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O temor em ser apontado como o “metido a literato” em uma cidade pequena
bloqueava o adolescente retraído. Dessa maneira, permanecia à sombra das leituras de seus
autores preferidos, conforme ele mesmo afirma, “entrincheirado” atrás dos volumes de quem
já estava sob a luz do reconhecimento literário. A literatura ocupava uma posição marginal
naquela época e os poucos que por meio dela sobreviviam eram reconhecidos por também
poucos iniciados. Segundo Moacyr Scliar, “o livro era um objeto estranho, distante,
hermético” para boa parte dos brasileiros, e Érico, por sua vez, participava dessa minoria
apreciadora que via, nos livros, uma poderosa forma de expressão social.
Estilos, escolas literárias e gêneros diversos configuravam a prática leitora de Érico
Veríssimo e enriqueciam seu caráter em formação de homem das artes e, principalmente, das
letras. Aluízio Azevedo, José de Alencar, Afonso Arinos, Afrânio Peixoto, Monteiro Lobato,
Joaquim Manoel de Macedo, Dostoiévski, Tolstói, Walter Scott, Émile Zola, Coelho Neto,
Júlio Verne, dentre outros, pertenciam à sua biblioteca pessoal, compondo, assim, uma
“salada literária”. Além de tais nomes, outras obras em inglês, da coleção Tauchnitz, vindas
de São Paulo, ligavam-no ao mundo literário estrangeiro, tais como romances e contos de
Clemente Dane, Margaret Kennedy e Katherine Mansfield.
Até meados de 1920, sua vida resumia-se ao trabalho na farmácia e às leituras em seu
tempo livre, com breves viagens a Porto Alegre por motivos de estudos. Nessa época, Érico
finalmente rompe as barreiras preconceituosas construídas pela sociedade e divulga alguns de
seus contos, tendo dois deles publicados na Revista do Globo. Tal acontecimento encorajou-o
a investir nessa área e a seguir escrevendo, uma vez que seus contos “Ladrão de Gado” e “A
Lâmpada Mágica” já estavam lançados nos meios públicos.
Nessas idas a Porto Alegre, a passagem pela Livraria do Globo era obrigatória ao
jovem escritor gaúcho. Lá, Érico conheceu o poeta e prosador Mansueto Bernardi, orientador
literário da firma, e criou laços de amizade que, futuramente, se tornariam profissionais.
Contudo, a precária situação financeira de Érico não o possibilitava de permanecer longos
períodos na capital, pois a farmácia dava-lhe prejuízos exorbitantes e o pai de sua namorada
Mafalda já cobrava-lhe o casamento. Assim, Érico encontrava-se entre realidades distintas,
ora imerso no mundo mágico da literatura, ora tragado pelo mundo concreto e desestimulador.
Eu vivia em três mundos, pelo menos. O primeiro era o da realidade cotidiana; a
rotina fisiológica, o ritual burguês, os avisos de bancos (um bombachudo, para
variar, me encostou um dia o cano do revólver no peito porque eu não lhe quis dar a
crédito um vidro de xarope contra tosse). O outro era o mundo dos livros, das
personagens de ficção que me levavam para outros tempos e outras geografias. O