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UIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE
PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA
ÚCLEO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
DE LA SALLE A LACASTER: os métodos de ensino na Escola de
Primeiras letras sergipana (1825-1875).
LUÍS SIQUEIRA
São Cristóvão-Sergipe
2006
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2
Dissertação de Mestrado
Luís Siqueira
DE LA SALLE A LACASTER: os métodos de ensino na Escola de
Primeiras letras sergipana (1825-1875)
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Educação da
Universidade federal de Sergipe, como
requisito parcial à obtenção de título de
Mestre em Educação, sob orientação do
professor Doutor Miguel André Berger.
São Cristóvão - Sergipe
2006
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3
Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução total ou parcial
do trabalho sem autorização da universidade, da autoria e do
orientador.
FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA CENTRAL
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE
S237s
Siqueira, Luís
De La Salle a Lancaster : os métodos de ensino na
escola de primeiras letras sergipana (1825-1875) / Luís
Siqueira. – São Cristóvão, 2006.
226 f. : il.
Dissertação (Mestrado em Educação) Núcleo de
Pós-Graduação em Educação, Pró-Reitoria de Pós-
Graduação e Pesquisa, Universidade Federal de
Sergipe, 2006
Orientador: Prof. Dr. Miguel André Berger
Educação elementar. 2. Instrução primária. 3.
História da educação Sergipe Província . 4. Métodos
de ensino. I. Título.
CDU 372.4(813.7)(091):371.3
4
5
a sala atijolada, três bancos encostados às paredes. Bancos altos. Os meninos, em sua
maioria, ficavam com as pernas no ar. Depois da minha entrada, puseram mais bancos. a
parede do fundo, encostava-se dona Sá Limpa, Sá Limpa para toda Itaporanga. Era
hidrópica, barriga imensa, um baú, impando diante dela como o bombo da Filarmônica
Itaporanguense. As faces, verdadeiras chagas, queimavam sob os olhos febris. Os dentes,
meio separados uns dos outros. Por entre eles passavam o Tesouro de Leitura, a Gramática
do Dr. Abílio, as quatro operações aritméticas e... o bafo do cachimbo de cano comprido,
com que assomava na aula e tirava da boca quando tinha que ralhar mais forte com
algum menino “Atrevido”.
(...) A sala da escola abria para a rua por uma porta sobre dois batentes que davam logo
para lama. A rua de Itaporanga era um rego por onde a enxurrada cachoeirava num
barulho gostoso. Para os pés da meninada era uma delícia. Saíamos da aula correndo a
patinhar na água barrenta que grugrulejava a rua abaixo. Oh, prazer! A idade da maioria
dos meninos era entre seis e dez anos, mas havia marmanjos de quinze e até um de dezoito,
moleques de engenho mandados tarde à escola.
(...) os meninos, todos, decoravam a tabuada cantando: “DOIS, MAIS DOIS, QUATRO!
TRÊS VEIS SEIS, DEZOITO!” João fazia isto olhando para o teto e alisando a perna com
a mão espalmada.
(AMADO, Gilberto. História de Minha infância. São Cristóvão, SE: Editora da UFS/
Fundação Oviêdo Teixeira, 1999. p. 57-58).
6
Á minha mãe, Julieta Santos Siqueira, sempre presente no incentivo.
Á Cristiane Silva Siqueira, fiel escudeira, por me segurar mesmo quando
não me dei conta.
À Luana Silva Siqueira, refrigério de meu cansaço, pelos abraços que
me deu quando escrevia.
7
AGRADECIMETOS
Na realização deste trabalho contei com a colaboração de muitas pessoas e sei que sem
elas não conseguiria chegar ao resultado que aqui está. Por isso expresso minha profunda
gratidão:
Ao professor doutor Miguel André Berger, pela atenção criteriosa na orientação e pelo
incentivo;
Ao professor doutor Jorge Carvalho do Nascimento, que mesmo entendendo minha
mudança de orientação não deixou de orientar e fazer sugestões no trabalho;
À professora doutora Anamaria Gonçalves Bueno de Freitas, pelas sugestões
apresentadas no exame de qualificação;
Ao engenheiro eletricista Hilton Cezar Gomes Silva, pala elaboração dos mapas das
escolas de primeiras letras;
Ao arquiteto Sérgio, pela orientação nos arquivos baianos;
Às amigas Joselita Marques Santos e Walneyde de Santana lima, pelas incontáveis
leituras e correção gramatical;
Aos amigos do Mestrado em Educação, Orlando Moreira Rochadel, Ricardo Abreu
Nascimento, Maria Lúcia Marques, Cristiane Vitório de Souza, Ana Luzia Santos, Maria
Betânia e Marcos Arlindo, pelas trocas de idéias, leituras, sugestões de fontes e vivência de
pesquisador;
Aos amigos da “informática”, Denis Santos silva e Reinaldo Barbosa dos Santos, pelos
socorros nas horas de aflição e ignorância;
Aos amigos Genilson Santos (Zinho), Robson da Silva Posidônio e Ricardo da Silva
Posidônio, pelos incansáveis apoios moral e cordial;
Aos familiares Meire Siqueira e Ana Carla Silva Siqueira, pelos socorros nas horas de
aflições;
À professora e amiga Maria Verônica Meneses Nunes, do Departamento de História da
UFS, pelo incentivo na caminhada do Mestrado;
A CAPES pela bolsa de Mestrado;
8
Aos professores do Mestrado, Vilma Porto, Maria Helena Santa Cruz, Edmilson
Meneses;
Ao Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, em especial a seu Gustavo; Ao Arquivo
Público do Estado de Sergipe, na pessoa do diretor Marques.
9
SUMÁRIO
Lista de Figuras..............................................................................................................viii
Lista de Quadro................................................................................................................ix
Lista de Tabelas.................................................................................................................x
Lista de Siglas...................................................................................................................xi
Resumo............................................................................................................................xii
Abstract..........................................................................................................................xiii
ITRODUÇÃO.............................................................................................................01
CAPÍTULO I - DA ORGAIZAÇÃO DA ISTRUÇÃO PRIMÁRIA..................64
1.1- O Brasil independente........................................................................................23
1.2- A Província sergipana........................................................................................28
CAPÍTULO II - DOS MÉTODOS DE ESIO........................................................64
2.1- O Método Simultâneo..........................................................................................65
2.1.1- Aspectos Gerais...............................................................................................65
2.1.2- A forma da escola............................................................................................66
2.1.3- O mobiliário da escola.....................................................................................67
2.1.4- Os agentes do ensino.......................................................................................68
2.1.5- Os registros......................................................................................................69
2.1.6- Meios disciplinares..........................................................................................71
2.1.6.1- Da divisão do tempo e das matérias de ensino.............................................71
2.1.6.2- Os comandos ...............................................................................................72
2.1.6.3- Recompensas e castigos...............................................................................80
2.1.6.3.1- Recompensas.............................................................................................81
2.1.6.3.2- Castigos.....................................................................................................82
2.1.6.4- Os exames....................................................................................................83
2.1.5- Classificação dos diferentes ramos do ensino.................................................85
2.1.5.1- O ensino da Gramática.................................................................................85
2.2- O Método Mútuo...................................................................................................89
10
2.2.1- Aspectos gerais................................................................................................89
2.2.2- O local da escola.............................................................................................90
2.2.3- A mobília da escola.........................................................................................91
2.2.4- O emprego do tempo......................................................................................93
2.2.5- Dos comandos, da execução e das regras do ensino.......................................94
2.2.6- Classificação das matérias de ensino..............................................................98
2.2.6.1- Ensino de leitura...........................................................................................98
2.2.6.1.2-Métodos...................................................................................................99
2.2.6.2-Ensino da Gramática e da Ortografia..........................................................100
2.2.6.2.1- Métodos...................................................................................................101
2.2.6.3- Ensino da escrita.........................................................................................101
2.2.6.3.1- Métodos................................................................................................101
2.2.6.4- Ensino da Aritmética..................................................................................102
2.2.6.4.1- Métodos................................................................................................103
2.2.6.5- Ensino do desenho linear............................................................................105
2.2.6.5.1- Métodos................................................................................................105
2.2.6.6- Ensino do catecismo...................................................................................106
2.2.6.6.1- Métodos................................................................................................107
2.2..7- Ensino aos monitores...................................................................................109
2.2.8- Recompensas e castigos................................................................................109
2.2.9- Exames......................................................................................................... 111
2.2.10- Registros......................................................................................................113
CAPÍTULO III - DOS QUE SE HABILITAVAM...................................................114
3.1-A legislação sergipana.......................................................................................117
3.2-Os concursos públicos.......................................................................................123
3.3-As visitas...........................................................................................................143
3.4- A habilitação....................................................................................................154
CAPÍTULO IV - OS MÉTODOS AS ESCOLAS SERGIPAAS.......................162
4.1- O Ensino mútuo................................................................................................162
4.1.1- As críticas ao método.................................................................................178
4.2- O ensino simultâneo.........................................................................................182
11
4.2.1- As críticas e elogios ao método..................................................................203
COSIDERAÇÕES FIAIS................................................................................212
FOTES.................................................................................................................217
REFERÊCIAS BIBLIOGRÁFICAS................................................................222
12
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1: Prova da candidata Flávia Benedicta de Niterbo em 27/09/1848.............125
FIGURA 2: Prova da candidata Narcisa Joaquina de Campos em 27/09/1848...........126
FIGURA 3: Prova da candidata Maria Pastora dos Anjos em 27/09/1848..................127
FIGURA 4: Prova do candidato Antonio Rodrigues das Fragas em 23/02/1848.........128
FIGURA 5: Prova do candidato Antonio Rodrigues das Fragas em 23/02/1848.........129
FIGURA 6: Prova do candidato Sevolo Rodrigues de São José em 07/11/1853.........131
FIGURA 7: Prova do candidato Manuel Rodrigues D’Ávila em 27/09/1853..............132
FIGURA 8: Prova do candidato Manuel Rodrigues D’Ávila em 27/09/1853..............133
FIGURA 9: Prova da candidata Ana Maria de São José Paes em 24/07/1853.............135
FIGURA 10: Prova da candidata Ana Maria de São José Paes em 24/07/1853...........136
FIGURA 11: Atestado de delegacia de policia do candidato João Batista de Meneses em
30/03/1864...............................................................................................................139
FIGURA 12: Atestado de saúde do candidato João Batista de Meneses em
18/08/1864.....................................................................................................................140
FIGURA 13: Atestado de cartório do candidato João Batista de Meneses em
06/04/1864.....................................................................................................................141
FIGURA 14: Traslado de visita das aulas da vila de Estância em 28/03/1832........... 150
FIGURA 15: Traslado de visita das aulas da vila de Estância em 28/03/1832........... 151
FIGURA 16: Planta baixa 01 da escola do sexo feminino da vila de Campos............193
FIGURA 17: Planta baixa 02 da escola do sexo feminino da vila de Campos............197
FIGURA 18: Planta baixa 03 da escola do sexo feminino da vila de Campos............202
13
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1: Distribuição das matérias de ensino e sessão das aulas............................49
QUADRO 2 : Registro de inscrição................................................................................70
QUADRO 3 : Distribuição das matérias de ensino e horário das aulas........................189
14
LISTA DE TABELAS
TABELA 1: Classificação das alunas da aula da vila de Campos em 1866.................195
TABELA 2: Classificação dos alunos da escola do sexo masculino da vila de Campos em
1866.........................................................................................................................199
15
LISTA DE SIGLAS
A: Arquivo Nacional
APES: Arquivo Público do Estado de Sergipe
BPEB: Biblioteca Pública do Estado da Bahia
CAPES: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior
IHGS: Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe
UFS: Universidade Federal de Sergipe
16
RESUMO
No século XIX a escola de primeiras letras passou por um processo de afirmação na
Província sergipana. A partir do momento em que os administradores provinciais
entenderam que através desta instituição escolar seria capaz de transformar regras de
condutas e garantir estabilidade social, levantaram bandeira de luta a favor da instrução
pública para a população escolarizável. Tomando de empréstimo o que havia de mais
moderno em termos de tecnologia pedagógica, os administradores adotaram métodos de
ensino para as escolas de primeiras letras sergipanas. O primeiro a ser adotado foi o método
mútuo ou método de Lancaster, no final da década de 1820. Em Sergipe, só funcionou uma
escola com essa tecnologia de ensino, em São Cristóvão, capital da Província. Não se sabe
até quando durou essa escola, mas em forma discursiva o método se estendeu até a cada
de cinqüenta quando os administradores passaram a fazer críticas e apontar um outro. A
partir desse momento o método de ensino simultâneo passou a fazer parte nos discursos dos
defensores da instrução pública para a população sergipana. Com a aplicação dessa nova
tipologia de ensino não era bem disciplinar, como fazia a anterior, mas ordenar fazendo
com que os valores transmitidos pela escola de primeiras letras formassem um homem
capaz de respeitar as leis, imperiais e a religião professada pelo Império, garantindo desta
forma condição de governabilidade. O ensino simultâneo teve vigência em Sergipe até a
década de 1870 quando os administradores provinciais se apropriaram das idéias de
Pestalozzi e Basedaw passando a descaracterizá-lo e indicar outro: o método de coisas.
PALAVRAS-CHAVE:
Escola de primeiras letras, instrução primária, método mútuo, método simultâneo,
Província de Sergipe.
17
ABSTRACT
The School of First Letters was submitted to a confirmation process in Sergipe during the
XIX Century. When province administrators understood that they would be able to
transform behavior rules and guarantee social stability through the use of these schools,
they began promoting the instruction of the school-age population. Using the most modern
European pedagogic technology, the administrators adopted the teaching methods of the
School of First Letters in Sergipe. The first method adopted was the mutual method starting
in 1820. There was only one mutual method school operating in Sergipe which was situated
in São Cristóvão, the capital of the Province. This method was chosen to discipline the
population of the capital on that time. The mutual method was used until the 1950´s when
other administrators started criticizing their efficiency to Sergipe and adopted the
simultaneous teaching method. This new method had as an objective transmiting the values
of Brazilian Empire through schools and establishing social order. Unlike the previous
method, the intention was not a disciplinal one but to transmit values that would prepare
people to respect Imperial Laws and the religion as vassals. The simultaneous teaching
method was in practice until the 1970´s, when administrators following ideas of Pestalozzi
and Basedaw uncharacterized it and recommended the adoption of the lessons with things
and the intuitive method.
Key words:
school of first letters; mutual method; simultaneous teaching method;
intuitive method.
18
ITRODUÇÃO
O século XIX foi o período em que o conceito de infância foi mais defendido por
aqueles que, imbuídos de ideais filosóficos, tomaram a tarefa de cuidar da criança. A
criança passou a ser vista como um ser que necessitava de cuidados. E um desses cuidados
seria uma instituição que lhe guiasse para um estágio de instrução: a escola primária.
Esse conceito foi tomado por empréstimo da filosofia do século anterior, tendo em
Rousseau seu maior expoente. Rompendo com a concepção de que a criança era um adulto
em miniatura como ocorria na Idade Média,
1
esse filósofo formulou nova visão admitindo
que se veja a criança em sua especificidade.
A humanidade tem seu lugar na ordem da vida do homem; é preciso considerar o
homem no homem e a criança na criança. Determinar para cada qual o seu lugar a ali
fixá-lo, ordenar as paixões humanas conforme a constituição do homem, é tudo o que
podemos fazer pelo seu bem-estar. O resto depende de causas alheias que não estarão
em nosso poder.
2
A infância, para o filósofo genebrino, começa a ocupar lugar na fase evolutiva da
idade dos homens. Ocorre, dessa forma, uma chamada para o aspecto peculiar da fase
infantil. Começava a surgir desigualdades jurídicas entre as fases do homem, ou seja, as
diferenças entre o ser criança e o ser adulto. Na visão de Rousseau, a fase da criança ou
condição infantil não é do arbítrio do homem, mas da natureza. É a natureza quem ordena
cada fase da vida humana. Ao homem e aos educadores cabem o respeito e cuidados para
com a educação da criança. Não tem cabimento, portanto, alterar a ordem da natureza, pois
a infância exige condições de educabilidade própria, diferente do adulto.
A natureza quer que as crianças sejam crianças antes de serem homens. Se quisermos
perverter essa ordem, produziremos frutos temporões, que o estarão maduros e nem
terão sabor, e não tardarão em se corromper; teremos jovens doutores e crianças velhas.
A infância tem maneira de ver, de pensar e de sentir que lhes são próprias; nada é
menos sensato do que querer substituir essas maneiras pelas nossas, e para mim seria a
1
- Arriés demonstrou em suas pesquisas que o conceito de infância é produto da modernidade. Segundo o
autor, a Idade Média não conheceu a infância. ARRIÉS, Philippe. História social da criança e da família.
Trad. de Dora Flaksman. 2 ed. Rio de Janeiro: LTC, 1981.
2
- ROUSSEAU, Jean-Jacques. Emílio ou Da Educação. Trad. de Roberto Ferreira Leal. 3 ed. São Paulo:
Martins Fontes, 2004. p. 73-74.
19
mesma coisa exigir que uma criança tivesse cinco pés de altura e que tivesse juízo aos
dez anos. Com efeito, de que servirá a razão nessa idade?
3
Ao defender que a criança necessita de cuidados especiais, Rousseau admite que se
repense a atividade pedagógica para esse ser. A atividade pedagógica proposta pelo filósofo
é o respeito às leis e aos costumes comuns. Mas não respeito de forma impositiva, mas do
livre arbítrio do homem. O homem agirá assim, mas não por convenções sociais, e sim de
acordo com as suas convicções morais.
Pode-se concluir que o conceito de infância defendido por esse filósofo traz implícita
uma formação do indivíduo para agir em sociedade. Sociedade esta regenerada, sem
corrupção e sem máscara. A pedagogia proposta pressupõe respeito às leis da natureza,
observando as peculiaridades do indivíduo.
A educação adquire uma extrema importância na filosofia rousseauniana porque
expressa a necessidade de que todas as potencialidades do homem possam ser
desenvolvidas, a fim de proporcionar-lhe melhores condições de atuar satisfatoriamente
na sociedade.
4
Outro filósofo que trabalhou o conceito de infância no final do século XVIII e
meados do seguinte foi o alemão Johann F. Herbart.
5
Segunda este filósofo, a criança vem
ao mundo como uma tábua rasa, desprovida de vontade e sem a capacidade moral para
decidir, pois é na alma que se acumulam experiências de forma sucessiva. Daí que seria
ideal aos pais apoderar-se de seus filhos impondo condições para bem viver na sociedade.
Saben, sin duda, perfectamente que em la criatura que tratan ahora a su gusto, sin contar
com ella, surgirá el tiempo una vontad, que habrá de conquistarse si se quiere evitar los
inconvenientes de una lucha inadmisible para ambas as partes.
6
A proposta educativa herbartiana aspira sobretudo à formação moral do indivíduo. O
trabalho que se pretende realizar na alma é a moldagem dos desejos e da vontade nas
3
- ROUSSEAU, Jean-Jacques. Op. Cit. p. 91-92.
4
- FREITAS, Lidiane Brito. A educação política de Rousseau. São Cristóvão: UFS, 2004. p. 49.
5
- Herbart nasceu na Alemanha em 1776 e morreu em 1841. HERBART, Johann F. Pedagogia General:
derivada del fin de la educación. Trad. de L’orenzo Luzuriaga. 2 ed. Espanha: Imprenta de la Cuidad
Lineal, 1806.
6
- Idem. p. 89.
20
pessoas. Assim, a contribuição do filósofo caminha no sentido de se trabalhar a afetividade
da criança como processo de educação.
Perfectamente, com tal que las horas de clase(llamo así, de uma vez para siempre, a
aquellas em que el professor está ocupado com sus alumnos de um modo serio y
metodido) den por resultado um trabajo espiritual que dispierte el interes del nino, y
junto al cual todas los juegos infantiles lleguen a parecerle mzquionos y desaparecan
ante sua vista.
7
Herbart, ao esboçar a importância da formação moral do indivíduo, não primou
pelo processo educativo, mas também pelo processo da instrução. Segundo o filósofo, sem
essas duas facetas, o homem que se pretende moldar seria incompleto.
La Pedagogia es la ciência que necesita el educador para si memso. Pero tambien debe
posser la ciencia para comunicala. Y, debo confesarlo aqui, yo no puedo conceber la
educación sin la instrucción, e, inversamnte, no reconozco, al menos en esta obra,
instrucción alguna que no eduque.
8
É importante dizer que a instrução defendida pelo filósofo alemão não é uma
instrução pública, mas privada. No entanto, diferente da educação formulada por Rousseau,
em Emílio a formação do indivíduo não se fora da sociedade, mas no seio desta. Desse
modo, a criança estaria aprendendo com os homens como viver e atuar na sociedade,
respeitando as normas e valores estabelecidos.
que se dizer também que Herbart foi um ardoroso defensor da disciplina como
ferramenta para moldar o caráter da criança. Segundo o filósofo, a disciplina não pode ser
aplicada de forma exagerada, mas de forma branda.
La educación se hace también coercitiva, aunque en forma menos brusca, cundo no
cuenta nunca con los deseos del discípulo. En uno y otro caso la educación invoca
tácita, y cundo es necesario expresamente, este pacto acordado antemano: nuestra
relación sólo existe y subsiste bajo tales y cuales condiciones.
9
7
- HERBART, J.F. Op. Cit. p. 62.
8
- Idem. p. 70.
9
- Idem. p. 110.
21
Essas formulações acerca da infância estavam no bojo da modernidade com a
afirmação da escola como agência capaz moldar o indivíduo. A escola moderna tem como
característica o vel de organização, dando vida a um sistema escolar; no nível do
programa de ensino (línguas nacionais, novas ciências, saberes úteis etc.); no nível da
didática, dando lugar a processos de ensino/aprendizagem bastante inovadores, mais
científicos ou mais práticos.
No século XVII desenvolveu-se uma imagem nova da Pedagogia moderna; laica,
racional, científica, orientada para valores sociais e civis, crítica em relação às
tradições, instituições, crenças e práxis educativas, empenhada em reformar a sociedade
também na vertente educativa, sobretudo na vertente educativa.
10
Atrelado a esse ideal de pedagogia e de escola moderna estava um mecanismo, a
opção política que melhor transmitisse o conhecimento curricular, a curto tempo e com
parcos recursos: o método de ensino. Essa ferramenta era vista como uma opção política
para alfabetizar a população, tanto da zona rural como da urbana.
O primeiro a querer ensinar tudo e a todos foi Comenius através da obra Didática
Magna.
11
A organização que este autor esboçou para se ensinar constava em dividir os
alunos em classe de idade cuja matéria de ensino seguiria regra que ia do simples para o
complexo. O ideal místico e utópico de Comenius pretendia criar um modelo universal de
homem virtuoso, ao qual era confiada a tarefa de reforma da sociedade e dos costumes.
Durkheim afirma que a Idade Média se caracterizou pela organização escolar enquanto que
o Renascimento elaborou o ideal pedagógico do método de ensino no qual a França, desde
o século XVI até o fim do século XVIII, viveu de forma exclusiva.
12
De fato, foi da França que surgiu o método de ensino simultâneo. A construção desse
método é atribuída a Jean Batist de La Salle (1651-1719), sacerdote da ordem nobiliar,
10
- CAMBI, Franco. História da Pedagogia. Trad. de Álvaro Lorencine. o Paulo: Edit. UNESP, 1999.
p.329.
11
- COMENIUS, João Amos. Didática Magna. Trad,. de Nair Fortes Abu-Merhy. Rio de Janeiro: Editora
Rio, 1978.
12
- DURHEIM, Emile. A evolução pedagógica. Trad. de Charles Magno. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.
p. 169.
22
profundamente religiosa.
13
La Salle propunha unir religião e instrução como condição para
formar um homem íntegro.
14
O plano pedagógico esboçado era uma minuciosa organização
das escolas e um programa didático que previa leitura e escrita da língua materna, as quatro
operações aritméticas e catecismo, acompanhado de uma formação cnico-científica de
caráter profissional.
Esse ensino se caracterizava como simultâneo pelo fato dos alunos da mesma aula ou
secção receberem ao mesmo tempo a mesma lição e também por fazer junção da escrita e
da leitura. Neste ensino, convém interrogar os meninos, um depois do outro, sem seguir
uma ordem muito regular. Nesse método, professor é o principal agente do ensino, mas
poderia utilizar alunos como seus ajudantes ou monitores.
15
O ensino era coletivo e apresentado a grupos de alunos reunidos em função da matéria
a ser estudada, não se destinava a um único aluno, como se disse, mas podia atender a
cinqüenta ou setenta ao mesmo tempo. Em nível de estrutura, o todo simultâneo
comportava três classes sucessivas. A primeira era consagrada à leitura, estando dividida
em subgrupos constituídos segundo o grau de adiantamento dos alunos que terminavam a
aprendizagem. A segunda classe recebia os alunos que terminavam a leitura e destinava-se
a aprendizagem da escrita, na qual eram trabalhados os modelos de caligrafia. Na terceira
classe, em que o número de alunos era bastante reduzido, eram abordadas as matérias mais
complexas como a gramática, ortografia e cálculo.
Segundo Lesage, esse método apresentava grandes desvantagens pelo fato de
dispender muito tempo com as tarefas determinadas. Quatro anos eram suficientes para a
classe aprender a ler e ter alguma chance a fim de passar para a segunda. A monótona
repetição das tarefas e a pobreza dos programas suscitavam aborrecimentos, distrações e
sanções.
16
13
- La Salle fundou na França a ordem religiosa conhecida como Irmãos das Escolas Cristãs, que a partir dela
seu modelo de ensino foi divulgado.
14
- CAMBI, Franco. Op. Cit. p. 299.
15
- Norodowski afirma que o uso de monitores ou decuriões apareceu com os jesuítas, sendo retomado por
Comenius, La Salle e Lancaster. NARODOWSKI, Mariano. Infância e poder: conformação da Pedagogia
Moderna. Trad. de Mustafá Yasbek. Bragança Paulista: Editora da Universidade São Francisco, 2001. p.
129.
16
- LESAGE, Pierre. A pedagogia nas escolas mútuas no século XIX. In.: BASTOS, Maria Helena Câmara;
FARIA FILHO, Luciano Mendes de. A escola elementar no século XIX: o método monitorial/mútuo.
Passo Fundo: EDIUPF, 1999. p. 11.
23
Da matriz do método simultâneo surgiu o método mútuo no início do século XIX . Os
promotores desse método foram a Joseph Lancaster (1778-1838), da seita dos Quakers, e a
André Bell (1752-1832), ministro da Igreja Anglicana.
17
Na Inglaterra, o método mútuo
tinha como objetivo instruir crianças em tempo recorde e com poucos recursos. A intenção
era instruir a classe operária inglesa.
Norodowski diz que o método mútuo é produto da Revolução industrial, pois a
infância pobre na rua representava perigo para os legistas e outras personalidades da época.
Essa infância era concebida como classe perigosa e necessitava ser disciplinada. Desse
modo, o corpo infantil necessitava de um método que garantisse a estabilidade social em
um ambiente ainda não escolarizado.
18
Esse autor também afirmou que o todo mútuo teve um forte apelo nos países norte
e ibero-americanos por garantir a pretensão iluminista de uma educação básica e universal e
o fato de ter estado vinculado às idéias emancipadoras nas décadas de dez e vinte do século
XIX, na América Latina.
19
Esse ensino consiste em dividir os alunos por grupos ou classes e colocá-los a frente
de monitores. O professor não se ocupa de outra coisa a não ser instruir e dirigir os
monitores, passando assim a se colocar em lugar secundário no ensino. Por causa dessa
estrutura pode-se instruir de cem a trezentos alunos em uma única escola.
Em termos de estrutura, o método mútuo exigia que os alunos fossem divididos em
classes e subgrupos móveis, flexíveis e diferenciados resultantes das matérias de ensino e
dos exercícios escolares. Desse modo, cada matéria baseava-se em um programa preciso e
organizado. Esse programa era dividido em oito graus hierarquizados que deveriam ser
percorridos sucessivamente.
Para que esse método funcionasse com eficiência, foram instituídos comandos que
garantiam o ritmo ordenado e regular. A comunicação que dava com esse dispositivo era
mecânica e inteiramente hierarquizada. As ordens eram transmitidas de quatro maneiras:
pela voz, pelo apito, pela sineta e por sinais (a voz intervinha pouco).
Os ritmos de aprendizagem e as aquisições variavam conforme os alunos e as
matérias de ensino. Desse modo, um aluno em seis ou sete meses poderia estar na quarta
17
- Esse método também recebia a denominação de monitorial ou lancasteriano
18
- NARODOWSKI, Mariano. Op. Cit. p. 132.
19
- Idem. p. 133.
24
classe de leitura, na quinta de escrita e na quarta de aritmética. A habilidade do aluno era o
que determinava o nível de posição nas classes.
O estímulo da ação educativa provinha através de prêmios variados. Havia também
sanções como castigos físicos, penalidades como retroceder ou avançar nas classes e
expulsão da escola.
A desvantagem apontada nesse método residia em seu caráter mais disciplinador que
propriamente instrutivo e educativo. Nesse sentido, a memória era exaltada como
mecanismo de bom desempenho, cujo mero de acertos era condição para que o aluno
passasse de uma classe inferior para a superior.
Tomando as experiências pedagógicas dos países europeus, os administradores
provinciais adotaram o que havia de moderno em termos de técnicas pedagógicas: os
métodos de ensino. No século XIX, os métodos de ensino para a escola primária eram
vistos nos países europeus, como a França e a Inglaterra, como a tecnologia pedagógica que
melhor atendia ao projeto de nacionalidade.
No Brasil, a adoção de métodos de ensino não ocorreu de forma diferente. Pesquisas
vêm elucidando a presença do método mútuo no início da cada de 1820. Em 1823, o
Imperador D. Pedro I, através do Decreto de primeiro de março, criou a primeira escola de
ensino mútuo para instruir a população de seu reino. O método foi introduzido através da
corporação militar.
Convindo promover a instrucção em uma classe tão distincta dos meos Subditos , qual a
da Corporação Militar, e achando-se geralmente recebido o methodo do Ensino Mutuo
pela facilidade, e precisão, com que desenvolve o espirito, e o preparar para a
acquisição de novas, e mais trancedentes idéas; Hei por bem mandar crear nesta Corte
um Escola de Primeiras Letras, na qual se ensinará pelo methodo do Ensino Mutuo,
sendo em beneficio não somente dos Militares do Exercito; mas de todas as classes dos
Meos Suditos, que queiram aproveitar-se de tão vantajoso estabelecimento. João Vieira
de Carvalho, do Meo Conselho de Estado, Ministro e Secretario de Estado dos
Negocios da Guerra o tenha assim entendido, e faça expedir as ordens necessarias.
Paço em primeiro de Março de mil oitocentos e vinte e trez: com a rubrica de SUA
MAGESTADE O IMPERADOR. João Vieira de Carvalho.
20
20
- Ensino Mútuo-Decreto de primeiro de março de 1823. AN. Fundo IG
3
23. Série Guerra. Diário do
Governo em nove de abril de 1823. Grifos e destaques do documento.
25
O decreto do imperador foi o primeiro passo oficial para a introdução do método no
Brasil. Mas foi com a Lei de 15 de outubro de 1827, a primeira lei de instrução pública
brasileira, que se determinou existência de escolas de ensino mútuo em cada capital de
província ou lugar populoso.
Na Província sergipana, o método mútuo passou a ser defendido ainda na década de
vinte, mas foi no final desta que foi efetivamente adotado na Capital. Na década de
quarenta, esse método passou a ser visto como inapropriado para a realidade sergipana.
Desse modo, começou-se a criticar por seu caráter mais disciplinador que instrutivo e
também pela realidade em que se encontrava a instrução provincial.
A partir desse momento, em que o método mútuo ou lancasteriano passou a ser
duramente criticado por seu caráter mais disciplinador que instrutivo, um novo método
passou a fazer parte dos discursos que os presidentes da Província defendiam na
Assembléia Provincial: o método simultâneo.
Ao passo que o método mútuo foi apontado como não mais adequado para a realidade
sergipana, estava visível para os administradores provinciais que a população necessitava
de uma escola que fosse capaz de transmitir os ditames do Império. Desse modo, era
urgente retirar práticas, organizar e uniformizar a escola de primeiras letras. E para que essa
nova forma discursiva fosse enraizada seria preciso adotar um método condizente com a
necessidade da Província.
Essa nova roupagem que a instituição escolar recebeu trazia de perto a adoção do
método simultâneo como uma nova solução para resolver os problemas da instrução
pública da Província sergipana. Na verdade, o método foi indicado para ser aplicado nas
escolas de primeiras letras através do Regimento Internos das Escolas em 1856.
21
Esse Regimento foi um documento que regulamentava os espaços e os tempos das
aulas, o oficio do professor e a didática da escola de primeiras letras. Além de determinar
essas medidas, o documento ainda uniformizava o currículo para toda a instituição escolar,
bem como a adoção do método simultâneo.
O novo método passou a ser determinado para a Província sergipana a partir do
Regulamento da Instrução Pública de 1858.
22
Por essa Lei, o ensino passava a ser
21
- Regimento Interno das Escolas de 1856. APES. Fundo Biblioteca José Alves. Cx. 01. .
22
- Regulamento da Instrução Pública de de setembro de 1858. APES. Fundo Publicações. Cx. 50. Doc.
02.
26
simultâneo por classe de alunos, obedecendo a suas idades e grau de conhecimento. Esse
método esteve em vigência em Sergipe até o início da década de 1880 quando um novo
método passou a ser defendido.
de se destacar que a adoção do método estava atrelada à influência da Reforma
Couto Ferraz. Esta Reforma foi uma ação que partia do Município da Corte para as
províncias e tinha como objetivo uniformizar a escola de primeiras letras do Império
brasileiro. A ênfase dessa medida recaía na adoção do método simultâneo e na
uniformização do currículo da escola de primeiras letras. O grupo que elaborou essa
mudança entendia que a escola era a agência que iria garantir a ordem imperial
estabelecida.
Faz-se necessário observar que a adoção do método de ensino estava atrelada ao
problema da afirmação da escola de primeiras letras na Província sergipana. Vlilela afirma
que no Brasil do século XIX havia multiplicidade de formas de ensinar e aprender.
23
As
escolas funcionavam nas propriedades rurais com padres ensinando aos filhos de
fazendeiros e agregados e nos espaços urbanos a diversidade era maior. Na maioria das
vezes essas escolas funcionavam na casa do professor. Tudo isso porque o modelo escolar
ainda não estava rigidamente internalizado e qualquer um que dominasse os rudimentos da
escrita, da leitura e do cálculo não se sentiria constrangido em transmiti-los em ambientes
domésticos, privados.
Faria Filho chama esse modelo de escolas que funcionavam em casas de professores
de casas-escolas.
24
Nesse sentido, a escola não possuía um local próprio, específico para
sua condição como instituição capaz de instruir e educar.
São aulas gias a as cadeiras de primeiras letras. Com professores reconhecidos ou
nomeados pelos órgãos de governo, assas escolas funcionavam em espaços
improvisados como câmara municipais, igrejas, sacristias, salas de lojas maçônicas,
prédios comerciais ou na própria casa dos professores. Os alunos ou alunas dirigiam-se
para esses locais, e lá permaneciam por algumas horas. Não raramente o período
23
- VILELA, Heloisa de S. O. O mestre-escola e a professora. In.: LOPES, Eliana M. Teixeira, FARIA
FILHO, Luciano Mendes de (orgs.). 500 anos de educação no Brasil. Belo Horizonte: Autêntica, 2000. p.
99.
24
- FARIA FILHO, Luciano Mendes de. Os tempos e os espaços escolares no processo de institucionalização
da escola primária no Brasil. In.: VIDAL, Diana Gonçalves e FARIA FILHO, Luciano Mendes de. As
lentes da História: estudos de História e historiografia da Educação no Brasil. Campinas: Autores
Associados, 2005. p. 45.
27
escolar de 4 horas era dividido em duas sessões : uma de 10 às 12 horas e outra das 14
às 16 horas.
25
Nesse modelo de escola o currículo, constava basicamente do ensino da leitura, da
escrita, da aritmética e doutrina cristã. No caso da escola feminina, o ensino de aritmética
estava reduzido somente às quatro operações, sendo complementado como aprendizado de
prendas domésticas.
Segundo Hébrard, as matérias ensinadas na escola primária do século XIX não foram
saberes originados no âmbito desta instituição, eram savoir-faire sem correspondente nas
ciências e sua hierarquia.
26
Os saberes ensinados pareciam ser então, não disciplinas escolares, mas facetas das
práticas ordinárias da cultura escrita, indistintamente concebida como suporte da
doutrina religiosa ou como instrumento necessário à gestão de sua vida e de suas
ocupações, por mais comuns que fossem.
27
Os saberes ensinados na escola primária foram apropriados em condições
diferenciadas. A matriz desses ensinamentos está no cruzamento da cultura dos clérigos e
protestantes e na dos mercadores. A primeira legou a prática da escrita e da leitura e a
segunda, a prática do cálculo. Nesse sentido, foi a partir do século XVII que esses saberes
passaram a fazer parte do currículo da escola primária européia. Para que essa cultura fosse
transmitida às crianças de forma racional foi preciso elaborar o método de ensino, pois este
era visto como a ferramenta pela qual se poderia instruir a população dos países europeus.
Boto chama atenção para a necessidade de se conhecer a escola e sua história,
observando o que ocorria em seu ambiente fechado.
28
Na verdade, a autora está propondo o
estudo das práticas escolares determinadas pela legislação e vivenciadas no século XIX.
Nesse sentido, é preciso desvendar as estratégias de aprendizagem utilizadas na escola, bem
como visualizar o que estava por trás dessa opção política.
25
- FARIA FILHO, Luciano Mendes de. Op. Cit. p. 45.
26
- HÉBRARD, Jean. A escolarização dos saberes elementares na Época Moderna. In.: Revista Teoria e
Educação. Porto Alegre: Editora Panonica, 1990. p. 65.
27
- Idem p. 65.
28
- BOTO, Carlota. Ler, escrever , contar e se comportar: a escola primária como rito do século XIX. In.:
SOUZA, Cynthia Pereira de; CATANI, Denice Bárbara(orgs.). Práticas educativas, culturas escolares,
profissão docente. São Paulo: Escrituras Editora. P. 162.
28
Da forma como propõe Boto, acredita-se que o estudo dos métodos de ensino seja
uma chave importante para se entender a sistemática de funcionamento da instrução
primária no Brasil do século XIX, principalmente o processo pelo qual a escola de
primeiras letras passou para se afirmar como instituição civilizatória. Contribui também
para entender como o Império brasileiro, através dos administradores provinciais, concebia
a sociedade e promovia a intervenção.
Entretanto, por muito tempo, a historiografia sobre a educação brasileira no século
XIX viu esse período como a nossa “Idade das trevas”, ou como estranhamente o mundo
estava fora do lugar.
29
O período que transcorreu a expulsão dos Jesuítas foi visto por essa
historiografia como um grande vazio, com a ausência do Estado imperial no campo da
instrução pública
Segundo Toledo, essa visão é herança da vertente historiográfica da “memória-
monumento,” preconizada por Fernando de Azevedo em sua obra A cultura brasileira.
30
Azevedo viu a instrução primária no século XIX como algo ineficaz porque contou com a
presença de um Estado imperial atrofiado. Dessa forma, os historiadores da educação
brasileira que tomaram as explicações azevedianas como fundamento, ao pesquisarem
sobre o século XIX repetiram teses já elaboradas.
Para sacralizar mais a visão azevediana sobre o século XIX brasileiro, Bomtemp Jr.
afirma que os pesquisadores não fizeram opções por objetos de estudo que contemplassem
esse período. Muito pelo contrário, as escolhas recaíram sobre o século XX, elegendo o ano
de 1930 como data-chave para a educação brasileira.
31
A historiografia sergipana sobre a educação também cristalizou a visão azevediana
para o século XIX. A historiadora Maria Thétis Nunes em sua obra História da educação
em Sergipe, valendo-se do referencial marxista, analisou a trajetória educacional sergipana
adotando os mesmos limites cronológicos azevedianos.
32
A influência azevediana também recaiu sobre as pesquisas dos estudantes de história
da Universidade Federal de Sergipe. Santos constatou a ausência de estudos que tivessem
29
- Cf. FARIA FILHO, Luciano Mendes de. Instrução elementar no século XIX. In.: LOPES, Eliana M.
Teixeira, FARIA FILHO, Luciano Mendes de (orgs.). Op. Cit.
30
- TOLEDO, Maria Rita de Almeida. Fernando de Azevedo e a Cultura Brasileira ou as aventuras e
desventuras do criador e da criatura. São Paulo: PUC, 1995. p. 37.
31
- BOMTEMP JR., Bruno. História da educação brasileira: o terreno do consenso. São Paulo: PUC, 1995.
p. 99.
32
- NUNES, Maria Thetis. História da educação em Sergipe. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1984.
29
como foco o século XIX.
33
Segundo o autor, a totalidade dos monografistas analisados
centrou seu olhar sobre o século XX, fruto da idéia de que os outros períodos já estavam
suficientemente estudados.
34
Nascimento pontuou que a partir da década de noventa do século XX os estudos de
História da Educação despertaram grande interesse e chamaram atenção de uma grande
massa de pesquisadores. A explicação para esse fato está na reformulação do currículo de
alguns cursos de graduação da Universidade Federal de Sergipe que introduziram a
produção monográfica como requisito para os concludentes, no surgimento de alguns
impressos pedagógicos financiados por órgãos estatais e no Mestrado em Educação do
NPGED (núcleo de Pós-Graduação em Educação) também da Universidade Federal de
Sergipe.
35
Até a metade da década de noventa a maioria dos estudos de História da Educação
sergipana fez preferência pelo recorte temporal macropolítico, com ênfase no século XX,
cujas explicações estavam subordinadas às estruturas econômicas. Essa opção denuncia o
caráter presentista dessas opções. Destas, só cinco trabalhos tiveram foco no século XIX.
36
Ainda segundo Nascimento, a maioria dos trabalhos produzidos na área de História da
Educação sergipana teve o Marxismo como matriz explicativa. A influência da teoria
marxista através dos trabalhos da historiadora Maria Thétis Nunes se estendeu até a década
de noventa nos cursos de Mestrado e Doutorado.
37
A partir dessa década, pode-se notar o
afastamento dessa matriz e a opção pelo referencial weberiano.
Pode-se considerar que a renovação da pesquisa em História da Educação sobre o
século XIX sergipano no âmbito da pós-graduação vem se renovando desde os anos iniciais
desta década.
38
O referencial que os pesquisadores vêm dando em seus estudos provém da
33
- SANTOS, Fábio Alves dos. Olhares de Clio sobre o universo educacional: um estudo das monografias
sobre educação do Departamento de História da UF(1996-2001). São Cristóvão: UFS/FAP-SE, 2004.
34
- Idem. p. 70.
35
- NASCIMENTO, Jorge Carvalho do. Historiografia educacional sergipana : uma crítica aos estudos de
História da Educação. São Cristóvão: grupo de Estudo e Pesquisas em História da Educação/NPGED,
2003. p. 26-27.
36
- Idem. p. 64.
37
- Idem. p. 54.
38
- Faço referência aos trabalhos de NASCIMENTO, Ester Fraga Vilas-Boas Carvalho do. A Escola
Americana: origens da Educação Protestante em Sergipe (1886-1913). São Cristóvão: Grupo de Estudos
em História da Educação/NPGED, 2004;
SILVA, Eugênia Andrade Vieira da. A formação da
intelectualidade sergipana (1822-1889). São Cristóvão: UFS, 2004.(Dissertação de Mestrado);
SANTOS, Vera Maria dos. A Geografia e os livros didáticos sobre Sergipe: Do século XIX ao século
30
história cultural francesa e da influência da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
Desse modo, têm-se analisado as práticas culturais, as representações e as apropriações que
a sociedade sergipana do século XIX fazia da educação.
No intuito de contribuir para o entendimento de como funcionava a instrução de
primeiras letras na Província sergipana, este trabalho tem como objetivo analisar os
métodos de ensino adotados pelos administradores provinciais para as escolas de primeiras
letras no período de 1825 a 1875.
O ano de 1825 foi escolhido porque a partir daí foi elaborado pelo presidente da
Província
Manuel Cavalcante de Albuquerque
um esboço administartivo no qual incluía a
adoção do método de ensino para a escola de primeiras letras sergipana e a criação do
sistema de instrução primária e secundária para Sergipe. Embora o método mútuo tenha
sido adotado no ano de 1828, três anos antes o presidente Manual Cavalcante havia
demonstrado para as autoridades imperiais o desejo de aplicar o método e as condições para
tal.
No caso a escolha do ano de 1875 justifica-se na vigência que o método simultâneo
teve na Província. Nesse período, foi aprovado o último regulamento da instrução pública
cujo método de ensino adotado esteve circunscrito apenas ao século XIX. A partir desse
regulamento, os dirigentes provinciais começaram a defender as idéias pedagógicas de
Pestalozzi e Basedaw e representar o método como ineficaz e obsoleto. O método seguinte
que se adotou o intuitivo teve vincia até a década de trinta do século XIX, extrapolando
portanto, o limite temporal deste trabalho.
Como se disse, o objetivo principal deste trabalho é analisar os métodos mútuo e
simultâneo na Província sergipana. O primeiro teve vigência do ano de 1828 até a década
de quarenta, mas na seguinte continuou presente nos relatório dos presidentes provinciais.
o segundo, foi adotado no final a década de cinqüenta, através do Regulamento de
primeiro de setembro de 1858 com vigência até a de setenta do século XIX.
Outro objetivo é demonstrar as apropriações que corpo docente da escola de primeiras
letras fazia da norma prescritiva sobre os métodos adotados. Analisaremos os dispositivos
XX. São Cristóvão: UFS, 2004. ( Dissertação de Mestrado); LIMA, Aristela Aristides. A instrução da
mocidade no Liceu Sergipense: Um estudo das práticas e representações sobre o ensino secundário na
província de Sergipe(1847-1855). São Cristóvão: UFS,2004.
31
que a os dirigentes provinciais criavam para habilitar os professores quando determinavam
a adoção de um novo método.
que os dirigentes administrativos consideravam o método inapropriado para as
escolas de primeiras letras, mostraremos qual o projeto subjacente à adoção de um novo e o
que se estava determinado através dessa opção política.
A descrição dos métodos é tarefa fundamental para se entender como funcionava essa
ferramenta pedagógica. Também ajuda entender a realidade das escolas de primeiras leras
na prática do método adotado.
Outro objetivo a que este trabalho se propõe é evidenciar a relação existente entre a
norma prescrita e a realidade das escolas de primeiras letras. Será que realmente o método
de ensino adotado na legislação era aplicado na prática? E se o era, quais as dificuldades
que os professores enfrentavam para garantir o sucesso de seu ofício?
O último objetivo aqui proposto é a contextualização da escola de primeiras letras
sergipana. Assim, será demonstrado como esse ramo de ensino era concebido e como foi
estruturada a rede de escolas na Província.
Para responder a essas questões, três hipóteses foram levantadas para balizar a análise
sobre os métodos de ensino na Província sergipana. A primeira é de que a adoção dos
métodos de ensino estava relacionada à idéia de que a manutenção da ordem imperial
brasileira seria possível via escola primária. A opção pelo método tornava-se assim uma
opção política. A segunda é que houve em Sergipe um esforço e uma corrente em prol do
processo de afirmação da escola primária pública. Esta instituição era vista como a agência
responsável pela transmissão dos valores concebidos pelo Império brasileiro. A terceira é a
de que os métodos de ensino foram ferramentas de racionalização da escola primária.
Por ser uma pesquisa de caráter histórico e descritivo sobre os métodos de ensino na
escola pública de primeiras letras da província de Sergipe, as informações foram
provenientes de duas esferas: do poder público estatal de abrangência local e nacional e dos
professores das escolas de primeiras letras sergipanas contidas nos documentos. Será feito
assim cotejo dessa documentação com o intuito de contextualizar a relação existente entre o
que se determinava e o que ocorria na prática..
Outro tipo de fonte utilizada no presente trabalho são os manuais escolares utilizados
na escola normal da Província baiana. A descrição dos métodos mútuo e simultâneo foi
32
extraída desses impressos pedagógicos. A opção por este tipo de fonte reside na relação
intrínseca que existiu entre estes e as fontes sergipanas que organizavam o cotidiano
escolar.
É evidente que toda documentação impões limites e possibilidades. O grau de
permissividade depende do que restou do passado. Le Goff chama atenção para a
intencionalidade do documento.
O documento não é inócuo. É antes de mais nada o resultado de uma montagem,
consciente ou inconsciente, da história, da época, da sociedade que produziu, mas
também das épocas sucessivas durante as quais continuou a viver, talvez esquecido
durante as quais continuou a ser manipulado, ainda que pelo silêncio.
39
De fato, o que sobreviveu não é o passado, mas aquilo que restou dele. As fontes são
apenas indícios de como os homens organizaram o sistema de escolas de primeiras letras na
Província sergipana. Por exemplo, os discursos presidenciais a cerca da instrução
desvalorizavam os atos do administrador precedente como estratégia para justificar novas
ações. Da mesma forma ocorria com os professores de primeiras letras que eram obrigados
a informar o estado material de suas aulas e o desenvolvimento dos alunos. Muitas vezes
esses professores omitiam a freqüência dos alunos para justificar o pedido de material
escolar à Diretoria de Instrução Pública.
Mesmo com todas essas dificuldades presentes nas fontes foi possível a construção do
cenário sobre a instrução sergipana no século XIX, inclusive para se montar a planta baixa
de escolas de primeiras letras.
Pelo fato deste trabalho se constituir como pesquisa sobre cultura escolar serão
descritos os métodos de ensinos adotados, pois permitem desvendar o que ocorria no
interior do espaço escolar.
Faria Filho afirma que o termo cultura escolar começou a subsidiar as análises
históricas relacionadas ao fenômeno educacional a partir dos anos de 1990. Essa nova
abordagem deve-se ao diálogo que houve entre o campo da Educação, a história social
39
- LE GOFF, Jacques. Documento/Monumento. História e memória. Trad. de Suzana Ferreira Borges. 3 ed.
Campinas, SP: Editora UNICAMP, 1994. p. 547.
33
emergente nos anos sessenta e a história cultural dos anos noventa.
40
O teemo cultura
escolar foi traduzido por Dominique Juliá para o português no ano de 2001 através da
Revista brasileira de história da Educação.
41
Segundo Juliá, a cultura escolar não pode ser estudada sem o exame preciso das
relações conflituosas ou pacíficas que ela mantém em cada período de sua história. O
próprio autor define o que seria a cultura escolar.
Um conjunto de normas que definem conhecimentos a ensinar e condutas a inculcar, e
um conjunto de práticas que permitem a transmissão desses comportamentos; normas e
práticas coordenadas a finalidades que podem variar segundo as épocas( finalidades
religiosas, sociais, políticas ou simplesmente de socialização).
42
Juliá além de incluir as normas e as práticas como dispositivos da cultura escolar,
também faz inclusão da profissionalização docente, as disciplinas escolares e as culturas
infantis. A partir desses elementos é possível entender a cultura escolar que é específica no
tempo e no espaço. Na verdade, o foco de atenção do autor recai no problema das práticas
diferenciadas, vividas de acordo a realidade de cada sistema escolar ou escola.
Faria filho inclui os métodos de ensino como parte da cultura escolar da sociedade do
século XIX brasileiro. Segundo o autor, eles têm demonstrado a imensa criatividade dos
sujeitos em suas práticas de apropriação e, por outro lado, a inserção do Brasil no processo
de internacionalização da educação e dos sistemas de ensino.
Os referenciais teóricos que foram tomados de empréstimos para analisar os métodos
de ensino vieram da Nova História Cultural que ultimamente vem mantendo um diálogo
bastante fértil como a História da Educação. Dessa forma, utilizaremos os conceitos de
representação e apropriação formulados pelo historiador Roger Chartier.
Segundo Chartier, as estruturas do mundo social não são um dado objetivo, tais como
são as categorias intelectuais e psicológicas: todas são historicamente produzidas pelas
40
- FARIA FILHO, Luciano Mendes de; GONÇALVES, Irlen Antônio; VIDAL, Diana Gonçalves. A cultura
escolar como categoria de análise e como campo de investigação na história da educação brasileira. In.:
Educação e Pesquisa. São Paulo.v. 30, jan/abr. 2004. p. 3.
41
- Idem. p. .4.
42
- JULIÁ, Dominique. A cultura escolar como objeto histórico. In.: Revista Brasileira de História da
Educação. n 01, jan/jun, 2001. p. 10.
34
práticas articuladas (políticas, sociais, discursivas) que constroem suas figuras. Se assim o
for, então as representações forjadas e as apropriações não são iguais, são diferenciadas.
43
Pode-se inferir que a representação que se faz sobre uma dada realidade nunca será
igual, sempre será diferenciada em uma dada sociedade, ou seja cada grupo cria a sua
diferente da outro. Segundo o autor, “as representações do mundo social assim construídas,
embora aspirem à universalidade de um diagnóstico fundado na razão, são sempre
determinadas pelos interesses do grupo que as forjam”.
44
Desse modo, serão analisadas as
representações que os administradores provinciais construíam sobre a escola primária e a
sociedade sergipana.
Com base no conceito de apropriação, buscou-se perceber como os professores de
primeiras letras faziam para conseguir a habilitação dos métodos a fim de pleitearem uma
vaga no quadro funcional da Província e quais as estratégias utilizadas pelo poder
provincial para garantir um corpo docente habilitado na escola de primeiras letras.
Esta dissertação sobre os métodos de ensino da escola de primeiras letras da Província
sergipana tem a pretensão de contribuir para os estudos de História da Educação que tem o
século XIX como foco de atenção. O objetivo maior foi buscar desvendar o que ocorria no
interior da escola de primeiras letras, bem como as estratégias utilizadas pelo poder
provincial para garantir esse ramo de ensino em todos os lugares. Desse modo, o trabalho
foi estruturado em quatro partes.
No primeiro capítulo, analisou-se como foi organizado o sistema de escolas de
primeiras letras da Província sergipana. As fontes utilizadas para a construção deste
capítulo foram provenientes do poder provincial como os relatórios de presidentes da
província e a legislação determinada para a organização do sistema. Percebendo como
funcionava o sistema, facilita a compreensão da problemática da adoção do método de
ensino.
No segundo capítulo, foi realizada a descrição dos métodos contemplados na
pesquisa. Esta tarefa teve como base os manuais escolares impressos para os alunos do
curso normal da escola normal da Província baiana que circulou em quase todo século XIX.
43
- CHARTIER, Roger. A história cultural: entre práticas e representações. Lisboa/Rio de Janeiro:
Difel/Betrand, 1988. p. 27.
44
- Idem. p. 17
35
Esses manuais foram traduções de manuais escolares utilizados nos cursos sobre métodos
de ensino das escolas normais francesas.
O terceiro capítulo trata da questão da habilitação dos professores de primeiras
letras sergipanos. Para construção deste capítulo, tomou-se como fontes principais a
legislação acerca da qualificação docente, as provas dos candidatos à cadeira de primeiras
letras, requerimentos e pedidos de licença dos professores. O objetivo presente neste
momento consistiu em evidenciar as estratégias criadas pelos dirigentes provinciais para
habilitar os professores e o percurso que estes fizeram para garantir a habilitação ao
aprendizado do método de ensino.
Por fim, no último capítulo, analisou-se os métodos mútuo e simultâneo adotados na
Província sergipana. Buscou-se evidenciar as apropriações que os professores fizeram
desses métodos, as dificuldades sofridas na escola para aplicá-los, bem como as críticas que
se faziam insucesso.
36
CAPÍTULO I
DA ORGAIZAÇÃO DA ISTRUÇÃO PRIMÁRIA
A instrução primaria deve pois, Senhores, ocupar-vos. Escolas por todas as Vilas e
Povoados, onde a mocidade estude os principios da arte de ler, escrever, e contar, e a
doutrina christã. Tal he a nossa impericia, e ignorancia, que vemos com dor geral dos
nossos habitantes sem saber ler, nem escrever, e talvez, que hum terço tenha aquella
instrução ordinaria. E o que poderão, Senhores, similhantes homens dar de util ao seu
paiz! Huma rotina escura se apossa deles e os que trabalhão, o fazem de tal modo, que o
resultado não compensa o tempo, e capitães que empregão para a sua execução; donde
provem o nenhum aumento na riqueza, e prosperidade dos nossos habitantes.
