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UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
CENTRO DE EDUCAÇÃO E HUMANIDADES
INSTITUTO DE PSICOLOGIA
PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA SOCIAL
CURSO DE MESTRADO
CAROLINA FURUKAWA
“COSPLAY”: IDENTIDADES NA HIPERMODERNIDADE
Rio de Janeiro
2008
CAROLINA FURUKAWA
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“COSPLAY”: IDENTIDADES NA HIPERMODERNIDADE
Orientadora: Prof. Ariane Patrícia Ewald
Rio de Janeiro
2008
DEDICATÓRIA
Dissertação apresentada ao
Programa de Pós - Graduação em
Psicologia Social da Universidade do
Estado do Rio de Janeiro, como
requisito parcial para obtenção do
Título de Mestre em Psicologia
Social.
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À minha família, por todos os momentos de apoio e, ao meu noivo, pelo
companheirismo durante este período.
AGRADECIMENTOS
Essa dissertação foi feita com a ajuda de várias pessoas, que direta ou
indiretamente contribuíram com a sua realização.
Primeiramente tenho que agradecer aos meus pais. Não por me alertar quando
reclamava demais, mas também por estarem ao meu lado dando o suporte necessário.
Compartilhar agora esse momento de conquista de mais uma etapa na minha vida é, para
mim, uma pequena forma de retribuir todo o esforço e dedicação que eles têm depositado
em mim ao longo desse tempo. E prometo a eles que é apenas o início desta troca.
Agradeço imensamente a professora Maria Luíza Magalhães Bastos Oswald a
oportunidade de participar do grupo de pesquisa “Infância, Juventude e Indústria Cultural”
do programa de Pós-graduação em Educação da UERJ. Sinto que ao encontrá-los eu me
encontrei, pois quem diria que iria encontrar tão perto um grupo que tratava justamente do
consumo de histórias em quadrinhos/desenhos japoneses, jogos eletrônicos. Com eles eu
percebi que não era apenas eu que tinha dificuldades em mudar pensamentos já firmados
ou de sentir um alien em terras estrangeiras.
Sinto-me incapacitada de expressar por escrito a imensa satisfação que tenho de
ter o meu noivo Fabio Iguchi sempre ao meu lado. Contar com sua companhia nos
momentos de aflição e desespero (e também alegria, é claro) da graduação até seu
agravamento com o mestrado, além de ser muito acolhedor, foi imprescindível para a
concretização deste trabalho e para meu desenvolvimento pessoal.
Outra pessoa que devo profundos agradecimentos é a minha irmã Luísa. Dotada
de um talento artístico incrível, talvez surgido por genes recessivos da família, posso dizer
que foi com ela que pude adentrar nesse mundo dos quadrinhos japoneses e agora do
cosplay. Muito obrigada pelas inúmeras ligações que realizou, pela filmagem e por pelas
incontáveis dúvidas retiradas.
À minha orientadora Ariane, pela sua bagagem de conhecimento que às vezes
pode ser vista concretizada em alguns exemplares nas bolsas ou malas que carrega.
Muito obrigada pelas luzes de esperança na confusão na minha mente. Estar com você
desde a graduação foi extremamente importante para mim.
Aos meus amigos do mestrado, agradeço pela grande troca de experiências e
momentos muito alegres que tivemos. “Tecendo redes” foi muito gratificante para mim e
espero que ele nunca de desfaça.
Agradeço também aos professores Jorge Coelho e Lúcia Rabello de Castro, por
participarem da etapa de qualificação. As orientações foram muito importantes para a
condução deste trabalho.
Aos cosplayers, o meu profundo agradecimento pela disponibilidade de tempo e
atenção. A alegria contagiante dos depoimentos fez dos encontros, momentos de muito
prazer. Muito obrigada pela contribuição de todos.
Não posso esquecer dos amigos de outras localidades: especialização, trabalho e
Nikkei. Muito obrigada!
À minha família que, mesmo estando longe, tem mandado constantes energias
positivas. Sei que posso contar com eles sempre. Em especial agradeço a minha avó
Romilda, por ter disponibilizado mais uma vez um tempo que estaria com ela para
realização desse trabalho.
A Deus obrigada por me proporcionar mais essa realização na minha vida.
Amo todos vocês!
RESUMO
O cosplay traduzido como “brincar de fantasiar” é uma atividade realizada por
algumas pessoas em eventos que reúnem admiradores de desenhos animados e histórias
em quadrinhos japonesas. Alguns de seus participantes vestem-se como os personagens
veiculados nesses meios e são chamados de cosplayers. Diferente de um baile à fantasia,
eles podem interpretar os personagens e, normalmente, a escolha é feita com base na
identificação com estes.
Esta dissertação tem como objetivo principal compreender o fenômeno cosplay,
como parte do mundo hipermoderno, que vem atraindo um crescente número de adeptos
no Brasil, e que vêm a fazer parte da identidade de alguns desses jovens. Para isso,
apresento um breve panorama sobre o contexto atual marcado por novas tecnologias,
difusão do consumo, mudanças nas relações familiares, diluição das barreiras físicas e
aumento das fontes de informação, que provocaram profundas mudanças nos modos de
ser e agir no mundo.
Destaco também a importância do papel do consumo, pois com a degradação das
estruturas tradicionais que proporcionavam bases estáveis nas quais se apoiavam as
identidades, estas foram se tornando incertas e fluidas e, assim, o mundo se prontifica a
oferecer uma variedade enorme de objetos de consumo para constituí-la.
Como o cosplay envolve o processo de identificação com os personagens do
entretenimento japonês, apresento algumas características das histórias em quadrinhos
japonesas que são considerados atrativos deste material, e discuto a questão da
juventude e identidade, e a importância do imaginário, fatos marcantes deste fenômeno.
A fim de entender mais essa dinâmica formou-se um grupo focal com cinco
cosplayers, entre 16 e 21 anos, moradores do Rio de Janeiro, que contribuíram
significativamente para a discussão de todo o trabalho. Além do divertimento e do
aumento das habilidades na confecção das vestimentas, o reconhecimento social
apareceu como uma das motivações para realização dos cosplays. Esse dado reitera a
importância das interações no processo de formação da pessoa. Um outro dado relevante
apontado foi que através de identificação com alguns personagens, os cosplayers
acabam questionando suas próprias atitudes, reforçando com isso, o papel ativo desses
jovens no consumo dos produtos midiáticos.
Palavras- chave: Cosplay, Identidade, Hipermodernidade, Consumo, Jovem.
ABSTRACT
The cosplay translated as "playing to fantasize" is an activity performed by some
people in events that bring together fans of cartoons and stories in Japanese comics.
Some of its participants dress up as the characters run these facilities and are called
cosplayers. Unlike a costume party, they can then interpret the characters and usually, the
choice is made on the basis of identification with them.
This thesis aims to understand the phenomenon main cosplay as part of the
hipermodernity world, which is attracting a growing number of followers in Brazil, and
coming to be part of the identity of some of these young people. For this, I start presenting
a brief overview on the current context marked by new technologies, dissemination of
consumption, changes in family relationships, dilution of physical barriers and increasing
sources of information, that caused profound changes in ways of being and acting in the
world.
It’s important o emphasize the role of consumption, because with the decline of
traditional structures that provided stable bases on which it supported the identities, they
were becoming uncertain and fluid, and the world get ready to offer an enormous variety of
objects of consumption that identity can be based on.
As the cosplay involves the process of identification with the characters of Japanese
entertainment, I show some characteristics of the stories in Japanese comics that are
considered attractions of this material, and discuss the issue of youth and identity, and the
importance of imagination, facts of this remarkable phenomenon.
In order to understand this dynamic, it was created a focus group with five
cosplayers, between 16 and 21 years old, residents of Rio de Janeiro, which contributed
significantly to the discussion of all the work. Besides the fun and increasing skills in the
manufacture of clothing, the social recognition emerged as one of the motivations for
achieving the cosplays. This finding confirms the importance of interactions in the process
of formation of the person. Another relevant figure has been suggested that by identifying
with certain characters, the cosplayers just questioning their own attitudes, reinforcing it
with the active role of these young people in the consumption of media products.
Keywords: Cosplay, Identity, Hipermodernity, Consumption, Young.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA 8
I – O MUNDO EM MUTAÇÃO 19
1. 1 - HIPERMODERNIDADE 25
1. 2 – VIRTUALIZAÇÃO DA FAMÍLIA 38
1. 3 - GLOBALIZAÇÃO EQUIVALE A MUNDO HOMOGENEIZADO? 43
1. 4 – JAPONIZAÇÃO 46
II - HISTÓRIAS EM QUADRINHOS E DESENHO ANIMADO JAPONÊS 51
2.1 – A ENTRADA DO MANGÁ NO BRASIL 53
2.2 - MAN: AS PARTICULARIDADES DO DESENHO JAPONÊS 55
2.2.1 - Um pouco de história: a origem nipônica
55
2.2.2 - Para entender mais esse quadrinho
56
III – CONHECENDO O COSPLAY 63
3.1 - EVENTOS E COSPLAY: MÁSCARAS DA REALIDADE 66
3.2 - BRINCANDO DE FAZ DE CONTA 72
IV – JUVENTUDE E IDENTIDADE: “ESSA METAMORFOSE AMBULANTE” 80
4.1 - GERAÇÃO 84
4.2 – IDENTIDADE: UMA RELAÇÃO COM O MUNDO 87
4.2.1 - Crise de identidade na hipermodernidade
96
V - COSPLAY E O IMAGINÁRIO SOCIAL 100
5.1 – A BUSCA POR SATISFAÇÕES 103
VI - CONSIDERAÇÕES FINAIS 108
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 111
APÊNDICE A – ROTEIRO PARA OS ENCONTROS 118
LISTA DE ILUSTRAÇÕES 121
INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA
_____________________________________________ _
A idéia de elaborar esta dissertação “’Cosplay’: identidades na hipermodernidade”
surgiu de várias reflexões acerca da identidade, consumo atual, adolescentes,
transformações na sociedade, além da vivência no universo de mangás e animes. Neste
primeiro (e pequeno) trecho podem-se perceber três palavras que não fazem parte do
vocabulário de muitos, e que o fazia do meu um tempo atrás. Iniciarei com uma
breve apresentação delas: Mangá é a história em quadrinhos japonesa, um tipo peculiar
de quadrinho, diferente em vários aspectos daquele que estamos habituados; anime se
refere aos desenhos animados japoneses, normalmente derivados dos mangás que mais
fizeram sucesso no Japão; e por último, o cosplay, foco desta dissertação, que se refere
ao ato de se vestir como os personagens de mangás e animes, principalmente, e que são
freqüentemente encontrados em eventos que reúnem admiradores daqueles produtos
midiáticos.
Essa experiência com mangás e animes e, agora cosplay, foi fruto da minha
monografia no qual tratei especificamente do mangá. Trabalhar com histórias em
quadrinhos, apesar de ser um assunto que me chamasse atenção, era considerado por
mim um tema sem muita profundidade. Parece estranho ler isso, eu suponho, mas é
verdade. Confesso que talvez esse assunto tenha sido alvo de aversão por acreditar que
quadrinhos era “coisa de criança” e não aceitava que jovens adultos ainda pudessem
querer lê-los. A infantilidade foi sempre uma resposta imediata na minha cabeça. Mas as
constantes explicações dadas por minha irmã de que aquele material não era igual a
revistas como “Mônica” ou “Supermanfizeram com que eu encarasse o desafio de não
apenas procurar entender esse fenômeno, mas de olhá-lo com as lentes de um
pesquisador, suspendendo as pré-concepções sobre esse fato. Foi extremamente difícil.
Era um abandono de uma crença, uma luta contra uma idéia enraizada. Mas o dizem
que o trabalho deve envolver algo que incomoda o pesquisador? Pode ser que não era
nesse sentido que a palavra “incômodo” estava se referindo, mas foi e continua sendo
muito recompensador ver as mudanças que tenho tido desde que assumi essa
inquietação como meu objeto de pesquisa.
A sugestão de ir aos encontros que reuniam aficionados por quadrinhos e
desenhos animados japoneses para observar os comportamentos e relatar os fatos que
ali ocorriam foi algo inicialmente encarado com certo receio. Porém, tendo em mente que
este seria o primeiro passo como aprendiz de pesquisador, resolvi aceitá-lo. Isso
aconteceu ainda na graduação. Era um sábado (esses eventos normalmente acontecem
nos finais de semana), o local: UERJ, nono andar. Cenário muito familiar que estudava
no andar de cima, porém a faculdade estava deserta, como se todos tivessem aderido a
mais uma greve. Entrei no elevador. Ao sair, se podia ouvir uma música e, na medida
em que me aproximava do tal lugar, guiada por uma pessoa muito próxima a mim, pude
perceber que a quantidade de jovens que se encontrava era maior do que eu
imaginava. Seria o mesmo andar? Uma corda indicava que o evento era restrito aos
que pagassem. Conduzida pela minha curiosidade, paguei: a entrada era oito reais. Após
esse momento, minha guia logo sumiu na multidão.
Comecei a explorar o local. Havia um comércio instalado no lado esquerdo com
livros, cds, brinquedos, chaveiros, blusas com estampas dos personagens e alguns
apetrechos que eram usados pelos próprios personagens. Um karaokê no centro reunia
alguns jovens que cantavam músicas em japonês, e no lado direito havia uma pequena
“arena” onde duas pessoas simulavam uma luta com suas “armas” de brinquedo. Depois
me informei que se tratava de uma “briga” baseada em movimentos que eram copiados
de alguns mangás.
Após alguns instantes admirando o que acontecia, resolvi ver o que havia nas
salas, para onde algumas pessoas se dirigiam. Em uma delas era organizado um torneio
de games boys (espécie de videogames portáteis) com joguinhos baseados nas histórias
em quadrinhos/ desenhos animados japoneses. Numa outra sala um grupo desenhava e,
mais adiante, em um outro espaço, algumas pessoas ajeitavam suas fantasias... Parei.
Fantasias? Perguntando a um deles descobri que se vestiam como os personagens dos
quadrinhos e que numa determinada hora todos participariam de um concurso, no qual
cada um teria que interpretar o personagem que a fantasia correspondia. Na hora
indicada eu fui verificar.
Era no auditório e, para minha surpresa, estava lotado. A cada apresentação as
pessoas vibravam! Muitas delas trocavam comentários e outras apenas repetiam as falas,
para mim incompreensíveis, em coro. Vaiavam também. No meio da gritaria, pude
perceber que muitos adultos acompanhavam alguns jovens (seriam seus filhos?) e, sem
nenhuma expressão, ali ficavam.
Após anunciar o ganhador, resolvi escolher um lugar para registrar as minhas
impressões. Logo em seguida um rapaz me interrompeu, perguntando se poderia tirar
uma foto minha. Impressionada questionei o porquê e ele disse gostar de orientais. Posei
meio sem graça. Foi estranho. Virei mais um atrativo do lugar por ter traços orientais?
Mais uma pergunta me veio à mente: Seriam apenas os “olhos puxados” que
chamaram a atenção do menino? Tentei encontrar algo externo que indicasse uma certa
característica que pudesse me diferenciar daquele ambiente. Havia muitas pessoas de
preto, mas não era maioria. Talvez fosse a idade ou quem sabe os símbolos
compartilhados, uma linguagem comum, isto é, expectativas de comportamento que
definem uma “consistência cultural”, como diria Velho (1999), e na qual eu estava fora.
Pode ser isso, mas o fato é que esse dia ofereceu um outro modo de ver, um outro
sentimento, não mais o de superar a barreira do “incômodo”, e sim da dúvida, em busca
do descobrimento e de entender de que maneira aquele fenômeno está relacionado à
sociedade hoje. Com isso, pude perceber que é no cotidiano que os detalhes são
revelados e a soma de impressões que acumulei neste primeiro encontro, mudou a forma
que os via.
Dentre os inúmeros aspectos que poderia escolher para este trabalho, optei por
explorar o ato de fantasiar como personagens, também chamado “cosplay”, adotado por
algumas pessoas nesses eventos. A importância deste estudo ao refletir sobre o
fenômeno “cosplay”, está em tratar de uma questão psico-sócio-cultural, um sintoma da
sociedade atual, que marca a multiplicidade de identidades. Ao focar no ato de fantasiar-
se como o personagem, isso tem seu valor justamente por pertencer a uma sociedade
heterogênea, no qual o que é diferente precisa ser considerado, ao invés de reprimido e
ignorado.
Busquei compreender o fenômeno cosplay e como ele pode se transformar em
mais um “mecanismo/produto” hipermoderno na constituição da identidade em um grupo
de adolescentes cariocas. E para alcançar esse objetivo alguns pontos são importantes
de serem explorados, como: a caracterização da sociedade atual; a influência das
histórias em quadrinhos e desenhos animados japoneses, mangá-anime, em
adolescentes cariocas; além de conhecer e compreender o que são mangá-anime, sua
história, a lógica interna – estrutural e de desenvolvimento; e o próprio fenômeno cosplay.
Procurei também compreender as mediações que se estabelecem entre o consumo de
histórias em quadrinhos e/ou desenhos animados japoneses e o fenômeno cosplay, bem
como o processo de identificação nele envolvido.
DISCUTINDO AS ESTRATÉGIAS METODOLÓGICAS
A construção do conhecimento é complexa e, por se tratar de produções humanas
de uma realidade, deve-se estar consciente de que apenas um aspecto específico desta é
apropriado por s, sendo esta limitação proveniente tanto do próprio meio/ contexto
estudado quanto das nossas práticas. O pressuposto norteador adotado para
desenvolvimento deste trabalho é a Epistemologia Qualitativa, como apresentada por
González Rey (2005). Escolhi trabalhar com a Epistemologia Qualitativa, pois ela era a
que mais se adequava ao modo como pretendia estar construindo o meu conhecimento,
pois em seu processo investigativo busca-se a ampliação da produção do conhecimento,
ou, segundo ele, das “zonas de sentido”, a qual:
confere valor ao conhecimento, não por sua correspondência linear e imediata com o ‘real’,
mas por sua capacidade de gerar campos de integibilidade que possibilitem tanto o
surgimento de novas zonas de ão sobre a realidade, como de novos caminhos de
trânsito dentro dela através de nossas representações teóricas. (GONZÁLEZ REY, 2005, p.
6).
A Epistemologia Qualitativa tem como foco o caráter teórico pela construção de
conhecimento, que vai sendo elaborado no encontro do investigador com o investigado,
num processo dialógico - reflexivo, que permite sair de conceitos ou idéias concebidas
previamente e buscar uma elaboração de hipóteses ao longo do processo investigativo. O
modelo teórico compõe-se de sentidos subjetivos e de configuração subjetiva que
consideram a realidade de uma forma, sendo esta sujeita a alterações em seu
processamento. As teorias são úteis na medida em que focam certos aspectos de um
fenômeno, não devendo ser consideradas “receitas de bolo” para condução de uma
pesquisa. Enfatizar o lado teórico o significa que o empírico seja excluído desta
metodologia, mas sim que ele não pode ser entendido de forma separada do teórico. O
empírico é considerado como um momento inserido num contexto maior que é o teórico,
sendo este um processo que constantemente produz outros conhecimentos. Deste modo,
o modelo teórico não é algo pronto, fixo e imutável que é assimilado pelos pesquisadores,
mas sim, surge pela construção e interpretação do sentido subjetivo.
Destaco três principais pressupostos epistemológicos que marcam a Epistemologia
Qualitativa. O primeiro é o caráter construtivo-interpretativo do conhecimento: Aqui se
destaca a posição ativa, participativa e reflexiva do investigador, que vai desenvolvendo
sua pesquisa conduzida por um modelo teórico que está sempre em construção e o qual
se depara com o momento empírico. Sartre (apud Maheirie, 1994) aponta que o
experimentador não é algo aparte do campo da experimentação, havendo interação entre
ambos. A relação, por isso, é dialética e de reciprocidade, pois o sujeito e o objeto estão
diretamente relacionados, ou seja, “(...) não o objeto se transforma, mas o sujeito é
transformado por esta relação” (Maheirie, 1994, p. 128).
Quanto ao caráter interpretativo, eu o considero um recurso válido, mas é preciso
ter cautela em relação a esse processo para que não se elaborem conhecimentos a partir
de dados apriorísticos ou de idéias deterministas. Compreender ao invés de explicar é, a
meu ver, o ideal, pois é considerado “um movimento de uma nova práxis, uma maneira de
nos relacionarmos concretamente com nosso objeto de estudo, e é ao mesmo tempo,
uma maneira de nos modificarmos, de irmos além de s mesmos” (Ibid., p. 133). Se
considerar que um fato pode possuir variadas significações tanto para pessoas diferentes
como para mesma pessoa em momentos distintos, em alguns casos, como em
entrevistas, ao invés de apenas interpretar, pode-se checar as informações construídas
pelo pesquisador por meio de perguntas realizadas diretamente à pessoa em questão, ou
buscar entendimento através de relações estabelecidas entre as significações relatadas e
as ações concretas.
O segundo pressuposto é conceber o singular como possível produtor de
conhecimento científico: A dificuldade encontrada na legitimação do singular pode ser
entendida pela relação direta que se estabeleceu entre o empírico e o científico e pela
valorização do trabalho feito com bases quantitativas, aspectos que reforçam a posição
do empírico, muitas vezes considerado como o resultado final da pesquisa e não um
procedimento para se chegar a tal condição. Os dados empíricos fornecem informações
válidas ao trabalho, mas o são tratados como foco nas discussões, pois isso levaria a
um reducionismo da complexidade humana.
O singular adquire sua relevância pelo lugar que ocupa no processo de estudo
dentro do sistema teórico adotado na pesquisa em questão, que se inicia antes mesmo de
se deparar com o singular. Como González Rey (2003, p. 271) coloca:
A construção teórica aparece tanto antes, como durante e depois dos dados empíricos,
além do que vemos nos dados apenas uma das formas em que se apresenta o momento
empírico, essencialmente naqueles registros que complementam a posição central do
investigador dentro do campo de investigação.
A pesquisa como comunicação, um processo dialógico é o último pressuposto que
aqui destaco. As pessoas apresentam inúmeras formas de expressão simbólica e, através
da comunicação, podemos buscar entender a constituição subjetiva e as diferentes
maneiras de ser no mundo.
A comunicação é uma via privilegiada para conhecer as configurações e os processos de
sentido subjetivo que caracterizam os sujeitos individuais e que permitem conhecer o modo
como as diversas condições objetivas da vida social afetam o homem. (GONZÁLEZ REY,
2005, p. 13).
Neste tipo de metodologia tanto os participantes quanto o pesquisador são vistos
como sujeitos no processo de elaboração do conhecimento. O fato de legitimar ambos,
pesquisador e participantes, enfatiza a importância da comunicação e da interação,
diferentemente do que acontece nas pesquisas de discurso positivista que só consideram
a informação obtida pelos instrumentos.
Gostaria ainda de somar contribuições da metodologia proposta por Jean-Paul
Sartre (1984) a este trabalho que também se caracteriza pela dialética. O movimento
progressivo-regressivo se refere ao movimento que parte da singularidade para
universalidade e vice-versa, o qual visa alcançar o resultado (futuro), mas sempre atento
ao que foi sugerido inicialmente. Como não se atêm a uma visão isolada e pré-concebida
dos fatos, pode haver a reformulação das verdades produzidas. Numa entrevista, por
exemplo, este movimento vai auxiliar na compreensão do discurso, pois será dada
importância tanto às características particulares do sujeito quanto às universais,
referentes à sociedade de consumo e ao momento histórico em que ele está inserido.
“Desta forma estabelecemos uma síntese horizontal, que é relativa à temporalidade, e
uma síntese vertical, relativa à singularidade na multiplicidade” (Maheirie, 1994, p. 137).
A partir desses dados que estão na base de todo o trabalho e, visando obter
informações para auxiliar na compreensão de como se forma e se caracteriza essa nova
identidade “cosplay”, optei por realizar encontros com um grupo de jovens que realizam
cosplay, para complementar minhas reflexões. Por considerar o homem como ser em
relação, é possível perceber que o ato de se vestir como personagem de uma história ou
desenho animado japonês, reflete uma forma de agir no mundo e de
indicação/formação de sua singularidade. Assim, apreender a relação que o adolescente
estabelece com o fantasiar e a sua participação em um evento, de que modo ele vive
esse processo e a relação deste ato na vida dele, são fundamentais para compreensão
tanto do sujeito como do mundo no qual ele pertence.
A opção de trabalhar com grupo se deve à experiência anterior que tive através da
monografia. Percebi que as respostas dadas pelas pessoas quando em situação de grupo
foram mais ricas, interessantes e produziram mais reflexões entre os participantes, o que
possibilitou a apreensão de diferentes visões, conduzindo inclusive a construção de um
conhecimento pelo próprio grupo.
A técnica do grupo focal foi escolhida para condução dos encontros, por oferecer
grandes auxiliadores na busca pela compreensão das atitudes, preferências, sentimentos
e identificações das pessoas, mais bem observados mediante a interação entre as
pessoas. Ela também permite que haja uma abertura, uma certa flexibilidade dentro de
um roteiro previamente estipulado para cada entrevista em grupo. Isso traz benefícios
tanto para o facilitador quanto para os participantes, na medida em que possibilita um
debate mais aberto e a disponibilidade de trabalhar com algo inesperado que venha a
surgir.
Ao colocar esta técnica como parte integrante neste estudo, tem-se o cuidado de
acompanhar as orientações dadas quanto ao ambiente e ao horário, por exemplo, para
que estes não ajam como limitadores no processo de construção de informações e
interfiram negativamente na qualidade da dinâmica. No caso do número de participantes,
o grupo focal não possui restrição, então, devido à experiência que tive na realização do
trabalho de monografia, preferi trabalhar com grupos pequenos.
Meu objetivo inicial era o de compor um grupo de oito pessoas, mas compareceram
somente cinco. Apesar de o número ser abaixo do esperado, qualitativamente a interação
entre os membros do grupo e as informações obtidas foram muito ricas. O número
reduzido permitiu que houvesse uma condição propícia para que os integrantes se
sentissem mais à vontade para expor suas opiniões e tivessem maiores oportunidades de
comentar sobre todos os assuntos sem que isto se tornasse exaustivo ou demorado.
Como se trata de uma amostra o-representativa da população e, como as pessoas são
selecionadas a partir de critérios estabelecidos pelo pesquisador, esta se caracteriza por
ser uma amostra intencional (Moura & Ferreira, 2005).
O grupo ficou então composto por cinco participantes, dois meninos e três
meninas, com idades variando entre 16 a 21 anos
1
, moradores de diferentes bairros do
Rio de Janeiro.
Para recrutar as pessoas, primeiramente, solicitei a uma adolescente próxima a
mim que me fornecesse alguns nomes de jovens que se vestissem como os personagens
midiáticos nos eventos. Ser jovem e fazer cosplay eram os dois critérios norteadores para
compor o grupo focal.
Ao todo foram realizados três encontros de aproximadamente duas horas de
duração. Este tempo (duas horas) segundo Aigneren (2001) é o recomendado, pois
depois disso é mais provável que as pessoas comecem a perder a concentração.
Um gravador e uma câmera foram utilizados com a conscientização dos
participantes para registro das discussões. Estes equipamentos auxiliaram na
recuperação dos comentários feitos, com a exatidão das palavras utilizadas, além de
possibilitar a observação de alguns aspectos que não puderam ser percebidos no dia. Foi
1
Conforme dados das Nações Unidas, é jovem aquela pessoa entre quinze e vinte e quatro anos de idade.
combinada entre os participantes e o facilitador, a questão da preservação do anonimato
nos depoimentos. Para tanto, optei por criar nomes fictícios aos participantes.
Para oferecer uma visão diferenciada que um mesmo fenômeno possa apontar,
um observador esteve presente durante o processo. O subgrupo, formado pelo facilitador
e observador, discutiu e trocou impressões sobre a dinâmica grupal após o encontro.
A fim de estimular as conversações, foram realizadas perguntas semi-abertas que
visam dar oportunidade ao grupo de compartilhar e construir novas experiências. Isso
também facilitou as expressões de sentidos subjetivos que foram se formando pela
comunicação interativa que se estabeleceu entre os participantes.
Um roteiro foi desenvolvido para cada encontro e serviu como norteador do
processo de exploração do tema selecionado para o dia (Dall’Agnol & Trench, 1999) e
continha os objetivos e os assuntos previamente elaborados (semi-estruturados).
Com o objetivo de verificar se as perguntas estavam claras e bem estruturadas, me
cadastrei no site do Cosplay Brasil
2
, que é referência para aqueles que realizam esta
atividade, tendo atualmente em torno de quatro mil membros cadastrados (Rossi, 2007).
Nesta página da web é possível encontrar o calendário com os próximos encontros, fotos
e vídeos de apresentações de cosplayers. os cosplayers podem participar dos fóruns,
nos quais muita troca de informação. E foi neste fórum que criei um espaço virtual que
serviu como um projeto piloto para elaboração e estruturação do que foi realizado no
grupo focal. A participação foi realizada pelos freqüentadores do site, sem nenhuma
restrição quanto à idade. Apesar de serem muitas perguntas, os participantes foram muito
prestativos e, na medida do possível, tentavam responder a todas as minhas dúvidas, e
não hesitaram em dar sugestões para a dissertação. Esse primeiro contato foi
enriquecedor, pois além de ser um espaço de troca mais efetiva do que na correria dos
eventos, foi uma oportunidade ímpar para conhecer mais um meio utilizado pelos
cosplayers para encontro e partilhamento de informações. Neste trabalho, algumas
colocações foram transcritas da mesma forma como foram divulgadas no site.
Pode parecer contraditório ter realizado um roteiro e até um projeto piloto, que
pontuei em várias partes que o trabalho vai sendo construído ao longo do processo de
realização do mesmo, porém a programação dos encontros é útil como forma de orientar
a organização das atividades, e podem ser modificadas no decorrer da pesquisa. Assim,
O projeto na pesquisa qualitativa está orientado a avaliar a representação do pesquisador
sobre o que estudará e a forma com que ele pretende acessar as pessoas que serão
2
Disponível em <http://www.cosplaybr.com.br/cb/>. Acesso em: 02 jan. 2008.
analisadas (...) Mais do que a seqüência rígida de etapas, na qual uma é condição da outra,
o projeto representa um instrumento prático de orientação, pois facilita o começo da
pesquisa, a qual, uma vez iniciada, se separa de todo o controle externo, convertendo-se
em um processo guiado pelo pesquisador, cujos momentos mais significativos se definem
no próprio curso da pesquisa. (GONZÁLEZ REY, 2005, p. 83).
Quero frisar que o guia que orientou cada encontro estava centrado na
conversação e não na realização de perguntas e registro das respostas respectivas, pois
o livre expressar dos participantes e as zonas de sentido subjetivo que foram se
formando, constituem o ponto central. Também utilizei algumas técnicas de dinâmica de
grupo para facilitar a produção de sentidos subjetivos e estimular a troca de informações
através de conversações.
Como o trabalho foi desenvolvido com a participação de jovens, a pesquisa foi
submetida à avaliação do Comitê de Ética em Pesquisa (COEP), sendo incluídas as
providências necessárias segundo as normas e diretrizes regulamentadoras de pesquisa
com seres humanos no Brasil (Resolução 196/96). No site do COEP
3
consta a aprovação
para execução desta pesquisa. O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido foi
elaborado e contém explicações sobre os objetivos e os métodos da pesquisa que foram
utilizados, preservando o participante de qualquer risco ou tratamento que infrinja a
dignidade e o respeito.
O desenvolvimento da dissertação teve início, primeiramente, pelas inúmeras
transformações em nossa sociedade, pois estas têm relação direta na forma como
ocorrem os relacionamentos interpessoais, o posicionamento diante do mundo, a
formação da identidade e a concepção de juventude. Por conta disso, no capítulo I,
considerei fundamental contextualizar o mundo atual para dar base às discussões
posteriores. Para tanto, relatei alguns aspectos do que Lipovetsky considera hoje como
“mundo hipermoderno”, reservando um tópico para falar das transformações ocorridas
nas relações familiares, posteriormente dos desdobramentos da globalização nas culturas
e da influência do Japão no processo de difusão de produtos e ideologias.
Dois dos produtos que o Japão exporta e vêm conquistando mais admiradores foi
apresentado no capítulo dois que o as histórias em quadrinhos e desenho animado
japoneses. Aqui foquei nas histórias em quadrinhos japonesas, pois são destas que
derivam os animes, principal responsável pelos primeiros contatos com esses produtos
japoneses. A análise das histórias em quadrinhos e/ou desenho animado japoneses se
concentrou no resgate de alguns sentidos, valores e idéias em geral nelas vinculadas, o
que ajudou a entender um pouco mais este material que tem se sobressaído num
3
Disponível em: <http://www.sr2.uerj.br/sr2/coep/index.php?mod=projetos.htm#2007>. Acesso em: 02 jan. 2008.
mercado com inúmeros estímulos para consumo. Algumas características diferenciais dos
mangás e uma visão geral de sua entrada no Brasil foram apresentadas neste capítulo.
