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“Análise da Tendência Temporal da Razão de Sexos ao Nascimento no
Brasil”
por
Gerusa Belo Gibson dos Santos
Dissertação apresentada com vistas à obtenção do título de Mestre em
Ciências na área de Saúde Pública e Meio Ambiente.
Orientador: Prof. Dr. Sérgio Koifman
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2
Rio de Janeiro, janeiro de 2008.
Esta dissertação, intitulada
“Análise da Tendência Temporal da Razão de Sexos ao Nascimento no
Brasil”
apresentada por
Gerusa Belo Gibson dos Santos
foi avaliada pela Banca Examinadora composta pelos seguintes membros:
Prof. Dr. Marcelo Gerardin Poirot Land
Prof.ª Dr.ª Silvana Granado Nogueira da Costa
Prof. Dr. Sérgio Koifman – Orientador
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Dissertação defendida e aprovada em 16 de janeiro de 2008.
Ministério da Saúde
Fundação Oswaldo Cruz
Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca
"ANÁLISE DA TENDÊNCIA TEMPORAL DA RAZÃO DE
SEXOS AO NASCIMENTO NO BRASIL"
por
Gerusa Gibson
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Saúde blica e
Meio Ambiente da Escola Nacional de Saúde Pública, com vistas à obtenção do
título de Mestre em Ciências na área de Saúde Pública e Meio ambiente.
Orientador: Prof. Dr. Sérgio Koifman
Rio de Janeiro, Janeiro de 2008.
4
Aos meus queridos
pais, José Gibson e Jucirema
5
AGRADECIMENTOS
Ao meu orientador Dr. Sérgio Koifman, por compartilhar o desenvolvimento e
realização das idéias aqui contidas;
À professora Dra. Gina Torres, pela valiosa colaboração no esclarecimento de idéias e
pelos úteis e gentis empréstimos bibliográficos;
Ao professor Dr. Aldo Pacheco, pelos gestos de incentivo e apoio e, principalmente,
pela gentileza sempre dispensada;
Aos meus pais José Gibson e Maria Jucirema (Juju), por me terem educado e,
sobretudo, pelo amor incondicional;
Ao meu "namorido" e amigo Alexandre, por suas infinitas qualidades, incentivo e
principalmente, por me fazer muito feliz;
À minha querida irmã Elke pela força, amizade e incentivo todos esses anos;
Aos meus queridos irmãos Fábio, Casca e César que mesmo distante sempre torceram
por mim;
À minha querida sobrinha Isabelle e minha filha de quatro patas Mina, pelo carinho,
amizade e por trazerem alegria ao nosso lar;
À minha pequena e recém chegada sobrinha Laíssa, novo xodó da família;
● Às minhas cunhadas queridas Eliana e Claúdia pelo apoio e torcida;
Aos meus amigões Thiago Miniero, Renato Mangolin, Thiago Sancho, Pedro Cesar,
Sâmia e Giandro pelos momentos felizes e descontraídos que serão eternamente
lembrados;
Aos meus sogros e amigos Maria Francisca e Eduardo Siqueira pelo carinho e gentileza
com que sempre me recebem;
Aos meus colegas de turma Rita de Cássia, Taliha, Lavínia, Claúdia, Benny, Miguel,
Denise, Ruy e Cássia, pelos agradáveis momentos compartilhados dentro e fora das salas
de aula.
6
"Trabalhe como se não precisasse de dinheiro, ame como se nunca tivesse sido ferido,
dance como se ninguém estivesse olhando e viva como se o céu fosse na terra!"
Autor desconhecido
7
"Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia
qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à
coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo
para as presentes e futuras gerações"
8
Artigo 225 da Constituição Brasileira
"O desenvolvimento técnico deixará apenas um único problema
por resolver: a debilidade da natureza humana"
9
Karl Kraus
RESUMO
"Análise da Tendência Temporal da Razão de Sexos ao Nascimento no Brasil"
Gerusa Gibson
Orientador: Dr. Sérgio Koifman
Resumo da dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Saúde Pública
e Meio Ambiente da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca ENSP/FIOCRUZ, como
parte dos requisitos necessários a obtenção do título de Mestre em Saúde Pública e Meio
Ambiente
.
A razão de sexos ao nascimento, referida no presente trabalho pela proporção de nascidos
vivos do sexo masculino em relação ao total de nascidos vivos em uma determinada população, é
normalmente determinada por fatores de diferentes naturezas, a exemplo de fatores demográficos
e genéticos. No entanto, dados da literatura mostram que alguns poluentes químicos ambientais, a
exemplo de resíduos industriais e alguns agrotóxicos oriundos da atividade agrícola, são capazes
de provocar alterações no sistema endócrino, resultando em distúrbios na saúde reprodutiva e,
consequentemente, alterando a estabilidade da razão de sexos ao nascimento.
Com isso, a razão
de sexos ao nascimento vem sendo apontada por muitos autores como indicador sentinela da
exposição ambiental a esses poluentes, apresentando tendência de declínio frente à exposição a
tais substâncias. Objetivo: Caracterizar e analisar a tendência temporal da proporção de
nascimentos masculinos no Brasil, segundo grandes regiões, estados e capitais assim como,
verificar a natureza da correlação existente entre a tendência observada em municípios
paranaenses e o alto consumo de agrotóxicos pelos mesmos. Metodologia: Foram utilizados
modelos de regressão polinomial para a análise das tendências temporais da proporção de
nascidos vivos do sexo masculino. Foi realizada ainda uma correlação entre a tendência
observada para os municípios paranaenses e o consumo de agrotóxicos pelos mesmos.
Resultados: Foram observadas tendências crescentes significativas na proporção de nascidos
vivos do sexo masculino para alguns estados e capitais brasileiros, além de um único caso de
tendência decrescente com significância estatística. Em relação ao Brasil, foi observada tendência
de declínio no período entre 1979 e 1994, padrão este semelhante ao que foi relatado em outros
países do mundo neste mesmo período. Foi observado ainda um acentuado declínio para alguns
municípios paranaenses (não significativo) com intensa atividade agrícola, sugerindo a
interferência de uma possível exposição a desreguladores endócrinos oriundos da contaminação
ambiental por agrotóxicos nestas localidades.
10
Palavras- chave: Razão de Sexos ao Nascimento, Desreguladores Endócrinos, Agrotóxicos.
11
ABSTRACT
"Analysis of Time Trend of Sex Ratio in Brazil"
Gerusa Gibson
Orientador: Dr. Sérgio Koifman
Abstract da dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Saúde Pública
e Meio Ambiente da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca ENSP/FIOCRUZ, como
parte dos requisitos necessários a obtenção do título de Mestre em Saúde Pública e Meio
Ambiente.
The sex ratio at birth, express in this present work as proportion of male birth in a
specific year and defined population, is a result of the interaction between different kind of
natural factors like genetic and demographics factors. However, several studies have shown that
environmental chemical pollutants such as pesticides used in agricultural activities and
contaminants from industrial production can lead to several disturbances in the endocrine system
(endocrine disrupters), which may cause reproductive disorders, affecting the sex ratio at birth.
Therefore, the sex ratio at birth has been suggested as a sentinel environmental health indicator,
which can dramatically decrease in the presence of such chemical pollutants. Several European
and American countries have been report declining trends in male proportion at birth. The same
phenomenon has been demonstrated in accidental and occupational episodes to endocrine
disrupters. Objective: Considering these aspects, the current work aims to present the results of
the analysis of time trend of sex ratio at birth in Brazil, in order to examine the possible declining
trend like those reported in other countries. Therefore, it was investigated the correlation between
the. Methodology: It was used polynomial regress models in order to analyze the time trend of
male proportion births as well as the bivariate correlation technique in order to evaluate the
correlation between the observed trend of male proportion births and the higher consume of
pesticide in some counties of Parana state. Results: According to our results, it was observed an
increased trend for most states and capitals. In terms of Brazil, it was observed a declining trend
between 1979 and 1994. Theses findings confirm the results observed in other countries of the
world. However, it was observed a slight decrease in the polynomial trend of sex ratio at birth on
the Parana, which was more evident when analyzing selected counties with intensive agricultural
activity, which suggests high levels of environmental contaminants in these areas.
Key words: Sex Ratio at Birth; Endocrine Disrupters; Pesticides.
12
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO _______________________________________________________ 01
Razão de Sexos ao Nascimento .................................................................................... 01
O Papel dos Desreguladores Endócrinos .................................................................... 04
A Participação dos Agrotóxicos ................................................................................... 08
OBJETIVO GERAL___________________________________________________ 11
Objetivos Específicos ..................................................................................................... 11
ASPECTOS ÉTICOS _________________________________________________ 12
ARTIGO I ___________________________________________________________ 13
ARTIGO II __________________________________________________________ 14
CONCLUSÃO _______________________________________________________ 15
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ____________________________________ 18
13
1. INTRODUÇÃO
1.1 Razão de Sexos ao Nascimento
A razão de sexos ao nascimento é uma medida padrão utilizada para avaliar a relação quantitativa
entre os sexos ao nascimento, através da divisão do número de nascidos vivos do sexo masculino pelo
número de nascidos vivos do sexo feminino em determinado ano e espaço geográfico. Tal medida pode ser
ainda expressa pela proporção de nascimentos masculinos em relação ao total de nascidos vivos, padrão
este adotado no presente trabalho. Os valores usuais descritos na literatura giram em torno de 1.06, ou seja,
106 nascimentos masculinos para cada 100 nascimentos femininos ou, e termos de proporção de
nascimentos masculinos, o correspondente a 51,5%
1, 12, 50
.
O excesso de nascimentos masculinos observado em populações humanas é um processo natural,
decorrente da evolução de mecanismos adaptativos da natureza, numa forma de compensar a alta
expectativa de vida entre as mulheres e maior mortalidade entre homens
2, 3
. Sendo assim, os fatores
atuantes na determinação da proporção de nascimentos entre homens e mulheres assumem diferentes
naturezas, a exemplo dos fatores genéticos, da exposição ambiental a poluentes químicos, bem como
fatores no âmbito demográfico e social
2, 4, 49
.
Segundo a literatura, os fatores que determinam a razão de sexos são classificados em dois tipos:
os fatores primários, isto é, aqueles que determinam o sexo da criança no momento da concepção; e aqueles
que, uma vez definido o sexo da criança, influenciam a sobrevivência do embrião no útero materno,
determinando a razão de sexos no momento do nascimento, os chamados fatores secundários
5
. Assim, a
razão de sexos definida por fatores secundários está intimamente ligada à incidência de natimortos que, ao
ocorrer de forma diferenciada nos sexos, pode refletir uma maior vulnerabilidade neonatal em um dos
gêneros e, consequentemente, afetando o equilíbrio da proporção de sexos entre os nascidos vivos
6
.
A razão de sexos ao nascimento pode variar também de acordo com especificidades de cada
população de estudo, através da atuação de fatores de natureza sócio-demográfica. Como exemplo,
podemos citar a considerável diferença existente na proporção de nascidos vivos do sexo masculino quando
comparamos populações de diferentes grupos étnicos, nos quais frequentemente se observa maior valor
entre asiáticos, isto é, maior proporção de nascimentos masculinos, enquanto que entre negros a proporção
14
de nascidos vivos do sexo masculino é reduzida
4
. Por outro lado, quando se trata de uma mesma população,
com características étnicas semelhantes, essa variação parece ocorrer em menor magnitude, na qual fatores
naturais como paridade materna (Poisson association), idade dos pais, ordem de nascimento de uma
criança dentro de uma mesma família (Markov association), além da predisposição de alguns indivíduos ou
casais a terem predominantemente crianças de um sexo em particular (Lexis association), parecem ter
maior relevância na associação
4
.
A associação de Markov é explicada pela hipótese da existência de uma dependência entre a
criança nascida anteriormente e a criança que é gerada posteriormente dentro de uma mesma família. Nesta
hipótese, o sexo da criança antecessora influencia a probabilidade de sobrevivência no útero da criança que
está sendo gerada
4,7
. Tem sido demonstrado ainda que crianças nascidas de gestações múltiplas tendem a
apresentar razão de sexos reduzida (proporção de nascidos vivos do sexo masculino menor), quando
comparadas a crianças nascidas de gestações não-múltiplas
4
. Alguns autores mencionam ainda o tempo da
concepção, no qual zigotos fertilizados no início e no final do período fértil feminino tendem a ser
predominantemente do sexo masculino, enquanto aqueles concebidos no meio do período fértil tendem a
ser predominantemente do sexo feminino
8, 9
.
