadequado e defasado para o mercado de trabalho. Não na área de Ciências,
mas em todas elas. O mercado de trabalho requer profissionais cada vez mais
preparados. Em virtude desse fato, as pessoas terão que se atualizar continuamente e,
para isso, as universidades e/ou outros centros, terão que criar projetos de formação
continuada para o público-alvo.
É muito importante também que um curso de formação continuada seja útil para
o professor, no sentido de haver uma relação com a questão da mudança das práticas
profissionais do mesmo.
Ao tratar da formação continuada, Mizukami (2002, p. 26), afirma que:
Ao longo dos últimos anos, nas discussões sobre formação
continuada vem-se questionando a oferta, pela universidade e por outras
agências, de cursos de curta duração (30-180 horas) como meio efetivo para
a alteração da prática pedagógica. Esses cursos, quando muito, oferecem
informações que, algumas vezes, alteram apenas o discurso dos professores
e pouco contribuem para a mudança efetiva.
Diante do exposto, não basta participar de um curso e adquirir mais um
certificado, vale a pena dele tirar proveito e levar para a escola o melhor possível
daquilo que aprendeu, partilhando-o com os demais componentes. Portanto a formação
continuada é muito importante, desde que tenha seus objetivos em sintonia com a escola
e que os participantes extraiam dela sua essência.
Carvalho e Gil-Pérez (2003, p. 18) enfatizam que:
O Trabalho docente tampouco é, ou melhor, não deveria ser uma
tarefa isolada, e nenhum professor deve se sentir vencido por um conjunto
de saberes que, com certeza, ultrapassam as possibilidades de um ser
humano. O essencial é que possa ter-se um trabalho coletivo em todo o
processo ensino/aprendizagem: da preparação das aulas até a avaliação.
Nessa perspectiva de entendimento, a união entre os professores, a troca de
informações, e a harmonia entre as disciplinas é muito importante em todos os
momentos, principalmente quando um professor volta de um curso de formação
continuada. É interessante para a instituição que pertence, o repasse daquilo que
aprendeu, para uma melhor busca na construção da qualidade de ensino.
51
Candau (1996), mais de uma década já alertava que a busca da construção de
qualidade e de uma educação básica comprometida com a formação para a cidadania
exigem necessariamente repensar a formação de professores, tanto no que se refere à
formação inicial como a formação continuada.
A formação continuada significa proporcionar novamente aos professores o
estudo, significa para ele não ficar apenas e tão-somente trancado entre quatro paredes,
lecionando sem ir à busca de conhecimentos. Desse modo, deixar os estudos de lado
significa parar no tempo e, como conseqüência, perder espaço no acirrado mundo do
trabalho. O professor deve estar consciente de que sua formação deve ser permanente, e
integrada no dia-a-dia das escolas.
Conforme Nóvoa (1997, p. 26) “a troca de experiências e a partilha de saberes
consolidam espaços de formação mútua, nos quais cada professor é chamado a
desempenhar, simultaneamente, o papel de formador e de formando”.
Essa troca de experiência se no curso de formação inicial, no de formação
continuada e também nas escolas. Não adianta um professor participar de um curso e
não compartilhar com o grupo de professores da escola aquilo que lhe foi ensinado.
Esse repasse de experiências é muito importante, uma vez que para um curso de
formação continuada não podem sair todos os professores.
Candau (1996), afirma que na perspectiva ‘clássica’ da formação de professores,
a grande maioria dos projetos ênfase à ‘reciclagem’, e esta privilegia como lócus a
Universidade, ou outros centros articulados com ela, locais esses que, supõe-se,
adquirem o avanço científico e profissional, deixando à margem as escolas de educação
básica.
A mesma autora reage contrariamente a essa concepção ‘clássica’. Pensando em
caminhos para uma nova perspectiva de formação continuada, adota três teses que
retratam os eixos de investigação, são eles:
- O locus da formação a ser privilegiado é a própria escola; isto é, é
preciso deslocar o locus da formação continuada de professores da
universidade para a própria escola de primeiro e segundo graus;
- Todo processo de formação continuada tem que ter como
referência fundamental o saber docente, o reconhecimento e a valorização
do saber docente;
- Para um adequado desenvolvimento da formação continuada, é
necessário ter presentes as diferentes etapas do desenvolvimento profissional
do magistério; não se pode tratar do mesmo modo o professor em fase inicial
do exercício profissional, aquele que conquistou uma ampla experiência
pedagógica e aquele que se encaminha para a aposentadoria; os
problemas, necessidades e desafios são diferentes e os processos de
52
formação continuada não podem ignorar esta realidade promovendo
situações homogêneas e padronizadas, sem levar em consideração as
diferentes etapas do desenvolvimento profissional. (CANDAU, 1996, p.
143)
Quanto ao eixo, não a Universidade pode gerar avanço científico e
profissional; o dia-a-dia na escola também é um lócus muito rico de formação, e supera
o modelo “clássico”, passando a ser uma nova perspectiva na área de formação
continuada de professores, pois ninguém melhor que o professor para conhecer seu
cotidiano, sua clientela, seu local de trabalho etc. Nessa perspectiva, segundo Nóvoa
28
(1991) (apud CANDAU, 1996, p.144):
A formação continuada deve estar articulada com o desempenho
profissional dos professores, tomando as escolas como lugares de referência.
Trata-se de um objetivo que adquire credibilidade se os programas de
formação se estruturarem em torno de problemas e de projetos de ação e não
em torno de conteúdos acadêmicos.
Quanto ao segundo eixo, é importante valorizar de modo especial os saberes da
experiência do professor, onde esse dialoga com as disciplinas e com os saberes
curriculares.
O terceiro eixo declina a reflexão sobre o ciclo de vida profissional de
professores. Trata-se de um processo heterogêneo; as necessidades, as dificuldades, as
peculiaridades, as ansiedades, as buscas são diferentes dependendo do momento de seu
exercício profissional. Candau (1996, p. 149) afirma que:
Essa preocupação com o ciclo de vida profissional dos professores
apresenta para a formação continuada, o desafio de romper com modelos
padronizados e a criação de sistemas diferenciados que permitam aos
professores explorar e trabalhar os diferentes momentos de seu
desenvolvimento profissional de acordo com suas necessidades específicas.
Nesse sentido, é importante que a formação continuada leve em consideração as
diferentes fases da vida profissional dos professores, não pode considerar que esses se
encontrem no mesmo patamar. Tal realidade não pode ser ignorada, pois cada fase
possui sua peculiaridade.
28
NÓVOA, A. Concepções e práticas da formação contínua de professores. In: NÓVOA, A. (org).
Formação contínua de professores: realidade e perspectivas. Aveiro: Universidade de Aveiro, 1991.
53
2.4. A QUÍMICA NO ENSINO FUNDAMENTAL
Como é amplamente divulgado e conhecido pelos professores, no ensino de
Ciências no ensino fundamental, os conteúdos (referentes ao mundo natural) são
apresentados na maioria dos casos de forma fragmentada (igualmente nos livros
didáticos): na série tem-se o ambiente (ar, água e solo); na série têm-se os seres
vivos; na série o assunto básico é corpo humano; e na série, aparece a Química e
Física. Assim, uma organização por área do conhecimento e não por disciplinas, o
que certamente leva a crer que seja essencial o estabelecimento de vínculos entre as
abordagens dos conteúdos de áreas específicas. Contudo, essa conexão quase nunca é
respeitada no ensino fundamental e o que se comumente é uma justaposição de
conteúdos sem relação entre eles, o que por sua vez, poderá dificultar a construção de
modelos explicativos mais consistentes e coerentes no aprendizado das Ciências
Naturais.
Lima e Silva (2007, p. 91), alertam para o fato de que a Química vem sendo
tratada no ensino fundamental “a partir de um número excessivo de informações
justapostas, que prioriza a nomenclatura das substâncias, bem como a representação de
suas estruturas e equações, em detrimento do entendimento de seu significado”. As
autoras continuam a argumentar que “lida-se com os conteúdos da Química como se os
nomes das coisas e suas representações pudessem anteceder ou substituir a compreensão
das mesmas” (2007, p. 91). Além dessas preocupações postas por Lima e Silva, pode-se
ainda relevar como aspecto importante a ausência de contextualização no ensino
fundamental de Química. Nesse sentido, ao tratar da questão da Química no ensino
fundamental Zanon e Palharini (1995), afirmam que, quando não se contextualiza
adequadamente o conhecimento químico, o seu entendimento torna-se um tanto quanto
fragilizado, pois o aluno não consegue enxergar o significado ou o valor dos mesmos
para sua vida. Nesse caso, o aluno não se sente atraído e/ou motivado a assistir uma aula
que não o envolva com seu dia-a-dia.
As autoras afirmam ainda que “aprender é relacionar: quanto mais se relaciona,
mais se aprende de forma significativa” (1995, p. 18). Porém, a dificuldade em
relacionar conteúdos químicos com eventos do cotidiano pode estar presente tanto no
aluno como no professor, e sabemos que essa não é uma tarefa fácil. Classificam tal fato
de ‘analfabetismo químico’ – quando lacunas são deixadas na formação das pessoas.
54
Destacam ainda, que os professores de Ciências apresentam formação deficiente
em Química “sim”, no entanto, lembram que “a reflexão sobre as práticas é uma forma
de melhorá-las” (1995, p. 15). Por isso enfatizam com veemência a necessidade e a
possibilidade da Química tão presente em nossas vidas ser contemplada ao longo do
ensino fundamental, e não começar tardiamente na rie do ensino fundamental, o
que reforça a colocação feita por Chassot (1992), citado no item 2.2.2.
Ainda, Zanon e Palharini (1995), afirmam que o aluno, sem usar a palavra
Química, pode nela, com prazer, mergulhar usando as terminologias químicas partindo
para um estudo centrado na compreensão e o na memorização principalmente de
fórmulas, nomenclaturas, simbologias, modelos teóricos, equações, reações; tendo o
objetivo apenas e tão-somente em usar os conhecimentos do seu dia-a-dia, e por meio
desses discutir e reelaborar novos conceitos básicos. Sendo isso que se espera para um
Ensino Fundamental de qualidade.
Dessa forma, Bizzo [S.d.] considera algumas importantes vertentes para o ensino
de Ciências que serão discutidas no item seguinte.
2.5. AS VERTENTES DO ENSINO DE CIÊNCIAS
Pode-se considerar que o ensino de Ciências apresenta cinco vertentes bem
definidas, são elas: semanticista, logicista, historicista, recapitulacionista e investigativa.
A seguir passamos a explicar cada uma dessas vertentes, segundo Bizzo. ([S.d.], p. 5-9)
A vertente semanticista prioriza o domínio da terminologia da Ciência para,
depois, dominar o conhecimento científico. O ensino de Ciências seria para a criança
uma espécie de preparo para futuras aprendizagens, em que ela aprende lenta e
paulatinamente a terminologia necessária para ser utilizada num posterior grau de
aprendizado. A criança deve ter um conhecimento prévio da terminologia, para mais
tarde fazer uso dela com mais domínio.
a vertente logicista prioriza a ‘sintaxe’ da Ciência, deixando a semântica para
segundo plano. “A compreensão dos conceitos científicos e da normatividade do
conhecimento científico através da apreensão de sua lógica interna seriam os objetivos
centrais dessa proposta”(BIZZO, [S.d.], p. 6). A formação de atitudes seria o objetivo
do ensino da criança, nessa proposta.
55
A historicista é a vertente que possui dimensão prática reduzida, porém
sofisticada formulação teórica. Aqui a apreensão da lógica interna do conhecimento
científico é viável por meio do resgate da trajetória da construção desse
conhecimento pela humanidade.
Quanto à vertente recapitulacionista, ela orienta que a estrutura básica do
conhecimento da criança deve ser vivenciada pela criança. Ademais, na investigativa, o
conteúdo do trabalho é investigado pelo aluno, e por outro lado o modo de compreender
o conteúdo é estudado pelo professor.
Diante disso, faz-se necessário discutir um pouco acerca das necessidades
formativas dos professores de Ciências.
2.6. AS NECESSIDADES FORMATIVAS DOS PROFESSORES DE CIÊNCIAS
NATURAIS
Carvalho e Gil-Pérez (2003, p. 14-63), consideram a existência de nove
necessidades formativas do professor, a saber: 1) A ruptura com visões simplistas sobre
o ensino de Ciências; 2) Conhecer a matéria a ser ensinada; 3) Questionar as idéias
docentes de ‘senso comumsobre o ensino e aprendizagem das Ciências; 4) Adquirir
conhecimentos teóricos sobre a aprendizagem das Ciências; 5) Saber analisar
criticamente o ensino tradicional; 6) Saber preparar atividades capazes de gerar uma
aprendizagem afetiva; 7) Saber dirigir o trabalho dos alunos; 8) Saber avaliar; e, 9)
Adquirir a formação necessária para associar ensino e pesquisa didática.
A primeira necessidade mencionada por Carvalho e Gil-Pérez (2003), demonstra
que romper com visões simplistas significa que não basta o professor ter um bom
conhecimento da matéria, da prática e de alguns complementos psicopedagógicos; é
necessário também que os professores se familiarizem com as contribuições da pesquisa
e inovações didáticas. Nós, professores, ainda não nos conscientizamos das nossas
insuficiências e que necessitamos de uma adequada formação. Insuficiência essa que
molda o professor como um mero transmissor de conhecimento, pois ele não produz
conhecimento, apenas repassa aquilo que já foi produzido por terceiros. Tudo muda de
figura quando um grupo de professores absorve uma gama de conhecimentos
necessários apontados pela pesquisa, deixando à margem a visão simplista do ensino de
Ciência. Nesse momento de agregação, debates, reflexão de suas produções, eles
56
aproximam-se da comunidade científica. Uma docência de qualidade existe quando é
abordado coletivamente o que se deve ‘saber’ e ‘saber fazer’; principalmente, que isso
esteja voltado para a aprendizagem do aluno. Trata-se de uma tarefa coletiva em todo
processo de ensino/aprendizagem, de inovação, pesquisa e formação permanente. Desta
forma a inércia de um ensino monótono, desanimado, sem perspectiva será rompida,
dando vazão à criatividade e ao potencial que possui o docente.
A necessidade de conhecer a matéria a ser ensinada é muito importante, porém
não é o suficiente, pois quando o professor possui uma carência ou deficiência do
conhecimento da matéria, ele se torna refém do livro texto, sendo considerado como um
mero transmissor dos conteúdos existentes. É preciso que o professor conheça a matéria
a ser ensinada, mas isso não é tudo, deve também conhecer a história das Ciências; as
orientações metodológicas empregadas na construção dos conhecimentos; as interações
CTS; os recentes desenvolvimentos científicos e suas perspectivas, e em função de
mudanças curriculares e avanços científicos, deve ter preparação para adquirir novos
conhecimentos.
A terceira necessidade se esbarra no primeiro entrave para uma atividade
docente inovadora e criativa, que é a ausência de conhecimentos científicos; e o
segundo é o ‘pensamento docente de senso comum’. Este último é adquirido de forma
não reflexiva. A idéia do senso comum pode certamente bloquear a capacidade de um
ensino renovado e criativo. Os professores devem ser favorecidos com um trabalho de
mudança didática que os leve a uma mudança de suas perspectivas, transformando sua
atividade em um trabalho criativo de pesquisa e inovação.
Para adquirir conhecimentos teóricos sobre a aprendizagem das crianças, é
preciso que a formação docente tenha uma orientação teórica que ultrapasse o
conhecimento de recursos e ‘estilo de ensino’ ou da obtenção de habilidades específicas.
A quinta necessidade formativa do professor de Ciências é saber analisar
criticamente o ensino tradicional’; ainda hoje se nas aulas de Ciências as mesmas
coisas que 60 anos. Nesta necessidade formativa, é necessário uma formação de
professor como uma mudança didática, conscientizando da formação docente adquirida
ambientalmente e oferecer alternativas viáveis. Os professores então analisam
criticamente os materiais didáticos que vêm prontos e acabados, sem levar em
consideração os conhecimentos prévios dos alunos, os exercícios e problemas
resolvidos são caracterizados como receitas.
57
No caso de saber preparar atividades capazes de gerar uma aprendizagem
efetiva, a atividade deve proporcionar uma concepção, uma idéia da tarefa a ser
realizada, e que esta lhe desperte interesse e prazer, para que haja compreensão
profunda da matéria e da própria natureza da Ciência. Exige aqui um trabalho coletivo
de inovação e pesquisa.
O trabalho do professor não se restringe apenas e tão-somente em ministrar
aulas, mas também a necessidade em saber dirigir o trabalho dos alunos. O fato de
orientar a aprendizagem como uma pesquisa requer muitas mudanças no papel do
professor, e novas exigências formativas, inclusive o professor deixa de ser um mero
transmissor de conhecimento, assumindo a posição de orientador sem, contudo, levar à
execução de ‘trabalhos forçados’. O professor deve sempre primar por um bom e
adequado ambiente de trabalho e mostrar também que tem interesse pela tarefa a ser
desenvolvida.
A penúltima necessidade formativa do professor de Ciências, segundo Carvalho
e Gil-Pérez (2003) é saber avaliar. O professor é também responsável pelos resultados
do aluno. O professor deve mostrar-se interessado pela promoção do aluno, e salientar
que trabalhando de forma adequada os resultados serão melhores. A avaliação é
transformada num efetivo instrumento de aprendizagem quando os professores
entendem os aspectos conceituais, de procedimentos e atitudes da aprendizagem das
Ciências. Ressalta-se ainda que toda avaliação tem que ser acompanhada de feedback,
para que o aluno entenda onde errou, e não persista no mesmo erro. Portanto, a
avaliação deve ser vista como uma fase positiva da aprendizagem, como um
instrumento de melhoria do ensino, e não como um simples julgamento dos alunos.
A última necessidade é que o professor de Ciências deve adquirir a formação
necessária para associar ensino e pesquisa didática. O professor deve possuir
experiência de tarefa investigativa, para poder orientar com mais eficiência a
aprendizagem de pesquisa dos alunos.
Para dar continuidade e ampliação à discussão sobre os conhecimentos
necessários ao professor de Ciências Naturais, no próximo capítulo apresentamos uma
reflexão sobre os conhecimentos docentes, perpassando pelos enfoques e tipologias,
pelos conhecimentos docentes na perspectiva de alguns autores, até a elaboração de uma
referência sob a perspectiva de um autor com os conhecimentos de Química.
58
CAPÍTULO III
CONHECIMENTOS DOCENTES
“O que me interessa agora, repito, é alinhar e discutir alguns saberes
fundamentais à prática educativo-crítica ou progressista e que, por isso
mesmo, devem ser conteúdos obrigatórios à organização programática da
formação docente. Conteúdos cuja compreensão, tão clara e tão lúcida
quanto possível, deve ser elaborada na prática formadora. É preciso,
sobretudo, e aí já vai um destes saberes indispensáveis, que o formando,
desde o princípio mesmo de sua experiência formadora, assumindo-se
como sujeito da produção do saber, se convença definitivamente de que
ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a
sua produção ou a sua construção”.
Paulo Freire
Na década de 80 aconteceu na América do Norte, sobretudo nos Estados Unidos
e Canadá, um movimento reformista da formação inicial de professores da educação
básica, que tinha como objetivo conseguir um status profissional para os profissionais
da educação. A partir disso, muitos pesquisadores foram mobilizados a investigar e
sistematizar os saberes dos professores, partindo do pressuposto que existe uma ‘base de
conhecimentos/saberes’ necessários ao ensino. A partir disso, deu-se início então à
tentativa de compreender a gênese da atividade docente, para convalidar um corpus de
conhecimentos que são mobilizados pelos professores em suas atividades educacionais.
Essa reforma teria influenciado vários países europeus, chegando então à América
Latina. O que se compartilhava era a crença de que a base de conhecimento permitiria
estruturar a educação do professor e instruiria diretamente as práticas de formação
(ALMEIDA e BIAJONE, 2007).
59
Nos diferentes países que vivenciaram esse movimento de reforma, os objetivos
comuns, segundo Borges e Tardif (2001) seriam, dentre outros: o conceber o ensino
como uma atividade profissional que se apóia num sólido repertório de conhecimentos;
considerar os professores como práticos reflexivos, sendo a formação um lugar de
produção de saberes.
Esse movimento desencadeou um processo de grande produção científica.
Assim, a cada ano, é publicado um número significativo de artigos e/ou trabalhos sobre
o tema, nos mais diferentes países (BORGES, 2001).
Ainda na década de 80, nesse contexto reformista da formação inicial de
professores, surge como campo de pesquisa em âmbito internacional, o Knowledge
base. Segundo Shulman (1987), em ensino, Knowledge base base de conhecimento
é o corpo de compreensões, conhecimentos, habilidades e disposições de que um
professor necessita para atuar efetivamente numa dada situação de ensino.
uma variedade considerável de produções a respeito do Knowledge base,
partindo de concepções e metodologias variadas. Por isso, nesta dissertação, apresentar-
se-á as concepções sobre conhecimentos/saberes da docência na perspectiva de três
autores
29
, a saber: Gauthier, Tardif e Shulman. As questões levantadas por esses autores
serão estudadas com mais detalhes nos itens seguintes.
3.1. CONHECIMENTOS DOCENTES: IDENTIFICANDO ENFOQUES E
TIPOLOGIAS
Autores como Shulman (1987), Giroux (1997), Gauthier (1998), Perrenoud
(2000), Sacristán e Gómez(2000), Gómez (1992), Zeichner (2000), Shön (2000), Tardif
(2002), dentre outros, dedicam seus estudos à formação de professores abordando os
diversos saberes que compõem a vida profissional, discutem a prática educativa,
focalizando o professor investigativo, reflexivo, político, dialógico e intelectual.
Para iniciar um diálogo sobre os conhecimentos docentes, faz-se necessário um
breve esclarecimento sobre as questões terminológicas utilizadas nos diferentes estudos
consultados dos autores supracitados, quanto ao uso da palavra ‘conhecimentos’ e
‘saberes docentes’. No rol de autores que fazem a opção pelo uso de ‘saber docente’
29
O critério de escolha desses autores baseou-se no fato desses produzirem trabalhos que são
considerados sínteses e marcos importantes na literatura referente à temática.
60
encontramos Maurice Tardif, e dentre os que utilizam o ‘conhecimento docente’
podemos citar L. Shulman. Segundo o novo Dicionário Aurélio, (FERREIRA, 1975, p.
1254) ‘saber’ significa “Ter conhecimento” e ‘conhecimento’ significa “erudição,
saber”. Sendo desse modo, no presente estudo não faremos distinção ao uso, porque
concebemos que não diferenças que justifiquem uma opção. Contudo, procuramos,
tanto quanto possível, respeitar as escolhas dos autores utilizados nas citações efetuadas
neste trabalho.
Para discutir sobre os saberes necessários aos professores é importante destacar,
de antemão, os saberes da prática educativa escolar, que pode ser concebida como a
experiência construída em sala de aula, ou ainda, como diria Schön (2000, p. 28)
“conhecimento tácito”, ou “saber mais do que se pode dizer”. Assim, considera-se que o
saber esteja presente em nossas vidas, em nosso cotidiano, em nossas experiências. Está
implícito nas ações humanas. Nesse mesmo raciocínio, pode-se considerar então que
também na prática docente temos um saber relacionado ao ‘conhecimento tácito’,
conforme comentado por Schön (2000), um saber pedagógico espontâneo, cotidiano,
experencial. Ainda para Schön (2000, p. 36) “uma prática é feita de fragmentos de
atividades, divisíveis em tipos mais ou menos familiares, cada um dos quais sendo visto
como vocação para o exercício de certo tipo de conhecimento”.
O autor denomina esses conhecimentos como ‘conhecer-na-ação’, em outros
termos, muitas vezes conhecemos muito bem as nossas ações pedagógicas, mas não
conseguimos torná-las verbalmente explicáveis. O nosso ato de conhecer estaria na
ação, oriundo do contexto das instituições com os quais efetuamos trocas de
significados e com outros profissionais, ou seja, no ambiente da escola, com todas as
suas possibilidades de vivências. Desse modo, aprendemos as convenções, regras,
limites nesse ambiente da prática. Segundo Schön (2000, p. 39), “quando alguém
aprende uma prática, é iniciado nas tradições de uma comunidade de profissionais que
exercem aquela prática e no mundo prático que eles habitam”.
Tardif (2002, p. 38), que estuda a questão dos saberes experenciais, afirma que:
Os próprios professores, no exercício de suas funções e na prática
de sua profissão, desenvolvem saberes específicos, baseados em seu trabalho
cotidiano e no conhecimento do seu meio. Esses saberes brotam da
experiência e são por ela validados. Eles incorporam-se à experiência
individual e coletiva sob a forma de habitus e de habilidades, de saber-fazer
e de saber-ser.