45
O discurso do vice-presidente da Província revela indícios sobre a educação no século
XIX. A primeira observação que se nota é a necessidade de promover a instrução primária
em todos os lugares sejam eles considerados populosos ou não. A segunda recai na
representação que o presidente fez acerca da sociedade e da escola enquanto instituição. A
terceira observação revela o papel que o locutor assumiu enquanto administrador da
Província, enquanto classe dirigente, representante do Estado imperial, em ser responsável
pela profusão de escolas primárias. A quarta, por fim, revela o currículo destinado à
instrução primária com objetivo proposto.
A primeira chamada que o discurso do presidente deixou claro é a necessidade de se
criar escolas em todos os lugares da Província sergipana, sejam eles considerados
populosos ou não. Na concepção do administrador seria inconcebível uma localidade onde
se constatasse a presença de crianças em idade de escolarização fora da escola.
Por outro lado, ao defender a instrução para as classes menos favorecidas o discurso
revela a representação que foi feita acerca da importância da escola de primeiras letras para
o momento. Se o presidente defendia a instrução para todos os lugares estava admitindo
45
- Relatório do vice-presidente da província de Sergipe Manuel Joaquim Fernandes de Barros. IHGS. In.:
oticiador Sergipense, n° 81, ano 1836. Sergipe: Tipografia de Silveira. p. 01.
37
uma nova necessidade para a sociedade: uma população que dominasse os rudimentos da
leitura, do cálculo, da escrita e noções de doutrina cristã.
É interessante observar que a representação formulada pelo presidente parte de um
prisma da classe dirigente, da elite provincial sobre a sociedade sergipana. Segundo
Chartier, as representações sobre o mundo social não são vazias de significados, não são
inocentes, estão comungadas a interesses de classes. Assim, “as representações do mundo
social assim construídas, embora aspirem à universalidade de um diagnóstico fundado na
razão, são sempre determinadas pelo interesses do grupo que as forjam”.
46
Assim como Manuel Fernandes de Barros, muitos outros administradores provinciais
tomaram a tarefa de defender a instrução como uma necessidade social. Na visão desses
homens, a instrução era a forma de garantir a retirada do estado de desordem em que se
encontrava a sociedade do século XIX. E, para realizar tal façanha seria necessária a
garantia de escolas para a população sergipana.
Imbuídos do ideal de civilização e progresso, os homens brasileiros do século XIX se
serviram de práticas culturais européias principalmente nos países como a França, a
Inglaterra, para fazerem alterações na realidade social brasileira. Esses países passaram a
ser referências em termo de instrução para povo. Um exemplo do que era considerado
termos de prática cultural nesses países era a questão do método de ensino aplicado nas
escolas primárias e a ampliação desse ramo de ensino para toda população.
Pensar, discursar e discursar da forma como fez o administrador provincial
sergipano, é conceber o Brasil como um país que estava num contínuo, num processo de
vir-a-ser-moderno. Para colocá-lo em um futuro próximo, em pé de igualdade com os
países europeus seria preciso afirmar a escola enquanto instituição que legitimasse a
atuação do Estado na vida da população escolarizável .
Ao olhar para o Brasil da época, os homens que estavam nos quadros administrativos
construíam a imagem de um país atrasado, comparado com os europeus, sem civilização e
que necessitava de interferência. Na ótica dos administradores, esse caminho seria a escola.
Seria por meio dessa instituição que se derramariam as luzes do conhecimento para o povo.
46
- CHARTIER, Roger. A história cultural: entre práticas e reprentações. Lisboa/Rio de /Janeiro:
Difel/Bertrand, 1988. p. 17.
38
Sem essa condição, o futuro seria uma rotina escura, no dizer do vice-presidente Manuel
Joaquim Fernandes de Barros.
O discurso do vice-presidente citado no início deste capítulo traz a idéia de
modernidade tomada de empréstimo dos países europeus. Idéia essa que fora gastada no
século anterior. A idéia de modernidade subjacente no discurso era a de que um país
seria moderno e só alcançaria seu progresso se garantisse escola e instrução para população.
Sem isso seria impossível a construção da nacionalidade do país. A instrução passou a ser
vista como algo moderno por estar a serviço desse projeto como defendiam os franceses.
A defesa da escola de primeiras e da instrução presente no discurso citado foi tomada
de empréstimo dos filósofos século anterior, principalmente a idéia sobre a função do
Estado sobre as práticas pedagógicas a serem desenvolvidas. Foi a partir do século XVIII
que se desenvolveu a concepção de que ao Estado cabia a tarefa de chamar para si a
responsabilidade pela garantia da escola pública e a redefinição do papel que essa
instituição passaria a ter na sociedade.
Para entender como e por que os homens brasileiros do século XIX defenderam essa
idéia, essa política cultural, é necessário recuar até a política do Iluminismo Pombalino. A
idéia de modernidade do século XIX é herdeira assim, em muitos traços, do século XVIII
português.
O projeto de intervenção do Estado na educação teve início com marquês de Pombal
que ao participar do governo português adotou uma política conhecida como despotismo
esclarecido. De acordo com essa política, o Estado passaria por um processo de
racionalização e modernização. E um dos caminhos contemplados nesse processo de
modernização estava a instituição escolar. De conformidade com esse Projeto, as ações
desenvolvidas no campo educacional resultaram numa série de medidas como por exemplo,
a retirada da influência direta dos jesuítas no ramo do ensino e a adoção de novas práticas
culturais .
47
A partir 1759, após a retirada do poder dos jesuítas sobre a educação dos súditos,
foram criadas aulas régias avulsas secundárias sob a responsabilidade do Estado português.
A nova orientação para essas aulas provinha da cultura clássica, com adoção de novos
47
- HILSDORF, Maria Lúcia Spedo. História da educação brasileira: leituras. São Paulo: Pioneira Learning,
2005. p.19-20.
39
compêndios escolares e novos métodos de ensino. Dessa forma, o Estado começava a
tomada do poder sobre a educação.
A ação pombalina não se restringiu apenas ao ensino secundário, mas também ao
ensino elementar. Em 1772 foram criadas, no Reino português, as aulas de primeiras letras
para meninos. Mais tarde, essa ação foi estendida para locais populosos das colônias
portuguesas como, por exemplo, o Brasil. Essas escolas possuíam a prerrogativa de
funcionarem em lugares populosos.
Junto com esse ato foi também instituído um currículo para as escolas. Para esse
ramo de ensino foi determinado um currículo constando o ensino da ortografia, da
gramática da língua nacional, da histórica pátria, da aritmética aplicada ao estudo de
moedas, pesos e medidas, frações e, ainda, normas de civilidade, com o intuito de
transformar o indivíduo em um homem polido, “civilizado”, como era comum nas escolas
européias da época. Essa formação seria diferenciada, proviria das lições da doutrina cristã,
sendo ensinada a partir da adoção de catecismo impressos e distribuídos para esse fim.
48
A expansão da rede de aula avulsa secundária e de primeiras letras, segundo o
programa pombalino, seria financiada por um artifício criado pelo Império português com a
finalidade de financiar educação e a escola: o Subsídio Literário, novo imposto criado em
1772. Esse imposto pode ser visto como a forma encontrada para que a escola funcionasse
sob a tutela imperial.
De acordo com o imposto, no Brasil seria cobrado um real para cada arrátel de carne
verde comercializada nos açougues e 10 réis por cada canada de pinga destilada nos
engenhos.
49
O objetivo dessa medida era garantir instruções para os súditos do reino e
dalém mar, tornar homens úteis aos fins do Estado português para melhor administrar. Sem
essa condição não haveria governabilidade.
As ações e as concepções sobre educação do Marques de Pombal permaneceram por
muito tempo no Estado português, inclusive durante o reinado de D. João VI quando o
progressivo controle do Estado sobre a instrução primária passou a ser implementado com
iniciativas para organizar um sistema de instrução primária. Assim, ao desembarcar em
48
- O catecismo adotado para as aulas de primeiras letras foi o Catecismo de Montpellier, traduzido pelo
bispo de Évora (1765). Esse texto foi também condenado por Roma. HILSDORF, Maria Lúcia Spedo.
Op. Cit. p. 21.
49
- Idem. p. 22.
40
1808 no Brasil o monarca trouxe consigo o legado da modernização defendida e implantada
por Pombal.
Nas iniciativas implementadas por D. João VI a escola primária foi alvo de atenção
por parte do Estado. A escola esteve nos debates administrativos. A realidade da Colônia
brasileira urgia a necessidade de criação de escolas espalhadas em viários lugares. Essa
iniciativa pode ser percebida na intenção de D. João VI quando enviou o Conde da Barca,
simpatizante do método de ensino mútuo, à Inglaterra par estudar e formular a implantação
de um sistema de instrução no Brasil.
50
A idéia que se tinha era a de que através do método
de ensino seria possível instruir e disciplinar a população em tempo curto e com poucos
recursos financeiros.
Essas medidas faziam parte de um projeto maior de modernização do reino
português, mais tarde foi estendido à Colônia brasileira ao ser elevada à categoria de Reino
Unido a Portugal e Algarve. Prova disso é que no Brasil ocorreu uma série de medidas
administrativa que alterou o quadro cultural com a criação de cursos superiores e de outras
instituições culturais como a criação da Biblioteca Nacional, do Jardim Botânico e de
cursos superiores, entre outros.
51
É necessário observar que a idéia do moderno em termos educacionais esteve presente
na política do governo joanino como se pode notar na intenção em implementar o método
mútuo, mas a realidade começou a ser mudada pouco a pouco. A situação educacional em
termos de escola primária ainda continuou pontuda, tímida. Continuou existindo subsídio
literário como garantia da existência de escolas, mas só nos lugares bastante populosos.
50
-VILELA, Heloisa de O. S. O mestre-escola e a professora. In.: LOPES, Eliane Marta Teixeira, FARIA
FILHO,Luciano Mendes, VEIGA, Cynthia Greive (Orgs.). 500 anos de Educação no Brasil. Belo
Horizonte: Autêntica, 2000. p. 99.
51
- NASCIMENTO, Jorge Carvalho do. A cultura ocultada: ou influência alemã na cultura brasileira durante
a segunda metade do século XIX. Londrina: Editora UEL, 1999. p. 66.
41
1.1 - O Brasil Independente
Em seu aspecto geral, a política joanina permaneceu no Brasil pós-independência.
Imbuídos de idéias filantrópicas e de cunho liberal, os homens que administrarão o Brasil
daí por diante, levantaram bandeira de luta em defesa da educação para a população sem
instrução. Prova disso é que, ao se elaborar a primeira constituição brasileira, a
Constituição de 1824, a educação para a população não foi esquecida.
De acordo com a Carta, a educação primária seria gratuita, e ainda era determinada a
criação de escolas de primeiras letras em todas as cidades, vilas e lugarejos, em toadas as
localidades brasileiras.
52
O que o texto deixa claro é a inclusão da educação dos súditos
como questão de Estado. Ainda que a referida Lei contenha restrições quanto a seu
conteúdo, como apontou muitas vezes a historiografia tradicional, há de considerar um
avanço para um país recém-independente.
A concepção de modernidade, para os administradores, que se pode perceber era a de
que a construção do Império brasileiro passaria pela presença da escola primária. Esta
passava a ser vista como a agência cultural que garantiria a ordem e o progresso da
sociedade. Para tanto a instrução pública passou a ser determinada pelo texto constitucional
de 1824. Daí a garantia da instrução primária foi considerada um avanço para a época. O
avanço que a Carta de 1824 trouxe foi garantir a presença de escolas em lugares que não
eram populosos.
Depois de ser incluída no texto legal, a escola de primeiras foi alvo de debates e
projetos. A discussão que estava pautada era o modelo de escola a ser adotado no país. Em
1826, Januário da Cunha Barbosa, Ferreira França e Pereira de Melo, membros da
Comissão de Instrução Pública ofereceram a Câmara Federal um projeto de ensino público
integral (ficou conhecido como Reforma Januário da Cunha Barbosa).
53
De acordo com
esse projeto, a instrução seria dividida em quatro graus distintos: pedagogias, liceus,
ginásios e academias.
52
- Na documentação aparecem as terminologias “escola primária”, “cadeiras de primeiras letras”, “aula
pública de primeiras letras”, significando a mesma modalidade de ensino.
53
- Sobre esse projeto ver MOACYR, Primitivo. A Instrução e o império: subsídio para a história da
educação brasileira (1823-1825). São Paulo: Cia. da Editora Nacional, 1936.
42
A instrução de primeiro grau (pedagogia), modalidade que aqui nos interessa,
compreendia a transmissão de conhecimentos para todas as profissões, com um currículo
indicado para ensinar a ler, escrever, princípios de aritmética, conhecimentos morais e
físicos. Essa modalidade de ensino ficaria a cargo dos Conselhos Provinciais.
Observa-se que o modelo de escola pública primária defendido na Reforma de
Januário da Cunha Barbosa é uma similaridade do modelo de escola primária francesa
esboçado pelos intelectuais da Revolução Francesa.
54
Adeptos da utopia da regeneração, os
iluministas franceses construíram um currículo para escola elementar no qual fossem
trabalhados o coração e a mente do indivíduo. Esses ideais foram transplantados para o
Brasil e foram defendidos pela geração que esteve presente no processo de Independência
do país.
Confiança na lei, catolicismo iluminista, laissez-faire econômico e ênfase na educação
popular serão portanto, características das lideranças políticas e culturais da geração da
Independência, que, nas décadas de 1820 e 1830, organizaram asilos de órfão, casas de
correção e trabalho, rodas de expostos, jardins botânicos, escolas de educação popular,
aulas de francês, bibliotecas e cursos superiores, adoção de sistema métrico decimal,
efim, uma rede de instituição e práticas civilizatórias, direcionadas à guarda, proteção e
formação da população.
55
A Reforma de Januário da Cunha teve como desdobramento a promulgação,
empreendida por D. Pedro I, da Lei de 15 de outubro de 1827, a primeira Lei geral de
instrução pública primária de caráter nacional. Por essa Lei é possível visualizar o esboço
traçado pelo Império brasileiro em matéria de educação, ao delimitar a abrangência
geográfica, o currículo, o método de ensino e os agentes da escola primária. Na verdade o
Imperador estava buscando um veículo para a construção da nacionalidade brasileira
determinando que em todas as cidades, vilas e lugares mais populosos a presença de escolas
de primeiras letras.
56
Ao determinar a presença de escolas de primeiras letras em todo país, o Imperador
sabia que seria tal façanha impossível se não dividisse responsabilidade com outros agentes
54
- Boto afirma em sua obra que a escola do homem novo forjada pelos filósofos da Revolução Francesa
estaria a serviço da nacionalidade, com um currículo estruturado para esse fim. BOTO, Carlota. A escola
do homem novo: entre o Iluminismo e a Revolução Francesa. São Paulo: Unesp, 1996.
55
- Idem. p. 43.
56
- BRASIL. IHGS. Lei e 15 de outubro de 1827.
43
administrativos. Assim o Império garantia escolas e ainda descentralizava o poder gestor
referente à área educacional.
Art. Os presidentes das provincias, em Conselho e com audiencia das respectivas
camaras, enquanto não tiverem exercicio os conselhos Gerais, marcarão o numero e
localidades das escolas, podendo extinguir as que existem em lugares pouco populoso e
remover os Professores dellas para as que se crearem, onde mais aproveitem, dando
conta à Assembléia Geral para final.
57
O artigo citado começa a definir as competências acerca da instrução de primeiras
letras nas províncias como a responsabilidade pela criação, extinção e remoção de cadeiras.
Ao Presidente da província, auxiliado pelo Conselho provincial, cabia a responsabilidade
pela criação ou extinção. À câmara municipal cabia a função de consultar, de emitir parecer
sobre a necessidade ou não de cadeiras na localidade - isso no caso da não existência do
Conselho de Instrução Pública ou Conselho Geral, como determinava a Lei.
O que essa Lei nos mostra é uma desnaturalização do lugar construído pela
historiografia tradicional acerca da instituição escolar. Mostra também que a escola não
surgiu no vazio deixado por outras instituições e que o Estado Imperial brasileiro constituiu
seu discurso de nacionalidade com clareza no papel que a escola desempenharia na
formação do futuro cidadão.
58
O modelo de escola primária pensado nesse momento para o Brasil, como se disse
anteriormente foi tomado de empréstimo dos países concebidos como padrões de
civilização. Através do currículo estruturado para a escola primária oitocentista pretendia
instruir e formar a criança com valores desejados para a manutenção do Império com o
objetivo de se fazer respeitar os valores cristãos com adesão à Igreja Católica e respeito às
leis imperiais e ao Imperador. No artigo sobre o currículo estava presente a intenção a partir
das matérias de ensino.
Art. Os Professores ensinarão a ler, escrever, as quatro operações de aritmetica,
pratica de quebrados, decimais e proporções, as noções gerais de geometria pratica, a
gramatica da lingua nacional, os principios de moral cristã e da doutrina da religião
57
- BRASIL. IHGS. Lei e 15 de outubro de 1827.
58
- FARIA FILHO, Luciano Mendes de. A instrução elementar no século XIX. In.: LOPES, Eliana Marta
Teixeira. Op. Cit. p. 136.
44
catolica e apostolica romana, proporcionados à comprehensão dos meninos; proferido
para as leituras, a constituição do Imperio e a Historia do Brasil.
59
A determinação do currículo para a escola primária exigiu que se pensasse também
no agente do ensino, uma vez que esse deveria possuir competência para lidar com outra
novidade da época: o método de ensino. Assim, a Lei deixou claro quanto às condições
para o ingresso no magistério e sua qualificação. E foi taxativa. Habilitar-se para ensinar só
seria possível mediante concurso público realizado perante o Conselho das Províncias, o
qual encaminharia o parecer para o Presidente e a este caberia a nomeação. Quanto à
aprendizagem do método de ensino, cabia aos professores a responsabilidade onerosa para
o seu aprendizado.
Uma outra questão de mérito no documento de 15 de outubro de 1827 é o fato de
admitir a criação de escolas para as crianças do sexo feminino, embora houvesse uma
pequena diferença curricular comparada com a escola masculina. Para aquelas não se
podiam ensinar as noções de geometria e o aprendizado era limitado às noções de
aritmética. Em troca desses aprendizados foi incluído o aprendizado de prendas domésticas.
É necessário observar que mesmo com o avanço da inclusão e admissão de escolas de
primeiras letras para o sexo feminino, por outro lado, a Lei de 15 de outubro de 1827
delimitou o currículo e definiu o papel da mulher instruída no Império brasileiro. Ao
substituir as noções de geometria pelas de prendas domésticas, educando assim a menina
para o lar familiar e para a maternidade, os dirigentes possuíam interesses na instrução
feminina.
O fato de ter uma mãe bem instruída facilitaria o processo de afirmação da escola
como agência civilizatória. Era uma ferramenta a mais que os administradores possuíam
para derramar a instrução sobre a população. À medida que o Império instruía o sexo
feminino para ser dona de casa, também instruía para ser uma aliada a mais no processo de
construção da Nação brasileira. A mulher instruída seria portanto a uma peça fundamental
contra determinadas práticas consideradas entraves para o progresso como a desobediência
às leis e à religião.
59
- BRASIL. Lei de 15 de Outubro de 1827. IHGS. Doc. Cit.
45
As bases para a afirmação da escola primária estavam assim alicerçadas, cabia então
a cada província contribuir com a sua parte, de acordo com suas condições reais. A
província que possuísse melhores condições de elaborar seu plano de educação sairia na
frente no trabalho de escolarização. As demais, necessitariam da intervenção do Poder
Central.
1.2 - A Província Sergipana
Quando a Província sergipana tornou-se independente da Bahia , em 1820, havia do
ponto de vista político- administrativo, a cidade de São Cristóvão (capital); sete vilas (Santa
Luzia, Tomar do Geru, Santo Amaro, Vila Nova, Propriá e Lagarto), as povoações de
Laranjeiras, Japaratuba, Pacatuba e São Pedro de Porto da Folha. Do ponto de vista
educacional, havia 18 cadeiras de primeiras letras espalhadas entre vilas e povoações.
60
Mas é importante deixar claro que essa realidade era ainda herança do período de D João
VI. Para uma Província com a existência de 12 localidades, o número de cadeiras
funcionando satisfazia as necessidades geográficas. Mas essas cadeiras foram criadas por
indicação do poder central, e não a partir de um plano educacional elaborado por
sergipanos, pelo menos é o que aponta a historiadora Maria Thetis Nunes, concebendo a
educação de primeiras letras como uma réplica do quadro nacional nos começos do século
XIX.
61
Se a situação sergipana era uma réplica, então quando foi que a elite administrativa
começou a pensar e elaborar um plano educacional para a Província?
A historiografia tradicional sergipana ao construir o cenário de Sergipe no século XIX
o fez a partir de um viés republicano. De acordo com essa corrente, as ações dos
administradores sergipanos eram destituídas de programas objetivando apenas a posse do
poder.
62
Não havia assim, uma elite pensante que fosse capaz de dar acolhidas as idéias que
60
- NUNES, Maria Thetis. História da educação em Sergipe. Rio de Janeiro/Aracaju: Paz e Terra/ SEC/UFS,
1984. p. 34.
61
- Idem. p. 35.
62
- FREIRE, Felisbelo. História de Sergipe. Aracaju: Governo de Sergipe, 1977. p. 260.
46
circulavam no Brasil de então.
63
Na obra de Oliva, o cenário pintado para Sergipe era
composto por uma elite maniqueísta, onde de um lado havia os que estavam no poder e de
outro os que dele não fazia, colocando Sergipe como uma província que no século XIX foi
incapaz de trocar seu próprio caminho.
64
No entanto, Silva quando analisou a formação da elite provincial constatou que os
sergipanos que emigravam muito deles retornavam para a Província com idéias que
estavam circulando fora e dentro do Império brasileiro.
65
Essas idéias eram defendidas em
forma de discurso e colocadas em práticas como por exemplo a defesa da escola de
primeiras letras e a adoção de métodos de ensino.
Também ao se observar e analisar as mesmas fontes utilizadas pela historiografia
tradicional percebe-se um viés diferente. No diz respeito à questão educacional,
percebemos que desde o processo de afirmação da Independência sergipana havia uma
corrente em prol da instrução não primária como também secundária, inclusive o
interesse em se criar uma escola normal.
A prova de que havia uma elite preocupada em desenvolver a Província sergipana
pela via da educação está no esboço que o presidente Manuel Cavalcante de Albuquerque
que em 29 de março de 1825 fez para o ministro e secretário de Estado dos Negócios do
Império. A citação é bastante elucidativa.
julgo ser de absoluta necessidade estabelecer nesta cidade capital da Provincia,
cadeiras publicas Rhetorica, de Logica, de Geometria, indicada a formalidade que
devem ser providas os respectivos professores, e designadas as Ordens que devem
perceber, com esta provincia facilitando-se à mocidade de toda a Provincia os
meios de adquirir conhecimentos elementares indispensaveis para os diferentes
empregos e misteres da Sociedade ir se hão milhorando os costumes, e remediar se
com grande vantagem do Estado a falta, que atualmente de individuos aptos
para os ramos do Serviços publico: A este mesmo fim muito contribuirá, que se
estabeleção Escollas do ensino mutuo, segundo o methodo Lencastriano, em lugar
das cadeiras de primeiras Letras, existentes, sendo dessa corte mandado um
Professor que venha fundar nesta cidade Escola Normal, obrigando os Professores
daquellas cadeiras a se habilitarem neste em prazo consignado, a ensinar pêlo
63
- NUNES, Maria Thetis. História de Sergipe a partir de 1820. Rio de Janeiro/Brasília: INL/Cátedra, 1978.
p. 80.
64
- Oliva, ao escrever sobre as estruturas de poder na província de Sergipe, bebeu na fonte da obra de
Felisbelo Freire. Esse historiador construiu o cenário sergipano a partir de um viés republicano. OLIVA,
Terezinha. As estruturas de poder. In.: DINIZ, Diana Maria de F. Leal(org.). Textos para história de
Sergipe. Aracaju: UFS/Banese, 1991. p.133.
65
- SILVA, Eugênia Andrade Vieira da. A formação da intelectualidade sergipana (1822-1889). São
Cristóvão: UFS, 2004.
47
mesmo melhodo, com a noção de que assim não acontecer de serem demithidos do
magisterio e substituidos por outros que preenchão a indicação.
66
A proposta do presidente da Província sergipana estava clara quanto à função que a
instrução pública iria desempenhar. Suas idéias podem ser elencadas como modernas à
medida que defendem aulas de retórica, lógica e geometria com o intuito de preencher os
quadros administrativos provinciais, e também por defender a introdução do método mútuo
ou lancasteriano e a criação de uma escola para Sergipe, ambos concebidos como
novidades no mundo ocidental.
Essa proposta foi transformada depois em solicitações dirigidas ao mesmo secretário
imperial.
67
Ao que indica, o plano proposto pelo presidente antecipou a Lei de 15 de
outubro de 1827. A explanação realizada pelo administrador provincial vai no contra senso
do que a historiografia afirmou acerca do papel do Estado na esfera da instrução pública.
No entanto, mesmo concebendo a explanação do presidente como um prelúdio da
educação provincial, datamos o início da estruturação da escola primária a partir dos anos
finais da década de 20. Foi com a lei de âmbito nacional que permitiu, na província de
Sergipe, o início da estruturação da escola primária, sendo datada a partir de 3 de dezembro
de 1828 com a abertura de um edital para concurso público para todas as cadeiras de
primeiras letras e Gramáticas Latina, consideradas vagas no momento.
De acordo com o Edital, o concurso seria realizado em 21 de janeiro de 1829.
68
Também nesse mesmo ano, em primeiro de dezembro, ocorreu a instalação do Conselho
Geral da Província, órgão que auxiliaria o presidente da Província em vários assuntos,
inclusive nos referentes à instrução primária, como por exemplo, a extinção ou não de
cadeiras nas mais diversas localidades.
A instalação do Conselho Geral da Província também impulsionou a criação de várias
cadeiras de primeiras letras, tanto do sexo masculino como do feminino. E não ficou na
criação ou extinção de cadeiras, mas também na tarefa de fazer cumprir os ideais
filantrópicos com a distribuição de materiais escolares para os alunos pobres. É o que se
pode afirmar a partir do oficio do professor Antonio Ricardo dos Mártires, da vila de
Lagarto.
66
- Ofício expedido em 29 de março de 1825. APES. Fundo G
1
267. p. 55.
67
- Ofício expedido em 30 de agosto de 1825. APES. Fundo G
1
267. p. 101.
68
- NUNES, Maria Thetis. História da educação em Sergipe. Op. Cit. p. 46.
48
Nesta data conferindo meos poderes a José Nicacio Gomes receber na Estação da
Thesouraria Provincia a resma de papel, e a quantia que o Exmº em Conselho
Resolveu distribuir com os alunos pobres de minha Aula, applicada a comprar de
utencilios para os mesmos, tenho sentido respondido aos officios de v. s. de 8 de
agto. E 25 de 7 bro. Passado.
D.G.a V.S. do Lgto. 11 de 9 bro de 1833.
69
O Conselho Geral da Província era um órgão de caráter consultivo que propiciou o
avanço da instrução em Sergipe. Do período de constituição até do Ato Adicional de 1834
Sergipe possuía 29 cadeiras de primeiras letras, sendo 25 para meninos e 4 para meninas.
Das 25 escolas masculinas, uma era de ensino mútuo.
70
Como se pode notar ocorreu um
relativo surto de criação de cadeiras.
Faz-se necessário também observar que o Conselho Geral era quem possuía
informações acerca da situação de funcionalidade das escolas de primeiras letras através
das Câmaras de Vereadores das localidades cuja função era a de fiscalizar. Com as
informações em seu poder, o Conselho Geral emitia parecer para o presidente da Província,
a quem cabia o poder de extinguir ou criar cadeiras. Ao presidente ainda cabia a tarefa de
repassar informações para o Poder Central.
Era dessa maneira que estava montada a estrutura provincial para tratar de assuntos
relacionados à instrução primária. Para facilitar o entendimento vamos dar como exemplo a
criação de uma cadeira. Os vereadores em comissão observam a situação da localidade e
repassavam informações à Câmara. Esta, por sua vez, enviava-as em forma de
requerimento ao Conselho da Província que, automaticamente, dava parecer e fazia chegar
ao Presidente da Província, a quem cabia o poder de autorizar a criação da cadeira ou
extinção. Essa prerrogativa estava justificada na Lei de 15 de outubro de 1827.
A estrutura presente pode ser exemplificada com o que ocorreu em 1832 quando da
remoção da cadeira de primeiras letras de Pacatuba.
A Comissão das Camaras emcarregada de dar seu parecer sobre a representação dos
Abitantes da Ilha de Brejo Grande em que pedem a remossão da cadeira de primeiras
Letras da Missão de Pacatuba p a mesma Ilha. Hé de parecer que aqles. Povos não
sejão privados d um beneficio a que tem todo jus e em favor dos Representantes,
[ilegível] julgo que se deve oferecer um artº ad tivo a Proposta de Criação de cadeiras
69
- Ofício expedido em 11 de agosto de 1833. APES. Fundo E
1
644.
70
- NUNES, Maria Thetis. História da educação em Sergipe. Op. Cit. p. 55.
49
de primeiras Letras apresentada pelo conselheiro =Boto= ficando deste modo uns e
outros satisfeitos. Salla da comissão. 1º de fevereiro de 1832.
S. G. A. Boto
Luis Barbosa Madureira
Gonçalo Paes Barbzª Madurª.
71
O documento citado sobre a remoção da cadeira de primeiras letras de Pacatuba para
Ilha de Brejo Grande nos faz pensar no papel que as câmaras de vereadores cumpriam no
trato das questões educacionais. Fica clara a importância que os camaristas davam à escola
primária enquanto instituição. E mais, defenderam não só a remoção da cadeira como
também a criação de uma outra.
Outra questão que o documento emitido pelos camaristas revela é a intenção
veemente em garantir a instrução primária para uma localidade como Pacatuba cuja
população era composta por índios e remanescentes, e garantir também a criação de uma
nova cadeira em outra localidade. Isso nos leva a pensar que esse espírito de atendimento
aos mais necessitados esteve presente não na elite administrativa do alto escalão do
Estado como também na elite local, nos vereadores. Desse modo, pode-se inferir que o
parecer dos camaristas, ao admitir a criação da cadeira para Brejo Grande, não possuía a
intenção de destituir a cadeira de Pacatuba. Muito pelo contrário, a intenção era de ampliar
a rede com a criação de outra, como ficou evidenciado no documento.
A Província sergipana continuou afirmando a instrução primária para a população.
Ano após ano o número de cadeiras ia crescendo e afirmando a presença da escola de
primeiras letras em todas as localidades. À medida que o número de cadeiras crescia,
necessitava-se de mecanismos que melhor regulamentasse a Instrução Pública.
O Ato Adicional de 1834 foi um dos mecanismos que trouxe para as províncias a
liberdade de legislar em matéria de instrução primária e secundária. No entanto, essa
liberdade ficou restrita apenas à instrução primária. A competência da legislação sobre a
esfera secundária cabia ao Poder Central.
A partir do Ato de 1834, as províncias não se restringiram só na limitação de criar ou
extinguir cadeiras, mas também na liberdade de legislar sobre educação como se disse. Essa
Lei foi significativa porque impulsionou uma intensificação de debates na Assembléia
71
- Ofício de 01 de fevereiro de 1832. APES. Fundo Sebrão Sobrinho. Cx. 27. Doc. 03.
50
Provincial acerca da organização da escola primária. Prova disso, comentado no início
deste capítulo, foi o discurso do Vice-Presidente Manuel Joaquim Fernandes de Barros,
datado de 1836.
O que mais se pode perceber na Província sergipana, a partir do Ato Adicional em
diante, é a defesa empreendida pelos dirigentes de um corpo de leis para regulamentar a
instrução, a favor da criação de cargo para inspecionar as aulas e também da habilitação do
corpo docente, entre outros. É necessário observar que um ano após o Ato Adicional em
Sergipe foi aprovada a primeira lei sobre instrução primária, a Lei de 5 de março de 1835.
Com essa Lei Sergipe assim como as demais províncias começou efetivamente o trabalho
de intervenção no campo da instrução primária.
72
A Lei de 5 de março de 1835, de modo geral, regulamentou o corpo docente da
Província, determinando condições de trabalho, investidura no cargo e aposentadoria. Outra
ação da lei foi a criação e remoção de novas cadeiras públicas. Mas a ênfase recaiu mesmo
na questão da regulamentação do quadro docente.
Art. 6º. Os actuaes professores, e mestras, que tiverem servindo mais de 12 annos com
effetividade, e não podem obter suas cadeiras em concurso, serão aposentados com a
metade do ordenado, que ora percebem.
Art. 23. Os professores, e mestres, que provarem impedimento plysico, poderão ser
jubilados tendo ensinado com effetividade, e sem nota por mais de vinte annos com
ordenado inteiro.
Art. 24. Os que tiverem ensinado com effectividade, e sem nota por mais de vinte annos
ainda que não tenham impedimento physico, poderão ser jubilado com ordenado
inteiro.
73
que se observar que a Lei de 1835 expressou, de forma mais clara e precisa, a
influência que a França exerceu sobre o Brasil do século XIX. As bases dessa influência
vieram da Lei de 1827 ao fazer noção do currículo, do modelo de escola, do método de
ensino e da profissionalização docente.
Outra questão que se a bandeira de luta que começou a partir de primeira lei de
instrução sergipana foi a criação de uma escola normal para habilitar o professor. A defesa
72
- A organização da instrução na Paraíba data de 1837. PINHEIRO, Antonio Carlos Ferreira. Da era das
cadeiras isoladas à era dos grupos escolares na Paraíba. São Paulo/Campinas: Autores
Associados/Univ. São Francisco, 2002. p. 27-28.
73
- FRANCO, Cândido. Compilação das leis da província de Sergipe (1835-1880). Aracaju: Tipografia de F.
das Chagas Lima [1880]. p. 137-140.
51
dessa instituição passou a ser vista como um critério para a garantia do perfeito processo de
civilização da população pobre escolarizável através da habilitão do professor. Foi o que
entendeu o presidente da Província Manuel Fernandes da Silva em 1836.
Sobre tudo vos recomendo mui particularmente que mediteis sobre um plano de
Instrução Elementar para a mocidade, ou na criação de huma escola Normal de ensino,
onde se formem Professores, para a educação da mocidade, os quaes serão prefeitos no
ensino, e concurso para esse fim aos outros, que não tiverem seguido esse curso; e os
ordenados deverão expor os meios faceis de apprender em pouco tempo pelo methodo
do alencastrino os principios da leitura, e escripturação, Arithemetica, e geometria
pratica, tão necessarias às artes mecanicas e liberais.
74
O discurso do presidente em defesa da criação de uma escola normal para Sergipe
acaba por revelar o estado em que se encontrava a instrução sergipana. A primeira questão
que o administrador chama atenção é a necessidade de um plano de educação provincial.
Isso significava admitir que não havia uniformização de práticas pedagógicas. O que na
verdade o presidente estava revelando através de seu discurso era uma província com
multiplicidade de formas de ensinar, ingerência na fiscalização das aulas e falta de controle
do corpo docente.
A fala do presidente Manuel Fernandes também revela a importância que a escola
normal recebia em termos qualificação docente. Fica subentendido que era através desse
espaço de formação docente que ocorreria a construção da Nação e caminho para o
progresso. A escola normal era concebida como o veículo pelo qual o Estado retiraria
práticas culturais, vistas como bárbaras.
A tentativa de implantar a escola normal saiu do discurso e foi para a prática. Dois
anos depois desse discurso, em 20 de março de 1838, a Assembléia Provincial criava a
escola normal.
75
Nesse mesmo ano, o padre Pedro Antonio Bastos foi enviado à Escola do
Rio de Janeiro, às custas dos cofres públicos, para aprender, na teoria e na prática, os
procedimentos para a institucionalização do referido estabelecimento de ensino. A escola
normal não saiu do papel . Esse projeto não cumpriu sua missão, pois em 1842 o presidente
Sebastião Gaspar de Almeida Boto solicitou à Assembléia Provincial a criação de uma
74
- Relatório do presidente Manuel Fernandes da Silva. IHGS. In.: oticiador Sergipense. n°.81. 1836. p. 01
75
- Relatório do presidente José Eloi Pessoa. IHGS. Sergipe: Tipografia de Silveira, 1838.
52
nova lei de instrução púbica primária para que se melhorasse o ensino simultâneo de
Sergipe.
76
A defesa e o projeto de criação da escola normal se forem olhados não do ponto de
vista do insucesso, mas do contexto em que estão situados, coloca Sergipe no rol do
movimento de afirmação desse templo de formação docente, como faziam as outras
províncias do Império brasileiro que almejavam o que havia de mais moderno para a
realização da construção do império brasileiro.
A primeira escola normal brasileira data de 1835.
77
Embora Nunes afirme que o
projeto da escola normal sergipana não tenha saído do papel, de se considerar que o
projeto dos administradores provinciais contemplava a escola como agência sine qua non
responsável pela regeneração da sociedade. E a instrução era a ferramenta principal.
Defender essa instituição foi a marca de quase todos os administradores provinciais até sua
concretização real na década de 1870.
Do ponto de vista internacional a Província sergipana estava inserida no ideário
pedagógico europeu. O espelho para implantação da escola normal provinha da Alemanha.
Muitas das inovações pedagógicas que estavam em prática nesse continente eram
apropriadas no Brasil e em Sergipe.
Da década de 1830 a o início da seguinte ocorreu um aumento do número de
cadeiras de primeiras letras. Em 1842 as cadeiras masculinas passaram de 25 para 29 e, as
femininas de 4 para 8.
78
A explicação para esse aumento pode estar no relativo poder que o
Ato Adicional deu à assembléia Legislativa Provincial para criar novas povoações e vilas.
Outra explicação para o aumento do número de cadeiras de primeiras letras pode estar
no desenvolvimento da economia da cana-de-açúcar que impulsionou o crescimento do
quadro populacional da Província À medida que a população aumentava, necessitava-se de
mais escolas para atender a faixa etária escolarizável.
O número de cadeiras expressivo na Província sergipana causava preocupações aos
administradores porque segundo eles não havia homogeneização dos impressos escolares
utilizados nas escolas primárias. Cada professor, por exemplo, utilizava o seu manual de
76
- Relatório do presidente Sebastião Gaspar de Almeida Boto. IHGS. Sergipe: Tipografia de Sergipe, 1842.
p.9.
77
-VILELA, Heloisa de Oliveira Santos. A primeira escola normal do Brasil: uma contribuição à história da
formação de professor. Niterói: Universidade Federal Fluminense, 1990. p. 15.
78
- Relatório do presidente Sebastião Gaspar de Almeida Boto. Doc. Cit. p. 9.
53
gramática, de aritmética e livros de leituras. Isso causava preocupações porque a unidade da
nação brasileira e conseqüentemente da Província dependiam dos valores e noções
transmitidas pela escola primária. Sem esses “utensílios”, como eram chamados na época,
não adiantaria criar escolas, como foi denunciado em 1845 pelo presidente da Província
José Francisco de Menezes Sobral.
A falta de regulamento que declare os compendios e materiais que devem ser
ensinados, e ate que ponto deverá o menino sabel-se; a nenhuma prestação de
syllabarios, traslados, em que essas trabalha o Mestre, tão nem muito concorre para
difficultar o ensino; com tudo não me posso forrar ao dever de confessar, que alem de
alguns Mestres, as Professoras da capital, e Laranjeiras se tem exforçado para vencer
todos os obstaculos, e hão feito aproveitar suas Louvaveis dedicações. São os Mestres
obrigados a ensinar a ler e escrever, gramatica, aritmtica, geometria practica, doutrina
christã: segundo o plano da escola normal, terão de ensinar tão bem ensaios sobre
synonimos, e elementos de geografia. Como deveis desempenhar tantos deveres sem
meios proporcionaes, ainda tendo os conhecimentos precisos?
79
O problema dos compêndios foi preocupação de quase toda a década de 40 do século
XIX. Além de não haver uniformização, contava com a situação do pouco orçamento
destinado para a instrução primária, segundo os relatórios dos presidentes. A situação
tornou-se tão vexatória que o presidente José Ferreira Souto, em 1847, para atender as
solicitações de professores comprou alguns compêndios da sobra correspondente do salário
de dois professores e dividiu entre as escolas mais freqüentadas.
80
A historiografia tradicional sergipana percebeu o papel do Estado na esfera da
educação como omisso e desleixado, como mostrou Nunes. Freire afirmou que de 1840 a
1855 não houve fiscalização do dinheiro público, chegando a ponto de não haver numerário
suficiente para pagar o funcionalismo, ao qual o governo na tentativa de solucionar o
problema entregava vales para serem rebatidos no comércio, provocando assim, grande
especulação por parte dos negociantes.
81
Essa situação só foi resolvida com a Lei nº 225 de 31 de maio de 1848 que, em apenas
dois artigos, tentou uniformizar e iniciar um plano de instrução para a toda a província. As
79
- Relatório do presidente José Francisco Meneses Sobral. IHGS. Sergipe: Tipografia de Sergipe, 1845. p.
6-7.
80
- Relatório do presidente José Ferreira Souto. IHGS. In.: Correio Sergipense. 35, ano X, 12 de maio de
1847. p. 2.
81
- FREIRE, Felisbelo. Op. Cit. p. 143.
54
competências e a distribuição dos impressos escolares foram indicadas nos artigos sexto e
sétimo.
Art. 6º. O Governador designará, e fará imprimir na Typographia os compendios, que
devem servir nas aulas de instrucção primaria, podendo organizar um plano, que
methodize em toda a provincia a mesma instrução, o qual será desde logo posto em
execução, e submettido a approvação d ‘assembléia provincial.
Art. 7º. Os compendios impressos serão divididos pelas aulas d‘ambos os sexos da
provincia, e incubidos aos respectivos professores para servirem de estudos aos
meninos pobres.
82
De acordo com essa lei, podemos perceber que mais uma vez a Província tomava para
si a tarefa de tutelar a população ao atribuir, também para si, competência pela distribuição
pelos impressos escolares. Embora houvesse reclamações a respeito do pouco orçamento
provincial destinado para a educação, não se pode notar desleixo no atendimento das
necessidades escolares.
A responsabilidade pela distribuição dos compêndios escolares traz, por outro lado,
uma primeira tentativa de uniformização da instrução primária. Se ainda não havia uma lei
que uniformizasse as práticas pedagógicas, a solução encontrada foi tentar equiparar o
trabalho docente com a distribuição igual de impressos pedagógicos para todas as escolas.
As reclamações do estado de carência da instrução pública continuaram sendo
denunciadas pelos presidentes da Província. Cada qual, por sua parte, denunciava os
problemas existentes e apontava as soluções para a melhoria da situação das escolas de
primeiras letras. O presidente ainda relatava em detalhes as melhorias que realizava.
Mesmo com toda essa avalanche discursiva acerca da instrução provincial a organização da
instrução só veio a começar a ser regularizada e planejada a partir da década de cinqüenta.
No trabalho de melhor organizar a Instrução Primária sergipana, em 1850 foi criada a
Inspetoria das aulas através da Resolução de 259. Essa medida, ao criar o cargo de
inspetor para toda a Província, diminuiu o poder fiscalizador que as câmaras municipais
exerciam sobre a instrução primária.
82
- FRANCO, Cândido A. P. Op. Cit. p.143.
55
Resolução N. 259 de 15 de março de 1850
Art. 1°. O governo fica autorizado a nomear um inspetor geral das aulas para toda a
provincia com o ordenado annuo de um conto de reis.
Art. 2°. Para este lugar será nomeado pessoa de reconhecida probidade e
reconhecimentos litterarios.
Art. 3°. O governo dará o regulamento necessario para o bom desempenho das funções
inherentes à este emprego.
Art.4°. Nem os juizes de direito, nem os municipaes dos termos poderão ser nomeados
para o cargo de inspector geral das aulas.
Art.5°. Revogam-se as disposições em contrario.
83
A Resolução que criou o cargo de Inspetor Geral das aulas não foi uma medida criada
no vazio, estava ligada ao contexto internacional e brasileiro referente à educação. Pode-se
notar a influência da Lei francesa de 1850, de Luís Bonaparte, substituindo a Lei Guizot, de
1833 que teve influência nas legislações das províncias brasileiras até 1854.
84
No contexto
brasileiro a resolução estava inserida no projeto dos Saquaremas grupo conservador que
elaborou um projeto de Nação cujas ações partiam do Município Neutro para as províncias
brasileiras.
A primeira observação presente na resolução é a de que para ser inspetor geral das
aulas tinha que ser pessoa de reconhecimento de probidade moral e literária. Essa medida
administrativa provincial começou por não só delimitar investidura no cargo como também
fez exigências para a atuação no campo educacional. Pela exigência podemos inferir que
para fazer parte desse campo era necessário possuir curso superior, ser considerado
intelectual e ainda pertencer à classe dos abastados.
O documento, ao citar o reconhecimento literário, não deixou claro qual era essa
competência. Dessa forma, podemos afirmar que esse reconhecimento literário provinha da
atividade jornalística, ou pelo fato de a pessoa escrever artigos em jornais ou revista, ou
ainda quem sabe de ser um poeta e ter publicado seus poemas em jornais.
Segundo Silva, o critério para ser reconhecido como intelectual bastava ter o
reconhecimento como tal entre seus pares.
85
Outro meio para ser considerado intelectual no
século XIX foi o exercício de atividades ligadas à poesia, música, formação acadêmica; ou
83
- FRANCO, Cândido A. P. p. 128-129.
84
- NUNES, Maria Thetis. História de Sergipe. Op. Cit. p..95.
85
- SILVA, Eugênia Andrade Vieira da. A formação da intelectualidade sergipana (1822-1889). Op. Cit. p
12.
56
o fato de está ligado a uma instituição cultural governamental ou particular, ter publicado
sua produção dentro ou fora da Província.
Outra questão determinada pela Resolução era que nem juiz de direito nem os
municipais poderiam ser nomeados para o cargo de inspetor geral das aulas. Ao fazer
restrições, o documento estava admitindo para o novo cargo exclusividade para o trato das
questões educacionais na Província. Um juiz possuía obrigações demais e, possivelmente,
como tal, não sobraria tempo para se dedicar aos trabalhos da inspetoria.
Ao criar o cargo de inspetor poder-se-ia estar também tentando eliminar possíveis
conflitos entre professores e camaristas ou entre estes e os presidentes da Província no trato
das questões educacionais. Por outro lado, interligava todas as escolas em um único órgão,
facilitando assim o conhecimento e o controle sobre os alunos e professores.
A partir daí o governo provincial poderia penetrar no espaço interno da escola e saber
o grau de práticas pedagógicas desenvolvido pelos docentes. Era uma forma de também
retirar dos professores a liberdade total sobre seu ofício e determinar normas de condutas.
A intenção era de que todas as escolas ensinassem de forma igualitária as determinações
provinciais.
A criação e regulamentação do cargo de inspetor geral das aulas podem ser vistas
como inovadora para o século XIX. Na verdade essa medida fazia parte do projeto
esboçado pelos Saquaremas, grupo que exerceu influência em todo o Império brasileiro. O
projeto tinha como pressuposto consolidar a Nação, através da escola de primeiras letras,
estabelecendo a ordem da sociedade de forma hierarquizada..
86
Esse projeto via a escola primária como uma das bases de sustentação do Império,
porém uma escola organizada, pois a integridade do território dependia dos ensinamentos
transmitidos via instituição escolar através do ensino da gramática, rompendo com as falas
regionais e impondo uma língua nacional; pelo ensino da matemática com as quatro
operações de aritmética e os conhecimentos da Geografia.
87
Daí, estar bastante clara a
intenção em se criar a Inspetoria Geral das Aulas.
que se observar que a resolução de 15 de março de 1850 não definiu a estrutura
organizacional nem atribuiu competências, pois mesmo afirmando que o governo faria a
86
- MATOS, Ilmar Holloff de. O tempo saquarema: a formação do Estado Imperial. 5 ed. São Paulo: Hucitec,
2004.
87
- Idem. p. 276.
57
regulamentação para o exercício do cargo, não o fez nesse período. A fiscalização das
escolas era realizada pelas câmaras de vereadores e com a criação do novo cargo seria
necessário atribuir competências para não causar conflitos de autoridades.
A regulamentação da Inspetoria Geral só ocorrerá em 22 de junho de 1858 através da
Lei 519.
88
A estrutura organizacional ficou definida pelas criações dos órgãos como a
Inspetoria Geral, Sub-Inspetoria de Direito e Conselho Literário. A cada órgão foram dadas
funções e para a investidura nos respectivos cargos eram exigidas algumas prerrogativas.
A criação e regulamentação da Inspetoria Geral receberam mais uma vez influência
do Poder Central. A partir daí pode-se perceber com clareza o poder de irradiação do grupo
Saquarema. Pode-se afirmar que o Estado efetivamente possuía mecanismos para penetrar
no espaço da escola. No dizer de Matos, começava a luta da Coroa contra o governo da
casa. O Estado Imperial começava a implementar assim o projeto de construção da Nação
brasileira com a estruturação da Inspetoria provincial.
A influência dessa medida adveio da Reforma do Ministério da Conciliação (1853-
1857) sob comando do ministro Luís Pedreira Couto Ferraz.
89
Esse ministro empreendeu
uma reforma educacional para o ensino primário e secundário para a corte que serviria de
modelo para as outras províncias. O ponto mais destacado foi o estabelecimento da
estrutura de supervisão para as escolas públicas e particulares, com a criação de inspetorias
provinciais ligadas ao Ministério dom Império.
É importante observar que ao se criar a Inspetoria Geral das Aulas, o governo não
estava excluindo as maras de vereadores no trabalho de organização da instrução. Muito
pelo contrário, foi redefinido de forma clara o papel que as câmaras passariam a ter. E não
elas como também Clero e dos professores. A cada uma das esferas foram atribuídas
novas competências.
De acordo com a referida Lei, o cargo de inspetor era nomeado pelo presidente da
Província. Ao inspetor geral das aulas competia inspecionar, dirigir, e instruir a todos os
empregados da instrução pública e particular; conceder licenças, julgar e aplicar penas aos
professores e prestar ao governo informações determinadas em lei.
88
- FRANCO, Cândido A. P. Op. Cit. p. 129-130.
89
- Esse projeto que teve como mentores o ministro Couto Ferraz e Justiniano da Rocha foi apresentado no
Parlamento em 1851com o nome de Regulamento da Instrução Primária e Secundária do Município da
Corte. NUNES, Maria Thetis. História da Educação em Sergipe. Op. Cit. p. 95.
58
Aos inspetores de distrito competiam inspecionar e dirigir todos os empregados da
instrução pública e particular; prestar informações e esclarecimento sobre as escolas; visitar
escolas duas vezes por ano; admoestar e repreender professores; conceder licenças aos
professores até oito dias; inventariar os móveis e utensílios escolares e delegar atribuições
aos subinspetores nos lugares mais distantes da Província.
Sobre os distritos literários havia as corporações com os títulos de Conselhos
Literários. Para fazer parte desse conselho a exigência era ser presidente da câmara de
vereador ou então ser vigário, ambos compreendidos no distrito. Esses membros possuíam
as funções de visitar assiduamente as aulas em qualquer estabelecimento de ensino do
distrito; exigir esclarecimentos e informações dos professores a cerca de seu oficio.
Somente aos vigários cabia a inspeção sobre o ensino da moral e da religião.
No caso dos presidentes das câmaras eram-lhes atribuídas funções especiais de
verificação e exigir que os alunos pobres fossem supridos, convenientemente, com livros,
papel, e demais objetos necessários para os exercícios escolares; ainda exigir dos pais,
tutores ou curadores a freqüência escolar das crianças maiores de sete anos e menores de
quinze anos; representar sobre a necessidade da criação de novas escolas. Para completar a
relação de competências, os presidentes das câmaras ainda estavam encarregados de exigir
dos professores o cumprimento na instrução dos princípios da moral civil, inspirando nos
alunos o respeito à pessoa do imperador e às diretrizes constitucionais.
Pelo que foi exposto, é possível perceber como a elite imperial brasileira construiu a
rede e a estrutura administrativa da Instrução Pública e particular. No dizer de Matos, essa
“teia de Penélope” foi esboçada pelo grupo dos Saquaremas que, tendo a Corte como
laboratório, indicava modelos de administração para as províncias. Nesse modelo estavam
incluídos os profissionais liberais, juizes, professores, caixeiros, membros de clero,
militares etc, enfim, todos os empregos a serviço do Estado.
90
Todos estavam assim,
incluídos como peças fundamentais pra a consolidação da ordem, da integridade territorial,
onde o progresso e a civilização transcorreriam sem interrupções.
A Lei que criou a Inspetoria da Instrução Pública é reflexo da ão dos Saquaremas
na província de Sergipe, quando se observa os agentes envolvidos na estrutura com suas
respectivas competências e abrangências. Há, subjacente a essa estrutura educacional, toda
90
- MATOS, Ilmar Holloff de. Op. Cit. p. 180.
59
uma rede de informações e fiscalizações que circulava em toda estrutura administrativa
imperial. Dessa forma, havia os que pensavam e deliberavam sobre a instrução primária, os
que informavam ou delatavam, os que cuidavam da escola, tudo enquadrado numa estrutura
piramidal.
Tudo estava interligado, seja nos lugares próximos ou distantes. Havia uma
circularidade de informações a cerca das escolas de primeiras letras, dos agentes de ensino,
dos pais, enfim de tudo. Por exemplo, se um determinado aluno sabia ler, escrever, se era
assíduo ou como estava sua freqüência, o estado de tal aula, essas informações eram
conhecidas pela classe dirigente provincial. Essa assertiva pode ser exemplificada pelo
relatório do professor de primeiras letras de Riachão Cypriano José, em 1856.
(...) A minha aula s’acha muito balda [sic] de utensis; porquanto, existindo na
respectiva matricula o numero de 37 meninos sendo a freqüencia de 30, pouco mais ou
menos apenas existem 3 bancos, 2 carteiras e uma pequena banca. Havendo nesta
localidade mais de cincoenta meninos, apenas existem, como já se disse 37
matriculados com freqüencia dita o que attribuho a uns a pobreza se seos Paes, e a
outros (em pequeno numero) o pouco apreço que seos Paes dão a instrucção (...)
Não havendo aqui sus-ispetor, espero que por intermedio de V. seja prehenchida
esta falta. É o que se m’offerece a relatar a V. Sª, se porem alguma coiza julgão
necessario digne-se ordenar-me, que, como sempre, serei fiel e pontual no
cumprimento.
Aula Publica no Riachão, 28 de novembro de 1856.
Cypriano José.
91
Informações como essas, passadas pelo professor de Riachão cumpriam a função
determinada pela estrutura administrativa. Era o olhar vigilante sobre o povo brasileiro para
se saber a que ponto andava a educação de primeiras letras, pois como disse, a instrução
era vista como o veículo pela qual a ideologia do Império brasileiro transitaria seria
transmitida.
Para que o projeto de nação esboçado pelos Saquaremas desse certo foi também
necessário legislar sobre o cotidiano escolar e os agentes do processo de
ensino/aprendizagem. Assim, com o intuito de uniformizar e operacionalizar melhor a
instrução de primeiras letras foi aprovado em 1856 o Regimento Interno das Escolas.
92
Esse
documento foi constituído em quatro partes. Na primeira o documentou traçou regras de
91
- Comunicação expedida em 28 de novembro de 1856. APES. Fundo E
1
634.
92
- Regimento Interno das Escolas. APES. Fundo Biblioteca José Alves. Cx.01. Doc. 01. 1856.
60
conduta para a relação entre os professores e alunos. Na segunda parte determinou deveres
e obrigações para os professores e os pais de alunos. a terceira regulamentou as sessões
escolares. A ultima parte tratou das disposições gerais.
Quando em Sergipe foi aprovado o Regimento Interno das Escolas havia um total de
54 escolas de primeiras letras, sendo 39 do sexo masculino e 15 do sexo feminino.
93
Era um
número relativamente grande para Província. Daí a necessidade de uniformizações.
Analisemos então o documento.