A concentração hormonal dos pais no momento da concepção é também considerada fator de
extrema importância, uma vez que está intimamente relacionada à definição do sexo do embrião a ser
desenvolvido. A partir desta concepção, conclui-se que a relação entre os sexos no momento do nascimento
possui relação de dependência com o sistema endócrino, que por sua vez, deve ter sua integridade
preservada nos genitores de uma determinada população em estudo
5, 10, 11
. Neste sentido, dados da
literatura constataram que altas concentrações de gonadotrofina e progesterona aumentam a probabilidade
de nascimento de uma criança do sexo feminino, o que implica numa razão de sexos reduzida, enquanto
que altas concentrações de estrogênio e testosterona implicam numa maior probabilidade de nascimento de
uma criança do sexo masculino
5,10
. A partir destas evidências, a explicação biológica para o declínio da
razão de sexos ao nascimento com o aumento da idade materna foi sugerida baseada no fato de que a
concentração de gonadotrofina tende a aumentar com a idade nas mulheres
8
.
No contexto mundial, a razão de sexos ao nascimento vem apresentando tendência de declínio em
diferentes países nas últimas décadas, motivo pelo qual vem despertando crescente interesse na
comunidade acadêmica
12, 13, 14
. O fenômeno é observado, sobretudo, em países que se industrializaram nos
períodos que sucederam as duas grandes Guerras Mundiais, momento que coincidiu também com a
introdução de novos pesticidas e drogas hormonais nas sociedades
15
. Países como Finlândia, Canadá,
Estados Unidos bem como outros da Europa ocidental como Inglaterra, País de Gales e Itália confirmaram
essa tendência de declínio em recentes publicações
12, 13, 16, 17
.
Alguns autores atribuem este declínio da razão de sexos ao nascimento ao aumento da exposição a
compostos químicos ambientais com atividade desreguladora do sistema endócrino, oriundos de resíduos
da atividade industrial e, principalmente, da atividade agrícola
17, 18
. A atribuição do declínio observado a
exposição a estas substâncias decorre do fato de que muitos apresentam a capacidade de interferir na
15
homeostasia do sistema endócrino, podendo causar distúrbios na saúde reprodutiva das populações
expostas, com conseqüente intervenção na estabilidade da razão de sexos ao nascimento
19, 8
.
Esta hipótese
é reforçada quando analisamos a trajetória de intenso desenvolvimento econômico e industrial, sobretudo, o
boom da indústria farmo-química na chamada Revolução Verde no século passado, que tiveram como
conseqüência, o aumento das quantidades de substâncias químicas lançadas no meio ambiente, sobretudo, a
partir do final do século passado
19
. Esta observação tem levado muitos autores a considerar a razão de
sexos ao nascimento como indicador sentinela da exposição ambiental a desreguladores endócrinos
20, 21
.
Em episódios de exposição acidental e ocupacional os efeitos sobre a razão de sexos ao
nascimento são mais facilmente comprovados. Um estudo constatou que trabalhadores expostos ao
nematocida dibromocloropropano tiveram diminuição na contagem de espermatozóides, nível de
gonadotrofina elevado e proporção de nascimentos masculinos diminuída entre suas proles
53
; trabalhadores
da indústria do alumínio assim como outros expostos a organoclorados e outros pesticidas tiveram
igualmente redução significativa de nascimentos masculinos entre seus descendentes. Da mesma forma, o
estudo desenvolvido por Talamanca
22
e colaboradores constatou a redução significativa de nascimentos de
crianças do sexo masculino em uma coorte exposta à dioxina durante o acidente de Seveso, Itália. Este
efeito foi observado ao longo de um período de até oito anos seguintes ao acidente (1977-1984)
22
. O
mesmo ocorreu em uma coorte de trabalhadores expostos à gasolina, na qual se observou redução
significativa da razão de sexos ao nascimento entre os descendentes quando comparada ao grupo não
exposto
23
.
Em alguns países da Ásia, por outro lado, o declínio da proporção de nascidos vivos do sexo
masculino é explicado por outros fatores, excluindo a responsabilidade de prováveis exposições ambientais.
Na China, a diferença encontrada na razão de sexos ao nascimento entre áreas urbanas e rurais, na qual se
verificou uma maior proporção de nascimentos de homens nas áreas urbanas em relação às áreas rurais, foi
atribuída a fatores de natureza demográfica e comportamental. A grande variedade de etnias resultando em
marcantes diferenças regionais no país, além da prática cultural de sub-notificação de nascimentos
femininos comum em determinadas áreas, foram os principais fatores responsabilizados pelas diferenças
achadas
24
. Em relação ao Japão, onde foi igualmente confirmado um declínio na proporção de nascimentos
de homens nas recentes décadas, não existe ainda um consenso a respeito da participação de desreguladores
endócrinos ambientais no fenômeno
25
. Para alguns autores, tal declínio está diretamente ligado ao aumento
da incidência de natimortos do sexo masculino em relação ao feminino no país nas últimas décadas,
sugerindo um aumento na vulnerabilidade pré-natal de fetos do sexo masculino
26
.
1.2 O Papel dos Desreguladores Endócrinos Ambientais
As interações hormonais desempenham um papel essencial na coordenação das múltiplas
atividades das células, tecidos e órgãos, através da regulação de funções biológicas como metabolismo,
crescimento, desenvolvimento, equilíbrio hidroeletrolítico e reprodução
27
. Esta cadeia de eventos, no
16
entanto, pode se tornar suscetível a ação de fatores de origem endógena ou exógena, os quais podem lhe
conferir alterações indesejadas, interrompendo a homeostase e conferindo agravos à saúde. Diversos
estudos mostram que diversas condições patológicas a exemplo de neoplasias de mama, testículo, próstata,
bem como algumas disfunções reprodutivas, são originadas inicialmente a partir de alterações hormonais
causadas por agentes desreguladores endócrinos
28, 29, 30
.
Segundo a literatura, os desreguladores endócrinos são definidos como "qualquer substância
exógena capaz de interagir na síntese, armazenamento, liberação, transporte, metabolismo, atividade
conjugadora ou eliminação de hormônios naturais na corrente sanguínea que o responsáveis pela
regulação da homeostase e pelo desenvolvimento" ou ainda "qualquer substância exógena que cause efeitos
adversos à saúde, secundários às alterações da função endócrina em organismos intactos, ou na sua prole"
30
.
A descrição dos desreguladores endócrinos na literatura se iniciou no final do século passado, no
entanto, seu estudo começou a ganhar importância apenas recentemente, quando diversos estudos
experimentais começaram a ser desenvolvidos, confirmando a seriedade dos problemas causados pela
exposição a tais substâncias
31
.
O mecanismo de atuação destes compostos pode ser realizado de diversas maneiras, cujo resultado
consiste essencialmente na alteração das concentrações hormonais plasmáticas do indivíduo exposto. A
ação química destes compostos está baseada, principalmente, no bloqueio da ligação hormônio-receptor,
alteração da sinalização celular e expressão gênica, mimetização de hormônios "verdadeiros" (como no
caso do estrogênio), uma vez que muitos apresentam estrutura molecular semelhante à molécula hormonal,
e alteração do metabolismo endócrino, ou seja, alteração da síntese e degradação fisiológica natural dos
hormônios
32
. Outros autores têm considerado ainda que certas substâncias teratogênicas ou mesmo
mutagênicas possam afetar a determinação do sexo do embrião, fato que levaria a uma aparente
predominância de nascimentos femininos. Este mecanismo se daria através da mutação do gene
determinante do sexo no cromossomo Y, o chamado gene SRY, ou ainda através de eventos que deterioram
espermatozóides Y no sêmen humano
50, 51
.
No Brasil e no mundo, várias substâncias com atividade endócrina comprovada e mesmo sob
suspeita, são amplamente utilizadas sem as devidas medidas de prevenção e controle de riscos. A ação
comprovada destes agentes químicos dificultando a reprodução em adultos e ameaçando o
desenvolvimento embrionário intra-uterino, é agravada pela escassez de estudos de avaliação dos efeitos
destes compostos sobre a saúde das populações expostas
32
.
Substâncias como as bifenilas policloradas (PCB's) que eram utilizadas até pouco tempo atrás
como isolantes em equipamentos elétricos e plastificantes, foram posteriormente proibidas em virtude dos
seus efeitos sobre a saúde humana e animal. No entanto, as dificuldades com desativação e destruição de
estoques causam ainda hoje problemas de contaminação ambiental e humana
31
.
As dioxinas juntamente com os furanos pertencem a uma classe de hidrocarbonetos produzidos
involuntariamente a partir de uma série de reações termoquímicas. São compostos altamente cancerígenos,
17
teratogênicos e persistentes, com efeitos tóxicos ao sistema endócrino através do bloqueio hormonal e ação
anti-estrogênica
33
. Outro exemplo trata-se de subprodutos de processos industriais, a exemplo dos
originados involuntariamente da síntese de compostos clorados como o PVC e o agrotóxico ácido 2,4,5-
triclorofenoxiacético-2,45-T
34
.
Por outro lado, existem ainda substâncias de produção voluntária como o Bisfenol A, um potente
xenobiótico amplamente utilizado como ingrediente de produtos de tratamentos dentários e em
revestimento de embalagens de alimentos, cuja ação disruptora no sistema endócrino advém de sua
estrutura química, muito semelhante à estrutura molecular de estrogênios naturais
35
.
Diversos agravos à saúde de populações humanas e animais vêm sendo atribuídos a exposição a
compostos desta natureza, dentre eles o aumento da incidência de neoplasias hormônio-dependentes,
abortos, malformação congênita do aparelho reprodutor masculino (hipospádia e criptorquidismo) bem
como anormalidades no desenvolvimento sexual durante a puberdade
36, 31, 50
. Um dos primeiros relatos
neste sentido foi na década de 60 quando Rachel Carlson publicou seu famoso livro Silent Spring,
chamando a atenção para insuficiência reprodutiva e comportamento de acasalamento aberrante em aves,
resultante da exposição a pesticidas organoclorados persistentes.
A partir da década de 60, os danos à saúde reprodutiva vêm sendo frequentemente confirmados em
sucessivas publicações científicas, com especial destaque para a tendência secular de declínio da qualidade
do sêmen humano, na qual muitos autores atribuem o fenômeno à exposição a desreguladores endócrinos
lançados na natureza
37, 38
.
Um estudo no qual se realizou a investigação das características do sêmen fornecido por grupos
homogêneos de homens ao longo de 10 a 20 anos, constatou a diminuição significativa na concentração de
espermatozóides, no volume de sêmen e na porcentagem de células normais
39
. Em outro trabalho, as
alterações nas características do sêmen, referente a volume e quantidade de espermatozóides, bem como o
aumento significativo das concentrações plasmáticas dos hormônios folículo estimulante (FSH) e
luteinizante (LH) no grupo de homens estudados, foram igualmente atribuídas à exposição a compostos
desreguladores do sistema endócrino presentes no ambiente
40
.
A atuação destas substâncias é direcionada à espermatogênese humana, resultando em efeitos
deletérios comprometedores do processo de produção das lulas sexuais masculinas
17, 39
. Considerando
que a proliferação das células de Sertoli que compõem o testículo do homem adulto ocorre durante sua vida
perinatal, uma exposição intra-uterina a compostos com atividade endócrina presentes no ambiente é,
portanto, potencialmente capaz de reduzir a quantidade de espermatozóides produzida na vida adulta
10
.
O declínio da fertilidade em homens cada vez mais jovens, representado pela queda da qualidade
do sêmen relatado nos últimos anos, tem, portanto, além dos fatores químicos antropogênicos
mencionados, atribuições relacionadas a alterações ambientais de natureza física, nas quais os indivíduos
expostos são submetidos a variações bruscas de temperatura. Diversos estudos em coortes de operários que
avaliaram os efeitos na fertilidade masculina da exposição ocupacional a altas temperaturas mostraram que
esta situação resulta numa maior proporção de espermatozóides inviáveis, uma vez que o calor provoca o
18
aceleramento do metabolismo e degeneração das células sexuais masculinas
28
. Atualmente, ao contrário dos
fatores ambientais físicos e químicos aqui relatados, não existem evidências de que o declínio da qualidade
do sêmen humano nas últimas décadas tenha uma origem genética
39
.
A maioria dos estudos realizados atualmente sobre fertilidade masculina avaliou mudanças
seculares na qualidade do sêmen em países do hemisfério Norte e Austrália, ao passo que tais estudos são
ainda escassos na América do Sul. No entanto, um estudo recente desenvolvido na região sudeste argentina,
avaliou o impacto de exposições químicas nas características do sêmen em homens residentes em áreas de
intensa atividade agrícola e industrial que buscavam por tratamento de infertilidade. Os resultados
mostraram que quase 40% destes homens tinham sido expostos a pesticidas ou solventes. A comparação
deste grupo de homens previamente expostos com um grupo não exposto mostrou uma concentração de
espermatozóides e porcentagem de células com motilidade normal significativamente menor que a
observada no segundo grupo
40
. Este estudo confirma a importância das exposições ambientais como fator
de risco para infertilidade masculina, sugerindo que a América do Sul sofre com o mesmo problema de
poluição ambiental observado em outros lugares do mundo
39, 40
.
Para Carlsen e colaboradores
37
, assim como para outros pesquisadores da saúde reprodutiva
humana, é inegável a participação da exposição ambiental a desreguladores endócrinos na responsabilidade
pela intensificação dos danos à fertilidade masculina
41
.
