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UNIVERSIDADE CIDADE DE SÃO PAULO
UNICID
Wilson Teixeira
A percepção dos alunos e dos educadores de uma escola da rede pública
estadual sobre a violência nas relações que se estabelecem no cotidiano da
escola.
SÃO PAULO
2008
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UNIVERSIDADE CIDADE DE SÃO PAULO
PROGRAMA DE MESTRADO EM EDUCAÇÃO
Wilson Teixeira
A percepção dos alunos e dos educadores de uma escola da rede pública
estadual sobre a violência nas relações que se estabelecem no cotidiano da
escola.
Dissertação apresentada como exigência parcial para
obtenção do título de Mestre em Educação junto à
Universidade Cidade de São Paulo – UNICID sob
orientação do Prof. Dr. Julio Gomes Almeida.
São Paulo
2008.
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AGRADECIMENTOS:
A Deus, meu suporte, meu guia, amparando-me nesta jornada;
Ao professor Julio Gomes de Almeida, Orientador incansável da vida, que quando me faltou
o chão, aparou a queda, levantou-me e me incentivou a ir em frente. Sua sabedoria, carinho e
dedicação ao ser humano não estarão impressas apenas nestas páginas, permanecendo para
sempre em minha mente, coração e espelhados nas suas atitudes.
Aos Professores do programa Mestrado em educação da UNICID que com suas
experiências, conhecimentos e capacidades foram fundamentais em minha trajetória, e me
possibilitaram transitar por diferentes leituras e reflexões.
As funcionárias Sheila e Juliana que sempre atenderam minhas solicitações, por mais
difíceis que fossem, com extrema presteza e competência, conseguindo o prodígio de algumas
vezes a elas anteciparem-se.
À minha esposa Graciete Silva Teixeira por um sem-número de razões, minha companheira
fiel de todas as horas.
Meus Pais, João Antônio e Maria Aparecida, a quem devo minha existência.
A minha filha Giovanna pelo carinho e pelas alegrias na minha vida.
Ao governo do Estado de São Paulo através da CENP me concedeu a Bolsa permitindo o
melhor rendimento possível de minhas pesquisas e estudos.
Ao amigo Jefferson por nossas discussões políticas que muito valeram a pena e hoje tornam-
se um pouco mais concretas.
Aos demais amigos do Mestrado que estiveram comigo durante o curso das disciplinas.
Aos professores, alunos e direção da E. E. Padre Tiago Alberione que me deram subsídios
para a construção do meu trabalho.
A todos aqueles que dedicaram suas vidas e mortes a uma sociedade melhor e que,
conhecidos ou anônimos, lutaram e lutam por um mundo no qual o capital não sobrepuje o ser
humano e este não explore seu semelhante. Durante toda a minha vida vocês têm servido de
espelho e os exemplos que deixaram de refúgio seguro quando o desânimo tenta aproximar-
se.
WILSON TEIXEIRA
A percepção dos alunos e dos educadores de uma escola da rede pública
estadual sobre a violência nas relações que se estabelecem no cotidiano da
escola.
Banca Examinadora:
UNIVERSIDADE CIDADE DE SÃO PAULO
PROF. Dr. JÚLIO GOMES DE ALMEIDA (ORIENTADOR)
_________________________________________________________________________
UNIVERSIDADE CIDADE DE SÃO PAULO
Profª. Drª. ECLEIDE CUNICO FURLANETTO
_________________________________________________________________________
UNIVERSIDADE NOVE DE JULHO
Prof. Dr. CARLOS BAUER DE SOUZA
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.......................................................................................................................09
CAPITULO I
1- História de vida..................................................................................................................13
CAPÍTULO II
1-Formação de professores: Um caminho para educação de qualidade...........................24
CAPÍTULO III
3.1 Violência na sociedade....................................................................................................34
3.2 Os meios de comunicação de massa e a violência..........................................................34
3.3 A violência na literatura..................................................................................................36
3.4 Drogas e violência na escola.............................................................................................51
3.5 A polícia na escola ...........................................................................................................57
3.6 Procedimentos da unidade escolar diante de situações de violência......................61
CAPÍTULO IV
4.1 A percepção da comunidade escolar sobre a violência................................................66
4.2 Caracterização da comunidade escolar.........................................................................67
4.3 A percepção dos educandos e educadores sobre a violência na escola.......................75
4.3.1 Definição da violência.................................................................................................76
4.3.2 Violência na unidade escolar.......................................................................................77
4.3.3 Violência não tem casa.................................................................................................79
4.3.4 Violência arte de quem?...............................................................................................80
4.3.5 As causas da violência na escola .................................................................................82
5 considerações sobre a pesquisa...........................................................................................85
6 Considerações finais...................................................................................................88
7 Bibliografia........................................................................................................................91
Anexos...................................................................................................................................98
Resumo
O objetivo inicial da pesquisa foi estudar a percepção dos alunos e dos educadores de uma
escola da rede pública estadual sobre a violência nas relações que se estabelecem no cotidiano
da escola. O interesse surgiu a partir de minha vivência diária na escola, de minha
convivência com os meus alunos e com meus colegas professores, principalmente em
momentos como: conselhos de classe, reuniões com pais e também das diversas conversas
presenciadas por mim na sala dos professores que sempre estavam falando sobre violência na
escola.
Escolhi a abordagem qualitativa de pesquisa e utilizei como procedimento de coleta de dados
a análise documental, complementada por um questionário composto por questões abertas e
fechadas e entrevista com cinco questões fechadas aplicada a educandos e educadores.
Recorri também à minha experiência enquanto professor da unidade pesquisada. Desta forma
este trabalho assume, também, um caráter de reflexão sobre a minha própria prática.
A pesquisa revelou que a percepção dos alunos com relação à violência coincide em alguns
aspectos com a percepção dos educadores, mas que em outros aspectos ela se distancia
bastante. Cheguei à conclusão de que a percepção das pessoas sobre um determinado assunto,
no caso deste trabalho, da violência na escola, depende do lugar que a pessoa ocupa no espaço
escolar. Depende também da idade e do compromisso social que a pessoa tem com relação ao
processo educativo.
A realização deste trabalho foi muito importante para mim na medida em que possibilitou
uma reflexão sobre a minha própria prática. Espero que ele se constitua em incentivo para que
outras pessoas possam mergulhar neste tema tão complexo.
Palavras chave: violência escolar, educação, protagonismo, participação.
Summary
The initial objective of the research was to study the perception of the pupils and
educators of a school of the state public net on the violence in the relations that if establish in
the daily one of the school, the interest appeared from my daily experience in the school, of
my convivencia with my pupils and my colleagues professors, mainly at moments as: advice
of classroom, meetings with parents and also of the diverse colloquies witnessed for me in the
room of the professors who always were speaking on violence in the school.
I chose the qualitative boarding of research and used as procedure of collection of data
the documentary analysis, complemented for a composed questionnaire for opened and closed
questions and interview with five closed questions applied the educandos and educators. I also
appealed to my experience while professor of the searched unit. In such a way this work
assumes, also, a character of proper reflection on my practical one.
The research disclosed that the perception of the pupils with regard to the violence
coincides in some aspects with the perception of the educators, but that in other aspects it if
distance sufficient. I arrived at the conclusion on that the perception of the people on one
determined subject, in the case of this work, on the violence in the school depends on the
place that the person occupies in the pertaining to school space. It also depends on the age and
the social commitment that the person has with regard to the educative process.
The accomplishment of this work was very important for me in the measure where it
made possible a proper reflection on my practical one. She waits that it if constitutes in
incentive so that other people can dive in this so complex subject.
Words key: pertaining to school violence, education, protagonism, participation.
9
Introdução
Com este trabalho pretendo analisar quais são as percepções que os alunos e
professores de uma escola têm da violência que os cerca, qual o sentido que eles dão para essa
violência, como definem, posicionam-se e lidam com a violência. Para realizar esta pesquisa
escolhi uma escola da rede pública estadual, a razão da escolha é por trabalhar nesta escola e
por presenciar cotidianamente várias situações de violência envolvendo alunos, professores e
demais funcionários da escola.
A violência tem sido motivo de grande inquietação na escola escolhida para realização
da pesquisa e algumas medidas têm sido tentadas com o fito de combatê-la.
Nesse sentido pretendo estudar as medidas tomadas pelos vários segmentos da escola
diante de atos de violência, indisciplina e infração que acontecem no seio da escola e verificar
até que ponto essas medidas promovem melhoria nas relações cotidianas que se estabelecem
no cotidiano da escola, isto é, promovem a humanização do ambiente escolar.
Esse tema é hoje uma questão muito discutida, conforme é possível constatar, tanto
nas conversas informais dos educadores, nos momentos de encontros formais para discutir
problemas da escola, no espaço que esse tema tem ocupado nos eventos educacionais e
também pela produção de livros, dissertações e artigos sobre o tema. No entanto, as formas
de entender o tema não são idênticas, estão ligadas a percepção que cada um tem do
problema.
Assim, estudar quais são as percepções da comunidade escolar sobre a violência nas
relações que se estabelecem no cotidiano da escola parece de grande importância para que se
possa encontrar saída para os grandes problemas que vivem hoje as escolas.
Compreender as percepções da comunidade escolar sobre a violência nas relações que
se estabelecem no cotidiano da escola, tem grande relevância tanto pessoal quanto social. Do
ponto de vista pessoal quero compreendê-la por acreditar que desta forma posso melhorar a
minha prática docente como educador, podendo contribuir para formar cidadãos, e com isso
contribuir para um mundo mais humano e acolhedor.
Do ponto de vista social é de grande relevância também pois vivemos em uma
sociedade pautada pelo individualismo, pela agressividade e pela intolerância, onde a lógica
da sobrevivência se sobrepõe à lógica da convivência. Vejo como contribuição social
importante deste trabalho a compreensão do papel da escola. Será que ela está formando
cidadãos para a cidadania, o respeito e a paz, ou será que os está excluindo, formando-os para
o preconceito, o racismo, a discriminação e para o belicismo?
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O interesse pelo tema “violência na escola” surgiu de minha convivência diária com os
alunos e com colegas professores, principalmente em momentos como: conselhos de classe,
reuniões com pais e também das diversas conversas presenciadas por mim na sala dos
professores que sempre estavam falando sobre violência na escola. Os fatos e os discursos da
escola dão conta de inúmeros casos de violência que acontecem em seu. Educandos, seus
familiares e educadores estão sempre falando sobre a violência que acontece dentro da escola,
especificamente na sala de aula.
Embora muito se fale sobre o tema, tenho observado, no entanto, que a forma de
compreender o que chamam de violência na escola não é a mesma para todos. Essa percepção
fortaleceu em mim a necessidade de compreender o que os alunos e educadores desta escola
entendem como violência e como o sentido ou significado por eles atribuído à violência
interfere nas relações de ensino e aprendizagem.
Este estudo é muito importante na medida em que permitirá problematizar a questão
da violência na escola, que hoje vem sendo, em muitas situações, discutida com base
puramente no senso comum. Nessa perspectiva, tenho notado que ela é vista como algo que
vem de fora e que atinge a todos da mesma maneira e intensidade. Mas será que toda
violência presente no cotidiano da escola vem de fora? Será que quando se fala de violência
na escola está falando da mesma coisa? Será que as maneiras dos educadores perceberem a
violência são as mesmas maneiras dos alunos? Que responsabilidade a escola tem na
construção da violência de que se diz vítima?
A minha experiência como professor e minha reflexão sobre a prática em uma escola
estadual da zona sul de São Paulo indicam que há no cotidiano da escola diferentes formas de
sofrer a violência e também de percebê-la. Desta forma, discutir questões como essas pode
contribuir para uma reflexão que favoreça a construção de estratégias pedagógicas que
ajudem a escola e seus educadores a lidar com essa problemática sem serem engolidos por
ela.
Na condição de professor, vivencio no meu dia-a-dia este problema e creio que um
estudo mais acurado ajudará os educadores a perceberem que a violência é também produzida
e reproduzida nas relações existentes dentro da unidade escolar. Compreender essa situação
me parece o primeiro passo no sentido de humanização da escola, abrindo caminho para a
redução do impacto da violência sobre o processo educativo.
No dicionário da língua portuguesa, Aurélio, o termo violência é descrito como uma
"qualidade ou estado do que é violento; força empregada contra o direito natural de outrem;
11
ação que se faz com o uso da força bruta; crueldade; força; tirania; coação". Neste sentido, a
violência significa obrigar a fazer algo, utilizando a força, a coagir alguém.
Sobre a origem e as raízes da violência sabemos segundo os teóricos
1
que estudam e
escrevem sobre este assunto que ela é multicausal, bastante complexa, merece estudo
cuidadoso e acurado, mas não é objeto de nossa pesquisa. O objeto desta são as percepções de
educadores e alunos sobre as violências existentes nas relações cotidianas de uma escola
pública da rede estadual. É senso comum considerar-se que a origem e também as raízes da
violência estão na sociedade, na escola e na família. As leituras sobre o assunto bem como as
observações cotidianas indicam que pode haver outras causas além destas. Para estudar as
percepções dos alunos e educadores da unidade estudada, lançarei mão da definição dada por
estes autores abaixo, nos quais basearei minha dissertação.
MIRIAM ABRAMOVAY (2002) uma grande estudiosa do tema violência no Brasil
define assim violência:
Intervenção física de um indivíduo ou grupo contra a integridade de outro(s) ou de
grupo(s) e também contra si mesmo, abrangendo desde os suicídios, espancamentos
de vários tipos, roubos, assaltos e homicídios até a violência no trânsito (disfarçada
sob a denominação de “acidentes”), além das diversas formas de agressão sexual.
As violências podem ser agressão física, homicídios, estupros, ferimentos, roubos,
porte de armas - aquelas armas que ferem, sangram e matam. (ABRAMOVAY,
2002, s. p).
Outra definição importante é a de BERNARD CHARLOT (1997) que se refere à
dificuldade em definir violência escolar, pois remete a fenômenos heterogêneos difíceis de
delimitar e de ordenar. A violência varia em função de quem fala: ex: para alguns alunos dar
um tapa em um colega não é violência, para eles violência e quando você arranca sangue de
alguém ou mata.
CHARLOT (1997) classificou a violência escolar em três níveis:
1) a violência – golpes, ferimentos, violência sexual, roubos, crimes, vandalismo;
2) incivilidades – humilhações, palavras grosseiras, falta de respeito;
3) violência simbólica ou institucional – falta de sentido em permanecer na escola
por tantos anos; o ensino como um desprazer, que obriga o jovem a aprender
matérias e conteúdos alheios aos seus interesses; as imposições de uma sociedade
que não sabe acolher os seus jovens no mercado de trabalho; a violência das
relações de poder entre professores e alunos; a negação da identidade e satisfação
profissional aos professores, a sua obrigação de suportar o absenteísmo e a
indiferença dos alunos.
1
Muitas pesquisas que têm tratado da temática da violência na escola, como os estudos de SPÓSITO (1994),
WHITAKER (1994), FUKUI (1994), COLOMBIER (1989), MANGEL (1989) e PERDRIAULT (1989),
procuram analisá-la a partir de questões mais relacionadas à violência simbólica, à segurança da escola e,
principalmente, à depredação e deteorização do patrimônio escolar.
12
ALBA ZALUAR (1999: p.8 –9) no artigo “um debate disperso: violência e crime no
Brasil da redemocratização” apropriam-se da origem latina do termo violência – violência,
constituindo a idéia de vis, como sendo força, vigor, emprego de força física ou os recursos do
corpo em exercer a sua força vital. Para Zaluar, esta força ganha a dimensão de violência
quando ultrapassa limites socialmente estabelecidos em acordos tácitos, regras ou convenções
que ordenam relações, adquirindo carga negativa ou maléfica.
Vejo que cada um destes autores possui uma percepção própria sobre a questão da
violência. Qual destas formas de perceber a violência é a dominante na escola estudada.
Existirão na escola estudada outras maneiras de perceber a violência, isso que pretendo
compreender e descobrir ao longo de minha pesquisa.
Adotei neste trabalho uma abordagem qualitativa de pesquisa e como procedimento de
coleta de dados realizei uma revisão bibliográfica através de livros, artigos, dissertações,
análise livros de registros oficiais da unidade e trabalho de campo realizado por meio de
observação participante, de questionário com questões abertas e fechadas que foi completado
por uma entrevista estruturada realizada com 4 educadores e 7 alunos.
Pretendo escrever a dissertação em quatro capítulos, no primeiro vou escrever sobre a
minha história de vida, o caminho que trilhei a minha batalha pessoal para escolarizar-me
desde o primário até cursar a faculdade e chegar ao Mestrado, pois descendo de família
humilde, de pais são semi-analfabetos. Pretendo mostrar a relação existente entre o tema
escolhido e a minha história de vida, pois ao longo de minha trajetória escolar pude observar e
vivenciar muitos atos de violência tanto por parte dos professores como por parte dos alunos,
isso sempre me deixou intrigado, pois na maioria das vezes via posturas autoritárias
principalmente por parte dos professores, que não entendiam que muitas vezes um
comportamento agressivo de um aluno é um grito de pedido de socorro. No capítulo segundo,
pretendo escrever sobre a formação de professores, um tema bastante presente na literatura
relativa ao campo educacional e que freqüentemente é relacionado com a possibilidade de
melhoria da qualidade da educação. No capítulo terceiro, apresentarei um estudo sobre a
questão da violência recorrendo para isso a pesquisadores e estudiosos do tema e no capítulo
quarto, pretendo identificar quais as percepções da comunidade escolar sobre a violência na
escola e como estas percepções interferem nas relações de ensino e aprendizagem, buscando
encontrar alternativas para lidar com esse problema que tanto aflige as famílias e os
educadores.
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Capitulo I
1 – História de vida
A violência, seja qual for à maneira como ela se manifesta, é sempre uma
derrota. (Jean-Paul Sartre).
Neste capítulo farei um breve histórico do que aconteceu na minha vida ao longo
destes anos e como sempre deparei com a violência na educação e no cotidiano, motivo ao
qual me levou a escolher este tema para a minha dissertação de Mestrado.
Nasci na zona rural do município de Diamantina (Cidade histórica) localizada no norte
do Estado de Minas Gerais, no vale do Rio Jequitinhonha. Região muito pobre que faz parte
do polígono das secas, devido à pouca quantidade de chuva na região.
O povo que vive nesta região leva uma vida simples de homem do campo sem muitas
perspectivas de futuro, pois são esquecidos pelo poder público. Quase não são feitas políticas
públicas de inclusão às classes menos favorecidas no Brasil, principalmente para este povo
que vive isolado no meio rural.
Vivi toda minha infância na zona rural, somente fui para a cidade aos 11 anos para
continuar os meus estudos, pois na localidade onde morava só tinha escola até a terceira série
do ensino fundamental.
Os meus pais chamam-se João Antônio Teixeira e Maria Aparecida Souza Teixeira,
pessoas simples e que não tiveram chance de estudar, mas que sempre me estimularam a
estudar e buscar o melhor para a minha vida.
Meu pai trabalhava como Balseiro transportando carros sobre o rio Jequitinhonha para a
prefeitura Municipal de Diamantina, quando estava em horário livre trabalhava na roça
praticando agropecuária. A minha mãe além dos seus afazeres domésticos do lar como: cuidar
das crianças, costurar, cozinhar, ainda ajudava meu pai na lavoura.
A relação com o trabalho de meu pai era de orgulho, achava a sua profissão bastante
honrosa e até mesmo heróica, pois muitas vezes durante as cheias do rio, meu pai até
arriscava a vida fazendo a travessia dos carros. Lembro que meu pai ajudava muito as
pessoas, pois muitos chegavam sem dinheiro para pagar a travessia da balsa e o meu pai
correndo risco de perder o emprego atravessava os carros sem receber pela travessia ou
deixava para receber a passagem depois.
Sinto uma nostalgia muito grande ao lembrar-me desta época, meu pai conhecia muita
gente e todos os dias víamos gente diferente passando pela balsa, era divertido todo aquele
movimento de pessoas.
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Os meus pais são semi-analfabetos, não tiveram a oportunidade de estudar, mas sempre
deixaram claro para mim a importância da educação. Tanto que eu e meus irmãos só
ajudávamos na roça uma parte do dia, quando chegávamos da escola.
Meus pais diziam constantemente que estudar era necessário para termos uma vida
melhor e não ficar como eles sofrendo, trabalhando na roça dos outros, pois o que ganhavam
dava somente para a nossa alimentação.
Lembro-me de uma cena onde meu pai mostrava para mim suas mãos calejadas de tanto
trabalhar capinando, cortando de machado e dizendo: “Está vendo minha mão meu filho, isso
é por que não tive oportunidade de estudar, portanto valorize essa oportunidade que estou
dando para vocês e aproveitem”.
Essa cena nunca saiu da minha cabeça talvez seja esse um dos motivos que me
impulsionou a estudar e me dedicar à carreira do magistério. Fiz o primário na Escola
Municipal Vargem de São João, se é que podemos chamar um cômodo minúsculo de pau a
pique de escola. Da primeira a terceira série do ensino fundamental estudei com uma
“professora leiga
2
”. O seu nome é Zenilha Pionil de Souza Reis, ela não era formada na época
e ficava com muitos alunos na mesma sala. Alunos de 1ª, 2ª e 3ª séries todos juntos em bancos
coletivos.
Normalmente a professora dividia a lousa que já era minúscula em três partes, e em cada
parte ela passava uma atividade para cada série.
Não sei como ela fazia para dar conta de lecionar para tantos alunos e de níveis
diferentes, só sei que estudei com ela durante 03 anos e fui por ela alfabetizado.
Em contraponto, outros alunos não foram alfabetizados, alguns que não conseguiam
aprender devido à falta de condições materiais, econômicas e financeiras desistiam da escola e
iam se dedicar à agricultura, iam trabalhar na roça. Presenciei naquela época pais dizendo: “
que você é burro mesmo e não aprende, não tem jeito para escola, você vai me ajudar na
roça”.
Na época achava normal pensava que alguns não conseguiam aprender mesmo, mas
vendo hoje de forma crítica acho um crime, pois todos temos condições de aprender, claro que
alguns mais depressa outros mais devagar cada um em seu ritmo.
Minha primeira professora era uma pessoa muito compromissada, mas às vezes era
muito autoritária e usava alguns métodos incomuns como puxões de orelha, bater com régua
2
Leiga no sentido que não tinha formação acadêmica como professora, no entanto, mesmo sem a formação para
o magistério conseguia alfabetizar a maioria dos alunos em condições adversas como veremos a seguir.
15
na cabeça dos alunos para manter a ordem e a disciplina, e até mesmo cortar as unhas dos
alunos e dar banho em todos que iam para a escola sujos.
Cabe frisar como era uma comunidade da zona rural e ela era amiga de todos os pais e
até parentes de alguns, ela tinha o “aval” dos pais para fazer isso. Apesar de agir desta forma
sendo leiga como era, alfabetizar centenas de alunos como ela fez, não é tarefa fácil, em vez
de criticada entendo que deva ser elogiada, pois sem recursos mínimos já que a sala de aula
era minúscula e com alunos de várias séries juntos, essa professora “fazia milagres” ao
alfabetizar e educar tantos alunos.
Minha infância na zona rural foi muito divertida, na minha família, por ser numerosa,
sempre tinha com quem brincar. Fazíamos várias brincadeiras como andar em pernas de pau,
subir em árvores, fazíamos pescarias e à noite também era divertido, pois meus pais e avós
sempre tinham uma história de assombração para contar para gente.
Havia um encantamento de todos por essas histórias. Talvez falte às nossas escolas de
hoje e também aos pais de hoje contar histórias para os seus filhos, pois é um momento
mágico para ambos.
Minha família plantava todos os anos e na época da colheita meu pai combinava com a
professora que naquele mês, ou naquela semana, eu não poderia ir à escola. Teria que dedicar
o dia inteiro à colheita na roça. Nós plantávamos milho, feijão, arroz, abóbora, cana de açúcar
etc, quase tudo que usávamos em casa para a nossa alimentação era tirado das nossas
plantações. O processo de plantio era manual, usando enxada para capinar e fazer as covas
para plantarmos já que não possuíamos trator. Às vezes também o meu pai pegava emprestado
o arado puxado a cavalo de um vizinho para arar a terra. A colheita também era feita
manualmente por toda a família, lembro também às vezes na época da capina e da colheita a
comunidade se organizava em mutirões onde todas as famílias da região trabalhavam nas
roças de cada um até terminar a capina e a colheita. Era bem divertido toda aquela gente
trabalhando juntas.
A economia da região era quase toda baseada na agropecuária e somente na época da
colheita que víamos a movimentação de dinheiro, mas era bem pouco, pois metade do que
produzíamos ia para o dono da terra.
Quando estávamos trabalhando na capina ou na colheita a professora compreendia, pois
fazia também parte da comunidade, ela adaptava sempre o calendário escolar
3
, pois isso não
3
O calendário escolar desta escola rural era feito respeitando as peculiaridades locais de plantio e colheita uma
vez que a maioria dos alunos em certa época do ano tinha que se ausentar da escola para ajudar os pais na
lavoura.
16
acontecia somente comigo, mas também com todos os alunos daquela comunidade. Com isso
não havia prejuízo para nenhuma das partes.
Uma das primeiras vezes em que presenciei a exploração e a violência, eu tinha mais ou
menos oito ou nove anos. Vi quando o meu pai fazia a partilha da colheita do que
plantávamos, o meu pai era “Meeiro” (plantava na proporção de metade com o dono do
terreno), tinha que dar a metade de tudo que produzia para o dono da terra.
Sempre achava aquilo uma violência e uma injustiça, não entendia porque tínhamos de
dar metade do que produzíamos para quem não ajudou trabalhar preparando a terra,
plantando, cuidando da plantação, capinando etc. Não imaginava naquela época que aquele
dono de terra era um coronel que comandava a região e que a única saída para não dividir a
produção é a tão sonhada reforma agrária que infelizmente o Brasil não concretizou até o
presente.
Toda a comunidade restante vivia da agricultura e da criação de alguns animais, alguns
como o meu pai sendo Meeiros, outros trabalhando por dia para os fazendeiros da região sem
nenhum direito trabalhista como férias, décimo terceiro, fundo de garantia por tempo de
serviço etc.
Apesar de ser uma violência contra àqueles trabalhadores rurais na época eu não tinha
clareza desta situação.
No entanto, a minha vida na zona rural era super agitada e alegre, ao contrário do que
pensam as pessoas que moram nas grandes cidades, pois cada dia era uma aventura. Eu me
divertia muito, apesar de estar longe do conforto da cidade grande, na minha casa, por
exemplo, não havia água encanada, e nem precisava, pois havia um rio gigante bem próximo
de casa. Eu passava boa parte do dia tomando banho, quando não estava ajudando o meu pai
na lavoura ou não estava na escola.
Outro momento marcante da minha juventude era a minha ida à escola. Eu e meus
irmãos e alguns vizinho, íamos juntos e caminhávamos entre quatro ou cinco quilômetros até
chegar à escola.
Durante este percurso brincávamos e nos divertíamos muito, pegávamos mangas,
laranjas, subíamos em árvores, corríamos atrás dos animais, brigávamos e brincávamos muito,
corríamos para ver quem chegava primeiro, era uma festa o trajeto para escola.
Lembro ainda que havia uma rivalidade muito grande entre os meninos que moravam de
um lado do rio e nós que morávamos do outro lado.
O meu pai gostava muito de futebol inclusive recebi o meu nome em homenagem ao
grande jogador “Wilson Piazza”. Meu pai gostava tanto de futebol que fez um time de
17
crianças, pois só lá em casa já tinham seis jogadores. A rivalidade do nosso time com o do
time do outro lado do rio era grande, mas sempre saíamos ganhando por que eu tinha um
irmão que era craque no futebol e praticamente ganhava os jogos sozinho.
Voltando a falar de minha educação escolar e minha professora da primeira a terceira
série, devo elogiá-la e agradecê-la muito por ter me alfabetizado e educado. Sendo leiga como
era, sem nenhum apoio material ou pedagógico. Além de dar aula para todos nós de 30 a 40
alunos de diversos níveis ela ainda fazia faxina na escola e merenda, ou seja, era uma mulher
polivalente. Não sei como ela dava conta de tudo isso, era uma verdadeira guerreira.
