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ADRIANE DE QUADROS SOBANSKI
COMO OS PROFESSORES E JOVENS ESTUDANTES DO BRASIL E DE
PORTUGAL SE RELACIONAM COM A IDÉIA DE ÁFRICA
CURITIBA
2008
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ADRIANE DE QUADROS SOBANSKI
COMO OS PROFESSORES E JOVENS ESTUDANTES DO BRASIL E DE
PO
RTUGAL SE RELACIONAM COM A IDÉIA DE ÁFRICA
Dissertação de Mestrado apresentada à
Banca Examinadora da Universidade
Federal do Paraná, como exigência parcial
para a obtenção do título de Mestre no
Programa de Pós-Graduação, da Linha de
Pesquisa Cultura, Escola e Ensino, Setor
de Educação, Universidade Federal do
Paraná.
Orientadora: Prof.ª Dr.ª Maria Auxiliadora
Moreira dos Santos Schmidt.
CURITIBA
2008
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A África
é do
outro lado da rua
e nos falta coragem para atravessá
-
la.
Henrique Cunha Jr.
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho à minha mãe, Izaluí. Graças a ela, sempre determinada a
fornecer a mim e a minha irmã uma educação fundamentada no bem e na valorização
da cultura e da educação, foi que me transformei naquilo que sou e pude chegar até
aqui.
Dedico também ao Jorge, companheiro, amigo e marido paciente. Sempre ao
meu lado, soube esperar, ouvir as muitas leituras que fiz dos meus textos e me
incentivar sempre.
AGRADECIMENTOS
À minha orientadora, Prof. ª Dr. ª Maria Auxiliadora Schmidt, a Dolinha, que tem
me acompanhado deste os tempos de graduação e que foi uma das principais
responsáveis pela descoberta do quanto meus caminhos devem se encontrar com a
Educação e, sobretudo, com o ensino de História.
À minha banca de qualificação, Prof. ª Dr. ª Tânia Baibich-Faria e Prof. ª Dr. ª
Leilah Santiago Bufren, tão doces e firmes ao mesmo tempo, me fazendo perceber os
caminhos que ainda precisavam ser trilhados para chegar até o fim deste trabalho.
À professora Dr. ª Tânia Braga, acreditando e incentivando desde o primeiro dia
de incertezas e expectativas.
Aos colegas do PPGE e do grupo de estudos em Educação Histórica, sempre
dispostos a ouvir e ver meus momentos de aflição: Rosi, Ana Cláudia, Geyso, Heleno,
Marcelo, C
armen, Henrique, Alamir, João, Cláudia, Berenice.
A Lilian, minha colega e amiga nos momentos de dúvidas e incertezas, por todo
o apoio e conselhos que me deu durante esse período de construção de conhecimento e
amadurecimento.
Aos professores, colegas e amigos, sempre dispostos a me incentivar e acreditar
em mim: Clarice, Cláudio Hess, Rita, Rosiane, Maridelma, Vanessa, Marlon, Silvia.
SUMÁRIO
TABELAS ...................................................................................................................... 06
RESUMO........................................................................................................................ 08
ABSTRACT.................................................................................................................... 09
INTRODUÇÃO............................................................................................................. 10
CAPÍTULO 1 ÁFRICA, UM CONCEITO SUBSTANTIVO E O SIGNIFICADO
PARA A EDUCAÇÃO HISTÓRICA ......................................................................... 18
1.1 LENDO O PASSADO E COMPREENDENDO O PRESENTE: A EDUCAÇÃO
HISTÓRICA...................................................................................................................19
1.2 LENDO O MUNDO HISTORICAMENTE: PRODUÇÕES EM EDUCAÇÃO
HISTÓRICA...................................................................................................................23
1.3 OS PROFESSORES DE HISTÓRIA E UM NOVO DESAFIO.............................. 25
1.4 A HISTÓRIA DA ÁFRICA E A EDUCA
ÇÃO HISTÓRICA................................
. 28
1.5 A EDUCAÇÃO HISTÓRICA E OS CONCEITOS SUBSTANTIVOS.................. 30
CAPÍTULO 2 – HISTÓRIA DA ÁFRICA: PERSPECTIVAS HISTÓRICAS E
CONHECIMENTO ESCOLAR.................................................................................. 33
2.1 HISTORIOGRAFIA BRASILEIRA: ÁFRICA E BRASIL..................................... 34
2.2 UMA VISÃO ALTERNATIVA: OS ESTUDOS CULTURAIS.............................
42
2.3 AS DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS PARA A EDUCAÇÃO DAS
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS E PARA O ENSINO DE HISTÓRIA E CULTURA
AFRO
-
BRASILEIRA E AFRICANA............................................................................45
2.4 A LEI 10.639/03 E AS DIRETRIZES CURRICULARES ......................................48
2.5 O PAPEL DA ESCOLA E DOS PROFESSORES DE HISTÓR
IA ........................51
2.6 A ÁFRICA E O CONHECIMENTO HISTÓRICO ESCOLAR..............................57
2.7 A HISTORIOGRAFIA ATUAL E AS FORMAS DE EXPLICAR A HISTÓRIA.60
CAPÍTULO 3
AS IDÉIAS HISTÓRICAS DOS PROFESSORES .....................66
3.1 AS IDÉIAS DOS PROFESSORES ........................................................................ 67
3.2 OS PROFESSORES COMO SUJEITOS DO UNIVERSO
ESCOLAR ................ 68
3.3 CAMINHOS DA INVESTIGAÇÃO...................................................................... 72
3.4. AS IDÉIAS DOS PROFESSORES ....................................................................... 75
CAPÍTULOS 4 JOVENS BRASILEIROS E PORTUGUESES E SUAS
RELAÇÕES COM O CONCEITO SUBSTANTIVO ÁFRICA............................. 93
4.1 IDÉIAS PRÉVIAS DOS ALUNOS COMO PONTO DE PARTIDA PARA A
EDUCAÇÃO HISTÓRICA.......................................................................................... 94
4.2 INVESTIGAÇÕES COM JOVENS ALUNOS BRASILEIROS ........................... 95
4.3 INVESTIGAÇÕES COM JOVENS ALUNOS PORTUGUESES....................... 104
CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................... 111
REFERÊNCIAS........................................................................................................ 114
ANEXOS.....................................................................................................................121
TABELAS
TABELA 1
– PROFESSORES BRASILEIROS......................................................... 74
TABELA 2
– PROFESSORES PORTUGUESES ...................................................... 74
TABELA 3 (BRASIL)
-
O QUE ACHA DESSA MEDIDA...................................... 76
TABELA 3 (PORTUGAL) O QUE ACHA DESSA MEDIDA................................
. 77
TABELA 4 (BRASIL)
-
ISSO SE APLICARIA EM PORTUGAL ......................... 78
TABELA 4 (PORTUGAL)
-
ISSO SE APLICARIA EM PORTUGAL.................. 78
TABELA 5 (BRASIL) - QUE ARGUMENTOS VOCÊ USARIA COM SEUS
ALUNOS PARA TRABALHAR TAL ASSUNTO.................................................... 80
TABELA 5 (PORTUGAL) - QUE ARGUMENTOS VOCÊ USARIA COM SEUS
ALUNOS PARA TRABALHAR TAL ASSUNTO.................................................... 81
TABELA 6 (BR
ASIL)
- É IMPORTANTE QUE ESSE TEMA “ÁFRICA”
ENTRE NO CURRÍCULO ESCOLAR? EM QUE SÉRIE?.................................... 81
TABELA 6 (PORTUGAL) - É IMPORTANTE QUE ESSE TEMA “ÁFRICA”
ENTRE NO CURRÍCULO ESCOLAR? EM QUE SÉRIE?.................................... 82
TABELA 7 (BRASIL)
-
IMAGEM DE ÁFRICA O TEXTO TRAZ....................... 83
TABELA 7 (P
ORTUGAL)
-
IMAGEM DE ÁFRICA QUE O TEXTO TRAZ...... 84
TABELA 8 (BRASIL)
JUSTIFICATIVA ............................................................... 86
TABELA 8 (PORTUGAL)
JUSTIFICATIVA........................................................ 87
TABELA 9 (BRASIL) - O ESTUDO DA HISTÓRIA DA ÁFRICA CONTRIBUI
PARA APROXIMAR OS LAÇOS ENTRE BRASIL, PORTUGAL E ÁFRICA .. 88
TABELA 9 (PO
RTUGAL)
- O ESTUDO DA HISTÓRIA DA ÁFRICA
CONTRIBUI PARA APROXIMAR OS LAÇOS ENTRE BRASIL, PORTUGAL
E ÁFRICA ..................................................................................................................... 89
TABELA 10 (BRASIL)
TEXTO SOBRE A ÁFRICA ........................................... 90
TABELA 10 (PORTUGAL) –
TEXTO SOBRE A ÁFRICA.................................... 91
ALUNOS BRASILEIROS
TABELA 1
-
O QUE ACHA DESSA MEDID
A......................................................... 96
TABELA 2
-
ACHA QUE ISSO DARIA CERTO EM PORTUGAL...................... 97
TABELA 3
-
TALVEZ SIM......................................................................................... 99
TABELA 4
-
SERIA DIFÍCIL................................................................................... 100
TABELA 5
-
SERIA INTERESSANTE ESTUDAR A ÁFRICA POR QUE........ 102
TABELA 6
-
IMPORTÂNCIA PARA AS AFIRMAÇÕES.................................... 103
ALUNOS PORTUGUESES
TABELA 1
-
O QUE AC
HA DESSA MEDIDA....................................................... 104
TABELA 2
-
ACHA QUE ISSO DARIA CERTO EM PORTUGAL.................... 105
TABELA 3
TALVEZ SIM...................................................................................... 106
TABELA 4
-
COM CERTEZA.................................................................................. 109
ANEXOS
ANEXOS.................................................................................................................... 112
QUESTIONÁRIO
PROFESSORES.................................................................... 113
R
ESPOSTAS DOS PROFESSORES BRASILEIROS.......................................... 116
RESPOSTAS DOS PROFESSORES PORTUGUESES ....................................... 122
QUESTIONÁRIO
ALUNOS ................................................................................ 130
RESPOSTAS DOS ALUNOS BRASILEIROS...................................................... 132
RESPOSTAS DOS ALUNOS PORTUGUESES.................................................... 139
LEI N° 10.639, DE 9 DE JANEIRO DE 2003......................................................... 147
DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS PARA A EDUCAÇÃO DAS
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS E PARA OENSINO DE HISTÓRIA E
C
ULTURA AFRO
-
BRASILEIRA E AFRICANA ................................................ 148
RESUMO
Com uma reivindicação histórica, sobretudo do Movimento Negro brasileiro, a Lei
10.639 de 09 de janeiro de 2003 tornou obrigatório o ensino de História da África e da
cultura afro-brasileira. No entanto, esta pesquisa procura demonstrar que a existência
de uma legislação não garante a aplicação e a efetivação de uma consciência acerca da
relevância desse conhecimento entendido como um conteúdo curricular. Destacando o
papel dos professores de História nesse processo de reconhecimento da História da
África e da cultura afro-brasileira enquanto conteúdo curricular a ser
ensinado/aprendido, esta pesquisa teve como ponto de partida entender quais idéias os
professores de História apresentam sobre o conceito de África. Para tanto, as pesquisas
em Educação Histórica foram fundamentais, em especial na linha de investigação
ligada à cognição histórica situada, a qual leva em consideração a compreensão das
idéias dos sujeitos escolares no contexto do ensino de História.Considerando os fortes
laços históricos que unem Brasil e Portugal com a África busquei, nesta pesquisa,
identificar como os professores de História dos dois países identificam esse conceito e,
como mediadores do conhecimento histórico, como influenciam na consciência
histórica dos jovens estudantes das séries finais do Ensino Fundamental, também do
Brasil e de Portugal. Sendo assim, passou a ser relevante também investigar as idéias
apontadas pelos alunos desses países, uma vez que a pesquisa apontou a forma com
que as idéias apresentadas pelos professores são fundamentais no desenvolvimento de
uma consciência histórica dos jovens estudantes. Teoricamente me amparei na
Historiografia tradicional sobre a África, sobretudo de Gilberto Freyre com
Casa
Grande e Senzala
, que ainda predomina na construção desse conhecimento no universo
escolar e, portanto, também sobre a consciência histórica dos sujeitos envolvidos. Em
contrapartida, como uma visão alternativa com relação à África, a referência foram os
E
studos Culturais a partir dos sociólogos Stuart Hall e Paul Gilroy, os quais discutem a
perspectiva da diáspora africana e a formação de uma nova identidade nacional a partir
dessa cultura.
Busquei, então, através de um questionário aplicado em professores de História e
alunos
brasileiros e portugueses, identificar as idéias, ou Conceitos Substantivos, que esses
sujeitos apontam com relação à África, procurando sempre entender como o
conhecimento da historiografia pode interferir no desenvolvimento dessas i
déias.
Palavras
-
chave:
África
-
Educação Histórica
-
Conceitos Substantivos
ABSTRACT
With a historical claim, especially Black Movement of Brazil, the Law 10639 of
January 09
th
, 2003 made it mandatory the teaching of the history of Africa and the
Afri
can
-Brazilian culture. However, this research aims to show that the existence of a
law does not guarantee the implementation and execution of the awareness about the
importance of this knowledge seen as a curriculum content. Highlighting the role of
teache
rs of history in the process of recognition of the history of Africa and the
African
-
Brazilian culture as curriculum content to be taught / learned, this research had
as a beginning point to understand what ideas do History teachers have related to the
Afr
ica concept. To do so, the researches were fundamental in History Education, in
particular the line of research related to the historical situated cognition, which takes
into account the understanding of the ideas of school subjects in the context of histo
ry
teaching.
Considering the strong historical ties that unite Brazil and Portugal with Africa I tried,
in this research, to identify how the history teachers of the two countries identify that
concept and, as mediators of historical knowledge, how they influence the historical
awareness of young students of the final grades of Elementary school, also in Brazil
and Portugal. Thus it became relevant also to investigate the ideas raised by the
students of these countries, since the research pointed that the
way in which these ideas
are presented by the teachers, is essential in the development of a historical awareness
of the young students. Theoretically I based my research on traditional Historiography
about Africa, mainly of Gilberto Freyre with Casa Grande and Senzala, which still
predominates in the construction of this knowledge in the school universe and thus
also on the historical awareness of the subjects involved. On the other hand, as an
alternative vision regarding Africa, the references were the Cultural Studies of the
sociologists Stuart Hall and Paul Gilroy, which discussed the prospect of the African
Diaspora and the formation of a new national identity in that culture. I have also tried,
through a questionnaire answered by history teachers, and Brazilian and Portuguese
students of history, to identify the ideas, or the Substantive Concepts, that these
subjects relate to Africa, always trying to understand how the knowledge of
historiography can interfere in the development of these ideas.
Key
words:
África
-
Historic Education
-
Substantive Concepts
10
INTRODUÇÃO
Gabriel Garcia Marquez
1
, no livro Crônica de uma morte anunciada, narra uma
história que se desenrola numa localidade distante da Colômbia, onde Santiago Nasar,
um jovem rico, solteiro e filho único, vê-se como vítima de um ajuste de contas
desencadeado por uma declaração da irmã dos homicidas, feita após a sua atormentada
noite de núpcias. Questões de honra e de virtude, como se pode adivinhar.
Conforme sugere o título, é um relato dos momentos que antecederam a morte do
jovem Santiago, entremeado pontualmente com recuos e avanços no tempo a
acontecimentos que o autor considerou importantes. A morte é, logo no início,
anunciada, retirando
-
se qualquer suspense sobre o desconheciment
o do final.
Em entrevista, o autor assumiu o receio de que o leitor desprezasse a leitura do
livro todo, uma vez que sabia o desfecho do personagem principal. Foi assim que
desenvolveu uma narrativa na qual o leitor seria desafiado a descobrir, então, o mo
tivo
da morte do personagem. Não restaria alternativa a não ser a leitura da obra por inteiro.
Da mesma forma, Collingwood compara o historiador a um detetive. Segundo ele,
provar a autoria de um crime encerra em si mesmo todo o universo de significados q
ue
o detetive busca. Para ele, o trabalho do historiador é semelhante a este. Mas enquanto o
detetive tem de descobrir um autor, é de supor que o historiador conhece a autoria e
deve buscar as motivações.
1
Gabriel Garcia Marquez, escritor colombiano, tem suas obras caracterizadas no estilo do “realismo fantástico”. Foi ganhador do
Nobel de Literatura, em 1982, com o livro “Cem Anos de Solidão”.
11
Assim parece acontecer com a História e com a formação de historiadores e
futuros professores. O desfecho de toda formação parece estar destinado apenas a dois
caminhos: a alguns cabe a função de serem historiadores, produtores do conhecimento
histórico; a outros, os professores
2
, cabe a função de “ensinar um conhecimento
elaborado pelos historiadores.
Mas essa “morte anunciada” acontece bem antes, ainda na vida acadêmica. Em
nossa formação nos cursos de História, acabamos nos tornando produto caracterizado
por uma educação eurocêntrica, vinculada a uma divisão tradicional da História dita
Universal. Seguindo a direção da maioria, ou seja, o inevitável desfecho que leva à
realidade escolar, o professor acaba reproduzindo consciente ou inconscientemente uma
razão única e verdadeira que moldou sua cognição histórica e que, provavelmente,
moldará o resultado das relações entre professores e alunos pelas aulas de História
afora.
Desse modo, as aulas de História também parecem ter uma “morte anunciada”,
sobretudo para os professores. Todos sabem os conteúdos que devem ensinar e aquilo
que os alunos devem aprender. Não nada de novo, apesar de turmas novas e jovens
estudantes diferentes a cada ano. A História não muda. Apesar de muitas sugestões para
incrementar as aulas de História, sua finalidade parece per
der
-se ainda num mar de
dúvidas ou mesmo de acomodações. A única coisa que se tem certeza é a de que os
professores precisam ensinar e os jovens estudantes precisam aprender História.
2
Não pretendo tomar partido das discussões sobre gênero, no caso, professor e professora. Portanto, as referências serão feitas aos
“professores” de modo geral.
12
Para somar mais dúvidas e angústias aos professores, em 2003 o Governo
Federal
elaborou a lei 10.639
3
, tornando obrigatório o ensino de História da África e da cultura
afro-
brasileira no Ensino Fundamental e Médio de escolas públicas e privadas.
Com a leitura das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações
Étnico
-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, a
sensação foi de que mais uma “morte” estava sendo anunciada, afinal a formação
acadêmica de História não tem qualificado os futuros historiadores para esse desafio,
uma vez que a grande maioria dos cursos de História do país nem sequer oferecem uma
disciplina específica sobre a História da África. O que pensar, então, do caso dos
professores de História de escolas públicas ou privadas, que se sentem distantes da
produção aca
dêmica e da pesquisa histórica?
A legislação é clara ao dispensar aos professores um papel fundamental como
mediadores nesse processo de reconhecimento da cultura afro-brasileira e de
valorização da identidade dos afro-brasileiros. Pensando assim, parecia que mais uma
“morte” poderia estar sendo anunciada, porque mesmo que os professores conheçam
parte dessa História, seria relevante dispensar momentos de seu planejamento tão
precioso para inserir esse assunto nas suas aulas?
Não quero com isto propor que a legislação tenha surgido como uma promessa
de fracasso, mas que ela dispensa uma análise mais a fundo, principalmente com relação
ao papel dos professores de História.
Com um projeto pautado nessas dúvidas, a entrada no Mestrado em Educação da
Universi
dade Federal do Paraná promoveu um acréscimo com as investigações em
3
Alterava a Lei n
o
9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelecia as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no
currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro
-
Brasileira".
13
Educação Histórica. Já não havia uma “morte anunciada”, pois a realização de um
trabalho pautado na investigação das idéias que os professores de História, bem como
jovens alunos, brasileiros e portugueses, têm com relação à África não se encerra, ao
contrário, tende a proporcionar cada vez mais informações sobre a temática em questão.
Portanto, minha investigação será norteada por uma questão:
Como os professores e jovens estudantes do Brasil e de Portugal se relacionam
com a idéia de África, considerando
-
a como um conteúdo a ser aprendido/ensinado?
A esta pergunta principal, somam
-
se outras:
1 Que elementos intervenientes aparecem na idéia de África apresentada por
professores e alunos
brasileiros e portugueses?
2 Que significados de África aparecem nas respostas de professores e alunos
brasileiros e portugueses?
Enquanto pesquisa qualitativa, esta dissertação se articulou em torno de quatro
pólos, ou instâncias metodológicas, cuja interação proporcionou o aspecto dinâmico da
investigação. Como início do trabalho se desenvolveu o pólo epistemológico, aquele
que pode ser entendido como o “motor” da pesquisa. Nesse momento aconteceu a
construção do objeto da pesquisa, a delimitação do problema e a construção do objeto
científico a ser investigado.
Sendo assim, no primeiro capítulo desta dissertação acontece uma revisão de
literatura sobre a Educação Histórica, seus primeiros ensaios, investigações e resultados
atuais a partir da pesquisa e elaboração de trabalhos de pós-graduação em Portugal e no
Brasil, no sentido de investigar as idéias substantivas. Entende-se como conceito
substantivo o “conhecimento de conteúdos concretos sobre o passado” que se “referem
14
a conceitos ontológicos da realidade humana e social” (BARCA, 2000). Neste caso em
especial, suas idéias sobre os conteúdos referentes à História da África.
Seguindo a linha de construção da pesquisa qualitativa, os pólos teórico e
morfológico
correspondem à instância metodológica em que as hipóteses se organizam
e em que os conceitos se definem. uma formulação sistemática dos objetos
científicos, como a interpretação dos fatos, de especificação e de definição das soluções
provisoriamente dadas às problemáticas. Especificamente, o pólo morfológico se refere
à configuração do objeto científico assim como do conjunto do processo que permitiu
sua construção.
A partir da leitura das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das
Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e
Africana surgiu a primeira dúvida que passou a nortear este trabalho, ou seja, a
preocupação com o papel dos professores de História na relação existente entre a
legislação e a prática em sala de aula. A análise desse document
al foi fundamental como
ponto de partida para a construção do problema e todo o processo de construção da
investigação que se seguiu.
Sendo assim, no segundo capítulo se analisa a historiografia brasileira produzida
por Gilberto Freyre, Nina Rodrigues e Oliveira Viana, e suas relações com as Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico
-
Raciais e para o Ensino de
História e Cultura Afro-Brasileira e Africana com a intenção de identificar como essa
historiografia interfere na construção do documento e das idéias substantivas que os
professores e jovens estudantes m sobre a África. Os Estudos Culturais auxiliam na
investigação sobre a existência de outra plausibilidade, a da perspectiva culturalista, a
partir das idéias de Stuart Hall
e Paul Gilroy.
15
Por fim, o
pólo técnico estabelece a relação entre a construção do objeto científico
e o mundo real dos acontecimentos. É o momento em que são recolhidas as informações
sobre o mundo real e em que essas informações são convertidas em dados pertinentes
face à problemática da investigação.
Quanto aos sujeitos investigados, professores e jovens estudantes brasileiros e
portugueses, foi procurada uma amostra intencional, a partir da qual a investigação
buscou levantar os elementos de argumentaç
ão com relação às idéias que dão sentido ou
significado ao tema pesquisado. O percurso metodológico em busca de respostas no
mundo real aconteceu a partir de um primeiro inquérito escrito com perguntas abertas e
fechadas destinado, inicialmente, aos profes
sores de História brasileiros e portugueses.
Coletadas no final de 2007, as respostas serviram como referencial para identificar
as informações e convertê-las em dados para continuar o processo da investigação.
Tendo em vista esse referencial foram organizados o terceiro e o quarto capítulos desta
dissertação, baseados na análise das Diretrizes Curriculares e nos inquéritos aplicados a
professores de História e jovens alunos brasileiros e portugueses.
No terceiro capítulo pretendo apresentar o papel dos professores no ensino da
História enquanto sujeitos ativos no universo escolar e as idéias que apresentam, no
Brasil e em Portugal, acerca da África. A escolha desses dois países não pretende, de
maneira alguma, ser feita com o objetivo comparativo, mas como possibilidade de
observar condições diferentes em que ocorrem relações com o conhecimento histórico
no intuito de verificar os pontos de partida, os caminhos percorridos e onde se a
chegada.
A inclusão de Portugal como local de investigação aconteceu pelos laços
históricos que unem aquele país, assim como o Brasil, à África. Outro motivo tem sido
16
a ligação acadêmica que se mantém, sobretudo com a Universidade do Norte de
Portugal, e as investigações que vêm sendo realizadas por alunos e professores da Pós
Graduação em Educação da Universidade Federal do Paraná no que se refere às
pesquisas em Educação Histórica.
Da leitura e análise das respostas dos professores, então, surgiu a idéia de ir mais
além e investigar a relação das idéias desses professores com a construção das idéias
dos alunos, sobretudo das séries finais do Ensino Fundamental de Brasil e Portugal.
Assim, partindo das idéias apresentadas nas respostas dos professores brasileiros e
portugueses, foram formuladas questões que deram origem a um instrumento de
investigação, novamente um questionário, com questões abertas e fechadas, aplicado a
jovens alunos brasileiros e portugueses.
No quarto e último capítulo, a partir da construção do conceito “aluno”, pretendo
discorrer sobre esses sujeitos p
articipantes do universo escolar e como suas experiências
se apresentam no que se refere ao conceito “África”. Por meio de um questionário
respondido por jovens alunos de Brasil e Portugal
4
do Ensino Fundamental, pretende-
se
entender como sua cognição sobr
e a África se apresenta.
Até este momento a expectativa tem causado grande suspense e o resultado do
trabalho promete, ao contrário do livro de Gabriel Garcia Marquez, grande
desconhecimento sobre o final, até mesmo porque os dados obtidos até o momento
pa
ssaram por uma análise prévia. O trabalho de investigação e análise das idéias dos
professores e alunos brasileiros e portugueses ainda se encontra em processo de
4
8ª série do Ensino Fundamental, no caso brasileiro e 9ª ano, em Portugal.
17
construção e o chegou a uma conclusão final. Se é que, neste caso, existe mesmo um
único fi
nal.
18
CAPÍTULO 1 ÁFRICA, UM CONCEITO SUBSTANTIVO E O SIGNIFICADO
PARA A EDUCAÇÃO HISTÓRICA
O passado não reconhece o seu lugar: está sempre presente.
-
Mário
Quintana
-
Aqui, pretendo discorrer sobre uma área de investigação, denominada Educação
Histórica, que passou a ser recorrente nos últimos anos e tem servido de guia para as
pesquisas dos alunos e professores da Pós Graduação em Educação da Universidade
Federal do Paraná, especialmente na linha de pesquisa Cultura, Escola e Ensino.
Para tanto, o caminho percorrido aconteceu a partir da leitura de produções acerca
dessa perspectiva sobre o ensino de História. Além de artigos escritos em Portugal e na
Ingl
aterra, as produções acadêmicas têm sido muito férteis não apenas naqueles países
como têm rendido uma série de investigações em Portugal e também aqui no Brasil.
Os fundamentos teóricos dessa investigação têm se baseado nos trabalhos do
alemão Jörn RÜSEN, que entende a História enquanto uma ciência que tem uma função
didática. Segundo ele, ao entrar em contato com a história, esta deve dar ao sujeito um
significado para a experiência no tempo que está estudando, competência de
interpretação, uma vez que o conhecimento histórico não é cumulativo e capacidade de
ampliar a orientação no tempo. Essa capacidade de orientação no tempo, ou seja, a
relação que o sujeito mantém com o passado e que serve para situá-lo no presente,
19
fundamental para a compreensão histórica, Rüsen define como sendo a consciência
histórica”, categoria bastante utilizada nas investigações em Educação Histórica.
1.1 LENDO O PASSADO E COMPREENDENDO O PRESENTE: A EDUCAÇÃO
HISTÓRICA
Das idéias de Rüsen (2001) e da racionalidade histórica, parte a teoria
desenvolvida pelo inglês Peter Lee (2005) com a formulação de categorias como
“Conceitos substantivos”, relacionados aos conteúdos da História (Renascimento,
Escravidão, Reforma, por exemplo)
5
e “Conceitos de Segunda Ordem”, aqueles que se
remetem à epistemologia da História.
Na década de 1970, pesquisadores do ensino de História no Reino Unido sentiram
necessidade de rever as ações metodológicas e as concepções do ensino da disciplina.
Até aquele momento, entendia-se o ensino a partir das concepções piagetianas, o que
colocava a disciplina numa situação incômoda, uma vez que estas afirmam que o ensino
da História se realiza a partir de uma temporalidade muito distante das crianças em
idade escolar. O resultado era que, para muitos educadores, a maioria dessas crianças
não estava preparada para trabalhar com concepções abstratas de tempo e noções
históricas.
A partir de então, novas propostas passaram a ser analisadas e, desse modo, por
volta dos anos de 1970 e 1980 uma nova concepção, a
New
History
(CHAVES, 2006),
5
O foco da Educação Histórica não é a historiografia, mas c
omo ler e interpretar a experiência historicamente.
20
apareceu como alternativa do ensino de História no Reino Unido. De acordo com essa
perspectiva, o aluno passou a ser percebido como agente de sua própria formação, com
idéias prévias sobre a História e com várias experiências, assim como o professor
passou a ter um papel de investigador constante, necessitando problematizar suas aulas
em diversas situações.
O Projeto “Chata” (Concepts of History and Teaching Approaches) de 1995,
na
Grã Bretanha, foi guiado por Peter Lee e Rosalyn Ashby.
Chata
é a abreviatura para
Conceitos de História e Abordagens de Ensino. O objetivo do projeto
Chata
é traçar
mudanças em idéias dos estudantes sobre a história entre as idades de sete e quatorze
anos. O projeto focalizou-se nos conhecimentos processuais de segunda ordem como a
evidência
ou a
causa
. (CHAVES, 2006)
Nesse processo de cognição é a partir do presente de cada um que o conhecimento
sobre o passado acontece. “Para saber ‘ler‘ a informação, debater e selecionar
mensagens, fundamentadamente é preciso saber interpretar fontes, analisar e selecionar
pontos de vista, comunicar sob diversas formas,
apostar em metodologias que envolvam
os alunos no ato de pensar historicamente”. (BARCA, 2007, p. 6).
De acordo com Barca, não interessa apenas saber História, mas o uso que se faz
dela. Existem diferentes tipos de passado, baseados em diferentes modos de ler o
presente, sendo que o passado deve ser descrito e explicado em coerência com a
evidência existente. A compreensão desse passado deve ser mobilizada na orientação
temporal dos sujeitos, ou seja, através da “consciência história”, idéia que dialoga com o
conceito desenvolvido por Rüsen (2001), e que se embasa na preocupação com o saber
histórico, com o pensar historicamente de crianças e jovens, bem c
omo dos professores.
21
É o que Lee identifica como sendo a
Literacia Histórica
, ou seja, a capacidade de “ler o
mundo historicamente”. (LEE, 2006).
Entre os trabalhos sobre consciência históricados jovens, destacam-se os que
assentam a pesquisa na preocupação explícita de ancorar o conhecimento de uma
história substantiva em idéias de segunda ordem que permitam usar’ esse
conhecimento para uma análise crítica do mundo, como é o caso de Peter Lee, na
Inglaterra, Keith Barton nos Estados Unidos e Peter Seixas no Canadá. Nas questões
identificadas com a relação entre consciência histórica e identidade nacional, salienta
-
se
o trabalho de Peter Lee, apoiado por Rosalyn Ashby e Foster, com o enfoque na
exploração das narrativas que os jovens constroem sobre a história humana, global, e
não apenas sobre a história do seu país. (CHAVES, 2006).
Várias investigações têm surgido sobre a consciência histórica dos jovens e
diferentes autores procuram explorar os sentidos das mensagens que os jovens
apresentam, sobretudo acerca dos seus países: Seixas e Clark, Letourneau e Moisan, no
Canadá; Wertsch, na Rússia; Barton e McCully na Irlanda do Norte; Waldron e Pike na
República da Irlanda.
Rosalyn Ashby (CHAVES, 2006) assenta suas pesquisas no conceito de
evidência, identificação e discussão sobre algumas das preocupações e idéias
alternativas que os alunos podem trabalhar, concentrando nos documentos históricos a
maior parte da influência nessa confirmação de evidência.
Essa linha de investigação foi pautada nas questões que buscam entender os
sentidos que crianças, jovens e professores dão a determinados conteúdos de História,
tais como Renascimento, Reforma, escravidão, chamados de “conceitos substantivos” e
os “conceitos de segunda ordem”, como narrativa, explicação, significância, entre
22
outros. A importância dos conceitos substantivos aparece enquanto ponto de partida
para a investigação prévia da cognição de cada indivíduo.
Isabel Barca, em Portugal desenvolve, a partir dos conceitos substantivos,
experiências com a realização daquilo que denominou de
aula
-
oficina
, na qual o
professor realiza a investigação dos conhecimentos prévios de cada aluno como forma
de iniciar o trabalho contextualizado da História. “O professor de História tem que
desenvolver uma atividade qu
estionadora para conhecer o aparato intelectual dos alunos
de modo a desafiá-lo e acompanhá-lo na construção da sua aprendizagem”. (BARCA,
2006). Seu trabalho de investigação se assenta sobre a utilização de diferentes fontes e
narrativas históricas com o objetivo de promover nos alunos a competência de
compreender que a História é construída com diversas perspectivas.
Naquele país, Barca está à frente de um grupo de pesquisadores na Universidade
do Minho realizando investigações com os alunos do curso de p
ós
-graduação em
Educação
Especialização em Supervisão Pedagógica do Ensino da História
.
Atualmente, os conceitos estruturais ou de Segunda Ordem ocupam um lugar de
destaque nas preocupações dos investigadores em cognição histórica em vários países
europe
us e no continente americano. Assim, no caso específico da significância
histórica, no Reino Unido destaca-se Michael Hunt, na Espanha Lis Cercadillo, nos
Estados Unidos Keith Barton, Linda Levstik, Elizabeth Yeager, Jennifer Greer, Mimi
Coughlin e Stuart Foster, e no Canadá Peter Seixas. O objetivo principal desses
investigadores tem sido melhorar o ensino e a aprendizagem da História através da
exploração das idéias de alunos e de professores sobre o conceito de significância
histórica.
(CHAVES, 2006).
23
Co
m a Grounded Theory (BARCA, 2001), metodologia adotada pela Educação
Histórica, acredita-se que a teoria é construída e desenvolvida de maneira provisória,
sendo confirmada apenas a partir do processo de recolhimento sistemático de dados e
sua constante an
álise.
1.2 LENDO O MUNDO HISTORICAMENTE: PRODUÇÕES EM EDUCAÇÃO
HISTÓRICA
Desde 2003, parte do grupo do Programa de Pós
-
Graduação em Educação (PPGE)
da Universidade Federal do Paraná, especificamente na linha de Pesquisa Cultura,
Escola e Ensino, vem realizando pesquisas e promovendo a elaboração de trabalhos
dentro da perspectiva da Educação Histórica, em colaboração com a Universidade do
Minho/Braga/Portugal.