61
Na perspectiva desse autor, os saberes experenciais englobam outros
saberes. Tardif (2002), ao analisar os saberes experenciais dos professores aponta
algumas características, tais como: o saber experencial do professor é personalizado,
complexo, não-analítico, social, temporal, dinâmico; que se desenvolve no âmbito de
uma carreira, de uma história de vida profissional. Sendo assim, pode-se considerar que
o saber experencial complementa os demais saberes, afinal nesse tipo de saber estariam
teoricamente contidos os saberes construídos na prática docente e na vida cotidiana.
Cabe ressaltar que o presente trabalho não enfatizará longamente o saber
experencial, pois esse não foi explorado na coleta de dados deste estudo, embora haja a
compreensão que esse saber encontra-se ligado às funções dos professores e poderá
comparecer em momentos específicos que o justifiquem nesta dissertação.
Após essas primeiras considerações, apresentaremos então as concepções e
tipologias sobre os conhecimentos da docência sob as perspectivas de Gauthier, Tardif e
Shulman, sem a intenção de descrever detalhadamente as diferentes tipologias e
classificações de todo esse campo de pesquisa, haja vista não ser objetivo deste
trabalho.
Na busca pelo entendimento de enfoques e tipologias do conhecimento docente,
começaremos citando Gauthier
30
(1998), o qual afirma que ainda se sabe muito pouco a
respeito dos fenômenos que são inerentes ao ensino. E para o autor, ir adiante na
pesquisa de conhecimentos nos remete a enfrentar dois obstáculos: o de um ofício sem
saberes e o de saberes sem ofício.
O primeiro, ofício sem saberes, refere-se à atividade docente que é exercida sem
revelar os saberes que lhe são inerentes. Apesar do ensino ser uma atividade que se
pratica desde a antiguidade, se sabe muito pouco sobre o mesmo, contribuindo dessa
forma para uma cegueira conceitual. Sabe-se também que são essenciais aos docentes,
os saberes referentes ao conteúdo, à experiência e à cultura, mas não são exclusivos, e
se dessa forma agir, o docente contribuirá para manter o ensino na ignorância.
O segundo obstáculo refere-se aos saberes sem ofício, que são os conhecimentos
produzidos nos centros acadêmicos, e muitos desses conhecimentos foram produzidos
sem levar em conta a realidade do exercício do magistério, desconsideram inúmeras
variáveis que o professor encontraria na sala de aula real, que com certeza interferem no
processo ensino-aprendizagem. Portanto, as Ciências da Educação muitas vezes
30
Clermont Gauthier é professor titular de Psicologia Educacional na Faculdade de Ciências da
Educação, na Universidade Laval – Canadá.
62
produzem saberes que não condizem com a prática docente, com a sua realidade no
exercício da profissão.
Gauthier (1998), afirma que o desafio da profissionalização docente é evitar
esses dois erros: ofício sem saberes e saberes sem ofício. Ele, então, propõe um ofício
feito de saberes, que contempla vários saberes que são mobilizados pelo professor e sua
prática, envolvendo o saber: a) Disciplinar, referente ao conhecimento do conteúdo a
ser ensinado; b) Curricular, relativo à transformação da disciplina em programa de
ensino; c) Ciência da Educação, relacionado ao saber profissional específico que não
está diretamente relacionado à ação pedagógica; d) da Tradição Pedagógica, relativo ao
saber de dar aulas que será adaptado e modificado pelo saber experencial, podendo ser
validado pelo saber da ação pedagógica; e) da Experiência, referente aos julgamentos
privados responsáveis pela elaboração, ao longo do tempo, de uma jurisprudência de
truques etc.; f) da Ação Pedagógica, referente ao saber experencial tornado público e
testado.
Ainda para esse autor, os saberes docentes são adquiridos e mobilizados para o
ou no trabalho com exclusividade ao ensino e ao seu ofício, exigindo uma prática
reflexiva do docente. Percebe-se que o professor passa a ser visto como um profissional,
isto é, aquele que provido de saberes e, ao confrontar-se com situações inesperadas que
não dependem simplesmente da aplicação dos saberes para que se resolva, consegue
deliberar, julgar e decidir acerca da situação durante todo o processo do ato pedagógico.
Uma outra contribuição na compreensão dos saberes docentes é a destacada por
Tardif
31
(2002, p. 11), quando afirma que tratar do saber significa relacioná-lo com as
condições de sua origem e com o contexto do trabalho: “o saber é sempre o saber de
alguém que trabalha alguma coisa no intuito de realizar um objetivo qualquer”. Nesses
termos, o autor complementa:
O saber dos professores é o saber deles e está relacionado com a
pessoa e a identidade deles, com sua experiência de vida e com a sua história
profissional, com as suas relações com os alunos em sala de aula e com os
outros atores escolares na escola, etc. Por isso, é necessário estudá-lo
relacionando-o com esses elementos constitutivos do trabalho docente.
31
Maurice Tardif, pesquisador canadense conhecido internacionalmente, é professor titular na
Universidade de Montreal, onde dirige o mais importante centro de pesquisa canadense sobre a
profissão docente. Ele é filósofo e sociólogo de formação, e seus trabalhos são traduzidos e publicados
em vários países.
63
Para Tardif (2002), todo saber quando atinge um certo grau de desenvolvimento
e sistematização é integrado aos processos de formação institucionalizados. Assim,
quanto mais experiência tiver o professor em sua profissão, mais enriquecedor tornará
esse saber. Segundo o mesmo autor (2002, p. 36), pode-se definir saber docente como:
“um saber plural, formado pelo amálgama, mais ou menos coerente, de saberes oriundos
da formação profissional e de saberes disciplinares, curriculares e experenciais”. Cabe
ressaltar que os saberes profissionais são compreendidos por Tardif (2002, p. 36), como:
[...] um conjunto de saberes transmitidos pelas instituições de
formação de professores (escolas normais ou faculdades de ciências da
educação). O professor e o ensino constituem objetos de saber para as
ciências humanas e para as ciências da educação.
Nos textos de Tardif (2002), percebe-se uma valorização da pluralidade e a
heterogeneidade do saber docente, destacando-se a importância dos saberes da
experiência, como comentamos anteriormente. Os ensaios apresentam características
dos saberes profissionais segundo a epistemologia da prática profissional dos
professores, ou seja, o conjunto de saberes utilizados realmente pelos profissionais em
seu espaço de trabalho cotidiano para desempenhar as suas atividades.
Tipologicamente Tardif (2002), classifica os saberes docentes em: saberes da
formação profissional (conjunto de saberes transmitidos pelas instituições formadoras);
saberes disciplinares (correspondentes aos diversos campos do conhecimento sob a
forma de disciplina, são saberes sociais definidos e selecionados pela instituição de
ensino superior); saberes curriculares (discursos, objetivos, conteúdos e métodos a
partir dos quais a instituição escolar categoriza e apresenta os saberes sociais por ela
definidos e selecionados como modelos da cultura erudita); e, saberes experenciais
(aqueles que surgem da experiência e são por ela validados, incorporando experiência
individual e coletiva sob a forma de habitus e de habilidades, de saber-fazer e de saber-
ser).
Vale ressaltar que, para Tardif(2002)
32
e colaboradores (apud SANTOS, 2002),
os saberes da experiência seriam o núcleo vital do saber docente, uma vez que os outros
saberes docentes, como os saberes pedagógicos, saberes das disciplinas e saberes
curriculares, mantêm uma relação de exterioridade com a prática docente, pois não
foram produzidos no interior dessa prática. Assim, os saberes da experiência seriam
32
TARDIF, M. Saberes docentes e a formação profissional. 5. ed. Petrópolis: Vozes, 2002.
64
como filtro, por meio do qual os outros saberes seriam avaliados, eliminando aquilo que
não tem aplicação na realidade onde o docente atua e conservando o que lhe pode ser
útil e aplicável. Pode-se considerar dessa forma que, os saberes da experiência não
seriam então apresentados com um corpo sistematizado de conhecimento, mas são
partes constituintes da prática, formando “um conjunto de representações a partir das
quais o(a)s professor(a)s interpreta(m) e orienta(m) sua profissão e sua prática cotidiana
em todas as suas dimensões” (idem, p. 99).
Por ser um saber que sempre foi visto pertencente apenas aos professores em
suas realidades de ensino, o saber da experiência, pouco era considerado em trabalhos
científicos. De alguns anos pra cá, contudo, esse saber passou a ser objeto de estudo dos
pesquisadores educacionais. Diante dessa intensificação do interesse dos pesquisadores
sobre esse saber, Santos (2002, p. 100), pondera “se esses novos discursos sobre a
prática, sobre os saberes da experiência, além da busca da explicitação de seus
significados não estariam também criando mecanismos de controlá-los”. Além disso,
apresenta uma questão de natureza ética: “os estudos da prática docente colocam a
descoberto ‘macetes/truques’ utilizados pelos professores para sobreviver às imensas
dificuldades postas pelo cotidiano. Trazer isso a público não desgastaria a imagem
pública do magistério?” (idem, p. 100). Dentre várias outras, essas seriam algumas das
razões pelas quais o presente estudo não optou em analisar os dados coletados
utilizando a tipologia de Tardif.
Outro autor relevante no campo dos saberes docentes é Lee Shulman, renomado
pesquisador que vem contribuindo para o avanço dos estudos sobre os conhecimentos
necessários ao professor, sendo que seus trabalhos têm servido de referências para
reformas educativas de vários países. Segundo ele, a essência dos programas de
formação nas reformas educacionais e dos programas de avaliação e certificação de
professor consistia tão-somente em agrupar habilidades, conhecimentos disciplinares e
pedagógicos necessários à realização das atribuições docentes num determinado
contexto de ensino.
Para Shulman (1986), a ênfase das pesquisas que tem servido de referência para
os programas de formação e certificação docente é como os professores administram
suas classes, organizam as atividades, alocam tempos e turnos, estruturam tarefas,
fazem críticas e elogios, formulam os níveis de suas questões, planejam lições e julgam
o entendimento geral dos estudantes.
65
Neste sentido, Shulman (1992), demonstra que os resultados das pesquisas sobre
o ensino eficiente, embora valiosos, não são a única fonte de evidência para
fundamentar uma definição sobre a base de conhecimento no ensino. um ponto cego
em relação ao conteúdo que caracteriza essas pesquisas, denominado pelo autor de
‘paradigma ausente’, ou seja, perdem-se questões sobre o conteúdo das lições ensinadas,
as questões feitas e as explicações oferecidas.
Assim, acreditando que essas pesquisas trivializam a prática pedagógica,
ignorando assim sua complexidade e reduzindo suas demandas, Shulman opta por
contribuir e consolidar a corrente do knowledge base
33
, comentada anteriormente no
início deste capítulo, ao desenvolver seu próprio programa de pesquisas, tendo como
foco as seguintes questões: a) Qual o conhecimento da matéria ensinada, os professores
têm em sua mente? b) Quais são as fontes dos conhecimentos dos professores? c) O que
um professor sabe e quando ele vem a saber disso? d) Como um novo conhecimento é
adquirido, o velho conhecimento é revisto e ambos, combinados, formam uma base de
conhecimentos?
Mizukami (2004, p. 5), corrobora com o autor, enfatizando que:
A base de conhecimento para o ensino consiste de um corpo de
compreensões, conhecimentos, habilidades e disposições que são
necessários para que o professor possa propiciar processos de ensinar e de
aprender, em diferentes áreas de conhecimento, níveis, contextos e
modalidades de ensino. Essa base envolve conhecimentos de diferentes
naturezas, todos necessários e indispensáveis para a atuação profissional.
Shulman (1986), considera que cada área do conhecimento tem sua própria
especificidade que justifica a necessidade de estudar o conhecimento do professor,
tendo em vista a disciplina que ele ensina. Nesse sentido, ele diferencia três categorias
de conhecimentos presentes no desenvolvimento cognitivo do professor, a saber:
conhecimento do conteúdo, conhecimento pedagógico e conhecimento curricular.
Para efeito desta pesquisa, apoiar-nos-emos exclusivamente nas categorias
apresentadas em Shulman (2004) e buscaremos investigar os conhecimentos, apontados
pelo autor, conhecimentos esses do conteúdo, conhecimento pedagógico e
conhecimento curricular dos dez professores que lecionam Ciências Naturais na oitava
33
Segundo Shulman, em ensino, “Knowledge base” (base do conhecimento) é o corpo de compreensões,
conhecimentos, habilidades e disposições de que um professor necessita para atuar efetivamente numa
dada situação de ensino, conforme já dito anteriormente.
66
série das escolas Municipais da Cidade de Várzea Grande - MT. Essas três vertentes
serão apresentadas no item a seguir.
3.2. CONHECIMENTOS DOCENTES NA PERSPECTIVA DE SHULMAN
3.2.1. O Conhecimento do Conteúdo
Para Shulman (2004), a primeira fonte do “knowledge base” é o conhecimento do
conteúdo que será objeto de ensino. Esse conhecimento repousa em dois fundamentos: a
literatura acumulada nas áreas e o conhecimento filosófico e histórico sobre a natureza
do conhecimento no campo do estudo.
Nesta categoria, o professor tem responsabilidades especiais em relação ao
conhecimento do conteúdo, servindo como fonte primária do entendimento do aluno
com relação à disciplina. Isso significa que o modo pelo qual esse entendimento é
comunicado leva ao aluno o que é essencial sobre um assunto e o que é periférico. Ao
enfrentar a diversidade dos alunos, o professor deve ter a flexibilidade e a compreensão
multifacetada, adequada para conceber explicações alternativas dos mesmos conceitos e
princípios.
Longuini e Nardi (2002), ao investigarem sobre a prática reflexiva na formação
inicial de Física, corroboram com esta pesquisa, dizendo que o conhecimento do
conteúdo da disciplina é caracterizado como sendo o corpo de conhecimentos que os
professores têm em mente.
Esse modelo refere-se especificamente à questão: o que um professor necessita
saber para ser professor? Ou, mais especificamente: o que um professor de Química (ou
de História, de Biologia, de Matemática, de Literatura Estrangeira, dos componentes das
séries iniciais do ensino fundamental, dentre outros) deve saber, de forma a ingressar na
profissão com um repertório mínimo que lhe possibilite, a partir dele, novas construções
e novos conhecimentos?
Portanto, o conhecimento do conteúdo refere-se a conteúdos específicos da
matéria que o professor leciona. Inclui tanto a compreensão de fatos, conceitos,
processos e procedimentos, entre outros, de uma área específica de conhecimento,
quanto os conhecimentos relativos à construção dessa área.
Embora o conhecimento do conteúdo específico seja necessário ao ensino, o
domínio de tal conhecimento, por si só, não garante que o mesmo seja ensinado e
67
aprendido com sucesso. Esse conhecimento é necessário, mas não é suficiente. A seguir
iremos discutir outras vertentes do conhecimento do professor que, junto com o
conhecimento do conteúdo, viabilizarão o entendimento prazeroso, por parte dos alunos,
daquilo que é ensinado.
Sob a perspectiva acima aludida, temos a considerar que a compreensão da
matéria por parte do professor é necessária, porém não é condição suficiente para que
ele seja capaz de ensinar. Os professores devem encontrar formas de comunicar
conhecimentos para os alunos e encontrar meios de ajudá-los a entender a disciplina que
ministra. Assunto esse que será tratado no próximo item.
3.2.2. O Conhecimento Pedagógico
A segunda fonte é o conhecimento pedagógico da disciplina. Para Shulman
(2004), essa fonte de conhecimento consiste nos modos de formular e apresentar o
conteúdo, de forma a torná-lo mais compreensível aos alunos.
Shulman (1992) entende o conhecimento pedagógico da disciplina como uma
combinação entre o conhecimento da disciplinar e o conhecimento do ‘modo de ensinar’
e de tornar a disciplina compreensível ao aluno, incluindo os modos de apresentá-lo e de
abordá-lo.
Neste momento, o professor não deve somente conhecer a disciplina a ser
ensinada, mas criar meios, estratégias, para que o conteúdo seja compreendido pelo
aluno de forma agradável e prazerosa. Se o professor, que é o mediador do processo
ensino-aprendizagem, não tiver essa habilidade, a compreensão do conteúdo pode ser
dificultada. Portanto, o professor, usando de suas estratégias, como analogias,
ilustrações, exemplos, explanações, demonstrações, dentre outras, facilitará a
compreensão do conteúdo, desde que essas estratégias sejam adequadas, coerentes e
sirvam realmente para facilitar a compreensão do conteúdo. O professor deve ter então
a capacidade de transformar o conhecimento do conteúdo que possui em estratégias que
sejam pedagogicamente eficazes e possíveis de adaptação às variações das diversidades
dos alunos.
Longuini e Nardi (2002), corroboram dizendo que o conhecimento do conteúdo
pedagógico é o conhecimento da disciplina transformado às necessidades do ensino.
Esse conhecimento engloba todas as estratégias que os professores usam, desde o
68
reconhecimento das idéias prévias dos estudantes, até a elaboração de analogias,
exemplos, ilustrações, dentre outros.
3.2.3. O Conhecimento Curricular
A terceira fonte diz respeito ao conhecimento curricular. Shulman (1992),
defende que o conhecimento curricular engloba a compreensão do programa, o
conhecimento de materiais que o professor disponibiliza para ensinar sua disciplina, a
capacidade de fazer articulações horizontais e verticais do conteúdo a ser ensinado,
além da história da evolução curricular do conteúdo a ser ensinado.
Na visão de Shulman (2004), o conhecimento curricular compreende a entidade
currículo como o conjunto de programas elaborados para o ensino de assuntos e tópicos
específicos em um dado nível, bem como a variedade de materiais instrucionais
disponíveis relacionados ao mesmo.
Para que o professor possa ensinar melhor seus alunos, necessidade que ele
também domine o conhecimento curricular, sua organização, pois é do currículo que o
professor extrai suas ferramentas de ensino para apresentar ou explicar o conteúdo. O
conhecimento do currículo diz respeito ao conjunto de conteúdos, à relação entre eles e
mais ainda, aos objetivos do seu ensino.
3.3. REFLEXÕES SOBRE OS CONHECIMENTOS QUÍMICOS NAS TRÊS
VERTENTES DE SHULMAN
A Química como disciplina do currículo escolar brasileiro foi introduzida por
volta de 1837, com a fundação do Colégio Pedro II no Rio de Janeiro, e estruturada
posteriormente em reformas educacionais. O que se percebe, no entanto, é que ao longo
de quase duzentos anos, o processo escolar de ensino-aprendizagem dessa Ciência tem
guardado mais ou menos as mesmas características, ao passo que a pesquisa na área de
ensino de Química nas últimas décadas avançou consideravelmente. A partir da década
de 80, por exemplo, surgiram em forma de materiais didáticos muitas propostas
alternativas de Ensino de Química para Educação Básica, tais quais: Projeto de Ensino
69
de Química para o Segundo Grau PROQUIM (SCHNETZLER et al., 1986)
34
;
Unidades Modulares de Química (AMBROGI et al., 1987)
35
; Interações e
Transformações para o Grau (GEPEQ, 1993)
36
; Química e Sociedade (SANTOS e
MÓL, 2005)
37
, dentre vários outros.
Apesar do desenvolvimento da área da pesquisa em ensino de Química, foram
constatados poucos resultados de aproveitamento em sala de aula, do muito que foi
produzido. Diante disso, as questões que se colocam são: por que muitas dessas
tentativas não surtiram efeito satisfatório nas salas de aula? Que dificuldades os
professores enfrentam ao tentarem introduzir atividades inovadoras em suas práticas
educativas? Quais são os fatores que determinam o sucesso ou o fracasso dos um
processos de inovação educacional? Falta aos professores conhecimento do conteúdo?
O problema poderia ser a falta de competência para trabalhar com estratégias
diferenciadas? As respostas às essas questões são por certo complexas e requisitam
investigações mais profundas. Contudo, a reflexão sobre os conhecimentos dos
professores pode contribuir nesses debates e discussões.
Nessa perspectiva, uma das vertentes no conhecimento do professor, quando se
refere ao conhecimento da disciplina, é, segundo Shulman (1986), o conhecimento do
conteúdo. Concordando com essa idéia Carvalho et al. [S.d.], defende que o
conhecimento do conteúdo refere-se à abrangência (quantidade), qualidade e
organização de um determinado tópico pelo professor. Trata-se de um conhecimento
que necessariamente o professor deve ter, porém não é suficiente quando se pensa em
ensino. Em outras palavras, aquele que sabe Química não necessariamente sabe ensinar
Química. Mas, o que os professores precisam saber de Química para ensiná-la?
Nos Projetos pedagógicos dos cursos da maioria das Licenciaturas Plenas em
Química, muito provavelmente encontramos que, para ser professor de Química, o
egresso deve apresentar algumas características que lhe permitam atuar nas atividades
de ensino-aprendizagem dessa disciplina, atendendo às necessidades dos alunos e da
sociedade em geral, entre as quais estão aquelas relacionadas à área específica do
34
SCHNETZLER, R. P. et al. Proquim: Projeto de Ensino de Química para o segundo grau. Campinas:
Capes/MEC/PADCT, 1986.
35
AMBROGI, A.; VERSOLATO, E. F.; LISBOA, J. C. F. Unidades Modulares de Química. São Paulo:
Hamburg, 1987.
36
GEPEQ – Grupo de Pesquisa para o Ensino de Química. Interações e transformações: química para o
2º Grau. v. I; livro do aluno, guia do professor. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo,
1993.
37
SANTOS, W. L. P. dos; MÓL, G. de S. (coords.). Química & Sociedade. Projeto de Ensino de
Química e Sociedade – PEQUIS. v. único, ensino médio. São Paulo: Nova Geração, 2005.
70
conhecimento químico: dimensão cognitiva, metodologia, ético-profissional. A
dimensão cognitiva refere-se, por exemplo, ao domínio da linguagem Química,
interpretação dos processos químicos, consciência da sua incompletude em relação ao
domínio desse conhecimento. O professor deverá abordar as questões cotidianas sob um
prisma científico, produzido a partir das percepções construídas historicamente dentro
das diversas áreas específicas das Ciências Naturais, ciente de que a sua abordagem é
uma das possíveis.
Mas, quais são os conteúdos a serem ensinados? Como selecionar esses
conteúdos? O professor de Química precisa ter conhecimento de todos os
conhecimentos químicos? Quais seriam esses conhecimentos fundamentais?
mais de uma década, Attico Chassot (1993), apresentou em seu livro
‘Catalisando transformações na educação’, a preocupação com os interrogantes que
fundamentam a tomada de decisões no ensino de Química, quais sejam: O que ensinar
de Química? Por que ensinar? Como ensinar? Pra quem ensinar? Assim, ao decidir o
que ensinar de Química aos alunos do ensino médio, uma das orientações observadas
em divulgações científicas sobre o ensino de Química é que os temas devem vincular-se
à realidade dos alunos, preparando-os no sentido de formar cidadãos. Visto dessa forma,
então, os conteúdos a serem ensinados de Química devem ser instrumentos para a
cidadania. Isso significa que o professor ao ensinar, por exemplo, equilíbrio químico
38
,
deverá abordar a partir de exemplos que sejam próximos dos alunos, como o equilíbrio
existente nas garrafas de refrigerantes, no sangue, dentre vários outros. Obviamente, que
ao refletir sobre o que deve ensinar, o professor perpassa pelo ‘pra quem ensinar’ e ‘por
que ensinar’ equilíbrios químicos, considerando ainda o exemplo anterior. Parece ser
ponto pacífico que o conhecimento químico do professor deve ser além daquele a ser
ensinado na educação básica, o que requer uma formação inicial adequada em níveis de
conteúdo técnico.
Como já foi dito anteriormente, não é bastante saber apenas o conteúdo da
disciplina, deve haver uma interação com outras esferas (com o pedagógico e o
curricular) que não os deixem à margem, pois uma vertente está intimamente ligada à
outra. Assim, a questão que se coloca é o que o professor deve saber para poder ensinar
Química, e, para que seu ensino possa conduzir as aprendizagens dos alunos? E, ainda,
38
Usaremos como exemplo o equilíbrio químico, por se tratar de um assunto organizador do ensino de
Química, tanto no ensino médio, quanto nos cursos de Licenciatura em Química. A compreensão do
mesmo se faz necessária para a fundamentação de várias discussões que levam ao entendimento de
fenômenos e processos, articulando vários temas como reação química, cinética química etc.
71
como os professores aprendem a ensinar Química? Como os professores constroem
conhecimentos sobre o ensino?