No capítulo seguinte (três) esclareço aspectos do fenômeno cosplay, revelando
sua origem, características principais e reflexões sobre o lugar que ele ocupa na
sociedade contemporânea, articulando com o lugar da máscara neste contexto. Em
seguida apresentei algumas histórias dos personagens de mangá/anime, objetos de
identificação dos cosplayers entrevistados, e os quadrinhos/ animes respectivos nos quais
eles aparecem, pois em minha monografia (Furukawa, 2005) pude perceber que o olhar
sobre o conteúdo estava ausente, tendo o anime e mangá sido vistos apenas de maneira
superficial e generalizada. Estas informações serviram como forma de entender um pouco
mais o processo de identificação com o personagem.
A partir do que foi discutido, no quarto capítulo tratei da juventude e da identidade.
Estes assuntos foram abordados a partir de uma perspectiva contextualizada e o a-
histórica e naturalizante, sendo este enfoque importante para dar um suporte maior na
compreensão do fenômeno “cosplay” e seus atuantes, pois são considerados o papel do
meio social e o período histórico no qual surgiram. Neste capítulo também foi discutido
um assunto que está presente em todo este trabalho, que é a identidade; suas
características principais e a questão da crise de identidade veiculada em várias
literaturas. E, por último, no capítulo seis, articulei a importância do imaginário na
construção dessas novas formas de ser no mundo e a sua atuação nos cosplayers.
Ao longo dos capítulos, algumas falas dos cosplayers, derivadas dos encontros
com eles realizados, foram apresentadas, pois elas servem para ilustrar algumas
questões que abordei neste trabalho. Porém, destacar essas falas, não significa que as
tenha considerado como dados isolados, pois as falas não são neutras, estando inseridas
no contexto no qual vivemos. Assim, elas facilitam a compreensão de como este
fenômeno está presente em cada assunto discutido. Por fim, nas “considerações finais”,
apresentei um apanhado geral do que foi discutido ao longo do trabalho, indicando o
caminho desenvolvido por ele, as ligações entre os assuntos abordados, e as direções
futuras.
CAPÍTULO I
O MUNDO EM MUTAÇÃO
O mundo vai sendo modificado ao longo do tempo e se distingue para cada cultura,
sociedade e momento histórico analisado. Por ele ser imerso em contradições e a
realidade ser complexa, não farei nenhuma análise global de intuito uniformizante, até
porque o “cosplay” é algo que se enquadra nessas novas formas de ser que o contexto
multicultural atual traz e que não pode ser simplificado. Como Lipovetsky (apud Charles,
2004, p.15) declara, padronizar levaria a juízos excessivo, sempre demasiado
elementares porque olham apenas um aspecto das coisas, a fim de livrar-se de toda a
complexidade do real e circunscrever as contradições de que este está urdido”. Optei por
iniciar esta parte com um apanhado geral de alguns pontos que marcam as
transformações ocorridas em várias partes no mundo e em nossa sociedade, que servirão
de base para as reflexões sobre a identidade e o ato de se fantasiar, tema central deste
trabalho.
A modernidade ocidental está relacionada à liberdade, a igualdade e a idéia de um
sujeito autônomo, porém, como este ideal foi acompanhado de um aumento de poder
estatal esse fato não teve grande impacto. Nesta época, a noção de individualismo reflete
um sujeito e uma identidade de caráter unificado e singular, característicos de um tempo e
cultura, onde as referências eram estáveis e na qual a construção se baseava em
capacidades e estruturas pré-estabelecidas. A industrialização trouxe mudanças na
sociedade moderna ocidental tornando mais social o sujeito. Neste momento também a
sociologia analisou o homem em processos grupais nos quais as subjetividades eram
formadas pelas interações sociais, as quais ao mesmo tempo em que eram transmitidas
as normas e estruturas, estas também eram mantidas pelas pessoas.
As transformações que acometeram o sujeito cartesiano e o sujeito sociológico no
século XX fizeram-se notar com o surgimento de um sujeito isolado, perturbado num
mundo que era visto como indiferente para ele. Hall (2001) declara que este sujeito
moderno sofreu um deslocamento que se deu “(...) através de uma série de rupturas nos
discursos do conhecimento moderno” (p. 34). Este autor explana cinco momentos que
conduziram a um descentramento deste sujeito cartesiano na segunda metade do século
XX. O primeiro consiste na reapropriação feita dos escritos de Marx no qual se afirma que
os homens agem na história mediante as limitações que lhe o impostas e com as
ferramentas estabelecidas pelos que os antecederam. Estes pensadores referem com
isso a uma falta de autonomia do homem e a ausência de uma essência universal de
homem presente em cada um. Mais um fato que causou impacto no pensamento
moderno foi a concepção de inconsciente veiculada por Freud, o qual funciona fora dos
princípios da razão. Outro ponto enfatizado por Freud foi a da formação do “eu ou
identidade realizada em interação com outros e não algo surgido desde o nascimento,
sendo um processo demorado e inconsciente, onde nunca uma finalização. Sobre a
importância do social na concepção do sujeito, Ewald & Soares (2007) colocam que a
identidade é formada no social, sendo então a sociedade seu produtor, mas também
resultado da nossa influência sobre ela. Nas palavras destes autores, a identidade
envolve
zonas de interseções, de vários tipos e tamanhos, pois são zonas de compartilhamento
intersubjetivo com um grupo, um time de futebol, um bairro, uma cidade, um estado, um
país, uma opção ideológico-política, etc., mas onde, também, sempre haverá o espaço da
singularidade. (EWALD & SOARES, 2007, p. 24).
A palavra identificação é empregada por Hall (2001) no lugar de identidade para
resolver a falta de unidade e também para ratificar o processo de contínua estruturação
que ocorre na pessoa. O termo identidade foi adotado neste trabalho, porém, com esta
visão de processo em sua formação.
O terceiro “descentramento” foi atribuído à lingüística de Saussure. Para ele, como
a língua é social e não individual, tendo os significados inseridos nela e na cultura, não
somos considerados seus atores. O poder disciplinar é o quarto tipo de descentramento e
se refere a um poder introduzido por Foucault, que institui o controle e a disciplina do
indivíduo e do corpo pelo poder administrativo. Hall (2001) coloca que o paradoxo desta
concepção está no fato de que “quanto mais coletiva e organizada a natureza das
instituições da modernidade tardia, maior o isolamento, a vigilância e a individualização do
sujeito individual” (Ibid., p. 43). E a última posição apontada foi o feminismo, originada nos
anos 60. Este evento toma destaque aqui por desestabilizar as noções de público e
privado, havendo uma politização da identidade e da identificação.
Para o melhor entendimento dessas modificações, exponho o projeto civilizatório
da modernidade ocidental que entrou em decadência, conforme cita Rouanet (1994). Não
estou afirmando, com isso, que esses ideais foram, algum dia, alcançados, mas quero
salientar que havia na civilização moderna ocidental esses três focos principais, que o:
universalidade, individualidade e autonomia. A universalidade seria a consideração de
todos independente das diferenças nacionais, étnicas ou religiosas. a valorização de
cada ser como único, sem considerá-lo parte de uma massa, seria a individualidade,
porém, a sociedade de consumo vai contra este princípio. A autonomia seria o poder
pensar sem o intermédio de alguma entidade ou instituição, o de usar o espaço público e
conseguir, pelo emprego, o que precisam para o sustento material. Sobre o colapso deste
projeto, o autor revela que hoje “uma rejeição dos próprios princípios, de uma recusa
dos valores civilizatórios propostos pela modernidade” (Ibid., p. 11).
Um novo cenário sociocultural então foi surgindo. Embora as muitas mudanças
fossem percebidas desde o século XIX, em meados do século XX, com a vinculação
dos modelos audiovisuais massivos com a noção de lucro, é que uma nova forma de
relação econômico - cultural global ganhou espaço e intensidade. Segundo Sevcenko
(2001) as transformações tecnológicas ampliaram o quantitativo de produção e a
possibilidade de consumo seguido da própria forma de estruturação da sociedade, da
cultura, da política e do agir cotidiano.
Para Severiano e Estramina (2006), as três fases nas sociedades ocidentais
modernas para as crises da modernidade são: a) Capitalismo de produção, no qual o
consumo está relacionado à utilidade do produto, voltado à satisfação das necessidades
básicas. Esta fase desenvolveu-se no século XIX e início do XX. Havia uma orientação à
poupança e o capitalismo era voltado à produção. b) Sociedade de consumo de massa,
época do fordismo. O consumo passa a ser uma satisfação dos desejos, manipulados
pelos anúncios publicitários. O período de seu apogeu seria, de uma forma geral, a partir
da segunda metade do século XX até os anos 80; e c) Por último a sociedade de
consumo segmentada que se originou em meio ao desenvolvimento das novas
tecnologias. Época do toyotismo e da globalização. Valorização da imagem-marca que
atribui valor ao produto. É diferenciado da segunda por difundir um consumo que visa
satisfazer partes da população, atribuindo características de personalidade a elas, o que
os autores chamam de “consumo personalizado”, sendo ainda de massa.
Essas mudanças nas concepções do homem e nos princípios levaram alguns
estudiosos a adotarem outros termos para caracterizarem essa sociedade, como por
exemplo, Modernidade tardia (Anthony Giddens), Pós-modernidade (Lyotard; Maffesoli) e
Hipermodernidade (Lipovetsky, que também usou o termo Pós-modernidade). Para
Lipovetsky (2004, p. 51), foi “a partir dos anos 70 [que] a noção de pós-modernidade fez
sua entrada no palco intelectual com o fim de qualificar o novo estado cultural das
sociedades desenvolvidas”. Neste novo momento sociocultural o enfraquecimento das
normas autoritárias e disciplinares é acompanhado por um processo caracterizado por
avanços tecnológicos, maior produção e difusão de produtos, aspectos publicitários e
advento da moda que propaga por toda a sociedade desde os anos 60.
Diante desse panorama, compete agora colocar que fatos foram propiciadores para
que ocorressem tamanhas alterações. Principio falando sobre a globalização.
A globalização, derivada do capitalismo, é um processo que acentuou as
operações globais não a nível econômico, mas também social, político e cultural, em
âmbito mundial. Um elemento característico da globalização é o neoliberalismo. Este
“representa uma necessidade global de restabelecimento da hegemonia burguesa”
(Mancebo, 2003, p. 77). O reflexo disto nas relações sociais e políticas seria a prevalência
de interesses individuais e da lógica mercantil. O comportamento pessoal se fundamenta
em sua utilidade de acordo com os interesses particulares. Neste novo arranjo, a
subjetividade é afetada por uma gama de fenômenos, permitindo ou exigindo novas
formas de se organizar. Pode-se dizer, então, que houve um movimento para a
globalização das idéias, pessoas, produtos e signos, trazendo repercussões inclusive a
nível local e individual. A inserção de personagens de histórias em quadrinhos japoneses
no conjunto de identificações de alguns adolescentes brasileiros hoje, que ocorre de
forma cada vez mais acelerada e vinculada a um comércio que visa o aumento de seus
consumidores, é um fato que permite verificar essa mudança na organização da
sociedade. Ainda neste capítulo no terceiro item Globalização equivale a mundo
homogeneizado?”, explorarei mais este tópico.
Um dos marcos importantes para essa transformação da sociedade foi a
implementação das tecnologias, que trouxe repercussões nos valores da sociedade. A
quebra de barreiras físicas, como distâncias territoriais, e a disseminação das
informações quase que imediatamente a lugares longínquos, facilitaram o
desenvolvimento da sociedade global, porém, devo ressaltar que isso não ocorreu de
maneira uniforme e nem atingiu todas as sociedades. Um outro efeito que este novo rumo
mundial provocou, foi o surgimento da divisão transnacional do trabalho (Ianni, 1997), isto
é, o partilhamento da empresa em localidades diferentes no mundo, no qual, em muitos
casos, forçou a migração acentuada de pessoas na procura por oportunidades de
trabalho. Mesmo havendo condições de o trabalhador permanecer na sua nação, alguns
deles passaram a interiorizar essa nova lógica, tornando, ele próprio um ser
desterritorializado, adotando um modo de ser “nômade”; o que implica em novas formas
de identidades e desqualificação de outras. Com essa estrutura de trabalho o mundo se
tornou, nas palavras do autor, uma “fábrica global”.
Com a inserção das tecnologias houve também o aumento da multiplicidade de
estímulos e signos que se apresentaram em um ritmo cada vez mais acelerado. Sevcenko
(2001) afirma que o controle tecnológico inserido numa metrópole influencia o
comportamento dos que vivem ditando um ritmo ao qual o homem deve se adaptar. A
rápida velocidade passa, então, a mudar a relação do homem consigo mesmo e com os
outros.
Além disso, essa exploração do movimento acelerado vinculado à valorização da
visão vai incidir em todos os aspectos de nossa vida, exigindo novas habilidades visuais,
uma readaptação dos sentidos e de seus valores. Esse culto à visão revela um novo
dimensionamento do tempo, e abarcam os diferentes meios: “Da televisão ao jornal, da
publicidade a todas as epifanias mercadológicas, a nossa sociedade canceriza a vista,
mede toda a realidade por sua capacidade de mostrar e de se mostrar e transforma as
comunicações em viagens de olhar” (Certeau, 2002, p. 48). Segundo Sevcenko (2001),
um meio rápido para identificar as pessoas se apoiou fortemente na visão, ou melhor, em
símbolos exteriores como maneira de vestir, agir e pertences que usa. Neste sentido, é a
visão que qualifica o produto, sendo este o que estipula o estilo de quem o consome.
Martin-Barbero (2003) ratifica este aspecto ao assinalar que:
un adolescente cuya experiencia de relación social pasa cada día más por su sensibilidad,
por su cuerpo, ya que es a través de ellos que los jóvenes que hablan muy poco con sus
padres– les están diciendo muchas cosas a los adultos mediante otros idiomas: los de los
rituales del vestirse, del tatuarse y del adornarse, o del enflaquecerse conforme a los
modelos de cuerpo que les propone la sociedad por medio de la moda y de la publicidad.
4
4
O trecho correspondente na tradução é: “Um adolescente cuja experiência de relação social passa cada dia mais por
sua sensibilidade, por seu corpo, já que é através deles que os jovens - que falam muito pouco com os seus pais
estão dizendo muitas coisas aos adultos através de outras linguagens: a dos rituais de vestir-se, de tatuar-de e adornar-
se, o do enfraquecer-se de acordo com os modelos de corpo que a sociedade propõe através de moda e da
publicidade.”
A identificação com base no olhar também se refere à vinculação a um grupo, pois
o compartilhar de certos produtos se torna um meio para inserção nele. Por exemplo, o
grupo de cosplayers entrevistados, colocou que os freqüentadores de eventos de anime/
mangá, possuem uma forma de vestir que os diferencia. Não só com fantasias, os
freqüentadores possuem uma vestimenta que os tornam parte daquele ambiente. Abaixo
estão as falas de alguns cosplayers que tentavam descrever essa comunicação visual
presente nas pessoas que vão aos eventos, suas regras implícitas e suas dificuldades em
verbalizar isso:
- Talita – [Roupas] No mínimo preto
- Márcia. – Correntinhas... Acessórios
- Talita Existem regras que você tem que seguir. Ninguém te diz que essas regras
existem, mas elas existem.
- André – E você absorve elas.
- Talita - Você pode até ir com essa roupa que você [facilitador] está vestida. O seu azul
está discreto, mas você nunca pode ir de rosa choque para um evento.
- Mônica – Se você ir com uma oncinha, sandália alta.... As pessoas vão te olhar assim [de
modo espantado]. Não tem nada a ver.
Porém, acompanhar o que, em cada momento, representa visualmente certa
posição social, muitas vezes relacionado à aquisição de um objeto, é complicado,
sobretudo pela rapidez com que as mudanças ocorrem. E é nisto que se ampara a lógica
do consumo: não somente é imprescindível a compra e ostentação de algo para revelar
certa identidade, mas a dedicação e habilidade em acompanhar que produto, naquele
momento, indica a posição desejada. Essa rapidez característica do nosso tempo é
notável em meios audiovisuais e pode ser caracterizada através do controle remoto. A
troca acelerada de canais exacerba a questão da descartabilidade (neste caso de um
programa), a progressiva diminuição do tempo de atenção, e a ocupação cada vez maior
do período necessário para que haja uma reflexão mais aprofundada; aspectos esses que
estão presentes em vários âmbitos da vida de uma pessoa hoje. Como o desenvolvimento
da tecnologia nos habitua a um movimento acelerado, fica mais evidente a questão da
seletividade do que é observado. Diante de uma imensidade de estímulos, “só vemos
aquilo que olhamos” (Berger, 1999, p. 10), ou seja, o olhar indica uma escolha e isto
reflete uma relação entre o foco de nosso olhar e nós mesmos.
Um fato importante é que essa divulgação de imagens e símbolos é acentuada
pelos meios de comunicação de massa em escala mundial. Para Ianni (1997, p. 28) na
sociedade global, “o mundo se povoa de imagens, mensagens, colagens, montagens,
bricolagens, simulacros e virtualidades. Representam e elidem a realidade, vivência,
experiência”. Numa comparação superficial, podemos dizer que como antes, no culo
XX, um fator de exclusão era o acesso à cultura letrada, hoje o que estipula essa barreira
é o consumo dos meios eletrônicos audiovisuais, pois as imagens dominam e ocupam o
lugar das palavras.
1. 1 - HIPERMODERNIDADE
O conceito de pós-modernidade tal como construído por Maffesoli (1994) se refere
a este período como um momento de saturação, de desgaste do que era conhecido como
modernidade. O termo “decadente” é também empregado por ele para se referir a algo
que deixa de existir para, em seu lugar, surgir coisas novas. Para este autor:
Estamos, pois, numa época provisória: notamos o que não é mais, mas não conhecemos
ainda o que está por vir (...) É um momento, uma passagem da Modernidade a qualquer
coisa que, para apreendermos, é preciso saber buscar no substrato sensível dos dados
sociais. (MAFFESOLI, 1994, p. 22).
A visão de Maffesoli, a meu ver, é reflexo do paradoxo, posteriormente discutido
por Lipovetsky, e que será apresentado neste trabalho.
Algumas modificações apontadas por Canclini (1999) que talvez indiquem traços
dessa transformação são apresentadas a seguir com alguns acréscimos:
a) Diminuição da influência dos órgãos locais e nacionais frente ao mercado
internacional.
b) Redimensionamento dos espaços urbanos que restringiu os locais de
encontro entre as pessoas e a diversidade, e tornou mais longínquos os lugares de
trabalho.
c) Apropriação de símbolos provenientes de culturas globalizadas
d) Redefinição do sentido de pertencimento e identidade pela inserção de
culturas transnacionais e desterritorizadas.
e) Mudança da condição de cidadão que argumenta e critica, ou seja, que tem
uma opinião pública, para aquele que busca qualidade de vida no convívio com meios
eletrônicos com redução do questionamento frente ao consumo deles.
Outras características destacadas da chamada “pós-modernidade seriam,
segundo Maffesoli (1994), a ênfase no simbólico que abarca a razão e sentidos, a
pluralidade, o patchwork, a “ética da estética” (estética referente ao grego aísthesis, que
significa percepção, sensação, emoção, etc), a busca da felicidade e a valorização do
presente.
Como foi visto no começo deste capítulo, a sociedade ocidental pós-moderna é
aquela caracterizada pelo interesse contínuo pelo novo, com destaque a autonomização
dos indivíduos, cujos desejos subjetivos foram emancipados. Porém, depois do período
de encantamento e despreocupação s-moderna baseada na felicidade instantânea,
surge a insegurança, medo e estresse num mundo de contradição. Segundo Lipovetsky
(2004), o termo pós-moderno foi superado, pois ele foi somente empregado para designar
essa libertação das amarras da tradição e ditames sociais. Agora, volta-se a uma pressão
com outra roupagem. A hipermodernidade anunciada pelo neoliberalismo global, pelos
avanços tecnológicos, intensifica as relações de mercado voltadas ao indivíduo e não tem
oposição significativa. Ela é marcada pelo fluxo contínuo, flexibilidade e instabilidade, de
ritmo acelerado. O prefixo “hiper” do termo “Hipermodernidade” oferece esse sentido de
excesso da modernidade. Segundo Aubert (2005, p.16):
Le type de personallité que nous qualifions d’hypermoderne emerge dans lês années 70 em
Europe occidentale et em Amérique du Nord. Dans la societé qui se dissipe à partir de ces
années , société ou l’hyperconsommation devient la règle, société flexible, sans
frontieres et sans limites (...)
5
Essa caracterização da sociedade ocidental como hipermoderna, exposta por
Lipovetsky, é a que será adotada neste trabalho. Em muitos momentos noções de pós-
modernidade apontadas por outros autores são citadas como características da
hipermodernidade, pois nesses casos se mostram equivalentes.
Trabalhar com hipermodernidade é enriquecedor, pois permite entender essa nova
configuração que se apresenta hoje e no qual o cosplay se insere. A identificação com
personagens de desenho japoneses indica essa flexibilidade, aproximação das
localidades, “acessibilidade” e busca constante aos meios de informação e objetos de
consumo de forma cada vez mais acelerada, características essas que marcam o período
atual.
O hipermoderno, de acordo com Charles (2004) é a dependência e completa
condição da vida em função do consumo. A sociedade de consumo como é caracterizada
hoje, revela esse aspecto e indica que se consome mais pelo prazer proporcionado do
que pelo status que adquire. uma exigência de consumo para haver uma distinção
social, mas mais do que isso, é a satisfação trazida. Nos encontros com os cosplayers
5
O trecho correspondente na tradução é: “O tipo de personalidade que qualificamos de hipermoderna emerge nos anos
70 na Europa Ocidental e ns América do Norte. Na sociedade que se dissipa a partir destes anos, sociedade a qual o
hiperconsumo torna-se a regra, [é uma] sociedade flexível, sem fronteiras e sem limites (...)”.
essa vinculação entre prazer e status, assim como, a busca por esse status, surgiu em
vários momentos. Como essa questão será discutida no capítulo cinco, destaco apenas
uma ocasião onde esse assunto ocorreu. Neste trecho selecionado, o grupo estava
falando de um fórum virtual chamado MAP
6
, que era famoso entre adoradores de mangás
e animes e que, com o tempo, foi deixando se ser um atrativo, pois os freqüentadores
foram aumentando e os encontros “ao vivo” começaram a juntar pessoas que não tinham
condutas aceitáveis:
- Márcia – [...] Ser do MAP era do tipo: ser o pioneiro de eventos do Rio.
- Renato - Aquele pessoal das antigas...Todo mundo se conhecia lá dentro.
- Márcia - Todo pessoal começava a ver o pessoal do MAP com certa distância. os
novatos que estavam começando a ir em eventos, principalmente quem começou a ir em
eventos depois de 2003, começava a olhar o pessoal do MAP [assim] “Caramba! Eles
gostam de anime há muito tempo...Eles conhecem tudo”. E aí passou a ser status.
- Mônica – Aí muita gente começou a entrar lá só pra tirar onda.
- Márcia - aquela história subiu a cabeça de alguns...Nego começou a se aproveitar
dessas coisas, fazendo altas algazarras. Já teve muitas histórias de algarrazas em eventos,
em lugares públicos [...].
- Renato - hoje em dia não existe mais [...] O legal do MAP era que, meio que todo
mundo se conhecia através do rum e no evento você sabia quem era. Nos eventos você
tinha mais facilidade de se aproximar das pessoas
- Mônica Porque no começo era muito legal porque era tipo família. Era pequeno. Era
todo mundo amigão.
- Talita - Acho que o MAP hoje foi substituído pelo “Cosplay Brasil”.
- Márcia – É verdade...
- Talita - Que é outro fórum [...] No início, em 2003, eu comecei a fazer cosplay, por causa
do “Cosplay Brasil”. Eu sou Cosplay Brasil anos. Eu conheço todas as pessoas velhas,
porque eu conheci as pessoas antes do pessoal ser famoso. Então... Não sou uma cosplay
famosa, mas conheço todas as cosplayers famosas.
- Facilitador – Então, você acha que o Cosplay Brasil hoje é um sinônimo de status?
-Talita - Hoje é sim [O restante do grupo concorda].
- Facilitador – Mas todo mundo pode participar, não é?!
- Todos – Sim.
- Talita – Não tem como barrar.
- Márcia – Mas o difícil é entrar na panelinha
- André - o poucos os que julgam sem utilizar a panelinha. Sempre tem aquele grupo
determinado que vai levar vantagem sobre você.
A obtenção de status como aqui explicitado, não se restringe a aquisição de bens,
fato este que não foi abordado neste trecho. Há, contudo, o “consumo” de formas de ser e
estar que fazem adquirir o status desejado. O olhar mais uma vez aparece neste aspecto,
pois ao ser acompanhado de um produto também se espera um comportamento visível e
compatível daqueles que o consomem. Assim, mesmo sendo poucos os que conseguem
o status, o prazer proporcionado em se comportar como os que já o possuem, por
6
MAP, segundo eles, era a abreviação de “Museu Anime Project”, que era o nome de um fórum que acontecia na
internet e cujos encontros “ao vivo” ocorriam no museu do Catete. Como se tratava de um evento pequeno acabou
virando um grupo de amigos que se autodenominou MAP. Os primeiros freqüentadores eram conhecidos como os
pioneiros nessa “adoração” aos animes e mangás. Depois a sigla passou a significar “Mi Amigo Pássaro”, mas sem uma
explicação certa da mudança. Uma das hipóteses é de que como deixou de ter eventos no museu eles queriam
conservar a sigla, mas também pode ser porque já havia um outro evento com o mesmo nome.
exemplo, freqüentando o MAP, justifica o “consumo” de tais comportamentos e
produtos, o que se evidencia no aumento cada vez maior de freqüentadores.
A sociedade do hiperconsumo contém assim consumidores fragmentados que
focam mais no experimental. A vinculação do consumo a idéia do prazer é algo marcante
nas campanhas publicitárias, principalmente, aquelas em que se destaca o prazer sexual.
Da mesma forma, a emoção passa a fazer parte da publicidade e é combustível para as
vendas, pois há uma constante busca por emoção.
Porém o “hiper”, o excesso não é referente ao consumo, mas também refletem
nas pressões, estresses e demandas. O indivíduo é marcado por ser compulsivo. Os
sentimentos, que demandam tempo para existir, são substituídos pelas sensações, mais
rápidas. O movimento atual dos meios de entretenimento é a de usar a emoção de modo
intenso. Lacroix (2006) estuda a “emoção” em seu livro, relacionando-o a intensificação
desta como parte da cultura atual. Para Lacroix (2006) a emoção tem esse aspecto
momentâneo e o sentimento seria algo duradouro, entretanto não é toda emoção que
marca a atualidade, destacando aquelas que provocam “choque”. Ele faz uma distinção
entre “emoção-choque” e “emoção-contemplação”. Aquela seria a do inesperado, de algo
que é rápido e a outra seria algo mais aproximado do sentimento, que não dura apenas
um instante, mas se estende e pode vir a ser um sentimento.
Vive-se então numa sociedade hiperemotiva. A emoção pode estar vindo
exacerbada para dar conta do vazio de ideologias ou de esperança que não meios
para ação. Assim, na falta de ideologias, religiões, o que os une é a emoção.
A emoção não é só individual, mas também social. Nos eventos que reúnem
admiradores de desenhos e quadrinhos japoneses que acontecem em todo Brasil, as
manifestações da platéia nos concursos de cosplayers é um exemplo de vivência da
emoção em conjunto.
Sem as presas da tradição que impõe suas normas inquestionáveis, o
individualismo emerge e vive uma mudança para uma autonomização que permite “maior
liberdade” nas escolhas: “Assiste-se à extensão a todas as camadas sociais do gosto
pelas novidades, da promoção do til e do frívolo, do culto ao desenvolvimento pessoal e
ao bem-estar – em resumo, da ideologia individualista hedonista” (Charles, 2004, p. 24). A
cultura hedonista traz uma necessidade de satisfação pelo prazer. Mas essa nova
perspectiva o implica que o poder de controle deixe de existir, ele foi transformado
em mecanismos que criam a idéia de possibilidade, sem uma imposição explícita. A
independência que se conquista trouxe uma dependência, uma complexidade promovida
pelo hedonismo que ocorre em graus diferentes de relação. Para o autor, não é que as
ideologias acabaram, mas que agora fazem parte do campo de escolhas pessoais e de
uma identidade.
O hipernarcisismo, diferente do narciso pós-moderno, é maduro, responsável,
flexível. O mundo é dos mais competentes, dos mais capazes de se adaptar e de
competir constantemente. O paradoxo vem de que ao mesmo tempo em que deve
assumir uma postura centrada, adulta, também aparece, por exemplo, a procura em
manter a todo custo uma juventude eterna, onde há um consumo, às vezes, compulsivo
de produtos “milagrosos” que se adequam a uma sociedade de tamanha fluidez e
superficialidade. Assim:
Os indivíduos hipermodernos são ao mesmo tempo mais informados e mais
desestruturados, mais adultos e mais instáveis, menos ideológicos e mais tributários das
modas, mais abertos e mais influenciáveis, mais críticos e mais superficiais, mais céticos e
menos profundos (CHARLES, 2004, p. 27-28).
Diante do paradoxo do individualismo o que pode acarretar é que “ante a
desestruturação dos controles sociais, os indivíduos, em contexto pós-disciplinar, têm a
opção de assumir responsabilidade ou não, de autocontrolar-se ou deixar-se levar”
(Charles, 2004, p.21). Mas mesmo tendo a opção de não assumir responsabilidade, isso
não significa que se pode destituir a responsabilidade sobre algo. Diante isso, a falta de
certezas e parâmetros ocasionada pelo declínio das estruturas tradicionais de sentido e
das ideologias levou a um stress permanente e acentuado refletindo numa luta diária em
se definir, provar sua eficácia e manter (ou conquistar) lugar no mercado de trabalho cada
vez mais competitivo.
Então, se pode afirmar que a condução da vida é de única e exclusiva
responsabilidade do indivíduo e, sendo assim, ter sucesso ou fracasso depende apenas
do sujeito. De acordo com Gaulejac (2005, p.22) “Il ne s’agit pas d’atteindre um but, il
s’agit d’être le meilleur
7
”. E como o mesmo autor enuncia, uma necessidade psíquica
de perfeição, de excelência, concretizados em conquistas de altos salários, ótimos
empregos, etc. Além disso, cabe apontar que o “ter sucesso” hoje em dia, está
relacionado ao alto poder aquisitivo e a maioria das pessoas tende a seguir esse modelo.
Para Botton (2005) hoje uma busca por status, que está cada vez mais conexo com a
condição econômica, revelando uma certa ânsia pelo dinheiro que isso pode trazer. Para
corroborar essa colocação, observei em uma parte da atividade chamadaauto-retrato” na
qual os integrantes do grupo foram solicitados a escrever no desenho o que gostariam de
receber (na mão esquerda) e conquistar na vida (na mão direita), que alguns deles
7
O trecho correspondente na tradução é: “Não se trata de atingir um objetivo, trata-se de ser mais melhor.”
colocaram essa necessidade de serem “bem – sucedidos” financeiramente em suas
respostas. O trecho onde alguns exemplos aparecem foram destacados abaixo:
- Márcia [...] Alguma coisa que eu gostaria de receber da vida eu botei amor porque na
verdade, dinheiro é alguma coisa que eu pretendo conquistar. Então eu botei na o
direita, no caso como sucesso profissional porque é o que eu quero mesmo e, para mim,
isso envolve também conseguir bastante dinheiro.
- Renato [...] Na minha mão esquerda, que é o que eu gostaria receber da vida, diferente
dela, eu falei dinheiro, o importa se recebido ou conquistado... Eu quero dinheiro. E na
mão direita, que eu realmente gostaria de conquistar, eu coloquei o reconhecimento do
meu trabalho.
- André - O que eu quero receber é dinheiro porque do resto eu consigo conquistar... Isso e
aquilo. O dinheiro é mais difícil, pois eu ainda não trabalho e nada do tipo. longe. Aos
poucos.
- Mônica - O que gostaria de conquistar é minha felicidade plena. Ter uma vida feliz e
saudável. O que eu gostaria de ganhar é dinheiro. Penso que nem o Renato, mesmo que
conquistado, dado, achado... É dinheiro. Eu sou muito consumista, eu preciso de dinheiro.
E na mão direita eu queria alcançar minha realização profissional, que eu não acho que
necessariamente tem a ver com dinheiro. Eu acho que tem a ver com a sua felicidade em
fazer o seu trabalho. Às vezes eu vou ganhar muito pouco, mas eu quero me sentir bem
trabalhando com aquilo, pois eu vou fazer aquilo a vida inteira.
- Talita - O que eu quero receber é amor, porque eu gosto de ser amada. Não é gostar
de ser amada. Talvez eu devesse ter colocado na outra mão porque é uma coisa que tem
que conquistar... De graça. Agora que estou pensando nisso. Na outra mão, uma coisa que
eu gostaria de conquistar é a realização pessoal. Realização pessoal vai envolver tanto o
lado profissional quanto o lado financeiro. Eu gostaria de fazer algo que eu goste e ganhar
bem com isso. A minha realização pessoal [é]... Algo que eu quero conquistar. Então é isso.
Como foi dito, é a lógica do consumo que agora reina, sendo caracterizada pelo
culto a emoção, prazer e superficialidade das relações. A mídia exerce uma enorme
influência sobre os costumes e comportamentos, vendendo modos de vida e identidades.
