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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL – UFRGS
FACULDADE DE BIBLIOTECONOMIA E COMUNICAÇÃO – FABICO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃO E INFORMAÇÃO
VIVIAN TEMP
A comunicação digital e as transformações nas
práticas culturais no contexto organizacional
Porto Alegre
2008
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL – UFRGS
FACULDADE DE BIBLIOTECONOMIA E COMUNICAÇÃO – FABICO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃO E INFORMAÇÃO
VIVIAN TEMP
A comunicação digital e as transformações nas
práticas culturais no contexto organizacional
Dissertação apresentada à banca
examinadora do Programa de Pós-Graduação
em Comunicação e Informação da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
– PPGCOM/UFRGS - como requisito parcial
para obtenção do título de mestre.
Mestranda: Vivian Temp
Orientadora: Profa. Dra. Karla Müller
Porto Alegre
2008
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Dedico essa dissertação ao meu filho
Pedro, minha grande inspiração e que
esteve comigo desde o início deste
trabalho.
AGRADECIMENTOS
Ao Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Informação da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul, pela oportunidade de realizar o mestrado e aprofundar
questionamentos da minha vida acadêmica.
À minha orientadora, Profa. Dra. Karla Maria Muller, pela sua atenção,
incentivo e contribuição em todas as etapas da realização desta dissertação.
À Procergs e aos profissionais entrevistados, pelo interesse e disponibilidade de
compartilhar suas experiências, colaborando para o enriquecimento desta dissertação e o
entendimento da comunicação digital nas organizações.
Aos docentes do Programa, pela troca de conhecimento e convivência.
À CAPES, pela disponibilização da bolsa que viabilizou minha dedicação
integral ao mestrado.
Ao meu marido Fabiano, pelo apoio incondicional e pelas palavras de estímulo e
encorajamento durante a trajetória da realização deste trabalho.
Aos amigos Carolina, Flávio e Lisiane pelo apoio dedicado durante a realização
desta dissertação.
RESUMO
Este trabalho consiste no estudo sobre como a inclusão de ferramentas de comunicação
digital nas organizações pode influir na cultura e na comunicação. A ênfase recai na
investigação de como a utilização do Correio Eletrônico, da Intranet e das Listas de
Discussão podem modificar o processo de comunicação organizacional através da
criação de novas práticas culturais que possibilitam a participação dos funcionários no
processo comunicativo. A análise resgata o modo como essas ferramentas foram
implantadas, a sua apropriação pelos membros organizacionais e as práticas culturais
que foram geradas a partir do seu uso. Para isso, realizou-se um estudo de caso na
Companhia de Processamento de Dados do Rio Grande do Sul (Procergs). O estudo
contempla o relato dos funcionários da organização que utilizam essas ferramentas
diariamente nas rotinas de trabalho. Por meio da fala dos participantes, constatou-se que
essas ferramentas proporcionam maior envolvimento desses funcionários no processo
de comunicação. Entretanto, elas não horizontalizam a relação existente entre os
funcionários e a organização, que permanece sendo o espaço de conexão do
relacionamento comunicacional.
Palavras-chave: comunicação digital, correio eletrônico, intranet, listas de discussão,
práticas culturais, organizações.
ABSTRACT
This master thesis addresses the inclusion of digital communication tools in
organizations and how it affects their culture and communication habits. The focus is on
how the adoption of Electronic Mail, Intranet and Discussion Lists may change the
processes of organizational communication by creating new cultural conventions that
enable employees to participate in the communicative process. A case study at
Companhia de Processamento de Dados do Rio Grande do Sul (Procergs) were
conducted to evaluate how these tools were adopted, how the staff assimilated them
and what cultural conventions were created by their use. This case study collected
various reports given by staff members who use these tools on the daily work
routine. The interviews demonstrated that digital communication tools allow a better
involvement of the employees in the communication process. However, the tools by
themselves do not equalize the relationship between the organization and its employees,
which remains as the connecting space to communicative interaction.
Keywords: digital communication, email, intranet, discussion lists, cultural conventions,
organizations.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Esquema 1 - A organização como sistema aberto...................................................................33
Esquema 2 - Como uma organização pode ser vista como um conjunto de subsistemas........37
Esquema 3 - Dimensões da comunicação e dimensões da mudança.......................................55
Esquema 4 - Paradigma de Interação Comunicacional Dialógica...........................................73
Fotografia 1 - UNIVAC 1005 III – Card Processador.............................................................99
Fotografia 2 - Máquina de pequeno porte para programação interna......................................99
Fotografia 3 - Cd’s e disquetes..............................................................................................100
Esquema 5 - Linha do tempo.................................................................................................105
Fotografia 4 - Setor de digitação da Procergs localizado na Rua Caldas Junior...................107
Imagem 1 - Procergs Comunica............................................................................................113
LISTA DE SIGLAS
ABERJE - Associação Brasileira de Comunicação Empresarial
ABRACORP - Associação Brasileira de Comunicação Organizacional e Relações Públicas
ACOM – Assessoria de Comunicação
ARPANET - Departamento de Defesa Americano
CI – Comunicado interno
CPED - Centro de Processamento de Dados
CTR – Centro de Treinamento
DTI – Divisão de Tecnologia e Infra-Estrutura
ECA –Escola de Comunicação e Artes
GMT - Greenwich Mean Time
INTERCOM – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação
PCI – Programa de Comunicação Interna
PCS – Política de Comunicação Social
PROCERGS – Companhia de Processamento de Dados do Rio Grande do Sul
TICs – Tecnologias de Informação e Comunicação
USP – Universidade de São Paulo
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO.................................................................................................................11
2. A SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA E AS ORGANIZAÇÕES...............................17
2.1 O TEMPO, O ESPAÇO E AS ORGANIZAÇÕES SOCIAIS NA
CONTEMPORANEIDADE....................................................................................................17
2.2 ENFOQUE SISTÊMICO...................................................................................................26
2.3 A ORGANIZAÇÃO SOB UMA PERSPECTIVA SISTÊMICA......................................30
3. DIMENSÕES DA CULTURA..........................................................................................40
3.1 RAÍZES DO CONCEITO DE CULTURA.......................................................................40
3.2 CULTURA DAS ORGANIZAÇÕES...............................................................................47
3.3 MUDANÇA ORGANIZACIONAL E CULTURA DIGITAL.........................................53
4. COMUNICAÇÃO ORGANIZACIONAL.......................................................................60
4.1 BREVE RETROSPECTIVA HISTÓRICA DA COMUNICAÇÃO ORGANIZACIONAL
................................................................................................................................................ 61
4.2 O PROCESSO DE COMUNICAÇÃO NO ESPAÇO ORGANIZACIONAL..................66
5. COMUNICAÇÃO DIGITAL E A GERAÇÃO DE NOVAS PRÁTICAS
CULTURAIS..........................................................................................................................76
5.1 COMUNICAÇÃO DIGITAL NAS ORGANIZAÇÕES...................................................76
5.2 INTERAÇÃO E COMUNICAÇÃO MEDIADA..............................................................79
6. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ...................................................................85
6.1 TRAJETÓRIA METODOLÓGICA..................................................................................85
6.2 DESCRIÇÃO DOS PROCEDIMENTOS.........................................................................88
7. ANÁLISE DOS DADOS...................................................................................................96
7.1 PROCERGS E A CULTURA ORGANIZACIONAL......................................................96
7.2 IMPLANTAÇÃO DAS FERRAMENTAS: CORREIO ELETRÔNICO, INTRANET E
LISTAS DE DISCUSSÃO....................................................................................................103
7.2.1 Correio Eletrônico......................................................................................................105
7.2.2 Intranet – Procergs Comunica...................................................................................112
7.2.3 Listas de Discussão.....................................................................................................121
7.3 APROPRIAÇÃO DAS FERRAMENTAS: MUDANÇA E RESISTÊNCIA.................126
7.4 COMUNICAÇÃO DIGITAL E A GERAÇÃO DE NOVAS PRÁTICAS
CULTURAIS.........................................................................................................................133
a) Acesso do Correio Eletrônico de casa............................................................................134
b) Correio Eletrônico aberto o dia inteiro.........................................................................135
c) Registro e arquivamento eletrônico da informação.....................................................137
d) Gerenciamento das ações do cotidiano a partir do acesso ao Correio
Eletrônico..............................................................................................................................138
e) Utilização do Correio Eletrônico mais do que o telefone.............................................140
f) Comunicação presencial..................................................................................................140
g) Construção de repositórios de informação....................................................................142
h) Gestão do conhecimento..................................................................................................143
i) Dedicação de maior tempo à busca e leitura de informações.......................................144
8. CONSIDERAÇÕES FINAIS..........................................................................................147
REFERÊNCIAS...................................................................................................................151
GLOSSÁRIO........................................................................................................................157
11
1. INTRODUÇÃO
A necessidade do ser humano de se comunicar não é nova e sempre existiu. Nas
civilizações mais primitivas, as trocas comunicativas estavam diretamente relacionadas com a
oralidade e a expressão simbólica. Nessa época, a palavra exercia uma função essencial na
gestão da memória social, visto que o armazenamento da informação e a propagação do
conhecimento eram restritos em termos geográficos, pois dependiam da interação face a face
e se limitavam ao compartilhamento do mesmo espaço físico pelos participantes.
Com o surgimento da escrita e, posteriormente, no século XV, da impressão, essa
barreira física foi transposta, o que possibilitou o desenvolvimento de uma nova situação
prática de comunicação. As técnicas de impressão permitiram que a informação pudesse ser
propagada, possibilitando que os indivíduos interagissem com a palavra escrita e que o
conhecimento fosse disponibilizado em um tempo futuro.
A partir do desenvolvimento dos meios de comunicação, tornou-se possível
estabelecer um tipo de relação espaço-temporal que não consiste somente na instituição de
novos meios de transmissão de informação, mas também na emergência de novas formas de
interação e relacionamento entre os indivíduos. A informação e as trocas simbólicas passaram
a fluir em um sentido unilateral, pois eram produzidas em um contexto e recebidas por um
número indefinido de receptores situados em outro contexto.
Bauman (2001) afirma que, com a conquista do tempo e do espaço, chega ao fim a
‘modernidade pesada’ ou ‘era do hardware’, e passa-se para a ‘modernidade leve’ ou ‘era do
software’. A modernidade pesada, caracterizada como a época das máquinas, dos muros, das
fábricas, das poderosas locomotivas, dos gigantescos transatlânticos, foi marcada pela
conquista do território e pela manutenção das fronteiras. O lugar era considerado como um
todo compacto que se mantinha por meio da rotinização do tempo e fixava o
trabalho ao solo.
O advento da modernidade leve, caracterizada por ser líquida, fluida e
infinitamente mais dinâmica que a anterior, muda essa perspectiva. O espaço se torna
irrelevante, disfarçado pela anulação do tempo. Na modernidade leve, as distâncias podem ser
12
percorridas por sinais eletrônicos e o tempo não confere mais valor ao espaço. A
instantaneidade denota a ausência de tempo e anuncia a desvalorização do espaço.
Harvey (2001) destaca que o espaço e o tempo são categorias sicas da
existência humana, e que se tem a tendência de concebê-los como certos, dando-lhes
atribuições do senso comum que são auto-evidentes e, raramente, discute-se o seu sentido.
Esse autor contesta a idéia de um sentido único e objetivo de tempo e de espaço e insiste que
se reconheçam as multiplicidades das qualidades objetivas que eles podem expressar e a
relevância das práticas humanas em sua construção.
Para Harvey, as concepções de tempo e de espaço são criadas necessariamente
através de práticas e processos materiais que servem à reprodução da vida social. Cada modo
distinto de produção ou formação social incorpora um agregado particular de práticas e
conceitos do tempo e do espaço, visto que esses podem ter diferentes sentidos, variando
geográfica e historicamente. Nesse aspecto, o autor ressalta a importância dada ao tempo e ao
espaço, na medida em que eles afetam o modo como se interpreta e age-se com relação ao
mundo.
Partindo dessa gica, as mudanças trazidas pelas Tecnologias de Informação e
Comunicação (TICs), surgidas na década de 70
1
, além de colocar em questão referenciais de
tempo e espaço, também trouxeram transformações que dizem respeito à linearidade e não
linearidade dos fluxos da informação e da comunicação, bem como ao papel do emissor e do
receptor no processo comunicativo. Neste novo contexto, as conexões estabelecidas através
das redes digitais tornam possível instituir-se outra formatação comunicacional, que não é
mais produzida por um centro, mas disseminada em todos os sentidos por meio da livre
circulação de mensagens, propagadas de forma não planejada e compartilhada.
Nessa configuração, o emissor e o receptor deixam de ser pólos estanques e se
tornam híbridos
2
, permutando-se em suas funções, de forma que o emissor se confunde com o
receptor e vice-versa, se adequando aos princípios de colaboração, participação e produção
coletiva estabelecidos pela Internet e pelas ferramentas que utilizam a Web como plataforma
de comunicação.
Segundo essa perspectiva, as tecnologias de comunicação e informação têm um
caráter descentralizador e pluralístico. Do ponto de vista da comunicação - e não somente da
1
A origem da Internet é uma mistura de estratégia militar, grande cooperação científica e contracultura. Nos
anos 70 ela teve entrada no meio universitário. Neste período, a fusão das telecomunicações analógicas com a
informática possibilitou a veiculação de diversas formatações de mensagens através do microcomputador,
rompendo com as dimensões de tempo e espaço. nos anos 90 a Internet começou a ser comercializada com
acesso ao público.
13
transmissão de informações - ferramentas como chats, e-mails, fóruns e listas de discussão
permitem estabelecer a relação dialógica na comunicação eletrônica
,
instaurando novas
formas de interação e novos modelos de comportamento.
À medida que aumenta a busca por uma efetiva conexão social, aumenta também
a necessidade do desenvolvimento de aplicativos ainda mais sofisticados que possibilitem o
surgimento de inúmeras práticas comunicacionais nas mais variadas esferas sociais. Madrid
(2002) ressalta que a evolução tecnológica incrementa o alcance e o poder da comunicação
não apenas dentro, mas também fora do espaço institucional e organizacional.
Na busca de maior flexibilidade, agilidade nos processos, adaptação em relação ao
mercado, desempenho e facilidade no relacionamento com os públicos, as organizações têm
demonstrado um esforço crescente na adoção e uso dos novos instrumentos tecnológicos. O
computador, por exemplo, que no princípio era utilizado apenas para melhorar as operações
internas e tarefas administrativas, como folhas de pagamento e faturamentos de clientes e
estoques, passou a ser a interface com a qual os funcionários podem estabelecer novas formas
de interação, cooperação, participação, comunicação e circulação de informações.
Diariamente, novas ferramentas tecnológicas, como Intranet, blog e orkut, são
colocadas à disposição das pessoas e incorporadas às empresas. Por exemplo, um funcionário
com acesso a e-mails e chats - independente do nível hierárquico em que se encontra - pode
receber e repassar mensagens para outra pessoa com acesso à Internet dentro ou, até mesmo,
fora da empresa. Também pode ter um blog ou escrever no blog de outra pessoa, participar de
listas de discussão e manifestar seu ponto de vista em relação a algum assunto, inclusive sobre
fatos ocorridos dentro da própria organização. Dessa forma, emissor e receptor passam a
exercer papel mais ativo e participativo no processo de comunicação, que se torna mais
horizontal e dinâmico.
Pensar em questões relacionadas à evolução tecnológica e à inserção do meio
eletrônico dentro da organização implica refletir no modo como esses aspectos podem
interferir na cultura organizacional. Eles vão exigir das organizações novas posturas frente aos
processos comunicativos caracterizados pela multidirecionalidade e informalidade, em que
qualquer pessoa pode receber e enviar informações de e para qualquer lugar do globo
terrestre.
Em outras palavras, muitas organizações que têm uma visão funcionalista e são
2
Para hibridação do emissor-receptor ver Trivinho (
2003)
.
14
balizadas pelo modelo informacional clássico
3
- em que a comunicação é vista de modo
instrumental e unidirecional, como processo mecânico que prioriza a linearidade na
transmissão das mensagens e na relação da organização com os seus públicos - têm que se
adaptar à nova configuração comunicacional suscitada pelo ambiente digital.
Pressupondo-se que as organizações se apropriam dessas tecnologias digitais de
comunicação, o presente estudo tem o propósito de estabelecer a relação entre cultura
organizacional, comunicação digital e interação mediada nas práticas culturais. Parte-se da
premissa de que a inserção e a utilização de ferramentas de comunicação digital na
organização possibilitam a participação dos funcionários no processo comunicativo.
Assim, a ênfase desta dissertação será investigar como essa utilização modifica o
processo de comunicação organizacional através da criação de práticas culturais
4
que
permitem estabelecer uma relação multilateral e horizontal entre a organização, representada
pelo corpo gerencial, diretivo e os funcionários. No trabalho, tem-se a seguinte questão de
pesquisa: como a inclusão de ferramentas de comunicação digital na organização pode
influenciar as práticas culturais, possibilitando a participação dos funcionários no processo
comunicativo.
Dentro dessa perspectiva, a finalidade desta dissertação é desenvolver um estudo
de caso na Companhia de Processamentos de Dados do Rio Grande do Sul Procergs -
empresa de economia mista, vinculada à Secretaria de Administração e dos Recursos
Humanos, cujo maior acionista é o Governo do Estado do Rio Grande do Sul. É a maior
empresa
5
de informática do Estado. A sua área de atuação abrange os órgãos da administração
direta e indireta do Estado, buscando gerar soluções em informática para os órgãos dos
poderes legislativo, judiciário e de outras esferas do governo.
A escolha dessa organização se justifica pelo fato de ela ser pioneira no uso das
TICs, assim como por ser a maior empresa de informática do Rio Grande do Sul, com
unidades de atendimento localizadas no interior do estado, situadas em Alegrete, Caxias,
Passo Fundo, Pelotas, Santo Ângelo e Santa Maria, nas quais somam cerca de 960
3
Os primórdios deste modelo são encontrados, na década de 40, nos estudos desenvolvidos por dois engenheiros
matemáticos, chamados Shannon e Weaver. Na época em que foi contratado pelo Laboratório Bell, para
trabalhar na área de criptografia, ao longo da Segunda Guerra Mundial, Shannon propôs a Teoria Matemática da
Comunicação, também conhecida como Teoria da Informação, que é uma teoria sobre rendimento
informacional. Essa teoria tinha como objetivo melhorar a velocidade de transmissão de mensagens, ao mesmo
tempo em que minimizava possíveis distorções, e aumentava a eficácia no processo de transmissão (WOLF,
2003).
4
Ressalta-se que as práticas culturais abordadas nesta dissertação são pensadas sob a ótica da comunicação.
5
Seu eixo de negócios é desenvolver softwares e soluções em informática para os órgãos ligados às autarquias
do governo estadual.
15
funcionários.
A primeira parte deste estudo apresenta o contexto que constitui o ponto de
partida para o desenvolvimento da pesquisa. Nesta parte, faz-se uma reflexão sobre os
conceitos de tempo e espaço e a sua evolução, que é evidenciada a partir das transformações
que as Tecnologias de Informação e Comunicação provocaram na sociedade contemporânea e
nos processos de trabalho. Posteriormente, utiliza-se a Teoria dos Sistemas de Ludwig von
Bertalanffy (1977) para se compreender o universo organizacional a partir de uma perspectiva
sistêmica.
A perspectiva teórica sobre cultura organizacional adotada nesta pesquisa é
apresentada na segunda parte. Faz-se a explanação de alguns conceitos sobre cultura no
contexto organizacional e exploram-se alguns aspectos que podem ocasionar transformações e
levar à mudança cultural, por meio da cultura digital que desponta como expressão da
sociedade contemporânea.
A terceira parte se refere ao processo de comunicação organizacional.
Inicialmente, faz-se uma breve retrospectiva histórica do processo de comunicação nas
organizações. Por conseguinte, busca-se compreender o modo como a comunicação se
encontra configurada nas organizações nos dias atuais.
A comunicação e a geração de práticas culturais são abordadas na quarta parte.
Primeiramente, aborda-se a comunicação digital e, em seguida, trata-se do surgimento de
novas técnicas e as ferramentas de comunicação digital.
A quinta parte diz respeito aos procedimentos metodológicos. Faz-se uma
exposição do método e das técnicas e descrevem-se os procedimentos adotados nesta
pesquisa.
A organização em que foi realizada a pesquisa é apresentada na sexta parte. No
intuito de atender ao propósito deste trabalho, analisa-se a organização, sua cultura, o
processo de comunicação, a inserção das ferramentas de comunicação digital e a geração de
práticas culturais. Nesta etapa, utiliza-se o material coletado durante as entrevistas, que
servem para subsidiar e complementar a teoria, realizar a análise e mostrar os resultados.
Na parte final, são colocadas as considerações finais que foram obtidas com o
desenvolvimento do trabalho.
É relevante ressaltar que a Internet e as ferramentas de comunicação digital
instituem princípios de comunicação colaborativa e associativa e que, por serem tecnologias
relativamente novas, suscitam questionamentos passíveis de reflexão, aprofundamento e
pesquisa. Esse assunto vem sendo discutido em alguns trabalhos e artigos científicos e
16
muitos desses servirão de subsídio no desenvolvimento desta pesquisa. A relevância desta
dissertação, portanto, consiste no fato de que trata de tema atual e de que o enfoque proposto
tem o objetivo de buscar maior entendimento sobre o processo de comunicação digital nas
organizações, contribuindo para o desenvolvimento da pesquisa científica na área da
comunicação.
Um contato preliminar foi realizado com o responsável
6
pela Divisão de
Desenvolvimento de Tecnologia e Infra-Estrutura da Procergs (DTI), com a coordenadora da
Assessoria de Comunicação (ACOM) e a Relações Públicas, no intuito de conhecer um pouco
mais sobre a realidade e o funcionamento dessa empresa e tomar conhecimento sobre quais
ferramentas tecnológicas são utilizadas no processo de comunicação. Dentre algumas das
ferramentas citadas, encontram-se: o e-mail, as listas de discussão, a intranet, fale com o
presidente, fale conosco, PSI
7
.
Eles explicaram que a organização é formada basicamente por três áreas:
desenvolvimento, administrativo e operacional. Cada uma destas áreas desenvolve
ferramentas de comunicação de acordo com a sua necessidade específica. Além disso,
destacaram que, embora as ferramentas de comunicação digital sejam disponibilizadas dentro
da organização, a forma como elas são usadas está diretamente relacionada com a postura do
gestor principal, neste caso, o presidente, pelo fato da Procergs ser uma instituição ligada ao
governo estadual.
Considerando-se que a Procergs tem o processo de comunicação mediado pelas
Tecnologias de Informação e Comunicação, têm-se como objetivo geral deste estudo:
investigar alterações provocadas nas práticas culturais da organização com a incorporação de
ferramentas de comunicação digital. Como objetivos específicos, pretende-se: investigar o
processo de implantação das ferramentas de comunicação digital na organização e a
apropriação dessas pelos funcionários; verificar se as ferramentas utilizadas para realizar a
comunicação mediada o incorporadas como canal oficial e/ou oficioso de comunicação da
organização; compreender o modo como ocorre o processo de comunicação a partir da
inserção das ferramentas de comunicação digital na rotina organizacional.
Após a apresentação das razões e dos objetivos que justificam a realização desta
pesquisa, a partir do próximo item, trata-se sobre a teoria que fundamenta e sustenta o estudo.
6
O responsável pelo Departamento de Desenvolvimento de Tecnologia e Infra-Estrutura da Procergs deixou
claro que a empresa demonstra abertura para a realização da pesquisa, e salientou que deveria haver mais
iniciativas deste tipo, pois, assim, todos saem ganhando: a academia e as organizações.
17
2. A SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA E AS ORGANIZAÇÕES
Tempo e espaço são conceitos que tiveram a sua compreensão modificada ao
longo do desenvolvimento da sociedade. Esses termos têm uma relação direta com o processo
de evolução social, com as organizações e as relações humanas e, de certa forma, são
apreendidos pelas mudanças das concepções e práticas espaciais e temporais. No intuito de
compreender essa transformação conceitual, a sua ‘compressão’ e posterior ‘aniquilação’ a
partir do desenvolvimento técnico e tecnológico, neste capítulo, faz-se uma reflexão sobre os
conceitos de tempo e espaço e a sua evolução, evidenciada a partir das transformações que as
TICs provocaram na sociedade contemporânea e nos processos de trabalho. Posteriormente,
expõe-se a origem do enfoque sistêmico e elucidam-se conceitos que entendem a organização
através dessa perspectiva.
2.1 O TEMPO, O ESPAÇO E AS ORGANIZAÇÕES SOCIAIS NA
CONTEMPORANEIDADE
No mundo pré-moderno, o tempo sempre esteve vinculado a um espaço ou lugar.
Segundo Giddens (1991), nessa época, existia uma coincidência espaço temporal, na medida
em que as dimensões espaciais da vida social eram associadas com atividades localizadas em
fronteiras territoriais fixadas. Todas as culturas desse período tinham formas de calcular o
tempo, ele consistia no alicerce da vida diária e, freqüentemente, era associado a ocorrências
naturais regulares.
7
PSI é um software de comunicação instantânea que possibilita que a comunicação se realize internamente entre
os funcionários, e também externamente entre os funcionários e outras pessoas que tenham conexão com algum
software desse tipo como Messenger ou ICQ. Disponível em: http://psi-im.org/
18
O autor explica que, no final do século XVIII, a criação e difusão do relógio
mecânico entre a população estabeleceram um marco na separação espaço temporal, pois isso
correspondeu à uniformidade na mensuração do tempo e na organização social do mesmo.
Além disso, a padronização dos calendários e do tempo através de regiões possibilitaram que
diferentes áreas, dentro de um único estado, passassem a viver em um ‘mesmo tempo’. “O
‘esvaziamento do tempo’ é em grande parte a pré-condição para o ‘esvaziamento do espaço’ e
tem assim prioridade casual sobre ele” (GIDDENS, 1991, p. 26).
A coordenação através do tempo é a base do controle do espaço. O surgimento do
‘espaço vazio’ pode ser entendido como a separação do espaço e do lugar
8
e está ligado a dois
aspectos: o primeiro concebe a representação do espaço sem referência a um local
privilegiado que forma um ponto favorável específico; o segundo torna possível a substituição
de diferentes unidades espaciais. As viagens realizadas pelos exploradores em busca de novas
regiões foram o fundamento necessário para ambos. Além disso, o progressivo mapeamento
do globo terrestre levou à criação de mapas universais, em que a noção de perspectiva
desempenhava um papel importante na representação da posição e forma geográficas,
estabelecendo o espaço como ‘independente’ de qualquer região particular.
A compreensão da evolução da concepção espaço temporal apresentada por
Giddens é complementada pela visão de Harvey (2001). De acordo com esse autor, a partir
do desenvolvimento dos mapas renascentistas, ocorre uma reconstrução em relação às
concepções do tempo e do espaço que vinham sendo estabelecidas até então. A representação
gráfica do espaço assumiu qualidades novas de objetividade, praticidade e funcionalidade,
tornando-se importante instrumento para a organização espacial, na medida em que passou a
definir direitos de propriedade da terra, fronteiras territoriais, rotas de comunicação. Além
disso, a visão totalizante do mapa permitiu que toda a população da terra fosse localizada em
uma única estrutura espacial.
[...] as viagens de descoberta produziram um assombroso fluxo de
conhecimento acerca de um mundo mais amplo que teve de ser, de alguma
maneira, absorvido e representado; elas indicavam um globo que era finito e
potencialmente apreensível. O saber geográfico se tornou uma mercadoria
valiosa numa sociedade que assumia uma consciência cada vez maior do
lucro. A acumulação de riqueza, de poder e de capital passou a ter um
vínculo com o conhecimento personalizado do espaço e o domínio
individual dele. (HARVEY, 2001, p. 221).
8
Embora exista uma distinção com relação e essas duas noções, Giddens (1991) salienta que, o lugar é melhor
conceitualizado através da idéia da localidade, referindo-se ao cenário físico da atividade social e a posição
geográfica.
19
Harvey salienta também que a mudança da experiência do espaço e do tempo está
muito relacionada com a ascensão da modernidade. Esse período celebrou a universalidade, a
queda de barreiras espaciais e explorou novos sentidos do espaço e do lugar. Também
celebrou a sujeição do espaço a propósitos humanos, a ordenação e controle racionais do
espaço como parte integrante da cultura moderna, fundada na racionalidade e na técnica.
Durante essa época, o capitalismo entrou em intensa fase de investimento na conquista
espacial, por meio da expansão da rede de estradas de ferro, do desenvolvimento do telégrafo,
da navegação a vapor, da comunicação pelo rádio, da bicicleta e dos automóveis e a
construção do Canal de Suez. Além disso, inovações técnicas com relação à fotografia e às
viagens de balões também mudaram a percepção da superfície da terra, ao mesmo tempo em
que a emergência de tecnologias de impressão e reprodução mecânica permitiu a
disseminação de notícias, informações e artefatos culturais a camadas cada vez mais amplas
da população.
Thompson (1998) esclarece que o surgimento e a utilização dos mais distintos
meios técnicos, além de alterar as dimensões espaço temporais da vida social, capacitaram os
indivíduos a se comunicarem através do espaço e do tempo e transcenderam os limites
característicos de uma interação face a face. O desenvolvimento das telecomunicações trouxe
uma disjunção entre o espaço e o tempo, de modo que o distanciamento espacial não mais
implicava em distanciamento temporal. Informação e conteúdo simbólico não dependiam
mais de seu deslocamento de um local para o outro e do transporte físico, pois podiam ser
transmitidos para distâncias cada vez maiores em um tempo cada vez menor.
Para o autor, as transformações do espaço e do tempo, trazidas em parte pelas
tecnologias de comunicação e pela evolução dos meios mais rápidos de transporte, deram
origem a problemas cada vez mais agudos de coordenação espaço-temporal, problemas que
foram superados com uma série de convenções destinadas a padronizar
9
o tempo no mundo. A
padronização do sistema de tempo em escala mundial forneceu uma estrutura para a
coordenação dos tempos locais e para a organização de redes de comunicação e transporte,
afetando o modo pelo qual os indivíduos experimentam as características de espaço e de
tempo da vida social. O desenvolvimento dos meios de comunicação criou uma ‘historicidade
mediada’ e uma ‘mundanidade mediada’ (THOMPSON, 1998). A primeira possibilitou a
9
A introdução do horário padronizado das estradas de ferro, com base na hora média de Greenwich,
gradualmente levou a adoção do GMT (Greenwich Mean Time) como horário padrão para toda a Inglaterra. Para
padronizar o cálculo do tempo em escalas territoriais maiores, o mundo foi dividido em 24 fusos horários.
20
compreensão do passado, e a segunda, a compreensão do mundo, que está sendo modelado
cada vez mais pela mediação de formas simbólicas.
Ao alterar a compreensão do lugar e do passado, o desenvolvimento dos
meios de comunicação modificou o sentido de pertencimento dos indivíduos
isto é, a compreensão dos grupos e das comunidades a que eles sentem
pertencer. [...] à medida que nossa compreensão do passado se torna cada
vez mais dependente da mediação das formas simbólicas, e a nossa
compreensão do mundo e do lugar que ocupamos nele vai se alimentando
dos produtos da mídia, do mesmo modo a nossa compreensão dos grupos e
comunidades com que compartilhamos um caminho comum através do
tempo e do espaço, uma origem e um destino comuns, também vai sendo
alterada: sentimo-nos pertencentes a grupos e comunidades que se
constituem em parte através da mídia (THOMPSON, 1998, p. 39)
Sem dúvida, as novas formas de comunicação e de transporte mudaram a
experiência espaço temporal existente até então. À medida que as barreiras temporais
perderam relevância e o ritmo da vida social foi acelerado, o mundo pareceu se tornar menor,
meticulosamente mapeado e explorado, ao passo que localidades distantes foram conectadas
por meio de redes globais de interdependência, o tempo das viagens foi reduzido, e a
velocidade da comunicação passou a ser instantânea.
Harvey (2001) assinala que, nas últimas duas décadas, vivemos uma intensa fase
de compressão espaço temporal, que tem gerado um impacto profundo sobre as práticas
político econômicas, sobre o equilíbrio do poder de classes, bem como sobre a vida social e
cultural. A implantação de novas formas organizacionais e de novas tecnologias produtivas
superaram a rigidez do fordismo e aceleraram a produção, que passou a ser balizada pelo
sistema de entrega ‘just in time’, pela redução de estoques e diminuição dos tempos de giro.
Para os trabalhadores, isso significou uma intensificação dos processos de trabalho e uma
aceleração na desqualificação e requalificação essenciais ao atendimento das novas
necessidades de trabalho. Essa aceleração generalizada acentuou a volatilidade e efemeridade
das modas, dos produtos, técnicas de produção, processos de trabalho, idéias, valores e
práticas estabelecidos. A produção de mercadorias começou a ser enfatizada, considerando-se
valores como a instantaneidade e descartabilidade.
Passa-se a viver na dinâmica de uma ‘sociedade do descarte’, com a sensação de
que ‘tudo se desmancha no ar’, salienta o autor. A volatilidade torna mais complexa a
realização de planejamento em longo prazo, levando os trabalhadores a desenvolverem uma
Assim, a padronização do sistema de tempo no mundo estabelceu uma estrutura para a coordenação dos tempos
locais e para a organização das redes de comunicação e transporte. (THOMPSON, 1998).
21
alta capacidade de adaptação para se movimentar com rapidez em resposta às mudanças do
mercado, sendo forçados a lidar com a descartabilidade, a novidade e a perspectiva de
obsolescência instantânea. E a efemeridade e a comunicabilidade instantânea no espaço
tornam-se virtudes a ser exploradas e apropriadas pelos capitalistas para objetivos próprios.
Enquanto as sociedades modernas se constituíram mediante uma ‘inversão do
tempo’ que instituiu a supremacia do futuro sobre o passado, a pós-modernidade é uma época
em que ocorre uma ausência de futuro’, e surge uma temporalidade social marcada pela
primazia do aqui e agora (LIPOVETSKY, 2004).
As inquietações com o futuro substituem a mística do progresso. Sob efeito
do desenvolvimento dos mercados financeiros, das técnicas eletrônicas de
informação, dos costumes individualistas e do tempo livre, o presente
assume importância crescente. Por toda a parte, as operações e os
intercâmbios se aceleram; o tempo é escasso e se torna um problema, o qual
se impõe no centro de novos conflitos sociais. Horário flexível, tempo livre,
tempo dos jovens, tempo da terceira idade: a hipermodernidade multiplicou
as temporalidades divergentes
(
LIPOVETSKY, 2004, p.58).
De acordo com esse autor, o nascimento da s-modernidade coincide com a
hipermodernização do mundo. Na hipermodernidade, não existe escolha que não seja acelerar
para não ser superado pela evolução. Esse presentismo instalou-se a partir dos anos 80 e 90,
encoberto pela globalização neoliberal e pela revolução informática. A combinação destes
dois fenômenos potencializou a lógica da brevidade, comprimindo o tempo numa lógica
urgentista. A mídia eletrônica e informática possibilitaram os intercâmbios de informação em
tempo real, proporcionando uma sensação de simultaneidade e de imediatez. Além disso, a
ascendência do mercado e do capitalismo financeiro institui uma nova ordem em favor do
desempenho de curto prazo e da circulação acelerada dos capitais em escala global, de modo
que as organizações são obrigadas a lidar com essa nova conjuntura, em que flexibilidade,
rentabilidade, concorrência temporal e atraso-zero passam a ser palavras-chave.
Instala-se, assim, um novo clima social e cultural, que se distancia da
tranqüilidade descontraída dos anos pós-modernos. A desestruturação do mercado de
trabalho, por meio da precarização do emprego e do desemprego crescente, fomenta a
sensação de vulnerabilidade, a insegurança profissional e material, o receio da desvalorização
dos diplomas, o surgimento das atividades subqualificadas e a degradação da vida social.
Além disso, a sociedade-moda reestruturada pelas técnicas do efêmero, da renovação e da
sedução permanentes, estimula o consumo por meio da idéia de que ‘tudo é descartável’.
22
A obsessão moderna com o tempo não mais se concretiza na esfera do
trabalho que está submetida a critérios de produtividade ela se apossou de
todos os aspetos da vida. A sociedade hipermoderna se apresenta como a
sociedade em que o tempo é cada vez mais vivido como preocupação maior;
a sociedade em que se exerce e se generaliza uma pressão temporal
crescente. (LIPOVETSKY, 2004, p. 75).
Passa-se de um mundo centrado na organização do trabalho, para um universo
evidenciado pelo acúmulo de problemas na organização e gestão do tempo social. Essas
contradições repercutem na vida diária, em que uma das conseqüências mais perceptíveis do
poder do regime presentista é o clima de pressão que ele faz sobre a vida das organizações e
das pessoas. Vive-se uma cultura da imediatez: o vínculo humano é substituído pela rapidez;
a qualidade de vida, pela eficiência; a fruição livre de normas e de cobranças, pelo frenesi; as
relações reais de proximidade cedem lugar aos intercâmbios virtuais. Nela organiza-se uma
cultura de hiperatividade caracterizada pela busca do desempenho. A primazia da técnica
sobre o tempo possibilitou uma automização crescente no que se refere às limitações
temporais coletivas, mas também resultou em uma dessincronização das atividades, dos
ritmos e das trajetórias individuais (LIPOVETSKY, 2004).
Essa nova formatação da vida produz conseqüências sobre a vida das
organizações e das pessoas. Diariamente, um mar de informações invade a vida individual e
coletiva. Aumentam as exigências de mercado e os funcionários trabalham em um ritmo cada
vez mais veloz para atender as necessidades de produção, o que leva todos a viver com uma
sensação de atraso com relação ao tempo e uma espécie de tensão permanente.
Drucker (1999) salienta que a vertiginosa transformação social que se verificou
nas últimas décadas, na qual toda a sociedade reorganiza a sua estrutura social e política, os
valores, as artes e as instituições, ocorreu tanto pelo desenvolvimento de novas tecnologias,
como pelas exigências em cima de uma sociedade baseada no conhecimento, em que os
indivíduos precisam tornar o aprendizado um processo vitalício.
O autor explica que, de certo modo, a sociedade, a comunidade e a família são
instituições conservadoras e que procuram manter a estabilidade ou, pelo menos, desacelerar
essas mudanças. Entretanto, destaca que a organização moderna é desestabilizadora. Ela
precisa estar preparada para as mudanças constantes e para a inovação, precisa estar
organizada “para o abandono sistemático de tudo aquilo que é estabelecido, costumeiro,
conhecido e confortável, quer se trate de um produto, um serviço ou um processo, um
23
conjunto de aptidões, relações humanas e sociais ou a própria organização” (DRUCKER,
1999, p. 58).
Para os gestores, as novas dinâmicas do conhecimento determinam que cada
organização precisa introduzir o gerenciamento das mudanças em sua própria estrutura. A
organização precisa se preparar para abandonar o que faz, antecipando-se às mudanças, de
modo que possa, quando necessário, planejar o abandono, ao invés de tentar prolongar a vida
de um produto, política ou prática de sucesso. Dessa forma, ela também deve se dedicar à
criação do novo, na qual Drucker (1999) indica três práticas sistemáticas que devem ser
adotadas. A primeira se refere ao aperfeiçoamento contínuo de tudo aquilo que a organização
faz. A segunda diz respeito ao fato de que cada organização deve aprender a explorar seus
conhecimentos. E a última sugere que as organizações têm que aprender a inovar, mediante
um processo organizado e sistemático.
O desenvolvimento das Tecnologias de Informação e Comunicação, manifestado
a partir dos anos 90 através da integração das telecomunicações com a informática,
evidenciou ainda mais essa aceleração e compressão espaço temporal, refletindo-se na
sociedade e nas organizações. A emergência das redes telemáticas possibilitou a realização da
revolução tecnológica, que reconfigurou “[...] o conjunto das sociedades humanas em todos os
seus aspectos, implodindo barreiras de Tempo e Espaço, colocando a Informação como
elemento central de articulação das atividades humanas” (LEMOS e PALACIOS, 2001, p.
05).
A utilização e consolidação dessas tecnologias nas mais variadas esferas da
sociedade provocaram transformações políticas, econômicas, tecnológicas, sociais e culturais.
Estes dispositivos tecnológicos modificam o modo como nos relacionamos e comunicamos,
tornando possível que pessoas situadas em locais geograficamente distantes possam se
conectar ao ciberespaço através da utilização de instrumentos cada vez mais interativos, com
acesso instantâneo a um universo de informações.
Castells (2004) argumenta que estamos vivendo um novo paradigma sócio-
técnico, que tem como fundamentação a Internet, já que ela interfere no modo como se
estruturam as relações, o trabalho e a comunicação. Para o autor:
24
[...] Internet é sociedade, expressa os processos sociais, os interesses sociais,
os valores sociais, as instituições sociais [...] ela constitui a base material e
tecnológica da sociedade em rede; e a infra-estrutura tecnológica e o meio
organizativo que permitem o desenvolvimento de uma série de novas formas
de relação social que não têm sua origem na Internet, que são fruto de uma
série de mudanças históricas, mas que não poderiam desenvolver-se sem a
Internet. [...] Nesse sentido, a Internet não é simplesmente uma tecnologia, é
o meio de comunicação que constitui a forma organizativa de nossas
sociedades; é o equivalente ao que foi a fábrica ou a grande corporação na
era industrial. (CASTELLS, 2004, p. 286 e 287).