Chegou uma época em meados dos anos 80 que o MOBRAL
4
surgiu como um
prosseguimento das campanhas de alfabetização de adultos iniciadas com Lourenço Filho. Só
que com um cunho ideológico totalmente diferenciado do que vinha sendo feito até então,
segundo BELO (1979). Apesar dos textos oficiais negarem, sabemos que a primordial
preocupação do MOBRAL era tão somente fazer com que os seus alunos aprendessem a ler e
a escrever, sem uma preocupação maior com a formação do homem.
O Mobral foi criado pela Lei número 5.379, de 15 de dezembro de 1967, propondo
a alfabetização funcional de jovens e adultos, visando “a conduzir a pessoa humana
a adquirir técnicas de leitura, escrita e cálculo como meio de integrá-la a sua
comunidade, permitindo melhores condições de vida. Apesar da ênfase na pessoa,
ressaltando-a, numa redundância, como humana (como se a pessoa pudesse não ser
humana!), vemos que o objetivo do MOBRAL relaciona a ascensão escolar a uma
condição melhor de vida, deixando à margem a análise das contradições sociais
inerentes ao sistema capitalista. Ou seja, basta aprender a ler, escrever e contar e
estará apto a melhorar de vida. (BELLO, 1979.)
Lembro que a minha professora abraçou a causa e lecionava durante o dia para nós e à
noite para os nossos pais, era uma tarefa árdua para ela. Essa professora morava há um seis
quilômetros e fazia esse trajeto a pé quatro vezes por dia. Todavia isso não era empecilho.
, Algo que minha professora do primário fazia, e que ficou marcado, que nunca esqueci,
era o seu famoso bolo de aniversário, todos os meses ela juntava os aniversariantes daquele
mês e cada um levava um ingrediente e ela fazia o bolo. Era uma alegria imensa para todos,
pois sabíamos que se a professora não fizesse a maioria das crianças nunca poderia
comemorar o aniversário, as famílias eram muito humildes.
Outro fato marcante que não esqueço é que nos finais de semana essa professora nos
convidava para ir para escola para que ela contasse histórias para gente, eram histórias
religiosas, fábulas, aventuras que até hoje estão na minha memória.
4
(Movimento Brasileiro de Alfabetização)
18
Quando terminei o primário fui estudar em uma cidade próxima chamada de Olhos
D’água, na época não era cidade ainda e fazia parte do município de Bocaiúva no norte de
Minas Gerias. Fui morar na casa de uma tia para estudar, achei tudo estranho, tudo diferente,
mas sempre com o apoio de meus pais, incentivando para estudar consegui terminar o antigo
primeiro grau hoje ensino fundamental.
Nesse momento em que fui estudar na cidade comecei a sentir preconceito e
discriminação, como era da zona rural, muitas vezes os alunos da cidade faziam brincadeiras
de mau gosto e colocavam apelidos pejorativos. Na maioria das vezes as professoras não
falavam nada, pois elas faziam parte daquela classe média da cidade e não davam muita
confiança para os alunos que vinham do meio rural.
No começo pensei até em desistir por causa das provocações e gozações dos alunos da
cidade, cheguei até a repetir o ano o que deixou a minha professora da zona rural muito
chateada, pois mesmo depois que parávamos de estudar, ela ficava acompanhando a nossa
evolução. Mas com o passar do tempo às provocações diminuíram eu me adaptei e consegui
terminar o ensino fundamental.
Outro período da minha vida que não foi fácil, foi a partir dos 12 anos de idade. Eu já
havia começado a trabalhar em empresas de reflorestamento
5
, fazendo diversas atividades
como combate de formigas, juntando lenha, enfim, serviços gerais. Era uma rotina duríssima e
exaustiva, havia dias que eu nem agüentava ir à escola, pois estudava à noite e trabalhava
durante o dia, era uma rotina desgastante para um adolescente. Mas não desisti, cheguei a
repetir o ano, pois muitas vezes ia para escola somente para dormir, pois estava exausto e
cansado.
Eu ficava chateado e achava muito injusto ter que trabalhar tão cedo, enquanto a maioria
dos alunos de minha sala eram filhos de comerciantes, vereadores, fazendeiros, e tinham todo
o tempo livre para dedicar aos estudos. Mas era preciso trabalhar, eu tinha que ajudar no
sustento de casa, a essa altura meus familiares já estavam morando todos na cidade, com
família numerosa, os filhos mais velhos deviam ajudar no sustento da casa. Foi uma época
difícil, mas conseguimos superar.
Em relação à saída de minha família do campo e sua vinda para cidade, isso aconteceu
devido à construção de uma ponte sobre o Rio Jequitinhonha, o meu pai era balseiro e com a
construção da ponte a prefeitura não precisava mais de seus serviços.
5
Plantavam eucalipto para a produção de carvão vegetal.
19
Por não ter terra e morar em terra de um fazendeiro meus pais acharam melhor ir viver
na cidade. Em termos de Brasil, o êxodo rural ou a saída do homem do campo para a cidade
tem um significado muito grande e com impacto social gigantesco. O homem que sai do
campo e vem para as cidades geralmente vai morar na periferia em péssimas condições de
vida causando o “inchaço” das grandes cidades. Este não tem mão de obra qualificada e logo
estará marginalizado do processo produtivo tendo que viver de forma precária, infelizmente
foi isso que aconteceu com a minha família.
Quando terminei o ensino fundamental foi outra luta, na minha cidade não havia escolas
de Ensino médio. Prestei então uma prova seletiva e fui estudar em uma cidade distante em
um colégio interno, tanto por falta de opção, quanto pela qualidade de ensino desta escola.
Fui estudar na Escola Agrotécnica Federal de Januária (Atual CEFET Januária), que está
localizada no município de Januária, norte do Estado de Minas Gerais, além do curso normal
de Ensino Médio oferecia o curso Técnico em Agropecuária.
Fiz ambos os cursos e aprendi muita coisa interessante. Além dos conteúdos, aprendi a
ser independente e resolver os meus problemas, pois ficava interno nesta escola e somente ia
para a casa no mês de Dezembro e janeiro período de férias.
A minha passagem neste colégio foi muito proveitosa, além de adquirir muito
conhecimento fiz muitas amizades, foi um orgulho para os meus pais quando no ano de 1996,
eu conclui o curso Técnico em Agropecuária e o Ensino Médio, eu era o primeiro integrante
da família a realizar “tal proeza”. Era a primeira pessoa da família que conseguia como se diz
no interior terminar os estudos, que na verdade estavam apenas começando.
Quando terminei esse curso Técnico cheguei a elaborar currículos e distribuir em
algumas Empresas para trabalhar como Técnico em Agropecuária, mas fiquei durante seis
meses aguardando respostas das Empresas e não fui chamado em nenhuma.
Decidi então a vir para São Paulo a convite de um tio meu para trabalhar, no primeiro dia
que cheguei já comecei a trabalhar. Trabalhava como Porteiro de um edifício residencial
próximo à Avenida Paulista, via muitos jovens na minha faixa etária fazendo faculdade, eu
ficava inquieto sonhando com o dia que eu também estaria cursando a minha faculdade.
Todavia meu sonho não tardou a acontecer no ano de 1998 prestei vestibular e em
1999 comecei a freqüentar a Universidade, era uma luta e tanto devido ao cansaço, e também
devido às minhas condições financeiras, mas como muito esforço consegui chegar ao ensino
superior.
A minha trajetória no Ensino Superior não foi muito tranqüila. Por ascender de família
pobre e ser migrante em São Paulo, cursar a faculdade para mim sempre foi um sonho, uma
20
utopia. Eu morava junto com um irmão que sempre me incentivava a estudar, nesse período
eu trabalhava no período noturno o que dificultava o meu ingresso na Universidade.
No ano de 1999 surgiu uma vaga para eu trabalhar no período diurno, não pensei duas
vezes, fui trabalhar durante o dia.
Fiz minha matrícula em fevereiro de 1999, o que eu ganhava em meu emprego mal dava
pra pagar os estudos e me sustentar, pensei em até desistir do curso. Pedir ajuda aos meus pais
era impossível, eu é que deveria ajudá-los, pois meu pai ganha salário mínimo e minha mãe é
dona de casa a renda de minha casa não dava nem para o sustento da família.
Com relação ao curso propriamente dito, no começo, devido à minha submissão e
passividade não tive muitas complicações. Mas no decorrer do Curso quando comecei a me
tornar crítico, questionador e consciente, começaram a surgir alguns problemas. No início, eu
era passivo e submisso do ponto de vista intectual, pois aceitava quase tudo em silêncio,
mesmo quando vislumbrava uma situação de injustiça não me manifestava. Um exemplo de
minha passividade foi quando uma professora me deu uma nota abaixo da média e ao
consultar as minhas anotações, as apostilas do curso e as questões da avaliação pude constatar
que estava quase idêntico ao respondido e mesmo assim não tive a ousadia ou coragem de
questionar a professora. Era o meu primeiro ano do curso.
Uma cena que marcou muito foi uma aula de História Antiga, eu estava no segundo da
Faculdade de História. Foi quando ao estudarmos um autor, eu falei para a professora que eu
não concordava totalmente com suas idéias e que havia vários pontos que cabiam
questionamentos. Foi quando a professora me respondeu que cabiam sim, questionamentos,
pois a História é dinâmica e nenhuma verdade pode ser considerada definitiva.
Foi a partir daí que senti que minha relação com o conhecimento podia ir além da
submissão. A prova disso que depois desse fato ao invés de ser somente receptor de
conhecimento passei a dialogar a entrar em conflito com os professores à medida que fazia
debates e discussões. Fiquei até conhecido na faculdade como o aluno perguntador e
questionador.
A minha relação com alguns dos meus professores da graduação era de autoria, de
diálogo, debates e discussões. Por exemplo, a professora de História da cultura era bastante
democrática e sempre dava vez e voz para os alunos. Com ela aprendi realmente o que
significa democracia e a respeitar as diferentes culturas, aprendi que muitas vezes o ouvir vale
mais do que o falar, e que muitas vezes ao dar a vez e voz aos seus alunos você também
aprende com eles.
21
A partir daí, durante a graduação sempre fui um aluno participativo e com
comprometimento tanto nas leituras, como nos debates em sala de aula, como nas pesquisas e
seminários que os professores aplicavam.
Outra cena marcante em minha graduação, que não esqueço jamais, foi quando uma
professora de sociologia começou a fazer uma descrição do perfil dos alunos na sala aula.
era o segundo ano e ela se lembrava de detalhes sobre cada um de nós, sobre como éramos
tímidos e submissos e depois com o passar do tempo como ficamos, alguns se tornaram
participantes críticos, outros continuavam iguais.
No meu caso, ela disse que eu havia melhorado bastante, pois no primeiro momento ela
me viu quieto, calado e tímido, mas que com o passar do tempo ele via o meu progresso em
relação ao saber e o conhecimento.
Depois que terminei a Graduação comecei a lecionar, como todo início de carreira foi
difícil, foram atribuídas poucas aulas para mim, e o pior muito longe de casa, acabava
pagando para dar aulas, pois tomava 3 conduções para chegar até a escola.
Terminei a Licenciatura
6
no ano de 2002, em 2003 prestei concurso para professor
PEBII da Rede Estadual e fui aprovado. Cargo o qual assumi em 2004 e continuo lecionando
até hoje, em 2005 também fiz concurso para Professor Adjunto da prefeitura Municipal de
São Paulo também fui aprovado e assumi este cargo em 2006. No ano de 2007 fiz concurso de
acesso e me tornei professor titular da prefeitura Municipal de São Paulo.
No primeiro momento não tinha em mente o que era ser professor, ao entrar em sala a
primeira vez eu fiquei muito nervoso, suava bastante. No entanto, o que me veio a mente
depois de uma rápida apresentação foi o que os professores ao longo de minha carreira escolar
faziam, encher à lousa
7
de lição como forma de controlar a sala e evitar perguntas e
questionamentos.
Não recebi muito apoio dos colegas e direção, pelo contrário, fui praticamente jogado
na pior sala da escola, sala esta em que os alunos ficavam o tempo todo desafiando os
professores, atirando ovo e bolas de papel, era uma sala muito indisciplinada e ninguém
gostava de lecionar nesta sala.
Ninguém queria dar aula nessa sala praticamente eu entrava todos os dias nela, foram
então atribuídas para mim cinco aulas nesta sala, sendo três de História e duas de Geografia.
6
Licenciei-me no curso de História obtendo o título de Licenciatura plena no ano de 2002.
7
O encher a lousa infelizmente é um recurso usado por professores iniciantes e até por professores que estão há
muito tempo no magistério como forma de controle da sala de aula, naquele momento foi a alternativa usada por
mim.
22
No começo eles me desafiaram jogaram bolas de papel em mim, mas como residia no
entorno da escola fui vendo estes alunos nas imediações da escola e fui conversando com eles
e fazendo amizade com eles. Pude ver que aqueles alunos não eram na verdade tão
indisciplinados e rebeldes, eles na verdade estavam querendo ser ouvidos, pois os professores
chegavam na sala nem davam boa noite e já enchiam a lousa de lição, como, aliás, cheguei
fazendo no início, pois não havia diálogo com esses alunos.
O me tornar professor me mostrou que muitas vezes taxamos determinados alunos de
violentos e indisciplinados, mas que na verdade eles estão dando um grito de socorro, tem
essa postura e essa atitude como forma de chamarem atenção dos professores, esse foi
também um dos motivos que me levou a escrever sobre a violência na educação.
A minha entrada no Mestrado foi para buscar respostas ao que me defrontava
cotidianamente dentro da escola com a violência indisciplina, opressão.
No começo, pensava que tudo isso era culpa ou dos pais ou dos alunos, nunca pensava
que a escola e os professores também poderiam ser promotores da violência escolar, mas o
Mestrado, as leituras, as discussões e debates contribuíram para a construção da visão que
tenho hoje. A de que a violência na educação é um tema muito complexo, e que não pode ser
explicado somente de um ponto de vista, é necessário fazermos estudos acurados e com rigor
científico para desvendarmos assunto tão relevante.
Atualmente acumulo cargos na rede municipal e estadual, foi lecionando nessas Redes
que tive contato com o racismo, o preconceito, a discriminação, a violência com que vários
colegas professores tratam os alunos. Talvez anteriormente até tivesse tido contato com essas
práticas, mas para mim não era claro. Foi daí que senti a necessidade de pesquisar a percepção
que a comunidade escolar tem da violência que acontece na escola.
Após ser aprovado nestes dois concursos e começar a lecionar na rede pública paulistana
a qual não conhecia muito bem, pois estudei em Minas gerais. Comecei a ter contato com as
diversas formas de violência existente dentro da instituição escola. Fiz então um retrospecto
de minha história de vida e pude constatar que desde a infância trabalhando na roça com o
meu pai, tive contato com a violência e a exploração, meu pai trabalhando e tendo que dividir
metade da produção com o dono da terra.
Depois foi na cidade onde no início sofri muito preconceito e discriminação por ter vindo
da zona rural, continuando minha trajetória quando me mudei para São Paulo também senti o
preconceito e a discriminação por não pertencer à classe média. Fui trabalhar em um
condomínio, servindo a classe média, trabalhei vários anos em serviços de baixa qualificação
por não ter acesso ao ensino superior que devia ser dado a todos que quisessem cursá-lo.
23
Após estar formado e prestar concurso na rede estadual de São Paulo, continuo
presenciando várias formas de violência contra os alunos e contra os professores. Por isso,
então, o meu interesse em pesquisar e escrever sobre tema tão importante e relevante e que me
acompanha de uma forma ou outra desde a minha infância.
Em relação a minha história de vida e o tema escolhido para minha dissertação, em
vários momentos de minha vida presenciei diversos tipos de violência, injustiça e opressão na
escola e fora dela, contra os alunos, sobretudo os mais pobres. Presenciei injustiça e violência
quando meu pai trabalhava na terra de um fazendeiro e tinha que dar metade da produção para
o dono da terra já que não possuíamos terra para plantar.
Presenciei preconceito e discriminação quando fui estudar na cidade e os alunos
colocavam apelidos pejorativos e a professora não fazia nada para combater o preconceito e a
discriminação. Diante de todos esses acontecimentos fui impulsionado e escrever sobre este
tema tão relevante.
Os estudos realizados no Programa de Mestrado em Educação, os contatos com os
colegas de profissão, os noticiários cotidianos na imprensa falada e escrita, enfim, a minha
vivencias enquanto cidadão e profissional indicam que a questão da violência é bastante
complexa. Trata-se de tronco com raízes variadas e profundas, algumas delas com
impressionante poder de mutação. Não se trata de um problema para ser enfrentado
individualmente, por um grande herói como parece sugerir a ideologia que muitas vezes
invade nossas casas através dos meios de comunicação, sobretudo o cinema. Pela sua
complexidade parece tratar-se de um tema para ser abordado pelo conjunto da sociedade e
creio que neste conjunto os educadores têm papel muito importante.
Pensando nas vivências na escola, antes como aluno e agora como educador penso que
muitas vezes as ações da escola corroboram com a violência que lhe é uma ameaça, muitas
vezes por falta de sensibilidade para encontrar o ser humano que às vezes está escondido em
atitudes dos jovens que chegam à escola sem a promessa de um futuro bom. Essa percepção
indicou a necessidade de refletir sobre esse tema, contribuindo, assim, para a criação de
condições para que a escola se prepare para lidar melhor com ele. Neste sentido, pareceu-me
fundamental discutir a relação entre a formação dos educadores e a construção de condições
para que a escola encontre formas de lidar com a violência diferente daquelas que vem
utilizando e que muitas vezes, antes de combater a violência acaba promovendo-a.
A escola é uma organização que tradicionalmente assumiu a responsabilidade de
inserir os indivíduos na sociedade por isso, no seu cotidiano, em muitas situações, algumas
relações da sociedade são reproduzidas. Embora não se possa considerar a escola como a
24
única responsável pela violência é importante discutir a sua contribuição neste processo na
medida em que ela reproduz algumas situações de injustiça, preconceito e discriminação que
se encontram presentes no tecido social.
Neste sentido, formar professores capazes de lidar com situações cotidianas
incentivando a convivência produtiva entre pessoas com interesses e identidades diferentes,
que se encontram no cotidiano da escola é importante no trabalho escolar, o que nos leva a
refletir sobre a formação de professores, buscando compreender a relação entre as práticas
que se desenvolvem na escola e o respeito às identidades das crianças que chegam à escola
para serem inseridas na sociedade.
25
Capítulo II
1 - A Formação de professores: Um caminho para educação de qualidade.
Pelos mais variados caminhos, alguns professores assumem sua própria formação,
isso significa responsabilizar-se pelo seu próprio desenvolvimento, fazer suas
escolhas, aproveitar as oportunidades que lhe são oferecidas pelas políticas
públicas, pelas instituições escolares e pela própria vida. ( FURLANETTO, 2006 p:
47).
A Formação de professores hoje é um tema que está em evidência no cenário nacional e
internacional. Muitos autores vêm relacionando a formação dos professores com a
necessidade de melhoria da qualidade da educação oferecida às crianças, sobretudo nas redes
públicas de ensino. Refletir sobre a melhoria da qualidade de ensino não pode prescindir da
discussão sobra as condições de trabalho do professor nem sobre as condições de estudo dos
alunos. Os aspectos envolvidos nas condições de estudo e de trabalho são vários, mas
coerente com os propósitos deste estudo, pretendo discutir apenas a violência na escola que
constitui um dos importantes dificultadores tanto do ensino quanto da aprendizagem.
Antes de discutir a relação entre as práticas desenvolvidas na escola e a produção e
reprodução da violência, pretendo traçar um panorama sobre a formação dos professores,
buscando compreender quais são as tendências que vem sendo desenvolvidas neste campo nas
ultimas décadas. Comecemos recorrendo ao filósofo KANT que afirmava que o homem é a
única criatura que precisa ser educada. Isso significa que o homem precisa da educação para
que seja constituído.
O homem quando nasce não está equipado, nem orientado para encarar o mundo. Ele
precisa de formação humana, que é um ato intencional, que é uma ação externa a ele. Para
mim este ato externo é a educação, que no sentido geral são todas as experiências de vida na
escola e fora dela, pode ser dada pela família, pela igreja, pelos sindicatos pelo mundo que o
cerca e se caracteriza por ser informal em contrapartida a educação escolar é feita
exclusivamente na escola de forma sistemática, planejada, progressiva e intencional.
Com relação à formação de professores partimos do pressuposto que a formação não
acaba na graduação ou no curso de licenciatura de formação de professores, nem segue uma
linha cronológica, linear, como é possível observar no trecho seguinte:
A formação do professor, não é linear; por isso um programa pensado longe de sua
realidade, desvinculado de seus sonhos, nem sempre atende à singularidade de seu
26
processo. A formação de cada um é um processo singular, rico em detalhes, nem
sempre perceptíveis à primeira vista. Cada um tem sua história, cheia de encontros
e desencontros, de limites e possibilidades, que precisa ser levada em conta. Não
levar em conta o processo de cada um pode ser uma das razões que dificultam o
envolvimento dos educadores com os programas oficiais de formação.
(FURLANETTO, 2004).
Além deste caráter singular que assume o processo de formação de cada indivíduo é
importante destacar que ele se estende pela vida inteira e abrange tanto os aspectos pessoais
quanto profissionais. Neste sentido, destaco o pensamento de FURLANETTO (2004) quando
menciona a especificidade do processo de formação de cada professor. Pois somos únicos na
aventura da vida, cada um de nós aprende e se forma de maneira distinta. Uns mais depressa
outros mais devagar, mas uma coisa é certa, todos aprendemos a cada dia, a cada aula, a cada
momento que estamos em sala com nossos alunos, aprender com a própria prática pode ser
entendido como um processo importante de formação continuada.
O mundo em que vivemos hoje exige um nível mais elevado de conhecimento e não
atinge somente o setor da educação, atinge a todas as áreas. Dessa forma a educação deixa de
ser uma breve passagem pelos bancos escolares, trata-se de aprender a reaprender em todas as
fases de nossa vida, na infância, na juventude e também na velhice, e a organizar a nossa vida
pessoal e profissional em função desta necessidade de aprendizagem constante.
Atualmente já não basta que cada um acumule no começo de sua vida umas lições,
devemos sempre atualizar
aprofundar e enriquecer estes primeiros conhecimentos e
se adaptar a um mundo em mudanças. (DELORS, 1999, pág. 89).
Nessa perspectiva a formação ganha características de auto-formar-se, de possibilidade
do indivíduo conduzir o próprio o processo formativo que se desenvolverá ao longo de sua
vida. O que estamos discutindo é a necessidade de formação contínua do sujeito, pois em um
mundo tão dinâmico e globalizado onde tudo se torna obsoleto em tempo muito breve, não dá
para pensar a formação como algo estanque e que tenha um fim.
Neste sentido, vale destacar os trabalhos desenvolvidos no campo da formação de
professores em perspectivas diversas, como a formação a partir das experiências de vida
(JOSSO, 2004), a organização educativa como local de formação (NOVOA, 1992), saberes
necessários ao exercício da docência (TARDIF, 2002) profissionalização docente
(MIZUKAMI, 2002), professor reflexivo (SCHON, 1992) entre outras perspectivas.
O contato com estes autores durante as aulas e atividades desenvolvidas durante o
mestrado encaminharam-me no sentido de ver o processo de formação do professor para além
27
daquele profissional formado nos termos do paradigma da racionalidade técnica que, como
podemos ver no trecho seguinte não leva em conta a subjetividade do sujeito em formação
como podemos entender com a leitura do trecho seguinte:
Para pensar na formação de professores, neste momento, é necessário ir além de
modelos que privilegiem a racionalidade técnica; devemos levar em conta os
avanços culturais e o surgimento dessa nova subjetividade. Não podemos mais
pensar em um professor abstrato genérico, não podemos mais acreditar de maneira
ingênua que a formação de professores acontece somente nos espaços destinados a
esse fim. (FURLANETTO, 2004, p. 14).
A vivência proporcionada pelo Programa de Mestrado me levou a perceber a influência
do modelo de formação baseado na racionalidade técnica na minha própria formação e na
formação de muitos professores que hoje atuam no sistema estadual de ensino. Levou-me,
igualmente, a vislumbrar a possibilidade de superar traços desta formação presentes em
nossas práticas cotidianas através de processos de formação continuada que assumam a
reflexão sobre a própria prática como metodologia de formação e produção de conhecimento.
Desta forma podemos superar a condição de profissionais cuja atuação é marcada pela não
reflexão, de apenas técnicos que executam programas e políticas pensadas longe do nosso
local de atuação. Se faz necessário que assumamos também a condição de produtores de
conhecimento e que façamos do nosso espaço de atuação um lugar onde o status quo é
questionado, e a reflexão sobre o modelo de sociedade que desejamos seja inerente ao
trabalho. Recorro a SACRISTÁN (2000) que frisa a necessidade de superar a perspectiva do
professor como um executor de ordens concebidas fora do seu espaço de trabalho.
O professor não deve mais ser concebido como um técnico, um "simples executor
de normas e coadjuvante da função reprodutiva da escola", mas sim como um
profissional crítico e reflexivo sobre questões essenciais em sua prática docente,
"contribuindo tanto para a renovação do conhecimento pedagógico quanto do
próprio ensino, na tentativa de permanentemente o adequar às necessidades dos
alunos na época de transição em que vivemos" (SACRISTÁN, 2000. p. 44)
A citação acima chama a atenção para um ponto importante no meu processo de
formação: sempre pensei que existia uma fórmula ou uma receita para ser um professor
reflexivo e que a academia possui esta formula milagrosa. Ao entrar em contato com os
teóricos que trabalham no campo da formação de professores comecei a perceber que não é
28
tão simples assim e que na verdade não existe nem uma fórmula em nenhum lugar, menos
ainda na academia.
Na verdade, para mim foi uma descoberta importante perceber que a escola é também
um lugar de formação de professores, que esta não acontece somente nas Universidades e nos
cursos de formação realizados fora do espaço escolar. O professor se forma também ao longo
de sua vida, não apenas por meio de sua carreira acadêmica, dos cursos, palestras, seminários
e congressos em que participa, mas também por meio do seu dia-a-dia, na convivência
cotidiana nos diversos espaços dos quais participa. Neste caso podemos considerar que, como
afirma JOSSO (2004), há uma situação de aprendizagem pela experiência.
Em linguagem corrente, aprender pela experiência é ser capaz de resolver
problemas dos quais se pode ignorar que tenha formulação e solução teóricas.
(JOSSO, 2004: p.39)
A experiência mostra que o cotidiano da escola encontra-se marcado por esses
problemas e, sobretudo, que mesmo quando eles são resolvidos de forma satisfatória
geralmente não são considerados como elementos importantes no processo de formação.
Nesse sentido parece importante considerar a necessidade de refletirmos sobre a nossa prática.
Nesta perspectiva ganha importância a formação do professor enquanto profissional reflexivo
como propõe GOMEZ (in: NOVOA, 1992, p.109). Para esse autor:
O fracasso das instituições de formação de professores, amplamente reconhecido
em Espanha, não é fruto de incompetências pessoais, mas sim do modelo de
racionalidade técnica subjacente à sua concepção da prática e da formação de
profissionais. Com a crise do modelo de racionalidade instrumental e o abandono
generalizado da concepção do ensino como um processo técnico de intervenção, as
atenções voltam-se para uma concepção mais artística da profissão docente e para
modelos de formação que prepare os professores para o exercício desta arte nas
situações divergentes da prática. (GOMEZ, in NÓVOA; 1992: p. 109).
Este autor parte da constatação de que há na sociedade ocidental uma preocupação
com os resultados insatisfatórios do processo de escolarização. Segundo ele, embora a escola
tenha chegado nos lugares mais distantes e de acesso difícil, não tem se mostrado eficaz no
que diz respeito aos objetivos que precisa alcançar. Essa situação tem contribuído para que as
atenções se voltem para a formação do professor que vem sendo considerado o principal
responsável pela natureza e pela qualidade do trabalho educativo. Ao comentar essa situação
o autor destaca que a formação de professores não pode ser considerada um domínio
autônomo do conhecimento e que as orientações adotadas com relação ao processo de
29
formação são determinadas pelos conceitos do campo da educação preconizados em cada
época. Segundo ele a partir da definição de conceitos como escola, ensino e currículo
dominantes em cada época é que se estruturam os processos de formação, como vemos no
trecho seguinte:
A partir da definição de cada um destes conceitos, desenvolvem-se imagens e
metáforas que pretendem definir a função do docente como profissional na escola e
na aula. São familiares metáforas do professor como modelo de comportamento,
transmissor de conhecimento, como técnico, como executor de rotinas, como
planificador, como sujeito que toma decisões ou resolve problemas, etc. GOMEZ,
(in NOVOA, 1992: p 96).
