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Fabrício José Nascimento da Silveira
Biblioteca como lugar de práticas culturais:
uma discussão a partir dos currículos de
Biblioteconomia no Brasil
Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG
Escola de Ciência da Informação – ECI
Setembro de 2007
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2
Fabrício José Nascimento da Silveira
Biblioteca como lugar de práticas culturais:
uma discussão a partir dos currículos de
Biblioteconomia no Brasil
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Ciência da Informação, da Escola de Ciência da
Informação da Universidade Federal de Minas Gerais –
ECI/UFMG, como parte dos requisitos necessários à obtenção
do grau de mestre em Ciência da Informação.
Orientadora: Profa. Dra. Alcenir Soares dos Reis
Linha de Pesquisa: Informação, Cultura e Sociedade
Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG
Escola de Ciência da Informação – ECI
Setembro de 2007
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3
Dedicatória
Este trabalho é dedicado à:
Rones José da Silveira (Meu Pai);
Marilurdes Nascimento da Silveira (Minha Mãe);
Elza França da Silveira (Minha Avó);
Alcenir Soares dos Reis (Minha Orientadora);
Maria Aparecida Moura (Minha Inspiração).
Por serem:
“luce intelletüal, piena d’amore,
amor di vero ben, pien de letizia;
letizia che trascende ogni dolzore”.
1
1
ALIGHIERI, Dante. Paradiso. In: La divina commedia. Milano: Rizzoli, 1949, p.185, Canto Trentesimo, versos
40-42.
“luz intelectual, plena de amor;
amor do bem, repleto de alegria;
alegria que a tudo é superior”.
4
Agradecimentos
Presto aqui um grato reconhecimento a todos aqueles que contribuíram diretamente para a
realização deste trabalho. Tenho certeza que sem este apoio nada disso teria sido possível.
Agradeço, pois:
A Deus, por me possibilitar viver este momento;
Aos meus pais, Rones José da Silveira e Marilurdes Nascimento da Silveira, que sempre me
deram “numa mão e noutra, amor com amor”;
1
Aos meus irmãos, Flávia, Fernanda e Fred, que cedo me ensinaram que “amizade dada é
amor”;
2
À minha Avó, Elza França da Silveira, e aos meus tios Roberto, Cássia, Ângela e Cirleide
pela enorme confiança que diariamente depositam em mim e em meus sonhos;
À sabedoria e à simplicidade dos métodos de orientação da professora Alcenir Soares dos
Reis, através dos quais aprendi, ao longo de todo este percurso, uma importante lição:
“quando o pensamento ilumina-se com o amor, a devoção e a graça fazem mais intensa esta
luz”;
3
Às professoras Alcenir Soares dos Reis (minha orientadora), Maria Aparecida Moura, Ana
Maria Rezende Cabral, Maria Guiomar da Cunha Frota, Maria da Conceição Carvalho,
Gercina Ângela Borém Oliveira Lima, Vera Regina Veiga França e Regina Helena. Queridas
amigas com as quais, no decurso das disciplinas, compreendi que “só se pode viver perto de
outro, e conhecer outra pessoa, sem perigo de ódio, se a gente tem amor. Qualquer amor já é
um pouquinho de saúde, um descanso na Loucura”.
4
Com elas cultivo o amor à educação e à
busca pelo conhecimento;
1
ROSA, 2006; p.127.
2
ROSA, 2006; p.142.
3
HEIDEGGER apud STEINER, 2005; p.115.
4
ROSA, 2006; p.284.
5
À professora Maria Aparecida Paiva Soares dos Santos pelas valiosas contribuições e
apontamentos feitos durante meu processo de qualificação;
À generosidade das professoras Vera Lúcia de Carvalho Casa Nova e Maria Aparecida Moura
que durante a defesa desta dissertação me mostraram, com extremo carinho, o real valor desta
velha máxima goethiana: “o homem que não é posto a prova não se instrui”;
5
Ao Neuber, meu tio, com quem compartilho o amor aos livros e os prazeres proporcionados
pela leitura. Foi através dele que “de repente, de repente, tomei em mim o gole de um
pensamento – estralo de ouro: pedrinha de ouro. E conheci o que é socorro”;
6
À Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais – FAPEMIG, pela bolsa que me permitiu
concretizar este trabalho;
À cordialidade de Viviane, Goreth, Gisele, Nádia, Roberto e Cláudia, funcionários desta
Escola que de pronto me ajudaram a lidar com as burocracias que permeiam a execução de
uma pesquisa acadêmica;
Aos amigos da livraria COOPEC / FAFICH, Cristiane, Leonardo, Jair e Júlio, pela gentileza e
alegria de todos os dias;
Ao Frances, Tuta, Moisés, Evânia, Wagner, Sonaly, Mélisson, Rosaline Mota, Ludmila, Luis
Fernando, Dani, Daniela Lages, Letícia, Gisele Patrícia, Nádia, Gustavo Saldanha, Ana Paula,
Leonardo, Aparecida Shikida, Patrícia, Raquel, Leandro, Adélio Dias, Adriana Nadaes, Euza,
Geraldo Venino e demais amigos da Escola Estadual Padre Augusto Horta, Giovani, Lucas,
Hebert, Fernanda, Kátia, Arthur, Michele, Marílis e Carol Morais. Amigos de todas as horas,
“com quem a gente gosta de conversar, do igual o igual, desarmado. O que um tira prazer de
estar próximo. Só isto, quase; e os todos sacrifícios. Ou – amigo – é que a gente seja, mas sem
precisar de saber o por quê é que é.
7
É graças a todas estas pessoas que hoje sustento a certeza que obra nenhuma ou vida alguma
tem sentido se não puder ser compartilhada com pessoas queridas e amigos afetuosos.
5
GOETHE, 1986; p.15, v.1.
6
ROSA, 2006; p.139.
7
ROSA, 2006; p.164.
6
Resumo
Este estudo teve por objetivo discutir as inúmeras relações que se instauram entre a história
das bibliotecas, a formação educacional dos bibliotecários (especialmente dos brasileiros) e o
universo das práticas culturais humanas. Para tanto, reconstituiu-se parte da história das
bibliotecas visando reunir indícios que comprovassem sua funcionalidade como lugar de
memória, cultura, educação e leitura, práticas culturais que auxiliam o homem a instituir
sentido para o mundo que o cerca. Almejou-se, ainda, descrever o profissional bibliotecário
como agente histórico que contribui para o processo de construção social da realidade através
da participação ativa em todas as etapas que constituem o ciclo informacional.
Para efeito de sustentação teórica, além de definir as práticas culturais como manifestações
simbólicas concebidas para se atribuir um olhar interpretativo às coisas do mundo, a presente
pesquisa enfatiza que nenhuma delas é completa em si mesma, necessitando, pois, de
elementos materiais para adquirirem sentido e visibilidade. De acordo com esta perspectiva,
constatou-se que tal materialidade funciona como elemento de ligação histórica entre as
práticas culturais e as bibliotecas.
Ao interrogar em que medida as bibliotecas, especialmente as bibliotecas públicas,
contribuem para que tais práticas se efetivem, o presente estudo trouxe à tona a figura do
bibliotecário e rediscutiu os atributos de seu ofício. Para tanto, apresentou-se a imagem do
bibliotecário humanista e seu papel de “zelador” dos segredos mantidos por uma biblioteca
para, posteriormente, e dando curso à evolução histórica, inserí-lo no conjunto dos Modernos
Profissionais da Informação, sujeitos que participam ativamente de todas as etapas do ciclo
informacional e travam íntimo contato com as tecnologias da informação.
Contudo, o que se pretendia enfatizar era que, independente do contexto histórico em que a
localizemos, a profissão de bibliotecário é demarcada por pensar criticamente as atividades de
coleta, organização, preservação e disseminação dos signos materiais que dão forma ao nosso
patrimônio intelectual.
Qual o perfil de bibliotecário que os atuais cursos de Biblioteconomia brasileiros almejam
formar? E em que medida seus currículos comportam, em termos práticos e teóricos,
7
conteúdos relacionados às práticas culturais? Objetivando responder a mais estas duas
inquietações, a presente pesquisa efetuou, como recurso metodológico, a análise das grades
curriculares de 5 (cinco) cursos de graduação em Biblioteconomia do país com o intuito de
identificar as principais diretrizes que norteiam a formação educacional de seus alunos.
Esta análise serviu para apontar qual a principal vertente teórico-prática adotada pelo atual
sistema de ensino de Biblioteconomia brasileiro e qual o perfil de bibliotecário que dele
resulta. Após a análise dos dados tornou-se possível assinalar que o referido sistema optou, e
isto é uma característica histórica, por formar profissionais capacitados tecnicamente para o
processamento e gestão dos acervos preservados em uma unidade de informação, em
detrimento do exercício de capacitá-los a compreender criticamente a importância que seu
ofício assume no processo de construção das muitas esferas de atuação humana. Tornou
possível, ainda, salientar a importância de novos estudos para a revisão dos parâmetros que
norteiam este modelo de formação.
8
Abstract
This study aimed to discuss the many relations among the library history, the education of
librarians (especially the Brazilian ones) and the universe of the human cultural practices. For
this, part of the library history was reconstructed intending to gather traces that could confirm
its functionality as a place of memory, culture, education and reading, which are cultural
practices that help men to create meaning to the surrounding world. It was also aimed to
describe the library professional as an historical agent that supports the process of social
construction of reality by means of active participation in all the stages that constitute the
informational cycle.
Looking for theoretical support, besides defining cultural practices as symbolic manifestations
that are devised to consider the things of the world in an interpretative way, this research
emphasizes that none of them are complete in themselves, therefore needing material
elements to acquire meaning and visibility. Grounded on this perspective, it was noticed that
such materiality functions as an historical link between the cultural practices and the libraries.
Inquiring in what degree the libraries, particularly the public libraries, contribute to the
effectiveness of those practices, this study highlighted the librarian role and rediscussed the
attributes of their duties. For this, the image of the humanistic librarian and his/her roll of
“caretaker” of the secrets kept in the library were presented to be, eventually, in the course of
historical evolution, inserted in the group of the Modern Information Professionals, who
participate actively in all the informational cycle stages and are intimate with information
technology.
Nevertheless, what was meant to be emphasized is that, independent of the historical context
in which it is put, the librarian profession is distinguished by pondering critically the activities
of collecting, organizing, preserving and disseminating the material signs that form our
intellectual patrimony.
Which is the profile of the librarian that the present Brazilian librarianship courses aim to
form? And to what degree their curriculums encompass subjects related to cultural practices
in practical and theoretical terms? Aiming to solve these two more disquieting issues, this
9
study accomplished, as a methodological resource, the analysis of the course listings of five
librarianship courses in the country in order to identify the main policies that guide the
students' education.
This analysis was useful to point out the main theoretical-practical approach adopted by the
present Brazilian librarianship teaching system and the profile of the librarian it produces.
After data were analyzed, it was possible to remark that the mentioned system opted to form
professionals technically able to process and manage the collections preserved in information
units (and this is an historical trait), with detriment to the development of the ability to
understand critically the importance of their role in the process of constructing the many
human action spheres. It was possible, also, to stress the importance of new studies to review
the parameters that guide this model of education.
10
Lista de tabelas
TABELA 1: Número de Bibliotecas Públicas por Estado no Brasil _________ 92
TABELA 2 – Parte 1: Currículos e Propostas Curriculares de Biblioteconomia
no Brasil: 1911 – 1982
______________________________________________ 154
TABELA 2 – Parte 2: Currículos e Propostas Curriculares de Biblioteconomia
no Brasil: 1911 – 1982
______________________________________________ 155
TABELA 2 – Parte 3: Currículos e Propostas Curriculares de Biblioteconomia
no Brasil: 1911 – 1982
______________________________________________ 156
TABELA 3 – Proposta de Diretrizes Curriculares – MEC / BRASIL para a
Área de Ciência da Informação
______________________________________ 157
TABELA 4: Conjunto de disciplinas referentes à área Fundamentos teóricos
da Biblioteconomia e da Ciência da Informação
________________________ 175
TABELA 5: Conjunto de disciplinas referentes à área Processamento da
Informação
_______________________________________________________ 181
TABELA 6: Conjunto de disciplinas referentes à área Recursos e serviços de
Informação
_______________________________________________________ 182
TABELA 7: Conjunto de disciplinas referentes à área Gestão de Unidades de
Informação
_______________________________________________________ 183
TABELA 8: Conjunto de disciplinas referentes à área Tecnologia da
Informação
_______________________________________________________ 184
TABELA 9: Conjunto de disciplinas referentes à Pesquisa ______________ 184
TABELA 10: Número de estágios supervisionados previstos em cada um dos 5
(cinco) cursos analisados
____________________________________________ 185
TABELA 11: Síntese dos dados apurados no processamento das informações
referentes às grades curriculares
_____________________________________ 186
11
Sumário
1. Introdução _______________________________________________________ 13
2. Capítulo I ________________________________________________________ 29
O refúgio de Mnemosine: biblioteca como lugar de memória e esquecimento ____ 29
2.1. As várias faces de Mnemosine ____________________________________ 30
2.2. Biblioteca como lugar de memória e esquecimento ___________________ 44
3. Capítulo II _______________________________________________________ 51
No fim do labirinto, o mundo: biblioteca como lugar de práticas culturais ______ 51
3.1. Cultura: modulações de um conceito ______________________________ 52
3.2. Biblioteca: lugar de urdidura da memória e da cultura _______________ 64
3.3. Livros e bibliotecas em terras brasileiras ___________________________ 81
4. Capítulo III _______________________________________________________ 94
Um mundo que encanta pela força da palavra: biblioteca como lugar de leitura e
educação ___________________________________________________________ 94
4.1. Educação e leitura: práticas culturais de produção de sentido _________ 95
4.2. Biblioteca como lugar de educação e de leitura _____________________ 106
5. Capítulo IV ______________________________________________________ 111
A formação do bibliotecário no Brasil ___________________________________ 111
5.1. O bibliotecário como agente histórico: do humanista ao Moderno
Profissional da Informação _________________________________________ 113
5.1.1. O bibliotecário humanista __________________________________________ 113
5.1.2. O Moderno Profissional da Informação ______________________________ 119
5.2. Biblioteconomia, ciências humanas e teoria curricular ______________ 127
5.3. A formação do bibliotecário no Brasil ____________________________ 134
5.3.1. De 1911 a 1960 __________________________________________________ 134
5.3.2. De 1960 a 1990 __________________________________________________ 142
5.3.3. De 1990 a 2005 __________________________________________________ 158
12
6. Capítulo V _______________________________________________________ 166
Biblioteca como lugar de práticas culturais: uma discussão a partir dos currículos
de Biblioteconomia no Brasil __________________________________________ 166
6.1. Universo empírico: apresentação dos 5 (cinco) cursos selecionados como
objeto de análise da pesquisa _______________________________________ 170
6.1.1. Curso de Biblioteconomia da Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC 170
6.1.2. Curso de Biblioteconomia da Escola de Ciência da Informação da Universidade
Federal de Minas Gerais – ECI/UFMG ____________________________________ 170
6.1.3. Curso de Biblioteconomia e Documentação do departamento de Biblioteconomia e
Documentação da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo –
ECA/USP ___________________________________________________________ 172
6.1.4. Curso de Biblioteconomia da Universidade Federal da Paraíba – UFPb ______ 173
6.1.5. Curso de Biblioteconomia da Universidade de Brasília – UNB ____________ 173
6.2. Processamento dos dados: divisão das disciplinas segundo as 6 (seis) áreas
básicas de conhecimentos em Biblioteconomia definidas para o Mercosul __ 175
6.2.1. Fundamentos teóricos da Biblioteconomia e da Ciência da Informação ______ 175
6.2.2. Processamento da Informação ______________________________________ 181
6.2.3. Recursos e serviços de Informação __________________________________ 182
6.2.4. Gestão de unidades de Informação ___________________________________ 183
6.2.5. Tecnologia da Informação _________________________________________ 184
6.2.6. Pesquisa _______________________________________________________ 184
6.2.7. Estágios supervisionados em Biblioteconomia _________________________ 185
6.3. Análise dos dados: “Biblioteca como lugar de práticas culturais” – uma
discussão a partir dos currículos de Biblioteconomia no Brasil ___________ 187
7. Considerações finais ______________________________________________ 195
8. Referências ______________________________________________________ 205
9. Anexos _________________________________________________________ 232
ANEXO 1 - Instituições que possuem curso de graduação em Biblioteconomia no
Brasil ___________________________________________________________ 232
ANEXO 2 – Grades curriculares dos 5 (cinco) cursos selecionados como objeto da
pesquisa
_________________________________________________________ 233
1. Curso de Biblioteconomia da Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC ___ 233
2. Curso de Biblioteconomia da Escola de Ciência da Informação da Universidade
Federal de Minas Gerais – ECI/UFMG ____________________________________ 235
3. Curso de Biblioteconomia e Documentação do departamento de Biblioteconomia e
Documentação da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo –
ECA/USP ___________________________________________________________ 237
4. Curso de Biblioteconomia da Universidade Federal da Paraíba – UFPb _________ 239
5. Curso de Biblioteconomia da Universidade de Brasília – UNB _______________ 241
13
1. Introdução
Dando no meu corpo, aquele ar me falou em gritos de liberdade. Mas a liberdade
– aposto – ainda é só alegria de um pobre caminhozinho, no dentro do ferro de
grandes prisões. Tem uma verdade que se carece de aprender, do encoberto, e que
ninguém não ensina: o beco para a liberdade se fazer. Sou um homem ignorante.
Mas, me diga o senhor, a vida não é cousa terrível? Lengalenga. Fomos, fomos.
1
Não, não é fácil escrever. É duro como quebrar rochas. Mas voam faíscas e lascas
como aços espelhados.
2
Vida, e guerra, é o que é: esses tontos movimentos, só o contrário do que assim
não seja. Mas, para mim, o que vale é o que está por baixo ou por cima – o que
parece longe e está perto, ou o que está perto e parece longe. Conto ao senhor é o
que eu sei e o senhor não sabe; mas principal quero contar é o que eu não sei se
sei, e que pode ser que o senhor saiba.
3
1
ROSA, 2006; p.280
2
LISPECTOR, 2006; p.19
3
ROSA, 2006; p.208-209
14
Não faz muito tempo que descobri em um livro de Alberto Manguel
4
que, de acordo com a
tradição talmúdica, quando Deus se pôs a criar o mundo as 22 letras do alfabeto desceram de
sua coroa augusta para suplicar-lhe que concretizasse a magnífica criação que iniciara por
intermédio delas. Ao consentir tal intento, Deus permitiu que:
Em plena escuridão, o alfabeto desse origem aos céus e à Terra, e
produzisse o primeiro raio de luz do seio desta, de tal modo que invadisse
a Terra Santa e iluminasse todo o universo. A luz, ou o que nós tomamos
por luz, é apenas a sombra de Deus, sob cujo esplendor ofuscante as
palavras já não são possíveis. (MANGUEL, 2006; p.221-222).
Reevocando a idéia básica desta genealogia, São João, o mais sensível dos evangelistas, nos
lembra em um trecho de grande inspiração poética que:
No começo a Palavra já existia:
A Palavra estava voltada para Deus,
E a Palavra era Deus.
Tudo foi feito por meio dela.
A Palavra estava no mundo,
O mundo foi feito por meio dela,
mas o mundo não a conheceu. (JOÃO, 1990, p.1353).
Ao traçar um paralelo entre estas duas tradições queremos evidenciar que as relações entre
escuridão, palavras e luz se instituem deste os tempos primordiais. Mas, sobretudo, destacar
que é na palavra que se inscreve a gênese do mundo.
É por intermédio da palavra e da capacidade de nomear que cada sujeito emerge para o
mundo e dá vida a todas as outras coisas. É através das palavras que os homens se tornam
capazes de estabelecer relações carregadas de sentido consigo mesmos e com os diversos
seres que compõem suas esferas de relações. É a palavra “que preserva a origem do tempo, é a
palavra que tem mais tempo, que contém o mundo, que contém tudo. A palavra, em sua
essência, é, portanto, mítica”. (ARAÚJO, 2001; p.9). É, pois, com a palavra que se inicia a
história. História que, por sua vez, tem as dimensões de nossa linguagem.
No entanto, ao mesmo tempo em que projeta um tênue raio de luz sobre as coisas dos homens
e do mundo, toda palavra carrega consigo um rastro de escuridão. Isto porque, ao fazermos
uso das palavras, atribuímos a estas certas qualidades de nossas esperanças e pesadelos,
4
O livro acima citado é: MANGUEL, Alberto. A biblioteca à noite. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.
15
acreditamos que elas deveriam existir para nosso deleite e nos entregamos à tarefa de inventá-
las sem temer a imprecisão e as limitações de nossa própria capacidade comunicativa.
Se ditas ao acaso, toda palavra corre o risco de se perder no tempo e ser assombrada pelo
esquecimento. Porém, reconhecendo sua importância para a construção das dimensões que
balizam nossa existência, concebemos, como mais um artifício para se suplantar as
leviandades da memória e as inclemências do tempo, estruturas físicas para abrigá-las e
conservá-las até o momento em que tudo se abater.
Desta forma, barro, pedra, metal, madeira, pele, ossos e carapaças de animais, o papiro, o
pergaminho e o papel se apresentam, em diferentes momentos históricos, como instrumentos
que constantemente revigoram o desejo humano de prolongar um pouco de sua existência
para além dos limites de nossas vidas individuais. No entanto, foi a partir do aparecimento do
livro que os intentos em torno da preservação da palavra receberam os estímulos necessários
para se tornarem um afã transmitido de geração em geração. Isto porque:
Tanta coisa foi nomeada, tanta coisa ainda será nomeada, que nem mesmo
nossa estupidez poderá fazer que abandonemos esse pequeno milagre que
nos garante uma ilusão de entendimento. Os livros podem não alterar
nosso sofrimento, os livros podem não nos proteger do mal, os livros
podem não nos dizer o que é bom e o que é belo, e certamente não terão
como nos livrar do destino comum – a tumba. Mas os livros nos abrem
miríades de possibilidades: de mudança, de iluminação. Pode bem ser que
nenhum livro, por mais bem escrito que seja, consiga remover um grama
de dor que seja da tragédia do Iraque ou de Ruanda, mas pode bem ser
que não haja livro, por mais mal escrito que seja, que não contenha
alguma epifania para algum leitor. (MANGUEL, 2006; p.192-193).
Os livros, tal qual a substância de que são feitos, exercem um verdadeiro fascínio sobre os
homens. Eles são um importante auxílio ao aprendizado e um recurso que nos permite
compartilhar nossas mais íntimas experiências em relação ao mundo. Por intermédio deles
adquirimos a capacidade de imprimir uma marca pessoal e intransferível nas muitas
realidades que ajudamos a edificar.
Neste sentido, cada palavra e cada livro carrega consigo duas marcas indeléveis e distintas: a
daqueles que lhes atribuiu um sopro de vida, e também aquelas concebidas por algum de seus
inúmeros leitores. Mesmo que se circunscreva a uma realidade espaço-temporal específica, ao
refletirem anseios, conflitos e necessidades individuais, cada nova marca se constitui como
16
um elemento indispensável à construção sócio-histórica de qualquer sujeito humano. Portanto,
é por intermédio deste jogo de troca de significados que nos tornamos aptos a tirar proveito de
um sábio equilíbrio entre lembrança e esquecimento, conhecimento e ignorância e outorgar
voz e coerência à nossa própria existência.
Embora não me insira na categoria dos poetas ou dos contadores de estórias, enquanto leitor
de livros e das muitas paisagens que conformam o meu mundo de interações, também cultivo
enorme apreço pelas palavras. Como leitor, percebo os livros não como uma estrutura rígida
composta por palavras que transmitem apenas um significado. Vejo-os, antes, como
instrumentos que me permite experimentar, conhecer ou recordar sensações, desejos, paixões,
lamentos e os muitos quadros históricos que vagamente se instituem ao meu redor.
Sendo assim, considero serem estes os principais motivos que levaram a humanidade a
conceber instituições voltadas para a preservação dos livros e de suas palavras leitoras. Tendo
suas origens ligadas ao nascimento das cidades, instituições como museus, arquivos e,
especialmente as bibliotecas, passaram a ocupar, em termos práticos ou simbólicos, um lugar
de destaque no processo de salvaguarda dos elementos materiais que informam nossa história
individual ou coletiva.
São elas que, por intermédio de seus acervos, nos permitem acessar as experiências comuns a
toda humanidade, bem como as razões e os intentos de cada um de seus usuários em
particular.
Através da estrutura caleidoscópica de seus acervos, cada uma destas instituições oferece ao
lugar onde se insere uma espécie de espelho que reflete os interesses e fraquezas de seus
interlocutores, bem como a maravilhosa pluralidade identitária que conformam os estratos
vitais de uma nação. Em outras palavras; são elas que generosamente oferecem “uma imagem
negociável daquele mundo real que gentilmente permite que o concebamos”. (MANGUEL,
2006; p.265).
Sendo assim, vale ressaltar que como um entusiasta da força da palavra, também cultivo
ardorosa paixão pelos livros. Acredito piamente que eles são um poderoso auxílio em nossa
incessante busca pelo conhecimento e um manancial onde é possível preservar, seja por meio
da ficção ou da história factual, as experiências acumuladas pela humanidade. Razão pela qual
17
se torna necessário salientar, já neste momento, que esta pesquisa nasce de uma inquietação:
por que as palavras deitadas nas páginas de um livro exercem tanto fascínio sobre a vida dos
homens e qual a participação da biblioteca na edificação da história humana?
Embora não seja possível atribuir uma resposta definitiva a esta questão, pretendemos, nos
capítulos que se seguem, lançar luzes sobre a mesma através do seguinte artifício: mapear as
relações que se instauram entre as bibliotecas, especialmente as bibliotecas públicas, e
algumas práticas culturais humanas diretamente ligadas ao universo dos livros. Sendo mais
preciso: objetivamos demonstrar que as funções sociais das bibliotecas públicas se tornam
mais evidentes quando relacionadas à questão da memória, da cultura, da educação e da
leitura.
Optou-se por trabalhar com bibliotecas públicas porque acreditamos serem elas que, dentre as
demais tipologias de bibliotecas, atendem de maneira mais indistinta todos os setores sociais.
Atendimento que, por sua vez, se consolida através de quatro funções básicas: a cultural, a
informacional, a recreativa e a educacional.
É, portanto, função de qualquer biblioteca pública colaborar para a difusão e visibilidade da
ampla gama das manifestações culturais humanas, sem se levar em consideração critérios
ligados à etnia, crença religiosa, condição financeira, questões sexuais ou políticas; além de
propiciar amplo acesso aos vários signos informacionais passíveis de serem preservados em
um acervo, tendo-se em vista contribuir para a consolidação e disseminação do conhecimento.
Para tanto, devem fazer isto não apenas através de uma estrutura rígida de coleta e
organização de materiais informacionais, mas também, de atividades lúdicas e recreativas que
promovam o surgimento de uma atmosfera propícia ao exercício da imaginação e da
criatividade. Devem, ainda, contribuir para o reforço e equalização das práticas educativas,
não como substituta da escola, mas como esfera que comporta grandes potencialidades
pedagógicas.
É com base nestas quatro funções básicas que podemos ressaltar que “a identidade de uma
sociedade ou nação [pode sim] ser espelhada por uma biblioteca [pública], por uma reunião de
títulos que, em termos práticos ou simbólicos, faça as vezes de definição coletiva”.
(MANGUEL, 2006; p.241).
18
Embora a instituição que conhecemos hoje como biblioteca pública tenha suas bases ligadas
ao século XIX, a história nos mostra que a idéia básica que lhe confere um formato e um
papel social se difunde desde os tempos do Império Romano. E é esta mesma história que nos
permite caracterizá-la como um “Lugar de práticas culturais”. Mas o que entendemos por
práticas culturais?
Seguindo os ensinamentos de Michel de Certeau (1994), podemos definir práticas culturais
como as várias manifestações simbólicas concebidas por uma dada sociedade ou por um
determinado indivíduo para atribuir um olhar interpretativo ao mundo que o cerca. Sendo
assim, é por intermédio das práticas culturais que nos tornamos capazes de acessar as
instâncias de significação que nos conferem uma identidade, seja esta individual ou coletiva.
A partir desta definição, podemos classificar a memória, a cultura, a educação e a leitura
como práticas culturais que nos permitem pensar e produzir sentido para o mundo com o qual
interagimos. Mas em que medida as bibliotecas podem ser consideradas um “lugar de práticas
culturais”? Mais especificamente, a partir de quais argumentos podemos entendê-la como um
lugar de memória, cultura, educação e leitura?
Tratando prioritariamente destas duas questões, os três primeiros capítulos da presente
pesquisa buscam salientar que prática cultural alguma é completa em si mesma e que todas
elas requerem uma dada materialidade para adquirirem visibilidade e sentido. Sendo assim,
podemos dizer que é exatamente tal materialidade que funciona como elemento de ligação
entre as práticas culturais e as bibliotecas.
Dando início à defesa deste argumento, o primeiro capítulo, intitulado de O refúgio de
Mnemosine: biblioteca como lugar de memória e esquecimento, discute a dualidade das
relações existentes entre as noções de memória e esquecimento e ressalta que embora a
memória seja uma função extremamente elaborada e um elemento indispensável para a
construção de uma noção de identidade, seja esta local ou nacional, individual ou coletiva, ela
não existe sem se contrapor à noção de esquecimento. Paradoxo que ressalta a necessidade de
se instituir os “Lugares de Memória”, dos quais a biblioteca se configura como um dos
principais expoentes.
19
Para dar sustentação a estes apontamentos, utilizamos como marco teórico os estudos de
Jacques Le Goff (2003); Maurice Halbwachs (1990); Ecléa Bosi (2003, 2004); Santo
Agostinho (2000); Frances Yates (1986); Paul Zumthor (1988); Harald Weinrich (2001);
Jean-Pierre Vernant (1990); Pierre Nora (1993); Bruno Latour (2000); Christian Jacob (2000);
Roger Chartier (1991, 1998, 1999); Vera Casa Nova (1990); Regina Marteleto (1996); Suzana
Müller (1984); Alfredo Serrai (1975), entre tantos outros citados na bibliografia.
A partir desta interlocução, e fazendo coro com Henri-Pierre Jeudy, este capítulo demonstra
claramente que:
Ao querer conservar o idêntico, a memória se consagra pela repetição do
mesmo até a saciedade de sua restituição. A expectativa da imagem
incongruente, fruto das associações arriscadas ou do quiasma dos
encadeamentos, torna-se liberta da premonição de um sentido feito
configuração única do destino. As temporalidades vivem a si mesmas
numa simultaneidade que ameaça os sinais da apreensão das coisas,
introduzindo a perda de uma finalidade da reversibilidade. O que retorna,
advém ao mesmo tempo, sob o efeito de deslocamentos cujo poder de
significação se anula, tornando-se um questionamento alucinado. A morte
aí ocorre, à sombra de uma morbidez que a restituição fiel parodia em
cenas de objetos de mortificação. Só a memória pode devolver à morte
sua alegria, para além da racionalidade da conservação e da
decomposição. Imersão na alteridade absoluta, no numinoso (ou
equivalente), o jogo da morte e da memória desafia toda lógica da
preservação do sentido e dos símbolos que o encerram, absorvendo-se no
movimento infinito da simultaneidade e da reversibilidade. Os signos
consagrados para a perenidade das civilizações são os fantasmas
maravilhosos da História fragmentada visto que o curso do tempo se
rompeu, deixando entrever no rodamoinho dos signos os fragmentos
únicos das sociedades e dos seres considerados desaparecidos. (JEUDY,
1990; p.146).
Se a história se constrói em fragmentos, a biblioteca, enquanto “Lugar de Memória”, nos
auxilia a formular e a nos posicionar em um quadro mais amplo de referências que nossa
memória individual, devido à sua falibilidade, se torna incapaz de abarcar e de preservar.
Por este motivo, e dando continuidade às discussões levantadas pela pesquisa, o segundo
capítulo, denominado de No fim do labirinto, o mundo: biblioteca como lugar de práticas
culturais, centra-se na questão da identidade e busca apreender as formas pelas quais
acessamos e interpretamos os elementos culturais que dão forma às várias esferas sócio-
históricas em que atuamos.
20
Após esboçar uma rápida apresentação do conceito de cultura, salienta-se que, embora não
seja possível delimitar uma noção estável e unificada de pertencimento cultural, este se
constitui a partir do acesso e da interpretação dos elementos simbólicos que nos ligam a uma
dada tradição coletiva, sendo, portanto, a biblioteca um importante espaço para a coleta,
organização e disseminação destes extratos que norteiam a construção da história de vida de
qualquer sujeito ou agrupamento social.
Este momento do texto se consolida tendo por base o olhar interpretativo de autores como
Hannah Arendt (2002); Peter Berger e Thomas Luckmann (2002); Alfredo Bosi (1987, 1995);
Marilena Chauí (1986); Clifford Geertz (1989); Stuart Hall (1997, 2001, 2003); Roque de
Barros Laraia (2003); Muniz Sodré (1983) e Raymond Willians (2000).
A partir da análise dos argumentos defendidos por estes pensadores, tornou-se possível
perceber que o grande conflito que assola o sujeito na contemporaneidade gira em torno da
capacidade de se constituir laços de sociabilidade que liguem sua história de vida individual à
história do grupo ao qual se insere, buscando cristalizar formas de interações que encontrem
ressonância na vida social.
Tentando amenizar este mal-estar, a segunda seção do capítulo recupera um longo período da
história das bibliotecas com o objetivo de levantar indícios que nos permitam caracterizá-las,
também, como um “Lugar de urdidura da cultura e da memória” que desperta, desde sua
gênese, o fascínio e o encantamento dos homens. Ou seja, como lugares mistos que, embora
permeados por tensões ideológicas, paradoxos e contradições, se transmutam em espaços
privilegiados do saber, nos quais o patrimônio cultural dos homens encontra solo profícuo
para edificar as bases em que nossa identidade se constitui, se nutre e se valoriza.
Faz-se isso tanto em relação à história universal, quanto ao que diz respeito à sociedade
brasileira por intermédio dos escritos de Fernando Baéz (2006), Matthew Battles (2003);
Jorge Luis Borges (1998, 1999); Luciano Canfora (1989, 2000); Robert Darnton (1990,
2001); Jean-Marie Goulemot (2000); Antônio Agenor Briquet de Lemos (1998); Regina
Maria Marteleto (1992, 1994, 2002); Wilson Martins (2002); Luis Milanesi (2002), Maria
Cecília Diniz Nogueira (1983, 1985); Sônia de Conti Gomes (1982; 1983); Lilia Moritz
Schwarcz; Paulo César de Azevedo e Ângela Marques da Costa (2002); Luiz Carlos Villalta
(1999) e Alberto Manguel (2006). Contudo, é este último que nos faz a seguinte advertência:
21
Conservar e transmitir a memória, aprender com a experiência alheia,
compartilhar o conhecimento do mundo e de nós mesmos são alguns dos
poderes (e perigos) que os livros nos conferem, bem como razões pelas
quais nós os prezamos e os tememos. (MANGUEL, 2006; p.220).
Sentimentos e razões que constantemente emergem, iluminando ou confundindo o senso de
realidade de muitos leitores. Leitores que, em ampla medida, se tornam a razão fundamental
para justificar a existência de uma biblioteca. Isto porque, é através das práticas de leitura que
cada signo informacional ali preservado tem seu valor social instituído.
É através das práticas de leitura que cada sujeito confere sentido ao mundo e à própria vida,
não numa tentativa de responder os grandes mistérios filosóficos, mas procurando acessar as
respostas dadas pelos outros às rotinas diárias de um dia comum, ou dando continuidade à
incessante busca por um mínimo de conhecimento que respalde sua existência.
Razão pela qual o terceiro capítulo, cujo título é Um mundo que encanta pela força da
palavra: biblioteca como lugar de leitura e educação, aborda as relações que se edificam
entre leitura, educação e bibliotecas. Se as bibliotecas possuem quatro funções básicas (a
cultural, a recreativa, a educacional e a informacional), estas se tornam mais evidentes quando
relacionadas ao universo das necessidades e desejos de cada leitor em particular.
Isto porque, são eles que, em última instância, determinam aquilo que se deve preservar ou
esquecer; da mesma forma como formalizam as regras do jogo de interesses que oferece as
pistas daquilo que se procura obter acesso, “um torturante momento de intuição de quem
somos como leitores, um vislumbre dos aspectos mais secretos do eu”. (MANGUEL, 2006;
p.250).
Por ser uma ação de grande carga simbólica e acentuada função interpretativa, as práticas
ligadas à leitura devem ser, em ampla medida, respaldadas por algum padrão educativo. Isto
porque, são as práticas educativas que possibilitam que cada sujeito desenvolva suas
potencialidades cognitivas e assuma papéis relativos à vida coletiva, à reprodução das
condições que garantem sua visibilidade e participação na esfera pública, bem como o uso
adequado e responsável de conhecimentos e habilidades disponíveis no tempo e nos espaços
onde sua vida se desenvolve.
22
Devemos, pois, pensar as práticas educativas como algo mais que o domínio mecânico de
técnicas utilizadas para ler e escrever. São, antes, práticas interpretativas que auxiliam a cada
sujeito em particular atuar conscientemente sobre um determinado contexto social, político,
econômico ou cultural. É, portanto, através da educação e da leitura que cada indivíduo se
prepara intelectual, científica e culturalmente para compreender e atribuir sentido às muitas
realidades espaço-temporais das quais faz parte.
Mas de que maneira a biblioteca pode contribuir para que tais práticas se efetivem? Tornando-
se um espaço propício para que cada leitor busque, encontre e faça uso dos diversos signos
informacionais que seus acervos comportam. Função que lhe confere uma posição de
destaque em vários períodos de nossa história.
É o que nos alerta os estudos de Luiz Percival Leme Brito (2004); Guglielmo Cavallo e Roger
Chartier (2002); Anne-Marie Chartier (2000); Michel de Certeau (1994); Roger Chartier
(1996, 1998, 1999, 2002 e 2003); Paulo Freire (1994, 2005); Gaudêncio Frigotto (2003); Eric
Havelock (1995, 1996); Wolfgang Iser (1996); Edmir Perrotti (1989); Vera Masagão Ribeiro
(2003, 2004); Neidson Rodrigues (1996, 1999, 2001); Soraia Gontijo Maia (2004); Ezequiel
Theodoro da Silva (1986, 1997); Magda Soares (2003, 2004); George Steiner (2001); Eliana
Yunes (1999, 2002); Regina Zilberman (1989, 1998, 2001) e Alberto Manguel (1996, 1997,
2006).
Com isso, e a partir daquilo que se expôs até aqui, torna-se evidente que o objetivo principal
destes três primeiros capítulos é caracterizar as bibliotecas como “Lugares de práticas
culturais” que interferem nos diversos cenários sociais, políticos e culturais onde se inserem,
fazendo frutificar o saber recolhido e contribuindo para a preservação e difusão de nosso
patrimônio material e intelectual.
No entanto, ao fazermos isto, outra grande questão nos foi apresentada: os bibliotecários
brasileiros são formados para compreenderem as potencialidades e a importância de todas
estas funções das bibliotecas? E mais, qual o perfil de bibliotecário que as escolas de
Biblioteconomia do país almejam formar? Responder a estas duas questões se tornou, pois, a
prioridade dos capítulos 4 e 5 do presente estudo.
23
Para tanto, o capítulo 4, cujo título é A formação do bibliotecário no Brasil, se inicia
discutindo as várias características que demarcam o fazer profissional dos bibliotecários ao
longo da história. Em um primeiro momento, caracteriza-o como um ofício permeado por
mistérios e só exercido por eruditos e humanistas portadores de uma memória prodigiosa,
capaz de atribuir sentido e ordem às várias facetas do saber que se passa a acumular
vertiginosamente.
Ressalta-se, ainda, que este perfil de bibliotecário tinha por característica básica uma sólida
formação erudita a partir da qual, e por intermédio de suas atividades profissionais e
intelectuais, interferia diretamente na paisagem sócio-cultural de onde se inseria. Contudo,
com o passar dos anos, verificou-se que o desenvolvimento tecnológico e urbano que deram
forma aos fundamentos da modernidade impôs a necessidade de se pensar novos parâmetros
em torno da formação educacional dos bibliotecários, tendo-se em vista inserí-lo no conjunto
dos Modernos Profissionais da Informação.
E é exatamente as discussões em torno da necessidade de se modernizar os fundamentos que
definem a atuação profissional dos bibliotecários que a segunda parte desta seção prioriza.
Através dela visualizamos que aquilo que efetivamente se altera no perfil de bibliotecário
exposto anteriormente é o fato de os Modernos Profissionais da Informação apresentarem em
seu ofício, além das funções tradicionais ligadas à biblioteca, um crescente envolvimento com
as novas tecnologias informacionais e com os diversos procedimentos administrativos que
permeiam sua produção e disseminação.
Com isso, busca-se indicar que nesta nova conjuntura que enfatiza a gestão dos sistemas e dos
suportes informacionais, o bibliotecário deixa de ser o único profissional a possuir a
informação como matéria-prima de seu labor. A ele se somam documentalistas, arquivistas,
administradores, analistas de sistemas, jornalistas, dentre outros.
Razão pela qual, e como recurso para se manter no mercado, os Modernos Profissionais da
Informação devem possuir, ao lado dos atributos necessários à coleta, organização e difusão
dos signos informacionais, um sem número de competências e habilidades que os tornem
capazes de atuar em espaços multidisciplinares e responder satisfatoriamente às demandas
informacionais dos inúmeros usuários que a modernidade faz emergir.
24
Este conjunto de habilidades e competências, bem como a função social que a história
reservou aos bibliotecários foi recuperado tendo por base os trabalhos de Oswaldo Francisco
de Almeida Júnior (2000; 2004), Umberto Eco (1983); Gisele Eggert (1996); Daniele Thiago
Ferreira (2003); José Augusto Chaves Guimarães (1995, 1997, 1998, 2000, 2002, 2004);
Patrícia Marchiori (1996); Richard Mason (1990); Suzana Müller (1989, 2004); Rosemeire
Marinho Nastri (1992); Glória Ponjúan Dante (2000), Jussara Pereira Santos (1993, 2000),
Johanna Smit (1994, 2000, 2002); Maria das Graças Targino (1991, 2000) e Marta Pomin
Valentim (1995, 2000, 2002).
A partir deste quadro de referências, e adotando por premissa que a modernidade impõe a
necessidade de se repensar a atuação e a formação educacional dos bibliotecários, a segunda e
a terceira seção deste mesmo capítulo levantam indícios importantes para se responder às
seguintes inquietações: os currículos das escolas de Biblioteconomia brasileiras oferecem
uma resposta satisfatória a este conjunto de mudanças estruturais? E ainda: qual o perfil de
profissional da informação os mesmos almejam formar?
Para tanto, antes de efetuar a reconstituição histórica dos principais acontecimentos que deram
origem à atual estrutura teórico-prática dos currículos das escolas de Biblioteconomia do país,
visualizamos a necessidade de discorrer, mesmo que rapidamente, sobre o que é um currículo
e em que medida este se torna capaz de representar em um conjunto de disciplinas as tensões
e contradições inerentes à construção do saber em tempos e espaços distintos. Elaboramos,
ainda, uma breve consideração sobre as “ciências humanas” e sobre as condições que
possibilitam a Biblioteconomia se aproximar, ao adotar por objeto de pesquisa algo tão vasto
quanto a informação, deste conjunto de positividades que pensam o homem e suas múltiplas
relações com o mundo como assuntos da ciência.
É importante mencionar que esta fase das discussões foi respaldada teoricamente pelos
estudos de Michel Foucault (1981), Sérgio Paulo Rouanet (1987), Ivor Goodson (1995),
Thomaz Tadeu da Silva (1992, 1995); Peter Mclaren (1991); Michael W. Apple (1982, 1989);
Jean-Claude Forquin (2000); Antonio Flávio Barbosa Moreira (2002a, 2002b, 2003); ABEBD
(1998); Jacira da Silva Câmara (1991) e César Augusto Castro (2002).
Dialogando com este conjunto de referências, tornou-se mais fácil recuperar o cerne dos
inúmeros acontecimentos que perfazem a trajetória da constituição histórica da
25
Biblioteconomia brasileira. História que, como se verá na última seção do capítulo, pode ser
dividida em três períodos específicos, a saber:
De 1911 a 1960: período nitidamente marcado pela opção por se constituir um campo de
ensino em biblioteconomia no país. Sua característica básica é a vigorosa disputa ideológica
acerca de quais deveriam ser os fundamentos teórico-práticos transmitidos pelos cursos que
começam a se formar.
De 1960 a 1990: Se os primeiros 50 anos acima mencionados se caracterizaram pela busca
por se constituir os fundamentos de uma Biblioteconomia Nacional, os 30 anos seguintes
foram pautados pela tentativa de se discutir, desenvolver e implementar um projeto de
Currículo Mínimo que promovesse o reconhecimento legal da profissão, além de instituir
coerência e visibilidade à área, ampliando, assim, seu espaço de atuação social.
De 1990 a 2005: Embora mais estruturada, a Biblioteconomia brasileira ainda apresentava,
nos primeiros anos da década de 1990, alguns pontos críticos a serem debatidos tendo-se em
vista alcançar uma formação profissional mais adequada face às necessidades culturais e
mercadológicas que começam a surgir. Sendo assim, o período acima compreendido foi
amplamente influenciado pela tentativa de se constituir um novo perfil de atuação para os
bibliotecários, no qual se objetivava dotá-los das habilidades e competências requeridas pelos
mercados informacionais brasileiros e do Mercosul.
Torna-se importante esclarecer, já neste momento, que todo este levantamento histórico teve
como base de sustentação os estudos de César Augusto Castro (1995, 2000, 2002, 2004,
2006); José Augusto Chaves Guimarães (1995, 1997, 1998, 2000, 2002, 2004); Luís Milanesi
(2002); Antônio Miranda (2003); Rosemeire Marinho Nastri (1992); Jussara Pereira Santos
(1993, 1997, 1998, 2000); Francisco José das Chagas de Souza (1990, 1991, 1993, 1996,
2000, 2002); Maria das Graças Targino (1991, 2000); Marta Lígia Pomin Valentim (1995,
2000, 2002); Ana da Soledade Vieira (1993) e Lee Welch (1994).
Contudo, embora tais estudos tenham nos fornecido os dados referentes à constituição
histórica do sistema de ensino de Biblioteconomia no país, faltava-nos, ainda, responder uma
importante pergunta: qual o perfil de bibliotecário que os atuais cursos de Biblioteconomia
brasileiros almejam formar?
26
Procuramos responder a mais esta inquietação através do capítulo Biblioteca como lugar de
práticas culturais: uma discussão a partir dos currículos de biblioteconomia no Brasil, o 5º
(quinto) do presente estudo. Como universo da pesquisa, elegemos, a nível nacional, 5 (cinco)
cursos de graduação em Biblioteconomia com o objetivo de analisar suas grades curriculares e
identificar os principais eixos teóricos e práticos que norteiam a formação educacional de seus
alunos.
Para respaldar nossa escolha, utilizamos os seguintes parâmetros empíricos:
1. Inserção dos cursos nas diferentes regiões do país;
2. Data de fundação ligada a distintos períodos da história da Biblioteconomia nacional;
3. Ocuparem posição de destaque no cenário biblioteconômico brasileiro, consoante os
seguintes indicativos: os cursos escolhidos devem possuir uma revista científica e um
programa de pós-graduação na área. Isto porque, tais aspectos se constituem como
elementos de reconhecida importância para a construção, crescimento e difusão de
qualquer campo do conhecimento.
No entanto, tornou-se necessário adotar, ainda, a seguinte estratégia operacional:
Naquilo que se refere ao primeiro parâmetro, optamos por dividir o mapa brasileiro
em 4 (quatro) regiões básicas, e não em 5 (cinco) como indicado no mapa geográfico.
Com isto, as áreas a serem consideradas por este trabalho são: Região Sul; Região
Sudeste (onde se concentra a grande maioria dos cursos de Biblioteconomia do país e
razão pela qual selecionamos 2), Região Norte-Nordeste (embora ocupe a maior área
territorial das quatro regiões incorporadas pelo universo da pesquisa, o curso escolhido
deve refletir, em ampla medida, as características gerais da área estudada
5
) e Região
Centro-Oeste.
5
Adotamos esta estratégia em virtude da seguinte constatação: por estarem geograficamente distantes dos
grandes centros industriais do país, os cursos de Biblioteconomia da Região Norte-Nordeste privilegiam a
formação de profissionais para atuarem em um mercado constituído basicamente por bibliotecas públicas,
escolares e universitárias. Razão pela qual seus programas de ensino adotam estruturas curriculares muito
similares.
27
Seguindo os parâmetros e critérios acima apresentados chegamos à escolha dos seguintes
cursos
6
:
1. Curso de Biblioteconomia da Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC.
(Região Sul);
2. Curso de Biblioteconomia da Escola de Ciência da Informação da Universidade
Federal de Minas Gerais – ECI/UFMG. (Região Sudeste);
3. Curso de Biblioteconomia e Documentação do Departamento de Biblioteconomia e
Documentação da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo –
USP. (Região Sudeste);
4. Curso de Biblioteconomia da Universidade Federal da Paraíba – UFPb. (Região
Norte – Nordeste);
5. Curso de Biblioteconomia da Universidade de Brasília – UNB. (Região Centro –
Oeste).
Como forma de operacionalizar nossas análises das grades curriculares de cada um dos 5
(cinco) cursos selecionados, dividimos suas inúmeras disciplinas entre as 6 (seis) áreas
básicas de conhecimentos em Biblioteconomia definidas para a área do Mercosul no I
Encontro de Dirigentes de Escolas Universitárias de Biblioteconomia do Mercosul, realizado
em Porto Alegre no ano de 1996.
7
As áreas mencionadas foram:
1. Fundamentos teóricos da Biblioteconomia e da Ciência da Informação;
2. Processamento da informação;
3. Recursos e serviços de informação;
6
Efetuamos uma apresentação detalhada de cada um deles na primeira seção do 5º (quinto) capítulo desta
pesquisa.
7
Discutimos a relevância deste encontro para a fundamentação do atual quadro de discussões em torno dos
conhecimentos que definem a estrutura curricular da área de Biblioteconomia no Brasil na última seção do
Capítulo 4 do presente estudo.
28
4. Gestão de unidades de informação;
5. Tecnologia da informação;
6. Pesquisa.
Esta última etapa nos permitiu apontar qual a principal vertente teórico-prática adotada pelo
atual sistema de ensino de Biblioteconomia do país, bem como o perfil de bibliotecário que
este almeja formar. Foi também neste momento da análise que buscamos apreender se a
querela entre “humanismo” e “tecnicismo” ainda se faz presente, bem como as condições em
que estes perfis se instituem em termos regionais.
Portanto, e a partir de tudo que já se expôs até o presente momento, penso estar claro que o
objetivo principal que permeia todo este estudo é demonstrar que a biblioteca se constitui, ao
longo da história, como um “lugar de práticas culturais” para, em seguida, apreendermos em
que medida os currículos das escolas de formação de bibliotecários no Brasil dialogam com
esta perspectiva.
Fazemos isto por acreditar que discutir os rumos da formação educacional dos bibliotecários é
condição fundamental para garantir a este profissional a continuidade do exercício de mediar
o acesso aos signos informacionais, atividade indispensável ao desenvolvimento de todos os
segmentos da vida humana. Ou seja, só a partir de sua constante revitalização que o ofício de
bibliotecário não correrá o risco de desaparecer em alguma das muitas brechas da história ou
ter sua importância diminuída perante alguma das muitas profissões que emergiram com a
modernidade.
29
2. Capítulo I
O refúgio de Mnemosine: biblioteca como
lugar de memória e esquecimento
Fitar o rio feito de tempo e água
E recordar que o tempo é outro rio,
Saber que nos perdemos como o rio,
E que os rostos passam como água.
Sentir que a vigília é outro sonho
Que sonha não sonhar e que a morte
Que teme nossa carne é essa morte
De cada noite que se chama sonho...
1
1
BORGES, 1999, p.243.
30
Como primeiro passo para definirmos as bibliotecas como “lugares de práticas culturais”, este
capítulo discute as várias relações que se estabelecem entre a memória, o esquecimento e
estas instituições seculares que preservam o patrimônio cultural humano. Razão pela qual
nosso ponto de partida será descrever a memória em suas várias facetas e interpretações ao
longo da tradição ocidental.
Para tanto, recorremos à noção de memória advinda da Grécia Antiga, examinando-a em sua
acepção mítica, para, em seguida, aproximá-la da história do esquecimento. Faz-se isto com o
objetivo de demonstrar que o acesso à tradição só se efetiva a partir dos movimentos
intermitentes ao ato de rememorar e de esquecer.
Neste sentido, por ser a memória humana fluida e incapaz de abarcar a plenitude dos
acontecimentos que marcam a vida individual ou coletiva dos muitos sujeitos históricos, este
primeiro capítulo lança, ainda, um olhar sobre as bibliotecas como “lugares de memória”. Ou
seja, como lugares que emergem para servir de apoio à salvaguarda da materialidade
simbólica concebida como elemento de representação coletiva, cuja função social está
diretamente ligada à missão de preservar, organizar e disseminar os elementos que se
originam dos saberes e das muitas manifestações culturais concebidas pelos homens.
Comecemos, pois, por recuperar a função histórica de Mnemosine.
2.1. As várias faces de Mnemosine
Em um de seus inúmeros momentos de intensa criação, Jorge Luis Borges nos conta que o
mesmo homem que edificou a grande muralha da China foi também aquele que mandou
queimar todos os livros anteriores a ele. Che Huang-ti, o Primeiro Imperador, desejoso de que
a história de seu povo começasse por ele, erigiu a muralha porque esta era sua defesa e
queimou os livros porque estes eram invocados para a celebração do passado. Talvez para este
homem “a muralha no espaço e o incêndio no tempo foram barreiras mágicas destinadas a
deter a morte”. (BORGES, 1999; p.10).
Ao exigir que uma sociedade tão tradicional quanto a dos chineses abandonasse seu passado,
sua história, talvez Che Huang-ti acreditasse que a imortalidade estaria intrínseca a seu ato e
que a corrupção não poderia entrar em um orbe fechado, sonhando, assim, fundar uma
31
dinastia imortal. Contudo, destruir a história anterior a si não significou, necessariamente, um
ato de arrogância ou de desonra para com a tradição de seu país, visto que, como aponta o
próprio Borges:
Talvez a muralha fosse uma metáfora, talvez Che Huang-ti tenha
condenado aqueles que adoravam o passado a uma obra tão vasta quanto
o passado, tão néscia e tão inútil. Talvez a muralha fosse um desafio e
Che Huang-ti tenha pensado: “Os homens amam o passado, e contra esse
amor nada posso nem podem meus carrascos, mas um dia há de viver um
homem que sinta como eu, e ele destruirá minha muralha, como eu destruí
os livros, e ele apagará minha memória e será minha sombra e meu
espelho, e não o saberá”. Talvez Che Huang-ti tenha amuralhado o
império porque sabia que este era precário e destruído os livros por
entender que eram sagrados, ou seja, livros que ensinam o que ensina o
universo inteiro ou a consciência de cada homem. (BORGES, 1999; p.10-
11).
Desta forma, a oposição entre edificar e destruir traz consigo o seguinte paradoxo: as coisas e
as ações humanas adquirem sentido em si mesmas, mas também, e sobretudo, através das
interpretações que o indivíduo e a coletividade lhes impõe. Portanto, talvez a grande lição que
podemos apreender dos feitos de Che Huang-ti seja aquela que demarca que a história se
constrói a partir da passagem contínua do tempo, no qual seu incessante fluir, furtivamente,
proíbe o presente de permanecer para sempre.
Esta noção de tempo contínuo se difunde no ocidente a partir da interpretação agostiniana da
brevidade da vida perante as incontingências da morte. Para Santo Agostinho, pensador
fortemente influenciado pela tradição neo-platônica e pelas leituras que fez da sagrada
escritura, as experiências vividas pelos homens se fundiriam em seu passado e nele se
tornariam imutáveis, conservando-se, pois, como lembranças ameaçadas de serem destruídas
pelo esquecimento.
Nesta concepção, a consciência humana que busca sentido para suas ações e para o mundo
que o cerca, de alguma forma, leva em consideração a dimensão temporal, visto que a
passagem da vida, das coisas e mesmo dos sonhos se desenvolvem tendo por referência um
determinado sistema cronológico.