Entende-se que o surgimento das Tecnologias de Informação e Comunicação o
apenas estabeleceu maior abertura informativa, como também rompeu com o modelo um-
todos - concebido como a troca de informações entre um emissor e um receptor - até então
estabelecido nos media tradicionais, favorecendo o aparecimento de novos modos de
interação e práticas sociais. As mudanças trazidas por essas tecnologias colocaram em questão
referenciais de tempo e espaço, aspectos que dizem respeito à linearidade e não linearidade
dos fluxos da informação e da comunicação, bem como o papel do emissor e do receptor no
processo comunicativo. Não se trata somente da emergência de novos suportes técnicos, mas
de novas formas de produzir, difundir e receber a informação, em que qualquer pessoa pode
alcançar a mesma ou maior influência que os meios de comunicação.
A análise dessas transformações, portanto, não pode se dar apenas sob o ponto de
vista midiático, pois elas “construyen nuevos espacios-tiempo en donde se constituyen nuevas
formas de relación social, nuevas formas institucionales, nuevas categorías de aprehensión de
la experiencia personal y social y nuevas dimensiones de la cultura” (VIZER, 2006, p. 324).
Para Rojasorduña (2005), vivemos em uma nova era na qual sentimos o impacto
dessas mudanças nos mais variados âmbitos da vida, e este cenário não poderia ser diferente
no contexto organizacional. Segundo este autor:
Se esta viviendo la democratización de la información, em la que um puñado
de personas pueden alcanzar la misma o mayor influencia que los medios
tradicionales. Pero esta revolución no solo está llamando a las puertas de los
médios. También las organizaciones están viviendo una transformación em
la manera de ser percibidas por el público. (ROJASORDUÑA, 2005, p.
243).
A concepção de redes, representadas pela Internet, está expressa nos meios de
comunicação e também no interior das organizações, que, em busca de maior flexibilidade,
agilidade nos processos, adaptação em relação ao mercado, desempenho e facilidade no
relacionamento com os blicos, têm demonstrado esforço crescente na adoção e uso dos
25
novos instrumentos tecnológicos.
Castells (1999) argumenta que as modificações ocasionadas nas organizações não
foram conseqüência automática da evolução tecnológica e ocorreram independentemente a
essa. Algumas, inclusive, precederam essa evolução ao surgirem como resposta à necessidade
das empresas de adaptar o seu modelo organizacional a um contexto operacional em constante
mudança. No entanto, essas modificações foram intensificadas pelo desenvolvimento das
Tecnologias de Informação e Comunicação.
A principal mudança ocorrida neste processo é caracterizada pelo autor como a
mudança de burocracias verticais para a empresa horizontal, definida como “uma rede
dinâmica e estrategicamente planejada de unidades autônomas e autocomandadas com base na
descentralização, participação e coordenação” (CASTELLS, 1999, p. 187).
Nesse contexto, frente à necessidade de utilização de redes pelas organizações, os
computadores pessoais e as redes de computadores foram largamente propagados e, devido à
disponibilidade dessas tecnologias, a integração em redes se tornou a resposta para a
flexibilidade e o desempenho organizacional. Assim, avanços na tecnologia da informação,
que até a década de 90 eram indisponíveis, tornaram possível o aparecimento de formas mais
dinâmicas de produção, gerenciamento e distribuição, baseadas na cooperação simultânea
entre diferentes unidades através de processos de trabalhos interativos, realizados por meio
dos computadores conectados em rede
.
Desta forma, a convergência entre as exigências
organizacionais e a transformação tecnológica estabeleceu a integração em rede como modelo
fundamental de concorrência da economia global, dando origem a uma nova forma
organizacional definida por Castells como: a ‘empresa em rede’.
Para o autor, a empresa em rede é aquela forma específica de empresa cujo
sistema de meios é constituído pela intersecção de segmentos de sistemas autônomos de
objetivos” (CASTELLS, 1999, 191). Castells considera que os componentes da rede podem
tanto ter autonomia quanto ser dependentes em relação à rede, de modo que podem também
constituir uma parte de outras redes e, dessa forma, fazer parte de outros sistemas cujos meios
são destinados a outros objetivos. Nesse caso, a desenvoltura de uma rede está relacionada a
dois aspectos essenciais: conectividade e coerência. O primeiro se refere à capacidade
estrutural de facilitar a comunicação entre os seus componentes, e o segundo diz respeito aos
interesses compartilhados entre os objetivos da rede e seus componentes. Pode-se dizer, então,
que o autor compreende a empresa em rede através de uma perspectiva sistêmica, na qual
distintos sistemas organizacionais influenciam e são influenciados pelo ambiente. Esses
26
sistemas se fundamentam em redes, que são os elementos essenciais para o funcionamento
das organizações.
Assim, entende-se que a concepção espaço temporal modificada ao longo do
desenvolvimento da sociedade se relaciona com o processo de evolução social, e também se
encontra presente em uma era em que as redes e a tecnologia colaboram para que o mundo
seja cada vez mais dinâmico e flexível. Essa transformação influencia não somente no modo
como se dão as relações humanas e as práticas sociais, mas também interfere na realidade
organizacional.
Seguindo esta ótica, no próximo item, buscar-se-á, através da concepção de
diversos autores, apresentar a perspectiva teórica sobre organizações adotada nesta pesquisa.
2.2 ENFOQUE SISTÊMICO
O pensamento administrativo é fundamentado por diferentes correntes teóricas
10
.
Neste trabalho, não se tem a intenção de fazer uma retrospectiva da teoria das organizações,
mas, com base no pensamento de alguns estudiosos, pretende-se elucidar conceitos que
compreendem a organização a partir de uma perspectiva sistêmica, fundamentada na idéia de
que todas as funções devem ser desempenhadas satisfatoriamente para o bem da estrutura
organizacional. Inicialmente, essa abordagem enfatizava um sistema fechado, no qual os
indivíduos trabalhavam de modo mecânico, previsível e determinístico. Depois, com o passar
do tempo, a organização passou a ser vista como um sistema aberto, com a percepção de que
o ambiente interno é sensível ao mundo que o rodeia.
Para se compreender a organização como um sistema, é necessário recorrer aos
estudos sobre a teoria dos sistemas abertos que surgiu e foi popularizada a partir dos trabalhos
do biólogo Ludwig von Bertalanffy (1977). Na década de 20, Bertalanffy se encontrava
intrigado com lacunas existentes na pesquisa e na teoria em biologia, nas quais a abordagem
do enfoque mecanicista negava a essência característica dos fenômenos vitais e se mostrava
10
A administração científica focalizava a especialização do trabalho; a teoria clássica concebia a organização
como um sistema fechado e enfatizava a estrutura; a escola de relações humanas desenvolveu uma abordagem
humanista, deslocando o foco da estrutura, passando a olhar para o indivíduo. Aqui, o método e a máquina
perdem a primazia em função da dinâmica do grupo surgindo uma nova idéia sobre o ser humano: “o homem
economicus cede lugar ao homem social” (CHIAVENATO, 2000, p. 125). O surgimento da teoria neoclássica
representa a teoria clássica configurada em um novo formato que aproveita a contribuição de todas as demais
27
insuficiente para atender aos problemas teóricos, em especial nas ciências bio-sociais, e aos
problemas práticos propostos pela tecnologia. Dessa forma, o autor trabalhou para o
desenvolvimento de uma concepção organísmica na biologia que acentuasse a consideração
do organismo como totalidade ou sistema. Assim, esse autor propôs a teoria dos sistemas
abertos e, com base no fato de que o organismo vivo é um sistema aberto, definiu que um
sistema é como um complexo de elementos em interação.
A interação significa que os elementos p estão em relações R, de modo que o
comportamento de um elemento p em R é diferente de seu comportamento
em outra relação R’. Se os comportamentos em R e R’ não são diferentes não
interação, e os elementos se comportam independentemente com respeito
às relações R e R.’ (BERTALANFFY, 1977, p. 84).
De acordo com esse ponto de vista, um sistema é considerado fechado quando
nenhum material entra nele ou sai dele, e aberto quando ocorre importação e exportação de
matéria.
O organismo não é um sistema estático fechado ao exterior e contendo
sempre os componentes idênticos. É um sistema aberto em estado (quase-)
estável, mantido constante em suas relações de massa dentro de uma
contínua transformação de componentes materiais e energias, no qual a
matéria entra continuamente vinda do meio exterior e sai para o meio
exterior (BERTALANFFY, 1977, p. 167).
Bertalanffy (1977) explica que o modelo do organismo visto como sistema aberto
se mostrou útil na explicação e na formulação matemática de diversos fenômenos vitais.
Desse modo, o conceito mecanicista da natureza, que predominou durante muito tempo e
enfatizava a resolução dos acontecimentos em cadeias lineares casuais, deu lugar a uma nova
concepção fundamentada na teoria dos sistemas abertos, em que se tornaram visíveis os
princípios de interação entre distintas variáveis e a organização dinâmica de processos.
A teoria geral dos sistemas proposta pelo autor se fundamenta na idéia de que se
deve considerar a interdependência entre as partes. Ao analisar o sistema, não se deve
restringir a análise apenas aos elementos que o compõem. É importante observar também o
grau de interdependência entre esses.
De modo geral, o conceito de sistemas se alastrou e, nos últimos anos, dominou
diversos campos da ciência, penetrando no pensamento popular, nas gírias e nos meios de
teorias administrativas, caracterizando-se por uma forte ênfase nos aspectos práticos da administração e pela
busca de resultados.
28
comunicação. A concepção sistêmica vem desempenhando papel relevante nas empresas
industriais, dos armamentos, no tráfego aéreo e até mesmo em relação aos automóveis.
Surgiram nomes de profissões e empregos com ênfase em sistemas, como Análise de
Sistemas, Engenharia de Sistemas, entre outros. E a tecnologia também foi impulsionada a
pensar não em termos de máquinas isoladas, mas em termos de sistemas. (BERTALANFFY,
1977).
As publicações desse autor também influenciaram diversas linhas de pesquisa,
entre elas, a teoria das organizações. Nesse sentido, é possível fazer analogia entre um
organismo vivo e uma organização social. A organização vista como sistema aberto apresenta
um conjunto de elementos que estão em contínua interação, além de manter constante relação
de interdependência com o ambiente que está ao seu entorno.
Para Katz e Kahn (1970, p. 33), “os sistemas vivos, quer sejam organismos
biológicos, quer sejam organizações sociais, se acham agudamente na dependência de seu
meio externo, e por isso, precisam ser concebidos como sistemas abertos”. Segundo esses
autores, existem nove características que são comuns a todos os sistemas abertos: importação
de energia, transformação, output, sistemas como ciclo de eventos, entropia negativa, input de
informação, retroinformação negativa e processo de codificação, estado firme e homeostase
dinâmica, diferenciação e equifinalidade.
O primeiro deles se refere ao fato de que os sistemas abertos importam energia do
ambiente externo. Nenhuma estrutura social é auto-suficiente ou auto-contida, assim como as
células recebem oxigênio da corrente sanguínea, a personalidade de um indivíduo depende do
mundo exterior para a obtenção de estímulos. Do mesmo modo, a organização precisa de
suprimentos renovados de energia e, para isso, importa insumos do ambiente, por exemplo,
matéria-prima, mão-de-obra, informação, etc.
Após ser importada, essa energia passa pela transformação, estágio pelo qual os
sistemas abertos processam a energia disponível. Nesse sentido, a organização transforma
insumos absorvidos em novo produto, na prestação de um tipo de serviço, mão-de-obra
qualificada, treinamento, ensino, etc.
O output se refere à energia que é exportada pelos sistemas abertos para o meio
ambiente. É reconhecida nos produtos finais ou na prestação de serviço que são
disponibilizados pelas organizações ao consumidor final.
Os sistemas como ciclos de eventos dizem respeito ao padrão de atividades que
são seguidas durante a troca de energia, na qual os produtos exportados provem as fontes de
energia para que as atividades do ciclo possam ser repetidas. Assim, a energia que é colocada
29
no ambiente retorna à organização para a repetição dos ciclos necessários ao processamento.
A repetição do ciclo não tem que, necessariamente, manter o mesmo grupo de eventos; ela
pode se expandir para inserir outros eventos da mesma espécie ou pode envolver atividades
semelhantes que levem em direção aos mesmos resultados.
Para sobreviver, todos os sistemas abertos se movem para evitar o processo
entrópico que leva a indiferenciação e à morte. As organizações, no intuito de melhorar a sua
posição de sobrevivência e obter de suas reservas uma situação confortável, importam do
ambiente mais energia do que aquela que é consumida, armazenando-a. Dessa maneira,
adquirem a denominada entropia negativa, conseguindo resistir ao processo entrópico. Cury
(2005) destaca que, para sobreviverem e manterem as suas características internas, os
sistemas devem importar do ambiente mais energia do que aquela que é consumida no
processo de transformação e exportação.
Os inputs para os sistemas abertos não se restringem somente a entrada de
materiais que contêm energia. A organização também recebe inputs de caráter informativo, o
que lhe possibilita o conhecimento do ambiente e do seu próprio funcionamento em relação a
ele. O processo de codificação oferece à organização o poder de selecionar e receber as
informações para as quais está adaptada. O controle por retroalimentação negativa permite à
organização a possibilidade de correção por desvios ou feedback.
No intuito de se adaptar ao seu meio e impedir a entropia, o sistema aberto busca
manter relações constantes de exportação e importação de energia. Para se ajustar a essa
dinâmica, a organização procura reagir a mudanças ou se antecipa a elas por meio de seu
crescimento. Esse exercício a leva a um processo de expansão de seu estado original através
da absorção de novas funções e, até mesmo, de novos subsistemas, denominado de estado
firme e homeostase dinâmica.
Assim, todos os sistemas abertos se movem para a diferenciação e para a
elaboração, substituindo os padrões difusos e globais por funções mais especializadas. A
organização se volta para a multiplicação e elaboração de funções, o que ocasiona a
multiplicação de papéis, o desenvolvimento de novos cargos e a diferenciação interna.
A última característica é chamada de equifinalidade. Ela diz respeito à percepção
sistêmica e pressupõe a inexistência de um único modo para a organização atingir uma
situação estável. Partindo de diferentes condições iniciais, qualquer organização pode seguir
uma multiplicidade de caminhos e alcançar o mesmo estado final. Tal estado pode ser
atingido por meio de condições e modos distintos que essa tem de se adaptar ao ambiente.
Segundo a perspectiva de Katz e Kahn (1970), todos os sistemas sociais, inclusive
30
as organizações, consistem em uma quantidade de indivíduos que desenvolvem atividades
padronizadas. Para manter essa atividade padronizada, através de uma renovação contínua de
energia, a organização importa os insumos do ambiente – recursos humanos, materiais,
energéticos, financeiros, científicos, tecnológicos, etc – processa-os, transformando-os em
bens ou serviços, e os devolve para o ambiente. Através desse processo, a organização
vivencia um movimento cíclico de importação e exportação de energia e busca fugir da
entropia negativa. A percepção das organizações como sistemas é o item que será tratado a
seguir.
2.3 A ORGANIZAÇÃO SOB UMA PERSPECTIVA SISTÊMICA
A teoria de sistema foi introduzida na teoria administrativa devido a três razões: à
necessidade de uma síntese e integração das teorias que a precederam, que enfatizavam uma
microabordagem; à cibernética, que permitiu o desenvolvimento e operacionalização das
idéias que a convergiam para uma teoria de sistemas aplicada à Administração; aos resultados
bem sucedidos da aplicação da teoria de sistemas nas demais ciências. Nas organizações, a
análise sistêmica permite:
[...] revelar o “geral no particular”, indicando as propriedades gerais das
organizações de uma maneira global e totalizante, que não são reveladas
pelos métodos ordinários de uma análise científica. Em suma, a Teoria de
Sistemas permite reconceituar os fenômenos dentro de uma abordagem
global, permitindo a inter-relação e integração de assuntos que são, na
maioria das vezes, de naturezas completamente diferentes.
(CHIAVENATO, 2000, p. 545).
Conforme afirma Chiavenato, o conceito de sistemas também possibilita ter-se
uma visão compreensiva, abrangente, holística e gestáltica de um conjunto de coisas
complexas, dando-lhes uma configuração e identidade total.
A complexidade é o ponto de partida do enfoque sistêmico na administração,
explica Maximiano (1997). O termo “indica o grande número de problemas e variáveis que
as organizações e os administradores devem enfrentar. Quanto maior o número de problemas
e variáveis, mais complexa é a situação” (MAXIMIANO, 1997, p. 236). De acordo com esse
autor, a sociedade moderna tem problemas que são intrinsecamente complexos, produzidos
31
pela interação de diversos fatores que antes eram inexistentes, como as grandes concentrações
urbanas, integração da sociedade global, evolução tecnológica acelerada, migrações,
esgotamento de recursos naturais, entre outros. Muitos desses problemas são produtos de
múltiplas causas e variáveis interdependentes, e quanto maior o número de problemas e
variáveis, mais complexa será a situação enfrentada pela organização. O enfoque sistêmico é a
ferramenta que permite que a organização possa enfrentar essa complexidade, pois ele
possibilita entender a multiplicidade e a interdependência das causas e variáveis dos
problemas complexos, e organizar soluções para esses problemas.
A base desse enfoque é a idéia de sistema - “[...] um todo complexo ou
organizado; [...] um conjunto de partes ou elementos que formam um todo unitário ou
complexo. Um todo que funciona como todo devido à interdependência de suas partes é um
sistema” (MAXIMIANO, 1997, p. 238). Esse autor entende que a organização se revela como
um conjunto de pelo menos dois sistemas interdependentes que se influenciam mutuamente: o
social e o técnico. O sistema técnico é constituído por recursos e componentes físicos e
abstratos, como objetivos, divisão do trabalho, tecnologia, instalações, duração das tarefas e
procedimentos. Já o sistema social compreende todas as manifestações do comportamento dos
indivíduos e dos grupos, como as relações sociais, os grupos informais, a cultura, o clima, as
atitudes e a motivação.
A administração científica tradicional focaliza apenas a eficiência do sistema
técnico e deixa as pessoas em segundo plano. A escola de relações humanas,
ao contrário, focaliza apenas o sistema social e deixa a tarefa em segundo
plano. A administração sistêmica propõe uma visão integrada: as
organizações são sistemas sociotécnicos. É impossível estudar ou gerenciar
um sistema sem levar em conta o outro. (MAXIMIANO, 1997, p. 247).
O autor ainda destaca que, embora a idéia do enfoque sistêmico seja simples, ela
exerce grande influência na formação intelectual do dirigente e de todos os profissionais do
mundo moderno, pois o enfoque sistêmico possibilita ao administrador ter uma visão
integrada das organizações e dos processos administrativos. Por isso, “uma das premissas
mais importantes do enfoque sistêmico é a noção de que a natureza dos sistemas é definida
pelo observador” (MAXIMIANO, 1997, 245). Como os limites dos sistemas não seguem
regras e dependem do observador, é possível se imaginar outros sistemas além do social e do
técnico. Assim, para enfrentar a complexidade do enfoque sistêmico, é preciso que o
observador desenvolva a capacidade de enxergá-la, para poder delimitar as fronteiras do
sistema e perceber os elementos que o compõem.
32
Cury (2005) faz uma classificação que difere um pouco da proposta de
Maximiano (1997), afirmando que a sociedade é o macrossistema, e a organização, parte da
sociedade, é o microssistema, composta pelos sistemas tecnológico, social e gerencial. Esse
autor ainda ressalta que, por meio de permanente feedback, a organização deve diagnosticar
os impactos externos e os reflexos nos sistemas internos - que irão reativar o ciclo vital da
organização - com o objetivo de internalizar as mudanças que ocorrem no macrossistema
social (Esquema 1). Internamente, este feedback se reflete no clima de trabalho, nas atitudes,
no grau de interação dos funcionários, no nível de satisfação, nos índices de produtividade e
lucratividade da empresa. Externamente, é relevante considerar o cenário atual e as
transformações sociais, políticas e econômicas no contexto nacional e internacional, uma vez
que mudanças nas diretrizes dos governos podem indicar a necessidade de adaptações internas
nas organizações.
O diagnóstico de qualquer disfunção interna ou externa pode revelar a necessidade
de intervenção nos processos organizacionais, evidenciando a relevância do ajuste no
planejamento estratégico. Organizações que sobrevivem e crescem são aquelas que
rapidamente conseguem se adaptar às mudanças que ocorrem no ambiente, adequando não
apenas as políticas e diretrizes, mas também o que se refere a sua estrutura, cultura e
processos de trabalho. (CURY, 2005).
33
Esquema 1 - A organização como um sistema aberto (CURY, 2005, p. 120).
Mesmo que possa existir alguma diferença em relação à classificação sistêmica
proposta pelos autores, percebe-se que ambos concordam que a organização é um subsistema
de um sistema maior, a sociedade. A organização funciona como uma microssociedade que
atua em distintas dimensões: social, econômica, política e simbólica. Além disso, a
organização vista como sistema aberto destaque para a questão da importação de insumos
do ambiente e do processamento desses insumos através dos subsistemas internos, que geram
os produtos organizacionais exportados para o ambiente externo.
O modelo teórico para a compreensão da organização é de um sistema de
energia insumo-produto, no qual o retorno da energia do produto reativa o
sistema. As organizações sociais são flagrantemente sistemas abertos,
porque o insumo de energias e a conversão do produto em novo insumo de
energia consistem em transações entre a organização e seu meio ambiente”
(CURY, 2005, p. 118).
Sistema
Tecnológico
Sistema
Gerencial
Sistema
Social
Processamento = Transformação
(Organização = Microssistema)
Recursos humanos
Matéria-prima
Rec. financeiros
Rec. energéticos
Rec. científicos
Rec. Tecnológicos
Etc.
Clima de trabalho
Satisfação do pessoal
Interações individuais e
grupais
Atitude dos empregados
Produtividade
Qualidade do produto
Lucratividade
Etc.
(Feedback Interno)
(
Feedback
Externo)
Insumos Produtos
Impactos
1. Ambiente
2. Tecnologia
Sociedade = Macrossistema
Bens
e
Serviços
34
Percebe-se, dessa forma, que a relação de interdependência estabelecida entre a
organização e o meio social em que está inserida é uma premissa básica para a compreensão
das organizações como sistemas abertos. Cabe observar que, embora as organizações vistas
como sistemas abertos tenham propriedades semelhantes, cada organização também possui
características próprias em relação à forma em que é desenvolvido o trabalho, à conduta
realizada nos procedimentos internos e à cultura organizacional. O caráter organizacional
distingue uma organização da outra e se reflete no clima, nas normas, valores, costumes,
crenças e no sistema de comunicação.
Segundo Cury (2005), organização é um sistema planejado de esforço cooperativo
no qual cada indivíduo possui um papel em que executa tarefas e deveres. Para o autor, essa
concepção abrange apenas o aspecto formal da organização, aquele sobre o qual a sua
estrutura foi planejada. Esse aspecto compreende problemas de estrutura, normas, métodos e
processos de trabalho, concebidos pelos criadores da organização. Porém, existe um outro
aspecto, denominado de organização informal, resultado da interação espontânea dos
membros organizacionais e do impacto das personalidades destes membros sobre os papéis
aos quais foram destinados, que diz respeito ao padrão de comportamento adotado pelos
indivíduos, na medida em que esses padrões não coincidem com o plano formal.
O autor ainda ressalta que não existe organização formal sem a sua contrapartida
informal. E ainda que, na grande maioria das vezes, os objetivos da organização formal sejam
explícitos e a sua estrutura seja o produto de decisões que foram tomadas conscientemente e
os diversos processos internos tenham sido cuidadosamente planejados, a estrutura informal
pode exercer uma influência tão marcante que possa levar a uma reordenação da estrutura
formal.
Além disso, em alguns casos, a estrutura informal pode competir com a estrutura
formal, ao invés de complementá-la. A força da organização informal dentro de uma
organização formal reside no fato de que, em uma organização formal, as pessoas possuem
diversos laços sociais. Alguns são internos e se referem aos grupos de trabalho, grupos
ligados pela proximidade física e grupos formados pela posição hierárquica ou formação
profissional ou técnica. Outros são os grupos sociais externos, étnicos e locais, que podem ter
uma força institucional com capacidade de perpassar a estrutura física da organização,
exercendo pressões sobre os membros que estão do lado de dentro.
Marchiori (2006a) também compreende a organização com um sistema. Para a
autora, a organização é um fenômeno vivo e dinâmico, uma sociedade em miniatura formada
por construções sociais e representa aquilo que para ela tem valor. Essa construção inicia nas
35
redes de relacionamento internas que envolvem os funcionários, as lideranças e a alta
administração. Depois se fundamenta externamente na imagem da organização.
(MARCHIORI, 2006b).
Para complementar a visão sistêmica exposta a o momento, encontra-se em
Morgan (2000) um estudo sobre metáforas vistas sob a ótica da administração, que contribui
tanto para a teoria quanto para a prática administrativa. A metáfora “é uma força primária
através do qual seres humanos criam significados usando um elemento de sua experiência
para entender o outro” (MORGAN, 2000, p. 21), capaz de permitir ampliar o pensamento,
aprofundar o entendimento e de possibilitar uma leitura da organização através de outras
lentes, vendo novas maneiras de agir e pensar. Ela é apresentada como o recurso que pode
fornecer uma maneira distinta de pensar sobre a organização, mostrando que o desafio de criar
novas formas de organização e administração está relacionado com o desafio de perceber
novas formas de ver a organização.
Entretanto, salienta o autor, nenhuma teoria isolada conseguirá oferecer um ponto
de vista perfeito e que sirva a todos os propósitos. O observador, ao buscar entender a
organização e administração por meio do uso de metáforas, pode ver diferentes dimensões de
uma mesma situação. A metáfora torna possível que se veja a organização de modo parcial,
pois produz uma visão unilateral do que está sendo observado. Ela também é ambígua,
incompleta e paradoxal, porque permite enxergar algumas coisas, mas deixa de mostrar
outras. Dessa forma, ela conduz a uma identificação das semelhanças, mas oculta as
diferenças.
Por isso, deve-se ter em mente que qualquer metáfora tem vantagens e limitações,
de modo que toda situação pode receber múltiplas leituras e interpretações, visto que a
realidade tem a tendência de se revelar de acordo com a perspectiva em que é abordada.
Quando você reconhece que suas teorias e pontos de vista são metafóricos,
você também reconhece suas limitações e encontra maneiras de superá-las.
Isto resulta num estilo de pensamento que está sempre aberto e em evolução
e é extremamente adequado para se lidar com a complexidade da vida
organizacional. (MORGAN, 2000, p. 24).
O autor apresenta a organização vista sob oito metáforas em que ela é
concebida como: máquina, organismo, cérebro, cultura, sistema político, prisão psíquica,
fluxo e transformação, instrumento de dominação. Para fins deste trabalho e nesta parte da
36
dissertação, considerar-se-á a metáfora em que as organizações são entendidas como
organismos
11
.
A metáfora organicista descrita por Morgan (2000) permite que as organizações
sejam observadas como sistemas abertos, como organismos vivos, que existem em ambientes
mais amplos e precisam atingir uma relação apropriada com esse ambiente para poder
sobreviver. Sob essa ótica, o autor esclarece que os princípios da teoria sistêmica exerceram
grande influência e mudaram a maneira de entender a organização em muitos aspectos.
Dentre esses, Morgan destaca três idéias que ajudaram a teoria da organização e da
administração a deixar para trás o pensamento burocrático e mecanicista, e passar a atender
aos requisitos do ambiente. A primeira idéia enfatiza a importância do ambiente em que as
organizações existem. Sugere que, ao se observar a organização, deve-se levar em conta todo
o ambiente no qual ela se encontra inserida, dando especial atenção às interações que a
organização mantém com os mais variados públicos: funcionários, clientes, concorrentes,
fornecedores, sindicatos, órgãos do governo e o contexto em geral. Esse cuidado possibilitará
que, na prática, a organização seja capaz de perceber mudanças na tarefa e nos ambientes
contextuais, superar e administrar limites críticos e áreas de interdependência, desenvolver
respostas operacionais e estratégicas adequadas.
Na segunda idéia, é considerado o fato de que as organizações devem ser vistas
como um conjunto de subsistemas inter-relacionados. Pois, do mesmo modo que as
organizações contêm indivíduos que são sistemas em si esses também pertencem a grupos
ou departamentos que, por sua vez, pertencem a divisões organizacionais maiores. Assim, se a
organização é entendida como um sistema, todos os outros níveis podem ser entendidos como
subsistemas de um organismo vivo, embora cada um deles seja, por si só, um sistema aberto
complexo.
Na última idéia, Morgan afirma que a abordagem dos sistemas abertos nos
permite estabelecer congruências ou alinhamentos entre diferentes subsistemas (FIG. 2) e
identificar e eliminar potenciais disfunções. Assim, do mesmo modo que os organismos, as
organizações podem ser concebidas como conjuntos de subsistemas em interação. Esses
subsistemas não são entidades separadas, não vivem em isolamento e nem são auto-
suficientes, mas, ao contrário, existem como elementos de um ecossistema complexo. Eles
podem ser definidos de diversas formas, como os que são ilustrados na figura a seguir.
11
A metáfora da cultura será utilizada no capítulo 3, quando será abordada a cultura das organizações.
37
Esquema 2 - Como uma organização pode ser vista com um conjunto de subsistemas
Fonte: MORGAN (2000, p. 63).
Ver a organização de modo organísmico, segundo o autor, apresenta as seguintes
vantagens: sugere que as organizações devem sempre prestar muita atenção a seu ambiente
externo; enfatiza a sobrevivência como um objetivo para qualquer organização, contrastando
com o enfoque clássico no desempenho de metas operacionais específicas; está em
congruência com o ambiente; contribui para a teoria e prática do desenvolvimento
organizacional; alcança um entendimento sobre a ecologia das organizações, que não podem
sobreviver como entidades independentes e seu futuro está vinculado ao contexto em que
estão inseridas.
Com relação às limitações dessa metáfora, salienta-se que é necessário se ter em
mente que as organizações não são organismos e seus ambientes são muito menos concretos
do que a metáfora presume. Até certo ponto, elas podem ser entendidas como fenômenos
socialmente construídos, de modo que a atividade organizacional seja produto das ações dos
indivíduos que a compõem. Esses indivíduos são agentes ativos que operam com outros na
subsistema
tecnológico
subsistema
estrutural
subsistema
estratégico
subsistema
humano-cultural
sistema
administrativo
supra-sistema
ambiental
ESTÍMULOS QUE
ENERGIZAM A
ORGANIZAÇÃO
Recursos humanos,
financeiros e mate-
riais e informações
RESPOSTAS
ORGANIZACIONAIS
Produção de bens e serviços,
em um nível de eficiência e
eficácia que influenciará a
futura disponibilidade de
recursos e a operação dos
sistemas
Subsistemas organizacionais
Fluxo de estímulo-
resposta
em termos de materiais,
energia e informações
38
construção do mundo. Além disso, as organizações, ao contrário dos organismos, podem
escolher se vão competir ou colaborar com o meio em que estão inseridas.
A metáfora também exagera no grau de unidade funcional e coesão interna
encontrado na maioria das organizações, que, normalmente, não são tão unificadas como os
organismos. Embora, na maior parte do tempo, elas possam ser unificadas, com pessoas
trabalhando em diversos departamentos para o bom andamento de toda a organização,
outras situações em que também podem ser caracterizadas pela cisão e pelo conflito.
Em relação à última limitação, Morgan entende que a metáfora pode vir a ser um
ideal. O fato de que organismos são funcionalmente integrados pode tornar-se o fundamento
para o propósito de que as organizações deveriam funcionar da mesma forma. Nesse sentido,
a metáfora acaba servindo como princípio normativo para determinar a prática. Em grande
parte, o desenvolvimento organizacional procura alcançar esse ideal de funcionamento
integrado ao ressaltar a idéia de que os indivíduos devem sentir-se satisfeitos se atenderem
suas necessidades pessoais através da organização. Porém, desta forma, os indivíduos podem
ser vistos apenas como recursos com potencial a ser desenvolvido e não como seres humanos
valorizados pelo que são capazes de escolher e por trilharem o próprio caminho.
Entende-se, assim, que a visão sistêmica é uma das formas de ver e analisar a
organização. Não se nega a existência de outras perspectivas e se reconhece que existem
distintas formas de se interpretar esse universo. Entretanto, para fins deste trabalho, considera-
se que as organizações estão inseridas em um contexto social de constante mudança, no qual
inovações técnicas e tecnológicas surgem em uma velocidade alarmante, as condições de
mercado diariamente apresentam novos desafios, e os estilos de gerenciamento e
administração devem ser abertos e flexíveis para se adaptar a essas transformações. Por isso,
acredita-se que a visão da organização como um sistema vivo e dinâmico consegue dar conta
da análise dessa nova conjuntura. Além disso, a organização em que é realizado este estudo
possui uma estrutura física sistematizada, e busca se adaptar constantemente a essa nova
configuração social, na medida em que novos elementos são incorporados nas práticas
administrativas, na cultura e no processo de comunicação.
Kunsch (2003) ainda lembra que não se pode aceitar de modo simplista o fato de
que as organizações são unidades sociais planejadas e construídas com a intenção de atingir
objetivos comuns específicos. Trata-se de algo mais complexo, que deve ser analisado de
forma crítica para que se possam equacionar os problemas e solucionar as questões
organizacionais. As organizações são formadas por pessoas – cada uma – que têm um
universo cognitivo particular e modo distinto de apreender as coisas, não existindo garantia de
39
que as diretrizes e orientações que a organização passa por meio de sua comunicação interna
estejam sendo efetivamente assimiladas pelo público. Daí a importância de avaliar a cultura
organizacional e o processo de comunicação nesse contexto.
40
3
.
DIMENSÕES DA CULTURA
Antes de tentar compreender o que é a cultura organizacional e como essa pode
sofrer interferências e alterações, entende-se que é relevante fazer algumas considerações
referentes ao conceito de cultura, origens e perspectivas teóricas que serão utilizadas nesta
pesquisa. Por conseguinte, faz-se a explanação de alguns conceitos sobre a cultura
organizacional, analisam-se aspectos que podem ocasionar alterações e mudanças na cultura
das organizações, e também se aborda a cultura digital, que desponta como uma forma de
expressão da cultura contemporânea.
3.1 RAÍZES DO CONCEITO DE CULTURA
Para falar sobre cultura, busca-se em Thompson (1995) um pouco sobre o
surgimento do termo.
Segundo o autor, a expressão deriva da palavra latina cultura. O
conceito, porém, somente adquiriu relevância em diversos idiomas europeus no início do
período moderno.
Inicialmente, a sua utilização estava relacionada à esfera agrícola, ao cultivo ou
cuidado de alguma coisa, como grãos e animais. Do início do século XVI em diante, esse
sentido original se estendeu do cultivo de grãos para o cultivo da mente, para o processo de
desenvolvimento humano.
A partir do século XIX, a palavra cultura passou a ser empregada
como sinônimo ou em contraste com a palavra civilização. Na França e na Inglaterra, a
utilização dos termos ‘cultura’ e ‘civilização’ se sobrepuseram e ambos foram usados para
descrever o processo de desenvolvimento de se tornar culto ou civilizado. O contrário ocorreu
na Alemanha, onde essas palavras foram contrastadas de modo que Zivilisation foi associada
41
à polidez e refinamento, enquanto que Kultur era utilizada para se referir a produtos
intelectuais, artísticos e espirituais.
No final do século XIX, o conceito de cultura foi incorporado à antropologia,
ocorrendo uma mudança definitiva em relação a sua utilização. Nesse processo, o termo
perdeu um pouco da sua implicação etnocêntrica, foi adaptado à descrição etnográfica e a
palavra cultura passou a ser mais ligada ao esclarecimento dos costumes, práticas e crenças de
outras sociedades que não as européias.
A discussão sobre cultura organizacional segue uma base conceitual que é
fornecida pela antropologia cultural, sobre a qual se podem encontrar diversas correntes
teóricas
12
. Neste estudo, utiliza-se a perspectiva simbólica, que entende a cultura como um
sistema de símbolos e significados compartilhados, em que a ação simbólica necessita ser
interpretada, lida e decifrada para ser compreendida. A ênfase dessa perspectiva está
relacionada a três aspectos: saber como os indivíduos interpretam e entendem suas
experiências e de que forma essa interpretação é ligada à ação; a análise dos processos básicos
através dos quais os grupos chegam a compartilhar interpretações para as experiências que
permitem a organização das atividades; como criar e manter um senso de organização e
atingir interpretações comuns das situações que coordenam a ação (FREITAS, 1991).
Seguindo essa perspectiva, considera-se que uma importante corrente para a
análise da cultura é a do interacionismo simbólico. Essa é uma corrente de estudos que deriva
da fenomenologia e tem como elementos de análise o indivíduo, o grupo humano e as
relações da vida cotidiana. Pensadores de diversas escolas contribuíram para o seu surgimento
e, dentre esses, um de seus inspiradores é Mead (1953)
.
Blumer (1969), assumindo o legado de Mead, faz uso do interacionismo
simbólico buscando ressaltar a natureza simbólica da vida social. De acordo com Blumer,
essa corrente de estudos se fundamenta em três premissas básicas. A primeira delas afirma
que os seres humanos agem em relação às coisas com base no significado que essas coisas
fazem para eles. Nesses elementos, incluem-se objetos físicos, como amigos ou inimigos,
categorias de seres humanos, como mãe ou motorista de táxi, instituições como escola ou
governo, idéias, como independência individual ou honestidade e assim por diante. A segunda
premissa diz que a significação das coisas deriva ou é produzida através da interação social
entre os indivíduos. E a terceira enuncia que esses significados o interpretados e
12
A antropologia cognitiva, que privilegia os conhecimentos compartilhados; a antropologia simbólica, que
enfatiza os significados compartilhados e a antropologia estrutural, que focaliza os processos psicológicos
inconscientes (FREITAS, 1991)
42
modificados de acordo com o processo interpretativo das pessoas em relação aos elementos
com os quais entram em contato. (BLUMER, 1969, tradução desta autora).
Berger e Luckmann (1985) também são importantes teóricos dessa corrente. Para
esses autores, o significado da vida cotidiana é uma construção social e constitui-se de
múltiplas realidades, estruturadas espacial e temporalmente, que são compartilhadas com
indivíduos através da interação e da comunicação. Nesse sentido, a sociedade deve ser
compreendida como uma realidade objetiva e concreta e, ao mesmo tempo, também deve ser
considerada como uma realidade subjetiva, que é construída por cada indivíduo. De acordo
com essa concepção, quando uma pessoa nasce, o mundo é apresentado a ela como algo
objetivo e concreto, como um universo formado de organizações, normas, regras e instituições
prontas e acabadas. No entanto, todos esses elementos são artefatos culturais, produzidos
pelos próprios indivíduos. Assim, a sociedade não é um elemento finalizado como parece num
primeiro momento, mas é construída pelos indivíduos que, ao mesmo tempo, são construídos
por ela continuamente.
Esses autores também se dedicaram a analisar os processos de socialização, que
são os modos pelos quais os indivíduos são introduzidos no mundo e na sociedade em que
vivem, aprendendo a incorporar e interpretar os seus padrões culturais. Para eles, existem dois
tipos de socialização: a primária e a secundária.
A socialização primária é a primeira socialização experimentada pelo indivíduo e
se refere ao modo como ele se torna membro de uma sociedade. Quando uma criança nasce,
ela se depara com uma estrutura social objetiva, na qual encontra outros significativos – pais e
parentes próximos que mediatizam o mundo e se encarregam da sua socialização. Por
conseguinte, esse indivíduo passa pela interiorização. Esse é o processo por meio do qual ele
internaliza regras, valores e conteúdos pré-definidos no âmbito familiar, que o tornam apto a
compreender seus semelhantes e apreender o mundo como realidade social provida de
sentido, constituir os seus padrões culturais básicos, formar o seu modo de ver o mundo e
interpretar a realidade. A socialização primária não se restringe ao aprendizado puramente
cognitivo, ela ocorre em situações que envolvem identificação e um alto grau de emoção da
criança com seus outros significativos. Por isso, a linguagem constitui-se em importante
instrumento de socialização, pois é através dela que os pais transmitem aos filhos os valores
que julgam relevantes, e que os esquemas motivacionais e interpretativos podem ser
interiorizados.
Na socialização secundária, o indivíduo passa a conviver com outros
significativos além do seu círculo familiar, como vizinhos, professores e colegas de trabalho.