O Regimento de 1856 começou por dar indicações ao professor. Nos dois primeiros
artigos consta que o professor deve ensinar a seus discípulos com amor e zelo, deve
despertar no discente o gosto de aprender, aconselhando-o paternalmente. No artigo
terceiro foi determinado que o professor não deveria castigar seus alunos senão depois de
aconselhá-lo por mais de uma vez.
Aqui podemos notar a influência de Herbart quando tece reflexões acerca do papel do
professor no processo de ensino.
94
Para o filósofo, quanto mais o professor se aproximasse
do aluno e tivesse uma relação afetiva mais fácil tornaria a aprendizagem, pois motivados
pelas relações afetivas, os alunos tomariam gosto pelo prazer do aprendizado.
O que se pode perceber a partir das determinações desse Regimento foi uma nova
representação do professor primário. Antes, nos relatórios dos presidentes da Província o
professor foi visto como um desleixado. Com a influência do Regimento Interno para as
aulas os docentes passaram a ser vistos a partir de uma nova ótica, como peça fundamental
para a construção da Nação. Essa nova representação fez do professor uma figura
responsável pelo sucesso da instrução junto com os demais envolvidos.
Nos artigos seguintes o documento regularizou a relação entre professor e aluno
determinando as formas de punição dos alunos rebeldes. As punições dos alunos iam desde
castigos físicos até a privação de lugar na classe. Segundo o documento, o aluno seria
castigado se cometesse:
1. Uma nota má;
2. A perda do logar alcançado nos diversos exercicios;
3. A privação ou restituição do premeo;
93
- Relatório do presidente Inácio Joaquim Barbosa. IHGS. Sergipe: Tipografia de Sergipe, 1854. p. 6.
94
- Herbart defendia que a afetividade desenvolve influência no processo de aprendizagem.
61
4. A detenção na eschola durante as horas de descanço, ou intervallo entre as duas
sessões diarias;
5. O ajoelhamento até meia hora;
6.
A prisão em quarto durante os trabalhos escolares, devendo a prisão ser sempre em
logar aceiado.
95
Pelo que foi exposto a partir do Regimento, dá-se para perceber como as formas de
punições determinadas para as escolas de primeiras letras. Desse modo, o que o documento
estava determinando era um mecanismo uniformizado de disciplinar os alunos para todas as
escolas de primeiras letras da Província para que não houvesse variações nas correções dos
alunos.
Havia também dispositivo para a expulsão do aluno da escola, mas isso ocorria se
o aluno fosse considerado de alta periculosidade para os colegas da escola. O julgamento
ocorria mediante acariação entre o inspetor das aulas e o aluno na presença do presidente da
Província. Confirmada a ocorrência quem detinha o poder de expulsá-lo da escola era
somente o presidente da Província.
Um dado que chamou atenção referente aos castigos é o fato de que nem o professor
nem o inspetor das aulas tinham o poder de expulsar o aluno da escola. Essa tarefa era de
competência privativa do presidente da Província. Mas isso só ocorria em caso raro, quando
o aluno depois de julgado fosse considerado perigoso e que colocasse os outros em situação
de risco. Em nossa pesquisa não encontramos documentos que revelassem casos de
expulsão de aluno da escola de primeiras letras
A disciplina escolar foi vista por Herbart como de vital importância no processo de
aprendizagem. Esse recurso, segundo o filósofo alemão, freava a impetuosidade do aluno.
96
O aluno ao perceber que estava sendo punido pelos atos cometidos não repetiria mais a
ação praticada. Além do que as punições determinavam algumas privações como a perda de
liberdade e de prêmios. A questão, como se disse, era para mostrar a autoridade do
professor.
Se o aluno passou a ser enquadrado por seus erros e faltas, por outro lado, poderia se
distinguir dos demais pelo mérito no desempenho de suas atividades escolares. Esse
95
- Regimento Interno das Escolas. Doc. Cit. cap.01, art. 4°.
96
- Cf. Herbart.
62
dispositivo do Regimento foi também uma forma de compensar a presença da disciplina na
escola. Os prêmios e distinções consistiam:
1. Em cartões ou bilhetes, que serão distribuidos aos disciplinados que mostrarem
maior aproveitamento, ou assiduidade e moralidade;
2. Em um lugar junto ao mestre, que se considerará lugar de honrar;
3. Em dadiva de lapis, pennas, e demais objetos proprios de escripta, que para esse fim
serão fornecidos pelo cofre Provincial,
4.
Na doação de livros, de que se fizerem uso nas escholas, os quaes serão igualmente
fornecidos pelo Cofre Provincial.
97
Ainda sobre os prêmios e distinções, cabe fazer um comentário quanto à
funcionalidade. Os cartões ou bilhetes eram conferidos pela assiduidade e moralidade do
aluno. Neles, eram inscritas as palavras “assiduidade” e “moralidade”. Esses bilhetes
possuíam a função de remir as faltas cometidas. Essa estratégia pode ser vista como uma
forma de incitar nos alunos o desejo de estudar cada vez mais estimulando assim a
concorrência entre eles. No caso dos prêmios em espécie como, por exemplo, livros que só
eram doados no caso de aprovação do discípulo nos exames que eram realizados. O
objetivo era estimar a freqüência e destacar o modelo de aluno para os demais.
Na segunda parte do Regimento foi determinada uma série de obrigações para o
professor. Esse também teve que estar submetido a deveres e obrigações A este agente do
ensino cabia a tarefa de fazer mensalmente, por escrito, a requisição aos pais dos alunos
que podiam comprar a relação dos objetos escolares tais como penas, lápis e papel. No caso
do aluno que fosse considerado pobre, a requisição não era destinada aos pais destes, mas
ao inspetor geral e este a enviaria ao presidente da Província para as devidas providências.
Cabia também ao professor informar aos pais, no final da semana, as faltas cometidas pelo
aluno durante a semana.
Art.7. Os professores farão saber por escripto, mensalmente, aos pais ou aios dos seus
discipulos quaes os objectos, de que os meninos precisão para o ensino,
compreendendo-se neste pennas, papel, e lapis.
97
- Regimento Interno das Escolas. Doc. Cit. Cap.I, art. 5°. p.01.
63
Art.9. Os objetos precisos aos alumnos pobres serão fornecidos por conta do cofre
provincial, e ordem da Presidencia, à quem os professores requisitarão, por intermedio
do Inspector Geral das Aulas.
98
O Regimento Interno ao determinar deveres para os professores acaba por revelaras
condições do que era considerada uma escola de primeiras letras e qual o papel do Estado
na educação. Essa observação se faz necessária porque a historiografia tradicional não
colocou a escola do século XIX no devido lugar. O que de certa forma necessita de
esclarecimentos.
Quando o artigo sétimo do documento afirmou que os professores dariam por escrito,
mensalmente, a relação dos objetos necessários para a escola, pode-se perceber a partir daí
que a escola era financiada por aqueles que possuíam condições para estudar. Para aqueles
que eram considerados pobres a responsabilidade pela manutenção na escola ficava por
parte do Estado imperial . Havia assim delimitações no papel do Estado.
O papel do Estado imperial no trato das questões educacionais estava bem delimitado
na legislação. Sua função era a de criar, extinguir ou remover a cadeira, pagar o salário do
professor e dos demais funcionários da Instrução Pública, manter a escola com móveis e o
aluguel da casa, garantir a doação de materiais escolares para os alunos pobres. No entanto,
os alunos que não fossem considerados pobres quem arcava com as despesas da escola
eram os pais daqueles. Portanto, o Estado garantia escolas para todos, mas só estava
obrigado a tutelar os alunos que fossem considerados pobres.
No Arquivo Público de Sergipe encontramos um outro regimento, sem data e
manuscrito, que nos artigos deixava clara a participação da família e do Estado na
educação. No capítulo segundo, artigos quinto, sexto e sétimo, era determinado o seguinte:
Art.5°. Os paes ou aios dos alumnos sendo obrigado a fornecerem os objetos de que
seus filhos precisarem, não poderão a seu bel prazer substituir por outros; mas
fornecerão aquelquer forem designados pelo professor em cumprimento do presente
regimento.
Art.6°. Quando der-se o caso de que os paes ou aios dos discipulos por sua pobreza não
possão fornecer os objetos pedidos pelos professores, e nem os possão haver por
emprestimo, fica à cargo do dicernimento e humanidade do Professor remediar este
mal: e se os objetos, que não poderem ser fornecidos pelos paes forem livros, o
98
- Regimento Interno das Escolas. Doc. Cit. Cap.III. p. 01.
64
Professor fará copiar alguns exemplares pelos discipulos mais adiantados para os
fornecer aos alumnos pobres.
Art.7°. Os Professores poderão exigir dos paes ou aios de seus discipulos uma leve
contribuição de 80 r
s
. no primeiro dia util de cada semana, o qual será destinada para
água, tinta, pennas e pael, que neste caso serão fornecido pelo Professor, ficando
dispensado desta contribuição os discipulos sumamente pobres, a quem entretanto se
fornecerão os misteres de que trata o presente artigo.
99
Fez-se necessário esclarecer essa questão porque a historiografia sergipana tradicional
quando operou com os discursos presidentes da Província não percebeu com clareza a
função do Estado imperial na esfera da instrução primária. Pelo fato de não ter
compreendido a delimitação do Estado na educação primária os historiadores construíram
um cenário desfocado para a atuação estatal no século XIX, concebendo-o como ausente e
inoperante.
O capítulo terceiro do Regimento foi o maior dos quatros. Nele, foram determinados
a organização interna da escola primária e os objetos pedagógicos. O currículo permaneceu
o mesmo determinado pela Lei de 20 de março de 1838, ou seja, o ensino da escrita, da
leitura, da aritmética e da moral cristã. Mas houve uma estruturação dos alunos. A divisão
dos alunos passou a ser organizada por classe, segundo suas idades.
100
A determinação de se estruturar os alunos por classes de idades trazia a exigência do
método de ensino simultâneo para as escolas de primeiras letras. Esse método foi defendido
pelos administradores provinciais em toda década de cinqüenta. Junto com o método vinha
a adoção dos impressos escolares para serem trabalhados pelos professores.
Ao fazer divisão de alunos por classe, o Regimento Interno de 1856 não deixou clara
a correspondência da classe por idade do aluno. No artigo 26 há apenas a determinação de
três classes de escrita: uma linha reta e curva; outra de caracteres maiúsculo, bastardo
101
ou
99
- Regimento Interno das Aulas. Correspondência Recebida. APES. Fundo G
1
974. Manuscrito. S/D. Vale
ressaltar que esse documento talvez tenha sido um rascunho do que foi aprovado em 1856.
100
- Classe no século XIX não era o mesmo que é hoje concebida. Compreendia a reunião de alunos por
matéria ou habilidades que o conjunto de alunos sentados em um banco possuía. O número de classe de
uma escola dependia de quantidade de alunos sentados. Mas geralmente era em número de cinco ou seis.
O somatório das classes compunha a escola ou a aula.
101
- Bastardo é a letra de talhe meio inclinado, com ligaduras e cujo desenho participa do rondo, espécie de
letra traços fortes, acentuadamente arredondados, e talhe vertical com versão tipográfica pertencente à
classe dos tipos escriturais e da letra inglesa, ou seja, letra escritural de traços finos e inclinados.
BARRA, Valdeniza Maria da. Da pedra ao : o itinerário da lousa na escola paulista do século XIX.
São Paulo: PUC, 2001. p. 26.
65
bastardinho;
102
e a terceira de caracteres minúsculos ou cursivos.
103
Quanto às matérias de
leitura ou aritmética, o artigo 23 diz que o professor pode dividir os alunos em dois bandos
ou grupos.
Sobre os compêndios escolares, a indicação variava de acordo com a classe. Para
leitura eram indicados abecedários, silabários impressos e cartas de nomes. As cartas eram
de quatro tipos: abecedários maiúsculos e minúsculos, cartas de labas, cartas de nomes
com separação de sílabas, cartas de nomes com silabas juntas. Para as classes mais
adiantadas eram prescritos manuscritos e livros impressos.
Os artigos utilizados para as classes mais adiantadas seriam extraídos dos livros de
Simão de Nantua e o catecismo de Fleury. Ainda era prescrito o Compêndio de Gramática,
de Antonio de Gentil de Ibirapitinga Pimentel. Esses impressos serviam para passar a
ideologia do Império brasileiro. No caso dos estudos de Caligrafia e Ortografia, estes eram
indicados pela Inspeção Geral.
Para o ensino de Aritmética foi indicado tabuada ou cartões. Estes eram de quatro
tipos: Tabuada de caracteres e sinais; tabuada de unidade e leituras de números; tabuadas de
pesos e medidas; e tabuada de somar, diminuir, multiplicar e dividir. O método para o
ensino dessa matéria era extraído do manual aritmético o de Besut.
O ensino da doutrina Cristã passaria a ser realizado pelo Catecismo de Dr. Autran,
substituindo o catecismo de Montpellier utilizado décadas anteriores. Esse ensino era
ocupação exclusiva das tardes dos dias de sábado.
As escolas, tanto masculina como feminina, funcionariam com duas sessões diárias:
uma pela manhã, das oito às onze horas; e outra à tarde, das duas às cinco horas. Para cada
sessão foram indicadas as matérias a serem ensinadas, as quais ocorriam de segunda aos
sábados à tarde.
De acordo com o Regimento, havia um tempo determinado para cada matéria de
ensino. A partir do documento montamos um quadro no intuito de entendermos melhor a
regulação do tempo da aula.
102
- Bastardinho era uma espécie de bastardo de módulo menor e traçado mais corrente. Idem. p.26.
103
- Cursiva é a letra de mão, também chamada manuscrita. Idem . p. 26.
66
QUADRO 01
Distribuição das matérias de ensino e sessão das aulas
Revisão e
revista
Escrita
Leitura
Aritmética
Doutrina Cristã
Manhã
Segunda a sábado
08:00 às 08:30
08:30 às 09:00
bastardo,
bastardinho e
cursivo
09:00 às 11:45
lições de cor, analise
gramatical e
exercícios
ortográficos
09:00 ás 11:45
exercício
aritmético
Não havia
DIAS DA SEMAA
Tarde
Segunda a sábado
14:00 às 14:30
14:30 às 15:00
15:00 às 16:45 o
mesmo que na
classe da manhã
15:00 às 16:45 o
mesmo que na
classe da manhã
Catecismo de
Dr. Autran
Exclusivo do
Sábado
Fonte: Regimento Interno das Aulas em 1856. Cap. III. Artigos 31 e 32.
O quadro construído a partir do Regimento Interno das Aulas de 1856 nos mostra o
tempo que era determinado para cada matéria. Para o ensino de escrita pode-se perceber
que era determinada apenas meia hora de exercício, tanto no período da manhã como da
tarde. Já o tempo destinado para o ensino da leitura e da aritmética era maior, ultrapassando
a duas horas de aprendizado. Acreditamos que a divisão do tempo para cada matéria estava
justificada pelo grau de complexidade do ensino.
Pelo quadro pode-se perceber como estava estruturado o período da aula. Os
exercícios ocorriam de forma simultânea para diferentes classes. Assim, enquanto as
classes de escrita estavam ocupadas com seus deveres de bastardo, bastardinho e cursivo, as
de leitura estavam exercitando lições de cor, análise gramatical e ortografia. Nessa mesma
67
escola as classes de aritmética treinavam em outras carteiras os aritticos. Se a aula fosse
no período da tarde todos de igual maneira teriam instruções sobre doutrina cristã.
Um dado relevante é que o Regimento de 1865 determinava seis dias de aula na
Província sergipana, como pode ser visto na tabela. Porém, nas disposições gerais do
Regimento Interno manuscrito, artigo sétimo era determinado que o dia de quinta - feira
seria considerado feriado. Ainda dizia que se num dia letivo da semana fosse feriado na
quinta-feira haveria aula normal. A documentação pesquisada não esclareceu porque nesse
dia a escola não funcionava. Não conseguimos encontrar informações que justificassem
esse feriado.
Além de organizar o tempo escolar interno das escolas, o Regimento de 1856 também
organizou o período letivo da instrução primária. Segundo o documento, as férias
compreenderiam um período que ia de 20 de dezembro a 20 de janeiro do ano seguinte. Os
feriados admitidos seriam considerados os dias da Semana Santa, desde o dia de Ramos até
a segunda-feira depois da Páscoa; o carnaval até a quarta-feira de cinzas; os dias de gala e
os de festividades nacionais.
104
No calendário escolar determinado pela legislação foi também previsto para antes das
férias o exame de todos os discípulos, o qual seria realizado na presença das pessoas
indicadas pelo Governo. O período de realização dos exames ocorreria entre o mês de
dezembro e o de janeiro. Acontecimento desse tipo funcionava como um rito de passagem
para os que estavam prontos para cursar outra classe ou outra modalidade de ensino.
A uniformização do tempo escolar e dos agentes do processo de ensino/aprendizado
esteve presente nos relatórios dos inspetores da Instrução Pública e dos presidentes da
Província junto com o problema do espaço escolar e da habilitação dos professores. A
discussão desses problemas atravessou as décadas de 40, 50 e 60 do período imperial com
um tom de denúncia do estado em que a instrução primária caminhava em Sergipe.
As críticas que os presidentes fizeram aos espaços escolares estavam pautadas na
questão do controle sobre os alunos e professores. O problema que estava como pano de
fundo era como o Estado iria penetrar e controlar os agentes do ensino e da aprendizagem
104
- Não encontramos documentos que informassem e explicassem quais eram os dias considerados de gala e
os de festividades nacionais.
68
que conviviam sob esse espaço. Isso porque a maioria das escolas funcionava nas casas dos
professores. A proposta de muitos presidentes era a de criar espaços próprios para a escola.
No caso do corpo docente, as críticas recaíram na questão salarial e na habilitação
precária dessa categoria do ensino. A atenção discursiva por parte dos presidentes referente
ao quadro docente possuía justificativa forte: esses agentes do ensino estavam incluídos no
projeto de nação concebido pelos administradores.
Na ótica dos administradores, a manutenção da ordem e da unidade da Nação seria
possível se a situação da instrução primária atingisse o mínimo necessário. Para isso a
habilitação do principal agente do processo pedagógico seria uma ferramenta para
viabilizar o processo civilizatório desejado. Sem esse quadro de funcionário seria
impossível penetrar no governo da casa e inculcar a ideologia do Império.
A resolução do problema da qualificação do professor de primeiras letras na
Província sergipana foi formulada estrategicamente pelos administradores com a criação
dos professores adjuntos, cargo criado no início da década de 1850. Esses professores não
eram concursados como os efetivos, apenas recebiam uma gratificação pelo trabalho
docente. Para ser professor adjunto a prerrogativa que se exigia era ter alcançado os
melhores resultados na escola, como se pode perceber no discurso do presidente da
Província José Antonio da Silva em 1852.
No intuito de obter-se o fim desejado crearão-se os professores adjuntos que outra coisa
não são, na frase pitoresca de um dos nossos publicistas, sinão aprendizes de mestre.
Estes adjuntos devem ser tirados d’entre os meninos pobres que mais se houvessem
distinguido depois por pomptos; e neste caso são desde logo associados ao ensino nas
escolas mais freqüentadas e percebem uma diminuta gratificação. Quando haja de
apparecer vaga, si algum desses moços houve attingido a idade pode ser aproveitado
para o professorado segundo procedimento e aptidão com preferencia a quaesquer
outros concurrentes.
105
Como se disse anteriormente, a criação desse cargo foi uma solução do Estado para
minimizar o problema da qualificação docente. Como em Sergipe não havia uma escola
normal que habilitasse o professor, a Diretoria de Instrução Pública daria o título ao aluno
pobre que melhor se destacasse na escola. Essa foi uma das formas encontrada pelos
administradores provinciais para habilitar o corpo docente a custo reduzido.
105
- Relatório do presidente José Antonio da Silva em 1852. IHGS. Sergipe: Tipografia Provincial. p. 18.
69
Outra questão que podemos perceber com o ato dos administradores é o retorno que o
Estado garantia pela manutenção e pelo investimento na instrução das classes pobres. Veja-
se que para ser admitido como professor adjunto a prerrogativa que se exigia era o aluno ser
oriundo da família pobre. Foi também uma forma de inserir os desfavorecidos
economicamente no quadro das profissões da Província, embora que de forma temporária.
Ao admitir o cargo de professor adjunto, o Estado estava delimitando as colocações
dos que compunham economicamente a população sergipana. Aos filhos da classe abastada
cabia a continuação dos estudos secundários e, conseqüentemente, superior, ou no próprio
país ou fora em uma universidade européia. Ao retornar para a Província sergipana
provavelmente iriam compor o quadro do alto escalão administrativo. Aos filhos dos pobres
ainda havia uma solução: o ingresso na carreira de professor de primeiras letras.
No mesmo relatório o presidente esclarece melhor a função do professor adjunto.
Além disso, mostrou também a estratégia utilizada para dominar o corpo docente da
Província.
Professor assim formados terão sobre os que principião a função sem tirocinio as
vantagens de estudos especiaes e de uma pratica sem interrupção, bebida nos verdes
annos, que tornará muito menos sensiveis as fadidas e tedios do magisterio.
Demais: acostumados desde a infancia a contentarem-se com pouco encararão como
uma fortuna um modesto ordenado, e não virão egoisticamente importunar os
legisladores para desviarem os dinheiros publicos de outros misteres mais urgentes, que
não o aumento de ordenados.
106
A partir das declarações do presidente é interessante observar como a elite
administrativa criou estratégias para diminuir vícios dos funcionários do Império, no caso
do corpo docente das escolas de primeiras letras. Com a aceitação de alunos provenientes
das classes pobres que estavam acostumados com tão pouco no cargo de professor, não
causariam preocupões ao Império no futuro. Para o presidente o cargo de professor era
uma conformação para o aluno pobre.
Pode-se perceber também como a elite usava de subterfúgios para diminuir as
tenções existentes no quadro de funcionário do Estado. Assim, o aluno pobre, na ótica do
106
- Relatório do presidente José Antonio da Silva. Doc. Cit.. p. 8.
70
presidente, não iria reivindicar por melhoras na sua condição de professor. O que fosse
destinado para a melhoria do ofício docente já estaria de bom tamanho.
A justificativa apresentada pelo presidente pontuou com precisão o objetivo e o
destino da instrução primária: instruir através de um currículo mínimo a camada pobre da
população. Ao admiti alunos para serem professores, o governo provincial estava também
limitando o currículo da escola de primeiras letras. Essa prerrogativa era básica para a
manutenção da ordem do império na qual os pobres teriam uma instrumentalização. Daí ter
sido tão forte a defesa da instrução para todos os lugares da Província.
No final da década de 1850 foi promulgada mais uma lei sobre educação para a
Província sergipana. A nova Lei, de nº 508 de 16 de junho de 1858, determinou um
Regulamento para a Instrução Pública no qual a ênfase caiu na situação da profissão
docente, na disciplina das escolas do ensino primário e adoção do método simultâneo e
normas para o ensino particular e secundário.
107
O currículo da escola priria, a partir do Regulamento de de setembro de 1858,
sofreu um acréscimo comparado com o anterior. Dessa vez foram incluídas noções gerais
de geometria plana, teoria e prática de aritmética até regra de três, sistema de pesos e
medidas do Império com as alterações que o mesmo tivesse no município. No entanto, para
as escolas do sexo feminino foram retiradas noções gerais de geometria plana e ensino de
aritmética limitada apenas às quatros operações por números inteiros, completando a grade
curricular com o ensino de trabalho em agulhas.
108
Outra novidade que o Regulamento de 1858 trouxe foi a permissão para divisão do
ensino primário em dois graus: ensino primário de primeiro grau e de segundo grau ou
superior. Para essa segunda parte do ensino foi indicada uma ampliação do currículo como
se pode ver no artigo 31.
Art. 31. Logo que as circustancias da Provincia permitir, instituirá o governo, com a
approvação da Assembleia Legislativa , alem das escola de instrução elementar, nos
lugares onde julgar conveniente, novas escolas de instrucção primaria superior, que
denominarão do-segundo grão - Estas, no seu ensino, compreenderão, alem das
materias mencionadas nos artigos antecedentes: o desenvolvimento da arithmetica em
suas applicações praticas, especialmente em relação à escripturação mercantil, leitura
107
- FRANCO, Cândido A. Op. Cit.p.143-144.
108
- Regulamento da Instrução Pública. Doc. Cit.
71
explicada dos Evangelhos, e noticia da historia sagrada, noções sagrada, noções gerais
de historia, e geografia, principalmente do Brasil.
109
Vale ressaltar que essas inovões introduzidas na instrução pública estão inseridas
no período considerado pela historiografia sergipana como “o período de Conciliação”
inaugurado pelo Poder Imperial, que se estende de 1853 a 1858, resultante do acordo entre
os partidos opostos. A repercussão em Sergipe da Conciliação foi a marca da
modernização, inclusive com a transferência da capital da Província de o Cristóvão para
Aracaju.
110
O Regulamento de 1858, como se viu adotou como método de alfabetização
simultâneo dividido por classe, adotando o sistema de aluno (a) s-mestre (a)s e professores
adjuntos com gratificação mensal. De acordo com o documento, o número de aluno (a)-
mestre (a) contratado com gratificação não poderia exceder o número de doze para toda
Província. o de professor (a) adjunto (a) não poderia exceder o mero de seis, também
para toda Província.
Para ser investido como aluno-mestre, a idade mínima exigida era de dezesseis anos
e poderia permanecer na tal função por um prazo de três anos. Para o sexo feminino a
idade mínima exigida era de vinte e um anos. No caso do professor adjunto, a exigência era
ter dezoito anos. Para se chegar ao cargo de professor titular, o aluno pobre teria que
cumprir essas etapas.
O que se pode notar a partir dessas mudanças introduzidas no campo da instrução
primária é uma forte influência das práticas do sistema de ensino prussiano, no qual o aluno
mais adiantado, na vivência de escola ia aprendendo com o mestre as técnicas da
alfabetização.
111
Depois do período de treinamento, o aluno com a aquiescência do mestre e
após ser examinado pelo mesmo e pelas autoridades competentes, solicitava o
enquadramento como aluno-mestre. Dessa forma, utilizando alunos como recrutas dos
professores, seriam reduzidos custos com o recrutamento de professores nas questões de
qualificação e também seria uma forma de suprir a carência de professores habilitados no
quadro da instrução primária.
109
- Regulamento da Instrução Pública. Doc. Cit.
110
- OLIVA, Terezinha Alves de. Op. Cit. p.136-137.
111
- VILELA, Heloisa de S. O. o mestre-escola e a professora. In.: LOPES, Eliana Marta Teixeira, FARIA
FILHO, Luciano Mendes de, VEIGA, Cynthia Greive. 500 anos de educação no Brasil. Op. Cit. p. 110.
72
A Lei 508 de 16 de junho de 1858 determinou as condições do que se poderia ser
considerado como uma escola primária ou aula pública em termos de público participante.
Segundo o documento, o Governo suprimiria a cadeira de ensino primário masculino que
tivesse a freqüência inferior a vinte alunos. as do sexo feminino, a freqüência mínima
exigida para uma escola era de doze alunas. No caso de supressão de cadeira, os alunos ou
alunas que comprovassem indigência seriam destinados a um professor ou professora
particular às custas do Tesouro Provincial mediante gratificação anual de 200$000 a
300$00 réis.
112
Com essa Lei e o Regulamento de 1858 o governo provincial quis pôr ordem na
Instrução ao sancionar uma nova lei para regularizar a situação do professor e tentar
resolver o problema da qualificação decente. Assim, em pouco mais de um mês, o
presidente João Dabney D’Avelar Brotero sancionava a Lei de N.°de 3 de julho de 1858
determinando que:
Art.1. O governo da Provincia fica authorisado à por em concurso por uma vez somente
todas aquellas Cadeiras, quer do ensino primario quer do ensino secundario, providas à
menos de cinco annos, cujos Professores lhe constar que tenha necessarias habilitações
para o Professorato.
§Unico. Para este fim lhes arbitrará um praso improrrogavel, e no caso de não
comparecimento, ou de não sair approvado o Professor de qualquer dos indicados
ensinos, perderá elle o direito a Cadeira que estiver à seo cargo.
113
Como se disse anteriormente, ao sancionar a nova Lei, o presidente da Província teve
objetivos claros: uniformizar a Instrução Pública sergipana. Ao colocar todas as cadeiras de
primeiras letras sergipanas a concurso público, o presidente estava tentando levar a
Instrução Pública em um único trilho. Dessa forma ficaria mais viável conseguir
implementar o projeto de unidade da nação. Também era uma forma de eliminar práticas
pedagógicas consideradas arcaicas, como o método de ensino, e homogeneizar novas.
Assim, o professor que fosse aprovado no concurso começaria seu trabalho docente se
pautando nas novas exigências da Diretoria de Instrução Pública. E começava sua labuta
com uma forte carga de responsabilidade, uma vez que esse agente do ensino estava
envolvido na “teia de Penélope”.
112
- FRANCO, Cândido A. Op. Cit.p.145; 149.
113
- Idem. p. 64.
73
A determinação do concurso para professor na Província sergipana foi também, por
outro lado, uma forma encontrada para resolver, definitivamente, o problema da
qualificação docente tão criticado por outros presidentes em décadas anteriores. A partir daí
diminuiriam as críticas e reclamações contra os professores. Os que conseguissem
aprovação já entrariam habilitados no que rezariam as determinações legais de Província.
Assim como o professorado da escola primária sofreu por mudanças na década de
cinqüenta, o corpo discente também passou por exigências. O alunado não era, como se
poderia pensar, constituído por qualquer um. Houve limitações e exigências na matrícula da
escola de primeiras letras. No Regulamento de 1858 havia uma série de restrições com se
pode ver através do que estava previsto nos artigos 56 e 57.
Art. 56. As matriculas são gratuitas, e ficão exculuidos della.
§ 1. Os meninos, que soffrem molestias contagiosas.
§ 2. Os escravos.
§ 3. Os menores de 5[cinco] anos, e os maiores de 16 [dezesseis].
§ 4. Os que houverem sido expulsos competentemente.
Art. 57. Os não vaccinados, por ora, em quanto se não acha sufficientemente propagada
a vaccina, não serão excluidos da matricula; mas deverão logo os professores participar
ao encarregado da vacinação do logar mais proximo quaes os alunos, que se achão em
taes circustancias.
114
Pode-se dizer que o Império também tinha objetivos claros com relação aos que
pretendiam cursar a escola primária: diminuir gastos com os alunos, racionalizando
despesas. Veja-se, por exemplo, um aluno com doença contagiosa. Pelo contato físico que
havia entre os alunos, a transmissão para outro se daria em pouco tempo e, com isso, a
Província teria que gastar com medicamentos, pois, os alunos por serem pobres não
possuiriam condições de comprar medicamentos.
No caso da criança escrava havia a proibição para a freqüência da escola por questões
óbvias: escravo era admitido como aquele que não possuía alma. E se assim era concebido
então não possuía também inteligência. Até porque negro era escravo. E escravo não era
visto como gente, era mercadoria como outra qualquer.
A lei educacional de 1858 ao determinar em outros artigos que as divisões das classes
seguiriam o critério de faixa etária, estava também uniformizando os alunos. Esse dado é
114
- Regulamento da Instrução Pública de 1858. Doc. Cit. p.14.
74
relevante porque o método de ensino adotado foi o simultâneo por classes e para a obtenção
do sucesso era necessária a uniformização etária das classes dos alunos.
O Regulamento de 1858 teve vigência até a década de 1870 quando foi aprovado um
novo. Na década de sessenta as discussões travadas estavam relacionadas à obrigatoriedade
do ensino, à extinção da função dos alunos-mestres, à defesa da escola normal, ao problema
da mobília escolar, aos métodos de ensino e ao professorado.
A década de sessenta e a seguinte se caracterizaram como um período em que a escola
passou por processo de cientificidade enquanto instituição responsável pela regeneração da
sociedade. Os presidentes da Província imbuídos nas correntes cientificistas que
fervilhavam em outras partes do mundo e no Brasil de então criticaram as práticas culturais
existentes e determinaram outras.
A partir da década de cinqüenta, os intelectuais passaram também a enxergara
sociedade pelas lentes da corrente cientificista. Barros afirma que em meados dos anos
sessenta se podia notar a influência do pensamento social de Augusto Comte.
115
Ainda,
segundo o autor, é no ano de 1874 com a obra As Três filosofias, de Luiz Pereira Barreto
que o positivismo, especialmente no sul, começou a mostrar toda a sua eficácia na luta pela
transformação do país.
116
Influenciados pelas correntes filosóficas européias, os
administradores provinciais olharam não mais para o passado como antes, mas sim para o
futuro e tentaram enquadrar o país na marcha da história.
O Regulamento de outubro de 1870 para nortear a instrução em Sergipe esteve
inserido nesse contexto de cientifização da sociedade brasileira, em especial a escola. A
intenção era tentar dar novo rumo à instrução pública da Província. Os pontos destacados
do novo documento foram a criação de um conselho literário, a determinações do ensino
obrigatório facultativo, ensino livre, severidade no concurso para provimento de cadeiras,
divisão da instrução elementar em duas classes -inferior e superior- escola normal e
instrução secundária.
A criação do Conselho Literário teve como finalidade examinar os melhores métodos
de ensino, inclusive os práticos, a escolha dos compêndios escolares, análise da proposta de
criação de cadeiras e melhoramentos da instrução. Como se pode perceber, esse órgão
115
- BARROS, Roque Spencer Maciel de. A ilustração brasileira e a idéia de universidade. São Paulo:
Convívio/Edusp, 1986. p. 116.
116
- Idem. p. 123.
75
funcionava como a cabeça pensante da Diretoria da Instrução Pública. O modelo de
educação que seria formulado daí por diante sairia do Conselho Literário. Participavam
desse órgão, o diretor da Instrução Pública, os professores de pedagogia e gramática
filosófica do Atheneu, além de outros.
O novo Conselho Literário, ao dividir o ensino primário em dois graus, agiu de forma
cautelosa na Província. Enquanto não havia escola normal para se aplicar novas
experiências pedagógicas foram escolhidas as cidades de Estância e Laranjeiras pelo fato
dessas duas localidades serem consideradas expressivas em termos sociais e econômicos.
Na primeira funcionou o ensino elementar inferior e para a segunda destinou-se para o
primário superior. A escola de Estância funcionaria para desenvolver os conhecimentos
preliminares, a escola de Laranjeiras iria aperfeiçoar e aprofundar os conhecimentos da
anterior.
117
A partir dessa forma de tratar a instrução podemos perceber como a escola começava
a se cientificizar. Não se admitia mais a transplantação de fórmulas prontas para a realidade
sergipana como fizeram os administradores das décadas anteriores. Daí em diante tudo teria
que passar pelo crivo da experiência para ver se o resultado daria certo. Se as experiências
dessem certo seriam adotadas em outros lugares da Província.
Junto com a criação de um órgão que melhor pensasse a educação provincial esteve
em pauta nos discursos presidenciais o problema do ensino obrigatório. Desde a década de
sessenta que vários administradores defenderam essa idéia para Sergipe, como se pode
averiguar no relatório do presidente da Província Evaristo Ferreira da Veiga em 1869.
que, infelizmente, nem todos os pais se compenetram de que seu primeiro dever é
dar instrução e educação aos seus filhos, cumpre que o poder competente lance mão de
qualquer medida coercitiva que os obrigue a cumprir o mais nobre e elevado de todos
os deveres de um pai. O magnifico exemplo de Prussia e de outros paizes da Allemanha
onde o ensino obrigatorio é adoptado em todo o seo rigor, nos deve convencer da
vantagem de, pelo menos tornar menos livre a instrucção primaria entre nós. Para
conseguir esse desideratum me parece que seria acertado a imposição de pequenas
multas aos paes que não mandam seus filhos à escola quando chegam a idade
conveniente, bem como àquelles que por um interesse mal entendido os retiram antes
117
- Relatório do presidente Francisco José Cardozo Junior. IHGS. Sergipe: Tipografia do Jornal do Aracaju,
1867. p. 52.
76
de haverem sido approvados nas matérias que formam o da instrucção salvo o casos de
extrema e reconhecida pobreza.
118
O discurso do presidente trouxe nos ajudam a entender o porquê da defesa do ensino
obrigatório para Sergipe, principalmente quando se pensa na instituição familiar e no ideal
de sociedade que se pretendia erigir a partir da escola. para se perceber como estava
claro para o administrador que um dos entraves para o bom desempenho da instrução estava
na instituição familiar. Faz-se necessário dizer: a família pobre.
Cunha demonstrou que para afirmar a escola no império brasileiro os dirigentes
lançaram discursos contra a família. Essa instituição passou a ser vista a partir das décadas
de cinqüenta e sessenta como inimiga da escola, como a grande vilã que emperrava o
projeto da Nação brasileira.
119
As palavras que o presidente usou para atribuir competências à família foram
adequadas: o seu primeiro dever é dar instrução e a educação a seus filhos. Foi uma
chamada para algo que não era levado a sério pelos pais dos alunos. Não havia uma clareza
por parte dos pais quanto ao conceito de instrução e educação.
A obrigatoriedade exigida no Regulamento revelou um indício acerca do conceito de
infância no século XIX. Quando os administradores usaram da coerção para obrigar os pais
dos alunos a manterem seus filhos na escola estavam admitindo que a família menos
abastada não entendia o que era infância.
120
Pelo documento podemos assim inferir que as
crianças pobres ainda eram concebidas por seus pais como um adulto em miniatura.
Concebendo a criança enquanto miniatura de adultos, os pais dos alunos estavam
dispensando toda especificidade da criança enquanto criança que necessitava de uma
intervenção para formar seu caráter e sua inteligência. Portanto, os pais dos alunos não
entendiam que um dos meios que contribuíam para a formação da criança em um ser adulto
seria a instituição escolar.
118
- Relatório do presidente Evaristo Ferreira da Veiga. IHGS. Sergipe: Tipografia do Jornal de Sergipe,
1869. p. 18.
119
- Uma relevante discussão entre a oposição escola/família pode ser encontrada em CUNHA, Marcus
Vinícius. A escola contra a família. In: LOPES, Eliane Marta Teixeira, FARIA FILHO,Luciano Mendes,
VEIGA, Cynthia Greive (Orgs.). 500 anos de Educação no Brasil. Op. Cit. pp. 447-468.
120
- ARIÉS afirma que o conceito de infância é uma invenção da modernidade européia e que na Idade Média
a criança era tratada como adulto.
77
Ao defender o ensino obrigatório, o presidente estava também representando a família
como uma instituição que além de não entender a importância da escola para seus filhos,
não entendia o papel que a instrução teria para o progresso socioeconômico da nação. Se os
pais não entendiam o que seria a instituição escolar cabia ao Estado imperial a forçá-los a
garantirem as crianças na escola . Dessa forma, o Estado estava também interferindo na
instituição familiar.
A partir da representação da família pobre sergipana podemos entender porque a
escola na Província foi criticada e ao mesmo tempo foi tão defendida. Exigia-se que a
família garantisse seu filho na escola porque essa era concebida como a instituição sine qua
non capaz de educar e instruir. Podemos assim perceber como o Estado tomava
paulatinamente para si a responsabilidade de educar os menos favorecidos.
Outra coisa que precisa ser ressaltada em relação ao tratamento que os
administradores davam aos pais dos alunos que viviam em extrema pobreza é a
compreensão pela situação econômica. Os pais que comprovassem atestado de pobreza não
seriam obrigados a pagarem as multas indicadas, pelo menos foi o que o presidente deixou
subentendido no discurso. Seria impossível cobrar daqueles que não possuíam nada. Mas,
com, isso não isentava a família de zelar pela criança na escola.
Vale ressaltar que o Regulamento de 1870 determinou o ensino obrigatório, mas de
caráter facultativo e não imperativo. Esse era um dado importante porque estava eivado de
problema quando se podia pensar no conceito de liberdade. Havia clareza por parte dos que
defenderam o ensino obrigatório de que a liberdade era um direito. A obrigação do ensino
não significava a perda da liberdade. Se o Estado estava retirando da pessoa o direito de
liberdade, estava reduzindo, podemos assim dizer, a uma condição de escravo.
Um indício de que a escola estava passando por processo de cientifização, e que
esteve ligado ao mesmo problema do ensino obrigatório, foi a determinação da liberdade
para o ensino livre para as escolas de primeiras letras. De acordo com essa medida,o
Império brasileiro não mais passava a fazer imposição de doutrinas porque assim estaria
violando o direito de liberdade. Ficava assim o ensino elementar livre à concorrência de
doutrinas que melhor aprouvesse.
O ensino livre, dessa forma, aparece como o complemento necessário da tarefa
pedagógica que está no cerne do cientificismo ilustrado. A liberdade de ensino, sem
78
quaisquer limitações, é por ele concebida como a condição sine qua non do êxito de sua
missão educadora.
121
Outro ponto importante que o Regulamento deu ênfase recaiu no problema da
habilitação do professor e na (re) criação da escola normal. Enquanto não se efetivava a
institucionalização da escola, o Governo provincial, na tentativa de moralizar o quadro
docente, colocou todas as cadeiras a concursos. Os concursos resultaram numa grande
reprovação dos candidatos, o que levou o presidente a suspendê-los até que a escola normal
estivesse funcionando.
122
Cabe ressaltar que o Regulamento de 1870 teve força de lei provisória. Pode ser visto
como um esboço do modelo de educação que se tentava estabelecer na Província a partir
das influências científicas que circulavam pelo Brasil. Em 1873, com a reformulação da
instrução, o ensino primário passou a ser de competência das câmaras de vereadores. Outra
novidade foi a determinação da idade de sete anos para o início da escolarização.
123
A década de setenta foi a que mais se destacou em quantidade de leis educacionais.
Em 21 de abril de 1874 pela Resolução n.° 969, o governo provincial implementou
alterações no Regulamento de 1870. Um ano depois, pela Resolução de 20
de abril, mais
uma vez se alterou o ensino primário na Província, suprimindo um grau. No entanto houve
uma ampliação do currículo.
Art. 8. O ensino primario publico será na provincia apenas de um grau, sendo o seu
programa :
1. Insrucção moral e religiosa, comprehendido o resumo de historia sagrada.
2. Leitura e escripta, comprehendida a declamação de versos.
3. Grammatica da lingua nacional.
4. Arithmetica em suas differentes operações por numeros inteiros, fraccinarios e
decimaes.
5. Systema metrico.
6. Elementos de geographia universal e historia do Brasil.
7. Elementos, de geometria e desenho linear.
Nas escolas de o sexo feminino o ensino comprehenderá demais - trabalhos de
agulha e outros analogos ao sexo, e nas do sexo masculino- noções geraes da
constituição politica do Imperio e de agricultura, pela leitura exercicios de cór
d’aquella e de uma epítome desta adoptada pela diretoria da instrução.
124
121
- BARROS, Roque Spencer Maciel de. Op. Cit. p. 194. Grifos do autor.
122
- NUNES, Maria Thetis. História da Educação em Sergipe. Op. Cit. p. 116.
123
- Idem. p. 125.
124
- FRANCO, Cândido A. P. Op. Cit. p.156-157.
79
O currículo adotado se diferenciou dos das décadas antecedentes, quando foi incluído
o ensino de noções agrícolas, sistema métrico, ensino de geografia, entre outros. A intenção
era desenvolver na criança noções para se trabalhar na agricultura, no comércio e na
sociedade. Podemos inferir que a partir daí era um currículo eivado de influências
utilitaristas. Como o Brasil do século XIX estava voltado para a agricultura nada melhor
que desenvolver a economia do país através das instruções teóricas que seriam dadas na
escola.
A partir do que se tentou construir acerca da organização da instrução primária na
província de Sergipe é possível perceber como funcionou esse ramo de ensino, quais os
seus objetivos, os entraves enfrentados e as representações que fizeram da instituição
escolar no decorrer das décadas.
Tentou-se mostrar como a classe administrativa provincial procurou afirmar a escola
primária como uma instituição que seria capaz de tirar o indivíduo do mundo da desordem.
Portanto, a escola não deixou de estar fora dos planos dos administradores da Província, daí
a ocorrência de tanta reclamação a cerca das condições do processo de escolarização da
população. Instruir a sociedade era uma das necessidades desse momento como garantia
para se manter a ordem e a estabilidade do Império.
Acreditamos que o Regulamento de 1858 e o de 1870 circunscreveram o modelo de
organização escolar concebido e consolidado. Esse modelo foi uma mescla da influência
que vinha de fora do país com o que os administradores sergipanos esboçavam para a
população escolarizável. Mesmo as leis aprovadas após esse período continuaram trazendo
novas influências pedagógicas que agitavam a Europa e o Brasil, o que atesta que os
intelectuais sergipanos bebiam dessa fonte e tentavam dar contribuições ao processo de
construção da Nação brasileira.
A persistência nesse ramo de ensino por parte dos que foram responsáveis pela
instrução residia no fato de que a Província sergipana seria moderna se combatesse o
problema da ignorância afirmando escolas. E para isso a necessidade maior residiu na
organização de corpo de funcionários para dar autoridade a escola enquanto instituição
civilizadora da sociedade.
80
A escola a partir da década de cinqüenta começou a sofrer um novo processo, passou
a ser estruturada. Verificou-se que a organização dessa instituição começou pela
organização de um órgão competente capaz de não fiscalizar, mas também zelar pela
instrução além de regulamentar o trabalho docente e o espaço interno da escola.
A avalanche que a instrução primária passou a sofrer a partir da segunda metade do
século XIX dava sinais de que a construção de um país moderno dependia também de todos
aqueles que estavam envolvidos com instituição escolar. Para que essa façanha desse certo
foram necessárias a instrumentalização do corpo docente e a regulação do tempo escolar
que vinha atrelado a adoção de método de ensino.
No próximo capítulo serão descritos os métodos de ensino adotados nas escolas de
primeiras letras sergipanas.
81
CAPÍTULO II
DA DESCRIÇÃO DOS MÉTODOS
Neste capítulo objetiva-se descrever os métodos de ensino simultâneo e mútuo.
Tomaremos como base para realizar as descrições o Manual das Escolas Elementares
D’Ensino Mútuo
125
e Manual Completo de Ensino Simultâneo
126
traduzidos por João Alves
Portella e Manoel Correia Garcia.
127
Os manuais foram confeccionados por M. Sarazin,
professor do curso especial de ensino mútuo da cidade de Paris. Segundo Silva, esses
manuais foram as principais obras didáticas utilizadas na Escola Normal da Bahia e
normatizaram por muito tempo a cadeira de Métodos e toda prática de futuro professores
em suas aulas de primeiras letras.
128
A impressão dessas obras na Província baiana ocorreu
até o final da década de sessenta.
129
Cabe ressaltar que essas obras não são traduções do manual elaborado pelos irmãos
das Escolas Cristãs nem do manual elaborado por Andrew Bell e Joseph Lancaster, mas
estratos de manuais confeccionados a partir daqueles para serem utilizados nas escolas
normais parisienses. Para tanto, a descrição dos métodos que se faz neste capítulo também
não parte dos manuais originais como fizeram os franceses, mas dos manuais citados no
parágrafo acima.
A escolha da descrição dos métodos a partir dos dois manuais sobre os métodos de
ensino simultâneo e mútuo se deu por duas razões. A primeira se justifica no insucesso da
pesquisa na busca, de versão em Língua Portuguesa, nos arquivos e bibliotecas sergipanas.
125
- PORTELLA. João Alves; SARAZIN, M. Manual das Escolas Elementares D’Ensino Mútuo. Bahia:
Tipografia de A. O. da França Guerra e Comp. 1854. (BPEB-SSA).
126
- PORTELLA, João Alves. Manual Completo de Ensino Simultâneo. Bahia: Tipografia de Camillo de
Lellis Masson & C. 1868. (BPEB-SSA).
127
- João Alves Portella e Manuel Correia Garcia foram advogados que quando estudantes da Escola Normal
de Paris receberam a missão de traduzir os manuais sobre os métodos de ensino mútuo e simultâneo para
serem aplicados na Escola Normal da Bahia.
128
- SILVA, José Carlos de Araújo. O Recôncavo baiano e suas escolas de primeiras letras (1827-1852): um
estudo sobre o cotidiano escolar. Salvador: Universidade Federal da Bahia, 1999. p. 76.
129
- Idem.
82
Pesquisamos na Biblioteca Nacional e no arquivo Nacional via on line e não obtivemos
respostas. A segunda razão, e a mais viável, consistiu em fazer a descrição dos métodos
pelos manuais que circularam na Província baiana. Provavelmente esses manuais
circularam também na Província sergipana.
O indício de que os manuais sobre métodos de ensino baianos circularam em Sergipe
no século XIX pode ser encontrado na semelhança entre aqueles e os regulamentos e
regimentos internos das escolas primárias adotados para a Instrução Pública sergipana no
trato da organização das escolas de primeiras letras, principalmente o Manual de Ensino
Simultâneo. Acreditamos que os administradores responsáveis pela Instrução Pública
sergipana conheciam os manuais que circulavam na província vizinha. Outro indício que
sustenta nossa hipótese é o fato de muitos professores solicitarem ao diretor da Instrução
Pública e ao presidente da Província licença para irem estudar na escola Normal da Bahia.
Começaremos descrevendo o método simultâneo e em seguida o mútuo.
2.1O Método Simultâneo
2.1.1 - Aspectos Gerais
O Manual de Ensino Simultâneo traduzido por João Alves Portella determinava o
número de trinta a cem alunos para uma escola que funcionasse com esse método. Esses
alunos eram divididos em grupos ou classes; cada classe era composta por um número ideal
de oito alunos ou discípulos sentados em um banco e uma carteira; mas a quinta classe seria
composta de dezesseis a vinte alunos.
130
O número de classe era estipulado em cinco. A
classe era concebida pelo domínio que os alunos possuíssem dos rudimentos da leitura, da
escrita e da aritmética, além dos da doutrina cristã e prendas domésticas, no caso da escola
feminina.
130
- No Manual de Ensino Simultâneo aparecem as terminologias discípulos e alunos. Assim, por respeito às
determinações paleográficas seguiremos a terminologia que aparecer no texto.
83
2.1.2 - A forma da escola
Para que uma escola de ensino simultâneo funcionasse de forma adequada era
necessário que esta fosse da forma de um quadrilátero. Mas caso se existisse algum local
era preferível que as mesas fossem do tamanho da classe.
A disposição das carteiras deve ser paralela, com duas ordens de discípulos assentadas
uns em frente dos outros, de tal forma que combine com a forma da escola. Assim, a ordem
se mantenha com mais facilidade em uma sala onde o professor, de um lançar de olhos,
veja todos os discípulos e, por conseguinte, todos os discípulos devem ter os olhos voltados
para o mestre.
A escola tinha que estar em um local bem arejado, para que evitasse a umidade. Se,
porém, o lugar fosse baixo e úmido dever-se-ia cobrir o terreno com um soalho em altura
conveniente. O teto deveria ser alto, a fim de que girasse na sala tal porção de ar. As janelas
deveriam ser suficientemente elevadas com uma parte em vidro acima do chão para que os
discípulos não pudessem ver o que se passava na rua; se fossem baixas suprimiam-se os
vidros da parte inferior de cada janela. As paredes da escola deveriam ser alvas para que, se
preciso fosse, pudessem escrever na parte superior com grandes caracteres os sons simples
e compostos, as articulações, os algarismos e as figuras elementares do desenho linear.
Era necessário que a escola tivesse uma ante-sala onde o professor reunisse os
discípulos antes da entrada para aula. Nesse espaço, o professor todas as manhãs e
imediatamente antes da classe, passava a revista de asseio em todos os alunos nas mãos,
rosto, orelhas e roupas.
A escola também havia latrinas. Estas deveriam ser bem conservadas com maior
asseio. A vigilância do professor deveria ser incansável e nunca permitiria aos meninos que
saíssem ao mesmo tempo, e deve exigir que o último que entrar diga em voz baixa quando
as latrinas estão sujas.
Por fim, o Manual de Ensino simultâneo determinava que houvesse uma fonte na
ante-sala, com um vaso por baixo e alguns copos de folhas de flandres, cuja água sairia por
uma torneira.
84
2.1.3 - O Mobiliário da Escola
O mobiliário da escola começava pela cadeira do professor que estava localizada
sobre um estrado de 16 a 24 polegadas de altura, com o intuito de que todos os alunos
vissem ao mesmo tempo o professor e este de um só olhar vissem todos.
A escola de ensino simultâneo funcionava com jogo de carteira e banco, unido por
uma travessa. O número ideal de carteiras e bancos que deveria conter na sala seria de sete.
A distância entre a carteira e o banco era de 12 palmos. E ainda pregados no soalho.
O comprimento da carteira se achava multiplicado pelo mero de discípulo que
deveria sentar a um espaço de 2 palmos; a sua largura deveria ser de palmo e meio e a
altura de 32 polegadas; a sua inclinação era de uma sobre quatro.
Na superfície das carteiras eram encaixados, ordinariamente, os tinteiros de chumbo.
Um servia a dois discípulos. Ainda eram colocados os traslados defronte para os discípulos
(alunos) copiarem. Para isso os traslados eram fixados nos fios de ferro fixados nas duas
extremidades da carteira, horizontalmente. Essas astes, de seis polegadas de altura, eram
atravessadas pelos fios que, nesse lugar, se podiam fixar por meio de um parafuso.
Na beira superior da carteira era aberto um entalho para o depósito dos lápis e penas.
À beira da carteira havia uma estreita guarnição para amparar os cadernos e os lápis.
Havia também as pedras. Essas eram de uso individual sendo fixadas nas carteiras.
Elas eram fixadas na superfície da madeira. Os discípulos para limpá-las traziam ao
pescoço uma esponja pendurada.
O uso das pedras era, além de útil, pouco dispendioso. As pedras menores eram
riscadas para bastardo, as de tamanho médio para bastardinho, e as maiores, pertencentes a
ultima classe, não se riscavam. Para esse tipo de pedra usava-se lápis de pedra em canivete
de metal.
No entanto, faz-se necessário distinguir as pedras individuais de um outro tipo de
pedra que era utilizada pelo professor: a pedra ou bua ou tábua preta para operações
aritméticas, com dimensões de 8 a 10 palmos de largura e 5 de comprimento.
131
Esse
objeto deveria está situado ao lado do professor que estava sentado em uma cadeira,
131
- A terminologia pedra ou tábua preta corresponde ao que hoje conhecemos como quadro - negro.
85
localizado em frente aos alunos, sentado a uma mesa sobre um estrado. Nela, o professor ou
mandava escrever com giz ou ele mesmo escrevia os exercícios de aritmética ou ortografia.
O mobiliário da escola era completado com o retrato do monarca ou imperador e um
crucifixo, ambos colocados acima do estrado onde estava localizado o professor. A intenção
era educar os alunos com os valores religiosos e fazer lembrar, a todo o momento, a seus
deveres não só para com Deus como também para com o Soberano.
Ainda era determinada a utilização do relógio para a regulação do tempo, pois cada
matéria de ensino estava submetida a um tempo regular.
Para manter a regularidade e a ordem da escola eram utilizados apitos e campainhas.
Esses objetos são os sinais de comandos para as tarefas que os alunos têm que cumprir.
Todas as ações passavam por determinação destes sinais.
Por fim, o que completava o mobiliário da escola era o armário, utilizado para
guardar os utensílios da escola. Nesse mobiliário, o professor colocava os cartazes com
dizeres como falador, mentiroso, desobediente, preguiçoso etc. para os castigos dos alunos.
Esses cartazes se grudavam em pedaços de papelão para serem pendurados aos pescoços
dos alunos.
2.1.4 - Os Agentes do Ensino
No Método de Ensino simultâneo o professor era o agente principal do ensino. Porém
se a escola fosse numerosa o professor poderia nomear decuriões (conhecidos como
decuriões gregos). Esses discípulos eram em número de seis e chamavam-se de decuriões
gerais. Cada um deles empregava-se por um dia inteiro, sentava-se em uma cadeira, diante
de uma mesa, ao lado do professor.
Havia também os decuriões de carteira. Em cada divisão
132
o professor escolhia na
divisão superior um decurião de carteira para dirigir todos os exercícios determinados pelo
professor. No entanto, na quinta divisão ou classe são escolhidos dois decuriões de carteira
caso a escola funcione em duas sessões; um auxiliava pela parte da manhã e outro pela
parte da tarde. Cada decurião era responsável pela inspeção da sua classe; toma nota dos
132
- No Manual aparece os termo divisão, equivalendo a classe.