Inicialmente, tais trabalhos estiveram concentrados no apoio a professores do
Município de Araucária, os quais passaram a promover uma realidade em sala de aula
pautada nos seus estudos sobre as idéias defendidas pela Educação Histórica. Foi desse
grupo que surgiram muitos investigadores, assim como as temáticas de várias pesquisas
desenvolvidas pelos alunos do Programa de Pós-Graduação da Universidade Federal do
Paraná.
Um dos primeiros trabalhos concluídos no PPGE-UFPR, traçando os caminhos
nessa linha, foi realizado por Daniel Medeiros
6
na sua tese de doutoramento defendida
6
A formação da consciência histórica como objetivo do ensino de história no ensino médio: o lugar do material didático. Tese de
Doutorado. PPGE
-
UFPR, 2005.
24
no ano de 2005. Seg
uiram
-se outras investigações que resultaram nas dissertações de
Mestrado de Ivan
Furmann
7
, defendida no ano de 2006, de Marcelo
Fronza
8
, e de
Henrique Theobald
9
, defendidas no ano de 2007, todos sob orientação da professora
Doutora Maria Auxiliadora Schmidt. Ainda no ano de 2006, mais uma dissertação de
Mestrado, orientada pela professora Doutora Tânia M. F. B. Garcia foi defendida por
Edilson Aparecido Chaves
10
seguindo a
linha da Educação Histórica.
Atualmente, a Linha de Pesquisa Cultura, Escola e Ensino se compõe de um
grupo com pesquisas bastante diversificadas no tocante à temática da Educação
Histórica. Os pesquisadores, tanto de Mestrado como de Doutorado, têm se debruçado
nos estudos da epistemologia da História, apoiando-se nos estudos de Rüsen, e
nas
reflexões sobre o modo como esses estudos podem modificar a forma de pensar dos
professores de História, bem como de suas aulas. Da mesma forma, um interesse
incessante com relação às idéias de alunos e professores de História, assim como
questionam
entos sob a forma como as narrativas dos professores podem permear a
elaboração da Consciência Histórica dos alunos.
Também no Paraná, na Universidade Estadual de Londrina, a Professora Doutora
Marlene Cainelli tem realizado, no Laboratório de Ensino de História daquela
Universidade, diversas investigações sobre as idéias das crianças em idade escolar no
tocante à compreensão da História e na compreensão da relação passado e presente. Tais
7
Cidadania e educação histórica: perspectiva
s de alunos e professores do município de Araucária. PPGE
UFPR, 2006.
8
Possibilidades da história em quadrinhos na educação histórica.
PPGE
UFPR
, 2007.
9
A experiência de professores com idéias históricas: o caso do “grupo Araucária
. PPGE
UFPR, 200
7.
10
A música caipira em aulas de História: questões e possibilidades. PPGE
UFPR, 2006.
25
investigações também têm resultado em publicações em revistas especializadas, assim
como importantes participações em encontros de História, como a ocorrida nas VI
Jornadas de Educação Histórica, realizadas no ano de 2006 em Curitiba.
Com o mesmo sentido dessas investigações realizadas pela equipe de professores
e alunos da PPGE-UFPR, podemos apontar os estudos que vem sendo realizados pela
Professora Doutora Kátia Maria Abud na Universidade de São Paulo e que traçam as
primeiras iniciativas de produção na linha de Educação Histórica.
1.3 OS PROFESSORES DE HISTÓRIA E UM NOVO DESAFIO
Na perspectiva da Educação Histórica fica evidente uma grande preocupação com
a forma com que crianças e jovens em idade escolar fazem a leitura histórica do mundo,
entendendo a existência das idéias prévias como ponto de partida para qua
lquer
intervenção nas aulas de História. De acordo com Melo, “os alunos têm idéias tácitas
sobre acontecimentos ou instituições históricas e essas idéias funcionam como uma
fonte de hipóteses explicativas para compreender o passado, as instituições, as pes
soas,
os valores, as crenças e os comportamentos”.
(MELO, 2000).
Igualmente significativo é o conhecimento das concepções dos professores sobre a
natureza da sua disciplina e sobre seu ensino. O professor, entendido nesse processo
também como um investigador, passa a ter uma participação ainda mais importante na
relação entre as idéias tácitas que os alunos possuem e a leitura de mundo que devem
realizar nas aulas de História.
26
Henrique Theobald, em sua Dissertação de Mestrado defendida em 2007,
procurou investigar como os professores do Município de Araucária, localizado
próximo à cidade de Curitiba, se relacionam com o objeto com o qual trabalham.
Utilizando a Educação Histórica como caminho da investigação, permeou sua
investigação na idéia de que os professores de História devem ser entendidos enquanto
intelectuais e, portanto, produtores do conhecimento. Buscou identificar em seu trabalho
a relação da identidade que esses professores apresentam com relação ao saber,
entendendo que a dimensão dessa identidade confere sentido ao aprender, com reflexos
na construção da imagem que o sujeito faz de si próprio.
O viés do professor como intelectual transformador, o qual se busca compreender aqui, vai
além da perspectiva que assume sua função política na construção da cidadania. Trata-
se
também de levar em conta o professor que investiga elementos de sua prática e domina o
processo de produção do conhecimento com que lida, além de transformar o ensino.
(Theobald, 2007, p. 47).
Ana Cláudia Urban, Doutoranda na linha de Pesquisa Cultura, Escola e Ensino do
PPGE
-UFPR, investiga a importância da Didática da História e das disciplinas de
Graduação que assumem um compromisso com relação ao “ensinar história”. A partir
da análise dos currículos das principais Faculdades de História do Estado do Paraná,
essa pesquisadora tem recolhido elementos para entender o processo da formação dos
futuros professores de História. Conclusões preliminares possibilitaram a constatação
de que “há um predomínio, nas ementas, das questões que levam em conta aspectos
técnicos e/ou metodológicos em relação ao ensino de História propriamente dito”.
(URBAN, 2006, p. 6)
Até o momento suas pesquisas possibilitaram a confirmação de que o processo de
formação dos professores deve objetivar, antes de qualquer coisa, a construção da
identidade desses professores.
27
Em Portugal, Magalhães (2003) realizou uma incursão sobre as Escolas Históricas
e quais são as concepções dos professores com relação a essa ciência. Realizando uma
investigação com professores, chegou à conclusão de que a grande maioria deles tende,
quase na unanimidade, a seguir uma concepção que entende a História como uma
“ciência da temporalidade” e que privilegia a importância da dimensão temporal e do
rigor metodológico. Com essa pesquisa verificou-se a importância de se repensar a
formação dos professores de História, dotando os futuros professores de competências
básicas que lhes permitam “compreender espaços de reflexão, nomeadamente em torno
da cognição histórica, que promovam uma verdadeira integração dos conhecimentos
teóricos e a sua articulação com a prática docente”. (MAGALHÃES, 2003, p. 18).
Em outra investigação realizada por Magalhães (2006), também com professores
de História portugueses, procurou identificar a relação entre os docentes e os
documentos históricos, objetivando conhecer as formas como os professores concebiam
a natureza da História e como entendiam seu ensino. Os resultados obtidos com essa
pesquisa levaram à conclusão de que a maioria dos professores, quando
envolvidos com
documentos históricos, tende a seguir aqueles que aparecem com maior freqüência nos
manuais didáticos, ou seja, selecionam fontes históricas conhecidas, deixando de lado
fontes “alternativas” para o trabalho nas suas aulas.
Passa
-se, então, a outro problema de cunho mais prático, mas de profunda
relevância para a Educação Histórica. Afinal, como os professores ou futuros
professores de História procedem na escolha dos conteúdos das suas aulas? O que é
mais significativo em História?
28
Nessa p
erspectiva, a dissertação de Mestrado de CHAVES
11
traçou um referencial
teórico sobre esse conceito estrutural, ou de Segunda Ordem, denominado de
“significância histórica”. O conceito de Significância Histórica aparece como o
principal critério usado pelos historiadores para avaliarem se um acontecimento do
passado é merecedor de estudo. Pode-se mesmo afirmar que as noções de significância
histórica são construções pessoais, culturais, políticas e historiográficas transmitidas de
forma diversificada aos mem
bros de uma sociedade.
1.4 A HISTÓRIA DA ÁFRICA E A EDUCAÇÃO HISTÓRICA
Isabel Barca (Apud. SCHMIDT, 2006) utiliza a perspectivação para caracterizar a
capacidade que se deve ter para ver, perceber a autoridade em outras fontes, em outras
interpretações
da História que não sejam apenas aquelas dos manuais didáticos. É assim
que essa perspectiva de ensino determina aos professores certas competências para dar
aulas de História, como contextualizar, problematizar o passado e criar pressuposições a
respeito
do presente.
De acordo com Rüsen existe, normalmente, uma historiografia orientando a
cognição e a
consciência histórica
, ou seja, a
(...) soma das operações mentais com as quais os homens interpretam sua experiência da
evolução temporal de seu mundo e de si mesmos de forma tal que possam orientar,
intencionalmente, sua vida prática no tempo. (RÜSEN, 2001, p. 57).
11
A significância de personagens históricos na perspectiva de alunos portugueses e brasileiros. Portugal, 2006.
29
Partindo dessa perspectiva, a consciência histórica é um fenômeno que emerge do
encontro do pensamento histórico científico com o pensamento histórico geral.
Ninguém, nem mesmo os professores de História estão destituídos dessa consciência,
uma vez que é inerente ao pensamento humano.
Nós somos determinados historicamente, portanto não podemos pensar que nossa
orientação está distante da História, nem de uma historiografia que colaborou para
construirmos uma determinada consciência. Ao nos encontrarmos com o agir humano
precisamos recuperar de forma objetiva as intencionalidades do agir ali presente para ser
observada a consciência histórica. É aqui que surge o papel da Educação Histórica,
buscando nas idéias dos professores as suas experiências no tempo. Experiências
interligadas com as idéias que possuem sobre a África e a cultura africana, as quais
orientam uma determinada racionalidade na sua vida prática. De acordo com Rüsen,
essa racionalidade é a força de todo o pensamento histórico. “O pensamento histórico
faz
-
se científico ao se submeter, por princípio, à regra de tornar o conteúdo empírico das
histórias controlável, ampliável e
garan
tível
12
pela experiência (RÜSEN, 2001, p. 101)
Ao contrário da consciência histórica, a cognição histórica não é algo natural,
inerente às pessoas, mas um produto da própria história. Neste caso, transparece a
importância dos conceitos substantivos como ponto de partida para a investigação
prévia dessa cognição. Os conceitos substantivos são, portanto, as teorias e noções
construídas por um sujeito para um campo específico do conhecimento.
Investigo os conceitos substantivos que os professores de História e os jovens
estudantes, tanto do Brasil como de Portugal, apresentam sobre a História da África.
12
Grifo do autor.
30
Para a Educação Histórica, esses conhecimentos substantivos devem ser analisados
porque são eles que direcionam a relação entre a vida prática e a ciência hi
stórica.
Essa racionalidade que norteia as idéias, conceitos substantivos de professores de
História e jovens estudantes, perspectivas orientadoras da experiência do passado, é o
que lança as bases para minha pesquisa e elaboração desta dissertação.
1.5
A EDUCAÇÃO HISTÓRIA E OS CONCEITOS SUBSTANTIVOS
A Educação Histórica articula suas pesquisas e ações a partir dos Conceitos de
Segunda Ordem
e
Conceitos Substantivos,
estes de especial importância neste trabalho.
Conceitos disciplinares, de segunda ordem, tais como mudanças e evidências, estão
envolvidos em qualquer história, qualquer que seja o conteúdo. Outros conceitos, como
comércio, nação, protestante, escravo, tratado ou presidente, são encontrados quando
lidamos com tipos particulares de conteúdos históricos. Eles são parte do que podemos
chamar de
substância
da história e, então, é natural chamá-los de conceitos substantivos
.
(LEE, 2005, p. 1).
Os
Conceitos Substantivos, investigados por Peter Lee, surgiram a partir de uma
categoria desenvolvi
da por Rüsen (2007) e definida como
Conceito Histórico.
De acordo com Rüsen, esses conceitos são recursos lingüísticos utilizados como
forma de definir como o pensamento histórico científico se realiza. Tais conceitos são
sempre referidos por nomes próprios e têm qualidades históricas pré-esboçadas pelas
categorias históricas.
Conceitos históricos são o recurso lingüístico que aplicam perspectivas de interpretação
histórica a fatos concretos e exprimem sua especificidade temporal. Designam, pois, a
relevân
cia que os estados de coisas referidos possuem, no contexto temporal, em conjunto
com outros estados de coisas, e que não são designados por nomes próprios. (RÜSEN,
2007, p. 94).
31
Partindo da definição de Rüsen de que esses conceitos, em relação às categori
as
históricas, possuem uma função particularizante e, em relação aos nomes próprios, uma
função generalizante, Lee afirma que todo entendimento dos conceitos em História
exige a compreensão da existência de regras e da competência em identificar exemplos
dessas regras. Usa como exemplo o conceito de Revolução e a diferença desse conceito
quando contextualizado, por exemplo, Revolução Americana: enquanto revolução é um
conceito global, já a Revolução Americana é o nome de uma instância particular.
Conceito
s substantivos em história envolvem uma complicação não freqüentemente
encontrada nos conceitos práticos da vida cotidiana: seus significados mudam com o
tempo, bem como com o espaço. Um rei do século XVIII não é o mesmo que um rei do
século XV ou XXI, e alunos que pensam que eles provavelmente se comportam do mesmo
modo, têm os mesmos poderes e papéis, provavelmente ficarão confusos. Concepções de
presidentes, líderes religiosos e até de riqueza ou beleza diferem em tempos diferentes.
(LEE, 2005, p. 2)
É
essa referência temporal que pode tornar complexa a compreensão desses
conceitos. Rüsen acredita que, de um lado se encontra a relação do pensamento
histórico com o passado e, de outro, a relação do pensamento histórico com o presente e
o futuro. Nessa perspectiva o grande desafio é conseguir realizar a mediação temporal
do pensamento histórico para significar o passado de forma a orientar, temporalmente,
seu sentido na vida prática presente voltada para o futuro.
Os dois componentes encontram-se numa relação de tensão, na qual a tensão entre
recordação e expectativa gera o tempo como ator particular da vida humana prática, como
determinante intencional da ação humana. Essa tensão atinge a prática cognitiva histórica
exatamente quando ela se organiza, lingüisticamente, com conceitos históricos. (RÜSEN,
2007, p. 95)
32
Enquanto um nome próprio, a África não é entendida como um conceito histórico.
De acordo com Rüsen (2007), os nomes próprios são designações lingüísticas que
apenas designam estados de coisas em sua ocorrência singular, referindo-se a eles
diretamente.
No entanto, a partir do momento em que lida com a relação intrínseca que existe,
no quadro de orientação da vida prática, entre a lembrança do passado e a expectativa
do futuro, a África passa a ser entendida como um conceito histórico.
33
CAPÍTULO 2 HISTÓRIA DA ÁFRICA: PERSPECTIVAS HISTÓRICAS E
CONHECIMENTO ESCOLAR
No fundo do mato-virgem nasceu Macunaíma, herói de
nossa gente. Era preto retinto e filho da noite. Houve
um momento em
que o silêncio foi tão grande escutando
o murmurejo do Uraricoera, que a índia tapanhumas
pariu uma criança feia. Essa criança é que chamaram
de Macunaíma
(...)
13
Após o entendimento de como esta pesquisa se insere na Educação Histórica, o
objetivo deste capítulo foi identificar a África dentro de uma perspectiva histórica, bem
como entender como esse tema tem sido apresentando no âmbito do ensino de História.
Para a construção deste capítulo foi necessário se debruçar sobre a produção
bibliográfica que se apóia em investigações sobre o papel dos negros e da África na
História brasileira.
Autores como Gilberto Freyre e Oliveira Viana tornaram-se fundamentais para
entender o olhar que o Brasil passou a ter, no século XX, sobre a África e a cultura
africa
na. Nina Rodrigues aparece como referencial para saber como essa temática
começou a ser pesquisada e incorporada num interesse científico crescente de entender a
formação da sociedade brasileira.
13
Publicado em 1928 e um dos principais representantes do Modernismo, "Macunaíma" é um dos livros mais importantes da
literatura brasileira, por várias razões: as rupturas narrativas de tempo, espaço e composição de personagem; a ruptura lingüística,
que mistura o culto e o popular, o urbano e o regional, o escrito e o oral, contribuindo para o estabelecimento de uma "fala”
brasileira.
34
Por fim, os Estudos Culturais colaboraram no sentido de investigar outras
possibilidades de entendimento da temática e numa análise mais abrangente na
pesquisa.
Os estudos sobre essa temática passaram a ser mais intensos a partir do século
XIX, sobretudo a partir de 1860, quando as teorias racistas obtêm o aval da ciência e a
aceitação por parte dos líderes políticos e culturais dos Estados Unidos e da Europa. No
Brasil, se iniciam os estudos científicos sobre a presença do negro na sociedade
brasileira. Da Antropologia partiram os primeiros estudos que buscavam situar o negro
e a cultura africana no contexto brasileiro, bem como o que se entendia como
contribuições, negativas ou não, dessa presença. Assim, a escolha dos autores e
estudiosos da presença negra no Brasil recaiu, basicamente, sobre as produções de
Oliv
eira Viana, Gilberto Freyre e Nina Rodrigues. Estes realizaram estudos que mais se
aproximam do entendimento obtido a partir da leitura das Diretrizes Curriculares
Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e
Cultura
Afro
-
Brasileira e Africana.
Além das produções acerca da presença africana no Brasil, os Estudos Culturais
apresentam
-se como uma alternativa de análise para o entendimento da legislação, seus
objetivos e alcance na realidade escolar.
2.1 HISTORIOGRAFIA
BRASILEIRA: ÁFRICA E BRASIL
Quando Macunaíma, o “herói sem nenhum caráter” nasceu, além de se tornar o
personagem de um dos maiores clássicos da literatura brasileira, como já vinha
35
acontecendo desde o final do século XIX a obra de Mário de Andrade colocava a
participação dos afro
-
brasileiros dentro de uma nova discussão com relação à identidade
brasileira. Já que não era mais possível negar a existência ou participação de uma
população negra, africana, no interior das relações sociais do país, o que rest
ava era uma
tentativa de compreensão da existência desse grupo na história nacional.
De acordo com Oliva (2003), este é um dos grandes problemas que ainda
norteiam a questão da presença negra na nossa história e em nossa sociedade, havendo
ainda uma grand
e luta para incluir os negros dentro de uma identidade cultural.
De um ponto de vista teórico, no Brasil a questão da presença negra foi tratada
sob diferentes abordagens, tendo como significativas contribuições os estudos de
Oliveira Viana, Gilberto Freyre e Nina Rodrigues. O que se pretendia era criar uma
narrativa histórica que justificasse um modelo de nação brasileira, entendida como
extensão da História da Europa Ocidental. As propostas entendiam uma nacionalidade
como síntese das raças branca, índia e negra, com predomínio de uma ideologia da
superioridade branca.
Na década de 1890 o jovem médico mulato, Nina Rodrigues, iniciou estudos mais
sistematizados acerca da influência africana, realizando pesquisas etnográficas sérias
sobre a população afro-
br
asileira, mas apresentando argumentos contraditórios, pois ao
mesmo tempo em que entendia a existência de uma cultura afro-brasileira, não deixava
de negar a inferioridade da raça negra em relação a uma raça superior, ariana. Tal
trabalho não deixa de most
rar o quanto é pernicioso, uma vez que sua importância deixa
uma herança de idéia racista.
Ele foi o primeiro estudioso brasileiro, na virada do século XIX para o XX, a
colocar a situação do negro brasileiro enquanto um problema social, importante
36
referênc
ia para a compreensão da formação racial da população brasileira. Embora pese
em seus estudos uma mentalidade fortemente influenciada por idéias racistas,
nacionalistas e cientificistas, seu trabalho tem colaborado para classificar como
manifestações cultu
rais os ritos e costumes da população negra brasileira. Com sua obra
Os Africanos no Brasil”
, Nina Rodrigues contribuiu com uma vasta e rica coletânea de
informações e dados a respeito do universo cultural das comunidades negras no Brasil.
Com a Proclamação da República no final do século XIX, o Estado-
nacional,
recém
-formado, procura instituir uma “comunidade nacional” na base de uma
etnicidade fictícia. O Estado etniza a população através de ideologias e mitos de
identidade baseados em culturas, origem
e projeto coletivo comuns.
Durante as décadas de 1920 e 1930 as agitações sociais e políticas tomaram conta
do Brasil. O regime republicano oligárquico entrava em crise. Era uma época de
manifestações que iam desde as revoltas tenentistas à Semana de Arte Moderna e ao
surgimento do Partido Comunista, culminando na Revolução de 1930. Nesse momento
a necessidade de construir teorias que explicassem o país motivou diversos intelectuais
de várias tendências a se envolverem nessa tarefa.
Nesse contexto destacam-se os estudos do jurista, professor, etnólogo, historiador
e sociólogo Francisco José de Oliveira Viana
14
. Em 1920 publicou o livro
Populações
Meridionais do Brasil” e um longo capítulo para o censo oficial de 1920 com o tulo
Evolução do povo brasileiro. Nessas obras buscava explicar o país a partir de teorias
racistas, ainda muito comuns no pensamento da época. Segundo ele, o Brasil seria o
resultado da vontade e da energia das elites brancas, racialmente superiores.
Dando
14
Adepto das idéias desenvolvidas, sobretudo por Gobineau, as quais afirmavam que havia evidências históricas da superioridade da
raça branca. Nessa escola de teoria racista, denominada de “Escola histórica”, a raça era o fator determinante da história humana,
gerando um culto ao arianismo.
37
ênfase ao patriarcalismo, ressaltou e defendeu a ão da classe dominante, da pula da
burocracia estatal e das elites urbanas, na formação social brasileira. E, embora fosse ele
próprio mulato, considerava defeituosa e inadequada a formação racial de nosso povo,
devido à enorme presença do negro, do índio e dos mestiços. Estes, segundo Viana, não
h
aviam dado “nenhum elemento de valor” à nossa formação histórica e cultural.
Seu pensamento se organizava a partir de três eixos: a influência das relações e do
meio social forjados em nosso processo de colonização; a psicologia do nosso povo e a
questão racial. Esta, em especial, fazia refletir sobre como poderia uma população
racialmente miscigenada como a do Brasil preservar sua unidade nacional e
desempenhar um papel no mundo moderno. Em sua tentativa de resposta, os mestiços
apareciam como seres “inferiores”. Nos seus argumentos fica evidente a transição de
uma nova mentalidade frente à população negra no Brasil, revelando a substituição de
um racismo de dominação por um racismo de exclus
ão.
Oliveira Viana era otimista e ao contrário da imensa maioria dos pensadores de
seu tempo pensava que os problemas do Brasil seriam resolvidos se duas condições
fossem satisfeitas: primeira, que a elite, tendo sido educada para isso, cumpra seu pap
el
civilizatório; segundo, que no processo de mestiçagem, os mestiços “superiores”
assimilassem os valores culturais do segmento branco, e os negros, índios e mestiços
“inferiores” fossem, naturalmente, eliminados.
Ainda durante as décadas de 1930 e 1940,
em pleno movimento de intervenção do
governo Vargas, é difundida no Brasil a idéia da “democracia racial”, isto é,
predominava no Brasil a miscigenação na constituição do povo brasileiro, que
supostamente teria levado à total ausência de preconceitos raciais e étnicos. No Brasil,
38
vivia numa sociedade multirracial e sem conflitos, um povo mestiço em harmonia. Cada
etnia colaborava, com seu heroísmo ou com seu trabalho, para a grandeza do país.
De acordo com Rocha (2006) “para o êxito da constituição do mito
da democracia
racial foi necessário apagar a história da resistência dos negros à escravidão, bem como
a forma e os efeitos da integração do negro na sociedade organizada pelo trabalho
livre”. Isso fica perceptível na constituição de uma história oficial que descaracteriza as
lutas e resistências dos negros à escravidão.
O governo, através de Decreto de 14 de dezembro de 1890, assinado por Rui
Barbosa, que na ocasião era Ministro da Fazenda, e na Circular nº. 29, de 13 de maio de
1891, determina a queima dos documentos relacionados à escravidão no país. “Assim,
com o esquecimento das mazelas da escravidão seria possível constituir uma nação em
que todos os povos poderiam conviver fraternalmente e avançar nos ideais liberais de
igualdade, fraternidade e liber
dade”. (ROCHA, 2006).
Do mesmo modo, segundo esse autor, o Estado brasileiro omitiu dos
recenseamentos a composição étnico
-
racial da população para constituir esse mito.
Sendo assim, a idéia da democracia racial, a omissão das desigualdades raciais no país, a
negação do negro enquanto um dado real, o silêncio sobre a história de resistência e de
identidade política e cultural do negro brasileiro contribuíram com a constituição de uma
forte ideologia racial no Brasil. (ROCHA, 2006, p. 26).
Assim, entende-se que, ao contrário das teorias racistas que imputavam a negros,
índios e mestiços a razão maior do atraso nacional, Gilberto Freyre fez sua reputação
com uma interpretação de caráter mais otimista, uma vez que afirmava que a nação
brasileira era o resul
tado de uma grande miscigenação.
No meio letrado ainda havia a necessidade de interpretar o país e suas
possibilidades como nação. Em pleno apogeu das teorias racistas, como as de Viana, o
39
autor celebra o papel essencial das etnias dominadas na formação do país, sobretudo da
presença negra vista por ele como de suma importância pra a formação cultural do país.
Freyre causou grande impacto com a clássica obra Casa Grande e Senzala ao
mostrar a influência dos negros e mulatos sobre os fazendeiros e seu estilo de vida:
comida, vestuário e sexo. Embora se mantenha o traço conservador, quase reacionário
ao exaltar a figura do patriarca, não deixa de mostrar que este era vítima dos vícios,
mazelas morais e violência.
Na ternura, na mímica excessiva, no catolicismo em que se deliciam nossos sentidos, na
música, no andar, na fala, no canto de ninar menino pequeno, em tudo que é expressão
sincera de vida, trazemos quase todos a marca da influência negra. Da escrava ou sinhana
que nos embalou. Que nos deu de mamar.
Que nos deu de comer, ela própria amolegando
na mão o bolão de comida. Da negra velha que nos contou as primeiras histórias de bicho
e de mal-assombrado. Da mulata que nos tirou o primeiro bicho-
de
-
pé de uma coceira tão
boa. Da que nos iniciou no amor físico e nos transmitiu, ao ranger da cama-
de
-vento, a
primeira sensação completa de homem. Do moleque que foi o nosso primeiro
companheiro de brinquedo. (FREYRE, 1988, p. 367).
Freyre afirma, categoricamente, que os negros africanos traziam consigo uma
cultu
ra consistente, o que os tornava superiores aos indígenas e mesmo frente a muitos
colonos portugueses. Utiliza essa análise, inclusive, para demonstrar uma suposta
diferença entre as populações que tiveram maior contato com os negros, como no caso
da Bahia, terra de povo alegre e extrovertido, com os moradores de Pernambuco, mais
introvertidos devido à menor presença negra entre essa população.
Freyre realiza uma comparação entre os africanos enviados aos Estados Unidos
(definidos como sendo fortes, brutos e resistentes) e aqueles que vieram para o Brasil,
trazidos de acordo com uma ‘escolha’ por outras necessidades e interesses, como de
técnicos em trabalhos de metalurgia. De certo modo, realiza uma crítica em relação às
teorias racistas seguidas por Oliveira Viana, que sempre afirmou serem os negros da
40
América do Norte superiores aos do Brasil em virtude da seleção imposta pelos anglo-
saxões.
Justifica certo “conformismo” dos negros enquanto escravos devido ao fato de, na
África, estarem acostumados ao trabalho de criação de gado, utilização da carne e do
leite, assim como do trabalho agrícola. E afirma: Sempre que considerarmos a
influência do negro sobre a vida íntima do brasileiro, é a ação do escravo e não a do
negro por si, que apreciamos”. (FREYRE,
1988, p. 397).
Para Gilberto Freyre, é impossível separar o negro de sua condição de escravo,
defendendo atitudes consideradas imorais por causa, justamente, dessa condição
desumana. Sempre vinculado à condição de escravo, o africano se tornou um agente
patogênico no seio da sociedade brasileira. Neste ponto realiza uma crítica com relação
ao trabalho de Nina Rodrigues, afirmando que aquele não se preocupou em reconhecer
no negro a condição de escravo, minimizando sua análise.
É bom ressaltar que Gilberto Freyre ainda tentou se redimir dessas idéias que
desenvolveu. No entanto, elas se mantêm até hoje e se configuraram nesse mito da
“democracia racial”, muito presente nas idéias que se fazem acerca da população negra
no país.
Contrariando a idéia que de Gilberto Freyre é um referencial seguro acerca da
presença africana na História e na formação da sociedade brasileira, Araújo (1993)
realizou um percurso bastante crítico pela obra daquele autor e apontou vários
elementos que alteram as intenções que o soció
logo pretendia demonstrar.
Segundo Araújo, Freyre expõe uma confissão de racismo em seu livro, embora
tente o tempo todo mostrar justamente o contrário. Podemos observar essa constatação
41
num trecho do prefácio da edição de Casa Grande e Senzala, focalizando um raro
momento em que Gilberto demonstra claramente uma posição racista:
“vi uma vez, depois de quase três anos maciços de ausência de Brasil, um bando de
marinheiros nacionais
mulatos e cafuzos
descendo não me lembro se do São Paulo ou
de Minas pela neve mole do Brooklin. Deram-me a impressão de caricaturas de homens. E
veio
-me à lembrança a frase de um viajante inglês ou americano que acabara de ler sobre o
Brasil: ‘the fearfully mongrel aspect of the population’. A miscigenação resultava naquilo.”
(FREYRE, 1933, p.12).
Nessa crítica realizada ao livro Casa Grande e Senzala, Araújo pretende
demonstrar que Freyre ambiciona ser o autor do primeiro grande trabalho de cunho
sociológico que pretendia romper com o racismo marcante das obras escritas até então,
consagrando
-se como aquele que conseguiria evidenciar o aspecto positivo das culturas
negras que promovem a formação da sociedade brasileira.
“no mesmo movimento em que se afasta do racismo e admite a relevância de outras
culturas, nosso autor teria criado uma imagem quase idílica da nossa sociedade colonial,
ocultando a exploração, os conflitos e a discriminação que a escravidão necessariamente
implica atrás de uma fantasiosa “democracia racial”, na qual senhores e escravos se
confraternizari
am embalados por um clima de extrema intimidade e mútua cooperação.”
(ARAÚJO, 1993, p.30
-
31)
Como um momento de severa crítica a essa obra de referência historiográfica,
Araújo afirmar que o livro de Gilberto Freyre se transformou em um trabalho assolado
pela mais terrível e absoluta imprecisão, visto que o aproveitamento da idéia de raça em
momento algum tem forças para cancelar o realce que a de cultura nele também vai
obter. Freyre, ao exaltar a mistura cultural que forma a sociedade brasileira, procu
ra
criar uma visão idílica, ocultando a exploração, o racismo e a discriminação que a
escravidão naturalmente promove, atrás de uma idéia fantasiosa de “democracia racial”.
É essa, portanto, a obra que vem formando a consciência história de gerações de
his
toriadores e professores, muitos dos quais não receberam uma formação adequada ou
42
a capacitação para explorar essa obra enquanto uma fonte historiográfica a ser analisada
e criticada.
2.2 UMA VISÃO ALTERNATIVA: OS ESTUDOS CULTURAIS
Fugindo da tendência de tomar a historiografia brasileira tradicional como única
perspectiva de orientação para o estudo da história da África, os Estudos Culturais
surgem como possibilidade de gerir uma nova racionalidade com relação a essa
problemática. Nascido em 1964, na Inglaterra, o Centre for Contemporary Cultural
Studie
s (CCCS) buscava reunir pesquisadores com as mesmas preocupações. O projeto
do Centro era claro: pretendia deixar os métodos e deslocar seus estudos para os
produtos da cultura de massa e para o universo das práticas culturais populares. Numa
perspectiva sociológica, os Estudos Culturais contribuem nesta análise com a categoria
da
Diáspora
. (HALL, 2003)
Um dos fundadores do Centro, o jamaicano Stuart Hall (2003), utiliza a categoria
da
Diáspora
15
para afirmar que não é o espaço territorial que determina uma cultura.
Em seu ensaio Pensando a Diáspora: reflexões sobre a terra no exterior
16
, afirma que
diáspora é um conceito baseado fundamentalmente nas noções de alteridade e diferença.
Tomado emprestado do povo judeu, o termo traz consigo “a promessa do retorno
15
A palavra
diáspora
vem-nos dos antigos gregos, para os quais “diáspora” (dispersão, ou semear) estava associada a idéias
de
migração e colonização na Ásia Menor e no Mediterrâneo na Antiguidade, de 800 a 600 a.C. Na tradução grega alexandrina do
Septuaginto
(Deuteronômio 28:25) a palavra designava a dispersão dos judeus exilados da Palestina depois da conquista babilônica
e
da destruição do Templo no ano de 586 A.C. como uma maldição: “Serás disperso por todos os reinos da terra!”
16
HALL, Stuart.
Da Diáspora
: identidades e mediações culturais. Org. Liv Sovik. Belo Horizonte: Editora UFMG.
43
redentor” à terra de origem, encerrando assim a dispersão do povo que, por determinada
circunstância
– no caso dos negros brasileiros, o tráfico transatlântico de africanos
escravizados
rompeu a relação espacial e geográfica de um povo com sua origem,
relação que de algum modo vai poder ser perpetuada do ponto de vista cultural e/ou
simbólico. No caso do deslocamento de milhões de africanos para a América, houve um
afrouxamento dos laços entre cultura e lugar. Para Stuart Hall, cada cultura possui seus
locais, mas que não é nada fácil dizer onde se originam, portanto possuir uma identidade
cultural é estar em contato com um núcleo imutável e atemporal, ligando passado e
presente numa linha ininterrupta
, ou seja, a tradição.
Integrante da segunda geração do Centro de Estudos Culturais, o sociólogo
britânico Paul Gilroy (2002) discute a importância de romper com a idéia de que a
cultura brasileira apresenta um mundo sem raças e também trabalha com a categoria da
Diáspora
, afirmando que a transferência de um número significativo de africanos ao
Brasil produziu um movimento de intensa influência cultural naquilo que denomina de
“universo do Atlântico”. Também utiliza a concepção da diáspora judaica para anal
isar
as formas como a cultura negra, africana, se expandiu pelo Oceano Atlântico.
