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TEREZINHA DA CONCEIÇÃO COSTA-HÜBES
O PROCESSO DE FORMAÇÃO CONTINUADA DOS
PROFESSORES DO OESTE DO PARANÁ.
UM RESGATE HISTÓRICO-REFLEXIVO DA FORMAÇÃO EM LÍNGUA
PORTUGUESA
Londrina
2008
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TEREZINHA DA CONCEIÇÃO COSTA-HÜBES
O PROCESSO DE FORMAÇÃO CONTINUADA DOS
PROFESSORES DO OESTE DO PARANÁ.
UM RESGATE HISTÓRICO-REFLEXIVO DA FORMAÇÃO EM LÍNGUA
PORTUGUESA
Tese apresentada ao Curso de Pós-Graduação
em Estudos da Linguagem, da Universidade
Estadual de Londrina UEL como requisito
parcial à obtenção do título de Doutora.
Orientadora: Profa. Dra. Alba Maria Perfeito
Londrina
2008
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Ficha catalográfica
Elaborada pela Biblioteca Central do Campus de Cascavel - Unioeste
C837p
Costa-Hübes, Terezinha da Conceição
O processo de formação continuada dos professores do Oeste do
Paraná: um resgate histórico-reflexivo da formação em língua
portuguesa. / Terezinha da Conceição Costa-Hübes.— Londrina, PR:
UEL, 2008.
382 f. ; 30 cm
Orientadora: Profa. Dra. Alba Maria Perfeito
Tese (Doutorado) – Universidade Estadual de Londrina.
Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Estudos da
Linguagem.
Bibliografia.
1. Professores - Formação. 2. Língua portuguesa . 3. Formação
continuada. I. Universidade Estadual de Londrina. II. Título.
CDD 21ed. 469.07
Bibliotecária: Jeanine da Silva Barros – CRB 9/1362
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TEREZINHA DA CONCEIÇÃO COSTA-HÜBES
O PROCESSO DE FORMAÇÃO CONTINUADA DOS
PROFESSORES DO OESTE DO PARANÁ.
UM RESGATE HISTÓRICO-REFLEXIVO DA FORMAÇÃO EM LÍNGUA
PORTUGUESA
Tese apresentada ao Curso de Pós-Graduação
em Estudos da Linguagem, da Universidade
Estadual de Londrina UEL como requisito
parcial à obtenção do título de Doutora.
COMISSÃO EXAMINADORA
____________________________________________
Prof. Dr. Odilon Helou Fleury Curado
Universidade Estadual de São Paulo – UNESP/Assis
_____________________________________________
Profa. Dra. Marilurdes Zanini
Universidade Estadual de Maringá – UEM
_____________________________________________
Profa. Dra. Regina Maria Gregório
Universidade Estadual de Londrina – UEL
_____________________________________________
Profa. Dra. Loredana Limoli
Universidade Estadual de Londrina – UEL
Londrina, 28 de fevereiro de 2008.
5
A Deus, que é luz, sabedoria e vida.
A Carlos Denir Hübes, meu marido, que foi meu
cúmplice, meu companheiro em todos os momentos,
meu grande incentivador e o maior responsável pela
conquista dessa titulação.
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COSTA-HÜBES, Terezinha da Conceição. O processo de formação continuada
dos professores do Oeste do Paraná. Um resgate histórico-reflexivo da formação
em Língua Portuguesa. 2008. 382 f. Tese (Doutorado em Estudos da Linguagem)
Universidade Estadual de Londrina. Londrina.
RESUMO
No presente trabalho busco, inicialmente, numa perspectiva histórico-reflexiva,
abordar a temática formação continuada de professores, relacionando-a, desde a
década de 1970 até a década atual, às políticas públicas do país, do estado e, mais
especificamente, da região Oeste do Paraná. Em seguida, procuro averiguar as
concepções (filosófica, psicológica, pedagógica e de linguagem) reveladas em
documentos pedagógicos norteadores da educação nas décadas em foco e que
influenciaram, direta ou indiretamente, a formação docente. Esse propósito
investigativo sustenta-se nas seguintes indagações: desde a década de 1970,
haveria, por trás das ações de formação, uma intencionalidade política,
determinando, por meio de documentos norteadores, como o professor deveria agir?
Que correntes teóricas definiram a formação e interferiram, consciente ou
inconscientemente, na ação docente? E hoje, quais documentos, programas,
projetos etc. orientam tal ação? Inserida nesta arena social de formação, na qual
inúmeros cursos de Língua Portuguesa foram por mim ministrados, prossigo,
analisando os efeitos de alguns desses cursos na prática pedagógica de professores
de 4ª série da região Oeste do Paraná, no sentido de verificar seus reflexos (ou não)
no ensino da gramática. Em função dos resultados, apresento uma proposta de
formação continuada por meio de grupo de estudos, que foi selecionado pelos
participantes da pesquisa como o evento que melhor integra a formação e a
reflexão. O processo investigativo inscreve-se, assim, na Lingüística Aplicada,
sustentado pela abordagem qualitativa, de base etnográfica, uma vez que procura
refletir sobre os significados culturais da formação continuada que envolve os
professores das séries iniciais, verificando, dentre outras bases teóricas, se ao
ensinar a Língua Portuguesa, ancoram-se na concepção (sócio)interacionista da
linguagem e se adotam os gêneros textuais como objeto de ensino, por entender
que apresentam as condições reais de concretização cio-histórico-ideológica da
língua e, conseqüentemente, da gramática.
Palavras-chave: formação de professores, língua portuguesa, grupo de estudos.
7
COSTA-HÜBES, Terezinha da Conceição. The continuing development process
of Western Paraná teachers. A historical-reflexive review of Portuguese Language
pre-service training. 2008. 382 f. Thesis (Doctorate in Language Studies)
Universidade Estadual de Londrina, Londrina.
ABSTRACT
In this research I intend, initially, from a historical-reflexive perspective, to deal with
the topic of the teachers’ continuing development, relating it, from the 1970’s up to
now, to the national and state public policies, more specifically of the western region
in Paraná. Next, my attempt is to investigate the conceptions (philosophical,
psychological, pedagogical and linguistic) revealed in guiding educational
pedagogical documents of the decades mentioned above, which, directly or
indirectly, influenced the pre-service training for teachers. Such investigative focus
springs up from the following questions: since the 1970’s, has there been, in the
background of the pre-service training actions, a political intentionality determining,
by means of the official documents, how the teacher was supposed to act? What
were the theoretical currents that defined the pre-service training and that interfered,
consciously or unconsciously, in the teaching practice? As a participant in this social
arena of pre-service training, having taught numerous Portuguese Language
courses, I move on to analyze the effects of such courses in the pedagogical practice
of fourth-grade teachers in the western Paraná with the intention to verify possible
consequences in the teaching of grammar. Based on the results, I present a proposal
of continuing development by means of study groups, which was pointed out by the
subjects in this research as the event that best integrates training and reflection.
Thus, this investigative process finds itself rooted in Applied Linguistics, sustained by
the qualitative approach, with an ethnographical basis, once it attempts to reflect
upon the cultural significance of continuing development which involves elementary-
school teachers, verifying, among other theoretical bases, if, when teaching
Portuguese, they follow a (socio-)interactionist conception of language and if they
adopt the textual genres as their teaching object because they understand that such
approach has the real conditions for the social-historical-ideological actualization of
language and, consequently, of grammar.
Key words: teachers’ pre-service training, Portuguese language, study group.
8
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO................................................................................................. 12
1 FORMAÇÃO DOS PROFESSORES DAS SÉRIES INICIAIS:
UM BREVE PANORAMA HISTÓRICO.............................................. 21
1.1 Panorama histórico da educação no Brasil........................................ 25
1.1.1 Décadas de 1960 e 1970: a “democratização” do ensino em função de
interesses político-econômicos .......................................................... 25
1.1.2 Década de 1980: abertura política, novas vozes, outros discursos.... 31
1.1.3 Neoliberalismo e educação: ações de impacto na década de 1990.. 34
1.1.4 A partir de 2000: esperanças renovadas, mas................................... 43
1.2 Panorama histórico da educação no Paraná...................................... 48
1.2.1 Décadas de 1960 e 1970: início do processo de descentralização.... 48
1.2.2 Década de 1980: acenos para a reorganização da escola pública .... 52
1.2.3 Década de 1990: sistematização dos ideários neoliberalistas ........... 56
1.2.4 A partir de 2000: tentativas de reorganização do ensino.................... 61
1.3 Panorama Histórico da Educação na Região Oeste do Paraná......... 64
1.3.1 Décadas de 1960 e 1970: da colonização para o crescimento
Populacional....................................................................................... 64
1.3.2 Década de 1980: criação da ASSOESTE ........................................... 70
1.3.3 Década de 1990: sistematização de propostas................................... 75
1.3.4 A partir de 2000: início de um novo ciclo na educação do Oeste........ 78
2 TEORIAS SUBJACENTES AO PROCESSO DE FORMAÇÃO
CONTINUADA EM LÍNGUA PORTUGUESA, NA REGIÃO OESTE DO
PARANÁ............................................................................................. 83
2.1 Primeira Fase (1970 até meados de 1980): Concepção de Linguagem
como Representação do Pensamento; Concepção de Linguagem como
Estrutura ou Instrumento de Comunicação......................................... 85
2.1.1 As bases teóricas do Currículo da SEED, do modelo de Alfabetização
Erasmo Pilotto e da cartilha Porta Mágica.......................................... 89
2.1.1.1 A gramática como objeto de ensino ................................................... 99
9
2.1.1.2 Modelo de Formação adotado no estudo da proposta pedagógica... 101
2.2 Segunda Fase (década de 1980 até meados da década de 1990):
Linguagem como Meio de Interação .................................................. 104
2.2.1 Reorientações teóricas nos estudos da linguagem............................ 109
2.2.2 João Wanderley Geraldi e o Projeto “O texto na sala de aula”: uma
proposta pioneira de trabalho com a língua sob o viés
(sócio)interacionista............................................................................. 113
2.2.2.1 A transposição do Projeto “O texto na sala aula” às séries iniciais:
o texto como objeto de ensino............................................................. 121
2.2.3 O Ciclo Básico de Alfabetização – CBA: consolidação da linguagem
como forma de interação?................................................................... 126
2.2.4 Currículo Básico para a Escola Pública do Estado do Paraná – CBPR:
uma proposta interacionista reconhecida e documentada .................. 134
2.2.4.1 A proposta de trabalho com a Língua Portuguesa ............................. 139
2.3 Terceira Fase (meados da década de 1990 até os dias atuais):
Retrocesso e/ou Consolidação de Concepção(ões) de Linguagem?. 145
2.3.1 Os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCNs – sob orientação do
neoliberalismo..................................................................................... 146
2.3.1.1 Concepção de linguagem e ensino da Língua Portuguesa ................ 153
2.3.2 Currículo Básico para a Escola Pública Municipal – Educação Infantil
e Ensino Fundamental (anos iniciais) – da Região Oeste do Paraná –
CBEPM: uma proposta alicerçada em reflexões................................. 160
2.3.2.1 A disciplina de Língua Portuguesa: concepção, objeto de ensino e
gramática............................................................................................. 163
2.4 Algumas Considerações...................................................................... 171
3 PERCURSO METODOLÓGICO ........................................................ 174
3.1 Método de Abordagem........................................................................ 174
3.2 Constituição do Corpus....................................................................... 178
3.3 Instrumentos de Coleta de Dados....................................................... 179
3.3.1 Questionário........................................................................................ 179
3.3.2 Entrevista ............................................................................................ 180
3.3.3 Gravação de aulas .............................................................................. 180
3.4 Levantamento do(s) Problema(s) e Proposta de Solução................... 181
10
4 REFLEXÃO SOBRE OS DADOS COLETADOS................................ 183
4.1 Perfil dos professores da região Oeste do Paraná............................. 183
4.2 Contextualizando a (minha) ação docente......................................... 195
4.2.1 Perfil dos municípios selecionados .................................................... 196
4.2.2 A respeito das ações de formação continuada................................... 198
4.2.3 Conteúdos abordados........................................................................ 201
4.3 Análise e Interpretação dos Dados..................................................... 212
4.3.1 Análise e interpretação do questionário ............................................ 213
4.3.2 Análise e interpretação das entrevistas.............................................. 238
4.3.3 Análise e interpretação das aulas gravadas....................................... 253
4.4 A propósito dos resultados................................................................. 273
5 GRUPOS DE ESTUDOS: CONSOLIDAÇÃO DE UMA PROPOSTA DE
FORMAÇÃO CONTINUADA............................................................... 277
5.1 Implantação da Proposta..................................................................... 278
5.2 Execução da Proposta ........................................................................ 280
5.3 Resultados Concretos do Grupo de Estudos ...................................... 300
5.3.1 A produção do instrumento teórico-metodológico ............................... 301
5.4 Considerações Finais sobre a Modalidade Grupo de Estudos............ 324
CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................. 330
REFERÊNCIAS................................................................................................ 337
ANEXOS .......................................................................................................... 349
ANEXO 01 – Certificados de participação em cursos de formação para
Alfabetizadores no modelo Erasmo Pilotto................................. 350
ANEXO 02 – Certificados de participação em cursos de formação para o
CBA............................................................................................ 353
ANEXO 03 – Questionários aos professores de 4ª série – ensino fundamental 356
ANEXO 04 – Entrevista com professores de 4ª série – ensino fundamental ... 359
ANEXO 05 – Questionário perfil dos professores em relação à educação de
1º ano e 1ª a 4ª séries do ensino fundamental – municípios da
Região Oeste do Paraná........................................................... 360
ANEXO 06 – Sugestões de produção de texto ................................................ 364
ANEXO 07 – Trabalho de correção de texto.................................................... 365
11
ANEXO 08 – Projeto de trabalho com os gêneros........................................... 367
ANEXO 09 – Tabela diagnóstica...................................................................... 369
ANEXO 10 – Sugestões de atividades para a reescrita coletiva...................... 371
ANEXO 11 – Sugestões de atividades a partir da reescrita individual do texto
Produzido pelo aluno.................................................................. 372
ANEXO 12 – Atividades – coesão referencial.................................................. 374
ANEXO 13 – Atividades – coesão seqüencial.................................................. 375
ANEXO 14 – Reescrita individual – discurso direto.......................................... 376
ANEXO 15 – Reescrita individual – concordância verbal e nominal, emprego
dos elementos coesivos ............................................................. 378
ANEXO 16 – Fotos da produção e divulgação de cartazes pelos alunos ........ 380
ANEXO 17 – Fotos do grupo de estudos ......................................................... 381
12
INTRODUÇÃO
A atividade de docência na formação continuada de professores das ries
iniciais constituiu-se, para mim, nos últimos anos, mais precisamente a partir de
1996, além de uma prática desafiadora, uma temática que induzia à investigação.
Desafiadora porque, a cada trabalho realizado, sentia-me provocada pelas
perguntas oriundas de professores que, na ânsia do caminho “certo”, esperavam
encontrar, nas ações de formação continuada, a resolução para inúmeros
problemas. Por outro lado, provocava inúmeras questões relativas tanto às minhas
ações docentes quanto à sua incidência na prática em sala de aula.
Tais inquietações levaram-me a indagar: será que a modalidade de evento
adotada anos no Brasil (e por que não na região Oeste do Paraná), definida por
meio de cursos de formação, tem garantido os subsídios necessários para que o
professor acrescente conhecimentos à sua formação inicial e reflita sobre a prática
pedagógica desempenhada no dia a dia? E como minha ação docente, neste
contexto, revelada nos inúmeros cursos de Língua Portuguesa ministrados na
região, tem contribuído para oferecer subsídios ao trabalho com a língua(gem)
dentro de uma concepção (sócio)interacionista, que requer um outro olhar também
para o ensino da gramática?
Presumi que as respostas poderiam ser encontradas a partir de um vasto
percurso de investigação que recuperasse, inicialmente, os recentes debates sobre
a formação continuada de professores no Brasil. Se minhas ações na região Oeste
do Paraná estavam atreladas às discussões teórico-metodológicas que envolvem o
tema, as quais, de alguma forma, são norteadoras das ações realizadas em nível
nacional e estadual, então estariam, pois, concorrendo para potencializar uma
cultura de formação continuada de professores, que se situam dentro de
contextos sócio-historicamente determinados.
Não há como pensar na formação de professores, na região, desarticulada de
ações maiores que, direta ou indiretamente, orientam o fazer-pedagógico. Dessa
maneira, não poderia esquecer de que os efeitos de minha ação docente não eram,
em momento algum, resultado de uma ação isolada. Ao contrário, eram
determinados pela própria formação (inicial e continuada) dos professores, pelos
discursos que os subsidiavam, pelas teorias que os orientavam e, ademais, pelo
13
lugar social que eu e os professores ocupávamos (na região, no Estado e no Brasil),
pelos espaços sociais com os quais interagíamos, pelas questões sócio-político-
ideológicas que incidiam sobre nós, e sobre todas as ações de formação e de
ensino/aprendizagem.
Conforme Popewitz & Pereyra (1992), pensar a formação de professores
como uma arena social significa reconhecer que naquele espaço multidimensional
interagem vários atores sociais (órgãos estatais, instituições de formação de
professores, organizações profissionais e sindicais, fundações de natureza
filantrópicas etc.) e rios instrumentos teóricos (Currículos, Projetos, Parâmetros
etc.). Logo, ao refletir sobre as ações de formação, deve-se considerar o modo como
as posições e as estratégias desses atores se relacionam e se confrontam umas
com as outras; como influenciam e procuram maximizar o potencial de suas
posições na arena, compreendendo os diferentes interesses em jogo.
Por outro lado, se quisesse verificar os efeitos de minha ação docente, não
poderia esquecer de que eram atravessados pelas condições físicas e sociais dos
interlocutores, afetados, segundo Nóvoa (1992), pelo desenvolvimento pessoal,
profissional e organizacional da escola; pela crise de identidade profissional,
decorrente do desprestígio social, da baixa remuneração, das condições precárias
de trabalho, do mal estar na profissão, da precariedade dos cursos de formação
inicial e da ausência e/ou descontinuidade dos programas de formação continuada.
Mesmo assim, era preciso acreditar na possibilidade de construir novos
paradigmas que pudessem alterar a estrutura epistemológica dos processos de
formação vigente, a começar pelas instituições responsáveis, reconhecendo que os
programas de formação continuada sustentam-se, na maioria dos casos, em
projetos pedagógicos limitados, deficientes em termos científicos e conceituais,
repercutindo na construção de práticas docentes.
Entretanto, para propor qualquer alternativa de mudança, era preciso, antes
de tudo, inserir-me num processo investigativo, a fim de subsidiar-me teoricamente
na definição das ocorrências de ações formativas desenvolvidas por órgãos
nacionais, estaduais e regionais e, ainda, na compreensão das interferências
políticas, econômicas e sociais que determinam tais formas de ação. Uma vez
assimiladas, minha incursão deveria ir em direção às práticas decorrentes de cursos
de Língua Portuguesa por mim ministrados em municípios da região Oeste do
14
Paraná, investigando atividades pedagógicas, ouvindo professores, levantando
dados que cooperassem na análise dos reflexos de tais ações.
Julgo interessante destacar que, ao investigar os efeitos dos cursos de
formação continuada por mim ministrados, estaria consciente de que os resultados
poderiam ser afetados pelo meu próprio fazer-pedagógico. Isto porque, além de tal
ação, desempenho o papel de professora desde 1985. Iniciei-me na profissão,
atuando em uma escola da zona rural do município de Vera Cruz do Oeste, em
turma multisseriada. Depois de 2 anos, fui convidada para assumir a coordenação
da Educação de Jovens e Adultos na Secretaria Municipal de Educação e, a partir
daí, dividi minhas funções entre coordenar a Educação Infantil e o Ensino
Fundamental (séries iniciais). Alguns anos depois, paralelamente a tais atribuições,
tornei-me professora colaboradora do Curso de Letras da Unioeste de Cascavel,
onde permaneci por 2 anos. Após 12 anos trabalhando com as séries iniciais, deixei
a Secretaria Municipal de Ensino e assumi vaga proveniente de aprovação no
concurso estadual, atuando em turmas de 6ª, 7ª, 8ª séries e ensino médio. Foi nesse
período que a ASSOESTE Associação Educacional do Oeste do Paraná
convidou-me para a atividade de docência em cursos esporádicos de Língua
Portuguesa e, um ano depois, sem deixar minhas aulas no ensino médio, tornei-me
assessora pedagógica da área, onde atuei por 18 meses. Retornei, posteriormente,
às séries iniciais do ensino fundamental como Secretária Municipal de Ensino,
afastando-me, então, 2 anos depois, para dedicar-me ao mestrado.
O percurso da vida profissional sempre refletiu-se, em seus diferentes
momentos, em minha formação, constituindo-me no que tange às ações praticadas
e aos conhecimentos adquiridos. Em cada momento, defrontei-me, diferentemente,
com situações ora instigantes, ora contraditórias, as quais revelavam o quanto a
dinâmica do ensino se distancia, muitas vezes, do discurso propagado pela
linguagem pedagógica revelada em documentos, em publicações acadêmicas e em
cursos de formação que eu mesma ministrava. Compreender por que e como era
produzida esta dicotomia seria vital para superar alguns limites e equívocos do meu
trabalho docente.
Em decorrência disso, após cada curso ministrado, algumas questões
insistiam em incomodar-me:
1) Quais necessidades formativas deveria priorizar no confronto da formação
continuada com a realidade objetiva das escolas?
15
2) Seria possível transformar a prática pedagógica do professor por meio do
investimento em cursos pontuais, resumidos em algumas horas de
reflexão?
3) Que programas de formação continuada de professores iriam, de fato,
tornar consistente sua formação?
As interrogações interferiam no planejamento dos cursos, visto que, em cada
um deles intencionava dirimir o descompasso entre o contexto de atuação do
professor e sua perspectiva profissional.
A intenção de pesquisa sustentava-se, inicialmente, em tais indagações,
sobre as quais pretendia, caso levantasse problemas, discutir soluções
concernentes à modalidade de evento adotada para a formação e para as reflexões
em Língua Portuguesa. No entanto, era preciso definir qual seria o meu objeto de
investigação. Julgando relevante tal pretensão de pesquisa, tratei de refletir sobre o
objeto que pretendia investigar.
A temática da formação continuada foi se apresentando como uma linha de
pesquisa capaz de auxiliar na compreensão de meus limites e possibilidades, na
busca de alternativas metodológicas propiciadoras de um trabalho docente
articulado, entre outras, pela relação teoria-prática.
Quando me tornei efetivamente Professora Assistente da Unioeste
Cascavel em 2003, o espaço acadêmico estimulou-me a elaborar um Projeto de
Pesquisa acerca do ensino da gramática. Afinal, minhas indagações direcionavam,
entre outras coisas, também para o ensino da gramática. Depois de tantos eventos
de formação continuada na área de Língua Portuguesa, na região, desde a década
de 1980, subsidiados pela concepção (sócio)interacionista da linguagem, como os
professores estariam abordando a língua e, mais especificamente, a gramática?
O interesse pelo ensino da gramática resultava das inúmeras discussões,
leituras e formações recebidas a respeito da natureza social da linguagem e seu
caráter dialógico e interacional. Tais conhecimentos exigiam um novo tratamento
para a gramática: a garantia da funcionalidade da língua em diferentes situações de
interação.
Estava consciente de que, nesta direção, haviam sido difundidas muitas
pesquisas, principalmente a partir da publicação de Geraldi (1984), quando propôs
um outro olhar para o ensino da Língua Portuguesa, compreendendo-a em três
eixos básicos, integrados sem artificialidades: leitura, produção e análise lingüística.
16
Neste último, residia uma proposta inédita de ensino da gramática, coligada às
situações de fala e de escrita, portanto, inserida no texto.
Embora a cada de 1980 seja considerada um marco na revolução das
reflexões sobre o ensino da língua, destacando algumas produções relativas à
funcionalidade da gramática, a década seguinte versou sobre o tema com maior
ênfase, aprofundando críticas, reflexões e proposições, depois de revelados os
primeiros resultados do Projeto NURC, o qual desvelou a oralidade culta do povo
brasileiro. Assim, Moura Neves (1996, 1999), Travaglia (1996), Franchi (1991, 1992),
Geraldi (1991, 1996), Possenti (1996), Britto (1997), entre outros, discutiram a
heterogeneidade da língua numa perspectiva interacionista, abordando aspectos e
propondo reflexões/soluções de acordo com a fundamentação teórica selecionada
dentro da “Lingüística da Enunciação”
1
.
Com o reconhecimento da natureza social da linguagem, a gramática
contextualizada tornou-se o centro das discussões. Desse modo, em todos os
cursos ministrados, ouvia dos professores questões como: “Devo ensinar
gramática?”, “Como devo ensiná-la?”. Em todas as situações, esforçava por revelar
meus conhecimentos a respeito, alicerçados pelos cursos de formação dos quais
participei e pelas inúmeras leituras de publicações teóricas, versando sobre o tema.
Eu acreditava, e tentava repassar minha “crença”, de que os fenômenos gramaticais
estavam presentes no ensino não mais como elementos representativos de regras
que deveriam ser decoradas, mas como princípios lingüísticos capazes de serem
descritos, observados e analisados dentro de uma perspectiva discursivo-textual,
organizadores dos efeitos de sentido no texto. Todavia, como os professores
assimilavam minhas convicções?
Para responder à questão, percebi que deveria me aproximar, mais
criteriosamente, dos saberes e conhecimentos produzidos pelos professores na sala
de aula, na tentativa de relacioná-los com a temática “formação continuada”,
definindo, assim, um locus para a pesquisa.
Ao pretender pesquisar sobre o ensino da gramática, não poderia, em
hipótese alguma, desarticular minhas observações de um processo mais amplo,
agregado aos modos de atuar na sala de aula. A maneira como a gramática é
ensinada pelos professores das séries iniciais da região Oeste não é resultado
1
Esse termo será explicitado no Capítulo 2.
17
apenas de minhas ações docentes (nos cursos de formação em Língua Portuguesa).
Entretanto, qual seria o peso de tais aprofundamentos para o êxito do processo
ensino-aprendizagem, no caso, da Língua Portuguesa?
Muitas eram as questões, todavia, se fazia mister definir quais despontariam
como propulsoras para a pesquisa pretendida. A
busca de definição “com maior
clareza e inteligibilidade” do quadro conceitual de formação continuada de
professores, como nos dizem as pesquisadoras portuguesas, Rodrigues & Esteves
(1993), tem motivado diversos estudiosos a traçarem enunciados de paradigmas,
objetivando situar melhor o(s) conceito(s) desse modo de formação.
O
trinômio investigação/reflexão/ação afigurou-me como suporte estruturador
e metodológico de viabilização de muitas pesquisas. Expressões como: articulação
entre a prática e a reflexão sobre a prática (PERRENOUD, 1993); conhecimento na
ação, reflexão na ação e reflexão sobre a ação e sobre a reflexão na ação (SCHÖN,
1992); investigação/reflexão/ação (ESTRELA, 1992); indagação/reflexão (GARCIA,
1992) eram reveladoras de que tal trinômio estava no auge da discussão das
práticas de formação continuada de professores.
No bojo de tais evidências, optei, finalmente, por inserir, em minha proposta
de investigação, a preocupação em compreender a temática da formação
continuada de professores e sua inserção nas políticas públicas da região Oeste do
Paraná, desde a década de 1970, ocasião em que se iniciou tal processo, sem
desarticulá-la das políticas públicas nacionais e estaduais.
Meu propósito é, portanto, o de pesquisar, brevemente e a princípio, como a
profissão docente foi tratada politicamente, em âmbito regional, estadual e federal na
continuidade do processo formativo profissional. E, no interior da política de
formação, verificar quais as bases teóricas (filosóficas, pedagógicas, psicológicas) e
a(s) concepção(ões) de linguagem que orientaram, em cada década, a formação do
professor.
Julgo interessante tal propósito investigativo, visto ter presenciado, mais
especificamente na última década do século XX, um conjunto de planos, programas,
diretrizes e legislações, produzidos pelos governantes, intencionando regular a
formação (inicial e continuada) de professores, na perspectiva de criar e dar
visibilidade ao sistema nacional (estadual e municipal) de formação, adequando-o ao
novo modelo de sociedade contemporânea.
18
No entanto, será que foi sempre assim? Desde a década de 1970, haveria,
por trás das ações de formação, toda uma intencionalidade política, determinando,
por meio de documentos norteadores, como o professor deveria agir? Que correntes
teóricas definiram a minha (a nossa) formação e que interferiram, consciente ou
inconscientemente, em minha (nossa) ação docente? E hoje, que documentos,
programas, projetos etc. orientam a minha (a nossa) ação?
Frente aos
questionamentos e aos propósitos investigativos, o objetivo geral
que orienta esta pesquisa está em refletir sobre os efeitos dos cursos de formação
continuada em Língua Portuguesa, por mim ministrados, na prática pedagógica de
professores de série da região Oeste do Paraná, no sentido de verificar seus
reflexos (ou não) para o ensino da gramática.
Como a minha ação e a dos professores não o neutras, mas fortemente
determinadas pelo contexto no qual estamos inseridos, vincularei, a tal propósito, a
reconstituição das políticas de formação continuada na região, desde a década de
1970, relacionando-a às políticas do Estado e da nação.
Logo, tendo em vista a análise das políticas públicas educacionais para a
formação continuada de professores no Brasil, no Estado e na região Oeste, desde
a década de 1970, até os dias atuais; a verificação dos documentos (currículos,
parâmetros, projetos etc.) que orientaram/orientam, em cada cada, a formação
dos professores e, associados a isso, a base filosófica, psicológica, pedagógica que
fundamenta tais documentos, determinando a concepção de homem e sociedade,
de ensino e aprendizagem, de educação e escola, de linguagem e língua e, dentro
desta, de gramática; a relação entre a modalidade de evento adotada na região com
as políticas públicas de formação e com os documentos norteadores, pretendo:
Verificar, por meio de dados coletados, como a gramática é compreendida
hoje, pelos professores, e como está sendo trabalhada em turmas de
séries, analisando se o discurso do professor e sua prática traduzem as
discussões teóricas de ensino da língua que embasaram os cursos de
formação continuada por mim ministrados.
Refletir, juntamente com os professores informantes, sobre os dados
coletados, no intuito de buscar alternativas, se necessárias forem, para a
formação continuada de professores em Língua Portuguesa que incidam,
realmente, no ensino da língua.
19
Com a intenção de alcançar os objetivos propostos, inicialmente a
investigação partirá de um estudo teórico, de cunho descritivo-analítico, pelo fato de
sentir-me desafiada a compreender melhor o quadro histórico e conceitual da
formação continuada no Brasil.
Nessa perspectiva, as informações, apresentadas no primeiro capítulo, são
coletadas de literatura especializada e, apresentam um relato histórico da formação
(inicial e continuada) no Brasil, no Paraná e na região Oeste, destacando as
influências políticas que incidiram sobre as ações formativas. Com tal descrição
teórica, a tentativa é de estabelecer os sentidos políticos atribuídos à formação de
professores, garantindo maior visibilidade às diferentes proposições formuladas a
esse respeito.
As informações, organizadas no segundo capítulo, resultam de um estudo de
documentos pedagógicos, mais precisamente de projetos, currículos e parâmetros
curriculares que, em cada década, determinaram concepções de homem, de ensino,
de aprendizagem e de linguagem, interferindo, incisivamente, nos programas de
formação continuada. Tais documentos foram selecionados em função das décadas
pesquisadas. No que diz respeito à década de 1970, investigo as concepções
filosóficas, psicológicas, pedagógicas e de linguagem fundamentadoras do Currículo
da SEED, documento norteador da prática docente naquele período, e o modelo
Erasmo Pilotto de Alfabetização. Em relação à década de 1980, destaco, dentre as
ações da ASSOESTE na região, o Projeto “O texto na sala de aula”, informando
sobre sua base teórica e sua provocação para outros olhares ao ensino da Língua
Portuguesa e, especificamente, da gramática. Ainda no que tange a década em
questão, recupero as bases formativas da proposta Ciclo Básico de Alfabetização
CBA imposta pelo Estado. Na década de 1990, os documentos em foco serão o
Currículo sico para a Escola Pública do Estado do Paraná CBPR e os
Parâmetros Curriculares Nacionais PCNs, destacando, principalmente, suas
orientações teóricas. E, finalmente, da década atual, a opção será pelo Currículo
Básico para a Escola Pública Municipal Educação Infantil e Ensino Fundamental
(anos iniciais) – da região Oeste do Paraná, publicado em 2007.
No terceiro capítulo, descrevo o percurso metodológico desta pesquisa para,
no quarto, interpretando dados da pesquisa de campo, refletir sobre a possibilidade
de nexos existentes entre as políticas de formação, as correntes teóricas que as
determinam, as minhas ações docentes em cursos na área de Língua Portuguesa e
20
algum reflexo destes na prática do professor, no que diz respeito ao tratamento dado
à gramática.
A partir da interpretação dos dados e de possíveis problemas detectados,
apresento, no quinto capítulo, uma proposta de formação continuada (eleita por
participantes da pesquisa) que aborda tanto a formação dos professores quanto o
ensino da Língua Portuguesa.
21
1 FORMAÇÃO DOS PROFESSORES DAS SÉRIES INICIAIS: UM BREVE
PANORAMA HISTÓRICO
Não é no silêncio que os homens se fazem, mas na
palavra, no trabalho, na ação-reflexão.
Paulo Freire
No capítulo em pauta, o propósito é situar, com um breve panorama histórico,
as discussões e propostas acerca da formação de professores, mais
especificamente, a formação continuada, no cenário nacional, estadual e regional
(Oeste do Paraná), sem, no entanto, desvinculá-las das políticas internacionais, uma
vez que toda ação é determinada por contextos mais amplos.
Para traçar a trajetória proposta, amparo-me em algumas análises que vêm
sendo feitas por educadores (Alarcão, 1998; Esteves & Rodrigues, 1993; Nunes,
2000; Freitas, 2002; Pimenta, 1992; Veiga, 1998; entre outros), no sentido de
identificar, como diz Freitas (2002), os (des)caminhos das políticas de formação de
professores. Nesse sentido, pretendo apontar os organismos que, direta ou
indiretamente, exercem e exerceram (forte) influência no campo da educação,
determinando ações, especialmente, de formação.
Estarei me reportando, com maior ênfase, às últimas três décadas
(1970,1980 e 1990), estendendo o olhar aos dias de hoje (2007), tendo em vista
que as maiores incidências de mudanças na educação, principalmente referentes à
formação do professor, remetem ao período citado, devido à massificação do ensino
público.
Antes de iniciar o trajeto, é importante esclarecer o entendimento que explicito
por formação continuada, pelo fato de ser este o foco de estudo. Para tanto, recorro
às palavras de Esteves & Rodrigues, as quais salientam que a formação contínua é:
(...) aquela que tem lugar ao longo da carreira profissional após a
aquisição da certificação profissional inicial (a qual só tem lugar
após a conclusão da formação em serviço), privilegiando a idéia de
que a sua inserção na carreira docente é qualitativamente
diferenciada em relação à formação inicial, independentemente do
momento e do tempo de serviço docente que o professor possui
quando faz a sua profissionalização, a qual consideramos ainda
22
como uma etapa de formação inicial (ESTEVES & RODRIGUES,
1993, p. 44).
Cito também Formosinho, reforçando o conceito, ao postular que a formação
contínua é seqüencial à formação inicial e claramente distinta desta. Então
argumenta:
(...) o conceito de formação contínua distingue-se essencialmente do
de formação inicial não pelos conteúdos ou metodologias de
formação, mas pelos destinatários, pois é oferecida a pessoas em
condição de adultos, com experiência de ensino, o que influencia os
conteúdos e as metodologias desta formação por oposição às da
formação inicial oferecida geralmente a jovens sem experiência de
ensino (FORMOSINHO, 1991, p. 237).
Lembro, ainda, as palavras de Alarcão, ao conceber a formação continuada
“como o processo dinâmico por meio do qual, ao longo do tempo, um profissional vai
adequando sua formação às exigências de sua actividade profissional” (ALARCÃO,
1998, p. 100). Sendo assim,
(...) a formação continuada deve visar ao desenvolvimento das
potencialidades profissionais de cada um, a que não é alheio o
desenvolvimento de si próprio como pessoa. Ocorrendo na
continuidade da formação inicial, deve desenrolar-se em estreita
ligação com o desempenho da prática educativa. (Idem, p. 106)
A autora pontua que tal formação deve se alicerçar na co-responsabilidade,
na colegiabilidade, na capacidade e no poder dos professores de cada uma das
escolas, instituída em grupos de estudos e organizada em torno de projetos de
formação-ação-investigação. É uma formação, portanto, que assenta em projetos
realizados com os professores, para os professores e pelos professores,
complementados pelas comunidades sociais envolvidas com a escola, com o
objetivo de transformá-las em autênticas comunidades educativas.
Remeto, ainda, a Alves (1998), para quem a formação (inicial e continuada)
está aliada a uma
intrínseca rede de relações e tensões, estabelecidas entre suas
várias dimensões: formação acadêmica; ação política do Estado; prática pedagógica
cotidiana; prática política coletiva; pesquisas em educação. Logo, o processo de
aperfeiçoamento contínuo, redimensionando o conhecimento, necessita ser tratado
como elemento constitutivo da formação de professores, sem desconsiderar que
23
esta se dá, também, em outros tempos e espaços diferentes destes, uma vez que
envolve sujeitos sócio-historicamente determinados.
A formação inicial, para Nunes (2000), tem seu espaço nas esferas das
instituições formadoras, cuja finalidade última centra-se na produção do profissional
do ensino. Mediante seus objetivos e a organização do trabalho pedagógico,
propicia determinadas bases de preparação, habilitando o futuro professor para o
exercício da profissão docente. Bases que o construídas a partir do domínio de
certas competências e habilidades (científicas e profissionais) e conceitos (técnico,
pedagógico, político, filosófico e social), veiculados nas instituições formadoras.
Arrisco-me a dizer que tais
bases, a princípio, concorrem para o delineamento
da profissão docente. Todavia, devo considerar que esta formação não pode ser
interpretada como se, isoladamente, pudesse garantir um conjunto de situações,
habilidades, atitudes e comportamentos que satisfizessem e contemplassem os
requisitos necessários ao exercício do trabalho docente, ou mesmo, que fosse válida
para qualquer contexto histórico-social. A dinâmica da formação impõe a
compreensão de que “não se deve pretender que a formação inicial ofereça
‘produtos acabados’, encarando-a antes como a primeira fase de um longo e
diferenciado processo de desenvolvimento profissional” (GARCIA, 1992, p. 55).
Nessa perspectiva, traduzo a formação continuada como um ato continuum,
como forma de educação permanente, pessoal e profissional, objetivando o
desenvolvimento da profissão docente, cunhando-se, portanto, a expressão
“formação continuada de professores”.
Ao interpretar a formação de professores como um processo educativo
permanente de (des)construção de conceitos e práticas, para corresponder às
exigências do trabalho e da profissão, é possível afirmar que a formação continuada
se insere, não como substituição, negação ou mesmo complementação da formação
inicial, mas como um espaço de desenvolvimento ao longo da vida profissional,
comportando objetivos, conteúdos, formas organizativas diferentes daquela, e que
tem seu campo de atuação em outro contexto.
Comungando nas definições de formação continuada acima elencadas, passo
a relatar a história da formação (inicial e continuada) dos professores ao longo das
três últimas décadas, destacando como ela foi compreendida pelos vários
programas educacionais, nos diferentes governos, em nível nacional, estadual e
regional.
24
Para iniciar o relato, parto da seguinte indagação: por que as discussões em
relação à formação continuada têm adquirido maiores proporções nas últimas
décadas e maior ênfase, nos últimos anos?
A resposta à questão requer um olhar para a organização social do país. O
contexto das histórias políticas, os sistemas e as formas de governo, os níveis de
industrialização, o desenvolvimento econômico e social, além de outros fatores, por
terem sofrido grandes transformações determinadas pelos avanços tecnológicos e
pelas políticas econômicas, exerceram, e continuam exercendo, forte influência nos
modelos de ensino e de sistema de formação de professores, determinando seus
pressupostos metodológicos e organizacionais.
Ao compreender que a educação é uma das formas elementares para
alcançar o progresso social e cultural da humanidade, os setores sociais,
empresariais, políticos e econômicos atentaram para esse segmento, questionando,
criticando e avaliando a formação do professor, já que entendem que todos os
setores sociais de um país são diretamente afetados pelo nível de educação de seus
cidadãos.
Sob tal enfoque, conforme destaca Nunes (2000), a lógica é de que se não há
boa formação educacional, também não desenvolvimento social e,
conseqüentemente, desenvolvimento econômico. Por isso, necessidade de
investir no setor educacional para garantir que os países (em desenvolvimento)
façam parte da rota do progresso social e econômico.
Logo, nasce daí o interesse pela reforma educacional, uma vez que, para tais
setores, a escola não está atendendo à demanda do mercado, o qual exige
qualidade na formação de capital humano eficiente. Ou seja, sob essa ótica, cabe à
escola atender às exigências da modernização: preparar um indivíduo com
capacidade crítica e reflexiva, com autonomia, com independência, com poder de
decisão na resolução de problemas, contribuindo, assim, com os avanços de uma
sociedade tecnológica.
E, como os países periféricos sempre foram fortemente influenciados por
movimentos e reformas dos países centrais, caberia ao Brasil aproximar-se das
políticas educacionais destes, visto que esta seria a “condição básica de superação
das desvantagens de inserção nos mercados mais competitivos” (BARRETO, 1998,
p.18), os quais são determinados por mega-blocos econômicos no cenário mundial,
dentre os quais destacam-se “a União Européia EU; a Comunidade dos Estados
25
Independentes CEI; a North América Free Agreement NAFTA; os Tigres
Asiáticos; e, mais diretamente ligado ao Brasil, o MERCOSUL” (NUNES, 2000,
p.20). Tais organizações, além de fortalecerem suas alianças políticas, econômicas
e geográficas, também derrubam fronteiras, porém criam exigências e expectativas
em todos os níveis da sociedade, inclusive na educação, cobrando mudanças, a fim
de atender às demandas do mercado econômico.
O professor é um dos elementos afetados pelas influências internacionais,
visto que dele se cobra a formação de indivíduos que correspondam às demandas
dos diferentes setores. Todavia, como o docente não se encontra ou não foi
preparado para tais avanços sócio-político-econômicos, as cobranças recaem sobre
o sistema de formação de professores.
Diante da realidade apresentada, algumas indagações são pertinentes: como
o sistema de formação de professores (inicial e continuada) foi tratado nas últimas
três décadas? Como esse processo de formação foi determinado politicamente?
Na tentativa de responder às inquietações expostas, apresento, a seguir, de
forma panorâmica, um relato das influências políticas, sociais e econômicas na
formação dos professores do Brasil, do Paraná e da região Oeste do Paraná.
1.1 Panorama histórico da educação no Brasil
1.1.1 Décadas de 1960 e 1970: a “democratização” do ensino em função de
interesses político-econômicos
Farinha (2004) relata que a formação de professores, no Brasil, teve início no
século XIX com a criação das Escolas Normais (as quais também surgiram na
Europa), funcionando, entre os anos de 1835 até 1971, em número bem reduzido. A
partir do final do Império no Brasil, as escolas foram abertas à mulher e iniciou-se,
assim, um processo de feminilização do magistério. Contudo, naquela época,
somente os filhos da elite tinham acesso à educação
2
. Pimenta (1992) afirma que o
professor, pautado nos pressupostos da educação liberal tradicional, trabalhava com
a imagem de um “aluno ideal”, construído a partir do modelo da classe média alta,
2
Naquele período “... metade da população brasileira compunha-se de analfabetos, havendo 8
milhões de crianças em idade escolar sem conquistar qualquer instrução” (VIEIRA, 1983, p. 167).
26
com pré-requisitos e estrutura familiar favorável à aprendizagem. Logo, sua tarefa
consistia em traduzir os conteúdos que deveriam ser assimilados pelos alunos.
Mesmo assim, as décadas de 60
3
e 70
4
do século XX o conhecidas,
conforme Pietri (2005), como as décadas da redemocratização do ensino, ação
defendida pelos ideários da Escola Nova
5
. Se até aquele momento somente os filhos
da elite tinham acesso à educação, os filhos dos trabalhadores passaram também a
tê-lo, conforme a ótica do governo da época.
A LDB de 1961 foi revista por Castelo Branco no ano de 1965 e
reordenada pela ordem privatista. Nessa reorientação, foram
ideologicamente garantidas as matrículas de 100% das crianças
entre 07 e 11 anos e aumentou-se a transferência de recursos
públicos para o setor privado. (...) o governo resolveu financiar, às
claras, o sistema de ensino particular, através da Lei 4.440, que
instituiu o salário-educação como responsabilidade para as
empresas (ROCHA e DEITOS, 2004, p. 138).
A atitude gerou o aumento da demanda pelo ensino pago, em detrimento da
procura pelo ensino público gratuito, diminuindo, dessa forma, a obrigação do
Estado com a manutenção da educação pública gratuita.
3
A década de 60 é fortemente lembrada, em âmbito geral, pelo golpe de 64 organizado para atender
aos anseios da burguesia brasileira e do capital internacional (principalmente dos EUA - que
representava grande parte dos investimentos estrangeiros no Brasil) de conter as reivindicações dos
trabalhadores, diretamente afetados pela falta de emprego e pela desvalorização dos salários.
4
Devido à crise econômica que se instalara no país, a década de 70 é lembrada principalmente pelo
arrocho salarial instalado pelo governo Médici. Para complementar o orçamento doméstico, foram
ofertadas as horas extras de trabalho e, entre 1968 e 1973, 60% dos operários brasileiros
trabalhavam 50 horas semanais e 24% destes atingiam uma jornada de 60 horas semanais.
5
A educação no Brasil, da década de 1960, era orientada pelos ideários da Escola Nova, já
manifestados desde o início do século XX e, mais intensamente, na década de 30, quando um grupo
de intelectuais, envolvidos pelas idéias de Dewey e Durkheim, se aliaram e, em 1932, promulgaram o
Manifesto dos Pioneiros da Educação, sob importantes impactos das transformações econômicas,
políticas e sociais pelas quais o Brasil vinha passando no governo provisório de Getúlio Vargas. Na
realidade, a Escola Nova foi um movimento marcado pelo desejo de renovação do ensino, pois
acreditava na educação como o único e exclusivo elemento eficaz para a construção de uma
sociedade democrática capaz de levar em consideração as diversidades e respeitar a individualidade
do sujeito, porém promovendo a equalização social. Sustentada pela crítica na Escola Tradicional,
esboça uma nova maneira de interpretar a educação, a qual passa a ser defendida, “como um
instrumento de correção da marginalidade na medida em que cumprir a função de ajustar, de adaptar
os indivíduos à sociedade, incutindo neles o sentimento de aceitação dos
demais pelos demais”
(SAVIANI, 2001, P. 8). Sob esse prisma, o indivíduo deveria ser considerado apto para refletir sobre a
sociedade e inserir-se nela, integrando-se à democracia e atuando como um cidadão democrático.
Para John Dewey, um de seus idealizadores, “a escola não pode ser uma preparação para a vida,
mas sim, a própria vida”. Amparados nesse ideário, o eixo norteador da educação passou a ser a
experiência de vida e aprendizagem, atribuindo à escola a função de construir permanentemente a
experiência de aprendizagem dentro da própria vida. Nesse sentido, a educação teria a função
democratizadora de igualar oportunidades a todos. Assim, ao professor caberia a tarefa de estimular
e orientar a aprendizagem, num ambiente estimulador, repleto de materiais didáticos, e ao alunos
caberia a iniciativa de aprender, manipulado aqueles materiais didáticos.
27
Com a reforma do ensino de e graus, a Lei nº 5.692/71 estabeleceu o
compromisso de fornecer, às camadas populares, o acesso à escola. Porém, isso
gerou muitos problemas devido ao fato de não haver número suficiente de
professores habilitados. Além disso, tanto os professores que estavam atuando,
quanto o sistema educacional, não se encontravam preparados para atender à nova
clientela. Para fazer cumprir (em parte) o compromisso estabelecido, diminuiu-se o
grau de exigência, tanto no trato dos conteúdos, quanto na seleção dos profissionais
que passaram a atuar como professores, provocando a qualidade do ensino
público, reforçada, também, por condições de trabalho não-condizentes.
A partir da situação em foco, a Escola Normal foi transformada em magistério,
grau de instrução exigido para o professor do ensino primário. para os
professores do ensino secundário, exigia-se a formação no curso superior, embora
fossem poucos os cursos superiores ofertados.
Isso gerou:
(...) uma expansão desordenada do ensino superior no Brasil e o
aumento das faculdades particulares, principalmente dos cursos de
licenciatura. Havia uma urgência em formar novos professores para
atender à demanda, já que ocorreu um aumento considerável no
número de alunos no ensino primário e secundário (FARINHA, 2004,
p. 31).
A expansão foi realizada, amplamente, no setor privado. Entretanto, com a
falta de fiscalização dos órgãos governamentais, começaram a surgir instituições
com todo o tipo de perfil, inclusive aquelas que ofereciam os chamados “cursos
vagos” e os cursos de finais de semana, os quais não exigiam a freqüência do aluno,
apenas a realização do pagamento nas datas marcadas. Havia, ainda, as
licenciaturas curtas e os cursos de complementação pedagógica que, inclusive, não
contribuíam com a formação dos professores, visto simplificarem o domínio dos
conteúdos.
Por outro lado, como o Brasil vivia, naquele período, sob a política da ditadura
militar, a educação foi posta a serviço do “desenvolvimento”, que a sociedade
brasileira encontrava-se em franco processo de urbanização industrial, com o que
Pimenta (1992) chamou de “bolsões de capitalismo avançado”. Na época, a política
educacional Brasileira sofreu forte influência dos EUA, tendo em vista a ação do
governo militar, o qual, segundo Sapelli (2003), concordou em assinar um acordo
28
entre MEC/USAID, autorizando os assessores americanos a passarem instruções e
orientações referentes ao conteúdo, à forma e até mesmo à fundamentação
psicopedagógica na elaboração de cartilhas e livros didáticos.
Tal ato acirrou o controle ideológico pelo processo de educação formal,
acreditando-se que a eficiência educacional só poderia ser alcançada se fosse
controlado o trabalho docente. Para isso, valorizou-se o trabalho dos supervisores.
Aos professores, consoante Dias e Lopes (2003), cabiam apenas seguir as
orientações daqueles. Controlados no exercício do magistério, não tinham espaço
para improvisar diante do imprevisível e para trabalhar de acordo com a
multidimensionalidade da prática educacional. Conseqüentemente, o docente
trabalhava como um perito, gerindo as condições de aprendizagem, não lhe
cabendo pensar no que fazer, mas encontrar caminhos e meios para fazer o que lhe
era ordenado. Com conteúdos altamente tecnificados, com o livro didático se
fazendo mais presente, a função do professor assumia uma dimensão técnica,
restringindo-lhe a autonomia, a criatividade e a capacidade intelectual e política. A
concepção pedagógica que orientava o ensino era a da Escola Tecnicista
6
.
Ainda, nas décadas em foco, surgiram os “cursos de reciclagem” para sanar
as deficiências da formação do professor. De acordo com as determinações da
reforma universitária (1968), caberia às faculdades de educação formar e promover
a atualização dos professores, ofertando “a capacitação supletiva (expressão usada
na época)” (KULLOK, 2000, p. 72). Esta corresponderia à formação permanente do
professor ou, como é dito hoje, à formação continuada.
Todavia, convém destacar que o conceito de formação continuada de
professores data do final da década de 1950, ganhando força nas décadas
subseqüentes, e foi construído a partir da definição de educação permanente
(compreendida como um processo que se prolonga por toda vida). Arouca (1996)
postula que o termo surgiu na Europa, na tentativa de construir um instrumento para
superar os limites da educação formal. As Conferências Mundiais de Educação de
6
Para Dias e Lopes (2003),
trata-se de um
m
odelo de educação inspirado nas teorias behavioristas
da aprendizagem e na abordagem sistêmica de ensino que passou a orientar uma prática pedagógica
sustentada por atividades mecânicas e disciplina rígida. O professor passou a ser tratado como um
mero especialista que deveria aprender as técnicas apresentadas pelos manuais e repassá-las
mecanicamente, ou seja, retiraram do professor a possibilidade de ele próprio organizar e determinar
os seus meios de ensino, uma vez que os especialistas da educação e os materiais didáticos eram
quem determinariam as maneiras de ensinar.
29
Adultos, realizadas a partir da década de 1960 e patrocinadas por diversos
organismos internacionais, entre eles a UNESCO, contribuíram significativamente
para a definição do quadro de educação formal.
Como o contexto sócio-educacional dessas décadas caracterizava-se por
uma profunda crise na educação (tanto nos países subdesenvolvidos como
naqueles em franco processo de industrialização), o sistema formal de ensino
passou a ser questionado:
(...) frente ao avanço da ciência, da técnica e da tecnologia; às
transformações políticas, sociais e econômicas; à produção de
novos conhecimentos; à dicotomia entre escola e trabalho e à
assunção da globalização do mercado econômico (NUNES, 2000, p.
50).
Tais questionamentos foram suficientes para conceber a educação
permanente como condição dos indivíduos acompanharem as mudanças da
realidade. No momento, a discussão voltava-se prioritariamente para os
profissionais, técnicos e especialistas dos mais diferentes setores e essa formação
era entendida como “processo ininterrupto de aprofundamento”, a ser realizado além
da escola, envolvendo, também, outros órgãos competentes e todos os domínios do
saber. Desse modo,
(...) a preocupação com a educação permanente nasce a partir do
momento em que se chega ao consenso de que seria necessário
investir na formação de jovens e adultos que não possuíam o perfil
profissional definido e de qualidade, por meio de ações formativas,
propostas por diferentes programas de educação continuada,
educação essa considerada necessária ao processo de
industrialização e ao desenvolvimento pessoal e profissional do
homem (Idem, p. 52).
Da concepção de educação permanente deriva a formação continuada de
professores, pautada na compreensão de que:
- a formação de professores deve estender-se pela vida toda;
- o professor deve estar em contínuo desenvolvimento;
- refere-se a um processo de formação de um período pós-escolar;
- os conhecimentos adquiridos por essas ações devem ir além dos conteúdos
formais de ensino;
- deve preencher as lacunas deixadas durante o período de formação
docente;
30
- é considerada fundamental para o desenvolvimento do professor como
indivíduo social.
Embora fosse delineada, teoricamente, de maneira consistente, atribuindo-lhe
a responsabilidade por sanar todas as lacunas deixadas na formação inicial, a
concretização da formação continuada não demonstrou essa eficiência. As linhas de
ações centralizaram-se em forma de cursos de curta duração, de forma esporádica,
sem continuidade e desvinculados das reais necessidades dos professores. Como,
na época, cabia apenas ao professor realizar as ações determinadas, geralmente,
pelos supervisores, eram estes quem definia os conteúdos os quais os professores
deveriam “aprender” nos cursos de formação, cabendo-lhes apenas “ouvir” o que o
palestrante (cursista ou formador) tinha a ensinar.
Todavia:
A formação contínua não pode ser concebida como um processo de
acumulação (de cursos, palestras, seminários etc., de
conhecimentos ou de técnicas), mas sim como um trabalho de
reflexividade crítica sobre as práticas e de (re)construção
permanente de uma identidade pessoal e profissional, em interação
mútua (CANDAU, 1996, p. 150).
Concordando com as palavras da autora, concluo que essa prática não se
efetivou nas décadas de 1960 e 1970 porque a ênfase recaiu sobre o processo de
“reciclagem” dos professores.
Mesmo assim, considero importante destacar as iniciativas que despontaram,
por parte do governo federal, em relação à formação de professores na modalidade
à distância (EAD). Dentre estas, destaco algumas
7
:
1960 Início da ação sistematizada do Governo Federal em EAD,
firmando contrato entre o MEC e a CNBB para a expansão do sistema de
escolas radiofônicas aos estados nordestinos, que fez surgir o MEB
Movimento de Educação de Base –, sistema de ensino a distância não-
formal.
1965 Início dos trabalhos da Comissão para Estudos e Planejamento da
Radiodifusão Educativa.
1967 Foi criada a Fundação Padre Anchieta, mantida pelo Estado de
São Paulo, com o objetivo de promover atividades educativas e culturais
por meio do rádio e da televisão.
7
Disponíveis no site: http://www.telebrasil.org.br/ead.pdf , acesso em 21 de março de 2007.
31
1970 – Portaria 408 determinou que emissoras comerciais de rádio e
televisão teriam a obrigatoriedade da transmissão gratuita de cinco horas
semanais de 30 minutos diários, de segunda a sexta–feira, ou com 75
minutos aos sábados e domingos para apresentação de cursos do Projeto
Minerva.
1971 Nasceu a ABT Associação Brasileira de Tele–Educação que
organizava, desde 1969, os Seminários Brasileiros de Teleducação,
atualmente denominados Seminários Brasileiros de Tecnologia
Educacional. Foi pioneira em cursos à distância, capacitando os
professores por meio de correspondência.
1972 Criação do Prontel Programa Nacional de Teleducação que
fortaleceu o Sinred – Sistema Nacional de Radiodifusão Educativa.
1973 Projeto Minerva passou a produzir o Curso Supletivo de Grau, II
fase, envolvendo MEC, Prontel, Cenafor e secretarias de Educação.
1973-74 Nasceu o Projeto SACI, conclusão dos estudos para o Curso
Supletivo "João da Silva", sob o formato de telenovela, para o ensino das
quatro primeiras séries do lº grau.
1974 TVE Cea começou a gerar tele–aulas; o Ceteb Centro de
Ensino Técnico de Brasília iniciou o planejamento de cursos em
convênio com a Petrobrás para capacitação dos empregados desta
empresa e do projeto Logus II, em convênio com o MEC, para habilitar
professores leigos sem afastá–los do exercício docente.
1.1.2 Década de 1980: abertura política, novas vozes, outros discursos
Após 21 anos de regime militar vividos no país, a década de 80, do século
passado, marcou o início da transição política. O último governo liderado por
militares (1979/1985) provocou o fortalecimento da oposição e a sociedade civil
retomou sua organização via sindicatos, partidos políticos e movimentos sociais.
A década de 1980, portanto, foi marcada pelo processo de abertura política
na sociedade brasileira. Neste período houve uma ruptura no nível político e teve
início o discurso progressista da reconstrução nacional das liberdades políticas
individuais e da cidadania. A política educacional brasileira, no final da década de
1970 e início da década de 1980, refletiria ações e programas voltados para as
32
regiões mais pobres, onde o caráter nacional define as políticas adequadas às
realidades locais.
De um modo geral, os anos de 1980 representaram uma ruptura com o
pensamento tecnicista predominante e resgatou o professor como a figura central
das preocupações com a educação. Se realmente quisessem que o ensino
garantisse reais perspectivas de valorização às classe trabalhadoras, era preciso
investir no professor, dos quais dependeriam as mudanças possíveis.
Destacaram-se, no movimento, educadores que “produziram e evidenciaram
concepções avançadas sobre formação do professor, destacando o caráter sócio-
histórico dessa formação” (FREITAS, 2002
8
). Estes educadores defendiam a
necessidade de professores com pleno domínio da realidade de seu tempo,
compreendendo as condições da escola, da educação, da sociedade, capazes de,
por meio do desenvolvimento da consciência crítica, interferirem e transformarem o
contexto sócio-educacional, embasados na corrente Histórico-Crítica
9
.
Dentre os educadores, Geraldi, Silva e Fiad postulavam que:
A mudança da escola, a sua melhoria e conseqüentemente a efetiva
democratização da educação (...) passaria também inevitavelmente
por uma transformação do professor em sala de aula. Não bastaria a
locação de recursos no setor educacional, sequer modificação de
estruturas. O investimento a ser feito seria no professor como fator
de mudanças. Este desafio seria possível de ser vencido através
de uma profunda e radical alteração na forma de se conceberem as
relações entre este trabalhador, o seu conhecimento e a sua prática,
sem a qual todo o esforço de mudança do ensino e dos
professores resultaria em nada, distante que estaria do critério
essencial desse trabalho de natureza intelectual: a distância entre
concepção e execução (GERALDI, SILVA e FIAD,
1996, p. 311)
.
8
Artigo divulgado na internet, sem paginação.
9
Conforme Saviani (2006), essa pedagogia é tributária da concepção dialética, especificamente na
versão do materialismo histórico, tendo fortes afinidades, no que se refere às suas bases
psicológicas, com a psicologia histórico-cultural desenvolvida pela “Escola de Vygotsky”. A educação
é entendida como o ato de produzir, direta e intencionalmente, em cada indivíduo singular, a
humanidade que é produzida histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens. Em outros termos,
isso significa que a educação é entendida como mediação no seio da prática social global. A prática
social se põe, portanto, como o ponto de partida e o ponto de chegada da prática educativa. Daí
decorre um método pedagógico que parte da prática social onde professor e aluno se encontram
igualmente inseridos, ocupando, porém, posições distintas, condição para que travem uma relação
fecunda na compreensão e encaminhamento da solução dos problemas postos pela prática social,
cabendo aos momentos intermediários do método identificar as questões suscitadas pela prática
social (problematização), dispor os instrumentos teóricos e práticos para a sua compreensão e
solução (instrumentação) e viabilizar sua incorporação como elementos integrantes da própria vida
dos alunos (catarse).
33
Com essa concepção emancipadora, a educação começou a ser repensada
em seu espaço institucional, ressaltando-se a importância dos educadores
relacionarem a compreensão de escola com a sua própria formação, vinculando às
grandes questões sociais e “ao movimento dos trabalhadores pela construção de
uma nova sociedade, justa, democrática e igualitária” (FREITAS, 2002). Na
realidade, pretendia-se que o professor (e todos os envolvidos com a educação)
compreendesse que sua luta, inserida na crise educacional brasileira, se
apresentava como:
(...) parte de uma problemática mais ampla, expressão das
condições econômicas, políticas e sociais de uma sociedade
marcada pelas relações capitalistas de produção e, portanto,
profundamente desigual, excludente e injusta, que colocam a
maioria da população em uma situação de desemprego, exploração
e miséria (Idem).
Foi um período em que se aqueceram as organizações dos movimentos de
educadores e a discussão sobre a formação de professores. Evidenciaram-se,
ainda, as lutas salariais por melhores condições de trabalho, devido ao fato de, na
década, ocorrer um crescente achatamento dos salários dos profissionais da
educação. Paralelamente, acentuaram-se a luta pela democratização da sociedade
brasileira, pela gestão democrática da escola e pela autonomia universitária. No
contexto das discussões, cresceram e prosperaram as reformulações curriculares
nos curso de Pedagogia, destacando-se a formação dos professores de educação
infantil e séries iniciais do ensino fundamental.
Por outro lado, segundo os Referenciais para a Formação de Professores, “a
década de 80 foi marcada (...) por índices alarmantes de fracasso escolar no ensino
fundamental traduzidos em percentuais de repetência e evasão inaceitáveis”
(BRASIL, 1999, p. 28). Isso, provavelmente, em decorrência da formação aligeirada
de professores (incentivada na década anterior), para atender a demanda de alunos
na escola; do pouco investimento na educação e da política de formação continuada
adotada.
Em contrapartida a esta realidade, ganharam força os movimentos pela
defesa da escola pública para a maioria da população, apoiados pelos governos de
oposição ao Regime Militar, desencadeando políticas públicas que visavam superar
o fracasso escolar.
34
No que se refere à formação de professores, incluindo a formação
continuada, convém salientar os Centros Específicos de Formação e
Aperfeiçoamento do Magistério (CEFAM), que foram instituídos pelo Decreto 28.089,
de 13 de janeiro de 1988. Criados a partir de encontros realizados entre Ministério
da Educação e um conjunto de instituições, os Centros surgiram para substituir os
antigos magistérios e os cursos normais. Tinham, como finalidade, conforme
explicam os Referenciais para a Formação de professores, “promover atualização e
aperfeiçoamento dos profissionais da educação, desenvolver práticas inovadoras de
pesquisa, formar professores leigos, atuar como agente de mudanças” (BRASIL,
1999, p. 29).
O principal objetivo da criação dos Centros era o de articular todos os graus
de ensino, oferecendo não a formação inicial, mas também a formação
continuada. Inicialmente foram implantados em seis estados, no ano de 1983,
expandindo-se posteriormente para outros estados.
É importante destacar, também, os debates proporcionados pelos
movimentos dos educadores, os quais revelaram o caráter sócio-histórico da
formação do professor, evidenciando uma ruptura com o pensamento tecnicista
dominante. Isso significou um grande avanço, na época, pois defendia-se a
necessidade de formar profissionais da educação com ampla compreensão da
realidade, portadores de postura crítica, capazes de interferir na transformação na
escola, da educação, da sociedade, na conquista de condições mais favoráveis para
a realização de seu trabalho. E, nessa perspectiva, caminharam também as
atividades de formação continuada, concretizadas, ainda, em eventos pontuais tais
como: seminários, palestras e cursos.
1.1.3 Neoliberalismo e educação: ações de impacto na década de 1990
Tendo em vista que a Constituição de 1988 incorporou, como princípio
básico, a urgente necessidade da valorização dos profissionais do magistério, a
década de 1990 do século passado destacou-se pelas mudanças implantadas na
educação, inicialmente com a posse do Presidente Fernando Collor de Melo em
1990, o qual, mesmo antes de ser eleito, já definia a política educacional, concebida
por um grupo de técnicos de sua confiança. Embora bem planejada, essa política
35
não teve efeito, devido aos conflitos gerados pela nomeação do Ministro (Carlos
Chiarelli), não bem recebida pelo grupo.
É desse período de governo, ainda, a Declaração Mundial de Educação para
Todos (aprovada em março de 1990, na Tailândia), a qual não teve maiores
desdobramentos no Brasil. Conforme expõe Cunha:
(...) a Declaração Mundial de Educação para Todos havia
incorporado a Recomendação Relativa à Situação do Pessoal
Docente, aprovada em 1966 pela Conferência Intergovernamental
Especial sobre a Situação do Pessoal Docente, organizada sob os
auspícios da Unesco-OIT. O conteúdo dessa Recomendação é rico
e abrangente, incluindo política de formação e de educação
continuada, profissão, carreira e salário, ética profissional, direitos e
obrigações, seguridade social e condições mínimas a um exercícios
docente eficaz (CUNHA, 1998, p. 53).
Com a retomada do processo de eleições diretas, esperava-se que o
problema do magistério fosse tratado com maior seriedade, incluindo-se na política
de Estado. Entretanto, poucos esforços foram registrados no período para fazer
valer a Declaração, agravando-se, assim, a situação, e apontando-se para o maior
índice de desvalorização da categoria, o que dificultava o tratamento de uma política
de formação. Mesmo diante do quadro negativo, o MEC-Seneb elaborou e publicou,
em 1992, um documento intitulado Diretrizes Gerais para a Capacitação de
Professores, Dirigentes e Especialistas da Educação Básica. O documento previa,
em linhas gerais, “a realização de estudos para a reestruturação da formação de
professores para educação básica, o fortalecimento de instituições de reconhecida
competência e a criação de experiências piloto de formação de professores” (In.:
CUNHA, 1998, p. 56). Todavia, o próprio MEC não conseguiu operacionalizar as
ações propostas pelo documento, devido à falta de apoio do discurso oficial.
Com a posse de Itamar Franco, em 1992, após o impeachment de Collor,
esperanças ressurgiram e, nesse clima, Murilo Hingel, o então Ministro da
Educação, após participar de uma conferência na China (a qual reuniu o grupo do
EFA9
10
), decidiu elaborar, no início de 1993, o Plano Decenal de Educação para
Todos com ampla participação dos segmentos da educação. Como resultado das
discussões, dentre outros, destaca-se: o estabelecimento do Pacto de Valorização
10
- Criado pela UNESCO, esse grupo reunia, segundo Cunha (1998), 9 países que apresentavam
déficits educacionais de risco: Brasil, índia, Paquistão, Nigéria, Egito, Bangladesh, Indonésia, México
e China.
36
do Magistério e Qualidade da Educação, operacionalizado pelo Fórum de
Valorização do Magistério, que teve como principal ação o início de um estudo sobre
a fixação do piso salarial dos profissionais da educação no Brasil, propondo-se,
nacionalmente, o valor de 300 dólares.
Em 1995, Fernando Henrique Cardoso assumiu o governo do Brasil,
comprometendo-se em dar continuidade às discussões, objetivando encontrar uma
solução para a crise do magistério. O Fórum voltou a se reunir e o MEC,
discordando da proposta de um piso salarial nacional, apresentou uma
contraproposta: “do total de recursos depositados nos fundos estaduais, 60% seriam
gastos com salários do magistério” (In. CUNHA, 1998, p, 67).
Contudo, como esta proposta direcionava-se apenas ao ensino fundamental,
não houve consenso no âmbito do Fórum, no qual tinha assento o Consed
Conselho Nacional dos Secretários de Educação, a Undime União Nacional dos
Dirigentes Municipais de Educação, e a CNTE Confederação Nacional dos
Trabalhadores em Educação (este último retirou-se do Fórum). Com o apoio da
maioria, o projeto do MEC tramitou regularmente e em 14 de setembro de 1996
converteu-se na Emenda Constitucional 14, criando, assim, o Fundo de
Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do
Magistério (FUNDEF), regulamentado, posteriormente, pela Lei 9.424, de 24 de
dezembro de 1996.
Considero oportuno ressaltar, no entanto, que dimensões importantes do
ideário crítico, norteadoras da proposição do projeto nacional, não foram plenamente
contempladas. Embora essas ações tenham lançado olhares significativos para a
educação, o governo federal, seguindo a tendência das reformas liberalizantes,
estendidas por toda a América Latina, incluindo obviamente o Brasil, buscou
adequar as políticas educacionais às exigências da reforma do Estado. Assim,
influenciado (ou comandado) por movimentos mundiais instaurados pela UNESCO e
pelo Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento BIRD e Banco
Mundial – BM (em sintonia com o Fundo Monetário Internacional), o Brasil promoveu
significativas mudanças na educação, com base no ideário neoliberal. Visando à
globalização e à unificação de determinados mercados econômicos, acirrando a luta
pela competitividade internacional e a hegemonia de mercado, era preciso que a
escola produzisse trabalhadores para uma nova “ordem mundial”.
37
Dessa forma, o sistema educacional brasileiro foi redefinido de acordo com a
pedagogia pragmática da empregabilidade. Daí, então, a repentina retomada de
interesse pela educação por parte do sistema político e econômico.
Destarte, para que essas pretensões político-econômicas se efetivassem, foi
preciso produzir “uma nova escola e um novo ensino”, definindo-se, assim, “o papel
social que o professor teria que corresponder para participar, qualitativamente, da
construção do mundo tecnológico” (NUNES, 2000, p. 23). Para tal, “o professor
passa a ser considerado o ‘agente das reformas educativas’, assumindo o papel de
mediador entre economia / desenvolvimento e educação” (Idem).
Pietri (2005) expõe que do movimento resultou a concretização do Plano
Decenal de Educação para Todos e a reforma educacional que produziu muitos
documentos, tais como
11
: o Programa Dinheiro na escola que, na concepção do
MEC, incentiva a autonomia das escolas para o desenvolvimento de projetos
educativos próprios; a política de avaliação educacional (SAEB, Sistema Nacional de
Avaliação da Educação Básica; ENEM, Exame Nacional do Ensino Médio; ENC,
Exame Nacional de Cursos), que orienta e subsidia os sistemas de ensino em
direção à melhoria da qualidade; a TV Escola, que possibilita o acesso dos
professores a informações e propostas atualizadas de práticas educativas; a
elaboração e a distribuição do Guia de Avaliação do Livro Didático, que visa ao
enfrentamento dos pontos desfavoráveis à época, divulgados nos livros; a
elaboração dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN
12
) para o ensino
fundamental regular, da Proposta Curricular para a Educação de Jovens e Adultos,
do Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil e para a Educação
Indígena, propiciando, aos professores, subsídios teórico-práticos e mobilizando-os
para a reflexão.
A este respeito, Chini e Figueiredo assinalam:
De acordo com as orientações do Banco Mundial, o governo federal,
juntamente com sua equipe, deveriam elaborar políticas que
assegurassem a centralização da proposta pedagógica, da
formação docente e do sistema de avaliação, bem como a
descentralização dos recursos financeiros e da gestão escolar. No
11
In: Referenciais para a formação de professores. Brasília: Secretaria de Educação Fundamental,
1999.
12
“A proposta de reforma que o MEC anunciou em 1997/1998 com a publicação dos PCNs teve por
objetivo adequar o sistema nacional brasileiro aos critérios de eficiência e produtividade, necessários
para a inserção dos indivíduos na sociedade e para a formação de mão-de-obra qualificada às novas
necessidades impostas pela globalização do mercado” (CHINI E FIGUEIREDO, 2004, p. 163).
38
que se refere à política de centralização, podemos mencionar: a
necessidade de estabelecer um currículo nacional, como os PCNs e
o livro didático, como o Provão, ENEN e SAEB; e a necessidade de
se desenvolverem estratégias de formação docentes nacionalmente,
de acordo com o plano curricular (CHINI e FIGUEIREDO, 2004, p.
158).
Entendia-se, assim, ser preciso investir qualitativamente na educação para o
bem estar da população brasileira e, partindo desse discurso, a qualidade na
educação era a bandeira que passaria a sustentar a implementação das políticas
neoliberais assumidas pelos diferentes setores governamentais e empresariais,
tornando-se condição para o aprimoramento de acumulação de riquezas e
aprofundamento do capitalismo.
Os anos de 1990 representaram, para a educação, em termos políticos, um
retrocesso aos avanços conquistados na década de 1980 pelos educadores,
marcada pela reação ao pensamento tecnicista das décadas de 1960 e 1970. Com a
volta da centralidade no conteúdo da escola, o ensino foi colocado a serviço das
competências e habilidades e a concepção tecnicista de educação voltou sob nova
roupagem.
Freitas, ao pontuar as mudanças estabelecidas na década, faz as seguintes
considerações:
A ênfase excessiva do que acontece na sala de aula, em detrimento
da escola como um todo, o abandono da categoria trabalho pelas
categorias prática, prática reflexiva, nos estudos teóricos de análise
do processo de trabalho, naquele momento histórico da abertura
política e da democratização da escola, recuperavam, na construção
de sujeitos históricos, professores como sujeitos de prática
(FREITAS, 2002).
As atividades práticas voltaram a ser enfaticamente valorizadas, criando-se
uma ruptura com a teoria. O que importava eram as reflexões sobre a prática
pedagógica.
Nesse sentido, passou-se a operar pela lógica do Banco Mundial, o qual
recomendou, no ano de 1995, em seu documento intitulado La enseñanza superior:
lãs liciones derivadas de la experiência”, a formação de um profissional
tecnicamente competente a um baixo custo. Mello (1999) assim escreve a respeito:
39
(...) inviável para o poder público financiar a preços das
universidades ‘nobres’ a formação de seus professores de educação
básica que se contam em mais de milhão. Com um volume de
recursos muito menor, um sistema misto de custos baixos, tanto
público quanto privados, configura um ponto estratégico de
intervenção para promover melhorias sustentáveis a longo prazo na
escolaridade básica (In. FREITAS, 2002).
O Brasil cumpriu fielmente tais determinações e, a partir daí, começaram a
expandir os ISEs Institutos Superiores de Educação e os cursos normais
superiores. Tais instituições, de caráter técnico-profissionalizante, tinham, como
objetivo principal, formar professores com ênfase no caráter técnico instrumental,
com competência para mobilizar saberes de modo adequado à situação,
solucionando problemas práticos do cotidiano.
Situada a formação inicial nesses parâmetros e associando-se às condições
de precariedade vigente no sistema educacional, destacaram-se, ainda mais, as
dificuldades e desafios a serem enfrentados no processo de formação continuada.
A perspectiva de caráter individualista e imediatista para atender à demanda
do mercado de trabalho norteou as iniciativas no plano de formação inicial e
continuada do professor. Advém da lógica neoliberal, ainda, a ênfase dada à
educação em serviço que “considera ser a forma mais barata e mais eficiente de
formação de profissionais da educação” (SANTOS, 2001, p. 170).
Para sustentar o ideário liberalista, o Governo Federal formulou e implantou,
no período de 1995 a 2002, a política de formação continuada, focalizada nas séries
iniciais do ensino fundamental. Entre 1995 e 1998, o MEC, por intermédio da
Secretaria de Educação Fundamental, elaborou diretrizes, parâmetros curriculares,
destacando-se, dentre estes, a publicação dos Referenciais para a Formação de
Professores, em 1999, que, nas palavras da Secretaria de Educação Fundamental,
tem, por finalidade “provocar e, ao mesmo tempo, orientar transformações na
formação dos professores” (BRASIL, 1999, p. 15). Logo, com o reconhecimento de
que “a formação de que dispõem os professores hoje no Brasil o contribui
suficientemente para que seus alunos se desenvolvam como pessoas” (idem, p. 16),
o documento sustenta-se numa proposta de transformação:
Mudanças nas práticas de formação que incluam a organização
das instituições formadoras, a metodologia, a definição de
conteúdos, a organização curricular e a própria formação dos
formadores;
40
Criação de sistemas de formação nos quais se articulem os
processos de formação inicial e continuada dos professores (Ibidem,
p. 16)
Em relação especificamente à formação continuada, o documento tece uma
crítica ao modelo predominante no Brasil, apontando as seguintes características
reveladas nos projetos, políticas ou programas de formação continuada:
a) partem sempre da “estaca zero”, desconsiderando a experiência e o
conhecimento já acumulados;
b) o contexto institucional dos professores, as suas reais condições de
trabalho, os recursos disponíveis, a carreira e o salário não o
considerados;
c) são direcionados unicamente aos professores, desconsiderando os
demais profissionais da educação;
d) não partem de uma avaliação diagnóstica das reais necessidades e
dificuldades pedagógicas dos professores;
e) em vez de ressaltarem a importância dos avanços conquistados,
supervalorizam os erros, destacando as debilidades da prática
pedagógica;
f) os instrumentos de avaliação não são eficazes para o alcance das ações
desenvolvidas;
g) realizam-se, na maioria das vezes, fora do local de trabalho;
h) são assistemáticos, pontuais, limitados no tempo e não integram um
sistema de formação permanente;
i) utilizam da pontuação, da progressão de carreira e dos certificados para
motivar a participação dos professores, e a essência do processo, que
seria o compromisso com o desenvolvimento profissional permanente, a
melhoria do ensino, a própria aprendizagem e a aprendizagem dos alunos,
fica camuflada.
O documento define este modelo de formação como fruto da história que o
produziu, ou seja, foi determinado pela “hegemonia de uma concepção de professor
como aplicador de propostas prontas, produzidas por técnicos das instâncias
centrais ou intermediárias do sistema educacional” (BRASIL, 1999, p. 45). E, como
contrapartida, é proposto que a formação aconteça num contexto favorável ao
desenvolvimento de diferentes competências profissionais, criando um sistema
41
integrado e permanente, incluindo a formação inicial e continuada. Para que
realmente se efetive, existe a necessidade de transformar os currículos e programas
de formação.
Comentam Dias e Lopes (2003) que, no documento, o sucesso da reforma
educacional brasileira está vinculada à existência de professores melhores
preparados para a realização do trabalho docente. Essa compreensão divide, com o
professor, a responsabilidade da mudança, visto que espera dele o compromisso
com a implementação da reforma. Conseqüentemente, toda e qualquer melhoria na
qualidade da educação estará vinculada à mudança na formação de seus
profissionais.
Além dos Referenciais para a Formação de Professores, é importante lembrar
que as políticas oficiais brasileiras procuram resguardar, em outros documentos, o
exercício da formação continuada. A LDB, por exemplo, define, no inciso III, do art.
63, que as instituições de ensino deverão manter “programas de formação
continuada para os profissionais da educação dos diversos níveis”. A Lei nº 9424/96,
instituidora do FUNDEF, estabelece 60% dos recursos do Fundo à remuneração
docente e o restante (40%) a outras ões, dentre as quais, à formação (inicial e
continuada) dos professores. De igual modo, a Resolução 03/97, do Conselho
Nacional de Educação, define, no artigo 5º, que os sistemas de ensino deverão
implementar “programas de desenvolvimento profissional dos docentes em
exercício”.
Embora a União desempenhe papel fundamental no processo de formação,
coordenando políticas nacionais de educação, atribuí aos Estados e Municípios a
responsabilidade pela organização de seus respectivos sistemas e a incumbência de
elaborar sua própria proposta pedagógica, junto com instituições escolares e com a
participação dos docentes,
É válido destacar, ainda, que, paralelamente às políticas governamentais,
mais precisamente no meio acadêmico, no conjunto de pesquisas sobre a formação
dos professores, revelou-se, nos debates, a influência acerca do professor reflexivo
proposto por Schön (1992). Para Lüdke (2001), a grande contribuição de Schön foi
expor tal conceito, visto que o componente da reflexão passou a ser considerado
imprescindível para o trabalho e para a formação do bom professor, na medida em
que, no seu dia-a-dia, os próprios docentes recorrem à reflexão, ainda que não se
dêem conta de tal processo. Lüdke (idem) concorda que essas idéias possibilitaram
42
o desenvolvimento do debate sobre o professor-pesquisador, tema defendido por
diferentes autores, em especial Demo (1990, 1997), trazendo contribuições sobre o
caráter formador da pesquisa na formação de educadores. No plano internacional, a
autora destaca os trabalhos de Keneth Zeichner (1998) que, mais recentemente,
tem se concentrado na valorização da pesquisa do professor.
Carvalho e Simões (2002) afirmam que a literatura evidenciada enfatizou o
aumento da atribuição da importância ao professor como centro no processo de
formação continuada, atuando como sujeito individual e coletivo do saber docente
em relação às experiências feitas com o saber científico. Enfim, que a participação
de professores na pesquisa de sua própria prática tem sido especialmente
valorizada nos últimos anos, garantindo-lhes vez e voz, por estarem exercendo o
papel de atores coletivos e sociais na transformação do cotidiano escolar e para
além dele.
Contudo, não poderia ser esquecida, no relato da década de 1990, a ênfase
dada à formação (inicial e continuada) na modalidade à distância. Em 1995, por
exemplo, nasce (experimentalmente) no Piauí, a “TV Escola” uma das ações
prioritárias da Secretaria de Educação à Distância - SED. Sua programação
provisória foi lançada em setembro e, a definitiva, em 04 de março de 1996. O
programa teve origem no Planejamento Estratégico do Ministério de Educação, cujo
objetivo era, nas palavras do MEC, democratizar o ensino básico e elevar a
qualidade da educação brasileira.
A partir da iniciativa do MEC, a TV Escola chegou à maioria das unidades
escolares, visto que, em 1996, todas as escolas públicas com mais de 100 alunos
receberam, do MEC, os equipamentos “kit tecnológico” (televisor, videocassete,
antena parabólica, receptor de satélite e caixa com dez fitas de vídeo) para recepção
e gravação dos programas. O programa TV Escola passou a ser transmitido para
todo o país com programação diária distribuída em faixas distintas, atendendo ao
Ensino Fundamental e Ensino Médio.
Inaugurada em 1996, a TV Escola leva ao ar, diariamente, 14 horas de
programação, com uma diversidade de programas e quantidade de títulos. A
principal proposta é que tudo o que for transmitidos seja gravado em fitas de
videocassete para posterior utilização do professor em sala de aula ou para sua
capacitação e atualização profissional.
43
Posso concluir que a década de 1990 destacou-se em relação às inúmeras
mudanças impostas à educação que, de uma forma ou de outra, denunciaram o
quanto as decisões políticas demandam sobre o fazer pedagógico. Embora,
teoricamente, o poder de decisão recaia sobre as próprias instituições, estas quase
sempre o “orientadas” por órgãos superiores que determinam o que fazer. No
cenário político-educacional em questão é valido lembrar que, como educadores, é
preciso estar atentos às reformas pedagógicas e/ou às mudanças propostas pelo
governo, sejam elas em que âmbito for (federal, estadual ou municipal). Em qualquer
situação, não é permitido esquecer que o conhecimento científico deve ser pensado
sempre com rigor, visto ser o motivo existencial da escola. A realidade não pode ser
simplesmente interpretada à luz do que é ofertado, sem o exercício da reflexão. “A
única via capaz de explicitar a prática social dos homens, hoje, é a ciência da
história” (KLEIN e RIBEIRO, 1991, p. 4). Sendo assim, é válido lembrar que cada um
faz e constrói história por intermédio de ações e interações com os outros e com o
meio.
1.1.4 A partir de 2000: esperanças renovadas, mas...
Com a publicação, como foi dito, dos Referenciais para a Formação de
Professores em 1999, o novo milênio inicia-se com a educação sustentada no
paradigma da competência. Retomando as palavras de Dias e Lopes (2003), a
escola deve estar sintonizada com as mudanças da sociedade e ajustada ao
mercado de trabalho. Para isso, é atribuída, à escola, novas tarefas, dentre as quais,
a ressignificação do ensino em resposta aos desafios contemporâneos que exigem
maior desenvolvimento das pessoas e da sociedade.
De novidade mesmo, na proposta, está o fato de se pensar uma escola mais
voltada para a comunidade, estimulando um envolvimento maior dos pais e da
sociedade com as ações educacionais.
Para Dias e Lopes (2003), os documentos oficiais vigentes, e não
contestados pela nova equipe de governo que assumiu em janeiro de 2003,
defendem uma nova concepção para a formação dos professores brasileiros, capaz
de superar a formação insuficiente que vem sendo observada no desempenho do
seu quadro docente. Desse modo, reforçam uma relação determinista entre o
desempenho do professor e o de seus alunos. A proposta curricular para formação
44
de professores anuncia um modelo de profissionalização que possibilita um controle
diferenciado da aprendizagem e do trabalho dos professores. Tal perspectiva
apresenta uma nova concepção de ensino que tende a secundarizar o conhecimento
teórico e sua mediação pedagógica. Assim, o conhecimento da prática acaba
assumindo o papel de maior relevância, em detrimento de uma formação intelectual
e política dos professores.
Um dos destaques do atual governo na educação é a ênfase dada à reforma
do ensino universitário, denominada Programa Universidade para Todos ProUni,
por meio do qual são previstas parte das 550 mil vagas ociosas em instituições de
ensino superior privadas para estudantes oriundos da rede pública, com renda
familiar de até um salário mínimo, e professores da educação básica, sem curso
superior. Propõe, ainda, que as instituições superiores filantrópicas destinem os 20%
de gratuidade, exigidos por lei, exclusivamente para bolsas de estudos, em troca
de isenção de impostos estabelecidos pela Constituição Federal. Já o Sistema
Especial de Reserva de Vagas, que também faz parte da Reforma da Educação
Superior, determina que 50% das vagas das universidades públicas sejam
destinadas a estudantes que tenham cursado o ensino médio em escolas públicas.
Nesta cota estão previstas vagas para negros e índios, de acordo com a proporção
dessas populações em cada estado, determinada pelo censo do Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE).
Se, por um lado, as instituições privadas são beneficiadas com a Reforma,
por outro, as universidades públicas encontram-se em total abandono, desprovidas
até de elementos básicos para sua sustentabilidade. As iniciativas que promovam
políticas afirmativas em qualquer nível de ensino devem ser valorizadas, contudo,
qualquer mecanismo que implique no apoio à iniciativa privada, por parte do setor
público na área da educação, pode ocorrer por períodos limitados, em regime
emergencial, baseado em um plano claro de reposição da oferta pública de
qualidade para todas as pessoas. Porém, parece que tal acordo até então inexiste,
visto que não um planejamento para suprir as necessidades reais das instituições
públicas de nível superior.
Outra iniciativa de impacto sobre a educação refere-se à criação do Fundo
de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb). A iniciativa veio
substituir o Fundo de Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do
Magistério (Fundef), implantado a partir de 1998, com o objetivo de financiar apenas
45
o Ensino Fundamental. As políticas educacionais do atual governo entendem que
todos os níveis de ensino (Educação Infantil, Ensino Fundamental, Ensino Médio,
Educação Especial, Educação de Jovens e Adultos e Educação Indígena) devam
ser contemplados igualmente.
Nesse sentido, Haddad e Graciano (2004)
13
postulam que, embora o
programa esteja imbuído da lógica da universalização do ensino, incorporando
setores excluídos pela proposta do governo anterior, até agora o Ministério da
Educação não apresentou dados indicativos do volume de recursos necessários
para a sustentação do FUNDEB a dio e longo prazos. As iniciativas,
aparentemente bem intencionadas, ilustram o impasse do atual governo federal:
programas muito bem fundamentados e necessários, todavia estagnados e/ou
desvirtuados pela falta de recursos que, nas palavras da atual administração, é
provocada, principalmente, pela manutenção da lógica política-econômica de
governos anteriores.
No que se refere à formação de professores, o MEC está desenvolvendo
programas que, segundo ele, articulam a formação inicial com a continuada. De
acordo com tal ótica, a Secretaria de Educação Básica está elaborando e propondo
projetos que promovam essa articulação, destacando-se os seguintes Programas
14
:
- PROINFANTIL: Programa de formação à distância de professores, oferecido
para o nível médio, modalidade normal, com habilitação em Educação Infantil e
duração de 2 anos. É destinado a professores que atuam em creches e pré-escolas
que não possuem a formação exigida pela lei vigente.
- PROFORMAÇÃO: Programa de formação à distância de professores,
oferecido também para o nível médio, modalidade normal, com habilitação em
Educação Infantil e duração de 2 anos. Destina-se a professores que ainda não
possuem habilitação e que atuam nos anos iniciais do ensino fundamental, classes
de alfabetização ou na educação de jovens e adultos das redes públicas de ensino
do país.
13
-
Sérgio Haddad é relator nacional para o Direito à Educação e Mariângela Graciano é assessora
da Relatoria Nacional para o Direito à Educação. Capturado em
http://www.social.org.br/relatorio2004/relatorio031.htm
14
- Informações publicadas pelo Ministério da Educação, Secretária de Educação Básica,
Departamento de Políticas de Educação Infantil e Fundamental, Coordenação Geral de Políticas de
Formação. Orientações gerais. Rede de Formação Continuada de Professores de Educação Básica.
Brasília: MEC, 2005, p. 19.
46
- PRÓ-LICENCIATURA: Programa de formação à distância, oferecido a
profissionais que exercem a função docente nos anos finais do ensino fundamental e
no ensino médio e que não possuem habilitação específica na área de atuação
(licenciatura).
Por outro lado, na perspectiva de articular a educação inicial com a
continuada, o MEC tenta efetivar um sistema nacional de formação continuada,
capaz de dar seqüência à formação inicial e, conseqüentemente, garantir a melhoria
da qualidade da educação básica no país. Objetivando a qualificação permanente,
estabeleceu parceria, formalizada em convênio, com universidades (estaduais e
federais), constituindo a Rede de Formação Continuada, contando com a
participação dos Centros de Pesquisa e Desenvolvimento da Educação, com os
sistemas de ensino público e com a participação e coordenação da SEB/MEC. Cabe
a esses Centros produzir pesquisas, materiais didático-pedagógicos impressos e
multimídia instrucionais para o desenvolvimento de cursos à distância e semi-
presenciais e coordenar a elaboração de programas voltados para a formação
continuada dos professores de Educação Básica, nos sistemas estaduais e
municipais de ensino.
Para isso, foram priorizadas cinco áreas, cada qual coordenada por um
conjunto de universidades (federais e estaduais):
a) Alfabetização e Linguagem: Universidade Federal de Pernambuco UFPE;
Universidade Federal de Minas Gerais UFMG; Universidade Estadual de
Ponta Grossa UEPG; Universidade de Brasília UNB; Universidade
Estadual de Campinas – UNICAMP.
b) Educação Matemática e Científica: Universidade Federal do Pará UFPA;
Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ; Universidade Federal do
Espírito Santo UFES; Universidade Estadual Paulista UNESP;
Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS.
c) Ensino de Ciências Humanas e Sociais: Universidade Federal do Amazonas
– UFAM; Universidade Federal do Ceará – UFC; Pontifícia Universidade
Católica de Minas Gerais – PUC-MG.
d) Artes e Educação Física: Universidade Federal do Rio Grande do Norte
UFRN; Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC-SP;
Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRS.
47
e) Gestão e Avaliação da Educação: Universidade Federal da Bahia UFBA;
Universidade Federal de Juiz de Fora – UFJF; Universidade Federal do
Paraná – UFPR.
Com a Rede Nacional de Formação Continuada, o MEC pretende:
(...) institucionalizar o atendimento da demanda de formação
continuada; desenvolver uma concepção de sistema de formação;
contribuir com a qualificação da ação docente; contribuir com o
desenvolvimento da autonomia intelectual e profissional dos
docentes; desencadear uma dinâmica de interação entre os saberes
pedagógicos produzidos pelos Centros, no desenvolvimento da
formação docente, e pelos professores dos sistemas de ensino, em
sua prática docente; subsidiar a reflexão permanente sobre a prática
docente e, finalmente, institucionalizar e fortalecer o trabalho
coletivo como meio de reflexão teórica e construção da prática
pedagógica (BRASIL, 2005, p. 20-21).
O blico alvo do programa são professores de Educação Básica em
exercício, diretores de escola e equipe pedagógica, por entender que a qualidade do
ensino sustenta-se nas séries/anos iniciais e, por mais que tais educadores tenham
sido estruturados por uma lida reflexão teórico-prática, devem ser
complementados com saberes construídos na reflexão do cotidiano. Assim, a
formação continuada favorece a retroalimentação do conhecimento consagrado com
observações do cotidiano escolar, levando à construção de outros saberes.
Entretanto, para que a formação realmente aconteça, compete ao professor,
conforme o MEC “participar ativamente dos programas, projetos e ações de
formação continuada que visam qualificar o trabalho docente” (Idem, p. 15); e
compete ao MEC “estabelecer uma política nacional de formação continuada”,
articulando as secretarias estaduais e municipais com as universidades, de modo a
possibilitar maior interação entre tais instituições.
Em suma, muitas ações foram e estão sendo desencadeadas pelos órgãos
oficiais da educação, porém, assim como Gatti (2003, apud Dalben, 2004), entendo
que a formação continuada realmente se efetivará no momento em que for
reconhecida como uma questão psicossocial, em função da multiplicidade de
dimensões que essa formação envolve, a dizer:
1- Especialidade que significa a atualização do universo de conhecimentos
dos professores. Ancora-se na constante reavaliação do saber escolarizável,
sendo, por isso, a dimensão que mais direciona a procura por projetos de
formação continuada.
48
2- Didática e pedagógica voltada para o desempenho das funções docentes e
a prática social contextualizada. A prática docente é essencialmente uma
prática social, historicamente definida pelos valores postos no contexto. Isso
significa que, por vezes, propostas didáticas poderão se confrontar com as
experiências, expectativas pessoais ou desejos dos docentes.
3- Pessoal e social relacionada com a perspectiva da formação pessoal e do
auto conhecimento. Enfocada pela necessidade de interação em contextos
diversos e pela necessidade de entender o mundo e a inserção profissional
no mundo.
4- Expressivo-comunicativa atrelada à valorização do potencial dos
professores, de sua criatividade e de sua expressividade no processo de
ensinar e aprender. É uma busca de caráter operacional, técnico.
5- Histórico cultural relativa ao conhecimento dos aspectos históricos,
econômicos, políticos, sociais e culturais incluindo a história da educação da
Pedagogia e sua relação com as necessidades educativas postas no
contexto.
1.2 Panorama Histórico da Educação no Paraná
1.2.1 Décadas de 1960 e 1970: início do processo de descentralização
No Paraná, a política educacional local era (assim como ainda é),
logicamente, determinada pela política nacional. Convivendo, nas décadas de 60 e
70 do culo passado, com o que se poderia considerar o final do ciclo do café,
pleno de implicações do momento que marcam o esgotamento da principal fonte de
produção econômica, inicia-se, nesse período, um processo de reorganização do
Estado em todos os setores, principalmente no educacional.
Implicadas pelas leis e reformas nacionais da educação (1961 e 1971),
começa-se a discutir, então, a municipalização do ensino
15
, tendo em vista à
15
A
então, a administração estadual mantinha ampla rede de ensino, inclusive com escolas na
zona rural. Interessante notar que, em 1960, somente 30,6% da população paranaense, que
totalizava 4.268.239 habitantes, segundo dados do IBGE, localizava-se no meio urbano. Em 1970,
segundo a mesma fonte, 36,1% da população de 6.929.868 habitantes moravam no espaço urbano.
Tais dados explicam, em parte, a configuração da rede mantida fortemente pela administração
pública estadual.
49
necessidade da estrutura administrativa do sistema de ensino se adequar às
exigências da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei 4.024/61, a
primeira LDBN. Na perspectiva de atender o que determinava a Lei, o Estado do
Paraná aprova, em 1964, a Lei do Sistema de Ensino, mantendo uma estrutura
administrativa descentralizada, configurada na existência das Inspetorias de Ensino
(Regionais e Auxiliares).
Posteriormente, com a reforma da Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (Lei 5.692/71), promovida pela ditadura militar em 1971, para o então
ensino de e grau, preconizou-se ainda mais a assunção gradativa dos
municípios em relação à educação de 1º grau. Para isso, o Estado do Paraná
formulou seu Plano da Reforma de Ensino (1973/1976), estabelecendo etapas a
serem cumpridas no prazo de cinco anos, incentivando a municipalização por meio
de acordos e convênios entre Estado e Municípios, à medida que estes fossem
implantando, gradativamente, a Reforma de Ensino. O poder público estadual foi
extinguindo as Inspetorias Auxiliares de Ensino conforme foram se constituindo os
órgãos municipais de educação para assumirem a responsabilidade das escolas de
1ª a 4ª séries rurais.
Outro fator importante que deve ser lembrado na história da educação,
dessas décadas, no Paraná, é o papel desempenhado pelo projeto PROMUNICÍPIO.
O PRÓMUNICÍPIO, Projeto de Coordenação e Assistência Técnica ao Ensino
Municipal, respondia às diretrizes do II Plano Nacional de Desenvolvimento PND II
(1975-1979) para a Educação e priorizava as regiões Nordeste, Norte e Centro-
Oeste. A inclusão do Paraná no Projeto, para Ramos (1987), muito provavelmente,
influenciada pelo Ministro da Educação da época, implicou a participação do Estado
no montante dos recursos federais voltados à área. A finalidade do PROMUNICÍPIO
assentava-se no fortalecimento das relações entre Estado e municípios, entendidas
como assessorias técnicas para desenvolvimento das condições de gerenciamento
descentralizado da educação, transferindo para os órgãos municipais a
responsabilidade com o ensino de 1ª a 4ª séries. E, para assegurar a implementação
da Lei 5.692/71, a opção foi construir as escolas consolidadas, visto que a maioria
das escolas rurais existentes nos municípios eram multisseriadas, não comportando
a implantação de 5ª a 8ª séries.