A ampliação da variedade de produtos, serviços e a competição entre as diversas marcas
estão presentes na sociedade de consumo, onde o excesso tanto na produção quanto na
necessidade de consumo e o próprio consumo são marcantes. Mesmo com essa lógica
do consumo permeando todas as relações, esta não destitui valores provindos do amor
ou voluntariado, por exemplo. Nessa inconstância do consumo, Lipovetsky (2004) declara
que a quantidade faz as pessoas mais exigentes de qualidade, não havendo a rejeição
desta como Bauman (2005) defende. Este autor coloca que nesse meio em que a
qualidade cai, é a quantidade que passa a interessar.
Nas discussões com os cosplayers, eles relatam que durante os eventos, as
pessoas estão cada vez mais críticas. Querem ver cosplayers os mais perfeitos possíveis,
exigindo um certo profissionalismo na sua elaboração. Não esperam apenas ver
cosplayers nos eventos, mas cosplayers com qualidade, isto é, com uma riqueza de
detalhes, de preferência, seguindo fielmente o personagem ao qual fazem referência. É
claro que isso envolve um gasto maior, pois se dá atenção a tudo: cor dos olhos, tipo mais
adequado de peruca, comprimento exato das roupas, entre outros aspectos. No segmento
abaixo estão algumas falas que apontam nesta direção:
- Márcia - Exigência até daquelas pessoas que vão aos eventos, mas não fazem cosplay. O
nível de exigência dessas pessoas é muito alto. Se você vai e escom cosplay mais ou
menos ninguém tira foto com você. Nem vem falar com você. Primeiro essas pessoas tiram
foto com cosplayers mais famosas, depois tiram com os mais bonitos e você, que está com
um cosplay simples, nem vem falar com você.
- Mônica – Em eventos o pessoal vaia quem sobe no palco. Isso é horrível. Nem deixam as
pessoas incentivadas. Nos eventos antigamente era mais legal. As pessoas eram menos
críticas.
- Mônica Eu já vi gente criticando por causa do cabelo. Como a roupa é simples, elas
podem criticar o cabelo.
- Talita – Eles querem o personagem pronto na sua frente.
- Renato Vocês ficam falando mal das pessoas que são mais críticas, mas eu sou assim.
Eu acho que o cosplay tem que ficar com o cabelo igual... Maquiagem. Se o cabelo for
arrepiado tem que usar direitinho.
A estruturação do tempo também sofreu mudanças, proporcionadas, sobretudo
pelos avanços tecnológicos, que levaram a uma aceleração e compressão do tempo,
vinculada a uma demanda por soluções imediatas e a curto prazo. Hoje cobrança e
estresse são inacabáveis e, em relação ao trabalho, isso fica mais evidente. O presente
passa a estar menos voltado ao viver intensamente o momento e mais direcionado a
incerteza e insegurança sobre a inserção ou manutenção de um espaço no mercado de
trabalho. Uma das conseqüências dessa aceleração na noção de tempo neste meio
reflete na necessidade diária e constante de mostrar eficiência como “garantia” para
permanecer no emprego; assim, o passado fica no passado e o presente precisa ser
constantemente validado. Nesta insegurança contínua para se manter no serviço, é
somada a vinculação do tempo com dedicação, no qual, quanto mais tempo se empenha
mais “dedicado” ao trabalho você é. Muitas vezes este aspecto é o que costuma trazer o
maior prejuízo nas relações familiares.
O capitalismo passou a organizar o tempo de trabalho que agora vai se tornando
“temporalidades heterogêneas” (Lipovetsky, 2004, p. 75): o tempo dos jovens, do
trabalho flexível, há a valorização do presente que se nota pelos trabalhos temporários,
eficácia no trabalho. Estas temporalidades se estendem aos outros aspectos da vida e
cria uma preocupação cada vez maior, pois os tempos definidos para cada atividade
muitas vezes se conflitam (exemplo: tempo para filho e para serviço).
A tecnologia também proporcionou que o tempo voltado para a reflexão e contato
com amigos fossem reduzidos e em seu lugar ocupado por formas de distanciamento das
relações face a face, como celular, trocas de mensagens virtuais, uso de ipod, resultando
muitas vezes em relações distanciadas, rápidas e até sem profundidade. A ordem agora é
a superficialidade. Conforme Bauman (2005, p. 33): “Com o mundo se movendo em alta
velocidade e em constante aceleração, você não pode mais confiar na pretensa utilidade
dessas estruturas de referência com base na sua suposta durabilidade”. Nem faz sentido
tê-los hoje em dia. Verifica-se um encurtamento do tempo de “vida útil” dos
comprometimentos, ou até mesmo o aparecimento dessa validade onde o existia. A
configuração dentro dessa lógica econômica do consumismo leva:
tanto a angústia existencial quanto o prazer associado às mudanças, o desejo de
intensificar e reintensificar o cotidiano. Talvez esteja o desejo fundamental do
consumidor hipermoderno: renovar sua vivência do tempo, revivificá-la por meio das
novidades que se oferecem como simulacros de aventura. É preciso ver o hiperconsumo
como uma cura de rejuvenescimento que se reinicia eternamente. Dessa maneira, o que
nos define não é bem o “presente perpétuo” de que falava Orwell, mas antes um desejo de
perpétua renovação do eu e do presente. (LIPOVETSKY, 2004, p. 79-80).
Então, não é que o passado e o futuro foram descartados, houve uma
reconfiguração da sua importância baseada neste presente em destaque. A importância
que se ao novo é acompanhada do aparecimento de momentos de expressão das
identidades nacionais, étnicas, regionais. A hipermodernidade não está paralisada num
presente eterno, mas nas palavras de Lipovetsky (2004) num “presente paradoxal” que
vai transformando e reformulando o passado.
O que era objeto de tradição ou de “autenticidade” virou produto de consumo
cultural, havendo uma mercantilização da cultura. Reviver o passado dentro dessa lógica
evidencia a comercialização temporal, sendo este o selo de importância que se ao
“antigo”. Pode-se dizer que atualmente o consumo comercial do tempo e da memória.
Assim:
o passado não é mais socialmente instituidor nem estruturante; está renovado, reciclado,
mas ao gosto de nossa época, explorado com fins comerciais. A tradição não mais convoca
à repetição, à fidelidade e à revivescência das coisas imutáveis de outrora: ela se tornou
produto de consumo nostálgico ou folclórico, mera olhadela para o passado, objeto-moda.
(LIPOVETSKY, 2004, p. 89-90).
o futuro não é mais aquele que contém promessas de um mundo melhor, mas
sim povoado de incertezas e preocupações, a confiança se tornou instável. Como o futuro
está imerso nessas inquietações tanto os próprios jovens quanto seus pais buscam desde
cedo que a educação propicie cada vez mais condições para enfrentar os desafios
posteriores. O hiperindividualismo passa então a dar valor à prevenção, projeção e
articulação entre presente e futuro. A prevenção e a tentativa de previsão podem vir
associadas à crença na ciência. Por exemplo, vincular os avanços tecnológicos a um
aumento da expectativa de vida e da qualidade desta ou, através da preocupação com a
saúde, a adoção de um controle sobre a dieta alimentar e exercícios físicos diários
visando um futuro mais saudável. Há, com isso, um declínio da cultura do carpe diem.
Como Lipovetsky (2004, p. 73) aponta: “[...] o hiperindividualismo é menos instantaneísta
que projetivo, menos festivo que higienista, menos desfrutador que preventivo, pois a
relação com o presente integra cada vez mais a dimensão do porvir”.
O hiperindivíduo é, desta forma, marcado pela virtualidade e presença, efêmero e
necessidade de permanência, é o encontro de paradoxos e não o “’escravo’ da ordem
social que exige eficiência, tanto quanto não é produto mecânico da publicidade. Outras
motivações, outros ideais (relacionais, intimistas, amorosos, éticos), não param de
orientar o hiperindivíduo” (Lipovetsky, 2004, p. 82).
Sobre a virtualidade, recorro à obra de vy (1996). Ele revela que o mundo hoje
passa por um processo de virtualização em vários âmbitos: nas relações, comunicação,
informação, sensibilidade e, inclusive, influencia diretamente a nossa formação.
Primeiramente, é importante que se defina o que seria virtual. A origem da palavra virtual
deriva do latim medieval virtualis que vem de virtus, força, potência. “Na filosofia
escolástica, é virtual o que existe em potência e não em ato. O virtual tende a atualizar-se,
sem ter passado, no entanto à concretização efetiva ou formal” (Lévy, 1996, p. 15). Neste
sentido o virtual é um modo de ser poderoso, pois ele permite que haja outras formas de
ser, ultrapassa os limites normais, não se contrapondo ao real, mas ao atual. O real para
Lévy seria a objetivação de um possível que estava latente, atributo da natureza. Em
relação ao virtual, pode-se dizer que ele seria uma “abertura do real, do que é
considerado objetivo, já determinado.
A virtualização diferentemente da atualização, é dinâmica, é tornar virtual o atual.
Em outras palavras, virtualização é “uma mutação de identidade, um deslocamento do
centro de gravidade ontológico do objeto considerado: em vez de se definir principalmente
por uma atualidade (uma ‘solução’), a entidade passa a encontrar sua consistência
essencial num campo problemático” (Lévy, 1996, p.17-18). O virtualizar não é se fixar em
algo permanente, mas sempre problematizá-lo, tornando fluidas as atualidades. Além
disso, neste processo o que permeia é a indeterminação e uma procura por atualização (ir
do virtual ao atual). A virtualização descrita por Lévy é semelhante ao que Bauman (2005)
denomina de “liquefação”, que é caracterizado por ser uma quebra da solidez das
estruturas e instituições sociais para uma forma fluida que o se mantém por muito
tempo.
Relacionada ao espaço e ao tempo, a virtualização seria o fato de se recortar o
espaço-tempo habitual, é o desterritorizar e o destemporalizar. É claro que a virtualização
não está livre da referência espaço-tempo, “uma vez que devem sempre se inserir em
suportes físicos e se atualizar aqui ou alhures, agora ou mais tarde” (Lévy, 1996, p. 21). O
virtual não é imaginação, somente tem algumas características parecidas como o fato de
se tratarem de “não-presenças”. É, na verdade, um modo de ser que vai possibilitar outras
relações e ritmos.
A virtualização como deslocamento para a problemática é observado na identidade
clássica. Como o uma identidade hoje definida, pré-estabelecida, pode-se dizer que
houve uma virtualização dela: “a virtualização é sempre heterogênese, devir outro,
processo de acolhimento da alteridade” (Lévy, 1996, p. 25). Esta troca contínua e fluida
da identidade não traz uma idéia sólida de que o indivíduo se torne “senhor de si mesmo”,
mas sim traz uma desestabilização da pessoa.
Quanto menos as normas coletivas nos regem nos detalhes, mais o indivíduo se mostra
tendencialmente fraco e desestabilizado. Quanto mais o indivíduo é socialmente cambiante,
mais surgem manifestações de esgotamentos e “panes” subjetivas. Quanto mais ele quer
viver intensa e livremente, mais se acumulam os sinais do peso de viver. (LIPOVETSKY,
2004, p. 84).
Porém ao mostrar a fluidez das identidades, não está se afirmando que são formas
negativas de ser, mas sim quais são as saídas ou transformações que estão acontecendo
para se adaptar a essa instabilidade que o mundo se apresenta.
É claro que essas mudanças trazem conseqüências. Com o decréscimo das
influências estrutural e organizadora de instituições coletivas como a familiar, religiosa,
políticas, a cultura na hipermodernidade implicou numa fluidez do eu que podem
repercutir em sintomas psicossomáticos, depressivos, compulsões. Alguns autores
afirmam que estes seriam as resistências contra as características presentes na
sociedade atual. Segundo Costa (2004) as resistências são de duas ordens: a primeira
provém da fraqueza dos excessos, por exemplo, estresse, insônia, depressão,
hiperatividade, anorexia, e a outra se origina da procura de alternativas como práticas
espirituais ou corporais para fugir deste ciclo que o mercado impulsiona. Porém, a meu
ver, a primeira não seria uma resistência, mas sim uma exacerbação da cobrança e
aceleração, muitas vezes resolvida com medicamentos, o que leva a um retorno ao
consumo acrítico; enquanto na segunda opção, deve-se estar atento se o modo
alternativo apresentado, não se trata de uma variação do que é oferecido pelo mercado
de consumo.
Outro fato associado a virtualização é a passagem do interior ao exterior e vice-
versa. O capitalismo e outras características citadas anteriormente permitiram vincular a
posição do homem a algo coisificado. Como Lévy cita é um “efeito Moebius” que ocorre
entre vários aspectos: público e privado, subjetivo e objetivo. As fronteiras do real diluem-
se no virtual, pois só no real que elas são definidas claramente.
Como uma forma de entender melhor a virtualização, focaremos na questão do
corpo. Mas por que pensar sobre o corpo na hipermodernidade? Percebo que como
outras questões, o corpo passou por transformações na sociedade de consumo e
compartilha de seu desenvolvimento. Antes o corpo era necessário em razão de sua força
muscular, sendo posteriormente substituído pelas máquinas. Neste momento, essas
transformações chegaram ao ponto no qual,
le corps s’inscrit aujourd’hui dans la société marchande et participe de la transformation
progressive du non-marchand en marchand, il est objet de réflexion pour l’individu qui
s’intéresse à sa propre personne mais aussi au regard que les autres vont porter sur lui, il
s’inscrit dans une démarche de recherche constante de la performance et de la maîtrise de
soi
8
(TISSIER-DESBORDES, 2005, p. 32).
Produtos para o corpo, academias de ginástica e medicamentos não param de
crescer. E o que antes poderia ser feito artesanalmente ou gratuitamente para cuidar do
corpo, hoje é transformado em algum produto comercializado. Por exemplo, para que
tomar chá verde, se você pode comprar uma cápsula desse chá? Tomar banho para
relaxar? Melhor se for num spa, coberta de pétalas vermelhas, com som ambiente e
massagem, inseridos num pacote especial que fazendo duas sessões você ganha 10%
na seguinte.
Portanto, na época atual o corpo é um exemplo evidente da virtualização do mundo
hipermoderno, pois tudo nele se modifica e é manipulado, desde sua imagem, através do
consumo de produtos, até a intervenção de modo evasivo, por cirurgias plásticas visando
modelá-lo. também a possibilidade de consumir medicamentos com o objetivo de
alterar o metabolismo. Em relação a virtualização dos sentidos, esta pode ser observada
pelo uso do telefone (audição) e da televisão (visão), por exemplo. A projeção ocorre pela
ação, com a desterritorização seja pelos meios de transporte; pela imagem através da
telepresença; ou pelo telefone, que leva a voz a lugares distantes, separando-o do corpo.
O corpo é projetado no virtual. Passa-se a ter um “hipercorpo”, um organismo híbrido, que
pode ser fragmentado, acrescentado, reduzido e partilhado.
Há um remédio para todo mal, podendo até se criar uma enfermidade para que, em
seguida, surja no mercado uma pílula para ele. Ser fraco, doente, o ter o corpo como
gostaria, não é desculpa. Ninguém tem tempo para ouvir lamentações. O jeito é agir.
8
O trecho correspondente na tradução é: “o corpo se inscreve hoje na sociedade do mercado e participa da
transformação progressiva do não-mercado em mercado, é objeto de reflexão para o indivíduo que se interessa por si
mesmo, mas também no olhar que os outros vão ter sobre ele, ele se inscreve numa diligência de busca constante de
desempenho e de controle de si”.
Como? Faça ginástica! Compre remédios! ao cirurgião! E “ao persistirem os sintomas
o dico deverá ser consultado”. Com isso, novas soluções serão recomendadas e o
ciclo continuado. Como declara Tissier Desbordes (2005, p. 34) “La science,
entransformant le corps, va donner l’illusion d’une transformation de l’identité
9
”.
Conforme apontado, houve uma desqualificação da tristeza, vinculando sua
permanência aqueles que não correram atrás de uma solução. O espaço para a dor ou
sofrimento foi reduzido. Por isso, atualmente, a felicidade é mais que um direito; é um
dever de todos. E esse foco numa alegria que deve sempre estar presente, apareceu nos
discursos dos cosplayers, participantes do grupo, quando estes foram solicitados a
colocar qual seria o lema de vida de cada um, na dinâmica do “Auto-retrato”. Abaixo estão
as falas apresentadas:
- Márcia - O que eu coloquei como lema de vida, é algo que eu falo muito. Parece meio
clichê, mas como eu falo, eu deixei: “No final tudo fica bem, se não está bem é porque
ainda não acabou...”.
- Renato - No lema da minha vida, eu botei... Na verdade é uma frase enorme, mas é uma
compilação de coisas que eu costumo dizer bastante numa dessas conversas filosóficas
com as pessoas, que é a seguinte: “Seja sempre positivo, nunca se deixe abater e
aproveite o melhor que puder o presente. No final, o que conta são as recordações e os
momentos intensos que você viveu”.
- André - Como lema de vida eu coloquei uma frase que eu sempre falo “Seja sempre você
mesmo, sem utilizar máscaras e seja feliz desse modo”.
- Mônica - Como lema de vida, parece bobo, mas eu coloquei “Hakuna Matata” porque é
um lema bom. Assim, acho que as pessoas têm que viver e esquecer um pouco dos
problemas, tentar viver na paz. Assim, sem botar muito empecilho na vida. Tem gente que
por qualquer coisinha pequena a pessoa transforma numa montanha e acho que isso
não vale a pena. Você tem que viver bem e relaxado.
- Talita - Como lema de vida eu coloquei a coisa mais clicdo que qualquer um que
colocaram aqui que é Carpe Diem. Porque realmente a gente tem que viver todos os dias
como se fossem os últimos. Viver tudo por momentos. Não pensar no dia seguinte, não
pensar no que vai ser depois.
Somado a isso se pode observar uma adequação dos homens ao perfil trazido
pelas máquinas (Belli, 1998). Hoje, a alta produtividade, multifuncionalidade e eficácia
diária podem ser atribuições de um bom funcionário ou de um novo aparelho eletrônico.
E, da mesma forma que uma máquina é descartada quandoo mais funciona, o
empregado é demitido quando é considerado inválido. O ser humano, com isso, passou a
ser identificado com uma quina, e “deixa de ser verbo para ser substantivo” (Ciampa,
1994, p. 72), o que implica em um deixar de ser proprietário, um ser humano, um
realizador de suas atividades, para se transformar, ele mesmo num produto. Sendo
talvez, o único verbo incentivado, o de consumir.
A virtualização do corpo é inclusive constatada quando uma externalização de
suas funções internas e dele próprio, pelo desenvolvimento de um comércio voltado a sua
9
O trecho correspondente na tradução é: “A ciência, transformando o corpo, vai dar a ilusão de uma transformação da
identidade”.
manipulação. O tornar externo o que era interno pelo raio x, por exemplo, é uma forma de
virtualização, assim como o deslocamento e trocas de parte dele como acontece quando
um transplante. As fronteiras o cada vez mais difíceis de serem delimitadas. Pode
parecer que praticar esportes que desafiam os limites humanos são formas de ir contra a
virtualização do corpo, pois intensificam o “aqui-agora” e sua noção de mortalidade.
Porém, esse desvio da norma, como se tendesse a uma metamorfização do corpo se
transformando em um pássaro ou peixe, indo ao limite entre o ar e água, vida e morte,
mostra que o indivíduo vive outros mundos e experimenta outros modos de ser, havendo
assim a virtualização.
Diante de todos esses aspectos é como se atualmente houvesse o poder de
reinventar o corpo. Torná-lo “flexível”. E, por ele fazer parte da identidade, através do
caráter mutável que hoje se apresenta, podem-se criar várias formas de ser com a
manipulação dele. Seguindo esse pensamento, então o cosplay (o vestir-se como um
personagem) seria uma identidade criada pela projeção de uma imagem que se torna
quase presente através da pessoa que se veste. Em razão dessa variedade de formas de
ser e agir, facilitadas pelo consumo, e como o foco deste trabalho é o de refletir sobre
essa nova forma de identidade, o tema “identidade” será dado maior atenção no capítulo
quatro.
1. 2 - VIRTUALIZAÇÃO DA FAMÍLIA
Mediante todos esses desdobramentos que incidiram na sociedade em geral, Ianni
(1997, p. 29) relata que “Ao mesmo tempo que se constitui e movimenta, a sociedade
global subsume e tenciona uns e outros: indivíduos, famílias, grupos e classes, nações e
nacionalidades, religiões e línguas, etnias e raças”. Abordei aqui a família, como uma das
dimensões que tem sofrido os maiores abalos e que está formando novos ajustamentos.
A família como responsável pela educação o aparece de forma tão preeminente
nem os pais são considerados os detentores do saber como em épocas anteriores.
Nascidos em um mundo onde as tecnologias são vistas como naturais; crianças e
adolescentes se mostram habilidosos no uso desses instrumentos até mais do que seus
pais, o que evidencia a desconstrução da posição de maior conhecimento dos adultos.
Inclui-se aqui o fato de que por volta de 1960, com a inserção das mulheres no mercado
de trabalho, houve uma reestruturação do modelo familiar, assim, atualmente, ambos os
pais trabalham e, muitas vezes, a mulher é quem contribui com os maiores retornos
financeiros. Hoje, com essa ausência dos pais por um período maior de tempo,
decorrente de uma exigência e insegurança cada vez maiores no trabalho, houve uma
diminuição do convívio com o que antes se tinha como referência de bases estáveis,
criando um espaço propício para que os meios midiáticos se tornassem mais presentes
como veículos de socialização e identificação dos jovens. Segundo Severiano e
Estramina (2006, p. 36) “A individualidade do sujeito parece ter sido subordinada a tal
ponto aos ideais do consumo que ele passa a conceber o objeto como fonte de
referência, como principal suporte da identidade”.
Pode-se também inferir que com a busca do “ideal jovem” veiculado pela mídia,
muitos adultos deixaram seu lugar de orientadores dos filhos, para partilharem deste
“mundo jovem”, saindo com os filhos, “ficando” e freqüentando os mesmos lugares que
eles, o que diminui a diferença entre gerações.
Essa mudança de referência é também corroborada por Sarlo (2000) ao colocar
que quando a religião, ideologias, escola, política, família e comunidade não servem de
base de identificação ou de valores, tanto em função da debilidade das autoridades
quanto pela inserção do mercado, este aproveita a “demanda simbólica” para inserir seus
produtos que são aceitos mais prontamente. Costa (2004) revela que a falta desses ideais
mais duradouros é o que se tem de mais danoso na sociedade consumista atual, pois não
é substituído por nada equivalente. Para ele, nossa cultura tornou-se “uma cultura do
imediato, do descompromisso consigo, com o outro e com o devir de todos” (Ibid., p. 85).
O que também se pode notar atualmente é que não parece haver uma
valorização dos meios midiáticos em detrimento de organizações como escola e família,
como estas inclusive adquiriram características “(...) hedonistas, imediatistas e produtoras
de demandas por consumo rápido” (Mancebo, 2003, p. 81). O que era então um modelo
baseado na tradição e em condições de certa forma duradouras, hoje se apresenta como
uma questão de estilo de vida, possibilitando a “escolha” de que tipo de identidade
pretende adotar. Agora, os jovens que vão crescendo nesse meio,
Encontram momentos e locais extremamente favoráveis para o desenvolvimento de suas
atividades diferenciadas e relativamente autônomas em relação aos adultos. Fugindo das
instituições já sedimentadas da modernidade o sistema escolar (...) os grupos juvenis
caíram nas malhas de novas instituições que eles próprios ajudaram a construir ou
sedimentar (GROPPO, 2000, p. 52-53).
Conforme mencionado, na ausência dos pais, as mídias eletrônicas passam a ser a
companhia necessária e fonte de distraimento dos filhos. A televisão é um exemplo de
mídia que conseguiu preencher esse espaço, proporcionando modelos e servindo como
agente socializador. Em relação às referências, não a televisão como quaisquer outros
meios de comunicação de massa, como os quadrinhos, tornaram espaços míticos, nos
quais se encontra uma variedade de “deuses” que mesmo distantes (por serem deuses)
se tornam próximos, pois “apenas” uma tela ou papel os separa. Esses vínculos
produzidos com os personagens midiáticos são fortes, pois atendem as demandas
afetivas de atenção, convivência, proximidade e uma “intimidade” que não causa
desgaste. Mas ao mesmo tempo são temporários, pois a partir do momento que ele perde
seu valor simbólico, ele é descartado. No encontro que realizei, vários cosplayers
relataram que aprenderam muito com mangás e animes e que, através do processo de
identificação com os personagens, muitos deles passaram a comparar sua atitude com a
dos personagens e a rever seus posicionamentos frente a diferentes situações,
encarando as questões vividas sem um nível alto de tensão. As falas seguintes foram
algumas respostas dos participantes sobre o meu questionamento sobre se eles tiram
algumas lições ao ler ou fazer cosplay:
- Márcia - Na verdade todos os otakus10 são uma mistura de todos os personagens de
todos os animes que ele já assistiu.
- Márcia - Tem gente que fala “Terapia para qse existe Fruits Basket?” É uma lição de
vida. É um mangá de auto-ajuda. Eu tenho milhões de problemas e qualquer um deles você
em algum dos personagens, e eles resolvem. E você pára e pensa: “Eu também posso
resolver meus problemas”. O mantrata, lida muito com sentimentos, então é muito com
uma coisa interior. Todo mundo tem problemas. Beleza, você tem problemas, assim como
eles, mas eles estão vivendo, não estão? A história do mangá correndo, a sua vida
também e no final tudo dá certo, sabe?
Em outro momento perguntei o que modificou neles ao lerem ou fazerem cosplay. Resgato
dois relatos:
- Mônica - No meu caso parece meio clichê, mas eu acho que lendo as histórias, você se
identifica com aqueles personagens excluídos, mas acabam [os personagens] arrumando
amigos e arrumando pessoas que eles gostam e eles vivem felizes para sempre.
- Facilitador - Dê um exemplo
- Mônica - Eu pensei no Keitarô de Love Hina. Ele era o feioso, o excluído do colégio, que
não pegava ninguém e não passou no vestibular. Love Hina é muito bom para
vestibulandos e no final do mangá ele entra em História e vira um grande historiador.
Parece meio clichê, mas eu tiro a lição de acreditar em mim mesmo.
- Márcia - Uma coisa engraçada é que na época que eu fui prestar vestibular pela primeira
vez, foi quando começou a sair [o mangá] Love Hina e eu nunca tinha lido ou assistido o
anime. Eu sabia da história sica, mas não sabia tudo. Eu lembro que quando saiu o
volume que eles estavam reprovados no vestibular, foi logo depois que eu vi o resultado da
UFRJ e não tinha passado. E eu fiquei assim: “Ai! Caraca! Eu, o Keitarô e a Naru não
passamos no vestibular”. Era nós três. Não era eu. Era eu e mais os dois no mangá.
Depois eu continuei lendo e eles passaram... Então eu vou passar também [pensou]. É
claro que não foi por isso, eu estudei, mas você se sente melhor [...] Foi exatamente isso,
eu olhei para o mangá e vi que o era a única, eles também não passaram. Não é como
10
Quando foi solicitado que os participantes do grupo explicassem o que seria esse termo, eles colocaram que era tipo
o “nerd” no Japão, só que lá teria uma conotação um pouco pior. Segundo Barral (2000, p. 15), um jornalista que vive no
Japão desde 1986 e escreveu um livro sobre os otakus, estes seriam “os catalisadores dos excessos da sociedade
nipônica nos três domínios [educação, informação e consumo], e, como tal, carregam os estigmas. Indubitavelmente,
não são eles os doentes, mas sim a sociedade que os engendrou”. Para o autor, otakus são as pessoas que não se
encaixaram na sociedade japonesa, e acabam se fechando em um mundo virtual, preferindo, então, um mundo mais
previsível e confiável.
Barral (2000) explica que o termo otaku contém dois significados que já existiam e, foi logo aceito para designar o
fenômeno, por serem as características principais que o definem. Estes são: distanciamento das relações pessoais e
isolamento na casa, mais especificamente no quarto. As convivências virtuais são vistas como mais seguras.
Quando o termo otaku foi difundido no Brasil, ele era uma expressão positiva, pois os fãs de anime e mangá o
utilizavam. Significava justamente as pessoas que eram s de anime e mangá. Porém, aos poucos, também foi
adquirindo um tom mais pejorativo, referindo-se aqueles que são viciados em anime e mangá, agindo de uma maneira
considerada “exagerada” por esse grupo, pois falam nisso, a vida gira em torno deste assunto. Apesar dessa
mudança, o termo otaku continua sendo utilizado pelo grupo aqui no Brasil nos dois sentidos. O que costuma diferenciar
quando se fala no sentido negativo, é que eles normalmente usam a expressão “otakus nerds”.
Figura 1 - Yuki do mangá Fruits Basket
[se] eles fossem personagens criados, era como se eles existissem e não tivessem
passado, porque para mim, quando você se envolve com qualquer história, não anime,
mangás, mas um livro também, às vezes novela... As pessoas se envolvem, mas não
admitem, porque novela é uma coisa mais popularizado demais. Mas as pessoas também
se envolvem com isso. Mas, então, tipo...você pensa: “Caramba! Aquele personagem fica
realmente triste, ou realmente feliz, porque aquele personagem realmente existe para
você”.
Porém, o estou afirmando que por conta desse declínio de referências estáveis
como os pais, o jovem absorve sem questionar o mundo apresentado pelos meios de
comunicação, pelo contrário, “Os diversos papéis que vive e os diferentes códigos que
aciona lhe fornecem um repertório simbólico e cultural que invalida a idéia de que, pelo
fato de ver tevê regularmente, possa se tornar um “mero joguete” da cultura de massas”
(Velho, 1999, p. 69). Uma das participantes do grupo de cosplayers entrevistados falou de
um cosplay que pretende realizar, na qual ela se identifica muito, que seria o Yuki do
mangá Fruits Basket. Ela relata que apesar de se identificar muito com a sua história diz
que não iria agir diferente por usar a roupa deste personagem. Segundo ela:
- Mônica - Se eu ficasse com a roupa dele, eu acho que agiria normal, porque eu gosto
do jeito que sou agora: mais escandalosa, mais espontânea e ele é mais caladão.
Sabe, eu demorei tanto para conseguir ser assim. Eu era tão tímida que eu não queria
voltar... Acho que é regredir.
Por conta da culpa que alguns pais sentem em relação à falta de tempo com os
filhos ou por uma espécie de fuga das cobranças diárias, muitas vezes o consumo se
insere como forma de alívio para esses pesares. Sevcenko (2001) ao estudar a sociedade
do espetáculo declarou que em conseqüência do processo capitalista difundido, o
consumo passou a ser uma fuga e/ou remédio para desejos reprimidos. E, assim, a lógica
do consumo se perpetua. Deve-se observar com este quadro, a relação intrínseca que se
estabeleceu entre juventude, tecnologia e cultura de massas. O “tempo livre” passou a
significar “tempo de consumo”, e é claro que a propaganda encontra aqui um campo fértil,
onde crianças e adolescentes passam a ser considerado potenciais consumidores. Então,
não somente houve uma reestruturação com relação à transmissão do saber como
também pode se considerar que ocorreu uma degradação do modelo hegemônico de
família nuclear, que se estenderam as outras instituições e também à própria política:
Homens e mulheres percebem que muitas das perguntas próprias dos cidadãos - a que
lugar pertenço e que direitos isso me , como posso me informar, quem representa meus
interesses - recebem sua resposta mais através do consumo primado de bens e dos meios
de comunicação do que nas regras abstratas da democracia ou pela participação coletiva
em espaços públicos. (CANCLINI,1999, p. 37).
Neste momento de inserção dos meios eletrônicos no ambiente familiar e a
reestruturação das relações neste contexto, gostaria de relatar um texto intitulado
“Redação de menino”
11
que, ironicamente foi lido em um programa de televisão, e o qual
escolhi para ilustrar esse fato.
A professora pediu aos alunos que fizessem uma redação e nessa redação o que
eles gostariam que Deus fizesse por eles.
À noite, corrigindo as redações, ela se depara com uma que a deixa muito
emocionada.
O marido, nesse momento, acaba de entrar, a vê chorando e diz:
"O que aconteceu?"
Ela respondeu: "leia". Era a redação de um menino.
"Senhor, esta noite te peço algo especial: me transforme em um televisor. Quero
ocupar o seu lugar. Viver como vive a TV de minha casa.
Ter um lugar especial para mim, e reunir minha família ao redor. Ser levado a sério
quando falo. Quero ser o centro das atenções e ser escutado sem interrupções nem
questionamentos. Quero receber o mesmo cuidado especial que a tv recebe quando não
funciona. E ter a companhia do meu pai quando ele chega em casa, mesmo que esteja
cansado. E que minha mãe me procure quando estiver sozinha e aborrecida, em vez de
ignorar-me. E ainda que meus irmãos "briguem" para estar comigo.
Quero sentir que a minha família deixa tudo de lado, de vez em quando, para passar
alguns momentos comigo. E, por fim, que eu possa divertir a todos.
Senhor, não te peço muito... Só quero viver o que vive qualquer televisor!"