43
Esses significativos apresentam outros modos de ser e de pensar e influenciam esse indivíduo,
socializado, que passa a adquirir conhecimentos específicos e interiorizar outros setores
institucionais do mundo objetivo. Esse tipo de socialização dispensa o intenso envolvimento
emocional e o alto grau de identificação, na medida em que prossegue apenas com a
identificação mútua, que possibilita a comunicação entre as pessoas. No aspecto prático, a
socialização secundária permite que o indivíduo aprenda e internalize os conteúdos de modo
racional e emocionalmente controlado.
Dentro dessa perspectiva, Berger e Luckmann (1985) buscam explorar o processo
de elaboração do universo simbólico. Esse universo integra o conjunto de significados que
possibilitam aos membros integrantes de um grupo apreender a realidade de uma forma
consensual, assim como integrar os conhecimentos e viabilizar a comunicação, mediante os
processos de institucionalização e legitimação. A institucionalização ocorre sempre que há
tipificação recíproca de ações habituais. As tipificações funcionam como ‘modelos internos’ e
permitem que se apreendam as ações do outro.
Ao analisar-se um contexto social, percebe-se que as tipificações das ões
habituais são sempre partilhadas, pois elas não surgem instantaneamente, mas dependem da
interação e da comunicação entre os indivíduos e são construídas no decorrer da história da
organização. Para que uma prática ou ação humana possa ser compreendida e compartilhada
pelos indivíduos, faz-se necessário conhecer a linguagem e partilhar os mesmos códigos, pois
é por meio deles que se constroem as representações simbólicas necessárias para a apreensão
e transmissão das informações e do conhecimento. Quando a ação humana se torna
institucionalizada, a organização previu padrões de conduta que devem ser seguidos e que
foram submetidos ao controle social. a legitimação ‘explica’ as ações
institucionalizadas, conferindo validade às normas, regras e significados práticos da conduta
organizacional.
Desta forma, em uma sala de aula ou em um grupo de amigos, por exemplo, o
significado que é dado a algum fato ocorrido vai depender da interação humana. Os
indivíduos irão interagir, interpretar e dar significado às atividades cotidianas com base em
valores, crenças e experiências vividas. São essas experiências que produzem o modo de ver,
pensar e agir em relação aos fatos que se apresentam na realidade. Cabe ressaltar que a
realidade existe e independe da interpretação para existir. E para conhecer o sistema de
significados construídos no contexto em questão, esses indivíduos precisam recorrer à
interpretação, pois a realidade conhecida é aquela que é interpretada.
Entende-se, assim, a idéia de que, durante o processo de interação e comunicação,
44
o sujeito exerce tanto o papel de produtor como o de receptor de significados. Nessa condição,
ele é agente ativo que pensa, age e busca encontrar significado para aquilo que realiza,
participando ativamente das trocas comunicativas, e não se restringe apenas a receptáculo das
informações.
Pensar no indivíduo como agente ativo implica romper com a concepção
mecânica e transmissionista do processo de comunicação, em que o emissor age e o receptor
reage, como se os atos comunicativos tivessem relação direta de causa e efeito. A partir dos
processos de interação e das trocas comunicativas, é estabelecida uma negociação entre os
indivíduos. Esses, ao tentar desvendar o sistema de significados culturais pertencentes ao
contexto em que estão inseridos, irão acionar processos interpretativos que permitirão dar
sentido e até mesmo reinterpretar as atividades do seu cotidiano.
Goffman (1985) ilustra de modo bastante claro a troca estabelecida entre os
indivíduos nas relações sociais. O autor compara a vida social e o teatro, retratando a
relevância das relações sociais nas quais os indivíduos atuam, como se estivessem em um
palco, representando papéis. A representação se refere “a toda atividade de um indivíduo que
se passa num período caracterizado por sua presença contínua diante de um grupo particular
de observadores e que tem sobre estes alguma influência” (GOFFMAN, 1985, p. 29). Ela se
realiza numa fachada social e se desenvolve através de acordo denominado consenso
operacional - em que os participantes contribuem conjuntamente para uma única definição da
situação - que pressupõe acordo real quanto às pretensões de cada um em relação às questões
que serão temporariamente cumpridas.
Durante a realização de uma representação, os indivíduos expressam dois tipos de
atividade: uma que é transmitida e outra que é emitida. A primeira diz respeito à comunicação
no sentido estrito, que abrange todos os símbolos utilizados propositalmente para veicular
uma informação. A segunda envolve todo o grupo de ações que são manifestadas de forma
não-verbal. Goffman ressalta que, quando a definição aceita de uma situação é desacreditada,
alguns ou todos os participantes podem ocultar o que pensam e sentem e simular que estão de
acordo com aquela circunstância.
Desta forma, entende-se que toda a manifestação cultural deve ser compreendida
dentro de um contexto, no qual é representada, percebida e interpretada. Os indivíduos não
devem ser considerados meros transmissores culturais, pois eles também são formados pela
cultura em que estão inseridos e podem, portanto, ser considerados produtores e produtos
dessa cultura. (FLEURY, 1992).
Thompson (1995) destaca a relevância dos contextos e processos sócio-históricos
45
estruturados, dentro dos quais os fenômenos culturais estão inseridos. No intuito de delinear
uma abordagem alternativa para o estudo dos fenômenos culturais, o autor se baseia na
concepção simbólica desenvolvida por Geertz (1978) e formula o que ele denomina de
concepção estrutural da cultura, definindo a análise da cultura como:
[...] o estudo das formas simbólicas isto é, ações, objetos e expressões
significativas de vários tipos em relação a contextos e processos
historicamente específicos e socialmente estruturados dentro dos quais, e por
meio dos quais, essas formas simbólicas são produzidas, transmitidas e
recebidas (THOMPSON, 1995, p. 181).
Os fenômenos culturais devem ser entendidos como formas simbólicas em
contextos estruturados, e a análise cultural deve ser vista como o estudo da constituição
significativa e da contextualização social das formas simbólicas. Thompson caracteriza cinco
aspectos em virtude dos quais as formas simbólicas podem ser compreendidas como
fenômenos significativos: intencional, convencional, estrutural, referencial e contextual.
O aspecto intencional refere-se ao fato de que as formas simbólicas são
expressões, como uma mensagem a ser entendida, de um sujeito para outro sujeito ou sujeitos.
O autor faz duas considerações em relação a esse aspecto. A primeira é a que diz que a
constituição de objetos como fenômenos significativos pressupõe que eles sejam produzidos
por alguém, ou que sejam percebidos como produzidos por sujeitos capazes de agir
intencionalmente. Na segunda consideração, ele afirma que o significado de uma forma
simbólica não será necessariamente idêntico àquilo que o sujeito-produtor teve a intenção de
dizer ao produzir essa forma simbólica. Thompson (1995) destaca que essa divergência está
presente na interação social diária, pois “o significado ou o sentido das formas simbólicas
pode ser muito mais complexo e ramificado do que o significado que poderia ser derivado
daquilo que o sujeito-produtor originalmente tencionou” (THOMPSON, 1995, p. 185). No
dia-a-dia, é possível visualizar esse descompasso quando existe diferença entre aquilo que se
comunica ou tem-se a intenção de comunicar e aquilo que foi compreendido do comunicado.
O segundo aspecto é o convencional. Este aspecto diz respeito ao fato de que a
produção, construção ou emprego das formas simbólicas, assim como a interpretação das
mesmas, são processos que envolvem a aplicação de diversas regras, códigos ou convenções.
O autor esclarece que essas regras, códigos e convenções variam desde regras de gramáticas,
convenções de estilo e expressão até a convenções aplicadas em situações práticas, como
aquelas que orientam a ação e a interação entre os indivíduos. Além disso, ressalta que as
46
regras de codificação e decodificação de uma forma simbólica não precisam coincidir ou
coexistir. Através das convenções, normas e regras, uma escola transmite o que é importante,
como as condutas e procedimentos que são aceitáveis no ambiente escolar, moldando, desta
forma, as ações dos alunos e professores.
O aspecto estrutural define que as formas simbólicas são construções que
manifestam estruturas articuladas, pois são compostas de elementos que estabelecem relações
uns com os outros. Thompson (1995) faz distinção entre a estrutura de uma forma simbólica e
o sistema que está materializado em uma forma simbólica particular. Para o autor, fazer a
análise da estrutura de uma forma simbólica significa analisar elementos específicos e suas
inter-relações, que podem ser distinguidos na forma simbólica em questão. analisar o
sistema corporificado em uma forma simbólica é abstrair a forma em questão e reconstruir um
conjunto de elementos e suas inter-relações.
A estrutura de uma forma simbólica é um padrão de elementos que podem
ser discernidos em casos concretos de expressão, em efetivas manifestações
verbais, expressões ou textos. Um sistema simbólico, por contraste, é uma
constelação de elementos podemos descrevê-los como “elementos
sistêmicos” que existem independentemente de qualquer forma simbólica
particular, mas que se concretizam em outras formas simbólicas particulares.
(THOMPSON, 1995, p. 188).
O aspecto referencial trata da questão de que as formas simbólicas são
construções que representam algo, referem-se ou dizem algo sobre alguma coisa. Thompson
(1995) argumenta que, para se entender o aspecto referencial de uma forma simbólica, é
necessário utilizar a interpretação criativa, que ultrapassa a análise dos elementos internos que
buscam explicar o que está sendo dito ou representado. O autor ainda ressalta que:
[...] não apenas para as maneiras como as figuras ou expressões fazem
referência ou representam algum objeto, indivíduo ou situação, mas também
para as maneiras pelas quais, tendo feito referência ou representado algum
objeto, as formas simbólicas tipicamente dizem algo sobre ele, isto é, afirma
ou declaram, projetam ou retratam. (THOMPSON, 1995, p. 191).
E, por fim, o aspecto contextual diz respeito à questão de que as formas
simbólicas sempre estão inseridas dentro de contextos sócio-históricos estruturados. Para o
autor, esses contextos estão estruturados de diversos modos, por exemplo, por relações
assimétricas de poder, por acesso diferenciado a recursos e oportunidades, por mecanismos
institucionalizados de produção, transmissão e recepção de formas simbólicas, etc. Dessa
47
forma, essas formas simbólicas são produzidas por agentes situados dentro de um contexto
sócio-histórico específico e, portanto, também são recebidas e interpretadas por indivíduos
que se encontram situados neste contexto.
Assim, da mesma forma que a cultura molda e condiciona o comportamento de
um grupo e a conduta das pessoas em qualquer região ou civilização que compartilhe a
mesma língua e divida experiências sociais e religiosas, ela também interfere nas ações de um
time, de uma família, no modo de agir de grupos sociais e dos indivíduos inseridos em um
contexto sócio-histórico estruturado.
No intuito de delinear os contornos do contexto a que se refere este trabalho, no
próximo item, será dada ênfase para a cultura existente no universo organizacional.
3.2. CULTURA DAS ORGANIZAÇÕES
A cultura organizacional, segundo Motta e Vasconcelos (2006), pode ser vista de
acordo com duas percepções distintas: uma diz que a organização é uma cultura e a outra que
a organização tem uma cultura. Dizer que uma organização é uma cultura significa entender
que ela é a expressão cultural dos membros da organização e é vista como esfera cultural e
simbólica. Afirmar que a organização tem uma cultura significa dizer que a cultura é uma
variável, uma característica da organização que pode receber influências do ambiente interno
e externo e mudar com o passar do tempo.
Conforme foi dito anteriormente, nesta dissertação, considera-se a organização
como um sistema aberto composto de subsistemas constituídos de diversas partes, que
funcionam de forma integrada e estão em permanente intercâmbio com o ambiente. Desta
forma, entende-se que a cultura é uma variável desse sistema, que influencia e também recebe
influências do seu entorno.
Um dos autores que trata a cultura organizacional como uma variável é Schein
(1988). Para esse autor, a cultura de uma organização:
[...] é o modelo dos pressupostos básicos, que determinado grupo tem
inventado, descoberto ou desenvolvido no processo de aprendizagem para
lidar com os problemas de adaptação externa e integração interna. Uma vez
que os pressupostos tenham funcionado bem o suficiente para serem
considerados válidos, são ensinados aos demais membros como a maneira
correta para se perceber, se pensar e sentir-se em relação àqueles problemas
[tradução desta autora] (SCHEIN, 1988, p. 09).
48
De acordo com a concepção desse autor, os membros de uma organização
desenvolvem planos, projetos e estratégias empresariais no intuito de fazer com que a
organização possa se adaptar ao meio ambiente e manter a sua estrutura. Na tentativa de
encontrar uma solução para os problemas de adaptação, esses indivíduos, por meio de suas
formas de trabalho, aprendem padrões de conduta e modelos de comportamento, experiências
positivas e negativas. A partir desse aprendizado, o grupo organizacional seleciona,
compartilha e mantém os valores, regras, convenções e padrões culturais percebidos como
responsáveis pelo seu sucesso e desenvolvimento. Esses elementos formarão o conjunto de
pressupostos que serão ensinados aos membros da organização como a forma correta de
perceber e resolver aqueles problemas.
A cultura pode ser considerada como uma variável, pois o conjunto de
pressupostos não é fixo. A organização está inserida em um ambiente instável e, assim, supõe-
se que constantemente teque enfrentar novos desafios, o que exigirá de seus integrantes a
busca por novos planos e soluções para contornar os problemas da melhor forma possível,
levando-os a descobrir um novo conjunto de pressupostos.
O entendimento de Marchiori (2006b) vai ao encontro da percepção de cultura
proposta por Schein (1988). Para a autora, a cultura é formada por meio da atuação dos
grupos e fomenta a chamada ‘personalidade da organização’. Ao se relacionarem, os
indivíduos interagem e desenvolvem formas de ser e de fazer que passam a ser incorporadas
pelo grupo. A partir do momento em que esses modos são comumente aceitos e que o grupo
começa a agir ‘automaticamente’, significa que a cultura está enraizada.
A cultura não é um processo autônomo de socialização, ritos e práticas sociais.
Ela é resultado de um processo histórico construído, mantido e reproduzido pelos indivíduos,
visto que são eles que elaboram e compreendem os significados. (MARCHIORI, 2006a). A
sua formação está diretamente ligada ao processo de conhecimento e relacionamento, pois é
construída socialmente e reflete os significados que foram constituídos nos processos de
interação realizados entre determinado grupo. Neste aspecto, é fundamental a existência de
diálogo, na medida em que ele constrói os relacionamentos e produz significados que poderão
ser transformados em conhecimento compartilhado.
Para a autora, os padrões de comportamento expressos pelos indivíduos são um
fenômeno cultural, produto da interação social e do discurso. Devido a isso, as culturas
dificilmente podem ser planejadas ou presumíveis, posto que são produtos naturais da
interação social. “A cultura influencia os sistemas e comportamentos de uma sociedade, assim
como recebe influência destes. Na organização acontece o mesmo, pois, tratando-se de um
49
sistema aberto que recebe influências do meio ambiente, também pode influenciar esse meio”
(MARCHIORI, 2006a, p. 66).
Schein (2007) argumenta que, para se compreender a cultura de uma organização,
deve-se considerar que ela ocorre em três níveis: no nível dos artefatos, dos valores casados e
das certezas tácitas compartilhadas. O nível dos artefatos é o mais fácil para ser observado
quando se entra numa organização, já que é expresso na arquitetura do local, na decoração, na
tecnologia, nos modelos de comportamento. O autor ressalta que, embora esses elementos
sejam visíveis, eles não são decifráveis de imediato, pois apenas observar e caminhar pela
organização não permite que se compreenda realmente por que os membros se comportam de
modo específico e por que a organização é estruturada de determinada maneira. E, portanto, é
preciso que se faça também pesquisa e reflexão para apreender melhor esses elementos.
O segundo nível, dos valores casados, refere-se ao fato de que duas empresas
podem ter valores semelhantes, mesmo quando são compostas por artefatos bem diferentes.
Em outras palavras, ambas podem ter princípios que valorizam o trabalho em equipe, mantêm
o foco no cliente, prezam pela qualidade dos produtos ou do serviço prestado e, no entanto,
possuir o layout físico e estilos de trabalho completamente distintos.
As certezas tácitas dizem respeito às crenças, aos valores e às certezas apreendidas
pelo grupo. Elas são modelos mentais compartilhados, que os membros da organização
adotam e consideram como corretos. Durante a concepção da organização, essas crenças e
valores estão apenas na mente dos fundadores e líderes. Mas, na medida em que eles são
partilhados, apreendidos e percebidos pelos membros da empresa como aspectos que levam
ao sucesso da mesma, eles passam a ser admitidos como corretos.
O autor também destaca que, para se fazer uma apreensão mais profunda da
cultura da organização, é necessário conversar com as pessoas e fazer perguntas sobre o modo
como as coisas funcionam. Schein salienta, dessa forma, que o que direciona a cultura de uma
organização “são as certezas tácitas aprendidas e compartilhadas nas quais as pessoas baseiam
seu comportamento diário. Ela resulta no que é popularmente conhecido como o jeito que
fazemos as coisas por aqui” (SCHEIN, 2007, p. 39).
Para Freitas (1991), a materialização da cultura ocorre através de alguns
elementos que fornecem interpretações para os membros da organização, auxiliando-os a
compreender o direcionamento das ações organizacionais. A autora cita oito elementos que
compõem a cultura organizacional: valores; crenças e pressupostos; ritos, rituais e cerimônias;
estórias e mitos; tabus; heróis; normas; e comunicação.
Os valores são criados e definidos pela cúpula. São definições sobre o que é
50
relevante para a organização atingir o sucesso e, por isso, têm uma ligação direta com os
objetivos organizacionais. A autora explica que, embora as organizações tenham a tendência
de personalizar os seus valores, costumam apresentar algumas características em comum,
como importância do consumidor, padrão de desempenho excelente, qualidade e inovação,
importância da motivação intrínseca dos empregados.
As crenças e pressupostos têm sido usados como sinônimos para manifestar
aquilo que é tido como verdade na organização, afirma a autora. A crença de que alguma
coisa é verdadeira a torna naturalizada e conseqüentemente inquestionável. Assim, para que
não ocorra desajuste entre o discurso e a prática organizacional, cabe aos administradores o
reforço das crenças, por meio de suas ações. Schein (apud FREITAS, 1991) argumenta que
não são os valores, mas os pressupostos o ponto fundamental da cultura.
Os ritos, os rituais e as cerimônias são exemplos de atividades estruturadas que
possuem conseqüências práticas e expressivas, pois tornam a cultura organizacional mais
tangível e coesa. Freitas explica (1991) que, no espaço de trabalho, eles produzem uma
sensação de segurança e um senso de identidade comum, conferindo significado às atividades
cotidianas. Os ritos mais correntes nas organizações são ritos de passagem, ritos de
degradação, ritos de reforço, ritos de renovação, ritos de redução de conflitos, ritos de
integração.
Fleury (1992) cita Beyer e Trice
13
, que consideram o rito uma relevante categoria
para se fazer uma análise da cultura organizacional. Para esses autores, o rito compõe um
conjunto planejado de atividades que reúne diversas formas de expressão cultural, que
resultam em atividades práticas e expressivas. Os ritos são expressos através de diversos
símbolos por meio dos quais os indivíduos se manifestam, como gestos, linguagem,
comportamentos, artefatos, etc.
As estórias são entendidas por Freitas (1991) como os fatos narrados sobre a
organização que têm o intuito de informar, reforçar o comportamento existente e ressaltar de
que forma esse comportamento se adapta ao ambiente organizacional. As estórias são
carregadas de simbolismo e flexibilidade, e podem ser reinterpretadas e alteradas de acordo
com o momento em que devem ser aplicadas. O propósito das estórias é atuar de maneira que
os membros da organização tenham as suas ações estruturadas para um objetivo comum e, ao
mesmo tempo, orientar sobre o modo como os indivíduos devem agir. Já os mitos também são
relatos sobre a organização, porém, não existem fatos concretos para sustentá-los.
13
BEYER, J. & TRICE, H. How an organization’s rites reveal it’s culture. Organizational Dynamics, 1986.
51
Os tabus têm a função de orientar o comportamento dos indivíduos e delimitar as
áreas de proibição. Segundo a autora, eles evidenciam o aspecto disciplinar da cultura e
enfatizam aquilo que não é permitido.
De acordo com Freitas (1991), existem os heróis natos, que têm influência mais
abrangente e filosófica, e os heróis criados, que são situacionais, usados como exemplos no
dia-a-dia, como o campeão de vendas, o administrador do ano, e assim por diante. A autora
ainda ressalta que a existência de heróis no universo organizacional cumpre algumas funções:
tornar o sucesso atingível e humano, fornecer modelos, simbolizar a organização para o
mundo exterior, preservar os aspectos positivos da organização, estabelecer padrões de
desempenho e motivar os empregados, fornecendo influência duradoura.
As normas abrangem todo o sistema normativo da organização. Elas influenciam
diretamente os indivíduos ao estabelecer regras de trabalho, definir padrões de
comportamento, determinar a postura profissional, dizer o que é correto, etc: “[...] a norma é o
comportamento sancionado, através do qual as pessoas são recompensadas ou punidas,
confrontadas ou encorajadas, ou postas em ostracismo quando violam as normas” (FREITAS,
1991, p. 33).
A comunicação é outro elemento que compõe a cultura organizacional. “O
processo de comunicação inerente às organizações cria uma cultura, revelando suas atividades
comunicativas” (FREITAS, 1991, p. 34). A comunicação possibilita aos indivíduos interagir,
trocar informações, emitir deixas simbólicas, apreender os modos de ser e de fazer no espaço
de trabalho e compartilhar a cultura organizacional. Segundo Fleury (1992, p. 24)
A comunicação constitui um dos elementos essenciais no processo de
criação, transmissão e cristalização do universo simbólico de uma
organização. O mapeamento do sistema de comunicações, sistema este
pensado tanto como meios, instrumentos, veículos, como a relação entre
quem se comunica é fundamental para apreensão deste universo simbólico.
Para essa autora, no sistema de comunicação, é preciso identificar tanto os meios
formais orais e escritos, quanto aqueles que são considerados informais, por exemplo, a ‘rádio
peão
14
’. O mapeamento desses meios permitirá que as relações existentes entre as categorias,
os grupos e as áreas da organização sejam compreendidas.
De acordo com Srour (1998), a cultura resulta de aprendizagem socialmente
14
Rádio-peão ou rádio-corredor são termos que as empresas utilizam para denominar a cadeia de boatos e
notícias distorcidas que surgem na rede informal de comunicação
.
52
condicionada, na qual os agentes sociais recebem os códigos, que são internalizados,
tornando-se produtos do meio sociocultural em que crescem através de processos de
integração e adaptação social. Nas organizações, a cultura é uma espécie de “cimento” que
impregna todas as práticas e representações mentais, une todos os membros em torno do
mesmo objetivo e modo de agir e expressa a identidade da organização. Esse autor ainda
ressalta que, sem referências próprias, as organizações ficariam à mercê das convicções
individuais de seus membros e, diante de novas situações, teriam prejuízos devido à
desigualdade de orientações e procedimentos.
A cultura é aprendida, transmitida e partilhada. Não decorre de uma herança
biológica ou genética, porém resulta de uma aprendizagem socialmente
condicionada [...] os agentes sociais adquirem os códigos coletivos e os
internalizam, tornam-se produtos do meio sociocultural em que crescem;
conformam-se aos padrões culturais, e, com isso, submetem-se a um
processo de integração ou de adaptação social. (SROUR, 1998, p. 174).
Ao tratar sobre a cultura, Aktouf (1994) enfatiza a ligação dialética entre fatos
concretos vividos, as representações e os símbolos. O autor ressalta que a cultura abrange o
modo de vida e as formas de relacionamento de uma organização, e não pode ser restrita a
uma imagem ou convicção. Pois, “[...] a cultura organizacional [...], antes de ser um princípio,
ou ainda, menos do que isso, antes de ser um mero instrumento de gerenciamento, é um
conjunto de práticas sociais materiais e imateriais” (AKTOUF, 1994, p. 48). Essas práticas
podem ser exemplificadas por meio da participação e da colaboração articuladas entre os
membros organizacionais, e devem estar relacionadas à ação cotidiana, ou então não passarão
de nomes vazios ou de rituais verbais.
Aktouf salienta que os dirigentes organizacionais desempenham um papel
importante na construção da realidade organizacional, e que isto não deve ser confundido com
a capacidade de fabricar mitos, símbolos e sistemas de representação. A identificação com o
trabalho é possível com a superação da alienação, quando o trabalhador consegue perceber
a si mesmo e assumir o ato de trabalhar como o seu ato, como a sua reabilitação como sujeito.
O autor destaca ainda que, mesmo que se admita que a cultura seja construída por
meio da interação e que os dirigentes tenham um papel importante no estabelecimento desse
processo, a sua formação não se restringe a isso. A cultura, portanto, não deve ser tratada de
modo trivial, como uma variável dependente constituída de fatores que podem ser separados,
53
medidos e construídos, e a sua percepção não deve ser limitada pela visão de uma lente
funcionalista e instrumental. Ela é algo muito mais abrangente e está inscrita de modo
profundo nas estruturas sociais, na história, no inconsciente, na realidade vivida, espontânea e
subjetiva dos indivíduos.
A empresa se torna, assim, um espaço em que os membros organizacionais
buscam se identificar com seus pares e com os locais de socialização reconhecidos. Nesse
processo, o trabalhador é o ator, o sujeito ativo que constrói a sua história ao mesmo tempo
em que constrói a história da organização.
Ressalta-se que a diversidade cultural existente dentro desse contexto possibilita
que, ao invés de se abordar a cultura organizacional, fale-se em culturas dentro da
organização. Entretanto, para fins deste trabalho, considera-se a organização como um todo e
opta-se por utilizar o termo cultura organizacional.
Nesse sentido, falar sobre cultura dentro do ambiente organizacional significa
compreender que ela ocorre dentro de um contexto estruturado que recebe influências de
fatores que estão em seu entorno. A cultura de uma organização, portanto, é um processo vivo
e dinâmico, que recebe essas influências e também sofre modificações. Essas modificações
serão tratadas no item a seguir.
3.3 MUDANÇA ORGANIZACIONAL E CULTURA DIGITAL
Tradicionalmente, tem-se acreditado que comunicação e mudança organizacional
mantêm um relacionamento de natureza unilateral, em que a comunicação é uma variável
dependente do processo de mudança organizacional, desempenhando, junto a esse, a função
de suporte (REIS, 2004).
Reis esclarece que a visão reducionista do que seja a comunicação e a sua ação foi
adotada por diversos comunicadores que atuam nas organizações, passando a dar visibilidade
à prática profissional. Ela resulta da interação promovida pelo estabelecimento das relações de
trabalho, regidas pela lógica capitalista, que utilizam a comunicação de modo técnico e
instrumental no intuito de influenciar as relações que promove. Ao se fazer uma análise da
presença da comunicação na vida organizacional, deve-se evitar compreendê-la de modo tão
estreito, como se fosse uma espécie de instrumento que é acionado durante os processos de
mudança organizacional, pois a comunicação humana “[...] é um processo cuja raiz está na
54
necessidade de interação para a produção da sociedade; necessidade esta também presente
quando da organização de estruturas de trabalho, das quais as organizações produtivas são o
exemplo mais característico” (REIS, 2004, p. 40).
Sob essa ótica, a autora entende que a comunicação é elemento constituinte e
instituinte das organizações, seu papel vai além do suporte e pode ser compreendida como
“[...] padrões e práticas interlocutivos cotidianos e episódicos que impregnam tanto a vida
interna quanto o estabelecimento e manutenção das relações externas das organizações”
(REIS, 2004, p. 41). Comunicação e mudança organizacional são processos que dialogam a
partir de sua instituição e, como tal, a inter-relação entre ambos é configurada por uma
influência mútua.
Nesse sentido, a comunicação no contexto das relações organizacionais se
caracteriza de modo mais abrangente, deixando de ser percebida de modo reducionista ou no
simples formato de suporte, pois não se restringe somente ao acréscimo de veículos
comunicacionais em um dado contexto de mudança.
Com relação à utilização de técnicas tradicionais de comunicação
15
, a autora faz
uma referência ao trabalho de Argyris
16
, que destaca que, normalmente, essas técnicas são
utilizadas para sistematizar, divulgar e expressar a informação. São úteis, na medida em que
auxiliam na produção de informação sobre questões rotineiras e na produção de dados
quantitativos para suporte a programas de gestão.
Pode se perceber, dessa forma, que a utilização de determinadas técnicas de
comunicação freqüentemente produz estruturas de mão única nas quais prevalece a lógica da
perspectiva informacional. O seu mero acréscimo em um dado contexto de mudança não
necessariamente privilegia a possibilidade participativa, a relação simétrica e a interação
dialógica, o que acaba muitas vezes não contribuindo e obstruindo a promoção da mudança
organizacional.
A relação entre comunicação e mudança não se de modo simplista, e a
comunicação não pode ser pensada como se fosse um pacote de ações padronizadas que é
acionado e utilizado em qualquer processo de mudança organizacional. Reis afirma que as
características contextuais e as particularidades de cada organização devem ser levadas em
consideração, pois
15
As técnicas tradicionais aqui são entendidas como: boletins, jornais internos, jornais murais, vídeos
institucionais, pesquisas de atitude e de clima.
16
ARGYRIS, C. Good communication that blocks learning. In: HBR, Managerial excelence: McKinsey awar
winers from the HBR 1980-1992. Boston: USA, p. 303-318.
55
O processo de mudança é o locus da prática comunicacional, sendo
impossível a existência de um sem o outro. É a prática comunicacional que
caracteriza, particulariza e diferencia o processo de mudança, tendo este
mesmo efeito sobre ela. É a dinâmica de articulação constitutiva mútua da
prática comunicativa com o processo de mudança que expressa as reais
intenções, possibilidades e limitações de realização de mudança (REIS,
2004, p. 52).
Ao argumentar sobre a natureza da mutualidade constitutiva da relação entre
comunicação e mudança, a autora apresenta um esquema
17
(Esquema 3) com seis dimensões
que formam um conjunto que, quando desconstruído, apresenta pares de relações
comunicação-mudança com fortes relações constitutivas mútuas.
Esquema 3 Dimensões da comunicação e dimensões da mudança
Fonte: REIS (2004, p 55)
Com base nesse esquema, a autora explica que os padrões comunicacionais de
uma organização tanto criam e promovem expectativas em relação ao contexto da mudança,
quanto reproduzem e retificam essas expectativas. Essa mesma dinâmica se em relação à
ação desses contextos sobre esses padrões. As iniciativas comunicativas são parte do conteúdo
CONTEÚDO DO
RELACIONAMENTO
DIMENSÕES
DA COMUNICAÇÃO
DIMENSÕES
DA MUDANÇA
padrão comunicacional
prática comunicativa
iniciativas comunicacionais
contexto da mudança
processo de mudança
conteúdo da mudança
cria expectativas
reproduz expectativas
caracteriza,
particularizando
e diferenciando
implementa ações
fomenta reações
56
da mudança, promovem reações e/ou dão retorno a esse conteúdo. Não é possível
implementar o conteúdo da mudança sem uma forte presença comunicacional. A prática
comunicativa é a somatória da ocorrência natural de relações comunicacionais, bem como da
produção intencional dessas relações, que é instigadora do processo de mudança e
indissociável desse.
Nesse sentido, Reis afirma que os processos de mudança organizacional podem
ser profundos e abrangentes, promovendo alterações simultâneas na estratégia, estrutura,
sistemas de controle, cultura e correlações internas de poder de uma organização. O contexto
organizacional é um espaço privilegiado de produção de interlocuções e interpretações e, por
isso, a realização desse processo de mudança é, ao mesmo tempo, intensa e pouco difusa de
impregnar a vida organizacional, promovendo reações entre os indivíduos envolvidos no
processo, o que, em alguns momentos, o torna mais difícil de ser implementado.
A visão de Freitas (1991) com relação à mudança complementa a percepção de
Reis. Segundo Freitas, mudança cultural é a definição de uma nova direção, um novo modo
de fazer as coisas baseado em novos valores, mbolos e rituais. A autora ressalta que, para
que a mudança de comportamento gere mudança na cultura, necessita-se justificar essa
mudança de comportamento. Desta forma, o blico interno deverá compreender a razão,
perceber a importância, o significado das transformações que estão sendo colocadas em
prática dentro da organização.
Para Motta e Vasconcelos (2006, p.295 -296), mudança cultural implica em:
[...] ruptura em valores e formas de comportamento em certezas
adquiridas. Muitos resistem em mudar. Contudo, o novo sistema, mesmo
rompendo com os padrões do primeiro, pode ser construído a partir da
experiência anterior. Os indivíduos e as organizações podem evoluir a
partir do que são, mesmo que o aprendizado implique rupturas. A gestão da
mudança e dos padrões culturais é um dos maiores desafios do grupo
organizacional atualmente.
Além das dificuldades trazidas pelas situações de mudança, os autores afirmam
que existem outros desafios no que se refere à gestão do subsistema humano e cultural. A
cultura de uma organização é composta pela cultura oficial e pela cultura dos subgrupos
18
17
Reis (2004) obteve este esquema ao utilizar-se do software Nvivo para tratamento de dados quando
desenvolveu investigação longitudinal e em profundidade durante quatro anos em três organizações inglesas que
passaram por processo de mudança organizacional. (REIS, 2004, p. 50)
18
Os subgrupos organizacionais são os diferentes conjuntos de indivíduos e atores sociais membros da
organização que interagem e constroem em conjunto o ambiente em que vivem e a própria organização
(MOTTA e VASCONCELOS, 2006).
57
organizacionais, e não pode ser considerada um todo sólido, bem acabado e de fácil
compreensão. Pois, em uma mesma organização, pode haver uma cultura em comum e
subculturas desenvolvidas em diferentes áreas ou departamentos. Por um lado, os membros
organizacionais possuem acesso a padrões culturais comuns, e por outro, cada subgrupo tem
seus valores e formas de ver o mundo. Indivíduos que têm experiências de trabalho similares
tendem a desenvolver valores e visões de mundo semelhantes no que se refere à prática
profissional. E os indivíduos que têm experiências de trabalho diferentes possuirão valores,
linguagem e padrões distintos de perceber o contexto ao seu redor.
Thompson (1995) destaque a um aspecto denominado de “processos de
valorização”, definidos como os processos pelos quais cada indivíduo atribui determinado
tipo de valor a um fenômeno social. Dessa forma, a inserção de um novo instrumento de
comunicação na organização poderá passar por um complexo processo de valorização,
avaliação, conflito e até mesmo de contestação pelo público interno. A sua mera inclusão não
irá assegurar o seu reconhecimento, entendimento e a participação das pessoas, que deverão
“[...] lidar com o impacto do fluxo acelerado de informações e, principalmente, dar-lhes um
significado, ou seja, interpretá-las, integrando-as com sua visão de mundo [...]”
(GUARESCHI, 2000, p.43).
A introdução do meio tecnológico e das novas práticas nas tarefas organizacionais
têm uma conotação para o agente produtor, neste caso, a organização, que não
necessariamente será a mesma para o público interno. Este público é composto de pessoas
com histórias, características distintas e experiências particulares, e essas serão acionadas no
momento de interpretar e compreender os significados da implementação das novas práticas.
Assim, pode-se concluir que a existência de alterações que venham garantir a utilização das
ferramentas tecnológicas torna necessária a mudança na concepção da cultura da organização.
O corpo diretivo e os gestores, através da valorização da comunicação estratégica
e de um planejamento comunicacional, podem estimular o desenvolvimento da cultura dentro
da organização. A cultura tem a sua formação na comunicação, no entanto, dificilmente será
planejada ou presumível, pois ela é formada a partir do momento em que as pessoas
interagem e se relacionam, e somente se modificará se os membros organizacionais desejarem
essa mudança (MARCHIORI, 2006b).
Muitas das inovações tecnológicas que são introduzidas nas organizações
atualmente estão repercutindo no processo de comunicação, nas práticas e na cultura
organizacional. Essas inovações tiveram origem no desenvolvimento da informática e da
cibernética nos anos 50, e hoje são denominadas de cultura digital ou cibercultura. Naquela
58
época, a informática era caracterizada como técnica de manipulação da informação, enquanto
que a cibernética pretendia ser um modo de reflexão sobre os usos das ferramentas de
comunicação. Na década de setenta, o surgimento do microcomputador promoveu o início da
popularização da chamada cibercultura, que se firmou a partir dos anos oitenta com o
desenvolvimento da informática de massa e se estabeleceu na cada de noventa com o
surgimento das redes telemáticas e a expansão da Internet.
A cibercultura pode ser compreendida como uma nova forma de expressão da
cultura contemporânea, que surge da relação simbiótica entre a sociedade, a cultura e as novas
tecnologias baseadas na micro-eletrônica (LEMOS, 2003; LEVY 1999). Os computadores,
através das redes telemáticas, deixam de ser apenas máquinas de calcular, para se tornarem
ferramentas de criação, comunicação e convívio, introduzindo alterações na relação entre o
tempo e o espaço e passando a abranger todos os fenômenos relacionados ao ciberespaço.
Alguns autores denominam essa nova forma de expressão da cultura
contemporânea de cultura digital. Para Prado, Caminati e Novaes (2005), a cultura digital não
se resume somente a uma conversão de artefatos analógicos para o equivalente em
digitalizados. Mas refere-se a um conjunto de transformações profundas na esfera social, em
que novas dinâmicas surgem mediante o compartilhamento de informações e de uma nova
configuração técnica fundamentada em interatividade plena.
Essa interatividade sugere mudança do comportamento ‘passivo’ para outro ativo
e engajado na produção coletiva diante dos meios de comunicação. A cultura digital substitui
o modelo de transmissão unidirecional por relações em rede, permitindo a realização de novas
possibilidades comunicativas, o desenvolvimento de novos costumes e a passagem da era
analógica para a digital, pois, nessa passagem, objetos técnicos são relacionados a novos
processos de produção e novas formas de apropriação das tecnologias que possibilitam usos
diferenciados.
Para Costa, a cultura digital é a cultura que cresce sob o signo da interconexão
entre dispositivos computacionais, da inter-relação entre os homens em escala planetária, do
relacionamento cotidiano com máquinas inteligentes e da obsessão pela interatividade”
(COSTA, 2003, p. 81). Esse autor ainda argumenta que a interação é um dos aspectos mais
relevantes da cultura digital, ressaltando a capacidade que os indivíduos têm de se relacionar
com os diversos ambientes de informação que os rodeiam.
Além disso, o termo digital sugere uma série de implicações, dentre as quais: o
acúmulo de dados, a possibilidade de manipulação de informações e, especialmente, a
ampliação da capacidade de participação e comunicação sob distintas formas. Portanto, saber
59
como interagir com esses dispositivos é essencial para que se possa extrair deles o que se
deseja.
Dessa forma, para que exista alguma inovação cnica no espaço organizacional,
deve haver também inovação social.
Na implantação de uma nova forma de realização do
trabalho, como através da inserção de uma ferramenta de comunicação, devem-se estabelecer
novas regras e normas que levem os indivíduos a aprender e conhecer as características e
particularidades dessa ferramenta e ter clareza sobre o modo e a forma que ela deve ser
utilizada. Esse conhecimento é repassado por meio da comunicação e os auxilia a incorporar a
nova técnica em suas rotinas, fazendo com que eles se adaptem a ela, mudando seus padrões
culturais e integrando a nova prática ao seu cotidiano de trabalho. Pois, por meio da
comunicação e [...] “da cultura, os indivíduos, compreendem, conhecem e reproduzem o
sistema social, bem como elaboram alternativas, na busca de dimensões transformadoras”.
(MÜLLER, GERZSON, EFROM, 2007, p. 03).
No intuito de complementar o que foi trabalhado até o momento sobre a origem e
a evolução do conceito de cultura, mudança cultural e cultura digital, no próximo capítulo,
tratar-se-á do processo de comunicação nas organizações.
60
4. COMUNICAÇÃO ORGANIZACIONAL
O significado mais antigo da palavra comunicação tem origem no latim
communicatio
19
. No intuito de entender a força da palavra comunicação e a sua ambivalência,
Wolton (2004) afirma que é preciso recorrer à sua etimologia, na qual três sentidos podem ser
definidos: a comunicação direta, a comunicação técnica e a comunicação social.
O primeiro vem do latim e remete à idéia de partilha. O segundo sentido está
relacionado à transmissão, difusão e ao desenvolvimento das técnicas de comunicação
mediada, que possibilitaram a propagação de informações, e de outras tecnologias que
desempenharam papel complementar para a comunicação, como o trem, o automóvel e o
avião. O terceiro sentido ocorre a partir do momento em que houve maior abertura mundial
para o comércio, assim como para o câmbio e a diplomacia, e as técnicas de comunicação
começaram a desempenhar papel indispensável, tornando a comunicação uma necessidade
social funcional para as economias interdependentes. Com isso, passaram a existir atividades
em que o trabalho efetuava-se de modo compartilhado, e os sistemas técnicos, os
computadores, as redes e os satélites tornaram-se uma necessidade funcional para a execução
do mesmo.