Ao investigar o processo de formação de professores, nestas décadas, no
Paraná, deparei-me com um artigo da Professora Rosa Lydia Teixeira Corrêa, da
50
Pontifícia Universidade Católica do Paraná
16
, no qual é apresentado o resultado
parcial de uma pesquisa desenvolvida por meio do projeto intitulado Concepções
educativas e saberes na formação de professores: uma reconstituição histórica sob
a ótica da cultura escolar, que tinha, como objetivo, analisar como se dava a
formação dos professores no Estado, entre 1900 e 1970, a partir de dados obtidos
no arquivo de uma instituição
17
de formação de professores.
Analisando três documentos desta Instituição um Regimento escolar do ano
de 1965, aprovado em 1966; um Projeto de Implantação da Reforma de 1971, cujo
documento datava de 1972; e um Projeto de formação de professores para a
educação pré-escolar do ano de 1978 a autora apresenta os pilares filosóficos dos
documentos, veiculando idéias e valores educacionais que orientavam os sujeitos
formadores.
O Regimento Escolar revelava uma preocupação com a formação relativa à
sociedade, ao currículo, à aprendizagem, à avaliação e aos meios de ensino. A
sociedade era caracterizada como passando por “modificações complexas e
contínuas”, as quais provocavam “desajustes entre o avanço tecnológico e as
instruções sociais”, causando, conseqüentemente, o “desajuste cultural”. era
evidente, naquele período, a preocupação com a necessidade de a escola
corresponder às exigências urbano-industriais em franco aprofundamento nas
principais capitais brasileiras. Nessa perspectiva, a escola precisava se transformar
para ser um agente de “ajuste social e individual” das novas gerações. Sendo assim,
o currículo deveria concorrer para o desenvolvimento do indivíduo em toda sua
potencialidade, respeitando às diferenças individuais, porém atendendo às
necessidades da sociedade democrática cristã
18
. No documento, conforme explicita
a autora, o projeto de formação indicava saberes a serem ensinados, caracterizados
acentuadamente como saberes atitudinais, específicos, pedagógicos e didático-
curriculares, voltados para o cultivo de “virtudes morais”; o exercício de experiências
16
História de concepções e saberes na formação de professores: um olhar sob a ótica da cultura
escolar. Publicado em
http://www.faced.ufu.br/colubhe06/anais/arquivos/344rosalydiateixeiracorrea.pdf (pesquisado no dia
21 de março de 2007).
17
A instituição é o atual Instituto de Educação do Paraná cuja origem encontra-se na Lei de 238 de
19 de abril de 1870 e na Lei n° 456 de 12 de abril de 1876.
18
Que necessitava de personalidades integrais, capazes de sentir verdadeiros valores, de tomar
posição e de agir e, conseqüentemente converter-se em portadores de valores. A sociedade urgia por
indivíduos portadores de uma armadura intelectual e moral principais sustentáculos da ão que
se constituíam em foco de energia de onde nasceria um mundo melhor.
51
que permitiriam fazer julgamentos; o desenvolvimento de qualidade de liderança e
iniciativa; o exercício prático por meio de estágios curriculares, entre outros.
O segundo documento fundamentava um Projeto de Implantação da Reforma
do Ensino de 2º Grau para o Magistério e o Currículo para o aperfeiçoamento e
atualização dos professores de 1ª a série do ensino de graus. Do ponto de
vista filosófico, a autora revela que as bases do Currículo eram distinguidas em
“filosofia da idéia e filosofia da ação”. Na filosofia da idéia, a ênfase recaia para a
capacidade de o indivíduo dirigir suas atividades com precisão e de planejar de
acordo com os fins em vistas ou propósitos de que era consciente. A compreensão
estava vinculada a uma prática precisa, previamente definida e organizada,
revelando o rigor cnico da concepção tecnicista. Por outro lado, o documento
denunciava, também, uma separação entre teoria (filosofia da idéia) e prática
(filosofia da ação).
O terceiro documento, por sua vez, se referia, entre outros fatores, ao caráter
científico da formação do professor, do qual dependeria a educação das crianças.
Nesse sentido tem-se:
A formação do professor de base científica poderá ser realizada
em curso específico, em instituições devidamente credenciadas para
tal fim; (...) não basta oferecer às crianças educação pré-escolar, é
necessário que essa educação se apóie em fundamentos científicos
de modo a proporcionar às crianças as experiências adequadas ao
seu nível de desenvolvimento (PFPEPE, p. 8, citado pela autora
Rosa Lidya Teixeira Correa, em seu artigo).
A autora conclui, a partir dos documentos analisados, que a formação de
professores, no Paraná, nas décadas de 1960 e 1970, se estruturava no desejo
de educar para a sociedade democrática, mesmo no interior da vigência do regime
político autoritário, que, em contrapartida, revelava um distanciamento da escola
em relação aos acontecimentos políticos e sociais. Se, por um lado, os pressupostos
de formação eram democráticos, por outro, não se ajustavam aos ditames da
legislação, quando apregoavam uma formação orientada segundo o modelo da
educação nova, prevalecendo projetos de formação instituídos pela escola, sem
levar em consideração o professor e suas reais necessidades.
Em se tratando da formação continuada, uma ação se destaca. Em 23 de
junho de 1969, o então governo do Paraná criou, por meio do Decreto 15729, o
52
Centro de Treinamento do Magistério Primário do Paraná
19
, em Curitiba, cuja missão
consistia em coordenar os eventos de capacitação continuada aos profissionais da
educação do Estado do Paraná. Esse Centro de Treinamento, mais conhecido como
CETEPAR, executou importantes ações de formação, ofertando, especialmente,
cursos que eram chamados de “Treinamentos para professores”. Para participar, os
docentes se deslocavam do interior do Estado e recebiam formação. Porém, é
importante lembrar que, neste período, o país vivia sob o comando do regime militar
e, em decorrência disso, os professores eram treinados a repassar conteúdos
simplesmente, sem o exercício da reflexão.
1.2.2 Década de 1980: acenos para a reorganização da escola pública
A década de 1980, no Paraná, destaca-se devido à bandeira erguida pelos
governadores José Richa (1983 a 1986), sucedido por Álvaro Dias (1987 a 1990), os
quais representaram o contraponto político ao regime militar. Em decorrência,
possibilitaram “a efetivação de programas educacionais que visavam à intervenção
para atingir a totalidade dos sistemas escolares, privilegiando as primeiras séries do
Ensino Básico” (FIGUEIREDO, 2001, p. 239) que contavam, na época, com índices
significativos de repetência e evasão.
Em novembro de 1982, a vitória do PMDB (São Paulo, Paraná,
Minas Gerais etc.) e do PDT (Rio de Janeiro) representou o
contraponto político do regime militar. Os programas educacionais
implementados assumem propostas comuns que visam à
intervenção para atingir a totalidade dos sistemas escolares,
privilegiando as primeiras séries do ensino básico, onde os índices
de repetência e evasão eram expressivos (CHINI e FIGUEIREDO,
2004, p. 154).
É nesse contexto que a temática Educação Básica passa a ser amplamente
discutida nos Estados e, particularmente no Paraná, sob o discurso de democratizar
o acesso à escola e melhorar a qualidade de ensino. “O governo José Richa
caracterizou-se pela participação popular e pelo anúncio da bandeira em favor da
19
Na Resolução de nº 618/90 a instituição passou a ser designada como Centro de Treinamento do
Magistério do Paraná e, em 04 de dezembro de 2001, o Decreto nº 5123 altera o nome para Centro
de Excelência em Tecnologia Educacional do Paraná.
53
prioridade ao ensino fundamental” (
FIGUEIREDO, 2001, p. 240)
, representada no
documento Políticas da SEED (PARANÁ, 1984, p. 8), no qual se previa a melhoria
da qualidade do ensino com prioridade para a rede pública, garantindo, dentre
outros objetivos, “acesso e permanência do aluno na escola” (Idem).
O documento detalhava, ainda, as políticas setoriais a serem adotadas, as
quais reforçavam a proclamada busca pela qualidade. Conforme a SEED, o
compromisso do governo seria em favor do(a):
1. resgate do compromisso político na ação pedagógica;
2. melhoria da qualidade do ensino com prioridade para a rede
pública;
3. incentivo às experiências não formais de educação;
4. democratização do poder pela participação das comunidades
organizadas, nas decisões relacionadas com a educação;
5. valorização do docente como profissional necessário à
sociedade;
6. implantação gradativa da educação especial na rede pública
estadual
(PARANÁ, 1984, p. 2)
.
Defendia-se a democratização das relações no âmbito educacional,
entendendo a educação como solução para as questões sociais que se avolumavam
no país e, conseqüentemente, no Estado.
Na medida em que se anunciava a Educação como possibilidade e
até garantia de solução para os problemas sociais, ocultava-se o
verdadeiro significado de tais reformas da educação
institucionalizada, dentro da reforma mais ampla promovida pelo
neoliberalismo, que era justamente utilizar-se da mesma para
ampliar o mercado consumidor e gerar estabilidade política. (...) As
ações explicitavam claramente a reorganização escolar no sentido
de promover gradativamente a retirada do Estado como mantenedor
da educação (
SAPELLI, 2003, p. 37).
Todavia, como se tratava de um período de reorganização do Estado em
relação até mesmo a um contexto mais amplo (mudanças nas políticas nacionais e
internacionais), poucas das ões propostas durante o Governo José Richa foram
concretizadas. Foi um período mais de politização do discurso pedagógico do que
de modificações das condições concretas das escolas. As ações implementadas
seriam retomadas pelo governo Álvaro Dias que, dando seqüência ao projeto
político-partidário do PMDB, procuraria operacionalizar as metas traçadas por Richa:
democratização do acesso à escola, reordenamento interno do sistema educacional
54
e educação como fator efetivo de mudança social, embora por outros caminhos.
Conforme Chini e Figueiredo:
(...) no governo Álvaro Dias (1987-1990), o “Projeto Pedagógico
1987-1990)” irá representar a continuidade do projeto político-
partidário do PMDB, em âmbito educacional e, por outro lado, o
reordenamento em relação ao projeto pedagógico anterior,
propondo uma nova medida de impacto, a partir da implementação
do Ciclo Básico de Alfabetização, o CBA (CHINI e FIGUEIREDO,
2004, p. 154-155).
O CBA Ciclo Básico de Alfabetização
20
tinha, como finalidade, diminuir a
reprovação nas séries iniciais do Ensino Fundamental, ampliando o período de
alfabetização para as duas primeiras séries, ou seja, “pretendia assegurar, aos
alunos matriculados na série do Ensino Fundamental, um prazo mínimo de dois
anos para a alfabetização” (Idem, p. 155).
Com a implantação do CBA no Paraná, em 1988, os esforços voltaram-se
para a formação e aperfeiçoamento docente. Foram realizados
(...) vários encontros para a ‘capacitação’ (assim definem os
documentos oficiais) dos professores. Um deles foi um evento
chamado ‘Curso Reorganização da Escola Pública Ciclo Básico’
que continha, em seu roteiro: ‘alfabetização aspectos políticos e
sociais’, ‘A proposta do ciclo básico’, ‘A construção da leitura e da
escrita’, ‘Práticas pedagógicas’. O Curso foi realizado em 1988 pelo
CETEPAR, de forma descentralizada nos NRE. Na seqüência, foram
organizados cursos de metodologia nas diferentes áreas (SAPELLI,
2003, p. 40).
No final da década de 80, mais precisamente a partir de 1987, iniciou-se um
processo de reestruturação curricular de pré a série, no sentido de repensar os
conteúdos básicos das disciplinas. O Currículo Básico para a Escola Pública do
Estado do Paraná - CBPR apresenta a seguinte explicação:
A necessidade de repensar os conteúdos básicos das disciplinas
tem, no Paraná, uma ampla trajetória, assentada em constantes
reflexões e discussões entre os educadores desse Estado, no que
se refere aos aspectos teórico-metodológicos de cada área do
conhecimento
(PARANÁ, 1990, p. 13)
.
As discussões aconteceram em estudos, cursos de atualização e envolveram
20
Implantado em 14 de março de 1988, pelo Decreto nº 2445/88, a partir de encontros realizados pela
Superintendência da SEED e departamento de 1º grau.
55
(...) professores da rede estadual e municipal, das equipes dos
Núcleos Regionais de Educação, de representantes da Associação
dos Professores do Paraná APP, da União dos Dirigentes
Municipais de Educação UNDIME, e das Instituições de Ensino
Superior – IES (CHINI e FIGUEIREDO, 2004, p. 155).
O objetivo era ampliar as discussões sobre os princípios da Pedagogia
Histórico-Crítica
21
que nortearia o Currículo Básico. Esse caminho teórico-
metodológico foi sendo adotado no Paraná, para que a educação escolar tivesse um
novo caráter no discurso dos atuais governos, negando-se, assim, a Pedagogia
Tecnicista do sistema de ensino do regime militar.
Evidenciou-se, também, neste governo, o início da concretização do processo
de municipalização das escolas de a séries
22
que representou “o cumprimento
das exigências que deviam ser consolidadas em função da minimização do Estado
para as questões sociais. À medida que o Estado ia se retirando, precisava transferir
suas funções à comunidade, sem, no entanto, perder o controle” (SAPELLI, 2003, p.
44). Essa foi uma forma encontrada para repassar responsabilidades, sem perder o
controle da situação:
A saída que o neoliberalismo encontra para a crise educacional é o
produto da combinação de uma dupla lógica centralizadora e
descentralizadora: centralização do controle pedagógico (em nível
curricular, de avaliação do sistema de formação dos docentes) e
descentralização dos mecanismos de financiamento e gestão dos
sistemas (GENTILI, 1998, p. 25).
Com a municipalização, o Estado pretendia atuar nos municípios
sobrecarregados, assumindo encargos e, para outros, transferindo
responsabilidades, caracterizando um processo crescente de desconcentração,
restrito às questões financeiras e administrativas, mantendo-se, todavia, uma
centralidade no controle.
Em relação à formação continuada de professores, teve início, no Paraná, em
1988, o ensino à distância. Para tal ação, foi implantada, nos 30 Núcleos Regionais
21
Essa corrente teórica vinha sendo discutida nacionalmente e, principalmente na região Oeste do
Paraná (como veremos adiante), tinha adquirido força tendo em vista que um intenso trabalho de
formação estava acontecendo na região, com a presença de educadores da Inijui/RS e da
IEL/UNICAMP, em decorrência do Projeto MEC/OEA.
22
“O processo de municipalização do ensino fundamental pautou-se principalmente nas questões
financeiras custo/aluno/ano: enquanto para a rede estadual, em 1987, o custo foi de US$ 221/ano,
para a rede municipal ficou em US$ 210/ano” (SANTOS, 1998, p. 204).
56
de Educação, as videotecas que ficariam disponibilizadas aos professores para
delas fazerem uso, aprofundando, com isso, o seu conhecimento.
Contudo, o que realmente marcou a histórica da educação no Paraná, na
gestão Álvaro Dias (1987/1990), foram as perdas salariais sofridas pelos
professores. Conforme Mainardes (1995), quando Álvaro Dias assumiu o cargo, em
15 de março de 1987, teve de garantir o piso salarial de 3 salários mínimos,
promovidos por Richa. Porém, a partir de setembro de 1987, iniciou-se um processo
de perdas salariais que foram acentuando-se mês a s. Isso provocou uma grande
revolta nos professores que deflagraram greve em 1988, promovendo, entre muitas
outras atrocidades (como demissões, processos administrativos), o confronto entre
policiais e professores no dia 30 de agosto, uma data difícil de ser esquecida. Não
atendidos em suas reivindicações, os professores estaduais entraram em greve
mais uma vez, em 1990, que se estendeu por 90 dias.
Resumidamente, podemos verificar que a década de 1980, no Paraná,
acenou para possíveis mudanças num primeiro momento do PMDB Partido do
Movimento Democrático Brasileiro. Todavia, a partir da última gestão, novos rumos
foram se definindo e o rompimento com o discurso progressista tornou-se mais
evidente, destacando-se na década seguinte.
1.2.3 Década de 1990: sistematização dos ideários neoliberalistas
De 1991 a 1994 aconteceu a terceira gestão do PMDB, sendo que, nesse
período, o Estado foi governado por Roberto Requião de Mello e Silva. No governo
de Requião, configuraram-se esforços significativos para ajustar o sistema escolar
paranaense às diretrizes impostas pelo Banco Mundial (BM):
Pudemos constatar que as principais ações do governo Requião
para o setor educacional acirramento do processo de
municipalização; valorização de experiências inovadoras,
construção dos projetos políticos pedagógicos; o retrocesso do
processo de democratização das escolas; o Plano de Capacitação
Docente; os altos investimentos na administração (15,4% do total)
respondiam, com maior ou menor amplitude, no início dos anos 90,
às novas diretrizes do Banco Mundial (SAPELLI, 2003, p. 55).
E uma ação de destaque para a implementação de sua política educacional,
foi a publicação, no ano de 1990, da nova proposta curricular, discutida desde 1986
57
o Currículo Básico para a Escola Pública do Estado do Paraná a qual
representou “a continuidade da reorganização da escola pública paranaense,
iniciada com a implantação do Ciclo Básico. (...) O Currículo Básico, com inspiração
marxista e construtivista, foi distribuído aos professores de pré a 8ª séries, a partir de
1991” (CHINI e FIGUEIREDO, 2004, p. 155).
É bom lembrar que o Currículo, ao contrário do Ciclo Básico de alfabetização,
foi obrigatório para as escolas da rede municipal de ensino e o Parecer CEE 242,
de 04 de abril de 1991, documentou essa obrigatoriedade.
Na época, consolidou-se, também, de forma definitiva, o processo de
municipalização no Estado do Paraná e os municípios assinaram um Termo
Cooperativo de Parceria Educacional (1992/1993). Entre outras coisas, os
municípios que assinaram o convênio concordaram em estabelecer e manter o nível
de qualificação mínima dos professores, fornecer, à SEED, informações sobre
matrículas e gastos e manter o Ciclo sicos de Alfabetização nas escolas. Além
disso, o município, ao assinar o Termo, “deveria comprometer-se com a adoção dos
princípios educacionais para a educação, contemplados na proposta do Currículo
Básico” (CHINI e FIGUEIREDO, 2004, p. 156). Porém, foi somente em 1994 que a
municipalização se concretizou parcialmente
23
.
Quem ditava as normas para a educação era o Bando Mundial.
Conseqüentemente, o governador Requião e sua equipe reelaboraram o projeto de
educação, atendendo à ordem proposta por tal órgão financiador. Nesse sentido,
dois documentos se destacaram, a partir de 1992: o “Paraná, construindo uma
Escola cidadã” e o “Plano Decenal de Educação para Todos do Estado do Paraná
1993/2002”.
O primeiro documento passou a nortear todas as ações da SEED, além de
revelar as novas diretrizes do BM, assumidas agora claramente como as diretrizes
do Paraná. Para Sapelli (2003), expressões como “autonomia”, “descentralização”,
“gestão democrática”, “racionalidade”, “autogestão” são usadas abundantemente no
documento, na tentativa de encobrir os propósitos neoliberais. Assim, os princípios
que norteavam a nova proposta educacional resumiam-se, dentre outros, em:
consolidar a gestão democrática; estabelecer comunicação direta entre secretaria,
23
Naquele ano, 268 municípios haviam aderido à municipalização integral das escolas, o que
representava 72,2% do total; 52 aderiram à municipalização parcial (14,1%) e, 51 deles (13,7%) ainda
não havia municipalizado suas escolas (SANTOS, 1998, p. 284).
58
escolas e comunidade; elaborar o projeto político pedagógico (PPP); e criar um
sistema de avaliação permanente do desempenho escolar. A ação que
verdadeiramente se efetivou foi a elaboração do PPP, embora sem a sustentação
teórica que lhe era devida.
O segundo documento, considerado o mais importante nesse processo
histórico da educação no Paraná, foi o Plano Decenal de Educação para Todos do
Estado do Paraná. Elaborado em 1993 e divulgado em agosto de 1994, o
documento partia de uma caracterização do Estado em relação ao seu contexto
social
24
, destacando os principais problemas do sistema escolar: os índices de
reprovação, de evasão e de distorção idade/série. Diante de tantos problemas, o
governo declarou-se incapaz, financeiramente, de resolver as questões e justificou a
necessidade de buscar empréstimo junto a órgãos financiadores.
Uma das ações que não entraram em consonância com as exigências do BM
foi a que propôs o Plano Estadual de Capacitação Docente. Enquanto o BM sugeria
que se priorizasse a capacitação em serviço, aproveitando-se, principalmente, da
modalidade à distância, o Plano determinava que cada professor deveria participar,
no mínimo, de 80 horas de cursos de capacitação. Para isso, integrou-se os três
graus de ensino (fundamental, médio e superior), cabendo às Instituições de Ensino
Superior do Estado desenvolver ações articuladas com os Núcleos Regionais.
Entretanto, como os cursos não estavam articulados a um projeto educacional mais
amplo, na maioria dos casos não priorizavam a discussão do Currículo Básico.
No final da gestão de Requião foi aprovado o PQE Programa Qualidade de
Ensino Público do Paraná o qual foi implementado na gestão seguinte (governo
Jaime Lerner, 1995-1998), quando se tornou evidente a desregulamentação
econômica, uma das metas neoliberais que “se traduz na descentralização
administrativa e pedagógica na educação” (CHINI e FIGUEIREDO, 2004, p. 156). O
PQE
25
atendia a uma proposta do BM em universalizar o Ensino Fundamental com
24
... as questões apresentadas referiam-se ao dinamismo das correntes migratórias, ao
esvaziamento do campo, ao grande índice de jovens na população, à baixa escolaridade básica da
população e à necessidade de transformação da sociedade”, colocando a escola como a instituição
que poderia dar respostas a tais necessidades sociais. Segundo o documento, “50% da população
maior de 14 anos são de analfabetos funcionais; 63% das crianças de 5 a 6 anos estão fora da
escola” (SAPELLI, 2003, p. 62).
25
Seus investimentos foram destinados a cinco componentes: a) material pedagógico (38% do total
dos recursos); b) treinamento de professores (14%); c)melhoria da rede física e aumento do acesso
(38%); d) desenvolvimento institucional (9%); e) estudos e avaliação (1%).
59
qualidade. Dentre os projetos financiados, estava o de Capacitação de Professores
e Gestão Escolar, visto que:
A gestão e autonomia escolar, cujo alvo final é o aluno, deverá se
efetivar como uma prática voltada ao convencimento dos agentes
educacionais da naturalidade daquelas premissas. Isso significa
dizer que a conceituação e implementação de prática da gestão de
autonomia escolar nada mais pretende que construir, nas unidades
escolares, posturas favoráveis à implementação do projeto do
capitalismo contemporâneo (LENARDÃO, 2001, p. 233).
Ainda segundo o autor, “os professores são sujeitos fundamentais. Deles é
que dependerá, mais uma vez, o sucesso ou o fracasso da disseminação do novo
modo de pensar, tão caro aos novos conceitos de gestão e autonomia escolar”
(Idem, p. 230).
No contexto, foi posto em prática o Projeto Universidade do Professor
26
, um
programa de capacitação de profissionais da área de educação do governo do
Estado do Paraná, iniciado em 1995 e operacionalizado pela Secretaria de Estado
da Educação - SEED-PR. Lá foram ofertadas modalidades de capacitação, tais
como: atualização (seminários com duração de 8 a 50 horas) para os quais os
profissionais eram liberados de suas atividades; proficiência (cursos de
aprofundamentos de conteúdos específicos em diversas áreas, com duração de 40 a
120 horas, fora do horário de trabalho); aperfeiçoamento (cursos que promoviam o
aprofundamento de conteúdos e metodologias de ensino em diferentes áreas, com
duração de 120 a 240 horas, fora do horário de trabalho); projetos (atividades
envolvendo elaboração de estudos e materiais voltados à prática pedagógica, sob a
orientação de especialistas do NRE ou das IES).
As metas desse programa de capacitação eram:
1) atingir 100% de participação voluntária dos profissionais do
magistério em no mínimo quatro eventos, no triênio 96-98; 2)
articular a teoria à prática pedagógica, de modo que ambas possam
ser aplicadas no cotidiano das escolas; 3) executar e avaliar,
juntamente com a Secretaria de Estado da Educação, as
concepções e estratégias de gestão compartilhada na atualização e
qualificação dos profissionais da área; 4) divulgar e estimular a
socialização de experiências inovadoras do sistema de educação
pública; e 5) procurar formar professores “multiplicadores de
26
Criada em 1995, em Faxinal do Céu, município de Pinhão - Paraná. Trata-se de um lugar onde a
qualidade é celebrada em todos os cantos. Pequenas casas de madeira muito simples, mas
limpíssimas e muito bem pintadas, circundadas por um imenso gramado pontilhado por folhagens.
60
aprendizagem”, os quais serão responsáveis pela educação
continuada nas escolas (KOLINSKI, 1998, p. 4).
A metodologia utilizada nos curso e seminários pretendia propiciar o relato de
experiências pessoais e a busca de alternativas em conjunto, valorizando propostas
inovadoras desenvolvidas no cotidiano escolar. Os professores também recebiam
orientação quanto a hábitos e atitudes de saúde física e mental, de forma a garantir
ganhos significativos em sua qualidade de vida.
O que se destacou, em Faxinal do Céu, foi “os Seminários de Atualização e
Motivação
27
, justamente por entender que cada sujeito, individualmente, deveria ser
convencido da sua responsabilidade” (SAPELLI, 2003, p. 136). E completa, num
desabafo:
Participar de eventos em Faxinal do Céu causou-nos sensações
antagônicas: de desconfiança, de asco e de êxtase. De
desconfiança porque nos sentíamos num campo de concentração
havia monitores “coloridos” por todos os lados controlando horários,
direito à comida, ouvindo nossas conversas que eram levadas à alta
cúpula e, no dia seguinte, despejadas sutilmente nas
apresentações; de asco porque nos fizeram assistir, por exemplo, ao
filme “Festa de Babete” para aprender que “a riqueza está dentro de
nós”; e de êxtase porque pudemos tomar um banho de cultura” e
assitir, por exemplo, a um “Carlinhos de Jesus”. Ao invés de
estarmos discutindo as relações da Educação com o Trabalho,
estávamos “meditando, adquirindo noções para maior qualidade de
vida” ou sendo convencidos de que nossa profissão era “vocação” e
que nossa dedicação não deveria estar associada a salários. Os
eventos de Faxinal eram verdadeiros “circos” com direito a
“palhaços” e tudo! Chegaram até a achar que nunca havíamos sido
bem tratados (idem).
De 1995 a 2001, foram realizados 1.415 eventos organizados pela
Universidade do Professor, dos quais 298 foram realizados no Centro de
Capacitação de Faxinal do Céu. Em 2001, dos 811 seminários realizados, 104 foram
Seminários de Sensibilização, uma vez que estes representavam a construção da
motivação necessária para que os professores respondessem ao chamado do
Governo Lerner que, sendo reeleito em 1998 para mandato até 2002, intensificou
esse processo de “adestramento”.
Paralelo ao programa de capacitação desenvolvido em Faxinal do Céu,
aconteceu, ainda, no Paraná, programas de formação de professores à distância.
27
Nos anos de 1995 e 1996, segundo a autora, quem organizou os eventos foi a empresa CESDE,
cujo proprietário era Arthur Pereira e Oliveira Filho, contratada sem licitação, o que provocou
polêmica. No início de 1997, esta empresa foi dispensada e, por meio de licitação, assumiu a
vencedora: Luna & Associados Consultoria de Empresas S/C Ltda, cujo proprietário era Jesus Luna.
61
Nesse sentido, é relevante destacar o Programa Salto para o Futuro que começou a
ser propagado, no Paraná, em 1992
28
. Distribuído em 32 NREs, para seu
desenvolvimento era necessário um orientador de aprendizagem, cuja ação
consistia em preparar de 20 a 30 cursistas, enfocando a utilização de recursos
audiovisuais.
Outra ação de destaque que favoreceu a educação à distância, em relação à
formação continuada, aconteceu em 1996, quando todas as escolas públicas do
Brasil, inclusive do Paraná, com mais de 100 alunos, receberam do MEC os
equipamentos do “kit tecnológico” para recepção e gravação dos programas
transmitidos pela TV Escola
29
. O desafio proposto pela TV Escola, na perspectiva do
MEC, foi o de vencer as distâncias que separavam alguns brasileiros do saber
pedagógico sistemático.
Vale lembrar, ainda, da influência nacional para novos rumos à educação,
reforçada com a publicação dos PCNs (1997, 1998), reconhecido como o
documento responsável por consolidar o discurso neoliberal.
Em suma, a década de 1990 será sempre lembrada pela sistematização dos
ideários liberais que reorientou os caminhos da educação no Paraná.
1.2.4 A partir de 2000: tentativas de reorganização do ensino
Ao reassumir o governo em 2003 (e depois reeleito em 2006), Roberto
Requião se comprometeu, entre outras coisas, com uma política educacional capaz
de garantir o ensino blico gratuito e de qualidade. Como conseqüência, traçou
algumas metas para a educação básica
30
, dentre as quais destacamos:
a.
Universalização progressiva da educação pública básica,
alcançando aqueles que não freqüentam a escola na idade
esperada.
28
Informações disponibilizadas no site do Portal Educacional do Estado do Paraná, da Secretaria de
Estado da Educação do Paraná: http://www8.pr.gov.br/portals/portal/institucional/cetepar/tvescola.php
pesquisado em 27/03/2007.
29
Cumpre-me lembrar que a TV Escola é um programa da Secretaria da Educação a Distância, do
Ministério da Educação - MEC, que consiste num canal de televisão transmissor de programação via
antena parabólica às escolas de Ensino Fundamental e Médio. O kit necessário à captação e
utilização do canal, composto por antena parabólica, televisor, vídeo cassete e 10 fitas VHS para
iniciar as gravações é distribuído gratuitamente às escolas públicas com mais de 100 alunos, como já
mencionado anteriormente.
30
Publicadas no site: http://www.bonde.com.br/deolho/deolhod.php?oper=plano&id_deolho=4 e no
site oficial do governo Requião no dia 27/12/2002.
62
b.
Distribuição racional de competências entre o estado e os
municípios, visando a otimização dos recursos destinados à
Educação.
c.
Combate ao analfabetismo.
d.
Ampliação da autonomia didática, administrativa e disciplinar
das escolas, garantindo-lhes condições materiais e financeiras
adequadas através do aperfeiçoamento do Fundo Rotativo.
e.
Reconhecimento do direito à livre organização dos professores,
servidores, pais e alunos das escolas públicas.
f.
Estímulo e ampliação da representatividade dos Conselhos
Escolares.
g.
Implantação do Plano de Cargos e Salários, conforme legislação
vigente.
h.
Salário decente para professores e demais trabalhadores da
ativa e aposentados.
i.
Formação profissional continuada e gratuita para professores
em instituições de ensino superior, preferencialmente nas
universidades públicas, em seus campi ou em postos
avançados próximos dos locais de trabalho e moradia.
Transformar o Instituto de Educação em centro de referência
para a formação e capacitação do professor incluindo neste
processo a utilização do espaço físico existente no Faxinal do
Céu e na Estância de Santa Clara.
Para efetivar a proposta em relação à formação e capacitação do professor,
uma das primeiras ações foi a extinção, em 2003, da Universidade do Professor, e o
espaço físico do Centro de Capacitação de Faxinal do Céu ficou sob o
gerenciamento do CETEPAR. No local, hoje acontecem apenas os eventos de
grande porte, uma vez que apresenta a infra-estrutura necessária para tais
realizações.
Por outro lado, o Estado continua investindo ainda na formação à distância. A
TV Escola, por exemplo, no Estado do Paraná, conta com uma Coordenadora
Estadual e 32 coordenadores regionais escolhidos pelos respectivos NREs. A
capacitação de tais profissionais é planejada e fortalecida em parceria com a CETE
(Coordenação Estadual de Tecnologia na Educação). Vale destacar que a TV
Escola, incentiva programas como Salto para o Futuro, o qual é compreendido, na
perspectiva do Estado, como uma proposta de formação continuada e
aperfeiçoamento de professores por meio de debates das questões relacionadas à
prática pedagógica e da interatividade. Os programas são veiculados de segunda a
sexta-feira. Em telessalas organizadas, os cursistas recebem boletim impresso, com
textos para estudo, bem como sugestões de atividades pedagógicas e bibliografias.
Os orientadores de educação à distância são os responsáveis pelos momentos
presenciais, desenvolvendo e adequando as atividades pedagógicas. São,
63
geralmente, cursos de 40 horas divididas em dois encontros semanais de 3 horas ou
dois encontros de 1 hora e 30 minutos e um de 3 horas, totalizando 6 horas
semanais. Para participar do Programa, basta ser professor da rede estadual ou
municipal de ensino ou ser aluno do último ano do curso de magistério, magistério
superior, pedagogia ou qualquer licenciatura em educação ou, ainda, ser da equipe
pedagógica da escola.
Outra ação que está se destacando é a proposta de reformulação do
Currículo do Ensino Fundamental, mais especificamente do e 4º ciclos,
apresentada e discutida pelo Departamento de Ensino Fundamental da SEED, em
parceria com os NREs. Tal iniciativa resultou de um diagnóstico realizado pela
Superintendência da Educação da SEED relativo às propostas curriculares das
escolas públicas do Paraná, por meio do qual se verificou que as unidades
escolares, como resultado das fortes políticas neoliberais, desencadeadas na
década de 90, sofreram um verdadeiro bombardeio de concepções e propostas
diferenciadas. E, em decorrência, até mesmo a concepção norteadora do Currículo
Básico de 1990 foi se desconfigurando.
Diante dessa constatação, estabeleceu-se, como linha de ação prioritária da
SEED, a retomada das discussões coletivas do currículo. A partir daí, procedeu-se
ao seguinte encaminhamento, nas respectivas datas assinaladas:
- 2003: discutiu-se e levantou a situação concreta das diretrizes curriculares
da Rede Estadual de Ensino do Paraná por meio de seminários promovidos
pela SUED/SEED;
- 2003 e 2004: refletiu-se sobre as propostas pedagógicas das áreas de
ensino, por meio de cursos, eventos e reuniões técnicas;
- 2005: encaminhou-se uma proposta de elaboração e avaliação do Projeto
Político Pedagógico das Escolas da Rede Pública de Ensino do Estado do
Paraná, orientado pela equipe de ensino dos NRE;
- 2005: reformulou-se, coletivamente, o currículo, quando os professores da
rede estadual tiveram a oportunidade de discutir e elaborar
encaminhamentos;
- 2005 e 2006: sistematizaram-se propostas oriundas de todo o Estado;
- 2007: está ocorrendo a fase de avaliação e acompanhamento que é
entendida como permanente e constante.
64
Em linhas gerais, a educação, no Paraná, assim como no Brasil, sempre foi
determinada politicamente e, em virtude disso, passou por muitas mudanças e
entendimentos, afetando diretamente ao professor que ora orientava-se por uma
determinação teórica, ora por outra. No momento, por exemplo, entendo que há toda
uma preocupação em assegurar uma educação comprometida com o social,
articulando todos os níveis e modalidade de ensino, para a formação de sujeitos
epistêmicos. Para isso, defende (pelo menos teoricamente) a formação de
professores capazes de pensar, criar, produzir e trabalhar com o conhecimento
científico, valorizando suas ações reflexivas e sua prática.
1.3 Panorama Histórico da Educação na Região Oeste do Paraná
1.3.1 Décadas de 1960 e 1970: da colonização para o crescimento populacional
Para contar a história da educação na região Oeste do Paraná é preciso
recuperar, pelo menos em parte, seu processo de colonização, tendo em vista que o
desenvolvimento educacional esteve condicionado a fatores sócio-econômico-
culturais da população que aqui se instalou.
A colonização intensificou-se, realmente, na década de 1950, quando
migrantes de Santa Catarina e do Rio Grande do sul, a maioria de origem européia,
começaram a fixar-se na região e, de imediato, mostraram um grande interesse pela
escolarização de seus filhos. Conforme Colodel (1988), na época existia apenas o
município de Foz do Iguaçu, o qual se estendia por toda a região e, devido à sua
extensão e às precárias condições econômicas da época, pouquíssimas escolas
existiam em toda a região
31
. Todavia, como era interesse do governo subdividir
31
Entre 1915 e 1916 foi construída a primeira escola (chamada casa escolar) no município de Foz do
Iguaçu. Em 1928 foi instalado um Grupo Escolar sob a direção da igreja católica e, em 1930, passou
a ser administrado pelo Estado. Em Santa Helena, somente em 1956 foi criada a primeira escola
(embora antes disso ocorresse a escolarização por meio das próprias famílias que ensinavam seus
filhos a ler, escrever e contar). Em Guaíra, a primeira escola (casa escolar) foi criada em 1928, a qual
foi transformada em grupo escolar no ano de 1942 e estadualizado em 1951 quando o município de
Guaíra foi criado. Em Catanduvas, embora tenha sido colonizado desde 1989, somente passou a ter
uma escola no final da década 1920 a qual foi desativada em 1931 e, somente reativada, em forma
de um grupo escolar estadual, em 1943. Em Cascavel, a escolarização iniciou-se em 1932, numa
capela. Em 1935, após Cascavel ser elevada a categoria de Distrito administrativo de Foz do Iguaçu,
foi criada a casa escolar oficial pública. Em 1947, a casa escolar foi transformada em grupo escolar, o
Estado passou a manter a escola e a pagar os professores.
65
administrativamente o Estado, foram criados, em 1951, os municípios de
Guaraniaçu, Cascavel, Toledo e Guaíra.
Os migrantes de origem européia (italianos na região de Toledo e Cascavel, e
alemães na região de Marechal Cândido Rondon), preocupados com a
escolarização de seus filhos, começaram a criar escolas primárias nas colônias,
porém, tinham dificuldades em encontrar professores qualificados para esta função.
Depois de muitas iniciativas
32
, somente na década de 1960 é que a região Oeste
começou a tomar corpo e se firmar enquanto estrutura educacional. De acordo com
Emer (1991), em 1960 já contava com 18 núcleos urbanos nas sedes de municípios,
com escolas confessionais, estaduais e grupos escolares municipais também nas
principais vilas do interior. Mesmo assim, a população urbana passou a reivindicar
outros níveis de escolarização.
Com a criação do ginásio estadual e particular, na época, a escola normal foi
extinta ou substituída por escolas normais colegiais estaduais, criadas com o
objetivo político de suprir a carência de professores habilitados para os grupos
escolares públicos. E assim, no final da década, as principais cidades da região
contavam com essas escolas, funcionando em caráter público e privado, preparando
os professores primários, além de contar, também, com escolas de contabilidade e
curso científico, o que era visto como uma considerável estrutura educacional
pública (municipal e estadual) e privada no nível primário, atualmente primeiro e
segundo ciclos do ensino fundamental.
Na tentativa de buscar a melhoria do ensino, ainda em 1950, transformou-se
a inspeção administrativa em inspeção técnica-pedagógica e, em decorrência de tal
ato, passaram a existir, nas cidades-pólo da região, as subinspetorias que foram
transformadas, na década de 1960, em Inspetorias Regionais de Ensino. Por meio
delas, o Estado ampliou sua assistência técnica e pedagógica, centralizando o
planejamento de ensino da SEED, assim como os cursos de treinamento dos
professores.
32
Segundo EMER (1991), no final da década de 1950, foram criadas as Escolas Normais Regionais,
algumas delas com internato para formação de filhos de colonos que residiam longe da sede. Além
da existência da Escola Normal Regional de Foz do Iguaçu, das escolas religiosas e com internato,
desde 1951, passou a existir a Escola Normal Regional Luterana e com internato, de Marechal
Cândido Rondon, em 1958. Em Cascavel passou a existir somente externato e público em 1959. Em
1957, o Colégio das Irmãs, de Foz do Iguaçu, implantou a Escola Normal Colegial, primeiro
estabelecimento da Região Oeste do Paraná a ofertar esse nível de escolarização.
66
Convém lembrar que a educação, no período, era nacionalmente tecnicista e
essa concepção de ensino orientava também as ações educativas em nossa região.
Como o Brasil vivia sob a hegemonia da ditadura militar, as reivindicações sociais
passaram a ser reduzidas, assim como foram silenciados os movimentos sociais
mais amplos.
Emer (1991) pontua que a partir dos últimos anos da década de 1960,
ocorreu a mais significativa mudança interna da região em relação aos seus
aspectos antropológicos. Além do vertiginoso crescimento populacional, ocorreu
uma heterogeneização da população, tanto nos usos e costumes, como nas
perspectivas de vida e no sistema produtivo. Tais fatores influenciaram, de forma
significativa, a escola e as condições da educação. A chegada dos mineiros e
nordestinos que se embrenharam na mata, longe das linhas onde estavam
estabelecidos os colonos descendentes de europeus, forçou os municípios a
construírem novas escolas. Porém, elas foram construídas nas áreas em que
havia um número mínimo de crianças em idade escolar. As que viviam mais
afastadas continuaram sem local para estudar. E nas localidades onde existiam as
escolas municipais rurais, estas eram precárias, funcionando no sistema
multisseriado. Os professores eram escolhidos dentre a população local e, na
maioria das vezes, tinham apenas a formação primária incompleta. Estas escolas,
de modo geral, atendiam, pela manhã, as e séries e, à tarde, as e séries.
O mesmo professor, além de atender aos dois turnos e as duas séries ao mesmo
tempo, cuidava da limpeza da escola e do pátio e, quando havia merenda,
cozinhava para os alunos. Era uma espécie de professor-faxineiro-cozinheiro. Afora
a insuficiência na qualificação dos professores e das condições precárias de
trabalho, havia carência e inadequação do material didático. Apenas nos povoados e
vilas as salas não eram multisseriadas e os professores tinham melhor qualificação.
Na tentativa de amenizar os problemas, as Inspetorias de Ensino e as
Secretarias ou Departamentos de Educação das prefeituras da região centralizavam
o planejamento curricular, o desenvolvimento do conteúdo e das avaliações e
realizavam visitas periódicas às escolas para verificar o rendimento dos alunos.
Ainda, promoviam treinamentos aos professores dentro da concepção tecnicista,
momento em que estudavam os materiais editados pela SEED
33
.
33
Os Currículos”, manuais editados pela SEED, um volume para cada série do ensino primário, com
sugestões e exercícios sobre o conteúdo a ser desenvolvido em sala de aula.
67
Como o início da modernização da agricultura na primeira metade da década
de 1970 (com maior intensidade na década de 1980) e com a elevação dos preços
das terras adequadas à mecanização, os pequenos produtores rurais foram forçados
a comprar terras impróprias à mecanização ou continuar na reduzida propriedade. A
mudança gerou uma certa desestabilização, provocando o êxodo rural ou a própria
migração das famílias entre uma propriedade e outra. Isso se refletiu na escola,
que a criança passou a ter acesso ao ensino apenas durante alguns meses, pois
com a mudança da família para outra propriedade (ou região), nem sempre aos
estudos retornava. A realidade vigente provocou um elevado nível de evasão e
repetência.
Tentando diminuir os impactos e problemas sociais gerados pelas
transformações econômicas na região
34
, foi criado, no Brasil, mais especificamente
na região Oeste do Paraná, em 1975, o Projeto Especial de Educação Brasil,
Paraguai e Uruguai – MEC/OEA
35
.
O Projeto se propôs a cooperar com os governos dos três países
membros nos esforços para fortalecer a infra-estrutura educacional
nas regiões de sua atuação com o fim de prepará-las para
solucionar os novos e variados problemas gerados pelas
transformações sócio-econômicas-culturais, produzidas pelos
grandes empreendimentos de caráter econômico que se realizam
nessas regiões determinando, por conseqüência, a necessidade de
renovação de seus sistemas educacionais (KUIAVA, 1983, p. 07).
A implantação deste projeto tinha, como objetivo, fortalecer a infra-estrutura
educacional na região, propondo a renovação dos sistemas educacionais e o
desenvolvimento do seu potencial educativo. Conseqüentemente, se dispunha a:
desenvolver recursos humanos através de cursos, seminários,
missões de estudo e outras ações;
desenvolver recursos institucionais e materiais, através de
assistência técnica e financeira e de outras ações de apóio –
implementando Planos Municipais de Educação; realizando
pesquisas educativas; desenvolvendo novas metodologias
educativas e procurando melhorar as condições técnicas das
34
Na época, já havia se iniciado a construção da Usina Hidrelétrica de Itaipu, que gerou novos
impactos e transformações sociais na região.
35
O Projeto MEC/OEA tem suas origens nas aspirações contidas na Declaração dos Chefes de
Estados Americanos, expressa em Punta Del Este, Uruguai, em 14 de abril de 1967, reconhecendo a
alta prioridade da educação na política de desenvolvimento integral das Nações Latino-Americanas e
suas ações, no Brasil, incidiram sobre duas sub-regiões limítrofes dos países Brasil e Paraguai, onde
se realizavam obras da represa Binacional de Itaipu, e dentro do Programa de Desenvolvimento da
Bacia da Lagoa Mirim, na fronteira Brasil/Uruguai (KUIAVA, 1983, p. 07 e 08).
68
unidades escolares pelo fortalecimento de equipamentos (Idem, p.
8).
Contudo, para a sua implantação e o desenvolvimento de seus planos de
ação, era necessária uma ampla articulação dos órgãos educacionais municipais,
estaduais e federais
36
. De início, foi necessário um amplo diagnóstico cio-
econômico-educacional, o qual projetou-se sobre três cidades-pólo: Toledo,
Cascavel e Foz do Iguaçu, revelando, segundo Andrade, Pacheco, Emer e Kuiava
(1982), em 1976 e 1977, as reais condições da educação na região. Em alguns
casos, os índices de evasão e repetência, na 1ª série, ultrapassavam a 65%.
Com o resultado alarmante, diversas organizações regionais, tais como: a
Associação dos Municípios do Oeste do Paraná (AMOP)
37
, as cooperativas
agropecuárias
38
, a cooperativa central
39
, os cursos superiores de educação
40
e
algumas associações de pais e mestres se reuniram, retomando discussões sobre o
rumo da educação na região.
De acordo com Emer (1991), as causas internas à escola que contribuíram
para a conformação do quadro apontado pelo diagnóstico foram: falta de
professores habilitados e qualificados para o magistério (54% na área urbana e 80%
na área rural) em escolas primárias; falta de domínio e metodologia de ensino,
gerando dificuldades de aprendizagem e, conseqüentemente, abandono e
repetência dos alunos; a mobilidade populacional (êxodo rural e migração para
outras regiões) no período; material pedagógico caro e inadequado à realidade
sócio-cultural da região.
36
O Projeto, no Brasil, tinha o apoio do então Presidente da República, João Baptista Figueiredo, do
Ministro da Educação e Cultura, Esther de Figueiredo Ferraz, contava com um Coordenador
Nacional, Sérgio Mário Pasquali, uma Coordeandora-Adjunta, Helena Mascarenhas Falluh, um
Coordenador de Área no Estado do Paraná, José Kuiava, e um Coordenador de Área no Estado do
Rio Grande do Sul, Gilberto Rudi Treplow.
37
Criada no dia 09 de junho de 1969.
38
COPACOL Cooperativa Agrícola Consolata Ltda., com sede no município de Cafelândia;
COOPERVALE Cooperativa Agrícola Vale do Rio Piquiri Ltda., com sede no município de Palotina;
COOPAVEL Cooperativa Agropecuária de Cascavel Ltda., com sede no município de Cascavel;
COTREFAL – Cooperativa Agropecuária Três Fronteiras Ltda., com sede no município de Medianeira;
COOPAGRO Cooperativa Agropecuária Mista do Oeste Ltda., com sede no município de Toledo;
COOPAGRIL Cooperativa Agrícola Rondon Ltda., com sede no município de Marechal ndido
Rondon. (Dados encontrados em um encarte publicados pela ASSOESTE sem autoria e sem ano
de publicação)
39
COOPAGRIL – Cooperativa Central Regional Iguaçu Ltda., com sede em Cascavel.
40
Curso de Pedagogia, Letras e Ciências-Matemática, os quais funcionavam na FECIVEL
Fundação Faculdade de Educação, Ciências e Letras de Cascavel, a primeira instituição de ensino
superior da região Oeste do Paraná, autorizada a funcionar em maio de 1972.
69
Por outro lado, outros fatores contribuíam para agravar ainda mais o
diagnóstico: a deficiência de saúde da população escolar; a deficiência visual e
auditiva do aluno; a distância da escola; a necessidade dos alunos trabalharem nos
períodos de limpa e colheita agrícola; as escolas mal localizadas; a falta de material
de apoio; a insuficiência de salas de aula e turnos intermediários.
Com os dados apurados, formulou-se um prognóstico, o qual ofereceu
alternativas para solução dos problemas elencados e estabeleceu uma programação
de ações futuras, as quais se resumiam em:
Programa correção de Fluxo
- Projeto Admissão Real
Subprojeto Matrícula e Chamada Escolar
Subprojeto Acompanhamento
- Projeto Abondono
Subprojeto Entrosamento Escola/Família
Subprojeto Transporte Escolar
Subprojeto Escola Consolidada
Subprojeto Assistência ao Educando
Subprojeto Serviços Médicos e Dentário
- Projeto Repetência
Subprojeto Metodologia de Aprendizagem
Subprojeto Pré-Escolar
Subprojeto Educação Especial
Subprojeto Avaliação de Base
- Projeto Rendimento
Subprojeto Consolidação do 2º grau
Subprojeto Mão-de-obra
Projeto Otimização de Recursos
- Projeto Capacidade Instalada Física
Subprojeto Demanda Capacida
Subprojeto Utilização Capacidade Instalada Física
Subprojeto Construção
Subprojeto Centro de Ambientes Específicos
Subprojeto Escola Consolidade
- Projeto Capacidade Instalada Docente
Subprojeto Habilitação de Professores
Subprojeto Salários
Subprojeto Treinamento
Subprojeto Quadro Pessoal
Subprojeto Carreira de Magistério
- Projeto Capacidade Instalada do Pessoal Técnico-Administrativo
Subprojeto Quadro Próprio
Supervisão Escolar, Estrutura e Funcionamento (KUIAVA,
1983, p. 25).
Enfim, é possível afirmar que as décadas de 1960 e 1970 apresentaram
marcos significativos na história da educação na região Oeste do Paraná, tendo em
70
vista que abriram caminhos para uma importante ação que se efetivaria na década
posterior.
1.3.2 Década de 1980: criação da ASSOESTE
Com o anúncio do término do Projeto MEC/OEA, previsto para dezembro de
1982, os envolvidos no processo entenderam que as ações desencadeadas até
aquele momento deveriam continuar. E para isso, seria necessário organizarem-se
de forma que houvesse uma coordenação regional que tomasse as rédeas, com o
aval de todas as instituições envolvidas. Foi assim que, depois de debates e apoio
manifesto dos prefeitos, aproveitando a existente Associação dos Municípios do
Oeste do Paraná – AMOP, fundaram, em agosto de 1980, a Associação Educacional
do Oeste do Paraná ASSOESTE. Inicialmente era constituída por 19 prefeituras
municipais das 20
41
que integravam a Região, pela Cooperativa Central Regional
(COTRIGUAÇU), pelas 06 cooperativas agropecuárias da região, na época
(COPACOL, COOPERVALE, COOPAVEL, COTREFAL, COOPAGRO e
COOPAGRIL), pelas 04 faculdades que existiam na região
42
, 03 Fundações
Educacionais e inúmeras associações de pais e mestres das escolas, tanto da zona
urbana quanto da zona rural.
Para a centralização das atividades, a Prefeitura de Cascavel cedeu um
espaço físico onde foi instalada uma gráfica ASSOESTE: Editora Educativa com
recursos do Projeto MEC/OEA. A subsistência da ASSOESTE foi garantida com
cotas de participação das instituições filiadas
43
e com a prestação dos serviços
gráficos. A Associação era presidida por um Prefeito dentre os municípios filiados e
contava com o apoio de um Secretário Executivo
44
, o qual tinha, como função,
41
Assis Chateaubriand, Capitão Leônidas Marques, Cascavel, Catanduvas, Céu Azul, Corbélia,
Formosa do Oeste, Foz do Iguaçu, Guaíra, Guaraniaçu, Marechal Cândido Rondon, Matelândia,
Medianeira, Nova Aurora, Nova Santa Rosa, Palotina, Santa Helena, São Miguel do Iguaçu, Terra
Roxa e Toledo.
42
Além da FECIVEL, que foi criada em 1972, criou-se, ainda, na região, mais 03 outras: FACITOL
Faculdade de Ciências Humanas de Toledo, criada em 1979; FACISA Faculdade de Ciências
Sociais Aplicadas de Foz do Iguaçu, criada também em 1979; FACIMAR Faculdade de Ciências
Humanas de Marechal Cândido Rondon, criada em 1980.
43
A partir de 1982, mais 9 municípios foram criados na região, sendo eles: Boa Vista da Aparecida,
Braganey, Cafelândia, Jesuítas, Missal, Santa Terezinha de Itaipu, Três Barras dos Paraná, Tupãssi
e Vera Cruz do Oeste, todos desmembrados de outros municípios maiores.
44
O Primeiro Secretário Executivo da ASSOESTE foi José Kuiava que exerceu essa função no
período de 1980 a 1984. Foi substituído, na seqüência, por Ivo Oss Emmer, que administrou entre
1984/1985. Depois, por Emma Gnoatto Pacheco, no período de 1985 a 1989. Em seguida, por
71
agilizar as determinações dos membros associados, coordenando, assim, todas as
ações.
A ASSOESTE foi criada com os objetivos de:
Promover o desenvolvimento da educação na região em todas
as suas formas, todos os níveis e graus, mediante atividades no
campo dos recursos humanos, técnicos e materiais.
Desenvolver recursos humanos através de cursos, seminários,
estudos e pesquisas para elevar o nível profissional do quadro
de administradores, professores e pessoal técnico.
Produzir material didático-pedagógico para professores e
pessoal técnico.
Desenvolver programas e atividades juntamente com órgãos
oficiais e de caráter privado para corrigir o fluxo escolar e elevar
o nível de ensino.
Promover programas no campo da educação cooperativa
(ANDRADE, PACHECO, EMER e KUIAVA, 1982, p. 05).
Das discussões sobre os rumos da educação regional, quando buscaram
alternativas para a melhoria da qualidade de ensino nas demais séries iniciais,
surgiu a primeira ação de destaque da ASSOESTE. Emer (1991) pontua que um
grupo de professores da Associação buscou acessoria junto a professores
pesquisadores da FIDENE
45
, de Ijuí/RS. Tal iniciativa tinha o propósito estabelecer
maiores vínculos entre a realidade vivida pelos alunos e o processo educacional.
Entendiam que, dessa forma, estariam resgatando e preservando valores culturais
dos colonos e das camadas populares que estavam sendo destruídos pelas relações
sociais impostas com a modernização da economia regional. E como os professores
da Unijuí/FIDENE desenvolviam um projeto de ensino semelhante ao pretendido,
estabeleceu-se, portanto, a parceria.
Da parceria nasceu o Projeto Memória, cujo objetivo era “realizar estudos e
pesquisas para produzir o inventário histórico-cultural dos municípios da 21ª
Microrregião do Paraná, visando reconstituir a consciência histórica do seu povo”
(Idem, 1982, p. 13).
E, com base nos estudos propiciados pelo Projeto, foram
Giovani Batista Palludo, entre 01/02/89 a 22/10/89. Helói Lomann assumiu essa função entre 1989 a
1991 e, por último, Fátima Ikiko Yokohama que exerceu a função entre os anos de 1991 a 2001.
45
Fundação de Integração, Desenvolvimento e Educação do Noroeste do Estado do Rio Grande do
Sul, criada em 1969, com o propósito de encaminhar a Universidade Regional, dando o suporte legal,
patrimonial e econômico-financeiro ao desenvolvimento do ensino superior no noroeste do Estado.
72
produzidos mais de 2.500 textos didáticos, dos quais 52 foram selecionados para
compor o livro “Repensando o Oeste do Paraná”
46
.
Segundo Emer (1991), o Projeto Memória foi o programa que mais acalorou
as discussões da educação regional e, também, o que mais sofreu restrições de
segmentos sociais temedores da revisão histórica da região. Antes da publicação,
foram censurados textos que tratavam dos conflitos de terras, das questões
fundiárias e dos colonos expulsos do campo por jagunços contratados pelas
indústrias madeireiras.
Outra ação importante resultante da parceria ASSOESTE/Ijuí/FIDENE foi a
publicação, pela Assoeste: Editora Educativa, em 1984, do livro “O texto na sala de
aula” (ATHAYDE JÚNIOR, 2001, p. 27), organizado por João Wanderley Geraldi. Tal
obra traz uma coletânea de textos que versam sobre uma proposta interacionista de
ensino de língua, resultante das discussões que professores da IEL/UNICAMP
vinham desencadeando na região, por meio dos Cursos de Atualização de
Professores
47
.
É bom lembrar que, na década de 1980, havia, entre educadores do país,
uma tentativa de superar as bases tecnicistas de ensino, discutindo-se os
postulados da corrente histórico-crítica, com base no materialismo histórico, a partir
do qual gestava-se uma proposta (principalmente para o ensino da Língua
Portuguesa) sustentada pela compreensão (sócio)interacionista da linguagem.
Paralelamente, a SEED também discutia novos rumos para a educação, pautada
numa proposta de trabalho com o Ciclo Básico, o qual rompia com o modelo de
alfabetização (Erasmo Pilotto) até então adotado.
Enquanto se propagava, na região, essa orientação teórico-metodológica
para o ensino da língua portuguesa, outras ações eram desencadeadas pela
ASSOESTE, via Projeto MEC/OEA. Amparo-me em Kuiava (1983) para citar
algumas delas:
- acompanhamento, matrícula e chamada escolar nos anos de 1980 a 1982
que resultou, no primeiro ano, na superlotação das escolas, sendo
necessário alugar salões de festas, igrejas e outros espaços físicos para
46
CALLAI, Dolair Augusta; AVANCINI, Elsa Gonçalves; ZARTH, Paulo Afonso. Repensando o Oeste
do Paraná Integração Social e Comunicação e Expressão. Cascavel : ASSOESTE, Ijuí/FIDENE,
1983.
47
Sobre esse assunto discorro, com maiores detalhes, no próximo capítulo.
73
atender a demanda de crianças de 7, 8, 9, 10 e mais anos que estavam fora
da escola;
- assistência ao educando com serviço médico e dentário, nos anos de 1979
a 1983;
- atividades de entrosamento escola/família nos anos de 1980 a 1982, cujo
principal objetivo era identificar os principais problemas para organização e
funcionamento das Associações de Pais e Mestres, as carências dos alunos
quanto à saúde, à alimentação, ao material escolar e ao vestuário;
- impressão de 3.100 exemplares de material pedagógico para alfabetização
e 3.100 exemplares de metodologia para os municípios da região no ano de
1980;
- produção de 45 mil exemplares da cartilha “A Porta Mágica
48
”, 45 mil
exemplares do Período Preparatório para o aluno e 6.500 Manual do
Professor de 1ª a 4ª séries
49
, nos anos de 1980 a 1982;
- continuidade dos Cursos de Aperfeiçoamento de Professores, resultando
num quadro de 7.128 professores em 1980, 5.554 em 1981 e 6.778 no ano
de 1982, cujo acompanhamento, no município, era feito pelo Departamento
de Desenvolvimento de Recursos Humanos da ASSOESTE, constituído por
assessores pedagógicos e supervisores de ensino que promoviam visitas
periódicas para levantar as dificuldades e deficiências no ensino;
- atividades de ampliação e melhoria da Educação Especial, orientando pelo
menos 120 professores que atendiam alunos com necessidades especiais,
entre os anos de 1979 e 1982;
- cursos de aperfeiçoamento para 7.990 professores de 1ª a 4ª séries no ano
de 1981;
- cursos de aperfeiçoamento para 6.700 professores e supervisores de a 4ª
séries no ano de 1992;
- especialização de técnicos da ASSOESTE, em 1983, para melhor
desempenho das ações executadas.
48
RUOSO, Isolda. A porta mágica. Cascavel: Assoeste, 1982.
49
RUOSO, Isolda. Período preparatório: Projeto classes multisseriadas (manual do Professor).
Material impresso pelo sistema gráfico da Associação Educacional do Oeste do Paraná
ASSOESTE, com o apoio técnico e financeiro do Projeto Especial Multinacional de Educação –
MEC/OEA.
74
Com o final do Projeto MEC/OEA aproximando-se, a FUNDEPAR – Fundação
Educacional do Estado do Paraná foi contratada pelo MEC para avaliar os
resultados e o impacto das atividades desenvolvidas, até aquele momento, pelo
Projeto. Kuiava pontua sobre a conclusão da FUNDEPAR:
(...) o Projeto, se não conseguiu por um lado minimizar os efeitos do
fracasso escolar nas 1ªs séries do ensino do grau índices de
evasão e repetência em torno de aproximadamente 40% na zona
rural e 35% na zona urbana – por diversos fatores, inclusive a
própria situação econômica do Estado onde houve e continua a
haver um grande contingente migratório da zona rural, por outro
lado, trouxe importantes modificações no âmbito educacional
(KUIAVA, 1983, p. 69).
E, dentre as modificações, ressaltou a geração de tecnologias alternativas
nos métodos de ensino e na produção de materiais didático-metodológicos
específicos para a região, que vão desde a elaboração da cartilha regional, da
produção de textos de Integração Social para e séries, resultantes do Projeto
Memória, até treinamentos
50
e cursos de aperfeiçoamento para professores
municipais, estaduais e universitários. Outra ação considerada altamente positiva
pela FUNDEPAR foi a criação da ASSOESTE pelo fato de que, mesmo findando o
projeto, daria continuidade às ações desencadeadas até então.
Com o término do Projeto MEC/OEA, com a ASSOESTE organizada e com
sua equipe pedagógica formada, as ações de formação continuada tiveram
continuidade, principalmente por meio de cursos de aperfeiçoamento nas diferentes
áreas, os quais eram ministrados diretamente nos municípios, a convite destes.
Assim, os professores, mesmo distantes dos cursos de licenciaturas (eram poucos
os licenciados na época), mantinham-se “atualizados” em relação às discussões
relativas ao ensino e, principalmente, às questões metodológicas.
Vale lembrar que, como o Estado estava implantando, a partir de 1988, o
CBA nos municípios, a ASSOESTE preocupou em interar-se da proposta,
questionando a forma de encaminhamento, refletindo sobre a base teórica,
participando e promovendo discussões com a SEED e com os secretários
municipais de educação, orientando e organizando cursos de alfabetização dentro
do viés teórico da corrente histórico-crítica já abraçada por essa instituição. Ou seja,
50
Inicialmente, os professores eram realmente treinados para alfabetizar por meio da sistematização
mecânica do modelo Erasmo Pilotto, sobre o qual abordarei, com mais detalhes, no próximo capítulo.
75
a Associação esteve presente em todos os acontecimentos relativos à educação,
sejam estes em ordem nacional, estadual ou regional.
1.3.3 Década de 1990: sistematização de propostas
A década de 1990 significou, para a região, a solidificação das ações
iniciadas na década anterior e intensificadas pela ASSOESTE. E, assim, muitas
foram as atividades de formação ofertadas, até porque a Secretaria de Estado da
Educação publicou, em 1990, o Currículo Básico para a Escola Pública do Estado do
Paraná e passou a exigir, a partir de então, a sua aplicabilidade. Contudo, antes era
preciso entendê-lo, estudá-lo e, para isso:
Muitos foram os encontros para discussões, reflexões, estudos
sobre as diferentes áreas. (...) nessas três décadas, saímos do
Processo de Alfabetização Erasmo Pilotto para uma ressignificação
da prática do ensino em Língua Portuguesa/Alfabetização,
Educação Física, Artes, bem como Matemática, História, Geografia
e Ciências (GNOATTO, 2007, p. 1).
No decorrer da gestão administrativa 1992-1996, por exemplo, a ASSOESTE
realizou, em parceria com a REDIC/APADEC, 240 horas de Cursos de
Aperfeiçoamento na área de Ciências, atendendo a 45 municípios e um total de 120
participantes. Os docentes que atuaram nesses cursos foram mestres e doutores da
Universidade Estadual de Maringá UEM, da Universidade Estadual do Oeste do
Paraná UNIOESTE; o Assessor Pedagógico de área da própria ASSOESTE e um
representante de área do Núcleo Regional de Educação NRE. Além do enfoque
teórico que recuperou a Concepção de Sociedade, Homem, Educação e Ciências,
os participantes tiveram a oportunidade de preparar materiais que, posteriormente,
foram levados aos respectivos municípios e, ainda, encerraram o curso com uma
viagem de estudo à UEM, objetivando a exploração dos laboratórios.
Em 1995 e 1996, em parceria com a UNIOESTE, a ASSOESTE realizou 160
horas de Cursos de Aperfeiçoamentos na Área de Matemática, envolvendo 45
municípios e 45 participantes. Estes eventos contaram com docentes de renome
internacional da UNICAMP, da Universidade Federal do Paraná UFPR, e com
docentes da UNIOESTE, além da Assessora Pedagógica de área da ASSOESTE.
Da mesma forma que o anterior, houve a preocupação em relacionar discussões
76
teóricas com encaminhamentos práticos. Aliás, essa sempre foi uma proposta de
trabalho priorizada, seja em que área fosse.
Outra ação importante que se destacou, na década de 1990, foi o
fortalecimento das Equipes de Ensino nos municípios. Para isso, a ASSOESTE
incentivou que as secretarias municipais buscassem, dentre os professores, um
representante de cada área, o qual seria convidado para cursos de aperfeiçoamento
em Cascavel, que aconteceriam no decorrer do ano, numa média de cinco encontros
de 8 horas. Em contrapartida, tal docente teria a responsabilidade de repassar, aos
colegas, a formação recebida. Foi uma forma que a ASSOESTE encontrou de estar
presente nos municípios, assessorando-os pedagogicamente. Os cursos
aconteceram, todavia a proposta não se concretizou integralmente, visto que muitos
docentes municipais não faziam a socialização, pelo fato do calendário escolar não
disponibilizar, durante os dias letivos, horas para tal atividade. Em conseqüência, o
fato de os estudos ocorrerem fora do horário de aula, desestimulava o interesse dos
professores.
Mesmo com os Encontros de Equipes (como eram chamados os cursos de
formação direcionados aos representantes de área), a ASSOESTE não deixou de
atender aos convites dos municípios para cursos nas mais diferentes áreas.
Além dos Cursos em Língua Portuguesa, a ASSOESTE atendeu às muitas
solicitações dos municípios nas mais diferentes áreas: Alfabetização, Matemática,
Ciências, História, Geografia e Educação Infantil. Os cursos eram ministrados pelos
próprios Assessores Pedagógicos e também por representantes do NRE ou da
UNIOESTE, com quem mantinha parceria. em 1995, por exemplos, foram
trabalhadas 2.742 horas/aula de formação nas diferentes áreas do conhecimento,
atendendo a um total de 8.887 professores.
Dentre os inúmeros realizados, queremos destacar, a título de amostragem,
as horas de formação destinadas especificamente ao ensino de Língua Portuguesa
(minha área de atuação e enfoque nesta pesquisa), nos anos de 1993 e 1994.
77
Ano Área Carga horária Município
40 Anahy
32 Cafelândia
48 Campo Bonito
24 Catanduvas
16 Céu Azul
24 Diamante do Oeste
40 Diamante do Sul
48 Formosa do Oeste
48 Guaraniaçu
40 Iguatu
32 Iracema do Oeste
24 Lindoeste
16 Maripá
24 Matelândia
32 Missal
24 Nova Aurora
24 Nova Santa Rosa
40 Santa Tereza do Oeste
24 São José das Palmeiras
12 São Miguel do Iguaçu
24 São Pedro do Iguaçu
24 Três Barras do Paraná
1993 - 1994
Língua
Portuguesa
24 Tupãssi
Total 684 h/a
Fonte: Relatório de Atividades – Período: 1993 – 1996, ASSOESTE.
A equipe da ASSOESTE procurava se manter, ainda, constantemente
atualizada em relação a todos os seguimentos da educação. Para isso, procurou
estar presente nos eventos de ordem estadual e nacional, acompanhando e
participando das discussões. Por outro lado, prestava assessoria aos municípios em
inúmeras solicitações, orientando quanto a leis, diretrizes, projetos ou normas
estabelecidas pelos órgãos federais ou estaduais; à merenda escolar; à educação
especial; à educação infantil; à UNDIME, entre outras. E, quando em 1998 o MEC
publicou e distribuiu às escolas públicas os Parâmetros Curriculares Nacionais
(PCNs), a ASSOESTE estava lá, orientando os municípios, discutindo e
questionando suas bases teóricas.
Embora a ASSOESTE sempre tenha acreditado e defendido uma proposta de
formação continuada por meio de grupos de estudos, prevaleceu, em suas ações,
até mesmo por exigência dos municípios, a realização de cursos, com carga horária
pontual. Ou seja, os municípios entenderam (e ainda entendem) que se
disponibilizarem, por exemplo, 24 horas de curso em Língua Portuguesa, durante o
ano, é suficiente para manter os professores atualizados por vários anos. Em
78
conseqüência, no ano posterior, o investimento recairá em outra área e assim,
sucessivamente. A ausência de aprofundamento contínuo, de estudos sucessivos se
revela nas ações e atitudes dos professores em sala de aula, fato que discutirei
posteriormente.
Enfim, se as ações da ASSOESTE na cada de 90 foram inúmeras, muitas
também foram as dificuldades encontradas, principalmente de ordem financeira.
Como posto, a Associação era mantida por contribuições que os associados, no
caso, os municípios, repassavam mensalmente. Uma vez que foi criada como
Associação, juridicamente era reconhecida como empresa privada e estava
subordinada às leis civis (comerciais, trabalhistas etc.), para as quais o ônus e os
encargos sociais eram (e ainda são) muito elevados. Tal situação impedia, por
exemplo, que fosse reconhecida pelas diferentes instâncias governamentais como
empresa blica, embora seu estatuto fosse de natureza pedagógica. Dessa forma,
se tornava inviável a alocação de recursos dos órgãos estaduais ou federais que
pudessem subsidiar os investimentos educacionais necessários.
Tendo em vista a situação financeira descrita, tornava-se cada vez mais difícil
manter uma equipe pedagógica permanente e sua manutenção estava, então,
subordinada à receita oriunda das contribuições dos associados. Daí a necessidade
ímpar de que os contribuintes fossem regulares, visto que, se um deles deixasse de
contribuir, algum encargo social, por exemplo, ficaria acumulado. E, como nem todos
os municípios eram regulares em suas contribuições, foi necessário alguns cortes
nas despesas, o que afetou diretamente o setor pedagógico, pois a ASSOESTE
obrigou-se a diminuir o número de seus assessores e, conseqüentemente, de seu
atendimento.
Os últimos anos da década de 90 foram marcados por acentuada dificuldade
financeira que era revelada em reuniões com os secretários municipais de
educação, com os prefeitos e até com as equipes de ensino dos municípios, numa
tentativa de conscientizar e sensibilizar aqueles que estavam inadimplentes com
suas contribuições.
1.3.4 A partir de 2000: início de um novo ciclo na educação do Oeste
As dificuldades financeiras que marcaram o final da década de 1990
estenderam-se para o início do novo século e, em 2001, se tornaram insustentáveis.
79
Com salários atrasados e débitos pendentes junto à Previdência, não se encontrou
outra alternativa que não fosse a extinção da ASSOESTE. E, assim, no dia 31 de
dezembro de 2001, como resultado de administrações políticas que o souberam
reconhecer o valor cultural e as importantes ações em prol da educação mantidas
pela ASSOESTE; que não acompanharam ou não quiseram entender as lutas
travadas, as batalhas vencidas em nome de todos os municípios da região Oeste;
que não entenderam (e ainda não entendem) o significado da educação a
ASSOESTE FOI DESATIVADA.
Politicamente, alguns prefeitos não entenderam a importância das ações
desenvolvidas pela Associação, mesmo que os secretários municipais de educação
atestassem o contrário. Para aqueles que acompanharam a luta, estiveram
presentes desde a criação, que fizeram parte da história e entenderam a significação
da ASSOESTE, este foi um momento de luto. Luto pelas batalhas que deixariam de
ser travadas, pelas ações de formação que acabariam ali, pelos professores
municipais que não receberiam mais sua assessoria.
Infelizmente, a história da ASSOESTE, iniciada em agosto de 1980, terminou
no dia 31 de dezembro de 2001, quando todas as suas atividades foram paralisadas.
E restou, àqueles que fizeram parte de sua história, apenas lamentar o fato ocorrido:
A extinção da ASSOESTE foi, para mim, uma fase que desarticulou
todo um trabalho educacional que no decorrer dos 20 anos se fez na
região. Éramos um grupo de assessores articulados, devido à
proposta de trabalho que se tinha com os municípios filiados. Nesse
período podíamos dizer que havia a Formação Continuada dos
professores. O contato constante com eles, por sua coordenação /
disciplina, ou via as Equipes de Ensino, que também tinham uma
programação ano a ano, aprofundando cada área do conhecimento,
nos reforçava a organizar e trabalhar cada vez mais o coletivo
regional. Tanto foi problema o fechamento que, em pouco tempo, os
próprios secretários municipais de educação se articularam com a
AMOP, no intuito de ter, mais uma vez, um trabalho educacional
com a participação de todos os municípios. Para cada um deles
faltava algo que ajudasse a pensar a condução da educação
regional. Vício? Dependência? Não. O espírito coletivo havia sido
construído e, portanto, o elo da corrente deveria ser unido de novo.
Um ano após, o Departamento de Educação, na AMOP, reinicia os
trabalhos. Não nos mesmos moldes, mas com a mesma
intencionalidade
51
.
51
Depoimento de EMMA GNOATO, ex-secretária executiva da ASSOESTE (1986-1989) e ex-
assessora pedagógica, na área de Matemática.
80
Depois do fato consumado, no dia 23 de janeiro de 2002, os prefeitos se
reuniram numa Assembléia Geral Ordinária convocada pelo Presidente da
ASSOESTE, Senhor Luiz Yoshio Suzuke, o então Prefeito de Medianeira que, como
último ato, pretendia prestar contas aos prefeitos em relação ao empréstimo
realizado, junto à AMOP, para rescisão contratual dos funcionários; apresentar os
débitos pendentes junto à Previdência e discutir alternativas de solução; encaminhar
as discussões preliminares sobre o patrimônio da ASSOESTE e sua futura
destinação
52
. O que interessa, realmente, dentre os assuntos discutidos na reunião,
é que o prefeito de Toledo, Senhor Derli Donin, na época, Presidente da AMOP,
sabedor e reconhecedor da importância da ação pedagógica da ASSOESTE, de seu
assessoramento e de seu patrimônio cultural, propôs a criação de um departamento
pedagógico na AMOP, numa tentativa de preservar pelo menos parte das ações. A
idéia foi acatada pela maioria dos prefeitos presentes e reiterada pelos prefeitos de
Capitão Leônidas Marques, Palotina, Quatro Pontes, Serranópolis do Iguaçu, Pato
Bragado, Vera Cruz do Oeste e Maripá.
Embora a necessidade fosse urgente, a proposta se efetivou
definitivamente em abril de 2003, quando a Associação dos Municípios do Oeste do
Paraná – AMOP, criou o Departamento de Educação
53
.
Uma vez que o Departamento foi criado, algumas ações foram recuperadas
(talvez não com a mesma extensão) e, dentre estas, o atendimento a cursos nos
municípios, agora não mais ofertados por docentes do Departamento, mas sim, por
docentes convidados da UNIOESTE, do NRE e de outras instituições de ensino
superior. Além disso, os secretários de educação dos municípios voltaram a se
reunir sob a orientação da assessoria pedagógica da AMOP para discutir ações
conjuntas voltadas à melhoria da educação na região Oeste do Paraná. E foi, numa
destas reuniões, que os secretários municipais de educação, conforme Gnoatto:
(...) ao refletirem sobre as mudanças previstas pela LDB em relação
a implantação do Ensino Fundamental de 09 anos, sentiram que era
hora de rediscutir um Currículo, definindo sob quais pressupostos
seria construído o Currículo Básico para as escolas públicas
municipais de cada um dos municípios desta região
(In.: AMOP,
2007, p. 9)
.
52
Os funcionários da Gráfica arrendaram os equipamentos e sua razão social. Assim, hoje a Gráfica
ASSOESTE ainda está na ativa, mas funcionando em caráter privado, em outro endereço.
53
Este Departamento passou a ser coordenado pela ex-assessora pedagógica, Emma Gnoatto, a
qual já havia ficado à frente da ASSOESTE como Secretária Executiva nos anos de 1986 a 1989.
81
Assim, decidiram que, sob a coordenação do Departamento Pedagógico da
AMOP, seria composta uma equipe de coordenadores de área, a qual, depois de
fundamentar-se teoricamente, iria reunir-se com coordenadores de áreas dos
municípios para, em conjunto, elaborarem uma proposta curricular.
A Equipe de Coordenadores de Área
54
foi formada por Docentes da
UNIOESTE, da UNIPAR
55
e da FAG
56
, representantes do NRE, professores
municipais, professores estaduais e até por professores aposentados, de
reconhecida competência na área, muitos dos quais haviam trabalhado como
Assessores Pedagógicos da ASSOESTE
57
e, por isso, apresentavam um vasto
currículo em ações de docência nas séries iniciais.
Depois de organizarem um cronograma de trabalho que se estendeu por dois
anos (2005 e 2006) de intensos estudos, reflexões, embates teóricos,
sistematizações, leituras, discussões e análise realizadas coletivamente com os
representantes de área de cada município, produziu-se, finalmente, o Currículo
Básico para a Escola Pública Municipal Educação Infantil e Ensino Fundamental
(anos iniciais) – da Região Oeste do Paraná, publicado em fevereiro de 2007
58
.
Este ano (2007) está se concretizando como um momento de estudo do
Currículo, mais diretamente com os professores nos municípios, na perspectiva de
garantir, principalmente, a compreensão do pressuposto filosófico que resgata o
Materialismo Histórico Dialético e, conseqüentemente, apresenta-se como método a
todas as áreas do conhecimento. Na área de Língua Portuguesa, a preocupação é
garantir o reconhecimento da concepção sociointeracionista da linguagem como
norteadora das ações com a língua, e dos gêneros textuais como objeto dessas
ações, à luz do método filosófico. Para isso, foram planejados cinco encontros de 08
horas com coordenadores de áreas dos municípios os quais, por sua vez,
54
Os docentes que compuseram essa Equipe foram: Andréa Pessutti Pansini e Telma Santana
Serafini Boschirolli (Artes); Ângela Zanatta e Rita Salete Cassol (Educação Física); Baltadar
Vendrúsculo (Alfabetização); Carmem Teresinha Baumgartner e Terezinha da Conceição Costa
Hübes (Língua Portuguesa); Darci Alda Barros e Maria DiloPizzato (Geografia); Celso Aparecido
Polinarski e Marco Antonio Batista Carvalho (Ciências); Eder Menezes e Paulino José Orso (História);
Heliane Mariza Gryzbowski Rippllinger e Marlene Lucia Siebert Sapelli (Matemática); Lucia Vitorina
Bogo Polidório e Maria das Dores Faria (Educação Infantil).
55
- Universidade Paranaense – com sede em Umuarama (Universidade privada).
56
- Fundação Assis Gurgas – oferece cursos de ensino superior (Fundação privada).
57
- Atuaram como Assessores Pedagógicos da ASSOESTE: Baltadar Vendrúsculo (Alfabetização);
Darci Alda Barros (Geografia), Eder Menezes (História); Maria das Dores Faria (Educação Infantil);
Terezinha da Conceição Costa Hübes (Língua Portuguesa).
58
AMOP Associação dos Municípios do Oeste do Paraná. Currículo básico para a Escola Pública
Municipal: Educação Infantil e Ensino Fundamental – anos iniciais. Cascavel: ASSOESTE, 2007.
82
socializarão, com seus parceiros, as sistematizações, em forma de grupos de
estudos.
No que diz respeito à Língua Portuguesa, ainda, uma importante ação foi
desencadeada em 2006, paralelamente à produção do Currículo: a concretização de
um grupo de estudo
59
com enfoque no ensino da gramática numa perspectiva
contextualizada. E, visto que, como disciplina do Currículo, adotou-se, como objeto
de ensino da Língua Portuguesa, os gêneros textuais, o grupo desdobrou-se nos
estudos dos gêneros, relacionando a estes, o ensino da gramática. Do grupo
resultou a produção de um Caderno Pedagógico
60
. Todavia, sobre isso discorrerei
no próximo capítulo, quando pretendo me deter, especificamente, no histórico da
formação continuada em Língua Portuguesa, destacando as diferentes concepções
de linguagem que orientaram e orientam, hoje, o ensino de língua.
Depois do panorama que pretendeu resgatar, brevemente, a história da
formação (inicial e continuada) dos professores, principalmente das séries iniciais do
ensino fundamental, quero registrar a importância de ter trilhado esse caminho, visto
que foi no percurso histórico que consegui responder a muitas das indagações e
preencher algumas lacunas de minha formação. Foi preciso tal estudo para que
tivesse ciência de, pelo menos, parte da história da qual eu mesma participei, ajudei
a construir, embora sem compreendê-la. Da mesma forma que eu, acredito que
outros professores são simplesmente conduzidos pelas ações políticas, sociais e
econômicas impostas, sem dar-lhes fôlego para refletir e/ou questionar tais
mudanças ou comandos dados. Porém, entendo que não basta apenas ser mais um
personagem da história viva. É preciso, sim, ser protagonista de ações que
contribuirão para fazer a História.
59
Proposto por professores da região e Coordenado pela Profa. Ms. Terezinha da Conceição Costa
Hübes, da UNIOESTE.
60
COSTA-HÜBES, Terezinha da Conceição (org.). Seqüências Didáticas: uma proposta para o
ensino da Língua Portuguesa nas séries iniciais. Cascavel: ASSOESTE, 2007.
83
2 TEORIAS SUBJACENTES AO PROCESSO DE FORMAÇÃO CONTINUADA EM
LÍNGUA PORTUGUESA, NA REGIÃO OESTE DO PARANÁ
A formação consiste em descobrir, organizar, fundamentar, revisar e
construir a teoria. Se necessário, deve-se ajudar a remover o sentido
pedagógico comum, recompor o equilíbrio entre os esquemas
práticos predominantes e os esquemas teóricos que os sustentam.
Francisco Imbernón
No capítulo anterior, lancei um olhar panorâmico sobre a história da formação
(inicial e continuada) dos professores no Brasil, no Paraná e na região Oeste do
Paraná, com o objetivo de contextualizar o objeto de estudo: a formação continuada
em Língua Portuguesa (com ênfase ao ensino da gramática na 4ª série) de
professores das séries iniciais do ensino fundamental da região.
Para dar um tratamento específico ao recorte, no capítulo em pauta,
proponho a discutir as teorias reveladas em documentos norteadores: Currículo
Básico da SEED 1977/1978/1979; Currículo Básico para a Escola Pública do
Estado do Paraná CBPR 1990; Parâmetros curriculares Nacionais PCNS
1997/1998 e Currículo sico para a Escola Pública Municipal CBEPM 2007; e
em programas e/ou projetos, como O Texto na Sala de Aula, de 1984. Tais embates
teóricos orientaram/orientam, de alguma forma, as reflexões sobre o ensino de
Língua Portuguesa, seja em cursos de formação, em seminários ou em palestras.
Objetivamente, ao debruçar sobre tais documentos, a intenção é de investigar sob
qual(is) método(s) teórico(s) estão ancorados; qual(is) concepção(ões) de
linguagem(ns) orientou(ram)/orienta(m) o ensino da Língua Portuguesa e, nessa
perspectiva, qual o objeto de ensino proposto por cada um, sem perder de vista o
lugar dado ao ensino da gramática.
Na tentativa de resgatar o entrelaçamento teórico em questão, pretendo
apontar as bases filosóficas, psicológicas e pedagógicas que subsidiaram/subsidiam
o ensino-aprendizagem da Língua Portuguesa, compreendendo que, conforme o
Currículo Básico construído pela AMOP:
Os pressupostos filosóficos dizem respeito à concepção de homem
e de sociedade e à compreensão de educação, e são eles que
84
definem a direção dos demais fundamentos; os psicológicos
explicitam uma concepção de desenvolvimento humano e de
aprendizagem; os pedagógicos expressam o modo de pensar o
fazer da educação, para consolidar os pressupostos filosóficos.
Assim dizem respeito ao método, aos conteúdos e às práticas
escolares cotidianas (
AMOP, 2007, p. 27).
Como o processo de formação continuada, na região, iniciou-se, em meados
da década de 1970, as reflexões partem desse período e seguem concentradas em
décadas, as quais denominarei de fases, por estarem assim delimitadas: primeira
fase década de 1970 até meados da década de1980; segunda fase a partir de
1984 até 1997; terceira fase – a partir de 1997.
Embora esteja convicta de que as linhas temporais não o assim tão
definidas, estou ciente de que o ensino da Língua Portuguesa, na região Oeste do
Paraná, foi determinadamente marcado por discursos acadêmicos desvelados em
programas e/ou projetos de formação e documentos oficiais, sejam estes nacionais,
estaduais ou regionais, propagados em cada década: o Currículo da SEED, o
modelo Erasmo Pilotto de Alfabetização e a cartilha Porta Mágica orientaram os
professores a partir de meados da década de 1970 até meados da cada de 1980;
as discussões acadêmicas pautadas na Lingüística da Enunciação (leitura, produção
de texto, reescrita e análise lingüística) ficaram conhecidas nos programas de
formação continuada, assim como as Diretrizes do Ciclo Básico de Alfabetização e o
Currículo sico para a Escola Pública do Estado do Paraná, os quais foram
elementos teóricos norteadores da prática docente, a partir de 1984/1985 até
meados da década de 1990; os Parâmetros Curriculares Nacionais redirecionaram o
ensino após 1997; e o Currículo Básico para a Escola blica Municipal Educação
Infantil e Ensino Fundamental (anos iniciais) Região Oeste do Paraná sistematizou
uma proposta de educação em 2007.
É sobre tais documentos e programas, focalizando suas bases teóricas, que
direcionarei o capítulo em pauta.
85
2.1 Primeira Fase (1970 até meados de 1980): Concepção de Linguagem como
Representação do Pensamento; Concepção de Linguagem como
Estrutura ou Instrumento de Comunicação
Para garantir maior clareza em relação às orientações teóricas que
subsidiaram o professor no ensino da Língua Portuguesa na década de 1970,
entendo que seja relevante esclarecer como a linguagem e a língua eram
compreendidas, na época, e sob que perspectiva os próprios professores foram
“capacitados”.
De início, reporto-me à sala de aula. No que se refere ao trabalho com a
língua, o que predominavam eram as marcas de um ensino tradicional. A maioria
dos professores, principalmente das séries iniciais, tinha pouca formação e,
conseqüentemente, reproduzia as práticas às quais foi submetido quando aluno.
As ações, na sala de aula, para abordar a Língua Portuguesa, advinham da
compreensão que tinham de linguagem e de língua. Linguagem como representação
do pensamento foi (inconscientemente talvez) a concepção orientadora do ensino
por séculos, exercendo forte influência, principalmente até final da década de 1960.
Trata-se de “um princípio sustentado pela tradição gramatical grega,
passando pelos latinos, pela Idade Média e Moderna e, teoricamente, rompida no
início do século XX, de forma efetiva, por Saussure (1969)” (PERFEITO, 2005, p.
28). Sob à luz de tal concepção, filósofos e outros estudiosos acreditavam que a
linguagem era um dom individual, produzida no interior da mente dos indivíduos. Por
isso, estava a serviço do pensamento, já que era considerada a sua forma de
tradução. A linguagem articulada estava diretamente relacionada à capacidade de
organizar logicamente o pensamento e, caso faltasse clareza na articulação da fala
ou da escrita, por exemplo, entendia-se que o indivíduo não pensava bem.
Tal concepção “parte da hipótese de que a natureza da linguagem é racional,
por entender que os homens pensam conforme regras universais (de classificação,
divisão, segmentação do universo)” (Idem). Em decorrência, os filósofos entendiam
que as línguas obedeciam a princípios racionais, lógicos e, por isso, podiam ser
orientadas igualmente. Portanto, era preciso exigir, dos falantes, clareza e precisão
no uso da linguagem, organizada por uma gramática capaz de distinguir formas
válidas das inválidas.
86
O alvo que esses estudiosos queriam atingir era a língua-ideal língua
universal, lógica, sem equívocos, sem ambigüidades, capaz de assegurar a unidade
da comunicação do gênero humano” (ORLANDI, 1999a, p. 12). Sob tal enfoque, os
franceses Arnaud e Lancelot (1690) produziram uma gramática que foi tida como
modelo: a Gramática de Port Royal, também chamada de Gramática Geral e
Racional. Pela gramática, os autores estabeleceram princípios não diretamente
ligados à descrição de uma língua particular, e sim, a princípios universais, ao
construir “uma espécie de esquema de linguagem, ao qual, de bom ou mal grado, as
múltiplas aparências da língua real devem se submeter” (LEROY, 1971, p. 27).
Essa maneira de conceber a linguagem foi contestada, no século XIX, pela
Lingüística Histórica com as gramáticas comparadas que defendia a idéia de que “as
línguas se transformam com o tempo (ORLANDI, 1999a, p. 13). Logo, para os
estudiosos da língua, “não é mais a precisão, mas a mudança o que importa” (Idem).
Embora os estudos históricos da linguagem tenham trazidos grandes contribuições
aos estudos lingüísticos, a idéia de uma gramática universal se sobrepôs e foi
fortemente defendida e trabalhada no ensino de línguas.
Todavia, no início do culo XX, Saussure, um lingüista suíço, estabeleceu,
dentre outras, a distinção entre língua e fala, reconhecendo a língua, “como um
sistema abstrato, homogêneo, social e supra-segmental, ao passo que a fala seria a
realização concreta e individual da língua” (SUASSUNA, 1995, p. 64). Essa
compreensão levou-o a optar pelo estudo da linguagem como que representada por
um sistema de signos, e da língua como um dos meios utilizados pelos homens para
operar com os signos. Mesmo reconhecendo a língua como social, adquirida num
dado momento e numa dada sociedade, Saussure analisou-a como sistema, sem
estabelecer analogias com as relações de uso.
Independentemente das teorias propostas por Saussure, a compreensão de
linguagem como transmissão do pensamento perpassou os séculos, sobrevivendo a
críticas, sem perder seu espaço na orientação das práticas pedagógicas, até final da
década de 1960 (e ainda hoje, em muitas situações). Estabeleceu regras do bem
falar e do bem escrever, as quais, conforme Maciel (2002/2003), sustentavam-se no
ensino prescritivo da gramática normativa, explorada sob o método da
memorização, estrategicamente organizado por atividades de cópia e repetição.
87
Na década de 1970, as idéias de Saussure ganharam força e, em decorrência
disso, divulgou-se uma outra maneira de conceber a linguagem, influenciada por tais
postulados lingüísticos, denominada de Estruturalismo
61
.
Sob esse viés teórico, a linguagem passou a ser concebida, principalmente
pelos seguidores da teoria saussuriana, não como representação do
pensamento, mas também como uma estrutura concreta, um código, passível de ser
analisado internamente. A escola estruturalista (assim como ficou chamada para os
estudiosos e seguidores de Saussure) investigava “fatos lingüísticos com base na
idéia fundamental de que a língua é sistema e de que cada elemento desse sistema
possui um valor especial, compreendido, principalmente, por suas oposições em
relação a outros elementos” (SUASSUNA, 1995, p. 69).
Os estudos dividiram-se em várias vertentes
62
; contudo, o que interessa, no
momento, é destacar que, dentro da vertente européia do Estruturalismo originou-se
o Funcionalismo, propondo-se a estudar a natureza das estruturas lingüísticas,
relacionando-as às situações de uso, pois defendia que assim seriam
compreendidas. E em suas subdivisões, destacou-se Jakobson, um lingüista da
Escola de Praga, para quem a linguagem deveria ser compreendida como aquela
que desenvolve diferentes funções. O pesquisador traçou um quadro das funções da
linguagem tendo em vista o locutor (emissor) e o alocutário (receptor), o canal (do
emissor até o receptor), a mensagem a ser transmitida pelo emissor, o referente
(assunto tratado na mensagem) e o código (entendido como a língua que organiza a
mensagem).
Esta visão fez surgir:
(...) uma didática de ensino de língua pautada pelo treinamento, pela
produtividade lingüística, pelo desenvolvimento de comportamentos
adequados à recepção e à produção de mensagens. Ensinar a
61
“O estruturalismo não é uma corrente exclusiva da lingüística: podemos encontrá-lo na psicologia,
na sociologia, na antropologia, na filosofia e na psicanálise. Na psicologia, a noção de estrutura
(Gestalt) aparece no princípio do século XX e Jean Piaget publica, em 1968, um livro fundamental
nesta área Le Struturalisme; na sociologia, Talcott Parsons, em Structure and Process in Modern
Sciences (1960), apresenta-nos uma visão ontológica da estrutura social; na antropologia social, a
primeira referência é Lévi-Strauss, cuja Antropologia Estrutural (1958) há de ser decisiva para o
nascimento da teoria estruturalista na literatura; na filosofia, Louis Althusser tentou uma interpretação
estrutural da obra de Marx, em Lire le Capital (1965); na psicanálise, os trabalhos de Jacques Lacan
partem do pressuposto de que o inconsciente está “estruturado como uma linguagem” (Écrits, 2 vols.,
1966-1971). (CEIA, 2005, In.:
http://www.fcsh.unl.pt/edtl/verbetes/E/estruturalismo.htm)
62
Para reconhecimento dessas vertentes ler Leroy (1971), Lepschy (1975); Suassuna (1995);
Aspresjan (1980), Maciel (2002/2003); entre outros.
88
língua passou a significar o treinamento do aluno na utilização
correta e adequada da língua, tanto em sua modalidade oral como
escrita (SILVA, 1994, p. 12).
Logo, tal teoria, direta ou indiretamente, organizou os pressupostos
pedagógicos que, por sua vez, determinaram como deveria ser o ensino de língua.
Ainda fortemente marcado pelos ideários da escola tradicional, revelou
(principalmente nos livros didáticos que passaram a ser amplamente utilizados na
década de 1970), traços definidores do Estruturalismo, porém aliados à concepção
normativa da linguagem. Enquanto, por um lado, defendia-se o ensino de regras
gramaticais como princípio sico para a aquisição de habilidades à fala e à escrita,
por outro a preocupação voltava-se à descrição das regras, a partir dos princípios
teóricos dos fonemas, dos morfemas e das frases, sendo a última sua unidade
superior de análise. Assim:
O estruturalismo, a teoria da comunicação, o estudo das funções da
linguagem, sobretudo, serviram de fundamento na produção de um
modelo de ensino de Língua Portuguesa, enfatizado a partir da
promulgação das Leis de Diretrizes e Bases 5692, de 1971, no
Brasil. A Língua Portuguesa, no ensino de 1
o
grau, passa a integrar,
como carro-chefe, a área de Comunicação e Expressão, aí incluídas
as disciplinas de Educação Física, Educação Artística e Língua
Estrangeira. Integração esta quase inexistente na prática
(PERFEITO, 2005, p. 34).
Pode-se dizer que, na cada de 1970, a linguagem foi concebida como um
instrumento de comunicação e a língua entendida como um conjunto de signos que
se combina para estabelecer a comunicação. Nessa perspectiva, parafraseando
Maciel (2002/2003), tivemos um ensino prescritivo da língua, orientado tanto pela
gramática normativa quanto descritiva, priorizando modelos ideais de construções
lingüísticas, os quais deveriam ser imitados e seguidos. Entendia-se que os alunos
aprenderiam fazendo (influência advinda da Escola Nova) e, portanto, deveriam
aprender e fixar informações (influência da Escola Tecnicista), as quais eram
repassadas por meio de exercícios de assinalar, repetir, treinar, seguir modelos,
preencher lacunas, marcar X, entre outros que (de acordo com aquela concepção)
conduziriam à apropriação das estruturas “corretas” da língua. Por isso, é comum
encontrar, ainda hoje, nos livros didáticos, atividades organizadas sob essa
orientação metodológica, o que significa que tais concepções ainda se fazem muito
presentes nas práticas de sala de aula.
89
2.1.1 Bases teóricas do Currículo da SEED, do modelo de Alfabetização
Erasmo Pilotto e da cartilha Porta Mágica
Em termos didático-pedagógico, o documento que orientava as aulas dos
professores das séries iniciais e, conseqüentemente, os “treinamentos”
63
, era o
Currículo, organizado pelo Departamento de Ensino de grau da Secretaria de
Estado da Educação SEED. Tratava-se de 4 volumes para as escolas da rede
urbana, com classes seriadas, e outros 4 para as salas multisseriadas da zona rural
(porém tomei como objeto de análise aqueles destinados às classes seriadas),
sendo que cada um deles destinava-se a uma série: 1) Elementos para o
Planejamento Curricular na Primeira Série do Ensino de Grau; 2) Elementos para
o Planejamento Curricular na Segunda Série do Ensino de Grau; 3) Elementos
para o Planejamento Curricular na Terceira Série do Ensino de 1º Grau; 4)
Elementos para o Planejamento Curricular na Quarta Série do Ensino de Grau.
No mesmo exemplar encontravam-se orientações (teóricas, de conteúdos e de
avaliação) para as quatro áreas do conhecimento trabalhadas na época:
Comunicação e Expressão, Matemática, Estudos Sociais e Ciências.
Apesar do objeto de estudo em questão ser a formação do professor para o
ensino da Língua Portuguesa nas séries iniciais, mais precisamente, professores de
série, julguei que seria interessante, ao analisar tais documentos, focalizá-los
desde a série, que as posturas adotadas nas ries posteriores (2ª, e 4ª)
estão associadas às orientações da alfabetização. Em virtude disso, o ponto de
partida da análise será o Currículo de 1ª série.
O volume destinado a série
64
parte de uma fundamentação teórica, a qual
explora o processo ensino-aprendizagem em suas dimensões cognitiva, afetivo-
social e psicomotora. A fundamentação psicopedagógica (primeira parte do
Currículo) discorre sobre a base teórico-metodológica que deve orientar as ações
em sala de aula.
Procedendo a uma leitura mais atenta para análise da fundamentação
psicopedagógica, fica evidente que a base orientadora é a da Escola Tecnicista,
63
Esse tipo de formação continuada era raro e quando ocorria, o professor tinha que, na maioria das
vezes, deslocar-se até Curitiba, pois os cursos eram ofertados no CETEPAR.
64
PARANÁ, Secretaria de Estado da Educação; Departamento de Ensino de grau. Currículo:
Elementos para o planejamento curricular na primeira série do ensino de 1º grau. Ano 3, 24,
1977a.
90
respaldada nos pressupostos filosóficos do empirismo positivista e na psicologia
behaviorista. O documento sustenta-se na compreensão de que a escola é a
responsável por modelar o comportamento humano, que, para tal concepção o
conhecimento é “produto das pressões do ambiente, significando o conjunto de
reações e estímulos que podem ser medidos, previstos e controlados” (GIUSTA,
1985, p. 26). Logo, aprendizagem é mudança de comportamento, resultante de
treinos e de experiências, enfim, de condicionamentos. Essa visão se evidencia
constantemente ao longo do texto, em citações do tipo: os objetivos “expressam
comportamentos que o aluno deve apresentar depois de passar pelas situações que
a escola oferece para a ocorrência do processo ensino-aprendizagem” (PARANÁ,
1977a, p. 21).