Portanto, para que o homem se tornasse capaz de inscrever sua história em uma estrutura
espaço-temporal invariavelmente fluida, o mesmo se viu obrigado a criar cronologias com o
32
intuito de “elevar acima das vidas individuais efêmeras, e mesmo da vida dos povos e de suas
dinastias passageiras, um tempo supra-humano que, de uma forma ou de outra, estabelece
uma transição entre o tempo do cosmo e o dos simples mortais [...], ou seja, uma inscrição –
uma grafia – do tempo humano no tempo sideral”. (RICOEUR, 1991; p.6).
É, pois, esta possibilidade de datação que insere o homem no tempo histórico: tempo de fatos
realmente ocorridos e tempo de discursos que narram esses fatos. Sendo assim, o tempo é um
elemento essencial para a construção de nossa consciência histórica. Ele é:
[...] a dádiva da eternidade. A eternidade nos permite todas essas
experiências de um modo sucessivo. Temos os dias e as noites, temos
horas, temos minutos, temos a memória, temos a sensação do presente e,
depois, temos o futuro, um futuro cuja forma ainda ignoramos, mas que
pressentimos ou tememos. (BORGES, 1999; p.234).
Esta noção de tempo histórico, concomitantemente vivido e relatado, com sua subdivisão em
passado, presente e futuro possibilita ao homem inserir e desenvolver suas ações em um
continum que sempre se prolonga e nunca se repete. Portanto, tal temporalização abole a
concepção vulgar do tempo segundo a qual os eventos e seres se sucederiam em uma
disposição cronológica tal qual a do relógio. Há os desdobramentos dos eventos da existência,
mas não existe a sucessão do tempo que obedece a um sentido linear. As coisas acontecidas, o
agora e o porvir são traduzidos em êxtase de um mesmo movimento que adquire sentido no
ser e nas interpretações que este lhes outorga. Para tanto:
Consideremos o momento presente. O que é o momento presente? O
momento presente é o momento que contém um pouco de passado e um
pouco de futuro. O presente, em si, é como o ponto finito da geometria. O
presente, em si, não existe. Não é um dado imediato de nossa consciência.
Pois bem. Temos o presente, e vemos que o presente está gradativamente
tornando-se passado, transformando-se em futuro. (BORGES, 1999;
p.235).
Talvez por esta razão a história humana se apresente como “o palco de todas as vicissitudes
imersas na temporalidade. Contar uma fábula, criar um poema ou um modelo científico
implica ressaltar as relações do homem com o mundo no qual ele se encontra”.
(NASCIMENTO, 2005; p.18). Contudo, ao defender que o presente é o agora e o futuro é a
esperança daquilo que virá, evidenciamos que as ações humanas manifestam-se e se instauram
a partir do passado. Mas como recuperar aquilo que já se foi?
33
Por ser o tempo fluido e ininterrupto, o mesmo se assemelha a um rio no qual a correnteza
constantemente revela a cada homem as mudanças contínuas que os acometem. Sob essa
perspectiva, a ordem social não se estabelece a partir da sucessão de eventos lineares, mas
sim, através da localização de um determinado evento ocorrido no passado, em associação a
um evento do presente por meio da memória.
Os acontecimentos do mundo e as vivências individuais de cada sujeito se desenvolvem como
as águas de um rio que não encontra barragens nem fim. É diante de tal perplexidade, e aliada
à constatação da fugacidade das coisas e dos seres, que vislumbramos a dificuldade de
determos apenas um ponto de vista. Todavia, tal dificuldade não nos impede de apreciarmos a
beleza da descoberta. Descoberta que, por sua vez, se pauta pelo referencial sócio-simbólico
concebido pela tradição do lugar onde nossas vidas e ações se localizam.
A tradição seria, pois, tudo aquilo que nos possibilita encontrar outros ângulos de visão e
projetar sobre as antigas formas de ver o mundo, o homem e suas ações, outras possibilidades
de compreensão. É a partir desta perspectiva que podemos inferir que as travessias realizadas
pelos sujeitos através do tempo e revividas pela memória nos posiciona diante da
continuidade da tradição. Isto porque:
Acreditamos que a tradição é uma possibilidade de compreendermos as
ações humanas no presente. Essa colaboração se dá através das constantes
revisitações que fazemos ao passado, usando a memória, os costumes
coletivos, as criações artísticas para depurar os eventos trazidos pelo
tempo. Entretanto, nenhuma compreensão pode ser total. Nenhuma
interpretação pode abarcar tudo em virtude de suas próprias rasuras e
hiatos que a sustentam. Diante dessas particularidades, constatamos que a
memória do grupo, e mesmo a memória individual, garante a
sobrevivência e a coerência do sujeito, já que essas duas modalidades de
memória são imprescindíveis para a preservação da tradição.
(NASCIMENTO, 2005; p.106-107).
Sob este ponto de vista, nenhuma compreensão da realidade pode ser total, bem como
nenhuma interpretação, por mais exemplar que seja, é capaz de abarcar todas as dobras que a
memória executa. No entanto, é função da memória ordenar a existência humana, visto que
procura atribuir sentido aos eventos ocorridos na história, dando coerência às aspirações dos
sujeitos, bem como à tradição em que este se encontra. Mas como funciona a memória
humana?
34
Segundo Proust, existem dois tipos de memória: a primeira é a memória comum, produto da
nossa inteligência, e que a um mínimo esforço nos restitui fatos já passados. Esta memória,
que depende da nossa vontade, é como um simples arquivo; fornece apenas fatos, datas,
números e nomes, mas não as sensações que experimentamos outrora e que não habitam em
nossa consciência.
Tais sensações jazem mais fundo e só são despertadas pela memória involuntária, que não
depende de nosso esforço consciente de recordar, que está adormecida em nós e que a um fato
qualquer pode fazer emergir a consciência e reencontrar o tempo, bem como recuperar o
passado. Tempo este que não existe mais em nós, mas que continua a viver oculto em um
sabor, em um aroma, em um som, em uma dada paisagem, etc..., provando que a vida vivida
não passa de tempo perdido, mas um tempo que se pode recuperar, transfigurar e se apresentar
sob o aspecto de eternidade através dos labirínticos caminhos da memória. É o que podemos
apreender da bela passagem que se segue:
[...] O sol se pusera. A natureza recomeçava a reinar sobre os Bois, de
onde se evolara a idéia de que era o Jardim elísio da Mulher; acima do
moinho artificial, o céu verdadeiro se mostrava cinzento; o vento
arrepiava o Grande Lago com pequenas ondinhas, como um lago; e
soltando gritos agudos pousavam, um após outro, nos grandes carvalhos
que, debaixo de sua coroa druídica e com uma majestade dodônea,
pareciam proclamar o vazio inumano da floresta desocupada, e me
ajudavam a compreender melhor a contradição que existe em procurar a
realidade nos quadros da memória, aos quais sempre faltaria o encontro
que lhes advém da própria memória e do fato de não serem percebidos
pelos sentidos. A realidade que eu conhecera já não existia. [...] Os
lugares que conhecemos não pertencem sequer ao mundo do espaço, onde
os situamos para maior facilidade. Não passam de uma Igada fatia em
meio às imprecisões contíguas que formavam nossa vida de então; a
recordação de uma certa imagem não é mais que a saudade de um
determinado instante; e as casas, os caminhos, as avenidas, infelizmente
são fugitivos como os anos. (PROUST, 2002; p.331, v.1)
Ou, ainda, da célebre passagem do chá servido com madeleines, no qual Marcel, personagem
central da narrativa proustiana, nos conta que:
[...] quando num dia de inverno, chegando eu em casa, minha mãe, vendo-
me com frio, propôs que tomasse, contra meus hábitos, um pouco de chá.
A princípio recusei e, nem sei bem por que, acabei aceitando. Ela então
mandou buscar um desses biscoitos curtos e rechonchudos chamados
madeleines. E logo, maquinalmente, acabrunhado pelo dia tristonho e a
perspectiva de um dia seguinte igualmente sombrio, levei à boca uma
colherada de chá onde deixara amolecer um pedaço de madeleine. Mas no
35
mesmo instante em que esse gole, misturado com os farelos do biscoito,
tocou meu paladar, estremeci, atento ao que se passara de extraordinário
em mim. Invadira-me um prazer delicioso, isolado sem a noção de sua
causa. Radicalmente me tornaram indiferentes as vicissitudes de minha
vida, inofensivos os seus desastres, ilusória a sua brevidade, da mesma
forma como opera o amor, enchendo-me de uma essência preciosa; ou
antes, essa essência não estava em mim, ela era eu. Já não me sentia
medíocre, contingente, mortal. (PROUST, 2002; p.51, v.1).
Estas sensações que se tornaram capazes de restabelecer a felicidade do narrador que nos fala
foram trazidas pela memória e por suas doces recordações de uma infância amena e aprazível
na companhia de sua mãe. Reminiscências que não foram evocadas pela vontade consciente
de seu portador, mas por um estímulo externo que, mesmo aparentando encontrar-se fora de
seu domínio e de seu alcance, de alguma forma ligava-se diretamente ao seu passado.
Sendo assim, e de acordo com o autor acima citado, o homem constrói sua memória de duas
maneiras: individual e coletivamente. A primeira parte de uma perspectiva individual, em
decorrência dos acontecimentos vividos e interpretados subjetivamente. A segunda se
manifesta a partir da constatação de que todo sujeito pertence a um grupo e compartilha com
este acontecimentos e situações que se configuram como experiências fundamentais para a
constituição do quadro de referências onde os contornos de sua memória se assentam, bem
como da memória coletiva da comunidade a qual pertence. Tais fatos são, segundo Pollak:
Acontecimentos dos quais a pessoa nem sempre participou mas que, no
imaginário, tomaram tamanho relevo que, no fim das contas, é quase
impossível que ela consiga saber se participou ou não. Se formos mais
longe, a esses acontecimentos vêm se juntar todos os eventos que não se
situam dentro do espaço-tempo de uma pessoa ou de um grupo. É
perfeitamente possível que por meio da socialização política, ou da
socialização histórica, ocorra um fenômeno de projeção ou identificação
com determinado passado, tão forte que podemos falar numa memória
quase que herdada. (POLLAK, 1992; p.201.).
Nesse sentido, para Pollak, a memória é um elemento essencial para a constituição de um
sentimento de identidade, seja este individual ou coletivo, pois se configura como fator de
extrema importância para a continuidade e para a coerência de uma pessoa ou de um grupo
em permanente construção. Ainda segundo Pollak, a construção da identidade é um fenômeno
que se produz em relação a outros, pois se molda a partir da referência a critérios de
aceitabilidade, de admissibilidade e de credibilidade que, por sua vez, se constituem por meio
da negociação direta com outros membros do grupo.
36
Sendo, pois, um elemento de sociabilidade, de construção de identidade, seja esta individual
ou coletiva, a memória adquire o status de elemento unificador, capaz de salvar o homem e o
tecido social no qual se insere do isolamento e da auto destruição, visto que garante a
sobrevivência destes via preservação da tradição. Esta noção já se encontra presente nas
Confissões de Santo Agostinho, escritas por volta de 398 a 399, onde, em certo momento, se
declara:
Eis-me nos campos da minha memória, nos seus antros e cavernas sem
número, repletas, ao infinito, de toda a espécie de coisas que lá estão
gravadas, ou por imagens, como os corpos, ou por si mesmas, como as
ciências e as artes, ou, então, por não sei que noções e sinais, como os
movimentos da alma, os quais, ainda quando a não agitam, se enraízam na
memória, posto que esteja na memória tudo que está na alma. Percorro
todas estas paragens. Vou por aqui e por ali. Penetro por toda parte quanto
posso, sem achar fim. Tão grande é a potência da memória e tal o vigor da
vida que reside no homem vivente e mortal. (AGOSTINHO, 2000; p.276-
277).
Este trecho enseja que, para Santo Agostinho, diferentemente da memória involuntária de
Proust, a memória se assemelharia a um depósito, podendo as lembranças serem evocadas
quando necessário. Seria, ainda, o lugar onde a providência divina se manifesta de forma mais
evidente. Para o bispo de Hipona, os “palácios da memória” possuíam a garantia de Deus, ser
absoluto, ao qual todos os eventos humanos estão submetidos e o único capaz de salvá-los das
garras da morte.
Desta forma, podemos dizer que a memória é um acúmulo de lembranças? Uma função do
passado? Um conhecimento do passado? A organização temporal de um passado individual
ou a organização de um passado comum a um número mais ou menos grande de homens?
Uma função ligada à inteligência e ao conhecimento, uma repetição, uma imitação?
Certamente que não. Migratória em sua essência, a memória não pode ser considerada uma
evocação literal do passado, mas antes, uma reaproximação, ou melhor, uma recriação do
vivido.
Isto porque, o trabalho da memória é essencialmente de elaboração, sendo mais preciso, de
reelaboração da experiência de vida humana a partir do reconhecimento e da reconstrução de
uma lembrança. Porém, essa dinâmica da memória acontece no contato com a realidade
presente, uma vez que utilizamos os recursos de conhecimentos acumulados para lidarmos
com situações novas, que se encontram unidas a novas lembranças. Estas, por sua vez, estão
37
associadas à maneira de pensar de tantos outros que fizeram e que ainda fazem parte de nossa
história, visto que, “o tempo só pode ser captado dentro de um horizonte mimético, e ademais,
a memória se define especificamente em função da ordem da colocação temporal dos objetos
que recordamos” (COLOMBO, 1991; p.85).
A memória não se constitui, pois, como uma cópia, um decalque do passado. Isto porque, os
acontecimentos, os seres e imagens não se apresentam à memória como formas acabadas ou
perfeitamente delineadas. No momento em que são evocadas, durante o ato de recordar, as
lembranças ligam-se sempre a outros elementos, onde tal dinâmica as tornam diferentes. É a
partir deste ponto de vista que podemos entender que o aspecto labiríntico e sinuoso da
memória invalida qualquer certeza ou possibilidade de exatidão. Talvez por isso Pierre Nora
ressalte que:
A memória é a vida, sempre carregada por grupos vivos e, nesse sentido,
ela está em permanente evolução, aberta à dialética da lembrança e do
esquecimento, inconsciente de suas deformações sucessivas, vulnerável a
todos os usos e manipulações, susceptível de longas latências e de
repentinas revitalizações. A memória é um fenômeno sempre atual, um
elo vivido no eterno presente. Porque é afetiva e mágica, a memória não
se acomoda a detalhes que a confortam; ela se alimenta de lembranças
vagas, telescópicas, globais ou flutuantes, particulares ou simbólicas,
sensíveis a todas as transferências, cenas, censura ou projeções. A
memória instala a lembrança no sagrado. A memória emerge de um grupo
que ela une, o que quer dizer que há tantas memórias quantos grupos
existem; que ela é por natureza, múltipla e desacelerada, coletiva, plural e
individualizada. A memória se enraíza no concreto, no gesto, na imagem,
no objeto. A memória é um absoluto. (NORA, 1993; p.9.).
É, portanto, a partir desta multiplicidade significativa que podemos dizer que "a memória é
um elemento essencial do que se costuma chamar identidade, individual ou coletiva, cuja
busca é uma das atividades fundamentais dos indivíduos e das sociedades” (LE GOFF, 2003;
p.469) visto que além de identidade, esta se converte em um instrumento de poder.
Mesmo que tenha sofrido transformações de acordo com o olhar de cada pensador e cultura
que lhe atribuiu um determinado valor interpretativo ao longo de sua evolução histórica, estas
características são denotadas à memória desde suas primeiras concepções, desde quando,
segundo LE GOFF:
38
Os Gregos da época arcaica fizeram da Memória uma deusa, Mnemosine.
É a mãe das nove musas que ela procriou no decurso de nove noites
passadas com Zeus. Lembra aos homens a recordação dos heróis e dos
seus altos feitos, preside a poesia lírica. O poeta é, pois um homem
possuído pela memória, o aedo é um adivinho do passado, como o
adivinho o é do futuro. É a testemunha inspirada dos "tempos antigos", da
idade heróica e, por isso, da idade das origens. (LE GOFF, 2003; p.433.).
Como visto, desde suas primeiras concepções advindas da tradição grega, a memória se
apresenta como uma função extremamente elaborada que atinge grandes categorias
psicológicas, como a do tempo e a do eu. Segundo Jean-Pierre Vernant, tais concepções
acerca da memória põem em jogo um conjunto de operações mentais complexas, e o seu
domínio sobre elas pressupõe esforço, treinamento e exercício.
Para este autor “o poder de rememoração é, nós o lembramos, uma conquista: a sacralização
de Mnemosyne marca o preço que lhe é dado em uma civilização de tradição puramente oral
como o foi a civilização grega entre os séculos XII e VII, antes da difusão da escrita”.
(VERNANT, 1990, p.108). Neste sentido, para os gregos, a poesia se identificava com a
memória, e a memória fazia desta um saber, uma Sofia. Por isso, para os helênicos da época
arcaica o poeta ocupava um lugar de destaque entre os "mestres da verdade" e chegavam
mesmo a afirmar que para Homero versejar era lembrar. Assim, a memória se apresentava
como um dom para os iniciados, só revelado aos poetas, como atesta o seguinte texto:
Mnemosine, revelando ao poeta os segredos do passado, o introduz nos
mistérios do além.[...] Ela é o antídoto do Esquecimento. No inferno
órfico, o morto deve evitar a fonte de esquecimento, não deve beber no
Letos, mas, pelo contrário, nutrir-se na fonte da Memória, que é uma
fonte de imortalidade. (LE GOFF, 2003, p.434).
Em contrapartida, a reminiscência, a capacidade de rememorar os eventos e seres que a
tradição elaborava, era uma técnica ascética por meio da qual os iniciados exercitavam seus
dons. Entretanto, há o Esquecimento que subjuga a Memória. Letos é o rio cujas águas
mágicas fazem ruir os duros contornos da lembrança. Segundo Weinrich:
Nos gregos, Letos é uma divindade feminina que forma um par
contrastante com Mnemosine, deusa da memória e mãe das musas.
Segundo a genealogia e a teogonia, Lete vem da linhagem da noite (em
grego nyx, nox em latim), mas não posso deixar de mencionar o nome de
sua mãe. É a Discórdia (em grego, eris, em latim, discordia), o ponto
escuro nesse parentesco. (WEINRICH, 2000, p. 24.).
39
Nessa perspectiva, constatamos que a memória não é infalível e que é impossível pensá-la
como uma forma perfeita, inteiriça e sem furos. Sem a noção de esquecimento não há
possibilidade de uma reminiscência. Ao beber as águas do Lete os antigos adquiriam a
capacidade de esquecer sua existência anterior e ficavam livres para renascer. Daí as torrentes
do rio Lete serem tão importantes para os poetas. Ao narrar as façanhas dos deuses, os poetas
faziam renascer as glórias e infortúnios da tradição. Isso acontece porque, ainda segundo
Harald Weinrich:
Da língua grega antiga, recebemos para a história do conceito do
esquecimento uma interessante revelação sobre uma palavra que no
começo parece estranha aqui. Refiro-me à palavra aletheia, “verdade”,
que naturalmente assume uma posição central no pensar dos filósofos
gregos, o primeiro elemento dessa palavra, o a-, é sem dúvida um prefixo
de negação (alpha privativum). O elemento seguinte, -leth-, negado pelo
a-, designa algo encoberto, oculto, “latente” (essa palavra latina é
aparentada com ela), de modo que a verdade do significado da palavra
aparece – com Heidegger – como o não-encoberto, não-oculto, não
“latente”. Mas como esse elemento significativo –leth- negado pelo a-
aparece também no nome de Lethe dado ao mítico rio do esquecimento,
podemos conceber também, da formação da palavra aletheia, a verdade
como o “inesquecido” ou “inesquecível”. Com efeito, por muitos séculos
o pensamento filosófico da Europa, seguindo os gregos, procurou a
verdade do lado do não-esquecer, portanto da memória e da lembrança, e
só nos tempos modernos tentou mais ou menos timidamente atribuir
também ao esquecimento uma certa verdade. (WEINRICH, 2001; p.21).
Se traçarmos um paralelo entre o enunciado acima e as posições defendidas por Jean-Pierre
Vernant, perceberemos que “nas diversas épocas e nas diversas culturas, há solidariedade
entre as técnicas de rememoração praticadas, a organização interna da função, a sua situação
no sistema do eu e a imagem que os homens conservam da memória” (VERNANT, 1990;
p.107.). Por isso, o homem atribui valor e configura suas técnicas de rememoração e sua
busca pela aletheia, pela verdade, através dos recursos que dispõe historicamente. É, então, a
partir deste paradoxo que podemos inferir que:
A memória e o esquecimento são elementos indissociáveis e
fundamentais para a permanência da tradição. Tanto a memória quanto o
esquecimento são instrumentos pelos quais os elementos da cultura
conseguem vencer as garras do tempo que tudo subjuga. Assim, diante
dos aspectos negativos, que num momento são esquecidos, estes mesmos
momentos tornam-se passíveis de retornar à cena como elemento positivo.
Cada texto, cada corpo atravessado pelo gesto e pela voz pode reencarnar,
em outro momento, e fazer ressurgir em ações que os precederam.
(NASCIMENTO, 2005; p.109).
40
Do mesmo modo como construiu cosmologias e cosmografias para medir o tempo e se
posicionar como sujeito cronológico dentro de um tempo histórico, o homem também
concebeu várias formas e signos de memória. A voz poética, ou narração, certamente se
apresenta como um dos primeiros artifícios de memorização/rememoração concebidos pelo
homem.
Como já apontado, desde a antiguidade clássica que a arte narrativa não se encontra confinada
nos livros, posto que seu veio épico se apresenta de forma oral. Segundo Walter Benjamin
isso acontece porque o narrador tira o que narra da própria experiência e a transforma em
experiência dos que o escutam, onde narrar algo significa, na verdade, ter algo especial a
dizer. O que nos leva a entender que é justamente a experiência do narrador que se constitui
como a função social da memória oral, visto que no transcurso do processo narrativo temos a
ausência do acontecimento ou do objeto que demarca o motivo da ação narrada.
Desta forma, torna-se possível evidenciarmos que desde os primórdios da humanidade o
acúmulo e a transmissão de elementos fazem parte do cotidiano humano, posto que nas
sociedades onde a escrita não se fazia presente tal processo se realizava de forma oral. Função
desempenhada, quase que exclusivamente, pelos membros "mais velhos" de cada
comunidade. Eles tinham um lugar de honra no centro das práticas culturais e eram vistos
como os "guardiões" do tesouro espiritual da mesma. Eram mestres da verdade que garantiam
a preservação da cultura e da “tradição” deste tecido social.
O narrador é então aquele que, a partir da interação com a comunidade, vê e ouve inúmeras
coisas e as retransmitem a partir da rememoração, proporcionando aos ouvintes não apenas o
prazer do verso, mas também o conhecimento acerca do mundo e da comunidade a qual
pertence. É o que atesta Walter Benjamin quando salienta que:
[...] essa experiência que anda de boca em boca é a fonte onde beberam
todos os narradores, narradores estes que se formam com a união entre o
conhecimento trazido de longe, com o conhecimento do passado, tecendo
assim, uma forma artesanal de comunicação, onde não se pretende
transmitir o “puro em si” da coisa narrada, como uma informação ou um
relatório, mas antes, inserir na narrativa a marca de quem narra, como à
tigela de barro a marca da mão do olheiro. (BENJAMIN, 1983, p. 58-63.).
41
É, então, a partir da performance do narrador que as palavras tornam-se o lugar privilegiado
da virtualidade da memória, na medida em que cada palavra apresenta uma ligação direta com
a tradição e com os ouvintes que as contemplam sob a forma de ensinamento. Isto acontece
porque “(...) enquanto as palavras desfilam, estabelece-se equivalência e contrastes que
comportam (porque o contexto se modifica, mesmo que imperceptivelmente) nuances sutis:
cada uma delas, recebida como uma informação nova, faz-se crescer do conhecimento ao qual
essa voz nos convida”. (ZUMTHOR, 1993; p.200 apud NASCIMENTO, 2005; p.52).
Por isso, cabia a estes “guardiões da tradição” ensinar, melhor dizendo, iniciar os mais jovens
aos costumes de seu povo. Eles desempenhavam tal papel não porque tinham uma capacidade
especial para isso, mas, sobretudo, porque seus interesses se voltavam para o passado e
porque transpunham suas interrogações para o presente como forma de se libertar para o
futuro, características que os inserem, ainda segundo Walter Benjamin:
Na categoria dos professores e dos sábios, pois lhe é dado recorrer a toda
uma vida. Uma vida, aliás, que, abarca não só a própria experiência, mas
também a dos outros. Àquilo que é mais próprio do narrador acrescenta-se
também o que ele aprendeu ouvindo. Seu talento consiste em saber narrar
sua vida; sua dignidade em narrá-la inteira. O narrador é o homem que
poderia deixar a mecha de sua vida consumir-se integralmente no fogo
brando de sua narrativa. Portanto, o narrador é a forma em que o “justo”
encontra a si mesmo. (BENJAMIN, 1983, p. 74.).
Sendo assim, um mundo social que possui uma riqueza e uma diversidade que não
conhecemos pode nos chegar através da memória e da performance de cada narrador, visto
que os mesmos recuperam o tempo que correu e aquelas coisas que quando as perdemos nos
fazem sentir diminuir e morrer, retransmitindo-a sob a forma de ensinamento.
Característica que muda radicalmente a partir do aparecimento do alfabeto, posto que agora se
tornara possível lembrar e ordenar visualmente os símbolos provenientes de cada um dos
novos códigos e suportes surgidos com a escrita. Isto porque, “uma imagem é signo de um
objeto porque o figura, mas é imagem porque dá testemunho de sua presença, e na condição
de testemunho de existência, serve de suporte para a lembrança”.(COLOMBO, 1991, p.47).
A memória, deste momento em diante, passa a se renovar através do uso de técnicas visuais,
circunstância que determina o surgimento de uma vasta "mitologia" da reminiscência em
42
épocas e em culturas distintas, onde tal fato acaba por alimentar a função, o lugar no sistema e
a imagem que o homem institui para a memória.
É no século VII antes de Cristo que se dá o nascimento da escrita alfabética e o declínio da
arte narrativa. A escrita se apresenta como uma tecnologia explosiva e revolucionária para a
cultura humana pois muda radicalmente as relações entre os homens e suas formas de
apreensão do saber.
Os arranjos lineares do alfabeto agora permitem acionar, automaticamente e individualmente,
a memória acústica de todo aquele discurso que antes se apresentava sob a forma de narrativa
e se delimitava à memória e à performance do narrador. A invenção da escrita proporciona,
portanto, uma mudança drástica nas estratégias de comunicação e interpretação dos homens.
O acesso aos conhecimentos agora se faz sem a presença de um intermediário, razão pela qual
se institui a igualdade entre os indivíduos e se subtraí o saber da onipotência da razão ou da
autoridade do narrador.
Porque rompe com toda forma de representação das coisas, porque despe
as figuras e os signos de seus mistérios, porque retira dos sacerdotes o
monopólio da interpretação, a escritura alfabética dá a todos os homens
“um direito igual ao reconhecimento da verdade”: todos podem procurar
descobrí-la para comunicá-la a todos, e comunicá-la por inteiro.
(CHARTIER, 2003; p.21-22).
A grande inovação da cultura escrita liga-se, de acordo com esta perspectiva, à possibilidade
de se efetuar acúmulos de discursos documentados e criar um “passado” que pode deslocar-se
do presente e da consciência do presente. O homem portador das técnicas de escrita pode
agora “olhar para trás de um modo como seu correspondente no mundo da oralidade não
podia e nunca quis fazer”. (HAVELOCK, 1996; p.32).
Evidenciando, assim, que a memória escrita, ao registrar o discurso oral a partir de signos
visuais, não mais depende das técnicas e dos ritmos empregados na utilização da memória
oral, tornando-se, deste modo, supostamente mais resistível aos assédios do tempo e do
esquecimento. Isto se estabelece porque, como atesta Havelock, esta nova forma de registro
da memória humana pode se tornar um documento, ou seja:
43
Um conjunto permanente de formas visuais, não mais constituído por
fugazes vibrações do ar, mas por formas que podiam ser conservadas até
um posterior resgate. [...] Além disso, as exigências da narrativa, a sintaxe
ativa e os agentes vivos de todo discurso oral preservado pela memória
podiam ser posto de lado, substituídos por uma sintaxe reflexiva de
definição, descrição e análise. (HAVELOCK, 1995; p.32).
Se no universo da oralidade é por intermédio da voz que o sentido se exibe e se erotiza por
meio do prazer de ouvir, na memória escrita é a imagem do signo lingüístico que enfeitiça,
que aprisiona o olhar e produz, devido à materialidade e a rigidez do suporte onde se
apresenta, uma sensação de segurança e de permanência no tempo.
No entanto, essa sensação de fixidez e estabilidade, supostamente inerente à memória escrita,
não garante a preservação e a perpetuação da totalidade da memória humana, visto que a
mesma ainda se apresenta sob a forma de fragmento e de descontinuidade. Toda memória,
mesmo a memória escrita, é lacunar, é falha e só consegue apreender uma parcela da
realidade.
Os homens são seres sociais porque suas ações, inclusive aquelas ligadas à memória, se
norteiam e adquirem sentido a partir dos princípios e regras que regem uma dada coletividade.
Por este motivo, nossas lembranças, mesmo as mais individuais, são fruto de nossa
participação no tecido social ao qual nos ligamos. Trabalhada pela nossa percepção, “a
memória opera com grande liberdade escolhendo acontecimentos no tempo e no espaço, não
arbitrariamente mas porque se relacionam através de índices comuns. São configurações mais
intensas quando sobre elas incide o brilho de um significado coletivo”. (BOSI, 2003; p.31).
Ao dialogarmos com a pensadora acima citada, queremos defender que, para adquirirem
algum sentido, nossas lembranças devem encontrar respaldo simbólico em uma certa tradição
coletiva. Isto porque, “elas nos são lembradas pelos outros, mesmo que se trate de
acontecimentos nos quais só nós estivemos envolvidos, e com objetos que só nós vimos”.
(HALBWACHS, 1990; p.26). Para tanto, e outorgada a impossibilidade de preservarmos
completamente nossas memórias, sejam elas individuais ou coletivas, orais ou escritas, o
homem, na tentativa de enfrentar o tempo e as incontingências da morte e do esquecimento,
instituiu os “lugares de memória”.
44
2.2. Biblioteca como lugar de memória e esquecimento
Os “Lugares de Memória”, expressão cunhada por Pierre Nora, surgem a partir do momento
que constatamos que nossa memória é frágil demais para reter, voluntariamente, a totalidade
das experiências humanas, sendo, por isso, necessário criar arquivos, museus, bibliotecas,
monumentos, organizar celebrações públicas e pronunciar elogios funerários como recurso
para se manter viva a história e a cultura de toda uma tradição coletiva.
Segundo o referido autor, são estes lugares que “secreta, veste, estabelece, constrói, decreta,
mantém pelo artifício e pela vontade uma coletividade fundamentalmente envolvida em sua
transformação e sua renovação” (NORA, 1993; p.13), ou seja, são eles que viabilizam sua
permanência na história e no tempo. Isto porque:
Museus, arquivos, [bibliotecas], cemitérios e coleções, festas,
aniversários, tratados, processos verbais, monumentos, santuários,
associações, são os marcos testemunhais de uma outra era, das ilusões de
eternidade. Daí o aspecto nostálgico desses empreendimentos de piedade,
patéticos e glaciais. São os rituais de uma sociedade sem ritual;
sacralizações passageiras numa sociedade que dessacraliza; fidelidades
particulares de uma sociedade que aplaina os particularismos;
diferenciações efetivas numa sociedade que nivela por princípio; sinais de
reconhecimento e de pertencimento de grupo numa sociedade que só
tende a reconhecer indivíduos iguais e idênticos. (NORA, 1993; p.13).
Por ser a memória humana lacunar e falível, os lugares instituídos socialmente como “lugares
de memória” se organizam para servir de apoio à salvaguarda da materialidade simbólica
concebida como elemento de representação coletiva. Todo lugar de memória é, pois, “um
lugar duplo; um lugar de excesso, fechado sobre si mesmo, fechado sobre sua identidade; e
recolhido sobre seu nome, mas constantemente aberto sobre a extensão de suas significações”
(NORA, 1993; p.27.).
É o que acontece com as bibliotecas, cuja função social está diretamente ligada à missão de
preservar, organizar e disseminar os elementos culturais e os saberes concebidos pelos
homens. São lugares que nutrem e valorizam nossa cultura e nossa memória coletiva, além de
nos permitir manter vivos os elementos que definem as bases conceituais daquilo que
entendemos por identidade, seja esta nacional, local ou individual. Em suma, elas se
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constituem como um “lugar de memória” porque auxiliam à preservação e à sobrevivência de
uma determinada cultura ao longo de seu transcurso histórico.
As bibliotecas chamam a atenção para a necessidade de se preservar os símbolos culturais que
garantem identidade e visibilidade a um dado tecido sócio-cultural, justamente por serem
estes os elementos que lhes instituem o status de comunidades históricas. Sendo assim, toda
biblioteca é:
Lugar da memória nacional, espaço da conservação do patrimônio
intelectual, literário e artístico, uma biblioteca é também o teatro de uma
alquimia complexa em que, sob o efeito da leitura, da escrita e de sua
interação, se liberam as forças, os movimentos do pensamento. É um
lugar de diálogo com o passado, de criação e inovação, e a conservação só
tem sentido como fermento dos saberes e motor do conhecimento, a
serviço da coletividade inteira. (JACOB, 2000; p.9).
Enquanto lugar de memória, a biblioteca tende a reafirmar os saberes e a torná-los móveis,
traduzíveis, permutáveis, enfim, tenta dar sentido ao saber e a fazer com que o mesmo se
torne um instrumento de reafirmação da "identidade" individual ou coletiva humana.
Portanto, é desde os primórdios de nossa história que o acúmulo e a transmissão de elementos
culturais fazem parte do cotidiano humano, onde a "tentação enciclopédica" criada pela
biblioteca tende a reafirmar os saberes e torná-los móveis, traduzíveis e permutáveis. É, pois,
como lugar de reevocação de um saber anterior que a biblioteca se torna espaço de memória,
bem como lugar que confere sentido ao saber. A partir de tal contexto, JACOB (2000) faz a
seguinte observação:
Todo saber se funda num saber precedente. O conhecimento é cumulativo
e se desdobra em tradição. A biblioteca capitaliza essa herança, permite
aumentá-la graças à atividade coletiva dos que a exploram. O trabalho
intelectual pressupõe que se faça referência a tudo o que já foi escrito
sobre o assunto, que se mobilizem e que se dê fluência aos conhecimentos
arquivados nos livros. Todos os livros da Terra num só lugar, isto é, todos
os pensamentos jamais formulados, os fatos jamais relatados. Os
problemas e suas soluções. (JACOB
, 2000; p.68.)
Se levarmos em consideração suas origens, há mais de 6000 (seis mil) anos atrás,
perceberemos que a história das bibliotecas é habitada por mitos, e que estes se difundem no
Ocidente através de dois grandes arquétipos: o primeiro se consolida em torno do império dos
signos, da profusão de línguas que em vez de promover o entendimento, torna-se o lugar do
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desencontro e do desespero, e que foi representada por Jorge Luis Borges, em sua "Biblioteca
de Babel", como um jogo de espelhos dispersos em um grande labirinto matemático. Por sua
vez, em um segundo momento, temos a metáfora da acumulação do infinito e da "cura da
alma" presentes nos ícones de Alexandria.
Imagens exemplares que demonstram que toda biblioteca conserva a lembrança das que a
precederam e que talvez as tenham sonhado. “A biblioteca ideal se situa assim na
encruzilhada da arqueologia e da utopia arquitetônica, da nostalgia das memórias perdidas e
das reconstruções que fazem as cinzas e a terra falar”. (JACOB, 2000; p.17). Talvez por estes
motivos Bruno Latour tenha dito certa vez que:
A biblioteca não se ergue como palácio dos ventos, isolado numa
paisagem real, excessivamente real, que lhe serviria de moldura. Ela
curva o espaço e o tempo ao redor de si, e serve de receptáculo provisório,
de dispatcher, de transformador e de agulha a fluxos bem concretos que
ela movimenta continuamente. (LATOUR, 2000; p.21.).
Portanto, desde a antiguidade que a biblioteca se apresenta como a esfera que congrega a
metáfora do saber total. Razão pela qual, como bem disse CASA NOVA (1990), uma
biblioteca é o “centramento do saber, “vontade de poder”, reserva como fundo, tesouro.
Biblioteca, que a letra já aponta para o sentido de sua história – gr. biblion + thêkê – cofre,
lugar de depósito. A biblioteca de Alexandria, a biblioteca de Babel. Lugar de tesouros, lugar
de muitas línguas, castigo de Deus-Pai”. (CASA-NOVA, 1990, p.132.).
São lugares de tradição que preservam o conjunto dos valores dentro dos quais nos
reconhecemos enquanto seres sociais. Desta forma, as bibliotecas não preservam apenas a
materialidade concebida para comportar os conhecimentos ou as opiniões que temos, mas,
também, a totalidade do conhecimento humano que só se deixa elucidar a partir do conjunto
de valores constitutivos de uma dada sociedade.
São, ainda, lugares de contradição posto que por trás da aparente calmaria de seus corredores
e de suas estantes, toda biblioteca se apresenta como arena de acirradas disputas ideológicas,
visto que convivem lado a lado, e em aparente harmonia, vozes de autores distintos e com
idéias, em ampla medida, contraditórias e dissonantes cuja validade se determina e se
manifesta através da ansiedade de seus múltiplos leitores.
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Sendo assim, a história das bibliotecas tem seu início junto à invenção da escrita, quando o
homem passa a gravar o que antes era narrado, o que antes se conservava e se transmitia por
via oral através da rememoração. A gênese de toda biblioteca liga-se, pois, à necessidade de
se conservar um dado signo informacional para que o mesmo se perpetue para além do ciclo
vital daquele que outrora o possuía.
As bibliotecas surgem, a partir deste prisma, quando o signo impresso foge “à tradição oral e
não permite mais aquela lenta superposição de camadas finas e transparentes, que oferece a
imagem mais exata da maneira pela qual a narrativa perfeita emerge da estratificação de
múltiplas renarrações”. (BENJAMIN, 1980, p.63). Desta forma, biblioteca serve aqui para
figurar um lugar demarcado:
Tão amplo e completo na sua dimensão de abarcar todo o conhecimento,
de forma tão extensa e exaustiva, que não haveria outro lugar de
interlocução, a não ser o seu próprio espaço sígnico e material, seus
estoques e significados: textos sem contexto, a biblioteca total fabulada
por Borges, que não remeteria a outro lugar, a não ser a ela própria.
(MARTELETO, 1996; p.241).
Se a memória é capaz de inspirar, recuperar a graça do tempo, distender conceitos duros,
devolver o entusiasmo pelo que era caro e se perdeu, redimir o sagrado e devolver não
simplesmente o passado, mas o passado que prometia, as bibliotecas, enquanto lugares
místicos que congregam a amplitude dos saberes concebidos pela humanidade, se configuram,
em ampla medida, como o espaço onde o homem, sua cultura, sua tradição e sua memória
coletiva se mesclam na tentativa de superar o esquecimento e se preservar futuro adiante. As
bibliotecas são, pois, segundo Nora:
Lugares mistos, híbridos e mutantes, intimamente enlaçados de vida e de
morte, de tempo e de eternidade; numa espiritual do coletivo e do
individual, do prosaico e do sagrado, do imóvel e do móvel. Anéis de
Moebius enrolados sobre si mesmos. Porque, se é verdade que a razão
fundamental de ser de um lugar de memória é parar o tempo, é bloquear o
trabalho do esquecimento, fixar um estado de coisas, imortalizar a morte,
materializar o imaterial para prender o máximo de sentido num mínimo de
sinais, é claro, e é isso que os torna apaixonantes: que os lugares de
memória só vivem de sua aptidão para a metamorfose, no incessante
ressaltar de seus significados e no silvado imprevisível de suas
ramificações. (NORA, 1993; p.22.).
Decerto, pois, que os leitores de Borges se lembram da laboriosa minúcia com que ele
recompõe as ruínas daquelas essências que perpassam a literatura dos filósofos platônicos,
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cristãos, cabalistas e cientistas de várias épocas até a disposição dos livros em galerias
hexagonais da Biblioteca de Babel.
Uma das imagens clássicas da memória apresentada nos textos borgianos é a biblioteca, com
suas galerias, livros, enciclopédias avançando com e no tempo e mapeando os saberes do
mundo. A biblioteca feita da mesma matéria que são feitos os sonhos. Uma Babel inscrita na
memória dos tempos, cujas medidas perturbadoras não contêm apenas todos os livros que
existem, mas também todos os que se pode imaginar para o futuro. Portanto:
“Não há, na vasta Biblioteca, dois livros idênticos”. Dessas premissas
incontrovertíveis deduziu que a Biblioteca é total e que suas prateleiras
registram todas as possíveis combinações dos vinte e tantos símbolos
ortográficos (número, ainda que vastíssimo, não infinito), ou seja, tudo o
que é dado expressar: em todos os idiomas. (BORGES, 1998; p.518).
As dobras da memória que os textos borgianos engendram nos faz, seus leitores, perguntar
sobre a realidade das coisas: o que é o mundo? O que é o homem e seus conhecimentos?
Através dos paradoxos, das enciclopédias e da dança dos tigres nos deparamos com o absurdo
do mundo. Possuir o engenho da memória dos tempos é sonhar o mundo.
Isto posto, a ficção deste homem apaixonado pelos livros nos auxilia a elaborar argumentos
que comprovem que a biblioteca, em qualquer época que se insira, representa a metáfora da
acumulação total: todo o conhecimento humano em um só lugar, bem como seu sonho de
perpetuar-se no tempo, mesmo agora quando descobrimos que:
(...) finalmente dotados de signos, os seres humanos perdem as próprias
recordações pessoais, às quais tendem a abdicar. Assim, mais do que
nunca, a memória parece encerrar em si um segredo: o armazém da
realidade transforma-se numa complexa caverna pintada, onde a entrada
não garante necessariamente a saída, e o que foi ciosamente mantido nas
salas das lembranças revela-se no fim um “espelho dos enganos”; e o
passado esvai-se lento, porém dolorosamente, no tempo que em vão
tentamos dominar (...). (COLOMBO, 1991, p.20-50).
Dominar o tempo, por mais fluido e disperso que este possa parecer, sempre foi o grande
sonho humano. É por este motivo que aqui:
A biblioteca parece assim ser uma espécie de Penélope que tece os fios da
teia do tempo e do conhecimento, e à noite a desfaz pelo silêncio, para
recomeçar no outro dia o mesmo trabalho. Palavra efêmera, conhecimento
49
efêmero. A teia, o tecido é esse grande discurso que ela encara no que é
manifesto, e naquilo que se mostra, e no que é subterrâneo, latente;
precisa e se quer desvelado. (CASA NOVA, 1990; p.136).
Em suma, toda biblioteca, por intermédio das relações que estabelece com a memória e com o
esquecimento, se constitui como um importante pólo de preservação da tradição coletiva.
Portanto, é pensando a tradição como uma possibilidade de se compreender as ações humanas
no presente a partir das constantes revisitações que fazemos ao passado através da memória e
dos costumes coletivos, que podemos vislumbrar a memória coletiva, aliada à memória
individual, como um dos principais elementos que garantem a sobrevivência de uma dada
coletividade, bem como a coerência do sujeito enquanto ser social.
Isto porque, as tradições e as várias formas de agir social se assentam em um conjunto de
relações simbólicas que norteiam e solidificam as várias esferas de atuação humana,
imprimindo nestas um modo de vida e de interpretação do mundo com características bem
definidas, tendo-se em vista demarcar a espeficidade do sujeito, bem como do tecido sócio-
cultural onde o mesmo se insere.
A memória, desta forma, não se encontra inteiramente fechada e isolada sobre si mesma. Para
poder evocar seu próprio passado, todo indivíduo adota como ponto de referência as
lembranças dos outros, norteando suas ações através de elementos que existem fora dele e que
são fixados pela sociedade. Sendo assim, a memória se configura como uma prática social que
tem seu valor determinado no seio de cada cultura.
É por esta razão que quando pensamos em cultura quase sempre nos remetemos à idéia de
tradição, repertório, conjunto de objetos, discursos ou significados construídos ao longo da
trajetória de uma dada sociedade, povo ou agrupamento humano, visto serem estes os
elementos que lhes instituem o status de comunidades históricas autônomas e com identidade
própria constituída. A partir deste ponto de vista, podemos configurar a cultura como:
[...] um contexto no sentido em que ela se refere a práticas de produção de
significados, que por sua vez alimentam todo um processo de dinâmica
cultural. Dessa forma, guardando o sentido produtivo que está contido no
contexto cultural é que estaremos operando uma passagem do plano
discursivo da cultura para o das práticas sociais de produção cultural.
Trata-se da passagem do universal para o singular, do homogêneo para o
plural, do total para o particular, que é onde se elabora a idéia de cultura
50
como construção, obra e trabalho, e não simplesmente como norma,
código ou tradição. (MARTELETO, 1992; p.90-91.).
Tendo por base este enfoque, acreditamos que as práticas culturais se apresentam como os
inúmeros recursos utilizados por cada sujeito, ou mesmo por uma determinada esfera coletiva,
para demarcar seu lugar no tempo, no espaço e nos muitos discursos onde suas ações se
desenvolvem.
Toda prática cultural é, portanto, um importante elemento de sociabilidade, bem como um
mecanismo indispensável à construção do sentimento de pertencimento a um determinado
sistema social de interações. Razão pela qual torna-se necessário discorrermos sobre os
múltiplos sentidos que demarcam o termo cultura, para podermos caracteriza a biblioteca
enquanto lugar de preservação da memória coletiva, bem como dos inúmeros elementos que
viabilizam a constituição de uma dada noção de cultura. Estratégia que se converte no
objetivo central do capítulo que se segue.
51
3. Capítulo II
No fim do labirinto, o mundo: biblioteca
como lugar de práticas culturais
Conta uma velha lenda talmúdica que nas vésperas do Dilúvio, dois sábios, dois videntes,
que eram filhos de Seth e conheciam as tenções de Deus, descendo por um caminho da
Mesopotâmia, numa tarde triste, naquela imensa tristeza das últimas tardes do mundo,
estremeceram, pararam ao avistar por trás dos montes Górdios as nuvens que subiam,
tenebrosas, enroladas, já carregadas de chuva suprema e vingadora. E o que então os
contristou não foi a destruição dos rebanhos, das fortes cidades muradas, de tantos povos
dóceis... o que os angustiou foi pensar que a ciência tão penosamente adquirida e
acumulada desde o paraíso, pereceria com os homens sapientes que a possuíam, de
repente, como se evapora a essência rica do nardo quando o vaso fino se quebra; - e que
as raças, renascidas sobre a terra renascida, deveriam recomeçar a áspera
aprendizagem... Naquele caminho perdido da Mesopotâmia, sob a tristeza da tarde, os
dois filhos de Seth, determinaram arquivar, escrevendo em matéria imperecível a ciência
que possuíram, que era a ciência total daquela primeira humanidade... gravaram sobre o
granito, e gravaram sobre o tijolo o livro de todo saber.
1
1
QUEIROZ, Eça. Almanaques. Obras Completas, p.1629 apud. CASA NOVA, 1990; p.130-131.
52
Dando continuidade a nosso intento, o capítulo que se segue tem por objetivo aproximar o
mundo das bibliotecas ao universo das práticas culturais. Para tanto, recorre-se à historicidade
de tais instituições como estratégia para demonstrarmos as tensões e contradições que
constantemente emergem em torno da preservação, organização e difusão da herança cultural
que informa e atribui sentido à existência humana.
Sendo assim, torna-se necessário esclarecer, já neste momento, que a presente pesquisa define
práticas culturais como as várias manifestações simbólicas que permitem a cada sujeito
imprimir uma marca interpretativa ao mundo que o cerca, atuando conscientemente na
tentativa de instituir seus próprios lugares de representação para as inúmeras esferas que
compõem sua vida individual ou coletiva.
Acreditamos, pois, que é através das práticas culturais que o homem se constrói enquanto
sujeito histórico. Razão pela qual a primeira seção deste capítulo recupera as inúmeras
nuances que circunscrevem o significado do termo cultura.
Por conseguinte, e adotando por premissa que toda prática cultural requer uma materialidade
que a represente enquanto tal, tendo-se em vista articular, através de obras e manifestações, o
universo simbólico do qual se origina, as duas últimas seções postulam que as bibliotecas se
constituem, ao longo do transcurso histórico, como “lugares de práticas culturais” porque
adotam como função básica a tarefa de recolher, preservar, organizar e difundir as obras e os
documentos que conferem identidade a um dado agrupamento humano. Sigamos, pois, para
nossa primeira empreitada.
3.1. Cultura: modulações de um conceito
O termo cultura tem em sua genealogia o adjetivo adverbial cultus que, em sua acepção
básica, designa o campo que já fora trabalhado por sucessivas gerações de lavradores e
demarca não apenas a ação de cultivar o solo através dos tempos, mas, “principalmente a
qualidade resultante desse trabalho já incorporado à terra que se lavrou” (BOSI, 1995; p.13).
Fato que atribui a este conceito um significado mais denso que a simples nomeação de uma
atividade ligada ao trabalho com o solo, visto demarcar, ainda, que “a sociedade que produziu
seu próprio alimento já tem memória”. (BOSI, 1995; p.13)
53
Memória que se ativa principalmente através do culto aos mortos, “forma primeira de religião
como lembrança, chamamento ou esconjuro dos que já partiram” (BOSI, 1995; p.13).
Portanto, cultus não designa apenas o trato com o solo e aquilo que se produz sobre ele a
partir do cultivo, mas também aquilo que se cultua sob ele através dos ritos mágicos em
reverência aos antepassados. Isto porque:
[...] a terra na qual repousam os antepassados é considerada como o solo
do qual brota cada ano, magicamente, o sustento alimentício da
comunidade. Os espíritos dos antepassados devem ter sido considerados,
seguramente, como cooperadores na germinação das plantas cultivadas.
(CHILDE, 1959; p.129-130 apud BOSI, 1995; p.14).
Segundo este prisma, cultus também demarca aquilo que se trabalha sob a terra. Ou seja, o
enterro dos mortos como instrumento de reverência à memória e à vida dos antepassados que
em seu momento de retorno à terra torna-se a força necessária à germinação dando, assim,
seqüência ao contínuo fluxo da vida. Fato que nos permite inferir que é a partir deste contexto
que a cultura se relaciona, desde suas primeiras acepções, com práticas de organização
simbólica e de produção social de significados, tendo-se em vista a interpretação e a
constituição do real.
Sendo assim, e tomando por base este segundo enfoque, salientamos que a noção de cultura se
difunde no Ocidente tendo por base dois sentidos básicos: o primeiro indica que cultura –
palavra e conceito – é de origem romana e deriva-se de colere – cultivar, habitar, tomar conta,
criar e preservar – e relaciona-se essencialmente com o trato que o homem dispensa à
natureza, no sentido de amanho e de preservação desta até que se torne adequada à habitação
humana.
De acordo com esta perspectiva, cultura seria uma atitude de carinhoso cuidado com a terra na
qual habitamos e se colocaria em aguda oposição a todo esforço de se sujeitar a natureza à
dominação do homem. Em decorrência disso, não se aplicaria apenas ao trato com o solo, mas
poderia designar, igualmente, o “culto” aos deuses e o cuidado com aquilo que lhes pertence,
sejam estes seus ancestrais, monumentos ou ícones que se ligam à memória e reevocam o
repertório simbólico que lhes instituem o caráter de comunidades históricas.
Já em seu segundo sentido, cultura designa questões ligadas ao espírito e à alma. Derivando
de expressões como escolere animum ou cultura animi, esta acepção indica a possibilidade de
54
se cultivar o espírito mediante alguns processos de auto-formação individual, na tentativa de
se alcançar um ideal de beleza e verdade que se apresentaria como indissociável da Natureza e
do Sagrado. É a partir deste outro olhar que cultura passa a ser definida como o “conjunto das
práticas, das técnicas, dos símbolos e valores que se devem transmitir às novas gerações para
garantir a reprodução de um estado de coexistência social”. (BOSI, 1995; p.16).
Para tanto, há que se notar, naquilo que concerne ao cultivo do espírito, que o termo cultura
apresenta íntima relação de sinonímia com o vocábulo grego Paidéia. Ou seja, à formação do
homem por intermédio das artes e da Educação. Por extensão, o termo pode ser usado para se
referir ao cuidado com as crianças, tendo-se em vista potencializar o desabrochar de suas
qualidades e faculdades mentais.
Sendo assim, de acordo com esta concepção, é através da cultura e da educação que o homem
institui coerência, lógica e sentido para o mundo no qual sua vida se desenrola. Cultura animi
é sinônimo de Paidéia porque esta traz consigo o sentido de educação do homem enquanto
indivíduo-cidadão ajustado à Polis. Razão pela qual:
A Paidéia – conjunto da poesia, artes, ciências, leis –, dos sofistas
equivale ao que os romanos [chamaram] de cultura animi, o processo de
formação humanista do indivíduo. A noção, vê-se, faz parte de uma ratio
que não é mais a razão cósmica, mas a razão do Estado, medida ideal de
toda educação para os sofistas. Poder de Estado e ação pedagógica
constituem agora o campo cultural, isto é, compõem as condições de
admissão de um fato como pertencente à Paidéia. (SODRÉ, 1983; p.21).
Era por intermédio deste ideal de auto-formação através da educação e do logos que o sujeito
se tornava capaz de processar e compartilhar gostos, costumes e crenças com o intuito de
enquadrar-se em um mundo de hábitos espiritualmente valorizados. Isto porque, “as artes, as
letras, a filosofia, o direito, que constituem o saber das Humanidades greco-latinas, eram
práticas diferenciais (que pretendiam gerar o bem e a verdade) voltadas para a busca de uma
ontologia existencial do indivíduo em face crescente do Estado” (SODRÉ, 1982; p.18).
Neste sentido, quando o homem se questiona sobre a verdade ou sobre as belezas das coisas
do mundo, bem como sobre as ações relacionadas à justiça ou sobre as demais esferas de
atuação humana, a cultura animi proporcionaria ao indivíduo os recursos necessários para que
o mesmo se enquadrasse harmonicamente dentro de uma dada estrutura de sociabilidade.
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Avançando um pouco no tempo, percebemos que foi exatamente esta noção que prevaleceu e
se difundiu no Ocidente até os primeiros anos do século XVIII, momento no qual o conceito
se associa ao termo civilização. A partir de então, cultura passa a designar um determinado
estágio de desenvolvimento histórico-social expresso em obras, feitos, ações ou instituições
oriundos de um processo de aperfeiçoamento moral e intelectual promovidos pelo
desenvolvimento autônomo da razão.
Tal concepção advém dos princípios difundidos pela Revolução Francesa e refere-se às boas
maneiras aristocráticas vivenciadas nas cortes imperiais. São as convenções sócio-políticas
que adquirem valor institucional e social mediante a idéia de progresso que se dissemina
juntamente com as novas conquistas tecnológicas. Vertente que ganha força com a ideologia
Iluminista, que vê na cultura uma possibilidade para a “difusão das luzes mais brilhantes da
consciência” (SODRÉ, 1982; p.23), acreditando, pois, que o mundo deveria progredir
mediante o acesso a uma razão universal.
Esta idéia pode ser apreendida já no momento de criação da Enciclopédia, obra máxima do
Iluminismo, que tem sua origem ligada ao propósito de promover, edificar e difundir uma
nova cultura através da democratização de informações enquanto instrumento que oferece a
oportunidade de acesso e cultivo de uma razão universal. O ponto de partida para a construção
da Enciclopédia foi a possibilidade de se considerar a existência e a práxis humana como
aplicação direta deste conjunto de conhecimentos tidos como autônomos e válidos para todos
em qualquer segmento da ação individual ou da ação coletiva dos homens. É a partir deste
sentido que podemos ressaltar que:
A cultura agora são os bens simbólicos produzidos e difundidos pelo
circuito de distribuição comercial, dentro de um mercado de acumulação
monetária ou estatal. Trata-se da difusão de cultura como difusão de
mercadoria. Não se trata, por outro lado, de um a priori, que deve ser
cultivada e/ou reconhecida em diferentes grupos ou sociedades, mas de
uma cultura que se produz, se reproduz e se modifica constantemente,
seguindo o próprio ritmo da produção material e da produção da verdade,
pela racionalidade. (MARTELETO, 1992; p.39).
Portanto, o produto mais visível desta vertente iluminista é aquele que instaura a oposição
entre cultura e natureza humana. Cultura, através da educação e dos costumes instituídos
como válidos, passa a ser encarada como algo que melhora, aperfeiçoa e desenvolve a
56
natureza inata de cada sujeito. Agora, cultura torna-se sinônimo de História e relega a
natureza ao reino da repetição.