Uma das metáforas escolhidas por esse autor para discutir a formação do professor é a
“metáfora do professor como um técnico” que, segundo ele, está relacionada com a concepção
tecnológica da atividade profissional e se trata de uma concepção epistemológica herdada do
positivismo, e prevaleceu durante todo o século XX e foi tomada como referência no processo
de formação dos profissionais de modo geral e dos docentes em particular. O autor questiona
a racionalidade técnica que, para ele, está fundada no paradigma da ciência moderna atual que
se pauta pelo rigor exarcebado, como se a ciência moderna desse conta de explicar tudo.
O autor critica o caráter simplista da racionalidade técnica que reduz a atividade
profissional a uma funcionalidade instrumental voltada para solucionar problemas mediante a
aplicação rigorosa de teorias e técnicas cientificas, conforme podemos verificar no trecho
seguinte:
Para serem eficazes, os profissionais da área das ciências sociais devem enfrentar
os problemas concretos que encontram na prática, aplicando princípios gerais e
conhecimentos científicos derivados da investigação. (Gómez, in NOVOA, 1992: p.
96).
Para este autor, a perspectiva da racionalidade técnica estabelece uma hierarquia nos
níveis de conhecimento e também um processo lógico de derivação entre eles e desta forma,
pela própria natureza da produção de conhecimento impõe uma relação de subordinação dos
níveis mais próximos da prática aos níveis mais abstratos da produção do conhecimento e ao
mesmo tempo cria as condições para o isolamento e para a sua confrontação corporativa.
Como exemplo desta idéia o autor cita Habermas para quem “a racionalidade técnica
reduz a atividade prática à análise dos meios apropriados para atingir determinados fins,
esquecendo o caráter moral e político da definição dos fins em qualquer ação profissional
que pretende resolver problemas humanos”. (GOMEZ, in: NOVOA, 1992: p.97)
30
Essa situação nos permite olhar para o nosso sistema educacional, particularmente
para a escola pesquisada, e perceber o quanto sua forma de funcionamento se aproxima dos
modelos derivados da racionalidade técnica no qual se estabelece do ponto de vista teórico os
papéis e as competências do profissional, natureza, conteúdos e estrutura dos programas
porém nada se cumpre porque a complexidade da vida cotidiana que não é considerada na
formulação dos programas não pode ser negada no momento do seu desenvolvimento.
Desta forma é possível perceber que os programas e ações derivados deste modelo de
racionalidade são bastante limitados conforme assinala GOMEZ, no trecho seguinte:
De qualquer modo, os limites e lacunas da racionalidade técnica são mais
profundos e significativos. A realidade social não se deixa encaixar em esquemas
preestabelecidos do tipo taxionômicos ou processuais. A tecnologia educativa não
pode continuar a lutar contra as características cada vez mais evidentes, dos
fenômenos práticos: complexidade, incerteza, instabilidade, singularidade e
conflito de valores. Gómez, (in NOVOA, 1992: p. 99).
Olhando ainda para a escola é possível perceber como ela funciona em sintonia com o
modelo de racionalidade técnica. Em muitas situações apesar de todas as evidências citadas
pelo autor neste trecho a escola ainda se porta como dona do saber, portadora dos conteúdos
universais que devem ser aprendidos pelos alunos sem questionamentos.
Considerando os limites dos modelos de formação organizados a partir da
racionalidade técnica e a concepção de ensino como intervenção tecnológica dele decorrente o
autor recorre a autores que vêm fazendo a critica a este modelo e apresenta a emergência de
metáforas alternativas à metáfora do professor como um técnico, como é possível observar no
trecho seguinte:
A critica generalizada à racionalidade técnica conduziu à emergência de metáforas
alternativas sobre o papel do professor como profissional. O professor como
investigador na sala de aula (Stenhouse, 1975) o ensino como arte (Eisner, 1980) o
ensino como uma arte moral (Tom, 1986) o professor como profissional clinico
(Clark, 1983, Griffin, 1985) o ensino como um processo de planejamento e tomada
de decisão (CLARK E PETERSON,1986) o ensino como um processo interativo
(Holmes Group Report, 1987) o professor como prático reflexivo (Schon,
1983,1987) etc. (GÓMEZ, in: NOVOA, 1992: p. 102)
Embora reconheça as diferenças entre essas imagens, o autor destaca como traço
comum entre elas o desejo de superar a relação linear e mecânica entre o conhecimento
cientifico técnico e a prática de sala de aula. Segundo ele todos esses autores tomam como
foco de suas reflexões as práticas dos professores como mostra o trecho seguinte:
31
Dito de outra modo: parte-se da análise das práticas dos professores quando
enfrentam problemas complexos da vida escolar, para a compreensão do modo
como utilizam o conhecimento cientifico, como resolvem situações insertas e
desconhecidas, como elaboram e modificam rotinas, como experimentam hipóteses
de trabalho, como utilizam técnicas e instrumentos conhecidos e como recriam
estratégias e inventam procedimentos e recursos. (GÓMEZ, in NOVOA, 1992: p.
102)
O autor situa a reflexão como uma questão complexa que envolve diversos aspectos da
vida e das relações humanas que se estabelece no espaço profissional. Com o propósito de
esclarecer compreender esta situação recorre a três conceitos de SCHON que ele considera
fundamentais neste processo: conhecimento na ação, reflexão na ação e reflexão sobre a
ação e sobre a reflexão na ação.
O conhecimento na ação se manifesta no saber fazer e, segundo o autor, orienta toda
atividade humana. Para ele, em qualquer ação humana, há um tipo de conhecimento, mesmo
que esteja consolidado na experiência e se manifeste apenas em esquemas semi-automáticos
ou em rotinas. O autor considera a reflexão na ação um processo de extrema riqueza e a
considera o primeiro espaço de confrontação com a realidade problemática “a partir de um
conjunto de esquemas teóricos e de convicções empíricas do profissional. Já a reflexão sobre
a ação e sobre a reflexão na ação, ainda segundo o autor, é constituída pela análise que o
indivíduo realiza a posteriori sobre as características e processos de sua própria ação.
Definindo essa etapa do processo ele assim se manifesta:
E a utilização do conhecimento para descrever, analisar e avaliar os vestígios
deixados na memória por intervenções anteriores. Seriam até mais corretas as
denominações: reflexão sobre a representação ou reconstrução a posteriori da ação.
Na reflexão sobre a ação, o profissional prático, liberto dos condicionamentos da
situação prática, pode aplicar os instrumentos conceituais e as estratégias de análise
no sentido da compreensão e da reconstrução da sua prática. (GÓMEZ, in:
NOVOA, 1992: p. 105)
O destaque destes conceitos coloca em evidência o espaço escolar como local de
formação e produção de conhecimento e indica a importância de compreendermos a
importância do saber da experiência no processo formativo. Ao definir como se dá o processo
de formação, Novoa (1992: p.25) assim se manifesta:
A formação não se constrói por acúmulo (de cursos, de conhecimentos ou técnicas),
mas sim através da reflexividade crítica sobre sua prática e de re construção
permanente de uma identidade pessoal. Por isso é tão importante investir na pessoa e
dar um estatuto ao saber da experiência. (NOVOA, 1992)
32
O mesmo autor identifica a formação dos professores como uma das áreas mais
sensíveis das mudanças que vêm sendo realizadas no campo educacional, como vemos no
trecho a seguir:
A formação de professores é provavelmente, a área mais sensível das mudanças em
cursos no setor educativo: aqui não se formam apenas profissionais: aqui se produz
uma profissão. Ao longo de sua história a formação de professores tem oscilado
entre modelos acadêmicos, centrado nas instituições e em conhecimentos
fundamentais e modelos práticos, centrados em escolas e métodos aplicados. É
preciso ultrapassar essa dicotomia, que não tem hoje qualquer pertinência,
adaptando modelos profissionais, baseados em soluções de paternariado entre
instituições de ensino superior e as escolas, com um reforço dos espaços de tutoria
e de alternância (NOVOA, 1992: p.26.)
Um exemplo de processo de formação em perspectiva semelhante a esta foi a parceria
estabelecida entre o Programa de Mestrado em Educação da Universidade Cidade de São
Paulo e uma escola da rede pública municipal situada na Zona Leste da cidade de São Paulo.
Um grupo de professores que decidiu refletir sobre as questões que faziam parte do cotidiano
da escola procurou o programa de Mestrado na pessoa do professor Jair Militão da Silva que
por meio de uma parceria inter-institucional passou a acompanhar as discussões realizadas no
grupo. A partir desta experiência, o grupo se constituiu como um grupo de pesquisa e
formação e tem se dedicado ao estudo e à pesquisa conforme informam na introdução do livro
que lançaram em 2008 no qual 17 educadores contam suas histórias de vida evidenciando
como foi para cada um o seu processo de escolarização e o que os levaram a tornarem-se
professores:
Este livro foi organizado a partir da experiência de educadores que atuam na Rede
Publica Municipal da cidade de São Paulo e que formaram um grupo de estudo
desde 2000, por ocasião da implantação do Projeto Escola Aberta em uma escola
municipal situada na periferia da cidade, mais especificamente no distrito de São
Mateus. A constituição do nosso grupo surgiu como resposta às demandas
decorrentes da implantação do projeto que colocou na ordem do dia temas como a
inclusão, participação da comunidade, gestão democrática entre outros que tanto se
fala nos textos legais e nos livros de pedagogia, mas que no cotidiano das escolas
ainda precisam ser trabalhados. (BENZATTI, NHOQUE e ALMEIDA, 2008: p.
11.)
O importante desta parceria é que ela não se restringiu apenas a um processo de
formação do grupo, mas contribuiu para que o grupo, que inicialmente tinha apenas a
preocupação de compreender as questões relacionadas ao seu cotidiano de atuação, passasse a
perceber a pesquisa como uma possibilidade no seu horizonte, como mostra o trecho seguinte:
Como tínhamos aprendido com Enriquez, para que um grupo se constitua se faz
necessária a existência de um projeto comum, uma vez que o Projeto Especial de
Ação da escola já não cabia todos nós. Neste momento o professor Jair Militão da
Silva passou a fazer parte da história do grupo, digamos de maneira formal, porque
antes já fazia através de contatos informais com alguns membros. Coma orientação
33
do professor Jair começamos a elaborar um novo projeto comum: um projeto de
pesquisa com o fito de pedir financiamento à FAPESP. (BENZATTI, NHOQUE e
ALMEIDA, 2008: p. 11).
Vale destacar que o grupo elaborou o projeto em parceria com o Programa de
Mestrado em Educação e conseguiu o financiamento pretendido o que se constituiu um
grande incentivo e também um aprendizado significativo.
Um ponto importante a ser destacado nas histórias de vida contadas no livro
organizado a partir desta parceria é o encontro com a própria dignidade de ser educador que a
experiência possibilitou a cada participante e, sobretudo o interesse que este fato despertou no
sentido de reconhecimento da dignidade das crianças e adolescentes que chegam à escola. É
nesse sentido que vejo a importância da formação de professores como um dos aspectos mais
importantes no processo de construção de uma escola onde os educadores possam não apenas
serem mediadores para a construção do conhecimento, mas também compreendam o seu
papel enquanto mediador para a construção de identidades como observa SILVA (in:
BENZATTI, NHOQUE e ALMEIDA, 2008: p. 23.
À escola não basta mais ser uma informadora, distribuidora de conhecimento a uma
geração jovem que nem sempre comunga dos mesmos valores e ideais dos
educadores. Há de se buscar a constituição de identidades capazes de promover
uma convivência respeitosa e produtiva nas quais o outro possa sentir-se
semelhante e, sem medo, procure viver em conjunto.
Neste sentido é possível compreender o professor ANTONIO NOVOA quando
considera a formação de professores uma área mais sensível das mudanças em cursos no
processo educativo. Porém, se pensarmos nos processos de formação a que os professores
foram e, em muitos casos, ainda estão sendo submetidos vemos que se faz necessário
investimento significativo no setor, sobretudo por meio de incentivo aos processos de
formação que partem de grupos de educadores que propõem iniciativas neste sentido.
34
CAPÍTULO III
3.1 A violência na sociedade:
No capítulo anterior, realizei uma breve reflexão sobre a formação de professores
partindo da consideração que os temas do cotidiano, entre eles a violência, no contexto onde
se manifesta, pode tornar-se elemento importante no processo de formação. Para isso é
importante que os professores possam nos horários de formação refletir sobre esses temas de
forma contextualizada e modo a elaborar coletivamente proposta de intervenção coerente com
a natureza do trabalho. Neste capítulo, pretendo apresentar uma reflexão sobre a questão da
violência
8
, buscando evidenciar alguns aspectos que parecem relevantes para o entendimento
da percepção dos alunos e professores sobre a violência na medida em que podem possibilitar
discussão, não apenas das manifestações consideradas violentas mas também das situações
geradoras desta violência.
Neste sentido pretendo examinar como a violência vem sendo tratada pelos meios de
comunicação e que repercussões o tratamento dado pela imprensa tem tido sobre os alunos e
professores. Entender como a violência aparece na mídia é importante, pois nos dará um
referencial para entender a violência na escola, não apenas como um problema moral
daqueles que praticam atos considerados violentos, mas também como uma construção social.
Discutiremos, ainda, como o tema vem sendo tratado pelos os educadores, pesquisadores e
estudiosos que a ele tem se dedicado. Para isso realizarei um exame da literatura pertinente,
utilizando as seguintes fontes: O acervo da biblioteca da Universidade Cidade de São Paulo
(UNICID), biblioteca da Universidade de São Paulo (USP), a internet e ainda adquiri alguns
títulos em livrarias de São Paulo.
3.2 - Os meios de comunicação e a violência
A questão da violência na escola também vem aparecendo de forma cada vez mais
freqüente nos meios de comunicação de massa: imprensa falada e escrita (jornais, revistas,
televisão, Internet) etc. Estes meios quando abordam a questão da violência na escola parte na
maioria das vezes do “senso comum e descambam para o sensacionalismo como ocorre no
“faz notícia” apresentado no trecho seguinte:
8
Pesquisa realizada pela APEOESP apresenta dados sobre a violência na escola que sinalizam as dimensões da violência escolar
e seu impacto na vida e no desempenho profissional dos educadores.
35
Acontece que os meios de comunicação de massas, com destaque para as televisões
e a radiodifusão, transmitem às populações o “faz notícia” que são os crimes
hediondos, atentados guerrilheiros, ataques terroristas, desastres chacinas, desvarios
no âmbito do crime organizado e coisas deste gênero. Assim os cidadãos – hoje
com acesso de notícias do mundo todo – recebem tal carga diária de imagens e
descrições de violência que já não distinguem o excepcional do habitual. Cidadãos
mais pacíficos sem sua modéstia, porém gente íntegra e de vida reta, estes passam
“pelas costas dos noticiários” de modo lastimável, pois que são a esmagadora
maioria. De toda forma a impressão deixada diariamente pela mídia é a de que uma
incontável onda de violência agita o mundo, sem que nada possamos fazer. Nossas
sociedades ainda não lograram em distinguir o ritmo inteiriço da realidade cotidiana
dessa colagem fragmentária feita em hiper-realidade pelos atuais meios de
comunicação’’. (MORAIS; 1995:24).
De acordo com Abramovay
(2002) e Morais (1995), a violência se torna então
mercadoria de audiência, e a mídia passa de reveladora da realidade à alimentadora dos
patrocinadores dos telejornais, novelas, etc. Segundo Michaud (1996), os meios comunicação
em massa, se não são diretamente responsáveis pelo aumento da violência e da criminalidade,
seriam, quando menos, um canal de estruturação de sociabilidades violentas, já que aí a
violência é, não raro, apresentada como um comportamento valorizado.
Para Michaud (1996), a violência, na mídia, seja ela estilizada ou não, seja ficção ou
parte dos telejornais da atualidade serve, de certa maneira, a um descarregar-se, distender-se,
dar livre curso aos sentimentos através do espetáculo. As cenas de violência são um sintoma
da nervosidade da sociedade. Podem não tornar as crianças mais violentas, mas certamente
contribuem para excitá-las.
Hoje observamos um grande número de cenas de violência nos telejornais, seriados,
telenovelas e filmes na TV. A influência da mídia na vida das pessoas tem se tornado maciça.
Vemos comerciais “induzindo” desde crianças a adultos a adquirir determinado produto,
mesmo que este faça mal para a vida do consumidor. Logo, a TV, não se interessa pelo que
suas cenas chocantes irão causar ao próximo.
Para MICHAUD (1996), a televisão, é mais que um simples veículo de comunicação,
sendo considerado também um agente de disseminação de violência e um instrumento
poderoso, que atenda contra a moral, os dogmas religiosos, enfim “contra a vida”.
A pressão contra o excesso de cenas violentas tem sido grande por parte da sociedade
civil, tem havido crescente mobilização da em favor da não-violência e, portanto, da paz.
Tanto que as próprias redes decidiram cortar em determinados horários muitas imagens de
agressões, tiros, socos, torturas e sangue. A violência real confunde-se às vezes com a ficção,
no entanto, esta mistura entre ficção e realidade não é sem propósito. O objetivo é garantir
maior audiência à rede de televisão. Seja em qual gênero for, na novela, no jornal, o fato é que
36
as cenas de violência atraem uma maior audiência. Temos, como exemplo, os filmes exibidos
na televisão, a maior parte retrata cenas de brigas, perseguições, tiros, mortes, e muito sangue,
tudo que atrai o público alvo.
As crianças mais cedo se interessam por filmes violentos, isto contribui para que ela
queira incorporar certos personagens do qual ela mais gosta. Esta grande influência da TV se
dá, também, a partir dos anúncios publicitários, que cria modelos de pessoas bonitas, magras e
altas. Fazendo a ditadura da moda, uma vez que a maioria da população não se enquadra neste
perfil.
Portanto, para WAINBERG (2005), a grande influência dos meios de comunicação
em massa especialmente da televisão, contrapõe-se a outro grande poder: o senso crítico do
receptor, que reinterpreta e reelabora as imagens vistas, de acordo com tendências e interesses
distintos, às vezes contraditórios, de sua consciência e inconsciência.
A riqueza visual da violência serve como estimulante adicional. Ela é amplamente
utilizada pela indústria do entretenimento, como se percebe nos filmes de ficção,
por exemplo. Já o noticiário televisivo é também, e especialmente, poderoso por
sua específica vantagem relativa de valer-se de imagens reais em movimentos,
ilustradas por narração, produzindo os mesmos resultados cognitivos.
(WAINBERG, 2005:22)
Nesse contexto, a mídia influencia a percepção, que a sociedade tem sobre a questão
da violência geral da sociedade e da violência escolar, contribuindo para que as mesmas sejam
tratadas de maneira imediatista, sem o circunstanciamento conceitual necessário. Pode-se
acrescentar, ainda, que a mídia contribui para gerar inquietudes na sociedade como também
para a proliferação de teorias sobre as violências baseadas no senso comum.
A cobertura da mídia não é representativa do universo das violências cometidas nas
escolas, mas sim dos eventos extraordinários. A mídia não pode mostrar ou representar o que
realmente acontece na escola, para isso, são necessários estudos mais acurados com rigor
científico. Pois não dá para entender o fenômeno da violência escolar partindo do senso
comum, do imediatismo e do sensacionalismo da mídia.
3.3 A violência na literatura
Desconfiai do mais trivial, na aparência singela. E examinai, sobretudo, o que
parece habitual.
Suplicamos expressamente: não aceiteis o que é de hábito como
coisa natural, pois em tempo de desordem
sangrenta, de confusão organizada, de
arbitrariedade consciente,
de humanidade desumanizada, nada deve parecer natural
nada deve parecer impossível de mudar. (Bertolt Brecht).
37
A violência tem sido um tema muito presente na escola e nos discursos que hoje se faz
sobre ela. Em decorrência deste fato tem sido tema de diversos trabalhos acadêmicos, artigos
e mesmo de programas de governo. A violência é um fenômeno que se constitui nos últimos
anos em um problema social de grande proporção. Na amplitude divulgada pelos meios de
comunicação de massa, tornou-se tema de debate público, atraindo estudiosos da educação e
de outras áreas do conhecimento na busca de entendimento e superação. Trata-se de um
fenômeno que possui determinações complexas e que evidencia a presença dos conflitos
sociais nas relações que se estabelecem no cotidiano da escola. Assim, abordar o tema
“violência na escola” não é uma tarefa fácil e exige muito cuidado do pesquisador para não
estigmatizar professores, alunos e demais sujeitos sociais envolvidos na dinâmica cotidiana da
escola.
Antes de discutir mais especificamente a violência na escola, gostaria de examinar
alguns teóricos que discutem a violência de modo mais amplo, sobretudo mostrando a relação
que existe entre a violência e o poder. Para isso realizarei uma revista na literatura pertinente
utilizando para isso as fontes anteriormente mencionadas.
Compreender como o tema vem sendo tratado por especialistas e interessados revelou-
se muito importante no sentido que dialogando com os teóricos fica mais fácil entender a
violência que acontece nas práticas escolares, os teóricos nos dão base para entender o
fenômeno da violência, daí a necessidade de escrever este capítulo sobre a violência na
literatura no meu trabalho.
Quando escutamos ou lemos algo sobre violência, a primeira coisa que nos passa em
mente é o conceito ou a imagem da agressão física. Porém, é importante sabermos que a
violência é uma manifestação que se dá através de várias situações como: relacionamento
professor aluno, relacionamento dos alunos entre si, relacionamento da direção com os
professores e dos professores entre si e com os demais funcionários etc., Enfim, a violência
está presente em todas as relações e pode assumir várias formas. Ela pode ser explicita ou
implícita, física ou simbólica. A escola, como a sociedade em geral, normalmente destaca a
violência explicita e relativiza os efeitos da violência simbólica, no entanto, essa forma de
violência pode ser mais danosa para a pessoa, pois deixa marcas invisíveis.
Podemos caracterizar a violência escolar como todo ato que impede, em sentido
amplo, o pleno desenvolvimento dos sujeitos sociais aí presentes. Trata-se da negação de
direitos básicos, um ataque à cidadania e à democracia.
38
Segundo ABRAMOVAY (2002), há violência em toda ação consciente ou voluntária
de um sujeito, grupo ou classe, com o propósito de impedir a outro sujeito, grupo ou classe, o
pleno exercício dos seus direitos e deveres. Tal ação pode ser direta ou indireta, velada ou
explícita e comporta sempre a negação do outro. Nesse sentido quando se fala em violência na
escola, estamos falando de qual violência? Quem está envolvido? Qual a percepção dos
alunos sobre a violência? Será que eles têm noção do que é violência? Quais as causas e
conseqüências desta violência para o ambiente escolar? Será que a violência vem de fora
somente? Ou a escola também produz violência? Essas e algumas outras perguntas que
pretendemos entender e contribuir para o seu desvelamento.
Atualmente assistimos a uma eclosão da violência em todos os âmbitos em nossa
cultura; provada pela onda violência que assola as nossas escola e que a mídia noticia
cotidianamente. A violência é definida por vários teóricos como uso da força física e do
constrangimento psíquico, violando a integridade física e psíquica da dignidade de alguém.
Fazendo um breve histórico dos estudos sobre violência no Brasil, SPOSITO (2001)
fez um balanço destes estudos a partir de 1980, segundo esta autora, no início dos anos 80 o
tema violência nas escolas entra no debate público, o fenômeno da violência nas escolas passa
a ter visibilidade, começam as denúncias sobre as precárias condições das escolas.
Esse período é marcado pela percepção da violência, a partir do vandalismo e
depredações das instalações escolares por invasores, pessoas sem vínculo com a
escola. Predomina nessa fase a idéia de que a escola precisava ser protegida de
elementos estranhos, daí a adoção de esquemas de proteção ao patrimônio, como
reforço no policiamento, zeladoria para as escolas e incrementos na infra-estrutura
física com muros e grades. ( SPOSITO, 2001p. 89)
Segundo SPOSITO (2001), entre os anos 1980 e 1990, em virtude da intensificação do
crime organizado e do tráfico de drogas, há um recrudescimento do sentimento de
insegurança na população em geral e paralelamente a isso, a imprensa passa a dar mais
destaque a violência que envolvia a escola. O final dos anos 1990 é marcado pelas iniciativas
públicas, algumas em parceria com ONGS (organizações não governamentais) e sociedade
civil, que visavam à redução da violência. A partir delas buscou-se desenvolver novas
concepções sobre segurança com ênfase no debate sobre a democratização dos
estabelecimentos escolares.
Nos anos 90, ONGS (organizações não governamentais), sindicatos, associações e
também órgãos públicos realizaram diagnósticos e pesquisas descritivas sobre as escolas.
Através das pesquisas e diagnósticos foi possível perceber algumas mudanças nos padrões em
39
relação ao período anterior. As práticas de vandalismo continuaram a ocorrer, no entanto
passam a ser registradas também agressões interpessoais entre alunos, entre as quais as
agressões verbais. As ameaças aparecem mais freqüentemente, inclusive em cidades de
grandes centros urbanos. Nesse mesmo período, ainda que de forma modesta, são iniciadas
pesquisas de vitimização no ambiente escolar. As pesquisas desenvolvidas pelas
universidades, nesse período também contribuíram para a compreensão de fenômeno e
algumas delas apontam a influência exercida pelo aumento da criminalidade e da insegurança
na deterioração do clima escolar afirma SPOSITO (2001).
BERNARD CHARLOT (2002) também nos ajuda a fazer um retrospecto das pesquisas
sobre violência na escola.
Contudo, a literatura retrata que os professores e a opinião pública pensam na
violência como um fenômeno novo que teria surgido nos anos 80 e se teria
desenvolvido nos anos 90. Na verdade, historicamente a questão da violência na
escola não é tão nova. Assim, no século XIX, houve, em certas escolas de 2º Grau,
algumas explosões violentas, sancionadas com prisão. Da mesma forma, as relações
entre alunos eram, freqüentemente, grosseiras nos estabelecimentos de ensino
profissional dos anos 50 ou 60. A violência na escola não é um fenômeno
radicalmente novo, ela assume formas que, estas sim,estão com novas modalidades.
(CHARLOT, 2002:76).
Segundo AQUINO (2003), a temática da violência e da indisciplina tomou maior
visibilidade a partir dos anos 1990, um exemplo disso são as publicações voltadas a essa
temática. Mas segundo Aquino não seria o caso de imaginar que a violência e a indisciplina
não habitassem o imaginário pedagógico antes de então, mas é a partir desse momento que o
tema desponta como um complicador do trabalho pedagógico entre os educadores.
Veremos abaixo como ABRAMOVAY (2002) define a violência:
A construção de uma visão crítica sobre o fenômeno da violência mostra-se
fundamental, na medida em que permeia todas as relações sociais, em que são
profundamente afeta todos os membros da comunidade escolar, como, por
exemplo, alunos, professores, diretores e pais. (ABRAMOVAY, 2002:43).
BERNARD CHARLOT (2002) refere-se à dificuldade em definir violência escolar ,
pois remete a fenômenos heterogêneos difíceis de delimitar e de ordenar. A violência varia em
função de quem fala: ex: para alguns alunos dar um tapa em um colega não é violência, para
eles violência e quando você arranca sangue de alguém ou mata. Segundo o autor vários
fatores dentro e fora da escola contribuem para a violência, o autoritarismo dos professores e
gestores escolares, a escola degradada e suja, a exclusão social da comunidade, o tráfico de
drogas, as gangs. Todos esses motivos contribuem para um ambiente escolar violento. Mas o
40
autor ainda nos chama atenção para não fazermos generalizações, por que existem exemplos
de escolas não violentas em comunidades pobres e escolas violentas em comunidades de
classe média ou vice-versa.