Os pressupostos de aprendizagem mencionados estão ancorados na
compreensão de que “o bom ensino depende de organizar eficientemente as
condições estimuladoras, de modo que o aluno saia da situação de aprendizagem
diferente de como entrou” (LIBÂNEO, 2002, p. 29). Para isso, era importante que o
professor entendesse, pelo menos um pouco, sobre os condicionantes do processo
ensino-aprendizagem que, no caso, estavam relacionados ao estudo científico do
comportamento, fato pelo qual os autores do Currículo (PARANÁ, 1977a)
expuseram definições sobre:
1. O que é aprendizagem? (p.22). Pautados em Gagne
65
, a
aprendizagem foi definida a partir do conceito de comportamento,
ressaltando as condições internas e externas para a aprendizagem.
2. Como representar o processo de aprendizagem? (p.23) A questão foi
explicada a partir de três princípios básicos: situação estimuladora,
comportamento de entrada, comportamento final. Nas palavras do
Currículo, a aprendizagem se quando o aluno apresenta mudança
de comportamento, ou seja, “faz alguma coisa que não podia fazer
antes. É a mudança no desempenho (comportamento) que nos leva a
conclusão de que ocorreu a aprendizagem” (idem, p. 23).
3. Que é instrução? (p. 24) “O professor administra as condições de
transmissão da matéria, conforme um sistema instrucional eficiente e
efetivo em termos de resultados da aprendizagem: o aluno recebe e
65
A teoria da aprendizagem que orienta a Escola Tecnicista e, conseqüentemente, o Currículo se
pauta, além deste citado, em Skinner, Blomm e Mager.
91
fixa as informações” (LIBÂNEO, 2002, p. 30). Por isso, houve a
necessidade de explicar o que é instrução, uma vez que ao professor,
caberia apenas repassar o conteúdo científico de acordo com o
sistema instrucional previsto, garantindo eficácia na transmissão do
conhecimento.
Resumindo: a preocupação revelada na fundamentação psicopedagógica do
Currículo da 1ª série era a de garantir, ao professor, subsídios para que
reconhecesse e identificasse o comportamento de entrada do aluno, selecionando
estratégias instrucionais que o levasse ao comportamento final desejável. Dessa
forma, compreender o desenvolvimento humano, a partir de comportamentos
observáveis, eram pré-requisitos fundamentais para motivar novas aprendizagens.
Sob tal orientação teórica, apresentaram a noção de linguagem. Esta foi
definida segundo a abordagem do estruturalismo: linguagem como instrumento de
comunicação:
A linguagem é um sistema de comportamentos potenciais, baseados
em símbolos convencionados. É sistema porque consiste em
ordenação de palavras; estas, por sua vez, constituem uma
ordenação de sons (letras). Nesta medida, pode-se dizer que a
linguagem é um tipo de comportamento complexo, pois implica num
encadeamento (PARANÁ, 1977a, p. 35).
A língua, no contexto, foi tratada como “conjunto de palavras ou de raízes” e,
ainda, como “conjunto de regras de combinação das palavras ou raízes em
enunciados ou sentenças” (idem). Assim, a compreensão que tinham da
aprendizagem da língua, neste caso para crianças da série, era a de que ela
acontece por meio da repetição mecânica de letras, sons, palavras, visto entender
que “a criança adquire comportamentos verbais não pela observação e
percepção de sons, mas também pelos comportamentos motores; isto é, aprende
por meio de ações sobre o ambiente, fazendo, praticando” (Ibidem, p. 36).
Para esclarecer a compreensão de língua, os autores do Currículo
apresentaram um exemplo de encaminhamento metodológico, partindo do princípio
de que, no processo de aquisição da escrita, “é importante se começar com palavras
92
fáceis, de interesse da criança
66
, de utilidade para ela” (Idem). Assim, a
alfabetização deveria organizar-se a partir da seguinte seqüência:
Aquisição do vocabulário – sons indiscriminados
- 1º oral - Aquisição de sílabas BA – BO.
- 2º escrito - Aquisição das primeiras palavras. Ex. Bola
- Início da formação de conceitos. Ex. dar o mesmo
nome para todas as bolas.
- Junção de palavras – Bola vermelha.
Aquisição de hábitos gramaticais
- 1º oral - Frases simples emitidas: Dá bola vermelha
- escrito - Formação de frases com artigos e preposições:
a bola vermelha.
- Formação de sentenças: Me dá a bola vermelha.
- Início do diálogo (PARANÁ, 1977a, p. 36).
O que fica evidente, na proposta, é que o trabalho com a oralidade precede o
da escrita. Tal encaminhamento está assentado na compreensão de que o aluno
aprenderia a ler e a escrever aquilo que já aprendeu a falar. O domínio da linguagem
oral era condição para a alfabetização e, em virtude disso, o ato de alfabetizar
deveria ser “precedido de uma fase de adaptação à escola em que o professor
procura tornar homogênea a linguagem de seus alunos” (idem). Esta fase foi
denominada como “Período Preparatório”
67
sobre a qual o professor era orientado
em relação às ações que poderia desempenhar com os alunos nos primeiros 20 dias
de aula.
O processo de alfabetização, diante da necessidade exposta pelo Currículo,
estava ancorado em cinco eixos: ouvir, falar, ler, escrever e raciocinar. O exemplo
seguinte ilustra bem o encaminhamento proposto:
Se os alunos falam “os menino brinca”, mas certa lição da cartilha
apresenta os meninos brincam”, o bom alfabetizador fará
antecipadamente exercícios em linguagem oral para que seus
alunos passem a falar normalmente a forma nova, para que leiam e
escrevam corretamente (PARANÁ, 1977a, p. 102).
66
Esse era um dos princípios que orientavam a Escola Nova ou a Tendência Liberal Renovada
Progressista. É possível inferir que, na cabeça dos educadores da época (no caso, aqueles que se
envolveram com a produção do Currículo), ainda predominava os ideários escolanovista, porém,
deveriam defender uma linha tecnicista que lhes era imposta.
67
RUOSO, Isolda Peixoto. Período Preparatório. Material impresso pelo sistema gráfico da
Associação Educacional do Oeste do Paraná – ASSOESTE, Cascavel Paraná, com o apoio técnico
e financeiro do PROJETO ESPECIAL MULTINACIONAL DE EDUCAÇÃO – MEC/OEA, 198?b.
93
Logo, a compreensão de alfabetização instaurada nos cinco eixos era a de
que o aluno aprenderia a partir da audição de palavras (corretas) proferidas pelo
professor, as quais deveriam ser repetidas (corretamente) quantas vezes fossem
necessárias para, depois, serem lidas (inicialmente no quadro) e, posteriormente,
escritas. Todavia, o princípio de todo o processo estava ancorado em “ouvir bem”,
uma vez que esta ação era interpretada como “raciocinar bem” (Idem, p.105).
Até a cada de 1970 (e até mesmo depois), muitos métodos e cartilhas
foram propostos para o exercício do alfabetizar
68
, destacando-se, no Brasil e
chegando até mesmo em algumas das escolas da região Oeste do Paraná, a
cartilha “Caminho Suave” de Branca Alves de Lima, por meio da qual muitos
(inclusive eu) foram alfabetizados. Eis um exemplo:
Pretendo evidenciar apenas o que foi amplamente utilizado e divulgado na
região, lembrando que, até aquele momento não havia ocorrido a municipalização
do ensino. As escolas das ries iniciais (principalmente as urbanas) pertenciam ao
Estado e eram administradas pelas Inspetorias de Ensino. Apenas as escolas
68
Para saber mais sobre os métodos e cartilhas de alfabetização, ler:
MORTATTI, Maria.R.L. Os sentidos da alfabetização (São Paulo: 1876-1994). São Paulo: Ed.
UNESP; CONPED, 2000.
______. Educação e letramento. São Paulo: Ed. UNESP, 2004.
SOARES, M.B. Alfabetização no Brasil: o estado do conhecimento. Brasília: INEP/REDUC, 1989.
94
multisseriadas das zonas rurais eram coordenadas pelas secretarias municipais de
educação.
Como exposto no primeiro capítulo, com a instalação do Projeto MEC/OEA
na região, e com o diagnóstico revelando um alto índice de reprovação e abandono
na 1ª série, adotou-se, no final da década de 1970 (mais precisamente a partir de
1977), na região, para atender às exigências do Currículo da SEED, o modelo de
alfabetização chamado “Erasmo Pilotto”. Conforme o próprio guia
69
explica:
É um processo que utiliza marcha sintética, através da técnica da
silabação. A palavra-chave serve de elemento introdutório, para dela
retirar-se a sílaba-chave. Esta sílaba, através da ênfase fônica dada
à vogal e sua junção à consoante, gerará a descoberta das
combinações das demais vogais com a mesma consoante (RUOSO,
198?a, p. 01).
Ao analisar o todo exposto na cartilha, fica evidente que atende
plenamente às orientações teórico-metodológicas do Currículo. Compreende o
processo de alfabetização numa perspectiva tecnicista (estruturado sob ações
mecânicas, tanto para o aluno quanto para o professor) e behaviorista
(condicionamento por meio do ouvir, falar/repetir, ler, escrever para então
raciocinar), que encaminha para ações que incidem sobre o comportamento do
aluno.
A criança era vista, naquele contexto, como alguém sem voz própria que
seria alfabetizada se, como foi dito, aprendesse a ouvir, pois “a língua se aprende
de ouvido” (PARANÁ, 1977a, p. 103); que aprenderia a ler e escrever se, antes,
dominasse oralmente a norma culta: “alfabetização pressupõe o correspondente
domínio da linguagem oral...” (idem, p. 101). Sendo assim, o saber ouvir e falar
deveria, necessariamente, anteceder a escrita, uma vez queo ouvir e o falar
precedem qualquer processo de alfabetização e devem acompanhá-lo” (Idem, p.
100).
Na mesma linha teórica do modelo Erasmo Pilotto, foi publicada a cartilha A
Porta Mágica
70
, estruturada conforme o todo sintético de alfabetização, com
ênfase no estudo das sílabas. Esse método foi adotado porque:
69
RUOSO, Isolda Peixoto. Processo de Alfabetização “modelo Erasmo Pilotto”. Material elaborado
pelo Centro de Treinamento do Magistério do Paraná CETEPAR, e impresso pela ASSOESTE,
Cascavel, com o apoio técnico e financeiro do Projeto MEC/OEA, 198?a.
70
RUOSO, Isolda Peixoto. A porta mágica. Cascavel: ASSOESTE, 1982.
95
É um processo fácil, que oferece ao professor condições de
desenvolver seu trabalho com segurança e simplicidade.
Inicialmente são estudadas as vogais, após aparecem as palavras-
chave (geradoras das sílabas-chave), formadas por sílabas simples
(consoante mais vogal) e, a seguir, as chamadas dificuldades
especiais (RUOSO, 1982, p. 03 – manual do professor).
Na realidade, a cartilha sistematiza o encaminhamento proposto pelo modelo
Erasmo Pilotto. Basta olhar para sua estrutura que já se identifica o método:
A autora foi uma das docentes que mais atuou na região, à época, “treinando
professores para o exercício da alfabetização em conformidade com tal metodologia.
Além da cartilha, como foi citado (cf. p. 73), ela elaborou e publicou, com o apoio
técnico e pedagógico do Projeto MEC/OEA, outros materiais pedagógicos para
auxiliar os professores.
96
Voltando-me, agora, para os demais Currículos da SEED (2ª, 3ª e 4ª séries)
71
,
estes não trazem uma discussão teórica extensa (subentendendo que a teoria de
base já foi exaustivamente explorada no currículo da 1ª série), porém partem de uma
“Apresentação” na qual recuperam, brevemente, a fundamentação psico-pedagógica
do behaviorismo, assim esquematizada
72
:
Para atingir o comportamento final desejado a partir dos objetivos
instrucionais, são apresentadas algumas orientações metodológicas com constantes
referências ao Currículo da rie, no qual as orientações encontram-se
sistematizadas. O índice aponta que os documentos focalizarão as quatro áreas do
conhecimento, assim como no Currículo da 1ª série: Comunicação e Expressão
(nome pelo qual passou a ser chamada a disciplina de Língua Portuguesa a partir da
Lei 5.692/71), Matemática, Estudos Sociais e Ciências.
A disciplina de Comunicação e Expressão dos Currículos de 2ª e séries
subdivide-se em cinco eixos:
Audição: neste eixo se define o que é a audição, qual sua importância na
aprendizagem e indica algumas atividades para o desenvolvimento de tal
habilidade.
Linguagem oral: são destacados os hábitos, atitudes e habilidades
essenciais para a linguagem oral, ressaltando a importância de um meio
71
PARANÁ, Secretaria de Estado da Educação; Departamento de Ensino de Grau; Equipe de
Currículo. Currículo: Elementos para o planejamento curricular na segunda série do ensino de
grau. Curitiba, Ano 3, nº 29, 1977b.
PARANÁ, Secretaria de Estado da Educação; Departamento de Ensino de 1º Grau; Equipe de
Currículo. Currículo: Elementos para o planejamento curricular na terceira série do ensino de grau.
Curitiba, Ano 4, nº 35, jul./1978.
PARANÁ, Secretaria de Estado da Educação; Departamento de Ensino de 1º Grau; Equipe de
Currículo. Currículo: Elementos para o planejamento curricular na quarta série
do ensino de grau.
Curitiba, Ano 5, nº 39, 1979.
72
In.: Currículo 2ª série, 1977b, p. 8; Currículo 3ª série, 1978, p. 8; Currículo 4ª série, 1979, p. 8.
Comportamento
de
Entrada
Situação
Estimuladora
Comportamento
Final
97
favorável (família, comunidade, escola) para o desenvolvimento da
oralidade na criança e apontando algumas atividades para esse fim. A
avaliação também é explorada, elencando práticas como: contar histórias,
ouvir histórias, ler histórias; fazer relato de passeios, de visitas, etc., com
sugestões de alguns textos.
A importância da leitura: é focalizada, teoricamente, a partir da
compreensão de que ler envolve os seguintes processos: “reconhecimento
visual dos símbolos; integração dos símbolos em palavras; associação das
palavras ao seu significado; comparação do que foi lido com as próprias
idéias para aceitação ou não das mesmas; aplicação do que foi aceito,
incorporando novas idéias para a própria vivência” (PARANÁ, 1977b, p.
104; PARANÁ, 1978, p. 97). São encaminhadas atividades para
exploração da leitura oral e da leitura silenciosa.
Desenvolvendo a expressão escrita: neste eixo enfatiza-se a necessidade
de produção de redações para o desenvolvimento da escrita dos alunos,
apresentadas em duas perspectivas: redação prática, que tem fins
sociais e práticos, atendendo à necessidade de comunicação social, e a
redação criativa, pela qual os alunos expressam, livremente, suas idéias,
pensamentos, experiências, emoções, sentimentos...” (Idem, p. 173; Idem,
p. 162). Para isso, apresenta uma série de sugestões de
encaminhamentos práticos.
Gramática: este eixo está ancorado na concepção de que a gramática se
aprende ouvindo, falando corretamente, repetindo estruturas (frases)
corretas, seguindo bons modelos de linguagem:
O ensino de gramática nas turmas de a séries deverá ser
assistemático, isto é, o aluno será levado à aprendizagem das
estruturas lingüísticas através de exercícios constantes, repetidos,
até automatizá-las (técnica da insistência), pois se a língua é hábito,
adquire-se o hábito pela prática
(PARANÁ, 1977b, p. 244;
PARANÁ, 1978, p.
230).
Condena o uso de nomenclaturas, pois “o professor não deve dar aulas do
tipo substantivo é a palavra que designa um ser. Que aprenderá realmente o nosso
aluno decorando a definição acima?” (Idem, p. 245; Idem, p. 231).
98
o Currículo da 4ª série (PARANÁ, 1979) organiza-se a partir dos seguintes
eixos:
Expressão oral: no qual se enfatiza a oralidade a partir de conversas,
discussões, entrevistas, coros falados, dramatizações, reproduções de
histórias e jornais falados, trazendo, para cada um, propostas de
atividades.
Uma aula de leitura: orienta a leitura a partir de cinco estágios: estágio
preparatório (que antecede a alfabetização); estágio inicial (alfabetização
propriamente dita); progresso rápido na leitura básica (3ª a ries);
expansão de experiências e aumento rápido da eficiência na leitura (6ª a
séries); aperfeiçoamento das habilidades, das atitudes e do gosto pela
leitura (fase final e séries). Partindo de uma breve explicação dos
estágios, estabelece “hábitos e atitudes básicas para a leitura” (PARANÁ,
1979, p. 45), pautando-se na classificação de Russel
73
.
Expressão escrita: é tratada como uma ação por meio da qual o aluno
pode “aliviar tensões internas, liberar criatividades. Redigir é por no papel
idéias e sentimentos” (Idem, p. 70). São apresentadas algumas formas de
encaminhamento, entendendo a expressão escrita como a ação de
escrever frases a partir de palavras dadas, agrupar palavras com
proximidades semânticas, produzir histórias a partir de títulos ou figuras,
produzir o início e/ou final de uma história, completar diálogos, entre
outras tantas sugestões.
Ortografia: enfatiza-se o trato correto com a palavra que deve ser fixada,
principalmente, por meio de atividades que exijam sua repetição. O ditado
também é tomado como um encaminhamento prático capaz de garantir a
escrita correta das palavras. São apresentadas, ainda, atividades como:
preencher lacunas, juntar sílabas, completar o início ou final das palavras.
Gramática: nesse eixo do Currículo de série, contrário aos demais dos
outros Currículos, a nomenclatura é retomada, embora se ressalte que
não deve ser enfatizada. Trabalha-se, então, com as classes de palavras
e suas flexões, apresentando atividades estanques para exploração das
mesmas.
73
RUSSEL, Marian E. Didáctica de lãs ciências aplicada a la escuela elemental. Editorial Trillas,
1972.
99
2.1.1.1 A gramática como objeto de ensino
Numa análise mais atenta dos Currículos (2ª, e séries), teria muito que
comentar sobre cada eixo, porém, obedecendo ao recorte da pesquisa, reportar-me-
ei, mais especificamente, ao eixo da gramática.
Os aspectos teóricos abordados em relação ao ensino da gramática se
mostram, a princípio, mais coerentes com os pressupostos psicológicos do
behaviorismo e com a abordagem estruturalista da linguagem, pois inferem que a
criança aprende a “ler e a escrever” ouvindo, falando, lendo, escrevendo, enfim,
repetindo ações com a linguagem, sem, necessariamente, relacioná-las a situações
reais de uso. E quando o faz, o “uso” está vinculado à linguagem culta, única forma
reconhecida pela escola. Para isso, apresentam, de acordo com o viés tecnicista,
passos para orientar o professor na condução da prática na sala de aula, no trato
com os conteúdos.
Entretanto, na tentativa de contemplar, também, uma abordagem
funcionalista, criticam, a princípio, o ensino da gramática como até então era
compreendido pela escola tradicional (normas, regras para bem falar e escrever),
sem deixar de reconhecer as estruturas formais da língua. Ao contra-argumentar a
gramática normativa, dizem que “o conhecimento da gramática não assegura a
correção no falar e no escrever. O conhecimento da forma gramatical correta não
significa que será usada corretamente no momento oportuno” (PARANÁ, 1979, p.
243), pois, como defendem os funcionalistas, o importante é garantir, ao falante, o
domínio da língua no seu momento de uso. Dessa forma, o Currículo da série
propõe que o ensino da gramática repouse, por exemplo:
(...) nas atividades de linguagem oral e escrita. Através do ouvir, ler,
escrever, contar histórias, fazer dramatizações, relatar experiências,
escrever cartas etc. o aluno é levado a perceber a importância do
uso de estruturas corretas. Sente-se que utilizando-as suas idéias
tornam-se mais claras e é melhor compreendido” (Idem, p. 243).
Mesmo apresentando, a princípio, todo um ideário de renovação da prática de
ensino da gramática, é possível inferir, no interdito, que a maneira de compreendê-la
assenta-se, ainda, na concepção que defende a linguagem como transmissão do
pensamento, quando diz que ao se utilizar de formas corretas na expressão verbal,
100
o aluno terá as idéias mais claras. E, quando se refere à linguagem em uso, não
está tratando das funções sociais que a língua pode ter, mas sim, das práticas de
linguagem que a escola deve proporcionar. Dessa forma, o uso da língua reduz-se a
exercícios de fala, de audição, de escrita que se faz na e para a escola.
A prática fora do contexto destaca-se ao apresentar, como exemplo, algumas
atividades de “uso” da língua, pautadas em “sentenças modelos”, as quais deveriam
ser seguidas sistematicamente. Mesmo que, em seguida, enfatize a o
necessidade da nomenclatura, no caso, do uso dos termos “plural” e “singular”, as
atividades não avançam para questões reais de sua aplicação social, pois se
esgotam nos espaços preenchidos. É o que mostra a atividade seguinte:
A compreensão de ensino de língua, no Currículo, está amparada na idéia de
que o aluno aprende a partir da leitura, da audição e da escrita de bons modelos de
estruturas frasais, retirados, muitas vezes, de autores literários de renomado valor. E
nisso se ancoram atividades como:
No Currículo da série, as nomenclaturas o mencionadas nas atividades
gramaticais propostas, sem desconsiderar os exercícios estruturais:
1- COMPLETE A CONVERSA:
a) Você viu os livros? – Eu vi um..................................
b) Você olhou os quadros? – Eu olhei um .....................
c) Você pintou as cores do céu? – Eu pintei a ............ do céu.
d) Você vê as luzes? – Eu vejo a ....................................
(Currículo 2ª série, 1977b, p. 244)
2- FAÇA CONFORME COMEÇAMOS:
a) João amou Maria profundamente.
João amou-a profundamente.
b) A professora preparava a lição com carinho.
A professora ................................... com carinho.
c) Cantava a canção alegremente.
............................. alegremente.
d) Levou a bicicleta para o filho.
.............................. para o filho.
(Currículo 3ª série, 1978, p. 234)
101
Evidencia-se, em relação ao tratamento dado à gramática nos currículos,
especialmente de 2ª a 4ª séries, que está atrelado à gramática normativa.
Em termos gramaticais, sem o abandono do ensino da gramática
tradicional, focaliza-se o estudo dos fatos lingüísticos por intermédio
de exercícios estruturais morfossintáticos, na busca da
internalização inconsciente de hábitos lingüísticos, próprios da
norma culta (PERFEITO, 2005, p. 36).
A valorização à gramática ampara-se na crença de que seu ensino
sistemático permitiria, ao sujeito, maior domínio das estruturas lingüísticas e,
conseqüentemente, maior capacidade de raciocínio. Diante de tal compreensão,
conforme explica Britto (1997), garantir o ensino da norma culta é garantir uma
unidade superior da língua ou condição prévia de acesso à cultura ou “ensinar língua
é ensinar as estruturas da língua bem como os comportamentos adequados para as
diferentes situações em que a linguagem se faz necessária” (SILVA, 1994, p. 13).
Esta aprendizagem estaria garantida em atividades de memorização, classificação e
denominação da gramática normativa (teoricamente criticada pelo currículo).
2.1.1.2 Modelo de formação adotado no estudo da proposta pedagógica
Até o ano de 1975, como já mencionado anteriormente, a preocupação com a
formação continuada dos professores quase não existia e, quando acontecia algum
evento destinado a esse fim, o professor era convocado, na maioria das vezes, a
deslocar-se até o CETEPAR, em Curitiba, para participar de “treinamentos”, como
era então chamado. Em alguns momentos, as Inspetorias de Ensino era quem os
organizavam e, quando isso acontecia, os cursos se realizavam nas cidades-pólo da
região. Nos momentos de formação, o Currículo era o objeto de estudo e os
professores eram preparados para trabalhar com os conteúdos nele propostos, de
acordo com a orientação teórico-metodológica.
2- Passe para o aumentativo:
a) Não é mais um cão. É um canzarrão
b) Não é mais um rapaz. É um ..........................................
c) Não é mais uma cada. É um...........................................
d) Não é mais um animal. É um .........................................
(Currículo 4ª série, 1979, p. 143)
102
Porém, com a implantação do Projeto MEC/OEA (1975 a 1984), houve um
período muito dinâmico relativo às ações planejadas com o propósito de garantir a
continuidade da formação do professor. A preocupação despontou-se a partir do
momento em que o diagnóstico educacional revelou a real situação do ensino na
região. Na tentativa de amenizar o problema, os educadores envolvidos no Projeto
elaboraram um prognóstico (cf. p. 69), no qual contemplaram um subprojeto,
denominado “Treinamento”, resultando em cursos, principalmente, para os
professores alfabetizadores.
Foram treinados 91 professores alfabetizadores no modelo Erasmo
Pilloto e os resultados obtidos, ao final do ano, foram muito
significativos. Como esta experiência de alfabetização obteve
resultados satisfatórios, ainda que aplicada em poucas escolas, o
Projeto Especial de Educação MEC/OEA e o CETEPAR resolveram
estender este curso aos municípios da 21ª Microrregião do Paraná,
a partir de 1976, envolvendo 2.421 professores (ANDRADE,
PACHECO, EMER e KUIAVA, 1982, p. 15-16).
No início, a proposta era atender apenas aos professores da zona rural, visto
que a maioria deles não estava habilitado para a função, tinha pouco acesso a
material didático-pedagógico e atuava em classes multisseriadas, de onde
originavam taxas de reprovação e abandono muito elevadas na série. Porém,
devido aos resultados apresentados no ano de 1976, os órgãos parceiros
(MEC/OEA, CETEPAR, Secretarias Municipais e Inspetorias Regionais de Ensino)
se propuseram a elaborar um projeto mais amplo, estendendo-o para todos os
professores alfabetizadores dos municípios de Toledo, Cascavel e Foz do Iguaçu.
O modelo Erasmo Pilotto foi novamente selecionado, na tentativa de elevar os
índices de aprovação na referida série. Assim, foram aplicados “cursos de 40 horas
para 129 professores alfabetizadores em Cascavel, 121 professores em Foz do
Iguaçu e 86 em Toledo, no período de 12 a 17 de fevereiro de 1979” (Idem, p. 17).
Os cursos foram realimentados no período de a 03 de agosto do mesmo ano, em
24 horas, com o acompanhamento de um supervisor do CETEPAR, de supervisores
de ensino das Inspetorias e Secretarias Municipais. No momento, avaliaram os
resultados obtidos com a aplicação dos cursos, analisaram as dificuldades
encontradas e a eficiência ou deficiência do método.
A partir dos resultados, a formação estendeu-se para outros municípios. Um
elemento que comprova tal informação, é o Certificado de Participação (anexo 1) de
103
uma professora das séries iniciais que, entre os meses de março e agosto de 1979,
freqüentou 120 horas, no município de Guaraniaçu, do Curso de Aperfeiçoamento
de Professores para a Implantação do Ensino de 1º grau, certificado pelo CETEPAR.
Conforme a descrição sumária do evento, o mesmo dividiu-se em quatro focos:
alfabetização (quando discutiu as bases do período preparatório, os princípios e
técnicas de alfabetização, incluindo, especialmente, os passos essenciais do método
Erasmo Pilotto); atividades de a séries (Matemática, Comunicação e
Expressão, Integração Social e Ciências); didática na sala de aula (enfatizando
técnicas de ensino); e estrutura e funcionamento do ensino de grau (com ênfase
no sistema de avaliação). Em 1980, foram oferecidas mais 24 horas de treinamento
num Encontro para Professores das Séries Iniciais do Ensino de Grau, para
Realimentação de Técnicas de Alfabetização, Micro-Região 21.
De acordo com um relato do Professor Jovino Miguel da Silva, que naquela
época trabalhava numa escola multisseriada da zona rural de Guaraniaçu, o
treinamento consistia em, no mínimo, uma semana e, em cada dia, enfocava uma
disciplina. Mas os professores da zona rural, que trabalhavam, assim como ele, com
as quatro séries (1ª a 4ª), chegavam a ficar 30 dias em treinamento, visto que cada
semana era destinada a uma série. Como o modelo Erasmo Pilotto organizava-se
por meio de 19 fichas
74
, os docentes, nos treinamentos, tinham que decorá-las,
seguindo os passos descritos em cada uma.
O todo determinava, ainda, que durante o primeiro semestre seria
trabalhado com as sílabas simples e, somente no segundo semestre, com as sílabas
“complexas”.
Este foi um método imposto (ação própria da Escola Tecnicista) não à
região Oeste, mas a todo o Estado do Paraná, e coube aos alfabetizadores da
época tomar a proposta didática como um receituário, decorando, passo a passo, o
que cada ficha propunha. A título de exemplo, a Ficha 6 continha a seguinte
orientação:
74
Ficha 01 Recomendações básicas; Ficha 02 Apresentação dos nomes; Ficha 03 Ensino das
vogais a i; Ficha 04 Pesquisa das vogais a i; Ficha 05 Ensino das outras vogais; Ficha 06
Apresentação da palavra-chave bola”; Ficha 07 Apresentação da sílaba “bo”; Ficha 08
Apresentação da sílaba la”; Ficha 09 Exploração da sílaba “bo; Ficha 10 Recapitulação da ficha
9; Ficha 11 Exploração da sílaba “la”; Ficha 12 Recomendações sobre exercícios de cópia; Ficha
13 Recomendações sobre a insistência no processo de formação da sílaba o...bo; Ficha 14
Formação de palavras; Ficha 15 Recapitulação das palavras formadas na ficha 14; Ficha 16
Treino auditivo; Ficha 17 Formação de sentenças; Ficha 18 Demais palavras-chave em sílabas
simples; Ficha 19 – Palavras-chave com dificuldades especiais (RUOSO, 198?a, p. 02).
104
Paralelamente à formação dos alfabetizadores, desde 1977, docentes da
INIJUÍ/FIDENE e, dentre eles, João Wanderley Geraldi (que, na época, trabalhava
nesta instituição de ensino superior), atuavam na região, com a formação de
professores de outras séries (3ª e e de a ries). Aconteceram cursos,
dessa ordem, em Medianeira, em Foz do Iguaçu e em outras localidades, revelando,
ainda timidamente, uma outra abordagem para o ensino da Língua Portuguesa que
iria revolucionar as discussões pedagógicas anos depois. Todavia, muitos dos
cursos, segundo depoimento do próprio autor
75
, não foram concluídos devido a
problemas políticos decorrentes do regime vigente (ditadura militar).
2.2 Segunda Fase (década 1980 até meados da década de 1990): Linguagem
como Meio de Interação
Os anos de 1980, além da democratização política, chegaram deflagrando um
intenso processo de revisão e de questionamento do sistema de ensino em vigor.
Enquanto a região Oeste vivia um momento de revitalização da educação com
ações desencadeadas pelo Projeto MEC/OEA e, mais especificamente, com a
75
Em entrevista concedida no dia 08 de junho de 2007, em Campinas.
FICHA 6
APRESENTAÇÃO DA PALAVRA
-
CHAVE “bola”
- Mostrar às crianças uma bola (ou uma gravura).
- Fazer as perguntas que seguem:
01. Que é que tenho na mão (ou “Que é que vocês estão vendo na gravura”)?
R. bola
02. Vou escrever no quadro, bola.
03. Que foi que eu disse que ia escrever no quadro?
R. bola
04. Então, que é que está escrito aqui?
R. bola
05. Leiam todos:
R. bola
06. Mais uma vez, leiam todos:
R. bola
07. Muito bem! Você ................., que é que está escrito aqui?
R. bola
08. Leia o que esta escrito aqui, ..................?
R. bola
09. ......................, leia você!
R. bola
10. Você..............................!
R.
bola
105
criação da ASSOESTE, novos discursos, em grande parte do país, ganhavam força
e se entrelaçavam. Estou falando de novas abordagens para uma concepção de
homem e sociedade, vindos da Filosofia; de outras compreensões sobre o
desenvolvimento da aprendizagem, ditadas pela Psicologia; de outros modos de
pensar a educação, discutidos pela Pedagogia; e, finalmente, de outra maneira de
compreender a linguagem, interpretada por correntes de estudos da língua,
reunidas, conforme Geraldi (1984) e Travaglia (1996), sob o rótulo da Lingüística da
Enunciação ou, segundo Morato (2004), como Lingüística Interacional.
Antes de focalizar a região Oeste, avalio como importante relembrar tais
vieses teóricos, que foram determinantes das ações que se concretizaram com os
professores.
A noção de interação o é desta década. Na realidade, ela surgiu, como
categoria de análise, nos anos de 1960. Porém, foi somente no final dos anos de
1970 e início dos anos de 1980 que a corrente teórica ganhou força no âmbito da
Filosofia ou da Sociologia, a partir da influência e prestígio da obra de Mikhail
Bakhtin (1895-1975) do campo da Lingüística. Tais reflexões se acentuam:
(...) com a introdução de uma concepção histórico-discursiva de
sujeito e da afirmação de uma ordem social na qual se inscreve a
linguagem, vista a partir de uma perspectiva dialógica. (...) Uma boa
expressão de uma teoria social forte aplicada ao entendimento de
noção de interação, com influência decisiva em vários domínios e
tendências teóricas da Lingüística, é sem dúvida representada por
Bakhtin e seu Círculo (MORATO, 2004, p.330).
Freitas relata como foi a chegada de Vygotsky e Bakhtin ao Brasil:
Vygotsky e Bakhtin romperam as barreiras do silêncio e da Rússia,
no final da década de 50, levaram, pois, 20 anos para chegar ao
Brasil. É aqui desembarcaram sem avisos de chegada, sem
comitivas de recepção, sem notícias na imprensa. Fizeram escalas
em outros países: Itália, Espanha, Inglaterra, França. Sem destino
certo, sem reservas de hotel, foram se alojando após encontros
fortuitos, nas casas de professores de Psicologia, de Letras, de
Educação que acabaram se tornando seus admiradores e amigos.
Foram por eles apresentados a outras pessoas e ingressaram
timidamente no meio acadêmico. Surgiram os primeiros textos, as
primeiras traduções, algumas até bem artesanais (FREITAS, 1994,
p. 38).
Com o início do processo de abertura política e distensão gradual do regime
militar, emergiram discursos aentão sufocados, principalmente sobre a educação,
106
ancorados em denúncias à pedagogia oficial. Os discursos ecoaram, principalmente,
nas academias e nos muitos encontros, congressos e seminários nacionais, bem
como em numerosas publicações que pretendiam divulgar esta nova relação entre o
homem, a sociedade e a linguagem, a educação e o trabalho, a teoria, a prática e as
formas de aprendizagem, principalmente da língua(gem).
Se até aquele momento a relação entre o homem e a sociedade era explicada
como ação daquele sobre o meio ou do meio sobre o sujeito, uma outra concepção
começou a ser divulgada: a de que a linguagem, entendida como atividade
constitutiva do conhecimento humano era “ao mesmo tempo estruturante do nosso
conhecimento e extensão (simbólica) de nossa ação sobre o mundo” (MORATO,
2004, p. 317).
A linguagem passou a ser interpretada como ação humana mediadora entre o
homem e a sociedade, por ajudá-lo a entender, interpretar, representar, influenciar,
modificar, transformar a realidade. Assim, no contexto da interação entre o homem e
o meio, as relações de mediação ocorrem na e pela linguagem. Essas relações
podem ser traduzidas como:
(...) o que a natureza ao homem ao nascer não lhe é suficiente
para viver em sociedade, sendo necessário estabelecer relações
humanas com o mundo. Toda individualidade do homem é
apropriação da realidade social que forma as faculdades específicas
(AMOP, 2007, p. 49).
Esta compreensão de homem e sociedade ampara-se nos pressupostos
filosóficos do Materialismo Histórico Dialético de Marx para quem o homem se
apropria da realidade pelo “movimento do pensamento que é apenas a reflexão do
movimento real, transportado e transposto no cérebro do homem” (MARX,1975, p.
74) ou, parafraseado por Wachowicz, “o real é anterior ao pensamento e subsiste a
ele. É a tese materialista fundamental: a exterioridade e a interdependência da
realidade, com relação ao homem” (WACHOWICZ, 2001, p. 34).
O marxismo pressupõe que o homem, ao explorar o meio para suprir suas
necessidades imediatas, cria novas carências, as quais lhe impõem o planejamento
de ações. E, para isso, desenvolve funções psíquicas que possibilitam refletir sobre
o real, recriando-o num processo de abstração.
Para entender o pressuposto dialético do materialismo marxista, é preciso
entender, primeiro, que o ponto de partida do método está na abstração, isto é,
107
começa no abstrato e eleva-se até o concreto, produzindo um concreto novo, porque
foi pensado, planejado.
A compreensão de homem e sociedade defendida por Marx alterou,
substancialmente, o entendimento que se tinha, até então, do desenvolvimento da
aprendizagem. As desigualdades intelectuais não foram mais vistas como frutos da
natureza biológica, mas sim, como resultantes das relações sociais economicamente
desiguais.
Na mesma direção, o maior expoente nos estudos da cognição relacionados
às atividades socioculturais foi, sem dúvida, o psicólogo bielorusso Lev
Semyonovich Vygotsky (1896-1934), para quem a gênese e o desenvolvimento
cognitivo são facultados à linguagem e às interações sociais.
Quando se focaliza hoje o estudo da cognição em meio às
atividades socioculturais dos sujeitos e na presença de uma ordem
da linguagem que não reduz ao sistema lingüístico stricto sensu, o
fato não deixa de representar, de alguma forma, um legado da
abordagem levada a cabo inicialmente por autores como Vygotsky
(MORATO, 2004, p. 324).
Associada a tal enfoque psicológico, a Lingüística analisou vários fenômenos,
dentre eles, o contexto pragmático, que ganhou maiores explicações fundamentadas
na vertente sociocultural da cognição humana.
Leontiev compartilhou das idéias de Vygotsky, ao afirmar que “as aptidões e
caracteres especificamente humanos não se transmite de modo algum por
hereditariedade biológica; mas adquirem-se no decurso da vida por um processo de
apropriação da cultura criada pelas gerações precedentes” (LEONTIEV, 1954, p.
267). Em outras palavras, o conhecimento, sob o ponto de vista da psicologia social,
se constrói mediado pelas relações histórico-culturais que determinam o meio.
A linguagem, sob tal perspectiva teórica, deixou de ser interpretada somente
como resultado do pensamento organizado ou como estrutura cognitiva e lingüística,
mas foi reconhecida como símbolo sócio e historicamente construído a partir de
necessidades reais de interação do homem geradas pelo trabalho, para atender às
práticas sociais com a linguagem.
A educação, por sua vez, também ganhou uma outra dimensão: passou a ser
vista como fenômeno social e histórico que participa diretamente das mudanças
108
sociais, sendo, ao mesmo tempo, determinada socialmente e determinante de
transformações. Pela educação:
(...) incidindo sobre o desenvolvimento histórico-objetivo dos
modelos sociais e utilizando-se dos postulados teórico da
concepção Dialética da História, tornou possível a formação de uma
nova consciência: a do relativismo da determinação da educação
pela sociedade e das possibilidades da educação no processo de
transformação social (SILVA, 1994, p. 7).
Essa visão pedagógica de ensino, no Brasil, sustentou-se nos postulados de
Saviani (1991) que, na tentativa de superar os limites da pedagogia não-crítica e da
teoria crítico-reprodutivista, empenhou-se em analisar e compreender a questão
educacional a partir do desenvolvimento histórico-objetivo, pressuposto no
materialismo histórico marxista. Amparado no olhar pedagógico para as bases
sociológicas de Marx, Saviani propôs a Pedagogia Histórico-Crítica
76
que pretendia
“reter o caráter crítico de articulação com as condicionantes sociais que a visão
reprodutivista possui, vinculado, porém à dimensão histórica que o reprodutivismo
perde de vista” (SAVIANI, 1991, p. 75).
Para o educador, a nomenclatura de Pedagogia Histórico-Crítica deve ser
considerada como sinônimo de Pedagogia Dialética, pois tem como objetivo a busca
de um pensamento crítico dialético para a educação. No entanto, preferiu denominá-
la desse modo não só para estimular a curiosidade dos leitores e criar oportunidades
de debater o tema, mas também para evitar uma interpretação idealista da dialética
ou mesmo a visão errônea da palavra, considerando o conceito pessoal que cada
leitor tem dela.
No berço de tais discussões sociológicas, filosóficas, psicológicas e
pedagógicas, e comungando da compreensão de homem/sociedade/linguagem
/educação que fundamenta estas reflexões teóricas, a ASSOESTE surgiu,
incorporando, desde o início, os postulados da corrente Histórico-Crítica, por
acreditar na concepção dialética do ensino, sustentada pelos ideários do
materialismo histórico.
76
Saviani é o autor dessa proposta pedagógica de ensino, discutida e, posteriormente, publicada em:
SAVIANI, Demerval. Pedagogia histórico-crítica: primeiras aproximações. 2. ed. São Paulo:
Cortez/Autores Associados, 1991.
109
Em outras palavras, a ASSOESTE tinha, como princípio básico, que a
educação deveria ser reconhecida como elemento mediador de transformações
sociais por meio do favorecimento de práticas capazes de integrar o indivíduo com o
meio. Assim, o método pedagógico adotado (e propagado nos cursos de formação)
sustentava-se no reconhecimento da prática social, na qual professor e alunos estão
inseridos, mesmo que em posições distintas. Compreender estas relações, propor
soluções para os problemas encontrados, refletir teoricamente sobre a organização
social e sentir-se integrante do processo eram os objetivos que, para a ASSOESTE,
deveriam permear a construção do conhecimento.
2.2.1 Reorientações teóricas nos estudos da linguagem
Em relação, mais especificamente, aos estudos da linguagem, as orientações
filosóficas, psicológicas e pedagógicas de educação, apresentadas no item anterior,
de uma forma ou de outra, transpareceram nos estudos lingüísticos que ganharam,
conforme posto, o rótulo de Lingüística da Enunciação ou Lingüística Interacional.
Os estudos se distribuíram em várias correntes teóricas Semântica Enunciativa,
Pragmática, Análise do discurso, Análise da conversação, Lingüística Textual,
Sociolingüística, Lingüística da Enunciação, dentre outras as quais se pautam
numa posição externalista da linguagem. Tais vertentes
(...) se interessam não apenas e tão somente pelo tipo de sistema
que ela é, mas pelo modo através do qual ela se relaciona com seus
exteriores teóricos, com o mundo externo, com as condições
múltiplas e heterogêneas de sua constituição de funcionamento
(MORATO,
2004, p. 312)
.
Na realidade, o que estas correntes m em comum é o fator histórico de
terem se estabelecido como disciplinas dentro de uma ciência específica: a
Lingüística, e a base na filosofia da linguagem, elevando a interação à condição de
princípio explicativo dos fatos da língua. Amparadas neste pressuposto, não mais
trataram do estudo de palavras ou de frases isoladas, mas relacionadas ao texto, ao
contexto sócio-histórico e ao(s) usuário(s) que as produziram. Estou me referindo a
110
uma nova concepção de linguagem: a concepção interacionista ou
sociointeracionista
77
que passa a tratar a língua como elemento histórico.
A compreensão da linguagem relacionada a um sujeito real (e não ideal) e ao
contexto de produção teve, em Benveniste, seu lugar de fundação. Para o lingüista:
A linguagem reproduz a realidade (...) aquele que fala faz renascer
pelo seu discurso o acontecimento e a sua experiência do
acontecimento. Aquele que ouve apreende primeiro o discurso e
através desse discurso, o acontecimento é reproduzido
(BENVENISTE,1976, p. 26).
A afirmação do autor pode ser traduzida numa proposta de, ao trabalhar com
a linguagem, transcender às estruturas lingüísticas exaustivamente exploradas, para
dar atenção às condições de emprego das formas em determinada situação de uso
real da língua. Como explica Maciel (2002/2003), sob este prisma a língua deixa de
ser entendida como abstrata e homogênea e passa a ser vista como uma realização
concreta e heterogênea.
Benveniste não deixou de lado a visão da língua como sistema/ estrutura,
todavia, o enfoque maior voltou-se para a língua em funcionamento, na produção de
enunciados concretos, carregados de enunciação(ões), determinada(s) pelos
interlocutores, num dado momento histórico, num contexto social definido. Nas
palavras do autor:
A que então se refere o eu? A algo de singular que é muito
lingüístico: eu se refere ao ato de discurso individual no qual é
pronunciado e lhe designa o locutor. É um termo que não pode ser
identificado a não ser dentro do que, noutro passo, chamamos uma
instância de discurso, e que tem referência atual. A realidade a
que ele remete é a realidade do discurso. É na instância do discurso
na qual eu designa o locutor que este se enuncia como “sujeito”. É
portanto verdade ao da letra que o fundamento da subjetividade
está no exercício da língua (BENVENISTE, 1995, p. 288).
E complementa:
Não atingimos nunca o homem separado da linguagem e não o
vemos nunca a inventando. Não atingimos jamais o homem
reduzido a si mesmo e procurando conceber a existência do outro. É
um homem falando que encontramos no mundo, um homem falando
77
A qual irei referir-me, a partir daqui, como (sócio)interacionista, na perspectiva de preservar, dessa
forma, suas denominações.
111
com outro homem, e a linguagem ensina a própria definição de
homem
(Idem, p. 285).
Tais discussões foram aprofundadas e exaustivamente analisadas sob
diferentes aspectos. Vale ressaltar, mais especificamente, os estudos da
Pragmática
78
e da Análise do Discurso (AD)
79
. Da Pragmática porque “sua riqueza
está em pensar o fenômeno lingüístico não apenas como língua, mas, sobretudo,
como linguagem” (SUASSUNA, 1995, p. 78). Portanto, daria conta de explicar o
extralingüístico, incluindo novos fatores como texto, contexto, intenções e atitudes
dos falantes em relação à prática da língua. Da AD por investigar a linguagem,
levando em conta o seu caráter discursivo, ampliando a noção de sujeito proposta
por Benveniste e explicando as condições de produção como fatores fundamentais
para a atribuição de significados estabelecidos no e pelo discurso.
Compreendida dessa forma, numa situação real de interação não mais
lugar para conceber a linguagem como unilateral (emissor que fala para
receptor), como se apenas um falasse e o outro não demonstrasse nenhuma
reação. Trata-se de entender tal processo numa relação de interlocução, momento
em que os sujeitos envolvidos no discurso (locutor e interlocutor) trocam idéias por
meio do uso da linguagem, influenciados pelo contexto sócio-histórico-ideológico no
qual estão inseridos. Assim, os propósitos de Jakobson para definir as funções da
linguagem adquirem outra dimensão: a da perspectiva dialógica em uma
determinada situação de interação.
Em Bakhtin (1988), sustenta-se o caráter dialógico da linguagem, para quem
a verdadeira substância da língua é constituída pelo fenômeno social da interação
78
Conforme Pinto (2001), Mey (1985) publicou estudos teóricos sobre a relação entre signos e
falantes; o filósofo inglês J. L. Austin propôs o conceito de Atos de fala para debater a relação entre o
que diz e o que se faz; Pierce (no pragmatismo americano) estabeleceu uma relação entre signo,
objeto e interpretante, destacando, como seus principais seguidores, William James e Charles Morris;
Donald Davidson e Richard Rorty acrescentaram, aos estudos pragmáticos, uma perspectiva
historicista; Moore coordenou o movimento conhecido como Filosofia Analítica ou Filosofia da
Linguagem, resultando no que ficou denominado como Teoria dos Atos de Fala, a qual concebe a
linguagem como ação; John Searle reafirmou a teoria de Austin, introduzindo a noção de proposição.
79
De acordo com Mussalim (2001), a AD é uma disciplina que teve sua origem na França, na década
de 1960, por Jean Dubois (lingüista e lexicólogo) e Michel Pêcheux (filósofo envolvido com os
debates em torno do marxismo). Tecendo críticas ao Estruturalismo saussureano, Pêcheux propôs
uma semântica do discurso, oferecendo reflexões sobre as condições de produção. Althusser (outro
filósofo), seguindo a linha marxista de Pêcheux, encontrou, na Lingüística, o lugar ideal para estudar
a linguagem e, nesse contexto, nasceu o Projeto da AD. Foi pela AD, portanto, que surgiu um novo
conceito de sujeito (sustentado inicialmente em Lacan), de discurso (relacionado a um contexto
histórico-social), de formação discursiva, de sentido, entre outros.
112
verbal, no qual toda enunciação é um diálogo, visto que cada enunciado pressupõe
aqueles que o antecederam e outros que o sucederam.
O autor não está reduzindo a palavra “diálogo” a uma relação face a face.
Seu conteúdo “diz respeito à teoria da dialogização interna do discurso”
(MUSSALIM, 2001, p. 127). Para Bakhtin, quando o sujeito usa a palavra, encontra-
a habitada por falas de outras pessoas, o que significa dizer que o discurso é
clivado por outras vozes, resultantes de leituras, conversas, culturas anteriores.
Assim, “as relações dialógicas são relações de sentido, quer seja entre os
enunciados de um diálogo real e específico, quer seja no âmbito mais amplo do
discurso das idéias criadas por vários autores ao longo do tempo e em espaços
distintos” (SOUZA, 1994, p. 98).
A AD explica as condições de produção de um discurso, traduzidas por
Pêcheux (1969) naquilo que ele chama de jogo de imagens, ao sintetizar os
elementos que interferem (ou entram em jogo) no momento da interação verbal:
1. A imagem que o sujeito, ao enunciar o seu discurso, faz:
a) do lugar que ocupa;
b) do lugar que ocupa seu interlocutor;
c) do próprio discurso ou do que é enunciado.
2. A imagem que o sujeito, ao enunciar o seu discurso, faz da
imagem que seu interlocutor faz:
a) do lugar que ocupa o sujeito do discurso;
b) do lugar que ele (interlocutor) ocupa;
c) do discurso ou do que é enunciado
(Apud MUSSALIM, 2001,
p. 137).
Para a autora, o jogo é preestabelecido antes do discurso, mas vai se
constituindo à medida que o próprio discurso se constitui. Isto significa que “o sujeito
não é livre para dizer o quer, a própria opção do que dizer é em si determinada
pelo lugar que ocupa no interior da formação ideológica à qual está submetido”
(idem). O sentido, nesse contexto de enunciações, depende da relação estabelecida
entre quem fala, para quem fala, em que lugar, quando, por que e/ou com que
finalidade. O sentido é construído, portanto, pelo contexto sócio-histórico-ideológico.
Em síntese: no berço da Lingüística da Enunciação ou da Lingüística
Interacional surgiu outra maneira de conceber a linguagem, o (sócio)interacionismo,
gerando novas compreensões de língua. Retomaram-se as discussões da correção
lingüística, das práticas de leitura, da prática de produção textual e do ensino da
gramática agora sob olhares renovados.
113
A eleição do fenômeno social da interação verbal, como espaço
próprio da realidade da língua, lugar de produção da linguagem,
centro organizador e formador da atividade mental e da expressão,
faz com que adquiram importância na sala de aula as práticas de
uso efetivo da língua no dizer-ouvir-escrever-ler, retomadas agora
como processo interlocutivos marcados socialmente e os sujeitos
que as realizam, enquanto sujeitos situados cultural, social e
historicamente (
SILVA, 1994, p. 16).
As diferentes instâncias sociais começaram a ser consideradas, visto que o
processo de interlocução passou a ser compreendido no interior das complexas
instituições de uma dada formação social. Em virtude disso, a língua não foi mais
interpretada apenas como produto, sistema acabado, pronto, fechada em si mesma,
mas passou a ser tratada também como viva, dinâmica, em constante processo de
transformação, constituindo-se nas próprias relações que a constituem e é assim
que deve ser analisada na sala de aula.
Todavia, como o viés teórico abordado pela Lingüística da Enunciação ou
Lingüística Interacional se concretizou nas propostas de ensino? Como tais
discussões chegaram aos professores e como lhes foram repassadas? O que
provocou de mudança significativa na prática efetiva de trabalho com a língua?
Algumas dessas indagações poderão ser respondidas no relato de um grande
projeto desenvolvido na região, apresentado a seguir.
2.2.2 João Wanderley Geraldi e o Projeto “O texto na sala de aula”: uma
proposta pioneira de trabalho com a língua sob o viés
(sócio)interacionista
Em todo processo de mudança na história, há homens e nomes que se
destacam pelos feitos realizados, os quais provocaram transformações. Na história
do ensino da Língua Portuguesa vale destacar (sem desmerecer outros) um nome: o
de João Wanderley Geraldi, educador responsável pela indicação de novos
paradigmas para o ensino da língua no Brasil, principalmente, na região Oeste do
Paraná e, posso dizer, o pioneiro ao traçar uma proposta de ensino de Língua
Portuguesa sob o viés do (sócio)interacionismo.
114
Para falar sobre ele, estarei me amparando em Silva (1994) que, em sua
Tese do Doutorado em Educação
80
, recuperou, com detalhes, a trajetória percorrida
pelo educador no final da cada de 1970 e nos anos de 1980, divulgando uma
nova proposta de ensino para a Língua Portuguesa, pautada numa concepção de
linguagem como forma de ação. Reportar-me-ei, também, a Galan (1991), a qual,
em sua dissertação no campo da Lingüística
81
, teceu considerações sobre a
proposta de trabalho com a língua definida pelo autor. Dessas fontes, retomarei
apenas dados relevantes de suas ações que, de uma forma ou de outra, ajudou-me
a entender a história da disciplina na região. Além dos relatos apresentados pelas
pesquisadoras, a descrição que segue estará respaldada nas próprias palavras do
autor, registradas em entrevista concedida.
Em 1978, o Professor Geraldi retornou a Ijuí/RS, depois de dois anos na
UNICAMP, realizando curso de s-graduação em Lingüística. Ao retomar as
atividades de docência no curso de Letras na UNIJUÍ/FIDENE, trazia consigo
algumas inquietações referentes aos conteúdos trabalhados nas licenciaturas e às
indagações dos alunos (futuros ou professores) em relação àquilo que realmente
deveriam trabalhar na sala de aula. E, em vez de buscar respostas a perguntas de
Como ensinar?”, ele ousou ir além: Para que ensinamos o que ensinamos”, pois
entendia que a resposta a esta questão deveria ser dada antes do “como”, do
“quando” e do “que” ensinar.
Instigado pelas dúvidas assinaladas, foi em busca de respostas possíveis,
capazes de reorientar a sua prática e a dos outros docentes, discutida, também, nos
cursos de extensão para professores de português. Na época, encontrara-se, pela
primeira vez, com uma obra de Bakhtin, El signo lingüístico e la filosofia da
linguagem Volochinov, que lhe apontou caminhos, confirmou idéias, compartilhou
o mesmo olhar para a linguagem, definindo, assim, as pesquisas pretendidas.
Uma de suas primeiras iniciativas em direção ao novo paradigma de ensino
da Língua Portuguesa foi a de alterar a ementa de uma disciplina que ocorria
simultaneamente à da Prática de Ensino, procurando articular aspectos teóricos
especialmente de Benveniste e de Bakhtin, com a própria prática na sala de aula. A
80
SILVA, Lílian Lopes Martin da. Mudar o ensino da língua portuguesa: uma promessa que não
venceu nem se cumpriu mas que merece ser interpretada. Universidade Estadual de Campinas,
Faculdade de Educação, 1994 (tese de doutorado).
81
GALAN, Maria Raquel Aparecida Coelho. A construção cotidiana de uma proposta de ensino: as
falas de professores e alunos de LP do oeste do Paraná. Florianópolis: UFSC, 1991.
115
partir de experiências efetivas de trabalho com alunos de 1º grau, começou a
produzir reflexões que, amadurecidas, problematizadas e pesquisadas durante os
anos de 1978 a 1981, revelaram-se nos “Subsídios Metodológicos para o Ensino da
Língua Portuguesa” (5ª a séries), publicados em 1981, no Caderno 18 da
FIDENE, instituição onde Geraldi trabalhava.
Nos Subsídios, o autor, após retomar resumidamente as duas concepções de
linguagem (como expressão do pensamento e como instrumento de comunicação),
apresentou, aos professores, uma terceira: “a de linguagem como forma de ação,
lugar de constituição de relações sociais, que correspondia à lingüística da
enunciação” (SILVA, 1994, p. 57). Estava apresentada, então, a concepção
(sócio)Interacionista da linguagem.
Para entrar em jogo tal concepção, Geraldi acreditava ser imperativo uma
tomada de posição quanto às variações lingüísticas e uma eleição do que julgava
mais importante no processo ensino-aprendizagem de língua. Em decorrência,
centrou sua proposta em três práticas básicas que deveriam ser concretizadas por
meio de atividades integradas entre si e nas relações sociais dos sujeitos:
1. Prática de leitura de textos
a) a leitura de narrativas longas: romance e novelas;
b) a leitura de textos curtos: contos, crônicas, reportagens,
lendas, notícias de jornais, editoriais etc.
2. Prática de produção de textos orais e escritos
3. Prática de análise lingüística (
GALAN,1991, p. 14)
.
Em outras palavras, o que o autor propôs foram “práticas efetivas de uso da
língua” (SILVA, 1994, p. 59).
A proposta chegou, inicialmente, na região Oeste, por intermédio de uma
disciplina (Metodologia de Ensino) que Geraldi ministrou num Curso de
Especialização ofertado pela FECIVEL, em 1981/1982, coordenado por uma equipe
de professores da UNICAMP.
Em 1983, Geraldi foi convidado pela ASSOESTE para uma reunião, na qual
estavam presentes, além dos representantes da Associação, alguns membros da
Secretaria de Estado da Educação, mais precisamente do CETEPAR. Na ocasião,
116
propuseram-lhe a coordenação de um projeto de formação continuada de
professores (5ª a 8ª séries
82
) em Língua Portuguesa.
Do convite nasceu o Projeto “O texto na sala de aula”, uma proposta ousada,
que tinha o objetivo de investir no professor como agente de mudanças,
responsabilizando-o por iniciativas para o ensino de língua. Parafraseando Silva
(1994), o projeto foi proposto como alternativa às atividades de capacitação de
professores e uma vez entendido como formação em serviço (ou continuada), seria
desenvolvido a longo prazo para contemplar professores de 5ª a 8ª séries da região.
Para a execução do mesmo, Geraldi fez uma exigência: que fossem abertas
vagas para todos os interessados (da rede estadual e privada) desse nível de
ensino. Depois de contatados e esclarecidos quanto ao objetivo da formação,
inscreveram-se um número próximo a 600 professores, os quais foram distribuídos
em 11 turmas, com 40 integrantes, reunidos nas diferentes cidades-pólo
83
.
A ASSOESTE e o CETEPAR sugeriram a Geraldi que, para o exercício da
docência nas turmas formadas, não contasse apenas com docentes da UNICAMP,
mas também do Paraná, para maior integração entre os participantes. Em acordo, o
educador solicitou um monitor, em cada turma, para subsidiar no momento e após a
formação, o qual, de preferência, tivesse participado da Especialização ocorrida em
1981/1982 na FECIVEL. Assim, acreditava ele, estaria garantida a participação
efetiva de professores da região nas atividades de docência, tendo em vista que
ajudariam a ministrar o curso. Com a contra-proposta, Geraldi pretendia envolver as
Faculdades locais para que, posteriormente, assumissem o Projeto na região. Sua
idéia, na ocasião, não foi bem aceita pelos professores que trabalhavam com a
disciplina de Língua Portuguesa nas Instituições de Ensino Superior, que não
concordavam muito com a proposta de ensino. Mesmo assim, a monitoria
aconteceu, envolvendo os próprios docentes da rede estadual de ensino e alguns
das faculdades. A docência ficou com dois professores do Paraná
84
, uma professora
de Aracaju
85
e os demais eram da UNICAMP.
82
Como, naquela época, a municipalização ainda não havia ocorrido, a ASSOESTE, ao pensar a
Educação, não conduzia seu olhar apenas às séries iniciais, mas sim a todo o ensino fundamental.
83
Os cursos aconteceram em Foz do Iguaçu, Medianeira, Toledo, Nova Aurora, Palotina, Nova Santa
Rosa, Assis Chateaubriand, Cascavel e Capitão Leônidas Marques. Em Cascavel, formaram-se 4
turmas, com 160 professores participantes.
84
Professor Hiram Ramos de Oliveira e Professora Iara Bem-querer Costa.
85
Professora Maria Nilma Góis da Fonseca
117
Uma outra ação que fez parte do planejamento do Projeto, foi a realização de
cursos (de 8 horas), ministrados pela ASSOESTE, nos municípios, os quais
enfocaram a concepção de língua, de texto, de leitura e de análise lingüística, como
uma forma de preparar os professores para o curso de 40 horas que aconteceria
posteriormente. Era um trabalho de conscientização e de convocação dos
professores, para que não fossem despreparados para a formação. Esta fase foi
denominada como “1ª etapa” do Projeto e concretizou-se no primeiro semestre de
1984.
A etapa foi o curso de 40 quarenta horas e, para garantir a mesma ação
programada nas diferentes turmas, Geraldi selecionou uma coletânea de textos, na
época, publicados
86
, os quais foram enviados, antecipadamente, para a
ASSOESTE, que deveria providenciar 600 cópias (número de inscritos), que os
mesmos seriam trabalhados durante a formação. Para facilitar e garantir maior
qualidade na multiplicação, Professor José Kuiava (então Secretário Executivo da
ASSOESTE) optou por organizar a coletânea em forma de um livro. Dessa
organização, nasceu O texto na sala de aula: leitura & produção”, publicado, pela
primeira vez, em 1984, com uma tiragem de 1000 cópias
87
.
No curso de 40 horas, que ocorreu no segundo semestre de 1984, mais
precisamente no período de 13 a 22 de setembro (com parte das turmas) e 22 a 26
de outubro (com as demais), efetuou-se, inicialmente, com os professores, uma
86
ALMEIDA, Milton José de. Ensinar Português?. Prefácio do livro Ensinando português, vamos
registrando a História... de Eulina Pacheco Lufti. São Paulo: Loyola, 1984;
FARACO, Carlos Alberto. As sete pragas do ensino do português. Revista Construtora, ano III, nº 1,
p. 5-12, 1975.
GEBARA, Ester; ROMUALDO, Jonas de Araújo; ALKMIN, Tânia Maria. A lingüística e o ensino da
língua materna. Linha d’água, Boletim da Associação de Professores de Língua e Literatura
(APLL/SP), nº 1, p. 7-12, Janeiro de 1980.
POSSENTI, Sírio. Gramática e política. Novos estudos CEBRAP, v.2, nº3, p.64-69, nov. 1983.
GERALDI, João Wanderley. Concepções de linguagem e ensino do português; Unidades básicas do
ensino do português. Retoma as idéias expostas em “Subísidios metodológicos para o ensino de
Língua Portuguesa”. Cadernos da FIDENE, Nº 18, 1981.
_____. Prática da leitura de textos na escola. Leitura: teoria e prática, ano 3, nº 3, p. 25-33, 1984.
SILVA, Lílian Lopes Martin da. Às vezes ela mandava ler dois ou três livros por ano. Este texto é
parte de uma pesquisa mais ampla, defendida como tese de mestrado na UNICAMP, sob o título de A
escolarização do leitor: a didática da destruição da leitura. Agosto de 1984.
FONSECA, Maria Nilma Góes da; GERALDI, João Wanderley. O circuito do livro na escola. Boletim
Informativo da FNLIJ, vol. 15, nº 65, p. 121-131, dez/1983.
BRITO, Percival Leme. Em terra de surdos-mudos (um estudo sobre as condições de produção de
textos escolares). Trabalhos em Lingüística Aplicada, nº 2, p. 149-167, UNICAMP/FUNCAMP, 1983.
87
Dessas 1000 cópias, 600 foram distribuídas entre os professores cursistas, os autores ganharam
10 livros cada e o restante foi imediatamente vendido pela ASSOESTE, tendo em vista que
começaram a surgir pedidos de todo o Brasil. A partir dessa primeira edição e diante da grande
procura, a ASSOESTE publicou mais 9 edições (uma média de 25.000 exemplares). Depois da
ASSOESTE, a Ática, a partir de 1996, passou a publicá-lo e, até hoje, já vendeu 25.000 exemplares.
118
sondagem relativa às dificuldades, às necessidades de trabalho, à formação e à
tradição de ensino a que estavam submetidos. Em seguida, debateram um conjunto
de novos princípios da linguagem e da educação (representados nos textos da
coletânea), provocando-os a revisitar seus pontos de vista, crenças e formas de
trabalho, propondo um outro encaminhamento para o ensino da Língua Portuguesa,
amparado na leitura, na produção e na análise lingüística. No final das reflexões,
lançou-se um desafio: o abandono aos materiais didáticos, iniciando-se uma
organização diferente de ensino, retratando os princípios apresentados no curso e
que, posteriormente, seriam consolidados nos grupos de estudos, apontados como
um processo maior de ação-reflexão sobre os eixos propostos: leitura, produção e
análise lingüística.
A prática de leitura, na proposta, foi reinterpretada:
(...) como um processo de interlocução entre autor/leitor mediado
pelo texto. (...) diante de qualquer texto, qualquer uma das relações
de interlocução com o texto/autor é possível, isto porque mais do
que o texto definir suas leituras possíveis, são os múltiplos tipos de
relações que com eles nós, leitores, mantivemos e mantemos que o
definem (
GERALDI, 1984, p. 80-81).
A partir da definição de leitura, o autor expôs o que entendia com: a) a leitura
busca de informações; b) a leitura estudo de texto; c) a leitura do texto-
pretexto; d) a leitura – fruição do texto.
Em relação à prática de produção de texto, Geraldi criticou a forma como era
conduzido o exercício da redação, no qual o aluno escrevia sempre para o mesmo
leitor (o professor), e propôs outro destino para os textos produzidos na escola:
produção de livros e de jornal mural para que outros leitores tivessem acesso ao
texto. Tratava-se, portanto, de uma proposta de produção ancorada em fatos reais
da língua, na sua funcionalidade, tendo em vista o propósito de interlocução.
Quanto à prática de análise lingüística, sua proposta se ancorava nos
seguintes passos:
a) a análise lingüística que se pretende partirá não do texto “bem
escritinho”, do bom autor selecionado pelo “fazedor de livros
didáticos”. Ao contrário, o ensino gramatical somente tem
sentido se for para auxiliar o aluno e por isso partirá do texto do
aluno;
b) a preparação das aulas de prática de análise lingüística será a
própria leitura dos textos produzidos pelos alunos nas aulas de
produção de textos;
119
c) para cada aula de prática de análise lingüística, o professor
deverá selecionar apenas um problema; de nada adianta
querermos enfrentar todos os problemas que podem acontecer
num texto produzido por nosso aluno;
d) fundamentalmente, a prática de análise lingüística deve se
caracterizar pela retomada do texto produzido na aula de
produção (segunda-feira, no horário proposta) para re-escrevê-lo
no aspecto tomado como tema na aula de análise;
e) o material necessário para as aulas de prática de análise
lingüística: os Cadernos de Redações dos alunos; um caderno
para anotações; dicionários e gramáticas;
f) em geral, as atividades serão em pequenos grupos ou em
grande grupo;
g) fundamenta esta prática o princípio “partir do erro para a auto-
correção” (GERALDI, 1984, p. 63).
Sob tais princípios teóricos, organizaram-se encaminhamentos práticos para
que os professores, que desejassem, pudessem seguir. No final do evento, 90% dos
professores participantes se comprometeram com a proposta de ensino e
organizaram um grupo de estudos para cada cidade do Oeste do Paraná. Os grupos
tinham, como princípio básico, dar seqüência à preparação dos trabalhos que
iniciariam em 1985.
A equipe pedagógica da ASSOESTE se comprometeu, no processo de
formação, com o assessoramento dos professores nos municípios, intermediando,
junto a diretores de escolas e prefeituras, as reuniões, selecionando e enviando
remessas de materiais como lista com sugestões de livros e textos para estudos. Por
outro lado, Geraldi orientava, de Campinas, a equipe da ASSOESTE e os próprios
professores que, na dúvida, enviavam-lhe cartas, às quais eram respondidas com
atenção. Segundo seu próprio depoimento, foram muitas as cartas recebidas,
inclusive dos alunos, chegando a responder até 100 cartas por semana. Foi um
intenso trabalho de acompanhamento de um projeto que estava caminhando.
Em julho de 1985, foi organizado um seminário, em Cascavel, para os
professores da região que estavam trabalhando com o Projeto e, paralelamente,
estendeu-se a formação para mais uma turma (40 horas), reunindo aqueles que não
haviam participado da etapa anterior. Na turma, além de professores da região,
participaram outros de Londrina, de Maringá, de Umuarama, enfim, de outras
regiões do Estado que, ao tomarem conhecimento do que acontecia no Oeste,
fizeram questão de participarem.
120
O seminário inicialmente foi preparado para 120 pessoas, porém, para a
surpresa dos organizadores, compareceram mais de 500. Acontecimentos como
este favoreceram para que a equipe do CETEPAR reconhecesse o trabalho da
ASSOESTE e se conscientizasse dos avanços propiciados com as discussões,
enquanto que, na capital, a SEED engatinhava para uma proposta na área de
Língua Portuguesa.
Foi assim que o Projeto começou a ser visto por todo o Estado e, em junho de
1986, a equipe de Geraldi foi convidada para participar de um seminário em Curitiba,
envolvendo professores e chefes dos cleos Regionais de Educação. No evento,
docentes de Cascavel e da região expuseram novas experiências de ensino,
resultantes da formação recebida no Projeto “O Texto na Sala de Aula”. A iniciativa
mostrou que as ações empreendidas no Oeste do Paraná estavam desafiando e
mobilizando professores e equipes pedagógicas de todo o Estado.
No final de 1986, aconteceu um encontro estadual com professores
envolvidos no Projeto, em Ponta Grossa, quando se criou uma comissão para, junto
à SEED, coordenar o trabalho no Estado, definindo verbas, cronogramas e
diretrizes. Sua atuação ocorreu até meados de 1988, momento em que foi dissolvida
por questões políticas. Porém, durante o tempo em que atuou, o grupo redigiu e
distribui à rede estadual, um documento
88
contendo os fundamentos propostos para
o ensino de língua.
O documento foi lido, analisado e reorganizado juntamente com professores
dos NRE, que também participaram do processo reflexivo e contribuíram com as
discussões, promovendo uma segunda versão. Esta foi apresentada e discutida no
Primeiro Encontro Estadual de Professores de Língua Portuguesa –, 2º e 3º graus
e, novamente, por todos os professores, nos NRE, num processo participativo e
democrático. O documento:
(...) representa o momento em que um coletivo de professores e de
experiências se organiza em torno de um projeto político que,
iniciado na região oeste do Paraná, é posto em discussão para o
conjunto de professores de língua portuguesa da rede pública do
Estado (ATHAYDE JUNIOR, 2006, p. 83).
88
Esse documento, segundo postula Athayde Junior (2006), trata-se da primeira versão de “Língua:
mundo, mundo, vasto mundo” elaborado pelo grupo de Língua Portuguesa da SEED (Fátima Ikiko
Yokohama DESG;, Francis Mary Guimarães Nogueira Escola Hasdrubal Belegar; Ivone Machado
de Oliveira DEPG; Maria Izabel de Moura Brito CETEPAR; Marilei D’Oro CETEPAR; Mário
Cândido de Athayde Júnior – DESG).
121
Contudo, a terceira versão nunca chegou a ser concluída, devido à mudança
de governo.
No ano de 1987, em virtude das inúmeras solicitações, firmou-se um convênio
entre a ASSOESTE, a FECIVEL e a UNICAMP para mais um Curso de
Especialização, agora em Metodologia e Prática de Ensino de Língua Portuguesa, o
qual se consolidou entre os meses de julho/1987 a maio/1988, em Cascavel, com o
apoio da CAPES e da SEED/CETEPAR. No curso, além de participantes da região,
muitos foram os professores que vieram de Curitiba
89
.
Paralelamente ao Curso, Geraldi e sua equipe já estavam voltados para
outras regiões do Paraná, centralizando seus trabalhos em cidades-pólo como
Maringá, Londrina, Umuarama, Curitiba, enfim, na maioria dos NRE do Estado
(menos em Paranaguá). A própria equipe da ASSOESTE, juntamente com aqueles
que participavam do Curso de Especialização, entenderam que a região podia
caminhar sozinha e que a UNICAMP já podia afastar-se do processo de formação.
Em 1987, com a troca de governo (de José Richa para Álvaro Dias), a equipe
de Geraldi tornou-se persona non grata no Estado e, conseqüentemente, não voltou
a trabalhar no Paraná. Se, como vimos no primeiro capítulo (p. 53-54), o Governador
Álvaro Dias se comprometera em dar continuidade às ações pedagógicas propostas
por JoRicha, isso de fato não se concretizou em todos os sentidos e, um deles,
refere-se especialmente à educação. “A nova proposta de ensino da Língua
Portuguesa não foi sustentada politicamente pelo primeiro e segundo escalões da
SEED” (MAINARDES, 1995, p. 37).
2.2.2.1 A transposição do Projeto “O texto na sala aulaàs séries iniciais: o
texto como objeto de ensino
Enquanto a proposta do “Texto na sala de aula” era discutida em outras
regiões do Estado, no Oeste a ASSOESTE assumira a formação, dentro da mesma
proposta de ensino, com os professores de a séries, adequando as discussões
para as séries iniciais. Tiveram importante participação na adaptação da proposta às
89
Representantes da SEED, do CETEPAR, destacando-se, dentre eles, Mário Cândido de Athayde
Junior, Fátima Ikiko Yokohama, Valdir Barsoto, Anna Cristina Bentes, Maria Isabel Moura.
122
séries iniciais, docentes da Secretaria Municipal de Educação de Cascavel
90
e
outros docentes da região, pois, na ocasião, a ASSOESTE ainda não compunha sua
equipe pedagógica.
Avançando na perspectiva teórica da concepção (sócio)interacionista da
linguagem, os docentes discutiam, nos cursos de formação, um outro viés para a
alfabetização e para o ensino da Língua Portuguesa, assentado no texto como
unidade de sentido e de ensino da língua, contrapondo os métodos sintéticos e
analíticos empregados na alfabetização (inclusive o modelo Erasmo Pilotto).
Ancorando o processo ensino-aprendizagem no texto como objeto de ensino
da leitura e da escrita, e entendendo-o como um processo real de interlocução entre
autor e leitor, a cartilha perdeu sua utilidade e, por outro lado, reforçou-se o
questionamento do uso do livro didático na sala de aula.
Dessa forma, o que se propunha aos professores (assim como na formação
de a 8ª séries) era um novo olhar para as práticas de leitura, de produção escrita,
acrescentando-se, também, para o ensino da gramática: o da análise lingüística. A
gramática seria conseqüência das ações que deveriam antecedê-la. Assim, “Criadas
as condições para atividades interativas efetivas em sala de aula, quer pela
produção de textos, quer pela leitura de textos, é no interior destas e a partir destas
que a análise lingüística se dá” (GERALDI, 1991, p. 189).
A leitura, nesta perspectiva teórica, deixaria de ser trabalhada apenas no
processo de decodificação e entonação, recebendo o tratamento da interlocução,
concebida fundamentalmente como um ato de co-produção de sentido(s) ao texto
lido. Para isso, os pseudo-textos apresentados pelas cartilhas e muitos dos
fragmentos expostos nos livros didáticos não dariam conta de tal exploração. Era
preciso levar para a sala de aula textos significativos, completos. A proposta era
91
:
- Ouvir narrativas de: fatos vividos, acontecimentos da escola, da
vida familiar, da comunidade; fatos imaginados, histórias infantis.
- Manusear, folhear e trocar material escrito: livros, revistas,
folhetos, rótulos.
- Ler outras linguagens: mímicas, desenhos, cartazes, símbolos
usuais.
90
A Professora Neiva Gallina Mazzuco e Marilei Teixeira foram as primeiras professoras a
“interpretar” a proposta para as séries iniciais.
91
Informações retiradas de um material produzido por assessores de Língua Portuguesa da
ASSOESTE para a condução das discussões dos cursos de formação trabalhados nos municípios
com os professores de 1ª a 4ª séries (sem autor e sem ano de produção).
123
- Ler: obras de literatura infantil; pequenas narrativas, quadrinhas e
poemas; textos informativos; textos curtos: pequenas narrativas
(extraídas de obras de literatura infantil); contos; crônicas; fábulas;
quadrinhas e poemas; textos informativos: associados a outros
componentes; jornais e revistas; noticiários; avisos e
comunicados.
- Textos longos: obras de literatura infantil; novelas; peças de teatro
infantil; romances de aventura.
A partir das diferentes sugestões de leituras na sala de aula, explicavam-se
as diversas maneiras de encaminhá-las: leitura-prazer (com a finalidade de ampliar a
visão de mundo, dar vazão às emoções, à fantasia e recriar a realidade); leitura-
estudo de texto (que prestava exclusivamente a textos curtos e visava ao
enriquecimento e à ampliação da visão de mundo da criança); leitura-pretexto (a
qual objetivava desencadear outras produções); leitura-busca de informações
(proposta quando havia necessidade de obter informações precisas sobre um
determinado assunto).
A prática de produção de textos (orais e escritos) fundamentava-se no
estabelecimento da interação com o outro. A produção de texto oral era entendida
como uma atividade de interlocução, por meio da qual a criança teria espaço para
narrar, comentar, debater fatos históricos e vividos, respeitando seu modo de falar e
as diferentes variedades lingüísticas até então desconsideradas pela escola, a qual
sempre sustentou seu discurso na norma culta da língua. A produção escrita deveria
ter, como ponto de partida, situações significativas (fugindo das práticas cristalizadas
pela escola como temas repetidos ano a ano) e interlocutores reais que não fosse
apenas o professor. A esse respeito, foram (e ainda são) imensamente explorados e
tomados como referência os seguintes dizeres:
Por mais ingênuo que possa parecer, para produzir um texto (em
qualquer modalidade) é preciso que:
a) se tenha o que dizer;
b) se tenha uma razão para dizer o que se tem a dizer;
c) se tenha para quem dizer o que se tem a dizer;
d) o locutor se constitua como tal, enquanto sujeito que diz o que
diz;
e) se escolham estratégias para realizar (a), (b), (c) e (d).
(GERALDI, 1991, p. 137).
Assim, a atividade de produção escrita era proposta a partir das leituras
realizadas e na perspectiva de múltiplos leitores (exposição em mural; troca, entre
os alunos da classe e com outras classes, dos textos produzidos). O objetivo era
124
expor tais produções a vários leitores e caracterizar o ato de escrever como um meio
de comunicação e interação entre as pessoas, evitando transformá-lo num mero
exercício de redação. Para tanto, as atividades com a língua (orais e escritas)
ancoravam-se em situações como: transmitir avisos e recados, escrever avisos e
bilhetes, fazer quadrinhas e poemas, escrever cartas a familiares, participar de
debates, resumir textos, entrevistar pessoas, dentre outras. E essa prática não
deveria centrar-se tão somente nos alunos que sabiam ler e escrever. Desde a
série entendia-se que o aluno tinha condições de produzir textos em função daquilo
que queria dizer, a partir de histórias contadas, de gravuras etc., mesmo que não
fossem legíveis e o professor tivesse que se colocar como escriba.
Uma vez o texto produzido, o passo seguinte consistia em encaminhar à
prática de análise lingüística. O viés para o ensino da gramática centrava-se no texto
do aluno, entendido como o ponto de partida para o domínio da língua padrão.
Como assinala Geraldi:
Considero a produção de textos (orais e escritos) como ponto de
partida (e ponto de chegada) de todo o processo
ensino/aprendizagem da língua (...). Sobretudo, é porque no texto
que a ngua objeto de estudos se revela em sua totalidade quer
enquanto conjunto de formas e de seu reaparecimento, quer
enquanto discurso que remete a uma relação intersubjetiva
constituída no próprio processo de enunciações marcada pela
temporalidade e suas dimensões (GERALDI, 1991, p. 135).
O objetivo da prática de análise lingüística era trabalhar com as organizações
da escrita que comprometiam a clareza dos textos produzidos pelos alunos,
incluindo aspectos gramaticais que interferiam no uso da modalidade escrita da
variante padrão.
Sobre tal enfoque, considero a grande contribuição dos estudos da
Lingüística Textual (Fávero & Koch, 1983; Marcuschi, 1986; Guimarães, 1987; Koch,
1984, 1989, 1990, entre outros)
92
que discutem o texto, as relações de sentido e os
92
FÁVERO, Leonor L. & KOCH, Ingedore C. V. Lingüística textual: introdução. São Paulo: Cortez,
1983.
MARCUSCHI, Luiz A. Lingüística do texto: o que é e como se faz. Série debates1. Recife:
Universidade Federal de Pernambuco, 1986.
GUIMARÃES, Eduardo R. J. Texto e argumentação: um estudo das conjunções do português.
Campinas: Pontes, 1987.
KOCH, Ingedore C. V. Argumentação e linguagem. São Paulo: Cortez, 1984.
_____. Coesão textual. o Paulo: Contexto, 1989.
_____. Coerência textual. São Paulo: Contexto, 1990.
125
aspectos discursivos em relação às marcas lingüísticas. De acordo com tal
perspectiva teórica, ensinar a norma culta e as regras gramaticais significa analisar e
refletir sobre os elementos lingüísticos do texto produzido pelo aluno (e, acrescento,
dos textos publicados). Para isso, a prática da reestruturação foi tomada como a
base condutora de todo o processo. Era preciso reestruturar textos produzidos pelos
alunos desde a 1ª série e, neste processo, estaria a sistematização da escrita.
Com efeito, nos cursos de formação, os professores eram preparados para,
além do encaminhamento da leitura e da produção de texto, o exercício de análise
lingüística por meio da reestruturação de textos, principalmente de forma coletiva. E,
neste aspecto, as orientações seguiram um percurso diferente do que foi proposto
por Geraldi (1984). Enquanto o autor ressaltava a importância de, na reescrita, “o
professor selecionar apenas um problema; de nada adiante enfrentarmos todos os
problemas que podem acontecer num texto produzido por nosso aluno”
(GERALDI,1984, p. 63), a orientação dada aos professores das séries iniciais era: “é
fundamental utilizar um texto representativo das dificuldades da classe e abordar
todos os aspectos possíveis de aperfeiçoamento, de forma integrada e
simultânea
93
” (grifo nosso).
A orientação foi seguida incondicionalmente pelos professores e a prática de
reescrita coletiva consolidou-se no exercício de higienização do texto, quando o
professor buscava, juntamente com a tentativa de prender a atenção dos alunos,
abordar todos os problemas nele apresentados, sejam de ordem discursiva, textual,
sintática ou morfológica.
Mesmo que se tenham revelados equívocos na condução da proposta, ela
fortaleceu (teoricamente falando) o reconhecimento da linguagem como meio de
interação social, apreendida na interlocução com o(s) outro(s), em situações
concretas de uso da língua, permitindo compreender, teoricamente:
(...) que não se domina uma língua pela incorporação de um
conjunto de itens lexicais (o vocabulário); pela aprendizagem de um
conjunto de regras de estruturação de enunciados (gramática). (...)
A aprendizagem da linguagem é já um ato de reflexão sobre a
linguagem: as ações lingüísticas que praticamos nas interações em
que nos envolvemos demandam esta reflexão, pois compreender a
93
Informação retirada do Programa de grau da cidade de São Paulo, Secretaria Municipal de
Educação, Departamento de Planejamento e Orientação, e repassadas nas formações de
professores.
126
fala do outro e fazer-se compreender pelo outro tem a forma do
diálogo (GERALDI, 1991, p. 17).
Os princípios teóricos psicologizantes de Vygostsky, a abordagem filosófica
bakthiniana, as discussões sociológicas marxistas sustentadas nas orientações
pedagógicas da escola histórico-crítica estavam, de alguma forma, entrelaçados no
discurso dos docentes (em cursos de formação continuada), garantindo uma
formação não apenas conteudista, mas principalmente político-pegagógica.
Se a proposta de ensino de língua não foi levada a efeito na totalidade
(hipótese que discutirei no quarto capítulo), o que posso afirmar, como professora
que participou ativamente desse processo de formação desde 1985, é que, de
alguma forma (talvez perpassados por outros discursos de formação), tais princípios
se revelaram (mesmo que timidamente) nas práticas didáticas de ensino da língua.
não era possível ensinar a gramática simplesmente. Os professores se sentiam
responsáveis por provocar reflexões sobre o uso da língua, mesmo que estas o
atendessem a todas as possibilidades de análise.
Se, por um lado, faltaram, naquele momento, mais aprofundamento teórico
para subsidiar os encaminhamentos práticos, por outro lado, muitas foram as
iniciativas voltadas para a concretização de uma proposta de ensino, a qual tinha o
texto como a unidade condutora de todas as ações com a língua.
2.2.3 O Ciclo Básico de Alfabetização CBA: consolidação da linguagem
como forma de interação?
As idéias fomentadas, no Brasil, na década de 1980, principalmente aquelas
amparadas em Piaget e Vygotsky, contribuíram, de maneira decisiva, para os
estudos do desenvolvimento lingüístico e cognitivo da criança. Todavia, dependendo
do aporte teórico adotado (cada autor, à sua maneira, deu um tratamento ao tema),
o encaminhamento prático tomou diferentes direções.
No Paraná, em 1988, a SEED, com a nova equipe pedagógica e
administrativa, apresentou outra proposta de alfabetização, denominada Ciclo
Básico de Alfabetização (CBA)
94
. Esta proposta, fundamentada nas bases teóricas
94
A Lei 4.024/61 permitiu a organização de cursos, currículos em escolas, métodos, períodos em
caráter experimental. Em decorrência dessa brecha, o Estado de o Paulo organizou, em 1967, as
séries inicias em dois veis: e 2ª; e séries, sendo adotada uma progressão continuada entre
127
piagetianas (de abordagem construtivista), tinha seus princípios metodológicos
fundados nas idéias de Emília Ferreiro
95
, negando, em parte, a caminhada
empreendida até aquele momento no Estado (principalmente na região Oeste), em
relação às discussões políticas e pedagógicas de ensino sob o viés de uma
concepção (sócio)interacionista da linguagem, amparada em Vygotsky, e dialógica,
conforme Bakhtin.
O CBA (cf. informações apresentadas na p. 54) justificava-se pelo número de
evasão e repetência que ainda persistia no Estado, a partir de dados coletados num
estudo realizado pela SEED entre 1978 e 1986. De acordo com dados divulgados no
documento intitulado Reorganização da escola pública de grau: proposta
preliminar de trabalho, ainda em 1987, 46% das crianças se evadiam ou eram
reprovadas na 1ª série. Objetivando a redução desse número, a Secretaria de
Estado da Educação SEED, observando os resultados obtidos em São Paulo e
Minas Gerais, decidiu pela implantação da progressão continuada dos alunos da
para a 2ª série (a princípio). E assim, segundo Mainardes (2007), o CBA definiu-se
como parte do projeto maior do Estado de reorganização da escola pública do
grau.
Entretanto, era preciso convencer os alfabetizadores da nova vertente teórico-
metodológica que ecoava no Brasil (e fortemente entre os educadores da equipe da
SEED) sob a hegemonia do pensamento construtivista de alfabetização, resultante
das pesquisas sobre a psicogênese da escrita, desenvolvida por Emília Ferreiro e
colaboradores. Mortatti (2006)
96
salienta que, se até então as discussões giravam
em torno de métodos de ensino, a partir daquele momento, o eixo seria deslocado
para o processo de aprendizagem da criança (sujeito cognoscente). O que entrava
em jogo era a compreensão de “como a criança aprende”, em vez de “como
as séries do mesmo nível. Em 1970, Santa Catarina implantou o Sistema de Avanço Progressivo
(SAP), abolindo a reprovação durante as quatro primeiras séries. A Lei 5.692/71, que institui e
organizou o ensino de e graus, manteve essa possibilidade dos estados (e escolas)
organizarem sua sistemática de ensino e, em conseqüência, na década de 1980, alguns estados
adotaram o CBA: São Paulo, em 1984; Minas Gerais, em 1985; Para e Goiás, em 1988
(JACOMINI, 2004)
95
Emília Ferreiro é uma psicóloga argentina, doutora pela Universidade de Genebra, sob a orientação
de Jean Piaget. Revolucionou o conhecimento que se tinha sobre a aquisição da leitura e da escrita
quando lançou, com Ana Teberosky, o livro Psicogênese da Língua Escrita, no qual descreve os
estágios pelos quais as crianças passam até compreender o ler e o escrever. Crítica ferrenha da
cartilha, ela defende que os alunos, ainda analfabetos, devem ter contato com diversos tipos de texto.
96
Em Conferência proferida durante o Seminário "Alfabetização e letramento em debate", promovido
pelo Departamento de Políticas de Educação Infantil e Ensino Fundamental da Secretaria de
Educação Básica do Ministério da Educação, realizado em Brasília, em 27/04/2006, intitulada
“História dos métodos de alfabetização no Brasil”.
128
ensinar”. O construtivismo apresentava-se não como um método novo, mas como
uma revolução conceitual, demandando novas posturas de ensino alfabetizador,
exigindo o abandono de teorias e práticas tradicionais, desmetodizando o processo
de alfabetização e questionado a necessidade da cartilha (aliás, esta havia sido
questionada na proposta de trabalho com o texto).
Conforme Iurk (2002), a ação inicial da SEED foi a realização do Encontro
das Instituições do Ensino Superior do Estado, em Curitiba, no ano de 1987, com o
intuito de propiciar o conhecimento e a divulgação dos trabalhos e projetos de
alfabetização que vinham ocorrendo:
O encontro contou com a participação da Professora Maria Leila
Alves, da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo,
Professora Abigail Linero Garcia Silvério, Chefe do Departamento de
Ensino de Grau da SEED, que discorreu sobre a reorganização
da Escola Pública de Grau, da Professora Maria Helena de
Santos, da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), que
apresentou a proposta de alfabetização que estava sendo
desenvolvida pela UEPG e que se denominava, Projeto Bê-a-bá.
Nesse mesmo ano, a SEED publicou um documento que teve como
título Reflexões sobre Alfabetização: subsídios, elaborado em torno
das discussões e reflexões realizadas a partir do Encontro (IURK,
2002, p. 108)
97
As discussões posteriores ao evento, pela decisão da implantação do CBA,
ocorreram sem a participação dos professores alfabetizadores, dos NRE e da
Secretarias Municipais de Educação, atitude avaliada como negativa pelos
interessados, os quais passaram a temer a proposta.
Depois da decisão tomada, a SEED, no final de 1987, divulgou a proposta em
cinco encontros regionais: Londrina, Maringá, Cascavel, Irati e Curitiba. Em
novembro do mesmo ano, juntamente com o CETEPAR, a SEED realizou, em
Curitiba, um curso de 40 horas, para o qual convocou representantes dos NRE, que
deveriam atuar como multiplicadores junto aos alfabetizadores, trabalhando, em
1988, com a proposta do CBA. A capacitação com os professores foi planejada para
uma carga horária de 160 horas. Os princípios teóricos norteadores do curso foram:
a teoria da psicogênese da língua, de Emília Ferreiro e Ana Teberosky; textos de
97
Note que, naquele momento, as ações que eram levadas a efeito na região Oeste do Paraná o
foram consideradas.
129
Telma Weisz, Ester Pilar Grossi e Luiz Carlos Cagliari, dentre outros, conforme
relato de Mainardes (2007).
A ASSOESTE esteve presente naquele momento de formação, representada
pela Professora Baltadar Vendrúscolo, assessora pedagógica da área de
Alfabetização.
Voltando aos NRE, seus representantes organizaram e levaram a efeito a
primeira etapa de formação, com um curso de 40 horas, que aconteceu em fevereiro
de 1988. Nos municípios pertencentes ao NRE de Cascavel, parte da formação se
efetivou ainda em 1987 (cf. anexo 02). Depois da primeira etapa, ocorreram outras
três de 40 horas cada, durante o ano de 1988. Contudo, estas:
(...) não foram muito esclarecedoras já que os conteúdos
curriculares não estavam ainda definidos, as orientações sobre a
forma de registro na avaliação foram divulgadas apenas em agosto
daquele ano e, na maioria das escolas o trabalho dos professores
não foi acompanhado pela equipe pedagógica (MAINARDES, 1995,
p. 38).
Ademais, os cursos (mesmo que 160 horas de formação) foram avaliados,
pelos alfabetizadores, como insuficientes para embasar a compreensão da proposta
pedagógica. É importante lembrar que os professores, em 1987/1988, viviam num
clima de descontentamento devido às perdas salariais (cf. relato da p. 56), o que
tornava ainda mais difícil convencê-los a aceitar qualquer coisa que viesse da
SEED. E, para complicar ainda mais o desenvolvimento do processo, consolidou-se
uma compreensão equivocada da teoria de Emília Ferreiro e Ana Teberosky de que
o processo de alfabetização deveria ocorrer de maneira natural e espontânea, com
pouca intervenção do professor.
Mesmo assim, a implantação oficial do CBA deu-se pelo Decreto 2545/1988
de 14/03/1988 e, a princípio, o foi obrigatória
98
, mas deveria ocorrer de forma
gradativa, tanto nas escolas estaduais quanto nas municipais, exigindo estrutura
humana e adequada.
Para os professores alfabetizadores da região Oeste (e por que não de todo o
Estado), o CBA chegou como um fantasma assustador. Afinal, estavam vivendo um
processo de formação que reorientava para uma proposta de alfabetização a partir
do texto, na tentativa de romper com o encaminhamento metodológico do modelo
98
naquele ano, a implantação aconteceu em 458 escolas estaduais, distribuídas em 179
municípios.
130
sintético Erasmo Pilotto e da cartilha A Porta Mágica, além de outros métodos
(fonético, misto etc.) orientadores da prática alfabetizadora do final da década de
1970 e início da década de 1980.
Trabalhar segundo as orientações do CBA significava, além da não-
reprovação do aluno de série, negar o sujeito social tão defendido, por exemplo,
pelo Projeto O Texto na sala de aula. Resgatando o sujeito cognitivo de Piaget
(1974, 1982)
99
, a proposta de alfabetização se ancorava na observação das
hipóteses da escrita, criadas pela criança, em suas diferentes fases de
aprendizagem.
A compreensão em tela resultava das abordagens construtivistas, a partir dos
trabalhos inspirados na teoria da ação produzida por Jean Piaget (idem) para quem,
“a aquisição do conhecimento resulta de uma troca contínua de informação entre a
tomada de consciência da ação e a tomada de consciência do objeto’(MORATO,
2004, p. 322), considerando, assim, que a cognição humana se define:
(...) em função de estruturas ou esquemas que o organismo
desenvolve em torno de um conjunto de ações coordenadas e em
função da interação que mantém com o meio ambiente,
determinante de formas possíveis de linguagem e de outros
sistemas cognitivos (Idem).
Pautada no estudo da psicogênese que responde pelo desenvolvimento da
inteligência humana, a proposta fundava-se na compreensão de que o organismo
humano (e logicamente da criança) possui um conjunto de esquemas acionais aptos
a lidar com o mundo circundante. Desse modo, se uma ação se revela como nova, o
organismo entra em desequilíbrio e, em razão disso, obriga o sujeito a adaptar seus
esquemas à nova situação, restaurando, assim, o equilíbrio.
Relacionando esses estudos com o processo de aprendizagem da criança, os
discípulos de Piaget (dentre eles, mais especificamente, Emília Ferreiro)
interpretaram que alfabetizar significava criar situações de desequilíbrios, ou seja,
espontaneamente a criança buscaria em seu meio (na escola, na sala de aula...)
abstrações que eram de seu interesse. Em seguida, pelo processo de reflexão
99
Dentre algumas obras, cito: Piaget, Jean. Aprendizagem e Conhecimento. São Paulo: Freitas
Bastos, 1974. PIAGET, Jean. O nascimento da inteligência na criança. 4. ed. Rio de Janeiro: Zahar,
1982.
131
(provocado pelo desequilíbrio), construiria conhecimentos novos. Conhecedores de
tal processo cognitivo, caberiam aos professores favorecer a interação do aluno com
o seu meio cultural (político, econômico etc.), para que, por intermédio de situações
de assimilação e acomodação, provocadas pelo mundo objetivo e subjetivo, o aluno
adquirisse conhecimento e desenvolvesse a linguagem.
Morato (2004) estabelece o seguinte paralelo entre as bases
(sócio)interacionista e construtivista: se, por um lado, Vygotsky considera a
linguagem como uma ação compartilhada entre sujeito/realidade e elemento
principal do processo de crescimento cognitivo geral, via noção de mediação, para
Piaget (1974), é a inteligência o motor da aquisição da linguagem, via noção de
desenvolvimento. Contudo, ambos concordavam que no ato de aprender, a criança
inicia o processo de aquisição da leitura e da escrita muito antes de entrar na escola
e, sendo assim, o processo de alfabetização não pode ser visto exclusivamente
como uma proposta pedagógica, mas deve ser entendido, também, pelas variáveis
sociais, culturais, políticas e psicolingüísticas.
O que significam tais variáveis, quando se trata efetivamente do como
ensinar? Essa não foi a preocupação evidenciada nas produções de Emília Ferreiro
e seus seguidores. A autora desviou o enfoque de “como se ensina” para “como se
aprende”. O foco estava, novamente, no aluno. Para ela, mais importante era o
alfabetizador entender como a criança concebe a aprendizagem da escrita.
O aspecto revolucionário de suas reflexões foi o de que a escrita da criança
não resulta de simples cópia de um modelo externo, mas é um processo de
construção pessoal, ou seja, primeiro ela precisa compreender como a escrita se
organiza para, a partir daí, reinventá-la.
Enquanto os cursos de formação tentavam preparar o professor para esse
outro olhar à criança e à aquisição da escrita e suas fases, os professores sentiam-
se frustrados, porque queriam entender o todo, o “como ensinar” e ter maior
clareza sobre os pressupostos teóricos de base. Até mesmo os docentes dos cursos
de capacitação pareciam não dispor da fundamentação teórica necessária à
compreensão e à prática da proposta do CBA, que, como justificavam alguns
deles, “tais componentes estavam em fase de construção”. Tudo isso gerou uma
certa resistência nos professores, principalmente da região Oeste, indispondo-se a
trabalhar de acordo com as orientações recebidas.
132
Mesmo assim, a implantação do CBA foi instituída em todas as escolas
paranaenses pelos seguintes atos oficiais:
Decreto 2545, de 14 de março de 1988, assinado pelo
Governador Álvaro Dias e pelo Secretário de Estado da Educação
Belmiro Valverde Jobim Castor, que diz respeito ao compromisso
do Estado quanto à oferta de um ensino de qualidade, ao
propósito de reorganização da Rede Estadual Oficial, tendo em
vista a .reversão do insucesso nas séries iniciais do Grau
quanto à evasão e repetência.
Resolução 744, de 22 de março de 1988, que autoriza a
implantação do CBA, regulamentando questões administrativas e
explicitando aspectos necessários para o desenvolvimento da
nova proposta. Estabelece o critério de que as escolas deveriam
ter uma infra-estrutura física e humana.