Outras questões que se colocam são: como pessoas que conhecem algo
aprendem a ensinar o que sabem a outros? Isto é, como alguém que aprendeu equilíbrio
químico, por exemplo, aprende a ensinar esse conhecimento aos outros? Como se
aprende a ensinar os conceitos envolvidos no assunto equilíbrio químico? Segundo
Mizukami (2004, p. 4), esses tipos de questionamentos que costumamos fazer não estão
exatamente corretos. Para essa autora “não procede a suposição de que professores ou
sabem ou não sabem algo”. Ainda, segundo a autora “eles sabem suas matérias de
diferentes formas e com diferentes áreas de especialização e familiaridade”(p. 4).
Assim, o professor de Química poderia então ensinar tópicos que sabe muito bem e
outros tópicos dos quais sabe apenas superficialmente. Mizukami (2004), demonstra em
suas pesquisas que os professores apresentam diferentes teorias implícitas ou explícitas
sobre suas disciplinas, e como elas deveriam ser ensinadas. Dessa maneira, propõe-se
então que a pergunta seja feita da seguinte forma: “como professores que sabem sua
disciplina em diferentes formas e em diferentes níveis ensinam essa disciplina aos
outros?” (MIZUKAMI, 2004, p. 4). De acordo a autora, os aprofundamentos nesses
estudos demonstram que essas questões se tornam cada vez mais diferenciadas e
aprofundadas de forma a abranger variações em contextos e nos repertórios dos
estudantes.
O ensino de determinados conhecimentos específicos, como a Química, por
exemplo, pode apresentar diferenças entre as idéias tais como elas são compreendidas
pelos pesquisadores da área específica desse conhecimento e como elas devem ser
compreendidas pelos estudantes. Assim, os professores de Química recorrem a
estratégias (analogias ou metáforas, por exemplo) diferenciadas para o ensino de
conceitos e idéias (complexas ou não) que estão em suas mentes e que precisam ser
entendidas pelos adolescentes. Segundo Shulman(2004)
39
(apud MIZUKAMI, 2004),
essas pontes envolvem tráfego de mão dupla, na medida que os alunos oferecem suas
próprias representações ao professor, assim como para outros alunos. A hipótese de
Shulman é a de que os professores têm conhecimento de conteúdo especializado de cuja
construção são protagonistas: o conhecimento pedagógico do conteúdo.
39
SHULMAN. L. S. Professing the liberal arts. In: ORILL (Ed.). Education and democracy: Reimagining
liberal learning in America. New York: The College Entrance Examination Board, 1997. In:
SHULMAN, L.S. Teaching as community property. Essays on higher education. San Francisco:
Jossey-Bass, 2004, p. 12-31
72
Assim, em relação à segunda vertente do conhecimento do professor, isto é, o
conhecimento pedagógico proposto por Shulman (1986), Neves e colaboradores (2001),
somam-se a este trabalho ao afirmarem que o conhecimento pedagógico do conteúdo é
o modo de representar e formular os conteúdos de Química de forma tal que sejam
compreensíveis pelos alunos, motivos pelos quais alguns conteúdos são mais ou menos
difíceis de ser entendidos. Ou seja, é o conhecimento sobre como pode ser ensinado um
dado conteúdo, para alunos específicos, com sucesso na aprendizagem. Complementam
ainda que, no conhecimento pedagógico do conteúdo incluem-se estratégias específicas
para ensinar um conteúdo dado, como as analogias, demonstrações, experimentos,
explicações, problemas de aprendizagem dentre muitas outras. E enfatizam que esse
tipo de conhecimento é um elemento essencial que diferencia um ‘químico’ de um
‘professor de Química’, pois não é suficiente saber Química para ser professor de
Química.
O conhecimento pedagógico do conteúdo de Química diz respeito a um tipo de
conhecimento que é apreendido durante a formação do professor e, por conseguinte,
construído constantemente ao ensinar essa matéria, que pode ser melhorado, segundo
Mizukami (2004, p. 6), “quando se amalgamam os outros tipos de conhecimentos
explicitados na base”. Segundo a mesma autora, o conhecimento pedagógico “é uma
forma de conhecimento do conteúdo. Inclui compreensão do que significa ensinar um
tópico de uma disciplina específica assim como os princípios e técnicas que são
necessários para tal ensino”(idem, p. 6). Podemos dar como exemplo o caso do ensino
de equilíbrio químico: basta ter o conhecimento técnico sobre equilíbrio químico para
ensinar esse conteúdo de forma adequada à compreensão dos estudantes? O que o
professor precisa saber sobre o aprendizado desse conteúdo para ensiná-lo? É no saber
responder a essas questões que configura-se a diferenciação de um professor de um não-
professor de Química.
O professor de Química deve saber que ao ensinar Química é preciso atentar-se
para o fato dessa ser uma Ciência com elevado nível de abstração, com explicações em
níveis microscópicos e que, portanto, devem ser utilizados modelos de ensino. Mas o
significado desse modelo não é o comumente utilizado, ou seja, simplesmente como
representações concretas de alguma coisa. Trata-se de considerar também os modelos
como representações de eventos, processos ou idéias (GILBERT and BOULTER
40
,
40
GILBERT, J. K.; BOULTER, C. J. Stretching models too far. Artigo apresentado na Reunião Anual
da Associação Americana de Pesquisa Educacional (“American Educational Research Association”),
73
1995) (apud MILAGRES e JUSTI, 2001). Um outro aspecto que o professor deve saber
é que os modelos são criados a partir de idéias na mente de uma pessoa e, desse modo,
existe inicialmente, como um modelo mental. Segundo Milagres e Justi (2001, p. 41), “a
elaboração de um modelo mental é uma atividade conduzida por indivíduos, sozinhos
ou em grupo. O resultado de tal atividade pode ser expresso através de ações, fala,
escrita ou outra forma simbólica”. Assim, um modelo mental pode ser expresso então
por meio de desenhos, analogias, diagramas, gráficos, esquemas, dentre vários outros.
Acontece que, muitas vezes o modelo expresso pode divergir do modelo mental que o
originou devido à dificuldade em expressar um raciocínio, ou mesmo à escolha de uma
linguagem adequada (MILAGRES e JUSTI, 2001). Por isso, é importante que o
professor esteja atento, ou melhor, tenha conhecimento sobre isso, para que possa
reconhecer essas divergências, pois essas podem representar limitações em relação ao
acesso aos modelos mentais e aos processos de desenvolvimento desses modelos.
No caso do ensino de conhecimentos químicos isso toma uma importância
considerável, como dissemos anteriormente, pelo nível de abstração desse
conhecimento específico. E, em se tratando de equilíbrio químico, o professor deve ter
conhecimento de que ao lançar mão de certas estratégias, como as analogias, por
exemplo, poderá criar obstáculos epistemológicos. Algumas analogias sugeridas pelos
livros didáticos podem conduzir o aluno a um entendimento equivocado do que seja o
‘estado de equilíbrio’, que na maioria das vezes é considerado pelos estudantes como
algo estático, enquanto deve ser entendido com algo dinâmico. Cabe então ao professor
saber que, ao iniciar o estudo sobre equilíbrio químico, isso deverá ser verificado e
discutido junto aos alunos, com vistas a não se criar um obstáculo ao aprendizado dos
conceitos relacionados a esse assunto.
A literatura científica aponta muitas dificuldades dos alunos, de diferentes níveis
de escolaridade, na aprendizagem de equilíbrio químico (TYSSON, TREAGUST E
BUCAT
41
, 1999) (apud MENDONÇA et al., 2005). Esses estudos apresentam, dentre
outras coisas, as concepções mais freqüentes dos estudantes, tais como: equilíbrio
estático, como dito anteriormente, visão compartimentalizada do equilíbrio
42
;
São Francisco (EUA) 22-6, abr. 1995.
41
TYSSON, L.; TREAGUST, D. F.; BUCAT, R. B. (1999). The complexity of teaching and learning
chemical equilibrium. Journal of Chemical Education, v. 76 (4), 554-558.
42
Alguns alunos acreditam que os sistemas em equilíbrio apresentam dois lados, dois compartimentos
independentes: o dos reagentes e o dos produtos. Essa concepção pode ser gerada pelos desenhos
apresentados nos livros didáticos (com dois compartimentos independentes para mostrar o antes e o
depois ou analogias que utilizam vasos comunicantes) ou pela própria representação na equação (em
74
equilíbrio apresentado como um pêndulo (devido à dificuldade de compreender o
equilíbrio como um sistema dinâmico); igualdade de concentrações de produtos e
reagentes (igualdade entre as concentrações e/ou massas). Ainda segundo Mendonça et
al. (2005), as principais concepções alternativas dos alunos são decorrentes da
transposição, para o contexto químico, da idéia de equilíbrio estático usado no
cotidiano, além da não compreensão do assunto em nível atômico-molecular. Isso, por
sua vez, argumenta as autoras; “resulta da ênfase freqüente atribuída no ensino a uma
abordagem quantitativa do tema” (idem, p. 2).
A importância do papel do professor como um mediador, tanto na exploração
dos domínios alvo e análogo quanto na reflexão e discussão da analogia, no sentido de
evidenciar a adequação das correspondências estabelecidas, e também as suas
limitações, é um aspecto muito importante, a ser considerado no ensino do equilíbrio
químico e de outros conceitos de Química. É nesse sentido, que se faz necessário que o
professor possa ter conhecimento de situações didático-pedagógicas do conhecimento
de Química que irá ensinar. Esse professor deve saber que a construção e utilização de
uma analogia, por exemplo, não é algo simples e imediato (DUIT, 1991), como às vezes
supõem alguns autores de livros didáticos (MILAGRES e JUSTI, 2001), mas exige,
como refere Oliva (2004, p. 7), “considerar o estímulo externo que serve para
impulsionar o pensamento analógico no aluno, o trabalho de interiorização pessoal que
este terá de realizar, a exteriorização posterior do produto construído e, finalmente, a
tarefa de regulação e tutoria constante que o professor deverá efectuar”.
O professor de Química deve possuir uma compreensão mínima e básica da
matéria a ser ensinada, de forma a tornar possível o ensino e a aprendizagem dos alunos
e um conhecimento adequado das possibilidades representacionais da Química,
considerando aspectos específicos dos contextos onde se encontra inserida a escola.
Assim, os “professores devem ter dois tipos de conhecimento da matéria: conhecimento
da área tanto em seus aspectos genéricos quanto em suas especificidades e
conhecimento de como ajudar seus estudantes a entender a matéria (WILSON;
SHULMAN; RICHERT
43
, 1987) (apud MIZUKAMI, 2004).
que reagentes e produtos aparecem em lados distintos e, ao se referir ao deslocamento do equilíbrio, se
menciona lado esquerdo e lado direito) (MENDONÇA et al, 2005, p. 1).
43
WILSON, S.; SHULMAN, L. S.; RICHERT, A. E. 150 ways of knowing: Representations of
knowledge in teaching. In: CALDERHEAD, J. (Ed.). Exploring teachers’ thinking. Grã-Bretanha:
Cassell Educational Limited, 1987, pp. 104-124.
75
Carvalho et al. (2002, p. 308-9) defende o conhecimento pedagógico como
sendo,
as maneiras mais relevantes, úteis e efetivas de se representarem
determinadas idéias ou conceitos químicos; as analogias adequadas que
podem auxiliar a compreensão de um dado assunto; os exemplos que são
imprescindíveis para se entender determinado tópico; os experimentos e
demonstrações que são fundamentais para se aprender um determinado
conceito; a explicitação dos ‘conceitos alternativos’ dos alunos naquele
tópico em questão; problemas e/ou exercícios propícios para evidenciarem
conflitos cognitivos.
Essa categoria fala do professor que sabe o conteúdo da disciplina e sabe
ensinar. Às vezes o docente sabe a matéria, mas tem dificuldade em ensinar aos alunos,
e esses sentem essa deficiência do professor, dizendo às vezes, ‘o professor sabe a
matéria, mas não tem didática’. Nesse momento, o aluno quis dizer que não entendeu a
matéria em virtude da dificuldade na explicação do professor, detectando a falta de
conhecimento do professor.
O conhecimento pedagógico do professor de Química deve, então, contribuir no
sentido de levar os alunos à compreensão e ao estudo da Química de maneira
satisfatória, prazerosa e atraente, diminuindo (ou mesmo eliminando) os problemas da
falta de atenção, indisciplina, pouca motivação e baixo rendimento escolar. Portanto, o
professor deve criar condições agradáveis e estratégias de ensino que favoreçam o
aprendizado, tornando a sala de aula um lugar de interesse e levando o aluno a encarar a
Química como uma das Ciências que nos permite entender melhor o nosso cotidiano.
Para tanto, caberá ao professor saber que “todo ensino parte inicialmente de uma
compreensão: de propósitos, de estruturas da área de conhecimento, de idéias
relacionadas a essa área” (MIZUKAMI, 2004, p. 8). Os professores precisam, segundo
Mizukami (2004, p. 8): “mais do que uma compreensão pessoal da matéria que
ensinam. Eles necessitam possuir uma compreensão especializada da matéria/área de
conhecimento que lhes permita criar condições para que a maioria de seus alunos
aprenda”.
Para Shulman
44
(1987) (apud MIZUKAMI, 2004, p. 8):
Idéias compreendidas devem ser transformadas, de alguma forma,
para serem ensinadas. O processo de transformação envolve combinação de
quatro subprocessos que, conjuntamente, produzem um plano, um conjunto
de estratégias para uma aula, uma unidade ou um curso. Essas formas de
44
SHULMAN, L. S. Knowledge and teaching: foundations of the new reform. Harvard Educational
Review, 57 (1), 1987, p. 1-22.
76
transformação, esses aspectos do processo pelo qual o professor se move de
uma compreensão pessoal para possibilitar a compreensão de outros, são a
essência do ato de raciocínio pedagógico.
Esse processo de raciocínio pedagógico envolve: interpretação crítica,
representação, seleção, adaptação e consideração de características dos alunos. Quanto à
interpretação crítica, podemos considerar como a análise crítica dos textos e materiais
utilizados para o ensino de Química. O professor deverá saber identificar erros,
equívocos e problemas nos textos didáticos que pretende utilizar, assim como saber
analisar os propósitos e fins educacionais. A partir da interpretação crítica do conteúdo a
ser ensinado e aprendido, o subprocesso de representação envolve o uso de um
repertório representacional que inclui analogias, metáforas, exemplos, demonstrações,
explicações, simulações, experimentos, filmes, mídias dentre outros, que sejam capazes
de construir pontes entre as compreensões do professor e as que se deseja que os alunos
tenham. Quanto à seleção, refere-se ao subprocesso que envolve escolha de como o
processo de ensino e aprendizagem será desenvolvido a partir do repertório
representacional identificado e escolhido, considerando aspectos básicos de
organização e manejo da classe em relação às características dos alunos em geral
(motivações, pré-concepções, dentre outros). Para isso, o professor precisa de um
repertório instrucional de abordagens ou estratégias de ensino. A adaptação e
consideração de características dos alunos envolvem levar em consideração as
concepções, pré-concepções, dificuldades, linguagem, gênero, idade, aptidão, dentre
outros, de turmas, alunos e contextos específicos.
Além desses subprocessos, Mizukami (2004) cita outros, tais como: instrução,
avaliação e reflexão. Instrução consiste no desempenho observável pelo professor,
envolvendo a organização e gestão da classe, formas de lidar com os alunos
individualmente e em grupos, dosagem de conteúdo, coordenação das atividades,
questionamentos, discussões, disciplina, dentre outros. A avaliação seria um processo
que ocorre durante e após a instrução, tanto via checagem constante e informal de
compreensões, possíveis dúvidas/equívocos, quanto vias sistemáticas mais formais de
avaliação. Por último, e não menos importante, o processo de reflexão, que envolve a
revisão e a análise crítica do desempenho do professor, fundamentando suas explicações
em evidências. São processos reflexivos sobre a ação pedagógica. Segundo a mesma
autora, não consiste em disposição individual ou se reduz a um conjunto de estratégias,
77
mas sim no uso de conhecimento analítico para examinar o próprio trabalho em face aos
fins estabelecidos.
Quanto à terceira vertente do conhecimento do professor, ou seja, o
conhecimento do currículo, não basta que ele tenha apenas o conhecimento químico e
saiba ensinar a disciplina, esse conhecimento deve ir além, é preciso que tenha também
um repertório de estratégias de ensino que viabilizem o entendimento dos conceitos
pelos alunos com mais prazer, ou seja, o professor tem que saber ensinar; e conhecer
toda estrutura da disciplina que irá ministrar, e as questões políticas que a cercam.
Lopes (2003, p. 2), define currículo como sendo uma
Política de constituição do conhecimento escolar, um conhecimento
construído para a escola (em ações externas à escola), mas também pela
escola (em suas práticas institucionais cotidianas). Ao mesmo tempo, toda
política curricular é também uma política cultural, na medida em que é fruto
de uma seleção da cultura e é campo conflituoso de produção de cultura, de
embate entre sujeitos, concepções de conhecimento, formas de ver, entender
e construir o mundo.
Portanto, a política curricular não é apenas e tão-somente produção das três
esferas governamentais, as práticas e propostas desenvolvidas nas escolas também são
produtoras de sentidos para as políticas curriculares.
O fato é que o currículo muito tempo deixou de ser apenas uma área
meramente técnica, voltada para questões relativas a procedimentos, técnicas, métodos,
tendo se desenvolvido no sentido de incorporar questões de natureza sociológica,
política, epistemológica. Assim, o currículo tem sido considerado um artefato social e
cultural, está implicado em relações de poder, produzindo identidades individuais e
sociais. Mesmo sendo visto nessa perspectiva, o currículo não tem conseguido
modificar a divisão disciplinar, a desconsideração da construção sócio-histórica do
conhecimento, superar a desvalorização do conhecimento implícito que os alunos
constroem ao longo de sua vida. O problema é que as práticas pedagógicas dos
professores não sofrem alterações por essa perspectiva mais atualizada de currículo,
favorecendo problemas de aprendizagem, como por exemplo, no caso de seleção de
conteúdos de Química, que são determinados na maioria das vezes pelos programas
apresentados nos livros didáticos, que também são muito parecidos, com raras exceções.
Como resultado, configura-se um ensino de Química desvinculado da realidade que, por
conseguinte, pode acarretar em um desinteresse dos estudantes da educação básica pela
educação científica. Isso demonstra que ainda hoje prevalece o velho modelo de
78
organização curricular centrado na racionalidade técnica e na transmissão-recepção de
conteúdos inadequados e com valor formativo questionável.
Apesar disso, as referências da tendência curricular do ensino de Química, ou
seja, contextualização e interdisciplinaridade, estão dispostas nos documentos oficiais,
tais como as Orientações Curriculares Nacionais (BRASIL, 2006), muitas vezes
desconhecidas pelos professores de Química.
Haja vista a polissemia do termo ‘currículo’, utilizamos neste trabalho o
‘conhecimento do currículo’ no sentido proposto por Shulman, englobando a
compreensão do programa, o conhecimento dos materiais que o professor disponibiliza
para ensinar sua disciplina, a capacidade de fazer articulações horizontais e verticais do
conteúdo a ser ensinado, a história da evolução curricular do conteúdo a ser ensinado.
Por isso, parece ser consenso que é essencial ao professor o conhecimento do
planejamento de ensino de Química, das rotinas, dos resultados didáticos e
institucionais, e o conhecimento das tarefas a serem realizadas.
Diante do exposto anteriormente retornamos a uma questão básica, qual seja:
quais os conhecimentos que os professores que lecionam Química necessitam?
Certamente, aqueles que lhe propiciem autonomia intelectual para analisar propostas de
ensino e tomar decisões, sendo que para isso necessitará dispor de ferramentas
conceituais e procedimentais bem construídas, que constituem um sistema de referência
ao desempenho do seu trabalho. É possível observar que nos estudos sobre o
desenvolvimento curricular, as variáveis que intervêm em sua formulação e as
mudanças que ocorrem nos currículos de modo geral, ainda estão bastante ausentes na
formação docente. Assim, merece análise as diretrizes curriculares veiculadas nos
documentos oficiais e sua tradução/transposição para os livros didáticos. Por isso, é
essencial que tanto na formação inicial quanto na formação continuada de professores
sejam abordados temas referentes ao papel da Química nos currículos e a formulação de
objetivos gerais e específicos para o seu ensino.
Como citado no Capítulo I, nesta pesquisa tomaremos como ponto principal de
referência as idéias de Lee Shulman acerca dos conhecimentos quais sejam:
conhecimento do conteúdo da disciplina, conhecimento pedagógico e conhecimento
curricular. Essa opção deve-se ao fato de esse autor apresentar as categorias do
conhecimento docente de forma mais próxima da visão da autora deste trabalho e,
sobretudo, por atender de forma satisfatória aos objetivos da investigação. No próximo
79
capítulo apresentamos os resultados obtidos por este estudo e as análises baseadas nas
categorias de Lee Shulman.
80
CAPÍTULO IV
RESULTADOS E DISCUSSÕES
“Um professor competente é: “[...] possuidor de uma base de conhecimentos suficientemente ampla para
desenvolver sua tarefa, capaz de gerar conhecimento sobre sua prática e de buscar os recursos
necessários para melhorá-la; com uma atitude positiva para com seu desenvolvimento profissional
contínuo; com uma autonomia na realização de sua tarefa, capaz de adequá-la ao contexto e de cooperar
com outros profissionais; com um código ético e mecanismos de autocrítica”.
Maria Lourdes Monteiro
Para uma reflexão e compreensão do objeto de pesquisa, nesta parte do trabalho,
fizemos a interpretação dos dados coletados durante os ‘diálogos reconstruídos
45
, isto
é, as entrevistas e os questionários.
Organizamos o material de análise em duas partes distintas, mas não
desvinculadas: uma relacionada aos dados coletados nos questionários e a outra
correspondente às entrevistas efetuadas. Em relação aos questionários, que designamos
de caracterização da escola e caracterização dos sujeitos de pesquisa, como vimos no
capítulo I, foi possível identificar o perfil de um grupo de professores que lecionam os
conhecimentos químicos na oitava série e apontar algumas das principais características
das escolas nas quais eles lecionam. Isso permitiu desenvolver uma busca de
entendimentos das questões relevantes que cercam a prática docente, quando tratamos
do ensino da Química na educação fundamental.
No que concerne às entrevistas, essas foram organizadas de forma a comporem
três blocos bem definidos: bloco A, bloco B e bloco C. Essa forma organizacional segue
45
A partir da transcrição tentamos reconstruir o diálogo (oral) realizado mediante a entrevista semi-
estruturada em textos escritos.
81
a tipologia de Lee Shulman, ou seja, no bloco A apresentamos os resultados obtidos em
relação aos conhecimentos curriculares, no bloco B dispomos os resultados relacionados
aos conhecimentos pedagógicos e, finalmente, no bloco C, oferecemos os resultados
mediante os conhecimentos dos conteúdos.
Apresentamos a seguir a sistematização dos dados e a análise dos resultados
obtidos, à luz dos pressupostos teóricos propostos por Shulman.
4.1. ANALISANDO OS QUESTIONÁRIOS
4.1.1. Caracterização das Escolas e dos Sujeitos da Pesquisa
A partir das informações obtidas junto à SMEC-VG/MT, sobre a existência de
setenta e duas escolas municipais, foram investigadas as dez, que a Secretaria apontou
como sendo as que apresentavam mais alunos com baixo rendimento escolar na
disciplina Ciências Naturais, conforme explicado anteriormente. Vale lembrar que
escolhemos a oitava série, por ser nessa o momento em que o aluno tem o primeiro
contato formal com a Química, dentro da disciplina Ciências.
Após selecionarmos as escolas, entramos em contato com a direção/coordenação
e posteriormente com os sujeitos da pesquisa os Professores. Os modelos dos
questionários para caracterizar a escola e para traçar um perfil dos professores,
encontram-se nos apêndices A e B, respectivamente.
Quanto à caracterização do lócus da pesquisa, foram pontuados alguns aspectos
com a finalidade de familiarizar o leitor com o cenário sobre o qual se desenvolveu o
trabalho. A maioria das escolas é classificada como de grande porte
46
e estão numa
faixa de período de funcionamento variando entre 06 a 58 anos
47
. São escolas situadas
no Município de Várzea Grande, porém estabelecendo uma grande distância entre o
centro
48
da cidade e as escolas, assim como delas entre si. Apesar de todas serem
periféricas, a Escola E
4,
está localizada mais próxima ao centro da cidade,
aproximadamente a 4Km, e as escolas mais distantes, E
9
e E
10
aproximadamente 13Km.
Quanto ao aspecto físico, as escolas não possuem muitas diferenças, apresentando
46
Terminologia utilizada pela SMEC-VG/MT.
47
Dados coletados no ano de 2006 junto à SMEC-VG/MT.