Ao contrário da diáspora judaica, vista como um fator cultural negativo, Gilroy
acredita que no caso da diáspora negra ela serviu para promover integração. O Atlântico
é usa
do como metáfora para ilustrar uma mistura, algo que se funde. “Marcada por suas
origens européias, a cultura política negra moderna sempre esteve mais interessada na
relação de identidade com as raízes e o enraizamento do que em ver a identidade como
um
processo de movimento e mediação (...)”. (GILROY, 2002, p. 65)
Na sua linha de raciocínio, trabalha com a idéia de uma cultura “viajante” como
instrumento valioso para desagregar as suposições a respeito de uma história cultural
44
sedentária ou mesmo rompendo com as concepções tradicionais que afirmam a
existência de uma “nacionalidade culturalque apresenta as diferenças étnicas como
uma ruptura absoluta nas histórias e experiências do povo “negro” e do povo “branco”.
Contrariando as idéias que se apóiam na noção de Estado-nação para definir uma
identidade, Gilroy discorre sobre aquilo que denomina de “reterritorialização”, ou seja,
a crença de que não importa a localização geográfica para que uma cultura exista. A
partir da categoria da diáspora, pretende demonstrar que não é mais possível seguir a
idéia da existência de uma cultura delimitada territorialmente, pois as formas culturais
originadas pelos negros dispersos nas estruturas de sentimento, de produção, de
comunicação e de memória se disseminaram pelo mundo Atlântico provocando, por sua
vez, uma influência mútua. A questão do território deixa de ser relevante, uma vez que
os povos dispersados reconheceram que os efeitos do deslocamento espacial tornavam a
questão da origem inacessível e em ampla medid
a irrelevante.
Como uma alternativa à metafísica da ‘raça’, da nação e de uma cultura territorial fechada,
codificada no corpo, a diáspora é um conceito que ativamente perturba a mecânica cultural
e histórica do pertencimento. (GILROY, 2002, p. 18).
Nes
sa perspectiva torna-se difícil colocar em prática a inclusão de uma “cultura
africana”, porque segundo Gilroy não existe uma essência africana que possa,
magicamente, conectar entre si todos os negros. Se essa idéia de pertencimento se dilui
pela não necessidade de um território específico, a crença de que temos no Brasil uma
população afro-brasileira com características culturais “tipicamente” africanas, poderia
colocar em xeque a própria identidade dessa parcela da população brasileira.
45
2.3 AS DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS PARA A EDUCAÇÃO DAS
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS E PARA O ENSINO DE HISTÓRIA E CULTURA
AFRO
-
BRASILEIRA E AFRICANA
Fica claro no decorrer dos argumentos das Diretrizes que ainda não foi possível se
desvincular de uma cognição segundo a qual existe uma forma de definir uma cultura
africana dentro de uma cultura maior, a brasileira. No desenvolvimento desse
documento prevalece um discurso pelo qual é possível identificar a presença de uma
consciência histórica na qual a idéia de que o sujeito negro, determinado pela cor, deve
ser visto dentro de uma cultura “própria”, ou seja, a africana. É como se as pessoas
negras, os afro
-
descendentes, carregassem, geneticamente, uma cultura africana, própria
de um território que não é o Brasil. Como afirmam as Diretrizes, “(...) é preciso
valorizar devidamente a história e cultura de seu povo, buscando reparar danos, que e
repetem há cinco séculos, à sua identidade e a seus direitos”.
As Diretrizes se referem à importância dos afro
-
descendentes em valo
rizar e sentir
orgulho de seu pertencimento étnico
-
racial como pressuposto para que todos tenham sua
identidade valorizada. Gilroy (2002), em seus estudos sobre a comunidade negra na Grã
Bretanha, percebeu que existe uma diferença que define alguém como sendo negro ou
britânico. De acordo com sua análise, esse é um problema que seria resolvido se esse
“ou”
fosse substituído por um
“e”
, ou seja, qualquer pessoa negra é, também, no caso
daquele país, um britânico. Esse é um entendimento que não parece ainda muito claro
também com relação ao Brasil.
Dentro do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do
Paraná (PPGE-UFPR), na linha de pesquisa em Cultura, Escola e Ensino, um grupo de
46
pesquisadores se dedica à investigação de como ocorre o processo de construção e de
afirmação da identidade negra dentro do espaço escolar. Tais trabalhos como os de
Onasayo (2008) e Lopes (2008) têm colaborado no entendimento de categorias como
negro, afro-descendente e afro-brasileiro, além de apontarem uma visão política de luta
pela igualdade de direitos e afirmação.
Em meu trabalho, no entanto, me apoiei em autores que caminham por outras
veredas, historiográficas e sociológicas, uma vez que a perspectiva deste trabalho não é
uma discussão política de afirmação e de identidade, mas como esse conceito
substantivo entra na escola e se apresenta nas idéias dos sujeitos desse universo escolar,
professores e alunos, por meio da produção historiográfica.
Em sua dissertação de Mestrado, Onassayô (2008) reconstrói o processo que deu
origem às três expressões mais utilizadas quando se refere a essa temática:
Negro, Afro
-
brasileiro e afrodescendente. De acordo com esse autor, o termo negro surgiu com o
escravismo, e expandindo pelo século XVI e ganhando notoriedade a partir da década
de 1920, em São Paulo, por meio do Movimento Negro, com uma forte retomada na
década de 1970.
o termo afro-brasileiro, segundo o autor, aparece na década de 1930, segundo
as idéias de Gilberto Freyre. Finalmente, descreve o autor, o termo afrodescendente foi
criado em 1986 por Henrique Cunha Junior devido a dois problemas: “um relativo aos
censos que precisavam integrar os pretos e pardos’, o outro que estava escrevendo
textos sobre a História e queria preservar a dinâmica entre África e Brasil, assim a idéia
de
afrodescendências
”. (2008)
Num outro momento, as Diretrizes afirmam que é preciso o reconhecimento e a
valorização da história, da cultura e da identidade dos descendentes de africanos. Para
47
Gilroy (2002), esse “inclusivismo cultural” até agora não passava de uma
“generosidade” em aceitar os negros na construção de uma nação que se pretende
homogênea.
Hall (2003) afirma que quando naturalizamos categorias históricas, como
“negros”, fixamos esse significante fora da história, da mudança e da intervenção
política. E quando isso acontece, usamos a categoria “negro” como algo suficiente em si
mesmo, como se não houvesse mais nada a ser discutido, a não ser que algo é negro ou
não.
De acordo com as Diretrizes, a utilização dessa categoria corresponde a questão
de que ser negro, no Brasil, não se limita às características físicas, mas se refere a uma
escolha política. Embora o termo negro tenha sido usado historicamente para diferenciar
o escravo do seu senhor, o Movimento Negro ressignificou esse termo dando-lhe um
sentido político e positivo. Da mesma forma, embora o IBGE (Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística) adote como forma de classificação da população brasileira o
termo preto, o Movimento Negro considera que tanto esse como o termo pardo estão
dentro de uma mesma categoria, a dos negros, já que ambos reúnem aqueles que
reconhecem sua ascendência africana.
Desse modo, ao tentar inserir essa temática como forte referencial no universo
escolar, a legislação reforça idéias p
-estabelecidas, como no caso de identificar o
negro como aquele sujeito que entra na história a partir da escravização e do legado
cultural” e que, portanto, precisa ser reconhecido e aceito pela sociedade.
48
2.4 A LEI 10.639/03 E AS DIRETRIZES CURRI
CULARES
É importante ressaltar que, durante a elaboração desta dissertação de Mestrado, a
Lei 11.465/08 foi criada, alterando um artigo da Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDB) substituindo a Lei nº 10.639/03, que previa a inclusão da temát
ica afro
-
brasileira nos currículos das redes de ensino. Agora, todas as escolas de ensino
fundamental e médio, tanto públicas quanto privadas, devem conferir o mesmo destaque
ao ensino da história e cultura dos povos indígenas. De acordo com a nova lei, todas as
disciplinas, especialmente História, Geografia e Literatura, devem incorporar a
contribuição dos negros e indígenas à cultura brasileira.
O governo Federal sancionou, em março de 2003, a Lei 10.639/03-MEC, que
alterou a LDB (Lei de Diretrizes e Base
s) e estabeleceu as Diretrizes Curriculares para a
implementação da mesma. A Lei 10.639 instituiu a obrigatoriedade do ensino da
História da África e dos africanos no currículo escolar do ensino fundamental e médio
com o “objetivo de corrigir injustiças, eliminar discriminações e promover a inclusão
social e a cidadania para todos no sistema educacional brasileiro”. (DIRETRIZES,
2004, p.5).
Na sua concepção, a nova Lei pretende recolocar a questão da participação do
negro, ou afrodescendente, na sociedade brasileira, sua identidade e papel cultural. De
acordo com Onasayo (2008), a expressão
afrodescendente
, criada por Cunha Júnior,
seria a mais coerente ao se abordar esse tema.
Apesar de utilizar essa expressão em vários momentos, o documento referencia a
pr
esença africana no Brasil através da categoria “negro”, embora afirme que ainda
exista grande dificuldade por parte dos professores em entender o significado dessa
palavra, assim como a forma com a qual devem se referir a seus alunos não-
brancos. As
49
Diretr
izes afirmam que “é fundamental que se desfaçam alguns equívocos. Um deles diz
respeito à preocupação dos professores no sentido de designar ou o seus alunos
negros como negros ou como pretos, sem ofensas”.
Independente da terminologia utilizada, as Diretrizes acabam diferenciando uma
cultura negra de uma cultura branca, como fica claro na afirmação que “reconhecer
exige a valorização e respeito às pessoas negras, à sua descendência africana, sua
cultura e história”. (DIRETRIZES, 2004, p.12). Em diversos momentos essa
distinção, a de que existe uma cultura tipicamente negra e, outra, branca, sobretudo
quando se enfatiza a necessidade de valorização da história e da cultura dos afro-
brasileiros e dos africanos.
Trata
-se de um viés culturalista a partir do qual o ponto de vista abordado pela
legislação se apóia em elementos culturais, tais como religiosidade e comportamento, e
que aparece com muita intensidade nas palavras que norteiam toda a proposta das
Diretrizes, colocando a questão da História da África dentro dessa categoria. Embora
visando à recolocação da população afro-descendente na sociedade com pleno direito à
cidadania, principalmente por meio da escola e da cultura escolar, a lei não consegue
romper com uma razão histórica dominante, mantendo
a mesma cognição com relação a
essa passagem da história, demonstrando que existem diferenças entre os brasileiros
brancos e aqueles que são “descendentes” dos povos africanos, tendo uma cultura
particular devido a essa questão basicamente genética.
Toman
do como referência a divisão tradicional da História, a
Quadripartite
17
,
a
África surge na História apenas por meio de uma visão eurocêntrica
18
, ou seja, a
17
Refere
-
se à divisão tradicional da
História em Idade Antiga, Idade Média, Idade Moderna e Idade Contemporânea.
50
historiografia produzida pelos europeus lançou seu olhar sobre aquele continente apenas
quando passou
a ser referência devido ao material humano que tanto interessava naquele
momento: os escravos.
Para Chesnaux (1995), essa divisão desempenha o papel de um verdadeiro
aparelho ideológico do Estado, tendo como função “privilegiar o papel do Ocidente na
hist
ória do mundo e reduzir quantativa e qualitativamente o lugar dos povos não-
europeus na evolução universal”. Os marcos escolhidos nessa divisão não têm
significado algum para a imensa maioria da humanidade, mas procuram demonstrar
uma suposta superioridade
européia.
A História, aliás, não aparece como baliza na perspectiva das Diretrizes nessa
intenção de resgatar a História da África e da cultura afro-brasileira. Não é proposta
nenhuma alternativa de estudo do continente africano, nem sequer a existência de uma
temporalidade histórica própria da África. O referencial se mantém na questão da
escravidão existente no Brasil, assim a África aparece, na História, a partir da atitude
portuguesa em escravizar os povos africanos. Não existe um momento anterior de
localização, de temporalidade. De acordo com Chesnaux (1995), cada um escolhe seu
passado, e essa escolha nunca é inocente.
Constata
-se, portanto, que o conceito de África, de cultura africana e de afro-
descendentes ainda está muito vinculado à periodização tradicional, que coloca aquele
continente submetido à escravidão moderna, a qual possibilitou a migração forçada de
milhões de africanos para o Brasil. É assim que a África entra na história brasileira:
como sinônimo de pessoas negras e de escravidão. A própria legislação se preocupa em
18
O Eurocentrismo trata de uma visão de mundo que tenta colocar a Europa (assim como sua cultura, suas línguas, seu povo) como
o elemento fundamental na constituição da sociedade
moderna, sendo a protagonista da história humana.
51
evidenciar a importância que a população negra teve na formação do Brasil devido a um
trabalho forçado, no caso da escravidão, não reconhecido até hoje pela maioria da
sociedade.
Ao mesmo tempo em que confirma a existência de uma diversidade racial e
social, as Diretrizes manifestam a existência de uma cultura típica, própria dos negros, o
que teria dificultado, até o momento, sua inclusão na sociedade brasileira devido a certa
resistência por parte do restante da população não-negra. Da mesma forma, os estudos
de Freyre procuram demonstrar a influência da cultura africana como elemento de
complementação na sociedade brasileira em alguns aspectos apenas, sobretudo de cunho
cultural, visão que se mantém na legislação.
2.5
O PAPEL DA ESCOLA E DOS PROFESSORES DE HISTÓRIA
Tomando como ponto de análise a cultura escolar, as Diretrizes mostram enorme
preocupação com relação à importância que a escola tem nesse processo de valorização
da cultura afro
-
brasileira e nas formas de
inserção da população afro
-
brasileira.
Reconhecer exige que os estabelecimentos de ensino, freqüentados em sua maioria por uma
população negra contem com instalações e equipamentos sólidos, atualizados, com
professores competentes no domínio dos conteúdos de ensino, comprometidos com a
educação de negros e brancos, no sentido de que venham a relacionar-se com respeito,
sendo capazes de corrigir posturas, atitudes e palavras que impliquem desrespeito e
discriminação. (DIRETRIZES, 2004, p.12).
Aqui surgem várias questões para ampliar as dúvidas existentes, como o
questionamento de que, realmente, os estabelecimentos de ensino são mesmo
freqüentados, em sua maioria, por uma população negra. Portanto, é de estranhar tal
52
afirmação com relação à presença da população afro-descendente como maioria nesse
universo escolar em todas as regiões do Brasil.
(...) aos estabelecimentos de ensino está sendo atribuída responsabilidade de acabar com o
modo falso e reduzido de tratar a contribuição dos africanos escravizados e de seus
descendentes para a construção da nação brasileira; de fiscalizar para que no seu interior, os
alunos negros deixem de sofrer os primeiros e continuados atos de racismo de que são
vítimas. (DIRETRIZES, 2004, p.18).
A legislação afirma que para obter êxito, acabando com o racismo e as
discriminações, a escola e seus professores não podem improvisar. É preciso desfazer a
mentalidade racista e discriminadora, superando o etnocentrismo europeu,
reestruturando as relações étnico-raciais e sociais, desalienando processos pedagógicos.
As Diretrizes afirmam, ainda, ser necessário que os estabelecimentos de ensino e os
professores tenham como referência princípios relativos à consciência política e
histórica da diversidade. Entre as várias sugestõ
es dadas pelas diretrizes, destaca
-
se
a busca, da parte das pessoas, em particular dos professores não familiarizados com a
análise das relações étnico
-
raciais e sociais com o estudo da história e cultura afro
-
brasileira
e africana, de informações e subsídios que lhes permitam formular concepções não
baseadas em preconceitos e construir ações respeitosas. (DIRETRIZES, 2004, p.19).
De acordo com Lopes (2008), é importante não perder de vista que essa discussão
acerca das políticas de ações afirmativas é fruto da resistência e persistência do
Movimento Negro organizado num combate permanente contra o racismo e a
discriminação racial da qual a população negra é vítima.
Lopes (2008) discute, em seu trabalho, a categoria da miscigenação como sendo a
forma que acabou incorporando nas práticas educativas e no ambiente escolar a idéia de
que não existem diferenças raciais no Brasil. Segundo ela
53
a miscigenação age como um elemento operacionalizador e manipulador das consciências
negras e brancas, pois é importante para se manter a ideologia criada pela elite dominante
de uma única identidade nacional e, evitando, desta forma, quaisquer conflitos entre os
diferentes grupos raciais, pela assimilação, reforçando o mito da democracia racial.
(LOPES, 2008, p
. 44).
Para Lopes (2008) esse ponto se apresenta como um terreno perigoso, uma vez
que a sociedade brasileira, principalmente, tende a se identificar mais com a cor branca,
“pois que, neste sentido, a miscigenação vem de encontro aos interesses almejados pela
ideologia do branqueamento, que neste processo a raça negra desapareceria, vencendo a
mais forte no caso, a raça branca”. (LOPES, 2008, p. 44)
A função dos professores, tão salientada pelas Diretrizes, nos faz buscar as
orientações da Educação Histórica com relação à indagação de quais idéias substantivas
eles possuem acerca da História da África e da cultura afro-brasileira para atingir os
objetivos sugeridos pela Legislação. A qualificação dos professores é um critério que
fica bem evidente como sendo a forma primordial para que a valorização da cultura
afro-
brasileira e da população negra aconteça.
Onasayo (2008), em sua dissertação de Mestrado, apresenta os resultados de sua
investigação no campo empírico a partir de um quadro denominado Das formas de
implementação: professores/as não vilões, mas produtores/as-reprodutores/as de
vítimas.
Pesquisando escolas
19
que procuram colocar em prática a lei 10.639/03, o
pesquisador descobriu que a maioria dos professores tendia mais a “folclorização” de
aspecto
s parciais da cultura afro-brasileira e africana, uma vez que as atividades
desenvolvidas “romantizavam” ou naturalizavam” aspectos da escravidão, como a
reconstituição de castigos físicos e aspectos da vida nas senzalas.
19
O autor realizou sua investigação em quatro escolas na rede estadual de ensino do Paraná, situadas na região metropolitana de
Curitiba.
54
Além deste tipo de conseqüência nefasta, também decorre daí a única maneira possível de
reação do público assistente, isto é, a pena. Assim, os/as espectadores/as, aqueles/as que
assistem ao “espetáculo” não têm como, pela ausência da crítica histórica, desenvolver
sentimentos de empatia ou solidariedade, visto que o que acontece ali reside apenas no
passado e não possui laços com nada do que seja contemporâneo e no espaço vivido.
(ONASAYO, 2008, p. 129).
Outra observação do pesquisador foi a presença de uma sensualidade constante
nesses trabalhos realizados pelos professores acerca da África e da cultura africana
.
“Adolescentes vestidas ou semi-vestidas com lençóis que permitem ficarem expostas
suas coxas, costas e outras partes do corpo feminino”. (2008) Para esse autor, o
imaginário dessas apresentações está baseado na obra de Gilberto Freyre que
preconizava a “harmonia” entre a Casa Grande e a Senzala, como se fosse possível tal
situação.
Do mesmo modo, a pesquisa desenvolvida por Onasayo (2008) pôde observar que
a cultura africana é retratada imitando determinados penteados e vestimentas típicas,
imitando determinados costumes e regiões da África. A observação realizada foi a de
que nenhum adolescente se apresentou vestido de forma contemporânea ou
caracterizado com qualquer símbolo mode
rno, como uma gravata ou um
laptop
.
Quando pesquisas realizadas a partir das práticas dos professores em sala de aula
identificam uma folclorização do conteúdo ou a identificação do “legado cultural” da
África e da cultura africana, entendemos que é fundamental que esses mesmos
professores passem a conhecer mais acerca da história da África e da produção
historiográfica que domina essa temática.
É devido a essa folclorização que se faz da África e da cultura africana que se
entende a necessidade de qualificação desses professores. Uma qualificação garantida a
partir do conhecimento de uma historiografia particular e da possibilidade de articulação
com diferentes materiais e fontes históricas. No entender desta investigação é essa
55
qualificação que garantirá aos professores o papel de mediadores no ensino de História
da África e da cultura afro-brasileira defendidos pelas Diretrizes. Há que se entender,
também, que isso só poderá ocorrer a partir do momento em que a África esteja presente
nos currículos e manuais didáticos como um conteúdo específico da História, como o
que já vem acontecendo com a História da Índia, da China e do Japão.
Dubet (1997) afirma que esse professor é um sujeito que possui uma capacidade
individual de ação, de subjetivação de suas próprias atitudes. Ao não conceber mais a
escola enquanto instituição esse professor passa a demonstrar que existe uma interação
mais dinâmica da escola com seus alunos, revelando experiências particulares na sua
prática e no seu discurso.
A experiência social aparece como uma maneira de construir o mundo, ao mesmo tempo
subjetiva (é uma "representação" do mundo vivido, individual e coletiva) e cognitiva
uma construção crítica do real, um trabalho reflexivo dos indivíduos que julgam sua
experiência e a rede
finem). (
WAUTIER, 2003, p. 180).
A escola é vista como instituição que possui como condição primeira ensinar”.
Ensinar que se estende para a idéia que se deve respeitar, valorizar a “outra” cultura,
uma vez que como já percebemos, se entende a existênci
a de uma cultura negra.
Dubet (1997) sugere que a escola é o espaço da subjetivação, da experiência
social em que o indivíduo toma consciência da sua relação com a sociedade, com a
realidade. Ele não nega a função ou a finalidade da escola em socializar, mas vai além
ao insistir que se deve entender as pessoas que dela fazem parte, caso dos alunos e
professores, uma vez que é justamente a relação entre esses indivíduos que possibilita
uma reflexão sobre as diferentes experiências. Para Dubet (1997) “uma escola não é
somente um local onde um professor ensina, é um ser moral, um meio moral
56
impregnado de certas idéias, de certos sentimentos, um meio que envolve tanto o
professor como o aluno”.
A sociologia da experiência social
20
visa definir a experiência como uma
combinatória de lógicas de ação que vinculam o ator a cada uma das dimensões de um
sistema. Alunos e professores não são vistos mais apenas nos aspectos pedagógicos,
mas através de uma multiplicidade de relações e ação. Os escolares são percebidos
enq
uanto alunos e crianças, alunos e adolescentes, alunos e jovens. Aprendem a crescer
em todas as dimensões de sua experiência. Embora diferentes, professores e alunos têm
semelhanças na experiência: desencanto, cansaço, decepções, expectativas. Para Dubet
(
1997)
“o ator deve articular estas lógicas de ação diferentes e a dinâmica que resulta
dessa atividade constitui a subjetividade do ator e sua reflexividade”. Disso se deduz
que os professores, nossos sujeitos da investigação, são capazes de produzir
conhe
cimento e de refletir sobre ele.
A experiência social aparece como uma maneira de
construir o mundo, ao mesmo tempo subjetiva (é uma "representação" do mundo vivido,
individual e coletiva) e cognitiva uma construção crítica do real, um trabalho
reflexiv
o dos indivíduos que julgam sua experiência e a redefinem).
O papel do professor, portanto, aparece como sendo de vital importância nesse
processo. Dentro do universo escolar, cabe a ele ter competência para articular as
sugestões das Diretrizes.
Segundo Dubet (1997) é preciso entender que esse professor, também um sujeito
que pertence ao universo escolar, pode ter dúvidas, angústias e resistências, pois cada
20
O ponto de partida de Dubet é a constatação de uma mudança profun
da na concepção da sociedade, do indivíduo e da ação social,
de uma "decomposição" da representação do social oferecida pela sociologia clássica.
57
professor carrega consigo uma multiplicidade de experiências, as quais podem interferir
nas suas id
éias, inclusive com relação à História da África.
Este é um ponto que será revelado, com maior autoridade, na análise feita com o
material recolhido junto aos professores de História do Brasil e Portugal e que serão
apontados no final deste trabalho.
2.
6 A ÁFRICA E O CONHECIMENTO HISTÓRICO ESCOLAR
Segundo Oliva (2003) a África tem aparecido em relatos de viajantes desde a
Antigüidade, mostrando o quanto aquele continente já atraia olhares e povoava a idéia
de diferentes povos e em diferentes situações.
A representação ou reconstrução da história, durante anos, foi feita pela narração,
por um relato que expunha em sua seqüência temporal uma ordem de acontecimentos,
sujeitos a uma
trama,
a uma relação inteligível, de forma que figurava um processo que
su
postamente “reproduzia” um mundo externo ao próprio discurso, ao próprio texto,
neste caso o mundo dos acontecimentos humanos do passado. O princípio da narrativa
passou a ser tema do debate teórico quando se tornou necessário levar em conta a
especificid
ade do pensamento histórico e de uma explicação científica. Para Rüsen
(2001), “a especificidade da narrativa histórica es em que os acontecimentos
articulados narrativamente são considerados como tendo ocorrido realmente no
passado”.
Ainda no século V a.C. Heródoto, o “pai da História”, definia a História como
investigação
daquilo que vemos por meio das evidências (documentos orais e escritos,
bem como artefatos arqueológicos) e sobre o modo de narrá-las, produzindo
58
conhecimento. Percebe-se então, que desde a Antigüidade as narrativas de viajantes,
historiadores e geógrafos, como Heródoto e Ptolomeu, no século II, tiveram papel de
destaque na tentativa de demonstrar aquilo que observavam e conheciam sobre o mundo
de então.
De especial interesse é a forma como esses viajantes da Antigüidade faziam
referência à África, procurando mostrar as diferenças e apresentando o continente e sua
população, enfatizando na sua descrição o que parece ter chamado maior atenção: a cor
da pele dos habitantes da região e as características geográficas do local, conhecido
como Etiópia. Essa era a única região conhecida da África até então e o que mais
causava estranheza, tornando-se evidente nos relatos desses viajantes, era com relação à
cor da pele, o que transparece c
laramente na denominação que deram ao local,
Aethiops,
que traduzido do grego significa “terra dos homens de pele negra”.
Assim, foi sendo construída uma imagem da África como continente sem história
e sem significado. A inexistência de registros escritos em boa parte desse continente
levou a historiografia do final do século XIX e início do XX a colocar a África fora da
história. De acordo com Oliva (2003), essa historiografia entendia a existência do
continente africano a partir do contato com os europeus, o que ocorreu por volta do
século XIV. Sendo assim, para além da educação escolar falha, é certo afirmar que as
interpretações racistas e discriminatórias elaboradas sobre a África e incorporadas pelos
brasileiros são resultado do casamento de ações e pensamentos do passado e do
presente. (OLIVA, 2003, p. 431).
É possível a existência de uma consciência histórica a respeito da África presente
na explicação das pessoas que, no entanto, contém apenas elementos da memória, uma
memória formada por relatos desses viajantes, como Heródoto ou de uma historiografia
59
que tende a seguir a mesma perspectiva com relação ao continente africano enquanto
terra exótica e sem história. Essa explicação possui, portanto, elementos constitutivos da
história, mas não com
uma racionalidade histórica.
Com o auxilio deste caso em especial, a historiografia pode colaborar enquanto
referencial teórico para conceber uma cognição histórica, que esta não é entendida
como inerente ao ser humano, mas construída por meio de uma pr
odução divulgada seja
através de materiais didáticos, seja por outros meios de comunicação.
Aqui cabe retomar a idéia de Peter Lee (2006) com relação à Literacia histórica,
na perspectiva de que os professores de história deveriam desenvolver uma competên
cia
para entender a multiperspectividade da historiografia e a possibilidade de criar uma
nova racionalidade histórica com relação à História da África e da cultura afro-
brasileira, o que desenvolveria nesses sujeitos a capacidade de pensar historicamente
e
de romper com uma cognição fundamentada em produções localizadas e tidas como
único ponto de referência.
No caso do ensino da história, devemos questionar a forma como este é feito,
geralmente seguindo uma “lógica”. Para tanto é preciso voltar à caracte
rística
multiperspectivada da História e contrariar uma racionalidade dominante que se
acomodou no sentido de apresentar apenas uma via de explicação aos acontecimentos e
problemas históricos. A função do historiador e do professor não é o de “contar as
co
isas”, nem mesmo quando essas histórias refletiram de verdade, o que é muito
improvável, as coisas “como realmente aconteceram”.
60
2.7 A HISTORIOGRAFIA ATUAL E AS FORMAS DE EXPLICAR A HISTÓRIA
O princípio da narrativa e as formas como se explica a história passaram a ser
tema do debate teórico quando se tornou necessário levar em conta a especificidade do
pensamento histórico, promovendo a necessidade de realizar uma explicação científica
da história. Foi criado, então, um sistema de explicação que assegure sua
“inteligibilidade” através do discurso histórico. “A especificidade da narrativa histórica
está em que os acontecimentos articulados narrativamente são considerados como tendo
ocorrido realmente no passado”. (ARÓSTEGUI, 2006, p. 357).
Para Collingwood (1981), a história tem que levar em consideração o
perspectivismo e estudar as idéias das pessoas quando agem para construir os fatos,
entendendo a relação das idéias dos sujeitos e suas ações. Essas idéias seriam as
perspectivas orientadoras da experiência do passado, aquilo que constrói a narrativa.
Para Rüsen (2001), as “idéias são os referenciais supremos que emprestam significado à
ação e à paixão”.
Mas, afinal, o que é a verdade em História? Barca (2006) enfatiza que “a história
não trata de certezas sobre um passado considerado fixo até que novos fatos sejam
descobertos; existem construções historiográficas diferentes, por vezes a responder a
perguntas muito próximas, mas com enfoques diferentes”.
Essa questão da verdade histórica é muito discutida em Educação Histórica,
segundo a qual não existe uma única verdade, mas plausibilidades. Considerando-se a
multiperspectividade da história e as diversas possibilidades de
explicação/interpretação, são essas plausibilidades que devem ser investigadas c
omo
componentes iniciais para qualquer pesquisa, principalmente com relação à História da
61
África. Para Aróstegui (2006) “não existe explicação histórica com o sentido que uma
explicação científica tem. O que existem são interpretações diversas e mesmo
cont
raditórias de certos conjuntos de fatos do passado”.
O que temos constatado é que sobre a História da África ainda pesam as mesmas
referências culturais idealizadas e defendidas por teóricos como Oliveira Viana, Nina
Rodrigues e Gilberto Freyre orientando as interpretações de um passado tido como
único e verdadeiro. As Diretrizes, quando se baseiam na necessidade de resgatar os
valores da cultura afro-brasileira, se mantêm ligadas a uma idéia de formação de
identidade nacional sob o ponto de vista de uma contribuição “externa”, entendendo os
negros a partir da sua inserção no Brasil por meio da escravidão moderna e seus
descendentes como pessoas com características próprias do povo africano,
desconsiderando a África como um continente de múltiplas características. De acordo
com Stuart Hall, o próprio termo “África” é uma construção moderna, cujo principal
ponto de origem comum se situa no tráfico de escravos.
Se considerarmos que a aprendizagem é contextualizada socialmente, as
experiências, o enfoque e os métodos de ensinar afetam sobremaneira o nível do
pensamento histórico. Os historiadores são influenciados por valores de seu próprio
tempo e pelas evidências de que dispõem, selecionando e combinando fontes para
recriar determinado acontecimento do passado. Suas interpretações, portanto, podem
variar de acordo com os diferentes interesses e perspectivas que apresentam. Lemos as
fontes de acordo com nossas experiências e nossa vida prática. A objetividade da
experiência que está na fonte pode ser usada por outra pessoa de modo subjetivo, com
outra experiência, outra intencionalidade.
62
Embora com essa característica multiperspectivada, podendo oferecer várias
explicações, o que acontece com a cognição histórica dentro da cultura escolar é a
dominação de um único discurso, uma única leitura do passado, o que pode ser
constatado com relação à História da África e da cultura afro-brasileira apoiadas quase
exclusivamente num único referencial, a obra de Gilberto Freyre
21
.
Segundo Oliva
Se levarmos em consideração que a grande maioria dos autores de livros didáticos são
historiadores, ou pelo menos professores de História, os manuais escolares—com seus
textos escritos e imagéticos ganham o status de serem representações da História.Da
mesma forma, seria natural p
ensar que as mesmas serão (re) significadas pelos seus leitores,
sejam eles professores ou alunos.Entendemos, portanto, que os textos e os recursos
imagéticos presentes em um livro didático - mapas, figuras, fotografias, pinturas, charges
ou desenhos
-
são
produtos da interpretação e da representação de uma certa realidade pelos
seus autores. (OLIVA, 2003, p. 442).
Nas narrativas sobre a África e o papel dos africanos no Brasil, podem aparecer
diferentes possibilidades de informações por parte dos professores, de acordo com sua
consciência histórica. Neste caso, os professores têm carecido de uma orientação que os
leve a perceber ou mesmo buscar outra racionalidade para interpretar essa história.
Para a narrativa histórica é decisivo (...) que sua constituição de sentido se vincule à
experiência do tempo de maneira que o passado possa tornar
-
se presente no quadro cultural
de orientação da vida prática contemporânea. Ao torna-se presente, o passado adquire o
estatuto de ‘história. (RÜSEN, 2001, p. 155).
De acordo com essa perspectiva de Rüsen, a África viria a adquirir um espaço
dentro dos conteúdos escolares a partir do momento em que o seu passado, sua história,
seja entendido enquanto conteúdo escolar e, portanto, passe a representar um
21
O livro Casa Grande e Senzala, publicado em 1933 têm, ainda, forte influência na cognição histórica e na racionalidade de
professores e manuais didáticos de História. A grande maioria das produções didáticas se baseiam nessa obra e, portanto, acabam
desenvolvendo uma única racionalidade reproduzida pelos professores nas aulas de História.
63
conhecimento sistematizado tanto nos currículos escolares como nos manuais didáticos
a serem utilizados por professores e estudantes.
Mas essa sistematização dos conteúdos escolares referentes à História da África
também pressupõem uma sólida formação historiográfica por parte daqueles que
elaboram os currículos e os manuais, assim como se espera que os professores que estão
em contato direto com os estudantes também tenham o domínio dessa historiografia. De
acordo com Rüsen (2001), a orientação, a interpretação e a experiência seriam os
princípios norteadores para que a História da África tenha sentido.
Essa orientação no tempo acontece a partir do contato e da experiência com as
fontes, garantindo a capacidade de problematizar, de entrar em contato com o passado e,
por conseqüência, levantar pressuposições e interpretação com relação ao passado e ao
presente.
E isso sepossível por meio de um contato direto dos professores de História
e seus alunos com uma documentação, primária ou secundária, que evidencie todos os
aspectos previstos pela lei 10.639/03, uma vez que dentro das mudanças temporais
apontadas por esses documentos, pode
-
se fazer um caminho histórico.
O processo histórico tem, então, a tarefa de ser desvinculado da idéia que os
conhecimentos dos fatos humanos se limitam apenas à apresentação ou descrição de
acontecimentos ou de realizações de determinados grupos. Jerzy Topolski
22
assinalou
que a palavra História, ainda que seja usada apenas para designar a atividade cognisciva
do histórico, encerra um duplo significado: designa o processo de pesquisa, mas
22
Citado por Aróstegui.
64
também o resultado dessa pesquisa como reconstrução na forma de uma série de
afirmações dadas pelos historiadores sobre os fatos passados.
De acordo com Rüsen (2001), o pensamento histórico está presente nas
explicações e os conteúdos nele inseridos são resultado de uma operação metódica que
se manifesta com a narrativa, a escrita, as problematizações que estabelecemos com a
experiência que está em nossa vida prática e nas evidências do passado, o que restou do
passado no presente. O desenvolvimento desse pensamento histórico promove a
competência de “pensar historicamente”, ou seja, a capacidade de se orientar no tempo
numa ligação entre passado, presente e futuro, sendo que o passado tem sentido
po
rque tem relação com o presente.