Deliberação nº 28, de 7 de outubro de 1988, do Conselho Estadual
de Educação CEE, que regulamenta o CBA e define que cabe à
SEED dirigir, orientar e supervisionar o CBA, explicitando sua
finalidade e caracterizando turno, contraturno, definindo matrícula,
rendimento escolar, assiduidade, documentos, aproveitamento,
documento oficial, parecer conclusivo, permanência no CBA,
promoção, transferência, regimento escolar e relatório final.
Resolução 3641, de 22 de dezembro de 1989, atin ente à
expansão para a totalidade dos estabelecimentos da Rede
Estadual de Ensino da proposta do CBA, oferecendo atendimento
igual e de qualidade a todas as crianças das séries iniciais (IURK,
2002, p. 110).
Porém, o que não se observou na implantação do CBA nas escolas, foram os
recursos físicos e humanos necessários para sua consolidação e, como
conseqüência, logo começou a faltar espaço físico e alimentação para as crianças
que necessitavam do contra-turno (permanecer na escola por mais um período,
como era proposto), além do surgimento das dificuldades em garantir a participação
dos professores em todas as etapas do curso de capacitação. Se durante o
processo de implantação tivessem sido tomadas as providências emergenciais
previstas pela regulamentação, provavelmente não teriam ocorrido falhas tão
imediatas, pois se atenderia à demanda física e humana legalmente suposta.
Em relação à formação continuada dos professores, ocorreu o seguinte:
A ênfase na capacitação dos professores, observada no ano da
implantação do Ciclo Básico, não se repetiu com a mesma
intensidade nos anos seguintes, assim como o fornecimento de
materiais e acompanhamento das classes, principalmente devido à
reconstituição da equipe da SEED e do DEPG, em 1988, com a
mudança do titular da Secretaria (MAINARDES, 1995, p. 38).
133
O fato estimulou os professores a buscarem cursos práticos que
apresentassem modelos “construtivistas” de ensino. Muitas das “receitas” foram
simplesmente repassadas, sem espaço para reflexão. A própria SEED, após 1988,
não abriu espaço para os professores se reunirem, refletirem e discutirem a
proposta. A falta de tais ações dificultou o trabalho e provocou o estrangulamento do
CBA, destoando os resultados pretendidos. Mesmo com todas as dificuldades,
rejeições e dúvidas apresentadas, sem nenhuma avaliação, a obrigatoriedade do
CBA foi estendida a todas as escolas do Paraná, em 1990
100
.
A ASSOESTE, apesar de não compactuar totalmente com as ações
empreendidas pela SEED, no sentido de adotar e impor atividades alfabetizadoras
sustentadas na perspectiva teórica do construtivismo, procurou se interar do
processo, participando dos momentos de formação para, posteriormente, discutir
com os professores da região.
Desde a implantação do CBA até a presente data, podem ser observados
avanços, uma vez que a SEED propiciou, posteriormente, momentos com
alfabetizadores para a construção/reconstrução e redimensionamento da proposta.
Os pressupostos foram melhores definidos e o encaminhamento metodológico
ganhou forma (ou melhor, retomou a forma do que se vinha trabalhando na região
Oeste): o texto passou a ser explorado como elemento norteador das atividades de
alfabetização.
Se houve, no momento da implantação, um impasse por parte dos
professores, talvez isso tenha ocorrido exatamente pelo desconhecimento do objeto
de ensino que estava sendo proposto, bem como das várias dimensões teóricas
envolvidas na proposta, quais sejam: psicológicas, lingüísticas e enunciativas. Ao
tratar da alfabetização, o docente deve ter claro quais são os aspectos psicológicos
que afetam o ato de ler e de aprender a ler; como associar as relações simbólicas ao
trabalhar com o objeto lingüístico; e como estabelecer, no ato da leitura e escrita,
certas condições enunciativas, sociais, históricas e políticas que estimulem a
inserção da criança no mundo letrado.
Klein faz uma importante análise dos resultados obtidos com reformas
implantadas e que não foram devidamente esclarecidas:
100
Em 1998, por meio da Resolução 615/98, o CBA foi estendido para as quatro séries iniciais de
todas as escolas da rede estadual.
134
A grande massa do professorado, aquela que de fato atua nas
classes de alfabetização, a quem se destinam, em última instância,
as considerações teóricas que orientam a ação pedagógica, essa
massa, desprovida das relações concretas para o estudo, o
aprofundamento e a reflexão que a complexidade dessas questões
exigem, acaba assimilando que o critério de validade do novo é ser
contrário, mecanicamente inverso à forma anterior. Busca-se, desta
forma, destrinçar nas mínimas nuances o fazer anterior, para se
proceder a ações que lhe são expostas; havia memorização na
prática anterior? Pois bem, agora a memorização deve ser abolida.
Fazia-se cópia e ditado? Abaixo, agora, a cópia e o ditado, e assim
em diante (KLEIN,1996, p. 25).
Em decorrência, revelam-se, hoje, resultados não muito gratificantes de um
aprendizado atravessado por ações docentes inseguras em relação a “o que
podemos ensinar” e “como podemos ensinar”. Quando o professor não tem claro o
caminho que pode seguir, corre o risco de perder-se entre os descaminhos que
atravessam o seu conhecimento.
2.2.4 O Currículo Básico para a Escola Pública do Estado do Paraná CBPR:
uma proposta interacionista reconhecida e documentada
Paralelamente às discussões de implantação do CBA, uma equipe da SEED
organizou-se para repensar a proposta de ensino do Estado. Essa preocupação
originou-se da própria mudança na alfabetização considerada novidade na área
educacional não do Paraná, mas de todo o país e em função das discussões e
divulgações científicas propagadas nos anos de 1980.
Se a cada de 1980 destacou-se por revelar outros rumos para a educação
e, principalmente, para o ensino de Língua Portuguesa, era preciso consolidar tais
mudanças, garantindo a hegemonia do discurso renovador. Para isso, pensou-se em
elaborar um novo currículo assentado nas propostas de inovação e fundado na
cientificidade do conhecimento, até mesmo porque a SEED não tinha um atualizado
(apenas aqueles de 1977 a 1979) e isso lhe era cobrado constantemente.
A proposta foi ousada, que o currículo deveria atender desde a Pré-escola
até a série. Para a produção do documento que teve início em 1987, mas cuja
elaboração foi intensificada apenas em 1989 a SEED se preocupou em garantir
um trabalho coletivo, consultando a comunidade escolar, envolvendo entidades
representativas e professores atuantes da sala de aula (cf. p. 54-55), embora tais
consultas e participações fossem revisitadas por consultores especialista que dariam
135
voz ao texto final em cada área do conhecimento
101
. A preocupação residia no
propósito de resguardar a abertura política de participação, anunciada nos discursos
governamentais do PMDB (José Richa e Álvaro Dias) e revelada na introdução do
documento:
A proposta curricular aqui sistematizada traduz o trabalho coletivo
dos profissionais comprometidos com a educação pública do
Paraná. Ela apresenta, neste momento, o projeto político-
pedagógico possível e expressa a preocupação e o compromisso
dos educadores com a melhoria do ensino no sentido de responder
às necessidades sociais e históricas, que caracterizam a sociedade
brasileira hoje (PARANÁ, 1990, p. 13 – grifo nosso).
Athayde Júnior, ao analisar, em sua tese, os diferentes discursos que
perpassam os documentos oficiais da SEED, postula que a voz da coletividade
revelada no CBPR nada mais é do que uma estratégia política que busca antecipar,
“através da construção da imagem de um governo que reconhece e dá voz a
históricas reivindicações da categoria dos professores” (ATHAYDE JÚNIOR, 2006,
p. 128), discursos da categoria que eventualmente poderiam voltar-se contra os
poderes constituídos e que, uma vez “garantido” o seu lugar, perde a força e a
legitimidade.
O resultado dos encontros e discussões foi sistematizado em versão
preliminar publicada em novembro de 1989, a qual foi rediscutida juntamente com os
professores, chegando-se, então, à versão final do documento, publicada em 1990.
Consolidou-se, assim, “um estágio do processo de implantação de um discurso novo
para o ensino de língua portuguesa no Estado do Paraná” (Idem, p. 135).
Fundado nos princípios da Pedagogia Histórico-Crítica, na primeira parte do
documento “Ensino de grau: elementar e fundamental” (PARANÁ, 1990, p. 15 a
18) destaca-se a preocupação de garantir a compreensão desta corrente
pedagógica. Para isso, respalda-se na fala de Saviani (1984, 1989), defendendo o
compromisso com o conhecimento científico, sistematizado e sustentado na
concepção de homem como cidadão participante e atuante de uma sociedade e na
de educação como aquela que determina e é determinada socialmente:
101
A equipe que assessorou a área de Língua Portuguesa foi composta por Elisiani Vitória Tiepolo e
Márcia Flamia Porto (representantes da SEED); Reny Maria Gregolin Guindaste, a qual, em 1990, era
mestre pela Universidade Federal do Paraná; e Sonia Monclaro Virmond, professora da rede estadual
e municipal de Curitiba.
136
A Educação é, sim, determinada pela sociedade, mas essa
determinação é relativa e na forma de ação recíproca – que significa
que o determinado também reage sobre o determinante.
Conseqüentemente, a Educação também interfere sobre a
sociedade, podendo contribuir para sua própria transformação (In.
PARANÁ, 1990, p. 15 e 16).
A valorização do saber sistematizado e sua relação com o processo de
transmissão-assimilação norteou a discussão, que, o que se pretendia, na nova
fase da educação, era um ensino pautado na ciência, capaz de refletir sobre as
relações políticas e sociais presentes no ensino-aprendizagem. Queria preservar, na
realidade, a necessidade do saber-docente, do conhecimento por parte do professor,
a fim de articular as reflexões necessárias com a formação de um sujeito crítico e
participativo. Nesse sentido, argumenta:
(....) é fundamental considerar que os agentes sociais presentes na
relação de ensino-aprendizagem são sujeitos inseridos e
determinados socialmente. Ou seja, professor e alunos estão
inseridos numa mesma prática social global, embora ocupem,
relativamente ao processo pedagógico, funções diferenciadas. A
compreensão do professor, por suposto, deve ser mais articulada
que a do aluno, isto é, ele deve deter uma leitura mais orgânica da
prática social, em que ele e o aluno estão inseridos. No entanto,
essa compreensão do professor não está acabada e pronta, pois ele
continua a ser desafiado por conhecimentos e experiências novas,
inclusive aquelas ligadas ao ensino (Idem, p. 17).
Ao discutir sobre o desenvolvimento do ser humano e a aquisição de
conhecimentos, a abordagem psicológica revelada é a do construtivismo expressa
em afirmações como:
A criança desempenha importante papel na formulação de seu
próprio conhecimento, por isso dizemos que ela é agente de seu
próprio conhecimento (Idem, p. 20).
A ação da criança depende da maturação orgânica e das
possibilidades que o meio lhe oferece: ela não poderá realizar uma
ação para a qual não esteja fisicamente preparada, assim como não
o fará, mesmo que organicamente madura, se a organização do seu
meio físico e social não a ensinar e/ou propiciar sua realização
(Ibidem, p. 20).
137
A relação da criança com a escola deve ser a de busca, interesse e de
problematização, pois “somente as situações que problematizam o conhecimento
levam à aprendizagem” (PARANÁ, 1990, p. 21). Para isso, o exercício da
observação e do levantamento de hipóteses é fundamental. Cabe, portanto, ao
professor, na relação educador-educando, agir criativamente na transposição do
conhecimento formal para um conhecimento assimilável àquele nível de ensino.
Logo:
Para o exercício desta ação pedagógica, é importante que o
educador domine não somente o conhecimento a ser ensinado, mas
compreenda o processo de desenvolvimento e aprendizagem da
criança para poder adequar seu método às possibilidades reais de
compreensão e construção do conhecimento que a criança
apresenta a cada período deste processo (Idem, p.23).
Apesar de garantir, em algum momento que “as interações são fundamentais
no processo de desenvolvimento e aprendizagem do ser humano” (Ibidem, p. 21), tal
enfoque não é o mesmo que aquele defendido por Vygotsky, visto que, tratando-se
de um discurso piagetiano, as relações de interação são favoráveis ao
desenvolvimento da inteligência que, por sua vez, desenvolverá a linguagem. Isto é,
exclui-se desse processo interacional sua ação direta sobre a linguagem, diferente
do (sócio)interacionismo para o qual “são facultados à linguagem e às interações
sociais a gênese e o desenvolvimento cognitivo” (MORATO, 2004, p. 324).
Porém, ao tratar da Alfabetização
102
(PARANÁ, 1990, p. 35-49), os
pressupostos teóricos se sustentam nos princípios sociológicos de Marx que,
embora não seja citado, revela-se nas definições de homem/sociedade:
O homem trabalha, e, pelo trabalho, se humaniza (...) ao agir sobre
a natureza, o homem produz a existência humana, num processo de
mútua transformação: não imprime, naquela, as marcas de sua
ação, humanizando-a, como também se produz a sim mesmo,
humanizando-se (Idem, p.31).
A linguagem, nesse contexto, ganha outra dimensão (diferente da abordagem
psicológica). Ela é vista como:
(...) fato histórico, resultado de ações coletivas que os homens
desenvolvem, no processo de trabalho, ao longo de sua história
(Ibidem, p. 35).
102
Área assessorada pelas Professoras Lígia Regina Klein e Rosicler Schafaschek.
138
A linguagem não liberta o homem de sua subordinação ao
concreto e ao imediato, permitindo-lhe operar na ausência dos
objetos, (...) como é responsável – juntamente com o trabalho – pela
formação das faculdades que possibilitam a realização dessas
operações (idem).
É evidente, nos enunciados, que “a linguagem é o motor do processo de
aquisição cognitiva geral, via noção de mediação (interação social)” (MORATO,
2004, p. 323).
as relações de interação, necessárias à aprendizagem, são explicitadas
não mais numa perspectiva construtivista, mas sim (sócio)interacionista (o que
demonstra um outro viés teórico abraçado pela SEED, diferente daquele do CBA),
com citações diretas de Vygotsky (1984) para quem a aprendizagem “pressupõe
uma natureza social específica e um processo através do qual as crianças penetram
na vida intelectual dos que a cercam” (In. PARANÁ, 1990, p. 38). Para explicar a
importância da interação social ao desenvolvimento da criança, recorrem àquilo que
Vygotsky chamou de zona de desenvolvimento proximal e nível de desenvolvimento
real e potencial.
A alfabetização, concebida como um processo de aquisição da língua escrita,
é abordada como um aprendizado capaz de instrumentalizar o indivíduo para
inserção no mundo letrado, garantindo-lhe condições de operar mentalmente, de
apreender conceitos mais elaborados e complexos, ampliando suas relações
sociais. o mais espaço para um ensino estruturalista revelado nos métodos
sintéticos, analíticos e mistos de alfabetização, que “eliminam da língua a sua
dimensão mais importante: a significação das palavras, construída na história dos
homens e reconstruída no processo de interação verbal” (idem, p. 37).
O que se quer garantir, na compreensão do CBPR, é o deslocamento da
“ênfase do aspecto material da língua para a constituição de sentido, para a
dimensão argumentativa da linguagem, para o processo de interação” (Ibidem, p.
37), que a língua deve ser tratada como o próprio processo dinâmico da interação
verbal, por meio da qual os interlocutores constituem o sentido de seu discurso.
É possível inferir, na abordagem, uma referência explícita ao discurso
interacionista revelado na proposta de Geraldi (1984), subsidiado pela Lingüística da
Enunciação ou Lingüística Interacional:
139
Impõe-se tomar, como objeto do processo de alfabetização, a
própria ngua. Para tanto, que se assumir, como elemento
norteador do processo, não a letra, a sílaba ou a palavra
descontextualizada, mas o texto, oral e escrito, enquanto unidade
de sentido da língua (PARANÁ, 1990, p. 38 – grifo nosso).
Para orientar a prática conforme tal perspectiva, o encaminhamento
metodológico apresenta algumas sugestões de trabalho com textos publicados
(considerando o nome das crianças como palavra-texto), com textos das crianças e
com textos produzidos pelo professor. Da mesma forma, a reestruturação de textos
recebe igual atenção, inclusive retomando algumas das orientações propostas por
Geraldi (1984) para o encaminhamento da reescrita coletiva. Finalmente, após
discutir aspectos da avaliação, os conteúdos de alfabetização (1ª e 2ª séries) são
apresentados a partir dos seguintes eixos: oralidade, leitura e produção coletiva de
textos.
2.2.4.1 A proposta de trabalho com a Língua Portuguesa
Em relação à Língua Portuguesa no CBPR (PARANÁ, 1990, p. 50-62), os
pressupostos teóricos que fundamentam a proposta foram construídos na mesma
direção daqueles da alfabetização: fundado em Marx, Vygotsky, mas acrescenta-se
a estes, Bakhtin, destacando os aspectos dialógicos interacionais:
Perceber a natureza social da linguagem, enquanto produto de uma
necessidade histórica do homem, leva-nos à compreensão de seu
caráter dialógico, interacional. Em outras palavras, tudo o que
dizemos, dizemos a alguém e é esse interlocutor, presente ou não
no ato da nossa fala, que acaba por determinar aquilo que vamos
dizer. Nossas palavras se dirigem a interlocutores concretos, isto é,
a pessoas que ocupam espaços bem definidos na estrutura social.
Mais do que isso, nossas idéias sobre o mundo se constroem nesse
processo de interação (PARANÁ, 1990, p. 50 e 51).
Assume, claramente, uma concepção (sócio)interacionista da linguagem por
entender que no processo de interação verbal está sua substância. Para sustentá-la,
tece uma crítica sucinta à concepção de linguagem como transmissão do
pensamento que via na gramática (e na norma culta) seu objeto de ensino. Nessa
direção, enfatiza as variedades lingüísticas como elementos históricos e sociais,
representativos de determinados grupos de falantes aos quais se deve respeitar.
140
Propõe, ainda, que a gramática seja tratada como estruturas subjacentes das
variedades de uma língua, pois mais importante que ensiná-la, é ensinar a ler e a
escrever. O trabalho com a gramática acontecerá concomitantemente aos atos de
leitura e escrita, que todo texto pressupõe uma estrutura gramatical que o
organiza. Com isso, o CBPR não nega o ensino da gramática, contudo, desloca o
cerne do trabalho com língua para os fatos lingüísticos como mais importantes do
que nomenclaturas e classificações.
O encaminhamento metodológico, assim como na alfabetização, orienta para
as atividades que se pode fazer com a língua oral, com a leitura e com a escrita,
sendo que nesta última estão implícitas a produção de texto e a análise lingüística (a
reestruturação do texto do aluno não é abordada).
Ao analisar mais especificamente o eixo “domínio da escrita” (lembrando que
aqui reside o foco desta pesquisa, já que a gramática está nele entremeada),
destaco o que o CBPR (PARANÁ, 1990, p. 57) indica como conteúdos para a 3ª e 4ª
séries:
Série Objetivo Geral Conteúdo
a) No que se refere à produção de
textos:
• produção de textos ficcionais
(narrativos);
• produção de textos
informativos;
produção de textos
dissertativos
.
b) No que se refere ao conteúdo:
• clareza;
• coerência;
• argumentação.
Desenvolver a noção de
adequação na produção de
textos, reconhecendo a
presença do interlocutor e as
circunstâncias de produção.
c) No que se refere à estrutura:
• processos de coordenação e
subordinação na construção
das orações;
• uso de recursos coesivos
(conjunções, advérbios,
pronomes etc.);
• a organização de parágrafos;
• pontuação.
141
d) No que se refere à expressão:
• adequação à norma padrão
(concordância verbal e nominal,
regência verbal e nominal,
conjugação verbal).
e) No que se refere à organização
gráfica dos textos:
• ortografia;
• acentuação;
• recursos gráficos-visuais
(margem, título etc).
O quadro de conteúdos incorpora o novo olhar para o ensino da gramática
(amparado principalmente na Lingüística Textual), entendida como parte de uma
estrutura mais ampla: o texto. Mais do que isso: o que o CBPR propõe, como
concepção de linguagem e como conteúdos que a exploram, é uma mudança de
postura, do professor, frente às produções escritas. Caso se coloque, realmente,
dentro de uma concepção (sócio)interacionista entendendo que a linguagem,
como produto histórico, é veículo das representações, significados e valores
existentes numa sociedade; compreendendo que a criança (sócio-histórico-
ideologicamente determinada), em constante contato com as palavras revestidas de
conteúdo ideológico, revela, nas suas produções, as perspectivas de mundo, o
momento histórico e o espaço geográfico nos quais está inserida então a postura
de um professor, frente a um texto produzido, deve ser mais a de um “garimpeiro” do
que a de um mero caçador de erros.
O CBPR pretende, a partir dos conteúdos elencados, que a língua seja
trabalhada no texto, compreendido como unidade de significado, contextualizando-o
como produção histórica, revelador da postura que se tem da realidade. Para que
esse universo venha a se descortinar na sala de aula, o ensino da Língua
Portuguesa precisa devolver às crianças o direito à palavra, a fim de que, como
afirma Geraldi (1984), o aluno possa ler a história contida em cada texto e não
apenas contá-la.
A gramática, sob tal viés teórico, ganha outra dimensão: ela não existe só,
separada, isolada em exercícios de “siga o modelo”, “dê o plural”, “classifique”,
“retire do texto”. Ao contrário, está imbricada no texto, que é a responsável pela
142
sua tessitura. Portanto, tem razão de ser estudada e/ou analisada dentro desse
contexto.
As atividades de análise lingüística, por sua vez, têm o propósito de provocar
o olhar da criança para a organização interna do texto, refletindo sobre as relações
de sentido provocadas pelo seu arranjo lingüístico. No quadro de conteúdos, estudar
a gramática pressupõe estudar o texto, analisando a estrutura lingüística empregada
para, a partir daí, enfocar noções de tipologia (textos narrativos e expositivos;
dissertativos não, pois eram considerados “pesados” para tal nível de ensino), de
coerência, de coesão e de correção (parágrafos, frases, ortografia, acentuação...),
relacionando-os aos efeitos de sentidos veiculados no processo de elaboração
textual.
Teoricamente ou visivelmente (a partir do quadro), tudo parece muito simples
de ser assimilado. Quando se trata da prática, da sala de aula, mais especificamente
do texto do aluno, quantas indagações. Falar de cada elemento gramatical,
individualmente, é considerado fácil, tendo em vista uma vasta experiência advinda
desde a formação. Todavia, encontrá-lo num texto, analisá-lo, refletindo sobre suas
relações de sentido, ganha uma outra dimensão: a do “é complicado”, “é difícil”, “não
sei como fazer”, “como é que se faz?”. Afinal, estou me referindo (assim como o
Currículo) a professores das séries iniciais, formados em diferentes áreas e que
aprenderam a dar nomes às palavras, a classificá-las, de acordo com a gramática
normativa. Mesmo depois de um vasto processo de formação continuada, por meio
de cursos ministrados por assessores pedagógicos da ASSOESTE desde década de
1980, quando já enfocavam a língua sob esse prisma, muitas dúvidas persistem.
No espaço das inquietações e das muitas indagações, ganha força (e muitas
formas) o discurso acadêmico propagado em variadas publicações, apresentando
conceitos, porém desacompanhados da discussão que o construiu. Para
exemplificar, podemos citar os termos “coesão” e “coerência textual”. “O que é isso?”
Era exatamente esta a pergunta feita pelos professores quando propunham a
estudar o CBPR. Mesmo com as publicações de Koch (1989, 1990) e de outros
autores, as quais estavam distante da sala de aula (nas academias), tornava-se
impossível encontrar respostas para tantas indagações.
As dificuldades encontradas por ocasião da implantação do CBPR para todo
o ensino fundamental do Paraná, principalmente referentes aos inúmeros termos
143
científicos não sistematizados no decorrer da proposta, induz-me a concordar com
Athayde Junior ao explicar que:
Trata-se de uma demonstração de uma aproximação ao discurso
científico a partir da idéia de que, na ciência, todos os conceitos
estão definidos e que, desse modo, basta listá-los tirando,
portanto, do fazer científico todo o processo histórico de construção
de sentidos dos conceitos (ATHAÍDE JÚNIOR,
2006, p. 141)
.
Ter o Currículo em mãos (uma vez impressa a versão final em 1990, o CBPR
foi distribuído para todos os professores de Pré a série, em 1991, numa tiragem
inicial de 90.000 cópias)
103
não foi suficiente para a consolidação da proposta. Era
preciso estudá-lo, compreendê-lo, apreender seu embasamento teórico, que seria
insuficiente revisitar cotidianamente o quadro (ou relação) de conteúdos na
perspectiva de esclarecimentos.
No entanto, esta não parecia ser a preocupação da SEED no momento. Os
cursos de capacitação realizados nos anos que o antecederam eram para os
professores do CBA que também encontravam-se um tanto desorientados. Mesmo
assim, no ano de 1990, os cursos foram reduzidos e, em 1991, o processo de
formação continuada agravou-se já que o CBA não era mais prioridade.
“A ênfase na capacitação dos professores somente foi retomada em 1992,
com a criação do Plano Decenal de Capacitação Docente da SEED, desenvolvido
pelas equipes dos Núcleos Regionais de Educação, em parceria com as Instituições
de Ensino Superior” (MAINARDES, 1995, p. 41). E, nos cursos (que foi a
modalidade de formação adotada), o CBPR e o CBA eram retomados enquanto
proposta de ensino.
A ASSOESTE teve, mais uma vez, um importante papel no processo de
formação. Atentando para a ausência de um programa efetivo, por parte da SEED,
de formação continuada, em vistas aos programas educacionais implantados no
Estado, e comungando da concepção de homem/sociedade, educação, linguagem e
ensino que fundamenta o CBPR, investiu, ainda mais, no aperfeiçoamento docente
na região Oeste, objetivando não só a discussão das propostas (CBA e CBPR), mas
103
Mais 30.000 exemplares foram publicados na impressão, em 1992, e 5.000 na impressão,
em 1997. Em 2003, o CBPR foi disponibilizado em versão eletrônica e encontra-se disponível em
http://www.diaadiaeducacao.com.br/portals/portal/institucional/def/pdf/curriculo_basico_escola_pub_p
r.pdf
144
principalmente o acompanhamento e a avaliação da prática pedagógica delas
decorrente.
A título de exemplo, o quadro abaixo apresenta os cursos ministrados pela
ASSOESTE em municípios da região, nas áreas de Alfabetização e Língua
Portuguesa, desde a implantação do CBA (1988) até 1991:
Ano Área Número de
cursos
Professores
atendidos
Alfabetização 27 1.764 1988
Língua Portuguesa
15 925
Alfabetização 34 1.904 1989
Língua Portuguesa
17 1.183
Alfabetização 23 1.663 1990
Língua Portuguesa
32 2.155
Alfabetização 20 1.367 1991
Língua Portuguesa
29 2.910
Fonte: Projeto de Integração Universidade com a Educação Básica, ASSOESTE, 1993.
As informações evidenciam que, nos anos de 1988 e 1989, período de
implantação do CBA, a procura por cursos de Alfabetização foi bem maior,
comprovando a necessidade dos professores para o embasamento da proposta.
nos anos de 1990 e 1991, a procura reverteu-se para Língua Portuguesa que,
naquele momento, era a área sobre a qual buscavam maiores informações.
Enfim, foi possível concluir, dessa segunda fase da história da educação e,
mais especificamente, da formação continuada dos professores na região Oeste do
Paraná, que ouve um grande avanço no ensino e no conhecimento dos educadores.
Beneficiados pela criação da ASSOESTE, direta ou indiretamente, foram envolvidos
por todo um processo de transformação, tanto na concepção de homem e
sociedade, quanto na compreensão sobre aprendizagem, ensino e linguagem.
Conduzidos que eram pela corrente tecnicista, pela compreensão da língua
como estrutura, os educadores foram provocados para uma visão histórico-crítica da
educação, para o reconhecimento da interferência do meio no desenvolvimento
cognitivo/discursivo da criança e para a compreensão do caráter sócio-histórico-
ideológico da linguagem, ampliando o conhecimento que tinham de homem e
sociedade.
As provocações, resultantes de uma posição política e ideológica assumida
pela ASSOESTE, desde a sua fundação, intensificaram-se no decorrer da cada
145
de 1980 pelas inúmeras ações empreendidas por educadores que pensaram na
educação da região, quais sejam: Projeto “O texto na sala de aula”, o envolvimento
nas discussões do CBA, a participação na elaboração do CBPR e, entremeados a
estas ações de destaque, os inúmeros cursos, seminários, palestras e grupo de
estudos realizados na região.
Por todos os acontecimentos arrolados até aqui (além de muitos outros que
não foram mencionados por não se constituírem o objeto de estudo), é possível
afirmar que, na região, a década de 1980 foi, sem dúvida, a do compromisso político
com a educação, revelado no fortalecimento das equipes municipais de ensino; na
formação de grupos de estudos; no interesse maior pela formação acadêmica e pelo
conhecimento científico; na produção coletiva de material teórico e didático-
pedagógico; na criação de mais escolas e mais bibliotecas; e, principalmente, nos
resultados favoráveis de aprendizagem do aluno.
As informações apresentadas confirmam que o processo pedagógico está
associado à visão de mundo (de homem, de sociedade, de educação, de ensino, de
aprendizagem, de linguagem) assumida por professores, educadores, governantes e
comunidades, os quais, uma vez coletivamente organizados, poderiam transformar a
educação de nosso país.
2.3 Terceira Fase (meados da década de 1990 até os dias atuais): Retrocesso
e/ou Consolidação de Concepção(ões) de Linguagem
Na década de 1990 ou, mais especificamente, a partir de 1995, as políticas
educacionais, principalmente aquelas ditadas nacionalmente, apresentavam
traços de um outro viés teórico que, uma vez determinado, respingou sua influência
no Estado e também na região.
Como arrolado no primeiro capítulo (cf. p. 36 e 56), o elemento chave
definidor da educação no Brasil, na cada, foi a política neoliberal. Atendendo às
exigências do movimento de rearticulação do capital na busca do desenvolvimento
econômico, político e educacional para, a partir daí, inserir-se no chamado mundo
globalizado, o Brasil, dentre inúmeras adequações, promoveu uma reforma
educacional ditada pelo Banco Mundial (BM) que se destacou como o principal
articulador das propostas educacionais.
146
O BM, além de agente de empréstimos, tornou-se promotor e interventor das
mudanças políticas dos países periféricos, com vistas a garantir-lhes a estabilidade
do sistema. A educação, nos ideais neoliberais, passou a gozar de especial atenção.
Propalando a chamada “sociedade do conhecimento”, uma outra concepção de
educação se revelou, ou melhor, foi retomada: aquela capaz de equacionar e
amenizar as desigualdades sociais, presente na proposta da Escola Nova:
Diante desta conjuntura,uma expectativa na sociedade brasileira
para que a educação se posicione na linha de frente da luta contra
as exclusões, contribuindo para a promoção e integração de todos
os brasileiros, voltando-se à construção da cidadania, não como
meta a ser atingida num futuro distante, mas como prática efetiva
(BRASIL, 1998, p. 21).
Para refletir, conferir e analisar os redirecionamentos teóricos propagados
pelo neoliberalismo, irei deter-me, mais especificamente, nos Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCNs), documento que consolidou tais orientações.
2.3.1 Os Parâmetros Curriculares Nacionais PCNs – sob orientação do
neoliberalismo
Conforme Menezes e Santos (2002), a palavra “parâmetros” significa um
conjunto de textos, representando as diferentes áreas de ensino, para nortear a
elaboração dos currículos escolares em todo o país. Assim definidos, os PCNs não
constituem, teoricamente, uma imposição de conteúdos a serem ministrados nas
escolas, mas sim, são propostas nas quais cada estado e/ou município pode se
pautar para elaborar seus próprios currículos. Ou, como dizem os próprios PCNs:
Sua função é orientar e garantir a coerência dos investimentos no
sistema educacional, socializando discussões, pesquisas e
recomendações, subsidiando a participação de técnicos e
professores brasileiros, principalmente daqueles que se encontram
mais isolados, com menor contato com a produção pedagógica atual
(BRASIL,
1997a, p. 13)
.
O documento originou-se, segundo informações apresentadas na Introdução
dos Parâmetros, da necessidade de reorganizar as diretrizes da educação, que
até dezembro de 1996 a lei que estruturava o ensino fundamental era ainda a Lei
Federal 5.692, de 11 de agosto de 1971.
147
Todavia, ao participar, em 1990, da Conferência Mundial de Educação para
Todos, promovida pela Unesco, Unicef, PNUD e Bando Mundial, o Brasil
(considerado um dos países periféricos em desenvolvimento) compartilhou com as
posições consensuais na “luta pela satisfação das necessidades sicas de
aprendizagem para todos, capaz de tornar universal a educação fundamental e de
ampliar as oportunidades de aprendizagem para crianças, jovens e adultos” (Idem,
p. 13).
Em função do compromisso assumido, principalmente com o BM, a primeira
ação cobrada foi a elaboração do Plano Decenal de Educação para Todos (1993-
2003), no qual o Brasil apresentou um conjunto de diretrizes políticas voltadas para
a recuperação da escola fundamental sob o discurso de “compromisso com a
eqüidade e com o incremento da qualidade” (Ibidem, p. 14).
O ensino de qualidade que a sociedade demanda atualmente
expressa-se aqui como a possibilidade de o sistema educacional vir
a propor uma prática educativa adequada às necessidades sociais,
políticas, econômicas e culturais da realidade brasileira, que
considere os interesses e as motivações dos alunos e garanta as
aprendizagens essenciais para a formação de cidadãos autônomos,
críticos e participativos, capazes de atuar com competência,
dignidade e responsabilidade na sociedade em que vivem (BRASIL,
1997a, p. 27).
O Plano Decenal de Educação reafirmou a necessidade e a obrigatoriedade
do Estado em elaborar parâmetros claros no campo curricular, orientando as ações
educativas, adequadas aos ideais democráticos e à busca da melhoria da qualidade
do ensino nas escolas brasileiras. A educação, nesse sentido, deveria amparar-se
nos quatro pilares do conhecimento: aprender a conhecer, aprender a fazer,
aprender a viver juntos e aprender a ser. A tese em pauta era a de que, se a escola
preparasse a criança para se adequar às mudanças constantes no campo de
trabalho, estaria formando indivíduos qualificados e criativos. E, já que o mundo está
em pleno desenvolvimento tecnológico, seria importante enfatizar o aprender-a-
aprender para a busca constante de atualização.
O discurso neoliberal, claramente revelado, reaviva o apregoado pela Nova
Escola, colocando a educação como a solução para os problemas sociais e os
homens como os responsáveis pelo seu sucesso ou fracasso, desconsiderando as
influências sócio-político-ideológicas que os envolvem. De acordo com tal
perspectiva teórica, a sociedade deveria ser convocada para atuar junto à escola,
148
interferindo nos conteúdos ministrados e, inclusive, resolvendo os problemas da
educação. Essa participação é tida como necessária para a formação do “novo
homem” que a sociedade globalizada requer
104
.
Para o “novo homem”, o necessários conhecimentos atuais e aplicáveis à
vida cotidiana:
Isso significa novas demandas para a educação básica, em que se
destacam os conteúdos que façam sentido para o momento de vida
presente e que ao mesmo tempo favoreçam o aprendizado de que o
processo de aprender é permanente. Para tanto, é necessária a
utilização de metodologias capazes de priorizar a construção de
estratégias de verificação e comprovação de hipóteses na
construção do conhecimento, a construção de argumentação capaz
de controlar os resultados deste processo, o desenvolvimento do
espírito crítico capaz de favorecer a criatividade, a compreensão dos
limites e alcances lógicos das explicações propostas (BRASIL, 1998,
p. 44).
Os PCNs (BRASIL, 1997a) representam uma estratégia política adotada pelo
governo brasileiro, visando melhorar e universalizar o ensino em função dos
objetivos específicos relacionados às demandas da sociedade e às posições
ideológicas adotadas. Porém, tais posições necessitavam assentar-se em bases
filosóficas, sociológicas, psicológicas e pedagógicas. Que bases eram essas?
De acordo com seus redatores:
O processo de elaboração dos Parâmetros Curriculares Nacionais
teve início a partir do estudo de propostas curriculares de Estados e
Municípios brasileiros, da análise realizada pela Fundação Carlos
Chagas sobre os currículos oficiais e do contato com informações
relativas a experiências de outros países (BRASIL, 1997a, p. 15).
A partir de tais análises, formulou-se uma proposta inicial, após um processo
de discussão em âmbito nacional (1995 e 1996) com docentes de universidades
públicas e particulares, cnicos de secretarias estaduais e municipais de educação,
instituições representativas de diferentes áreas de conhecimento, especialistas e
educadores. Teceram pareceres sobre a proposta, estenderam a discussão em
inúmeros encontros regionais, promovidos pelas delegacias do MEC, aculminar
na versão final dos Parâmetros. Os PCNs resultaram, portanto, de discussões
104
Um exemplo claro dessa política é o incentivo a programas sociais voltados à educação como
“Amigos da Escola”, da Rede Globo de Televisão.
149
coletivas que foram ouvidas, analisadas e contempladas no discurso final, produzido
pelos especialistas contratados para esse fim.
Todavia, há uma história oposta. Saviane (1999) postula que César Coll
Salvador, professor de Psicologia Evolutiva e da Educação, da Universidade de
Barcelona, foi contratado como consultor e compôs sua equipe de apoio para ajudá-
lo na tarefa de produzir os textos que formariam os Parâmetros Curriculares.
Moreira (1996), por sua vez, observa que, no processo de produção dos
Parâmetros, não foram consideradas pesquisas de estudiosos da educação, como
da ANPED Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação
que há anos vinha se dedicando a estudos do problema.
Como a década de 1990, influenciada pela revolução teórica propagada na
década de 1980, ainda preservava as bases epistemológicas de homem e
sociedade, e como os PCNs (de acordo com afirmações dos redatores)
contemplariam tais orientações, um dos aspectos que prepondera nos seus
fundamentos, é a da educação como veículo da inserção do homem no meio social:
Cabe ao campo educacional propiciar aos alunos as capacidades de
vivenciar as diferentes formas de inserção sociopolítica e cultural.
Apresenta-se para a escola, hoje, mais do que nunca, a
necessidade de assumir-se como espaço social de construção dos
significados éticos necessários e constitutivos de toda e qualquer
ação de cidadania (BRASIL, 1997a, p. 27).
Por outro lado, quando se referem às bases pedagógicas, recuperam
brevemente as diferentes correntes teóricas, destacando suas influências no ensino,
comprometendo-se não a abandoná-las, mas sim, a retirar delas o que há de
positivo para, nesse alicerce, traçar os novos rumos da educação:
As tendências pedagógicas que marcam a tradição educacional
brasileira (...) trazem, de maneira diferente, contribuições para uma
proposta atual que busque recuperar aspectos positivos das práticas
anteriores em relação ao desenvolvimento e à aprendizagem,
realizando uma releitura dessas práticas à luz dos avanços
ocorridos nas produções teóricas, nas investigações e em fatos que
se tornaram observáveis nas experiências educativas mais recentes,
realizadas em diferentes Estados e Municípios do Brasil (BRASIL,
1997a, p. 32).
As discussões sobre o desenvolvimento da aprendizagem ancoram-se,
principalmente, nas orientações da psicologia genética, e a alfabetização é enfocada
150
à luz da psicogênese da escrita, apontando aspectos positivos da teoria, mas
destacando, em contrapartida, as conseqüências acarretadas pela sua interpretação
equivocada como método de ensino. Em seguida, apresenta a base psicológica que
orientará os PCNs:
Ao contrário de uma concepção de ensino e aprendizagem como um
processo que se desenvolve por etapas, em que a cada uma delas o
conhecimento é “acabado”, o que se propõe é uma visão da
complexidade e da provisoriedade do conhecimento. De um lado,
porque o objeto de conhecimento é “complexo” de fato e reduzi-lo
seria falsificá-lo; de outro, porque o processo cognitivo não acontece
por justaposição, senão por reorganização do conhecimento. É
também “provisório”, uma vez que não é possível chegar de
imediato ao conhecimento correto, mas somente por aproximações
sucessivas que permitem sua reconstrução (idem, p. 33).
E, nesse sentido, reafirmam, como princípio básico, o desenvolvimento das
capacidades do aluno de aprender-a-aprender a partir dos conteúdos trabalhados,
sendo sujeito de sua própria formação, porém num processo interativo, no qual o
professor se coloque como mediador do conhecimento.
Embora não mencionem nenhum autor, seja em citação direta ou indireta, é
possível deduzir que o viés teórico adotado para falar do conhecimento é o de
Vygotsky, tendo em vista o reconhecimento de que a aprendizagem ocorre no social,
por meio da interação com o outro (com pessoas mais experientes) que, uma vez
disposto a socializar, poderá mediar conhecimentos. A escola, determinada
socialmente para o propósito explicitamente educativo, é apresentada como a
responsável pela função socializadora do educando, e isto a remete para, além do
compromisso com o desenvolvimento individual do aluno, a promoção dele no
contexto social e cultural. O conhecimento, portanto, é definido como socialmente
estabelecido, mas criado e recriado pela escola, numa reflexão constante:
Os conhecimentos que se transmitem e se recriam na escola
ganham sentido quando são produtos de uma construção dinâmica
que se opera na interação constante entre o saber escolar e os
demais saberes, entre o que o aluno aprende na escola e o que ele
traz para a escola, num processo contínuo e permanente de
aquisição, no qual interferem fatores políticos, sociais, culturais e
psicológicos (BRASIL, 1997a, p. 34).
Entretanto, para se chegar ao conhecimento, o indivíduo necessariamente
passa pelo processo de aprendizagem que os PCNs explicam como um processo
151
construído pelo indivíduo na sua relação com a realidade exterior, mas também
internamente. Em outras palavras: para explicar a aquisição do conhecimento por
meio da aprendizagem, utilizam-se, principalmente, da teoria construtivista, entre
outras influências, tais como, da “psicologia genética, da teoria sociointeracionista e
das explicações de atividade significativa” (idem, p. 36). O conhecimento é, de
acordo com os Parâmetros, uma construção histórica e social, na qual interferem
fatores de ordem cultural e psicológica.
Piaget, embora não citado diretamente, organiza a explicação para a
aprendizagem humana, que é descrita a partir do desenvolvimento cognitivo do
indivíduo:
O que o aluno pode aprender em determinado momento da
escolaridade depende das possibilidades delineadas pelas formas
de pensamento de que dispõe naquela fase de desenvolvimento,
dos conhecimentos que construiu anteriormente e do ensino que
recebe. Isto é, a intervenção pedagógica deve-se ajustar ao que os
alunos conseguem realizar em cada momento de sua
aprendizagem, para se constituir verdadeira ajuda educativa. O
conhecimento é resultado de um complexo e intrincado processo de
modificação, reorganização e construção, utilizado pelos alunos
para assimilar e interpretar os conteúdos escolares (BRASIL, 1997a,
p. 37).
Ao optarem pela vertente teórica em foco, o que os PCNs deixam entrever é
que não estão excluindo a explicação (sócio)interacionista de Vygotsky, para a
aprendizagem humana. Estão tratando-a como arcabouço teórico do construtivismo,
interpretando que este integra, “num único esquema explicativo, questões relativas
ao desenvolvimento individual e à pertinência cultural, à construção do
conhecimento e à interação social” (idem, p. 37), todos mediados por sujeitos mais
experientes.
Na seqüência desta justificativa, transparece, no texto, uma paráfrase à fala
de Vygotsky relativa às zonas de desenvolvimento proximal (ZPD) da criança. Para
Vygotsky (1984) há apenas um meio de reter a atenção dos alunos nas ações
propostas: planejar as atividades didáticas, levando em conta e buscando incidir
sobre a ZDP. Para tal, é imprescindível que o educador conheça tanto o
desenvolvimento real quanto o potencial de seus alunos, ou seja, as atividades que
estes conseguem realizar autonomamente e aquelas que são possíveis apenas com
a colaboração de outrem. A esse respeito, assim evidenciam:
152
Para a estruturação da intervenção educativa é fundamental
distinguir o nível de desenvolvimento real do potencial. O nível de
desenvolvimento real se determina como aquilo que o aluno pode
fazer sozinho em uma situação determinada, sem ajuda de
ninguém. O nível de desenvolvimento potencial é determinado pelo
que o aluno pode fazer ou aprender mediante a interação com
outras pessoas, conforme as observa, imitando, trocando idéias com
elas, ouvindo suas explicações, sendo desafiado por elas ou
contrapondo-se a elas, sejam essas pessoas o professor ou seus
colegas. Existe uma zona de desenvolvimento proximal, dada pela
diferença existente entre o que um aluno pode fazer sozinho e o que
pode fazer ou aprender com a ajuda dos outros. De acordo com
essa concepção, falar dos mecanismos de intervenção educativa
equivale a falar dos mecanismos interativos pelos quais professores
e colegas conseguem ajustar sua ajuda aos processos de
construção de significados realizados pelos alunos no decorrer das
atividades escolares de ensino e aprendizagem (BRASIL, 1997a, p.
38).
O interessante é que, embora façam referência explícita, não ocorre nenhuma
menção direta ao autor no corpo do texto, apenas na bibliografia
105
. Mesmo que
demonstrem respaldar os PCNs também nas discussões (sócio)interacionistas da
aprendizagem (até mesmo porque a maioria dos currículos estaduais e municipais
da década de 1980 e início da década de 1990 contemplavam tal visão e seria,
então, interessante mostrar-se favoráveis a eles), ao analisar o construto teórico que
o embasa, percebo a forte influência de teorias construtivistas
106
, subsidiando a
105
VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1984.
_____. Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1987.
106
CARRETERO, M. Construtivismo e educação. Buenos Aires: Aique, 1993.
CASTORINA, J. A. Psicologia genética. Porto Alegre: Artes Médicas, 1988.
CASTORINA, J. A.; FERREIRO, E.; LERNER, D. e OLIVEIRA, M. K. Piaget-Vigotsky: novas
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WEISZ, T. As contribuições da psicogênese da língua escrita e algumas reflexões sobre a prática
educativa de alfabetização. In: CENP, Secretaria da Educação do Estado de São Paulo. São Paulo:
1989.
153
compreensão que pretendem defender em relação a como a criança aprende e,
portanto, como devemos ensinar.
2.3.1.1 Concepção de linguagem e ensino da Língua Portuguesa
Organizado em ciclos (primeiro ciclo corresponde a 1ª e séries; segundo
ciclo, a e 4ª séries; terceiro ciclo, a 5ª e 6ª séries; quarto ciclo, a e ries), o
objetivo geral do ensino da Língua Portuguesa para o ensino fundamental é,
segundo os PCNs, “que os alunos adquiram progressivamente uma competência em
relação à linguagem que lhes possibilite resolver problemas da vida cotidiana, ter
acesso aos bens culturais e alcançar a participação plena no mundo letrado”
(BRASIL, 1997b, p. 41).
Se na introdução dos PCNs destacou-se o viés construtivista de
aprendizagem, na área de Língua Portuguesa, desde o início, a linguagem é
entendida como histórica e ideologicamente determinada, reconhecida como
instrumento de integração do indivíduo para a participação social e como resultado
das práticas sociais nas quais o indivíduo está inserido. Trata-se de “uma concepção
enunciativa/discursiva de linguagem, decorrente não de uma opção teórica,
dentre outras, mas, sobretudo, dos princípios e objetivos gerais assumidos pelos
PCNs” (BARBOSA, 2000, p. 151), o de formar cidadãos.
A língua, dentro do sistema amplo das diferentes formas de linguagem, é
tomada, da mesma forma, como um bem socialmente construído:
(...) a língua é um sistema de signos históricos e sociais que
possibilita ao homem significar o mundo e a realidade. Assim,
aprendê-la é aprender não as palavras, mas também os seus
significados culturais e, com eles, os modos pelos quais as pessoas
do seu meio social entendem e interpretam a realidade e a si
mesmas (BRASIL, 1997b, p. 24).
Assumindo a versão cio-discursiva bakhtiniana, a linguagem é tratada na
perspectiva da interação verbal entre interlocutores reais, considerando situações
concretas de produção. Logo, “produzir linguagem significa produzir discursos.
Significa dizer alguma coisa para alguém, de uma determinada forma, num
determinado contexto histórico” (idem, p. 25). Portanto, a linguagem deve ser
154
abordada sempre na perspectiva do outro, do interlocutor, que determinará o que
dizer e como dizer, selecionando palavras e carregando-as de significado.
Na realidade, toda palavra comporta duas faces. Ela é determinada
tanto pelo fato de que precede de alguém, como pelo fato de que se
dirige para alguém. Ela constitui justamente o produto da interação
do locutor e do ouvinte. Toda palavra serve de expressão a um em
relação ao outro. (...) A palavra é uma espécie de fonte lançada
entre mim e os outros. Se ela se apóia sobre mim em uma
extremidade, na outra, apóia-se sobre meu interlocutor (BAKHTIN,
1988, p. 113).
Para garantir a função social da linguagem, a interlocução por meio de
discursos, a prática efetiva de uso da língua, os PCNs adotam os gêneros (na
perspectiva bakhtiniana) como o lugar de concretização real do discurso. A noção de
gêneros (discursivos
107
ou textuais
108
), bem como a de discurso são apresentadas,
estabelecendo uma relação com o texto.
A eleição do texto como unidade básica de ensino, bem como da
noção bakhtiniana de gêneros do discurso como articuladora do
trabalho em Língua Portuguesa, tal como efetivada pelos PCNs, é
uma dessas possibilidades de concretização (BARBOSA, 2000, p.
151).
Reconhecer os gêneros como formas de dizer sócio-historicamente
construídas e elegê-los como objeto de ensino, pelo fato de incluir aspectos da
enunciação e do discurso, indubitavelmente, pode contemplar, de forma mais
satisfatória, o processo de produção e de compreensão de textos. Quando se adota
a noção de gêneros, está se incorporando os aspectos sociais e históricos presentes
na interlocução; considerando a situação de produção de um dado discurso,
refletindo sobre quem fala, para quem fala, como fala, com que posicionamentos
ideológicos, em que situação, em que momento histórico, em que veículo, com que
objetivo, finalidade, ou intenção, em que registro, etc.; focalizando o conteúdo
temático, tendo em vista do que se pode dizer em um dado gênero; refletindo sobre
sua estrutura composicional que determina, socialmente, a forma de dizer; e
107
Quando se adota a expressão “gêneros discursivos” está assumindo a teoria proposta por Bakhtin
que explica e define os gêneros em relação ao discurso.
108
Quando se adota a expressão “gêneros textuais” está empregando a teoria de Bronckart, que
estuda a arquitetura interna dos textos a partir da compreensão dos gêneros como socialmente
definidos.
155
selecionando o estilo, ou seja, os recursos lingüísticos disponibilizados pela língua
em função do que se vai dizer e para quem.
Todavia, ao eleger os gêneros como objeto de ensino, os PCNs não deram o
tratamento devido ao tema. Desde a sua primeira menção até a última, os gêneros
foram abordados sem detalhamentos que, especificamente neste documento, seria
necessário, tendo em vista seus interlocutores reais: professores das séries iniciais,
com diferentes formações.
Costa-Hübes (2005), ao proceder a uma análise a respeito de como os
gêneros são tratados nos PCNs dos ciclos iniciais, constatou que, diferentemente do
que se esperava, quando a palavra “gênero” aparece pela primeira vez (BRASIL,
1997b, p. 25), a mesma não é definida e sim tratada como conhecimento comum a
todos. Somente na página seguinte, ao retomar novamente o termo, os PCNs
apenas informam, em nota de rodapé, que o termo “é utilizado aqui como proposto
por Bakhtin e desenvolvido por Bronckart e Schneuwly” (Idem, p. 25) sem qualquer
referência às suas obras. Os redatores dos PCNs agiram como se os teóricos
apontados fossem velhos conhecidos de seus interlocutores. A seguir,
exemplificaram-no da seguinte forma:
Os vários gêneros existentes, por sua vez, constituem formas
relativamente estáveis de enunciados, disponíveis na cultura,
caracterizados por três elementos: conteúdo temático, estilo e
construção composicional. Pode-se ainda afirmar que a noção de
gênero refere-se a “famílias” de textos que compartilham algumas
características comuns, embora heterogêneas, como visão geral à
qual o texto se articula, tipo, suporte comunicativo, extensão, grau
de literalidade, por exemplo, existindo em número quase ilimitado
(Idem, p.26 – grifo nosso).
Costa-Hübes (2005) reconheceu, na citação, um discurso tecnicamente
elaborado por especialistas, estudiosos, pesquisadores da linguagem, de forma tal
que os termos destacados entrelaçam-se à definição de maneira estável, como se
tratassem de expressões amplamente discutidas e assimiladas pelos leitores.
Porém, caso não saibam interpretar tais termos, será que compreenderiam a noção
de gênero aí estabelecida?
Silva havia tecido críticas a esse respeito, postulando que o texto dos
PCNs “apresenta falhas textuais, pois em vez de ajudar a divulgar e a introduzir
conceitos lingüísticos (...) parece estar dialogando com os leitores” (SILVA, 2001, p.
156
106) que, nesse caso, conheceriam os recentes trabalhos e pesquisas sobre
gêneros textuais. Desconsidera, portanto, a possibilidade desse conhecimento não
ser real, uma vez que estão se dirigindo a professores que, em grande parte, não
possuem uma formação de nível superior.
A partir da seleção dos gêneros como o lugar onde o discurso se concretiza,
o ensino da Língua Portuguesa é assentado em três variáveis: o aluno, o professor e
a língua. O aluno é tratado como “sujeito da ação de aprender, aquele que age
sobre o objeto de conhecimento” (BRASIL, 1997b, p. 29); o professor como o
mediador da aprendizagem; e a língua ensinada deve ser aquela que “se fala em
instâncias públicas e a que existe nos textos escritos que circulam socialmente”
(idem). A diversidade de texto (ibidem, p. 30) é tomada, então, como a unidade
articuladora do conhecimento da língua.
Ao discorrer sobre o assunto, tratam o texto não mais como gêneros, mas
sim como tipos de textos que circulam socialmente, como se fossem termos
sinônimos. Quando falam do “tratamento didático” (idem, p. 54) que deve ser dado à
leitura, novamente ressaltam a importância de “trabalhar com a diversidade de texto
e das combinações entre eles”. E assim reforçam expressões como “modalidades de
textos” e “diferentes textos” (ibidem, p.57) que são recorrentes em outras citações,
até mesmo nos objetivos de ensino da língua “... ler e analisar uma grande
variedade de textos e portadores do tipo que se vai produzir” (idem, p.71). A
expressão “gêneros” é retomada na parte em que os autores tratam da “Prática
de produção de texto” (ibidem, p.65) e escrevem:
Um escritor competente é alguém que (...) sabe selecionar o gênero
no qual seu discurso se realizará escolhendo aquele que for
apropriado a seus objetivos e à circunstância enunciativa em
questão. Por exemplo: se o que deseja é convencer o leitor, o
escritor competente selecionará um gênero que lhe possibilite a
produção de um texto predominantemente argumentativo; se é fazer
uma solicitação a determinada autoridade, provavelmente redigirá
um ofício; se é enviar notícias a familiares, escreverá uma carta. O
escritor competente é alguém que planeja o discurso e
conseqüentemente o texto em função do seu objetivo e do leitor a
que se destina, sem desconsiderar as características específicas
dos gêneros (BRASIL, 1997b, p. 65 – grifo nosso).
Quando abordam os conteúdos específicos deste ciclo, os autores adotam a
terminologia de Bakhtin (1988) “gêneros discursivos” e o de Bronckart (2003, p.
143) “gêneros de texto” e os dividem em dois grandes grupos: “gêneros adequados
157
para o trabalho com a linguagem oral (...), gêneros adequados para o trabalho com a
linguagem escrita” (
BRASIL, 1997b,
p.111). Para os gêneros orais, sugerem o
trabalho com contos, poemas, saudações, entrevistas, notícias, anúncios,
seminários e palestras; para os gêneros escritos, indicam receitas, instruções de
uso, listas, textos impressos em embalagens, rótulos, calendários, cartas, bilhetes,
postais, cartões, convites, quadrinhos, textos de jornais, revistas e suplementos
infantis, anúncios, slogans, cartazes e folhetos.
Embora com algumas impropriedades teóricas, a eleição dos gêneros como
objeto de ensino nos PCNs ampliou não a noção de texto, mas também a noção
discursiva da língua. Barbosa, ao analisar os aspectos favoráveis a tal adoção,
acrescenta que os gêneros:
(...) permitem circunscrever as formas de dizer que circulam
socialmente, o que permite que o professor possa ter parâmetros
mais claros acerca do que deve ensinar e do que deve avaliar e, por
extensão, os alunos também podem ter uma maior clareza do que
devem saber ou do que devem aprender (BARBOSA, 2000, p. 155).
A perspectiva enunciativa/discursiva da linguagem orienta, assim, o próprio
trabalho com a língua, com os mecanismos lingüísticos que organizam internamente
o gênero, bem como seus aspectos tipológicos. Os conteúdos de Língua Portuguesa
são, portanto, assentados, no trabalho com a oralidade, com a leitura, com a
produção de textos e com a análise e reflexão sobre a língua.
Ao tratar da língua tanto na alfabetização (primeiro ciclo), como nas séries
do segundo ciclo, o texto (produzido pelo aluno ou impresso) é apresentado como o
instrumento ideal para ensinar e provocar reflexões sobre a língua, pois “para
aprender a ler e a escrever é preciso pensar sobre a escrita, pensar sobre o que a
escrita representa e como representa graficamente a linguagem” (BRASIL, 1997b, p.
82).
A gramática é, então, focalizada, sob o rótulo de “análise e reflexão sobre a
língua” (Idem, p. 78), entendendo as atividades de análise lingüística “como aquelas
que tomam determinadas características da linguagem como objeto de reflexão”
(idem), apoiando-se na capacidade humana de refletir sobre os fenômenos da
língua. Em outras palavras, a análise lingüística:
(...) implica uma atividade permanente de formulação e verificação
de hipóteses sobre o funcionamento da linguagem que se realiza
158
por meio da comparação de expressões, da experimentação de
novos modos de escrever, da atribuição de novos sentidos a formas
lingüísticas já utilizadas, da observação de regularidade (no que se
refere tanto ao sistema da escrita quanto aos aspectos ortográficos
ou gramaticais) e da exploração de diferentes possibilidades de
transformação dos textos (BRASIL, 1997b, p. 78 e 79).
Compreendida dessa forma, as atividades de análise e reflexão sobre a
língua organizam-se a partir da revisão (reescrita / reestruturação / refacção) de
textos; de leitura e análise de textos impressos de diferentes autores; das práticas
de alfabetização/sistematização do código escrito; da pesquisa, estudo e formulação
de hipóteses sobre os aspectos ortográficos da língua; e da reflexão sobre os sinais
de pontuação empregados num texto. Pautados em tais pressupostos, os PCNs
apresentam uma relação de conteúdos que compreendem a “Análise e Reflexão
sobre a Língua”:
Análise da qualidade da produção oral alheia e própria,
reconhecendo progressivamente a relação entre as condições
de produção e o texto decorrente (no que diz respeito tanto à
linguagem como à organização do conteúdo).
Comparação entre diferentes registros utilizados em diferentes
situações comunicativas.
Análise dos sentidos atribuídos a um texto nas diferentes
leituras individuais e discussão dos elementos do texto que
validem ou não essas diferentes atribuições de sentido.
Revisão do próprio texto:
durante o processo de redação, relendo cada parte escrita,
verificando a articulação com o escrito e planejando o
que falta escrever;
depois de produzida uma primeira versão, trabalhando
sobre o rascunho para aprimorá-lo, considerando as
seguintes questões: adequação ao gênero, coerência e
coesão textual, pontuação, paragrafação e ortografia.
Exploração das possibilidades e recursos da linguagem que se
usa para escrever, a partir da observação e análise de textos
especialmente bem escritos.
Análise de regularidades da escrita:
derivação de regras ortográficas;
concordância verbal e nominal (e outros aspectos que se
mostrem necessários a partir das dificuldades de redação);
relações entre acentuação e tonicidade: regras de
acentuação (BRASIL, 1997b, p. 133)
O enfoque da língua está voltado para a sua funcionalidade, para os aspectos
enunciativos e discursivos resultantes de sua organização em determinado gênero
textual. Assim, mais importante que “decorar” regras gramaticais, é o aluno produzir
textos (orais e escritos), considerando as características do gênero, utilizando os
159
recursos lingüísticos necessários para a organização do(s) sentido(s) pretendido(s) e
saber revisar seus próprios textos, aprimorando-os à situação de interlocução. Se o
professor do primeiro e segundo ciclos garantir tal aprendizagem, terá atingido o
objetivo desejável para esse nível de ensino. A aprendizagem/ensino da gramática
será uma conseqüência de textos bem produzidos.
Assim como todos os demais documentos/propostas elencadas a aqui
(Currículo da SEED, modelo Erasmo Pilotto, Projeto “O texto na sala de Aula”, CBA,
CBPR), cada qual com sua contribuição, os PCNs apresentaram-se como mais uma
proposta diante das ações já implementadas.
Todavia, atendendo a um momento histórico-político-ideológico, os efeitos
das ações serão potencializados se diferentes modalidades de intervenção forem
implementadas. Dentre as tantas possíveis, comungo das idéias de Barbosa quando
diz: “Consideramos que a formação continuada de professores e demais educadores
deva ser privilegiada, sem o que a prática da sala de aula não sofrerá mudanças
substanciais na direção pretendida” (BARBOSA, 2000, p. 150). E acrescenta que
qualquer documento oficial necessita dessa intervenção e a sua transposição direta
para a sala de aula “feriria a natureza desses próprios documentos e seria
contraditório com alguns princípios norteadores da prática pedagógica nestes
assumidos” (idem).
Todavia, o que houve de concreto nesse sentido? O que o MEC, órgão oficial
responsável pela elaboração dos PCNs, propiciou para que os professores se
sentissem mais seguros para pautar suas aulas, seus planos de ensino, o Projeto
Político Pedagógico da sua escola neste documento?
Além da publicação dos Referenciais para a Formação dos Professores, em
1999 (cf. p. 39 3 40), e de garantir, em outros documentos (citados na p. 41), o
exercício de formação, as ações concretas do MEC nesta direção podem ser
resumidas em duas ações: a da criação da Rede Nacional de Formação Continuada
(cf. p. 46 e 47); e a do Pró-letramento.
O Pró-letramento
109
, considerado um braço das ações produzidas pela Rede
Nacional de Formação continuada, tem, como objetivo, segundo o MEC, promover a
melhoria da qualidade de aprendizagem da leitura/escrita e da matemática nas
séries iniciais do ensino fundamental. Trata-se de um programa coordenado pelo
109
No qual atuei, em 2006, como docente, trabalhando com tutores dos Estados da Bahia, de
Alagoas e de Santa Catarina.
160
MEC e realizado em parceria com os Centros que compõem a Rede (cf. p. 46-47),
com a adesão dos Estados e Municípios.
A partir de sete fascículos produzidos por professores dos diferentes Centros
de Formação Continuada
110
, os quais são distribuídos aos tutores
111
e professores,
são trabalhadas 120 horas de formação, divididas em duas modalidades: no mínimo
84 horas presenciais e as demais em forma de atividades individuais. Até o
momento, todos os Estados do Nordeste, mais São Paulo, Rio de Janeiro e Santa
Catarina já foram envolvidos no processo.
No entanto, considero que somente estas ações do MEC não sejam
suficientes para garantir o exercício da formação continuada, que nem todos os
Estados foram contemplados por ela. Logo, cabe aos Estados e aos Municípios
complementarem com outras iniciativas que atendam à necessidade de reflexão, de
estudo, de pesquisa, enfim, de formação continuada dos professores durante o
exercício do magistério. Caso contrário, de que adiantará elaborar documentos,
implementar programas, repensar o planejamento se não houver espaço para o
estudo, para a reflexão?
2.3.2 Currículo Básico para a Escola Pública Municipal Educação Infantil e
Ensino Fundamental (anos iniciais) da Região Oeste do Paraná
CBEPM: uma proposta alicerçada em reflexões
Os educadores da região Oeste do Paraná, depois de três décadas de
intensas reflexões propiciadas por ações do Projeto MEC/OEA, da ASSOESTE e,
hoje, da AMOP, sobre métodos de ensino (Erasmo Pilotto, dentre outros), Projetos
de ensino (Projeto “O texto na sala de aula”) e documentos oficiais (Currículo da
110
Fascículo 1: Capacidades lingüísticas da alfabetização e da avaliação, produzido por um grupo de
professores da Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG; Fascículo 2: A organização do tempo
pedagógico e o planejamento de ensino, elaborado por professores da Universidade Estadual de
Campinas - UNICAMP; Fascículo 3: Organização e uso da biblioteca escolar e das salas de leituras,
também organizado pela Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP; Fascículo 4: Relatos
docentes: uma possibilidade de reflexão sobre a prática lingüística na alfabetização e no ensino da
língua nas séries ou ciclos iniciais, produzido pela professora Maria Beatriz Ferreira, da Universidade
Estadual de Ponta Grossa - UEPG; Fascículo 5: Jogos e brincadeiras no ensino da língua
portuguesa, produzido por um grupo de professores da Universidade Federal de Pernambuco –
UFPE; Fascículo 6: Modos de falar, modos de escrever, produzidos por professores da Universidade
de Brasília UnB; Fascículo 7: O livro didático em sala de aula: algumas reflexões, produzidos por
professores da Universidade Federal de Pernambuco – UFP e Universidade Federal de Minas Gerais
– UFMG.
111
Como são chamados os professores selecionados, nos municípios, para receber, dos Centros, a
formação em relação aos fascículos para, posteriormente, repassá-la aos colegas.
161
SEED, CBA, CBPR e PCNs); depois das mudanças previstas pela LDB em relação a
implantação do Ensino Fundamental de nove anos; também sentiram que chegara o
momento de discutir um Currículo próprio que formatasse o conhecimento
construído pelo extenso processo de reflexões.
Contudo, o mesmo deveria assentar-se numa base teórica capaz de garantir
a formação de homem desejada, sem perder de vista os documentos oficiais
organizadores do ensino. Para tanto, foram necessárias muitas reflexões, encontros,
estudos e pesquisas (cf. p. 80 e 81) para, finalmente, depois de dois anos, mais
precisamente no início de 2007, ser publicado o CBEPM.
O documento, após uma apresentação, na qual resgata o seu processo de
construção, apresenta uma breve “Contextualização Histórica da Região” (AMOP,
2007, p. 12-15), na perspectiva de garantir a visão de educação como resultado de
ações sócio-histórico-ideológicas que perpassam o tempo, influenciando as ações
que se fazem na e pela educação.
Na seqüência, por meio de uma “Contextualização Histórica da Organização
Curricular” (idem, p. 16-27), apresenta o relato de como as políticas governamentais
encaminharam os processos decisórios de municipalização da educação e como tais
decisões afetaram o ensino nos municípios. Arrola, também, sobre as mudanças
acarretadas pela implantação do CBA que provocou a necessidade de reestruturar
todo o ensino fundamental, resultando na elaboração e publicação do CBPR.
Resgata, ainda, o processo de elaboração dos PCNs, revelador de uma política
nacional neoliberal, e suas implicações, diretas ou indiretas, na organização do
ensino. Os resgates o construídos dialeticamente, tendo em vista as reflexões
críticas que alertam seus interlocutores para as influências políticas e ideológicas
subjacentes às decisões pedagógicas.
A partir de tais contextualizações, encaminha uma discussão sobre os
pressupostos filosóficos, legais, psicológicos e pedagógicos que subsidiarão as
áreas de ensino para, então apresentar cada disciplina com sua contextualização
histórica, sua concepção, seu objetivo geral, seus conteúdos e sua proposta de
avaliação.
Como pressuposto filosófico, o Currículo está ancorado, assim com o CBPR,
no Materialismo Histórico Dialético por acreditar que a educação não se faz sempre
da mesma forma, mas “de acordo com as condições possíveis em cada momento do
processo de desenvolvimento social, histórico, cultural e econômico, ou seja, fazer
162
educação pressupõe pensá-la e fazê-la numa perspectiva política-pedagógica”
(AMOP, 2007, p. 28). A educação, posta sob tais parâmetros, ganha uma outra
dimensão: trata-se de um ato pedagógico que “carrega implicações sociais, está
marcada pela prática de todos os envolvidos no processo educativo e é mediada por
relações sócio-históricas” (idem).
Se, conforme Marx (1977), a realidade não é estática, está em constante
devir, também a educação está em movimento: o que foi, influencia no que é hoje
que, por sua vez, determina o que poderá vir a ser. O homem, assim como a
educação, também é compreendido como “produto do meio que, em sendo
produzido, passa a produzir o meio que o produz e em que se produz” (AMOP,
2007, p. 29). Desse modo, os homens fazem a história, mas não como querem;
fazem-na conforme as condições nas quais se encontram, e a educação, como parte
da sociedade, prepara o homem para viver nela mesma, não para adaptar-se e
adequar-se a ela, e sim para lutar e transformá-la segundo suas necessidades.
Os pressupostos legais, por sua vez, fazem um resgate da legislação que
rege a educação, com a pretensão de situá-la no contexto da organização da
sociedade, destacando o Estado como o gerenciador dos processos educativos.
Também numa perspectiva dialética, procura mostrar que as leis educacionais são
constituídas “pelos limites e pelas intencionalidades postos pelas condições
históricas, políticas, culturais e sociais nas quais foram produzidas” (idem, p. 35).
os pressupostos psicológicos irão destacar, primeiramente, como o
desenvolvimento humano foi concebido ao logo da história, para, em seguida, firmar-
se no (sócio)interacionismo de Vygotsky (1991).
A marca distintiva dessa concepção é o pressuposto fundamental de
que a interação do sujeito com o objeto e deste com o sujeito se
insere no contexto social e, obrigatoriamente, depende de relações
de mediação (AMOP, 2007, p. 49).
O desenvolvimento é entendido, então, como socialmente determinado. É na
interação com o meio e com o outro, isto é, com pessoas mais experientes, que o
sujeito desenvolve suas funções psicológicas, tais como: atenção voluntária,
percepção, memória, linguagem, pensamento e raciocínio. O desenvolvimento
humano é regido por leis sócio-históricas, mediadas, inicialmente, pelo uso de
instrumentos e, posteriormente, pelo uso de signos que contribuem para libertar o
sujeito da necessidade de manipulação do concreto:
163
A transposição do concreto ao abstrato é um passo significativo no
desenvolvimento humano porque possibilita ao sujeito a utilização
do pensamento como estratégia/meio para a aquisição do
conhecimento e para a troca de experiências (Idem, p. 52).
A linguagem, produzida historicamente a partir da necessidade de interação,
é interpretada como um sistema simbólico básico que permite a troca de
informações e a ação conjunta sobre o mundo.
Compactuando com tais bases teóricas, os pressupostos pedagógicos irão
ancorar numa proposta de ensino que provoque, nos alunos, o espírito investigador
e que amplie a exigência em relação ao conhecimento historicamente acumulado.
Para isso, propõem que o educador, ao abordar determinado conteúdo, parta do que
é visível e observável (concreto) para o aluno, conduzindo-o a uma síntese (concreto
pensado), ou seja, partir dos conceitos espontâneos para construir conceitos
científicos.
Para partir do simples, a realidade sensível deve ser o ponto de
partida e de chegada, mas o ponto de chegada deve conter
elementos do universal agregados ao particular. (...) É necessário
tornar dialética a relação do contexto social mais amplo com o
contexto da escola, levando o educando a construir instrumentos
para intervir na própria organização social (AMOP, 2007, p. 64).
A compreensão do contexto social exige um trabalho com o conhecimento na
sua totalidade, superando a costumeira fragmentação tão presente nas práticas
escolares, tratando-o em blocos de disciplinas, de conteúdos, enfim, de informações.
Cabe à escola, nesse processo, possibilitar o acesso a um conjunto de
conhecimentos produzidos pela humanidade, “não como algo alienado, mas sim
como instrumento para fazer a leitura de mundo, capaz de nortear sua prática social.
Isso exige, no processo educativo, a capacidade de análise, de interpretação e de
síntese” (idem).
Este é o cidadão e a escola idealizados pelo CBEPM.
2.3.2.1 A disciplina de Língua Portuguesa: concepção, objeto de ensino e
gramática
Ao tratar da disciplina de Língua Portuguesa, o CBEPM parte de uma
contextualização histórica com o propósito de explicar como a linguagem foi
concebida através dos tempos, resgatando, brevemente, as influências das
164
concepções de linguagem como “transmissão do pensamento” e como “instrumento
de comunicação” no tratamento dado à língua.
A concepção (sócio)interacionista é adotada como norteadora das discussões
sobre o ensino da língua, tendo em vista que a linguagem é compreendida, no
contexto, como sócio-historicamente determinada. Dessa forma, “pensar no ensino
da Língua Portuguesa implica pensar na realidade como algo que permeia o nosso
cotidiano, articulando nossas relações com o mundo e com o outro, e com os modos
como entendemos e produzimos essas relações” (AMOP, 2007, p. 144).
Interpretada sob tal dimensão, ensinar a língua não é somente ensinar a ler e
a escrever, mas sim, é letrar o indivíduo para que faça uso da leitura e da escrita em
suas práticas sociais, pois “ler e escrever não significam apenas a aquisição de
‘instrumentos’ para a futura obtenção de conhecimentos, mas uma forma de
pensamento, um processo de produção do saber, um meio de interação social com
o mundo” (Idem, p. 144).
Nesse sentido, tratar apenas do texto como instrumento de análise e ensino,
o basta. É preciso focalizar realizações concretas de interação, representadas
pelos gêneros discursivos. Os gêneros são, assim, adotados, da mesma forma que
nos PCNs, como objeto de ensino, compartilhando com as palavras de Bakhtin
(1992) quando diz que o homem é um ser histórico e social, carregado de valores, e
a língua na qual e pela qual ele se constitui, é reflexo de suas relações com os
outros homens. Assim, os modos de dizer são realizados a partir das possibilidades
oferecidas pela língua numa determinada situação ou contexto de produção e,
portanto, podem se concretizar por meio dos gêneros discursivos, entendidos
como enunciados relativamente estáveis que circulam nas diferentes áreas de
atividade humana.
Porém, como a pretensão, ao tratar da língua, é analisar, além do discurso,
os elementos que a constituem, focalizando a arquitetura interna dos textos, que
serão tomados como unidades de ensino, o CBEPM adotou, de Bronckart (2003), o
termo “gêneros textuais”.
O objetivo pretendido com o ensino da Língua Portuguesa a partir dos
gêneros textuais, “é que os alunos desenvolvam, de forma contínua, os
conhecimentos em relação aos usos da linguagem, possibilitando-lhes interagir
socialmente com o outro, ter acesso aos bens culturais e agir efetivamente no
mundo letrado” (AMOP, 2007, p. 147).
165
Para isso, a metodologia adotada pautou-se na compreensão dos gêneros
como socialmente produzidos, em função do uso geral e para atender às
necessidades sociais. Então, ao invés de, ao alfabetizar, a ação pedagógica partir
da sílaba ou da palavra, ou, ao ensinar a refletir sobre a língua, começar de frases e
texto, os gêneros textuais serão tomados como elementos nucleares do processo
ensino/aprendizagem, compartilhando com a idéia de Schneuwly e Dolz (2004b), os
quais o reconhecem como mega-ferramentas para o ensino.
Para dar forma à proposta, o Currículo adota a proposição de agrupamento
dos gêneros de Dolz e Schneuwly (2004), na perspectiva de garantir domínios
essenciais de comunicação oral e escrita, desenvolvendo diferentes capacidades de
linguagem compreendidas nos gêneros do narrar, do relatar, do argumentar, do
expor e do descrever ações.
Na perspectiva de tentar garantir um tratamento específico a cada gênero
trabalhado, a disciplina de Língua Portuguesa se ampara em Dolz, Noverraz e
Schneuwly (2004), os quais apresentam uma proposta de trabalho organizado por
meio de Seqüências Didáticas (SD) que, segundo os autores, traduz-se em:
(...) conjunto de atividades, organizadas de forma sistemática, em
torno de um gênero textual (oral ou escrito), cuja finalidade é ajudar
o aluno a dominar melhor um gênero de texto, permitindo-lhe, assim,
escrever ou falar de uma forma adequada numa dada situação de
comunicação. O trabalho será realizado sobre gêneros que o aluno
não domina ou o faz de maneira insuficiente; sobre aqueles
dificilmente acessíveis espontaneamente, para a maioria dos alunos;
e sobre os gêneros públicos, e não privados (DOLZ, NOVERRAZ e
SCHNEUWLY, 2004, p. 97).
Diante de tal proposta, adotou-se o seguinte encaminhamento para o trabalho
com determinado gênero textual (AMOP, 2007, p. 150-152), com adaptações
necessárias, por tratar-se de um trabalho com as séries iniciais:
1) Apresentação da situação: Toda proposta de produção oral e escrita deve
pautar-se numa necessidade (motivo) para que a ação se efetive, ou seja, trata-
se de apresentar, aos alunos, situações de produção verdadeiras, que exijam,
realmente, sua participação na dada situação de interação. Assim, o trabalho
com um gênero textual deve ancorar-se em necessidades reais de interlocução.
166
2) Seleção do gênero: Essa necessidade de produção, que provocará um “querer
dizer” no aluno tendo em vista seu(s) interlocutor(es), exige a seleção de um
gênero textual (oral ou escrito) que o represente socialmente. Além disso, requer
um “saber dizer” embasado num “ter o que dizer”, ou seja, requer conhecimento
do tema.
3) Reconhecimento do gênero: Para utilizar o gênero selecionado, é preciso,
antes de tudo, reconhecê-lo quanto à sua função social, à sua estrutura
composicional, ao seu conteúdo temático e ao seu estilo (marcas lingüística-
enunciativas que o organizam). Para isso, inicialmente, é importante buscar, na
sociedade, textos prontos, publicados, que representem o gênero selecionado.
Por meio da leitura desses “modelos” ou amostras, os alunos poderão
reconhecer, gradativamente, sua forma “mais ou menos estável” de organização,
ao realizar atividades de:
3.1- Pesquisa sobre o gênero:
É o momento em que o professor encaminhará os alunos para atividade(s)
de pesquisa em casa, com os pais, com os irmãos, na biblioteca, na
internet etc. para reconhecimento e localização de textos do gênero na
sociedade e em diferentes veículos de circulação.
3.2- Leitura de textos do gênero:
Uma vez localizados, por meio da pesquisa, textos do gênero selecionado,
pode ser encaminhado, na sala de aula, atividades de leitura desses textos,
explorando:
a) o contexto de produção (onde foram produzidos, quem os produziu,
quando, em qual suporte, etc.);
b) a função social do gênero (papel social do emissor, objetivo(s) do
gênero, possível(is) interlocutor(es), veículo de circulação etc.);
c) o conteúdo temático (sobre o que fala cada texto, ideologia(s)
presentes, valores implícitos, relações sociais etc.);
d) estrutura composicional (análise de como os textos desse gênero se
organizam, listando suas características composicionais);
e) discurso predominante (discutir oralmente dependendo do nível de
conhecimento dos alunos, o discurso predominante nos textos do
gênero, relacionando-os com seus aspectos tipológicos);
3.3- Seleção de um texto do gênero
para atividades de leitura e interpretação:
167
a) análise do contexto de produção (formulando questionamentos por
meio de atividades);
b) análise da função social do texto (formulando questionamentos por
meio de atividades);
c) análise do conteúdo temático. As questões formuladas devem ser
distribuídas entre “decodificar o texto”, “explorar o conteúdo (as
intenções do autor, as pistas deixadas no texto, o subentendido,
provocando inferências, percebendo a ideologia presente no texto), e
“extrapolar o texto”, provocando relações com a vida, numa perspectiva
dialética;
d) análise da estrutura composicional, elaborando atividades que
exploram as características do gênero presentes no texto; que
analisem o discurso e a tipologia predominantes;
e) análise do estilo do texto, elaborando atividades que abordem suas
marcas lingüísticas, a sistematização do código escrito letras,
sílabas, fonemas (no caso da alfabetização), enfim, a gramática
contextualizada. O objetivo é explorar todos os elementos importantes
na construção do(s) sentido(s) do texto.
4) Produção oral ou escrita: O processo de produção, principalmente no que se
refere ao texto escrito, compreende, na SD, minimamente as seguintes fases:
a) planejamento do texto (primeiro esboço ou rascunho);
b) reescrita do rascunho. Não no mesmo dia, após a produção, pois se faz
necessário um distanciamento do autor em relação ao texto produzido.
Quanto mais tempo o autor se distanciar do texto, mais condições terá de
perceber as inadequações cometidas. Num trabalho em sala de aula, a
sugestão é retomar o texto no dia seguinte ou dois dias depois.
5) Reescrita do texto: As atividades de reescrita do texto são fundamentais para
observar a(s) necessidade(s) de interação em jogo, dentro do gênero
selecionado. Portanto, elas se tornam indispensáveis no processo de
sistematização do código e da língua, e pode acontecer da seguinte forma:
a) análise, pelo professor (ou pelos/com os alunos), do texto produzido;
b) levantamento das maiores dificuldades apresentadas pela turma e reveladas
na produção escrita;
c) seleção de um conteúdo
para ser abordado no momento da reescrita;
168
d) seleção de um texto produzido que apresente dificuldades no trato do
conteúdo selecionado;
e) reescrita coletiva do texto. Principalmente no primeiro ciclo, essa prática é
fundamental, pois trata-se do momento em que o aluno estará sistematizando
o código escrito. Por isso, ver o professor escrevendo, explicando no próprio
texto o funcionamento da língua, facilita a aprendizagem do código. Nos
demais ciclos, trata-se de um outro momento de análise lingüística, quando a
turma é convocada a refletir sobre os elementos lingüísticos do texto
produzido;
f) reescrita individual é outro momento de igual importância, pois mesmo que
um texto tenha sido trabalhado coletivamente, cada um deve reescrever o
seu, observando os apontamentos do professor. Este é mais um momento de
reflexão sobre os fatos da língua.
6) Circulação do gênero: Uma vez reescrito o texto e sanados os seus problemas,
este deve cumprir a sua função social, ou seja, é o momento da circulação do
gênero, tendo em vista o(s) interlocutor(es) definido(s) inicialmente.
A gramática, no contexto todo, é trabalhada em função do texto produzido
pelo aluno, ou seja, está atrelada às atividades de leitura, produção e reescrita de
textos de determinado gênero, constituindo-o, organizando-o, atribuindo-lhe
sentido(s). Assim, o Currículo propõe atividades reflexivas de uso da língua em
determinado contexto de interlocução. O quadro seguinte (AMOP, 2007, p. 158)
organiza a proposta:
OBJETIVOS ESPECÍFICOS
CONTEÚDOS CURRICULARES
1.1- Leitura de diversos textos, considerando diferentes
possibilidades de produção de sentido.
1.2- Interpretação de formas variadas de representação
(mímica, dramatização, desenho, pintura, esculturas, número,
entre outros), a partir do gênero trabalhado.
1.3- Distinção entre os símbolos da escrita e outros grafismos
(desenho, logotipo, número, entre outros), reconhecendo sua
lógica de funcionamento.
1- Ler diferentes textos do
mesmo gênero, produzindo
significados a partir de elementos
contextualizadores.
1.4- Distinção entre informações essenciais e acessórias nos
textos.
2.1- Participação nas exposições orais, escutando com
atenção, respondendo e elaborando questões, expressando
opinião.
2.2- Reprodução oral das idéias veiculadas no texto.
2- Propiciar situações de
exposição oral a partir dos textos
lidos.
2.3- Síntese oral das idéias do texto.
3- Ler oralmente textos do
mesmo gênero.
3.1- Reconhecimento das relações entre fonemas e grafemas,
de sua junção na formação de sílabas (leitura decodificação),
169
para a organização global de palavras, veiculando sentidos.
3.2 Leitura com fluência, entonação e ritmo.
4.1- Compreensão da organização do gênero oral e escrito:
4.1.1- Reconhecimento do texto escrito como registro gráfico
descontínuo (espaço entre palavras), e no texto oral como
contínuo.
4.1.2 Reconhecimento de partes (título, parágrafos, introdução,
conclusão etc.) que compõem o texto oral e escrito (de acordo
com o gênero).
4- Ler diferentes textos do
mesmo gênero, a fim de
reconhecer sua estrutura
organizacional.
4.1.3 Conhecimento da direção convencional da escrita e da
leitura.
5.1- Estrutura da narração.
52- Estrutura do relato.
5.3- Estrutura da argumentação.
5.4- Estrutura da exposição / explicação.
5.5- Estrutura da descrição.
5- Ler diferentes textos do
mesmo gênero, reconhecendo
suas seqüências discursivas que
determinam a sua tipologia.
5.6- Estrutura da injunção.
6.1- Reconhecimento das letras do alfabeto como sistema de
representação gráfica dos sinais sonoros produzidos na
linguagem oral (valor fonético fixo, posicional e arbitrário).
6.2- Categorização gráfica (diferentes formas de traçar a letra,
exercendo a mesma função na palavra), e categorização
funcional das letras (arbitrariedade do sistema da escrita).
6.3- Distinção entre letras e notações léxicas (acentos, til,
trema, apóstrofo, cedilha, hífen).
6.4- Utilização das letras do alfabeto nas tentativas de escrita,
com compreensão do princípio alfabético da língua.
6.5- Distinção entre letras e sílabas e conseqüente
segmentação das palavras em final de linha, reconhecendo as
sílabas (com uma, duas ou mais letras) e seu valor fonético.
6.6- Identificação de novas palavras resultantes de trocas de
sílaba, acréscimo ou supressão de letras numa palavra.
6.7- Reconhecimento da grafia das palavras (ortografia).
6- Ler diferentes textos do
mesmo gênero, identificando
aspectos gráficos e gramaticais.
6.8- Reconhecimento da função e do valor semântico das
palavras no texto (adjetivos, substantivos, verbos, pronomes,
conjunções e advérbios, entre outros).
7.1-.Produção do texto, considerando o gênero trabalhado, o
interlocutor, o contexto de produção, o suporte (instrumento
que carrega o texto – cartolina, envelope, papel sulfite, entre
outros), seu veículo de circulação (mural, revista, jornal, entre
outros) e sua função social.
7- Produzir textos, orais e
escritos, tendo em vista o gênero
trabalhado, o interlocutor, o
suporte e seu veículo de
circulação.
7.2- Escolha de vocabulário adequado às circunstâncias da
interação.
Revisão do texto observando se atende à necessidade de
interação, em seus aspectos sócio-histórico-ideológicos, tais
como: quem produziu, por que, para quem, quando, onde, com
que intenção, para qual veículo de circulação, que valores
expressam etc.
8.1- Clareza e coerência:
8.2.1- Unidade temática
8.2.2- Informações completas
8.2.3- Idéias bem desenvolvidas
8.2.4- Seqüência cronológica
8.2.5- Pontuação
8.2.6- Discurso direto
8.2.7- Discurso indireto
8.2.8- Paragrafação
8.2.9- Legibilidade do texto
8- Revisar o texto (oral ou
escrito) produzido, a fim de
adequá-lo ao gênero, ao(s)
interlocutor(es), ao suporte e ao
veículo de circulação.
8.2.10-Seqüência lógica
170
8.2.11- Idéias sem contradição
8.2.12- Idéias sem ambigüidade
8.2.13- Informações não redundantes
8.2.14- Título
8.2.15- Consistência
8.2.16- Objetividade
8.3- Emprego adequado dos mecanismos de textualização:
8.3.1- Coesão nominal (referencial)
8.3.1.1- Emprego dos pronomes
8.3.1.2- Emprego dos advérbios
8.3.1.3- Emprego de expressões sinônimas
8. 8.3.1.4
- Emprego de repetições
8.4- Coesão verbal:
8.4.1- Emprego dos verbos (sem sujeito)
8.4.2- Adequação dos tempos e formas verbais às pessoas do
discurso.
8.5- Mecanismos de conexão (coesão seqüencial):
8.5.1- Emprego das conjunções
8.6- Organização sintática:
8.6.1 Concordância verbal
8.6.2 Concordância nominal
8.6.3 Regência verbal
8.6.4 Regência nominal
9- Divulgar textos produzidos, de
acordo com o gênero textual
selecionado, o(s) interlocutor(es),
o suporte e o veículo de
circulação, a fim de garantir a
função social da escrita.
9.1- Divulgação, oral ou escrita, do texto produzido.
Todavia, para que a proposta de ensino da língua, organizada em forma de
SD, realmente se efetive na prática da sala de aula, ainda haverá um longo
percurso. Trata-se de tornar o Currículo, com seus pressupostos e o que se propôs
em relação à Língua Portuguesa, compreensível aos professores. É preciso,
primeiramente, entender o que está posto, compartilhar das idéias, acreditar nas
possibilidades de concretização para, só depois, tentar traduzi-las para a prática.
Para auxiliar neste percurso, julgo que será necessário um intenso trabalho
de formação continuada, organizada principalmente por meio de grupos de estudos,
pois essa modalidade de evento requer um compromisso maior dos integrantes em
relação às leituras e às compreensões decorrentes destas, propiciando maior
reflexão. Cursos e palestras poderão contribuir desde que associados a grupos de
estudos organizados em cada município.
As políticas públicas municipais para essa formação não podem ser
compostas de eventos pontuais, especialmente quando
comprometidos com a ideologia empresarial de qualidade total e
empreendedorismo, entendidas como responsabilidade do diretor ou
dos especialistas que atuam na escola. (...) A formação a que nos
171
referimos ganhará caráter de continuidade se propiciar um
processo de aprofundamento epistemológico (AMOP, 2007, p. 59).
Para isso, a AMOP está retomando, em 2007, os “Encontros de Equipes”
realizados pela ASSOESTE (cf. p. 81). Trata-se de encontros de estudos realizados
nas diferentes áreas, representadas, cada uma, por coordenadores dos municípios.
Estes são professores ou representantes da equipe pedagógica que assumem a
responsabilidade de socializar, com os colegas, no município, as informações
assimiladas em cada encontro. Para este ano, foram planejados 5 encontros. Além
destes, os coordenadores de área da AMOP, que coordenaram a elaboração do
Currículo, estão se dirigindo aos municípios para realização de cursos, atendendo a
convites.
Na área de Língua Portuguesa, prossegue o grupo de estudos iniciado em
2006, contando, em 2007, com 18 integrantes
112
, os quais aprofundam o estudo dos
gêneros textuais, enfocando, mais especificamente, neste ano, a estrutura interna
dos gêneros. Ademais, estão elaborando propostas de atividades com os gêneros
textuais, voltadas para as séries/anos iniciais e organizadas em forma de SD, com a
pretensão de construírem, ainda neste ano, o Caderno Pedagógico 2, dando
continuidade à produção do ano anterior.
2.4 Algumas Considerações
Ao traçar esse longo percurso, iniciado na década de 1970, meu propósito,
com o olhar voltado para a região Oeste do Paraná, foi o de resgatar e apresentar os
documentos e projetos de ensino que, uma vez embasados teoricamente,
influenciaram/influenciam, direta ou indiretamente, a formação continuada dos
professores das séries iniciais, determinando, conseqüentemente, suas ações.
A intenção foi de revelar que toda proposta de ensino reproduz a ideologia
propagada pelos órgãos executores que, para garantir maior cientificidade ao
discurso, amparam seu querer-dizer nos pressupostos retirados da Filosofia, da
Psicologia, da Pedagogia etc. A partir de tal base teórica, orientam como deve ser a
formação do aluno e sua relação com a sociedade, explicam como a criança
aprende e desenvolve seus conhecimentos, determinam, dentro do processo todo,
112
O Grupo de Estudo, assim como em 2006, continua sob minha coordenação.
172
como a escola deve ensinar e como o professor deve trabalhar. Portanto, estar
atento à formação ideológica que subjaz cada documento é uma maneira
interessante de conhecer e se resguardar (se necessário for) da ideologia de seus
organizadores.
Caso o professor não esteja atento, corre o risco de ser moldado pelos
diferentes discursos (oficiais e/ou acadêmicos) que, uma vez formatados num
documento, adquirem valor de “verdade”, impondo-se sobre as ações didáticas. O
que importa, diante das vozes que se cruzam, ganham força ou se perdem, é
colocar-se como interlocutor, refletindo, questionando, posicionando-se, enfim,
(re)formulando conceitos. Nessa atitude de interlocução, o docente deixa de ser
“moldado” para construir a própria compreensão de mundo, de sociedade, de
homem, de escola, de ensino, de aprendizagem, de língua.
Se a Língua Portuguesa, no contexto das décadas mencionadas, adquiriu
diversas nuances: da gramática (para aprender a “ler e escrever corretamente”) para
o texto (como unidade de interação entre os sujeitos, no qual a língua se concretiza);
do texto para os neros textuais (como mega-instrumento de interação e de
reflexão sobre a língua), refletir sobre cada momento, reavivar situações na maioria
das quais participou, é reconhecer o ensino da língua como sócio-historicamente
construído.
Portanto, falar das ações político-educacionais em cada década e/ou fase,
refletir sobre elas, relacionando-as com o presente historicamente situado, foi uma
tentativa de colocar-me numa atitude dialética em relação ao conhecimento sócio-
historicamente construído.
Assim, o percurso histórico traçado, desde o primeiro capítulo, procurou
responder às indagações acometidas inicialmente na pesquisa: quais as teorias de
linguagem que subsidiaram os projetos e documentos oficiais em Língua Portuguesa
e, conseqüentemente, os cursos de formação continuada, determinando o(s)
objeto(s) de ensino da disciplina? Uma vez respondida a tal inquietação, o trajeto
teórico será tomado como subsídio para analisar os dados coletados na pesquisa de
campo (apresentados nos próximos capítulos), na tentativa de responder a outros
questionamentos:
a) A modalidade de evento adotada (cursos), para a maioria dos programas
de formação continuada aqui na região, a partir da década de 1980, tem
subsidiado suficientemente os professores para entender os pressupostos
173
teóricos que subjazem as propostas de ensino da Língua Portuguesa, a
ponto de se refletir em suas ações na sala de aula?
b) Em relação, particularmente, ao ensino da gramática, como está sendo
abordado, hoje, nas turmas de séries? Traduzem as discussões
teóricas do ensino de línguas que embasam os cursos de formação
continuada?
c) E eu, como docente em cursos de formação, estou, de alguma forma,
contribuindo para que os professores ampliem sua compreensão sobre o
trabalho com e sobre a lingua(gem) e, mais precisamente, com a
gramática?
174
3 PERCURSO METODOLÓGICO
A pesquisa é um trabalho capaz de avançar o
conhecimento.
Goldenberg, 1993.
Neste capítulo, discorro sobre o percurso metodologicamente percorrido na
investigação para alcançar os objetivos traçados. Dessa forma, descrevo e justifico o
método adotado, especifico a constituição do corpus, apresento os instrumentos
utilizados na coleta de dados e, finalmente, encaminho a possibilidade de solução de
problema(s), caso seja(m) encontrado(s).
3.1 Método de Abordagem
Para incorrer com os propósitos traçados na investigação, o objeto de
pesquisa e os objetivos estabelecidos no estudo se inscrevem numa abordagem
qualitativa em pesquisa educacional, por entendê-la como um método apropriado ao
fenômeno social investigado, não tendendo apenas à quantificação, mas à
interpretação dos dados coletados. Para isso, inseri-me no contexto de investigação,
que, conforme Kaplan & Duchon (1988), as principais características dos todos
qualitativos são a imersão do pesquisador no contexto e a perspectiva interpretativa
de condução da pesquisa.
Trata-se, portanto, de um estudo em ambiente natural, envolvendo
professores de 4ª série em seus municípios e escolas, sobre os quais pretendo
interpretar os significados assumidos nos cursos de formação por mim ministrados.
No contexto da investigação, a pretensão é de desenvolver conceitos, idéias e
entendimentos a partir de elementos revelados nos dados.
Explicitada de tal forma, esta pesquisa define-se como qualitativa porque:
(...) tem o ambiente natural como sua fonte direta de dados e o
pesquisador como seu principal instrumento (...). Supõe o contato
direto e prolongado do pesquisador com o ambiente e a situação
que está sendo investigada (...). Os dados coletados são
predominantemente descritivos (...). A preocupação com o processo
é muito maior do que com o produto (...). O significado que as
pessoas dão às coisas e à sua vida são focos de atenção especial
pelo pesquisador (...). A análise dos dados tende a seguir um
processo indutivo (LÜDKE e ANDRÉ, 1986, p. 11-12).
175
Todavia, para garantir tal incursão, optei pela pesquisa etnográfica, que
pretendo descrever um sistema de significados culturais de um determinado grupo
(professores de série), envolvendo a preocupação de pensar o ensino e a
aprendizagem dentro de um contexto cultural amplo.
Conforme Braga (1988), tal método de investigação é uma postura/posição
metodológica que se opõe aos modos tradicionais de manipular os problemas de
ordem social (essência vista “de fora”), propondo a interação como uma forma nova
de apreender a realidade, mesmo que não se consiga apreendê-la totalmente. Para
Segovia Herrera (1988, apud Lima et al., 1996), o método etnográfico tem a
finalidade de desvendar a realidade através de uma perspectiva cultural.
Os aspectos culturais que devem ser considerados na pesquisa etnográfica,
segundo Bernardi (1974) são quatro:
(...) o anthropos, ou seja, o homem na sua realidade individual e
pessoal; o ethnos, comunidade ou povo entendido como
associação estruturada de indivíduos; o oikos, o ambiente natural e
cósmico dentro do qual o homem se encontra a atuar; o chronos, o
tempo, condição ao longo do qual, em continuidade de sucessão, se
desenvolve a atividade humana (
apud LIMA, et al., 1996, p. 23)
.
Todavia, é preciso entender que um fator por si não constitui a cultura,
mas a ação dos quatro fatores é uma constante no processo cultural. Cada ação do
sujeito único, mesmo sendo nova, original ou importante, estaria destinada a perder-
se ou apagar-se se não fosse apropriada pela coletividade, articulada num conjunto
orgânico e transmitida como parte do patrimônio comum.
Malinowski (1953), o mestre do método antropológico da observação
participante, considera a cultura como um todo integrado ou global do qual os
elementos culturais singulares são as partes constitutivas. a análise funcional é
capaz de descobrir e de compreender os significados dos elementos culturais
individuais porque os nas suas relações com o todo da cultura. O reflexo da
totalidade do fenômeno cultural sobre os aspectos elementares e normais do viver
humano, é evidenciado pelo autor. Em sua visão de pesquisador, considera o evoluir
dinâmico da realidade em correspondência com a condição humana, ao explicar que
a realidade não é um esquema lógico coerente, mas antes, uma mistura em ebulição
de princípios em conflito. Para apreendê-la, o trabalho de campo é condição sine
qua non.
176
O trabalho de campo, consoante Herskovits (1963, apud LIMA, et al., 1996),
consiste em dirigir-se ao povo que se pretende estudar, escutar as conversas, visitar
os lares, assistir aos ritos, observar o comportamento habitual, interrogar sobre as
tradições para obter, mediante o conhecimento direto dos modos de vida, uma visão
de conjunto da cultura ou analisar algum elemento especial da mesma. Os dados
obtidos lançarão luz sobre os problemas essenciais da natureza e sobre o
funcionamento da cultura e do comportamento social humano. Somente uma ampla
base de dados descritivos será capaz de fornecer a primazia da cultura na
modelagem da conduta.