Por este motivo, o conceito de cultura passa a ser difundido como as inúmeras possibilidades
de relacionamento entre os homens e seus múltiplos processos de interação com o tempo e no
tempo, tendo-se em vista alcançar um determinado padrão de aperfeiçoamento humano, bem
como a busca por um caminho que estabeleça níveis satisfatórios de relacionamento social
como alternativa para se atingir o maior índice possível de progresso.
Contudo, ao se tornar sinônimo de civilidade, a cultura passa a ser encarada como um produto
à disposição das elites que detêm o controle sobre o capital e sobre os bens de produção, bem
como dos burocratas que dominam os aparelhos ideológicos do Estado. Ter ou não cultura
serve agora para homologar a diferenciação entre classes, visto que a mesma se converte em
elemento a ser exibido e ostentado em uma arena de fetiches que poucos possuem acesso.
Neste sentido:
Ser culto, ter cultura, é ter acesso a livros, ter acesso a discos, ter acesso a
aparelhos de som muito requintados, que são caros, que exigem espaços.
A própria arquitetura passa a funcionar de acordo com essas novas
necessidades. Quem tem cultura e precisa de um aparelho de som grande,
vai precisar também de uma sala especial na sua casa. O que acontece? A
arquitetura começa a moldar-se de acordo com essas necessidades
específicas, o que é o contrário da idéia de pobreza. Porque a arquitetura
da pobreza é uma arquitetura multifuncional. Numa casa pobre, o mesmo
espaço pode servir para comer, para dormir, para trabalhar; enfim, a
plurifunção do espaço, a sua flexibilidade, é própria de uma cultura da
pobreza. [...] O palácio é o lugar onde a cultura deve ser vista, apreciada
em si, elogiada, sem que se tenha uma relação direta com o cotidiano,
aliás, sem dever ter qualquer relação direta com o cotidiano, porque este
não é, de fato, considerado como cultura. Verifica-se, por este conceito,
que a cultura não pode ser democrática. (BOSI, 1987; p.36).
Condição que postula a cultura como uma instância à margem do social, fechada sobre si
mesma, indicando a possibilidade de uns terem acesso e outros não, sempre levando em
consideração as qualidades inatas de cada sujeito, bem como as relações de poder e interesses
de onde estes se originam.
É, ainda, a partir deste quadro histórico que se institui a distinção entre Cultura Erudita e
Cultura Popular, cuja primeira liga-se diretamente ao consumo de bens culturais elitizados
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que, por terem alto custo, não se mostram acesveis à maioria da população. Por sua vez, a
Cultura Popular se apresenta como “um sistema simbólico, coerente e autônomo, que
funciona segundo uma lógica absolutamente alheia e irredutível à cultura letrada”.
(CHARTIER, 1995, p.179).
Se a cultura erudita é tudo aquilo que pertence ao nicho da elite dominante, a cultura popular
se apresenta, neste discurso com ares de positivismo, como todas as coisas que o povo fez ou
faz. São seus valores, costumes e mentalidades. É a expressão simbólica que surge para
representar a periferia, aqueles que se encontram à margem dos grandes centros urbano-
industriais do Ocidente. Caracterizando-se, portanto, como as estratégias utilizadas por
aqueles que não se ligam diretamente ao circuito de produção da cultura erudita, mas que têm
por objetivo conceber interpretações próprias para o mundo que os cercam.
Embora tenha sofrido inúmeras depreciações em torno de seu processo de efetivação e
circulação, toda cultura popular deve ser vislumbrada como uma produção discursiva e
organizada de sentido, amplamente diversa daquela concebida pelas instâncias do poder
dominante, tendo por característica básica, como atesta Michel de Certeau (1994), “suas
astúcias, seu esfarelamento em conformidade com as ocasiões, suas “piratarias”, sua
clandestinidade, seu murmúrio incansável, em suma, uma quase-invisibilidade, pois ela quase
não se faz notar por produtos próprios, mas por uma arte de utilizar aquilo que lhe são
impostos” (CERTEAU, 1994; p.94, v.1). Ou seja, é a partir de práticas, costumes e tradições
tidas como de pouco valor simbólico que a cultura popular se organiza para constituir e
edificar seu espaço, sua linguagem, seu mundo.
Por isso se apresenta como um campo simbólico autêntico, no qual a cultura dominante é
aceita, interiorizada, transformada e reproduzida pelos mesmos mecanismos através dos quais
é recusada, negada e afastada conscientemente pelos dominados. Não é uma outra cultura,
mas algo que se constitui a partir de sucessivas interpretações, negociações e intercâmbios
efetuados com a cultura erudita. Posicionando-se, assim, como uma cultura tradicional, tanto
em termos materiais como simbólicos, com graus variados de espontaneidade, coerência e
consciência de sua identidade.
É, portanto, a partir deste ponto de vista que, independente se erudita ou popular, cultura
denota, sociológica e antropologicamente, a criação de uma ordem simbólica da linguagem,
58
do trabalho, do espaço, do tempo, do sagrado e do profano, do visível e do invisível, enfim,
das inúmeras esferas de atuação humana. É o conjunto das práticas e dos fazeres a partir do
qual o homem, ou uma dada comunidade histórica se constitui para configurar e transformar o
mundo no qual se insere, servindo, assim, como elemento essencial para a construção daquilo
que chamamos de identidade.
Neste sentido, e como síntese dos apontamentos teóricos que traçamos até o presente
momento, percebemos de imediato que memória e identidade são duas instâncias
fundamentais para esboçarmos uma compreensão acerca dos elementos que caracterizam as
relações humanas na contemporaneidade.
Isto porque, a partir do advento da globalização e da conseqüente distorção das noções de
tempo e espaço, o homem moderno se vê imerso em um contexto onde suas ações não se
definem de forma tão estáveis como outrora. Razão pela qual se promove um intenso debate
em torno das categorias que historicamente balizaram nosso entendimento sobre o que é
pertencer culturalmente a uma dada coletividade, bem como este sentimento nos define
enquanto sujeitos socialmente localizados e integrados a um determinado contexto espaço-
temporal.
Embora a noção de pertencimento cultural não pressuponha o isolamento geográfico, visto ser
o contato entre indivíduos e culturas um fator indispensável para a produção coletiva de
significados, as transformações que ora emergem atribuem novos valores simbólicos para
algumas das categorias que notadamente instituíam status de individualidade aos muitos
sujeitos históricos.
Se até recentemente o conceito de individualidade se definia por meio do apego a padrões
éticos, morais, religiosos, raciais ou sexuais, as rupturas que marcam a experiência
contemporânea e sua lógica da descontinuidade imprimem sobre as relações humanas um
esvaziamento tal que sua marca passa a se constituir através de percepções estritamente
ligadas aos deslocamentos e façanhas pessoais.
Este rompimento com o apego à localidade e a não identificação com os produtos simbólicos
provenientes das interações entre os sujeitos traz à tona a dificuldade de se conjugar a história
de vida individual com as experiências coletivas concebidas na esfera social. Como
59
conseqüência, tais eventos ameaçam suas vítimas de não encontrarem ressonâncias que
respaldem sua participação na construção de um quadro de referências compartilhadas, tendo,
assim, suas biografias fraturadas pela falta de uma identidade enraizada no mundo.
Com isso, se a definição básica de identidade ligava-se à busca das origens, das semelhanças,
do substrato comum, daquilo “que, por baixo das diferenças, do movimento, das mudanças
costura e mantém a unidade” (FRANÇA, 2002; p.27), a contemporaneidade passa a designá-
la como um discurso em permanente processo de elaboração; ou seja, “como uma produção
que nunca se completa, formada e transformada no interior da representação”. (FRANÇA,
2002; p.27).
Representação que, por sua vez, se forja a partir do prisma da multiplicidade. Ou seja: o
sujeito ao longo de seu percurso histórico, e no ato mesmo da socialização, desenvolve e
modula suas ações por intermédio do contato com esferas sócio-culturais essencialmente
diversificadas. O que equivale dizer que, mesmo pertencendo a uma localidade específica,
como a de uma família católica que reside em um pequeno município do sertão mineiro,
nosso referencial simbólico se forma com base em um contexto global, visto que somos, a um
só tempo, mineiros, brasileiros, americanos e ocidentais, compartilhando de toda aquela
diversidade que caracteriza cada uma destas esferas. Em outras palavras:
A identidade tem a ver com discursos, objetos, práticas simbólicas que
nos posicionam no mundo – que dizem nosso lugar com relação a outro
(outros pontos de referência, outro lugar). Ao fazer isto, a identidade
também marca e estabelece uma posição, o lugar que efetivamente
construímos e no qual nos inserimos. Ela se constrói assim – nessa
interseção entre discursos que nos posicionam e o nosso movimento de
nos posicionarmos enquanto sujeitos no mundo. (FRANÇA, 2002; p.28).
E isto acontece porque talvez a marca mais eminente da condição pós-moderna seja a
fragmentação. Característica que se confirma pelo indicativo de que “as velhas identidades,
que por tanto tempo estabilizaram a vida social, estão em declínio, fazendo surgir novas
identidades e fragmentando o indivíduo moderno, até aqui visto como um sujeito unificado”.
(HALL, 2001, p.7).
Portanto, se até bem pouco tempo a noção de identidade cultural se definia pela certeza de se
pertencer a grupos que compartilham o mesmo referencial simbólico, as transformações
60
estruturais oriundas da pós-modernidade acometem radicalmente o quadro de referências em
que se assentavam os antigos padrões que por longa data delimitaram tal conceito, libertando
“o indivíduo de seus apoios estáveis nas tradições e nas estruturas” (HALL, 2001; p.25) e
refutando a idéia de uma identidade única e estável para os muitos sujeitos humanos. Fator
que nos possibilita inferir que:
Esse processo produz o sujeito pós-moderno, conceptualizado como não
tendo uma identidade fixa, essencial ou permanente. A identidade torna-se
uma “celebração móvel”: formada e transformada continuamente em
relação às formas pelas quais somos representados ou interpelados nos
sistemas culturais que nos rodeiam. (HALL, 2001, p.12-13).
Neste sentido, e segundo o autor acima citado, a noção de uma identidade única, coesa e
completa em si mesma se torna uma fantasia, visto que o sujeito assume identidades
múltiplas, e em ampla medida contraditórias, nos diferentes momentos e espaços onde sua
história de vida adquire sentido e encontra ressonância.
Isto acontece porque o atual contexto histórico é caracterizado por rápidas e permanentes
transformações que instituem um movimento de “distanciamento da idéia sociológica clássica
de “sociedade” como um sistema bem delimitado e sua substituição por uma perspectiva que
se concentra na forma como a vida social está ordenada ao longo do tempo e do espaço”.
(GIDDENS, 1990, p.64 apud HALL, 2001; p.67-68). Neste novo momento histórico uma
parcela significativa dos eventos humanos passa a ser percebida em função de uma rede
global que interconecta todos os pontos da terra em uma velocidade antes impensada.
Com o tempo de comunicação implodido e encolhido à insignificância do instante, o espaço e
todos os seus delimitadores deixam de importar. Indicando, assim, que a distância não mais se
constitui como um elemento expressivo de restrições. Motivo pelo qual a esfera cultural sofre
profundas transformações e as relações entre os componentes globais se tornam
eminentemente mais difusas. A partir de agora:
Os fluxos culturais, entre as nações, e o consumismo global criam
possibilidades de “identidades partilhadas” – como “consumidores” para
os mesmos bens, “clientes” para os mesmos serviços, “públicos” para as
mesmas mensagens e imagens – entre pessoas que estão bastante distantes
umas das outras no espaço e no tempo. À medida em que as culturas
nacionais tornam-se mais expostas às influências externas, é difícil
conservar as identidades culturais intactas ou impedir que elas se tornem
61
enfraquecidas através do bombardeamento e da infiltração cultural.
(HALL, 2001; p.74).
Percebemos, a partir deste prisma, que a identidade cultural não se fixa no momento do
nascimento, visto que não é parte integrante da natureza que se imprime através do parentesco
ou da linhagem dos genes que dão vida a um indivíduo. Ao contrário, ela se manifesta a partir
do entrelaçamento e da fusão dos diferentes elementos que compõem a esfera global dos
discursos culturais onde cada sujeito se insere.
Possuir uma identidade cultural não é estar primordialmente inserido em um núcleo imutável
e atemporal que liga o passado ao presente, e este ao futuro em uma linha ininterrupta que se
forja através do apego à tradição e da fidelidade às origens. É, antes, a consciência e a
possibilidade de se abarcar, o mais amplamente possível, o jogo de semelhanças e diferenças
presentes nas culturas do mundo inteiro.
Portanto, só quando entendemos as práticas culturais como um elemento central para a
constituição e consolidação da subjetividade do sujeito enquanto ator social, que nos
habilitamos a pensar as identidades culturais como manifestações construídas no interior das
representações, através da cultura, não fora delas. “Elas são o resultado de um processo de
identificação que permite que nos posicionemos no interior das definições que os discursos
culturais (exteriores) fornecem, ou que nós subjetivamos (dentro deles)”. (HALL, 1997; p.26).
Ou seja, como toda prática cultural necessita de um quadro de referências para adquirir
sentido e valor, é notório que as mesmas se instauram dentro de um repertório simbólico
demasiado amplo, que em momento algum pode ser interpretado como se possuísse apenas
um sentido. Todo repertório simbólico se constitui como um amálgama proveniente da
urdidura dos múltiplos olhares interpretativos que emergem dentro de um determinado
referencial cultural, possibilitando ao sujeito, e mesmo a uma coletividade inteira, construir e
consolidar sua própria noção de identidade. Tal possibilidade se edifica porque:
Os seres humanos são seres interpretativos, instituidores de sentido. A
ação social é significativa tanto para aqueles que a praticam quanto para
os que a observam: não em si mesma, mas em razão dos muitos e
variados sistemas de significado que os seres humanos utilizam para
definir o que significam as coisas e para codificar, organizar e regular sua
conduta uns em relação aos outros. Estes sistemas ou códigos de
significado dão sentido às nossas ações. Eles nos permitem interpretar
62
significativamente as ações alheias. Tomados em seu conjunto, eles
constituem nossas “culturas”. Contribuem para assegurar que toda ação
social é “cultural”, que todas as práticas sociais expressam ou comunicam
um significado e, neste sentido, são práticas de significação. (HALL,
1997; p.26).
O que equivale dizer que é a partir dos processos de interiorização, significação e
exteriorização do repertório simbólico e das tradições culturais que nos posicionamos
enquanto sujeitos históricos e sociais capazes de assimilar e transformar o mundo que nos
cerca. Nossa identidade se constrói a partir do confronto entre aqueles elementos que
alimentam e sustentam nosso referencial de mundo, com a especificidade de nossa
subjetividade. Condição que nos atribui os recursos necessários para aceitá-los ou rompermos
definitivamente com eles.
Sendo assim, o grande conflito que assola o sujeito na contemporaneidade gira em torno da
capacidade de construir laços de sociabilidade que liguem sua história individual à história do
grupo ao qual se insere, configurando formas de interações que encontrem ressonâncias na
vida social. Ou seja, poder participar ativamente da construção dos “meios onde recebe os
princípios da vida moral, intelectual e espiritual que irão informar sua existência. Participação
que pode vir do nascimento, da casa, da vizinhança, do trabalho, da cidade”.
(FROCHTENGARTEN, 2005; p.368).
Formular um discurso identitário requer, segundo aquilo que se expôs até aqui, pensar as
múltiplas manifestações humanas como ações dinâmicas, amplamente permeadas por
confrontos, cujo sentido em momento algum determina o nivelamento, a estabilidade, a
fixidez ou a homogeneização.
Com isso, se observarmos atentamente os múltiplos sentidos atribuídos ao termo cultura nas
páginas iniciais deste capítulo, perceberemos que não é possível falar em cultura no singular,
mas sim, em culturas, no plural. Isto porque, toda cultura, em essência, diz respeito às várias
maneiras através das quais o homem se relaciona com seus semelhantes na tentativa de
construir, simbólica e discursivamente, as várias esferas onde sua vida se desenvolve. É o que
aponta Alfredo Bosi quando ressalta que:
A cultura dá sentido ao tempo redimindo-o da entropia cotidiana e da
morte que cada novo minuto decreta sobre o anterior. A cultura não se
63
confunde com a manipulação direta dos objetos e do outro com fins
práticos; a cultura, em si, na sua pureza, e enquanto alheia às instâncias de
poder que dela se apropriam, significa o respeito pela alteridade das
criaturas, pela sua transcendência, o desejo de ultrapassar os confins do
próprio ego, e vencer com as forças da alma as angústias da existência
carnal e finita. (BOSI, 1992; p.19).
Portanto, é como sistema de significações a partir do qual uma dada ordem social se
dissemina, se reproduz, se vivencia e se preserva, que a cultura deve ser vislumbrada. Mas o
que pode ser feito para se preservar os elementos simbólicos que caracterizam uma cultura?
Da mesma forma como criou sistemas de significações tendo-se em vista produzir sentido
para as ações que estabelece com o mundo e no mundo, o homem criou instituições cujo
objetivo gira em torno de preservar, administrar e disseminar os vários produtos oriundos de
sua tradição, convertendo-os em lugares representativos de seu repertório simbólico. Nesta
perspectiva, as igrejas, as escolas, os sindicatos, os museus, os arquivos e as bibliotecas
certamente se posicionam como as de maior visibilidade, visto serem espaços nos quais a
“cultura mostra sua face universalizante, de tradição e continuidade, e também onde se vive
de maneira concreta as ações e representações de cada um e de todos, origem e destino de
toda cultura autêntica”. (MARTELETO, 1992; p.11).
Demonstramos anteriormente que as bibliotecas se constituem como “Lugares de Memória
porque sua função social é respaldada por ações que objetivam preservar e disseminar os
saberes concebidos pelo homem, na tentativa de se garantir a construção de uma dada noção
de identidade, independente se local, nacional ou individual.
Partimos agora para a tentativa de enfatizar que as bibliotecas também se configuram, ao
longo de sua história, como instituições fundamentais para a preservação dos elementos
culturais que emergem das diversas esferas sócio-históricas onde se inserem, posicionando-se,
assim, comoLugares de Cultura”. Acreditamos que esta possibilidade encontra-se presente
já nas funções básicas de seleção, organização e transmissão dos diversos signos
informacionais contidos em seus acervos.
Característica que lhes confere o status de lugar de continuidade e de preservação da história
em tempos e espaços específicos. Configurando-se, desta maneira, como organismo de
fundamental importância para a estabilidade e o desenvolvimento de uma noção de identidade
64
cultural, bem como do sentimento de se pertencer a um determinado agrupamento humano via
preservação da tradição e da memória coletiva. Isto se efetiva porque a história das bibliotecas
acaba por se converter na história daquilo que uma sociedade decide preservar e transmitir ao
longo de seu continum histórico.
3.2. Biblioteca: lugar de urdidura da memória e da cultura
Sintetizando aquilo que já se salientou até o presente momento, uma biblioteca, especialmente
uma biblioteca pública, não é apenas o depósito dos estratos informacionais que o homem
almeja proteger das investidas do tempo e do esquecimento. É antes, e sobretudo, o reflexo da
ansiedade do Ser por preservar-se futuro adiante. Por isso, forma-se como um conceito
imaterial que, de acordo com o lugar onde se insere, confere sentido às práticas culturais
humanas.
É a memória do mundo: todos os conhecimentos humanos em um só lugar. Isto é, aquilo que
o conhecimento significa para o homem é o que a biblioteca pretende conservar, seja este “o
sopro de Deus, as Musas, a morada do Bom e do Belo, os ventos uivantes do comércio, ou
uma mistura confusa de todas estas coisas – será aquilo que a biblioteca é templo”.
(BATTLES, 2003; p.16). É, enfim, o lugar onde se vive de maneira concreta as ações e
representações de cada um e de todos, origem e destino de toda cultura autêntica.
Características que nos possibilita afirmar que:
A história das bibliotecas no Ocidente é indissociável da história da
cultura e do pensamento, não só como lugar de memória no qual se
depositam os estratos das inscrições deixadas pelas gerações passadas,
mas também como espaço dialético no qual, a cada etapa dessa história,
se negociam os limites e as funções da tradição, as fronteiras do dizível,
do legível e do pensável, a continuidade das genealogias e das escolas, a
natureza cumulativa dos campos de saber ou suas fraturas internas e suas
reconstruções. (JACOB, 2000; p.11).
Portanto, a razão para lançarmos um olhar sobre a história das bibliotecas e de suas coleções,
bem como sobre seu papel crucial para a salvaguarda da memória e da cultura dos homens,
liga-se à impossibilidade de compreendermos e transformarmos o mundo no qual habitamos
sem os elementos materiais e imateriais que nelas se preservam para nos ligar a um dado
repertório simbólico.
65
Retrocedendo no tempo, visualizamos que a história das bibliotecas, tal qual a das civilizações
humanas, tem sua gênese ligada ao acúmulo das diversas experiências porque passaram as
gerações que nos precederam, visto que a conservação e a transmissão “das aquisições
elaboradas e complexas somente pode ter lugar mediante registros físicos de tipo permanente,
ou pelo menos bastante duradouros” (SERRAI, 1975; p.141). Premissa que nos indica que as
primeiras bibliotecas se formaram em paralelo à invenção da escrita, momento no qual o
homem passa a gravar em materiais estáveis a substância essencial daquilo que era narrado,
ou seja, daquele conteúdo que se conservava e se transmitia oralmente através das práticas de
narração e rememoração.
O que implica que à memória biológica, que pertence à espécie, e à memória cerebral, que
pertence ao indivíduo, acrescentou-se a biblioteca como memória coletiva das experiências
existenciais, científicas e culturais do homem e da sociedade como um todo. Inscrita sob a
forma de documento, esta memória requer sua reunião, organização e meios específicos para
sua disseminação, tendo-se em vista seu amplo uso por parte de todas as esferas sócio-
culturais.
Como marco histórico, é possível apontarmos que as primeiras bibliotecas surgiram mais ou
menos no quarto milênio antes de Cristo, na cidade babilônica de Nipur. Região onde foram
encontrados os primeiros vestígios de uma coleção de tábuas de argila impressas com a
técnica da escrita cuneiforme.
Acompanhando o surgimento das cidades, estas primeiras bibliotecas floresceram no Extremo
Oriente, às margens dos rios Tigres e Eufrates. Foi nesta localidade que se edificou a
biblioteca de Nínive, fundada por Assurbanipal, rei da Assíria. Como era típico daquele
momento histórico, esta biblioteca encontrava-se alocada em uma das muitas salas do palácio
imperial e funcionava como uma coleção privada que possuía cerca de 25 mil tabletes de
argila contendo transcrições que o rei mandara coletar em diversas partes de seu reino.
No entanto, foi o Egito que viu nascer as bibliotecas mais importantes da Antiguidade, sendo
a biblioteca de Alexandria a mais famosa de todas elas, em cujo acervo encontravam-se
depositados mais de setecentos mil volumes. De acordo com MARTINS (2002; p.75), foi
Ptolomeu Soter quem a fundou durante seu reinado, ficando a cargo de seu filho, Ptolomeu
Filadelfo, ampliá-la. Procedimento imitado incessantemente por seus sucessores.
66
Tendo por objetivo reunir em suas estantes toda a herança cultural da Antigüidade, a
Biblioteca de Alexandria entrou para a história como a primeira instituição a possuir
aspirações universais e, através de sua comunidade de sábios e estudiosos, tornou-se o
protótipo das universidades modernas. Isto porque, “o grande estoque de livros reunidos em
Alexandria definiu uma nova concepção a respeito do valor do conhecimento” (BATTLES,
2003; p.36).
Conhecimento que, tanto para os Ptolomeus quanto para a comunidade Alexandrina, era
encarado como um bem, uma mercadoria, uma forma de capital a ser adquirido e
“entesourado” como recurso para a promoção do espírito e da cura da alma. Alexandria é,
portanto, o fruto mais visível das atividades de “uma comunidade de intelectuais que se
dedica à pesquisa e ao ensino, que encontra na biblioteca um de seus instrumentos de
trabalho, em domínios tão diversos quanto a poética, as ciências, a história e, naturalmente, a
filosofia”. (JACOB, 2000; p.46).
Originando-se no ano de 331 antes de Cristo, quando Alexandre Magno fundou uma cidade a
oeste do Nilo e a transformou em capital do reino do Egito, Alexandria se apresentava como
uma cidade nova – centro urbano grego e de cultura helênica em terras egípcias – que deveria
criar sua própria memória. Sendo assim, sua biblioteca, que se unia a um museu junto ao
túmulo do imperador, nasceu em meio a imagens múltiplas que conjugavam o conhecimento
laico a uma memória sagrada e uma noção pouco terrena de tempo e espaço.
Sua eficácia parecia estar atrelada ao papel dos livros como bens
simbólicos; suportes importantes capazes de ser revestidos em grandes
ganhos políticos. No caso de Alexandria, por exemplo, tratava-se de
valorizar uma cidade nova, formada por emigrados e contraposta à
tradição grega. Dessa maneira, a marginalidade geográfica e cultural era
compensada por uma nova centralidade simbólica, que premiava o local
com “toda memória do mundo” e o transformava em referência para
intelectuais e eruditos do Mediterrâneo helenístico e greco-romano. Além
do mais, estabeleceu-se em Alexandria um efeito ilusório entre a cidade e
a biblioteca, já que os cinco bairros foram batizados tendo como critério
as letras do alfabeto: Alfa, Beta, Gama, Delta e Épsilon. A cidade
convertia-se, assim, em paródia e ganhava uma mensagem do tamanho
das aspirações reais: Alexandros Basileus Genos Dios Ektisen (polin
amimetion), “o rei Alexandre, da raça de Zeus, fundou uma cidade
inimitável”. (SCHWARCZ; AZEVEDO; COSTA, 2002; p.124).
67
Desta forma, a Biblioteca de Alexandria se constituiu como uma instituição de domínio
privado, onde o Estado e o patrocínio do rei asseguravam seu funcionamento e definiam sua
política de aquisição, controle e acesso. Biblioteca que, através de sua pretensão de
universalidade, tornou-se pólo de atração de livros e leitores do mundo inteiro.
Um tesouro onde alguns poucos leitores desfrutavam de uma infinidade de textos escritos em
grego ou traduzidos de línguas bárbaras. Memória do mundo que almejava apropriar-se de
todos os traços escritos pelos diversos povos da terra, em todas as línguas e em todos os
lugares. Biblioteca formada através de uma intensa política de aquisições, cujo princípio
voltava-se para a tentativa de se alcançar a completude de todas as formas de saber inscritas
em uma materialidade espaço-temporal e passível de serem armazenadas e disponibilizadas
em um único lugar. Condição que instaura uma nova relação com o tempo e com o espaço,
onde:
Há o tempo da busca dos livros, de sua acumulação progressiva que visa
criar uma memória total, universal, abolindo a distância com o passado
para propor num único lugar de conservação todos os escritos humanos,
os vestígios do pensamento, da sabedoria e da imaginação. A coleção
afirma uma vontade de domínio intelectual ao impor uma ordem de
acumulação de livros e de textos provenientes de regiões e de épocas
muito variadas. (JACOB, 2000; p.50).
Porém, a empreitada de reunir em um único lugar todos os saberes concebidos pelos homens
se mostrou por demais ambiciosa e encontrou nas restrições espaciais sua impossibilidade de
concretude física. Alexandria foi um lugar utópico onde seus freqüentadores criaram novas
relações culturais, mas sem se esquecer de suas origens. Fruto do paradoxo que se instaura
entre a totalidade e suas partes, entre a promessa de uma memória universal, mas que
ultrapassa o olhar do indivíduo e seus itinerários pacientes, parciais e atípicos diante da
necessidade de escolha de um dado documento.
Um império dos signos, com seus jogos de espelhos que se desdobram em labirintos e
escapam a todo entendimento. Alexandria foi, por fim, “a biblioteca como metáfora do
infinito, do tempo imóvel, da imensa sincronia de todas as palavras e pensamentos jamais
formulados, exposta ao risco final da perda de sentido e de referência”. (JACOB, 2000; p.11).
Sendo mais específico, sistema depositário do saber, fonte do sentido de toda literatura,
filosofia e ciência da Antigüidade.
68
Embora tenha se tornado o mais importante centro intelectual da Antigüidade, Alexandria não
foi a única biblioteca a gozar de grande prestígio naquele período. Isto porque, Pérgamo, que
chegou a abrigar cerca de duzentos mil volumes, conseguiu, em certos momentos de sua
história, um nível de fama capaz de rivalizar com sua antecessora.
Pérgamo foi fundada por Eumenes, filho de Átalo, a partir de uma intensa campanha de caça
aos livros promovida com métodos muito semelhantes aos praticados havia mais de um século
em Alexandria. Porém, grande parte da fama de Pérgamo se deveu ao aperfeiçoamento da
técnica, originalmente concebida em países do Oriente, de tratamento do couro de certos
animais para servirem de base aos processos ligados à escrita. Técnica que posteriormente deu
origem ao pergaminho, material que se tornou, a partir da crise do papiro, a principal matéria-
prima para a fabricação do livro.
Porém, como a história das bibliotecas antigas é permeada por catástrofes, sejam estas
impostas por forças naturais ou pela loucura dos homens, tanto Alexandria como Pérgamo
foram completamente dizimadas, sendo seus tesouros condenados à história do esquecimento.
Dando curso à história, a partir da fundação das Cidades-Estados gregas, as bibliotecas
helenísticas, que tomaram as de Alexandria por modelo, edificaram-se tendo por base dois
objetivos: servir de sinal visível do poder das grandes dinastias e funcionar como local de
trabalho para um círculo restrito de eruditos e letrados. Não eram instituições públicas, posto
que continuavam a obedecer um modelo de referência mais antigo, o das “coletâneas de livros
das escolas de filosofia e de ciências, reservados a um número muito restrito de mestres,
discípulos e alunos”. (CAVALLO; CHARTIER, 2002, p.14, v.1).
Embora se sustente a certeza de que existiram inúmeras bibliotecas em algumas das muitas
cidades do mundo helenístico, tendo sido a de Pisístrato a primeira a ser fundada por volta do
século VI antes de Cristo, o caráter oral da literatura grega, feita mais para ser ouvida da boca
dos próprios autores, que para ser lida em orbes fechados e frios, explica a pouca importância
que os gregos atribuíram a estas instituições culturais.
Para os helênicos era desnecessário guardar os livros em lugares específicos porque o
conhecimento se produzia e se difundia através do diálogo, da troca de experiências e não do
monólogo, da discussão e não da mediação, do entrechoque das idéias e não do virtuosismo
69
das mesmas, enfim, da literatura dos poetas olímpicos, dos cantores de estádio, dos oradores
políticos e dos mestres da ágora.
É a partir deste contexto que, segundo MARTINS (2002), se instaura mais um paradoxo na
história da humanidade, visto que é com “um povo militar e guerreiro, comerciante e prático,
imediatista e político, que só admitia a palavra, escrita ou oral, como instrumento de ação, que
vai, no mundo ocidental, possuir as melhores bibliotecas e, em particular, as primeiras
bibliotecas públicas”. (MARTINS, 2002; p.77). A idéia de uma biblioteca pública parecida
com a dos moldes atuais foi, de fato, uma invenção dos romanos. Foram eles que destituíram
a sacralidade dos materiais escritos para convertê-los no veículo condutor por excelência das
idéias, dos projetos e dos empreendimentos que deveriam ser postos ao alcance de todos.
Dentro deste panorama, a primeira biblioteca pública romana foi edificada por volta do ano 39
antes de Cristo e contava com dois salões de leitura: um para os livros escritos em latim, e
outro para os livros em grego, sendo que cada um deles era decorado por estátuas que
homenageavam os poetas e os oradores de cada um dos dois idiomas. Padrão que serviu de
modelo para todas as bibliotecas de Roma construídas a partir de então. É o que nos aponta
BATTLES (2003) quando afirma que isso ocorre:
Desde os grandes repositórios imperiais de Augusto e de Trajano até as
bibliotecas públicas mais modestas e as pequenas coleções das cidades
provincianas. Isso significava um desvio marcante do modelo grego, cujo
protótipo era Alexandria, que não dispunha propriamente de salas de
leitura. O bilingüismo das bibliotecas romanas expressava a herança
mediterrânea reclamada por Roma, enquanto a ênfase na experiência do
leitor dá provas de suas origens republicanas. (BATTLES, 2003; p.52).
Característica que também se encontra presente na biblioteca Palatina fundada por Augusto,
junto ao templo de Apolo, que mais tarde se tornaria a mais importante do Império. Apesar de
ser uma biblioteca imperial e de caráter erudito, a mesma encontrava-se aberta a qualquer
pessoa que almejasse freqüentá-la, correspondendo, desta maneira, ao aumento da demanda
por materiais de leitura.
Portanto, em seu conjunto, as bibliotecas públicas romanas configuraram-se como um
indicativo de que “no mundo das representações das sociedades greco-romanas da época,
livros e leitura tinham seu lugar na abastança e nos comportamentos de uma vida opulenta”.
70
(CAVALLO; CHARTIER, 2002; p.18, v.1). Fato que nos permite inferir que tais bibliotecas
são um caso único na Antigüidade Clássica, visto se portarem como as esferas mais próximas
de uma instituição cultural como conhecemos nos dias atuais. Instituição que tem o seu real
valor projetado pelas seguintes palavras do Imperador Adriano:
Fundar bibliotecas era construir celeiros públicos, aprovisionar reservas
contra o inverno do espírito cuja aproximação eu já podia prever mesmo
contra minha vontade. Tenho construído muito: é uma forma de colaborar
com o tempo sob seu aspecto de passado, é preservar ou modificar seu
espírito, fazer dele uma espécie de reserva para o futuro; é reencontrar
sobre as pedras o segredo das origens. (YOURCENAR, 1980; p.131).
Referencial histórico que nos possibilita constatar que as bibliotecas antigas eram
visualizadas, já naquele período, como lugares privilegiados para a preservação da cultura e
da memória coletiva do mundo clássico. Foi por intermédio de seus acervos que a
modernidade pôde travar contato com as obras dos grandes intelectuais daquele tempo,
destacando-se aí os gramáticos, os retóricos, os poetas e prosadores greco-latinos.
Documentos indispensáveis para a elaboração de nosso passado intelectual. Passado que não
nos chegou de forma íntegra e completa, posto que, como aponta Luciano Cânfora (2000):
Considerada em seu conjunto, a história das bibliotecas da Antigüidade
não passa de uma série de fundações, reconstruções e catástrofes. Um fio
invisível liga todos os esforços feitos pela civilização do mundo
helenístico-romano para salvar seus livros, esforços múltiplos e, em geral,
ineficazes. Tudo começa em Alexandria: Pérgamo, Antioquia, Roma,
Atenas são apenas repetições. Destruições, saques, incêndios atingem
infalivelmente as grandes coleções de livro. Mesmo as bibliotecas de
Bizâncio não constituem exceções. (CANFORA, 2000; p.237-238.).
Quadro que se estabelece porque as bibliotecas estão constantemente envolvidas tanto na
descoberta da verdade, quanto na sua destruição, tendo-se em vista satisfazer o espírito
bárbaro ou à busca cega por poder de príncipes, presidentes ou sujeitos comuns aspirantes a
um trono. Os argumentos para a destruição de uma biblioteca encontram suas bases de
sustentação no “resultado do medo, da ignorância e da cobiça de seus supostos benfeitores e
patronos, [onde] somente uma catástrofe é capaz de fornecer o enredo dramático que age
como uma droga contra a realidade da decadência e do destino”. (BATTLES, 2003, P.37).
Por incrível que pareça, as bibliotecas são instituições de estruturas pouco vigorosas que a
duras penas conseguem suportar, tal qual muralhas, as investidas do tempo e a loucura dos
71
homens. Isto porque, como já apontamos, a história das bibliotecas é feita de duplicidades e
de paradoxos. Observadas de soslaio, parecem indestrutíveis, mas se vistas com um grau mais
acentuado de concentração e de capacidade crítica, apresentam-se como construções frágeis e
passageiras. “Alocadas em grandes edifícios e compostas por coleções de coleções, por livros
milenares e documentos cuja data se perdeu, as bibliotecas guardaram uma imagem de
estabilidade e solidez que, na verdade, pouco combinou com seu destino”. (SCHWARCZ;
AZEVEDO; COSTA, 2002; p.418). É o que também aponta Robert Darnton (2001) quando
nos diz que:
A história nos mostra como essas livrarias foram e continuam sendo
destruídas, seja por motivos naturais ou por conta da razão instável dos
homens. E, cada vez que uma caía, tombava com ela uma parte de
civilização. Foi assim com Alexandria, que durou apenas um século, e
com ela – com seus 700 mil volumes – desapareceu parte do
conhecimento disponível sobre a Grécia. Não por acaso os ingleses
queimaram a Biblioteca do Congresso em 1814, e um novo acervo
cultural teve de ser construído. Foi assim quando Monte Cassino foi
bombardeada, durante a Segunda Guerra Mundial, e perdeu-se boa parte
do conhecimento sobre a Europa medieval. E, não faz muito tempo, a
destruição da Biblioteca Nacional do Camboja, pelo Khmer Vermelho,
levou consigo o maior estoque de informações sobre a civilização
Cambojana. Por sinal, esse era o objetivo de seus algozes, que pretendiam
reduzir o passado a zero e recomeçar do nada: criar uma memória,
inventar de novo uma mesma nação. Não por acaso destruíram 80% dos
seus livros e mataram 57 dos seus sessenta bibliotecários. Como se vê, a
história das bibliotecas é antiga e feita de destruições, mais ou menos
intencionais. Mas a repetição pede atenção, e a insistência em queimar
revela o objetivo de liquidar com a memória e de tudo recomeçar.
(DARNTON, 2001; p.4).
O principal motivo que coloca as bibliotecas na linha de frente da disputa por poder é o fato
das mesmas preservarem, em forma de um acervo físico, a memória coletiva e cultural de um
povo. Disputas que, por sua vez, tornam-se as grandes responsáveis pela perda irrevogável de
valiosos tesouros do conhecimento humano. Aquilo que sobreviveu até os dias atuais é uma
amostra ínfima de todo o repertório informacional que se produziu nos primeiros séculos da
humanidade, tendo-se salvado graças aos esforços individuais de leitores que os conservaram
mais ou menos ao acaso.
Condição que ainda se manteve inalterada no alvorecer da Idade Média, momento no qual as
bibliotecas continuam a se definir como um prolongamento daquelas fundadas na
Antigüidade, tanto no que diz respeito à sua composição, quanto à sua organização, natureza e
72
funcionamento. São bibliotecas que não se encontram abertas ao uso do público em geral,
devido ao fato de se ligarem às grandes ordens religiosas que as viam como organismos mais
ou menos sagrados, devendo, portanto, manter o livro e a palavra escrita fora do contato com
o mundo profano. Porém, por localizarem-se no interior dos conventos e mosteiros, lugares
por natureza de difícil acesso para os leitores comuns, conseguiram preservar para a
posteridade parte do conhecimento que se produziu até aquele período.
A Idade Média também ficou marcada pelo nascimento de três tipos de bibliotecas: as
primeiras emergem junto aos conventos e mosteiros, cujo principal exemplo é a Biblioteca do
Vaticano, idealizada pelo Papa Nicolau V no ano de 1450. O segundo tipo nasce em paralelo
ao surgimento das primeiras universidades, é o caso das bibliotecas das Universidades de
Paris e Oxford. Por sua vez, o terceiro tipo notabilizou-se por seu caráter particular,
bibliotecas que mais tarde, e por força de uma evolução natural, transformaram-se em
bibliotecas “oficiais” e públicas.
Contudo, é preciso salientar que durante toda a Idade Média o trato com os livros esteve quase
que exclusivamente restrito ao interior dos mosteiros e dos conventos. Isto aconteceu porque,
naquele período, o contato com os livros associava-se, em todos os seus níveis, à educação
religiosa. Tomando os livros como receptáculos sagrados que acolhem os saberes oriundos do
contato privilegiado com a divindade, as grandes ordens religiosas solicitaram para si a
responsabilidade de administrar todas as etapas de sua produção, bem como os meios
necessários para evitar que circulassem no mundo profano.
Os fundadores das grandes ordens religiosas da Idade Média pretendiam, a partir de tais
medidas, substituir os elementos característicos da cultura greco-romana por uma muito mais
ascética, onde a conversão à vida monástica exigia a renúncia de todos os elos que
constituíam sua vida anterior. Razão pela qual não se permitia o estudo das artes liberais, da
mitologia, das fábulas e da retórica.
Toda a cultura dos monges deveria, portanto, provir dos estudos e da exegese bíblica, livro
que abarcava tudo aquilo que era necessário saber. Neste sentido, se um monge desejasse
fazer poesia deveria “ler os salmos, se dialética, as epístolas de São Paulo; para quem se
interessava pela ciência, o Gênese é o livro que se deveria estudar, e, caso se quisesse fazer
73
história, o Antigo Testamento e em particular o Livro dos Reis ofereceriam uma longa séria
de acontecimentos”. (RICHÉ, 2000; p.248).
É, pois, a partir da crença de que o livro era um bem que deveria permanecer inacessível ao
domínio público, que as bibliotecas da Idade Média se desenvolveram e se instauraram quase
que exclusivamente no interior dos mosteiros e conventos europeus. Cada um deles possuía
sua própria biblioteca e certas ordens chegavam a incluir em seu código de regras, como
dever piedoso, o trabalho em tais instituições. Sendo assim, podemos inferir que durante todo
este período as bibliotecas se caracterizaram como:
[...] o verdadeiro tesouro do mosteiro; sem biblioteca, ele seria uma
cozinha sem caçarolas, uma mesa sem alimentos, um poço sem água, um
rio sem peixes, um jardim sem flores, uma vinha sem uvas, uma torre sem
guardas, uma casa sem mobília. E, da mesma forma por que se conserva
cuidadosamente uma jóia num escrínio bem fechado, ao abrigo da poeira
e da ferrugem, a biblioteca, suprema riqueza do convento, deve ser
atentamente defendida contra a umidade, os ratos, e os bichos. (KEMPIS
apud MARTINS, 2002; p.83.).
Foi no interior destas bibliotecas que se assemelhavam a “cofres hermeticamente fechados”
que se preservou grande parte da literatura clássica que hoje podemos travar contato. Isto se
deve ao fato de terem sido ao mesmo tempo, e graças ao trabalho dos escribas, centros de
confecção de livros e depósitos de obras antigas e modernas destinadas à venda, troca ou
empréstimo entre o círculo restrito das grandes ordens religiosas ou, em menor medida, entre
os representantes das burguesias locais.
Dentre todas as ordens religiosas da Idade Média européia a que mais se identificou com os
livros foi a dos Beneditinos. Inspirados pelas ideologias de São Bento, para quem a
ociosidade era uma inimiga da alma, os Beneditinos se dedicaram a desenvolver um trabalho
de cópia manuscrita de livros que, por ser executada em larga escala e com tamanho esmero,
passou a qualificar o ofício intelectual caracterizado por grande valor, paciência e correção.
O trabalho com os livros era uma tarefa oficial desta ordem, devendo ser executado em equipe
e em horas especialmente reservadas, visto que requeria grande atenção e extremo cuidado.
Foi, portanto, graças aos escribas e às bibliotecas dos conventos e monastérios que as obras
dos Padres da Igreja, dos gramáticos, dos retóricos, dos filósofos, poetas e prosadores greco-
latinos puderam ser conservadas até a modernidade. A dívida que a cultura Ocidental tem para
74
com os escribas, em especial com aqueles que pertenceram à ordem dos Beneditinos, é
imensa. Sem eles o conhecimento das letras, do pensamento e da cultura da Antigüidade
Clássica ficaria extremamente limitado.
Como cada mosteiro era também uma editora por intermédio da qual os abades enriqueciam
suas bibliotecas, os mesmos contribuíram de forma decisiva para a consolidação dos pilares
que sustentavam a cultura européia e, particularmente, para a difusão do livro. Política que se
intensificou a partir do século IX em benefício de uma cultura que se tornava cada vez mais
humanista. Contudo, é preciso lembrar que:
Todas essas riquezas contidas nas bibliotecas monásticas do Ocidente ter-
se-iam perdido para a civilização intelectual, e não teriam resultado na
Renascença que as revelou e aproveitou, se não fossem as bibliotecas do
Oriente Próximo, as de Bizâncio, igualmente mantidas por monges.
(MARTINS, 2002; p.86).
Esta afirmação pode ser considerada correta na medida em que constatamos que foram os
monges Bizantinos que levaram para os monastérios e conventos europeus os acervos das
bibliotecas do Oriente, depois que estas foram tomadas pelos turcos durante a conquista de
Constantinopla no ano de 1453. Por conterem as bases do conhecimento da Antigüidade tais
acervos difundiram os fundamentos teóricos que deram origem ao Renascimento artístico e
científico europeu.
De fato o mundo islâmico viu florescer em suas terras um sem número de bibliotecas que se
encontravam repletas de grande parte da filosofia e da ciência do mundo helenístico. Material
este que, mediante a ação de tradutores e calígrafos, foi vertido para a língua árabe e,
juntamente com a poesia persa, formaram os acervos das bibliotecas que deixaram uma
herança inestimável para ser compartilhada entre os vários públicos da Europa renascentista.
A cultura mulçumana, juntamente com suas bibliotecas, se formou em ritmo acelerado visto
que já no século VIII Bagdá havia se transformado em um renomado centro de estudos,
contando com uma enorme biblioteca onde se tinha acesso a importantes obras sagradas,
científicas e humanísticas.
Conhecida pelo nome de Casa da Sabedoria, a biblioteca de Bagdá era também um
importante centro de tradução, compilação e disseminação do conhecimento acumulado por
75
todos os povos muçulmanos da Índia à Península Ibérica. Ela era, deste modo, “a um
tempo biblioteca, escola e centro de pesquisa capaz de satisfazer a todas as necessidades de
um jovem intelectualmente bem dotado”. (BATTLES, 2003; p.67).
No entanto, foi em Constantinopla, durante o governo de Constantino, que se deu o apogeu
das grandes bibliotecas do Oriente. Embora seja vista como mais uma biblioteca particular,
posto que se mantinha com recursos oriundos dos fundos do Estado imperial, a biblioteca de
Constantino chegou a possuir cerca de cem mil volumes acumulados graças à atividade de
uma intensa legião de copistas encarregados de multiplicarem os manuscritos advindos de
várias partes do globo. Segundo consta a lenda, era nesta biblioteca que estava depositada,
entre outras preciosidades, a cópia autêntica dos Atos do Concílio de Nicéia, além de obras de
Homero e Hesíodo escritas em letras de ouro.
Foi este tesouro do conhecimento que os monges Bizantinos levaram para a Europa quando,
em meados do século XIII, os reinos árabes se viram completamente tomados pelos bárbaros.
Fato que, por sua vez, infiltrou na Europa uma parcela antes impensada e mesmo
desconhecida de informações sobre a Antigüidade Clássica. Circunstância basilar e
indispensável para a emergência do Renascimento e o fim da Idade Média. Movimento
histórico que merece destaque porque:
[...] enquanto as bibliotecas ocidentais perpetuavam exclusivamente a
literatura latina e sua respectiva cultura, as bizantinas eram com
predominância núcleos de civilização helênica. Ora, sem o helenismo não
haveria igualmente Renascença, e as bibliotecas bizantinas, concorreram
assim, com a parcela mais importante nessa revolução de idéias. A
Renascença, antes de ser uma ressurreição da cultura latina, é o
reconhecimento da cultura grega, praticamente desconhecida no Ocidente
até então. A verdadeira revelação renascentista é a da cultura grega, visto
que o contacto com a latina não se havia praticamente interrompido.
(MARTINS, 2002; p.87).
Foi, portanto, a partir das bibliotecas das grandes ordens religiosas como a Vaticana e as de
São João e São Paulo em Veneza, que o homem medieval, angustiado no mais profundo de
seu ser pelo temor do desgaste dos homens e das coisas, aliado ao medo da finitude da história
(crença motivada pela profanação do saber divino), consegue manter a salvo da destruição os
fundamentos da cultura e da memória humana concebidos até então e transformá-los nos
pilares responsáveis pela edificação da Modernidade.
76
Outro fator a ser levado em consideração neste panorama histórico que apresenta a biblioteca
como instituição responsável pela salvaguarda, organização e disseminação da memória e do
patrimônio cultural da humanidade é aquele que recupera a importância das bibliotecas
particulares para a concretização de tal função.
Como os acervos de tais bibliotecas sempre cresceram ao gosto de seus proprietários, e tendo
muitos deles conseguido burlar as restrições ideológicas impostas por parte da censura estatal
e da Igreja, os mesmos se tornaram responsáveis pela preservação de parte importante do
conhecimento que se pretendeu condenar à destruição e ao esquecimento. Foi graças às
bibliotecas particulares que as obras de Platão, Isócrates, Sófocles, Tucídides, Aristóteles e
muitos outros poetas e pensadores permaneceram a salvo.
De Constantino a José Mindlim, passando por imperadores, grandes fidalgos das cortes
burguesas européias ou mesmo de pessoas comuns, o hábito de colecionar livros se tornou
uma importante variante das formas de conservação da memória e do patrimônio cultural
humano. Isto porque, os acervos das bibliotecas particulares não são constituídos apenas por
livros tidos como essenciais ou representativos daquilo que se convencionou chamar de
cultura erudita ou letrada, mas por todos aqueles documentos que, como um fetiche, uma
objetivação ou uma obsessão de colecionador desperta o interesse e a vontade de posse. Sendo
assim, muitos elementos que demarcam as várias esferas culturais da atualidade se difundiram
graças à ação dos bibliófilos.
Característica que se reafirma no momento em que lembramos que muitos destes acervos
particulares acabaram por se constituir no núcleo central das grandes bibliotecas da
modernidade. É o caso da Biblioteca Nacional de Paris, que se desenvolveu a partir do que
restou dos quase mil e quinhentos volumes da Biblioteca particular de Carlos V, ou da
Biblioteca Nacional do Brasil que tem suas bases ligadas ao acervo trazido pela família real
portuguesa quando esta imigrou para terras coloniais.
É exemplar também o caso da Biblioteca da Universidade de Oxford, hoje um dos maiores do
mundo, que se inicia com uma doação de cerca de 600 volumes feita por Richard de Bury em
1334, e o da Biblioteca da Universidade de Paris, cujo acervo se desenvolveu a partir de uma
doação feita por Robert de Sorbon. Instituições que conquistaram seu prestígio por terem
lançado os fundamentos necessários à laicização do saber e à publicização do livro.
77
Surgindo como um desdobramento das bibliotecas monásticas, principalmente daquelas
pertencentes aos franciscanos, beneditinos e dominicanos, as bibliotecas universitárias
ganharam impulso em meados do século XV, quando suas riquezas aumentaram
consideravelmente e a racionalidade proveniente do Renascimento fez destas o grande celeiro
para a produção e difusão do saber humano. Episódio que se constituiu como fator decisivo
para a consolidação e disseminação da cultura européia, além de incentivar a difusão do livro
e das práticas ligadas à leitura.
A partir da criação das universidades as bibliotecas passaram a não se preocupar apenas com
o acúmulo e preservação dos livros, mas principalmente com a difusão da leitura e da
consolidação dos espaços de pesquisa e de estudos. Do mesmo modo como as bibliotecas
monacais haviam se tornado a imagem de um claustro fechado e inacessível, as bibliotecas
das universidades converteram-se no cenário onde os livros, mesmo acorrentados às paredes,
encontravam-se expostos e disponíveis para satisfazer às necessidades informacionais de seus
novos usuários. Sendo assim:
Do ponto de vista arquitetônico, essa nova biblioteca é constituída por
uma sala cumprida, com um corredor vazio no centro, sendo a sala
ocupada, nas duas naves laterais, por filas paralelas de bancos, dos quais
os livros, para leitura e consulta, ficam presos por meio de correntes. A
planta é, em resumo, a da igreja gótica; e se trata de uma semelhança que
vai muito além do fato puramente arquitetônico, visto que assume as
novas exigências próprias da civilização gótica. A biblioteca sai da
solidão do monastério ou do limitado espaço que lhes destinavam os
bispos nas catedrais românticas, para se tornar urbana e ampla. O quadro
que define esse novo modelo de biblioteca é o silêncio: silencioso deve
ser o acesso ao livro, perturbado apenas pelo tilintar das correntes que o
prendesse ao banco. Silenciosa deve ser a procura de autores e de títulos
então dispostos num catálogo bastante acessível. (CAVALLO;
CHARTIER, 2002; p.23).
A partir deste momento as bibliotecas deixam de ser vistas como um lugar de estudo
individual para se tornar o local em que professores e alunos podiam ler, escrever e estudar.
Foi nestas bibliotecas onde os livros se encontravam amarrados à grossas correntes que a
necessidade de silêncio se tornou explícita pela primeira vez. Condição fundamental para que
o livro perdesse seu caráter de objeto sagrado e secreto para se transformar em um
instrumento de trabalho posto ao alcance de todas as mãos.
78
É também neste momento que a biblioteca se torna uma instituição leiga, civil e pública a
serviço da laicização, democratização e socialização do conhecimento, abrindo as portas de
seus acervos e se posicionando, definitivamente, como esfera público-democrática que busca
captar, organizar, preservar e difundir a memória coletiva e o patrimônio cultural do meio
onde se insere.
As bibliotecas públicas surgem na Europa como resultado de inúmeras transformações
decorrentes do intenso desenvolvimento industrial e da crescente urbanização que ocorre nos
séculos XVIII e XIX. Neste período, esperava-se que as bibliotecas contribuíssem de maneira
significativa para o progresso cultural e intelectual da nação, bem como para a promoção da
ordem social.
Acompanhando o desenrolar das grandes transformações sociais que tiveram seu marco
inicial naquele momento histórico, as bibliotecas públicas adotaram como uma de suas
principais funções a elaboração e o auxílio às políticas públicas ligadas à promoção da
educação. Colaborando, assim, para a socialização e a emancipação do indivíduo via
preservação e transmissão do patrimônio material e cultural do grupo ao qual se insere.
Desta forma, “o adjetivo público, que contemporaneamente se juntou ao nome da biblioteca,
não corresponde apenas ao desejo de identificá-la como organismo mantido pelo governo ou
por entidades particulares, mas aberto a todos os interessados”. (MARTINS, 2002; p.325).
Sendo assim, o conceito biblioteca pública denota uma instituição social sempre em evolução,
que influencia e é influenciada pela estrutura social que a circunda, refletindo e contribuindo
para o seu desenvolvimento através da coleta, organização e disseminação dos produtos
culturais, da administração e produção do conhecimento registrado, além da garantia de livre
acesso a todos aqueles que queiram utilizá-los.
As bibliotecas públicas são, pois, centros locais de informação que têm por objetivo tornar
prontamente acessíveis todos os signos informacionais armazenados em seu acervo, cujos
serviços devem ser oferecidos tendo-se em vista a igualdade de oportunidades, sendo
indiferente a questões que se relacionem com critérios de raça, idade, sexo, religião,
nacionalidade ou condição social. Isto porque:
79
A liberdade, a prosperidade e o progresso da sociedade e dos indivíduos
são valores humanos fundamentais, mas só serão atingidos quando os
cidadãos estiverem na posse das informações que lhes permitam exercer
seus direitos democráticos e ter um papel ativo na sociedade. A
participação construtiva e o desenvolvimento da democracia dependem
tanto de uma educação satisfatória como de um acesso livre e sem limites
ao conhecimento, ao pensamento, à cultura e à informação. (UNESCO,
1994).
Por serem uma criação da democracia moderna, as bibliotecas públicas possuem como missão
política e civilizadora, segundo a UNESCO (órgão das Nações Unidas responsável por
desenvolver ações relacionadas à educação e à cultura), a função de captar, organizar e
disponibilizar os estratos informacionais humanos a fim de colocá-los a serviço de toda uma
coletividade. Como prestam auxílio à auto-formação individual, devem se posicionar, ainda,
como local propicio para um criativo desenvolvimento pessoal, a fim de promover a
construção do conhecimento por intermédio do apreço à arte e às inovações científicas.
Devem priorizar, portanto, o fomento e o fortalecimento do diálogo intercultural, em especial
o da diversidade cultural, bem como facilitar o desenvolvimento de habilidades ligadas ao uso
da informação e da informática, entre inúmeras outras funções cujo objetivo gira em torno de
sua caracterização como organismo social de extrema importância para a preservação da
tradição, da cultura e da memória coletiva de qualquer agrupamento humano. Sendo assim, é
a partir deste prisma que podemos inferir que:
A biblioteca não é mais, por conseqüência, um mero depósito de livros:
esse o mais importante de todos os pontos característicos na evolução de
seu conceito. À sua passividade substituiu-se um salutar dinamismo, a
iniciativa de uma obra que é, ao mesmo tempo, de socialização,
especialização, democratização e laicização da cultura. Ela desempenha,
dessa forma por menos que pareça, o papel essencial na vida das
comunidades modernas; é em torno dela que circulam todas as outras
correntes da existência social. (MARTINS, 2002, p.325).