48
Considerando o Terminal de ônibus, ao lado do Ginásio de esportes Fiotão, como centro da cidade, pois
esses locais são referências mais conhecidas de todos que ali moram.
82
basicamente os mesmos espaços educativos; as carências estruturais e materiais,
independentemente do porte físico, também se assemelham.
A maioria (80%) das escolas investigadas disponibiliza apenas uma turma de
oitava série. Quanto ao número de professores de Ciências, 60% das escolas possuem
01 professor, sendo que as demais escolas (40%) contam com dois professores de
Ciências. Em ambas as situações os professores atuam em outras séries e não somente
na oitava.
Ao analisarmos o perfil dos professores envolvidos na pesquisa, deparamos com
resultados que apontam que os professores que lecionam Química no Ensino
Fundamental nas escolas municipais de Várzea Grande-MT são majoritariamente
mulheres, com idade variando entre 29 e 51 anos. Desses professores somente 40% são
mato-grossenses, como apresenta o quadro 3.
Quadro 3: Sobre os dados pessoais dos professores de Ciências Naturais da Rede
Municipal de Várzea Grande
Professor(a)
49
Idade Sexo Estado Civil Naturalidade
P
1
43 F Casada São Paulo
P
2
48 F Casada Minas Gerais
P
3
51 F Casada Ceará
P
4
32 F Casada Mato Grosso
P
5
49 M Solteiro Rio de Janeiro
P
6
30 F Solteira Rondônia
P
7
29 F Solteira Mato Grosso
P
8
45 F Casada Pará
P
9
40 F Casada Mato Grosso
P
10
32 F Casada Mato Grosso
Em relação à formação acadêmica, um professor possui Licenciatura Plena em
Química, sendo a maioria formada em Ciências Biológicas pela rede particular de
ensino superior de Mato Grosso. Dos dez professores entrevistados, oito são licenciadas
49
Não serão colocados os nomes dos professores, serão dados aos mesmos uma única letra (P) e o
número variando de 1 a 10, em virtude de serem num total de 10 sujeitos.
83
em Ciências Biológicas, uma professora é formada em Ciências
50
e apenas um professor
é licenciado em Química, como apresenta o quadro 4.
Quadro 4: Sobre a formação acadêmica dos professores de Ciências Naturais da Rede
Municipal de Várzea Grande
Professor(a)
Tipo de Formação no
Ensino Médio
Graduação
Instituição de
Graduação
Pós-graduação
(lato senso)
P
1
Propedêutico
Ciências
Biológicas
UNIC Sim
P
2
Magistério Ciências
Santa
Marcelina –
MG
Sim
P
3
Científico
Ciências
Biológicas
UNIVAG Sim
P
4
Técnico
Ciências
Biológicas
UFMT Não
P
5
Científico
Química
UFMT Não
P
6
Magistério
Ciências
Biológicas
UNIC Sim
P
7
Magistério
Ciências
Biológicas
UNIVAG Sim
P
8
Saúde
Ciências
Biológicas
UFPA Não
P
9
Magistério
Ciências
Biológicas
UNIVAG Sim
P
10
Contabilidade
Ciências
Biológicas
UNIC Não
Quanto ao perfil profissional, é possível afirmar que 40% dos professores
possuem contratos temporários (interinos); a maioria leciona apenas Ciências Naturais,
enquanto alguns professores trabalham simultaneamente outras disciplinas. Os
professores investigados possuem um considerável tempo de experiência no ensino de
50
Segundo a Delegacia do Ministério da Educação de Mato Grosso – DEMEC/MT (artigo 40 da Lei nº
5692, de 11/08/1971), o curso de Ciências referente à Professora P2, a habilita para o trabalho com as
seguintes áreas: Matemática, Ciências Físicas e Ciências Biológicas.
84
Ciências e dedicam-se exclusivamente ao magistério. Identificamos também que 50%
dos professores possuem uma jornada de trabalho relativamente alta, variando de 21 a
55 horas trabalhadas semanalmente, como mostra o quadro 2, no Cap I (p. 27).
Tanto a grande demanda do Estado de Mato Grosso, como a prioridade dada aos
licenciados em Ciências Biológicas, também na rede Estadual de ensino, pode explicar
essa realidade em estar no magistério professores que não são licenciados em Química,
mas que lecionam Química, tanto em nível fundamental quanto em nível médio. Essa
parece ser uma realidade não exclusiva ao Estado de Mato Grosso, mas um problema
nacional que remete à formação inicial de professores de Química no Brasil.
4.2. ANALISANDO AS ENTREVISTAS
Foram realizadas entrevistas semi-estruturadas com dez professores, com
duração aproximada de 40 a 55 minutos cada. O roteiro da entrevista semi-estruturada
encontra-se no apêndice C.
A necessidade de tal estudo advém da seguinte questão: Que conhecimentos
possuem os professores que lecionam Ciências Naturais na oitava série nas escolas
municipais de Várzea Grande em Mato Grosso?
Na tentativa de responder essa indagação, a entrevista foi dividida em três
blocos, contendo vários questionamentos: bloco A Conhecimento Curricular, bloco B
– Conhecimento Pedagógico e bloco C – Conhecimento do Conteúdo.
Ao realizar a entrevista efetivamente, fizemos algumas perguntas introdutórias
que não estavam enquadradas em nenhum dos blocos da mesma. A primeira pergunta
foi no sentido de descobrir o porquê da escolha em ensinar as Ciências Naturais na
oitava série. As respostas, a essa questão foram agrupadas em três categorias, a saber:
afinidade com o conteúdo, preencher a carga horária e a permissão dada pela formação.
Vale ressaltar que um mesmo professor pode se enquadrar em mais de uma categoria.
Assim, tivemos que, dos dez professores, seis declararam que foi a afinidade com o
conteúdo (P2, P3, P4, P5, P6, P9) que orientou a escolha, quatro responderam que a
escolha se deu simplesmente para preencher carga horária (P1, P3, P7, P8) e apenas
duas professoras disseram que suas formações permitem ministrar essa disciplina (P10
e P9). Importante destacar que o professor P5, o único licenciado em Química, justifica
que leciona Química no Ensino Fundamental porque obviamente tem afinidade com o
85
conteúdo, porém, tendo em vista as normas utilizadas na rede Municipal de Ensino de
Várzea Grande, teoricamente sua formação em Química não lhe permite exercer a
atividade de Professor de Ciências
51
na oitava série, priorizando desta forma os
licenciados em Ciências Biológicas.
Quando um professor diz que ‘tem afinidade com o conteúdo’, presume-se que
goste e que estude o conteúdo para poder ensinar. Assim, mesmo que não seja formado
na área, podemos supor que tentará buscar o melhor para poder ensinar aos alunos.
Sabemos, porém, que na prática as coisas não funcionam dessa maneira, pois ensinar
não é uma tarefa fácil, principalmente quando não se domina o conteúdo e não se tem
um repertório enriquecido para transformar o conteúdo em algo mais prazeroso de
aprender. Assim, simplesmente ter afinidade pelo conteúdo não é suficiente para ensinar
Química, muito menos, simplesmente para preencher carga horária ou, ainda pior,
simplesmente porque os documentos oficiais assim lhe permitem.
Vale ressaltar que das duas professoras (P
9
e P
10
) que responderam que sua
formação permite lecionar Ciências, a professora P9 entra teoricamente em contradição
na resposta da questão 10 do bloco B
52
, quando responde que sua formação não é
adequada para ensinar Química na oitava série. Podemos interpretar essa resposta
aparentemente contraditória como uma tomada de consciência dessa professora ao
admitir e revelar que ‘embora lhe seja permitido como profissional da Biologia lecionar
Química na 8ª série, não se considera preparada para essa ação docente’.
A segunda pergunta introdutória foi no sentido de saber o que é necessário
conhecer para ser professor de Ciências no Ensino Fundamental? Dos dez professores
entrevistados, cinco responderam que é necessário que o professor conheça o conteúdo
da matéria (P1, P2, P3, P9, P10), e outros cinco disseram que é necessário o professor
ter conhecimento tanto do conteúdo como do conhecimento pedagógico (P4, P5, P6, P7,
P8). Nenhum dos sujeitos da pesquisa mencionou sobre o conhecimento curricular.
De acordo com Sacristán e Gómez
53
(2000) (apud REZENDE, 2004, p. 96), não
uma definição de currículo, mas sim rias, que terminam ficando limitadas; porém,
51
Segundo a SMEC-VG/MT, apenas o Professor licenciado em Ciências Biológicas pode fazer concurso
para ministrar aulas de Ciências na Rede Municipal de Ensino da cidade de Várzea Grande/MT, o
professor de Química não pode realizar esse concurso.
52
Questão que trata sobre a adequação da formação para o ensino de Química na 8ª Série do ensino
fundamental.
53
SACRISTÁN, G. J.; GÓMEZ, P. A. Compreender e transformar o ensino. 4.ed.. Porto Alegre: Artes
Médicas, 2000.
86
para esses autores em qualquer conceituação é importante fazer as seguintes
considerações:
Primeiro: o estudo do currículo deve servir para oferecer uma visão
da cultura que se nas escolas em sua dimensão oculta e manifesta,
levando em conta as condições em que se desenvolve.
Segundo: trata-se de um projeto que pode ser entendido como
um processo historicamente condicionado, pertencente a uma sociedade,
selecionado de acordo’ com as forças dominantes nela, mas não apenas com
capacidade de reproduzir, mas também de incidir nessa sociedade.
Terceiro: o currículo é um campo no qual interagem idéias e
práticas reciprocamente.
Quarto: como projeto cultural elaborado, condiciona a
profissionalidade docente, e é preciso vê-lo como uma pauta com diferente
grau de flexibilidade para que os professores/as intervenham nele.
Essas considerações revelam a importância do entendimento do currículo, que às
vezes passa despercebido pelo professor, ou também muitos deles nem participam da
sua estruturação, como mostra a maioria dos nossos entrevistados (P1, P4, P6, P7, P8,
P10), na resposta 2 do bloco A
54
, quando responderam que não participaram da
construção curricular da escola em que estão inseridos, como veremos posteriormente.
Dessa forma, os professores figuram como meros consumidores de idéias e
independentemente de concordar e terem conhecimentos ou não sobre o currículo, têm
que colocá-los em prática.
Os conhecimentos curriculares são considerados essenciais para a formação dos
sujeitos que procuram a educação escolar. Segundo Zabala (1998, p. 167), os materiais
curriculares são muito importantes e podem ser definidos como “todos aqueles
instrumentos que proporcionam ao educador referências e critérios para tomar decisões,
tanto no planejamento como na intervenção direta no processo de ensino-aprendizagem
e em sua avaliação”.
Nessa perspectiva posta por Zabala (1998), é possível perceber que os materiais
curriculares são elementos que ajudam os professores a compreender melhor o processo
de planejamento, avaliação, dentre outros, contudo é preciso lembrar que também
sozinhos não dão conta da prática docente, devendo associar-se a saberes disciplinares.
Ao serem questionados sobre quais as fontes de aquisição do conhecimento
para ser professor de Ciências, o agrupamento de respostas mostra que oito professores
54
Questão que trata sobre a participação na construção da proposta curricular para o ensino de Ciências
na Instituição que está inserido.
87
consideram como sendo o livro didático a fonte dos conhecimentos (P1, P2, P5, P6, P7,
P8, P9, P10), três declinaram-se à Internet (P2, P8, P10), duas professoras apontaram a
faculdade (P3, P8) e um professor, além do livro didático, apontou a mídia (P5).
Reiterando que um mesmo professor pode se enquadrar em mais de uma resposta.
Observamos que a maioria dos professores usa o livro didático
55
do ensino médio como
recurso mais freqüente para obtenção dos conhecimentos para lecionar no ensino
fundamental.
Nesse sentido, é importante observar que as diversas pesquisas sobre o livro
didático no Brasil têm mostrado como o livro passou a ser o principal controlador do
currículo. Os professores utilizam o livro como o instrumento principal que orienta o
conteúdo a ser administrado, a seqüência desses conteúdos, as atividades de
aprendizagem e avaliação para o ensino das Ciências. O uso do livro didático pelo(a)
professor(a) como material didático, ao lado do currículo, dos programas e outros
materiais, institue-se historicamente como um dos instrumentos para o ensino e
aprendizagem. O livro didático nasce com a própria escola e está presente ao longo da
história, em todas as sociedades, em todos os tempos (SOARES, 2001). Assim, os livros
didáticos não apenas têm um papel central nas orientações das atividades de muitos
professores, como também servem de base de estudos para o preparo das aulas.
4.2.1. Bloco A – Sobre os Conhecimentos Curriculares
No que se refere ao conhecimento sobre os PCN, na área de Ciências Naturais,
somente a professora P10 afirma que não tem conhecimento desse documento oficial.
Ela foi enfática e monossílaba em seu depoimento, ao responder apenas “não”.
Quanto aos professores que responderam que conhecem os PCN obtivemos as
seguintes respostas:
[...] pra mim ele não acrescentou muita coisa porque a necessidade
do aluno faz com que a gente mude no dia-a-dia [...]. (P1)
Eu uso muitas vezes, ele me dá alguns subsídios exatamente porque
a gente é carente de uma série de suporte, né? E ele não deixa de ser um
suporte para o professor. (P3)
55
Questão esta que será tratada com mais ênfase na resposta 1 do Bloco B, quando os professores são
questionados acerca da utilização do livro didático.
88
[...] a gente acaba fazendo nosso planejamento em cima do PCN e
em cima também da documentação que a escola tem [...]. (P4)
[...] eu conheço o PCN e as minhas aulas, eu trabalho aplicando o
PCN. (P5)
[...] eu tenho meu PCN de Ciências [...] li [...] se você me
perguntar alguma coisa agora, eu teria que pesquisar nele, porque eu não
me lembro [...]. (P8)
Algumas das respostas obtidas apontam para a importância da existência de
orientações curriculares, com exceção de P1, que considera o conhecimento sobre os
PCN pouco contributivo. Para essa professora, é a experiência do dia-a-dia que vai
delinear suas aulas, ou seja, é a sua prática particular como professora que irá
determinar os parâmetros de ensino-aprendizagem. Tardif et al. (1991), entre outros
autores, identifica a experiência como uma das categorias do saber profissional,
salientando ainda o estatuto particular que é atribuído, pelos professores, a essa
categoria. Ainda segundo Tardif et al. (1991), os saberes da experiência seriam aqueles
resultantes do trabalho cotidiano, no conhecimento do seu meio, que surgem e são
validados pela experiência. Dessa forma, os conhecimentos de P1 sobre o currículo, no
caso sobre os PCN, são baseados na experiência, que se referem às idéias que essa
professora desenvolveu durante o exercício da profissão a respeito de aspectos que
compõem o processo ensino-aprendizagem, como, por exemplo, a metodologia, a
avaliação, dentre outros que, por sua vez, estão implicados diretamente no
conhecimento do currículo.
Ao serem indagados sobre a participação na construção da proposta curricular,
as professoras P1, P4, P6, P7, P8, P10, argumentaram que não participaram da
construção e apontam alguns dos vários motivos: a proposta curricular ter sido
elaborada pela SMEC-VG/MT, sem a consulta aos professores; pelo vínculo de trabalho
ser provisório (interino); pelo fato das escolas convocarem para construção da proposta
curricular apenas o professor membro do conselho pedagógico ou do conselho
deliberativo, ficando o restante do corpo docente excluído de participação etc.
Na seqüência, perguntamos se os professores conheciam a proposta curricular
para o ensino de Ciências e, dos dez entrevistados, seis responderam positivamente (P1,
P2, P3, P4, P5, P9), sendo que os mesmos declaram o que ela propõe para o ensino de
Ciências na oitava série:
89
[...] eles exigem o mínimo possível de conteúdo [...] a iniciação de
Química e Física, e algumas habilidades em relação a isso. (P1)
[...] aprendizagem do dia-a-dia [...] formar cidadãos conscientes
que no futuro consiga alguma coisa melhor [...]. (P2)
[...] ela quer que o professor esteja direcionando esse aluno de uma
maneira muito mais eficaz no campo da Física, da Química, né? [...]. (P3)
[...] ela propõe que seja separado em conteúdo de série, de Física
e Química. (P4)
Ela propõe...]os conteúdos [...] que serão solicitados no ensino
médio [...] o aluno deve ir para o ensino médio com a base do ensino
fundamental [...]. (P5)
Ela propõe que a gente forme alunos críticos, que ele tenha o
conhecimento científico e que eles adquirem os conhecimentos necessários
para o seu cotidiano e sua vida profissional. (P9)
As quatro professoras (P6, P7, P8, P10) que declaram não conhecerem a
proposta curricular, apresentam algumas justificativas, conforme depoimentos a seguir:
Não tenho conhecimento. Não tenho, porque ela foi organizada não
por mim [...] mas o que ela busca é o que todas as escolas buscam. E como
professora de Ciências a gente tem a noção das outras escolas. Mas dessa
escola em si, na hora que foi formulada, eu não estava presente. (P6)
Não conheço, porque geralmente a escola não deixa disponível para
o professor. Em nenhuma escola é acessível. Eu ainda estava conversando
com um colega [...] ele falou, assim, que cada professor, quando a gente
chega na escola, a gente sendo professor novo na escola, deveria ter na sala
do professor uma cópia da proposta curricular, o que nós professores temos
que trabalhar naquela escola, na nossa disciplina. Não temos acesso nenhum
[...]. Os conteúdos, a gente acompanha o livro didático, mas uma proposta, a
escola deveria apresentar: você tem que trabalhar isso e isso, não; proposta
curricular da escola nós não temos acesso. (P7)
Olha, nós temos o Projeto Político Pedagógico, que fala um
pouquinho, né? Mas assim, só de Ciências, não. (P8)
A professora P10 se restringiu a dizer apenas “não”, sem apresentar uma
justificativa.
O atual currículo de Ciências na oitava série, de acordo com oito das
entrevistadas (P1, P2, P4, P6, P7, P8, P9, P10) ênfase ao conteúdo. Essa perspectiva
de priorizar o conteúdo ainda está muito enraizada em nossa sociedade. Assim, de
acordo com Arroyo (1988, p. 4):
O pensamento mais comum entre os professores é que o ensino de
ciências se relaciona com a preparação para o mundo produtivo. Se lhes
perguntarmos para que servirá a Física, a Química, a Biologia e a
90
Matemática ensinadas no segundo grau, a resposta será quase unânime: para
capacitar os jovens a um trabalho profissional competente. Se fizermos a
mesma pergunta aos professores de humanas (no linguajar escolar a
condição de ciências não se aplica a humanas), possivelmente a resposta
seja: preparar os jovens para a cidadania.
Esse trecho confirma o quanto o pensamento está voltado tão-somente ao
conteúdo que envolve as Ciências Exatas. Em relação a esse assunto, Machado [S.d.]
considera que os currículos tradicionais
Acabam por transformar a cultura química em uma cultura escolar,
sem história e sem contexto, com excesso de conceitos desarticulados (não
seriam definições?) que acabam sugerindo ao aluno ser esta uma ciência que
exige apenas boa memória para haver aprendizagem. Os tais conceitos
aprendidos limitam-se a definições capazes de permitir a resolução de
problemas verbais (questões sobre a própria definição) ou numéricos
(cálculos primários) e incapazes de ir além. Assim, o dito "ensino de
química" limita-se ao treino no manejo de pequenos rituais de memorização
e resolução de problemas.
Aqueles professores que responderam que o currículo está voltado para a
cidadania (P3, P5), acrescentaram:
[...] nós trabalhamos em cima de uma proposta que é “vida”, e
dentro dessa proposta nós vamos colocando ou tentando colocar todos os
conteúdos de maneira mais prática, buscando com que o aluno use isso
realmente na prática. Buscando melhor qualidade de vida, buscando uma
integração melhor [...] você tem que, além de conteúdo, votem que ter
essa sensibilidade de estar permeando outros conteúdos que não é aquele
livresco, né?. (P3).
[...] o nosso currículo está voltado para a cidadania, então o aluno
vai adquirindo o conhecimento, a cidadania e a ética [...] isso vai fazer com
que ele aplique esses conhecimentos em prol da comunidade. (P5).
Desses dois sujeitos, o professor P5, que enfatizou que o currículo deve estar
voltado no sentido de propiciar a formação de cidadãos, é o único licenciado em
Química.
O entendimento de P5 está em consonância com as idéias propagadas por Santos
e Schnetzler (1996, p. 33), quando afirmam que
A implantação do ensino de ensino de Química para formar cidadão
implica a busca de um novo paradigma educacional que venha reformular a
atual organização desse ensino. E nesse sentido, não basta apenas incluir
alguns temas sociais ou dinâmicos de simulação ou debates em sala de aula.
É preciso ter claro que ensinar para a cidadania significa adotar uma nova
maneira de encarar a educação, pois o novo paradigma vem alterar
91
significativamente o ensino atual, propondo novos conteúdos, metodologias,
organização do processo de ensino e aprendizagem e métodos de avaliação.
Para que isso se efetive, continuam os autores, é necessário que “os professores
recuperem a real função da educação, que tenham uma nova postura diante do aluno e
que realmente contribuam para a construção de uma sociedade democrática, composta
de cidadãos conscientes e comprometidos com a transformação dessa sociedade”
(SANTOS e SCHNETZLER, 1996, p. 33). Na mesma direção Machado [S.d.], aponta
que qualquer currículo para o ensino de Química deve contemplar aspectos conceituais
que permitam a compreensão da constituição, propriedades e transformações dos
materiais, destacando as implicações sociais relacionadas a sua produção e a seu uso. O
mesmo autor ainda afirma que pelo exame dos currículos atualmente praticados, via de
regra isso não acontece.
Quando os professores foram convidados, durante a entrevista, a classificar e
analisar a proposta curricular de Ciências existente em sua escola, as professoras P1, P4
e P9 disseram que é fraca, sendo que P2, P3, P5 e P6 consideram-na boa e os demais
responderam que não poderiam analisar porque não a conhecem (P7, P8, P10). As
professoras que classificam a proposta curricular como fraca argumentaram da seguinte
forma:
[...] porque são poucos conteúdos, é uma coisa que foi decidida em
conjunto; eu no meu ver acho que cada professor deveria fazer o seu, porque
eu conheço os alunos, sei as necessidades deles [...] você não pode basear
uma proposta só em alguns conteúdos, né? Deveria ser uma coisa mais
ampla. Na rede municipal, eu acho que a proposta curricular deixa a desejar.
(P1)
Eu acho que esse conteúdo, ele supre o mínimo do que o aluno
deve saber, cabendo a cada professor colocar aquilo que ele também achar
mais importante daquele conteúdo mínimo, para que fique um conteúdo
mais ou menos bom pra oitava série. (P4)
Sempre está faltando alguma coisa. Nunca está totalmente
preenchido. E com o passar do tempo e com as verbas que vêm, ela vai
preenchendo algumas necessidades, mas sempre fica faltando algo mais.
(P9)
Na fala da professora P9 é possível observar insatisfação com a proposta
curricular de sua escola, ao classificá-la como fraca. Porém é importante observar uma
contradição em sua resposta, pois ao ser questionada anteriormente sobre a sua
92
participação na construção da proposta curricular da sua escola, essa professora estava
entre as que contribuíram na confecção do currículo de Ciências Naturais.
Dos professores que disseram que era boa a proposta curricular de Ciências da
sua escola, argumentaram o seguinte:
Porque buscamos sempre procurar o melhor, né? Pra poder
melhorar a aprendizagem do aluno. (P2)
O aluno ele precisa estar integrado ao ambiente, ao meio, e a gente
tem essa preocupação. (P3)
Acredito que foi colocado não na minha área de Ciências, como
na área de todas as outras disciplinas, tá? Essa questão de o aluno ser
trabalhado como um indivíduo cidadão crítico e cidadão antenado com os
conhecimentos de tecnologia, que a gente está recebendo na atualidade. (P5)
Ela é muito interessante porque trata tanto dos conhecimentos que
os alunos têm por fora, desde a produção de lixo, né? E o abastecimento de
água, saneamentos básicos principais, aum melhoramento e uma idéia que
eles tenham, própria, de como conseguir reciclar e melhorar o ambiente que
eles vivem. (P6)
Queremos destacar que P6 enfatiza ser boa a proposta curricular de Ciências da
sua escola, porém entra em contradição, pois no início da entrevista disse não ter
participado da sua construção
56
, e que também não conhece
57
essa proposta.
Ao ser perguntado qual a primeira fonte consultada para elaborar o planejamento
para a oitava série, seis professores responderam que utilizam os livros didáticos (P1,
P2, P5, P7, P8 e P9); três disseram que além dos livros utilizam também a internet e
mídias (P3, P6 e P10) e apenas uma entrevistada disse que primeiramente utiliza a
documentação da escola (P4), como o Projeto Político Pedagógico – PPP.