É no interior desse cenário investigativo, que a Lingüística Aplicada se insere,
uma vez que esta busca, parafraseando Signorini (2000), atender a demanda de
instrumentos de reflexão mais adequados ao estudo de práticas contextualizadas
de uso da linguagem, e ao mesmo tempo, garantir a formação continuada do
professor, o qual é tratado não como objeto de pesquisa, mas sim como produtor,
sujeito ao qual será oportunizado o crescimento profissional por meio de
conhecimento reflexivo e crítico de sua prática.
Para garantir a inserção, portanto, foi preciso recorrer à pesquisa
etnográfica que possibilita descrever “(...) os padrões característicos da vida diária
dos participantes sociais (professores e alunos) na sala de aula de línguas na
tentativa de compreender o processo de ensinar/aprender línguas” (MOITA
LOPES, 1996, p. 88). Logo, é tempo, como reafirma o autor, de a Universidade
aprender com a escola, trocando conhecimentos para retomar a formação
continuada dos professores, voltada para a reflexão crítica do ensino da língua.
Diante desta opção metodológica, defino o campo de pesquisa (municípios da
região Oeste com os quais estive envolvida com ações de formação continuada em
Língua Portuguesa por, pelo menos, 24 horas de cursos por mim ministrados); a
situação investigada (professores de série dos municípios selecionados, os quais
participaram dos cursos de formação) e o objeto de estudo (os efeitos de minha
ação docente para estes professores, no que se refere ao ensino da gramática).
Para contemplar o objeto de estudo, persegui um dos caminhos orientado por
Firestone e Dawson (1981, apud Lüdke e André, 1986):
1) Para verificar os efeitos dos cursos de formação por mim ministrados, fui a
campo, ou seja, voltei aos municípios nos quais trabalhei com docência,
177
apliquei um questionário (anexo 03), realizei entrevista com professores de
4ª série (anexo 04) e gravei aulas em turmas de 4ª série.
2) Se, na pesquisa etnográfica, o pesquisador deve realizar a maior parte do
trabalho de campo, tive o cuidado de, pessoalmente, levantar os dados.
3) Como o trabalho de campo, na pesquisa, deveria durar pelo menos um
ano, concentrei o processo de investigação entre 2004 e 2005.
4) Com os dados coletados, propus, no final de 2005, a analisá-los e
interpretá-los, juntamente com os professores envolvidos, a fim de
descobrir seu(s) significado(s) e se estes apontavam necessidades de
mudanças.
5) Uma vez apontadas tais necessidades, focalizei, em 2006 e 2007,
juntamente com os envolvidos, ações voltadas para a solução dos
problemas levantados.
A análise dos dados coletados ocorre, portanto, de forma interpretativa, pois a
pretensão não é a de buscar evidências que comprovem as hipóteses iniciais, mas
sim a de consolidar abstrações. Em outras palavras: às questões ou focos de
interesse que, de início, apresentaram-se de forma ampla, é dado um tratamento
direto e específico. Para isso, o processo de investigação parece-me mais
importante que o produto final, que é construído pelas perspectivas dos
participantes.
Nesse âmbito, o foco investigativo está centrado na compreensão dos efeitos
de minha ação docente na prática pedagógica do professor de série, em relação
ao ensino da gramática. No momento, a pesquisa constitui-se na análise das
interações com estes professores (inseridas num contexto sócio-historicamente
definido), a partir das quais, conjuntamente, construímos interpretações,
compreendemos significados e propomos alternativas.
Tendo em vista os resultados dos aspectos apresentados, infiro que minha
função, na pesquisa, foi a de desenvolver um papel ativo no equacionamento dos
problemas apresentados, assim como no acompanhamento e na avaliação das
ações desencadeadas em função dos problemas. Sendo assim, a relação com os
demais professores participantes do processo foi explicitada dentro da situação de
investigação, tomando o cuidado necessário para não perder de vista a
reciprocidade por parte do grupo implicado.
178
3.2 Constituição do Corpus
Para analisar os efeitos de minha ação como docente em Curso de Formação
Continuada, tomei, como referência, 5 municípios dentre os 16 para os quais fui
convidada a ministrar algum curso na área de Língua Portuguesa entre 2004 e 2005.
Esse período foi recortado por revelar maior incidência de minha ação docente.
Como sempre defendi que as ações de formação continuada não se estabelecem
em cursos pontuais (de 8h, por exemplo), considerei participantes do processo de
investigação, professores de série dos municípios nos quais foram dedicadas, no
mínimo, 24 horas de estudos teórico-práticos em Língua Portuguesa.
Por que professores de 4ª série? Como o eixo do ensino da língua que estou
abordando é a gramática, a opção por tal rie foi subsidiada pela hipótese (e pelas
minhas observações na sala de aula) de que, nesta fase de ensino destaca-se uma
preocupação maior, do professor, com o ensino das regras e/ou normas gramaticais.
Em decorrência disso, é meu interesse verificar como a gramática está sendo
abordada, e se transparece, nas atividades desenvolvidas, alguns reflexos dos
conteúdos focalizados nos cursos que ministrei. Os dados serão tratados como uma
amostragem do ensino da gramática na região.
Assim, dos 49 municípios que compõem a Região Oeste do Paraná, destaco
(omito o nomes dos municípios por questões éticas da pesquisa): Município 1 (M1),
Município 2 (M2), Município 3 (M3), Município 4 (M4) e Município 5 (M5):
M1 que, no ano de 2004, promoveu 24 horas de formação presencial,
envolvendo 25 professores, dos quais 4 eram de 4ª série;
M2 que, da mesma forma, investiu na área de Língua Portuguesa,
também em 2004, 24 horas de formação, reunindo seus 40 professores,
dos quais 8 eram de 4ª série;
M3, também em 2004, ofertou 32 horas de curso, envolvendo
aproximadamente 35 professores de e ries, dos quais 15 eram da
4ª série;
M4, em 2005, promoveu 32 horas de formação em Língua Portuguesa
somente para os professores de 3ª e 4ª séries, dos quais 21 eram da
série;
M5, em 2005, promoveu 48 horas de formação, com 2 turmas de 30
professores (24 horas cada turma), dos quais 15 eram da 4ª série.
179
Assim, por amostragem, pretendo analisar dados coletados dentre os 63
professores de 4ª série do ensino fundamental.
3.3 Instrumentos de Coleta de Dados
3.3.1 Questionários
Ao número total de 63 professores de 4ª série, apliquei um questionário
(anexo 3) com 31 perguntas (apenas 5 questões subjetivas) na perspectiva de
levantar dados relativos ao sexo, à idade, à formação, ao tempo de serviço, à
experiência profissional, à participação em cursos de formação continuada, ao
interesse pelo estudo da língua e aos conhecimentos relativos à Língua Portuguesa
em relação à concepção de linguagem, à gramática contextualizada e aos gêneros
textuais. Todavia, do total de questionários distribuídos, apenas 35 retornaram e são
estes os analisados.
Além do questionário direcionado aos professores de séries, apliquei um
outro (anexo 5) direcionado à equipe pedagógica dos 49 municípios da região Oeste
do Paraná, com o objetivo de traçar, antes de qualquer análise, o perfil dos
professores das séries iniciais da região, no que tange à sua formação (inicial e
continuada); às suas características físicas (idade, tempo de serviço etc.); ao seu
contexto mais amplo (município, número de habitantes, número de escolas etc.); e
ao seu contexto imediato (número máximo de alunos na sala de aula, material de
apoio, equipe pedagógica, remuneração etc.). Considero necessário tal
levantamento, que os municípios selecionados foram tomados como amostras de
toda a região. Defini-la, traçando um perfil de seus professores, contribuirá,
certamente, com as interpretações necessárias em cada situação analisada.
Esse instrumento foi selecionado (nas duas situações) por garantir uma
pesquisa ampla em relação aos informantes, atendendo a finalidades específicas.
Além de garantir o anonimato, os questionários, aplicados criteriosamente,
apresentam elevada confiabilidade ao levantar dados relativos a atitudes, opiniões,
comportamentos, conhecimentos e outras questões.
180
3.3.2 Entrevista
A entrevista foi elaborada a partir do(s) problema(s) apontado(s) no
questionário (anexo 03) relativo(s) à gramática contextualizada e ao exercício da
formação continuada para tal. Em função disso, as indagações foram dirigidas a
alguns dos informantes do questionário, com o objetivo de completar/confrontar
respostas.
Eu havia planejado entrevistar 01 professor de 4ª série de cada escola dos
municípios, selecionando (caso houvesse mais de 01 professor dessa série na
escola) aquele que mais tempo atuasse no município, o que resultaria em pelo
menos 26 entrevistas. Pretendia garantir, com a seleção, a fala do professor que
teve mais oportunidade de participar de cursos de formação, investigando, em seu
discurso, orientações advindas, além das minhas ações de formação, de
documentos analisados. Entretanto, somente 13 professores concederam a
entrevista (anexo 04), não possibilitando, assim, a análise conforme planejada
inicialmente.
A entrevista foi um dos instrumentos de coleta de dados selecionado porque,
quando se trata da pesquisa qualitativa em educação, esta modalidade
(...) representa um dos instrumentos básicos para a coleta de dados
(...). Ela desempenha importante papel não apenas nas atividades
científicas, como em muitas outras atividades humanas. (...) na
entrevista a relação que se cria é de interação, havendo uma
atmosfera de influência recíproca entre quem pergunta e quem
responde (LÜDKE e ANDRÉ, 1986, p.33).
O instrumento constituiu-se como importante elemento de análise que, além
de garantir maior proximidade com aqueles que se deixaram entrevistar,
possibilitou, ainda, refletir, conjuntamente, sobre as compreensões reveladas nas
palavras dos entrevistados.
3.3.3 Gravação de aulas
Gravei 20 aulas consecutivas de Língua Portuguesa de 3 professoras de
série com o intuito analisar os reflexos da formação continuada em sala de aula. O
propósito inicial era de gravar, no mínimo, 20 aulas de 5 professores (um de cada
181
município), porém também encontrei dificuldades para permitirem tal “invasão”,
que é assim que entendem este instrumento.
Por que o interesse pelas aulas gravadas se eu podia contar com os dados
revelados na entrevista e no questionário? Conforme Cavalcanti e Moita Lopes
(1991), a sala de aula de língua tem sido predominantemente um local de ensino e
muito raramente um local de pesquisa. E, de acordo com Moita Lopes (1996), a
aprendizagem da sala de aula é um lugar real, transparente, do resultado da
interação social entre os significados do professor e dos alunos na tentativa de
construção de um contexto mental comum.
Por tudo isso, corroboro com as idéias de Cavalcanti e Moita Lopes (1991),
quando dizem que é tempo de reconhecer a sala de aula como um espaço de
excelência para a investigação, principalmente em se tratando de pesquisa voltada
para o ensino da língua materna, pois é neste espaço que se revelam as condições
de ensino e aprendizagem. “O que a pesquisa em sala de aula pretende é
exatamente dar conta dessa construção, ao investigar (...) os processos interativos
que caracterizam o contexto da sala de aula, isto é, como o professor ensina e como
o aluno aprende” (CAVALCANTI e MOITA LOPES, 1991, p. 134).
É importante criar situações voltadas para a reflexão crítica do ensino da
língua, que privilegiem, conforme salienta Travaglia (2003), o desenvolvimento
lingüístico-discursivo do aluno, adequado a cada situação de interação
comunicativa. Considero “que a realidade do ensino e aprendizagem da sala de aula
pode chegar a ser conhecida através de metodologias de pesquisas
interpretativas e qualitativas que permitam descrever e conhecer o contexto natural
da aula” (KLEIMAN, 2001, p. 16).
Por isso a minha insistência em também apresentar dados relativos à
gravação de aulas no ensino de 4ª série.
3.4 Levantamento do(s) Problema(s) e Proposta de Solução
Como nesta pesquisa pretendo, além de tratar de problema(s), apresentar
alternativas para sua solução, foi preciso definir, exatamente, qual o percurso que
deveria incorrer, pois o propósito não é simplesmente indicar caminhos, mas traçá-
los conjuntamente com os participantes da pesquisa.
182
Esta fase foi levada a efeito da seguinte forma: durante a coleta de dados
envolvendo os professores de 4ª séries (entrevista, questionário e gravação de
aulas), instiguei os participantes, tendo em vista as ações docentes desenvolvidas
em seu município, principalmente no que se refere ao trabalho com a gramática,
para que refletissem sobre suas atividades em sala de aula. O objetivo da reflexão
residia em elencar (se houvesse) dificuldades (problemas) que ainda persistiam para
que, em decorrência disso, selecionassem um formato de evento, o qual, segundo
eles, pudesse dar continuidade ao trabalho de formação continuada, resultando num
instrumento significativo para a solução do(s) problema(s) elencado(s).
Foram muitas as soluções propostas, contudo, após refletirmos
conjuntamente, optamos por retomar uma modalidade de evento, aliada à
elaboração de um instrumento teórico-metodológico capaz de contribuir para
amenizar as dificuldades apresentadas ao ensino da gramática.
O percurso traçado para a solução do(s) problema(s) elencado(s) apresento no
último capítulo. Considero importante lembrar que, como toda pesquisa, esta
pretende revelar apenas os aspectos já delimitados, porém não de forma conclusiva,
que estará aberta a indagações e contra-argumentações oriundas de outros
pesquisadores.
183
4 REFLEXÕES SOBRE OS DADOS COLETADOS
A auto-satisfação é inimiga do estudo. Se queremos realmente
aprender alguma coisa, devemos começar por libertar-nos
disso. Em relação a nós próprios devemos ser 'insaciáveis na
aprendizagem' e em relação aos outros, 'insaciáveis no
ensino'.
Mao Tse-Tung.
Depois do resgate histórico da formação (inicial e continuada) dos
professores no Brasil, no Paraná e na região Oeste; após verificar as bases teóricas
dos documentos que orientaram tal formação a partir da década de 1970, é
momento de relacionar tais informações com os dados coletados na investigação.
Antes, porém, julgo importante definir quem são, afinal, os professores das
séries iniciais da região Oeste, traçando o perfil desses profissionais a partir de
dados coletados com a aplicação de um dos questionário (anexo 05), com 21
perguntas objetivas, a todos os 49 municípios da região, dos quais apenas 2
deixaram de responder. As informações coletadas são relativas, portanto, a 47
municípios.
A opção por essa apresentação inicial reside no fato de que a análise dos
dados se efetivará sempre na perspectiva de considerar o contexto cio-histórico
dos professores, por acreditar que as práticas pedagógicas são sócio-historicamente
determinadas e, desse modo, inconcebível seria refletir sobre os dados sem levar
em consideração os elementos contextuais que os circundam, além dos fatores
político-econômicos que os determinam.
4.1 Perfil dos Professores da Região Oeste do Paraná
A região Oeste do Paraná possui uma população de aproximadamente 1,5
milhões de habitantes, distribuída em 49 municípios. Trata-se de uma região
predominantemente agrícola, conseqüência do solo fértil e apropriado para a
produção de alimentos. Os municípios que a compõem encontram-se assim
distribuídos:
184
Conforme relato histórico apresentado no segundo capítulo, os municípios
foram criados, por ato político, em diferentes momentos que marcaram a
colonização da região.
Ano de criação dos municípios da região Oeste
45%
4%
26%
23%
2%
a. Antes da cada de
1970.
b.cada de 1970.
c. Década de 1980.
d.cada de 1990.
e.cada de 2000.
185
Dos 49 municípios que hoje compõem o Oeste do Paraná (cf. mapa), 21
deles
113
(o que significa 45%) foram criados antes da década de 70 e são
considerados marcos importantes da história da colonização da região por terem
sido tratados, por muitos anos, como cidades-pólo de localidades vizinhas. O
capítulo 1 (cf. p. 64-70) tentou garantir um pouco dessa história, ao reconstituir parte
dos acontecimentos da década de 1970.
Outro dado importante que define a região é o número de habitantes dos
municípios. A maioria deles (37%), que equivale a 17 dos 47 municípios, conta com
um número em torno de 5.001 a 10.000 habitantes, conforme especifica o gráfico
seguinte:
Número de habitantes
4%
11%
37%
17%
19%
6%
6%
a. Até 3.000.
b. De 3.001 a 5.000.
c. De 5.001 a 10.000.
d. De 10.001 a 15.0000.
e. De 15.001 a 30.000.
f. De 30.001 a 50.000.
g. Acima de 50.000.
Como é possível verificar, a região, neste aspecto, define-se por municípios
de pequeno porte, os quais dependem exclusivamente da agricultura. Se esta não
produz, todos sofrem as conseqüências. A arrecadação tributária é baixa, o que
afeta a todos os setores ligados à administração pública, inclusive a educação.
Apesar de receber verbas específicas para sua sustentabilidade, o setor educacional
padece devido às responsabilidades impostas, desviando, na maioria das vezes, a
sua real função.
Apenas 3 municípios (4%) contam com uma população acima de 50.000
habitantes (na realidade acima de 100.000): Cascavel, Toledo e Foz do Iguaçu, os
quais são considerados, efetivamente, como cidades-pólo da região por
113
Assis Chateaubriand, Capitão Leônidas Marques, Cascavel, Catanduvas, Céu Azul, Corbélia,
Formosa do Oeste, Foz do Iguaçu, Guaíra, Guaraniaçu, Marechal Cândido Rondon, Matelândia,
Medianeira, Missal, Nova Aurora, Palotina, Santa Helena, Santa Terezinha de Itaipu, São Miguel do
Iguaçu, Terra Roxa e Toledo.
186
concentrarem melhores condições de atendimento à saúde, à educação, ao
comércio, enfim, os municípios vizinhos recorrem a elas para buscarem aquilo que
não encontram disponível em seus municípios.
O número de alunos matriculados nas ries iniciais do ensino fundamental
(incluindo o 1º ano) gira entre menos de 500 a2000 alunos em 40 dos municípios.
Em apenas 4, o número oscila entre 2001 a 4000 alunos e, em 3 (nas cidades-pólo)
a quantidade está acima de 8000 alunos. Veja detalhes no gráfico:
Alunos matriculados nas séries iniciais, em relação aos
municípios
28%
29%
28%
9%
0%
6%
a. Menos de 500
b. De 501 a 1000
c. De 1001 a 2000
d. De 2001 a 4000
e. De 4001 a 8000
f. Acima de 8.000
As escolas envolvendo alunos, professores, equipe pedagógica e
administrativa estão concentradas, em grande parte dos municípios (28 deles), na
zona urbana. Em 15 outros, ainda unidades na zona rural, mas estas, a maioria,
estão organizadas em núcleos, reunindo, num mesmo local, alunos de várias
comunidades, cujo acesso é facilitado pelo transporte escolar. Isso significa dizer
que as turmas multisseriadas são raríssimas e, quando existem, é porque o
município não encontrou outra alternativa para melhorar as condições de
aprendizagem, devido à grande distância da escola de qualquer núcleo de formação.
Inseridos neste contexto espacial estão os professores que trabalham com as
séries iniciais. A maioria dos municípios, 14 deles, administra um número
aproximado de 21 a 40 profissionais da educação, efetivados, a maior parte deles,
por concurso público. O gráfico abaixo sintetiza essa realidade:
187
Número de professores - séries iniciais
6%
31%
19%
4%
6%
22%
6%
6%
a. Menos de 20
b. De 21 a 40
c. De 41 a 60
d. De 61 a 80
e. De 81 a 100
f. De 101 a 200
g. De 201 a 500
h. Acima de 500
O número de professores poderia ser favorável, principalmente em relação ao
acompanhamento pedagógico e aos programas de formação continuada, já que uma
grande parcela dos municípios administra uma quantidade pequena de docentes.
Porém, ao levantar as horas de formação em Língua Portuguesa, desde o ano 2000,
a realidade mostrou-se diferente.
No ano 2000, dos 47 municípios pesquisados em relação à quantidade de
horas de formação (cursos, palestras, conferências...) ofertadas, na área de Língua
Portuguesa, 16 deles não investiram na área; apenas 2 ofereceram 24 horas e
outros 2, 32 horas; 2 disseram ter ofertado 40 horas e 4 afirmaram ter investido mais
de 40 horas. Os demais investiram em apenas 8 horas de formação.
Os dados relativos à formação entre os anos de 2001 a 2005 o diferiram,
em quase nada, dos dados anteriores. Pequenas oscilações que não chegaram a se
destacar. no ano de 2006, os números mostraram-se um pouco diferentes:
apenas 6 municípios não ofertaram nenhuma hora de formação em Língua
Portuguesa; 18 ofereceram pelo menos 8 horas; 7 ofertaram 16 horas; 2, 24 horas; 5
dedicaram 32 horas de formação na área; outros 5 ofertaram 40 horas; e 4
municípios apenas, disseram ter ofertado acima de 40 horas.
O resultado pode ser justificado, de certa forma, pelo fato de não ser apenas
a área de Língua Portuguesa que requer formação. Como os professores das séries
iniciais trabalham com quase todas as disciplinas (Matemática, Ciências, História,
Geografia), é preciso investir também nestas. Assim, os recursos destinados à
188
formação continuada são distribuídos geralmente entre cursos de 8 horas em cada
área, ou, então, prioriza-se uma disciplina em detrimento das demais.
Tal realidade justifica o pouco investimento em formação continuada na área
de Língua Portuguesa, e revela também qual é a cultura que persiste em relação a
formação: cursos pontuais (8 horas), direcionados, cada vez, a uma diferente área, o
que parece não garantir as reflexões necessárias para cada uma delas.
Em relação à experiência profissional, os dados revelam que
aproximadamente 40% dos professores da região estão atuando há mais de 11 anos
no ensino das séries iniciais. Isso significa dizer que parte deles atuou na década de
1980 e passou pelo intenso processo de formação ocorrido na ocasião: experenciou
o modelo de alfabetização “Erasmo Pilotto”, todos como o da Abelhinha, o misto,
entre outros; vivenciou as mudanças impostas pelo CBA; e participou (direta ou
indiretamente) da (re)construção de uma nova proposta de ensino da Língua
Portuguesa, à luz da concepção (sócio)interacionista da linguagem.
É claro que, dentro do corpo docente atual, os que estão se inserindo
nesta profissão agora. Dos 47 municípios pesquisados, 38 afirmaram que 10% de
seus professores têm menos de 5 anos de tempo de serviço. Estes são, geralmente,
os recém-formados no magistério ou em alguma licenciatura. Portanto, a
compreensão de educação está basicamente relacionada com as práticas vividas na
formação inicial.
Mas qual é o nível de formação dos professores da região Oeste do Paraná?
Em 28 municípios, apenas 10% cursaram somente o magistério (ou outro curso
correspondente). Os demais são licenciados. Os formados em Letras são poucos:
29 municípios pontuaram que apenas 10% de seus professores são licenciados em
Letras, enquanto outros 18 apresentaram um número um pouco maior, que oscila
entre 11 a 30%. Os demais professores possuem outra licenciatura – História,
Matemática, Educação Física, Ciência Biológica, Pedagogia – destacando-se, dentre
estas, a Pedagogia.
189
Licenciados em Pedagógia, na região
3
8
12
19
5
Até 10%
De 11 a 30%
De 31 a 50%
De 51 a 80%
Acima de 81%
O gráfico apenas comprova aquilo que eu havia constatado nos cursos de
formação: em 19 dos 47 municípios pesquisados, o número de pedagogos está
acima de 51% e muito próximo a 80%. Dos professores licenciados, um
percentual de 51 a 80% fizeram algum curso de pós-graduação relacionado à
educação.
Contudo, como o desempenho na sala de aula não está vinculado apenas à
formação (inicial ou continuada), mas é fortemente afetado pelas questões salariais,
pelo material de apoio à disposição, pelo número de alunos em sala de aula, pela
estrutura física da escola, pelas condições de estudo e pesquisa, entre outras,
procurei levantar alguns dados nesse sentido, para aferir as reais condições de
trabalho do professor.
Quanto ao piso salarial (líquido), referente a 20 horas de trabalho semanais,
pude constatar a seguinte realidade: 39 municípios pagam, aos seus professores,
entre R$ 301,00 a R$ 700,00. Um número pequeno de 7 municípios informaram que
o salário mensal gira entre R$ 701,00 e R$ 1.000,00. Um município afirmou que o
salário de seus professores está acima de R$ 1.000,00, porém, julgo que essa
interpretação seja referente a 40 horas de trabalho. O gráfico sintetiza esses dados:
190
Piso salarial por 20 h/a
36%
47%
15%
2%
De R$301,00 a
R$500,00
De R$501,00 a
R$700,00
De R$701,00 a
R$1.000,00
Acima de R$1.000,00
Ao serem indagados sobre o grau de satisfação de seus professores pela
remuneração recebida, o resultado foi este:
Grau de satisfação dos professores em relação
ao piso salarial
9%
59%
30%
2%
insatisfeitos
pouco satisfeitos
satisfeitos
muito satisfeitos
A pouca satisfação dos professores em relação ao salário mensal pode afetar
o desempenho na sala de aula, desmotivando-os a buscarem novos conhecimentos
por meio de estudos e de pesquisa.
Quando o problema que afeta o professor não é o salário, aparece(m)
outro(s) como, por exemplo, o número de alunos na sala de aula. Busquei também
este dado, pois a intenção era cercar-me de todas as informações possíveis
relativas ao contexto no qual estão inseridos os professores das séries iniciais da
191
região Oeste. Dentre o número de alunos apontados no questionário, verifiquei que
as turmas são formadas por 25, 30 e 35 alunos.
Número máximo de alunos por turma
40%
47%
13%
25 alunos
30 alunos
35 alunos
Diante das reais condições das escolas do país, muitos professores da região
podem considerar-se privilegiados, pois em 40% dos municípios as turmas são
formadas com, no máximo, 25 alunos, enquanto que é natural encontrar, na maioria
das escolas brasileiras, turmas com 30, 35, 40 ou até mais alunos, dependendo da
localização. E sabendo que os resultados de aprendizagem estão diretamente
relacionados com o número que compõe uma sala de aula, o que esperaria, então,
desses municípios, seriam resultados mais favoráveis.
Para atender aos estudantes, os professores de 23 municípios contam com o
apoio de uma equipe formada por diretor(a), auxiliar de classe, coordenação
pedagógica e orientador(a) (este último em apenas 8 deles). Outros 15, além destes
integrantes, dispõem, ainda, de psicóloga, de fonoaudióloga e de recuperação
paralela. Em contrapartida, 6 municípios cuja equipe é formada apenas pela
coordenação pedagógica e orientador(a) e, em 2 deles, o professor é apoiado
somente pela coordenação pedagógica. Procurei sintetizar, percentualmente, como
é formada a equipe pedagógica nos municípios, por meio do gráfico abaixo:
192
Apoio pedagógico aos professores
4%
2%
13%
32%
17%
32%
Só com a coordenação pedagógica
Com auxiliar de classe e coordenação pedagógica
Com coordenação pedagógica e orientador(a)
com diretor(a), auxiliar de classe e coordenação pedagógica
Com diretor(a), auxiliar de classe, coordenação pedagógica e orientador(a)
Com outros apoios a mais (psicóloga, fonoaudióloga, recuperação paralela
etc.
Afora a equipe pedagógica nas escolas, existe, ainda, a equipe da Secretaria
Municipal de Educação, responsável pelo apoio pedagógico aos coordenadores e
professores, pelo apoio administrativo e financeiro ao(à) diretor(a) das escolas, pela
coordenação geral de toda a educação em relação à merenda, à Educação
Especial, à Educação Infantil, às creches, à Educação de Jovens e Adultos, à
Educação Indígena (quando há), à elaboração de projetos, inclusive de formação
continuada, enfim, à organização geral de todo o ensino fundamental (série/anos
iniciais). Trata-se uma equipe com uma dimensão relevante de responsabilidades,
inclusive burocráticas (senso educacional, planilhas, informações de matrículas etc.),
da qual dependem as iniciativas para implementar a educação.
Mesmo diante de tantas atividades e responsabilidades, verifiquei que essa
equipe é reduzidíssima em 22 municípios: formada por apenas 2 ou 3 pessoas. Em
outros 16, o número oscila entre 4 e 6 integrantes:
193
Equipe de apoio da Secretaria Municipal de
Educação
23%
23%
35%
13%
6%
2 pessoas
3 pessoas
4 a 6 pessoas
7 a 10 pessoas
11 a 15 pessoas
Questionados sobre o fato de as escolas terem ou não bibliotecas, com salas
destinadas especificamente para esse fim, os municípios revelaram-se da seguinte
forma:
Municípios cujas escolas têm bibliotecas
62%
4%
15%
13%
6%
Todas têm 2/3 têm 50% têm 1/3 tem Nenhuma escola tem
Neste caso, os resultados são mais favoráveis. Nas escolas de 29 municípios
(62%), todas dispõem de uma sala especial para a biblioteca. Porém, 7 municípios
(15%) revelaram que apenas metade de suas escolas conta com esse espaço,
enquanto que em outros 6 (13%), um lugar específico para livros e leituras existe em
apenas 1/3 das escolas. Tais dados revelam que não é cultural, ainda, a importância
da leitura para a aprendizagem do aluno, pois, caso contrário, mais municípios
194
despontariam para tal preocupação, garantido o espaço da leitura para todas as
escolas.
em relação à internet, muitos municípios não dispõem desse recurso aos
professores, o que dificulta principalmente a pesquisa:
Acesso à internet pelos professores
40%
42%
9%
9%
Tem à disposição na sala dos professores ou na biblioteca.
o tem disponível na escola.
Tem, mas com tempo determinado
1/3 das escolas têm.
Essa realidade é justificável, pois, embora seja um recurso amplamente
utilizado, ainda não se encontra disponível (tecnicamente) em todos as localidades
que se deparam com dificuldades para acessar a rede mundial de informações.
Quanto a material de apoio (além do quadro de giz), a grande maioria dos
professores da região dispõe, segundo dados fornecidos pelos municípios, de TV,
vídeo, retroprojetor, datashow, mimeógrafo, computador e impressora, tendo em
vista que 29 (63%) dos 47 pesquisados apontaram esses materiais como
disponíveis aos professores.
195
Material de apoio
23%
63%
2%
4%
2%
6%
TV e vídeo, retroprojetor e mimeográfo.
TV e vídeo, retriprojetor, datashow, mimeográfo, computador e impressora.
TV e vídeo e mimeográfo.
TV e vídeo, computador e impressora.
Mimgrafo, computador e impressora.
TV e vídeo, retroprojetor, mimgrafo, computador e impressora.
Conforme os dados revelados, concluí que a região Oeste do Paraná, se
comparada a outras regiões do Estado e até do país, das quais tenho conhecimento,
não difere em muitos aspectos: o arrocho salarial e o grau de insatisfação é o
mesmo que em muitos outros lugares. Da mesma forma, os materiais de apoio
(pedagógico, físico, humano) não são ainda o necessário e desejável para todas as
situações. Em contrapartida, a formação (inicial) dos professores é um aspecto
positivo dos dados coletados, visto que a maioria tem especialização em alguma
área, assim como a organização das turmas, predominantemente com, no máximo,
25 alunos.
Porém, de acordo com a interpretação a aqui efetuada, falta um maior
investimento na formação continuada, principalmente no que se refere à
compreensão que os municípios têm desse processo. A retroalimentação do
conhecimento ainda é concretizada por meio de cursos pontuais.
4.2 Contextualizando a (minha) Ação Docente
A prática da docência nas séries iniciais, na região Oeste, está centralizada
na AMOP (antes na ASSOESTE), que recebe as solicitações de cursos nas
diferentes áreas, contata o docente e transfere-lhe a solicitação. Este, a partir daí,
geralmente, entra em contato com o município para combinar detalhes tais como:
conteúdos a serem trabalhados, cópias de textos aos professores, horário, local de
196
realização, transporte e remuneração (que hoje corresponde a R$ 67,00 a hora/aula
– conforme estabelecido pela AMOP, independente da titulação do docente).
A seleção dos docentes ocorre pela apreciação do Currículo Lates e,
principalmente, pela experiência com as séries iniciais. A titulação, nesse caso, é
secundária, pelo fato de não garantir, muitas vezes, a interlocução necessária com
os professores. Na área de Língua Portuguesa são várias as docentes, porém as
que mais têm atuado (a pedido dos municípios que, quando solicitam cursos, muitas
vezes já indicam o docente) são duas, e eu sou uma delas
114
.
No ano de 2004, atuei 112 horas com cursos em alguns municípios da região,
das quais, 24 foram no M1, 24 no M2 e 32 no M3. em 2005, foram 136 horas de
docência, dentre as quais destaco M4, com 32 horas de formação em Língua
Portuguesa, e M5 com 48 horas, ressaltando que, nestes anos, estas foram as
maiores cargas horárias trabalhadas.
4.2.1 Perfil dos municípios selecionados
Embora minha pretensão seja interpretar os dados de uma forma
homogênea, sem destacar este ou aquele município, que foram tomados como
amostragem de toda a região, considerei interessante, a priori, identificar alguns
aspectos dos municípios selecionados para a investigação, no sentido de revelar
quais são suas características em relação aos demais. A preocupação reside no fato
de garantir o distanciamento da seleção dos mesmos, ou seja, nenhum deles foi
tomado como objeto de investigação por se destacar dos demais, seja positiva ou
negativamente. O critério utilizado, como já exposto, foi unicamente o da maior
carga horária de formação investida em Língua Portuguesa.
Por outro lado, como os dados, em hipótese nenhuma, podem ser
interpretados isoladamente, julgo conveniente revelar mais informações do contexto
imediato dos professores investigados.
Quem são, afinal, os municípios selecionados para esta pesquisa? Qual é o
número de seus habitantes? Quantos são os professores que formam o corpo
docente? E os alunos matriculados nas séries iniciais, quantos são? Quantas
escolas existem nestes municípios para atender a demanda? Qual é o número
114
Além da carga horária apontada, na seqüência, para 2004 e 2005, trabalhei mais 152 horas em
2006.
197
máximo de alunos permitidos por turma? Para responder a estas e outras questões,
recorri, mais uma vez, ao questionário de definiu o perfil dos professores da região
Oeste (anexo 5), verificando, especificamente, as informações relativas aos
municípios investigados, e obtive os seguintes dados:
Municípios investigados Informações
M1 M2 M3 M4 M5
1- Ano de criação do município 1997 1990 1951 1961 1961
2- Número de habitantes 4.740 6.224 17.201 37.828 15.000
3- Número de professores das
séries iniciais
35 40 75 83 65
4- Número de alunos matriculados
nas séries iniciais
422 580 1.669 2.724
1.178
Zona urbana 2 2 8 8 6 5- Número de
escolas
Zona rural - 1 5 1 2
6- Número máximo de alunos por
turma
25 25 30 25 35
As escolas desses municípios, assim como as demais da região, encontram-
se equipadas com biblioteca, TV, vídeo, retroprojetor, mimeógrafo, computador,
impressora e, em alguns casos, até com datashow. Além de tais equipamentos, os
professores são assessorados pela equipe pedagógica de cada escola, formada
pela direção, auxiliar de classe, coordenação pedagógica, assistente aos educando,
fonoaudióloga, psicóloga (estes dois últimos menos no M3) e, ainda, pela própria
equipe da Secretaria Municipal de Educação. No M2, há até professora de língua de
sinais na equipe e, só no M2, há recuperação paralela.
Julguei interessante expor tais dados, tendo em vista que, quando o ensino
não caminha bem, a primeira causa recai sobre a equipe e os materiais de apoio,
caso não os tenha. Nos municípios investigados, estes não seriam os fatores
agravantes de nenhuma situação, pois os professores encontram-se bem
assessorados pelos recursos oferecidos. Não estou, com isso, afirmando que tais
recursos são suficientes. O ideal estaria além da realidade de todas as escolas
brasileiras. Porém, em comparação a muitas delas, estes municípios oferecem
condições básicas de trabalho aos professores.
198
No que diz respeito à formação dos professores, percebi um quadro comum
àquele apresentado na região Oeste: a maioria deles (perto de 80%) é licenciado em
Pedagogia (ou Normal Superior, considerado equivalente a este) e, destes, entre 51
a 80% são pós-graduados, com exceção do M2, onde o número de professores com
pós-graduação cai para menos de 30%, surpreendendo-me, principalmente pela
proximidade de Cascavel (60 km), onde inúmeros cursos são ofertados. Os
professores formados em Letras (minha área de interesse) são menos de 10%.
Todavia, a grande maioria tem muitos anos de experiência: aproximadamente 30%
trabalham entre 11 a 15 anos e outros aproximados 30%, entre 16 e 25 anos, com a
faixa-etária entre 30 a 49 anos.
Outro dado que penso afetar diretamente as ações na sala de aula é a
remuneração do professor. Quando satisfeito com sua remuneração, um profissional
pode apresentar um comportamento favorável nas ações empreendidas, mas, em
contrapartida, quando está insatisfeito financeiramente, a tendência é levar, para a
sala de aula, o seu descontentamento, repassando, ao aluno, suas frustrações.
Nesse sentido, ao verificar, no questionário (anexo 5) o rendimento dos
professores, constatei que estão entre insatisfeitos e pouco satisfeitos (com exceção
dos professores do M4 que se dizem satisfeitos), visto que o salário gira em torno de
R$ 300,00 a R$ 500,00 para aqueles que têm apenas o ensino médio, chegando a
R$ 700,00 para os licenciados e pós-graduados. Isso por 20 horas semanais.
Tal realidade (que se identifica com a do Estado e do país) faz com que
muitos professores optem por trabalhar dois e até três turnos consecutivos,
sobrecarregando-se de afazeres e, conseqüentemente, prejudicando o planejamento
das aulas, o estudo dos conteúdos e o aperfeiçoamento constante. O ideal seria que
fossem remunerados o suficiente para dedicarem-se exclusivamente à turma
assumida. Porém, esta é uma outra discussão política e econômica que envolve o
país, na qual não pretendo adentrar nesse momento. Interessa-me, agora, revelar o
contexto (imediato e amplo), no qual ocorreram os cursos por mim ministrados para,
a partir daí, refletir sobre os seus efeitos nas ações cotidianas dos professores.
4.2.2 A respeito das ações de formação continuada
Os municípios selecionados, assim como os demais da região Oeste,
conforme relatado, m uma cultura de formação continuada bem sedimentada.
199
Desde a implantação do Projeto MEC/OEA (1976 1984) e depois da ASSOESTE
(1980-2001), criou-se uma necessidade de investir na formação dos professores e, a
partir daí, regularmente os municípios oferecem cursos nas diferentes áreas do
conhecimento, destinando, em cada ano, pelo menos 8 horas direcionadas a uma
determinada disciplina. Obviamente que tais investimentos foram referendados pelo
FUNDEF e, hoje, pelo FUNDEB, quando o governo nacional tentou garantir, dentro
das verbas destinadas à educação, recursos próprios à formação continuada (cf. p.
41). Contudo, na região Oeste esta prática já existia.
Perscrutando, então, qual foi a preocupação dos municípios investigados
quanto ao investimento em formação continuada, entendida com resultante de
cursos, palestras, conferências etc., na área de Língua Portuguesa, os dados (anexo
05) revelaram quantas horas foram ofertadas aos professores pelos municípios
investigados:
Anos M1 M2 M3 M4 M5
2000 16h 8h 8h 32h 32h
2001 24h 16h 32h 32h 32h
2002 16h 8h 24h 40h 32h
2003 24h 16h 24h 24h 16h
2004 24h 24h 32h 24h 16h
2005 32h 16h 24h 32h 24h
2006 16h 8h 16 24h 16h
De acordo com os dados, uma preocupação com esse tipo de
investimento. Tanto é verdade que em todos os anos de 2000 a 2006 foram
dedicadas algumas horas para a formação na área. Contudo, como os professores
das séries iniciais trabalham com outras áreas também, as horas destinadas a esse
fim precisam ser redistribuídas com outras disciplinas (conforme exposto), o que
fragmenta o processo formativo.
Porém, a carga horária apresentada seria suficiente para garantir o
conhecimento necessário para o trabalho com a língua? Como discorri no primeiro
capítulo, o professor não pode esperar apenas dos cursos o aprofundamento ou
confirmação de seus conhecimentos. Sua formação profissional obviamente
acontece durante toda a vida, inclusive durante a formação inicial (magistério,
licenciatura, pós-graduação). Os programas de formação continuada devem ser
entendidos, retomando Esteves & Rodrigues (1993), como aqueles que
acompanham toda a carreira profissional, se fazendo necessários, pois, é por meio
200
deles que o professor vai adequando a profissão às exigências de sua atividade.
Vale retomar Alarcão, para quem:
(...) a formação continuada deve visar ao desenvolvimento das
potencialidades profissionais de cada um, a que não é alheio ao
desenvolvimento de si próprio como pessoa. Ocorrendo na
continuidade da formação inicial, deve desenrolar-se em estreita
ligação com o desempenho da prática educativa (ALARCÃO, 1998,
p. 106).
A autora pontua ainda que a formação continuada deve se alicerçar na co-
responsabilidade, na colegiabilidade, na capacidade e na organização dos
professores de cada escola, instituída em grupos de estudos, fundados em torno de
projetos de formação-ação-investigação. É uma formação, portanto, que assenta em
projetos realizados com, para e pelos professores, complementados pelas
comunidades sociais envolvidas, com o objetivo de transformar a escola em
autêntica comunidade educativa.
No entanto, seriam as práticas de formação interpretadas de tal forma? Ao
verificar, em toda a região, quantos são os municípios que, além dos cursos, têm-se
preocupado com a manutenção de um grupo de estudos, aprofundando-se
continuamente, os dados (anexo 5) revelaram o seguinte:
Municípios com grupo de estudos
32%
68%
sim
não
Dos 32% que afirmaram ter grupo de estudos organizado no município,
encontrei, dentre eles, alguns que interpretaram equivocadamente a questão,
entendendo que, ao ofertarem cursos aos professores, no decorrer do ano,
estariam consolidando esse tipo de evento. É o caso de um dos municípios da
201
região que informou manter um grupo de estudos com 200 integrantes, o que seria
humanamente impossível para tal modalidade de formação.
Dentre os 5 investigados, apenas um mantém um grupo de estudos com
aproximadamente 30 integrantes, reunindo-se quinzenalmente (fora do horário de
trabalho) para ler, aprofundar, rever conceitos, refletir sobre a prática.
Por outro lado, nem sempre as ações de formação continuada o
organizadas por meio de projetos que contemplem as reais necessidades dos
professores, ouvindo o que eles têm e querem dizer. Em muitas situações, os
programas são determinados pela equipe pedagógica das Secretarias Municipais de
Educação, a partir daquilo que julgam necessário ser trabalhado.
Tais atitudes são heranças da escola tecnicista, que os supervisores, além
de centralizarem as ações de formação em cursos de curta duração, de forma
esporádica, sem continuidade e desvinculados das reais necessidades dos
professores, definem os conteúdos que os professores devem “aprender”, cabendo
a estes apenas “ouvir” o que o palestrante (cursista ou formador) tem a “ensinar”.
4.2.3 Conteúdos abordados
Dentre a abordagem geral de reflexão sobre os efeitos da formação em
Língua Portuguesa, propus um recorte para o ensino da gramática. Como não o
concebo desarticulado da leitura, da produção e da reescrita de texto, apresento, a
seguir, uma descrição/reflexão de todos os conteúdos explorados em cursos que
ministrei nos municípios selecionados, e não apenas da gramática, embora a esta a
ênfase seja maior. Por outro lado, não relatarei sobre cada município
particularmente, mas sim de um modo geral, reservando-me o direito de referir-me a
um deles, quando se destacar em relação aos demais, em algum aspecto.
O M1, por exemplo, quando solicitou-me um curso de capacitação, o fez no
sentido de rever conceitos gramaticais com os professores, dentro de uma
perspectiva da gramática normativa. As coordenadoras entendiam que se o aluno
não compreendia bem a Língua Portuguesa era porque o professor não a dominava.
Portanto, havia necessidade de retomar conceitos, relembrar regras, tirar dúvidas
relativas à gramática. Em relação a quais conteúdos? Isso não foi definido. Coube a
mim, de acordo com a experiência vivida com meus alunos da graduação, recortar
202
os conteúdos que julguei apresentarem mais dificuldades: concordância verbal e
nominal, regência verbal e nominal, conjugação verbal e sinais de pontuação.
Atendendo ao pedido, trabalhei, amparada por Infante (1995), Cipro Neto &
Infante (1999) e Cunha & Cintra (2001) conceitos e atividades relativas a tais
conteúdos. Como o trabalho gramatical, na perspectiva solicitada, não correspondia
ao meu propósito de trabalho com a língua, procurei, ao mesmo tempo que atendia
à solicitação, provocar, nos participantes, um outro olhar. Daí surgiu a necessidade
de mais horas de formação. A princípio, a intenção do município era investir em
apenas 8 horas, mas, diante das dificuldades levantadas, a carga horária foi sendo
ampliada, aconcluir as atividades de formação com 24 horas, estendendo-se para
conteúdos concernentes à sala de aula e ao aluno: possibilidades de
encaminhamento da leitura, da interpretação, da produção de texto e da gramática
contextualizada.
Nos demais municípios, a carga horária de formação foi planejada
antecipadamente e os conteúdos (na verdade eixos) solicitados leitura e
interpretação, produção de texto, reescrita e gramática contextualizada deveriam
ser explorados nos cursos.
Para discutir sobre o eixo “leitura”, associado a encaminhamentos práticos de
atividades, em menos de 8 horas, nas quais priorizo, além de minhas explanações,
espaços para questionamentos, relatos de experiências e contribuições teóricas, o
ponto de partida foi uma definição de Orlandi
115
, a qual explora a constituição do
processo de significação, tanto do ponto de vista do autor quanto do leitor: “não é
quem escreve que significa; quem também produz sentidos” (ORLANDI, 1999b, p.
101) sócio-historicamente determinados.
Julguei interessante pautar-me nessa fundamentação por ainda residir, entre
os professores, uma compreensão de leitura assentada apenas na decodificação
textual. Só depois de resgatar esse viés teórico (exaustivamente explorado em
muitas publicações, no CBPR, nos PCNs e também CBEPM) e de ouvir
questionamentos e contribuições, encaminhei algumas sugestões de atividades
leitura e produção de textos, provocando reflexões sobre que textos levar para a
sala de aula e que textos produzir a partir de leituras realizadas (anexo 06),
ressaltando a importância do trabalho sistemático com alguns gêneros.
115
Do livro, selecionei o capítulo “O inteligível, o interpretável e o compreensível”, p. 101-118.
203
Fui aliando, às propostas de atividades com a leitura e com a produção, as
discussões teóricas, no sentido de garantir o reconhecimento de que, ao ler, “os
sentidos não nascem ab nihilo. São criados. São construídos em confronto de
relações sócio-historicamente fundadas e permeadas pelas relações de poder com
seus jogos imaginários.(ORLANDI, 1999b, p. 103). Ao propor uma leitura na sala
de aula, os sentidos poderão diferir de aluno para aluno, visto que cada um é
afetado por suas relações sociais, sua história, sua ideologia, elementos estes que
constituem o leitor/autor de textos, atribuindo-lhe esta ou aquela capacidade. Cabe,
então, ao professor, respeitar as diferenças, estimular reflexões, valorizar a
construção de sentidos revelada nas atividades de leitura e de produção textual.
Dessa forma, propus, no mesmo encaminhamento das atividades de leitura,
as de produção textual (oral e escrita), dentro de uma visão (sócio)interacionista da
linguagem, na qual se inscrevem considerações teóricas de Vygotsky (1985) e de
Bakhtin (1988). Lembrei que, ao abordar esse enfoque na sala de aula, se o objetivo
pretendido é o de desenvolvimento das capacidades de escrita, o professor não
pode perder de vista ser este o resultado de interações sócio-historicamente
determinadas. Nessa perspectiva, a aquisição do conhecimento deverá ocorrer por
meio da interação do aluno com outros interlocutores. O ato de escrever não envolve
apenas um interlocutor (o professor). Sempre que as situações de produção permitir,
deve-se criar motivos para que o aluno escreva para outras pessoas, pois o
conhecimento será construído a partir de relações intra e interpessoais.
E, conforme Bakhtin (1988), é particularidade constitutiva do enunciado ter
um destinatário, dirigir-se a alguém, sem o qual não há, e não poderia haver,
enunciado, pois é sob a influência do destinatário e de sua presumida resposta que
o locutor seleciona todos os recursos lingüísticos de que necessita.
Falar da leitura e da produção de acordo com a concepção
(sócio)interacionista da linguagem significa refletir sobre as relações de interação
provocadas pelos instrumentos mediadores, no caso, textos representativos de
determinado(s) gênero(s) textual(is).
O M1, após trabalhar esse enfoque da leitura e produção textual, julgou
interessante verificar como os alunos de a série estavam lendo, ou seja, qual
“capacidade” de interpretação estavam desenvolvendo. Tanto os professores quanto
a equipe pedagógica tinham conhecimento da importância da leitura como co-
produtora de sentidos, porém, será que isso estava se concretizando na prática? Os
204
alunos estavam realmente co-produzindo sentidos ou estavam apenas
decodificando? E, nesse contexto todo, como o texto estava sendo explorado?
Diante de tais reflexões, concluíram que seria interessante aplicar uma
avaliação aos alunos para, na realidade, avaliar o próprio desempenho dos
professores no sentido de garantir os encaminhamentos necessários à leitura e à
interpretação. Para isso, solicitaram-me que organizasse uma avaliação para cada
série, a fim de diagnosticar o nível de compreensão dos alunos.
Uma vez elaboradas e aplicadas, diagnostiquei alguns pontos que julguei
pertinentes de serem aprofundados. As avaliações revelaram que os alunos tinham
dificuldades em ler as entrelinhas, em fazer inferências no texto. Eles estavam muito
presos somente àquilo que estava escrito, ou seja, liam o texto linearmente. Tais
dados, uma vez apresentados aos professores, fizeram refletir sobre como os textos
eram analisados e os alunos motivados à leitura. A partir das reflexões, os
professores se comprometeram com um outro encaminhamento para as atividades
de leitura, quando tentariam explorar, além da decodificação, as inferenciações.
Os eixos de reescrita de texto e gramática contextualizada foram abordados
como conseqüência das atividades de leitura e produção e, em decorrência,
deveriam ser versados no sentido de propiciar, ao aluno, reflexões sobre os fatos
lingüísticos (gramática textual), entendendo que estes organizam o texto e
garantem-lhe sustentação. Para isso, propus, inicialmente ponderações sobre como
corrigir os textos produzidos pelos alunos, de acordo com sugestões de Ruiz
(2001)
116
que levantou, junto a professores de 3ª e 7ª séries, as formas mais comuns
de correção, definidas por Serafini (1989, apud Ruiz, 2001) como:
- Correção indicativa: consiste em marcar, junto à margem do texto, as
palavras, as frases e os períodos inteiros que apresentam erros ou são
pouco claros. O professor freqüentemente se limita à indicação do erro,
alterando muito pouco; somente correções ocasionais, geralmente
limitadas a problemas localizados, como os ortográficos e os lexicais.
- Correção resolutiva: consiste em corrigir todos os erros, reescrevendo
palavras, frases e períodos inteiros. O professor realiza uma delicada
operação que requer tempo e empenho, isto é, procura separar tudo o que
no texto é aceitável e interpretar as intenções do aluno sobre trechos que
116
Desse livro, sintetizei o capítulo1, “A correção (o turno do professor): uma leitura” – (anexo 07).
205
exigem uma correção. Reescreve tais partes, fornecendo um texto correto.
Nesse caso, o texto do aluno é eliminado pela solução que reflete a
opinião do professor.
- Correção classificatória: consiste na identificação não-ambígua dos erros
por uma classificação. Em alguns desses casos, o próprio professor
sugere as modificações, porém é mais comum que ele proponha ao aluno
que corrija sozinho o seu erro.
- Correção textual-interativa: trata-se de comentários mais longos dos que
se fazem na margem, razão pela qual são geralmente escritos em
seqüência ao texto do aluno. Tais comentários realizam-se na forma de
pequenos bilhetes que, muitas vezes, dada sua extensão, estruturação e
temática, mais parecem verdadeiras cartas.
Representei tais formas de correção em textos de alunos, nos quais os
professores foram imediatamente se reconhecendo: “eu corrijo assim”, “eu também”.
Depois disso, fui destacando os aspectos positivos e/ou negativos de cada forma de
correção, de acordo com a autora, no sentido de proporcionar, no momento da
reescrita, uma postura reflexiva sobre a língua.
Enfatizei a importância de olhar para os textos produzidos não apenas com a
intenção de “caçar” erros, mas principalmente de verificar o que os alunos
dominam e aquilo que eles não dominam ainda, pois a aula de Língua Portuguesa
seria muito mais produtiva se tomassem tais textos como referência. Como diz
Possenti (1996), o professor perde muito tempo ensinando o que o aluno sabe ou
coisas que não lhe são necessárias naquele momento como, por exemplo, teorias
gramaticais. A maior parte do tempo das aulas dessa disciplina ainda é destinada a
reconhecer, definir e classificar as palavras.
A pretensão era provocar, nos professores, a crença nas palavras de
Possenti (idem)
117
quando assinalou que cabe ao professor das séries iniciais
ensinar o aluno a ler e a escrever, pois:
(...) ler e escrever são atividades importantes. Como aprendemos a
falar? Falando e ouvindo. Como aprenderemos a escrever?
Escrevendo e lendo, e sendo corrigidos, e reescrevendo, e tendo
nossos textos lidos e comentados muitas vezes, como uma
117
Desse autor, não recortei, especificamente, uma parte do livro “Por que (não) ensinar gramática na
escola”, mas focalizei-o como um todo, citando trechos do autor, em determinados momentos de
minha fala e recomendando a sua leitura aos professores.
206
freqüência semelhante à freqüência da fala e das correções da fala
(POSSENTI, 1996, p. 48).
Todavia, procurei resguardar, nas reflexões e leituras propostas, as diferentes
possibilidades de interpretação, não as tomando como verdades únicas e acabadas,
mas em processo de construção, aliadas à realidade da sala de aula de cada um, ao
contexto socialmente determinado.
Ao falar da leitura, da produção de textos (orais e escritos), referi-me aos
gêneros textuais. O enfoque teórico em pauta foi abordado a partir de algumas
leituras de Bakhtin (1992)
118
, de Bronckart (2003)
119
, de Marcuschi (2003)
120
, de
Schneuwly e Dolz (2004a)
121
, entre outros, os quais, dentro da concepção
(sócio)interacionista, reconhecem a natureza social da linguagem e o caráter
dialógico e interacional da língua, entendendo os gêneros como a materialização da
interação entre os homens. Portanto, versar sobre a leitura e a produção de textos
nesta perspectiva significa trabalhar com os gêneros, reconhecendo a sua
funcionalidade. Conseqüentemente, toda atividade de leitura e produção deve ser
entendida como real, concreta e sistemática, situando o texto no tempo, no espaço e
na sua relação de interlocução, enfim, contextualizando-o.
Como ainda persistia uma confusão conceitual entre gêneros e tipologia
textual, provoquei algumas discussões nesse sentido, sustentadas em Marcuschi
(2003). Para isso,provoquei a exploração de exemplos, de análise de textos,
estabelecendo relações com os discursos propagados em documentos oficiais, tais
como o CBPR e os PCNs, ressaltando o objeto de ensino da língua em cada
documento. Citei partes dos PCNs (um documento acessível a todos) para garantir
maior proximidade com minha fala, destacando que neles os conceitos não estavam
bem definidos.
118
De Bakhtin, as leituras efetivamente realizadas por mim e parafraseadas nos cursos, logicamente
citando o autor, foram: segunda parte do livro Marxismo e Filosofia da Linguagem”, envolvendo o
capítulo 5: Língua, fala e enunciação; capítulo 6: A interação verbal; capítulo 7: Tema e significação
da língua. Do livro “A estética da criação verbal”, o capítulo enfocado foi “Os gêneros do discurso”.
119
Este autor foi tomado como base principalmente quando reportei-me à diferenciação entre
Gêneros textuais e tipologia textual, devido à explanação que faz, no capítulo 6 do livro “Atividades de
linguagem, texto e discurso, sobre seqüências discursivas.
120
De Marcuschi, interessou a leitura do artigo “Gêneros textuais: definição e funcionalidade”. Aliás,
esta foi uma leitura indicada e oferecida aos professores, devido à forma didática como trata o
assunto, especialmente quando diferencia gêneros e tipologia. É um texto que considerei acessível
aos professores das séries iniciais.
121
Desses autores, recortei o capítulo 4: Seqüência didática para o oral e a escrita: apresentação de
um procedimento”.
207
Na tentativa de aproximar a teoria de encaminhamentos práticos, apresentei
a proposta de um projeto de trabalho com gêneros textuais (anexo 08) para, em
seguida, mostrar outro projeto, desenvolvido, de leitura e produção de texto a
partir do estudo do gênero textual fábula, denominado, conforme Dolz, Noverraz e
Schneuwly (2004), Seqüência Didática. Na realidade, todo esse discurso tinha a
pretensão de oportunizar, aos professores, um novo percurso para o trabalho (de
leitura, de gramática, de produção) com o texto numa perspectiva contextualizada,
quando o aluno pudesse realmente reconhecer o gênero estudado quanto a sua
funcionalidade, seu conteúdo temático, sua estrutura composicional e seu estilo
lingüístico.
A reescrita de texto foi explorada como um processo de análise lingüística, de
acordo com as propostas de encaminhamento de Geraldi (1984)
122
. Numa tentativa
de aproximar teoria-prática, propus, aos professores, uma tabela diagnóstica (anexo
09) com o objetivo de, ao ler os textos produzidos pelos alunos, destacar os
problemas mais incidentes, diagnosticando os aspectos da língua não dominados,
explorando os problemas revelados pela maioria. Expliquei cada item da tabela e,
em seguida, distribui alguns textos para que os professores os diagnosticassem.
Naquele momento percebi, não apenas em um município, mas em todos eles,
o distanciamento existente entre a teoria e a prática. Os professores reconhecem as
inadequações textuais, mas não sabem relacioná-las com os itens apontados na
tabela. Essa realidade me fez refletir sobre a posição em que os professores (e eu
me coloco entre eles), muitas vezes se encontram. Em quantas situações agem por
indução, pela prática cristalizada no dia a dia, pela experiência da língua, sem
entender ou refletir exatamente sobre o que estão fazendo, ou por que estão agindo
de tal forma, com que objetivo. Propõem encaminhamentos práticos, a maior parte,
seguindo modelos que lhes são repassados, copiados ou recortados de livros
didáticos.
Se a proposta de análise lingüística foi apresentada por Geraldi, em 1984, na
região, e se, a partir daí, ela foi exaustivamente explorada em publicações, projetos
e documentos norteadores (CBPR, PCNs e CBEPM), o dado observado revela que
as orientações teóricas nem sempre foram explícitas. Ao contrário, chegaram de
forma confusa, fragmentada, negando conhecimentos anteriores, apresentando
122
Da coletânea apresentada no livro “O texto na sala de aula”, priorizei os artigos: “Concepções de
linguagem e ensino de português” e “Unidades básicas do ensino do português”.
208
outros, sem o tempo e espaço necessários para a reflexão e a assimilação de uma
ou de outra teoria.
Esta constatação me fez indagar: no momento em que propunha um olhar
reflexivo para o texto do aluno, diagnosticando problemas para, em seguida, pensar
em como superá-los, eu não estaria apresentando mais uma maneira de como
corrigir textos, ou seja, mais uma “teoria”? E se fosse, o tempo que tinha para
abordar aquele conteúdo era suficiente para aprofundar e garantir uma
compreensão mais ampla da proposta ou estaria incorrendo nos mesmos “erros” os
quais eu criticava?
Essas incertezas incomodavam-me, no entanto, as situações vividas, o
contexto sócio-histórico-ideológico no qual me encontrava não deixavam outra
alternativa senão trabalhar daquela forma. Afinal, eu fora contratada para “falar”
sobre aqueles conteúdos. Então, procurava mediar a situação, provocando
reflexões, insistindo na importância do professor ler assiduamente, na necessidade
de grupos de estudo no município, visto que tais ações complementariam as lacunas
não supridas pelos cursos.
Para evidenciar o processo da reescrita e da análise lingüística, apresentei
encaminhamentos de reescrita coletiva (anexo 10) e de reescritas individuais (anexo
11), enfocando, em cada exemplo, um problema apresentado no texto. Isto porque,
para Geraldi (1984), as atividades de reescrita devem centrar-se na resolução de
apenas um problema e não na higienização total do texto. Com tais atividades,
estava provocando um olhar para o ensino gramatical contextualizado.
Todavia, qual era o conhecimento dos professores em relação ao ensino
gramatical, via texto do aluno ou textos publicados? Como poderiam encaminhá-lo?
De que forma explorá-lo? É claro que os professores haviam lido ou estudado
alguma coisa em relação ao assunto, porém percebi que esta não era a prática, pois
tinham muitas dúvidas a respeito.
Quando questionados sobre abordagens da gramática em texto já publicados,
os professores diziam trabalhar com atividades do tipo: “retire os pronomes do
texto”, assinale os verbos no texto”, de acordo com exemplos propostos por alguns
livros didáticos. Essa era a compreensão que tinham da gramática contextualizada,
até porque, conforme Perfeito e Costa-Hübes (2005), o livro didático é o
companheiro inseparável dos professores, ocupando, na maioria dos casos, grande
espaço nas aulas de língua materna, orientando, ensinando, mostrando e propondo
209
inovações. Nele trabalhada, a gramática é revisitada de acordo com suas
pretensões e comandada pela perspectiva de ensino defendida.
Sobre o livro didático, Bräkling (2003) e Rojo e Batista (2003) postulam que
quase sempre as atividades gramaticais são apresentadas dentro dos modelos da
gramática normativa tradicional e, muito raramente, com uma condução reflexiva, o
que não tem contribuído, seguramente, com as práticas de leitura, compreensão e
produção de textos escritos. Ou seja, a maioria das atividades não privilegia a
reflexão sobre o uso da língua, não prioriza a variação lingüística, não orienta os
trabalhos com o conteúdo numa perspectiva reflexiva, não explora conhecimentos
pragmáticos/discursivos ou textuais. Mesmo quando as atividades propostas estão
relacionadas a um texto, estas se reduzem a classificar gramaticalmente
determinado elemento, sem necessariamente provocar reflexões sobre o seu uso na
situação discursiva apresentada.
A visão prescritiva da língua ainda está impregnada na escola e na
sociedade. Nos municípios investigados (bem como na região), não era diferente:
Na escola (...) uma arraigada tradição de ensino dos chamados
conteúdos gramaticais, que caberia à escola, supostamente,
sistematizar o conhecimento resultante da reflexão assistemática,
circunstancial e fortemente marcada pela intuição de todo falante da
língua, propondo essa sistematização como um suporte necessário a
um melhor desempenho lingüístico dos estudantes (GERALDI, 1996,
p. 129).
Percebi (não nestes municípios, mas em todos que até então tinha
trabalhado), assim como Moura Neves (1999) após analisar “para que se ensina
gramática”, “o que é ensinado” e “como se ensina gramática”, que ao ensino da
língua era dado um tratamento predominantemente formal com exercitação
gramatical dentro dos padrões de normatização da língua. No M5, por exemplo,
deparei-me com uma professora aplicando prova a alunos da 2ª série sobre
identificação e classificação de encontros consonantais, totalmente desarticulados
de qualquer situação de uso, sem um objetivo maior que não fosse “ensinar
gramática”.
Nos municípios investigados, a a realização dos cursos que ministrei,
predominava um ensino gramatical desarticulado das práticas da linguagem,
distanciado do texto. Portanto, só servia para que o aluno fosse bem na prova e para
ser aprovado, uma vez que a metodologia empregada residia em atividades que
210
seguiam da metalíngua para a língua por meio de exemplificação, exercícios de
reconhecimento e memorização de terminologias.
O ensino de gramática em nossas escolas tem sido primordialmente
prescritivo, apegando-se a regras de gramática normativa que, como
vimos, são estabelecidas de acordo com a tradição literária clássica,
da qual é tirada a maioria dos exemplos. Tais regras e exemplos são
repetidos anos a fio como formas “corretas” e “boas” a serem
imitadas na expressão do pensamento (TRAVAGLIA, 1996, p.101).
Por outro lado, embora houvesse todo um saber cristalizado, as falas dos
professores foram me revelando, no decorrer dos cursos, que a concepção de
linguagem norteadora de suas práticas em sala de aula, principalmente referente ao
ensino da gramática, estava assentada naquelas propagadas antes mesmo da
década de 1970: Linguagem como transmissão do pensamento e, posteriormente,
como instrumento de comunicação. Em outras palavras: a gramática ensinada
deveria garantir, ao aluno, as habilidades para falar e escrever corretamente. Para
isso, nada melhor do que amparar-se em “modelos” estruturais que revelavam o
bom uso da escrita e, ainda, explorando as terminologias, as classificações e as
regras.
Era dessa forma que a gramática contextualizada vinha sendo interpretada.
Então, senti-me no compromisso de, naquelas poucas horas de curso, provocar um
outro olhar para o ensino da gramática, de forma que, por meio de atividades
contextualizadas, estimulassem reflexões necessárias sobre o uso dos elementos
lingüísticos no texto. Para isso, fui comprovando que tais discussões não eram
recentes e vinham sendo divulgadas desde a década de 1980, com o Projeto “O
texto na sala de aula”, de Geraldi (1984).
Localizei o início da preocupação com o ensino gramatical contextualizado,
retomando as bases da concepção (sócio)interacionista, relacionando-a com as
orientações teóricas de Vygotsky (1984), de Bakhtin (1988), da Lingüística da
Enunciação. Lembrei-os que, depois de Geraldi, conforme posto (considerado
pioneiro ao sistematizar uma proposta interacionista de trabalho com a língua),
essas discussões foram divulgadas por muitos autores, dos quais destaquei:
123
Perini (1985), Franchi (1988), Possenti e Ilari (1992), Possenti (1996), Geraldi (1991,
123
Dos autores mencionados, fiz citações, paráfrases e indicações de leituras, levando livros na sala
para que pudessem folhear, copiar bibliografias. Como texto, fiz resumos das obras de Travaglia
(1996) e de Britto (1997), que foram repassados aos professores.
211
1996), Suassuna (1995), Moura Neves (1996, 1999, 2002 e 2004), Travaglia (1996,
2003), Britto (1997), Matêncio (2001), Antunes (2003), entre outros. E assim, na
perspectiva de contemplar tais discussões, o CBPR (1990) reorientou o ensino da
língua para o texto. Os PCNs (BRASIL, 1997/1998), alguns anos depois, reforçaram
ainda mais esse propósito do ensino da gramática, enfatizando o trabalho com a
língua em situações de uso, no caso, em diferentes gêneros textuais.
Fiz questão de rememorar tais documentos para que os professores
reconhecessem, em minha fala, leituras realizadas, mas que, por algum motivo,
não foram interpretadas e, em decorrência, não foram transpostas didaticamente.
A partir da apresentação teórica, oportunizei o contato com exemplos de
atividades contextualizadas, pautadas, principalmente, na Lingüística Textual (uma
das vertentes da Lingüística da Enunciação) que era, no momento, meu maior
referencial teórico e prático. De acordo com tal vertente, explorei os recursos
coesivos referenciais (anexo 12) no gênero fábula, os recursos coesivos seqüenciais
(anexo 13) num relato histórico.
Além destas, apresentei atividades a partir da reescrita de textos produzidos
por alunos, abordando o discurso direto e indireto (anexo 14), a concordância verbal
e nominal e a conjugação verbal e nominal (anexo 15) em atividades de reescrita de
textos de alunos. Além disso, apresentei alguns exemplos de atividades reflexivas
propostas por Travaglia (1996), explorando, por exemplo, as preposições, os
adjetivos e algumas outras classes de palavras, por entender que essa proposta
aproxima-se muito das diferentes situações de uso da língua.
De um modo geral, foram estes os aspectos da língua abordados nas horas
de formação continuada nos municípios investigados. Todavia, após tal descrição (e
após cada curso), algumas perguntas insistem/insistiam em incomodar:
a minha ação docente reveladas nestes municípios (e nos inúmeros
cursos de Língua Portuguesa ministrados na região), estavam contribuído
para oferecer subsídios ao trabalho com a língua dentro de uma
concepção (sócio)interacionista da linguagem, que requer um outro olhar
também para o ensino da gramática? Em outras palavras: qual o efeito de
minhas ações de formação na prática diária do professor, mais
especificamente sobre o ensino da gramática?
Será que as horas de formação contribuíram para provocar reflexões,
revisitar conceitos, rever os encaminhamentos de ensino/aprendizagem,
212
provocar tentativas de produção de outros encaminhamentos para o
ensino da gramática numa perspectiva textual/discursiva?
Após alguns dias do curso, depois de ter esgotado as atividades
discutidas por mim, o professor teria produzido outras atividades a partir
dos exemplos dados? Ou seja, a formação recebida nestas 24 ou 32
horas foi suficiente para estimulá-lo à pesquisa, à produção e a mudança
de sua prática, no caso, da gramática descontextualizada para a
contextualizada?
Talvez não obtenha respostas para tantas indagações, contudo meu
propósito se inscreve na tentativa de, ao interpretar os dados coletados, encontrar
pelo menos algumas, relativas a tais (ou outros) questionamentos. Encaminho-me,
agora, à análise e interpretação de dados coletados por meio do questionário, das
entrevistas e das gravações de aulas, lembrando que os resultados poderão ser
perpassados pelas minhas próprias constatações, isto porque, como se trata de uma
pesquisa etnográfica, presenciei muitas situações e, por isso seria impossível
distanciar-me delas e não complementá-las com minhas inserções.
4.3 Análise e Interpretação dos Dados
Antes de iniciar a análise e interpretação, gostaria de lembrar que os mesmos
não foram coletados durante os cursos de formação, pois julguei que talvez a
aproximação com as reflexões pudesse interferir nos resultados. Assim, três meses
ou mais após concluir as horas de formação, deixei o questionário (anexo 03) para
que os professores de rie o respondessem com tranqüilidade e o devolvessem
posteriormente. Somente depois de sua análise retornei para a entrevista (anexo 04)
com tais professores.
Da mesma forma, as gravações de aulas, que aconteceram com apenas três
professoras de diferentes municípios, ocorreram após alguns meses, quando assisti
e gravei, pessoalmente, 20 aulas consecutivas em turmas de 4ª séries. Ressalto a
minha ação direta na coleta dos dados por se tratar de uma pesquisa qualitativa em
educação, de caráter etnográfico.
Enfim, procurei garantir um distanciamento dos cursos de formação,
exatamente para verificar os efeitos dos mesmos. Caso eles fossem duradouros e
efetivos, ainda encontraria suas marcas, mesmo passado algum tempo. Então, caso
213
detectasse a ausência de tais marcas, estaria, de certa forma, confirmada (sob o
ponto de vista desta pesquisa) a efemeridade de tais eventos e, neste caso, partiria
para uma proposta de solução do(s) problema(s) levantados(s).
Estava consciente de que poderia encontrar, nos dados, marcas de outra(s)
formação(ões), afinal, os professores são sujeitos sociais, convivendo com
diferentes meios que, de uma forma ou de outra, interferem na sua formação diária
e esta, por sua vez, resulta, também, das leituras, de outros cursos de formação, da
participação em outros eventos, da interação com colegas e da própria prática do dia
a dia. Em outras palavras: são muitas as formas de interação que interferem no
conhecimento do professor e que poderiam transparecer nos dados coletados.
4.3.1 Análise e interpretação do questionário
Conforme já exposto no capítulo 3, um dos questionários (anexo 03) foi
distribuído entre 63 professores de série dos municípios investigados para que o
respondessem (com calma) e dias depois o devolvessem. Talvez esta não tenha
sido uma boa estratégia, porque apenas 35 professores devolveram-no respondido
ou parcialmente respondido. Tais informantes serão tratados, no decorrer da análise
e interpretação, por números distribuídos, aleatoriamente, entre (01) e (35). A opção
pelo tratamento único, sem referir a informantes deste ou daquele município,
justifica-se pelo caráter de amostragem do presente instrumento e pela preservação
da identidade do informante.
O questionário foi organizado com 31 questões, das quais 6 eram subjetivas.
A pretensão, ao elaborar o instrumento, foi de identificar os professores de série
quanto: ao sexo e à idade (questões 1 e 2); à formação inicial (questões 3 a 6); ao
tempo de atuação e experiência em educação (questões 7 a 9); à carga horária de
trabalho (questões 10 e 11); à formação na área (questões 12 a 15); à participação
na formação continuada (questões 16 a 21); ao ensino da gramática contextualizada
(questões 22 a 28); e à concepção de linguagem, gramática e gêneros textuais
(questões 29 a 31). Na seqüência, apresentarei e interpretarei os dados, tratando-os
como uma amostragem dos professores de 4ª série da região Oeste do Paraná.
Uma primeira informação confirmadora é que as mulheres são,
destacadamente, a maioria entre os professores de séries do ensino fundamental
(dentre os 35 questionários coletados, encontramos 34 do sexo feminino) e, dentre
214
elas, a faixa-etária predominante é de 30 a 39 anos de idade (46%), conforme
distribuição no gráfico:
Idade
3%
14%
46%
31%
6%
0%
Até 24 anos.
De 25 a 29 anos.
De 30 a 39 anos.
De 40 a 49 anos.
De 50 a 54 anos.
55 anos ou mais.
Atuam no município há mais de 10 anos e são, portanto, profissionais
relativamente jovens, com anos de experiência na área, o que pode favorecer o
interesse pela busca de conhecimentos e de maior formação. Tanto é verdade que
todos freqüentaram a escola de magistério ou antigo normal (apenas 1, Educação
Geral) e 91% concluíram um curso de graduação. Destes últimos, a maioria é
licenciado em Pedagogia ou Curso Normal Superior.
A predominância desta licenciatura, presumo, se dá em conseqüência da
própria atuação nas séries iniciais e do incentivo dos municípios, organizando salas
de formação à distância para o Normal Superior, evitando o deslocamento diário do
professor até às cidades-pólo (Cascavel, Toledo, Foz do Iguaçu, Assis
Chateaubriand, Marechal Cândido Rondon, Medianeira e São Miguel do Iguaçu)
onde se localizam as universidades (públicas ou privadas).
O incentivo à formação inicial do professor, conforme relatado no capítulo 1,
data da década de 1970, quando passou-se a exigir, como formação mínima para a
profissão docente, o curso magistério. Embora esse princípio não tenha se cumprido
em todas as situações na ocasião (principalmente devido à falta de professores em
muitas localidades rurais, por exemplo), o MEC-Seneb retomou tal preocupação ao
elaborar e publicar, em 1992, as Diretrizes Gerais para a Capacitação de
Professores, Dirigentes e Especialistas da Educação Básica e, em 1993, o Plano
215
Decenal de Educação para Todos. Um dos enfoques deste documento era o de que,
dentro do período de 10 anos, todos os professores das séries iniciais deveriam ter
uma licenciatura. A partir daí, multiplicaram-se as ofertas dos cursos presenciais na
região (principalmente pela rede privada), assim como na modalidade à distância,
estimulando os professores a optarem por uma ou outra maneira de se licenciarem.
Nesse sentido, os dados revelam haver um equilíbrio numérico entre aqueles que
fizeram um curso superior (licenciatura) de forma presencial, dos que o fizeram na
modalidade à distância ou semipresencial.
Modalidade de Formação Superior (licenciatura)
48%
23%
29%
Presencial.
Semipresencial.
À distância.
As modalidades evidenciam os princípios do Banco Mundial que, por sua vez,
refletem-se nas políticas de formação propagadas pelo MEC no Plano Decenal de
Educação para Todos. O que interessa é formar um profissional “competente” a
baixo custo. Para isso, nada melhor do que incentivar a expansão dos ISEs –
Institutos Superiores de Educação – e os Cursos Normais Superiores na modalidade
à distância. A estes, cumprem formar professores com ênfase no caráter técnico
instrumental, com competência para mobilizar saberes de modo adequado à
situação, solucionando problemas práticos do cotidiano. Prevalece uma formação
neotecnicista, por entrar em jogo, mais uma vez, a prática, sobrepondo-se às
reflexões teóricas.
Por outro lado, embora haja todo um incentivo financeiro para aqueles que
são pós-graduados, a remuneração oferecida ainda não é a ideal. Conforme dados
revelados anteriormente, os professores pós-graduados recebem entre R$ 701,00 a
216
R$ 900,00 pela carga horária de 20 horas semanais. Conseqüentemente, 80% deles
trabalham 2 turnos consecutivos (matutino e vespertino), sendo que, destes, 36%
atuam em 2 escolas diferentes, o que, de certa forma, interfere nas ações do
professor. Por serem mulheres, a maioria, além das 8 horas diárias de trabalho, por
certo acumulam as responsabilidades de mãe, de esposa, de dona de casa,
restando (quando resta) pouco tempo para leituras, reflexões, estudos e
planejamento de suas aulas. Mesmo assim, demonstram interesse, participação e
preparo para o trabalho.
Quando instigados sobre a disciplina que se acham mais ou menos
preparados para trabalhar (tendo em vista que, nas séries iniciais, abordam todas as
disciplinas), a maioria deles afirma estar preparado para todas elas, visto terem
cursos de formação na área e/ou sua formação (superior) ter focalizado todas as
áreas. Minha intenção foi, ao elaborar estas questões (12 e 13 – anexo 3), de
investigar a opção pela disciplina de Língua Portuguesa. Nesse sentido, constatei
que apenas 17% deles sentem-se mais preparados para esta disciplina, pelo fato de
terem sua formação em Letras, enquanto que 18% não se sentem preparados,
justificando que ou fizeram poucos cursos de formação, ou sua formação
(licenciatura) não é nesta área.
Todavia, em relação a cursos de formação, 66% informaram ter participado
de cursos de Língua Portuguesa nos últimos anos. Os demais (34%) preferiram não
apresentar a informação. Dentre os cursos apontados, verifiquei, além da minha
docência, algumas outras, focalizando conteúdos como: tipologia textual, práticas de
alfabetização, literatura infantil, oratória, produção de textos, sintaxe e semântica,
leitura, português básico, coesão e coerência textual, dentre outros. Os cursos são,
em geral, ofertados pelo próprio município ou são buscados pelos professores em
outros locais como nas universidades, por exemplo.
Em se tratando, ainda, de formação continuada, a cultura que sobrepõe, na
região, segundo informações coletadas, como a modalidade de evento que contribui
para o conhecimento do professor e o seu trabalho na sala de aula, é a dos cursos
de formação:
217
Modalidade de formação que mais contribui
17%
0%
0%
83%
0%
Grupo de Estudos.
Teleconferências.
Seminários.
Cursos de formação.
Outros.
Como demonstra o gráfico, 83% dos professores escolheram, dentre os
eventos apresentados, os cursos pontuais, que ainda é a modalidade predominante
no Brasil. Para os informantes, não importa se tal modalidade, conforme concluíram
os Referenciais para a Formação de Professores (BRASIL, 1999), é considerada
assistemática, pontual, limitada no tempo, não integrando um sistema de formação
permanente, e se “a formação de que dispõem os professores hoje no Brasil o
contribui suficientemente para que seus alunos se desenvolvam como pessoas”
(Idem, p. 16). Para os profissionais da educação, esta continua sendo a modalidade
que mais lhes interessa. Tal preferência seria, talvez, por não terem participado de
outra(s) modalidade(s) de formação?
Verificando esta questão, os dados demonstraram que 54% dos professores
já participaram (ou participam) de grupo de estudos, 40% presenciaram seminários e
6%, outra(s) modalidade(s). Entendo que os cursos de formação se sobrepõem a
outras modalidades como, por exemplo, grupo de estudos, porque são os mais
ofertados.
No entanto, como deveria ser a organização de tais eventos (cursos, grupo de
estudos etc.), segundo os professores? Para a maioria deles, organizar-se-iam
distribuindo o tempo entre exposições teóricas e encaminhamentos práticos. Uma
grande parcela, porém, ainda entende o evento em foco como um momento de
elaboração de atividades. Neste caso, os professores demonstram um discurso
consagrado pelo modelo “ideal” de formação, criticado nos Referenciais para
Formação de Professores, ou seja, aquele revelador da “hegemonia de uma
concepção de professor como aplicador de propostas prontas, produzidas por
218
técnicos das instâncias centrais ou intermediárias do sistema educacional” (BRASIL,
1999, p. 45).
Os cursos são apontados como o modelo mais significativo porque, até a
década de 1990 (e, em muitos lugares, ahoje), era este o único evento ofertado
aos professores. Para sua execução, elegiam-se os docentes “tecnicamente”
preparados, os quais ditavam regras, modelos de atividades, mudanças de postura,
enfim, levavam propostas prontas. No início deste século, despontou(aram) outra(s)
modalidade(s) de formação continuada, centrada(s) numa perspectiva reflexiva, para
a(s) qual(is) os professores não se apresentam como meros participantes, mas
também como profissionais reflexivos. As discussões avançaram quando no
conjunto de pesquisas sobre a formação dos professores, o componente da
reflexão, do estudo, da própria formação, passou a ser considerado imprescindível,
possibilitando o incentivo ao professor-pesquisador.
Todavia, pelos dados revelados, tal perspectiva de formação ainda não é
devidamente sistematizada pelos professores (e, por que não, pelos próprios
administradores da educação) da região, já que não se reconhecem como núcleo do
próprio processo de formação continuada e esperam de “pessoas especializadas”,
orientações de como devem proceder.
Penso que a mudança de opção ocorrerá a partir do momento em que os
professores se colocarem como sujeitos individuais e coletivos de seu saber docente
em relação às experiências feitas com o saber científico, participando na pesquisa
da própria prática, com direito à fala, à orientação, à reflexão, exercendo o papel de
atores coletivos e sociais na transformação do cotidiano escolar e para além dele.
Postulo, desse modo, ser preciso optar por uma modalidade de formação que
garanta o estudo constante por meio de diferentes leituras, de reflexões, de
indagações, de proposições, enfim, de pesquisa. E, seguramente, os cursos
pontuais, por mais que se realizem em 24 ou 32 horas, sozinhos, não garantem a
aprofundada extensão.
Como os docentes poderiam compreender que a formação é “repassada” e
não “construída”, investiguei sobre quais eixos da Língua Portuguesa gostariam de
obter maior formação. Os professores fizeram a seguinte indicação:
219
A gramática contextualizada é, sem dúvida, a maior necessidade de formação
dos professores. Assim como havia constatado durante os cursos e já posto
anteriormente, esses profissionais ainda têm muitas dúvidas a respeito. Embora,
conforme dito, eu tenha trabalhado tal enfoque numa parte da carga horária
destinada à formação (8 horas), este dado revela que as reflexões realizadas nos
cursos não foram suficientes para garantir um domínio maior sobre o eixo. Pelo
menos é o que revelam alguns professores, por meio da justificativa apresentada
(questão 21):
(01) Ainda tenho dúvidas a respeito dessa prática.
(02) Pois encontro um pouco de dificuldade ainda na elaboração de
atividades.
(03) Porque é nelas que eu ainda me sinto menos segura.
(04) Apesar de ter participado de alguns cursos que enfocaram
este tema, ainda tenho dúvidas de como encaminhar este
trabalho. Também na graduação obtive alguns
encaminhamentos, procuro materiais, porém ainda não são
suficientes. Procuro trabalhar alguns aspectos gramaticais,
mas outros, acho difícil trabalhar contextualizado.
Nas palavras, fica evidente a insegurança, a dúvida no que tange ao trabalho
com a gramática contextualizada, apesar de terem, em algum momento, refletido
sobre tal abordagem. O emprego do “ainda” em todas as falas confirma tal
constatação. Este operador argumentativo, empregado para introduzir um
Necessidade de maior formão
14%
14%
55%
17%
0%
Leitura e interpretação.
Produção e reescrita de
texto.
Gramática contextualizada.
neros textuais.
Oralidade.
220
argumento a favor da alternativa selecionada na questão anterior, indica a
necessidade de acrescentar estudos, reflexões sobre o tema, mesmo tendo sido
explorado em outras ocasiões como: cursos de formação (ministrado por mim ou
outro(s) docente(s)), em outros momentos de formação (inicial ou continuada) ou,
ainda, por meio de leituras das publicações referentes ao tema.
Nas questões 25 e 26 a pretensão foi a de verificar se os professores
estavam lendo textos teóricos (livros, artigos científicos) que abordassem o ensino
da gramática. A maior parte deles, 53%, apontou que tem lido, mas muito pouco. Em
contrapartida, 25% dos professores indicaram que lêem pelo menos um artigo (ou
livro) por mês referente ao tema, enquanto 22% disseram ler a cada dois meses.
Quando interrogados sobre o acesso a tais leituras, 42% dos professores
reduzem sua leitura àquelas indicadas ou propostas nos cursos de formação; outros
29% estão indo além, buscando na biblioteca da escola ou do município, outras
fontes de leitura; 20% informaram que, por meio dos cursos de graduação ou pós-
graduação, estão aprofundando seus conhecimentos teóricos; apenas 9% indicaram
estar adquirindo livros e/ou revistas científicas.
O importante nos dados aferidos é que os professores estão, de alguma
forma, procurando, por meio da leitura, interar-se das discussões propostas sobre a
gramática. Talvez não estejam lendo na medida considerada “ideal” para a
profissão, mas indicativos de busca, de iniciativas que, se ampliadas
gradativamente, poderão interferir na prática diária.
Convém lembrar, por outro lado, que os professores, em sua maioria,
estudaram a língua do ponto de vista normativo, estrutural, privilegiando o falar e o
escrever corretamente, seguindo modelos formais, que ainda resistem em muitos
cursos de formação. Sendo assim, não é de se estranhar que as justificativas
apresentadas para a questão 21, relativas à opção de maior formação em gramática
contextualizada, sejam como a de (05):
(05) Porque na minha formação superior o tive esse trabalho,
pois meu professor era defensor da gramática pura.
Tal maneira de traduzir o ensino da língua, faz com que a gramática
normativa seja interpretada como “a valorização de uma modalidade lingüística que
se respalda na normatização do uso da escrita para se impor à oralidade” (BRITTO,
221
1997, p. 58). E essa prática ainda subsiste, mesmo que, desde a cada de 1980,
Geraldi tenha propagado que “o ensino gramatical somente terá sentido se for para
auxiliar o aluno e por isso partirá do texto do aluno” (GERALDI, 1984, p. 63). Tanto é
verdade que quando é proposta a gramática contextualizada como uma das opções
de reflexão sobre a língua, parece, para alguns, que a abordagem é nova no ensino:
(06) Porque até pouco tempo trabalhava somente com a gramática
isolada.
(07) Pelo fato de ser conteúdo novo eu ainda encontro algumas
dificuldades e variantes para trabalhar.
Percebo, destarte, que há tentativas, esforços dos professores no sentido de,
ao trabalhar com os elementos lingüísticos, aproximar-se, o máximo possível, de
situações reais de uso. Para isso, o texto é tomado como instrumento de análise e a
gramática é considerada como estrutura do texto. Tratado dessa forma, o ensino da
gramática pretende auxiliar no desenvolvimento da capacidade interativa do aluno,
por meio da reflexão sobre o uso da língua. Porém, quando reduzido à cobrança da
regra pela regra, a prática torna-se equivocada e mantém o rótulo da língua como
sistema. Na tentativa de romper com esta concepção de língua, os professores
ensaiam práticas contextualizadas. É o que revelam as seguintes informantes, ainda
justificando a necessidade de maior formação sobre o trabalho com a gramática
contextualizada:
(08) Porque é tarefa difícil fazer o aluno buscar no texto. Para isso
temos que ter bastante clareza.
(09) Porque considero a gramática cheia de peculiaridades e,
portanto, mais difícil de contextualizar, de forma que se torna
um círculo vicioso, ou seja, por mais que você contextualize,
muitas vezes voltamos à gramática isolada.
Segundo Rojo e Cordeiro (2004), o texto foi, e ainda é visto, como objeto de
uso em sala e aula propiciando hábitos de leitura e estímulo para a escrita ou
como suporte para o desenvolvimento de estratégias e habilidades para a redação
e para a gramática e não como objeto de ensino, propriamente dito. Isso ocorre
porque, nas práticas relativas ao uso, à circulação e à produção de textos, os
222
professores ignoram, muitas vezes, a situação de produção (contexto, interlocutores,
finalidade, suporte etc.), levada em conta no processo discursivo, fechando-se
apenas no texto como estrutura gramatical e tipológica.
Os livros didáticos, nessa perspectiva, são tomados como suporte, fonte de
pesquisa em muitas situações, principalmente quando se esgotam as atividades
propostas nos cursos e os professores não conseguem produzir outras. Eles
mesmos denunciam tal dependência ao justificarem a opção por maior formação
sobre a gramática contextualizada:
(10) Porque somos reféns dos livros didáticos e gostaria de ter mais
subsídios para elaborar atividades assim.
(11) Porque é a questão que encontro maior dificuldade, é difícil de
se encontrar nos livros didáticos de forma clara e fácil
compreensão do aluno. É uma formação que tem poucos
cursos.
O problema é que, quase sempre as atividades gramaticais, nos livros
didáticos, são apresentadas dentro dos modelos da gramática normativa tradicional
e, muito raramente, com uma possibilidade de reflexão. A interpretação e as
palavras dos professores se confirmam na questão 24, quando é solicitado a eles
que avaliem o enfoque que o livro didático tem dado à “gramática contextualizada”:
49% dos professores optaram pela alternativa (d), a qual indica que a maioria dos
manuais usa o texto como pretexto e continuam priorizando a teoria gramatical; em
contrapartida, 36% deles indicaram a alternativa (c), dizendo que têm encontrado
livros didáticos que apresentam apenas algumas atividades nessa perspectiva;
apenas 15% afirmaram, por meio da alternativa (b), terem encontrado livros
didáticos que tentam trabalhar dessa forma na maioria das atividades.
Assim como interpretou a maioria dos professores, grande parte dos manuais
é genérico e, em função da obediência ao consumo, freqüentemente desvirtua a
proposta de trabalho com a língua. Todavia, reconheço que os livros didáticos têm
sofrido alterações, principalmente a partir da implantação do Programa Nacional do
Livro didático – PNLD – e da publicação dos PCNs, propondo que:
(...) as situações didáticas devem, principalmente nos primeiros
ciclos, centrar-se nas atividades epilingüísticas, na reflexão sobre a
língua em situações de produção e interpretação, como caminho
223
para tomar consciência e aprimorar o controle sobre a própria
produção lingüística (BRASIL, 1998, p. 39).
Mesmo assim, esses manuais não atendem plenamente à proposta textual-
discursiva de trabalho como a língua, para a qual o texto deve ser tomado como
manifestação concreta do discurso, como unidade de sentido (coerência)
recebido/produzido, oralmente ou por escrito, por interlocutores em condições
específicas de produção. A gramática, no contexto, é interpretada como aquela que
está para o texto, assim como este concretiza o gênero que, por sua vez, é
determinado socialmente. Um pressupõe o outro e se completam. As articulações
sócio-discursivas (orais e escritas) são construídas por estruturas lingüísticas
gramaticais.
Ao ser Interpretada incoerentemente a concepção sócio-discursiva de
trabalho com a língua, muitas abordagens práticas, embora amparadas em textos,
ainda são organizadas como o ensino de regras e normas lingüísticas. É o que
evidenciam os informantes (12) e (13), quando interpretam, ainda na questão 21
(anexo 03), a gramática contextualizada como o ensino de regras:
(12) Para mim, o mais complicado de abordar e compreender com
os alunos é o uso da gramática devido à complexidade das
regras.
(13) Porque sinto dificuldades em fazer com que os alunos
compreendam e façam os textos de acordo com a escrita
padrão.
Prevalece a importância das “regras” e o reconhecimento da “escrita padrão”.
Saber escrever pressupõe, neste caso, empregar adequadamente as regras
gramaticais da língua padrão em todas as situações de produção escrita, como se
esta fosse a única variante da língua portuguesa.
No entanto, quando pesquisados sobre a compreensão teórica que têm sobre
esta prática (questão 22), apenas 11% dos professores indicaram não se sentirem
seguros para definir o ensino da gramática contextualizada. A grande maioria (83%)
apontou a alternativa considerada correta: “trata-se de propor questionamentos aos
alunos de forma que reconheçam os elementos gramaticais como importantes para
construir o significado do texto”. Apenas 6% apontaram a alternativa que mais se
distanciava da compreensão necessária para tal prática: “trata-se de ensinar a
224
gramática usando texto do qual retiro palavras ou frases para classificá-las
gramaticalmente”.
As indicações denunciam que existe um conhecimento teórico
sistematizado. Esse conhecimento pode ser, em parte, conseqüência das reflexões
provocadas nos cursos de formação que ministrei. Como exposto, a ênfase ao
texto e suas marcas lingüísticas foi uma constante durante as horas da formação,
seja quando abordei a leitura, seja quando focalizei a produção e a reescrita de
texto. Embora tenha priorizado 8 horas para discutir exclusivamente a gramática
contextualizada, o tema foi revisitado durante todo o percurso. o ignoro que tal
conhecimento pode ser conseqüência, também, de outros cursos, de outras práticas
de formação.
Devido ao conhecimento construído, metade dos professores considerou,
quando se trata do trabalho com gramática contextualizada (questão 23), ser “fácil
teoricamente”, mas eles ainda têm dúvidas quanto ao encaminhamento prático.
Outros (29%) não avaliaram o encaminhamento como complicado e estão
colocando em prática algumas sugestões que chegam às suas mãos. Contudo,
revelaram não se sentirem seguros para produzirem atividades sozinhos. Apenas
18% consideraram fácil o encaminhamento das reflexões sobre a língua e 3%
afirmaram tratar-se de uma prática difícil, tanto que preferem trabalhar com a
gramática por meio de exercícios isolados.
Partindo da hipótese de que foram publicadas muitas discussões teóricas
criticando o ensino da gramática descontextualizado; e que muito pouco se encontra
como contraproposta – ou seja, encaminhamentos práticos que orientem o professor
para provocar, em seus alunos, as reflexões necessárias sobre o emprego desta ou
daquela palavra em determinado contexto instiguei (questão 28) se
necessidade de mais material de apoio, de consulta, que oriente em direção a esta
prática. Dentre os 35 professores, 6% deixaram de responder esta questão e 17%
afirmaram não sentir tal necessidade, justificando nesta direção de (14):
(14) Devido ao tempo em que nós participamos dos Programas
de Formação continuada, temos sugestões de como
trabalhar e, baseando-se nelas, procuramos elaborar outras,
dependendo dos objetivos.
225
Sem dúvida alguma, este é o comportamento desejável a todo professor,
pois, “talvez um dos princípios mais universais de quem se interessa pelas questões
pedagógicas em sala de aula, principalmente na área de língua portuguesa, seja o
de que cada professor deve fazer seu próprio material didático” (TEZZA, 2002, p. 2).
As universidades deveriam se colocar como o lugar de excelência para, junto com
os professores, produzirem nesta direção. Embora ocorram algumas iniciativas,
ainda não são suficientes e poucos são os professores que produzem, assim como
são poucas as parcerias entre universidades e professores das séries iniciais. Como
conseqüência, 77% dos professores apontaram a necessidade de publicações
direcionadas para o encaminhamento prático da gramática contextualizada.
Selecionei algumas respostas dos seguintes informantes, as quais apontam para a
maioria:
(15) Sim. Livros e textos teóricos que trabalhem a gramática
contextualizada.
(16) Seria muito bom receber novas sugestões de atividades que
envolvem a gramática como por exemplo: apostilas com textos
variados, contendo a gramática contextualizada, livro...
(11) Sim, necessidade de se ter mais material de apoio, pois o
pouco material que encontramos para consulta sobre a
gramática são os livros didáticos e as gramáticas onde as
atividades são soltas e não contextualizadas. Acredito que
artigos, revistas e livros com sugestões seriam úteis, assim
como cursos de formação nestes conteúdos.
Nas falas, é possível inferir, também, atitudes um tanto quanto acomodadas
por parte de alguns, como, por exemplo, de (16), para quem seria muito bom
receber novas sugestões”. Atitudes assim podem ser tomadas como resquícios da
escola tecnicista quando o professor era “orientadopara apenas fazer aquilo que
lhe era repassado. Não havia espaço para produção, discussão ou reflexão. Cabia-
lhe, apenas, repassar o conteúdo que vinha sistematizado nos manuais didáticos
ou nos currículos. O Currículo da SEED é um exemplo de tal maneira de conduzir o
ensino, trazendo aulas praticamente prontas, restando, ao professor, somente
transmiti-las. Se, em contrapartida, o professor elaborasse seu próprio material
didático, estaria se colocando numa atitude permanente de atualização, reflexão e
produção diante da percepção concreta e real dos problemas apresentados por seus
226
alunos, não dependendo, exclusivamente, de atividades prontas recortadas dos
livros didáticos, sem, muitas vezes, refletir sobre elas.
(...) o problema mais grave dos livros didáticos tem sido a ausência
de qualquer discussão mais profunda sobre o conceito de norma
padrão; em geral, os manuais, em grande parte, ignoram todo o
saber sobre a ngua acumulado pela lingüística nos últimos cem
anos, reproduzindo gramáticas normativas que vêm séculos se
copiando umas às outras. O manual didático, nessa área, é
tipicamente aquele livro que ensina, burocrático, “a linguagem certa”
e, por motivos mais ou menos óbvios, é exatamente nesse tipo de
modelo que a maioria esmagadora dos alunos e dos professores
está interessada. O problema dessa tal “linguagem certa” é que ela
acaba por destruir uma compreensão mais generosa do potencial da
linguagem pior ainda, o seu modelo acaba sendo um empecilho
para o aprendizado de um padrão escrito de qualidade (TEZZA,
2002, p. 2).
Entretanto, toda mudança de postura requer compreensão teórica das
atividades práticas, o que provocará questionamentos como: por que trabalhar, por
exemplo, a gramática contextualizadamente? Como conduzir as reflexões para que
o aluno reconheça a gramática como organizadora das interações verbais (orais e
escritas)? Que conhecimento o aluno deve sistematizar, a partir de atividades com a
língua? Abordar a língua por meio destas reflexões requer uma concepção clara de
linguagem.
Explorando este aspecto, a questão 29 solicitou, dos professores, uma
exposição sobre a “concepção de linguagemque embasa seus trabalhos com a
língua. Esta foi uma das questões que 23% deles deixaram de respondê-la.
Interpretei a atitude como ausência teórica ou, melhor dizendo, falta de clareza
nesse sentido. Em contrapartida, aqueles que, conscientes de seu
desconhecimento, não se intimidam em revelá-lo:
(10) Acredito que, como ainda estou um pouco insegura com as
novas abordagens, acabo por fazer uma “mistura de
concepção”.
(17) Não tenho concepção firmada. Transito por várias concepções
conforme a necessidade e o caso.