Através delas nos tornamos capazes de compreender que em todos os momentos da história
do Ocidente o homem tentou achar respostas para o seguinte paradoxo: obcecados pelo sonho
de uma biblioteca total que reunisse todos os textos da terra em um só lugar (e Alexandria é o
grande ícone desta busca), sempre nos vimos atormentados pela realidade decepcionante das
bibliotecas reais que, por maiores que sejam, somente podem fornecer uma imagem parcial,
lacunar e mutilada do conhecimento universal. “Através da conservação de livros que se
multiplicam ao infinito, manifesta-se a angústia surda do tempo que passa e que destrói, o
80
medo de perder-se nessa enchente de letras e palavras sempre ameaçadas pela ignorância, pela
violência, pela história, pelo tempo e pela barbárie dos homens”. (GOULEMOT, 2000;
p.261).
As bibliotecas, especialmente as públicas, são lugares de confrontos, de sonhos e de
pesadelos. Lugares onde se inscrevem as angústias e as esperanças de uma época, bem como
suas contradições e confusões. Espaços permeados por tensões contraditórias, mas que estão
abertas ao mundo das realidades e das idéias. Instrumentos privilegiados do saber através dos
quais, por intermédio da materialidade de suas coleções, nossa tradição, nossa memória
coletiva e nosso patrimônio cultural se mesclam para urdirem o tecido onde aquilo que
chamamos de identidade se constitui, se nutre e se valoriza. Por este motivo:
Nossa herança humilde e espantosa resume-se ao mundo e apenas ao
mundo, cuja existência estamos sempre testando (e comprovando) com as
histórias que contamos a seu respeito. A suspeita de que nós e o mundo
somos feitos à imagem de algo maravilhosa e caoticamente coerente,
muito além de nossa compreensão mas ao qual também pertencemos; a
esperança de que nosso cosmo estilhaçado e nós mesmos, pó de estrelas,
sejamos dotados de sentido e métodos inefáveis; o prazer de repetir a
velha metáfora do mundo como livro que lemos e somos lidos; a hipótese
de que tudo que podemos saber da realidade é uma imagem criada pela
linguagem – tudo isso encontra manifestação material nesse auto-retrato
que chamamos de biblioteca. E nosso amor a ela, nosso desejo de
conhecê-la melhor, nosso orgulho por suas façanhas, enquanto andamos
entre estantes cheias de livros que prometem mais e mais delícias, são
algumas das provas mais felizes e comoventes de que conservamos –
apesar das misérias e pesares desta vida e mais até do que desejaria
alguma divindade ciosa – uma fé íntima, consoladora, quiçá redentora, em
algum método por trás da loucura. (MANGUEL, 2006; p.265-266).
Portanto, seja como espaço físico, como símbolo de uma ordem cósmica ou social, ou como
forma visível da razão humana, as bibliotecas são lugares que guardam histórias e despertam
o fascínio e o encantamento. Lugares onde tais elementos se transmutam, perturbando e
excitando fantasias, irmanando o sonho com a ação, além de provocarem medo e instigarem
reações.
Motivo pelo qual a construção, a repressão e a destruição de bibliotecas fazem parte de um
mesmo círculo vicioso que praticamente se retroalimenta. Com isso, a história nos mostra que
quando não estavam a favor das autoridades, as bibliotecas estavam sempre contra elas, em
face disso, acabavam sendo arrasadas e impossibilitadas de existirem. Tais características não
81
são exclusivas das grandes bibliotecas do mundo antigo, visto se manifestarem inclusive em
terras de história relativamente recente como as da América Portuguesa.
3.3. Livros e bibliotecas em terras brasileiras
Se recuperarmos um pouco dos fragmentos que dão forma à história do Brasil, perceberemos
que até os primeiros anos do século XIX livros e bibliotecas públicas eram praticamente
inexistentes por aqui. Quadro que se liga diretamente ao fato de ter sido, até a chegada da
Real Família Portuguesa, sumariamente proibido imprimir ou publicar materiais escritos, do
mesmo modo como não se permitia instalar universidades ou bibliotecas públicas em terras
coloniais.
Por serem escassos os livros, e como conseqüência de apenas os jesuítas cuidarem da difusão
de materiais impressos, durante todo o século XVI somente textos religiosos (obras de
doutrinação, de devoção mística e ascética) circulavam deste lado do Atlântico. Estratégia
utilizada como recurso de preservação da fé católica. Realidade que praticamente se manteve
inalterada no século XVII, onde livros e bibliotecas ainda permaneciam raros. Portanto, neste
primeiro momento, predominou-se a existência de obras dedicadas à devoção dos preceitos
católicos: resumos de histórias santas, catecismos, exercícios espirituais, livros de novena e
oração.
Contudo, e como nos lembra SCHWARCZ; AZEVEDO e COSTA (2002; p.269), mesmo
neste cenário pobre foram descobertos registros de bibliotecas que continham, além de livros
de teologia, obras na área da moral, do direito canônico e da filosofia – como então se
denominava o conjunto das ciências profanas. Tais bibliotecas se encontravam, sobretudo, em
cidades que possuíam um nível acentuado de desenvolvimento e onde começava a se formar
um grupo ainda restrito de leitores, como é o caso de Salvador, Rio de Janeiro, Olinda e São
Luis. Porém, as maiores e mais ricas bibliotecas certamente eram aquelas que estavam ligadas
às grandes ordens religiosas que por aqui se instalaram com destaque para as pertencentes à
Companhia de Jesus, que detinha o monopólio sobre a educação.
Portanto, até meados do século XVII o número de proprietários de livros era extremamente
pequeno e cada um deles possuía uma quantidade muito reduzida de volumes. Talvez a maior
82
biblioteca particular do século XVI tenha pertencido a Rafael Olivi, italiano que viveu na
Bahia e que chegou a possuir um acervo de 27 volumes. Ao lado desta, encontramos a
biblioteca do advogado João Mendes da Silva que continha, em meados do século XVII, um
acervo de aproximadamente 250 volumes trazidos da Europa, dos quais 150 eram de direito e
o resto de história ou curiosidades, quantidade notável para as condições histórico-sociais da
época.
Contudo, é preciso ressaltar, já neste momento, que durante todo este período os modestos
acervos familiares e individuais encontravam seu contraponto nas bibliotecas dos colégios
jesuítas. É o que nos mostra o inventário feito sobre os livros da biblioteca do Colégio da
Bahia que no ano de 1764 já registrava uma quantia de aproximadamente 3000 volumes. Por
sua vez, no Rio de Janeiro, ainda nos primeiros anos do século XVIII, estimava-se que o
espaço da biblioteca do colégio jesuíta seria capaz de comportar cerca de 5000 mil livros.
Porém:
Desde o século XVIII assistiu-se a uma significativa mudança na
composição das bibliotecas locais. O predomínio ainda era da literatura
religiosa, no entanto, aos poucos, abriam-se novos espaços – ao menos
dentre as pessoas que tinham acesso a uma educação mais esmerada –,
para obras de ciências, saberes profanos, e para as perigosas obras da
ilustração. Foi nesse século que a elite letrada se educou em Coimbra e
que certos intercâmbios literários se estabeleceram por meio das
academias – dos Esquecidos (1724) e dos Renascidos (1724) na Bahia;
dos Felizes e dos Seletos, no Rio de Janeiro, e mais tarde a sociedade dos
Científicos, fundada em 1771. (SCHWARCZ; AZEVEDO; COSTA,
2002; p.272).
Com isso, se nos séculos XVI e XVII os livros em circulação eram essencialmente de cunho
religioso, constituindo-se em fonte de conhecimento e de acesso ao sagrado e encontrando-se
alocados prioritariamente nas bibliotecas das grandes ordens religiosas, cujos maiores acervos
bibliográficos tinham por objetivo atender à rotina das atividades dos colégios Jesuítas, tal
panorama começou a se modificar no século XVIII, momento no qual a presença de livros e
bibliotecas na então colônia portuguesa tornou-se cada vez mais constante.
A constituição de uma civilização urbana, aliada à implementação de um expressivo setor de
serviços e ao aumento do nível educacional começou a favorecer a circulação dos livros em
terras brasileiras. Amparando-se neste novo cenário, especialmente na capitania de Minas
Gerais, os impressos ganharam ampla projeção. É o que nos informa Luiz Carlos Villalta
83
(2002), pesquisador que ao efetuar estudos junto a inventários do século XVIII e autos da
devassa da Inconfidência pôde constatar uma presença considerável de livros e outras formas
de material impresso em Diamantina, Mariana, Vila Rica e São João Del Rei.
De acordo com os trabalhos do autor acima referenciado, até o século XVIII as maiores
bibliotecas particulares pertenciam, quase que exclusivamente, a padres, advogados,
cirurgiões e boticários que as constituíam mediante a seleção de obras representativas para seu
campo de atuação profissional. Em paralelo a esta tipologia específica de obras, haviam outras
que indicavam a adesão à certas correntes filosóficas ou políticas por parte de seus
proprietários, característica que reforça o papel da biblioteca como veículo de difusão de
idéias consideradas perigosas ou revolucionárias para uma colônia. A partir deste quadro,
VILLALTA (2002) nos explica que:
O tamanho das bibliotecas era diverso, não sendo determinado pela
riqueza, mas pelo grau de refinamento intelectual e escolaridade dos
proprietários. Geralmente padres, advogados e, em menor escala,
cirurgiões possuíam as maiores bibliotecas. Havia, ainda, uma relação
estreita entre, de um lado, a composição das livrarias e, de outro, a
condição social e os ofícios dos seus proprietários. Aqueles que se
dedicavam a ofícios, na maioria das vezes, possuíam livros relacionados
às suas carreiras, enquanto, entre os demais, imperavam as obras
devocionais e, em menor escala, obras de medicina, história ou belas
letras. Conclui-se, portanto, que os livros subsidiavam com suas
informações o exercício de profissões, constituíam meios de acesso às
“verdades sagradas” e também eram objeto de deleite e de recreio.
(VILLALTA, 2002; p.198).
No entanto, apesar de serem um instrumento potencialmente revolucionário, as bibliotecas
particulares da colônia eram, em ampla medida, mal utilizadas. Isto porque, em vários
momentos e localidades foram entendidas como objetos de status e de poder, sendo
acompanhadas, com relativa freqüência, de outros elementos materiais então passíveis de
ostentação, é o caso de louças, jóias e pratarias.
Característica que nos possibilita inferir o uso do livro como um privilégio, não apenas no
sentido econômico ou político, mas cuja posse e leitura se tornara um direito exclusivo de
grupos sociais seletos em uma sociedade preponderantemente patriarcal e marginalizadora.
Panorama que aos poucos começa a se alterar devido a influência causada pela chegada da
Corte Portuguesa ao Brasil, pela fundação de uma imprensa local e pela criação e abertura ao
público da Biblioteca Imperial.
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A Corte Portuguesa de Dom João VI, encontrando-se completamente cercada pelas tropas
francesas de Napoleão Bonaparte e seu Conselho, deixou Lisboa às pressas em novembro de
1807 e trouxe em seus navios uma enorme quantidade de pratarias, jóias, louças, livros,
mapas, moedas, documentos de Estado e outros bens que conseguiram juntar. Depois de
quase quatro meses ao mar, a comitiva que transportava a parte mais importante da corte
atracou no Rio de Janeiro em 7 de março de 1808. No entanto, a Família Real só desembarcou
no dia seguinte imbuídos de grande curiosidade, visto que era hora de encontrar, em “carne e
osso”, personagens conhecidos apenas através de gravuras, folhetos e moedas.
Com o fim das comemorações e da acomodação da Família Real e de sua Corte, iniciaram-se
as providências para se garantir o funcionamento da nova máquina administrativa do Estado,
visto que era a partir da colônia que seriam encaminhadas as ordens para todos os lugares
onde persistia a dominação de Portugal.
A colônia se tornara o centro do Império e todas as questões relacionadas à política interna e
externa, antes solucionadas em terras lusitanas, passaram a ser articuladas e resolvidas no
próprio Brasil. Além disso, ao trocar Lisboa pelo Rio de Janeiro, as embaixadas e delegações
estrangeiras iriam dinamizar a vida diplomática local e conferir ao país o aspecto de nação
soberana. Ao transplantarem para o Brasil as instituições de Estado que funcionavam em
Portugal, as grandes autarquias da Corte pretendiam:
Criar a nova sede, tomando a administração de Lisboa como espelho:
organizar o Império seria reproduzir a estrutura administrativa portuguesa
no Brasil e amparar os desempregados. O eixo da política era o mesmo,
secularmente fundado: o reino deveria servir à camada dominante, ao seu
desfrute e gozo. (FAORO, 1979; p.251, v.1 apud SCHWARCZ;
AZEVEDO; COSTA, 2002; p.246-247).
Como não foi preciso recomeçar do zero, posto que a Coroa sempre administrou e controlou o
Brasil com base no mesmo código legal que vigorava em Portugal desde o século XVII, Dom
João VI conseguiu, logo no primeiro ano de seu governo, prover toda a estrutura
administrativa da nova sede, fazendo funcionar os setores de suas principais áreas de atuação.
É o caso do setor de segurança, da polícia, da justiça, da fazenda e da área militar.
Em paralelo a tudo isso, outros setores essenciais para os negócios do Estado também foram
constituídos e começaram a funcionar. Quadro que se consolida em 1808 quando a Junta da
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Fazenda, a Alfândega, a Intendência da Marinha e o Banco do Brasil foram criados.
Instituições que dispensavam um toque de requinte e revolução à Colônia.
Outra grande evolução se deu em 13 de maio de 1808, quando Dom João VI promulgou a
revogação da lei que proibia a montagem de oficinas tipográficas em terras brasileiras e criou
a Impressão Régia com o objetivo de suprir as necessidades oriundas da publicação de
decisões, legislações, papéis diplomáticos e inúmeros outros documentos e atos produzidos
pelas repartições do serviço real. Contudo, faz-se necessário lembrar que:
O liberalismo da monarquia portuguesa tinha limites e, dentre as
atribuições da junta diretora, constavam o exame de tudo o que se
mandasse publicar e o impedimento da impressão de papéis e livros cujo
conteúdo contrariasse o governo, a religião e os bons costumes. Era a
censura colocada à Real Tipografia, preocupada em impedir a divulgação
de idéias que ameaçassem a já frágil estabilidade da Coroa Portuguesa.
(SCHWARCZ; AZEVEDO; COSTA, 2002; p.250).
Sendo assim, para que uma obra fosse publicada era imperativo que chegasse à Tipografia
Real trazendo, ao pé da página de rosto, a indicação: Por Ordem de S. A. R. De sua fundação
até 1822 foram ali impressos cerca de 720 títulos entre pequenas brochuras, folhetos,
opúsculos, sermões, prospectos, obras científicas, literárias, traduções de textos em francês e
em inglês que versavam sobre agricultura, comércio, ciências naturais, matemática, história,
economia, política, filosofia, teatro, romances, oratória sacra, poesia, literatura infantil e todo
o tipo de obras que tivessem passado pelo crivo da censura real. Foi nesta tipografia que
também se imprimiu o primeiro periódico brasileiro: a Gazeta do Rio de Janeiro, cujo
primeiro número data de 10 de setembro de 1808.
No entanto, foi só a partir de 1811 que a Colônia ganhou ares de civilidade dignos da
distinção e da grandeza de uma corte que tinha por objetivo representar os ideais iluministas
do governo português. Isto porque, foi nesta data que se processou a inauguração do Jardim
Botânico, com plantas frutíferas e ornamentais trazidas de várias partes do globo, bem como
do Museu Real e da Escola Real de Ciências, Artes e Ofícios.
Instituições que adotaram por premissa incentivar o desenvolvimento do saber científico e
dotar a nova sede do Império de lugares onde o conhecimento humano pudesse ser
representado e multiplicado livremente. É no cerne destas revoluções culturais que se
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processa a criação da Real Biblioteca, aberta ao público em 1814. Data em que a imagem da
nova sede do Império definitivamente ganha um novo tempero e adquire ares de metrópole,
graças à presença da Família Real.
A Biblioteca Real Portuguesa chegou ao Brasil após três grandes viagens de navio e foi
instalada no segundo andar da Ordem Terceira do Carmo onde funcionava, até então, uma
enfermaria. No entanto, à medida que se abriram os caixotes de livros percebeu-se que tal
locação seria exígua demais para abarcar tamanha quantidade de materiais, razão pela qual,
em dezembro de 1812, através de aviso Régio, a Biblioteca Real se estendeu também para o
térreo, cômodo para onde havia se transferido a enfermaria.
A livraria parecia bem-arrumada e distribuída em diversas salas, segundo
as diferentes classes de objetos científicos ou de literatura, tudo ajeitado
com método, de forma a ser considerada por muitos a mais importante do
Novo Mundo, não só por conta de seus livros raros como também pelos
impressos e pelas coleções de estampas, desenhos e mapas, manuscritos e
quadros que possuía, os quais, vindos de Portugal, acabavam por animar o
ambiente. (SCHWARCZ; AZEVEDO; COSTA, 2002; p.402).
Desta feita, é inegável que a colônia havia se beneficiado com a chegada e com a abertura
pública da Real Biblioteca, em cujo acervo se encontravam depositadas inúmeras raridades,
todas distribuídas em cinco classes: teologia, ciências, artes, belas-artes e história, além de
incontáveis manuscritos, mapas e estampas que remotavam à Antigüidade e chegavam até o
momento presente, apresentando-se sob a forma de desenhos reais, paisagens, locais
existentes e imaginários. Mas como se formou este grande acervo?
Para termos uma noção mais clara de sua diversidade e importância, além de podermos
avaliar o quanto o Brasil se beneficiou com sua abertura ao público e com sua permanência
após os processos de independência, torna-se necessário regressarmos um pouco no tempo e
aportarmos no reinado de Dom João V, monarca que edificou as bases desta biblioteca através
de uma grande política de aquisição de manuscritos, livros, gravuras, mapas e outros materiais
que, posteriormente, a tornariam uma das maiores e melhores bibliotecas da Europa, quiçá do
mundo.
A Real Livraria Portuguesa tem sua fundação ligada ao reinado de Dom João I, monarca que
após a reconquista das terras lusitanas das mãos dos mouros deu início a uma coleção cujo
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objetivo era servir de base para a educação dos membros da dinastia dos Avis. Tal tarefa teve
continuidade no reinado de Dom Duarte, onde se visou, sobretudo, recuperar a história
daquele reino. No entanto, foi Dom Afonso V quem destituiu a biblioteca de seu caráter
exclusivamente imperial e a colocou à disposição dos estudiosos e a serviço da secularização
da cultura.
Porém, faz-se necessário destacar que, ainda neste período, a Biblioteca Real não se
caracterizava como uma instituição pública, mas antes, como um espaço separado que
continha algumas mesas destinadas a atender às necessidades informacionais e de leitura de
uma classe restrita de eruditos e das pessoas da corte mais ligadas aos estudos.
Como já dissemos, foi Dom João V quem mais se dedicou a aumentá-la e a sistematizá-la.
Governando em tempos de paz e riqueza, este monarca via a Biblioteca Real como um
elemento capaz de dispensar prestígio às realezas européias, principalmente porque, naquele
momento, as monarquias se apresentavam através de seus palácios e livrarias imperiais. Era
como se a cultura presente nestes acervos representasse e projetasse para o mundo a própria
imagem do soberano. Sob o reinado de Dom João V a biblioteca Real passou a responder a
problemas concretos como subsidiar o desenvolvimento do conhecimento científico,
especialmente o geográfico e o cartográfico, visto que se referiam ao conflito luso-espanhol
acerca dos limites e domínios da América do Sul.
Empreendendo uma grande caçada a todos os tipos de materiais bibliográficos, a Real
Biblioteca se viu amplamente aumentada, chegando a ser considerada uma das maiores de
toda a Europa, tanto em número quanto na qualidade das obras nela depositada. Os muitos
milhares de preciosos volumes ali contidos cobriam um vasto domínio do saber e se referiam
a áreas como Teologia, Filosofia, História, Direito Canônico, Filologia, Literatura, Medicina e
Ciências, além de possuir uma das mais famosas e importantes coleções de gravuras que o
mundo já havia conseguido reunir. O certo é que: “depois de tanto empenho, a Biblioteca de
D. João V seria avaliada em 60 mil exemplares, número que combina bem com a
generosidade esbanjadora do “Rei Magnânimo”, cuja biblioteca era comparada à do Vaticano
e à do soberano da França, as grandes do gênero”. (SCHWARCZ; AZEVEDO; COSTA,
2002; p.78).
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No entanto, mais uma vez a sina que liga o destino das bibliotecas às catástrofes muda os
rumos da história da Real Livraria portuguesa. O dia era 1º de novembro de 1775 e um
terremoto destruíra Lisboa, reduzindo o Palácio Real a pó e com ele quase toda a Biblioteca.
Mas como naquele período uma monarquia era vista através de sua Real Livraria, logo depois
do incêndio e junto com os trabalhos que começaram a reconstruir e reinventar a velha
Lisboa, Dom José I, amparado por seu primeiro ministro Pombal, empenhou-se em reunir o
pouco que sobrara da Biblioteca Imperial e iniciou uma nova coleção.
Tal empreitada se desenvolveu através de políticas que buscaram efetuar a compra de acervos
privados, a requisição de coleções esquecidas em mosteiros e abandonadas às pressas pelos
jesuítas expulsos por Pombal, ou mesmo por intermédio de generosas doações. Sendo assim, a
nova Biblioteca Real, agora situada no Palácio da Ajuda, não parou mais de crescer. Fatos que
instituem o seguinte panorama:
A Real Biblioteca ia se constituindo de obras de temas variados: religião,
história, filosofia, belas-artes e ciências naturais. Faziam parte deste
acervo, também, atlas, obras impressas e manuscritas, partituras de
música, desenhos, cartas geográficas, gravuras, estampas, algumas obras
de arte, instrumentos de medição, moedas e medalhas. [Além daquela
coleção] conhecida sob o nome de “Infantado”, [que] compreendia uma
série de livros consagrados à educação dos jovens príncipes e futuros
dirigentes da nação. Nela se guardavam os compêndios de história e de
geografia, os primeiros livros de ciências, gramáticas e outras tantas obras
que ajudariam na educação dos herdeiros reais. (SCHWARCZ;
AZEVEDO; COSTA, 2002; p.149).
Como pode ser notado, as políticas de restauração promovidas por Pombal e por Dom José I
foram extremamente frutíferas e em menos de 60 anos a Real Biblioteca já gozava de enorme
prestígio, sendo mais uma vez definida como uma das mais importantes da Europa, tanto em
termos de qualidade, quanto de quantidade. Contudo, como também já apontamos, em 1807 a
dinastia de Avis sofreria mais um baque, sendo obrigada a fugir às pressas para o Brasil por
motivo das invasões francesas que o governo de Napoleão empreendera em terras lusitanas.
A Corte Portuguesa desembarcou no Brasil em 7 de março de 1808 e com ela vieram todos os
elementos necessários para a reconstituição do Império em terras estrangeiras, exceto a sua
preciosa Biblioteca. Por motivo de extrema pressa, os valiosos volumes da Real Biblioteca
foram esquecidos no porto de Lisboa e por lá permaneceram debaixo de sol e chuva até
89
retornar ao palácio da Ajuda. Notado o infortúnio, Dom João VI imediatamente mandou que
trouxessem seus livros para as terras brasileiras.
Para tal empreendimento foram gastos três grandes viagens de navio e aproximadamente 310
caixões. Após três longos meses de viagens pelo mar, a transferência da Biblioteca se
completou em setembro de 1811, sendo totalmente reunida em novembro daquele mesmo ano
no primeiro e no segundo andar do antigo hospital da Ordem Terceira do Carmo.
A partir desta data a Real Biblioteca se impôs ao cotidiano local e, mesmo não sendo uma
instituição plenamente pública, uma vez que o empréstimo de obras era evitado, a mesma
passou a acolher para consultas internas todas as pessoas que se apresentassem decentemente
vestidas, sem discriminação de sexo, cor e nacionalidade. Porém, em seus primeiros anos
atendeu basicamente àquelas pessoas que pertenciam à corte, especialmente à família real e
aos homens brancos, livres e de posses. Sendo assim, é possível afirmar que a Real Biblioteca
se constituiu, pelo menos nos seus primeiros anos de funcionamento, em um espaço de
sociabilidade da alta burguesia masculina da cidade do Rio de Janeiro.
Com os passar dos anos, e com a ajuda da Inglaterra, os franceses foram expulsos das terras
lusitanas e Dom João VI se viu obrigado a retornar para Portugal como tentativa de
restabelecer o Império e a Corte dos Avis. No entanto, Dom Pedro I, herdeiro do reino e
contando com seus 22 anos, permaneceu no Brasil herdando os projetos políticos e as
esperanças de continuidade administrativa.
Ao deixar o país em 25 de abril de 1821, Dom João VI levou consigo, além dos tesouros e
cofres do Banco do Brasil, parte dos manuscritos da Coroa que se configuravam como os
documentos mais importantes para a preservação e difusão da história de Portugal. História
que começava a ser reescrita de forma distinta daquela que seria a história do Brasil
independente.
Instaurado o processo de independência mais uma querela se impôs entre Portugal, Inglaterra
e Brasil em torno da Biblioteca Real. Para que a emancipação brasileira efetivamente
acontecesse seria necessário constituir um quadro cultural que representasse o instinto de
nacionalidade local. E, neste sentido, a Biblioteca ocupava um lugar de destaque. Isto porque,
“se os livros carregam metaforicamente a liberdade, neste caso cumpriam papel formal e
90
viravam item de pauta de negociação e de independência, no mais amplo, e talvez único, dos
seus sentidos”. (SCHWARCZ; AZEVEDO; COSTA, 2002; p.386).
A partir deste quadro, e como único caminho para o reconhecimento da emancipação
brasileira, Portugal passou a exigir um ressarcimento pelos bens deixados pela Coroa no
Brasil, principalmente pela sua Real Biblioteca. Tendo a Inglaterra por intermediadora,
estipulou-se que o Brasil pagaria a quantia de 250 mil libras esterlinas pela independência e
800 contos de réis pela permanência da Biblioteca em terras nacionais. Valor que em um
primeiro momento pareceu exorbitante, mas era preciso lembrar-se que:
Comparativamente, portanto, os livros representavam muito: custavam
caro e significavam mais do que seu valor objetivo. Objetos carregam
dons, portam dádivas e se vinculam a outros ganhos, emocionais,
políticos ou mesmo simbólico. E era assim que se avaliava uma Real
Livraria. Mais do que livros, lá se acumulavam idéias, projetos, ambições,
e ainda a cultura possível de uma nação – sobretudo de uma monarquia
independente, isolada no meio da América Republicana. [...] Segundo
item de uma longa pauta de negociações, ela representava a cultura
acumulada e a tradição de que carecia: nada como colocar tudo numa lista
e qualificar o que é da ordem da cultura e da própria representação.
(SCHWARCZ; AZEVEDO; COSTA, 2002; p.401).
Ao permanecer no Brasil a Real biblioteca tornou-se o sinal vivo de que o país compartilhava
de um quadro vasto da cultura humanística de todos os tempos, sendo portador de uma
tradição capaz de inserí-lo no contexto das nações livres, soberanas e portadoras de história e
cultura dignas de serem preservadas.
Foi como instituição que a partir daquele momento se tornou responsável por salvaguardar e
disseminar a memória coletiva e o patrimônio cultural dos brasileiros que, em 1822, a
Biblioteca Real tornou-se Imperial e Pública e, em 1876, por força do decreto número 6141,
Biblioteca Nacional, espelho da tradição de uma terra com passado político recente, mas
dotado dos recursos necessários para se fazer uso de um acervo histórico capaz de se reportar
aos vários meandros da história humana.
Chegamos às primeiras décadas do século XIX e até este momento o Brasil possuía apenas
duas bibliotecas públicas legalmente reconhecidas pelos órgãos de poder do Império, são elas:
a Biblioteca Imperial no Rio de Janeiro e a Biblioteca Pública de Salvador, inaugurada em
1818 e que teve seu acervo enriquecido pelas duplicatas encontradas no catálogo da
91
Biblioteca Imperial. No entanto, um novo e arrojado projeto começava a nascer na província
de São Paulo com a criação dos Gabinetes de Leitura.
Os Gabinetes de Leitura, que mais tarde se configurariam como as primeiras bibliotecas
populares do país, foram idealizados por ex-alunos da Faculdade de Direito do Largo de São
Francisco. Há que se destacar aqui que tais estudantes eram, em sua maioria, filiados à
maçonaria. Sendo um projeto de caráter contestador e subversivo, os Gabinetes de Leitura se
constituíram como uma rede de estabelecimentos voltados para a leitura e pela busca por se
criar bibliotecas com acervos diversificados, onde os usuários pudessem alugar os livros que
desejassem travar contato.
Pretendiam, ainda, formar uma escola de primeiras letras com o objetivo de instruir os leitores
e alfabetizar os segmentos menos favorecidos da província paulistana. Faziam isto porque
possuíam como ideologia a crença de que a Educação era o caminho indispensável para se
formar o futuro cidadão. Para tanto, viam o livro como um instrumento estimulante e capaz de
promover o questionamento das estruturas sociais então vigentes, potencializando sua força
como ícone temido e freqüentemente censurado pelo poder. Deste modo:
O projeto dos Gabinetes de Leitura, a julgar pelos seus Estatutos e mesmo
por sua prática, apresentava aspectos avançados, constituindo-se em
projeto completo, que não se limitava a introduzir nas rústicas estantes
apenas livros que veiculavam a Liberdade, a Igualdade e a Fraternidade –
palavras de uso corrente e de entendimentos e significados múltiplos
naqueles dias. Criava-se, efetivamente, uma teia de informações, de
captações ideológica, traduzida não só pela existência de títulos de obras
normalmente censurados, como pela troca de periódicos de caráter
contestador, conforme a tônica do periodismo vigente, marcado então
pela propaganda republicana. E mais. Acoplava-se-lhe uma escola de
primeiras letras, responsável pela formação de um público leitor.
Finalmente, numa postura filantrópica e num ensaio democrático
facultava-se a entrada àquele desprovido de posses, independente de sua
filiação como sócio e/ou pagamento de taxa de aluguel. Na sociedade
estamental da época, na qual o homem livre vivia nas fímbrias do sistema,
era um espaço de inserção significativo, um dos raros para expressar sua
representação. (MARTINS, 2002; p.403-404).
Neste sentido, além de cuidarem da formação de um público leitor e da alfabetização da
parcela mais pobre da província paulistana, os Gabinetes de Leitura fizeram da biblioteca um
veículo de contestação que se contrapunha e questionava a grave crise sócio-política e cultural
92
que há muito se instaurara em São Paulo e em praticamente todas as outras províncias
brasileiras.
A partir deste momento as bibliotecas públicas começam a ser visualizadas como o lugar onde
os homens preservam e acessam os saberes, a tradição, a memória e o patrimônio cultural
humano, justamente por serem estes os elementos que lhes outorgam o caráter de sujeitos
históricos e portadores de identidade.
Característica que se converte em elemento propulsor para a criação de inúmeras outras
Bibliotecas Públicas. É o caso da Biblioteca Mário de Andrade em São Paulo, da Biblioteca
Pública do Paraná, da Biblioteca Pública de Belo Horizonte, entre tantas outras, visto que
atualmente o Brasil possui cerca de 4174 bibliotecas públicas espalhadas por todas as regiões
do país. Números que podem ser melhor visualizados através da tabela que se segue.
TABELA 1: Número de Bibliotecas Públicas por Estado no Brasil
Fonte: Anuário Estatístico do Brasil 1989. Rio de Janeiro: IBGE, v.49, 1989.
Unidades da Federação Número de Bibliotecas Públicas
Acre 12
Alagoas 71
Amapá 4
Amazonas 19
Bahia 246
Ceará 121
Distrito Federal 14
Espírito Santo 57
Goiás 192
Maranhão 109
Mato Grosso 41
Mato Grosso do Sul 65
Minas Gerais 931
Pará 90
Paraíba 129
Paraná 371
Pernambuco 126
Piauí 75
Rio de Janeiro 131
Rio Grande do Norte 178
Rio Grande do Sul 282
Rondônia 8
Roraima 1
Santa Catarina 180
São Paulo 659
Sergipe 62
Brasil 4174
93
Portanto, como síntese daquilo que se expôs até aqui, podemos caracterizar as bibliotecas
como lugares de continuidade, estando seu poder diretamente ligado à função de preservar,
organizar e transmitir a materialidade que define os saberes e a cultura humana. Por isso, sua
história se converte na história daquilo que uma sociedade decide transmitir, nos
conhecimentos que decide conservar, na necessidade de seu esquecimento para posterior
recuperação, mas, sobretudo, na reevocação e reutilização destes a partir do rememorar, dos
processos educativos e da leitura. Práticas que nos fornecem as bases necessárias para a
construção de uma esfera social de interações. Em outras palavras:
[...] gostamos de sonhar com uma biblioteca que reflita cada um de nossos
interesses e cada uma de nossas fraquezas – uma biblioteca que, em sua
variedade e complexidade, reflita integralmente o leitor que somos.
Assim, não é absurdo supormos que, de modo semelhante, a identidade de
uma sociedade ou nação possa ser espelhada por uma biblioteca, por uma
reunião de títulos que, em termos práticos ou simbólicos, faça às vezes de
definição coletiva. (MANGUEL, 2006; p.241).
Contudo, este poder de representação coletiva que demarca a importância e a atuação das
bibliotecas só se efetiva quando intermediado por práticas de educação e de leitura que
promovam o intercâmbio, o diálogo entre os inúmeros signos que compõem seus acervos,
com os desejos, as ansiedades e as necessidades de cada um de seus usuários. Sendo assim,
além de ser um lugar de memória e de cultura, uma biblioteca é também um espaço de
transformação social que interfere no meio cultural onde se insere através do incentivo às
práticas ligadas à educação e à leitura.
No entanto, é preciso ter clareza de que quando falamos em Educação estamos falando da
compreensão crítica das práticas que envolvem a leitura e a escrita, que, por sua vez,
demandam a compreensão crítica da atuação da Biblioteca e do bibliotecário como agentes
executores de tais processos. Isto porque, nenhuma prática educativa pode se dissociar do
contexto sócio-político-econômico e cultural do indivíduo, e que as mesmas devem ser
vivenciadas como práticas de libertação e de construção da historia individual de cada sujeito.
Premissas que nos indicam a necessidade de discorrer sobre os vários fatores que também
definem a Biblioteca como um “Lugar de Educação e de Leitura”. É o que pretendemos fazer
no capítulo que se segue.
94
4. Capítulo III
Um mundo que encanta pela força da palavra:
biblioteca como lugar de leitura e educação
É pois de saber que este fidalgo, nos intervalos que tinha de ócio (que eram os mais
do ano), se dava a ler livros de cavalarias, com tanta afeição e gosto, que se
esqueceu quase de todo do exercício da caça, e até da administração dos seus bens;
e a tanto chegou a sua curiosidade e desatino neste ponto, que vendeu muitos
trechos de terra de semeadura para comprar livros de cavalarias que ler, com o que
juntou em casa quantos pôde apanhar daquele gênero...
Em suma, tanto naquelas leituras se enfrascou, que passava as noites de claro em
claro e os dias de escuro em escuro, e assim, do pouco dormir e do muito ler, se lhe
secou o cérebro, de maneira que chegou a perder o juízo. Encheu-se-lhe a fantasia
de tudo que achava nos livros, assim de encantamentos, como pendências, batalhas,
desafios, feridas, requebros, amores, tormentas e disparates impossíveis; e
assentou-se-lhe de tal modo na imaginação ser verdade toda aquela máquina de
sonhadas invenções que lia, que para ele não havia história mais certa no mundo.
1
1
CERVANTES, 1978, p.29-30.
95
Dando seguimento à busca por caracterizar as bibliotecas como “lugares de práticas
culturais”, o presente capítulo demonstra a interlocução histórica que se institui entre as
bibliotecas, a educação e a leitura.
Reconhecendo que tanto a educação quanto a leitura são práticas culturais que têm por
objetivo preparar os homens para assumirem papéis sociais relativos à vida coletiva a partir
do desenvolvimento de suas potencialidades físicas e intelectuais, a primeira seção deste
capítulo objetiva ressaltar que a escola não mais se configura como único espaço responsável
por seu desenvolvimento. Ao lado dela inúmeros, outros setores da esfera pública são
convocados a colaborar para uma promoção igualitária dos benefícios que advém de tais
práticas.
Razão pela qual defendemos, na segunda seção deste mesmo capítulo, que as bibliotecas se
consolidam como lócus privilegiado para que a alquimia da leitura e dos processos educativos
se desenvolva e se efetive. Fazemos isto por acreditar que nos meandros destes corredores e
estantes que preservam a infinitude do conhecimento humano, cada usuário se sente
confortável para buscar, encontrar e utilizar determinada informação, convertendo-a,
posteriormente, em insumo gerador de novos conhecimentos. Portanto, nossa primeira tarefa
será posicionar a educação e a leitura no conjunto das práticas culturais de produção de
sentido.
4.1. Educação e leitura: práticas culturais de produção de
sentido
A história da educação e da leitura é análoga à história de outras práticas culturais humanas.
Isto porque, tal qual a memória e a cultura, se constituem a partir dos múltiplos olhares
interpretativos e das várias configurações históricas que cada sujeito lhes atribui. Sendo
assim, embora sejam vistas como um elemento essencial para que cada indivíduo construa e
efetive as diversas relações que estabelece com o meio no qual se insere, tanto a educação
quanto a leitura não se apresentam como um ato natural, mas antes, como práticas históricas,
sociais e culturalmente demarcadas por uma dada realidade espaço-temporal.
96
De acordo com esta perspectiva, podem ser definidas como processos regulares e contínuos
de desenvolvimento que têm por objetivo preparar os sujeitos humanos para assumirem
papéis sociais relativos à vida coletiva, à reprodução das condições que garantem sua
visibilidade e participação na esfera pública, bem como o uso adequado e responsável de
conhecimentos e habilidades disponíveis no tempo e nos espaços onde sua vida se
desenvolve.
Por serem práticas culturais através das quais sujeitos comuns adquirem a capacidade de
interpretar e atribuir significados diversos para as várias instâncias que compõem o mundo no
qual habita, a educação e a leitura, juntamente com outras práticas a elas relacionadas, se
apresentam também como instâncias básicas para a constituição identitária do sujeito humano,
visto que “o homem não se define como tal no próprio ato de seu nascimento, pois nasce
apenas como criatura biológica que carece se transformar, se criar como ser humano”.
(RODRIGUES, 2001; p.240).
Fator que nos permite indicar que tal formação é o resultado de um ato intencional que tem
por objetivo transformar uma criatura biológica em um novo ser, em um ser social capaz de
compreender, incorporar e produzir sua própria interpretação, aceitando ou não os elementos
culturais que outorgam sentido à sua vida enquanto agente coletivo, bem como à existência do
grupo ao qual pertence. Característica que se institui e se difunde:
Desde tempos imemoriais do processo civilizatório humano. Como a nos
lembrar, por todo o tempo e a todo instante que, à margem da ação
educativa, teriam os homens um destino não muito diferente dos seres
brutos. É ela que cria o Ser Humano em primeiro lugar, e em segundo lhe
fornece os meios para o exercício de sua liberdade, autonomia e
humanidade. (RODRIGUES, 1999; p.19-20).
Portanto, e segundo o autor acima citado, as práticas educativas, entre as quais encontramos
aquelas ligadas à leitura, não se reduzem apenas à formação externa do sujeito. Ou seja, a um
exercício de reprodução acrítica de modelos historicamente datados, o que transformaria o
homem em um objeto a ser trabalhado por um sujeito formador.
Mais importante que isto é saber que o ato de educar compreende ainda um segundo plano:
aquele que “aciona os meios intelectuais de cada educando para que ele seja capaz de assumir
o pleno uso de suas potencialidades físicas, intelectuais e morais para conduzir a continuidade
97
de sua própria formação” (RODRIGUES, 2001; p.241), sendo esta a condição básica para que
cada indivíduo se construa como um sujeito livre, independente e com características
particulares em relação àqueles que o estão gerando. Neste sentido, são as práticas educativas
que possibilitam que cada sujeito adquira a capacidade de autoconduzir seu próprio processo
formativo, condição básica para a construção de um quadro de referências identitárias.
Visto que também a identidade cultural, como já apontado anteriormente, não se fixa no
momento do nascimento. Ela não é parte integrante da natureza que se imprime através do
parentesco ou da linhagem dos genes que dão vida a um indivíduo. Ao contrário, a identidade
se manifesta a partir do entrelaçamento e da fusão dos diferentes elementos que compõem a
esfera global dos discursos culturais.
Para tanto, toda prática educativa deve ser compreendida como uma atividade que pretende
atingir a plenitude da formação humana. Ou seja, significa muito mais que a preparação dos
indivíduos para desempenharem determinadas funções sociais ou ocuparem espaços em um
mundo com espaços cada vez mais fragmentados pelo excesso de informações, pela
multiplicidade dos objetos e pela corrupção dos valores que até então nos forneciam os
elementos necessários à construção do sentimento de pertencimento a certo círculo identitário.
Sendo assim, o grande valor das práticas educativas está diretamente relacionado à
possibilidade de se:
Criar o ser humano como individualidade que vive no mundo, mas
somente após tê-lo transformado em seu mundo próprio. Eis o grande
mistério da Educação: forjar o Homem que constrói o mundo onde
acontecerá o jogo de sua própria existência. O mundo em que vive não lhe
é dado anteriormente à sua própria consciência de nele existir.
(RODRIGUES, 1999; p.21).
Por este motivo acredita-se que participar ativamente dos processos ligados às práticas
educativas seja a condição fundamental para que cada indivíduo adquira a capacidade de atuar
e transformar o tecido social no qual se insere, bem como construir suas próprias noções
acerca de sua individualidade e de sua autonomia enquanto sujeito humano. Isto porque, o
princípio subjacente a todo este movimento é o de que a educação seria uma força capaz de
conduzir à liberdade do espírito e a uma atividade crítica e individualizada de cada homem em
relação aos espaços em que habita e às atividades que nele desenvolve.
98
Ou seja, não deve ser pensada como algo neutro em relação ao mundo, mas sim, como algo
que produz, na sua própria dinâmica, caminhos diferenciados para uma ação social concreta
em virtude da diversidade das necessidades e interesses de cada agente envolto em tal
processo.
Com isso, e considerando-se tudo o que já se disse até aqui, torna-se possível inferir que é
através das práticas educativas que cada sujeito se prepara intelectual, científica, profissional
e culturalmente para compreender a realidade social, econômica e política em que vive e, ao
mesmo tempo, se capacita para participar efetivamente do processo de construção e mudança
desta realidade através de sua atividade interpretativa, faculdade que lhe possibilita atribuir
sentido para as coisas do mundo.
Se todo cidadão é livre porque está certo de que sua vontade não será impedida de ser
proclamada por injunções que lhe são externas, a noção de educação também se torna cara ao
exercício da cidadania porque esta compreende duas ações externas: “a primeira refere-se à
participação lúcida dos indivíduos em todos os aspectos da organização e da condução da vida
privada e coletiva; e a segunda, à capacidade que estes indivíduos adquirem para operar
escolhas” (RODRIGUES, 2001; p.238), onde tais ações articulam as diversas vontades e
capacidades individuais e coletivas para construir um modo de viver que lhes permita efetivar
o mais alto grau de exercício de liberdade de escolhas nos espaços onde se desenrolam suas
atividades sociais.
Ou seja, as práticas educativas também se convertem em esteio para a formação do sujeito
enquanto agente que participa ativamente da vida em comunidade a partir da preservação e da
difusão dos princípios, regras, valores, além da tradição e da memória coletiva de e para todos
os membros que configuram o tecido social onde se insere. Fator que lhe atribui o status de
consciência viva de uma norma que rege uma comunidade humana, quer se trate da família,
de uma classe ou profissão, quer se trate de um agrupamento mais vasto como um grupo
étnico ou um Estado. Sendo assim, “a educação não é algo para produzir um sujeito
necessário à vida econômica, ou ao progresso material da nação, mas a Educação é o meio
pelo qual se preserva a cultura e o espírito do povo”. (RODRIGUES, 1999; p.26).
Motivo pelo qual devemos considerar as práticas educativas como algo mais que o domínio
mecânico de técnicas utilizadas para ler e escrever. São antes, práticas interpretativas que
99
oferecem ao homem a possibilidade de atuar conscientemente sobre seu contexto social,
político, econômico e cultural. Para tanto, devem ser capazes de potencializar o conjunto das
habilidades individuais de cada sujeito, dotando-lhes de faculdades que lhes outorguem a
capacidade de responder às diversas necessidades práticas e valores que caracterizam o lugar
de onde é fruto.
Toda prática educativa deve ser capaz de permitir ao homem conhecer-se a si mesmo e a
realidade que o cerca a partir do desenvolvimento de uma consciência crítica e da ampliação
de sua capacidade de intervenção social. Característica fundamental para inserí-la no rol das
práticas culturais que viabilizam a sujeitos comuns imprimirem uma marca interpretativa nas
diversas paisagens que compõem sua vida social, contribuindo efetivamente para a formação
do mundo que lhe acolhe.
Elemento também compartilhado pelas práticas de leitura, visto que todo leitor é livre para
configurar seu próprio sentido interpretativo para a materialidade textual com a qual trava
contato. Materialidade que, por sua vez, não se restringe a uma folha de papel grafada com
símbolos alfabéticos. Pelo contrário, antes de sermos leitores de palavras, somos leitores do
mundo, posto que desde o nascimento interagimos com os elementos que nos caracterizam
como seres sociais.
Portanto, também o leitor deve ser compreendido como um sujeito autônomo que circula e se
apossa livremente do texto, criando a partir de seus anseios, habilidades intelectuais e lugar
social suas próprias interpretações para o texto que manipula. Deste modo, “o ato de ler,
imagem da passividade para a maioria dos observadores e professores [é] um exemplo de uma
atividade de apropriação, produção independente de sentido, noutras palavras, “o paradigma
da atividade tática”.
2
(CERTEAU, 1994; p.31, v.1).
Ler é, então, uma ação criadora de sentido que “quase não deixa traços visíveis nem garantias
contra a usura do tempo, mas ação produtora que em cada um dos seus encaminhamentos e de
fazeres, ao mesmo tempo alteram e conferem existência ao texto”. (CHARTIER; HÉBRARD,
2
Segundo Michel de Certeau (1994), as atividades táticas se referem aos vários mecanismos que permitem a
cada sujeito apropriar-se dos espaços e práticas culturais organizadas através de técnicas que viabilizam uma
produção autônoma de sentido.
100
1998; p.32). É, enfim, apropriação, recriação, uma arte de fazer que não se restringe a um
único conceito, mas sim, a um conjunto de práticas difusas e em permanente transformação,
fator que acaba por romper com o aspecto de passividade que por longa data a caracterizou.
De fato, a atividade leitora apresenta, ao contrário, todos os traços de uma
produção silenciosa: flutuação através da página, metamorfose do texto
pelo olho que viaja, improvisação e expectação de significados induzidos
de certas palavras, intersecções de espaços escritos, dança efêmera. [...]
Ele [o leitor] insinua as astúcias do prazer e de uma reaproximação no
texto do outro, aí vai à caça, ali é transportado, ali se faz plural como os
ruídos do corpo. Astúcia, metáfora, combinatória, esta produção é
igualmente uma ‘invenção” de memória. Faz das palavras as soluções de
histórias mudas. A fina película do escrito se torna um remover de
camadas, um jogo de espaços. Um mundo diferente (o do leitor) se
introduz no lugar do autor. (CERTEAU, 1994; p.49, v.1).
Embora esteja intimamente relacionada com a escrita e seja classificada como um processo de
tradução em que se transpõem para a linguagem verbal os diversos signos que permeiam
nossas relações de interação e comunicação com o mundo, efetuamos, mesmo que
inconscientemente, diversas outras modalidades de práticas de leitura. É o caso daquela que o
músico faz de uma partitura, traduzindo-a em sons e sentimentos; a leitura das estrelas feita
pelos astrônomos; ou a leitura dos oráculos que prevêem o futuro a partir de movimentos
naturais. Todos eles dividem com os leitores de palavras os segredos de atribuir sentido para
os processos de interação e comunicação que edificam nossas relações sociais.
Desta feita, e por ser uma prática interpretativa, a leitura não deve ser vista como recepção
imposta de conteúdos objetivos ou como ato passivo de sujeição ao texto. Todo leitor, como
aponta Michel de Certeau (1994) “caça em terras alheias, demarca com os olhos, com o dedo,
com o franzir das sombrancelhas, com o sorriso, seus caminhos em busca do sentido. Sob a
contingência, sem dúvida, e no espaço próprio do texto, ele elabora – como quer ou como
pode – sua leitura do texto: um novo texto”. (CHARTIER; HÉBRARD, 1998; p.33). Toda
leitura é então um processo voluntário da inteligência onde se produzem e sobrecodificam
sentidos e significados, dado que:
Longe de serem escritores, fundadores de um lugar próprio, herdeiros dos
servos de antigamente mas agora trabalhando no solo da linguagem,
cavadores de poços e construtores de casas, os leitores são viajantes;
circulam em terras alheias, nômades caçando por conta própria através
dos campos que não escreveram. A escritura acumula, estoca, resiste ao
tempo pelo estabelecimento de um lugar e multiplica sua produção pelo
101
expansionismo da reprodução. A leitura não tem garantias contra o
desgaste do tempo (a gente se esquece e esquece), ela não conserva, ou
conserva mal a sua posse, e cada um dos lugares por onde ela passa é
repetição do paraíso perdido. [...] Com efeito, a leitura não tem lugar.
(CERTEAU, 1994; p.269-270, v.1).
Visão amplamente compartilhada pelos teóricos que constituem o escopo de referências que
caracterizam o movimento interpretativo conhecido sob o nome de Estética da Recepção.
Vertente de pensamento que ao operar com conceitos como efeito, recepção, emancipação,
horizonte de expectativa e leitor implícito se constitui em um dos esforços intelectuais mais
originais e vigorosos sobre a questão da leitura.
Entendendo as várias materialidades significativas como um complexo que adquire sentido a
partir da relação dialética que se instaura entre o autor, a obra e seus possíveis leitores, a
Estética da Recepção defende que toda atividade interpretativa se constitui mediante o
processo de interação que se estabelece entre a subjetividade do leitor e as diversas condições
sócio-históricas na qual determinado signo se originou.
A Estética da Recepção teve início em 1967 na Universidade de Constança na Alemanha.
Naquela ocasião, Hans Robert Jauss proferiu uma conferência intitulada O que é, e com que
fim se estuda história da literatura? que, posteriormente foi denominada A história da
literatura como provocação à ciência literária.
Influenciado pela análise hermenêutica da obra de arte efetuada por Gadamer, Jauss propôs, a
partir deste texto, uma mudança metodológica a respeito das abordagens interpretativas acerca
das obras artísticas. Para tanto, sugeriu que o foco central de toda interpretação textual deveria
recair sobre o leitor e seus processos de recepção e não exclusivamente sobre o autor e os
mecanismos envolvidos na concepção dos mesmos. Ao fazer isso, o referido autor passou a
atribuir à hermenêutica o papel de intérprete da história, reconhecendo nela as bases do
conhecimento do texto. Fato que, de acordo com esta perspectiva, permitiria recuperar a
imagem do leitor como um produtor de interpretações e significações válidas para o signo que
manipula.
Jauss defendia que todo signo passível de leitura não se configura apenas como uma
reprodução, um reflexo dos eventos sociais que possibilitaram sua concepção. São antes, um
constructo social e cultural que, a partir de sua história, desempenham um papel ativo na
102
produção das possíveis interpretações de cada leitor, posto que toda recepção envolve e ativa
as estruturas intelectuais, emotivas e sensoriais dos mesmos.
O leitor de Jauss é, então, uma figura histórica que respeita a história do signo que lê, mas que
ao mesmo tempo promove uma ruptura com as leituras feitas até então, empreendendo sua
própria interpretação, sua marca pessoal na obra que lhe é apresentada. Razão pela qual se
torna possível afirmar que a concepção de leitor de Jauss baseia-se, como nos aponta
ZILMERMAN (1989; p.49-50), em duas categorias essenciais:
A de horizonte de expectativa, misto dos códigos vigentes e da soma de
experiências sociais acumuladas; e o conceito de emancipação, entendido
como a finalidade e efeitos alcançados pela arte, que libera seus
destinatários das percepções usuais e confere-lhes nova visão da
realidade. (ZILBERMAN, 1989; p.49-50.).
Para Jauss, todo ato de recepção, julgamento estético ou interpretação, por mais espontâneo
que seja sua expressão, advém de uma câmara de ecos onde ressoam os pressupostos
históricos, sociais ou técnicos que possibilitam sua efetivação. Ao estabelecer que o signo lido
provoca, a partir de sua historicidade, uma reação, um efeito em seus leitores, Jauss atribui à
leitura uma natureza emancipatória segundo a qual a experiência da leitura libera o leitor de
adaptações, prejuízos e apertos de sua vida prática, atribuindo-lhe a possibilidade de se
emancipar para empreender novas percepções, sentidos e interpretações para o mundo no qual
habita.
Enquanto Jauss se preocupa em entender como se dão os processos de recepção das obras de
arte, Wolfgang Iser, outro importante teórico da Estética da Recepção, se preocupa com o
efeito que cada obra causa em seus receptores, vale dizer, leitores. Iser distingue então duas
modalidades de interação entre a obra e o leitor: de um lado temos o efeito que todo signo
provoca em seu leitor; e de outro a recepção, processo histórico que se configura a partir das
diferentes interpretações que cada sujeito lhe impõe.
Acreditando que os signos passíveis de leitura estão abertos a múltiplas interpretações, visto
não serem concebidos como um espelho da realidade, Iser chama o leitor para participar dos
processos de criação dos mesmos. Tal participação, por sua vez, não se limita ao mero
preenchimento dos vazios que determinado signo traz consigo, é antes o processo de
constituição da própria obra que, graças à atuação do leitor, passa de “mero artefato artístico a
103
objeto estético, passível de contemplação, entendimento e interpretação”. (ZILBERMAN,
2001; p.51.). Isto porque, tais vazios provocam estímulos que possibilitam, através da força
imaginativa dos leitores, a impressão de vários sentidos interpretativos para a obra que este
manipula.
Além disso, Iser, ao ser influenciado por Ingarden, concebe o conceito de estrutura de apelo
do texto que determina que o mundo imaginário ao ser representado em uma obra mostra-se
esquematizado, por isso incompleto, apresentando vários pontos de indeterminação, vazios,
lacunas que dependem da interferência dos leitores para adquirirem sentido. Sentido este que,
segundo o referido autor, não é uma mensagem universal a ser extraída do texto por um leitor
competente, um leitor implícito capaz de atingir a completude significativa da obra lida, é
antes, uma interpretação mutável em virtude da historicidade própria da obra e das várias
leituras que a mesma sofre ao longo do tempo. Isto porque:
Quando lemos, nossa expectativa é função do que já lemos – não somente
ao texto que lemos, mas em outros textos –, e os acontecimentos
imprevistos que encontramos no decorrer de nossa leitura obriga-nos a
reformular nossas expectativas e a reinterpretar o que já lemos, tudo o que
já lemos até aqui neste texto e em outros. A leitura procede, pois, em duas
direções ao mesmo tempo, para frente e para trás, sendo que um critério
de coerência existe no princípio da pesquisa do sentido e das revisões
contínuas pelas quais a leitura garante uma significação totalizante à
nossa experiência. (COMPAGNON, 2003; p.149.).
Toda prática de leitura é, então, um grande percurso em busca de se atribuir sentido ao texto.
Por isso, nenhum texto pode ser apreendido todo de uma só vez. O leitor é um viajante que
desvenda ao longo do processo de leitura os sentidos, os significados, as múltiplas
possibilidades interpretativas que a obra lhe oferece. Neste caso, nenhuma obra se apresenta
por completo, mas se evidencia durante a travessia, durante as intervenções de seus inúmeros
leitores. Eis então o grande paradoxo da leitura:
Admite-se comumente que ler é decodificar: letras, palavras, sentidos e
estruturas, e isso é incontestável; mas acumulando as decodificações, já
que a leitura é, de direito infinita, tirando a trava do sentido, pondo a
leitura em roda livre (o que é sua vocação estrutural), o leitor é tomado
por uma intervenção dialética: finalmente ele não decodifica, ele
sobrecodifica; não decifra, produz, amontoa linguagens, deixa-se infinita
e incansavelmente atravessar por elas: ele é essa travessia. (BARTHES,
1988; p.51).