1.3 A Participação dos Agrotóxicos
A prática de uso de agrotóxicos e fertilizantes se iniciou na segunda metade do século XX quando,
após a utilização para fins bélicos durante a Guerra do Vietnã, seu emprego foi estimulado em escala
mundial durante a chamada Revolução Verde, que incentivada pelo boom da indústria farmo-química
prometia aumentar a produtividade agrícola e acabar com o problema da fome nos países em
desenvolvimento
19.
No ranking mundial, os países em desenvolvimento respondem atualmente por aproximadamente
25% do consumo de agrotóxicos, e dentre estes países, o Brasil ocupa posição de destaque, em especial a
Região Sudeste que concentra grande parte do consumo brasileiro. No final da década de 90 a estimativa
média de consumo anual para esta região já havia ultrapassado a marca de 12 kg por trabalhador rural
42, 43,
44
.
O incremento no uso destas substâncias quando associado ao manejo inadequado dos solos, constitui
uma ameaça às características naturais e potencialidade dos biomas, resultando em contaminação de águas
e solos, erosão, rupturas de cadeias tróficas e perda de biodiversidade
19
. Diante deste quadro, o uso massivo
de tais substâncias vem se tornando um grave e urgente problema de Saúde blica, na medida em que
atuam como potentes e persistentes poluentes químicos, com comportamentos dinâmicos complexos,
capazes de fluir através das diferentes matrizes ambientais, causando desequilíbrios ao ecossistema e,
conseqüentemente, proporcionando agravos à saúde das populações expostas
17, 31
.
19
Nas últimas décadas, toneladas de agrotóxicos, muitos dos quais comprovadamente considerados
desreguladores endócrinos e outros ainda sob suspeita (tabela 1) vêm sendo despejadas no ambiente,
gerando grande preocupação sobre seus potenciais efeitos sobre a saúde humana e ecossistêmica
45
.
Tabela 1. Compostos químicos com evidências científicas de atividade disruptora sobre o sistema
endócrino e que estão amplamente distribuídos no ambiente (adaptado de Colborn e cols., 1993).
TIPO
SUBSTÂNCIAS
Compostos de
uso agrícola
Nematocidas: Aldicarb e DBCP.
Inseticidas: β-HCH, Carbaril, Clordano, Dicofol, DDT e metabólitos,
Dieldrin, Endosulfan, Heptacloro, Lindano (γ - HCH), Metoxicloro,
Mirex, Toxafeno, Oxiclordano, Paration e Piretróides
.
Herbicidas: 2,4-D; 2,4,5-T, Alacloro, Amitrole, Atrazina, Metribuzin,
Nitrofen e Trifluralin
.
Fungicidas: Benomil, Hexaclorobenzeno, Mancozeb, Maneb, Metiram,
Zineb e Ziram
.
Compostos de
uso industrial
Ftalatos, Estirenos, Cádmio, Dioxina (2,3,7,8-TCDD), Chumbo, PBB's,
PCB’s, nonilfenóis e Mercúrio.
Uma das substâncias mais estudadas sob o aspecto de desregulação endócrina é o DDT (dicloro-
difenil-tricloroetano) que, embora tivesse sido proibido em mais de 80 países em meados da década de
70, no Brasil o seu uso tornou-se restrito a campanhas de combate a Malária em 1982 e, apenas
recentemente em 1994, sua utilização foi completamente proibida. Por ser uma substância altamente
persistente no ambiente, ainda hoje é possível encontrá-lo em altos níveis no leite materno e tecido adiposo,
20
sobretudo, em indivíduos residentes de áreas endêmicas de Malária na Amazônia, onde as campanhas de
combate ao vetor foram intensas
45, 46
.
Mesmo nas regiões mais distantes como as regiões polares, é possível detectar resíduos de
inseticidas organoclorados como o DDT e o dicloro-difenil-etilcloro (DDE), seu principal metabólito, em
tecido adiposo de leões marinhos e outros mamíferos aquáticos
47
.
Atualmente, sabe-se que agrotóxicos como o dibromopropano, dibromito de etileno e clordecone
provocam efeitos tóxicos relevantes sobre a reprodução, afetando, sobretudo, a espermatogênese humana.
No caso do DDT foi constatado que o seu principal metabólito, o DDE, é capaz de interferir na ação dos
hormônios masculinos, promovendo uma ação feminizadora
17
.
Um estudo desenvolvido por Lemaire e colaboradores
54
testou a interação in vitro de pesticidas
organoclorados com receptores andrógenos (hAR) da linhagem de células de próstata PALM e concluiu
que a atividade endócrina destas substâncias in vivo interferem na via de sinalização hormonal masculina,
reforçando a hipótese de que o recente aumento na incidência de distúrbio sexuais masculinos pode ser
devido a longas exposições a pesticidas organoclorados presentes no ambiente. Outro estudo avaliou a
situação dos níveis de testosterona em ratos depois de exposições in vivo e in vitro a atrazina, um dos
agrotóxicos mais utilizados. Este estudo demonstrou a ação disruptora sobre o sistema endócrino em ratos
machos através da inibição direta da síntese de testosterona pelas células de Leydig dos testículos
48
.
As evidências anteriormente mencionadas nos mostram que a contaminação ambiental e
conseqüente exposição humana e animal a substâncias com atividade sobre o sistema endócrino
representam atualmente um sério problema de Saúde Pública. Neste sentido, o presente estudo se destina a
discutir questões relacionadas ao problema, através da caracterização e análise da razão de sexos ao
nascimento no cenário brasileiro e avaliação da participação dos agrotóxicos no comportamento deste
indicador sentinela.
2. OBJETIVO GERAL
Descrever e analisar a tendência temporal da razão de sexos ao nascimento no Brasil.
2.1 Objetivos Específicos
21
-
Descrever a distribuição da tendência de razão de sexos ao nascimento por regiões, estados e capitais
(1994-2004) do Brasil (artigo 1);
-
Determinar a correlação entre o volume de venda de agrotóxicos e a razão de sexos ao nascimento no
estado do Paraná (artigo 2);
3. ASPECTOS ÉTICOS
Todas as atividades relacionadas a este projeto de pesquisa foram realizadas conforme as
determinações do Comitê de Ética em Pesquisa da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca,
segundo parecer N
o
65/07, CAAE 00666.0.031.000-07.
Este estudo não oferece riscos nem constrangimentos, uma vez que os dados coletados são de
origem secundária, não envolvendo informações referentes a seres humanos bem como uso de animais em
geral.
22
ARTIGO I
23
Tendência Temporal da Razão de Sexos ao Nascimento no Brasil:
Análise do Período de 1994 a 2004.
Time Trend of Sex Ratio at Birth in Brazil in the Period from 1994 to 2004.
Gerusa Gibson
1
Sergio Koifman
1
1
Departamento de Epidemiologia e Métodos Quantitativos
em Saúde, Escola Nacional de Saúde Pública- ENSP/ FIOCRUZ
Rua Leopoldo Bulhões 1480, Rio de Janeiro, RJ 21041-210
Resumo
A tendência de declínio da razão de sexos ao nascimento, medida expressa pela relação
entre o número de nascidos vivos do sexo masculino sobre o número de nascidos vivos do sexo
feminino, ou ainda através da proporção de nascimentos masculinos em determinado ano e
espaço geográfico, vem sendo apontada nas últimas décadas como resultado do aumento da
exposição a desreguladores endócrinos presentes no ambiente, poluentes químicos capazes de
causar danos à saúde reprodutiva nas populações expostas. Neste sentido, a razão de sexos ao
nascimento vem sendo sugerida como indicador sentinela da exposição a tais substâncias.
Objetivo: Caracterizar e analisar a tendência temporal da proporção de nascidos vivos do sexo
masculino no Brasil, segundo grandes regiões, estados e capitais. Metodologia: O estudo
caracteriza-se por ser do tipo descritivo com delineamento ecológico. As séries históricas da
razão de sexos ao nascimento foram obtidas do banco de dados DATASUS, com utilização de
modelos de regressão polinomial na análise da tendência. Resultados: Foram observadas
tendências crescentes significativas para o Brasil e Região Nordeste, e em nível local para os
estados de São Paulo e Acre. Apresentaram igualmente tendências crescentes e estatisticamente
24
significativas as capitais Cuiabá, Palmas e Rio Branco. Por outro lado, o estado do Ceará foi o
único a apresentar tendência de declínio significativa. Conclusão: A maioria dos estados e
capitais do Brasil apresentaram tendências estáveis na proporção de nascidos vivos do sexo
masculino, com médias semelhantes aquela considerada usual na literatura científica. No entanto,
foram observadas tendências crescentes em alguns estados e capitais, sugerindo que o fenômeno
seja decorrente de variações sócio-demográficas locais, enquanto que a tendência de declínio
observada para o estado do Ceará aponta para a necessidade de uma investigação futura que
analise a hipótese do aumento da exposição à desreguladores endócrinos ambientais, assim como
a participação de variáveis de natureza sócio-demográficas já descritas na literatura.
Palavras chave: Razão de Sexos ao Nascimento; Desreguladores Endócrinos; Agrotóxicos.
25
Introdução
A razão de sexos ao nascimento,
expressa pela divisão entre o número de nascidos
vivos do sexo masculino sobre o número de
nascidos vivos do sexo feminino, ou ainda pela
proporção masculina de nascimentos em relação
ao total de nascidos vivos em uma população em
determinado ano
1
, pode variar dentro de uma
mesma população e entre populações ou ainda
mudar ao longo dos anos devido a fatores de
natureza ambiental e demográfica
2, 14
.
Dados da literatura classificam os
fatores determinantes da razão de sexos ao
nascimento em primários, ou seja, aqueles que
determinam o sexo da criança no momento da
concepção e secundários, que por sua vez
influenciam a sobrevivência do embrião no útero
materno e, portanto, estão relacionados à
vulnerabilidade neonatal
3
. Dentro desta
classificação, a concentração hormonal dos pais
no momento da concepção é considerada um
fator de importante influência na determinação
do sexo da criança a ser gerada
3,20
.
Consequentemente, a razão de sexos ao
nascimento está diretamente relacionada ao grau
de integridade do sistema endócrino dos
genitores de uma determinada população
3
.
Acredita-se que altas concentrações de
gonadotrofina e progesterona aumentem a
probabilidade de nascimento de uma criança do
sexo feminino, o que implica numa razão de
sexos reduzida (menor proporção de nascimentos
masculinos), enquanto altas concentrações de
estrogênio e testosterona nos genitores
aumentem a probabilidade de nascimento de uma
criança do sexo masculino
3, 4, 20
.
Existem relatos ainda de fatores naturais
associados à razão de sexos ao nascimento.
Diversos estudos mostram diferenças
significativas entre etnias, na qual a razão de
sexos apresenta maior valor entre asiáticos
(maior proporção de nascimentos masculinos), e
menor entre negros (menor proporção de
nascidos vivos do sexo masculino)
5,6
. A idade
dos pais e a ordem de nascimento de crianças
dentro de uma mesma família são fatores
também mencionados como tendo associação
7
.
No entanto, é o declínio atribuído a fatores
ambientais decorrentes da ação antrópica nas
últimas décadas que vem despertando crescente
interesse da comunidade científica
7, 8
.
O aumento da exposição a
desreguladores endócrinos presentes no
ambiente, contaminantes residuais oriundos da
intensa atividade agrícola e industrial, vem sendo
apontado como o principal responsável por tal
declínio
8, 9, 13
. Isto ocorre porque tais compostos
são capazes de interferir na homeostasia do
sistema endócrino, podendo causar distúrbios na
saúde reprodutiva das populações expostas com
conseqüente intervenção na estabilidade da razão
de sexos ao nascimento
9
. Esta observação tem
levado muitos autores a considerar a razão de
sexos ao nascimento como indicador sentinela da
saúde reprodutiva e ambiental
12.
Diversos estudos mostram episódios de
exposição acidental e ocupacional a
desreguladores endócrinos associados ao
declínio significativo da proporção de
nascimentos do sexo masculino
10, 11
. No entanto,
a ausência de estudos da razão de sexos ao
nascimento no Brasil assim como a evidência da
crescente contaminação ambiental que vem
26
sendo frequentemente relatada na literatura,
refletem a urgência em se realizar estudos sobre
o assunto no cenário brasileiro
13
.
Neste sentido, uma vez reconhecida a
importância e a necessidade de estudos do
gênero no Brasil assim como seu potencial uso
na detecção e identificação de exposições a
desreguladores endócrinos, o objetivo do
presente trabalho consiste em caracterizar e
analisar a tendência temporal da proporção de
nascidos vivos do sexo masculino no Brasil
(segundo estados e capitais), bem como
compará-la à observada em países da Europa e
nos Estados Unidos.