A história hoje tem uma característica bastante rigorosa ao não aceitar apenas
“uma grande narrativa” acerca do passado, que a historiografia pode produzir
narrativas divergentes, resultado de diferentes perspectivas a partir das mesmas fontes
ou situações.
Neste ponto voltamos as atenções, novamente, em defesa da importância de se
resgatar a história da África. “Partindo da idéia de que a história é o campo das ações
mentais e materiais humanas no tempo, a África é a região do mundo de mais longa
historicidade”. (OLIVA, 2003, p. 436). Nessa perspectiva, torna
-
se obrigatório um novo
olhar sobre a História da África e da cultura afro-brasileira a ser resgatada no universo
escolar, observando no presente os elementos africanos de um passado que, até então,
tem sido observado a partir de um único ponto de vista da historiografia.
Segundo a análise sobre consciência histórica de Rüsen (2001), o tempo, à medida
que transcorre, provoca pequenas e grandes mudanças que são v
ividas pelos sujeitos nas
suas práticas quotidianas. A experiência do tempo e o nosso desejo de prever as
65
mudanças no futuro causam a necessidade de orientação no tempo relativamente à
interpretação do passado.
Como argumenta Lee (2006), embora pareça que a nossa necessidade de
orientação no tempo, no dia-a-dia, cria o interesse acerca do passado e reforça a
História, a história acadêmica “produz um acréscimo teórico para além da necessidade
de identidade dos sujeitos ativos” e este “acréscimo teórico deve ser visto como a
produção racional específica da pesquisa orientada em narrativa histórica; a História
transcende a particularidade da orientação de senso comum para a ação no mundo”.
Assim, a Educação Histórica se apresenta neste quadro de investigação, uma vez
que esta pesquisa busca entender a forma como os conhecimentos históricos acerca da
África estão presentes nas idéias de professores de História e alunos brasileiros e
portugueses.
66
CAPÍTULO 3
AS IDÉIAS HISTÓRICAS DOS PROFESSORES
O meu passado é tudo quanto não consegui ser.
Nem as sensações de momentos idos me o
saudosas: o que se sente exige o momento;
passado este um virar de página e a história
continua, mas não o texto.
-
Fernando Pessoa
-
Desde o início desta investigação a preocupação foi quanto ao papel central dos
professores de História no processo de inserção da Lei 10.639/03 no cotidiano escolar e
sua função como formadora de uma consciência histórica.
Levando em consideração a forma como as Diretrizes se referem aos profe
ssores
como os sujeitos fundamentais na execução desse projeto foi importante analisar, com o
auxílio das idéias desenvolvidas por Peter Lee, denominadas de conceitos substantivos,
dentro da perspectiva da Educação Histórica, as formas como acontece a cogn
ição
desses professores e como sua consciência histórica interage com o processo de
aprendizagem dos alunos do Ensino Fundamental.
As idéias que os professores de História apresentam de África foram tomadas,
portanto, como referencial para o início desta d
iscussão.
Este capítulo, portanto, pretende investigar a forma como os professores de
História, entendidos enquanto sujeitos com experiências próprias, se relacionam com o
conceito substantivo “África”.
67
3.1 AS IDÉIAS DOS PROFESSORES
Como já se anunciou na perspectiva do pólo teórico dessa investigação, além da
pesquisa documental realizada a partir das Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-
Brasileira e Africana, privil
egiou
-se a utilização do inquérito sob a forma de
questionário escrito.
O inquérito ou questionário escrito foi elaborado com perguntas abertas e
fechadas com características de inquérito em pequena escala. Neste sentido, como
afirmam Cohens e Manion (1990), foi necessário delimitar bem a finalidade exata da
pesquisa e as características da população a ser investigada.
Com relação aos professores, um critério que se estabeleceu é que deveriam
trabalhar com a disciplina de História no Ensino Fundamental. Com apenas uma
exceção no caso brasileiro, em que um dos professores investigados é formado em
Filosofia, todos os outros são formados em História. Da mesma forma, embora os
professores brasileiros trabalhem em escolas públicas e privadas, os professores que
devolveram os questionários respondidos trabalham em escolas públicas, tanto aqui no
Brasil como em Portugal.
A investigação realizada com os alunos tomou como critério o fato de serem
alunos da última rie do Ensino Fundamental, no caso, série no Brasil e série em
Portugal, todos com idade entre 13 e 15 anos. Os alunos brasileiros freqüentam uma
escola privada da cidade de Curitiba, enquanto os portugueses são alunos de escola
pública de uma cidade próxima do espaço rural.
68
Outra questão ainda apontada por estes autores diz respeito às decisões sobre a
amostra da população a ser investigada. Para tanto se optou pelo tipo de “amostra
intencional”, a qual “el investigador seleciona a mano los casos que serán incluídos en
su muestra sobre la base de su proprio juicio en cuanto a tipicidad. De esta manera
construye una muestra que es satisfactoria para sus necesidades específicas.”(COHEN e
MANION, 1990, p. 133)
Nessa mesma perspectiva, definem-se pelo tamanho da amostra a partir dos
propósitos da pesquisa e da própria natureza da população investigada. Foram
selecionados 2 professores brasileiros e 3 professores portugueses, bem como 24 alunos
brasileiros e 31 alunos portugueses.
3.2 OS PROFESSORES COMO SUJEITOS DO UNIVERSO ESCOLAR
Muito se tem discutido acerca do papel dos professores no contexto do universo
escolar. As pesquisas atuais, que se baseiam na perspectiva da sociologia da experiência
(DUBET, MARTUCELLI, 1997), apontam para o fato de que esse ofício de ensinar
precisa ser entendido sob uma no
va perspectiva, a partir da qual os professores passam a
ser vistos como sujeitos completos, com uma subjetivação própria que obriga a
compreendê
-
los além do espaço da sala de aula.
Aqui entra o papel primordial da Educação Histórica nesta investigação par
a
entender como a experiência dos professores interfere nesse processo de cognição e
como isso aparece em suas explicações com relação à temática da história da África.
69
Por isso a preocupação com os conhecimentos prévios e com a investigação dos
interesses
que está presente na experiência das pessoas.
De acordo com Peter Lee (2006), a capacidade de pensar historicamente é o fator
fundamental que desenvolve uma cognição histórica mais aperfeiçoada, possibilitando
aos professores a competência de educar também historicamente. O professor de
história, portanto é, ao mesmo tempo, historiador e “ensinante”. Ele deve produzir
conhecimento e fazer com que o aluno escreva e leia o mundo historicamente por meio
da narrativa. Assim, os alunos devem entender a história como compromisso de
indagação, com características e vocabulários próprios: “passado”, “acontecimento”,
“situação”, “evento”, “causa”, “mudança”.
Peter Lee (2006) acredita que os professores têm mais facilidade de identificar
aqueles conhecimentos prévi
os que os alunos possuem, uma vez que esses conceitos são
centrais para a História e para entender aquilo que ele pensa de si próprio enquanto
leciona. Tais conceitos podem vir de vários setores de nossa vida e o entendimento de
seu significado é de fundamental importância, sobretudo porque pode mudar de acordo
com o tempo e com o contexto.
Nesse ponto a pesquisa realizada pelo projeto CHATA
23
, procura demonstrar que
as idéias que os alunos têm sobre evidência histórica não conferem com a realidade,
pois geralmente acreditam que essa evidência nada mais é que uma cópia do passado e
carregam para dentro deles a visão que têm dos acontecimentos.
23
O Projeto “Chata” (Concepts of History and Teaching Approaches) Conceitos de História e Abordagens de Ensino, de 1995,
realizado na Grã Bretanha, foi guiado por Peter Lee e Rosalyn Ashby. Pesquisa na área da Investigação Histórica destinada a
explorar a
compreensão dos alunos.
70
São esses aspectos e a compreensão de sua existência o papel que os professores
devem desempenhar, criando um padrão de
valores,
significados ou
intenções sobre a
seleção, a reconstrução e a articulação temática estruturada no fato histórico escolhido,
qual seja, o significado de África. É neste significado que os professores constroem sua
originalidade, pois é através do sentido elaborado pelos professores e alunos que se
definirá a historiografia a ser utilizada na abordagem do tema escolhido, construindo
assim sua
consciência histórica
.
Na investigação sobre o ensino de História, a Educação Histórica sente a
necessi
dade de buscar um conhecimento sistemático sobre as idéias históricas tanto de
crianças e jovens, assim como dos professores. um conhecimento que é obtido pela
ciência e um produto da reflexão que fazemos da própria história pessoal. “Como
regra geral, as ciências ao se constituírem vão criando linguagens particulares, repletas
de termos específicos, que podem transformar-se em complexos sistemas formais”.
(ARÓSTEGUI, 2006, p. 369).
Entendendo que a África faz parte da construção social e cultural do Brasil e de
Portugal, houve o entendimento de que seria necessário realizar um estudo de caso
nesses dois países. Utilizando a categoria de Conceito Histórico formulada por Rüsen
(2007), a África precisava ser investigada a partir das idéias de professores brasileiros e
portugueses para entender como essa mesma idéia foi construída. Para tanto, houve
necessidade de buscar guarida em produções alternativas que auxiliassem na busca por
respostas.
A partir dos Estudos Culturais, inseridos na sociologia inglesa e tendo como
principais representantes Raymond Williams e Stuart Hall foram buscadas novas
plausibilidades de explicação para a questão da História da África, pautada na utilização
71
do conceito de diáspora, sobretudo nos estudos de Paul Gilroy e Stuart Hall. Seus
trabalhos se remetem a investigações acerca de questões de identidades, relações de
gênero e ensino, relações dos sujeitos com o conhecimento escolar, na dimensão da
cultura e da sua relação com os processos de escolarização.
O conceito fechado de diáspora se apóia sobre uma concepção binária de diferença. Está
fundado sobre a construção de uma fronteira de exclusão e depende da construção de um
‘outro’ e de uma oposição rígida entre o dentro e o fora. (HALL, 2003, p. 33).
Assim, existe uma questão que é a de interpretar a África, reler a África, do que a
África poderia significar para as crianças e adolescentes hoje, depois da diáspora.
Aqueles que saem de sua ‘terra’ acabam se acostumando com os novos ritmos e os elos
naturais e espontâneos acabam sendo interrompidos por suas experiências diaspóricas.
Sem contar um novo problema a se considerar, aquele de que a história e a cultura
negras são percebidas como uma intrusão ilegítima em uma visão de vida nacional.
Assim, a utilização de um primeiro instrumento de investigação, na forma de um
questionário, pretende mapear as idéias substantivas dos professores de ambos os
países, fortemente relacionados com a História da África, com relação à legislação e sua
relevância enquanto parte de sua práti
ca cotidiana no âmbito escolar.
O questionário foi construído tendo em vista as leituras realizadas das Diretrizes e
das idéias apontadas pelos Estudos Culturais a partir de Stuart Hall (2003) e Paul Gilroy
(2002). Formulado principalmente com questões abertas, o instrumento de investigação
pretende obter respostas dos professores no sentido de identificar quais idéias seriam
apontadas com relação à África e como esse assunto, enquanto conteúdo escolar, pode
ser abordado em sala de aula.
72
3.3 CAMINHOS DA I
NVESTIGAÇÃO
Comumente, em uma investigação educacional tenta-se compreender algo de um
grupo estudando-se em profundidade uma pequena parcela desse grupo. Esta
investigação se enquadra dentro das pesquisas qualitativas, tomando um grupo de
professores para a realização do estudo, tendo em vista que a ação tem significado com
um sujeito, e também com toda a sociedade e com a relação do sujeito com ela.
As pesquisas em cognição histórica inserem-se no âmbito do modelo de aprendizagem
situada, ou contextualizada e, como tal, procuram responder à questão central: como é que
os sujeitos constroem as suas idéias em diferentes contextos concretos de aprendizagem?
(CHAVES, 2006, p.4)
De acordo com Erickson (1986, citado por LESSARD-
HÉBERT, M. et ali, 1990)
(.
..) os significados possuem uma história, isto é, que eles podem estar ligados, na origem a
uma cultura mais vasta do que aquela do meio imediato; esta cultura é definida, em termos
cognitivos, como uma aprendizagem de normas que guiam as percepções, as convicções, as
ações e a avaliação das ações dos outros (...)
(LESSARD
-
HÉBERT, 1990, p. 42).
As pesquisas qualitativas são caracteristicamente multimetodológicas, isto é,
usam uma grande variedade de procedimentos e instrumentos de coleta de dados. Neste
caso, em especial, o instrumento escolhido foi o questionário, uma técnica de inquérito
bastante utilizada pelas Ciências Sociais. O questionário intencionava recolher as
respostas de cinco professores brasileiros e cinco professores portugueses, mas foi
respondido por apenas dois professores de História no Brasil e três professores de
História em Portugal. No entanto, embora tenham sido distribuídos mais de 20
questionários, contando escolas públicas e privadas no Brasil, houve uma grande
resistência por p
arte dos professores em devolvê
-
los. Alguns professores argumentavam
ter preenchido, mas à lápis e, então, teriam que passar a limpo”. Outros esqueciam em
73
casa ou, então, estavam preenchendo “aos poucos”. Do mesmo modo, dos 20
questionários enviados a Portugal, apenas os três aqui apresentados foram devolvidos.
E, mesmo assim, cerca de 8 meses após o envio desses questionários a Portugal.
É bom ressaltar que o objetivo desta investigação se baseou, portanto, numa
amostra intencional, ideal para um determinado projeto de pesquisa que visa um
segmento específico de público. Essa "amostra intencional" acontece a partir de
entrevista, observação ou realização de um grupo focal com as pessoas que, por critérios
definidos pelo avaliador, sejam capazes de transmitir as informações que se julgam
necessárias para realizar a avaliação (isto significa que as pessoas ou grupos escolhidos
devem ser selecionados baseados no critério de representatividade dentro do contexto
onde se realiza a avaliação).
O que garantiu a intensidade e a finalidade desta investigação não foi a realização
de uma comparação entre os dois países nem a triangulação com a legislação, mas a
busca por elementos de argumentação do sentido e dos significados apontados por
professores e alunos com rela
ção à História da África.
Com o recebimento desses questionários, foi possível realizar uma análise das
suas respostas obtidas considerando, também, a formação de cada um dos professores e
o tempo que atuam em sala de aula. Embora a intenção fosse investigar as idéias
apresentadas por professores de História, um dos questionários respondido no Brasil foi
apresentado por uma professora que aulas de História, mas têm formação em
Filosofia.
74
TABELA 1
-
PROFESSORES BRASILEIROS
Idade
Formação
Ano de formação
Instituição
Professor José
39 anos
Licenciatura e
Bacharelado em
História
2000
UFPR
Professora Ana
29 anos
Licenciatura e
Bacharelado em
Filosofia
2001
UFPR
No caso dos questionários que retornaram de Portugal, todos os três professores
apresentam formação superior em História.
TABELA 2
-
PROFESSORES PORTUGUESES:
Idade
Formação
Instituição
Professor Carlos
26 an
os
Licenciatura em
ensino de História
2005
Universidade do
Minho
Portugal
Professora
Carmem
27 anos
Licenciatura em
ensino de História
2005
Universidade do
Minho
Portugal
Professora Andréa
48 anos
Licenciatura em
História
1981 Faculdade de Letras
da
Universidade do
Porto
-
Portugal
75
3.4 AS IDÉIAS DOS PROFESSORES
De modo geral, fica perceptível que falta para os professores um referencial
teórico da historiografia, sendo que em suas idéias acerca da África aparecem
interferências de outros meios, como da mídia e de manuais didáticos. Os professores
desconhecem o caminho percorrido na construção histórica, interferindo na forma como
os alunos se aproximam do conhecimento.
As idéias dos professores apresentam a África enquanto um conceito-
gênero”,
categoria que Rüsen (2007) define como sendo um conceito da linguagem dos
historiadores que não são especificamente históricos, como acontece com palavras
como
trabalho
e
economia
, por exemplo. “Eles designam, nos estados das coisas,
complexos de qualidades que eles têm em comum com os outros estados de coisas,
independente de sua relevância nos processos temporais”. (RÜSEN, 2007, p. 92)
A África se torna um conceito histórico porque lida com a relação intrínseca
que existe, no quadro de orientação da vida prática presente, entre a lembrança do
passado e a expectativa do futuro. Quando a relevância do conceito é designada, torna-
se um conceito histórico, como “cultura africana”.
Um exemplo desse desconhecimento acerca de um referencial teórico fica claro
nas idéias apontadas na tabela 1.
1) No ano de 2003, o presidente Luís Inácio Lula da Silva sancionou a lei 10.639, a
qual torna obrigatório o ensino de História da África e da cultura afro no Ensino
de 5ª. a 12ª. série no Brasil.
76
TABELA 3 (BRASIL)
-
O QUE ACHA DESSA MEDIDA
Professor José - Acho a medida bastante justa visto que pouco se sabe sobre
o assunto e o debate desta questão movimenta as informações tornando mais
acessível.
Professora Ana - Mais uma lei imposta. Sem ter sentido, pois não é
elaborada pelo povo.
A resposta do professor José apresenta interesse sobre a temática, mas ele mesmo
atenta para o fato de que é uma temática histórica que os professores não têm acesso. O
debate desta questão movimenta as informações tornando mais acessível. Que
informações seriam essas e o que se tornaria mais acessível não fica claro. Muito menos
para quem.
a professora Ana atenta para o fato de a lei ser imposta, sem a participação
popular em sua elaboração, deixando de comentar acerca da África e de uma possível
importância da medida em si.
Seria, mesmo uma lei sem sentido? Se considerarmos que essa legislação não é
fruto de uma idéia espontânea do governo e o foi elaborada de um momento para
outro, mas é resultado das lutas do Movimento Negro organizado, essa afirmação pode
demonstrar o desconhecimento acerca dessa discussão. ainda a afirmação de que o
povo não participou dessa elaboração. Porém, devemos considerar que os integrantes do
Movimento Negro também fazem parte da sociedade, do povo brasileiro, lutando em
prol da valorização da história e da cultura africanas no Brasil e que graças a essa
atuação essa legislação foi elaborada.
Nessa questão, ao elaborar uma legislação específica sobre a História da África e
da cultura africana, podemos afirmar que o Brasil se encontra bastante adiantado com
77
relação a outros países que m laços bastante estreitos com a África, como é o caso de
Portugal. Ao mesmo tempo, a ênfase da legislação em nosso país pode estar
dificultando novas orientações e a capacitação dos professores de História.
No caso dos professores portugueses, as respostas passaram por outras idéias:
TABELA 3 (PORTUGAL)
-
O QUE ACHA DESSA MEDIDA
Professor Carlos - O ensino de História de qualquer país e cultura é sempre
interes
sante, mas neste caso espefico concordo com esta medida, pois este
estudo deveria ser apenas um complemento à História do país de origem.
Professora Carm en - A medida parece-me um pouco exagerada. Creio que a
História da África deve ser lecionada no conjunto da História Universal, de
forma a poder relacioná
-
la com as ocorrências em outros locais.
Professora Andréa - Parece-me uma medida adequada num país em que a
população é constituída por um grande número de africanos ou seus
descendentes e com vínculos históricos culturais são indissociáveis da história
brasileira.
De modo geral concordam que a medida parece exagerada e começam a apontar o
que será constante em suas respostas: o acúmulo de conteúdos no currículo de História.
Gomes (2005), se referindo ao ensino da História da África no Brasil, afirma que para
muitos professores, a função da escola fica reduzida à transmissão de conteúdos
historicamente acumulados, como se essa temática pudesse ser desvinculada da
realidade brasileira e, acreditamos
, também da portuguesa.
Embora a professora Andréa observe a importância dessa medida no Brasil
enquanto país que possui um grande número de africanos e de seus descendentes
acredita, como os outros professores, que essa medida seria realmente adequada
como um complemento à história Universal, como afirma a professora Carmen.
78
Aparentemente encontramos uma negação da presença negra em Portugal, visto que a
professora Andréa acredita que no Brasil as relações com a África são indissociáveis.
TABELA 4 (B
RASIL)
-
ISSO SE APLICARIA EM PORTUGAL
Professor José
-
Provavelmente, devido à relação entre aquele país e a África.
Professora Ana - Com certeza, seria interessante explorar mais essa ligação
entre aquele país e o continente africano.
Inquiridos sobre a aplicabilidade de uma legislação como essa em Portugal, os
professores brasileiros concordam que seria interessante explorar a ligação entre aquele
país e África, tomando como ponto de partida a idéia de uma identidade comum.
Isso, no entanto, não é verificado nas respostas obtidas com os professores
portugueses:
TABELA 4 (PORTUGAL)
-
ISSO SE APLICARIA EM PORTUGAL
Professor Carlos
-
Portugal teve desde sempre ligação com África, mas penso
que esta medida não se aplicaria.
Professora Carmen
-
Crei
o que não faz sentido trabalhar a História de África
de forma isolada.
Professora Andréa - Penso que seria difícil de concretizar em Portugal, dada
a vastidão dos programas, no entanto a temática africana é abordada em alguns
contextos históricos. Embora o tratamento destes conteúdos seja breve são
abordados rios conteúdos que se leccionam em determinados anos de
escolaridade.
79
A África, nas idéias dos professores portugueses, aparece apenas como um
“conceito
-gênero”, sem um referencial teórico de valor histórico que se aplique a uma
medida como a de enfocar esse tema num contexto maior de sala de aula. A professora
Carmen, por exemplo, afirma que “não faz sentido trabalhar a História de África de
forma isolada”. Soma-se, ainda, uma questão que vai se apresentar constante em suas
respostas, que é a preocupação com os programas de ensino de História que se
apresentam muito vastos, não permitindo tempo de salientar esse assunto em sala de
aula.
De acordo com Dubet (1997), a identidade cultural é um elemento que aparece na
experiência social que o sujeito mantém com o conhecimento. Neste caso, os
professores brasileiros constatam a presença uma relação cultural entre a África e o
Brasil e conseguem, ao menos, levantar argumentos para trabalhar esse tema em sala de
aula.
Na perspectiva de educadores que estudam a questão da discriminação e do
preconceito
Para que a escola consiga avançar na relação entre saberes escolares/realidade
social/diversidade étnico-cultural é preciso que os (as) educadores (as) comp
reendam que o
processo educacional também é formado por dimensões como a ética, as diferentes
identidades, a diversidade, a sexualidade, a cultura, as relações raciais, entre outras.
(GOMES, 2005, p. 147)
As idéias apontadas pelos professores portugueses nos levam a crer que a África
aparece mesmo apenas como um conteúdo e não como um tema que mereça ser
discutido como referencial de identidade ou de postura perante a sociedade. Isto está
provando a necessidade da presença e da ênfase na utilização de documentos primários
80
e secundários em aulas de História como recurso fundamental para a orientação e
interpretação no tempo.
TABELA 5 (BRASIL)
-
QUE ARGUMENTOS VOCÊ USARIA COM SEUS
ALUNOS PARA TRABALHAR TAL ASSUNTO
Professor José - Os argumentos seriam a constituição da população
brasileira, as permanências que encontramos hoje e que surgiram do contato
dos africanos com o Brasil. A origem deste povo africano (branco e negro) na
própria África, que me parece ser algo bastante desconhecido do povo
brasileiro
.
Professora Ana - Talvez levasse os alunos a refletirem a respeito do
“monopólio” do “uso e abuso” no período da expansão comercial.
Nota
-se a presença de uma idéia fundamentada na questão cultural e, baseando-
se
nas observações de Rüsen (2001), uma certa orientação no tempo, uma vez que o
professor José se refere à origem do povo africano branco e negro, apontando inclusive
uma nova forma de entendimento da África composta não apenas de elementos negros.
Sua perspectiva, aqui, é a da existência de uma história africana e não apenas de uma
contribuição culturalista. Porém, ao afirmar que ainda encontramos permanências e não
se referindo às mudanças, podemos acreditar que entende a existência dessa
contribuição como algo inerente aos africanos, como se os afrodescendentes fizessem
parte de outra cultura.
os professores portugueses não responderam a essa questão, manifestando a
inexistência relacional entre a vida prática e a idéia que têm de África. Ou,
provavelmente, falte a eles mesmos o entendimento do por que trabalhar tal assunto em
81
sala de aula, haja vista que reclamem constantemente doa cúmulo de conteúdos a ser
trabalhado nas aulas de História.
TABELA 5 (PORTUGAL)
-
QUE ARGUMENTOS VOCÊ USARIA COM SEUS
ALUNOS PARA TRABALHAR TAL ASSUNTO
Profes
sor Carlos
-
Não respondeu.
Professora Carmen
-
Não respondeu.
Professora Andréa
-
Não respondeu.
Sobre a importância desse tema no currículo escolar, as respostas dos professores
brasileiros foram apontadas na tabela 4:
TABELA 6 (BRASIL)
-
É IMPORTAN
TE QUE ESSE TEMA “ÁFRICA”
ENTRE NO CURRÍCULO ESCOLAR? EM QUE SÉRIE?
Professor José - Sim. A partir da 5ª série quando se faz os estudos sobre as
primeiras civilizações no mundo. Na 6ª série quando se pensa as rotas
comerciais na dita Idade Média. Na série quando se trabalha com a
formação do Brasil.
Professora Ana - Sim. Considerando nosso processo de colonização, nossas
influências, a formação da nossa cultura, a busca de novas terras (expansão
marítima). Também pode ser considerada ao analisarmos a atual situação dos
negros (e índios) como efeito do nosso processo de colonização.
Perguntados sobre o melhor momento de incluir esse estudo, os professores
mostraram
-se adeptos da divisão tradicional da História, que sugerem essa inclusão
tendo ora o Egito como referência, ora a expansão marítima. A África, nessa
perspectiva, não é vista dentro de uma localização temporal própria. E embora
analisando a partir da História do Brasil, o enfoque ainda permanece eurocêntrico, uma
vez que o ponto de partida das idéias desses professores são a Idade Média (européia) e
a expansão marítima, momento de conquistas dos países europeus, sobretudo de
Portugal e da Espanha.
82
Não uma fuga da divisão tradicional da história, quadripartite, apontada por
Chesnaux (199
5). As idéias dos dois professores seguem uma linearidade dos conteúdos
apresentados nos currículos e nos manuais didáticos.
No caso dos professores portugueses, além da presença desse tema seguir também
essa linearidade, podemos conferir a forte influênc
ia da idéia de nação apontada em suas
respostas. De acordo com o professor Carlos, a África deveria ser estudada para
entender melhor o contexto da guerra colonial
24
, entendendo que essa temática só
interessa a partir do ponto de vista de Portugal e lançando, ainda, um olhar eurocêntrico
sobre o estudo da História. A África transparece na fala dos professores portugueses
como o “outro”.
TABELA 6 (PORTUGAL)
-
É IMPORTANTE QUE ESSE TEMA “ÁFRICA”
ENTRE NO CURRÍCULO ESCOLAR? EM QUE SÉRIE?
Professor Carlos -
É
sempre importante ter um conhecimento geral de todos
os temas que marcaram a História de Portugal. No caso deste tema África
poderia
-se eventualmente alargar um pouco mais o conhecimento aquando da
abordagem da expansão marítima nos 5° e 8° anos e da gue
rra colonial nos 6° e
9° anos. Seria interessante aprofundar um pouco mais o tema “Áfricapara se
compreender melhor o contexto da guerra colonial, bem como toda a sua
envolvente para que se possa perceber as vincias daqueles que por
passaram.
Profe
ssora Carmen - O tema África deve ser tratado sempre que se
justifique, mas não deve ser encarado como um caso particular e isolado.
Professora Andréa - Como já referi o tema África é abordado e diversos
conteúdos sem tratamento aprofundado, na minha opino a ser tratado com
mais profundidade deveria ser abordado no tema “Portugal hoje, tocando
essencialmente relações de cooperação com as ex-colônias, sem esquecer
obviamente o aspecto da lusofonia.
24
Guerras promovidas por colônias africanas durante a segunda metade do século XX, sobretudo após a Segunda Guerra Mundial,
com o objetivo de conquistar a sua independência com relação à dominação européia.
83
A questão da lusofonia, citada pela professora Andréa, deixa transparecer a idéia
de que a África se apresenta como complemento da história portuguesa e o com uma
historicidade própria. De acordo com Gilroy (2002), a África se apresenta apenas a
partir de um passado genérico, neste caso se relaciona com
o período colonial e só como
tal merece ser mencionada. A partir do momento em que as colônias africanas tornaram
-
se independentes, deixaram de existir do ponto de vista histórico. A professora Carmen
ainda reforça essa idéia quando afirma que o tema não
deve ser encarado como um caso
particular e isolado, ou seja, acredita que a África merece ser estudada tendo como
ponto de partida sua relação com os portugueses uma vez que, dentro dessa perspectiva,
não apresenta uma história particular.
Conclusões muito próximas podem ser obtidas a partir das idéias apontadas com
relação ao texto apresentado no questionário:
“Entre as civilizações mais antigas da história da humanidade, algumas se
desenvolveram no continente africano, como a egípcia, a cuxita, a axu
mita e a etíope. A
história do Egito faraônico talvez seja a mais conhecida por nós, mas todas essas
civilizações sobreviveram a um longo período da história da humanidade,
desenvolvendo tecnologias e inúmeras formas de organização de suas sociedades, e
pr
oduzindo um enorme legado cultural para toda humanidade.” (MUNANGA,
Kabengele e GOMES, Nilma Lino. Para entender o negro no Brasil de hoje: história,
realidades, problemas e caminhos. São Paulo: Global, 2006.)
TABELA 7 (BRASIL)
-
IMAGEM DE ÁFRICA O TEXTO
TRAZ
Professor José
-
Em branco.
Professora Ana
-
Que na África somente os egípcios foram importantes.
-
Questão geográfica;
-
Outras civilizações africanas;
-
História do Egito.
O professor José não respondeu a essa questão, mas a professora Ana apo
ntou
uma idéia tradicional, sem explicitar o que estaria envolvido na questão geográfica e
quais seriam as outras civilizações africanas além da egípcia.
84
TABELA 7 (PORTUGAL)
-
IMAGEM DE ÁFRICA QUE O TEXTO TRAZ
Professor Carlos - O texto trás a imagem de um continente grandioso,
proporcionador de uma mistura de raças e culturas fascinantes, uma imagem de
inovação, desenvolvimento. Dá a idéia de que foi este a origem das grandes
culturas e de que toda essa grandiosidade se perpetuou até aos dias de hoje.
Pa
ra trabalhar com os alunos colocaria questões mais abrangentes e
relacionadas com os temas que estudam e estão contemplados no currículo
escolar. Colocaria as questões mais no âmbito do estudo do Egito no ano,
embora não deixasse de referir as outras civilizações. Falar-
se
-ia das inovações
introduzidas pelo povo epcio que já para a época apresentava inovações
espantosas, como por exemplo as suas construções. No caso do 5° ano seria
interessante por causa da expansão muçulmana e expansão marítima.
Prof
essora Carmen - A imagem transmitida dá conta do continente africano
como sendo o berço da civilização e um pólo importante de difusão de
novidades e inovações importantes para a humanidade.
- Qual o continente que o documento se refere?- Quais as civilizações que se
desenvolveram nesses continentes?- Que contributo deixaram essas civilizações
para os dias de hoje?
Professora Andréa - O texto remete-nos mais para as civilizações antigas,
dando por isso uma visão redutora das civilizações e culturas africanas. Não
posso, no entanto, pronunciar
-
me sobre o tratamento do tema, uma vez que não
se insere nos currículos escolares dos anos que lecciono.
“Dá a idéia de que foi este a origem das grandes culturas e de que toda essa
grandiosidade se perpetuou até ao
s dias de hoje”,
é o que afirma o professor Carlos. De
acordo com Anjos (2005)
“o sistema escolar tem sido estruturado para a perpetuação de uma ideologia sócio
-
político
-
econômica que, junto com os meios de comunicação social, mantém uma estrutura
classis
ta, transmissora de valores distorcidos e individualistas. Primeiro, são os livros
didáticos, que ignoram o negro brasileiro e o povo africano como agente ativo da formação
geográfica e histórica.” (ANJOS, 2005, p. 174)
É interessante perceber, novament
e, a preocupação com o currículo escolar, como
apontado na resposta do professor Carlos: “Para trabalhar com os alunos colocaria
questões mais abrangentes e relacionadas com os temas que estudam e estão
contemplados no currículo escolar”. De acordo com Gomes (2005), trabalhar com a
África e todas essas dimensões
85
não significa transformá-las em conteúdos escolares ou temas transversais, mas ter a
sensibilidade para perceber como esses processos constituintes da nossa formação humana
se manifestam na nossa v
ida e no próprio cotidiano escolar. (GOMES, 2005, p.147)
Da mesma forma, esse professor se pronuncia afirmando que o texto “dá a idéia”
de que foi a África o berço de grandes civilizações, negando estudos científicos que, até
o momento, seguindo as idéias evolucionistas apontam a África, de fato, como local de
origem dos seres humanos. A referência a elementos culturais aponta a idéia de que a
África não existe historicamente e, segundo Rüsen (2007), a história não pode sem deve
ser entendida a partir de uma única racionalidade, ou seja, de uma única perspectiva,
caso que aparece nas respostas da maioria dos professores.
A orientação no tempo se faz apenas a partir da divisão tradicional da História e,
mesmo assim, se estiver adequada ao que se exige no currículo escolar. Todos os
elementos mencionados estão relacionados com uma produção historiográfica que
aponta sempre os mesmos elementos como Egito e Expansão Marítima, tendo esta um
olhar europeu.
Na questão 4, foram apresentados dois textos para que os professores apontassem
um deles para ser trabalhado em sala de aula. A escolha deveria ser justificada:
Texto 1- “(...) O piloto de Colombo, Pedro Nino, também era africano. Desde
então, a história do Atlântico negro, constantemente ziguezagueando pelos mo
vimentos
dos povos negros – não só como mercadorias, mas engajados em várias lutas de
emancipação, autonomia e cidadania -, propicia um meio para reexaminar os
problemas de nacionalidade, posicionamento, identidade e memória histórica (...).”
(GILROY, Paul. O Atlântico Negro. Modernidade e dupla consciência, São Paulo, Rio
de Janeiro, 34/Universidade Cândido Mendes - Centro de Estudos Afro-
Asiáticos,
2001. P. 59.)
Texto 2 “(...) Sabemos que o termo ‘África` é, em todo caso, uma construção
moderna, que se refere a uma variedade de povos, tribos, culturas e línguas cujo
principal ponto de origem comum situava-se no tráfico de escravos (...) (HALL, Stuart.
Da Diáspora
: identidades e mediações culturais. Belo horizonte: UFMG, 2003. P. 31)
86
TABELA 8 (BRASIL
)
JUSTIFICATIVA
Professor José - Um texto que aborda o tema de maneira mais ampla
estimulando a busca de informações sobre a participação dos povos negros nas
lutas.