104
Se toda obra só se efetiva a partir das intervenções de seus leitores, a noção de um leitor ideal
é, para Iser, uma falácia, uma impossibilidade estrutural visto que um leitor ideal seria aquele
que possui o mesmo código que o autor. Em outras palavras, seria aquele que tem as mesmas
intenções que se manifestam no processo criativo. Para este autor, “o leitor ideal é, à diferença
de outros tipos de leitores, uma ficção”. (ISER, 1996; p.66, v.1).
Em contraponto a esta idéia de leitor ideal, Iser propõe o conceito de Leitor implícito.
Conceito este percebido simultaneamente como uma estrutura textual e como um ato
estruturado. O leitor implícito de Iser não tem uma existência real, nem se funda em um
substrato empírico, mas sim na própria estrutura do texto. Isso significa que as condições
necessárias à existência e atualização do objeto de leitura se inscrevem em sua própria
construção. Sendo assim, o conceito de leitor implícito enfatiza as estruturas de efeito do
texto, cujos atos de apreensão relacionam o receptor a ele.
Portanto, o conceito de leitor implícito de Iser postula que o efeito condicionado pela obra,
apesar de oferecer uma orientação prévia quanto às formas de lê-las e quanto ao significado a
ser apreendido, não reduz o leitor a um sujeito passivo à caça de uma mensagem original, mas
propicia a este o direito de estabelecer inúmeras interpretações e imprimir na obra lida sua
marca criativa, visto que:
A recepção, no sentido estrito da palavra, diz respeito à assimilação
documentada de textos e é, por conseguinte, extremamente dependente de
testemunhos, nos quais atitudes e noções se manifestam enquanto fatores
que condicionam a apreensão do texto. Ao mesmo tempo, porém, o
próprio texto é a “prefiguração da recepção”, tendo com isso um potencial
de efeitos cujas estruturas põem a assimilação em certo curso e a
controlam até certo ponto. (ISER, 1996; p.7, v.1).
Razão pela qual, mesmo sendo uma prática que se liga à inteligência, a leitura não é apenas
uma operação intelectual abstrata, ela é também o uso do corpo, uma inscrição dentro de um
espaço histórico-temporal e uma relação dos leitores consigo mesmos e com os outros. A
leitura de qualquer texto é, portanto, um processo de construção cultural e histórica que se
configura a partir das condições materiais destinadas à sua produção e disponibilização, bem
como do lugar e da subjetividade em que cada leitor se encontra no momento de executá-la.
105
Nenhum leitor é confrontado com textos abstratos, ideais ou desligados de uma materialidade
espaço-temporal, eles manipulam objetos, ouvem palavras cujas modalidades governam a
leitura e a escrita. Fazendo isso, comandam a possível compreensão e apropriação do texto,
posto que, “toda história das práticas de leitura é, portanto, necessariamente uma história dos
objetos escritos e das palavras leitoras”. (CAVALLO; CHARTIER; 2002; p.6).
O leitor é, então, um sujeito autônomo capaz de construir sentidos e imprimir sua marca
interpretativa no texto que sobrecodifica. Leitor é aquele que se apossa do texto para dotá-lo
de existência, visto que todo signo passível de leitura se abre a uma infinidade de
possibilidades de significação. Não são obras hermeticamente fechadas à procura de um
sujeito capaz de restabelecer o significado primevo que possibilitou sua construção. São antes,
constructos que adquirem sentido mediante a interação dos anseios e da capacidade subjetiva
de seus leitores, com o contexto espaço-temporal onde se inserem, e com a especificidade das
características que lhe foram atribuídas no momento de sua criação. Quadro de referências
que nos possibilita afirmar que:
Em nossas sociedades centradas em livros, o ofício de ler assinala nossa
entrada nos hábitos da tribo, com seus códigos e exigências particulares,
nos permitindo compartilhar a fonte comum de palavras registradas; mas
seria um erro pensar na leitura como uma atividade meramente repetitiva.
Ao contrário: Mallarmé propôs que o dever de cada leitor era “purificar o
sentido das palavras da tribo”. Para isso, os leitores devem se apropriar
dos livros. Em bibliotecas infindáveis, como ladrões na noite, os leitores
surrupiam nomes, vastas e maravilhosas criações tão simples quanto Adão
e tão artificiais quanto Rumpelstiltskin.
3
(MANGUEL, 2000; p.24).
É por isso que explicar as práticas de leitura e educação requer compreendê-las como
constructos sócio-culturais que adquirem sentidos a partir da urdidura de inúmeras variáveis
que em nenhum momento se isolam, encerrando em si modos, ritmos, intensidades e desejos
que variam de texto para texto, de leitor para leitor e de educando para educando, da mesma
forma que devemos tentar apreender como se efetivam nos vários lugares onde se
desenvolvem.
Isto porque, quando tratamos de práticas culturais estamos, na verdade, tratando de vários
aspectos que ocupam uma posição de destaque na cultura de um povo, visto serem os
3
Anão do folclore alemão que transforma fios de linho em ouro para que uma donzela cumpra a exigência do
príncipe com que se casou, sob a condição de que ela lhe dê seu primeiro filho ou adivinhe seu nome.
106
instrumentos simbólicos que dispomos para pensar, comunicar e agir sobre uma dada
realidade, e que, por isso mesmo, estão fortemente associadas a um amplo leque de
determinantes sociais, políticas, econômicas e ideológicas.
4.2. Biblioteca como lugar de educação e de leitura
Se traçarmos um paralelo entre a história da educação e a história da leitura, perceberemos de
imediato que tradicionalmente o acesso a tais práticas se circunscreveu ao espaço escolar,
efetivando-se através do processo que nele se desenvolve: a escolarização. Por este motivo,
sempre fez parte do senso comum a crença de que é na escola que se ensina e se aprende as
técnicas que caracterizam os processos educativos e as atividades de leitura. Tal vínculo é tão
forte que: “a alfabetização escolar, apenas uma das possíveis modalidades de alfabetização, é
considerada o padrão para todas as demais modalidades; de certa forma, é a alfabetização
escolar que legitima toda e qualquer atividade que vise a aprendizagem da leitura e da
escrita”. (SOARES, 2004; p.94).
No entanto, a história também nos mostra que a escola não é capaz de, sozinha, promover em
plenitude e de forma igualitária o acesso à leitura e à educação, necessitando, pois, de outros
espaços para que tais práticas se efetivem. Espaços que podem ser a família, a igreja, ou
diversas outras esferas da sociedade civil como as bibliotecas.
De fato a biblioteca se configura como lócus privilegiado para que a alquimia da leitura e dos
processos educativos se desenvolva e se efetive. Isto porque, por entre seus corredores e
estantes que preservam a infinitude do conhecimento humano, cada usuário se sente
confortável para buscar, encontrar e utilizar determinada informação, convertendo-a,
posteriormente, em insumo gerador de novos conhecimentos. Razão pela qual:
Uma visita demorada às bibliotecas nos permite viver e reviver a singular
experiência que ocorre quando estabelecemos um diálogo com os sábios
que nos antecederam. É sempre provocador de demoradas reflexões. E
por serem portadores de sabedoria não deixam de nos instruir ainda
quando suas vozes se encontram silenciadas. Se não falam aos nossos
ouvidos, estabelecem com os leitores uma conversa no plano do
entendimento. E despertam nossa curiosidade, ativando a mente para
perscrutar, por eles e com eles, os obscuros caminhos por onde trilharam
as diversas experiências da humanidade. (RODRIGUES, 1999; p.82).
107
Ler e estudar em uma biblioteca é promover a atividade dialética que se instaura entre a
totalidade e suas partes, entre a promessa de uma memória universal, mas que ultrapassa o
olhar de todo indivíduo, e os itinerários pacientes, parciais e atípicos desenvolvidos por cada
sujeito em seu processo de interação com as várias materialidades simbólicas que constituem
os acervos destas instituições.
É tentar conciliar um desejo de universalidade e a necessidade de escolha,
de seleção, até mesmo de esquecimento, como as próprias condições da
leitura e do pensamento. O trabalho na biblioteca é percurso no interior de
um livro, em seguida de livros para livros e dos livros para o mundo, com
suas travessias áridas, suas erranças labirínticas e seus momentos de
jubilação intelectual, suas caminhadas míopes e seus grandes panoramas.
É também uma viagem no tempo, uma “anábasis” nas ramificações da
memória do saber e da criação de um espaço de encontros utópicos e
ucrônicos – convergência das idéias, perenidade e metamorfoses dos
modelos e das lições, afinidades eletivas ou escolhas longamente
refletidas, em que se reaviva o pensamento e o saber de outrem e de
outrora através do comentário, da leitura e do jogo livre das digressões.
(JACOB, 2000; p.10).
É por estas e outras qualidades que toda biblioteca constantemente se reafirma como uma
imensa base de dados que permite a seleção, circulação e permuta dos saberes através da
atividade paciente e singular de seus leitores. Relação instituída há longa data, visto que a
história da educação e da leitura é indissociável da história das bibliotecas, estando suas
dimensões sócio-culturais atreladas às formas e circunstâncias por meio das quais cada um
destes elementos são concebidos no tempo e nos espaços onde se concretizam.
Portanto, embora a história da educação e da leitura comece por desprezar a materialidade
escrita, dado que todo conhecimento se transmitia através da oralidade, há relatos
suficientemente sólidos para comprovarmos que já no período helenístico tais práticas se
efetivavam também na intimidade, indicando que “da leitura como momento de vida
associativa própria da polis, passara-se à leitura como um dobrar-se sobre si mesmo, como
procura interior, refletindo bem as atividades culturais e as correntes de pensamento da
civilização helenística”. (CAVALLO; CHARTIER, 2002, p.15).
Condição a partir da qual visualizamos uma vertiginosa emergência de espaços de educação e
de leitura. Espaços que adquirem enorme importância justamente por inserirem-se em um
cenário onde se manifestava uma crescente demanda por livros e outras materialidades
textuais. Situação que encontra sua resposta em três planos indissociáveis, são eles:
108
[...] a criação de bibliotecas públicas e incremento das particulares,
complementadas pelo florescimento de tratados que visam a guiar o leitor
na escolha e na aquisição de livros; na oferta de textos novos (ou
rarefeitos) destinados a novas faixas de leitores; na produção e
distribuição de um tipo diferente de livro, o códex, mais adequado às
necessidades desses novos leitores e das diferentes práticas de leitura.
(CAVALLO; CHARTIER, 2002, p.15).
Neste sentido, mesmo não se caracterizando como uma instituição amplamente pública, posto
que devemos pensá-la como lugar restrito a um contingente de leitores oriundos da classe
média alta, a biblioteca se institui, já no período greco-romano, como arena privilegiada para
que as práticas ligadas à educação e a leitura se efetivem. Elementos que definitivamente se
difundem nos séculos que caracterizaram a Idade Média. Período no qual:
A leitura do ócio literário que no mundo antigo se realizava geralmente
entre jardins e arcadas e que previa também praças e ruas urbanas como
espaços de escritas expostas e de ensejos de leitura na alta Idade Média
ocidental, foi substituída pela prática de leitura concentrada no interior
das igrejas, das celas, dos refeitórios, dos claustros, das escolas religiosas,
algumas vezes das cortes: leituras, aliás, geralmente limitadas às Sagradas
Escrituras e a textos de edificação espiritual. (CAVALLO; CHARTIER,
2002, p.20).
De fato, foi no momento em que a leitura e a educação adquiriram o status de caminhos que
conduzem às verdades divinas e à beleza do mundo, que as bibliotecas converteram-se em
lugares de educação e de leitura”. Portanto, foi no interior das bibliotecas ligadas às grandes
ordens religiosas da Idade Média que tais práticas encontraram ambiente adequado para
desenvolverem-se e se expandirem. Isto porque, embora o livro fosse um objeto
extremamente raro, as bibliotecas medievais, especialmente as universitárias, fundaram a
crença de que:
O conhecimento não consiste no acúmulo de textos ou informações, nem
no livro como objeto, mas na experiência resgatada das páginas e
novamente transformada em experiência, em palavras que se refletem
tanto no mundo exterior como no próprio ser do leitor. (MANGUEL,
2006; p.83).
Condição que ainda se manteve entre os séculos XIII e XV, quando a arquitetura e o
mobiliário das bibliotecas mudaram de forma dramática. Como já apontado, a partir da
criação das primeiras universidades as bibliotecas saem dos claustros dos conventos e
monastérios europeus para instalarem-se em salões espaçosos, com mobiliário amplamente
109
distinto daquele que as caracterizavam até então. Deste modo, foi nestas bibliotecas que
professores e alunos encontraram a atmosfera perfeita para lerem, escreverem e estudarem.
Infra-estrutura que se amplia a partir do surgimento das primeiras bibliotecas públicas no
século XIX. Isto porque, ao constituírem-se como centros locais de informação que adotam
por objetivo recolher, organizar e disponibilizar uma grande parcela da materialidade oriunda
da produção intelectual humana, as bibliotecas públicas consolidam-se como importantes
aliadas ao processo de auto-formação cognitiva dos sujeitos e à educação formal em todos os
seus níveis.
Com a assimilação deste novo conjunto de transformações, as bibliotecas posicionam-se
definitivamente no espaço sócio-cultural onde se inserem como lugar privilegiado para que
cada sujeito acesse e tome posse dos elementos simbólicos que outorgam sentido às práticas
culturais que ali se desenvolvem. Posto desta forma, é possível apontar que a acumulação de
livros suscita práticas e relações que têm por “vocação ativar uma memória total, mas virtual.
A biblioteca forja um novo olhar de leitor, distanciado, atento à forma, à liberdade e à própria
legibilidade da obra”. (JACOB, 2002; p.60).
Se é verdade que a leitura e a educação são ofícios que nos permitem recordar a experiência
comum a toda humanidade, as bibliotecas nos auxiliam a perceber o mundo de dois ângulos
distintos: como terra estrangeira ou como lar. Em outras palavras:
Vagando entre nossos livros, tirando um volume da estante e folheando-o
ao acaso, as páginas ou bem nos espantarão por diferir de nossa
experiência ou bem nos confortarão por sua semelhança. A cabeça de
Agamêmnon ou a brandura do lama de Kim me são absolutamente
estranhos; a surpresa de Alice ou a curiosidade de Sinbad refletem uma e
outra vez minhas próprias emoções. Todo leitor é um andarilho ou um
viajante de retorno. (MANGUEL, 2006; p.253).
Desta forma, embora se constate que o imaginário que define os signos informacionais como
ícones revestidos de poder seja uma concepção característica das sociedades arcaicas, vemos
que a mesma se prolonga até os dias atuais, sendo as bibliotecas uma das principais esferas
responsáveis por sua constante revitalização. Isto porque, enquanto lugares de práticas
culturais, as bibliotecas e seus acervos adquirem a capacidade de interferir nos cenários sócio-
110
políticos em que se inserem, fazendo frutificar o saber acumulado e contribuindo para a
preservação e difusão de todo o legado cultural humano.
Característica que, por sua vez, suscita uma série de questões em torno da formação e da
atuação do bibliotecário. Constatado o poder atribuído às bibliotecas, tal profissional é
chamado a se posicionar como mediador entre as várias materialidades informacionais que
compõem seus múltiplos espaços de atuação e os inúmeros segmentos sociais que buscam
acessá-los. Desta forma, a atividade do bibliotecário se encontra no centro do processo de
socialização e democratização da informação, determinando em que condições e quais
usuários poderão dela usufruir.
Dissemos na introdução desta dissertação que o objetivo principal que permeia todo este
estudo é demonstrar que a biblioteca se constitui, ao longo da história, como um “lugar de
práticas culturais” para tentarmos apreender em que medida os currículos das escolas de
formação de bibliotecários no Brasil disponibilizam disciplinas cujos conteúdos contemplam,
teórica e praticamente, aspectos relacionados à memória, à cultura, à educação e à leitura.
Ao fim destes três capítulos, acreditamos ter alcançado a primeira parte de nosso objetivo
geral. Contudo, devemos ainda nos perguntar: qual o tipo de profissional da informação as
escolas de Biblioteconomia no Brasil almejam formar? Este modelo de formação possibilita
a compreensão, em termos práticos e teóricos, da biblioteca como um “lugar de práticas
culturais”? Ou seja, como lugar de memória, cultura, educação e leitura?
Responder estas e outras questões que por ventura se tornem eminentes se configura, deste
ponto em diante, como o cerne primordial dos dois próximos capítulos que compõem o
conjunto deste trabalho. Para tanto, torna-se extremamente relevante que comecemos por
identificar como a Biblioteconomia brasileira se desenvolveu historicamente, tendo-se em
vista apreendermos os pressupostos teóricos e práticos que nortearam sua fundamentação.
Sendo assim, é exatamente a construção deste panorama histórico-temporal que se converte
na substância essencial do capítulo que se segue.
111
5. Capítulo IV
A formação do bibliotecário no Brasil
Para esses homens devotados à escritura a biblioteca era ao mesmo tempo a
Jerusalém celeste e um mundo subterrâneo no limite entre a terra desconhecida e
os infernos. Eles eram dominados pela biblioteca, por suas promessas e
proibições. Viviam com ela, por ela e talvez contra ela, aguardando culposamente
o dia de violar todos os seus segredos. Por que não deveriam arriscar a vida para
satisfazer uma curiosidade de sua mente, ou matar para impedir que alguém se
apropriasse de um seu bem guardado segredo?
1
1
ECO, 1983; p.216.
112
Tendo por objetivo responder a pelo menos uma das questões levantadas no final da seção
anterior, este quarto capítulo faz uma incursão pela história da Biblioteconomia buscando
ressaltar os vários momentos que instituem validade científica à formação profissional dos
bibliotecários, especialmente dos bibliotecários brasileiros.
Para tanto, apresenta-se inicialmente a figura do bibliotecário humanista e seu ofício de
“zelador” dos segredos mantidos por uma biblioteca para, posteriormente, e dando curso à
evolução histórica, inserí-lo no contexto dos Modernos Profissionais da Informação, sujeitos
que participam ativamente de todas as etapas que compõem o ciclo informacional.
Partindo de uma experiência literária, a primeira seção busca salientar que o labor
bibliotecário caracterizou-se, durante séculos, como uma ocupação permeada por mistérios e
desenvolvida por intelectuais dotados de vasta cultura humanística, grande capacidade de
organização e devotado amor aos livros. Contudo, e como mais uma conseqüência do advento
da modernidade, verifica-se que a partir de meados do século XX inúmeras discussões
emergem em torno da valorização dos fazeres que demarcam a atuação deste profissional.
Isto porque, o surgimento das tecnologias da informação, aliado à constituição de um mercado
global que se centra no acesso remoto aos signos informacionais passou a requerer novas
competências, habilidades e funções sociais para os bibliotecários. Característica que impõe a
necessidade de se repensar os padrões teóricos e práticos que permeiam a formação
educacional do Moderno Profissional da Informação.
Como se forma a Biblioteconomia brasileira e em que medida ela se deixa influenciar por
tais mudanças? Tentando elucidar estas interrogativas, a parte final deste capítulo recupera as
tensões e contradições que deram origem ao quadro de referências teórico-práticas
responsáveis pela constituição dos programas de ensino de Biblioteconomia do país.
Permeando toda esta discussão, a segunda seção do capítulo apresenta uma breve
consideração sobre as “ciências humanas” e em que condições a Biblioteconomia, ao adotar
por objeto de pesquisa algo tão vasto quanto a informação, se aproxima deste conjunto de
positividades que pensam o homem e suas múltiplas relações com o mundo como assunto da
ciência.
113
Para sustentar nossa análise da evolução histórica dos programas de ensino de
Biblioteconomia brasileiros, esta mesma seção discute o que é um currículo e como seu
processo de construção e efetivação é perpassado por disputas ideológicas acerca de quais
conhecimentos merecem ou não serem validados socialmente. Sendo assim, comecemos por
demonstrar como a figura do bibliotecário emerge para o conjunto das profissões humanas.
5.1. O bibliotecário como agente histórico: do humanista
ao Moderno Profissional da Informação
5.1.1. O bibliotecário humanista
Talvez a lição mais importante que Roland Barthes tenha nos legado em sua “Aula” inaugural
para a cadeira de Semiologia Literária do Collége de France em 1977 seja aquela que destitui
o texto literário de seu caráter meramente descritivo. Para o referido autor, o signo lingüístico
não se encontra preso a um conteúdo apenas, visto ser capaz de, e está é condição própria de
sua existência, dialogar com os vários vértices (o cultural, o social, o político, entre outros),
que possibilitam ao leitor mobilizar a gama de impressões, sentimentos e conhecimentos
necessários para interpretar o mundo que o cerca e, ao mesmo tempo, tornar-se
verdadeiramente membro deste.
Sendo assim, ao assinalar que o discurso literário não se detém na estagnação e na fixidez
inerente a todo discurso científico, Roland Barthes defende que a literatura realiza, por meio
da escritura, a façanha de conceber redes variadas de saberes e transformar conceitos
estanques em fronteiras móveis que se potencializam e adquirem sentido pelo aspecto
múltiplo da palavra. Para tanto, onde existiria um único ponto de vista, a literatura faz emergir
inúmeros outros ângulos de compreensão. Ou, como aponta o próprio autor:
[...] a literatura faz girar os saberes, não fixa, não fetichiza nenhum deles,
ela lhes dá um lugar indireto, e esse indireto é precioso. Por um lado, ele
permite designar saberes possíveis – insuspeitos, irrealizados: a literatura
trabalha nos interstícios da ciência: está sempre atrasada ou adiantada em
relação a esta. A ciência é grosseira, a vida é sutil, e é para corrigir esta
distância que a literatura nos importa. Por outro lado, o saber que ela
114
mobiliza nunca é inteiro nem derradeiro; a literatura não diz que sabe
alguma coisa, mas que sabe de alguma coisa; ou melhor: que ela sabe algo
das coisas – que sabe muito sobre os homens. (BARTHES, 2004; p.18-
19).
É nesse sentido que, ao demonstrar o caráter abrangente da literatura, Roland Barthes pôde
reconhecer a pertinência do discurso literário e postular que, através da escritura, a linguagem
trabalha vorazmente incluindo a diversidade e a multiplicidade em sua criação. Ao contrário
do discurso científico que tem compromisso com as regras e normas, ou seja, com a
epistemologia. Portanto, de acordo com a proposta barthesiana, a literatura serve para corrigir
a distância existente entre ciência e ficção.
Ao contrário da rigidez conceitual da ciência, o saber literário, através do confronto entre
leitor e texto, amplia a compreensão das coisas que nos cercam e nos ajuda a “lidar com a
nossa própria e intransferível morte, na medida em que trabalha ludicamente com a noção de
duplicidade que está presente na condição humana. A duplicidade resultante da alteridade
intrínseca dos seres humanos”. (NASCIMENTO, 2005; p.118). Em sua operação de fazer
girar os signos, o discurso literário nos permite representar o real e melhor nos
compreendermos como sujeitos históricos inseridos em uma determinada realidade espaço-
temporal, visto que a leitura, a interpretação e o julgamento estético:
[...] por mais espontânea que seja sua expressão, por mais provisórios ou
equivocados que possam ser, advém de uma câmara de ecos onde ressoam
os pressupostos históricos, sociais e técnicos que informam o
reconhecimento: uma espécie de decifração eventual, de avaliação
informada que analisa o encontro da nossa sensibilidade com o texto ou a
obra de arte. (STEINER, 2001; p.151).
Em outras palavras, através da interpretação do texto literário e da linguagem dos poetas e
contadores de histórias adquirimos a capacidade de buscar o conhecimento indireto que
encena o sentido do fim que nos atravessa e reconhecer algo que não sabíamos que
conhecíamos. Em suma, são as vozes dos discursos literários que dão ao mundo sua aparência
de narratividade, que concentram e dramatizam “a matéria-prima da experiência, que
traduzem a tristeza e o encantamento em prazeres estéticos”. (STEINER, 2001; p.154). Razão
pela qual a literatura se apresenta como instância indispensável para a compreensão, pelo
homem, de suas circunstâncias de vida e de sua própria história.
115
Portanto, embora não almeje alcançar a verdade, o discurso ficcional fornece elementos e
fragmentos que permitem ao leitor reconstruir momentos reais que marcaram sua trajetória de
vida ou de todo um período histórico.
No entanto, para que a literatura alcance o status de referencial simbolicamente instituído e
compartilhado, as palavras geradoras de sentido não devem ser entendidas como simples
instrumentos poéticos ou estéticos. São antes, “um objeto sensual, núcleo de onde pode
expandir-se todo um movimento textual ou, inversamente, concentração ideal, lugar onde se
condensa todo um pensamento” (PERRONE-MOISÉS, 2004; p.71). É, pois, através deste
movimento que nos tornamos capazes de interpelar a realidade por intermédio das analogias e
contrastes que o encantamento e a experiência literária nos proporcionam.
Neste sentido, e por ser a biblioteca e o bibliotecário o tema central desta pesquisa, tomemos a
obra O Nome da Rosa, de Umberto Eco, como exemplo de análise das relações que se
estabelecem entre o discurso literário e a história factual dos homens.
O livro O Nome da Rosa foi escrito em 1980 e narra os eventos ocorridos no interior de um
mosteiro Beneditino do século XIV, mais precisamente entre os anos de 1316 a 1334 onde,
durante o papado de João XXII, sete assassinatos misteriosos se sucedem no decorrer de uma
semana, todos ligados à tentativa de se barrar o acesso ao segundo volume da Poética, livro
de Aristóteles considerado profano pelo bibliotecário. “Ao instaurar a dúvida sobre se Jesus
Cristo sorriu alguma vez em sua vida, de alguma situação ou de alguém, o autor critica
impiedosamente determinadas questões, no seu entender sibilinas e ridículas, que os teólogos
debatiam entre si”. (CASTRO, 2006; p.3).
Enredo que evidencia o embate clássico entre fé e razão tão recorrentes em nossa história,
bem como o esforço da Igreja Católica para manter inabaláveis seus dogmas e critérios de
verdade. Contudo, há ainda uma narrativa de maior importância para nós. Ao mergulhar no
mundo e nas histórias que cercam o universo das bibliotecas medievais, Umberto Eco retrata
o poder e a função social que estas exercem ao longo dos tempos, bem como as estratégias
estruturais e organizacionais utilizadas para se impedir o acesso ao conhecimento.
Como labirinto terreno e espiritual, a biblioteca de O Nome da Rosa:
116
[...] tinha mais livros que qualquer outra biblioteca cristã do Oriente ou do
Ocidente, o que a tornava objeto de desejo e admiração por parte de
outras abadias. O scriptorium, como centro de cópias, de miniaturização e
de ilustração, abrigava uma equipe de especialistas no tratamento e
concepção de livros. Dirigidos pelo bibliotecário, esses profissionais
executavam seu trabalho do nascer ao pôr-do-sol, seguindo férreas regras.
O bibliotecário – e tão somente ele – detinha o conhecimento total das
obras guardadas nas salas e armários. (CASTRO, 2006; p.4).
Demonstrando íntima relação de similitude com a história das bibliotecas, o livro acima
mencionado retrata e rediscute a disputa de poder que por longa data se instaurou entre
aqueles que produziam, organizavam e controlavam a circulação dos saberes humanos e os
que infringiam as regras de acesso a textos proibidos em busca de conhecimento.
De fato, é no período histórico em que a narrativa de O Nome da Rosa se desenrola que a
biblioteca adquire o status de espaço privilegiado para a organização, preservação e difusão
de toda aquela materialidade simbólica capaz de representar uma cultura. Eram espaços
fechados sobre si mesmos, “um universo de regras próprias que [pretendiam] substituir ou
traduzir as do universo informe ao redor”. (MANGUEL, 2006; p.19). Eram, ainda, grandes
centros de estudos, de trocas de informação, leitura, educação e sociabilidade. No entanto, o
que nos chama mais atenção neste grande romance não é a biblioteca em si ou os inúmeros
assassinatos que nela ocorrem, mas sim, a figura de seu bibliotecário.
Jorge, personagem central da história de Umberto Eco, é um monge cego e o grande
responsável pela organização e guarda de todos os segredos da monumental biblioteca do
mosteiro. Biblioteca capaz de comportar todos os segredos acumulados no mundo e propiciar
aos seus usuários um poder só avaliado pelos eruditos que, de fato, conheciam de perto as
potencialidades de um tesouro como aquele.
Analisando com maior acuidade as características físicas e intelectuais de Jorge, autoridade
máxima naquele universo de livros, percebemos as potencialidades da metáfora que seu nome
e ofício carregam. Jorge é uma personagem figurativa para homenagear o escritor argentino
Jorge Luis Borges, poeta e presidente da Biblioteca Nacional de seu país por mais de dezoito
anos e que, mesmo com sua pouca visão, conseguiu atribuir sentido à lógica ilógica das
classificações biblioteconômicas e criar, através de sua prosa poética, as mais belas figurações
do labor bibliotecário.
117
Compartilhando das mesmas paixões borgianas, o bibliotecário de Umberto Eco é um sujeito
dotado de imensa capacidade organizativa, que constrói arqueologias para tratar, ordenar,
classificar e conservar os signos sob sua custódia. Mas, diferentemente do primeiro, em O
Nome da Rosa, Jorge não presa pela difusão do conhecimento, mas antes, pela sua clausura. É
o que pode ser deduzido da passagem que se segue, na qual o bibliotecário explica a função
de seu trabalho a Frei Guilherme de Baskerville:
Mas de nosso trabalho, do trabalho de nossa ordem, e em particular do
trabalho deste mosteiro faz parte – aliás é a sua substância – o estudo e a
custódia do saber. A custódia, digo, não a busca, porque é próprio do
saber, coisa divina, ser completo e definido desde o início, na perfeição do
verbo que exprime a si mesmo. A custódia, digo, não a busca, porque é
próprio do saber, coisa humana, ter sido definido e completado no arco
dos séculos que vai desde a pregação dos profetas à interpretação dos
padres da igreja. Não há progresso, não há revolução de períodos na
história do saber, mas no máximo, contínua e sublime recapitulação. [...]
Eis aí a responsabilidade de nossa ordem durante os séculos, e o fardo de
nossa abadia hoje: orgulhosos das verdades que proclamamos, humildes e
prudentes em preservar as palavras inimigas da verdade, sem nos
deixarmos conspurcar por elas. Ora, meus irmãos, qual é o pecado de
orgulho que pode tentar um monge estudioso? O de entender o próprio
trabalho não como custódia mas como busca de alguma notícia que não
tenha sido ainda dada aos humanos. (ECO, 1983; p.452-453).
Por serem os livros objetos escassos durante toda a Idade Média, somente os monges
designados como bibliotecários transitavam livremente entre os volumes e mistérios de uma
biblioteca. Somente eles decidiam como e se outros monges poderiam acessá-los. Isto porque,
até aquele momento, e como recurso para se manter a soberania sobre certo conhecimento, as
bibliotecas eram encobertas por uma aura mística e obscura, onde alguns homens devotados
trabalharam durante séculos seguindo férreas regras. Portanto:
Somente o bibliotecário recebeu o segredo do bibliotecário que o
precedeu, e o comunica, ainda em vida, ao ajudante-bibliotecário, de
modo que a morte não o surpreenda, privando a comunidade desse saber.
E os lábios de ambos estão selados pelo segredo. Somente o bibliotecário,
além de saber, tem o direito de mover-se no labirinto dos livros, somente
ele sabe onde encontrá-los e onde guardá-los, somente ele é responsável
pela sua conservação. (ECO, 1983; p.53-54).
De fato, se fizermos uma incursão pela história da Biblioteconomia veremos que a figura do
bibliotecário emerge para o grupo das profissões humanas como o artífice responsável pela
organização e salvaguarda do patrimônio intelectual concebido ao longo dos tempos. De
Calímaco, célebre bibliotecário de Alexandria, passando por Gabriel Naudé, Gottfried
118
Wilhelm Leibniz e chegando a Borges, os bibliotecários foram representados como sábios
humanistas portadores de uma memória prodigiosa, capaz de atribuir sentido e ordem às
várias facetas do saber que vertiginosamente se acumula.
Este perfil de bibliotecário, em sua maioria filósofos, cientistas, poetas ou religiosos, era
marcado por uma sólida formação erudita a partir da qual, e por intermédio de sua atividade
profissional e intelectual, interferia diretamente na paisagem sócio-cultural onde se
encontrava alocado. Neste quadro de formação humanística, “as atividades dos bibliotecários
estavam voltadas para a cultura, para a educação, para o saber, para o conhecimento, tendo
características que permitiam incluí-los como segmentos direcionados para atender
necessidades no âmbito do espírito do homem”. (ALMEIDA JÚNIOR, 2000; p.45).
Portanto, para aqueles que objetivassem exercer o ofício de bibliotecário eram necessárias
qualidades como amor à leitura e prazer para o trato com os livros, aguçado senso de
organização, perspicácia para criar e manejar inúmeros sistemas classificatórios, dominar com
fluência idiomas modernos e antigos, especialmente o latim e o grego, para acesso aos
mistérios e segredos do conhecimento, além de compreender os processos de produção e
circulação do escrito. Estes foram, durante longa data, atributos requeridos e difundidos pelas
escolas de formação de bibliotecários, especialmente pela École des Chartres francesa.
Aliando-se à aura lúgubre e misteriosa que por longa data caracterizou as bibliotecas, a figura
do bibliotecário se edificou na história como aquele que protege os livros da usura do tempo,
das intempéries da natureza e da loucura dos homens. De Alexandria ao início do século XX,
o labor bibliotecário se caracterizou pelo silêncio, pela solidão, pelas ardilosas práticas de
organização do conhecimento, pelo amor ao livro e à leitura e pelo imenso respeito à memória
dos homens e seus símbolos culturais.
Contudo, o desenvolvimento tecnológico e urbano que pautou os fundamentos da
modernidade impôs a necessidade de se pensar novos parâmetros para a formação dos
bibliotecários. A partir dos primeiros anos do século XX este profissional deixa de ser
encarado como um erudito que deve saber todos os segredos contidos nos vários acervos com
que trabalha, para se tornar um facilitador do acesso à informação.
119
Neste novo cenário, que conta ainda com o surgimento das tecnologias da informação e da
comunicação e com a emergência de um mercado informacional constituído por usuários cada
vez mais exigentes em relação às suas demandas, evidencia-se, sobremaneira, a necessidade
de se constituir um novo perfil profissional para o bibliotecário.
Para tanto, tais mudanças reconfiguram o quadro histórico da formação educacional e da
atuação social deste profissional. Se antes suas ações práticas e intelectuais limitavam-se ao
espaço físico de uma biblioteca, os novos usos das tecnologias da informação fazem com que
os serviços informacionais transponham os limites físicos e institucionais que cerceavam seu
ofício. Mais do que nunca a globalização acena para crescentes níveis de competitividade
local e global, valorizando e reestruturando as formas de acesso à informação, bem como a
busca por se prover recursos humanos altamente qualificados para responder aos desafios que
ora emergem.
Neste sentido, tornou-se tarefa imediata dos sistemas educacionais que oferecem carreiras no
campo da informação incorporar as novas dimensões estruturais que demarcam o contexto
atual, tendo-se em vista atender suas especificidades e criar cenários favoráveis para a
satisfação das demandas sociais. Portanto, visando acompanhar as drásticas transformações
culturais, políticas e econômicas que caracterizam o atual momento histórico, os profissionais
da informação devem incorporar à sua ação prática habilidades, atitudes e conhecimentos que
lhes propiciem os meios adequados para responder satisfatoriamente às múltiplas esferas que
diariamente requerem seus préstimos. Mas o que diferencia o Moderno Profissional da
Informação de um bibliotecário com perfil humanista? É o que veremos na seção que se
segue.
5.1.2. O Moderno Profissional da Informação
Construir um novo perfil de atuação para os bibliotecários e inseri-los no rol das atividades
que impulsionam o moderno mercado da informação exigiu repensar os atributos que por
longa data definiram o saber biblioteconômico. Para tanto, tornou-se necessário converter
uma área que atende apenas aspectos espirituais do homem em uma profissão que participa
120
ativamente de todas as facetas do circuito de produção informacional. Neste sentido, e
resgatando-se um panorama em permanente evolução histórica:
Discutir perfil profissional do bibliotecário hoje é discutir a função
profissional no atual contexto social, que exige que a prática profissional
se modifique para atender expectativas novas e diversificadas que
emergem da sociedade. Tornam-se necessárias novas competências e
atitudes e isto é indissociável da questão da formação profissional, pois os
traços almejados para compor o perfil fornecem as diretrizes para o
estabelecimento das necessidades básicas de aprendizagem. (MÜLLER,
1989; p.63-64).
Sendo assim, ao inserir-se em um contexto onde a informação adquire força capaz de intervir
na construção dos vários contextos sócio-históricos, o Moderno Profissional da Informação
(MIP) passa a ser identificado como:
Todos aqueles que estão vinculados, profissional e intensivamente, a
qualquer etapa do ciclo vital da informação e, portanto, devendo ser capaz
de operar eficiente e eficazmente todas as etapas relativas ao manejo da
informação em organizações de qualquer tipo ou em unidades
especializadas de informação. (PONJUÁN DANTE, 2000; p.93).
A partir da definição acima apresentada, torna-se possível apreender que aquilo que
efetivamente se altera no perfil de bibliotecário humanista anteriormente exposto é o fato de o
Moderno Profissional da Informação conjugar o exercício das funções tradicionais que
demarcam as rotinas de uma biblioteca com o uso crescente das novas tecnologias
informacionais, além de incorporar em seu fazer os novos procedimentos administrativos que
configuram a produção e a disseminação da informação.
Embora a biblioteca tenha se constituído historicamente como instituição responsável pela
preservação, organização e disseminação das informações concebidas pelos vários estratos
culturais humanos, e o bibliotecário se definido como profissional encarregado de concretizar
tais funções, nesta nova conjuntura que enfatiza a gestão dos sistemas e suportes
informacionais para atender às demandas que ora emergem, estes agentes não mais se
posicionam como os únicos profissionais da informação. Isto porque, em virtude da expansão
dos segmentos produtores de insumos informacionais a eles somam-se “documentalistas,
arquivistas, museólogos, administradores, contadores, analistas de sistemas, comunicólogos,
jornalistas, publicitários, estatísticos, engenheiros de sistemas, sociólogos, educadores, dentre
outros”. (TARGINO, 2000; p.64-65).
121
Portanto, o atual modelo de mercado informacional requer um profissional flexível, apto a
atuar em situações de trabalho diversificadas e a mobilizar seus conhecimentos em prol das
organizações onde se encontram alocados e da satisfação das várias demandas que lhes
chegam. Ou seja, em virtude da nova conjuntura político-econômica priorizar a polivalência
do universo tecnológico, valorizando suas inúmeras formas de acesso à informação, o
Moderno Profissional da Informação:
[...] também passa a ser cobrado a investir em seu aperfeiçoamento
contínuo, seja este aperfeiçoamento pela via da educação continuada e/ou
por aprendizado autônomo; por sua capacidade de articular e aprofundar
conhecimentos que respondam às demandas do setor produtivo, ou por
sua capacidade de transferir para o trabalho sua vivência profissional e
sociocultural. A qualificação profissional passa a ser um “fator
coadjuvante”, mas não determinante do sucesso profissional, uma vez que
a estas se aliam à trajetória de vida do profissional (antes mesmo de sua
formação acadêmica), suas aptidões culturais, profissionais, políticas e
sociais. (ARRUDA; MARTELETO; SOUZA, 2000; p.21).
Com isso, se até recentemente o bibliotecário possuía uma formação voltada para a
preservação da cultura humana, para o apoio à educação como suporte ao processo de ensino-
aprendizagem, para o estudo, à pesquisa, e para o planejamento e administração dos recursos
informacionais, sua nova fundamentação teórico-prática deve ampliar o escopo de
conhecimentos necessários ao seu fazer profissional, tendo-se em vista priorizar premissas
como: planejamento, gerência e processamento de sistemas de informação, além da
concepção e uso das recentes tecnologias da informação e da comunicação - TICs.
Característica que evidencia a seguinte condição: se até este momento os bibliotecários
tiveram como foco de suas preocupações o acervo, os Modernos Profissionais da Informação
se voltam para o estudo do ciclo informacional como um todo. Ou seja, além de enfatizarem
em seus aspectos teóricos, práticos e tecnológicos os processos de coleta, organização e
preservação da informação, também devem levar em consideração os fatores que demarcam
sua concepção, circulação e acesso, além das conseqüências econômicas, políticas e sociais
que influenciam na conformação histórica de uma dada paisagem cultural.
Neste sentido, em paralelo às atividades de coleta, organização e difusão de documentos
informacionais, o mercado passou a exigir dos bibliotecários competências e habilidades que
os capacitem à:
122
1. Entender, de maneira ampla, a informação como objeto de seu fazer profissional;
2. Trabalhar de forma globalizada visando acompanhar as tendências mundiais em torno
do desenvolvimento informacional;
3. Conhecer e utilizar as tecnologias da informação e da comunicação – TICs – como
ferramentas de trabalho para a seleção, armazenamento, processamento e
disseminação da informação;
4. Fazer uso de técnicas administrativas com o objetivo de criar e planejar produtos e
serviços informacionais;
5. Trabalhar de forma integrada, relacionando formatos eletrônicos e digitais às
tecnologias de telecomunicações, tendo-se em vista possibilitar acesso local ou remoto
aos documentos informacionais;
6. Disponibilizar sistemas que permitam a avaliação contínua dos produtos e serviços
oferecidos;
7. Efetuar uma disseminação seletiva da informação;
8. Utilizar bases de dados externas e produzir bases de dados comerciais;
9. Organizar o conhecimento por meio de ferramentas lingüísticas e conceituais
adequadas, visando sua rápida recuperação;
10. Criar pontos de acesso físico e intelectual para a informação, independente se alocada
em bases físicas ou on-line;
11. Construir um quadro de referências acerca das teorias, dos paradigmas e dos aspectos
legais da informação.
Por isso, e conforme atesta VALENTIM (2002; p.123-127), constatada a necessidade de se
prover uma resposta satisfatória a este quadro de exigências oriundas do mercado de trabalho,
a classe bibliotecária definiu, através do documento final da Reunião de Diretores do IV
Encuentro de Directores de Escuelas de Bibliotecología y Ciencia de La Información Del
Mercosur, realizado em Montevidéu no ano de 2000, um conjunto de competências e
habilidades para compor o perfil do Moderno Profissional da Informação, são elas:
2
2
É importante ressaltar que embora as competência e habilidades que se seguem tenham sido definidas e
sistematizadas no Encuentro de Directores de Escuelas de Bibliotecología y Ciencia de La Información Del
123
1. Competências de Comunicação e Expressão
Formular e gerenciar projetos de informação;
Capacitar e orientar os usuários para um melhor uso dos recursos informacionais
disponíveis em uma unidade de informação;
Elaborar produtos de informação (bibliografias, catálogos, guias, índices,
disseminação seletiva da informação, etc.);
Planejar e executar estudos de usuários dos sistemas de informação.
2. Competências Técnico-Científicas
Desenvolver e executar o processamento de documentos em distintos suportes,
unidades e serviços de informação;
Selecionar, registrar, armazenar, recuperar e difundir a informação gravada em
qualquer meio para os usuários de unidades, serviços e sistemas de informação;
Utilizar e disseminar fontes, produtos e recursos de informação em diferentes
suportes;
Preservar e conservar os materiais armazenados nas unidades de informação;
Planejar, constituir e manipular redes globais de informação;
Formular políticas de pesquisa em Biblioteconomia e Ciência da Informação;
Realizar pesquisa e estudos sobre desenvolvimento e aplicação de metodologias de
elaboração e utilização do conhecimento registrado;
Realizar perícias referentes à autenticidade, antigüidade, procedência e estado geral
de materiais impressos de valor bibliográfico.
Mercosur, sediado em Montevidéu no ano de 2000, a grande efervescência de estudos em torno de uma
atualização dos parâmetros que norteiam a formação teórico-prática dos Modernos Profissionais da Informação
se dá em meados da década de 1990. Portanto, este conjunto de características já se encontra presente, em maior
ou em menor medida, nos estudos realizados por ARRUDA (1997); ABEBD (1998); BARBOSA (1998);
CASTRO (1995); EGGERT (1996); GUIMARÃES (1995, 1997, 1998); MARCHIORI (1996); MASON (1990);
MÜLLER (1989); SANTOS (1993, 1997, 1998); SMIT (1994); SOUZA (1990, 1991, 1993, 1996, 1997);
VALENTIM (1993); VIEIRA (1993); WELCH (1994), entre outros.
124
3. Competências Gerenciais
Dirigir, administrar, organizar e coordenar unidades, sistemas e serviços de
informação;
Formular e gerenciar projetos de informação;
Prestar assessoria ao planejamento de recursos econômico-financeiros e humanos do
setor;
Planejar, constituir e manipular redes globais de informação.
4. Competências Sociais e Políticas
Selecionar e avaliar todo tipo de material para as unidades de informação;
Buscar, registrar, avaliar e difundir a informação com fins acadêmicos e
profissionais;
Prestar assessoria referente à formulação de políticas de informação;
Fomentar uma atitude aberta e interativa com os diversos atores sociais (políticos,
empresários, educadores, trabalhadores e profissionais de outras áreas, instituições e
cidadãos em geral) que configuram o atual ciclo informacional;
Identificar as novas demandas sociais de informação;
Atuar coletivamente com seus pares no âmbito das instituições sociais com objetivo
de promover a defesa da profissão.
5. Habilidades
Utilizar as metalinguagens pertinentes à preservação, organização e disseminação da
informação;
Demarcar campos específicos e integrar conteúdos de áreas correlatas em uma
perspectiva multidisciplinar;
Produzir e divulgar conhecimentos;
Processar documentos, quaisquer que sejam os suportes, linguagens e formatos, de
acordo com as teorias, paradigmas, métodos e técnicas da área;
Desenvolver ações pedagógicas voltadas para melhoria do desempenho profissional
e para ampliação do conhecimento em geral;
125
Realizar atividades profissionais autônomas de modo a orientar, dirigir, assessorar,
prestar consultoria, realizar perícias, emitir e assinar laudos técnicos e periciais;
Responder às demandas sociais determinadas pelas transformações tecnológicas que
caracterizam o mundo contemporâneo;
Elaborar novas metodologias de tratamento da informação tendo-se em vista futuros
cenários;
Reestruturar os canais de distribuição, disseminação e transferência da informação
visando expandir o uso das telecomunicações e das tecnologias da informação.
Sendo assim, e tendo por base este conjunto de competências e habilidades, assinalamos que a
atuação profissional dos bibliotecários na contemporaneidade não destoa das características
que historicamente demarcaram seu papel social. Ainda é parte integrante de seu labor as
atividades de coleta, preservação, organização e disseminação dos documentos informacionais
concebidos pela atividade racional humana.
Contudo, se antes tais funções se restringiam aos limites físicos de uma biblioteca e às
especificidades de seus acervos físicos, o crescente uso das tecnologias da informação e da
comunicação, aliada à virtualização dos documentos informacionais e ao surgimento de
usuários cada vez mais conscientes de suas demandas impõem a necessidade de se
reestruturar as dinâmicas que por longa data caracterizaram seu perfil de atuação profissional.
Com isso, o Moderno Profissional da Informação deve ser capaz de interagir com todas as
etapas que perfazem o ciclo vital da informação, mostrando-se consciente da importância que
a mesma assume para o desenvolvimento político, econômico, social e cultural do indivíduo e
de toda uma coletividade. Segundo esta perspectiva, ser proativo, comunicativo e atuar em
espaços multidisciplinares tornou-se atributos fundamentais para que os bibliotecários
respondam satisfatoriamente aos problemas e demandas informacionais que a modernidade
faz emergir.
Em paralelo a este cenário, e em virtude das tecnologias da informação implodirem as
barreiras impostas pelo tempo e pelo espaço, além de instituírem novos parâmetros e valores
para o acesso à informação, o panorama atual passou a exigir que tais profissionais adotem
uma postura investigativa e crítica acerca de suas atividades com o objetivo de incorporar
126
gradativamente tais mudanças. Foi, portanto, a partir deste momento que os estudos sobre a
reformulação dos padrões que definem a formação acadêmica dos bibliotecários ganharam o
impulso necessário para se estabelecer como campo de investigação.
Como resultado, tais estudos demonstraram que estabelecer habilidades e competências para
os Modernos Profissionais da Informação não é um problema. O problema está em definir
propostas curriculares que revitalizem os modelos de ensino-aprendizagem que
historicamente definiram a Biblioteconomia como campo de conhecimento. Isto porque, todo
processo formativo deve ter por base os auspícios de atender às demandas de mão-de-obra
existentes na sociedade e, no caso específico dos profissionais bibliotecários, responder
satisfatoriamente aos problemas informacionais que atualmente se constata.
A partir deste prisma, e levando-se em consideração que a modernidade impõe a necessidade
de se repensar a atuação e a formação dos bibliotecários, posto que seu ofício assume
dimensões sociais mais complexas, interrogamo-nos aqui: os currículos das escolas de
Biblioteconomia do Brasil oferecem uma resposta satisfatória a este conjunto de mudanças
estruturais? E ainda: qual o perfil de profissional da informação os mesmos almejam
constituir?
Acreditamos ser possível encontrar respostas satisfatórias para as questões acima apresentadas
na própria história que demarca a constituição da Biblioteconomia brasileira enquanto campo
do conhecimento. Contudo, antes de efetuarmos a reconstituição histórica dos principais
acontecimentos que deram origem à atual estrutura teórico-prática dos currículos de formação
de bibliotecários do país, pensamos ser conveniente discorrer, mesmo que rapidamente, sobre
o que é um currículo e em que medida este se torna capaz de representar em um conjunto de
disciplinas as tensões e contradições inerentes à construção do saber em tempos e espaços
distintos.
Para tanto, além de desenvolver os apontamentos acima mencionados, a próxima seção
também apresenta uma breve consideração sobre as “ciências humanas” e ressalta em que
condições a Biblioteconomia, ao adotar por objeto de pesquisa algo tão vasto quanto a
informação, se aproxima deste conjunto de positividades que pensam o homem e suas
múltiplas relações com o mundo como assuntos da ciência.
127
5.2. Biblioteconomia, ciências humanas e teoria curricular
Em um de seus muitos textos de rara sobriedade o psicólogo, filósofo e historiador Michel
Foucault nos ensina que o projeto epistemológico das ciências humanas, “esse conjunto de
discursos que tomo por objeto o homem no que ele tem de empírico” (FOUCAULT, 1981;
p.361), adquiriu seus primeiros contornos no exato momento em que o homem se enxergou
como um objeto científico. Melhor dizendo, no instante em que o sujeito humano e suas
múltiplas possibilidades de interação com o mundo se tornaram objetos empíricos da ciência.
Ao elaborar uma arqueologia das diversas formas do conhecimento empírico, Foucault
defende que esta virada epistemológica se efetivou em um momento facilmente detectável na
história de nossa racionalidade. Segundo o pensador francês, da época clássica até o início do
século XVIII o campo do saber se constituía de forma perfeitamente homogênea porque seu
principal fundamento racional era a noção de semelhança. Conhecer algo era, de acordo com
esta categoria, trazer à luz as similitudes que o ligava ao cosmos ou à natureza.
Contudo, o advento da modernidade e a imposição de novas normas pela sociedade industrial
provocaram a fragmentação dos saberes e instauraram diferentes possibilidades de
formalização do pensamento. Neste novo cenário, e ao emergir como objeto da ciência, o
homem abandona seu posto de agente que observa o mundo com o objetivo de criar suas
possíveis significações, para se tornar alguém que, do interior da vida a que pertence e pela
qual é atravessado em todo o seu ser, constitui representações empíricas para aquilo que vive,
para aquilo que fala e para aquilo que produz. Em outras palavras:
É como ser vivo que ele nasce, que tem funções e necessidades, que vê
abrir-se um espaço cujas coordenadas móveis ele articula em si mesmo;
de um modo geral, sua existência corporal fá-lo entrecruzar-se, de parte a
parte, com o ser vivo; produzindo objetos e utensílios, trocando aquilo de
que tem necessidade, organizando toda uma rede de articulação ao longo
do qual perpassa o que ele pode consumir e onde ele próprio se acha
definido como objeto de troca, aparece ele em sua existência
imediatamente imbricado com os outros; enfim, porque tem uma
linguagem, pode constituir para si todo um universo simbólico, em cujo
interior se relaciona com seu passado, com coisas, com outrem, a partir do
qual pode imediatamente construir alguma coisa com um saber
(particularmente esse saber que tem de si mesmo e do qual as ciências
humanas desenham uma das formas possíveis). (FOUCAULT, 1981;
p.368).
128
Portanto, se até o advento do século XVIII o campo da epistémê se sustentava em três pilares
específicos: o das ciências físicas e matemáticas, o da filologia e o da biologia, a positividade
das ciências humanas não se ordena conforme uma matematização perfeita e nem se delineia
de acordo com as dimensões da lingüística ou do funcionamento biológico. Ao assumir o
homem, seu mundo e suas manifestações como objeto racional e empírico, as ciências
humanas incorporam e articulam em torno de si o conjunto de referenciais simbólicos através
dos quais os indivíduos se representam e atribuem sentido à vida em sociedade. Sendo mais
explícito, a base de sua racionalidade liga-se à tentativa de explicar como a atividade humana
adquire um caráter individualizado e em que medida cada sujeito se torna capaz de conceber
laços de sociabilidade.
É através da possibilidade de se inscrever as ações humanas em um parâmetro individual, mas
amplamente perpassado pelo coletivo que, na modernidade, nenhum olhar interpretativo pode
ser considerado perfeitamente estável ou cerrado sobre si mesmo. Apoiando-se nesta
assertiva, Foucault defende que o conhecimento, a partir do século XVIII, deve ser
representado como uma massa fragmentada que se mistura aqui e ali com as figuras do
mundo. Neste sentido, ainda segundo este pensador, as ciências humanas alcançam seu
estatuto de validade epistemológica quando:
Abandonando o espaço da representação, os seres vivos alojaram-se na
profundeza específica da vida, as riquezas no surto progressivo das
formas de produção, as palavras no devir das linguagens. Nessas
condições, era necessário que o conhecimento do homem surgisse, com
seu escopo específico, como contemporâneo e do mesmo veio que a
biologia, a economia e a filologia, de tal sorte que nele se viu, muito
naturalmente, um dos mais decisivos progressos realizados, na história da
cultura européia, pela racionalidade empírica. (FOUCAULT, 1981;
p.362).
Porém, é preciso frisar que neste movimento por se instituir o homem como fundamento de
todas as positividades, as ciências humanas não se colocaram em oposição ao triedo que as
precederam. Ao contrário, foi exatamente no interstício desses saberes, no volume definido
por suas três dimensões, que elas encontraram seu lugar e que alguns de seus procedimentos e
resultados puderam ser formalizados. Isto porque, ao estabelecer relações de proximidade
com a física, a biologia e a filologia, as ciências humanas se tornaram capazes de instituir
relações entre elementos descontínuos, mas, ao mesmo tempo, análogos.
129
A prioridade das ciências humanas não é, portanto, determinar aquilo que o homem é por
natureza, mas analisar como este se vislumbra enquanto ser que vive, trabalha, fala e constitui
laços de sociabilidade, bem como compreende, ou busca compreender, o que é a sociedade e a
vida, qual a essência do seu trabalho e de que maneira pode falar. Neste sentido, segundo
Foucault:
O homem, para as ciências humanas, não é esse ser vivo que tem uma
forma bem particular (uma fisiologia bastante especial e uma autonomia
quase única); é esse ser vivo que, do interior da vida a qual pertence
inteiramente e pela qual é atravessado em todo o seu ser, constitui
representações graças às quais ele vive e a partir das quais detém esta
estranha capacidade de poder se representar justamente a vida.
(FOUCAULT, 1981; p.369).
Trabalhando com a essência humana, a racionalidade desta nova ciência não trata a vida, o
trabalho e a linguagem como discursos transparentes que modulam, na esfera do
comportamento, da fala, dos gestos e dos afetos as ações de cada sujeito em relação ao mundo
que o cerca. Ao inserir seu objeto no campo da finitude, da relatividade e da perspectiva, as
ciências humanas colaboram com a difícil tarefa de atribuir um sentido empírico e factível às
normas, às regras e ao conjunto de significantes que conformam um saber científico ou uma
competência prática acerca do comportamento individual ou coletivo dos homens.
Foi a partir desta concepção que a modernidade viu surgir disciplinas como a psicologia, a
sociologia, as ciências políticas e a antropologia. Da mesma forma que vislumbrou a história e
a filosofia se firmarem como positividades que contribuem para a formação dos homens ao
pensarem racionalmente suas múltiplas formas de relacionamento com o mundo e ao inseri-
los em certo ramo da tradição universal.