Naquele momento, o marido da professora disse:
"Meu Deus, coitado desse menino. Nossa, que coisa esses pais".
E ela olha e diz:
"Essa redação é do nosso filho".
1. 3 - GLOBALIZAÇÃO EQUIVALE A MUNDO HOMOGENEIZADO?
Ao tratar de globalização, muitos autores a entendem como o mundo se tornando
homogeneizado nos gostos, atitudes e produtos que consomem. A homogeneização do
mundo é vista como fato evidente por parte deles, pois ao contrário seria considerado
“desqualificado como nostálgico do nacionalismo” (Canclini, 2003, p. 8). Eles também
defendem que a globalização procura a homogeneização com a exclusão dos diferentes.
Ianni (1997) defende que a globalização não leva a homogeneização. Para ele, essas
transformações ou novas realidades que estão acontecendo agregam, originam ou
recriam outras formas de ser neste mundo, outras singularidades e identidades, imersas
11
Texto disponível em: < http://maisvoce.globo.com/mensagem.jsp?id=16510>. Acesso em: 09 set. 2006.
em uma multiplicidade que, muitas vezes se chocam. Porém Canclini (2003, p. 46)
declara que “A globalização o apenas homogeneíza e nos aproxima, mas também
multiplica as diferenças e gera novas desigualdades (...)”.
Assim, autores que, como Ianni, defendem que uma certa adaptação do que
é imposto de fora que pretendo focar neste trabalho e, associado a isso, idéias, como
a de Canclini (2003) que alertam para o fato de que a globalização não é a circulação e
mútua influência de todas as nações do globo, mas sim um processo onde o ocidente dita
as regras e o resto dos países as absorve.
O termo “creolization” em inglês ou “glocalização”, é muitas vezes empregado por
antropólogos e lingüistas para se referir as mesclas interculturais notadas na língua ou
cultura. De acordo com Canclini (2003), se conceber que a globalização ocorreu na
segunda metade do século XX deve-se diferenciar esta da internacionalização e da
transnacionalização. A internacionalização originou com as navegações, colonização,
onde havia troca de informações, objetos e cultura. Era a “abertura das fronteiras
geográficas de cada sociedade para incorporar bens materiais e simbólicos das outras”
(Canclini, 1999, p. 41). Esse mercado mundial que se instalava era marcado por um
protecionismo local. A transnacionalização se observa a partir do começo do século XX
com a transposição de empresas e negócios em locais diferentes de sua nação de
origem, porém conservando traços que marcam sua identidade nacional. A globalização
surge de uma exacerbação de alguns pontos desses aspectos anteriores em escala
mundial que foram facilitadas pelo desenvolvimento tecnológico, diferenciando daqueles,
qualitativo e quantitativamente. Mas
também foi preciso que os movimentos transfronteiriços de tecnologia, bens e finanças
acompanhados por uma intensificação de fluxos migratórios e turísticos que favorecem a
aquisição de línguas e imaginários multiculturais. Nessas condições é possível, além de
exportar filmes e programas televisivos de um país a outro, construir produtos simbólicos
globais, sem ancoragens nacionais específicas, ou com várias ao mesmo tempo, como os
filmes de Steven Spielberg, os videogames e a world music (CANCLINI, 2003, p. 42-43).
A globalização é vista em se tratando de economia por expandir seus mercados a
nível mundial e destituir alguns poderes nacionais. Ela acabou com algumas barreiras o
que permitiu que produtos de outros países entrassem no mercado global, em uma
velocidade cada vez maior. Esse contato com culturas tão distantes teve como um dos
facilitadores o aprimoramento tecnológico que proporcionou a criação de vários meios
comunicacionais e de locomoção. Woodward (2000, p. 20) define a globalização como um
processo que “envolve uma interação entre fatores econômicos e culturais, causando
mudanças nos padrões de produção e consumo, as quais, por sua vez, produzem
identidades novas e globalizadas”. A globalização cultural segundo Befu (2003) pode se
dar de duas formas: a primeira pelo deslocamento de pessoas e a segunda através de
produtos culturais sem as pessoas. Assim, não pelas migrações em busca ou em
razão de trabalho, congresso, turismo, mas também por encontros através de meios
midiáticos, por exemplo, cada vez mais sofisticados é que o mundo foi tornando-se
intercultural (Canclini, 2005).
Pela internet ou pela televisão é possível estar em contato com vários países, e em
nosso convívio diário, produtos alimentícios, eletrônicos e musicais de diferentes
localidades podem ser encontrados com facilidade. Eles passaram a fazer parte do
cotidiano e foram obtendo significados nacionais “Em poucos anos, as economias dos
países grandes, dios e pequenos passaram a depender de um sistema transnacional
do qual as fronteiras culturais e ideológicas se desvanecem(Canclini, 2005, p. 19). O
próprio processo de conhecimento do que seriam animes e mangás pelos cosplayers,
integrantes do grupo focal, é um exemplo de como essa inserção de produtos
estrangeiros foi fazendo parte de uma atividade cotidiana. O primeiro contato com esses
produtos, normalmente, foi através da televisão, mais especificamente na Tv Manchete, a
qual exibia os animes. Posteriormente, a internet serviu para encontrar novos animes (ou
até saber o que eram animes) e mangás, desvendar outros produtos a ele vinculados,
sendo também um meio de troca das descobertas entre os interessados. A seguir um
trecho para ilustrar como esses meios participam desse processo de inserção de produtos
de outros locais:
- Márcia - No nosso caso [Márcia e Mônica] a gente via [anime na televisão] muito
tempo. Desde 94, 95 a gente assistia quando passava na Manchete. Depois ficou um
tempo meio morno que não saia nada no Brasil, mas ainda tinha um ou outro ali. Depois
voltou, apareceram muitas coisas e a gente continuou e aí, logo depois tinha uma época
que as pessoas começaram a ter mais internet. Tipo, a gente, por exemplo, não usava
internet. A gente foi ter internet em 98/97... A gente nem tinha computador em casa antes
dessa época. Aí que começou...Usa internet, procura site, procura isso, procura aquilo...
a gente começou a descobrir outros mangás, outros animes que o tinham no Brasil.
tinha naquela época o mIRC
12
, que virou febre por aqui.
- Renato - Que saudade!
- Márcia - Todo mundo achava tudo no mIRC. Todo mundo trocava arquivos no mIRC. Foi
aí que a gente começou a pegar anime.
- Talita - Eu não peguei essa parte
- Renato - Eu peguei todas essas etapas.
- Márcia - nessa época do mIRC tinha também o ICQ
13
. A moda era ICQ. E todo mundo
se falava pelo ICQ e tinha aquela coisa de trocar ICQ. E quando alguém achava um anime
legal, ele passava para todo mundo e logo a notícia se espalhava. E isso foi na época
que nem tinha orkut. Se fosse hoje em dia...
12
É um popular IRC, isto é, Internet Relay Chat. É um programa gratuito que permite conversar com pessoas de
diferentes localidades em tempo real. Ele também oferece a possibilidade de troca de arquivos entre os participantes.
13
É uma sigla que representa a pronúncia em inglês das palavras “I seek you”, em português, “eu procuro você”. É um
programa com as mesmas características do mIRC, que tem a finalidade de permitir que pessoas se comuniquem
instantaneamente de lugares distintos.
É também neste cenário que se insere o desmembramento das empresas por
vários países na busca por lucros, com a contratação de mão-de-obra mais barata,
recursos mais acessíveis e menos impostos. Com isso, a interdependência passou a ser
relacionada a vários aspectos, tais como: econômico, financeiro, comunicacional, que leva
a novos meios de se estruturar.
Canclini (2003) aponta que apesar de se utilizar constantemente a palavra
globalização, sua definição não é consensual. Alerta para dois pontos que costumam
aparecer em algumas bibliografias: 1) equivaler globalização a neoliberalismo, isto é,
basear em um único paradigma e 2) pensar na pluralidade de narrativas.
Quando se fala em globalização, normalmente vem a idéia de uma concepção
ocidental (norte-americana) que se difunde pelo resto do mundo. O ideal é que a
multiplicidade fosse adotada e o a diversidade, pois como Silva (2000, p.100-101)
aponta:
Tal como ocorre na aritmética, o múltiplo é sempre um processo, uma operação, uma ação.
A diversidade é estática, é um estado, é estéril. A multiplicidade é ativa, é um fluxo, é
produtiva. A multiplicidade é uma máquina de produzir diferenças diferenças que são
irredutíveis à identidade. A diversidade limita-se ao existente. A multiplicidade estende e
multiplica, prolifera, dissemina. A diversidade é um dado da natureza ou da cultura. A
multiplicidade é um movimento. A diversidade reafirma o idêntico. A multiplicidade estimula
a diferença que se recusa a se fundir com o idêntico.
Pode-se dizer que antes, os EUA era o centro do poder, a cultura de referência.
Com o passar do tempo, outros países como o Japão começaram a ganhar espaço e,
aquele poder de influência, centrado na hegemonia norte-americana, foi perdendo seu
status e descentrando seu poder (Iwabuchi, 2002).
1. 4 – JAPONIZAÇÃO
Japonização ou niponização é o termo que Befu (2003) se refere à inserção da
cultura japonesa pelo mundo. Como Hao e Teh (2004, p. 18) afirmam “as the marketing of
Japanese cultural products expands beyond its own shores, the impact of the Japanese
popular culture begins to be felt overseas, especially in Asian Countries that share cultural
similarities with Japan”
14
.
A palavra “cultura” pode se referir a três significados, segundo o dicionário Aurélio:
1. Ato, efeito ou modo de cultivar. 2. Fig O complexo dos padrões de comportamento, das
crenças, das instituições, das manifestações artísticas, intelectuais, etc., transmitidos
14
O trecho correspondente na tradução é: “enquanto o marketing de produtos culturais japoneses expande além de
suas próprias terras, o impacto da cultura popular japonesa começa a ser sentido em outras localidades, especialmente
nos países asiáticos que compartilham similaridades culturais com o Japão”.
coletivamente, e típicos de uma sociedade. 3. Fig. O conjunto dos conhecimentos
adquiridos em determinado campo. (FERREIRA, 1993, p. 156).
Aprofundando mais sobre o segundo item do dicionário, que será a concepção
adotada neste trabalho, Canclini expõe que:
o cultural abrange o conjunto de processos mediante os quais representamos e instituímos
imaginariamente o social, concebemos e administramos as reações com os outros, ou seja,
as diferenças, ordenamos sua dispersão e sua incomensurabilidade por meio de uma
delimitação que flutua entre a ordem que possibilita o funcionamento da sociedade (local e
global) e os autores que a abrem ao possível (CANCLINI, 2003, p. 57-58).
Ao mesmo tempo em que a cultura define as inter-relações numa sociedade, como
acrescenta Velho (1999), ela indica a diferença na construção social da realidade tanto
temporal quanto espacialmente.
Na sociedade atual a multiplicidade de variáveis econômicas, simbólicas, políticas
é intensificada pelos meios de comunicação e economia globalizada. A difusão global dos
meios de comunicação e o advento da tecnologia modificou as relações e modos de
existência, e os indivíduos “(...) de um modo inédito, estão expostos, são afetados e
vivenciam sistemas de valores diferenciados e heterogêneos. Existe uma mobilidade
material e simbólica sem precedentes em sua escala e extensão” (Velho, 1999, p. 39).
Como foi mencionado, apesar desta suposta idéia de que a maior parte do mundo
caminha para uma homogeneização da cultura pela penetração de fast-foods, estilos de
vida e padrões estéticos, entendo que a multiplicidade ainda impera mesmo que haja o
consumo de produtos em comum. Por exemplo, o é tudo que é vendido no Japão que
terá aceitação aqui e o modo como é recebido também se diferencia. Assim, “(...)
nenhuma sociedade é efetivamente simples ou homogênea. Mesmo nas de menor escala,
encontra-se alguma diferenciação, seja de natureza sociológica, seja a nível dos
universos simbólicos” (Velho, 1999, p. 44).
Como Velho (1999), acredito que teorias como “aldeia global” devem ser
relativizadas assim como as de comunicações de massa, pois a recepção é distinta e as
interpretações se diferenciam de acordo com os grupos sociais. Um dos motivos para que
a recepção dos produtos estrangeiros seja diferente, é que as pessoas são ativas no
processo e captam a mensagem de acordo com a cultura na qual estão inseridas, isto
sem mencionar as diferenças individuais que também se apresentam. Quando um
produto de uma determinada localidade e cultura é colocado em uma cultura diferente,
busca-se, em alguns casos, a adaptação deste para adequar ao público local (Befu,
2003). Em animes (desenho animado japonês) como o Pokémon, por exemplo, houve a
mudança do nome dos personagens, música e algumas vezes da história para agradar
aos norte-americanos. As modificações dos animes e mangás no Brasil podem ocorrer no
conteúdo, por vezes muito erótico à faixa que visam, assim como naqueles pontos
modificados acima para o mercado americano. Mas cada história contém um tipo de
adaptação mais adequada.
E, dependendo do lugar em que o produto de uma cultura vai ser inserido, ele pode
optar por preservar uma maior ou menor quantidade da sua versão original. Em países do
leste asiático o consumo de produtos japoneses é em grandes quantidades e sem muitas
modificações, fato este que pode ser explicado pela proximidade e similaridade cultural,
que facilita o entendimento e identificação com o produto, não relacionado a desenhos
animados como também a outros entretenimentos como karaokê e mangás. Porém, o que
pode observar em todos é que mesmo havendo algumas alterações, muitas
características da cultura japonesa são preservadas, e dentro de uma lógica do consumo,
passam a servir como fator diferencial e atrativo para o produto. No Brasil, os mangás
mantiveram a ordem de leitura (da direita para esquerda) e o “estilo” monocromático, por
exemplo. Um outro aspecto apontado num estudo intitulado “O impacto da cultura
japonesa nos jovens de Singapura” é de que a popularidade dos produtos e mídias
japonesas não se restringiu a sua compra, mas levou os jovens a uma busca por um
maior conhecimento da língua, hábitos da cultura japonesa e da organização de eventos
que reúnem interessados nestes produtos, como também acontecem no Brasil. Em
decorrência disso, vários livros, artigos sobre vestimenta e outros mercados foram
surgindo para suprir essa demanda.
Para aprofundar ainda mais neste aspecto da inserção de outras culturas, como a
japonesa, em países diferentes e da adaptação sofrida pelo contato com a cultura local e
pelo mercado envolvido, ressalto o crescente número de restaurantes japoneses
encontrados no mundo todo. De acordo com Favaro (2006) mais de vinte mil
restaurantes que preparam comida japonesa fora do Japão. Visando o lado exótico e
atrativo, em muitos restaurantes voltados a consumidores de maior poder aquisitivo,
um alto investimento na decoração ambiente para criar um clima “japonês”. Neste sentido
também o termo de alguns pratos como o “sushi” é conservado nos cardápios, assim
como um nome japonês é adotado para muitos estabelecimentos.
Em relação ao preparo do sushi, há uma maneira particular de realizá-lo, mas pode
admitir variações sem perder as suas características. No Brasil, por exemplo, para ajustar
ao paladar local, o arroz ficou mais adocicado do que o original japonês. Além disso, se
encontram variações nos ingredientes como o sushi califórnia que contém kani, manga e
pepino, ou sushi contendo banana. Para tentar barrar todas essas modificações, um
certificado de autenticidade da culinária japonesa está sendo criado. Apesar das regras
não terem sido indicadas, algumas atitudes que foram divulgadas como reprovadas.
Alguns exemplos são: o uso de cream cheese ou manga, a junção de arroz tipo agulhinha
com o japonês e o fritar. Considero alguns limites impostos válidos, porém a possibilidade
de inovação fica prejudicada. Esse tipo de iniciativa ocorreu em culinárias como a
tailandesa e a italiana, mas não houve muita repercussão aporque, segundo Favaro
(2006), esse tipo de reivindicação leva a questão se há uma culinária totalmente
autêntica.
Um ponto vinculado a esta discussão é o de que atualmente é difícil considerar um
lugar como pertencimento
tampouco a língua nem a comida constituíam marcas identitárias que nos inscrevessem
rigidamente em uma única nacionalidade. Ambos extraíramos de vários repertórios hábitos
e pensamentos, marcas heterogêneas de identidade, que nos permitiam desempenhar
papéis diversos e até fora de contexto (CANCLINI, 2003, p. 56).
A inserção e o distanciamento do seu local de origem chegam a tal ponto que, por
exemplo, comidas japonesas podem ser encontradas em churrascarias e até em fast-
foods. Esse aspecto é mais uma forma de observar a decadência das bases estáveis
deste mundo hipermoderno, que desterrioriza tudo.
Como foi apontado anteriormente, o imperialismo ocidental norte-americano vem
sendo deslocado desse centro e países como o Japão estão ampliando seu espaço no
mercado mundial, mas a representação que acompanha os EUA da idéia do “american
way of life” continua forte e conquistando adeptos em todo o mundo. O Japão na Era Meiji
foi o responsável pela difusão do conhecimento ocidental aos países asiáticos, e era o
que fazia as adaptações de modo a facilitar a aceitação por parte desses países. Antes da
Segunda Guerra Mundial o Japão era referência para o aprendizado de conhecimentos
ocidentais.
O que se evidencia é que, na maioria das vezes, o valor de um produto está
associado à imagem, experiências históricas e pessoais que a pessoa possui do país de
origem, isto é, sua representação. Entretanto, um assunto deve ser apontado: o consumo
de um produto da cultura japonesa não está vinculado necessariamente a um “gostar” do
Japão. Comprar algo “japonês” pode estar relacionado a um design diferente, qualidade,
funcionalidade ou por ser a moda atual apenas. Quando o Japão é valorizado, o fato de
adotar nomes japoneses para quadrinhos pode ser positivo. Por outro lado, muitas
empresas que ao entrar no mercado internacional optaram por nomes não japoneses
como Sony ou Panasonic, para não evocar associações com os tempos de guerra ou da
época em que produtos japoneses não tinham tanta qualidade. Percebe-se, contudo que
esse “anonimato” adotado ou a busca de aceitação está vinculado a um estilo ocidental
norte-americano. Power Rangers, Pokémon ou o vídeo game Super Mario Bros o
alguns exemplos nos quais foram retirados elementos que caracterizariam o produto
como japonês para serem mais aceitos.
Hoje, porém a nova geração de jovens no Brasil vivencia uma época na qual a
popularidade da cultura japonesa está em alta. Hello Kitty, Pokémon e alguns animes e
mangás fazem sucesso por aqui, especialmente entre essa faixa etária da população.
CAPÍTULO II
HISTÓRIAS EM QUADRINHOS
E
DESENHO ANIMADO JAPONÊS
Escolhi abordar os quadrinhos, pois o “cosplay” é baseado nos personagens
veiculados nesse meio midiático e por serem poucas as pessoas do meio acadêmico que
têm conhecimento sobre este material, seria importante um esclarecimento maior sobre
ele. É fato que muitos admiradores cujo contato inicial com as histórias japonesas foi
através do desenho animado japonês, ou seja, pela televisão, mas mesmo neste caso o
estudo do quadrinho é importante, pois os animes (ou desenhos animados japoneses)
são normalmente derivados das histórias em quadrinhos que tiveram maior sucesso no
Japão.
Porém, antes de partir para a explicação do que caracterizaria a história em
quadrinho japonesa, acredito ser de grande valia explorar um pouco mais sobre esse
universo das histórias em quadrinhos como um todo, para que posteriormente se possa
entender melhor as peculiaridades do quadrinho japonês.
As histórias em quadrinhos fazem parte da nossa cultura, sendo encontradas em
revistas contendo somente este assunto ou como parte de outro meio comunicativo, como
acontece no jornal. Coupèrie (apud Anselmo, 1975) revela que mesmo essa relação
sendo complexa ela faz parte de um momento histórico em que foi construída,
influenciada por tradições e pela cultura que está inserida.
Caracterizada como produto infanto-juvenil no Brasil, é fato que entre o seu
público, muitos adeptos de idade mais avançada. É um mercado que atrai pessoas de
diferentes níveis sócio-econômicos e são de fácil acesso, pois vendem em qualquer
banca de jornal, mas como todos os produtos inseridos nesse mundo capitalista, são
poucos os que de fato conseguem adquiri-lo. Mesmo assim, os quadrinhos são
consumidos em grandes quantidades e se inserem na cultura popular. Eles exercem um
importante papel na divulgação de informação e difusão de maneiras de ser e estar de um
país. Assim como outras formas de comunicação e meios que estão servindo de
referência para crianças e adolescentes, as histórias em quadrinhos se tornaram um
veículo no qual eles podem adquirir certos valores, pois influenciam aqueles que as lêem.
O poder da repercussão dos quadrinhos pode ser constatado quando, por exemplo,
na época da conquista da Lua, a Apolo 8 e seu dulo lunar foram nomeados de Charlie
Brown e Snoopy. O desenho Flash Gordon foi proibido por Mussolini na Itália. E, nos
tempos da Segunda Guerra, não eram raros, heróis como Capitão América, Fantasma,
Tarzan, aparecerem em quadrinhos combatendo nazistas e japoneses.
Não é um consumo de massa recente. Uma época exata que determine quando e
onde as histórias em quadrinhos surgiram é difícil de especificar, porém ela é encontrada
em diferentes culturas, tendo para cada uma delas uma denominação específica. Pelo
próprio nome atribuído a elas nos diversos países é possível entender as distintas formas
de perceber esse objeto. Segundo Bibe-Luyten (1987) nos Estados Unidos, assim como
nos demais países de língua inglesa, como o conteúdo desse material era inicialmente
humorístico e caricaturesco, o termo “comic” foi dado para se referir às tiras (comic strips)
ou histórias em quadrinhos (comic books).
“Bandes dessinées” ou tiras desenhadas é assim nomeado na França, já na Itália a
designação “fumetti” foi escolhida para representar esse objeto. Este nome se refere aos
traços encontrados nos quadrinhos como fumacinhas ou balões.
Em Portugal são denominadas “histórias aos quadradinhos”. E no Japão utiliza-se
a palavra “manga” que alguns traduzem como “imagens involuntárias” ou, conforme
Moliné, “imagens a partir de si mesma”. Segundo este autor, o termo foi “empregado
inicialmente para designar todo tipo de caricatura” (Moliné, 2004, p. 218), e depois passou
a ser sinônimo de histórias em quadrinhos no Japão.
Tanto no Brasil quanto na Espanha, uma revista em quadrinhos muito veiculada
deu origem ao nome do gênero no país. No caso da Espanha foi o T. B. O. de 1917, que
posteriormente originou a palavra “tabeó”. O equivalente no Brasil aconteceu com a
revista “Gibi” de grande sucesso nas décadas de 30 e 40.
No Brasil “há indícios de que os primeiros quadrinhos nacionais datam da época do
Império época das ‘Aventuras de Caipora’, de Ângelo Agostini, na Revista Ilustrada
(1884) [...]” (Netto apud Anselmo, 1975, p. 16).
2.1 – A ENTRADA DO MANGÁ NO BRASIL
No Japão, as histórias em quadrinhos não o um entretenimento de menor
dimensão. Elas abrangem todas as idades e o sucesso do consumo deve-se a uma
cultura na qual desde criança eles entram em contato. Mesmo o mangá tendo um formato
diferente do quadrinho no Brasil, ele segue um modelo parecido, o que facilitou o manejo
desse produto por aqui. Outro ponto que pode ter ajudado no interesse dos mangás é a
similaridade com a novela, tão presente na cultura brasileira. Recorrer a uma cultura onde
existe o contato com a história em quadrinho e com as novelas é considerado aqui
como um motivador a mais, contudo, não determina seu consumo. Não se pode dizer que
o fato de ser parecido com um produto brasileiro foi algo determinante para o seu
consumo, pois novidades surgem a cada dia, no mesmo segmento ou não, e os jovens
parecem se adaptar a esse movimento de troca com extrema facilidade. Porém, o
cerceamento deste produto com a divulgação de desenhos animados, brinquedos,
biscoitos e outros produtos, tornaram o campo ainda mais favorável para entrada no
mercado.
O espaço para a inserção de mangás estava dando sinais, pois em vários locais
no Brasil se encontravam reproduções piratas. Mas até eles entrarem no Brasil teria
que haver adaptações desses produtos ao público local e encontrar interessados em
licenciá-los. A porta de entrada para os quadrinhos japoneses, de acordo com Tezuka
(apud Schodt, 1986) tem uma relação direta com a veiculação do desenho animado
japonês (anime), como mencionado anteriormente
15
, pois muitos fãs dos animes
procuravam produtos que continham seus personagens favoritos.
Considero o mangá um produto novo, pois mesmo havendo similaridades com os
quadrinhos por nós conhecidos, ele se destaca por certas particularidades como modo de
leitura, desenho, caracterização da história e personagens, etc. Como o “sushi”, ele pode
até ter algumas semelhanças (por exemplo, conter arroz), porém a sua apresentação e
características o fazem ser algo novo e, com isso, um mercado vai surgindo e variações
aparecendo.
O Brasil possui a maior colônia japonesa fora do Japão, completando em 18 de
julho de 2008, 100 anos de imigração japonesa. Talvez, em razão da quantidade de
descendentes de japoneses no Brasil, o consumo do mangá ocorreu antes dos EUA ou
Europa. Entre os imigrantes e descendentes, o mangá servia como forma de manutenção
ou atualização da ngua. A inauguração da primeira associação de mangás intitulada
ABRADEMI (Associação Brasileira de Desenhistas de Mangá e Ilustrações) ocorreu em
1983.
O primeiro mangá original publicado no Brasil foi Lobo Solitário, em 1988 pela
Editora Cedibra. Esse mangá é caracterizado como adulto, por haver um enredo mais
dramático e denso que os para jovens. Outros mangás foram lançados nessa época como
Akira pela Editora Globo, Crying Freeman pela Editora Sampa, contudo em alguns deles a
publicação foi interrompida. O sucesso foi conseguido somente em 2000 com o
lançamento dos mangás “Dragon Ball” e “Cavaleiros do Zodíaco” pela Editora Conrad
(antiga Editora Sampa). Esta, juntamente a Editora JBC, são consideradas as maiores
representantes de mangás no Brasil. Após cinco anos, somando-se edições especiais e
livros, “o mercado editorial dos mangás no Brasil cresceu impressionantes 680%” (Del
Greco, 2005, p. 30).
Atualmente os quadrinhos japoneses vêm atraindo cada vez mais adeptos no Brasil
e é considerado um fenômeno social constitutivo desse mundo globalizado. Ele se tornou
um bom mercado em nosso país. Surgiram eventos nos quais reúnem os interessados;
criou-se um canal a cabo (Animax) com a programação inteiramente de animes, 24 horas,
todos os dias da semana; e há lançamentos de livros, camisetas e outros artigos sobre os
personagens de mangás ou assuntos vinculados à cultura japonesa.
15
Vide página 46.
2.2 - MANGÁ: AS PARTICULARIDADES DO DESENHO JAPONÊS
2.2.1 – Um pouco de história: a origem nipônica
Os primórdios dos quadrinhos japoneses apareceram por volta do século XI com os
ê-makimono feito em pergaminhos com desenhos de animais. Em 1814 o pintor Katsuhika
Hokusai, originou o primeiro encadernado em que desenhava imagens em sucessão. A
série total contava com quinze. O termo mangá foi criado por ele, derivado da junção de
man que significa “involuntário” e ga “desenho”.
Toba-e (“imagens ao estilo de Toba”) e os kibyôshi (“livros de capa amarela”) eram
produtos “fabricados em série, sendo impressos em chapas de madeira, o que, de certo
modo, precedia a produção em massa da atual indústria do mangá” (Bibe-Luyten, 2004, p.
19). A partir de 1853 começou a se estabelecer uma relação com o ocidente, acentuado
no período Meiji (1868-1912), que influenciaria o desenho japonês.
A popularização do termo mangá ocorreu em 1901 através de Rakuten Kitazawa
(1876-1955) considerado o primeiro autor japonês de quadrinhos. Foi ele quem elaborou
histórias em que os personagens permaneciam nesta.
As primeiras publicações eram voltadas aos adultos e depois foram expandidas ao
público infanto-juvenil.
Com a Segunda Guerra Mundial a produção de mangás sofreu uma queda devido
à economia e a censura. Tal como nos EUA, houve publicações voltadas à propaganda
bélica. Depois dos ataques a Hiroshima e Nagasaki iniciou-se uma nova etapa na história
dos mangás. A partir da década de 50 ocorreu um crescimento da publicação de mangás
semanais com a aparição de novos gêneros voltados as mais variadas faixas etárias. Ao
contrário do que aconteceu na América e na Europa onde a televisão diminuiu o consumo
de quadrinhos, no Japão ele expandiu juntamente com a indústria de animação que
produzia desenhos adaptados de mangás.
Por volta dos anos 90 houve uma queda na venda de mangás, que alguns autores
relacionaram a entrada de entretenimentos como computador e videogames. Porém, hoje
o Japão continua sendo o maior consumidor de histórias em quadrinhos no mundo. Em
seu mercado editorial, os quadrinhos ocupam, segundo Moliné (2004), 40% de toda
produção, sendo o número de editoras de aproximadamente 130 e, somados as
publicações periódicas, podendo atingir a 300.
2.2.2 – Para entender mais esse quadrinho
No Japão, a produção de quadrinhos é feita independentemente de editoras, sendo
os próprios artistas responsáveis por ela, o que pode decorrer em um maior controle
sobre a elaboração e em seu reconhecimento, expresso através da fama e retornos
financeiros (Schodt, 1986). Assim, segundo este mesmo autor, os “Syndicates” como os
existentes nos EUA, não há no Japão.
No Brasil também o um equivalente a “Syndicate”, pois o é um sindicato
nem uma associação. Pode-se configurar que nos EUA seja uma espécie de agência ou
serviço especializado que trabalha com entretenimento, possui direitos sobre venda e
distribuição do que é produzido pelos desenhistas e serve como divulgador ao vender as
matrizes para reprodução tanto nos EUA quanto em outros países. Eles funcionam sob
um código de ética e por agirem como intermediários no processo de divulgação do
produto, eles contribuíram para que isso se tornasse um fenômeno social. Alguns ainda
trabalham com notícias, reportagens, charges, etc. Este tipo de serviço beneficiou o
desenhista ao lhe fornecer além do que foi exposto acima, um salário fixo e/ou uma
porcentagem sobre as vendas, porém ao mesmo tempo o tornou um empregado dos
“syndicates”.
Os autores de mangá, chamados de mangakás, podem produzir para diferentes
editoras, quadrinhos diferentes e, diversamente do que acontece com um quadrinho
americano, a história não continua através de um outro autor.
Mas apesar desses pontos positivos, é um mercado competitivo e de produção
muito intensa. Para ter uma idéia do lugar que o quadrinho ocupa no Japão, as nove
principais revistas semanais de mangá para adolescentes, alcançaram uma tiragem em
1997, superior a 17 milhões numa semana (Barral, 2000). Porém, neste meio, são poucos
aqueles que conseguem chegar ao estrelato. A quantidade de histórias e a repercussão
da obra do autor formam a base para uma espécie de classificação que reflete no preço
pago por página pelo trabalho dele. O que seria, então, fonte de prazer virou algo imerso
numa lógica da rapidez e da cobrança, marcas do mundo capitalista. Como cita Schodt
(op. cit., p. 139, tradução nossa): “O artista logo se transforma no prisioneiro de seu
próprio sucesso”.
Conhecer algumas peculiaridades do mangá é importante, pois ajudam a entender
quais as características que foram relevantes no processo de escolha desse produto por
alguns jovens. A seguir são apresentadas, de forma breve, algumas delas.
Normalmente os mangás são publicados em revistas e em forma de histórias
seriadas e não de tiras. Mais tarde algumas séries de sucesso podem ser reunidas em um
livro, que é impresso em uma qualidade melhor de papel. O habitual é que ele seja de
baixa qualidade e monocromático, estilo este que é seguido no Brasil. A quantidade de
páginas de um manno Japão também impressiona um leitor ocidental, tendo em torno
de 150 a 600 ginas e “contém umas vinte histórias publicadas como folhetim” (Barral,
2000, p. 120-121). No Brasil, os mangás têm em torno de 200 páginas e são referentes a
uma história. As revistas mais vendidas aqui são aquelas voltadas ao público juvenil
masculino (shonen manga) e feminino (shojo manga), mas no Japão existem mangás
para todas as idades e de diferentes estilos (histórico, esportivo, terror). No Shojo manga,
tipo de man direcionado as adolescentes, os traços são mais detalhados, com um
destaque aos olhos que muitas vezes são desenhados com uma estrela nas pupilas para
criar uma impressão de sonho ou romance. Apesar desta separação entre faixa etária,
não há uma restrição ou relação direta entre a categoria e os seus leitores.
A presença de uma maneira artística de contar uma história na qual, muitas vezes,
a imagem seria a mensagem, sem precisar de um texto vinculado, pode ser associada
ao próprio sistema de escrita do Japão, pois alguns ideogramas ou kanjis foram formados
a partir de desenhos (Kurihara, 2007)
16
ou sinais: Abaixo alguns exemplos
17
:
Exemplo 1:
à à à (HI = sol)
à à à (KI = árvore)
Exemplo 2: à (um ponto sobre a superfície indicando "em cima")
Exemplo 3:
(KI = árvore)
(HAYASHI = bosque)
(MORI = floresta)
16
Disponível no site <http://www.nj.com.br/kanji/historia_kanji.php>. Acesso em: 28 out. 2007.