Percebe-se que o desenvolvimento dessas técnicas mudou a relação do homem
com o mundo, mas a comunicação não perdeu o seu sentido original. A evolução das
máquinas proporcionou o desenvolvimento de novas possibilidades de comunicação e
interação. Entretanto, a comunicação manteve, em seu conceito, a essência que pressupõe
comunhão, partilha, intercâmbio, troca. Assim, entende-se que, nas organizações, estão
presentes os três sentidos sobre comunicação citados acima, pois nesse universo coexistem
tanto as idéias sobre desenvolver atividades em conjunto, quanto o processo de interação entre
19
Segundo Martino (2001), esse vocábulo é composto por três elementos: pela raiz munis, que significa ‘estar
encarregado de’; pelo prefixo co, que expressa simultaneidade, reunião e a idéia de uma ‘atividade realizada
61
as pessoas e a difusão e propagação de informações.
Neste capítulo, buscar-se-á compreender o modo como a comunicação
organizacional se encontra configurada nos dias atuais. Isso será feito através do resgate de
uma breve retrospectiva histórica da comunicação nas organizações e do entendimento do
processo de comunicação organizacional.
4.1 BREVE RETROSPECTIVA HISTÓRICA DA COMUNICAÇÃO
ORGANIZACIONAL
A comunicação envolve uma multiplicidade de sentidos. Para estudar e dar conta
da pluralidade e dispersão desse campo, teóricos como Armand y Michele Mattelart (2001)
remetem aos séculos XVIII e XIX. Buscam nos estudos e nas propostas socioeconômicas e
políticas de Adam Smith - e de outros autores - aspectos relevantes para a compreensão da
comunicação. A “divisão do trabalho”, segundo os autores, foi o primeiro passo teórico para a
aplicação da comunicação como formulação científica. A comunicação contribuiu para a
organização do trabalho coletivo no interior das fábricas
20
e na estruturação dos espaços
econômicos. E o processo de desenvolvimento e crescimento desencadeado pela Revolução
Industrial tornou as vias fluviais, marítimas e terrestres, relevantes vias de acesso e de
comunicação nesse período.
Estudos desenvolvidos por Torquato (1984) demonstram que a automatização,
o crescimento das indústrias e a especialização aumentaram a complexidade organizacional,
de modo que a divisão do trabalho gerou uma ruptura interna nas relações entre empregador e
empregado. Além disso, a migração de camponeses- atraídos pelas fábricas- do campo para a
cidade, o regime de produção em massa, os processos de editoração e impressão, o
desenvolvimento dos meios de comunicação de massa
e a gradual conscientização dos
operários levaram ao surgimento da imprensa sindical. Para enfrentar a concorrência e a força
dos sindicatos, as organizações tiveram que aumentar os seus mecanismos comunicativos,
com o propósito de se tornarem conhecidas e ganharem a preferência do público, criando,
assim, novas formas de comunicação. Esse fato levou ao aparecimento das publicações
conjuntamente’; e pela terminação tio, que reforça a idéia de atividade. O autor destaca que a primeira aparição
do termo ocorreu no vocábulo religioso do cristianismo antigo.
20
Taylor e Fayol, integrantes da Escola Clássica de Administração, trataram sobre a comunicação nas
organizações ao destacar a verticalidade com que o processo ocorria no interior das fábricas. (MAXIMIANO,
1997).
62
empresariais, que se tornaram um veículo relevante de orientação ao trabalhador, pois
possibilitavam que esse compreendesse melhor não apenas o seu ambiente interno, mas
também o externo, ao mesmo tempo em que promoviam a sua integração ao meio
empresarial.
Desta forma, pode-se dizer que a Revolução Industrial, com a conseqüente
expansão das empresas a partir do século XIX, proporcionou transformações no
relacionamento entre os indivíduos, nos modos de produção e nos processos de
comercialização. E a forma como a comunicação nas organizações se encontra configurada
nos dias atuais é resultado de idéias que surgiram nessa época. (KUNSCH, 1997).
Bueno (2003) apresenta a evolução ocorrida no perfil da comunicação
empresarial
21
brasileira e aponta para cinco grandes fases, que vão desde a sua incipiente
formação até a sua consolidação como matéria-prima estratégica.
A primeira fase se refere ao período que antecede a década de 70. Nessa época, a
comunicação interna convivia com a publicidade. Essa simulava uma empresa democrática e
aberta, enquanto aquela era marcada pelo autoritarismo e pelo desestímulo à participação e ao
diálogo. O autor lembra que se deve considerar o contexto em que as empresas e o país
estavam inseridos - a ditadura militar no qual a postura empresarial se ajustava com a
conduta dos militares. Embora as empresas se comunicassem, as atividades eram
desenvolvidas isoladamente, de modo fragmentado, a expressão ‘comunicação empresarial’
era desconhecida e a existência de departamentos que reunissem todos os esforços de
relacionamento da empresa com seus públicos era uma raridade. Quase sempre, a atividade
era exercida de modo parcial e desempenhada por profissionais oriundos de outras áreas e
pouquíssimas eram as instituições em que a comunicação era vista como um campo
importante.
Bueno ressalta a relevância da mobilização de editoras de jornais e revistas que,
em 1967, fundaram a Associação Brasileira de Comunicação Empresarial (ABERJE)
considerada a entidade mais importante dessa área no país. Naquele período, as publicações
empresariais eram, em grande maioria, relacionadas à área de Recursos Humanos e a
instituição tinha outra designação, compatível com a sigla que a definia: Associação Brasileira
de Editores de Revistas e Jornais de Empresa. Esse período também coincide com a
21
Bueno refere-se à comunicação organizacional como comunicação empresarial. Nesta parte da dissertação
utilizaremos a nomenclatura comunicação empresarial, pois é uma nomenclatura utilizada pelo autor. No
entanto, este trabalho é balizado pela comunicação organizacional - concepção proposta por Kunsch, conforme
é explicitado no item 4.2 desta dissertação.
63
implantação dos primeiros cursos de comunicação no Brasil, o que explica o fato de que, até
então, o número de profissionais da área era pouco expressivo.
A segunda fase se passou na década de 70 e indicou algumas mudanças
significativas com relação à implantação de uma cultura de comunicação nas organizações. A
partir desse período, as empresas de grande e médio porte começaram a criar setores de
comunicação ou recrutar profissionais para desempenhar atividades específicas. A literatura
também surgiu através da contribuição das universidades
22
, assim como a realização de alguns
eventos que contemplavam temas relacionados à área. Estes fatos colaboraram para tornar
visível a formação do mercado de comunicação empresarial.
A terceira fase ocorreu nos anos 80. Nesse período, a comunicação ganhou status
nas organizações, passando a ser um campo de trabalho proficiente que atraía profissionais de
todas as áreas. O jornalismo empresarial e as relações públicas se profissionalizaram com a
chegada de formandos egressos das faculdades de comunicação, e a vigência do regime
democrático passou a exigir uma nova postura das organizações. Os recém criados cursos de
pós-graduação em comunicação, através do desenvolvimento de dissertações e teses,
fomentaram a pesquisa, ao mesmo tempo em que eventos relacionados a essa área se
multiplicavam. Em 1983, foi fundado o I Congresso Brasileiro de Comunicação Empresarial.
Poucos anos depois, a Aberje realizou eventos focando a comunicação empresarial e a sua
amplitude por meio do Prêmio Aberje, que contemplava trabalhos de Comunicação que
extrapolavam os limites do jornalismo empresarial.
Kunsch (2006) ressalta que as interfaces das relações públicas e da comunicação
organizacional como campos acadêmicos de estudos são uma realidade presente no Brasil. A
criação dos cursos de pós-graduação em comunicação possibilitou desenvolver trabalhos mais
sistematizados, institucionalizando o desenvolvimento da pesquisa científica nas
universidades brasileiras. Esses trabalhos, gradualmente, foram sendo publicados por editoras
comerciais em formato de livros, que passaram a ser adotados pelas escolas de comunicação
social, o que contribuiu para a formação universitária de novos profissionais. Segundo a
autora,
22
A implementação de reformas curriculares, a partir de 1969, possibilitou a institucionalização do curso de
Comunicação Social, com habilitações em Jornalismo, Publicidade e Propaganda, Relações Públicas,
Radialismo, Cinema, e Produção Editorial/Editoração. (KUNSCH, 2006)
64
Para compreender e aplicar os fundamentos teóricos das Relações Públicas
é necessário também conhecer o espetro da abrangência da Comunicação
Organizacional e das áreas afins. Relações Públicas como disciplina
acadêmica e atividade profissional tem como objetos de estudos as
organizações e seus públicos. (KUNSCH, 2006, p. 47).
Bueno (2003) salienta que, na segunda metade da década de 80, uma iniciativa
pioneira no mercado, realizada pela Rodhia
23
, marcou profundamente a comunicação
empresarial brasileira. A publicação da sua Política de Comunicação Social (PCS) tornou-se
uma referência na área, influenciando outras organizações e posicionando a Comunicação
Empresarial como essencial no processo de tomada de decisões. A PCS da Rodhia foi
considerada o primeiro caso de sucesso, transformando-se em um best-seller publicado com
direito a reedições consecutivas para atender ao interesse dos profissionais da área.
Essa visão é ratificada por Kunsch (2006) que afirma que, em 1985, a Rodhia
criou a sua Gerência de Comunicação Social, reunindo as áreas de jornalismo, relações
públicas e marketing social, numa iniciativa que acabou por chamar a atenção dos meios
universitários e se tornou modelo para outras organizações, que passaram a dar mais atenção
para a comunicação como um todo.
A quarta fase ocorreu na década de 90. Bueno (2003) afirma que, nesse momento,
a comunicação empresarial deixou de ser um simples conjunto de atividades, desenvolvidas
de modo fragmentado, para se constituir em um processo integrado que orientava o
relacionamento da empresa com os seus públicos de interesse. O conceito de comunicação
empresarial ficou mais refinado e vinculou-se diretamente ao negócio, passando a ser
estratégico para as organizações. Essa mudança teve como conseqüência a geração de um
novo perfil para o campo, que demandou planejamento, recursos, tecnologia e profissionais
capacitados para exercer a profissão nessa área.
As diversas transformações geopolíticas e o fenômeno da globalização, ocorridos
em nível mundial, refletiram nas organizações. Entre outras coisas, houve uma redefinição das
atividades de assessorias de imprensa e de relações públicas, que se transformaram em
assessorias de comunicação. Além disso, em 1999, foi criado, na Escola de Comunicação e
23
A Rodhia é uma empresa mundial de química de especialidades, presente no Brasil desde 1919. É reconhecida
mundialmente nas áreas de polímeros, química orgânica e inorgânica e em formulações. O nome Rhodia tem
origem em Rhône (Ródano, em português), que era o endereço telegráfico das Usines du Rhône na França e na
Suíça.
65
Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP), o curso de Gestão Estratégica em
Comunicação Organizacional e Relações Públicas em vel de pós-graduação-especialização.
O principal objetivo deste curso é formar estrategistas e gestores da Comunicação
Organizacional com uma vasta visão da sociedade e das suas interseções com as Ciências da
Comunicação, possibilitando trazer para o debate científico-acadêmico os profissionais que
estão no mercado e que sentem a necessidade de embasamento teórico para a prática de suas
atividades. (KUNSCH, 2006).
A quinta fase se refere aos dias atuais. Segundo Bueno (2003), a comunicação
empresarial se prepara para ascender a um novo patamar e se tornar um elemento importante
do processo de inteligência empresarial. Para tanto, estrutura-se de modo a usufruir as
potencialidades das novas tecnologias, respaldar-se em banco de dados inteligentes e
maximizar a interface entre a empresa e a sociedade.
Kunsch (2006) destaca que tanto as relações públicas quanto a comunicação
organizacional têm contado com o apoio da Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares
da Comunicação (Intercom) para o desenvolvimento de ambos os campos no Brasil. Essa
contribuição se processa de forma efetiva nos espaços oferecidos para comunicações
científicas nos congressos anuais, através dos núcleos de pesquisa com sessões temáticas de
relações públicas e comunicação organizacional. Além disso, a autora lembra que, em maio
de 2006, em São Paulo, foi criada a Associação Brasileira de Comunicação Organizacional e
Relações Públicas (Abrapcorp) com o propósito de estimular a realização e a divulgação de
estudos resultantes de pesquisas desenvolvidas na área. Em parceria com a ECA-USP, a
Abrapcorp realizou, em maio de 2007, o Congresso Científico Brasileiro de Comunicação
Organizacional e Relações Públicas com o objetivo de contribuir com o avanço científico do
Campo.
Assim, pode-se dizer que o surgimento da comunicação organizacional no Brasil
começou de forma fragmentada e incipiente e, gradualmente, foi se desenvolvendo, o que
possibilitou um aumento do número de profissionais no mercado de trabalho. No Brasil, o
campo acadêmico científico está instituído, na medida em que a realização de eventos sobre a
área é crescente, o desenvolvimento de pesquisas aumenta a cada ano, assim como a
disponibilidade de literatura significativa sobre o tema.
66
4.2 O PROCESSO DE COMUNICAÇÃO NO ESPAÇO ORGANIZACIONAL
No Brasil, a terminologia “comunicação organizacional” costuma ser utilizada
indistintamente dos termos “comunicação empresarial” e “comunicação corporativa”,
referindo-se a todo o trabalho de comunicação realizado nas organizações em geral
(KUNSCH, 1997). Esta dissertação será balizada pela concepção de Kunsch (2003) que
afirma que a terminologia ‘comunicação organizacional’ apresenta maior amplitude, pois se
aplica a qualquer tipo de organização - pública, privada, sem fins lucrativos, organizações não
governamentais - ONGs, associações - e abrange toda a gama de atividades comunicacionais
realizadas dentro das organizações.
Diversos estudiosos concebem o processo de comunicação de acordo com o
modelo informacional. No entanto, entende-se que esse modelo se torna limitado para se fazer
uma análise do processo de comunicação organizacional. Assim, neste trabalho, utilizar-se-á a
concepção de autores que entendem a comunicação de modo mais abrangente, em que o
emissor e o receptor são vistos como agentes ativos e participantes do processo comunicativo.
Kreps (1995) é um dos autores que adotam a concepção mais abrangente da
comunicação. Ele explica que a comunicação humana é um processo dinâmico e contínuo que
permite aos integrantes de uma organização trabalhar, cooperar e interpretar as necessidades e
atividades organizacionais. Para esse autor,
La comunicación humana ocurre cuando una persona responde a un mensaje
y le asígna significados. La dos partes claves de esta definición son el
mensaje y el significado. Los mensajes son cualquer símbolo al que la gente
presta atención y para el que se crea un significado en el processo de
comunicación. Los mensajes pueden tomar muchas formas: palavras
habladas, palabras escritas, expressiones faciales, señales del entorno,
pensamientos o sentimientos. (KREPS, 1995, p. 27).
Ele afirma que se deve reconhecer que nenhum indivíduo é somente emissor ou
somente receptor no processo comunicativo. Como comunicadores, as pessoas enviam e
recebem mensagens simultaneamente, interpretam as mensagens recebidas e criam outras
mensagens que comunicam outras necessidades, idéias e sentimentos. Esse autor enfatiza que
a comunicação funciona como negociação, e que essa negociação implica o envolvimento de
diversos elementos que atuam concomitantemente, como as trocas de mensagens, os
67
significados que as pessoas dão às mensagens, o contexto em que se realiza a comunicação, a
relação estabelecida entre os comunicadores, as experiências anteriores de quem está se
comunicando, o propósito do comunicador e os efeitos da comunicação sobre as pessoas e as
situações.
De acordo com a concepção do autor, a comunicação é percebida como atividade
simbólica, na qual os indivíduos recebem informações que são processadas, interpretadas e
transformadas em significados que os ajudam a compreender os diversos fenômenos do
mundo social. A informação está relacionada com as experiências internas de cada indivíduo
e com os significados que eles criam para responder e interpretar as mensagens e os
fenômenos organizacionais.
Com o objetivo de definir o que é a comunicação organizacional, Goldhaber
(1999) fez um estudo sobre o modo como diversos autores se posicionam em relação a esse
tema. O autor se deparou com distintos pontos de vista, mas encontrou alguns aspectos em
comum entre as definições estudadas:
1. La comunicación organizacional ocurre en un sistema complejo y abierto
que es influenciado e influencia al médio ambiente.
2. La comunicación organizacional implica mensajes, su flujo, su propósito,
su dirección y el medio empleado.
3. La comunicación organizacional implica personas, sus actitudes, sus
sentimientos, sus relaciones y habilidades. (GOLDHABER,1999, p. 23).
Assim, Goldhaber considera que a comunicação organizacional é o fluxo de
mensagens existente dentro de uma rede de relações interdependentes, formada por quatro
componentes: mensagem, rede, interdependência e relações.
A mensagem é a informação que é percebida e para a qual os receptores dão um
significado. As mensagens tratam a respeito de informações significativas sobre pessoas,
objetos e acontecimentos gerados durante as interações humanas dentro da organização. As
mensagens de uma organização podem ser examinadas de acordo com diversas perspectivas:
a modalidade da linguagem mensagens verbais e mensagens não verbais - os receptores
internos e externos, o método de difusão e o propósito do fluxo - que se refere ao motivo pelo
qual se envia uma mensagem na organização.
A rede de comunicação é o caminho percorrido pelo fluxo de mensagens dentro
da organização, que pode ser formal ou informal. Já a natureza e a extensão de uma rede são
influenciadas por diversos fatores, como a função das relações, a direção do fluxo das
mensagens, a natureza do fluxo das mensagens e o conteúdo dessas mensagens. A direção de
68
uma rede é dividida em três formatos de comunicação: ascendente, descendente e horizontal.
Pois depende de quem inicia a mensagem e de quem recebe ou deveria recebê-la. A
comunicação descendente ocorre quando uma mensagem flui de um superior em direção a um
subordinado; a comunicação ascendente ocorre quando a mensagem flui de um subordinado
para um superior; e a comunicação horizontal é o intercâmbio lateral de mensagens entre
indivíduos que se encontram no mesmo nível de hierarquia dentro da organização.
Aos formatos de comunicação apresentados por Goldhaber, Torquato (2002)
acrescenta mais um, denominado de diagonal. Esse se refere às mensagens que são trocadas
entre um superior e um subordinado localizado em uma outra área ou departamento,
abrangendo todas as comunicações diagonais. É mais usual em organizações que são mais
abertas e menos burocráticas.
Concebendo a organização como sistema aberto, cujas partes estão relacionadas
entre si e com o meio ambiente, Goldhaber entende que a natureza das relações é
interdependente, pois todas as partes da organização, denominadas de subsistemas, afetam e
são afetadas mutuamente sempre que ocorre algum tipo de mudança em alguma parte do
sistema. E, uma vez que uma organização é um sistema vivo e aberto, e as suas partes estão
conectadas pelas pessoas, o autor considera relevante estudar as relações existentes entre elas,
pois através delas é que se conectam e interagem, realizando as trocas comunicativas.
Kunsch (2003) propõe que as organizações concebam a sua comunicação a partir
da perspectiva integrada, na qual a comunicação é uma filosofia que integra a reunião de
diversas áreas, possibilitando atuação sinérgica. A comunicação integrada abrange a
comunicação institucional, a comunicação mercadológica, a comunicação interna e a
comunicação administrativa. Constitui-se em um mix que forma o composto da comunicação
organizacional.
A comunicação administrativa se relaciona com os fluxos, os níveis e as redes
formal e informal de comunicação, que permitem o funcionamento do sistema organizacional.
A comunicação interna ocorre em paralelo com a circulação cotidiana da comunicação que
perpassa todos os setores. Essa seria um setor planejado, com objetivos que visam realizar a
interação entre a organização e os funcionários, usando, para isso, ferramentas da
comunicação institucional e da comunicação mercadológica. A comunicação mercadológica
abrange toda a produção comunicativa em torno dos objetivos mercadológicos e está ligada
diretamente ao marketing de negócios. a comunicação institucional esrelacionada aos
aspectos corporativos institucionais e envolve a construção e a formatação da imagem e da
identidade da organização
69
Para Kunsch, não se deve isolar essas modalidades comunicacionais. Ao contrário
disso, é necessário que haja uma ação conjugada das atividades de comunicação, pois são elas
que possibilitam uma organização relacionar-se com seus públicos e a sociedade em geral. A
autora ainda destaca que “[...] comunicação é um ato de comunhão de idéias e o
estabelecimento de um diálogo. Não é simplesmente uma transmissão de informações”
(KUNSCH, 2003, p. 161).
Torquato (2002) sugere uma classificação distinta da proposta por Kunsch. O
autor destaca que a comunicação não deve ser percebida somente como comunicação social e
que, nas organizações, ela assume quatro modalidades distintas, na qual cada uma exerce um
conjunto de funções específicas. A primeira delas é a comunicação cultural, que abrange o
clima interno no qual estão inseridos os costumes, as idéias e os valores. A segunda é a
comunicação administrativa e se refere às correspondências internas e materiais impressos. A
terceira modalidade é a comunicação social, que reúne o jornalismo, as relações públicas,
editoração e marketing. A última modalidade é conhecida como sistema de informação e
agrega as informações armazenadas em bancos de dados.
Verifica-se que Torquato, ao argumentar que todas as modalidades são
estratégicas e devem funcionar como uma orquestra, em que metais, cordas e percussões
devem estar em perfeita afinação para tocar uma melodia harmônica, demonstra ter uma visão
sistêmica da comunicação organizacional. Destaca-se ainda que as modalidades apresentadas
por Kunsch e Torquato, embora tenham denominações diferentes, visam abranger a
complexidade da comunicação nas organizações e enfatizam a relevância da comunicação ser
concebida de forma integrada e estratégica.
Bueno (2003) a comunicação como o instrumento de inteligência empresarial.
Para o autor, em função de seu caráter estratégico, a comunicação deve se respaldar em
bancos de dados inteligentes e no conhecimento mais profundo dos seus públicos de interesse,
dos canais de comunicação e da própria mídia, superando o planejamento que se baliza
unicamente pela visão impressionista de seus profissionais.
A Comunicação como inteligência empresarial não pode fazer concessão ao
improviso. Apóia-se em metodologias, em pesquisas, em desenvolvimento
de teorias e conceitos a serem aplicados a novas situações; apóia-se,
sobretudo na necessidade imperiosa de dotar a Comunicação de um novo
perfil: a passagem real do tático para o estratégico. (BUENO, 2003, p. 15).
O autor entende que a comunicação como inteligência empresarial exige uma
nova postura dos comunicadores, em que a intuição e experiência são relevantes, mas também
70
é necessário incorporar a prática de pesquisa e o desenvolvimento de metodologias para
mensurar resultados. Para isso, o comunicador do futuro deve estar em condições de se
adaptar a um mundo em permanente e rápida mutação.
Putman, Nelson e Chapman (2004) são autores que examinam sete linhas
metafóricas que introduzem formas alternativas de ver as organizações. Eles descrevem traços
centrais de como elas projetam, de distintos modos, a relação comunicação organização. As
linhas metafóricas apresentadas pelos autores são: conduíde, lente, linkage, performance,
símbolo, voz e discurso.
Essas metáforas servem como molduras alternativas para examinar a
literatura de comunicação organizacional e a relação entre comunicação e
organização. Não são paradigmas ou categorias discretas; antes servem
como perspectivas para facilitar o entendimento do campo, diversificado e
multifacetado, da comunicação organizacional (PUTMAN, NELSON,
CHAPMAN, 2004, p. 83).
A metáfora do conduíte considera as organizações como canais ou contêineres
utilizados para o encaminhamento da comunicação. A ênfase dada é na ‘transmissão’, na
quantidade, tipo, direção e estrutura do fluxo informacional. Nessa metáfora, a comunicação é
vista como um fluxo linear de mão única.
A metáfora da lente trata as organizações como sistemas perceptuais ou ‘olhos’
responsáveis pela filtragem de dados. A comunicação é filtrada e, em algumas vezes, chega a
ser distorcida ao passar pelas diversas ‘membranas’ entre a organização e o ambiente, entre
departamentos e indivíduos. Essa distorção pode ocorrer no modo em que a mensagem é
selecionada e encaminhada ou, até mesmo, quando uma informação é protelada e chega com
atraso.
A metáfora do linkage concebe a organização como redes de comunicação ou
unidades de indivíduos interconectados, nas quais a comunicação age para conectar,
construindo padrões de interconectividade relacional e integração global. Nessa metáfora, a
comunicação é o conector que liga as pessoas e configura as organizações como redes de
relacionamento.
Na metáfora da performance, a organização aparece como ações coordenadas,
projetando a comunicação como interação social. A comunicação consiste em intercâmbios
conectados, nos quais a interação social está enraizada nas seqüências, padrões e significados
que brotam do intercâmbio verbal das mensagens não verbais. As performances são processos
dinâmicos, interacionais, contextuais, episódicos e improvisados, nos quais os indivíduos
71
atribuem sentido e a comunicação se torna parte de uma sucessão de indicações, sem início e
fim claros. A interação tanto é comportamental quanto simbólica, com certa ênfase simultânea
na ação e na atribuição de sentido.
A metáfora do símbolo emerge da cultura organizacional para projetar a
comunicação como interpretação de forma literária, tais como as narrações, as metáforas, os
ritos, rituais e os paradoxos. Essa metáfora fornece uma ligação direta entre representação e
interpretação, em que a vida organizacional torna-se uma atividade literária na qual os
membros interpretam as atividades simbólicas que eles próprios inscrevem na paisagem
organizacional, se posicionam no cenário organizacional e entendem os motivos e valores de
suas vidas cotidianas.
Na metáfora da voz, a organização torna-se um coro de vozes, que podem ser
abafadas ou estrondosas. A comunicação é a expressão dessa manifestação musical. Essa
metáfora envolve alguns grupos relacionados, como: vozes distorcidas, vozes de dominação
por meio da ideologia e do controle suave, a voz diferente por meio das perspectivas
feministas, e o acesso à voz por meio das práticas participativas e democráticas.
E por fim, na metáfora do discurso, a organização aparece como texto que
consiste em gênero e diálogo, no qual a comunicação é evidenciada como conversação.
Entende-se que a análise metafórica possibilita se delinear um modo de perceber o
mundo e atribuir sentido a ele, facilitando a criação e a interpretação da realidade social.
Nesta dissertação, considera-se que as metáforas predominantes no universo pesquisado são
as metáforas do linkage, da performance e do símbolo, pois essas auxiliam a revelar a
ambigüidade e a complexidade organizacional. Com isso, não se quer dizer que as outras não
estejam presentes. Ao contrário, acredita-se que, de um ou de outro modo, é possível perceber
todas as metáforas no contexto organizacional, no entanto algumas são mais evidentes que as
outras.
Para Oliveira e Paula (2007), a comunicação organizacional ocorre nas interfaces
com outros campos, promovendo interações entre organizações e atores sociais e enfatizando
fluxos de informação e relacionamento no intuito de contribuir para a construção de sentido
sobre as ações da organização e do ambiente. Também proporciona a interação da
organização com a sociedade por meio de mecanismos que tornam possível a validade pública
da sua atuação e conduta. A comunicação organizacional também envolve políticas e
estratégias de comunicação criadas com base nos valores e objetivos organizacionais, assim
como nas expectativas e demandas dos atores sociais com os quais a comunicação interage.
Para essas autoras:
72
[...] os processos comunicacionais constituem o objeto de estudo da
comunicação organizacional e são entendidos como os atos de interação
planejados e espontâneos que se estabelecem a partir dos fluxos
informacionais e relacionais da organização com os atores sociais que
atingem e/ou são atingidos por sua atuação. Os fluxos informacionais
representam todas as ações e instrumentos utilizados para veicular
informações. os fluxos relacionais são oportunidades de interação e
encontro entre a organização e atores sociais. (OLIVEIRA e PAULA, 2007,
p. 21).
Para responder às crescentes demandas comunicativas decorrentes das
transformações ocasionadas pela inserção das tecnologias de informação e comunicação e
pela utilização de ferramentas de comunicação mediada nas organizações, encontra-se em
Oliveira (2002)
24
o desenvolvimento de um modelo de comunicação que permite fazer uma
apreensão mais ampla e abrangente do processo comunicativo. O modelo denominado
interação comunicacional dialógica é respaldado pelo conceito de interação e pelo paradigma
relacional (Esquema 4).
Para construí-lo, a autora utilizou duas concepções complementares: a primeira é
a de que a comunicação nas organizações constitui um espaço de interface entre os campos da
comunicação e da administração, pressupondo-se uma relação de interação negociada entre
interlocutores; a segunda é a de que os públicos são interlocutores que participam e atuam na
dinâmica da negociação, considerando-se a comunicação organizacional como um processo
interativo evidenciado pela intenção dialógica.
A comunicação é concebida através da perspectiva de interação negociada. Nessa
interação, as partes assumem o papel de interlocutores de uma dinâmica argumentativa,
promovendo e organizando, através das trocas simbólicas e práticas, a troca comunicativa
entre a organização e os agentes sociais com os quais ela se relaciona.
Como proposta teórica para a comunicação organizacional, o modelo de interação
comunicacional dialógica
25
nega a linearidade dos processos comunicacionais nas
organizações, realçando relações mais horizontalizadas entre os agentes participantes.
Também reforça a simetria das relações ao conceber um espaço comum entre o emissor e o
receptor, que se tornam interlocutores, participantes de uma dinâmica argumentativa que
subentende o diálogo e a negociação. Ao ser concebido como interlocutor, o receptor alcança
um papel em que pode exercer maior interferência na troca simbólica e comunicativa.
24
Ivone criou o modelo de interação comunicacional dialógica, durante o desenvolvimento de sua tese de
doutorado defendida na Escola de Comunicação no Rio de Janeiro em 2002.
25
O modelo de interação comunicacional dialógica também é encontrado em Oliveira (2003) e Oliveira e
Caetano de Paula (2006, 2005).
73
Esquema 4 Paradigma de Interação Comunicacional Dialógica
Fonte: OLIVEIRA (2003, p. 4)
Visto por outro ângulo, percebe-se que o modelo destaca também relações
assimétricas ao evidenciar a posição da organização em relação aos outros interlocutores. A
organização exerce o papel de interlocutor central, pois todos os outros interlocutores se
posicionam ao seu redor. Entretanto, Braga (2000) salienta que a existência de assimetria
estrutural não implica necessariamente falta de interação comunicativa, pois as assimetrias
problemáticas ocorrem devido aos usos e construções sociais das interações, e não em função
dos processos interativos da sociedade.
Embora exista maior simetria nas relações, emissor e receptor não são
74
transformados em instâncias simétricas. Mas, ao contrário do que ocorre no modelo
informacional da comunicação, que tem caráter bipolarizado e no qual o emissor e o receptor
exercem funções específicas, no modelo de interação comunicacional dialógica, ocorre um
redimensionamento da posição ocupada por cada agente no processo de comunicação.
No que diz respeito à comunicação organizacional, Grunig (1984) desenvolveu
quatro modelos de relações públicas que demonstram a natureza da comunicação estabelecida
entre a organização e os públicos. Entre eles, o modelo de comunicação simétrica de mão
dupla apresenta semelhanças com o modelo de interação comunicacional dialógica proposto
por Oliveira. Assim como o modelo de Oliveira, o modelo proposto por Grunig também
valoriza o diálogo entre a organização e seus blicos e está fundamentado na negociação e
no acordo mútuo.
O modelo simétrico de mão dupla, em contraste, consiste mais de um
dialogo do que um monólogo. Se ocorrer a persuasão, o público deve muito
provavelmente persuadir a gerência da organização a mudar atitudes ou
comportamento, assim como é provável que a organização mude as atitudes
ou comportamento do público. Idealmente, ambos a gerência e os públicos
mudarão de alguma forma após um esforço de relações públicas. (GRUNIG,
1984, p. 23, tradução desta autora).
O autor ressalta a relevância do papel das relações públicas, que podem auxiliar os
dois grupos a se comunicar de maneira que um compreenda as posições do outro, entendendo
que as organizações se tornam eficazes quando anseiam e praticam objetivos que têm
relevância tanto para a organização quanto para seus públicos estratégicos. “É bem provável
que uma organização que possua um bom relacionamento com seus públicos estratégicos
tenha que incorporar os objetivos desses públicos nas suas missões. Caso contrário, a
organização corre o risco de ser combatida ou até ignorada por esses blicos”. (GRUNIG,
2003, p. 74).
No modelo de comunicação simétrica, a troca comunicativa flui para e entre os
públicos. A simetria atua como componente que possibilita que o processo de comunicação
ocorra de modo equalizado a partir do momento em que prevalece o equilíbrio na valorização
tanto em relação a questões organizacionais quanto a dos públicos.
Assim, concebida como processo de interlocução entre agentes sociais, a
comunicação organizacional promove e organiza, por meio de trocas simbólicas e práticas, a
interação comunicativa entre a organização e os grupos que a afetam e são afetados por suas
ações. Dessa maneira, ao pensar no processo comunicacional da organização, deve-se
75
considerar o contexto organizacional: sua estrutura, sua cultura e suas políticas, as relações de
poder, o planejamento e a dimensão estratégica do negócio e todos os processos que fazem
parte do campo administrativo. Dentro desse contexto, a comunicação é um dos elementos
que permitem pensar e planejar a interação entre a organização e os grupos com os quais ela
interage, as trocas simbólicas que eles efetuam entre si e que caracterizam a dimensão
comunicacional.
Considerando-se a proposta deste estudo e tomando por base os conceitos dos
autores apresentados, entende-se que comunicação organizacional é o processo por meio do
qual os públicos realizam não apenas a troca de mensagens ou a transmissão de informações
no espaço de trabalho. Eles também se relacionam e interagem ativamente, interpretando
todas as práticas organizacionais.
Neste capítulo, foi concluída a perspectiva teórica sobre comunicação
organizacional adotada nesta pesquisa e, no próximo, abordar-se-á a comunicação e a geração
de práticas culturais dentro do contexto organizacional mediado pelas Tecnologias de
Informação e Comunicação.
76
5. COMUNICAÇÃO DIGITAL E A GERAÇÃO DE NOVAS PRÁTICAS CULTURAIS
As TICs, através do surgimento das mais variadas ferramentas de comunicação,
têm proporcionado aos indivíduos novas possibilidades de participação no processo
comunicativo. Essa participação se através da utilização desses instrumentos de
comunicação digital, que permitem estabelecer outros modos de interação, compartilhar
informações, produzir conhecimento, gerando novas práticas culturais. Neste capítulo, tratar-
se-á sobre a comunicação digital e a geração dessas práticas. Inicialmente, aborda-se a
comunicação digital nas organizações para, logo após, tratar-se sobre a comunicação digital e
a interação mediada presentes no contexto organizacional.
5.1 COMUNICAÇÃO DIGITAL NAS ORGANIZAÇÕES
As alterações que o desenvolvimento das Tecnologias de Informação e
Comunicação vêm gerando nos modelos de gestão organizacional também repercutem na área
de comunicação. É crescente o trabalho para a integração e correta utilização dessas
tecnologias ao projeto de comunicação, com a finalidade de melhorar o relacionamento entre
a organização e seus públicos. Nesse contexto, um dos conceitos que se destaca é o da
comunicação digital.
A comunicação digital é conceituada por Correa como “o uso das Tecnologias
Digitais de Informação e Comunicação (TIC’s), e de todas as ferramentas delas decorrentes,
para facilitar e dinamizar a construção de qualquer processo de Comunicação Integrada nas
organizações (2005, p. 102)”. Assim, pode-se dizer que um dos aspectos mais salientes da
comunicação digital é a possibilidade de interação e de resposta. Essas duas características
tornam possível a realização de uma comunicação simétrica de modo personalizado e
interativo.
Correa ainda destaca que nem todo o processo de comunicação de uma
77
organização é digital ou digitalizável e que nem toda a TIC é adequada à proposta de
comunicação integrada de uma organização. O plano de comunicação digital deve estar
baseado e fundamentado no plano de comunicação estratégica integrada.
A autora explica que o primeiro conjunto a ser considerado na construção da
comunicação digital de uma empresa é a sua cultura e a relação dessa com questões referentes
à inovação, tecnologia, utilização de computadores, Internet, etc. Em segundo lugar, estão os
públicos estratégicos da organização, quem são e qual o vínculo com o ambiente digital. A
terceira etapa diz respeito ao fato de que é necessário combinar a cultura organizacional com
as características dos públicos para se dar início à formatação do conteúdo das mensagens
comunicacionais, nas quais a clareza estratégica da escolha de uma ferramenta tecnológica
pode agregar valor e aprimorar a relação da empresa com seus distintos públicos. E a última
etapa considerada refere-se à elaboração da estratégia de comunicação digital, em que se
define que tipo de ferramenta será utilizado, como e-mail marketing, fóruns, websites,
intranets, portais corporativos, ferramentas de busca, transações, multimídia e mensagens
instantâneas.
Terra (2006) argumenta que, independente da ferramenta de comunicação digital a
ser utilizada em um planejamento de comunicação organizacional, algumas características
comuns podem ser observadas em todas elas: mudança de linguagem, que se torna mais
objetiva e concisa; mudança de foco de grupos massificados e homogeneizados para
audiências segmentadas e/ou agrupadas por interesses afins; maior velocidade; oportunidade
de retorno, resposta e participação; possibilidade de construção coletiva on-line; rápida
capacidade de difusão.
A mesma autora também considera que a Internet, através de suas diversas
ferramentas, apresenta algumas fraquezas que podem ser contornáveis: não substitui outras
mídias nem a comunicação presencial; não é adequada à comunicação com todos os públicos;
pode tornar-se complicada para muitas pessoas; pode ser dispendiosa na implantação; requer
esforços contínuos nos retornos, respostas e constantes atualizações de informações.
Antes da popularização da Internet, a comunicação escrita dentro das
organizações era baseada nos veículos existentes, como murais, boletins, correspondência
empresarial, publicações, mala direta, etc. A partir do desenvolvimento das redes e das
tecnologias digitais, novas práticas comunicacionais passaram a ser adotadas no contexto
organizacional, o que possibilitou o surgimento de novas modalidades de comunicação e
interação.
Alguns autores já m estudando a inserção de vários instrumentos de
78
comunicação eletrônica no contexto organizacional. Segundo Rojasorduña (2005), as ginas
web, a intranet, o correio eletrônico, os dark sites, as salas de imprensa na Internet e os
weblogs estão ganhando cada vez mais visibilidade no espaço de trabalho.
Marcuschi (2005) classifica, analisa e descreve as características de diversos
gêneros textuais que estão emergindo no contexto digital em ambientes virtuais. Os gêneros
abordados pelo autor dizem respeito a interações entre indivíduos reais que estabelecem suas
relações nos ambientes virtuais. O intenso uso da escrita caracterizada por uma linguagem
mais informal, que se aproxima da oralidade, é um aspecto constante neste tipo de
comunicação. Alguns instrumentos, como os chats e as videoconferências, permitem uma
interação síncrona, enquanto que o e-mail, os fóruns de discussão e os weblogs são meios de
comunicação assíncronos.
Nesse panorama, a seleção e implantação das ferramentas eletrônicas, portanto,
atravessam a compreensão de diversos aspectos, dentre eles, as motivações, pressões internas
e externas
26
. Também promovem o desenvolvimento da comunicação e colocam em prática
sua utilização, tornando-se necessário pensar a comunicação e a tecnologia inseridas no
contexto da cultura organizacional.
Por isso, os responsáveis pela comunicação devem estar atentos às inovações
tecnológicas e procurar aproveitá-las apropriadamente, de modo que estejam integradas com
os outros instrumentos de comunicação, encarregando-se da definição de quais desses são
mais adequados para estar de acordo com as necessidades administrativas e as características
do público que a organização pretende atingir. Por conseguinte, é necessário que exista o
domínio das ferramentas tecnológicas para facilitar e dinamizar o processo de comunicação
organizacional, pois a sua utilização requer um repertório cognitivo que determine a
compreensão dos funcionários e deve, portanto,
estar alinhada à cultura organizacional.
Percebe-se, assim, que a utilização das ferramentas de comunicação digital
possibilita o surgimento de novas práticas culturais. A oportunidade de resposta e interação
entre os envolvidos permite que o processo de comunicação ocorra de modo bi ou, até
mesmo, multidirecional. Além disso, a comunicação digital suscita uma alteração no modelo
de comunicação assimétrico e de mão única, na medida em que demanda o envolvimento e a
participação de todos os interagentes que partilham da troca comunicativa.
No intuito de complementar o que foi dito até o momento sobre as ferramentas de
26
Para pressões internas e externas, ver Sandi (2006). Disponível em
http://www.unirevista.unisinos.br/_pdf/UNIrev_Sandi.PDF.
79
comunicação digital, no próximo item, tratar-se-á sobre os distintos modos de conceber a
interação e a comunicação mediada dentro do universo organizacional.