Abaixo estão os argumentos de alguns professores que disseram que utilizam o
livro didático para elaboração do planejamento de ensino:
Porque o livro didático, na verdade, é o material que a gente tem
concreto na escola. Às vezes tem alguma outra coisa, mas não tem espaço
físico, em tudo a gente encontra muita dificuldade. Vovai elaborar uma
aula diferente, passar um deo, alguma coisa, a estrutura da escola não
facilita. Então a gente vai no livro didático, porque o livro oferece bastante
novidade, ele trabalha o texto de uma forma diferenciada, ele propõe
bastante atividades práticas. Então o livro tem o que eu preciso, é só eu saber
selecionar o conteúdo e saber trabalhar com eles. (P1)
56
Questão 2 do Bloco A, que investiga a participação do professor na construção da proposta curricular
para o Ensino de Ciências.
57
Questão 3 do Bloco A, que trata do conhecimento da proposta curricular para o Ensino de Ciências.
93
Porque essa é a base que o aluno tem e o primeiro contato que ele
vai ter é com os conteúdos do livro didáticos [...]. Em cima desse livro
didático eu trabalho outros livros paradidáticos [...]. (P5)
Porque são os mecanismos, os recursos que a gente tem. (P7)
Porque é o livro que a escola tem disponível [...]. (P9)
Ao trabalhar os conteúdos, freqüentemente os professores se deparam com
frágeis instrumentos de trabalho, o que possivelmente pode gerar dependência ao uso do
livro didático. Krasilchik
58
(2004) (apud LIMA e VASCONCELOS, 2006, p. 399),
assume diante dessa constatação uma postura crítica, qual seja:
O docente, por falta de autoconfiança, de preparo, ou por
comodismo, restringe-se a apresentar aos alunos, com o mínimo de
modificações, o material previamente elaborado por autores que são aceitos
como autoridades. Apoiado em material planejado por outros e produzido
industrialmente, o professor abre mão de sua autonomia e liberdade,
tornando-se um técnico.
Sendo desse modo, é de se presumir que a influência do livro didático sobre
qualidade do ensino é decisiva.
Mortimer
59
(1988) (apud MACHADO [S.d.]) constatou, em uma avaliação feita
acerca da importância e problemática da utilização do livro didático de Química em
nível médio, que 80% dos professores dessa disciplina utilizam esse livro como o
principal recurso instrucional. Observou ainda a qualidade da maioria desses
recursos, enfatizando que são meras cópias uns dos outros, ficando as aulas
configuradas como aulas expositivas impressas, que tratam de assuntos desarticulados e
distantes da realidade do aluno e, por conseguinte, assegura que promovem a preguiça e,
conseqüentemente, desfavorecem situações de investigação (MACHADO, [S.d.]).
Mortimer (1988) (apud MACHADO [S.d.], ainda completa que:
A Química é mostrada como algo pronto e acabado, e seus modelos
são transformados em dogmas irrefutáveis. Essa visão é totalmente
distorcida, pois os modelos e teorias nas Ciências Físicas o aproximações,
sujeitos à revisão desde que surjam fatos que os contradigam ou que fiquem
sem explicação.
58
KRASILCHIK, M. Prática de ensino de Biologia. 4. ed. São Paulo: Ed. da USP, p. 198, 2004.
59
MORTIMER, E.F. A evolução dos livros didáticos de química destinados ao ensino secundário. Em
Aberto, Brasília, ano 7, n. 40. out./dez., 1988.
94
Os professores que disseram que utilizam, além do livro a mídia ou internet,
justificaram o seguinte:
Eu não fico muito presa ao livro [...] busco muito também na
internet, que é uma fonte que me oferece condições de estar trazendo sempre
algo novo nessa área, enfim, com isso eu vou me baseando pra estar fazendo
o planejamento. (P3)
[...] Porque se eu for trabalhar em relação ao aquecimento global, é
uma coisa que está bem atual, e a mídia está bastante assim, em cima em
relação a isso. (P6)
Porque facilita mais para o aprendizado. (P10)
Como mais uma alternativa e de bastante relevância, hoje o educador dispõe da
internet e mídias em geral, que oferecem atualização sobre os mais diversos temas
científicos. Vale ressaltar, porém, que não são todas as pessoas que têm acesso ao
computador e/ou a internet.
Quanto à professora P4, que afirmou que primeiramente consulta a
documentação da escola para fazer o planejamento da oitava série, temos o seguinte
depoimento:
Peguei a documentação da escola, pra ver o que estava dizendo que
era o conteúdo mínimo. Porque o conteúdo mínimo, eu acho que ele que
deve estar norteando. Depois que você tem o conteúdo mínimo que você
deve trabalhar, que você vai procurar aquilo que vo acha que é
importante, que seu aluno deva saber, pra você estar colocando junto no seu
planejamento [...]. (P4)
Cabe salientar que, essa professora não participou da construção da proposta
curricular de Ciências, porém a conhece e foi buscá-la como primeira fonte de pesquisa
para elaborar seu planejamento. Depois de tomar conhecimento daquilo que a escola
propõe, foi buscar ajuda em livros, internet, bibliotecas, artigos, dentre outras fontes de
informação/atualização.
Quanto ao papel do professor na definição e na seleção dos conhecimentos de
Ciências a serem ensinados pela instituição escolar, os entrevistados foram unânimes ao
afirmarem que o papel do professor é selecionar aquilo que acredita ser importante para
o aluno, destacando sua autonomia dentro de sala de aula. Farias (2005, p. 59),
compartilha da mesma opinião quando diz que os alunos são o público-alvo do nosso
trabalho. Assim, devemos ensinar-lhes o que seja bom para eles, e não para nós”.
95
A seguir, os depoimentos de alguns dos professores entrevistados sobre esse
tema:
Eu acho que o meu papel é justamente esse, selecionar o que eu
acho importante pra eles, na minha experiência. Ele já vem pronto, eu
seleciono, tem coisas que eu dou maior ênfase, e tem coisas que eu dou
menor ênfase. Tem coisa que o aluno, eu sei que ele não vai utilizar, daí a
gente trabalha de uma forma mais superficial pra não tomar muito nosso
tempo, e aquilo que eu sei que vai construir o conhecimento, que vai ajudar
muito na vida profissional, na vida pessoal dele, eu trabalho melhor. Eu,
seguindo o fundamental para fundamental, eu tenho autonomia pra poder
escolher o que eu faço em sala de aula. Então eu escolho, eu tenho minha
autonomia, eu trabalho em sala de aula o que eu acho necessário, quanto a
isso ninguém interfere, os alunos estão sempre de acordo. Eu nunca tive
assim, reclamações de pais de alunos, por estar trabalhando algum assunto
que eles não desejassem que fosse trabalhado, tenho autonomia total pra
isso. (P1)
Não é dar aula, eu tenho que pegar aquilo que eu acho que é
realmente útil e importante para eles. Meu papel é ensinar, definir,
selecionar, e ver o que eles conseguem. É sempre ir buscando o melhor para
eles. (P2)
Eu me vejo como orientadora, direcionando esse educando pra ter
uma formação mais ampla, e por isso a preocupação de estar sempre
inserindo textos ou alguma coisa que seja nova e que tenha o significado pra
eles [...]. (P3)
Eu creio que cada professor tem que ter domínio do conteúdo, e
também uma visão do que seu aluno precisa aprender, do que você precisa
ensinar. Então eu acho que é um papel mesmo importante, porque eu acho
assim, o professor que vai escolher o conteúdo, ele que está utilizando
aquele conteúdo para o ensino. [...] E é de muita responsabilidade, porque
um conteúdo mal escolhido, ele é um conteúdo mal passado também, ou
então passado de maneira errada, ou que o aluno nem precisaria estar
aprendendo naquele nível de aprendizado [...]. (P4)
[...] não participo da elaboração, como também da definição e
dos componentes que serão ministrados na sala de aula. (P5)
O meu papel é ver o que seria mais importante, dizendo que todos
são importantes, o mais que é prioridade de estudo pra eles, o que está mais
próximo da vivência dele. Então eu observo os conteúdos que podem ser
organizados com mais facilidade, e tento aplicá-lo em sala, que nós somos
mediadores do conhecimento. (P6)
Definir assim não, o conteúdo tem que ser básico da oitava série,
em cima dos projetos que a gente vai desenvolver durante o bimestre ou
semestre, fica aleatório ao professor, da maneira como ele quiser
trabalhar. (P7)
Não se tem dúvidas dos problemas atuais e das dificuldades enfrentadas pelos
professores, especialmente no planejamento das atividades de ensino-aprendizagem.
Porém, as discussões sobre a realidade educativa, precisam ser constantes na ação
96
docente, tentando buscar soluções e ações a serem desenvolvidas, juntamente com os
alunos, no cotidiano na sala de aula; pois, sem a compreensão do que se faz, sem as
competências necessárias para desenvolver o conhecimento nos diversos âmbitos, sem a
consciência do saber pensar e refletir e, sobretudo, sem a vontade de buscar inovações e
mudanças no desempenho de seu trabalho, a ação pedagógica do educador não passa de
mera reprodução de conteúdos e atividades definidas por outrem.
Nesse sentido, os resultados demonstram que a maioria dos professores
pesquisados percebe a importância do papel do professor como orientador das
atividades e, ainda, compreendem que, ao ensinar Ciências na série, o professor deve
buscar atender as necessidades dos alunos, ou seja, deve então saber selecionar o
conteúdo. Todavia, pouca preocupação entre os entrevistados com as orientações
oferecidas pelo PPP da escola. Assim, apesar de reconhecer a importância desse
conhecimento curricular, a maioria dos professores não o relaciona com as orientações
curriculares nacionais ou com os parâmetros estabelecidos para a escola no PPP,
agregando ao professor uma responsabilidade isolada de selecionar o que ensinar de
Química no ensino fundamental.
4.2.2. Bloco B – Quanto ao Conhecimento Pedagógico
Neste bloco foram feitos dez questionamentos com o objetivo de identificar
indícios acerca do conhecimento pedagógico que cada professor traz consigo.
Perguntamos se o professor utilizava livro didático na oitava série, e, em caso
afirmativo, perguntamos ainda qual livro era utilizado. Dos dez professores, nove (P1,
P2, P3, P4, P5, P6, P7, P9 e P10) responderam que utilizavam e apenas uma professora
(P8) afirma não utilizar. Os livros selecionados e adotados pelas escolas e cedidos pela
Prefeitura Municipal de Várzea Grande, durante a pesquisa foram:
“Coleção Ciências Tecnologia e Sociedade” de Cecília Valle (2004) Editora
Positivo. Esse livro é utilizado pelas professoras P1, P3 e P7;
“Ciências, Física e Química” de Carlos Barros e Wilson Roberto Paulino (2006)
Editora Ática. Esse livro é utilizado pelas professoras P2, P4 e P10;
97
“Ciências & Educação Ambiental” de Daniel Cruz (2003) Editora Ática. Esse livro
é utilizado pelos professores P5 e P6.
“Ciências Matéria e Energia” de Fernando Gewandsznajder (2005) Editora Ática.
Esse livro é utilizado pela professora P9.
Os professores que adotaram livros foram unânimes em dizer que os
selecionados são livros bons, porém declararam utilizar outros livros textos, artigos,
jornais, dentre outros como fonte complementar do livro adotado. A professora P8
revelou que não adotou livro didático porque a escola não os recebeu.
Ao questionar os professores sobre a diferença em ensinar Química e Física na
oitava série, as respostas foram as mais variadas:
Existe uma diferença, a Química ela está mais presente no dia-a-dia
deles. Na verdade, Química e Física sim, mas a Química é mais fácil de
vivenciar o que você está ensinando. E Física é mais difícil, porque muita
coisa é muito abstrata como a Matemática [...]. A Física é mais difícil
porque ela já vem com a parte Matemática, com fórmulas, com regras e não
tem, às vezes, como vivenciar, são poucas coisas [...]. (P1)
[...] a Química você vai trabalhar com as reações, com os
fenômenos, que acontece na natureza no dia-a-dia; e Física você já vai
colocar mais em prática cálculos de movimento, aceleração, velocidade,
deslocamento, intervalo de tempo. (P2)
Química eu gosto muito mais, ela fala muito da estrutura, da vida
enfim, e quando eu cito algum exemplo, em diferentes conteúdos, eu sempre
coloco ou tento colocar naquilo que pra o aluno tenha um certo significado,
porque ele vai valorizar isso com muito mais intensidade. E a gente pode
estar falando muito disso. Porque você fala da digestão, da água, você está
falando de algo que ele conhece né? Física também [...]. Mas quando
trabalho Física, também tento fazer o máximo com que ele entenda que essa
Física está sempre na nossa vida, está permeando isso em alguns
movimentos [...] em algumas situações do dia-a-dia, você está usando [...].
(P3)
Cada uma tem a sua especificidade [...] quando eu falo em
introdução à Química, eu falo mais na composição tanto dos alimentos como
na composição do planeta terra . [...] Já na Física, eu falo mais em relação ao
movimento, em relação à aceleração, então é uma coisa mais imaginária, não
é tão palpável. A Física é mais imaginária, a gente utiliza bastante a
imaginação tentando fazer desenhos pra que organize o conhecimento deles.
Já na Química, se você for trabalhar, por exemplo, substâncias simples,
puras ou misturas, você pode trabalhar com o conhecimento que ele tem
visualizando [...]. (P6)
Eu vejo a Química, como [...] coisas que estão mais presentes no
seu dia-a-dia. E a Física, por ser mais assim, teoria, cálculo, regras, é muito
mais difícil [...]. (P7)
98
[...] muita diferença. A Química, a gente vai tratar
principalmente do início, pra eles entenderem o que é átomo, o que é
molécula, as reações químicas [...] a primeira parte é conhecer os átomos,
que eles nãom nem uma noção, até a sétima série, do que é um átomo. [...]
uma coisa que eu começo desde o primeiro semestre é falar sobre os átomos,
pra eles conhecerem, né? O núcleo, eletrosfera, toda aquela parte dos
prótons elétrons, e utrons. Porque eles não fazem nem idéia. Na sica
não, a gente fala sobre os movimentos, a parte do movimento, a parte de
energia, um pouquinho também, tudo noções básica. Então tudo é bem
diferente. (P8)
[...] a Física ela foge mais um pouco. Agora a diferença que
existe, embora não tenha nenhuma diferença, porque as duas você utiliza
cálculo, né? Talvez seja a prática que eu acho que seja mais difícil, porque a
Física você quase no final do ano, né? Você trabalha mais com a
Química durante o ano. A Física você já no final do terceiro para o
quarto, então você já não apanha todo conteúdo da Física. [...] No meu ponto
de vista a Física é mais abstrata [...]. (P9)
A Física está direcionada mais na área de cálculo; e a Química faz
parte no dia-a-dia. É interessante o aluno saber sobre Química. O que é
Química, às vezes confunde um pouco, mas a Química faz parte do dia-a-dia
de cada um. [...] A Física é mais abstrata, porque a Física é mais difícil de
entender. (P10)
Quase todos entrevistados disseram que a Química faz parte do dia-a-dia,
ponderaram que existe diferença entre ensinar Química e ensinar Física, declinando
maior abstração e cálculos matemáticos à Física. Somente o professor licenciado em
Química (P5) argumentou que:
[...] a Física trabalha com os movimentos das moléculas, e a
Química trabalha com a composição dessa molécula [...] nós temos
abstração nas duas, tanto pra Física como na Química [...] a questão é que a
Física tem muitos fenômenos direto em contato com a natureza, onde o
aluno pode comprovar. (P5)
A maioria dos professores confere à Física as maiores dificuldades no ensino de
Ciências na série do ensino fundamental. É possível identificar que alguns
professores não reconhecem a Química como uma Ciência abstrata, com explicações
microscópicas, que se não forem trabalhadas adequadamente são capazes de dificultar o
seu entendimento, ocasionando inclusive obstáculos epistemológicos. Além disso,
nenhum dos professores aponta a questão da linguagem química como uma
especificidade importante dessa disciplina. Em todo caso, é possível afirmar que
embora o professor P5 não tenha apresentado em seu depoimento informações mais
amplas sobre a especificidade de cada disciplina, é possível identificar que maior
clareza no que se refere ao entendimento do ensino de Química, o que demonstra a
importância da formação na área específica.
99
Ainda nessa perspectiva, somando-se a essa idéia, Martins et al. (2003, p. 6),
afirmam que:
Para promover o envolvimento dos estudantes com o aprendizado
da Química, partimos do fato de que existe uma enorme diversidade de
materiais e transformações que permeiam a vida cotidiana. Isso constitui um
elemento facilitador da aprendizagem da Química no Ensino Fundamental.
Por outro lado, a Química lida com modelos e teorias bastante abstratos,
construindo explicações para um mundo que não se vê. Por isso, é
necessário um intenso trabalho pedagógico para que as idéias sejam
compreendidas não de modo dogmático, mas como uma ferramenta para
compreender e interferir nos processos naturais.
Quanto à Física, os mesmos autores (p. 8) afirmam que:
A sica é uma ciência que lida com um grande leque de
fenômenos naturais e tecnológicos: movimentos, sons, luz, eletricidade,
magnetismo, calor, ondas e outros [...]. Tradicionalmente, a Física é vista
como a ciência que serve de alicerce para as carreiras científico-
tecnológicas, com especial destaque às engenharias. Os livros didáticos
vincularam fortemente os conteúdos de Física na Educação Básica ao
tratamento dado a essa disciplina nos cursos de engenharia. Por isso, pouca
ênfase foi dada às contribuições da Física no tratamento de fenômenos
naturais mais próximos do cotidiano dos estudantes e de aspectos ligados à
vida. A Física, então, ficou reduzida a uma ciência "exata" e formal, mais
associada à Matemática do que as outras disciplinas da área de ciências
naturais.
Um outro destaque importante a fazer em relação à questão do entendimento dos
professores sobre as diferenças em ensinar Química e Física no ensino fundamental,
refere-se ao depoimento da professora P4, que declarou o seguinte:
[...] A Química está em tudo e em todo lugar, nos
medicamentos, na comida. Então é uma coisa mais acessível, coisas assim
que eles conseguem enxergar melhor, né? Quando você trabalha Física, é
uma coisa que eles têm que fazer uma ponte, uma conexão entre aquilo que
eles vêem, e aquilo que está sendo ensinado. Então eles m um pouco mais
de dificuldade em estar trabalhando a Física [...]. (P4) [grifo nosso]
Essa professora demonstra uma idéia complicada da Ciência Química e a
construção do conhecimento científico, que geralmente não se identifica entre os
licenciados em Química, pois essa questão costuma ser amplamente trabalhada nas
disciplinas de Prática de Ensino de Química, que é a visão da Química como único
conhecimento capaz de explicar os fenômenos. Isso é compreensível à medida que
ainda nos dias atuais encontramos livros didáticos de Química, destinados ao ensino
médio que apresentam a Ciência como sendo a única forma de conhecimento, sem
100
reconhecer a diversidade de formas do conhecimento humano e as diferenças entre elas.
Cabe ressaltar que, esse constitui-se em um critério de exclusão de uma obra no
Programa Nacional do Livro Didático para o Ensino Médio - PNLEM (BRASIL, 2007).
Sobre como os professores sujeitos desta pesquisa ensinam fenômenos físicos e
químicos, as respostas obtidas revelam a adoção unânime da conhecida estratégia
chamada de ‘aula expositiva’ seguindo livros-textos, usando a lousa e ilustrando com
exemplos do dia-a-dia. Apenas uma professora, a P1, disse que pede esse conteúdo em
forma de pesquisa escrita seguida de exposição. É importante observar nesse momento
que, o discurso anteriormente obtido nos depoimentos da maioria dos professores, sobre
a importância do professor saber selecionar o conteúdo, reverte-se em estratégias que
seguem o livro didático, o qual, por conseguinte passa a ser o orientador dos conteúdos
a serem trabalhos em sala de aula.
Ao questionarmos como os professores ensinam o conteúdo ligações químicas
no ensino fundamental, esses responderam que é por meio de ‘esquemas’ dos livros
didáticos (Professora P3, por exemplo), com estratégias como seminário, quadro e giz,
cartazes, desenhos, dentre outras. Apenas duas professoras (P1 e P2) revelaram que em
virtude do escasso tempo, não conseguem chegar a esse conteúdo, chegando apenas até
a tabela periódica, e lamentam muito esse fato.
Quanto ao ensino da estrutura atômica, as respostas revelaram que a maioria dos
professores estabelece um diálogo com os alunos utilizando a história do
desenvolvimento dos modelos atômicos, ou seja, é apresentado aos alunos uma
seqüência de modelos atômicos numa ordem cronológica, geralmente muito bem
organizada nos livros didáticos. Usam também o quadro de giz e desenhos para fazerem
a representação da estrutura atômica, conforme depoimento:
[...] eu faço com eles vários questionamentos sobre a matéria, como
é formada a matéria, as moléculas, se ouviram falar da molécula, o
exemplo que eles mais conhecem é a molécula da água, aí, molécula é
formada por átomos, se ouviram falar do átomo. vo apresenta o
átomo, desenha no quadro, mostra as partes de um átomo, como que é
formado, que o átomo assim não é uma estrutura totalmente conhecida, que
ainda tem muito mistério sobre o átomo. E eu vou apresentando, vou
questionando, vou falando as partes de um átomo, eles vão acompanhando, e
eles ‘pegam’ até bem. A estrutura atômica, eu trabalho assim. (P1)
[...] Olha, é só quadro e giz mesmo [...] e conto historinhas. (P2)
Os livros às vezes trazem alguns esquemas, né? Usando esses
esquemas você consegue estar trabalhando isso [...]. (P3)
101
Eu faço em forma de desenhos [...] eu conto a história, né? do
átomo, né? Desde quando se pensou que era uma bolinha divisível, então a
gente vai contando uma história. Nessa história a gente vai colocando os
cientistas que acabaram descobrindo a constituição atual do átomo. eu
peço pra eles fazerem os desenhos de como era o átomo de Dalton, como era
o átomo de Rutherford, e naquele desenho eles vão explicar pra mim como é
que aqueles pesquisadores pensavam que era aquela constituição naquela
época. Então eu trabalho desse jeito. (P4)
[...] eu trabalho muito em cima das pesquisas que eu faço, com isso
eu sempre conto em forma de história [...] então para mim poder explicar a
questão científica, eu trabalho com a história, então eu trabalho de forma
interdisciplinar. Então eu uso a história, eu uso a geografia, é uma estratégia
que o aluno pode estar localizando, mentalmente, como que tudo isso
aconteceu [...]. (P5)
[...] nós temos pouco material, ou é demonstração do livro [...] ou
então é através de desenhos no quadro. (P6)
[...] desenho, passo no quadro, a estrutura do átomo, tento explicar
da minha forma, da minha maneira [...]. (P7)
[...] a gente conta os vários experimentos dos cientistas, né? Porque
cada um tinha um conceito [...]. (P9)
[...] cartazes, pode pedir mesmo para eles elaborar trabalhos em
grupos e pra poder apresentar [...]. (P10)
Os professores apresentam algumas estratégias para o ensino de estrutura
atômica, mas nenhum deles refere-se à importância dos modelos no ensino de Química,
sobretudo, no ensino de estruturas atômicas. A professora P8 afirma que utiliza modelos
(bolinhas) para o ensino da estrutura atômica, com atribuições de cores para as bolinhas,
conforme podemos verificar no depoimento a seguir:
[...] a gente faz todo o desenho do átomo, mostrando o núcleo e a
eletrosfera, depois os prótons, os elétrons e os nêutrons, fazendo bem a
diferença da carga elétrica positiva e carga elétrica negativa. [...] A gente faz
tudo pintadinho, se você pegar o caderno deles do primeiro bimestre está
tudo pintadinho, as bolinhas, que eu friso bastante, não vamos falar
bolinhas, eu falo bolinha agora pra vocês aprenderem, mas essas bolinhas
são cargas elétricas positivas e cargas elétricas negativas. (P8)
A professora P8 revelou sua estratégia para ensinar estrutura atômica, porém
sabe-se que a atomística, para a maioria dos alunos, configura-se como um dos tópicos
de Química de maior complexidade, pois, além da dificuldade de compreensão os
alunos não conseguem relacionar esse conteúdo com seu dia-a-dia, dificultando ainda
mais o entendimento. Nesse sentido, Bernadelli (2004, p. 3-4) percebe que “o fracasso
do ensino de Química está vinculado à metodologia de trabalho que é inadequada ao
desenvolvimento intelectual do aluno”.
102
Apesar de estar configurada a dificuldade de compreensão, Messeder et al.