Metodologia
Tipo de Estudo
O presente estudo caracteriza-se por ser
do tipo epidemiológico descritivo com
delineamento ecológico, no qual se utilizou
dados secundários oriundos do banco de domínio
público DATASUS
32
. Os estudos ecológicos
têm por finalidade a utilização de um grupo
populacional como unidade de análise na sua
investigação, o que permite apenas o
conhecimento do número de indivíduos expostos
a um determinado evento e da frequência deste
evento dentro de um determinado grupo
populacional, desconhecendo, portanto, as
características individuais
15
. De uma forma
geral, os estudos ecológicos são empregados em
caráter exploratório, visando o melhor
entendimento e compreensão do processo saúde-
doença ao nível populacional. Tais estudos são
ainda frequentemente utilizados na análise de
séries temporais
16
.
Fonte de Dados
Foram utilizadas as séries históricas das
proporções de nascimentos masculinos,
calculadas a partir de dados de nascidos vivos
para estados e capitais brasileiras no período de
1994 a 2004, fornecidos pelo site de domínio
público DATASUS
32
. O comportamento das
séries foi, portanto, analisado em um único
período de onze anos. Salienta-se aqui que as
séries históricas foram as mais longas
disponíveis, uma vez que o DATASUS
32
somente começou a disponibilizar os dados sobre
nascidos por local de residência a partir de 1994.
Análise da Tendência
A análise da tendência foi realizada
através de modelos de regressão polinomial. A
opção pela utilização destes modelos foi devido
ao alto poder do ponto de vista estatístico bem
como pela facilidade de formulação e
interpretação que os mesmos oferecem
17
. O
modelo de regressão visa encontrar a curva que
melhor se ajusta aos dados, de modo a descrever
a relação entre a variável independente X (ano de
estudo) e a variável dependente Y (razão de
sexos ao nascimento). Em outras palavras, tal
modelo tem por objetivo encontrar a equação que
melhor descreve a relação existente entre as
variáveis citadas
18.
Considerando o mencionado
acima, foram então testados os seguintes
modelos de regressão polinomial, onde X e Y
representam as variáveis independente e
27
dependente respectivamente e β
0
, β
1
e β
2
são os
coeficientes de regressão.
a) Linear (1ª ordem): Y = β
0 +
β
1
X
b) 2ª ordem: Y = β
0 +
β
1
X + β
2
X
2
c) 3ª ordem: Y = β
0 +
β
1
X + β
2
X
2
+ β
3
X
3
onde: Y = Proporção de Nascimentos
Masculinos
X = Ano
β
0
= Proporção dia de Nascimentos
Masculinos no Período
β
1
= Incremento médio anual
A escolha do modelo mais adequado
dependeu da análise do diagrama de dispersão,
do valor do coeficiente de determinação (quanto
mais próximo de 1, mais ajustado o modelo) e
da análise dos resíduos. Nas situações em que
dois modelos eram semelhantes do ponto de
vista estatístico, optou-se pelo modelo mais
simples, ou seja, o de menor ordem. Com o
objetivo de evitar a correlação serial entre os
termos da equação, optou-se por não utilizar os
valores de X e sim o ponto médio da série
temporal. Neste caso, para o período estudado,
de 1994 a 2004, o termo (X- 1999) representa a
variável centralizada. Como exemplo, para o
modelo linear tem-se a seguinte expressão:
Y= β
0 +
β
1.
(X-1999),
onde: Y = Proporção de Nascimentos
Masculinos
X = Ano
β
0
= Proporção Média de Nascimentos
Masculinos no Período
β
1
= Incremento médio anual
Foi considerada tendência significativa
aquela cujo modelo de regressão estimado
obteve um p valor < 0,05. As localidades que
apresentaram tendências com significância acima
de 0,10 foram consideradas estáveis. O programa
utilizado para a elaboração dos modelos de
regressão polinomial foi SPSS for Windows
(9.0), assim como dos gráficos de dispersão.
Resultados
Análise da série histórica de 1994 a 2004
A tabela 1 e os gráficos 1 e 2
apresentam os resultados das tendências da
proporção de nascimentos masculinos para o
Brasil e grandes regiões referentes ao período de
1994 a 2004.
A análise dos dados mostrou tendência
crescente estatisticamente significativa (p<0,05)
da proporção de nascidos vivos do sexo
masculino para o país como um todo, o qual
apresentou uma proporção média de 51,10 e
incremento de 0,03 ao ano no período. Em 1994,
a proporção de nascimentos masculinos no Brasil
era 50,68 passando para 51,18 em 2004, um
aumento de 0,98%. A mesma tendência
crescente significativa foi observada para a
região Nordeste, que por sua vez apresentou uma
média de 50,97 para o período e incremento de
0,1 ao ano. Para esta região, a razão de sexos ao
nascimento passou de 49,30 em 1994 para 51,18
em 2004, representando um acréscimo de 3,8%
no período. As Regiões Norte, Sudeste, Sul e
Centro-Oeste não apresentaram tendências
significativas para a proporção de nascimentos
masculinos no referido período.
28
A tabela 2 apresenta os resultados da
tendência temporal da proporção de nascimentos
masculinos para os estados. Das 26 unidades
federativas, tiveram tendência crescente e
significativa os estado de São Paulo e Acre
(gráficos 3 e 4), enquanto que o estado cearense
foi o único a apresentar tendência de declínio
significativa para o período estudado (gráfico 6).
Por outro lado, o estado do Pará, embora tenha
também apresentado tendência significativa, a
mesma não foi constante ao longo do período
(gráfico 5). O estado do Paraná também
apresentou tendência decrescente, porém, sem
significância estatística. Os demais estados
apresentaram tendências estáveis com variações
não significativas.
A proporção de nascimentos masculinos
média para o estado de São Paulo foi de 51,17
com incremento anual de 0,01. Em 1994, este
estado apresentou proporção de nascidos vivos
do sexo masculino de 51,15 passando para 51,18
em 2004, um acréscimo de 0,05%. O estado do
Acre apresentou proporção de nascimentos
masculinos média de 51,28 no período, com um
incremento de 0,16. Para este estado, verificou-
se ainda que a tal proporção passou de 49,80 em
1994 para 51,46 em 2004, um aumento de 3,3%.
Em relação ao Pará, o comportamento observado
da tendência da proporção de nascimentos
masculinos não foi constante ao longo do
período. Houve inicialmente uma tendência de
declínio nos primeiros anos da série seguida de
uma tendência crescente que se estendeu até o
final do período em 2004 (gráfico 5). A
proporção média de nascidos vivos do sexo
masculino para este estado foi de 51,33 com
incremento médio anual negativo de 0,02. O
estado do Ceará, por outro lado, apresentou uma
proporção de nascimentos masculinos média de
51,30 e incremento médio negativo de 0,04 ao
ano. Em 1994, a referida proporção para este
estado foi de 50,88 passando para 50,70 em
2004, um decréscimo de 0,35%.
Em relação às capitais brasileiras,
apenas três apresentaram tendências crescentes
estatisticamente significativas: Cuiabá, Palmas e
Rio Branco, enquanto que a tendência observada
para Belém e Florianópolis não foi constante ao
longo do período (tabela 3).
A cidade de Cuiabá apresentou uma
proporção de nascimentos masculinos média de
51,43 e incremento anual de 0,16 para o período.
Em 1994 tal proporção era 49,58 passando para
51,95 em 2004, um aumento de 4,8% (gráfico 7).
Para a capital Palmas verificou-se uma
proporção de nascidos vivos do sexo masculino
média de 50,99 e incremento anual de 0,3 para o
referido período de estudo (tabela 3). Em 1994,
esta proporção era de 47,78 passando para 51,70
em 2004, um aumento de 8,2% para o período
(gráfico 8).
Em relação a Belém, verificou-se uma
proporção média de nascimentos masculinos de
51,40 e incremento negativo médio anual de 0,05
para o período (tabela 3). No entanto, o declínio
observado nesta cidade ocorreu apenas na
primeira metade da série e, a partir de então, a
razão de sexos apresentou tendência crescente
(gráfico 9).
Com relação à capital Rio Branco, a
mesma apresentou proporção de nascimentos
masculinos média de 51,08 e incremento de 0,22
ao ano durante o período de estudo. Em 1994,
esta proporção era de 49,24 passando para 52,18
29
em 2004, um incremento de 5,6% no período
(gráfico 10).
Para a capital Florianópolis foi
observada uma proporção de nascidos vivos do
sexo masculino média de 51,0 e incremento
médio negativo anual de 0,09 para o período de
1994 a 2004 (tabela 3). No entanto, assim como
Belém, a tendência de declínio observada em
Florianópolis se deu apenas na primeira metade
da série. Em seguida, tal proporção apresentou
tendência crescente até o final do período em
2004 (gráfico 11).
Discussão e Conclusão
Diversos estudos mostram que a razão
de sexos ao nascimento vem apresentando
tendência de declínio em diversos países da
Europa, nos Estados Unidos e Canadá, fato que
vem sendo alvo de intensa discussão na
comunidade acadêmica
2, 9, 14, 22
. No entanto, tal
tendência não foi confirmada para o Brasil no
período de 1994 a 2004 no presente trabalho.
Segundo um estudo de 1992
24
, no qual
se utilizou amostras de registros hospitalares de
nascidos vivos e natimortos de 11 países da
América latina (Uruguai, Argentina, Chile,
Brasil, Bolívia, Peru, Paraguai, Equador,
Venezuela e Costa Rica), foi observada uma
tendência significativa de declínio na proporção
de nascidos vivos do sexo masculino para o
Brasil para o período de 1967 a 1987, assim
como para os demais países, com exceção de
Peru e Uruguai. Os autores deste estudo
sugeriram que tal declínio poderia estar
relacionado à incidência de natimortos nestes
países, cuja incidência foi crescente até 1984
24
.
A partir destes resultados e
considerando que havia disponibilidade de dados
censitários referentes ao número de nascidos
vivos nos Anuários Estatísticos do IBGE a partir
de 1979 apenas para o Brasil, foi realizada uma
análise da tendência da proporção de
nascimentos masculinos computados no país, na
qual o declínio descrito para o Brasil no estudo
mencionado acima foi confirmado (gráfico 12).
Estes resultados mostram, portanto, que
a proporção de nascidos vivos do sexo masculino
no Brasil apresentou tendência de declínio entre
os períodos de 1979 a 1994 e, somente a partir
de então, passou a apresentar tendência
crescente, que se estendeu até o final da série em
2004 (gráficos 1 e 12).
Estes achados sugerem que o Brasil
apresentou padrão de tendência da razão de
sexos semelhante aos padrões observados no
Canadá e Estados Unidos no período de 1970 a
1990
2, 19, 14
. Este mesmo padrão de declínio foi
ainda observado na Dinamarca a partir da década
de 50, e na Suécia, Finlândia, Alemanha e
Noruega a partir da década de 70, momento que
coincidiu com o grande desenvolvimento
industrial nestes países
25
.
Neste sentido, é irrefutável a afirmação
de que a partir da segunda metade do século XX,
a tendência de declínio observada nos
nascimentos masculinos em países da Europa
bem como nos Estados Unidos e Canadá não foi
um fato restrito as estes países, uma vez que o
fenômeno foi igualmente observado no Brasil
assim como em diversos países da América
Latina
24
, num contexto histórico parecido,
marcado pelo intenso desenvolvimento
30
industrial, sobretudo, da indústria farmo-química
24, 26
.
A partir de 1994, a proporção de
nascidos vivos do sexo masculino no Brasil
parece ter iniciado uma tendência de
estabilização ou mesmo de compensação,
apresentando uma discreta e significativa
tendência crescente até o final da série em 2004
(gráfico 1).
Em relação aos estados e capitais, os
resultados mostraram variações não
significativas para a maioria deles, sugerindo que
a razão de sexos se manteve estável durante o
período de 1994 a 2004. Por outro lado, o
incremento observado na Região Nordeste assim
como no estado do Acre e nas capitais Palmas,
Cuiabá e Rio Branco, permitiu que os valores da
proporção de nascimento masculinos que se
encontravam abaixo do considerado usual
(abaixo de 51,0) no início da série em 1994,
atingissem valores acima de 51,0 em 2004,
incremento considerado positivo em se tratando
de proporção de nascimentos masculinos
19
.
Para o estado de São Paulo, a tendência
crescente observada para a proporção de
nascidos vivos do sexo masculino, embora
significante estatisticamente, não parece ter
grande impacto na média final do período, uma
vez que o incremento observado no período foi
pequeno. É relevante ressaltar o fato de que este
estado apresenta uma grande comunidade de
imigrantes asiáticos, etnia cuja razão de sexos ao
nascimento tende a ser maior
2
.
Em relação ao estado do Ceará, cuja
tendência temporal foi decrescente, é importante
que se destaque que o mesmo apresentava
proporção de nascimentos masculinos de 50,7
em 2004, ano final da série, valor no limite
inferior (boderline) quando comparado a valores
usuais descritos na literatura
19
, merecendo,
portanto, atenção nos anos seguintes.
Por outro lado, o estado do Paraná
embora tenha apresentado declínio o
significativo, merece maior investigação futura,
por se tratar de um estado tipicamente agrícola,
potencialmente exposto a desreguladores
endócrinos ambientais advindos desta atividade.