É exatamente o que acontece quando o trabalho com a língua ocorre
desarticulado de uma concepção de linguagem. O professor transita entre uma
227
abordagem e outra, sem necessariamente identificá-la. As falas dos informantes (10)
e (17) confirmam as argumentações expostas de que, muitas vezes, as ações na
sala de aula são conduzidas sem que o professor estabeleça (conscientemente)
alguma relação com a corrente teórica que as subsidia. Apenas reproduzem o que
lhes foram ensinados na formação inicial, repassados em cursos de formação
continuada, ou transcritos em livros didáticos. Em decorrência, é natural que, ao
serem questionados a respeito, faltem palavras para explicar ou, mesmo quando
apresentem resposta, evidenciem o apego à prática, desarticulada de uma
concepção norteadora. A exposição de (18) demonstra isso no momento em que, ao
tentar expor sua concepção de linguagem, não consegue ultrapassar a listagem de
encaminhamentos didáticos:
(18) Explorando todas as possibilidades possíveis, através da
oralidade e da escrita, interpretação oral, interpretação escrita,
dramatização, ilustrações, gramática, dentro de filme, textos
informativos, debates, seminários, transparências e textos
diversos. Entrevistas, pesquisas etc.
Apesar de se propagar, hoje, um discurso “democrático” para o ensino, no
qual o professor é o sujeito de suas ações, o que se infere, nas entrelinhas das falas
e ações dos professores, é uma insegurança, um medo de mudar, de optar por
encaminhamentos didáticos oriundos de reflexões e pesquisas. Os professores se
comportam, muitas vezes, como se fossem controlados por seus supervisores (no
caso, coordenação, direção, equipe da secretaria municipal de educação etc.),
cabendo-lhes apenas seguir as orientações determinadas, sem espaço para
iniciativas. Reitero que tal comportamento é próprio da escola tecnicista que,
conforme Dias e Lopes (2003), controlava, no exercício do magistério, o professor,
não lhe reservando o espaço para improvisar diante do imprevisível e para trabalhar
de acordo com a multidimensionalidade da prática educacional.
Parece-me que existe, ainda, uma dependência do docente em relação aos
seus superiores que, de uma forma ou de outra, acabam gerindo as condições de
aprendizagem, não cabendo ao professor pensar no que fazer, mas encontrar
caminhos e meios para executar o que lhe é ordenado, além dos superiores, pelo
planejamento anual ou pelo livro didático. Assim, prende-se à quantidade de
atividades, sem as reflexões necessárias sobre a teoria que as embasam (ou
deveria embasar). Este comportamento restringe-lhe a autonomia, a criatividade e a
228
capacidade intelectual e política, tornando-o mero reprodutor de atividades prontas.
Em virtude disso, quando é questionado sobre “concepção de linguagem”, é até
natural que desconheça do que se trata.
Por outro lado, entre aqueles que se propuseram a descrever a(s)
concepção(ões), alguns discursos se alicerçaram (talvez inconscientemente) na
compreensão de que a linguagem é determinada pelo pensamento, produzida no
interior da mente ou simplesmente um instrumento de comunicação. Compreendida
de tal forma, é função da escola (do professor, das aulas de Língua Portuguesa),
exigir clareza e precisão, dos alunos, na transmissão dos pensamentos pelo uso da
linguagem, a qual deve ser organizada por meio de uma gramática que distinga
formas válidas de inválidas, ou seja, maneiras de falar e escrever corretamente.
Conseqüentemente, a linguagem é entendida, por alguns informantes, como:
(04) É a expressão verbal e escrita do que se pensa, é um
instrumento de comunicação.
(02) A minha concepção de linguagem consiste em desenvolver no
aluno a habilidade para falar, ler e escrever com correção e
propriedade o seu idioma. Também clareza, exatidão e
objetividade que vai evidenciar o uso da linguagem.
(08) Procuro enriquecer a língua falada, levando em conta a norma
culta, apresentando a forma correta de se falar sem
discriminação.
Evidencia-se, ainda, uma “mistura” de concepções: ao mesmo tempo em que
a linguagem é traduzida como expressão do pensamento (04), é interpretada,
também como “instrumento de comunicação” e apresenta marcas da concepção
(sócio)interacionista (08), ao enfatizar a “forma correta”, mas “sem discriminação”.
Embora a língua seja interpretada como a serviço da comunicação entre emissor e
receptor (04), está presa a regras gramaticais, ou seja, à “correção”, como princípio
básico para a aquisição de habilidades à fala e à escrita (02), sem discriminar a
linguagem do aluno (08). É como se, de cada concepção, fosse preservada algum
aspecto, somando-o às ações do trabalho como a língua na sala de aula, o que
entendo como perfeitamente normal, desde que conscientemente organizados.
229
Enquanto, para alguns, não há uma exata clareza sobre qual concepção
norteia o trabalho com a língua, para outros tal orientação está bem definida: língua
é instrumento a serviço da comunicação:
(19) É instrumentalizar o aluno de forma apropriada para
aquisição da linguagem.
(20) Para mim, linguagem é comunicação, seja ela por diferentes
formas, textos, sinais....
(01) Linguagem é o instrumento necessário que o aluno terá para
compreender as representações do mundo com as quais
convive e os valores subjacentes a ela. É o instrumento que o
fará capaz de construir e defender seus próprios valores.
(21) Vejo o estudo e o domínio da linguagem como instrumento
fundamental na vida escolar e social do ser humano, no
cotidiano.
Para tais discursos, cabe à escola (mais precisamente ao professor),
oferecer, ao aluno, os conhecimentos necessários da língua, a fim de que se
aproprie desse instrumento a linguagem (19), entendida como comunicação. O
que o aluno deve apreender, nessa perspectiva, além das regras normativas da
língua, é o reconhecimento de modelos ideais de construções lingüísticas, isto é,
estruturas (de frases, de palavras, de textos...) as quais devem ser seguidas.
Todavia, infere-se em (21) a compreensão de linguagem como instrumento de
comunicação, porém para a “vida escolar e social do ser humano”. Mesmo que a
escola, nesta fala, seja interpretada como um elemento à parte da sociedade,
reconhece-se que a linguagem está em função da vida social do aluno. Nesse
sentido, entrelaçam-se duas concepções: da linguagem como instrumento de
comunicação e da linguagem como meio de interação social – (sócio)interacionismo.
A concepção de linguagem como meio de interação, enfatizada desde a
década de 1980, é assimilada por parte professores, os quais se referem a ela como
constituída socialmente por meio da interação com o outro, com o meio e com os
objetos (05). Sendo esta social, cabe à escola (ao professor) favorecer a interação
do aluno com diferentes situações de uso da linguagem (16), a fim de que possa
entender, interpretar, representar, influenciar, modificar, transformar a realidade (07),
agindo e atuando sobre o meio e sobre o(s) seu(s) interlocutor(es):
230
(05) A linguagem é uma realidade impregnada de social e de
história; uma realidade construída a partir de uma necessidade
humana que serve de trama a todas as relações sociais em
todos os domínios. Seu sentido é, portanto, subordinado a um
determinado ponto de vista (daquele que fala e daquele que
ouve). A ngua Portuguesa deve preparar o aluno para
interagir socialmente.
(16) É uma forma de ação orientada por uma finalidade específica,
constante diálogo com os alunos, troca de leitura e textos,
atividades de reflexão e análise lingüística, fazendo com que
os alunos construam seus próprios paradigmas, descobrindo
diferenças e levantando hipóteses, produzindo, assim,
conhecimentos e defendendo suas opiniões.
(07) Vejo a linguagem como forma e processo de interação. O que
o aluno faz ao usar a língua não é tão somente traduzir e
exteriorizar um pensamento ou transmitir informações a
outros, mas sim, realizar ações, agir, atuar sobre os
interlocutores. A linguagem é, pois, um lugar de interação
humana, pela produção de efeitos de sentido.
(22) Concepção dialética histórica crítica que leva o aluno a pensar,
interpretar, raciocinar e agir no mundo em que vive.
Estes informantes reconhecem que a linguagem deve ser trabalhada numa
perspectiva histórica e dialética (22), favorecendo o desenvolvimento de sujeitos
críticos e participativos, que saibam agir sobre o mundo, interpretando-o e
transformando-o.
Entretanto, como trabalhar com a língua à luz de tal concepção de linguagem
ou, mais especificamente, como abordar a gramática nessa perspectiva? Para
responder à questão, julguei interessante averiguar por que se ensina gramática aos
alunos (questão 30), entendendo que a resposta revelaria, mais uma vez, a
compreensão que os professores têm de linguagem, visto que uma pressupõe a
outra. Em outras palavras: a concepção que se tem de linguagem determina o
encaminhamento do ensino da gramática, ou o modo como esta é ensinada revela
(consciente ou inconscientemente) a compreensão daquela.
O predominante, nas respostas, foi a compreensão de que a gramática deve
ser ensinada em função do falar e escrever corretamente, ou seja, do domínio da
língua culta, dita padrão. A título de exemplo, destacamos algumas respostas:
231
(23) Nossa língua é muito complexa. muitas “regras” no jeito de
escrevermos e também de falarmos. Ensinamos gramática
devido à norma padrão, a de melhor compreensão a todos.
Pois se cada um falar de uma maneira diferente, ninguém
entende ninguém.
(12) A gramática faz parte do cotidiano para nos aproximarmos da
linguagem falada e escrita de forma correta, devemos ter
conhecimento e domínio gramatical.
(24) Para que possa ter conhecimento sobre a língua padrão,
seu aperfeiçoamento na oralidade e na escrita.
(25) Para sistematizar a aprendizagem da linguagem falada e
escrita, colocá-los mais próximos da forma culta.
(02) Porque é necessário dominarmos a língua culta, contribuir
para a apropriação da mesma.
(19) Para ter conhecimento da língua padrão e aperfeiçoar a
oralidade, a leitura e a escrita.
Nas respostas selecionadas (dentre outras), o professor entende a gramática
como aquela que dita as normas (complexas) da língua padrão, sendo essencial o
seu ensino para garantir a perpetuação da fala e escrita correta (23). Sob tal
perspectiva, se o aluno obtiver o domínio gramatical (12), ou seja, a linguagem
falada e escrita de forma correta, estará aperfeiçoando a oralidade, a leitura e a
escrita (19). A compreensão e o domínio da língua (oral e escrita) estão
subordinados ao reconhecimento das normas gramaticais.
Tal compreensão sustenta-se tanto na concepção de linguagem como
transmissão do pensamento quanto na concepção de linguagem como instrumento
de comunicação, visto que ambas entendem o estudo da língua desarticulado das
situações de interação e valorizam apenas uma forma de usá-la: a forma
estruturalmente correta, padrão, culta, garantida pela gramática, tratada como objeto
de ensino, que ao aprendê-la, o aluno aprende a ser comunicar, conforme (24),
(25) e (02).
As respostas apresentadas nesta direção contrapõem-se às discussões
teóricas do ensino da gramática nos cursos de formação por mim ministrados e
também às orientações teóricas e metodológicas do CBPR, dos PCNs e do CBEPM.
Na realidade, estão ancoradas na escola tradicional e tecnicista e
232
metodologicamente organizadas no Currículo da SEED, o que não significa que tais
professores trabalhem desde a década de 1970/1980. O que é possível inferir, na
verdade, é que, embora tenham passado por todo um processo de formação (inicial
e continuada) que provocou reflexões sobre o ensino da língua, ainda mantém uma
postura tradicional.
Enquanto muitos apresentam uma postura assim definida, ainda aqueles
que abordam o ensino da gramática sem ter clareza de por que deve trabalhá-la. É o
caso de (17):
(17) Boa pergunta! Acredito que seja para que aprendam a se
expressar de forma correta em vários momentos de sua vida.
A resposta de (17) parece indicar a voz de um professor que não costuma
traçar objetivos para o ensino da língua, não refletindo sobre o porquê de ensinar a
gramática. Mesmo quando tenta apresentar uma justificativa para tal ação, sustenta-
a na cultura tradicional: “para que os alunos aprendam a expressar de forma
correta”, revelando, quem sabe, o discurso que sempre ouviu, enquanto aluno, em
suas aulas de gramática.
Por outro lado, há outros que justificam o ensino da gramática como parte dos
conhecimentos que os alunos devem adquirir para viver socialmente, que
favorece o desenvolvimento da oralidade e da escrita. Em outras palavras: o ensino
da gramática contribui para o exercício da cidadania e, desse modo, para o acesso à
vida social, segundo os sujeitos (14), (22) e (16), que, conforme for trabalhada,
amplia o conhecimento do aluno sobre a língua, com o propósito de poder utilizá-la
em diferentes situações de uso da linguagem:
(14) Conhecendo melhor a gramática podemos melhorar nossa
linguagem, nossa comunicação, tanto escrita como oral.
Dessa forma estamos desempenhando o nosso papel de
educadores, proporcionando aos alunos a oportunidade de
compreensão e maior e melhor comunicação.
(22) Porque é necessária para a comunicação oral e escrita no dia
a dia do aluno, ou seja, para a sua vida.
(16) Porque a língua é uma forma de comunicação necessária para
o exercício da cidadania, ampliando seus conhecimentos e
tem mais possibilidade de trocar informações. A escola tem
que garantir o domínio da língua oral e escrita, que ela é o
233
instrumento que favorece o acesso a uma vida social
completa. Devem ser oferecidas aos alunos oportunidades de
analisar as formas da língua em diversas situações. Aos
poucos os alunos devem apropriar-se de uma competência
discursiva, que domine o falar sobre a língua: conceituar,
descrever, classificar, rever usos, adequando-os às
circunstâncias.
Nas respostas, evidenciam-se a concepção (sócio)interacionista da
linguagem, na qual a gramática não é tomada como objeto de ensino, mas como um
componente da arquitetura interna dos textos (orais e escritos), abordados como
meio de interação social. As pessoas interagem pelos textos que, por sua vez,
organizam-se também por elementos lingüísticos. Assim, ensinar gramática é criar
condições para que os alunos reflitam sobre essas marcas, atribuindo-lhes
significação(ões).
Tal compreensão está sistematizada (teoricamente) por parte dos professores
que reconhecem o texto como o lugar em que a gramática e suas relações de
sentidos se estabelecem. É o que transparece nas respostas seguintes, as quais
ainda justificam o ensino da gramática:
(04) Para que ele possa expressar-se de maneira correta ao usar a
escrita, entender o que o texto quer passar. Ao escrever um
texto, saber usar os aspectos gramaticais com coerência
verbal, evitar repetições. A gramática é que sustenta a
estrutura do texto.
(07) Observamos que o estudo da gramática é importante se
considerarmos que o conhecimento lingüístico deve estar
voltado para o funcionamento da linguagem e aos usos
relevantes para o aprimoramento da leitura e da produção de
textos.
(11) Para que ao registrarem suas idéias em forma de produção
escrita, possam articulá-las de maneira que o leitor possa
compreender o que se quer transmitir.
(09) Ensinamos gramática a nossos alunos porque é o
embasamento para uma boa produção de texto, oral ou
escrito.
(26) Para que possam utilizá-la dentro do texto, sabendo a maneira
correta de utilizá-la.
234
Nas palavras destes professores, é possível identificar marcas do discurso
(meu e de muitos autores) propagado nos cursos de formação, mesmo que um tanto
fragmentadas. Em (04), por exemplo, quando o professor defende que o ensino da
gramática deve criar condições para que o aluno, “ao escrever um texto, saber usar
os aspectos gramaticais com coerência verbal, evitar repetições”, revela alguma
compreensão que tem da Lingüística Textual sobre coerência e coesão, mesmo que
não expressa claramente. E, depois, quando afirma que “a gramática é que sustenta
a estrutura do texto”, transparece parte das minhas discussões sobre o ensino da
gramática, pautadas em Travaglia (1996, 2003), Geraldi (1984, 1991), dentre outros,
sempre na tentativa de convencer os professores de que, se for ensinada distante
do texto, estará impedindo ao aluno de refletir sobre o seu uso efetivo. Além disso,
expressões como “conhecimento lingüístico” e “funcionamento da linguagem” (07)
são revelações de tais teorias discutidas nos encontros.
Tenho consciência, todavia, de que as marcas identificadas nas respostas de
alguns professores podem, também, ser conseqüência de suas próprias leituras, da
formação inicial, dos documentos norteadores do fazer pedagógico (CBPR e PCNs),
enfim, de outros contextos de formação que, necessariamente, não foram somente
aqueles por mim ofertados. Como sujeitos sociais, são constantemente afetados por
inúmeros discursos que poderão constituí-los. Importa que eles estão incorporando
um saber teórico insistentemente trabalhado, proposto e discutido por muitas
publicações, tais como: de “O texto na sala de aula”, em 1984; do CBPR, em 1990 e
dos PCNs em 1997/1998. Sendo assim, parte dos sujeitos parece consciente de que
o ensino da gramática deve associar-se a diferentes atividades com a língua, tais
como: leitura, oralidade e escrita de textos, como revelados por (11), (09), (26) e
também em (05):
(05) Eu procuro ensinar a ler e escrever, mostrando o uso da
funcionalidade dos elementos gramaticais, trabalhando a
compreensão dos fatos lingüísticos e não a nomenclatura e
classificação dos mesmos, trabalho a língua voltada para o
desenvolvimento das atividades verbais: fala, leitura, escrita.
Por outro lado, aqueles que têm conhecimento das propostas teóricas
veiculadas e, no entanto, insistem numa postura tradicional, ensinando a gramática
de forma isolada, descontextualizada, respaldando tal atitude nos alunos, como se
235
fossem eles os responsáveis por determinar as atividades com a língua. Um
exemplo é o que diz (27):
(27) Os alunos não se sentem seguros. Pois sendo trabalhada em
textos, eles encontram dificuldades em separá-los uns dos
outros.
As respostas, de um modo geral, evidenciaram que uma parcela (43%) dos
professores está consciente, teoricamente, dos motivos que os levam a ensinar
gramática. Em contrapartida, a maioria (46%) ainda a entende como unicamente
para sistematização da norma culta ou padrão da língua e os demais (11%)
preferiram se omitir, não respondendo as questões.
O resultado não se traduz, ainda, como o desejável, todavia se justifica por
diversas razões: a licenciatura da maioria dos professores (Pedagogia), a qual o
oferece a disciplina de Língua Portuguesa para aprofundamento das ações que se
podem fazer com a oralidade, a leitura e a escrita, mais especificamente, neste
caso, com a gramática; o formato de formação continuada na região (cursos
pontuais que não garantem maior aprofundamento); a carga horária da maioria dos
professores (dois períodos), não restando tempo para as leituras individuais e suas
reflexões; entre tantas outras que incidem sobre o conhecimento deles.
Se as discussões sobre o texto datam da década de 1980, e até hoje não
foram amplamente sistematizadas, o que é possível dizer do conhecimento sobre os
gêneros textuais, discussão recente, que despontou com a publicação dos PCNs?
Esta foi a última questão averiguada no questionário, quando interroguei se
eles tinham ouvido falar (ou lido) sobre neros textuais ou discursivos e, caso
tivessem conhecimento, qual seria sua relevância para o ensino da Língua
Portuguesa. Julguei interessante abordar esta questão por tê-la trabalhado em todos
os cursos e pela própria divulgação nos PCNs e nas inúmeras publicações, dentre
as quais algumas foram sugeridas como leitura.
As respostas revelaram que 50% dos professores haviam lido ou ouvido
falar sobre gêneros, definindo-os, então, de modo satisfatório; 21% afirmaram não
saber defini-lo e 29% preferiram não responder a questão, o que traduzi como
incompreensão do tema. Dentre aqueles que procuraram defini-lo, encontrei
respostas condizentes, reveladoras das teorias apresentadas nos cursos. É o que
verifiquei em (09) e (01):
236
(09) Sabemos que existe uma diversidade muito grande de gêneros
textuais em circulação na sociedade e na escola. s,
enquanto instituição de ensino, devemos levar ao
conhecimento dos alunos o maior número possível, pois são
necessários nas práticas sociais. O texto produzido pelo aluno
deve-se levar em conta a função do gênero para que ele
domine e identifique as características de cada gênero.
(01) Sim. São importantes porque circulam socialmente e
estabelecem formas próprias de organização do discurso. São
textos que estão inseridos na nossa vida diária e para tanto
precisamos diferenciá-los.
Nas palavras empregadas pelos professores, expressões próprias da
teoria dos gêneros explorada, por mim, nos cursos de formação. O informante (09),
por exemplo, quando diz “...diversidade muito grande de gêneros textuais em
circulação na sociedade”, está retomando palavras de Marcuschi (2003), de
Bronckart (2003) e (por que não) de Bakhtin (1992) mesmo que este trate-os por
gêneros do discurso. Quando, na seqüência, afirma que “devemos levar ao
conhecimento dos alunos o maior número possível, pois o necessários nas
práticas sociais”, o professor reproduz o discurso dos PCNs (BRASIL, 1997/1998)
que enfatiza o trabalho com a variedade de gêneros textuais na escola. E, ao
salientar que “O texto produzido pelo aluno deve-se levar em conta a função do
gênero para que ele domine e identifique as características de cada gênero”,
sintetiza o propósito de trabalho com tal objeto de ensino, defendido por Dolz e
Shneuwly (2004a) e reproduzido constantemente em minhas falas nos cursos de
formação. Na resposta do sujeito (01), da mesma forma, a teoria dos gêneros se
revela, direcionada mais às palavras de Bakhtin (1992): “circulam socialmente e
estabelecem formas próprias de organização do discurso” e de Marcuschi (2003):
“São textos que estão inseridos na nossa vida diária”. Talvez a relação das palavras
deste autor com as do professor se justifique porque a leitura de seu artigo
124
foi
muito recomendada. Enfim, nas respostas apresentada por estes professores (09) e
(01) (dentre outras não descritas), a teoria dos gêneros mostrou-se sistematizada.
Por outro lado, percebi tentativas de exposição da teoria, aproximando-se do
que se quer que entendam por gêneros e pelo trabalho com os mesmos. Porém, não
124
MARCUSCHI, L. A. Gêneros Textuais: definição e funcionalidade. In. DIONISIO, Ângela Paiva;
MACHADO, Anna Rachel; BEZERRA, Maria Auxiliadora (orgs.). Gêneros Textuais & Ensino. 2.ed.
Rio de Janeiro: Lucerna, 2003.
237
estão muito claras ainda, embora eu considere satisfatórias, devido ao pouco tempo
que os professores têm tido para refletir sobre este objeto de ensino. Se as
discussões sobre o texto se estendem quase três décadas e ainda não foram
amplamente compreendidas, como desejar que, em menos de 8 anos, os docentes
tenham clareza sobre o assunto? É o que reconheço em (15), (04) e (11):
(15) ouvi falar sobre gêneros textuais. Eles são de grande
relevância para o ensino da Língua Portuguesa, pois ajudam a
entender o seu uso e sua importância quando circulam na
sociedade, por que, para quem eles foram escritos (sua função
social).
(04) Acredito que é de suma importância o trabalho com a
diversidade, ou seja, com os gêneros textuais, porque os
alunos precisam saber, ver e entender esses textos. Cabe
então ao professor trabalhar com os alunos, fazer com que os
interpretem e saibam.
(11) Sim. ouvi falar e até participei de cursos. Sua relevância
para o ensino da língua é saber reconhecer e como utiliza-los
nas produções escritas de forma coerente com cada situação
a ser empregados para uma melhor compreensão do leitor.
Da mesma forma, posso a considerar como normal o professor traduzir
“gêneros textuais” por “gêneros literários” como em (18), que, antes do advento
dos PCNs, no Brasil, as referências a gêneros resumia-se aos literários: épico, lírico,
dramático etc.
(18) Sim, é de suma importância porque através do conhecimento
dos gêneros literários adquire-se mais conhecimentos a
respeito da língua portuguesa, e maior facilidade para
transmitir esses conhecimentos aos nossos educandos e
como isso despertando no aluno o gosto pela leitura,
facilitando a sua expressão e criatividade, facilitando um rico
aprendizado interdisciplinar.
As propostas metodológicas, reveladas em diferentes momentos e por meio
de diferentes teorias se apresentaram, de alguma forma, nas respostas do
professores, reveladas no questionário. Mesmo reconhecendo que este instrumento
determinou, na maioria das questões, as possibilidades de respostas (apenas 6
238
questões eram subjetivas), foi possível interpretar informações que considero
relevantes ao traduzirem as compreensões e ações dos professores de 4ª série.
Mesmo que a região Oeste se destaque, em relação a outras do Paraná,
conforme posto, pelo intenso processo de formação continuada instaurado e não
interrompido desde a década de 1980, principalmente por meio da oferta, aos
municípios, de cursos pontuais, os resultados apontaram para a necessidade de
maior aprofundamento teórico.
A prática, descolada da teoria, é uma constante, contradizendo os
encaminhamentos metodológicos revelados em vários documentos (CBPR, PCNs e
CBEPM) e, principalmente, nos cursos de formação em Língua Portuguesa
ministrados por mim. Interpreto este dado como ausência de estudo sistemático,
contínuo e reflexivo, que realmente invista nas questões propostas teoricamente, por
exemplo, nos cursos e documentos. Por outro lado, encontrei respostas reveladoras
de bagagem teórica, de estudos e reflexões, advindas de professores conscientes
dessa necessidade, procurando e investindo na sua própria formação.
De um modo geral, os efeitos de minhas ações em cursos de formação,
revelados no questionário, aparentaram-se tímidos e efêmeros em algumas
situações e, em outras, parecem ter provocado tentativas de mudanças,
principalmente no que diz respeito ao tratamento dado à gramática. Todavia, estou
ciente de que, tanto as iniciativas quanto as reais mudanças (e mesmo a negação
destas) não são conseqüências exclusivas dos cursos por mim ministrados.
Envolvem todo um contexto mais amplo (formação inicial, carga horária de trabalho,
salário, número de alunos em sala de aula, equipe de apoio, material de apoio,
políticas governamentais etc.) que interfere, direta e indiretamente, nas atividades
didáticas do professor.
4.3.2 Análise e interpretação das entrevistas
A entrevista (anexo 4), um outro instrumento de coleta de dados empregado,
foi, inicialmente, planejada para 01 professor de série de cada escola dos
municípios participantes, o que totalizaria 26 entrevistados. Somente 13 professores
se disponibilizaram para tal, sendo que 03 destes são do M4, 02 do M1, 03 do M3 e
05 de M5. No M2 ninguém se dispôs para a tarefa. Ainda que tivesse justificado a
necessidade deste instrumento para a pesquisa, procurei não “forçar” nenhuma
239
situação, desejando que ocorresse naturalmente e que as pessoas não se
sentissem constrangidas nem impelidas para tal ação.
Em função das respostas apresentadas no questionário, elaborei as
indagações a partir daquilo que ficou ressaltado como problema no ensino da Língua
Portuguesa: a gramática contextualizada apontada por 55% dos informantes. Se,
mesmo depois das 24 ou 32 horas de formação, este assunto continuava
despontando como uma questão a ser resolvida, julguei que seria importante
indagar:
1- Por que ensinar gramática? Como ensiná-la?
2- Os cursos de Língua Portuguesa, dos quais você participou, trouxeram
contribuições para as atividades na sala de aula, principalmente em
relação ao ensino da gramática contextualizada? Por quê?
3- O que é necessário para que haja maior aprofundamento de como
conduzir o trabalho com a gramática contextualizada na sala de aula?
As informações apresentadas nas entrevistas correspondem aos informantes
(04), (05), (07), (09), (10), (11), (12), (13), (14), (15), (16), (24) e (25) que
contribuíram com o questionário. O objetivo, ao aplicar dois instrumentos diferentes
aos mesmos informantes, foi o de complementar, na entrevista, os indicativos que
despontaram no questionário: o porquê da necessidade de mais estudo sobre a
gramática contextualizada, indicada por 55% dos professores; qual a contribuição
dos cursos para tal compreensão; como produzir um instrumento teórico-
metodológico que oriente para o ensino da gramática contextualizada, solicitado por
77% dos informantes do questionário.
Ao interpelar os informantes com a primeira indagação (Por que ensinar
gramática? Como ensiná-la?), a pretensão era verificar em qual concepção pautaria
a justificativa do professor de série. Se este compreendia a linguagem como
transmissão do pensamento ou instrumento de comunicação, seria natural
encontrar, em suas palavras, expressões como “garantir a norma padrão”, “ensinar a
ler e a escrever”, “ensinar a norma culta”. Porém, caso as orientações do ensino da
língua estivessem respaldadas na concepção (sócio)interacionista da linguagem,
então transpareceriam expressões como “interagir socialmente”, “saber empregá-la
no seu dia-a-dia”, “para aplicá-la em diferentes situações de uso”.
240
Por outro lado, seria interessante comparar, em se tratando do mesmo
informante, como ele entendia a gramática na entrevista e no questionário,
verificando se haveria proximidade/relação entre as respostas.
No que se refere à concepção de linguagem que orienta e legitima o ensino
da gramática, foi possível perceber em (04), por exemplo, um apego à teoria
gramatical, fortemente marcada pelo racionalismo. Os pensadores da época
compreendiam a linguagem como representação do pensamento, então, a
preocupação consistia em mostrar que as línguas obedecem a princípios racionais,
lógicos, dos quais derivam as regras, as normas para a clareza e precisão dos
falantes. Dessa lógica, surgem as teorias classificatórias e normativas da língua que
foram fortemente defendidas durante séculos, ultrapassando fronteiras, inclusive do
tempo, permanecendo viva até hoje, conforme a justificativa de (04):
(04) Eu acho que escola é... uma das funções da escola é... e que a
gente vem esquecendo é a transmissão de conteúdos
historicamente acumulados. E a gramática faz parte disso e
hoje no contexto em que nós estamos vivendo ela está sendo
muito... banalizada, esquecida, deixada de lado... não precisa
ensinar, o aluno aprende conforme vai escrevendo... mas eu
acredito que ela deve ser ensinada, deve ser ensinada na sala
de aula sim, inclusive a nomenclatura dela. Se você vai
ensinar os verbos, deve dizer os verbos são... os adjetivos
são... pra criança saber o que é, porque muitas vezes os
professores trabalham mas não dão nomenclatura em quando
aparece a nomenclatura eles não sabem fazer a relação do
que eles usam... eles sabem usar, mas eles não sabem o que
é um adjetivo, o que é um verbo, o que é uma...
Para o informante (04), ensinar gramática é, antes de tudo, classificar e
teorizar, e justifica, neste caso, o ensino da mesma, pela necessidade da criança
reconhecer a categorização das palavras quando lhe for solicitada. Não importa se
ela saiba ler, interpretando adequadamente; se é capaz de escrever, atendendo ao
contexto e à situação de uso. O que lhe interessa é que o aluno saiba classificar
adequadamente as palavras.
Concordo com (04) quando diz “uma das funções da escola é... e que a gente
vem esquecendo é a transmissão de conteúdos historicamente acumulados”.
Realmente é função deste segmento social tratar do conteúdo científico, garantindo,
ao aluno, o conhecimento numa perspectiva histórica e, acrescento, dialética.
241
Todavia, para o tratamento do conteúdo nessa ordem, necessariamente não é
preciso abordar a gramática descontextualizada de situações reais de uso. Ou será
que ao aplicá-la diretamente em contextos reais de produção, estaria negligenciando
as reflexões que se podem fazer com os mecanismos lingüísticos? Parece ser esta
a compreensão da informante quando diz que hoje no contexto em que nós
estamos vivendo, ela está sendo muito... banalizada, esquecida, deixada de lado...
não precisa ensinar, o aluno aprende conforme vai escrevendo...”.
Talvez essa redução da gramática ao estudo dos princípios que regem a
língua se deva ao fato de (04), durante sua formação inicial, ter estudado a
gramática nesta perspectiva e, dessa forma, não compreender os propósitos que
subjazem as reflexões contextualizadas da língua. A incompreensão evidenciou na
resposta da questão 21 do questionário, quando afirmou que “(...) tenho dúvidas de
como encaminhar este trabalho. (...) acho difícil trabalhar contextualizado”.
Nas palavras de (11) também encontramos expressões que respaldam o
ensino da gramática normativa, relacionando seu ensino com a escrita, com o texto
do aluno.
(11) Por quê?... Eu vejo assim... desde a escrita deles... a
gramática às vezes esclarece muito. Traz muitos
esclarecimentos para eles... como se escreve, a concordância
das palavras, os erros gramaticais... Os livros novos, por
exemplos, não traz muita gramática. Nós temos que dar conta
procurando em outros locais ou livros mais antigos e deixar de
ensinar a eles não dá. Dependendo de um texto, como se
escreve uma palavra, então, com a gramática, isso
esclarece muito. Vê como que escreve a palavra.
O informante parece dizer que o ensino da gramática deve trazer
esclarecimentos aos alunos relativos à sua própria escrita, relacionando as regras
de “(...) concordância das palavras, os erros gramaticais...” às produções escritas de
textos. Nesse caso, não basta apenas ensinar normas. O importante é estabelecer
analogias com as situações reais de uso da língua.
Em contrapartida, (11) faz uma crítica aos livros didáticos atuais e,
indiretamente, às propostas contextualizadas de trabalho com a língua quando diz
que Os livros novos, por exemplos, não traz muita gramática. Especificamente, o
informante está se referindo àqueles livros que abordam a gramática mais em textos
do que em exercícios isolados. Em seguida, deixa explícita a necessidade de
242
trabalhar com exercícios gramaticais, ao dizer que Nós temos que dar conta
procurando em outros locais ou livros mais antigos e deixar de ensinar a eles não
dá.” Em outras palavras: pode-se abordar a gramática, relacionando-a com
situações de escritas, mas não se deve deixar de trabalhar com os exercícios
isolados, explorados pelos livros didáticos “mais antigos”.
Parece-me que (11) está se conscientizando das relações significativas
estabelecidas pela gramática na estrutura de um texto, porém ainda está preso à
cultura normativa da língua: o aluno aprendea escrever se souber reconhecer
as regras que subjazem à escrita. De certa forma, a postura tende a revelar um
pouco da insegurança que tem em conduzir as reflexões contextualizadas da
gramática. Tanto que o livro didático é tomado como suporte na condução das
atividades. Essa mesma preocupação o informante deixou transparecer no
questionário, quando justificou a necessidade de maior formação para a abordagem
do ensino gramatical contextualizado, dizendo que é difícil de se encontrar nos
livros didáticos de forma clara e fácil compreensão do aluno”.
Igualmente, (09) e (12) demonstraram a mesma dificuldade, tanto na
entrevista quanto no questionário. (09) expõe as suas ao escrever neste que “(...)
considero a gramática cheia de peculiaridades e, portanto, mais difícil de
contextualizar, de forma que se torna um círculo vicioso, ou seja, por mais que você
contextualize, muitas vezes voltamos à gramática isolada”. O informante (12), por
sua vez, assume que “(...) o mais complicado de abordar e compreender com os
alunos é o uso da gramática devido à complexidade das regras”.
o informante (07) reconhece que o ensino da gramática
descontextualizada não garante a compreensão necessária que o usuário deve ter
de sua língua, além de criar uma aversão do aluno por tal estudo. Aliás, pelo menos
foi isso que aconteceu com ele. No entanto, tem dificuldades em traduzir, com suas
palavras, qual a necessidade de ensinar gramática.
(07) Por quê? olha... eu não sou professor muito gramatiqueiro. Eu
sei mais assim... não sei se diferencia, mas eu acho que...
mesmo na faculdade eu não era tanto de gramática. Eu acho
que... (...) Então tá... eu vou pensar assim... desde o passado
lá... porque a gramática foi ensinada para mim foi uma
gramática bem diferente... de... de... conjugar verbo, uma
coisa que a gente não via muito sentido. Acho que é um pouco
disso essa aversão, né... tanto que quando eu estudava eu
243
tinha mais afinidade com produção de texto, do que sublinhar
verbo, encontrar pronomes, por exemplo. Então hoje, acho
que a gramática é importante sim... a gente tem que conhecer
a nossa língua, a gente não pode desprezar achando que
basta se comunicar e tudo bem... o... acho que não. A
gente tem que se comunicar de forma correta, claro,
comunicação acima de tudo, desde que seja de forma correta,
né...e principalmente na escola, aliás.. é aqui o lugar de se
aprender a forma correta, você não vai aprender gramática de
forma correta assistindo tv... e aqui na escola o lugar da forma
correta, e pra isso que existe a escola... também... isso é
importante né.
Primeiramente ele tenta justificar por que não gosta de ensinar gramática,
tecendo uma crítica à normatização da língua que lhe foi imposta durante sua
formação, inclusive acadêmica, afirmando que, ao ser tratada dessa forma, “(...) a
gente não via muito sentido”. Esperava-se, então, que ele apresentasse uma outra
proposta de encaminhamento, a partir do momento em que diz Então hoje, acho
que a gramática é importante sim...”. Entretanto, (07) não consegue avançar em
suas reflexões, demonstrando não ter sustentação teórica para uma proposta
diferenciada de ensino gramatical. Tanto é verdade que, depois de alguns rodeios,
recai nas premissas que sustentam o ensino da gramática como normas para
expressar-se de forma correta, precisa e transparente: A gente tem que se
comunicar de forma correta, claro, comunicação acima de tudo, desde que seja de
forma correta, né...”.
Nesta afirmação, (07) nega as variedades lingüísticas, as diferentes situações
de uso da linguagem, a fim de defender apenas uma “forma correta de falar e
escrever”, aquela pautada na norma culta. E a escola é o lugar de dizer o que é
errado e de ensinar o que é correto, desconsiderando todas as outras formas de
interação por meio das quais a criança aprende: “(...)aqui é o lugar de se aprender a
forma correta, você não vai aprender gramática de forma correta assistindo TV(...)”.
Essa insegurança teórica, oscilando entre a crítica e a ausência de
argumentos que a sustentem, é mais uma evidência não só de (07), mas de
professores que, embora tenham presenciado e participado de muitas discussões
teóricas a respeito da língua, sustentadas na concepção (sócio)interacionista da
linguagem, ainda o incorporaram totalmente esse discurso. (07) justifica a
imprecisão quando, no questionário, escreve que “Pelo fato de ser conteúdo novo eu
ainda encontro algumas dificuldades e variantes para trabalhar.”
244
Mais uma vez comprova-se que os ideais de mudança, por mais enfáticos que
sejam, não acontecem na velocidade desejada. Na realidade, as ações são lentas,
assim como são as assimilações. Mais de 20 anos de reflexões/discussões sobre
análise lingüística e, ainda, a proposta é considerada “nova” ou como “conteúdo
novo”.
Os informantes (24) e (25), assim como (07), mostram-se confusos e
imprecisos em suas respostas, com dificuldades em encontrar palavras para
justificar o ensino da gramática. Essa mesma dificuldade transpareceu no
questionário quando, por exemplo, (25) diz que o ensino da gramática deve: “(...)
sistematizar a aprendizagem da linguagem falada e escrita, colocá-los mais
próximos da forma culta. Em outras palavras: as posturas dos informantes oscilam
entre ensinar normas gramaticais e ensinar a escrever, tendo dificuldades em
justapor os dois encaminhamentos. Ainda prevalece, em suas convicções teóricas,
que ensinar gramática é, conforme (24), “(...) ter conhecimento sobre a língua
padrão, seu aperfeiçoamento na oralidade e na escrita”.
Se, por um lado, há professores que ainda não entenderam os propósitos do
ensino gramatical contextualizado, por outro aqueles que têm plena consciência
deste encaminhamento. As palavras de (10) representam a parcela de docentes que
incorporam um saber teórico sobre o assunto, conseguindo fazer analogias
coerentes entre a gramática abordada isoladamente e a contextualizada:
(10) Bom... a forma como a gente vinha trabalhando, trabalhava
com a gramática pura, com exercícios repetitivos, achando
que... dessa forma o aluno estaria aprendendo a fazer o uso
melhor da língua. E a gente viu que isso não basta, não basta
o aluno saber o que é um substantivo, o que é um verbo, de
que forma ele se apresenta. É preciso saber é... no seu uso
mesmo, saber construir, saber produzir texto, fazendo um uso
de forma é... tendo em vista o meu interlocutor, a pessoa que
vai ler o texto, a pessoa que vai me ouvir, é... compreenda de
uma forma bem articulada e trabalhando com a gramática
solta a gente percebeu que não.. não dá esse resultado, mas...
em um aprofundamento maior de como fazer diferente, eu vejo
bastante dificuldade pra gente. Então seria necessário que nós
nos debruçássemos mais nas produções de atividades, nas
produções de nossas aulas, com uma gramática.. mas uma
gramática é... com sentido, com uso mesmo, não somente
aquela memorização que a gente vinha trabalhando com
nossos alunos.
245
Para sustentar tal relação, (10) parece amparar-se na concepção
(sócio)interacionista da linguagem, propalada nos documentos norteadores (CBPB e
PCNs) e também nos cursos de formação continuada, principalmente aqueles que
ministrei. Esse discernimento teórico revela-se em expressões como “(...) É preciso
saber é... no seu uso mesmo (...) tendo em vista o meu interlocutor, a pessoa que
vai ler o texto, a pessoa que vai me ouvir (...)”, ou seja, compreende-se que a
gramática organiza o texto (oral ou escrito) e, sendo assim, ao ensiná-la, deve-se
relacionar às situações de interlocução. A escrita é tratada como social e,
conseqüentemente, escrevem-se textos para interlocutores reais que participam,
lendo e/ou ouvindo enunciados concretos, carregados de enunciações.
Ter a clareza teórica não significa dispor do domínio necessário para a
elaboração de encaminhamentos práticos nesta perspectiva. Tanto é verdade que
(10) confirma a dificuldade em produzir atividades que abordem reflexões sobre a
língua dentro de um contexto: “(...) mas... em um aprofundamento maior de como
fazer diferente, eu vejo bastante dificuldade pra gente. Então seria necessário que
nós nos debruçássemos mais nas produções de atividades, nas produções de
nossas aulas, com uma gramática (...). com sentido, com uso mesmo (...)”. Tal
necessidade apontada por (10) já foi reforçada no questionário ao dizer que Porque
somos reféns dos livros didáticos e gostaria de ter mais subsídios para elaborar
atividades assim”.
Assim como (10), os informantes (05), (13), (14), (15) e (16) mostraram-se
favoráveis ao ensino da gramática, desde que contextualizada, defendendo o estudo
da língua incorporado às diferentes situações de uso, salientando, no entanto, a
necessidade de maiores reflexões sobre seu encaminhamento prático, já que a
formação inicial tratou a gramática desarticulada dos contextos de produção. A
necessidade despontou-se também no questionário, ao justificar maior formação
neste eixo de ensino de língua, inclusive solicitando, dos pesquisadores, “modelos”
de encaminhamentos práticos nesta direção.
Transformando os dados coletados em números, na primeira indagação,
apenas um informante – ( 04) – revelou-se preso à gramática normativa, defendendo
o ensino de regras e teorias gramaticais. Percentualmente, isso significa que 8% dos
professores comungam com tal forma de tratamento da gramática para alunos de
série. Em contrapartida, 06 informantes (07), (09), (11), (12), (24) e (25) que
equivalem a 46% dos entrevistados, declararam-se confusos, oscilando entre a
246
gramática isolada (com aplicação de regras gramaticais) e a contextualizada. Mesmo
revelando um certo conhecimento teórico desta, ainda não têm o domínio necessário
para o trabalho com a mesma, recorrendo, portanto, ao ensino descontextualizado
da língua. Por outro lado, os informantes (05), (10), (13), (14), (15) e (16),
equivalentes a 46%, revelaram um maior domínio teórico da gramática
contextualizada, relacionando-a à função (sócio)interacionista da linguagem, porém
estão conscientes da necessidade de mais estudos e reflexões para a elaboração de
propostas de trabalho com a língua nesta perspectiva.
Se ainda persistem posturas tradicionais de ensino da gramática; se grande
parcela dos professores não compreende satisfatoriamente como encaminhar as
atividades com a língua, propiciando reflexões sobre as diferentes situações de uso;
se mesmo compartilhando desse viés teórico, ainda perduram dificuldades
referentes ao seu tratamento prático, a entrevista, até o momento, está
comprovando o problema levantado com o questionário. Sendo assim, interessante
se faz verificar a contribuição dos cursos de Língua Portuguesa, por mim
ministrados, em relação ao encaminhamento da gramática contextualizada. Afinal,
eles contribuíram ou não para tal modalidade de ensino?
A segunda indagação foi no sentido de averiguar tais contribuições. As
respostas advindas da interpelação sustentaram-se em três diferentes olhares para
os cursos de formação continuada: 1) como um momento de repasse de atividades,
quando um docente “autorizado”, de reconhecido saber, apresenta “receitas prontas”
de como trabalhar, neste caso, com a gramática; 2) como um momento de
aprendizagem e reflexão sobre a língua, quando se relacionam questões teóricas e
práticas; 3) como um momento de reflexão sobre a prática docente, mas que deve
ser complementado. Porém, pouco ou nada acrescentaram especificamente sobre a
gramática contextualizada.
Sustentadas no primeiro enfoque, encontramos as respostas de (04), (11) e
(12), as quais reforçam a idéia de que os cursos de formação contribuem com o
professor quando socializa encaminhamentos práticos, tomados como “atividades
diferentes” para serem trabalhadas em sala de aula.
(04) Acredito que sim. Todo curso bem aproveitado que o professor
vai e participa ele tira algo de bom para estar trabalhando na
sala de aula. Esses que eu participei com certeza eu utilizei.
247
(11) Eu acho que sim porque só o livro didático não traz toda
aquela bagagem pra gente trabalhar com os alunos. Então
esses cursos trouxeram algumas atividades que a gente
acabou trabalhando em sala de aula e isso contribui sim
porque idéias novas são sempre bem vindas.
(12) Com certeza, acho que todos os cursos que a gente realiza,
cursos com o pessoal da secretaria, de uma forma simples, de
uma maneira ou de outra acabam trazendo contribuições para
que a gente possa aplicar na sala de aula... atividades,
sugestões, encaminhamentos, né... formas de vc estar
encaminhado determinados conteúdos que acabam
contribuindo e muito com a sala de aula, na prática do dia a
dia.
(04) considera um curso como “bom”, se oferecer propostas aplicáveis aos
alunos: “(...) Todo curso bem aproveitado que o professor vai e participa ele tira algo
de bom para estar trabalhando na sala de aula”. Mas e se o curso organizar-se em
torno de reflexões teóricas, por exemplo, sobre o ensino da gramática? Neste caso,
é possível que não se avalie igualmente. Da mesma forma, (11) entende que os
cursos de formação ministrados contribuíram para o ensino da gramática
contextualizada porque “(...) trouxeram algumas atividades que a gente acabou
trabalhando em sala de aula”. E, segundo o informante, “(...) idéias novas são
sempre bem vindas”. Ou seja, espera-se, quase sempre, que os cursos tragam
inovações, diferentes modelos de atividades, formas diferentes de encaminhamento,
de preferência prontas. Desse modo, evita-se “ter que pensar” sobre sua
elaboração. (12), por sua vez, entende que a qualidade de um curso reside em
trazer “(...) contribuições para que a gente possa aplicar na sala de aula...
atividades, sugestões, encaminhamentos, né... formas de vc estar encaminhando
determinados conteúdos que acabam contribuindo e muito com a sala de aula, na
prática do dia a dia”. Da mesma forma que os anteriores, este informante espera dos
cursos sugestões de atividades prontas para serem levadas à sala de aula.
Como nos cursos que ministrei procurei entrelaçar as reflexões teóricas com
encaminhamentos práticos, os informantes aprovaram e acenaram positivamente
para a contribuição de tais cursos, principalmente em relação às propostas de
atividades para o ensino da gramática contextualizada sem, contudo, especificá-las.
Os informantes (07), (14) e (25) comungam com a idéia de que os cursos
trouxeram contribuições em relação à gramática contextualizada e inscrevem tal
248
modalidade de formação como um momento de aprendizagem, de reflexão sobre a
língua e sobre as atividades que se podem fazer com a língua.
(07) Sim. Porque a gente começa a ver que o português que a
gente encontrou enquanto estudante é diferente do português
que a gente pode aplicar. A aplicabilidade dos conteúdos de
língua portuguesa e de outros conteúdos também a gente
pode ver de forma diferente. Por exemplo o que a gente fez
com o gibi lá, né... o gibi era uma leitura que no passado era
tipo que marginal, era uma leitura que não era para a sala de
aula, ne... e com os cursos a gente começa a perceber essa
aplicabilidade, como utilizar o gibi... a importância e toda essa
forma de ver o material que as vezes a gente despreza muda.
(14) Sim, pois a gente sempre vendo atualidades, né... trazem
formas diferentes para fazer com que os alunos consigam
interagir mais e melhor tanto com os textos... e a gramática
contextualizada dentro deles.
(25) Sim e muito, porque na verdade a gente trabalhava a
gramática isoladamente e agora, através desses cursos,
aprendi que posso trabalhar com aluno dentro do texto e não
fora dele.
De acordo com (07), por meio dos cursos “(...) a gente começa a ver que o
português que a gente encontrou enquanto estudante é diferente do português que a
gente pode aplicar”. Este informante entende os cursos como momento de
relacionar conhecimentos, refletir sobre formas práticas de trabalho com a língua,
em função dos objetivos que se pretende atingir. Em outras palavras: os propósitos
traçados para o ensino da língua enquanto estudante, não é mais o mesmo em
pauta. Conforme (14), os cursos também são momentos de atualização, quando é
possível refletir sobre “(...) formas diferentes para fazer com que os alunos consigam
interagir mais e melhor tanto com os textos (...)” e, ainda, momento de
aprendizagem. Nas palavras de (25), “Através desses cursos, aprendi que posso
trabalhar com aluno dentro do texto e não fora dele”. O informante (13) também
compartilha desta idéia, assim como (15), para quem os cursos devem ser tomados
como momentos de reflexão crítica da prática pedagógica:
(15) Com certeza, em princípio eles têm alertado para uma
observação mais crítica de nosso trabalho, de nosso ensino do
português, da língua, né... sempre no que tange aos objetivos
249
que a gente quer atingir que seria o uso da língua tanto falada
quanto escrita e analisar sempre quais são os melhores
caminhos, né... formas que realmente o válidas, que vão
ajudar os alunos a construir seu conhecimento e por em
prática.
Para o informante, esta modalidade de evento propicia, ao professor, pensar
sobre si mesmo, ponderando sobre atitudes, encaminhamentos e conhecimentos,
alertando “(...) para uma observação mais crítica de nosso trabalho, de nosso ensino
do português, da língua (...)”. São momentos de reflexão sobre a ação do fazer
pedagógico, no sentido de “(...)analisar sempre quais são os melhores caminhos,
né... formas que realmente são lidas, que o ajudar os alunos (...)”. Revela-se,
nesta elocução, as orientações teóricas de Schön (1992) sobre a formação de
profissionais reflexivos.
Por outro lado, os informantes (05), (09), (15) e (16) retratam, em suas falas,
o discurso de professores conscientes da necessidade de um estudo contínuo para
aprofundar conhecimentos, principalmente quando se trata da profissão docente. Os
cursos de formação, como eventos pontuais que são, contribuem no sentido de
despertar interesses, indicar fontes de consultas, revelar pesquisas etc., no entanto,
se a formação restringir-se a este tipo de evento, não garantirá o aprofundamento e
as reflexões necessários das teorias lingüísticas, como ressalta (05):
(05) No que a gente percebe, assim, os cursos são.. eles trazem
alguma contribuição, porém o é ainda suficiente para a
gente ver uma mudança de prática na sala de aula, dos
professores. Então eu acho que esses encontros pontuais eles
têm que ser repensados para ver uma maneira de dar uma
continuidade. necessidade de uma formação continuada
para os professores para tentarmos ver uma mudança na
prática da sala de aula mesmo. Os cursos contribuem sim,
mas necessidade de se repensar uma nova modalidade,
quem sabe, de trabalho para essa mudança que nós
esperamos.
Para transformar a condução da prática docente (se necessário), é preciso,
antes de tudo, conhecimento, para depois acreditar nos propósitos da mudança e
ousar nesta direção. Segundo (05), mesmo que os cursos de formação continuada
acenem para isso, “(...) o é ainda suficiente para a gente ver uma mudança de
prática na sala de aula, dos professores”, porque são pontuais, com curta duração,
250
não propiciando o tempo necessário para refletir e sistematizar informações.
Todavia, eles têm que ser repensados para ver uma maneira de dar uma
continuidade”, pois se a formação fosse planejada sequencialmente,
indubitavelmente, apresentaria resultados mais eficazes. (16) também acredita nisto:
(16) Olha, professora, eu acredito o seguinte... que o curso ele é
sempre válido, você sempre aprende, vo sempre
crescendo nele, mas ele teria que ter continuidade, porque da
forma que vem sendo trazido pra gente, ele... ele... contribui
momentaneamente e aí, depois, a impressão de que as
idéias vão se esvaziando no decorrer do tempo. Então, eu até
acredito que são bons, são lidos, como eu disse, pro
momento. Eles teriam que ser revistos, retomados e ter uma
continuidade para estar contribuindo nas atividades.
A continuidade proposta por (16) reflete as palavras de Alarcão (1998) que
concebe a formação permanente como um processo dinâmico, acompanhando o
docente ao longo de sua atividade profissional, adequando-o às exigências da
prática educativa. Desse modo, desenrola-se em estreita ligação com o fazer
pedagógico. Mesmo que os cursos ocorram esporadicamente, sozinhos não
garantirão a continuidade desejada porque os professores devem, segundo (09),
continuar se aperfeiçoando, independentemente dos cursos ofertados pelo
município:
(09) Eu acredito que sim. Tudo que vem de novo, vai acrescentar,
porém a gente tem ressaltar que é preciso que os professores
continuem se aperfeiçoando cada vez mais, que sempre existe
novidade, é... existe mudanças, né... que exige que o
professor se adeqüe, passem a se adequar com as
necessidades buscando novas fontes.
Dentre os entrevistados, 04 (31%) ainda os cursos de formação como
momentos de “repasse de atividades”; 05 (38%) entendem esta modalidade como
um momento de reflexão sobre a prática docente, mas que deve ter continuidade; os
outros 04 (31%) defendem a idéia de que somente os cursos o garantem a
formação continuada necessária, propondo uma outra modalidade de evento para
dar seqüência às discussões iniciadas e, como apontado por 77% dos professores
no questionário, elaborar atividades que auxiliem no encaminhamento da gramática
contextualizada.
251
Entretanto, como dar seqüência a este aperfeiçoamento? Que modalidade de
evento garantiria momentos para reflexões teóricas e elaboração de
encaminhamentos práticos? Grande parte dos informantes do questionário (anexo
03) (83%) conforme exposto apontou que os cursos de formação, até hoje,
foi a modalidade que mais contribuiu com os professores, até mesmo porque este
tipo de evento tem predominado na região. Porém, de acordo com os dados
coletados via questionário aplicado aos municípios da região Oeste (anexo 05), 32%
deste já apontam para uma outra modalidade de evento que vem, aos poucos,
repercutindo na região: os grupos de estudos.
Ao interpelar os entrevistados que acenaram para a insuficiência de uma
formação somente por meio dos cursos (09 deles, o que equivale a 69%), (07) e (04)
indicaram a realização de oficinas como forma de aprofundamento dos conteúdos
trabalhados nos cursos; (09) sugeriu que o município ofertasse cursos de
especialização em diferentes áreas; (05), (10), (11), (13), (16) e (25) sugeriram que
a continuidade dos cursos se efetivasse por meio de grupos de estudos, revelando
um conhecimento mais fecundo sobre formação continuada. O informante (10), por
exemplo, não reafirmou a efemeridade dos cursos, como apontou para o evento
que, segundo ele, garantiria a seqüencialidade das reflexões:
(10) Eu penso que nos grupos de estudos menores, onde há
oportunidades de você entrar em contato com a teoria, no
caso ali, sobre diversos autores, ou dependendo da
perspectiva a ser aprofundada, ele dá um suporte maior para a
discussão, para tirar as dúvidas e consequentemente, a fazer
com a gente ouse a começar a produzir também dentro
dessas perspectivas, porque nos cursos acaba o
proporcionando porque é um número maior de pessoas e não
tem essas oportunidade de você estar frente a frente com o
conteúdo e o professor acaba mais por ouvir e não consegue
fazer uma transposição para sua prática mais tarde.
Os grupos de estudos, retomando Alarcão (1998), quando organizados em
torno de projeto de formação-ação-investigação, realizados com/para/pelos
professores, alicerçam a formação continuada como co-responsabilidade não dos
docentes, mas de toda comunidade escolar. Além disso, conforme assinala (10),
“(...) ele um suporte maior para a discussão, para tirar as dúvidas e
consequentemente, a fazer com a gente ouse a começar a produzir (...)” porque
252
aproxima mais os participantes não só pelo número de integrantes, mas pela relação
existente entre eles. O informante (05), assim como o (13) e o (16), também
comungam com a proposta:
(05) Eu acredito assim... que uma formação continuada deveria ser
em cima dos grupos de estudos mesmo, porque são grupos
pequenos, você possibilita uma confrontação maior ente teoria
e prática, então a gente pode estar mais perto, discutindo,
comparando, trocando experiências e... vendo o que é
possível e não é possível estar aplicando na sala de aula.
(13) ... eu vejo assim que... o grupo de estudo ajuda a tirar essas
dúvidas, a estar é... redigindo alguma coisa, a estar
produzindo alguma coisa... e fazendo essa troca mesmo um
com o outro.
(16) Eu acredito que os professores... eles têm que ter outras
formações, de estudo, de retomada desses conteúdos, é... e aí
a forma como isso seria colocado depende... via município ou
até dentro da escola, de se pensar formas de estudar
novamente aquilo que foi proposto no momento do curso.
Teria que ser revisto no decorrer do ano letivo. Eu acredito que
os grupos de estudo é a melhor maneira de fazer essas
retomadas.
Os depoimentos da maioria dos entrevistados demonstraram uma outra
compreensão da formação permanente, ao selecionar o grupo de estudos como a
modalidade capaz de garantir a continuidade desejada aos cursos pontuais.
Segundo eles, no evento em foco os integrantes não se colocam apenas como
ouvintes, mas como colaboradores de um trabalho em execução. As dificuldades
tornam-se coletivas e transformam-se em objeto de discussão para que,
conjuntamente, reflitam e busquem soluções, reforçando, assim, a percepção e a
pertinência do fato.
Por outro lado, não há, no momento de encontro do grupo, monólogos, mas
sim relatos, que os integrantes têm sempre o que dizer sobre suas ações,
dificuldades e sucessos, compartilhando-as com seus colegas. Em virtude disso,
terão condições de aprofundar conhecimentos, revisar conceitos teóricos, produzir
atividades que atendam aos objetivos desejados.
Por conseguinte, em grupos de estudos cujos professores estejam
embasados na concepção (sócio)interacionista da linguagem e que acreditam nos
253
propósitos do trabalho reflexivo com a língua podem até apresentar, ainda,
dificuldades na elaboração de atividades, porém estas serão facilmente sanadas a
partir do momento em que se criar situações coletivas de reflexão e de produção.
Uma vez inseridos no processo formativo, rapidamente ganharão segurança para
ousar em algumas propostas de ensino.
4.3.3 Análise e interpretação das aulas gravadas
A gravação de aulas foi mais um instrumento de coleta de dados que
selecionei neste processo de investigação, por entender que, em se tratando de uma
pesquisa qualitativa, com base etnográfica, este instrumento seria essencial para
completar os indicativos do questionário e da entrevista.
Em se tratando de uma pesquisa em Lingüística Aplicada, a sala de aula deve
ser considerada como um espaço de excelência para a investigação, principalmente
em se tratando de pesquisa voltada para o ensino da língua materna. É na sala de
aula que se revelam as condições de ensino e aprendizagem.
O que a pesquisa em sala de aula pretende é exatamente dar conta
dessa construção ao investigar (...) os processos interativos que
caracterizam o contexto da sala de aula, isto é, como o professor
ensina e como o aluno aprende (CAVALCANTI e MOITA LOPES,
1991, p.134).
Sendo assim, considerei “que a realidade do ensino e aprendizagem da sala
de aula pode chegar a ser conhecida através de metodologias de pesquisas
interpretativas e qualitativas que permitam descrever e conhecer o contexto natural
da sala de aula” (KLEIMAN, 2001, p. 16). Em decorrência disso, propus-me a refletir
também sobre o encaminhamento dado ao ensino da gramática na sala de aula, a
partir de gravações de 20 aulas consecutivas de Língua Portuguesa, em turmas de
4ª séries do ensino fundamental para verificar como o professor ensina gramática.
Conforme exposto no capítulo 3, a proposta inicial residia em gravar aulas
em 5 turmas, sendo cada uma de um município diferente (dentre aqueles
selecionados para investigação). Contudo, também nesta modalidade de coleta de
dados encontrei dificuldades, evidenciando-me, assim como no questionário e na
entrevista, que os professores não se encontram tão disponíveis como imaginava e
254
desejava, ainda mais em se tratando da gravação de suas aulas, com a presença de
uma pessoa “estranha”, acompanhando suas ações. Finalmente, três professoras
concordaram, depois de conversar com cada uma individualmente, explicitando os
propósitos de tal instrumento. Na realidade, o objetivo residia em verificar os efeitos
dos cursos de formação por mim ministrados no encaminhamento dado à gramática
na 4ª série.
Logo, na análise transparecerão excertos retirados das gravações de 20
aulas consecutivas de Língua Portuguesa de três professoras (uma de cada
município do corpus de investigação), num recorte mais específico para o ensino da
gramática. Por discrição, as professoras serão tratadas por P1, P2 e P3. Julgo
importante destacar, ainda, que durante a fase de gravação das aulas (que ocorreu
em 2005), todas estavam cursando Letras em instituições privadas e exerciam a
função docente há pelo menos 5 anos, em séries iniciais de seus respectivos
municípios.
As escolas nas quais atuavam eram na zona urbana, oferecendo os recursos
básicos para o apoio pedagógico, como: televisão, vídeo, retroprojetor e
mimeógrafo, além de uma equipe formada pela coordenação, direção e professor no
contra-turno para alunos com maiores dificuldades. As três escolas tinham sala para
biblioteca, refeitório e amplo espaço no pátio. As turmas eram formadas por, no
máximo, 25 alunos.
Porém, quando se trata de análise de aulas, estou consciente de que
alguns princípios que devem ser considerados para entender o quadro interativo
deste espaço escolar: o primeiro refere-se à compreensão de que as instâncias
institucionais intervêm diretamente na ação docente, determinando, por exemplo, a
duração das aulas, os objetivos educacionais, a seleção e divisão do programa
anual, o tipo de avaliação, entre outros; o segundo aponta para o fato de que os
lugares e papéis sociais, definidos previamente, direcionam o grau de formalidade, a
forma de tratamento, as relações interpessoais, além de interferirem no
gerenciamento do evento.
Nesse contexto, não poderia esquecer que as ações as quais seriam
presenciadas estariam vinculadas não às orientações teórico-metodológicas dos
cursos de formação ministrados por mim, mas a diferentes fontes de referências
que, direta ou indiretamente, interfeririam tanto nas atividades que seriam propostas
aos alunos, como na hierarquização e na seleção dos instrumentos de ensino.
255
A organização de uma aula inclui dimensões cognitivas e
socioinstitucionais ligadas tanto ao conhecimento sobre o objeto
de estudo e o saber fazer como ao conhecimento sobre esse tipo de
interação e o saber dizer – que orientam efetivamente o processo de
planejamento e execução desse gênero (MATÊNCIO, 2001, p. 81).
Por outro lado, quando se trata de refletir sobre as relações de interação, no
caso, entre professor e alunos, estou ciente do vasto campo de investigação,
relacionado à estrutura da conversação e aos atos de fala. Rojo (2006) faz uma
importante descrição de pesquisas e publicações nesse sentido. No entanto, o que
pretendo abordar, nesta análise, são as esferas específicas das interações e
conversações entre professoras e alunos, nas aulas de Língua Portuguesa,
reportando-me, mais diretamente, para a abordagem do ensino da gramática.
No contexto, priorizarei o processo de ensino-aprendizagem (como se ensina)
e o objeto de ensino (a gramática), relacionando-os com o sistema de formação
continuada por meio de cursos por mim ministrados, dos quais as professoras
participaram em seus respectivos municípios.
Para gravar as 20 aulas de Língua Portuguesa em cada turma, acompanhei,
em média, 8 dias de aulas, quando, além das gravações, fui observando o ambiente,
a organização da escola e da sala, a relação professor/coordenação/direção, a
interação professor/aluno, enfim, procurei inserir-me no ambiente de tal forma que o
contexto falasse também, além das professoras e dos alunos.
Na leitura preliminar do ambiente sala de aula ficou evidente três
comportamentos distintos no que se refere à atitude das professoras perante aos
alunos. P1 mostrou-se totalmente segura quanto aos educandos, aos conteúdos, à
escola e a minha presença parecia não interferir na sua rotina didática, revelando
domínio e segurança com os alunos. Estes, por sua vez, comportavam-se muito
bem, demonstrando respeito à professora e à minha presença. P2 revelou-se um
pouco intimidada pelo fato de eu estar assistindo suas aulas, principalmente nos
primeiros dias, e essa intimidação repercutiu no relacionamento professor/alunos,
visto que apresentou dificuldades em controlar o comportamento deles. Todos
falavam ao mesmo tempo, impedindo, muitas vezes, a professora de falar. P3, por
sua vez, colocou-se, desde o início, numa postura enérgica, exigindo silêncio,
participação e respeito, talvez pela minha presença na sala. Os alunos
corresponderam. Contudo, em algumas situações, ela teve que alterar sua voz para
lembrar de quem era a autoridade.
256
No que tange ao processo ensino/aprendizagem, P1 conduzia as aulas de
forma interativa, provocando reflexões a partir dos próprios questionamentos dos
alunos. Não lhes dava respostas prontas, mas induzia-os à pesquisa. P2, por sua
vez, procurava, o tempo todo, estabelecer esta interação, porém as conversas
paralelas eram tantas que ela desistia das instigações e apresentava as respostas,
conforme solicitadas. P3, quando estava falando, não admitia conversa paralela e,
da mesma forma, quando um aluno estivesse lendo, todos deveriam ouvir. Não tinha
muita paciência para as reflexões, antecipando as respostas com suas explicações.
As professoras organizaram suas aulas pautadas em três eixos da língua: a
leitura (com interpretação), a produção escrita e a reescrita de texto, com
predominância do primeiro. A gramática foi raramente abordada como conteúdo
específico. Tanto P1, como P2 e P3, quando se referiram a ela, na maioria das
vezes, trataram-na articulada às situações de leitura, de produção ou de reescrita do
texto. Cada uma demonstrando uma compreensão diferente de ensino.
P1 revelou maior compreensão da gramática contextualizada, deixando
transparecer, em suas ações, referências teórico-metodológicas mobilizadas nos
cursos de formação que ministrei; P2 procurou associar a gramática com o texto,
porém na tentativa de compatibilização entre a prática tradicional e as orientações
teórico-metodológicas da gramática contextualizada, promoveu alguns equívocos;
P3 fugiu ao máximo do ensino da gramática, priorizando atividades de leitura e
interpretação, abordando algumas explicações lingüísticas apenas quando
solicitadas por um aluno.
As aulas seguiram, nas três turmas, a mesma organização global:
primeiramente a professora ou um aluno lia um texto, o qual era, na seqüência,
debatido (com orientação das professoras) para, em seguida, ser interpretado com
algumas questões que eram colocadas no quadro, copiadas no caderno e
respondidas pelos alunos. De tais questões, surgia uma proposta de produção de
texto, o qual era corrigido pela professora e encaminhado para reescrita individual.
Dentre as questões de interpretação do(s) texto(s), algumas direcionavam-se
a conteúdos gramaticais, contextualizados ou não. P1, por exemplo, aproveitou um
texto lido pelos alunos para reforçar a idéia de palavras sinônimas que podem ser
empregadas num texto, evitando repetições desnecessárias. Para isso, ela retirou
trechos do texto lido e interpretado, e pediu para os alunos substituírem as palavras
sublinhadas por outra de igual valor, após pesquisa no dicionário:
257
P1: Isso. Reescrever os trechos, aqueles trechos foram frases que eu
retirei do texto “Lágrimas de Potira”. E onde estivesse as palavras
sublinhadas vocês teriam que trocá-las por outras palavras que
signifiquem a mesma coisa, que tenha o mesmo sentido. Então você
não poderia trocar por palavras que significassem o contrário, que
significassem outra coisa, mas palavras que tenham o mesmo
sentido, que nós chamamos de SINÔNIMOS. Lembram? Tá. Os
sinônimos são as palavras que possuem o mesmo sentido, o
mesmo significado. Então, era isso que vocês fariam agora.
Compreendendo aquela frase você trocaria por outra. (...) Então, a
primeira frase, a frase A, quem que lê para nós?
AL: Eu.
P1: Então, leia Alexia.
AL: (lendo) Envolvida pelo sofrimento, Potira passou o resto de sua vida
à beira do rio chorando sem parar.
P1: Tá. Na frase estava chorando sem cessar, ela fez chorando sem
parar. Mudou o significado da frase ?
AL: Não.
P1: Não. Tem o mesmo sentido: sem parar. Todos fizeram assim?
Alguém usou outra , outra forma ? O que que você usou?
AL : Éh, cansar.
P1: Chorando sem cansar. Muito bem. Agora, veja só: é a mesma coisa
eu dizer assim : chorando sem cessar, chorando sem parar? É o
mesmo sentido e, seu disser: chorando sem cansar. Mudou o
sentido ou continua o mesmo? Que que vocês acham?
AL: Muda, eu acho que muda ...
P1: Mudou, mudou o sentido, olha: cessar; sem cessar; sem parar.
Agora ela colocou sem cansar. Mudou ou não mudou?
AL: Mudou.
Vale observar que P1 não descarta a teoria gramatical. Emprega-a no
momento de explicar o que são palavras sinônimas: “(...) Os sinônimos são as
palavras que possuem o mesmo sentido, o mesmo significado (...)”, estabelecendo
relações com as diferentes situações de uso, provocando reflexões sobre as
possíveis alterações de sentido quando se substitui uma palavra por outra. A
professora não traz respostas prontas. Ela instiga o aluno a pensar: “(...) Mudou o
sentido ou continua o mesmo? Que que vocês acham?”, além de justificar a
necessidade da aprendizagem de tal conteúdo:
258
P1 : Vocês viram quantas palavras nós podemos substituir por calma. E
às vezes a gente vai escrever um texto e não acontece da gente
começar a repetir palavra lá no meio? Que que a gente deveria fazer
neste momento? Pegar um dicionário, pensar o que que eu poderia
usar no lugar dessa palavra. Pega um dicionário e olha quais os
sinônimos dela, quais as outras palavras que significam a mesma
coisa. São todas essa dão certo. (...) Então: “perdeu a calma que
mantivera até então e derramou lágrimas copiosas”. O que que
significa derramar lágrimas copiosas? Que que vocês fizeram aí?
Leia lá.
P2 utiliza o mesmo recurso da interpelação para ensinar gramática, com uma
outra forma de encaminhamento:
P2: (...) lendo novamente a história a quem o ele se refere... é isso que
vocês vão escrever aqui... número quatro... observem as palavras
destacadas na fala de Roni “mas será ele o meu príncipe
encantado?” A palavra destacada aqui é o se-rá... observem a outra
fala dele aqui mas ele continuará maravilhoso?” A palavra
destacada aqui é continuará... observem gente olhando para essas
duas palavras antes da gente ler o resto... o que que a gente
percebe? O que elas tem em comum essa palavra continuará e
será? Elas têm acento... em que sílaba elas têm acento?
AL: Na última.
P2: Então observem aqui que as palavras será... continuará... são
chamadas de oxítonas porque a sílaba mais forte é a última...
então as palavras oxítonas que terminam em a e o ei eis
seguidas ou não de “s” são acentuadas... esse seguidos ou não
de “s”por exemplo eu quero tirar ele do plural... café, cafés... então
observe... todas as palavras que tiverem a terminação a e o ei eis
serão acentuadas na última laba... todas as palavras... essas
palavras que são acentuadas na última sílaba elas são chamadas
de...
AL: Oxítonas
P2: Bom... se elas forem acentuadas... se a penúltima laba for a mais
forte como elas são chamadas?
AL: Paroxítonas
P2: Paroxítonas... e se por exemplo elas forem acentuadas na
antepenúltima sílaba?
AL: Proparoxítonas.
Neste encaminhamento de P2, interpreto duas situações distintas: uma
relacionada a abordagem do conteúdo e, outra, ao processo ensino/aprendizagem.
259
No que se refere ao conteúdo explorado regras de acentuação o tratamento
revela uma concepção normativa de linguagem, prevalecendo o reconhecimento das
regras gramaticais. Para isso, empregou o texto (anteriormente lido e discutido), do
qual destacou uma frase e, desta, uma palavra para retomar noções de oxítonas,
paroxítonas e proparoxítonas. A professora não estabeleceu nenhuma relação com
o contexto do qual a frase foi retirada, apresentando definições da gramática
normativa: “(...) palavras será... continuará... são chamadas de oxítonas porque a
sílaba mais forte é a última... então as palavras oxítonas que terminam em a e o ei
eis seguidas ou não de “s” são acentuadas...”. Nesta situação, o texto foi usado
como pretexto para o ensino da gramática normativa.
Quanto ao processo ensino/aprendizagem, P2 revelou um comportamento
distinto de P1. Enquanto esta provocava reflexões, aquela não. Da mesma forma
que interpelava os alunos, apresentava ou induzia a resposta: “(...) o que que a
gente percebe? O que elas tem em comum essa palavra continuará e será? Elas
têm acento... em que sílaba elas têm acento?” . Na realidade, ela acaba não
disponibilizando tempo necessário para as reflexões, visto ler todas as atividades
propostas, explicando minuciosamente o que o aluno deveria fazer, impedindo-o de
pensar sobre os enunciados de comando.
A partir de tais explorações, P2 esqueceu-se do texto inicial e orientou os
alunos para recortarem, de jornais e revistas distribuídos por ela, palavras oxítonas:
P2: Também... ela termina em em por isso que ela é acentuada (...)
então as palavras... o que vocês têm que lembrar é o seguinte...
todas as palavras oxítonas acentuadas terminam em a e o ei eis...
se elas terminarem nessas sílabas aí que vocês estão vendo...
nessas letras... é sinal de que elas serão acentuadas... agora o que
que vocês vão fazer nessa última aqui... procurem em jornais
revistas e livros palavras oxítonas que terminem em a e o só...
poderia ser também gente se vocês encontrarem que terminem em
em eu ens vocês podem colocar também... que seja importante
gente
AL: Que termine com a letra a?
P2: Que sejam acentuadas... por exemplo ali...
AL: Em qualquer lugar?
P2: Ele perguntou em qualquer lugar... pra ela ser oxítona ela tem que
ser na última...
260
Interessante notar que, mesmo depois de a professora fazer uma exaustiva
explicação das regras de acentuação, e depois de retomar quais são as palavras
oxítonas e quando elas são acentuadas, o aluno ainda perguntou se o acento é Em
qualquer lugar?”. A interpelação constitui-se prova de que a teoria gramatical,
descolada das situações reais de uso, não é esclarecedora para o aluno, ou seja,
ele não consegue estabelecer analogias com as situações práticas.
Mesmo nos momentos em que P2 aproximou a gramática do texto, ainda
assim não garantiu as devidas relações significativas. Ao explorar o conteúdo
temático de um poema via questões interpretativas, apresentou indagações que
exploravam a gramática na organização do texto, no caso, a conjugação verbal,
que o poema estava escrito na primeira pessoa do singular. A professora, por certo,
desejava que os alunos justificassem o porquê do emprego da primeira pessoa e
retirassem, do texto, exemplos de verbos assim conjugados:
P2: Atenção aqui a número três Escreva por que o poema está escrito
todo na primeira pessoa do singular. Copie os verbos que estão
confirmando isso”. Atenção nesse daqui gente dexo vecê falá
Mateus nesse daqui voceis vão copiá do poema todos os verbos
que estão a ação da menina — que é verbo? vamos lembrar lá (...)
AL: Verbos é uma atitude.
P2: Uma atitude, por exemplo: cantar, andar, correr, brincar, dançar é
uma ação...
AL: Jogar...
P2: Cansar é uma aÇÃO “eu canso” “tu cansas” “ele cansa” né... num é
uma ação? Olhem aqui eu quero duas respostas nessa daqui a
primeira porque que ele está escrito toda na primeira pessoa do
singular. vamos imaginar que a / a Márcia vamo vê vamo intendê
— a Marcia ta escreveno um texto ta fazendo confidencias que
acontecem com ela. Bom, ela vai escrevê assim “eu não gosto mais
de brincar de bonecas porque eu acho que eu passei dessa fase
e assim por diante”. Bom, si eu pedisse pra ela justifica por que que
ela escreveu na primeira pessoa por que qui ela usou a pessoa EU
o que que ela ia me dize? “Porque é uma coisa que está
acontecendo cumigo” os verbos que justificam isso éh:::: “já paSSEI
da idade” então são coisas que acontecem comigo então voceis vão
justificar por que tem que estar escrito na primeira pessoa do
singular por que que ela usou a pessoa EU pra contar isso.. ta? I
outra coisa que voceis vão faze copiá os verbos. Somente os verbos
que justificam isso ou seja os verbos que indicam que ele foi escrito
na primera pessoa do singular primera pessoa do singular é o EU
lembram do sujeito EU... As vezes gente o sujeito nem do lado do
261
verbo mas quando eu falo assim: é... o Samuel fala assim:: “hoje
joguei bola” quem jogou bola?
Na tentativa de garantir maior compreensão, P2 estendeu-se na explicação,
extrapolando o texto, relacionando com situações da sala de aula. Quando coube
aos alunos demonstrar a compreensão que tiveram daquela orientação didática, as
dificuldades despontaram:
AL: Profe... não entendi a três...
P2: A três... o que que tá pedindo na três... pra você explicá por que que
o poema está escrito na primeira pessoa do singular...
P2: Não... não é pra retirá os verbos de dentro e explicá os verbos...
os verbos você vai copiávocê vai explicar por que que ela se
utilizou do eu pra contar a história...
Eram 6 as questões que os alunos deveriam responder sobre o poema lido,
dentre as quais, três referiam-se à gramática. Porém, devido à dificuldade em
controlar o comportamento da turma e da professora ser ouvida, o tempo
empregado para a atividade chegou a mais de três aulas e sempre com a
necessidade de retomar, individualmente, o conteúdo veiculado.
P3, quando abordou questões de interpretação, ficou presa às informações
explícitas do texto, explorando, por exemplo, quem era os personagens, qual era o
protagonista da história, onde aconteceu, como etc., sem fazer analogias com
situações que extrapolassem o texto e sem provocar inferenciações. Não versou
sobre os possíveis efeitos de sentido dos adjetivos na descrição quando pediu aos
alunos para descrever, com detalhes, o local do fato e os personagens. Somente,
orientou para que descrevessem. Apenas numa situação de leitura, momento em
que um aluno lia um texto, a professora aproveitou a oportunidade para explorar um
elemento coesivo referencial, fazendo uma breve menção aos pronomes:
P3: (...) Aqui por exemplo: a pulga e o leão ficam pensando o que os
incomoda tanto. Esse “os” refere-se a quem?
AL: Aos que interpreta, aos personagens do texto.
P3: Isso! Que são a pulga e o leão ficam pensando o que “os” incomoda
tanto. Esse “os” substitui o nome de quem?
AL: Da pulga e do leão.
262
P3: Muito bem.
AL: Uma palavra verbal.
P3: Um personagem né, um personagem da história.
AL: Que substitui, que substitui o nome dos personagens.
P3: Que é chamado de ? Os pronomes, pronomes.
AL: Pronomes.
Outro momento em que a gramática foi abordada (direta ou indiretamente)
pelas professoras, ocorreu durante a produção, originária de textos lidos (turmas de
P2 e P3) e/ou de histórias contadas oralmente (P1). Este encaminhamento didático-
metodológico recebeu tratamento diferenciado em cada sala.
P1 tratou a produção escrita como conseqüência do ter o que dizer após uma
história contada, ou seja, uma reprodução do oral. Depois de um aluno ter relatado
um fato (mais especificamente um “causocontado pelos pais ou avós), os demais
alunos eram orientados a reproduzir a história por meio da escrita. Tal atividade era
encaminhada durante a aula, sem apresentar um objetivo maior para a produção
(por que e para quem escrever). Ficou claro tanto para a professora como para os
alunos que esta era uma atividade para aprender a escrever.
AL: Tamo ferrado, professora do céu.
P1: Não. É assim que a gente aprende, Yuri. A gente aprende, a
gente aprende escrever, escrevendo. Nem que precisa apaga,
arrumar de novo, começa de novo, né. Claro.
Partindo dessa compreensão, as noções gramaticais eram ensinadas durante
a própria produção, quando a professora circulava pela sala e atendia aos alunos
em suas dificuldades relativas à organização lingüística de um texto. Noções de
ortografia, pontuação, paragrafação, concordância verbal e nominal, entre outras,
eram repassadas a partir da pergunta de um aluno, de um erro encontrado no texto.
O comportamento de P1 demonstrava conhecer e concordar com que disse Possenti
“Ler e escrever o são tarefas extras que possam ser sugeridas aos alunos como
lição de casa, mas atividades essenciais ao ensino da língua. Portanto, seu lugar
privilegiado, embora não exclusivo, é a própria sala de aula” (POSSENTI, 1996, p.
20).
263
AL : Aqui tem que ir sempre um /h/ aqui junto?
P1 : Isso, /h/. Gente, sempre que vocês vão escrever: muito tempo,
esse /há/ é com /h/, sempre, tá? Que é /há/ de haver.
AL : Ainda bem que professora falou. Verbo havia.
P1: Ainda bem que eu falei? Tava escrevendo o /há/ sem /h/?
Uma forma de encaminhamento que chamou, mais uma vez, minha atenção,
foi a maneira de orientar a ortografia das palavras. Em vez de dar respostas prontas
quando indagada sobre como escrever determinadas palavras, ela instigava o aluno
a pensar, a pesquisar no dicionário ou pedia que o mesmo fosse até o quadro
escrever a referida palavra com a ajuda dos colegas e de sua própria percepção:
P1: Lobisomem. Tó, pega o giz e vai então. Vai que eu te ajudo.
Vai . /Ló/ como é que faz? (...) Isso. /Lo/ /Bi/. /Lo/, /Lo/ você
tem e agora /Bi/ (Ao fundo A: lobisomem). /Só/. A tua dúvida é
como que faz o /so/ , lo-bi-só. Que que vocês acham, com que é ?
AL: S.Ó.
P1: Isso. S. vai lá. Lo-bi-so-mem. “Mem” Como que faz o “mem?
lobisomem. Isso. Vai lá. “M”. E agora : lobisomem. Qual letra? Isso
“E” e termina como? aqui está escrito “lobisome”. Às vezes é
comum nós falarmos “lobisome”, né. Nós falamos na nossa
linguagem,, nós falamos “lobisome”, mas será que agente escreve
“lobisome”.
AL: Não.
P1 : Então o que que termina ali?
AL : homem.
P1 : Com “m”, lobisomem, mem, aí. Lobisomem, senão fica “lobisome”.
AL : Põe um acento lá , lobisomem.
P1: Não, não, não tem acento, não. Lobisomem. tem o pinguinho no
i, aqui. Oh, lobisomem. Tá assim. É comum nós falarmos “lobisome”,
na oralidade, mas a escrita ..., vocês procuraram no dicionário a
palavra lobisome”, vocês não vão encontrar, por que a grafia certa
dela é essa daqui, tá.
Nos excertos acima, evidenciam-se as provocações de P1 ao estimular os
alunos à construção do conhecimento, não apresentando respostas prontas. O aluno
aprende interagindo com o outro, com pessoas mais experientes, como postula
264
Vygotsky (1991), ao reconhecer a aprendizagem como um processo social que
ocorre na interação com adultos e pessoas mais experientes. Nesse processo, o
papel da linguagem é destacado, visto que é na apropriação de habilidades e
conhecimentos socialmente disponíveis que as funções psicológicas humanas são
construídas. Para isso, ela adota uma postura de professora mediadora, tão
discutida nos cursos de formação que ministrei, fundamentando a concepção
(sócio)interacionista da linguagem. Outro exemplo:
AL: Professora como é que escreve colocou?
P1: Colocou, escreve no quadro, vai lá. Escreve como você imagina que
seja. Colocou. Daí o que não conseguir, nós ajudamos. Colocou.
Co-lo-(mesmo lo de lobisomem). Colocou. Cou. Cou. Como se
escreve /cou/. Isso. Aí, viu como você sabe escrever ?! tava com
dúvida? Colocou.
AL: Ahã. Não sabia se no final era com /l/ ou era /u/.
P1: Ahã. Colocou com /u/.
P1 parece entender a língua como organizadora das ações com a linguagem,
ou seja, demonstra ter uma concepção clara sobre os processos de aprendizagem.
Para ela, ensinar a escrever nada mais é do que ensinar os alunos a ler, refletindo
sobre o que leu e escreveu, entendendo o significado das palavras que organizam o
texto, reconhecendo sua estrutura, refletindo sobre as marcas lingüísticas que o
constituem. Ensinar a escrever é, ainda, diferenciar a fala da escrita, sem
desrespeitar as variedades lingüísticas:
P1: Oh, pessoal, o ( ) perguntou como se escreve taubua ou tábua? É
comum a gente ouvir as pessoas falando “tauba”, não ouviram?
Tem muitas pessoas que falam assim. Isso teve origem da .. da
origem da linguagem dos negros. Eles geralmente falam “taubua”,
tá.
AL: Taubua?
P1: Então, se escreve assim, óh: Tábua.
AL: Tauba.
P1: Tábua. Tábua.
265
P2 também orientou atividades de produção escrita depois de um poema lido
e interpretado. Individualmente, cada aluno produziu o seu texto, também durante a
aula, depois de uma exaustiva explicação sobre o que deveriam escrever. Enquanto
os alunos escreviam, a professora ficou circulando na sala, atendendo a cada aluno
individualmente, retomando, por inúmeras vezes, a própria proposta de produção. A
atividade de escrita não veio acompanhada de um objetivo, assim como conduziu
P1. Os alunos simplesmente deveriam produzir textos e isso era inquestionável, ou
melhor, tal atividade fazia parte da hierarquia das ações didáticas com língua.
No caso dessa turma, a preocupação não era com a ortografia, mas com a
tipologia e o número de linhas que deveria conter o texto:
P2: O que que é narrativo gente?...é aquela... é uma história né? que
você vai contar...
AL: É a pessoa que fala uma história.
P2: É pra contar...e pur favor colaborem.
AL: Pode ser do tamanho que quizé psora?
P2: O tamanho que você... o tamanho que você achá necessário pra
escreve... na há uma quantia exata
No entanto, P2 aproveitou a oportunidade e, ao circular pela sala olhando as
produções, apresentou algumas noções gramaticais, tomando, como base, o
emprego inadequado de determinados elementos lingüísticos no texto que estava
sendo produzido:
P2: Esse MAS ta fora do... do contexto... Aqui ó.. então deveria se...
pois eu estou ficando... não mas... porque uma impressão de
contradição esse mas né?... então coloque... POIS eu estou...
Mesmo nesses momentos, ela não provocava reflexões. Simplesmente
apontava o(s) erro(s) e indicava, em seguida, o emprego correto. Essa atitude
talvez possa ser justificada pela desordem que havia na sala. Todos falavam ao
mesmo tempo e não ouviam as explicações da professora. No entanto, ela não
desistiu, em nenhum momento, de cumprir com o seu papel: o de ensinar.
P2: Dois pontos... muito bem... agora você vai enumera o que você
vai...
266
AL: Na outra linha né?
P2: Sim... pode sê.
na turma de P3, o encaminhamento da produção de texto originou da
leitura de uma história em quadrinhos, a qual deveria ser transcrita na forma de um
texto narrativo, em prosa. A atividade foi tomada como pretexto para a aplicação de
discurso direto e indireto aos alunos, com o emprego da pontuação adequada:
P3 :Muito bem! Aqui por exemplo eu estou, eu estou vendo aqui um
travessão. Esse travessão aqui indica o quê?
(....)
P3: Por exemplo, não tem a voz digamos diretamente da personagem.
Que tipo de discurso? Que tipo de fala? Quando é a fala do narrador
é que tipo de discurso, que tipo de fala, por exemplo?
P3: O narrador é discurso indireto.
(...)
P3: Então vamos ver uma fala.
P3: Não brinco com você, você está sujo! É discurso direto ou indireto
isso?
AL: Direto.
P3: Direto porque esta falando certo muito bem. Numerou os
quadrinhos...
O encaminhamento didático teve a duração de aproximadamente 5 aulas,
durante as quais cada aluno ia à frente da sala e lia seu texto depois de produzido. A
professora olhou cada um, individualmente, marcando nele as palavras “erradas” e
escrevendo-as da forma correta, adotando a correção resolutiva apresentada por
Ruiz (2001). Embora tivesse demorado, os alunos participaram da produção com
interesse e respeito, atendendo, sem questionamentos, as orientações de P3.
P3 propôs, algumas aulas depois, uma outra situação de produção: a escrita
de um bilhete e de uma carta, estabelecendo a diferença entre os gêneros. O bilhete
foi produzido na sala, mas a carta, para “ganhar tempo”, a professora pediu que os
alunos produzissem em casa. Depois de discutir o preenchimento do envelope, a
professora fez, rapidamente, uma explicação sobre os pronomes de tratamento:
267
P3: Por exemplo, ta bom, por exemplo, o destinatário eu vou, por
exemplo, escrever é para um amigo meu né, para um colega meu, ai
eu vou escolher tipo de pronome né, eu posso colocar querido
amigo né, isso são expressões acompanhada escolhida pelo
remetente dependendo do destinatário, conforme o destinatário que
você vai escolher para escrever essa carta. Vai ser o pronome que
você vai usar, os pronomes pessoais lembram, os pronomes né,
você, senhor, senhora, excelentíssimo né, pronome de
tratamento né.
Na explicação, a professora demonstra insegurança em relação ao conteúdo
que explora. Ora fala de pronomes pessoais, ora de tratamento, sem estabelecer
relação entre ambos. Talvez a quase ausência de ensino gramatical, durante as
aulas gravadas, se justifique pela falta de domínio de P3 em relação à própria
gramática.
Um outro momento em que pude perceber uma relação direta (e indireta) com
o ensino da gramática foi na reescrita de texto, a qual cada professora conduziu de
sua forma. P1 reestruturou um texto coletivamente, distribuindo uma pia do texto
que seria trabalhado para cada aluno; P2 corrigiu cada texto individualmente e,
seguida, pediu que os alunos reescrevessem; P3 não apresentou nenhuma situação
de reescrita, seja esta coletiva ou individual. Apenas de correção.
Ao distribuir uma cópia do texto que seria reestruturado por cada aluno, P1
orientou a execução de tal atividade:
P1: Eu trouxe um texto pra vocês, um texto de um aluno, certo? E esse
texto desse aluno vocês vão verificar que ele precisa éh, de alguns
ajustes, certo? Então, quando cada um pegar o texto, vai perceber,
vai ler sozinho, tá., pra trabalhar individual, vai ler primeiro,
primeiro vamos fazer assim eu vou ler com vocês, vamos ver se a
gente entende o sentido do texto, depois a gente conversa sobre
o que que vocês poderiam estar modificando para que ele fique um
pouco melhor, para que fique dentro daquilo que a professora
ensina pra vocês., que se deve ter um texto. Então vocês vão
perceber que faltam algumas coisinhas nesse texto e essas coisas
que vocês acham que precisa melhorar, que precisa mudar é que
vocês vão mudar, seja em relação à pontuação ou, palavras de
repente repetidas; termos repetidos; alguma frase de repente que
você achou que não ficou bem assim, você pode dar uma ajustada
nela, mas sem tirar a idéia principal do autor, certo?
A partir das orientações, os alunos foram organizados em duplas
(selecionadas pela professora), com o seguinte propósito, claramente definido:
268
P1: Eu vou dividir as duplas, certo? Vocês vão sentar em duplas e
vocês vão trocando idéias, vão lendo, o colega diz: não, eu acho
que aqui fica melhor se fizer desse jeito. O outro: não, mas eu acho
que não. Então, vocês vão discutir os dois e vão fazer o mesmo
texto do mesmo jeito.
Em seguida, os alunos se colocaram numa atitude de “corretores”,
sublinhando, corrigindo, substituindo, pontuando, enfim, concertando o texto, sempre
com a orientação e auxilio de P1, que ficou movimentando-se pela sala e orientando
nas dificuldades.
P1: Leiam o texto com atenção e reescreva fazendo as correções
necessárias. Essas correções então, pessoal : quanto a pontuação,
paragrafação, palavras repetidas, vocês acham que tem coisas
sobrando ou se tiver alguma coisa faltando, certo?
(...)
P1: Vocês vão empregar tudo, todo o conhecimento que vocês tem
sobre textos, tá. Pode por parágrafo, letra maiúscula, sim. Tudo,
todo o conhecimento sobre textos que vocês conhecem vão aplicar
aí.... Eu quis dizer assim, não tem palavras escritas, por exemplo de
forma errada, com letras trocadas, isso ele não fez, tá? Então vamos
lá.
O interessante, também, neste momento de trabalho com o ensino da língua,
foi a maneira como a professora conduziu o processo. Mais uma vez ela não se
colocou como a detentora do saber. Provocou reflexões, instigou a pesquisa, enfim,
criou situações para que os alunos examinassem mais profundamente um problema
levantado. O excerto seguinte ilustra muito bem essa forma de interação entre P1 e
seus alunos no processo de ensino e aprendizagem:
P1: O que é que você fez aí. “Um dia Gustavo estava indo ler o seu
livro”, olha pro caderno dela “tava indo ler”, será que precisa essas
três palavras “tava indo ler”?
AL: Estava indo, professora?
P1: “Estava indo ler”, que que vocês acham?
AL: (ininteligível) ... indo ler?
P1: Tirar um desses, porque tem três, três verbos, será que precisa,
“Um dia Gustavo estava indo ler”, o que que vocês poderiam
modificar para melhor aí. Precisa desses três verbos será? “Um dia
Gustavo estava indo ler o seu livro no sofá”.
269
AL: Mudá né, professora.
P1: Por que que você falou que tem que mudar?
AL: Pra tirar mesmo, né.
P1: Só pra tirar mesmo. Vai ficar diferente se tirar um desses verbos, se
acha que vai ficar melhor?
AL: Vai ficar pior, professora.
P1: Você acha que vai ficar pior?
AL: Estava. Olha só: “Um dia Gustavo indo ler”, eu podia tirar esse
“estava”.
P1: Ah, mas se tirar, péra aí. Se tirar um desses verbos vai ter que fazer
outra adaptação, né.
AL: Então.
P1: É isso que ela está querendo dizer. Que, que vai ter que fazer
adaptações aí. Fica mais interessante. Como é que você pensa em
fazer?
AL: Tirar uma e, não dá certo aquela ali, daí nas outras por outra.
P1: Ah, trocar. O que que ficaria bom , então? Olha: “um dia Gustavo
estava indo ler o seu livro”, tem jeito de enxugar isso, diminuir esses
três verbos, que estão juntos “estava indo ler” e que significa a
mesma coisa.
A professora poderia ter abreviado essa discussão, apresentando, de
imediato, uma estrutura de frase mais elaborada. No entanto, preferiu que o aluno
refletisse e apresentasse hipóteses, analisando-as em cada situação. P1, nessa
maneira de conduzir o ensino da língua, demonstra a orientação teórico-
metodológica da gramática reflexiva proposta por Travaglia (1996, 2003). Com base
na reflexão, quer que os alunos recorram ao conhecimento intuitivo dos mecanismos
da língua e ampliem, assim, sua capacidade de uso por meio da atividade com o
texto.
Além disso, P1 está demonstrando a seus alunos que a língua não se
organiza de forma única, invariável, mas que, necessariamente, abriga um conjunto
de variantes que se adequam às diferentes situações de uso. Afinal, “usar a
linguagem não é um fato puramente lingüístico, mas cada instância de comunicação
é, em primeiro lugar, um evento humano e, a partir daí, social e cultural” (MOURA
270
NEVES, 2004, p. 37). Dessa forma, as atitudes interventivas da professora favorecia
a metalinguagem.
P2 empregou outro expediente para orientar a reescrita de texto de seus
alunos. Primeiramente ela leu cada texto, individualmente, com o aluno do lado,
sublinhando palavras grafadas incorretamente e apontando lacunas ou estruturas
mal construídas. Para isso, adotou um dos modelos de correção descritos por Ruiz
(2003) e explorado por mim nos cursos de formação: o indicativo. Ao ler os textos, já
indicava os recursos ausentes ou as falhas, as quais os alunos iam concertando.
P2: (...) mãe...já estou com treze anos... se entende... não brinco
mais com carrinhos... agora sou homem... que mais é ser
responsável... – escrito errado... vá lá procura - (...) como você...
quero trabalhar e sustentar a casa... e por isso não me mais
esses brinquedinhos... daí... vírgula aqui... depois de
brinquedinhos – (...) quando for me dar alguma coisa... me dê
roupas... calçados... e também a chave do carro viu...” esse viu
aqui... tem uma vírgula aqui... tá bom...
(....)
P2: (...) um menino muito pobre... cansava de inventar coisas... mãe eu
gosto... eu gostaria de um carrinho bonito... eu tenho quatro anos...
óh... esse por isso aqui ta fora de ordem... você vai arruma
– (...) eu gostaria de ganhar aquele... óh... o aquele aqui também
(...) carrinho de... ou é carrinho assim ou é da maneira que
você escreveu aqui em cima... vai procurá (...) lojinha... oh
como você escreveu lojinha aqui (...) mãe... não quero mais
aquele carrinho... que veja... aqui no início do teu texto...
você começa de uma maneira... quando você passa... calma aí...
quando você passa para a segunda parte... que que acontece?...
(...) pode deixar meu filho... oba... obrigado eu... oh... nome
próprio com letra minúscula...- (...) podemos brincar” (...).
A forma de orientar a reescrita, segundo Ruiz (2001), não modifica o texto do
aluno, porque a professora não resolve os problemas, apenas aponta-os, indicando
o local das alterações a serem feitas pelos alunos. No entanto, percebo, no
encaminhamento adotado por P2, uma predominância de correção resolutiva. Está
certo que a professora não resolve o problema para o aluno, reescrevendo, ela
mesma, trechos do texto. Porém, na maioria das situações que presenciei, ela
refletia sobre o texto produzido, destacando-se a linguagem de intervenção. Em
lugar de postular uma reflexão a cerca do que fora escrito pelo aluno, P2 ia
271
propondo um outro discurso, considerado melhor, substituindo a forma de dizer do
aluno.
E assim, as aulas seguiram, delineando três comportamentos distintos quanto
à abordagem de conteúdos gramaticais, ao encaminhamento didático-metodológico
e ao conhecimento teórico que subsidiou as ações.
Conforme dito, P1 utilizou estratégias didáticas que envolveram os alunos
no estudo da língua, de forma que o ensino da gramática atravessou as situações de
leitura, de produção e de reescrita de textos, sem mesmo ser caracterizado como tal,
evidenciando a compreensão dos pressupostos teóricos da gramática
contextualizada. Talvez tenha faltado, apenas, uma abordagem mais específica,
explorando, com maior ênfase, os elementos lingüísticos presentes nos textos lidos
e produzidos.