CHARLOT (2002) classificou a violência escolar em três níveis:
1) a violência - golpes, ferimentos, violência sexual, roubos, crimes, vandalismo;
2) incivilidades - humilhações, palavras grosseiras, falta de respeito;
3) violência simbólica ou institucional - falta de sentido em permanecer na escola
por tantos anos; o ensino como um desprazer, que obriga o jovem a aprender
matérias e conteúdos alheios aos seus interesses as imposições de uma sociedade
que não sabe acolher os seus jovens no mercado de trabalho; a violência das
relações de poder entre professores e alunos; a negação da identidade e satisfação
profissional aos professores, a sua obrigação de suportar o absenteísmo e a
indiferença dos alunos. (Charlot, 1997:56)
Segundo CHARLOT (2002) A violência na escola é aquela que se produz dentro do
espaço escolar, sem estar ligada à natureza e às atividades da instituição escolar: quando um
bando entra na escola para acertar contas das disputas que são as do bairro, a escola é apenas
o lugar de uma violência que teria podido acontecer em qualquer outro local. A violência à
escola está ligada à natureza e às atividades da instituição escolar: quando os alunos
provocam incêndios, batem nos professores ou os insultam, eles se entregam a violências que
visam diretamente à instituição e aqueles que a representam. Essa violência contra a escola
deve ser analisada junto com a violência da escola: uma violência institucional, simbólica,
que os próprios jovens suportam através da maneira como a instituição e seus agentes os
tratam (modos de composição das classes, de atribuição de notas, de orientação, palavras
desdenhosas dos adultos, atos considerados pelos alunos como injustos ou racistas.
De acordo com CHARLOT (2002), existem duas formas de violência que devemos ter
cuidado para não confundirmos, a violência na escola é aquela que acontece no interior da
escola que não tem muito a ver com sua dinâmica e pode ser cometida por pessoas estranhas a
instituição. Existe ainda a violência à escola que é quando membros da escola cometem a
violência que é resultado da própria dinâmica da instituição. Pode ser cometida pelos
professores, alunos, direção e demais funcionários.
Para MICHAUD (1989)
:
Há violência quando, numa situação de interação um ou vários atores agem de
maneira direta ou indireta, maciça ou esparsa, causando danos a uma ou mais
pessoas em graus variáveis, seja em sua integridade física, seja em sua integridade
moral, em suas posses, ou em suas participações simbólicas e culturais.
(MICHAUD 1989, 11).
41
A filósofa MARILENA DE CHAUI (1998), no artigo Ética e violência, define
violência utilizando a palavra latina vis, para entendê-la como sendo:
Tudo que abrange a força para ir contra a natureza de algum ser. A violência
abrange manifestações de coação, constrangimento tortura, brutalizações, violações
sevícias, abusos físicos e psíquicos contra alguém, produzindo, de algum modo,
opressão, intimidação, medo e terror de "um contra todos", "um contra um" e de
"todos contra um. (CHAUI, 1998:33-34).
A autora entende violência como um ato de brutalidade, sevícia e abuso físico e
psíquico contra alguém e caracteriza relações intersubjetivas e sociais definidas pela opressão,
intimidação, pelo medo ou terror e chama atenção para o fato de que se acompanharmos a
história das idéias éticas, estas indicam que desde a Antigüidade clássica até os dias atuais o
problema da violência está presente em todas as sociedades, pois as várias culturas e
sociedades definem a violência de maneira diferente, de acordo com um conjunto de valores
éticos tidos como padrões de conduta, de relação intersubjetiva e interpessoal, de
comportamentos sociais, com a intenção de garantir a integridade físico-psíquica de seus
membros.
Segundo LATERMAN (2000), no senso comum, a palavra violência é muito utilizada
e carregada de valor negativo. O contrário de violência no dia a dia é “paz”, embora o
contrário de paz não seja apenas violência. No entanto, nos campos de investigação da
educação, em sociologia e antropologia, o termo violência é plural; são as diversas
manifestações da violência que se procura entender.
A violência aparece através da história muitas vezes como necessária como
culminância de momentos de transformação ou até, se pensarmos na violência do
estado, como mantenedor do status quo. A violência contra o indivíduo violento
que, por exemplo, mata estupra, pode ser vista por muitos sujeitos, em geral
pacíficos como indispensável para a ordem social. A violência rebelde pode ser
admirada por muitos. A violência tem um papel e um significado próprio para cada
situação social e expressa por sua vez, os valores, contradições e modos de vida de
cada sociedade. (LATERMAN, 2000: 26).
MAFESSOLÍ (1987), outro autor importante, contribui para a compreensão do tema.
Para este autor a violência que pensamos ser banal, é a resistência cotidiana as imposições
determinadas pelo controle social, ela não se faz de grandes atos, mas de pequenos encontros
do cotidiano, do uso do silêncio e da fala, do riso e da solidariedade. Está categoria que tem
sido admitida como alienada, toma as rédeas de seu presente, atuando sem alarde na teia
social a seu próprio modo, que implica solidariedade, compartilhar com o outro, gerar valores
e vida social diferentes daquelas regras delimitadas pelo controle social. É uma
desestruturação dos planos de um presente e de um futuro garantidos e desejados pelas
42
instituições estabelecidas, mas a constituição de um presente vivo e inesperado, tecido no dia
a dia das relações sociais.
MAFESSOLÍ (1987) destaca três modalidades de violência e suas formas de
expressão. A primeira, a violência totalitária, obedece à lógica do dever-ser e objetiva a
planificação e o controle racionalizado da vida social. Quanto maior a tentativa de
homogeneização dos poderes constituídos, tanto mais destrutiva se torna a violência.
Segundo o autor esta reação, a violência anômica, decorre da tensão constante entre
poder e potência em que o bloqueio de um dos pólos ou da ordem ou da desordem – que
fundamentam a estrutura social converge para um confronto. A vazão do querer-viver explode
em violência no embate com o dever-ser instituído. Esta explosão constitui uma reação ao
conformismo e à dominação.
MAFESSOLÍ (1987) define a violência totalitária como sendo um empreendimento
difuso e autoritário, de órgãos estatais sobre o conjunto das atividades da vida social. A escola
é um dos órgãos estatais que melhor cumpre a violência totalitária, segundo o autor, pois é
local onde concentra pessoas a serviço dos órgãos estatais. Pessoas estas que muitas vezes
conscientemente ou inconscientemente cometem violências em nome do estado.
O autor afirma que o estado centralizador promete a segurança e a proporciona, mas a
que preço? O preço é evocar a si a vida e as paixões dos homens. O estado segurança, estado
providência pretende desincumbir o indivíduo das preocupações sem cessar lhe causa. Mas tal
domesticação do futuro incerto, tal planificação da existência social exige o nivelamento mais
ou menos total como condição de possibilidade.
Recorro a MAFESSOLÍ (1987):
O totalitarismo pode se exprimir de várias maneiras pode assumira forma paroxísta
que se verifica no stalinismo ou nos diferentes fascismos; pode também ter o caráter
mais difuso, porém não menos pernicioso, do controle social que estende o seu
império sobre o conjunto da vida social.(MAFESSOLI, 1987,43)
O autor fala ainda da violência na sua dualidade e que a mesma desempenha uma
função de ligação e de indicador. A “violência social”, como simbolização da força, vivida
coletivamente e ritualmente, assegura a coesão e o consenso: a “violência sanguinária” que se
manifesta, quando há a impossibilidade de simbolização, ou quando está é imperfeita, e
significa o retorno do reprimido. No caso da última, segundo o autor, quando a sociedade
impede a juventude de se expressar os seus símbolos e sua cultura acaba fazendo com que
estes jovens se juntem em “tribos” e cometam violências e vandalismo como forma de
expressão.
43
Mas a nosso ver a reação lógica a um processo de atomização, à perda da
solidariedade orgânica: é a resposta desvairada que a organização economicista
acha para um individualismo que lhe foi necessária no início, mas que traz em si
elementos de anarquia, de desagregação que não são integráveis. (MAFESSOLI;
1987; 243)
A importância da contribuição de MAFESSOLÍ é ajudar a perceber a relação existente
entre a violência e as relações de poder que se estabelecem nas relações cotidianas.
Geralmente se discute violência como ato individual ou de um pequeno grupo contra a
coletividade, desvinculado do contexto totalitário ao qual a pessoa está submetida. Neste
sentido, com freqüência é vista como um ato moral, cujo autor merece ser punido.
A relação entre poder e violência é tema bastante discutido, sobretudo quando se fala
das instituições totais, mas essas relações também se fazem presentes na escola e, às vezes
constituem o certe do processo pedagógico. Por isso vale discutir ainda que brevemente o
assunto.
Ao abordar a questão da violência na escola, SANTOS (2001), assim se expressa:
Contudo, independente das definições e abordagens adotadas, os autores alertam
que a constante presença da violência no ambiente escolar coloca em xeque a
função primordial da escola. Assim, de instituição encarregada de socializar as
novas gerações, a escola passa a ser vista como o ambiente que concentra conflitos
e práticas de violência, situações essa que passa pela reconstrução da complexidade
das relações sociais que estão presentes no espaço social da escola. (SANTOS,
2001:118)
FOUCAULT (1997), em diversas obras, mas, sobretudo em Vigiar e Punir faz um
estudo detalhado sobre a evolução histórica da legislação penal e respectivos métodos e meios
disciplinares, coercitivos e punitivos adotados pelo poder público na repressão da
delinqüência, desde os séculos passados até as modernas instituições correcionais. Analisa as
relações de poder e define os mecanismos de sujeição do corpo como uma tecnologia que se
estabelece sobre os indivíduos.
Esses métodos que permitem o controle minucioso das operações do corpo, que
realizam a sujeição constante de suas forças e impõem uma relação de socidade-
utilidade, são o que podemos chamar as “disciplinas”. Muitos processos disciplinares
existiam há muito tempo: nos conventos, nos exércitos, nas oficinas também. Mas as
disciplinas se tornaram no decorrer dos séculos XVII e XVIII fórmulas gerais de
dominação. Diferentes da escravidão, pois não se fundamentam numa relação de
apropriação de corpos;é até a elegância da disciplina dispensar essa relação custosa e
violenta obtendo efeitos de utilidade pelo menos igualmente grandes.
(FOUCAULT.1997:118).
Segundo o autor, cada época as autoridades públicas criou suas próprias leis penais,
instituindo e usando os mais variados processos punitivos que vão da terrivelmente violência
44
física até a violência sutil ou simbólica, que muitas vezes pode ser mais perversa que a
violência física, pois é dissimulada, podendo durar anos sem ser notada e combatida.
O século XIX a modular os castigos segundo os indivíduos culpados, Punições
menos diretamente físicas, certa discrição na arte de fazer sofrer, um arranjo de
sofrimentos mais sutis mais velados e despojados de ostentação. Técnicas sempre
minuciosas, muitas vezes íntimas, mas que retém sua importância; porque definem
um certo modo de investimento político e detalhado do corpo, uma nova”
microfísica do poder “; e por que não cessaram desde o século XVII, de ganhar
campos cada vez mais vastos como se tendessem a cobrir o corpo social inteiro.
Pequenas astúcias dotadas de um grande poder de difusão, arranjos sutis, de
aparência inocente, mas profundamente suspeitos, dispositivos que obedecem a
economias inconfessáveis, ou que procuram coerções se grandeza, são eles,
entretanto que levaram à mutação do regime punitivo, no limiar da época
contemporânea.(FOUCAULT, 1997: 120).
FOUCAULT não fala especificamente da escola, fala das esferas do poder público na
repressão da delinqüência, mas as suas idéias remetem também diretamente a nossa escola
contemporânea, pois, muitas violências e métodos usados nas prisões, e em outros
estabelecimentos públicos são usados ainda hoje largamente em nossas escolas.
O autor faz ainda uma análise de como a arquitetura dos estabelecimentos correcionais
eram adaptadas no sentido de vigiar e disciplinar os indivíduos.
O programa arquitetural da maior parte dos projetos de prisão era a maneira mais
direta de traduzir “na pedra da inteligência da disciplina” de tornar a arquitetura
transparente à gestão do poder; de permitir que a força ou coações violentas fossem
substituídas pela eficácia suave de uma vigilância sem falha; de ordenar o espaço
segundo a recente humanização dos códigos e a nova teoria penitenciária.
(FOUCAULT 1997: 209).
Quando o autor fala da arquitetura da prisão, do sistema panóptico e da vigilância ele
poderia estar falando de nossas escolas atuais, que mais se parecem com penitenciárias do que
realmente com escolas. São locais fechados com muitas grades, com corredores estreitos e
muitos portões para inibir a movimentação e circulação dos alunos. No caso específico da
escola na qual fiz a pesquisa, a secretaria, a sala dos professores e a sala do Diretor ficam em
um plano superior ao pátio e as salas de aula. Portanto, se o Diretor aparece na saída de sua
sala ele tem uma visão geral do pátio e das salas de aula, é uma arquitetura projetada para a
vigilância e controle.
Num modelo arquitetônico minuciosamente criado, a prisão é então constituída por
um edifício central, uma torre, circundada a toda à volta por outra edificação, onde
ficam os prisioneiros. Com a posição das autoridades na torre, em que podem ver
sem ser vistos, outorgam a possibilidade de estabelecerem, desta forma, um
contacto visual permanente com os reclusos, efetivando até à perversão o controle
prisional. (FOUCAULT, 1997: 206)
45
A vigilância e a punição podem ser encontradas em várias entidades estatais, como
hospitais, prisões e escolas. Foi criado até um sistema chamado panóptico para facilitar nessa
vigilância, nesse sistema haveria uma torre central a qual avistaria, vigiaria todos de uma só
vez que estão a sua volta.
Segundo FOUCAULT (1997) para economia do poder seria mais rentável e mais
eficaz vigiar do que punir. Isso pode ser facilmente observado se pegarmos o panoptismo
como exemplo, pois é muito mais barato vigiarmos as pessoas para que estas não infrinjam as
leis, do que posteriormente puni-las, na punição terá que ser gasto muito dinheiro para que a
pessoa que infringiu a lei seja ressociabilizada.
O autor MICHEL FOUCAULT em seu livro Vigiar e punir (1997) dedica capítulos
sobre a situação nos Hospitais, das escolas, na vida militar e nas prisões. Segundo ele na
instituição hospitalar, é então criada a figura do enfermeiro, para perpetuar o
acompanhamento do doente, visto serem cíclicas na época, por vezes semanais apenas, as
visitas dos médicos aos seus pacientes.
Na prisão nasce o mais emblemático símbolo deste movimento da visibilidade
perversa, na perversidade do poder. É criado o encarceramento, em que o homem preso
pagará desta forma a sua dívida à sociedade pelo crime cometido, e onde é possível racionar o
seu físico para produção, em trabalhos na terra ou de outro tipo. Nas escolas passa a existir
uma individualização do método de ensino, um constante acompanhamento do professor,
figura central e incontável até então, alargando a todos o conhecimento, a visibilidade, então
ele cita os colégios jesuítas.
Nos colégios jesuítas encontra-se ainda uma organização ao mesmo tempo binária e
maciça: as classes podiam ter até duzentos ou trezentos alunos, eram divididas em
grupos de dez: cada um desses grupos com seu decurião era colocado em um
campo, o romano ou cartaginês: cada decúria correspondia uma decúria adversa. A
forma geral era a da guerra e da rivalidade: o trabalho, o aprendizado, a
classificação eram feitas sob a forma de justa pela defrontação dos dois exércitos: a
participação de cada aluno entrava nesse duelo geral; ele assegurava por seu lado, a
vitória ou as derrotas de um campo; e os alunos determinavam um lugar que
correspondia à função de cada um e ao seu valor de combatente no grupo unitário
de cada decúria. (FOUCAULT, 1997: 126)
O autor nos mostra que a educação nos colégios jesuítas era pautada na
individualidade na competição e rivalidade; era como se fosse uma guerra, onde havia uma
disciplina muito rígida a ser seguida.
46
Discutiremos agora como o FOUCAULT (1997) vê a questão do poder, o mesmo
recusa-o como meramente opressor. Para ele, o alcance do poder é muito maior e afirma ainda
que a partir do século XVIII, a sociedade é controlada e normatizada por múltiplos processos
de poder.
O poder provém de todas as partes, em cada relação entre um ponto e outro. Essas
relações são dinâmicas, móveis, e mantêm ou destroem grandes esquemas de
dominação. Essas correlações de poder são relacionais, segundo o autor;
relacionam-se sempre com inúmeros pontos de resistência que são ao mesmo tempo
alvo e apoio”, saliência que permite apreensão “(FOUCAULT, 1997:91).
As resistências, dessa forma, devem ser vistas sempre no plural. FOUCAULT trata
principalmente do tema do poder, rompendo com as concepções clássicas deste termo. Para
ele, o poder não pode ser localizado apenas uma instituição (escola, hospital, prisão) ou no
Estado, o que tornaria impossível a "tomada de poder".
O poder para FOUCAULT não poderia ser concebido de forma macrofísica, numa
super-infra-estrutura como fora analisado por Karl Marx numa estrutura de domínio de
propriedades e do Estado, mas sim de forma microfísica, numa construção social com
estratégias usadas por todas as esferas e segmentos, para tal, as técnicas do poder disciplinar
se sustentam em quatro pilares fundamentais: o controle do espaço e do tempo, a vigilância e
a norma.
O poder para FOUCAULT (1997) não é considerado como algo que o indivíduo cede
a um soberano (concepção contratual jurídico-política), mas sim como uma relação de forças.
Ao ser relação, o poder está em todas as partes, uma pessoa está atravessada por relações de
poder, não pode ser considerada independente delas. De acordo com FOUCAULT, o poder
não somente reprime, mas também produz efeitos de verdade e saber, constituindo verdades,
práticas e subjetividades.
Nesse sentido a punição e a vigilância são poderes destinados a educar (adestrar) as
pessoas para que essas cumpram normas, leis e exercícios de acordo com a vontade de quem
detêm o poder. A vigilância é uma maneira de se observar à pessoa, se esta está realmente
cumprindo com todos seus deveres – é um poder que atinge os corpos dos indivíduos, seus
gestos, seus discursos, suas atividades, sua aprendizagem, sua vida cotidiana.
Nesse cenário a vigilância tem como função evitar que algo contrário ao poder
aconteça e busca regulamentar a vida das pessoas para que estas exerçam suas atividades. Por
conseguinte, a punição é o meio encontrado pelo poder para tentar corrigir as pessoas que
infringem as regras ditadas pelo poder. A relação entre vigiar e punir segundo o autor está no
47
fato de que com ela seria possível “adestrar” ou “domesticar” as pessoas para que estas
exercessem suas tarefas como bons cidadãos, evitar o máximo que as pessoas infringissem as
normas estabelecidas pelo poder.
Dizendo poder, não quero significar 'o poder', como um conjunto de instituições e
aparelhos garantidores da sujeição dos cidadãos em um estado determinado.
Também não entendo poder como um modo de sujeição que, por oposição à
violência, tenha a forma de regra. Enfim, não o entendo como um sistema geral de
dominação exercida por um elemento ou grupo sobre o outro e cujos efeitos, por
derivações sucessivas, atravessem o corpo social inteiro. A análise em termos de
poder não deve postular, como dados iniciais, a soberania do Estado, a forma da lei
ou a unidade global de uma dominação; estas são apenas e, antes de mais nada, suas
formas terminais. Parece-me que se deve compreender o poder, primeiro, como a
multiplicidade de correlações de forças imanentes ao domínio onde se exercem e
constitutivas de sua organização; o jogo que, através de lutas e afrontamentos
incessantes as transforma, reforça, inverte; os apoios que tais correlações de força
encontram umas nas outras, formando cadeias ou sistemas ou ao contrário, as
defasagens e contradições que as isolam entre si; enfim, as estratégias em que se
originam e cujo esboço geral ou cristalização institucional toma corpo nos
aparelhos estatais, na formulação da lei, nas hegemonias sociais. (FOUCAULT,
1997:88-89).
FOUCAULT (1997) afirma que a contemporaneidade agiu com racionalidade e a
técnica. Deu basta a obsoletas formas de dominação e estabeleceu e redefiniu o corpo
numa nova perspectiva. É a substituição dos objetos. Entra em cena o “corpo”
investido por relações de poder, dominação e sujeição. O corpo torna-se útil produtivo
e submisso. As relações de poder tem alcance imediato sobre ele; elas o investem,
mascaram, o dirigem, o supliciam, sujeitam-no a trabalhos obrigam no a cerimônias
exigem-lhes sinais.
Com a modernidade o corpo passou a ser trabalhado detalhadamente, exercendo-se
sobre ele uma coerção sem folga, mantendo-o, ao nível mesmo da mecânica –
movimentos, gestos, atitude, rapidez: poder infinitesimal sobre o corpo ativo
(FOUCAULT, 1997: 118).
Um esquadrinhamento que, além de utilitário, pode ser pensado como uma forma de
conter a agressividade humana, já que esses métodos – disciplinas – controlam e sujeitam as
forças do corpo, numa relação de docilidade e utilidade como diz FOUCAULT. Nesse cenário
para o autor o corpo está preso no interior de poderes muito apertados que lhes impõem
limitações ou obrigações. As técnicas de controle, as disciplinas impõem uma relação
de docilidade-utilidade. Segundo FOUCAULT, a disciplina é uma anatomia do detalhe, a
arte da distribuição celular do espaço e controle do tempo visando maior vigilância em
todos os lugares. O quadriculamento estabelece a localização imediata dos indivíduos.
48
Estes dispositivos são necessários tanto no ato de vigiar, punir, como de controlar no
sentido de utilidade.
Nesse sentido, o exercício da disciplina, cria uma espécie de arquiteturização e
hierarquização dos indivíduos, de saberes, capacidades e corpos. O principal objetivo do
poder disciplinar é tornar os indivíduos economicamente úteis e politicamente dóceis, afirma
o autor.
Assim sendo, é importante sabermos que a violência pode ser encontrada por meio de
uma relação de poder, manifestada pela transmissão das ideologias e da cultura da classe
dominante sobre a dominada.
A questão da violência é também discutida por PIERRE BORDIEU e JEAN CALUDE
PASSEIRON (1982) que destacam em seus trabalhos a violência simbólica. A partir deste
referencial buscam também discutir o que é ideologia, o que é poder e violência. Segundo
estes autores a transmissão dessas ideologias se transformam em uma verdadeira “Violência
Simbólica” da “classe dominante” sobre a “classe dominada.”
O conceito de violência simbólica foi criado pelo pensador francês PIERRE
BORDIEU para descrever o processo pelo qual a classe que domina economicamente impõe
sua cultura aos dominados. BORDIEU (2007), juntamente com o sociólogo JEAN CLAUDE
PASSEIRON (1982), partem do princípio de que a cultura, ou o sistema simbólico é
arbitrária, uma vez que não se assenta numa realidade dada como natural. De acordo PIERRE
BORDIEU e JEAN CLAUDE PASSEIRON (1982) a violência simbólica pode ser exercida
por diferentes instituições do estado: a mídia, a escola, a polícia etc.
Esses dois autores questionam como a escola consegue reproduzir e conservar a
cultura dominante. Desse modo acreditam que os grupos dominantes da sociedade controlam
os significados culturais, tornando alguns mais valorizados que outros.
Partindo desta perspectiva, desenvolvem o conceito de “capital cultural”, referindo-se
ao domínio lingüístico e cultural valorizados pela sociedade e que facilita o desempenho
escolar do aluno, tornando-o um indivíduo privilegiado socialmente, economicamente e
culturalmente, garantindo-lhe um lugar na sociedade, de tal forma que:
A cultura dominante é definida como sendo “a” cultura, o que a transforma, pois
isso mesmo, em capital cultural, ou seja, sua posse confere valiosa vantagem ao
possuidor na relação entre os grupos ou classes. Todo segredo da reprodução reside,
pois, na forma como esse capital cultural é transmitido de geração para geração.
(SILVA, 1992:34).
Para esses autores quando a escola esquece de valorizar a cultura local, dando mais
ênfase a cultura da elite da classe dominante. Ela está cometendo uma violência simbólica,
49
quando aliena e exclui o aluno. Conseqüentemente, a escola consolida a distribuição do
conjunto de saberes que divide a sociedade em grupos diferentes, onde aquele que tem mais
capital cultural tem mais sucesso escolar, enquanto quem tem menos teria também resultados
escolares piores, ou seja, o indivíduo privilegiado social, econômico e culturalmente obteria,
sem esforço, êxito na escola, e o outro sem capital cultural, teria dificuldades.
Os autores acreditam que a escola reforça a organização social baseada na
desigualdade de oportunidades. Nesse sentido quando a nossa escola pública ignora a origem
de seus alunos, transmitindo-lhes o ensino padrão, que não valoriza o saber local e suas
peculiaridades regionais. Ocorre exclusão, evasão escolar, indisciplina e violência, pois
quando o aluno não vê sentido na escola ou abandona ou vai à escola somente para bagunçar,
pois a escola não tem sentido para ele por não dar voz e nem vez para o mesmo.
Os autores BOURDIEU E PASSEIRON (1982), explicam este processo pela ação
pedagógica, que perpetua a violência simbólica através de duas dimensões arbitrárias: o
conteúdo da mensagem transmitida e o poder que instaura a relação pedagógica exercido por
autoritarismo, ”eu mando e você obedece”.
Nessa relação pedagógica não há questionamento, pelo contrário há passividade, não
há debates de idéias e discussões, todo o conteúdo é imposto verticalmente, e os professores
na maioria dos casos, são vistos como “donos dos saberes”.
Nessa perspectiva infelizmente no nosso país, o conteúdo transmitido nas escolas é
aquele que interessa à perpetuação da hegemonia cultural das classes dominantes, como diz
Caetano Veloso com “o macho, adulto, branco sempre no comando”. Nesta situação a
metáfora do branco, urbano e bem sucedido é apresentada como exemplo natural de sucesso.
As peculiaridades das culturas regionais ou são esquecidas ou são transmitidas a título de
curiosidade e as culturas do índio e do negro quando são transmitidas é de forma estereotipada
e muitas vezes perpetuando o racismo o preconceito e a discriminação dentro da própria
escola, que seria um local de inibir tais formas de preconceito.
Ao nos depararmos com a linguagem, observaremos como a violência simbólica age
de modo dissimulado e imperceptível ao senso comum, pois as crianças das classes
economicamente mais baixas, ao ouvirem o discurso da classe dominante transmitido pelo
professor, são obrigadas a traduzi-los para sua realidade, para que desta forma possam
entendê-los. Portanto, para conseguirem ter “sucesso” na sala de aula, precisariam aprender
um novo tipo de discurso, entrando em contradição com os códigos e saberes locais utilizados
no seu ambiente familiar.
50
Nesse sentido, segundo esses autores é possível visualizar a Violência Simbólica como
um processo de formação oculto e velado dos indivíduos, onde a escola, enquanto instituição
social distribui os conteúdos legitimados pela classe dominante, ratificando a posição social
que cada indivíduo já ocupa na sociedade, dificultando que o mesmo venha mudar seu lugar
perante a sociedade.
Para esses autores, o ensino é compreendido com uma “Violência Simbólica”, porque
é exercido mediante relações de “forças simbólicas” entre grupos e classes, isto é, por meio de
uma relação de poder, manifesto pela transmissão das idéias e da cultura da classe
economicamente dominante sobre a dominada.
Numa formação social determinada, o trabalho pedagógico pelo qual se realiza a
ação pedagógica dominante que tende a impor nos membros dos grupos ou classes
dominados o reconhecimento da legitimidade da cultura dominante, tende a lhes
impor do mesmo modo,
pela inculcação ou exclusão, o reconhecimento da
ilegitimidade de seu arbitrário cultural”. (BOURDIEU E PASSERON, 1982:52).
Nesse sentido concordo com o pensamento do autor escritor italiano Antomio Gramsci
(1978) para quem a escola não é, como se acreditava, um espaço absoluto de poderes
hegemônicos, mas sim da contradição. Em que distintos autores sociais, com diferentes visões
de mundo e localização na dinâmica social circulam e interagem, e dessa circulação e
interação constroem-se, ao mesmo tempo dialeticamente, a aceitação e a resistência, a
manutenção e a mudança.
BOURDIEU (2007) e FOUCAULT (1997) concordam ser a violência um excesso de
poder, uma forma de disciplina que se torna presente justificando-se racionalmente, podendo
levar a exclusão dos que formam a força contrária, isto é, dos alunos das classes
desfavorecidas ou que apresentem comportamento diferente daquele esperado pela escola.