17
Disponível no site <http://www.meishusama.org/homepage/nihongo.htm>. Acesso em: 29 out. 2007.
O simbolismo é decorrente também da variedade de significados que uma palavra
pode ter, o que reflete numa riqueza das histórias por conta desta característica. A
palavra “kaeru”, por exemplo, pode significar: sapo, regressar, transformar, trocar, etc.
O sucesso dos quadrinhos nesse tempo de profunda correria pode estar vinculado
ao fato de ser mais prático de ler do que um romance ocidental e é um entretenimento
portátil, podendo ser lido a qualquer hora. Trata-se, porém, de uma atividade solitária.
Ao invés das tiras horizontais quase do mesmo tamanho e dos quadrinhos
praticamente uniformes, os mangás não possuem uma linearidade, variando seu formato
enormemente. O ritmo é outro aspecto que o diferencia de outros quadrinhos e, em vários
momentos, o foco em vários ângulos de uma mesma cena, tal como acontece no cinema,
é um mecanismo utilizado. Há também um aprofundamento no que diz respeito à reflexão
dos personagens sobre a situação em que se encontram. Nos encontros que tive com os
cosplayers, em um momento, eles afirmaram que os fãs de anime e mangá “costumam
ser os centros do mundo”. Questionados sobre essa afirmativa, eles fizeram uma ligação
entre algumas características do mangá/anime e o movimento deles perante isso, os
quais transcrevo no trecho abaixo para visualizar melhor esse aspecto do mangá:
- Márcia - [...] Geralmente nos mangás e animes tem o personagem principal. Toda trama
vai girar em torno daquilo, e normalmente a maior introspecção é desse personagem
principal e, [...] enquanto personagem principal, ele pensa muito. Todos eles sempre
pensam muito, sempre se questionam muito. Para fazer a trama mesmo, e justamente para
você ver uma evolução. E eles sempre acabam enfrentando diversos problemas. Então
você... Vobota isso para você. Você passa a ser o personagem principal da sua vida,
com seus problemas. Então, assim como todos os questionamentos do mangá giram em
torno do personagem principal, por uma razão óbvia: normalmente é em primeira pessoa; a
sua vida acaba virando em primeira pessoa para você.
- Márcia - Não que isso seja bom ou ruim. É uma forma de ver a vida. Eu faço isso. Você se
coloca como personagem principal da sua vida
- Talita - Acho que não necessariamente um otaku faz isso, acho que qualquer pessoa
faz isso.
- Márcia – Porque, na verdade, você tem que ter essa relação. Não vem do nada. Ninguém
tira isso do nada. Vonão nasce achando “Ah! Então eu tenho que pensar no mundo a
partir de mim”. Não, você conhece o mundo a partir de você. Fato. Mas que todos os
problemas do mundo em geral estão nos outros, é mais fácil você ver assim. Tá no mundo
e o sei se isso é da cultura. Eu tenho impressão que é uma coisa da visão... Tem uma
coisa a ver com uma visão oriental, até religiosa. Porque, tipo...
- Mônica - Ah! Acho que tem a ver... Tipo... Para você consertar o mundo você tem que se
consertar. É uma lição [das histórias japonesas].
- Márcia - A grande diferença é que eles pensam muito. Numa novela você não tem uma
cena inteira falando, tipo um monólogo. Agora no mangá e animes isso acontece direto. Um
personagem está andando pela rua, sozinho e então surgem várias falas, que não são
falas, são pensamentos. [...] Toda a seqüência do mangá vai acontecendo e, ao longo de
todo o mangá, tem sempre um personagem que está pensando ao longo dessa história. [...]
Então você acaba se acostumando com essa visão e faz tanto sentido fazer isso, porque
realmente é assim. Quando você traz isso para sua vida é muito mais fácil. Você faz
mesmo isso. Quando alguma coisa acontece você já está pensando no seu papel aqui.
A ordem de leitura é inversa à ocidental, começando
da direita para a esquerda. Algumas editoras optaram pela
“ocidentalização” dos quadrinhos, invertendo a disposição
dos desenhos para adaptar ao estilo ocidental, porém
muitos acusavam essa atitude de adulteração. Atualmente
percebe-se uma aceitação da direção da ordem de leitura
original. Há, inclusive, mangás que contém orientações
sobre este aspecto. Por exemplo, se a pessoa abre um
mangá na primeira página da esquerda, em alguns deles
aparece a seguinte mensagem, como mostra na figura ao
lado.
Um fato que ocorre em vários países é a organização
de eventos para apreciadores de mangás e animes
(desenho animado japonês). No Brasil, inúmeros eventos voltados a este público. Em
São Paulo, por exemplo, um dos eventos chegou a reunir em dois dias cerca de onze mil
pessoas. Neles, é comum encontrar pessoas vestidas como os personagens de história
em quadrinho japonesa ou do anime, sendo chamados de cosplayers. O capítulo seguinte
será voltado a este fenômeno.
Vários termos novos como Dojinshi e Fansubber
18
passam a faz parte do
vocabulário dos que estão inseridos nesse grupo. Dojinshi se refere aos fanzines
japoneses. Fanzine vem da junção de “fan” e “magazine” e é definido como a criação de
quadrinhos japoneses por autores independentes. Seu conteúdo pode ser original ou
baseado em algum quadrinho existente. Fansubber é uma outra palavra criada que é
derivada de uma ligação entre “fan” e “subtitled” que significa “traduzido por fãs”. Por
conta da demanda crescente dos fãs de anime e mangá, e de um mercado que não a
acompanha, muitos grupos vendem cópias de produções ainda não publicadas
oficialmente no Brasil com traduções realizadas por eles mesmos que, em grande parte
[segundo os próprios consumidores], o de grande qualidade. Também há certa
preferência por esse material por parte de alguns fãs por ser comum que em alguns
animes e mangás, haja cortes ou alterações do original.
Uma característica especial é que as personalidades dos personagens são mais
realistas, pois eles possuem defeitos, tem inseguranças, crescem com a vida e morrem.
18
Disponível em: <http://www.clubotaku.org/cow/Manga/Manga>. Acesso em: 10 nov. 2006.
Figura 2
-
Orientações para leitura
no mangá Chobits
Não um personagem que seja mal “por natureza” ou aque um seja classificado
assim, uma vez que mesmo os personagens principais, que seriam considerados
“certinhos” cometem “erros”. Então, parâmetros como “bom ou “mau” para definir os
personagens não costumam ser encontrados, os dois coabitam no indivíduo e são
sentidos de forma ambivalentes. Uma marca de um personagem tem uma razão de estar
ali.
Para corroborar esse ponto anterior é usual no mangá que haja um breve
histórico de cada personagem para que o leitor entenda porque ele age de tal forma. Por
exemplo, um aspecto marcante de um personagem do mangá Samurai X, Soujirou Seta,
era que ele lutava e matava sempre conservando um sorriso no rosto. Por pertencer a um
grupo inimigo do personagem principal Kenshin, alguns o poderiam ver apenas com maus
olhos, considerando-o insensível e que precisa ser eliminado, pois se trata de um inimigo.
Porém, no episódio 31 Soujirou Seta expõe a sua história: ele era um menino, filho de um
relacionamento fora do casamento e, por isso era desprezado pela família que o
considera um serviçal. Qualquer problema era motivo para a família descontar a raiva
nele. Certa vez ele percebeu que quanto mais chorava ou ficava bravo, mais seus
familiares eram violentos com ele e, por isso, passou a manter o sorriso, mesmo sentindo
raiva ou dor. Com esse breve histórico da sua vida, o leitor pode não conhecer a
personalidade dos personagens apresentados, mas também entender que não há apenas
um lado da história (o sorriso não era a demonstração de um prazer de matar, como
alguns poderiam achar). Serve inclusive para compreender quais foram as saídas que
aquela pessoa escolheu para seguir a vida.
Para exemplificar essa dificuldade de definir o mau e o bom, ou o que é certo ou
errado no mangá /anime, gostaria de citar uma discussão surgida com os cosplayers
sobre o mangá (também o anime) “Deaf Note”. Primeiramente tentarei descrever um
pouco a história deste mangá.
Deaf Note é um mangá escrito em doze volumes pelo autor Tsugumi Ohba. A
história gira em torno de um caderno, antes pertencido ao Deus da Morte, que cai nas
mãos de um estudante chamado Light Yagami. Ele descobre que ao escrever o nome de
uma pessoa neste caderno, ela morre e a narrativa conta justamente a forma que o
estudante se posicionou frente a esta descoberta, que foi a de eliminar o mal da
sociedade. A trama é acompanhada da busca de um detetive em descobrir o assassino.
Diante da conversa entre os cosplayers sobre este mangá, perguntei sobre do que
ele se tratava:
- Talita - É um jogo psicológico. Tipo tem a parte mística que é um caderno do Deus da
morte que cai na Terra e vai parar na mão de um dos melhores alunos do Japão. Tem
aquela coisa da moral “matar é errado”. Você fica pensando se o caderno caísse na minha
mão, o que você faria. Eu não ia fazer nada. “Matar é errado”. Ninguém nunca vai afirmar...
- Renato Mas do jeito que é retratado você acaba...Porque de alguma forma o
personagem principal é como se fosse o vilão da história, porque ele pega o caderno e faz
justiça com as próprias mãos. Ele mata todos os criminosos.
- Talita - Ele quer o mundo perfeito
- Renato - Mas ele acaba se perdendo no meio dessa história, se corrompendo, tentando...
Ele passa a matar para defender o próprio império que ele próprio construiu.
- Márcia - E mesmo assim, ele mesmo matando todos os criminosos do mundo, ele ainda
assim é um assassino.
- Renato - Mas essa é a grande discussão ética, se é justo ou não, se vale a pena ou não.
- Facilitador - Vocês questionam isso?
Todos dizem que sim.
- Talita - Tem hora que ele mesmo pensa sobre isso.
- Márcia - No próprio mangá pessoas se dividem para ver se o Kira [nome dado ao
assassino] escerto ou o. Até mesmo na sala de aula [no próprio mangá] o professor
pergunta o que vocês acham sobre o Kira.
- Facilitador - No próprio mangá se estimula o questionamento?
- Todos - É.
- Talita- [...] Alguns tem adoração ao Kira. As pessoas, embora elas o consigam admitir,
quando elas estão sozinhas, elas pensam: “Finalmente alguém está fazendo alguma coisa.
Finalmente alguém está tentando mudar o mundo”.
- Márcia - A divisão entre bem e mal nem sempre é muito clara em animes e mangás. Em
Deaf Note praticamente não existe essa divisão entre bem e mal. Existe a policia e quem
está sendo perseguido pela polícia. Tipo... A policia esagindo dentro da lei. Se você
considerar que agir dentro da lei, é o bem, então a policia está sendo o bem. Por outro lado,
o Raito [como o japonês fala Light] não está sendo mal...Então não dá para saber.
- Talita - Ele está querendo acabar com a maldade do mundo, por isso pode ver ele como o
bom.
- Márcia - Por isso às vezes em animes e mangás é difícil falar em mocinho e vilões. Não é
tão fácil como Superhomem.
- Renato - É muito mais complexo.
- Márcia - Por isso que normalmente fala em personagem principal e o inimigo dele. Agora,
lado bom e lado mau já fica bem mais difícil.
- Mônica - Por isso eu acho que mangá é muito mais atrativo do que americano, HQ. Muito
mais complexo.
- Márcia - Porque a vida não é dividida em bem e mal, a vida é dividida em várias partes.
- Mônica - Faz você pensar. [As pessoas] acabam procurando qual é o mau da história. Se
os dois são corretos, quem é o errado?
A partir destes aspectos mostrou-se uma variedade de elementos diferenciais que
servem como atrativos para seus leitores e o qualifica como um produto novo,
aumentando seus admiradores.
CAPÍTULO III
CONHECENDO O COSPLAY
Após elucidar sobre o mane seu diferencial frente a outros quadrinhos, passo a
explicar o fenômeno “cosplay”. Em um artigo publicado em 1997 nos Estados Unidos,
intitulado "Fifteen years of japanese animation fandom, 1977-92", Ledoux, Ranney e
Pattern (1997) revelaram que o primeiro evento organizado por fãs de animes na América
do Norte ocorreu em abril de 1977 em Los Angeles. Neste mesmo período originou o
primeiro fã clube.
Segundo este mesmo artigo, em julho/agosto de 1980 houve o primeiro evento no
qual seriam observadas pessoas vestidas como os personagens dos desenhos
japoneses. Este encontro foi realizado em San Diego, chamado de San Diego-Com, que
contou com a presença de trinta cartunistas japoneses entre eles: Osamu Tezuka, Go
Nagai e Yumilo Igarashi, que se impressionaram com a popularidade dos desenhos entre
os americanos.
A palavra “cosplay” é originada da junção de duas palavras: “costume” que significa
fantasia e “play” que seria brincar ou jogo em inglês, criando assim o sentido de “brincar
de fantasiar”. Segundo Andriatte & Benedetto (2005) esta palavra foi designada por um
jornalista japonês Nobuyuki Takahashi quando, ao ir aos EUA para registrar o evento
Wordcon em 1984, se deparou com inúmeras pessoas vestidas como os personagens. A
princípio ele denominou esse fenômeno de “masquerade”, que em inglês quer dizer
“disfarçar” ou “se passar por”, porém, para diferenciar do sentido de “festa a fantasia”
utilizou o termo “costume-acting” ou “costume-play”, que mais tarde foi reduzido a
“cosplay”.
Em um outro artigo, Pattern (2004) relatou que em um dos eventos anuais nos
EUA, o Anime Expo 2003, o qual reuniu cerca de dezoito mil pessoas, os termos
“masquarade” e “costuming” ainda eram usados na programação, mas aos poucos o
termo “cosplay” vem sendo adotado pela totalidade dos participantes.
O vestir-se como o personagem foi absorvido pela cultura japonesa e também pelo
Brasil. Aqui esta atividade começou a ser desenvolvida em eventos realizados pela
ABRADEMI (Associação brasileira de desenhistas de mangá e ilustrações) em
1996/1997. Hoje, os eventos acontecem em várias localidades, sendo realizados
normalmente aos sábados e domingos, e a entrada custa em torno de dez reais, o dia.
Antigamente os eventos eram destinados à exibição de animes, pois a divulgação e
acesso a esse produto era escasso no Brasil. Aos poucos ele foi adquirindo mais atrativos
e o concurso de cosplay passou a ser algo extremamente importante, porém este não é, e
nem pode ser, o único entretenimento. Talita, uma das cosplayers do grupo, comenta que
“Era o auge do evento o concurso de cosplay. Hoje em dia, os eventos têm que ter
concurso de cosplay, DDR [Dance Dance Revolution], tem que ter banda. Hoje em dia o
concurso não é só suficiente”.
Os maiores eventos no Brasil acontecem em o Paulo, que são o AnimeCon e
Anime Friends, os quais recebem aproximadamente quarenta mil pessoas.
Mesmo com essa variedade de atividades, os concursos de cosplay não deixaram
de ser destaque. Segundo reportagem de Souza, Greco e Malone (2006) as regras para
competição logo surgiram e foram ficando mais rebuscadas. Além de se vestir o mais
semelhante possível a um personagem de mangá ou anime, é preciso agir como ele,
tanto em relação aos gestos de luta, por exemplo, como no modo de falar, dependendo
da categoria escolhida. São inúmeros os eventos que acontecem no Rio de Janeiro, e em
cada um deles pode haver variações quanto às regras dos concursos. Alguns desses
eventos como Anime Family e Anime Center, possuem sites onde se divulgam a
programação, locais de compra de ingresso e as normas para os interessados em
participar dos concursos. No Anime Center, por exemplo, as categorias que os cosplayers
podem concorrer são: interpretação; indumentária; adereços e caracterização; escolha do
público; e conjunto da obra. E todas essas são subdivididas em subcategorias individuais
ou em grupo. O julgamento varia conforme a categoria. O Anime Center
19
define que:
· As notas serão dadas pelos juízes, e a média entre eles será a nota final. Cada quesito
receberá uma nota de zero a 10, com intervalos de 0,5 (meio) ponto.
· Os juízes do concurso de cosplay são escolhidos pelo coordenador do concurso e
aprovados pelo organizador do evento.
· Para o critério de julgamento da categoria “interpretação” os juízes são instruídos a julgar a
similaridade na representação do personagem, criatividade na concepção da cena e desenvoltura
no palco.
· Para o critério de julgamento da categoria “indumentária” os juízes são instruídos a julgar
somente a roupa, similaridade com o original, qualidade na confecção e escolha de materiais
utilizados.
· Para o critério de julgamento da categoria “adereços e caracterização” os juízes são
instruídos a julgar os acessórios e materiais utilizados na confecção dos mesmos, acabamento em
armas e armaduras, jóias e outros. Também serão avaliados neste critério, soluções para a
caracterização do personagem, como maquiagem, perucas, enchimentos e outros “efeitos
especiais”.
· Para o critério de julgamento da categoria “escolha do público” os juízes são instruídos a
julgar o quanto à apresentação empolgou o público. O desempate será decidido nas palmas.
· O quesito “conjunto da obra” será julgado da maneira tradicional dos concursos de
cosplay, avaliando a fidelidade tanto da roupa quanto da interpretação, usando-se a criatividade
como critério de desempate.
· Em caso de empate nas notas finais dos primeiros colocados e sujeitos a premiação, irá
prevalecer aquela com menor desvio-padrão. Se ainda assim ocorrer empate, os juízes e o
coordenador do concurso realizarão uma votação.
· Além de julgar o concurso os juízes irão se reunir antes do concurso, para receber
instruções detalhadas sobre o procedimento e os critérios de julgamento, e irão se reunir após o
concurso, para analisar o cálculo das notas, julgar casos especiais e assinar um documento
declarando estarem de acordo com os resultados finais do concurso.
· Casos omissos ou que não constarem neste corpo de regras serão julgados pelo
coordenador do concurso de cosplay.
19
Disponível em <http://www.animecentereventos.com.br/cosplay.htm>. Acesso em: 29 out. 2007.
Figura 3
-
Cosplay do pe
rsonagem
principal do filme “O Máskara”
O evento considerado o mais importante para competição de cosplayers é o World
Cosplay Summit (WCS), que em 2006 teve pela primeira vez uma etapa para
classificação de duplas no Brasil. Os irmãos Mônica e Maurício Somenzari Leite Olivas
foram os ganhadores da etapa no Brasil e também da final no Japão. Vestidos dos anjos
Rosiel e Alexiel do anime Angel Sanctuary, eles ensaiaram diariamente, tendo aulas de
kung-fu, treinando as falas em japonês e despendendo trinta dias na confecção de seis
asas de aproximadamente 1,50m de altura feita de penas. Esses jovens não o
japoneses nem descendentes, e isso exemplifica bem a popularização com que a cultura
pop japonesa atingiu o público brasileiro.
Os cosplayers não necessariamente têm que competir. Eles podem optar por
simplesmente se vestirem como os personagens e freqüentarem os eventos. Com o
passar do tempo, fazer cosplay deixou de ser exclusividade de personagens de mangás e
animes e começou a estender a filmes, desenhos, vídeo-games, entre outros, sem
importar a origem étnica dos mesmos.
3. 1 – EVENTOS E COSPLAY: MÁSCARAS DA REALIDADE
Rabelais é considerado por Bakhtin um dos autores mais democráticos do
Renascimento e valoriza o caráter popular de sua obra literária ao se aproximar das
fontes populares. O meu intuito ao utilizar esta obra de Bakhtin é mostrar possíveis
paralelos entre os festivais carnavalescos da cultura cômica popular na Idade Média e no
Renascimento, e os eventos que acontecem atualmente, para então entender um pouco
mais esse espaço criado, no qual o cosplay é aceito como parte desta realidade.
Reconhecer algumas semelhanças entre o carnaval da Idade Média e os encontros de
aficionados por anime e mangá é algo delicado, pois trata de períodos singulares com
culturas totalmente distintas, porém esse recurso de recorrer ao passado é colocado de
modo a auxiliar na compreensão de aspectos atuais.
As festas e festividades foram sempre comuns na civilização humana, sendo
marcadas por um momento sóciohistóricocultural. Para Bakhtin, as festas são apenas
denominadas assim se estiverem vinculadas ao mundo dos ideais. Outra característica é
que os festivais têm locais e horários determinados e estão ligados a momentos de crise
e/ou transtorno.
Os festejos de carnaval eram importantes para o homem medieval e traziam uma
visão de mundo diferente do culto e das cerimônias oficiais que estavam relacionadas à
Igreja ou ao Estado feudal. Estas festas oficiais iam contra a natureza do sentido de festa,
e se caracterizava por ter uma visão acabada, imutável e séria.
Para o homem da Idade Média, com o regime de classes e do Estado, as
manifestações cômicas possuíam caráter não-oficial e adquiriam o sentido de cultura
popular. Neste aspecto, os ritos e espetáculos cômicos faziam parte da vida cotidiana de
uma parte da população e não estavam presos a dogmas religiosos e nem possuíam
qualquer aspecto mágico. O carnaval dessa época representava uma forma diferente de
ser, com características próprias, marcadas por uma forma de expressão dinâmica,
flutuante e sem as verdades que imperavam as relações daquele período. o havia
hierarquias, regras ou tabus. Na época do regime feudal na Idade Média, as festas de
carnaval representavam uma outra forma de viver, que se expressava como um “reino
utópico da universalidade, liberdade, igualdade e abundância” (Bakhtin, 1996, p. 8).
Huizinga (2001) relata as semelhanças existentes entre festa e o jogo. Para ele:
ambos implicam uma eliminação da vida quotidiana. Em ambos predominam a alegria,
embora não necessariamente, pois também a festa pode ser séria. Ambos são limitados no
tempo e no espaço. Em ambos encontramos uma combinação de regras estritas com a
mais autêntica liberdade. Em resumo, a festa e o jogo têm em comum suas características
principais. (HUIZINGA, 2001, p. 25)
O caráter de não-oficialidade também marca o evento voltado para os interessados
em animes e mangás. Eles criam esse lugar, tal como no carnaval da Idade Média, em
que todos os participantes, vestidos ou não como personagens, vivem aquele momento
como uma mescla entre realidade e “arte”. a vivência de algo que pode ser
considerado tanto fictício como parte da vida real e isso é compartilhado por aqueles que
estão. Lembro de um episódio narrado por Velho (1999) de uma situação ocorrida em
1970 na qual um senhor teria incorporado “preto-velho” e estava dando conselhos ou
orientações a alguns transeuntes. Este autor observou a interação das pessoas e de certa
forma, como no evento do Anime Center o qual relatei minha primeira visita, praticamente
todos os que ali estavam “atuaram dentro e um sistema compartilhado de crenças e
valores. Mesmo admitindo uma certa variação individual, o comportamento e a atitude dos
participantes apresentavam notável homogeneidade” (Velho, 1999, p. 17).
Esses encontros proporcionam, tanto nos carnavais da Idade Média quanto nos
eventos de fãs da cultura japonesa, a formação de um tipo especial de relação, com a
criação de novos vocabulários e gestos que passam a constituir uma linguagem
característica desse grupo ou situação, sem o peso de regras e etiquetas normalmente
seguidas. Bakhtin (1996) coloca que essa nova forma de comunicação proporcionada
pela aproximação entre as pessoas acontece quando, por exemplo, duas pessoas com
afinidades, estabelecem uma relação de amizade. Elas criam uma forma de comunicar
entre elas, evidenciadas seja pela adoção de apelidos ou comportamentos menos polidos.
Em uma entrevista com um dos organizadores do Anime Friends, Takashi Tikasawa
responde o que ele acredita ser uma diferença entre o público brasileiro e o de outros
países que freqüentam este tipo de evento. Para ele “O público japonês não faz amizades
como o do Brasil. Os otakus japoneses compram produtos, tiram milhares de fotos e vão
embora. Não interação. No Brasil é diferente. Tudo é uma grande festa” (Tikasawa
apud Del Greco, 2005, p. 34).
Porém esse encontro que se estabelece entre semelhantes que tem um contato
concreto e vivo nos eventos de mangá e anime se diferencia do carnaval popular de praça
pública na Idade Média por não ter o “caráter universal”. Esse fato é corroborado por
conta da restrição da acessibilidade para dele participar. Os ingressos custam em torno
de dez reais, o que evidencia uma distinção econômica, deixando de existir a
universalidade, pois como foi dito, não se consegue atingir todas as pessoas.
A aproximação com as formas do espetáculo teatral aparece tanto no carnaval na
Idade Média quanto em eventos de anime e mangá, podendo ser mais especificamente
considerados no próprio cosplay, pois a representação e um aspecto “fantasioso” que
é partilhado. Nas palavras de Bakhtin (1996, p. 6) “ele [o carnaval] se situa nas fronteiras
entre a arte e a vida. Na realidade, é a própria vida apresentada com os elementos
característicos da representação”. Neste período “por um certo tempo o jogo se
transforma em vida real” (Ibid., p.7). É como se houvesse uma segunda vida.
Perguntei ao grupo de cosplayers se fazer cosplay tem semelhanças com a
apresentação teatral. Segundo eles:
- Talita - Não existe uma diferença.
- Márcia - É a mesma coisa
- Facilitador - Mas eu não posso dizer que cosplay é um teatro?
- Talita – Na parte da apresentação sim.
- Márcia - É um teatro, que você monta aquele seu teatrinho, mas baseado naquele
personagem que existe. Não é que como no teatro que você cria um personagem. Ali
você vida a um personagem, fora da tela ou fora da página do mangá. O barato é isto:
você pega alguma coisa que já existe.
- Talita - Você pode até criar novas falas, novas coisas, mas você tem que seguir algo que
já está ali.
Apesar de concordarem com essa semelhança, percebi ao longo dos encontros,
que a escolha do personagem, baseada na identificação, seria algo característico do
cosplay, do qual falarei posteriormente.
O jogo, na concepção de Huizinga (2001), é útil para entender essa brincadeira.
Este autor revela sua crescente crença de que a origem e desenvolvimento da civilização
se o pelo/no jogo e defende que a cultura tem um caráter lúdico, do qual o jogo faz
parte. Deve-se estar atento que na maioria das línguas européias o jogo e o brincar são
designados por uma mesma palavra, porém em português uma distinção, exigindo
uma escolha entre essas duas possibilidades.
O jogo, para este autor, é uma atividade que possui um fator significante, que
envolve prazer, paixão, divertimento, e não pode ser explicada simplesmente pela via
biológica. Também o traz um elemento racional, pois os animais jogam. O jogo como o
autor coloca é uma abstração, uma realidade autônoma. Ele abrange desde brincadeiras
simples, como nos animais, de morder a orelha sem ferir, até formas mais complexas.
Então, ele não se restringe a algo psicológico, biológico ou material, e sim possui uma
função significante, dando um sentido a ação, ou seja, “um elemento não material em
sua própria essência” (Huizinga, 2001, p. 4).
Considero o cosplay como uma forma de jogo presente nesses encontros. Assim,
conforme Huizinga (2001), as principais características do jogo que agora serão
relacionadas ao próprio “cosplay” são as de que:
1) Trata-se de uma atividade voluntária que pode ser suspensa a qualquer momento.
A obrigatoriedade pode surgir caso tenha função cultural;
2) Não faz parte da “realidade”, sendo que a pessoa tem consciência de que aquilo
não é “real”, marcado por ser temporário. Qualquer jogo pode envolver por completo a
pessoa. Ele é desinteressado, isto é, não faz parte do dia-a-dia, sua satisfação provem da
realização desta, é temporário, tendo papel importante na vida como um todo. Quando o
jogo começa a fazer parte da cultura, ele não deixa de ser desinteressado, pois não está
relacionado a algo material ou biológico, fazendo parte da manutenção do grupo social;
3) Respeita certos limites quanto ao tempo e espaço. Quanto ao tempo, se fixa como
fenômeno cultural, pode se tornar uma tradição. Tem a capacidade de se repetir e pode
haver alternância. Em relação ao espaço, o limite pode ser “material ou imaginária,
deliberada ou espontânea” (Huizinga, 2001, p. 13);
4) O jogo cria ordem, “Introduz na confusão da vida e na imperfeição do mundo uma
perfeição temporária e limitada, exige uma ordem suprema e absoluta: a menor
desobediência a esta ‘estraga o jogo’, privando-o de seu caráter próprio e de todo e
qualquer valor” (idem). Além de satisfação, se caracteriza pelo ritmo e harmonia. No jogo
a tensão está presente, sendo esta entendida como incerteza ou acaso.
Ao falar sobre a mascarada, Huizinga (2001, p. 16) afirma ser esse o momento mais
“extra-ordinário” que o jogo pode alcançar:
O indivíduo disfarçado ou mascarado desempenha um papel como se fosse outra pessoa,
ou melhor, é outra pessoa. Os terrores da infância, a alegria esfuziante, a fantasia mística e
os rituais sagrados encontram-se inextricavelmente misturados nesse estranho mundo do
disfarce e da máscara.
A mascarada então possui características muito próximas do cosplay. O jogo, ao
“representar” alguma coisa, é entendido como a exposição de algo da característica da
pessoa. Quando um jovem, por exemplo, finge ser um personagem, ele sente prazer,
incorpora o personagem, age como se fosse ele, e transmite algo dele naquela
representação, porém sem deixar de perceber que aquilo se trata de uma construção,
imaginação.
O cosplay é então, de certa forma, uma máscara e tal como ela, na visão popular e
carnavalesca:
traduz a alegria das alternâncias e das reencarnações, a alegre relatividade, a alegre
negação da identidade [vista como algo fixo] e do sentido único, a negação da coincidência
estúpida consigo mesmo; a máscara é a expressão das transferências, das metamorfoses,
das violações das fronteiras naturais, da ridicularização, dos apelidos; a máscara encarna o
princípio de jogo da vida, está baseada numa peculiar inter-relação da realidade e da
imagem, característica das formas mais antigas dos ritos e espetáculos. (BAKHTIN, 1996,
p. 35).
Esse aspecto está relacionado com a idéia de identidade que será discutida no
penúltimo capítulo deste trabalho que, do mesmo modo que a máscara, possui inúmeras
possibilidades de ser. A identidade apresenta esse caráter de se metamorfizar, também
remetendo ao sentido de virtualização de Lévy (1996) que trata da diluição das fronteiras
existentes. Ao comparar a máscara com a identidade e a relação delas com o consumo,
pode-se pressupor que neste caso a máscara o é usada no sentido de esconder algo,
mas o de revelar quem a pessoa é; utilizando para isso, objetos que nos classificam pelo
olhar.
Pode-se dizer, então, que a fantasia ou máscara marca um efeito presente hoje,
que é o da transitoriedade de identidades. Canevacci (2001, p. 139), ao falar de máscara
a coloca como possibilidade de ser um outro, “seja em relação à temporalidade, para
impedir a decadência da própria imagem e realizar o outro grande desejo, ser imutável e
indestrutível”.
Uma outra expressão usada para o ato de fantasiar é o “avatar”, usado no mundo
cibernético ao criar um personagem. Dentro de uma concepção apontada por Machado
(2002), se trata de uma “máscara” utilizada para criar uma identidade. O termo “avatar”
tem sua origem na mitologia hindu que, segundo Machado (2002, p. 7-8), “designava o
corpo temporário utilizado por um deus quando visitava a Terra. O antigo termo sânscrito
avatara significava, ao pé da letra, ‘passagem para baixo’”. Em um jogo da internet
chamado “Second Life”, a pessoa pode criar um avatar, isto é, montar um personagem
que gostaria de ser neste universo virtual. Pode-se escolher o tipo físico, a cor da pele,
profissão e, assim, viver essa “segunda vida”. Sobre este novo mundo virtual que vem
atraindo pessoas do mundo todo, foi apresentada uma dissertação pela Perissé (2007) a
qual discute essa outra possibilidade de ser na atualidade.
3.2 - BRINCANDO DE FAZ DE CONTA
Para melhor entender o processo de desenvolvimento do interesse em fazer cosplay,
solicitei ao grupo de cosplayers que, inicialmente, me contassem como foi o primeiro
contato com os eventos. Todos responderam que foram convidados por amigos e essa
informação é importante, pois mostra que a socialização é algo marcante desde o
princípio.
Pensando agora na etapa de escolha do personagem, propus uma dinâmica para o
grupo na qual os participantes deveriam imaginar que tinham acordado vestidos como um
personagem que já fizeram ou gostaria de fazer cosplay, e respondessem algumas
questões que estarão expostas nas transcrições dos trechos abaixo. Usei uma história
para apreender melhor esse processo, pois “É sabido que nem sempre a melhor
articulação a respeito da compreensão do outro e de nossa autocompreensão é feita pelo
discurso racional, acadêmico. Talvez seja possível fazê-lo através de um romance ou de
um filme” (Taylor apud Mattos, 2006, p. 38).
Figura 4
-
Shin do mangá
Nana
Os depoimentos destacados de cada um dos participantes têm como objetivo
permitir a melhor visualização de como a identificação com o personagem se desenvolve.