86
discípulos que conversassem ou procedessem mal, mas não deveria altear a voz, porque
assim ocasionaria perturbação.
A nomeação dos decuriões tanto os gerais como os de carteira era feita pelo professor
na presença dos demais companheiros, dando a estes toda solenidade possível. Dessa
forma, os nomes dos decuriões eram escritos no quadro de honra, sobre o qual o professor
costumava chamar atenção dos visitadores. No caso da ausência de algum decurião era logo
nomeado um substituto.
2.1.5 - Os Registros
Para um bom funcionamento da escola se fazia necessário registro para garantir a boa
administração e controle. O Manual determinava seis tipos de registro:
1 - O registro de inscrição dos discípulos;
2 - O registro de chamada;
3- O registro do resultado da chamada;
4- O registro de receita e despesa;
5- O registro dos aspirantes;
Cada registro cumpria uma função de controle, administração, além de levantar
conhecimentos sobre os alunos. Por exemplo, no registro de inscrição dos discípulos
continham, em ordem alfabética, os nomes dos alunos da escola, sua idade, a profissão dos
pais, a sua morada, a indicação de classe em que o aluno entrou e saiu e o tempo que nelas
gastaram, como se pode visualizar neste o exemplo de registro de inscrição que está no
Manual.
87
QUADRO 02
Registro de inscrição
leitura escrita
Nomes
idade Profissão
dos pais
Moradas
ruas
1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
observações
Paulo 14 anos carpina S. Pedro
n° 7
15/1 19/2
30/1
15/1
Em seguimento se
devem traçar trez outras
divididas recentes, para a
arithimetica, e o desenho
linear.
Fonte: PORTELLA, João Alves. Manual de ensino Simultâneo. Bahia: Tipografia de Lellis Masson & Cia. 1865.
88
2.1.6 - Os Meios Disciplinares
Os meios disciplinares de uma escola que funcionava com o método simultâneo
eram seis:
1-
Decuriões gerais e decuriões de carteira;
2-
Registro;
3-
Divisão do tempo, e das matérias de ensino;
4-
Comandos;
5-
Recompensas e castigos;
6-
Exames.
Por termos tratado dos decuriões, dos registros vamos tratar dos outros itens de
forma separada.
2.1 6.3 - Da divisão do tempo e das matérias de ensino.
Na escola simultânea, o tempo era ferramenta fundamental por permitir um controle
e assim dar regularidade ao processo de ensino. Para cada matéria de ensino era
determinado um período da aula na forma em que as cinco classes que compunham a
escola estivessem ocupadas.
A cada divisão de escrita o professor dispenderia pouco mais ou menos doze minutos
de atenção. Mas as divisões da classe de lição devem durar dezoito minutos até que os
alunos terminassem a leitura dos livros ou textos. cada divisão de escrita deveria durar
doze minutos, principalmente nos trabalhos de cópia de traslados. Para classe de
aritmética seria determinada meia hora, sendo que cada divisão ficaria com seis minutos
para os exercícios. Desse modo, no final da sessão cada divisão teria por dia trinta e seis
minutos de lição de leitura, vinte e quatro de escrita e doze de contas, totalizando setenta e
dois minutos de aprendizagem para cada divisão ou classe. Esse tempo poderia ser
também esquematizado da seguinte forma:
89
A - Classe da manhã
7 horas .............................. Revista e asseio
6 horas e 45 minutos.............O professor e o decurião geral aparavam as penas e separavam
os cadernos de escrita.
7 horas e 10 minutos..........Oração
7 horas e 15 minutos..........Lições de gramática
8 horas...............................Classe de escrita
9 horas...............................Classe de aritmética
10 horas e 50 minutos.......Oração
11 horas.............................Saída da escola
B - Classe da tarde
1 hora e 45 minutos...........Oração e chamada
2 horas...............................Recitação do catecismo
3 horas.............................. Classe de desenho linear
4 horas...............................Lições de gramática
5 horas...............................Distribuição de prêmios
6 horas e 15 minutos.........Distribuição saída por quarteirões
Desse modo, enquanto uma classe estava ocupada com a escrita, outra estava
aprendendo a somar ou a diminuir como se pode ver na divisão do tempo. É importante
chamar atenção para o fato de que uma classe de leitura, por exemplo, podia conter três ou
mais divisões, a depender da necessidade do professor.
2.1.6.4 - Os Comandos
Para se manter a ordem e regularidade nos exercícios empregavam-se comandos
conhecidos dos alunos. Eles eram transmitidos pelo apito, pela companhia e por sinais.
Desse modo, desde o entrar na sala de aula até o momento de saída, cada atividade era
90
regulada por esses dispositivos. Pode-se mostrar os dispositivos de sinais e comando
exemplificando a sessão da aula da manhã.
Aula da manhã
Para fazer cessar a bulha na ante-sala------------
Comando 1°
------Um toque de apito
Para mandar dividir os meninos ------------------
Comando 2°
------Diz o decurião em
em classe de
escrita.
Para designar os decuriões
de carteira para as respectivas classes -----------
Comando 3°
------5ª classe:
fulano
; 4ª
classe:
cicrano
, e
assim por
diante.
133
Execução
Os discípulos cumprimentavam o professor e se dispunham para a revista de asseio
em fileiras afastadas três pessoas uma das outras. O professor começava a revista
acompanhado do decurião, que trazia lápis, e papel para escrever os castigos, que pelo
professor eram dados aos discípulos pouco assiados. Estes, com as cabeças descobertas,
estendiam as mãos, que mostravam por ambos os lados. Se elas não estão limpas, eles
trazem o rosto sujo, a roupa e o calçado rotos, o professor ordenava-lhes o asseio e a
decência, castigava-os quando eles reincidiam, tomava a respeito uma lembrança para se
queixar à família (
comandos 1°
).
A essa voz eles se dividiam logo em cinco classes, e cada menino tomava o lugar
que ocupava no fim da classe de escrita (
comando 2°
).
À medida que eram chamados, eles iam deixando as fileiras para irem pôr à testa de
suas respectivas classes. O decurião geral entregava-lhes o distintivo de decurião de
carteira
(
comando 3°
).
133
- Antes dessa chamada o professor já tinha nomeado com toda solenidade os decuriões.
91
Para mandar entrar os discípulos para a sala de classe-----------
Comando 4°
- um toque de
apito.
Pra mandá-los ajoelhar para oração---------------------------
Comando
- toca-se a
campainha e
mostra-se o
crucifixo.
Para que os meninos se sentem--------------------------------------
Comando 6°
- três toques
de
campainha
Campainha.
Para ordenar a chamada aos decuriões-----------------------------
Comando 7°
- um toque
de apito:
notai os
Ausentes.
Execução
O decurião entrava na sala do estudo, colocava-se no estrado para presidir o
movimento geral, chamava à ordem os que dela se afastavam. O professor punha-se na
porta da sala da parte de fora e dava o sinal no apito: os discípulos marcavam de leve o
passo com os braços cruzados; a classe entrava em primeiro lugar, depois a classe ,
seguia-se a mesma marcha com as outras. Estas classes eram conduzidas pelos seus
decuriões que marchavam fora de linha (
comando 4°
).
Os discípulos ajoelhavam-se nos bancos e cruzavam os braços esperando a oração
em profundo silêncio; o decurião e o professor, de joelhos no estrado, punham-se de modo
que ficavam voltados para o crucifixo. Então o professor tirava a oração n°1 e o decurião
respondia (
comando 5°
).
Ao primeiro toque eles começavam a sentar nos bancos, o segundo entrava e o
terceiro restabelecia o silêncio e o professor subia no estrado (
comando 6°
).
Os decuriões tomavam os registros e procediam à chamada e assim que chegavam ao
estrado o professor mandava que escrevesse no registro o resultado da chamada (
comando
).
92
Para mandar começar a recitação da gramática------
Comando 8°
-- um toque e apito
e a palavra gra-
tica.
Para fazer vir outra divisão ao estrado e para
que se retire a que aí está------------------------------
Comando 9°---
três toques de
apito.
Execução
O decurião da divisão trazia os seus discípulos e os dispunham ao redor da mesa
do professor que interrogava em primeiro lugar ao mesmo decurião para que este pudesse
depois seguir os seus companheiros na recitação, e assim ajudá-los. De tempo em tempo
podia o professor mandar argumentar os discípulos e então recompensava os que melhor
respondesse. Estes argumentos não deveriam ser praticados por mais de duas vezes por
semana para não perderem o mérito da novidade. Ao tempo que o decurião da classe
chegava ao estrado, os da 1ª e dispunham-se para formarem grupos em torno dos
quadros de leitura que estavam suspensos nas paredes (começavam as perguntas dos
decuriões). Se havia segunda sessão na classe, o professor mandava vir
simultaneamente- era sem dúvida uma classe numerosa, mas havia muita perda de tempo
em tomar as duas sessões uma após outra,seria preferível organizar seis divisões
(
comando 8°
).
Ao primeiro (toque de apito), os discípulos, que tinham de partir saiam dos bancos e
ficavam de pé, os que estavam com o professor se preparavam para deixá-lo; ao segundo
(toque de apito), a quinta divisão retirava-se e a quarta aproximava-se do estrado pelo lado
oposto ; ao terceiro (toque de apito), a divisão que circulava o professor dispunha-se para
dar lição e a que deixou se sentar principiava logo outra ocupação (
comando 9°
).
Para mandar formar as classes de escrita----------------
Comando 10 -- em classe de escrita
e toque de apito.
93
Para começar escrever-------------------------------------
Comando 11
-- um toque de campa-
inha, o movimento
com a mão, como
quem escreve
Para mandar corrigir qualquer classe----------------
Comando 12
-- ---- o professor faz com
a mão um
movimento
horizontal de
direita
para esquerda.
Para mandar trazer os traslado
para se guardarem e examinar o seu
estadode aceio--------------------- --------------------
Comando 13--- - --
um toque de apito.
Para mandar cessar a escrita e
começar a aritmética---------------------------------
Comando 14-- ---- - em classe de aritmé-
tica
e um toque de
apito.
Execução
Dissemos que ao entrar os discípulos foram organizados em classes de escrita; se
estas não correspondessem inteiramente a recitação das suas lições, para escreverem,
voltavam à primeira classificação (
comando 10
).
Os discípulos tomavam a pena e começavam a escrever (
comando 11
).
Todos os discípulos aproximavam os seus cadernos do decurião de carteira, de modo
que se toquem; o professor os examinava, marcando com um lápis a ordem dos lugares; na
melhor escrita punha o n.° 1, na segunda o n.° 2, e assim por diante. Esta nova ordem era a
que se seguia na entrada da classe da tarde (
comando 12)
.
Logo que o professor passava à correção da certeira imediata, o decurião tirava o
traslado e o apresentava ao decurião geral que o examinava e tomava nota do seu bom ou
mau estado para o dizer ao professor no fim da classe da manhã (
comando 13
).
Ao toque de apito, os discípulos da e divisões limpavam as pedras e
começavam a traçar os algarismos que lhes eram ditados e quando queria o professor que a
quinta classe viesse à pedra grande, mostrava-a com a mão e o decurião se aproximava
com os seus discípulos (
comando 14
).
94
Para vir outra divisão de aritmética-------------------
Comando15
-----três toques de apito.
Para passar às classes de leitura----------------------------
C
omando16
------
Em classe de leitura
- e
um toque de apito.
Para mandar começar a leitura-----------------------
Comando17
-----Um toque de apito.
Para mudar de método--------------------------------
Comando18
------Dois toques de apito.
Para designar os lugares de leitura------------------
Comando19------
o professor diz,
fulano1°
cicrano 2° etc.
Para que os meninos se ajoelhem-------------------
Comando20
-------como no n.° 5.
Execução
O mesmo que no nono comando (
comando15
).
Ao toque de apito os discípulos iam tomar fileira nas classes de leitura. Os decuriões
de escrita, se não eram de leitura, cediam tais lugares aos que os obtinha como recompensa
na última classe de leitura e lhes davam o sinal de decurião (
comando16
).
A esse sinal o decurião da 5ª divisão se aproximava com ala ao estrado, os discípulos
com os seus livros abertos se dispunham a começar a lição. Se havia suficiente lugar em
torno da classe para formar quatro grupos, os decuriões da quarta, da terceira e segunda
dispunham os seus discípulos ao longo das paredes, colocavam-nos em semicírculos em
torno de um quadro de leitura e começava a lição (
comando17
).
A esse sinal os decuriões de cada classe mudavam logo e passavam ao segundo
método (
comando18
).
Na imediata lição de leitura estas designações serviam para a classificação dos
discípulos (
comando19
).
Os discípulos ajoelhavam-se nos bancos e cruzavam os braços, o professor tirava a
oração número 2 e o decurião respondiam:
amém
(
comando 20
).
95
Para mandá-los levantar----------------------------------------
Comando 21----
o professor
levanta-se.
Para mandar sair dos bancos-----------------------------------
Comando22
----um toque de
apito e movi-
mento horizontal
co
m as mãos.
Para preparar os discípulos para
saírem em ordem da escola-----------------------------------
-Comando23
--- o professor diz:
por quarteirões
.
Para mandar sair da escola-------------------------------------
Comando24----
dois toques de
apito.
Para fazer cessar a bulha na ante-sala-----------------------
Comando25-
----um toque de
apito.
Execução
Todos os discípulos imitavam o professor (
comando21
).
Os meninos levantavam-se, tomavam seus chapéus e colocavam-se por divisões de
leitura ao longo das paredes (
comando22)
.
A essa voz eles se dispunham por quarteirões e um condutor previamente designado
punha-se à frente de cada divisão. Estes condutores deviam escolher entre os discípulos
maiores e mais ajuizados para servirem como tais até que fossem substituídos por outros
(
comando23
).
Ao toque os discípulos se voltavam para o lado da porta; ao segundo marcavam o
passo. O primeiro quarteirão desfilava e saudava o professor que estava ao lado da porta
enquanto o decurião geral inspecionava os alunos. Quando o professor queria que o
segundo desfilasse dava toque de apito; seguia-se a mesma marcha com os outros
(
comando24
).
Comando 25
(vide comando n.01).
96
Para mandar preparar os discípulos
a se organizarem em classes------------------------------
Comando26
— em classe de leitura.
Para mandar recitar o catecismo e as rezas-------------
Comando27
----em classe de catecis-
mo- e um toque de
apito.
Para retirar uma divisão e vir outra----------------------
Comando28
----três toques de apito.
Para distribuir os prêmios--------------------------------
Comando29
-----três toques de apito.
COMADOS PARTICULARES
Para entrar uma classe
de desenho linear-----------------------------------------
Comando30
-----
em classe de desenho
um toque de apito.
Para mandar vir uma
classe à pedra-------------------------------------------
Comando31
------um toque de apito e as
palavras:
tal classe de
desenho.
Execução
Comando 26
(vide comando n. 02).
Ao toque de apito a quinta divisão levantava-se e saia da fileira; à palavra
catecismo
,
acompanhada do seu monitor ela ia se dispor ao redor do estrado do professor
(
comando27
).
Comando 28
(vide comando n.09).
O decurião geral ia com os de carteira ao estrado do professor; este ouvia as
observações e notas de cada decurião de carteira, proclamava os alunos que mereceriam
prêmios e os entregava aos monitores para imediatamente distribuí-los (
comando29
).
Os discípulos se dividiam em cinco classes que desenhavam em pedras ou em
cadernos oblongos (
comando30
).
A classe designada punha-se ao redor da pedra grande e o professor dava a lição
(
comando31
).
97
Para mandar restabelecer o silêncio-------------
Comando32
---------- um toque de apito e
sinal para continuar a
ler ou escrever.
Para castigar qualquer discípulo----------------
Comando33
----------o professor fita os
olhos no aluno cul-
pado, dirige o dedo
para ele e volta pa-
ra si.
Para suspender o castigo-----------------------
Comando34
------------o professor fita os olhos
no aluno, volta o dedo
para ele e depois para
o seu lugar.
Se algum discípulo quer falar ao
professor----------------------------------------
Comando35-------------
põe-se em pé em seu
lugar.
Se algum discípulo quer sair
para ir as latrinas-----------------------------
Comando36
--------------levanta a mão direita
para o ar.
Execução
Os discípulos ficavam imóveis e ao sinal de mão continuavam nas suas ocupações
(
comando32
).
O discípulo ia ao estrado e, ao pescoço, pendura-se-lhe um rótulo exprimindo erro
cometido; depois o professor designava com o dedo o lugar onde ele deveria pôr para ser
visto pelos outros (
comando33
).
O discípulo tomava seu lugar depois de ter largado o rótulo no estrado (
comando34
).
O professor o chamava a si, ou quando não, dirigia o dedo para baixo; então o
discípulo se sentava (
comando35
).
O decurião examinava se o telégrafo indicava ter alguém fora da classe e neste caso
o mandava sentar (
comando36
).
98
2.1.6.5 - Recompensas e Castigos
Numa escola simultânea os alunos eram recompensados pelas suas ações, mas
também eram castigados pela má conduta e pela desobediência.
2.1.6.5.1 - Recompensas
O Manual de Ensino Simultâneo determinava uma série de recompensas e
premiações para os alunos com o intuito de excitar e manter a emulação na escola.
Segundo o Manual, o prêmio ocasionava prazer, lisonjeava o amor próprio, a ternura dos
pais e motivava o próprio professor para a alegria. Eis os prêmios que se davam na escola:
- Se o discípulo respondia com inteligência subiria um ou mais lugares acima dos
outros;
- O que no fim do exercício era o primeiro discípulo recebia o distintivo de
primeiro
;
- O que se distinguia por constantes progressos recebia um
bilhete de satisfação
que valia cinco prêmios;
4° - O que era considerado constantemente
primeiro
de uma classe passaria a
superior e seria elogiado pelo professor em presença de todos os discípulos;
5° - O que tivesse uma conduta exemplar e aplicada receberia do professor uma carta
para ser destinada à família e que, antes de ser enviada, era lida na sessão do
sábado em presença de todos os alunos;
6° - Inscrevia-se no quadro e honra o nome dos melhores alunos daí só seria
suprimido se eles cometessem alguma falta;
7° - Se o discípulo praticava alguma ação meritória o professor a narrava em voz alta
no maio da sala. Se a ação incitasse os demais alunos, o professor convidava o
diretor dos Estudos para realçar com louvor àquele que praticou a ação;
- Lançavam-se numa lista particular os nomes dos alunos que se distinguissem
pela sua boa conduta e energia moral para serem futuros decuriões;
99
- Aos sábados à tarde o professor premiava os melhores discípulos com medalhas
contendo a efígie do Imperador que eram colocadas nos pescoços dos alunos por
uma fita ou corrente de metal.
Havia também na escola simultânea os prêmios que eram dados aos decuriões de
carteira e ao decurião geral. Aos melhores decuriões de carteira eram dados cinco prêmios
ao final do dia. Já o decurião, em geral, recebia dez.
Outra forma de se premiar ocorria através das cartas de méritos que eram dadas em
forma de bilhete de satisfação. Esses bilhetes possuíam duração de três meses. Cada um
desse valia vinte e cinco prêmios. Quatro cartas de mérito valiam um prêmio representado
por um objeto no valor de trezentos e vinte rs., pouco mais ou menos, equivalente a uma
porção de papel, ou de penas, esquadria , compassos, estampas , livros, etc.
Também antes das rias ocorria distribuição de prêmios para os alunos na presença
do diretor dos Estudos e de outras autoridades que eram convidadas. Numa escola de
cinqüenta a oitenta alunos o número de prêmios era estipulado em:
Um prêmio de virtude;
U de aplicação;
Um de decurião geral;
Cinco de decuriões de carteira;
Dois de leitura;
Dois de escrita;
Dois de aritmética;
Um de desenho;
Um de gramática;
E tantos outros que se faziam necessários. Esses prêmios consistiam em livros, e
noutros objetos acima indicados.
2.1.6.5.2 – Castigos
Segundo o Manual de Ensino Simultâneo, os alunos eram castigados pelo seu
péssimo caráter, indócil e pertinaz. Esses alunos agiam dessa forma por causa de sua
educação doméstica deficiente. Daí que não seria possível ocultar essa realidade. Desse
modo, a aplicação dos castigos possuía a intenção de acostumar os meninos à justiça.
100
Determinava-se que se castigassem os alunos com propósito, com calma e inflexibilidade,
assim produziria o efeito esperado. E ainda que os castigos fossem raros para causar
maior impressão. Eis os tipos de castigos:
1-
O discípulo que respondesse sem atenção, descia a um lugar inferior;
2-
O discípulo indócil era enviado ao último lugar da divisão;
3-
Se o discípulo obstinasse na conduta era castigado pelo professor ficando em
pé na sala ou de joelhos por mais de quatro horas;
4-
Punham-se nos pescoço dos meninos preguiçosos cartazes em letras grandes
preguiçoso
,
mentiroso
,
falador
,
desobediente
,
teimoso
, etc.;
5-
Inscrevem-se os nomes dos maus alunos em um quadro preto que deve ser visto
pelos visitadores. Esses nomes permaneciam até que os alunos mudassem sua
conduta;
6-
Se o aluno continuasse a conduta o professor, na sessão de sábado, no fim da
classe lhe dirigia bons conselhos; se a conduta continuasse na semana
seguinte o professor escreveria uma carta endereçada aos pais dos alunos
narrando a péssima conduta;
7-
No caso de o aluno proferir alguma mentira grave ou de entregar-se à venda ou
troca de objetos proibido tirado de sua casa, reunia-se um júri composto pelo
professor, pelo decurião geral e dos 5 de carteira e de outros das classes, julgava
o fato e aplicava o castigo preferido.
No entanto, o Manual também determinava castigos para os decuriões de carteira e
decurião geral. Se os decuriões de carteira e geral procedessem mal lhes eram retirados os
prêmios, passavam para o lugar inferior e desciam para o lugar abaixo dos outros.
Quando os decuriões infringiam da autoridade o professor nunca poderia repreendê-
los na presença dos outros alunos, mas sempre no final da sessão. Caso isso não ocorresse
o professor chamava o decurião com o dedo para ir à sua presença. Se ocorresse
reincidência de infração o nome do decurião seria riscado do quadro de honra e punido
com severidade perante os alunos e ainda só poderia voltar às funções depois de um ano.
101
2.1.6.6 – Os Exames
Numa escola que funcionasse com o método simultâneo, o exame era considerado
menos necessário. Nela, o professor tinha a oportunidade de examinar os discípulos
continuamente, revistá-los sucessivamente, avaliar-lhes as capacidades e os progressos
diários. Desse modo, bastava que fossem feitos dois exames periódicos, um antes da
Páscoa, outro antes do Natal. Mas comumente os exames eram feitos da seguinte forma:
1 -
Classe de leitura
O professor organizava a classe consistindo apenas a diferença em terem os
examinadores os livros em que passavam a acompanhar os examinando que liam em voz
alta. Tendo-se adotado o modo de examinar por cartões nas decúrias, os examinadores,
sentados em distância conveniente, atentavam para o que os meninos lessem e assim
formavam o juízo de valor.
2 -
Classe de escrita
As divisões depois do exame de leitura tomavam seus respectivos lugares e
começavam a escrever. Em seguida mostravam aos examinadores não só as escritas
traçadas como também as feitas nos dias anteriores. Logo que essa tarefa era realizada, os
examinadores tomavam nota e emitiam juízos.
3 -
Classe de aritmética
Os examinadores procediam dirigindo-se aos alunos algumas perguntas sobre o que
eles tinham estudado e mandava-os irem a pedra mostrar na prática que sabiam.
102
4 -
Ensino religioso
Embora não possuindo divisões em classe, os alunos eram interrogados sobre os
compêndios ou catecismos adotados pelo Conselho de Instrução.
5 -
Desenho linear
Os alunos iam à pedra traçar as figuras que lhes eram indicadas dando a cada uma
delas uma explicação que aprenderam com o professor. Além disso, eles tinham obrigação
de mostrar os cadernos em que habitualmente desenhavam com o auxilio de instrumentos.
6 –
Classe de gramática
O professor ou os examinadores ditavam orações que os discípulos escreviam na
pedra grande. Se nessas orações aparecia alguma palavra pouco conhecida, o professor em
alta voz o observava e ditava a ortografia usual da palavra, deixando ao discípulo o
cuidado de indicar a ortografia do gênero, do número e das pessoas.
Para esse tipo de exame era proferível pouca questão de gramática e muita oração na
pedra, pois se os discípulos sabiam escrever corretamente o professor cumpria seus
deveres. As respostas dos discípulos apenas provavam a sua boa memória e nada mais.
2.1.7 - Classificação dos diferentes ramos do ensino
A escola que funcionasse pelo método simultâneo ensinava os rudimentos da
Gramática, da Aritmética e noções de catecismo.
2.1.7.1 – O ensino da Gramática
O ensino da Gramática podia ser feito neste método mediante livreto ou cartões nas
decúrias.
103
No primeiro caso, o professor ensinava pela pequena gramática adotada pelo
Conselho Geral de Instrução Pública, tendo o cuidado de fazer a aplicação das regras e
definições através das apostilas cujos exemplos e a prática tornavam-se familiares.
No segundo caso, a gramática era reduzida a cartões que ao lado da definição e da
regra encontrava sempre o exemplo. Nessa redução da Gramática ter-se-ia em vista a
formação de cinco classes do método simultâneo, sendo que as três últimas aprendiam a
gramática e as demais a leitura nas respectivas decúrias.
Sendo adotado o sistema de se ensinar por cartões era conveniente seguir os métodos
que fossem claros e precisos. Mas o manual indicava o recurso da apostila no qual o
professor devia dar vinte e cinco minutos de alua a cada classe de gramática.
Classe de escrita
Quando o professor tivesse boa letra faria ele mesmo os traslados, quando não
tivesse usaria os impressos. A letra cursiva era a que geralmente se ensinava, mas também
era bom ensinar a redonda e a gótica.
As cinco classes do método simultâneo escreviam:
A 1ª, elementos de letras e letras destacadas.
A 2ª, bastardo unido.
A 3ª, ora bastardo, ora bastardinho e maiúsculas.
A 4ª, fina e letras capitais.
A alternadamente a que tinha aprendido nas outras classes: a redonda, a gótica e no
fim de cada escrita uma linha de algarismos. Aos sábados as escritas eram feitas em folha
de papel separadas para que os meninos levassem para seus familiares.
Classe de leitura
O professor podia ensinar os alunos a lerem por livretos ou mediante cartões que
eram distribuídos nas cinco classes. No primeiro caso, cada aluno possuía o seu exemplar.
O ensino da leitura nos dois casos se dava da seguinte forma:
A 1ª classe estudava as vogais e consoantes de todas as espécies.
104
A 2ª classe estudava sílabas de qualquer natureza.
A 3ª classe estudava palavras cujas sílabas eram separadas e depois palavras unidas.
A 4 ª estudava oração ou frases.
A estudava leitura corrente em livretos ou cartões apropriados e adotados pelo
Conselho de Instrução Pública.
Os métodos de se ensinar eram os seguintes:
Cartas de letras
1° método - o decurião nomeava e mostrava a letra; o discípulo repetia.
2° método - o decurião mostrava uma letra sem nomeá-la; o discípulo a nomeava.
3° método - o decurião nomeava a letra; o discípulo a mostrava com o apontador do
decurião.
Cartas de palavras
método - o decurião indicava uma palavra passando devagar o apontador sobre as
sílabas que a compunha; o discípulo as nomeava, sem soletrar à proporção que
lhes eram mostradas.
- método - o decurião indicava uma palavra; o discípulo a enunciava
corretamente.
método - (com a carta voltada). O decurião enunciava uma palavra; o discípulo a
decompunha em sílabas, depois em letras que juntava em cada sílaba e enfim
enunciava a palavra corretamente.
Cartas de frases
método - o decurião indicava uma frase; o discípulo a enunciava com vagar,
carregando bem em cada sílaba à medida que ela lhe era mostrada.
2° método - o decurião indicava uma frase e o discípulo a enunciava corretamente.
105
método - (com a carta voltada). O decurião enunciava uma frase; o discípulo
enunciava sucessivamente as sílabas e depois as letras que ia reunindo em sílabas
e finalmente dizia a frase corretamente.
Quanto às cartas ou livros de leitura na classe mais adiantada só se empregavam dois
métodos: o 1° que durava meia hora e consistia em mandara cada discípulo ler até o fim; e
o 2° que se fazia com uma decomposição como acima se viu nas cartas de frases.
Classe de aritmética
A 1ª classe traçava algarismos e estuda numeração.
A 2ª somava e diminuía.
A 3ª multiplicava.
A 4ª repartia.
A 5ª as mesmas coisas e todas as regras úteis ao comércio.
Os exercícios de aritmética eram feitos nas carteiras ou na pedra grande. Nas
carteiras, os exercícios e as operações eram ditados pelos decuriões. Na pedra eram feitos
pelo professor. Os discípulos operavam em silêncio debaixo da vigilância de um ou de
outro.
Recomendava-se ao professor que determinasse a 1ª classe a escrever os números
com elegância; que a classe aprendesse a tabuada por ser a base do cálculo; que a
classe se acostumasse a diminuir e aumentar uma unidade no algarismo inferior em vez de
diminuir no algarismo superior. O resultado era o mesmo, porém a operação era mais
rápida.
Classe de desenho linear
As três últimas classes de escrita somente aprendiam o desenho linear pelo
compêndio designado pelo Conselho de Instrução Pública.
Para este ensino, o professor deveria possuir os instrumentos próprios como
compassos, esquadrias, referidores, régua etc.
Havia dois exercícios diferentes neste ramo de ensino: um na pedra grande, outro nas
carteiras. Na pedra, o professor designava um discípulo para traçar as figuras e outro para
106
retificá-la (sem instrumento); por último ele mesmo fazia a correção com ou sem
instrumentos. Nas carteiras desenhava-se em cadernos com instrumentos ou sem eles. Se
se desenha com instrumentos, bastava dava a cada menino um lápis e um traslado. O uso
dos instrumentos era muito difícil, e caso houvesse recomendava-se muito asseio para se
poder obter bom resultado.
Classe de catecismo
A classe estuda as orações da manhã e da noite, a oração Dominical, a Saudação
Evangélica, o símbolo dos apóstolos e a confissão dos Pentecostes.
A 2ª classe estuda as mesmas rezas e alguns salmos das Vésperas.
A 3ª estuda o pequeno catecismo.
A e a o grande catecismo. O evangelho se aprende nos sábados em lugar do
catecismo. Para isso, o professor o lê em voz alta e explica a doutrina por meio de alguma
paráfrase, ou então um capítulo da Imitação de Cristo, ou ainda faz qualquer leitura
piedosa própria para desenvolver os sentimentos virtuosos nos corações dos discípulos.
Com esse tópico encerramos a descrição do método simultâneo extraído do Manual
de Ensino Simultâneo que foi traduzido por João Alves Portela. Em seguida faremos a
descrição do método mútuo.
2.2 – O Método Mútuo
2.2.1 - Aspectos Gerais
O Manual das Escolas elementares de Ensino Mútuo de M. Sarazin,
134
traduzido por
João Alves Portela logo na introdução afirmando que este método deveu-se aos progressos
do método de ensino simultâneo.
135
Este Manual tinha o objetivo de servir aos inspetores
134
- M. Sarazin foi professor do curso especial de ensino mútuo da cidade de Paris.
135
- M. SARAZIN.
Manual das Escolas Elementares de Ensino Mútuo
. Tradução de João Alves Portela.
Bahia: Tipografia de A. O. da França Guerra e Companhia, 1854. Daqui para frente usarei a sigla
MEEEM para me referir ao manual citado.
107
das aulas que quisessem aplicar em suas escolas o ensino mútuo, bem como a professores
públicos ou particulares.
O Manual começava determinando o número de até trezentos alunos para uma escola
que funcionasse com o método de ensino mútuo. Para uma escola com 240 alunos o
tamanho da sala deveria ser de 17 metros e 30 centímetros de comprimento por 8 metros e
90 centímetros de largura.
136
Com duzentos e quarenta alunos essa escola funcionaria com 16 classes, sendo que
cada classe possuiria 15 alunos.
137
Essas classes de 15 alunos sentariam em carteiras e
bancos justapostos em lugares determinados.
Nela, o principal agente do ensino não era o professor como no método anterior, mas
os próprios alunos. Com isso, pretendia-se reduzir tempo e gastos pecuniários com a
instrução infantil.
2.2.2 - O local da escola e a forma
Uma escola de ensino mútuo deveria ter a forma de um quadrilongo com duplo
comprimento da sua largura e estar preferivelmente situada em alguma altura do solo.
Também deveria estar situada em um quarteirão populoso de modo que os estudos não
fossem perturbados pelo barulho exterior, tendo-se o cuidado de dar ao teto da sala altura
suficiente para que se pudesse nela circular o ar necessário à respiração dos discípulos.
As janelas
deveriam estar situadas nos dois maiores lados paralelos e aberta a dois
metros do solo. Desse modo os discípulos não podiam se distrair com o que acontecesse
no exterior da escola. As janelas de balanço eram preferíveis pela razão de se poderem
facilmente manobrar por meio de uma corda.
O pavimento
da escola deveria ser feito de uma camada de salitre, de tijolos ou de
tábuas; estas eram preferíveis por não acumular poeira e não exigirem freqüentes reparos.
A porta
da sala deveria estar situada perto do estrado do professor a fim de que se
pudesse observar a ordem de entrada e saída dos discípulos sem ter que sair do lugar.
A ante-sala
, local onde os discípulos eram reunidos antes da aula, consistia em uma
sala que precedia sempre a das classes. ficavam nas paredes os cabides para guardar os
chapéus e um depósito para água, com um vaso por baixo e copos de folhas de flandres.
136
- Nesse Manual as medidas aparecem em metros e centímetro.
137
- Segundo o MEEM, classe é conjunto de uma carteira banco e corredor por onde transitam os meninos.
108
As latrinas
deveriam estar situadas no pátio ou no quintal da casa de modo que o
professor pudesse observar os meninos por meio de uma janela que ficava próxima às
classes dos alunos ou discípulos.
O Estrado
situado deveria está situado em uma extremidade da sala sobre o qual se
punha a mesa do professor e as mesas menores dos monitores gerais. A elevação desse
estrado e suas dimensões eram proporcionais ao tamanho da sala; todavia o máximo que
se podia conceber era 65 centímetros de altura, 5 metros de comprimento e 2 de largura. A
ele se subia por um degrau e era rodeado por um baluarte.
2.2.3 -
A Mobília da escola
Para que uma escola de ensino mútuo funcionasse de forma adequada eram
necessários móveis e objetos com medidas precisas para comportar o número de alunos.
As carteiras
eram fabricadas de madeira mais conveniente; eram postas no meio da
sala de modo que todos os discípulos estivessem situados de frente para o professor. As
carteiras deveriam ter 1 metro e 45 centímetros entre as suas extremidades e as paredes da
sala, sendo que a altura variava de 67 a 84 centímetros e as dimensões de 24 centímetros
por 27 na terça parte e 50 na outra; os pés das carteiras em distância um dos outros
deveriam ter 1 metro e 62 centímetros, mais 12 centímetros de largura que se iam
alargando para a parte superior.
Em todo comprimento da carteira, na sua parte mais alta, existia um entalho onde se
colocavam
os lápis e as penas
. também lugares para se fixar as pedras em um entalho.
Nas carteiras mais largas se achavam os
tinteiros de chumbo
encaixados em entalhos,
contendo pequenos copos de vidro.
Havia também as
carteirinhas dos monitores
situadas no lado esquerdo das carteiras
normais. Elas eram construídas sobre as carteiras grandes, mas de tal maneira que os que
ali se sentavam pudessem estar voltados para os discípulos. Outra função desse mobiliário
era guardar os lápis, as penas e os traslados nas carteiras em que escreviam em papel.
Os bancos
cujos assentos achavam-se separado das carteiras eram do mesmo
comprimento destas. A sua altura era graduada, variando de 40 centímetros a 52. Por
detrás de cada banco deveria haver um corredor com 32 centímetros de largura.
109
Os telégrafos
em número de 8 eram formados de um varão de ferro ou de uma haste
de madeira de comprimento de 80 centímetros. Na extremidade do varão achava-se uma
taboinha que se podia girar quando se queria, sobre uma haste ou varão que atravessava.
De um lado deste telégrafo viam-se os números de 1 a 8 e do outro lado as letras COR.,
significando a palavra
correção
. Era posto um telegrafo em cada carteira de frente para os
discípulos.
Para sustentar os traslados que eram usados na primeira, na sétima e na oitava classe
existiam os
porta traslados,
colocados horizontalmente em frente dos discípulos, por cima
dos entalhos das carteiras. Este objeto era fixado por duas hastes de ferro fixadas nas
extremidades das carteiras.
Os semicírculos
eram marcados no chão por pregos de cabeças achatadas dispostos
em arco na superfície do tablado ou por um círculo que se enchia por um fio de ferro; o
raio desse semicírculo deveria ser de 81 centímetros e um intervalo de um a outro de 65.
Esse espaço existia para os exercícios de leitura e outros.
Em cada semicírculo, suspenso à parede, achava-se um
quadro preto
ou
pedra
para
servir aos exercícios de aritmética, de desenho, com um metro de largura sobre 70
centímetros de altura; sua base tinha que estar situada a 80 centímetros do chão e de modo
que se pudesse tirar para limpar.
Anexo ao quadro encontrava-se a
varinha do monitor
que tinha 65 centímetros de
comprimento. Esse objeto servia para indicar a lição aos discípulos.
Havia também as tábuas de madeira durável. Nelas se colavam as cartas que os
discípulos escreveriam. Costumavam ter 49 centímetros de altura e 32 de largura; um furo,
feito na parte superior, servia para suspendê-las nos pregos fixados nas paredes. Essas
tábuas podiam ser substituídas por folhas de papelão.
Outro objeto que era colado em tábuas semelhantes às citadas acima era a lista de
presença. Cada tábua dessas possuía um pequeno tubo de folha para guardar o lápis que
servia ao monitor.
A
mesa do professor
posta sobre o estrado podia ter, nas grandes escolas, 2 metros
de comprimento por 1 de largura; possuía algumas gavetas e uma carteira com chaves.
Nela depositava-se a
campainha
,
o
apito
,
as listas dos monitores
,
o
tinteiro
,
os
registros
,
a
bolsinha dos prêmios
e os
bilhetes de contentamento
. A diante desta mesa achava-se
suspensa um
pedra preta
para uso da primeira classe; do lado do professor estavam
110
diversas cadeiras
para o professor e os visitadores. Se houvesse lugar também se
colocavam
as carteiras dos monitores gerais
.
Também sobre o estrado encontrava-se um
armário
e uma
biblioteca
, ambos com
chave e de iguais dimensões, isto é, com 1 metro e 60 centímetros de altura, 70
centímetros e largura e 40 de fundo. O armário era destinado para as provisões de giz,
lápis, de talco, canetas, papel, penas, tinta e esponja, traslados, coleções de pesos, de
medidas, de sólidos geométricos, instrumentos de desenho, etc. Na biblioteca continha
todos os compêndios da escola.
Junto à porta via-se
o sinal de saída
, espécie de telégrafo que tinha uma face preta e
outra branca. O discípulo que ia à latrina virava para os seus companheiros a face preta e
ninguém então podia sair; quando entrava para seu legar virava a face branca.
O
relógio
ficava suspenso à parede próximo ao professor. Este objeto era
indispensável para regular o tempo dos exercícios.
O
quadro de honra
, com moldura dourada e vidro, continha os nomes dos melhores
discípulos da escola, e também se pendurava na parede junto ao estrado de modo que os
visitadores pudessem ler.
Defronte dos discípulos, por cima do estrado, estava um
crucifixo
suspenso à parede;
por baixo desse objeto religioso colocava-se ao
retrato do monarca
.
Sobre as paredes, em boa altura, colocava-se um grande alfabeto de letras cursivas,
os algarismos, as principais figuras do desenho linear, três cartas geográficas, o mapa-
múndi da Europa e do Brasil.
Como se pode ver no ensino mútuo cada objeto e mobiliário possui lugares e
dimensões precisas. Isso garante com precisão o sucesso do ensino. Muitos desses estão
presentes na escola de ensino simultâneo como descrevemos linhas acima.
2.2.4 -
O Emprego do tempo
Na escola de ensino mútuo o tempo era uma ferramenta essencial porque permitia o
domínio das ações didáticas e o controle sobre a divisão das disciplinas que se tinha de
instruir. Tudo era regulado pela ação do relógio.
111
Classe da manhã
Das 9 às 10 horas ---------- Leitura nas decúrias
Das 10 às 11 horas -------- Escrita nas carteiras
Das 11 ao meio dia -------- Aritmética nas decúrias
Classe da tarde
Das 2 às 3 horas --------- Escrita e desenho linear
Das 3 às 4 horas --------- Leitura e desenho linear
Das 4 às 5 horas --------- Instrução moral e religiosa
A gramática era ensinada três vezes por semana das 9 às 10 horas da manhã. A hora
consagrada, em cada dia, à instrução moral e religiosa era empregada pelo modo seguinte:
Das 4 as 4 e meia nos bancos: ora era em forma de leitura e de explicação, ora era
em forma de interrogação.
Das 4 e meia às 5 horas nas decúrias: rezas e catecismos.
2.2.5 -
Dos Comandos, da execução e das regras do ensino
Na escola que funcionasse com o método de ensino mútuo havia precisão de
comandos e execução. Mas é preciso deixar claro que os comandos já começavam na ante-
sala. Vamos mostrar os comandos, tomando como exemplo a classe de leitura do turno da
manhã. As demais seguiam os mesmos meios de comandos, daí não ser necessária a
reprodução de todos os comandos com todas as matérias de ensino.
Comandos
Para fazer entrar os monitores da
ante-sala para a classe ----------------------1-
monitores de classe
e um toque de campainha.
Para preparar os discípulos
a entrarem para a classe --------------------2- um toque de campainha.
112
Para fazê-los voltar para o
lado por onde devem marchar --------3-
atenção
e ao mesmo tempo a mão direita
levantada para o ar e depois descrevendo um
semicírculo da
direita para a esquerda.
Para fazê-los marchar -----------------------4-
em classe de leitura
e um toque de apito.
Para fazer cessar a
marcha e obter silêncio----------------------5- um toque de apito.
Para fazer voltar os discípulos
para o estrado-------------------------------6 - um toque de campainha.
Para fazê-los pôr de
joelhos para a oração----------------------7- um toque de campainha.
Para mandá-los levantar------------------8 - um toque de campainha.
Para fazê-los voltar
para os monitores------------------------9-
atenção
e depois movimento com a o da
direita para a esquerda.
Para enviar todos os
discípulos aos semicírculos--------------10- aos grupos de leitura e um toque de campainha.
Para mandar descer dos bancos
aos monitores de classe----------11-monitores de classe e um toque de
campainha.
Para mandar cessar o passo-------------- 12- um toque de apito.
Execução
Ao toque de campainha, os monitores de classes e seus ajudantes entravam, subiam
nos bancos e voltavam os números dos telégrafos para a extremidade da carteira oposta ao
lado que eles ocupam (
comando 1
).
Os discípulos observavam em silêncio e se punham ao redor das paredes da ante-sala
(
comando 2
).
À palavra
atenção
eles olhavam o monitor geral que ao sinal de mão eles davam um
quarto de volta (
comando 3
).
113
Ao toque de campainha, os discípulos, tendo as mãos nas costas, marchavam juntos
em linha, com passo regular, sem bater os pés, sem arrastá-los e iam-se formar as classes
de leitura entrando pela extremidade oposta aos monitores. Cada um se punha diante de
uma pedra, continuando sempre a estar voltado para o seu monitor de classe e marcando
de leve o passo. Os monitores de leitura não seguiam os discípulos aos bancos; iam formar
uma linha no corredor situado junto aos telégrafos, e tomando um lugar em frente às
classes que lhes eram destinadas, faziam face aos discípulos (
comando 4
).
Os monitores de classe conservando-se sobre bancos voltavam-se assim como os
discípulos e os monitores de grupos para o estrado e, ao mesmo tempo, voltavam os seus
telégrafos de modo que apresentassem ao estrado os números e a classe (
comandos 5 e 6
).
Os discípulos punham-se de joelhos sobre os bancos, os monitores de classe sobre as
carteiras e os monitores de grupos no chão. Todos com os braços cruzados sobre os peitos.
O monitor geral, voltado para os discípulos, recitava a oração. Os monitores de classe
respondiam
amém
no fim (
comando 7
).
Eles se punham de pé nos seus lugares e levavam as mãos às costas (
comando 8
).
À palavra
atenção
eles olhavam para o monitor geral. Ao movimento de mão os
discípulos davam um quarto de volta e os monitores se voltavam para os seus discípulos
(
comando 9
).
Ao toque de campainha, os monitores de grupo partiam cada um com nove
discípulos para se disporem ao redor da sala. A classe mais adiantada partia antes das
outras saindo das carteiras onde estavam os monitores, voltava para última carteira e se ia
organizar à direita da sala. As outras desfilavam em seu seguimento de modo que as
últimas classes ocupavam o corredor situado à esquerda do estrado. Nesta marcha, cada
monitor se punha ao lado do primeiro discípulo, tendo às mãos no seu antebraço para
conduzi-lo; quando chega chaga ao semicírculo voltava as costas ao quadro e seus
discípulos voltavam-se para ele e o rodeavam. O primeiro se punha à sua esquerda, os
demais à esquerda do primeiro, e todos, de leve, ainda marcavam o passo. Durante este
movimento, os monitores de classe que ficavam sobre os bancos deveriam vigiar os
discípulos e igualmente dividi-los entre os monitores de grupos (
comando 10
).
À palavra
monitores
eles desciam; ao toque de campainha eles iam-se reunir aos
discípulos dos grupos, atravessando os bancos em todo o seu comprimento; tornavam-se
então discípulos de leitura (
comandos 11 e 12
).
114
Comandos
Para mandar começar
a leitura, 1° método-------------------- 13 ---dois toques de campainha.
Para mandar executar o 2° método-- 14 --dois toques de apito.
Para mandar executar o 3° método-- 15 --dois toques de apito.
Para mandar cessar a leitura,
suspender os quadros e dar
o sinal primeiro------------------------ 16 --dois toques de apito.
Para mandar enfileirar os pri-
meiros discípulos junto à parede---- 17 --um toque de campainha.
Para mandar sair das fileiras os
primeiros discípulos ----------------- 18 –um toque de campainha.
Para mandar distribuir os prêmios-- 19 –um toque de campainha.
Para mandar entrar em fileira
os primeiros discípulos--------------20 –um toque de campainha.
Execução
A este sinal, o monitor de grupos tomava o apontador que se achava suspenso junto à
pedra, punha-se à esquerda do quadro de leitura defronte do primeiro discípulo e indicava
com a extremidade do apontador o que devia ser objeto da lição dizendo:
primeiro
(
comando 13
).
Os monitores, depois de haverem suspendido seus quadros e distribuídos os sinais de
prêmios, voltavam as costas para a parede (
comando 14
).
Os discípulos se desenvolviam ao longo das paredes, marchando em ordem. O
monitor se colocava defronte do seu primeiro discípulo e se voltava para ele (
comando
15
).
Os primeiros faziam um passo adiante e colocavam-se em à esquerda de seus
monitores respectivos, voltando-se, como eles, para os discípulos (
comandos 16 e 17
).
O monitor fazia as distribuições (
comandos 18 e 19
).
115
Os primeiros tornavam a tomar os seus lugares e os monitores restituíam os sinais e
os prêmios (
comando 20
).
Assim, como ocorria com o ensino da leitura, ocorria também com as outras
matérias de ensino. Sempre os alunos mais experientes ensinavam aos mais velhos. O
professor acabava se tornando figura secundária nesse processo de ensino. A escola
funcionava com rigor disciplinar. Os comandos ditavam o que os alunos tinham que
executar. Desse modo, a hierarquia e a disciplina eram condições fundamentais para o
bom desempenho do método da escola.
2.2.6
Classificações das matérias de ensino
As matérias de ensino da escola mútua obedeciam à classificação e, para suas
divisões havia estruturação entre os alunos.
2.2.6.1 - Ensino da leitura
Para esse aprendizado, os discípulos estavam divididos em classes e estudavam do
seguinte modo:
classe – vogais, consoantes simples, monogramas: a, e, é, ê, o, ô ,u- b, c, d, f, g, h,
j, l, m, n, p, q, r, s, t, v, z.
classe - sílabas diretas de duas letras:
va
,
me
,
bu
, etc; seguidas de palavras e frases
nas quais entravam como elemento:
vate
,
mérito
,
evita cólera
.
classe labas inversas de duas letras:
or
,
as
,
if
, etc; sílabas compostas de três
letras:
cor
,
balcão
,
ativo
,
arsenal
,
alto mar
.
4ª classe – vogais, consoantes simples, poligramas:
eu, ou, in, au, on, em, oi, - ch, nh,
th
. Exemplo:
onze, oito, audaz, ourives, montanha, chapeo, medalhão, ganhou o
chalé
.
classe – vogais e consoantes compostas:
ia, iê, io, ieu, iau, iou, ,bl, br, cl, cr, fl, fr,
gl, gr, pl, pr, dr, ir, st, str, sc, scr, sp
. Exemplo:
dia, crime, problema, credor
.
6ª e 7ª classes – vogais e consoantes equivalentes: K é equivalente de C em
alkali
.
QU C em
quociente
X CS em
convexo, sexo
X Z em
exemplo
Y I em
mistério
116
2.2.6.1.2 - Métodos
Quadro de letras
1° método - o monitor nomeava e mostra a letra, e o discípulo repetia.
2° método - o monitor mostrava uma sem nomeá-la e o discípulo nomeava-a.
método - o monitor nomeava a letra e o discípulo mostrava-a com o apontador do
monitor.
Quadro de sílabas
método o monitor indicava uma sílaba, e o discípulo enunciava as letras; o
monitor unia-as.
2° método – o monitor indicava uma sílaba, e o discípulo enunciava sem soletrar.
método (quadro voltado) o monitor enunciava uma sílaba, o discípulo soletrava
e juntava as letras.
Quadro de palavras
método o monitor indicava uma palavra passando devagar o apontador sobre as
sílabas que compunham; o discípulo as enunciava sem soletrar, à proporção que
lhe eram mostradas.
2° método – o monitor indicava uma palavra e o discípulo, enunciava-a
corretamente.
3° método – (com o quadro voltado) o monitor enunciava uma palavra; o discípulo a
decompunha em sílaba, depois em letras que juntava em cada sílaba e, enfim,
enunciava a palavra corretamente.
117
Quadro de frases
método o monitor indicava uma frase: o discípulo a enunciava com vagar,
carregando bem em cada sílaba à medida que ela lhe era apresentada.
2° método – o monitor indicava uma frase, e o discípulo enunciava-a corretamente.
método (com o quadro voltado) o monitor enunciava uma frase; o discípulo
enunciava sucessivamente as sílabas, depois as letras que ia reunindo em sílabas
e finalmente dizia a frase corretamente.
Quanto aos quadros de leituras correntes e de leitura nos livros, se empregavam
dois métodos: o primeiro, que durava meia hora, consistia em mandar ler cada discípulo
até um ponto final; o segundo se fazia decompondo como foi visto nos quadros de frases.
2.2.6.2 - Ensino da gramática e da ortografia
Para se ensinar a gramática, era necessário que os discípulos soubessem ler e
escrever corretamente. Assim, esse ensino só tinha lugar para a sétima e oitava classes.
Classificação
A gramática achava-se dividida em oito classes:
1ª classe – definições da parte do discurso
2ª classe – substantivo, adjetivo, pronome
3ª e 4ª classes – verbo
5ª classe – substantivo, adjetivo, pronome
6ª classe – verbo
7ª classe – advérbio, preposição, conjunção
8ª classe – pontuação
118
2.2.6.2.1 – Métodos
método o monitor indicava uma definição ou uma regra, com exemplos, que a
acompanhava e o discípulo as lia.
método - (com o Quadro voltado) o monitor interrogava o discípulo sobre o que
ele tinha acabado de ler; este respondia recitando, tanto quanto se lembrava, o
texto do quadro.
método o monitor escrevia sobre a pedra uma das frases que se achavam nos
exercícios do quadro que se acabava de estudar; lia depois a definição e a regra
que se lhe referiam e o discípulo sublinhava a palavra definida ou cuja ortografia
acabava de ser ensinada pela regra.
2.2.6.3 - Ensino da escrita
Para o ensino da escrita era necessário dividir os discípulos em oito classes.
1ª classe - elementos de letras e o alfabeto
2ª classe - sílabas de duas letras
3ª classe - sílabas de três letras
4ª classe - sílabas de quatro letras
5ª classe - palavras de uma sílaba
6ª classe - palavras de duas sílabas
7ª classe - palavras de três sílabas
classe palavras de quatro sílabas, na primeira divisão; na segunda aperfeiçoava-
se a escrita pela cópia de bons traslados e de frases escolhidas.
2.2.6.3.1 - Métodos
Para dar início à tarefa dos exercícios o monitor geral pronunciava as palavras
oitava classes, começai
, e os discípulos da segunda divisão começavam a escrever
copiando dos traslados, de cursivo ou de letras redondas; ao mesmo tempo, o monitor da
primeira divisão, da mesma classe, lia uma frase do traslado para os discípulos começarem
119
a escrever; depois enunciava separadamente a mesma palavra e a soletra; os discípulos de
sua classe escreviam.
Imediatamente o monitor da sétima classe ditava uma frase do seu traslado e depois a
palavra que queria. Esta palavra era escrita nos cadernos como na oitava classe.
Em seguida, o monitor da sexta classe e o da quinta praticava da mesma maneira,
mas escrevia sobre pedras. Os monitores da quarta, da terceira e da segunda classes
limitavam-se a enunciar, cada um por sua vez, uma sílaba de seu traslado, que soletravam
e depois juntavam.
Na primeira classe também, o monitor enuncia o que está escrito na pedra que estava
junto do professor e os discípulos traçavam sobre suas pedras o elemento ou a letra.
Quando o monitor da primeira classe acabava de ditar, voltava-se para o da oitava
para ditar nova frase; depois o da sétima e assim sucessivamente.
Para corrigir os erros, os monitores passavam por trás dos bancos de cada classe,
observando o exercício de cada discípulo, riscava a letra errada e traçava outras nas
entrelinhas. Enquanto durava esta correção os discípulos não ficavam inativos, pois
continuavam a executar outras letras. Depois da correção os discípulos procuravam imitar
o correto.
2.2.6.4 - Ensino da Aritmética
Assim como nas outras matérias, no ensino da aritmética os discípulos também eram
divididos em oito classes.
Classificação
1ª classe - noções dos primeiros números e traçados de algarismos
2ª classe - numeração
3ª classe - somar
4ª classe - diminuir
5ª classe - multiplicar
6ª classe - dividir
7ª classe - cálculo das frações ordinárias e exposição do sistema métrico
8ª classe - aplicação da aritmética
120
2.2.6.4.1 - Métodos
método - o monitor mostrava um ou diversos riscos ou pontos representando um
número com algarismo correspondente e enunciava-lhes o valor; o discípulo
repetia.
2° método - o monitor mostrava um algarismo sem nomeá-lo e o discípulo repetia.
3°método- o monitor traçava um algarismo no alto da pedra; cada discípulo
sucessivamente o traçava e enunciava.
Primeiros quadros de numeração em que se achavam representadas com riscos
todas as unidades de que cada número se compunha
método - o monitor mostrava uma ou diversas dezenas de riscos com o número
correspondente e enunciava o seu valor, o discípulo repetia.
2° método - o monitor mostrava um número sem enunciá-lo; o discípulo repetia.
método - (quadro voltado) o monitor enunciava um mero; o discípulo o
escrevia sobre a pedra.
Quadro para o estudo do valor relativo dos algarismos
método - o monitor mostrava um número composto de três algarismos, dizia seu
valor e o discípulo repetia; o monitor juntava- ele se dividia em unidade, em
dezenas e centena- o discípulo repetia.
2° método - o monitor mostrava um número, o discípulo dizia seu valor.
3° método - (quadro voltado) o monitor indicava a ordem de um número; o discípulo
enunciava o valor.
Quadro dos modos de ler e escrever qualquer número
método - o monitor dizia:
escrevei tal número
; o discípulo o escrevia na pedra,
enunciava o valor da cada algarismo à medida que escrevia.