5.2 INTERAÇÃO E COMUNICAÇÃO MEDIADA
Interação significa a existência de uma ação comum entre os participantes e
pressupõe um interesse recíproco. Uma contribuição importante no estudo da interação
mediada foi realizada por Thompson (1998). Esse autor desenvolveu uma estrutura conceitual
para analisar as formas de interação criadas pela mídia através da análise de três tipos de
situação interativa: face a face, mediada e quase-mediada ou quase-interação. Para a
realização desse projeto, pretende-se utilizar essa tipologia, mas apenas as concepções da
interação face a face e da interação mediada, pois a interação quase-mediada é aquela
realizada entre os indivíduos e os meios de comunicação de massa – rádio, televisão e jornal –
e, portanto, não é relevante para os fins deste trabalho.
A interação face a face é aquela que ocorre em um contexto de co-presença, no
qual os indivíduos interagem uns com os outros, compartilhando o mesmo espaço-temporal.
Esse modelo de interação tem um caráter dialógico e implica na troca de informações entre os
interagentes nos dois sentidos. Além disso, emissor e receptor, ao enviar uma mensagem, têm
a possibilidade de utilizar uma variedade de trocas simbólicas, manifestas através de
expressões corporais, entonação da voz, gestos e expressões faciais, o que auxilia na sua
compreensão.
A interação mediada contrasta com interações face a face, pois os participantes
não partilham do mesmo referencial de espaço e tempo. Este tipo de interação também tem
um caráter dialógico, porém, requer o uso de um meio técnico, por exemplo, telefone, papel e
fios elétricos, para a troca de informação entre participantes que se encontram situados em
contextos espaciais e temporais distintos
.
Nesse sentido, a interação mediada diminui as
possibilidades de indicações simbólicas, restringindo a capacidade
de interpretação entre os
interagentes. Embora Thompson não tenha desenvolvido esta estrutura conceitual para
analisar ferramentas que possibilitam a comunicação eletrônica, é possível dizer que a
interação mediada também é estabelecida através de diversos aplicativos tecnológicos, como
e-mails, chats, videoconferência, blogs, listas de discussão e ferramentas de comunicação
instantânea.
80
Com o desenvolvimento da imprensa e dos meios de comunicação, surge a
interação quase-mediada ou quase-interação. Este tipo de interação se refere às relações
sociais estabelecidas entre os indivíduos e os meios de comunicação de massa,
caracterizando-se pela capacidade de disseminação através do tempo e do espaço. A
informação e as trocas simbólicas fluem num sentido único, são produzidas em um contexto e
recebidas por um número indefinido de receptores em outro contexto, o que revela um caráter
monológico e a existência de uma certa assimetria que impede a reciprocidade entre os
interagentes.
Ao analisar a tipologia conceitual criada por Thompson, percebe-se que o autor
pensou nos meios de comunicação enfatizando o seu potencial dialógico, e não somente o
aspecto relacionado à transmissão de informações. Além disso, o autor chama atenção para o
fato de que o desenvolvimento da interação mediada e da quase-interação não ocorreu em
detrimento da interação face a face.
Lemos (1997) faz uma análise da interatividade proporcionada pelos novos media
digitais. Para este autor, o que entendemos por interatividade nos dias de hoje diz respeito a
uma nova forma de interação técnica, de cunho eletrônico-digital, distinta da interação
analógica evidenciada nos media tradicionais. Ao contrário dos meios de comunicação
tradicionais, que se caracterizam pela distribuição da informação a partir de um centro, nos
meios digitais - como na Internet - qualquer indivíduo pode participar da produção e
distribuição da informação de modo personalizado, multidirecional e em tempo real. Assim, a
interatividade digital é entendida como um diálogo estabelecido entre o indivíduo e o
computador, que possibilita ao usuário interagir não mais apenas com o objeto, mas através
do acesso à informação e da modificação do conteúdo.
Primo (2007) desenvolve um estudo que reflete preocupação sobre interação
mediada por computador. Diante da problemática em que grande parte desses estudos origina-
se de um viés tecnicista, observando basicamente o desempenho do hardware e do software, o
autor propõe uma abordagem de orientação sistêmico relacional, dedicada ao estudo do
relacionamento que se estabelece entre os interagentes.
Assim como Bertalanffy (1977), que foi mencionado no capítulo 2, Primo (2007)
também faz uso da Teoria Geral dos Sistemas, encontrando nela uma visão inspiradora para
balizar as discussões sobre a interação mediada por computador. O autor assume a postura
sistêmica no intuito de dar conta do processo interativo em sua totalidade, pois a mesma
observa o mundo em termos relacionais e de integração.
81
Primo chama atenção para o fato de que não se deve avaliar a qualidade da
interação como se essa dependesse exclusivamente do meio, como se a interação fosse uma
característica do canal, independente do que os interagentes fazem com o, e através do meio.
A interação também não deve ser observada como simples transmissão de informação, na
medida em que não se pode igualar o comportamento humano e o funcionamento informático.
Segundo o autor, “[...] interagir não é algo que alguém faz sozinho, em um vácuo. Comunicar
não é sinônimo de transmitir. Aprender não é receber. Em sentido contrário, quer-se insistir
que interação é um processo no qual o sujeito se engaja”. (PRIMO, 2007, p. 71, 72).
Também salienta que o se deve confundir interação interpessoal com interação
presencial. “Uma conversa entre duas pessoas ao telefone ou em um fórum na Internet é uma
interação interpessoal, apesar delas não compartilharem o mesmo espaço físico” (PRIMO,
2007, p. 96). Para tanto, cita Galimberti et al. (2001)
27
que reconhece que “a comunicação
interpessoal não acontece exclusivamente face a face. Em contexto de trabalho, como na via
privada, existem cada vez mais situações de comunicação utilizando artefatos tecnológicos
on-line” (PRIMO, 2007, p. 96). Com relação a esses artefatos, pode-se pensar na utilização do
correio eletrônico, das listas de discussão, dos fóruns, dos softwares de comunicação
instantânea, entre outros.
O autor critica a miopia do enfoque mecanicista da Teoria da Informação que
reduz a comunicação à transmissão de informações e a perspectiva comportamentalista do
Behaviorismo, que ‘isola a mente do indivíduo em uma bolha de vácuo’. Contudo, os
processos cognitivos do indivíduo não são simplesmente ignorados, visto que, ao apontar para
a recursividade interacional, o autor reconhece que é necessário compreender que ela ocorre
nas estruturas mentais de cada participante da interação interpessoal. Assim, busca ampliar a
sua visão e evita dar destaque ao descontextualizado comportamento individual para enfatizar
as inter-relações que emergem durante o processo interativo, valorizando a totalidade
sistêmica.
Antes de estudar o relacionamento que se estabelece entre os interagentes a partir
do enfoque relacional, Primo expõe as bases da abordagem sistêmico-relacional que norteiam
a discussão sobre interação mediada por computador. Apóia a sua argumentação em autores
que se fundamentam na premissa de que a comunicação afeta o comportamento, sendo o seu
efeito pragmático, em articulação com autores que defendem uma abordagem da cognição,
provinda da Biologia do Conhecimento.
27
GALIMBERTI, Carlo et al. Communication and cooperation in Networked enviroments: an experimental
analisys. CyberPsychology & Behavior, v. 4, nº 1, p. 131-146, 2001.
82
Ao explicar que a pragmática da comunicação também ficou conhecida como
enfoque interacional e que valoriza a interação entre si, encontra em teóricos como Gergen,
Bateson, Watlawick et al (1967)
28
, Fisher e Rogers subsídios essenciais para o estudo da
interação a partir de relações estabelecidas ‘entre’ os participantes.
De acordo com esse enfoque, o relacionamento está na conexão estabelecida entre
os parceiros e não isolado dentro de um ou outro participante. Envolve os laços, os vínculos
que conectam as pessoas e que são criados através da interação, de modo que a comunicação
não pode ser vista somente como um conjunto de contribuições individuais e deve valorizar
os processos que integram a ação dos comunicadores. Além disso, uma pessoa não se
comunica sozinha, pois ela deve engajar-se em um processo de
comunicação. Assim, modelos
de comunicação que se baseiam na ação e reação ou estímulo e resposta, não fazem sentido
para uma abordagem
pragmática.
A comunicação relacional é uma abordagem baseada em interação para o
estudo de relações interpessoais. Fundada em uma perspectiva sistêmica,
cibernética, esta abordagem atenção primária aos padrões produzidos
conjuntamente de inter-relação de um como outro. (ROGERS, apud
PRIMO, 2007, p. 84).
Para tratar sobre a produção de conhecimento, Primo faz uso de autores
29
que
defendem a abordagem cognitiva, provinda da Biologia do Conhecimento, e entendem “que o
conhecimento, como relação (ou produto dela), emerge na medida em que o sujeito age
sobre o objeto e sofre ação deste” (PRIMO, 2007, p. 87). O conhecimento não parte do sujeito
e nem do objeto, mas é construído interativamente na relação estabelecida entre ambos, que se
modifica ininterruptamente ao passo que um sofre a ação do outro.
[...] se a interação entre o sujeito e o objeto os modifica, é a fortiori evidente
que cada interação entre sujeitos individuais modificará os sujeitos uns em
relação aos outros. Cada relação social constitui, por conseguinte, uma
totalidade nela mesma, produtiva de características novas e transformando o
indivíduo em sua estrutura mental. (PIAGET, apud PRIMO, 1973).
“Durante um encontro interpessoal, cada interagente ao assimilar as ões do
outro as confronta com os esquemas de ação, adaptados às interações anteriores para lhes dar
sentido” (PRIMO, 2007, p. 93). Ao considerarem-se os interagentes como sistemas vivos,
28
Os teóricos Watzlawick, Beavin e Jackson
28
são colaboradores no Instituto de Pesquisa Mental de Palo Alto,
na Califórnia. Em 1967, lançaram a Pragmática da Comunicação Humana, considerado um dos mais importantes
livros na área de comunicação interpessoal e terapia familiar.
83
pode-se dizer que eles dependem da compatibilidade com o meio no qual estão inseridos,
envolvendo-se reciprocamente na criação de si mesmos. Percebe-se, assim, a presença da
postura sistêmica, que valoriza a totalidade de todos os aspectos que envolvem a interação
humana.
Para a construção da abordagem sistêmico-relacional da interação, Primo também
trabalha a dimensão política do diálogo. Para tanto, baliza-se no trabalho de Freire sobre ética
do diálogo. Primo explica que Freire concebe o diálogo como um processo de ação e reflexão,
como o encontro em
que se solidariza o refletir e agir dos sujeitos, de modo que não se pode
reduzir o diálogo ao ato de depositar idéias de um sujeito no outro, mas, sim, à conquista do
mundo pelos sujeitos dialógicos.
Como se pode perceber, a argumentação de Primo sobre a elaboração da
abordagem sistêmico-relacional entende que a interação deve ser estudada a partir da relação
estabelecida entre os interagentes, pois essa relação revela a complexidade da construção
negociada dos relacionamentos interindividuais. Sob essa ótica, o autor caracteriza dois tipos
de processos interativos mediados pelo computador: interação reativa e interação mútua.
A interação reativa é caracterizada como um sistema fechado que apresenta
relações lineares e unilaterais, nas quais o reagente tem pouca ou nenhuma condição de alterar
o agente. A relação é baseada no estímulo/resposta ou ação/reação, fazendo com que o
diálogo seja reduzido a um certo automatismo, pois o reagente, independente do contexto em
que esteja inserido, pode apenas reagir a possibilidades pré-programadas, por exemplo, na
relação estabelecida entre o homem e o computador.
A interação mútua, em contraste com a reativa, caracteriza-se como um sistema
aberto, formado com elementos interdependentes. Este tipo de interação tem um fluxo
dinâmico e se vale da construção de uma relação na qual a comunicação se de forma
negociada, voltada para a sua evolução e desenvolvimento, sendo constantemente construída
pelos interagentes. Nesse sentido, a interação não ocorre de forma mecânica e preestabelecida,
pois leva em conta o contexto e uma variedade de aspectos
comportamentais que influenciam
o sistema. O autor explica que, ao falar em interação mútua, não está querendo oferecer um
pleonasmo, mas que o termo foi escolhido para caracterizar as modificações recíprocas dos
interagentes. Durante o processo interativo, cada comportamento é estabelecido em face de
ações anteriores. A construção desse relacionamento não pode ser prevista, visto que cada
ação produz um tríplice impacto: ao interagente, ao outro e ao relacionamento.
29
Primo faz uso das idéias de autores como Piaget, Franco, Maturana e Varela, Axt e Schuch.
84
Primo lembra ainda que, em muitos relacionamentos, a comunicação não ocorre
somente através de um canal, ressaltando que a interação mútua e a reativa podem se dar
simultaneamente. Nesse caso, dentro do ambiente organizacional, por exemplo, um indivíduo
pode estar falando com uma pessoa que se encontra no mesmo espaço físico e, ao mesmo
tempo, conversar com outra através de um chat. Esse indivíduo também estará reagindo com
a interface do software, com o mouse e com o teclado. Desta forma, interações mútuas e
reativas podem se estabelecer concomitantemente, definidas pelo autor como multi-interação.
Nesse sentido, estudar a relação humana é reconhecer os interagentes como seres
vivos pensantes e criativos de uma relação que tem como característica transformadora a
recursividade. Essa característica é visível na medida em que o conhecimento do indivíduo
depende do seu contínuo aprendizado com relação ao meio e esse processo está diretamente
ligado com a linguagem, com as crenças e com a cultura na qual está inserido (PRIMO,
2007).
Desta forma, entende-se que a interação mediada é uma realidade presente no
cotidiano dos indivíduos. O desenvolvimento tecnológico permitiu
que a interatividade
ocorresse através de novos meios, como através da Internet e de suas diversas ferramentas,
por meio dos quais os participantes podem interagir ativamente,
participando em conjunto da
construção do conteúdo. Esses novos formatos de interação mediada estão presentes no
contexto organizacional, que, gradualmente, vem incorporando novas ferramentas de
comunicação digital. Essas ferramentas proporcionam a realização de outras práticas culturais
e possibilitam a realização de novas formas de relacionamento e interação dentro dos espaços
de trabalho. Cabe lembrar que, nas organizações, a interação face a face não entra em desuso
em função da interação mediada, porém ela apenas deixa de ser exclusiva.
Para dar conta dessa análise, é necessário deixar de lado o olhar tradicional que
percebe o emissor e o receptor isoladamente. Deve-se buscar enxergar através de uma lente
sistêmica que considera a relação estabelecida entre os participantes em sua totalidade, assim
como a cultura e o contexto em que estão inseridos.
Para dar continuidade ao referencial teórico desenvolvido até o momento, no
próximo capítulo, apresentam-se os procedimentos metodológicos adotados e a trajetória
trilhada durante a realização desta pesquisa.
85
6. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
O desejo de compreender aspectos do mundo real é o que motiva todo
pesquisador. Com base nessa motivação, neste capítulo, apresenta-se a trajetória metodológica
percorrida para a realização desta dissertação. A técnica utilizada foi o estudo de caso. O
estudo foi desenvolvido por meio da pesquisa bibliográfica, entrevistas em profundidade,
observação participante e análise de conteúdo.
6.1 TRAJETÓRIA METODOLÓGICA
A opção feita com relação à pesquisa tem por base uma abordagem qualitativa.
Segue-se a concepção de Bauer e Aarts (2002), que propõem a construção de um corpus
como um princípio alternativo de coleta de dados. Acredita-se que essa concepção se aplica
adequadamente para a escolha dos métodos e técnicas selecionados para o desenvolvimento
desta pesquisa.
Bauer e Aarts entendem que a construção de um corpus e a amostragem
representativa são funcionalmente equivalentes, embora sejam estruturalmente diferentes. O
primeiro significa escolha sistemática de algum racional alternativo. Atesta a eficiência na
seleção de determinado material para caracterizar o todo, compreendido como uma coleção de
textos demarcados ou qualquer material com funções simbólicas. O segundo significa
estatística aleatória. Figura a população e confere eficiência na pesquisa, proporcionando
sustentação para o estudo sem que informações sejam perdidas. Esta população pode ser de
objetos, animais, seres humanos, acontecimentos, ações, situações, grupos e organizações.
Corpus é um sistema que cresce, sugerindo um procedimento que deve seguir as
seguintes etapas: selecionar preliminarmente uma variedade, analisá-la e ampliar o corpus de
86
dados até que ele não se repita mais. Em primeiro lugar, os assuntos teoricamente relevantes
devem ser coletados seguindo apenas um ponto de vista, pois o material tem um foco
temático. Depois, esse material deve manter uma homogeneidade, de modo que textos não
devem ser misturados com imagens. E, em terceiro lugar, os materiais estudados devem
obedecer a uma sincronicidade, sendo, portanto, escolhidos dentro de um intervalo de tempo
histórico (BAUER e ARTS, 2002).
Partindo desses pressupostos, a seleção das pessoas a serem entrevistadas será de
acordo com as funções que essas desempenham dentro da organização em análise. O tamanho
do corpus não foi estabelecido previamente, pois a pesquisa foi realizada com a finalidade de
atingir o ponto de saturação. A saturação diz respeito ao critério de finalização. Quando esse
critério é alcançado, o pesquisador assume que a variedade representacional foi atingida no
tempo e no espaço social.
Este trabalho é realizado através de um estudo de caso. A opção escolhida visa
uma análise qualitativa que será expressa no tratamento dado ao objeto de estudo, na qual se
busca uma compreensão do fenômeno que seja mais aprofundada e menos extensiva.
Embora este método seja visto com desconfiança por alguns autores que o julgam
como uma forma menos desejável de investigação do que levantamentos que representam
uma amostragem com resultados estatísticos, entende-se que “o estudo de caso é uma
inquirição empírica que investiga um fenômeno contemporâneo dentro de um contexto da
vida real quando a fronteira entre o fenômeno e o contexto não é claramente evidente e onde
múltiplas fontes de evidência são utilizadas” (YIN, 2001, p. 32).
Segundo Yin (2001), este é o método mais indicado quando se tem o objetivo de
responder a questões do tipo ‘como’ e ‘por que’, pois elas envolvem “ligações operacionais
que necessitam serem traçadas ao longo do tempo, em vez de serem encaradas com meras
repetições ou incidências” (YIN, 2001, p. 25). Duarte ressalta que estudo de caso é:
[...] o método que contribui para a compreensão dos fenômenos sociais
complexos, sejam individuais, organizacionais, sociais, ou políticos. É o
estudo das peculiaridades, das diferenças daquilo que o torna único e por
essa mesma razão o distingue ou aproxima dos demais fenômenos.
(2005, p.
234)
87
Nisbet e Watt (1978)
30
, citados por Duarte, indicam três fases para o
desenvolvimento do estudo de caso: a primeira fase é a aberta ou exploratória e ocorre quando
se devem detalhar as questões ou pontos críticos, estabelecer os contatos preliminares para
iniciar o trabalho de campo, localizar informantes e as fontes de dados para o estudo; a
segunda é a da coleta sistemática de dados, com base nas características próprias do objeto
estudado; e a terceira é a análise e interpretação sistemática dos dados e elaboração do
relatório.
Esta pesquisa é um projeto de caso único holístico
31
(Yin, 2001), pois apresenta
apenas uma unidade de análise e pretende investigar o contexto global de uma organização.
Duarte (2005) lembra que o projeto de estudo de caso é um instrumento suscetível a
alterações e revisões durante o processo inicial do estudo. Isso pode acontecer quando o
pesquisador, após realizar um estudo-piloto, averigua que o projeto inicial continha algumas
lacunas. Yin (2001) esclarece que esta flexibilidade está presente, por exemplo, na seleção
dos casos que pretendiam ser analisados, mas não na alteração dos objetivos do estudo para se
adequar aos casos que foram encontrados.
Ao retratar a realidade de forma completa e profunda, o pesquisado destaca a
multiplicidade de dimensões presentes em uma determinada situação,
enfatizando a sua complexidade natural e revelando as possíveis inter-
relações de seus componentes. Nos estudos de caso, os detalhes, de um
objeto o tornam único, pois suas imperfeições, na verdade, traduzem sua
história. Cada fenômeno analisado é, portanto, fruto de uma história que o
torna exclusivo. O que poderia significar uma imperfeição no estudo de caso
é o que leva à diferenciação. (DUARTE, 2005, p. 233).
O tema dessa pesquisa será analisado a partir da reunião das seguintes cnicas:
pesquisa bibliográfica, entrevistas em profundidade, observação participante e análise de
conteúdo.
30
NISBET, J; WATT, J. Case study. Readguide 26: guides in educational research. University of Nottingham
School of Education, 1978.
31
Com relação aos tipos de projetos para estudo de caso, Yin (2001, p. 61) apresenta quatro tipos: projeto de
caso único holístico, com uma unidade única de análise; projeto de caso único incorporado, com unidades
múltiplas de análise; projeto de caso múltiplo holístico, com unidade única de análise; projeto de caso múltiplo
incorporado, com unidades múltiplas de análise
.
88
6.2 DESCRIÇÃO DOS PROCEDIMENTOS
O planejamento geral desse trabalho parte da pesquisa bibliográfica. A revisão
bibliográfica
32
acompanha o trabalho acadêmico desde a sua concepção até a sua conclusão.
A partir do levantamento bibliográfico pertinente ao tema, tem-se como objetivo formar um
quadro referencial e teórico com uma gama de conceitos que servem para orientar os estudos
e balizar a realização da pesquisa. Além disso, esses conceitos serviram para auxiliar na
escolha dos instrumentos e procedimentos mais indicados para alcançar a solução do
problema de pesquisa. De acordo com Stumpf (2005, p. 51), a pesquisa bibliográfica é:
[...] um conjunto de procedimentos que visa identificar informações
bibliográficas, selecionar os documentos pertinentes ao tema estudado e
proceder à respectiva anotação ou fichamento das referências e dos dados
dos documentos para que sejam posteriormente utilizados na redação de um
trabalho acadêmico.
Conforme foi comentado anteriormente, uma aproximação inicial de caráter
exploratório foi realizada junto à Procergs, visando conhecer um pouco mais a realidade desta
organização e o seu grau de interação com a inserção dos artefatos tecnológicos no cotidiano
dos funcionários. Nesse contato preliminar, detectou-se que a organização utiliza diversas
ferramentas de comunicação digital para o desenvolvimento das atividades diárias. Algumas
dessas ferramentas são de uso de toda a organização, outras são desenvolvidas por áreas
específicas e utilizadas conforme necessidades próprias.
A realização da etapa que se refere à base empírica deste estudo, trabalhada a
partir da realização de entrevistas em profundidade, foi dividida em duas partes. Na primeira
parte, realizou-se um contato preliminar com a participação de 15 funcionários no período
entre 03/09/2007 a 17/09/2007. A seleção desses contou com o auxílio do responsável pelo
Departamento de Tecnologia e Infra-Estrutura DTI- e da Assessoria de Comunicação, pois
se visava conversar com pessoas de diversos setores que desempenhassem funções distintas e
que estivessem bastante tempo trabalhando na organização. Algumas entrevistas foram
realizadas em duplas e outras individualmente, agendadas de acordo com a disponibilidade de
32
Esta etapa foi realizada através de um levantamento nas bibliotecas das principais universidades locais
(UFRGS, PUC e Unisinos) e por meio de consulta em outras universidades pela Internet e em sites dos principais
órgãos brasileiros de desenvolvimento científico (CAPES e CNPq). Este levantamento possibilitou verificar os
89
cada participante. Nessa fase, buscou-se verificar qual é a percepção e o relacionamento dos
entrevistados com relação à inserção das Tecnologias de Informação e Comunicação nas
rotinas diárias, assim como averiguar quais as ferramentas digitais e quais ferramentas não
digitais são utilizadas na comunicação da empresa.
De acordo com a percepção dos entrevistados, a empresa possui as seguintes
ferramentas de comunicação não digital: quadro mural, caixa de sugestões, eventos, reuniões,
telefone, contato pessoal, manuais, atas, formulários, agendas, jornal da empresa, jornal da
associação. Atualmente, as mais utilizadas são: os eventos, as reuniões, o telefone, o contato
pessoal.
Quanto às ferramentas de comunicação digital, averiguou-se que, devido à
empresa ter como eixo de negócio o desenvolvimento de softwares, a variedade de
instrumentos é muito grande. Essa diversidade de ferramentas, em algumas vezes, faz com
que haja mais de um instrumento de trabalho para realizar a mesma tarefa ou que possibilite o
acesso aos mesmos processos e procedimentos. Além disso, alguns entrevistados também
demonstraram não ter muita clareza sobre a diferença entre o que é uma ferramenta ou
software de trabalho e o que é uma ferramenta de comunicação.
A realização dessa etapa foi fundamental para o desenvolvimento e o bom
andamento da pesquisa, pois permitiu constatar a necessidade de se fazer uma adequação com
relação aos instrumentos que se pretendia investigar inicialmente
33
, conforme se justifica a
seguir.
O Correio Eletrônico e a Intranet são as ferramentas de comunicação digital mais
utilizadas dentro da organização. Ambos são instrumentos oficiais da comunicação, e o
primeiro é o mais utilizado no processo comunicativo.
As Listas de Discussão fazem parte de uma prática denominada ‘Gestão do
Conhecimento’
34
, que foi inserida na organização em 2001. O objetivo das listas é gerar
conhecimento e troca de informação entre os funcionários sobre temas específicos de
trabalho. São instrumentos extra-oficiais, pois a prática não é adotada por toda a empresa,
autores mais pertinentes, recuperar textos de trabalhos teóricos, teses e dissertações, assim como de outros
estudos relacionados ao tema proposto.
33
Inicialmente, tinha-se a intenção de trabalhar com seis ferramentas de comunicação digital: correio eletrônico,
intranet, listas de discussão, fale com o presidente, fale conosco, PSI. Entretanto, quando se deu início à etapa
que se refere à base empírica deste estudo, trabalhada a partir da realização de entrevistas em profundidade, foi
necessário fazer uma adequação com relação aos instrumentos de comunicação que seriam avaliados na
pesquisa.
34
O conceito de ‘Gestão do Conhecimento’ não será discutido neste trabalho; ele é apenas uma denominação
usada pela organização em que foi realizada a pesquisa.
90
abrange mais os integrantes da área de desenvolvimento e operações, e a sua iniciativa faz
parte de um grupo de funcionários do setor de desenvolvimento.
O Fale com o Presidente é um instrumento que surgiu por iniciativa do presidente
da organização, que visava estabelecer um canal aberto em que pudesse manter contato mais
próximo com os funcionários. Para o seu lançamento, foi feito um intenso trabalho de
comunicação com o objetivo de ganhar a aceitação e a credibilidade do público interno em
relação ao fato de que só o presidente teria acesso e responderia as mensagens postadas. O
presidente que teve essa iniciativa, no entanto, saiu da organização, e, atualmente, o canal
encontra-se desativado. De acordo com o relato dos participantes, percebeu-se que o fale com
o presidente gerou bastante expectativa e tem grande potencial a ser desenvolvido, pois alguns
entrevistados, inclusive, chegaram a enviar mensagens e obtiveram resposta do presidente.
O Fale Conosco é um endereço de correio eletrônico específico que mantém a
comunicação com a assessoria de comunicação. Os entrevistados demonstraram conhecer a
sua existência, porém revelaram que, para se comunicarem com a assessoria, utilizam outros
meios, como o contato pessoal, o telefone e o correio eletrônico corporativo. Cada funcionário
possui um endereço de correio eletrônico corporativo. Para entrar em contato com a
Assessoria de Comunicação, os funcionários da Procergs costumam utilizar mais o endereço
eletrônico corporativo da Relações Públicas, do Jornalista e do Designer do que o canal Fale
Conosco.
O PSI é um instrumento extra-oficial utilizado pelos funcionários que fazem parte
das áreas de desenvolvimento e operações. O seu uso não é incentivado pela organização e a
adoção ou não da ferramenta depende da iniciativa individual. Alguns entrevistados relataram
que não o conheciam; outros disseram que não o utilizam, pois não o consideram um
instrumento de comunicação conveniente para utilizar no trabalho, visto que causa muitas
interrupções e dispersões; e outros, ainda, disseram que o utilizam e entendem que ele seja
uma boa ferramenta de comunicação.
Considerando-se que o Fale com o Presidente encontra-se desativado, o Fale
Conosco não é um canal utilizado e o PSI possui restrições quanto a sua utilização pelos
próprios funcionários, para dar continuidade ao trabalho, optou-se em permanecer com o
Correio Eletrônico e a Intranet, que são os dois instrumentos oficiais de comunicação, e as
Listas de Discussão que, embora não sejam um instrumento oficial, fazem parte de uma
prática recente e que tem grande potencial a ser desenvolvido.
Na segunda parte da pesquisa, deu-se início às entrevistas em profundidade.
Segundo Duarte (2005), esta é uma técnica dinâmica, flexível, que tem como objetivo
91
apreender uma realidade e explorar um assunto a partir da busca de informações, percepções e
vivências dos informantes para que se possa, posteriormente, analisá-las e apresentá-las de
modo estruturado. Nesse sentido, este tipo de entrevista “[...] procura intensidade nas
respostas, não quantificação ou representação estatística [...] não permite testar hipóteses, dar
tratamento estatístico às informações, definir a amplitude ou quantidade de um fenômeno”
(DUARTE, 2005, p. 62, 63).
Para a realização desta pesquisa, são utilizadas as entrevistas caracterizadas como
semi-abertas. Este modelo de entrevista segue um roteiro de questões semi-estruturadas que
abrangem o interesse da pesquisa. De acordo com o autor, o roteiro exige entre quatro e sete
questões amplas o suficiente para que possam ser discutidas em profundidade, de modo que
não ocorra interferência ou redundância entre elas. Assim, o pesquisador faz a primeira
pergunta e busca explorar ao máximo cada resposta até esgotar a questão. Cada questão é
aprofundada a partir da resposta do entrevistado, de modo que perguntas gerais vão dando
origem a específicas. O roteiro utilizado por esta pesquisadora contemplava as quatro
questões centrais citadas abaixo. Essas questões foram aprofundadas durante o contato com
cada participante.
1. Como se deu o processo de implantação das ferramentas de comunicação digital na
Procergs?
2. Que transformações foram provocadas no desenvolvimento nas práticas culturais
com a incorporação das ferramentas de comunicação digital?
3. De acordo com a sua percepção, explique como ocorre o processo de comunicação a
partir da inserção das ferramentas de comunicação digital na rotina organizacional.
4. Você acha que a utilização das ferramentas de comunicação digital no ambiente de
trabalho potencializa a participação dos funcionários no processo de comunicação da
organização?
Em grande medida, a entrevista é conduzida pelo entrevistado, mas adequada ao
roteiro do pesquisador. É comum, nesse caso, o pesquisador começar com um roteiro e
terminar com outro, visto que a lista de questões-chave pode ser alterada no decorrer das
entrevistas. A principal vantagem desse modelo é a de possibilitar a criação de uma estrutura
de comparação de respostas e articulação de resultados que auxilia na sistematização das
informações fornecidas pelos entrevistados.
92
Em relação à seleção dos informantes, Duarte afirma que:
A seleção dos entrevistados em estudos qualitativos tende a ser não
probabilística, ou seja, sua definição depende do julgamento do pesquisador
e não de sorteio do universo, que garante igual chance a todos. [...] Existem
dois tipo básicos de amostras o probabilísticas par ao uso em entrevistas
qualitativas: por conveniência ou intencional.
(2005, p.69)
Nesta pesquisa, a seleção dos informantes é não probabilística com amostra
intencional. No intuito de buscar maior representatividade sobre o assunto, as fontes foram
selecionadas de acordo com o juízo particular do pesquisador, pois a relevância deste tipo de
entrevista refere-se à contribuição que os entrevistados podem dar para atingir os objetivos da
pesquisa. Através da utilização desta técnica, recolhem-se respostas dos informantes,
buscando contemplar e explorar o tema de pesquisa com detalhamento e profundidade para se
compreender como a estrutura do problema de pesquisa é percebida a partir de suas
experiências e seus pontos de vista.
Os dados foram coletados através da gravação das entrevistas e anotações
realizadas entre 01/10/2007 a 09/11/2007. O uso do gravador evitou a perda de informações,
auxiliou a minimizar distorções, facilitar a condução da entrevista e permitiu que fossem
feitas anotações sobre aspectos não verbalizados.
Durante a realização das entrevistas, a pesquisadora inseriu-se no ambiente de
trabalho dos entrevistados, ao passo que realizou a observação participante. Essa “consiste na
inserção do pesquisador no ‘ambiente natural’ de ocorrência do fenômeno e de sua ‘interação’
com a situação investigada” (PERUZZO, 2005, p. 124). Neste tipo de técnica, o pesquisador
se insere no grupo pesquisado e faz um acompanhamento de todas as suas rotinas. Peruzzo
ressalta que, quanto ao papel do pesquisador, é relevante observar os seguintes aspectos:
a) o pesquisador se insere no grupo pesquisado, participando de todas as suas
atividades, ou seja, ele acompanha e vive (com maior ou menor intensidade)
a situação concreta que abriga o objeto de sua investigação. Porém, o
investigador não “se confunde”, ou não se deixa passar por membro do
grupo. Seu papel é o de observador. [...].
b) O pesquisador é autônomo. O ‘grupo’, ou qualquer elemento do ambiente,
não interfere na pesquisa, no que se refere à formulação dos objetivos e às
demais fases do projeto, nem no tipo de informações registradas e nas
interpretações dadas ao que foi observado.
c) O observador pode ser ‘encoberto’ ou ‘revelado’, ou seja, o grupo pode ter
ou não conhecimento de que está sendo investigado.
(2005, p. 133)
93
A autora ainda salienta que a pesquisa qualitativa tem grande relevância para
estudos nos quais as evidências de natureza qualitativa trazem um tipo de conhecimento em
que o dado quantitativo, ou a informação estatística, não consegue captar de modo pleno.
As entrevistas foram agendadas individualmente, realizadas no próprio local de
trabalho dos entrevistados de acordo com a disponibilidade de horários desses. Após a sua
realização, elas foram transcritas. O material transcrito foi analisado através da análise de
conteúdo. Bardin define a análise de conteúdo como
um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por
procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das
mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de
conhecimentos relativos às condições de produção / recepção (variáveis
inferidas) destas mensagens (1977, p.42).
Fonseca Jr. (2005) afirma que a análise de conteúdo organiza-se em três fases:
pré-análise, exploração do material, tratamento dos resultados obtidos e interpretação. A
primeira refere-se ao planejamento do trabalho e a sistematização das idéias iniciais; a
segunda, diz respeito à análise propriamente dita que permitiu a codificação do material
coletado; na terceira fase, os resultados brutos foram categorizados de forma a tornarem-se
válidos e significativos. A partir desses resultados, a pesquisadora pode então, propor
inferências.
A inferência é o procedimento interposto que permite a passagem da descrição do
texto à interpretação (BARDIN, 1977). Ela possibilitou que o material coletado na fase das
entrevistas fosse analisado e interpretado até que se pudesse avaliar a presença de
determinadas características no conteúdo para se chegar à formação de categorias.
Embora esta pesquisa contemple a interpretação qualitativa, ressalta-se que na
análise do material coletado, faz-se uso de alguns dados quantitativos no intuito de
complementar o trabalho.
Nesta dissertação, utiliza-se a transcrição de trechos das entrevistas com o
propósito de reforçar e dar suporte à investigação. Essa etapa contemplou 11 entrevistados,
sendo que oito fazem parte da área técnica desenvolvimento e operações e três da área
administrativa. Essa divisão não visa alcançar dados estatísticos, mas busca obedecer ao modo
como é composto o corpo funcional da Procergs. A seguir apresentam-se os sujeitos
participantes da pesquisa:
94
Sujeito A
Coordenador - Setor: Projetos Especiais
Entrevista concedida na sede da matriz, em 01/10/2007.
Sujeito B
Gerente - Setor: Atendimento ao Cliente
Entrevista concedida na sede da matriz, em 02/10/2007.
Sujeito C
Analista de sistemas - Setor: Equipe de Infra-Estrutura
Entrevista concedida na divisão situada no prédio do IPÊ, em 05/10/2007.
Sujeito D
Gerente - Setor: Comercial
Entrevista concedida na sede da matriz, em 09/10/2007.
Sujeito E
Coordenador - Setor: Desenvolvimento de Projetos – Procuradoria
Entrevista concedida na sede da matriz, em 10/10/2007.
Sujeito F
Consultora organizacional – Setor: Desenvolvimento de Tecnologia e Sistemas
Entrevista concedida na sede da matriz, em 15/10/2007.
Sujeito G
Gestão de pessoas - Setor: Recursos Humanos
Entrevista concedida na sede da matriz, em 11/10/2007.
Sujeito H
Gestão de projetos - Setor: Controladoria
Entrevista concedida na sede da matriz, em 22/10/2007.
95
Sujeito I
Bibliotecária – Setor: Biblioteca
Entrevista concedida no CTR, em 25/10/2007.
Sujeito J
Analista de sistemas - Setor: Divisão de Tecnologia de Infra-estrutura
Entrevista concedida na sede da matriz, em 24/10/2007.
Sujeito L
Gerente - Setor: Tecnologia Operacional
Entrevista concedida na sede da matriz, em 09/11/2007.
Alguns dos entrevistados desta etapa haviam participado da primeira fase das
entrevistas; outros foram escolhidos para participar apenas da segunda, à proporção que se
julgou que esses poderiam melhor contribuir com a pesquisa. Além disso, julgou-se
interessante entrevistar a Relações Públicas, o Jornalista e o Designer da Assessoria de
Comunicação com o propósito de conhecer como funciona a dinâmica desse setor dentro da
organização.
Nesta etapa do texto foi feita a exposição e elucidação dos procedimentos
metodológicos. Seguimos agora com a análise dos dados coletados.
96
7. ANÁLISE DOS DADOS
Este capítulo contempla a análise da coleta de dados e será explanada a parte
empírica desta dissertação. Ele é escrito com base nas entrevistas em profundidade e na
observação participante realizadas entre 01/10/2007 a 09/11/2007. No intuito de responder a
questão de pesquisa e atender aos objetivos propostos inicialmente, foram utilizadas
informações verbais coletadas durante o contato com os participantes deste trabalho.
7.1 PROCERGS E A CULTURA ORGANIZACIONAL
O início da era eletrônica na administração pública do Rio Grande do Sul tem
origem no Centro de Processamento de Dados (CPED), fundado no dia 14 de fevereiro de
1966, com subordinação direta ao governador do estado. O objetivo do CPED era executar,
com exclusividade, processos eletromecânicos e eletrônicos e todos os serviços de
informações necessários aos órgãos da administração centralizada e descentralizada do Rio
Grande do Sul.
Inicialmente, esse órgão contou com três computadores UNIVAC
35
, que podiam
trabalhar individualmente ou interligados. O sistema continha três processadores, três
impressoras, oito unidades de fitas magnéticas, além do equipamento periférico
compreendendo 20 máquinas perfuradoras de cartões e sete unidades para processamento
intermediário de dados. Nessa época, o órgão totalizava, entre as atividades de analistas,
operadores, programadores e perfuradores, 36 técnicos, além do pessoal administrativo e
ficava instalado no décimo segundo andar do Edifício Sede do Banco do Estado do Rio
Grande do Sul.
35
UNIVAC é o nome do modelo do computador.
97
A decisão de criação da Procergs partiu da Junta de Reforma Administrativa -
Resoluções 1/71 e 2/17 de 23/09/71 e 13/10/71, respectivamente. A Lei 6.318, de 30 de
novembro de 1971, autorizou ao Poder Executivo a constituição de uma sociedade anônima
de economia mista, sob a denominação de Companhia de Processamento de Dados do Rio
Grande do Sul (Procergs), tendo como sede a cidade de Porto Alegre. A finalidade da
companhia era a execução de serviços de processamento de dados, tratamento de informação
e assessoramento técnico para os órgãos da administração pública e entidades privadas. O
artigo 1 dessa lei considerou automaticamente extinto o Centro de Processamento
Eletrônico de Dados CPED após o arquivamento dos atos constitutivos da Procergs na
Junta Comercial.
Assim, em 28 de dezembro de 1972, a Procergs foi constituída, centralizando o
uso da informática no Estado do Rio Grande do Sul. As suas operações iniciaram
efetivamente em de janeiro de 1973 e, no começo de suas atividades, possuía
aproximadamente dez clientes, dentre esses, a Caixa Econômica Estadual, a Brigada Militar, a
Polícia Civil, o Instituto de Previdência do Estado, a Secretaria da Fazenda, a Fundação de
Economia e Estatística e o Departamento Autônomo de Estradas e Rodagens, realizando
basicamente serviços de “área meio
36
”.
Na década de 70, o uso da informática ainda era incipiente na administração
pública estadual, e não havia concorrência. A partir de 1976, foi dado início à construção da
sede
37
própria da Procergs, adaptada ao uso da informática, e à criação de unidades regionais,
que centralizaram a entrada de dados e a emissão de relatórios, visando melhor atender às
necessidades da Caixa Econômica Estadual do Rio Grande do Sul. Nessa época, foi
desenvolvida uma infra-estrutura com equipamentos, instalações e pessoal que pudesse
atender à demanda de operações 24h por dia durante os sete dias da semana. Também foi
criado o plano de carreira flexível para a função de Técnico em Computação, o que permitiu a
evolução do funcionário, desde Programador até Analista de Sistemas, sem a necessidade de
novo concurso público.