Os demais estados brasileiros não apresentaram
tendências significativas (p > 0,05), o que sugere
que a razão de sexos ao nascimento manteve
tendência estável no período de estudo.
Dentre as cinco capitais que
apresentaram tendências estatisticamente
significativas. Palmas foi a que apresentou maior
incremento no período, totalizando um aumento
de 8,2%, seguida de Rio Branco e Cuiabá e que
tiveram aumento de 5,6% e 4,8%
respectivamente. Por outro lado, as tendências
observadas para Belém e Florianópolis, embora
significativas, não foram constante ao longo do
período. Ambas capitais apresentaram tendências
de declínio nos primeiros anos da série, seguidas
de tendências crescentes a partir da metade do
período de estudo (1999). É relevante ressaltar
ainda que o Acre e a capital Rio Branco
apresentaram tendências semelhantes, fato este
que sugere que o fenômeno possa estar
ocorrendo nos demais municípios do estado,
merecendo uma investigação mais detalhada de
suas causas. O mesmo foi observado para o
estado do Pará e sua capital Belém.
É prudente que se considere a
possibilidade de que o aumento da proporção de
nascidos vivos do sexo masculino observada em
31
alguns estados e capitais possa ser reflexo da
melhoria da assistência pré-natal, com
conseqüente redução de óbitos fetais, majoritário
no sexo masculino
24, 30
. Outra observação neste
sentido refere-se à redução da paridade materna,
associada negativamente com a razão de sexos
na literatura assim como o aumento da idade
materna no país nas últimas décadas
2, 28
.
Segundo dados do banco DATASUS
32
,
de 1994 a 2004 ocorreram 33.219.289
nascimentos no Brasil, destes 16.980.877 são
homens, 16.145.519 são mulheres e 92.893 são
crianças que tiveram o sexo ignorado no
momento do registro. Esses números
representam um aumento de 17,7% de nascidos
vivos no Brasil no período, com 18,9% de
aumento de nascimentos masculinos e 18,4% de
nascimentos femininos. Embora a utilização de
dados censitários apresente limitações, este tipo
de dado oferece amplo acesso para investigação
de parâmetros populacionais, a exemplo da razão
de sexos ao nascimento. Neste sentido, o risco
inerente de erros sistemáticos no reporte de
dados censitários deve ser considerado na
interpretação dos resultados.
Outro ponto a ser considerado é o
grande número de nascimentos que tiveram o
sexo ignorado, sobretudo no início da série
histórica, ainda que este número tenha diminuído
85,9% durante toda a série.
Embora estudos anteriores tenham
relatado tendências de declínio da razão de sexo
ao nascimento em alguns países, outros
mostraram tendência estável ou até mesmo
tendência crescente
2, 14
. A sugestão de alguns
autores de que a razão de sexos seria um
indicador sentinela da saúde ambiental, uma vez
que ela se mostrou sensível em populações
expostas a contaminantes químicos presentes no
ambiente, vem sendo questionada em muitos
trabalhos
14.
Em episódios de exposição aguda a
desreguladores endócrinos ambientais, a razão de
sexos mostrou-se visivelmente sensível,
apresentando clara tendência de declínio nas
populações expostas, principalmente em estudos
do tipo caso-controle
10, 11
. No entanto, quando se
trata de exposições crônicas, nas quais as
limitações metodológicas proporcionam grandes
dificuldades em se estabelecer relações de causa
e efeito, em especial em estudos ecológicos, a
relação com a razão de sexos não é tão evidente
27
.
A tendência significativa crescente na
proporção de nascimentos masculinos observada
em alguns estados e capitais sugere que essas
diferenças possam ser explicadas por fatores
sócio-demográficos locais, a exemplo da própria
diminuição da paridade materna e conseqüente
queda da fecundidade
2, 28
, bem como o aumento
da idade materna e queda na incidência de
natimortos devido a melhorias na assistência pré-
natal
21,31
. Este resultado distancia a hipótese de
possíveis exposições a desreguladores
endócrinos ambientais, com exceção do estado
do Ceará, cuja tendência foi de declínio.
Em relação à capital Palmas é
importante destacar que a mesma vem
apresentando grande incremento no número de
nascidos vivos desde a recente criação do estado
do Tocantins em 1988. Desde então, o número
total de nascidos vivos nesta cidade sofreu um
incremento de 133,8%, fato que confirma o
grande crescimento da cidade.
32
Segundo a literatura, a razão de sexos
tende a variar em maior magnitude entre
populações, principalmente quando se trata de
populações de diferentes etnias
7
. Por outro lado,
a variação intra-população tende ocorrer em
menor magnitude e, neste caso, fatores como
idade dos pais, gravidez múltipla, ordem de
nascimento de uma criança dentro de uma
mesma família (Markov association) e
predisposição de alguns indivíduos ou casais a
terem predominantemente crianças de um sexo
em particular (Lexis association), parecem ter
maior relevância na associação 7.
Baseado nestes conceitos, é plausível
que a tendência crescente observada na
proporção de nascidos vivos do sexo masculino
em um pequeno número de estados e capitais a
partir de 1994, seja resultado de diferenças e
transformações demográficas que o país vem
atravessando nas últimas décadas, ao passo que o
declínio desta mesma proporção observado para
o país no período de 1979 a 1994 obedeceu ao
mesmo padrão observado para diversos países
europeus assim como Estados Unidos e Canadá
neste mesmo período
2, 14, 19, 22, 23, 24, 25
. Por outro
lado, a tendência de declínio observada para o
estado do Ceará revela a necessidade de estudos
futuros, direcionados à investigação de suas
causas, uma vez que o fenômeno vem sendo
associado à exposição a desreguladores
endócrinos ambientais em outros países
9
.
Neste sentido, o presente trabalho
representa apenas um passo inicial no estudo de
caracterização e análise da tendência da razão de
sexos ao nascimento no Brasil, considerando a
grande escassez de estudos do tipo no cenário
brasileiro. Analisar a relevância e participação de
variáveis associadas à determinação da relação
entre os sexos ao nascimento já descritas na
literatura, bem como investigar as possíveis
causas associadas ao declínio da proporção de
nascidos vivos do sexo masculino observada no
estado do Ceará, são metas que devem ser
alcançadas em estudos futuros.
Referências Bibliográficas
1.
Organização Pan-Americana de Saúde
OPAS/OMS, 2002. Indicadores
básicos para a saúde no Brasil:
conceitos e aplicações. Capítulo 3:
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Gráfico 1
Proporção de Nascimentos Masculinos
Brasil (1994-2004)
Ano (X-1999)
6420-2-4-6
Nascimento Masculino (%)
51,3
51,2
51,1
51,0
50,9
50,8
50,7
50,6 Rsq = 0,4883
.
Gráfico 2
Proporção de Nascimentos Masculinos
Região Nordeste (1994-2004)
Ano (X-1999)
6420-2-4-6
Nascimento Masculino (%)
51,5
51,0
50,5
50,0
49,5
49,0 Rsq = 0,3683
35
Gráfico 3
Proporção de Nascimentos Masculinos
São Paulo (1994-2004)
Ano (X-1994)
6420-2-4-6
Nascimento Masculino (%)
51,8
51,6
51,4
51,2
51,0
50,8
50,6 Rsq = 0,4261
Gráfico 4
Proporção de Nascimentos Masculinos
Acre (1994-2004)
Ano (X-1999)
6420-2-4-6
Nascimento Masculino (%)
53,0
52,5
52,0
51,5
51,0
50,5
50,0
49,5 Rsq = 0,5286
Gráfico 5
Proporção de Nascimentos Masculinos
Pará (1994-2004)
Ano (X-1999)
3020100-10
Nascimento Masculino (%)
52,0
51,8
51,6
51,4
51,2
51,0 Rsq = 0,6514
Gráfico 6
Proporção de Nascimentos Masculinos
Cea (1994-2004)
Ano ( X- 1999)
3020100-10
Nascimento Masculino (%)
51,6
51,4
51,2
51,0
50,8
50,6
50,4 Rsq = 0,6000
Gráfico 7
Proporção de Nacimentos Masculinos
Cuiabá-MS (1994-2004)
Ano (X-1999)
6420-2-4-6
Nascimento Masculino (%)
52,5
52,0
51,5
51,0
50,5
50,0
49,5 Rsq = 0,4627
Gráfico 8
Proporção de Nascimentos Masculinos
Palmas - TO (1994-2004)
Ano (X-1999)
6420-2-4-6
Nascimento Masculino (%)
52,0
51,0
50,0
49,0
48,0
47,0 Rsq = 0,6484
Gráfico 9
36
Proporção de Nascimentos Masculinos
Belém - PA (1994-2004)
Ano (X-1999)
3020100-10
Nascimento Masculino (%)
52,0
51,8
51,6
51,4
51,2
51,0
50,8 Rsq = 0,7544
Gráfico 10
Proporção de Nascimentos Masculinos
Rio Branco - AC (1994-2004)
Ano (X-1999)
6420-2-4-6
Nascimento Masculino (%)
52,5
52,0
51,5
51,0
50,5
50,0
49,5
49,0 Rsq = 0,7017
Gráfico 11
Proporção de Nascimentos Masculinos
Florianópolis - SC (1994-2004)
Ano (X-1999)
3020100-10
Nascimento Masculino (%)
52,5
52,0
51,5
51,0
50,5
50,0 Rsq = 0,6528
Gráfico 12
Proporção de Nascimentos Masculinos
Brasil (1979-1994)
Ano (X- 1986)
1086420-2-4-6-8
Nascimento Masculino (%)
51,2
51,1
51,0
50,9
50,8
50,7
50,6 Rsq = 0,2208
Tabela 1
. Análise de tendência da proporção de nascimentos masculinos no Brasil e Grandes Regiões (1994-2004).
Tabela 2. Análise da tendência da proporção de nascimentos masculinos por estados brasileiros (1994-2004).
Proporção de
Nascimentos Masculinos
(Grandes Regiões)
Modelo
Coeficiente de
Determinação
(r
2
)
p
val
or
Tendê
ncia
Brasil
Y = 51,10 + 0,03.X
0.4882
<
0,05
Crescente
Região Norte
Y = 51,29 + 0,009.X
0.1805
>
0,10
Estável
Região Nordeste
Y = 50,97 + 0,10.X
0.3682
<
0,05
Crescente
Região Sudeste
Y = 51,09 + 0,004.X
0.1067
>
0,10
Estável
Região Centro-Oeste
Y =51,29 - 0,01.X + 0,002.X
2
0.2015
>
0,10
Estável
Região Sul
Y = 51,19 + 0,01.X
0.3595
>
0,10
Estável
Proporção de
Nascimentos Masculinos
(estados)
Modelo
Coeficiente
de
Determina
ção
(r
2
)
p
valor
Tendên
cia
São Paulo
Y= 51,17 + 0,01.X
0.4260
<
0,05
Crescent
e
Acre
Y = 51,28 + 0,16.X
0.5285
<
0.05
Crescent
e
Pará
Y = 51,33 + 0,001.X - 0,02.X
2
0.6514
<
0.05
Decres./Cre
s.
Ceará
Y = 51,30 + 0,0008.X - 0,04.X
2
0.5999
<
0,05
Decresce
nte
38
Tabela 3.
Análise da tendência da proporção de nascidos vivos do sexo masculino por capitais brasileiras (1994–2004).
Proporção de
Nascimentos Masculinos
(capitais)
Modelo
Coeficiente
de
Determina
ção
(r
2
)
p
valo
r
Tendên
cia
Cuiabá
Y= 51,43 + 0,16.X
0.4627
<
0,05
Crescent
e
Palmas
Y= 50,99 + 0,30.X
0.6483
<
0,05
Crescent
e
Belém
Y =51,4 - 0,05.X + 0,002.X
2
0.7544
<
0,05
Decres./Cre
s.
Rio Branco
Y= 51,08 + 0,22.X
0.7017
<
0,05
Crescent
e
Florianópolis
Y = 51,00 - 0,09.X + 0,005.X
2
0.6528
<
0,05
Decres./Cre
s.
39
ARTIGO II
Consumo de Agrotóxicos em Municípios Paranaenses e
Razão de Sexos ao Nascimento: Existe Alguma Relação?
1
Gerusa Gibson
2
, Sergio Koifman
2
_______________________________________________________________________________________
Resumo
Alguns poluentes químicos ambientais, a exemplo de muitos agrotóxicos utilizados na
agricultura, são capazes de provocar alterações no sistema hormonal
(desreguladores endócrinos), resultando em distúrbios na saúde reprodutiva e
40
consequentemente alterações na razão de sexos ao nascimento. Com isso, a razão de
sexos ao nascimento (expressa aqui pela proporção de nascimentos masculinos na
população) vem sendo apontada como indicador sentinela da exposição ambiental a
esses poluentes, apresentando tendência de declínio frente à exposição a tais
substâncias. Por outro lado, a demanda por agrotóxicos nas atividades
agropecuárias mais que dobraram no Brasil nas últimas décadas, em especial no
Estado do Paraná, grande consumidor brasileiro. Objetivos: O presente trabalho
mostra os resultados de um estudo epidemiológico-descritivo com delineamento
ecológico, no qual se investigou a tendência temporal da proporção de nascidos
vivos do sexo masculino para o Estado do Paraná e, a natureza da correlação da
tendência desta proporção com o aumento das vendas de agrotóxicos no Estado.