Para finalizar esse capítulo recorro a ALMEIDA (2003) ao referir-se à agressividade
de um grupo de alunos da escola onde realizou sua pesquisa assim se manifesta:
Neste contexto, a agressividade parece ser um sinal de que o tratamento dispensado
a estas crianças e adolescentes, quer pela escola quer pelos colegas da parte mais
nobre do bairro, não é bom, sendo este conflito um sinal de como se dá o
relacionamento na escola. As crianças são bem tratadas, respeitadas, integradas ou
estigmatizadas, rejeitadas, discriminadas. As conversas com crianças e adolescentes
têm revelado que a agressividade aparente esconde um complexo de inferioridade
crônico, sendo o enfrentamento uma atitude de autodefesa. Este complexo de
inferioridade fica evidente quando olhamos as fichas de matrícula do pessoal do
Vera Cruz. Quase todos dão o endereço da Rua Leonice Alves Rodrigues.
Geralmente, não colocam o endereço correto com vergonha de dizer que são da
favela, o que dificulta o encontro das crianças que desaparecem da escola.
(ALMEIDA, 2003: p.108).
51
Encerrar este capítulo com esta citação, após o percurso realizado no qual visitei
diversos teóricos me parece bastante significativo, sobretudo porque ela remete para o
cotidiano concreto de uma escola da rede publica de ensino e por expressar diversos aspectos
que estão envolvidos nesta questão extremamente complexa que geralmente é tratada com
extrema simplicidade.
Esse capítulo é importante para a dissertação no sentido que os autores clássicos
citados ao longo deste capítulo nos deu instrumentos, bagagem e conhecimento para lidar com
esta problemática da violência que é um tema bastante complexo. Segundo a definição de
violência dos autores citados neste capítulo pude ver e não a violência descrita por eles na
escola pesquisada, este capítulo foi de extrema importância, pois me deu referenciais teóricos
para pesquisar e entender sobre a violência, sobretudo a violência escolar.
3.4 – Drogas e violência na escola
O uso e o tráfico de drogas são freqüentemente apontados como causa da violência na
escola por isso pareceu-me imperativo refletir sobre essa questão. Discutir a questão das
drogas na escola e na sociedade no presente trabalho é importante no sentido de problematizar
o tema com vistas a abandonarmos os pré julgamentos freqüentes a partir do senso comum.
Trata-se de uma questão extremamente complexa, cujo aprofundamento demandaria
um tempo maior do que aquele de que dispomos para realizar uma dissertação. Creio que
implicaria inclusive na realização de outro trabalho devido à complexidade desta questão. No
entanto não me furtarei de discutir o tema, ainda que brevemente, uma vez que ele está
presente na maior parte dos momentos em que a violência na escola está em pauta. Tão
freqüente quanto a discussão do tema é a tendência de demonização do consumo de drogas na
sociedade, no entanto é importante destacar que o uso de drogas se fez presente em várias
sociedade ao longo de nossa História.
Ao longo da história a visão do consumo de drogas, sobretudo no ocidente, vem
mudando, embora na atualidade a sociedade, ainda seja freqüente, sobretudo em alguns
setores da mídia, um discurso estigmatizador e que demoniza os usuários de drogas, há
setores que vêm reivindicando uma abordagem mais realista do assunto. E, como nos mostra
CARNEIRO (2002), as drogas têm seu uso milenar em quase todas as culturas humanas e, em
muitos casos, corresponde a necessidades médicas, religiosas e gregárias.
Ao discutir a presença das drogas na sociedade ocidental ao longo da história, e no
presente momento CARNEIRO (2002) propõe que voltemos na história para vermos que as
52
drogas desde os séculos XV e XVI são parte dos produtos coloniais que se difundiram
inicialmente como comércio de luxo e se tornaram produtos do consumo de massas e,
portanto, necessidades sociais. Para ele, a primeira questão a se definir é a de que as drogas
são necessidades humanas. Seu uso milenar em quase todas as culturas humanas corresponde
a necessidades médicas, religiosas e gregárias. Não apenas o álcool, como quase todas as
drogas são parte indispensável dos ritos da sociabilidade, da cura, da devoção, do consolo e
do prazer. Por isso as drogas foram divinizadas em inúmeras sociedades.
Para o autor a visão que temos hoje das drogas é bem diferente do passado, que em
várias sociedades o consumo de drogas era bem aceito. E cita o caso dos índios brasileiros que
consumiam uma espécie de bebida destilada o “cauí” feito através da fermentação do milho e
que até hoje é muito consumido pelos indígenas. O tabaco, traficado pelos jesuítas, que após
uma resistência inicial dos protestantes e dos orientais, foi aceito e valorizado, juntando-se ao
álcool, ao açúcar, ao café, ao chá e ao chocolate para constituírem o universo das drogas
oficiais da vida cotidiana moderna, no entanto afirma o autor, outros como os cactos e
cogumelos alucinógenos americanos foram proibidos pela Igreja no período colonial, assim
como os derivados do ópio, da coca e da maconha, partir do século XX, conheceram o
estatuto da proscrição, nas diversas formas de proibicionismo.
Para este autor a droga sempre fez parte da história da humanidade, e slogans de
proibição as drogas é uma contradição com a história das civilizações. O autor cita ainda o
caso das drogas legais como vinho que faz parte dos rituais católicos e da cerveja que é um
símbolo da identidade nacional brasileira que são propagandeados em larga escala na mídia.
Vejamos:
As campanhas contra as drogas, sob o slogan “Vida sim, drogas não”, supõe que
possa existir vida sem drogas, o que é uma completa contradição com a história da
humanidade, que desde a idade da pedra, passando por todas grandes civilizações,
sempre usaram algum tipo de droga. O próprio álcool, para ficarmos em uma droga
apenas, faz parte essencial da cultura ocidental, onde o vinho tem um lugar
primordial, até mesmo na eucaristia cristã. Não se duvida que o vinho tem bons
usos, não só na eucaristia, como em qualquer boa mesa. Há, obviamente, usos
nocivos do vinho, a existência de milhões de álcool-dependentes comprova isso.
Mas nem todos que consomem o vinho, ou o álcool em geral, tornam-se
dependentes e os que se tornam, como ocorre com muitas mercadorias que a
intoxicação publicitária torna fetiches de consumo compulsivo, necessitam tão
somente que não lhes impeçam de poder gozar do seu hábito. Hábito esse que é
elevado como símbolo da felicidade e da identidade nacional, bastando se recensear
os temas das campanhas publicitárias de cerveja. A fusão, aliás, das duas maiores
empresas de cerveja do Brasil, na Ambev, dá nascimento à maior empresa privada
brasileira como uma multinacional global player da alcoolização planetária, o que
se junta ao nosso recorde de primeiro exportador mundial de tabaco. (CARNEIRO;
2002 s.p )
53
Para CARNEIRO a droga continua fazendo valer a sua importância na economia
9
da
libido humana. No entanto cabe ressaltar que o autor não faz aqui uma defesa intransigente do
uso de drogas principalmente do álcool, prova disso que o mesmo tece críticas ao consumo
descontrolado desta droga como veremos.
Alçada à condição de principal mercadoria do mundo, os meios químicos de prazer
sofreram um crescimento análogo em seu valor mercantil e em sua influência
econômica, social e cultural. O álcool, que é uma das drogas mais perigosas do
mundo, reconhecida oficialmente como a causa de uma boa parte das patologias
individuais e sociais, desde a cirrose e a dependência metabólica (calcula-se que
cerca de 5% da população mundial é álcool dependente), até a violência urbana e os
acidentes de trânsito não só é permitido, como faz parte do imaginário oficial da
felicidade e da alegria. Quais as razões históricas para o predomínio do álcool na
preferência popular para a obtenção de meios simples e diretos para o consolo
físico e espiritual da dor, da fadiga, do tédio e do sofrimento? Porque como remédio
para o sofrimento, diante de um cardápio incomensurável de substâncias químicas,
se consome acima de todas os diferentes tipos de álcool? Não se trata, entretanto, de
abolir o álcool
mas de buscar um uso saudável e responsável dessa droga. O que foi
dito em relação ao álcool aplica-se a todas as outras drogas. Cada uma possui a sua
virtude, faz parte de determinadas culturas humanas e, ao mesmo tempo, oferece o
seu perigo. A proibição cria não só um Estado policial como um fluxo de comércio
clandestino, devido a hipertrofia do preço. (CARNEIRO, 2003. s.p).
Ao mesmo tempo em que cresce a demanda pelo prazer químico, também se institui
um sistema proibicionista que se apóia num discurso médico-jurídico para justificar uma
pretensa guerra contra as drogas que, na verdade, desde a lei Seca de 1920, nos EUA, só tem
servido para aumentar o lucro e a violência.
Segundo Henrique Carneiro
10
, As drogas são um dos arquétipos culturais mais
fortemente presentes no espírito da nossa época. O significado econômico de um consumo
massivo e as formas políticas do seu controle - como o regime do proibicionismo, adotado
como “lei seca” de 1920 a 1934 nos Estados Unidos em relação ao álcool e hoje estendido a
uma escala mundial com a “guerra contra as drogas” - são alguns dos aspectos mais relevantes
do fenômeno contemporâneo das drogas.
Assistimos atualmente uma demonização dos consumidores e dos traficantes de
drogas, a demonização do “drogado” e a construção de um significado suposto para o
conceito “droga” alcança na época contemporânea um auge inédito. Um fantasma ronda o
9
O informe da ONU sobre drogas estimava, em 1997, que o tráfico de drogas ilícitas de cerca de 400 bilhões de
dólares equivalia a 8% do comércio mundial (Le Monde, 27/6/97). No Brasil, os 4 maiores mercados (FSP,
3/8/98) são, em bilhões de reais anuais: cerveja, 8,8; refrigerante 7,4; cigarro 5,3; e aguardente 2,1. A Ambev,
fusão da Brahma e Antártica, tornou-se a maior empresa privada do país. O nosso país é o quarto produto
rmundial e o primeiro exportador de tabaco (FSP, 10/8/2000).
10
Texto apresentado na conferência: “A construção do vício como doença: o consumo de drogas e a medicina”,
no XIII Encontro Regional de História (Anpuh - MG), em 15/07/2002 em Belo Horizonte.
54
mundo, o fantasma da droga, alçado à condição de pior dos flagelos da humanidade afirma o
autor.
Existem atualmente várias campanhas publicitárias condenando o uso e o tráfico de
drogas, sobretudo a droga produzida na Colômbia e na Bolívia. Há ainda políticas de
repressão e controle do consumo de drogas no Brasil e no exterior. O autor cita o Plano
Colômbia que tem características de uma guerra neo-colonial. Para o autor, tal situação se
acentuou a partir dos anos 70, quando Nixon lançou a guerra contra as drogas, atingiu graus
extremos nos anos 80 e 90, na entrada ao terceiro milênio, e parece tornar-se ainda mais
grave. O autor ainda nos chama atenção para os aspectos da degeneração da situação social
que se relacionam direta ou indiretamente ao estatuto do comércio de drogas na sociedade
contemporânea: aumento da violência urbana, do número de encarcerados e das forças
militares envolvidas com as drogas.
Segundo CARNEIRO, as medidas repressivas impostas pelas legislações, pelos
mecanismos disciplinares, dispositivos e políticas de controle social à produção, distribuição,
divulgação, comércio e consumo de substâncias psicoativas caracterizam o proibicionismo
contemporâneo. No mercado internacional globalizado das sociedades industriais, algumas
substâncias são vistas como estigmas, e sofrem diferentes formas de preconceito e retaliação
no âmbito das relações de grupo e das economias individuais.
Segundo o autor, dentro de uma visão macroeconômica, essas mesmas substâncias
proscritas movimentam valores enormes e encontram-se da mesma forma absorvidas por
processos comerciais paralelos como mercadoria de consumo no mercado negro. Esse aspecto
econômico paradoxal oferece à análise a perspectiva dos fatores históricos que envolveram as
diferentes substâncias no âmbito das sociedades e das relações comerciais intercontinentais
dos últimos séculos.
Para este autor a proibição mundial das drogas foi uma das invenções imperialistas
que mais permitiu especulações financeiras e policiamento repressivo das populações no
século XX.
Segundo CARNEIRO, há o nascimento de um novo racismo que, além de biológico,
assume contornos biopolíticos, na estigmatização demonizante dos consumidores de drogas
do final do século XX e inícios do XXI. Para este autor, está estigmatização não se sustenta
porque as drogas são necessidades humanas, seu uso milenar em quase todas as culturas
humanas corresponde a necessidades médicas, religiosas e gregárias. As drogas, portanto,
fazem parte da cultura dos povos. A cultura da droga é estética, religiosa, científica e política.
55
O autor vai além e afirma que a cultura da droga faz parte do processo fundador da psicologia
como ciência no século XIX.
A experiência oitocentista das drogas, de certa forma funda a psicologia na medida
em que fornece um instrumento de produção de diferentes estados de consciência
que permitem uma observação de si - próprio como nunca antes alcançada, “um
reflexo de si mesmo(...) a sombra espelho simbólica destinada à refletir à luz do dia
o que deveria de outra forma permanecer escondido para sempre”. É assim que os
espíritos curiosos sobre si próprios serão seduzidos incessantemente por esta via
para o auto-conhecimento: “é um assunto de psicologia, um estudo sobre mim
mesmo”, como escrevia Balzac numa carta. É a atitude experimental diante da
consciência que inaugura uma ciência cujo objeto é o próprio sujeito observador, e
os instrumentos produtores de consciência alterada permitem ampliar a gama dos
três estados básicos da consciência: vigília, sono e sonho. O ópio e o haxixe trazem
o sonho para a vigília, confundem-nos num novo estado. Os anestésicos trazem o
sono para a vigília, anulando-a quimicamente de uma forma tão absoluta que se
tornaram possíveis as intervenções cirúrgicas indolores.(CARNEIRO;2002 s.p)
Para CARNEIRO, o conhecimento do funcionamento do espírito, a classificação das
instâncias do pensamento, a “história natural da mente”, como podem ser definidos os
objetivos da psicologia, tiveram nas drogas alguns dos seus principais veículos. Desta forma,
segundo ele, imaginário das drogas mudou de acordo com as épocas até chegar ao atual
produto de um século de proibicionismo, com os seus estereótipos do viciado como
paradigma da degeneração física e mental. Muito antes, entretanto, da invenção do quadro
clínico do vício, as drogas forneceram elementos indispensáveis para a atmosfera cultural da
modernidade e para a abordagem estética e científica dos fenômenos da mente humana.
Segundo CARNEIRO, o proibicionismo
11
do início do século XXI dirige-se não
contra o álcool, ou o tabaco que são consideradas drogas legais, mas contra outras drogas (os
derivados de coca, ópio e canábis e substâncias sintéticas). Seu efeito é aumentar a voracidade
da especulação financeira nesse ramo de alta rentabilidade do capital e, ao mesmo tempo,
inflar o aparato policial na tarefa da repressão moral.
As drogas são produtos da cultura, são necessidades humanas, assim como os
alimentos ou as bebidas, podendo ter um bom ou um mau uso, assim como ocorre
com os alimentos. A diferença é que um viciado em açúcar não corre o risco de ir
preso, mas apenas o de perder a saúde na obesidade ou diabetes. A idéia da
erradicação do consumo de certas substâncias é uma concepção fascista que
pressupõe um papel inquisitorial extirpador para o Estado na administração das
drogas, assim como de outras necessidades humanas. Tal noção de um Estado
investido do poder de polícia mental e comportamental legislando e punindo sobre
os meios botânicos e químicos que os cidadãos utilizam para interferir em seus
estados de humor e de consciência é um pressuposto necessário para a hipertrofia
11
Publicado na revista Outubro, IES, São Paulo, vol. 6, 2002, pp.115-128.
56
do lucro obtido no tráfico. Em outras palavras, a proibição gera o super lucro. Tais
razões levam a que a reivindicação da descriminação das drogas se choque tanto
com os interesses dos grandes traficantes assim como com os do Estado policial.
(CARNEIRO, 2003 s.p)
O autor encerra o seu artigo afirmando que a história da guerra contra as drogas, em
seus aspectos econômicos, culturais, políticos e militares ainda está sendo escrita e que
hipocrisia dos argumentos que querem julgar as necessidades humanas para poder administrá-
las através das proibições e da repressão.
O artigo coloca a relação entre o uso de drogas e a violência em um patamar diferente
daquele que freqüentemente vemos. Esta relação a partir de lugar epistemológico diferente
acompanhou todas as etapas da minha pesquisa e é extremamente presente nos discursos da
escola.
Trata-se de uma realidade que, no meu ponto de vista, não pode ser negada, uma
vez que a escola aglomera uma grande quantidade de jovens é seria um grande mercado
consumidor em potencial, disputado por aqueles que atuam neste mercado. Embora o
consumo de drogas seja uma prática arraigada em nossa sociedade ocidental e tenha seu uso
milenar, é importante problematizar a questão afinal, não é porque uma coisa sempre foi
usada que é adequada. Não se pode negar que, em muitas situações a proibição acaba
contribuindo com a voracidade da especulação financeira nesse ramo de alta rentabilidade do
capital. Por outro lado a militarização infla o aparato policial na tarefa da repressão moral
causando violências e corrupção dentro da sociedade e indiretamente dentro das escolas.
Não se pode negar, também que, no dia a dia da escola, são freqüentes os comentários
sobre a morte de jovens em decorrência do seu envolvimento com “o mundo das drogas”. O
grande problema que vejo neste mundo é que ele é um sub-mundo, com regras próprias,
muitas vezes cruéis, incompatíveis com os valores de uma sociedade democrática. No
cotidiano da escola há situações com as quais não é fácil conviver. Esses dias eu mesmo
vivenciei uma delas: perguntei a um aluno que repetia o primeiro ano do Ensino Médio pela
quarta vez:
- E aí, rapaz, este ano você vai estudar, ser aprovado e sair do primeiro ano do
Ensino Médio
- Ah, professor, o senhor sabe qual é minha parada aqui.
Situações como essa são freqüentes no cotidiano dos professores e, refletindo sobre
elas é possível entender por que alguns às vezes acabam apoiando medidas excludentes.
Diante de certas circunstâncias é difícil não acreditar quando ouvimos que estes alunos que
57
ficam nos corredores são o elo entre o tráfico fora da escola e os alunos. Mas como podemos
lidar com esses alunos? A maneira de lidar com eles tem significado ajuda para que repensem
seus caminhos ou tem empurrado mais para o crime?
Há um consenso na unidade e na sociedade de que consumo e o tráfico de drogas
prejudica rendimento escolar e interfere negativamente nas relações que se estabelecem no
ambiente educativo. Esta situação gera insegurança e medo, pois é impossível ficar tranqüilo
convivendo cotidianamente com a possibilidade iminente de situações de violência inerentes
aos ambientes onde a presença do tráfico e a falta de atitude das autoridades competentes,
tanto em relação ao tráfico quanto em relação aos alunos que cabulam aula.
Nesse contexto, é também comum ouvirmos os alunos desta escola reclamar que vários
dos seus colegas cabulam aula e consomem drogas e nada acontece, não há diálogo com esses
alunos para sua responsabilização. As minhas observações levaram a constatar que há um
absenteísmo e parte da direção que não toma as providencias necessárias no sentido de
construir regras juntamente com os alunos de modo que o processo de construção seja um
espaço de educação para a convivência fraterna.
A situação de falta de limite e de impunidade que marca o cotidiano da escola tem sido
uma metáfora da sociedade não pode ser resolvida através de atos de heroísmo de um diretor
isoladamente. Há certa hipocrisia na cobrança de que a escola imponha limites sendo que a
falta de limite está instalada nas demais organizações da sociedade, atingindo desde os
poderes da república até as relações cotidianas nos espaços de trabalho e convivência.
Discutir convivência na escola não pode estar desvinculado da discussão da convivência em
outros espaços e aponta no sentido de uma educação voltada para a construção de uma
sociedade democrática. Neste sentido discutir controle e limites na escola não se restringe
apenas a discussão do comportamento dos alunos, mas deve corresponder à discussão dos
espaços de poder na organização educativa.
3.5 Polícia na escola: A visão da comunidade escolar
A questão da presença da polícia na escola de início não seria tema de minha
dissertação, no entanto, durante a pesquisa e durante a minha vivência nesta escola pude
presenciar várias vezes comportamentos hostis dos alunos e por parte dos policiais e entre
ambos. Esses comportamentos iam desde xingamentos aos policiais, mesmo que estes não
ouvissem fazer gestos obscenos. Ouvi também na sala dos professores muitas questões ligadas
à questão da presença ou da ausência e sua relação com a violência na escola.
58
Começamos essa parte da dissertação com a fala dessa professora que de é contrária a
presença da polícia na escola, mas depois ao não ver saída para a questão da violência dentro
da instituição escolar, acaba corroborando com a presença da polícia.
Eu acho que na escola não é lugar de polícia. A gente trabalha tanto cidadania,
democracia e de repente você topa um homem com uma farda aqui. Todo mundo
fardado vigiando os meninos. Eu acho isso muito complicado. Eu não acho correto.
Mais eu acho que... Eu também não tenho solução. Eu não sei o que fazer. A polícia
acaba sendo um paliativo. Nesta situação que a gente vive, a solução é a polícia
mesmo.
( professora do período noturno).
A fala desta professora merece uma reflexão na medida em que é bastante reveladora
do que significa trabalhar na escola nos tempos atuais. São muitas as situações como essa,
onde o educador tem que agir contra os seus princípios para evitar que um mal maior
aconteça. Neste sentido os trabalhadores em educação, de modo particular os professores
vivem um estado permanente de tensão. O drama de não fazer o bem que quer, mas o mal que
não quer relatado pelo apóstolo Paulo na Primeira carta aos Corintos, é hoje o cerne da
experiência do professor. Vemos esse drama na fala da professora que, embora não concorde
com a presença da polícia na escola, se rende diante da evidência de que não tem uma
alternativa melhor.
Porém, a minha vivência junto aos alunos revela que a relação destes com a polícia
não tem sido das melhores. A grande maioria dos alunos com os quais converso, diz ter sido
vítima de violência física ou verbal praticada pela polícia, evidenciando o quanto a nossa
polícia, sobretudo aquela que atende a periferia, necessita de formação e treinamento para que
não continue com promotora de violência contra os cidadãos que tem o dever de proteger.
Embora a comunidade escolar deseje a presença da polícia na escola ela não manifesta
uma visão positiva da instituição policial, como pode ser observado na seguinte fala de um
professor:
A Polícia é racista e preconceituosa e truculenta, é um aparato de repressão do
estado. Não respeita ninguém, não sabe abordar e lidar com os alunos, não tem
preparo para isso. Ela é treinada para lidar com bandidos e não com a educação na
escola, por isso, sou contra a presença da polícia aqui na escola, e mesmo por que
ela ta sempre ausente. (Professor de História da escola).
Apesar desta percepção sobre a polícia, a comunidade escolar deseja a sua presença na
escola. Muitos professores acham que a presença da polícia na escola é importante, dizem que
a polícia devia sempre acompanhar a entrada e a saída dos alunos e até mesmo ficar de olho
no intervalo para inibir a presença de traficantes nos arredores da escola. No momento de
59
aflição e impotência diante da dura realidade muitos esquecem que a ação da polícia na escola
é limitada e que, em muitos casos, a sua ação tem agravado a situação de violência que
procura combater, pois ainda hoje temos uma polícia treinada para reprimir o crime e não para
orientar a comunidade em suas relações cotidianas, uma polícia formada para reprimir e não
para conviver.
A dúvida entre ficar sem polícia na escola ou melhorar a relação na escola é, ao
menos, paradoxal. Se por um lado a presença policial traz certa segurança à escola,
coibindo, por exemplo, brigas e ameaças, por outras posturas como as relatadas
acima não contribuem para a melhora das relações escolares, pois afirmam a força
ao invés do diálogo e do respeito como bases para o relacionamento no espaço
escolar."( ALVES, 2006:139)
também na comunidade a percepção, que aparece justamente na fala dos alunos, de
que a polícia na escola é um desrespeito para com eles. A polícia que vem para a escola é a
mesma polícia que os agride na rua. A escola pode ser o lugar onde podem ser identificados
para tornarem-se alvo de ações mais violentas em momentos em que estiverem mais
vulneráveis. A maneira como os alunos percebem a presença da polícia na escola é revelada
na fala seguinte:
Lugar de polícia é na rua atrás de bandido, não é na escola Vigiando alunos, nós
não somos bandidos. Não sou a favor da presença da polícia na escola. (aluno do 1º
ano do ensino médio).
As falas e os relatos dos jovens desta escola apontam para o abuso de autoridade dos
policiais, os jovens são enfáticos ao falarem que confiam mais nos bandidos do que na polícia.
Muitos, diante dos atos praticados pela polícia, chegam a afirmar que se não existisse a polícia
as coisas seriam melhores. O mundo do crime possui leis e regras de funcionamento
conhecidas enquanto a polícia possui leis, regras e objetivos proclamados, que funcionam
enquanto há sol e leis, regras e objetivos vivenciados, que funcionam onde não há luz.
Olhando deste lugar não se pode tirar a razão destes alunos. Evidentemente não se pode dizer
que toda a polícia é igual, mas os relatos dos alunos remetem sempre à parte perversa da
instituição.
Na comunidade onde fica a escola pesquisada há a ausência preventiva do poder
público.O estado só aparece em situações de emergência, como força de repressão, não se
verificando essa presença em forma de políticas públicas de segurança, de geração de
emprego, de educação etc, com projetos que possibilitem a inclusão social dos jovens
marginalizados e que se encontram muitas vezes a caminho da delinqüência. Nesse contexto
60
a ação policial é uma produtora de violência, é processo de formação de agentes da violência
no seio da sociedade, uma vez que ao sofrerem violência policial estes jovens acabam que por
reproduzi-la consciente ou inconscientemente.
No caso específico da escola onde realizei a pesquisa, cabe ressaltar que a polícia estava
sempre ausente e a direção chamava-os para resolver casos mais graves, e eles, nem sempre
eram bem-vindos para os alunos e alguns professores. Verifica-se que esta escola antes de
chamar a polícia precisa entender o que está acontecendo: como fica evidente na situação
seguinte por mim vivenciada:
Tudo se iniciou dentro de uma sala, eu estava passando uma atividade na lousa,
quando de repente vi uma cadeira ser atirada sobre uma aluna por um aluno.
Felizmente a cadeira não acertou à aluna, pedi então que este aluno subisse e fosse
conversar com a diretora sobre o ocorrido. Ele ficou irredutível e disse que não iria
sair da sala de jeito nenhum, pedi então para a monitora da sala chamar a diretora
para conversar com ele. O mesmo continuou irredutível e ainda agrediu a diretora
com palavras de baixo calão. A diretora então vendo a presença da ronda escolar
decidiu chamar os policiais para tentarem resolver a situação.
Os policiais chegaram abordando o aluno como se fosse bandido, xingando-o de
vagabundo, enquadrando-o e revistando no corredor da escola na frente dos seus
colegas.
Depois este aluno foi levado para a sala da diretora, eu fui acompanhar o caso,
presenciei os policiais dizendo que iam colocar drogas no bolso do aluno, e que ele
seria preso por tráfico de drogas. Não pude me conter com tal situação, vi no rosto
daquele aluno a angústia e a decepção, falei com os policiais que gostaria de falar
em particular como aluno. Levei-o então para a sala dos professores que estava
vazia naquele momento, perguntei a ele o que estava acontecendo. O que o aluno
me confidenciou me deixou estarrecido, disse que estava passando por dificuldades
em casa pois os pais estavam desempregados e que na última semana também o seu
irmão havia sido morto pela polícia, por isso ele estava estressado. Conversamos
então ele que sua colega havia xingado ele e que não era motivo para ele ter feito
aquilo, conversei com os policiais e disse que tinha resolvido a situação". (Situação
vivenciada por mim professor durante as aulas).