121
2° método - o monitor indicava um número, o discípulo enunciava-o.
método - o monitor enunciava dois números; o discípulo escrevia traçando as
unidades da mesma ordem por baixo das outras.
Quadro de combinações dos primeiros números para preparar às quatro regras
1° método - o monitor indicava uma combinação, discípulo enunciava-a.
método - (com o quadro voltado) o monitor enunciava os números que se deviam
combinar, o discípulo dizia o resultado.
3° método - (quadro voltado) o monitor enunciava o resultado e um dos elementos, o
discípulo dizia o outro.
Quadro das quatro regras fundamentais do cálculo
1° método - o monitor indicava um problema no seu quadro; o primeiro discípulo lia
o problema e traçava os algarismos que se devia operar. O segundo discípulo o
substituía e fazia uma parte da operação, era um diminuir parcial; o outro fazia
outra parte e assim por diante até que o último enunciava o resultado.
2° método - o monitor indicava outro problema; o discípulo o lia, traçava os números
e operava tudo em alta voz.
método - os dois primeiros discípulos do grupo iam à pedra; o monitor enunciava
o problema, eles traçavam os meros e operavam em silêncio. Aquele que
concluiu primeiro e com mais acerto, tornava-se o primeiro dos dois; seguiam-se
dois outros e assim sucessivamente.
Quadro para dar aos discípulos noções de frações
1° método - o monitor mostrava uma linha em que estavam marcadas certas divisões
para representar uma fração, mostrava em algarismos a fração correspondente e
enunciava o seu valor; o discípulo repetia.
2° método - o monitor mostrava uma fração representada por algarismos, o discípulo
enunciava-a.
122
3° método - (quadro voltado) o monitor enunciava uma fração; o discípulo a escrevia
na pedra.
2.2.6.5 – Ensino do desenho linear
O ensino do desenho linear era indicado para as quatro classes mais adiantadas por já
possuírem aptidão no manejo com o lápis. Este ensino também se dividia em oito classes,
sendo que as cinco primeiras classes desenhavam com mão levantada e as três últimas
com traçado geométrico.
1ª classe - traçado e divisões de linhas retas
2ª classe - traçado e divisão de ângulos
3ª classe - triângulos, quadriláteros e polígonos irregulares
4ª classe - linhas curvas, círculo e polígonos regulares
6ª classe - traçado e divisão de linhas retas, de circunferências e de ângulos
7ª classe - triângulos, quadriláteros e polígonos regulares
8ª classe - tangentes curvas com diversos centros, secções cônicas e aplicações
diversas do desenho
2.2.6.5.1 - Métodos
Desenho nas carteiras
Os discípulos desenhavam conforme os monitores e, sucessivamente, ditavam as
figuras sem os instrumentos. Por exemplo: o monitor da oitava classe dizia aos discípulos:
traçai um círculo
; o da sétima dizia depois aos seus
traçai um octógono regular
etc.
Quando chegava a ocasião em que de novo devia ditar, o monitor da oitava classe
ordenava que se traçasse outra figura; se os discípulos ainda não tinham acabado, o
monitor mandava continuar. O da sétima e os das demais também assim o faziam até que
se tinham ditado seis vezes em cada classe; feito isso, os monitores voltados para os
telégrafos pediam correção.
123
Desenho linear nos grupos
1° método - o monitor mostrava e nomeava a figura que se devia traçar; um discípulo
a nomeava e a executava. Todos os outros discípulos a nomeavam e executavam,
o monitor a desenhava por último.
método - o monitor mostrava a figura que devia traçar sem nomeá-la; o discípulo
a nomeava e a executava, o monitor tornava a desenhar.
3° método - o discípulo executava a figura que se lhe ditou e avaliava no todo ou em
parte as suas dimensões em decímetros ou em centímetros, depois verificava se a
execução era exata.
2.2.6.6 - Ensino do catecismo
Para o ensino do catecismo, a escola passava por uma reorganização das classes.
Desse modo, o professor divide a escola em três grandes classes de catecismo.
As quatro primeiras classes de leitura formavam a primeira divisão com destino ao
aprendizado das rezas portuguesas; a quinta e a sexta classes formavam outra divisão para
o aprendizado do catecismo pequeno; a sétima e a oitava classes formavam a última
divisão para aprender o catecismo grande.
Na aula do dia de sábado o professor indicava a lição que serviria na semana
seguinte; depois por si mesmo certificava-se de que os grupos e os monitores sabiam das
lições estudadas anteriormente.
Os discípulos que estavam em fase de preparação para a primeira comunhão
formavam grupos particulares a fim de aprenderem as rezas determinadas pela Igreja.
Estes discípulos aprenderiam as noções sobre o Evangelho.
Determinava-se que se devia depositar o catecismo grande nas tabuinhas para a
terceira divisão; nas duas outras divisões os monitores possuíam catecismos, uma vez
que os discípulos ainda não sabiam ler.
124
2.2.6.6.1 - Métodos
Rezas
1° método - o monitor lia uma frase e a fazia repetir ao primeiro discípulo, depois ao
segundo e assim sucessivamente. Quando todos repetiam, o monitor lia outra
frase e vai fazendo essa sucessão de atos até que enfim reunia as frases e as fazia
recitar.
método - o monitor lia a passagem que foi estudada no primeiro método e a fazia
sucessivamente a todos os seus monitores.
Catecismo pequeno
método - o monitor lia uma questão e suas respostas; depois dirigia a mesma
questão ao primeiro discípulo e este dava a resposta; a mesma perguntai era feita
ao segundo e assim sucessivamente.
método - o monitor fazia uma questão ao primeiro discípulo e este lhe
respondia; essa pergunta era feita aos demais de modo sucessivo.
Catecismo grande
método - o monitor tendo indicado a passagem que devia servir de objeto à lição,
dirigia-a ao primeiro discípulo para ler; este lhe respondia, lendo-a. A mesma
ação era feita aos ouros de forma sucessiva.
método - os discípulos, tendo entregado seus catecismos ao monitor, respondiam
de cor as perguntas feitas. O primeiro respondia a primeira pergunta, o segundo a
segunda, e assim sucessivamente.
Além dos exercícios da doutrina cristã que se praticavam na escola havia as orações
para serem rezadas antes e depois da aula, o mesmo valendo para a classe da tarde.
125
Oração antes da aula
Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo - Amém”.
Vinde, Espírito Santo, enchei os corações dos vossos fiéis e neles acendei o fogo do
Vosso amor.
Enviai o vosso Espírito e as nossas almas de novo serão criadas.
Resposta. E vós renovareis a superfície da terra. Deus que instruístes o coração dos
fiéis com as luzes do Espírito Santo, fazei-nos hoje a graça de amarmos o bem e a
sabedoria por este mesmo Santo Espírito e de acharmos a nossa felicidade nas suas
consolações. ós vo-lo o pedimos por Cristo nosso Senhor – Amém.
Oração do final da aula
Ó Divino Jesus que por Vós fizeste menino; ó Vós que sempre mostrastes tanta
ternura e bondade aos meninos que os vedes com piedade se chegarem para Vós, que Vos
dignais mesmo abençoá-los e que dissestes que era preciso perecer-se com eles para
entrar no reino dos Céus; lançai sobre nós um benigno olhar, fazei que tenhamos sempre
a sua doçura e a candura da infância, sem conservarmos a sua leviandade e que, imitando
a Vossa Santa Infância cresçamos de dia em dia , a vosso exemplo em ciência e em
sabedoria perante Deus e os homens , a fim de reinarmos um dia convosco no Céu. Amém.
Essas mesmas orações são rezadas na classe da tarde. Outras orações também são
rezadas como o
Pai osso
, a
Salve Rainha
, o
Creio em Deus Pai
,
Eu me confesso a Deus
e
Pelo Sinal
.
126
2.2.7 - Ensino aos monitores
A base principal da escola que funcionava com o método mútuo era o sistema de
monitores. Instruídos pelo professor, essas crianças ou jovens eram encarregados de
propagar a instrução às outras.
Primeiramente os monitores se dividiam em dois grandes grupos: os monitores
gerais que comandavam toda a escola sob as vistas do professor; e os monitores
particulares que, subordinados aos primeiro, instruíam e vigiavam uma classes ou um
grupo. O número de monitores gerais era determinado em dois, mas depois se ampliou
para seis. Os monitores de classe eram em mero de dezesseis, número duplo da divisão
de cada classe; oito eram pela manhã e oito pela tarde. Durante o tempo de descanso os
monitores aproveitavam as lições que se davam nas classes respectivas.
Havia também os ajudantes e os monitores de grupo. Tanto em um grupo como no
outro não se determinava o número, eles se achavam dependentes do número de alunos.
O aprendizado dos monitores ocorria em sessão oposta da sua de atividade. Os
monitores de grupo e de classe estudavam na sessão da tarde e instruíam na sessão da
manhã seguinte ou vice-versa, sempre havendo permuta entre eles.
Na sessão da manhã, os horários de estudo dos monitores assim se dividem:
Das 9 às 10 horas ---------------------- leitura: monitores de grupo
Das 10 às 11 horas -------------------- escrita: monitores de classe
Das 11 às 12 horas -------------------- aritmética
Desse modo, os monitores estudando nessa sessão na posterior empregavam os
ensinamentos adquiridos nas classes dos discípulos que lhes eram confiadas.
O estudo dos monitores ocorria na ante-sala. O período de estudo neste lugar quando
não ocorria no horário mostrado acima, acontecia no horário das sete às nove horas da
manhã, antes do início da sessão. Desse modo,os monitores eram instruídos pelo professor
em todas as matérias de ensino, inclusive nos todos que eram aplicados em cada classe.
Tudo o que se aplicava nas classes dos discípulos era exercitado na ante-sala. Quando o
professor se ausentava da ante-sala, deixava um monitor mais velho na tarefa da instrução
dos demais.
127
2.2.8 – Recompensas e castigos
Assim, como numa escola de ensino simultâneo, a escola mútua funcionava com o
sistema de recompensas e castigos. Assim , quando os alunos progrediam nos exercícios
ou mantinham uma conduta exemplar eram recompensados com prêmios, ascensão em
lugares ou nomeados para serem monitores. Do outro modo, quando isso não ocorria, a
conduta desviada ou a insubordinação era punida com uma rie de castigos determinada
para esse fim.
Recompensas
As principais recompensas eram:
1-
Ascender a um lugar superior por acertar nos exercícios;
2-
Recebimento de prêmio e ascensão para o primeiro lugar por acertar todos os
exercícios;
3-
Recebimento de bilhete de satisfação por ser considerado o discípulo de melhor
conduta durante um mês;
4-
Receber elogios em voz alta do professor perante todos os discípulos por alguma
ação meritória;
5-
Receber carta de satisfação para entregar aos pais pelo notável contentamento;
6-
Ser inscrito no quadro de honra da escola junto ao estrado;
7-
Ser nomeado como ajudante de monitor;
8-
Aos melhores monitores doação de medalhas de bronze;
9-
Indenização aos monitores gerais pelos serviços prestados.
Em uma escola de duzentos a trezentos alunos era permitida a recompensa de
cinqüenta prêmios e quarenta e dois acessos como se pode ver a seguir:
Monitor geral----------------------------1 prêmio
Monitores particulares------------------6 prêmios
Virtude -----------------------------------1prêmio
128
Instrução moral e religiosa-------------3 prêmios ------3 acessos
Leitura ----------------------------------- 8 prêmios ------8 acessos
Escrita-------------------------------------8 prêmios ------8 acessos
Aritmética ------------------------------- 8 prêmios-------8 acessos
Ortografia-------------------------------- 8 prêmios-------3 acessos
Desenho ----------------------------------4 prêmios-------4 acessos
História------------------------------------4 prêmios--------4 acessos
Geografia---------------------------------4 prêmios -------4 acessos
Castigos
Os castigos cumpriam a função de punir os alunos e faziam com que a conduta
não fosse imitada pelos demais. Os principais castigos eram:
1-
Perda do lugar por não desempenhar bem as funções;
2-
Passar para o último lugar em caso de indocilidade;
3-
Em caso de reincidência, castigos no canto da sala, em e com as mãos nas
costas;
4-
Colocar no pescoço cartaz com as palavras
falador,
desobediente
,
preguiçoso
,
etc.;
5-
Escrever cartas aos pais narrando a má conduta do aluno;
6-
Expulsão do aluno da escola que cometesse caso grave e urgente;
7-
Retirada da medalha e conseqüente demissão do monitor que cometesse infração;
Embora a escola funcionasse com o sistema de monitoria, quem aplicava os castigos
nos alunos era o professor. Aos monitores cabiam apenas cumprir as tarefas determinadas
pelo professor como por exemplo fazer descer os discípulos do banco.
2.2.9 - Exames
Assim como na escola simultânea, também a escola mútua examinava os seus
discípulos. Nessa escola quem examinava os alunos era o professor. Os alunos deviam
129
estar classificados de acordo com suas aptidões. Toda vez que um aluno se destacava dos
demais passava para outra divisão e assim sucessivamente até que mudasse de classe.
Os exames da escola mútua ocorriam semanalmente em cada matéria de ensino.
Desse modo, eram precisas cinco semanas para que os alunos fossem examinados em
tudo.
Para os exames de leitura, o professor percorria todos os grupos durante este
exercício mandando os discípulos lerem de forma sucessiva e, tomando nota, fazia as
mudanças de classe.
O exame de escrita era feito de forma rápida. O professor preparava a escrita sobre
as pedras e papel, depois ele mesmo ia às carteiras e examinava os escritos dos discípulos
e fazia as devidas mudanças de classe.
No exame de aritmética, o professor mandava os discípulos da primeira classe traçar
os algarismos e, os da segunda, os números. Depois ia às carteiras, observava os traçados e
os números e mandava que os discípulos os enunciassem separadamente. Caso saíssem
bem dessa prova, subiam para a classe de somar.
Chegando a classe de somar, o professor ditava os números e mandava os discípulos
somar; eles operavam em silêncio sem ver a conta do vizinho. Finda essa tarefa, o
professor reclassificava os alunos.
O mesmo ocorria com os discípulos das classes de diminuir, multiplicar e dividir.
Todos deviam resolver do mesmo modo. Depois disso, o professor ia às carteiras, tomava
nota e certificava do resultado. Os discípulos, tanto dessas classes como das outras, faziam
também em voz alta o seu cálculo.
Os exames de desenho linear e ortografia ocorriam do mesmo modo que os de
aritmética.
Para recompensar os discípulos pelos seus progressos, o professor distribuía
recompensas aos que mudavam de classe através de bilhetes de exame, proclamava os
nomes destes perante os demais e fazia as anotações no registro de inscrição e no de
classificação.
130
2.2.10 - Os Registros
A escola mútua funcionava através de um sistema de registro para dar conta de tudo
o que ocorria no espaço interno da aula. Os registros da escola eram:
1- Registro de Inscrição;
2- Lista de presença;
3- Registro de receita e despesas;
4- Registro de visitadores;
5- Registro de distribuição de prêmios;
6- Registro de classificação
Como foi apresentado, a escola mútua funcionava com precisão de tempo, com
mobiliário adequado, com comandos determinados, aliado aos métodos aplicados em cada
matéria de ensino. O fundamento desse sistema de instrução tinha nos alunos mais
instruídos e/ou um pouco mais velhos a sua base de sustentação. O professor apenas
coordenava os monitores e vigia os alunos do seu lugar fixo, sentado em uma cadeira
situada no alto do estrado. Dessa forma, com tudo em seu lugar, poder-se-ia instruir de
cem a trezentos alunos com um professor. Nesse modo de instruir a intenção era
reduzir gastos com a instrução das crianças e economizar o tempo da escolarização.
131
CAPÍTULO III
DOS QUE SE HABILITAVAM
Quando começamos a pesquisar sobre os métodos de ensino na Província sergipana
tínhamos a preocupação em saber como os professores de primeiras letras se apropriavam
dos métodos de ensino adotados e o que ocorria na prática do trabalho docente. Intrigou-
nos também saber quais os mecanismos que os dirigentes provinciais utilizavam para
configurar a profissão docente e qual a representação que era feita sobre a figura do
professor. Essas preocupações balizaram a construção deste capítulo.
Para elaboração deste capítulo baseamo-nos nas reflexões de Chartier acerca da
questão da apropriação e da prática.
138
Segundo esse autor, a apropriação nunca ocorre de
forma igualitária, será sempre diferenciada. O mesmo ocorrendo prática, os professores
primeiras de letras se apropriavam dos métodos de ensino de forma diversa e os
praticavam de acordo com a realidade de cada escola.
No caso das representações que se faziam sobre o professor de primeiras letras, estas
eram determinadas pelos interesses dos grupos que as forjou. Segundo Chartier, “as
representações do mundo social assim construídas, embora aspirem à universalidade de
um diagnóstico fundado na razão, são sempre pelos interesses do grupo que as forjam”.
139
Com base nos pressupostos de apropriação, práticas e representações analisaremos
como foi delimitada a questão da profissionalização docente na Província sergipana.
A formação do Estado nacional no Ocidente europeu coincidiu com o momento do
controle progressivo sobre a secularização do ensino e profissionalização docente.
Também o processo de emergência dos sistemas estatais cruza-se com o início de um
processo de profissionalização docente, que segundo Vilela, não era um produto daquele,
pois, já desde o século XVI, os contornos da profissão vinham se definindo nas sociedades
ocidentais.
140
Portugal como um país centralizado iniciou o controle sobre o ensino a partir do
século XVIII, adentrando o século seguinte com um sistema bastante precário de
138
- CHARTIER, Roger.
A história cultural
: entre práticas e representações Lisboa/Rio de Janeiro:
Difel/Bertrand, 1988.
139
- Idem. p. 27.
140
- VILELA, Heloisa de O. S. O mestre – escola e a professora. In.: LOPES, Eliana Marta Teixeira ,
FARIA FILHO, Luciano Mendes de, VEIGA, Cynthia Greive.
500 anos de Educação no Brasil
. 2ª. ed.
Belo Horizonte: Autêntica, 2000. p. 100.
132
instrução. Em relação à instrução primária algumas medidas passaram a ser tomadas no
sentido de aumentar o controle estatal como a adoção de métodos de ensino, autorização
de livros e concessão de “liberdade” para aqueles que dotados de algumas habilidades na
escrita, na leitura e no cálculo pudessem ser professores de primeiras letras.
No caso do Brasil, o processo de tutela estatal sobre a instrução da população
brasileira teve início com D. João VI. Segundo Chizzotti, D. João VI parece ter pretendido
criar um sistema de escolas públicas viabilizado através de um plano sistemático de
educação.
141
Esse projeto elaborado pelo Conde da Barca, General Francisco de Borja
Gastão Stocker, não foi adiante motivado pelo desentendimento dos representantes
provinciais, mas a idéia foi retomada na Constituinte de 1823.
A continuidade do processo de tutela estatal sobre a educação de primeiras letras da
população escolarizável brasileira pode ser verificada na Constituição de 1824, que
colocou dispositivo educacional em seus artigos garantindo a instrução primária de forma
gratuita a todos os cidadãos. Mas foi com a Lei de 15 de Outubro de 1827 que o Império
brasileiro principiou o trabalho de intervenção no campo educacional ao admitir que “nas
vilas e lugares populosos fossem criadas escolas de primeiras letras”.
Se o Império brasileiro passava a admitir a criação de escolas de primeiras letras em
quase todos os lugares, passava ao mesmo tempo a condicionar quem deveria ser o
profissional para esses espaços de instrução. Esta era a nova situação para o recente país:
um professor que ensinasse os rudimentos da leitura, da escrita e do cálculo. Era preciso
instruir a população para melhor governar, daí que se requereria um profissional habilitado
para instruir a população escolarizável.
Analisando o dispositivo da Lei de 15 de outubro de 1827 referente à habilitação do
professor percebemos que houve certa transferência de responsabilidade para os que se
destinavam a serem docentes de primeiras letras nas províncias brasileiras. Podemos
verificar essa questão através de dois dos artigos da referida lei.
Art.5°. Para as escolas do ensino mutuo se applicarão os edificios, que houverem com
sufficiencia nos logares dellas, arranjando-se com os utensilios necessarios à custa da
Fazenda Publica e os Professores; que não tiverem a necessaria instrucção deste
141
- CHIZZOTTI, Antônio. A constituinte de 1823 e a educação. In.: FÁVERO, Osmar (org.)
A educação
nas Constituintes Brasileiras.1823-1988
. Campinas, São Paulo: Autores Associados, 1996. p. 38.
133
ensino, irão instruir-se em curto prazo e à dos seus ordenados nas escolas das
capitaes.
Art. 7°. Os que pretenderem ser providos nas cadeiras serão examinados publicamente
perante os Presidentes, em Conselhos: e estes proverão o que for julgado mais digno e
darão parte ao Governo para sua legal nomeação.
142
Na Lei de 15 de outubro de 1827, a primeira de caráter geral sobre educação, nota-se
que houve brechas quanto ao problema da qualificação do professor de primeiras letras.
Ao admitir a criação de escolas que funcionassem com o todo tuo o Império
brasileiro passava a responsabilidade pela habilitação para o pretendente a carreira docente
de primeiras letras por esse método.
Outra questão que pode ser verificada nessa última é o dispositivo presente no artigo
sétimo ao transferir para as províncias a responsabilidade pelos julgamentos das
habilitações dos professores sem ao menos determinar os critérios de julgamento para
aqueles que se intentavam ao cargo de professor. Isso significa dizer que cada província
passava a ter a liberdade nos critérios de julgamento para realizar a investidura no cargo.
O que a Lei de 15 de outubro de 1827 indica são exigências para ser professor de
primeiras letras no Brasil. Como o país estava recente no processo de construção da
Nação, os administradores concebiam a instrução como uma ferramenta essencial para
ordenar o povo brasileiro. Seria através da escola de primeiras letras espalhadas pelos
quatro cantos do país que os valores do Império seriam incutidos nas crianças em idade de
escolarização.
A questão que se colocava era por ordem no mundo da desordem, para melhor
conhecer a fim de controlar a massa populacional analfabeta e desordenada. E nisso o
professor primário desempenharia um papel fundamental ao ser concebido como aquele
que fosse o agente capaz de transmitir o conhecimento sem subverter a ordem
estabelecida. Ao contrário, a questão era conservar o que estava posto tal como se
apresentava. Essa era a função destinada aos professores primários.
Segundo Vilela, a institucionalização do corpo docente de primeiras letras foi
pensada pelo Império brasileiro através do movimento de institucionalização da escola
normal.
143
Esse templo de formação docente passou a ser visto como solução para
142
- BRASIL. Lei de 15 de Outubro de 1827. IHGS. Grifo meu.
143
- VILELA, Heloisa de S. O. Op. Cit. p. 104.
134
aumentar o nível intelectual daqueles cuja tarefa era elevar o nível intelectual e moral da
sociedade, unificando padrões culturais e de convivência social.
No entanto, a mesma autora aponta retrocessos e avanços nesse movimento. Assim,
afirma também que concomitante a esse movimento, o Império procurou outros
mecanismos que garantiu a conformação da carreira do docente de primeiras letras. Os
mecanismos apontados pela autora referem-se à legislação, aos concursos blicos, ao
sistema holandês-prussiano e ao sistema de controle através das visitas às escolas de
primeiras letras. Dessa forma, analisaremos passo a passo como se deu a conformação da
profissão docente na Província sergipana.
1- A legislação sergipana
A legislação sobre instrução blica no período imperial brasileiro tem se
apresentado um valioso manancial de informação para o conhecimento da educação.
Através dessa documentação é possível perceber o projeto esboçado pela classe dirigente
para a educação e as determinações para aqueles que desejavam ser docentes. No caso dos
professores de primeiras letras, são fontes que indicam a conformação da profissão
docente e a ênfase dada a essa questão. A partir da legislação sergipana buscaremos
compreender o tratamento dado à questão da profissão docente, ou seja, o que a classe
dirigente provincial determinava para ser professor de primeiras letras e a condição dada
para o aprendizado do método de ensino.
A intervenção legal da Província sergipana na esfera da instrução primária pode ser
datada a partir do ano de 1828 como conseqüência da Lei de 15 de outubro de 1827.
Naquele ano foram colocadas todas as cadeiras de primeiras letras a concurso público
através de Edital. A partir desse documento o Governo provincial admitia professores de
primeiras letras para ensinar às crianças sergipanas em idade de escolarização. Mas esse
dispositivo ainda não sistematizou a questão da profissão docente na Província.
A primeira intervenção no campo da instrução primária sergipana que tratou da
questão do professor primário começou com a Lei de 5 de março de 1835. Essa lei teve
135
como pressuposto básico a questão do professor primário determinando condições de
concurso para professor, aposentadoria docente e prazo para habilitação.
A Lei de 1835 foi conseqüência do Ato Adicional de 1834 que transferiu para as
províncias competência para legislar em matéria de instrução primária. O Ato Adicional
descentralizou também assim a competência com as províncias em matéria da
conformação da profissão docente.
144
A partir da responsabilidade que a Província sergipana recebeu para legislar sobre
instrução primária os debates sobre a representação do professor tornaram-se intensos. Os
discursos eram proferidos em forma de relatórios pelos presidentes provinciais que se
utilizavam de espaços na Assembléia Provincial para defenderem a instrução primária
como uma necessidade social.
145
Junto a essa defesa estava também o problema da
profissão docente.
Através dos Relatórios dos presidentes provinciais podemos perceber que havia
também discursos em torno da qualificação do professor de primeiras letras através da
criação de uma escola normal sergipana, como podemos verificar no relatório do vice-
presidente Manuel Joaquim Fernandes de Barros em 1836.
Sobretudo vos recomendo mui particularmente que mediteis sobre um plano de
Instrucção Elementar para a mocidade, ou na criação de huma Eschola normal de
ensino, onde se formem Professores, para a educação da mocidade; os quaes serão
preferidos no ensino, e concurso para esse fim aos outros, que não tiverem seguido
esse curso; e os ordenados deverão ser maiores para os animar, e dar impulso à este
importante estabelecimento, e à instrucção da mocidade.
146
O discurso do vice-presidente ao reclamar um plano de instrução e o estabelecimento
de uma escola normal para a Província sergipana indica, por outro lado, que não havia
uma uniformidade de práticas pedagógicas dos professores. Na verdade o que o
administrador estava propondo era condições de governabilidade para a população
144
- SUCUPIRA, Newton. O Ato Adicional de 1834 e a descentralização da Educação. In.: FÁVERO,
Osmar.
A Educação nas constituintes brasileiras
. 1823-1988. Campinas, São Paulo: Autores
Associados, 1996. p. 61.
145
- Rosa afirma que o debate sobre a instrução em Minas Gerais além de ser proferido na Assembléia
provincial ocupou amplo debate nos jornais de circulação, principalmente no Jornal
O Universal
.
ROSA, Walquíria Miranda. Instrução pública e formação de professores em Minas Gerais (1825-1852).
In.:
Revista Brasileira de História da Educação.
n. 6.
Campinas , São Paulo: Autores Associados,
jul./dez. 2003. p. 91.
146
- Relatório do vice-presidente Manuel Joaquim Fernandes de Barros. In.:
oticiador Sergipense
. IHGS.
Sergipe: Tipografia de Silveira, 1836, n.81. p. 02.
136
sergipana através da instrução. Essa mesma realidade era vivida em muitas províncias
brasileiras.
A defesa a favor da criação de uma escola normal sergipana não acontecia de forma
isolada do restante do país. Vinha acompanhada de outras províncias que também lutavam
pela criação e instalação de escolas normais como ocorreu com o de São Paulo, Minas
Gerais e Bahia.
147
Essas províncias estabeleceram esse templo de formação docente com
o objetivo de melhor organizar a instrução pública de suas regiões.
No caso sergipano, a existência de uma escola normal foi tão defendida que, por
causa disso, os administradores provinciais faziam discursos colocando a situação do
atraso da instrução no corpo docente das escolas de primeiras letras. Para esses homens, a
melhoria da instrução seria possível com uma boa habilitação dos professores que
estariam aptos para fazer jus ao método de ensino adotado para as escolas.
A ênfase que os administradores sergipanos davam em seus discursos à necessidade
de um quadro docente de primeiras letras qualificado via escola normal revela, por outro
lado, a inclusão dos professores como construtores da nação brasileira. Essa inclusão
passava por toda uma reformulação da imagem do professor. Este seria um dos grandes
colaboradores que iria trazer o progresso para o país.
A escola normal sergipana foi criada na década de trinta, mas sua criação efetiva
veio a ocorrer na década de setenta do século XIX. Embora os administradores tenham
realizado investimentos com o objetivo de fazer funcionar a escola na década de trinta
como o envio de pessoas à Corte, tudo não passou de realizações infrutíferas.
Como o projeto da escola normal não se concretizou e a Província possuía poderes
para legislar sobre instrução primária, os dirigentes provinciais começaram, a partir de lei
de 1835, a criar mecanismos que condicionassem e delimitassem a profissão docente. Um
dos primeiros atos dos dirigentes foi dar um prazo para que os professores se
qualificassem nas matérias determinadas pela lei de 1827. Assim, no artigo quinto da lei
sergipana estava expresso:
Art.5°. Tanto as cadeiras de primeiras lettras novamente creadas, como as existentes,
serão postas à concurso, para serem providas, ou nos mesmos professores e mestras,
ou em outros, que bem satisfaçam os quizitos recomendados na lei de 15 de outubro
de 1827, concedendo o Governo aos actuaes professores, e mestras, um prazo rasoavel
se o requererem, que não excederá à 6 mezes, para instruirem nas materias
147
- VILELA. Op. Cit. p. 104.
137
necessarias, vencendo metade de seus ordenados, e não podendo elles serem chamados
a concurso senão depois de findo o tempo, que lhe for concedido.
148
No que se pode perceber a partir desse dispositivo da lei sergipana é a preocupação
pela habilitação nas matérias determinadas pela lei de 1827. Não consta determinação
quanto à questão do aprendizado do método de ensino adotado pela lei geral de educação:
o todo mútuo. Essa questão ficou reservada a segundo plano. Assim, podemos tirar
como conclusão que o método de ensino em Sergipe com a primeira lei de instrução
primária não recebeu ênfase. Ficou a cargo de quem pretendesse ser professor e
concorresse ao concurso público.
de se esclarecer que embora a questão do método de ensino não apareça na
legislação não significa dizer que os administradores provinciais tenham esquecido esse
problema. Como a habilitação do método ficava a cargo do professor de primeiras letras,
talvez essa prerrogativa tenha dispensado elaboração e aprovação de artigos para esse fim.
A lei provincial de 1835, em sua abrangência, procurou conformar a profissão
docente na Província sergipana, determinando ordenado dos professores, as formas de
admissão, aposentadoria, forma de vigilância e delimitação da profissão, inclusive no
artigo 14 era taxativa: determinava que os professores não poderiam ocupar algum ofício
público segundo as leis existentes.
A primeira lei sergipana sobre instrução priria teve vigência longa, durou até a
década de cinqüenta. Durante esse período a questão da profissão docente continuou a
mesma. A partir da década de cinqüenta outros dispositivos passaram a conformar a
profissão docente e fazer indicação indireta sobre o método de ensino para as escolas de
primeiras letras sergipanas. Mas ainda continuou a passar para o professor a
responsabilidade sobre a habilitação do método de ensino.
O Regimento Interno das Escolas de 1856 foi uma das legislações que ordenou como
o professor deveria ensinar como deveria preencher o espaço da escola e dividir com os
alunos. Esse documento também determinava o método de ensino simultâneo para as
escolas de primeiras letras.
Na parte que trata dos professores e a relação destes como os alunos e pais de alunos,
o Regimento Interno trazia em seus artigos uma série de deveres que conformavam o
papel desse agente de ensino na Província. Na verdade são determinações de práticas de
148
- FRANCO, Cândido Augusto Pereira. Op. Cit. p.137.
138
relacionamento com o objetivo de tornar o processo de ensino mais agradável, enfatizando
uma relação amistosa e agradável entre professores e alunos, tornando assim a prática
docente menos fastidiosa conforme se pode verificar nos artigos do Regimento.
Art. 1. O Professor deve ensinar a seus discipulos com amor e zêlo.
Art.2. Deve despertar nelles o gosto de aprender, já aconselhando-os paternalmente, já
recompensando por meio de premios e distinções escholares os que se mostrarem mais
assiduos, e amantes do ensino.
149
Em outra parte do Regimento indicação de como o professor deve ensinar as
matérias aos alunos e como deve ensinar obedecendo às especificidades do método
simultâneo. Também mostra a distribuição espacial do professor na aula. Por exemplo, em
alguns exercícios de aritmética o professor acompanhava o aluno passo a passo, mas em
outros tipos de exercício dispensavam a presença do mestre, ficando a cargo do monitor
como era o caso do ensino da leitura e da escrita.
Outra legislação da década de cinqüenta que podemos tomar como fonte para
sabermos acerca da conformação docente é o Regulamento de de setembro 1858. Esse
documento delimitava a condição de investidura para aquele que pretendesse ser professor
de primeiras letras e a forma de comportamento e ações a serem desenvolvidos no
processo de ensino. Sobre a condição de investidura no cargo de magistério esse
documento exigia as seguintes prerrogativas.
Art. 80. Só podem ser professor publico os cidadãos brasileiros, que reunirem as
condições seguintes:
1.
A idade de 18 annos.
2.
A moralidade.
3.
Capacidade profissional.
Art. 81. Prova-se a primeira condição com certidão de baptismo, ou justificação
d’idade.
Art. 82. A prova de moralidade consiste na apresentação de folha corrida nos lugares
onde haja residido nos três annos mais proximos à data e o requerimento, attestação
dos parochos, e do Inspector do districto.
150
149
-
Regimento Interno das Escolas
. APES. Fundo Biblioteca José Alves. Cx. 01. Doc. s/n. 1856.
150
-
Regulamento da Instrução Pública de 1 de setembro de 1858
. APES. Fundo Publicações. Cx.50. Doc.02.
p. 19-20.
139
O Regulamento de 1858 ao exigir uma série de condições como a idade e a
capacidade profissional para aquele que desejaria ser professor mostra que a morigeração
e o proselitismo religioso possuíam grande relevância no rol das exigências. Essas
exigências eram concretizadas com as provas apresentadas ao órgão competente. Na
verdade essa exincia relacionava-se à questão da representação que a classe dirigente
provincial fazia do professor como o cidadão probo, respeitador das condições imperiais e
da religião Católica.
A questão da boa morigeração tornava mais exigente quando se tratava do sexo
feminino. Para a mulher que desejasse ser professora o documento exigia a idade de vinte
e cinco anos além de outras prerrogativas como, por exemplo, a apresentação da certidão
de óbito para as viúvas.
Art. 83. As professoras devem exibir demais, se forem casadas, a certidão do seo
casamento, as viuvas a do obito seos maridos, e se viverem separadas d’estes, a
publica forma da sentença, que julgou a separação, para se avaliar o motivo, que a
originou. As solteiras, que não tiverem 25 annos completos, exibirão o consentimento
paterno, de seos tutores, ou parentes honestos, em cuja companhia viverem,
obrigando-se estes à continuar a tel-as em sua companhia até completarem a supradita
idade, salvo se casarem-se , podendo o governo dispensar–lhes o documento de folha
corrida.
151
O rol de exigência determinado pelo Regulamento de 1858 na verdade mostra que os
administradores representavam o professor (a) como aquele (a) que seria o espelho, o
exemplo de conduta tanto para a clientela escolarizável como para a população provincial.
No entanto, essa lei ao mesmo tempo em que delimitava a profissão docente
determinava quem não poderia ser admitido no quadro funcional da Província sergipana.
Essa restrição reforça a condição oposta a da boa morigeração. Assim, não ocuparia o
cargo de professor primário quem:
[Art. 84.]
§ 1. Os que não professarem a religião do Estado.
§ 2. Os que houverem sido privado d’emprego publico por processo disciplinar, à que
tenhão dado causa, falta de conducta moral ou civil, ou desobediência.
151
- Regulamento da Instrução Pública de 1 de setembro de 1858. Doc. Ct. p. 20.
140
§ 3. Quando houverem soffrido condemnação por crime de homicidio, roubo,
estellionato, furto, peculato, juramento falso, falsidade, rapto, adulterio, estupro,
ou por crimes contra a moral publica, e a religião do Estado.
§ 4. Quando soffrerem molestias contagiosas, ou mortaes.
152
As condições e as restrições presentes no Regulamento da Instrução Pública de 1858
mostram o projeto de construção da nação brasileira via escola de primeiras letras
sergipana. Ao exigir provas de boa conduta moral e religiosa dos candidatos ao magistério
público, os administradores incluíam os professores como aqueles que também estavam
encarregados na tarefa de construção da ordem. Provavelmente essa exigência estava
associada ao clima de intranqüilidade vivida na época.
Nessa condição o professor era representado através da imagem do bom cidadão,
exemplo a ser seguido por todos os alunos. Era aquele que respeitava as leis imperiais e a
religião oficial do Estado. A sua conduta passava a ser modelo para a construção de uma
sociedade organizada, ordenada e hierarquizada.
2- Os Concursos públicos
Outro mecanismo de prática cultural de conformação da carreira do magistério
público de primeiras letras desenvolvido pelos administradores provinciais sergipanos
foram os concursos públicos, prática presente durante todo transcorrer do século XIX. A
documentação existente sobre essa prática é de importante relevância porque nos informa
o que era exigido para ser professor, os mecanismos que o Estado criava para a habilitação
do professor e a metodologia de realização do concurso.
O primeiro concurso público para professor de primeiras letras sergipano ocorreu no
final da década de vinte, em 1828, por determinação da Lei de 1827. Mas a legislação
sergipana não especificou como seria realizado o concurso. Até onde se sabe, o presidente
da Província abriu o Edital de concurso para todas as cadeiras de primeiras letras.
153
Foi o
primeiro ato para investir no professor no quadro funcional da Província.
152
- Regulamento da Instrução Pública de 1 de setembro de 1858. doc. Cit.
153
- NUNES, Maria Thetis . Op. Cit. p. 46.
141
A determinação sobre o concurso público para o magistério de primeiras letras
estava especificada de forma clara na lei de 1835. Nos artigos 18 e 19 da lei estava
especificada a forma de realização do concurso:
Art. 18. O Governo mandará publicar por editaes remettidos à todas as camaras
municipaes, e juizes de paz por espaço de seis mezes, e em folhas publicas, o concurso
das cadeiras, declarando, as que nelle tem de entrar, attento ao art. 5°, e o dia em que
deve dar principio aos exames.
Art. 19. Os exames serão feitos publicamente perante o Presidente da provincia, que
chamará para isso professores habeis, guardando-se em tudo o mais que se acha
disposto nas leis em vigor.
154
A lei, ao determinar como seria realizado o concurso para professor, não especificou
os procedimentos de julgamento dos candidatos, inclusive quanto ao método de ensino. Na
documentação que pesquisamos não encontramos provas de julgamento sobre o método de
ensino adotado para as escolas. A documentação que encontramos indica apenas que o
concurso ocorria com uma prova de escrita, sendo ditada pela comissão e um exercício de
matemática.
Com base nas provas dos candidatos ao magistério público pode-se perceber a
exigência de habilitação do professor e ainda a ideologia que o Império forjava através do
professor como pode ser visto nas provas das candidatas Flavia Benedicta de Niterbo,
Narcisa Joaquina de Campos e Maria Pastora dos Anjos.
154
- FRANCO, Cândido Augusto P. Op. Cit. p. 139.
142
Transcrição
O poder moderador é a chave de toda
a organização politica, e é delegado privativamente ao Impera-
dor como chefe supremo da Nação, e seu primeiro Representante,
para que inscessantemente vele sobre a manutenção da indepen
dencia equilibrio, e armonia dos mais poderes politicos. A pessoa
do Imperador é inviolavel, e sagrada, elle não está sugeito a respon
sabilidade alguma.
Sergipe 27 de Setembro de 1848.
Flavia Benedicta de Niterbo.
155
Como se pode perceber o exame da candidata foi realizado através de um ditado. Na
forma como foi realizado o exame para se perceber que o critério de julgamento da
155
-
Prova de concurso da candidata Flávia Benedicta de iterbo em 27 de setembro de 1848
.
Correspondência recebida. APES. Fundo G
1
1885.
143
candidata foi o domínio da escrita. Outro detalhe que se pode perceber claramente foi a
ausência do exame de aritmética.
O texto escrito pela candidata Flavia Benedicta de Niterbo é um estrato da
Constituição de 1824, artigos 98 e 99. Pelo teor do texto fica evidenciada a intenção do
examinador em tornar a lei imperial conhecida. Ao ditar trechos da Constituição, o
examinador legitimava a ordem estabelecida. O recurso tinha a intenção de treinar a futura
professora a respeitar a lei e assim disseminar a ideologia imperial.
De forma igual foi exame da candidata Narciza Joaquina de Campos que concorreu à
uma vaga de professora no mesmo mês que a candidata anterior. O texto da candidata fala
da constituição política do Brasil, informando a divisão em províncias. Mais uma vez
podemos perceber a intenção do examinador em passar a idéia de um Brasil organizado.
Transcrição
O imperio do Brazil he a acociação politica, de todos os cidadã
os Brasileiros. Elles forma-o huma nação livre, e independen
te, que não admitem com qual quer outro laço algum de uni
ão, ou federação, que se oponha a sua independencia. O
seu territorio he dividido em Provincias, na forma em que ac
tualmente as acha; as quaes poderão ser subdivididas, como
144
pedir a bem do estado. Sergipe 27 de 7br°. de 1848.
156
De teor diferente foi o texto da candidata Maria Pastora dos Anjos. O ditado versou
sobre a religião. A intenção consistiu em mostrar o peso da religião do Império. Seu
exame assim como os das outras candidatas não consta prova de aritmética.
Transcrição
A liberdade Religiosa foi violada quebra
das, e ultrajadas as cruzes. Tudo quanto nossos Pais adorarão,
tudo quanto nós reservariamos foi entregue a distruição, e a vili
pendio. Huma Igreja antiga não foi protegida, se não
convertendo-se em casas de audiencia para salvalla,
foi mister desforalla.
Sergipe 27 de 7br°. de 1848.
Maria Pastora dos Anjos.
157
156
-
Prova de concurso da candidata arcisa Joaquina de Campos em 27 de setembro de 1848
. APES.
Correspondência recebida. Fundo G
1
1885.
157
-
Prova de concurso da candidata Maria Pastora dos Anjos em 27 de setembro de 1848
. Correspondência
recebida. APES. Fundo G
1
1885.
145
No caso do concurso para o candidato do sexo masculino era realizado em duas
etapas. Na primeira etapa era feito um ditado da mesma forma que se fazia com as
candidatas. Na etapa seguinte o candidato era avaliado na parte de aritmética, inclusive na
parte de geometria.
No exame de Antonio Rodrigues da Fraga podemos perceber que o candidato não foi
examinado na parte de geometria como determinava a legislação. O candidato foi
examinado apenas através de um texto e uma conta de multiplicar.
Transcrição
nome
Pelo numero de prudencia entende-se frequenti
mente o habito de seguir promptamente os meios sa
biamente excogitados, para se obter o fim intentado.
Differe da sabedoria, por que a primeira pre-
para e esta executa, donde se vê claramnete, que
uma pode estar ao mesmo tempo sem a outra.
Serg
e
. 23 de fevereiro de 1849
Antonio Roez. da Fraga
158
158
-
Prova de concurso do candidato Antonio Rodrigues da Fraga em 23 de fevereiro de 1849
. APES.
Correspondência recebida. Fundo G
1
1885.
146
Transcrição
1234567890,4587
34,20
______________________________
246913578091440
864197523921090
37037036713762
_______________________________
45925925925525063640
159
A prova de Antonio Rodrigues da Fraga como podemos observar apresentou erro na
parte de aritmética. Na verdade o produto da conta deveria ser 452222221853,516540 e
não o resultado que foi apresentado pelo candidato. Mas mesmo assim houve aprovação
do candidato para a cadeira de primeiras letras como consta no documento anexado à
prova.
Attestamos, que examinando Antonio Rodrigues da Fraga nas materias analogas à
Escola de primeiras letras, o achamos com alguma sufficiencia p
r
. se habilitar a Escola
do P
e
. José Antonio Corr
a
.
Serg
e
. 23 de Janr°. de 1849.
Antonio Rois das Cotias
159
-
Prova de concurso do candidato Antonio Rodrigues da Fraga em 23 de fevereiro de 1849
. APES.
Correspondência recebida. Fundo G
1
1885.
147
Antonio Roiz. de Szª. Br
am
.
160
Os dados presentes na prova e no atestado de aprovação de Antonio Rodrigues da
Fraga acabaram por nos revelar que o candidato fez sua habilitação na escola de primeiras
letras do padre José Antonio Correia. Provavelmente alguma noção sobre o método de
ensino o candidato sabia. Mesmo não sendo julgado na parte pedagógica, o candidato
conseguiu aprovação com a nota de “alguma suficiência” dada pelos dois examinadores.
Sobre a parte pedagógica teórica e prática do método de ensino, Vilela afirma que
ficava em segundo plano nos concursos para o magistério. O que interessava e estava
colocado em primeiro lugar para a classe dirigente era a questão da boa morigeração.
161
Havia assim ênfase no aspecto moral na formação do professor com objetivo de submissão
ideológica ao Império como ficou demonstrado através dos testos escritos pelos candidatos
ao magistério sergipano.
Os textos ditados nos exames orais dos candidatos começaram a sofrer mudanças a
partir da década de cinqüenta. Por força do novo currículo adotado que contemplava
noções de história, os examinadores passaram a ditar textos sobre história geral e do
Brasil, principalmente nos exames dos professores do sexo masculino. Nos do sexo
feminino notamos ditados com teor de boa conduta como regras para ler, jargões sobre a
Constituição imperial, alfabeto e números.
No exame de Sevolo Rodrigues de São José e Antonio Procópio Torres, concorrentes
a cadeira de ensino primário da Freguesia de Pacatuba em 1853, o ditado ocorreu com
texto de história geral e sobre o alfabeto. Não consta exame da parte de aritmética.
Os examinadores que avaliaram esses candidatos foram o padre José Gonçalves
Barroso, José Antônio Correia e Tito Augusto de Andrade. O candidato vencedor foi
Sevolo Rodrigues de São José que obteve duas notas de “suficientes”. O ditado dos
candidatos possuíam o mesmo teor, como pode ser visto a seguir.
160
-
Atestado de aprovação do candidato Antonio Rodrigues da Fraga em 23 de janeiro de 1849
. APES.
Correspondência recebida. Fundo G
1
1885.
161
- VILELA, Heloisa de O. S. O mestre – escola e a professora. Op Cit. p. 107.
148
Transcrição
Um dos Cezares tentou debalde augmen
tar de tres letras o alfabeto Romano; o poder
Imperial não pode dar vida; Como poderia
o homem inventar o genio d’euma lingua, or
ganisar o mecanismo d’ella em suas regras
concordancias, e excepções nomerosas.
162
No exame de Manuel Rodrigues D’Avila candidato à cadeira do sexo masculino da
vila de Capela, o texto versou sobre a História Geral, narrando os feitos dos portugueses
na conquista de novas terras e sobre literatura também portuguesa. O candidato recebeu
aprovação no concurso.
162
-
Prova do Candidato Sevolo Rodrigues de São José em 7 de novembro de 1853
. APES. Correspondência
Recebida. Fundo G
1
974.
149
Texto sobre História Portuguesa
Transcrição
Recebêo elrei D. Manoel com alegria a n[o]
ticia que lhe trouxe Lemos, vendo d’ahi endi
ante estender-se o seu dominio, não sómente
nas tres antigas partes do mundo; mas ainda
na quarta de nova descoberta: os prosperos suc
cessos de Cabral n’a India corroborarão, p
r
. ou
tro lado, todas as suas esperanças; dos Portu
gueses bastavão apparecer, para darem Leis; a
os mesmos soberanos de quem elles soliciatarão
aliança, não conseguirão mais [ilegível]
não reconhecendo-se vaçalo da Corte
de Lisbôa.
163
163
-
Prova do Candidato Manuel Rodrigues D’Ávila em 27 de agosto de 1863
. APES. Correspondência
Recebida. Fundo E
1
395.
150
Texto sobre Literatura Portuguesa
Transcrição
Estava linda Ignes posta ensocego
De teus annos, colhendo doce fruito,
N’aquelle engano da[?] ledo, e sego
Que a fortuna não deixa durar muito,
Nos saudosos campos do Mondêgo,
De teus formosos olhos nunca inchutos,
Aos montes ensinando e as ervinhas
O nome que no peito escripto tinha
Aracajú 14 de Septembro de 1864
Manoel Rodrigues d’Avila
164
164
-
Prova do Candidato Manuel Rodrigues D’Ávila em 27 de agosto de 1863
. APES. Correspondência
Recebida. Fundo E
1
395.
151
No exame da candidata Ana Maria de São José, realizado no ano de 1864, os
examinadores não ditaram textos referentes à História Geral ou do Brasil, mas o teor de
suas provas consta de lições de boas maneiras, escrita do alfabeto e de números como se
pode verificar abaixo;
Texto sobre boas maneiras
Transcrição
QUANDO ACABARDES
de ler um livro, comvém sempre fechá-lo com cuidado. Algu
mas pessoas costumam voltar o livro e colloca-lo aberto sobre
uma mesa, ou cadeira; o que abre demasiado o livro e frequen
temente emporcalha as paginas.
N 1234567890$
Anna Maria de S. Jose Paes
165
165
-
Prova da Candidata Ana Maria de S. José Paes em 24 de julho de 1864
. APES. Correspondência
Recebida. Fundo E
1
395.
152
Texto sobre o Alfabeto
166
166
-
Prova da Candidata Ana Maria de S. José Paes em 24 de julho de 1864
. APES. Correspondência
Recebida. Fundo E
1
395.
153
Os textos utilizados nos exames das candidatas diferenciavam-se no teor dos exames
dos candidatos. Assim como os professores estavam inseridos no projeto de construção da
nação, as professoras assumiam também função de relevância porque passariam a instruir
como a ideologia imperial as meninas que depois seriam as futuras mães de família. Foi
uma das formas que os dirigentes provinciais encontram para penetrar no espaço familiar
sergipano.
O concurso para o magistério público de primeiras letras era realizado depois que o
(a) candidato (a) apresentasse atestados de boa conduta moral e civil. Essa questão de se
exigir a morigeração continuou por todo período contemplado neste trabalho. Ligado a
essa exigência e por força da lei do Regulamento de 1858, os candidatos também deveriam
apresentar provas de capacidade profissional antes de serem examinados. Esse mecanismo
adotado em Sergipe estava justificado na criação do cargo de aluno-mestre e de professor
adjunto na década de cinqüenta. Assim, a capacidade profissional era provada por:
[Art. 85.]
§ 1. Pela apresentação de titulo devidamente reconhecido, pelo qual mostre o
candidato que é graduado ao menos em - Bellas letras - por qual quer estabelecimento
publico litterario, nacional ou estrangeiro; com tal titulo terá admissão interinamente
durante um anno, e com attestação legitima de bons serviços durante esse praso, será
dispensado de mais exames.
§ 2. Por atestado do Inspetor Geral das aulas de ter o candidato exercido 3 annos sem
nota má as funções de professor adjunto. Esta atestação depende do prenechimento das
condições do artigo 67.
§ 3. Os que não estiverem em taes circunstancias se julgarão habilitados por
exame oral e escripto feito publicamente em presença do Presidente da
Província pelos examinadores que elle nomear. Serão preferidos para
examinadores professores de qualquer estabelecimento de instrucção superior,
que para o futuro sejão creados na Capital, e a taes exames assistirá sempre o
Inspetor Geral das aulas.
167
Como se pode perceber, a questão da habilitação do método de ensino estava
presente no rol da capacidade profissional do candidato. O artigo 67 citado na fonte trata
do exame de prova prática para os professores adjuntos realizado na capital da Província a
cada final de ano, na presença do inspetor geral das Aulas.
168
Desse modo, O candidato
167
- Regulamento da Instrução Pública. Doc. Cit. p. 20.
168
- Idem. p. 20.
154
que tivesse atuado como aluno mestre ao optar pela carreira de professor de primeiras
letras realizava a prova prática com o objetivo de mostrar a capacidade de instruir nas
matérias de ensino determinadas.
Assim, embora a conformação da profissão docente tenha recaído no aspecto da
formação moral havia também preocupação em se apurar o aprendizado prático do método
de ensino simultâneo adotado nesse período.
A documentação sobre a prova ptica que os professores adjuntos faziam não
aparece no rol dos documentos apresentado à Diretoria de Instrução Pública. Constam
apenas os documentos que comprovassem a conduta moral do indivíduo, atestado de boa
condição de saúde, além dos exames oral e escrito, como podemos exemplificar com a
situação do candidato João Batista de Meneses.
O candidato João Batista de Meneses apresentou em 1864 requerimento à Diretoria
Geral das Aulas dando informação sobre seu julgamento na parte prática e que por isso
solicitava seu nome nos rol dos candidatos concorrentes à vaga da cadeira de Pacatuba. Na
documentação que apresentou consta do atestado de conduta moral como provas do
cartório, da delegacia de polícia e de saúde, como podem ser comprovados a seguir.
155
Atestado da Delegacia de Polícia
Transcrição
Attesto que o supplicante
Tem excelente conducta ci
vil e moral. Delegacia em
Propriá 30 de Março 1864
O Delegado
José Mattins da Graça Leite
169
169
-
Atestado de polícia do candidato João Batista de Meneses em 30 de março de1864
. APES. Fundo E
1
395.
156
Atestado de boa Saúde
Transcrição
Eu abaixo firmado. Doutor em Medicina pela Fa
culdade Medico-Cirurgica da Bahia, e Cavalheiro da Or-
dem da Rosa
Certifico que o S
or
. João Baptista de Meneses não soffre
molestia nem uma, quer contagiosa quer não-contagiosa.
Passei-lhe este certificado in fide gradêis mei para que
conste onde convir. Aracaju, 18 de agosto de 1864.
Thomaz Diogo Leopoldo.
170
170
-
Atestado de saúde do candidato João Batista de Meneses em 6 de abril de 1864
. APES. Fundo E
1
395.
157
Atestado de Cartório
Transcrição
Nada de culpas do sup
plicante, pelo meo car-
torio, e doque dou fé. Vil
la de Propriá 6 d’Abril
1864. o Escr
am
Manoel Joaquim Rangel
Nada consta do Supp
e
. em meos
rois de culpados, doque dou fé.
Propriá 6 de Abril de 1864.
O Escrivam
Bento Rodrigues de Amorim
171
171
-
Atestado de cartório do candidato João Batista de Meneses em 1864
. APES. Fundo E
1
395.
158
Pelas provas que os candidatos eram obrigados a apresentar à comissão examinadora
concursos públicos para professor de primeiras acabava se tornando um processo. Além do
julgamento da capacidade profissional, o candidato ainda teria que apresentar outras
provas que atestassem boa morigeração e o grau de saúde. Documentos como esses
apareciam com freqüência nos processos dos concursos de vários professores. Essas
exigências acabam por revelar a representação do professor como uma figura importante,
como uma ferramenta essencial no processo de construção da nação.
Vilela afirma que com a Reforma Couto Ferraz empreendida na década de cinqüenta,
os dirigentes valorizavam mais os concursos públicos que a formação anterior do
professor deixando a cargo dos inspetores o trabalho pela vigilância e controle.
172
Assim,
muito antes do concurso, o candidato pelas provas que apresentava estava pré -
selecionado.
Quando o candidato exercia a profissão ou possuía uma formação intelectual e era
considerado como um bom cidadão com conduta moral exemplar era dispensado dos
exames. Foi o que ocorreu com o padre João Ponciano dos Santos que conseguiu do
presidente da Província em 1862 a licença e em seguida a cadeira de primeiras letras de
Aracaju por exercer a condição do sacerdócio.
173
Caso similar ocorreu com Josias Maurício Cardoso que, pretendendo abrir uma
escola de primeiras letras, solicitou ao inspetor geral das Aulas dispensa de provas de
capacidade profissional. Para conseguir sua dispensa, o solicitante apresentou provas
constando que exercia a profissão de professor primário na Praça da Matriz, em
Estância desde 1850, segundo o diretor do colégio dessa localidade Marcelo José de S. Fé.