Professora Ana
-
Não é um discurso preconceituoso, traz idéias introdutórias
que levariam os alunos a pesquisar e construir o conhecimento. É apenas uma
citação não-ideológica que pode ser explorada sem cairmos em conceito
preconceituoso.
O professor José se refere ao primeiro texto, pois afirma que ele é mais abrangente
e estimula “a busca de informações sobre a participação dos povos negros nas lutas”.
No entanto, não deixa claro a que lutas está se referindo. Sua consciência histórica está
presente, mas carece de uma orientação para elucidar esse papel de luta na vida prática.
A professora Ana optou pelo segundo texto, mas sua justificativa demonstra uma
cognição não-situada, pois não aponta elementos concretos sobre qual conhecimento
pode ser construído com o texto escolhido, nem os conceitos preconceituosos podem ser
apontados. De acordo com Gomes (2005) “tocar no campo dos valores, das identidades,
mexe com questões delicadas e subjetivas e nos leva a refletir sobre diversos temas
presentes no campo educacional. Um deles se refere à autonomia do professor”.
No caso português, todas
as escolhas recaíram sobre o segundo texto. Observamos
nas justificativas juízos de valores, como a possibilidade apontada pelo professor Carlos
de “
fazer uma reflexão dos valores morais
.”
87
TABELA 8 (PORTUGAL)
JUSTIFICATIVA
Professor Carlos - O segundo texto permite abordar o tema da escravatura,
mas também ao mesmo tempo permite fazer uma refleo dos valores morais.
A exploração do texto permite em simultâneo retirar informação e partir do
tema da escravatura para o tema da liberdade e de todo o percurso que se teve
de ultrapassar para se atingir esse direito sagrado. Por outro lado, define de
uma forma muito sucinta o que é África, por quem é constituída (rias raças e
culturas) e mostra também qual a sua origem e de que forma os africanos se
expa
ndiram pelo mundo.
Professora Carmen - Creio que o segundo texto reaa de forma mais
evidente as diferenças que justificam e explicam a diversidade cultural,
lingüística e de identidade existente neste continente. Por outro lado, o
primeiro texto parece centrar a justificação dessa diversidade atras de
factores externos: o imperialismo europeu. Embora esse facto possa ter
contribuído para esse mosaico cultural, as suas raízes são anteriores e bem
mais profundas.
Professora Andréa - Descobrimentos, tráfico negreiro, colonização do
Brasil.
No entanto, a resposta do professor Carlos aponta elementos com relação à idéia
de Diáspora africana, permitindo a possibilidade de entender as formas como “os
africanos se expandiram pelo mundo”.
A professora Carmen abordou mais elementos, apontado em suas idéias as
possibilidades de diversidade cultural, lingüística e de identidade ao relacionar esse
tema África, considerando, novamente, a África do ponto de vista da cultura e não da
História. Já a professora André
a se manteve presa a uma linearidade temporal produzida
pela historiografia: “Descobrimentos, tráfico negreiro, colonização do Brasil”.
Perguntados se o estudo da História da África pode contribuir para aproximar os
laços entre Brasil e Portugal, a professora Ana respondeu que “sim, fazendo os alunos
entenderem que a história é feita também de homens comuns. Compreendendo como se
88
a relação dominados X dominadores”. Percebemos que a afirmação não procura
uma utilização desse aprendizado na vida prática, uma vez que a África e os elementos
que a ela poderiam se referir, não são apresentados em seu argumento.
Novamente, os professores portugueses parecem se manter distantes da África e
daquilo que a envolve. O entendimento se a partir de uma cognição que não é
situada, como podemos observar na resposta da professora Ana: O estudo de História
de qualquer civilização, cultura, povo, serve sempre para aproximar países e descobrir
afinidades”.
Ela não se compromete ao afirmar se esse estudo pode contribuir,
e
xatamente, para aproximar os laços entre Brasil, Portugal e África.
TABELA 9 (BRASIL)
-
O ESTUDO DA HISTÓRIA DA ÁFRICA CONTRIBUI
PARA APROXIMAR OS LAÇOS ENTRE BRASIL, PORTUGAL E ÁFRICA
Professor José - Contribui, pois esclarece cada vez mais e este
escla
recimento leva a discussões que trazem novos elementos à luz
(bibliografias, letras de músicas, danças, sites, etc.)
Professora Ana - Sim, fazendo os alunos entenderem que a história é feita
também de homens comuns. Compreendendo como se dá a relação domi
nados
X dominadores.
Os professores brasileiros apontam a importância de novos recursos, ou seja,
demonstram uma clara necessidade de se relacionar com outras fontes nas quais sejam
encontrados elementos a serem discutidos com relação à idéia que traze
m de África.
A professora Ana, por exemplo, entende claramente a presença da África e dos
africanos simplesmente como dominados e não como sujeitos de uma História na qual
também dominam uma cultura, um conhecimento particular. A idéia apontada segue
89
aquel
a segundo a qual os africanos são, simplesmente, escravos e, portanto, entram na
escola a partir de uma História contada pelos europeus.
TABELA 9 (PORTUGAL)
-
O ESTUDO DA HISTÓRIA DA ÁFRICA
CONTRIBUI PARA APROXIMAR OS LAÇOS ENTRE BRASIL, PORTUGAL
E ÁFRICA
Professor Carlos - Contribui sempre. Quando se tem um conhecimento mais
aprofundado de rios assuntos é muito cil relacioná-los e descobrir os
pontos comuns que podem existir entre eles.
Professora Carm en - O estudo da História, seja de África ou de qualquer
outro continente, permite conhecer melhor a sua “realidade” evitando, ou
combatendo, preconceitos e idéias pouco fundamentadas. Nesse sentido, creio
que o estudo da História de África poderia aproximar as culturas. No entanto, e
no seguimento do que foi afirmado, creio que não faz sentido estudá-
la
isoladamente.
Professora Andréa - O estudo de História de qualquer civilização, cultura,
povo, serve sempre para aproximar países e descobrir afinidades.
Nossa consciência histórica não é espontânea, sendo que a relação que temos com
o passado é determinada pela forma com que a historiografia construiu isso. Os textos
dos professores brasileiros e portugueses apontam idéias semelhantes, demonstrando
que nos dois países a produção historiográfica sobre esse assunto se apóia em dados
comuns ou, pelo menos, muito próximos.
De acordo com Oliva (2003), evidencia-se uma relação - observado/observador,
um jogo não de dominação e resistência, mas também de dificuldade de explicar e
reconhecer a alteridade. Isso fica evidente na fala da professora Carmen quando se
mostra preocupada em aproximar as culturas portuguesa e africana, sem significar a
importância do estudo da História da África ou sua relação com a história européia. É
90
importante ressaltar a preocupação dessa professora em não se estudar a África de
forma “isolada”.
Do mesmo modo a professora Andréa afirma que o estudo de
“qualquer
civilização, cultura, povo, serve sempre para aproximar países e descobrir afinidades”.
A África ainda faz parte do imaginário como sendo o Outro, portanto ainda é preciso
descobrir as afinidades.
TABELA 10 (BRASIL)
TEXTO SOBRE A ÁFRICA
Professor José - O continente africano é, na minha opinião, o mais
injustiçado dos 5 continentes. O mais explorado e dentro destas injustiças que
eu vejo, as justificativas para um atendimento diferenciado aos países do
continente por parte das nações que exploraram, ou seja, a Europa e seus
países.
Professora Ana - Uma civilizaçãopouco explorada pelos historiadores. Ao
busca
rmos nos livros encontramos sempre as mesmas fontes de pesquisa, o
mesmo enfoque. Talvez seja a hora de mudarmos, buscarmos compreender o
que é a África enquanto continente e local de formação e ocupação de diversos
povos. Bem como analisar o uso” que se faz deste povo tão rico culturalmente
e tão aniquilado pelos discursos ideológicos.
A visão dos professores brasileiros é permeada por uma idéia de injustiça e de
piedade com relação aos africanos, não como elemento histórico marcado por diferenças
cul
turais e pela dominação de um grupo social pelo outro. Aponta-se, aqui, um
desconhecimento histórico e a ausência de uma análise mais detalhada dessas
“injustiças”.
A professora Ana se refere a “uma civilização” quando se refere à África, porém
demonstra a necessidade de um maior conhecimento desse conteúdo e de outras fontes
91
históricas como auxílio para essa compreensão. No entanto, identifica um “uso” cultural
da África, se distanciando novamente de uma visão histórica de África, assim como
acontece na ma
ior parte das respostas de todos os professores aqui questionados.
TABELA 10 (PORTUGAL)
TEXTO SOBRE A ÁFRICA
Professor Carlos - A África como todos os continentes foi importante e
continua a sê-lo na História. Se analisarmos a sua importância desde o início
dos tempos mais remotos, concluímos que terá sido o berço da humanidade e
por isso, a nossa origem. Ao longo do tempo este foi um continente que sempre
se destacou, não só por ser um local onde nasceram rias civilizações, mas
também pelas suas riquezas naturais e localização geográfica estratégica. Foi
por isso, um continente de passagem para muitos povos e de fixação para
outros, ficando por tudo isto marcado na História.
Professora Carm en A África é considerada pela História como sendo o
poss
ível local da origem do homem, assim como o berço de algumas civilizações
que deixaram um legado importante para a posteridade. Este continente é
também retratado como um território que forneceu mão
-
de
-
obra escrava de que
os europeus se serviram, sobretudo na América, assim como um território que
foi cobiçado e explorado pelas suas riquezas no período da expansão marítima
européia. É ainda visto como um ponto de discórdia entre alguns reinos
europeus que, na corrida ao fornecimento de matérias-primas, essenciais ao
desenvolvimento da industrialização européia do século XIX, serão objecto da
descolonização, formando-se assim, alguns dos estados africanos
independentes dos nossos dias. O relato histórico sobre África é, por isso, um
relato sujeito a diversos h
iatos, não seguindo uma continuidade cronológica.
Professora Andréa
-
Não respondeu.
92
A idéia de legado apontada pela professora Carmen se volta novamente para a
questão de que a África aparece nas idéias dos professores do ponto de vista culturalist
a
e não histórico. De acordo com as respostas dessa professora, é possível perceber o
quanto a produção dos
historiadores do século XIX ou da virada para o XX apresenta a História da África—
vivenciada ou contada— como tendo começado somente no momento em que os europeus
passaram a manter relações com as populações do Continente. Não só pela ação de registrar
e relatar, feita por viajantes, administradores, missionários e comerciantes do século XV ao
XIX, mas principalmente pelas mudanças introduzidas pelos europeus na África. (OLIVA,
2003, p. 438).
É neste sentido que os professores de História vêm apresentando suas idéias a
respeito da África, ou seja, entendendo a África do ponto de vista cultural e não
histórico, tendo como ponto de partida uma identi
dade branca e européia.
93
CAPÍTULOS 4 JOVENS BRASILEIROS E PORTUGUESES E SUAS
RELAÇÕES COM O CONCEITO SUBSTANTIVO ÁFRICA
O passado é lição para se meditar, não para se
reproduzir.
-
Mário de Andrade
Durante o percurso desta investigação, sobretudo após os resultados obtidos com
os questionários destinados aos professores de História brasileiros e portugueses, houve
a compreensão de que seria necessário pesquisar, também, as idéias que os jovens
alunos, brasileiros e portugueses, têm sobre a África.
Entendendo que professores e alunos são sujeitos com experiências próprias,
convivendo no mesmo universo, o escolar, torna-se necessário investigar as
inter
ferências que os professores provocam no processo de cognição histórica dos
jovens. O próprio encaminhamento da investigação foi organizado tendo em vista as
respostas obtidas junto aos professores, uma vez que as questões propostas aos alunos
foram elabor
adas a partir delas.
Assim, enquanto estudo de caso, a pesquisa foi pautada nas idéias de África
apresentadas por jovens estudantes brasileiros e portugueses entre 13 e 15 anos de idade
do Ensino Fundamental. Sem esquecer a Educação Histórica como norte de
sta
investigação, as idéias apresentadas pelos alunos dos dois países foram elementos
significativos para tentar compreender como acontece o processo de aprendizagem da
História, sobretudo com relação ao conceito substantivo África.
94
4. 1 IDÉIAS PRÉVIAS DOS ALUNOS COMO PONTO DE PARTIDA PARA A
EDUCAÇÃO HISTÓRICA
Muitos investigadores de Educação Histórica defendem que devemos possibilitar
às crianças o contato com os procedimentos através dos quais se constroem as narrativas
e as explicações históricas. Elas devem compreender o que faz com que uma narrativa
seja histórica, como se constrói, como funciona em relação a outras narrativas
históricas, quais os suportes dos argumentos históricos. Collingwood (Apud
ARÓSTEGUI, 2006) afirma que “para a história, o objeto a descobrir não é o simples
acontecimento, mas o pensamento nele expresso. Descobrir esse pensamento é
compreendê
-
lo”.
Os conceitos que os alunos carregam surgem de suas experiências e ajustam-se a
padrões de comportamento que nem sempre são compreendidos, mas que esses mesmos
alunos acreditam ser “normais”.
Lee (2005) acredita que os alunos necessitam conhecer alguma história
substantiva bem: eles necessitam ter uma fundamentação profunda de conhecimento
factual e conceitual e entender estes fatos e idéias em uma estrutura mais ampla. A
qualificação “alguma” história é importante porque aquilo que os alunos realmente
conhecem deve ser gerenciável. E como esse conhecimento é gerenciável, deve ser
organizado de modo que os alunos possam acessá-lo e u
-lo, sabendo como fazer
avaliações cautelosas e realísticas sobre quanto e em quais circunstâncias ela é
aplicável. Nós, no entanto, precisamos considerar o tipo de história que permitirá que
isso seja alcançado.
95
“Nós podemos dizer que o conhecimento substantivo dos alunos poderia ser organizado de
uma forma usável de modo que pudessem relacioná-lo a outras partes do passado e do
presente. Isto significa que os alunos necessitam adquirir uma proposta utilizável do
passado, um grande quadro organizado por conceitos substantivos sobre os quais eles, de
modo crescente, entendem e podem refletir. Isto também significa que eles também
precisam de um conhecimento aprofundado de passagens (não demasiado longas) contidas
no passado, com tempo para explorar o jeito de vida e a visão de mundo das pessoas que
estão estudando. Isto permite a eles a começarem a ter consciência das inter-
relações
complexas envolvidas e serem pensativos e reflexivos sobre analogias que fazem com
outros tempos e lugares. (LEE, 2005, p. 8)
4. 2 INVESTIGAÇÕES COM JOVENS ALUNOS BRASILEIROS
A metodologia empregada para investigar as idéias que jovens brasileiros e
portugueses têm da África foi baseada nas respostas obtidas por meio do instrumento
aplicado com os professores desses mesmos países. Obtidas as respostas, estas foram
analisadas, ainda de maneira superficial, e delas foram elaboradas as questões a serem
aplicadas junto aos jovens brasileiros e portugueses. De cada resposta apresentada pelos
professores foi estabelecida uma pergunta e, também em alguns momentos, as
alternativas de outras questões.
Nas respostas dos alunos aparecem as interferências deixadas pelos professores.
Os alunos dão conceitos que não são históricos, mas “conceitos-gênero”, aqueles
apontados por Rüsen (2007) como sendo apenas elementos da linguagem, como África,
e utilizados pelos historiadores.
Todos os alunos apresentam uma “proto-narrativa” (Rüsen, 2001), aquilo que a
Educação Histórica classifica como “conhecimentos tácitos”, ou seja, todos sabem
história
e, portanto, conhecem algo sobre a África. Esse conhecimento, no entanto, não
é científico, mas baseado em senso
-
comum.
96
De acordo com Lee (2003), é fundamental entender as idéias históricas que as
pessoas têm e compará-las com as de outros tempos. A História tem que ser contra-
intuitiva, uma vez que a criança tem que se colocar no lugar do Outro.
Os alunos, normalmente, não apresentam contato com as fontes, o que para a
Educação Histórica é uma condição fundamental para desenvolver o conhecimento
histórico
e a capacidade de reflexão. É fundamental que os alunos entendam o caminho
percorrido na construção histórica, pois ao se apropriar desse processo, os sujeitos têm
condição de se apropriar da ciência. A apropriação de um pensamento científico passa
pelo en
tendimento de como o historiador se apropriou do real.
Analisando as respostas dadas pelos jovens alunos brasileiros, foi possível
perceber como os conhecimentos tácitos são adquiridos na vida social. Exemplo disso é
que a totalidade dos alunos respondeu q
ue a legislação que torna obrigatório o ensino de
História da África é uma medida “adequada por causa da grande presença de pessoas
negras no país”. Em segundo lugar, a resposta que mais apareceu pode ser considerada
um complemento da primeira, uma vez que afirma ser a lei uma “medida bastante
justa”.
TABELA 1
-
O QUE ACHA DESSA MEDIDA
Uma a medida bastante justa.
06
Uma lei sem sentido.
X
Deveria ser apenas um complemento da História do país.
03
Uma decisão exagerada.
01
Adequada por causa da grande
presença de pessoas negras no país.
14
97
Partindo da idéia de Dubet, aqui podemos constar a homologia da experiência, ou
seja, numa turma com 24 jovens alunos, sujeitos diversos e opiniões diversificadas, as
experiências com relação a essa informação parecem semelhantes, uma vez que as
respostas foram direcionadas para uma opinião muito próxima com relação à
necessidade de estudar a História da África. Não levamos em consideração aqui, ainda,
quais suas idéias sobre a África.
Na segunda questão, ao serem interrogados sobre a aplicabilidade dessa mesma
legislação em Portugal, os jovens brasileiros demonstraram certo desconhecimento de
como a África aparece enquanto elo entre Brasil e Portugal. Dos 24 jovens, 12
responderam que “talvez sim”, fosse possível aplicar a mesma lei em Portugal e 06
deles afirmaram que “seria difícil”.
TABELA 2
-
ACHA QUE ISSO DARIA CERTO EM PORTUGAL
Talvez sim.
12
Com certeza.
01
Não daria certo.
02
Não faria sentido.
03
Seria difícil.
06
98
A relação que se faz presente pode demonstrar a forma como a consciência
histórica se constrói no ensino de História, uma vez que a maioria das respostas faz
referência à colonização portuguesa e à utilização da mão
-
de
-
obra escrava africana.
Uma visão culturalista predomina em seus argumentos, demonstrando elementos
de uma cognição situada, como na resposta de Carlos (13 anos) ao afirmar que “a
Europa inteira colonizou a África”. Apesar disso, a organização temporal seja muito
precária, que apontam a África como um país e não como continente. Ana (14 anos)
diz que “Talvez assim eles ficassem sabendo um pouco sobre o país que eles
dominaram”.
uma forte referência à questão da escravidão e do racismo nos argumentos
apresentados, informando que a perspectiva culturalista da África leva
nta elementos que
enquadram esse continente a um fornecedor de mão-
de
-obra escrava, emprestando
sentido àquilo que a maioria dos jovens alunos brasileiros sabe.
Um diferencial aparece apenas na resposta da Thiago (13 anos), pois este
consegue realizar uma orientação no tempo ao relacionar a África com a atualidade e
seus problemas decorrentes da colonização, mas também como um continente com
elementos modernos, seja do ponto de vista dos problemas sociais como da inserção
mundial através do esporte, como o caso do futebol e da realização de uma Copa do
Mundo. Assim mesmo, a África é mencionada de modo absoluto, como se fosse um
todo, lembrando que a Copa do Mundo de 2010 deve ocorrer na África do Sul e não no
continente inteiro.
99
TABELA 3
-
TALVEZ SIM
M
atheus
- Pois hoje em dia as pessoas de Portugal têm consciência do que
fizeram seus descendentes mais antigos”.
Mylla
-
“Talvez sim, pois assim como no Brasil, Portugal também é formada por
africanos”.
Luís
- Pois esse tempo de escravidão negra passou apesar de haver vários
racistas em Portugal”.
Ana
- Talvez assim eles ficassem sabendo um pouco sobre o país que eles
dominaram”.
Carlos
-
“Porque a Europa inteira colonizou a África”.
Gustavo
-
“Porque a África também faz parte da história de Port
ugal”.
Bruno
- Pois algumas pessoas gostam da história da África, por isso alguns
gostam de estudar”.
Bruna
- Pois se algumas pessoas não fossem tão racistas daria muito certo. E
muitas pessoas acham isso desnecessário”.
Pedro
-
“Pois Portugal também
teve algumas colônias na África”.
Filipe
-
“Algumas pessoas aceitariam e outras não”.
Carlos
-
“Porque seria um complemento cultural no ensino”.
Thiago
-
“Porque existem muitos negros no mundo inteiro e para todos conhecer
um pouco mais da África e pensar (refletir) um pouco que existe muitas coisas
ruins na África como: doenças como a Aids, roubos e outras coisas. Mas também
na África existem roubos como em qualquer outro lugar do mundo. A África
também tem suas maravilhas, e inclusive a copa do mundo s
erá na África”.
Nas argumentações que defendem a dificuldade de se colocar essa lei em prática,
foram obtidas as seguintes respostas:
100
TABELA 4
-
SERIA DIFÍCIL
Joel
- “Porque Portugal teve rias conias africanas (escravizaram os negros)
e provavelmente a maioria dos portugueses criticaria essa idéia. No entanto,
alguns gostariam, pois poderiam auto-
criticar
-se em relação a como
maltrataram os negros.”
Alexandre
- “Acho que seria difícil, pois a presença de negros lá não é tão
grande quanto no Brasil
”.
Guilherme
- Seria difícil porque a população afro-descendente não é grande
como no Brasil”.
Lucas
-
“Porque o povo português sentiria vergonha de seu próprio país”.
Rodrigo
- “Pois foram os próprios portugueses que trouxeram os africanos
para o Bras
il para escravizá
-
los.
Leonardo
- Seria difícil, pois Portugal é um país com poucos negros. Mas por
outro lado poderia dar certo, pois Portugal foi formado também por africanos”.
O brasileiro Joel (14 anos) chega a afirmar que os portugueses poderiam “auto-
criticar
-se” com relação ao seu comportamento no período colonial, apresentando uma
idéia mais elaborada sobre o assunto. “Porque Portugal teve várias colônias africanas
(escravizaram os negros) e provavelmente a maioria dos portugueses criticaria e
ssa
idéia. No entanto, alguns gostariam, pois poderiam auto-
criticar
-se em relação a como
maltrataram os negros.” Na sua afirmação aparece certa consciência histórica, com
alguma orientação temporal, uma vez que menciona a colonização portuguesa na África
e a escravização de africanos.
Da mesma forma, os jovens brasileiros Guilherme (13 anos) e Alexandre (14
anos), apresentam respostas semelhantes ao afirmarem que em Portugal não um
número considerável de negros que justifique uma legislação em prol da História da
101
África. Sujeitos diferentes apresentam em suas respostas experiências semelhantes, no
caso, da ausência de informações sobre as relações entre Portugal e a África.
Pesa, ainda, sobre essa falta de articulação acerca das informações sobre a Áfric
a,
uma idéia de pertencimento. A idéia de Nicolas (13 anos) responde negativamente a
pergunta sobre a conveniência de estudar a História da África em Portugal: “Porque a
África não pertence a Portugal e sim ao Brasil”.
Lucas (13 anos) afirma que haveria certo incômodo com relação a essa temática,
que o povo português sentiria vergonha de seu próprio país”. Não fica claro o tipo
de vergonha. Existe uma cognição histórica, um tipo de informação sobre a África, mas
ela não é situada, pois não justifica o t
ipo de vergonha nem o motivo dela existir.
Rodrigo (14 anos) parece afirmar que, como Portugal patrocinou a escravidão no
Brasil não faria caso de ensinar tal questão na escola. Sua resposta apresenta uma
racionalidade histórica, pois apresenta elementos de uma historiografia dominante na
produção de conhecimentos sobre a África, embora sem conseguir se orientar no tempo.
A escravidão foi patrocinada por portugueses no passado e, portanto, é um assunto que
não se deve mencionar no presente.
A investigação procurou descobrir porque seria interessante aos jovens alunos
estudar sobre a África. Da mesma forma que se observou nas respostas dos professores,
os jovens alunos demonstram que a cultura é a categoria articuladora da experiência
com relação ao tema Áfri
ca.
102
TABELA 5
-
SERIA INTERESSANTE ESTUDAR A ÁFRICA POR QUE:
A população do Brasil e de Portugal foi formada também por
africanos.
08
Porque a África foi dominada pelos portugueses e os africanos
levados para Brasil e Portugal.
04
Por causa do Egito.
03
Porque nossa cultura é formada por muitos elementos africanos.
17
Não seria nada interessante.
01
A maioria dos alunos apontou como relevante o fato de a África ter relação com
nossa identidade portuguesa e brasileira. Isso pode parecer contraditório, uma vez que
em questões anteriores a maioria dos alunos não entendia a necessidade de se ensinar a
história da África em Portugal devido a pouca relação entre aquele continente e o país
europeu.
Ao serem inquiridos sobre qual idéia a África mais aparece em sua memória, as
frases mais citadas pelos professores brasileiros e portugueses foram aquelas que
aparecem na Tabela 7, a seguir. Utilizadas no questionário destinado aos alunos, essas
frases deveriam ser ordenadas de acordo com a importância que davam para cada uma
delas.
103
TABELA 6
-
IMPORTÂNCIA PARA AS AFIRMAÇÕES
Classificação
1° lugar
2° lugar
3° lugar
4° lugar
5° lugar
Ela lembra um continente.
2 vezes
É um mosaico de vários povos.
1 vez
Local que fornecia os escravos
para a Améric
a.
3 vezes
Tem relação com nossa
identidade portuguesa e
brasileira.
10 vezes
Local de grandes civilizações,
como a egípcia.
9 vezes
ainda que se observar que vários jovens brasileiros afirmaram que Portugal
não tem um número relevante de população negra ou afro-descendente, demonstrando
que a relação África Portugal - Brasil não acontece de maneira significativa, embora
saibam que foram os portugueses que promoveram a vinda de africanos ao Brasil. É o
caso da resposta de Gabriela (13 anos) ao afirmar que “como em Portugal não houve
escravos e a população negra é quase nula não faria sentido estudá-
la”.
E Paulo (14
anos) argumenta que
“não faria sentido por não existir uma quantidade significativa de
negros no país”.
Como foi dito no início desta análise preliminar acerca das idéias dos alunos
sobre a África, pudemos constatar até agora que as idéias apresentadas pelos professores
dominam as idéias dos jovens, os quais desconhecem o percurso da construção
historiográfica que define os parâmetros a serem estudados sobre determinado tema.
104
Perpetua
-se, assim, uma cognição baseada exclusivamente numa perspectiva
historiográfica presente nas explicações de professores e manuais didáticos.
4.3 INVESTIGAÇÕES COM JOVENS ALUNOS PORTUGUESES
Nos
argumentos apresentados pelos jovens alunos portugueses, podemos perceber
uma grande dificuldade de localização geográfica e temporal. Em várias respostas se
apresenta a África como sendo um país e não um continente. Aline (14 anos) conclui
que
“as pessoas se iriam interessar pela história de outro país, neste caso da África”,
assim como José considera que que falamos de vários povos de outros países,
África parece
-
me um país interessante para aprofundar os nossos conhecimentos”.
Do mesmo modo, estudar a África aparece como uma concessão que se faria a
qualquer outra cultura considerada, até mesmo, exótica. Não nenhuma relação de
pertencimento ou identidade com relação àquele continente.
TABELA 1
-
O QUE ACHA DESSA MEDIDA
Uma a medida bastante jus
ta.
04
Uma lei sem sentido.
01
Deveria ser apenas um complemento da História do país.
13
Uma decisão exagerada.
08
Adequada por causa da grande presença de pessoas negras no país.
05
105
Dos 31 jovens portugueses, 13 afirmaram que a História da África deveria ser
estudada apenas como um complemento à História portuguesa. É o mesmo argumento
utilizado pelos professores portugueses, que afirmam não haver necessidade de estudar
a África de forma “isolada”.
Em segundo lugar, com 08 escolhas, aparece a idéia de que a legislação é uma
decisão exagerada.
Aos jovens estudantes portugueses falta a oportunidade de compreender os laços
que se criaram entre Portugal e o continente africano. Resta, ainda, um olhar sobre o
Outro, como se além de ser um outro continente, a África também se localizasse em
outro período histórico, aquele do período colonial.
Seria plausível afirmar que os olhares sobre o Outro estariam impregnados do
“estranhamento”, da dificuldade de emprestar significados e aceitar as diferenças. Ao
me
smo tempo, tal relação é fundamental para a afirmação/reelaboração da própria
identidade. Nesse movimento os europeus emprestaram, quase sempre, um aspecto de
inferioridade aos povos da região. (OLIVA, 2003, p.432)
TABELA 2
-
ACHA QUE ISSO DARIA CERTO E
M PORTUGAL
Talvez sim.
16
Com certeza.
04
Não daria certo.
05
Não faria sentido.
04
Seria difícil.
05
Em grande maioria, os jovens portugueses acreditam que talvez a mesma
legislação que se estabeleceu no Brasil desse certo em Portugal. 16 alunos ass
inalaram
que talvez sim, que desse certo, mas sempre de um ponto de vista que coloca a África
dentro da História a partir do contato com Portugal.
106
TABELA 3
TALVEZ SIM
Rafael
- Esta medida poderia ser bem aceita em Portugal devido à grande “história
que Portugal tem com o continente africano. Seria deste modo importante e igualmente
interessante em Portugal termos esta medida”.
Maria
-
“Porque devemos saber um pouco da história de cada país”.
Otávio
- Porque há rias pessoas não sabem nada sobre a História da África e assim
enriqueciam a sua cultura”.
Clara
- Porque nós fomos para a África ensinar os nossos costumes por isso não nos
fazia mal nenhum conhecer um pouco da história da África e da cultura afro”.
Fernanda
- “Essa medida poderia dar certo em Portugal porque aumenta o
conhecimento de outras reges para cada estudante e o conhecimento requerido por
ambos iria ajudar significativamente a história geral que se relaciona com nosso país. A
medida, após ser estabelecida, tanto os professores como os alunos iriam obter uma
maior informação acerca dessa cultura e a sua aprendizagem, apesar de ser mais
estudada e com um maior trabalho a nível profissional, seria um grande conhecimento
sobre essas culturas e regiões”.
Aline
- Porque acho que as pessoas se iriam interessar pela história de outro país,
neste caso da África”.
Isabella
- Eu acho que seria difícil porque teríamos muita matéria para estudar e
podíamos baralhar as idéias, mas depois de nos “avituarà idéia de ter que estudar a
cultur
a de Portugal e África.”
Margarida
-
“Porque não fazia sentido estudarmos tanto tempo a cultura de África”.
Helena
- “Eu acho que sim porque África como teve influência no nosso país faz
sentido nós também estudar sobre África”.
José
- Já que falamos de rios povos de outros países, África parece-me um país
interessante para aprofundar os nossos conhecimentos”.
Mirian
- Não sei, talvez devido a uma certa população do nosso país ser negra, talvez
por isso”.
Laís
- “Seria difícil porque a matéria é bastante, mas fazemos algumas referências
sobre África”.
Larissa
- “Pois o passado de Portugal passou muito por África, como os
descobrimentos”.
André
- “Porque como se pode aprender a cultura de outras raças também se poderia
aprender a cultura african
a e que seria uma coisa diferente e nova que se iria aprender”.
Júlia
- “Penso que talvez desse certo em Portugal, visto que há sempre quem goste e se
interesse por outras culturas que não a nossa. Mas como todo, há sempre que não se
interesse e ignore a cultura am de Portugal. E se para alguns a nossa própria é
aborrecida, que farão culturas que não a nossa”.
Marina
- Porque seria injusto uma pessoa de outro país de outra raça não saber da
nossa história e talvez as pessoas não fossem tão racistas se soubessem a história de
outros países.”
107
Assim como aparece nas respostas dos jovens alunos brasileiros, a questão
cultural perpassa pelas idéias dos jovens portugueses, embora a África, nesse sentido,
tenha sido tratada como um conceito
-
gênero e não
um conceito histórico.
O eurocentrismo que aparece nos argumentos dos professores também se faz
presente nas respostas dos jovens para justificar suas opiniões acerca da plausibilidade
da legislação em Portugal. Temos essa referência nas respostas de vários estudantes
portugueses a seguir.
Clara (15 anos) respondeu que talvez fosse interessante estudar a África “Porque
nós fomos para a África ensinar os nossos costumes por isso não nos fazia mal nenhum
conhecer um pouco da história da África e da cultura afro”. Temos um claro
demonstrativo de uma consciência histórica fundamentada na idéia eurocêntrica. Foram
os portugueses, dotados de uma civilidade que cumpriram seu papel de ensinar
costumes aos africanos, como se aqueles não tivessem uma cultura própria ou, o que é
pior, uma historicidade particular. Do mesmo modo, ao afirmar que não faria mal
conhecer um pouco da história da África e da cultura afro,
aponta uma idéia de que em
seu país não existem elementos culturais africanos.
Flora (14 anos) completa: “Porque África tem pouca história”. Essa perspectiva
representa a limitação do conhecimento e da identidade que se manifesta com relação ao
continente africano, da mesma forma como revela a inferioridade” que se entende com
relação à África. Seguindo os argumentos defendidos por vários alunos portugueses,
apenas Portugal tem História e a África representa um simples complemento, por isso
não teria como ser estudada de “modo isolado”.
Tomas (14 anos), por sua vez, escreveu que a África foi um ponto de grand
e
importância da história de Portugal, porque foi das maiores conquistas de Portugal e
108
faz
-nos relembrar uma época de bonança e conquista por parte dos portugueses.”
A
orientação que se faz é por meio de uma história oficial, que apresenta os portugueses
como um povo que proporcionou a outro o contato com a civilização. É a idéia da
superioridade européia emprestando significado à existência de um continente inteiro. É
uma vertente que procura reafirmar Portugal como ponto de partida para a localização
da Á
frica.
É com essa idéia de civilização que as idéias dos jovens portugueses são
permeadas, uma vez que em várias respostas a África aparece apenas como
conseqüência das aventuras e desbravadores portugueses. A existência daquele
continente foi garantida graças aos europeus. Em que pese que essa existência não
garante o direito de ser uma existência de caráter histórico, mas apenas do ponto de
vista cultural, com todo o “legado” que os africanos deixaram para as gerações atuais.
Quando os jovens estudante
s portugueses se referem à África do ponto de vista da
escravidão, revelam que seus olhares ainda estão impregnados do “estranhamento”, da
dificuldade de emprestar significados e aceitar as diferenças. De acordo com Lopes
(2008), essa idéia perpassa pelo que denominou de “racismo silencioso”, o qual
permanece entranhado nas relações sociais desiguais entre os negros e brancos.
Um racismo que foi herdado desde o período colonial (...), que garantiu a escravização de
africanos, baseados em supostas “justificativas” racistas, que hierarquizou e classificou
seres humanos em superiores (brancos) e inferiores (negros), tornando estes propriedades
materiais daqueles. (LOPES, 2008, p. 38).