Será que essa situação teria se resolvido se a polícia não tivesse sido chamada ou
mesmo se a diretora não tivesse sido chamada. Chama atenção que a situação foi resolvida
pelo próprio professor que inicialmente não se julgou capaz de resolver e acabou chamando a
diretora. Onde esse professor encontrou, no momento que viu seu aluno prestes a se tornar
vítima de uma injustiça maior, a criatividade que lhe faltou no momento do conflito na sala de
aula. Essa situação coloca em evidência a necessidade de o professor dedicar tempo para
entender as situações que acontecem na sala de aula antes de procurar transferir o problema,
que o diretor precisa entender o que acontece na escola antes de tentar transferir o problema e
assim por diante.
O caso apresentado deixa as seguintes indagações: como preparar a escola para
resolver problemas cotidianos com os recursos de que dispõe? É possível encontrar ajuda para
61
resolver um problema sobre o qual não se tem o conhecimento necessário para realizar uma
intervenção correta? A reflexão que venho realizando sobre a minha própria prática vem
deixando evidente que a principal preparação necessária à escola ou à polícia para intervir nas
situações é a capacidade de compreender antes de agir. Essa postura que parece simples, na
verdade exige destas instituições que deixem de ser instituições portadoras da verdade e se
disponham a se tornar organizações que aprende.
A minha vivência com os alunos sempre vinham questões como: assassinatos, ameaças,
alguns alunos afirmaram ter parentes assassinados outros afirmaram ter mudado de escola por
ter sofrido ameaça. Desta forma, vemos que a violência no bairro tem interferido no percurso
escolar das crianças e adolescentes do local, na medida em que interrompe o vínculo com a
escola e com os professores uma vez que ficam mudando sempre de escola.
Não apenas os alunos mudam de escola em razão da violência, isso ocorre tamm com
os professores, que sempre que têm oportunidade procuram escola que oferecem melhores
condições de trabalho. A rotatividade de professores é outro fator que interfere negativamente
no processo de ensino e aprendizagem, conforme vêm indicando estudos realizados
recentemente.
Mudar de escola nem sempre é uma saída desejada ou possível experimenta uma
situação de violência na escola onde estuda ou trabalha. Embora alguns deixem a escola para
fugir da violência muitos permanecem por opção ou por não ter alternativa. Entra aí a
necessidade de garantir a quem deseja o direito de permanecer. A polícia aparece como
instituição que por sua natureza deveria garantir esse direito, no entanto, pelos motivos já
apontados anteriormente há necessidade da instituição policial preparar-se para esse trabalho.
3.6 Procedimentos da unidade escolar diante das situações consideradas de indisciplina.
Do rio que tudo arrasta, diz-se que é violento. “Mas ninguém chama violentas às
margens que o comprimem”. (BERTOLT BRECHT).
Nesta parte do trabalho pretendo problematizar a aplicação penalidades e sanções
aplicadas nos alunos considerados “indisciplinados”. Para isso, realizarei um levantamento
utilizando como fonte a minha experiência como docente na unidade pesquisada, os registros
oficiais da unidade sobre questões disciplinares tais como ficha individual de aluno, ficha de
ocorrência disciplinar, comunicado disciplinar e ainda conversei informalmente com pessoas
da direção, com professores, com funcionários e com os próprios alunos. As medidas tomadas
pelas escolas nos casos de indisciplina são as seguintes:
62
1 Repreensão verbal.
A repreensão verbal ocorre quando o aluno ultrapassa os limites, quebra determinadas regras
do regimento escolar, quando há situação de ameaças, desavenças que poderá ocasionar
brigas futuras. Quem aplica é a direção, e a coordenação onde os pais e responsáveis são
comunicados por escrito. Acho importante a repreensão verbal, mas não como é feito nesta
escola, na maioria das vezes direção e coordenação não dão chances para o aluno se explicar,
se defender, vão logo acusando o aluno de ser o responsável por determinado erro. Acho
importante o diálogo, o debate a discussão, com o aluno tendo chance de se manifestar
colocando seu ponto de vista.
2 Advertência por escrito.
A advertência por escrito funciona desta forma: o professor faz a ocorrência por escrito, por
diversos motivos: quando o aluno não participa das aulas, quando é desinteressado, quando
ultrapassa os limites causando violência verbal e física, desacatando e não respeitando os
colegas e nem os professores, quando tumultua a aula, situações onde a questão pedagógica
fica comprometida. Depois de o professor lavrar a advertência ela é encaminhada para a
direção que em seguida convocam-se os pais ou responsáveis dos alunos.
3 Convocação dos pais ou responsáveis.
É sempre feita pela direção da escola e pela coordenação pedagógica, e acontece por motivos
variados: agressões físicas (socos, tapas, pontapés), agressões verbais repetitivas xingamentos,
racismo, preconceito e discriminação, quando alunos são flagrados consumindo drogas,
quando algum aluno e flagrado alcoolizado, quando a casos de assédio sexual etc.
4 Suspensão por determinados períodos.
A suspensão por determinados períodos ocorre somente em casos mais graves, casos onde
haja violência física visível, quando algum aluno agrediu, ameaçou ou desacatou algum
professor. No entanto, antes de suspender os alunos, os pais são convocados e se não
63
comparecem aí então a direção suspende os alunos geralmente por 2 ou 3 dias das aulas até a
vinda dos pais à escola para tomarem ciência do fato acontecido.
5 Encaminhamento a “outras instâncias correcionais
12
” (conselho tutelar, vara da
infância e da juventude).
A coordenação pedagógica juntamente com a direção, depois de analisar os casos,
tomam um posicionamento se vão resolver tudo na escola ou se vão enviar para outras
instâncias. Geralmente só encaminham casos graves com reincidência. A causa mais
freqüente de encaminhamento a outras instâncias, no caso o conselho tutelar, é a freqüência
irregular (quando o aluno atinge 20% de faltas). Outros casos de encaminhamento ao
conselho tutelar são agressão física grave com alunos reincidentes, violência contra
professores e alunos quando é lavrado o boletim de ocorrência na delegacia de polícia.
Além destas medidas a escola conta ainda com alguns documentos como comunicado
disciplinar que é um documento emitido pela escola e enviado aos pais em caso de má
conduta do aluno na escola, neste comunicado que segue em anexo estão elencadas 13
situações que o aluno poderia ter cometido. Este documento é enviado aos pais que assinam
um protocolo se comprometendo a comparecer na escola para resolver a situação de seu filho.
Neste ínterim enquanto os pais não comparecem a escola o aluno fica impedido de assistir as
aulas, o que é ilegal, pois a atual LDB garante o acesso e a permanência do aluno na escola. O
documento ocorrência disciplinar é o local onde todos os envolvidos na ocorrência aluno,
professor, inspetor, responsável pelo aluno e a direção se expressam sobre a ocorrência
disciplinar.
No primeiro momento parece ser democrático, mas analisando algumas ocorrências
disciplinares constatei que o parecer da direção sempre penaliza e culpabiliza o aluno, nunca o
professor ou demais funcionários da escola. Assim, algo que no primeiro momento parece ser
democrático acaba sendo estritamente autoritário e injusto, pois sempre dá razão somente uma
das partes. Por último a ficha individual
13
do aluno é o local onde durante o ano letivo são
anotadas as diversas ocorrências disciplinares com assinatura do aluno e do responsável por
ele, é uma forma de controlar a quantidade de ocorrência que alguns alunos se envolvem.
12
A utilização da expressão outras instâncias correcionais é aqui empregada como ironia, na medida em que a
escola, em muitas situações, por desconhecimento ou por se apoiar no fato da comunidade desconhecer os
objetivos destas instituições as cita como instituições complementares a suas atitudes excludentes e, em muitos
casos ilegais.
13
Esses três documentos citados estão disponíveis nos anexos.
64
Além das medidas disciplinares escritas, constatei através de minha vivência diária
como professor da unidade, da fala de alguns professores e mesmo em reuniões do conselho
de escola que muitas vezes o aluno é “convidado a se retirar da escola”. Os pais são chamados
e são “obrigados” a pedirem a transferência do aluno, ou pedem a transferência ou o aluno é
expulso da escola.
Pude constatar que os pais sofrem tanta pressão, e são chamados tantas vezes na escola
que acabam por retirar o seu filho desta escola, de tanto ser incomodado e muitas ameaçado
que seu filho será mandado para o conselho tutelar, muitos pais retiram os filhos da escola e
deixam em casa fora da escola acarretando a perda do ano letivo.
Cabe ressaltar que essa medida de expulsão não surte muito efeito, pois muitas vezes o
aluno é expulso da escola, mas continua nas imediações. A escola é o único local onde o
aluno tem para ir, e mesmo sendo expulso ou suspenso ele acaba pulando o muro e
adentrando para a escola.
vira o jogo de gato e rato entre esses alunos expulsos e as inspetoras de alunos.
Flagrei várias vezes as inspetoras colocando esses alunos para fora da escola, não se passavam
nem 10 minutos e eles estavam de volta.
Meus amigos estão aí, minha namorada estuda na 6ª “D”, não tem outra local para
eu ir por isso é que venho para cá.” (aluno que foi expulso”.)
Esses alunos que são convidados a se retirar da escola ficam com raiva da escola e
também de alguns professores, tanto que durante este ano letivo, vários carros dos professores
que estavam no estacionamento foram riscados, tiveram os pneus esvaziados e tiveram ainda
dois casos de carros que tiveram as placas arrancadas, um de um professor de matemática e o
outro do dono da cantina.
Esses alunos que são expulsos também praticam vários atos de vandalismo como pichar
as paredes de fora da escola, quebrar vidraças, subir no telhado e quebrar telhas. A vontade
era de estarem dentro da escola com os seus amigos, divertindo-se e aprendendo algo de
importante na escola.
Alguns funcionários da escola com que conversei e que fazem parte da direção
(coordenadores, vice-direção, professores) informaram que é uma prática adotada entre
escolas, ou seja, elas trocam também entre si os alunos que são percebidos como tendo
ultrapassado todos os limites e que já passaram por todas as medidas disciplinares possíveis, e
que discutiremos a partir de agora.
65
Várias são as formas de punições encontradas por esta escola para tentar barrar o avanço
da violência e indisciplina. Como forma de manter a disciplina esta escola tem tomado
algumas medidas. Além das já citadas há outra prática da escola que merece destaque:
punição de toda sala por causa dos atos de um aluno. Com isso a escola procura jogar a sala
contra aquele que praticou o ato, procura fazer com que os alunos resolvam um problema que,
na realidade é atribuição dos educadores. A fala seguinte mostra o que pensa o aluno sobre
essa prática:
Teve um menino da sala que colocou fogo na lixeira, mas como ninguém quis
dedurá-lo, a sal inteira vai ficar três dias de suspensão. Acho isso injusto não
podemos ser punidos por coisas que não fizemos. (aluna do 1º ano do ensino
médio).
A fala do aluno dá indicação sobre a contribuição da escola para o estabelecimento do
sistema de convivência que prevalece em seu cotidiano. Neste sentido é possível concordar
com AQUINO (2002) quando ele afirma que a indisciplina na escola pode ser entendida como
um termômetro da própria relação do professor com o seu campo de trabalho, seu papel e suas
funções.
Termino esta parte do trabalho com a seguinte indagação será que existem disciplinas
eticamente válidas e desobediências legítimas que acabam por fazer a sociedade evoluir, será
que esta indisciplina que acontece tanto nesta escola pesquisada não é por causa de regras que
não fazem sentido para os alunos ou de valores suspeitos como subserviência cega e
autoritarismo como bem coloca LA TAILLE (2001).
66
Capítulo: IV
4.1 A percepção da comunidade escolar sobre a violência.
Apenas a violência pode servir onde reina a violência, e apenas os
homens podem servir onde existem homens. (Bertolt Brecht).
Neste capítulo tratarei da percepção da comunidade escolar sobre a violência existente
nas relações que se estabelece no cotidiano da unidade, que é o objeto desta pesquisa, cuja
preocupação foi investigar como a comunidade escolar percebe a violência que acontece na
escola e como essa violência é vivida por essa comunidade. Embora a rede estadual seja
gigantesca, escolhi apenas uma escola como local para realização da pesquisa. Creio que
compreendendo as percepções da comunidade desta escola terei elementos para inferir pistas
sobre o que ocorre em outras unidades do sistema escolar, ficando a possibilidade de, em
outro momento, ampliar o campo de pesquisa em uma situação em que contar com mais
tempo. Desta forma, a pesquisa investiga as percepções que a comunidade escolar de uma
escola da rede pública estadual, localizada na zona sul de São Paulo, tem sobre a violência
que acontece em um ambiente escolar de Ensino Fundamental e Médio, e quais as
conseqüências desta percepção para as relações de ensino e aprendizagem.
Para atingir os objetivos da pesquisa recorri inicialmente a um questionário com
questões abertas e fechadas que foi completado por uma entrevista estruturada que apliquei
aos alunos e educadores com o objetivo de completar os dados levantados no primeiro
questionário. No caso do primeiro questionário as questões respondidas pelos alunos foram
diferentes daquelas respondidas pelos educadores e serviu para traçar um perfil sócio-
econômico da comunidade escolar. No caso da entrevista, as questões respondidas pelos
educadores foram iguais àquelas respondidas pelos alunos e com os dados coletados por meio
delas completaram as informações sobre a percepção da comunidade sobre a violência na
escola. As questões distribuídas no segundo momento da coleta de dados foram as seguintes:
1 – O que é violência escolar?
2 – Nesta unidade escolar há situações de violência?
3 – Em que locais da escola ocorrem situações de violência?
4 – Quem pratica violência na escola?
5 – Por que ocorrem situações de violência na escola?
Além dos instrumentos acima mencionados, recorri também a minha própria prática
uma vez que atuo na unidade pesquisada e convivo cotidianamente com as situações de
violência que marcam o cotidiano da escola. Recorri também aos registros oficiais, tais como
67
registros de ocorrências, convocação de pais, atas de reuniões do Conselho de Escola, entre
outros. A partir da consultas a estas fontes oficiais elaborei o último item deste capítulo que
trata dos procedimentos da escola com relação às atividades dos alunos que a escola considera
como manifestação da violência escolar.
Outro procedimento de coleta de dados foi a observação dos horários de entrada e saída
de escola e também dos momentos de intervalo. Olhar para estes momentos, assumindo a
atitude de pesquisador, é uma experiência muito rica na medida em que permite observar
atitudes dos alunos nestes momentos e questionar até que ponto certos gestos deles nestes
momentos marcados pela informalidade se constituem em atos de violência ou apenas são
símbolos de um código próprio da juventude.
Antes de discutir suas percepções sobre a violência na escola, pareceu-me conveniente
apresentar a comunidade escolar, destacando as condições de vida e as expectativas das
crianças e adolescentes que chegam à escola pesquisada para serem educados. Pretendo
também apresentar a escola para assim colocar em discussão juntamente com as condições de
estudo dos alunos, as condições de trabalho dos professores. Desta forma podemos criar
condições para a discussão da violência como problema social construído historicamente e
que se manifesta em um contexto especifico e não apenas como um desvio moral de alguns
alunos.
4.2 - Caracterização da escola e da comunidade.
A violência leva à violência, e justifica-a. (Théophile Gautier)
Para melhor situar o leitor, nesta parte do trabalho, farei uma breve descrição da
unidade onde a pesquisa foi realizada e do contexto onde ela está inserida. Trata-se da
Escola Estadual Padre Tiago Alberione, está localizada na Avenida Ângelo Cristianini nº
1434 no Bairro de Cidade Júlia, no extremo sul da cidade de São Paulo pertencente a
Diretoria de ensino sul 1, O bairro fica na divisa com Diadema e sua população vive em
situação econômica e social bastante precárias.
A escola pesquisada funciona em dois turnos diurnos e um noturno, com 21 salas em
funcionamento por turno. Atende crianças, jovens e adultos com idade a partir de 10 anos, em
um total de 2400 alunos.
68
O aspecto físico geral da escola dá a impressão de uma escola que no passado já
esteve mais provida de recursos, e que vem se degradando. Esta impressão é confirmada pela
desativação e degradação de certos espaços, como laboratório de ciências e sala de
informática) e pelo aspecto de manutenção e conservação do estabelecimento escolar que é
bastante precário.
Outro aspecto que chama atenção é o estado de conservação das lousas, que encontram
sujas, com buracos, trincas e pichações. A escola possui ainda uma biblioteca que pela
primeira impressão parece ser ótima com um acervo bem grande, mas que devido à falta de
funcionários está desativada. Possui ainda uma sala com 15 computadores novos que nunca
foram utilizados nem mesmo pelos professores. Embora conte com uma boa biblioteca e uma
sala de informática bem equipada, que não estão sendo usadas por falta de funcionário ou
excesso de zelo da direção, faltam materiais pedagógicos básicos de trabalho dos professores.
Quando tem o material geralmente fica trancado como ocorre com a sala de leitura e de
informática.
Outro problema sério é a falta de cadeiras e carteiras para os alunos, nos dias de alta
freqüência registra-se o maior corre, corre dos alunos à procura de cadeiras e carteiras para
sentarem. Todos os dias uma parte do tempo de trabalho escolar é perdida pelos alunos que
ficam correndo de sala em sala à procura de mesas e cadeiras para sentarem.
A sala de vídeo também não tem cortinas nas janelas e por isso tem seu uso
prejudicado. Desta forma é mais utilizada como um depósito de cadeiras quebradas e de livros
didáticos do que para exibição de filmes, documentários etc.
A Biblioteca, não funciona mais por falta de funcionários, desde quando um professor
que tomava conta foi embora nunca mais abriram a biblioteca e a nova sala de informática
está impecável, chegaram computadores novos e desde o início do ano estamos esperando sua
reinauguração e até agora nada, e olha que já estamos no mês de outubro.
Em conversa com uma professora de Biologia que há muito tempo está na escola, a
mesma afirmou que há 10 anos havia um laboratório muito bem equipado, mas que tiveram
que fechá-lo para esta sala abrigar uma nova sala de aula, pois a demanda por vagas aqui
nesta escola e muito grande. Com relação aos recursos físicos e materiais é possível observar
o seguinte: há grande falta de recursos e matérias e o que tem está sub-utilizado.
Fechar laboratórios, fazer puxadinhos nas escolas muitas vezes eliminando espaços de
convivência para dar lugar à criação de salas de aula com o fito de garantir o direito de acesso
à escola foi prática muito comum na rede pública de ensino. Esse tipo de situação se repetiu
em diversos bairros da cidade e, com mais freqüência nas regiões periféricas, onde há grande
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quantidade de ocupações irregulares. Embora considere essencial a garantia do direito a
educação é importante questionar a ampliação de vagas sem preocupação com a qualidade do
trabalho que se desenvolve na escola. Parece importante refletir sobre em que medida
garantir o acesso de todos em uma escola que não ensina e onde não há convivência social
produtiva é garantir o direito à educação. Foi prática bastante comum no sistema publico de
ensino
Outro aspecto importante a ser observado diz respeito aos recursos humanos
disponíveis para que a escola desenvolva o seu trabalho. A escola no ano em que a pesquisa
foi realizada atendeu cerca de 2.400 alunos e, para isso, contou com 94 professores, sendo 45
na condição de efetivos e 49 na situação de contratação temporária. Para cuidar destes alunos
nos horários de entrada e saída e também nos horários de intervalo contou com 4 inspetores
de alunos. Para realização da limpeza da unidade em seus três turnos de funcionamento a
escola contou com apenas 4 serventes. Essa situação implica em salas de aula com média de
45 jovens ou adultos o que interfere negativamente na qualidade do trabalho e na
impossibilidade de manutenção da escola limpa. Neste sentido, fica evidente a carência de
funcionários, o que certamente vem dificultar o trabalho pedagógico da escola, afetando
diretamente a qualidade do ensino e toda a dinâmica de funcionamento da escola. Como
vemos, a escola apresenta deficiência muito grande quanto a presença de funcionários
operacionais, principalmente, de limpeza e na cozinha, os quais são em número reduzido e
precisam sempre revezar, por vezes entre o cumprimento das duas funções.
À falta de funcionário se junta o problema da organização da escola que coloca em um
único período os alunos de 5ª e 6ª séries. Essa situação torna o período da tarde extremamente
crítico, tanto em função das particularidades da idade das crianças e adolescentes atendidos
quanto pelo fato de serem eles provenientes de outras unidades do entorno e nos primeiros
anos na escola ainda estarem se conhecendo.
Talvez esse seja um ponto da chamada reorganização das escolas estaduais que mereça
reflexão: as crianças conviverem por quatro anos em escolas diferentes e se encontrarem no
quinto ano de escolarização, em um momento em que começam os grandes questionamentos
identitários, com outras crianças vindas de realidades diferentes e entre as quais existem até
rivalidade. Embora reconheça a importância desta reflexão, ela não será realizada neste
momento para me manter no foco deste trabalho.
Diante desta situação parece importante compreender situações vivenciadas pelos
alunos para além não apenas como atos de agressão que acontecem entre eles, mas como
situações que tem origem na própria forma de organização da escola.
70
Outro aspecto que parece importante de ser destacado é a instabilidade do corpo
docente. O quadro de professores da unidade no ano em que foi realizada a pesquisa iniciou o
ano letivo com 27 professores novos e, durante o ano muitos chegaram à unidade e muitos
saíram. Essa é uma situação que se repete todo ano e que tem influência na maneira como as
crianças se comportam na escola. A organização da escola encontra-se sujeita a diversas
modificações ao longo do ano por diferentes razões: licenças saúde, licença prêmio, gestação,
remoções. Quando há substituição destes professores afastados, há contratação de
profissionais por tempo determinado o que implica em um tipo de compromisso com o aluno
bem semelhante ao que o estado tem com esses profissionais.
Um dado que pude perceber a partir da minha própria experiência foi a relação que
existe entre a falta do professor e o sentimento de não ser acolhido pelo aluno. Se o professor
falta muito à aula, o aluno entende que este professor não gosta deles, que está faltando para
se ver livres deles naquele dia. Isso aconteceu comigo mesmo no período em que estava
fazendo os Créditos do Mestrado e sempre chegava atrasado às quartas-feiras ou acabava
faltando às duas últimas aulas que eu tinha em uma sala. Um dia uma aluna me perguntou:
Professor você também não gosta mais da gente né, não está vindo dar aulas nas
quartas-feiras".(aluna da sétima série H)
Fiquei muito apreensivo com a fala da aluna, sempre vi os alunos festejarem as faltas
dos professores e não imaginava que esse tipo de sentimento por parte deles. Vi que a minha
presença era um sinal de respeito a eles, um sinal de que eu gostava deles. A escola pode
proporcionar um ambiente agradável quando há nela professores que com sua presença
mostra respeito aos alunos.
Como podemos ver, os problemas relacionados ao corpo docente não param na alta
rotatividade dos profissionais há também o elevado número de faltas que ocorrem muitas
vezes em função das condições de trabalho e da carga horária quadro docente gera além de
desafios pedagógicos como também desafios administrativos. Somando a esta situação temos
ainda a questão da faltas freqüentes dos professores efetivos.
Segundo os professores a rotatividade e as faltas de alguns professores interferem no
clima de trabalho, pois estamos sempre nos deparando com pessoas novas, se não criam
vínculos conosco, professores, imagine com os alunos - reclamam os professores.
Recorro à fala de uma professora:
Nós temos um grande número de professores com contrato temporário, acabou o
ano eles vão embora para outras escolas, isso é um dificuldade na linha de ação da
escola, tem colegas aqui que eu nem sei o nome, por que estão há pouco tempo,
ficam 2 ou 3 meses substituindo depois vão embora. Alguns vêm e desistem por
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causa da violência e do salário. Alguns ingressaram no último concurso e não
agüentaram nem uma semana pediram exoneração, estavam acostumados a
trabalharem em firmas, não estavam acostumados com o clima da escola. Então o
fato de não termos um quadro permanente na escola, para que haja uma
continuidade do trabalho gera um problema: nós temos dificuldade na organização
devido a esta rotatividade de professores na escola".
(professora do período noturno)
A situação descrita na fala da professora é comum nas escolas da rede pública estadual
e denuncia vários problemas ainda hoje presentes na escola pesquisada: precariedade dos
contratos de trabalho, rotatividades de professores impedindo continuidade do trabalho,
salário não convidativo e violência como motivo de abandono da carreira do magistério,
profissionais de outras áreas atuando na carreira do magistério. Um dos aspectos que chama a
minha atenção durante a realização da pesquisa foi que a violência escolar geralmente não
aparece relacionada com estes aspectos ficando sempre como um problema externo à escola e
ao sistema escolar.
Ainda tomando como referência a fala da professora, é possível verificar que em uma
situação como a descrita poucas condições se tem de desenvolvimento de um processo de
gestão democrática participativa, o que parece fundamental para a redução da violência na
escola. Afinal, em uma escola onde nem mesmo os professores se conhecem, como mostra a
fala citada, como se pode esperar que eles conheçam os pais e, sem conhecê-los, como
convencê-los a participarem ativamente da vida da escola? Um dos aspectos que foi possível
perceber é que há um caráter fortemente falacioso nos discursos sobre a participação da
comunidade na elaboração e desenvolvimento do trabalho pedagógico. Hoje há a exigência
legal de inclusão da comunidade no processo de gestão da escola, porém, se olharmos para o
funcionamento da escola pesquisada, vemos que as condições para esta inclusão ainda
precisam ser construídas. Essa situação evidencia os motivos apontados no trecho seguinte
como responsáveis para que as condições de trabalho da escola encontrem-se tão deterioradas.
Péssimas condições de ensino existentes. E isto ocorre, mais uma vez, por conta do
fato de que a educação está longe de ser estabelecida como prioridade para o
engrandecimento nacional e para a melhoria da qualidade de vida dos brasileiros.
Afinal, vivemos um momento no qual, como nunca antes, ficou esclarecido que
nosso Estado (nosso aparelho Jurídico-político) não passa, no dizer de certo
economista'. (MORAIS; 1995: 41).
É possível perceber na escola pesquisada que, por falta de funcionários, há
subutilização de espaços e de recursos existentes nesta escola para serem utilizados em
benefício da convivência e da aprendizagem dos alunos. Recursos fundamentais para a
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diversificação das atividades pedagógicas e para o estimulo do interesse dos alunos e que
poderiam contribuir para melhorar a qualidade da relação de ensino e de aprendizagem estão
sendo deteriorados pelo tempo sem serem utilizados.
É muito comum faltarem cinco ou até mais professores por tarde nesta escola, e os
eventuais que são professores que cobrem as faltas dos professores titulares da sala não
gostam de trabalhar à tarde, pois não conseguem lecionar devido às questões disciplinares que
se concentram neste período.
As pesquisas demonstram que as crianças e adolescentes que cometem atos violentos
sistematicamente (e são considerados por isso com problemas de comportamento)
provem de uma minoria desfavorecida com muitos problemas sociais e que são
esquecidos ou excluídos socialmente e a escola precisa ser um espaço acolhedor,
inclusivo e promotor de uma vida saudável para esses abandonados. A violência
simbólica existente na hierarquia escolar vem acompanhada da noção de violência
estrutural, especialmente nas escolas públicas que carecem de equipamentos e
estruturas físicas adequadas ao aprendizado, bem como padecem de uma pedagogia
inadequada ao público que atendem'‘. (DUARTE, 2005; PINTUS, 2005).
Inspetoras de alunos existem quatro, duas atuando em cada período, mas ainda é
pouco para controlar uma escola que tem 21 salas de aula e em torno de 800 alunos por
período. O número de inspetores de alunos é muito pequeno para controlar contingente tão
grande de alunos tanto que várias vezes durante o ano o sinal do intervalo foi batido com
antecedência e a professora coordenadora pedia para os professores descerem rápido para as
salas de aula, pois estava ocorrendo brigas no intervalo.
O gigantismo desta escola é relatado por vários professores como sendo um dos
motivos para tanta violência que ocorre nesta escola.
Com relação à comunidade atendida esta escola atende jovens que moram no próprio
bairro Cidade Júlia e arredores como: Parque Primavera, Missionária, Jardim Luso, Favela
Pantanal, Favela Buraco do Sapo e Sete Campos, algumas ruas não há saneamento básico, e
outras não têm asfaltamento e nem iluminação pública, o que favorece à potencialização da
violência no entorno da escola, que é considerado um dos mais violentos da cidade. Alguns
anos atrás este bairro foi destaque na mídia por servir de cativeiro para o ex-prefeito de Santo
André Celso Daniel que acabou assassinado depois. A escola atende a camadas baixas e
desfavorecidas e nas proximidades existem outras escolas públicas que oferecem o ensino
fundamental. Trata-se de um bairro formado por ocupações irregulares, em uma vez que está
em área de manancial, ocupada há mais de 35 anos.