Além disso, consta também um atestado do padre José Luiz de Azevedo afirmando que o
professor exercia com “muito bem o magistério”, segundo suas observações.
174
A experiência profissional apresentada pelo solicitante e a atestada por pessoas
consideradas de confiança proba como foi o caso do padre e do diretor do colégio onde
Josias Maurício Cardoso ensinou, garantiu-lhe licença para abrir a escola. O que também
172
- VILELA, Heloisa de O. S. O mestre – escola e a professora. Op Cit. p. 126.
173
-
Licença do padre João Ponciano dos Santos em 9 de junho de 1862
. APES. Fundo E
1
395.
174
-
Processo do professor Josias Maurício Cardoso em 9 de janeiro de 1862
. APES. Fundo E
1
395.
159
levou o professor a ganhar o título e licença para ensinar foi o comprometimento em
seguir o programa de ensino adotado para as escolas públicas da Província.
Essas práticas desenvolvidas pelos dirigentes provinciais para conformar a profissão
docente de primeiras letras sergipanos apresentadas linhas acima sobre os concursos
públicos, evidenciam a função atribuída à escola como agência responsável pela
construção do país. A questão que se colocava era não subverter a ordem estabelecida,
mas contribuir para a manutenção do que estava estabelecido.
3- As Visitas
Não foi a prática da legislação e dos concursos públicos que o Estado imperial
criou para conformar a profissão docente de primeiras letras. Ligado a essas práticas foi
desenvolvido desde a década de trinta o mecanismo de visitas às escolas de primeiras
letras. No início, essas visitas eram realizadas uma vez durante o ano e era de
responsabilidade da mara de vereadores. Mas a partir da década de cinqüenta, com a
estruturação da Diretoria de Instrução Pública, passou a ser realizada semestralmente.
A função das visitas era informar a situação material das escolas de primeiras letras,
mas a ênfase recaía no desempenho do professor. Na verdade a intenção dos dirigentes
provinciais era vigiar e controlar as ações dos professores. Assim, os visitadores
passavam a ser os “olhos e ouvidos” do Estado. Pelo fato de a profissão docente ser
considerada vitalícia, a função da vigilância atendia aos objetivos de controle e de
disciplina desse agente do ensino de primeiras letras.
Segundo Foucaut, o poder disciplinar é um poder que em vez de se apropriar e de
retirar tem como função adestrar para se apropriar mais e melhor.
175
O sucesso desse
poder se deve ao uso de instrumentos simples como o olhar hierarquizado, a sanção
normalizadora. Isso porque a intenção da disciplina é tornar os indivíduos úteis.
A hierarquização do poder disciplinador se processava na forma em que os
professores de primeiras letras eram vigiados por um corpo de funcionários designado
para isso. Ao mesmo tempo os professores também faziam parte desse sistema ao
controlar e vigiar os alunos, determinando normas de condutas. Dessa forma, tanto os
professores como os alunos estavam submetidos a normas de sanção instituídas.
175
- FOUCAUT, Michel.
Vigiar e punir
: nascimento nas prisões. 29ª ed. Petrópolis: Vozes, 2004. p. 143.
160
Seguindo as reflexões de Foucault podemos perceber que a classe dirigente
provincial sergipana ao criar o sistema de visitas tinha como objetivo adestrar os
professores primários para melhor aproveitá-los no projeto de construção da Nação
brasileira. Como ainda existiam práticas de ensino herdadas do culo anterior como o
ensino da gramática latina, e também diferenciadas, a vigilância cumpria a função de
corrigir, retirar e impor outras que atendessem aos propósitos do Império.
Muitas das escolas de primeiras letras funcionavam nas casas dos professores que
por sua vez estavam longe dos administradores. Nesse espaço, o domínio era dado ao
professor que estava em seu ambiente privado. Dessa forma, as visitas cumpriam a função
de vigiar a profissão com o intuito de retirar práticas culturais particulares e conformar e
uniformizar a profissão docente.
Com o mecanismo de visitas às aulas, o Império também procurava solucionar os
problemas existentes no funcionamento das escolas e das práticas dos professores,
controlando-os e vigiando-os. A ptica da visita revelava o que era ensinado, como era
ensinado e qual o estado físico da escola; avaliava o desempenho do professor e dos
alunos.
Através da documentação sobre as visitas realizadas pelos encarregados para tal fim
podemos perceber como se dava o processo de ensino e aprendizagem na escola
sergipanas do século XIX. Embora seja um olhar da classe dirigente sobre os agentes do
ensino as fontes revelam dados que ajudam a entender a mecânica de funcionamento da
profissão docente na Província sergipana.
Como se disse, desde o início da década de trinta os dirigentes procuravam conhecer
a situação das escolas sergipanas como se pode mostrar através da visita realizada nas
escolas de primeiras letras empreendida pelo visitador nomeado, Braz Diniz de Vilas-Boas
em 1831 na vila de Santo Amaro. Essa vila além de compreender sua sede contava
também com algumas povoações que faziam parte do termo da região. Faremos citação
das localidades presentes no relatório com intuito de mostrar as várias realidades do
período.
O relatório começa dando conta das escolas da vila e depois relata a realidade das
escolas públicas e particulares das povoações. Por esse documento podemos fazer
inferências das habilitações e das práticas dos professores, tanto de Santo Amaro como das
povoações, como se pode verificar a seguir.
161
1° - Ha n’esta Villa huma cadeira de 1
as
. Letras, instituida para instrucção de meninos,
regida actualm
e
. pelo Professor Jose Lopes de Moura, aberta em 22 de 8br°. de 1825.
Achei em sua aula 54 alunnos, bem que me deu em lista o numero de 56 entre assiduo
e não assiduo, inclusos nesse numero os que tem sahido em differenrtes graos de
adiantam
to
. Seus actuais discipulos, sem uso de lettra redonda, pouco adiantamentos,
são naturalm
e
. propensos a escrever bem.
176
Pelo que diz o documento do visitador, na cadeira da sede da vila de Santo Amaro o
professor estava instruindo seis anos e não para se saber com certeza quais as
matérias que os alunos aprendiam. O que ficou evidenciado no relatório foi o aprendizado
da escrita sem uso de letras redondas, indicando assim falhas na habilitação do professor.
Situação diferente era a da cadeira da povoação do Rosário do Catete regida pelo
professor José Gonçalves de Souza. Segundo o visitador, nessa escola, o professor
continuava com práticas herdadas do período anterior.
2°- Ha na povoação de N. S. do Rosario do Catete huma Cadeira de 1
as
. Letras, creada
p
a
. a educcação de meninos, ora regida pelo seu professor Jose Gl
z
. de Sousa, aberta
em 27 de Março de 1829. Achei em sua aula 40 e tantos alunnos, bem que me
appresenta em lista o numero de 42 entre assiduos, e não assiduos, incluido nesse
numero de 39, que sahirão promptos, ou menos promptos, a aprender Latim ou
officios mechanicos. [ ] os discipulos, dirigidos por hum Mestre conhecedor da
grammatica Latina, estão soffrivelm
e
. adiantados em ler, contar, e Doutrina Christã,
ainda que não escrevem muito bem.
177
De acordo com o relatório, tem-se que o professor da cadeira da povoação de Nossa
Senhora do Rosário do Catete ensinava a Gramática Latina a seus alunos. O currículo
dessa escola estava restrito as noções de leitura, escrita, aritmética e doutrina cristã, mas
apenas sofrivelmente, não constava o ensino das noções práticas de geometria,
determinada pela lei de 1827.
Acompanhando o documento verifica-se que nessa povoação também existia uma
cadeira de primeiras letras particular, instituída no mesmo período que a pública. No
entanto, a situação da primeira escola apresentava bom resultado que a segunda, como
informou o visitador. O problema que existia era o pouco zelo e desleixo do professor da
176
-
Termo de visitas em 12 de março de 1831
. APES. Fundo G
1
672.
177
- Idem.
162
escola particular. Isso significa afirmar que também a escola particular ensinava
Gramática Latina, não havendo o ensino de Geometria.
Na cadeira pública da Povoação de Nossa Senhora da Purificação da Capela a
situação da instrução blica não era nada boa, era alarmante, segundo o visitador. Essa
escola, que fora criada em 1825, com um quadro de 24 alunos, seis anos após 13 deles
tinham saído prontos e os demais ainda não sabiam nada, como se pode verificar no
relatório do visitador.
3°- Ha na povoação de N. S. da Purificação da Capella duas cadeiras de 1
as
. Lettras,
huma publica, e outra particular. Na publica aberta em 16 de fevereiro de 1825, e
provecta ao Professor Rosino Jose Diogo Cardoso, achão-se 24 alunos, bem que
apparecerão 13, tendo sahido 19, e alguns destes a freqüentar outra eschola ; e nada de
arithmetica, estando o publico summam
e
. desgostoso deste Professor. Na particular,
aberta em de fevereiro de 1825, achão-se 24 alunnos, tendo sahido 19; pouco mais
sabem que doutrina Christã, Todavia tem mais preparos comparativam
e
., que na
publica.
178
Na visita à povoação de Nossa Senhora da Purificação da Capela, o visitador, ao
fazer comparações entre a cadeira pública e a particular, nos mostrou uma realidade que
pode nos indicar que os professores ou pouco sabiam para ensinar ou suas escolas
passavam por dificuldades e, conseqüentemente o ensino estava atrasado demais para o
tempo em que as escolas foram criadas. Se na pública os alunos não sabiam noções de
aritmética, na particular sabiam pouca doutrina cristã.
Em outra localidade, na povoação de Divina Pastora, pertencente também ao termo
da vila de Santo Amaro, a situação da cadeira era diferente porque a pouca habilitação que
o professor possuía em Língua Latina não interferia tanto no processo de ensino. Muito
pelo contrário, o visitador apresentou falhas na freqüência escolar e no abandono da
cadeira pelo titular.
4°- Ha na Povoação da Divina Pastora huma Aula Publica de 1
as
. Lettras, aberta em 23
de março de 1829. Seu Professor Antonio Joaquim Pitanga, soffrivelm
e
. instruindo na
Lingua Latina, e de mt°. boa moral , he exatissimo em suas obrigações; appresentou-
me o numero de 50 e tantos alunos, bem que da lista com o de 78 entre frequentes , e
infrequentes . Achei – os adiantados em principios de arithmetica, ler, Doutrina
Christã, e alguns tanto em escrever. Mas consta que o mencionado Professor, para
ordenar largou a aula deixando substituto.
179
178
-
Termo de visitas em 12 de março 1831
. APES. Fundo G
1
672.
179
- Idem.
163
Na ultima povoação visitada, a de Bom Jesus, o visitador mesmo reconhecendo a
pouca habilitação do professor da cadeira reconhece o comprometimento que o docente
possuía para com seus alunos. Também nessa escola não constavam as noções de
geometria como a lei determinava.
5°- Ha finalm
e
. em a Povoação do Bom Jesus Aula publica de 1
as
. Letras, aberta em
de abril de 1829, cujo Professor Manoel Francisco Lino, ainda que sem grandes
conhecim
tos
., toda via he o mais zeloso, assiduo, e vigilante de todos no cumprimento
dos seus deveres, e da milhor conducta moral, seus discipulos estão grandem
e
.
adiantados em Arithmetica, ler, escreve, e doutrina Christã. Approveito-me em lista o
numero de 44 alunnos, o que he admiravel em tão pequena Povoação.
180
Pelo que se pode observar a partir do relatório confeccionado pelo visitador da Vila
de Santo Amaro, os professores de primeiras letras sergipanos ainda vivenciavam práticas
de ensino comuns no período colonial brasileiro. Em suas escolas não eram ensinadas
noções de geometria e o ensino de Gramática Latina ainda era uma realidade muito
presente.
O que chamou atenção nesse documento foi o fato de que em quase todas as cadeiras
o ensino da doutrina crisse apresentava com bom desempenho. Essa questão pode nos
mostrar o elo de união que havia entre o Império brasileiro e a religião Católica. E também
a necessidade de passar as noções morais através do ensino dessa matéria. Pelo ensino da
doutrina cristã o coração e a mente da criança seriam moldados. Dessa forma, a escola de
primeiras letras não instruiria, como também educaria a população escolarizável
sergipana.
Outra questão que se pode perceber é a falta de ênfase no ensino da Gramática
Nacional, como ficou constatado no relatório. Para um país e uma Província que se
tornaram independentes, o ensino da Gramática Portuguesa seria ferramenta essencial para
a construção da Nação, constituindo o cimento que uniria as quatro regiões do país,
garantindo assim a unidade social.
A continuidade dessas práticas herdadas do período anterior preocupou o visitador.
Na conclusão que fez sobre a situação das práticas dos docentes de primeiras letras ficou
180
-
Termo de visitas em 12 de março de 1831
. APES. Fundo G
1
672.
164
evidente que a realidade da Província sergipana era outra e exigia novas competências dos
docentes. O que se exigia daí por diante era uma nova habilitação como determinava a lei
de 1827. A citação da conclusão do visitador se faz necessário por ser bastante elucidativa
dessa questão.
Apezar do que deixo dito, em obsequio da verdade, e a prol da prosperidade da
minha Portaria a que não devo ser indifferente, sou forçado a significar a VV.
SS., que nenhum dos Professores de 1
as
. Letras da villa, e Termo de S. Amaro
satisfez o [me] rito e letra da Lei de 15 de Outubro de 1827 Art por que
ninhum ha, que na conformidade da citada Lei ensina practica de [quebrada]
[ilegível] decimaes, proporções, noções geraes de geometria practica,
grammatica da lingua Nacional etc; e pareceme hum enorme peculato, que
estando habilitados na forma das Leis anteriores às de 15 de outubro de 1827,
contra o disposto na de 14 de junho de 1830 Artig. estejão na fruição de
augmento do Ordenado, permittido aos que se habilitarão, ou se hebilitaram
segundo a supracitada Lei: o que he digno da attenção de VV. SS., para o
fazerem prezente ao Exmo. Senr°. Presidente desta Provincia. Deos Guarde a
VV. SS. Muitos annos. Villa de Sancto Amaro das Brotas 12 de Março de
1831.
Braz Diniz de Villas-Boas
Visitador nomeado
181
Seguindo a linha conclusiva do visitador Braz Diniz de Vilas-Boas, a situação da
instrução pública sergipana necessitava de medidas para se adequar aos ditames da lei
geral de instrução. A nova realidade exigia um currículo no qual constasse o ensino da
Gramática Nacional e acréscimo das noções de Geometria Prática.
Na povoação da vila de Estância em 1832 a precariedade do ensino somava-se com a
realidade vivida na vila de Santo Amaro. O visitador constatou que os professores
possuíam pouca qualificação, pois segundo suas observações os alunos aprendiam
superficialmente e para provar tal afirmação enviou à Câmara de vereadores seis escritos
dos alunos para serem analisados e, consequentemente, tomadas as devidas providências.
A visita foi realizada nas escolas da povoação regidas pelos professores Heliodoro
Brantor Cardoso e José Pinheiro em 28 de março de 1832. Segundo o visitador, os
professores ainda seguiam o método antigo, ou seja, o método individual de ensino.
181
-
Termo de visitas em 12 de março de 1831
. APES. Fundo G
1
672.
165
Também informa que era a segunda vez que visitava as duas escolas. O resultado, segundo
o visitador, não foi dos melhores daí que o visitador coletou os escritos que foram
utilizados pelos professores nas aulas para enviar aos responsáveis e assim comprovar o
que encontrou em termos de desempenho dos professores e alunos.
Os escritos enviados pelo visitador chamam atenção pela riqueza em detalhes.
Mostram ainda como os professores seguiam à risca a determinação dos ditames
ideológicos do Império ao fazerem com que os alunos copiassem o que estava
determinado. Esse escrito nos faz entrar em contato com os tipos de material didático
utilizados nas aulas do século XIX.
166
Transcrição
Abcdefghiojklmnopoqrstuvxz
boa ou
Da boa ou
da má educação dos paes depende
a feliciade, ou infelicidadedos filho
s porisso ó paes, educai os vossos
filhos, segundo a Lei de Deos.
Estancia 26 de Março de 1832
ABCDEFGHIJKLMNO
PQRSTUVXZ
Faustino Jose de Porciuncula
167
Escrito n. 2
182
Provas como essas colhidas pelo visitador evidenciam como o professor era vigiado
em seu ofício. Para mostrar a prática docente o visitador se valeu dos escritos dos alunos.
A intenção era fazer valer outras práticas e melhorar a situação das escolas Na conclusão
do visitador, a solução para a melhoria das duas escolas estaria na habilitação dos
professores no método lancasteriano e a conseqüente adoção nas escolas da vila
estanciana.
183
Se o visitador estava sugerindo o método de ensino lancasteriano para essas escolas
como determinava a Lei de 1827 estava, por outro lado, admitindo pticas contrárias à
legislação. Daí que a função do visitador cumpria com os objetivos de inspecionar para
depois fazer intervenção nas práticas desempenhada pelos professores.
182
-
Visita das aulas da Vila de Estância em 28 de março de 1832
- Comissário das Aulas. APES. Fundo G
1
672.
183
- Idem.
168
Na verdade a intenção do visitador foi tentar mostrar, através dos escritos dos
alunos, como a profissão docente estava sendo vista. Ao coletar provas sobre o
desempenho docente, o visitador afirmava por outro lado a desqualificação profissional
dos professores. Não foi à toa que em seu relatório os saberes e as práticas dos professores
foram desqualificados. Daí que seria urgente a substituição por outros saberes mais úteis
ao que se esperavam da escola de primeiras letras sergipana para o momento.
A desqualificação do professor passou a sustentar o discurso, na década de trinta, de
construção de um templo que fosse capaz de melhor qualificar esse profissional: a escola
normal. Vilela afirma que a classe dirigente brasileira via esse templo de qualificação
docente como um bem comum para a sociedade.
184
Seria através do professor qualificado
que a sociedade seria instruída e, assim, regenerada.
A prática das visitas nas escolas de primeiras letras tornou-se uma rotina comum no
século XIX, evidenciando práticas e saberes. Na maioria das vezes o método de ensino
nem sequer era notado. O sucesso da escola, apresentado pelos relatórios dos visitadores
era enfatizado pelo que os alunos dominavam de escrita, leitura, aritmética e doutrina
cristã. Ao relatar sobre o domínio dos alunos, os dirigentes estavam também conferindo os
investimentos feitos na esfera da instrução como pode ser observado na visita.
As práticas das visitas também cumpriam a função de vigiar os professores no seu
ofício diário. O que mais apareceu na maioria dos relatórios diz respeito ao zelo,
assiduidade, e bom desempenho docente. Nas visitas não havia preocupação em saber se o
professor dominava a teoria e a prática do método de ensino.
Na visita que o comissário da Inspetoria Geral fez às escolas primárias da vila de
Laranjeiras em 11 de maio de 1858, a questão da qualificação e do desleixo dos
professores ficaram evidenciados.
A aula do Professor Manoel Candido da Cunha [ilegível] apresentou
30 alunnos, d’estes poucos lêm com alguma facilidade, nenhum sabe gramatica.
Indagando ao Professor a razão de semelhante falta na sua aula, disse que os pais de
seus dissipulos não querem, negando-lhes os compendios e que elle tambem os não
tinha. Parece-me bem frivola a rasão, porque se houvesse vontade, poderia o professor
ter uma grammatica, e fazer apostila pelos seus discipulos.
Alguns poucos mostrão conhecer praticamente a aritmetica; a orthographia nenhum.
Na ocasião em que visitei a aula as 4 da tarde não se occupara o professor com os seus
discipulos: sobre uma pequena mesa escrevia papel circundado de mais três individuos
que parecião mostrtar interesse pelo escripto. A aula tem apenas três bancos, disedome
184
- VILELA, Heloisa de O. S. O mestre – escola e a professora. Op Cit. p. 104.
169
o professor que requisitado mobilia, e se lhe não tem dado. Consta porem d’esta
Inspetoria, que isso não é exacto que esse professor já teve authorização para comprar
mobilia, e que se recusa de o fazer.
185
Nem sempre as visitas que eram realizadas apresentavam as mazelas da instrução
primária sergipana. Muitas vezes os visitadores apresentavam elogios aos professores pela
forma como desempenhavam o ofício docente com assiduidade, zelo e boa conduta moral
como aconteceu com a escola da professora Possidônia Maria já vista em outra parte deste
trabalho. Esses elogios eram registrados nos livros de visitas da escola.
Na verdade esses elogios acabavam se tornando ferramenta para legitimar discursos
na Assembléia Provincial sobre a profissão docente. Quando o professor desempenhava
suas funções, principalmente quanto à questão do método de ensino, os administradores
provinciais faziam destaque no relatório que apresentavam na Assembléia. Em muitos
relatórios podemos encontrar citações do desempenho de alguns professores.
Outra questão que observamos na avaliação dos termos de visitas é que as notas
dadas sobre o desempenho dos professores serviam também como parâmetro para o
aumento de salário. Assim, recebia mais quem dominasse mais conhecimentos acerca das
matérias de ensino determina
das pela legislação.
No entanto, se o desempenho do professor era notificado como parâmetro para
aumento de salário, a conduta moral se destacava nos termos de visitas. Com a
sistematização da Diretoria de Instrução Pública na década de cinqüenta, essa questão
tornou-se mais evidente como podemos observar través do termo de visita da aula do sexo
feminino da cidade de São Cristóvão em 22 de maio de 1869.
No dia vinte e dous de Maio de 1869 visitei a aula do ensino primário do sexo
femenino regida pela Senhora Francisca Xavier do Monte Carmello, e encontrei
quarenta e duas alunnas, que fiz ler, reger, e contar em minha presença, e achei-as
bastante adiantadas. Outro sim devo declarar que a Professora, que me não esperava,
estava decente, e ensinado com esmero prendas domesticas. Louvo a Senhora
Professora pelo zelo, e enteresse, que toma pelo adiantamento de suas discipulas. São
Christovão 22 de Maio de 1869. O Inspector de Distrito vigario Jozé Gonçalves
Barrozo.
Está conforme.
A Professora
Francisca Xavier do Monte Carmelo.
186
185
-
Relatório das aulas da Vila Laranjeiras em 11 de maio de 1858
. Correspondência Recebida. APES.
Fundo G
1
967.
170
Visita como a que ocorreu de surpresa na aula da professora Francisca Xavier do
Monte Carmelo na cidade de São Cristóvão era freqüente, principalmente depois da
década de cinqüenta quando foi estruturado sistema de inspeção da Instrução Pública
provincial. Essa tarefa cumpria a função de melhor vigiar para controlar e administrar.
Dessa forma, o Estado vigiando conseguia entrar no espaço interno particular da escola,
retirando práticas como o ensino da Gramática Latina e determinando outras em seu lugar,
a exemplo da Gramática Portuguesa. Tudo passava pelo crivo dos “olhos e ouvidos” da
classe dirigente provincial. Buscava-se saber sobre a conduta do professor, seu zelo para
com o ensino, o adiantamento dos alunos e a freqüência destes.
4- A Habilitação
Quando se discutiu sobre a cadeira de ensino mútuo sergipana constatamos que dois
professores de primeiras letras que se inscreveram para o concurso sergipano haviam feito
as habilitações na cidade de Pedro Velho da Bahia e que, essa cidade, fora a única
determinada pelo governador da Província baiana para funcionar como escola de
habilitação de professores para o ensino mútuo.
A situação dos candidatos da cadeira de ensino mútuo sergipana estava inserida no
contexto da Lei de 1827, que através do artigo quinto determinava a fixação de tempo
curto para os professores que quisessem ensinar pelo método de Lancaster e assim, que
fossem aprender por conta própria nas capitais das províncias à custa de seus ordenados.
Com esse dispositivo, o Estado brasileiro passava para os agentes do ensino a
responsabilidade pela habilitação.
No entanto, sobre as cadeiras de primeiras letras que não funcionavam com base no
método mútuo, a Lei de 1827 silenciou quanto à habilitação dos candidatos concorrentes a
outras cadeiras. Nada informou, de forma especificada, como se daria a habilitação do
candidato ao magistério elementar. Assim, se a primeira lei de caráter geral não
186
-
Visita da aula do sexo feminino da cidade de São Cristóvão em 22 de maio de 1869
. Correspondência
Recebida. APES. Fundo E
1
299.
171
especificou a forma da habilitação então cada candidato que cuidasse da sua e que a
fizesse em local que melhor condição lhe apresentasse.
Ao se discutir sobrte a realização dos concursos na Província sergipana,
constatamos que não havia ênfase na formação intelectual dos candidatos, mas na conduta
moral e religiosa que acabavam recebendo peso maior para a investidura no cargo. Dessa
forma, a habilitação do método de ensino não recebia ênfase. Acreditamos que a
habilitação do método de ensino não era condição para a investidura no cargo de professor
por causa da legislação que determinava como o professor deveria proceder durante a aula.
A documentação pesquisada mostra que as práticas da habilitação para o magistério
público de primeiras letras não se deu de forma homogênea, mas variada tanto em lugares
quanto nas matérias de ensino, em vários locais, na própria Província sergipana ou fora
dela, variando também no tempo.
A não ser as habilitações dos professores concorrentes da cadeira de ensino mútuo
analisada em outra parte deste trabalho, não encontramos dados claros para as décadas de
trinta e quarenta que revelassem as habilitações dos docentes em locais específicos criados
para esse fim.
A Lei de 5 de março de 1835 concedia um prazo de seis meses para que os
professores públicos fizessem suas devidas habilitações por suas próprias custas. Como se
pode ver era uma concessão de um prazo curto, o que de certa forma evidencia a
fragilidade na formação do docente de primeiras letras. Desse modo, a primeira lei sobre
educação sergipana ao não especificar como daria a habilitação docente - que a
Província a partir do Ato adicional de 1834 passou a ter liberdade para atuar no campo da
instrução primária - permitiu variações de habilitações.
Das buscas que se empreendeu encontramos fonte que evidencia o aprendizado
particular de matérias de ensino em Sergipe como foi o caso do professor João Ponciano
dos Santos morador da vila de Laranjeiras que em 1848 solicitou atestado de freqüência ao
então inspetor geral das aulas e professor particular de Gramática Latina Braz Diniz de
Vilas-Boas.
João Ponciano dos Santos morador nesta v
a
. filho legitimo de Jose Ponciano dos
Santos, a bem de seo direito precisa que lhe ateste de baixo de sua palavra de honra e
com a verdade que lhe he propria quanto sentir a respeito de frequencia, e
172
aproveitamento do supplicante no tempo em que freqüentou a sua aula particular de
Grammatica Latina.
187
Assim como João Ponciano dos Santos muitos outros candidatos e professores
fizeram suas habilitações em locais variados, pois em Sergipe, nesse momento, não existia
uma escola normal como espaço para formação de professores. Daí ser freqüente, nos
relatórios dos presidentes provinciais sergipanos, a defesa de um templo para habilitação
docente.
Muitas vezes o candidato ao magistério público de primeiras fazia sua habilitação de
forma particular. Os jornais da época estavam cheios de anúncios sobre aulas particulares
para os que pretendiam habilitar-se nas matérias exigida pela legislação. Uma das pessoas
que habilitava candidatos para o magistério público sergipano era o professor Tito
Augusto Souto de Andrade que em 1853 publicou um anúncio no Jornal Correio
Sergipense informando que habilitava candidatos pretendentes a vaga de cadeiras
primárias.
Tito Augusto Souto de Andrade, offerece em o tempo das ferias , e d’elle em diante à
ensinar Gramatica Latina, Francez, Geometria, pelo preço de 2U000 rs mensaes, à
todas as pessoas que desejarem suas explicações igualmente habilita a qualquer
pessoa que quizer oppor-se à alguma cadeira de 1ª letras em todas as materias
necessarias pelo preço de 8U000 rs mensaes e adiantados.
Sergipe 28 de novembro de 1853.
188
A nota colocada no jornal Correio Sergipense por Tito augusto Souto de Andrade
parece ter chamado atenção dos que pretendiam seguir a carreira do magistério docente.
Em 1862 encontramos um requerimento de um candidato à cadeira do sexo masculino, de
nome Martinho Alves de Mello, provando que fora habilitado pelo anunciante do Jornal
citado acima. No processo do professor consta o atestado de quem o habilitou e as
matérias de ensino que cursou.
189
187
-
Solicitação de João Ponciano dos Santos em 10 de fevereiro de 1848
. APES. Fundo E
1
395.
188
-
Correio Sergipense
. Aracaju, n.85, 03 de dez. 1853. p. 04. Grifo nosso.
189
-
Processo do Professor Martinho Alves de Mello em 17 de julho de 1862
. APES. Fundo E
1
395.
173
Attesto que tenho lecionado particularmente ao peticionario Grammatica Portuguesa, e
Arithmetica até proporções; e que tem sufficientemente aproveitado; o que atesto em
verdade. Laranjeiras 5 de julho de 1862.
Tito Augusto Souto de Andrade
190
Nas décadas de cinqüenta e na seguinte os candidatos faziam suas habilitações não
através de aulas particulares como as citadas acima, como também através das cadeiras
isoladas de ensino espalhadas pela várias localidades da Província como ocorreu com o
professor Antonio José Rodrigues das Cotias. Esse professor, além de ter estudado em um
internato da vila de Estância freqüentou também as aulas isoladas de Geometria e de
Geografia também na mesma vila como consta no atestado.
Atestto e juro, se preciso for que o supp
e
. no anno escolar de 1859, frequentou as duas
aulas que eu então regia com grande aproveitamento e conducta sempre exemplar, sem
que nunca fosse preciso fazer-lhe a minima observação sobre o respeito devido, e bem
assim que foi examinado em qualquer das materias por S. M. o Imperador, o Senhor
Dom Pedro 2°, quando visitou o Internato desta cidade ( hoje extincto) ficando o
nosso Augusto Monarca satisfeito com a sua prova; frequentou ainda este anno as duas
aulas, e supprimindo a de Geografia, continuou na de Geometria até o dia 13 do corre.
Estancia 27 de agosto de 1860.
Joaquim Mauricio Cardoso, Professor P
r
.
E. R. M.
191
A habilitação de Antonio José Rodrigues das Cotias em Geografia e Geometria, além
da avaliação do Imperador deram relevantes credenciais ao professor primário. Essa
habilitação deu ao professor competências para ser examinador de muitos candidatos à
cadeira de primeiras letras sergipana. Encontramos muitas provas de concurso público
primário no qual o exame em Geometria ficava sob a responsabilidade desse professor.
Caso como o do professor citado acima era comum em toda a década de sessenta. As
habilitações variavam de professor para professor. Muitas vezes a habilitação era feita em
cadeiras que a lei não exigia a exemplo do candidato Alexandre José Teixeira que
freqüentou as cadeira de Filosofia, Geografia e História, além das exigidas pela legislação.
Nas matérias exigidas pela legislação sergipana o candidato cursou as aulas particulares
com o professor Tito Augusto Souza de Andrade, na cidade de Laranjeiras.
192
190
-
Processo do Professor Martinho Alves de Mello em 17 de julho de 1862. Doc. Cit.
191
-
Requerimento de Antonio José Rodrigues das Cotias em 13 de agosto de 1860
. APES. Fundo E
1
395.
192
-
Requerimento de Alexandre José Teixeira em 2 de outubro de 1863
. APES. Fundo E
1
395.
174
A prática da habilitação em diferentes lugares e diferentes cadeiras de ensino
secundário mostra como a profissão docente não era uniformizada na Província sergipana.
A conseqüência disso recaia no desnível salarial. Dessa forma, quem mais habilitação
tivesse mais remuneração recebia. Caso professor só tivesse habilitação nas matérias
exigidas pela lei receberia menos que outro com habilitão em Geografia, História,
Filosofia, entre outras.
Na legislação sergipana encontramos atos do governo provincial determinando os
salários dos professores. Em 1854, o presidente da Província Inácio Joaquim Barbosa,
através da Resolução n. 395 de 17 de junho, elevou os ordenados de muitos professores
primários e de Latim de muitas vilas sergipanas.
193
O ato do presidente chamou atenção
por determinar o aumento salarial dos professores primários das cidades e vilas,
deixando de fora os professores das povoações e de lugares distantes sem aumento.
Provavelmente esses professores possuíam habilitação deficiente a ponto de não serem
contemplados pelo presidente provincial.
A habilitação dos professores de primeiras letras não ficou restrita apenas à
Província sergipana. Muitas vezes ocorria na província vizinha como foi o caso do
professor da cadeira da Capital sergipana, Aracaju, Inácio de Souza Valadão. O referido
professor solicitou à Inspetoria Geral das Aulas licença para ir estudar o curso normal na
província da Bahia em 1858. Pelo que diz o documento o professor conseguiu a
autorização da Inspetoria para se habilitar no curso normal.
194
Como se disse parágrafos acima, a documentação sobre a habilitação dos candidatos
concorrentes à cadeira de primeiras letras sergipana não apresentava atestado de
habilitação no método de ensino adotado na Província. Em nenhum documento consta o
local de aprendizagem do método. Provavelmente essa aprendizagem estava diluída nas
matérias cursadas pelos candidatos. Daí que para tentar uniformizar a prática pedagógica
os administradores provinciais aprovavam regimentos internos para as escolas de
primeiras letras. Assim, a prática pedagógica do método ficava determinada pela
legislação a exemplo do Regimento Interno das Aulas de 1856.
193
- SERGIPE. Resolução N. 395 de 17 de fevereiro de 1854. In. :
Coleção das Leis e Decretos de Sergipe
.
BPED.
194
-
Inspetoria Geral das Aulas n. 82 de 3 de setembro de 1858
. Correspondência recebida. APES.
Fundo G1 967.
175
Outro aspecto interressante sobre a habilitação do método de ensino foi a ausência de
regimentos internos das escolas de primeiras letras nas décadas de trinta e quarenta. Os
Regimentos começaram a aparecer na década de cinqüenta por força da Reforma Couto
Ferraz. A partir da adoção dos regimentos podemos perceber a concretização do processo
de uniformização da instrução primária.
Além dessas práticas de habilitação que ocorriam na Província sergipana, os
dirigentes provinciais adotaram o tipo de habilitação conhecido como holandês-prussiano.
Esse sistema, adotado na década de cinqüenta por força da Reforma Couto Ferraz, na
ausência de uma escola normal na Província, tinha como objetivo habilitar o professor
primário.
Segundo Vilela, a habilitação do professor por esse sistema dava-se pela prática do
aluno em sala de aula.
195
Assim, o aluno que melhor resultado apresentasse na aula era
escolhido como aluno-mestre que depois de certo período requeria o direito de ser
admitido como professor adjunto até que estivesse apto para reger sua própria escola.
Na Província sergipana, o Regulamento de 1858 determinava que o número de
professores adjuntos fosse de seis, mas a depender da situação poderia ser ampliado. Em
muitos documentos encontramos professores indicando alunos ao diretor da Inspetoria
Geral das Aulas para ser professor adjunto a exemplo do que fez a professora Possidônia
Maria de Santa Cruz Bragança em 1860.
Diz a Professora Possidonia Maria de St
a
. Cruz Bragança que das alunnas que [ ? ] em
sua aula igualmente habilitadas, e com vocação para o magisterio, se apresentou D.
Ermelina Escorcia do Sacramento pretendendo o grão de alunna mestra e requerendo o
exame exigido pelo Regulamento da Instrução Publica, pelo que ella Professora,
assinando a requisição de sua alunna dirigiu-se na petição ao Sen
r
. Do
r
. Insp
or
. do
Distrito Litterario apresentando lhe se digne se nomear examinadôres e marcar o dia,
hora e lugar, onde fosse feito o acto; e que fôra deferido como se do despacho
exarado na dita petição.
196
Pelo requerimento que a professora fez indicando sua aluna para ser examinada e
depois admitida como professora adjunta podemos perceber como o sistema holandês-
prussiano acabava se tornando um ritual de conformação e habilitação docente. A aluna ao
ser instruída nas matérias de ensino exigida pela legislação passava ao grau de aluna -
195
- VILELA, Heloisa de O. S. O mestre – escola e a professora. Op. Cit. p. 110.
196
-
Requerimento da professora Possidônia Maria de Santa Cruz Bragança em 26 de julho de 1860
. APES.
Fundo E
1
395.
176
mestra, sendo auxiliar da professora. Depois dessa fase passava por um exame no qual se
fosse aprovada era indicada para ser professora adjunta por um prazo de três anos. Findo
esse período, a legislação sergipana determinava a realização de um exame teórico e
prático que seria realizado na capital da sergipana.
197
Depois desse ritual o candidato
estava habilitado como professor de primeiras letras e poderia requer o direito de ser
isento do concurso público.
O Sistema de habilitação holandês-prussiano na Província sergipana admitia que
fossem alunos mestres e futuros professores adjuntos os alunos provenientes das classes
menos abastadas. Outra novidade desse sistema foi a instituição de remuneração como
forma de incentivo para os que se candidatavam a tais cargos.
Quando o professor não indicava o aluno para ser aluno-mestre, a indicação era feita
pelos visitadores das escolas que conferiam os adiantamentos dos alunos, como fez o
vigário José Gonçalves Barroso em seu parecer da visita realizada na escola do sexo
feminino da cidade de São Cristóvão em 1869.
Tendo por veses visitado a aula de primeiras letras do sexo feminino regida pela habil
Professora D. Francisca Xavier do Monte Carmello, convenci-me da necessiadae de
uma alunna mestra, que derva de auxiliar àq
la
. Professora nos trabalhos escholares; por
isso peço a V. S. que se digne de sua sabedoria providenciar de modo a satisfazer de
interesse publico.
N’aula, de que lhe fallo, existe uma alunna de nome Gracinda do Amor Divino,
bastante habilitada, que podeser nomeada aluna-mestra, se satisfatoriam
e
. responder
ao exame exigido por lei. Deus Guarde a V. S. cidade de São Christovão 9 de maio de
1869.
198
O sistema de professores adjuntos durou até o início da década de setenta do século
XIX. Por força dos Regulamentos de 1870 e outros que sucederam instituindo a escola
Normal Sergipana o sistema holandês-prussiano foi destituído na Província sergipana. No
entanto, a presença de aluno - mestre ou monitor nas escolas continuou passando a função
a não ser mais remunerada.
Aliado a outros mecanismos de habilitação docente, o sistema holandês-prussiano
cumpria a função da conformação docente. O objetivo era instruir a população sergipana
para garantir o mínino de governabilidade. Para isso seria necessário um corpo de
197
- Regulamento de 1° de setembro de 1858. doc. Cit. cap. III, Arts. 63-67. p. 16-17.
198
-
Visita do vigário José Gonçalves Barroso a escola de primeiras letras de São Cristóvão em 9 de maio
de 1869
. APES. Fundo E
1
299.
177
funcionário que instruísse a população com os rudimentos da leitura, do cálculo e da
escritura, e, sobretudo da doutrina cristã.
Para garantir uma condição de governabilidade da população os dirigentes
provinciais sergipanos criaram um corpo de leis para os professores, as condições de
investidura no cargo, um sistema de controle da profissão e mecanismos de habilitação
docente. Tudo isso por que a instrução primária passou a ser a ferramenta que auxiliaria no
projeto de construção da ordem imperial brasileira. O objetivo que se colocava no
momento era por ordem no mundo visto como de desordem. E para tanto, a instrução
primária para as classes menos favorecidas era a solução vista por esse dirigentes.
178
CAPÍTULO IV
OS MÉTODOS AS ESCOLAS SERGIPAAS
Neste capítulo é analisado como os métodos de ensino chegaram à Província
sergipana e quais os mecanismos que os dirigentes fizeram para que esta ferramenta
pedagógica fosse aplicada nas escolas de primeiras letras. Também mostra como o
simultâneo e o mútuo foram apropriados pelos professores de primeiras letras sergipanos.
Embora o método simultâneo tenha surgido no final do século XVII, na Europa, e o mútuo
no seguinte, a análise começa pelo segundo por seguir a ordem em estes apareceram e
foram apropriados na Província sergipana.
4.1 - O ESIO MÚTUO
A historiadora Maria Thétis Nunes em sua obra
História da
Educação
em Sergipe ao
analisar ensino mútuo diz que teria sido Euzébio Vanério, baiano que possuía ligações
com a vida sergipana a partir da autonomia política, o primeiro a utilizar, no Brasil, o
método lancasteriano desde 1817. Após o processo de Independência,esse professor
também ofereceu ao Imperador Pedro I a
Memória Concernente ao Ensino Mútuo
.
199
Antes, porém, no reinado de D. João VI (em 1820), Euzébio Vanério havia oferecido
a tradução do
Sistema lancasteriano acerca da educação da mocidade
, ao tempo em que
solicitava, para ele e a esposa, subsídio a fim de instruírem-se na Inglaterra ou na França
na prática do mesmo, ou ser encarregado de difundir os seus conhecimentos teóricos,
sendo para isso admitido ao Rei Serviço.
200
Nunes ainda afirma que essa solicitação endereçada a D. João VI não foi acatada,
ficando na Mesa do Desembargo do Paço para ser discutida. A resposta para essa situação
está nos acontecimentos políticos desencadeados em Portugal e a repercussão no Brasil,
199
- NUNES, Maria Thétis.
História da Educação em Sergipe
. Rio de Janeiro/Aracaju: Paz e Terra/Secretaria
de Estado da Educação de Sergipe, 1984. p. 40. Ao que tudo indica, essa
Memória
dava conta do que
era o método mútuo ou lancasteriano, quais os países que o aplicavam e os resultados obtidos.
200
- Idem. p. 40
179
determinando o retorno do Rei, o que deve ter contribuído para a paralisação do
processo.
201
As afirmações de Nunes nos levam a tirar algumas inferências. A primeira é que não
certezas quanto a real adoção do método mútuo no Brasil em 1817. A segunda refere-
se à condição de que se Euzébio Vanério não recebeu subvenção para ir junto com sua
esposa à Europa ou foi por conta própria ou traduziu o método através de algum impresso
que circulou no Brasil dessa época. Mas não se sabe se o método foi aplicado.
No entanto, Nunes também afirma que em Sergipe, em 1831 o Conselho do Governo
provincial aprovou o plano do cônego José Marcelino de Carvalho para o funcionamento
de uma casa de educação. Essa casa deveria ter pensionato e receber 10 órfãos, ensinando-
lhes as primeiras pelo método de Lancaster, Gramática Latina, Língua Francesa, Língua
Inglesa, Música e Dança.
202
O plano foi aprovado, houve até a nomeação de uma Junta
Promotora, mas não conseguiu tornar-se realidade.
Outro plano educacional foi o do Cônego Fernandes da Silveira, apresentado ao
Conselho Geral da Província em dezembro de 1833. De acordo com esse plano, seria
criada uma escola de ensino mútuo que ensinasse noções de Geometria, Meteorologia e
Agricultura, além das matérias determinadas pela Lei de 15 de outubro de 1827. Esse
projeto também não apresentou positivo. No dizer de Nunes, significou mais uma tentativa
fracassada.
203
Nunes apresenta as tentativas de implantação do ensino mútuo na província
sergipana no início da década de 30 do século XIX, no entanto, não podemos datar, com
base em sua obra, quando e onde começou a trajetória das intenções de se implantar o
método mútuo na Província sergipana antes dessa data.
Na documentação levantada no Arquivo Público Sergipano foram encontradas fontes
que retroagem a data apresentada por Nunes acerca do método mútuo para meados da
década de vinte do século XIX. A primeira intenção data de 10 de novembro 1825 com a
exposição do presidente Manuel Clemente Cavalcante em ofício ao ministro e secretário
de Negócios do Império e diz o seguinte:
201
- NUNES, Maria Thétis.
História da Educação em Sergipe
. Op. Cit. p. 40.
202
- Idem. p. 48
203
- Idem. p. 48.
180
Sendo do mêo dever dar inteiro cumprimento e Providentissima determinação Imperial
manifestada em Portaria por V. Exª. firmada em 22 de agosto ultimo, promovendo por
todos os meios a meo alcance a introdução do ensino mutuo nas Escolas Publica de 1
as
Letras desta Provincia, tenho feito escolha de hum mancebo natural desta cidade, que
a inteligencia da gramatica e lingua Latina junta huma regular conduta, para ir a Bahia
instruir-se no methodo Lancasteriano, e vir estabelecer nesta cidade a 1ª Escolla onde
possão os professores Publicos existentes na provincia habilitar-se para o pôr em
practica nas suas Escollas em beneficio da educação da mocidade, que lhe está
confiada. E como o referido mancebo não tenha os meios necessarios para os gastos da
viagem e sua subsistência na Bahia, será indispensável prestar se lhe pela Fazenda
Publica algum modico subsidio. Digne-se V. E. obter-me e este fim a preciza
authorização de sua magestade o Imperador. Deos guarde a V. Exª. Cidade de São
Cristovao de Seg
e
. 10 de novembro de 1825.
Ilm°. Exm. Estevao Ribeiro de Rezende = Manoel Calvacante d’Albuquerque.
204
A preocupação em enviar um jovem à Bahia para estudar e depois criar uma escola
em Sergipe para habilitar professores nos conhecimentos do método lancasteriano não
fazia parte só da imposição do poder imperial, mas também faziam parte das preocupações
do presidente acerca da educação da “mocidade” sergipana. No relato do presidente fica
clara a intenção em mandar um jovem às terras baianas. Na documentação aferida não
conseguimos identificação desse jovem apontado na fonte citada. O que se pode inferir é a
real intenção do administrador provincial em desenvolver um projeto educacional para
Sergipe.
O plano de educação para Sergipe foi esboçado para as autoridades imperiais no
mesmo ano em que estas indicaram a adoção do método mútuo para a Província..
205
Na
sua visão, a instrução seria capaz de trazer a civilização e transformar a sociedade,
garantindo assim, condições de governabilidade.
206
O método mútuo, através da instrução,
seria assim uma das alternativas para disciplinar a população sergipana.
É importante observar a representação que o presidente fazia da sociedade sergipana
nessa época. Para o administrador, a sociedade estava destituída de instrução, necessitando
assim escolas de primeiras letras para esse fim. Pelo fato do presidente ter estudado em
204
-
Ofício Expedido n 60 de 10 de novembro de 1825
. APES. Fundo G
1
267. p. 135-136.
205
- “Desejoso de estabelecer a ordem, acabando com as dissensões procurou alterar o quadro administrativo,
nomeando para os cargos novas figuras”. Na ótica do historiador Pires Wyne, esse presidente, recém
formado em universidade européia, foi um grande empreendedor, realizando grandes realizações em
Sergipe. In: WYNE, J.Pires.
História de Sergipe (1575-1930
). Rio de Janeiro: Pongetti, 1970. p. 155.
206
-
Ofício n.° 60 de 10 de novembro de 1825
. Doc. Cit. A preocupação maior do presidente Manuel
Cavalcante era tirar a Província sergipana do atraso, da situação caótica existente e reduzir os altos
índices de criminalidades que ocorriam na região.
181
uma universidade européia, pode-se perceber a influência movimento iluminista ao admitir
escolas públicas para instruir a sociedade.
A notícia da intenção do envio de um jovem estudante à Bahia parece ter se
espalhado na Província, pois, no ano seguinte, um professor de primeiras letras da vila de
Santa Luzia se ofereceu ao presidente Manuel Cavalcante como um dos candidatos para
tal empreitada.
Tendo as Cidades civilizadas abraçado o Methodo do Ensino Mutuo a Instrução da
mocidade, parece de rasão ser mais util nestes lugares similhante instrução, para a qual
me ofereço como hum dos Professores das primeiras letras d’esta villa. Sendo da
aprovação, e agrado de V. Exª. a quem peço me sirva de Protector, e coadjuve, não só
com a sua Sabia direção, se não tãobem com as cousas necessárias, e fornecim
to
. pª. a
dª. Aula, ao q. eu com o pequeno ordenado, e poucas não posso suprir principalmen
te
.
aos alunnos orfõas, e filhos de pais pobrissimos.
Deos Guarde a V. EXª. por muitos annos.
Villa de Santa Luzia. 24 d’Abril de 1826.
Simeão Esteves da Silva.
Professor de Primeiras Letras
207
Ao que tudo indica esse professor não foi preterido para ir estudar nas escolas da
Bahia. Não se sabe o motivo pelo qual o presidente rejeitou a solicitação do jovem
sergipano pois, a documentação existente não revela dados sobre sua presença em terras
baianas. Acreditamos que nem esse professor, nem o mancebo citado acima pelo
presidente tenham ido aprender o método. Essa afirmação está sustentada no ofício
enviado pelo representante de Sergipe ao ministro e secretário dos Negócios do Império
em 1828, determinado pela Lei de 15 de Outubro de 1827 na qual manda criar nas cidades,
capitais e locais populosos escolas de ensino tuo. O documento só relata a obrigação de
criar a escola.
Fica esta Presidencia na intelligencia de dirigir a secretaria d’Estado dos Negocios do
Imperio a correspondencia relativa as escolas de Ensino Mutuo, mandadas crear nesta
Provincia em conseqüencia da carta de Ley de quinze de Outubro do anno proximo
passado, como foi comunicado em Aviso do secretario de Estado dos Negocios da
207
-
Ofício do professor Simeão Esteves da Silva em 24 de abril de 1826
. APES. Fundo E
1
634.
182
Guerra por V. Exª. firmado em 7 de Fevereiro deste anno. Deos Guarde a V. Exª.
Cidade de São Christovão de Sergipe de El Rey 20 de abril de 1828.
208
A inferência que se pode tirar dessa fonte é a imposição por parte do Poder Central
em criar a escola de ensino mútuo, levando a crer que não havia interesse dos
administradores sergipanos em criar tal escola. No entanto, as intenções presentes nas
declarações do presidente Manuel Cavalcante em 1825 reforçam a hipótese de que a
Província sergipana ainda não apresentava as condições necessárias para instituir a escola.
Havia a intenção, mas o administrador sergipano repassava essa responsabilidade para o
poder central.
[F.05] A este mesmo fim muito contribuirá, que se estabeleçâo Escollas do ensino
mutuo, segundo o methodo Lencasteriano, em lugar de cadeiras de primeiras letras,
existentes, sendo dessa Corte mandado hum Professôr que venha fundar nesta cidade
Escola Normal, obrigando os professores d’aquellas cadeiras a se habilitarem nesta em
prazo consignado, a ensinar pêlo mesmo methodo, com a com[ ?] nação de que assim
não acontecer de serem demittidos do magisterio e substituidos por outros que
preenchão a indicação.
209
O documento enviado pelo presidente sergipano ao Poder Central revela as boas
intenções em administrar a Província sergipana. Ao fazer referência do que era
considerado moderno nos países europeus, como a escola normal e o método mútuo, o
presidente comungava do ideal de que a construção da nacionalidade do país dependia da
presença da escola de primeiras letras.
de se registrar que a escola normal vinha com a intenção de habilitar professores
e retirar certas práticas de ensino a exemplo do método individual. Como não havia local
que habilitasse os professores primários cada professor ensinava de acordo com sua
prática de aprendizagem. Isso colocava dificuldades para os administradores porque não
havia uniformidades de práticas pedagógicas.
A intenção em instituir uma escola de ensino mútuo em Sergipe estava clara para os
administradores provinciais desde a década de vinte. Acreditamos que essa insistência
estaria relacionada ao problema da organização da sociedade sergipana. Como o método
possuía um forte caráter disciplinador, sua adoção para Sergipe caía bem porque a massa
208
-
Ofício Expedido em 07 de abril de 1828
. APES. Fundo G
1
267. n. 08.
209
-
Ofício Expedido em 29 de março de 1825
. APES. Fundo G
1
267. p. 55.
183
populacional era considerada pela elite administrativa como desorganizada e
indisciplinada.
Três anos mais tarde, em 1828, o presidente Inácio José Vicente da Fonseca
comunicou à Secretaria de Estado dos Negócios do Império a criação da cadeira de ensino
mútuo.
210
O edital para o concurso público foi aberto no dia 17 de março. Apareceu apto
para a inscrição apenas um candidato: Antonio José Peixoto Valadares.
(...) se oppôs Antonio Jose Peixoto Valladares, e habilitando-se foi publicamente
examinado perante mim em conselho na forma dos artigos e da mesma Lei, e
não concorrendo mais oppositores algum, obteve sua approvação e foi provido na dita
cadeira Publica do Ensino Mutuo desta m
ma
. Cidade da qual toma posse dando
primeiro o juramento nas mãos do secretario deste governo haverá o ordenado annual
que interinamente em Conselho se lhe taxou de 300$ r
s
devendo sollicitar a Imperial
Confirmação na forma da Lei.(...).
211
No concurso, após ser examinado perante o presidente da Província, o candidato
imediatamente foi investido no cargo de professor da cadeira. Fato curioso é que no
cabeçalho do documento existe uma inscrição onde se pode ler com clareza o termo “sem
efeito”, levando a crer que o documento teria sido invalidado. Isso significa dizer que o
aprovado não tomou posse da dita cadeira por motivo de força maior e que esta, mesmo
criada, continuou vaga. Estas inferências estão sustentadas em outro documento de
provisão da mesma cadeira, emitido um ano depois, em 1829. Dessa vez apareceram dois
concorrentes, o mesmo da anterior e um outro, Francisco Moreira da Silva Marramaque.
Provisão da Cadeira de Ensino Mutuo desta capital a Antonio Jose Peixoto Valladares.
(...) Faço saber aos que esta Procuração virem que devendo ser de ensino Mutuo a
cadeira de primeiras Letras desta Cidade de São Christovam capital da mesma
Provincia na forma do artigo 4° da certa de Lei de 15 de Outubro de 1827, e o
havendo nella copia de provas, que do dito Ensino tenhão os conhecimentos
necessarios tendo-me requerido em conselho Francisco Moreira da Silva Marramaque,
e Antonio Jose Peixoto Valladares o serem providos na referida Cadeira, mostrando
ambos pelas certidões que apresentarão acharem-se instruidos no methodo do dito
Ensino, em que forão exercitar-se na cidade da Bahia, e não havendo nesta Provincia
para taes exames os precisos Examinadores foi provido na dita Cadeira Jose Peixoto
Valladares, por ser entre os dois candidatos o que perante mim em conselho pelos seus
Documetos, foi por mais digno julgado, por estar habelitado na forma da lei,
examinado, e approvado não no dito Methodo do Ensino Mutuo, mas igualmente
em as noções geraes de geometria Pratica por Lasaro Martins da Costa, Professor da
210
-
Ofício Expedido em 20 de abril de 1828
. APES. Fundo G
1
267.
211
-
Provisão da Cadeira de Ensino Mútuo da Capital em 1828
. Ofício recebido. APES. Fundo G
1
406.
184
cadeira Publica de 1
as
Letras da freguesia de Sam Pedro Velho da cidade da Bahia que
a rege pelo novo Methodo, e he o Instructor, e Examinador dos Professores, e mais
Pertendentes, por Portaria do governo daquella Provincia: e da mencionada Cadeira,
depois de prestar o juramento de estillo na mão do secretario deste governo, tomara
possse e com ella haverá ordenado annual, que interinamente se lhe taxou de tresentos
mil reis: Devendo logo requerer a Imperial nomeação na conformidade da Lei citada
Em do que lhe mandei passar a presente por mim assignada, e sellada com o sello das
armas Imperiais, a qual se cumprirá como nella se contem, depois de registrada no
Livro da secretaria do governo, nas da Ad’minestração da Fazenda Publica , e nos
mais a que João Rodrigues dos Santos Official da mesma Secretaria a fez na cidade de
Sam Christovao Capital da Provincia de Sergipe d’El Rey aos 13 do mês de março de
1829. Desta.
212
O documento de provisão da nova cadeira a Antonio Peixoto Valadares em 1829 traz
dados importantes. O primeiro deles é o fato de que a apropriação do ensino mútuo em
Sergipe ocorreu de forma diferenciada das demais províncias brasileiras. Nestas, o método
foi introduzido via instituição militar, através de pessoas que foram aprender em outro
país, por via impresso pedagógico como jornais e revistas que circulavam no exterior e no
Brasil ou então ficou a cargo de instituições filantrópicas européias encarregadas em
difundir o método. A explicação para essa realidade está na dependência que Sergipe
ainda possuía com a província da Bahia.
Outro dado que chama atenção é o fato de que a apropriação desse método de ensino
em Sergipe, ao contrário do que ocorreu nas outras províncias, apareceu no final da década
de vinte e não no início desta. No Rio de Janeiro, por exemplo, começou a ser aplicado nas
corporações militares em 1823.