Como a identidade é uma questão que perpassa todas as declarações, o capítulo
seguinte foi necessário para aprofundar esse tópico.
Por conta dos mangás e animes não serem conhecidos pela maioria das pessoas,
juntamente ao relato de cada participante da vivência da situação proposta, solicitei que
eles contassem um pouco da história do personagem escolhido.
Foi difícil para os participantes imaginarem apenas um personagem, apresentando
na maioria das vezes uns dois ou três. Porém, em alguns deles, o relato se concentrou
em um dos personagens, e nestes casos, a apresentação do mangá/anime se restringiu a
este, especificamente.
A seguir, exponho o jovem entrevistado, o respectivo personagem ao qual gostaria
de fazer cosplay e o relato, propriamente dito.
1) Renato
Personagem principal escolhido: Shin do mangá de Nana
20
- Renato - Quem eu estava pensando primeiro. Eu primeiro pensei no meu cosplay de
Raito, mas eu sempre quis fazer o meu cosplay de alguém de Nana... Mas eu fiz o cosplay
de Raito, porque eu gosto dele também, mas porque era mais fácil por causa das roupas e
tal. Mas o que eu queria mesmo é fazer o Shin. eu imaginei, acordando com o cosplay
de Shin, porque além de ser cosplay de anime e mangá, ele ligado ao visual também
porque é de banda, ele é todo estilozinho. Eu acho que mudaria o jeito de eu agir, porque
eu me empolgo muito, então... E eu adoro e eu tenho essa expressão corporal, mais
caricatural, então com certeza eu ia tentar o jeito dele agir dele, todo coisinha.
- Facilitador - Que características dele você adquiria para você?
- Renato - Eu acho que basicamente a expressão corporal e o jeito. Ele tem um jeito mais
bonequinho, fofinho.
- Facilitador - Como é esse personagem? Descreva. Como você vê ele? Qual a história?
- Talita - Posso descrever? Eu sei!
- Renato - É um mangá sobre bandas, duas bandas. E daí os integrantes das bandas...
Acontecem vários relacionamentos, é aquela coisa tipo de cotidiano. O personagem tem...
- Talita - 15 anos
- Renato - Ele se relaciona no meio de pessoas mais velhas. Ele toca baixo numa das
bandas, da personagem principal, que é ela [aponta para Márcia que está vestida como
Nana]. E ele tem um jeitinho... Ele é meigo.
- Talita - Ele tem muita história por trás. Ele o sabe quem é o pai dele, pois o cara que
disseram que era o pai dele, não é o pai dele. Então ele tem certeza que a mãe traiu o pai
dele.
20
O mangá conta a história de duas mulheres de 20 anos que tem o mesmo nome, Nana, e acabam se conhecendo
quando se mudavam para Tokyo. Porém, apesar dessas similaridades, ambas tem personalidades muito diferentes.
Seu autor é o mangaka Ai Yazawa.
O mantrata de relações amorosas, os diferentes modos de se relacionar, a busca por um objetivo de vida e do
conhecimento de si mesmo.
Este mangá não foi lançado no Brasil, sendo o acesso proveniente da internet. As páginas são scaneadas e, muitas
delas, estão em outras línguas, como no inglês.
- Renato - Ele é uma pessoa complexada...Ele sempre tenta agir de um jeito bem positivo.
Ele está sempre feliz.
- Talita - Ele tem todo esse passado, ele fugiu de casa. A primeira aparição dele, ele é uma
pessoa todo normal, blusa listrada, cabelo normal. No segundo apareceu com cabelo azul.
No terceiro ele aparece com um piercing aqui, outro aqui. Você vai vendo toda a evolução.
- Facilitador - O que te chamou a atenção? Por que escolher esse personagem?
- Renato - Eu acho ele o mais legal da história. Eu acho ele o mais estiloso, porque ele tem
um jeitinho mais divertido.
- Facilitador - E essa história?
- Renato - Acho que a história não influenciou tanto na escolha. Eu gosto da personalidade,
do jeito, mais do que a história da vida dele em si.
- Facilitador - Tem alguma coisa característica negativa do personagem que você mudaria?
- Renato - Acho que não.
- Márcia - É uma confluência quando você escolhe um personagem. Tem a história, tem o
visual e tem um pouco da personalidade. Você tem que no mínimo se simpatizar com ele.
- Facilitador - Esse “ser estiloso” é uma característica que você vê em você? [pergunto para
o Renato].
- Renato - Ah ham [sim].
- Facilitador - Tem uma característica dele que você queria ter em você?
- Renato - Eu gosto do visual dele. Eu gostaria de ter um guarda roupas tão legal.
2) Márcia
Personagem principal escolhido: Nataku do mangá/anime Soul Hunter
21
- Márcia - Quando você falou, o primeiro personagem que pensei foi a Nana por estar
vestida que nem ela, mas na verdade logo depois eu pensei em outro personagem e ele
não saiu da cabeça, que é o Nazza, Nataku, na verdade, o nome original japonês que é de
um anime Soul Hunter, que é o próximo cosplay que eu estou pensando em fazer. Seria
estranho acordar com a roupa dele e ter que passar o dia todo assim, porque não é um
anime de cotidiano, é um desses animes bem fantasiosos. Então a roupa dele é daquelas
bem esfalapabéticas, bem bizarras. Tipo: braceletes enormes, um troço enorme na perna
também, um troço na testa de ferro assim [cobrindo a testa]... Aí eu fiquei tentando imaginar
ficar um dia inteiro com ele e eu com certeza mudaria minha forma de agir. Ele é aquele
personagem cool; ele é um cara caladão, tipo sem expressão. E é um cara que sempre
acontece as coisas mais esdrúxulas com ele, justamente porque ele é um cara sério. Na
verdade o nome do anime é Senkai Den Houshin Engi, mas foi traduzido como Soul Hunter.
É mais ou menos assim: se passa na China feudal e têm absurdos... Tem tecnologias
juntas. É meio atemporal. tem um mago, que é o personagem principal, Taikun, que ele
caça as almas dos espíritos maus que fugiram do confinamento dele. ele tem que
recapturar essas almas. ele encontra vários personagens nessa jornada dele, como
normalmente acontece em todos os animes, para desenrolar a história. E o primeiro
personagem que ele encontra é esse cara, que ele na verdade, é um andróide. Ele não é
uma pessoa. Ele nasceu de uma flor de lótus. ele não tem muita expressão, justamente
por causa disso, ele é um andróide, que ele é muito fofo. Ele morava numa aldeia
quando se encontra com esse personagem. Ele morava numa aldeia com pessoas simples
e ele é todo sinistro, com bracelete e ele começa a andar com o Taikun para ajudar na
missão dele e eles se tornam amigos.
- Facilitador - O que te atraiu nele?
- Márcia - Esse personagem eu sempre achei ele muito legal. Eu gosto do visual
dele. Eu acho ele muito fofo. Eu acho ele legal mesmo. Ele tem umas tiradas
muito legais no anime. Ele o tem expressão no rosto, mas assim, todo
mundo conversando, alguém fala uma besteira, ele vira e [levantado o
braço] e ele atira na pessoa, porque os braceletes saem. As pessoas ficam com
medo dele. Todo mundo fica sacaneando ele.
- Facilitador - Você se identifica com ele?
21
Criado por Ryo Fujisaki, é um mangá publicado pela editora japonesa Jump em 1999, tendo 23 volumes, publicados
ao longo de quatro anos.
Este mangá trata da saga de um mágico que visa acabar com os espíritos malignos com a missão de salvar um
imperador.
Figura 8 - Kaname do Vampire
Knight
Figura 7
-
Tamaki do
mangá Ouran High School
Host Club
- Márcia - Não exatamente. Eu me acho muito escandalosa e bem mais expressiva, mas
gosto dele. Eu acho assim, se eu não fosse como eu sou, eu seria como ele.
- Facilitador - Então isso de brincar de ser...
- Márcia - Com certeza. Eu ia passar o dia inteiro muito feliz fingindo ser ele.
- Facilitador - Você traria algumas características dele para você?
- Márcia - Provavelmente sim. Algumas vezes desse tipo de personagem, não só dele...
Tem vários personagens parecidos com ele. Desse tipo de personagem eu tiro uma coisa:
que muitas vezes é melhor você ficar calada. Eu perco muita dessas oportunidades de ficar
calada. Com certeza eu traria isso.
3)Talita
Personagens principais escolhidos:
- Renge do mangá Ouran High School Host Club
22
- Tamaki Suou do mangá Ouran High School Host
Club
- Kaname do Vampire Knight
23
- Talita - Eu pensei em três personagens diferentes e lembrei da Renge. Ela é a
otaku. Talvez porque a gente estava falando de otaku agora a pouco. Ela tem
aquelas risadas escandalosas. Ela chama atenção. Ela entra e todo mundo tem
que parar para olhar para ela. Ela sempre aparece com roupas malucas. As
pessoas perguntam: “O que você está fazendo?” “Tô fazendo cosplay![fala da
personagem respondendo]. Ela faz cosplay no meio do desenho. Eu nem gosto
dela, sabe?! Mas ela é muito paranóica. Depois fiquei...Não! Eu prefiro me identificar com
outra pessoa, eu lembrei do Tamaki, que era assim... Eu vou fazer o cosplay dele, porque
ele é o cara perfeito. Ele se acha; é o gostoso. Ele é idiota. [...] Eu acho bem legal, eu me
divirto com ele. Ainda tem outro. Não sei por que eu lembrei do Kaname do Vampire Knight.
Ele é o oposto dos outros dois. Ele é quieto, calado. Ele é vampiro. Ele é superior. É um
vampiro de raça pura. Ele não tem nada a ver com os outros. Eu me identifico muito com
ele. O jeito dele. Talvez porque os opostos se atraem. Esse, ao contrário, dos outros, não
tem nada em comum.
- Facilitador - E os outros tem algo em comum com você?
- Talita - É... Eu acho que eu sou escandalosa. Eu acho que quanto mais parecido mais
afinidade. Você tem de se manter fiel ao personagem.
- Facilitador - E é isso que te chamou atenção nos personagens?
- Talita É. Uns por serem iguais e outro por ser um desafio, porque ele é tudo que eu não
sou.
- Facilitador - Você pegaria alguma característica deles para você?
22
Mangá criado por Bisto Hatori. A história fala do Colégio Ouran, onde estudam pessoas ricas e de prestígio. O Clube
dos Anfitriões foi criado por alguns meninos de boa aparência no qual a satisfação das garotas tornou-se um negócio.
Tamaki, fundador do Clube, quer ser o centro das atenções.
Renge é uma otaku no mangá e se declara gerente do Clube.
23
Neste mana história se passa numa época onde havia vampiros. Com o objetivo de que os vampiros e os
humanos consigam conviver pacificamente, o diretor Cross cria a Classe do Dia e a Classe da Noite. Há regras rígidas:
os vampiros, que são da turma da noite não podem revelar sua identidade e não podem sugar sangue. Kaname é um
vampiro de “puro sangue”, pois em sua família não houve mistura com humanos. Por ser de puro sangue ele tem o
poder de transformar humanos em vampiros. Kaname participa da turma da noite e aceita participar da escola, pois
neste projeto uma esperança de quebrar séculos de preconceito e violência.
Figura 5
-
Nataku do mangá Soul
Hunter
Figura 6
-
Renge do mangá
Ouran High School Host
Club
Figura 9 -
Yuki Souma
do mangá Fruits
Basket
- Talita - Da primeira [personagem] com certeza não. Ela é o pesadelo de qualquer um. Do
Tamaki talvez sim. É o jeito de tratar as pessoas, todo educado. Do Kaname, acho que com
certeza eu acharia alguma coisa dele.
4) Mônica
Personagem principal escolhido: Yuki Souma do mangá Fruits
Basket
24
. A seguir mais detalhes sobre ele, expostos pela pessoa
que o escolheu:
- Mônica - Eu na verdade pensei no próximo cosplay que eu pretendo fazer que é a Pink.
Mas na verdade eu nem gosto muito da Pink, eu pensei nela por causa da roupa dela
mesmo. Parece uma roupa que eu usaria. Ela usa duas chuquinhas, ela usa um shortinho,
uma botinha, ela usa um coletinho por cima da blusa dela. E eu gosto muito do colete. Mas
eu fiquei mais por causa da roupa dela. Mas sempre que fala de personagem que eu me
identifico, eu sempre penso no Yuki, do Fruits Basket. Assim, olhando por fora, o tem
nada a ver. Mas eu conheço, quando eu leio, ele tem sim. Ele é mais caladão que eu. Mas
a história base é muito parecida comigo. Ele... A auto-estima dele era muito baixa, ele era
muito inseguro. E ao longo do mangá ele vai melhorando, ele vai ficando mais confiante
dele mesmo, mais alegre, coisa e tal. E eu me identifico, pois eu era muito assim. Quando
eu era nova eu era muito tímida, eu me achava horrorosa, um patinho feio e, ao longo dos
anos, eu fui tomando mais auto-confiança. Ah! Eu não sou tão ruim assim. Vou dar uma
ajeitadinha. Comecei a falar mais piadas e tal. A me soltar mais.
- Facilitador - Você leu esse mangá depois de tudo isso ou foi durante?
- Mônica - Não. Foi mais depois, mas eu vi nele alguma coisa que tinha acontecido em
mim. eu me identifiquei. Apesar de hoje em dia, apesar de ter mais auto-confiança, eu
sou um pouco insegura. E também porque ele tem uma aparência muito andrógena e eu
também. Então, várias vezes eu com cabelo solto e com uma blusa que não pra ver
muito o meu peito, as pessoas acham que sou um garoto. E eles sempre acham que ele é
uma garota e eu me identifico com ele nessa parte.
[...]
- Mônica - Eu me identifiquei com ele. Quando fala em personagem eu penso nele.
- Facilitador - Você, então, não agiria diferente do que você é.
- Mônica - Não. Talvez se tivesse com cabelo prata eu mexeria mais no cabelo. Acho que
se fosse para ter uma das características dele, se eu quisesse ter, é a inteligência dele.
- Facilitador - E tem alguma característica que você mudaria nele?
- Mônica - Eu... Não sei porque ele evoluiu tanto ao longo do mangá. Não tem nada nele
que me irrite. Talvez ele pudesse ser um pouco mais espontâneo, mais solto.
24
É um mangá escrito por Natsuki Takaya. Ele foi lançado em 2001 no Japão, e em 2004 foi transformado em um
anime com 26 episódios. Neste mesmo ano ele foi considerado o shojo mangá mais vendido nos EUA.
O nome dado ao mangá, “Fruits Basket” se refere a uma brincadeira na qual a cada pessoa é atribuído um nome de
uma fruta e o objetivo é achar o par. No mangá, a história o trata de frutas, mas sim de uma maldição na qual
algumas pessoas de uma família se transformam nos animais do horóscopo chinês ao serem abraçados por pessoas do
sexo oposto. A relação com o jogo Fruits Basketé que o grande desafio dessas pessoas amaldiçoadas é permitirem
encontrar seus pares [companheiros], pois muitos deles levam consigo o sentimento de rejeição de seus familiares.
Yuki Souma é o personagem que se transforma em rato quando abraçado por uma mulher. É inteligente, mas muito
calado, não fala de sua intimidade.
Disponível no site: <http://mangasjbc.uol.com.br/fruitsbasket/interna.php?secao=manga>. Acesso em: 02 nov. 2007.
Figura 10
-
Kaname do
mangá Vampire Knight
5) André
Personagem principal escolhido: Kaname do mangá Vampire Knight
- André - Quando você falou, eu pensei no Kaname, que é o próximo cosplay que eu quero
fazer que, por acaso, ela [Talita] também pensou. Ele é exatamente o que eu não sou. Ele é
sério, tem um jeito refinado. É basicamente isso que me atraiu nele. É o que eu não sou. Eu
acho que se eu vestisse a roupa dele, eu acho que não ia mudar em tudo.
- Facilitador - O que você adquiria para você?
- André - Eu aprenderia algumas coisas como: às vezes é bom ser sério, e deixar de falar
algumas coisas.
- Renato - Se eu usasse a roupa do Kaname eu ia me sentir tão poderoso que eu ia ter
que agir com aquele jeito elegante dele. A roupa dele pede isso.
- André - Jeito elegante a gente pega, mas eu não ficaria tão sério. Porque eu era muito
sério. Acho que todo mundo aqui pelo jeito começou com aquela fase tímida e foi se
soltando. Agora sou escandaloso do jeito que eu sou.
No site Cosplay Brasil coloquei duas perguntas relacionadas a esse processo de
identificação com os personagens para realização do cosplay. A primeira foi: “Como é
feita a escolha do personagem?”. Selecionei duas respostas para exemplificar o que foi
por eles colocado:
Nadia - Eu escolho o meu personagem qdo vejo que suas caracteristicas são parecidas
com as minhas, e quando sei que irei ficar bem nele. Hoje tenho muitos amigos cosplayers
e posso garantir que é uma emoção sem igual.
Marcelo - Normalmente escolho o personagem porque gosto do jeito dele, o ligo muito
pra complexidade da roupa, se eu gosto da personalidade do personagem tento fazê-lo...
^^... afinal o que vale é se divertir, e não parecer APENAS bonitinho... ^^... mas é claro,
essa opinião varia entre os cosplayers, cada um com seu critério de escolha.
Em seguida perguntei se as “características parecidas” são relacionadas a
aspectos físicos ou seriam relativas ao comportamento.
Nadia - Bom eu procuro personagens parecidos comigo nas duas formas: comportamento e
físicas. E sim algumas características de comportamento nas quais eu realmente
procuro me espelhar.
Marcelo - Normalmente são características que eu tenho, não digo características físicas
(até porque é difícil encontrar um personagem que tenha minhas características), mas sim
no jeitinho dele ser, assim não preciso me esforçar tanto pra interpretá-lo, por exemplo: não
consigo fazer personagens muito sérios, até poruqe gosto muito de rir e por qualquer
besteirinha estou dando risada... rs. Então me identifico mais com personagens mais
alegres e agitados... ^^... mas nada me impede de fazer cosplay de um personagem sério,
se eu gostar eu faço... ^^
Tanto no site quanto no encontro com os cosplayers “ao vivo”, se pode notar que
eleger qual personagem gostariam (gostam) de fazer cosplay, está relacionado a uma
identificação, que pode ser pela história, personalidade ou vestimenta. Algumas dessas
características o as que eles têm de parecido, outras são opostas, mas que gostariam
de ter.
O fato de se identificar com um personagem do sexo oposto não é impedimento para
realização do cosplay. No caso das mulheres se vestirem como homens não há problema,
mas o inverso não é visto com tanta naturalidade.
Contudo, no processo de elaboração de um cosplay, selecionar um personagem é
apenas uma etapa. Depois disso, as pessoas se deparam com o próximo passo, que é
torná-lo real. “Dar vida ao personagemenvolve não apenas interpretá-lo, mas também
preparar uma fantasia real. A maioria dos participantes do grupo fez mais de três
cosplayers e pretendem fazer mais, sendo a troca de experiência entre os cosplayers uma
das características que mais me chamou a atenção. Durante os eventos ou até mesmo
nos fóruns virtuais, muitos cosplayers (no grupo isso acontece com todos) costumam
compartilhar informações sobre a forma de elaboração da vestimenta e acessórios, dando
dicas e sugestões. Afora as perucas, que podem ser adquiridas prontas, a maioria das
peças que compõem o personagem precisa ser construída. O processo de formação de
uma fantasia pode ser muito demorado, dependendo da complexidade da roupa e do
dinheiro disponível, e envolve várias atividades, tais como: escolha do tecido mais
adequado ao movimento que o personagem realiza; pesquisa de preços e de materiais
mais baratos para confecção do cosplay (normalmente não possuem muita renda para
isso), distribuindo o orçamento para conseguir montar a fantasia completa;
desenvolvimento de habilidades no uso da cola quente e corte e costura para a
montagem da fantasia e dos adereços, e criatividade em coordenar todas essas etapas a
tempo para um evento. Em alguns casos, eles desenham a roupa e compram o material,
sendo a costura encaminhada a um profissional.
Uma das dúvidas que eu tive é se a roupa tinha que ser, necessariamente, idêntica
ao do personagem. Eles responderam o seguinte:
- Mônica – Eu acho legal quando a pessoa dá uma adaptada às vezes. [...]
- Márcia Eu acho que tem adaptações que são muito válidas. É como se você falasse
assim: Tem cosplays que você consegue botar fielmente o que seria o ideal e tem cosplays
que não dá. Se fosse colocar na vida real, seria assim. E é uma adaptação super válida.
- Talita E tem gente que assim... Inclusive fala assim: “Eu fiz [cosplay] de tal
personagem na vida real”. [...]. Eu vi [cosplay] do rei do Evangelion. Ela [a personagem]
tem um cabelo azul. ela [a cosplayer] tem um cabelo idêntico só que castanho. [Não
usou a peruca] E ficou muito bom. E o azul é peruca... Todo mundo olha e vê que é peruca.
- Renato – Tem gente que pinta o cabelo.
A dificuldade em montar uma fantasia vai depender, então, do personagem
escolhido. Muitas vezes são roupas do cotidiano e que não precisam de muita
elaboração. Nesses casos no qual a roupa é simples, há a possibilidade dessas pessoas
fazerem um “cosplay de armário”. O que seria isso? Seria aquele cosplay de improviso,
que utiliza o que se tem em casa, e que normalmente o se gasta nada para fazer.
Cosplay de armário o é sinônimo de cosplay ruim; para isso eles utilizam o termo
“cospobre”. Nas palavras de uma das participantes, “Cospobre é aquele cosplay zoado
que você pega qualquer coisa da sua casa e faz”.
CAPÍTULO IV
JUVENTUDE E IDENTIDADE:
ESSA METAMORFOSE AMBULANTE
A escolha de trabalhar com o grupo jovem para melhor compreensão do fenômeno
“cosplay” advém do fato de ser uma atividade realizada, em sua maior parte, por essa
parte da população. E, além disso, estudar a juventude serve como meio de entendimento
das transformações que estão ocorrendo em nossa sociedade, principalmente porque é
nesta fase que atualmente acometem as maiores contradições tanto em relação à
formação da identidade quanto pelo choque entre estruturas passadas e atuais.
As variações quanto à definição do termo juventude aparece nos trabalhos dos
diferentes profissionais, assim como naqueles que lidam com categorias gerais como
infância e adulto, por exemplo. As diferenças no entendimento acontecem, sobretudo por
ocasião do referencial utilizado. Segundo Groppo (2000) os três termos mais usados
quando se trata de juventude são:
1) Puberdade, derivada das ciências médicas, é relativo às mudanças no corpo;
2) Adolescência, proveniente da psicologia e pedagogia, se refere às alterações na
personalidade e no comportamento durante a passagem para idade adulta;
3) Juventude, adotada pela sociologia. Trata-se do período marcado pelas
transformações sociais entre a infância e a idade adulta. É a época da socialização
secundária que ocorre através da escola e outras instituições.
Uma definição mais detalhada da juventude a apresenta como:
Uma concepção, representação ou criação simbólica, fabricada pelos grupos sociais ou
pelos próprios indivíduos tidos como jovens, para significar uma série de comportamentos e
atitudes a ela atribuídos. Ao mesmo tempo, é uma situação vivida em comum por certos
indivíduos. (GROPPO, 2000, p. 8).
Pensar em juventude, segundo uma visão biológica ou psicológica, conforme
descritas acima, implica em concordar que esta é uma fase entre “a maturidade fisiológica
até a maturidade social” (Castro; Abramovay; Rodriguez, 2004, p. 25), porém, é olhar
para o cotidiano que se percebem as variedades quanto ao tempo histórico e as maneiras
de vivê-la em cada período. A incoerência decorre porque na modernidade considerava-
se a juventude uma fase preparatória para entrada na vida adulta, mas como categoria
social, ela acaba abrangendo uma série de possibilidades de ser jovem dependendo do
contexto social e cultural que se situe. E é a partir disso que a sociologia e as ciências
políticas contribuíram, mostrando outras perspectivas, o que torna viável se falar hoje em
“juventudes”. Uma das marcas da juventude é a formação de grupos concretos com
símbolos e estilos que se diferenciam de outros, e a criação de uma identidade entre
aqueles que compartilham destes aspectos.
autores que apontam para uma continuidade no desenvolvimento, com uma
perspectiva evolucionista, no qual primeiro viria a infância, seguida da adolescência,
depois da juventude, chegando a idade adulta. Também é possível encontrar em alguns
livros a equivalência na definição de adolescência e juventude como época de transição
entre infância e idade adulta. Historicamente, a adolescência foi criada na sociedade
capitalista como período para se preparar para o mercado de trabalho.
O termo a ser adotado neste trabalho é o de juventude, visto como uma construção
do indivíduo situado num momento histórico, social e cultural. Ao empregar este conceito
não se está ignorando as questões biológicas e psicológicas, pois acredito que este
enfoque engloba estes aspectos. Eventualmente empregarei o termo “adolescência” e
suas variações, na mesma perspectiva defendida para o termo “juventude”.
Para reforçar o caminho que estou delineando, ressalto quatro aspectos que vem
acompanhando o imaginário das pessoas e que podem interferir na compreensão,
quando se trata de juventude. Primeiro, ao considerar a juventude um período entre a
infância e a idade adulta, isto não implica que esta fase, assim como a infância, seja
apenas uma etapa de preparação para alcançar um futuro, no qual ele passará a ser
alguém (adulto), destituindo com isso o presente. A pergunta “o que você vai ser quando
crescer?” seria um indício desse ponto. A partir de 1960, uma outra visão da juventude
começou a repercutir, associando-a a uma idéia de liberdade, de prazer, na qual essa
fase serviria para se experimentar atitudes e sensações novas, sem o peso da
responsabilidade e voltada para busca do prazer. Soma-se a isso os que consideram a
juventude como momento de crise, rebeldia e conflitos com a família e consigo mesmo.
Segundo esta visão, a juventude é aquela que contradiz as idéias dos adultos
simplesmente por capricho, por isso a desqualificação da posição desses jovens. Como
último aspecto, acrescento a idéia de Dayrell (2003) de que hoje existe uma tendência em
reduzir o jovem a uma cultura, que se expressa em determinadas ocasiões ou atividades.
Sem essas pré-concepções é possível entender a juventude não como fase de
transição, mas como um momento em si, importante na vida de uma pessoa, no qual se
passa por transformações no corpo, nas relações e emoções, que terão repercussões ao
longo da vida. Como esse processo está diretamente relacionado ao meio social que o
sujeito se encontra, existem várias formas de ser jovem. O jovem como sujeito social é
um ser em construção que sentido a si mesmo e ao que está a sua volta, e “se
constitui como ser biológico, social e cultural, dimensões totalmente interligadas, que se
desenvolvem com base nas relações que estabelece com o outro, no meio social concreto
que se insere” (Dayrell, 2003, p. 43).
O critério etário é usualmente adotado por sociedades ocidentais e orientais para
definir quem é considerado jovem, porém segundo Castro (1998b), essa restrição
referente à categoria baseada na idade é limitada, sendo importante ressaltar a
relatividade deste discernimento diante das diferenças nas representações simbólicas e
valores de acordo com a nacionalidade, gênero, classe social, contexto histórico, etc,
pois, como mencionado anteriormente, existe uma variedade de juventudes. Um fato
que implica numa dificuldade ainda maior em estipular uma faixa etária para definir a
juventude decorre da cultura de massa da sociedade capitalista que, por conta da entrada
de novos elementos houve uma desinstitucionalização da juventude, passando a ter uma
“juvenilização” (Groppo, 2000) da vida. A fase jovem começou a ganhar espaço e é
definida como a melhor etapa a ser vivida. Sob essa nova óptica, “ser jovem” não se
refere mais a uma fase transitória, nem está vinculado a uma idade, mas sim está
relacionado a um “estilo de vida identificado ao bem-estar consumista”, sendo
extremamente almejado hoje em dia. Vianna (1992) corrobora este aspecto em uma das
perspectivas que adota para juventude. Nesta, ela aponta que a:
Juventude é um complexo de representações na mídia, cujos signos e símbolos são
manipulados no domínio do consumo e introjetados por cada pessoa, que lhes um
sentido específico. A pessoa será sempre jovem enquanto estiver existencialmente em
formação, atenta à dinâmica do mercado e aberta para as inovações e transformações que
se dão no mundo. Juventude está associada a um padrão de beleza e isso envolve um
aumento progressivo de cuidados com o corpo, cuidados que, em geral, tendem a atenuar
e dissimular a idade sócio-biológica e causar a impressão de vitalidade perene. Além disso,
envolve toda uma preocupação em seguir modas de vestuário e praticar certos tipos de
atividades. Juventude, então, significa uma "idade mídia", isto é: uma categoria trans-etária,
incorporada pela cultura de massa como mito da "eterna juventude", que reforça o estigma
da velhice em nossa sociedade.
Mesmo havendo essas limitações, creio que a melhor opção seja adotar a faixa
etária como referência, mas deixo registrado aqui que esta delimitação foi sugerida
visando facilitar a escolha do grupo a ser estudado e por falta de critérios mais precisos.
Como o período que define a juventude varia enormemente, adotarei o limite etário
estipulado pelas Nações Unidas que define a população jovem aquela entre 15 e 24 anos.
O Brasil é o quinto país que possui o maior percentual de jovens, “correspondendo a 50%
da população jovem da América Latina e 80% do Cone Sul. Os 34,1 milhões de jovens
brasileiros, ou 20,1% do total da população brasileira, representam quase que a
população total da Argentina (cerca de 38 milhões)”
25
.
Pode-se dizer, de uma forma geral, que a faixa etária que corresponde ao jovem foi
ampliada, avançando no que antes era considerado adulto. Isso decorre de mudanças na
sociedade e na cultura, em especial pelo maior tempo de preparação nas escolas devido
ao aumento de exigências para entrada no mercado de trabalho. O período cada vez
maior dedicado ao estudo evidencia a enorme concorrência para conseguir uma boa
oportunidade de emprego, item tão importante na conquista do sucesso. Nos eventos que
reúnem admiradores de mangá e anime, as competições aparecem e as pessoas
concorrem a prêmios. Porém, alguns competidores chegam a exacerbar as reações com
a concorrência, passando a discutir por conta disso. Dois depoimentos dos participantes
foram selecionados para corroborar esse ponto:
- Mônica - Eu vi gente brigar porque entrou no grupo de fulano e não no meu grupo,
então cortou a amizade. Uma coisa absurda.
- Márcia - Outra coisa relativa à briguinha também: Pessoa que faz cosplay de determinado
personagem e se acha dono daquele personagem. O que teve gente se achando dono
de determinado personagem... De encontrar no banheiro e falar: “Mas por que você está
usando cosplay de tal personagem? Porque o tal personagem eu faço cosplay dele”.
Aconteceu com uma amiga nossa, ela estava com o cosplay de Sailor Júpiter. Naquela
época havia um único grupo de Sailor Moon. Elas eram as Sailors. Um dia essa amiga fez
um cosplay dela [de uma das Sailors, a Sailor Júpiter], tava bonitinho. Foi ao banheiro,
começou a se ajeitar... A garota chegou, colocou o dedo na cara dela e falou “Que história
é essa de fazer Sailor Júpiter?! Você não vai se apresentar!”. Ela queria que ela não se
apresentasse, pois ela era a Sailor Júpiter. Depois disso várias outras historinhas
25
Disponível em <http://www.onu-brasil.org.br/view_news.php?id=4697>. Acesso em: 31 out. 2007.
4. 1 - GERAÇÃO
Um outro ponto importante de ser abordado ao estudar o fenômeno “cosplay” entre
adolescentes é o tema das gerações. Esse conceito sociológico é uma forma de situação
social que deve ser distinguida dos grupos sociais concretos como foi proposto por
Mannheim (1982). Os grupos sociais concretos seriam as organizações com propósitos
definidos, formados através de laços familiares e/ou de “proximidade” como o “grupo
comunitário”, ou pela vontade como “grupos associativos”.
Na geração, diferentemente do grupo, os membros não conhecem
necessariamente uns aos outros, não precisa haver uma proximidade entre eles e
também o possuem um objetivo ou documentos relativos a uma organização que os
una. A geração, enquanto fenômeno social possui estrutura semelhante à classe social.
Esta se caracteriza por ser uma situação comum vivida por alguns indivíduos diante da
estrutura econômica de poder e, por isso, não advém da vontade das pessoas. Do
mesmo modo, a geração é uma situação comum, mas esta se pelo ritmo biológico
humano. Pessoas que nasceram num mesmo ano possuem uma situação comum, com
uma dimensão histórica e social específica, que os diferencia dos demais por estarem
expostos a um modo de vida, estímulos, contextos e modos de pensar específicos
daquele momento. Apesar da base biológica, não está havendo aqui uma redução dos
fenômenos sociológicos a fatos naturais, estes servem apenas como auxílio para
entender o fenômeno como tipo de situação social compartilhado por “grupos etários” em
um processo histórico-social comum. Assim, da mesma forma que a juventude, a
geração pode ser definida pela idade, mas não se reduz a isso.
Porém o fato de nascerem em um mesmo período o garante que seus
constituintes estejam “similarmente situados”, sendo apenas condição para que haja uma
situação comum. Aquela é criada por uma posição de partilhamento de experiências
comuns. Os membros devem coincidir na contemporaneidade cronológica e também
participarem das circunstâncias históricas e sociais.