Metodologia: A tendência temporal da proporção de nascimentos masculinos para o
Estado do Paraná foi obtida através da utilização de modelos de regressão
polinomial (1994-2004). Em seguida, foi realizada uma correlação bivariada entre o
volume de venda de agrotóxicos e as séries temporais das proporções de nascidos
vivos do sexo masculino por municípios do estado. O consumo de agrotóxicos foi
ainda georeferenciado por municípios e estratificado em quartis. Resultados: Uma
discreta tendência de declínio da proporção de nascimentos masculinos foi
observada para o Estado referente ao período entre 1994 e 2004. A magnitude deste
declínio foi aumentada quando se analisou individualmente um grupo de municípios
com intensa atividade agrícola, sugerindo altos níveis de contaminação ambiental
por desreguladores endócrinos nessas localidades. Estes resultados apontam para a
necessidade de estudos futuros que visem esclarecer e dimensionar a força dos
impactos da contaminação ambiental por agrotóxicos na saúde reprodutiva,
representada aqui pela razão de sexos ao
nascimento.
Palavras chave
Desreguladores Endócrinos; Saúde Reprodutiva; Agrotóxicos
.
________________________________________________________________________________________
1
O presente trabalho faz parte do projeto de dissertação de
mestrado de Gerusa Gibson e será apresentado ao Departamento
de Epidemiologia e Métodos Quantitativos em Saúde do
Programa de Pós-Graduação em Saúde Pública e Meio
Ambiente da Escola Nacional de Saúde Pública- ENSP. O
trabalho recebe apoio financeiro da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).
2
Departamento de Epidemiologia e Métodos Quantitativos em
Saúde, Escola Nacional de Saúde Pública - ENSP, Fundação
Oswaldo Cruz - FIOCRUZ, Rio de Janeiro - RJ, Brasil.
Correspondência e pedidos de separatas devem ser enviados a
Gerusa Gibson no seguinte endereço: Rua Marquês de Abrantes,
172/503, Flamengo, CEP 22230-061, Rio de Janeiro - RJ. Fone:
+55-21-2551-9728. Email: gibs[email protected]
______________________________________________________________________________
Introdução
Grande parte dos agrotóxicos e outros compostos químicos utilizados na atividade
agrícola fazem parte de um conjunto de poluentes ambientais definidos como
desreguladores hormonais, compostos capazes de alterar a fisiologia do sistema endócrino
a partir de múltiplos mecanismos, sobretudo, pela capacidade de mimetização de
hormônios verdadeiros, uma vez que apresentam estruturas moleculares semelhantes à de
hormônios naturais, a exemplo da atividade estrogênica desempenhada por tais
contaminantes
1,2.
Segundo a literatura científica, a exposição crônica a esse conjunto de poluentes
pode resultar, em longo prazo, numa série de agravos de saúde relacionados a disfunções
no sistema endócrino, a exemplo de neoplasias hormônio-dependentes e distúrbios na
saúde reprodutiva, como redução da fertilidade masculina, abortos espontâneos e más-
formações congênitas
3,4
.
A exposição a desreguladores endócrinos ambientais parece ainda estar
relacionados à razão de sexos ao nascimento, medida que reflete a relação quantitativa
entre os sexos ao nascimento, e que pode ser também expressa pela proporção de nascidos
vivos do sexo masculino em relação ao total de nascidos vivos em uma determinado
população
4
. Tal razão vem se mostrando sensível a condições ambientais adversas,
causadas pelo aumento do nível de desreguladores endócrinos presentes no ambiente
6.
Por ser um dos fatores determinantes do sexo do embrião durante a concepção, as
concentrações hormonais dos pais, especificamente com relação aos hormônios estrogênio,
progesterona, testosterona e gonadotrofina, são suscetíveis a ação destes desreguladores
endócrinos, influenciando consequentemente na razão de sexos ao nascimento
7
. Dados da
literatura mostram que altas concentrações de estrogênio e testosterona aumentam a
probabilidade de nascimento de uma criança do sexo masculino, enquanto que altas
concentrações de gonadotrofina e progesterona aumentam a probabilidade de nascimento
do sexo feminino
7
.
Em situações usuais, a razão de sexos ao nascimento apresenta valores próximos a
51.2, ou seja, 51,2% de nascidos vivos do sexo masculino ou, em outras palavras, 105
nascimentos masculinos para cada 100 nascimentos femininos. Isto significa que a
proporção de nascimentos masculinos é normalmente superior a de nascimentos femininos.
Em países cujos níveis de compostos com atividade endócrina presentes no
ambiente é elevado, assim como em estudos que avaliaram a razão de sexos ao nascimento
em coortes expostas a desreguladores endócrinos, a proporção de nascidos vivos do sexo
masculino apresentou tendência de declínio e, em muitos casos, inferior a proporção de
nascimentos femininos
8, 9, 10, 11, 12
.
Fatores relacionados à sobrevivência do embrião no útero, capazes de resultar em
uma maior vulnerabilidade em um dos sexos e conseqüentemente mortalidade diferenciada
em um dos gêneros, podem igualmente configurar alterações na relação natural entre os
sexos ao nascimento
13
. Outras publicações acadêmicas mencionam ainda a idade do
ovócito ao nascimento, idade dos pais, etnia, diferenças na motilidade e tempo de vida de
espermatozóides X e Y como fatores influentes. A exposição intra-uterina influenciando a
proliferação das células de Sertoli e, conseqüentemente alterando a quantidade de
espermatozóides produzidos na vida adulta é igualmente mencionada na explicação da
redução da fertilidade masculina decorrente da exposição a desreguladores endócrinos
14.
Dados da literatura mostram que os grupamentos halogênios introduzidos na
composição de muitos pesticidas organoclorados são capazes de interagir com o sistema
endócrino, provocando uma ação estrogênica que resulta em alterações penianas
(hipospádia) e testiculares (criptoquirdia) em animais em desenvolvimento fetal. No caso
do DDT foi constatado que o seu principal metabólito, o DDE, é capaz de interferir na ação
dos hormônios masculinos, promovendo uma ação feminizadora
14.
Em outro trabalho, a exposição a desreguladores endócrinos ambientais foi
associada a alterações nas características do sêmen e ao aumento das concentrações
plasmáticas de hormônio folículo estimulante (FSH) e luteinizante (LH) nos grupos de
homens estudados
15
. Sob este aspecto, observa-se ainda que as notificações de distúrbios
reprodutivos em seres humanos e na vida animal, associados à exposição a tais substâncias
vêm se tornando cada vez mais freqüentes
16
. Desta forma, tanto o declínio da qualidade do
sêmen observado em diferentes países bem como a rapidez com que essa deteriorização
vem ocorrendo, reforçam a hipótese de que suas causas possam estar relacionadas à
exposição ambiental a substâncias químicas com atividade endócrina
16.
Conseqüentemente
é factível pensar que distúrbios desta natureza decorrentes da exposição crônica a este
conjunto de poluentes químicos ambientais, a exemplo de pesticidas, estejam relacionados
ao eventual declínio da proporção de nascimentos de crianças do sexo masculino
1, 2, 8.
No contexto mundial, sabe-se que a razão de sexos ao nascimento vem
apresentando tendência de declínio em diversos países europeus, a exemplo da Inglaterra,
País de Gales, Dinamarca e Canadá
17, 18, 19
. Na Finlândia, tal declínio foi atribuído à
"quimicalização ambiental" decorrente da intensa atividade industrial no país
14
.
Por outro lado, a tendência de declínio observada em países asiáticos, a exemplo da
China, parece ser decorrente de fatores culturais relacionados a padrões comportamentais
de sub-notificação de nascimentos femininos, assim como diferenças de etnia e aumento da
vulnerabilidade pré-natal nas áreas rurais
23
. Em relação ao Japão, ainda não existe
consenso em relação aos motivos do declínio da razão de sexos ao nascimento observado
nas últimas décadas no país. Especula-se que um dos fatores responsáveis seria o aumento
da incidência de natimortos do sexo masculino em relação ao feminino, evidenciando a
maior vulnerabilidade pré-natal dos primeiros, sobretudo, nos primeiros meses de
gestação
13
.
Considerando tais evidências, a hipótese de que o quadro citado, caracterizado por
um declínio na proporção de nascidos vivos do sexo masculino, possa estar ocorrendo
também no Brasil torna-se claramente plausível, sobretudo se considerarmos a trajetória da
agricultura brasileira nos últimos anos, cujo modelo de desenvolvimento baseia-se na
dependência de uma crescente demanda de agrotóxicos e fertilizantes
14.
Neste contexto, o
estado do Paraná destaca-se por ser um grande representante deste modelo de produção
20
.
Diante deste quadro, acredita-se que o uso massivo de tais substâncias, além de
representar uma ameaça às características naturais e potencialidade dos biomas, seja um
precursor responsável pelo aumento na incidência de inúmeros agravos de saúde, incluindo
modificações na razão de sexos ao nascimento, fato que torna a questão da contaminação
ambiental por agrotóxicos prioritária para a Saúde Pública.
Neste sentido, o objetivo do presente trabalho consiste em analisar a tendência
temporal da proporção de nascidos vivos do sexo masculino para o estado do Paraná, assim
como avaliar a natureza da correlação existente entre tal tendência e o consumo de
agrotóxicos segundo municípios do estado.
Metodologia
Fontes de Dados
Este estudo caracteriza-se por apresentar delineamento ecológico no qual se buscou
explorar a associação entre o consumo de agrotóxicos no Estado do Paraná e possíveis
alterações na distribuição da proporção de nascidos vivos do sexo masculino. Foram
empregados como fonte de dados o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)
para obtenção de informações relativas ao consumo de agrotóxicos e perfil agrícola dos
municípios, e o banco DATASUS
30
para a obtenção de informações relativas aos
nascimentos segundo sexo no período compreendido entre 1994 e 2004.
Critérios de Exclusão
Dos 399 municípios paranaenses oficialmente cadastrados no IBGE, foram
excluídos aqueles que sofreram modificações em seus territórios no período de estudo,
assim como aqueles cujas informações sobre nascidos vivos e venda de agrotóxicos em
moeda local no ano de 1985 não estavam disponíveis. Considerando que, para que os
impactos na razão de sexos ao nascimento sejam perceptíveis necessidade de um período
de exposição crônica, optou-se por utilizar séries temporais oito anos após o ano de
consumo de agrotóxicos pelos municípios. Neste caso, o ano de consumo escolhido foi 1985
e as séries utilizadas foram de 1994 a 2004.
Correlação Bivariada
Para a análise de correlação, foi utilizado o software estatístico SPSS (versão 9.0).
Nesta etapa foi realizada correlação bivariada utilizando como variáveis o consumo de
agrotóxicos de 308 municípios do Paraná em 1985 e os correspondentes valores medianos
das proporções de nascimentos masculinos referente ao período de 1994 a 2004. O banco de
dados referente ao consumo de agrotóxicos foi dividido em quartis resultando em quatro
estratos contendo 77 municípios cada um.
Os pontos de corte para o consumo de agrotóxicos foram: 44,5 para os municípios
pertencentes ao primeiro quartil, enquanto que o consumo dos municípios pertencentes ao
segundo quartil se estendeu até 125,0, o terceiro até 239,0 e, a partir deste valor até 1.195,7
ficaram os municípios pertencentes ao quarto quartil.
A análise de correlação foi realizada separadamente dentro de cada quartil de
consumo. Os valores da variável proporção de nascimentos masculinos foram obtidos ano a
ano para cada município e, ao final do período, um valor mediano foi calculado para cada
uma das localidades. Optou-se por utilizar a mediana em detrimento à média dos valores
anuais da razão de sexo para que se evitasse a interferência de valores eventuais incomuns
(outliers) no valor final da variável.
Análise Exploratória dos Dados
Foi realizada uma análise descritiva comparativa dos quartis, na qual se calculou o
consumo médio bruto por quartil, consumo médio percapita, bem como a mediana dos
valores das proporções de nascimentos masculinos para cada um dos estratos (quartis)
referente ao período de 1994 a 2004 (tabela 1). Foi realizada ainda uma análise descritiva
relativa ao perfil agrícola dos municípios selecionados (tabela 2).
Análise da Tendência
Optou-se pela utilização de modelos de regressão polinomial em virtude do poder
estatístico bem como pela facilidade de formulação e interpretação que os mesmos
oferecem. O modelo de regressão polinomial tem por objetivo encontrar a equação que
melhor descreve a relação existente entre a variável independente X (ano de estudo) e a
variável dependente Y (proporção de nascidos vivos do sexo masculino)
21
. Nesta etapa, tal
modelo foi utilizado para a análise da tendência da razão de sexos ao nascimento para o
estado do Paraná (gráfico 1.a).