(2007, p. 1) enfatizam que é “indiscutível a importância dos modelos atômicos para a
elucidação das teorias”, e que “é preciso buscar novas metodologias para o ensino de
modelos atômicos e sua evolução, possibilitando assim, um melhor entendimento do
mundo microscópico da Química”.
Ao perguntarmos aos professores se, quando eles ensinam fenômenos físicos e
químicos, consideram que o aluno possa saber algo sobre essa temática, oito professores
responderam que consideram que sim, são eles: P1, P2, P3, P4, P5, P6, P7, P10. Os
demais professores responderam que não (P8, P9).
Em relação aos professores que consideram o conhecimento prévio do aluno ao
trabalhar os fenômenos físicos e químicos, obtivemos alguns esclarecimentos, tais
quais:
O que está bem relacionado com seu dia-a-dia, o relâmpago, a
chuva, o trovão. (P2)
O relâmpago, por exemplo. Alguma coisa do gelo. Você trabalha
algumas transformações, o bolo que ele faz em casa, o arroz que ele cozinha,
enfim, coisas do dia-a-dia. (P3)
[...] a queima do papel [...]. (P4)
[...] eu parto sempre de uma área que é muito próximo de todos
alunos, que é a cozinha da sua casa. É na cozinha da sua casa que ele vai
perceber diversos fenômenos, tanto fenômenos físicos como fenômenos
químicos. Os fenômenos físicos, ele a mudança do estado físico da água,
então ele está presenciando a água formando gelo, no congelador, ele está
vendo a água fervendo, e passando do estado líquido, para o estado de
vapor, ele está vendo o retorno. Quando a mãe coloca a tampa sobre a
panela, depois que o arroz está cozido, ela desliga, coloca a tampa, e
quando levanta a tampa está cheia de gotículas, quer dizer o retorno. Então
tudo isso ele está presenciando de fenômeno físico. E o fenômeno químico,
é o próprio cozimento do alimento [...]. (P5)
[...] dando exemplos do que ocorre no dia-a-dia, coisas que está no
ambiente que ele pode estar observando, eles conseguem fazer essa ligação.
As transformações, os fenômenos físicos e químicos, uma mistura, uma
substância, eles conseguem estar analisando uma mistura química, um
fenômeno químico e físico, o que altera e o que não altera sua estrutura [...].
(P7)
De acordo com Diniz (1998, p. 31), “o conhecimento que os alunos já dominam
sobre os conteúdos a serem trabalhados é de fundamental importância para que o
professor possa elaborar estratégias de ensino eficientes no sentido de promover o
domínio dos conteúdos científicos pretendidos”.
103
Martins (2003), assegura que o currículo de Ciências, no qual acreditamos,
pressupõe uma educação mais dialógica. Isso, por sua vez, implica propor e vivenciar
atividades nas quais se possa tomar consciência de alguns aspectos dos conhecimentos
prévios dos estudantes sobre o tema a ser desenvolvido. Assim, para resgatar e utilizar
de modo sistemático os conhecimentos prévios, é necessário pensar um currículo a
partir de contextos e temas vinculados à vivência dos estudantes. Dessa forma, cria-se
condições para a construção dos conteúdos da área estudada.
Questionamos se haviam ensinado Química de forma diferenciada das
experiências propostas, para tornar o conteúdo mais compreensível; quatro professores
disseram que ‘sim’ (P1, P3, P5, P9), e seis professoras responderam que ‘não’ (P2, P4,
P6, P7, P8, P10). Dos que responderam positivamente, perguntamos em qual conteúdo,
e solicitamos um breve comentário acerca da atividade proposta, e assim foi feito:
Os elementos, as substâncias químicas, as variedades das
substâncias, a mistura [...] a gente fez uma oficina de produto de limpeza.
Eles mesmos produziram detergente, sabão em pó, sabão em barra. (P1)
[...] ligações químicas [...] usei um baralhinho [...] por exemplo
para formar o NaCl, você tem as duas partes, e depois que você aprendeu
mais ou menos esse conteúdo, você vai colocar na prática e no joguinho
você consegue. (P3)
[...] ácidos, bases, sais e óxidos [...] você pode fazer uma solução
com água e sal, e colocar uma mpada, fazendo com que a eletricidade
passe por ele, a lâmpada vai acender, se você põe em uma água pura, a
lâmpada não acende [...]. (P5)
Foi no conteúdo sobre substâncias e misturas. [...] Falei para eles
levarem grãos de arroz, feijão, açúcar, sal, e fizemos uma mistura com todos
esses ingredientes. Através da mistura dessas substâncias, houve um
processo de separação, para que eles pudessem estar conhecendo cada um
dos processos [...] como a catação, o feijão e arroz, eles cataram, separaram.
Como a decantação, sujamos um pouquinho da água, deixamos ela
descansar, dessa forma eles passam a entender e não decorar. E eles
percebem que isso também se utiliza no cotidiano [...]. (P9)
Sobre a importância das aulas diferenciadas, Carvalho (1996), afirma que é
preciso que os professores saibam construir atividades inovadoras, que levem os alunos
a evoluírem em seus conceitos, habilidades e atitudes; mas é preciso também que eles
saibam dirigir os trabalhos dos alunos para que estes realmente alcancem os objetivos
propostos. O saber-fazer nesses casos é, muitas vezes, bem mais difícil do que o fazer
(planejar a atividade) e merece todo um trabalho de assistência e de análise crítica
dessas aulas.
104
Em outros termos, não adianta planejar uma aula para, apenas e tão-somente,
chamar a atenção do aluno, para que ele goste da disciplina. É preciso que todo o
processo educativo seja minuciosamente planejado com claros objetivos, para não se
tornar uma atividade em vão ou pouco eficiente. É preciso que a aula tenha um objetivo
e que esse seja alcançado no sentido de ensinar, promover a curiosidade e fazer com que
o aluno efetivamente compreenda com prazer o conteúdo ministrado na oportunidade.
Quando perguntamos a opinião dos professores acerca do ensino tradicional de
Ciências, os entrevistados foram unânimes em responder que são favoráveis ao ensino
tradicional, pois foi assim que aprenderam e acreditam que surte mais resultado. Veja a
resposta do professor P5, que é o único entrevistado licenciado em Química:
O ensino tradicional de Ciências, ele é bom porque eu aprendi na
escola tradicional, e eu acho que houve uma má interpretação em abandonar
esse ensino tradicional em busca de novidade. Eu penso que isso deixou o
aluno muito fraco em relação à visão da parte científica. Os conteúdos foram
levados muito para o senso comum e foi abandonada a parte científica. E
quando um aluno vai prestar um concurso ou vai fazer um vestibular, é
cobrado a ele, a parte científica, é aonde ele não consegue adentrar na
universidade. (P5)
A análise da metodologia de ensino das escolas investigadas nesta pesquisa
revela que a educação tradicional ainda é muito adotada. Nesse sentido, Kruger (2003,
p. 71), afirma que:
O Modelo Didático Tradicional é caracterizado por concepções de
ensino como uma transmissão/transferência de conhecimentos, por uma
aprendizagem receptiva e por um conhecimento absolutista e racionalista.
Destas deriva uma prática profissional que concebe os conteúdos de sala de
aula como reprodução simplificada do conhecimento científico ‘verdadeiro’,
transmitido verbalmente pelo professor (metodologias transmissivas), por
um currículo fechado e organizado de acordo com uma lógica disciplinar e
por uma avaliação classificatória e sancionadora.
Neste contexto, P1 mostrou que:
[...} eu sou a favor do ensino tradicional “na escola”. [...] quando
baseia em tradicional, é leitura, é o livro né? [...]. No geral, eu sou a favor
do tradicional, porque eu acho que tem mais resultado [...]. [grifo nosso]
Na mesma linha algumas professoras argumentam que:
[...] infelizmente a gente ainda trabalha muito o tradicional.
Dizem que é nele que aprende, né? (P2) [grifo nosso]
105
Eu aprendi assim, né? Mesmo em todo meu primeiro grau, meu
ensino médio, que foi o magistério [...]. (P3) [grifo nosso]
[...] o tradicional, ele já vai desde o conteúdo, que é separado na
oitava série, de forma a ser Física e Química. [...] o que nós temos hoje em
dia é o ensino tradicional, ele é repartido assim em temas, né? Como quinta
série, terra água, ar; sexta série seres vivos. [...] eu vou no conteúdo
tradicional [...]. (P4) [grifo nosso]
Hoje em dia o ensino tradicional, ele tem a sua validade, apesar que
vários meios de não se tornar tradicional, mas se utiliza livros, se você
utiliza quadro, é tradicional ainda. (P6) [grifo nosso]
É aquela decoreba, né? quando eu estudei era questionário,
perguntas, respostas e acabou [...] não visitava um laboratório, não tinha
acesso assim [...} e hoje em dia também sentimos muita dificuldade em
levar um aluno pra conhecer um laboratório, pra uma aula diferente.
Encontramos muita barreira. E acabamos caindo no tradicional mesmo.
(P7) [grifo nosso]
[...] Todos encontros no início do ano, quando faz também
encontros na Secretaria, nas oficinas, isso é muito falado, que a gente tem
que fazer uma aula diferenciada, né, com as aulas práticas, mas a realidade
da escola não oferece, porque eu volto a repetir, o tem laboratório, não
tem o material pra fazer em sala de aula, tem que ser inventado, aqui a
gente faz uns recortes [...]. (P8) [grifo nosso]
[...] o ensino tradicional, você somente trabalha a teoria, né? você
não tem oportunidade de estar trabalhando na prática. (P9) [grifo
nosso]
Ah, estar direcionado mais a livros didáticos e a teoria, passar
conteúdo no quadro, aluno escrevendo, copiando [...]. (P10) [grifo nosso]
Em linhas gerais, para os professores entrevistados o ensino tradicional trabalha
somente a teoria, sem vivenciar a prática, está caracterizado pela utilização de livros
didáticos, a utilização de quadro, aulas expositivas e muita ‘decoreba’. Eles
argumentam, ainda, que a dificuldade reside na carência da escola, que não oferece
laboratório, não possui material didático para trabalhar com os alunos, o espaço físico é
reduzido, portanto elencaram alguns argumentos que os levam a optar pelo ensino
tradicional.
Todavia vale ressaltar que parece que os professores ainda fazem algumas
confusões acerca do que venha a ser ensino tradicional. Argumentando, por exemplo,
que o ensino tradicional é assumido por eles, tendo em vista o uso de livros didáticos, a
utilização do quadro, a falta de laboratórios, conforme as respostas dos professores P6,
P7 e P8, reiteradas abaixo:
106
Hoje em dia o ensino tradicional, ele tem a sua validade, apesar que
vários meios de não se tornar tradicional, mas se utiliza livros, se você
utiliza quadro, é tradicional ainda. (P6) [grifo nosso]
É aquela decoreba, né? quando eu estudei era questionário,
perguntas, respostas e acabou [...] não visitava um laboratório, não tinha
acesso assim [...} e hoje em dia também sentimos muita dificuldade em
levar um aluno pra conhecer um laboratório, pra uma aula diferente.
Encontramos muita barreira. E acabamos caindo no tradicional mesmo.
(P7) [grifo nosso]
[...] Todos encontros no início do ano, quando faz também encontros
na Secretaria, nas oficinas, isso é muito falado, que a gente tem que fazer
uma aula diferenciada, né, com as aulas práticas, mas a realidade da escola
não oferece, porque eu volto a repetir, não tem laboratório, não tem o
material pra fazer em sala de aula, tem que ser inventado, aqui a gente faz
uns recortes [...]. (P8) [grifo nosso]
Ao nosso ver o ensino tradicional se caracteriza muito mais pelos seus
fundamentos, a exemplo, de como entendemos a aprendizagem, o ensino e demais
aspectos envolvidos na prática pedagógica dos professores, do que pelas técnicas e
recursos utilizados.
Na seqüência, perguntamos aos professores se eles conhecem alguma proposta
alternativa de ensino de Química para a oitava série do ensino fundamental. Dos dez
entrevistados, oito foram categóricos ao dizer que não conhecem (P1, P2, P3, P4, P5,
P7, P8, P9), e duas professoras disseram que conhecem (P6, P10), mas não souberam
explicar quais seriam essas propostas. Esses professores acrescentaram apenas que:
[...] se tivesse laboratório, se pudesse mostrar as substâncias se
transformando [...] eu acho que seria bem mais válido do que mostrar
livro e explicação no quadro. (P6)
[...] estar direcionada mais assim a pesquisas, a desenvolver, eles
mesmos, fazer pesquisa na sala de aula, procurar em livros, esse tipo de
coisa, porque ficar só no tradicional, não é o suficiente. (P10)
Em muitas falas percebemos de forma veemente a reivindicação, por parte dos
professores, do laboratório nas escolas e verificamos que em nenhuma delas existe esse
espaço. Esses dados traduzem ainda que os professores tendem a valorizar o laboratório
percebendo-o como única fonte que dispõe de recursos para o ensino, em que possam
realizar experiências contribuindo para a motivação dos alunos a participarem das aulas.
Ao nosso ver, acreditamos que o laboratório sirva de instrumento didático para auxiliar
o ensino-aprendizagem de determinados conteúdos, sem, contudo, substituir todas as
estratégias de ensino disponíveis.
107
Silva e Zanon (2000, p. 120), são enfáticas em dizer que:
Quando usualmente expressam posições ou impressões
relativamente ao ensino experimental, professores costumam dizer que é
fundamental para melhorar o ensino, mas lamentam a carência de condições
pra tal, referindo-se a turmas grandes, inadequação da infra-estrutura
física/material, carga horária reduzida. Nem sempre focalizam os aspectos
centrais dessa problemática que, ao nosso ver, dizem respeito à carência na
formação docente: a falta de clareza sobre o papel da experimentação na
aprendizagem dos alunos.
Afirmam ainda que as aulas experimentais não asseguram as aprendizagens
significativas dos alunos, e as relações entre teoria e prática, complementando que “a
relação teoria-prática é usualmente vista e tratada nas salas de aula como uma via de
mão única, em que a prática comprova a teoria, ou vice versa” (SILVA e ZANON,
2000, p. 120).
Da mesma forma que Silva e Zanon (2000), pensamos que é preciso que a
experimentação no Ensino de Ciências, deixe de ser tratada como uma mera atividade
física dos alunos, como uma visão simplista; as Ciências experimentais devem sim
envolver menos experimentos e mais reflexão, possibilitando uma nova forma dos
alunos visualizarem as práticas científicas.
Baptista (2005), em seu artigo sobre ‘a utilização de recursos didáticos
alternativos no ensino das Ciências’, enfatiza a importância de se criar recursos
didáticos alternativos nas aulas de Ciências e deixar de perceber que os recursos
didáticos não representam apenas aqueles contidos em um laboratório. Nessa linha,
ressalta que:
A idéia de recursos didáticos alternativos não pretende ser a
solução para os inúmeros problemas que perpassam o ensino e a
aprendizagem de Ciências na atualidade. Do mesmo modo, não significa
dispensar o laboratório, mas sim deixar de percebê-lo como única fonte que
dispõe de recursos para o ensino (Idem, p. 2).
Quanto à avaliação da aprendizagem dos conhecimentos de Química na oitava
série do ensino fundamental, os professores mostraram que:
A avaliação é feita à base de atividades escritas, trabalhos,
questionamentos, a participação deles em sala de aula, prova escrita, prova
oral, só. (P1)
Aqui nós fazemos testes, nós fazemos seminários, prova escrita,
oral [...]. (P2)
108
Eu uso um pouco o lúdico, desenhos, esquemas, oral, a gente
conversa como é que você entendeu isso. [...] não faço todos os dias, cada
dia eu faço com um pouco, o fico assim na avaliação só escrita, só escrita,
não. Mas a gente faz essa avaliação escrita. Então seria avaliação escrita,
oral – mais um diálogo, né? E nessa avaliação escrita entra tudo aquilo que a
gente trabalhou, é óbvio. (P3)
[...] para eu avaliar, primeiro é o conhecimento que ele já traz de
casa, e o que ele pode estar colocando em relação aquele conteúdo, né? E a
outra avaliação eu procuro não trabalhar assim a questão, por exemplo,
decoreba da tabela periódica, isso eu não trabalho [...], então eu não preciso
fazer com que ele decore a tabela, mas eu preciso fazer com que ele olhe
uma tabela, entenda os números que estão na tabela, nas letras, o que
significa, como que chegaram aquela conclusão, né? Isso eu faço na
avaliação [...]. Eu não trabalho com esse método de decorar na Química de
oitava série. (P4)
[...] prova [...], seminário (leitura, explicação, a escrita e os
cartazes), [...] as atividades no caderno, [...] a pesquisa, [...] sua presença na
sala de aula [...]. (P5)
[...] questionamentos [...], avalio o interesse dos alunos [...]
exercícios que eu proponho em sala, [...] prova escrita, [...]. (P6)
[...] provas escritas, trabalhos, apresentação de seminários, tudo
isso é avaliado. (P7)
Provas, participação, apresentação de trabalhos, exercícios. (P8)
Olha, a minha avaliação ela é cotidiana, todos os dias eu avalio, tá?
Trabalhos produtivos, exercícios produtivos, aula prática, participação dos
alunos, que é muito importante, né? E uma correção no final do semestre. E
seminários também. (P9)
Avaliação eu faço no dia-a-dia, né? A participação do aluno, o
interesse do aluno, não faço prova oral, faço mais assim trabalhos em grupo,
observo o aluno se ele está fazendo atividade ou não, e também faço prova
escrita, né? Faço seminários, apresentação de trabalho, apresentação em
grupo. Tudo é avaliado. (P10)
Estes dados levam-nos a inferir que os professores, ao utilizarem avaliações
escritas, orais, seminários, participação, presença, trabalhos em grupo, testes e
exercícios, mesmo sem muita consciência, exercitam uma prática de avaliação numa
perspectiva mais crítica, ética e transformadora.
No que se refere à capacidade dos alunos, e se estão preparados cognitivamente
para aprender Química na oitava série, quatro professoras (P1, P2, P3, P10) afirmam
que não consideram seus alunos aptos à aprendizagem de Química na série. Os
demais professores (P4, P5, P6, P7, P8, P9), ao contrário, acreditam que seus alunos
estão preparados cognitivamente para aprender Química no ensino fundamental.
Aqueles professores que disseram que os alunos não possuem preparo cognitivo
para aprender a Química nesse nível de ensino, justificaram suas respostas mediante a
109
heterogeneidade das salas; desinteresse e confusão dos alunos; e, sobretudo, porque a
Química é introduzida de forma tardia na vida dos estudantes do ensino fundamental.
Sobre isso, os professores consideram que os conhecimentos químicos deveriam
aparecer também nas séries anteriores, conforme declarações:
Não, a sala é muito heterogênea, você encontra alunos que estão
bem preparados, que eles entendem fácil o que você explica, tem aluno que
tem a maior dificuldade, uns não escrevem bem, não lêem bem, não
entendem. Você explica, explica, explica e ele não tem o raciocínio bom, ele
não junta as partes. Assim, é muito variado, eu acho que deveria ser como
foi muitos anos atrás, as salas eram separadas de acordo com a
aprendizagem. Porque uns perdem, outros ganham, né? Vem de diferentes
escolas, passou por diferentes profissionais, hoje a gente acha todo tipo de
profissional, então tem aluno bem preparado e tem aluno muito mal
preparado. (P1)
Olha, eu acho que não. Tem dia que eu entro nas salas, eu fico triste
de ver a falta de interesse dos alunos. (P2)
No começo eu acho que eles ficam um pouco assustados, mas
depois você vai colocando de maneira mais, assim, gradativa, ampliando
essa dificuldade. E assim, eles fazem uma confusão muito grande e
perguntam ‘professora, você é professora de ciências, professora de Química
ou professora de Física?’ [...]. (P3)
Se eles estão preparados totalmente não, porque a Química deveria
ser trabalhada bem antes, né? E falta muito interesse dos alunos. É
novidade para eles. (P10)
Os professores (P4, P5, P6, P7, P8, P9), que disseram que os alunos possuem
preparo cognitivo para aprender Química, argumentaram da seguinte forma:
Eu acho que eles estão, sim, preparados na oitava série, e o que a
gente tem que tomar cuidado, é que ele vem com uma visão da Química
diferente daquela que a gente quer passar pra eles. Então, às vezes eu tenho
um aluno que acha que “ah a Química é ruim”. Porque fala que alimento é
Química, então aquele alimento não é bom. Então, quando você começa a
trabalhar, eles começam a descobrir que a Química é importante, sim [...].
(P4)
Eu acredito que com essa nova geração está preparada
cognitivamente devido à gama de informações que a televisão [...]
Algumas escolas não têm nem sala de computação. Com isso, o aluno vive
no seu dia-a-dia uma tecnologia de ponta, e quando ele vai à escola e tem
que ser ensinado como se ensinava na idade média. Então isso é uma queda
muito brusca, e o aluno que não existe nada relacionado com a vida
dele e a escola. Então a escola não se torna atrativa. Por mais que se brinque,
por mais que se crie coisas na escola, ela não se torna atrativa porque o
Governo Federal não emprega a verba justamente, para que a escola se torne
um complemento da tecnologia que ele tem na sua casa. (P5)
[...] são coisas que, se você explicar a maneira como que forma
outras substâncias, a maneira como que ela é organizada e desenvolvida,
110
você faz com que eles se interessem pelo estudo de Química,;na oitava série,
a nossa função é exatamente essa, que eles se interessem, primeiro passem a
se interessar pela disciplina de Química. (P6)
Sim [...] tem aluno que possui, sim, capacidade de entender e
compreender de uma forma assim mais rápida. São interessados sim, tem
alunos que são muito bons, que tem bagagem muito boa. (P7)
[...] meus alunos vieram estudando comigo desde a quinta série, e
eu friso bastante pra eles [...] que eles precisam aprender o básico agora [...]
eu friso muito com eles que eles precisam saber o básico [...] Eu acho que
60% deles vão ter uma boa noção básica para quando forem para o primeiro
ano. (P8)
Eles têm capacidade, sim, são inteligentes, eles correm atrás. Eles
buscam. Têm, sim, capacidade. (P9)
Quanto ao fato das formações dos professores entrevistados serem adequadas
para ensinar Química na oitava série, quatro professoras (P1, P6, P7, P9) disseram que
‘não’, argumentando que:
Porque quando eu fiz faculdade, não foi bem enfatizada assim, a
Química e a Física. O que eu aprendi, na verdade, é uma coisa mais
ampla, mais aprofundada, que não está no nível deles. Então não foi
aquele básico que você vai ensinar. Eu aprendi a Química e a Física no nível
superior, mas não é a Química e a Física que eu utilizo na sala de aula. (P1)
[grifo nosso]
Não é adequada porque pra isso eu teria que ter muito mais
estudo na área de Química. (P6) [grifo nosso]
Porque durante a minha faculdade, durante o curso que fiz, vim do
ensino médio, que era magistério, então já não teve assim aquela bagagem,
porque é formação de professor. fui pra faculdade; chegando na
faculdade, eu não tive base nenhuma de como eu trabalhar conteúdos de
Ciências, de quinta a oitava série, o que é necessário trabalhar, não
tivemos formação nisso, isso seria na matéria didática. E nós não tivemos
isso. (P7) [grifo nosso]
Acho que porque faltou mais alguma coisa na graduação. Acho
que na graduação foram muito pouco enfatizados os conteúdos que são
ministrados (Ensino Fundamental). No meu curso, eu fiz modular, e modular
ele é muito corrido, né? (P9) [grifo nosso]
Os depoimentos dessas professoras comprovam que a formação deveria ser um
dos aspectos determinantes para definir a competência (entendida aqui como ‘fazer bem
feito’) para o ensino de Química no ensino fundamental. É possível observar que os
professores reconhecem a deficiência oriunda da formação inicial, em relação aos
conhecimentos químicos e pedagógicos necessários à função.