Da mesma forma, ao afirmarem que a África aparece a partir do momento da
chegada dos portugueses, apela-se para a idéia de que “teriam sido os contatos com os
109
europeus que fizeram os africanos perceberem ou serem “obrigados” a aceitar que entre
eles existiam elementos de proximidade e de identidade”. (OLIVA, 2003, p. 43
3).
Interessante é perceber que assim como os professores, os alunos também
demonstram grande preocupação com o aumento dos conteúdos a serem estudados,
provavelmente como referência ao currículo de História adotado em Portugal.
TAB
ELA 4
-
COM CERTEZA
Augusto
-
Porque acho que devíamos estudar sobre a nossa história do nosso
país, só se envolvesse o nosso país é que devíamos estudar.
Régis
-
Porque nós já demos matéria sobre África e não é obrigatório.
Marlon
- Porque sendo obrigatório no Brasil também pode existir em
Portugal, não havendo problemas, acho eu.
Marlus
-
Porque assim ficaríamos a conhecer melhor a civilização e costumes
de África em Portugal e também era melhor porque assim podíamos ajudar.
Augusto (15 anos) afir
ma
“(...) acho que devíamos estudar sobre a nossa história
do nosso país, se envolvesse o nosso país é que devíamos estudar”. Não aparece,
nesta resposta, nenhuma aplicabilidade desse assunto na vida prática dos jovens
estudantes portugueses. Nenhuma relação se apresenta entre a história de seu país e a
daquele continente. Não laços que os unam histórica ou, como se apresenta em
muitas respostas, culturalmente.
Ao escrever seu texto sobre a África, Clara (15 anos) respondeu “Quando os
portugueses saíram de Portugal para descobrir partes do mundo e descobrir a África
onde implantou a nossa cultura e também recolheu várias matérias
-
primas e também os
escravos que a África fornecia”. Novamente temos a perspectiva da superioridade
européia, pois Portugal saiu para descobrir algo que ainda não existia. A África se
110
revela a partir de Portugal e de suas conquistas e capacidades de viajar e de levar a
civilização, o conhecimento branco e superior.
Se Portugal “recolheu” várias matérias-primas e também os escravos, é passível
de se discutir qual a idéia que os jovens estudantes de Portugal fazem dos escravos, uma
vez que parecem estar sendo colocados no mesmo nível das matérias
-
primas. De acordo
com Gilroy (2002) a conexão com a África, hoje, acontece apenas por intermédio do
cunho comercial, ou seja, de um vínculo criado a partir da escravidão, da obtenção de
produtos e de matérias
-
primas.
111
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Na introdução deste trabalho utilizei a obra de Gabriel Garcia Marquez para fazer
uma analogia com o que pretendia investigar. Entendendo que da mesma forma que no
livro um crime seria cometido e todos sabiam, ficava o desconhecimento dos motivos
de um fim trágico. Minha intenção foi provocar a atenção do leitor para o fato de que,
ao profissio
nal da História, seja ele um pesquisador ou professor de Ensino fundamental
ou Médio, acredita ocupar apenas um espaço profissional sem interferir no processo de
trabalho do outro. Assim, como na obra de ficção, o final parece ser previsível a partir
da es
colha que cada estudante de História faz: ser professor ou historiador.
Este trabalho gerou a possibilidade de confirmar o que muito se acredita, ou seja,
se confirmou a idéia de que nenhum professor de História é “apenas” professor. Para
realizar um trabalho sério com relação ao ensino de História da África, ainda falta ao
profissional de sala de aula maior contato com as fontes e com a pesquisa acadêmica.
Ficou claro que esse professor de História deve promover o contato dos alunos com a
produção historiográfica, fazendo com que saibam como a História é produzida e
pensada, sendo entendida enquanto uma ciência que domina técnicas de investigação e
de análise.
Depois de todas as leituras teóricas que me referenciaram e da análise das
respostas de professores de História e de alunos do Brasil e de Portugal, as conclusões
se assemelham, e muito, com as impressões do jovem Santiago Nasar quando percebeu
que ia perder a vida. Na obra de Garcia Marquez todos sabiam que Santiago Nasar iria
ser morto, mas o fizeram nada para evitar. Acreditavam que, embora sua vida
estivesse ameaçada, de fato ninguém teria coragem de levar a cabo aquele crime.
112
Quando o próprio Santiago soube que “o estavam esperando para matá-lo, sua reação
não foi de pânico, como tanto se disse, foi antes a desorientação da inocência”.
(MARQUEZ, 1999, p. 149).
Este trabalho teve impressões muito próximas com relação à legislação e às
Diretrizes, pois acreditam no papel dos professores de História enquanto mediadores do
conhecimento e do desenvolvimento de uma consciência crítica com relação à História
da África. De certo modo podemos afirmar como isso irá terminar, uma vez que a
legislação aponta objetivos a serem alcançados nesse processo de ensino, mas esquece
as dificuldades que se encontram no caminho. Sem uma qualificação específica dos
professores de História, estes continuarão a apresentar uma consciência histórica
distante da historiografia especializada, bem como poderão ter dificuldades em lidar
com as fontes históricas que colaboram p
ara a investigação e análise dessa temática.
Como conseqüência ficou evidente que a consciência histórica dos jovens
estudantes, sejam brasileiros ou portugueses, é elaborada a partir da interferência dos
seus professores. Se estes não têm uma relação direta com as fontes, o mesmo
acontecerá com seus alunos que, portanto, passam a reproduzir um conhecimento
apreendido pela explicação de seus professores.
O próprio entendimento da lei deixa claro que pretende a inclusão da História da
África, mas durante toda a pesquisa tentei demonstrar como a preocupação está muito
mais pautada, na prática, com uma perspectiva culturalista da África. Do mesmo modo,
as respostas dos professores foram claras ao demonstrar aproximação muito maior com
o “legado cultural” da África do que propriamente de um entendimento dessa História
ou de uma historiografia onde possam buscar informações consistentes para trabalhar
com essa temática.
113
Fica o entendimento, então, de que não basta a existência de lei como garantia de
uma mudança de pensamento e de comportamento. Mesmo assim, paira certa
ingenuidade em acreditar que, mesmo sem uma capacitação fundamentada numa
historiografia diversificada e na promoção do contato direto dos professores com
diferentes fontes, a África passará a ser identificada de forma mais consciente e sem
preconceitos.
114
REFERÊNCIAS
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Macunaíma
: o herói sem nenhum caráter. Belo Horizonte:
Itatiaia, 1989.
ANJOS, Rafael Sanzio Araújo dos. A Geografia, a África e os Negros Brasileiros. In:
MUNANGA, Kabengele. (
org.).
Superando o Racismo na Escola. Editora: SECAD.
Edição: 2ª. Edição Revisada. 2005.
ARAÚJO, Ricardo Benzaquen de. Guerra e paz: Casa-Grande & Senzala e a Obra de
Gilberto Freyre nos Anos 30. Rio de Janeiro: Editora 34, 1994.
ARÓSTEGUI, Júlio. A pesquisa histórica: teoria e método. Bauru, São Paulo:
EDUSC, 2006.
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121
ANEXOS
122
UNIVRSIDADE FEDERAL DO PARANÁ
Mestrado em Educação
-
Linha de pesquisa: Cultura, Escola e Ensino
Aluna: Adriane de Quadros Sobanski
Orientadora: Profª. Dra. Maria Auxiliadora Schmidt
Questionár
io
-
professores
Dados pessoais
Idade: _________________________________________________________________
Formação: _____________________________________________________________
Ano de formação: _______________________________________________________
Instit
uição: _____________________________________________________________
Dados profissionais
Trabalha em instituição: Pública
Privada
Série(s) em que trabalha: _________________________________________________
É professor (a) há quanto tempo? ___________________________________________
Questões
1) No ano de 2003, o presidente Luís Inácio Lula da Silva sancionou a lei 10.639, a qual
torna obrigatório o ensino de História da África e da cultura afro no Ensino de 5ª. a 12ª.
série no Brasil.
-
O que você acha dessa medida?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
123
-
Que argumentos você usaria com seus alunos para trabalhar tal assunto?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
2) Para você é importante que esse tema “África” entre no currículo escolar? Em caso
afirmativo, em que série? Como parte de qual assunto?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
“Entre as civilizações mais antigas da história da humanidade, algumas se
desenvolveram no continente africano, como a egípcia, a cuxita, a a
xumita e a etíope. A
história do Egito faraônico talvez seja a mais conhecida por nós, mas todas essas
civilizações sobreviveram a um longo período da história da humanidade,
desenvolvendo tecnologias e inúmeras formas de organização de suas sociedades, e
produzindo um enorme legado cultural para toda humanidade”. (MUNANGA, Kabengele e
GOMES, Nilma Lino. Para entender o negro no Brasil de hoje: história, realidades, problemas e caminhos. São
Paulo: Global, 2006).
3) No seu ponto de vista que imagem de África o texto acima traz? Que questões você
colocaria sobre esse texto para ele ser trabalhado com os seus alunos?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
Os textos a seguir foram extraídos de dois livr
os que discutem questões sobre a África.
“(...) O piloto de Colombo, Pedro Nino, também era africano. Desde então, a história do
Atlântico negro, constantemente ziguezagueando pelos movimentos dos povos negros
não como mercadorias, mas engajados em várias lutas de emancipação, autonomia e
cidadania
-, propicia um meio para reexaminar os problemas de nacionalidade,
posicionamento, identidade e memória histórica (...)”. (GILROY, Paul
.
O Atlântico Negro
.
Modernidade e dupla consciência, São Paulo, Rio de Janeiro, 34/Universidade Cândido Mendes - Centro de Estudos
Afro
-
Asiáticos, 2001. P. 59)
“(...) Sabemos que o termo ‘África` é, em todo caso, uma construção moderna, que se
refere a uma variedade de povos, tribos, culturas e línguas cujo principal ponto de
origem comum situava-se no tráfico de escravos (...) (HALL, Stuart. Da Diáspora: identidades e
mediações culturais. Belo horizonte: UFMG, 2003. P. 31)
124
4)
Qual dos dois textos você usaria como referência para trabalhar o conceito de África
com os seus
alunos?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
Justifique:
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
5) Na sua opinião, o estudo da História da África contribui para aproximar os laços
entre Brasil, Portugal e África? Justifique.
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
6) Ordene de 1 a 5 de a
cordo com o grau de importância que você dá para as afirmações
abaixo:
( ) Ela lembra um continente.
( ) É um mosaico de vários povos.
( ) Local que fornecia os escravos para a América.
( ) Tem relação com nossa identidade portuguesa e brasilei
ra
( ) Local de grandes civilizações, como a egípcia.
7) De que ponto de vista você trabalharia com seus alunos o conteúdo que escolheu
como o mais relevante na questão 6?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
8) Escreva um pequeno texto sobre a África na Histór
ia:
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
OBRIGADO!
125
Respostas dos professores brasileiros
Idade
Formação
Instituição
Professor José
39 anos
Licenciatura e
Bacharelado em
História
2000
UFP
R
Professora Ana
29 anos
Licenciatura e
Bacharelado em
Filosofia
2001
UFPR
Dados profissionais
Trabalha em instituição
Professor (a) há quanto
tempo?
Série(s) em que trabalha
Pública e Privada
15 anos
5ª a 8ª séries do Ensino
Fundamental e 1° ano do
Ensino Médio.
Pública
5ª série do Ensino
Fundamental e 1° e 2° ano
do Ensino Médio.
10 anos
126
1)
No ano de 2003, o presidente Luís Inácio Lula da Silva sancionou a lei 10.639, a
qual torna obrigatório o ensino de História da África e da cultura afro no Ensino
de 5ª. a 12ª. série no Brasil.
-
O que você acha dessa medida?
TABELA 1
-
O QUE ACHA DESSA ME
DIDA
Professor José - Acho a medida bastante justa visto que pouco se sabe sobre
o assunto e o debate desta questão movimenta as informações tornando mais
acessível.
Professora Ana - Mais uma lei imposta. Sem ter sentido, pois não é
elaborada pelo povo
.
-
Você acha que isso se aplicaria em Portugal?
TABELA 2
-
ISSO SE APLICARIA EM PORTUGAL
Professor José
-
Provavelmente, devido à relação entre aquele país e a África.
Professora Ana - Com certeza, seria interessante explorar mais essa ligação
entre
aquele país e o continente africano.
- Caso positivo, que argumentos você usaria com seus alunos para trabalhar tal
assunto?
TABELA 3
-
QUE ARGUMENTOS VOCÊ USARIA COM SEUS ALUNOS
PARA TRABALHAR TAL ASSUNTO
Professor José - Os argumentos seriam a constituição da população
brasileira, as permanências que encontramos hoje e que surgiram do contato
dos africanos com o Brasil. A origem deste povo africano (branco e negro) na
própria África, que me parece ser algo bastante desconhecido do povo
brasileiro.
Professora Ana - Talvez levasse os alunos a refletirem a respeito do
“monopólio” do “uso e abuso” no período da expansão comercial.
127
2) Para você é importante que esse tema África” entre no currículo escolar? Em
caso afirmativo, em que série? Como parte
de qual assunto?
TABELA 4
-
É IMPORTANTE QUE ESSE TEMA “ÁFRICA” ENTRE NO
CURRÍCULO ESCOLAR? EM QUE SÉRIE?
Professor José - Sim. A partir da 5ª série quando se faz os estudos sobre as
primeiras civilizações no mundo. Na 6ª série quando se pensa as rotas
comerciais na dita Idade Média. Na série quando se trabalha com a
formação do Brasil.
Professora Ana - Sim. Considerando nosso processo de colonização, nossas
influências, a formação da nossa cultura, a busca de novas terras (expansão
marítima). Também pode ser considerada ao analisarmos a atual situação dos
negros (e índios) como efeito do nosso processo de colonização.
“Entre as civilizações mais antigas da história da humanidade, algumas se
desenvolveram no continente africano, como a egípcia, a cu
xita, a axumita e a etíope. A
história do Egito faraônico talvez seja a mais conhecida por nós, mas todas essas
civilizações sobreviveram a um longo período da história da humanidade,
desenvolvendo tecnologias e inúmeras formas de organização de suas sociedades, e
produzindo um enorme legado cultural para toda humanidade.” (MUNANGA, Kabengele e
GOMES, Nilma Lino. Para entender o negro no Brasil de hoje: história, realidades, problemas e caminhos. São Paulo: Global,
2006.)
3) No seu ponto de vista que imagem de África o texto acima traz? Que questões
você colocaria sobre esse texto para ele ser trabalhado com os seus alunos?
TABELA 5
-
IMAGEM DE ÁFRICA QUE O TEXTO TRAZ
Professor José
-
Em branco.
Professora Ana
-
Que na África somente os egípcios foram im
portantes.
-
Questão geográfica;
-
Outras civilizações africanas;
-
História do Egito.
128
Os textos a seguir foram extraídos de dois livros que discutem questões sobre a África.
“(...) O piloto de Colombo, Pedro Nino, também era africano. Desde então, a
história do
Atlântico negro, constantemente ziguezagueando pelos movimentos dos povos negros
não como mercadorias, mas engajados em várias lutas de emancipação, autonomia e
cidadania
-, propicia um meio para reexaminar os problemas de nacionalidade,
posicionamento, identidade e memória histórica (...)”. (GILROY, Paul
.
O Atlântico Negro
.
Modernidade e dupla consciência, São Paulo, Rio de Janeiro, 34/Universidade Cândido Mendes - Centro de Estudos
Afro
-
Asiáticos, 2001. P. 59.)
“(...) Sabemos que o termo ‘África` é, em todo caso, uma construção moderna, que se
refere a uma variedade de povos, tribos, culturas e línguas cujo principal ponto de
origem comum situava-se no tráfico de escravos (...) (HALL, Stuart. Da Diáspora: identidades e
mediações culturais
. Belo horizonte: UFMG, 2003. P. 31)
4)
Qual dos dois textos você usaria como referência para trabalhar o conceito de
África com os seus alunos?
TABELA 6
-
QUAL DOS DOIS TEXTOS USARIA COMO REFERÊNCIA
PARA TRABALHAR O CONCEITO DE ÁFRICA
Professor José
-
O primeiro texto, de Paul Gilroy.
Professora Ana
-
O segundo texto.
TABELA 7
JUSTIFICATIVA
Professor José - Um texto que aborda o tema de maneira mais ampla
estimulando a busca de informações sobre a participação dos povos negros nas
lutas.
Profe
ssora Ana
-
Não é um discurso preconceituoso, traz idéias introdutórias
que levariam os alunos a pesquisar e construir o conhecimento. É apenas uma
citação não-ideológica que pode ser explorada sem cairmos em conceito
preconceituoso.
129
5) Na sua opinião, o estudo da História da África contribui para aproximar os
laços entre Brasil, Portugal e África? Justifique.
TABELA 8
-
O ESTUDO DA HISTÓRIA DA ÁFRICA CONTRIBUI PARA
APROXIMAR OS LAÇOS ENTRE BRASIL, PORTUGAL E ÁFRICA
Professor José - Contribui, pois esclarece cada vez mais e este
esclarecimento leva a discussões que trazem novos elementos à luz
(bibliografias, letras de músicas, danças, sites, etc.)
Professora Ana - Sim, fazendo os alunos entenderem que a história é feita
também de homens comuns. Compreendendo como se dá a relação dominados
X dominadores.
6) Ordene de 1 a 5 de acordo com o grau de importância que você para as
afirmações abaixo:
TABELA 9
-
GRAU DE IMPORTÂNCIA PARA AS AFIRMAÇÕES SOBRE A
ÁFRICA
Alternativas/ordenação
Pro
fessor José
Professora Ana
Ela lembra um continente.
5
5
É um mosaico de rios
povos.
4
2
Local que fornecia os
escravos para a América.
3
4
Tem relação com nossa
identidade portuguesa e
brasileira.
1
1
Local de grandes
civilizações, como a egípcia.
2
3
7) De que ponto de vista você trabalharia com seus alunos o conteúdo que es
colheu
como o mais relevante na questão 6?
130
TABELA 10
-
QUE PONTO DE VISTA VOCÊ TRABALHARIA COM SEUS
ALUNOS O CONTEÚDO QUE ESCOLHEU COMO O MAIS RELEVANTE NA
QUESTÃO ANTERIOR
Professor José
Em branco.
Professora Ana
No processo de formação da nossa i
dentidade cultural.
8) Escreva um pequeno texto sobre a África na História:
TABELA 11
TEXTO SOBRE A ÁFRICA
Professor José - O continente africano é, na minha opinião, o mais
injustiçado dos 5 continentes. O mais explorado e dentro destas injustiças que
eu vejo, as justificativas para um atendimento diferenciado aos países do
continente por parte das nações que exploraram, ou seja, a Europa e seus
países.
Professora Ana - Uma civilizaçãopouco explorada pelos historiadores. Ao
buscarmos nos livros encontramos sempre as mesmas fontes de pesquisa, o
mesmo enfoque. Talvez seja a hora de mudarmos, buscarmos compreender o
que é a África enquanto continente e local de formação e ocupação de diversos
povos. Bem como analisar o uso” que se faz deste povo tão rico culturalmente
e tão aniquilado pelos discursos ideológicos.
131
Respostas dos professores portugueses
Idade
Formação
Ano de formação
Instituição
Professor Carlos
26 anos
Licenciatura
em
ensino de História
2005
Universidade do
Minho
Portugal
Professora
Carmem
27 anos
Licenciatura em
ensino de História
2005
Universidade do
Minho
Portugal
Professora Andréa
48 anos
Licenciatura em
História
1981 Faculdade de Letras
da Universidade do
Porto
-
Portugal
Dados profissionais
Trabalha em instituição
Professor (a) há quanto
tempo?
Série(s) em que trabalha
Pública
5° e 6°s anos do Ensino
Fundamental
4 anos
Pública
5° e 6°s anos do Ensino
Fundamental
2 anos
Pública
5° e 6°s
anos do Ensino
Fundamental
______
132
1) No ano de 2003, o presidente Luís Inácio Lula da Silva sancionou a lei 10.639, a
qual torna obrigatório o ensino de História da África e da cultura afro no Ensino
de 5ª. a 12ª. série no Brasil.
-
O que você acha dess
a medida?
TABELA 1
-
O QUE ACHA DESSA MEDIDA
Professor Carlos - O ensino de História de qualquer país e cultura é sempre
interessante, mas neste caso espefico concordo com esta medida, pois este
estudo deveria ser apenas um complemento à História do paí
s de origem.
Professora Carm en - A medida parece-me um pouco exagerada. Creio que a
História da África deve ser lecionada no conjunto da História Universal, de
forma a poder relacioná
-
la com as ocorrências em outros locais.
Professora Andréa - Parece-
me
uma media adequada num país em que a
população é constituída por um grande número de africanos ou seus
descendentes e com vínculos históricos culturais são indissociáveis da história
brasileira.
-
Você acha que isso se aplicaria em Portugal?
TABELA 2
-
ISSO SE APLICARIA EM PORTUGAL
Professor Carlos
-
Portugal teve desde sempre ligação com África, mas penso
que esta medida não se aplicaria.
Professora Carmen
-
Creio que não faz sentido trabalhar a História de África
de forma isolada.
Professora Andréa - Penso que seria difícil de concretizar em Portugal, dada
a vastidão dos programas, no entanto a temática africana é abordada em alguns
contextos históricos. Embora o tratamento destes conteúdos seja breve são
abordados rios conteúdos que se leccionam em determinados anos de
escolaridade.
133
- Caso positivo, que argumentos você usaria com seus alunos para trabalhar tal
assunto?
TABELA 3
-
QUE ARGUMENTOS VOCÊ USARIA COM SEUS ALUNOS
PARA TRABALHAR TAL ASSUNTO
Professor Carlos
-
Não respondeu.
Profess
ora Carmen
-
Não respondeu.
Professora Andréa
-
Não respondeu.
2) Para você é importante que esse tema “África” entre no currículo escolar? Em
caso afirmativo, em que série? Como parte de qual assunto?
TABELA 4
-
É IMPORTANTE QUE ESSE TEMA “ÁFRICA” EN
TRE NO
CURRÍCULO ESCOLAR? EM QUE SÉRIE?
Professor Carlos - É sempre importante ter um conhecimento geral de todos
os temas que marcaram a História de Portugal. No caso deste tema África
poderia
-se eventualmente alargar um pouco mais o conhecimento aquando da
abordagem da expansão marítima nos 5° e 8° anos e da guerra colonial nos 6° e
9° anos. Seria interessante aprofundar um pouco mais o tema “Áfricapara se
compreender melhor o contexto da guerra colonial, bem como toda a sua
envolvente para que se possa perceber as vincias daqueles que por
passaram.
Professora Carm en - O tema África deve ser tratado sempre que se
justifique, mas não deve ser encarado como um caso particular e isolado.
Professora Andréa - Como já referi o tema África é abordado e diversos
conteúdos sem tratamento aprofundado, na minha opino a ser tratado com
mais profundidade deveria ser abordado no tema “Portugal hoje, tocando
essencialmente relações de cooperação com as ex
-
conias, sem esquecer
134
obviamente o aspecto da lu
sofonia.
“Entre as civilizações mais antigas da história da humanidade, algumas se
desenvolveram no continente africano, como a egípcia, a cuxita, a axumita e a etíope. A
história do Egito faraônico talvez seja a mais conhecida por nós, mas todas essas
civilizações sobreviveram a um longo período da história da humanidade,
desenvolvendo tecnologias e inúmeras formas de organização de suas sociedades, e
produzindo um enorme legado cultural para toda humanidade.” (MUNANGA, Kabengele e
GOMES, Nilma Lino.
Pa
ra entender o negro no Brasil de hoje: história, realidades, problemas e caminhos. São Paulo: Global,
2006.)
3) No seu ponto de vista que imagem de África o texto acima traz? Que questões
você colocaria sobre esse texto para ele ser trabalhado com os seus
alunos?
TABELA 5
-
IMAGEM DE ÁFRICA QUE O TEXTO TRAZ
Professor Carlos - O texto trás a imagem de um continente grandioso,
proporcionador de uma mistura de raças e culturas fascinantes, uma imagem de
inovação, desenvolvimento. Dá a idéia de que foi este a origem das grandes
culturas e de que toda essa grandiosidade se perpetuou até aos dias de hoje.
Para trabalhar com os alunos colocaria questões mais abrangentes e
relacionadas com os temas que estudam e estão contemplados no currículo
escolar. Colocaria as questões mais no âmbito do estudo do Egito no ano,
embora não deixasse de referir as outras civilizações. Falar-
se
-ia das inovações
introduzidas pelo povo epcio que já para a época apresentava inovações
espantosas, como por exemplo as suas construções. No caso do 5° ano seria
interessante por causa da expansão muçulmana e expansão marítima.
Professora Carmen
-
A imagem transmitida dá conta do continente africano
como sendo o berço da civilização e um pólo importante de difusão de
novidades e inovaç
ões importantes para a humanidade.
-
Qual o continente que o documento se refere?
-
Quais as civilizações que se
desenvolveram nesses continentes?
-
Que contributo deixaram essas civilizações
para os dias de hoje?
Professora Andréa - O texto remete-nos mais para as civilizações antigas,
dando por isso uma visão redutora das civilizações e culturas africanas. Não
posso, no entanto, pronunciar
-
me sobre o tratamento do tema, uma vez que não
se insere nos currículos escolares dos anos que lecciono.
135
Os textos a seguir foram extraídos de dois livros que discutem questões sobre a
África.
“(...) O piloto de Colombo, Pedro Nino, também era africano. Desde então, a
história do Atlântico negro, constantemente ziguezagueando pelos movimentos dos
povos negros não como mercadorias, mas engajados em várias lutas de
emancipação, autonomia e cidadania -, propicia um meio para reexaminar os problemas
de nacionalidade, posicionamento, identidade e memória histórica (...).”
(GILROY, Paul
.
O Atlântico Negro
.
Modernidade e dupla consciência, São Paulo, Rio de Janeiro, 34/Universidade
Cândido Mendes
-
Centro de Estudos Afro
-
Asiáticos, 2001. P. 59.)
“(...) Sabemos que o termo ‘África’ é, em todo caso, uma construção moderna,
que se refere a uma variedade de povos, tribos, culturas e línguas cujo principal ponto
de origem comum situava
-
se no tráfico de escravos (...)
(HALL, Stuart.
Da Diáspora
: identidades e mediações culturais. Belo horizonte: UFMG, 2003. P. 31)
4)
Qual dos dois textos você usaria como referência para trabalhar o conceito de
África com os seus alunos?
TABELA 6
-
QUAL DOS DOIS TEXTOS USARIA COMO REFERÊNCIA
PARA TRABALHAR O CONCEITO DE ÁFRICA
Professor Carlos - Para trabalhar o conceito de África utilizaria o segundo
texto.
Professora Carmen
-
Usaria o segund
o texto.
Professora Andréa - Dado o nível etário dos alunos (5° e 6° anos de
escolaridade) teria que adoptar o segundo texto por uma questão de facilidade
de linguagem e ligação dos conteúdos abordados.
136
TABELA 7
JUSTIFICATIVA
Professor Carlos - O segundo texto permite abordar o tema da escravatura,
mas também ao mesmo tempo permite fazer uma refleo dos valores morais.
A exploração do texto permite em simultâneo retirar informação e partir do
tema da escravatura para o tema da liberdade e de todo o percurso que se teve
de ultrapassar para se atingir esse direito sagrado. Por outro lado, define de
uma forma muito sucinta o que é África, por quem é constituída (rias raças e
culturas) e mostra também qual a sua origem e de que forma os africanos
se
expandiram pelo mundo.
Professora Carmen - Creio que o segundo texto reaa de forma mais
evidente as diferenças que justificam e explicam a diversidade cultural,
lingüística e de identidade existente neste continente. Por outro lado, o
primeiro texto parece centrar a justificação dessa diversidade atras de
factores externos: o imperialismo europeu. Embora esse facto possa ter
contribuído para esse mosaico cultural, as suas raízes são anteriores e bem
mais profundas.
Professora Andréa - Descobrimentos, tráfico negreiro, colonização do
Brasil.
5) Na sua opinião, o estudo da História da África contribui para aproximar os
laços entre Brasil, Portugal e África? Justifique.
TABELA 8
-
O ESTUDO DA HISTÓRIA DA ÁFRICA CONTRIBUI PARA
APROXIMAR OS LAÇOS EN
TRE BRASIL, PORTUGAL E ÁFRICA
Professor Carlos - Contribui sempre. Quando se tem um conhecimento mais
aprofundado de rios assuntos é muito cil relacioná-los e descobrir os
pontos comuns que podem existir entre eles.
Professora Carm en - O estudo da História, seja de África ou de qualquer
outro continente, permite conhecer melhor a sua “realidade” evitando, ou
combatendo, preconceitos e idéias pouco fundamentadas. Nesse sentido, creio
que o estudo da História de África poderia aproximar as culturas. No
entanto, e
no seguimento do que foi afirmado, creio que não faz sentido estudá-
la
isoladamente.
Professora Ana - O estudo de História de qualquer civilização, cultura, povo,
serve sempre para aproximar países e descobrir afinidades.
137
6) Ordene de 1 a 5 de acordo com o grau de importância que você para as
afirmações abaixo:
TABELA 9 - GRAU DE IMPORTÂNCIA PARA AS AFIRMAÇÕES SOBRE A
ÁFRICA
Alternativas/ordenação
Professor
Carlos
Professora
Carmen
Professora
Andréa
Ela lembra um continente.
1 4 4
É
um mosaico de vários
povos.
5 3 2
Local que fornecia os
escravos para a América.
3 5 5
Tem relação com nossa
identidade portuguesa e
brasileira.
4 2 1
Local de grandes
civilizações, como a
egípcia.
2 1 3
7) De que ponto de vista você trabalharia com s
eus alunos o conteúdo que escolheu
como o mais relevante na questão 6?
TABELA 10
-
QUE PONTO DE VISTA VOCÊ TRABALHARIA COM SEUS
ALUNOS O CONTEÚDO QUE ESCOLHEU COMO O MAIS RELEVANTE NA
QUESTÃO ANTERIOR
Professor Carlos
-
Em branco.
Professora Carm en - Para trabalhar o conceito de África seria conveniente
estudar várias definições de África. Ou seja, procurar conhecer outras visões
sobre aquele continente, nomeadamente a visão européia e americana, sendo
estes dois continentes aqueles que, provavelmente, ao longo dos tempos mais
contactos estabeleceram com aquele território.
Professora Andréa
-
Em branco.
138
8) Escreva um pequeno texto sobre a África na História:
TABELA 11
TEXTO SOBRE A ÁFRICA
Professor Carlos - A África como todos os continentes foi importante e
continua a sê-lo na História. Se analisarmos a sua importância desde o início
dos tempos mais remotos, concluímos que terá sido o berço da humanidade e
por isso, a nossa origem. Ao longo do tempo este foi um continente que sempre
se destacou, não só por ser um local onde nasceram várias civilizações, mas
também pelas suas riquezas naturais e localização geográfica estratégica. Foi
por isso, um continente de passagem para muitos povos e de fixação para
outros, ficando por tudo isto marcado na H
istória.
Professora Carm en A África é considerada pela História como sendo o
possível local da origem do homem, assim como o berço de algumas civilizações
que deixaram um legado importante para a posteridade. Este continente é
também retratado como um território que forneceu mão-
de
-obra escrava de
que os europeus se serviram, sobretudo na América, assim como um território
que foi cobado e explorado pelas suas riquezas no período da expansão
marítima européia. É ainda visto como um ponto de discórdia entre alguns
reinos europeus que, na corrida ao fornecimento de matérias-
primas,
essenciais ao desenvolvimento da industrialização européia do século XIX,
serão objecto da descolonização, formando-se assim, alguns dos estados
africanos independentes dos nossos dias. O relato histórico sobre África é, por
isso, um relato sujeito a diversos hiatos, não seguindo uma continuidade
cronológica.
Professora Andréa
-
Não respondeu.
139
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ
Adriane de Quadros Sobanski
Mestrado em Educ
ação
-
Linha de pesquisa: Cultura, Escola e Ensino
Orientadora: Profª. Dra. Maria Auxiliadora Schmidt
QUESTIONÁRIO
-
ALUNOS
No ano de 2003, o presidente Lula confirmou a lei 10.639, a qual torna obrigatório
o ensino de História da África e da cultura afro no Ensino de 5ª. a 12ª. série no
Brasil.
1) O que você acha dessa medida?
( ) Uma a medida bastante justa.
( ) Uma lei sem sentido.
( ) Deveria ser apenas um complemento da História do país.
( ) Uma decisão exagerada.
( ) Adequada por causa da gran
de presença de pessoas negras no país.
2) Você acha que isso se daria certo em Portugal? Justifique a sua resposta:
( ) Talvez sim.
( ) Com certeza.
( ) Não daria certo.
( ) Não faria sentido.
( ) Seria difícil.
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
3) Para você seria interessante estudar a África por que:
( ) A população do Bras
il e de Portugal foi formada também por africanos.
( ) Porque a África foi dominada pelos portugueses e os africanos levados para Brasil e
Portugal.
( ) Por causa do Egito.
( ) Porque nossa cultura é formada por muitos elementos africanos.
( ) Não seria
nada interessante.
140
4) Se esse tema Áfricafosse estudado na escola, você acha que seria melhor em
que série?
( ) 5° ano.
( ) 6° ano.
( ) 7° ano.
( ) 8° ano.
( ) 9° ano.
5) Para muitas pessoas, o estudo da História da África contribui para aproxi
mar
os laços entre Brasil, Portugal e África. Numere de acordo com a importância que
você dá para isso:
( )
Contribui, pois esclarece cada vez mais sobre nossa história.
( ) Nos f
azendo entender que a história é feita também de homens comuns.
( )
Col
abora para termos um conhecimento mais aprofundado de vários assuntos.
( ) Permite conhecer melhor a nossa realidade.
( ) Serve para aproximar países e descobrir afinidades.
6) Ordene de 1 a 5 de acordo com o grau de importância que você para as
af
irmações abaixo:
( )
Ela lembra um continente.
( ) É um mosaico de vários povos.
( ) Local que fornecia os escravos para a América.
( ) Tem relação com nossa identidade portuguesa e brasileira.
( ) Local de grandes civilizações, como a egípcia.
7)
Escreva um pequeno texto sobre a influência da África na história do seu país:
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
Obrigado!
141
Respostas dos Alunos Brasileiros
24 alunos com idade entre 13 e 14 anos.
5 meninas e 19 meninos.
8ª série do Ensino Fundamental.
Escola Privada da cidade de Curi
tiba
-
Paraná.
No ano de 2003, o presidente Lula confirmou a lei 10.639, a qual torna
obrigatório o ensino de História da África e da cultura afro no Ensino de 5ª. a 12ª.
série no Brasil.
1) O que você acha dessa medida?
TABELA 1
-
O QUE ACHA DESSA MEDID
A
Uma a medida bastante justa.
06
Uma lei sem sentido.
X
Deveria ser apenas um complemento da História do país.
03
Uma decisão exagerada.
01
Adequada por causa da grande presença de pessoas negras no país.