Outro ponto relevante é que a existência das gerações na vida social implica num
movimento contínuo de surgimento de novas gerações e desaparecimento de outras,
podendo haver transmissão do processo cultural vivido no decorrer desta passagem.
Cabe esclarecer que a herança cultural acumulada é recebida pelo outro diferente da
forma com que foi adquirida, do mesmo modo que acontece com produtos de outros
países. Em nossa sociedade a diferença das gerações tornou-se visível pelo contraste
proporcionado pela proliferação tecnológica que vinculou a necessidade de um objeto não
mais a sua utilidade, mas sim ao desejo em adquiri-lo, tornando o produto uma marca de
diferença (Canclini, 1999). Como foi discutido no item “virtualização da família” os adultos
como os principais responsáveis pela educação e transmissão dos valores, costumes e
normas para continuidade do mundo, estão, muitas vezes, destituindo desses papéis (até
porque muitos desses conhecimentos são novos para ele também) que,
progressivamente vão sendo ocupados pelos meios eletrônicos, que perpetuam saberes e
modos de ser.
A diferença no modo como os grupos de uma mesma geração reagem diante de
uma mesma experiência é também abordada por Mannheim, sendo nomeada de
unidades de geração. Estas são caracterizadas pela semelhança no modo de pensar dos
seus integrantes. Hoje uma dessas ligações pode estar relacionada ao consumo de certo
produto, pois além de adquirirem o mesmo artigo também uma adequação quanto ao
valor atribuído a ele. Nas palavras de Mannheim (1982, p. 89) as unidades de geração,
se caracterizam pelo fato de que o envolvem apenas a livre participação de vários
indivíduos em um padrão de acontecimento partilhado igualmente por todos (embora
interpretado diferentemente por indivíduos diferentes), mas também uma identidade de
reações, uma certa afinidade no modo pelo qual todos se relacionam com suas
experiências comuns e são formados por elas.
A unidade de geração surge de um encontro entre pessoas, de grupos concretos
que, posteriormente, provocam atitudes integradoras entre aqueles que não formavam o
grupo inicial, ampliando suas concepções que, aos poucos, vão sendo desvinculadas do
grupo de origem.
É viável apontar que uma situação de geração (refere àqueles que partilham do
mesmo período de nascimento, região histórica e cultural) não é pré-requisito para que
haja uma unidade de geração, assim como o movimento não necessariamente é voltado a
atitudes progressistas. Portanto, mesmo que novas concepções e movimentos seqüentes
ganhem forma pelo coletivo, não é em toda situação de geração que eles são
observados.
Como resultado de uma aceleração no ritmo da transformação social e cultural, as atitudes
básicas precisam se modificar tão rapidamente que a adaptação e modificação latente e
contínua dos padrões tradicionais de experiência, pensamento e expressão deixa de ser
possível, fazendo então com que as várias fases novas de experiência sejam consolidadas
em alguma nova situação, formando um novo impulso claramente distinto e um novo centro
de configuração. Falaremos em tais casos, da formação de um novo estilo de geração ou
de uma nova intelíquia de geração (MANNHEIM, 1982, p. 92).
O fator biológico apenas possibilita novas intelíquias, mas o as determina. Neste
sentido, uma mudança pode ocorrer sem reflexão, sem constituição de uma unidade
diante desse novo impulso ou sem ter experienciado conscientemente seu caráter de
unidade de geração. Além disso, o período de uma nova geração não tem quantidade fixa
de anos, mas depende da ação do processo social e cultural.
Hoje ao mesmo tempo em que um certo “confronto” entre aqueles que estão
vivendo a trajetória de um mundo cada vez mais dominado pelas máquinas e aqueles que
nasceram convivendo com isso nesta sociedade, pode também ser observado (como
anunciei anteriormente) uma dissolução dessa diferença, ao instituir a juventude como
uma categoria sem fronteiras etárias ou “trans-etária”. Neste caso, as gerações anteriores
e atuais coincidem. Como Vianna (1992, p. 14) elucida “O tempo histórico - o passar das
gerações - é abolido em detrimento de um tempo mítico - onde a juventude é eternamente
imobilizada. O indivíduo rebela-se contra a possibilidade de envelhecer”.
4.2 – IDENTIDADE: UMA RELAÇÃO COM O MUNDO
Ao longo deste trabalho foi sendo discutido como a sociedade hoje está
contextualizada, o que serve agora como alicerce para discorrer sobre a “identidade”. A
questão da identidade foi mencionada direta ou indiretamente em diferentes aspectos,
sobretudo no capítulo três, “Conhecendo o cosplay”, no qual este assunto esteve presente
em vários momentos, havendo, por isso, a necessidade de aprofundar esse tema, que
a realização do cosplay está relacionada principalmente a identificação com o
personagem.
A identidade é algo construído e sua origem ocorreu em decorrência da crise do
pertencimento. Segundo Bauman (2005), não devemos recorrer a autores que não
viveram esse período para responder ou explicar as questões sobre identidade, pois os
problemas agora são diferentes do momento no qual desenvolveram suas teorias. Nas
palavras deste autor: “Quando a identidade perde as âncoras sociais que a faziam
parecer ‘natural’, predeterminada e inegociável, a ‘identificação’ se torna cada vez mais
importante para os indivíduos que buscam desesperadamente um ‘nós’ a que possam
pedir acesso” (Bauman, 2005, p. 30). Fica, assim, mais fácil entender porque a identidade
é um assunto que está em evidência nas últimas décadas.
Pela etimologia da palavra, identidade é um termo de origem latina que significa “o
mesmoou semelhante, fato este que indica a dialética em sua formação, pois o homem
se forma a partir das relações que estabelece com o mundo. Berger (1999) em seus
estudos sobre os modos de ver, também apresenta essa relação de reciprocidade quando
relata que ao vermos somos vistos.
O processo de construção do “eu” tem início pela inserção num meio que vai
transmitindo seus valores e regras. Assim “antes que eu ‘me chamasse Fulano’, eu ‘era
chamado Fulano’” (Ciampa, 1994, p. 63). Ou seja, é a partir da relação que vai sendo
formado um “eu”, uma subjetividade e se adquire uma singularidade. O princípio
existencialista dizia que “a existência precede a essência” o que demonstra a
importância da relação no estabelecimento da essência. Nas palavras de Maheirie (1994,
p. 115): “(...) nascemos ninguém e vamos nos tornando alguém na medida em que
vivenciamos as relações com as coisas, com os homens, com o tempo e com o corpo”.
Segundo esta mesma autora, para Sartre, “eu”, essência e identidade possuem o mesmo
sentido, sendo formadas na relação corpo e consciência no mundo.
Presumo que seja imprescindível fazer uma distinção entre subjetividade e
identidade, pois diferentemente da autora citada, eu os considero diferentes. Vários são
os autores que procuram distinguir esses conceitos com variações do tipo: identidade
individual e coletiva, subjetividade individual e social, somente identidade ou
subjetividade, podendo também encontrar os que empregam como sinônimos; o que
justifica a confusão dos termos. Como dito acima, a identidade é aqui entendida em um
contexto social, sendo uma característica que a torna pertencente a um grupo social. A
subjetividade é a que indica o porquê se investe em tal posição na sociedade ou se
identifica com tal grupo ou pessoa. No dicionário “Le notions philosophiques” (Jacob,
1990), uma das definições da subjetividade na filosofia moderna aparece como sendo
consciência de si ou sua essência. Para Woodward (2000) a subjetividade envolve
pensamentos e emoções pessoais, conscientes ou não, que pode ser manifesta pelas
identidades. Assim:
O conceito de subjetividade permite uma exploração dos sentimentos que estão envolvidos
no processo de produção da identidade e do investimento pessoal que fazemos em
posições específicas de identidade. Ele nos permite explicar as razões pelas quais nós nos
apegamos a identidades particulares. (WOODWARD, 2000, p. 55-56).
Ao elaborar seu pensamento dentro de fundamentos sartrianos, Souza (1987)
expõe que ao se deparar com o mundo, cada pessoa o organiza de maneira particular,
havendo então várias percepções e inúmeros significados para um mesmo fenômeno.
Segundo esta autora, “Nunca vemos ‘objetos’ puros e simples. Vemos as coisas dentro de
um contexto no espaço e no tempo. Tudo o que os nossos órgãos dos sentidos
conseguem captar interessa particularmente em primeiro lugar a nós mesmos” (Ibid., p.
37). Neste sentido, a identificação que uma pessoa tem por determinado grupo, produto
ou personagem revela algo sobre a subjetividade dela. Além da identificação, é pelo agir
que é formado o ser, assim, na medida em que uma pessoa escolhe uma forma de se
colocar no mundo, ela também se escolhe e constitui seu projeto existencial.
Um fato característico é que atualmente a identidade está cada vez mais
sustentada por ideais ou princípios com a qual a pessoa se afilia e menos ditada por laços
de criação. O modelo antigo de identidade, fixa, estável, não tem mais sentido e se
distancia das novas estruturas. Como ela está aumentando seu apoio em bases
“líquidas”, parafraseando Bauman (2005), é complicado se pensar em exigir identidades
estáveis e duradouras. Neste contexto a existência de uma identidade que dure por um
longo período vai se tornando inconciliável: “As identidades são para usar e exibir, não
para armazenar e manter” (Ibid., p. 96). Pertencimento e identidade tornam-se
transitórios. Uma questão hoje talvez seja qual das identidades escolher, havendo uma
avaliação se tal identidade é compatível com a pessoa. Este é mais um dos meios que o
homem é considerado um ser virtualizado de acordo com Lévy (1996), o que significa
poder assumir várias formas, inúmeras identidades.
Para pensar em algumas características da identidade, utilizo em alguns casos os
meios midiáticos, pois estes exploram essa questão de diferentes maneiras. Um aspecto
que Ciampa (1994) destaca é o ocultamento intencional da identidade que pode ser
verificado no caso de um espião ou um super-herói, por exemplo. Uma variação deste
ocultamento pode surgir quando se esconde algum aspecto de sua identidade por receio
de rejeição. Numa história em quadrinho japonesa chamada Kare Kano, este tipo de
ocultamento é o foco inicial da narrativa, sendo possível acompanhar as dificuldades que
a personagem enfrenta por acreditar que se agisse de modo autêntico, isso resultaria num
afastamento dos benefícios que o seu meio social lhe oferece. Deste modo, ela finge ser
uma pessoa prestativa, calma e que adquire notas boas sem muito esforço, para
conseguir elogios de seus colegas.
Um fato a ser elucidado nestes casos é que pode haver um confronto entre as
identidades pessoais e suas respectivas representações. Sobre a representação, pode-se
dizer que são as
práticas de significação e os sistemas simbólicos por meio dos quais os significados são
produzidos, posicionando-nos como sujeito. É por meio dos significados produzidos pelas
representações que damos sentido à nossa experiência e àquilo que somos.
(WOODWARD, 2000, p. 17).
Na adolescência esse conflito normalmente acontece, pois algumas vezes se cobra
que ele seja adulto, outras o posiciona como criança. E quando, por algum motivo, uma
identidade não é mais reconhecida isso se torna ameaçador. Um exemplo é o de um ex-
prisioneiro. Este, muitas vezes não consegue ter uma identidade digna, pois esta não é
confirmada pela sociedade, que impõe uma barreira para se ter uma identidade diferente.
As pessoas o identificam como pertencente a um grupo (delinqüentes) o qual é difícil de
ser modificado. Não estou entrando na questão do posicionamento do indivíduo frente a
isso, seja enfrentando o preconceito ou consentindo com essa posição. Nesses casos em
que a identidade é descartada a priori, a pessoa é destituída de ter identidade, pois é
afastada do meio social onde esta é formada, confirmada ou eliminada, sendo chamada
de “identidade de subclasse”.
A “sub-classe” é um grupo heterogêneo de pessoas que como diria Giorgio Agamben
tiveram o seu “bios” (ou seja, a vida de um sujeito socialmente reconhecido) reduzido a
“zöe” (a vida puramente animal, com todas as ramificações reconhecidamente humanas
podadas ou anuladas) (BAUMAN, 2005, p. 46).
A representação também suporte ao estabelecimento das identidades
individuais e de grupo na cultura, pois é através da representação que adquirem sentido.
A representação o possui caráter mentalista ou interior, mas se coloca como uma
marca material, exterior, tal qual uma pintura, expressão oral, texto. Silva (2000, p. 91)
complementa que “a representação é um sistema lingüístico e cultural: arbitrário,
indeterminado e estreitamente ligado a relações de poder”. Assim, quem representa dita
as identidades a serem seguidas. é que a publicidade se insere, produzindo
identidades e fornecendo significados. Desta maneira, o sucesso de um anúncio se
pela identificação do consumidor pela imagem veiculada. Por exemplo, a representação
de uma mulher independente e decidida hoje, pode estar vinculada à aquisição de um
determinado produto. Outra representação difundida atualmente é a da identidade
americana, que se apóia numa visão maniqueísta. Nesta, veicula-se a idéia de que,
quem está ao lado dos EUA são pessoas “boas” ou até “coitadinhas”, e a personificação
do mal se coloca na figura do “Osama bin Laden”.
O grupo de cosplayers demonstrou indignação quanto à representação que é
passada sobre eles em alguns meios de comunicação. Um assunto que foi motivo de
discussão por vários cosplayers foi a reportagem sobre dois adolescentes que teriam
fugido para manter o romance. O trecho inicial publicado no jornal O Globo dizia o
seguinte:
Clara Graham, de 14 anos, e Robson Celestino, de 17, são fanáticos por desenhos
animados japoneses. Na vida real, os dois se envolveram numa aventura: há uma semana,
fugiram de casa e seus pais tiveram de recorrer à polícia para tentar encontrá-los. De
acordo com o pai de Clara, Miguel Bruno de Souza, de 57 anos, o motivo da fuga teria sido
a oposição ao namoro dos dois:
- Minha filha começou a entrar nessa onda de se vestir como esse pessoal fanático por
desenho. Até então, não achávamos nada demais. Conversamos com os dois e ficou tudo
bem. Mas o relacionamento chegou a um ponto com o qual não estávamos concordando.
Pedimos que terminasse o namoro e ela fugiu.
O que aproximou Clara de Robson foi o culto aos desenhos animados japoneses,
conhecidos como anime. Os dois costumavam se encontrar com outros adolescentes para
conversar sobre os desenhos e ouvir músicas ligadas a esse universo (MOREIRA, 2007, p.
15).
Quando o grupo falou sobre esse episódio, eles comentaram a repulsa que sentem
ao divulgarem essas informações errôneas sobre o cosplay:
- Renato[...] Quando eles falam alguma coisa... Eles nunca retratam bem. É sempre uma
coisa esquisita
- Márcia – Apesar de ser verdade que a gente mesmo fala: “Hummm aquele cara é
surfistinha” e alguém olhar para você e dizer: “Humm aquele é otaku”, acho que quando
está falando de você, quem você é, parece sempre que este tachando negativamente,
mesmo que não esteja mesmo pensando nisso. Eu sinceramente não gosto. Quando eu
vejo matérias falando sobre isso, eu até leio mesmo para saber sobre o que eles estão
falando, mas eu não gosto. Eu nunca gostei.
Uma outra situação onde a identidade é colocada em uma condição de confusão
ocorre quando, por exemplo, se descobre que tal amiga é na verdade a filha dela. Como a
criação da história de cada pessoa vai sendo construída na relação, pode-se dizer que a
identidade de uma revela a da outra, assim, no exemplo anteriormente citado, desvendar
que uma amiga é a filha dela traz uma nova identidade para ambas.
Esses manejos apresentados da identidade revelam que esta não é algo
estanque. De acordo com a herança social, experiências vividas e aspectos pessoais
formam-se identidades que se transformam e são imersas em contradições. Para
visualizar este quadro, recorro a Castro (1998a) num trecho em que ela aponta a
pluralidade de faces que o adolescente vive, dependendo do meio que ele é exposto. O
jovem convive, então, com uma face aparentemente submissa encontrada na escola; uma
outra que se forma pela televisão, videogame e institui uma nova pedagogia através da
imagem e do predomínio da sensação; outra ainda é constituída na ausência da
convivência mais próxima com os pais e no aumento da troca entre seus pares; e, por
último, a face que lhe confere o status de consumidor, nova forma de ser cidadão nesta
sociedade. Cada uma dessas situações se apresenta com regras particulares e, os
diferentes modos de ser aos quais os adolescentes estão expostos, muitas vezes
paradoxais, influem diretamente na autopercepção e nas maneiras pelas quais eles se
apresentam, dependendo do meio em que se encontram. Porém, em meio a tantas
demandas que podem ocorrer no mesmo dia, incluindo as transformações que vão
acontecendo com o passar dos anos (ao deixar de ser criança para se tornar
adolescente), uma tendência em manter uma unidade, uma noção de que somos a
mesma pessoa. Assim, fica claro que somos “diferentemente posicionados pelas
diferentes expectativas e restrições sociais envolvidas em cada uma dessas diferentes
situações, representando-nos, diante dos outros, de forma diferente em cada um desses
contextos” (Woodward, 2000, p. 30).
A questão do prenome e do sobrenome como Ciampa (1994) elucida, indica mais
um aspecto importante da identidade, que é a presença da diferença (prenome) e da
igualdade (sobrenome) perante os demais. Assim, ao pertencer ou se identificar com um
grupo, isso revela uma igualdade entre os membros, um certo reconhecimento dos
integrantes quanto ao seu pertencimento e de seu reconhecimento no grupo, da mesma
forma que indica uma distinção ou exclusão de outros grupos. As identificações com
grupos diferentes ratificam o caráter social da identidade.
Retomo a condição de transitoriedade da era “líquido moderna” (Bauman, 2005, p.
18) que ocasionou uma mudança no estabelecimento dos laços sociais, que foram se
tornando mais frágeis. As comunidades das quais as pessoas fazem parte assim como as
“intimidades” somam agora características como: serem passageiras e superficiais.
Bauman define essas comunidades de “comunidades guarda-roupa”, pois tal como em
alguns espetáculos em que os casacos são unidos no começo e entregues no final, elas
só duram o tempo que for preciso para utilizá-las.
Como o consumo é algo que está totalmente vinculado ao processo de
identificação, gostaria de discutir sobre esse ponto de forma mais aprofundada.
As identidades podem servir como linguagem e compartilhamento de sistemas
simbólicos. Para Baudrillard (1995), um acontecimento notável nos dias de hoje é a
relação da lógica do consumo com a “lógica da produção e da manipulação dos
significantes sociais” (p. 59). Segundo ele, o objeto o é consumido pelo seu valor de
uso, mas pelos signos que representam e que os insere em determinados grupos e os
distingue de outros. Ele relaciona o consumo como um meio de linguagem, na qual a
diferença não se restringe ao significado, mas por um sistema de valores numa
hierarquia. Tendo o objeto como símbolo de identificação em um grupo social, referencial
das preferências e consequentemente de diferenciação daqueles que não se enquadram
em tal grupo, são esses os critérios baseados na lógica do consumo que vão servir de
alicerces na construção da identidade atual.
É, então, nesse mundo de eternidades passageiras, segurança fictícia e intimidade
superficial que as identidades são constituídas. Esse hiperconsumo reflete a
desestabilização do indivíduo que sem os referenciais que a antiga socialização os
fornecia, interessam-se mais pela emotividade e menos à reflexão. A sociedade de
consumo caminha para uma construção de uma subjetividade ligada ao consumo e à
aparência. Como a identidade é uma escolha, uma construção que está sempre sendo
remodelada dentro da lógica do consumo, o que a pessoa consome passa a refletir o que
ela é. O consumo passa a ser indicativo dos gostos e faz parte do sistema de
reconhecimento dos valores, estilos de vida e dos grupos de relacionamento, sendo
mantidos como utensílio necessário para marcar uma identidade, aa sua substituição
pelo próximo objeto que é visto sempre como o ponto máximo a ser alcançado. O
consumo o faz destacar/ diferenciar frente aos demais e isso é o que denomina sua
identidade. Por conta dessa inconstância, esta passa a ser vista como campo no qual
novas tecnologias podem investir e explorar mercados, sendo a influência da mídia
marcante nesse meio. Os meios de comunicação oferecem um arsenal de produtos que
servem como formas de definir a pessoa e possuem características frágeis e
descartáveis, sendo assim:
Hoje em dia, um século e meio depois, somos consumidores numa sociedade de consumo.
A sociedade de consumo é a sociedade do mercado. Todos estamos dentro e no mercado,
ao mesmo tempo clientes e mercadorias. Não admira que o uso/consumo das relações
humanas, e assim, por procuração, também de nossas identidades (nós nos identificamos
em referência a pessoas com as quais nos relacionamos), se emparelhe, e rapidamente,
com o padrão de uso/consumo de carros, imitando o ciclo que se inicia na aquisição e
termina no depósito de supérfluos. (BAUMAN, 2005, p. 98).
Uma autora que analisa a identidade inserida na cultura de consumo é Beatriz
Sarlo. Segundo ela, a identidade sofre influência pelo que é ditado no mercado e sua
transformação incide numa posição que apresenta o desejo do novo. “Em certa medida as
vanguardas estéticas sabiam disto, porque uma vez rompidas as comportas da
tradição, da religião, das autoridades indiscutíveis, o novo se impõe com seu moto-
perpétuo (Sarlo, 2000, p. 26). Esta importância dada pela pessoa ao ato de adquirir
objetos em detrimento da conservação dos mesmos, fez com que Sarlo a nomeasse de
“colecionador às avessas”. A expressão “shopping spree” seria um extremo desse
consumo, o qual se esgota quando as limitações econômicas se impõem. Porém hoje,
com a facilidade de se ter um dinheiro virtual, como o cartão de crédito, essa ação pode
prejudicar a vida da pessoa em proporções ainda maiores.
Ao invés do “desejo do novo”, Bauman (2004) sugere que o desejo seja o de repetir
o ato e se entregar aos impulsos. O desejo para ele demanda tempo para ser cultivado,
preferindo adotar a palavra “impulso” para descrever esse movimento instantâneo de
consumir imediatamente. Como os impulsos possuem caráter temporário, esta ação é
vivida com profundo prazer.
O colecionismo, marcado pelo sentimentalismo pelo que é consumido, é hoje
substituído por objetos hipersignificantes, que possuem um valor simbólico que está além
da utilidade deles, no qual sua durabilidade está diretamente relacionada ao tempo que o
objeto conserva sua validade simbólica, seu poder. Costa (2004) sugeriu que o
consumismo o se deve à sedução da propaganda, mas à satisfação de necessidades
psicossociais provenientes “da nova moral do trabalho e da nova moral do prazer” (p. 79),
que traria uma forma de realização pessoal. A moral do trabalho estaria baseada na
insegurança e competição nos/por trabalhos, que trouxe modificações nas condutas dos
sujeitos, tornando-os flexíveis, superficiais nas relações, criativos e voltados ao presente;
características que se estenderam aos vários contextos da vida em geral. O consumo
atende a essa forma de conduzir a vida, pois o produto é mantido dependendo do
interesse por ele. A aquisição de um produto também traz uma sensação de estabilidade
enquanto possuído, podendo ser descartado e facilmente substituído. Assim “a posse de
mercadoria permitiu ao indivíduo preservar a necessidade psicológica de estabilidade sem
renunciar à elasticidade pessoal exigida pelo mundo dos negócios” (p. 80).
A moral do prazer, segundo Costa (2004), foi a maior conquista promovida pela
lógica do consumo. Este valor conferido ao prazer das sensações físicas passou a fazer
parte da constituição da subjetividade. O prazer sensorial, diferente do prazer sentimental,
precisa da presença do objeto para que haja estimulação, sendo igualmente necessária a
disposição daquele que seestimulado. Mas para manter este prazer é preciso também
que haja uma excitação duradoura num limiar adequado. o prazer sentimental persiste
sem que precise dos estímulos sensórios-motores. A lógica do consumo pode ser
entendida pelo prazer sensorial na medida em que esta depende de um objeto e, como
este perde a capacidade de excitação rapidamente, uma diversidade de outros objetos é
necessária para manutenção do prazer. Essa valorização das sensações é corroborada
por Lacroix (2006), porém, ele questiona se usamos bem a emoção e coloca que ao
reduzirmos emoção a uma excitação, algo exacerbado, ela acaba por deturpar-se.
Diferentemente do que é considerado por muitos, para Baudrillard (1995), o
consumo não está vinculado ao objeto ou ao prazer, que seria individual, mas sim tem
função de produção, sendo coletiva, um sistema de troca. O prazer não é o fim, servindo
como racionalização de uma atividade que não termina aí. Para este autor o prazer seria
apenas o consumo individual, com o final em si. Assim, o homem não se depara com a
sua necessidade, “O consumo surge como sistema que assegura a ordenação dos signos
e a integração do grupo; constitui simultaneamente uma moral (sistema de valores
ideológicos) e um sistema de comunicação ou estrutura de permuta” (Baudrillard, 1995, p.
78). O resultado disso, como ele mesmo aponta, é a condução para uma era de alienação
radical.
Por outro lado, Canclini (1999) questiona a idéia de que o consumo seja uma
atividade irracional e que os meios de comunicação de massa dominam aqueles que o
consomem. uma racionalidade no consumo, podendo se exercer cidadania a partir
dele. Esse autor fala do aspecto simbólico do consumir. O consumo além de servir na
comunicação, inteligibilidade ao mundo, e também serve para pensar. O desejo de
consumir que se torna uma demanda não é algo irracional, mas está inserido numa
cultura.
Considero que há no ato de fazer cosplay um estímulo à criatividade para tornar
algo de duas dimensões em uma de três. É uma forma de produção vinda de um meio
midiático que coloca o espectador como autor de um trabalho e ajuda o sujeito a refletir
sobre suas atitudes, pois a escolha do personagem envolve um processo de identificação
que começa desde a leitura do mangá ou ao assistir a um anime. Dois exemplos de como
isso aconteceu, apareceram quando perguntei se os cosplayers notaram uma modificação
em sua atitude ao ler mangá, assistir anime ou fazer cosplay. Abaixo alguns depoimentos:
- Mônica - Eu acho que tem a [história] de Nana. É muito bom este mangá e eles são
personagens bem... Com uma historia bem fantasiosa. [...] Eu me identifico com uma das
personagens principais que é a Hachi, mas eu fico com raiva porque ela é muito mimada,
mas eu, ao mesmo tempo, eu me identifico com ela. Daí eu acabo tirando a lição de que ‘eu
não vou ser assim’. Eu tenho que deixar de ser um pouco mimada. Às vezes... Algumas
coisas que ela faz eu acho que eu faria também, mas eu vendo eu fico com raiva dela. Pô!
Mas eu faria isso! Então eu não posso fazer mais.
- Márcia - Isso acontece comigo com a Asuka de Evangelion. Ela é muito chata. Todo
mundo odeia a Asuka e eu odeio também ela. Eu digo que odeio ela especialmente.
Quando alguém fala para mim ‘eu odeio ela’ eu falo que o odeia ela tanto quanto eu
porque ela é igual a mim, por isso eu posso odiar mais ainda. Eu digo que tenho mais
propriedade para odiar ela, porque eu sou ela praticamente. É muito igual, entendeu?
Realmente tem muitas vezes que eu paro: “Caraca que coisa horrível!”... Às vezes você
pensa: “Caramba! Que garota mimada e escrota”... E você pensa...e eu ... tô fazendo.
Além da questão da identificação ou motivação para o consumo de um produto,
Certeau (2002) enfatiza que se deve observar o que o sujeito constrói a partir das
produções cio-culturais dadas pela sociedade. Essa “produção secundária” derivada da
representação do que é transmitido é algo que não deve ser desprezado. Para este autor,
na sociedade de consumo os meios podem oferecer os produtos e estímulos, porém o
os consumidores que apropriam destes de acordo com suas necessidades e
particularidades.
4.2.1 - CRISE DE IDENTIDADE NA HIPERMODERNIDADE
É freqüente, autores colocarem como conseqüência da sociedade atual a “crise” ou
“fragmentação da identidade”, vinculando esse fato à instabilidade/perda dos referenciais
estáveis. Segundo Martin- Barbero (2003):
(...) estamos ante un sujeto cuya autoconciencia es muy problemática, porque el mapa de
referencia de su identidad ya no es uno solo, pues los referentes de sus modos de
pertenencia son ltiples, y, por tanto, es un sujeto que se identifica desde diferentes
ámbitos, con diferentes espacios, oficios y roles. (...) Hoy nos encontramos con un sujeto
mucho más frágil, más quebradizo, pero paradójicamente mucho más obligado a asumirse,
a hacerse responsable de mismo, en un mundo en el que las certezas en los planos del
saber, como en el ético o el político, son cada vez menores
26
.
Para elucidar a viabilidade do uso da expressão “crise de identidade”, utilizo a
diferenciação proposta por Canclini (1999) entre as identidades modernas e as pós-
modernas, que neste último caso posso associá-las também as hipermodernas. As
primeiras seriam territoriais e praticamente monolinguísticas no qual a força da cultura
local era forte e, por isso, sua definição pode ser considerada sócio-espacial. Já as
segundas se caracterizam como transterritoriais e multilinguísticas, cuja lógica se
fundamentaria na produção industrial de cultura, tecnologia e consumo, e pode ser
definida como sócio-comunicacionais. Esta identidade deve também, como foi
apontado, ser diferenciada daquela formada na Modernidade, cujas referências eram
estáveis e onde a construção se baseava em capacidades e em estruturas
estabelecidas. Neste sentido, torna-se viável afirmar que está havendo uma crise de
identidade.
A palavra “crise” entendida “no seu sentido etimológico original Krisis, significa
distinguir, escolher, julgar, mas também cortar, dividir” (Soares, 2000, p. 226). Ela não
possui nenhuma conotação negativa, pelo contrário, é um indicativo de que alguma coisa
está por vir. Conforme Soares (2000, p. 226) aponta: “É a crise afinal que expõe o
potencial de liberdade de cada homem, de cada sociedade. [...] o das crises e das
soluções – incluindo o preço emocional a ser pago – de onde o homem extrai a força para
mudar o rumo de sua existência”. Um ponto interessante a enfatizar é que no idioma
chinês esta mesma palavra (crise) é formada de dois ideogramas: “ameaça” e
“oportunidade”, o que vem a reforçar o caráter de mudança e atuação do sujeito. Sem ter
26
O trecho correspondente na tradução é: “(...) estamos ante um sujeito cuja autoconsciência é muito problemática,
porque o mapa de referência de sua identidade, não é um só, pois os referenciais de seus modos de pertencimento
são múltiplos e, portanto, é um sujeito que se identifica desde diferentes âmbitos, com diferentes espaços, profissões e
papéis. (...) Hoje nos encontramos com um sujeito muito mais frágil, mais quebradiço, mas paradoxalmente muito mais
obrigado a assumir-se, a ser responsável de si mesmo, em um mundo em que as certezas nos planos do saber, como
no ético e no político, são cada vez menores”.
em mente uma busca imaginária de identidade, psicanaliticamente falando, acredito que o
entendimento do que era identidade na modernidade ocidental sofreu alterações, sendo
possível afirmar que houve uma fragmentação da identidade, porém esse fato o
impossibilita a criação de outras formas de ser a partir das características desse novo
contexto onde se vive.
Uma questão levantada por Woodward (2000) relativa à crise de identidade foi
abordada através da identidade nacional na antiga Iugoslávia, durante a guerra entre
sérvios e croatas. Para tanto, ele expôs duas definições da identidade, uma que ele
denominou de essencialista e outra de não-essencialista. A visão essencialista acredita
que características autênticas e imutáveis em todos os rvios (seguindo o exemplo
dele), uma qualidade essencial que permanece inalterável independente do tempo. O uso
de argumentos referentes à história, mito e a biologia é freqüentemente utilizado a fim de
criar uma coesão no pensamento, fazendo parte da cultura.
Ao comparar identidade com linguagem, Silva (2000, p. 84) afirma que há uma
busca ou necessidade por uma estabilização, “Entretanto, tal como ocorre com a
linguagem, a identidade está sempre escapando. A fixação é uma tendência e, ao mesmo
tempo, uma impossibilidade”. Mantendo a relação com a linguagem, para mostrar a
instabilidade desta por conta de seu sistema de significação, sobretudo devido ao signo,
Silva (2000) esclarece seu pensamento a partir do dicionário. A procura do significado de
uma palavra no dicionário leva sempre à indicação de outros signos, adiando-se
continuamente a “presença” (Derrida apud Silva, 2000). Esta seria a indicação de um
objeto concreto, um conceito concreto ou aabstrato, porém ela nunca é alcançada.
Deste modo, se nos apoiamos na linguagem para entender nossa constituição, isto é, em
uma estrutura na qual o
adiamento indefinido do significado e sua dependência de uma operação de diferença,
[isso] significa que o processo de significação é fundamentalmente indeterminado, sempre
incerto e vacilante [aspecto que vai aparecer na identidade]. [...] Na medida em que são
definidas, em parte, por meio da linguagem, a identidade e a diferença não podem deixar
de ser marcadas, também, pela indeterminação e pela instabilidade (SILVA, 2000, p. 80).