Dentre essas quatro professoras (P1, P6, P7, P9), que reconhecem a deficiência
na formação, notamos que a P7 era a mais incomodada com o fato de não ter graduação
111
em Química e reconhecer a deficiência para ensinar a disciplina. Essa professora
argumenta que em sua graduação teve apenas uma relacionada à Química e a outra
relacionada à Física. Mesmo assumindo a inadequação para o cargo designado, declara
que ainda assim prefere ministrar Química do que Física; porém, em ambas asseverou
que deixa conteúdo para trás ou seja, alguns conteúdos não são ministrados, por falta de
entendimento do conhecimento químico/físico. A sua insegurança ficou ainda mais
evidente quando perguntamos o seguinte: e quando surge uma dificuldade no decorrer
do conteúdo? Ela respondeu com firmeza que:
Muitas vezes a gente aquele conteúdo e sabe que não vai dar
conta, e não tem como passar para o aluno, a gente pula. Passa pra
frente. Passa pra frente e não aquele conteúdo. E muitas vezes, fala ao
aluno que ele vai aprender no primeiro ano, na onde ele vai começar a
Química e a Física separadas; e a gente trabalha outro conteúdo ali, que seja
até mais fácil pra gente, e pula, e pula. (P7) [grifo nosso]
Esse ‘pula, pula’ de conteúdos, declarado pela professora, obviamente, é um
sério problema no ensino de Química na série nas escolas municipais de Várzea
Grande. Isso, sobretudo, caracteriza a deficiência do conhecimento do conteúdo
específico, que por sua vez afeta a prática docente que, por conseguinte pode causar
complicações educacionais das mais variadas, que pode inclusive ajudar a explicar o
baixo nível de aprendizagem em Ciências Naturais, conforme informações da SMEC-
VG/MT, citadas no capítulo I. Podemos citar ainda, mediante o depoimento da
professora, a problemática que é a questão da formação inicial nos cursos na área de
Ciências Naturais (Química, Física e Biologia); preocupação muito mais com a
formação para o ensino médio, em detrimento do ensino de Ciências no ensino
fundamental.
Ademais, podemos citar Wallace e Louden
60
(1992) (apud LONGUINI e
NARDI, 2002, p. 3), em seu artigo intitulado ‘uma pesquisa sobre a prática reflexiva na
formação inicial de professores de Física’, no qual afirmam que “quando um certo
conhecimento não é familiar aos professores, além de se aterem ao livro didático para
buscarem conhecimento, eles evitam ensinar os conteúdos que desconhecem”.
Ao observar cuidadosamente as falas dos professores, notamos uma insatisfação
quanto ao aprendizado que os mesmos tiveram no ensino médio e/ou no ensino superior,
60
WALLACE, J; LOUDEN, W. Science Teaching and Knowledge: prospects for Reform of Elementary
Classrooms. Science Education, v. 76, n. 5, p. 507-21, 1992.
112
declinando a esses a deficiência que possuem, e por isso consideram justo sentirem
dificuldade em ensinar Química na oitava série.
Somando-se a essa idéia, Weber (2007, p. 1), em seu artigo denominado ‘eles
ensinam sem terem aprendido’, afirma que:
A formação dos professores é apontada por especialistas como
uma das principais causas do fraco desempenho dos estudantes brasileiros
na última prova do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA),
que deixou o Brasil em 52º lugar entre 57 países e territórios.
Nesse sentido, Zanon e Palharini (1995), enfatizam que o professor de Ciências
tem formação deficiente em Química. As autoras destacam ainda, a necessidade da
Química ser contemplada em séries anteriores à oitava série, e não tardiamente como
vimos na realidade estudada.
4.2.3. Bloco C Concepções Manifestadas Quanto ao Conhecimento do
Conteúdo
Este bloco ficou reservado para investigarmos os possíveis conhecimentos do
conteúdo que o professor tem acerca da disciplina Química.
Primeiramente perguntamos o que o professor entende por Ciência, e obtivemos
as seguintes respostas:
[...] é o conhecimento da vida, tudo que envolve a vida. Conhecer
o mundo, as formas de vida, e tudo em torno da vida. Tudo que gera, ou que
é conseqüência ou que envolve o bem-estar. (P1) [grifo nosso]
Eu acho que Ciência é o seu dia-a-dia, é o ambiente que você vive,
é o contato, tudo envolve Ciência hoje em dia. (P2) [grifo nosso]
Ciência é a vida, desde da molécula da célula, enfim, é você, é o
conjunto, é isso que a gente respira, eu acho que todo mundo tem que ter
uma noção, que, pelo menos de que nós somos o conjunto disso tudo, que é
o minúsculo que vai pro macro. (P3) [grifo nosso]
É um estudo, estudo da natureza. (P4) [grifo nosso]
A Ciência pra mim, ela está englobada em toda vida. Quando a
gente fala Ciência, ela não é especificamente Ciências Naturais, como
muitos colocam como componente curricular; a Ciência, ela faz parte do ser
humano, desde a pré-história que o homem faz Ciência. Embora ela não
estava ainda catalogada como está nos dias de hoje. Mas a descoberta do
fogo é Ciência; a comunicação das palavras é Ciência; o posicionamento
113
geográfico, que o homem era nômade, que mudava de uma região para
outra, é Ciência; à volta da fogueira e contar a história de toda vida, que os
antepassados viveram. Então a Ciência, ela está ligada desde o começo, que
a gente nasce, até o último suspiro de vida; apenas ela foi sistematizada pelo
homem, e o componente para que o homem pudesse compreender ela como
um todo. (P5) [grifo nosso]
Ciência, sendo ela uma disciplina, ela é maravilhosa quando você
quer saber em relação aos seres vivos; quando você trabalha os seres vivos,
a relação dos seres vivos, a vida das pessoas, o habitat das pessoas, quando
você trabalha a composição das substâncias, o funcionamento do corpo
humano; então, todas essas partes, desde o minúsculo até o corpo humano
em geral, no caso, os seres vivos maiores, nós observamos que a Ciência, ela
é maravilhosa, porque traz ao aluno a coisa que ele conhece. (P6) [grifo
nosso]
Entendo por Ciências estudar o ambiente, as transformações que
ocorrem nesse ambiente, o porquê, todas as formas de vida e existência
nesse ambiente. (P7) [grifo nosso]
[...] Ciência é Química, é Física, é Biologia, é Matemática, isso
tudo é Ciência [...] é o estudo dos animais e dos vegetais, dos
microorganismos, tudo isso é Ciência. (P8) [grifo nosso]
Ciência, ela é em si uma matéria que estuda a vida, estuda o
ambiente, os seres vivos. (P9) [grifo nosso]
Ciências é tudo, é você estudar os fenômenos, você estudar a
natureza, vo estudar a evolução; então, ciência faz parte da vida da
pessoa. (P10) [grifo nosso]
Conforme os trechos anteriores, percebemos que os professores, quando
indagados sobre o que é a Ciência, manifestaram uma representação de Ciência
vinculada apenas ao aspecto escolar, entendem Ciência como sinônimo de área de
conhecimento, mas praticamente todos os entrevistados relacionam a Ciência com a
vida das pessoas e, de certa forma, numa alusão às Ciências Naturais.
No artigo intitulado ‘Tendência da prática do professor de ciências: um olhar
para o ensino público fundamental do município de Belém’, escrito por Manfredo e
Santana (2004, p. 10), quando indagam seus sujeitos a respeito do mesmo tema,
percebem que:
De modo geral, que todos os professores não estabelecem uma
relação entre Ciência como conteúdo a ser ensinado e a ciência enquanto
produção humana atrelada às definições e legitimações afetas ao contexto
político, econômico e cultural da sociedade. Não há, da mesma forma, uma
referência explícita a aspectos polêmicos e ambíguos associados à ciência
[...]. Enfim, a discussão das contradições presentes no conhecimento
científico em nenhum momento é frisado pelos sujeitos da investigação.
Parece-nos que a Ciência e seus determinantes ainda encontram-se distantes
da escola.
114
Ainda, Manfredo e Santana (2004), enfatizam a necessidade de estudos em
Filosofia e principalmente em História da Ciência. Machado e Leão (2003)
61
(apud
MANFREDO e SANTANA, 2004, p. 11) ainda corroboram, destacando que:
Os efeitos positivos do uso da História da Ciência no trabalho
docente a saber, a introdução de aspectos socioculturais nas aulas;
historização das descobertas, a ruptura com o positivismo das aulas e dos
livros didáticos; ruptura com o senso comum na relação ontogênese x
filogênese; compreensão dos problemas científicos de hoje e seus
desdobramentos e finalmente, para dizer aos alunos o que é Ciência.
Nesse contexto fica clara a importância do enfoque histórico da Ciência para
sua completa compreensão. No entanto, essa discussão não se configura no discurso da
maioria dos professores envolvidos, o que implica, segundo Manfredo e Santana (2004),
em uma certa limitação na postura epistemológica sobre a natureza da Ciência e do
conhecimento científico, necessária a uma prática pedagógica diferenciada.
Na seqüência da entrevista, perguntamos aos professores o que eles entendem
por Química, e eles assim responderam:
A palavra Química, pra mim vem assim, as reações, as misturas as
substâncias, os componentes, os elementos que existem. Tudo que passa ao
nosso redor tem química, então eu vejo o material, do que é feito cada
coisa [...]. (P1) [grifo nosso]
Química são as transformações que acontecem no nosso meio, no
nosso dia-a-dia. (P2)
É a estrutura de tudo que existe, ela é a fonte, é o básico. (P3)
[grifo nosso]
Química estuda a constituição dos seres vivos, ela vai estudar os
fenômenos, a constituição de cada ser vivo, como ele é constituído. (P4)
A Química, ela é um componente curricular que está determinado
no ensino, tanto fundamental como ensino médio e ensino superior, mas a
Química ela é a nossa vida. Nós não conseguimos viver sem Química,
porque ela está presente no nosso organismo, através dos hormônios que nos
sensação de sede, de sono, ela está presente nos produtos que a gente
ingere de alimentação, nos produtos de limpeza que nós usamos na nossa
casa, nos venenos pra matar os insetos, na pasta de dente pra escovar os
dentes de manhã. A substância química, ela está presente até no nosso olho,
é uma substância chamada rodopsina, se ela não fizer um giro de 180° logo
cedo, você não enxerga nada, você é uma pessoa cega. Então essa substância
é importantíssima pra que o primeiro raio de luz entre nos seus olhos e você
começa a enxergar o mundo. (P5) [grifo nosso]
61
MACHADO, J.; LEÃO, C. A História da Ciência como instrumento de educação científica. NPADC,
Belém, 2003.
115
[...] Eu penso em substâncias se transformando, eu penso na
composição dos seres vivos, eu penso na composição dos alimentos. Então
quando eu vejo a palavra Química, desde o que faz com que a gente cure,
que são os remédios, até com a composição que é feita por nós mesmos.
(P6)
Química, é que tudo pode ser mudado, transformado, dali daquela
substância posso formar uma outra substância [...]. (P7)
[...] Química envolve muito: transformação, modificações. [P8]
Química, ela não é algo que você pensa que é desastroso, porque a
Química está no nosso corpo, está na nossa alimentação, ela vem
acompanhada nas substâncias que nós utilizamos. Então pra mim a Química,
ela é somente mudanças, transformações de matéria. (P9)
[...] Química é a evolução, Química é você analisar, é você estudar,
verificar as modificações no dia-a-dia, nós estamos constantemente
relacionados com a Química. (P10)
É importante observar que em algumas respostas é possível identificar a
questão de que a Química é tudo e está em tudo, como sendo a única (ou a melhor)
forma de conhecimento (dentre outras considerações), conforme discutimos em
tópico anterior, e esta é uma questão inadequada de considerar a Química,
principalmente, na construção do conhecimento.
No que se refere à classificação do domínio do conteúdo de Química, tem-se
que de dez professores, seis classificam o seu domínio como ‘bom’ (P2, P3, P4, P5, P6,
P10).
Uma professora considera-se limitada em relação ao conteúdo (P1), conforme
depoimento:
Eu tenho dificuldade no domínio de Química, por causa do meu
conhecimento. Eu não tenho conhecimento amplo. [...]. Em Química eu sou
limitada, não tenho conhecimento sobre ela. Então, tem coisa que fica assim
meio no ar, eu tenho interrogações, não sei pra onde eu vou com aquele
conteúdo, não consigo fechar aquilo na minha cabeça, o concreto daquilo.
Então eu tenho dificuldade. (P1)
A professora P7 classifica da seguinte forma: “Eu diria regular. Principalmente
em relação à tabela periódica, a esse conteúdo assim, eu sinto muita dificuldade”. a
professora P8 pondera, afirmando “meu conhecimento de Química e Física é para o
básico mesmo”. Para a professora P9, o seu conhecimento do conteúdo de Química
pode ser classificado com razoável e argumenta:
É porque a gente como professor sente que está faltando alguma
coisa. Você nunca está satisfeito com aquilo que voministrou, que você
116
passou, você fica em dúvida, ai, será que ele entendeu mesmo aquilo que eu
quis passar? [...]. (P9)
Analisando as falas das professoras (P1, P7, P8, P9), percebemos que algumas
reconhecem a limitação de conhecimento para ministrar aulas de Química. Segundo
Farias (2005, p. 19), “ninguém pode ensinar aquilo que não sabe” em outras palavras, se
você é professor de Química, estude Química.
Ao questionar os professores sobre o que significa ensinar Ciências na oitava
série, quatro (P1, P4, P7, P8), de dez professores, disseram que significa preparar o
aluno para o ensino médio. Os demais professores relacionaram o ensino de Química
com o dia-a-dia, com a nossa vida, com a evolução.
Quando perguntamos se ensinar Ciências na oitava série é fácil ou difícil, quatro
professores (P2, P3, P5, P6) responderam que acham fácil e seis responderam que
acham difícil (P1, P4, P7, P8, P9, P10). Aquelas que consideram que ensinar Ciências é
difícil, argumentam da seguinte forma:
É a série que eu me sinto menos preparada. [...] é bom o
professor, quando ele tem o domínio de tudo que ele faz. Se eu o tenho
um bom domínio, é uma coisa que não é tão prazerosa pra mim, pela
minha dificuldade, não do aluno. Apesar da gente estudar, procurar passar
da melhor maneira possível, como eu me sinto limitada, eu não me sinto
bem. Não é a série que eu mais gosto. (P1) [grifo nosso]
[...] porque você sempre tem que ver a atualidade, né? Não tem
como você ensinar Ciências, sem assistir, ler uma revista, não tem. Na
oitava série, ainda é mais complicado, porque não são temas de fácil
entendimento para o aluno, e até às vezes o professor também acaba se
atrapalhando em alguma coisa. Mas eu gosto de ensinar [...], e sempre
‘peguei’ oitava série. Porque eu sempre gostei [...] Então ensinar Ciências,
pra mim, na oitava série, é difícil porque a gente tem que estar buscando
outras fontes, você não pode simplesmente falar eu sei o conteúdo, e
utilizar esse conteúdo o ano inteiro. (P4) [grifo nosso]
Pela dificuldade mesmo que a gente tem, pela formação, pela base
que nós não tivemos durante a graduação. [...] mas nós professores, durante
a nossa graduação, não tivemos como introduzir os conteúdos na sala de
aula. Escolhi ciências na oitava série porque não tenho opções. Ou é isso ou
é nada. Ou você pega isso ou você fica desempregada. (P7) [grifo nosso]
Porque na minha graduação, eu tive um semestre só de Física. (P9)
Essas falas caracterizam ainda mais a dificuldade dos professores em relação
ao conhecimento do conteúdo, fato esse que os tornam fragilizados, inseguros,
despreparados, chegando a classificar determinados conteúdos como muito difíceis. Isso
pode ser declinado à formação não adequada que cada um teve para ministrar a
117
disciplina Química, pois, como já dito anteriormente, esses professores são licenciados
em Ciências Biológicas. Vale lembrar que os professores P4 e P8 disseram no bloco
anterior que sua formação é adequada para o ensino da Química no ensino fundamental,
e, ainda, os professores P4 e P10 afirmam, neste bloco, na questão que se refere à
classificação do domínio do conteúdo de Química, que seu domínio era bom, porém
revelam achar difícil ministrar a disciplina Química na oitava série.
Vale ressaltar que alguns professores também atribuem aos alunos a sua
dificuldade em ensinar Ciências, como é o caso das professoras P8 e P10:
[...] o que eu acho mais difícil é fazer com que meus alunos da
oitava série se conscientize dessa responsabilidade que eles tem de aprender
isso agora, [...] acho que por saber que vão terminar a oitava, que é o
oitavão, eles ficam muito assim, exitados, né? vão terminar, são donos
de si, já tem quinze anos, quatorze, né? Então essa parte que é difícil. (P8)
Uma porque você está em contato com adolescentes. Não é fácil,
estou dizendo, não em relação à matéria, e sim devido aos alunos, a faixa
etária, [...] tem alunos interessados, mas a sala que estou trabalhando é uma
sala muito difícil de trabalhar, porque eles são muito rebeldes, muito
danados, eles não respeitam, então você tem que ter técnicas pra poder
chamar atenção. (P10)
Quanto à seleção do conteúdo de Química, a ser ministrado, a maioria dos
professores disseram que seguem a seqüência do livro que está dentro do mínimo a ser
ministrado. O professor P5 disse: “[...] esses conteúdos são selecionados de acordo com
o nosso programa curricular, então eu analiso os tópicos necessários que o aluno precisa
adquirir de conhecimento, não só para a sua vida, como para o ensino médio, o qual será
cobrado de forma científica”. A Professora P10 relatou que “[...] primeiro eu estou
seguindo o planejamento para poder trabalhar, então eu vou selecionando nos livros”.
Os professores que seguem a seqüência do livro disseram que selecionam dessa forma
porque um conteúdo é pré-requisito do outro, e a seqüência atinge seus objetivos. Os
professores P1, P2, P3, P4, P5, P6, P9 e P10, acreditam que os conteúdos selecionados
conforme mencionaram proporcionam uma visão atual de Ciências. Apenas a professora
P8 argumenta que “o pouco que eu dou, ainda é pouco pra eles, eu acho que quando
eles tiverem no primeiro ano, ou no terceiro ano, eles vão ter uma idéia geral mesmo do
que é a Química”. E a professora P7 afirmou que a forma como os conteúdos são
selecionados não proporciona uma visão atual de Ciências, asseverando que:
[...] a gente poderia selecionar o conteúdo de acordo com o grau de
conhecimento dos alunos, de uma maneira mais fácil de entendimento deles.
118
Geralmente o que vem no livro didático, os alunos não tem aquela bagagem
para entender e compreender o que está selecionado. Como esse ano já foi
mudado, o que vem pra escola nós professores não elaboramos, né? Como fala
‘proposta curricular’, ‘conteúdo necessário’, precisa ser de cada escola, como
que deve ser, porque nós professores, que estamos em sala de aula, que
sabemos o grau de conhecimento dos alunos. No entanto, em cada 3 anos é
mudado o livro didático, como esse ano nós escolhemos para o ano letivo de
2008, então já é outro livro.
Apenas a professora P7 afirma que os conteúdos selecionados dessa forma não
são acessíveis aos alunos e nem suscetíveis de interesse, enfatizando em sua fala o
seguinte: “não, não apresenta tanto interesse assim não. E chegam também na oitava
série, achando que eles estão saindo da escola, que eles estão no último ano. Poderia ter
mais interesse da parte deles”.
Dentre os conteúdos sugeridos
62
pelos documentos das escolas, os professores
elencaram aqueles que possuem mais facilidade, como mostram os relatos:
[...] compostos orgânicos e inorgânicos [...] estrutura e identificação
do átomo, tabela periódica. (P1)
Matéria e energia, fenômenos físicos da matéria, propriedades
gerais, separação de misturas [...]. (P2)
Estados físicos da matéria, propriedades gerais [...]. (P3)
[...] fenômenos físicos e químicos [...] Substâncias simples e
compostas, separação de misturas e soluções [...]. (P4)
Substâncias simples e compostas, substâncias orgânicas e
inorgânicas. (P6)
Separação de misturas, soluções, substâncias simples e compostas,
estados físicos da matéria, os conceitos de matéria. (P7)
Estrutura e identificação dos átomos. (P8)
Conceito da matéria e energia, os fenômenos químico e físico. (P9)
Substâncias simples e compostas. (P10)
Apenas o professor P5 disse sentir facilidade em todos conteúdos supra-
citados, o que pode conferir à medida que se trata do único professor licenciado em
Química.
62
Conteúdos sugeridos pela ementa das escolas: conceito de matéria e energia, fenômenos físicos e
químicos, estados físicos da matéria, propriedades gerais e específicas da matéria, substâncias
simples e compostas, substâncias orgânicas e inorgânicas, separação de misturas e soluções, estrutura
e identificação dos átomos, classificação periódica dos elementos químicos, ligações químicas,
fórmulas e reações químicas e funções químicas inorgânicas.
119
Olha, pra mim, desses conteúdos analisados, eu não tenho
dificuldade em nenhum, porque todos eles estão relacionados à vida, ao dia-
a-dia. No momento que você tem os conceitos de matéria e energia;
fenômenos físicos e químicos que acontecem no seu dia-a-dia; dos estados
físicos da matéria, sólido, líquido e gasoso; as propriedades; as substâncias
simples e compostas; a separação de misturas, a qual você tem misturas
homogêneas e heterogêneas; estrutura do átomo que vai compor essas
substâncias; a classificação periódica, que demonstra que através dessa
classificação periódica, o homem compreendeu como que os átomos são e
como eles fazem essas ligações para ver as substâncias necessárias para o
dia-a-dia; as fórmulas e as reações, que são funções inorgânicas, no caso é o
ácido, a base, o sal e os óxidos [...]. (P5)
E quanto à dificuldade em ensinar os conteúdos acima, as respostas
evidenciaram o conteúdo de Ligações Químicas, que se apresenta como dificuldade para
as professoras P1, P2, P4, P9 e P10; Funções Químicas Inorgânicas, foi citada pela
professora P3; Estrutura e Identificação dos Átomos, pelas professoras P6 e P7;
Classificação Periódica dos Elementos, pelas professoras P7 e P9; e o conteúdo
Fórmulas e Reações Químicas foi mencionado pelas professoras P8, P9 e P4.
As professoras P1, P2, P3, P6, P8 e P10 sentem dificuldade em ensinar apenas
um item do conteúdo, as professoras P4 e P7 em dois itens do conteúdo, e a professora
P9 revelou sentir dificuldades em ensinar três itens do conteúdo. Porém o professor P5,
que é formado em Licenciatura em Química, disse não ter nenhuma dificuldade em
ensinar os conteúdos sugeridos pela ementa da escola em que leciona. As demais
professoras relataram o porquê da dificuldade:
De ligações químicas pra frente começa a dificuldade, porque
nunca a gente pra trabalhar isso aí; quando inicia um trabalho que você
fez muito pouco sobre ele, que vão surgir as dificuldades, e você tem que
buscar outros meios pra poder se inteirar no assunto. (P1)
Não tem material, eu acho muito abstrato pra ensinar pra eles.
Eu tenho dificuldade e não consigo chegar nela também. Olha aqui,
fórmulas e reações, eles não conseguem montar fórmulas de Química. Hora
que chega nos sais ácidos, bases, eles não conseguem. (P2) [grifo nosso]
Por causa da aceitação, eles m que ter conteúdo significativo e
atrativo. (P3)
Porque é muito abstrato pra eles, não tem exemplos assim de
vivência que possa ser relacionado com isso. (P4) [grifo nosso]
A estrutura atômica é uma coisa que a gente explica, mas [...] por
mais que você fale nêutrons, prótons e elétrons, é uma coisa mais
imaginária, então não tem como eles visualizarem. através de desenhos,
mas não dá para pegar porque já que é bem pequeno, e nós não temos
também materiais adequados para isso. (P6)
120
Porque não tivemos como trabalhar de uma maneira diferente, na
formação, com essa tabela, [...] porque a hora que chega ali na distribuição,
os alunos sentem muita dificuldade. Muuuita. (P7)
[...] Eu tenho mais dificuldade de passar pra eles porque é mais
complexo para eles entenderem; não é em uma aula nem duas, tem que fazer
os exercícios, ir corrigindo, e através dos exercícios que eles vão fazendo,
que eles vão entendendo, não na primeira explicação que eles vão
entender as fórmulas. (P8)
Eu acho que é porque são coisas novas pra eles [...] porque é a
primeira vez que eles estão vendo, estão estudando esse conteúdo, então por
isso que há dificuldade. (P9)
Porque não é fácil. Não é fácil para que eles entendam. Então você
tem que trabalhar bastante e da melhor forma possível para que possa ser
entendido. (P10)
A falta de material adequado, segundo a fala das professoras P2 e P6, é um dos
agravantes para que tenham dificuldades em ensinar os conteúdos; em nenhum
momento foi registrado que o problema estava na formação do professor.
Sobre isso, Wallace e Louden (1992), mostram: muitos professores, quando
defrontados com suas próprias deficiências, apontam outros fatores como responsáveis
pelos problemas, tais como falta de tempo para preparação das aulas, currículos
apertados ou mesmo falta de material.
Importante ressaltar que três professoras (P2, P4 e P6) consideram as
dificuldades com o conteúdo relacionadas ao fato do conteúdo ser abstrato, conforme
evidenciamos nos depoimentos acima. Isso de certa forma contradiz as informações
anteriores dos professores, que consideravam ensinar Química mais fácil do que ensinar
Física, sobretudo, pelo fato dessa segunda ser menos abstrata.