A segurança demonstrada pela professora, interpreto como decorrente do
conhecimento teórico que a subsidiava. Nas muitas ações observadas e no seu
discurso, revelaram-se conhecimentos científicos acerca da concepção
(sócio)interacionista presentes no encaminhamento didático-metodológico das
atividades de leitura, de produção de texto, de reescrita e de gramática
contextualizada, expostos nos cursos de formação, porém ampliados pela
professora.
Como P1 estava envolvida também com a formação acadêmica, os
conhecimentos que ia assimilando eram transpostos para as situações práticas da
sala de aula, enriquecendo os propósitos de trabalho com a linguagem e,
conseqüentemente, a aprendizagem dos alunos.
P2 e P3, por sua vez, não demonstraram a mesma segurança de P1, embora
também estivessem envolvidas com a formação acadêmica e com a continuada. P2
evidenciou dificuldades no desenvolvimento do ensino gramatical contextualizado,
mesmo apresentando tentativas de construir os encaminhamentos didáticos,
segundo as orientações teórico-metodológicas apresentadas e discutidas nos cursos
de formação. P3 nem ousou nesta direção, “fugindo” das situações que
promoviam reflexões sobre a língua.
Algo, todavia, as três apresentaram em comum: submeteram-se a um projeto
didático de leitura e produção escrita, acompanhando um programa orientado pela
instituição escolar.
272
Esse projeto didático referente aos objetivos do professor,
conteúdos selecionados, abordagens e estratégias de ensino e de
avaliação, qualifica a interação na sala de aula como uma interação
verbal que visa frequentemente o texto escrito, não somente como
fonte de referência, mas também como instrumento de verificação
do que foi ensinado/assimilado (MATÊNCIO, 2001, p. 90).
O texto foi tomado como objeto de estudo em todas as situações. A forma de
explorá-lo é que diferenciou-se substancialmente. P1 tinha maior liberdade para
conduzir suas aulas, mesmo que estas estivessem “amarradas” ao programa
escolar. P2 e P3, em contrapartida, seguiram rigidamente os conteúdos
programados, não ousando em outra direção. Tal comportamento pode ser
interpretado como resquícios da escola tradicional e tecnicista que ainda insiste em
comandar as ações na sala de aula.
Como as aulas foram gravadas com o objetivo de verificar os efeitos, dos
cursos de formação ministrados por mim, nas atividades práticas de ensino, a
conclusão que cheguei foi a de que (se é que é possível avaliar): nas atitudes, no
discurso, no encaminhamento teórico-metodológico dos conteúdos abordados por
P1 houve atravessamentos das discussões e propostas apresentadas nos cursos,
principalmente no que se refere à forma de abordagem da leitura, da produção e da
análise lingüística na reescrita de texto. Inclusive, transpondo as propostas
apresentadas.
Todavia, tenho ciência de que tais transposições não são única e
exclusivamente conseqüências da participação de P1 em tais cursos. São, inclusive,
resultados de um processo sócio-historicamente determinado, envolvendo
interações variadas, sejam estas por meio das próprias leituras da professora, de
outras situações de formação (acadêmica, por exemplo), resultando em um
conhecimento histórico e culturalmente acumulado.
em relação a P2 e P3, foi possível distinguir alguns procedimentos
práticos, tomados como modelos para a exploração de um conteúdo os elementos
coesivos do texto, por exemplo. Entretanto, a falta de bagagem teórica impediu o
aprofundamento, a proposição de outras práticas, a ousadia de criar situações a
partir das propostas apresentadas. P2 foi mais audaciosa do que P3 que preferiu se
omitir a expor suas dificuldades. Para ambas, apenas os cursos não foram
suficientes.
273
A análise permitiu-me concluir, mais uma vez, que os cursos de formação são
válidos e necessários para revelar pesquisas, apontar discussões teóricas, propor
reflexões e situações de leitura e aprofundamento, estimulando a formação contínua
do professor. Entretanto, não são suficientes. Precisam de continuidade.
Por mais que eu tenha focalizado aspectos relevantes do estudo da
linguagem, não foi possível garantir que tais conhecimentos fossem assimilados e
transpostos para os projetos didáticos de ensino. Se P1 foi um exemplo dessa
transposição, devo admitir, segundo o exposto, que não foram apenas os cursos os
responsáveis por tal efeito, mas, somou-se a estes, o interesse individual de buscar
outras formas complementares de estudos e aprofundamentos.
A formação continuada deveria, portanto, fazer parte da dimensão natural do
ser humano sujeito histórico, inacabado, em processo permanente de
desenvolvimento colocando-o numa atitude de “eterno aprendiz”. Entenderia,
desse modo, que a aprendizagem não se esgota num determinado local e espaço
de tempo. Ocorre, sim, concomitantemente ao desenvolvimento pessoal, numa
relação de reciprocidade. Não são apenas os cursos que formarão profissionais
competentes, mas:
As pessoas começam a ser formadas profissionalmente em seu
cotidiano. Cada um de nós sofre um processo de formação
profissional a partir da educação formal e informal a que está
submetido, diariamente, desde muito cedo. É na interação social, na
família, nos grupos de amigos, nas instituições, nas horas de lazer
que começa essa formação, não nos cursos básicos que
ministramos (MARIN, 2003, p. 162).
A gênese da formação continuada dos professores não pode reduzir-se a
cursos pontuais. Ao contrário, é preciso ser interpretada como uma trajetória
permanente de aprendizagem, reforçada por situações de estudos e reflexões sobre
as ações pedagógicas.
4.4 A Propósito dos Resultados
Depois do vasto percurso de análise dos dados coletados por meio dos
questionários, das entrevistas e das aulas gravadas, é possível responder às
indagações que orientaram nessa busca. Dentre elas, retomo as selecionadas como
mais pertinentes no processo de investigação, quais sejam:
274
d) A modalidade de evento adotada (cursos), para a maioria dos programas
de formação continuada aqui na região, tem subsidiado suficientemente os
professores para entender os pressupostos teóricos que subjazem a
proposta de ensino da Língua Portuguesa, a ponto de refletir em suas
ações na sala de aula?
e) Em relação mais especificamente ao ensino da gramática, como está
sendo enfocado, hoje, nas turmas de séries? Traduzem as discussões
teóricas do ensino de línguas que embasam os cursos de formação
continuada?
f) E eu, como docente em cursos de formação, estou, de alguma forma,
contribuindo para que os professores ampliem sua compreensão sobre o
trabalho com a língua e, mais precisamente, com a gramática?
Os dados revelaram que, embora os cursos de formação continuada
(modalidade de evento adotado na região), sejam preferidos por 83% dos
professores das séries iniciais, não têm sido suficientes para garantir o
conhecimento dos pressupostos teóricos que subjazem a proposta de ensino da
Língua Portuguesa.
A constatação decorre das imprecisões teóricas reveladas pelos professores,
seja no questionário, na entrevista e, até mesmo, nas aulas gravadas,
principalmente no que se refere ao ensino da gramática. Predomina, ainda, na
região, um ensino gramatical desarticulado das situações reais de uso da linguagem,
embora tais discussões se revelem nos cursos desde a década de 1980.
Na realidade, grande parte dos professores (45%), mesmo que reconheçam
as orientações para o ensino da língua, subsidiadas pela concepção
(sócio)interacionista da linguagem, ainda se mostram inseguros e temerosos quando
se trata de abordar o ensino da gramática, preferindo, neste caso, adotar uma
postura tradicional, conhecida e dominada por eles. Prevalece, assim, nos projetos
didáticos, o ensino da gramática normativa, atravessado por tentativas de aproximá-
la do texto.
Ao experenciar a compatibilização entre a prática tradicional e orientações
teórico-metodológicas da gramática contextualizada, muitos professores promovem
equívocos, no momento em que pretendem intervir nas práticas da sala de aula.
Dessa forma, (re)constroem conceitos muitas vezes não previstos. Tal imprecisão
teórico-prática é denunciada por 77% dos professores que apontaram, no
275
questionário, necessidade de produzir um instrumento teórico-metodológico capaz
de suprir, pelo menos em parte, as inseguranças para o trabalho com a gramática
contextualizada.
É possível inferir, então, que os efeitos acarretados pelos cursos
(principalmente aqueles ministrados por mim), seja em relação às discussões
teóricas, seja em relação às atividades propostas, são efêmeros, transitórios, devido,
principalmente, à superficialidade decorrente da carga horária a eles destinada. Não
creio ser possível em 24 ou 32 horas de curso garantir o conhecimento teórico-
metodológico suficiente para interferir na prática.
A interpretação dos dados comprovou um problema pertinente, porém óbvio,
relacionado ao objeto da pesquisa: os cursos não são suficientes como subsídios
teórico-metodológicos para o ensino Língua Portuguesa dentro da concepção
(sócio)interacionista e, conseqüentemente, do ensino gramatical contextualizado.
Necessitam de retomadas, aprofundamentos, enfim, de continuidade.
A constatação provocou uma outra pesquisa: como garantir a continuidade
das discussões apresentadas nos cursos? De que forma poderia aprofundar tais
discussões teóricas, a ponto de transpô-las para projetos didáticos de ensino da
gramática contextualizada?
A maioria dos informantes da entrevista apontou para uma outra modalidade
de evento efetivada em apenas 17% dos municípios da região Oeste: o grupo de
estudos. Segundo depoimentos apresentados anteriormente, esta modalidade
possibilitaria aprofundar as orientações teóricas apresentadas no curso, criando
situações de reflexão, de troca, de relatos e de produção de atividades.
O grupo de estudos foi eleito pela maior parte dos entrevistados, como uma
proposta capaz de solucionar o problema confirmado pela pesquisa. Todavia, julgo
importante lembrar que, mesmo em se tratando de uma modalidade de formação
continuada, este não foi interpretado como uma complementação, suplência, espaço
de correção das distorções e equívocos da prática pedagógica do professor. Aliás,
nem os cursos foram pensados desta forma. Na realidade, ambos foram tratados
como espaço para reflexão do que, do como, do por que e de para que ensinar,
enfim, da própria formação. A modalidade grupo de estudos eleita pelos informantes
da entrevista foi compreendida como um percurso de formação, cuja trajetória seria
capaz de produzir e consolidar um conhecimento que, aliado à experiência
276
profissional dos participantes, poderia resultar em um saber docente norteador das
opções político-metodológicas e dos rumos profissionais do professor.
Reconhecido e selecionado de tal forma, o próximo capítulo será dedicado ao
relato da experiência de um grupo de estudo levado a efeito.
277
5 GRUPOS DE ESTUDOS: CONSOLIDAÇÃO DE UMA PROPOSTA DE
FORMAÇÃO CONTINUADA
Mestre não é quem ensina; mas quem, de
repente, aprende.
Guimarães Rosa.
É recorrente no discurso de professores, pesquisadores, técnicos e políticos a
necessidade de se investir na continuidade do processo formativo do professor,
tendo em vista as exigências impostas por um mundo globalizado que requer
profissionais qualificados, atendendo aos requisitos contemporâneos. Assim como é
recorrente, também, que o professor deve se manter numa postura constante de
construção e reconstrução do seu próprio conhecimento, tendo em vista as rápidas e
profundas transformações ocorridas em todos os setores da vida humana.
E, nesse sentido, como garantir a continuidade da formação do professor de
forma que ele se torne consciente do papel da escola e de seu papel, neste cenário
de transformações e mudanças de conhecimentos? Em outras palavras: como
envolver decisivamente o professor nesse processo formativo, despertando-lhe para
a incompletude, a provisoriedade do conhecimento científico, reconhecendo que as
“verdades” estão sendo questionadas, assim como a escola, o processo ensino-
aprendizagem e os conteúdos?
Os dados coletados e interpretados revelaram que o investimento em cursos
pontuais, nas diferentes áreas do conhecimento, como é cultural na região Oeste do
Paraná, não tem garantido a conscientização necessária para a formação contínua,
assim como o domínio do conhecimento científico que deveria subsidiar o fazer
pedagógico. É natural que o professor sustente o ensino num saber provisório,
contudo deve ter ciência de que é necessário redimensioná-lo constantemente.
Apostando num estudo contínuo, planejado, sistematizado e organizado a
partir de necessidades previamente elencadas, apresento, neste capítulo, o relato de
uma experiência envolvendo a modalidade de evento elencada pelos entrevistados
como aquela capaz de garantir a continuidade das reflexões iniciadas nos cursos: o
grupo de estudos. Logo, a pretensão é a de defender uma proposta de formação
278
continuada com condições de aliar dois elementos apontados, nos dados, como
necessários aos professores das séries iniciais: o aprofundamento teórico do ensino
gramatical contextualizado e, conseqüentemente, a produção de um instrumento
teórico-metodológico que oriente o trabalho com a língua sob o viés da concepção
(sócio)interacionista da linguagem. Em outras palavras: interagir teoria e prática.
5.1 Implantação da Proposta
Tomando como indicativo os resultados revelados nos questionários (anexos
03 e 05), nas entrevistas (anexo 04) e nas aulas gravadas, considerei a importância
de levar a efeito uma proposta de formação continuada, organizada por meio da
modalidade “grupo de estudos”, indicada, pelos entrevistados, como aquela capaz
de dar continuidade às reflexões iniciadas nos cursos de formação.
Para isso, elaborei, no início de 2006, um projeto de grupo de estudos
intitulado “O ensino da gramática contextualizada: perspectivas de reflexão”,
planejado para 80 horas (8 horas mensais), das quais parte seria destinada ao
aprofundamento teórico das abordagens relativas à linguagem e, mas
especificamente, à gramática, e parte à elaboração de atividades que abordassem a
gramática contextualizada, conforme solicitação dos professores.
Apresentei-o à AMOP órgão de reconhecida credibilidade nos municípios
para garantir maior respaldo à sua concretização
125
. Apostando nos objetivos e nos
prováveis resultados, a AMOP acreditou no Projeto e aceitou a condição de
proponente, viabilizando condições físicas e financeiras para sua concretização.
Para isso, elaborou um outro projeto, acrescentando um investimento
financeiro para cada município interessado e emitiu-o às secretarias municipais de
educação da região, convidando-as a integrar o grupo de estudos que pretendia ser
formado por, no máximo, 25 pessoas. Dos 49 municípios que compõem a região
Oeste, apenas 7 acenaram positivamente ao convite
126
, dispondo-se a investir na
formação de um integrante para o grupo, desde que o mesmo assumisse a
incumbência de coordenar, posteriormente, um outro grupo em seu município. Na
125
O Projeto não foi desenvolvido via Universidade por dois motivos: primeiro porque, na região, a
AMOP tem maior atuação junto aos municípios, no que se refere ao trabalho com o ensino
fundamental séries iniciais; segundo porque, como o projeto previa uma extensa carga horária e
publicação, necessitava de apoio físico e financeiro, o qual teria mais dificuldade em adquirir via
Universidade.
126
Campo Bonito, Itaipulândia, Marechal Cândido Rondon, Maripá, Palotina, Santa Helena e Toledo.
279
realidade, a pretensão, além do aprofundamento teórico e da produção do
instrumento teórico-metodológico, era criar uma cultura de grupos de estudos na
região (assim como dos cursos), estendendo-os, gradativamente, a todos os
municípios, subsidiando-os com sugestões de textos científicos, se necessárias
fossem.
Finalmente o grupo consolidou-se com 10 integrantes, sendo que destes, 03
se dispuseram a arcar com as despesas (de transporte, alimentação, xérox etc.)
para garantir a participação, que seus municípios não se dispuseram a
colaborar
127
, alegando inviabilidade financeira para tal investimento. Essa realidade
confirma que “o professor tem consciência clara da precariedade de sua formação
profissional e reclama o direito de capacitar-se, de aperfeiçoar-se” (ALVES, 1995, p.
59). Entretanto, o sistema oficial de ensino nem sempre oferece, sistematicamente,
situações de aprendizagem que dêem oportunidades para continuar os estudos que
irá mantê-lo atualizado quanto às modificações na área de conhecimento da(s)
disciplina(s) que leciona.
A dificuldade em reunir um número significativo de integrantes para o grupo
revela, ainda, que nem todos os administradores estão conscientes das
necessidades da educação em seus municípios e, como postula Carrascosa (1996),
constantemente estão surgindo novos problemas, conseqüentes do próprio trabalho
na sala de aula, e o professor deve estar preparado para enfrentá-los. No entanto, é
necessários que os professores disponham de formação e atualização permanente,
diversificada e de qualidade, nas quais o município deve investir.
Se a sociedade exige, do professor, determinadas habilidades, competências
e vocação de profissional crítico, criativo, produtor de inovações e idéias, instaurador
de práticas qualitativas, pesquisador de sua própria prática, enfim, de um agente de
mudanças, é preciso investir nesse profissional, garantindo-lhe condições de estudo.
Justificar que tais investimentos acontecem via oferta de cursos pontuais,
direcionados a diferentes áreas do conhecimento, não é suficiente, tendo em vista
sua efemeridade comprovada. É preciso acreditar que:
(...) a formação do professor não se concretiza de uma vez, é um
processo. Não se produz apenas no interior de um grupo, nem se faz
através de um curso, é o resultado de condições históricas. Faz parte
necessária e intrínseca de uma realidade concreta determinada.
127
Cascavel e Guaraniaçu (com 02 integrantes).
280
Realidade essa que não pode ser tomada como uma coisa pronta,
acabada, ou que se repete indefinidamente. É uma realidade que se
faz no cotidiano. É um processo e como tal precisa ser pensado
(FÁVERO, 1981, p. 17).
No contexto da pesquisa, tornar-se-ia inútil se, ao discutir o processo de
formação continuada, desconsiderasse à escola como um espaço cultural, social e
político, tratando o ensino da língua como “transmissão de conhecimentos neutros e
desvinculados do contexto particular de ação” (MAGALHÃES, 2004, p. 60).
Assim, consciente de que o grupo de estudo seria mais uma modalidade de
formação que, acreditava eu, acrescentaria ao conhecimento do professor, mas que
não solucionaria os problemas educacionais da região, investi na coordenação do
grupo, planejado em 10 encontros de 8 horas. Julgava importante comprovar a
eficiência deste evento, desde que planejado e projetado a partir de necessidades
reais, previamente elencadas, como foi o caso.
5.2 Execução da Proposta
Nunes (2000), ao defender sua tese relativa aos sentidos da formação
contínua, constatou que o discurso teórico em defesa da formação continuada dos
professores está assentado em três lógicas articuladas: a lógica acadêmica, a lógica
do trabalho e a lógica economicista.
Nas academias prevalece um discurso centrado na formação, na
profissionalização, nas práticas didático-escolares que afetam, indubitavelmente, o
trabalho do professor, de tal forma que, conforme Nóvoa (1992), a formação
continuada de professores assume importância crucial.
Do outro lado mas não desarticulado da lógica acadêmica está o mundo
do trabalho, propagando alterações tecnológicas, gerenciais e informacionais. Em
decorrência disso, delineiam um formato para os programas de educação
continuada às diversas profissões, inclusive do professor, atribuindo-lhes a função
de manter o profissional informado, inclusive de reprofissionalizá-lo, se for
necessário.
Por último, a lógica da economia que se entrelaça às anteriores, refletindo
sobre os custos-benefícios e as taxas de retorno do investimento, por exemplo, na
educação, mais especificamente, na formação contínua dos professores. Como
explorado nos capítulos iniciais, o grande representante deste cenário é o Banco
281
Mundial (BM) que propõe um maior investimento na capacitação em serviço,
desaconselhando o investimento na formação inicial.
Nos cenários acadêmico/pedagógico, empreendedor e capitalista instaurou-
se o grupo de estudos, fundado sob a hegemonia de tais lógicas que, direta ou
indiretamente, cobrariam, dos integrantes, resultados equivalentes ao investimento.
Se a princípio aparentavam-me como assustadores, posteriormente foram
tomadas como um estímulo à persistência. E nesta ousadia, reuni, pela primeira vez,
as 10 integrantes do grupo
128
(três das quais compuseram o corpus de investigação)
que abraçaram, comigo, aquele desafio. Juntas, discutimos expectativas,
necessidades e, a partir do reconhecimento das responsabilidades impostas,
traçamos, coletivamente, qual seria o percurso do grupo.
Primeiramente, por meio de um questionário aplicado às integrantes, propus
que esclarecessem duas questões: por que o município havia aderido ao Projeto? e
como cada uma foi selecionada, dentre tantos professores de séries iniciais no
município? No que tange à primeira indagação, apresento algumas das respostas
obtidas (as quais, sempre que citadas, serão indicadas por G1 a G10, omitindo-se,
portanto, o nome):
G2 Por desejar fazer parte e estar a par das discussões a respeito desse
assunto enquanto região, por procurar melhorar e aprofundar os
conteúdos relacionados à gramática em língua portuguesa, visando
sempre um ensino de qualidade.
G3 O município aderiu ao projeto porque sente a necessidade de um
trabalho voltado para o verdadeiro uso da Língua, pois é preciso
mostrar como se trabalhar na perspectiva defendida pelas Diretrizes
Curriculares, a qual está em construção pelos municípios da região
Oeste do Paraná, sendo uma forma de garantir a efetivação da
mesma. Além disso, acreditou ser viável porque haverá um retorno
para os alunos em termos de conhecimento uma vez que o
integrante do grupo volta ao município e socializa as atividades com
demais professores, e estes as aplicam em sala de aula.
G5 Por entender que o ensino da língua requer uma análise maior de
como acontece a sua utilização. É preciso conceber o estudo da
linguagem como um processo vivo, portanto, em constante
modificação, conforme os contextos nos quais estão inseridos os
indivíduos que a utilizam. Não basta estudá-la em seus aspectos
128
Alice Rosália Catellan (Marechal Cândido rondon), Claudete Aparecida Simioni (Campo Bonito),
Deise Mirian Velazquez Inácio e Marleide Maria Cardoso (Toledo), Fabiane Moser (Itaipulância),
Lauciane Piovesan e Sara Camargo Barreto de Oliveira (Guaraniaçu), Márcia Roehsig Sponchiado
(Maripá) Margarete Aparecida Nath (Cascavel), Naura Teresinha Kölln Genero (Palotina) e Simone
Ripp Butzge (Santa Helena).
282
isolados, mas no espaço social no qual ela é construída e
modificada. Dessa forma o ensino da língua portuguesa numa
perspectiva textual/discursiva, possibilitará a reflexão e,
consequentemente, a sua aprendizagem e uso dentro de espaços
reais de comunicação, considerando as necessidades, bem como os
gêneros textuais que circulam hoje na sociedade. É preciso ressaltar
também, que os livros didáticos de que dispomos para realizar o
trabalho, não contemplam a língua numa concepção sócio-
interacionista de linguagem, embora se discuta esses pressupostos
há bastante tempo.
G6 Pelo motivo dos professores sempre estarem preocupados e não
terem claro ainda como trabalhar a gramática de uma forma
contextualizada.
G7 Devido às dificuldades que os professores municipais apresentam
em relação ao ensino de gramática e por ser um tema que exige
constante aprimoramento. Não são todos os professores que tem a
mesma opinião sobre o ensino da gramática nas séries iniciais,
necessitando desta forma repensar e rediscutir o tema.
Os depoimentos reafirmaram a necessidade apontada pela maioria dos
professores que constituíram o corpus da pesquisa anterior: a de um estudo mais
aprofundado sobre o ensino gramatical contextualizado, resultando na produção de
um instrumento teórico-metodológico nesta perspectiva. E isso fortalecia ainda mais
a certeza de estar investindo num evento capaz de garantir a continuidade desejada
à formação dos professores.
Ao responder a segunda questão, esclarecendo por que o município as
haviam selecionado para integrar o grupo, as professoras apresentaram justificativas
muito pertinentes, revelando interesses individuais e pedagógicos. Eis algumas
delas:
G1- Como a Secretaria de Educação está sem coordenador na área de
Língua Portuguesa, optou-se pelo meu nome, uma vez que sou
graduada em Letras.
G2- Por estar na secretaria de educação como assessora pedagógica
para a disciplina de Língua Portuguesa e Alfabetização e assim
poder ter mais clareza para poder auxiliar os demais professores.
G3- Estou participando pela necessidade que sinto, enquanto professora
em sala de aula, de realizar um trabalho que atenda as
necessidades de utilização da língua dentro de contextos reais e
significativos, considerando as necessidades desse momento
histórico e, de um trabalho com a linguagem que faça a diferença na
formação de nossos alunos.
283
G4- Porque eu participava, no ano anterior (2005), das capacitações
de Língua Portuguesa, inclusive foi solicitação da nossa turma,
consequentemente, quando o grupo de estudo foi formado, eu fui
indicada por estar a par da situação.
G5- Fui selecionada dentre os professores do município, pelo fato de ser
Representante da área de ngua Portuguesa na equipe de ensino
do município desde 2005.
Como informam os dois últimos depoimentos e conforme relatado no
capítulo 2, a AMOP havia iniciado, em 2005, um projeto de “Consolidação do
Currículo Básico para a Escola Pública Municipal da Região Oeste do Paraná”, no
qual eu, juntamente como outra docente
129
, também da Unioeste, estávamos
inseridas como coordenadoras da área de Língua Portuguesa na produção do
Currículo para as séries iniciais do ensino fundamental. Para sua consecução,
estava envolvido um representante de área de cada município e, coincidentemente,
todas as integrantes do grupo de estudos eram representantes de área e
participavam das discussões do Currículo. Isso fortaleceria o grupo duplamente. Por
tudo isso, as professores decidiram incluir, no rol das discussões e estudos teóricos,
o instrumento que seria adotado, no Currículo, como objeto de estudos da língua: os
gêneros textuais.
Para garantir um melhor planejamento e respectiva execução, o percurso
traçado, pelo grupo, foi de, nos primeiros encontros, concentrar-se nos estudos
teóricos para angariar maiores subsídios à produção de atividades. Nessa direção, o
primeiro encontro, que ocorreu no dia 23 de março de 2006, além das decisões
quanto ao funcionamento do grupo, promoveu a leitura e discussão coletiva dos
capítulos 1 (Objetivos do ensino da língua materna), 2 (Concepção de linguagem) e
3 (concepção de gramática), presentes na obra de Travaglia (1996). Os textos foram
lidos e debatidos, reforçando a concepção de linguagem adotada pelo grupo
(sociointeracionista) e de gramática contextualizada, estimulando a participação de
todos, o que é caractestico desse tipo de evento.
Embora tímidas, de início, as integrantes foram se expondo, falando de suas
dificuldades pessoais em relação aos assuntos abordados e das dificuldades dos
colegas no município. A tentativa era, naquele momento, criar um ambiente de
confiança, onde elas se sentissem seguras para participar. Para isso, tinha que
romper com minha imagem de docente que já havia interferido em outros momentos.
129
Carmem Teresinha Baumgartner.
284
No grupo de estudos, eu seria mais uma colega disposta a somar conhecimentos,
dúvidas, expectativas e, para isso, não estava ali numa condição de superioridade,
mas de igualdade. Essa imagem não se diluiu instantaneamente. Tive que quebrá-la
a cada encontro, revelando minhas limitações e distribuindo responsabilidades.
Além das leituras coletivas, todas concordaram com outras complementares,
as quais seriam realizadas entre um encontro e outro, com a incumbência de discuti-
las posteriormente. Assim, inicialmente os artigos científicos selecionados foram
130
:
“O ensino da produção textual: o saber e o fazer das professoras” (OLIVEIRA, 2001)
e “Gramática: conhecimento e ensino(MOURA NEVES, 2000). Tais artigos foram
selecionados porque, no primeiro, a autora discute a formação dos professores e a
construção do conhecimento numa perspectiva cio-histórica, retomando
conceitos-chave de Vygotsky (1984) e Bakhtin (1988, 1992); no segundo, a ênfase
recai especificamente sobre o ensino da gramática, lembrando que ensinar
eficientemente a língua e, portanto, a gramática é, acima de tudo, propiciar e
conduzir a reflexão sobre o funcionamento da linguagem. Para garantir maior
reflexão, combinamos que cada uma (inclusive eu) produziria um texto síntese das
leituras encaminhadas e que as mesmas seriam retomadas no encontro seguinte.
O segundo encontro aconteceu no dia 17 de abril e iniciou-se retomando as
leituras complementares, quando cada uma expôs sua compreensão e
incompreensão sobre os temas abordados. Nas dúvidas apresentadas, eu sempre
esperava que, primeiramente, alguma colega apresentasse esclarecimentos para,
então, se necessário fosse, dirimi-las. Na seqüência, iniciamos uma discussão sobre
gêneros textuais, um assunto que, na época, não era quase abordado,
principalmente na região, gerando muitas dúvidas e imprecisões teóricas que o
grupo julgou pertinente avaliar, aprofundando e refletindo sobre o tema.
Por outro lado, se era objetivo estudar e apresentar propostas de trabalho
com a gramática contextualizada, era necessário, primeiramente, reconhecer o
contexto no qual ela estaria inserida: o texto, que nada mais é do que a
materialização de um gênero.
Para isso, recorrendo ao aprofundamento teórico que obtive durante as
disciplinas do doutorado, elenquei alguns textos científicos, propondo um percurso
de estudos sobre o assunto, com o qual as integrantes concordaram.
130
As leituras iniciais foram sugeridas por mim. Porém, durante o percurso, as participantes iam
acrescentando outras sugestões.
285
Conseqüentemente, o ponto de partida para o estudo foi Bakhtin (1992), do qual
selecionei, no que se refere aos gêneros do discurso, o capítulo 1 (Problemática e
definição) e 2 (O enunciado, unidade da comunicação verbal). Essa leitura foi
complementada com uma síntese do capítulo 1 (Quadro e questionamento
epistemológicos) de Bronckart (2003). Como se tratavam de textos densos, exigindo
mais tempo para sistematização dos conceitos apresentados, sugeri, como leitura
complementar, o artigo de Marcuschi (2003), no qual o autor também trata da
definição de gêneros.
O terceiro encontro, realizado no dia 05 de maio, iniciou-se com retomadas
das leituras anteriores. No momento, depois de ouvir as indagações das integrantes,
fiz uma exposição recorrendo à compreensão que, até então, tinha sobre o assunto,
na perspectiva de acrescentar maior conhecimento. Levei, ainda, alguns gêneros e,
conjuntamente, refletimos sobre suas propriedades à luz das teorias de Bakhtin
(1992), Bronckart (2003) e Marcuschi (2003). E, para o perder de vista a
concepção de linguagem subjacente à vertente teórica dos gêneros, relembramos a
teoria do desenvolvimento e aprendizagem de Vygotsky (1984) e sua relação com o
dialogismo proposto por Bakhtin (1988, 1992).
Todavia, era preciso pensar numa possibilidade de viabilizar o trabalho com
os gêneros também nas ries iniciais. Os professores da região haviam adotado
o texto como objeto de ensino (pelo menos teoricamente), no entanto, este era
tratado, na maioria das vezes, apenas como pretexto para o ensino da gramática,
para as ações de alfabetização e para o encaminhamento de atividades de leitura e
interpretação. A sócio-história e a função social dos textos dificilmente eram
abordadas. E o grupo concluiu que tal abordagem somente seria ampliada se os
gêneros fossem tomados como objeto de ensino
131
. E daí, como possibilitar essa
transposição?
Conhecedora da obra de Schneuwly e Dolz (2004a), apresentei o livro ao
grupo e propus a leitura de, pelo menos, três de seus artigos: “Gêneros e tipos de
discurso: considerações psicológicas e ontogenéticas” (SCHNEUWLY, 2004),
“Gêneros e progressão em expressão oral e escrita – elementos para reflexões
sobre uma experiência suíça (francófona)” (DOLZ e SCHNEUWLY, 2004) e
131
Nesta fase das discussões, o grupo que participava da elaboração do Currículo também estudava
os gêneros, intensificando, assim, o estudo das integrantes.
286
“Seqüências didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento”
(DOZ, NOVERRAZ e SCHNEUWLY, 2004).
O grupo acatou a sugestão e iniciamos com a leitura do primeiro artigo
apontado, no qual o autor defende a tese de gênero como instrumento para o
trabalho com a linguagem na escola. Para sustentá-la, Schneuwly argumenta que:
A ação discursiva é, portanto, ao menos parcialmente, prefigurada
pelos meios. O conhecimento e a concepção da realidade estão
parcialmente contidos nos meios para agir sobre ela. Tínhamos dito
que o instrumento é um meio de conhecimento: eis a concretização
da minha tese (SCHNEUWLY, 2004, p. 28).
A partir daí, o autor retoma a classificação dos gêneros em primários e
secundários, proposta por Bakhtin (1992) e conclui, apresentando uma definição
para tipos de textos, pautado em Bronckart et al. (1985)
132
e Adam (1992)
133
.
Depois dessa discussão preliminar, o grupo decidiu que leria os dois outros
artigos durante o mês, para discuti-los no próximo encontro.
O quarto encontro ocorreu no dia 05 de junho, retomando a leitura pré-
encaminhada. Cada participante apresentou suas considerações sobre o texto,
destacando dúvidas, enfim, fundamentando suas reflexões. O que o grupo abordou,
em relação ao segundo texto, foi a proposta dos autores de elaboração de um
currículo, sustentado na progressão do conhecimento. Como estava em execução a
elaboração do currículo para as séries iniciais, as integrantes aliaram a proposta de
Dolz e Schneuwly (2004) aos propósitos do ensino na região e argumentaram a
favor, além da elaboração do currículo, da produção um projeto didático-
metodológico de ensino que considerasse, assim como propunham os autores:
(...) uma visão de conjunto dos objetos de ensino e dos objetivos
limitados a atingir em face desses objetos. (...) o problema da
progressão de grupos heterogêneos de alunos trabalhando
conjuntamente. (...) os obstáculos típicos da aprendizagem, nos
diferentes ciclos escolares e no interior desses ciclos, assim como
as novas etapas pelas quais os alunos podem passar, fornecendo
aos professores as grandes orientações de trabalho como
referenciais e hipóteses a adaptar, de acordo com os grupos de
alunos e com as restrições e as situações concretas de ensino. (...)
situações de colaboração entre alunos do mesmo ciclo e/ou de
132
BRONCKART, J.- P.; BAIN, D.; SHNEUWLY, B.; PASQUIER, A e DAVAUD, C. Le fonctionnement
des discourse. Neuchâtel e Paris: Delachaux et Niestlhé, 1985.
133
ADAM, J.-M. Les textes: Types et prototypes. Paris: Nathan, 1992.
287
diferentes ciclos, facilitando uma construção conjunta de novas
capacidades. (...) os instrumentos e as estratégias de intervenção
para transformar as capacidades iniciais apresentadas pelos alunos
(DOLZ e SCHNEUWLY, 2004, p. 48-49).
Para a consolidação de tal pleito, concordou com a proposta de Seqüência
Didática (SD) apresentada por Dolz e Schneuwly (idem, p. 51-55) e sistematizada
por Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p. 95-128), compreendendo, assim como os
autores, que “as seqüências didáticas instauram uma primeira relação entre um
projeto de apropriação de uma prática de linguagem e os instrumentos que facilitam
essa apropriação” (DOLZ e SCHNEUWLY, 2004, p. 51).
Eu, juntamente com as demais integrantes do grupo, estava convencida de
que, ao adotar os gêneros como objeto de ensino e as SD como encaminhamento
metodológico de trabalho com os gêneros, estaríamos criando condições para que
os alunos fossem confrontados com diferentes práticas de linguagem historicamente
construídas, oportunizando a sua reconstrução e a sua apropriação.
E assim, tratamos de analisar e ponderar sobre a proposta de agrupamento
dos gêneros (idem, p. 57-63) e sobre a apresentação de um procedimento de
Seqüência Didática (DOLZ, NOVERRAZ e SCHNEUWLY, 2004, p. 95-128).
Refletimos sobre a estrutura de base de uma SD apresentada pelos autores e nos
comprometemos com tentativa de transpô-la, didaticamente. Além disso, assumimos
o compromisso de classificar gêneros de acordo com a ordem proposta pelos
autores: narrar, relatar, argumentar, expor e descrever ações, interpretando isso
como um exercício que tentaria coligar as proposições teóricas com
encaminhamentos práticos.
Uma vez assumido o desafio, organizei, inicialmente, o seguinte esquema,
para uma melhor compreensão da proposta apresentada pelos autores em relação à
estrutura de uma SD:
1- DEFINIÇÃO
Uma “Seqüência Didática” é um “conjunto de atividades escolares organizadas, de
maneira sistemática, em torno de um gênero textual (oral ou escrito)” (DOLZ,
NOVERRAZ e SCHNEUWLY, 2004, p. 97).
2- FINALIDADE
“Uma Seqüência Didática tem, precisamente, a finalidade de ajudar o aluno a dominar
melhor um gênero de texto, permitindo-lhe, assim, escrever ou falar de uma maneira
mais adequada numa dada situação de comunicação. O trabalho será realizado sobre
gêneros que o aluno não domina ou o faz de maneira insuficiente; sobre aqueles
dificilmente acessíveis, espontaneamente, para a maioria dos alunos; e sobre gêneros
públicos e não privados” (idem, p. 97).
288
3- ESTRUTURA DE BASE DE UMA SD
1. APRESENTAÇÃO DE UMA SITUAÇÃO (necessidade / motivo de produção)
2. SELEÇÃO DO GÊNERO TEXTUAL (tendo em vista o que se quer dizer, para quem,
em que local de circulação...)
3. RECONHECIMENTO DO GÊNERO SELECIONADO (por meio de:)
a) Produção inicial
“Momento em que os alunos tentam elaborar um primeiro texto (oral ou escrito)
e, assim, revelam para si mesmos e para o professor as representações que tem
dessa atividade” (ibidem, p. 101).
b) Módulos de atividades
“Trata-se de trabalhar os problemas que apareceram na primeira produção e de
dar aos alunos os instrumentos necessários para superá-los” (idem, p. 103).
- Que problemas abordar?
a) Representação da situação de comunicação.
“O aluno deve aprender a fazer uma imagem, a mais exata possível, do
destinatário do texto (pais, colegas, a turma...), da finalidade visada
(convencer, divertir, informar), de sua própria posição como autor ou
locutor (ele fala ou escreve como aluno ou representante da turma?) e do
gênero visado” (ibidem, p. 104).
b) Elaboração dos conteúdos.
“O aluno deve conhecer as técnicas para buscar, elaborar ou criar
conteúdos. Essas técnicas diferem muito em função dos gêneros: técnicas
de criatividade, busca sistemática de informações relacionadas ao ensino
de outras matérias, discussões, debates e tomada de notas, citando
apenas as mais importantes” (idem, p. 104). Pesquisa sobre o tema
(assunto) e o gênero.
c) Planejamento do texto.
“O aluno deve estruturar seu texto de acordo com um plano que depende da
finalidade que se deseja atingir ou do destinatário visado; cada gênero é
caracterizado por uma estrutura mais ou menos convencional(ibidem, p.
104). – Ler e analisar outras amostras de texto daquele mesmo gênero.
d) Realização do texto.
“O aluno deve escolher os meios de linguagem mais eficazes para escrever
seu texto: utilizar um vocabulário apropriado a uma dada situação, variar
os tempos verbais em função do tipo e do plano do texto, servir-se de
organizadores textuais para estruturar o texto ou introduzir argumentos”
(idem, p. 104). – Uso dos elementos lingüísticos.
e) Produção final.
Este é o momento que “dá ao aluno a possibilidade de pôr em prática as
noções e os instrumentos elaborados separadamente nos módulos. Essa
produção permite, também, ao professor realizar uma avaliação somativa”
(ibidem, p. 106).
289
Todavia, no momento em que tentei transpor a proposta para a elaboração de
uma SD às séries iniciais, algumas dúvidas me acometeram, as quais levei para o
quinto encontro do grupo, ocorrido no dia 17 de julho: em se tratando de alunos de
1ª, 2ª, e séries, como eram divididas as turmas na região, teriam eles
condições de acompanhar um projeto de ensino de determinado gênero tal como
exposto pelos autores?
A preocupação maior residia em iniciar, com tais alunos, o reconhecimento do
gênero com uma produção inicial, quando sabia de antemão que, na região, não
se tinha por hábito mencionar o gênero para o aluno, mas sempre a tipologia. Os
comandos de produção giravam em torno de “produza um texto narrativo”, “produza
um texto descritivo” e assim por diante.
As demais componentes do grupo entenderam a preocupação e juntas
pensamos numa maneira de adaptar tal proposta à realidade das séries iniciais da
região. A contraproposta organizou-se, finalmente, da seguinte maneira:
1. APRESENTAÇÃO DE UMA SITUAÇÃO (necessidade / motivo de produção).
2. SELEÇÃO DO GÊNERO TEXTUAL (tendo em vista o que se quer dizer, para quem, em
que local de circulação...).
3. RECONHECIMENTO DO GÊNERO SELECIONADO (por meio de:)
a) Pesquisa sobre o gênero.
b) Leitura de textos do gênero, explorando e estabelecendo relações entre:
- sua função social,
- seu conteúdo temático,
- sua estrutura composicional (características, tipologia predominante etc.),
- seu estilo (análise lingüística).
c) Seleção de um texto do gênero para um estudo mais específico:
- de sua função social,
- de seu conteúdo temático,
- de sua estrutura composicional,
- de seu estilo (análise lingüística).
4. PRODUÇÃO DE TEXTO do gênero, tendo em vista a necessidade apresentada.
5. REESCRITA DE TEXTO do gênero produzido, com o objetivo de aproximá-lo, o máximo
possível, de seus “modelos” que circulam socialmente.
6. CIRCULAÇÃO DO GÊNERO, tendo em vista o(s) interlocutor(es) definidos inicialmente.
290
A partir deste esquema, o grupo subdividiu-se em duplas
134
e iniciou-se um
processo de produção de SD, aliando-se ao propósito de criar um instrumento
teórico-metodológico com ênfase à gramática contextualizada. Para auxiliá-las nesta
produção inicial, apresentei uma tentativa de produção de SD para a 4ª série,
explorando o gênero “cartaz”, a qual apresento a seguir:
SEQÜÊNCIA DIDÁTICA – GÊNERO TEXTUAL CARTAZ
Elaborada por: Profa. Ms. Terezinha da Conceição Costa Hübes
UNIOESTE / Cascavel
1- O ponto de partida em um trabalho de LEITURA, PRODUÇÃO E REESCRITA DE
TEXTO organizado por meio de uma Seqüência Didática (SD) pode ser, por
exemplo
, de você, professor(a), estimular a PERCEPÇÃO DE UMA NECESSIDADE
DE INTERAÇÃO, por exemplo, com a comunidade. Trata-se de apresentar aos
alunos uma SITUAÇÃO DE COMUNICAÇÃO que será realizada “verdadeiramente”.
2- Você pode comunicar à turma que está marcada a FESTA JUNINA DA ESCOLA
e que é preciso DIVULGÁ-LA à comunidade. Mas, como fazer isso?
3- Questione os alunos: quais são os textos que circulam com o objetivo de divulgar
alguma coisa, seja para vender um produto, anunciar uma festa, divulgar uma
campanha? Estimule-os a pensarem sobre tais gêneros e apresentarem o nome dos
mesmos, os quais você, professor(a), irá listando no quadro:
Faixa
Cartazes
Panfletos
Folders
Anúncios no rádio
Anúncios na televisão
Convite
Anúncios no jornal
Outdoors
Placas
134
As duplas organizaram-se favorecendo a proximidade entre os municípios, para facilitar o contato
também fora dos encontros do grupo. A princípio, agruparam-se da seguinte forma: 1) Alice Rosália
Catellan (Marechal Cândido rondon) e Claudete Aparecida Simioni (Campo Bonito); 2) Deise Mirian
Velazquez Inácio e Marleide Maria Cardoso (Toledo); 3) Fabiane Moser (Itaipulância) e Simone Ripp
Butzge (Santa Helena); 4) Lauciane Piovesan e Sara Camargo Barreto de Oliveira (Guaraniaçu); 5)
Márcia Roehsig Sponchiado (Maripá); Naura Teresinha Kölln Gênero (Palotina); 6) Margarete
Aparecida Nath (Cascavel) – que preferiu trabalhar sozinha.
Gêneros textuais com objetivos afins
Apresentação da situação
291
4- Converse com seus alunos: Dentre esses, temos que escolher um para divulgar a
nossa festa. Qual deles poderá divulgá-la melhor? Ou seja, qual gênero vocês
acham que pode ser mais lido pela comunidade? Qual chamará mais a atenção da
nossa população? Enfim, professor(a), tente propiciar reflexões que instiguem os
alunos a analisar o CONTEXTO DE CIRCULAÇÃO do gênero que será escolhido. É
importante que eles pensem nos INTERLOCUTORES prováveis para que, a partir
daí, SELECIONEM O GÊNERO que melhor represente aquela situação de uso da
linguagem. Certamente, uns alunos decidirão por um gênero e outros, por outros
gêneros textuais. Nesse caso, oriente para uma escolha democrática, fazendo valer
o voto da maioria.
5- Vamos supor que o gênero escolhido seja CARTAZES para serem fixados em locais
de grande circulação (supermercado, farmácia, igreja, lojas etc.). Nesse caso,
oriente os alunos para que busquem em casa, na comunidade, e tragam para a
escola, outros cartazes para que possam conhecer melhor esse gênero e tenham
algumas amostras que ajudarão na produção do cartaz de divulgação da festa
junina. Trata-se de um momento de PESQUISA do gênero, quando você,
professor(a), poderá também investigar se os alunos realmente reconhecem esse
gênero na sociedade.
6- Além dos textos pesquisados pelos alunos, pesquise também e leve para a sala de
aula algumas amostras do gênero selecionado. Ex.:
Explore a estrutura do gênero, pedindo aos alunos que listem aquilo que eles têm
em comum (papel, tamanho, colorido, letras grandes, imagens, enunciados curtos e
objetivos etc.).
Seleção do gênero textual
Pesquisa sobre o gênero
“Modelo(s)” do gênero
292
7- Selecione, dentre eles, um texto para que seja explorado mais especificamente.
Elabore questões que provoquem a leitura e interpretação do gênero lido. Ex.
1. Observe, no texto, a palavra AERÓDROMO. Você sabe o que ela
significa? Pesquise no dicionário o seu significado.
__________________________________________________
__________________________________________________
2. A palavra AERÓDROMO é formada por duas palavras:
Leitura e interpretação de texto
AÉREO (= pelo ar, por avião) + DROMO (lugar para correr)
293
Segundo a Gramática Normativa (GN), essa formação de palavras na
língua portuguesa é chamada de Composição, ou seja, junção de
dois radicais (= núcleos de palavras).
a) Pesquise no dicionário e explique o que significa:
- autódromo: ______________________________________
- cartódromo: ______________________________________
- hipódromo: ______________________________________
- velódromo: _______________________________________
b) Quais palavras que se juntaram para formar as palavras acima?
____________________________________________________
____________________________________________________
3. Observe, no texto ainda, a palavra PILOTAÇO. Com que sentido ela
foi empregada? ______________________________________
_________________________________________________
4. Essa palavra, segundo a Gramática Normativa, é chamada de
derivada, porque ela tem origem em uma outra palavra. Qual?
_________________________________________________
_________________________________________________
5. Observe, portanto, a composição desta palavra, de acordo com a
gramática:
6. Junte as palavras com os sufixos apresentados abaixo e verifique
que outras palavras você pode formar:
a) ric(o) + aço = __________________________________
b) animal + aço = _________________________________
c) pared(e) + ão = ________________________________
d) barb(a) + aça = ________________________________
e) dent(e) + uça = ________________________________
f) boc(a) + arra = _________________________________
PILOT(O) + AÇO = PILOTAÇO
substantivo sufixo
substantivo
primitivo derivado
Substantivo
: palavras que nomeamos os seres em geral;
Substantivo primitivo: palavras que não se formam de nenhuma
outra e que servem de base para a formação de outras palavras;
Substantivo derivado: palavras formadas a partir de substantivos
primitivos;
Sufixo: partes que se juntam ao final de uma palavra para formar,
assim, uma nova palavra, com outro significado.
294
7. Releia as palavras que você formou na atividade anterior. O sufixo
acrescentado a cada uma dela garantiu um significado comum a
todas. Que significado é esse? É esse o mesmo significado que
“aço” atribuiu à palavra “piloto”? ________________________
__________________________________________________
__________________________________________________
8. Localize, no texto, as seguintes informações:
- Tipo de evento: ____________________________________
- Local: ___________________________________________
- Data do evento: ___________________________________
- Forma de inscrição: ________________________________
- Data da inscrição: __________________________________
- Telefone para contato: ______________________________
- Patrocinadores:____________________________________
9. Ainda em relação ao cartaz, pense e responda:
- Para quem foi dirigido esse texto? _____________________
- Com que objetivo ele foi produzido?____________________
- Quando ele foi produzido? ___________________________
- Quem o produziu?__________________________________
- Que recursos usaram para chamar a atenção dos leitores? _
10. Após a leitura e as atividades que nos ajudaram a entender o texto,
pense agora no CARTAZ que iremos produzir e responda:
- Para quem será dirigido? ____________________________
- O que iremos divulgar?______________________________
- Com que objetivo? _________________________________
- Quando será a festa que iremos divulgar? _______________
- Qual o seu horário de início? _________________________
- Que atrações ela terá? ______________________________
- Que recursos utilizaremos para tornar o texto mais atrativo?_
- Qual será o suporte de circulação do texto: cartolina, papel graft,
sulfite...?_________________________________________
- Onde fixaremos os textos produzidos?__________________
- Quem serão os autores?
(divisão da turma em grupos organizados por você, professor(a))
8) Para a produção escrita do gênero, você, professor(a), poderá organizar os alunos
em grupos, tendo o cuidado de formar equipes heterogêneas, nas quais alunos
mais experientes poderão relacionar-se com aqueles menos experientes,
favorecendo uma relação de mediação. Feita a divisão, inicia-se o processo de
produção escrita.
Primeira produção: esse é um momento de revelação, quando os alunos,
ao tentar elaborar um primeiro cartaz, revelam para si mesmos e para o
professor as representações que têm dessa atividade. Portanto, nesse
primeiro momento, oriente para que apenas apresentem um esboço, um
rascunho do texto que pretendem produzir e que, sendo assim, jamais
constituirá já num texto pronto. Mesmo assim, quando apresentarem essa
Produção e reescrita de textos
295
etapa concluída, recolha os textos e guarde-os para serem retomados em
outro momento (de preferência no dia seguinte). Isso fará com que os alunos
se distanciem do texto, facilitando, dessa forma, a reescrita do mesmo.
Segunda produção primeira reescrita: ao retornar à atividade, devolva
os textos (rascunhos) para cada grupo e oriente para a leitura do mesmo,
que poderá ser feita pelo próprio grupo e também por outros grupos. Nessa
leitura, peça que fiquem atentos às informações essenciais e à escrita:
divulga adequadamente o evento? As informações essenciais (data, local,
horário etc.) estão presentes? As informações estão distribuídas
adequadamente, de forma que chame a atenção do interlocutor? Além disso,
oriente para a verificação da ortografia das palavras, da pontuação, da
concordância etc. Você, professor(a), também poderá participar dessa
leitura, dirigindo-se a cada grupo. Somente após esse momento de revisão é
que deverão iniciar a produção. Esta deve aproximar-se o máximo possível
da versão final. Portanto, poderão optar por transcrevê-lo no suporte
escolhido ou ainda utilizar papel rascunho. Terminada a segunda produção,
a correção deve ser feita, nesse momento, por você, professor(a), que
deverá orientar para o uso adequado da língua.
Terceira produção segunda reescrita: consiste na produção final do
texto em seu suporte de circulação. Porém, caso algum grupo ainda não
adequou a escrita a sua função de uso, deve ser orientado para uma quarta
reescrita. É importante que os alunos entendam a funcionalidade da língua e
coloquem-se como autores do texto produzido, garantindo-lhe objetividade,
clareza e correção. Portanto, não deverão esquecer de assinar os cartazes.
9) Esse é o momento de tornar público o texto produzido. Para isso, organize-se para
que os grupos distribuam os cartazes, de acordo com os locais pré-estabelecidos. E
observe, nesse momento, professor(a), a satisfação de seus alunos, pois acabam
de realizar uma atividade que mostra realmente a funcionalidade do ensino da
língua portuguesa. Acreditamos que um ensino norteado por essa concepção de
língua e linguagem, além de favorecer a aprendizagem, terá mais condições de
seduzir o aluno para a aprendizagem tanto da leitura, quanto da gramática e da
produção e reescrita de texto. Apostamos nisso.
Elaborada em maio de 2006.
Refletindo sobre o modelo exposto, o grupo apresentou considerações,
reorganizou algumas atividades, enriquecendo a SD. Depois de reformulada, uma
integrante do grupo
135
se dispôs a levá-la a campo, a fim de que pudéssemos
verificar sua funcionalidade, afinal, antes de investirmos num propósito,
precisávamos certificar de seus possíveis resultados. Três professoras de séries
de seu município se comprometeram a trabalhar com o gênero proposto, depois que
135
Professora Claudete Aparecida Simioni, do município de Campo Bonito.
Circulação do gênero na sociedade
296
a integrante expôs o que era e como deveria ser organizada e trabalhada uma SD
em torno de determinado gênero textual.
Interessante destacar, do processo de execução na sala de aula, a maneira
como a proposta foi interpretada: uma professora trabalhou-a em três dias, a outra
durante uma semana e a terceira, durante 30 dias. A professora que trabalhou
apenas em 3 dias, desconsiderou a fase de reconhecimento do gênero, partindo
direto para a produção e o primeiro cartaz produzido foi divulgado, apresentando,
naturalmente, inúmeras incorreções. A segunda professora, durante a semana de
trabalho com o gênero, explorou mais as atividades e não enfatizou tanto a
produção escrita, prejudicando, também, a qualidade dos cartazes produzidos. a
terceira estendeu o trabalho por mais tempo porque executou-o passo a passo e
valorizou o momento da produção escrita, conduzindo a revisão do texto quantas
vezes julgou necessária. Os cartazes produzidos demonstram, em parte, o
envolvimento dos alunos no processo.
Conforme relato da integrante que acompanhou as professoras, o
envolvimento desta última turma de alunos foi fantástico. Eles se sentiram
responsáveis pelo sucesso da festa. Por isso, envolveram-se inteiramente com o
processo de estudo e produção de textos do gênero, compreendendo o real
significado da escrita naquela situação de interlocução. Tanto que espalharam,
pessoalmente, os cartazes pela cidade (cf. fotos – anexo 16).
O que diferenciou os encaminhamentos e resultados, obviamente foram as
compreensões/assimilações e comprometimento das professoras ao repassar, aos
alunos, a funcionalidade do gênero naquela necessidade real. Isso serviu para
alertar-nos de que, apenas a produção de SDs não garantiria o tratamento
adequado com a língua. Era necessário, antes de tudo, conhecimento dos gêneros,
da concepção de linguagem e, acima de tudo, disponibilidade para aderir à proposta.
Conscientes dos possíveis descaminhos, o grupo optou por continuar com a
produção. E, como haviam se distribuído em duplas, o momento seguinte foi de
decisão sobre quais gêneros seriam explorados nas SDs e em relação a quais
séries. Como desejava atender todas as séries, nesse primeiro momento de
produção de um instrumento teórico-metodológico, o grupo decidiu por elaborar SDs
para cada série, porém, com maior ênfase para a 3ª e 4ª.
Assim, optou pelo trabalho com os seguintes gêneros e séries:
297
Elaborador(es) Gênero textual Ano/série
136
a. Terezinha da Conceição Costa Hübes
(Cascavel)
Lista de compras 1º ano ou 1ª
série
2. Deise Mirian Velazquez Inácio e Marleide
Maria Cardoso (Toledo)
Rótulo 1º ano ou 1ª
série
3. Márcia Roehsig Sponchiado (Maripá) e
Naura Terezinha Kölln Gênero (Palotina)
Adivinha 1º ano ou 1ª
série
4. Deise Mirian Velazquez Inácio e Marleide
Maria Cardoso (Toledo)
Conto de fada 2º ano ou 2ª
série
5. Deise Mirian Velazquez Inácio e Marleide
Maria Cardoso (Toledo)
Receita culinária 2º ano ou 2ª
série
6. Alice Rosália Catellan (Mal. Cândido
Rondon) e Claudete Aparecida Simioni
(Campo Bonito)
Cartum 3º ano ou 3ª
série
7. Alice Rosália Catellan (Mal. Cândido
Rondon) e Claudete Aparecida Simioni
(Campo Bonito)
Fábula 3º ano ou 3ª
série
8. Fabiane Moser (Itaipulândia) e Simone Ripp
Butzge (Santa Helena)
Lenda 4º ano ou 3ª
série
9. Margarete Aparecida Nath (Cascavel) Poema 4º ano ou 3ª
série
10. Lauciane Piovesan e Sara Camargo Barreto
de Oliveira (Guaraniaçu)
Carta familiar 4º ano ou 3ª
série
11. Lauciane Piovesan e Sara Camargo Barreto
de Oliveira (Guaraniaçu)
Seminário 4º ano ou 3ª
série
12. Margarete Aparecida Nath (Cascavel) Resenha crítica 5º ano ou 4ª
série
13. Margarete Aparecida Nath (Cascavel) Artigo de opinião 5º ano ou 4ª
série
14. Fabiane Moser (Itaipulândia) e Simone Ripp
Butzge (Santa Helena)
Biografia/autobiografia
5º ano ou 4ª
série
15. Lauciane Piovesan e Sara Camargo Barreto
de Oliveira (Guaraniaçu)
Carta do leitor 5º ano ou 4ª
série
Para a produção das SDs, a princípio o grupo definiu que aconteceria nos
próximos encontros, pois ainda havia mais 4 planejados. Porém, cada integrante,
durante o mês, pensaria em encaminhamentos, selecionaria textos do gênero, para
facilitar o trabalho durante o encontro do grupo.
Uma outra importante decisão foi quanto ao interlocutor, ou seja, para quem
seriam produzidas as SDs? Com quem o grupo estaria dialogando: com o(a)
professor(a) ou com o(s) aluno(a)? E ainda: como seriam organizadas? Como a
intenção era produzir um instrumento teórico-metodológico, primeiramente optou-se
por dialogar com o(a) professor(a), com sugestões de atividades as quais poderiam
136
Como estava em discussão o Ensino Fundamental de 09 anos, alterando de série para ano, o
grupo optou por indicar o ano e a série para os quais foram produzidas as SD.
298
ser transpostas aos alunos. E, como o objetivo era o de não perder de vista a teoria,
tentaria aliar, aos encaminhamentos práticos, as orientações teóricas.
Assim, no sexto encontro, realizado no dia 23 de agosto, as integrantes
iniciaram definitivamente a produção das SDs. Conforme iam produzindo,
socializavam com o grupo os encaminhamentos e cada uma colaborava com
sugestões. Esse momento foi muito rico, criando uma cumplicidade e, mesmo que
cada dupla ou integrante fosse responsável por apresentar propostas de trabalho
com determinados gêneros, a coletividade predominou. Todas se sentiam
responsáveis o pela sua produção, mas também pelas das outras colegas. O
meu papel, no contexto, além de produzir também, era de leitora das propostas
organizadas, alinhavando idéias, sugerindo alterações, indicando materiais para
pesquisa, enfim, dando suporte às elaboradoras.
Sempre retomando a base teórica dos gêneros, os encontros que se
seguiram o timo, no dia 14 de setembro, o oitavo, em 20 de outubro e o nono,
no dia 22 de novembro foram de intensas produções, socializações e
contribuições. Naqueles momentos de estudos e de reflexões, entendi o sentido real
da formação continuada definida por Alarcão:
(...) a formação continuada deve visar ao desenvolvimento das
potencialidades profissionais de cada um, a que não é alheio o
desenvolvimento de si próprio como pessoa. Ocorrendo na
continuidade da formação inicial, deve desenrolar-se em estreita
ligação com o desempenho da prática educativa (ALARCÃO, 1998,
p. 106).
As pessoas que compunham aquele grupo de estudos eram professoras
conscientes da necessidade de (re)organização do conhecimento, das suas
potencialidades, porém, sentindo-se responsáveis também pelos colegas,
esforçavam-se por traduzir as experiências teóricas em práticas que favorecessem o
desempenho educativo.
Aquelas professoras que se apresentaram, inicialmente, tímidas e inseguras,
transformaram-se potencialmente e o perfil que as delineava era de ousadia,
confiança, desenvoltura e segurança, porém cientes da responsabilidade assumida
e de suas limitações.
O grupo não queria apenas apresentar, aos colegas professores, propostas
que fossem tomadas simplesmente como “receitas”. A intenção era provocar
reflexões e fazê-los tomar decisões, tendo em vista o contexto de ensino de cada
299
um. Entendia que as ações da sala de aula deveriam ser interpretadas e discutidas
com base nas experiências vividas e nos contextos escolares. Por isso, as atitudes
do professor, em relação às escolhas didáticas como, por exemplo, na seleção de
material e/ou de atividades, deveriam ocorrer “...em função de quem fala e de quem
ouve, de quem sabe e de quem não sabe, em resumo, no currículo enfocado de
fato” (MAGALHÃES, 2004, p. 62).
Por conseguinte, o grupo não tinha, em hipótese alguma, a pretensão de cair
no outro extremo, com um foco excessivo na discussão e transmissão de teorias
isoladas da compreensão da prática de sala de aula e do contexto particular de
ação. Estava consciente de que propostas assim encaminhadas o garantem, ao
professor, uma base para refletir sobre as escolhas feitas e seu(s) significado(s) em
relação aos objetivos propostos e à aprendizagem dos alunos. O importante era criar
contextos nos quais refletissem sobre o significado político das práticas e dos
interesses que embasam suas escolhas e ações.
O grupo estava consciente de que:
O conhecimento do professor não é meramente acadêmico,
racional, feito de factos e teorias, como também não é um
conhecimento feito de experiência. É um saber que consiste em
gerir a informação disponível e adequá-la estrategicamente ao
contexto da situação formativa em que, em cada instante, se situa,
sem perder de vista os objectivos traçados. É um saber agir em
situação. (...) o professor tem de ser um homem ou uma mulher de
cultura, ser pensante e crítico, com responsabilidades sociais no
nível da construção e do desenvolvimento da sociedade (ALARCÃO,
1998, p. 104).
Nessa perspectiva, as integrantes delinearam uma proposta teórico-
metodológica de ensino, alinhavada no último encontro, 15 de dezembro de 2006,
organizada com 15 seqüências didáticas. O propósito era de atender as solicitações
apresentadas na pesquisa, relativas à produção de encaminhamentos didáticos para
o trabalho com a gramática contextualizada na série. Contudo, o enfoque foi
ampliado, propondo algumas transposições didáticas de trabalho com os gêneros
textuais, pautadas em Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004), explorando conteúdos da
Língua Portuguesa de 1º ano/série a ano/4ª série, dentre os quais, os da
gramática.
Dessa maneira, o propósito inicial de formar um grupo de estudos que, uma
vez preocupado com reflexões sobre o ensino da gramática contextualizada, seria
300
capaz de propor um projeto didático de ensino sobre o assunto, havia se
concretizado em um projeto ainda mais amplo. Em vez de apenas refletir sobre a
gramática, foi necessário estudar o seu contexto e, ao elaborar a proposta didática,
garantir conhecimentos sobre esse contexto, no caso, os gêneros textuais.
Então, era preciso definir a formatação do instrumento teórico-metodológico
produzido. Como queria garantir a prática aliada à teoria, o grupo optou por reunir as
SDs num Caderno Pedagógico, organizado, inicialmente, com uma breve
fundamentação da concepção (sócio)interacionista da linguagem, seguida da
teorização dos gêneros textuais, da tipologia e da seqüência didática.
Posteriormente, apresentaria as SDs desenvolvidas, organizadas a partir do
ano/série até ano/4ª série. Como coordenadora do grupo, responsabilizei-me pela
correção e formatação final do Caderno.
A seguir, apresento, como amostragem, produções do grupo, destacando
duas, uma de e outra de série. Na leitura e análise das propostas, é pertinente
considerar que seus autores o professoras das séries iniciais, licenciadas em
diferentes áreas, com uma carga horária mínima de 40 horas semanais, sem
dedicação exclusiva para o estudo e a pesquisa e que, inicialmente, não tinham
maiores conhecimentos sobre gêneros e gramática contextualizada.
O que representam nas produções é, por um lado, resultado das muitas
leituras e reflexões propiciadas pelo grupo, as quais serviram de alicerce para
aprofundar conhecimentos. Por outro lado, são revelações das experiências sócio-
historicamente acumuladas na interação professor/aluno, professor/escola,
professor/professor em contextos politicamente definidos.
5.3 Resultados Concretos do Grupo de Estudos
Conforme descrição anterior, o Caderno Pedagógico, intitulado Seqüência
Didática: uma proposta para o ensino da ngua Portuguesa nas séries iniciais,
constituiu-se de duas partes: uma teórica e outra de encaminhamentos didático-
metodológicos de trabalho com os gêneros e, inserida no reconhecimento e análise
deste, a gramática contextualizada.
Se “(...) é importante investir na produção de material didático, criando linhas
de pesquisa que possibilitem a elaboração de materiais mais compatíveis sobre o
301
que se sabe hoje sobre a linguagem e o seu funcionamento” (NÓBREGA, 2002, p.
84), o grupo ousou nesta direção.
À gramática, foi dado um tratamento especial, que é estudá-la no próprio
exercício da linguagem. “... o lugar de observação desse uso são os produtos que
temos disponíveis falados e escritos mas é, também, a própria atividade
lingüística de que participamos, isto é, a produção e a recepção, afinal, a interação”
(MOURA NEVES, 2002, p. 73). A gramática produz sentidos numa dada situação
interativa.
Assim compreendida, é que a gramática será focalizada dentro dos gêneros
textuais. Com isso, não estou garantindo que o grupo conseguiu abordá-la em todas
as suas perspectivas, satisfatoriamente. Na realidade, a tentativa foi de não perder
de vista o texto e, conseqüentemente, o gênero, para não incorrer em exercícios
pretextos para o ensino da gramática descontextualizada. Entretanto, como é um
percurso inicial, seria natural a ocorrência de equívocos, os quais o grupo se propõe
a discutir e acatar sugestões.
5.3.1 A produção do instrumento teórico-metodológico
A título de amostragem do material produzido pelo grupo, recorto, do Caderno
Pedagógico 01, duas SD: uma de e outra de série. A opção pela seleção das
duas foi no sentido de expor como a gramática foi abordada em textos dos gêneros
explorados.
Ressalto que, obviamente, em se tratando de SD, a gramática é apenas um
dos aspectos abordados. Em todo o trabalho proposto, as autoras se preocuparam
em amparar-se às situações de leitura, de fala e de escrita, ou seja, em aspectos
significativos para o aluno, definidos por objetivo(s), o(s) qual(is) deve(m) ser
esclarecido(s) pelo professor, inicialmente.
A primeira SD é com o gênero textual “carta familiar”, produzida por Lauciane
Piovesan e Sara Camargo Barreto de Oliveira, do município de Guaraniaçu. As
duas, em 2006, eram professoras de séries e, portanto, fizeram questão de levar
a efeito, com seus alunos, a proposta produzida.
A partir do encaminhamento na sala de aula, readequaram alguns enunciados
e concluíram-na, tal qual apresentada na página seguinte e publicada em Costa-
Hübes (2007, p. 104-113):
302
1- APRESENTAÇÃO DA SITUAÇÃO E SELEÇÃO DO GÊNERO TEXTUAL
Professor(a):
Inicie esta SD lembrando aos alunos que o ser humano tem, como
característica fundamental, a necessidade de viver em sociedade. A maneira
como ele sobrevive neste contexto está relacionada aos costumes, às
diferentes culturas e às atividades variadas, tudo na busca da interação com o outro.
Para promover essa interação, temos as diferentes formas de linguagem, que
garante a comunicação entre os seres humanos.
Essa comunicação pode ocorrer de variadas formas, de acordo com o tempo, espaço
e necessidades vigentes, seguindo uma formatação adequada a cada situação ou
propósitos comunicativos. E uma das formas de interação com outra pessoa, mesmo que
esteja distante, é a CARTA.
Nesse sentido, questione aos alunos:
a) O que é uma carta?
b) Quem é que já viu uma carta? Onde? Quando?
c) Quem é que escreve cartas em nossos dias de hoje?
d) Para quem é que escrevemos cartas?
e) Em que situações são necessárias a produção de cartas?
f) Como é que a carta chega até a pessoa que desejamos? Sempre foi assim?
g) E vocês, já produziram cartas? Para quem? Em que situação?
h) Que tipos de cartas vocês conhecem?
Dentre todas as cartas que existem e circulam em nossa sociedade, informe que, neste
momento, você, professor(a), irá trabalhar com os alunos apenas uma delas: a CARTA
SEQÜÊNCIA DIDÁTICA 10
GÊNERO TEXTUAL “CARTA FAMILIAR”
(4º ano ou 3ª série)
Conversa com o (a) professor(a)
Conversa com o (a) professor(a)Conversa com o (a) professor(a)
Conversa com o (a) professor(a)
Professor(a):
Lembrar aos alunos, neste momento, que a carta, seja para qualquer propósito, possui
sua funcionalidade e transita pelos mais diversos campos de atividades, quais sejam: nos
negócios, nas relações pessoais, nos departamentos públicos, nas mais variadas formas
de trabalho. Dessa diversidade de funções, derivam seus sub-gêneros: CARTA DE
SOLICITAÇÃO, CARTA DE RECLAMAÇÕES, CARTA DE AGRADECIMENTOS, CARTA
FAMILIAR, CARTA AO LEITOR, CARTA DO LEITOR, CARTA COMERCIAL, DENTRE
OUTRAS.
Tais cartas podem veicular nos mais diversos suportes como: revistas, jornais, livros,
manuais, murais, envelopes, dentre outros.
Sabendo que a escola contribui para o uso adequado da Língua, faz-se necessário
promover práticas de escrita de CARTAS, a fim de que os educandos saibam utilizar-se
desse gênero (e seus sub-gêneros) em benefício próprio.
303
FAMILIAR, a qual tem por finalidade a INTERAÇÃO com um interlocutor distante, com o
objetivo de informar, fazer um convite, agradecer, aconselhar, solicitar, reclamar, sugerir,
dentre outros, de forma a contemplar a NECESSIDADE do momento.
Sabendo, portanto, que nem sempre podemos estar juntos das pessoas de quem
gostamos (avós, tios, primos, amigos, padrinhos....), faz-se necessário conhecermos melhor
este gênero para podermos nos utilizar dele sempre que necessitarmos.
Por isso, vamos pensar:
- Quem de nossa família (avós, tios, primos...) ou amigos de nossa família que mora
longe (em outra cidade ou outro estado) para quem gostaríamos de escrever?
- Cada um de vocês pense nesta pessoa e, chegando em casa, peça à mãe (ou pai,
irmão...) o endereço dela, pois, depois de conhecermos melhor o que é uma
CARTA FAMILIAR, vocês irão escrever uma carta a esta pessoa distante.
2- RECONHECIMENTO DO GÊNERO TEXTUAL “CARTA FAMILIAR”
Professor(a):
Solicite aos seus alunos que tragam, para a sala de aula, textos do gênero CARTA
(sejam elas: carta familiar, carta de solicitação, carta de reclamação, carta comercial ou
entre outras). Converse com seus alunos sobre as diferenças e semelhanças existentes
entre elas, enfocando, principalmente, a linguagem.
2.1- Gêneros textuais com objetivos afins
Questione, ainda, aos alunos, quais são os outros meios que estão sendo utilizados
hoje, talvez em substituição à carta, para interagir com pessoas distantes. Citar, então:
E-mail;
Messenger (MSN);
Mensagem de celular;
Bilhete;
Telegrama;
Cartas;
Telefonema, dentre outros.
Além dos textos levados pelos alunos, fale (e/ou disponibilize) textos desses outros
gêneros, a fim de que os alunos possam compará-los.
Explore a função social de cada um, seu veículo de circulação, relacionando-os com
os avanços tecnológicos da modernidade, refletindo sobre os benefícios (ou prejuízos) que
trouxeram para a interação humana.
2.2- Pesquisa sobre o gênero
Conversar com os alunos sobre o que é uma carta familiar,salientando a sua
característica primordial que é a marca da aproximação entre autor (remetente)
e interlocutor (destinatário). Para isso, é importante, professor(a), que vo
traga, para a sala de aula (e solicite para que os alunos também tragam), várias
cartas familiares (se possível, trazer cartas de outras épocas para analisar a
mudança de linguagem). Explore as cartas levadas, pedindo aos alunos que
listem as diferenças e as semelhanças entre elas, quanto a:
- emissor
- destinatário
- local e data
304
- vocativo
- desenvolvimento da carta (linguagem formal ou informal? Tem gírias? É uma carta
contemporânea?)
- despedida
- objetivo de cada uma
- tipologia predominante
2.3- Leitura de textos do gênero
Professor(a):
Paralelo à leitura das cartas (trazidas pelos alunos ou por você, professor(a)), fale da
sócio-história do gênero, ou seja, como eram escritas e lidas as cartas, antigamente, tendo
em vista que a grande maioria das pessoas não sabiam ler nem escrever, quem é que
escreviam essas cartas, como elas eram enviadas.
A seguir, apresentamos alguns modelos de CARTA FAMILIAR, sendo a primeira,
parte de uma carta mais atual (1993), e a segunda, parte de uma carta muito antiga, datada
de 1930. Vejamos:
Uma sugestão, para explorar melhor a sócio-história do gênero, é assistir, com os alunos,
o filme: “Central do Brasil”, com Fernanda Montenegro, o qual explora muito bem o
tempo em que muitas pessoas recorriam a outras para escrever-lhes cartas que seriam
enviadas, posteriormente, a parentes distantes.
305
Tendo em vista estes dois modelos (ou outros trazidos por você ou pelos alunos),
questione:
Quem escreveu estas duas cartas? É possível saber?
Para quem elas foram produzidas?
Por que elas foram produzidas?
Quando?
Onde?
Qual o assunto da primeira carta?
306
Qual o assunto da segunda carta?
Há diferença de linguagem entre a primeira e segunda carta? Por quê?
Que palavras da primeira carta não usamos (ou escrevemos) mais da mesma
forma hoje?
Qual das cartas citadas possibilita uma maior aproximação entre remetente e
destinatário?
Qual a estrutura da carta, ou seja, que elementos ela deve apresentar?
2.4- Seleção de um texto do gênero
Após essa análise das cartas trazidas por você e pelos alunos, escolher UMA para
que seja explorada em vários aspectos.
Nesta SD, foi escolhida a carta de uma aluna de série que escreveu para uma
das componentes da banda mexicana – RBD.
A título de informação, apresentaremos algumas informações acerca do contexto de
produção dessa carta. Em função da comoção sentida pelas pessoas perante seus ídolos,
sejam eles artistas ligados à música, às Artes Plástica e Cênicas, à literatura ou até mesmo
aos esportes, muitas vezes, crianças, adolescentes e até mesmo adultos sentem
necessidade de exprimir os seus sentimentos (admiração, respeito), nesse caso específico
para Anahí, que é uma dos membros da banda.
Perceberemos, nesta carta, que a menina gosta tanto da cantora que trata-a como
uma amiga íntima, características estas reveladas no gênero CARTA FAMILIAR escolhido
por ela para interagir com seu ídolo.
Conversa c
Conversa cConversa c
Conversa com o (a) professor(a)
om o (a) professor(a)om o (a) professor(a)
om o (a) professor(a)
Professor(a):
Tendo em vista este último questionamento, explore, com os alunos, a partir dos modelos
de cartas trazidas pelos alunos (e outros apresentados por você), qual é a estrutura de
uma CARTA FAMILIAR.
Fale-lhes do cabeçalho (que indica a cidade e a data), vocativo (saudação),
desenvolvimento (corpo da carta), despedida (quando o autor despede-se de seu
interlocutor) e assinatura (do autor).
De preferência, mostre-lhes uma carta, em transparência, apontando essas partes, a fim
de que visualizem a estrutura.
307
ATIVIDADES PARA O ALUNO
Leitura e compreensão
1- Identifique, dentro do gênero carta, as seguintes informações:
a) cabeçalho (local e data);
b) vocativo;
c) destinatário;
d) corpo da carta;
e) despedida;
f) assinatura.
2) Ainda em relação à carta, responda às seguintes questões:
a) A quem se dirige essa carta?
b) Qual era o objetivo da autora ao escrever essa carta?
c) Que recursos ela utilizou para reforçar a idéia a que propôs ao escrever a carta?
308
d) É possível afirmar, lendo a carta, que a Mídia exerce uma influência muito grande
sobre as pessoas? Por quê?
e) De que recursos a dia se utiliza para “recrutar” tantos fãs em todo o mundo, como
é o caso da banda RBD?
f) E você, conhece essa banda? Gosta dela? Por quê?
g) Você também tem um ídolo? Quem é? Por quê?
Atividades de análise lingüística
1- Observe, no texto, a expressão “Querida Anahí”. Ao utilizá-la a autora da carta apresenta
um certo grau de intimidade com a interlocutora. Por que, se nem se conhecem
pessoalmente?
2- Transcreva o parágrafo em que a autora contradiz esse tom de intimidade inicial.
3- Leia o trecho abaixo retirado da carta. Depois, faça o que se pede.
Querida Anahí”.
Olá! Meu nome é Carolina. Tenho 10 anos e sou sua fã, talvez a n° 1 ”.
a) A palavra destacada está se referindo a quem?
4- “Assisto a novela Rebelde todos os dias. Curto muito a novela Rebelde”.
a) Que palavras se repetem no trecho acima?
b) De que maneira a autora do texto escreveu, para não repetir essas palavras?
5- Que outras palavras presentes no texto têm por objetivo substituir nomes, evitando,
assim, repetições? Cite, pelo menos, cinco delas.
6- Observe os seguintes trechos da carta, analisando as palavras destacadas. Após, volte
ao texto e aponte a quem ou a que estes termos se referem:
a) “...Sei cantá-las bem certinho...”
b) “Gostaria de vê-los ao vivo...”
c) “...e a gravata por dentro dela...”
d) “Adoro a armação de suas saias.
As expressões destacadas na atividade 6 servem ao propósito de substituir nomes,
evitando, assim, a repetição de palavras.
Elas são denominadas, pela Gramática Normativa, de PRONOMES.
PRONOMES são palavras que substituem ou acompanham nomes (substantivos),
indicando a pessoa correspondente do discurso e outras idéias como: posse (meu, tua,
nosso, seu, etc.), apontamentos (este, esse, aquela, isto, isso, aquilo), falar dos seres de
maneira indefinida (alguém, ninguém, pouco muito, todo, tudo,etc.). Essas palavras
também podem indicar masculino e feminino, singular e plural.
Alguns pronomes são usados apenas para indicar as pessoas do discurso (quem fala:
eu/nós; para quem se fala: tu/vós; e de quem/que se fala: ele/eles) e sempre estão
substituindo o nome. Nós os chamamos de Pronomes pessoais.
Fonte: TRAVAGLIA, Luiz Carlos, Gramática e interação. São Paulo : Cortez, 1997.
309
7- Em vários momentos da carta, a autora utilizou expressões que caracterizam uma
linguagem informal, própria deste gênero textual. Escreva, abaixo, algumas dessas
expressões:
8- Em determinado momento da carta, a menina escreve:
Você usa roupas maravilhosas”.
a) A palavra sublinhada é um ADJETIVO, ou seja, uma característica que acompanha
um nome, no caso “roupas”. Por que ela usou esse adjetivo para caracterizar as
roupas da cantora?
b) Se ela dissesse “Você usa roupas bonitas”, alteraria o sentido? Por quê?
c) Pense nos possíveis sentidos quando se emprega os seguintes adjetivos:
- Você usa roupas lindas!
- Você usa roupas fantásticas!
- Você usa roupas exuberantes!
- Você usa roupas esplêndidas!
- Você usa roupas fascinantes!
ATENÇÃO: preste muita atenção nas palavras que você seleciona no momento da
produção, pois cada uma provoca determinado sentido. Portanto, sempre releia seu texto
para ver se as palavras empregadas estão garantindo o sentido que você quer dar ao
mesmo.
3- PRODUÇÃO TEXTUAL
Professor(a):
Levando em consideração os estudos realizados com o gênero em questão,
organize algumas informações que irão auxiliar na PRODUÇÃO DE UMA CARTA
FAMILIAR, discutindo com os alunos o seguinte:
a) Para QUEM escrever? Quem é esta pessoa? Onde ela mora? Vamos ver no mapa?
(mostrar a localização no mapa).
b) Sobre O QUE cada um irá falar?
c) POR QUE, então, escrever esta carta?
d) Que linguagem cada um poder usar? Formal? Informal? Pode usar gírias?
e) Quais os elementos que devem estar presentes na estrutura dessa carta?
f) Como será enviada a carta?
g) Todos já conseguiram o endereço?
Conversa com o (a) professor(a)
Conversa com o (a) professor(a)Conversa com o (a) professor(a)
Conversa com o (a) professor(a)
Professor(a):
Aproveite o momento para falar sobre os serviços dos Correios como eles entregam
uma carta, quanto tempo demora, quem leva as cartas, o que é Sedex, entre outras
informações que julgar importante.
Se possível, convide uma pessoa dos Correios para falar sobre isso aos alunos sobre
isso.
310
3.1- Produção e Reescrita de Texto
produção rascunho: Para essa produção, é necessário que os
alunos a façam individualmente. Levá-los a observar que a linguagem a
ser adotada depende de para quem dirigimos. Se for adulto, é
necessário adotar uma linguagem mais próxima dos adultos, mas se for
uma criança ou adolescente como eles, pode-se usar uma linguagem
própria dessa idade. Nesse momento, trata-se apenas de rascunhar a
carta, momento em que você, professor(a), poderá lembrá-los também dos elementos que
compõem uma carta (cabeçalho, vocativo, corpo, despedida e assinatura).
Feita essa primeira escrita, recolha os textos produzidos e guarde-os até o dia
seguinte. Algo de grande valia, na hora da reescrita, é o distanciamento. Professor(a), para
fazer a reescrita do texto de seu aluno, permita que o mesmo se distancie de sua produção,
ou seja, a reescrita nunca deve ser feita logo após a primeira produção, mas,
preferencialmente, no dia seguinte. Isso permitirá que ele identifique, com maior facilidade,
possíveis erros.
2ª produção – primeira reescrita: Quando retomar essa atividade
no
dia seguinte (ou outro), oriente para que cada um releia o seu texto,
tendo em vista que se trata de algo pessoal, observando com
atenção aspectos essenciais para que a situação comunicativa se
efetive como: ortografia das palavras, pontuação, concordância
nominal e verbal, uso adequado dos verbos, paragrafação, uso dos
pronomes, seleção das palavras, evitando, assim, repetições
desnecessárias, dentre outros.
É necessário que você, professor(a), esteja circulando entre os alunos, orientando
quando for solicitado.
Para auxiliar neste reescrita, sugerimos o seguinte quadro de auto-avaliação da
carta, que pode ser entregue para cada aluno, a fim de orientá-lo na revisão e reescrita do
texto.
Ficha de auto-avaliação da carta
Questões a serem avaliadas Sim Não
Coloquei local e data acima e à direita?
Destaquei o destinatário ao escrever a saudação?
Escrevi uma despedida?
Coloquei minha assinatura?
Deixei a mensagem bem clara?
Usei ponto no meio e no final dos parágrafos?
Usei letra maiúscula depois do ponto e nos nomes próprios?
Usei vírgula depois do local, do destinatário e da despedida?
Minha letra está legível
Pulei uma linha entre cabeçalho/vocativo e vocativo/corpo do texto?
Pulei uma linha entre despedida/assinatura?
Há erros ortográficos?
Usei linguagem adequada ao meu destinatário?
Após a revisão, iniciar a produção. Depois da reescrita dessa versão preliminar,
você, professor(a) fará a correção somente se o aluno solicitar, tendo em vista que se trata
de um texto pessoal.
311
Mas, caso você perceba, neste momento, que os alunos ainda não estão dominando
a estrutura da carta, tome um modelo, leve-o para o quadro ou transparência e retome a
estrutura do gênero.
Produção segunda reescrita: Essa versão ocorrerá após a correção, e deverá ser
feita no papel que o aluno julgar mais apropriada. E interessante questionar: qual o papel
mais apropriado para escrever uma carta? Onde normalmente as pessoas escrevem cartas:
em papel almaço, sulfite, papel de carta, folha de caderno? Assim você estará discutindo o
suporte do gênero.
4- CIRCULAÇÃO DO GÊNERO
Nesse momento, trabalhar com o preenchimento do envelope (com o endereço
trazido por cada aluno), levando em consideração o remetente, o destinatário, o endereço e
o código de endereço postal (CEP).
Enfoque a “importância do suporte” para veicular determinados gêneros textuais, no
caso específico, o envelope.
No momento da postagem, levar a turma toda à empresa que presta esse serviço,
para que os alunos conheçam os procedimentos adequados para a veiculação deste
gênero.
Outro aspecto a ser considerado é que, no caso de haver resposta, estimular para
que haja uma segunda produção. Com isso, você, professor(a), estará mostrando a função
social da escrita na vida das pessoas.
Dentre todos os aspectos abordados na SD com o gênero “Carta Familiar”,
destaco o conteúdo gramatical explorado noções de pronomes e adjetivos,
integradas ao texto do gênero. Entendo que o aluno deve estar ciente do valor
significativo destas classes de palavras para empregá-las com propriedade, quando
delas fizer uso. Conforme conduzido e explorado pelo professor, poder-se-á garantir,
no momento, a compreensão de que as normas lingüísticas, estabelecidas para a
língua, além de sistematizar a escrita, articulam-se àquilo que se quer dizer, dentro
de determinado contexto, garantindo a sua significação.
Além das orientações teóricas para o professor, das sugestões de atividades
para o aluno, as autoras se preocuparam, também, em indicar outras fontes de
pesquisas, a fim de que ele pudesse ampliar seus conhecimentos sobre o assunto
abordado.
312
Como pode ser conferido na SD até então apresentada, o instrumento
teórico-metodológico formatado no Caderno Pedagógico não deve ser comparado a
um livro didático, a porque não é esta a sua função. O grupo tentou garantir
reflexões sobre a aprendizagem e o ensino, aliadas à exploração do gênero. Na
verdade, as atividades, ao organizarem-se em torno de um gênero, tornam-se
indissociáveis, tanto que, caso sejam tratadas de forma isolada, desmantelarão os
propósitos de abordagem.
Obviamente, é esta unicidade que faz com que tal projeto de ensino da
Língua Portuguesa seja tratado por Seqüência Didática, conforme Dolz, Noverraz e
Schneuwly (2004).
A SD seguinte foi produzida pela professora Margarete Aparecida Nath, do
município de Cascavel e encontra-se publicada em Costa-Hübes (2007, p. 133-143).
Nesta, a ênfase recai para os aspectos tipológicos do texto argumentativo, depois de
explorar o gênero “Artigo de Opinião”, destacando os mecanismos lingüísticos que
favorecem a argumentação.
313
1- APRESENTAÇÃO DA SITUAÇÃO E SELEÇÃO DO GÊNERO TEXTUAL
Professor(a):
Para iniciar esta SD, converse com seus alunos sobre a importância de saber
discutir, opinar e argumentar sobre determinado assunto. Em nossa sociedade
atual, o indivíduo que sabe posicionar-se perante um determinado tema,
emitindo sua opinião e apresentando argumentos para sustentá-la, certamente
será mais respeitado.
Por exemplo: se numa roda de amigos surgir uma discussão sobre a doação de
esmolas, com certeza serão emitidas opiniões a favor e outras contras porque quem
acredite que dando esmolas contribuímos para que aqueles que se encontram numa
situação desfavorável, continuem na rua dependendo desta doação, e outros que não
pensam assim.
Mas, como apresentar nossas idéias, sustentar nossos argumentos, em se tratando
de um texto escrito?
É o que iremos estudar nesta SD, reconhecendo um dos gêneros textuais que tem
essa função: O ARTIGO DE OPINIÃO.
Depois ler vários textos deste gênero, reconhecer suas características e estrutura de
organização, produziremos, coletivamente, um para expormos a nossa opinião a respeito
desse assunto tão questionado pela população em geral: A DOAÇÃO DE ESMOLAS ou
DOAÇÃO DE CESTAS BÁSICAS.
Nosso texto será divulgado no mural da escola para que todos os demais alunos,
professores e pais possam lê-lo e, ao mesmo tempo, conhecerem a nossa opinião sobre o
assunto.
2- RECONHECIMENTO DO GÊNERO
Professor(a):
Como se trata de um gênero que nem todos os alunos têm acesso, tendo em vista
seu veículos de circulação (jornais e revistas), antes de solicitar uma pesquisa de textos do
gênero, apresente uma breve definição que explicite, de forma clara, para que se destina um
Artigo de opinião. Por exemplo:
Artigo de opinião: Tem a finalidade de estreitar os laços entre Produtor Texto
Leitor, a fim de envolver este último, com o objetivo de obter sua adesão ao ponto de
vista defendido no artigo, pois os artigos de opinião têm, como fim discursivo, o fazer-
crer. Eles são publicados em jornais, revistas e revistas eletrônicas e, na maioria das
vezes, vêm após títulos como: Ponto de vista” ou “Opinião”. Nele, o autor, o qual
aparece identificado logo no final do texto, defende uma tese em relação a
determinado tema polêmico, apresentando argumentos favoráveis à tese defendida.
SEQÜÊNCIA DIDÁTICA 13
GÊNERO TEXTUAL “ARTIGO DE OPINIÃO”
(5º ano ou 4ª série)
314
Exemplo de um Artigo de Opinião:
Texto 1
A água e a escassez (também de informação).
Vista do espaço, a Terra parece um planeta azul com 72% de sua superfície coberta por água.
Quase 1,350 bilhão de Km³ estão disponíveis na superfície do planeta; 97% deste volume é água
salgada (mares e oceanos) e 3%, água doce. As camadas de gelo polar constituem três quartos
da água doce superficial. Embora a água doce seja a principal fonte de abastecimento de água
das pessoas, uma pequena parte da totalidade da água disponível na terra (0,3%) é realmente
usada com esse propósito.
400 a C., Hipócrates (460-377) chamava a atenção de seus colegas para a relação entre a
qualidade da água e a saúde da população. Foi profético quando disse que o médico "que chega
numa cidade desconhecida deveria observar com cuidado a água usada por seus habitantes".
Entretanto, pouco crédito lhe foi dado e um período subseqüente de obscurantismo durou mais de
2000 anos.
A partir de 1875 e durante os 20 anos seguintes, os cientistas identificaram os microorganismos
causadores da lepra, antrax, tuberculose, cólera, pasteurelose, febre tifóide, tétano, praga, etc.
Estas descobertas proporcionaram o desenvolvimento da higiene pessoal e da saúde pública, as
quais vieram a contribuir para o aumento da expectativa de vida pós-parto, tal como tem ocorrido
na Europa nos dois últimos séculos.
Atualmente, nos países da América Latina e do Caribe, o consumo médio de água é de 200 litros
por pessoa/dia. Contudo, esta quantidade somente reflete aquela usada pelo consumidor. Na
realidade, a quantidade de água extraída do ambiente natural para produzir água potável é maior
que a quantidade de água que os usuários recebem. Isto depende das condições de operação das
redes e, principalmente, do nível dos vazamentos.
No gerenciamento dos recursos hídricos deve-se considerar os riscos associados ao consumo da
água, os quais podem ser coletivos ou individuais, imediatos ou de longo prazo. Durante todo o
ciclo da água, as descargas isoladas ou a poluição generalizada - sejam industriais, agrícolas ou
urbanas - podem comprometer a qualidade da água e torná-la, total ou parcialmente, imprópria
para consumo.
Permanentemente as autoridades sanitárias devem oferecer informação ao público, especialmente
aos clientes "sensíveis", para os quais uma mudança na qualidade da água possa representar um
risco potencialmente mortal (pessoas com diálesis). Esta informação é essencial em casos de
contaminação acidental, mas também deve ser proporcionada em circunstâncias normais, já que a
água é o bem mais amplamente consumido no mundo.
Os meios de comunicação, a sociedade organizada e o setor de saúde são sócios totais nesta
empreitada. Estão em boa posição para retransmitir informação, especialmente em casos de
contaminação acidental. O artigo 9º, inciso VI, da Portaria 1469/2000 do Ministério da Saúde,
estabelece que as equipes de vigilância sanitária e as empresas responsáveis pelo tratamento e
distribuição de água potável têm a obrigação de informar, rotineira e periodicamente, à população
as condições em que a água está sendo fornecida.
Neste contexto, cabe a indagação para a nossa região: onde estão as equipes de Vigilância
Sanitária e os responsáveis pela Sabesp que o estão cumprindo aquela obrigação legal??? É
importante obter os pontos de vista do público com respeito à quantidade e qualidade da água
para consumo, que deve cumprir a citada Legislação Federal, quanto ao atendimento dos padrões
de potabilidade. Finalmente, o público deve informar-se, não com relação à qualidade da água,
mas também quanto aos custos que implica usá-la e manter as redes de abastecimento. Isto dará
às pessoas um incentivo para não desperdiçar este recurso limitado.
José Carlos Simões Florençano é de São Paulo.
Artigo veiculado a partir de 03 de abril de 2004, no Portal da Agência Brasil (http://www.radiobras.gov.br)
.
315
Professor(a):
Leia, você, esse artigo para os alunos, expondo-o numa transparência. Depois da
leitura, questione:
- Qual o tema que está sendo debatido?
- Qual a tese defendida pelo autor?
- Que argumentos ele usa para sustentar a sua tese?
- Você concorda com as idéias do autor? Por quê?
2.1- Pesquisa sobre o Gênero
Depois desse reconhecimento preliminar, solicite para que os alunos busquem,
em jornais e/ou revistas (inclusive eletrônicas, se tiverem acesso à internet) e
tragam para a escola, exemplos de ARTIGO DE OPINIÃO, para que possam
conhecer melhor esse gênero e tenham alguns “modelos” para produzir o seu
texto. Trata-se de um momento de PESQUISA de textos do gênero, quando
você, professor(a), poderá também investigar se os alunos realmente
reconhecem esse gênero na sociedade.
É comum, neste momento, que eles confundam e tragam, para escola, outros
gêneros afins, tais como crônicas ou editoriais. Porém, traçando a diferença entre eles, a
fim de que os alunos possam distinguir as características de cada um.
E leve, você também, alguns textos do gênero, tendo em vista que os alunos
poderão, a princípio, apresentar dificuldades para reconhecê-los e localizá-los.
2.2- Seleção de textos do gênero
Exemplos de Artigos de Opinião:
Texto 1
Deve-se dar esmolas?
Esmola é o que se dá por caridade a alguém que necessita. Deve ser evitada e
utilizada em último caso, quando todas as outras alternativas falharam. A todo ser humano,
qualquer que seja a situação em que esteja vivendo, é preciso garantir dignidade. Desde o
direito à privacidade, ao livre arbítrio, à educação, até o direito ao trabalho através do qual se
entende que a própria pessoa possa administrar sua vida e obter o que necessita para viver.
Quando uma família se desestrutura, quando enfrenta alguma tragédia, doença
prolongada de seu chefe, ou alguma impossibilidade para o trabalho, deve-se entender que
esta situação não é definitiva e tem que ser encarada como passageira. Neste momento,
quando se recorre à esmola, leva-se junto com ela também a humilhação, o rebaixamento à
condição de favor. Ou seja, junto com o ato da caridade está implícito o ato de vontade: dou
porque quero, não tenho obrigação. Com a esmola o direito acaba e o necessitado perde a
condição de ser humano sujeito de direitos e passa à condição de objeto que vai receber
Conversa com o (a) professor(a)
Conversa com o (a) professor(a)Conversa com o (a) professor(a)
Conversa com o (a) professor(a)
Professor(a):
A crônica é um texto essencialmente jornalístico e é redigido de forma livre e pessoal,
discorrendo, de forma irônica, satírica, com uma linguagem literária, sobre temas, fatos ou
idéias da atualidade, geralmente de teor artístico, político ou esportivo.
O editorial é um artigo que exprime a opinião do órgão (jornal ou revista), em geral escrito pelo
redator-chefe, e publicado com destaque. Não é assinado, tendo em vista que representa a
idéia dos editores daquele órgão.
316
alguma coisa, dependendo da vontade de quem dá ou de quem a administra.
Por o se tratar de direitos, a administração da esmola também não tem critérios
objetivos, ou seja, dá-se a quem vê, a quem está mais perto e nem sempre a quem mais
necessita. Uma sociedade que conta com políticas públicas para crianças, idosos, doentes e
desempregados não precisa lançar mão de esmolas. A manutenção de políticas sociais
estáveis, além de garantir direitos, tem também de garantir a universalidade do atendimento,
ou seja, o serviço ou o benefício tem que atingir a todos que dele necessitam. A esmola só
serve para deixar em paz a consciência de quem a dá. Ainda assim, a paz é falsa.
Alda Marco Antônio.
In: IstoÉ, 19/06/1996
Texto 2
Quero trabalhar!
O desemprego é a realidade de 88 milhões de jovens no mundo inteiro, segundo dados da
Organização Internacional do Trabalho (OIT). No total, as pessoas entre 15 e 24 anos
representam 47% de toda população mundial sem emprego.
No Brasil, os números também surpreendem: enquanto a taxa média de desemprego geral
nos grandes centros urbanos é de 20%, entre os jovens, o número é mais que o dobro e
chega a 44%. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a cada
dois desempregados no país, um tem menos do que 25 anos. No total, quatro milhões
declaram não estudar, o trabalhar, nem procurar trabalho! Ou seja, vivem com perspectiva
de futuro quase zero.
Nesse cenário, o direito ao trabalho dos jovens precisa ser afirmado com todas as letras, e
alternativas precisam ser discutidas. Esse foi o objetivo da oficina Economia Popular:
experiência de acesso a Mercado para jovens”, realizada no V Fórum Social Mundial pela ong
Visão Mundial (www.visaomundial.org.br), o projeto Redes e Juventudes, a ong Ação
Educativa (www.acaoeducativa.org.br) e a Fundação Friedrich Ebert (www.fes.org.br).
Em roda, mais de 100 participantes - jovens e adultos - puderam falar e ouvir opiniões e
relatos sobre a inclusão juvenil no mercado de trabalho em diferentes regiões do país. O
pernambucano Cândido Júnior contou sobre sua experiência na Cooperatur - Cooperativa
Escola de Jovens do Setor Turístico do Cabo de Santo Agostinho.
Criada sete anos na cidade do Cabo de Santo Agostinho, vizinha à capital pernambucana,
a Cooperativa oferece alternativa de trabalho e renda para jovens da região que passaram por
um projeto de capacitação em hotelaria e turismo, mantido pela Visão Mundial. Tiveram aulas
sobre a história da comunidade, inglês, espanhol, recepção e orientação turística. Também
receberam informações básicas sobre empreendimentos cooperativos. Terminado o curso, 20
jovens levaram adiante o projeto da cooperativa, mantida na fase inicial pela própria Visão
Mundial.