Entre 1986 e 1990, a Procergs configurava-se como o único centro de
processamento de dados, absorvendo todos os serviços de informática da administração
pública estadual. A partir de 1990, o foco voltou-se para áreas estratégicas que visavam o
desenvolvimento e a absorção de novas tecnologias. Nesse sentido, houve investimentos em
computação gráfica, multimídia e novas formas de comunicação, como a que é estabelecida
36
Serviços de área meio são aqueles destinados à administração interna e não à prestação de serviço ao cliente.
37
A construção da sede ocorreu na Praça dos Açorianos, s/nº, onde permanece até hoje.
98
via correio eletrônico. Em 1994, a Internet passou a ser a rede padrão, e a interface web
passou a ser utilizada para aplicações, possibilitando o desenvolvimento de diversos produtos,
dentre eles o Via-RS
38
, provedor de acesso à Internet do Estado.
Desde a sua criação, a Procergs vem apresentando um crescimento constante, e a
evolução tecnológica é uma característica presente no desenvolvimento da empresa.
Atualmente, possui a seguinte estrutura: a sede localizada na Praça dos Açorianos, s/nº; a
biblioteca principal localizada no Centro de Treinamento situado na Rua Mario Totta, nº 64, o
arquivo localizado na Rua D. Margarida, nº 64, a Divisão Financeira e Tributária – DFT - que
atende à Secretaria da Fazenda localizada na Av. Borges de Medeiros, nº 1945, no 9º andar do
prédio do Ipê e seis unidades de atendimento regional localizadas respectivamente em
Alegrete, Caxias, Passo Fundo, Pelotas, Santo Ângelo e Santa Maria, somando um total de
960 funcionários.
A questão tecnológica está presente na vida da organização desde a sua constituição.
Pode-se até dizer que, devido ao tipo de negócio que a Procergs possui, ela somente existe em
função da tecnologia. Na matriz, no hall de recepção, é possível perceber que esse é um
aspecto inerente à vida organizacional ao visualizar-se a exposição de diversos equipamentos
antigos (Fotografias 1, 2, 3) que revelam detalhes sobre a história da organização, deixando
evidente a relevância que os artefatos tecnológicos têm para a empresa. Grande parte dos
funcionários fica 8h diária na frente do computador, o que revela a existência de uma “cultura
tecnológica” (VIZER, 2006) que é intrínseca à composição da organização.
38
Endereço eletrônico de acesso ao Via RS: www.via-rs.com.br
99
Fotografia 1 - UNIVAC 1005 III – Card Processador
Fonte: arquivo da empresa
Fotografia 2 - Máquina de pequeno porte, com programação interna. Evolução da UNIVAC 1004
Fonte: arquivo da empresa
100
Fotografia 3 - Cd's e disquetes
Fonte: arquivo da empresa
Entretanto, ao se observar e analisar mais de perto o contexto organizacional,
percebe-se que não é somente a questão tecnológica que influencia a formação de sua cultura.
Existem também outros fatores, como aspectos relacionados ao tipo de administração,
estrutura física, forma de trabalho e relacionamento estabelecido entre os funcionários.
A Procergs é uma empresa de economia mista, ligada ao governo estadual, um
ambiente fértil para mudanças. A cada troca de gestão, a organização recebe influências de
um novo governo, regido por ideais próprios e modos de pensar e administrar específicos que
acabam interferindo na cultura organizacional. Dessa forma, constata-se que a Procergs vive
uma eterna cultura de transição. Essa transição é percebida constantemente, na medida em que
a organização e os funcionários têm que se adaptar a mudanças, que são tanto materiais
quanto imateriais. Materialmente, ela é visível nas modificações físicas do layout interno, nas
alterações do organograma, nas novas nomenclaturas dos setores. Imaterialmente, ela é visível
na política e nas diretrizes dos novos diretores e nos projetos que orientam a administração da
empresa.
De certo modo, percebe-se que os funcionários, sendo concursados, sabem que, a
cada troca de governo, mudanças irão ocorrer no modo de gestão e têm, por isso, uma certa
predisposição para aderir e adaptar-se a essas transformações. Mas, embora essa prática faça
101
parte da cultura da organização, não impede que, vez ou outra, eles sintam-se perdidos e ou
deslocados como afirma o sujeito F:
[...] eles fazem mudanças tão grandes que a gente mesmo se perde. [...]
Estruturam muitos setores que antes eram gerências, chefias e divisão. [...]
Bom, eu consigo saber os nomes dos setores e as siglas daqueles que eu
estou trabalhando [...]. Temos mudança de layout que se dá ainda mais vezes
durante a mesma gestão. Sempre tem uma área mudando o layout. De
repente eu vou embaixo e ‘ops’, que empresa é essa? Eu não reconheço
mais nada.
Essa estrutura referida é visível na disposição visual dos espaços de trabalho. A
Procergs possui salas de diversos tamanhos. Aquelas em que os funcionários das áreas fim
39
-
desenvolvimento e operações ficam situados costumam ser amplas, com diversos setores e
divisões
40
, em que muitas pessoas trabalham juntas e ficam situadas próximas fisicamente.
Ressalta-se que essa mudança na disposição visual não ocorre somente em função da entrada
de um novo governo, mas também na tentativa de conseguir uma melhor acomodação dos
funcionários que compartilham o mesmo espaço sico. Nessas salas, também se percebe que
o som das vozes é presente, pois a inexistência de paredes torna o ruído uma característica
constante.
Outro aspecto relevante que também está relacionado à estrutura organizacional
refere-se ao fato da Procergs ter funcionários trabalhando em edificações físicas separadas:
grande parte fica na sede principal, uma divisão inteira situa-se no andar do prédio do IPÊ,
algumas pessoas ficam no centro de treinamento e outras nas sedes regionais, localizadas no
interior do estado. Durante as entrevistas, conversou-se com duas pessoas que, hoje em dia, se
encontram sediadas, respectivamente, no prédio do IPÊ e na Biblioteca – no centro de
treinamento - e pôde perceber-se a sua visão no que diz respeito à questão de pertencerem a
Procergs, mas estarem assentados em prédios fora da sede
41
.
39
Áreas fim são aquelas que produzem soluções em informática destinadas ao cliente final.
40
Divisão é uma nomenclatura muito utilizada dentro da Procergs como sinônimo de departamento. Ex: Divisão
de Tecnologia e Infra-Estrutura – DTI.
41
Quando se falar em sede, estar-se-á referindo ao principal prédio da organização, localizado na Praça dos
Açorianos s/nº.
102
[...] é complicado assim, em termos pessoais, ficou um pouco mais distante.
O que é que trocou? A questão do convívio com os colegas que a gente tinha
[...]. Volta e meia eu almoço com a turma de para manter o vínculo. O
único problema é assim de relacionamento e, às vezes, não sei se de repente
a gente não fica mais esquecido [...]. Em resumo, eu diria assim, levemente a
gente se sente como uma outra empresa mesmo (Sujeito C).
[...] eu estou acostumada, mas tu perdes. Faz horas que eu não apareço e
eu gosto de aparecer por [na sede], tu perdes a referência para algumas
pessoas, eu acho que não é bom se afastar muito (Sujeito I).
Em ambos os relatos, percebe-se que, apesar dessas mudanças terem ocorrido
algum tempo, elas criam uma fragmentação física que parece gerar uma sensação de
deslocamento com relação à sede, produzindo certo afastamento entre as pessoas. A diferença
de espaços e a distância geográfica acabam sendo fatores que mudam e interferem no modo
como se dão os relacionamentos. E, apesar da existência de recursos tecnológicos para o
contato com os funcionários que estão situados em diferentes prédios, os dois entrevistados
deixam clara a relevância que o contato face a face tem no dia-a-dia profissional, posto que
buscam mantê-lo fazendo ‘visitas’ à sede.
A fala de dois entrevistados estabelecidos na Praça dos Açorianos, também revela
a sua percepção com relação às pessoas que ficam situadas no Prédio do IPÊ. Os aspectos
percebidos por esses funcionários demonstram que o distanciamento e as diferenças
estruturais dão a sensação de que a mesma organização é dividida em mais de uma, e que,
portanto, possui mais de uma cultura. A sensação de fragmentação ‘física’ relatada
anteriormente pelos sujeitos C e I, situados respectivamente nos prédios do IPÊ e no CTR,
também é percebida pelos sujeitos D e F que ficam locados na sede da organização.
[...] A gente perde muita interação com essas pessoas. Inclusive, pessoas que
trabalham lá até dizem brincando: que bom que aqui não pega a rádio
corredor [...] Em determinadas épocas atribuladas aqui na companhia, o
pessoal dava graças a deus por estar lá. [...] Essas pessoas estão mais
distantes fisicamente (Sujeito D).
[...] às vezes, a gente pensa num colega e diz [...] quem não é visto não é
lembrado. Eu, às vezes, ligo para falar com as minhas amigas que estão lá,
mas é coisa mais pessoal. [...] Aquilo funciona mais ou menos como uma
outra empresa, eles falam isso inclusive. Porque o ambiente é diferente, o
mobiliário é diferente, o piso. [...]
Eles têm uns procedimentos diferentes
daqui da sede (Sujeito E).
A troca de funcionários entre setores também é outra característica da organização.
Essas trocas podem acontecer por solicitação do próprio funcionário - que tem a intenção de
103
trocar de área ou exercer outra função diferente daquela a que está acostumado - ou devido ao
desenvolvimento de algum projeto que requer a participação de pessoas com um perfil
específico.
Nesse item, apresentou-se a organização e aspectos relacionados à sua história e a
sua cultura e, no próximo, aborda-se o processo de implantação do correio eletrônico, da
intranet e das listas de discussão.
7.2 IMPLANTAÇÃO DAS FERRAMENTAS: CORREIO ELETRÔNICO, INTRANET E
LISTAS DE DISCUSSÃO
Até a implantação do primeiro Correio Eletrônico na Procergs, toda a
comunicação organizacional era realizada através do contato face a face, das reuniões, do
telefone e por meio do papel através dos mais diversos documentos, formulários,
memorandos, relatórios, etc.
Se trabalhava muito com formulário, ou seja, os registros de contato, atas de
reuniões, pareceres. Isso era tudo em formulário, era impresso. Às vezes, tu
ias fazer uma solicitação para outra área e tinha que abrir um processo,
tramitava muito papel (Sujeito B).
A comunicação técnica era toda em pastas, em documentos. Nós tínhamos
um setor de documentação, até na parte de software sempre que tu querias
liberar um versão, fazer alguma coisa, tu tinha um procedimento em papel,
tinha que escrever uma notificação, quem fez, o que fez, porque fez,
carimbar e entregar isso no setor de documentação. Tinha todo esse trabalho
de fazer o registro, essa documentação (Sujeito H).
Uma das práticas adotadas nessa época era o uso da Circular Interna - CI - para
realizar a comunicação entre os setores. O formato visual - de /para - do comunicado interno
assemelha-se ao aspecto visual que o correio eletrônico possui hoje. O que mudou foi o modo
como a comunicação transcorre dentro da organização, pois a tecnologia permite maior
agilidade na transmissão da informação do que aquela que era proporcionada pela
comunicação via malote.
104
A parte de comunicação era feita via papel, era um papelzinho, um
papelucho que a gente preenchia - de: fulano / para: beltrano. Então ali tu
colocavas, preciso falar contigo sobre tal assunto [...] Tu pegavas a CI e
colocavas dentro de um malote que ficava na mesa da secretária. Daí, várias
vezes ao dia, o boy passava, pegava o malote e distribuía nos setores
(Sujeito A).
É interessante ressaltar que, nessa época, em muitas divisões ou áreas de trabalho,
ainda não existia um ramal telefônico para cada trabalhador. Os funcionários que
compartilhavam a mesma sala ou a mesma ilha de trabalho tinham um único aparelho que era
utilizado por todos.
Grande parte dos entrevistados demonstrou certa dificuldade para conseguir
relembrar como se deu o processo de implantação das ferramentas de comunicação digital
dentro da organização, assim como a apropriação dessas pelos funcionários.
Acredita-se que
isso possa ocorrer pelo fato de a Procergs ser uma empresa de tecnologia de informação e
comunicação e a tecnologia é inerente ao seu processo de constituição e à vida profissional
dessas pessoas, o que torna esse processo um fato trivial naturalizado. Mesmo assim, de
acordo
com o relato dos participantes, foi possível fazer a reconstituição do processo de
implantação e apropriação das ferramentas, assim como da evolução da comunicação
eletrônica que, inicialmente, restringia-se ao correio e, posteriormente, passou a se dar por
outras vias como a Intranet e as Listas de Discussão.
A ‘linha do tempo’ - descrita a seguir - busca ilustrar a passagem e a progressão
de uma tecnologia para outra. A comunicação utilizando o papel como suporte existe dentro
da Procergs desde o ano em que a organização foi constituída. Foi usada de modo exclusivo
juntamente com o telefone, o fax e as reuniões para realizar as trocas comunicativas da
organização até 1990, quando a entrada do Mainfraime
42
possibilitou que a comunicação
passasse a ocorrer via Correio Eletrônico. Após o surgimento do Correio Eletrônico, a
integração das telecomunicações com a informática proporcionou o desenvolvimento das
redes telemáticas, dando origem à Internet. Seu aparecimento foi seguido da criação da
Intranet e, anos mais tarde, apareceram as Listas de discussão.
42
Computador de grande porte que guardava todas as informações eletrônicas. Ocupava todo o segundo andar da
Procergs. Hoje ele continua ativo, porém, sua utilização restringe-se a uma quantidade menor de
funcionalidades.
105
Esquema 5: Linha do tempo
Fonte: Autora desta dissertação
Neste trabalho, não será feita uma reconstituição histórica do surgimento da
comunicação em papel, via mainfraime e por meio da Internet. Esses meios apenas servirão
de subsídio para auxiliar na descrição do processo de implantação do Correio Eletrônico, da
Intranet e das Listas de Discussão que será realizada a seguir.
7.2.1 Correio Eletrônico
O Correio Eletrônico, também conhecido como e-mail, é uma forma de
comunicação criada ocasionalmente nos computadores do Departamento de Defesa
Americano (ARPANET) na década de 70. Ele se popularizou nos anos 80 e assumiu o
formato que tem atualmente na cada de 90. De acordo com Marcuschi (2005, p. 26), o
correio eletrônico trata “sobretudo de um meio de comunicação interpessoal com remessa e
recebimento de correspondência [...]. Ao lado das salas de bate-papos, o e-mail é hoje o mais
popular ambiente virtual”. Devido à forma e à velocidade com que as mensagens são
transmitidas, ele possibilita maior agilidade no processo de comunicação, podendo ser
utilizado para o envio de mensagens em diversos formatos: como arquivos, circulares,
convites, formulários e documentos os mais variados.
O processo de implantação do Correio Eletrônico na Procergs começou na década
de 90. Desde a sua introdução, a organização utilizou três ferramentas desse tipo: o Memo
(1990), o Lótus Notes (1995) e o Direto (1999).
Na visão dos entrevistados, a implantação do Memo foi o marco, o divisor de
águas que transformou o modo como se dava a comunicação dentro da organização. Ele era
um Correio bastante simples que conectava a Procergs apenas com os clientes que tivessem
Papel Mainfraime 1º Correio Eletrônico Internet Intranet L. de Discussão
1971 1990 1990 1995 1996/1997 2001
106
esse software instalado nos seus computadores e que mantivessem conexão via cabo com o
Mainfraime.
Com a implantação do Memo, a gente saiu da pré-história para a eletrônica.
[...] A capacidade de comunicação expandiu um monte, com o Correio
eletrônico ficou muito mais fácil. Primeiro porque tu podias acessar toda a
empresa, pois normalmente, no correio, tem a relação de endereços de todo
mundo. Eu entro ali agora e posso olhar por divisão, posso procurar por
nome. E segundo, porque para falar por telefone, tu dependias daquela
pessoa estar ali e de ela ter cinco minutos para ficar falando contigo. Com o
correio não. Eu mando a mensagem na hora que é melhor prá mim, e tu
recebes na hora em que tu quiseres, e lês na hora em que tu puderes (Sujeito
A).
[...] o Memo foi a grande diferença, aumentou o relacionamento com o
cliente. No telefone, às vezes tu não acha o cliente. Com o Correio, o
relacionamento é constante (Sujeito B).
[Na área técnica, existia] não vou dizer ansiedade, mas tinha uma vontade do
pessoal de partir para uma coisa mais informatizada, automatizada e fugir do
papel. [O Memo] permitiu uma comunicação simples; uma pessoa não está
disponível, eu mando uma mensagem, quando ela puder, vai me responder
(Sujeito L).
Ao contrário do contato telefônico, que estabelecia uma comunicação síncrona, o
Memo surgiu como uma forma de estabelecer uma comunicação assíncrona entre os membros
organizacionais, ampliando a capacidade comunicativa, visto que permitiu o acesso a
qualquer funcionário da organização. A introdução da ferramenta não causou transformações
apenas na comunicação interna, mas também na comunicação externa, como aquela que é
estabelecida entre a organização e os clientes, modificando a forma como ocorrem as
relações.
O sujeito J descreve a forma como a introdução dessa ferramenta modificou as
práticas de trabalho e de comunicação no dia-a-dia da organização.
Foi uma mudança violenta na nossa cultura [...], porque, quando entrou, o
mercado não tinha esse hábito de usar ferramentas desse tipo, ele [o Memo]
foi o pioneiro. [...] Foi uma revolução muito grande, o nosso hábito mudou
[...] porque não tínhamos essa mania de escrever coisas e entrar em contato
com cliente, por exemplo. Era por telefone, ligava para ele, fazia ata de
reunião, fazia registro de contato. E o Memo, você mandava algo para o
cliente ou ele te mandava e ficava registrado tudo ali. Mudou o nosso jeito
de trabalhar. (Sujeito J).
107
Quando o primeiro correio eletrônico foi implantado, a CI deixou de ser utilizada,
embora a utilização do malote ainda seja uma prática dentro da organização, mas para a
tramitação de documentos e processos administrativos. De acordo com Cesca (2004, p. 168),
“no que tange à comunicação, a informatização está transformando a comunicação dirigida
escrita impressa em dirigida escrita eletrônica”. No relato dos entrevistados, visualiza-se
claramente essa transição, na medida em que a entrada do meio eletrônico foi produzindo
transformações nas práticas culturais.
Embora o modo como o processo de comunicação ocorria começasse a tomar
outro formato, ainda tramitava muito papel na execução do trabalho diário, pois não existia
um terminal de computador pessoal na mesa de cada funcionário como existe hoje. A
atividade dos programadores, por exemplo, era realizada com cartão perfurado e folhas de
codificação, nos quais eles programavam escrevendo os códigos e comandos para gerar um
sistema. Esses formulários eram enviados para o setor de digitação (Fotografia 4), que era
responsável em tornar o programa manuscrito em sistema. Após a digitação, a máquina fazia
a compilação dos dados e era emitida uma listagem em papel com o resultado do trabalho.
Então cabia ao mesmo grupo de programadores fazer a revisão do trabalho impresso,
buscando verificar se havia algum erro de codificação. Hoje, o setor de digitação não existe
mais, e é o próprio analista ou programador que desenvolve, executa e implanta o sistema.
Fotografia 4 – Setor de digitação da Procergs localizado na Rua Caldas Junior.
Fonte: arquivo
da empresa
108
Os poucos terminais
43
que existiam nas salas e que permitiam o acesso ao Correio
não ficavam sobre as mesas de trabalho, mas espalhados em pontos específicos de modo que
pudessem ser partilhados por mais colegas. Estes terminais eram conectados via cabos até o
Mainframe que ficava situado no segundo andar do prédio, na sala dos computadores. Em um
primeiro momento, o Correio funcionou internamente, depois foi estendido para todos os
clientes
44
que possuíssem terminais da Procergs conectados dentro da rede com o Mainframe.
Devido à inexistência de um computador pessoal por funcionário, sempre que esse quisesse
acessar o Correio Eletrônico, deveria levantar da sua mesa de trabalho e dirigir-se até a mesa
em que estava situado o terminal de computador para fazê-lo.
Nessa época, a comunicação eletrônica era bastante incipiente, visto que as trocas
comunicativas ocorriam através do papel, contato pessoal ou via telefone. O Memo possuía
poucos recursos gráficos e a interface dele era mais simples do que o Correio possui
atualmente. A interface caracter, como era chamada, constituía-se de uma tela de fundo preto
ou verde com letras, sem imagens. Trabalhava-se somente com o teclado, pois não existia
mouse. Apesar de a apresentação gráfica ser mais pobre, ele apresentava uma funcionalidade
que o Correio de hoje
45
não possui, podia-se saber, por exemplo, se uma pessoa tinha
visualizado ou não a mensagem.
Um cliente que eu lembro que tinha na época que entrou o Correio era a
Secretaria da Fazenda. A Secretaria da Fazenda tinha a sua rede de terminais
que eram conectados ao computador que ficavam aqui. Então eles tinham
acesso ao Memo e a gente se comunicava com o cliente via Memo. Mas era
pouca coisa que a gente fazia, era pouca comunicação, mesmo porque era
pouco o tempo que a gente ficava na frente do terminal. [...] Na época, a
gente não tratava muita coisa via Memo, exatamente porque nem todo
mundo tinha o seu terminal e depois saía daqui e estava desconectado, se
quisesse falar com alguém, só por telefone mesmo (Sujeito E).
Tu mandavas e ficavas cuidando para saber se ele tinha lido [a
mensagem]. Como era tudo dentro do Mainfraime tu podias ficar cuidando.
Tipo assim, a mensagem ficava em alto brilho, e quando a pessoa lesse,
ficava em baixo brilho. Então tu sabias que a pessoa tinha aberto e sabias a
hora (Sujeito A).
43
Eram denominados terminais ‘burros’, pois não faziam nenhum tipo de processamento. Esse era realizado
dentro do Mainfraime.
44
Os clientes são órgãos do Governo do Estado do Rio Grande do Sul.
45
O Correio Eletrônico de hoje também permite saber se o destinatário recebeu a mensagem. Mas, ao contrário
do Memo, em que esse recurso era ‘automático’, atualmente o emissor depende da ‘confirmação de recebimento’
do destinatário que, pode ou não, confirmar o recebimento da mensagem.
109
Alguns funcionários que participaram da equipe piloto e testaram a utilização do
Memo tiveram dúvidas quanto a sua utilização e aplicabilidade.
Achava-se que aquela ferramenta não ia avançar, não ia evoluir, né! Aí,
depois passando o tempo, se ficou dependente daquilo”. Inicialmente, a
entrada da nova ferramenta causou certo estranhamento e desconfiança, pois
alguns funcionários não conseguiam perceber de que forma ela seria útil
dentro da organização (Sujeito B).
Em 1995, a Procergs passou a utilizar outro tipo de ferramenta de Correio
Eletrônico, denominado Lotus Notes ou Notes. Ele é mais aprimorado que o anterior, tem
mais funcionalidades e não se restringe a uma ferramenta de Correio Eletrônico, pois era e é
utilizado até hoje na gerência de documentos e de controle de fluxo de alguns processos,
como revela o Sujeito J:
[...] toda essa parte de trâmites de documentos internos, demanda de
aprovação de processos administrativos, promoções, férias, manutenção
estrutural, elétrica e até de serviços começou a ser migrado para dentro do
Notes (Sujeito J).
Ele ainda não utilizava a web, pois possibilitava a conexão do funcionário com
qualquer pessoa de fora da organização que tivesse uma conta de e-mail via cabo telefônico.
Mas, ao contrário do Memo que ficava localizado dentro do servidor principal
46
, o Notes
era usado em baixa plataforma
47
. Entretanto, ele tinha uma restrição com relação ao acesso,
pois era um software que precisava ser instalado na máquina do usuário, que somente
conseguia acessar a sua conta em computadores que tivessem este programa devidamente
configurado. Além disso, ao contrário do Memo, que permitia o acesso apenas com a
digitação da senha, para o usuário ingressar no Notes de uma máquina que não fosse a sua, ele
deveria andar permanentemente com um disquete que tivesse a sua chave de identificação
para poder entrar na sua caixa postal.
A partir de 1999, a Procergs desenvolveu o seu próprio Correio Eletrônico,
chamado Direto, baseado em software livre
48
. Quando ele foi implantado, o Correio
Eletrônico do Lotus Notes foi desativado, embora esse sistema permaneça sendo utilizado até
hoje para a utilização de outros aplicativos. O Sujeito A demonstra o quanto é complexo para
46
O servidor principal era o Mainfraime
47
Baixa plataforma é a denominação utilizada para o processamento que se em computadores de menor porte
que o Mainfraime.
48
Software livre – software sem direito de propriedade que pode ser usado gratuitamente por qualquer pessoa.
110
uma empresa de tecnologia desativar completamente um programa, na medida em que foi
desenvolvido outro para ocupar o seu lugar, quando diz:
[...] essas coisas quando a gente diz desativada, nunca morrem
completamente, sempre ficam uns pedaços porque alguém usa lá não sei
onde e o consegue trocar porque tem uma funçãozinha que é importante
(Sujeito A).
O seu diferencial em relação aos anteriores é o de que ele trouxe uma mudança
importante quanto à forma de se acessar o e-mail, pois, como ele é implantado na web, deu ao
usuário grande mobilidade, que esse pode ingressar na sua caixa de Correio de qualquer
computador conectado à internet. Além disso, o Direto é uma ferramenta de Correio
Eletrônico com mais recursos do que o Notes, pois ele possui agenda com catálogo que
permite visualizar a disponibilidade – não o compromisso agendado – de qualquer funcionário
e até de funcionários de órgãos do Estado que também utilizam o Direto. Esse aspecto
facilitou a marcação de reuniões e a procura de alguma pessoa em determinado setor, visto
que ele também disponibiliza o ramal e a matrícula de cada trabalhador, o que tornou o Direto
a principal ferramenta de comunicação da Procergs.
[A implantação do Direto] mudou principalmente para quem se deslocava da
empresa e estava fora do seu ambiente de trabalho, pois podia acessar a
caixa postal de qualquer micro, porque era web. [...] Antigamente, a gente
saia da empresa e se alguém perguntava sobre um e-mail, tu dizia que ainda
não tinha visto porque estava fora do micro e o acesso ficava muito
vinculado ao micro (Sujeito D).
[...] aí sim, abriu para o mundo, a comunicação hoje é bem mais utilizada via
Correio, eu uso muito, principalmente com cliente (Sujeito E).
Percebe-se que a entrada do Direto, além de permitir maior mobilidade,
proporcionou também maior aproximação e oportunidade de interação entre os funcionários.
Segundo Terra (2006, p. 86), “a comunicação em mão dupla, em um grau maior de simetria,
gera comprometimento, pois demanda um engajamento e uma ação de ambos os envolvidos
no relacionamento comunicacional”. Roman (2005, p. 75) reitera a relevância do Correio
Eletrônico como instrumento de comunicação organizacional ao assinalar que, dentro do
espaço de trabalho, “o e-mail é um canal oficial [...] através dele são disseminadas as
informações que visam assegurar o perfeito funcionamento da organização”.
111
O Sujeito L ressalta que, hoje em dia, praticamente qualquer ferramenta que é
colocada no ar tem integração com o Correio Eletrônico, possibilitando que ele seja utilizado
como um gerenciador do trabalho. Com relação a esse aspecto, o Correio pode tornar-se um
instrumento falho, visto que possui uma capacidade de armazenamento de mensagens
limitada e, por isso, corre o risco de interromper o andamento de diversos processos.
O que o Correio me ajuda é avisar quando tem uma ação minha que está
pendente. O problema é que ele muitas vezes é falho. Às vezes, a minha
caixa está cheia ou a caixa de alguém está cheia e a pessoa não recebe este
aviso que ele tem que aprovar umas férias, tem que aprovar a instalação de
um software, tem que ler uma ata ou tem que fazer uma avaliação de um
projeto que está para entrar e com isso, as coisas ficam paradas (Sujeito L).
Outro aspecto destacado é o de que o conteúdo enviado através do Correio
Eletrônico é muito diversificado. Ao mesmo tempo em que ele é usado para realizar
procedimentos de trabalho, muitas pessoas o utilizam para tratar de assuntos particulares e
enviar e receber informações pessoais.
[...] muitas pessoas não avaliam na hora de mandar os e-mails como cursos,
piadas, etc. Como ficou muito fácil tu enviares uma informação, um e-mail,
uma mensagem, acabou atribulando a gente (Sujeito D).
[...] daqui a pouco alguém manda um power point sobre as suas férias e
aquilo enche a caixa postal de alguém (Sujeito L).
[...] tu recebe muita coisa, muita propaganda, muita abobrinha, muita coisa
que não precisa, é a mensagem, é a corrente, é o futebol, é o vídeo não sei do
quê. Isso acaba te dispersando um pouco (Sujeito B).
Essas mensagens podem sobrecarregar o limite de armazenamento e lotar o
espaço da caixa postal, fazendo com que aquelas que são realmente importantes não sejam
recebidas. Nesse sentido, o e-mail pode ser utilizado como ferramenta de comunicação, porém
ele não oferece garantias de que os processos organizacionais mais urgentes terão andamento.
De acordo com Roman (2005), o e-mail é um espaço para carnavalização, pois é um meio que
permite possibilidade de ocupação clandestina. Além disso, os funcionários tendem a
expressar nos e-mails muitas coisas que não podem manifestar no dia-a-dia das organizações.
Percebe-se, assim, que “o correio eletrônico deixou de ser um recurso opcional de
aumento da produtividade para tornar-se simplesmente obrigatório” (PINHO, 2003, p. 45).
Ele é uma ferramenta bastante versátil, oferece agilidade no encaminhamento de informações
112
e mobilidade para quem precisa deslocar-se para fora da organização, criando condições
favoráveis para o estabelecimento do processo de comunicação.
7.2.2 Intranet – Procergs Comunica
Na Procergs, a Intranet foi implantada em meados de 1996 e 1997. Atualmente,
ela é considerada o Portal Interno da organização e, além de conter o Boletim Digital da
organização Procergs Comunica -, funciona como repositório de informações, pois
possibilita apontar para sistemas
49
específicos e alguns serviços utilizados nas práticas diárias.
De acordo com Pinho (2003), ao contrário da Internet, em que as informações circulam
publicamente pelo mundo, a Intranet é uma rede privada, em que as informações que
transitam são acessíveis somente ao pessoal interno.
Esta dissertação centralizará a análise da Intranet dando ênfase ao Procergs
Comunica (Imagem 1). Desde 2001, ele configura-se como a página de abertura da Intranet e
é o instrumento de comunicação oficial da organização para com o público interno. Através
dele, são divulgadas todas as informações e notícias importantes referentes à instituição
50
e ao
corpo funcional.
49
Site de Desenvolvimento, Site de Operações, Notes, entre outros.
50
No Procergs Comunica, são divulgadas informações que tem envolvimento direto com a empresa. O que não
tem ligação com a Procergs e diz respeito ao Governo do Estado, por exemplo, a Assessoria de Comunicação faz
clippagem e encaminha diretamente para a diretoria.
113
Imagem 1 – Procergs Comunica
Fonte: Procergs
Na época do seu lançamento, a Assessoria de Comunicação realizou uma
campanha de divulgação, em que foi distribuído um folder com orientações sobre a relevância
e os objetivos da nova ferramenta. Este folder foi entregue em mãos para cada um dos
funcionários com o propósito de atingir o maior número possível de pessoas e alcançar maior
eficácia
51
no acesso à ferramenta. Durante a campanha, os funcionários também receberam a
orientação de que o Procergs Comunica deveria ser colocado como a página inicial no
computador de cada usuário.
O boletim digital é composto de diversas seções. Algumas se destinam à
publicação de notícias referentes à Procergs, outras são reservadas para quadro de avisos,
aniversariantes do mês, cardápio do dia do que será servido no refeitório da empresa-,
eventos, memória virtual, etc.
Diariamente ele é atualizado com informações referentes à organização e ao corpo
funcional. A atualização do seu conteúdo é de responsabilidade da Assessoria de
51
Ao se falar de eficácia nesta dissertação, baliza-se em Kunsch, que afirma que o termo “[...] liga-se a
resultados em função dos quais é preciso escolher alternativas e ações corretas, usando para tanto
conhecimento e criatividade para fazer o que é mais viável e certo” (KUNSCH, 2003, p. 208).
114
Comunicação. Para que alguma informação seja publicada, o funcionário ou o gestor deve
encaminhar um e-mail para a assessoria solicitando a divulgação do assunto desejado. A
Assessoria de Comunicação preferência para que essas solicitações sejam encaminhadas
via Correio Eletrônico, pois ela não é a fonte dessa notícia. Esse cuidado com a documentação
dessa solicitação tem o propósito de evitar possíveis erros ou transtornos com relação à
correta publicação da informação.
Desde o início da implantação do Procergs Comunica, foi adotada uma prática
pela Assessoria com o objetivo de estimular o corpo funcional a acessar o Boletim Digital,
dividida em duas etapas: inicialmente, toda vez que qualquer notícia nova será divulgada,
primeiro ela é publicada no Procergs Comunica; em um segundo momento, a Assessoria
encaminha um e-mail para todos os funcionários com as manchetes e o resumo das notícias
novas. Esse resumo tem um link que possibilita ao funcionário clicar e entrar no Procergs
Comunica. O propósito desta prática é despertar a atenção e curiosidade daqueles que não têm
o hábito de acessar a Intranet diariamente para que passem a buscar mais informações no
Boletim Digital.
Antes da sua criação, as informações oficiais eram divulgadas pelo Correio
Eletrônico - via Notes - através do Programa de Comunicação Interna - PCI. O PCI era um
instrumento de comunicação mais modesto e dividia-se em seções como: eventos, notícias,
avisos.
No relato dos entrevistados, detectou-se que a percepção deles com relação à
Intranet vem passando por um processo de mudança. No início, ela era vista como um grande
mural de informações, com poucas funções e baixo tempo de resposta. Hoje é reconhecida
como um Portal Interno no qual está inserido o Procergs Comunica - em que são publicadas
as informações oficiais da Procergs e que também permite o acesso a diversos sistemas
específicos da organização, como Site de Desenvolvimento, Site de Operações, Doc Net,
Notes, Biblioteca, etc.
[...] eu não consigo me lembrar da questão da Intranet, mas eu tenho a
impressão que foi posterior ao Direto (Sujeito D).
A Intranet, quando começou, o pessoal dizia: por que eu vou precisar disso?
O que eu vou fazer com isso? Na verdade, eu não me lembro direito quando
é que começou a aparecer a Intranet [...] eu não me lembro como era o
primeiro layout, sumiu da minha memória, acho que é porque eu não usava.
[...] Passei a acessá-la quando começou o movimento dos comunicandos
52
.
52
A entrevistada se refere ao boletim eletrônico, o Procergs Comunica.
115
[...] Depois que eu percebi que todas as informações importantes estavam ali,
tanto da diretoria quanto de RH, quanto de utilidade pública, eu passei a usá-
la como tela inicial (Sujeito E).
[...] a entrada da Intranet, surgiu àquela explosão da Internet, e, aos poucos,
foi entrando o conceito da Intranet e foram aparecendo os comunicados da
empresa, o site da empresa, o Procergs Comunica [...]. Então, aos poucos, a
gente foi sendo apresentado a estas coisas e foi utilizando (Sujeito C).
De acordo com os depoimentos citados acima, detecta-se que a inserção da
Intranet na rotina de trabalho ocorreu de modo gradual: Alguns revelam que, inicialmente,
não conseguiram perceber a relevância da introdução da ferramenta na rotina diária. Outros
demonstram que a percepção do seu conceito mudou. As declarações deixam evidente que a
ausência de significado que a Intranet denotava para os entrevistados tornava o seu acesso
sem sentido.
Embora o propósito do trabalho seja fazer uma análise qualitativa, julga-se
relevante destacar que 73% dos entrevistados afirmaram que hoje a Intranet é a sua gina
inicial. Esse aspecto evidencia uma mudança de prática, na medida em que estes entrevistados
relatam que, ao chegarem ao trabalho, têm como hábito ligar o computador e acessar o
Procergs Comunica, pois ele é o canal de comunicação em que são divulgadas todas as
notícias oficiais da organização.
[...] quando eu ligo a minha máquina, eu entro no Internet Explorer e a
minha página inicial é a Intranet, e de cara eu vejo o link de notícias relativo
à diretoria, ao governo, aos aniversariantes do dia, vejo os eventos
programados, cursos, se foi lançado tal projeto (Sujeito A).
Ela é a minha página inicial. Eu acho que deveria ser de todos, mas não sei
se é (Sujeito D).
[...] faço uso da Intranet diariamente, com certeza sempre no início do
expediente eu tenho o hábito de abrir a Intranet e dar uma olhada no que
tem. Chego de manhã e sempre abro, é um hábito meu, prá mim é tipo ler
jornal, então eu sempre abro a Intranet. E, ao longo do dia, eu sempre dou
uma olhada mais umas duas ou três vezes (Sujeito E).
[...] ela é a tela de entrada, nós usamos e a gente busca todas as informações
internas ali (Sujeito F).
A minha página principal no Internet Explorer é a Intranet da Procergs, [...]
ali tem áreas específicas que aparecem as mensagens, novidades, embora
tenha um e-mail que vem da Assessoria de Comunicação (Sujeito H).
116
Eu tenho o hábito, cheguei de manhã, eu acesso a Intranet, a minha primeira
página é Comunica e eu leio todo o Comunica antes de fazer qualquer coisa
(Sujeito I).
É a minha página de entrada, mas não é todo mundo que tem, não é
institucionalizada e eu acho que deveria ser (Sujeito J).
A mudança de postura quanto ao acesso ao Procergs Comunica também é visível
nas palavras do Sujeito E, que demonstra que, desde o seu surgimento, houve uma
transformação no comportamento de alguns funcionários com relação ao acesso da Intranet
quando relata:
Eu noto que os meus colegas, pelo menos na minha volta, todos entram na
Intranet. Isso é uma mudança, porque é tipo abrir o jornal todos os dias. [...]
As comunicações oficiais estão à disposição, a gente não pode dizer que não
contam nada (Sujeito E).
Por outro lado, três entrevistados ressaltaram que, de acordo com sua percepção, a
prática de acesso diário não é adotada por todos.
[...] o que boa parte das pessoas fazem? Entram direto no Correio Eletrônico
ou entram direto no seu sistema de trabalho. O cara tá programando e chama
o sistema que ele vai programar e não olha a Intranet. E daí se a gente for
fazer uma pesquisa, perguntar se as pessoas se sentem informadas pela
empresa, muitos dizem que não entram na Intranet, dizem que não sabe o
que tá acontecendo na empresa e que não é divulgado. (Sujeito A)
[...] o Procergs Comunica é onde saem todas as notícias. Mas tem uma boa
parte das pessoas que nem acessa o Procergs Comunica. Olha, tu tem que
chegar na empresa e abrir o Procergs Comunica porque lá vão estar as
notícias do dia, quais eventos tiveram, mudanças operacionais, mas o pessoal
não tem essa cultura de buscar a informação na Intranet. [...] Tem-se a
cultura de se buscar a informação em outros repositórios que têm serviços de
arquivos, outras facilidades que têm na rede, que são repositórios de
informação e que o pessoal têm acesso, do que propriamente na Intranet.
(Sujeito B)
[...] tem gente que não olha, tem colegas que perguntam onde está tal coisa e
está no Comunica. Não sabem, porque não leram. (Sujeito I)
As afirmações acima demonstram que o acesso ao Procergs Comunica ainda não é
uma prática corporativa institucionalizada, e esse fato faz com que diversas pessoas se sintam
desinformadas pela organização. Isso não quer dizer que a organização não repasse as
informações aos funcionários, mas, sim, que a ferramenta deixa de ser eficaz na medida em
que falta uma atitude pró-ativa de alguns trabalhadores no que diz respeito ao acesso à
117
Intranet. Ressalta-se que qualquer ferramenta de comunicação, seja digital ou não, por si
não basta para que se alcance eficácia nas trocas comunicativas. Ninguém comunica sozinho
e, para que o processo ocorra de modo completo, cabe a cada indivíduo participar ativamente
do processo de comunicação.
Isso revela que, muitas vezes, experimenta-se a ilusão de que a simples inclusão
de um sistema de computadores irá garantir mudanças necessárias. Nem sempre isso é um
fato real, pois é necessário se pensar na participação das pessoas, por exemplo, dentro da
Intranet, cujo funcionamento demanda uma série de condições, dentre elas, uma articulação
ativa da informação e da comunicação (SANDI, 2006).
Apesar de a Intranet fazer parte da rotina da organização mais de 10 anos, o
relato de alguns entrevistados evidencia que os participantes reconhecem a sua presença na
vida organizacional, mas, ao mesmo tempo, entendem que o seu potencial não é aproveitado
suficientemente e que esse pode ser desenvolvido para que ela seja devidamente utilizada
como ferramenta de comunicação.