213
Na província de Minas Gerais também começou em
1823 com o professor Peregrino que foi habilitado na França.
214
em São Paulo, Hilsdorf
diz que teve início antes da Lei de 1827 por intermédio das escolas também militares.
215
O terceiro esclarecimento que a fonte faz diz respeito à ausência de pessoas
habilitadas na Província sergipana para examinar os candidatos concorrentes. Como não
212
-
Provisão da cadeira de Ensino Mutuo da Capital em 03 de março de 1829
. Ofício Recebido. APES.
Fundo G
1
406.
213
- CARDOSO, Tereza Maria Fachada. “Abrindo um novo caminho: o ensino mútuo na escola pública do
Rio de Janeiro (1823-1840)” In.: BASTOS, Maria Helena Câmara, FARIA FILHO, Luciano Mendes
de (orgs.).
A escola elementar no século XIX
: o método monitorial/ mútuo. Passo Fundo: Ediupf,
1999. p. 119- 143.
214
- FARIA FILHO, Luciano Mendes de, ROSA, Walquíria Miranda. “O ensino mútuo em Minas Gerais
(1823-18420)”. In.: BASTOS, Maria Helena , FARIA FIHO, Luciano Mendes de.
A escola elementar
(...). Op. Cit. 177-196.
215
- HILSDORF, Maria Lúcia. “o Ensino mútuo na província de São Paulo: primeiros apontamentos”. In.:
BASTOS, Maria Helena C. , FARIA FILHO, Luciano Mendes de(orgs.
). A Escola elementar
(...). Op.
Cit. p. 197-215.
185
havia examinador competente, o mecanismo utilizado pelas autoridades examinadoras
para a aprovação do candidato vencedor foi a Lei de 15 de Outubro de 1827 e o fato de
Antonio Jose Peixoto Valladares possui noções gerais de Geometria. Pelas informações
presentes não foi julgada a parte pedagógica dos candidatos, mas os documentos
apresentados perante as autoridades, revelando por outro lado que não existiam pessoas
conhecedoras do método em Sergipe nesse período.
O quarto indício presente na fonte recai na figura do professor baiano Lásaro Muniz
da Costa, professor de primeiras letras da freguesia de São Pedro Velho da cidade da
Bahia, apresentado como instrutor e examinador de professores. Quem foi esse professor?
Como e onde aprendeu o método mútuo para instruir candidatos ao ofício do magistério
primeiras letras?
Silva, no trabalho sobre as escolas de primeiras letras no Recôncavo baiano do
século XIX, traz dados referentes ao professor Lásaro Muniz da Costa. Com base em
documentos baianos, o autor afirma que o professor possuía uma escola de ensino mútuo
no salão do hospício de Jerusalém, na freguesia de São Pedro em 1831.
216
Diz Lazaro Muniz da Costa, Professor Nacional de Primeiras Letras da Aula do
Ensino Mutuo da Freguezia de S. Pedro, que ontem recebeo hum officio da meza dos
Orfãos em que o avisa, para quanto antes evacuar a Aula, que tem no Sallão do
Hospicio de Jerusalém por ordem do governo que o que se não tem arrendado por
cauza da escola, quando parece não ser a aula esse motivo, porque ainda todos os
cubiculos estão cheios e immensos, de diversos volumes inventariados, que ainda se
não evacuarão, alem disso ainda existe o Donato com três escravos, fora 8 ou 9, que o
thesoureiro levou para os orfãos; mas como a Meza manda, que o supplicante evacue a
aula parece justo que este como leva ao conhecimento de V. Exª., para que haja de lhe
determinar para onde deve conduzir e firmar[ ] Estabelecimento, bem com
respeitosamente lembrou a V. Exª, hum dos salloens, que conforme a lei de 15 de
outubro de 1827 deve dar caza idônea para as aulas do Ensino Mutuo.
217
Pela data do documento, 1831, o professor vinha há algum tempo ensinando pelo
método de ensino mútuo na Bahia, funcionando sua escola em um espaço religioso. Mas
uma questão nos intriga: como e onde esse professor prendeu o método? Silva nos
esclarece mais uma vez que a chegada do método mútuo na Bahia ocorreu através de
contatos de estudantes baianos na Europa e através de textos impressos publicados naquele
216
- SILVA, José Carlos de Araújo.
O Recôncavo baiano e suas escolas de primeiras letras (1827-1852):
um estudo do cotidiano escolar. Bahia: UFBA, 1999.
217
- Idem. p. 64.
186
continente.
218
Bastos também afirma que a influência européia subjacente no método
apropriado provinha da França, país que estava à frente na divulgação do sistema
lancasteriano de ensino através de sociedades filantrópicas e de impressos educacionais
divulgados para esse fim.
219
Na obra de Silva, há outras referências complementares acerca do professor Lásaro
Muniz da Costa. Dessa vez, outro documento utilizado pelo autor traz informações
complementares ao ofício anterior do professor Lásaro.
Estabeleceo nesta capital o Sistema de Ensino Mutuo na aula Nacional, que regia na
Freguesia de S. Pedro Velho onde servio por 19 annos [...] Em 1828 o suplicante
recebeo uma Portaria do governo para ensinar o novo sistema, que se Quisessem
propor as cadeiras de Meninas, que se hirão crear em virtude de Lei de 15/10/1827 o
que tudo satifez o suplicante gratuitamente tanto que se estabeleo sua aula normal com
a obrigação de todos os Professores, que existião hirem frequental-a requererão a
assemblea, que tinham com o supplicante aprendido por ordem do Governo, forão
razão esta, por que o supplicante pedia a sua jubilação sem ter os 20 annos.
220
Com base na documentação apresentada, pode-se perceber como o método foi
apropriado na província de Sergipe. A partir daí ficou claro o porquê do plano de educação
do cônego sergipano apontado na obra de Nunes em 1831 não ter sido aprovado. A
primeira escola elementar de ensino mútuo havia sido criada e dispensava a criação de
uma casa de educação, como sugeriu o cônego. Desse modo, afirma-se que no final da
década de vinte do século dezenove só funcionou uma cadeira de ensino mútuo em
Sergipe e ainda na Capital, São Cristóvão, como determinava a Lei de 15 de outubro de
1827. A elite sergipana possuía intenções em espalhar o método pela Província, como
ficou claro através da documentação, mas esta responsabilidade pelas escolas era jogada
para o poder central.
O que também chamou atenção foi o fato de o ter existido em Sergipe escola de
primeiras letras do sexo feminino que funcionasse com base no método mútuo, mesmo a
Lei de 15 de Outubro de 1827 admitisse tal crião. Provavelmente as condições sociais e
econômicas da Província não permitissem tal empreitada.
A primeira cadeira de ensino mútuo sergipana regida por Antonio Peixoto Valladares
foi criada sem a indicação do lugar de funcionamento. Não conseguimos encontrar fontes
218
- SILVA, José Carlos de Araújo. Op. Cit.
219
- BASTOS, Maria Helena Câmara. Op. Cit. 121.
220
- SILVA, José Carlos de Araújo. Op. Cit. p. 75.
187
que indicassem o lugar, na capital sergipana, onde funcionou a cadeira. Apontamos como
hipótese para o local um dos dois conventos de São Cristóvão, o dos Carmelitas Calçados
e o dos Franciscanos, por vários indícios presentes na documentação sergipana. O
primeiro vem do presidente Manuel Cavalcante quando em 1825 esboçou suas intenções
educacionais para o secretário de Estado de Negócios do Império apontando os dois
conventos como locais apropriados para a instrução.
221
O convento dos Carmelitas foi o
local onde funcionou o primeiro Liceu Sergipano, mas este só foi criado em 1847,
222
antes
disso poderia ter sido ocupado com a cadeira de ensino mútuo.
O segundo indício que aponta os conventos sergipanos como locais onde funcionou a
cadeira do professor Antonio Peixoto Valladares é o fato de que para aplicação do método
era necessário local espaçoso para adequar confortavelmente um grande número de alunos
e os materiais necessários, condição adequada para os dois conventos.
A permanência de Antonio Peixoto Valladares na cadeira de primeiras letras de
ensino mútuo sergipana foi rápida. Não se sabe o motivo pelo qual o levou a abandonar
seu ofício. Tudo indica que durou apenas dois anos e poucos meses de funcionamento,
indo de 1829 a 1831. Essa afirmativa está sustentada no documento de nomeação da nova
cadeira de ensino mútuo passada para o segundo colocado do concurso: Francisco Moreira
da Silva Marramaque.
A provisão de Marramaque ocorreu em 1831 e revela um dado intrigante: que o
mesmo estava instruindo antes de ser provido na cadeira, como consta no documento.
(...) Faço saber aos que esta Provisão virem, que estando a concurso a cadeira Publica
de ensino Mutuo desta Cidade para ser provida na forma de Leio de 15 de Outubro de
1827, vaga por abandono de Antonio Jozé Peixoto Valladadres, que exercia, se
opposerão a mesma Cadeira Francisco Moreira da Silva Marramaque, que se acha
no exercicio interino della, por nomiação da respectiva Câmara com approvação do
Conselho do Governo, e igualmente Joze Joaquim de Mello, que se mostrou tão bem
habelitado, e sendo ambos publicamente examinados perante mim em Conselho na
forma dos Art
os
e da mesma Lei, e approvados este simplesmente, e aquelle
plenamente, como consta da Certidão dos examinadores por mais digno foi julgado o
dito Marramaque, e provido na mencionada Cadeira percebendo interinamente o
ordenado annual de tresentos mil r
s
que vencia o seo antecessor, da qual tomará posse
dando primeiro o juramento do estilo devendo sollicitar a legal Nomiação conforme a
citada Lei. Em firmesa do que se lhe passou a presente p
r
mim assignada, e sellada
com o sello das armas Imperiais, a qual se registará nos L
os
da Sec
ra
deste Governo e
221
-
Ofício expedido em 29 de março de1825
. APES. Fundo G
1
267. p. 56.
222
- LIMA, Aristela Aristides
. A instrução da Mocidade no Liceu Sergipense
: Um estudo das práticas e
representações sobre o ensino secundário na Província de Sergipe (1847-1855). São Cristóvão: UFS,
2005. p. 59.
188
onde mais tocar. José Guilherme Machado de Araujo a fiz na Cidade de São
Christovao Capital de Sergipe de EL Rey aos 20 de julho de 1831.
223
Essa fonte nos faz refletir sobre a questão da habilitação dos concorrentes e o
resultado do concurso. Marramaque no primeiro concurso tinha ficado em segundo lugar
por não possuir noções de geometria. Dessa vez sua nota de aprovação foi de
“plenamente”. Isso revela que não havia tanta exigência curricular. Se a escola foi
confiada a Marramaque, que não sabia noções de geometria, pode-se concluir que a
primeira escola de ensino mútuo sergipana já nasceu com limitações.
O documento de provisão do professor de primeiras letras Maramaque revelou
também mais uma pessoa com habilidades no método mútuo na Província sergipana.
Leva-nos a crer que a apropriação desse método ocorreu lentamente em Sergipe. Essa
situação é fruto do que determinava a Lei de 15 de outubro de 1827.
Artigo 5°. Para as escolas de ensino mutuo se applicarão os edifícios, que houverem
com sufficiencia nos logares dellas, arranjando-se com os utensllios necessarios a
custa da Fazenda Publica e os professores; que não tiverem a necessaria instrução
deste ensino, irão instruir-se em curto prazo e a custa de seus ordenados nas escolas
das capitais.
224
O dispositivo dessa lei nos esclarece o motivo pelo qual a criação da cadeira de
ensino mútuo demorou em Sergipe mais que nas outras províncias brasileiras. A questão
estava nos custos com a escola que incluía local, utensílio e a habilitação do professor.
Provavelmente essas necessidades onerariam os cofres provinciais.
Sobre a habilitação, a Lei dizia que esta ficaria a cargo de quem pretendesse instruir
pelo método mútuo e, ainda que fosse fazer nas capitais das províncias onde existisse
escola para tal. Como o salário do professor dependia dos conhecimentos que este possuía,
a habilitação tornava-se algo difícil. D a existência de poucos professores habilitados
nesse método em Sergipe.
Para melhorar o quadro docente, o governo provincial, na tentativa de difundir o
método em Sergipe, promulgou em 1837 uma lei com o objetivo de impulsionar os
professores para a habilitação no Rio de Janeiro. A estratégia utilizada consistiu na
223
-
Provisão da cadeira de Ensino Mutuo a Francisco Moreira da Silva Marramaque em 20 de julho de
1831
. APES. Fundo G
1
406.
224
- BRASIL.
Lei de 15 de Outubro de 1827
. p. 171-172.
189
concessão de licença aos professores primários e uma pequena subvenção ou gratificação,
como foi chamada.
Art. O governo da provincia fica autorizado a conceder licença, desde já, por dous
anos, a aqueles professores de primeiras letras que mais habilitado se mostrar, para ir
com o seu ordenado aprender o ensino mutuo na escola normal estabelecida na
provincia do Rio de Janeiro, dando-se-lhe uma gratificação de 60$ para viagem.
225
Essa lei impulsionou muitos professore para realizar suas habilitações nas matérias
determinadas em várias localidades, tanto em Sergipe como em outras províncias. A
manutenção com as despezas ficaria por conta do professor e não dos cofres provinciais. O
que o poder provincial garantia era o aumento de salário a quem mais habilitação
possuísse. Desse modo, um professor de primeiras letras com habilitação comum recebia
em média de 200 a 250 mil réis. o professor que possuíssem outras habilidades, como
noções de Geometria, recebia a quantia de 300 mil réis como se pode perceber no
documento de provisão da cadeira de ensino mútuo. Em vários documentos de provisão a
variação girava em torno dessas quantias.
Fato curioso é que na obra de Jo Pires de Almeida consta a existência de uma
cadeira de ensino mútuo na vila de Itabaiana. Segundo o autor, essa cadeira foi criada em
13 de outubro de 1831.
226
Não encontramos documentos que comprovassem a efetiva
provisão e funcionamento dessa cadeira. O mesmo autor afirma que muitas cadeiras
criadas em Sergipe não funcionaram por falta de professores. Acreditamos que o problema
não estava na questão da qualificação docente, mas também nas condições exigidas
para o funcionamento da escola, como local adequado para a aplicação do método e
materiais pedagógicos adequados para o mesmo. Aparece a cadeira de Itabaiana, mas no
documento não diz que funcionava pelo método mútuo como a da capital.
Provisão da cadeira de 1
as
Letras da de Itabaiana a Antonio Correia de Araujo
Cedro
(...) Faço saber aos que esta Provisão virem que estando a concurso as cadeiras de 1
as
letras desta Provª, na forma da carta de Lei de 15 de 8
bro
de 1827, e Portaria de 17 do
Corrente de 1828, expedido pela Secretª d’Estado dos Negocios do Imperio, se oppôs
Antonio Correia de Araujo Cedro, a cadeira de 1
as
Letras da de Itabaina desta
225
- FRANCO, Cândido. Lei de 13 de Março de 1837. Op. Cit. p. 470.
226
- ALMEIDA, José Pires de.
História da instrução Pública no Brasil (1500-1889
). São Paulo: Educ/Inep,
1989. p. 75
190
Provª., e habilitando-se foi publicam
te
. Examinado, perante mim em Conselho na
forma do artigo 7° da m
ma
Lei, e obtendo sua approvação por mais digno foi julgado e
provido na dita Cadeira de 1
as
Letras da m
ma
Villa , daqual toma posse dando
premeiro o provimento nas mãos do secretario deste governo, e haverão ordenado a
nnual que interinamnte em conselho se lhe Taxou de 250$00
r
s
. devendo requerer a
Imperial Nomiação na conformidade da Lei citada(...).
227
A criação da cadeira de primeiras letras de Itabaiana vem mais uma vez reforçar a
tese de que só existiu uma cadeira de ensino mútuo em Sergipe, funcionando na capital.
228
Acredita-se que esta tenha funcionado por muitos anos. Dois ofícios do professor
Francisco da Silva Marramaque, um solicitando materiais escolares e outro prestando
conta dos recebidos pela Secretaria da Província sergipana comprovam essa hipótese. O
primeiro ofício data de 1831 no qual se pode notar a dificuldade sofrida na manutenção da
escola.
Como sempre se está precisando de utencilios para fornecim
to
. da Aula de Ensino
Mutuo represento a V. Exª. mande Ordem ao Adm
or
da Faz
da
. pª. q. independente
cada vez que se lhe pedi refer
da
. Aula, afim de não o importem a V. Exª. cada vez
que se precisar de q
l
q
r
huma cousa. D
s
G
e
a V. Exª. Cid
e
. de Sam Christovão 8 de
julho de 1831.
229
Pelas pistas que o documento deixa, a aula de ensino mútuo necessitava de muitos
utensílios, de investimentos para o pleno funcionamento. Essa questão nos põe a contestar
a literatura educacional referente ao método mútuo na escola de primária oitocentista
quando afirma que o mesmo era defendido palas autoridades por causa de seu custo
reduzido e também por maximizar tempo utilizado. Seria impossível instruir cem,
duzentas ou trezentas crianças sem os materiais necessários parta o bom funcionamento do
método, como por exemplo, lápis, canivete, ardósias, quadros, testos impressos, papel,
móveis, etc. Tudo isso requeria gastos e custava caro aos cofres provinciais.
O fato de os alunos monitores serem os atores principais do ensino/aprendizagem,
reduzindo assim gastos com a contratação de professores, não inviabilizava investimentos.
Muitos dos materiais escolares possuíam vida curta como é o caso dos impressos, lápis,
227
-
Provisão da Cadeira de Primeiras Letras da vila de Itabaiana em 12 de março de 1829
. Documentação
recebida. APES. Fundo G1 406. p. 28-29.
228
- Não encontramos documentos que dessem conta da existência de outras cadeiras de ensino mútuo em
Sergipe.
229
-
Ofício recebido em 08 de julho de 1831
. APES. Fundo G
1
672.
191
papel, entre outros. Atentamos para essa questão com base no documento do professor da
escola de ensino mútuo Francisco Moreira da Silva Marramaque em 1833.
Recebi do Il
mo
. Sen
r
. Secretario Braz Diniz de Villas Boas huma colleção de traslllados
litografados, contendo diversas licções p
a
. O uso dos alunnos que frequentão esta aula
do ensino mutuo.
Sergipe 12 de abril de 1833.
Francisco Mr
a
. da Sª. Marramaq.
230
O recibo do professor chama justamente atenção para a necessidade de compra de
materiais escolares adequados ao bom desempenho do processo instrutivo. Tomemos por
exemplo uma aula freqüentada por duzentos alunos: a quantidade de materiais de curta
duração requereria reposição rápida.
De acordo com a Lei de 15 de outubro de 1827, a manutenção das aulas de ensino
mútuo era de responsabilidade das câmaras de vereadores. É bom lembrar que esse órgão
não possuía a obrigação de manter a aula do ponto de vista financeiro, mas de zelar pelo
bom funcionamento da Aula. Mais uma vez contestamos a literatura educacional quando
afirma ser as câmaras municipais responsáveis pela criação e manutenção da escola de
primeiras letras. Pela lei sergipana de 1835 o papel reservado às câmaras estava bem claro
e definido.
Art. 20. as aulas de ensino mutuo serão preparadas pelas respectivas camaras
municipais, as quaes darão conta das despezas ao Governo para serem pagas pela
thesouraria provincial; e alem dos utencis, que annualmente se lhe devem prestar, se
não estiverem em edificio publico, e nem se poderem collocar em algum Convento,
se dará mais professores o aluguel de uma sala propria para tal ensino, sendo
previamente examinada, e approvada pelas respectivas camaras.
231
Anteriormente afirmou-se que em Sergipe só funcionou uma escola de ensino mútuo.
No início da nossa pesquisa, com base na Lei de 15 de Outubro de 1827, quando dizia que
em cada capital ou lugar populoso da província deveria existir uma escola de ensino
mútuo, acreditou-se que em Sergipe pudessem ter existido várias cadeiras, pois de lugar
populoso existiam além da capital, São Cristóvão, sete vilas e a povoação de
230
-
Recibo do professor Francisco Moreira da Silva Marramaque em 12 de abril de 1833
. APES. Fundo E
1
644.
231
- FRANCO, Cândido. Lei de 05 de Março de 1835. Op. Cit. p. 139.
192
Laranjeiras.
232
Acreditou-se também que os dirigentes provinciais, influenciados pela
propaganda sobre a modernidade pedagógica que circulava na Europa e no Brasil,
garantiriam a criação de escolas de primeiras letras com o método mútuo. A pesquisa
mostrou outra realidade. Mostrou uma corrente discursiva em defesa do que era
considerado moderno em termos de pedagogia e uma realidade arraigada na prática de
métodos tradicionais como o individual e o misto. Como a aplicação do método de
Lancaster exigia dispêndio com a compra de materiais escolares por parte da Tesouraria
Provincial como determinou o artigo 20° da Lei sergipana de 1835, e professores
habilitados por conta própria, como determinou o artigo quinto da Lei de 15 de Outubro de
1827, essas condições foram empecilhos para a não adoção do método nas localidades
sergipanas.
Outra questão intrigante foi o fato de o método mútuo ser tão defendido pelos
administradores provinciais e ter sido somente adotado na capital da Província.
Levantamos a hipótese de que o fato de o método possuir um caráter mais disciplinador
que verdadeiramente instrutivo. Essa condição era apropriada ordenar a população. A
disciplina era vista como fundamental porque adestrava os corpos, tornando-os dóceis, no
dizer de Foucault.
233
A escola mútua pelo tipo de organização, tornava-se um aparelho de aprender
disciplinado e hierarquizado onde cada aluno, em cada nível de ensino, estava estabelecido
de maneira regular e combinada. A partir dessa estrutura tornava-se possível adestrar os
corpos. Foucault chama atenção para o fato de o poder disciplinador em vez de se
apropriar e de retirar, tem como função maior adestrar para melhor utilizar.
234
Nesse tipo
de escola, a disciplina age de forma a organizar as classes divididas com decuriõe,
espionando e controlando tudo.
Faz-se necessário observar que a cadeira de ensino mútuo sergipana não consta na
lista esboçada na obra de José Pires de Almeida sobre a instrução brasileira. Esse
historiador operou com documentos referentes a todas as províncias brasileiras. Fato
estranho porque as autoridades provinciais passavam informações acerca da instrução para
as autoridades imperiais como se pode ver através do ofício de 1833 no qual governo da
232
- As vilas eram a de Santo Amaro, Lagarto, Santa Luzia, Estância, Vila Nova do Rio São Francisco,
Itabaiana, Própria. NUNES, Maria Thetis. Op. Cit. p.34.
233
- FOUCAULT, Michel.
Vigiar e punir
: o nascimento das prisões. Petrópolis: Vozes, 1987.
234
- Idem. p. 143.
193
Província sergipana solicitou esclarecimentos a respeito da situação das aulas e dos
métodos utilizados.
Circular as Camaras
Para dar se pleno, e cabal cumprim
to
. ao que de Ordem da Regencia em Nome do
Imperador lhe Determinando a esta Presidencia pela Portaria do Ministerio do Imperio
em data de 08 de novembro pp
do
. Cumpre que V. Sª. passem sem perda de Tempo e
com a maior urgencia a informar em circunstanciadam
e
. sobre o numero e localidade
das Escolas de Primeiras, e segunda Letras desse Municipio com distinção de
Publicas, e particulares, de Meninos e Meninas, pelo methodo Lancastriano, ou
individual; qual o numero de alunos de cada huma; vantagens, e desvantagens de hum
e de outro methodo: o que se lhe incube sob a sua mais restrita responsabilidade. Deos
Guarde a V. Sª. Palacio de Sergipe em 17 de Dezembro de 1833 = Geminiano de
Morais Navarro.
235
Informações como essas cumpriam a função de tornar o trabalho dos administradores
mais organizado. Desse modo, a intenção era fiscalizar para melhor intervir, tanto na
escola de primeiras letras como nos agentes do ensino. Dentre essas preocupações estava o
problema da uniformização do curculo escolar.
Havia o intenso interesse dos administradores provinciais em uniformizar o currículo
das escolas de primeiras letras sergipanas porque ocorriam variações nas práticas
pedagógicas. Essa questão causava preocupação aos dirigentes provinciais porque sem a
uniformização do currículo e das práticas pedagógicas o projeto de unidade da Nação e,
conseqüentemente da Província, estaria inviabilizado. Como garantir essa pretensa
unidade se cada professor seguia um método de ensino, se estava existindo realidades
diferenciadas nas escolas de primeiras letras? Ora era através dessa modalidade de
instrução que os valores da Nação necessitavam ser incutidos nas crianças. Uma escola da
Capital funcionava pelo método mútuo, nas demais, em lugares menos populosos ou não,
a prática persistia no método individual, como podemos constatar na correspondência dos
vereadores da vila de Itabaiana em 1834.
Comprindo nós, como que nos he determinado por V. Exª. em officio de 17 de
Dezembro do anno findo: temos a informar, que neste Municipio seaxão o numero de
tres Escolas Publica: a de Premeiras e segundas Letras, e a de 1
as
. do Curato de Nossa
Senhora da Boa Hora do Campo Brito, e Sete particulares, em todas a extenção deste ,
235
-
Ofício Circular em 17 de dezembro de 1833
. APES. Fundo G
1
280. p. 79.
194
municipio todas de Meninos, e pelo Methodo endividual. O numero de alunnos de
cada huma dellas, consta da lista que levamos as mãos de V. Exª. bem como o lugar, e
citios onde são existentes, os proffessores das mesmas Escolas.
Deos Goarde a V. Exª. Villa de Itabaiana em Camara de 19 de fevereiro de 1834.
236
O documento emitido pela Câmara de vereadores da vila de Itabaiana chama atenção
para a realidade das escolas circunscritas na região. Uma realidade que está clara na fonte
era a existência de escola funcionando em espaços religiosos e até em sítio, provavelmente
nas casas dos professores. Outra realidade era a existência de escolas funcionando pelo
método individual. Essa situação nos leva a pensar na disparidade educacional vivida na
Província com a pluralidade de práticas pedagógicas presentes. Daí nos discursos dos
presidentes da Província estarem presentes as preocupações com a uniformização da
instrução primária.
Na década de trinta do século XIX houve intensa luta por parte dos presidentes
provinciais sergipanos para instituir um templo de formação docente e expandir o método
de ensino mútuo para as escolas de primeiras letras nos lugares mais distantes. A escola
normal foi criada pelo presidente José Eloi Pessoa através do Decreto n.15 de 20 de março
de 1838, mas não saiu do papel.
237
4.1.1- As críticas ao método
A crítica ao método mútuo começou acirrada na Assembléia Legislativa Provincial
em 1840. Nesse ano, o presidente Wenceslao de Oliveira Belo apresentou o método como
defasado para Sergipe, uma vez que os países considerados como civilizados, na época,
estavam abolindo essa forma de ensino. O problema apresentado pelo presidente recaía na
figura do professor, quase que ausente no processo de instrução.
O methodo de Lancaster, ou o ensino mutuo, adoptado no Brasil, não tem produzido o
dezejado effeito, e tem perdido a voga, que gozou na Europa: a Alemanha que nas
Sciencias e instrucção publica tem-se mostrado superior as outras Nações, nãqo adopta
actualmente methodos exclusivos, e segue o principio de que tudo depende de
Mestres, e que he portanto mister por tê-los bons.
238
236
-
Oficio da Câmara de vereadores da vila de Itabaiana em 19 de fevereiro de 1834
. APES. Fundo CM
1
19. Doc.44.
237
- NUNES, Maria Thetis. Op. Cit. p. 62.
238
-
Relatório do presidente Wenceslao de Oliveira Belo em 11 de janeiro de 1840
. IHGS.Sergipe:
Tipografia de Sergipe. p. 9-10.
195
A fala do presidente demonstra o interesse em colocar a Província na mesma trilha
pelos quais os países europeus caminhavam em termos de instrução primária. Pode-se
perceber também como as informações acerca do que ocorria no exterior eram bastante
conhecidas pela elite administrativa. O que existia de moderno na Europa era apropriado e
defendido em Sergipe. Quando o método de Lancaster passou a ser visto como solução
para o problema da nacionalidade e da formação da classe trabalhadora européia, foi logo
apropriado de forma discursiva quando passou a não apresentar bons resultados, as
autoridades competentes passaram a fazer ressalvas.
As ressalvas que se faziam ao método recaiam muito na questão da formação moral
do indivíduo. Tornava-se inadmissível, para os responsáveis pela escola primária, a
instrução sem a formação moral do indivíduo. Foi dessa forma que o presidente Antonio
Joaquim Álvares do Amaral em 1846 fez críticas ao método:
Estou que a Lei, que estabeleceo uma semelhante escola na Provincia do Rio de
Janeiro, he um modelo aproveitável, ainda que converia talvez não adoptar o methodo
do ensino mutuo puro ahi inteiramente estabelecido, e que vai sendo modificado na
Europa, como era em 1837 em alguns Cantões Suissos, segundo o que mesmo tive
occasião de observar, julgando-se então menos perfeito o dito ensino em rasão dos
alunnos aprenderem como maquinas, sem que seja facil ao Professor dar-lhes huma
educação moral, exercendo o poder paternal para lhes formar o caração.
239
A preocupação do presidente estava de acordo com o projeto de criação e
manutenção nacionalidade brasileira. Essa questão era levada muito a sério, pois como
esperar do indivíduo respeito ao Imperador, ao Estado brasileiro e à religião Católica se o
coração desse mesmo indivíduo não era trabalhado por esse tipo de escola? A escola que
funcionava com o método mútuo passou a ser vista como espaço de formação mecânica de
crianças. A unidade da Nação dependia muito dos valores escola elementar incutia.
As críticas que eram feitas ao método também não se restringiram à questão da
autoridade do professor e à formação moral do indivíduo, mas outros motivos
desencadeavam discursos contrários. Em outro relatório provincial, de 1847, as razões
para não continuar na permanência do método recaíram na questão da pouca densidade
populacional, nas casas onde funcionam as escolas, no tempo gasto com a instrução e nos
239
-
Relatório do presidente Antonio Álvares do Amaral em 11 de janeiro de 1846
. IHGS. Sergipe:
Tipografia de Provincial de Sergipe.
196
gastos financeiros. Para fazer essa crítica o presidente da província José Ferreira Souto
apropriou-se da experiência de países como a Prússia e a Holanda.
240
Na citada lei julgo que deveis fazer algumas alterações, sendo a primeira a alteração
do systema mutuo puro, que ella pertendeo estabelecer; porque está demonstrado
que semelhante methodo não pode ser admitido senão em escolas muito frequentadas,
o que exige casas espaçosas, e é incompativel com as nossas circunstancias e atrazo, e
porque suas apregoadas vantagens estão mui contestadas por valiosas autoridades, e
segundo mostrão as comparações e exames modernamente feitas por differentes
estabelecimentos de instrução na Prussia e na Holanda, sobre ser assás dispendioso e
muito demorado.
241
A fala do presidente mais uma vez reforça as críticas feitas ao método quanto à
questão de tempo e de recursos financeiros. Se na Europa esses problemas eram vistos
como agravantes para o processo de escolarização da população, em Sergipe, província de
recursos considerados parcos, as reclamações presidenciais contra tal método encontravam
justificativas sólidas. O presidente apresenta também outros fatores que endossavam suas
críticas como a questão da freqüência escolar e o espaço adequado para o bom resultado
da instrução.
É importante observar que as críticas que os responsáveis pela instrução elementar
faziam acerca do método mútuo revelam a preocupação em estabelecer escolas de
primeiras letras para a população. Pode-se notar uma forte corrente em prol desse ramo de
ensino e o papel do Estado imperial ao advogar para si o dever da garantia da instrução
pública.
A presença do todo mútuo nos relatórios presidenciais chegou até os anos
cinqüenta do século XIX. As críticas que o presidente da Província José Amâncio
Cardozo fez no relatório de 1850 mais uma vez recaíram as condições econômicas da
Província como o entrave para o sucesso do método. Também recaía na defasagem da lei
existente, a Lei de instrução de 1838.
242
(...) convem que seja alterada a vossa lei de 20
de
março de 1838 na parte que teve por
fim estabelecer o methodo de ensino mutuo puro. As autoridades de boa nota se tem
levantado a desconhecer as vantagens desse methodo, que além de demorado,
240
- Relatório do presidente José Ferreira Souto em 12 de maio de 1847. IHGS. In. :
Correio Sergipense
, ano
X , n.35. p.02.
241
- Relatório do presidente José Ferreira Souto . Doc. Cit. p. 02.
242
-
Relatório do presidente Amâncio João Pereira de Andrade em primeiro de março de 1850
. IHGS.
Sergipe: Tipografia Provincial.
197
demanda grandes despesas e não pode ser admissível nas circunstancias actuais da
provincia.
243
O discurso do presidente soma-se aos outros que fizeram críticas acirradas a respeito
do ensino mútuo em Sergipe. Foram críticas que recaíram no problema da forte carga
disciplinar que o método possuía, aos gastos que oneravam os cofres provinciais, ao tempo
que levava para escolarizar crianças, aos locais adequados e, principalmente, a questão da
formação moral do indivíduo.
Para aos administradores provinciais, cabia a escola primária instruir a população
com os rudimentos da leitura, do cálculo e da escrita. Cabia a essa agência civilizadora
incutir nas crianças respeito o Império e à religião Católica da Nação. Na verdade o que
esses dirigentes pretendiam era garantir condições de governabilidade da massa
populacional.
Ao observar que a realidade dos países considerados civilizados contrastava com a
sergipana, os administradores percebiam o antagonismo existente entre a escola primária
européia e a realidade de escola primária brasileira. Enquanto que na Europa o método
mútuo havia caído em desuso, o Brasil teimava em permanecer com práticas desse tipo.
A realidade do Brasil do século XIX estava assentada no trabalho escravo, a da
Europa na industrialização. Quando os administradores faziam comparações percebiam de
antemão a tarefa que lhes cabia no que concernia à instrução da população. E para isso o
caminho a ser seguido era imitar, trazer para o Brasil práticas educacionais européias e
abolir o que passava a ser obsoleto.
Na Europa desse período estava ocorrendo um fervilhar de teorias pedagógicas e
práticas educacionais. Havia a influência de Herbart defendendo uma cientificidade da
pedagogia e uma escola que formasse moralmente o indivíduo. Por outro lado havia
também a influência de Pestalozzi e Basedaw.
O que também estava subjacente nos discursos presidenciais era a questão da
formação moral do indivíduo. Ao fazer ressalvas quanto à funcionalidade do método
adotado, os administradores presidenciais estavam admitindo que a sociedade sergipana
necessitava ser provida de valores concernentes ao Império brasileiro. A solução para esse
problema estava na instituição escolar. Para isso, seria necessário afirmar essa instituição
como agência formadora da identidade imperial.
243
- Relatório do Presidente Amâncio Pereira de Andrade. Op. Cit. p. 10-11.
198
O fato de o método mútuo ter sido aplicado na capital sergipana e de ter estado
por duas décadas nos relatórios presidenciais, revela como a elite administrativa pensava a
sociedade e a escola. Revela como a escola de primeiras letras tornava-se mais e mais uma
necessidade social da Província.
Mergulhados na filosofia iluminista em defesa da instrução pública para a população,
os presidentes da província e seus auxiliares tomaram a responsabilidade de construir a
Nação brasileira via instituição escolar pública e laica, com adoção de métodos de ensino e
um currículo no qual constassem os rudimentos da leitura, da escrita, do cálculo e da
doutrina cristã. Essa era a necessidade social da época. Esse projeto ocorria
simultaneamente com o que era considerado pedagogicamente como moderno nos países
considerados civilizados. Depois que o método mútuo, esta novidade pedagógica caiu
tornou-se obsoleto, uma nova foi adota na Província: o método simultâneo.
4.2 - O ESIO SIMULTÂEO
A vista do que acabo de expor-vos [sobre a criação de uma escola normal sergipana],
tenho a honra de pedir-vos, que crieis huma Lei sobre Instrução primaria, que
melhorando o ensino simultâneo, conceda meios ao Governo de arremedar deste
magistério homens que pouco serviço prestão à mocidade.
244
O discurso do presidente da Província sergipana começa por criticar a situação da
instrução primária sergipana no século XIX. Fala da necessidade de se criar uma nova lei
sobre instrução que melhor organize, uniformize a escola de primeiras letras. A lei que
regia esse ramo de ensino datava de 1835 e, na ótica desse presidente, estava ultrapassada.
Ao cometer esse ato está pressuposto que o presidente descaracterizava todo trabalho
que havia sido concretizado. A lei, para o administrador, estava ultrapassada. Quanto aos
professores, passaram a ser vistos como inoperantes para os serviços da instrução
primária. Rosa constatou que quando os dirigentes mineiros desejavam instituir outros
saberes para a escola de primeiras letras desqualificavam as práticas dos agentes desse
244
- Relatório do presidente Sebastião Gaspar de Almeida Boto Doc. Cit. p. 09.
199
ramo de ensino.
245
Com esse tom de acidez, o administrador reclamava um novo tipo de
escola com novas práticas e novos saberes.
Foi demonstrado em outra parte deste capítulo que a partir de certo período houve
várias críticas tecidas pelos administradores sergipanos quanto ao método mútuo e a falta
de uniformização da instrução primária. Pelo tom das críticas deu para perceber esse ramo
do ensino não seguia uma organização e um plano. Essas denúncias acompanharam a
década de 1830 e a seguinte. Reclamava-se muito da situação do método de ensino
adotado pelo poder público e da vivência dos professores de primeiras letras.
Ao reafirmar a importância da escola para o progresso da Província os
administradores reformularam a importância dessa instituição como ferramenta para
garantiria o progresso do Império e a manutenção da ordem estabelecida, garantindo
assim, a modernidade do país, como pode ser visto no relatório do inspetor geral das aulas,
Pedro Autran da Mata Albuquerque em 1858.
A instrução primaria que prepara a todos para todas as carreiras sem levar este com
preferencia a aquelle, e que não forma artistas e nem profissionais, e sim homens uteis
a si e a sociedade, tem o seu ponto de vista na boa condução do mestre, e tudo quanto
se possa fazer para melhorar e aperfeiçoar a instrucção será esteril, se se não organizar
escolas que formem bons mestres, porque o maior defeito em que labuta a instrucção
da Provincia é o scisma entre os professores públicos não uniformizados na estrada do
ensino.
246
No início da década de 1850 começaram as defesas pelo novo método de ensino: o
simultâneo. A adoção desse método trazia junto uma nova concepção de escola. Essa
nova concepção estava galgada nas influências ilustradas que começavam a circular no
seio da intelectualidade brasileira. Em Sergipe, as idéias de reforma e modernização da
escola chegava através dos presidentes da Província e seus acólitos. Segundo Carvalho, o
sistema de rotatividade de empregos nos cargos de comando provincial contribuía para
uma circularidade de idéias e projetos.
247
Para garantir essa homogeneidade a estratégia
utilizada pelo Imperador consistia em nomear presidentes para as províncias oriundos de
245
- ROSA, Walquíria Miranda. Op. Cit. p. 89.
246
- Relatório do inspetor geral das aulas Pedro Autran da Mata Albuquerque. In.:
Relatório do presidente
João Dabney D’Avelar Brotero em 15 de abril e 1858
. IHGS. Bahia : Tipografia de A. Olavo da França
Guerra . p. 13.
247
- CARVALHO, José Murilo de.
A construção da ordem
: a elite política imperial. Brasília: UNB, 1981. p.
93.
200
outras localidades do país. Desse modo, a elite administrativa brasileira circulava com o
mesmo projeto elaborado pelo Império.
Como se viu também em outra parte deste trabalho na década de cinqüenta, o grupo
dos conservadores assumiu o poder e traçou novas formas de organizar o Império
brasileiro. Utilizando a Corte como modelo para as outras províncias o grupo Saquarema
influenciou a Província sergipana com a nova visão sobre o país. No projeto esboçado para
a Nação constava a inclusão de todas as profissões, inclusive a dos professores das escolas
de primeiras letras.
A realidade da Província necessitava de medidas administrativas urgentes. Não era
para menos, pois em 1854 havia em Sergipe um total de 54 escolas de primeiras letras,
sendo que 39 eram do sexo masculino e, cinco eram do sexo feminino.
248
Era um número
relativamente alto de escolas que requereria medidas salutares, como a instituição de
novas práticas e saberes. No discurso do presidente Inácio Joaquim Barbosa a situação da
instrução primária era caótica.
Ellas não tem utesis proprios, não tem cartas, não tem livros, não tem compendios, não
tem emfim nem ordem, nem unidade em seos methodos. Algumas tem exigido o que
chamam mobilia; mas esta mobilia posta à arbitrio de cada um Professor é de ordinario
o que pode haver de peor e de mais improprio para o ensino.
249
A situação reclamada pelo presidente tomava a escola de primeiras letras como um
todo, tanto na parte pedagógica como na parte físico-espacial. Para melhorar essa situação
a solução passou a ser visto como a adoção ensino simultâneo e uma conseqüente
uniformização da instrução primária que partia tanto de fora para dentro como do
contrário.
Foi com base nessas críticas que em 1856 os administradores provinciais aprovaram
o
Regimento Interno das Escolas
.
250
Esse documento estava dividido em quatro capítulos e
foi uma mediada que possuía caráter disciplinador para os agentes do ensino como
professores e alunos; foi também uma forma de regular o tempo escolar, a pedagogia
escolar e os materiais didáticos das aulas primárias sergipanas.
A novidade que esse documento trouxe foi a divisão dos discípulos em classe,
segundo as idades e objetos do ensino. Na verdade a divisão de alunos em classes,
248
-
Relatório do presidente Icio Joaquim Barbosa em 20 de abril de 1854
. IHGS. Sergipe: Tipografia
Provincial. p. 06.
249
- Idem. p. 04.
250
-
Regimento Interno das Escolas de 1856
. APES. Biblioteca José Alves. CX.01. DOC. s/n.
201
segundo as habilidades adquiridas, era condição tanto da escola simultânea quanto da
mútua e não por faixa de idade como determinava o novo documento. Por esse dispositivo
o método de ensino passava a ser o simultâneo, embora o documento não deixasse
expresso. Mas basta observar o documento na parte que trata dos objetos das matérias de
ensino que se pode perceber a tentativa de se implantar o novo método para todas as
escolas de primeiras letras sergipanas.
Art. 13. Os objetos destinados para a leitura serão abcedarios esyllabarios impressos, e
cartas de nomes, que serão colados à cartões, e pregoados nas paredes; e os discipulos
farão a classe de leitura collocados em semicirculos em frente do cartão, que lhes é
destinados pelo professor, conforme o seo gráo de adiantamento, sendo assiatido por
um discipulo mais adiantado para guiar na leitura.
251
O artigo acima expressa de modo claro como deveria ser organizada a classe de
leitura em uma escola primária, funcionando com o método simultâneo. O que chama
atenção nesse dispositivo é a forma como os alunos da classe de leitura deveriam ler:
reunidos em semicírculos e em pé, observando os impressos colados na parede. Todos
leriam com a ajuda de um monitor. Nas classes mais adiantadas, quando o professor
trabalhasse com manuscritos e livros impressos, o documento ordenava que os alunos
lessem em seus assentos, ou seja, em seus bancos.
252
Pela forma como era realizada o
aprendizado da leitura dá para se perceber a hierarquia que havia no interior da escola.
A classe de escrita funcionava de forma diferente da anterior, não havendo divisão
entre alunos sentados e em pé. Nesse tipo de organização dos alunos, a forma de
aprendizado dava-se de forma em que todos permaneciam sentados. Os traslados
litografados utilizados para escrever eram colocados em caixilhos envidraçados e pregados
às carteiras para que servissem a dois ou mais alunos.
253
No caso da classe de aritmética, esta funcionaria de forma parecida com a de leitura.
Uma parte dos exercícios seria feita em semicírculos, em outra haveria o acompanhamento
do professor aluno por aluno, e o terceiro modo seria realizado através de ditado com a
utilização de cadernos para esse fim.
Pelo exposto sobre as divisões de uma escola de primeiras letras dá para termos uma
idéia de como era a organização espacial desse ensino. Essa tentativa de organizar a
251
- Regimento Interno das Escolas. DOC. Cit. p. 02.
252
- Idem. Artigo 15.
253
- Idem.. Artigo 24.
202
atividade pedagógica foi a solução encontrada para uniformizar a disparidade que
ocorriam nas escolas de primeiras letras da Província sergipana.
É necessário observar que o Regimento Interno das Escolas foi um prelúdio que
disciplinou o espaço interno das escolas e a atividade pedagógica. No entanto, não havia
ainda no documento ordenação expressa do método simultâneo. Pode-se perceber
claramente que seria uma preparação de uma nova lei de instrução que estava por vir.
A determinação legal do método simultâneo ocorreu com o
Regulamento da
Instrução Pública de de setembro de 1858
, promulgado no governo do presidente João
Dabney d’Avelar Brotero. Esse novo documento possuía 151 artigos englobando a
instrução primária, secundária, inspeção das escolas, material das escolas, mobília escola,
os tempos e os espaços escolares.
A respeito do método de ensino o Regulamento de 1858 deixou claro que seria o
simultâneo por classe como estava determinado nos artigos 38 e 39.
Art. 38. O ensino será simultaaeo por classes, assegurando - se o professor de que
todas estejão convenientemente applicadas ao estudo, de que se occupão. Para a
divisão das classes e programma do ensino de cada uma, expedirá o Inspector Geral,
com previa approvação do Governo, as necessarias instrucções: ficando salvo à
qualquer professor o direito de empregar qualquer outro methodo de ensino autorisado
pelo Inspector Geral, na forma do art. 3° § 19 deste regulamento.
Art. 39. Não obstante ser o ensino simultâneo, o professor nomeará, da classe mais
adiantada, monitores para fazerem repetições nas classes inferiores, salvo quando não
tiver alunno idôneo para esse fim.
254
Por esses dois artigos o novo Regulamento da Instrução Pública trouxe duas
novidades. A primeira novidade foi a divisão da escola em classes de aprendizagem por
idade. A segunda foi a criação do cargo de alunos-mestres ou monitores financiados pelos
cofres provinciais.
A divisão dos alunos em classes vem mostrar como o conceito de infância estava
presente nesse novo conceito de escola. Ao admitir tal organização da escola, os
administradores responsáveis pela instrução estavam concebendo a criança na sua
especificidade.
255
Essa assertiva pode ser verificada no artigo doze do Regulamento de
254
- Regulamento da Instrução Pública de 1° de setembro de 1858. Doc. Cit.
255
- Ariés afirma que a classificação dos alunos em classes surgiu a partir do século XIX como necessidade
da Pedagogia Nova. Desse modo passou a existir correspondência entre idade e classe. ARIÉS,
Philippe.
História social da criança e da família
. Rio de Janeiro: LTC, 1981. p. 115.
203
1856 determinando que os discípulos fossem divididos em classes, segundo as idades e os
objetos de ensino.
256
Para esse novo tipo de organização escolar foi admitida uma nova qualificação do
trabalho docente. O que nos chama atenção é o fato de que os dirigentes provinciais, ao
adotarem o método de ensino para as escolas, criaram estratégias para qualificar o
professor. Como em Sergipe ainda não existia a escola normal à nova forma de habilitar o
quadro docente veio com a instituição do sistema de aluno-mestre. A nova experiência
tomada de empréstimo da Prússia.
257
Quanto ao currículo, o novo documento educacional trazia novidades e se apresentava
para a realidade das escolas de primeiras letras sergipanas. As escolas primárias foram
estruturadas em dois graus, de acordo com as necessidades da Província. Antes, as escolas
de primeiras letras funcionavam com um grau. A estrutura curricular desses dois graus
estava determinada da seguinte forma:
O primeiro gráo do ensino deve constar de:
Escripta
Leitura
Instrucção moral e religiosa
Elementos de grammatica
As quatros operações arithmeticas por numero inteiro e fracções
Systema de pesos e medidas
O segundo gráo que não é mais do que a continuação do primeiro deve constar dos
elementos de geographia, e especialmente a do Brasil.
Noções de historia universal, e perticularmente a do Brasil.
Elementos de geometria theorica e practica
Desenho linear
As operações arithmeticas de fracções decimais até complexos.
258
Faz-se necessário destacar que o currículo organizado para as escolas do sexo
masculino não se aplicava às escolas femininas. Nestas, o currículo compreendia leitura,
256
- Regimento Interno das Escolas de 1856. Doc. Cit.
257
- O sistema funcionava de seguinte forma: o aluno que obtivesse maior aproveitamento na escola passaria
a ser ajudante do professor e depois requereria o direito de ser professor adjunto. VILELA, Heloisa de
O. S. o mestre-escola e a professora. In .: LOPES, Eliana Marta Teixeira; FARIA FILHO, Luciano
Mendes de; VEIGA, Cynthia Greive.
500 anos de educação no Brasil.
2 ª ed. Belo horizonte: Autêntica,
2000.
258
-
Regulamento da Instrução Pública de 1858
. Artigos 29 e 31. O documento o informa o tempo de
duração de cada grau dessa estrutura curricular.
204
escrita, instrução moral e religiosa, as quatro operações aritméticas por números inteiros,
completado com os trabalhos de agulhas.
259
Observando essa disparidade curricular entre os sexos pode-se perceber claramente
que houve limitações quanto à formação do papel feminino para atuar na sociedade do
século XIX. Recebendo educação moral e religiosa, poucas noções de aritmética e
trabalhos com agulhas, o papel da mulher estava restrito ao lar familiar e à maternidade. A
menina estaria assim sendo preparada para ser uma boa dona de casa e boa mãe.
A grade curricular ou programa de ensino seria planejado pelo inspetor geral da
Instrução Pública como determinava os artigos do Regulamento de 1858. Encontramos no
livro da Compilação das Leis e Decretos de Sergipe um quadro elaborado pelos
administradores da instrução elementar para as classes das escolas de instrução primária
sergipanas, como se pode observar a seguir.
259
- Regulamento da Instrução Pública de 1858. Artigo 30.
205
Quadro 01
Distribuição das matérias de ensino e dos exercícios para cada classe
4ª classe 3ª classe 2ª classe 1ª classe
Instrução
moral e
religiosa
Doutrina
Christam
Parte historica do
cathecismo
Parte dogmatica do
cathecismo
Parte moral e
lyturgica do
catecismo
Leitura
Alfabeto
syllabarios
1° livro de leitura
2° e 3° livros de
leitura
Manuscripto
de D. Jayme
Calligraphia
Limhas retas e
curvas,
algarismos,
letras
Bastardo
Bastardinho
Cursivo
Calculo
Calculo verbal
( fromação dos
numeros,
addicção e
subtracção)
Calculo verbal
( multiplicação e
divisa), calculo,
escripto(numeração,
addicção e
subtracção)
Calculo
escripto(multiplicação
e divisão dos numeros
intiros e decimaes)
Fracções
ordinarias
Grammatica
Exercicios de
ortographia por
meio de
subtracção
Estudo das
principaes especies
de palavras,
conjugação dos
verbos auxiliares
regulares
Conjugação dos
verbos irregulares,
ortographia por tema,
analyse grammatical,
prosódia e atymologia
Grammatica
inteira,
exercicios
sobre as regras
da syntaxe,
analyse logica-
grammatical
Systema
metrico
Conhecimento
dos multiplos
das unidades
metricas
Conhecimento dos
multiplos das
unidades metricas
Estudos mais
aprofundados do
systema metrico
Syatema
metrico
completo
Fonte: FRANCO, Cândido. Aracaju: Tipografia de F. das Chagas Lima. V I, A_H. Anexo.
De acordo com o quadro, pode-se perceber que a escola funcionava dividida em
quatro classes de alunos, sendo que cada estava voltada para uma matéria de ensino. A
primeira classe começava com a classe de instrução moral e religiosa e a última, com o
sistema métrico. O que chama atenção, observando o quadro elaborado pela Inspetoria
Geral da Instrução Pública, é a forma como as classes foram organizadas: começa da
quarta e termina na primeira.
206
Do ponto de vista de uma escola do sexo feminino podemos também perceber que a
indicação curricular no que diz respeito ao ensino de aritmética estava limitada até a
segunda classe, sendo completada a estrutura com os trabalhos de agulhas.
A forma como as classes estavam organizadas nos visão clara da reorganização
que a escola sofreu a partir do conceito de infância que estava subjacente. Se a infância
possuía fases sucessivas assim também seria o programa de ensino. Cada matéria de
ensino começava na forma simples para a mais complexa.
Para que o método de ensino simultâneo funcionasse com todo sucesso requeria o
uso de material escolar e impressos pedagógicos. Isso porque existe uma relação intrínseca
entre método e material escolar. Desse modo, cada material pedagógico estava
determinado em um local, atrelado a um objeto da sala. No entanto, na relação existente
não havia determinação do segundo sobre o primeiro, a ausência de materiais implicava na
reorganização do espaço escolar. Podemos exemplificar alguns objetos escalares utilizados
no século XIX através da relação elaborada pela Inspetoria Geral e dirigida ao presidente
da Província em 1858 para uso da Aula Pública da Capital.
Relação dos objetos precisos para a aula publica da Capital regida pelo professor
Germancio de Sousa Valadão
30 Cannivetes para aparar as pennas
2 Resmas de papel para escripturação dos meninso pobres
30 Aretmetcas e
30 Ortographia
30 Grammaticas e
20 Cartilhas
6 Maços de pennas
2 Garrafas de tinta
2 Dusias de cartas de abecedarios e syllabarios
4 dusias de lapis
1 Compendio do Catecismo de Fleury
10 compendios de Simão de Nantua.
Aracaju 26 de O Professor
Fevereiro de 1858. Germancio de Sousa Valadão.
260
260
-
Ofício Recebido da Inspetoria Geral da Instrução Pública n.28 em 20 de março de 1858
. APES. Fundo
G
1
967.
207
A relação que o diretor elaborou para a escola da Capital sergipana nos informa
como havia uma relação direta entre o impresso e método de ensino. Outro indício que se
pode perceber a junção entre o ensino da escrita e o da leitura como processos
simultâneos. Ao passo que os alunos iam escrevendo também ia lendo.
261
De outra maneira, podemos perceber como o método estava sendo adotado pelos
professores das escolas de primeiras letras sergipanas, observando o que de mobiliário era
solicitado por estes. O Regulamento de 1858, no artigo sessenta e um, parágrafo terceiro,
ordenava que os professores da Instrução Primária confeccionassem relatório anual no
qual constasse o orçamento anual da escola para o ano seguinte e o estado do material da
escola; apontasse a situação do método de ensino adotado, o grau de progresso dos alunos
e freqüência.
Em 1866, a professora contratada Maria Belarmina de Meneses, da Aula Pública do
sexo feminino da vila de Campos em relatório dirigido ao inspetor do distrito literário,
revelou os móveis necessários para sua escola através do orçamento que ela mesma
elaborou. A referida escola tinha sido estabelecida no dia 15 de maio de 1860 e ainda em
1866 a professora reclamava da demora do mobiliário que era solicitado a cada ano. De
acordo com o orçamento confeccionado para 1866, sua escola necessitava dos seguintes
móveis:
Orçamento dos moveis necessarios para a Eschola do sexo feminino da Villa de
Campos e seu material para o anno de 1867
Uma cadeira com 15 palmos de comprimento e seos bancos.................22 $ 000
Seis cadeiras de palhinhas.......................................................................24 $ 000
Uma meza com pano...............................................................................14 $ 000
Uma escrivaninha de louça...................................................................... 3 $ 000
A cadeira da Professora...........................................................................15 $ 000
Uma pedra pª. Operações de Arithmetica................................................10 $ 000
Oito tinteiros de chumbo pª. A Carteira....................................................4 $ 000
Um espanador............................................................................................2 $ 000
Dous copos de vidro para beber agua........................................................2 $ 560
_____________________________
Soma 96 $ 560
261
- Galvão e Batista redefinem o conceito de livro didático para o século XIX. Segundo os autores, os
alunos aprendiam a ler e escrever não só através de livros impressos como também através de
manuscritos, extratos de leis, cartas pessoais, traslados, tabelas, etc. tudo isso pode ser considerado livro
didático. GALVÂO, Ana Maria de Oliveira; BATISTA, Antônio Augusto Gomes. Manuais escolares e
pesquisa em História. In.: FONSECA, Thaís Nívea Lima; VEIGA, Cythia Greive.
História e
Historiografia da Educação no Brasil
. Belo Horizonte: Autêntica, 2003. p.163.