14
2) Você acha que isso se daria certo em P
ortugal? Justifique a sua resposta:
TABELA 2
-
ACHA QUE ISSO SE DARIA CERTO EM PORTUGAL
Talvez sim.
12
Com certeza.
01
Não daria certo.
02
Não faria sentido.
03
Seria difícil.
06
142
TABELA 3
-
JUSTIFICATIVA
TALVEZ SIM
Matheus
- Pois hoje em dia as pessoas de Portugal têm consciência do que
fizeram seus descendentes mais antigos.”
Mylla
-Talvez sim, pois assim como no Brasil, Portugal também é formada
por africanos.”
Luís
- Pois esse tempo de escravidão negra passou apesar de haver vários
racis
tas em Portugal”.
Ana
- Talvez assim eles ficassem sabendo um pouco sobre o país que eles
dominaram.”
Carlos
-
“Porque a Europa inteira colonizou a África.”
Gustavo
-
“Porque a África também faz parte da história de Portugal.”
Bruno
-Pois algumas pessoas gostam da história da África, por isso alguns
gostam de estudar.”
Bruna
- Pois se algumas pessoas não fossem tão racistas daria muito certo.
E muitas pessoas acham isso desnecessário”.
Pedro
-
“Pois Portugal também teve algumas colônias na África.”
Filipe
-
“Algumas pessoas aceitariam e outras não.”
Carlos
-
“Porque seria um complemento cultural no ensino.”
Thiago
- Porque existem muitos negros no mundo inteiro e para todos
conhecer um pouco mais da África e pensar (refletir) um pouco que existe
muitas coisas ruins na África como: doenças como a Aids, roubos e outras
coisas. Mas também na África existem roubos como em qualquer outro lugar
do mundo. A África também tem suas maravilhas, e inclusive a copa do
mundo será na África.”
COM CERTEZA
E
duardo
- “Na minha opinião deve sim ser ensinado sobre a história da
África, para que as crianças saibam um pouco mais sobre a cultura de lá.”
143
NÃO DARIA CERTO
Bruna
- Eu como descendente de portugueses sei que são muito racistas, iria
causar pomica em todo país, inclusive aqui no Brasil. Os portugueses se
revoltariam.”
Gabriela
- “Nos países da Europa existe muito preconceito contra negros,
principalmente africanos”.
NÃO FARIA SENTIDO
Gabriela
- Como em Portugal não houve escravos e a população negra é
quase nula não faria sentido estudá
-
la.”
Igor
- Não faria sentido por não existir uma quantidade significativa de
negros no país.”
Nicolas
-
“Porque a África não pertence a Portugal e sim ao Brasil.”
SERIA DIFÍCIL
Joel
- “Porque Portugal teve rias conias africanas (escravizaram os negros)
e provavelmente a maioria dos portugueses criticaria essa idéia. No entanto,
alguns gostariam, pois poderiam auto-
criticar
-se em relação a como
maltrataram os negros.”
Alexandre
- “Acho que seria difícil, pois a presença de negros lá não é tão
grande quanto no Brasil.”
Guilherme
- Seria difícil porque a população afro-descendente não é grande
como no Brasil.”
Lucas
-
“Porque o povo português sentiria vergonha de seu próprio país.”
Rodrigo
- “Pois foram os próprios portugueses que trouxeram os africanos
para o Brasil para escravizá
-
los.
Leonardo
- Seria difícil, pois Portugal é um país com poucos negros. Mas por
outro lado poderia dar certo, pois Portugal foi formado também por africanos.”
144
3) P
ara você seria interessante estudar a África porque:
TABELA 4
-
SERIA INTERESSANTE ESTUDAR A ÁFRICA PORQUE:
A população do Brasil e de Portugal foi formada também por
africanos.
08
Porque a África foi dominada pelos portugueses e os africanos
levados par
a Brasil e Portugal.
04
Por causa do Egito.
03
Porque nossa cultura é formada por muitos elementos africanos.
17
Não seria nada interessante.
01
4) Se esse tema “África” fosse estudado na escola, você acha que seria melhor em
que série?
TABELA 5
EM
QUE SÉRIE SERIA MELHOR ESTUDAR A ÁFRICA
5° ano.
07
6° ano.
07
7° ano.
08
8° ano.
05
9° ano.
02
5) Para muitas pessoas, o estudo da História da África contribui para aproximar
os laços entre Brasil, Portugal e África. Numere de acordo com a importância que
você dá para isso:
145
TABELA 6
O ESTUDO DA HISTÓRIA DA ÁFRICA CONTRIBUI PARA
APROXIMAR OS LAÇOS ENTRE BRASIL, PORTUGAL E ÁFRICA
6) Ordene de 1 a 5 de acordo com o grau de importância que você dá para as afirmações
abaixo:
TABELA 7
-
IMPORTÂNCIA PARA AS AFIRMAÇÕES
Classificação
1° lugar
2° luga
r
3° lugar
4° lugar
5° lugar
Ela lembra um continente.
2 vezes
É um mosaico de vários povos.
1 vez
Local que fornecia os escravos para
a América.
3 vezes
Tem relação com nossa identidade
portuguesa e brasileira.
10 vezes
Local de grandes civilizações,
como a egípcia.
9 vezes
Classificação de acordo com a
freqüência de escolhas:
1° lugar
2° lugar
lugar
lugar
5° lugar
Contribui, pois esclarece cada
vez mais sobre nossa história.
6 vezes
Nos fazendo entender que a
história é feita também de
homens comuns.
11
vezes
Colabora para termos um
conhecimento mais
aprofundado de vários assuntos.
2
vezes
Permite conhecer melhor a
nos
sa realidade.
1 vez
Serve para aproximar países e
descobrir afinidades.
2
vezes
146
7)
Escreva um pequeno texto sobre a influência da África na história do seu país:
TABELA 8
-
TEXTO SOBRE A INFLUÊNCIA DA ÁFRICA NA HISTÓRIA DO
SEU PAÍS
Alexandre
- “A África tem uma influência muito grande nas nossas culturas,
nas danças, na comida, em praticamente tudo.”
Carlos
- O nosso país tem muitos africanos, eles têm uma grande influencia
na nossa cultura e história”.
Ana
- “Os escravos quando vieram para o Brasil, tiveram grande influencia
tanto
cultural, como religiosa e trabalhista. E deram grande importância para
países como o Brasil.”
Gustavo
- No Brasil há muitas influências da África como os escravos, nossos
descendentes, comida, vestuário, hábitos e entre outras coisas. E também o
Brasil
tem muitas influências indígenas em nossa cultura e acho que seria
importante para todos estudar mais sobre os indígenas assim como a África”.
Gabriela
- “A cultura africana está presente em muitos aspectos do Brasil,
desde o tempo que eles foram trazidos aqui como escravos, eles misturaram
a cultura, culinária, vestuário...”.
Bruno
-“Contribuiu muito com o desenvolvimento do país, mesmo de uma
forma escrava e também ajudou a montar uma cultura própria.”
Bruna
- “Eu acho que a vinda de escravos da África influenciou muito na
cultura e nos costumes e também na miscigenação de raças aqui no Brasil Essa
é uma bela cultura, que deve sim ser ensinada nas escolas para as crianças de
hoje conhecerem o passado e entenderem o futuro”.
Rodrigo
-
“A África foi
a base de nosso país, pois sem os escravos negros nosso
país nunca evoluiria (economicamente e culturalmente). Graças a ela hoje
existem as culturas africanas aqui, como o candomblé, a capoeira, etc.”
Filipe
- “Muitos africanos vieram para o Brasil e colaboraram com muitas
partes da cultura do país. A África também contribui no aprendizado de
história por possuir grandes civilizações, etc.”.
Lucas
- A África foi responsável por grande parte da nossa história, pois de
vieram os escravos que colhiam a c
ana
-
de
-açúcar na época de colônia e
também porque dela foram trazidas coisas como a feijoada e a capoeira, mas
também foram os negros que criaram algumas lendas do Brasil, como a do Saci
e do Negrinho do Pastoreio”.
Guilherme
- No século XVI os primeiros escravos vieram da África para o
Brasil e eles ajudaram na nossa cultura, na língua e na culinária”.
Luís
- “A influência cultural no Brasil é muito grande em comidas, roupas,
costumes, etc. Acho que deveríamos agradecer, pois temos uma grande cultura
147
e
devemos parte dela a África”.
Mylla
- “O nosso país teve muita influência africana, entre elas está a comida,
pois atras deles aprendemos muitos pratos que hoje são muito conhecidos
como por exemplo a feijoada, ela foi criada nas senzalas onde os africa
nos
viviam.”
Gabriela
- “A África foi a fonte de escravos para o Brasil. Sem a África o Brasil
não estaria onde está hoje a nível de cultura, todos os brasileiros sabem de sua
cultura, mas tem influência de outras.”
Pedro
- Muitos negros africanos foram trazidos da África para trabalharem
como escravos no Brasil e também eles trouxeram rias comidas, danças e
culturas para o nosso país”.
Igor
- A África influencia o Brasil desde antes dos africanos chegarem no
nosso pais, pelos costumes de antigos epcios. Quando os escravos africanos
chegaram no Brasil, a cultura mudou, sofrendo influências dos indígenas,
europeus e africanos. Os africanos nos influenciaram com comidas, danças e
linguagem.”
Matheus
- “Eram trazidos escravos de para o Brasil trabalhar nas lavouras
de café. Ponto que trouxe bastante riqueza para o nosso país. (café)”.
Leonardo
- “Com os escravos africanos no Brasil, as culturas se misturaram.
Mais de 50% da população brasileira é negra devido a este fator”.
Nicolas
- “Para saber dos nossos descendentes, nossa cultura, comidas e a
forma de agir e falar”.
Ricardo
- A África nos influenciou a cultura, comida e algumas pessoas que
vivem no Brasil são africanos. Alguns africanos eram escravos as eles ajudaram
muito o Brasil”.
Paul
o - A África nos influenciou na cultura, culinária (feijoada). Os africanos
foram trazidos para o Brasil como escravos, sem opção de escolha, muitos
morreram nos navios. Sendo assim, a maior parte dos brasileiros tem “sangue
africano.”
Eduardo
- A população do Brasil e de Portugal foi formada em grande parte
pela população africana e tem muitas coisas em comum até os dias de hoje. Por
isso principalmente no Brasil tem muitas pessoas diferentes, negras, brancas,
etc, que formam um povo só”.
Joel
-
“Foi
muito importante por vários aspectos da nossa cultura são baseados
na cultura africana que nos foi trazida na época da colonização.”
Thiago
- Quando os europeus trouxeram escravos da África para o Brasil,
junto com eles vieram suas culturas de cada tribo que existem até hoje, como a
capoeira. Os escravos também carregavam o Brasil nas costas durante o
período colonial, eles desenvolveram o Brasil”.
148
Respostas dos Alunos Portugueses
31 alunos com idade entre 14 e 15 anos.
20 meninas e 11 meninos
9° ano
do Ensino fundamental.
Escola de periferia urbano/rural da cidade de Guimarães, norte de Portugal.
No ano de 2003, o presidente Lula confirmou a lei 10.639, a qual torna
obrigatório o ensino de História da África e da cultura afro no Ensino de 5ª. a 12ª.
série no Brasil.
1) O que você acha dessa medida?
TABELA 1
-
O QUE ACHA DESSA MEDIDA
Uma a medida bastante justa.
04
Uma lei sem sentido.
01
Deveria ser apenas um complemento da História do país.
13
Uma decisão exagerada.
08
Adequada por causa da gran
de presença de pessoas negras no país.
05
2) Você acha que isso se daria certo em Portugal? Justifique a sua resposta:
TABELA 2
-
ACHA QUE ISSO SE DARIA CERTO EM PORTUGAL
Talvez sim.
16
Com certeza.
04
Não daria certo.
05
Não faria sentido.
04
Seria
difícil.
05
149
TABELA 3
JUSTIFICATIVAS
TALVEZ SIM
Rafael
- Esta medida poderia ser bem aceita em Portugal devido à grande história
que Portugal tem com o continente africano. Seria deste modo importante e
igualmente interessante em Portugal termos es
ta medida.”
Maria
-
“Porque devemos saber um pouco da história de cada país”.
Otávio
-
“Porque há várias pessoas não sabem nada sobre a História da África e assim
enriqueciam a sua cultura”.
Clara
- Porque nós fomos para a África ensinar os nossos costumes por isso não nos
fazia mal nenhum conhecer um pouco da história da África e da cultura afro”.
Fernanda
- Essa medida poderia dar certo em Portugal porque aumenta o
conhecimento de outras regiões para cada estudante e o conhecimento requerido por
amb
os iria ajudar significativamente a história geral que se relaciona com nosso país.
A medida, após ser estabelecida, tanto os professores como os alunos iriam obter uma
maior informação acerca dessa cultura e a sua aprendizagem, apesar de ser mais
estudada
e com um maior trabalho a nível profissional, seria um grande conhecimento
sobre essas culturas e regiões”.
Aline
- Porque acho que as pessoas se iriam interessar pela história de outro país,
neste caso da África”.
Isabella
- Eu acho que seria difícil porque teríamos muita matéria para estudar e
podíamos baralhar as idéias, mas depois de nos avituarà idéia de ter que estudar a
cultura de Portugal e África.”
Margarida
-
“Porque não fazia sentido estudarmos tanto tempo a cultura de África”.
Helena
- “Eu acho que sim porque África como teve influência no nosso país faz
sentido nós também estudar sobre África”.
José
- “Já que falamos de rios povos de outros países, África parece-me um país
interessante para aprofundar os nossos conhecimentos”.
Miri
an
-
“Não sei, talvez devido a uma certa população do nosso país ser negra, talvez
por isso”.
Laís
- “Seria difícil porque a matéria é bastante, mas fazemos algumas referências
sobre África”.
Larissa
- Pois o passado de Portugal passou muito por África, como os
descobrimentos”.
André
- Porque como se pode aprender a cultura de outras raças também se poderia
aprender a cultura africana e que seria uma coisa diferente e nova que se iria
aprender”.
150
Júlia
- Penso que talvez desse certo em Portugal, visto que há sempre quem goste e
se interesse por outras culturas que não a nossa. Mas como todo, há sempre que não se
interesse e ignore a cultura além de Portugal. E se para alguns a nossa própria é
aborrecida, que farão culturas que não a nossa”.
Marina
- Porque seria injusto uma pessoa de outro país de outra raça não saber da
nossa história e talvez as pessoas não fossem tão racistas se soubessem a história de
outros países.”
COM CERTEZA
Augusto
-
Porque acho que devíamos est
udar sobre a nossa história do nosso
país, só se envolvesse o nosso país é que devíamos estudar.
Régis
-
Porque nós já demos matéria sobre África e não é obrigatório.
Marlon
- Porque sendo obrigatório no Brasil também pode existir em
Portugal, não havend
o problemas, acho eu.
Marlus
-
Porque assim ficaríamos a conhecer melhor a civilização e costumes
de África em Portugal e também era melhor porque assim podíamos ajudar.
NÃO DARIA CERTO
Fernando
-
Porque seria muito repetitivo e isso não resultava, p
ois os alunos
portugueses não gostam.
Régis
-
Porque não fazia sentido estudarmos tanto tempo a cultura de África.
Elaine
- Não daria certo pois seria um pouco chatoestarmos a estudar a
História de outro país em todos os anos acadêmicos.
Manoela
- Eu acho que não daria certo em Portugal porque acho muito
exagerada porque há coisas mais interessantes do que falar sempre da mesma
coisa todos os anos. E também porque acho que não muito importante falar
deste assunto.
Anita
- Não dava certo porque ia ser muito cansativo para nós estudar a
História da África no ensino do 5° ao 12° ano, os alunos começavam a por a
disciplina de lado.
151
NÃO FARIA SENTIDO
Lorena
- Acho que devemos estudar um pouco de tudo não só uma cultura
para conhecer um pouco de tudo.
Flávia
- Porque a história deve ser estudada em geral e não só a história de
um certo país.
Beatriz
- Não fazia sentido porque nós estudamos África, não na
totalidade, mas muito da sua História tem a ver com Portugal por isso é que já
a estudamos.
João
-
Não faria sentido, pois havia poucos alunos africanos e isso dificultaria
o trabalho das escolas, pois poderiam não ter nenhum e assim não faria
sentido os alunos aprenderem a cultura de outros povos e outras religiões.
SERIA DIFÍCIL
Bianca
- Porque ainda existe muito racismo, podia até nem ser por mal e
acabaria por causar “mau” ambiente.
Flora
-
Porque África tem pouca história.
Isabella
- Eu acho que seria difícil porque teríamos muita matéria para
estudar e podíamos baralhar as idéias, mas depois de nos avituarà idéia
de ter que estudar a cultura de Portugal e África.
Laís
- Seria difícil porque a matéria já é bastante, mas fazemos algumas
referências sobre África.
Tomas
- Porque existe muito preconceito em relação aos negros. E era
mai
s estudo para os alunos pelo que daria uma grande confusão.
3) Para você seria interessante estudar a África por que:
152
TABELA 4
-
SERIA INTERESSANTE ESTUDAR A ÁFRICA POR QUE:
A população do Brasil e de Portugal foi formada também por
africanos
.
04
Porque a África foi dominada pelos portugueses e os africanos
levados para Brasil e Portugal.
13
Por causa do Egito.
01
Porque nossa cultura é formada por muitos elementos africanos.
11
Não seria nada interessante.
05
4) Se esse tema “África” fosse estudado na escola, você acha que seria melhor em
que série?
TABELA 5
EM QUE SÉRIE SERIA MELHOR ESTUDAR A ÁFRICA
5° ano.
03
6° ano.
03
7° ano.
16
8° ano.
09
9° ano.
04
5) Para muitas pessoas, o estudo da História da África contribui para aproximar os
laços entre Brasil, Portugal e África. Numere de acordo com a importância que
você dá para isso:
153
TABELA 6
O ESTUDO DA HISTÓRIA DA ÁFRICA CONTRIBUI PARA
APROXIMAR OS LAÇOS ENTRE BRASIL, PORTUGAL E ÁFRICA
6) Ordene de 1 a 5 de acordo com o grau de importância que você para as
afirmações
abaixo:
TABELA 7
-
IMPORTÂNCIA PARA AS AFIRMAÇÕES
Classificação
1° lugar
2° lugar
3° lugar
4° lugar
5° lugar
Ela lembra um continente. 7
vezes
É um mosaico de vários povos.
6
vezes
Local que fornecia os escravos para
a América.
6
vezes
Tem
relação com nossa identidade
portuguesa e brasileira.
6
vezes
Local de grandes civilizações,
como a egípcia.
6
vezes
Classificação de acordo com a
freqüência
de escolhas:
lugar
lugar
lugar
lugar
lugar
Contribui, pois esclarece cada vez mais
sobre nossa história.
6
vezes
Nos fazendo entender que a história é feita
também de homens comuns.
7
vezes
Colabora para termos um conhecimento
m
ais aprofundado de vários assuntos.
5
vezes
Permite conhecer melhor a nossa realidade.
7
vezes
Serve para aproximar países e descobrir
afinidades.
6
vezes
154
7)
Escreva um pequeno texto sobre a influência da África na história do seu país:
Observação:
Dos 31 alunos que responderam ao questionário, 5 não escreveram nada
nesta questão.
TABELA 8
-
TEXTO SOBRE A INFLUÊNCIA DA ÁFRICA NA HISTÓRIA DO
SEU PAÍS
Marina
- “No 8° ano dei a influência da África na história em Portugal, porque
África foi dominada pelos portugueses e os africanos foram levados pelos
portugueses para fugir da escravatura.”
João
- A África influenciou a história da nossa pátria a partir do momento em
que começaram a ser escravos até ao domínio dos portugueses sobre a África”.
Júlia
-
“Vieram para Portugal, muitos pa
ra servirem os grandes senhores (nobres
e burgueses) – escravidão. Foram muito importantes para a nossa riqueza em
matérias
-
primas”.
André
- A África foi muito importante para o nosso país devido às colônias que
Portugal tinha nesse continente, pois fornecia ao nosso país coisas importantes
que o nosso país não tinha”.
Otávio
- A África mandava os escravos para Portugal e também era um país que
mandava também mercadorias”.
Maria
- Teve influencia por causa de todas as explorações, descobertas e
conqui
stas dos portugueses”.
Rafael
- A descoberta de África foi, para o nosso país, muito importante em
termos econômicos, quer com as minas de ouro, quer com os escravos embora eu
não concorde com essa medida de utilização de pessoas como objeto de trabalho
e
serviço para outros”.
Clara
- “Quando os portugueses saíram de Portugal para descobrir partes do
mundo e descobrir a África onde implantou a nossa cultura e também recolheu
várias matérias
-
primas e também os escravos que a África fornecia”.
Larissa
- É um país muito rico, muito explorado e conquistado pelos
portugueses. Apesar de tudo, temos a mesma língua (alguns países)”.
Tomas
- África foi um ponto de grande importância da história de Portugal,
porque foi das maiores conquistas de Portugal e faz-nos relembrar uma época de
bonança e conquista por parte dos portugueses”.
Laís
- Estudei em rios anos África em História. A conquista de Ceuta, etc., a
Guerra mundial foi importante descobrir outras culturas e histórias do país”.
Fernanda
- A influência da África na história do nosso país influenciou rias
pessoas para que o racismo entre todos começa a terminar entre toda a
população. O assunto de assuntos referentes a África, ajuda a relacionar na nossa
história, podendo conhecer a nossa região com
a da África.”
155
Aline
- A África mandava os escravos para Portugal e também na África tinham
boas matérias
-
primas que vinham para Portugal, isto são as exportações”.
Isabella
- “Eu acho que os africanos influenciaram a cultura portuguesa,
Portugal já dom
inou a África”.
Anita
-
“Não sei o que falar sobre a África na história do nosso país”.
Flora
-
“A África influenciou o poder dos portugueses”.
Margarida
-
“África é um país pobre com grandes dificuldades”.
Helena
- África teve grande influência na história de Portugal porque a
população de Portugal foi formada também pelo povo africano e porque África foi
uma grande influência para o nosso país”.
Beatriz
- África contribuiu muito no sentido econômico para Portugal com os
seus recursos e matérias-
pri
mas. Mas também foi pretexto de muitas guerras
como a 1ª guerra mundial, a guerra colonial. O que é certo é que devemos estudar
África se esta tiver a ver com o nosso país”.
José
- Talvez, quem sabe se o estado poderia mudar algumas atitudes onde o
povo
não aprova. Talvez o povo se unisse e fizesse mais recolhas de bens
alimentares e não alimentares para doar a outros povos de rios países
necessitados”.
Bianca
- “Apesar de já termos falado muito em África, eu não me lembro de
quase nada. Apenas me lembro de diversas terras que foram escravizadas pelos
portugueses”.
Flávia
- “África é um país como outro qualquer e por isso não merece mais
atenção”.
Fernando
- “Aprendemos a lidar com outros tipos de raças, neste caso pessoas
de cor negra”.
Lorena
-
“Áf
rica influencia na história do nosso país devido às comunidades”.
Marlon
- “África influenciou e continua a influenciar o nosso país, visto que
ainda temos lá alguns descendentes e acho que a África é sem dúvida um
continente satélite de Portugal”.
Régis
Não respondeu.
Augusto
Não respondeu.
Marlus
Não respondeu.
Mirian
Não respondeu.
Elaine
Não respondeu.
Manoela
Não repondeu.
156
LEI N° 10.639, DE 9 DE JANEIRO DE 2003.
Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e
bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a
obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro-Brasileira", e outras
providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e
eu sanciono a seguinte Lei:
Art. A Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar acrescida
dos seguintes arts. 26
-
A, 79
-
A e 79
-B:
"Art. 26-A. Nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, oficiais e
particular
es, torna
-
se obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro
-
Brasileira.
§ O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá o estudo da
História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira
e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro
nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil.
§ Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira serão ministrados no
âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de Educação Artística e de
Literatura e História Brasileiras.
§ 3° (VETADO)"
"Art. 79
-
A. (VETADO)"
"Art. 79-B. O calendário escolar incluirá o dia 20 de novembro como 'Dia Nacional da
Consciência Negr
a'."
Art.
2° Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 9 de janeiro de 2003; 182° da Independência e 115° da República.
Luiz Inácio Lula da Silva
Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
157
DIRETRIZES CURRICULA
RES NACIONAIS PARA A
EDUCAÇÃO DAS RELAÇÕES ÉTNICO
-
RACIAIS E PARA OENSINO DE HISTÓRIA
E CULTURA AFRO
-
BRASILEIRA E AFRICANA
(...)
Questões introdutórias
O parecer procura oferecer uma resposta, entre outras, na área da educação, à demanda da
população afrodescendente, no sentido de políticas de ações afirmativas, isto é, de políticas de
reparações, e de reconhecimento e valorização de sua história, cultura, identidade. Trata, ele, de
política curricular, fundada em dimensões históricas, sociais, antropológicas oriundas da
realidade brasileira, e busca combater o racismo e as discriminações que atingem
particularmente os negros.
Nesta perspectiva, propõe à divulgação e produção de conhecimentos, a formação de
atitudes, posturas e valores que eduquem cidadãos orgulhosos de seu pertencimento étnico-
racial
- descendentes de africanos, povos indígenas, descendentes de europeus, de asiáticos
para interagirem na construção de uma nação democrática, em que todos, igualmente, tenham
seus direitos garantidos e sua iden
tidade valorizada.
É importante salientar que tais políticas têm como meta o direito dos negros se
reconhecerem na cultura nacional, expressarem visões de mundo próprias, manifestarem com
autonomia, individual e coletiva, seus pensamentos
.
É necessário sublinhar que tais políticas
têm, também, como meta o direito dos negros, assim como de todos cidadãos brasileiros,
cursarem cada um dos níveis de ensino, em escolas devidamente instaladas e equipadas,
orientados por professores qualificados para o ensino das diferentes áreas de conhecimentos;
com formação para lidar com as tensas relações produzidas pelo racismo e discriminações,
sensíveis e capazes de conduzir a reeducação das relações entre diferentes grupos étnico-
raciais,
ou seja, entre descendentes de africanos, de europeus, de asiáticos, e povos indígenas. Estas
condições materiais das escolas e de formação de professores são indispensáveis para uma
educação de qualidade, para todos, assim como o é o reconhecimento e valorização da história,
cultura e id
entidade dos descendentes de africanos.
Políticas de Reparações, de Reconhecimento e Valorização, de Ações Afirmativas
A demanda por
reparações
visa a que o Estado e a sociedade tomem medidas para
ressarcir os descendentes de africanos negros, dos danos psicológicos, materiais, sociais,
políticos e educacionais sofridos sob o regime escravista, bem como em virtude das políticas
explícitas ou tácitas de branqueamento da população, de manutenção de privilégios exclusivos
para grupos com poder de governar e de influir na formulação de políticas, no pós-
abolição.
158
Visa também a que tais medidas se concretizem em iniciativas de combate ao racismo e a toda
sorte de discriminações.
Cabe ao Estado promover e incentivar políticas de reparações, no que cumpre ao dispo
sto
na Constituição Federal, Art. 205, que assinala o dever do Estado de garantir indistintamente,
por meio da educação, iguais direitos para o pleno desenvolvimento de todos e de cada um,
enquanto pessoa, cidadão ou profissional. Sem a intervenção do Estado, os postos à margem,
entre eles os afrobrasileiros, dificilmente, e as estatísticas o mostram sem deixar dúvidas,
romperão o sistema meritocrático que agrava desigualdades e gera injustiça, ao reger-se por
critérios de exclusão, fundados em preconceitos e manutenção de privilégios para os sempre
privilegiados
.
Políticas de reparações voltadas para a educação dos negros devem oferecer garantias a
essa população de ingresso, permanência e sucesso na educação escolar, de valorização do
patrimônio histórico-cultural afro-brasileiro, de aquisição das competências e dos
conhecimentos tidos como indispensáveis para continuidade nos estudos, de condições para
alcançar todos os requisitos tendo em vista a conclusão de cada um dos níveis de ensino, bem
como para atuar como cidadãos responsáveis e participantes, além de desempenharem com
qualificação uma profissão.
A demanda da comunidade afro-brasileira por
reconhecimento,
valorização e afirmação
de direitos, no que diz respeito à educação, passou a ser particularmente apoiada com a
promulgação da Lei 10639/2003, que alterou a Lei 9394/1996, estabelecendo a obrigatoriedade
do ensino de história e cultura afro
-
brasileiras e africanas.
Reconhecimento implica justiça e iguais direitos sociais, civis, culturais e econôm
icos,
bem como valorização da diversidade daquilo que distingue os negros dos outros grupos que
compõem a população brasileira. E isto requer mudança nos discursos, raciocínios, lógicas,
gestos, posturas, modo de tratar as pessoas negras. Requer também que
se conheça a sua história
e cultura apresentadas, explicadas, buscando-se especificamente desconstruir o mito da
democracia racial na sociedade brasileira; mito este que difunde a crença de que, se os negros
não atingem os mesmos patamares que os não negros, é por falta de competência ou de
interesse, desconsiderando as desigualdades seculares que a estrutura social hierárquica cria
com prejuízos para os negros.
Reconhecimento requer a adoção de políticas educacionais e de estratégias pedagógicas
de valorização da diversidade, a fim de superar a desigualdade étnico-racial presente na
educação escolar brasileira, nos diferentes níveis de ensino.
Reconhecer exige que se questionem relações étnico-raciais baseadas em preconceitos
que desqualificam os negros e salientam estereótipos depreciativos, palavras e atitudes que,
159
velada ou explicitamente violentas, expressam sentimentos de superioridade em relação aos
negros, próprios de uma sociedade hierárquica e desigual.
Reconhecer é também valorizar, divulgar e res
peitar os processos históricos de resistência
negra desencadeados pelos africanos escravizados no Brasil e por seus descendentes na
contemporaneidade, desde as formas individuais até as coletivas.
Reconhecer exige a valorização e respeito às pessoas negras
, à sua descendência africana,
sua cultura e história. Significa buscar, compreender seus valores e lutas, ser sensível ao
sofrimento causado por tantas formas de desqualificação: apelidos depreciativos, brincadeiras,
piadas de mau gosto sugerindo incapacidade, ridicularizando seus traços físicos, a textura de
seus cabelos, fazendo pouco das religiões de raiz africana. Implica criar condições para que os
estudantes negros não sejam rejeitados em virtude da cor da sua pele, menosprezados em
virtude de seus antepassados terem sido explorados como escravos, não sejam desencorajados
de prosseguir estudos, de estudar questões que dizem respeito à comunidade negra.
Reconhecer exige que os estabelecimentos de ensino, freqüentados em sua maioria por
população negra, contem com instalações e equipamentos sólidos, atualizados, com professores
competentes no domínio dos conteúdos de ensino, comprometidos com a educação de negros e
brancos, no sentido de que venham a relacionar-se com respeito, sendo capazes de corrigir
posturas, atitudes e palavras que impliquem desrespeito e discriminação.
Políticas de reparações e de reconhecimento formarão programas de ações afirmativas
,
isto é, conjuntos de ações políticas dirigidas à correção de desigualdades raciais e sociais,
orie
ntadas para oferta de tratamento diferenciado com vistas a corrigir desvantagens e
marginalização criadas e mantidas por estrutura social excludente e discriminatória. Ações
afirmativas atendem ao determinado pelo Programa Nacional de Direitos Humanos1, be
m como
a compromissos internacionais assumidos pelo Brasil, com o objetivo de combate ao racismo e
a discriminações, tais como: a Convenção da UNESCO de 1960, direcionada ao combate ao
racismo em todas as formas de ensino, bem como a Conferência Mundial de Combate ao
Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Discriminações Correlatas de 2001.
Assim sendo, sistemas de ensino e estabelecimentos de diferentes níveis converterão as
demandas dos afro-brasileiros em políticas públicas de Estado ou institucionais, ao tomarem
decisões e iniciativas com vistas a reparações, reconhecimento e valorização da história e
cultura dos afrobrasileiros, à constituição de programas de ações afirmativas, medidas estas
coerentes com um projeto de escola, de educação, de formação de cidadãos que explicitamente
se esbocem nas relações pedagógicas cotidianas. Medidas que, convêm, sejam compartilhadas
pelos sistemas de ensino, estabelecimentos, processos de formação de professores, comunidade,
professores, alunos e seus pais.
160
Medida
s que repudiam, como prevê a Constituição Federal em seu Art.3º, IV, o
“preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação” e
reconhecem que todos são portadores de singularidade irredutível e que a formação escolar te
m
de estar atenta para o desenvolvimento de suas personalidades (Art.208, IV).
Educação das relações étnico
-
raciais
O sucesso das políticas públicas de Estado, institucionais e pedagógicas, visando a
reparações, reconhecimento e valorização da identidade, da cultura e da história dos negros
brasileiros depende necessariamente de condições físicas, materiais, intelectuais e afetivas
favoráveis para o ensino e para aprendizagens; em outras palavras, todos os alunos negros e não
negros, bem como seus professores, precisam sentir-se valorizados e apoiados. Depende
também, de maneira decisiva, da reeducação das relações entre negros e brancos, o que aqui
estamos designando como relações étnico-raciais. Depende, ainda, de trabalho conjunto, de
articulação entre processos educativos escolares, políticas públicas, movimentos sociais, visto
que as mudanças éticas, culturais, pedagógicas e políticas nas relações étnico-raciais não se
limitam à escola.
É importante destacar que se entende por raça a construção social forjada nas tensas
relações entre brancos e negros, muitas vezes simuladas como harmoniosas, nada tendo a ver
com o conceito biológico de raça cunhado no século XVIII e hoje sobejamente superado. Cabe
esclarecer que o termo raça é utilizado com freqüência nas relações sociais brasileiras, para
informar como determinadas características físicas, como cor de pele, tipo de cabelo, entre
outras, influenciam, interferem e até mesmo determinam o destino e o lugar social dos sujeitos
no interior da sociedade brasi
leira.
Contudo, o termo foi ressignificado pelo Movimento Negro que, em várias situações, o
utiliza com um sentido político e de valorização do legado deixado pelos africanos. É
importante, também, explicar que o emprego do termo étnico, na expressão étnico-racial, serve
para marcar que essas relações tensas devidas a diferenças na cor da pele e traços fisionômicos o
são também devido à raiz cultural plantada na ancestralidade africana, que difere em visão de
mundo, valores e princípios das de origem indíge
na, européia e asiática.
Convivem, no Brasil, de maneira tensa, a cultura e o padrão estético negro e africano e
um padrão estético e cultural branco europeu. Porém, a presença da cultura negra e o fato de
45% da população brasileira ser composta de negros (de acordo com o censo do IBGE) não têm
sido suficientes para eliminar ideologias, desigualdades e estereótipos racistas. Ainda persiste
em nosso país um imaginário étnico-racial que privilegia a brancura e valoriza principalmente
161
as raízes européias da sua cultura, ignorando ou pouco valorizando as outras, que são a
indígena, a africana, a asiática.