Aos 21 anos, sonhando fazer o vestibular de Jornalismo, Cândido é um dos cooperados.
muito legal a gente perceber que não precisa de carteira assinada para ter um trabalho. Para
mim, o cooperativismo foi uma proposta nova, que eu não conhecia e decidi abraçar."
28/jan/2006 -16h50
Imaculada Lopez - Agência ViraJovem
Professor(a):
Explore as características discursivas do gênero (condições de produção e circulação)
com os seguintes questionamentos:
a) Quem escreve (em geral) esse gênero?
b) Com que propósito?
c) Onde? Quando?
317
d) Como?
e) Com base em que informações?
f) Como o redator obtém as informações?
g) Qual a temática explorada em cada texto?
h) Quem escreveu cada texto?
i) Quem lê esse gênero?
j) Por que o lê?
k) Onde encontramos esse gênero?
l) Que tipo de resposta um leitor pode dar a esse gênero?
m) Por que esse gênero é produzido?
n) Que influência um leitor pode sofrer devido à leitura desse gênero?
o) Em que condições esse gênero pode ser produzido e pode circular em nossa
sociedade?
Professor(a): Segundo Lopes-Rossi (2002), esse nível de conhecimento sobre o gênero
textual permite uma série de inferências, por parte do leitor, que poderão auxiliá-lo,
posteriormente, na escolha vocabular, no uso dos recursos lingüísticos, na seleção de
informações presentes no texto, na omissão de determinadas informações, no tom, no estilo,
enfim, na organização discursiva do texto.
Explore, também, a estrutura do gênero, pedindo aos alunos que listem as marcas que
têm em comum:
local de publicação,
data de publicação,
autoria,
título,
tema,
disposição da letra no papel,
exemplos,
argumentos,
parágrafos,
extensão do texto etc.
Professor(a): Essa exploração permitirá um olhar mais atento às marcas estruturais do
gêneros, aos “modelos” apresentados para esse gênero especificamente, garantindo, dessa
forma, maior proximidade entre o texto produzido pelo aluno e aqueles que já circulam
socialmente.
2.3- Seleção de um texto do Gênero Textual “Artigo de Opinião”
Professor(a):
Para garantir maior compreensão do gênero, selecione, dentre os textos
apresentados e lidos, um para que seja explorado tanto em relação às suas marcadas
lingüístico-discursivas, quanto à sua estrutura formal. Elabore questões que provoquem a
leitura e interpretação do gênero lido. Sugerimos a seleção do seguinte texto:
Deve-se dar esmolas?
1- Esmola é o que se dá por caridade a alguém que necessita. Deve ser evitada e utilizada
2- em último caso, quando todas as outras alternativas falharam. A todo ser humano,
3- qualquer que seja a situação em que esteja vivendo, é preciso garantir dignidade. Desde
4- o direito à privacidade, ao livre arbítrio, à educação, até o direito ao trabalho através do
5- qual se entende que a própria pessoa possa administrar sua vida e obter o que necessita
6- para viver.
318
7- Quando uma família se desestrutura, quando enfrenta alguma tragédia, doença
8- prolongada de seu chefe, ou alguma impossibilidade para o trabalho, deve-se entender
9- que esta situação não é definitiva e tem que ser encarada como passageira. Neste
10- momento, quando se recorre à esmola, leva-se junto com ela também a humilhação, o
11- rebaixamento à condição de favor. Ou seja, junto com o ato da caridade está implícito o
12- ato de vontade: dou porque quero, não tenho obrigação. Com a esmola o direito acaba
13- e o necessitado perde a condição de ser humano sujeito de direitos e passa à condição
14- de objeto que vai receber alguma coisa, dependendo da vontade de quem dá ou de
15- quem a administra.
16- Por não se tratar de direitos, a administração da esmola também não tem critérios
17-objetivos, ou seja, dá-se a quem vê, a quem está mais perto e nem sempre a quem mais
18- necessita. Uma sociedade que conta com políticas públicas para crianças, idosos,
19-doentes e desempregados não precisa lançar mão de esmolas. A manutenção de
20-políticas sociais estáveis, além de garantir direitos, tem também de garantir a
21-universalidade do atendimento, ou seja, o serviço ou o benefício tem que atingir a todos
22- que dele necessitam. A esmola só serve para deixar em paz a consciência de quem a
23- dá. Ainda assim, a paz é falsa.
Alda Marco Antônio.
In: Isto É, 19/06/1996
Atividades para o aluno
1- Observe como esse texto se organiza:
1º parágrafo:
Define o que é a esmola, fazendo afirmações que defendem o ponto de vista
(tese) que a autora pretende enfatizar “não se deve dar esmolas”. Apresenta os
direitos que devem ser garantidos a todos os seres humanos.
2º parágrafo:
Apresenta as situações de desequilíbrio econômico que fazem com que o
indivíduo recorra a esmola e, ao mesmo tempo, ressalta a condição do sujeito
como um ser de direitos que deve ser atendido pelo poder público em suas
necessidades, não o submetendo a favores que podem ser prestados por
terceiros ou não.
3º parágrafo:
Fala sobre a necessidade de critérios para a doação de esmolas e sobre a
importância de políticas sociais que atendam às pessoas que se encontram com
essa dificuldade.
2- Observe os argumentos utilizados pela autora para defender a sua idéia de que
“esmolas não devem ser dadas”:
Argumento 1:
O ser humano possui direitos: direito à privacidade, ao livre arbítrio, à educação,
ao trabalho, de forma que, na ausência deste último, deva ser assistido em suas
necessidades.
319
Argumento 2:
Esmola significa humilhação, favor, rebaixamento à vontade dos outros. A
esmola substitui o dever que o poder público tem de auxiliar o indivíduo quando
este se encontra numa situação difícil.
Argumento 3:
Necessidade de políticas sociais públicas que atendam às pessoas que se
encontram sem condições de viver com dignidade.
3- Observe o conteúdo do texto e responda:
a) Com que intenção ele foi produzido?
b) Você conhece a revista onde este texto foi divulgado? A quem ela se dirige?
c) Vamos conhecer melhor essa revista? (levar alguns exemplares para serem
folheados pelos alunos, observando as características deste tipo de revista e o
público a quem ela se dirige).
d) Olhe com atenção a revista e responda: Que tipo de matéria/ assuntos e/ ou textos
circulam nela?
e) Em que página da revista o gênero circula?
f) Que título o identifica na revista?
g) Onde e quando esse texto foi produzido?
h) Que tema está sendo discutido?
i) Como a autora se coloca diante do tema: ela concorda ou não com a doação de
esmolas? Como ela defende sua tese? De que argumentos se utiliza?
j) Você considera que a autora quis influenciar os leitores a pensarem como ela? Por
quê?
k) E você, diante desse tema, como se posiciona? Você concorda ou discorda da
autora? Por quê?
l) Por que o título é uma pergunta?
m) O que você entende por políticas públicas?
n) Que políticas deveria haver em nosso país capaz de solucionar o problema da
“doação de esmolas”?
o) Você concorda com a autora que com a esmola o direito acaba e o necessitado
perde a condição de ser humano sujeito de direitos e passa à condição de objeto”?
Justifique através de argumentos que fortaleçam a sua opinião.
p) Quem escreveu esse texto? Você leu alguma outra produção escrita dessa
autora? Você sabe quem é ela?
CONHEÇA A BIOGRAFIA DA AUTORA
ALDA MARCO ANTONIO: Formada em engenharia civil pela Faculdade de
Engenharia do Triângulo Mineiro em 1969, especializou-se em saneamento pela Faculdade
de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP).
Começou a trabalhar como engenheira em 1970 no antigo Fomento Estadual de
Saneamento Básico na divisão de Estudos e Projetos como projetista e analista de Sistemas
Públicos de Abastecimento de Água e de Coleta, Afastamento e Tratamento de Esgotos
Sanitários para municípios do Estado de São Paulo.
Em setembro de 1973 afastou-se deste trabalho para montar seu próprio escritório,
320
passando a atender, além de serviços públicos, o setor industrial da iniciativa privada.
Interrompeu essa atividade no período em que ocupou cargos públicos.
Alda Marco Antonio foi Secretária de Estado de Relações de Trabalho no governo de
Franco Montoro, em 1983, e Presidente do Conselho Estadual da condição Feminina.
No governo Quércia, em 1986, foi nomeada Secretária de Estado do Menor, cargo
que também ocupou no governo seguinte de Fleury Filho.
Na prefeitura de César Maia, de 1993 a 1996, no Rio de Janeiro, Alda foi assessora
para projetos Especiais. No governo Itamar Franco assumiu a presidência da Fundação
Centro Brasileiro para a Infância e Adolescência, representando o Brasil junto ao Instituto
Iteramericano da Criança, da Organização dos Estados Americanos – OEA.
Ainda na prefeitura de São Paulo de Celso Pitta, Alda foi Secretária Municipal de
Assistência Social. Dos 14 programas de atendimento à criança de rua que criou e
implantou durante sua gestão na Secretaria do Menor, oito foram escolhidos como modelo
para outros países e divulgados no mundo, pela UNICEF.
4- Procure explicar o sentido das seguintes expressões do texto:
a) Garantir dignidade (linha 3):
b) Junto com o ato de caridade está implícito o ato de vontade (linhas 11 2 12):
Atividades de Análise Lingüística
1- Para escrever bem esse gênero e sustentar a tese que se quer defender, o uso de
determinados elementos gramaticais é fundamental. Observe, por exemplo, algumas das
palavras (destacadas no texto) que são utilizadas para reforçar a idéia defendida pelo
autor: Desde, até, quando, neste momento, ou seja, ainda assim, ou, e, porque. Esses
conectivos reforçam a argumentação do texto.
ARGUMENTAR é discutir, deduzir, concluir. Raciocínio, indício ou prova pelo qual se
tira uma conseqüência ou dedução por meio de exemplos que comprovem o que foi dito.
Essas expressões são utilizadas para ligar, costurar as idéias do texto, ressaltando o
que o autor pretende dizer. São chamadas de conectivos ou de elementos coesivos,
ou, ainda, de coesão.
Exemplos:
a) “Deve ser evitada e utilizada em último caso, quando todas as outras alternativas
falharam” (linhas 1 e 2).
Observe que, neste caso, a conjunção e adiciona, ou seja, acrescenta uma
informação ao que foi dito anteriormente.
b) “A manutenção de políticas sociais estáveis, além de garantir direitos, tem também
de garantir a universalidade do atendimento”. (linhas 19 e 20).
Observe que a conjunção além de reforça o que foi dito e acrescenta um novo
argumento a idéia anterior, reforçando-a.
Coesão:
é a relação existente entre um elemento do texto e algum
outro elemento, crucial para a sua interpretação. A coesão
estabelece relações de sentido entre o que foi dito e o que será
dito em seguida. A coesão é construída com o uso das conjunções,
advérbios, pronomes, substantivos, etc. de forma a construir a
unidade do texto.
321
c) “A esmola serve para deixar em paz a consciência de quem a dá. Ainda assim,
a paz é falsa.” (linhas 22 e 23).
Observe que a conjunção ainda assim ressalta a idéia que pretende defender.
As conjunções são elementos coesivos que auxiliam na “costura” das idéias que
produzem o texto.
CONJUNÇÃO (ou locução conjuntiva): é a palavra (ou expressão) que liga duas orações,
dois parágrafos ou dois termos semelhantes de uma mesma oração, estabelecendo, entre
eles, relações de sentido. As principais conjunções são: Mas, porém, todavia, contudo, porque,
pois, e, dessa forma, até mesmo, sem que, que, um pouco, com isso, nem, mas também,
que, porquanto, logo, portanto, por isso, a fim de que, quanto menos, quanto mais, com isso,
no entanto, mas também, a menos que, assim sendo, ainda, ou, entre outras.
2- As frases a seguir, retiradas do texto, apresentam palavras que estão ligando uma idéia
à outra. Que sentido essas palavras expressam? Poderiam ser substituídas por outras?
Qual (ais)?
a) “Deve ser evitada e utilizada em último caso...” (linhas 1 e 2)
b) “A manutenção de políticas sociais estáveis, além de garantir direitos, tem também
de garantir...” (linhas 19 e 20)
c) “A esmola só serve para deixar em paz a consciência de quem a dá. Ainda assim, a
paz é falsa”. (linhas 22 e 23)
d) O segundo parágrafo inicia com a conjunção Quando (linha 7). Que outra
expressão poderia ser usada para iniciar este parágrafo sem alterar o sentido? E que
sentido ele estabelece?
e) “Desde o direito à privacidade, ao livre arbítrio, à educação, até o direito ao
trabalho”. (linhas 3 e 4)
f) “Neste momento, quando se recorre à esmola, leva-se junto com ela também a
humilhação, o rebaixamento à condição de favor...” (linhas 9 e 10)
g) “Ou seja, junto com o ato da caridade está implícito o ato de vontade...” (linhas 11 e
12)
h) “...dou porque quero, não tenho obrigação”. (linha 12)
Professor(a):
E expressa o sentido de soma, acrescenta mais uma idéia. Poderia ser substituída por “e
também”, “bem como”
ALÉM DE: reforça a idéia apresentada anteriormente, somando outros argumentos. Poderia
ser substituída por “assim como” , “ainda que”.
Ainda assim: ressalta a idéia que foi dita anteriormente. Poderia ser substituído por “mesmo
assim”, “não obstante”.
Quando: expressa a idéia de tempo, momento. Poderia ser substituída pela expressão “No
momento em que” , “Na ocasião em que”.
Desde.... Até: além de ressaltar um argumento, valoriza-o gradativamente (até...). substituí-
los por outro conetivo, corre-se o risco de desvalorizar a idéia.
Neste momento, quando: ambos apresentam idéia de temporalidade. Podem ser
substituídos por “agora, no momento em que”, “neste instante, na hora em que”.
Ou seja: retifica a idéia apresentada anteriormente, retomando-a com outras palavras. Pode
ser substituído por “isto é”.
Porque: explica, justifica. Pode ser substituído por “pois”
Desde que: Expressa a idéia de tempo, momento. Poderia ser substituído por “Desde o
momento em que “, “desde quando”.
322
Obs.: No momento em que substituímos um elemento por outro, muitas vezes é necessário
fazer algumas adaptações na frase.
3- Agora utilize os elementos coesivos necessários para ligar uma frase à outra:
a) Alda Marco Antonio começou a trabalhar como engenheira em 1970. Foi projetista e
analista de Sistemas Públicos de Abastecimento de Água e de Coleta.
b) De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a cada dois
desempregados no país, um tem menos do que 25 anos. No total quatro milhões
declaram não estudar, não trabalhar, nem procurar trabalho!
c) O São Paulo se sentiu quase que onipotente. O time, que começava a ser dominado
pelos mexicanos, passou a se considerar inquebrável e recuperou a volúpia de seu
jogo.
d) A presença do pensamento juvenil ainda não é muito consistente. É pequena a
participação de adolescentes nesses movimentos.
e) Tive sorte. Conheci Tatuaçu. Ele me deixou uma grande lição de vida.
f) Esse fenômeno não é apenas brasileiro. Vale para times de todos os países.
4- Volte ao texto e selecione a idéia principal:
a) 1º parágrafo:
b) 2º parágrafo:
c) parágrafo:
4- PRODUÇÃO COLETIVA DE TEXTO
Professor(a):
Após as leituras e as atividades que ajudaram no reconhecimento do gênero e de
sua função social, conduza a seguinte reflexão que orientará na produção
coletiva de um ARTIGO DE OPINIÃO.
Imagine que você terá que escrever um artigo de opinião sobre o seguinte tema:
Cesta básica para as famílias carentes: auxilia num momento de dificuldade, ou torna
as pessoas dependentes desta doação?
Em primeiro lugar se pergunte POR QUÊ? Ou seja, explicite uma idéia central:
Porque muitas famílias dependem da cesta básica para sobreviver? Procure responder a esta
questão, apresentando três respostas condizentes com o tema.
Ex.:
Muitas famílias dependem da cesta básica para sobreviver porque não têm emprego
argumento 1
fixo, falta-lhe o alimento básico para sua subsistência e, além disso, não há uma política
argumento 2
governamental preocupada em solucionar esses problemas.
a
rgumento 3
Uma vez elaboradas essas respostas, você tem pronto seus argumentos em
relação a esse tema.
323
Professor(a):
Você precisará auxiliar o aluno a encontrar as respostas para essa pergunta. Leve-os a refletirem,
coletivamente, sobre o tema com perguntas do tipo:
Por que muitas famílias não têm emprego? Por que muitas famílias, mesmo tendo emprego, não têm
condições de sustentar-se? Vocês acham que existe má distribuição de renda no país? Os políticos
preocupam-se com os pobres? Como?
Depois dessa discussão coletiva, pode-se iniciar a produção do Artigo de Opinião,
também de forma coletiva, neste primeiro momento:
Para a produção, neste primeiro momento, pode recorrer-se à seguinte estrutura
(que poderá ser alterada, posteriormente, quando o aluno obter maior domínio sobre o
gênero):
a) Primeiro parágrafo: apresentação da tese + argumento 1 + argumento 2 +
argumento 3
b) Segundo parágrafo: desenvolvimento do argumento 1
c) Terceiro parágrafo: desenvolvimento do argumento 2
d) Quarto parágrafo: desenvolvimento do argumento 3
e) Quinto parágrafo: conclusão (quando retoma a tese e consolida-a)
O segundo, terceiro e quarto parágrafos poderão ligar-se ao anterior pela utilização de elementos
como:
Além disso,...
Ainda convém lembrar que,...
Além do mais,...
Dessa forma...
Sendo assim...
É preciso lembrar que...
Precisamos considerar que...
Outro fator existente,...
A conclusão final poderá iniciar com expressões como:
Dessa forma,...
Sendo assim,...
Em vista dos argumentos apresentados,...
Em virtude do que foi mencionado,...
Assim,...
Levando-se em conta o que foi observado,...
Por todas as idéias apresentadas,...
Tendo em vista os aspectos observados,...
Por tudo isso,...
5- CIRCULAÇÃO DO GÊNERO NA SOCIEDADE
Esse é o momento de tornar público o texto produzido. Para isso, este “Artigo de
opinião”, produzido pelos alunos, após digitado, deverá ser exposto no mural da escola,
onde os alunos de outras turmas, professores, pais e funcionários poderão lê-lo,
conhecendo, assim, a opinião da turma sobre o tema.
Na SD do gênero “artigo de opinião”, a autora, além de explorar, por meio da
leitura, a compreensão dos textos e de sua função social, preocupou-se em orientar
324
professor e aluno quanto à organização estrutural do gênero. Para isso, deu maior
ênfase aos aspectos tipológicos e lingüísticos que estruturam tais textos.
Muitos aspectos gramaticais poderiam ser abordados, contudo, a preferência
pela conjunção justificou-se pela importância desse mecanismo lingüístico na
organização dos argumentos, acarretando-lhes sentidos. Tais conectivos quando
corretamente empregados, valorizam as idéias do autor, organizando-as
hierarquicamente para os propósitos desejados.
Logo, se o usuário da língua, ao fazer uso deste gênero, souber organizar os
argumentos de forma articulada, estará criando condições favoráveis para que o
leitor compartilhe de suas idéias, atendendo aos objetivos da interlocução.
Mesmo que não tenham sido apresentadas todas as SDs, julgo que as
expostas comprovam que o projeto inicial foi concretizado. O grupo de estudo foi
eleito, pelos entrevistados, como a modalidade que possibilitaria estudos e reflexões
mais aprofundadas em relação ao ensino da Língua Portuguesa, aliando teoria e
prática no processo de formação do professor. E é exatamente essa aliança que se
tentou garantir nas SDs.
5.4 Considerações Finais sobre a Modalidade Grupo de Estudos
Se, como argumenta Marin (2003), a formação continuada deveria
transformar a escola em espaço de troca e de reconstrução de novos
conhecimentos, o grupo de estudos provou que isso é possível. Trocando
conhecimentos, (re)construindo conceitos, cada integrante redimensionou sua
prática, partindo do pressuposto da educabilidade, numa formação que se num
continuum, formalizada por uma dimensão inicial, mas não por um ponto final, tendo
em vista a continuidade desse processo.
O crescimento pessoal e profissional das participantes, além de diagnosticado
por mim, foi confirmado por cada professora em uma entrevista realizada no último
encontro. Com o objetivo de avaliar o percurso do grupo e de cada uma, indaguei
sobre o significado da participação no grupo, a modalidade grupo de estudos, as
contribuições relativas ao estudo da gramática contextualizada e a outros
conhecimentos.
Em relação à participação no grupo, selecionei alguns depoimentos, os quais
reafirmaram os resultados propiciados por tal modalidade de evento:
325
(G1) Eu tive muito crescimento, apesar de estar fazendo algumas
discussões a respeito de trabalhar a gramática a partir do texto,
muitos pontos que foram discutidos esse ano foram novos para mim.
Um dos pontos é a questão de estar discutindo o ensino da ngua
portuguesa a partir dos gêneros textuais. E outro ponto que foi
fundamental para o meu crescimento é... profissional, foi o fato de
estar trabalhando com a s seqüências didáticas, que eu considerei
é... uma das formas mais completas de trabalhar em Língua
Portuguesa contemplando tanto o eixo da oralidade quanto da
escrita, é.... e também é... a própria produção textual, o
encaminhamento metodológico em forma de seqüência didática ela
contempla uma formação global para a criança.
(G3) Eu acredito que... além do crescimento pessoal em termos de
conhecimento, nós tivemos uma atualização muito grande nesse
sentido, que não era um curso, que era um grupo de estudo que a
gente tinha que vir e dedicar mesmo, estudar teoria, além desse
conhecimento enquanto pessoal vem a parte profissional, que a
gente sentiu reflexo no aluno, a partir do momento que você tem
mais teoria, você está mais embasado para desenvolver a prática
pedagógica.
(G4) A participação nesse grupo foi de suma importância tanto pra
aprofundarmos questões teóricas quanto da própria prática nossa na
sala de aula. O crescimento participando de um grupo de estudos é
muito grande, pelas discussões, pela troca de informação com os
colegas... então foi de muita importância mesmo tanto para o meu
crescimento pessoal quanto profissional.
(G5) Eu vejo que foi muito positivo devido as reflexões e discussões que
foram surgindo através dos encontros, porque não foi uma parada
de um dia e depois cada um volta ao seu ritmo normal, mas sim uma
reflexão contínua
Como revelam os depoimentos, é consenso que, uma vez assumida com
seriedade e comprometimento, a participação num grupo de estudos só poderá
trazer resultados significativos, uma vez que exige, de cada integrante, atitudes de
leituras, reflexões, discussões, enfim, de envolvimento. As situações de
aprendizagens são contínuas, que, em cada encontro, cria-se um estreitamento
entre os participantes, os quais se sentem à vontade para socializar dúvidas e
conhecimentos. Em virtude disso, tal modalidade de evento foi aprovada e avaliada
positivamente pelos seus integrantes, conforme algumas respostas oriundas da
seguinte indagação: Como você avalia a modalidade grupo de estudos no processo
de formação continuada?
(G3) Eu acho extremamente importante, todos os professores deveriam
ter oportunidade de participar em grupo de estudo né, porque você
326
se dedica mesmo, ele acaba exigindo de você, o grupo de estudo
exige de você, você se dedica e compartilha com as outras
pessoas... então é um momento de troca de idéias, você cresce
muito mais.
(G4) O grupo de estudos, através da troca com os colegas, através das
discussões, ele é muito importante mesmo para a formação
continuada porque muitas vezes nós fazemos cursos isolados,
cursos pontuais que não dão conta de atender a todas as
perspectivas que nós desejamos.
(G6) Eu vejo o grupo de estudos como algo muito positivo porque é um
grupo menor onde mais possibilidade de discussões, de
ampliação de estudos, e como o grupo é menor uma reflexão
mais intensa e por conta disso tem que haver um comprometimento
maior.
(G7) Eu considero que essa modalidade é a modalidade ideal para dar
continuidade a nossa formação. Por que é a modalidade ideal?
Porque ela encaminha leitura, atividades, produção, e todos os
envolvidos no estudo precisam produzir. Então é dessa forma que
eu penso que a formação continuada deva acontecer.
Todavia, como o objetivo inicial era aprofundar questões relativas ao ensino
da gramática contextualizada, procurei verificar se, mesmo ampliando nosso foco, tal
propósito foi atingido. Ou seja, será que a participação no grupo de estudos garantiu
maior clareza sobre o tema? A maioria dos depoimentos, mais uma vez, acenou
positivamente para esta questão, confirmando que, mesmo abordando também a
questão dos gêneros, o estudo sobre a gramática contextualizada foi garantido.
(G3) Com certeza contribuiu. Nós passamos daquela visão de gramática
como exercícios repetitivos, como listas de plurais, conjugações de
verbos, enfim, o que faz a gramática normativa. Nós passamos
dessa concepção para ter uma concepção de gramática como
reflexão da língua, e usa-la como... eé... não sei se posso dizer
como instrumento né... mas como instrumento que ajuda a língua e
não daquela forma solta que se trabalhava e reflexão... s
começamos a refletir mais sobre o papel da gramática.
(G6) Olha, para mim realmente contribuiu... como eu coloquei antes,
veio ao encontro de algumas questões que eu refletia bastante e
o trabalho em grupo ampliou tudo isso, né... de que não tanta
necessidade do aluno ter o domínio da norma, mas sim de aplica-la
dentro do seu dia a dia, na escrita, e até mesmo na oralidade.
(G7) Contribuiu muito no sentido de que nas atividades realizadas, por
exemplo, na minha própria sala de aula, muitas das discussões que
aqui eu depois tentava aplicar na sala de aula. E também no sentido
de toda essa discussão de gêneros textuais até então eu não tinha
327
conhecimento. Então foi a partir daí que eu comecei a refletir sobre
a quantidade e a proporção de gêneros que estão presente em
nossa vida e de como é possível o trabalho da lingüística a partir
dos gêneros. E é dessa forma que a linguagem acontece em meio à
sociedade... na nossa interação.
Entretanto, conforme depoimento de uma das integrantes, o assunto deveria
ser retomado, priorizando mais seus aspectos teóricos e práticos, o que significa,
para a entrevistada, que o grupo não atendeu, totalmente, ao objetivo proposto.
(G4) Eu penso que sim, mas eu acho que deveríamos aprofundar um
pouco mais a questão da gramática por ser uma questão polêmica
também. A gramática, até hoje, os professores vêem muita ela de
uma forma normativa, então eu vejo que necessidade de nós
revermos os conceitos da gramática e buscarmos uma maneira mais
apropriada de trabalhar com a mesma na sala de aula.
No entanto, todas estão conscientes de que tal modalidade de evento deveria
ser mais incentivada pelos municípios da região, possibilitando que um maior
número de professores faça parte do processo.
(G5) Que realmente pensem nessa possibilidade, que eu vejo como uma
das saídas, como algo que a gente realmente deveria procurar e
procurar e propor para os nossos colegas. Porque eu vejo que por
aí. Muitas vezes nós pensamos em grandes profissionais que estão
em outras realidades, trabalham em outros contextos e esquecemos
que a discussão da nossa realidade... do que acontece em nosso
meio... acontece a partir do momento que paramos para pensar
no nosso dia a dia, no nosso cotidiano. E uma forma da gente ver,
de refletir, de discutir, de procurar caminhos é realmente através do
grupo de estudos.
(G7) Penso que todos os professores deveriam ter acesso, ter interesse e
deveriam procurar participar em grupos de estudos, os municípios
deveriam também investir em grupos de estudos assim, em grupos
menores que visassem o estudo, a reflexão, aplicar na prática,
atualidades, ou seja, estar constantemente revendo teorias, para
estar redimensionando.
Esta é uma necessidade assimilada pelas integrantes do grupo e que deveria
ser implantada em cada município da região: a busca pelo espaço contínuo de
formação, não se esgotando, também, neste grupo de estudos de 10 meses (ou em
outros de determinada carga horária), nem em cursos pontuais, mas numa formação
continuada, interpretada como espaço de interação entre as dimensões pessoais e
328
profissionais. E que aos professores fosse permitido apropriarem-se dos próprios
processos de formação, dando-lhes um sentido no quadro de suas histórias de vida.
Conscientes de tal necessidade, o projeto foi reorfertado em 2007 e o grupo
foi ampliado para 18 integrantes de 12 municípios. Além deste, outros grupos de
estudos foram organizados pelas integrantes em seus respectivos municípios. Se
inicialmente o grupo foi formado por 10 pessoas, hoje existem, aproximadamente,
150 professores envolvidos nesta modalidade de formação, na região, decorrentes
deste. O organograma abaixo faz uma demonstração do processo:
Comparado à quantidade de professores na região, poderia considerar um
número insignificante. Contudo, como se trata de uma modalidade em implantação,
Grupo de estudos ofertado pela
AMOP
Guaraniaçu Campo Bonito
Cascavel Toledo
Marechal Cândido Rondon Palotina
Maripá Itaipulândia
Santa Helena
Grupo de Estudos com
30 integrantes
Grupo de estudos com
15 integrantes
Grupo de Estudos com
30 integrantes
Grupo de estudos com
15 integrantes
Grupo de estudos com
22 integrantes
Grupo de estudos com
30 integrantes
Grupo de Estudos com
22 integrantes.
329
alicerçada por pessoas conscientes, tais iniciativas poderão somar-se a outras e,
futuramente, reorientar a cultura de formação continuada na região.
O Caderno Pedagógico 2 está em processo de elaboração pelo grupo de
2007, que continua aprofundando o estudo sobre os gêneros textuais e apostando
nas SDs como um encaminhamento metodológico capaz de garantir o ensino da
Língua Portuguesa, pautada na concepção (sócio)interacionista da linguagem, por
meio da qual a língua é trabalhada em situações reais de interação.
Por todos os dados e resultados apresentados, concluo que o grupo de
estudos é a modalidade capaz de garantir a formação contínua do professor, desde
que alguns aspectos sejam considerados, tais como: seja formado por profissionais
conscientes da necessidade constante de retroalimentação dos conceitos
sistematizados pela ciência, dispostos, portanto, a ler, estudar, expor dúvidas,
conhecimentos e dificuldades; seja amparado por órgãos administrativos
connhecedores da necessidade de investimento na formação continuada do
professor, com finalidades emancipatórias, críticas, reflexivas e transformadoras; e
se paute no aprofundamento teórico, aliando-o às reflexões da prática da sala de
aula.
Assim com Geraldi, em 1984, apostara nesta modalidade de formação para
dar continuidade ao Projeto “O Texto na Sala de Aula”, também ouso defender que
os cursos pontuais que atualmente acontecem na região, garantirão
conhecimentos, desde que retomados por reflexões propiciadas nos grupos de
estudos, organizados em cada município.
330
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Iniciei a pesquisa movida pelo desafio de refletir sobre a temática “Formação
de Professores”, verificando os efeitos dos cursos de formação continuada em
Língua Portuguesa, por mim ministrados, quanto aos seus reflexos (ou não) para o
ensino da gramática, na prática pedagógica de professores de série da região
Oeste do Paraná.
Agora, ao finalizá-la, sinto-me mais preparada para responder às indagações
que nortearam o propósito investigativo, desafiando-me a percorrer caminhos antes
desconhecidos ou incompreendidos.
O percurso histórico-reflexivo foi instigado, inicialmente, pela seguinte
questão: desde a década de 1970, haveria, através das ações de formação, uma
intencionalidade política, determinando, por meio de documentos norteadores, como
o professor deveria agir?
A incursão investigativa permitiu-me asseverar que tanto a formação inicial
como a continuada são fortemente afetadas pelas finalidades político-
governamentais que pretendem projetar o percurso da educação, em função de
seus próprios interesses. Todavia, a incorporação de novas teorias, concernentes a
estudos e pesquisas, também contribui para, cada após década, delinear “novos”
contornos à educação, definindo formas e ações aos professores.
Em relação às influências políticas, a década de 1970 evidenciou-se pela
“democratização” do ensino, com objetivos político-ideológicos determinados,
principalmente pela necessidade de mão-de-obra às indústrias que, à época, eram
incentivadas a se instalarem no Brasil. As medidas adotadas, sem que houvessem
escolas com professores preparados, provocaram a queda na qualidade de ensino,
resultando, apenas, na extensão formal da escolaridade. Conseqüentemente, a
formação inicial dos professores foi acelerada, com o intuito de atender ao grande
número de alunos que passaram a freqüentar a escola (antes destinada à elite).
Rebelando-se contra as determinações impostas politicamente, a década de
1980 é lembrada pelas novas vozes e pelos novos discursos permitidos após a
abertura política. Tratava-se de um período de transição, no qual a valorização do
professor foi resgatada, tornando-se figura central nas preocupações com a
educação. Os discursos propagavam que, se o Brasil quisesse realmente que o
331
ensino garantisse reais perspectivas de valorização da classe trabalhadora, era
preciso investir nos professores, pois deles dependeriam as mudanças futuras.
Despontou-se, então, a concepção sócio-histórica de formação, reivindicando
profissionais da educação com maior conhecimento sobre a realidade, capazes de
traduzir as condições de sua escola, da educação, da sociedade, outorgados a
interferir e transformar o contexto sócio-histórico-educacional.
A década de 1990, por sua vez, é lembrada pelas adequações da educação
às políticas liberalizantes assentidas pelo Banco Mundial. O sistema educacional
brasileiro foi redefinido em anuência à pedagogia pragmática da empregabilidade e,
assim como na década de 1970, o sistema econômico legitimou a educação como
capaz de produzir trabalhadores para uma nova “ordem mundial”: a da
competitividade. Em decorrência, os avanços ideológicos, garantidos na década
anterior, foram debelados pela necessidade de formar professores com capacidade
de participar, qualitativamente, da construção de um mundo tecnológico. A ênfase
na formação (inicial e continuada) foi garantida pelas inúmeras propostas nessa
direção.
O novo milênio iniciou-se com a educação sustentada pelos paradigmas da
competência, entendendo-se que a escola deveria ajustar-se ao mercado de
trabalho e sintonizar-se com as mudanças da sociedade. Para isso, reforçaram a
relação determinista entre o desempenho do professor e a aprendizagem do aluno,
atribuindo maior relevância ao conhecimento prático, em detrimento da formação
intelectual e política dos professores.
O resgate histórico permite-me inferir que, nas décadas pesquisadas
despontaram, por trás de qualquer iniciativa política em relação à educação, uma
intencionalidade a favor da economia da nação, determinando, para isso, as ações
pedagógicas dos professores. Estes, em sua maioria, despolitizados que a
formação inicial e a continuada pouco contribuíram para sua politização – nem
sempre souberam discernir tais interesses e agiram conforme determinações
governamentais, transpostas principalmente nas leis que regem a educação.
Em se tratando das influências advindas das teorias, busquei resposta à
indagação: que correntes teóricas definiram a formação e interferiram, consciente ou
inconscientemente, na ação docente?
Foi possível interpretar, pela pesquisa, que as ações na sala de aula são
orientadas pela concepção (filosófica, psicológica, pedagógica e de linguagem),
332
transposta nos documentos pedagógicos e nos cursos de formação, a qual o
professor procura incorporar durante o processo de formação inicial e continuada.
Tal orientação, por sua vez, sustém-se nos avanços científicos assegurados pelos
estudos e pesquisas que prescrevem, provisoriamente, a base teórica da educação.
Como exemplo, posso citar o Currículo da SEED que legitimou, na década de
1970, um ensino tecnicista, articulado aos pressupostos filosóficos do empirismo
positivista e à psicologia behaviorista. Anuindo com tais pressupostos, a linguagem
era interpretada como forma, estrutura, passível de ser incorporada pela repetição
exaustiva de “modelos” bem definidos de estruturas frasais. Foram essas bases
teóricas que ditaram as ações dos professores, decidindo o que (não) era pertinente
ensinar e como se deveria ensinar. No entanto, a despeito de aparentes mudanças,
para atingir os propósitos delineados, a gramática, ao lado de estudos de elementos
da comunicação, continuou a ser tomada como objeto de ensino.
Teoricamente, essas correntes foram contestadas, na década de 1980, por
teorias que procuravam afiançar uma outra concepção de homem, de sociedade, de
ensino, de aprendizagem e de linguagem. A linguagem passou a ser compreendida
como ação humana mediadora entre o homem e a sociedade, auxiliando-o a
entender, interpretar, representar, influenciar, modificar, enfim, transformar a
realidade.
Esta compreensão ampara-se, principalmente, nos pressupostos filosóficos
do Materialismo Histórico Dialético de Marx. Na mesma direção, evidenciaram-se os
estudos de Vygotsky, relacionando as atividades de cognição humana às atividades
socioculturais, ao facultar o desenvolvimento da linguagem às interações sociais. Tal
viés teórico contrapôs, em parte, os estudos de Piaget, que explicitou a aquisição do
conhecimento a partir de esquemas cognitivos ativados pela tomada de consciência
do objeto e da ação.
Nessa perspectiva, o ensino-aprendizagem ganhou diferentes abordagens:
por um lado, pautado nos pressupostos vygotskyanos, passou a ser visto como
resultado de interações sociais mediadas entre os sujeitos; por outro lado, tem-se a
teoria da ação, produzida por Jean Piaget, a qual não nega o papel social do sujeito,
mas põe em relevo a função da cognição no processo de desenvolvimento da
criança.
333
Em termos de língua, o texto foi abordado como objeto de ensino e a
gramática enfocada como constituinte do texto e, portanto, seu estudo deveria ser
contextualizado.
Tais explicitações de ensino/aprendizagem, de linguagem, de homem e
sociedade, embasaram, de alguma forma, documentos norteadores das práticas
pedagógicas das décadas posteriores (1990/2000) como: Currículo Básico para a
Escola Pública do Estado do Paraná (1990), Parâmetros Curriculares Nacionais
(1997/1998) e Currículo Básico para as Escolas Públicas Municipais da Região
Oeste do Paraná Educação Infantil e Séries iniciais (2007), reorientando as ações
dos professores. O ensino da língua, culturalmente sensível à centralidade no texto,
foi, depois, direcionado para os gêneros discursivos/textuais, privilegiando, dessa
forma, as condições sócio-discursivas de interação.
Porém, como essas perspectivas teóricas tornaram-se perceptíveis aos
professores? Que formação receberam no sentido de refletirem sobre sua prática
pedagógica à luz de tais vertentes?
Ficou evidente, no regaste histórico-reflexivo, que no Brasil e por que o
no Paraná e na região Oeste predomina uma cultura de que a formação dos
professores acontece em dois momentos: no período da licenciatura (e em cursos
de pós-graduação) e nos programas de formação continuada - os últimos, quase
sempre, reduzidos a cursos pontuais, com carga horária limitada.
Todavia, se que os cursos, modalidade de evento adotada há anos no
Brasil (e principalmente na região Oeste do Paraná), tem garantido os subsídios
necessários para que o professor acrescente conhecimentos à sua formação inicial,
e para que reflita constantemente sobre a prática pedagógica realizada no dia a dia?
O propósito de resposta à pergunta em foco exigiu-me uma incursão
investigativa em duas direções: por um lado, propus-me a refletir sobre minha
prática como docente em cursos de formação continuada, na área de Língua
Portuguesa; por outro, procurei investigar quais seriam os efeitos de tais eventos na
prática pedagógica de professores de 4ª série.
Os instrumentos empregados na coleta de dados (questionário, entrevista e
gravação de aulas) conferiram-me à seguinte conclusão: por mais que eu, como
docente, tenha consciência das limitações teóricas dos professores, da necessidade
de politização, da importância da formação reflexiva, o terei condições de
334
assegurar-lhes as discussões necessárias em eventos limitados à carga horária
reduzida e pontual.
Os professores necessitam de tempo, na sua carreira docente, para ler,
estudar, refletir, discutir, questionar, produzir etc. Somente as horas destinadas a
cursos não são suficientes para tais ações. Os órgãos oficiais que regem a
educação deveriam reconhecer essa necessidade e garantir, como forma de
profissionalização, uma formação contínua como complemento de sua carga horária
semanal. Caso contrário, por mais que se divulguem teorias e propostas
pedagógicas (por meio de artigos científicos, livros, dissertações, teses etc.), e que
se faça chegar, a o professor, documentos fundados na proposta
(sócio)interacionista, essas iniciativas não serão suficientes. Ele continuará apenas
tentando absorver as “novas” informações que lhe são repassadas, sem tempo
disponível para refletir sobre elas.
Se realmente interesse dos governantes em promover a educação no
país, importa que compreendam a aprendizagem na sala de aula, assim como o
conhecimento do professor, não como fenômenos estáticos, mas sim como
processos dinâmicos, por meio dos quais, tanto o profissional da educação como o
aluno, colocam-se como agentes transformadores da realidade. Porém, para que
isso ganhe legitimidade, faz-se mister investir (dentre outras coisas) na formação
continuada, visando ao desenvolvimento progressivo de suas potencialidades
profissionais, aliadas ao seu próprio desenvolvimento (social, político, ideológico
etc.) e, conseqüentemente, ao desempenho da prática educativa.
A necessidade despontou tanto nos questionários aplicados, como nas
entrevistas e nas aulas gravadas. Mesmo que a região Oeste tenha
indubitavelmente investido, desde a década de 1980, na formação de professores
por meio de cursos; mesmo que eu tenha “trabalhado” em muitos desses cursos,
explorando o ensino da Língua Portuguesa e, especificamente, da gramática, à luz
da concepção (sócio)interacionista, os dados denunciaram que não foram
suficientes para garantir, à prática pedagógica, a clareza, o discernimento em
relação à concepção adotada. Os documentos (Currículos e Parâmetros), da
maneira como chegaram ao professor, não propiciaram a compreensão necessária.
Em muitas situações, docentes que continuam agindo mecanicamente em
relação ao tratamento dado aos conteúdos de língua. Prova disso é que, mesmo
depois de quase três décadas, a maioria dos professores informantes ainda trabalha
335
a gramática subsidiado pela concepção que norteou, em anos anteriores, a sua
formação nas séries iniciais. Em outras palavras, adotam a postura determinada
pela escola tecnicista (de obedecer comandos da coordenadora pedagógica, da
direção da escola, etc.) e trabalham com a língua como forma, estrutura, que
precisa ser decorada para ser apreendida.
Os cursos de formação (inicial e continuada) não conferiram às ações
pedagógicas, um conhecimento dialético das teorias que fundamentam os
documentos pedagógicos, bem como das políticas governamentais que regem as
diferenças e/ou complementariedades das orientações.
Como romper com este paradigma e garantir uma postura mais reflexiva do
professor? De que forma a formação continuada poderia realmente despertar, nesse
profissional, o espírito de co-responsabilidade, de colegiabilidade, de investigação?
Os informantes apontaram (e minha experiência confirmou) que uma
modalidade de formação capaz de proporcionar alguma orientação nessa direção, é
a do grupo de estudos, organizado a partir de projetos “realizados com os
professores, para os professores e pelos professores, complementados pelas
comunidades sociais envolventes da escola” (ALARCÃO, 1998, p. 119), constituindo
em alternativas formativas capazes de transformar as escolas em autênticas
comunidades educativas.
No entanto, cabe ressaltar que a formação de profissionais críticos, reflexivos
e transformadores se assenta num projeto educacional pautado na ética, na
participação democrática e na formação política e social do professor. Trata-se,
portanto, de um desafio que não deve ser imputado apenas aos professores, nem
tampouco às agências formadoras. Ao contrário, cabem às universidades e ao poder
público oficial representado nas esferas municipal, estadual e federal,
responsabilizar-se pelo planejamento, execução e avaliação dos programas de
formação continuada.
Quando tais órgãos atenderem a essa necessidade, e apostarem na
formação continuada por meio de grupos de estudo - como uma das mais
importantes ações político-educacionais que poderão efetivar-se para complementar
e garantir a continuidade da formação inicial - então estarão dando início à reforma
educacional, pois a educação contará, certamente, com profissionais com uma
formação acadêmica que lhes permita melhor exercer o papel que lhes foi investido
pela própria sociedade.
336
E as outras ações, quais seriam? Obedecendo ao recorte proposto
inicialmente para este estudo, deixo esse problema para ser discutido em futuras
pesquisas, o que mostra que ainda um vasto campo investigativo a ser
considerado, na perspectiva de talvez trazer elementos que possam contribuir para
uma reforma educacional calcada nos parâmetros reais das necessidades
contemporâneas.
337
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SOARES, M. B. Alfabetização no Brasil: o estado do conhecimento. Brasília:
INEP/REDUC, 1989.
SOUZA, S. J. Infância e linguagem. 5.ed. Campinas-SP: Papirus, 1994.
SUASSUNA, L. Ensino de língua portuguesa: uma abordagem pragmática.
Campinas, SP: Papirus, 1995.
TEZZA, C. Material didático um depoimento. Educar, n. 20, p. 35-42. Curitiba:
Editora UFPR, 2002.
TRAVAGLIA, L. C. Gramática: ensino plural. São Paulo: Cortez, 2003.
_____. Gramática e interação: uma proposta para o ensino de gramática no e
graus. 3.ed. São Paulo : Cortez, 1996.
VEIGA, I. P. A. (org.) Caminhos da profissionalização do magistério. Campinas, SP:
Papirus, 1998.
VIEIRA, E. Estado e miséria social no Brasil de Getúlio a Geisel. o Paulo: Cortez,
1983.
VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos
psicológicos superiores. São Paulo: Martins Fontes, 1991.
_____. Interação entre aprendizado e desenvolvimento
.
In. M. Cole, S. Scribner et al.
(orgs) A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1984.
WACHOWICZ, L. A. O método dialético na didática. 4.ed. Campinas, SP: Papirus,
2001.
ZEICHNER, K. Para além da divisão entre professor-pesquisador e pesquisador
acadêmico. In: GERALDI; FIORENTINI & PEREIRA. Cartografias do trabalho
docente. Campinas: Mercado das Letras/ALB, 1998.
349
ANEXOS
350
ANEXO 01
CERTIFICADOS DE PARTICIPAÇÃO EM CURSOS DE FORMAÇÃO PARA
ALFABETIZADORES NO MODELO ERASMO PILOTTO
351
352
353
ANEXO 02
CERTIFICADOS DE PARTICIPAÇÃO EM CURSOS DE FORMAÇÃO PARA O
CBA
354
355
356
ANEXO 03 – QUESTIONÁRIO AOS PROFESSORES DE 4ª SÉRIE - ENSINO
FUNDAMENTAL
1- Sexo:
(a) Masculino
(b) Feminino
......................................................................................
2. Idade:
(a) Até 24 anos
(b) De 25 a 29 anos
(c) De 30 a 39 anos
(d) De 40 a 49 anos
(e) De 50 a 54 anos
(f) 55 anos ou mais
.....................................................................................
3. Formação no Ensino Médio (2º grau):
(a) Magistério
(b) Educação Geral
(c) Curso Técnico
(d) Outro. Qual? _________________________
......................................................................................
4. Formação acadêmica (Curso Superior):
(a) Não possuo.
(b) Estou cursando. Qual curso? ____________
____________________________________
(c) Já concluí. Qual curso? ________________
.......................................................................................
5. Se você fez curso superior, de que forma ele foi
realizado?
(a) Presencial.
(b) Semipresencial.
(c) À distância
.......................................................................................
6. Em relação à sua formação em Pós-graduação:
(a) Não fiz ainda e não pretendo fazer.
(b) Não fiz ainda, mas pretendo fazer.
(c) Estou fazendo. Qual curso?________________
______________________________________
(d) Já conclui. Qual curso? __________________
_______________________________________
.......................................................................................
7. Há quanto tempo você está lecionando?
(a) Há menos de 1 ano.
(b) De 1 a 2 anos.
(c) De 3 a 5 anos.
(d) De 6 a 9 anos.
(e) De 10 a 15 anos.
(f) De 16 a 20 anos.
(g) Há mais de 20 anos.
.......................................................................................
8. Há quanto tempo você trabalha neste município?
(a) Há menos de 1 ano.
(b) De 1 a 2 anos.
(c) De 3 a 5 anos.
(d) De 6 a 9 anos.
(e) De 10 a 15 anos.
(f) De 16 a 20 anos.
(g) Há mais de 20 anos.
...............................................................................................
9. Além da 4ª série, com quais outras turmas você
trabalha atualmente?
(a) 1ª série
(b) 2ª série
(c) 3ª série
(d) Outra. Qual?___________________________
(e) Nenhuma outra.
10. Em quantas escolas você trabalha?
(a) Apenas nesta escola.
(b) Em 2 escolas.
(c) Em 3 escolas.
(d) Em 4 ou mais escolas.
......................................................................................
11. Em quanto(s) turno(s) você trabalha?
(a) Um turno.
(b) Dois turnos.
(c) Três turnos.
.......................................................................................
12. Com qual disciplina vo se acha mais
preparado(a) para trabalhar?
(a) Língua Portuguesa.
(b) Matemática.
(c) História.
(d) Geografia.
(e) Ciências.
(f) Outra. Qual? __________________________
(g) Todas.
.......................................................................................
13. Se você se sente mais preparado(a) para trabalhar
com essa disciplina, qual a razão disso? (Assinale
a alternativa que melhor lhe representa)
(a) Minha formação é nesta área.
(b) Eu encontro mais material de apoio para
trabalhá-la.
(c) Eu fiz muitos cursos de formação nessa
área.
(d) Eu gosto de pesquisar nessa área.
(e) Por outro motivo. Qual? _________________
_____________________________________
_____________________________________
_____________________________________
.................................................................................
14. Com qual disciplina você se acha menos
preparado(a) para trabalhar?
(a) Língua Portuguesa
(b) Matemática
(c) História
(d) Geografia
(e) Ciências
(f) Outra. Qual? __________________________
(g) Todas.
.................................................................................................
15.
Se você se sente menos preparado(a) para trabalhar
com essa disciplina, qual a razão disso? (Assinale a
alternativa que melhor lhe representa)
(a) Minha formação não é nesta área.
(b) Eu não encontro ou tenho pouco material de apoio
para trabalhá-la.
(c) Eu fiz poucos cursos de formação nessa área.
(d) Eu não gosto de pesquisar nessa área.
(e) Por outro motivo. Qual? __________________
_____________________________________
_____________________________________
357
16. Complete o quadro abaixo, relacionando os curso de
LÍNGUA PORTUGUESA que vo participou nos
últimos anos:
Ano Carga
horária
Conteúdo Docente
2006
2005
2004
2003
.....................................................................................
17. Além de Cursos de Formação Docente, de que outra
forma de capacitação você mais participou nos últimos
anos (depois de 1998)? (Assinale apenas uma
alternativa)
(a) Grupo de Estudos.
(b) Teleconferências.
(c) Seminários
(d) Outro(s). Qual(is)? ____________________
____________________________________
____________________________________
.......................................................................................
18. Qual modalidade de formação você considera que
contribui mais significativamente para o seu
conhecimento e seu trabalho na sala de aula? (Assinale
apenas uma alternativa)
(a) Grupo de Estudos.
(b) Teleconferências.
(c) Seminários
(d) Cursos de Formação
(e) Outro(s). Qual(is)? ____________________
____________________________________
......................................................................................
19. Em relação aos Programas de Formação Continuada de
Professores dos quais você já participou e pretende
participar, como você acha que deveria ser encaminhado
para que houvesse maior aproveitamento?
(Numa escala de 01 a 10, numere as alternativas que
seguem, sendo que 01 é para o encaminhamento mais
importante e 10 para o encaminhamento que você
considera menos importante).
(a) – ( ) Leitura de textos teóricos.
(b) – ( ) Discussões teóricas individuais.
(c) – ( ) Troca de experiências entre colegas.
(d) – ( ) Sugestão de atividades.
(e) – ( ) Elaboração de propostas de atividades.
(f) – ( ) Análise de livros didáticos.
(g) – ( ) Apresentação de teoria e
encaminhamento prático.
(h) – ( ) Discussões teóricas em grupo e
apresentação em forma de Seminários.
(i) – ( ) Só atividades práticas como modelos para
trabalhar com os alunos.
(j) – ( ) Outra. Qual? ______________________
20. Dentro da Língua Portuguesa, em qual das práticas
abaixo você gostaria de receber maior formação?
(Assinale apenas uma alternativa)
(a) Leitura e interpretação.
(b) Produção e reescrita de texto.
(c) Gramática no texto (contextualizada).
(d) Gêneros textuais.
(e) Oralidade.
......................................................................................
21. Por que você escolheu essa alternativa? Responda
com suas palavras (use o verso da folha, se for
necessário).
_________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
......................................................................................
22. Em relação às práticas de “gramática
contextualizada”, como você as explicaria em
poucas palavras?
(Assinale apenas uma alternativa)
(a) Trata-se de ensinar a gramática usando texto do
qual eu retiro palavras ou frases para
classificá-la gramaticalmente.
(b) Trata-se de pedir para que o aluno encontre, no
texto, determinada(s) classe(s) de palavra(s) e
classifique-a(s).
(c) Trata-se de propor questionamentos aos alunos
de forma que eles reconheçam os elementos
gramaticais como importantes para construir o
significado do texto.
(e) Nenhuma alternativa porque eu não me sinto
seguro(a) para definir esse eixo.
........................................................................................
23.
Ainda em relação à “gramática contextualizada”, como
você considera o trabalho com esse eixo? (Assinale
apenas uma alternativa)
(a) Muito fácil porque eu compreendo bem essa forma de
encaminhamento.
(b) Fácil teoricamente, mas ainda tenho dúvidas quanto
ao encaminhamento prático.
(c) Razoável, pois venho colocando em prática algumas
sugestões que chegam às minhas mãos, mas ainda
não me sinto muito seguro(a)
para produzir atividades sozinho(a).
(d) Difícil, porque é uma nova maneira de trabalhar com
a gramática e não compreendo bem essa forma de
encaminhamento.
(e) Muito difícil. Prefiro trabalhar com a gramática
isolada.
(f) Desconheço essa forma de encaminhamento.
........................................................................................
24. Como você avalia o enfoque que o livro didático tem
dado à “gramática contextualizada”? (Assinale apenas
uma alternativa)
(a) Tenho encontrado livros didáticos que trabalham
________________________________________
________________________________________
_________________________________________
________________________________________
________________________________________
358
totalmente com a gramática contextualizada.
(b) Tenho encontrado livros didáticos que tentam
trabalhar dessa forma na maioria das atividades.
(c) Tenho encontrado livros didáticos que apresentam
apenas algumas atividades nessa perspectiva.
(d) Os livros didáticos, na maioria, usam o texto como
pretexto e continuam priorizando a teoria
gramatical.
(e) Os livros didáticos, que eu conheço, não trabalham
com a gramática contextualizada.
....................................................................................
25. Além dos textos que você tem levado para a sala de aula,
você tem lido outros textos teóricos (livros, artigos
científicos...) que discutem o ensino da gramática?
(Assinale apenas uma alternativa)
(a) Sim. Tenho lido pelo menos um artigo (ou livro) por
mês.
(b) Sim. Tenho lido pelos um artigo (ou livro) a cada dois
meses.
(c) Sim. Tenho lido pelo menos um artigo (ou livro) a
cada seis meses.
(d) Tenho lido, mas muito pouco.
(e) Nada tenho lido a esse respeito.
.......................................................................................
26. Como você tem acesso às leituras sobre o ensino da
gramática? (Assinale apenas uma alternativa)
(a) Por meio da biblioteca da escola ou do município.
(b) Por meio de cursos de graduação ou especialização.
(c) Por meio de cursos de formação continuada.
(d) Adquirindo livros e/ou revistas científicas.
(e) Não tenho acesso a esse tipo de leitura. (nesse caso,
responda à questão seguinte)
.......................................................................................
27. O difícil acesso à leitura se deve ao fato de: (Assinale
apenas uma alternativa)
(a) Não encontrar esse tipo de leitura na biblioteca da
escola ou do município.
(b) Por não estar estudando no momento.
(c) Por que os cursos de formação continuada não estão
indicando nenhuma leitura.
(d) O salário não é suficiente para adquirir livros ou
revistas científicas.
(e) Não gosto de ler, por isso não procuro esse tipo de
leitura.
...............................................................................................
28. Você sente necessidade de ter mais material de
apoio para consulta ao trabalhar com a gramática?
Que tipo de material? Dê sugestões, escrevendo no
espaço abaixo.
________________________________________
________________________________________
________________________________________
________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
.......................................................................................
29. Escreva, em poucas palavras, qual a “Concepção
de Linguagem” que embasa o seu trabalho com a
língua. (use o verso da folha, se for necessário).
_________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
.......................................................................................
30. Responda: por que ensinamos gramática a nossos
alunos? (use o verso da folha, se for necessário).
_________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
__________________________________________
__________________________________________
__________________________________________
__________________________________________
__________________________________________
31. Você já ouviu falar sobre gêneros (textuais e
discursivos)? Se ouviu, qual a sua relevância para o
ensino da Língua Portuguesa?
_________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
Muito Obrigada pela sua Colaboração com o Ensino e a Pesquisa
359
ANEXO 04 – ENTREVISTA COM PROFESSORES DE 4ª SÉRIE – ENSINO
FUNDAMENTAL
4- Por que ensinar gramática? Como ensiná-la?
5- Os cursos de Língua Portuguesa, dos quais você participou, trouxeram
contribuições para suas atividades na sala de aula, principalmente em
relação ao ensino da gramática contextualizada? Por quê?
6- O que é necessário para que haja maior aprofundamento de como
conduzir o trabalho com a gramática contextualizada na sala de aula?
360
ANEXO 05 – QUESTIONÁRIO PERFIL DOS PROFESSORES EM RELAÇÃO À
EDUCAÇÃO DE 1º ANO E 1ª A 4ª SÉRIES DO ENSINO FUNDAMENTAL –
MUNICÍPIOS DA REGIÃO OESTE DO PARANÁ
1. Nome do município: _____________________________________________________
..............................................................................................................................................................
2. Ano de criação do município:
a. ( ) Antes da década de 1970.
b. ( ) Década de 1970.
c. ( ) Década de 1980.
d. ( ) Década de 1990.
e. ( ) Década de 2000.
..............................................................................................................................................................
3. Número de habitantes:
a. ( ) Até 3.000.
b. ( ) De 3.001 a 5.000.
c. ( ) De 5.001 a 10.000.
d. ( ) De 10.001 a 15.0000.
e. ( ) De 15.001 a 30.000.
f. ( ) De 30.001 a 50.000.
g. ( ) Acima de 50.000.
..............................................................................................................................................................
4. Número de Professores que trabalham com o ano e com turmas de a séries do ensino
fundamental.
a. ( ) Menos de 20.
b. ( ) De 21 a 40.
c. ( ) De 41 a 60.
d. ( ) De 61 a 80.
e. ( ) De 81 a 100.
f. ( ) De 101 a 200.
g. ( ) De 201 a 500.
h. ( ) Acima de 500.
...............................................................................................................................................................
5. Desse número de professores, quantos são efetivos?
a. ( ) Menos de 15.
b. ( ) De 16 a 20.
c. ( ) De 21 a 40.
d. ( ) De 41 a 60.
e. ( ) De 61 a 80.
f. ( ) De 81 a 100.
g. ( ) De 101 a 200.
h. ( ) De 201 a 500.
i. ( ) Acima de 500.
...............................................................................................................................................................
6. Número total de alunos matriculados do 1º ano a 4ª série:
a. ( ) Menos de 500.
b. ( ) De 501 a 1000.
c. ( ) De 1001 a 2000.
d. ( ) De 2001 a 4000.
e. ( ) De 4001 a 8000.
f. ( ) ( ) Acima de 8000.
361
8. Número de Escolas no município (marque um X na quantidade correspondente):
De 1 a 3 De 4 a 8 De 8 a 10 Acima de 10
a. Zona urbana ( ) ( ) ( ) ( )
b. Zona rural ( ) ( ) ( ) ( )
c. Distritos ( ) ( ) ( ) ( )
...............................................................................................................................................................
9. Em relação à formação dos professores de ano a série, indique, aproximadamente, o
percentual que:
Até 10% De 11%
a 30%
De 31%
a 50%
De 51%
a 80%
Acima
de 81%
a. Cursou apenas o Magistério (ou
outro curso correspondente).
( ) ( ) ( ) ( ) ( )
b. Licenciado em Letras. ( ) ( ) ( ) ( ) ( )
c. Licenciado em Pedagogia. ( ) ( ) ( ) ( ) ( )
d. Outra licenciatura. ( ) ( ) ( ) ( ) ( )
...............................................................................................................................................................
10. Em relação à formação dos professores de ano a série, indique, aproximadamente, o
percentual dos professores que fizeram um curso de pós-graduação:
a. ( ) Até 10%
b. ( ) De 11% a 30%
c. ( ) De 31% a 50%
d. ( ) De 51% a 80%
e. ( ) Acima de 81%
...............................................................................................................................................................
11.Indique quantas horas de formação (cursos, palestras, conferências...) foram ofertadas aos
professores, na área de Língua Portuguesa:
Nenhum
a
8 h/a 16 h/a 24 h 32h 40h Acima
de 40h
a. No ano de 2000. ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )
b. No ano de 2001 ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )
c. No ano de 2002. ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )
d. No ano de 2003. ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )
e. No ano de 2004. ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )
e. No ano de 2005 ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )
f. No ano de 2006 ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )
................................................................................................................................................................
12. Vocês têm grupo de estudos organizado e atuando no município?
a. ( ) sim, com _________ participantes. (indicar o número de participantes)
b. ( ) não.
...............................................................................................................................................................
13. Em relação ao tempo de serviço dos professores de 1º ano a 4ª série, indique:
Nenhum
Até
10%
De
11% a
20%
De 21%
a 40%
De
41% a
60%
De
61% a
80%
Acima
de 81%
a. Menos de 2 anos. ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )
b. De 2 a 5 anos. ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )
c. De 6 a 10 anos. ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )
362
d. De 11 a 15 anos. ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )
e. De 16 a 25 anos. ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )
f. Acima de 26 anos. ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )
...............................................................................................................................................................
14. Qual a faixa-etária dos professores de seu município?
Nenhum
Até
10%
De
11% a
20%
De 21%
a 40%
De
41% a
60%
De
61% a
80%
Acima
de 81%
a. Até 24 anos. ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )
b. De 25 a 29 anos. ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )
c. De 30 a 39 anos, ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )
d. De 40 a 49 anos ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )
e. De 50 a 54 anos. ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )
f. 55 anos ou mais. ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )
................................................................................................................................................................
15. Qual o piso salarial (líquido) dos professores por 20 horas de trabalho?
(a) até R$300,00.
(b) De R$301,00 a R$500,00
(c) De R$501,00 a R$700,00
(d) De R$701,00 a R$1.000,00
(e) Acima de R$1.000,00
................................................................................................................................................................
16. Pelas atitudes no trabalho, qual seria o grau de satisfação dos professores em relação ao
salário?
(a) Insatisfeitos
(b) Pouco satisfeitos
(c) Satisfeitos
(d) Muito satisfeitos
...............................................................................................................................................................
17. Qual é o número máximo de alunos com os quais os professores trabalham numa turma?
(a) 15 alunos
(b) 20 alunos
(c) 25 alunos
(d) 30 alunos
(e) 35 alunos
(f) 40 ou mais alunos.
...............................................................................................................................................................
18. Com que material de apoio (humano) os professores podem contar?
(a) Só com auxiliar de classe
(b) Só com a coordenação pedagógica
(c) Só com orientador(a)
(d) Só com o(a) diretor(a)
(e) Com auxiliar de classe e coordenação pedagógica
(f) Com coordenação pedagógica e orientador(a)
(g) Com diretor(a), auxiliar de classe
(h) Com diretor(a), auxiliar de classe e coordenação pedagógica
(i) Com diretor(a), auxiliar de classe e coordenação pedagógica e orientador(a)
(j) Com outro apoio. Qual? __________________________________________________
363
19. Todas as escolas do município têm bibliotecas? (entendida como uma sala especialmente para
esse fim)
(a) Sim, todas têm.
(b) 2/3 das escolas têm
(c) 50% das escolas têm.
(d) 1/3 das escolas têm.
(e) Nenhuma escola tem biblioteca.
20. Com que outros materiais de apoio (além do quadro e giz) o professor do seu município pode
contar? (assinale só uma alternativa).
(a) TV e vídeo.
(b) Retroprojetor.
(c) Datashow.
(d) Mimeógrafo.
(e) Computador e impressora.
(f) TV e vídeo e retroprojetor.
(g) TV e vídeo, retroprojetor e mimeógrafo.
(h) TV e vídeo, retroprojetor, datashow e mimeógrafo
(i) TV e vídeo, retroprojetor, datashow, mimeógrafo, computador e impressora.
(j) TV e vídeo e datashow.
(k) TV e vídeo e mimeógrafo.
(l) TV e vídeo, computador e impressora.
(m) Retroprojetor e datashow.
(n) Retroprojetor e mimeógrafo.
(o) Retroprojetor e computador com impressora.
(p) Datashow e mimeógrafo.
(q) Datashow, computador e impressora.
(r) Mimeógrafo, computador e impressora.
...............................................................................................................................................................
21. A equipe de apoio pedagógico da Secretaria Municipal é formada por quantas pessoas?
(a) 2 pessoas.
(b) 3 pessoas.
(c) 4 a 6 pessoas
(d) 7 a 10 pessoas
(e) 11 a 15 pessoas
(f) Mais de 15 pessoas
...............................................................................................................................................................
22. Os professores de seu município têm acesso à internet na escola onde trabalha?
(a) Sim. Têm internet à disposição (na sala dos professores ou na biblioteca).
(b) Não têm internet disponível na escola.
(c) Têm, mas com tempo determinado.
...............................................................................................................................................................
Nome e função do responsável pelas informações: __________________________________
________________________________________________________________________________
Data: ______________/ ____________________/ 2007.
Muito Obrigada pela sua Colaboração com o Ensino e a Pesquisa!!!
Profa Terezinha da Conceição Costa Hübes
Profa Terezinha da Conceição Costa HübesProfa Terezinha da Conceição Costa Hübes
Profa Terezinha da Conceição Costa Hübes
364
ANEXO 06 – SUGESTÕES DE PRODUÇÃO DE TEXTOS
Todo trabalho de texto deve ser precedido de leitura e discussão.
Quando o aluno produz um texto, deve escrever para alguém ler, para expor na sala, na
escola, na comunidade..., garantindo a INTERLOCUÇÃO. O professor não deve ser o
único leitor do texto.
O professor, como leitor, deve indicar os pontos para serem melhorados, a fim de
conscientizar o aluno de como o texto pode ser reestruturado e melhorado para que
OUTROS leiam e compreendam-no.
A produção do aluno não deve ser vista apenas como objeto de leitura, mas também
como produto da atividade escrita do aluno.
O trabalho de produção de texto pode originar a partir de diferentes situações
interessantes e até divertidas. Segue algumas sugestões de produção a partir de
NARRATIVAS:
1. DI-VERSÕES: Coletânea, em forma de livro, de diferentes versões de um conto
produzidas pelos alunos.
2. CON-FABULANDO: Coletânea, em forma de livro, criadas pelos alunos da classe,
transformando determinados aspectos do texto (desfecho, personagens, ponto de vista,
etc.
3. ASSOMBRACONTOS: Coletânea, em forma de livro, de contos de assombração,
reescritos pelos alunos.
4. “CAUSOS” DA MINHA TERRA: VERDADE OU MENTIRA? Coletânea, em forma de
livro, de lendas e causos populares resgatados na comunidade pelos alunos da classe.
5. AVENTURANDO: Coletânea, em forma de livro, de contos de aventuras produzidos
pelos alunos.
6. HISTÓRIAS QUE OS POETAS CONTAM: Coletânea, em forma de livro, de contos
criados pelos alunos, a partir de “poemas que contam histórias.
7. UM OUTRO LADO DA HISTÓRIA... : Coletânea, em forma de livro, de textos produzidos
pelos alunos, a partir da subversão de contos clássicos, de mitos, tais como: Os três
porquinhos maus; O patinho lindo; Sansão, o anão...
Produção a partir de JORNAIS:
1. ESCRITA DE NOTÍCIAS: Transformar um acontecimento ouvido, lido ou presenciado em
uma notícia escrita.
2. CONFECÇÃO DE UM JORNAL MURAL: Após explorar os elementos que compõem um
jornal, propor aos alunos a confecção de um jornal mural, distribuindo a cada grupo, a
produção de um texto específico, até a sua ilustração.
3. ESCRITA DE RESENHAS CRÍTICAS: Explorar pequenos textos e orientá-los quanto à
produção de um texto crítico, a respeito daquele lido.
- Produção de texto, a partir de escrita de CARTAS.
- produção de texto a partir de participação em CAMPANHAS DE SAÚDE.
365
ANEXO 07 – TRABALHO DE CORREÇÃO DE TEXTO
Síntese de: RUIZ, Eliana. Como se corrige redação na escola. Campinas : Mercado de
Letras, 2001.
- O QUE É O TRABALHO DE CORREÇÃO?
O trabalho de correção tem o objetivo de chamar a atenção
do aluno para os problemas do texto. A tarefa de corrigir é,
assim, uma espécie de “caça erros”, já que o professor,
quando intervém por escrito, em geral dirige a sua atenção
para o que o texto tem de “ruim”, não de “bom”; são os
“defeitos”, e não as “qualidades” que, com raríssimas exceções, são focalizados. A
correção consiste, dessa forma, no trabalho de marcar no texto do aluno as possíveis
“violaçõeslingüísticas nele cometidas contra uma suposta imagem do que venha a ser um bom
texto.
- O QUE GERALMENTE ESPERAMOS DOS TEXTOS PRODUZIDOS PELOS ALUNOS?
Quando lemos alguma coisa, como meros falantes da língua, partimos dos princípio de
que aquilo nos faz algum sentido, é coerente para nós. Sempre agimos como se o texto
fosse coerente: enquanto o autor sempre quer produzir um texto que faça sentido, o
leitor sempre a produção como algo feito para ter sentido e tudo faz para calcular o
sentido do texto e encontrar sua coerência. Mas, e o professor? Como o texto do
aluno? O professor, por princípio, não crédito de coerência ao texto do aluno. Ao
contrário, concebe-o como um texto potencialmente incoerente, uma vez que pode, em
algum momento, estar falhando na produção de sentido. É por isso que o texto na
expectativa de encontrar falhas, e assim, fazer jus ao seu papel instituído de corretor.
Mas, afinal, qual o comportamento verbal do professor diante do texto do aluno? Ou seja, quando
encontra aquilo que realmente procura (erros)? Como ele corrige os “erros” dos textos?
O texto interventivo do professor é um texto sobreposto ao texto do aluno, ou seja, para
falar acerca do texto do aluno, escrevendo, o professor utiliza o mesmo espaço utilizado
pelo aluno na redação, qual seja, a própria folha de papel já preenchida pela escrita.
TIPOLOGIA DE CORREÇÃO DE TEXTOS MENCIONADA POR SERAFINI (1989)
- Correção indicativa: consiste em marcar junto à margem as palavras, as frases e os
períodos inteiros que apresentam erros ou são pouco claros. O professor
freqüentemente se limita à indicação do erro e altera muito pouco; há somente correções
ocasionais, geralmente limitadas a erros localizados, como os ortográficos e os lexicais.
- Correção resolutiva: consiste em corrigir todos os erros, reescrevendo palavras, frases e
períodos inteiros. O professor realiza uma delicada operação que requer tempo e
empenho, isto é, procura separar tudo o que no texto é aceitável e interpretar as
intenções do aluno sobre trechos que exigem uma correção; reescreve tais partes
fornecendo um texto correto. Nesse caso, o texto é eliminado pela solução que reflete a
opinião do professor.
- Correção classificatória: consiste na identificação não-ambígua dos erros através de
uma classificação. Em alguns desses casos, o próprio professor sugere as modificações,
mas é mais comum que ele proponha ao aluno que corrija sozinho o seu erro.
- Correção textual-interativa:
trata-se de comentários mais longos dos que se fazem na
margem, razão pela qual são geralmente escritos em seqüência ao texto do aluno. Tais
366
comentários realizam-se na forma de pequenos bilhetes que, muitas vezes, dada sua
extensão, estruturação e temática, mais parecem verdadeiras cartas.
QUAL O VALOR DESSES TIPOS DE CORREÇÕES?
Correções monofônicas, isto é, intervenções de tipo resolutivo, instauram uma
relação assimétrica entre professor e aluno, na qual apenas aquele que detém o saber
sobre o texto, na qual apenas o professor detém o saber sobre o texto, e condicionam um
determinado tipo de revisão por parte do aluno: cópias mecanizadas de soluções
propostas pelo professor.
Já as correções polifônicas, ou seja, indicativas, classificatórias, ou textuais-
interativas, dada a simetria que instauram nessa mesma relação, na qual tanto professor
como aluno são detentores do saber sobre o texto, acabam gerando outro tipo de
revisão: alterações bem ou malsucedidas que revelam, contudo, uma tentativa do sujeito
de rever o seu discurso, assumindo-se como autor.
Síntese elaborada por: Terezinha da Conceição Costa Hübes (Profa.Ms.
do Curso de Letras da UNIOESTE / Cascavel)
367
ANEXO 08 – PROJETO DE TRABALHO COM OS GÊNEROS
ESTRUTURA DE PROJETOS PEDAGÓGICOS PARA LEITURA E PRODUÇÃO DE
GÊNEROS TEXTUAIS NA ESCOLA
Início do Projeto: Explicitação do objetivo final do projeto quanto à divulgação ao público
(fora da sala de aula e mesmo da escola) dos textos a serem produzidos pelos alunos, ou
seja, PARA QUEM SE IRÁ ESCREVER.
- Sugestões de textos que poderão ser produzidos:
Confeccionar Cartões de Natal e enviá-los a familiares e amigos
Escrever cartas (aos pais, amigos, ao leitor – revista, ao Papai Noel, ao Prefeito...)
Produzir cartazes, panfletos, faixas (caso ocorrer algum evento na escola, ou no
município)
Folders educativos (Campanha de Coleta Seletiva do lixo, Campanha de vacinação,
Degue, Febre Amarela...)
Produção de Fábulas (para a confecção de um livro que irá circular na escola, estar
à disposição na Biblioteca...)
Bilhete (ao professor, ao pai, à mãe, ao irmão...)
Produzir livros de poesia para serem lançados em evento na escolas, entre outros.
PASSOS DO DESENVOLVIMENTO DO PROJETO
LEITURA
1. O professor seleciona o gênero com o qual pretende trabalhar. Ex. Cartões de
Natal
2. O professor leva para sala de aula diversos textos que pertençam àquele
gênero escolhido (e pode também pedir para os alunos trazerem de sua
casa) exemplos de textos do gênero com qual será trabalhado. Ex.
Cartões com vários objetivos: de amigo, de namorado, de dia das Mães,
DE NATAL e outros.
3. O professor distribui os textos entre os alunos e deixa que estes
circulem entre eles. Em seguida, pede que façam uma lista daquilo que têm em
comum. Ex. cartão: mensagens curtas, belas, colorido, tamanho etc.
4. Em seguida, o professor questiona: quem escreveu esse gênero textual?Com que
propósito? Onde? Quando? Como? Com base em que informações? Para quem ele
escreveu? Quem esse tipo de gênero? Por que o faz? Onde o encontramos? No
caso dos cartões, deixar que cada um analise o seu cartão.
5. Na seqüência, deixar que os alunos percebam a temática daquele gênero; sua forma
de organização (distribuição das informações); sua composição geral (se inclui ou
não determinados elementos não verbais, como: cor, padrão gráfico, fotos,
ilustrações, gráficos e outros tipos de figuras ou recurso).
6. Observar, ainda, o suporte onde o gênero circula: tipo do papel, se é um livro, uma
embalagem, um suporte metálico, de madeira, uma revista, um jornal, um envelope...
Essas observações remetem o aluno às condições de produção e de circulação do
gênero
Obs. A organização composicional típica do gênero discursivo a ser produzido e as
condições que determinam sua produção e circulação são dois níveis de conhecimentos
básicos ao domínio da escrita de textos para que o aluno saiba onde buscar informações
necessárias para sua produção escrita, quais informações selecionar para o seu texto e
como organizá-lo por escrito.
368
ESCRITA
1. Para a produção escrita do texto escolhido, pode-se organizar os alunos
em pequenos grupos. Isso favorece a interação, a troca de informações,
a divisão de tarefas, se o gênero for mais complexo, entre outras
vantagens.
2. É interessante que, para manter a essência da proposta pedagógica,
que a obtenção de informações necessárias ao texto e à redação
propriamente dita seja feita de acordo com a produção desse gênero na
sociedade. Por exemplo: o que é comum aparecer escrito nos cartões
de Natal? Como organizamos a mensagem? Qual o tipo de papel em que
normalmente aparece impresso? Além disso, é importante que os alunos
compreendam que certas produções não ficam prontas num dia. Algumas
demandam pesquisas, fotos, entrevistas, o que exige tempo e empenho.
Naturalmente, o professor deve avaliar com a sala a viabilidade de certas produções
(no caso do cartão, pode-se optar por papéis diferentes daqueles que comumente
encontramos nos cartões).
3. Produção da primeira versão (em rascunho – apenas um esboço).
4. Revisão colaborativa do texto (o professor pode dar algumas sugestões, se
necessárias);
5. Produção da segunda versão (aproximando-se o máximo possível da versão final)
6. Revisão colaborativa do professor (quanto à pontuação, parágrafos, coesão, domínio
gramatical, adequação vocabular).
7. Produção da versão final, incluindo o suporte para a circulação do texto (No caso do
cartão, produção do envelope, endereçamento e postagem).
DIVULGAÇÃO AO PÚBLICO
1. De acordo com o gênero selecionado, o professor deverá organizar a
sua forma típica de circulação montar uma exposição, distribuir os
textos ao público alvo ou, no caso de cartões, cartas, postá-los no
correio. Essa é uma etapa de grande satisfação para todos os envolvidos
no Projeto. Sentimentos como emoção e orgulho encerram um processo
que, certamente, contribuiu muito para o desenvolvimento das
habilidades comunicativas dos alunos e para a ampliação de seu
conhecimento de mundo.
369
ANEXO 09 – TABELA DIAGNÓSTICA
CRITÉRIOS DE ANÁLISE LINGUISTICA
Aspectos não dominados (3ª e 4ª séries)
A L U N O S
1- QUANTO AO GÊNERO
1.1- Autor (quem escreveu)
1.2- Para quem
1.3- Para que veículo de circulação
1.4- Corresponde a estrutura do
gênero
2- QUANTO AOS ASPECTOS
TEXTUAIS
8,2-Clareza e coerência:
8.2.1- Unidade temática
8.2.2- Informações completas
8.2.3- Idéias bem desenvolvidas
8.2.4- Seqüência cronológica
8.2.5- Pontuação
8.2.6- Discurso direto
8.2.7- Discurso indireto
8.2.8- Paragrafação
8.2.9- Legibilidade do texto
8.2.10-Seqüência lógica
8.2.11-Idéias sem contradição
8.2.12- Idéias sem ambigüidade
8.2.13- Informações não
redundantes
8.2.14- Título
8.2.15- Consistência
8.2.16- Objetividade
2- QUANTO AOS ASPECTOS
LINGUISTICOS
8.2- Coesão nominal (referencial)
8.2-1. Emprego dos pronomes
8.2-2. Emprego dos advérbios
8.3.3- Emprego de expressões
sinônimas
8.3.4- Emprego de repetições
8.4- Coesão verbal:
8.4.1- Emprego dos verbos (sem
sujeito)
8.4.2- Adequação dos tempos e
formas verbais às pessoas do
discurso.
8.5- Mecanismos de conexão
(coesão seqüencial):
8.5.1- Emprego das conjunções
8.6- Organização sintática:
8.6.1 Concordância verbal
8.6.2 Concordância nominal
8.6.3 Regência verbal
8.6.4 Regência nominal
370
3- QUANTO AOS ASPECTOS
ORTOGRÁFICOS
Letras forma X cursiva
Uso de maiúscula e minúscula
Transcrição fonética
Variação lingüística
Hipercorreção
Segmentação
Juntura
Acentuação
Separação das palavras em sílabas
Uso indevido de letras
371
ANEXO 10 – SUGESTÕES DE ATIVIDADES PARA A REESCRITA COLETIVA
REESCRITA COLETIVA DE TEXTO
Proposta elaborada pela Profa. Dtda. Terezinha C. Costa-Hübes
1. Professor(a) corrige todos os textos dos alunos, diagnosticando os problemas
apresentados.
2. Professor(a) destaca O PROBLEMA mais freqüente nos textos.
3. Professor(a) SELECIONA dentre todos, UM TEXTO QUE REPRESENTE O
PROBLEMA DA MAIORIA.
4. Professor(a) transcreve o TEXTO SELECIONADO num cartaz ou digita-o,
xerocando-o depois numa transparência, CORRIGINDO TODOS OS DEMAIS
PROBLEMAS, deixando sem correção APENAS AQUELE QUE SERÁ
TRABALHADO. Ex. Discurso direto
A CIGARRA E A FORMIGA
Era uma vez uma formiga estava trabalhando cansada enquanto a cigarra
cantava e cantava até o amanhecer. Então a formiguinha suando falou cigarra
me ajude um pouco. E ela nem ouviu e continuou cantando até que, mais uma vez,
a formiga gritou cigarra você nunca faz nada. fica cantando. Levanta daí e
vem trabalhar. Mas a cigarra falou eu canto. Para que trabalhar? E continuou
cantando. Mas a formiga olhou para frente e junto com todas as formigas
começaram a falar para a cigarra trabalhar. E aí a cigarra achou que devia ajudar as
formigas e, então, começou a trabalhar. Assim, viveram felizes para sempre.
5. Professor(a) lê o texto com os alunos, destacando o problema apresentado (no caso
do discurso direto, sublinha a fala da(s) personagem(ns)).
6. Em seguida, vai reescrevendo o texto no quadro, chamando a atenção dos alunos
para o PROBLEMA QUE ESTÁ SENDO TRABALHADO (no caso, discurso direto).
Ao final da escrita, tem-se o seguinte texto reestruturado:
A CIGARRA E A FORMIGA
Era uma vez, uma formiga estava trabalhando cansada enquanto a cigarra
cantava e cantava até o amanhecer.
Então a formiguinha suando falou:
___ Cigarra me ajude um pouco.
Ela nem ouviu e continuou cantando até que, uma vez, a formiga gritou:
___ Cigarra, você nunca faz nada. fica cantando. Levanta daí e vem
trabalhar.
Mas a cigarra falou:
___ Eu já canto. Para que trabalhar?
E continuou cantando. Porém a formiga olhou para frente e junto com todas as
formigas começaram a falar para a cigarra trabalhar.
E aí a cigarra achou que devia ajudar as formigas e, então, começou a trabalhar.
Assim, viveram felizes para sempre.
372
ANEXO 11 – SUGESTÕES DE ATIVIDADES A PARTIR DA REESCRITA
INDIVIDUAL DO TEXTO PRODUZIDO PELO ALUNO
ATIVIDADES PARA REESCRITA DE TEXTO - INDIVIDUAL
2ª SÉRIE
PONTUAÇÃO:
Veja este texto produzido por uma criança de 2ª série:
É um texto muito legal, mas quem o escreveu esqueceu de pontuá-lo. Vamos ajudar a
pontuar esse texto?
1. Responda cada uma das perguntas abaixo e, ao final de cada resposta, coloque um
ponto. E se aconteceu mais de uma coisa no mesmo dia, separe-a com vírgula.
a. Como foi a semana da criança? ________________________________________
b. O que aconteceu na segunda-feira? _____________________________________
c. O que teve na terça-feira? _____________________________________________
d. O que teve na quarta-feira? ___________________________________________
e. O que teve na quinta-feira? ____________________________________________
f. E na sexta-feira, o que teve? __________________________________________
2. Agora junte todas essas respostas e reescreva de novo o texto, não esquecendo de
copiar as vírgulas e o ponto que foram colocados em cada resposta.
ATIVIDADES PARA REESCRITA DE TEXTO
3ª SÉRIE
PONTUAÇÃO E PARAGRAFAÇÃO
Vamos ver o este aluno de 3ª série escreveu em seu texto.
Semana da criança
A semana da criança foi muito legal na segunda o Gaspar veio
e cantou música de igreja. Na terça teve brincadeira na quarta teve
o piquenique tinha o rio tinha o campo tinha corda para pular na
quinta teve brincadeira na sexta teve a festinha teve geladinho teve
dança teve bolo foi bem legal. Eu vou contar mais um pouco na
terça teve dominó, ludo, corda, vôlei, futebol, alguns piás e meninas
jogaram pedrinhas que legal
Cidadania da criança
As crianças de oito anos trabalham na roça com seus pais para ter uma
comida saudável e para nunca passar fome são crianças que nem o Rafael ele
trabalha na roça com seu pai mas cedo ele vai para a escola quando chega da
escola vai para seu quarto guarda a mochila troca de roupa come sua comida e
descansa um pouco para ir trabalhar na roça com sua mãe e seu pai ele carpi
feijão e outras coisas como milho soja etc. quando está quase escurecendo o pai
de Rafael fala vamos para casa amanhã nós continuamos a carpir chegando em
casa vão tomar banho jantar e depois eles esperam a comida abaixar e vão
dormir no outro dia Rafael acorda muito cedo e vai para a escola
373
1. Veja que é um belo texto com suas idéias, mas o aluno não pontuou e não fez
nenhum parágrafo. Vamos ajudá-lo. Então organize as idéias pedidas abaixo,
selecionando-as, cada qual no seu parágrafo.
1º Parágrafo:
Por que as crianças trabalham?
2º Parágrafo:
Como é o Rafael?
3º Parágrafo:
O que acontece quando está
Quase Escurecendo?
4º Parágrafo:
O que o pai de Rafael fala?
5º Parágrafo:
Eles vão para casa fazer o quê?
6º Parágrafo:
E no outro dia, o que acontece?
2. Agora que você separou o texto em parágrafo, vamos pontuá-lo?
a) Coloque um ponto no final do primeiro parágrafo.
b) Releia o que você escreveu no segundo parágrafo. Coloque ponto onde a
pausa é maior e separe com rgula todas as atividades que Rafael faz. Não
esqueça do ponto no final do parágrafo.
c) No terceiro parágrafo, o pai de Rafael se prepara para falar. Que sinal de
pontuação usamos antes da fala de uma pessoa?
d) E agora, no quarto parágrafo, o pai está falando. Para marcar sua fala, o
que colocamos antes? Veja que ele fala duas coisas. Separe-as com ponto.
Não esqueça do ponto no final do parágrafo.
e) Separe com vírgula o que a família faz quando chega em casa. Coloque o
ponto no final do parágrafo.
f) Coloque um ponto no final do último parágrafo.
3. Agora que você ajudou a pontuar o texto, copie-o, corretamente, obedecendo aos
PARÁGRAFOS e aos SINAIS DE PONTUAÇÃO. Não esqueça: sempre depois de
um ponto, use LETRAS MAIÚSCULAS.
________________________________________
________________________________________
________________________________________
________________________________________
________________________________________
________________________________________
________________________________________
________________________________________
________________________________________
________________________________________
________________________________________
________________________________________
________________________________________
________________________________________
________________________________________
________________________________________
________________________________________
_____________________________________
374
ANEXO 12 – ATIVIDADES: COESÃO REFERENCIAL
A CORUJA E A ÁGUIA
A coruja e a águia, depois de muita briga, resolveram fazer as pazes.
__ Basta de guerra __ disse a coruja. __ O mundo é grande, e tolice maior que o mundo é
andarmos a comer os filhotes uma da outra.
__Perfeitamente __ respondeu a águia. __ Também eu não quero outra coisa.
__ Nesse caso combinemos isto: de ora em diante não comerás nunca meus filhotes.
__ Muito bem. Mas como posso distinguir os teus filhotes?
__ Coisa fácil. Sempre que encontrares uns borrachos lindos, bem-feitinhos de
corpo, alegres, cheio de uma graça especial que não existe em filhotes de nenhuma outra
ave, já sabes, são os meus.
__ Está feito! __ concluiu a águia
Dias depois, andando ‘a caça, a águia encontrou um ninho com três monstrengos
dentro, que piavam de bico aberto.
__ Horríveis bichos! __ disse ela. __ Vê-se logo que não são os filhos da coruja.
E comeu-os.
Mas eram os filhos da coruja. Ao regressar à toca, a triste mãe chorou amargamente
o desastre e foi justar contas com a rainha das aves.
__ Quê? __ disse esta, admirada. __ Eram teus filhos aqueles monstrenguinhos?
Pois, olha, não se pareciam nada com o retrato que deles me fizeste...
Lá diz o ditado: quem o feio ama, bonito lhe parece.
(Monteiro Lobato, Fábula, Ed. Brasiliense)
1. Leia o texto e assinale, com os seguintes códigos, as PALAVRAS referentes à águia,
ao filhote e à coruja.
águia
coruja
filhotes da coruja
- Observando o emprego do código estabelecido na atividade anterior, retire, do texto,
todas as palavras que se referem a águia, filhotes e coruja:
2. Retorne ao texto e responda as questões abaixo, estabelecendo a devida referência.
a) A expressão “horríveis bichos” (linha 13) refere-se a quem?
b) Quais os nomes usados para retomar a palavra filhotes?
c) O pronome “os” (linha 14) substitui o nome de qual personagem?
d) O verbo “andarmos” (linha 3) e “chorou” (linha 15) retomam personagens.
3. “... não se pareciam nada com o retrato que deles me fizeste” (linha 18). Os pronomes
sublinhados neste trecho substituem nomes. Que nomes são esses?
4. Quem é a “rainha das aves” (linha 16)?
5. O que é “coisa fácil” (linha 7), de acordo com o texto?
6. Numere a 2º coluna, estabelecendo a devida referência.
(1) coruja ( ) “borrachos lindo” (linha 7)
(2) águia ( ) “uma” (linha 3)
(3) filhotes ( ) “outra” (linha 3)
( ) “eu” (linha 4)
( ) “triste mãe” (linha 15)
( ) “esta” (linha 17)
( ) “mostrengos (linha 11)
( ) “me” (linha 18)
7. Nesse caso, combinemos isto” (linha 5). A que se referem as expressões destacadas?
01
02
03
04
05
06
07
08
09
10
11
12
13
14
15
16
17
18
375
ANEXO 13 – ATIVIDADES: COESÃO SEQÜENCIAL
COESÃO SEQUENCIAL
1. Complete as lacunas do texto abaixo, com a palavra que liga as idéias:
O teste
Paulo foi fazer um teste .................... ser mecânico, .................... não
conseguiu passar.
....................... ele ficou tão desanimado, ...................... estava querendo
desistir da profissão.
........................ seus amigos lhe deram apoio, muitos conselhos .....................
ele foi fazer de novo o teste.
........................ foi ver o resultado, ficou feliz, ....................... tinha passado.
2. Que idéia nos passa as palavras listadas abaixo, que aparecem no texto?
a) para (l. 1)= __________________________________________________
b) mas (l. 1) = _________________________________________________
c) e (l. 5) = ____________________________________________________
d) quando (l. 7) = _______________________________________________
e) porque, pois (l.7) _____________________________________________
376
ANEXO 14 – REESCRITA INDIVIDUAL: DISCURSO DIRETO
DISCURSO DIRETO:
1. No texto que segue, aparecem os seguintes personagens:
- Chapeuzinho
- mãe de chapeuzinho
- as crianças
- as filhas malvadas
Cada personagem fala, no texto, alguma coisa. Então, vamos fazer o seguinte: usando lápis
de cor, pinte:
de azul, a fala de chapeuzinho
de vermelho, a fala da mãe de chapeuzinho
de verde, a fala das crianças
de amarelo, a fala das filhas malvadas
CHAPEUZINHO VERMELHO
ERA UMA VEZ UMA LINDA MENINA CHAMADA CHAPEUZINHO ESTAVA
CONVERSANDO COM AS CRIANÇAS.
A MÃE DE CHAPEUZINHO VERMELHO CHEGOU E DISSE CHAPEUZINHO VÁ
LOGO PARA COZINHA.
E DEPOIS, A MÃE DISSE ÀS CRIANÇAS QUEREM CONHECER AS MINHAS
FILHAS?
E AS CRIANÇAS DISSERAM SIM
E ELAS FICAVAM BRIGANDO. UMA DIZIA EU SOU MAIS BONITA QUE VOCÊ!
DE TANTA BRIGAR, ELAS CAIRAM. ENTÃO A MÃE DISSE AGORA VOCÊS VÃO
FICAR DE CASTIGO.
A CHAPEUZINHO SAIU DAQUELA CASA E PERGUNTOU PARA AS CRIANÇAS E
AGORA, POR QUAL CAMINHO EU VOU?
AS CRIANÇAS DISSERAM PELO CAMINHO DO LADO DIREITO.
ENTÃO, A CHAPEUZINHO FOI EMBORA.
2. Agora que você pintou a fala das personagens, vamos fazer outra coisa: volte ao texto e
coloque dois ponto ( : ) na última palavra antes de iniciar a fala, assim:
ERA UMA VEZ UMA LINDA MENINA CHAMADA CHAPEUZINHO ESTAVA
CONVERSANDO COM AS CRIANÇAS.
A MÃE DE CHAPEUZINHO VERMELHO CHEGOU E DISSE: CHAPEUZINHO VAI
LOGO PRA COZINHA.
3. Então você aprendeu que sempre colocamos dois pontos antes da fala das personagens.
Aprenda mais uma coisa: coloque a fala das personagens cada uma numa nova linha do
texto e, antes de escrever essa fala, coloque um sinal chamado travessão, assim ( _ ).
Faça isso, copiando o texto. Não esqueça de copiar também os dois pontos que você
colocou.
Vamos começar e depois você continua.
CHAPEUZINHO VERMELHO
ERA UMA VEZ UMA LINDA MENINA CHAMADA CHAPEUZINHO ESTAVA
CONVERSANDO COM AS CRIANÇAS.
A MÃE DE CHAPEUZINHO VERMELHO CHEGOU E DISSE:
___ CHAPEUZINHO, VÁ LOGO PARA COZINHA.
________________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________
377
4. Agora que você sabe como devemos escrever uma fala de personagens em histórias, nos
ajude a consertar os trechos seguintes, reescrevendo-os com dois pontos e travessão:
A) O URUBU FOI CONVIDADO PARA A FESTA NO CÉU E CHEGOU A
TARTARUGA FALANDO EU QUERIA IR À FESTA, MAS EU NÃO TENHO ASAS
PARA VOAR.
.........................................................................................................................................
........................................................................................................................................
B) O URUBU, ESCUTANDO A CONVERSA, FALOU ESTÁ FALANDO SOZINHA DONA
TARTARUGA? SE VOCÊ QUISER ENTRA NA MINHA VIOLA E VAMOS PARA A
FESTA. ...........................................................................................................................
........................................................................................................................................
C) A TARTARUGA FICOU TODA CONTENTE E SAIU GRITANDO EU VOU NA FESTA,
EU VOU NA FESTA!. .....................................................................................................
........................................................................................................................................
D) CONTINUE ESTA CONVERSA:
MILENA E ANA PAULA SE ENCONTRARAM NUM DOMINGO, LÁ NA IGREJA.
ENTÃO A MILENA PERGUNTOU:
___ ANA PAULA, POR QUE VOCÊ NÃO FOI À AULA SEXTA-FEIRA?
ANA PAULA RESPONDEU:
......................................................................................................................................................
......................................................................................................................................................
......................................................................................................................................................
......................................................................................................................................................
5. Agora é com você. Olhe os quadrinhos abaixo e reconte a história, não mudando a fala das
personagens. Não se esqueça de usar os dois pontos e o travessão:
378
ANEXO 15 – REESCRITA INDIVIDUAL: CONCORDANCIA VERBAL E NOMINAL,
EMPREGO DOS ELEMENTOS COESIVOS
CONCORDÂNCIA VERBAL
1. Leia os trechos abaixo, retirado de textos de alunos de e séries. Os alunos
esqueceram de combinar o verbo com o sujeito. Então, vamos ajudá-los a fazer essa
combinação?
a) “Quando os pais chegam bêbado eles ficam com raiva e bate nas crianças”.
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
b) “As crianças tem que ter uma vida boa...”
____________________________________________________________________
c) “O policial falou que nós ia ter uma prova de como andar no trânsito”.
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
d) “No trânsito, todos nós pode morrer”.
____________________________________________________________________
e) “Quando você quiser andar nas calçadas, devemos andar do lado direito”.
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
f) A bicicleta é um meio de transporte utilizados por todos”.
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
g) “Nós tem que apertar bem os freios da bicicleta”.
____________________________________________________________________
h) “Para nós ter um trânsito melhor, nós temos que estes poucos cuidado.
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
i) “Hoje nós somos um pedestre, amanhã nós pode ser um motorista”.
____________________________________________________________________
j) “Os alunos nem esperarão o carro sair, atravessarão errado. Os outros dois
esperarão o carro sair, atravessarão em linha reta, mas errarão porque não
atravessarão na faixa”.
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
k) “Quando tiver um acidente no trânsito, nós não podemos se amontoar em volta do
acidente
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
CONCORDÂNCIA NOMINAL
a) “Nasceram muito filhotes de tartarugas”.____________________________________
b) “Nasceu muitos irmãozinho”._____________________________________________
c) “A água serve para muitas coisa.”_________________________________________
REPETIÇÕES: ELEMENTOS COESIVOS
1. Observe que, nos trechos abaixo, algumas palavras foram repetidas por diversas
vezes. Vamos tentar eliminar essas repetições, reescrevendo estes trechos?
379
d) “O trânsito em todo o mundo é muito perigoso. Por isso, foram criadas as
normas de trânsito: as placas, os semáforos e os guardas de trânsito que
servem para sinalizar o trânsito.
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e) “Quando um veículo vem reto em você, você tem que pular em algum lugar,
senão você pode morrer ou ser ferido”.
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f) Quando temos uma faixa sem semáforo, temos que olhar para os lados para
ver se está vindo algum veículo e se não estiver vindo nenhum veículo,
podemos passar.”
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g) “Um dia a minha professora entrou na sala com livrinhos sobre o trânsito.
Naquele mesmo dia ela começou a dar aula de trânsito e todos os dias a
professora dava um pouco de aula de trânsito. Quando ela dava aula ela
sempre falava para prestarmos atenção porque nós iríamos ter aula de
trânsito com um soldado”.
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h) “O trânsito é muito importante para nós. Hoje em dia o trânsito está muito
violento. Para nós termos um trânsito melhor, temos que ter esses cuidados:”
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i) “As bicicletas são um importante meio de transporte para o dia a dia. Ela é
um meio de transporte utilizado por todos. As bicicletas devem andar nas
calçadas. Os sinais das bicicletas são os mesmos sinais dos automóveis”.
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j) “Então cuide bem da sua vida porque ela não tem preço. Ela é mais valiosa
que diamante, ouro, prata e outras coisas valiosas. Cuide bem da sua vida
porque quando perder a sua vida vai se arrepender de ter perdido a sua vida
que é muito valiosa. Cuide bem da sua vida!”
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Obs. Estas são apenas algumas sugestões. A partir destas, vamos produzir
outras atividades?
380
ANEXO 16 – FOTOS DA PRODUÇÃO E DIVULGAÇÃO DE CARTAZES PELOS
ALUNOS
381
ANEXO 17 – FOTOS DO GRUPO DE ESTUDOS
382
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