A maior parte dos alunos, segundo dados levantados no questionário que apliquei, vive
em famílias que ganham até 03 salários mínimos, sendo que muitos deles pertencem famílias
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de pais e mães desempregados. Alguns inclusive cometeram atos infracionais o que os
levaram à experiência de internação na antiga FEBEM
14
, hoje Fundação Casa.
Em relação a áreas para prática de esportes e lazer, o único local disponível para esta
comunidade usufruir é um terreno baldio, onde há demarcados sete campos de futebol e que,
segundo comentam, freqüentemente é usado como local de desovas de corpos. Nos finais de
semana o local é usado para a prática de esporte e lazer. A comunidade organiza campeonatos
e as crianças usam também o local para empinarem pipas. O outro espaço de lazer utilizado
pela comunidade é a quadra de esportes da escola que, em muitas ocasiões, é invadida em
hora de aula, impossibilitando a prática de Educação Física pelos alunos.
A maioria das habitações não é planejada, construída pelas próprias famílias de acordo
com a necessidade no ritmo do crescimento das famílias. As casas estão sem acabamento,
com os tijolos à mostra, ainda encontramos ainda moradias feitas de madeiras.
Os jovens desta comunidade circulam na maioria das vezes apenas no seu bairro, por
não terem dinheiro para condução, ou para gastarem fora em alguma atividade esportiva,
cultural ou de lazer. Portanto ficam segregados no seu bairro, não se beneficiam dos espaços
de cultura e lazer existentes na cidade onde vivem e também são excluídos do mercado de
consumo. Esses fatores certamente interferem na sua convivência no seu bairro e na escola.
Nesse sentido em conversas com jovens é comum ouvir deles frases ressentidas pela
discriminação que sofrem, inclusive na escola, por morarem na periferia, sobretudo por
morarem em favelas. À discriminação pelo local de moradia se junta à discriminação pelo
modo de se vestirem, pela condição racial, pelo gosto ou estilo musical, pela orientação
sexual. Vários comentam que muitas vezes foram dispensados de entrevistas de empregos em
função do local de moradia.
Os questionários aplicados também permitiram perceber que a grande maioria dos
alunos atendidos pela escola é filho de nordestinos. Esse é um dado que não pode deixar de
ser considerado quando se discute violência na escola, pois, segundo PASSETTI (1987) a
imigração vinda do nordeste principalmente para o eixo Rio - São Paulo foi um choque
cultural fruto do padrão cultural rural com o padrão cultural urbano desorganizando as
famílias.
Embora quase a totalidade declarar ter nascido na cidade de são Paulo, serem, portanto
paulistanos, não se pode desprezar o fato de serem filhos de nordestinos, uma vez que tiveram
sua formação fortemente marcada por esta cultura. Devido à condição econômica das
14
Fundação de bem estar ao menor, atual Fundação Casa.
74
famílias a maior parte dos jovens que freqüentam a unidade contribuem para o sustento da
própria família, sendo que para uma parte considerável deles essa contribuição é constante,
havendo inclusive casos em que o jovem é o único provedor da casa.
Ser o provedor da casa tem várias implicações, primeiro porque o adolescente tem
uma grande responsabilidade diante de si, que em uma fase da vida em que precisa ser
ajudado para poder construir sua autonomia passa a assumir uma responsabilidade que, em
uma sociedade mais justa não seria dele. A implicação desta situação para a vida escolar é
notória, pois chegam do trabalho cansados, atrasado e muitas vezes desanimados, o que tem
como conseqüência inevitável um desempenho insatisfatório na escola.
Desta forma os jovens das comunidades atendidas pela escola pesquisada têm na
unidade escolar o mais importante agente do processo de socialização. Isso é decorrência,
entre outros fatores, das mudanças ocorridas no mundo do trabalho, da presença das mulheres
no mercado de trabalho e das novas configurações que a família vem assumindo.
Como ocorre na maior parte das crianças na atualidade, no bairro onde fica a escola
pesquisada, as crianças e adolescentes tem pouco contato com os pais. Esse contato, quando
ocorre é geralmente à noite, quando chegam do trabalho, já cansados e sem disposição para
conversarem, brincarem com seus filhos, conviverem com seus filhos.
ABRAMOVAY (2002) aponta que a "proximidade ou a distância, o diálogo, ou o
silêncio, a presença ou ausência dos pais, a proibição ou a permissividade são fatores que
influenciam os jovens na definição de sua escala de valores e’formas de inserção social". Ao
relatar as características dos agressores e o modelo de domínio-submissão, considera que
entre os principais antecedentes familiares, destaca-se a ausência de uma relação afetiva e
segura, por parte dos pais.
Nesse cenário, onde os pais muitas vezes não tem um espaço de convivência com os
filhos, o diálogo é praticamente impossível o que torna difícil a construção de valores e a
partilha de experiências de vida. Em alguns casos essa ausência gera angústia nos próprios
pais que procuram compensá-la com presentes ou sendo permissivos ao extremo. Outro fator
que tem interferido na relação pais e filhos é o questionamento forte que hoje existe com
relação aos padrões autoritários de educação que historicamente foram construídos. É possível
notar que alguns casos os pais tentam fugir destes padrões, no entanto, não conseguem
estabelecer novos padrões que contribuam para uma educação para a liberdade e a autonomia.
Não raro, a negação dos padrões autoritários, descamba para a falta de referência. O trecho
seguinte nos ajuda a compreender esta situação:
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Na fase da adolescência, a ausência de clareza, a desorientação, enfim, torna-se um
complicador para os jovens. A total liberdade, que a família assegura aos seus
filhos, acaba levando-os à perda de referências significativas, o que lhes complica o
desenvolvimento e o amadurecimento psicológicos
. (SILVA, 2002: s p)
Na fase da adolescência, a ausência de clareza, a desorientação, enfim, torna-se um
complicador para os jovens. As condições em que crescem os jovens, com pouca convivência
com os adultos, acaba levando-os a não construir referências significativas, o que lhes
complica o desenvolvimento e o amadurecimento psicológicos. Nesse contexto os pais não
exercem mais seus padrões de comportamentos, de valores, de crenças e atitudes, a criança
cresce desenraizada da cultura familiar, com a ausência paterna ou materna estes jovens ficam
mais vulneráveis às situações de violência social na rua e na escola.
É comum ouvir-se dos professores que nem a escola, nem os educadores estão
preparados para atender as novas demandas que estão postas para as instituições e pessoas
ligadas ao campo educacional. A escola atual tem outras responsabilidades sobre os alunos
que no passado não tinha, atualmente além de prover os conteúdos, que prepararam as
crianças, adolescentes e adultos para viver em uma sociedade cada vez mais dependente da
cultura letrada, tem também a incumbência de ensinar valores e, acima de tudo, ensinar a
conviver e se inter-relacionar uns com os outros, de forma respeitosa e produtiva.
Nesta parte do trabalho realizei uma breve descrição da escola e do contexto onde ela
está inserida, buscando, com isso, apresentar o cenário onde interagem os sujeitos desta
pesquisa, que busca compreender quais são as percepções da comunidade escolar sobre a
violência na escola. Em seguida, pretendo verificar quais são estas percepções o que farei
através da análise das entrevistas por mim realizadas com 04 educadores e 07 alunos.
4.3 A percepção dos educadores e educandos sobre a violência na escola
Aprender e ensinar é um ato de responsabilidade ético-política. (PAULO FREIRE).
Este parte do trabalho procura identificar as percepções de educandos e educadores
sobre a violência com que convivem no cotidiano da escola na condição de educadores ou de
estudantes. Com este objetivo realizai entrevistas com 04 educadores sendo eles o diretor da
escola, o assistente, a coordenadora e um professor. No processo de análise das entrevistas,
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como já foi dito, refleti sobre minha própria prática, observei o dia-a-dia da escola e conversei
com alunos do Ensino Fundamental e Médio, que estão cursando do Primeiro ano do Ciclo II
ao Terceiro ano do Ensino Médio. Esses alunos, em sua grande maioria possuem idades entre
11 e 18 anos. De antemão, cabe colocar que tive muita dificuldade para pesquisar em uma
situação na qual eu estava envolvido diretamente, no entanto, o mesmo fato que foi
dificuldade se revelou um fator positivo na medida em que permitiu transformar a minha
prática cotidiana em uma experiência significativa no meu processo de formação.
4.3.1 – A definição de violência escolar
Para identificar as percepções de violência de educandos e educadores da escola
pesquisada comecei buscando saber como estes sujeitos definiam essa questão. A primeira
observação que foi possível fazer com relação a essa questão inicial foi que, a percepção
sobre a violência depende muito do lugar que você ocupa no espaço escolar. Neste sentido
vale destacar nas falas dos alunos o fato deles ao definirem violência escolar relacionarem
com discriminação, preconceito e intolerância para com as diferenças. Embora a pergunta
fosse clara (o que é violência escolar?), os entrevistados nem sempre deram uma definição
teórica do conceito, procuraram citar exemplos por meios dos quais expressavam qual o
conceito particular de violência, como podemos observar na fala da coordenadora pedagógica
reproduzida a seguir:
Violência escolar é tanto o educador como qualquer outro funcionário da escola,
agredir verbalmente ou fisicamente qualquer um da escola ou ainda um educando
agredir verbalmente ou fisicamente um professor, funcionário ou aluno da escola.
A fala evidencia que a coordenadora entende como violência a agressão física ou
verbal praticada por qualquer pessoa contra uma outra pessoa. Admite que a agressão pode ser
praticada não apenas por alunos, mas também por educadores. Na mesma, o diretor define
violência como todo ato praticado na escola cujos efeitos sejam danosos a outros, como
podemos ver no trecho seguinte:
É todo ato e qualquer ato praticado na escola (ou pela escola) cujos efeitos sejam
danosos ao outro. Os danos podem ser de várias ordens (físicos, morais,
psicológicos, etc.) e a violência na escola pode ser praticada por qualquer um
(direção, professores, funcionários etc.) como também pode ser direcionada a
qualquer pessoa, seja intencionalmente ou não. (Diretor da unidade).
Como a coordenadora também enfatiza o fato de que a violência pode ser praticada
tanto pelos educandos quanto pelos educadores. Em sua fala abre a possibilidade da violência
não ser apenas verbal ou física e admite a possibilidade de atos não intencionais também se
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constituírem em exemplos de atos que causam danos ao outro, o que nos remete à violência
simbólica.
O professor por seu lado define a violência escolar como violência social e entende
que a escola é o lugar onde se manifesta a virtude e o vício social.
A violência escolar nada mais é do que a violência social. A escola é reflexo da
sociedade. Na escola manifesta-se a virtude e o vício social. A violência do
professor que trata os alunos de modo grosseiro, dos alunos que tratam colegas e
professores sem urbanidade e respeito. Danos ao patrimônio público. Tudo isso são
reflexos da violência social que se manifesta na escola.
Como vemos, além dos atos danosos às pessoas, ele classifica como violência escolar
os danos ao patrimônio publico. A vice-diretora amplia o alcance da violência escolar e inclui
também os pais como possíveis vítimas de atitudes violentas, destaca sobretudo aquelas
atitudes que provocam situações de constrangimento e amedrontamentos envolvendo os pais,
como vemos em sua fala:
Violência escolar é quando há situações de constrangimento e amedrontamento
envolvendo pais, pais professores alunos, ou seja, a comunidade escolar. Além de
agressões verbais, xingamentos ameaças e agressões físicas, que é quando chega
aos extremos.
A sua definição de violência escolar é bastante interessante e vale apenas refletir um
pouco sobre ela, sobretudo se a confrontarmos com as medidas disciplinares aplicadas aos
alunos pela escola. Entre essas medidas boa parte delas ilegais, encontra-se a convocação aos
pais. Tenho observado que estas convocações geralmente se caracterizam como momentos de
constrangimento e, muitas vezes, de pressão para que os pais tirem seus filhos da escola
quando eles estão dando trabalho como já me referi anteriormente. A reflexão sobre essa fala
faz surgir a seguinte questão: por que a escola com tanta freqüência toma atitude que sabe
inadequada?
A fala do aluno A, que define violência escolar como discriminação, ajuda a refletir
sobre essa questão:
É discriminação que ocorre dentro da escola por professores funcionários e
principalmente por alunos contra outros alunos e contra os professores. Violência
verbal e física que ocorre dos alunos contra os professores e vice-versa.
O aluno B define violência escolar com a privação de alunos, professores e
funcionários exercerem seus direitos. Segundo ele “é a privação que o aluno, professores,
funcionários vem a ter de exercer os seus direitos e deveres por pressão psicológica e mesmo
física”.
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Finalmente destaco a definição do aluno G sobre a violência escolar: “são agressões
tanto físicas quanto verbais que acontece dentro da escola, às vezes por um aluno ou grupo,
ser diferente é motivo para ser discriminado”.
De sua fala destaco algo que é muito comum no dia-a-dia da escola pesquisada e que
não é estranho às demais escolas da rede pública estadual de modo geral que é a intolerância
com relação à diferença. Seja ela que diferença for, mas principalmente aquela diferença
produzida pela escola.
4.3.2 – A violência na unidade escolar
As respostas dadas à questão anterior, de certa maneira já responderam à segunda
questão que fiz aos sujeitos de minha pesquisa. Não restam dúvidas sobre se na unidade
pesquisada há situações de violência. No entanto, avaliei como necessária a reprodução de
algumas de suas respostas por considerar que as mesmas acrescentam revelam uma percepção
que merece reflexão. Embora na questão anterior apareça a possibilidade de atos violentos
serem praticados por qualquer pessoa, ao comentarem as situações de violência que
presenciam na escola, todos – inclusive os alunos – citaram apenas atitudes praticadas pelos
alunos. Examinemos as falas: A coordenadora pedagógica ao referir-se a situações de
violência afirma que “muitos alunos xingam os professores e os colegas de classe, partindo
muitas vezes para agressões físicas”. Também o professor entrevistado não indica a
existência de outro sujeito na escola que também promova situações de violência, como
podemos ver na sua fala:
Certamente, paredes pichadas, carteiras quebradas constantes brigas entre alunos
são manifestações da violência escolar. Contudo a escola tem um papel
fundamental. Incutir e fazer refletir sobre os valores humanos que devem
prevalecer sobre os atos de violência contra colegas professores e contra o
patrimônio público.
Tanto a fala do diretor da unidade quanto a da sua vice não apresentam percepção
diferente e citam como situações de violência apenas situações que se referem aos alunos,
como podemos observar:
Sim, especialmente manifestações através de brincadeiras agressivas entre alunos
(socos, pontapés, tapas, etc.) e bullyng (zombarias direcionadas a características
físicas dos alunos ou professores, funcionários). Além disso, poderia ainda citar as
piadas racistas e os enfrentamentos de alunos contra professores e de professores
contra alunos, que são praticamente diários (diretor da unidade).
Sim, há creio que não com tanta intensidade e freqüência, mas há e quando
acontece estas situações, nos gestores não deixamos chegar aos extremos; através
de algumas ações inseridas no regimento escolar. (vice diretor)
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Os alunos também não mudam de toada, suas falas também apresentam como
situações de violência escolar apenas situações relacionadas às atitudes dos colegas:
Sim, e a maior parte é causada por alunos, onde desrespeitam professores e
funcionários, causando danos a estrutura física da escola através de pichações e
vandalismos (Aluno B).
Também para o aluno D na escola acorrem situações de violência. Para ele, as maiores
vítimas são os professores.
Sim, os maiores alvos da violência são os professores, alunos revoltados agridem
seus professores, por acharem que são responsáveis pelos seus problemas. Há ainda
alguns casos de alunos que são agredidos por outros alunos.
Comparando as respostas dadas a esta questão com aquelas dadas à primeira é possível
inferir que a escola quando chamada a discutir o tema é capaz de fazer o discurso se não
totalmente correto, pelo menos um discurso aproximado, mas quando chamada a se
manifestar sobre situações cotidianas geralmente revela concepção diferente daquela que
apresenta no discurso.
4.3.3 – A violência não tem casa
As entrevistas mostram que a violência não acontece em lugares específicos da escola,
acontece em todos eles como revela a fala do diretor “Acho que em todos os lugares, desde
uma demora excessiva no atendimento da secretaria, ao banheiro sujo, às salas de aulas
lotadas, sem estética e conservação até o interior da sala de aula”. A fala da coordenadora
indica que a violência ocorre no interior da escola, não especifica lugar, porém sua fala chama
atenção para o fato de que a violência que se expressa no interior da escola é fruto de uma
violência exterior, como vemos em sua fala:
Para combater a violência, a escola tem de analisar a forma como é exercido o seu
controle tem que se organizar pedagogicamente, para conseguir deter a violência
não sô no interior mas também no exterior. Então a violência ocorre geralmente no
interior da escola e é fruto da violência exterior a escola.
O professor entrevistado destaca como lugares onde acontece a violência são: “as
salas de aula, paredes pichadas e carteiras quebradas, nos sanitários, vasos quebrados. Já a
vice-diretora aponta como lugares onde ocorre a violência os “ intervalos e quando saem da
escola nos portões e nos arredores da unidade escolar”.
80
Nas falas dos alunos o lugar que aparece como onde mais ocorre violência é a sala de
aula. Para o aluno A, é neste espaço que acontece a “violência verbal e também física, tem
aluno que agride outro aluno no pátio e na saída da escola”.
Para o aluno E a violência ocorre em todos os lugares da escola, segundo ele, o único
lugar onde não ocorre violência é na diretoria “Com exceção a diretoria em todo o resto como
as salas de aulas, pátio corredores, portão de entrada entre outros locais podemos encontrar
a violência. O aluno F parece discordar desta fala pelo menos em um aspecto: para ele a
violência escolar também acontece na diretoria: na sala de aula, diretoria, pátio e nos
corredores. O aluno G considera o vandalismo a principal forma de violência que ocorre na
escola e, para ele, os sinais desta violência encontram-se em todas as partes da escola.
O vandalismo ó o tipo de violência mais freqüente e ocorre em todas as partes da
escola, desde a sala de aula, corredores, pátio e também na quadra da escola.
4 – Violência: arte de quem?
Outra questão que pareceu importante no processo de compreensão das percepções
que os educadores e os alunos da escola pesquisada tem sobre a violência estava relacionada
com o sujeito que pratica a violência. Nas respostas à questão: quem pratica violência na
escola prevaleceu a tendência também dominante nas respostas às demais perguntas de
considerar os alunos os principais agentes da violência. Para a coordenadora pedagógica quem
pratica a violência na escola são “os educandos, geralmente eles xingam os colegas e
professores e muitas vezes partem para agressões físicas”. O professor entrevistado, por sua
vez, considera que o agente da violência é o ser humano. Embora sua fala ressalte a
complexidade do tema e indique a possibilidade do agente da violência pode ser uma vítima
que a reproduz.
O agente da violência é o ser humano, achar um responsável é fácil. A reflexão,
porém, é bem mais profunda. È preciso ter a consciência que o agente da violência
é na maior parte das vezes vítima da violência e apenas reproduz no ambiente
escolar o que aprende em nível social.
O diretor por sua vez, considera que a violência na escola é praticada por “todos que
nela transitam, desde pais que eventualmente vão até a escola, como professores alunos e
funcionários que a freqüentam diariamente”. Na fala da vice-diretora, o aluno aparece
claramente como o agente da violência na escola e culpa a falta de uma estrutura familiar
definida como motivo para os alunos praticarem atos de violência.
81
Alunos que infelizmente, não tem uma estrutura familiar definida, muitos crescem
sem a presença dos pais, da mãe e ficam muito tempo dispersos na rua com valores
inversos.
Refletir sobre essa fala parece muito importante porque ela é muito ouvida na escola
tanto nos espaços formais como horário de trabalho pedagógico coletivo, reuniões
pedagógicas, reuniões do conselho de escola etc, quando em espaços informais como sala dos
professores, corredores, pátio, portão da escola e assim por diante. A importância que vejo em
destacar essa fala é que ela se constitui hoje em uma das maiores fontes de preconceito e de
discriminação na escola que reivindica alunos provenientes do modelo tradicional de família.
A tendência de considerar os alunos os principais agentes da violência na escola
predomina na fala dos alunos, embora em suas falas apareçam indicações de violência
praticada por outras pessoas como aparece na fala do aluno A que reproduzo a seguir:
Na maioria dos casos os alunos, no entanto já houve caso de uma professora que
agrediu um aluno na minha sala de aula.
Em concordância como o aluno A, o aluno F também revela em sua fala que há na
escola outros agentes que reproduzem a violência:
Alunos principalmente por não respeitarem as regras e não aprenderem a conviver
com as diferenças entre as pessoas, ou até mesmo outros funcionários por abusarem
da sua autoridade.
Apesar dessas falas, o que predominou nas respostas foi a idéia de que quem pratica a
violência é o próprio aluno. O aluno C introduz como agente da violência na escola outro
elemento que são as pessoas estranhas que invadem a escola:
Na maioria das vezes é o próprio aluno que pratica quebrando as carteiras
xingando professores e também por parte de pessoas estranhas que invadem a
escola.
Além de mostrar sintonia com a tendência que considera o aluno o principal agente da
violência na escola, o aluno D considera a violência uma situação comum nas escolas, não
apenas nas redes públicas e não apenas no Brasil, como indica sua fala.
São os alunos que praticam a violência, eles são responsáveis pela maioria das
agressões. É comum ver professores se queixando da rebeldia por parte dos alunos.
A violência infelizmente é comum em escolas públicas e particulares não somente
no Brasil, já foram registrados casos de violência em outros colégios do mundo
como nos Estados Unidos.
82
A resposta do aluno E à pergunta sobre quem pratica a violência na escola indica,
porém, que a violência não é praticada apenas pelos alunos e procura classificar os agentes da
violência na escola por ordem de importância como ele mesmo fala. Vejamos a sua resposta:
Se eu pudesse enumerar seria assim em ordem de importância:
1° alunos principalmente do sexo masculino.
2º professores.
3º pessoas que freqüentam a escola, porém não são alunos ou funcionários.
4º funcionários
Trata-se de uma resposta intuitiva, que não está embasada em uma pesquisa, mas que
pareceu muito interessante, sobretudo porque muitas vezes nós professores nos consideramos
apenas vítima da violência e, na percepção deste aluno, somos os segundos na ordem de
praticantes de atos violentos.
Por fim, destaco a fala do aluno G, que atribui a prática de violência na escola às
pessoas preconceituosas e que não aceitam o diferente.
São mais as pessoas preconceituosas que por não aceitar uma pessoas diferente, acaba
discriminando-a ou quando uma pessoa não vai com a cara da outra qualquer coisa é
motivo para se brigar.
Creio que esta fala, em certo sentido, aponta os motivos da maior parte das situações
de violência que acontecem na escola e, ao indicar a intolerância para com a diferença como
causadora da violência deixa pouca gente do sistema escolar fora do rol de praticantes de atos
violentos.
5 – As causas da violência na escola
Finalmente busquei investigar quais seriam as causas da violência na percepção dos
educandos e educadores da escola pesquisada. As respostas evidenciaram questões
relacionadas ao uso de drogas, ao preconceito, à disputa de poder e a problemas pessoais do
que relacionadas ao uso ou tráfico de drogas. Nas respostas a essa questão tive uma surpresa:
o uso de drogas aparece apenas como mais um dos fatores causadores da violência, em apenas
uma das falas. Embora não se possa desconsiderar o impacto negativo no processo
pedagógico do uso de drogas dentro e no entorno da escola parece necessário pensar sobre em
que medida a grande ênfase neste aspecto não se constitui apenas em uma maneira de
esconder outros fatores mais complexos, como relações injustas na escola e na vida, falta de
perspectiva de futuro, conteúdos e discursos da escola descontextualizados, falta de
significado concreto para o estudo e o trabalho escolar, enfim, uma série de situações que
83
fazem o cotidiano de quem estuda e trabalha na escola. Mas isso seria assunto para um outro
trabalho.
Voltando às respostas à questão sobre quais seriam as causas da violência na
percepção de educandos e educadores, a coordenadora pontua como causas questões que
parecem relacionadas a gestão de situações conflituosas. Vejamos o que ela diz:
Ocorre devido o aluno sempre querer ter razão e sair vencedor das situações. O
aluno não quer levar desaforo para casa e na maioria das vezes o aluno não aceita a
opinião da escola ou o conselho dos professores”. Coordenadora
O professor entrevistado ao referir-se às causas da violência enfatiza que a violência é
aprendida socialmente e que no ambiente escolar é reproduzido aquilo que se aprende fora
dele. Vale destacar que o educador entrevistado não identifica a violência com o aluno, mas
utiliza um termo genérico “o ser humano”.
Um ato de violência é um ato aprendido socialmente. O ser humano reproduz no
ambiente escolar o que aprende fora dele. A escola, porém deve reverter esse
processo: fazer com que a superação da violência no ambiente escolar possa
significar também a superação da violência na sociedade como um todo. A escola
deve ser o centro irradiador de combate à violência, combatendo as situações de
violência vivenciadas no ambiente escolar (Professor).
O professor considera que na escola é reproduzido o que se aprende fora dela, mas
considera também que é a escola o lugar onde esse processo pode ser revertido. Neste sentido
também vem a fala do diretor da escola que embora deixe perceber o aluno como o agente da
violência, indica a possibilidade do ato de violência praticado pelo aluno ser uma resposta ao
tratamento por ele recebido. Uma denúncia sobre algo na unidade ou no sistema escolar que
não está correndo bem, como vemos na sua fala:
Acho que é uma reação, talvez uma denuncia ou reflexo de algum elemento da
estrutura da escola ou do sistema educacional que se encontra ultrapassado ou seja,
incompatível/ inconveniente em relação aos valores e princípios mais íntimos dos
seres humanos. Outro fato também que muitas vezes o aluno como qualquer ser
humano, acaba descarregando sua raiva no mais próximo ou mais fraco, então “o
pouco” é suficiente para cometer um ato de violência.
A Assistente do diretor, por sua vez, identifica na falta da família dos valores que ele
considera inerente a ela a razão para a ocorrência de situações violentas na escola, como
observamos em sua fala:
Devido a falta da família, de proteção amparo carinho e o que é pior de disciplina e
valores familiares e humanos.
84
Essa afirmação indica um dos problemas muito sérios que a escola tem enfrentado no
seu cotidiano que é a ausência da família no processo de educação escolar dos seus filhos.
Geralmente a essa ausência são atribuídos muitos dos problemas que a escola enfrenta na
relação com as crianças e adolescentes. Um dos aspectos que nem sempre a escola tem se
dado conta é que a educação, como preconiza a Constituição Federal, a Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional, Lei 9.394/96 é dever da família, do estado e da sociedade que
devem empreender ações complementares no sentido de garantir a inserção do jovem nos
mundos da cultura e do trabalho. Em muitas situações, vemos que as ações da família, do
estado e da sociedade nem sempre caminham na mesma direção, o que acaba dificultando o
processo de formação do jovem.
Quando a escola fala dos valores que falta às crianças e adolescentes que tem sob seus
cuidados e proteção, certamente ela conhece quais são esses valores. Mas será que esses
valores são os mesmos para todos os educadores da escola? Afinal de contas, o que é
disciplina e o que são valores familiares e humanos? Que tipos de valores são ensinados por
algumas práticas existentes na escola? O desenvolvimento deste trabalho vem me ajudando a
refletir sobre as atitudes da escola frente aos atos dos alunos que são considerados atos de
indisciplina ou de violência. A escola dispõe de um rol de medidas punitivas, que busca o
ajustamento da conduta dos alunos etc, mas onde estão as propostas voltadas para o
protagonismo dos jovens ou os espaços para discutir o sentido daquilo que a escola propõe
enquanto currículo?
Nas falas dos alunos aparece com freqüência a incapacidade de diálogo por parte de
professores e funcionários como uma das razões para o surgimento de situações de violência,
como vemos nas falas seguintes:
Por que um colega não gosta do estilo ou maneira que o outro colega comporta do
cabelo da cor ou até mesmo da simplicidade do colega e nisso acaba gerando
conflito. Entre funcionários quando não aceitam sugestões ou opiniões dos alunos
que sempre acaba em discussões e brigas, porque o aluno nunca está certo sempre
tem algo que o impede de falar a verdade sobre o fato ocorrido. (Aluno F).