Para a referida análise, foi estabelecido um nível de significância de α < 0,05.
Posteriormente, foi construído o diagrama de dispersão para o quarto quartil (municípios
com maior consumo) para as variáveis consumo de agrotóxico percapita em 1985 e
proporção de nascidos vivos do sexo masculino, referente ao período de estudo (gráfico
2a).
Na análise estatística, optou-se por utilizar o consumo de agrotóxicos percapita, de
maneira que a exposição estivesse representada de forma mais fidedigna, proporcional ao
número de habitantes de cada município. O programa utilizado para a elaboração dos
modelos de regressão polinomial foi SPSS for Windows (9.0), assim como para os gráficos
de dispersão.
Descrição Espacial dos Dados
Foi utilizado o software Terraview (versão 3.1.4) para visualização dos dados
geográficos referentes ao consumo de agrotóxicos nos municípios paranaenses. Nesta
etapa, foi construído o mapa temático do estado do Paraná referente ao consumo de
agrotóxico segundo municípios, estratificado em quatro gradientes. Posteriormente foi
construído um mapa de Kernel, ferramenta que permite estimar a quantidade de eventos
por unidade de área em cada célula de uma grade regular que recobre a região estudada
22
.
O mapa de kernel é técnica não paramétrica que promove o alisamento ou suavização
estatística –, permitindo filtrar a variabilidade de um conjunto de dados, retendo as
características essenciais dos locais
22.
Resultados
A estimativa dos coeficientes de correlação de Pearson entre consumo de
agrotóxicos e proporção de nascidos vivos do sexo masculino indicou valores negativos
muito próximos a zero para todos os quartis e, ainda assim, sem significância estatística.
Os valores dos coeficientes de correlação encontrados foram -0.080, -0.149, -0.098 e -
0.125 respectivamente para o primeiro, segundo, terceiro e quarto quartil (tabela1). Os
diagramas de dispersão correspondentes aos quartis corroboram com os valores dos
coeficientes de Pearson encontrados, evidenciando uma correlação negativa próxima de
zero para os municípios dos três primeiros quartis (gráficos não apresentados) e quarto
quartil (gráfico 2a).
Foi observada uma discreta tendência de declínio da proporção de nascimentos
masculinos para o Estado do Paraná no período, como revela o gráfico 1a, porém, sem
significância estatística. No entanto, durante a digitação do banco de dados, percebeu-se
que este efeito se mostrava ressaltado em alguns municípios do estado, fato que motivou a
realização de uma análise específica para essas localidades. Sendo assim, optou-se pela
análise individual dos municípios de Santo Antônio do Caiuá, Nova Aliança do Ivaí,
Jardim Olinda, Guairaçá, Icaraíma, Doutor Camargo, Rio Bom, Cafeara, Palmeira e Barra
do Jacaré, caracterizados por serem de pequeno porte com intensa atividade agrícola e
elevado consumo percapita de agrotóxicos no ano de 1985.
Dos onze municípios mencionados, três apresentaram declínio significativo da
proporção de nascimentos masculinos (p<0,05): Icaraíma, Palmeira e Barra do Jacaré
(gráfico 1b). Em seguida, foi feito um diagrama de dispersão entre o consumo de
agrotóxicos (1985) e a referida proporção masculina de nascimentos (1994-2004) para este
pequeno grupo de 10 municípios, onde se observou a existência de correlação negativa
para as variáveis, embora não significativa (gráfico 2b).
A tabela 2 contém dados referentes à produção agrícola, porcentagem de
trabalhadores na atividade agropecuária, número de estabelecimentos agropecuários, área
colhida em hectare, consumo de agrotóxicos percapita e a respectiva proporção de
nascimentos masculinos no ano de 2004 para estes municípios. De acordo com estes dados,
a variedade de cultivos não difere consideravelmente nos mesmos. Basicamente, os
principais tipos de cultivo nestas localidades são os de mandioca, cana-de-açúcar, soja,
milho, trigo, arroz, feijão, algodão herbáceo, café e, em menor freqüência, as culturas de
girassol, amendoim, erva-mate, fumo, sorgo granífero, banana e cevada. O município com
maior porcentagem da população trabalhando na atividade agropecuária no ano de 1996 foi
Guairaçá com 47,1%, seguido dos municípios Doutor Camargo com 36,3% e Barra do
Jacaré com 35,1% da população respectivamente. O município com maior número de
estabelecimentos agropecuários em 1996 foi Palmeira com 2.152 estabelecimentos,
seguido de Icaraíma (983) e Doutor Camargo (735), respectivamente. O município que
apresentou maior área colhida foi Icaraíma com 1.016,8 hectares, seguido de Palmeira com
623,0 e Guairaçá com 614, 8 hectares. Em relação ao consumo de agrotóxicos, o município
com maior consumo percapita foi Cafeara com 541,8 seguido de Barra do Jacaré com
449,0 e Palmeira com 359,6. Todos os dez municípios analisados, com exceção de Rio
Bom, Nova Aliança do Ivaí e Barra do Jacaré (tiveram a proporção de nascidos vivos do
sexo masculino em 2004 acima de 50,0), apresentaram proporção de nascimentos
masculinos inferior a 50.0, evidenciando uma inversão nos valores da razão de sexos ao
nascimento, na qual o número de nascimentos masculinos foi proporcionalmente inferior
ao número de nascimentos femininos.
O mapa temático em seguida mostra a distribuição espacial deste consumo
estratificada por diferentes gradientes de consumo de agrotóxicos nos municípios, no qual
os 10 municípios selecionados encontram-se dentro das faixas de maior consumo. As
informações contidas neste mapa foram estimadas posteriormente em um mapa de Kernel,
na qual as "regiões quentes" encontraram-se predominantemente nas Mesoregiões Norte
Pioneiro Paranaense e Centro Ocidental Paranaense.
Discussão e Conclusão
Apesar das evidências, os motivos pelos quais a razão de sexos ao nascimento
parece estar declinando em alguns países ainda o estão esclarecidos
24.
Parece que ainda
muito que se aprofundar sobre o tema, relevante, mas relativamente novo e pouco
explorado. Embora não haja conclusões definitivas sobre seus reais mecanismos de
ocorrência, existem evidências de que a razão de sexos ao nascimento possa ser alterada
por exposições químicas ambientais e ocupacionais. Por exemplo, a redução da proporção
de nascimentos masculinos foi observada em populações expostas à dioxina
9
, mercúrio
25
,
pesticidas
26, 27, 28
e bifenilas policloradas
29
. A explicação é que tais compostos têm ação
disruptora sobre o sistema endócrino, influenciando a razão de sexos por alteração das
concentrações hormonais dos pais ou mesmo através da indução de mortalidade sexo-
específica in utero
25.
No entanto, alguns autores sugerem que não se pode atribuir a responsabilidade
pelo declínio na proporção de nascimentos masculinos exclusivamente à poluição
ambiental por desreguladores endócrinos, uma vez que não se sabe como se comportaria
tal proporção na ausência desses poluentes
8
.
Embora existam evidências crescentes de que a exposição ocupacional e ambiental
a desreguladores endócrinos possa afetar a razão de sexos ao nascimento, os resultados
obtidos até a presente data são de difícil interpretação em virtude de achados conflitantes e
do grande número de variáveis envolvidas na determinação da razão de sexos. Desta
forma, o efeito da exposição química na razão de sexos ao nascimento das populações
parece depender de um grande número de fatores, que incluem a idade dos pais no
momento da exposição, a intensidade/ frequência da exposição e se a exposição ocorreu no
pai ou na mãe
24.
Em contrapartida, estudos como o realizado por Figa-Talamanca
6
, no qual se
constatou associação significativa entre exposição à dioxina - decorrente do acidente de
Seveso em 1976 - e o declínio na proporção de nascimentos de homens na coorte de estudo
não devem ser desprezados, assim como os resultados obtidos em outro trabalho no qual se
utilizou uma coorte de trabalhadores expostos à dioxina neste mesmo acidente
9
(tabela 3).
Outros exemplos de episódios de exposição ocupacional e acidental a desreguladores
endócrinos e alterações na proporção de nascidos vivos do sexo masculino são
mencionados na tabela 3, para efeitos comparativos.
O resultado de um estudo desenvolvido em um grupo de trabalhadores expostos a
diferentes tipos de dioxinas mostrou que a proporção de nascidos vivos do sexo maculino
foi significativamente mais baixa nesta coorte (40,0%) quando comparada ao grupo não
exposto
10
. Em outro trabalho, atribuiu-se o excesso de nascimentos de crianças do sexo
feminino em áreas próximas a indústrias incineradoras na região central da Escócia à
exposição a poluentes químicos liberados na fumaça
11
. Outro exemplo refere-se a um
estudo que investigou se a exposição ocupacional de trabalhadores a gasolina na província
de Farz, no Iran, afetava a razão de sexo de seus filhos. Neste caso, foi concluído que a
razão de sexos da prole da coorte exposta foi significantemente mais baixa quando
comparada à razão de sexos no grupo não exposto
12.
Com base nestas evidências, foram buscadas informações sobre o comportamento
da razão de sexos no contexto brasileiro, mais precisamente no Estado do Paraná, grande
produtor rural e, conseqüentemente, consumidor de agrotóxicos e produtos ligados à
atividade agrícola.
Os dados disponíveis sobre consumo de agrotóxicos no ano de 1985 no Estado do
Paraná permitiram a realização de uma análise exploratória preliminar, na qual se buscou
verificar a existência de uma possível correlação entre o referido consumo (exposição) e a
tendência de declínio da proporção de nascimentos masculinos verificada na região.
Embora não se observado correlação robusta e estatisticamente significante entre o
consumo de agrotóxicos e a tendência da proporção de nascimentos masculinos, é
conveniente que alguns pontos sejam considerados.
A prática de compra de agrotóxicos não significa necessariamente que o produto
será para uso exclusivo no território do município comprador, fato que poderia introduzir
tendenciosidade na interpretação dos resultados deste estudo. Outro ponto importante
refere-se ao fato de que as informações referentes ao consumo de agrotóxicos não estavam
disponíveis segundo sua classificação por tipos específicos (inseticidas, herbicidas,
fungicidas e outros), o que não permitiu uma avaliação mais detalhada. Neste caso, a
multiplicidade de propriedades e efeitos observada nestas diferentes classes de agrotóxicos,
resulta em dinâmicas diferenciadas destes poluentes nas matrizes ambientais, assim como
na intensidade da gravidade dos danos causados nos sistemas reprodutivos de animas e
humanos
14, 24
.
Embora os tipos de cultivos pesquisados por municípios (tabela 2) tenham
fornecido uma idéia do tipo de agrotóxicos utilizados nos diferentes municípios, -
herbicidas, fungicidas e inseticidas em sua maioria - é necessário que haja um maior
detalhamento e especificação das substâncias químicas utilizadas
1.
Algumas características particulares dos municípios mereciam ainda serem levadas
em consideração, a exemplo da extensão territorial e proximidade das áreas de cultivo com
os centros urbanos, onde possivelmente encontra-se grande parte da população exposta,
fator de importante peso na caracterização da intensidade da exposição. Sob este aspecto, é
importante mencionar que se utilizou um amplo contingente de municípios agrupados em
quartis, cujo critério de formação dos grupos baseou-se exclusivamente no consumo de
agrotóxicos. Desta forma, assumiu-se o consumo destas substâncias como único indicador
da exposição ambiental a desreguladores endócrinos, quando na verdade sabe-se que tais
contaminantes podem ter diversas origens
14, 24.
Ao se agrupar em quartis um grande número de municípios, cada qual com
geografia e economia próprias, é provável que tenha ocorrido diluição da exposição, fato
que motivou a seleção e análise individual de um grupo de municípios.
O gráfico de tendência polinomial destas localidades revelou um declínio
visivelmente acentuado ao longo de um período de apenas dez anos (1994-2004), cujos
valores da proporção de nascimentos de crianças do sexo masculino passaram de usuais
(acima de 51,%) a valores típicos de localidades que sofreram intensa exposição a
desreguladores endócrinos (abaixo de 50%) (gráfico 1b)
6, 9, 10, 24
.
A hipótese de que o uso abusivo de agrotóxicos tenha contribuído para o declínio
de nascimentos de homens torna-se consistente quando analisamos o grau de proximidade
entre os municípios. O mapa temático, assim como o mapa de Kernel mostraram uma
localização próxima entre os municípios selecionados e, mais precisamente, uma
localização dentro da área de influência calculada pelo estimador. A partir do mapa de
kernel, percebemos que a área de influência calculada se origina desde parte da
Mesoregião Oeste Paranaense, passando pelo Centro Ocidental, Nordeste e Norte Central
Paranaense indo até a Mesoregião Norte Pioneiro Paranaense.