208
Para o material.........................................................................................20 $ 000
______________________________
Total 116 $ 560
Aula publica do sexo feminino da villa dos Campos 14 de dezbrº. 1866
Maria Bellarmina de Men
es
.
Professora contratada
262
Através do orçamento da professora pode-se perceber claramente a limitação que o
currículo destinado para as escolas femininas sofria. A presença da pedra para operações
aritméticas na lista de solicitação leva a deduzir que a escola funcionava pelo método
simultâneo. Esse objeto pedagógico ordenava que todos os alunos sentassem de frente para
o professor a aprendessem ao mesmo tempo. Desse modo, a disposição dos bancos teria
que ficar de frente para o professor. Com essa disposição todos os alunos aprenderiam a
lição ao mesmo tempo. Isso dava uma uniformização evitando também maiores contatos
entre os alunos, pois todos estariam olhando para frente
A pedra para operações aritméticas determinava uma nova reorganização espacial da
escola. Segundo Barra, essa nova maneira de ensinar e aprender dava determinava a
maneira simultânea.
263
O olhar vertical do aluno é dirigido pelo plano horizontal da lousa individual,
enquanto que o plano vertical do quadro-negro a direção horizontal do seu olhar.
uma redefinição espacial da aula, do mobiliário escolar, especialmente dos bancos
e das bancas (mesas) dos agentes e das relações de ensino.
264
Seguindo as exigências do ensino simultâneo montou-se a planta baixa da escola da
professora Maria Belarmina a partir do documento emitido por esta, na tentativa de uma
melhor visualização do espaço físico da escola. A planta foi montada com objetivo de
mostrar as possíveis disposições dos móveis de uma escola primária do século XIX.
262
-
Ofício da professara Maria Bellarmina de Meneses em 14 de dezembro de 1866
. APES. Fundo E
1
634.
263
- BARRA, Valdeniza Maria da.
Da pedra ao
: o itinerário da lousa na escola paulista do século XIX.
São Paulo: PUC, 2001. A autora diz que no século XIX o quadro negro era chamado de
pedra
ou
tábua preta
.
264
- BARRA, Valdeniza Maria da. Op. Cit. p. 21.
209
PLANTA BAIXA 01
Escola do sexo feminino da vila de Campos
265
Fonte: confecção de Luís Siqueira e Hilton Cezar Gomes Silva
De acordo com as determinações, pode-se perceber como a disposição espacial dos
móveis determinava poder de vigilância e relação de poder na escola. Cada a partícipe da
escola estava em posição tal que, de um lado havia quem vigiava e ordenava, e do outro
quem era vigiado e obedecia.
Escolano afirma que o espo-escola não é espaço neutro, está repleto de valores, de
determinação. A arquitetura escolar para o autor, é um programa, uma espécie de discurso
que institui ordem, disciplina e vigilância, marcos para a aprendizagem sensória, motora e
265
-
Ofício da professara Maria Bellarmina de Meneses em 14 de dezembro de 1866
. APES. Fundo E
1
634.
210
toda uma simbologia que cobre diferentes mbolos estéticos, culturais e também
ideológicos.
266
Mesmo que esse espaço seja de improviso,
267
funcione na casa do professor
como muitas escolas sergipanas do século XIX, influenciava na subjetividade do aluno
com valores do império brasileiro.
O documento emitido pela professora revela também o grau de adiantamento das
alunas de sua escola. A escola estava funcionando com 19 alunas divididas em classes de
leitura, escrita e aritmética.
Grão de progresso
No decurso do corrente anno tenho empregado os precisos meios para o
adianatamento de minhas alunnas, e não obstante o meo disvelo, apenas pude obter o
adiantamento seguinte: trez dão grammatica; quatro dão arithmetica; duas principiam
a ler; sete leem carta missiva; duas leem cartas de nomes; e uma lê catas de syllabas.
268
É importante também observar que os trabalhos de agulhas ordenados pelo
Regulamento de 1858 não aparecem no grau de adiantamento. Provavelmente essa
atividade não era exigida pela Inspetoria da Instrução, estando implícita nas atividades das
professoras. Outra observação é que também não aparecem indícios quanto à questão do
ensino da moral e da doutrina cristã.
Analisando o adiantamento das alunas, pode-se dizer que a professora Bellarmina
organizou a escola em seis classes. A freqüência era de dezenove alunas e segundo a
professora, essa freqüência às vezes caía para dezessete. A organização das classes escola
pode ser estruturada da seguinte forma:
266
- ESCOLANO, A arquitetura como programa: espaço, escola e currículo. IN.: FRAGO, Antonio Vinao;
ESCOLANO, Augustín.
Currículo, espaço e subjetividade
: a arquitetura como programa. Trad. Alfredo
Veiga Neto. 2ª ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2001. p. 26.
267
- Faria Filho chamou as escolas de primeiras letras do século XIX de
escolas de improviso
por não
possuírem ainda locais próprios, mas funcionando em ambientes improvisados como em casas de
professore ou em igrejas. FARIA FILHO, Luciano Mendes de; VIDAL, Diana Gonçalves. Os tempos e
os espaços escolares no processo de institucionalização da escola primária no Brasil. In.:
Revista
brasileira de Educação.
268
- Idem.
211
Tabela 01
Classificação das alunas da aula da vila de Campos em 1866
Classes Grau de progresso N. de
alunos
por classe
01 Gramática 03
02 Aritmética 04
03 Principiam a ler 02
04 Lêem cartas missivas 07
05 Lêem cartas de nomes 02
06 Lêem cartas de sílabas 01
Fonte:
Ofício da professora Maria Bellarmina de Meneses em quatorze de dezembro de 1866
. APES. Fundo
E
1
634.
De forma deferente, era a realidade da escola do sexo masculino de Riachão, regida
pelo professor Cypriano José. Sua escola possuía um quadro de trinta e sete alunos, mas a
freqüência caía para trinta. No relatório desse professor, não aparece o grau de progresso
dos alunos, mas mostra a realidade em termos de mobília escolar, o que de certa forma
indica as possibilidades de como a escola poderia ser organizada seguindo as
determinações do ensino simultâneo. De acordo com ofício do professor, a realidade era a
seguinte:
A minha aula s’acha muito balda de utensis; por quanto existindo na respectiva
matricula o numero de 37 meninos sendo a frequencia de 30, pouco mais ou menos
apenas existem 3 bancos, 2 carteiras e uma pequena banca sendo dois bancos de
comprimento de 15 palmos cada um, e o outro de 9 ditos, as carteiras com 15 palmos
de comprimento cada uma, e a banca com 5 palmos de comprimento e 2
1
/
2
de
largura, tudo isto em pessimo estado. Não pois nada mais, pelo que espero que
por intermedio de V. . Seja tal falta sanada, pondo-se em effeito o disposto no artigo
51 do dito Regulamento.
269
269
-
Ofício do professor Cypriano José em 28 de novembro de 1866
. APES. Fundo E
1
634.
212
O mobiliário apresentado pelo professor Cypriano José não era considerado ideal
para a quantidade de alunos que freqüentava a escola. O professor, ao terminar a
exposição, recorreu ao artigo 51 do Regulamento de 1858 como garantia para que seu
pedido fosse atendido. De acordo com esse artigo, todos os móveis e demais utensílios
seriam fornecidos pelos Cofres Provinciais.
270
Pela exposição do professor pode-se perceber claramente que os alunos estudavam
sentados em bancos e escreviam em carteiras. No relatório podemos ainda verificar que a
lista de mobiliário seguiu acompanhada de medidas métricas. Essa exincia provinha das
normas da Diretoria Geral da Instrução Pública.
De acordo com Barra, havia uma disposição de organizar a escola como base nos
móveis e utensílios escolares presentes.
271
Essa (forma) de organização que foi
denominada de
forma escolar
, indica a simultaneidade do ensino. A simultaneidade do
ensino era dada pela junção entre a escrita e a leitura. Essa condição era determinada pala
presença dos objetos de ensino como o quadro-negro e os textos e a disposição em que
estes eram colocados na sala. Hérbrad reconhece na simultaneidade do ler e escrever o
grande esforço escolar do século XIX, principalmente por causa do método de ensino
adotado.
272
De acordo com relatório do professor Cypriano José, foi construída a planta baixa da
sua escola. A escola pode ser representada com a seguinte forma:
270
- Regulamento de 1858. Doc. Cit. Artigo. 51.
271
- A autora concebe forma escolar “como a disposição de organizar a escola como seus móveis e utensílios
que, distribuídos de modo estratégico, garantem a forma simultânea de ensino”. Este conceito a autora
tomou de empréstimo do francês Guy Vicent, no trabalho sobre a história e a forma escolar das escolas
primárias francesas. BARRA, Valdeniza Maria da. Op. Cit. p. 02.
272
- HÉRBRAD, Jean. Três figuras de jovens leitores: alfabetização e escolarização do ponto de vista da
história cultural.
História de leitura
: leitura, história e história da leitura. Trad. de Christian Pierre
Kasper. ALB/FAPESP, São Paulo: Mercado de Letras, 2000. p. 49.
213
PLANTA BAIXA 02
Escola do sexo masculino de Riachão
273
Fonte: confecção de Luís Siqueira e Hilton Cezar Gomes Silva
A questão do mobiliário escolar vinha sendo criticada desde o início da aprovação do
Regulamento de 1858 pelos administradores da Província sergipana. Em 1860, o
presidente Manuel da Cunha Galvão fez denúncias das dimensões irregulares dos móveis
escolares como bancos e carteiras nas escolas de primeiras letras.
274
273
-
Ofício do professor Cypriano José em 28 de novembro de 1866
. APES. Fundo E
1
634.
274
-
Relatório do presidente Manuel da Cunha Galvão em 1860
. Bahia: Tipografia de Ponggetti de Cattellina
e Cia. p. 9-10.
214
Na ótica desse presidente, havia uma relação intrínseca entre os móveis escolares e o
bom desempenho do método de ensino adotado. Se os móveis não fossem considerados
perfeitos o método de ensino não sortiria o efeito desejado.
Na tentativa de padronizar os veis escolares das escolas de primeiras letras da
Província em seis de março de 1861 foi aprovado um novo Regimento Interno para as
escolas determinado o número, o tamanho, a forma as dimensões e os usos dos diversos
móveis, indispensáveis para a fiel execução do método adotado.
275
No do relatório confeccionado pelo professor da vila de Campos José Joaquim de
Montalvão para o ano de 1867 a situação da escola era diferente. De acordo com o
documento, pode-se perceber que o mobiliário da escola era mais completo que o das
outras escolas. A primeira situação presente é que a escola estava funcionando com uma
mesa com pouco mais de seis palmos de comprimento e três e meio de largura. O
professor afirma no documento que complementava sua escola com os móveis
emprestados de seu colega antecessor.
276
A segunda informação presente no relatório é a ausência de utensílios para a aula, o
que de acordo com as declarações do professor, deixava dúvidas se o método de ensino
adotado era ou não proveitoso. O que o professor quer afirmar é a inviabilidade do método
devido à ausência de impressos pedagógicos.
Ao relatar sobre o progresso dos alunos, o professor José Joaquim de Montalvão,
além de indicar as classes presentes de sua escola, acabou por revelar o perfil do seu
quadro discente.
Gráo de Progresso
Sendo esta aula composta em parte, por meninos pobres, aconteceo cometerem elles
muitas faltas no decurso do corrente anno, e por isso apenas passo apresentar o
adiantamento seguinte: Seis estão regendo grammatica; dez estão dando arithmetica;
nove decorão doutrina; nove lêem cartas missivas; cinco lêem cartas de nomes, e três
lêem cartas de syllabas.
277
275
- Relatório do inspetor geral das aulas Guilherme Pereira Rebelo. IHGS. In.:
Relatório do presidente
Alexandre Rodrigues da Silva Chaves em 1864.
. IHGS. Sergipe: Tipografia Provincial.
276
-
Ofício do professor de primeiras letras Joaquim José de Montalvão em 15 de novembro de 1866
.
APES. Fundo E
1
634.
277
- Idem.
215
De acordo com esse documento, pode-se perceber - diferente da realidade das outras
escolas - a presença do ensino da doutrina cristã. Mesmo com todas as dificuldades
apresentadas, o professor obedecia ao currículo proposto para as escolas de primeiras
letras da Província cujo número de alunos que estava decorando doutrina cristã
relativamente era grande.
As classes dessa escola estavam estruturadas de acordo com a tabela abaixo.
Tabela 02
Classificação dos alunos da escola do sexo masculino da vila de Campos em 1866
Classes Grau de progresso N. de alunos
por classe
01 Regendo Gramática 06
02 Dando Aritmética 10
03 Decoram doutrina 09
04 Lêem cartas missivas 09
05 Lêem cartas de nomes 05
06 Lêem cartas de sílabas 03
F
onte: Ofício do professor José Joaquim de Montalvão em quinze de novembro de 1866. APES. Fundo E
1
634.
Assim como a escola feminina estruturou as alunas em seis classes, a masculina da
vila de Campos organizou os alunos em seis classes. O que causa dificuldade na análise é
entender as gradações das matérias ensinadas como se pode ver nas classes. O professor
afirma, respectivamente, que seis alunos estão regendo gramática e dez alunos dando
aritmética, mas não menciona a gradação dessas matérias.
Da mesma forma que ocorreu com a aritmética se verifica com o ensino das noções
de pesos e medidas, ausente nas informações passadas pelo professor. Se havia o ensino de
pesos e medidas o documento deixou obscura essa questão. Provavelmente essas noções
estavam diluídas no ensino da aritmética, pois no orçamento consta a presença do quadro
para operações aritméticas e geometria..
216
O orçamento elaborado pelo professor José Joaquim Montalvão também ajuda a
montar planta baixa da escola. Pelos objetos presentes, pode-se perceber a presença do
Império e da religião Católica na escola como consta no orçamento.
Orçamento dos moveis necessários para a Eschola de 1
as
. Lettras da Villa de Campos e
seu materail para o anno de 1867.
Um crucifixo e preparos para sua colocação............................................20 $ 000 r
s
Um retrato do Imperador e sua colocação................................................20 $ 000
Três Carteiras e seus bancos.....................................................................66 $ 000
Uma mesa com pano e estrado.................................................................21 $ 000
Uma cadeira para o professor...................................................................16 $ 000
Uma escrivaninha de louça.........................................................................3 $ 000
Seis cadeiras de palhinha..........................................................................24 $ 000
Uma pedra para operações arethmetica e geometria................................15 $ 000
Um espanador.............................................................................................2 $ 000
Duas toalhas...............................................................................................1 $ 000
Quatro copos de beber água.......................................................................5 $ 120
Uma bandeja pequena................................................................................2 $ 000
Dous canecos de folha de flandres.............................................................. $ 400
Um coco[sic] de folha de flandres................................................................$ 500
Uma Campanhia........................................................................................1 $ 000
Quinze tinteiros de chumbo para as carteiras............................................7 $ 500
Um relogio de sineta................................................................................30 $ 000
Para o alluguer da casa em q. deve funcionar a Eschola.........................24 $ 000
__________
Soma 243 $ 220 r
s
.
Para o material..................................... 70 $ 000
___________
Total 304 $ 220 r
s.278
O orçamento da escola do sexo masculino da vila de Campos ainda merece alguns
comentários pelo detalhe de informações que apresentou como ao retrato do Imperador e a
presença do crucifixo.
A presença da imagem do imperador na parede da escola o tempo todo era uma
maneira de passar para as crianças que o Brasil tinha um monarca que governava. Esse
governante seria o defensor, o administrador e aquele que impulsionaria o
desenvolvimento do País. Era enfim, um recurso utilizado para passar a ideologia do
Estado, tentando assim fixar a imagem do imperador na memória infantil.
278
- Ofício do professor José Joaquim Montalvão. Doc. Cit.
217
No caso do crucifixo também pregado na parede era a forma de passar a religião do
Império para as crianças. Era um meio de doutrinação do catolicismo brasileiro. O respeito
à religião continuava no recinto escolar. E para reforçar essa estratégia havia a
complementação com as orações determinadas na legislação que eram decoradas antes e
depois das sessões escolares. Este objeto, assim como o retrato do Imperador, incutia
valores significados no espaço escolar do século XIX.
Para ajudar a compreender ao orçamento elaborado pelo professor José Joaquim de
Montalvão construiu-se também a planta baixa com objetivo de visualizar o espaço
escolar, as disposições dos móveis e objetos de uma escola de primeiras letras sergipana.
Os móveis da escola foram colocados de acordo com o que determinava o método
simultâneo. O crucifixo foi posto na parede do lado do estrado do professor. O retrato do
imperador D. Pedro II está situado na mesma parede, só que em lado paralelo ao crucifixo.
As carteiras dos alunos estavam dispostas em três filas quase paralelas, em frente para o
professor. De posição oposta aos alunos está o quadro-negro. As seis cadeiras de palhinhas
foram colocadas de lado das carteiras, provavelmente seria para os monitores. Por não
haver indicação no documento da ante-sala, os demais objetos foram colocados em uma
mesa ao lado do estrado. A porta da escola está situada na mesma localização do estrado
do professor para que este vigie e controle a saída e entrada dos alunos.
218
PLANTA BAIXA 03
Escola do sexo masculino da vila de Campos
279
Fonte: confecção de Luís Siqueira e Hilton Cezar Gomes Silva
Até aqui se tentou mostrar através de legislação, de relatórios dos presidentes da
Província e de professores, como o método de ensino simultâneo foi adotado nas escolas.
279
-
Ofício do professor José Joaquim de Montalvão. Doc. Cit.
219
Na pesquisa que se empreendeu, foram encontradas críticas e elogios quanto à sua
aplicação nas escolas depois do Regulamento de 1858. Começaremos pelas críticas e
elogios emanados da elite administrativa provincial. Desse modo, será mostrado como os
presidentes enxergavam o caminhar da instrução primária na Província sergipana, quais os
entraves e as saídas apontadas para melhorar a crise.
4.2.1 - As críticas e os elogios ao método
A primeira crítica empreendida acerca do atraso da instrução ocorreu dois anos
depois da adoção do método e partiu do presidente da Província Manuel da Cunha Galvão
em 1860. De acordo com esse administrador, a instrução apresentava problema devido à
falta de material escolar, o que de certa forma estava causando transtorno para que o
ensino público tornasse metódico e regular. A saída encontrada para o atraso seria o
aumento de mais investimentos na educação por parte do poder público. A instrução, para
o presidente, possuía valor inestimável porque era o caminho para a edificação da
sociedade.
A instrução elementar é a primeira porta, que se abre para a rasão humana: é por ella
que se denuncia o quilate de cada intelligencia, é por ella que começão à desenvolver
as dedicações, as tendencias, as propensões de cada um, é por ella que se fasem os
artistas, os homens de letras e sciencias, os que se dão as especulações mercantis: é
ella emfim, que, dirigindo a docil intelligencia da verde juventude, e moldando-a nos
preceitos da moral civil e religiosa, no amor do trabalho e na obediencia cega ao
sentimento de dever, produz o cidadão e o pae de familia.
280
Pelas afirmações do presidente pode-se observar a representação que é feita da
instrução elementar. Na ótica do administrador, esse ramo do ensino seria a base para a
construção da Nação brasileira. A formação da elite que comandariam o país dependia de
uma base educacional solidificada. Até a construção de uma família seria tributária de uma
boa instrução.
A construção da família e, consequentemente da boa sociedade, estava garantida via
instrução elementar porque seria através do currículo escolar com as noções de moral e
280
- Relatório do presidente Manuel da Cunha Galvão em 5 de março de 1860. Doc. Cit. p. 10-11.
220
doutrina cristã que a escola trabalharia a mente e os corações das crianças, dos futuros pais
de famílias. No caso das escolas femininas as alunas ainda aprenderiam além da leitura, da
escrita e de um pouco de cálculo, as noções de trabalhos com agulhas.
Outro problema, dessa vez apontado pelo presidente José Pereira da Silva Morais em
1867, era a questão da criação de cadeiras e da freqüência escolar de algumas localidades.
281
O presidente denunciava a forma irregular de se criar cadeiras de primeiras letras em
locais inapropriados. Para o presidente, a criação de cadeiras sem obedecer a um plano
onerava o chofre provincial. A cadeira criada em local pouco populoso acabava por criar
transtorno por causa do problema da evasão escolar.
No caso da escola possuir número insuficiente para seu funcionamento, a legislação
era taxativa: os alunos e professor seriam transferidos para outra escola.
282
Com relação
aos objetos como os móveis escolares, possivelmente, seriam remanejados para outra
escola. os impressos pedagógicos, o professor da cadeira levaria consigo para serem
aplicados em outra aula.
O problema que chamava atenção dos responsáveis pela administração da instrução
na Província era a questão do espaço destinado para o funcionamento das escolas. Desde o
final da década de quarenta que essa situação passou a ser reclamada nos relatórios
apresentados pelos presidentes provinciais. Segundo Faria Filho, essa questão não era
própria da intelectualidade ou da classe dirigente brasileira, mas estava no cerne da
modernidade e não poderia deixar de estar no cerne do processo de escolarização.
283
A crítica sobre o espaço sico das escolas esteve presente no relatório do presidente
Inácio Joaquim Barbosa em 1854 quando este fazia defesa da organização geral da
Instrução Pública de forma contundente. O bom desempenho da instrução de primeiras
letras dependia de uma boa casa para o ofício do magistério.
Permitti que tambem chame a vossa attenção sobre as casas, em que funccionão as
Escholas, e sobre sua falta de mobília e utensis. É indispensável que consigneis
281
-
Relatório do Presidente José Pereira da Silva Morais em 21
de janeiro de 1867
. Sergip: Tipografia
Provincial.
282
- É importante verificar que o artigo 27 do Regulamento de 1858 dava poderes ao governo de suprimir a
cadeira com o número menor de 20 alunos e menos de doze as cadeiras do sexo feminino. Isso evitaria
gastos com a contratação de professores, com a compra de mobília e compêndios escolares por parte do
poder público.
283
- FARIA FILHO, Luciano Mendes de; VIDAL, Diana Gonçalves. Os tempos e os espaços escolares no
processo de institucionalização da escola primária no Brasil. Op. Cit. p. 22.
221
alguma quantia, não para a compra d’essa mobilia e uttensis, senão mesmo pra o
aluguel de casas apropriadas ao ensino, por quanto não convem que continue o
systema de lccionarem os Professores em casas de sua residencia. Alem da distracção
do trabalho, que d’ahi resulta, as casas por via de regra não tem capacidade sufficiente
para os alunos.
284
A denúncia do presidente a respeito do funcionamento das escolas em casas dos
professores trazia problemas no processo de ensino/aprendizagem. Para que o processo de
escolarização desse certo o ideal seria que a escola tivesse local próprio. Em todo século
XIX os administradores provinciais defenderam a instituição de locais apropriados para os
alunos. A defesa da instrução pública para a população passava por essa questão, pois o
sucesso do método de ensino dependia dessa condição.
Se a condição do espaço escolar adequado não estava sendo atendida o processo de
instrução estava sofrendo reflexos diretos. Para que o processo de ensino surtisse efeito,
uma das condições exigidas era amplo espaço para as disposições dos móveis e,
consequentemente dos alunos.
Como se disse, e não torna redundante, o método de simultâneo determinava que os
móveis como carteiras e bancos fossem dispostos em posição tal que os alunos teriam que
ficar em frente do professor. Essa situação colocava o professor em um estado de
vigilância. Esse tipo de organização era também exigência de um objeto indispensável
para a transmissão do conhecimento de aritmética: o quadro-negro, tecnologia escolar
colocada para todos os alunos, ao mesmo tempo.
Encontrou-se a presença do quadro negro nos relatórios dos professores
confeccionados para a Diretoria da Instrução Pública em toda a década de sessenta do
século dezenove. Acredita-se que a adoção do método simultâneo no regulamento de
1858 foi o fator impulsionador da prática desse instrumento em Sergipe.
Pelo fato do professor ser o agente principal do processo de ensino e ter que ensinar
a todos a mesma lição, o quadro-negro era a tecnologia que permitia a uniformização da
transmissão do conhecimento. Assim, todos aprendiam de uma maneira e ao mesmo
tempo os conhecimentos exigidos pelo currículo da escola de primeiras letras.
Introduzido no modelo da escola lassallista o quadro-negro também modificava a
disposição dos alunos no processo de aprendizagem. Olhando para frente e de forma
sentada o aluno não precisaria estar levantado para ir à lição. Muito pelo contrário, era a
284
- Relatório do presidente Inácio Joaquim Barbosa em 20 de abril de 1854. Doc. Cit. p.07.
222
lição que chegava até a ele e a seus companheiros. Nos orçamentos que os professores
apresentavam à Diretoria de Instrução Pública, o esse objeto de ensino apareceu ora como
pedra para operações de aritmética e geometria , ora como quadro de madeira.
285
A condição de haver críticas quanto ao desempenho do método na Província não
significava dizer que o havia elogios. A boa visão sobre a aplicação do método nas
escolas de primeiras letras recaía na figura da professora Possidônia Maria de Santa Cruz
Bragança, da vila de Laranjeiras. Essa professora ensinava pelo método simultâneo desde
a década de cinqüenta, muito antes da aprovação legal como se pode observar no relatório
do inspetor geral das aulas Pedro Autran da Mata Albuquerque em 1856.
A aula de primeiras letras do sexo feminino da cidade de Laranjeiras regida por
Possidonia Maria de Santa Cruz Bragança, é aula, que pode servir de exemplo; a casa
em que lecciona foi feita pelo Snr. Dr. Bragança appropriada para o ensino; circulos
de ferro formão as classes que requer o methodo de ensino simultâneo, a sala do
ensino além de estar completa do material, existe na maior ordem possivel, e a
professora com esmero cumpre os deveres de seu cargo apresentando o melhor
resultado.
286
Os elogios do inspetor geral das aulas feito à professora Possidônia e à sua escola
revelam o espaço ideal para a boa aplicação do método simultâneo: círculos de ferro para
separar as classes e material escolar completo.
A escola da professora Possidônia fora estruturada com verbas dos cofres públicos e
s às custas de seu pai com o consta no relatório do inspetor. Anexo à escola funcionava
um colégio. Esse dado foi revelado pelo termo de visita realizado em 1858 pelo comissário
da Instrução Pública quando dizia cerca da realidade da escola:
De todas as aulas de instrucção primaria feminina que visitei, apenas uma do sexo
feminino regida pela professora D. Possidonia Maria da Santa Cruz Bragança tem o
verdadeiro typo de uma escola bem regulada. Não sei, Exm° Snr. Se pelo zêlo do
magisterio pubnlico, ou pelo credito de seo collegio conjuncto. O certo é a professora
é mui boa habilitada, que há uma realidade ali no ensino, methodo,
aproveitamento. Achei 43 alunnas divididas em classe e a aula mobilhada mui
285
- No relatório do professor de Pacatuba consta de “1 carteira , 1 quadro de madeira pintado para
exercícios aritméticos,14 caixilhos envidraçados, 1 cadeira de braços e 2 estantes”.
Relatório do
professor de Pacatuba José Raimundo da Silva em 26 de setembro de1868
. APES.Fundo E
1
299.
286
- Relatório do inspetor gral das aulas Pedro Autran da Mata Albuquerque. In.:
Relatório do presidente
Salvador Correia de e Benevides em 2 de julho de 1856
. IHGS. Bahia: Tipografia de Carlos
Ponggetti. p. 22.
223
regularmente a custa da mesma professora; 8 das alunnas lêm correctamente, escrevem
com perfeição, e regem bem, mostrando-se mais habilitadas na construcção
grammatical as discipulas Alcina Esmeralda de Barros e Ermelina [ilegível] do
Sacramento.
287
O termo de visita sobre a aula da professora Possidônia esclarece o sucesso o sucesso
do método adotado em sua escola. Três fatores influenciavam a escola: o investimento
particular realizado na escola, a ajuda do cofre público e a presença de um colégio anexo.
A presença do colégio e da escola funcionando juntos contribuía, sobretudo, para um
bom resultado do trabalho docente. Provavelmente a professora utilizava alunas do colégio
como monitoras ou assistentes de suas aulas. Dessa forma, a escola de primeiras letras
passava a ser um espaço de prática pedagógica para as alunas do colégio anexo.
Tentou-se mostrar através de informações de alguns presidentes da Província e de
inspetores da Instrução Pública como se encontrava o estado da instrução com o método
de ensino simultâneo. Mostraremos agora quais as dificuldades encontradas pelos
professores, agentes diretos do processo de aprendizagem.
A primeira dificuldade apresentada para o bom desempenho do ensino simultâneo
era a questão da sessão escolar. Como as escolas funcionavam com duas sessões diárias, o
professor do povoado de Santa Rosa reclamava das duas viagens que seus alunos davam
para chegar à escola. Poe causa disso fez a seguinte solicitação ao diretor Geral da
Instrução:
Diz Bernardo Camelo de Jesus, professor de 1
as
. Letras do povoado de Santa Roza,
que sendo inconveniente dar duas sessões escholares por dia, por morar alguns de seus
alunnos meia legua, é m
s
. distante d’este m
mo
. Povoado por serem seus pais
summamente pobres, e não poder ter aqui em casas alugadas deixão m
tas
. vezes de
freqüentar um numero suficiente; por conseqüência seria mui conveniente que em
lugar de dar as duas sessões desse uma só, porque assim pouparia m
tos
. sacrifícios dos
pais; por isso requer o supp
e
. a V. S. queira dar sua informação a fim de levar ao
conhecim
to
. do Senr. D
or
. Insp
r
. Geral das Aulas, e esse dar suas providencias: é do que
afirma
288
A solicitação do professor do povoado de Santa Rosa evidencia a realidade de muitas
escolas de primeiras letras da Província. Instruir com poucos recursos e em duas sessões
287
-
Termo de visita das aulas da Província em 11 de maio de 1858
. Correspondência recebida. APES.
Fundo G
1
967.
288
-
Solicitação do professor do povoado de Santa Rosa em 1869
. Correspondência recebida. APES. Fundo
E
1
299.
224
acabava sendo um estorvo para a maioria de muitos professores. A solução para o
professor seria a redução de uma das sessões de sua aula.
A condição de trabalhar em uma só sessão era permitida, de acordo com o
regimento interno das aulas, para as escolas que funcionassem com um número de mais de
cem alunos. Para esse tipo de escola a sessão começava às oito horas da manhã e
terminava às duas da tarde.
289
Essa situação era vivenciada pelo professor de primeiras letras Gonçalo Ferreira do
Bomfim, da cidade São Cristóvão em 1866. De acordo com esse professor que ensinava
mais de cem alunos, as duas sessões diárias estavam provocando dispersão dos alunos. No
relatório apresentado, afirma que muitos dos alunos não estavam comparecendo as sessões
da tarde para irem à aula de música e outros para se empregarem em outras atividades.
290
Os alunos não freqüentando as aulas da tarde conseqüentemente não realizariam os
exercícios aritméticos.
Outros problemas foram evidenciados pelos mesmos professores que apresentaram
relatórios para a Instrução Pública na década de sessenta. Por exemplo, o professor
Joaquim José de Montalvão apontava que os problemas de sua aula eram por causa da
pobreza dos alunos e por causa do desleixo dos pais.
A frequencia desta Aula este anno tem sido alguma couza interrompida, interrupção
esta devida a duas couzas: a primeira é o estado de pobreza de alguns meninos, e a
segunda é o pouco gosto que certos Pais têem na instrucção, os quaes não tendo
penalidades alguma pelas faltas que seos filhos commetem, os desvião da eschola para
empregal-os em occupações muito differente do ensino.
291
O estado de pobreza dos alunos denunciado pelo professor estava influenciando de
forma direta no processo aprendizagem porque havia incompatibilidade entre o tempo
escolar e o tempo agrícola. Numa província onde o trabalho estava assentado na
propriedade canavieira era comum os pais dos alunos utilizarem a mão de obra infantil
como complemento. Daí a denúncia do professor.
O professor, ao fazer denúncia da situação de sua aula, deixa indícios acerca da
representação que os pais dos alunos faziam da instrução primária e da escola. Essa
289
-
Regimento Interno das Aulas
. Correspondência recebida. APES. Fundo G
1
974. Não encontramos data
de referencia nesse documento.
290
-
Relatório do professor Gonçalo Ferreira do Bomfim em 30 de novembro de 1866
. APES. Fundo E
1
634.
291
- Ofício do professor José Montalvão. Doc. Cit.
225
questão também está presente nos relatórios dos presidentes da Província. Enquanto os
administradores entendiam a instrução como ante-sala para o desenvolvimento e progresso
da Nação, os pais dos alunos não possuíam essa visão.
Na pesquisa que se empreendeu não foram encontrados documentos que revelassem
a representação que os pais dos alunos faziam da escola. O que conseguimos encontrar
foram reclamações dos presidentes e dos professores alegando que os pais dos alunos não
davam o devido valor à instrução de seus filhos.
Mas é bom lembrar que quando falamos em pais de alunos estamos falando daqueles
que compunham a classe pobre. Os pais da classe abastada davam o devido apreço a
formação de seus filhos. Até porque os filhos dessa camada eram aqueles que futuramente
iriam compor os quadros administrativos da Província. Ao terminarem seus estudos
elementares iam estudar nas faculdades ou do Brasil ou fora dele.
292
O mesmo professor da aula de São Cristóvão, Bernardo Ferreira Bomfim apresentou
outro problema que colocava o andamento de sua escola de maneira insatisfatória. De
acordo com o documento, a escola estava desprovida de impressos pedagógicos, de
mobiliário, inclusive faltava até água para beber.
Senhor, uma das principaes necessidades desta aula, alem do banco com suas
respectivas carteiras e traslados, é os cartões, a vista dos quaes estudem para melhor se
promover a ordem das classes, e outros utensis com que se premiem os que
distinguirem-se, e assim faça apparecer a emulação: só ella fará cessar as difficuldades
com q. luta-se: são taes quaes as que obrigão-me, por comiseração, a desprover-me da
importancia d’um ou dous cadernos de papel em dias determinados para arguirem-se
reciprocamente em esciptos, e a dar-lhes agua, que m’a pedem com instancias, não
obstante repetidamente responder-lhes que, não posso dar, visto como meu estipendio
é ainda menos do ordenado do proprietario, e não permitte-me ao menos aquella
decencia e com modo que o magisterio exige.
293
O professor aponta muitas dificuldades para instruir os alunos. É bom lembrar que a
escola possuía um quadro de cem crianças em processo de aprendizagem. A falta de
móveis e material pedagógico atrasava o desempenho do ofício docente. Uma escola em
que na a argüição era realizada com um ou dois cadernos não se poderia esperar bom
resultado.
292
- No trabalho de Vieira ficou contatado que muitos filhos egressos da Província retornavam e preenchiam
os cargos administrativos do estado. VIEIRA, Eugênia Andrade.
A formação da intelectualidade
sergipana
. Op. Cit.
293
- Relatório do professor Gonçalo Ferreira Bomfim em trinta de novembro de 1866. Doc. Cit.
226
As reclamações do professor de São Cristóvão também vêm reforçar o que se disse
a respeito de como a população menos abastada entendia o papel da escola. Um simples
ato de negação de água colocava o processo de aprendizagem em situação vexatória.
Mesmo com a boa vontade do professor, a condição salarial não permitia ir além.
As denúncias dos professores e administradores da Província continuaram por toda a
década de 1860. E não era para menos em 1868 existiam na Província um total de 85
cadeiras públicas de ensino primário, sendo 51 do sexo masculino e 34 do sexo
feminino.
294
Era um número relativamente grande para a menor Província brasileira.
A situação denunciada pelos professores acerca da realidade das escolas de primeiras
letras atravessou toda década de sessenta do dezenove. Na documentação emanada dos
professores havia dúvidas quanto ao método de ensino adotado. No iniciar da década de
setenta havia ainda dúvida quanto a viabilidade do método simultâneo. Foi o que afirmou
em 1872 a professora da vila de Campos Maria Belarmina de Meneses.
Vantagens do methodo do ensino adoptado
Não posso ainda avaliar as vantagens do ensino simultaneo hoje adoptado na Província
por ainda não estar esta Eschola munida dos compendios e traslados precisos para as
aulas.
295
Devido aos problemas sofridos em seu ofício docente, as declarações da vila de
Campos são contundentes à medida que colocava em xeque a aplicação do método
simultâneo. E não era para menos, em sua escola faltava aquilo que possuía uma relação
intrínseca com o método como o impresso pedagógico e outros mobiliários.
A realidade de Maria Belarmina de Meneses chamou atenção porque sua escola fora
instituída no dia quinze de maio de 1860. Doze anos depois a professora ainda estava
passando por dificuldades. No orçamento elaborado para o ano de 1873 ainda constam as
mesmas solicitações feitas no ano de 1866.
No entanto, o que se pode tirar como conclusão é o fato de que a classe dirigente
provincial via na instrução a ferramenta para se garantir a ordem estabelecida do Império
brasileiro. O sucesso dessa empreitada dependia da afirmação da instituição escolar.
294
-
Relatório do presidente Antônio de Araújo d’Aragão Bulcão em dois de março de 1868
. IHGS. Sergipe:
Tipografia do Jornal do Aracaju. p. 15.
295
-
Relatório da professora Maria Belarmina de Meneses em 30 de novembro de 1872
. APES. Fundo E
1
634.
227
Subjacente a essa defesa estava a adoção de um método de ensino como opção política que
garantisse o sucesso da escolarização a população sergipana. As críticas que se faziam
pelos problemas existentes nesse processo revelavam o esforço da defesa na afirmação da
escola para o povo no século XIX.
O método de ensino simultâneo esteve vigente por toda a década de setenta. No final
desse período não se achava mais adequado continuar com essa forma de ensino. Daí
em diante, um novo método começou a ser defendido no Brasil, o método prático de
coisas, o qual chamou atenção dos administradores da Província sergipana.
Esse método começou a ser defendido no final da década de setenta do século junto
com as idéias pedagógicas de Pestalozzi e Basedow. No início da década seguinte o novo
método fora adotado nas escolas sergipanas.
228
COSIDERAÇÕES FIAIS
No século XIX, a escola passou por um ritual de afirmação na Província sergipana.
A partir do momento que os administradores provinciais entenderam que esta instituição
seria capaz de transformar regras de condutas e garantir estabilidade social, levantaram
bandeira de luta em favor da instrução pública para população. Sem a presença dessa
instrução o que se esperava era uma rotina escura, sem prosperidade da população e sem
riqueza econômica, no dizer do presidente Manuel Joaquim Fernandes de Barros. Desse
modo, a missão que se impunha era espalhar escolas de primeiras por todas as vilas e
povoados.
O projeto de garantir escolas de primeiras letras em todos os lugares vinha
acompanhado da necessidade social de se garantir condições de governabilidade. Essa
condição se daria através de um currículo que trabalhasse o coração e as mentes das
crianças. Nesse sentido, o que se esperava das crianças era respeito às leis imperiais e à
religião professada pelo Império brasileiro.
O currículo dessa escola deveria constar o ensino da escrita, da leitura, do cálculo, do
desenho linear e da doutrina cristã, além das noções de prendas domésticas para as escolas
femininas. Com esses saberes, os responsáveis pela organização escolar entendiam que era
o mínimo necessário para a manutenção da ordem imperial estabelecida.
Para que a escola tornasse realidade na Província sergipana foi preciso também criar
um corpo legislativo que garantisse as condições de existência desta instituição, para
influir no quadro docente e na habilitação deste, nas formas de se ensinar, de se comportar
e no espaço escolar.
O corpo docente começou a sofrer intervenção a partir da Lei de cinco de março de
1835, a primeira de caráter provincial no que diz respeito à esfera educacional. A principal
medida dessa Lei foi determinar condições para ser professor de primeiras letras, outra foi
a concessão de prazo para habilitação docente.
A habilitação do professor de primeiras letras foi pensada inicialmente através da
instituição da escola normal, mas esse projeto veio a se concretizar na segunda metade
da década de setenta. Enquanto isso não ocorria, vários mecanismos foram criados para
garantir a habilitação como subvenção, licença e a instituição do sistema holandês-
229
prussiano, além daquelas que eram realizadas por conta do próprio candidato à cadeira de
primeiras letras.
A intervenção legal na esfera da instrução pública continuou com a instituição de
regimentos internos para as escolas de primeiras letras. Na verdade esse dispositivo era
quem normatizava o método de ensino adotado nessas instituições. Além disso, esse tipo
de regra regulamentava também as relações entre professores e alunos, o tempo escolar, as
sanções e o calendário escolar. Determinando essas regras, os administradores acabavam
por reorganizar e uniformizar práticas culturais a serem transmitidas no espaço interno
escolar sergipano.
Outra necessidade que garantiu o efetivo sistema de escolas funcionando na
Província foi a criação de mecanismo para garantir o controle efetivo sobre o ofício
docente. No inicio, esse mecanismo começou a funcionar de forma precária através das
visitas realizadas pela câmara de vereadores. Essas visitas eram realizadas anualmente
quando os vereadores ou os visitadores nomeados informavam aos dirigentes provinciais
as condições das escolas, o desempenho dos professores e o desenvolvimento dos alunos.
Na década de cinqüenta, o sistema o sistema de inspeção das aulas pública passou a
ser realizado por um corpo de funcionários instituído para esse fim. As visitas tornaram-se
mais freqüentes, passaram a ser semestrais ou de acordo com as necessidades. Pode-se
afirmar que a partir desse momento o ofício docente passou a ser mais vigiado e
controlado. Com esse mecanismo de vigilância do ofício docente, pretendia-se não deixar
nada escapar aos olhos dos dirigentes provinciais.
É necessário registrar que as ações empreendidas pelos dirigentes provinciais nessa
década estavam em comum diálogo com as do grupo dos Saquaremas. Esse grupo
elaborou um projeto para o Império brasileiro que partia da Corte para as províncias. De
acordo com esse projeto, a instituição escolar e os agentes do ensino estariam a serviço da
manutenção da ordem estabelecida.
A defesa da escola pra a população sergipana do século XIX trazia como pano de
fundo a opção política pelo método de ensino. Essa tecnologia pedagógica foi tomada de
empréstimo de países considerados como modelos de civilização a exemplo da França e da
Inglaterra. Nesses países, os métodos de ensino foram adotados como estratégia a serviço
da nacionalidade e como meio para se instruir a classe trabalhadora.
230
No Brasil, a adoção do método mútuo ocorreu no início da década de vinte nas
escolas militares, mas a partir da Lei de 15 de outubro de 1827 foi admitida sua adoção
para as capitais e lugares mais populosos do Império. No entanto, em muitas províncias o
método foi introduzido antes a exemplo da província de Minas Gerais, São Paulo, Rio de
Janeiro e Bahia.
Na Província sergipana, a defesa do método mútuo ocorreu antes da Lei imperial de
15 de outubro de 1827, em meados desta década, com o presidente Manuel Cavalcante
quando esboçou para as autoridades imperiais seu projeto de instrução para a Província
sergipana. Na proposta do administrador, pretendia-se criar uma escola de primeiras letras
em um dos conventos da capital sergipana para aplicar o referido método.
Mesmo com toda intenção do presidente Manuel Cavalcante a introdução do método
mútuo só ocorreu em 1828, na capital sergipana, como determinava a Lei de 15 de outubro
de 1827. A introdução ocorreu através de concurso realizado com dois candidatos que
foram habilitados na Província da Bahia: Antonio José Peixoto Valadares e Francisco
Moreira da Silva Marramaque. O primeiro foi o vencedor, mas abandonou a cadeira,
ficando ao segundo candidato a responsabilidade de ensinar pelo método.
Como se disse, funcionou uma cadeira de ensino mútuo na Província, na capital,
São Cristóvão. No entanto, a Lei de 1827 determinava também a existência de escolas
mútuas em vilas e locais populosos. Nesse momento, em Sergipe, existiam sete vilas
(Lagarto, Santa Luzia, Santo Amaro da Britas, Vila Nova Própria e Tomar do Geru) e as
povoações de Laranjeiras e Porto da Folha, realidade administrativa que forçava a
existência de mais cadeiras de ensino tuo, mas isso não ocorreu.
A existência de apenas uma escola de ensino mútuo funcionando na capital da
Província pode ser explicada devido ao caráter disciplinador que esta ferramenta
pedagógica possuía. Pelo fato da capital ser o centro administrativo provincial os
administradores perceberam a necessidade social em instruir e disciplinar a população
deste lugar, pois se fazia necessário organizar essa sociedade para melhor administrar.
Enquanto que em São Cristóvão havia uma escola de ensino mútuo, nas escolas das
outras localidades a realidade era totalmente diferente. Em muitas vilas e povoações a
realidade estava ainda pautada na persistência da prática do ensino individual, como se viu
através das visitas realizadas pelas câmaras de vereadores ou pelos visitadores nomeados.
231
O método mútuo permaneceu vigente nos discursos presidenciais até a década de
cinqüenta. Influenciados pelas críticas que se faziam ao insucesso dessa experiência
pedagogia, os administradores provinciais passaram a descaracterizá-lo como não mais
profícuo para as escolas de primeiras letras sergipanas. A nova opção política e
pedagógica seria o método simultâneo.
O método simultâneo passou a fazer parte da realidade das escolas sergipanas a
partir do
Regimento Interno das Escolas
de 1856 no momento em que determinava a
divisão dos alunos em classe obedecendo ao critério de idade. Na verdade este tipo
documento influenciava toda prática pedagógica das escolas de primeiras letras como, por
exemplo, a relação entre professores e alunos, regularização do tempo escolar e do
calendário das aulas.
Se o Regimento Interno foi um prelúdio da introdução do método simultâneo o
Regulamento da Instrução Pública de primeiro de setembro de 1858
determinou e
uniformizou essa prática para todas as escolas de primeiras letras. A partir desse ano todas
as escolas funcionariam como base nesse método em duas sessões diárias.
É importante destacar que a opção política que os administradores fizeram pelo
método simultâneo comungava com o projeto de construção da Nação brasileira esboçada
pelo grupo dos Saquaremas cujo objetivo era instruir a população com os ditames do
Império esperando da população escolarizada respeito às normas imperiais e à religião
oficial adotada. Desse modo, a necessidade maior desse momento era manter a ordem
imperial través do currículo determinado para as escolas de primeiras letras sergipanas.
Do mesmo modo que o método anterior, o simultâneo foi bastante criticado tanto
pelos administradores provinciais como pelos professores de primeiras letras. Estes
últimos apontavam como principais problemas a falta de mobília, de material escolar, a
falta de atenção dos pais para com a instrução dos filhos e a demora no atendimento das
solicitações realizadas. Para os administradores, o problema maior residia na falta de
uniformização do mobiliário escolar e no espaço escolar adequado para boa execução do
método.
Mesmo com todas as críticas, o método de ensino simultâneo permaneceu até o final
da década de setenta do século XIX nas escolas sergipanas. A partir de meados desta
década, os administradores provinciais começaram a descaracterizar essa tecnologia
pedagógica exemplificando com as dificuldades que existiam e começaram a fazer defesa
232
pelo método prático intuitivo. Daí em diante, as idéias pedagógicas de Pestalozzi e
Basedaw foram evocadas como corolário de um novo tipo de escola que duraria até a
década de trinta do século seguinte.
No entanto, é preciso destacar que com todas as dificuldades os professores de
primeiras letras continuaram instruindo as crianças de acordo com o que a realidade da
Província permitia. Se houve reclamação esse fato não foi motivo para frear o processo de
afirmação da escola sergipana. Muito pelo contrário, cada ano o número de cadeiras de
primeiras letras aumentava para instruir a população sergipana com os rudimentos da
leitura, da escrita, do cálculo e da doutrina cristã.
233
FOTES
Anúncio de aula particular em 3 de dezembro de 1853
. Correio Sergipense. Aracaju, n.85.
Atestado de aprovação do candidato Antonio Rodrigues da Fraga em 23 de janeiro de
1849
. APES. Correspondência recebida. Fundo G
1
1885.
Atestado de polícia do candidato João Batista de Meneses em 30 de março de 1864
.
APES. Fundo E
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Atestado de Saúde do candidato João Batista de Meneses em 30 de março de 1864
. APES.
Fundo E
1
395.
BRASIL.
Ensino Mútuo-Decreto de primeiro de março de 1823
. AN. Fundo IG
3
23. Série
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BRASIL.
Lei de 15 de Outubro de 1827
. IHGS.
Comunicação expedida em 28 de novembro de 1856. APES. Fundo E
1
634.
Inspeção Geral das aulas n. 82 de 3 de setembro de 1858
. Correspondência recebida.
APES. Fundo G
1
967.
Ofício circular de 17 de dezembro de 181833
. APES. Fundo G
1
280.
Ofício da Câmara de Vereadores da vila de Itabaiana em 19 de fevereiro de 1834
. APES.
Fundo G
1
280. Doc. 44.
Ofício expedido em 29 de março de 1825
. APES. Fundo G
1
267.
Ofício expedido n. 60 de 10 novembro de 1825
. APES. Fundo G
1
267.
Ofício expedido em 01 de fevereiro de 1832
. APES. Fundo Sebrão Sobrinho. Cx. 27. doc.
03.
Ofício expedido em 30
de agosto de 1833
. APES. Fundo E
1
644.
Ofício expedido em 20 de abril de 1828
. APES. Fundo G
1
267.
Ofício da professora Maria Belarmina de Meneses em 14 de dezembro de 1866
. APES.
Fundo E
1
634.
Ofício do professor Cypriano José em 28nevembro de 1866
. APES. Fundo E
1
634.
Ofício do professor Joaquim José de Montalvão em 15 de novembro de 1866
. APES.
Fundo E
1
634.
Ofício do professor de Pacatuba José Raimundo da Silva em 26 de setembro de 1868
.
APES. Fundo E
1
634.
234
Ofício do professor Simeão Esteves da Silva em 24 de abril de 1826
. APES. Fundo E
1
634.
Ofício do recebido do inspetor Geral da Instrução Pública em 20 de março de 1858
.
APES. Fundo G1 9967.
Processo do professor Josias Maurício Cardoso em 9 de setemro de 1862
. APES. Fundo
E
1
395.
Prova da candidata Ana Maria de São José em 24 de julho de 181864
. Correspondência
recebida. APES. Fundo E
1
395.
Prova da candidata Flávia Benedicta de iterbo em 27 de julho de 1848
. APES. Fundo
G
1
1885.
Prova da candidata Maria Pastora dos Anjos o em 27 de julho de 1848
. APES. Fundo G
1
1885..
Prova da candidata arcisa Joaquina de Campos em 27 de julho de 1848
. APES. Fundo
E
1
395.
Prova do candidato Antonio Rodrigues da Fraga em 23 de janeiro de 1849
. APES. Fundo
G
1
1885.
Prova do candidato Manuel Rodrigues D’Ávila em 27 de agosto de 1863
. APES. Fundo
E
1
395.
Prova do candidato Sevolo Rodrigues de São José em 7 de novembro de 1853
.
Correspondência recebida. APES. Fundo G
1
974.
Provisão da Cadeira de Ensino Mútuo da Capital em 1828
. Documentação recebida.
APES. Fundo G
1
406.
Provisão da Cadeira de Ensino Mútuo da Capital em 1829
. Documentação recebida.
APES. Fundo G
1
406.
Provisão da Cadeira de Ensino Mútuo a Francisco Moreira da Silva Marramaque em 20
de agosto de 1831
. APES. Fundo G
1
406.
Provisão da Cadeira de Primeiras Letras da vila de Itabaiana em 12 de março de 1831
.
APES. Fundo G
1
672.
Recibo do professor Francisco Moreira da Silva Marramaque em 12 de abril de 1833
.
APES. FundoE
1
644.
Regimento Interno das Escolas de 1856
. APES. Fundo Biblioteca José Alves. Cx. 01.
Doc. S/n.
235
Regimento Interno das Escolas
. APES. Fundo G
1
974. Manuscrito. S/n.
Regulamento da Instrução Pública de 1° de Setembro de 1858
. APES. Fundo Publicações.
Cx. 50. Doc. 02.
Relatório das aulas do sexo feminino da cidade de são Cristóvão em 22 de maio de 1869
.
APES. Fundo E
1
299.
Relatório das aulas da vila de Laranjeiras em 11 de maio de 1858
APES. Fundo G
1
967.
Relatório das aulas do sexo feminino da cidade de são Cristóvão em 22 de maio de 1869
.
APES. Fundo E
1
299.
Relatório do presidente Amâncio Pereira de Andrade em 01 de março de 1850
. IHGS.
Sergipe: Tipografia Provincial.
Relatório do presidente Antonio do Amaral em 11 de novembro de 1846
. Sergipe:
Tipografia Provincial. IHGS. Sergipe: Tipografia Provincial.
Relatório do presidente Antonio Araújo D’Aragão Bulcão em 02 de março de 1868
.
IHGS. Sergipe: Tipografia do Jornal do Aracaju.
Relatório do presidente Evaristo Ferreira da Veiga
. IHGS. Sergipe: Tipografia do Jornal
de Sergipe. Sd.
Relatório do presidente Francisco José Cardoso Júnior em 03 de março de 1871
. IHGS.
Sergipe: Tipografia Provincial.
Relatório do presidente Francisco Meneses Sobral em 1845
. IHGS. Sergipe: Tipografia
Provincial.
Relatório do presidente Inácio Joaquim Barbosa em 20 de abril de 1854
.. IHGS. Sergipe:
Tipografia Provincial.
Relatório do presidente José Ferreira Souto em 12 de maio de 1847
. IHGS. In.:
Correio
Sergipense
. n, 35. ano X.
Relatório do presidente José Pereira da Silva em 21 de janeiro de 1864
. IHGS. Sergipe:
Tipografia Provincial.
Relatório do presidente Manuel da Cunha Galvão em 1860
. IHGS. Bahia: Tipografia de
Ponggetti de Cattellina e Cia.
Relatório do presidente Manuel Joaquim Fernandes de Barros em 1836
. IHGS. In.:
oticiador Sergipense
. n. 81.
236
Relatório do inspetor geral das aulas Guilherme Pereira Rebelo. In.:
Relatório do
presidente Alexandre Rodrigues da Silva Chaves em 24 de fevereiro de 1864
. Sergipe:
Tipografia Provincial.
Relatório do inspetor geral das aulas Pedro Autran da Mota Albuquerque. In.;
Relatório do
Presidente João Dabney D’Avelas Brotero em 15 de abril de 1858
. Bahia: Tipografia de
A. Olavo da França Guerra.
Relatório do presidente Sebastião Gaspar de Almeida Boto em 1842
. IHGS. Sergipe:
Tipografia de Sergipe.
Relatório da professora Maria Belarmina de Meneses em30de novembro 1872
. APES.
Fundo E
1
634.
Relatório do professor Gonçalo Ferreira do Bomfim 30 de novembro 1872
. APES. Fundo
E
1
634.
Relatório do professor de Pacatuba José Raimundo da Silva 26 de setembro de 1868
.
APES. Fundo E
1
299.
Requerimento da professora Possidônia Maria de Santa Cruz Bragança em 26 de julho de
1860
. APES. Fundo E
1
395.
Requerimento de Alexandre José Teixeira em 02 de fevereiro de 1863
. APES. Fundo E
1
395.
Requerimento de Antonio José Rodrigues das Cotias 13 de agosto de 1860
. APES. Fundo
E
1
395.
SEGIPE.
Resolução n. 395 de 17 de fevereiro de 1854
. Coleção das Leis e Decretos de
Sergipe. BPED.
Solicitação de licença do padre João Ponciano dos Santos em 9 de agosto de 1862
. APES.
Fundo E
1
395.
Solicitação de João Ponciano dos Santos em 10 de fevereiro de 1848
. APES. Fundo E
1
395.
Solicitação do professor da povoação de Santa Rosa em 1869
. APES. Fundo E
1
299.
Termo de visita das aulas em 11 de maio 1858
. Correspondência recebida. APES. Fundo
G
1
967.
Termo de visita em 12 de março de 1831
. APES. Fundo G
1
672.
Visita das aulas de Estância em 28 de março de 1832
. Comissário das aulas. APES. Fundo
G
1
672.
237
Visita das aulas do sexo feminino da cidade de São Cristóvão em 22 de maio de 1859
.
APES. Fundo E
1
299.
Visita do vigário José Gonçalves Barroso à escola de primeiras letras de o Cristóvão
em 09 de maio de 1869
. APES. Fundo E
1
299.
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