Os diferentes grupos, em sua diversidade, que constituem o Movimento Negro brasileiro,
têm comprovado o quanto é dura a experiência dos negros de ter julgados negativamente seu
comportamento, idéias e intenções antes mesmo de abrirem a boca ou tomarem qualquer
iniciativa.
Têm, eles, insistido no quanto é alienante a experiência de fingir ser o que não é para ser
reconhecido, de quão dolorosa pode ser a experiência de deixar-se assimilar por uma visão de
mundo, que pretende impor-se como superior e por isso universal e que os obriga a negarem a
tradição do seu povo.
Se não é fácil ser descendente de seres humanos escravizados e forçados à condição de
objetos utilitários ou a semoventes, também é difícil descobrir-se descendente dos
escravizadores, temer, embora veladamente, revanche dos que, por cinco séculos, têm sido
desprezados e massacrados.
Para reeducar as relações étnico-raciais, no Brasil, é necessário fazer emergir as dores e
medos que têm sido gerados. É preciso entender que o sucesso de uns tem o preço da
marginalização e da desigualdade impostas a outros. E então decidir que sociedade queremos
construir daqui para frente.
Como bem salientou Frantz Fanon, os descendentes dos mercadores de escravos, dos
senhores de ontem, não têm, hoje, de assumir culpa pelas desumanidades provocadas por seus
antepassados. No entanto, têm eles a responsabilidade moral e política de combater o racismo,
as discriminações e juntamente com os que vêm sendo mantidos à margem, os negros, construir
relações raciais e sociais sadias, em que todos cresçam e se realizem enquanto seres humanos e
cidadãos. Não fossem por estas razões, eles a teriam de assumir, pelo fato de usufruírem
do
muito que o trabalho escravo possibilitou ao país.
Assim sendo, a educação das relações étnico-raciais impõe aprendizagens entre brancos e
negros, trocas de conhecimentos, quebra de desconfianças, projeto conjunto para construção de
uma sociedade justa,
igual, equânime.
Combater o racismo, trabalhar pelo fim da desigualdade social e racial, empreender
reeducação das relações étnico-raciais não são tarefas exclusivas da escola. As formas de
discriminação de qualquer natureza não têm o seu nascedouro na escola, porém o racismo, as
desigualdades e discriminações correntes na sociedade perpassam por ali. Para que as
instituições de ensino desempenhem a contento o papel de educar, é necessário que se
constituam em espaço democrático de produção e divulgação de conhecimentos e de posturas
que visam a uma sociedade justa. A escola tem papel preponderante para eliminação das
162
discriminações e para emancipação dos grupos discriminados, ao proporcionar acesso aos
conhecimentos científicos, a registros culturais diferenciados, à conquista de racionalidade que
rege as relações sociais e raciais, a conhecimentos avançados, indispensáveis para consolidação
e concerto das nações como espaços democráticos e igualitários.
Para obter êxito, a escola e seus professores não podem improvisar. Têm que desfazer
mentalidade racista e discriminadora secular, superando o etnocentrismo europeu, e
estruturando relações étnico-raciais e sociais, desalienando processos pedagógicos. Isto não
pode ficar reduzido a palavras e a raciocínios d
esvinculados da experiência de ser inferiorizados
vivida pelos negros, tampouco das baixas classificações que lhe são atribuídas nas escalas de
desigualdades sociais, econômicas, educativas e políticas.
Diálogo com estudiosos que analisam, criticam estas realidades e fazem propostas, bem
como com grupos do Movimento Negro, presentes nas diferentes regiões e estados, assim como
em inúmeras cidades, são imprescindíveis para que se vençam discrepâncias entre o que se sabe
e a realidade, se compreendam concepçõ
es e ações, uns dos outros, se elabore projeto comum de
combate ao racismo e a discriminações.
Temos, pois, pedagogias de combate ao racismo e a discriminações por criar. É claro que
há experiências de professores e de algumas escolas, ainda isoladas, que
muito vão ajudar.
Para empreender a construção dessas pedagogias, é fundamental que se desfaçam alguns
equívocos. Um deles diz respeito à preocupação de professores no sentido de designar ou não
seus alunos negros como negros ou como pretos, sem ofensas.
Em primeiro lugar, é importante esclarecer que ser negro no Brasil não se limita às
características físicas. Trata-se, também, de uma escolha política. Por isso, o é quem assim se
define. Em segundo lugar, cabe lembrar que preto é um dos quesitos utilizados pelo IBGE para
classificar, ao lado dos outros
branco, pardo, indígena
-
a cor da população brasileira.
Pesquisadores de diferentes áreas, inclusive da educação, para fins de seus estudos,
agregam dados relativos a pretos e pardos sob a categoria negros, já que ambos reúnem,
conforme alerta o Movimento Negro, aqueles que reconhecem sua ascendência africana.
É importante tomar conhecimento da complexidade que envolve o processo de construção
da identidade negra em nosso país. Processo esse, marcado por uma sociedade que, para
discriminar os negros, utiliza-se tanto da desvalorização da cultura de matriz africana como dos
aspectos físicos herdados pelos descendentes de africanos. Nesse processo complexo, é
possível, no Brasil, que algumas pessoas de tez clara e traços físicos europeus, em virtude de o
pai ou a mãe ser negro(a), se designarem negros; que outros, com traços físicos africanos, se
digam brancos. É preciso lembrar que o termo negro começou a ser usado pelos senhores para
designar pejorativamente os escravizados e este sentido negativo da palavra se estende até hoje.
163
Contudo, o Movimento Negro ressignificou esse termo dando-lhe um sentido político e
positivo. Lembremos os motes muito utilizados no final dos anos 1970 e no decorrer dos anos
1980, 1990: Negro é lindo! Negra, cor da raça brasileira! Negro que te quero negro! 100%
Negro! Não deixe sua cor passar em branco! Este último utilizado na campanha do censo de
1990.
Outro equívoco a enfrentar é a afirmação de que os negros se discriminam entre si e que
são racistas também. Esta constatação tem de ser analisada no quadro da ideologia do
branqueamento que divulga a idéia e o sentimento de que as pessoas brancas seriam mais
humanas, teriam inteligência superior e por isso teriam o direito de comandar e de dizer o que é
bom para todos. Cabe lembrar que no pós-abolição foram formuladas políticas que visavam ao
branqueamento da população pela eliminação simbólica e material da presença dos negros.
Nesse sentido, é possível que pessoas negras sejam influenciadas pela ideologia do
branqueamento e, assim, tendam a reproduzir o preconceito do qual são vítimas. O racismo
imprime marcas negativas na subjetividade dos negros e também na dos que os discriminam.
Mais um equívoco a superar é a crença de que a disc
ussão sobre a questão racial se limita
ao Movimento Negro e a estudiosos do tema e não à escola. A escola, enquanto instituição
social responsável por assegurar o direito da educação a todo e qualquer cidadão, deverá se
posicionar politicamente, como já vimos, contra toda e qualquer forma de discriminação. A luta
pela superação do racismo e da discriminação racial é, pois, tarefa de todo e qualquer educador,
independentemente do seu pertencimento étnico-racial, crença religiosa ou posição política. O
racism
o, segundo o Artigo da Constituição Brasileira, é crime inafiançável e isso se aplica a
todos os cidadãos e instituições, inclusive, à escola.
Outro equívoco a esclarecer é de que o racismo, o mito da democracia racial e a ideologia
do branqueamento atingem os negros. Enquanto processos estruturantes e constituintes da
formação histórica e social brasileira, estes estão arraigados no imaginário social e atingem
negros, brancos e outros grupos étnico-raciais. As formas, os níveis e os resultados desses
processos incidem de maneira diferente sobre os diversos sujeitos e interpõem diferentes
dificuldades nas suas trajetórias de vida escolar e social. Por isso, a construção de estratégias
educacionais que visem ao combate do racismo é uma tarefa de todos os educadores,
independentemente do seu pertencimento étnicoracial.
Pedagogias de combate ao racismo e a discriminações elaboradas com o objetivo de
educação das relações étnico/raciais positivas têm como objetivo fortalecer entre os negros e
despertar entre os brancos a consciência negra. Entre os negros, poderão oferecer
conhecimentos e segurança para orgulharem-se da sua origem africana; para os brancos,
poderão permitir que identifiquem as influências, a contribuição, a participação e a importância
164
da história e da cultura dos negros no seu jeito de ser, viver, de se relacionar com as outras
pessoas, notadamente as negras.
Também farão parte de um processo de reconhecimento, por parte do Estado, da
sociedade e da escola, da dívida social que têm em relação ao segmento negro da população,
possibilitando uma tomada de posição explícita contra o racismo e a discriminação racial e a
construção de ações afirmativas nos diferentes níveis de ensino da educação brasileira.
Tais pedagogias precisam estar atentas para que todos, negros e não negros, além de ter
acesso a conhecimentos básicos tidos como fundamentais para a vida integrada à sociedade,
exercício profissional competente, recebam formação que os capacite para forjar novas relações
étnico
-raciais. Para tanto, necessidade, como vimos, de professores qualificados para o
ensino das diferente áreas de conhecimentos e, além disso, sensíveis e capazes de direcionar
positivamente as relações entre pessoas de diferentes pertencimento étnico-racial, no sentido do
respeito e da correção de posturas, atitudes, palavras preconceituosas. Daí a necessidade de se
insistir e investir para que os professores, além de sólida formação na área específica de
atuação, recebam formação que os capacite não a compreender a importância das questões
relacionadas à diversidade étnicoracial, mas a lidar positivamente com elas e sobretudo criar
estratégias pedagógicas que possam auxiliar a reeducá
-
las.
Até aqui apresentaram-se orientações que justificam e fundamentam as determinações de
caráter normativo que seguem.
História e Cultura Afro
-
Brasileira e Africana
Determinações
A obrigatoriedade de inclusão de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana nos
currículos da Educação Básica trata-se de decisão política, com fortes r
epercussões
pedagógicas, inclusive na formação de professores. Com esta medida, reconhece-se que, além
de garantir vagas para negros nos bancos escolares, é preciso valorizar devidamente a história e
cultura de seu povo, buscando reparar danos, que se repetem cinco séculos, à sua identidade
e a seus direitos. A relevância do estudo de temas decorrentes da história e cultura afro-
brasileira e africana não se restringem à população negra, ao contrário, dizem respeito a todos os
brasileiros, uma vez que devem educar-se enquanto cidadãos atuantes no seio de uma sociedade
multicultural e pluriétnica, capazes de construir uma nação democrática.
É importante destacar que não se trata de mudar um foco etnocêntrico marcadamente de
raiz européia por um africano, ma
s de ampliar o foco dos currículos escolares para a diversidade
cultural, racial, social e econômica brasileira. Nesta perspectiva, cabe às escolas incluir no
contexto dos estudos e atividades, que proporciona diariamente, também as contribuições
histórico
-culturais dos povos indígenas e dos descendentes de asiáticos, além das de raiz
165
africana e européia. É preciso ter clareza que o Art. 26A acrescido à Lei 9394/1996 provoca
bem mais do que inclusão de novos conteúdos, exige que se repensem relações étnico-
raciais,
sociais, pedagógicas, procedimentos de ensino, condições oferecidas para aprendizagem,
objetivos tácitos e explícitos da educação oferecida pelas escolas.
A autonomia dos estabelecimentos de ensino para compor os projetos pedagógicos, no
cumprimen
to do exigido pelo Art. 26A da Lei 9394/1996, permite que se valham da
colaboração das comunidades a que a escola serve, do apoio direto ou indireto de estudiosos e
do Movimento Negro, com os quais estabelecerão canais de comunicação, encontrarão formas
pr
óprias de incluir nas vivências promovidas pela escola, inclusive em conteúdos de disciplinas,
as temáticas em questão.
Caberá, aos sistemas de ensino, às mantenedoras, à coordenação pedagógica dos
estabelecimentos de ensino e aos professores, com base neste parecer, estabelecer conteúdos de
ensino, unidades de estudos, projetos e programas, abrangendo os diferentes componentes
curriculares. Caberá, aos administradores dos sistemas de ensino e das mantenedoras prover as
escolas, seus professores e alunos d
e material bibliográfico e de outros materiais didáticos, além
de acompanhar os trabalhos desenvolvidos, a fim de evitar que questões tão complexas, muito
pouco tratadas, tanto na formação inicial como continuada de professores, sejam abordadas de
maneira
resumida, incompleta, com erros.
Em outras palavras, aos estabelecimentos de ensino está sendo atribuída responsabilidade
de acabar com o modo falso e reduzido de tratar a contribuição dos africanos escravizados e de
seus descendentes para a construção da nação brasileira; de fiscalizar para que, no seu
interior,os alunos negros deixem de sofrer os primeiros e continuados atos de racismo de que
são vítimas. Sem dúvidas, assumir estas responsabilidades implica compromisso com o entorno
sócio
-cultural da escola, da comunidade onde esta se encontra e a que serve, compromisso com
a formação de cidadãos atuantes e democráticos, capazes de compreender as relações sociais e
étnico
-raciais de que participam e ajudam a manter e/ou a reelaborar, capazes de decodificar
palavras, fatos e situações a partir de diferentes perspectivas, de desempenhar-se em áreas de
competências que lhes permitam continuar e aprofundar estudos em diferentes níveis de
formação.
Precisa, o Brasil, país multi
-
étnico e pluricultural, de organiz
ações escolares em que todos
se vejam incluídos, em que lhes seja garantido o direito de aprender e de ampliar
conhecimentos, sem ser obrigados a negar a si mesmos, ao grupo étnico/racial a que pertencem
e a adotar costumes, idéias e comportamentos que lhes são adversos. E estes, certamente, serão
indicadores da qualidade da educação que estará sendo oferecida pelos estabelecimentos de
ensino de diferentes níveis.
166
Para conduzir suas ações, os sistemas de ensino, os estabelecimentos e os professores
terão como referência, entre outros pertinentes às bases filosóficas e pedagógicas que assumem,
os princípios a seguir explicitados.
Consciência política e histórica da diversidade
Este princípio deve conduzir:
-
à igualdade básica de pessoa humana como sujeito
de direitos;
- à compreensão de que a sociedade é formada por pessoas que pertencem a grupos
étnico
-raciais distintos, que possuem cultura e história próprias, igualmente valiosas e que em
conjunto constroem, na nação brasileira, sua história;
- ao conhecimento e à valorização da história dos povos africanos e da cultura
afrobrasileira na construção histórica e cultural brasileira;
- à superação da indiferença, injustiça e desqualificação com que os negros, os povos
indígenas e também as classes populares às quais os negros, no geral, pertencem, são
comumente tratados;
- à desconstrução, por meio de questionamentos e análises críticas, objetivando eliminar
conceitos, idéias, comportamentos veiculados pela ideologia do branqueamento, pelo mito da
democracia r
acial, que tanto mal fazem a negros e brancos;
- à busca, da parte de pessoas, em particular de professores não familiarizados com a
análise das relações étnico-raciais e sociais com o estudo de história e cultura afro- brasileira e
africana, de informações e subsídios que lhes permitam formular concepções não baseadas em
preconceitos e construir ações respeitosas;
- ao diálogo, via fundamental para entendimento entre diferentes, com a finalidade de
negociações, tendo em vista objetivos comuns; visando a um
a sociedade justa.
Fortalecimento de identidades e de direitos
O princípio deve orientar para:
-
o desencadeamento de processo de afirmação de identidades, de historicidade negada ou
distorcida;
- o rompimento com imagens negativas forjadas por diferentes meios de comunicação,
contra os negros e os povos indígenas;
-
o esclarecimentos a respeito de equívocos quanto a uma identidade humana universal;
-
o combate à privação e violação de direitos;
167
- a ampliação do acesso a informações sobre a diversidade da nação brasileira e sobre a
recriação das identidades, provocada por relações étnico
-
raciais.
- as excelentes condições de formação e de instrução que precisam ser oferecidas, nos
diferentes níveis e modalidades de ensino, em todos os estabelecimentos, inclusive os
localizados nas chamadas periferias urbanas e nas zonas rurais.
Ações educativas de combate ao racismo e a discriminações
O princípio encaminha para:
- a conexão dos objetivos, estratégias de ensino e atividades com a experiência de vida
dos alunos e professores, valorizando aprendizagens vinculadas às suas relações com pessoas
negras, brancas, mestiças, assim como as vinculadas às relações entre negros, indígenas e
brancos no conjunto da sociedade;
- a crítica pelos coordenadores pedagógicos, orientadores educacionais, professores, das
representações dos negros e de outras minorias nos textos, materiais didáticos, bem como
providências para corrigi
-
las;
- condições para professores e alunos pensarem, decidirem, agirem, assumindo
responsabilidade
por relações étnico-raciais positivas, enfrentando e superando discordâncias,
conflitos, contestações, valorizando os contrastes das diferenças;
- valorização da oralidade, da corporeidade e da arte, por exemplo, como a dança, marcas
da cultura de raiz af
ricana, ao lado da escrita e da leitura;
- educação patrimonial, aprendizado a partir do patrimônio cultural afro-
brasileiro,
visando a preservá
-
lo e a difundi
-
lo;
- o cuidado para que se um sentido construtivo à participação dos diferentes grupos
socia
is, étnico-raciais na construção da nação brasileira, aos elos culturais e históricos entre
diferentes grupos étnico
-
raciais, às alianças sociais;
- participação de grupos do Movimento Negro, e de grupos culturais negros, bem como
da comunidade em que se insere a escola, sob a coordenação dos professores, na elaboração de
projetos político
-
pedagógicos que contemplem a diversidade étnico
-
racial.
Estes princípios e seus desdobramentos mostram exigências de mudança de mentalidade,
de maneiras de pensar e agir
dos indivíduos em particular, assim como das instituições e de suas
tradições culturais. É neste sentido que se fazem as seguintes determinações:
- O ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, evitando-se distorções,
envolverá articulação entre passado, presente e futuro no âmbito de experiências, construções e
pensamentos produzidos em diferentes circunstâncias e realidades do povo negro. É meio
168
privilegiado para a educação das relações étnico-raciais e tem por objetivos o reconhecimento e
va
lorização da identidade, história e cultura dos afro-brasileiros, garantia de seus direitos de
cidadãos, reconhecimento e igual valorização das raízes africanas da nação brasileira, ao lado
das indígenas, européias, asiáticas.
- O ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana se fará por diferentes meios,
em atividades curriculares ou não, em que: - se explicite, busque compreender e interpretar, na
perspectiva de quem o formule, diferentes formas de expressão e de organização de raciocínios
e pensamentos de raiz da cultura africana; - promovam-se oportunidades de diálogo em que se
conheçam, se ponham em comunicação diferentes sistemas simbólicos e estruturas conceituais,
bem como se busquem formas de convivência respeitosa, além da construção de projeto de
sociedade em que todos se sintam encorajados a expor, defender sua especificidade étnico
-
racial
e a buscar garantias para que todos o façam; - sejam incentivadas atividades em que pessoas
estudantes, professores, servidores, integrantes da comunidade externa aos estabelecimentos de
ensino
– de diferentes culturas interatuem e se interpretem reciprocamente, respeitando os
valores, visões de mundo, raciocínios e pensamentos de cada um.
- O ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, a educação das relações
étnicoraciais, tal como explicita o presente parecer, se desenvolverão no cotidiano das escolas,
nos diferentes níveis e modalidades de ensino, como conteúdo de disciplinas, 2 particularmente,
Educação Artística, Literatura e História do Brasil, sem prejuízo das demais3, em atividades
curriculares ou não, trabalhos em salas de aula, nos laboratórios de ciências e de informática, na
utilização de sala de leitura, biblioteca, brinquedoteca, áreas de recreação, quadra de esportes e
outro
s ambientes escolares.
- O ensino de História Afro-
Brasileira
abrangerá, entre outros conteúdos, iniciativas e
organizações negras, incluindo a história dos quilombos, a começar pelo de Palmares, e de
remanescentes de quilombos, que têm contribuído para o desenvolvimento de comunidades,
bairros, localidades, municípios, regiões (Exemplos: associações negras recreativas, culturais,
educativas, artísticas, de assistência, de pesquisa, irmandades religiosas, grupos do Movimento
Negro). Será dado destaque a aco
ntecimentos e realizações próprios de cada região e localidade
.
- Datas significativas para cada região e localidade serão devidamente assinaladas. O 13
de maio, Dia Nacional de Luta contra o Racismo, será tratado como o dia de denúncia das
repercussões das políticas de eliminação física e simbólica da população afro-brasileira no
pósabolição, e de divulgação dos significados da Lei áurea para os negros. No 20 de novembro
será celebrado o Dia Nacional da Consciência Negra, entendendo-se consciência negra no
s
termos 2 § 2°, Art. 26A, Lei 9394/1996: Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-
169
Brasileira serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de
Educação Artística e de Literatura e História Brasileiras.
Entre outras datas de significado histórico e político deverá ser assinalado o 21 de março,
Dia Internacional de Luta pela Eliminação da Discriminação Racial.
- Em História da África, tratada em perspectiva positiva, não de denúncia da miséria e
discriminações que atingem o continente, nos tópicos pertinentes se fará articuladamente com a
história dos afrodescendentes no Brasil e serão abordados temas relativos: - ao papel dos
anciãos e dos griots como guardiãos da memória histórica; - à história da ancestralidade e
religiosidade africana; - aos núbios e aos egípcios, como civilizações que contribuíram
decisivamente para o desenvolvimento da humanidade;
-
às civilizações e organizações políticas
pré
-coloniais, como os reinos do Mali, do Congo e do Zimbabwe; - ao tráfico e à escravidão do
ponto de vista dos escravizados; - ao papel dos europeus, dos asiáticos e também de africanos
no tráfico; - à ocupação colonial na perspectiva dos africanos; - às lutas pela independência
política dos países africanos; - às ações em prol da união africana em nossos dias, bem como o
papel da União Africana, para tanto; - às relações entre as culturas e as histórias dos povos do
continente africano e os da diáspora; - à formação compulsória da diáspora, vida e existência
cultural e histó
rica dos africanos e seus descendentes fora da África;
-
à diversidade da diáspora,
hoje, nas Américas, Caribe, Europa, Ásia; - aos acordos políticos, econômicos, educacionais e
culturais entre África, Brasil e outros países da diáspora.
- O ensino de Cultura Afro-Brasileira destacará o jeito próprio de ser, viver e pensar
manifestado tanto no dia a dia, quanto em celebrações como congadas, moçambiques, ensaios,
maracatus, rodas de samba, entre outras.
- O ensino de Cultura Africana abrangerá: - as contribuições do Egito para a ciência e
filosofia ocidentais; - as universidades africanas Tambkotu, Gao, Djene que floresciam no
século XVI;
- as tecnologias de agricultura, de beneficiamento de cultivos, de mineração e de
edificações trazidas pelos escravizados, bem como a produção científica, artística (artes
plásticas, literatura, música, dança, teatro) política, na atualidade .
- O ensino de História e de Cultura Afro-Brasileira, far-
se
por diferentes meios,
inclusive, a realização de projetos de diferentes naturezas, no decorrer do ano letivo, com vistas
à divulgação e estudo da participação dos africanos e de seus descendentes em episódios da
história do Brasil, na construção econômica, social e cultural da nação, destacando-se a atuação
de negros em diferentes áreas do conhecimento, de atuação profissional, de criação tecnológica
e artística, de luta social (tais como:Zumbi, Luiza Nahim, Aleijadinho, Padre Maurício, Luiz
Gama, Cruz e Souza, João Cândido, André Rebouças, Teodoro Sampaio, José Correia Leite,
170
Solano Trindade, Antonieta de Barros, Edison Carneiro, Lélia Gonzáles, Beatriz Nascimento,
Milton Santos, Guerreiro Ramos, Clóvis Moura, Abdias do Nascimento, Henrique Antunes
Cunha, Tereza Santos, Emmanuel Araújo, Cuti, Alzira Rufino, Inaicyra Falcão dos
Santos, entre
outros).
- O ensino de História e Cultura Africana se fará por diferentes meios, inclusive a
realização de projetos de diferente natureza, no decorrer do ano letivo, com vistas à divulgação
e estudo da participação dos africanos e de seus descendentes na diáspora, em episódios da
história mundial, na construção econômica, social e cultural das nações do continente africano e
da diáspora, destacando
-
se a atuação de negros em diferentes áreas do conhecimento, de atuação
profissional, de criação tecnológica e artística, de luta social (entre outros: rainha Nzinga,
Toussaint
-Louverture, Martin Luther King, Malcon X, Marcus Garvey, Aimé Cesaire, Léopold
Senghor, Mariama Bâ, Amílcar Cabral, Cheik Anta Diop, Steve Biko, Nelson Mandela,
Aminata Traoré
, Christiane Taubira).
Para tanto, os sistemas de ensino e os estabelecimentos de Educação Básica, nos níveis de
Educação Infantil, Educação Fundamental, Educação Média, Educação de Jovens e Adultos,
Educação Superior, precisarão providenciar:
- Registro da história não contada dos negros brasileiros, tais como em remanescentes de
quilombos, comunidades e territórios negros urbanos e rurais.
- Apoio sistemático aos professores para elaboração de planos, projetos, seleção de
conteúdos e métodos de ensino, cujo foco seja História e Cultura Afro-Brasileira e Africana e a
Educação das Relações Étnico
-
Raciais.
-
Mapeamento e divulgação de experiências pedagógicas de escolas, estabelecimentos de
- Inclusão, nos instrumentos de avaliação das condições de funcionamento de ensino
superior, secretarias de educação, assim como levantamento das principais dúvidas e
dificuldades dos professores em relação ao trabalho com a questão racial na escola e
encaminhamento de medidas para resolvê-las, feitos pela administração dos sistemas de ensino
e por Núcleos de Estudos Afro
-Brasileiros.
- Articulação entre os sistemas de ensino, estabelecimentos de ensino superior, centros de
pesquisa, Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros, escolas, comunidade e movimentos sociais,
visando à fo
rmação de professores para a diversidade étnico/racial.
- Instalação, nos diferentes sistemas de ensino, de grupo de trabalho para discutir e
coordenar planejamento e execução da formação de professores para atender ao disposto neste
parecer quanto à Educação das Relações Étnico-Raciais e ao determinado nos Art. 26 e 26A da
Lei 9394/1996, com o apoio do Sistema Nacional de Formação Continuada e Certificação de
Professores do MEC.
171
- Introdução, nos cursos de formação de professores e de outros profissionais
da
educação, de análises das relações sociais e raciais no Brasil; de conceitos e de suas bases
teóricas, tais como racismo, discriminações, intolerância, preconceito, estereótipo, raça, etnia,
cultura, classe social, diversidade, diferença, multiculturalismo; de práticas pedagógicas, de
materiais e de textos didáticos, na perspectiva da reeducação das relações étnico-raciais e do
ensino e aprendizagem da História e cultura dos Afro
-
brasileiros e dos Africanos.
- Inclusão de discussão da questão racial como parte integrante da matriz curricular, tanto
dos cursos de licenciatura para Educação Infantil, os anos iniciais e finais da Educação
Fundamental, Educação Média, Educação de Jovens e Adultos, como de processos de formação
continuada de professores, inclu
sive de docentes no ensino superior.
- Inclusão, respeitada a autonomia dos estabelecimentos do Ensino Superior, nos
conteúdos de disciplinas e em atividades curriculares dos cursos que ministra, de Educação das
Relações Étnico-Raciais, de conhecimentos de matriz africana e/ou que dizem respeito à
população negra. Por exemplo: em Medicina, entre outras questões, estudo da anemia
falciforme, da problemática da pressão alta; em Matemática, contribuições de raiz africana,
identificadas e descritas pela Etno-
Ma
temática; em Filosofia, estudo da filosofia tradicional
africana e de contribuições de filósofos africanos e afrodescendentes da atualidade.
- Inclusão de bibliografia relativa à história e cultura afro-brasileira e africana às relações
étnico
-raciais, aos problemas desencadeados pelo racismo e por outras discriminações, à
pedagogia anti
-
racista nos programas de concursos públicos para admissão de professores.
- Inclusão, em documentos normativos e de planejamento dos estabelecimentos de ensino
de todos os
níveis
- estatutos, regimentos, planos pedagógicos, planos de ensino - de objetivos
explícitos, assim como de procedimentos para sua consecução, visando ao combate do racismo,
a discriminações, ao reconhecimento, valorização e respeito das histórias e culturas afro-
brasileira e africana.
- Previsão, nos fins, responsabilidades e tarefas dos conselhos escolares e de outros órgão
colegiados, do exame e encaminhamento de solução para situações de racismo e de
discriminações, buscando-se criar situações educativas em que as vítimas recebam apoio
requerido para superar o sofrimento e os agressores, orientação para que compreendam a
dimensão do que praticaram e ambos, educação para o reconhecimento, valorização e respeito
mútuos.
- Inclusão de personagens negros, assim como de outros grupos étnico-raciais, em
cartazes e outras ilustrações sobre qualquer tema abordado na escola, a não ser quando tratar de
manifestações culturais próprias de um determinado grupo étnico
-
racial.
172
- Organização de centros de documentação, bibliotecas, midiotecas, museus, exposições
em que se divulguem valores, pensamentos, jeitos de ser e viver dos diferentes grupos étnico-
raciais brasileiros, particularmente dos afrodescendentes.
- Identificação, com o apoio dos Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros, de fontes de
conhecimentos de origem africana, a fim de selecionarem-se conteúdos e procedimentos de
ensino e de aprendizagens.
- Incentivo, pelos sistemas de ensino, a pesquisas sobre processos educativos orientados
por valores, visões de mundo, conhecimentos afro-brasileiros e indígenas, com o objetivo de
ampliação e fortalecimento de bases teóricas para a educação brasileira.
- Identificação, coleta, compilação de informações sobre a população negra, com vistas à
formulação de políticas públi
cas de Estado, comunitárias e institucionais.
- Edição de livros e de materiais didáticos, para diferentes níveis e modalidades de
ensino, que atendam ao disposto neste parecer, em cumprimento ao disposto no Art. 26A da
LDB, e para tanto abordem a pluralidade cultural e a diversidade étnico-racial da nação
brasileira, corrijam distorções e equívocos em obras publicadas sobre a história, a cultura, a
identidade dos afrodescendentes, sob o incentivo e supervisão dos programas de difusão de
livros educacionais do MEC - Programa Nacional do Livro Didático e Programa Nacional de
Bibliotecas Escolares (PNBE).
- Divulgação, pelos sistemas de ensino e mantenedoras, com o apoio dos Núcleos de
Estudos Afro-Brasileiros, de uma bibliografia afro-brasileira e de outros materiais como mapas
da diáspora, da África, de quilombos brasileiros, fotografias de territórios negros urbanos e
rurais, reprodução de obras de arte afro-brasileira e africana a serem distribuídos nas escolas da
rede, com vistas à formação de professores e alunos para o combate à discriminação e ao
racismo.
- Oferta de Educação Fundamental em áreas de remanescentes de quilombos, contando as
escolas com professores e pessoal administrativo que se disponham a conhecer física e
culturalmente a comunidade e
a formar
-
se para trabalhar com suas especificidades.
- Garantia, pelos sistemas de ensino e entidades mantenedoras, de condições humanas,
materiais e financeiras para execução de projetos com o objetivo de Educação das Relações
Étnicoraciais e estudo de H
istória e Cultura Afro
-
Brasileira e Africana, assim como organização
de serviços e atividades que controlem, avaliem e redimensionem sua consecução, que exerçam
fiscalização das políticas adotadas e providenciem correção de distorções
.
- Realização, pelos sistemas de ensino federal, estadual e municipal, de atividades
periódicas, com a participação das redes das escolas públicas e privadas, de exposição,
avaliação e divulgação dos êxitos e dificuldades do ensino e aprendizagem de História e Cultura
173
Afro
-
Bra
sileira e Africana e da Educação das Relações Étnico-Raciais; assim como
comunicação detalhada dos resultados obtidos ao Ministério da Educação, à Secretaria Especial
de Promoção da Igualdade Racial, ao Conselho Nacional de Educação, e aos respectivos
cons
elhos Estaduais e Municipais de Educação, para que encaminhem providências, quando for
o caso.Estabelecimentos de ensino de todos os níveis, nos aspectos relativos ao currículo,
atendimento aos alunos, de quesitos que avaliem a implantação e execução do es
tabelecido
neste parecer.
- Disponibilização deste parecer, na sua íntegra, para os professores de todos os níveis de
ensino, responsáveis pelo ensino de diferentes disciplinas e atividades educacionais, assim como
para outros profissionais interessados a fim de que possam estudar, interpretar as orientações,
enriquecer, executar as determinações aqui feitas e avaliar seu próprio trabalho e resultados
obtidos por seus alunos, considerando princípios e critérios apontados.
Obrigatoriedade do Ensino de Histór
ia e Cultura Afro
-
Brasileiras, Educação das Relações
Étnico
-
Raciais e os Conselhos de Educação.
Diretrizes são dimensões normativas, reguladoras de caminhos, embora não fechadas a
que historicamente possam, a partir das determinações iniciais, tomar novos rumos. Diretrizes
não visam a desencadear ações uniformes, todavia, objetivam oferecer referências e critérios
para que se implantem ações, as avaliem e reformulem no que e quando necessário.
Estas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e
para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, na medida em que procedem de
ditames constitucionais e de marcos legais nacionais, na medida em que se referem ao resgate
de uma comunidade que povoou e construiu a nação brasileira, atingem o âmago do pacto
federativo. Nessa medida, cabe aos conselhos de Educação dos Estados, do Distrito Federal e
dos Municípios aclimatar tais diretrizes, dentro do regime de colaboração e da autonomia de
entes federativos, a seus respectivos sistemas, dando ênfase à importância de os planejamentos
valorizarem, sem omitir outras regiões, a participação dos afrodescendentes, do período
escravista aos nossos dias, na sociedade, economia, política, cultura da região e da localidade;
definindo
medidas urgentes para formação de professores; incentivando o desenvolvimento de
pesquisas bem como envolvimento comunitário.
A esses órgãos normativos cabe, pois, a tarefa de adequar o proposto neste parecer à
realidade de cada sistema de ensino. E, a partir daí, deverá ser competência dos órgãos
executores
- administrações de cada sistema de ensino, das escolas - definir estratégias que,
quando postas em ação, viabilizarão o cumprimento efetivo da Lei de Diretrizes e Bases que
estabelece a formação básica comum, o respeito aos valores culturais, como princípios
constitucionais da educação tanto quanto da dignidade da pessoa humana (inciso III do art. 1),
174
garantindo
-
se a promoção do bem de todos, sem preconceitos (inciso IV do Art. 3) a prevalência
dos dire
itos humanos (inciso II do art. 4) e repúdio ao racismo (inciso VIII do art. 4).
Cumprir a Lei é, pois, responsabilidade de todos e não apenas do professor em sala de
aula. Exige-se, assim, um comprometimento solidário dos vários elos do sistema de ensino
brasileiro, tendo-se como ponto de partida o presente parecer, que junto com outras diretrizes e
pareceres e resoluções, têm o papel articulador e coordenador da organização da educação
nacional.
(...)
Brasília
-
DF, 10 de março de 2004.
Conselheira Petroni
lha Beatriz Gonçalves e Silva
Relatora
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