Para esse aluno, uma das razões para o surgimento de situações de violência é o fato
de funcionários não aceitarem as sugestões dos alunos. Já na fala seguinte, o aluno A coloca
como razão para o surgimento destas situações o fato de existirem pessoas descontroladas e
folgadas, além de alunos que não fazem as lições:
Porque tem pessoas que são descontroladas e folgadas, alunos que não fazem suas
lições e nem deixar os outros fazerem, as vezes os professores não agüentam pois
ninguém tem sangue de barata.
85
Outro motivo indicado pelos alunos para a existência de violência é o uso de drogas.
Em sua fala o aluno D faz referência a essa situação:
Devido a vários motivos como: alunos que não respeitam os colegas e nem os
professores, alunos que mexem com drogas e vem para escola muito doidos e
também por que tem alguns professores que xingamos alunos e eles respondem e
brigam com os professores.
Finalmente gostaria citar duas falas de alunos que, tomando como referência a minha
experiência na escola, parece bem sintonizada com a sua cultura. Primeiro o aluno C para
quem a violência escolar ocorre “por falta de educação básica, algo que deve vir de casa, a
escola no meu ponto de vista não pode fazer nada” e, em seguida os motivos indicados pelo
aluno E que indica três pontos que merecem ser discutidos. Para ele, a violência escolar
decorre das seguintes situações:
1° pela falta de aplicação de penalidades devidas.
2º Existem alunos que tem proteção de funcionários que são amigos deles ou
parentes.
3º Falta de um bom alicerce nas famílias.
São três questões muito importantes e que merecem uma reflexão muito cuidadosa na
medida em que são questões muito presentes em todos os tempos e espaços da escola e
mesmo da sociedade como um todo. A primeira diz respeito à impunidade, a segunda à
corrupção e ao tráfico de influência, males tão presentes em nossa sociedade e a última pode
estar relacionada com a intolerância diante da diferença.
5 Considerações sobre a pesquisa
Ao analisar os registros coletados pude verificar que há pontos discordantes e
concordantes entre professores e alunos sobre a violência na escola. A percepção sobre a
violência na escola depende do lugar que o sujeito pesquisado ocupa nesta organização e na
pirâmide social.
O consumo e o tráfico de drogas não aparece nas entrevistas com a mesma ênfase que
costuma aparecer nas reuniões e nas conversas costumeiras, o que em certo sentido me
surpreendeu. Sobretudo nas falas dos alunos aparece com bastante força a idéia de que o
preconceito é uma das principais causas da violência na escola o que, de certa forma, também
surpreende. Quando se discute esse tema geralmente não se considera o que os alunos pensam
sobre ele, aliás não é apenas nas discussões sobre esse tema que esse tipo de situação
acontece.
86
As entrevistas mostram que – como todas as escolas – a unidade pesquisada é um lugar
de conflitos, pois reúne um grande número de crianças e jovens de diferentes origens, por
várias horas do dia, em situações onde ocorrem diversas trocas materiais ou simbólicas. Neste
contexto, a violência pode aparecer como uma linguagem que oferece status e prestígio.
A escola tem sido um lugar onde emergem os conflitos sociais e, em muitas situações,
a ela tem sido atribuída a responsabilidade de resolvê-los. Essas situações freqüentemente se
tornam desastrosa porque a escola irrefletidamente assume para si essa responsabilidade e
passa a implementar ações carregadas de preconceito e que levam inevitavelmente à
discriminação e a exclusão de grande parte das crianças e adolescentes que a freqüentam.
Neste sentido, a pesquisa indica a necessidade de a escola repensar o seu papel.
Tradicionalmente à escola foi atribuída a responsabilidade de inserir o jovem na
cultura, o que era realizado com relativa facilidade enquanto ela se reduzia a uma instituição
que atendia apenas aos filhos aristocracia que desejavam freqüentá-la. Neste contexto a escola
era freqüentada por pessoas vinculadas a culturas, se não idênticas, pelo menos semelhantes.
Era um tempo em que fazia sentido a expressão “a educação vem de casa” porque todos que
estavam na escola tinham casa e, dentro de casa alguém para educá-lo. À escola restava a
tarefa de fazer a mediação para a construção do conhecimento. Essa situação começou a
mudar a partir de meados do século passado, com a democratização do acesso. A partir deste
momento começou chegar à escola um contingente de crianças de diferentes origens sociais,
étnicas e culturais. Essa situação se agravou sobremaneira nas regiões metropolitanas para
onde acorreram grandes fluxos migratórios, sobretudo nas regiões periféricas, onde fica a
escola pesquisada, cuja marca é a precariedade das condições de existência.
Ao se referir a esta situação, SILVA (2008) assim se manifesta:
Com a existência de um contingente migratório e uma pluralidade cultural sempre crescente
cabe, cada vez mais a escola exercer um papel de criadora de um espaço de diálogo e
convivência entre as diversas perspectivas com que chegam as crianças e jovens a ser educados
e que retratam a realidade social dos pais. (SILVA 2008: s.p)
Ainda segundo esse autor a escola precisa rever sua atuação:
À escola não basta mais ser uma informadora, distribuidora de conhecimento a uma
geração jovem que nem sempre comunga dos mesmos valores e ideais dos
educadores. Há que buscar a constituição de identidades capazes de convivência
respeitosa e produtiva, onde o outro possa sentir-se semelhante e, sem medo,
procure viver em conjunto.
Desse modo o educador vê acrescido ao seu papel de mediador para o
conhecimento o de formador de identidades, o que implica em comunicar
significados, valores, proposta de vida. Em uma palavra: há que se superar a mera
informação para atingir-se a formação. (SILVA 2008: s.p)
87
Essa situação coloca para a escola a necessidade de olhar para os jovens que chegam
em uma perspectiva diferente, como pessoas que buscam significado. Por isso a ação da
escola não pode ignorar seu o contexto e a maneira como nele vivem as pessoas. Os processos
de ensino e aprendizagem precisam tornar-se significativos e assumirem como prioridade a
humanização das relações que se estabelecem na escola.
Não basta à escola, sobretudo àquelas situadas nas periferias das grandes metrópoles,
preparar para o convívio na sociedade existente, faz-se necessário formar pessoas capazes de
atuarem nesta sociedade com vistas à sua transformação.
Isso implica em rever os objetivos da escola. O modelo de escola voltado para preparar
o jovem para escapar do seu local de origem (DOWBOR, 2006) tem dado visíveis sinais de
esgotamento e precisa ser repensado. A educação precisa ser instrumento de melhoria da
qualidade de vida coletiva e não apenas um meio dessa sociedade injusta selecionar os
melhores para colocar a serviço do sistema vigente. Talvez a maior violência que existe hoje
na escola seja a falta de sentido para o trabalho, para o estudo, para a vida.
88
6 Considerações finais
O objetivo inicial da pesquisa foi estudar a percepção dos alunos e educadores de uma
escola da rede pública estadual sobre a violência nas relações que se estabelecem no cotidiano
da escola, o interesse surgiu a partir de minha vivência diária na escola, de minha convivência
com os meus alunos e com meus colegas professores, principalmente em momentos como:
conselhos de classe, reuniões com pais e também das diversas conversas presenciadas por
mim na sala dos professores que sempre estavam falando sobre violência na escola.
Surgiu ainda porque cotidianamente me deparava com vários discursos sobre a
violência tanto por parte dos alunos quanto por parte dos professores, da direção e dos
funcionários de apoio da escola. Meu intuito era descobrir as causas e conseqüências desta
violência e como esses diversos atores escolares percebiam e lidavam com esta violência.
Escolhi a abordagem qualitativa de pesquisa e utilizei como procedimento de coleta de
dados a análise documental, complementada por um questionário composto por questões
abertas e fechadas e entrevista com cinco questões fechadas aplicada a educandos e
educadores. Recorri também à minha experiência enquanto professor da unidade pesquisada.
Desta forma este trabalho assume, também, um caráter de reflexão sobre a minha própria
prática.
A pesquisa revelou que a percepção dos alunos com relação à violência coincide em
alguns aspectos com a percepção dos educadores, mas que em outros aspectos ela se distancia
bastante. Cheguei à conclusão de que a percepção das pessoas sobre um determinado assunto,
no caso deste trabalho, da violência na escola depende do lugar que a pessoa ocupa no espaço
escolar. Depende também da idade e do compromisso social que a pessoa tem com relação ao
processo educativo.
Foi possível perceber, ainda, que vários fatores internos e externos à escola contribuem
para o surgimento da violência, dentre eles podemos citar: o autoritarismo dos professores e
gestores escolares, a má distribuição de renda, a exclusão social da comunidade, o consumo e
o tráfico de drogas, a influência dos meios de comunicação e, sobretudo, o preconceito.
A escola produz e contribui para o aumento da violência quando é autoritária e espera
que o jovem se enquadre a uma estrutura pré-definida; quando impõe um ensino pouco
interessante e com metodologias ultrapassadas e que não valorize o saber local e o
protagonismo dos alunos.
89
Alguns alunos identificaram ainda na escola situações de injustiças e tratamento
diferente por parte dos professores, direção e funcionários.
Outro tipo de violência que a escola pratica e ficou constatado na pesquisa é a
violência camuflada, sutil e invisível, que se esconde sob o nome de “exclusão”. Que pode ou
não ser inconsciente, e que é promovida pelos próprios educadores, através de regulamentos
opressivos, currículos e sistemas de avaliação inadequados à realidade, na qual está inserida a
escola, medidas e posturas que estigmatizam, discriminam e afastam os alunos.
É na escola onde ocorrem encontros, ou seja, as amizades, afetividades, respeito,
tolerância, confidências, mas também é este o lugar dos desencontros, que podemos entender
como as tensões, brigas, desrespeito, indiferença e desconfiança. Se a escola é um local onde
acontecem todas essas tensões é também um local privilegiado para sua resolução, pois é onde
as crianças passam a maioria do seu dia e sob a supervisão de adultos que supostamente estão
preparados para atendê-las.
O aparecimento de manifestações da violência no ambiente escolar aponta para a crise
nas relações sociais entre alunos, professores, diretores e demais funcionários da escola. Urge
então combater esta crise de relações para diminuirmos a violência na escola, para isso é
necessário favorecer o protagonismo juvenil e dar vez e voz aos alunos.
Devemos olhar o nosso aluno como sujeito do saber, e não como objeto do saber. Para
isso, segundo SANTOS (1989), não podemos criar cidadanias mutiladas, temos que contribuir
para a formação de um cidadão capaz de compreender os seus direitos e deveres e poder
reivindicá-los numa relação dialógica. Nesse sentido é preciso reconhecer o outro como
diferente, respeitando-os seus valores e seus saberes sendo democrático, mas infelizmente o
que permanece é o autoritarismo na relação professor- aluno.
Os alunos geralmente valorizaram os poucos recursos e a infra-estrutura que a escola
possui, contudo ficou claro que estes recursos são insuficientes. Entendem ainda que de
maneira geral o ensino e o relacionamento com alguns docentes são bons e que com outros
falta diálogo e respeito. Os alunos valorizam muito os círculos de amizade, e aprendizagem
que alguns professores proporcionam.
Postulamos a criação de um ambiente em que o diálogo e o respeito substituam o
ambiente de não diálogo e desrespeito, onde as violências e micro violências sejam
substituídos pela paz e o bom relacionamento. Acreditamos que estas práticas constituem-se
um trabalho, árduo que exige comprometimento de toda comunidade escolar.
90
Deixamos as seguintes indagações: será que a violência é uma resposta ruidosa ou
silenciosa ao modelo de escola que estes alunos estão inseridos? Será que a escola que temos
é a escola que queremos?
Neste sentido, o percurso que fiz para a realização deste trabalho fortaleceu a idéia de
que precisamos nos empenhar na construção de modelo de escola democrática participativa
no qual seja possível a convivência fraterna entre os diferentes.
91
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98
ANEXOS
99
Anexos: 1
Questionários aplicados aos alunos com objetivo da caracterizá-los.
Pesquisador: Wilson Teixeira
Orientador: professor Júlio Almeida
Local da pesquisa: Escola Estadual Padre Tiago Alberione Ano: 2007
Questionários sobre a violência aplicados para os alunos.
Não é preciso se identificar-se.
Questionários distribuídos: 100
Questionários devolvidos: 80
O que os alunos menos gostam na escola?
1) a sala de aula
2) os corredores
3) o pátio
4) os banheiros
5) a secretária
6) os alunos
7) os professores
8) as aulas.
Estatísticas socioculturais dos alunos.
1 você é natural de onde?
A) São Paulo
B) outros estados
2 seus pais são naturais de onde?
A) São Paulo
B) outros estados
3 você contribui para o sustento da sua família?
A) Sim
B ) não
C) As vezes
4 Qual sua idade?
A) 10 a 15 anos
B) 15 a 20anos
C) 20anos ou mais
5 qual a sua etnia?
A) Branco
B) negro
C) indígena
D) pardo
E) outros
6 Qual seu sexo?
100
A) Masculino
B) feminino
7 você vive com sua família?
A) pai e mãe B) Pai
C) mãe
D) tio
E) tia
F) avós
G) não vivo com minha família.
8 você mora em casa própria?
A) sim
B) Não, alugada
C) outras.
Anexo 2
Questionários aplicados aos professores com objetivo de caracterizá-os
Questionários distribuídos: 20 devolvidos: 20
1) Qual é sua idade?
A) 20
a 30anos
B) 30 a 40anos
C) 40 a 50anos
D) 50 ou mais anos
2) Quanto tempo você atua no magistério?
A) 0 a 10 anos
b) 10 a 20 anos
c) 20 anos ou mais
3)Quanto tempo você leciona nesta escola?
A)0 a 3 anos
B) 3 a 6 anos
C) 6anos a 12 anos
D) acima de 12 anos.
4) Você acumula cargos ?
A) sim
B) Não
A)Estado e Prefeitura
B) Estado e Particular
C) Estado e outros
5)Já percebeu alunos usando drogas?
A) sim
B) não
101
6)Os alunos consomem bebidas alcoólicas?
A) sim
B) não
C) as vezes
7)Os professores e direção sabem lidar com a violência na escola?
A) sim
B) não
C) as vezes
8) já presenciou preconceito racial na escola?
A) sim
B) não
9)As famílias dão importância para escola?
A) sim
B) não
C)as vezes
10) já presenciou furtos ou vandalismo e depredações na escola?
A) sim
B) não
11) Quais os tipos mais comuns de violência dentro da sua escola? (pode marcar mais de
uma)
(A) agressão verbal
(B) atos de vandalismo
(C) agressão física
(D) furto
E) outros
12) Quais as principais causas da violência? (pode marcar mais de uma)
A) conflito entre alunos
(B) drogas e álcool
(C) falta de funcionários
(D) pobreza generalizada
E) outros
13) Quem são os causadores dessa violência?
(A) os alunos
(B) desconhecidos
(C) pais ou responsáveis
(D) a direção
E) os professores
(F) outros
14) Em relação à sensação de segurança:
A)25% responderam que os alunos se sentem inseguros a ponto de deixar de ir
Para a aula.
B) 20% responderam que os professores se sentem inseguros a ponto de deixar de
102
Lecionar
15) Em relação à segurança em torno da escola:
A) 50% acham mais ou menos seguro
B) 30% inseguro
C) 20% seguro
16) Casos de professores ou alunos ameaçados:
A) 80% dos entrevistados disseram que conhecem professores ameaçados dentro da escola.
B) 90% dos entrevistados confirmaram que conhecem casos de alunos ameaçados dentro da
escola.
Anexo 3
Entrevista estruturada aplicada a 7 alunos, um professor, uma coordenadora, uma vice diretora
e ao diretor da escola com objetivo de identificar qual a percepção destes sobre a violência
escolar.
Entrevista estruturada com os professores e alunos.
Professor, direção e coordenação
Coordenadora
1)O que é violência escolar?
Violência escolar é tanto o educador como qualquer outro funcionário da escola, agredir
verbalmente ou fisicamente qualquer um da escola ou ainda um educando agredir
verbalmente ou fisicamente um professor, funcionário ou aluno da escola.
2)Nesta unidade escolar há situações de violência?
Sim, muitos alunos xingam os professores e os colegas de classe , partindo muitas vezes para
agressões físicas e brigas.
3)Em que locais da escola ocorrem situações de violência?
Para combater a violência, a escola tem de analisara forma como é exercido o seu controle
tem que se organizar pedagogicamente, para conseguir deter a violência não sôo no interior
mas também no exterior. Então a violência ocorre geralmente no interior da escola e é fruto da
violência exterior a escola.
4)Quem pratica violência na escola?
Os educandos, geralmente eles xingam os colegas e professores e muitas vezes partem para
agressões físicas.
103
5)Por que ocorrem situações de violência na escola?
Ocorre devido o aluno sempre querer ter razão e sair vencedor das situações. O aluno não
quer levar desaforo para casa e na maioria das vezes o aluno não aceita a opinião da escola ou
o conselho dos professores.
Professor B
1) O que é violência escolar?
A violência escolar nada mais é do que a violência social. A escola é reflexo da sociedade. Na
escola manifesta-se a virtude e o vício social. A violência do professor que trata os alunos de
modo grosseiro, dos alunos que tratam colegas e professores sem urbanidade e respeito.
Danos ao patrimônio público. Tudo isso são reflexos da violência social que se manifesta na
escola.
2) Nesta unidade há situações de violência?
Certamente, paredes pichadas, carteiras quebradas constantes brigas entre alunos são
manifestações da violência escolar. Contudo a escola tem um papel fundamental. Incutir e
fazer refletir sobre os valores humanos que devem prevalecer sobre os atos de violência
contra colegas professores e contra o patrimônio público.
3) Em que locais da escola ocorrem situações de violência?
Nas salas de aulas paredes pichadas e carteiras quebradas, nos sanitários, vasos quebrados.
4) Quem pratica a violência na escola?
O agente da violência é o ser humano, achar um responsável é fácil. A reflexão porém é bem
mais profunda. È preciso ter a consciência que o agente da violência é na maior parte das
vezes vítima da violência e apenas reproduz no ambiente escolar o que aprende em nível
social.
5) Por que ocorrem situações de violência na escola?
Um ato de violência é um ato aprendido socialmente. O ser humano reproduz no ambiente
escolar o que aprende fora dele.
A escola porém deve reverter esse processo: fazer com que a superação da violência no
ambiente escolar possa significar também a superação da violência na sociedade como um
todo.A escola deve ser o centro irradiador de combate à violência, combatendo as situações de
violência vivenciadas no ambiente escolar.
Diretor
1) O que é violência escolar?
104
É todo ato e qualquer ato praticado na escola (ou pela escola) cujos efeitos sejam danosos ao
outro. Os danos podem ser de várias ordens( físicos, morais, psicológicos, etc.) e a violência
na escola pode ser praticada por qualquer um (direção, professores, funcionários etc.) como
também pode ser direcionada a qualquer pessoa, seja intencionalmente ou não.
2) Nesta unidade há situações de violência?
Sim, especialmente manifestações através de brincadeiras agressivas entre alunos (socos,
pontapés, tapas, etc.) e bullyng (zombarias direcionadas a características físicas dos alunos ou
professores, funcionários). Além disso, poderia ainda citar as piadas racistas e os
enfrentamentos de alunos contra professores e de professores contra alunos, que são
praticamente diários.
3) Em que locais da escola ocorrem situações de violência?
Acho que em todos, desde uma demora excessiva no atendimento da secretaria, ao banheiro
sujo, as salas de aulas lotadas, sem estética e conservação até o interior da sala de aula.
4)quem pratica a violência na escola?
Todos que nelas transitam, desde pais que eventualmente vão até a escola como professores
alunos e funcionários que a freqüentam diariamente.
5) Por que ocorrem situações de violência na escola?
Acho que é uma reação, talvez uma denúncia ou reflexo de algum elemento da estrutura da
escola ou do sistema educacional que se encontra ultrapassado, ou seja, incompatível/
inconveniente em relação aos valores e princípios mais íntimos dos seres humanos.
Outro fato também que muitas vezes o aluno como qualquer ser humano, acaba
descarregando sua raiva no mais próximo o ou mais fraco, então o pouco é suficiente para
cometer um ato de violência.
Vice-diretora
1)O que é violência escolar?
Violência escolar é quando há situações de constrangimento e amedrontamento envolvendo
pais, pais professores alunos, ou seja, a comunidade escolar. Além de agressões verbais,
xingamentos ameaças e agressões físicas, que é quando chega aos extremos.
2)Nesta unidade escolar há situações de violência?
Sim, há creio que não com tanta intensidade e freqüência, mas há e quando acontecem estas
situações, nos gestores não deixamos chegar aos extremos; através de algumas ações inseridas
no regimento escolar.
3) Em que locais da escola ocorrem situações de violência?
105
Geralmente nos intervalos e quando saem da escola nos portões e nos arredores da unidade
escolar.
4)Quem pratica violência na escola?
Alunos que infelizmente, não tem uma estrutura familiar definida, muitos crescem sem a
presença dos pais, da mãe e fica muito tempo disperso na rua com valores inversos.
5)Por que ocorrem situações de violência na escola?
Devido a falta da família, de proteção amparo carinho e o que é pior de disciplina e valores
familiares e humanos.
Entrevista estruturada (alunos)
Aluno A
1)O que é violência escolar?
É discriminação que ocorre dentro da escola por professores funcionários e principalmente
por alunos contra outros alunos e contra os professores. Violência verbal e física que ocorre
dos alunos contra o professores e vice-versa.
2)Nesta unidade escolar há situações de violência?
Sim, alunos que discutem com professores ou até mesmo aluno contra
aluno e de alunos contra funcionários e direção.
3) Em que locais da escola ocorrem situações de violência?
Na sala de aula violência verbal e também física, tem aluno que agredi outro aluno no pátio e
na saída da escola.
4)Quem pratica violência na escola?
Na maioria dos casos os alunos, no entanto já houve caso de uma professora que agrediu um
aluno na minha sala de aula.
5)Por que ocorrem situações de violência na escola?
Porque tem pessoas que são descontroladas e folgadas, alunos que não fazem suas lições e
nem deixar os outros fazerem, as vezes os professores não agüentam pois ninguém tem
sangue de barata.
Aluno B
1)O que é violência escolar?
É a privação que o aluno, professores, funcionários vem a ter de exercer os seus direitos e
deveres por pressão psicológica e mesmo física.
2)Nesta unidade escolar há situações de violência?
106
Sim, e a maior parte é causada por alunos, onde desrespeitam professores e funcionários,
causando danos a estrutura física da escola através de pichações e vandalismos.
3) Em que locais da escola ocorrem situações de violência?
O vandalismo ó o tipo de violência mais freqüente e ocorre em todas as partes da escola,
desde a sala de aula, corredores, pátio e também na quadra da escola.
4)Quem pratica violência na escola?
Os próprios alunos que acabam prejudicando a si mesmos, mas por algum motivo continuam
a destruir algo que é seu.
5)Por que ocorrem situações de violência na escola?
Por falta de educação básica, algo que deve vir de casa, a escola no meu ponto de vista não
pode fazer nada.
Aluno C
1)O que é violência escolar?
Na minha opinião violência escolar é a violência que ocorre dentro da escola com professores
diretores, coordenadores e até mesmo com os próprios alunos.
2)Nesta unidade escolar há situações de violência?
Nesta escola ocorrem os dois tipos de violência, contudo a violência verbal acontece com
mais freqüência do que a violência física.
3) Em que locais da escola ocorrem situações de violência?
Na maioria das vezes dentro da própria sala de aula, mas também nos corredores e no pátio da
escola.
4)Quem pratica violência na escola?
Na maioria das vezes é o próprio aluno que pratica quebrando as carteiras xingando
professores e também por parte de pessoas estranhas que invadem a escola.
5)Por que ocorrem situações de violência na escola?
Devido a vários motivos como: alunos que não respeitam os colegas e nem os professores,
alunos que mexem com drogas e vem para escola muito doidos e também por que tem alguns
professores que xingamos alunos e eles respondem e brigam com os professores.
Aluno D
1)O que é violência escolar?
É o ato de agredir verbalmente ou fisicamente uma pessoa dentro da escola.
2)Nesta unidade escolar há situações de violência?
107
Sim, os maiores alvos da violência são os professores,alunos revoltados agridem seus
professores, por acharem que são responsáveis pelos seus problemas. Há ainda alguns casos
de alunos que são agredidos por outros alunos.
3) Em que locais da escola ocorrem situações de violência?
A maior parte das agressões ocorre em sala de aula, mas também já foram vistos alunos
brigando em banheiros, pátio e corredores.
4)Quem pratica violência na escola?
São os alunos que praticam a violência, eles são responsáveis pela maioria das agressões. É
comum ver professores se queixando da rebeldia por parte dos alunos. A violência
infelizmente é comum em escolas públicas e particulares não somente no Brasil, já foram
registrados casos de violência em outros colégios do mundo como nos Estados Unidos.
5)Por que ocorrem situações de violência na escola?
Os alunos acham que agredir seus colegas e professores irá resolver seus problemas, até
mesmo, chegam a ver os professores como inimigos. Alguns alunos quando recebem suas
notas ficam descontentes, culpam os professores por seu mau desempenho.
Aluno E
1)O que é violência escolar?
Todo tipo de agressão acontecido na escola seja ela física, verbal, ou moral.
2)Nesta unidade escolar há situações de violência?
Sim , todas citadas na resposta acima.
3) Em que locais da escola ocorrem situações de violência?
Com exceção a diretoria em todo o resto como as salas de aulas, pátio corredores, portão de
entrada entre outros locais podemos encontroa r a violência.
4)Quem pratica violência na escola?
Se eu pudesse enumerar seria assim em ordem de importância:
1° alunos principalmente do sexo masculino.
2º professores.
3º pessoas que freqüentam a escola, porém não são alunos ou funcionários.
4º funcionários.
5)Por que ocorrem situações de violência na escola?
1° pela falta de aplicação de penalidades devidas.
2º Existem alunos que tem proteção de funcionários que são amigos deles ou parentes.
3º Falta de um bom alicerce nas famílias.
Aluno F
108
1)O que é violência escolar?
A violência escolar pode ser na forma de agressões, verbalmente o ou ainda preconceito com
o colega ou com funcionários da escola.
2)Nesta unidade escolar há situações de violência?
Sim entre alunos e entre professores e são de diversas formas.
3) Em que locais da escola ocorrem situações de violência?
Na sala de aula, diretoria, pátio e nos corredores.
4)Quem pratica violência na escola?
Alunos principalmente por não respeitarem as regras e não aprenderem a conviver com as
diferenças entre as pessoas, ou até mesmo outros funcionários por abusarem da sua
autoridade.
5)Por que ocorrem situações de violência na escola?
Por que um colega não gosta do estilo ou maneira que o outro colega comporta do cabelo da
cor ou até mesmo da simplicidade do colega e nisso acaba gerando conflito. Entre
funcionários quando não aceitam sugestões ou opiniões dos alunos que sempre acaba em
discussões e brigas, porque o aluno nunca escerto sempre tem algo que o impede de falar a
verdade sobre o fato ocorrido.
Aluno G
1)O que é violência escolar?
São agressões tanto físicas quanto verbais que acontece dentro da escola, às vezes por um
aluno ou grupo, ser diferente é motivo para ser discriminado.
2)Nesta unidade escolar há situações de violência?
Sim o tempo todo, sempre tem alunos brigando e discutindo com outros alunos ou com
professores.
3) Em que locais da escola ocorrem situações de violência?
Ocorrem mais no pátio e nos corredores principalmente na hora do intervalo, no entanto já vi
briga também dentro da sala de aulas.
4)Quem pratica violência na escola?
São mais as pessoas preconceituosas que por não aceitar uma pessoas diferente, acaba
discriminando-a ou quando uma pessoa não vai com a cara da outra qualquer coisa é motivo
para se brigar.
5)Por que ocorrem situações de violência na escola?
Porque ainda existem pessoas muito fechadas mentalmente, não aceitando que o colega seja
diferente. E às vezes por um simples mal entendido.
109
Anexo 4 Ficha individual do aluno:
Excluído: <sp>
110
Anexo 5: Ficha de ocorrência disciplinar:
111
Anexo: 6 Ficha de comunicado disciplinar:
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