Além disso, os resultados mostraram que o gráfico de dispersão dos municípios
pertencentes ao quarto quartil (maiores consumidores de pesticidas) apresentou tendência
de declínio da proporção de nascimentos masculinos na medida em que os valores de
consumo de pesticidas aumentam (embora não tenhamos observado correlação
significativa), constituindo desta forma, um forte indício de que o alto consumo de
agrotóxicos neste grupo de municípios possa estar influenciando a razão de sexos ao
nascimento nestas localidades.
É importante ressaltar ainda que os três municípios que apresentaram tendências de
declínio significativas foram também os que apresentaram maior área colhida em hectares
(Icaraíma e Palmeira), a terceira maior porcentagem da população trabalhando na atividade
agropecuária (Barra do Jacaré) e maior número de estabelecimentos agropecuários
(Palmeira e Icaraíma).
A limitação inerente aos estudos ecológicos quanto à dificuldade em se estabelecer
relações de causa e efeito constitui outro fato que deve igualmente ser considerado. Aliado
a isto, acredita-se que a utilização da razão de sexos ao nascimento, expressa aqui na forma
de proporção de nascimentos masculinos, como indicador sentinela da saúde reprodutiva e
ambiental é mais confiável quando se trata de populações pequenas, especialmente quando
a exposição a poluentes químicos é documentada, o que não ocorre em estudos ecológicos
6, 24
.
Sob este aspecto, novos estudos que englobem períodos mais extensos
(considerando que o desfecho aqui estudado é produto de exposições crônicas) devem ser
realizados, bem como estudos que avaliem a situação da razão de sexos ao nascimento em
décadas anteriores a história de consumo excessivo de agrotóxicos nestas localidades, pois,
a proporção de nascimentos masculinos referente aos municípios selecionados para o
período (1994-2004), mostrou-se frequentemente no limite inferior (boderline) em relação
àquela considerada normalmente usual. Neste caso, seria possível uma avaliação mais
precisa e segura da trajetória do comportamento da razão de sexos ao nascimento no
Estado do Paraná, capaz de dimensionar a real magnitude do impacto do consumo de
agrotóxicos na razão de sexos ao nascimento.
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30. DATASUS. Disponível em www.datasus.gov.br
Mapa temático. Consumo de agrotóxicos em 1985 segundo municípios paranaenses. Pontos em
vermelho referente a localização dos 10 municípios selecionados.
Mapa de Kernel. Regiões (hot spots) que tiveram alto consumo de agrotóxicos em 1985.
TABELA 1.
Correlação bivariada entre o consumo per capita de agrotóxicos (1985) e valores medianos das proporções
de nascidos vivos do sexo masculino (1994-2004) por quartil, com seus respectivos valores de coeficiente de
Pearson e intervalos de confiança.
*Fonte: IBGE & DATASUS.
Total de vendas
de agrotóxicos
(1985)
Consumo per capita
de agrotóxicos*
(1985)
Nascimentos
masculinos (%) -
mediana
Coeficien
te
de Pearson
Sig.
(bilateral)
Primeiro
Quartil
665.200,6
14,0
51,2
r = - 0,080
0, 487
Segundo
Quartil
2.089.287,0
82,5
51,1
r = - 0,149
0, 196
Terceiro
Quartil
2.754.912,6
177,6
51,0
r = - 0,098
0, 395
Quarto
Quartil
5.874.764,2
429,5
51,3
r = - 0,125
0, 277
TABELA 2. Perfil da atividade agrícola, consumo de agrotóxicos (1985) e proporção de nascidos vivos do sexo
masculino em 2004 em municípios selecionados, Paraná, Brasil.
* No grupo de trabalhadores na agropecuária, estão incluídos homens, mulheres e crianças. Fonte: IBGE.
Município
Pessoal
Ocupado na
Agropecuária
em 1996 (%)*
Estabelecimentos
Agropecuários,
1996 (unidade)
Área Colhida
(hectare)
(1996
)
Principal tipo de
cultivo
(lavoura permanente/
temporária)
Consumo de
Agrotóxicos
Per Capita
(1985)
Nascimentos
masculinos
(%)
2004
Sto. Antônio
do Caiuá
14,2
65
87,2
Mandioca, algodão
(herbáceo), milho,
feijão, soja e café;
130,4
44,8
Nova Aliança
do Ivaí
32,2
69
61,1
Cana-de-açúcar,
mandioca, soja, milho,
laranja e café;
95, 9
50,0
Guairaçá
47,1
411
614,8
Mandioca,
milho, feijão,
café, laranja e
sorgo granífero;
161,0
41,1
Jardim
Olinda
14,2
31
5,4
Milho, soja,
mandioca, algodão
(herbáceo), feijão,
girassol e café;
147,7
26,3
Icaraíma
*
32,9
983
1.016,8
Cana-de-açúcar, arroz,
feijão, milho, algodão,
mandioca, soja e café;
0,41
99,2
45,3
Doutor
Camargo
36,3
735
318,8
Soja, milho, aveia, trigo,
girassol, café e banana
;
170,4
40,3
Rio Bom
26,4
608
88,9
Soja, milho, trigo, feijão, aveia,
triticale (grão), arroz, café e
banana;
113,2
52,4
Cafeara
31,9
181
179,5
Soja, milho, feijão, cana-de-
açúcar, algodão, café,
girassol e amendoim;
541,8
40,0
Palmeira
*
23,4
2.152
623,0
Milho, trigo, soja,
feijão, fumo, cevada
(grão), aveia, batata-
inglesa, arroz, erva-
mate, maça e uva;
359,6
48,0
Barra do
Jacaré*
35,1
400
46,8
Cana-de-açúcar, café,
arroz, algodão, soja, milho
e trigo;
449,0
52,0
TABELA 3. Episódios de exposição ocupacional e acidental a desreguladores hormonais e proporção de nacimentos
masculinos.
AUTOR
LOCAL
ANO/TEMPO
DE EXPOSIÇÃO
POLUENTE
NASCIMENTOS
MASCULINOS (%)
Mocarelli e
cols., (2000)
Seveso (Itália)
(1976-1977)
TCDD
(tetraclorodibenzo
p-dioxina)
48,0
Ryan e cols.,
(2002)
Bashkortostan
(Rússia)
(1961-1988)
TCDD
(tetraclorodibenzo
p-dioxina)
40,0
Willians e cols.,
(1992)
Distrito de Falkirk
(Escócia)
(1975-1979)
Fumaça de
Incineradores
50,0
Ansari-Lari e
cols., (2004)
Shiraz, província de
Fars (Iran)
(7,7anos)
Gasolina
41,0
Gibson e
Koifman, (2007)
Paraná, Brasil
(1985)
Agrotóxicos
Todos os quartis = 51,0
Sto. Antônio Caiuá = 44,8
Nova Aliança Ivaí = 50,0
Guairaçá = 41,1
Jardim Olinda = 26,3
Icaraíma = 45,3
Doutor Camargo = 40,3
Rio Bom = 52,4
Cafeara = 40,0
Palmeira = 48,0
Barra do Jacaré = 52,0
Gráfico 2.a
Diagrama de Dispersão
IV Quartil
Venda de Agroxicos
413.000412.000411.000410.000
Nascimentos Masculinos (%)
60,0
58,0
56,0
54,0
52,0
50,0
48,0
46,0
Rsq = 0,0106
Gráfico 1.a
Proporção de Nascimentos Masculinos
Paraná - PR (1994-2004)
Ano (1999-X)
6420-2-4-6
Nascimentos Masculinos (%)
51,8
51,6
51,4
51,2
51,0
50,8
Rsq = 0,0452
Gráfico 1.b
Gráfico 2.b
Tendência da Proporção de Nacimentos Masculinos
Municípios Paranaenses (1994-2004)
40,0
42,5
45,0
47,5
50,0
52,5
55,0
57,5
60,0
1994
1996
1998
2000
2002
2004
Período (anos)
Nova Aliança Ivaí
Cafeara
Jardim Olinda
Santo Antônio Caiuá
Barra do Jacaré*
Guaiçará
Rio Bom
Icaraíma*
Doutor Camargo
Palmeira*
Nascimento Masculino (%)
*Municípios com t
endência decrescente com nível de significância
α
= 0,05
Diagrama de Dispersão
Municípios Selecionados
Venda de Agrotóxicos
6005004003002001000
Nascimentos Masculinos (%)
0,58
0,56
0,54
0,52
0,50
0,48 Rsq = 0,0273
4. CONCLUSÃO
A partir dos resultados mostrados, chegamos às seguintes conclusões:
- A proporção de nascidos vivos do sexo masculino observada no Brasil apresentou tendência de declínio no
período de 1979 a 1994 e, a partir daí, passou a apresentar tendência crescente que se estendeu até o final da
série temporal em 2004;
- Para o período compreendido entre 1979 e 1994, a tendência da proporção de nascimentos masculinos no
Brasil mostrou-se semelhante ao padrão de declínio observado na segunda metade do século XX em países
europeus, assim como nos Estados Unidos e Canadá, fato que pode estar relacionado ao grande
desenvolvimento industrial e a Revolução Verde daquela época;
- Para a maioria dos estados, capitais e Grandes Regiões, foram observadas variações não significativas ao
longo do período de estudo, o que nos sugere que a tendência da proporção de nascimentos masculinos se
manteve estável ao longo do período de estudo;
- Dentre os estados brasileiros, apresentaram tendências crescentes na proporção de nascidos vivos do sexo
masculino o Acre e São Paulo. O incremento no Acre foi de 3,3% (saiu de 49,8 para 51,5 em 2004), enquanto
que São Paulo, embora o incremento tenha sido significativo, o mesmo não teve grande impacto na média
final;
- O estado do Pará, embora tenha apresentado tendência significativa na proporção de nascidos vivos do sexo
masculino, a mesma não foi constante ao longo da série;
- O estado do Ceará foi o único a apresentar tendência de declínio significativa na proporção de nascimentos
masculinos, chamando atenção para o valor de 50,7 em 2004, no limite inferior (boderline) quando
comparado a valores usuais descritos na literatura. Foi observada ainda tendência de declínio para o estado
do Paraná, no entanto, não significativa;
- Três capitais brasileiras apresentaram tendências crescentes significativas, sendo que todas saíram de
valores abaixo de 50,0 para valores acima de 50,0: Palmas (aumento de 8,2% no período), Cuiabá e Rio
Branco, com aumento de 4,8% e 5,6% respectivamente. Belém e Florianópolis também apresentaram
tendências significativas, porém, não constante ao longo do período;
-
A tendência significativa crescente observada em alguns estados e capitais sugere que esse padrão possam
ser explicado, em parte, por transformações demográficas que o país atravessou nas últimas décadas, a
exemplo da redução da taxa de fecundidade entre as mulheres. Este resultado distancia a hipótese de
possíveis exposições a desreguladores endócrinos ambientais, a exceção do estado do Ceará, cuja tendência
foi de declínio;
- A tendência de crescimento observada para a capital Palmas pode ser resultado do grande incremento no
número de nascidos vivos (133,8%) desde a recente criação do estado do Tocantins em 1988, possivelmente
decorrente de um intenso processo emigratório;
- Por outro lado, a tendência de declínio observada para o estado do Ceará revela a necessidade de estudos
futuros, direcionados à investigação de suas causas, uma vez que o fenômeno vem sendo associado à
exposição a desreguladores endócrinos ambientais em outros países;
- Ao analisar o padrão da tendência de declínio em dez municípios paranaenses selecionados, verificamos
que o mesmo parece ser mais acentuado quando comparado ao padrão observado para o estado do Paraná,
sugerindo que a extensão territorial tende a diluir a velocidade com que tal declínio vem ocorrendo;
- O declínio na proporção de nascimentos masculinos observado nos municípios paranaenses selecionados
foi visivelmente acentuado considerando que a série estudada foi de apenas 11 anos, cujos valores passaram
de usuais (acima de 51,0) a valores picos de localidades onde ocorreu uma exposição intensa a
desreguladores endócrinos (abaixo de 50,0);
- O diagrama de dispersão dos municípios pertencentes ao quarto quartil (maiores consumidores de
pesticidas) apresentou tendência de declínio na proporção de nascimentos masculinos na medida em que os
valores de consumo de pesticidas aumentam (embora não tenhamos observado correlação significativa),
constituindo um forte indício de que o alto consumo de agrotóxicos neste grupo de municípios possa ter
contribuído para este declínio nestas localidades;
- A proximidade destes municípios, localizados dentro da região de interpolação apresentada no mapa de
Kernel, reforça a hipótese de que o uso intenso de agrotóxicos com conseqüente contaminação ambiental
nesta região tenha contribuído para a tendência de redução na proporção de nascidos vivos do sexo masculino
nestas localidades;
- É importante ressaltar ainda que dentre os dez municípios analisados separadamente, os três que
apresentaram tendências estatisticamente significativas (Icaraíma, Palmeira e Barra do Jacaré) foram também
os que apresentaram maior área colhida em hectares (Icaraíma e Palmeira), maior número de
estabelecimentos agropecuários (Palmeira e Icaraíma) e a terceira maior porcentagem da população
trabalhando na atividade agropecuária (Barra do Jacaré).
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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