Falta alguma coisa, eu acho que não é na ferramenta, é na gestão da
ferramenta. Falta alguma coisa assim, em quem produz a ferramenta [...].
Uma das coisas que teve bem interessante, que aí funcionou muito bem, foi o
nosso presidente que até saiu agora a pouco, ele criou um Fale com o
Presidente
53
. Este fez um sucesso total, daí o pessoal entrava na Intranet para
falar com ele [...]. A gente tem a Intranet, mas, por exemplo, aqui na nossa
diretoria, a gente tem várias outras ferramentas de informação [...] e o
na Intranet e também são ferramentas [...] Isso é uma coisa que eu acho que
se tudo estivesse na Intranet talvez também estimulasse mais o uso. (Sujeito
B).
A gente poderia evoluir, apesar de que evoluiu bastante, mas, na minha
visão, pode evoluir um pouco mais. Poderia haver enquete [...] Enquete
sobre quem vai ser o campeão gaúcho, coisas curiosas para dar mais
intimidade com o veículo. [...] eu acho que ela podia ser um canal mais
amplo, ela podia ter partes de cultura [...] mas que tivesse não cultura
interna, mas informações sobre a programação do Teatro São Pedro. [...]
Aqui na empresa também tem músicos, escritores, pintores, mas a gente
recebe notícias dessas pessoas mais por e-mail de alguém que tem relação
com a pessoa e divulga. Então, essa parte é restrita hoje. (Sujeito D)
Através das citações acima, detecta-se que falta alguma coisa no modo como a
Intranet é gerida. Os entrevistados destacam que, se o acesso às outras ferramentas utilizadas
53
Durante as entrevistas preliminares realizadas anteriormente às entrevistas em profundidade, alguns
entrevistados já tinham salientado o potencial do Fale com o Presidente e das expectativas positivas que ele
havia gerado entre os funcionários. Este canal de comunicação ficava dentro da Intranet. Porém, após a
ocorrência de uma troca de gestão na presidência, foi desativado.
118
pela organização estivesse centralizado na Intranet, o seu acesso seria facilitado e estimularia
o seu uso. Além disso, expressam certa insatisfação com relação ao conteúdo que é publicado
no Procergs Comunica. Bueno (2003, p. 14) destaca que “[...] é preciso pensar em conteúdos e
formatos específicos para públicos específicos. [...] Quase sempre, será preciso redimensionar
os conteúdos e desenvolver linguagens apropriadas para que a comunicação se torne efetiva”,
ressaltando que esses devem estar adequados ao perfil do público com o qual se está
comunicando.
Também é constatada uma insatisfação com relação à atualização da Intranet, que
é vista como lenta, visto que os funcionários conseguem informações mais rapidamente por
outros meios do que através do Portal Interno.
Acho que ela ainda não está completa, ela ainda tem muito a se desenvolver.
Até te digo que é mais rápida a nossa interação, a busca por informações, do
que é possível os responsáveis colocarem a informação ali [...] Os projetos
54
,
muitas vezes, têm épocas que estão desatualizados e a gente está buscando
informação e a informação ainda não foi colocada (Sujeito F).
Eu acho que a Intranet poderia ter mais coisas [...] a questão do site de
projeto poderia ser melhorada, embora a gente tenha a Intranet, nós não
temos esse procedimento de site de projetos bem estruturado dentro da
organização. Acho que tem muita coisa que a gente poderia melhorar na
forma como a maioria dos projetos, dos programas utilizam informações
para disponibilizar através de sites, isso não é uma prática muito difundida
na empresa, até porque toma muito tempo da pessoa que está desenvolvendo
(Sujeito H).
Embora as duas citações colocadas anteriormente não se refiram ao Procergs
Comunica, mas aos Sites de Projetos, que também ficam situados dentro da Intranet, julgou-se
relevante inseri-las, pois elas expressam uma insatisfação com a forma como a ferramenta é
gerida e utilizada dentro da organização. Além disso, demonstram que, embora exista um
esforço por parte da Procergs com relação à utilização das ferramentas de comunicação
digital, a sua inclusão nas rotinas diárias não torna o processo de comunicação satisfatório
para o público interno.
Segundo o sujeito G, o fato de se depender da Assessoria de Comunicação para
que as informações sejam publicadas no Procergs Comunica torna o processo de atualização
de informações mais vagaroso.
119
A Intranet é boa para atingir o grande grupo, o corpo funcional. Mas ela é
mais engessada, mais lenta, mais burocrática, porque não sou eu que publico,
tem que encaminhar para a área responsável para que eles publiquem. Então
a gente fica na dependência deles terem tempo de olhar, avaliar, reescrever
muitas vezes, colocar no texto padrão jornalístico. (Sujeito G).
Ainda que o entrevistado considere que essa dependência’ torna o processo mais
engessado, entende-se que seria inviável que cada pessoa fosse responsável por fazer as
atualizações e publicações na Intranet. O Procergs Comunica é a ferramenta oficial de
comunicação da organização com o público interno e, como tal, a sua administração deve
ficar a critério da Assessoria de Comunicação da organização.
Pinho (2003) cita Sherwin & Ávila
55
, que apresentam várias vantagens no uso da
Intranet sobre as tradicionais formas de comunicação que empregam o papel como suporte.
Destacam que a Intranet: oferece à empresa um caminho mais seguro para transmitir
informações sigilosas, que a circulação de material impresso desses documentos aumenta o
risco das informações vazarem; proporciona uma comunicação mais ágil entre os
funcionários, tornando-se um importante meio para compartilhar a informação e executar o
trabalho; permite que rapidamente uma informação seja atualizada e disponibilizada a
qualquer hora para o acesso dos usuários; possibilita redução dos custos com a produção,
impressão e distribuição dos tradicionais newsletters, manuais e listas de telefones internos;
permite maior participação, interatividade e troca de informações entre os colaboradores,
tornando-se uma poderosa ferramenta de gestão empresarial; a transmissão em maior largura
de banda possibilita a troca de uma maior quantidade de informação em uma menor unidade
de tempo. Muitas vezes, essas vantagens tornam a Intranet mais interativa, interessante e rica
em conteúdo do que o próprio site da empresa na Internet.
Concorda-se com as vantagens apresentadas pelos autores apenas com relação ao
seu aspecto teórico. Pois, de acordo com o relato dos entrevistados, constata-se que, no
aspecto prático, a mera existência da Intranet no processo de comunicação, por si só, não
garante o envolvimento e a participação das pessoas. A sua eficácia demanda uma
“construção social” (BERGER e LUCKMANN, 1985), visto que necessita de um
comportamento pró-ativo por parte dos funcionários, que devem antes de tudo reconhecer o
seu significado como um instrumento necessário ao dia-a-dia profissional. E, a partir disso, o
acesso a ela pode ser aprimorado e melhor incorporado nas suas práticas diárias.
54
A entrevistada refere-se aos sites de Projetos situados dentro da Intranet que, em alguns momentos, não
recebem informações atualizadas com relação ao andamento do trabalho.
120
Ao analisar-se o Procergs Comunica, percebe-se que é uma ferramenta de
comunicação voltada para a publicação e divulgação das notícias oficiais da organização. Ele
não se caracteriza estritamente como um instrumento unidirecional, na medida em que os
diversos setores podem requerer a publicação de informações referentes ao desenvolvimento e
andamento de seus projetos. Porém, não proporciona demanda comunicacional de baixo para
cima com relação à definição do conteúdo publicado.
[...] ela é democrática no sentido de divulgar, de propagar a informação de
uma forma muito rápida, mas não no sentido de teres uma participação
popular, uma participação do corpo funcional (Sujeito D).
A Intranet não é somente unidirecional porque a gente publica informações
também [...], mas não é uma informação pessoal, ainda é uma informação
institucional (Sujeito A).
Detecta-se também que a organização não possui um mecanismo formal que
permita monitorar e controlar a quantidade de acessos diários ao Procergs Comunica. O
retorno que os responsáveis pela comunicação interna recebem desse acesso é bastante
informal. Eles ficam sabendo que os funcionários acessam o Procergs Comunica a partir de
ligações telefônicas em que esses perguntam, por exemplo, qual o motivo de o cardápio do dia
ainda não estar disponibilizado, ou fazem alguma observação relacionada a algum aspecto não
contemplado na publicação de determinada notícia, ou mesmo a partir dos comentários das
pessoas nos corredores. Entende-se que a ausência de um mecanismo de monitoramento
impede que a organização possa mapear o comportamento do público interno com relação a
esse canal e melhorar a eficácia da ferramenta.
Ressalta-se ainda que, no decorrer das entrevistas, constatou-se que a Procergs
tem como objetivo reformular a Intranet e transformá-la em um grande Portal Corporativo no
intuito de que ela seja o único canal de acesso a todos os outros repositórios de informação.
Acredita-se que essaão proporcionaria maior aproveitamento da ferramenta e poderia
estimular uma maior e melhor apropriação da Intranet e do Procergs Comunica como
ferramentas por parte dos funcionários.
55
SHERWIN, Gregory R. & AVILA, Emily N. Connecting online: creating a successful image on the internet.
121
7.2.3 Listas de Discussão
As Listas de Discussão são formadas por pessoas que têm interesses específicos,
que se comunicam de forma assíncrona, em geral mediada por um responsável que organiza
as mensagens e eventualmente faz as triagens. Essas pessoas constituem um grupo como
comunidade virtual que opera via e-mail para a discussão de temas específicos.
(MARCUSCHI, 2005).
De modo geral, não existem assuntos fixos para serem tratados, pois as listas são
caracterizadas por veicularem informações úteis ou de utilidade ao grupo participante. Elas
podem ser utilizadas para as mais diversas finalidades e nos mais variados contextos, como
para troca de informações entre um grupo no ambiente escolar, universitário ou profissional.
Dentro das organizações, essa ferramenta permite que as pessoas possam compartilhar idéias
e informações sobre projetos ou experiências, contribuindo para facilitar e aumentar a
eficiência do trabalho em equipe.
Na Procergs, as Listas de Discussão
56
fazem parte de uma prática chamada Gestão
do Conhecimento, criada pelo Setor de Desenvolvimento em 2001. A Gestão do
Conhecimento abrange três eixos específicos: as Listas de Discussão, o Site de
Desenvolvimento e a Quarta do Conhecimento.
As Listas de Discussão foram criadas com o propósito de discutir temas técnicos.
Os integrantes são praticamente todos oriundos da área de desenvolvimento e operacional.
Atualmente, cinco Listas encontram-se em atividade: Cultura e Competências (com dezenove
participantes); Metodologia (com 167 participantes); Tecnologia (com 104 participantes);
Natural
57
(com 35 participantes); Software livre (com 42 participantes). Não existe um
número restrito de participantes em cada lista e eles podem participar de mais de uma lista ao
mesmo tempo.
Além dessas, alguns projetos em andamento também possuem Listas formadas
por pessoas que necessitam discutir problemas específicos referentes a ele. Entretanto, quando
o projeto chega ao fim, a Lista também é encerrada.
Central Point, Oregon: The Oasis Press, 1999.
56
Durante as entrevistas alguns participantes relataram a existência de uma outra Lista chamada Memória.
Entretanto, naquele momento, essa se encontrava sem movimentação de mensagens. Além disso, não faz parte
da Gestão do Conhecimento e, por isso, não é abordada no trabalho.
57
Nome de uma linguagem técnica
122
O Site de Desenvolvimento configura-se como uma ferramenta criada com o
propósito de disponibilizar todas as informações referentes ao desenvolvimento de sites e de
programas aos membros da organização, em especial àqueles que pertencem à área de
desenvolvimento. Existe uma pessoa encarregada em administrá-lo, que também é
responsável em tirar eventuais dúvidas que possam ser postadas.
A Quarta do Conhecimento é um evento que acontece uma vez por semana, todas
as quarta-feiras, e é aberto para todos os funcionários. Inicialmente, a realização dessa
atividade abrangia apenas assuntos técnicos. Hoje é abordado qualquer tema de interesse da
organização. Os palestrantes podem ser tanto internos quanto convidados externos.
As Listas de Discussão e a Quarta do Conhecimento são práticas complementares.
O público que participa de uma não é, necessariamente, o mesmo que participa de outra.
Enquanto a Quarta do Conhecimento busca abranger um tipo de público que tem necessidade
de estabelecer contato interpessoal presencial, as Listas envolvem aqueles que têm um perfil
mais voltado para manter contato mediado pelo meio eletrônico.
Eu sei que tem gente que aprende mais lendo e outras mais ouvindo, vendo
ou conversando com as pessoas e esse é o objetivo da Quarta do
Conhecimento, que a pessoa esteja ali na frente e a gente tenha a
oportunidade de troca, ao vivo (Sujeito J).
Não houve nenhum tipo de treinamento ou de campanha para divulgação das
Listas. No início, quando foram criadas, algumas pessoas interessadas nos temas que seriam
tratados foram convidadas a participar da discussão. Hoje, qualquer funcionário pode
participar. Para isso, basta entrar na Intranet, acessar o Site de Desenvolvimento e fazer a sua
inscrição. Já houve casos de pessoas de fora da Procergs que se interessaram em participar,
mas as Listas se restringem somente a quem é funcionário
58
da organização.
De acordo com os relatos, detectou-se que o principal propósito das Listas de
Discussão é a produção e disseminação do conhecimento.
No contato presencial, uma
idéia poderia ser trocada, por exemplo, entre duas ou três pessoas. Ao ser lançada na Lista,
essa mesma idéia é compartilhada com todos os outros participantes.
[As Listas são] um excelente instrumento de agregação e disseminação de
conhecimento. É um grande instrumento de desenvolvimento, porque as
pessoas que entram têm um comprometimento e dá resultado. Tu podes
entrar só para tomar conhecimento (Sujeito F).
58
Aqueles que são contratados como terceiros também podem participar, porém, quando perdem o vínculo com
a empresa, o seu acesso às listas é bloqueado.
123
[...] antes tu buscavas informação, mas o nível de informação que conseguia
era muito baixo [...] dependia muito da tua rede de relacionamento. [...]
Então hoje, com a Lista, tu consegues jogar uma pergunta no ar e não tem
que saber quem é o especialista, o cara é quem vai se identificar e responder
(Sujeito J).
Para nós [as Listas] realmente são uma divisão de experiências, permite
fazer consultas à comunidade. Se alguém tem uma dúvida técnica, espalha
para a comunidade. E se alguém tem alguma noção sobre aquele respeito ou
sugestão, contribui [...] Pode ser que os problemas sejam resolvidos e pode
ser que não sejam. (Sujeito L).
[As Listas são] [...] como uma grande fonte de conhecimento. Ali são
colocadas dúvidas, são colocadas experiências. E alguém joga alguma coisa
na Lista e aquilo vai sendo enriquecido, e, de uma hora para outra, tu tens
uma chuva de informações sobre uma coisa que tu aprendeste e não sabia.
Tu acabas aprendendo sem nem ter pensado em aprender sobre aquilo.
(Sujeito B).
Segundo Pinho (2003, p. 67), “as pessoas subscrevem e contribuem com as Listas
de Discussão porque elas têm interesses em comum, aprendem e ainda ganham com os
relacionamentos que estabelecem e com as discussões que mantêm com seus componentes“.
As Listas não permitem o estabelecimento de uma comunicação estruturada que
envolva soluções de problemas ou processos de trabalho, pois a participação requer uma
iniciativa voluntária e a sua utilização não é regrada. Entretanto, após o conhecimento ser
compartilhado, ele fica registrado, possibilitando o resgate posterior da informação.
A circulação do conhecimento agiliza bastante, além de ficar registrado.
Volta e meia, eu quero saber alguma coisa e, quando é algo que foi
discutido na Lista, tu vais ali, fazes uma pesquisa e o assunto está registrado
(Sujeito J).
Alguns entrevistados disseram que, além de participar das Listas internas, também
são assinantes de Listas externas.
Muitas das informações que eu termino postando dentro das Listas são fruto
de informações que eu trago de fora. Eu acho que não tem como a gente
trabalhar hoje com tecnologia sem estar observando o que acontece fora da
empresa, fora das organizações. Então eu assino uma série de outras Listas
(Sujeito H).
[...] a gente usa as Listas mais para se comunicar com pessoas de fora da
empresa, então a gente tem grupos de trabalho em universidades, com
pessoal autônomo [...] (Sujeito L).
124
A participação nas Listas não se resume ao envio de questionamentos e dúvidas.
Algumas pessoas têm por hábito enviar artigos que consideram interessantes para
compartilhá-los com os outros integrantes.
[Ao enviar um artigo], o necessariamente eu estou pedindo uma resposta,
ninguém precisa comentar nada, mas simplesmente mando aquela
informação para todo mundo ter acesso a ela (Sujeito H).
Embora as Listas tenham diversos integrantes, os entrevistados relataram que
muitos desses têm um comportamento passivo, não participando ativamente. A grande
maioria, cerca de 95%, participa como ouvinte. Pelo que se detectou, a participação nas listas
esbarra em duas dificuldades. Uma delas refere-se ao fato de que algumas pessoas sentem-se
desconfortáveis para expor-se e postar mensagens, pois isso demonstraria que elas não
dominam determinado tipo de assunto.
Às vezes tem um constrangimento, porque como é que eu vou perguntar
isso? Será que somente eu estou tendo essa dúvida?” Eu noto que não é um
bom canal porque a pessoa se expõe prá todo mundo, e não é todo mundo
que está disposto a se expor. Tem várias coisas que são fatores que inibem a
pessoa. Ás vezes, internamente, é mais fácil levantar e ir conversar com a
pessoa. (Sujeito E).
[...] para as pessoas se abrirem é difícil, porque terão que colocar, por
exemplo, que não sabem tal coisa, vão estar se expondo para todo mundo,
então isso é meio complicado. (Sujeito J).
São poucas as pessoas que publicam coisas na Lista, a maior parte ouve ou
responde alguma colocação (Sujeito L).
O outro aspecto inibidor parece estar relacionado à escrita, ou melhor, à
dificuldade que algumas pessoas têm de se expressar e se fazer entender corretamente através
da escrita.
Quando a gente escreve, como é Lista de Discussão, às vezes, a pessoa
escreve como está falando e a frase não sai bem construída e ela é mal
entendida [...]. A minha redação melhorou com esse advento, porque eu
tenho que caprichar mais para que a outra pessoa entenda o que eu estou
querendo dizer, eu não posso errar no português (Sujeito E).
[...] quem não consegue escrever muito, participa menos [...] Muita gente
não gosta de escrever, não sabe. [...] Até hoje tem gente que tem dificuldade,
mas já melhorou muito (Sujeito F).
125
A comunicação estabelecida por meio das ferramentas eletrônicas tende a ser cada
vez mais informal e menos monitorada devido à fluidez proporcionada pelo meio. Nesse
sentido, a falta de atenção e cuidado para com o ato de escrever pode provocar distorções e
mal entendidos, pois uma frase mal construída está sujeita a interpretações errôneas e,
portanto, a receber críticas dos outros participantes.
Para tentar quebrar esse receio, buscar construir um clima de confiança e alcançar
uma postura mais ativa dos participantes, cada Lista passou a ter um responsável
59
em
alimentá-la e estimular as discussões.
[...] se eu ouvia uma pergunta pelos corredores, de alguém que o sabia tal
coisa eu colocava como se [a dúvida] fosse minha. (Sujeito J Coordenador
de Lista).
A experiência que a gente tem, para a Lista funcionar, é que precisa de um
animador, tem que ter alguém que volta e meia coloque uma questão
polêmica, que faça algum relato, que se responsabilize por deixar a lista
funcionando (Sujeito L).
O nível de participação ativa nas Listas também está relacionado ao interesse que
cada pessoa tem de discutir um assunto em determinado momento.
[...] o meio mais efetivo de comunicação que a gente tem hoje dentro da
empresa é a questão das Listas de Discussão. [...] A diferença é que talvez
tenha um número elevado de pessoas que estão inscritas frente aqueles que
efetivamente precisam daquele instrumento para comunicação, então ela tem
um movimento bastante grande de discussão, que ela envolve o pessoal
que está mais diretamente focado naquele problema (Sujeito H).
Eu estou com várias Listas internas, eu estou com uma ferramenta que está
sendo usada agora, então estou usando bastante a Lista de Discussão (Sujeito
E).
As Listas são mais novas, é uma coisa que agora está mais em evidência.
Mas elas também não são muito usadas, mas eu acho que é porque ainda é
muito nova e o pessoal não conseguiu perceber as vantagens que elas têm.
Falta o pessoal entender melhor, saber usar mais. As externas a gente
interage mais porque outras comunidades já têm cultura, então elas estão
sempre mandando coisas e a gente acaba respondendo, interagindo (Sujeito
B).
As internas, às vezes, costumam ser muito paradas (Sujeito E).
59
Este responsável ou ‘coordenador “da Lista não é um mediador. O papel dele não é fazer triagem das
mensagens postadas e sim, tentar ‘animar’ e buscar maior participação ativa por meio do envio de mensagens.
126
Detecta-se, assim, que, embora as Listas existam desde 2001, elas possuem grande
potencial para ser desenvolvido. Mesmo que sejam constituídas por diversos integrantes,
muitos possuem uma postura reativa. A prática é exercida ativamente apenas por poucos e
esse envolvimento está diretamente relacionado com o perfil pessoal e com o estímulo que é
dado pelo “coordenador” da Lista. Além disso, detecta-se que as Listas internas são uma
prática relativamente nova e que ainda não está consolidada. A participação nas Listas
externas é maior, pois essas são mais antigas, de modo que foi instaurada uma ‘cultura de
participação’.
7.3 APROPRIAÇÃO DAS FERRAMENTAS: MUDANÇA E RESISTÊNCIA
Partindo da visão que concebe a cultura como uma ‘variável’ da organização
(SCHEIN, 1988), considera-se que, dependendo das situações e dificuldades enfrentadas no
âmbito externo ou interno, essa cultura pode sofrer mudanças. Essas freqüentemente geram
resistências internas, porque os funcionários necessitam se adaptar a novas formas de
trabalho, comunicação e maneiras de operacionalizar as atividades.
Na análise realizada na Procergs, constatou-se que o processo de mudança
envolve um período de transição que não se refere apenas à adequação social, mas também à
técnica. Antes de uma nova ferramenta ser disponibilizada e introduzida nas rotinas diárias,
ela tem que ser adaptada tecnicamente para manter as funcionalidades antigas e agregar as
novas. Somente quando todo e qualquer ajuste técnico já tenha sido realizado, é que a
ferramenta poderá ser disponibilizada para os usuários, que então passam pelo “processo de
socialização secundária” (BERGER e LUCKMANN, 1985), em que se apropriam e adaptam-
se quanto ao uso.
Durante a implantação de uma nova ferramenta, a organização busca escolher
uma área ou um grupo para ser responsável por testá-la durante um período determinado.
Depois, esse teste passa por uma ‘fase aberta’, em que qualquer funcionário tem acesso à
ferramenta para conhecê-la até chegar a uma data limite em que ela passa a ser utilizada
oficialmente por todos. O tempo de implantação varia e relaciona-se com a pressão que existe
por parte da própria diretoria em colocá-la disponível.
127
Na realização das entrevistas, constatou-se que, durante o desenvolvimento de um
novo sistema ou a migração de um sistema para outro, a Procergs preocupa-se com a sua
implantação, que, muitas vezes, não é realizada apenas internamente, mas também nos
clientes que utilizam essas ferramentas.
[...] sempre um processo de mudança é um processo de implantação, tem que
fazer manual, tem que treinar, tem que divulgar com antecedência, tem que
escolher um grupo piloto, daí implantar naquela divisão ou naquele grupo de
usuários. [...] Tem que treinar as pessoas, tem que mostrar a interface,
mostrar a telinha como funciona (Sujeito A).
A tendência de grande parte das pessoas é reagir das mais diversas formas durante
a implantação de uma nova ferramenta. Mas, nem todas se manifestam de forma ‘negativa’.
Algumas, inclusive, se voluntariam e se disponibilizam para experimentar, conhecer e testar a
nova tecnologia.
Sempre foi um processo de mudança, então sempre teve reação, sempre foi
difícil, sempre precisou treinamento, precisou de todo o esforço e nunca foi
de uma vez. Sempre que tem uma transição, têm pessoas reclamando,
reagindo contra a mudança. Têm alguns que se atiram já de cara, são
voluntários, têm outros que vão aprendendo aos poucos até se convencerem
e têm outros que agem o tempo que puderem para retardar a mudança, dizem
que é pior, ficam procurando motivo para não usar. Qualquer mudança causa
isso. (Sujeito A)
[...] quando começou a época dos microcomputadores para nós, tinham dois
na entrada do setor, que daí quem quisesse utilizar, tinha um colega que se
dispôs a ensinar. A primeira vez que eu me sentei lá, eu me lembro que foi
difícil. Naquela época de mudar de interface gráfica
60
, tinha muita gente que
não queria, porque a gente diz que aquele que se agarrou ao terminal o
larga. Essa mudança foi em 96 [...] e teve gente que reclamou bastante, aliás,
como em qualquer mudança (Sujeito E).
A fase de adaptação, internalização e aceitação das mudanças pelos funcionários
não é característica exclusiva da implantação das ferramentas de comunicação digital. Ela
ocorre sempre que existe alguma modificação nas rotinas vigentes. Segundo Vizer (2006, p.
326), “Como en toda tecnologia, su valor y su legitimación se determinan por sus usos, por el
contexto social en que se aplica y por las consecuencias que produce”.
Quanto à análise da implantação do Correio Eletrônico, da Intranet e das Listas de
Discussão, as opiniões foram diversas. De modo geral, percebe-se que qualquer processo de
128
implantação, seja de um software de trabalho ou de uma ferramenta de comunicação, tende a
causar algum tipo de reação no corpo funcional.
O interessante é que, como nós éramos os pioneiros, praticamente não tinha
ninguém usando esse tipo de ferramenta [o Memo], então a gente foi
aprendendo aos poucos, fomos os primeiros (Sujeito J).
Eu não diria resistência, mais a dificuldade mesmo. Então, ah, como fazer
alguma coisa? Ou pindura a máquina, o que fazer? Coisas que não ocorriam
com tanta freqüência, daí começaram a criar um outro tipo de problema. Mas
mais dificuldade, não diria rejeição, pelo menos que eu saiba, não (Sujeito
C).
Sempre tem gente que tem mais dificuldade, depende do jeito da pessoa.
Tem gente que é mais resistente a mudanças. Mas, no dia-a-dia, tu vais
descobrindo, aprendendo [...] (Sujeito I).
Eu acho que foi muito fácil, muito bom. A mudança, em geral, tem
resistências, é o normal das pessoas, mas nisso eu não me lembro de críticas,
de alguém achando que não ia dar certo (Sujeito J).
A Procergs foi pioneira na adoção e no uso do Correio Eletrônico no Rio Grande
do Sul. A implantação dessa ferramenta na vida organizacional foi a que causou maior
impacto no corpo funcional, visto que era uma inovação que gerava mudanças no modo como
se davam as práticas de trabalho e as trocas comunicativas.
Embora a tendência geral seja de resistência, percebe-se que essa está relacionada
com as características e a subjetividade e de cada indivíduo. Algumas pessoas aceitam e lidam
com as mudanças de modo mais sereno, adaptando-se mais tranqüilamente, outras não
apresentam a mesma facilidade. Além disso, o processo de apropriação o envolve somente
resistência ou rejeição, mas dificuldades durante a fase de apreensão das características de
uma nova ferramenta ou situação.
Eu noto que os meus colegas mais antigos, como eu, às vezes, têm mais
resistência. Os mais novos já não são muito resistentes. Se trocássemos o
Correio hoje, íamos notar o mesmo movimento, tem gente que se adapta e
tem gente que vai embora. Antigamente a resistência era maior (Sujeito E).
O processo de mudança também envolve um processo de descoberta e adaptação
interna, na medida em que, algumas vezes, é preciso se abrir mão de alguma coisa ou de uma
60
Interface gráfica - mecanismo de interação entre o usuário e o computador. Torna prática a utilização do
computador através de representações visuais como: ícones, janelas, etc.
129
prática conhecida, para se poder aprender e internalizar outra. Esse aprendizado pode conter
diversas tentativas de erro e acerto.
Em todas as situações, tu tens a curva do aprendizado, até aquilo se tornar
uma coisa transparente prá ti, se tornar automatizado, leva um tempo
(Sujeito A).
Como toda mudança, tu custa um pouco a te adaptar, mas, à medida que a
gente foi usando, fomos descobrindo e foi bem melhor. O Direto é bem
melhor do que o Memo. Claro que, porque estávamos acostumados com o
Memo, achávamos uma maravilha (Sujeito I).
Quando mudou do Memo para o Notes eu me lembro que teve resistência,
porque daí mudou para uma interface caracter para trabalho com mouse [...]
Então para trabalhar com o mouse, tu podes não acreditar, mas tinha gente
que não gostava, que não se dava bem, porque tem que ter uma coordenação
[...] Eu não conseguia apontar direito. Qual é o botão? Eu não sei (Sujeito E).
[...] essas migrações sempre têm muita resistência, ninguém quer trocar. Tu
aprendes, daí tu dominas aquilo ali. Daí, quando tu tens que trocar, não
interessa que ele tenha muito mais vantagens, as pessoas sempre resistem,
porque elas têm que aprender o novo, porque aquele que era bom. Elas não
conseguem ver o que esse daqui traz de bom, elas conseguem ver o que
elas vão perder naquela. Mas, principalmente o conhecimento, vão ter que
pensar de novo, se adaptar à nova ferramenta (Sujeito B).
De acordo com Freitas (1991), diante de situações em que os indivíduos
experimentam a perda de sentido e que geram algum desconforto, eles tendem a reagir ou
prendendo-se ao passado ou envolvendo-se com o presente de forma a negar a perda. Os
símbolos são criados para dar sentido à vida e, quando são quebrados, negados ou
substituídos, provocam esse tipo de reação e uma mudança na cultura.
Durante as entrevistas, constatou-se que, de modo geral, grande parte das pessoas
tendem a reagir e a resistir ao processo de mudança. Até pode-se dizer que essa resistência
seja um paradoxo. A Procergs é uma organização que tem como eixo de negócios o
desenvolvimento de sistemas e softwares e o seu relacionamento com a tecnologia é
intrínseco a sua constituição. Porém, mesmo assim, a mudança quanto à inserção ou aplicação
dos artefatos tecnológicos causa algum tipo de estranhamento ou de reações internas. É
provável que isso aconteça, talvez, porque a resistência seja mais inerente ao ser humano do
que propriamente à atividade exercida ou à natureza do seu serviço. Entretanto, também se
percebe que os funcionários mais novos que têm suas funções relacionadas diretamente com a
tecnologia parecem estar mais abertos ao processo de evolução digital, visto que esse faz parte
130
de sua rotina. Este aspecto torna a apropriação de alguma ferramenta mais tranqüila, como
expressa o sujeito E:
Nós somos fuçadores. Mas eu noto que, quando se fala em mudanças,
principalmente antigamente, que ficava muito tempo com um tipo de
tecnologia [...] não é como hoje, que a interface muda, às vezes, os lugares
dos botões, a disposição do menu. Então, naquela época, as resistências às
mudanças, eu acho, eram maiores (Sujeito E).
Os indivíduos também tendem a ter uma reação negativa quando não participam
da definição, criação e desenvolvimento de um novo processo ou da implantação de uma nova
ferramenta, e essa é simplesmente apresentada como algo novo que será instaurado a partir de
um momento específico. Segundo Marchiori (2004), a compreensão, o envolvimento e a
concordância dos funcionários com relação ao pensamento da alta administração auxiliam
para que novas idéias e atitudes sejam incorporadas naturalmente e as ações organizacionais
tenham credibilidade.
A incorporação e aceitação de novas idéias - de que fala a autora - são destacadas
pelo Sujeito A que afirma:
“Quando tu estás trabalhando naquilo que vai mudar, tu vais conhecendo,
vais te empolgando. Agora quando tu não tens nada a ver com aquilo,
quando se diz que agora não vai mais ser esse, mas vai ser aquele, tem
aquele negócio da curva do aprendizado, que antes daquilo te ajudar, na
verdade atrapalha”. (Sujeito A)
O Sujeito F não participou da fase de implementação do Direto, mas fez parte do
grupo piloto que testou a ferramenta antes da sua expansão pela empresa.
Eu participei da fase de avaliação do Direto, para ver se ele era bom ou não.
Então foi instalado na minha máquina e mais de algumas pessoas para que a
gente fosse testando. Daí para a transição total foi rápido, não teve problema
internamente (Sujeito F).
O seu contato prévio com o Correio Eletrônico confirma a afirmação do Sujeito
A, pois ele sentiu-se incluído ao participar do processo, o que possibilitou que tivesse uma
experiência e uma visão positiva com relação à fase de implantação, assim como de aceitação
com relação à mudança.
O Sujeito H também acha que a transição da evolução tecnológica se deu de
maneira natural, principalmente após os computadores terem se popularizado e a aquisição
para ter um equipamento em casa ter se tornado algo mais trivial.
131
À medida que a tecnologia foi evoluindo, acho que a partir de 96 a gente já
teve uma facilidade maior de comprar computadores e ter computador em
casa e o uso dessas ferramentas, o uso da Internet, do correio, de todas as
tecnologias que surgem a cada momento. [...] Hoje o pessoal tem facilmente
um processo de adoção, conhecimento, utilização da tecnologia sem grandes
problemas de ter que dar um treinamento porque via de regra as pessoas tem
em casa um equipamento melhor do que aquele que a gente usa no trabalho
(Sujeito H).
O relato do entrevistado demonstra que, à proporção que a inserção do
computador na vida privada das pessoas foi tornando-se rotineira, também gerou facilidades
para que, de casa mesmo, pudessem ser feitas melhorias em termos de hardware, software e
outros equipamentos. Esse aspecto faz com que, muitas vezes, o processo de atualização seja
mais rápido fora da organização do que aquele que ocorre internamente.
Com relação à Intranet, constatou-se que a sua inserção na organização teve
menor impacto do que a implantação do Correio Eletrônico. Como o seu surgimento foi
posterior ao da Internet e os funcionários estavam acostumados a navegar na web, a sua
apropriação ocorreu de modo mais tranqüilo.
Eu tenho a impressão que a Intranet foi menos traumática, porque, na
verdade, a Intranet não substituiu nada. Sempre que tu implantas alguma
coisa que não está substituindo nada, é mais fácil (Sujeito A).
O impacto foi bem menor com relação ao uso da Internet para a Intranet.
Não foi tão grande o impacto como foi com relação ao uso do Memo
(Sujeito C).
Embora a implantação da Intranet não tenha causado grande incômodo nos
funcionários, a introdução do Procergs Comunica passou por uma fase de estranhamento,
mudança e aceitação. Antes da criação da Assessoria de Comunicação, a comunicação interna
da empresa era feita de modo mais improvisado e informal, pois cada setor criava seus
próprios canais de comunicação, por exemplo, as Páginas Internas. De modo geral, essa
comunicação era feita por profissionais que não eram oriundos da área, sem uma grande
preocupação com a formatação da comunicação e da informação. Com a criação da
Assessoria de Comunicação, o processo comunicativo da organização passou a ser
centralizado nesse setor, sob responsabilidade de profissionais especialistas nessa área.
Inicialmente, essa nova estruturação provocou resistência entre os funcionários,
pois alterou o modo como vinham “fazendo” a comunicação, mexendo tanto nas práticas que
132
eram adotadas até então, como na cultura organizacional. Nesse sentido, o lançamento do
Procergs Comunica também alterou o modo como o processo de comunicação ocorria dentro
da organização, na medida em que passou a ser o canal oficial de comunicação da
organização para com os seus funcionários.
Com o objetivo de sensibilizar o público interno quanto a esse canal, a
Assessoria de Comunicação desenvolveu duas formas de abordagem. A primeira refere-se à
publicação da informação na Intranet, e a segunda, diz respeito ao envio do link com as
manchetes do dia através do Correio Eletrônico para a caixa postal de todos os funcionários.
A segunda é um complemento da primeira e visa estimular o público interno a acessar o
Procergs Comunica. Assim, gradualmente, os funcionários foram sendo sensibilizados e, na
medida em que perceberam que ali são divulgadas todas as informações oficiais da
organização, foram apropriando-se da ferramenta. Ressalta-se que, de acordo com a
percepção de alguns entrevistados - relatada anteriormente - essa apropriação vem
crescendo, mas ainda não acontece por todo corpo funcional.
A introdução das Listas de Discussão não causou estranhamento. Muitos
entrevistados conheciam essa ferramenta, pois participavam de Listas externas à Procergs.
Assim, a adaptação e o processo de apropriação ocorreram facilmente, de acordo com a
iniciativa de cada interessado em participar das trocas comunicativas via Listas.
Percebe-se assim que, “o processo de comunicação evoluiu na medida em que o
homem encontrava sinergia entre modos, formas e meios de expressão” (CORREA, 2005, p.
98). A inserção do Correio Eletrônico foi o instrumento que demarcou uma importante
mudança na comunicação organizacional. Ele gerou grandes transformações no modo como
se davam as práticas comunicativas e de trabalho. A introdução da Intranet e das Listas de
Discussão não tiveram o mesmo impacto, pois seu surgimento foi posterior ao
desenvolvimento das redes telemáticas e da Internet, o que facilitou a adaptação e a aceitação
dos funcionários.
Nesse item, abordou-se a apropriação e adaptação dos funcionários com relação às
mudanças produzidas pela implantação do Correio Eletrônico, da Intranet e das Listas de
Discussão na rotina de trabalho. Com o intuito de complementar a forma como ocorreu essa
apropriação, na próxima parte, trata-se sobre as práticas culturais que foram geradas a partir
da utilização dessas ferramentas de comunicação digital.
133
7.4 COMUNICAÇÃO DIGITAL E GERAÇÃO DE NOVAS PRÁTICAS
CULTURAIS
Como se percebeu até o momento, a implantação da comunicação digital na
Procergs gerou uma série de transformações, não apenas técnicas, mas também nas práticas
culturais. Conforme já foi discutido anteriormente, considera-se que a análise cultural abrange
o estudo das formas simbólicas – ações, objetos e expressões – em relação ao contexto
observado. Nesse sentido, a cultura abarca o conjunto de práticas materiais e imateriais
compartilhadas entre os funcionários da organização. Ela não é algo que aparece sempre da
mesma maneira, pois pode transformar-se de acordo como cada grupo usa, apropria-se,
comunica, interpreta e modifica o significado dos elementos simbólicos.
Dentro dessa concepção, analisam-se quais transformações a incorporação das
ferramentas de comunicação digital provocou nas práticas culturais dos funcionários da
Procergs. Para tanto, considera-se que qualquer prática social contém uma dimensão
significante que lhe dá sentido, que a constitui e constitui a interação dos indivíduos na
sociedade (CANCLINI, 2005). Segundo Marchiori, (2006a), todas as práticas podem ser
analisadas a partir de um ponto de vista cultural. Para entender o seu significado, deve-se
buscar identificar aspectos que possuam conteúdo, analisando-os com relação ao contexto
social e histórico em que estão inseridos.
Durante a realização das entrevistas, percebeu-se claramente que a incorporação
das ferramentas de comunicação digital no cotidiano dos funcionários provocou mudanças e a
geração de algumas práticas culturais como: acesso do Correio Eletrônico de casa; Correio
Eletrônico aberto o dia inteiro; registro e arquivamento eletrônico da informação;
gerenciamento das ações do cotidiano a partir do acesso ao Correio Eletrônico; utilização do
Correio Eletrônico mais do que o telefone; comunicação presencial; construção de
repositórios de informação; gestão do conhecimento; dedicação de maior tempo à busca e
leitura de informações.
A seguir, alguns trechos das entrevistas serão relatados com o propósito de
ilustrar a percepção dos entrevistados. Lembra-se que esta é uma análise qualitativa que visa
conhecer em maior profundidade o fenômeno estudado. Portanto, não se busca quantificar o
número de respostas dadas pelos participantes da pesquisa, e sim analisar o conteúdo das falas
observadas.
134
A) Acesso do correio eletrônico de casa
O acesso ao Correio Eletrônico de casa foi uma das práticas bastante salientadas
pelos entrevistados. Ela é vista como algo que faz parte da rotina e não como algo incômodo
ou um “trabalho extra” que deve ser realizado após o término do expediente.
É uma prática acessar os e-mails de casa, principalmente para ver os e-mails
particulares, mas mesmo os da Procergs eu consulto em casa (Sujeito H).
Boa parte dos funcionários que eu conheço usa o e-mail também para
assuntos particulares, então eles usam esse e-mail 24h por dia, em casa ou no
trabalho estão usando o mesmo endereço. Eu estou tentando separar as
coisas, tentando cada vez menos usar o e-mail da empresa para isso (Sujeito
L).
Fora do horário de trabalho eu não acesso [...] Quando estou em férias, eu
até acesso de casa, mas não olho assuntos que sejam de trabalho, olho
assunto que eu vejo que é muito urgente ou alguma coisa que me mandaram
e é pessoal [...] o motivo de acessar quando estou de férias é porque a nossa
caixa postal é limitada [...] se começar a cair muitas coisas ali que ocupem
muito espaço [...] tem pessoas que tentam acessar a minha caixa nesse
período e a caixa vai estar lotada e a mensagem que é importante, não vai
entrar (Sujeito G).