Embora não se inscreva no conjunto das ciências humanas de forma stritu senso, a
Biblioteconomia, campo do saber que adota a informação como fundamento de sua
positividade, também se insere no ramo das disciplinas que pensam o homem, suas relações
sociais e suas ações sobre o mundo. Desenvolvendo métodos racionais e empíricos para
coletar, armazenar, organizar e disseminar os vários estratos informacionais concebidos por
nosso fazer racional, esta esfera do saber que tem sua origem ligada ao período clássico e ao
surgimento das primeiras bibliotecas se consolida, na contemporaneidade, como epistémê
fundamental para a preservação da tradição, da história e da memória coletiva dos homens.
130
Ao adotar como premissa que a informação perpassa e modula todas as esferas racionais em
que somos capazes de atuar, a Biblioteconomia, através dos saberes e das práticas que lhe
caracteriza, também se capacita a atribuir uma resposta satisfatória às diferentes necessidades
informacionais de cada um dos muitos usuários que diariamente recorrem aos serviços de uma
biblioteca ou centro de informação.
Neste sentido, se as ciências humanas caracterizam-se por pensar o homem e suas práticas
como objetos científicos, a Biblioteconomia confere à produção, circulação e utilização da
informação diferentes olhares interpretativos. Contudo, é preciso salientar que se por longa
data seus esforços empíricos se evidenciaram pelo intenso uso de técnicas de organização,
gestão e tratamento dos signos informacionais, os últimos cinqüenta anos promoveram uma
verdadeira revolução em torno dos fundamentos que sustentam sua racionalidade.
Isto se dá porque a constante valorização da informação como insumo responsável pela
construção das várias esferas sociais, econômicas, políticas e culturais; como recurso que
alicerça a produção e difusão do conhecimento; como elemento que valoriza a história, a
tradição e a memória coletiva, bem como fator estratégico para a democratização dos recursos
humanos impôs a necessidade de se repensar os fundamentos teóricos e práticos que conferem
visibilidade e autoridade científica ao labor dos bibliotecários.
Agora, todos são chamados a saírem dos limites que demarcam o espaço físico de uma
biblioteca e irem a campo investigar as várias incógnitas que perpassam o ciclo
informacional, objetivando-se determinar quais os fatores que facilitam ou impedem sua
efetivação, bem como os benefícios ou conseqüências sociais que emanam de todo este
processo.
Para tanto, e como mais um recurso para fundamentar e validar seu programa de pesquisa, a
Biblioteconomia deve promover um intenso diálogo com outras disciplinas científicas. É o
caso da sociologia, da história, da psicologia, da economia, da administração, da informática,
da comunicação, da filosofia, da educação, da lingüística e da literatura. Disciplinas que nos
ajudam a entender a atualidade que nos modela e que contribuímos para modelar na exata
medida em que conhecemos as influências que nos constituem.
131
Daí a necessidade de interrogarmos se os currículos das escolas de Biblioteconomia
brasileiras oferecem uma resposta satisfatória a este conjunto de mudanças estruturais? E,
também: qual o perfil de profissional da informação os mesmos almejam constituir? Porém,
antes de prosseguirmos com nossa busca por elucidar tais inquietações, e como salientado
anteriormente, torna-se necessário discorrermos um pouco sobre o que é um currículo e quais
os pressupostos a serem considerados em sua elaboração. Estratégia que nos ajudará a melhor
compreender a evolução das tensões e das contradições que conformam o atual panorama da
Biblioteconomia nacional.
Sendo assim, se recorrermos à etimologia perceberemos que a palavra currículo, ao derivar-se
da expressão latina curriculum, significa, basicamente, pista, circuito atlético, ordem,
seqüência ou estrutura. No entanto, ao introduzir-se no campo pedagógico o termo adquire
outras acepções. Inicialmente foi utilizado para designar um arranjo sistemático de matérias,
disciplinas ou conteúdos. Posteriormente passou a ser identificado como o conjunto de
estratégias empregadas para preparar o jovem para a vida adulta. Logo em seguida, e ligando-
se às experiências trabalhadas pela escola, se configurou como o conjunto das atividades e dos
meios que objetivam alcançar os fins da educação.
Esta evolução histórica é importante para, já neste momento, demarcarmos que o
conhecimento corporificado em um currículo não funciona como algo fixo, imutável e
fechado sobre si mesmo. Ao contrário, ele deve ser pensado como um constructo social e
histórico que, por tais razões, está sujeito a mudanças e flutuações. Em outras palavras:
O currículo [de qualquer disciplina] tal como o conhecemos atualmente
não foi estabelecido de uma vez por todas, em algum ponto privilegiado
do passado. Ele está em constante fluxo e transformação. De forma
igualmente importante e relacionada, é preciso não interpretar o currículo
como resultado de um processo evolutivo, de contínuo aperfeiçoamento
em direção a formas melhores e mais adequadas. Uma análise histórica do
currículo deveria, em vez disso, tentar captar as rupturas e disjunturas,
surpreendendo, na história, não apenas aqueles pontos de continuidade e
evolução, mas também as grandes descontinuidades e rupturas. (SILVA,
1995; p.7).
De acordo com este prisma, ao constatarmos que o currículo é um artefato que se origina de
nossas práticas culturais, não devemos, em seguida, pensá-lo como o resultado de um
processo social necessário de transmissão de valores, conhecimentos e habilidades em torno
132
dos quais haja um acordo geral, mas sim, “como um processo constituído de conflitos e lutas
entre diferentes tradições e diferentes concepções sociais”. (SILVA, 1995; p.8).
Sendo assim, se seguirmos os rastros de Tomaz Tadeu da Silva, um dos mais importantes
historiadores e teóricos que discute a temática do currículo no Brasil, compreenderemos que,
enquanto constructo cultural, todo currículo expressa, entre outras coisas, a forma como certas
questões são definidas como problemas sociais. Portanto, sua organização não deve ser
concebida como um processo epistemológico desinteressado ou imparcial. De acordo com
este autor:
O processo de fabricação do currículo não é um processo lógico, mas um
processo social, no qual convivem lado a lado com fatores lógicos,
epistemológicos, intelectuais, determinantes sociais menos “nobres” e
menos “formais”, tais como interesses, rituais, conflitos simbólicos e
culturais, necessidades de legitimação e controle, propósitos de
dominação dirigidos por fatores ligados à classe, à raça, ao gênero. A
fabricação do currículo não é nunca apenas o resultado de propósitos
“puros” de conhecimento [...]. O currículo não é constituído de
conhecimentos válidos, mas de conhecimentos considerados socialmente
válidos. (SILVA, 1995; p.8).
Elaborar um projeto curricular requer, de acordo com esta perspectiva, levar em consideração
aspectos de quatro ordens teórico-práticas, a saber:
1. Forças sociais: todo currículo deve contemplar conhecimentos que expressem, em
termos teóricos e práticos, os anseios sociais e culturais que permeiam o contexto local
onde este se insere;
2. Desenvolvimento humano: pensar um currículo requer outorgar voz aos vários
discursos que o identificam como uma expressão ou representação de conteúdos validados
socialmente, visando-se formar indivíduos capazes de conviver, interagir e consolidar
respostas satisfatórias para os inúmeros problemas, desafios e mudanças que
constantemente assolam a sociedade;
3. Natureza da aprendizagem: para conseguir cumprir sua função social, todo projeto
curricular deve prever processos distintos de ensino-aprendizagem. Neste sentido, podem
ser contempladas diretrizes pedagógicas de natureza passiva ou ativa, significativa ou
rotineira, do todo ou das partes e, ainda, individual ou coletiva;
133
4. Natureza do corpo organizado de conhecimentos: instância que pensa a gênese e a
validade conceitual, teórica, metodológica e empírica de cada uma das disciplinas que
compõem a estrutura de um currículo, de acordo com a área e o público a que este se
destina.
Neste sentido, torna-se evidente que elaborar um modelo curricular dinâmico e consistente
enseja a necessidade de pensar todo projeto educativo como um empreendimento sócio-
cultural que se efetiva por meio dos muitos conteúdos instituídos como válidos por uma dada
sociedade em um determinado momento histórico. Sendo mais preciso, “a reflexão sobre o
currículo precisa incidir tanto sobre as propostas, sobre as intenções nelas contidas, como
sobre as práticas e os sujeitos que as concretizam e as renovam”. (MOREIRA, 2003; p.94).
Portanto, e dialogando com os pensadores até aqui citados, o presente estudo adota, para fins
de fundamentação teórica e como recurso metodológico, a seguinte definição de currículo:
Por currículo se entende, geralmente, tudo que é suposto de ser ensinado
ou aprendido, segundo uma ordem determinada de programação e sob a
responsabilidade de uma instituição de educação formal, nos limites de
um ciclo de estudos. Por extensão, o termo me parece fazer referência ao
conjunto dos conteúdos cognitivos e simbólicos (saberes, competências,
representações, tendências, valores) transmitidos (de modo explícito ou
implícito) nas práticas pedagógicas e nas situações de escolarização, isto
é, tudo aquilo a que poderíamos chamar de dimensão cognitiva e cultural
da educação escolar. (FORQUIN, 2000; p.48).
Ao adotarmos a definição acima apresentada como centro de nossa argumentação acerca das
propostas curriculares que instituem forma ao campo da Biblioteconomia nacional,
pretendemos ampliar nossa possibilidade de compreensão do contexto sócio-histórico em que
cada uma delas se originou. Estratégia que nos permitirá projetar luzes sobre as tensões e
contradições impostas pela modernidade à formação teórica e prática dos bibliotecários
brasileiros. Formação cuja historicidade começa a ser recuperada a partir deste momento.
134
5.3. A formação do bibliotecário no Brasil
5.3.1. De 1911 a 1960
O primeiro projeto para se instituir um curso de formação de bibliotecários no Brasil veio à
luz em 11 de julho de 1911 nos corredores da Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro, através
do Decreto n. 8.835, Artigo 34
3
. Como não possuía nenhum planejamento curricular e por
visar apenas o aperfeiçoamento da mão-de-obra que nela se alocava, o referido projeto apenas
se concretizou em 1915.
Mesmo possuindo uma grade curricular composta de disciplinas escassas e oferecidas de
maneira estanque e desarticuladas, a gênese deste curso, moldado sob a influência da École
des Chartres francesa, objetivava formar um profissional bibliotecário com perfil erudito e
humanístico. Para tanto, as bases de seu processo de ensino centravam-se no repasse de
experiências pelos professores encarregados das seções de Bibliografia, Paleografia,
Diplomática, Iconografia e Numismática.
Contando com uma carga horária em ampla medida extensa, tais disciplinas, que
correspondiam às seções da Biblioteca Nacional, dividiam-se em conteúdos práticos e
teóricos. Inicialmente previsto para durar 1 (um) ano, o curso se propunha a formar um
bibliotecário humanista conservador, razão pela qual sua ênfase curricular priorizava os
aspectos relacionados à teoria cultural.
Sendo assim, além de possuírem uma vasta cultura geral, os bibliotecários formados pela
Biblioteca Nacional deveriam dominar vários idiomas, principalmente o idioma materno, bem
como conhecimentos sobre Artes, Ciências e Letras que os tornassem aptos a participarem
ativamente da formação do quadro intelectual, sócio-histórico e cultural brasileiro.
Após sofrer algumas interrupções o curso foi reiniciado em 1931 com algumas reformulações
em sua estrutura curricular básica. Fato respaldado legalmente em 1933 com a aprovação do
3
Se mais uma vez atentarmos para os aspectos históricos, constataremos que tal projeto surge no exato momento
em que se comemora 100 anos de instalação da primeira biblioteca pública do país. Sendo mais preciso, do
primeiro centenário de funcionamento da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro.
135
Decreto n. 23.508 de 28 de novembro de 1933, que inverte a ordem das disciplinas e inclui
História Literária em seu programa. Contudo, “em termos gerais, não ocorreram mudanças
significativas entre a primeira e a segunda fase quanto aos saberes da formação do
bibliotecário” (CASTRO, 2002; p.28), visto que ainda se priorizava o ensino de uma cultura
geral em detrimento às técnicas de organização do conhecimento.
Por sua vez, em 1929, na cidade de São Paulo, outro curso de formação biblioteconômica se
inicia. Funcionando junto ao Colégio Mackenzie e seguindo as ideologias de Rubens Borba
de Moraes e Adelpha de Figueiredo que retornavam de uma temporada de estudos nos
Estados Unidos, o currículo deste novo curso tinha sua gênese vinculada a disciplinas como
Classificação, Catalogação, Referência e Organização de Documentos Informacionais.
Portanto, ao contrário do curso da Biblioteca Nacional, este seguiu orientações teórico-
práticas norte-americanas, priorizando o ensino de aspectos técnicos da organização de
bibliotecas.
Sendo denominado de modelo Deweyano e enfatizando o ensino de técnicas de tratamento da
informação aliada ao uso de um Sistema de Classificação do Conhecimento, o curso paulista
pretendia formar bibliotecários aptos a executarem todas as rotinas instrumentais necessárias à
circulação do conhecimento e da informação. Portanto, não pretendia dotar seus alunos dos
aparatos teóricos para intervirem na construção sócio-histórica do lugar onde estes se
inseriam, mas possibilitar que todo e qualquer usuário tivesse suas demandas informacionais
atendidas a partir da organização conveniente da biblioteca e dos serviços de informação por
ela oferecidos.
Sendo assim, neste modelo de formação bibliotecária o “projeto educacional era linear,
racional e positivista. As disciplinas eram trabalhadas a partir de um centro ideal, a
Organização e a Administração da Biblioteca, incorporando catalogação e classificação,
sendo complementado rigidamente pela Bibliografia e Referência”. (CHAGAS, 1996; p.9).
Tendo suas atividades encerradas em 1935, o curso do Colégio Mackenzie cedeu lugar a um
novo. Criado pela Prefeitura de São Paulo e baseando-se nas orientações curriculares do
precedente, este novo curso incorporou ao seu projeto pedagógico a disciplina História do
Livro. Contudo, é preciso salientar que a Prefeitura Paulista retirou seu apoio pouco tempo
após sua instalação. Para continuar existindo o curso anexou-se, no ano de 1940,
à Escola
136
Livre de Sociologia e Política daquele mesmo Estado, onde se firmou e expandiu sua duração
e conteúdo, sempre levando em consideração as orientações curriculares do modelo norte-
americano.
Avançando um pouco mais no tempo, percebemos que a década de 1940 ficou marcada por
mais uma reforma no curso da Biblioteca Nacional que, apoiado pelo Governo Federal e pela
Fundação Rockefeller, passou a ceder bolsas a alunos de outros estados, os quais, ao
regressarem às suas cidades natais, reorganizavam velhas bibliotecas ao mesmo tempo em que
criavam novas. Foi neste período, portanto, que os profissionais bibliotecários começaram a
se instalar em regiões distintas do país.
Projetada pela bibliotecária Heloisa Cabral da Rocha Werneck e executada por Cecília Roxo
Wagley e Josué Montello, esta nova reforma operou modificações de extrema relevância para
o ensino de Biblioteconomia no país. De acordo com DIAS (1955; p.10 apud CASTRO,
2000; p.28-29), “a sua finalidade era transformar o antigo curso de Biblioteconomia, que até
então se limitava a formar bibliotecários para atender às necessidades da instituição e para a
promoção de seu quadro de pessoal em curso destinado a capacitar bibliotecários para
qualquer tipo de biblioteca”.
Ou seja, a partir desta nova configuração, a ênfase curricular de preparação humanística cede
lugar a uma de ordem mais técnica, uniformizando os saberes bibliotecários e consolidando o
modelo pragmático de instrução norte-americana no país.
Destoando das orientações e necessidades clássicas de formação do bibliotecário por meio de
conceitos e métodos europeus, “o empréstimo de modelos curriculares americanos que
estivessem em harmonia com as intenções acima mencionadas não causam surpresa. As
teorias americanas inicialmente mais influentes no Brasil constituíam em combinações de
idéias tecnicistas e progressistas”. (MOREIRA, 1995; p.83 apud CASTRO, 2002; p.29).
Sendo assim, após a adoção desta nova estrutura curricular o antigo curso de Biblioteconomia
carioca passou a denominar-se, já em meados daquela mesma década, Curso da Biblioteca
Nacional (CBN), compreendendo três níveis distintos de formação, são eles:
137
1. Curso Fundamental de Biblioteconomia – CFB;
2. Curso Superior de Biblioteconomia – CSB;
3. Cursos Avulsos – CA.
Cada um destes respectivos níveis de formação possuía objetivos próprios e uma grade
curricular formada por disciplinas específicas. Amparados pelo estudo de CASTRO (2002;
p.29-30), podemos assim descrevê-los:
O Curso Fundamental de Biblioteconomia tinha por finalidade formar bibliotecários
auxiliares que, sob a orientação de profissionais mais graduados e experientes, executassem
serviços técnicos. Para tanto, seu currículo era composto por quatro disciplinas básicas, a
saber:
1.Bibliografia e Referência;
2.Catalogação e Classificação;
3.História do livro e das Bibliotecas;
4.Organização de Bibliotecas.
Por sua vez, o Curso Superior de Biblioteconomia objetivava formar mão-de-obra mais
qualificada para administrar, organizar, gerir e dirigir serviços técnicos referentes às rotinas
biblioteconômicas. Sua estrutura curricular, por ser mais densa e diversificada que a do
primeiro, era constituída por dois núcleos de disciplinas: as comuns, e por isso obrigatórias, e
as optativas.
O núcleo comum abrangia disciplinas técnicas como Organização e Administração de
Bibliotecas, Catalogação e Classificação. Possuía, ainda, uma vertente de cunho mais teórico,
encarnado pela disciplina História da Literatura. No que tange às disciplinas optativas, eram
oferecidas anualmente, em um único período e em número suficiente para atender às
necessidades de um ensino mais generalista e aos interesses humanísticos dos alunos. De
acordo com esta proposta, foram disponibilizadas as seguintes disciplinas:
1.Biblioteca de Música;
2.Bibliotecas Infantis e Escolares;
3.Bibliotecas Públicas, Especializadas e Universitárias;
138
4.Iconografia;
5.Mapotecas;
6.Noções de Paleografia e Catalogação de Manuscritos, Livros Raros e Preciosos;
7.Publicações Oficiais e Seriadas.
Portanto, o elenco de disciplinas acima apresentado nos permite apontar que, embora sofrendo
nítida influência do modelo de formação norte-americano, este currículo ainda conservava
alguns elementos do humanismo que caracterizou as origens da Biblioteconomia no país.
Sendo destinado a atualizar os conhecimentos dos profissionais já formados, os Cursos
Avulsos tinham por finalidade “divulgar conhecimentos sobre Biblioteconomia e promover a
homogeneidade básica dos serviços de biblioteca”. (NEVES, 1971; p.227 apud CASTRO,
2002; p.30). Estes cursos de atualização profissional marcaram, por sua vez, o início da
sistematização de um programa formal de educação continuada para os bibliotecários
brasileiros.
Neste sentido, se traçarmos mais um paralelo com a história da Biblioteconomia paulista,
veremos que a Escola Livre de Sociologia e Política, ao seguir os passos do curso carioca,
também reformulou sua estrutura curricular a fim de atender a todas as pessoas interessadas
em graduar-se nesta área do conhecimento.
Com isso, os pressupostos norteadores do processo de ensino-aprendizagem de ambos os
cursos buscaram, a partir daquele momento, treinar e habilitar seus alunos a participarem
ativamente da concepção, gestão e efetivação dos vários serviços que compõem as rotinas de
uma biblioteca. Ou seja, tanto o curso da Biblioteca Nacional quanto o da Escola Livre de
Sociologia e Política de São Paulo adotaram como base dos conhecimentos ministrados por
seus currículos cinco disciplinas básicas, são elas:
1. Bibliografia e Referência;
2. Catalogação;
3. Classificação;
4. História do Livro;
5. Organização e Administração de Bibliotecas.
139
Também neste período, ambos os cursos passaram a receber alunos oriundos de outros
Estados da Federação, política extremamente importante para a difusão da profissão em nível
nacional. Isto porque, ao se formarem, os novos bibliotecários regressavam para suas cidades
de origem e fundavam novos programas de ensino pautados na mesma organização e
fundamentos curriculares dos cursos originais.
Foi beneficiando-se deste contexto que importantes Escolas de Biblioteconomia iniciaram
suas atividades de ensino. Podemos citar os seguintes cursos como exemplo desta dinâmica:
1942 – Curso de Biblioteconomia da Escola de Biblioteconomia da Bahia – Salvador.
(O curso foi integrado à Universidade Federal da Bahia em 1958);
1944 – Curso de Biblioteconomia da Faculdade de Filosofia “Sedes Sapientae” – São
Paulo. (Este curso encerrou suas atividades em 1960);
1945 – Curso de Biblioteconomia da Faculdade de Biblioteconomia da Universidade
Católica de Campinas – Campinas;
1947 – Curso de Biblioteconomia e Documentação da Escola de Biblioteconomia e
Documentação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – Porto Alegre;
1948 – Curso de Biblioteconomia da Prefeitura Municipal de Recife – Recife. (Este
curso teve suas atividades encerradas em 1950, porém, neste mesmo ano foi reaberto e
incorporado à Universidade Federal do Recife);
1950 – Curso de Biblioteconomia da Escola de Biblioteconomia de Minas Gerais –
Belo Horizonte. (O Curso foi incorporado à Universidade Federal de Minas Gerais em
1963);
1952 – Curso de Biblioteconomia e Documentação da Universidade Federal do Paraná
– Curitiba;
1957 – Curso de Biblioteconomia e Documentação da Associação da Companhia
Santa Úrsula – Rio de Janeiro;
1959 – Curso de Biblioteconomia e Documentação da Escola de Biblioteconomia e
Documentação de São Carlos – São Carlos.
140
Outro importante movimento para a difusão da Biblioteconomia e para a construção de uma
base curricular sólida e coerente com as necessidades brasileiras se deu na década de 1950
com a criação do Instituto Brasileiro de Bibliografia e Documentação (IBBD) e a
implementação de uma proposta que visava modificar as disciplinas oferecidas pelos cursos
existentes. De acordo com CASTRO (2002; p.31), tais mudanças se deram por dois motivos:
“incorporar referenciais teóricos e práticos da documentação; e, formar um profissional
especializado no tratamento de informações técnico-científicas”. Neste contexto:
O Instituto Brasileiro de Bibliografia e Documentação procurava se firmar
no conjunto das indecisões políticas e sociais que marcaram a sociedade
brasileira nos anos 50 e 60. Buscava-se então adaptar o bibliotecário às
várias regras sociais impostas com o término da II Grande Guerra. É a era
da bibliografia, da documentação e, principalmente, da introdução da
informática no campo da Biblioteconomia. (CASTRO, 2004; p.43-44).
Difundindo definitivamente o modelo Deweyano no país, o IBBD buscou consolidar um
sistema de formação que oferecesse aos bibliotecários os recursos necessários para se
controlar a produção bibliográfica nacional, em especial a produção técnico-científica. Função
que requeria grande especialização e diferenciava as atividades de um bibliotecário
generalista do qualificado, do especializado.
Com a abertura de novos cursos e a criação do Instituto Brasileiro de Bibliografia e
Documentação, a década de 1950 ficou marcada, também, pelo nascimento de uma
inteligência bibliotecária responsável pela consolidação e difusão do habitus da
Biblioteconomia no Brasil. Fazem parte deste grupo nomes como: Adelpha de Figueiredo,
Lydia de Queiroz Sambaquy, Bernadete Senay Neves, Laura Russo, Etelvina Lima, Zila
Mamede, Rubens Borba de Moraes, Edson Nery da Fonseca e Antônio Caetano Dias.
Portanto, e tendo este conjunto de referências como elemento de sustentação, podemos
afirmar que os primeiros 50 anos em torno da construção de uma Biblioteconomia brasileira
foram amplamente marcados por uma intensa disputa entre currículos com características
eminentemente técnicas, e outros com disciplinas mais generalistas ou humanistas.
Porém, a preponderância do modelo de formação norte-americano já nos primeiros anos da
década de 1940 serve como indicativo de que os cursos de Biblioteconomia então existentes
compartilhavam dos pressupostos ideológicos que defendiam a instrumentalização técnica
141
como principal recurso para se promover o desenvolvimento político, econômico e social
brasileiro.
É importante ressaltar, ainda, que muitos destes pressupostos ideológicos encontraram
respaldo teórico no pensamento que caracterizou a vertente educacional conhecida pelo nome
de “Escola Nova”. Para este movimento, muito influente nos anos de 1920 e 1930, a educação
se convertia, especialmente em sua dimensão técnica, na base para a:
Disseminação de valores e normas sociais em sintonia com os apelos da
nova sociedade moderna, constituída a partir dos preceitos do trabalho
produtivo e eficiente, da velocidade das transformações, da interiorização
de normas de comportamento otimizados em termos de tempos e
movimentos e da valorização da perspectiva da psicologia experimental
na compreensão “científica” do humano, tomado na dimensão individual.
(VIDAL, 2000; p.498).
Ao apropriar-se da discussão internacional sobre educação, preponderantemente através da
literatura americana, os “Pioneiros da Escola Nova” objetivavam estender para todo o
território nacional as condições materiais e técnicas da escola de massas, “desafio que
associava as largas dimensões do Brasil à sua diversidade cultural e populacional”. (VIDAL,
2000; p.514).
Neste cenário, ao pretender formar uma mão-de-obra capaz de contribuir para o projeto de um
país independente, a Biblioteconomia que aqui se institui reforçou, em suas primeiras décadas
de atividade, a tese de que a biblioteca é um organismo de extrema importância para a
construção das muitas paisagens históricas. No entanto, a base de seu argumento era que tal
condição só seria alcançada através da difusão de rígidos padrões técnicos em torno da
execução das rotinas de captação, organização, preservação e disseminação da informação.
Sendo assim, preocupados com os rumos que a formação bibliotecária havia tomado, uma
parcela dos representantes dos cursos brasileiros institui comissões com o objetivo de discutir,
desenvolver e implementar um plano de Currículo Mínimo capaz de outorgar coerência à área
enquanto campo do conhecimento, bem como possibilitar a conquista de um espaço mais
amplo pela Biblioteconomia nacional. A partir de então, mais especificamente de 1960 em
diante, os cursos dão início à busca por tentar equalizar a dimensão técnica de seus currículos
142
com a vertente cultural que por longa data demarcou a atuação social das bibliotecas e dos
bibliotecários, bem como vinculá-los ao sistema de ensino universitário.
5.3.2. De 1960 a 1990
A partir do exposto acima, verifica-se que até 1960 cada curso ou escola de Biblioteconomia
era independente para determinar o segmento teórico-prático que seu programa curricular
deveria seguir, tendo-se em vista atender às necessidades de mão-de-obra específica para
determinados setores da sociedade brasileira.
Contudo, a partir de 1960, mais especificamente de 1962, este padrão educacional passou a
ser duramente criticado. Advindas tanto daqueles que defendiam um modelo de formação
tecnicista, quanto da ala que priorizava uma formação com características humanistas para os
bibliotecários, tais críticas evidenciavam que a falta de uma uniformidade curricular que
promovesse o “estabelecimento de um Currículo Mínimo no Brasil, antes dos anos 60, estava
na ausência de uma unidade de ponto de vista entre as escolas de Biblioteconomia, isto é, não
havia clareza sobre quais os saberes a serem incorporados nesse currículo”. (CASTRO, 2002;
p.33).
No entanto, torna-se necessário salientar que tais inquietações já haviam sim sido expostas
anos antes do período acima apresentado. Isto porque, as primeiras propostas com o objetivo
de implementar um Currículo Mínimo capaz de nortear os projetos político-pedagógicos dos
cursos de Biblioteconomia brasileiros emergiram no ano de 1954, durante o Primeiro
Congresso de Biblioteconomia realizado na cidade do Recife.
De acordo com este primeiro modelo, que mais uma vez deu voz à querela entre tecnicismo e
humanismo, o currículo básico dos cursos de Biblioteconomia deveria comportar dois níveis
de disciplinas: as profissionais e as não profissionais. Desta forma, foram incluídas na
primeira categoria as seguintes disciplinas:
Bibliografia e Referência;
Catalogação e Classificação Especializada;
Catalogação;
143
Classificação;
História dos Livros e das Bibliotecas;
Organização e Administração de Bibliotecas;
Técnicas de Documentação.
Por sua vez, mesmo sendo alvo de divergências entre os diretores das escolas que não as
consideravam como importantes para a formação do bibliotecário, foram selecionas como
disciplinas não profissionais:
Ciência Filosófica;
História da Literatura ou Bibliografia Literária;
Introdução à Cultura Histórica, Literária, Artística e Científica;
Seleção e Orientação de Leitores.
Se efetuarmos uma análise atenta deste conjunto de 11 disciplinas arroladas, notaremos que já
nesta primeira proposta de conformação curricular evidencia-se uma tendência que se fará
presente em todas as discussões posteriores: uma supervalorização dos conteúdos das
disciplinas técnicas e uma conseqüente desvalorização da vertente cultural. Vertente que
apresentava-se, em ampla medida, “como apanhados pretensamente enciclopédicos de temas
que certamente poderiam ser abordados em função das atividades profissionais do
bibliotecário”. (NASTRI, 1992; p.85).
Avançando no tempo, e tendo por base o respaldo do Artigo 1º da Lei 4084 de junho de 1962
e o Artigo 60 da Lei de Diretrizes da Educação Nacional, Dumerval Trigueiro Mendes, então
Diretor de Ensino Superior, formou uma comissão de especialistas em Biblioteconomia com o
intuito de elaborar uma proposta de Currículo Mínimo que deveria ser encaminhada ao
conselho Federal de Educação para análise. Constituíram esta Comissão: Edson Nery da
Fonseca, Abner Lellis Vicentini, Nancy Wesfallen Correa, Cordélia de Cavalcanti, Sueli
Bradbeck e Zilda Galhardo de Araújo.
Com o término das atividades, a comissão propôs que o ensino de Biblioteconomia fosse
ministrado nas universidades em três níveis distintos e complementares de formação: Curso
de Graduação; Curso de Pós-Graduação e Curso de Doutorado. Decidiu-se, ainda, que:
144
O Curso de Graduação deveria ter a duração de três anos e destinava-se a
formar bibliotecários e documentalistas. Os critérios de ingresso,
mediante concurso de habilitação, seriam exames de Língua Portuguesa,
Literatura Brasileira e Portuguesa, História Geral e do Brasil, Língua
Inglesa e outras disciplinas a serem escolhidas entre o Francês, o Alemão
e o Italiano. (CASTRO, 2002; p.34).
Estipulou-se também que o Curso de Graduação deveria abarcar as seguintes disciplinas:
Armazenagem e Recuperação de Informações;
Bibliografia;
Catalogação;
Documentação;
História da Arte;
História da Ciência e da Tecnologia;
História da Literatura;
História do Livro e das Bibliotecas;
Introdução à Filosofia;
Introdução às Ciências Sociais;
Literatura;
Organização e Administração de Bibliotecas;
Pesquisa Bibliográfica;
Recuperação de Documentos;
Seleção de livros;
Serviços de Documentação;
Técnicas de Indexação e Resumos;
Teoria da Informação e Cibernética.
Por sua vez, definiu-se que o Curso de Pós-Graduação em Biblioteconomia deveria abranger
quatro áreas específicas, são elas:
1. Bibliografia;
2. Bibliotecas Especializadas e Didáticas;
3. Bibliotecas Infanto-Juvenis;
4. Documentação.
145
Com relação ao grau de Doutor em Biblioteconomia, determinou-se que este seria conferido
àquele que concluísse o Curso de Doutorado, devendo o mesmo produzir e defender
publicamente uma tese, de acordo com as formalidades legais.
Acordadas todas estas especificações, o primeiro Currículo Mínimo Obrigatório para os
cursos de Biblioteconomia foi estabelecido pelo Conselho Federal de Educação através da
Resolução de 16 de novembro de 1962. Por sua vez, o parecer em que se fundou a Resolução
ficou a cargo do Conselheiro Josué Montello e passou a ser conhecido como Parecer n. 326 /
62, através do qual se instituiu que:
Artigo 1: O Currículo Mínimo do Curso de Biblioteconomia compreenderá as seguintes
matérias:
Bibliografia e Referência;
Catalogação e Classificação;
Documentação;
Evolução do Pensamento Filosófico e Científico;
História da Arte;
História da Literatura;
História do Livro;
Introdução aos Estudos Históricos;
Organização e Administração de Bibliotecas;
Paleografia.
Artigo 2: A duração do curso será de três anos letivos;
Artigo 3: É obrigatória a observância dos Artigos 1 e 2 a partir do ano letivo de 1963.
A promulgação deste primeiro Currículo Mínimo Obrigatório visava, entre outros objetivos:
Atender às necessidades do “mercado biblioteconômico ascendente”, ao
aumento da produção científica brasileira, que requeria organização e
controle, e às técnicas biblioteconômicas que eram o canal privilegiado
para isso, justificando a inclusão de disciplinas como Catalogação,
Classificação e Bibliografia. É evidente que, para não configurar a
formação do bibliotecário como exclusivamente técnica, foram
incorporadas algumas disciplinas culturais, panorama que atendeu, em
146
parte, às reivindicações das escolas e associações de classes. (CASTRO,
2002; p.36).
Com a aprovação deste Currículo Mínimo Obrigatório, a classe bibliotecária almejava
padronizar não apenas o ensino, mas também suas atividades mediante a especialização dos
conteúdos que melhoravam a qualidade da execução das rotinas biblioteconômicas. Para
tanto, e com o objetivo de minimizar as diferenças de projetos pedagógicos existentes entre os
vários cursos de formação do país, a Diretoria de Ensino Superior do MEC, através da
Portaria n. 28 de 31 de janeiro de 1967, instituiu uma nova comissão formada por influentes
especialistas da área com a atribuição de diagnosticar as situações das escolas e as possíveis
melhorias em seus sistemas de ensino.
Esta Comissão de Especialistas de Ensino em Biblioteconomia (CEEB) foi composta por:
Edson Nery da Fonseca, professor da Universidade de Brasília; Maria Martha de Carvalho,
professora da Universidade Federal de Minas Gerais; Laura Garcia Moreno Russo, presidente
do Conselho Regional de Biblioteconomia de São Paulo; Lydia de Queiroz Sambaquy,
professora do curso da Biblioteca Nacional; Maria Lectícia de Andrade Lima, professora da
Universidade Federal de Pernambuco e Zenaira Garcia Márquez, professora da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul.
Como resultado, estabeleceu-se que para se instituir modelos uniformes de formação entre as
diversas escolas do país, as dimensões geográficas deveriam ser levadas em conta. Neste
sentido, o mais adequado seria fixar padrões mínimos e máximos de disciplinas, adotando as
disponibilidades financeiras de cada instituição de ensino como prerrogativa.
Estas e outras importantes questões foram retomadas no Seminário de Ensino de
Biblioteconomia no Brasil, promovido pela Associação Brasileira de Ensino de
Biblioteconomia e Documentação e sediado pela Escola de Biblioteconomia da Universidade
Federal de Minas Gerais em 1968. Tendo como objetivo principal avaliar o ensino brasileiro
de Biblioteconomia e adequá-lo à reforma do Ensino Superior, os participantes do referido
encontro discutiram três temáticas consideradas prioritárias para a atualização dos
fundamentos educacionais que caracterizavam a formação dos bibliotecários brasileiros até
aquele momento, são elas:
147
1.Pesquisa em Biblioteconomia;
2.Currículo e Duração dos Cursos;
3.Pós-Graduação e Biblioteconomia.
Naquilo que se refere ao Currículo e à Duração dos Cursos, os relatores do referido seminário
indicaram que quaisquer mudanças a serem realizadas deveriam aguardar a Reforma
Universitária de 1968 que, conseqüentemente, alcançaria a Biblioteconomia.
Com relação às disciplinas curriculares, os participantes recomendaram ao Conselho Federal
de Educação os seguintes itens:
A. Desdobramento da disciplina Introdução aos Estudos Históricos e Sociais em
Introdução aos Estudos Históricos e Introdução aos Estudos Sociais;
B. Desdobramento da disciplina Evolução do Pensamento Filosófico e Científico em
História da Ciência e História da Filosofia;
C. Desdobramento da disciplina Bibliografia e Referência em duas. O mesmo deveria
ocorrer com as disciplinas Catalogação e Classificação;
D. Supressão da disciplina Paleografia como matéria autônoma e sugestão da inclusão de
seu conteúdo na disciplina Introdução aos Estudos Históricos.
Com isso, o panorama histórico até aqui apresentado nos permite apreender que:
O Currículo Mínimo de 1962, apesar de constituir-se em um marco
significativo para a Biblioteconomia, bem como fator decisivo para a
obtenção do reconhecimento da profissão em nível universitário, não
chegou a satisfazer os professores e às exigências dos avanços
tecnológicos, sociais e educacionais da época. Seu elenco de disciplinas
não permitia um entendimento claro, talvez porque sua elaboração não
tenha tomado por base os pressupostos essenciais que deveriam ser
considerados para a apreciação de um Currículo Mínimo. (CASTRO,
2002; p.43).
Foi a partir desta constatação, e dando continuidade às atividades em prol da elaboração de
um Currículo Mínimo adequado às exigências biblioteconômicas nacionais que se processou,
ainda na década de 60, mais precisamente em 1967, a criação da Associação Brasileira de
148
Ensino de Biblioteconomia e Documentação (ABEBD), em São Paulo. Entidade de classe
destinada à:
Congregar o corpo docente dos cursos de Biblioteconomia, criando uma
comunidade empenhada em buscar soluções de seus problemas, em
atualizar os currículos plenos adotados nas várias escolas e em promover
permanentemente o aperfeiçoamento dos professores desta área.
(CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, 1983, p.139 apud NASTRI,
1992; p.85).
Torna-se importante destacar, também, que em paralelo ao efervescente cenário de discussões
em torno do estabelecimento de uma base comum de conhecimentos através da aprovação de
um Currículo Mínimo, a Biblioteconomia brasileira viu surgir, durante toda a década de 1960
e 1970, importantes cursos de formação bibliotecária. Dentre eles, merecem destaque:
1963 – Curso de Biblioteconomia da Faculdade de Biblioteconomia da Universidade
de Brasília – Brasília;
1963 – Curso de Biblioteconomia da Universidade Federal Fluminense – Niterói;
1963 – Curso de Biblioteconomia da Universidade Federal do Pará – Belém;
1964 – Curso de Biblioteconomia e Documentação da Universidade Federal do Ceará
– Fortaleza;
1966 – Curso de Biblioteconomia e Documentação do Departamento de
Biblioteconomia e Documentação da Escola de Comunicações e Artes da
Universidade de São Paulo – São Paulo;
1966 – Curso de Biblioteconomia da Universidade Federal do Amazonas – Manaus;
1967 – Curso de Biblioteconomia da Escola de Biblioteconomia da Fundação de
Ensino Superior do Oeste de Minas – Formiga;
1969 – Curso de Biblioteconomia da Universidade Federal da Paraíba – João Pessoa;
1969 – Curso de Biblioteconomia da Fundação Universitária do Maranhão – São Luiz;
1972 – Curso de Biblioteconomia do Departamento de Biblioteconomia da Fundação
Universidade Estadual de Londrina – Londrina;
149
1974 – Curso de Biblioteconomia e Documentação da Universidade Federal de Santa
Catarina – Florianópolis;
1974 – Curso de Biblioteconomia e Documentação da Universidade Federal do
Espírito Santo – Vitória;
1974 – Curso de Biblioteconomia da Universidade para o Desenvolvimento do Estado
de Santa Catarina – Florianópolis;
1974 – Curso de Biblioteconomia da Fundação Universidade do Rio Grande do Sul –
Rio Grande;
1975 – Curso de Biblioteconomia e Documentação da Faculdade de Biblioteconomia e
Documentação Teresa D’Ávila – Lorena;
1977 – Curso de Biblioteconomia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de
Catanduva – Catanduva;
1977 – Curso de Biblioteconomia e Documentação da Universidade Estadual Paulista
Júlio de Mesquita Filho – Marília.
Aliando-se à expansão das escolas de formação de bibliotecários no decorrer das décadas de
1960 e 1970, o surgimento dos primeiros periódicos especializados na área e a implementação
dos primeiros cursos de mestrado no país fizeram emergir novas discussões acerca dos
conteúdos curriculares ministrados e de uma possível reconfiguração do Currículo Mínimo
Obrigatório instituído em 1962.
Mesmo pautadas por uma intensa atuação da recém criada Associação Brasileira de Ensino de
Biblioteconomia e Documentação – ABEBD, o cerne desta nova fase de discussões ainda
permaneceu o mesmo, ou seja: o conteúdo dos programas dos cursos, seus métodos de ensino,
a carga horária excessiva para as disciplinas técnicas, o desenvolvimento das disciplinas
culturais, além dos aspectos sociais envolvidos na formação do profissional bibliotecário.
Em meio a este contexto em permanente ebulição, o ano de 1981 ficou marcado pelo trabalho
de um grupo liderado pelo então presidente da ABEBD e composto por uma comissão de
professores da UFMG, USP, UFPb, UFPr, UNB, IBICT, além de assessores técnicos da
Secretaria de Ensino Superior (SESU / MEC), que apresentou ao Conselho Federal de
150
Educação uma proposta de reformulação da primeira versão do Currículo Mínimo Obrigatório
de Biblioteconomia instituído em 1962. De acordo com GUIMARÃES:
A referida proposta serviu de gênese para o teor da Resolução 8 / 82 do
Conselho Federal de Educação, que aprovava o novo Currículo Mínimo
de Biblioteconomia a partir da qual o curso passava dos até então três
anos de duração para uma carga horária mínima de 2.500 horas (mais 10
% de estágio obrigatório) a ser cumprida no decorrer de oito semestres.
(GUIMARÃES, 2002; p.54).
Edificando-se no período de redemocratização civil, onde a informação adquire o status de
elemento indispensável à construção das várias esferas sociais humanas, este novo Currículo
Mínimo Obrigatório procurou, em maior medida, estabelecer um equilíbrio entre a concepção
humanista difundida pela tradição francesa e a concepção tecnicista de orientação norte-
americana.
Preocupando-se, ainda, com o crescente uso das tecnologias da informação e da comunicação,
bem como com a abertura de novos mercados de trabalho para os bibliotecários, o Currículo
Mínimo de 1982 adotou como proposição básica a interdisciplinaridade, conceito que
objetivava responder satisfatoriamente às transformações sócio-culturais eminentes na época.
Para tanto, sua organização básica foi pensada a partir de três matérias principais, com suas
respectivas subdivisões em disciplinas de caráter prático ou teórico, são elas:
1. Matérias de Fundamentação Geral
Aspectos sociais, políticos e econômicos do Brasil contemporâneo;
Comunicação;
História da Arte;
História da Cultura;
Iconografia;
Paleografia.
2. Matérias Instrumentais
Língua Estrangeira Moderna;
Língua Portuguesa e Literatura de Língua Portuguesa;
151
Lógica;
Métodos e Técnicas de Pesquisa.
3. Matérias de Formação Profissional
Administração de Bibliotecas;
Bibliografia;
Catalogação;
Classificação;
Controle Bibliográfico dos Registros do Conhecimento;
Disseminação da Informação;
Formação e Desenvolvimento de Coleções;
Informação Aplicada à Biblioteconomia;
Produção dos Registros do Conhecimento;
Referência.
A partir deste momento, e seguindo as recomendações advindas da promulgação legal do
novo Currículo Mínimo, todos os cursos de formação de bibliotecários do país passaram a
constituir seus Currículos Plenos tendo por base a estrutura acima apresentada. Contudo,
todos eles eram livres para atualizá-los, por meio de outras disciplinas (obrigatórias ou
optativas), de acordo com as necessidades locais.
Porém, trazendo à tona a necessidade de se avaliar as conseqüências da implementação do
novo Currículo Mínimo, bem como sua operacionalização junto às escolas de
Biblioteconomia de todo o país por meio dos diferentes Currículos Plenos concebidos, a
ABEBD promoveu em Recife, em fevereiro de 1986, o I Encontro Nacional de Ensino de
Biblioteconomia e Ciência da Informação – ENEBCI.
Contando com quatro frentes de discussões (corpo docente, ensino de graduação, ensino de
pós-graduação e pesquisa), o evento atribuiu maior relevância às atividades que enfocavam
questões relacionadas à elaboração das grades curriculares. Razão pela qual o foco do
encontro recaiu sobre a normalização das terminologias e a distribuição da carga horária das
disciplinas adotadas por cada curso do país.
152
Dando continuidade ao exercício das atividades para as quais foi criada, a ABEBD promoveu
em Brasília, em meados de junho de 1989, o II Encontro Nacional de Ensino de
Biblioteconomia e Ciência da Informação visando discutir as conseqüências advindas da
implantação do Currículo Mínimo de 1982. Desta vez, as atividades tiveram como parâmetros
norteadores três aspectos fundamentais: o estágio curricular, a evasão escolar e o mercado de
trabalho. Ao fim das discussões, destacou-se que:
O referido evento teve resultados altamente positivos, pois, além de
propiciar uma integração entre ensino de graduação e de pós-graduação
na área (visto que nos dias subseqüentes realizou-se o Encontro Nacional
de Cursos de Pós-Graduação em Ciência da Informação e a criação da
Associação Nacional de Ciência da Informação e Biblioteconomia –
ANCIB), permitiu que se chegasse a algumas ações de histórica
importância para a área. (GUIMARÃES, 2002; p.57).
As ações históricas das quais nos fala o autor acima citado foram:
A. A criação, por parte da ABEBD, de quatro Grupos Regionais de Estudos Curriculares
visando realizar pesquisas comparativas entre os Currículos Plenos das escolas no âmbito
de cada estado, organizar reuniões periódicas de estudos referentes às experiências e
perspectivas de compatibilização curricular nas diferentes regiões e integrar os educadores
em um trabalho de avaliação curricular permanente;
B. A criação dos Seminários Nacionais de Avaliação Curricular que deveriam ser
realizados em sessões paralelas aos Congressos Brasileiros de Biblioteconomia e
Documentação, servindo como espaço natural para a apresentação e discussão dos
resultados alcançados através dos estudos curriculares levados a cabo pelos Grupos
Regionais.
Torna-se necessário enfatizar que além das duas ações acima mencionadas, o referido evento
destacou, ainda, outras importantes estratégias voltadas para a questão da padronização
curricular. Dentre elas, merecem destaque:
1. A realização de um estudo comparativo entre os diversos Currículos Plenos existentes
no país, com o objetivo de analisar a adequação do novo Currículo Mínimo a partir de
153
aspectos relacionados ao perfil de profissional bibliotecário necessário ao mercado de
trabalho atual e futuro;
2. Promover a proporcionalidade na divisão da carga horária entre as disciplinas de
fundamentação geral, instrumentais e profissionalizantes;
3. Realizar encontros temáticos por disciplinas voltados para o intercâmbio de idéias,
material didático-pedagógico e incentivo à divulgação de novas estratégias e metodologias
de ensino;
4. Criar um banco de dados contendo os programa das disciplinas, estudos de casos e
relatos de experiências usadas nos cursos.
Foi, portanto, a partir deste II ENEBCI que os Grupos Regionais deram início a uma série de
estudos comparativos dos Currículos Plenos adotados pelas várias escolas de Biblioteconomia
do país. Este conjunto de estudos teve como finalidade equalizar os conteúdos ministrados
pelos vários cursos brasileiros e adequá-los às muitas diferenças regionais e mercadológicas
existentes.
Sendo assim, e como recurso para melhor visualização dos principais pontos que marcaram a
evolução histórica dos esforços em torno da equalização dos conhecimentos ministrados pelos
cursos de Biblioteconomia brasileiros, inserimos aqui um conjunto de tabelas contendo as
várias propostas curriculares que se edificaram ao longo dos dois períodos acima abordados.
154
TABELA 2 – Parte 1: Currículos e Propostas Curriculares de Biblioteconomia no
Brasil: 1911 – 1982
Biblioteca Nacional Mackenzie Departamento
de Cultura de
São Paulo
1915 (1 ano) 1931 (2 anos) 1944 1962 1929 – 1931 1936 – 1937
Bibliografia;
Paleografia;
Diplomática;
Numismática.
História Literária
com aplicação à
Bibliografia;
Iconografia e
Cartografia;
Bibliografia;
Paleografia;
Diplomática.
Organização e
Administração de
Bibliotecas;
Catalogação;
Classificação;
Bibliografia e
Referência;
História dos
Livros e das
Bibliotecas;
História da
Literatura
aplicada à
Bibliografia;
Noções de
Paleografia;
Cursos Avulsos.
Técnicas de
Referência;
Bibliografia
Geral;
Catalogação e
Classificação;
Organização e
Administração de
Bibliotecas;
Organização e
Técnicas de
Documentação;
Literatura e
Bibliografia
Literária;
Introdução à
Cultura Histórica
e Sociológica;
Reprodução de
Documentos;
Paleografia;
Introdução à
Cultura Filosófica
e Artística.
Catalogação;
Classificação;
Referência.
Catalogação;
Classificação;
Referência.
Fonte: CASTRO, César. Currículos e propostas curriculares de Biblioteconomia no Brasil: 1911 – 1982, p.325.
Apud VALENTIM, 2000; p.13.
155
TABELA 2 – Parte 2: Currículos e Propostas Curriculares de Biblioteconomia no
Brasil: 1911 – 1982
Escola Livre da Sociologia e Política 1º Projeto de
Currículo Mínimo
1º Currículo
Mínimo (3 anos)
1938 1940 1944 1956 1962
Catalogação;
Classificação;
Referência;
História do Livro
e das Bibliotecas.
Catalogação;
Classificação;
História do Livro e
das Bibliotecas;
Organização e
Administração de
Bibliotecas.
Catalogação;
Classificação;
Referência;
História dos Livros e
das Bibliotecas;
Organização e
Administração de
Bibliotecas.
Bibliografia;
Classificação;
Catalogação;
História do Livro e das
Bibliotecas;
Referência;
Documentação;
História da Arte;
História da Ciência e da
Tecnologia;
História da Literatura;
Introdução à Filosofia;
Introdução às Ciências
Sociais;
Organização e
Administração de
Bibliotecas;
Serviços de
Documentação;
Seleção de Livros.
História dos Livros e
das Bibliotecas;
História da Literatura;
História da Arte;
Introdução aos
Estudos Históricos e
Sociais;
Evolução do
Pensamento Filosófico
e Científico;
Organização e
Administração de
Bibliotecas;
Catalogação e
Classificação;
Bibliografia e
Referência;
Documentação;
Paleografia.
Fonte: CASTRO, César. Currículos e propostas curriculares de Biblioteconomia no Brasil: 1911 – 1982, p.325.
Apud VALENTIM, 2000; p.14.
156
TABELA 2 – Parte 3: Currículos e Propostas Curriculares de Biblioteconomia no
Brasil: 1911 – 1982
Proposta de Mudança
Curricular – ABEBD
Proposta de Mudança
Curricular – ABEBD (3 anos)
2º Currículo Mínimo
1976 1977 1982
Formação Social da Biblioteca;
Estudo de Usuário;
Planejamento e Administração de
Sistemas de Informação;
Fontes de Informação;
Seleção e Aquisição;
Organização da Informação;
Recuperação e Disseminação da
Informação.
Catalogação;
Classificação;
Planejamento e Administração de
Bibliotecas;
Seleção e Aquisição;
Documentação;
Introdução à Biblioteconomia;
História do Livro e das
Bibliotecas;
Introdução à Filosofia;
História da Arte;
Introdução aos Estudos Históricos;
História da Literatura;
Biblioteca Referencial.
Comunicação;
Aspectos Sociais, Políticos e
Econômicos do Brasil
Contemporâneo;
História da Cultura;
Lógica;
Língua e Literatura Portuguesa;
Métodos e Técnicas de Pesquisa;
Informação Aplicada à
Biblioteconomia;
Formação e Desenvolvimento de
Coleções;
Controle Bibliográfico dos
Registros do Conhecimento;
Disseminação da Informação;
Administração de Bibliotecas.
Fonte: CASTRO, César. Currículos e propostas curriculares de Biblioteconomia no Brasil: 1911 – 1982, p.325.
Apud VALENTIM, 2000; p.14.
157
TABELA 3 – Proposta de Diretrizes Curriculares – MEC / BRASIL para a Área de
Ciência da Informação
Matérias Comuns para a Área de Ciência da
Informação
Matérias Específicas para a Área de
Biblioteconomia
A construção do Conhecimento
Epistemologia;
Metodologia da Pesquisa;
Heurística;
O Estatuto do Documento
Produção de evidência versus atribuição de sentido;
A informação orgânica e a inorgânica;
As unidades físicas de referência: documento, peça,
série, coleção, arquivo e acervo (cartorial e operacional);
As unidades intelectuais de referência: assunto e função;
O documento como indício, prova e testemunho.
O fluxo documental: da gênese ao acesso
Produtores e usuários da informação (mediações e
interfaces);
A contextualização como ferramenta;
Seleção / Avaliação;
Representação e comutação: polissemia e monossemia.
As Instituições
Funções pragmáticas, cognitivas, estéticas e vivenciais;
Gestão, custódia; conservação, depósito legal e
curadoria;
Patrimônio, memória, herança, cultura.
Fundamentos Teóricos da Biblioteconomia
História das Bibliotecas e da Biblioteconomia;
O papel e a missão do bibliotecário na sociedade;
As etapas de geração, tratamento, difusão, recepção e
uso da informação;
As interfaces da Biblioteconomia com as demais
ciências;
Bases legais e éticas da profissão.
Organização e Tratamento da Informação
Descrição física e temática da informação e do
conhecimento;
Aplicação de códigos, normas e formatos disponíveis;
Uso da informática nos serviços de informação;
Desenvolvimento e gestão de bancos de dados, bases
de dados e bibliotecas digitais;
Metodologia de análise e avaliação de sistemas de
informação.
Recursos e Serviços de Informação
Fundamentos, princípios, processos e instrumentos do
serviço de referência: seleção, aquisição, avaliação,
descarte, preservação, conservação e restauração de
recursos informacionais;
Normas para desenvolvimento de coleções;
Fontes de informação impressas, eletrônicas e digitais:
conceitos, tipologias, acesso, utilização e avaliação;
Estudo e educação de usuários;
A indústria da informação: geração, produção e
comercialização de documentos, fontes e serviços de
informação.
Serviços de referência e informação;
Serviços de extensão e ação cultural.
Gestão de Unidades e Serviços de Informação
Princípios e evolução da Administração e da teoria
organizacional;
Funções da Administração: planejamento, organização,
execução, controle, mensuração e avaliação;
Gestão de marketing, de recursos humanos, de
recursos financeiros, de recursos físicos, de produção e
materiais;
Qualidade aplicada ao contexto das unidades e
serviços de informação.
Fonte: CASTRO, César. Currículos e propostas curriculares de Biblioteconomia no Brasil: 1911 – 1982, p.325.
Apud VALENTIM, 2000; p.15.
158
Este conjunto de tabelas, aliadas aos vários acontecimentos históricos até aqui mencionados,
nos permite indicar que a Biblioteconomia brasileira ficou profundamente marcada, no
período acima compreendido, por uma intensa busca pelo reconhecimento legal da profissão
através da consolidação de algumas propostas em torno da padronização dos conteúdos
ministrados em cada uma das disciplinas oferecidas pelas várias instituições de ensino que se
criam, bem como pela institucionalização e permanente avaliação de seus Currículos
Mínimos.
Características que se acentuam após a criação da ABEBD, órgão destinado a promover o
estabelecimento, avaliação e atualização dos Currículos Mínimos da área de Biblioteconomia.
Realidade que se torna mais efervescente após o aparecimento das primeiras revistas
especializadas na área, da emergência das tecnologias da informação e da comunicação –
TICs, do novo papel social atribuído à informação e da implementação dos cursos de
mestrado e doutorado em Biblioteconomia e Ciência da Informação.
No entanto, é preciso salientar que o ensino de Biblioteconomia brasileiro ainda apresentava
alguns pontos críticos a serem debatidos para se alcançar uma formação profissional mais
adequada face às necessidades mercadológicas, culturais, políticas e sociais que começam a
surgir já nos primeiros anos da década de 1990.
5.3.3. De 1990 a 2005
Com o desenvolvimento da internet e o barateamento do acesso às tecnologias da informação
e da comunicação, o início da década de 1990 ficou marcado pela necessidade de se constituir
um novo perfil de atuação profissional para os bibliotecários. O objetivo agora era dotá-los
das habilidades e competências que o recente mercado informacional passou a exigir.