Esse último relato serve como introdução à perspectiva não-essencialista, a qual
está baseada no que de comum e o que a diferencia dos que não pertencem a este
grupo, estando atenta também às transformações ocorridas ao longo do tempo. Um dos
contrapontos relacionados às identidades fixas e delimitadas é o hibridismo, presente na
nossa cultura e marcado pela interlocução das diferenças (raciais, étnicas, nacionais).
Neste sentido “A identidade que se forma por meio do hibridismo não é mais
integralmente nenhuma das identidades originais, embora guarde traços dela” (Silva,
2000, p. 87). Porém na hibridação relações de poder, pois a ocupação é normalmente
imposta. Em nossa sociedade o hibridismo ocorre tanto por deslocamentos físicos, muitas
vezes exigidos pelos empregos, quanto pela facilidade que trouxe a quebra de barreiras
pela tecnologia. Esse contato com diferentes sistemas simbólicos é o fator constituinte
dessa conjunção. Por conta disso, uma propriedade dessa visão o-essencialista é o
foco no movimento.
Em todo o trabalho, pode-se observar que permeia o princípio de que a identidade
não é fixa, estável, homogênea ou acabada, mas sim “que a identidade é uma
construção, um efeito, um processo de produção, uma relação, um ato performativo. A
identidade é instável, contraditória, fragmentada, inconsistente, inacabada. A identidade
está ligada a estruturas discursivas e narrativas” (Silva, 2000, p. 97). Além disso, como
apontado anteriormente, ela está ligada a representações e a relações de poder. Mas, ao
lado da desestabilidade provocada, pode-se entender algo de positivo na identidade atual,
pois se pode ter a liberdade de escolhê-la e de permitir que haja:
a inventividade e a engenhosidade humana por trás das sólidas e solenes fachadas de
credos aparentemente temporais e intransponíveis, dando-lhes assim a coragem
necessária para se incorporar intencionalmente à criação cultural, conscientes dos riscos e
armadilhas que sabidamente cercam todas as expansões ilimitadas. (BAUMAN, 2005, p.
20-21).
Diante do que foi apontado, o cosplay se torna um exemplo dessa “metamorfose
ambulante” de nossos dias, algo que possui uma influência marcante da mídia que passa
a ditar os modelos e atribuir valores a eles, porém sem ser considerada uma atividade
irracional ou sem reflexão.
Seguindo esta perspectiva, eu entendo a crise de identidade também como uma
possibilidade que a pessoa tem de se adaptar ao mundo, ao conseguir transitar por
diferentes códigos e universos simbólicos e se transformar na interação com eles. Porém
afirmar que a identidade assume um caráter instável e está sujeita a multiplicidade de
referências superficiais e transitórias, não indica que esse fato não deva ser mudado ou
que eu concorde com essas condições. O que está sendo enfatizado aqui é que há
possibilidade de mudança.
CAPÍTULO V
COSPLAY E O IMAGINÁRIO SOCIAL
Como o cosplay trata do ato de se fantasiar e realizar representações, um assunto
que deixo para o último capítulo, sem que isso desqualifique sua importância, é o
imaginário.
Como vários conceitos como, por exemplo, a identidade, o um consenso em
sua definição. Durante muito tempo o que era proveniente da imaginação o havia
exatidão, sendo o “conhecimento verdadeiro [aquele que] resulta sempre da atividade
demonstrativa da razão” (Teves, 1992, p. 6). Sem as amarras que a idéia do dualismo
coloca (real x imaginário), principalmente relacionados ao pensamento empirista e
racionalista, o imaginário é aqui considerado como algo “impalpável e real” (Maffesoli,
2001, p. 77). Não se constitui como algo fixo, imutável e sim como sensibilidade que
escapa a lógica.
O imaginário se constitui da experiência e por processos que advém dela, então, o
imaginário varia conforme a cultura e a sociedade. Mas qual seria o limite entre o real e o
imaginário? Conforme Patlagean (1993) o imaginário não é estanque e o seu limite
também não é. O que tem de comum, por outro lado, é o campo em que este vai
pertencer, que é o da experiência humana.
De acordo com Bazcko (1985), o imaginário social faz parte da vida social, no
modo como atuam e do que produzem os que aí pertencem. Sendo que
através dos seus imaginários sociais, uma colectividade designa a sua identidade; elabora
uma certa representação de si; estabelece a distribuição de papéis e das posições sociais;
exprime e impõe crenças comuns; constrói uma espécie de digo de <bom
comportamento>, designadamente através da instalação de modelos formadores tais como
o do <chefe>, o <bom súdito>, o <guerreiro corajoso>, etc. [...] O imaginário social é, deste
modo, uma das forças reguladoras da vida coletiva. (BAZCKO, 1985, p. 309).
Assim, é por meio do imaginário social que se faz parte de uma sociedade, se
informa sobre ela e se orienta quanto ao comportamento. A partir das representações e
imagens, que fazem parte da experiência, é que são criados as identidades, normas e
valores. Nos sistemas simbólicos nos quais atua o imaginário social, se inserem as
experiências de vida, os desejos, as motivações e as expectativas. Conforme Teves
(1992), pelo imaginário é possível que o grupo se identifique, o que possibilita trocas e
instituem-se papéis sociais.
também a produção de signos e ritos nos imaginários sociais. Para Bazcko
(1985, p. 324):
O nascimento e a difusão dos signos imaginados e dos ritos coletivos traduzem a
necessidade de encontrar uma linguagem e um modo de expressão que correspondem a
uma comunidade de imaginação social, garantindo às massas, que procuram reconhecer-
se e afirmar-se nas suas ações, um modo de comunicação.
Uma outra discussão trazida por Bazcko é a de que o alcance do imaginário social
sobre as pessoas está sujeito aos meios de transmissão destes. Daí o poder daqueles
que controlam esses meios. Com o avanço tecnológico, a veiculação e o controle das
informações e imagens se modificaram. Sobre os meios de comunicação de massa, o
autor destaca a relação estabelecida entre informação e imaginação. Neste meio a
quantidade de informações é enorme e, por isso, um processo de seleção e
manipulação tanto sobre o que deve ou não ser divulgado, como pela forma que isso
ocorre. A propaganda procura, portanto, manipular esses imaginários.
Maffesoli (2001, p. 80) afirmou que “O imaginário é alimentado por tecnologias”, o
que coloca a tecnologia atual como capaz de influenciar e estimular a construção do
imaginário. Como o imaginário se dá, para ele, na interação e na comunicação, é deste
modo que a tecnologia vai criando seus vínculos. Seguindo este pensamento, as
tecnologias se inserem nas necessidades sociais, o que acaba revelando a relação que o
indivíduo estabelece com o objeto de consumo, detentor de significados sociais,
instituídos simbólica e culturalmente.
O imaginário proporcionado pela mídia serve a instantaneidade do mundo, que
oferece variados tipos de elementos passíveis de identificação.
Sem deixar de estar inscritos na memória nacional, os consumidores populares o
capazes de ler as citações de um imaginário multilocalizado que a televisão e a publicidade
reúnem: os ídolos do cinema hollywoodiano e da sica pop, os logotipos de jeans e
cartões de crédito, os heróis do esporte de vários países e os do próprio que jogam em
outro compõem um repertório de signos constantemente disponível (CANCLINI, 1999, p.
87).
Como é pelo corpo que as pessoas agem e interagem, é através dele que cada um
forma a sua essência. Assim “Ao invés do corpo ser ‘utilizado’ pelo homem como um
instrumento de trabalho, como o foi na sociedade industrial, o homem/a mulher inserem-
no na sociedade de consumo como um objeto extremamente valorizado, a ser cuidado, e
a ser exibido” (Lehmann, Silveira, Afonso, Castro, 1998, p. 126). O vestuário passa a criar
uma imagem que é facilmente descartada. Ele assume papel de destaque nas novas
formas de ser e, com o consumo e a globalização, dita diferentes identidades e trocas
simbólicas. Além disso, há um perfil esperado para quem utiliza aquele produto. Segundo
Villaça (2007, p. 16): “O corpo é um lugar de construção identitária que se articula
crescentemente com a imagem, substituindo, progressivamente, a idéia de adequação
por uma estranheza”. O corpo é o que diz sobre o sujeito, que a imagem que dele se
forma é o que predomina.
Desta forma, o cosplayer utiliza este imaginário, ao desenvolver imagens como ele
gostaria de vivenciar. E, ao freqüentar os eventos, é possível que essa imaginação seja
compartilhada, pois a roupa é um instrumento fundamental para sua identificação. Ao
buscar entender como um personagem pode ser visto como algo “vivo” para o grupo de
cosplayers, uma delas explicou:
- Márcia - A gente fala: “Ah! Fulano morreu para mim”. Se você consegue matar uma
pessoa que está viva porque você não pode viver uma pessoa que não existe? Sabe, eu
acho que é exatamente o mesmo processo.
Pode-se notar então o papel importante que a vestimenta tem no imaginário nos
dias atuais, pois ela é ornamentada e cuidada como se fizesse parte do corpo. Sobre este
assunto, Villaça (2007, p. 142) coloca que: “A aderência ao corpo mais evidente é
certamente a roupa: embalagem que vela e desvela, simula e dissimula. Fisicamente
autônoma, ela é, entretanto, intimamente ligada ao corpo do qual recebe odores e calor e
ao qual oferece um estatuto”.
5.1 – A BUSCA POR SATISFAÇÕES
Quando foi colocado para que os cosplayers informassem o que os motivava a
fazer cosplay, as respostas obtidas foram: divertimento, ganho de conhecimento em
várias áreas e, reconhecimento. Mesmo não havendo atores ou públicos formalmente
estruturados, pois a pessoa se fantasia e faz suas interpretações com liberdade, sem
precisar competir, os cosplayers esperam pela reação do seu “público”, o que eu
relaciono como uma busca por status.
Status é uma palavra de origem latina, statum, que se refere à posição de uma
pessoa na sociedade. Ela será utilizada fazendo referência ao “valor e a importância de
uma pessoa aos olhos do mundo” (Botton, 2005, p. 7). É interessante notar no trecho da
frase “olhos do mundo”, que a posição de alguém está associada ao outro, ao que ele
pensa dele. Para Sartre (apud Perdigão, 1995), o homem não vive isolado. Ele desloca a
perspectiva para o outro, sendo que isto o se refere ao simples fato do outro nos
conhecer, porque apenas nos situaria como objeto. Segundo sua teoria “O Outro é a
condição necessária para que eu possa me conhecer de uma maneira que, sem o olhar
dele, eu sequer seria capaz de imaginar que fosse possível”. (Ibid., p.142).
Os motivos normalmente pronunciados para alcance do status são três: dinheiro,
fama e influência, mas, para Botton (2005), estes podem ser sintetizados em apenas um:
busca por amor. As razões apontadas anteriormente seriam apenas meios para obter
amor. A partir do amor recebemos atenção, cuidado e proteção e, com isso, conseguimos
crescer. O pior para uma pessoa é ela não ser notada.
Pode-se dizer que a atenção dos outros importa para nós principalmente porque somos
afetados por uma incerteza congênita em relação a nosso próprio valor – e como resultado
disso, o que os outros pensam de nós vem a ter um papel determinante no modo como
conseguimos nos ver. Nosso senso de identidade torna-se cativo da opinião daqueles com
quem convivemos. (BOTTON, 2005, p. 18)
Assim, por mais que os cosplayers do grupo reconheçam que o próprio ato de
confecção da roupa foi bem desenvolvido, é preciso que sejam valorizados pelo outro
para se convencerem disso. Isso se deve porque reconhecemos idéias contrárias de nós
mesmos: podemos nos considerar burros e inteligentes, fortes e fracos, e, por conta
dessa incerteza, o outro é quem passa a indicar esse valor. A importância que o outro nos
dá, é indicativo do valor que temos no mundo. Um dos depoimentos que vem a corroborar
este aspecto surgiu no fórum no site Cosplay Brasil, no qual participei, quando um dos
participantes comentou sobre a apresentação dele no concurso de cosplay. Ele destaca
que:
- Lucas - No caso de se apresentar, quando recebemos os aplausos do público
percebemos que somos capazes de agradar alguém, nos faz sentir bem. Desenvolve a
auto-estima e a auto-confiança "eu sei que eu sou capaz de melhorar, eu sei que posso
fazer".
No encontro com os cosplayers, eles falavam dessa necessidade e dificuldade de
obterem reconhecimento pelo trabalho junto aos freqüentadores dos eventos, pois estes
estão com um nível de exigência cada vez maior:
- Mônica - Os eventos antigamente eram eventos pequenos. Os eventos eram muito
família. Você chegava para um cosplay com uma peruca e o pessoal [comentava]: “Nossa!
Você tá com uma peruca!!!”.
-Talita - Hoje em dia chega a ser ridículo. “Vonão comprou lente?? [eles perguntam].
Mas o personagem pede lente”. Como se fosse obrigação. Hoje em dia você tem que estar
de peruca, a roupa, a lente de contato e não pode ter nenhum defeito, para não ser
criticado. Isso é horrível!
- Mônica - E sempre tem algum que fala: “Está errado! Porque a saia é um dedo maior que
isso”. Umas palhaçadas assim.
A falta de reconhecimento surgiu nas falas dos cosplayers de duas formas: pelas
críticas negativas e pelo fato das pessoas do evento não pedirem para tirar foto. Uma das
participantes relatou que chegou a tirar o cosplay dela, isto é, a fantasia representando
um personagem, por não ter tido reconhecimento. Porém, um outro integrante do grupo
colocou que nem se importa com isso, pois vai aos eventos geralmente para se divertir
com os amigos. Ao ouvir esse depoimento, ela comentou:
- Márcia - Nesses casos é divertido. Nesses casos a satisfação está em você. Mas às
vezes tem casos que você faz [cosplay] querendo que os outros olham. E quando os outros
não olham é muito frustrante.
- Mônica - Quando você vai e ninguém tira foto sua.
Perguntei se o objetivo da maioria dos cosplayers, na opinião deles, era o de ter o
reconhecimento com as pessoas tirando fotos. Eles relataram que:
- Mônica Isso [o fato das pessoas não tirarem fotos com eles], na verdade, aconteceu
no Anime Friends, mas eu acho que estava muito cheio. Quase ninguém estava tirando
fotos dos cosplayers e eu falei com algumas pessoas que estavam na sala do Cosplay
Brasil e tava todo mundo meio mal por causa disso, porque o público não estava tirando
muita foto por causa disso, porque estava muito cheio. Estava todo mundo meio ruim,
porque é legal você tirar foto.
- Talita - Hoje em dia tem uma parada que o Cosplay Brasil criou. Ele criou assim... Nos
eventos, reserva uma sala e faz um estúdio de fotografia. Eles levam um pano branco,
forram a parede e um pedaço do chão, fica meio um estúdio de fotografia. Tem luzes que
eles levam e os fotógrafos, que são os fotógrafos oficiais. Você conhece as pessoas.
Isso é muito legal, as fotos ficam muito boas, mas acho que isso decaiu com a foto do
evento. Tipo, ninguém mais pára: “Seu cosplay muito bonito. Posso tirar uma foto sua?”.
Todo mundo [fala/pensa]: “Ah não! Depois eu entro no site e vejo a foto que os fotógrafos
tiraram dela”. Acho que foi muito legal a iniciativa do Cosplay Brasil, mas isso estragou
esse outro lado do cosplayer, esse outro divertimento, que é de você ser parado no evento.
Diante disso, vê-se a necessidade deste reconhecimento e, de certa forma, as
justificativas encontradas para o decréscimo deste tipo de abordagem com os cosplayers.
Percebe-se uma exigência de melhor qualidade tanto na realização do cosplay quanto na
hora de tirar foto e isso está diminuindo o prazer que os cosplayers têm de ter esse
contato com o público.
O reconhecimento social é visto como parte da inclusão no meio social. A formação
do indivíduo se dá pelo reconhecimento social e isso se deve porque é através da
interação que é possível perceber certas características compartilhadas por outros e
também algo que é seu. Os cosplayers ao refletirem sobre sua identidade podem se
deparar com características que o compartilhadas com este grupo, aumentando sua
sensação de pertencimento, isto é, se reconhecem como parte deste grupo. No encontro
com os cosplayers, por exemplo, a identificação que ocorreu entre eles em relação à
admiração pelos quadrinhos e desenhos animados japoneses, foi algo notável. E eles
ligaram isso ao próprio modo deles agirem. Conforme uma participante colocou:
- Márcia - Todo mundo que acaba assistindo, lendo mangá, acaba tendo uma visão...
Assim... Uma reação a algumas situações que é muito característica. E disso eu posso
tirar uma conclusão: que tem influência dali. Não tem outra coisa que se destaque. É minha
conclusão. Eu vejo isso em mim mesmo.
Axel Honneth, baseado nos trabalhos da teoria do conhecimento de Hegel e da
psicologia social de Herbert Mead, desenvolve uma sociologia do reconhecimento. A
identidade, segundo Honneth está relacionada a um processo intersubjetivo de
reconhecimento. Utiliza os conceitos de Me e I de Mead que coloca que o “indivíduo
toma consciência de si mesmo na condição de objeto” (Honneth apud Mattos, 2006, p.
88). Assim, a identidade é formada a partir do outro. O Me é como sou a partir da
perspectiva do outro e o I é justamente as especificidades que contrapõem ao Me, é a
busca da singularidade. Um outro conceito vinculado à socialização é o de “outro
generalizado”. Este se refere a uma generalização de expectativas de comportamento
que permitem sentir como parte de uma comunidade. De certa forma o os padrões de
comportamento esperados e compartilhados entre os membros daquele grupo. Mas essa
interação entre Me e I não se dá de forma passiva, pois não é tudo que se encaixa nas
normas.
Uma conquista que alguns adquirem ou procuram com o cosplay é que este facilita
o processo de socialização. Estar com as pessoas não é apenas uma forma de ser
reconhecido por seu esforço, mas também atua como meio que promove a aproximação e
o conhecimento de outras pessoas. No rum virtual do Cosplay Brasil, essa questão
surgiu em alguns momentos, como destaquei abaixo
27
:
- Lívia - O cosplay (na minha opinião) faz com que os outros saibam (mesmo sem você
dizer) que gosta de tal personagem de tal anime, acho que isso também é um pretesto pra
você fazer novas amizades (o que sozinho em casa é impossível). Fora que fazendo
cosplay (eu pelo menos) perco minha timidez, afinal todos pedem fotos, chamam pra
conversar e bblá blá, e o fato de eu saber que essas pessoas também gostam das
mesmas coisas que eu facilita (coisa que se acontecesse no meio da rua, eu no mínimo
iria estranhar)
- rgio - Acho que a maioria que fez ou faz cosplay, eu falo a maioria ou seja não todos,
no passado foi uma pessoa muito tímida e fechada, eu no caso era assim, acho que
inicialmente usava o "cosplay" como uma forma para perder essa timidez, que por sua
vez como você mesma falou você ganha ums minutinhos de fama e pessoas vem falar com
você, pessoas das quais você não iria parar a pessoa para conversa com ela do nada e tal,
dai você de certa forma acaba teno a possibilidade de ficar "menos tímido" bom sei lá......
em outras palavras acho que o cosplay ajudo eu a ser o que sou hoje, porque antigamente
eu era uma pessoa muito tímido e fechado, não saia direito e tal, com cosplayer conquistei
amigos mesmo sendo tímido e estes amigos me ajudaram a ser algem um pouco mais
sociável e tal ^^ hoje em dia eu sou bem diferente do que eu era antes. de certa forma acho
que o cosplayer serve como uma forma de socialização daquelas pessoas que vivem
fechadas e sei lá de certa forma tímidas que existem por ai ^^ e vai por mim ajuda e muito.
A sociedade coloca que, atualmente, para ser valorizada, a pessoa tem que se
destacar de alguma forma. Assim, para algumas pessoas, o cosplay serve como uma
forma mais rápida para conquistarem essa posição. É certo que não são todos os que
fazem essa atividade com esse fim, mas esta pode ter sido uma saída encontrada diante
de um mundo com tamanhas cobranças. Longe, então, de imaginar que se vestindo como
um personagem, o jovem estaria se afastando da realidade, acredito que é uma forma
criativa de se adaptar a uma sociedade cercada por novidades, plasticidade e exigências.
Além disso, qual seria a estranheza desta máscara perante tantas outras que utilizamos
27
Como se trata de participações onde os cosplayers escrevem seus depoimentos via internet, optei por preservar seus
relatos sem correções ortográficas.
no dia-a-dia? A vantagem destascara em relação a outras, é que ela se enquadra nas
características da sociedade atual, porém é vista como uma brincadeira, uma diversão,
que fazem alguns refletirem sem ser de uma forma ameaçadora.
VI - CONSIDERAÇÕES FINAIS
Cosplay é um “brincar de se fantasiar” originado em 1980 nos Estados Unidos. O
“fantasiar” neste caso se assemelha ao que acontece numa festa à fantasia, pelo fato
de que as pessoas colocam trajes diferentes dos quais costumam usar normalmente.
Porém, há significativas diferenças. Primeiro eles ocorrem em eventos voltados a pessoas
interessadas em desenhos animados e quadrinhos japoneses. Segundo, essas fantasias
são relacionadas, principalmente, aos personagens desse entretenimento japonês.
Terceiro, a escolha do personagem normalmente está relacionada à identificação com
ele. As pessoas que se vestem passam a agir como o personagem, uma vivência de
uma nova realidade. E, por último, um ganho proporcionado por essa atividade que,
em geral, é a valorização de si mesmo.
O estudo procurou compreender o fenômeno cosplay, explorando o processo de
identificação desenvolvido pelos cosplayers com os personagens provindos dos meios
televisivos e impressos. A identificação com alguns personagens de mangás e animes
decorre, sobretudo, por estes oferecerem um aspecto mais realista, sem a invencibilidade
ou enquadramento em dualidades, mal e bem, que costumam acontecer em quadrinhos
ocidentais. Somado a isso, outros fatores que podem ser destacados como facilitadores
no processo de identificação neste entretenimento japonês são: maior profundidade no
trato da personalidade dos personagens e um desenvolvimento gradual da história, com o
envelhecimento e crescente aprendizagem deles.
Ao longo do trabalho descrevi aspectos dos eventos onde os cosplayers e demais
admiradores de mangás e animes se encontram, pois é que os cosplayers
afirmam/confirmam sua existência como pertencente daquele lugar e procuram satisfazer
suas necessidades. Além disso, inclui falas dos jovens que vivem a experiência de serem
cosplayers, pois somente a partir deles, que conseguiria me aproximar do entendimento
desse fenômeno. Os objetivos para participação nos eventos são muitos e diferentes,
sendo os mais citados: diversão, reconhecimento social e aumento de habilidades com a
confecção de roupas e adereços. A facilidade proporcionada no relacionamento social foi
citada como uma vantagem para os que se consideram tímidos, pois muitas pessoas
iniciam a conversa com eles. Também pude perceber que o processo de realização do
cosplay envolve muita dedicação e criatividade, aspectos esses que vão de encontro à
idéia de um consumo passivo do que é veiculado pela mídia.
Apesar das informações obtidas pelo grupo focal não poderem ser generalizadas,
pois não trabalhei com amostras representativas estatisticamente dos jovens do Rio de
Janeiro, os dados obtidos suprem as necessidades deste trabalho, uma vez que visa
entender, refletir e questionar o fenômeno cosplay, e no qual o singular tem relevância
para este estudo.
Considero o cosplay como parte do mundo hipermoderno, pois ele explicita o
caráter flexível das identificações, baseadas predominantemente no consumo de
produtos, compartilhados pelo grupo e identificáveis pela visão. A competição e a busca
por excelência, tanto de alguns competidores quanto dos próprios freqüentadores dos
eventos, são outros aspectos presentes nos eventos que se adequam ao contexto atual.
Como a identidade torna-se mais manipulável, a sua ligação com uma roupagem
toma destaque, e o lugar da mídia se insere na formação do sujeito. O ato de fazer
cosplay pode parecer distante para nós, mas o fato é que não é. Tanto nos eventos de
aficionados por animes e mangás, quanto no mundo o qual estamos mais familiarizados,
desenvolvemos algumas identidades utilizando objetos de consumo, a diferença é que
naquele ambiente teríamos mais facilidade, ou uma visibilidade maior nesse poder de
escolha.
Da mesma forma, incorporar um personagem e interpretá-lo pode ser encarado
como atividade distante, no máximo voltado para atores ou cosplayers (agora que
conhecem esse fenômeno), mas será que não podemos dizer que atualmente muitas
“mulheres de 50 estão interpretando garotas de 18”, conforme aponta Medeiros (2007)?
Sem mencionar que normalmente as pessoas representam ser seres imunes de dor ou
sofrimento, pois aceitam as verdades midiáticas de que não pode haver falhas ou ter
defeitos.
Entendo o cosplay como um jogo no qual a imaginação a liberdade de
transformar a realidade, possibilitando brincar de ser outra pessoa. Ela possibilita que
haja um ambiente sem muitas barreiras, o que facilita o uso de maneiras novas de ser,
diferentes do habitual. Ao se vestirem como os personagens isso seria uma forma
encontrada para lidar com a realidade, servindo como algo constituinte da subjetividade.
O lúdico, desta forma, permite que se encarem as situações com um nível menor de
tensão.
Posso dizer, então, que as fronteiras entre imaginário e a realidade são móveis e,
com o crescimento da influência da mídia, é difícil definir quando estamos vivendo
conforme nossas demandas e necessidades ou quando adquirimos, sem refletir,
modelos de comportamento colocados pelos meios de entretenimento. Contudo, uma
diferença é a convivência com a mídia, vendo-a como um entretenimento em si, outra é
tê-la como autoridade, fonte de modelos inquestionáveis. Se a mídia coloca, por exemplo,
que ser uma executiva está vinculado a usar terninho, salto alto e ter uma bolsa da Vitor
Hugo, então, serão os cosplayers mais um exemplo de “fenômeno problema”,
característicos dos jovens, ou um acontecimento coerente com o contexto social,
diferenciada por ser controlada por aqueles que a vestem, e que aqui aparece com uma
roupagem distinta daqueles já absorvidos pela população?
Um fato interessante é que não há, por parte dos cosplayers dos quais entrevistei,
um consumo não reflexivo dos modelos da mídia. Apesar de muitas vezes copiar as
roupas, a confecção envolve inventividade e a identificação com os personagens traz
uma leitura do comportamento deles, nos quais leva a um questionamento de suas
próprias atitudes.
No começo deste trabalho, apontei que ele iria ser desenvolvido não mais para
superar a barreira do incômodo sobre o tema, mas sim a da vida; porém, agora o
encaro minhas questões como barreiras, mas como pontos de curiosidade frente a um
tema tão amplo. Na dissertação pude desenvolver apenas um aspecto dentre tantos que
podem ser explorados, assim, acredito que com o aprofundamento dessas questões ou a
exploração de outras, novos aspectos possam surgir que podem corroborar ou não com o
que foi aqui apresentado. Destaco a questão de alguns cosplayers preferirem se vestir
com personagens do sexo oposto e a comparação do processo de identificação do
cosplays em diferentes nacionalidades, como alguns assuntos interessantes de serem
estudados.
Portanto, em meio a acelerações no ritmo da vida e ao declínio das bases estáveis
na qual formamos nossa identidade, podemos ver o exótico, não como algo que agride a
estética aceita pela mídia, mas sim como uma alternativa surgida em meio a tantas
limitações.
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APÊNDICE A - ROTEIRO PARA OS ENCONTROS
1º encontro - “Adesão das pessoas: Conhecendo o grupo”
Neste primeiro momento foi necessário explicitar o cenário da pesquisa aos
participantes, de forma que estimulasse a comunicação e envolvimento deles, mas
principalmente, que instigasse o sentido subjetivo dos participantes. Como envolve
conteúdos subjetivos, o envolvimento do grupo (incluindo o pesquisador e o observador)
assim como o estabelecimento de um rapport, foram essenciais para o desenvolvimento
da pesquisa.
Foi informado que este trabalho precisaria que as pessoas estivessem disponíveis
para expor suas opiniões e experiências e participassem de algumas atividades, sendo
apontado que em nenhuma das solicitações, as pessoas passariam por qualquer tipo de
constrangimento. Também foi comunicado que não havia obrigatoriedade em continuar a
vir nos encontros, porém uma vez que os convidados aceitassem participar da pesquisa,
isso seria considerado como forma de interesse e comprometimento com a proposta do
estudo.
Foi acordado também sobre o horário e dias dos encontros.
A dinâmica de “Auto-retrato” foi escolhida para apresentação dos participantes, por
iniciar uma autoreflexão de quem se apresenta. Os materiais utilizados foram: papel
sulfite, lápis de cor, canetas hidrocor e giz de cera. A atividade consiste em o facilitador
pedir a cada participante que faça uma representação de si mesmo, estando livre para
desenhar da forma que desejar. Juntamente a isso, o facilitador solicita que todos (cada
um no seu desenho) complementem a figura com os seguintes itens:
· Saindo da boca, fazer um balão com uma frase que represente seu lema de vida;
· Saindo do coração, fazer uma seta indicando três dos seus valores;
· Na mão esquerda escrever algo que gostaria de receber; e
· Na mão direita, escrever uma meta que deseja alcançar.
Para finalizar, o facilitador pede a cada um que se apresente para o grupo, dizendo
seu nome, como é chamado pelos amigos (apelido), idade e escolaridade e, em seguida,
fale sobre o seu desenho.
Abaixo um esquema simplificado do que foi desenvolvido em cada encontro. As
discussões, contudo, o necessariamente se restringiram a esse roteiro prévio, às
vezes, tomando outros rumos.
PROPOSTA DESCRIÇÃO DURAÇÃO
Apresentação - Facilitador e observador 5 min
Esclarecimento
da proposta
- Temas
- Objetivos
- Técnica dos grupos focais
- Horário e dia
- Leitura e explicação das questões éticas
10 min
Atividade - Aplicação da Dinâmica: “Auto retrato”
- Apresentação dos participantes
40 min
Alguns assuntos
para debate
- Primeiro contato com os eventos. Através de
amigos, Internet;
- Contato anterior com animes/ mangás;
- Primeiro contato com os animes/ mangás.
Amigos, televisão, conta própria, algum meio de
divulgação;
- Interesse em fazer o primeiro cosplay
- Cosplayers que já realizaram.
55 min
Encerramento -Impressões gerais, opiniões, sugestões
- Marcação do próximo encontro.
- Agradecimento
10 min
2º encontro “Influência da mídia”
No segundo encontro, foi dada continuidade a discussão sobre alguns assuntos,
como explicitado abaixo:
PROPOSTA DESCRIÇÃO DURAÇÃO
Abertura Recebimento dos participantes 5 min
Alguns tópicos
para debate
- Influência da mídia;
- Pessoas que se fantasiam como personagens
do sexo oposto;
- Mudança com o uso da internet;
- A escolha do mangá ou anime.
- Discussão sobre as histórias ou atitudes de
alguns personagens com amigos.
75 min
Encerramento - Impressões gerais, opiniões, sugestões.
- Marcação do próximo encontro
- Agradecimento
10 min
3º encontro- “Ser um cosplay”
Neste terceiro encontro, em um determinado momento, foi solicitado que os
participantes realizassem a atividade “Sendo o cosplay por um dia”. Esta consistia em que
todos imaginassem que ao acordar, estivessem com uma roupa de um personagem que
tivessem feito ou que gostariam de fazer cosplay, e deveriam passar o dia assim,
fazendo as atividades que normalmente realizam durante o dia. A partir disso pedi que
cada um respondesse:
1) Que personagem escolheu, contando um pouco da história do personagem
selecionado;
2) Se agiria diferente por estar vestindo essa roupa;
3) Quais características você mudaria em si mesmo (ou se mudaria);
4) Por que escolheu esse personagem;
5) Se você mudaria alguma coisa nele; e
6) Se tem uma característica dele que gostaria de ter.
PROPOSTA DESCRIÇÃO DURAÇÃO
Abertura Recebimento dos participantes 5 min
Alguns tópicos
para debate
- Motivação para se vestir;
- A escolha do personagem;
- O processo de montagem da vestimenta;
- Tempo disponível para realização das roupas
do cosplay;
- Influência da leitura do mangá, anime e
cosplay;
- Impressão sobre as vaias;
- A competição nos eventos;
- Diferença entre teatro e cosplay;
- Representação do cosplay para eles.
60 min
Atividade - “Sendo o cosplay por um dia”
- Exposição dos participantes
30 min
Encerramento - Impressões gerais, opiniões, sugestões
- Agradecimento
15 min
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 – Yuki do mangá Fruits Basket .................................................................. 42
Figura 2 – Orientações para leitura do mangá Chobits.............................................59
Figura 3 – Cosplay do personagem principal do filme “O Máskara”..........................66
Figura 4 – Shin do manNana................................................................................73
Figura 5 – Nataku do mangá Soul Hunter..................................................................74
Figura 6 - Renge do mangá Ouran High School Host Club.......................................75
Figura 7 - Tamaki do mangá Ouran High School Host Club………………………..…75
Figura 8 – Kaname do mangá Vampire Knight..........................................................75
Figura 9 – Yuki Souma do mangá Fruits Basket........................................................76
Figura 10 – Kaname do mangá Vampire Knight........................................................77
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