[...] eu chego em casa e não fico pensando mais no serviço. Depois eu acesso
minha caixa postal porque é a administração do meu pequeno espaço de
armazenamento de dados, eu tenho que limpar, não tem jeito (Sujeito E).
Ontem, por exemplo, às 10h da noite, eu tava reagendando uma reunião que
a gente vai ter na sexta-feira. Eu me acostumei, é um hábito, tu entras
em casa na Internet, clicas no Correio e dás uma olhada, vês que tem um
monte de coisas e daí já fazes uma limpeza na caixa (Sujeito A).
Chegou o domingo, a gente entra prá dar uma olhada na agenda e ver o que
tem na segunda-feira. [...] é aquele negócio meio doido, domingo tem cara
respondendo e-mail, a gente recebe e-mails de madrugada e coisas assim [...]
Mas, hoje, eu estou muito mais policiado, eu deixo para acessar aqui. No
início eu entrava mais, pois, quando é novidade, tu te empolgas, a gente fica
deslumbrado com a tecnologia (Sujeito D).
No fim de semana, eu acesso a Lista, aliás, os e-mails mais trabalhados [das
Listas de Discussão], as mensagens mais trabalhadas para a Lista eu faço em
casa. Tu tens que procurar algum livro, ler, pegar um trechinho para falar,
para escrever alguma idéia que eu li de algum lugar, essas coisas eu faço em
casa (Sujeito J).
As razões que levam as pessoas a acessar o Correio Eletrônico de casa estão
associadas à intenção de cada indivíduo: alguns o fazem, porque utilizam o endereço de e-
135
mail da organização para tratar tanto assuntos profissionais como pessoais; outros, para fazer
limpeza na caixa postal, porque o Correio Eletrônico possui um espaço limitado; e outros
ainda, para verificar os compromissos agendados para o dia seguinte e/ou para reagendá-los e
enviar mensagens. Percebe-se também que existe um esforço para mudar esse hábito, ao passo
que os funcionários entrevistados tentam se policiar para evitar o acesso de casa e / ou
procuram separar os endereços de Correio Eletrônico, buscando ter um para assuntos pessoais
e outro para profissionais.
B) Correio Eletrônico aberto o dia inteiro
Trabalhar com o Correio Eletrônico aberto durante todo o dia é outra prática muito
comum entre os participantes. Esse hábito é adotado, porque o Correio é considerado uma
ferramenta facilitadora do trabalho, pois agiliza a comunicação, centraliza e otimiza a
realização das tarefas.
Poucos participantes ressaltaram que, embora trabalhem com ele aberto -
minimizado no canto da tela do computador - conseguem estabelecer uma disciplina com
relação a sua visualização, estipulando horários para verificar as mensagens recebidas. A
grande maioria demonstrou a necessidade de visualizá-lo constantemente para conferir cada
mensagem que chega.
Antes da entrada do Correio Eletrônico, o telefone podia ser considerado um
relevante meio de comunicação no espaço de trabalho. Em teoria, pode-se pensar que a
comunicação realizada através do Correio poderia acabar com as interrupções causadas pelo
toque insistente do telefone, pois cada pessoa pode escolher acessá-lo no horário que for mais
conveniente para ler as mensagens. Entretanto, percebe-se que isso não se confere na prática,
o que faz com que o acesso permanente à caixa postal atravesse e interrompa a realização das
atividades diárias dos funcionários.
Não fico olhando toda hora, mas ele fica aberto [...] Eu o deixo minimizado
no canto da tela e, especialmente no início do dia e no fim do dia, é certo que
eu vou olhar (Sujeito J).
Mantenho ele sempre aberto [...] às vezes, acabo me passando em alguns e-
mails. E tanta coisa, ele é útil, mas sei lá, às vezes, tenho uma relação meio
conflituosa com e-mails porque é difícil eleger qual é a prioridade. [...]
Porque eu elenco como prioridade despachar um processo, fazer uma
reunião, um relatório e, no atual momento, eu estou trabalhando muito com
informações gerenciais e preciso elaborar muitas coisas, então eu acabo
priorizando essas atividades e os e-mails eu vou ler depois (Sujeito D).
136
Dependendo da função, o Correio Eletrônico atrapalha a produtividade. Se a
pessoa não souber se gerenciar, ele interrompe o que tu estás fazendo. Tem
pessoas que têm disciplina, acessam o e-mail às 8h da manhã, depois perto
do meio-dia e no final da tarde. Admiro! Eu trabalho com ele aberto e ele
picota as minhas atividades, interrompe, é um problema (Sujeito A).
A caixa postal fica aberta o dia inteiro, direto. minimizo para acessar
outras coisas e vou trocando a tela [...] ele é uma das ferramentas de
trabalho, eu preciso tê-lo aqui e eu preciso me manter atualizado (Sujeito G).
Tu podes dar uma volta aqui agora e tá todo mundo com o Correio aberto
(Sujeito B).
Sempre tem que estar com a caixa aberta. Sempre tem que estar se
comunicando (Sujeito I).
O fato de grande parte dos entrevistados trabalharem com o Correio aberto não
significa que a ferramenta seja ruim ou ineficiente. Apenas demonstra que a melhor forma de
utilizá-la está relacionada diretamente com o comportamento e o uso que cada indivíduo faz
dela. Pode-se dizer que, apesar dessa prática depender da intenção de cada indivíduo e de não
existir nenhuma regra organizacional que a formalize dentro do contexto organizacional, ela
se encontra convencionada e institucionalizada dentro da Procergs, pois o seu significado é
compartilhado por todos os funcionários.
Ainda que as ferramentas analisadas não sejam instrumentos que possibilitem
estabelecer uma comunicação instantânea – como MSN, Google Talk, PSI – em alguns
relatos, ficou evidente que, devido aos entrevistados permanecerem conectados o tempo todo
e o Correio Eletrônico permanecer aberto o dia inteiro, em alguns indivíduos, ele pode
provocar a sensação de que o seu funcionamento é instantâneo. Essa sensação gera
expectativas nos usuários, pois esses podem imaginar que, pelo fato da mensagem ter sido
enviada, ela também foi lida, supondo que o processo foi concluído. Assim, ficam aguardando
um retorno do destinatário. Porém, isso pode não acontecer, que, por diversas razões,
aquele a quem se destina a mensagem pode não acessar o Correio com a mesma freqüência e
intensidade que a pessoa que a emite o faz. Desta forma, percebe-se que a ferramenta pode ser
eficaz na entrega da informação, mas não necessariamente na efetivação do processo
comunicativo, pois esse depende da participação de todos os interlocutores envolvidos no
relacionamento comunicacional.
137
Tu recebes um e-mail e não respondes logo. a pessoa acaba te
telefonando, te mandei um e-mail, porque acaba criando uma expectativa
de que ele fosse quase como um MSN, uma mensagem instantânea (Sujeito
A).
A facilidade que trouxe, uma vez que da nossa mesa nós nos comunicamos
com qualquer um. Esses meios fizeram com que pudéssemos interagir quase
que intantaneamente. [...] Eu faço um trabalho na minha mesa e distribuo
para todo mundo (Sujeito F).
A sensação de instantaneidade não é compartilhada por todos os indivíduos. As
distintas pretensões de cada entrevistado em relação à forma e a freqüência com que realizam
o acesso ao Correio Eletrônico referenciam que, para cada um deles, existe uma diferença em
relação ao que representa o acesso ao Correio Eletrônico. Os indivíduos que têm a sensação
de que a ferramenta é instantânea parecem entender a comunicação como algo único, e
não percebem que ela depende da articulação de todos os envolvidos no relacionamento
comunicacional.
C) Registro e arquivo eletrônico da informação
O registro da mensagem através do Correio Eletrônico é uma prática adotada no
intuito de formalizar e oficializar o processo de comunicação. Proporciona uma espécie de
segurança para quem envia e para quem recebe a mensagem, visto que o seu arquivamento
permite que, posteriormente, ela seja consultada, auxiliando a evitar possíveis distorções que
possam ocorrer nas trocas comunicativas.
Para a consulta dessas mensagens, os usuários se valem de um artifício: criam
pastas eletrônicas para arquivar os e-mails recebidos que são considerados relevantes.
Ressalta-se que o volume de mensagens recebidas diariamente é muito elevado
61
, o que torna
essa tarefa algo interminável, provocando o acúmulo de muitas informações registradas que
ficam centralizadas na caixa postal de cada usuário.
No meu entender, a mensagem eletrônica formaliza um contato pessoal, seja
anterior ou posterior. Eu gosto de conversar com a pessoa: ta, entendeu! Ta,
tudo bem. Daí, nós fazemos uma ata de reunião, ou mando um e-mail:
Conforme o combinado... [...] (Sujeito C).
61
Alguns entrevistados relataram que recebem mais de 100 mensagens por dia via Correio Eletrônico.
138
Eu acho que isso é um grande ganho que a gente tem utilizando essas
ferramentas, porque se tu fores pensar que se a gente tivesse tudo na base do
verbal, a gente não teria essas coisas a nossa disposição de poder resgatar
exatamente o que foi dito, o que foi conversado. Lógico que se tu tentar
lembrar disso, vai acabar esquecendo de algo que foi dito ou vai deturpar. Na
verdade, tens a segurança de que a informação que tu resgatas é aquela
mesma que foi tratada naquele momento (Sujeito G).
Centenas de pastas, todos eles arquivados. Volta e meia eu deleto, chego lá e
vejo os e-mails mais antigos. Deletar que eu digo é de anos anteriores, está
na época de deletar 2001, 2002, dependendo da pasta (Sujeito H).
Se te mandam uma notícia por ali tu não tens como armazenar e tens que
ficar criando artifícios para isso, daí tu começas a criar pastas para
armazenar as mensagens. [...] Se tem que centralizar em algum lugar, não é
no Correio Eletrônico (Sujeito A).
Pode-se dizer que o registro e arquivamento eletrônico da informação é uma
prática que substituiu o seu registro e arquivamento em “pastas físicas”. Apenas uma
entrevistada disse que ainda permanece com o hábito de imprimir os e-mails e guardar todas
as informações em “pastinhas”. Para isso, após recebê-los, ela separa aqueles que julga
importante, faz a sua impressão, arquiva na pastinha - e exclui as mensagens recebidas na
caixa postal.
Imprimo e guardo [...] é muita informação [...] deixo na pastinha [física]
(Sujeito I).
Apesar da entrevistada I ter relatado que não arquiva as mensagens em pastas
eletrônicas, entende-se que, de modo geral, existe um consenso operacional entre os
funcionários quanto ao registro e arquivamento eletrônico da informação. Embora não exista a
indicação de uma regra corporativa que formalize essa ão, compreende-se que, a partir do
momento em que a organização a reconhece para solucionar possíveis distorções no processo
de comunicação, ela convenciona a realização dessa prática no trabalho.
D) Gerenciamento das ações do cotidiano a partir do acesso ao Correio
Eletrônico
A possibilidade de integrar todas as ferramentas e softwares com o Correio
Eletrônico faz com que ele torne-se uma ferramenta centralizadora de informações. Percebe-
139
se, nessa questão, a existência de uma distorção, na medida em que o Correio Eletrônico é
uma ferramenta de comunicação, mas passa a ser utilizado como uma ferramenta
“responsável” pelo gerenciamento do trabalho.
De um lado, a adoção dessa prática pode ser vista como facilitadora e otimizadora
do trabalho. De outro, impede que os funcionários tenham uma postura pró-ativa na busca
pela informação, pois, ao comportar-se de modo mais passivo, ficam aguardando que essa
chegue até a sua caixa postal e terminam por não entrar em outros repositórios, sejam
softwares, sistemas e, até mesmo, na própria Intranet e no Procergs Comunica.
Eu vejo que o e-mail se tornou ferramenta de trabalho e isso é um problema.
E-mail não tem estatística, tu não consegues contabilizar o tempo que as
pessoas trabalharam, nada [...] A quantidade de e-mails respondidos não
quer nos dizer nada. [...] Porque o e-mail está numa caixa pessoal, aquela
pessoa que responde, tu não consegues socializar o assunto que eles estão
discutindo. A partir do momento em que tu passas a usar ele como
ferramenta de trabalho, tu acabas prejudicando os teus processos de trabalho
[...]. O problema é que tu não consegue fazer nenhuma avaliação da
prestação do teu serviço. [...] Se, por um lado, agiliza, facilita a dinâmica,
por outro lado, te rouba essa capacidade de poder avaliar, de poder
quantificar o trabalho das pessoas, de poder ter algum indicativo para custos
(Sujeito B).
Agora o que eu percebo, e é um aspecto mais pessoal, é que parece que a
gente ficou meio preso ao e-mail. Porque o e-mail entra direto no processo
de ferramenta oficial, saiu ali, parte-se do pressuposto que tu estás
informado, se tu leste ou não problemas teu. Porque, além da Intranet, ele é
considerado um meio de comunicação oficial (Sujeito D)
Cada vez menos a gente devia se basear no e-mail. Mas hoje, na prática,
qualquer ferramenta que a gente põe no ar, quase que virou uma regra ter
integração com o e-mail (Sujeito L)
Outro dia eu comecei a fazer uma campanha nos projetos em que eu trabalho
para a gente parar com esse negócio de integrar as ferramentas com o e-mail.
A gente gerenciando muito o trabalho, gerenciando a empresa pelo e-mail
[...] (Sujeito A)
Embora essa prática seja vista com algumas restrições pelos entrevistados,
entende-se que ela se encontra estruturada e convencionada, pois existe uma concordância
que orienta a ação dos membros organizacionais, na medida em que todos os projetos
desenvolvidos dentro da organização devem ter conexão com o Correio Eletrônico.
140
E) Utilização do Correio Eletrônico mais do que o telefone
Alguns entrevistados relataram que, com a possibilidade de estabelecer a
comunicação por meio do Correio Eletrônico, esse passou a substituir a comunicação por
telefone. Percebe-se que, neste caso, a prática comunicativa permanece mediada, o que
mudou foi o suporte através do qual é estabelecido o relacionamento comunicacional.
Eu uso muito mais o e-mail do que o telefone. Eu desestimulo as pessoas a
me telefonarem. Se alguém me telefonar e eu tiver que retornar o
telefonema, de repente vou deixar isso para o outro dia. Se for por e-mail, eu
faço na hora (Sujeito A).
Eu acho que o e-mail eu estou usando até mais do que o telefone. Mas eu
recebo muita ligação de pessoas que demandam informações da minha área
de trabalho. Quando sou eu que preciso entrar em contato, estou usando mais
o e-mail do que o telefone (Sujeito G).
Certamente [as ferramentas] substituíram o telefone. Aquilo que vocês fazia
por telefone, a grande maioria das comunicações que se fazia por telefone,
foram trocadas por esses mecanismos. E grande parte da comunicação
pessoal também (Sujeito H).
Entende-se que, a partir do momento em que a organização disponibiliza a
ferramenta para ser utilizada nas rotinas de trabalho, ela está convencionando que a mesma
seja utilizada no processo de comunicação. Porém, como não existe nenhuma regra que
formalize essa prática, o maior uso do Correio Eletrônico com relação ao telefone depende da
intenção de cada indivíduo, pois as razões que os levam a fazer isso têm uma representação
distinta para cada um deles.
F) Comunicação presencial
O advento da comunicação em rede proporcionou uma série de facilidades.
Permitiu maior mobilidade aos usuários, agilidade no processo de comunicação e fluidez na
realização das atividades profissionais, fazendo com que, hoje, as pessoas dependam menos
do deslocamento físico para conseguir alguma informação ou executar alguma tarefa.
Embora essas facilidades estejam presentes no cotidiano dos entrevistados,
detecta-se que a utilização das ferramentas de comunicação digital é uma prática que não
substituiu a comunicação face a face. Os participantes julgam relevante, dependendo da
141
situação ou do assunto a ser tratado, estabelecer a comunicação presencialmente. Ao contrário
daquela que é mediada - e que pode propiciar mal entendidos, pois depende que a capacidade
de expressão de quem emite a mensagem esteja em sintonia com a capacidade de
interpretação de quem a recebe esta, permite perceber a manifestação facial e corporal, os
gestos e a entonação da voz do outro interlocutor. Assim, ambos os participantes poderão ter
maior certeza de que determinada situação foi compreendida e que o processo de
comunicação se deu de maneira efetiva.
O e-mail funciona muito bem quanto tu conheces a pessoa e estabeleces um
tipo de protocolo. O problema é dosar essas coisas todas, utilizar o e-mail
para aquilo que ele é melhor, utilizar a Intranet para aquilo que ela é melhor,
utilizar o contato pessoal prá aquilo que ele é melhor. Esse é o grande
desafio hoje, né! (Sujeito A).
A comunicação eletrônica afastou um pouco as pessoas, ela propicia mal
entendidos, interpretação errada. [...] Hoje, por exemplo, a Procergs está e
nós estamos aqui. A gente comunica muita coisa por e-mail, mas tu não crias
um espírito de corpo. Então, com a comunicação eletrônica só, tu o
consegues isso. O contato pessoal é fundamental (Sujeito C).
Determinados assuntos são mais polêmicos eu trato pessoalmente, o trato
por e-mail. Depois eu vou para o e-mail: Conforme conversamos, faça tal
coisa’. Porque se eu largar simplesmente um e-mail, a pessoa pode não
entender perfeitamente. Se eu chamo, converso, eu consigo antecipar uma
situação, eu consigo eliminar uma reação negativa numa leitura de um e-
mail (Sujeito D).
[...] se é uma coisa que eu precise explicar melhor e que talvez escrevendo
não fique muito claro, daí talvez eu até a pessoa ou ligue e explique a
situação. Que daí tem aquela troca, eu falo, e pessoa me responde e eu vejo
se ela entendeu mesmo, aí depois eu posso formalizar por e-mail (Sujeito E).
[...] Quando eu não tenho a necessidade de ter isso por escrito, eu prefiro até
levantar e ir falar com a pessoa ou por telefone. Eu aprecio a manutenção
desse contato [...] eu vou até as pessoas [...] eu circulo mais na empresa, eu
sei onde as pessoas estão, onde elas sentam, quais são os setores (Sujeito G).
Ela [a comunicação digital] não substitui, porque é normal quando você tem
que tratar de um determinado assunto você pensar: eu vou mandar um e-
mail, pegar o telefone ou conversar pessoalmente. Depende muito do assunto
que você vai tratar [...] Determinados assuntos não para conversar por
telefone, eu vou levar mais tempo, porque o assunto merece um contato face
a face para ver a reação da pessoa em relação ao que está sendo tratado
(Sujeito H).
Continuo tendo contato [pessoal], porque eu acho também que tu não podes
só ficar atrelada às ferramentas (Sujeito I).
Ajuda a agilizar os processos, aproximar e até aumentar a velocidade, mas
tem muita coisa que tu só resolve olho no olho (Sujeito L).
142
Embora os participantes considerem a comunicação presencial essencial no dia-a-
dia profissional, ressalta-se que, dependendo do perfil de cada indivíduo e a atividade
exercida, algumas vezes, o seu mundo pode restringir-se ao setor em que trabalha, não
estabelecendo contato intenso com outras pessoas. Nesse caso, as ferramentas digitais de
comunicação favorecem a comunicação, mas também estimulam o isolamento, na medida em
que essas pessoas se comportam de modo a evitar o contato face a face para comunicar-se.
Aqui na empresa tem muitas pessoas que eu acho até que se escondem um
pouco atrás dessa tecnologia toda [...] o pessoal que trabalha na área técnica,
pessoal de andar, são pessoas mais fechadas, o pessoas bem menos
expansivas, são pessoas que falam pouco umas com as outras, a gente nota
essa diferença (Sujeito G).
O pessoal da área de tecnologia tem um perfil mais reservado, eles valorizam
muito as ferramentas. Muitas vezes, tu podes ver um técnico que não fala o
dia todo, mas ele está em constante comunicação através do e-mail e de
todas as ferramentas de comunicação que possam existir. [...] Esse é um
perfil porque essas pessoas que trabalham com TI
62
dominam muito bem
essas ferramentas (Sujeito L).
Dependendo do significado que cada indivíduo pretenda dar para a comunicação,
escolherá o modo mediado ou face a face que a represente. Nesse sentido, com o objetivo
de que a mensagem seja compreendida pelo outro interlocutor, os participantes do processo
comunicativo escolhem intencionalmente o meio que julgam ser o mais adequado para
comunicar-se. Apesar da existência dessa intenção, ela não oferece garantias de que quem
recebe a mensagem terá a mesma compreensão daquele que a emitiu, pois essa compreensão
necessita da capacidade interpretativa de codificação e decodificação de cada indivíduo
envolvido no relacionamento comunicacional.
G) Construção de repositórios de informação
O fato de a Procergs ser uma empresa de tecnologia e ter grande parte do seu
quadro funcional sediado na área técnica possibilita que muitos analistas e programadores
tenham grande facilidade em construir repositório de informações, tornando essa prática uma
questão presente na organização.
62
Ao utilizar a expressão TI, o entrevistado está se referindo a tecnologia da informação.
143
Além dos repositórios ‘formais’, como os grandes sistemas e softwares utilizados
no trabalho, existem diversos outros menores, que são desenvolvidos a partir de necessidades
específicas de um indivíduo ou grupo de trabalho. Essa facilidade transforma-se, na realidade,
em uma dificuldade, pois o excesso de repositórios faz com que a informação, muitas vezes,
torne-se deslocada e, até mesmo, seja perdida.
Tem vários locais onde tem informação. Isso é uma coisa que eu acho que se
tudo estivesse na Intranet, talvez também estimulasse mais o uso (Sujeito B).
Precisa ter alguma coisa mais voltada para isso, que consiga centralizar e ter
uma entrada para todos os repositórios de informação que tem na empresa
(Sujeito A).
A construção de um repositório de informação está associada com o propósito
particular de cada indivíduo. Ressalta-se que, com essa prática, o funcionário despende tempo
na construção de um sistema ou programa para arquivar as informações que julga relevante.
Além disso, duplica a informação que fica registrada, ao mesmo tempo, em um repositório
formal e em um ‘particular’. E quando o registro ocorre somente no repositório particular, a
informação deixa de ser compartilhada, pois o seu acesso torna-se restrito somente a quem o
construiu.
H) Gestão do Conhecimento
A Gestão do Conhecimento é uma prática adotada na Procergs desde 2001, na
área de operações e desenvolvimento. Como ela já foi abordada no item 7.2.3, onde se tratou
sobre as Listas de Discussão, optou-se por, nesta parte da dissertação, não se fazer uma
referência à fala dos entrevistados.
Embora a participação nas Listas de Discussão não conte com o envolvimento de
todos os funcionários, ela é uma prática que se encontra convencionada dentro da
organização. A participação resulta da iniciativa de cada indivíduo, que irá escolher
intencionalmente participar dessa prática, dependendo da relevância que essa faz para ele.
144
I) Dedicação de maior tempo à busca e leitura de informações
algum tempo, pensava-se que o advento tecnológico traria muitas facilidades
ao cotidiano, como agilizar os processos e otimizar as atividades no trabalho, possibilitando
um maior tempo livre para as pessoas se dedicarem ao lazer e à família. Com certeza, a
incorporação das ferramentas de comunicação no dia-a-dia profissional trouxe uma série de
benefícios. Entretanto, por conta da sua utilização, a quantidade de informação que é acessada
e recebida diariamente também aumentou consideravelmente.
Antes, a busca pela informação era certeira, pois ela encontrava-se catalogada e
guardada em pastas e arquivos. Hoje, devido à variedade de ferramentas disponíveis e à
facilidade com que se tem acesso à informação, ela encontra-se alastrada em diversos
repositórios.
[antes] tu querias saber tal assunto era na pastinha laranja, tal assunto na
pasta verde. Era mais fácil. Hoje proliferado. Às vezes, tu não
consegues tal informação (Sujeito B)
A sensação é a seguinte, eu respondo 10 e-mails, quando eu vou ver tem
mais 30 que acabaram de entrar. A gente acaba no horário do expediente,
selecionando e-mail, porque se deixar a gente acaba passando tanto dentro
quanto fora da empresa respondendo e-mails. Esse é o lado negativo, a
sensação de que se tem muito mais trabalho [...]. Tem muita informação.
[...] Os e-mails internos não são spams e muitas pessoas não avaliam na hora
de mandar os e-mails como cursos, piadas, etc [...] Como ficou muito mais
fácil tu enviares uma informação, um e-mail, uma mensagem, acabou
atribulando a gente. [...] Agora se perde muito tempo avaliando e eliminando
coisas que não são úteis.
(Sujeito D)
[...] como as informações caem na tua caixa, como a quantidade de
informações cresceu muito, a gente ficou com menos tempo e mais trabalho.
Tanto é que a gente faz trabalho em casa (Sujeito E).
Eu vejo aqueles problemas que todo mundo vê de caixa postal, receber
coisas que tu não devias, que tu não solicitaste, que te roubam tempo de
leitura, roubam espaço na tua caixa postal, esse é um aspecto negativo. A
gente recebe muita coisa que não solicitou. Algumas coisas até, de repente,
podem ser úteis prá ti, mas outras não são, e, às vezes, a gente perde tempo
abrindo e lendo ou começando a ler até te dar conta de que aquilo não te
interessa, é um tempo despendido, o fato de parar para verificar o que é
que é, quando não está óbvio no título da mensagem, é um desperdício de
tempo (Sujeito G).
Lembro que, 10 anos atrás, a gente via todas essas ferramentas como uma
forma de aumentar a produtividade e conseguir fazer as coisas mais
rapidamente (Sujeito L).
145
Essa prática faz com que os funcionários tenham que dedicar um tempo maior de
busca e de leitura para verificar e analisar a relevância dessas informações, dando margem
para a criação de um paradoxo. As ferramentas que deveriam auxiliar a agilizar as atividades
diárias, na realidade, não conseguem atender à demanda informacional disponível. Nesse
sentido, hoje é necessário se fazer muito mais na mesma quantidade de tempo.
Através da análise da fala dos sujeitos entrevistados, constata-se que a inserção
das ferramentas de comunicação digital na Procergs interfere nas práticas culturais ao
proporcionar uma mudança de comportamento no modo como são estabelecidas as relações
comunicativas e possibilitar maior participação dos funcionários no processo de comunicação.
Entretanto, a utilização dessas ferramentas não horizontaliza o relacionamento entre a
organização representada pelo corpo gerencial, diretivo e os funcionários, pois,
dependendo da forma como forem empregadas, podem promover a aproximação ou o
distanciamento entre ambos.
[...] antes, tu não tinha o e-mail e tu queria falar com o chefe, tu tinha que ir
na sala dele, ou tu tinha que ligar e perguntar. Agora não. Tu mandas um e-
mail prá ele, tu tratas o assunto com ele, tu participa ele das coisas que tu
está fazendo (Sujeito B).
Elas trazem o funcionário para mais perto da chefia, quer dizer, qualquer
funcionário hoje pode enviar uma mensagem para um diretor, presidente.
que o problema é que muitas chefias eventualmente não têm o perfil de
muita interação pessoal com os funcionários, e podem passar a criar uma
formalidade na comunicação que às vezes não existia. Antes a chefia era
obrigada a sentar com o funcionário para conversar, planejar o trabalho,
trocar uma idéia. Hoje em dia, um superior pode se esconder através de um
e-mail, achando que o funcionário recebeu e entendeu (Sujeito L).
Se o chefe vai ficar gerenciando só por e-mail, acaba sendo um grande
problema. Tem coisas que têm que se fazer olho no olho. [...] Quando tu
manda um e-mail tu nunca tem certeza se a pessoal está entendendo aquilo
que tu quis dizer. Quando tu falas numa reunião tu vê pela cara do sujeito se
ele tá entendendo ou não (Sujeito A).
De modo geral, percebe-se que as práticas relatadas não são resultado de uma
convenção que tenha sido institucionalizada pela organização. São uma construção social,
representam e expressam o modo com que os entrevistados melhor adequaram-se às
mudanças proporcionadas pelos artefatos tecnológicos. Nesse sentido, acredita-se que, se a
organização tivesse uma política formal com diretrizes e orientações sobre a forma de
146
utilização das ferramentas de comunicação digital, poderia alcançar maior eficácia no uso
dessas ferramentas, proporcionando melhorias no processo de comunicação.
147
8. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir da conceitualização teórica apresentada e do estudo de caso realizado,
buscou-se averiguar como a introdução do Correio Eletrônico, da Intranet e das Listas de
Discussão modificaram o processo de comunicação e a cultura da Procergs.
A organização pôde ser analisada sob a perspectiva sistêmica, ao passo que se
constatou que as transformações ocorridas no ambiente externo refletem-se no ambiente
interno. Essas transformações dizem respeito, em especial, à mudança de gestão e a evolução
tecnológica. O fato de a Procergs ser uma empresa de economia mista ligada ao governo
estadual torna intrínseca a mudança de gestão a cada troca de governo. Já a tecnologia da
informação é um aspecto que faz parte da constituição da empresa e está diretamente
relacionado ao seu negócio, o que torna a adaptação à evolução tecnológica um fato inerente
ao seu desenvolvimento e crescimento. Essas mudanças não se referem apenas ao aspecto
estrutural, pois também interferem na formação da cultura da Procergs.
A cultura, entendida nesta dissertação como uma variável do sistema
organizacional, recebe as influências das mudanças citadas acima. A sua construção ocorre
socialmente, o que vem a reforçar as afirmações de Berger e Luckmann (1985). Pois é
compartilhada e mantida pelos membros organizacionais, que apreendem e dividem
experiências, buscando encontrar meios de fazer com que a organização se adapte às
transformações proporcionadas pelo ambiente externo. Essas mudanças refletem-se nas
práticas culturais e no processo de comunicação.
O Modelo de Interação Comunicacional Dialógica desenvolvido por Oliveira
(2002) conta da análise realizada, pois a utilização das ferramentas de comunicação digital
permite que se estabeleça uma negociação entre os participantes do processo comunicativo,
possibilitando maior aproximação entre a organização e o corpo funcional. As ferramentas
148
também democratizam a comunicação no sentido de proporcionar a propagação da
informação de forma rápida através de demandas que podem vir de ambos os lados.
Por meio da análise da fala dos sujeitos entrevistados, conclui-se que a inserção
das ferramentas de comunicação digital na Procergs interfere nas práticas culturais, visto que
proporciona uma mudança de comportamento, no modo como são estabelecidas as rotinas
administrativas e as trocas comunicacionais ao possibilitar maior envolvimento dos
funcionários no processo de comunicação. Entretanto, o uso dessas ferramentas não
horizontaliza a relação existente entre os participantes. A organização permanece sendo o
interlocutor principal, o espaço de conexão do relacionamento comunicacional, sem o qual,
todo o restante não existiria.
A trajetória para a realização da pesquisa transcorreu tranqüilamente. Desde o
primeiro contato, a empresa mostrou-se favorável e solidária com a realização do trabalho,
demonstrou agilidade na indicação dos entrevistados e abertura no fornecimento de material e
de informações. Além disso, praticamente todos os participantes se mostraram disponíveis e
entusiasmados em colaborar com a realização da dissertação. Uma pequena dificuldade foi
encontrada no momento de marcar uma das entrevistas que deveria ser realizada na segunda
fase, mas se considerou que os dados coletados até aquele momento eram satisfatórios para a
realização da análise e do andamento do trabalho.
Acredita-se que os objetivos propostos foram alcançados. Apesar de os
entrevistados sentirem um pouco de dificuldade de relembrar como se deu o processo de
implantação das ferramentas de comunicação digital, conseguiu-se resgatar como ele ocorreu
e a forma como essas ferramentas foram apropriadas pelos membros organizacionais. Dessa
forma, o relato dos participantes revelou práticas culturais e auxiliou na compreensão do
modo como ocorre o processo de comunicação a partir da inserção dessas ferramentas na
rotina organizacional.
Sobre esse aspecto, constatou-se que, embora a Procergs seja uma empresa de TI,
os entrevistados demonstraram certa resistência inicial às mudanças que ocorreram com a
introdução das ferramentas no cotidiano profissional. Esse estranhamento ocorreu, sobretudo,
no que se refere à introdução do Correio Eletrônico, que foi destacado como o ‘divisor de
águas’ com relação à maneira como ocorria a comunicação dentro da organização.
A implantação da Intranet foi posterior a Internet e, por isso, não causou tanto
estranhamento entre os funcionários. Já a introdução do Procergs Comunica modificou o
modo como a comunicação vinha sendo desenvolvida até aquele momento. Nesse sentido,
averigou-se que a sua aceitação passou por um processo de evolução e mudança na medida
149
em que os membros organizacionais foram percebendo que ela se tornou o canal oficial em
que eram divulgados todos os comunicados importantes da empresa. As Listas não geraram
resistência, pois os entrevistados participavam de Listas externas à organização quando
foram criadas as listas internas.
Ressalta-se que o Procergs Comunica é uma ferramenta que, como o próprio
nome diz, ‘comunica’. É um meio que mais informa sobre os acontecimentos organizacionais
do que permite o real envolvimento do público interno sobre as trocas comunicativas e a
divulgação de informações. Pondera-se que talvez pudesse haver um espaço dentro do
informativo que possibilitasse o compartilhamento dos funcionários, tornando-o um meio
mais participativo e dinâmico, e auxiliando para que a comunicação ocorra de modo mais
sinérgico, indo ao encontro do que propõe Kunsch (2003).
Nesse sentido, cabe destacar que é visível a existência de um esforço por parte da
Procergs na incorporação das TICs, assim como o domínio humano em relação ao uso da
tecnologia. Mas, apesar disso, os entrevistados demonstraram que as ferramentas de
comunicação digital analisadas não dão conta de trabalhar a comunicação de modo
satisfatório, assim como ainda existe dificuldade para envolver todos os funcionários no
processo comunicativo. Comprovando que esta tarefa não é fácil.
Verificou-se que apenas o Correio Eletrônico e a Intranet são considerados canais
oficiais de comunicação. As Listas de Discussão, embora sejam um meio oficioso, fazem
parte de uma prática exercida pelos funcionários das áreas fim. Apesar disso, acredita-se que
ela tem grande potencial para ser desenvolvido e possa ser estendida para o restante da
organização com temas que correspondam aos interesses de cada área. A realização das
entrevistas em profundidade e da observação participante auxiliaram na
compreensão das mudanças que ocorreram nas práticas culturais e no processo de
comunicação a partir da implantação das ferramentas de comunicação digital no cotidiano
profissional dos funcionários.
Além disso, embora os artefatos tecnológicos estejam cada vez mais presentes no
cotidiano organizacional, a pesquisa ratifica Thompson (1998), que afirma que a comunicação
face a face não entra em desuso com a utilização da comunicação mediada. Os entrevistados
manifestaram a questão de que, apesar das facilidades proporcionadas pelas ferramentas de
comunicação digital, a comunicação presencial permanece sendo essencial no cotidiano
profissional.
O estudo também evidenciou o fato de que, ao mesmo tempo em que a inserção
dessas ferramentas produziu mudanças na cultura organizacional e nas práticas culturais,
150
também gerou resistências internas durante o período de implantação, corroborando Sandi
(2006). Para que essas mudanças se tornem menos drásticas e a aceitação seja maximizada, é
necessário se levar em consideração o indivíduo e a sua subjetividade. Nesse sentido, é
preciso que o público interno seja envolvido, participe e acompanhe o processo de qualquer
alteração organizacional. Para tanto, lembra-se que Reis (2004) considera que o processo de
mudança é o espaço da prática comunicacional e que um não existe sem o outro. Assim,
percebe-se a relevância do processo de comunicação dentro do contexto analisado.
Por isso, ressalta-se a importância dos profissionais em comunicação. Eles são
habilitados para atuarem nas organizações, possuem aptidão para compreender e analisar a
complexidade organizacional e desenvolver estratégias e planos de comunicação que sejam
favoráveis ao processo de mudança.
Entende-se que o desenvolvimento dessa dissertação contribuiu para o avanço da
pesquisa nas interfaces entre comunicação organizacional e comunicação digital. Considera-
se o tema atual e, nesse sentido, a pesquisa não se esgota com a realização desse trabalho.
151
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157
GLOSSÁRIO
Blog ou weblog é uma página da web cujas atualizações, denominadas posts (postagens),
são organizadas cronologicamente de forma inversa, como um diário. Estas postagens podem
ou não pertencer ao mesmo gênero de escrita, referir-se ao mesmo assunto ou ter sido escritas
pela mesma pessoa. O blog conta com algumas ferramentas para classificar informações
técnicas a seu respeito, e todas elas são disponibilizadas na internet por servidores e/ou
usuários comuns. As ferramentas abrangem: registro de informações relativas a um site ou
domínio da internet quanto ao número de acessos, páginas visitadas, tempo gasto, de qual site
ou página o visitante veio, para onde vai do site ou página atual e uma série de outras
informações. Os sistemas de criação e edição de blogs são muito atrativos pelas facilidades
que oferecem, pois dispensam o conhecimento de HTML, o que atrai pessoas a criá-los.
ChatO termo é um neologismo utilizado para designar softwares de conversação em tempo
real. Esta definição inclui programas de IRC, conversação em páginas web –webchat –
sofwares de comunicação instantânea.
Corpus - corpo
Dark sites - são páginas web construídas previamente, para serem acionadas em caso de
surgimento de uma crise que possa prejudicar a imagem e o funcionamento de uma
organização.
E-mail ou correio eletrônico é um método que permite enviar e receber mensagens através
de sistemas eletrônicos de comunicação. O termo e-mail é aplicado tanto à Internet quanto à
intranet. A Internet é baseada no protocolo SMTP e permite a troca de mensagens para fora de
uma empresa; a intranet, normalmente baseada em protocolos privados, permite a troca de
mensagens apenas dentro da organização.
Feedback também chamado de retroalimentação ou realimentação; é o nome dado ao
158
procedimento através do qual uma parte do sinal de saída de um sistema é transferida para a
entrada deste mesmo sistema; na comunicação refere-se ao retorno de informações ao sistema.
Hardware conjunto dos componentes físicos (material eletrônico, placas, monitor,
equipamentos, periféricos, etc) de um computador.
Input ato ou processo de entrada de material, energia ou informação em um sistema,
computador, empresa, etc.
Internet - é um conglomerado de redes em escala mundial de milhões de computadores
interligados pelo Protocolo de Internet, que permite o acesso a informações e todo tipo de
transferência de dados. Ao contrário do que normalmente se pensa, Internet não é sinónimo de
World Wide Web. Esta é parte daquela, sendo a World Wide Web, que utiliza hipermídia na
formação básica, um dos muitos serviços oferecidos na Internet.
Intranet no contexto da Internet, a intranet é uma rede privada de comunicação muito
comum nas organizações. O seu acesso é privado, restrito somente aquelas pessoas que
trabalham na organização.
iPod – refere-se a uma série de players de áudio digital projetados e vendidos pela Apple Inc.
Os aparelhos da família iPod oferecem uma interface simples para o usuário, centrada no uso
de uma roda clicável, ou click Wheel. O maior dos modelos do iPod armazena mídia em um
disco rígido acoplado, enquanto os modelos menores usam memória flash. Como a maioria
dos players portáteis digitais, o iPod pode servir como um armazenador de dados quando
conectado a um computador.
iPhone é um telemovel desenvolvido pela Apple Inc. com funções de tocador de áudio,
câmera digital e Internet.
IRC Internet Relay Chat protocolo de comunicação utilizado na Internet como bate-papo
e troca de arquivo que permite a conversa em grupo ou privada, sendo antecessor dos
sofwares de comunicação instantânea atuais.
159
Link – conexão
Mouse – dispositivo de apontamento para entrada de dados e de informação na tela do
computador.
Newsletter – boletim informativo
OrkutO Orkut é uma rede social filiada ao Google, criada em 19 de Janeiro de 2004 com o
objetivo de ajudar seus membros a criar novas amizades e manter relacionamentos.
Output ato ou processo de saída de energia, material, informação ou produto final de um
sistema, computador, empresa, etc.
Power point – software para criação de apresentações.
Software conjunto dos componentes lógicos de um computador ou sistema de
processamento de dados; refere-se ao programa, à rotina e ao conjunto de instruções que
controlam o funcionamento de um computador.
Software livre software sem direito de propriedade que pode ser usado gratuitamente por
qualquer pessoa.
Web ou World Wide Web - significa rede de alcance mundial, e é um sistema de
documentos em hipermídia interligados que é executado na Internet. Os documentos podem
estar na forma de vídeos, sons, hipertextos e figuras. Para visualizar a informação, pode-se
usar um programa de computador - chamado navegador - para descarregar informações de
servidores web e mostrá-las na tela do usuário. O usuário pode, então, seguir as hiperligações
na página para outros documentos ou mesmo enviar informações de volta para o servidor para
interagir com ele. O ato de seguir hiperligações é comumente chamado de "navegar" ou
"surfar" na Web.
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