Buscando atribuir uma resposta satisfatória ao conjunto de transformações que demarcam este
período, realiza-se na cidade de São Paulo, em agosto de 1992, o III Encontro Nacional de
Ensino de Biblioteconomia e Ciência da Informação (ENEBCI). Adotando como tema
principal a Capacitação Docente em Biblioteconomia, este evento discutiu questões ligadas à
atuação dos docentes da área em três aspectos básicos: sua capacitação, sua prática
159
pedagógica e a interface currículo / política educacional. Contudo, o aspecto positivo
alcançado pelo encontro ligou-se à:
Discussão curricular em um contexto mais amplo, na qual aspectos como
a inserção dos conteúdos em um projeto político-pedagógico maior, que
refletisse a ambiência do curso e o profissional por ele almejado, assim
como as necessidades de capacitação docente para tal, puderam ser mais
especificamente trabalhados. (GUIMARÃES, 2002; p.59).
Ainda sob influência direta do evento acima mencionado, e dando continuidade às suas
atribuições históricas, a Associação Brasileira de Ensino de Biblioteconomia e Documentação
(ABEDB) deu início a um projeto nacional denominado Ensino de Biblioteconomia no Brasil:
perspectivas de desenvolvimento integrado para o terceiro milênio. Graças a tal projeto,
integralmente financiado pelo CNPq, tornou-se possível realizar reuniões nacionais de
professores em cada uma das matérias de formação profissional incluídas no Currículo
Mínimo de 1982 com o intuito de elaborar recomendações específicas para os conteúdos e
procedimentos pedagógicos indicados à cada curso do país.
Contudo, a partir de 1994, e em virtude das influências advindas do Special Intererest Group
on Modern Information Professional da Federação Internacional de Informação e
Documentação – (MIP / FID), criado em 1991, uma nova tendência passou a nortear as
discussões acerca da reformulação curricular exigida à área de Biblioteconomia.
Focando-se neste novo direcionamento, cuja questão central tornou-se o perfil profissional a
ser alcançado pelos cursos de modo a atender às demandas exigidas pela sociedade em
relação ao Bibliotecário, a ABEBD promoveu em São Paulo, em agosto de 1995, o IV
ENEBCI. No entanto, foi no ano de 1996 que se processou as alterações mais importantes em
torno de uma reforma curricular para a área de Biblioteconomia pós 1982. Isto porque, foi
naquele momento que dois importantes acontecimentos históricos diretamente relacionados a
este cenário se consolidaram, são eles:
1. A promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB (Lei
9394/96), que trouxe à baila uma concepção curricular mais flexível, voltada para as
diferentes realidades sócio-culturais e mercadológicas do país e mais centrada nas
competências e habilidades esperadas dos egressos;
160
2. A inserção da ABEBD no âmbito do Plano para o Desenvolvimento Educativo
Regional dos Países do MERCOSUL. Aspecto que, por sua vez, culminou com a
realização do I Encontro de Dirigentes de Escolas Universitárias de Biblioteconomia
do Mercosul, na cidade de Porto Alegre, em setembro de 1996. Evento que teve como
principal objetivo elaborar uma proposta de harmonização curricular para os cursos de
Biblioteconomia da região acima assinalada.
Naquilo que tange especificamente à LDB, vale ressaltar que:
O referido diploma legal, ao dispor, em seus artigos 43 a 57, sobre o
ensino superior, trouxe novas perspectivas (e preocupações) às
instituições de ensino superior da área, visto preconizar uma concepção de
ensino baseada em princípios como flexibilidade curricular, integração
graduação / pós-graduação, integração universidade / comunidade,
desenvolvimento de projetos políticos pedagógicos como base para a ação
educativa e avaliação global do processo formativo, entre outros.
(GUIMARÃES, 2002; p.61-62).
Portanto, ao substituir a noção de Currículo Mínimo pela idéia de Diretrizes Curriculares, a
Lei de Diretrizes e Bases da Educação introduziu uma revolução nos estudos curriculares,
visto esta nova perspectiva não conceber os conteúdos curriculares isoladamente, mas como
elementos a serem constituídos de acordo com as especificidades de cada instituição de
Ensino Superior.
Por sua vez, ao reunir representantes das escolas de Biblioteconomia da Argentina, Chile,
Uruguai, Paraguai e Brasil, o Encontro de Porto Alegre apresentou como resultado de suas
seções discursivas um conjunto de conhecimentos necessários à padronização dos conteúdos
ministrados pelos cursos que compõem o Mercosul. Para tanto, e como mais uma contribuição
do referido evento, houve-se a necessidade de agrupá-los em um conjunto de seis áreas
básicas de fundamentação teórica e prática que deveriam ser adotadas por todas as instituições
de ensino superior em Biblioteconomia da região. De acordo com o relatório final do evento
as áreas indicadas foram:
161
1. Fundamentos teóricos da Biblioteconomia e da Ciência da Informação:
Biblioteconomia, Documentação, Arquivologia, Museologia, Ciências da
Informação e áreas afins;
Comunicação e informação;
Cultura e sociedade;
História e tendências da produção dos registros do conhecimento, das unidades e
dos sistemas nacionais e internacionais de informação;
O profissional da informação: formação e atuação;
Unidades e serviços de informação.
2. Processamento da informação
Geração e organização de instrumentos de recuperação da informação;
Organização do conhecimento e da informação;
Práticas, tecnologias e produtos referentes à informação;
Tratamento descritivo dos documentos;
Tratamento temático: teoria da classificação, análise da informação, teoria da
indexação.
3. Recursos e serviços de informação
A indústria da informação: geração, produção e comercialização de documentos,
fontes e serviços de informação;
Estudo e educação de usuários;
Fontes de informações documentais e virtuais: conceitos, tipologias,
características, acesso, utilização e avaliação;
Fundamentos, princípios, processos e instrumentos para: seleção, aquisição,
avaliação, descarte, preservação, conservação e restauração de recursos de
informação e documentos virtuais;
Normas relativas ao desenvolvimento de coleções;
Serviços de extensão e ação cultural;
Serviços de provisão e acesso;
162
Serviços de referência.
4. Gestão de unidades de informação
Formulação de projetos de informação;
Gestão de espaço físico;
Gestão de recursos humanos;
Gestão de unidades e serviços de informação: leitores, usuários, clientes e
ambiente social;
Gestão financeira;
Mensuração e avaliação de serviços e unidades de informação;
Técnicas modernas de gestão;
Teoria de sistemas;
Teoria Geral da Administração;
Teoria organizacional.
5. Tecnologia da informação
Análise e avaliação de sistemas e redes de informação;
Análise, avaliação e desenvolvimento de sistemas de informação;
Aplicações das tecnologias da informação e comunicação nas unidades de
informação;
Gestão de bases de dados e bibliotecas virtuais;
Informatização das unidades de informação.
6. Pesquisa
Epistemologia da investigação científica;
Metodologia da pesquisa social;
Pesquisa em Biblioteconomia e Ciência da Informação: produção e comunicação
científica.
163
Após serem adotadas as resoluções oriundas do Encontro de Porto Alegre, e objetivando
integrar a Biblioteconomia brasileira ao contexto das Diretrizes Curriculares da Educação
Nacional, teve início o V Encontro Nacional de Biblioteconomia e Ciência da Informação,
sediado em São Paulo e realizado em setembro de 1998, que discutiu o perfil dos profissionais
almejados em termos de habilidades, atitudes e conhecimentos em cada uma das seis áreas
indicadas acima.
Como resultado dos trabalhos, chegou-se ao texto da Proposta de Diretrizes Curriculares para
os cursos de Biblioteconomia, em cuja estrutura encontra-se, como nos aponta GUIMARÃES
(2002; p.63-64), os seguintes elementos:
A. Perfil almejado para os egressos;
B. Competências e habilidades (gerais, para toda a área de Ciência da Informação e
específicas para a Biblioteconomia);
C. Tópicos de estudos (matérias de formação geral e específica);
D. Duração dos cursos;
E. Estágio e atividades complementares;
F. Estrutura geral dos cursos (corpo docente; avaliação, padrões de qualidade e interface
graduação / pós-graduação).
Aspectos que permaneceram em voga e continuaram a ser discutidos durante o VI Encontro
Nacional de Biblioteconomia e Ciência da Informação (ENEBCI), realizado em Campinas em
maio de 2001. Na ocasião, os trabalhos tiveram como eixo norteador os aspectos relativos à
capacitação docente para os cursos de Biblioteconomia do Mercosul, dando-se especial
atenção ao tratamento dispensado à questão da pesquisa e do estágio discente em cada um dos
referidos cursos.
Foi também neste evento que se processou a criação da Associação Brasileira de Educação
em Ciência da Informação (ABECIN). Instituição responsável por ampliar a atuação da
ABEBD em torno da reflexão sobre a implementação das Diretrizes Curriculares para a área
de Biblioteconomia através de oficinas de trabalhos nacionais e regionais voltados para o
delineamento dos projetos político-pedagógicos mais adequados ao conjunto do Mercosul,
164
bem como para a reflexão das concepções e dos parâmetros de avaliação considerados
legítimos pela área. Portanto:
O evento buscou não só analisar as características do docente de
Biblioteconomia para a formação da sociedade do conhecimento, como
também refletir, compreender e atuar sobre a prática docente com o
objetivo de transformação social e, ainda, favorecer a inovação educativa
nas escolas de Biblioteconomia do Mercosul e contribuir para o
delineamento do perfil do docente de Biblioteconomia e Ciência da
Informação. (GUIMARÃES, 2002; p.76).
Com isso, torna-se possível indicar que tais eventos influenciaram sobremaneira os estudos
curriculares em Biblioteconomia no Mercosul e indicaram a necessidade de muito a se fazer
pelo amplo desenvolvimento da Biblioteconomia brasileira e pelo aumento da participação
dos bibliotecários na constituição das muitas esferas sociais que diariamente solicitam seus
préstimos. Demanda que tenta ser suprida por profissionais formados em todas as cinco
regiões do país.
Portanto, se a busca por informações aumentou vertiginosamente desde o início da década de
1990, a Biblioteconomia brasileira também se expandiu muito neste período. Atualmente,
milhares de bibliotecários se formam todos os anos através da inserção em algum dos 37
(trinta e sete) cursos aprovados pelo MEC.
Embora a grande maioria das escolas de formação de bibliotecários esteja alocada na região
Sudeste, o mapa que se encontra em anexo a esta pesquisa nos permite visualizar uma
importante difusão de mão-de-obra especializada no tratamento da informação para áreas
menos centrais do país como os estados das regiões Norte e Nordeste.
Mercado que, dado a dimensão territorial do país, apresenta-se multifacetado e com demandas
específicas de mão-de-obra especializada. Portanto, entender como a sociedade se organiza
em torno dos processos de produção, captação, organização e disseminação da informação se
tornou indispensável para a revalorização da profissão de bibliotecário no mercado de
trabalho. Contudo, dissemos em certo momento deste capítulo que as disciplinas culturais que
compõem os currículos de biblioteconomia do país sempre foram tratadas como apanhados
generalistas e pretensamente enciclopédicos de temas relevantes para a formação educacional
e cultural deste profissional, será que tal condição ainda se faz presente?
165
Trataremos de elucidar esta questão através da análise das grades curriculares dos atuais
cursos de Biblioteconomia do país. Esta análise buscará identificar o espaço dispensado às
disciplinas que relacionam o universo da memória, da cultura, da educação e da leitura ao
mundo das bibliotecas. Ou seja, buscará apreender em que medida o conceito “biblioteca
como lugar de práticas culturais” está incorporado ao contexto de formação dos bibliotecários
brasileiros.
166
6. Capítulo V
Biblioteca como lugar de práticas culturais:
uma discussão a partir dos currículos de
Biblioteconomia no Brasil
A biblioteca existe ab aeterno. Dessa verdade cujo corolário imediato é a
eternidade futura do mundo, nenhuma mente razoável pode duvidar. O homem, o
imperfeito bibliotecário, pode ser obra do acaso ou dos demiurgos malévolos; o
universo, com seu elegante provimento de prateleiras, de tomos enigmáticos, de
infatigáveis escadas para o viajante e de latrinas para o bibliotecário sentado,
somente pode ser obra de um deus. Para perceber a distância que há entre o
divino e o humano, basta comparar estes rudes símbolos trêmulos que minha
falível mão garatuja na capa de um livro, com as letras orgânicas do interior;
pontuais, delicadas, negríssimas, inimitavelmente simétricas.
1
1
BORGES, 1998; p.517.
167
Qual o perfil de bibliotecário que os atuais cursos de Biblioteconomia brasileiros almejam
constituir? E em que medida seus currículos comportam, em termos práticos e teóricos,
conteúdos relacionados ao universo das práticas culturais? Objetivando responder a mais
estas duas inquietações, o presente capítulo analisa as grades curriculares de 5 (cinco) cursos
de graduação em Biblioteconomia do Brasil com o intuito de identificar as principais
diretrizes que norteiam a formação educacional de seus alunos.
Recordamos que para processar a escolha dos cursos, foram adotados os seguintes parâmetros
empíricos:
1. Inserção dos cursos nas diferentes regiões do país;
2. Data de fundação ligada a distintos períodos da história da Biblioteconomia nacional;
3. Ocuparem posição de destaque no cenário biblioteconômico brasileiro, consoante os
seguintes indicativos: os cursos escolhidos devem possuir uma revista científica e um
programa de pós-graduação na área. Elementos de reconhecida importância para a
construção, crescimento e difusão de qualquer campo do conhecimento.
Em paralelo a estes 3 (três) parâmetros, lançamos mão da seguinte estratégia operacional:
Naquilo que se refere ao primeiro parâmetro, optamos por dividir o mapa brasileiro
em 4 (quatro) regiões básicas, e não em 5 (cinco) como indicado no mapa geográfico.
Com isto, as áreas a serem consideradas por este trabalho são: Região Sul; Região
Sudeste (onde se concentra a grande maioria dos cursos de Biblioteconomia do país e
razão pela qual selecionamos 2), Região Norte-Nordeste (embora ocupe a maior área
territorial das quatro regiões incorporadas pelo universo da pesquisa, o curso escolhido
deve refletir, em ampla medida, as características gerais da área estudada
2
) e Região
Centro-Oeste.
2
Esta estratégia foi adotada em virtude da seguinte constatação: por estarem geograficamente distantes dos
grandes centros industriais do país, os cursos de Biblioteconomia da Região Norte-Nordeste privilegiam a
formação de profissionais para atuarem em um mercado constituído basicamente por bibliotecas públicas,
escolares e universitárias. Razão pela qual seus programas de ensino adotam estruturas curriculares muito
similares.
168
De acordo com os parâmetros e critérios acima mencionados, o universo empírico da pesquisa
foi composto pelos seguintes cursos
3
:
1. Região Sul: Curso de Biblioteconomia da Universidade Federal de Santa Catarina –
UFSC. O curso funciona desde 1974 e tem por objetivo formar profissionais bibliotecários
capazes de suprir as demandas informacionais que diariamente demarcam as rotinas dos
centros de informação da localidade;
2. Região Sudeste: Curso de Biblioteconomia da Escola de Ciência da Informação da
Universidade Federal de Minas Gerais – ECI/UFMG. Fundado em 1950, o curso destina-
se a formar profissionais bibliotecários para atuarem nas áreas de Gestão da Informação e
de Gestão de Coleções.
Curso de Biblioteconomia e Documentação do Departamento de Biblioteconomia e
Documentação da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo – USP.
Funcionando desde 1966, o curso paulista visa formar bibliotecários aptos a fazer frente às
exigências sociais por meio de conhecimentos práticos e teóricos ligados à área da
informação;
3. Região Norte-Nordeste: Curso de Biblioteconomia da Universidade Federal da
Paraíba – UFPb. Criado em 1969 e adotando por premissa o objetivo de formar
bibliotecários preparados para interagir com o processo de transferência da informação,
independente do suporte e do formato em que esta se encontre, o mesmo congrega as
principais nuances que caracterizam o ensino de Biblioteconomia de toda a Região Norte-
Nordeste.
4. Região Centro - Oeste: Curso de Biblioteconomia da Universidade de Brasília – UNB.
Considerando que o papel social do bibliotecário consiste em atuar como mediador entre o
universo da informação e o dos seus possíveis usuários, o curso pretende formar
profissionais aptos para o trabalho com a informação, independente do suporte ou do
3
A primeira seção deste capítulo traz uma apresentação mais detalhada das características que demarcam a
especificidade de cada um dos 5 (cinco) cursos abaixo em relação ao cenário biblioteconômico brasileiro.
169
espaço no qual esta se insira. Condição que o torna um importante pólo de formação de
mão-de-obra especializada para os demais estados da região.
Selecionados os cursos, a parte analítica do capítulo se inicia com a divisão das disciplinas
que compõem o universo específico de cada uma das 5 (cinco) grades curriculares entre as 6
(seis) áreas básicas de conhecimentos em Biblioteconomia definidas para a área do Mercosul
no I Encontro de Dirigentes de Escolas Universitárias de Biblioteconomia do Mercosul,
realizado em Porto Alegre no ano de 1996
4
. Como apontado na seção 5.3.3, as áreas
mencionadas ao fim do evento foram:
1. Fundamentos teóricos da Biblioteconomia e da Ciência da Informação;
2. Processamento da informação;
3. Recursos e serviços de informação;
4. Gestão de unidades de informação;
5. Tecnologia da informação;
6. Pesquisa.
Esta etapa, processada na segunda seção do capítulo, nos permitiu reunir indícios para apontar
qual a principal vertente teórico-prática adotada pelo atual sistema de ensino de
Biblioteconomia do país, bem como o perfil de bibliotecário que o mesmo almeja formar.
Pudemos apreender, ainda, se a querela entre “humanismo” e “tecnicismo” continua a
demarcar o cerne de suas estruturas curriculares e como esta disputa se institui em termos
regionais.
Discutir a presença do “humanismo” e do “tecnicismo” nos currículos de Biblioteconomia
brasileiros se mostrou importante para assinalarmos em que medida eles comportam, em
termos práticos e teóricos, conteúdos relacionados ao universo das práticas culturais, objetivo
final desta pesquisa.
4
Esclarecemos que a relevância deste encontro para a fundamentação do atual quadro de discussões em torno
dos conhecimentos que definem a estrutura curricular da área de Biblioteconomia no Brasil foi discutida na
última seção do Capítulo 4 do presente estudo.
170
6.1. Universo empírico: apresentação dos 5 (cinco) cursos
selecionados como objeto de análise da pesquisa
5
6.1.1. Curso de Biblioteconomia da Universidade Federal de Santa
Catarina – UFSC
O curso de graduação em Biblioteconomia, modalidade bacharelado, da Universidade Federal
de Santa Catarina – UFSC iniciou suas atividades docentes no ano de 1974, sendo
reconhecido pelo Conselho Federal de Educação em 8 de novembro de 1977. Seu atual
currículo, em vigor desde 1991, está dividido em 9 (nove) semestres letivos.
Funcionando no período noturno, e com o objetivo de formar profissionais bibliotecários
capazes de gerenciar e organizar as várias modalidades de centros de informação, suprindo as
necessidades informacionais de seus usuários em relação a seus aspectos políticos,
econômicos, educacionais, sociais, culturais, recreativas e tecnológicas, o curso disponibiliza
um total de 80 (oitenta) vagas anuais, que devem ser preenchidas através de concurso
vestibular.
Para adquirir o título de bacharel em Biblioteconomia cada aluno deve cursar um total de
2898 horas em disciplinas obrigatórias e optativas.
6.1.2. Curso de Biblioteconomia da Escola de Ciência da Informação
da Universidade Federal de Minas Gerais – ECI/UFMG
O curso de Biblioteconomia, modalidade bacharelado, da Escola de Ciência da Informação da
Universidade Federal de Minas Gerais – ECI/UFMG, cujo marco inicial se liga à data de 25
de março de 1950, destina-se a formar profissionais bibliotecários aptos a atuarem nas áreas
de gestão de informações e de gestão de coleções. A gestão de informações privilegia as
5
Ressaltamos que as apresentações a seguir foram feitas tendo por base as informações disponibilizas nos sites
oficiais de cada um dos 5 (cinco) cursos selecionados.
171
atividades voltadas para o acesso e para o uso dos recursos informacionais, enquanto que a
gestão de coleções privilegia o planejamento, implementação, organização e o tratamento de
acervos.
Com relação ao conteúdo, seu currículo atual, aprovado no ano de 2000, compreende as
seguintes modalidades de matérias:
a) Matérias de fundamentação geral: Comunicação, aspectos sociais, políticos e
econômicos do Brasil contemporâneo, história da cultura, etc;
b) Matérias instrumentais: Lógica da língua portuguesa e literatura da língua
portuguesa, língua estrangeira moderna, métodos e técnicas de pesquisa, etc;
c) Matérias de formação profissional: Informação aplicada à biblioteconomia, produção
dos registros do conhecimento, formação e desenvolvimento de coleções, controle
bibliográfico dos registros do conhecimento, disseminação da informação, administração
de bibliotecas, entre outras.
O curso é oferecido nos turnos diurno e noturno, sendo que em ambos a integralização dos
créditos pode ser feita em oito semestres. Em cada um deles é ofertado um seminário de 15
h/a (1 crédito), mais cinco disciplinas de 60 h/a (4 créditos).
Sua estrutura curricular é formada pelo ciclo básico, com duração de um semestre e pelo ciclo
profissional, com duração de sete períodos. Este último prevê um conjunto de cinco semestres
para o oferecimento de disciplinas obrigatórias, comuns para todos os alunos, e um período de
dois semestres para a oferta de disciplinas optativas/eletivas complementares, compondo as
duas ênfases (gestão de coleções e gestão de informações). Tais disciplinas podem ser
escolhidas a partir de um elenco de conteúdos optativos que têm por objetivo permitir uma
formação específica, de acordo com as ênfases propostas.
O curso prevê, ainda, um estágio supervisionado obrigatório com o objetivo de possibilitar a
visão de um serviço de informação em funcionamento, seus aspectos técnicos e
administrativos, seu relacionamento com a comunidade a que serve, permitindo o confronto
entre o conhecimento teórico adquirido na escola e a prática adotada na instituição.
172
Sendo assim, o bibliotecário formado por esta instituição pode atuar em uma gama variada de
unidades de informação, tais como: bibliotecas públicas, escolares, universitárias,
especializadas, centros de documentação, serviços de informação, serviços de análise de
informação, entre outras.
6.1.3. Curso de Biblioteconomia e Documentação do Departamento
de Biblioteconomia e Documentação da Escola de Comunicação e
Artes da Universidade de São Paulo – ECA/USP
O curso de Biblioteconomia e Documentação, modalidade bacharelado, do Departamento de
Biblioteconomia e Documentação da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São
Paulo – ECA/USP foi fundado em 1966, período no qual a informação adquire o status de
elemento responsável pelo fortalecimento das inúmeras relações humanas. Razão pela qual
dominar os instrumentos de acesso, organização e recuperação dos insumos informacionais se
tornou condição necessária para o progresso de qualquer área do conhecimento.
Objetivando responder satisfatoriamente a este conjunto de mudanças estruturais, o curso
objetiva dotar o futuro bacharel em Biblioteconomia dos recursos práticos e teóricos
necessários à satisfação das novas exigências da sociedade em relação à informação. Para
tanto, seus alunos devem ser capazes de atuar não apenas nos ambientes tradicionais (como
bibliotecas públicas, escolares, universitárias, de institutos de pesquisa, empresas, etc.), mas
também em inúmeras outras instituições ou atividades vinculadas ao ciclo informacional,
destacando-se entre elas empresas de comunicação, arquivos, museus e sindicatos.
Para tanto, sua grade curricular disponibiliza disciplinas práticas e teóricas específicas da área
de biblioteconomia ou de caráter multidisciplinar, que podem ser integralizadas em 9 (nove)
semestres para o curso matutino, e em 10 (dez) semestres para o noturno
6
.
6
É preciso esclarecer que as disciplinas oferecidas pelos dois cursos são exatamente as mesmas, a diferença de
tempo necessária à integralização do curso matutino ou do curso noturno se refere ao período destinado à
realização dos dois projetos experimentais previstos em suas grades curriculares. Portanto, nossa análise se
refere aos 2 (dois) cursos como um todo.
173
6.1.4. Curso de Biblioteconomia da Universidade Federal da
Paraíba – UFPb
O curso de Biblioteconomia, modalidade bacharelado, da Universidade Federal da Paraíba –
UFPB inicia suas atividades acadêmicas no ano de 1969, momento em que o cenário
biblioteconômico brasileiro reunia esforços para discutir, desenvolver e implementar uma
plano de Currículo Mínimo que promovesse o reconhecimento legal da profissão, além de
instituir coerência e visibilidade à área, ampliando assim seu espaço de atuação social.
Sofrendo influências diretas deste cenário, o Currículo Pleno do curso, aprovado em 21 de
dezembro de 1983, prevê que para tornar-se um bibliotecário graduado cada aluno deve cursar
um total de 2790 horas/aula, que perfazem um conjunto de 177 créditos divididos entre
disciplinas obrigatórias e optativas de cunho teórico-prático.
Adotando como pressuposto que o profissional bibliotecário deve ser preparado, prática e
intelectualmente, para interagir com o processo de transferência da informação (de sua
concepção ao uso) e participar ativamente da construção e interpretação da sociedade através
de reflexões intelectuais, sua grade curricular é composta por disciplinas específicas do
corpus teórico da Biblioteconomia e outras, de caráter multidisciplinar, que também ajudam a
pensar racional e empiricamente as várias facetas que compõem o ciclo informacional.
6.1.5. Curso de Biblioteconomia da Universidade de Brasília – UNB
A história da graduação em Biblioteconomia, modalidade bacharelado, da Universidade de
Brasília – UNB inicia-se em 1963, ano de fundação do curso. Do início das atividades até os
dias atuais o curso adota por premissa formar profissionais aptos para o trabalho com a
informação em qualquer lugar ou suporte em que esta se insira. Neste sentido, ao levar em
consideração o caráter multifacetado do atual mercado de trabalho, sua estrutura curricular foi
pensada a partir de três níveis básicos de fundamentação teórico-prática, são eles:
1. Nível gerencial: envolve disciplinas cujos conteúdos básicos se voltam para a
supervisão, administração, planejamento e assessoria de serviços informacionais;
174
2. Nível operacional: prioriza disciplinas que sustentem teórica e praticamente as
atividades de seleção, aquisição, análise, síntese, armazenamento e recuperação da
informação independente do lugar ou suporte em que esta se inscreva;
3. Nível educacional: enfatiza disciplinas relacionadas à pesquisa, ao ensino e à extensão.
Por conseqüência, o curso adota uma estrutura curricular que:
Pensa a informação como todo conhecimento humano inscrito sob qualquer forma. Daí
a necessidade de geri-la independente de sua origem, suporte material ou instituição
depositária. Razão pela qual busca oferecer um meio ambiente de imersão integral nas
tecnologias da informação, enquanto instrumentos convencionais da ação profissional do
bibliotecário;
Amplie a interdisciplinaridade acadêmica, especialmente no segmento curricular
reservado à formação diversificada de seus alunos (disciplinas optativas e do módulo
livre), para permitir que o futuro profissional da informação possa assimilar uma formação
teórica e uma habilidade metodológica holística;
Privilegie a iniciação à pesquisa científica como atividade curricular.
Sendo assim, e visando abarcar todos estes pressupostos, sua grade curricular é composta por
24 disciplinas obrigatórias, 4 disciplinas, também obrigatórias, denominadas de cadeia
seletiva
7
e 15 optativas que podem ser escolhidas a partir de uma lista de 168 (cento e sessenta
e oito) possíveis.
7
Nesta modalidade de disciplina cada aluno escolhe cursar, entre matérias pré-determinadas, aquela que mais se
aproxima do perfil desejado para sua formação. De acordo com esta estrutura, a cadeia seletiva 1 se refere à
lógica; a cadeia seletiva 2 à línguas estrangeiras; a cadeia seletiva 3 à cultura brasileira e a cadeia seletiva 4 à
evolução do pensamento científico, filosófico e literário.
175
6.2. Processamento dos dados: divisão das disciplinas
segundo as 6 (seis) áreas básicas de conhecimentos em
Biblioteconomia definidas para o Mercosul
6.2.1. Fundamentos teóricos da Biblioteconomia e da Ciência da
Informação
TABELA 4: Conjunto de disciplinas referentes à área Fundamentos teóricos da
Biblioteconomia e da Ciência da Informação
Nome do Curso
UFSC UFMG USP UFPb UNB
Arquivística;
Aspectos sociais,
políticos e econômicos
do Brasil
Contemporâneo;
Biblioteconomia
aplicada I;
Biblioteconomia
aplicada II;
Biblioteconomia
aplicada III;
Comunicação;
Editoração;
Estatística aplicada I;
História da cultura;
Informação aplicada à
Cultura e informação;
Economia;
Estatística;
Fundamentos
científicos da
comunicação;
Fundamentos de análise
sociológica;
Inglês instrumental;
Introdução à
biblioteconomia;
Introdução à filosofia
com ênfase em lógica e
filosofia da ciência;
Introdução à teoria
democrática;
Biblioteca e Sociedade;
Elementos de lógica
para documentação;
Fundamentos em
Biblioteconomia,
Documentação e
Ciência da Informação;
História da cultura e da
comunicação I;
História da cultura e da
comunicação II;
Inglês instrumental I;
Inglês instrumental II;
Língua portuguesa:
redação e expressão
oral I;
Cultura brasileira I;
Economia I;
Editoração;
Educação Física;
Estatística I;
Evolução do
pensamento filosófico e
científico I;
Fundamentos
científicos da
comunicação I;
História da Arte;
História da Literatura I;
História dos livros e das
bibliotecas;
Informação aplicada à
Cadeia seletiva 1
8
;
Cadeia seletiva 2
9
;
Cadeia seletiva 3
10
;
Cadeia seletiva 4
11
;
Editoração;
Estatística aplicada;
Introdução à
Biblioteconomia e à
Ciência da Informação;
Leitura e produção de
textos;
Teorias da comunicação
I.
8
O aluno deverá escolher entre as seguintes disciplinas: Lógica ou Introdução à lógica.
9
O aluno deverá escolher entre as seguintes disciplinas: Francês Instrumental, Língua Alemã I, Inglês
Instrumental ou Língua Espanhola I.
10
O aluno deverá escolher entre as seguintes disciplinas: Cultura Brasileira ou História social e política do
Brasil.
11
O aluno deverá escolher entre as seguintes disciplinas: Evolução do pensamento filosófico e científico,
Introdução à filosofia, Idéias filosóficas em forma literária ou Fundamentos de história literária.
176
Biblioteconomia;
Inglês instrumental I;
Inglês instrumental II;
Literatura em língua
portuguesa;
Lógica;
Matemática básica;
Organização e métodos
aplicados à
Biblioteconomia;
Português prático –
redação;
Produção dos registros
do conhecimento.
Disciplinas Optativas
Direitos e deveres do
bibliotecário no Brasil;
Introdução à Ciência da
Informação;
Paleografia;
Tópicos especiais em
Biblioteconomia.
Língua portuguesa;
Literaturas brasileira e
portuguesa;
Produção dos registros
do conhecimento;
Teorias da informação.
Disciplinas Optativas
Psicologia social I;
Tópicos em
arquivologia;
Tópicos em cultura e
informação;
Tópicos em estudos da
informação: seminários;
Tópicos em informação
e sociedade;
Tópicos em produção
de documentos;
Tópicos em teorias da
informação.
Realidade sócio-
econômica e política
brasileira;
Teoria e ação cultural.
Disciplinas Optativas
Bibliotecas públicas:
objetivos e funções
sociais;
Imaginário e ação
cultural;
Introdução à
museologia;
Leitura, teoria e prática.
Biblioteconomia;
Inglês instrumental;
Introdução à
Biblioteconomia;
Introdução à
matemática;
Introdução à
Sociologia;
Língua inglesa I;
Língua portuguesa I;
Literatura da língua
portuguesa;
Lógica Formal
(Aristotélico-Tomista);
Sociologia I.
Disciplinas Optativas
Fundamentos
científicos da
comunicação II;
História da Paraíba I;
História da Paraíba II;
Introdução à filosofia;
Introdução à Psicologia;
Introdução aos estudos
históricos e sociais;
Língua francesa II;
Língua inglesa II;
Língua portuguesa II;
Problemas sócio-
econômicos
contemporâneos;
Relações públicas e
humanas;
Sociologia da educação
I;
Sociologia II (Cultural);
Técnica de arquivos.
Disciplinas Optativas
A Questão da Mulher e
Políticas Sociais;
Análise da Imagem;
Análise dos
Condicionamentos
Ambientais;
Análise e Opinião;
Análise Gráfica 1;
Análise Gráfica 2;
Análise Multivariada 1;
Antropologia Cultural;
Arquivo Corrente 1;
Arquivo Intermediário;
Arquivo Permanente 1;
Biblioteconomia e
Sociedade Brasileira;
Cartografia 1;
Ciência, Tecnologia e
Governo;
Ciências do Ambiente;
Cinema e Literatura;
Criatividade e
Produtividade;
Cultura e Meio
Ambiente;
Cultura Popular;
Desenvolvimento de
Comunidade;
Diplomática e
Tipologia Documental;
Direito Autoral;
Direito de Cidadania;
Direitos Humanos e
Cidadania;
Documentação;
Elementos de
Linguagem Estética e
História da Arte 1;
Elementos de
Linguagem Estética e
História da Arte 2;
Epigrafia e Paleografia
Antiga;
177
Epigrafia e Paleografia
Medieval e Moderna;
Estatística Exploratória;
Estética e Cultura de
Massa;
Estilística da Língua
Portuguesa;
Estudos de Sistemas de
Informação;
Evolução da Educação
no Brasil;
Evolução das Idéias
Econômicas e Sociais;
Filosofia da Educação
1;
Folclore Brasileiro 1;
Formação Econômica
do Brasil;
Francês Instrumental 1;
Francês Instrumental 2;
Fundamentos de
Linguagem;
Fundamentos de
Linguagem Visual;
Geografia Humana e
Econômica;
Grego 1;
Grego 2;
História da Arte 1;
História da Arte e da
Tecnologia;
História da Ciência 1;
História da Ciência 2;
História da Educação 1;
História da Filosofia no
Brasil;
História da Imprensa;
História do Livro e das
Bibliotecas;
História do Teatro 1;
História Econômica
Geral;
História Social e
Política Geral;
História Social e
Política Latino-
178
Americana;
Historiografia do
Brasil;
Imprensa e Sociedade;
Informática e
Sociedade;
Inglês Instrumental 2;
Instituições do Direito
Público e Privado;
Introdução à Análise do
Discurso;
Introdução à
Antropologia;
Introdução à
Arquitetura e
Urbanismo;
Introdução à
Arquivologia;
Introdução à Ciência da
Computação;
Introdução à Ciência da
Informação;
Introdução à Ciência
Geográfica;
Introdução à Ciência
Política;
Introdução à Economia;
Introdução à Educação;
Introdução à Gravura;
Introdução à História
das Idéias Sociais no
Brasil;
Introdução à
Lingüística;
Introdução à Música 1;
Introdução à
Programação Visual;
Introdução à Psicologia;
Introdução à Psicologia
Social;
Introdução à Semântica;
Introdução à
Sociologia;
Introdução à Teoria
Literária;
Introdução ao Direito 1;
179
Introdução ao Direito 2;
Introdução ao Estudo
da História;
Introdução ao Estudo
das Relações
Internacionais;
Introdução ao Estudo
de Políticas Públicas;
Introdução ao
Planejamento
Educacional;
Introdução ao Serviço
Social;
Latim 1;
Latim 2;
Lexicologia e
Lexicografia;
Língua Alemã 2;
Língua Alemã 3;
Língua Alemã 4;
Língua Espanhola 2;
Língua Espanhola 3;
Língua Espanhola 4;
Língua Francesa 2;
Língua Francesa 3;
Língua Francesa 4;
Língua Inglesa 2;
Língua Inglesa 3;
Língua Inglesa 4;
Língua Japonesa 1;
Língua Japonesa 2;
Linguagem Publicitária;
Mercadologia em
Publicidade;
Movimentos Populares;
Mulher, Cultura e
Sociedade;
Oficina de Produção de
Textos;
Organizações
Internacionais;
Paleografia;
Planejamento Gráfico;
Planejamento Social;
180
Prática Desportiva 1;
Prática Desportiva 2;
Processos de Leitura e
Escrita;
Produção e Leitura de
Imagem;
Produção Gráfica;
Psicologia da
Aprendizagem 1;
Psicologia da Infância;
Psicologia da
Personalidade 1;
Publicidade e
Sociedade;
Recreação e Lazer 1;
Redação Oficial;
Redação para
Publicação Impressa;
Reportagem e
Entrevista;
Reprografia;
Sociologia da Ciência;
Sociologia da
Comunicação;
Sociologia da Cultura;
Sociologia da Educação
1;
Sociologia do
Conhecimento;
Teatro Brasileiro 1;
Teoria da Ciência;
Teoria da História;
Teoria do
Conhecimento;
Teoria Geral do Direito
Público;
Teorias
Contemporâneas da
Música 1.
181
6.2.2. Processamento da Informação
TABELA 5: Conjunto de disciplinas referentes à área Processamento da Informação
Nome do Curso
UFSC UFMG USP UFPb UNB
Catalogação (entrada de
cabeçalhos);
Catalogação de
Multimeios;
Catalogação descritiva;
Classificação Decimal
de Dewey;
Classificação Decimal
Universal;
Indexação.
Disciplinas Optativas
Arquivos
especializados;
Documentação
cartográfica;
Sistemas especiais de
classificação.
Tratamento da
informação I
(Catalogação);
Tratamento da
informação II
(Indexação);
Tratamento da
informação III
(Tesauros e cabeçalhos
de assunto);
Tratamento da
informação IV
(Classificação);
Tratamento da
informação V.
Disciplinas Optativas
Construção de
linguagens de
indexação I;
Construção de
linguagens de
indexação II;
Tópicos em tratamento
da informação.
Documentação
audiovisual;
Indexação e resumos;
Linguagens
documentárias;
Lingüística e
documentação;
Representação
descritiva I;
Representação
descritiva II;
Representação temática
I;
Representação temática
II.
Disciplinas Optativas
Laboratório de
construção de tesauros;
Organização de
arquivos fotográficos.
Catalogação I;
Catalogação II;
Indexação e resumo;
Indexação pós-
coordenada;
Indexação pré-
coordenada I;
Indexação pré-
coordenada II;
Multimeios.
Análise da informação;
Catalogação;
Classificação;
Indexação;
Disciplinas Optativas
Elaboração e
Manutenção de
Tesauros;
Linguagens
Documentárias;
Organização de
Arquivos;
Organização de
Arquivos de
Computadores;
Organização de
Sistemas;
Organização do
Trabalho Intelectual;
Organização e
Tratamento de
Materiais Especiais;
Sistemas de
Classificação
Bibliográfica.
182
6.2.3. Recursos e serviços de Informação
TABELA 6: Conjunto de disciplinas referentes à área Recursos e serviços de Informação
Nome do Curso
UFSC UFMG USP UFPb UNB
Controle dos registros
do conhecimento I;
Controle dos registros
do conhecimento II;
Controle dos registros
do conhecimento III;
Controle dos registros
do conhecimento IV;
Disseminação da
informação;
Formação e
desenvolvimento de
coleções;
Normalização de
documentos;
Periódicos e seriados;
Planejamento dos
serviços bibliotecários;
Usuário da informação.
Disciplinas Optativas
Conservação e
preservação de
documentos especiais;
Conservação e
restauração de
documentos;
Recuperação da
Informação.
Fontes de informação
especializada;
Fontes de informação
geral;
Formação,
desenvolvimento e
preservação de acervos;
Normalização
bibliográfica;
Organização e controle
bibliográfico da
informação;
Serviços de
disseminação da
informação;
Usuários da
informação.
Disciplinas Optativas
Extensão em unidades
de informação;
Leitura e formação do
leitor;
Tópicos em
disseminação da
informação;
Tópicos em fontes
especializadas;
Tópicos em fontes
gerais;
Tópicos em formação e
desenvolvimento de
acervos;
Tópicos em preservação
de acervos;
Treinamento de
usuários.
Formação e
desenvolvimento de
coleções;
Recursos
informacionais I;
Recursos
informacionais II;
Serviço ao usuário.
Disciplinas Optativas
Orientação
bibliográfica;
Usuários da
informação:
comunicação integrada.
Bibliografia brasileira;
Bibliografia
especializada em
ciências biomédicas e
tecnológicas;
Bibliografia
especializada em
ciências humanas;
Bibliografia geral;
Disseminação da
informação I;
Disseminação da
informação II;
Estudo do usuário;
Formação e
desenvolvimento de
coleções.
Bibliografia;
Controle Bibliográfico;
Estudo de usuários;
Formação e
desenvolvimento de
acervos;
Serviços de informação.
Disciplinas Optativas
Bibliografia Brasileira;
Bibliografia
Especializada 1;
Bibliografia
Especializada 2;
Conservação e
Restauração de
Documentos;
Pesquisa Jurídica;
Sistemas de
Informação.
.
183
6.2.4. Gestão de unidades de Informação
TABELA 7: Conjunto de disciplinas referentes à área Gestão de Unidades de Informação
Nome do Curso
UFSC UFMG USP UFPb UNB
Organização de
bibliotecas;
Teoria da
Administração.
Disciplinas Optativas
Bibliotecas Escolares;
Bibliotecas
Especializadas;
Bibliotecas Infantis;
Bibliotecas Públicas;
Bibliotecas
Universitárias;
Custos aplicados à
Biblioteconomia;
Informação para
empresas;
Marketing aplicado à
Biblioteconomia.
Administração de
unidades de informação
I;
Administração de
unidades de informação
II;
Administração de
unidades de informação
III;
Unidades de
informação.
Disciplinas Optativas
Marketing de unidades
de informação;
Tópicos em
administração de
unidades de
informação.
Introdução à
administração de
bibliotecas;
Introdução à
administração;
Planejamento
bibliotecário I;
Planejamento
bibliotecário II.
Marketing
bibliotecário;
Organização e
administração de
bibliotecas I;
Organização e
administração de
bibliotecas II;
Planejamento
bibliotecário.
Disciplinas Optativas
Sistemas de bibliotecas.
Gerência de serviços de
informação;
Introdução à
administração.
Disciplinas Optativas
Introdução à Atividade
Empresarial;
Legislação
Administrativa;
Métodos e Processos
Administrativos;
Psicologia Aplicada à
Administração;
Sistemas
Computacionais
Aplicados à
Administração;
Teoria do
Planejamento.
184
6.2.5. Tecnologia da Informação
TABELA 8: Conjunto de disciplinas referentes à área Tecnologia da Informação
Nome do Curso
UFSC UFMG USP UFPb UNB
Automação de
bibliotecas;
Disciplinas Optativas
Gerenciador de Bases
de Dados –
MICROISIS;
Tópicos especiais em
Biblioteconomia –
Internet.
Introdução à
informática.
Disciplinas Optativas
Acesso à informação
eletrônica;
Introdução à tecnologia
da informação;
Tópicos em recursos
informacionais:
seminários;
Tópicos em tecnologia
da informação.
Documentação e
informática.
Informação, ciência e
tecnologia.
Automação de
bibliotecas.
Informática
documentária;
Introdução à
microinformática;
Planejamento de
sistemas de informação;
Planejamento e
elaboração de bases de
dados;
Redes de informação e
transferência de dados.
Disciplinas Optativas
Análise de Sistemas;
Banco de Dados.
6.2.6. Pesquisa
TABELA 9: Conjunto de disciplinas referentes à Pesquisa
Nome do Curso
UFSC UFMG USP UFPb UNB
Métodos científicos
para Biblioteconomia;
Métodos da pesquisa
em Biblioteconomia.
Métodos e técnicas de
pesquisa em
biblioteconomia em
ciência da informação.
Disciplinas Optativas
Tópicos em métodos e
técnicas de pesquisa em
biblioteconomia e em
ciência da informação.
Teoria e métodos de
pesquisa em
comunicação.
Elaboração de trabalhos
monográficos;
Metodologia da ciência
III;
Métodos e técnicas de
pesquisa I.
Disciplinas Optativas
Métodos e técnicas de
pesquisa II.
Monografia em
Biblioteconomia e
Ciência da Informação.
Disciplinas Optativas
Epistemologia das
Ciências Humanas e
Sociais;
Metodologia da
História;
Métodos de Pesquisa;
Planejamento e
Pesquisa 1;
Técnicas de
Amostragem;
Técnicas de Pesquisa.
185
6.2.7. Estágios supervisionados em Biblioteconomia
TABELA 10: Número de estágios supervisionados previstos em cada um dos 5 (cinco)
cursos analisados
Nome do Curso
UFSC UFMG USP UFPb UNB
Estágio Supervisionado
em Biblioteconomia
Estágio Supervisionado
A;
Estágio Supervisionado
B.
Estágio Supervisionado
em Bibliotecas
Especializadas e
Universitárias;
Estágio Supervisionado
em Bibliotecas Públicas
e Escolares;
Projeto Experimental
em Biblioteconomia I;
Projeto Experimental
em Biblioteconomia II.
Estágio Supervisionado
Estágio Supervisionado
em Biblioteconomia I;
Estágio Supervisionado
em Biblioteconomia II.
Estes dados, consolidados a partir da análise das 5 (cinco) grades curriculares selecionadas
como objeto da presente pesquisa, permitem uma melhor visualização das relações de
proximidade e dissonâncias quanto à forma de constituição e efetivação de cada um dos
respectivos programas de ensino. Relações que se tornam mais claras a partir da síntese
apresentada a seguir.
186
TABELA 11: Síntese dos dados apurados no processamento das informações referentes às grades curriculares
Cursos Ano de
Fundação
Perfil de profissional que
deseja formar
Quantidade de
disciplinas
Quantidade de disciplinas em cada uma das 6 (seis) áreas definidas para o Mercosul
Obrigatórias
(OB)
Optativas
(OP)
Fundamentos
teóricos
Processamento da
Informação
Recursos de
informação
Gestão de unidades
de informação
Tecnologia da
informação
Pesquisa
UFSC
1974
Bibliotecários capazes de
gerenciar e organizar as várias
modalidades de unidades de
informação, atentando-se para
suas potencialidades políticas,
econômicas, sociais, culturais e
educacionais.
41 (68%)
19 (32%)
22 (36,5%)
18 OB
4 OP
10 (16%)
6 OB
4 OP
14 (23, 5%)
12 OB
2 OP
10 (16%)
2 OB
8 OP
3 (5%)
1 OB
2 OP
2 (3%)
2 OB
UFMG
1950
Bibliotecários para atuar na
organização e na gestão de
informações e coleções a partir
da compreensão crítica da
informação.
34 (59%)
24 (41%)
20 (34%)
13 OB
7 OP
8 (14%)
5 OB
3 OP
15 (26%)
7 OB
8 OP
6 (11%)
4 OB
2 OP
5 (9%)
1 OB
4 OP
2 (3%)
1 OB
1 OP
USP
1966
Bibliotecários que possam fazer
frente às novas exigências da
sociedade em relação à
informação. Para tanto, devem
ser capazes de atuar em todas
as etapas do ciclo
informacional.
33 (81%)
8 (19%)
14 (34%)
10 OB
4 OP
10 (24%)
8 OB
2 OP
6 (15%)
4 OB
2 OP
4 (10%)
4 OB
2 (5%)
2 OB
1 (2%)
1 OB
UFPb
1969
Bibliotecários aptos, prática e
teoricamente, para interagir
com o processo de transferência
da informação e para participar
da construção e interpretação
da sociedade através de
reflexões críticas.
43 (71,5%)
17
(28,5%)
34 (56,5%)
20 OB
14 OP
7 (12%)
7 OB
8 (13,5%)
8 OB
5 (8%)
4 OB
1 OP
1 (2%)
1 OB
4 (6%)
3 OB
1 OP
UNB
1963
Bibliotecários aptos para
trabalharem com a informação
em qualquer lugar ou suporte
em que esta se insira.
28 (65%) 15 (35%) 9 (32%) OB
140 (83%)
OP
4 (15%) OB
8 (5%) OP
5 (18%) OB
6 (3,5%) OP
2 (7%) OB
6 (3,5%) OP
5 (18%) OB
6 (3,5%) OP
1 (3%)
OB
6 (3,5%)
OP
187
6.3. Análise dos dados: “Biblioteca como lugar de práticas
culturais” – uma discussão a partir dos currículos de
Biblioteconomia no Brasil
Se traçarmos um paralelo entre a história da Biblioteconomia brasileira e as informações
coletadas com o processamento dos dados acima apresentados, veremos que embora o acesso
à informação tenha se tornado, a partir da década de 1970, recurso indispensável à construção
de todas as esferas de atuação humana, a atual estrutura curricular dos cursos de
Biblioteconomia do país ainda privilegia disciplinas técnicas cujo foco está centrado nas
atividades de coleta, organização, gestão, preservação e disseminação dos recursos
informacionais.
Condição expressa pelo significativo número de disciplinas cujo teor se volta para o
processamento da informação, para a gestão de unidades de informação e para o uso dos
recursos de informação. Interpretando a TABELA 11 do presente estudo, o primeiro dado que
nos salta aos olhos é o fato destas 3 (três) áreas concentrarem grande parte da carga horária
obrigatória destinada à formação dos bibliotecários brasileiros. Situação inversa ao que
acontece com os fundamentos teóricos da Biblioteconomia e da Ciência da Informação, área
que dispõe da maioria dos conteúdos classificados como optativos.
Ainda nos valendo dos aportes históricos, é possível apontar que este quadro revigora o
embate entre “tecnicismo” e “humanismo” que por longa ditou os rumos das discussões em
torno do melhor modelo de estrutura curricular a ser adotado pelas escolas de
Biblioteconomia brasileiras.
Se trouxermos novamente à tona alguns dos apontamentos feitos na seção 5.3. do capítulo
anterior, recordaremos que o primeiro projeto de formação de bibliotecários a se instituir no
país seguiu padrões franceses e priorizava o ensino de conteúdos relacionados às Ciências
Humanas e à intenção de se dotar os bibliotecários da capacidade crítica necessária para
compreender a importância que seu ofício assumia no cerne do cenário sócio-cultural da
188
época. Época que, por sua vez, marca o início do projeto de desenvolvimento econômico do
país.
Embora os primeiros profissionais formados por este modelo tenham assumido a execução
das rotinas necessárias ao funcionamento da Biblioteca Nacional, uma parcele significativa
dos mesmos contribuiu, graças à formação humanista oriunda dos preceitos difundidos pela
École des Chartres, para impulsionar o crescimento do país, sobretudo no segmento
educacional
12
.
Contudo, a necessidade de se prover mão-de-obra especializada para suprir a carência do
mercado de trabalho que emerge com os primeiros anos de industrialização e urbanização das
grandes cidades brasileiras ditou novos rumos para a história do sistema de ensino de
biblioteconomia nacional. Isto porque, como aconteceu em inúmeros outros setores sociais, as
escolas de formação de bibliotecários passaram a ser fortemente influenciadas pela ideologia
do tecnicismo norte-americano.
Tecnicismo que, aliás, serviu de fundamento para a formatação do curso de Biblioteconomia
do Instituto Mackenzie, o segundo do país. Contando com uma grade curricular que
priorizava o ensino de técnicas de tratamento e gestão da informação, o mesmo objetivava
formar profissionais aptos a executarem todas as rotinas instrumentais que garantissem a
produção e a circulação do conhecimento.
Em essência, podemos dizer que estes dois modelos pretendiam a mesma coisa: fazer do
bibliotecário o profissional responsável pela captação, seleção, organização, preservação e
disseminação dos registros documentais oriundos da atividade intelectual humana. Contudo,
em termos teóricos e metodológicos há uma distância acentuada entre ambos.
Enquanto o modelo humanista ministrava disciplinas relacionadas com as Ciências Humanas
e com a necessidade de se interpretar as conseqüências sociais que surgem do acesso ou da
falta de acesso à informação, o modelo norte-americano, também conhecido como Modelo
Deweyano, tratava estes mesmos conteúdos como apanhados enciclopédicos que mereciam
12
Não nos esqueçamos que a Biblioteca Nacional do Brasil já era considerada, no final do século XIX, o maior
acervo público da América Latina.
189
pouco destaque em uma estrutura curricular permeada por disciplinas cujo foco principal
eram as técnicas de tratamento e gestão da informação, aliada ao uso de um Sistema de
Classificação do Conhecimento.
Como as primeiras quatro décadas do ensino de Biblioteconomia no Brasil foram marcadas
pela tentativa de se consolidar um modelo de formação que respondesse satisfatoriamente aos
anseios de desenvolvimento nacional, dois fatores se mostraram preponderantes para a
supremacia do modelo Deweyano e um posterior enfraquecimento do modelo humanista, são
eles: a necessidade de se prover mão-de-obra especializada para suprir a carência do mercado
de trabalho que emerge com a industrialização e a urbanização do país, como apontado
anteriormente, e o surgimento do Instituto Brasileiro de Bibliografia e Documentação
(IBBD).
Quando foi criado em meados da década de 1950 o IBBD lançou as sementes de um projeto
nacional que visava formar profissionais bibliotecários especializados no tratamento de
informações técnico-científicas com o intuito de adaptá-los às várias regras sociais impostas
com o término da II Grande Guerra. Movimento que marca a aproximação da
Biblioteconomia com a Documentação e com a Informática.
Com isso, ao difundir o modelo Deweyano no país, o IBBD consolidou um sistema de
formação que oferecia aos bibliotecários os recursos necessários para se controlar a produção
bibliográfica nacional, em especial a produção técnico-científica. Função que requeria grande
especialização e diferenciava as atividades de um bibliotecário generalista (humanista) do
qualificado, do especializado. Razão pela qual, deste momento em diante, todas as propostas
curriculares referentes à reforma do sistema de ensino de Biblioteconomia brasileiro se
mostraram marcadas pela tendência a supervalorizar os conteúdos das disciplinas técnicas em
conseqüência da desvalorização da vertente cultural.
Tendência que, segundo os dados arrolados acima, ainda se faz presente. Em todas as 5
(cinco) grades curriculares estudas encontramos um aprofundamento excessivo dos conteúdos
relativos às técnicas de tratamento da informação e de gestão dos serviços oferecidos pelas
unidades de informação. Em contrapartida, as áreas de Fundamentos teóricos da
Biblioteconomia e da Ciência da Informação e a de Pesquisa, cujos conteúdos se mostram
importantes para o desenvolvimento de uma Biblioteconomia mais preocupada em interpretar
190
como o acesso à informação contribui para edificar a realidade atual do país, são mantidas
com disciplinas optativas que oferecem apenas uma visão parcial da responsabilidade que as
bibliotecas e os bibliotecários assumem em um cenário com graves problemas sociais como o
brasileiro.
Por isso foi preciso lembrar, e este era um dos objetivos da pesquisa, qual o papel dispensado
aos bibliotecários pela história. Durante toda a primeira parte do Capítulo 4 deste estudo
ressaltou-se que a figura do bibliotecário emerge para o universo das profissões como o
agente que auxilia na construção da paisagem sócio-cultural onde se insere através das
atividades de organização, preservação e disseminação do patrimônio intelectual concebido ao
longo do tempo. Ou seja, seu ofício foi validado socialmente porque facilitava o acesso aos
bens culturais, à educação e aos conhecimentos preservados nos acervos de uma biblioteca.
Para tanto, além de dominarem a elaboração e o manejo de sistemas classificatórios, deveriam
compreender as várias etapas que compõem o ciclo informacional e avaliar em que medida a
falta de acesso à informação corrobora com a manutenção das diferenças sociais. Sendo
assim, seu fazer racional deveria ser respaldado por uma sólida formação humanística e não
apenas pelo tecnicismo que retira deste profissional seu papel de agente histórico. Isto porque,
a técnica, isolada do racional e pensada separadamente do social, contribui para a
homogeneização da sociedade em torno de valores, normas, idéias e comportamentos
dominantes.
E foi isso que aconteceu em certos momentos da recente história brasileira. Ao se tornar
excessivamente técnica e por trabalhar com programas de ensino vinculados explicitamente às
demandas do mercado, a Biblioteconomia brasileira rompeu com a vertente teórica que pensa
as bibliotecas como organismos de mobilização social. Ou seja, ao refletirem a especialização
técnica de seus gestores, as bibliotecas públicas gradativamente se afastaram do povo.
Em contrapartida, como o projeto de desenvolvimento nacional exigia ampla especialização
na formação da mão-de-obra e na utilização dos recursos e equipamentos existentes, este
período que marca a decadência da biblioteca pública é também aquele que viu florescer o
nascimento e difusão das bibliotecas especializadas e dos grandes sistemas de informação. Tal
fato não seria um problema se estas medidas tivessem sido pensadas de acordo com as
191
necessidades da população local e em consonância com políticas de desenvolvimento das
bibliotecas públicas.