Solicitamos aos professores que informassem o assunto de Química de maior
interesse dos alunos na oitava série, e a maioria citou a ‘tabela periódica’, como
podemos observar nos relatos:
Porque é o que eles mais ouvem falar. Eles vêem os alunos do
ensino médio que estão usando a tabela periódica, só falam em tabela
periódica. Então eles perguntam, professora e a tabela periódica, a tabela
periódica. É esse o assunto que eles mais interessam. Por isso que eu demoro
com eles na tabela periódica, para eles entenderem bem como ela é
construída, como que surgiram os elementos, a classificação dos elementos,
os símbolos dos elementos. Tudo certinho, porque eles saem da oitava série
dizendo, bom agora eu sei tabela. (P1) [grifo nosso]
Porque eles acham assim, bonita a tabela periódica. Eles acham
assim, se eles dominarem aquilo, é um conhecimento que as outras turmas
não m. Então eles querem deter um conhecimento que os outros não têm,
eles querem chegar em casa, mostrar a tabela para os pais, e falar que eles
121
sabem identificar na tabela, eles sabem dizer o que a tabela está mostrando,
eles sabem fazer uma leitura daquela tabela. Então pra eles é o máximo.
Tanto que tem aluno que fala ‘professora, deixa eu fazer a tabela no caderno
professora’, eles querem construir a tabela. Então, porque eles acham assim,
bonito, interessante. (P4) [grifo nosso]
Porque são coisa que, por exemplo, se você fala carbono, cálcio,
fósforo, são coisas que eles escutam através da mídia, composição do creme
dental, então são coisas que eles observam, e ficam imaginando
(referindo-se a tabela periódica). Então eles chamam bastante atenção,
principalmente, são substâncias que eles têm contato de uma certa forma,
por exemplo, magnésio, então leite de magnésio, lembra [...] consegue
assimilar uma coisa a outra. (P6) [grifo nosso]
Porque fica com a tabela periódica na mão, fica até mais fácil, eles
não gostam muito de copiar, ficar copiando, copiando, e a tabela periódica
eu dei um pra cada um, eles pintaram e escreveram os nomes de cada
família. Eu acho que eles gostaram. (P8) [grifo nosso]
Eles têm dificuldade, mas o interesse sabe por que que é? É eles
conhecer ela. Porque aí, chega no começo, ‘ah nós vamos estudar aquela
tabela periodica?’ Porque os mais velhos estudando então, talvez seja
por curiosidade, né? Ou talvez porque acham bonito, né? Porque cada um é
de uma cor, tem um monte de letrinha e números, eles querem entender o
que é. (P9) [grifo nosso]
É fácil perceber que o aluno gosta de aprender coisa do seu dia-a-dia, pois
torna-se mais motivador e ele pode participar, dando opiniões. Nessa perspectiva, Zanon
e Palharini (1995, p. 15), dizem que “quando os conteúdos não são contextualizados
adequadamente, estes tornam-se distantes, assépticos e difíceis, não despertando o
interesse e a motivação dos alunos”.
Por fim, a entrevista semi-estruturada também procurou conhecer a opinião
dos professores em relação ao conteúdo de Química, o que consideram essencial que os
alunos aprendam no ensino fundamental conforme mostra o quadro 5.
Quadro 5: Sobre quais conceitos de Química o professor considera essencial que os
alunos aprendam no Ensino Fundamental.
Professor
Qual(is) conceito(s) de Química você considera
essencial(is) que os alunos aprendam no Ensino
fundamental? Por quê?
P1
Todos
. Porque é o que base para eles fazerem depois o ensino médio
[...].
P2
Todos
. Porque é o nimo que você pode ensinar de Química, é o
mínimo para eles fazerem o primeiro ano [...].
P3
Todos
. Porque você trabalha um, depois você amplia, usa aquele como
122
pré-requisito [...].
P4
História da Química e a estrutura do átomo
. [...] porque é a base da
Química [...]. A partir disso eles vão entender a importância da Química
[...].
P5
Todos
. Porque ele vai te dar a visão de um ensino mais aprofundado no
ensino médio [...].
P6
Estrutura atômica e Tabela periódica
. Porque ele
vai utilizar isso no
ensino médio [...].
P7
Tod
os
. Porque eles vão ter uma bagagem para estar no primeiro ano.
P8
Estados físicos da matéria e Tabela periódica
. Porque eu acho
inconcebível sair da oitava série para o primeiro ano sem saber o que é
solidificação, liquefação, ebulição [...]. E no caso da tabela periódica,
para eles conhecerem os elementos [...].
P9
Todos
. Porque um conteúdo puxa outro.
P10
Todos
. Porque lá na frente ele vai precisar.
Obs.: [grifos nossos]
Essas respostas nos apontam que a maioria dos professores considera
importante que todos os conteúdos sugeridos pela ementa da escola sejam ensinados,
porém demonstram preocupar-se especialmente com o ensino médio, etapa essa que
possivelmente os alunos cursarão em seguida. Verifica-se, portanto que os professores
atribuem uma necessidade significativa ao ensino-aprendizagem dos conceitos que
supostamente vinculam o ensino fundamental ao ensino médio, evidenciando o
desconhecimento dos objetivos e, por conseguinte, dos Parâmetros Curriculares
Nacionais desse nível de escolaridade.
Sobre isso, cabe ressaltar que, aprender Ciências é aprender a ler o mundo e,
como apregoa os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998), o conteúdo dessa
área, nas séries iniciais deveria então envolver o conhecimento do ser humano e do
meio ambiente – tanto meio físico quanto os demais seres vivos, além de incluir
conhecimentos tecnológicos. Portanto, os conhecimentos químicos deveriam ser
ensinados de forma a contribuir nesse sentido, do estudante ‘aprender o mundo’, a partir
da vivência e formação de seus próprios conceitos.
123
Nesse sentido, a organização dos conteúdos poderá seguir diferentes critérios,
integrando-se num conjunto de atividades, tendo o professor como mediador que
incentiva os alunos a solucionarem problemas, respeitando seus limites e valorizando
suas contribuições. Ademais, os conteúdos deveriam ser apresentados numa perspectiva
que não valorize a memorização de informações, mas a sistematização dos
conhecimentos, num processo ativo, no qual o estudante possa entender e compreender
o mundo numa dimensão mais global.
124
CONSIDERAÇÕES
“...fiquei surpreso ao ver quanta obscuridade cercava a abordagem do
ensino de Química...”
Lavoisier
Chegamos ao momento de concluir o processo investigativo proposto. Para isso
necessitamos acenar com algumas possíveis respostas ao problema da pesquisa: que
conhecimentos possuem os professores que lecionam Ciências Naturais na oitava
série nas escolas municipais de Várzea Grande, em Mato Grosso?
Consideramos, durante o processo investigativo, três tipos de conhecimentos,
baseados em L. Shulman, quais sejam: conhecimento do conteúdo, conhecimento
curricular e conhecimento pedagógico. Buscamos compreender como tais
conhecimentos poderiam ser identificados nos discursos dos professores responsáveis
pelo ensino de Química na série do ensino fundamental das escolas várzea-
grandenses. Cabe considerar que, apesar de termos delimitado a análise da investigação
na tipologia shulmaniana, entendemos que outras tipologias, não menos importantes,
também apresentam categorias relevantes, tais como os conhecimentos experenciais dos
professores. Ademais, é importante ressaltar que neste trabalho entendemos que os
conhecimentos que os professores constroem e reconstroem sobre a docência e na
prática docente, em variados contextos, sejam eles formais ou informais, sejam um
continuum, e que influenciam a vida profissional dos mesmos.
Muitos foram os autores lidos durante o percurso de construção deste trabalho, a
fim de nos apropriarmos de algumas teorias sobre a prática docente, especificamente
sobre os conhecimentos dos professores. Não foi tarefa difícil encontrar referências
sobre o assunto, haja vista existir uma quantidade expressiva de trabalhos relevantes
sobre a temática, em tempos atuais. Isso foi um ponto facilitador no desenvolvimento da
presente investigação.
A análise dos dados de nossa pesquisa nos permite abordar, nesse momento,
alguns aspectos relevantes que conseguimos observar no desdobramento desta pesquisa:
125
Dos dez professores envolvidos, apenas um professor é licenciado em Química e
leciona Ciências na oitava série, isto porque um dos requisitos para provimento
no cargo de professores de Ciências inscritos no concurso público da SMEC-
VG/MT, é que o candidato seja formado em Ciências Biológicas e não em
Química. Dessa forma fica caracterizada a prioridade do professor de Biologia à
Química, para o exercício da função;
O conhecimento do conteúdo é considerado como necessário por 50% das
professoras, mas a maioria não se considera preparada em nível conceitual para
lecionar Química na 8ª série;
A maioria dos professores acha necessário que o professor tenha um bom
conhecimento pedagógico para ser professor de Ciências no ensino fundamental.
Todavia a maioria deles, por não conhecer o conteúdo da disciplina de Química,
naturalmente, não conhecendo as especificidades da disciplina, os
conhecimentos pedagógicos para o seu ensino-aprendizagem ficam dificultados
ainda mais;
Não identificamos entre os professores, inclusive no caso do professor formado
em Química, a preocupação ou a necessidade de se conhecer o currículo para se
ensinar Química no ensino fundamental. O livro didático é a principal fonte de
informação para se lecionar Química na 8ª série;
Quanto aos conhecimentos curriculares, observamos os seguintes pontos: apenas
uma professora não conhece os PCN, mas identificamos alguns professores que
desconhecem a proposta curricular de Ciências da escola que lecionam. Apenas
uma professora utiliza o Projeto Político Pedagógico (PPP) de sua escola como
primeira fonte na elaboração de seu planejamento. Ficou evidente a autonomia
dos professores dentro de sala de aula, no sentido de selecionar o que considera
importante para o aluno;
126
Em relação aos conhecimentos pedagógicos, é possível considerar que:
O livro didático é apontado como o principal recurso para o norteamento do
planejamento e conseqüentemente das aulas;
A Física é considerada como mais difícil para ministrar e mais abstrata em
relação à Química;
As aulas expositivas são as mais utilizadas entre os professores
entrevistados;
O conhecimento prévio do aluno é considerado pela maioria dos professores
ao ensinar Química na 8ª série;
A maioria dos professores não ensina a Química com estratégias
diferenciadas e são favoráveis ao ensino tradicional. Eles destacam que com
esse método os resultados são mais profícuos. Isso pode se considerado
como de falta de formação pedagógica adequada para a atividade exercida,
ou ainda, desconhecimento de como ensinar os conhecimentos químicos.
Isso fica comprovado quando os professores afirmam que desconhecem uma
proposta alternativa para o ensino de Química, o que reforça a idéia de que,
possivelmente, a maioria dos professores investigados não possui formação
ou experiência para o ensinar Química na 8ª série;
Nenhuma das escolas investigadas possui laboratório, e os professores
declinam uma enorme importância a esse espaço físico, sendo a falta desse o
motivo para a não realização de atividades experimentais. Há, portanto, o
reconhecimento da necessidade da experimentação no ensino de Química,
contudo não foi possível identificar se a concepção dos professores sobre a
experimentação no ensino é indutivista. Seus discursos nos conduzem a
acreditar que não estão atentos para o fato de que a relação experimento-
teoria não é relação direta e fácil. Em outros termos, o ensino experimental
por si só não garante a aprendizagem e nem tampouco o desenvolvimento da
127
atitude científica, como alguns acreditam. Desse modo, uma visão
simplista e reducionista, que poderia levar os alunos a considerarem que as
teorias são simplesmente conjecturas e que podem ser provadas ou
contrariadas por um simples experimento. Ademais, a crença de que o
“laboratório” (espaço físico) poderia ajudar a resolver o problema de
aprendizagem da Ciência é complicada, haja vista que não se pode confundir
os procedimentos didáticos escolares para o ensino-aprendizagem de
Química, com a idéia de estar fazendo Ciência’. Ou seja, não se trata de
fazer experimentos para comprovar as teorias, ou vice-versa, e sim de
possibilitar o desenvolvimento social, intelectual e físico do estudante,
usando, para isso, atividades aceitas dentro da comunidade em que vive. Isso
não contrapõe ao fato de se requisitar um laboratório de Ciências ou de
Química na escola, mas sim a postura conceitual e metodológica do uso
desse espaço físico;
Com relação às avaliações, observamos nas entrevistas, que os professores
utilizam várias estratégias, com ênfase para a utilização da prova escrita. Em
linhas gerais não obtivemos dados significativos sobre as questões que
envolvem a avaliação no ensino-aprendizagem;
A maioria dos professores considera que seus alunos estão aptos a aprender
Química no ensino fundamental;
40% dos professores reconhecem que suas formações são inadequadas para
ensinar Química na oitava série, reconhecendo ser esse o principal fator da
sua deficiência quanto ao conhecimento do conteúdo específico necessário
para o cargo designado, portanto consideram a sua dificuldade justa;
Ficou caracterizado que a maioria dos professores ministra aula para o
ensino fundamental, reconhece e preocupa-se substancialmente com a fase
que vem à frente – com o ensino médio, e não com o próprio ensino
fundamental;
128
Quanto ao conhecimento do conteúdo, podemos destacar que:
Os professores têm em mente o conceito de Ciências como vinculada apenas
e tão-somente ao âmbito escolar, relacionando-a somente com a vida das
pessoas. Há, portanto a necessidade do enfoque histórico da Ciência;
A maioria dos professores considera o seu domínio do conteúdo como bom,
porém alguns reconhecem sua limitação na área, como comentamos
anteriormente;
Para os professores entrevistados, ensinar Ciências no Ensino Fundamental
significa preparar os alunos para o ensino médio;
A maioria dos professores acha difícil ensinar Ciências na oitava série,
justamente pela deficiência que sentem no domínio do conhecimento do
conteúdo, podendo ser esse fato declinado à formação não adequada para tal
função;
Para selecionar o conteúdo a ser ministrado, os professores seguem a
seqüência do livro didático adotado, revelando que esses atingem seus
objetivos;
Apenas um professor sente facilidade em ministrar todos os conteúdos
sugeridos pela escola, isso se deve ao fato de ser o único professor licenciado
em Química;
O assunto de maior interesse para os alunos é a tabela periódica;
Todos os tópicos sugeridos pela ementa da escola foram apontados como
importantes para o desenvolvimento do ensino fundamental, porém os
professores preocupam-se primeira e profundamente com o ensino médio,
próxima fase que o aluno enfrentará. Nesse sentido, podemos observar um
argumento para o ensino um tanto quanto inconsistente, à medida que o
129
ensino de Química deveria ter como objetivo permitir ao cidadão uma
melhor interação com o mundo, como nos ensina Chassot (1993). Portanto,
uma grande perda para o ensino fundamental é atrelá-lo ao ensino médio, e
assim por diante.
A pesquisa realizada nos permite então concluir que os professores apresentam
indícios de dificuldades para o trabalho com a Química no ensino fundamental, nas três
categorias do conhecimento propostas por L. Shulman. Poderíamos inferir que a maioria
dos professores indicia uma problemática mais acentuada em relação aos conhecimentos
curriculares. Todavia, os demais tipos de conhecimentos revelados nos discursos dos
professores, o conhecimento pedagógico e de conteúdo, não permitem considerá-los
todos adequados para o ensino de Química. Aliada a essa informação, temos a
constatação de que a maioria dos professores é formada em Ciências Biológicas, o que
faz surgir algumas indagações, quais sejam: não seria mais adequado que os professores
formados em licenciatura em Química ficassem responsáveis pelo ensino dos
conhecimentos dessa área nas
s
séries? Não estaria o alto índice de reprovação na
disciplina de Ciências Naturais no ensino fundamental das escolas municipais de Várzea
Grande atrelado de alguma forma aos conhecimentos (conteúdo, pedagógico e
curricular) insuficientes revelados pela maioria dos professores investigados?
Essas indagações, ainda presentes, nos fazem perceber que o tema, a prática
docente e o ensino de Ciências/Química no ensino fundamental, não se conclui aqui,
cabendo a nós a partir desse momento, problematizar nossas práticas individuais e/ou
coletivas, socializando os resultados dessa pesquisa com a SMEC-VG/MT, permitindo a
construção de outros horizontes e possíveis pesquisas.
130
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136
APÊNDICES
137
APÊNDICE – A
CARACTERIZAÇÃO DAS ESCOLAS
138
APÊNDICE A
Questionário 1 - Caracterização da Escola
NOME DA ESCOLA: ___________________________________________________
Endereço: ______________________________________________________________
Bairro: _________________________________________________________________
Telefone(s): _____________________________________________________________
Ponto de referência: _______________________________________________________
E-mail da Escola: ________________________________________________________
Nome do(a) Diretor(a) da Escola: ___________________________________________
Tempo de funcionamento da Escola: _________________________________________
Número total de alunos da Escola: __________________________________________
Número total de salas da Escola: ____________________________________________
Número total de Professores: _______________________________________________
Número de Professores de Ciências: _________________________________________
Turnos de funcionamento:: ( ) Matutino ( ) Vespertino ( ) Noturno.
Possui 8ª série? ( ) Sim ( ) Não
Quantas salas de 8ª série: __________________________________________________
Número de alunos por 8ª série: _____________________________________________
Possui 8ª série no(s) período(s): ( ) Matutino ( ) Vespertino ( ) Noturno.
Muito obrigada !
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
Área de Ensino de Química
Laboratório de Pesquisa e Ensino de Química - LabPEQ
Solicito sua colaboração no sentido de responder ao presente questionário. As informações
obtidas serão utilizadas na dissertação de Saad Untar, mestranda da Linha de Pesquisa de Educação
em Ciências do Instituto de Educação da UFMT.
O objetivo deste, é investigar a química no ensino fundamental em algumas Escolas Públicas
Municipais de Várzea Grande-MT. Vale ressaltar, que os dados disponibilizados não serão repassados
a terceiros, bem como, caso sejam utilizados na dissertação, os nomes reais serão mantidos em absoluto
anonimato.
Todas as informações serão extremamente importantes para a análise dos resultados, portanto,
a sinceridade de suas respostas é fundamental. Quanto à presteza na devolução do questionário, é
condição “sine qua non” para o êxito do trabalho.
Antecipadamente agradeço o tempo que você investirá no preenchimento deste questionário, o
cuidado e a atenção que dispensar à tarefa.
139
APÊNDICE – B
CARACTERIZAÇÃO DOS PROFESSORES
140
APÊNDICE B
Questionário 2 - Caracterização do Professor
1) Dados Pessoais
Nome:______________________________________________________________
Data de nascimento:___/___/____ Natural de:____________________________
E- mail_______________________________________tel_____________cel_____
Sexo: F ( ) M ( )
Estado Civil: ( ) casado(a) ( ) solteiro(a) ( ) Divorciado(a) ( ) Outros
2) Formação Acadêmica
Nível de instrução
Curso/habilitação
Ano de Início e
Término
Instituição/Cidade/Estado
Ensino Médio
Graduação
Especialização
Mestrado
Doutorado
3) Experiência Profissional
a) Escola onde trabalha:___________________________________________________
b) Vínculo com a Escola: ( ) Efetivo ( ) Interino/Substituto ( ) Outros
c) Turno em que trabalha nessa Escola: ( ) Matutino ( ) Vespertino ( ) Noturno
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
Área de Ensino de Química
Laboratório de Pesquisa e Ensino de Química - LabPEQ
Solicito sua colaboração no sentido de responder ao presente questionário. As informações
obtidas serão utilizadas na dissertação de Saad Untar, mestranda da Linha de Pesquisa de Educação
em Ciências do Instituto de Educação da UFMT.
O objetivo deste, é investigar a química no ensino fundamental em algumas Escolas Públicas
Municipais de Várzea Grande-MT. Vale ressaltar, que os dados disponibilizados não serão repassados
a terceiros, bem como, caso sejam utilizados na dissertação, os nomes reais serão mantidos em absoluto
anonimato.
Todas as informações serão extremamente importantes para a análise dos resultados, portanto,
a sinceridade de suas respostas é fundamental. Quanto à presteza na devolução do questionário, é
condição “sine qua non” para o êxito do trabalho.
Antecipadamente agradeço o tempo que você investirá no preenchimento deste questionário, o
cuidado e a atenção que dispensar à tarefa.
141
d) Qual(is) série(s) você trabalha nessa Escola: ________________________________
e) Qual(is) disciplinas você ministra:_________________________________________
d) Há quantos anos você trabalha na área de Educação como Professor? _____________
e) Há quanto tempo você trabalha como professor de Ciências?____________________
f) Qual é a sua jornada de trabalho semanal? __________________________________
g) Exerce outra profissão além de Professor? ( ) sim ( ) não
Qual?__________________________________________________________________
Onde?_________________________________________________________________
Sobre o Ensino de Ciências
Em que série você ministra a disciplina?_____________________________________
Qual a carga horária semanal dessa disciplina? ________________________________
Quantas aulas por semana?________________________________________________
Qual o tempo de duração de cada aula?_______________________________________
Quantos alunos você tem (média) por turma?__________________________________
Muito Obrigada !
142
APÊNDICE – C
ROTEIRO DA ENTREVISTA
143
APÊNDICE C
Roteiro para entrevista semi-estruturada
Escola ? Professor(a) ? Formação ?
Por que você escolheu ensinar a disciplina Ciências na 8ª Série?
Em sua opinião o que é necessário conhecer (conhecimento) para ser professor de
Ciências no Ensino Fundamental? Quais são as fontes para aquisição desse
conhecimento?
Bloco A – Conhecimento Curricular
1) Você conhece o PCN da área de Ciências Naturais?
2) Você participou da construção da proposta curricular para o Ensino de Ciências
da sua Escola? Por quê?
3) Você conhece a proposta curricular para o Ensino de Ciências da sua Escola? O
que ela propõe para o ensino de Ciências na 8ª série?
4) Em sua escola qual é a ênfase dada ao atual currículo (ênfase curricular) de
Ciências para a 8ª Série?
5) (para complementar a 4) A Proposta curricular da sua escola dá maior ênfase
aos conteúdos disciplinares das áreas ou prevê uma formação mais global.
Comente sobre isso.
6) Como você analisa a proposta curricular de Ciências da sua Escola?
7) Qual a primeira fonte que você consultou para elaborar seu planejamento para a
8ª série? Por quê?
8) Na sua opinião qual é o seu papel na definição e na seleção dos conhecimentos
de Ciências a serem ensinados pela instituição escolar?
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
Área de Ensino de Química
Laboratório de Pesquisa e Ensino de Química - LabPEQ
144
Bloco B – Conhecimento Pedagógico
1) Você utiliza livro didático na 8ª série? Qual?
2) Na sua opinião qual é a diferença entre ensinar Química e Física na 8ª série?
3) Como você ensina, por exemplo, Fenômenos Físicos e Químicos na 8ª série?
E Ligações Químicas?
E Estrutura Atômica?
4) Quando você trabalha Fenômenos Físicos e Químicos, por exemplo, você
considera que o aluno possa saber algo sobre essa temática? O quê por exemplo?
5) Você ensinou química de forma diferenciada das experiências propostas, para
tornar o conteúdo mais compreensível aos alunos? Em qual conteúdo? Comente
sobre isso.
6) Qual a sua opinião sobre o ensino tradicional de Ciências?
7) Você conhece alguma proposta alternativa de ensino de Química para a 8ª Série?
Qual(ais) ? Comente.
8) Como você avalia a aprendizagem dos conhecimentos de Química na 8ª série?
9) Qual a sua opinião quanto a capacidade dos seus alunos para aprender Química
na 8ª série? Eles estão preparados cognitivamente?
10) Você acha que sua formação é adequada para ensinar Química na série? Por
quê?
Bloco C – Conhecimento do Conteúdo
1) O que você entende por Ciência? E por Química?
2) Como você classifica seu domínio do conteúdo de Química?
3) Pra você, o que é (o que significa) ensinar Ciências na 8ª série?
4) Ensinar Ciências na 8ª série é fácil ou difícil? Por quê?
5) Como você seleciona o conteúdo de Química a ser ministrado?
Por que você faz dessa forma?
Você acredita que os conteúdos selecionados dessa forma proporcionam
uma visão atual de ciência? Por quê?
E você acha que dessa forma os conceitos são mais acessíveis aos alunos
e suscetíveis de interesse?
6) Dentre os conteúdos sugeridos pela ementa da Escola, comente qual (ais) você
tem mais facilidade para ensinar? Por quê?
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7) Dentre os conteúdos sugeridos pela ementa da Escola, comente qual (ais) você
sente mais dificuldade para ensinar? Por quê?
8) Em sua opinião qual é o assunto da Química de maior interesse dos alunos da
8ª série? Por quê?
9) Qual(is) conceito(s) de Química você considera essencial(is) que os alunos
aprendam no Ensino Fundamental? Por quê?
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