Influenciado mais uma vez por ideologias externas, disseminou-se aqui a idéia do
planejamento e implementação de grandes sistemas de informação, onde a biblioteca pública
aparecia, em ampla medida, como uma das infra-estruturas que os faziam funcionar. Ou seja,
as bibliotecas e os bibliotecários não eram mais os agentes históricos responsáveis por dar
sentido ao saber e a fazer deste um instrumento de reafirmação da "identidade" individual ou
coletiva. Eram, antes, o espelho que refletia o jogo de interesses de uma minoria dominante
que, por deter o poder econômico, opôs-se à proposta de contribuir para a construção de um
novo tempo de igualdade e democracia.
Mas em que medida a Biblioteconomia brasileira contribuiu, ou ainda contribui, para a
constituição histórica do quadro acima mencionado? Certamente a resposta para esta questão
pode ser encontrada na trajetória que demarca as discussões em torno de quais seriam o
conjunto de conhecimentos necessários à formação teórica e prática dos profissionais
bibliotecários do país.
Dissemos, com base nos argumentos defendidos por SILVA (1995; p.8), que todo currículo é
um artefato que se origina de nossas práticas culturais e que, por esta razão, não deve ser
pensado como o resultado de um processo social necessário de transmissão de valores,
conhecimentos e habilidades em torno dos quais haja um acordo geral, mas sim, como um
processo constituído de conflitos e lutas entre diferentes tradições e diferentes concepções
sociais. Neste sentido, e como acontece em qualquer campo do conhecimento, a construção
dos currículos das escolas de Biblioteconomia brasileiras também está permeada por este jogo
de tensões e contradições. Razão pela qual é possível indicar que o atual modelo de formação
dos nossos bibliotecários se sustenta em diretrizes lançadas ao longo de quase um século de
história.
Como demonstramos em vários pontos desta pesquisa, a marca mais eminente da constituição
da Biblioteconomia brasileira enquanto campo do conhecimento é a disputa entre dois
modelos distintos de formação: o modelo “humanista” e o “modelo tecnicista”. Modelos que
até o início da década de 1950 conviveram com certa tranqüilidade e responderam, até certo
ponto, às necessidades de mão-de-obra do país. Contudo, a adoção de uma ideologia
192
desenvolvimentista através da técnica decretou a supremacia do segundo em relação ao
primeiro. E foi aí que o ensino de Biblioteconomia entrou em contradição com a realidade
sócio-cultural do país.
Segundo dados do INAF (Indicador Nacional de Alfabetismo Funcional / 2001), o Brasil
possui 9% de sua população completamente analfabeta, 65% não conseguem compreender
plenamente aquilo que lêem e apenas 26% são plenamente alfabetizados
13
, índices
preocupantes para um país em vias de desenvolvimento. Contudo, o que pretendemos
demonstrar com estes números é a quase inexistência de participação das bibliotecas e dos
bibliotecários na promoção de mudanças neste cenário.
Durante os 3 (três) primeiros capítulos desta pesquisa caracterizamos as bibliotecas como
“lugares de práticas culturais”, ou seja, como lugares de memória, cultura, educação e
leitura. Espaços físicos que embora permeados por tensões ideológicas, paradoxos e
contradições se transmutam em ambientes privilegiados do saber, nos quais o patrimônio
cultural humano encontra solo profícuo para edificar as bases em que nossa identidade se
constitui, se nutre e se valoriza.
No capítulo seguinte, por sua vez, nos detemos na figura do bibliotecário como agente
histórico, cujo ofício é demarcado pelas atividades de coleta, organização, preservação e
disseminação da materialidade simbólica que resulta de nossa atividade intelectual. Ao fim
deste breve resumo, cabe aqui uma interrogação: por que estas potencialidades das bibliotecas
e dos bibliotecários não ficaram tão marcadas na sociedade brasileira?
Certamente porque o modelo de formação de bibliotecários aqui instituído não fornece os
aparatos teóricos e práticos necessários à efetivação deste conjunto de potencialidades. Ao
tornar-se excessivamente tecnicista os currículos das escolas de Biblioteconomia do país
romperam com o cenário histórico em que ocorre a formação dos profissionais da informação
13
Os dados acima apresentados tiveram por base a seguinte referência: RIBEIRO, Vera Masagão. Por mais e
melhores leitores: uma introdução. In: RIBEIRO, Vera Masagão (Org.). Letramento no Brasil: reflexões a partir
do INAF. 2 ed. São Paulo: Global, 2004, p.9-29.
193
e desconsideraram o lugar que as bibliotecas e os bibliotecários ocupam na sociedade
brasileira.
Preocupando-se mais com as atividades técnicas de organização dos acervos que com os
problemas sociais ligados ao acesso à informação, o sistema de ensino aqui instituído
desconsidera a participação social deste profissional em esferas como a promoção da leitura, o
incentivo à equalização das práticas educacionais e à preservação dos símbolos culturais ou
dos lugares de memória.
Contudo, o fator que nos causa mais espanto é aquele que determina que este cenário não é
exclusivo de um dado período da história da Biblioteconomia nacional, é um problema que
ainda se evidencia quase um século após a fundação do primeiro curso do país. Apontamos
isto com base no conjunto de disciplinas que compõem as grades curriculares dos 5 (cinco)
cursos selecionados como universo empírico desta pesquisa.
Após a análise dos dados, tornou-se visível que os conteúdos obrigatórios dos cursos
estudados priorizam disciplinas técnicas relacionadas às áreas de Processamento da
Informação, Gestão de unidades e serviços de informação, bem como o uso das Tecnologias
da informação. Realidade bem acentuada nos programas curriculares dos cursos de
Biblioteconomia da Universidade de São Paulo – USP, da Universidade Federal de Minas
Gerais – UFMG e da Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. Característica que
evidencia a gestão de acervos como principal atividade profissional dos bibliotecários
formados no Brasil.
Em contrapartida, disciplinas que favorecem uma discussão mais aprofundada dos impactos
gerados pelo acesso ou pela falta de acesso à informação e qual deveria ser a participação das
bibliotecas e dos bibliotecários na construção social da realidade brasileira são oferecidas
como optativas. É o caso daquelas que compõem o escopo das áreas de Fundamentos teóricos
da Biblioteconomia e da Ciência da Informação e da área de Pesquisa. Mas este ainda não é o
maior problema. O problema está na forma como seus conteúdos são ministrados. Ou seja,
como apanhados enciclopédicos ou generalistas de conhecimentos essenciais para que os
bibliotecários possam ampliar suas possibilidades de atuação profissional. Demonstremos isto
com um exemplo.
194
No capítulo 3 desta pesquisa descrevemos a biblioteca como um lugar propício para que as
práticas ligadas à leitura se efetivem fora do ambiente escolar e apresentamos o bibliotecário
como um importante agente no processo de equalização das práticas educativas. No entanto,
para que esta perspectiva realmente se concretize os cursos de Biblioteconomia deveriam
prover seus alunos com os aparatos teóricos e técnicos necessários à realização das atividades
acima mencionadas. Condição que efetivamente não se estabelece.
Isto porque, dos 5 (cinco) cursos estudados, apenas 3 (três) – USP, UFMG e UNB,
disponibilizam 1 (uma) disciplina relacionada à história da leitura ou à formação de leitores
em suas grades curriculares. E, para salientar aquilo que dissemos anteriormente, nestes três
cursos a referida disciplina é ofertada como optativa.
Sendo assim, se nosso objetivo era investigar em que medida os currículos das escolas de
Biblioteconomia aproximam o universo das práticas culturais às atividades desenvolvidas em
uma biblioteca, penso já termos levantado indícios suficientes para apontar que o ensino de
Biblioteconomia no Brasil optou, e isto é uma característica histórica, por formar profissionais
capacitados tecnicamente para o processamento e gestão dos acervos preservados em uma
unidade de informação, em detrimento do exercício de capacitá-los a compreender
criticamente a importância que seu ofício assume no processo de construção das muitas
esferas de atuação humana.
Portanto, se quisermos revitalizar a imagem do bibliotecário como agente histórico que,
através de seu ofício, contribui para a conformação das múltiplas paisagens sócio-culturais
onde se insere, devemos repensar os parâmetros que norteiam sua formação educacional e
lembrar que a técnica, concebida acriticamente, reforça as desigualdades e retira das
bibliotecas, seu ambiente de trabalho por natureza, a possibilidade de servir de espaço de
representação coletiva onde aquilo que entendemos por identidade constantemente se reafirma
e no qual as “práticas culturais” entendidas nos termos desta pesquisa se corporifica.
195
7. Considerações finais
Ai, palavras, ai, palavras,
que estranha potência, a vossa!
Ai, palavras, ai, palavras,
sois de vento, ides no vento,
no vento que não retorna,
e em tão rápida existência,
tudo se forma e se transforma!
Sois de vento, ides no vento,
e quedais com sorte nova!
Ai, palavras, ai, palavras,
que estranha potência, a vossa!
Todo o sentido da vida
principia à vossa porta...
1
Vivendo, se aprende; mas o que se aprende, mais, é só a fazer outras
maiores perguntas.
2
1
MEIRELES, 1986; p.492-493.
2
ROSA, 2006; p.378.
196
Esta dissertação tem sua gênese ligada à exaltação da palavra e à busca por elucidar uma de
minhas mais antigas inquietações: por que as palavras deitadas nas páginas de um livro
exercem tanto fascínio sobre a vida dos homens e qual a participação da biblioteca na
edificação da história humana? Ao recuperar um pouco da história dos livros e das
bibliotecas, a presente pesquisa projeta um rastro de luz sobre esta instigante questão.
Vimos, logo nas primeiras linhas que dão corpo a este trabalho, que a palavra ocupa um lugar
central na formação da cultura do Ocidente, visto que esta encontra seu ponto de referência
nos preceitos que fundamentam a tradição judaico-cristã, cuja história inicial se narra através
de dois livros sagrados: a Torá e a Bíblia.
A Torá, conjunto das palavras que Deus dirigiu diretamente aos homens, é o eixo ao redor do
qual o povo judeu entrelaça as referências, as elucidações, o debate hermenêutico que
organiza e informa a vida da comunidade em seu dia-a-dia e ao longo da história. Dito de
outra forma, o conjunto dos livros que congregam os ensinamentos da Torá expressa e enseja
o continuum da existência judaica.
Definindo-se por sua devoção à palavra, nenhuma outra tradição ou cultura atribuiu tanta
importância à conservação e à transcrição de textos. Condição que se evidencia através de
toda a teoria e toda a técnica que circunscreve o universo da cabala, segundo o qual em cada
letra hebraica, a partir de sua forma e de seu nome, está gravado uma multiplicidade de
energias e significados.
As letras contêm a essência da divindade porque, de acordo com os cabalistas, Deus criou o
universo mediante as múltiplas combinações possíveis de se estabelecer entre os números
cardinais de um a dez e as vinte e duas letras do alfabeto.
Vinte e duas letras fundamentais: Deus desenhou-as, gravou-as,
combinou-as, pesou-as, permutou-as e com elas produziu tudo o que é e
tudo o que será. Em seguida, revela-se qual letra tem poder sobre o ar, e
qual sobre a água, e qual sobre o fogo, e qual sobre a sabedoria, e qual
sobre a paz, e qual sobre a graça, e qual sobre o sonho, e qual sobre a
cólera, e como (por exemplo) a letra Kaf, que tem poder sobre a vida,
serviu para formar o sol no mundo, a quarta-feira no ano e a orelha
esquerda no corpo. (BORGES, 1999; p.102).
197
Em decorrência de sua essência divina e da capacidade de nomear e dar vida a todas as coisas,
as palavras inscritas na Torá constituem um livro que transcende a natureza desafiadora do
tempo e do espaço. Razão pela qual, mesmo após tantas diásporas, sua leitura demarca, quer
no nível interpretativo-meditativo, quer no comportamental, um movimento no qual o povo
judeu reverencia seu mundo e sua pátria. O “povo do livro” foi, portanto, o primeiro a instituir
a palavra escrita como sua morada. Morada que se edifica em todos os cantos da terra, mas
está permanentemente ligada ao centro de sua tradição.
Se as palavras que deram forma à Torá foram ditadas pelo Deus de Israel, a certeza de que a
divindade escrevera um livro também permeia os fundamentos da teologia cristã. A Bíblia, ou
a Escritura erigida pela vontade do Espírito Santo, é, segundo o filósofo George Steiner, “o
livro que define, e não apenas para a civilização ocidental, o conceito de texto”. (STEINER,
2001; p.51).
Isto porque, segundo este pensador de origem judaica, todos os outros livros que narram a
história do Ocidente, por mais diferentes que sejam seus assuntos e sua organização,
relacionam-se, ainda que indiretamente, a este Livro dos livros. Ou seja, tal qual a Torá para o
povo judeu, a Bíblia preserva grande parte da identidade histórica e social da tradição
ocidental. Todos os demais livros que constituem nosso cânone intelectual estabelecem, em
maior ou em menor medida, um diálogo multifacetado com o texto bíblico. Desta relação
apreende-se que:
A filologia e a lingüística comparada, o estudo da gramática e da retórica
desenvolveram-se, todos eles, em torno de um ponto focal bíblico. Os
conceitos ocidentais de história e historiografia originam-se nas
organizações de tempo e de fatos da narrativa das Escrituras. As teorias
políticas medievais, renascentistas e do século dezessete buscam
fundamentar-se nos princípios teocráticos das sucessivas formas de
governo do Antigo Testamento ou, em movimento oposto, buscam dele se
emancipar. Por vários séculos a jurisprudência se debateu com o
problema de uma possível concordância entre os critérios legais de
Moisés e Paulo e os dos modelos romanos e da “lei natural”. O mesmo
ocorre com livros e monografias de abordagem psicanalítica em relação a
personagens e episódios bíblicos. (STEINER, 2001; p.53).
Não por acaso o movimento que marca a popularização do livro na Europa e, logo em
seguida, nas demais partes do globo tem como ponto de partida a impressão da “Bíblia de 42
linhas” por Gutenberg em meados do ano 1462. A partir deste momento a história do
198
Ocidente se tornara amplamente marcada pela leitura apaixonada de livros, chegando mesmo
a se definir como uma sociedade livresca no mais profundo sentido da palavra.
Portanto, a primeira resposta satisfatória para nossa questão inicial nos é apresentada pelos
aportes históricos que demonstram que toda tradição ocidental se difunde tendo como ponto
de referência os preceitos oriundos de dois livros sagrados. Enquanto textos canônicos, é para
a Torá e para a Bíblia que muitos homens se voltam quando almejam satisfazer sua busca por
felicidade, seu desejo de encontrar sabedoria.
No entanto, é preciso ressaltar que os homens não se relacionam com os livros apenas porque
desejam aproximar-se das verdades sibilinas. Como produto que adquire forma através da
atividade racional humana, eles se convertem no instrumento a partir do qual qualquer sujeito,
fazendo uso da tinta e da pena para dar voz à ansiedade ou à imaginação que por vezes
queimam seu corpo, contribui para que a memória coletiva que caracteriza uma dada
sociedade se preserve incólume dos assédios do tempo e do esquecimento. Talvez por esta
razão Jorge Luís Borges (1999) certa vez afirmou que:
Dos diversos instrumentos do homem, o mais assombroso é, sem dúvida,
o livro. Os demais são extensões de seu corpo. O microscópio e o
telescópio são extensões de sua visão; o telefone é a extensão de sua voz;
em seguida, temos o arado e a espada, extensões de seu braço. O livro,
porém, é outra coisa: o livro é uma extensão da memória e da imaginação.
Em César e Cleópatra, de Shaw, quando se fala da biblioteca de
Alexandria, diz-se que ela é a memória da humanidade. O livro é isto. E é
algo mais, também: a imaginação. O que é nosso passado senão uma série
de sonhos? Que diferença pode haver entre recordar sonhos e recordar o
passado? Essa é a função exercida pelo livro. (BORGES, 1999; p.189).
Extensão da memória e da imaginação, talvez estas sejam as duas virtudes do livro que mais
fascinem seus leitores. Como instrumento de memória, eles preservam em suas páginas o
conjunto dos elementos históricos que informam os homens sobre seu passado, dando-lhes a
possibilidade de projetar uma explicação para o presente, de divagar acerca do futuro.
Enquanto produto da imaginação, eles se portam como pouso seguro para todos os delírios,
sonhos, paixões, aventuras e desventuras da alma humana.
Portanto, eis aqui a segunda explicação possível para nossa inquietação inicial: os livros nos
encantam porque suas páginas estão permeadas pelas mais diversas experiências humanas.
199
Experiências que, quando resgatadas através da leitura, se transformam em experiências
individuais, refletindo aquilo que somos e as muitas facetas com as quais nossas palavras
esculpem o mundo.
Foi justamente para reunir, organizar, preservar e disseminar este conjunto de materialidades
que comportam boa parte das experiências humanas relatadas pelo universo das palavras, que
as bibliotecas apareceram para a história. A acumulação de livros é, de acordo com esta
proposição, uma dinâmica que demarca a vontade dos homens de enfrentar o tempo e resistir
às investidas do esquecimento. Razão pela qual toda biblioteca se define como espaço de
preservação da memória e do patrimônio cultural, artístico e literário que institui forma aos
movimentos racionais de uma dada localidade. São, portanto, lugares de representação
coletiva onde aquilo que chamamos de identidade encontra solo profícuo para nutrir-se e
valorizar-se.
Se em seus primeiros séculos de existência as bibliotecas caracterizaram-se pela função de
depositária da materialidade concebida através da escrita, as sucessivas revoluções em torno
do livro impuseram-lhes inúmeras outras funções sociais. Na modernidade, além das
atividades de coleta, organização, preservação e disseminação do escrito, as bibliotecas
devem participar ativamente do processo de construção sócio-histórica das múltiplas
paisagens culturais que configuram o lugar onde encontram-se inseridas.
Mas em que medida as bibliotecas se tornam capazes de oferecer uma resposta satisfatória
para este conjunto de exigências? Foi exatamente isto que buscamos responder através dos 3
(três) primeiros capítulos desta pesquisa. Ao relacionar as atividades desenvolvidas em uma
biblioteca com o universo da memória, da cultura, da educação e da leitura nos capacitamos a
defini-la como um “lugar de práticas culturais”. Ou seja, como espaços que mesmo
permeados por tensões e contradições refletem os interesses e fraquezas de seus
interlocutores, bem como a maravilhosa pluralidade identitária que conformam os estratos
vitais de uma nação.
Por isso, seus acervos chamam a atenção para a necessidade de se preservar os símbolos
culturais que garantem identidade e visibilidade a um dado tecido sócio-cultural, justamente
por serem estes os elementos que lhes instituem o status de comunidades históricas. Portanto,
embora seja, em essência, um lugar de diálogo com o passado, toda biblioteca funciona
200
também como espaço de criação e inovação, onde a conservação só tem sentido como
fermento dos saberes a serviço da coletividade inteira.
Se o conhecimento é acumulativo, as bibliotecas, através do exercício de coleta, organização,
preservação e disseminação capitalizam essa herança e permitem aumentá-la graças a
atividade coletiva daqueles que as exploram. E é exatamente tal potencialidade que lhes
confere um lugar de destaque no processo de construção sócio-histórica da modernidade,
momento no qual a informação se constitui como elemento indispensável à edificação de
todas as esferas de atuação humana.
Característica que, por sua vez, suscitou uma série de questões em torno da atuação e da
formação do bibliotecário. Profissional que se posiciona como mediador entre as várias
materialidades informacionais que compõem os acervos de uma biblioteca e os inúmeros
segmentos sociais que buscam acessá-los.
Ao constatar que o bibliotecário se encontra no centro do processo de socialização e
democratização da informação, determinando em que condições e quais usuários poderão dela
usufruir, nos sentimos obrigado a investigar como este ofício emerge para a história das
profissões e qual o perfil de profissional da informação o atual sistema de ensino de
Biblioteconomia brasileiro almeja constituir? Esta pergunta se mostrou importante para
apreendermos se a estrutura curricular que dá forma ao modelo acima referido compreende,
em termos práticos e teóricos, a biblioteca como um “lugar de práticas culturais”.
Iniciando a busca por respostas para mais estas questões, descobrimos que a primeira imagem
que a história reserva a este profissional é a do “bibliotecário humanista”, do zelador
cuidadoso de todos os segredos mantidos por uma biblioteca. Razão pela qual eram quase
sempre representados como sábios humanistas portadores de uma memória prodigiosa, capaz
de atribuir sentido e ordem às várias facetas do saber que vertiginosamente se começava a
acumular.
Este perfil de bibliotecário, em sua maioria filósofos, cientistas, poetas ou religiosos, era
marcado por uma sólida formação erudita a partir da qual, e por intermédio de sua atividade
profissional e intelectual, interferia diretamente na paisagem econômica, política, social e
cultural do lugar onde se encontrava alocado. Portanto, para aqueles que objetivassem exercer
201
o ofício de bibliotecário eram necessárias qualidades como amor à leitura e prazer para o trato
com os livros, aguçado senso de organização, perspicácia para criar e manejar inúmeros
sistemas classificatórios, dominar com fluência idiomas modernos e antigos, especialmente o
latim e o grego, para acesso aos mistérios e segredos do conhecimento.
Com o avançar do tempo, que a tudo transforma, vimos que para manter sua reserva de
mercado os bibliotecários se viram obrigados a inserirem-se na categoria dos Modernos
Profissionais da Informação, sujeitos que participam ativamente de todas as etapas do ciclo
informacional e travam íntimo contato com as tecnologias da informação.
Ao inserir-se nesta nova categoria profissional e por incorporar em seu perfil novas
habilidades e competências, sua formação, até então voltada para o apoio à educação como
suporte ao processo de ensino-aprendizagem, para o estudo, à pesquisa, e para o planejamento
e administração dos recursos informacionais, passou a priorizar premissas como:
planejamento, gerência e processamento de sistemas de informação, além da concepção e uso
das recentes tecnologias da informação e da comunicação - TICs.
Ou seja, além de enfatizarem em seus aspectos teóricos, práticos e tecnológicos os processos
de coleta, organização e preservação da informação, os Modernos Profissionais da
Informação devem levar em consideração os fatores que demarcam sua concepção, circulação
e acesso, além das conseqüências econômicas, políticas e sociais que influenciam na
conformação histórica de uma dada paisagem cultural.
Efetuado este percurso histórico, chegamos à primeira resposta que buscávamos. No entanto,
era preciso voltar o olhar para a formação dos bibliotecários brasileiros e apreender em que
medida a Biblioteconomia nacional acompanhou o ritmo destas mudanças, bem como o perfil
de profissional da informação que atualmente se forma no país.
Para tanto, nossa estratégia inicial foi recuperar os principais acontecimentos históricos
responsáveis por instituir forma à Biblioteconomia brasileira enquanto campo do
conhecimento. Nesta empreitada, ressaltamos que os primeiros cinqüenta anos desta história,
de 1911 a 1960, têm como característica básica a vigorosa disputa ideológica acerca de quais
deveriam ser os fundamentos teórico-práticos transmitidos pelos cursos que começam a se
formar. Centrando-se em dois modelos, o “humanista” e o “tecnicista”, esta disputa permeou
202
todas as discussões posteriores em torno da implementação do melhor modelo de formação
para os bibliotecários do país.
Se os primeiros 50 anos acima mencionados caracterizaram-se pela busca por se constituir os
fundamentos de uma Biblioteconomia Nacional, os 30 anos seguintes, de 1960 a 1990, foram,
como vimos, pautados pela tentativa de se discutir, desenvolver e implementar um plano de
Currículo Mínimo que promovesse o reconhecimento legal da profissão, além de instituir
coerência e visibilidade à área, ampliando, assim, seu espaço de atuação social.
Ou seja, através da aprovação do Currículo Mínimo Obrigatório, a classe bibliotecária
almejava padronizar não apenas o ensino, mas também suas atividades mediante a
especialização de conteúdos que pudessem melhorar a qualidade da execução das rotinas
biblioteconômicas. Currículo que, ao edificar-se no período de redemocratização civil, onde a
informação adquire o status de elemento indispensável à construção das várias esferas sociais
humanas, procurou, em maior medida, estabelecer um equilíbrio entre a concepção humanista
difundida pela tradição francesa e a concepção tecnicista de orientação norte-americana.
Equilíbrio que na prática não se efetivou. Razão pela qual a Biblioteconomia brasileira ainda
apresentava, nos primeiros anos da década de 1990, alguns pontos críticos a serem debatidos
tendo-se em vista alcançar uma formação profissional mais adequada face às necessidades
culturais e mercadológicas que começam a surgir. Buscando responder satisfatoriamente às
demandas deste novo cenário, o período que compreende toda a década de 1990 até os dias
atuais se mostra amplamente influenciado pela tentativa de se constituir um novo perfil de
atuação para os bibliotecários, bem como dotá-los das habilidades e competências requeridas
pelos mercados informacionais brasileiros e do Mercosul.
Mercado que, devido à dimensão territorial do país, apresenta-se multifacetado e com
demandas específicas de mão-de-obra especializada. Razão pela qual chamamos a atenção
para o fato de que entender como a sociedade se organiza em torno dos processos de
produção, captação, organização e disseminação da informação havia se tornado
indispensável para a revalorização do labor bibliotecário e para a permanência deste
profissional no mercado de trabalho.
203
Contudo, havíamos apontado que em virtude da disputa entre modelos “humanistas” e
“tecnicistas” as disciplinas culturais que compõem os currículos de biblioteconomia do país
sempre foram tratadas como apanhados generalistas e pretensamente enciclopédicos de temas
necessários à formação educacional e cultural deste profissional, houve-se então a
necessidade de investigarmos se tal condição ainda se fazia presente na atualidade.
Tentamos elucidar esta última inquietação através da análise das grades curriculares de 5
(cinco) cursos de graduação em Biblioteconomia do Brasil (UFSC, UFMG, USP, UFPb e
UNB). Estratégia que nos permitiu reunir indícios para apontar qual a principal vertente
teórico-prática adotada pelo atual sistema de ensino de Biblioteconomia do país, bem como o
perfil de bibliotecário que o mesmo almeja formar.
Após a análise dos dados, tornou-se visível que todos eles priorizam em suas estruturas
curriculares conteúdos obrigatórios relacionadas às áreas de Processamento da Informação,
Gestão de unidades e serviços de informação, bem como o uso das Tecnologias da
informação. Em contrapartida, os conteúdos que favorecem uma discussão mais aprofundada
dos impactos gerados pelo acesso ou pela falta de acesso à informação, bem como a
interpretação crítica de qual deveria ser a participação das bibliotecas e dos bibliotecários na
construção social da realidade brasileira são oferecidos em disciplinas optativas de cunho
altamente generalista. É o caso do conjunto de saberes que compõem o escopo teórico-prático
das áreas de Fundamentos teóricos da Biblioteconomia e da Ciência da Informação e da área
de Pesquisa.
Sendo assim, se nosso objetivo era investigar em que medida os currículos das escolas de
Biblioteconomia aproximam o universo das práticas culturais às atividades desenvolvidas em
uma biblioteca, os indícios levantados com o processamento dos dados apresentados no
capítulo 5 desta pesquisa nos permitiram apontar que o ensino de Biblioteconomia no Brasil
optou, e isto é uma característica histórica, por formar profissionais capacitados tecnicamente
para o processamento e gestão dos acervos preservados em uma unidade de informação, em
detrimento do exercício de capacitá-los a compreender criticamente a importância que seu
ofício assume no processo de construção das muitas esferas de atuação humana.
Condição que se mostra paradoxal em virtude da informação ser um dos elementos
responsáveis pela construção e conformação dos muitos setores oriundos da atividade racional
204
humana e um insumo indispensável à efetivação do projeto de crescimento de qualquer nação
em vias de desenvolvimento.
Sendo assim, defendemos que o fazer racional dos bibliotecários deveria ser respaldado pelo
equilíbrio entre disciplinas teóricas, de cunho humanístico, e aquelas voltadas para as técnicas
de seleção, organização, preservação e disseminação da informação. Isto porque, a técnica,
isolada do racional e pensada separadamente do social, contribui para a homogeneização da
sociedade em torno de valores, normas, idéias e comportamentos dominantes, além de retirar
deste profissional seu papel de agente histórico.
Papel que está diretamente imbricado à função que a história dispensou às bibliotecas: servir
de refúgio seguro para os mais íntimos sonhos, desejos, imagens, histórias, conhecimentos,
aventuras e desventuras que as palavras (a única porta para o infinito segundo João Guimarães
Rosa) oferecem aos homens a capacidade de fabular.
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254. SOUZA, Francisco das Chagas de. Os paradigmas da Biblioteconomia e suas
implicações no ensino desta ciência. Encontros Bibli, Florianópolis, n.2, p.1-14, set., 1996.
255. STEINER, George. Lições dos mestres. Rio de Janeiro: Record, 2005.
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228
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Campinas, v.12, n.2, p.61-69, jul./dez, 2000.
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266. VALENTIM, Marta Lígia Pomin. Atuação e perspectivas profissionais para o
profissional da informação. In: VALENTIM, Marta Lígia (Org.). Profissionais da
informação: formação, perfil e atuação profissional. São Paulo: Polis, 2000, p.135-152.
(Palavra-Chave; 11).
267. VALENTIM, Marta Lígia Pomin. Formação: competências e habilidades do profissional
da informação. In: VALENTIM, Marta Lígia (Org.). Formação do profissional da
informação. São Paulo: Polis, 2002, p.117-132. (Palavra-Chave; 13).
268. VALENTIM, Marta Lígia Pomin. Introdução. In: VALENTIM, Marta Lígia (Org.).
Profissionais da informação: formação, perfil e atuação profissional. São Paulo: Polis, 2000,
p.7-29. (Palavra-Chave; 11).
269. VALENTIM, Marta Lígia Pomin. O moderno profissional da informação: formação e
perspectiva profissional. Encontros Bibli: Revista de Biblioteconomia e Ciência da
Informação. Florianópolis, n.9, p.16-27, jun. 2000.
229
270. VERGUEIRO, Waldomiro da Costa Santos. O futuro das bibliotecas e o
desenvolvimento de coleções: perspectivas de atuação para uma realidade em efervescência.
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271. VERNANT, Jean-Piere. Aspectos míticos da memória e do tempo. In: Mito e
pensamento entre os gregos: estudo de psicologia histórica. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1990,
p.105-131.
272. VIDAL, Diana Gonçalves. Escola nova e processo edicativos. In: LOPES, Eliane Marta
Teixeira; FARIA FILHO, Luciano Mendes; VEIGA, Cyntia Greive (Orgs.). 500 anos de
educação no Brasil. Belo Horizonte: Autêntica, 2000, p.497-517. (Coleção História; 6).
273. VIEIRA, Anna da Soledade. Desenvolvimento de um novo profissional para um novo
tempo. Revista da Escola de Biblioteconomia da UFMG, Belo Horizonte, v.18, n.1, p.111-
113, 1993.
274. VILLALTA, Luiz Carlos. A censura, a circulação e a posse de romances na América
Portuguesa: (1722-1822). In: ABREU, Márcia; SCHAPOCHNIK, Nelson (Orgs). Cultura
letrada no Brasil: objetos e práticas. Campinas: Mercado de Letras : Associação de leitura do
Brasil; São Paulo: Fapesp, 2005, p.161-181. (Coleção Histórias de leitura).
275. VILLALTA, Luiz Carlos. O diabo na livraria dos inconfidentes. In: NOVAES, Adauto
(Org.). Tempo e história. São Paulo: Companhia das Letras / Secretaria Municipal de Cultura,
1992, p.367-395.
276. VILLALTA, Luiz Carlos. Os leitores e os usos dos livros na América portuguesa. In:
ABREU, Márcia (Org.). Leitura e história e história da leitura. Campinas: Mercado de Letras
: Associação de leitura do Brasil; São Paulo: Fapesp, 1999, p.183-212. (Coleção História de
leitura).
277. WEINRICH, Harald. Lete: arte e crítica do esquecimento. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 2001.
278. WELCH, Lee. The modern information professional: a very personal definition. FID
News Bulletin, The Hague, v.44, n.4, p.47-48, 1994.
279. WILLIANS, Raymond. Cultura. 2 ed. São Paulo: Paz e Terra, 2000.
230
280. WITTER, G. P. Profissional da informação: caracterização e busca de instrumentos para
avaliação. Transinformação, Campinas, v.11, n.1, p.47-53, jan./abr. 1999.
281. YATES, Francês A. El arte de la memória. Madrid: Taurus, 1986.
282. YATES, Francês A. El tratado de la memória de Lodovico da Pirano. In: Ensayos
reunidos. México: Fondo de Cultura Económica, 1991, p.117-139, v: II (Renacimiento Y
Reforma: la contribución Italiana).
283. YOURCENAR, Marguerite. Memórias de Adriano. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,
1980.
284. YÚDICE, George. A conveniência da cultura. In: A conveniência da cultura: usos da
cultura na era global. Belo Horizonte: UFMG, 2004, p.25-64.
285. YÚDICE, George. A globalização da cultura e a nova sociedade civil. In: A
conveniência da cultura: usos da cultura na era global. Belo Horizonte: UFMG, 2004, p.121-
155.
286. YUNES, Eliana. Elementos para uma história da interpretação. In: YUNES, Eliana
(Org.). Pensar a leitura: complexidade. Rio de Janeiro: PUC-Rio ; São Paulo: Loyola, 2002,
p.97-103. (Teologia e ciências humanas; 5).
287. YUNES, Eliana. Função do leitor: a construção da singularidade. In: YUNES, Eliana
(Org.). Pensar a leitura: complexidade. Rio de Janeiro: PUC-Rio ; São Paulo: Loyola, 2002,
p.114-119. (Teologia e ciências humanas; 5).
288. YUNES, Eliana. Leitura, a complexidade do simples: do mundo à letra e de volta ao
mundo. In: INFORMARE: Cad. Prog. Pós-Grad. Ci. Inf. Rio de Janeiro, v.5, n.1, p.6-29,
jan./jun. 1999.
289. ZILBERMAN, Regina. Estética da recepção e história da literatura. São Paulo: Ática,
1989. (Fundamentos; 41).
290. ZILBERMAN, Regina. Fim do livro, fim dos leitores?. São Paulo: SENAC, 2001.
(Ponto Futuro; 3).
231
291. ZILBERMAN, Regina. Políticas de leitura e de formação do leitor no Brasil. Revista da
Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo, v.56, p.53-64, jan./dez., 1998.
292. ZILBERMAN, Regina; SILVA, Ezequiel Theodoro da. Leitura: por que a
interdisciplinaridade? In: ZILBERMAN, Regina; SILVA, Ezequiel Theodoro da (Orgs.).
Leitura: perspectivas interdisciplinares. 3 ed. São Paulo: Ática, 1995, p.11-17. (Fundamentos;
42).
293. ZUMTHOR, Paul. Permanência da voz. O correio da UNESCO, outubro, 1985, ano 13,
n.10, Brasil, p.4-8.
294. ZUMTHOR, Paul. Poesia, tradição e esquecimento. Folha de S.Paulo. São Paulo, 17
dez. 1988. Folhetim, p. G2-G5.
232
9. Anexos
ANEXO 1 - Instituições que possuem curso de graduação
em Biblioteconomia no Brasil
1. CESAT (Serra, ES)
2. FAINC
(Santo André, SP)
3. FATEA
(Lorena, SP)
4. FESP-SP
(São Paulo, SP)
5. FUA
(Manaus, AM)
6. FUNLEC
(Campo Grande, MS)
7. FURG
(Rio Grade, RS)
8. PUC-Campinas
(Campinas, SP)
9. UDESC
(Florianópolis, SC)
10. UEL
(Londrina, PR)
11. UESPI
(Pirajá, PI)
12. UFAL
(Maceió, AL)
13. UFBA
(Salvador, BA)
14. UFC
(Fortaleza, CE)
15. UFES
(Vitória, ES)
16. UFF
(Niterói, RJ)
17. UFG
(Goiânia, GO)
18. UFMA
(São Luís, MA)
19. UFMG
(Belo Horizonte, MG)
20. UFMT
(Rondonópolis, MT)
21. UFPA
(Belém, PA)
22. UFPB
(João Pessoa, PB)
23. UFPE
(Recife, PE)
24. UFPR
(Curitiba, PR)
25. UFRGS
(Porto Alegre, RS)
26. UFRN
(Natal, RN)
27. UFSC
(Florianópolis, SC)
28. UFSCar
(São Carlos, SP)
29. UNB
(Brasília, DF)
30. U NESP
(Marília, SP)
31. UNIFOR
(Formiga, MG)
32. UNINCOR
(Três Corações, MG)
33. UNIPAC
(Ubá, MG)
34. UNI-RIO
(Rio de Janeiro, RJ)
35. UNIRONDON
(Cuiabá, MT)
36. USP
(São Paulo, SP)
37. USU (Rio de Janeiro, RJ)
Disponível em: http://www.crb10.org.br/escolasecursos.html
, Acessado em: 31/08/2005.
233
ANEXO 2 – Grades curriculares dos 5 (cinco) cursos
selecionados como objeto da pesquisa
1. Curso de Biblioteconomia da Universidade Federal de Santa
Catarina – UFSC
Disciplinas Obrigatórias
1º Período
1.Informação aplicada à Biblioteconomia;
2.Comunicação;
3.Inglês Instrumental I;
4.Português prático – Redação;
5.Matemática básica.
2º Período
1.Normalização da documentação;
2.Teoria administrativa;
3.Aspectos sociais, políticos e econômicos do Brasil contemporâneo;
4.Inglês Instrumental II;
5.Literatura em Língua Portuguesa.
3º Período
1.Metodologia científica para Biblioteconomia;
2.Produção dos registros do conhecimento;
3.Arquivística;
4.Lógica;
5.História da cultura;
6.Disciplina optativa I.
4º Período
1.Catalogação descritiva;
2.Classificação Decimal de Dewey;
3.Editoração;
4.Controle dos registros do conhecimento I;
5.Disciplina optativa II;
6.Disciplina optativa III.
234
5º Período
1.Catalogação (entradas e cabeçalhos);
2.Classificação Decimal Universal;
3.Organização e métodos aplicados à Biblioteconomia;
4.Controle dos registros do conhecimento II;
5.Estatística aplicada I;
6º Período
1.Catalogação de multimeios;
2.Indexação;
3.Planejamento dos serviços bibliotecários;
4.Controle dos registros do conhecimento III;
5.Métodos da pesquisa em Biblioteconomia;
6.Disciplina optativa IV.
7º Período
1.Periódicos e seriados;
2.Recuperação da informação;
3.Organização de bibliotecas;
4.Usuários da informação;
5.Controle dos registros do conhecimento IV.
8º Período
1.Automação de bibliotecas;
2.Formação e desenvolvimento de coleções;
3.Disseminação da informação;
4.Biblioteconomia aplicada I;
5.Biblioteconomia aplicada II.
9º Período
1.Estágio supervisionado em Biblioteconomia;
2.Biblioteconomia aplicada III;
3.Disciplina optativa V.
Disciplinas Optativas
1.Sistemas especiais de classificação;
2.Custos aplicados à Biblioteconomia;
3.Marketing aplicado à Biblioteconomia;
4.Paleografia;
5.Bibliotecas universitárias;
6.Bibliotecas escolares;
7.Bibliotecas públicas;
235
8.Bibliotecas infantis;
9.Bibliotecas especializadas;
10. Direitos e deveres do bibliotecário no Brasil;
11. Tópicos especiais em Biblioteconomia;
12. Tópicos especiais em Biblioteconomia (Internet);
13. Tópicos especiais em Biblioteconomia;
14. Gerenciador de base de dados (Microisis);
15. Arquivos especializados;
16. Informação para empresa;
17. Conservação e preservação de documentos especiais;
18. Conservação e restauração de documentos;
19. Introdução à Ciência da Informação;
20. Documentação cartográfica.
Disponível em: http://www.ced.ufsc.br/bibliote/coord/curso.html
; Acessado em: 01/09/2005.
2. Curso de Biblioteconomia da Escola de Ciência da Informação
da Universidade Federal de Minas Gerais – ECI/UFMG
Disciplinas Obrigatórias
1º Período
1.Introdução à teoria democrática;
2.Economia I;
3.Introdução à Filosofia (ênfase em lógica e filosofia da ciência);
4.Informação e Biblioteconomia;
5.Fundamentos de análise sociológica.
2º Período
1.Introdução à informática;
2.Inglês Instrumental;
3.Tratamento da informação I;
4.Unidades de informação;
5.Cultura e informação;
6.Carga optativa complementar.
3º Período
1.Administração (TGA);
2.Estatística;
3.Produção dos registros do conhecimento;
4.Normalização bibliográfica;
5.Tratamento da informação II
236
6.Métodos e técnicas de pesquisa em Biblioteconomia e em Ciência da Informação;
7.Carga optativa complementar.
4º Período
1.Língua portuguesa;
2.Literaturas brasileira e portuguesa;
3.Fontes de informação geral;
4.Tratamento da informação III;
5.Usuário da informação;
6.Administração de unidades de informação I;
7.Carga optativa complementar.
5º Período
1.Fundamentos científicos da comunicação I;
2.Fontes de informação especializada;
3.Tratamento da informação IV;
4.Formação, desenvolvimento e preservação de acervos;
5.Administração de unidades de informação II;
6.Carga optativa complementar.
6º Período
1.Organização e controle bibliográfico da informação;
2.Tratamento da informação V;
3.Serviços de disseminação da informação;
4.Teorias da informação;
5.Administração de unidades de informação III;
6.Carga optativa complementar.
7º Período
1.Estágio supervisionado A;
2.Carga optativa complementar;
3.Carga optativa complementar.
8º Período
1. Estágio supervisionado B;
2. Carga optativa complementar.
Disciplinas Optativas
1.Introdução à tecnologia da informação;
2.Tópicos em tratamento da informação;
3.Tópicos em Arquivologia;
4.Acesso à informação eletrônica;
237
5.Construção de linguagens de indexação I;
6.Construção de linguagens de indexação II;
7.Treinamento de usuários;
8.Tópicos em disseminação da informação;
9.Tópicos em fontes especializadas;
10. Tópicos em fontes gerais,
11. Tópicos em produção de documentos;
12. Tópicos em estudos da informação (seminários);
13. Psicologia social I;
14. Extensão em unidades de informação;
15. Gerência de recursos informacionais;
16. Leitura e formação do leitor;
17. Marketing de unidades de informação;
18. Tópicos em administração de unidades de informação;
19. Tópicos em cultura e informação;
20. Tópicos em formação e desenvolvimento de acervos;
21. Tópicos em informação e sociedade;
22. Tópicos em métodos e técnicas de pesquisa em Biblioteconomia e em Ciência da
Informação;
23. Tópicos em preservação do acervo;
24. Tópicos em tecnologia da informação;
25. Tópicos em teoria da informação;
26. Tópicos em recursos informacionais (seminários).
3. Curso de Biblioteconomia e Documentação do departamento de
Biblioteconomia e Documentação da Escola de Comunicação e
Artes da Universidade de São Paulo – ECA/USP
Disciplinas Obrigatórias
1º Período (Matutino/Noturno)
1.Fundamentos em Biblioteconomia, Documentação e Ciência da Informação;
2.Inglês instrumental para comunicações I;
3.História da cultura e da comunicação I;
4.Língua portuguesa (redação e expressão oral I).
2º Período (Matutino/Noturno)
1.Representação descritiva I;
2.Indexação e resumo;
3.Inglês instrumental para comunicações II;
4.História da cultura e da comunicação II.
238
3º Período (Matutino/Noturno)
1.Biblioteca e sociedade;
2.Representação descritiva II;
3.Representação temática II;
4.Elementos de lógica para documentação.
4º Período (Matutino/Noturno)
1.Recursos informacionais I;
2.Representação temática II;
3.Linguagens documentárias;
4.Teoria e ação cultural;
5.Documentação audiovisual.
5º Período (Matutino/Noturno)
1.Recursos informacionais II;
2.Formação e desenvolvimento de coleções;
3.Introdução à administração de bibliotecas;
4.Lingüística e documentação.
6º Período (Matutino/Noturno)
1.Documentação e informática;
2.Estágio supervisionado em bibliotecas públicas e escolares;
3.Realidade socioeconômica e política brasileira;
4.Teoria e métodos de pesquisa em comunicação.
5.Introdução à Administração.
7º Período (Matutino)
1.Serviço ao usuário;
2.Estágio supervisionado em bibliotecas especializadas e universitárias;
3.Projeto experimental em Biblioteconomia I;
4.Informação, ciência e tecnologia;
5.Planejamento bibliotecário I.
7º Período (Noturno)
1.Serviço ao usuário;
2.Informação, ciência e tecnologia;
3.Planejamento bibliotecário I.
8º Período (Matutino)
1.Planejamento bibliotecário II;
2.Projeto experimental em Biblioteconomia II.
239
8º Período (Noturno)
1.Planejamento Bibliotecário II
9º Período (Noturno)
1.Estágio supervisionado em bibliotecas especializadas e universitárias;
2.Projeto experimental em Biblioteconomia I.
10º Período (Noturno)
1.Projeto experimental em Biblioteconomia II.
Disciplinas Optativas
1.Orientação bibliográfica;
2.Bibliotecas públicas: objetivos e função social;
3.Usuários da informação: comunicação integrada;
4.Laboratório de construção de tesauros;
5.Introdução à Museologia;
6.Imaginário e ação cultural;
7.Leitura: teoria e prática;
8.Tecnologias da informação: estudos de caso;
9.Organização de arquivos fotográficos.
Disponível em: http://www.eca.usp.br/departam/cbd/cursos/index.htm; Acessado em:
01/09/2005.
4. Curso de Biblioteconomia da Universidade Federal da Paraíba
– UFPb
Disciplinas Obrigatórias
1º Período
1.Língua portuguesa I;
2.Introdução à Biblioteconomia;
3.Introdução à Sociologia;
4.Fundamentos Científicos da comunicação;
5.História da Arte;
6.Economia I.
240
2º Período
1.Lógica Formal (Aristotélico – Tomista);
2.História da Literatura I;
3.Literatura da Língua Portuguesa;
4.Introdução à Matemática;
5.Língua Inglesa I;
6.Cultura Brasileira I.
3º Período
1.Evolução do pensamento filosófico e científico I;
2.Indexação e resumo;
3.Sociologia;
4.Estatística;
5.Elaboração de trabalhos monográficos;
6.Inglês Instrumental.
4º Período
1.Disseminação da informação I;
2.Catalogação I;
3.Indexação Pré-coordenada I;
4.Bibliografia Geral;
5.Informação aplicada à Biblioteconomia;
6.História do livro e das Bibliotecas.
5º Período
1.Métodos e técnicas de pesquisa I;
2.Catalogação II;
3.Indexação Pré-coordenada II;
4.Bibliografia Brasileira;
5.Automação em bibliotecas;
6.Organização e administração de bibliotecas I.
6º Período
1.Editoração;
2.Multimeios;
3.Indexação Pós-coordenada;
4.Bibliografia especializada em Ciências Humanas;
5.Formação e desenvolvimento de coleções;
6.Organização e administração de bibliotecas II;
7.Educação Física.
7º Período
1.Marketing bibliotecário;
2.Estudo do usuário;
241
3.Bibliografia especializada em Ciências Biomédicas e Tecnológicas;
4.Optativa;
5.Disseminação da informação II;
6.Planejamento bibliotecário;
7.Optativa.
8º Período
1.Estágio supervisionado;
2.Optativa;
3.Optativa.
Disciplinas Optativas
1.Introdução aos estudos históricos e sociais;
2.Introdução à Psicologia;
3.Técnica de arquivo;
4.Sistemas de bibliotecas;
5.Introdução à Filosofia;
6.Metodologia da Ciência III;
7.Sociologia II (Cultural);
8.Sociologia da Educação I;
9.Fundamentos científicos da comunicação II;
10. História da Paraíba I;
11. História da Paraíba II;
12. Problemas sócio-econômicos contemporâneo;
13. Língua Inglesa II;
14. Língua Francesa II;
15. Língua Portuguesa II;
16. Métodos e técnicas de pesquisa II;
17. Relações públicas e humanas.
Disponível em: http://www.prg.ufpb.br/cursos/1230200A.HTM
, Acessado em: 01/09/2005.
5. Curso de Biblioteconomia da Universidade de Brasília – UNB
Disciplinas Obrigatórias
1º Período
1.Introdução à microinformática;
2.Leitura e produção de textos;
3.Introdução à Biblioteconomia e à Ciência da Informação;
4.Cadeia Seletiva 1;
5.Cadeia Seletiva 2;
6.Disciplina optativa (módulo livre).
242
2º Período
1.Introdução à Administração;
2.Teorias da comunicação I;
3.Controle bibliográfico;
4.Estatística aplicada;
5.Disciplina optativa (módulo livre).
3º Período
1.Editoração;
2.Bibliografia;
3.Análise da informação;
4.Catalogação;
5.Disciplina optativa (módulo livre);
6.Disciplina optativa (módulo livre).
4º Período
1.Planejamento e elaboração de base de dados;
2.Classificação;
3.Planejamento de sistemas de informação;
4.Cadeia Seletiva 3;
5.Disciplina optativa (módulo livre);
6.Disciplina optativa (módulo livre).
5º Período
1.Gerência de sistemas de informação;
2.Indexação;
3.Estágio supervisionado em Biblioteconomia I;
4.Disciplina optativa (módulo livre);
5.Disciplina optativa (módulo livre).
6º Período
1.Redes de informação e transferência de dados;
2.Formação e desenvolvimento de acervos;
3.Serviços de informação;
4.Disciplina optativa (módulo livre);
5.Disciplina optativa (módulo livre);
6.Disciplina optativa (módulo livre).
7º Período
1.Informática documentária;
2.Cadeia Seletiva 4;
3.Estudos de usuários
4.Disciplina optativa (módulo livre);
5.Disciplina optativa (módulo livre);
243
6.Disciplina optativa (módulo livre).
8º Período
1.Estágio supervisionado em Biblioteconomia II;
2.Monografia em Biblioteconomia e Ciência da Informação;
3.Disciplina optativa (módulo livre).
Disciplinas pertencentes às Cadeias Seletivas
1. Cadeia Seletiva 1: O aluno poderá optar por uma das seguintes disciplinas: Lógica 1 ou
Introdução à lógica;
2. Cadeia Seletiva 2: O aluno poderá optar por uma das seguintes disciplinas: Francês
Instrumental, Língua Alemã, Inglês Instrumental 1 ou Língua Espanhola 1;
3. Cadeia Seletiva 3: O aluno poderá optar por uma das seguintes disciplinas: Cultura
Brasileira 1 ou História social e política do Brasil;
4. Cadeia Seletiva 4: O aluno poderá optar por uma das seguintes disciplinas: Evolução
do pensamento filosófico e científico, Introdução à Filosofia, Idéias filosóficas em forma
literária ou Fundamentos de história literária.
Disciplinas Optativas
1.A questão da mulher e políticas sociais;
2.Análise da imagem;
3.Análise de sistemas;
4.Análise dos condicionamentos ambientais;
5.Análise de opinião;
6.Análise gráfica 1;
7.Análise gráfica 2;
8.Análise multivariada 1;
9.Antropologia cultural;
10. Arquivo corrente 1;
11. Arquivo intermediário;
12. Arquivo permanente 1;
13. Banco de dados;
14. Bibliografia brasileira;
15. Bibliografia especializada 1;
16. Bibliografia especializada 2;
17. Biblioteconomia e sociedade brasileira;
18. Cartografia 1;
19. Ciência, tecnologia e governo;
20. Ciências do ambiente;
21. Cinema e literatura;
22. Conservação e restauração de documentos;
23. Criatividade e produtividade;
244
24. Cultura e meio ambiente;
25. Cultura popular;
26. Desenvolvimento de comunidade;
27. Diplomática e tipologia documental;
28. Direito autoral;
29. Direito de cidadania;
30. Direitos humanos e cidadania;
31. Documentação;
32. Elaboração e manutenção de tesauros;
33. Elementos de linguagem estética e História da Arte 1;
34. Elementos de linguagem estética e História da Arte 2;
35. Epigrafia e Paleografia Antiga;
36. Epigrafia e Paleografia Medieval e Moderna;
37. Epistemologia das Ciências Humanas e Sociais;
38. Estatística exploratória;
39. Estética e cultura de massa;
40. Estilística da língua portuguesa;
41. Estudos de sistemas de informação;
42. Evolução da educação no Brasil;
43. Evolução das idéias econômicas e sociais;
44. Filosofia da educação 1;
45. Folclore brasileiro 1;
46. Formação econômica do Brasil;
47. Francês Instrumental 1;
48. Francês Instrumental 2;
49. Fundamentos de linguagem;
50. Fundamentos de linguagem visual;
51. Geografia humana e econômica;
52. Grego 1;
53. Grego 2;
54. História da Arte 1;
55. História da Ciência e da Tecnologia;
56. História da Ciência 1;
57. História da Ciência 2;
58. História da Educação 1;
59. História da Filosofia no Brasil;
60. História da Imprensa;
61. História dos livros e das bibliotecas;
62. História do Teatro 1;
63. História econômica geral;
64. História social e política geral;
65. História social e política Latino-americana;
66. Historiografia do Brasil;
67. Imprensa e sociedade;
68. Informática e sociedade;
69. Inglês Instrumental 2;
70. Instituições do direito público e privado;
71. Introdução ao Direito 1;
72. Introdução ao Direito 2;
73. Introdução à Análise do Discurso;
245
74. Introdução à Antropologia;
75. Introdução à Arquitetura e Urbanismo;
76. Introdução à Arquivologia;
77. Introdução à atividade empresarial;
78. Introdução à Ciência da Computação;
79. Introdução à Ciência da Informação;
80. Introdução à Ciência Geográfica;
81. Introdução à Ciência Política;
82. Introdução à Economia;
83. Introdução à Educação;
84. Introdução à Gravura;
85. Introdução à história das idéias sociais no Brasil;
86. Introdução à Lingüística;
87. Introdução à Música 1;
88. Introdução à programação visual;
89. Introdução à Psicologia;
90. Introdução à Psicologia Social;
91. Introdução à Semântica;
92. Introdução à Sociologia;
93. Introdução à Teoria Literária;
94. Introdução ao estudo da História;
95. Introdução ao estudo das Relações Internacionais;
96. Introdução ao estudo de políticas públicas;
97. Introdução ao planejamento educacional;
98. Introdução ao serviço social;
99. Latim 1;
100. Latim 2;
101. Legislação administrativa;
102. Lexicologia e Lexicografia;
103. Língua Alemã 2;
104. Língua Alemã 3;
105. Língua Alemã 4;
106. Língua Espanhola 2;
107. Língua Espanhola 3;
108. Língua Espanhola 4;
109. Língua Francesa 2;
110. Língua Francesa 3;
111. Língua Francesa 4;
112. Língua Inglesa 2;
113. Língua Inglesa 3;
114. Língua Inglesa 4;
115. Língua Japonesa 1;
116. Língua Japonesa 2;
117. Linguagem publicitária;
118. Linguagens documentárias;
119. Mercadologia em publicidade;
120. Metodologia da História;
121. Métodos de pesquisa;
122. Métodos e processos administrativos;
123. Movimentos populares;
246
124. Mulher, cultura e sociedade;
125. Oficina de produção de textos;
126. Organização de arquivos;
127. Organização de arquivos de computadores;
128. Organização de sistemas;
129. Organização do trabalho intelectual;
130. Organização e tratamento de materiais especiais;
131. Organizações internacionais;
132. Paleografia;
133. Pesquisa jurídica;
134. Planejamento e pesquisa;
135. Planejamento gráfico;
136. Planejamento social;
137. Prática desportiva 1;
138. Prática desportiva 2;
139. Processos de leitura e escrita;
140. Produção e leitura de imagens;
141. Produção gráfica;
142. Psicologia aplicada à Administração;
143. Psicologia da aprendizagem;
144. Psicologia da infância;
145. Psicologia da personalidade;
146. Publicidade e sociedade;
147. Recepção e lazer;
148. Redação oficial;
149. Redação para publicação impressa;
150. Reportagem e entrevista;
151. Reprografia;
152. Sistemas computacionais aplicados à Administração;
153. Sistemas de classificação bibliográfica;
154. Sistemas de informação;
155. Sociologia da ciência;
156. Sociologia da comunicação;
157. Sociologia da cultura;
158. Sociologia da educação;
159. Sociologia do conhecimento;
160. Teatro brasileiro 1;
161. Técnicas de amostragem;
162. Técnicas de pesquisa;
163. Teoria da ciência;
164. Teoria da História;
165. Teoria do conhecimento;
166. Teoria do planejamento;
167. Teoria geral do Direito Público;
168. Teorias contemporâneas da música 1;
Disponível em: http://www.unb.br/fa/cid/
; Acessado em: 01/09/2005.
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