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Universidade Federal de Juiz de Fora
Christiano Pereira de Almeida
A IDENTIFICAÇÃO DE NOMES E ADJETIVOS POR CRIANÇAS ADQUIRINDO
O PB
Dissertação de Mestrado
Juiz de Fora
2007
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Christiano Pereira de Almeida
A IDENTIFICAÇÃO DE NOMES E ADJETIVOS POR CRIANÇAS ADQUIRINDO
O PB
Juiz de Fora
2007
Dissertação de mestrado apresentada ao
Curso de Pós-
Graduação em Letras da
Universidade Federal de Juiz de Fora,
elaborada sob a orientação da Profª
Maria Cristina Lobo Name.
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AGRADECIMENTOS
À minha orientadora, Maria Cristina Name, pela paciência, apoio e incentivo desde o início
deste trabalho; por ser uma profissional impecável e uma pessoa maravilhosa.
Aos meus pais, pelo apoio e paciência.
À Prof.ª Neusa Salim Miranda, por ter feito despertar em mim o interesse em estudar
lingüística.
Ao Prof. Márcio Leitão, pela ajuda indispensável durante este trabalho e pelo carinho.
À Profª. Luciana Teixeira, pela ajuda com os dados.
Ao GP de Psicolingüística, em especial à Ana Paula, Juliana, Carolina, Azussa e Flávia.
Às minhas amigas de turma, Fernanda Cunha Souza e Eliana dos Santos Rangel, pelos bons
e divertidos momentos e pelo apoio durante o mestrado.
Aos Professores do Mestrado em Lingüística da.
Aos pais e crianças que participaram dos experimentos, pela colaboração indispensável
para que este trabalho pudesse ser realizado.
Ao meu amigo João Reis de Faria, por ter me incentivado a fazer iniciação científica e
pelos bons momentos.
À Amanda, por estar sempre ao meu lado, pela compreensão e pelo carinho.
Aos meus avós José Pereira e Terezinha, pelo carinho e incentivo.
Aos meus amigos Marquinhos e Miguel, pelos momentos de descontração e pelo apoio.
Ao meu amigo Edson Basílio, pela ajuda e pela diversão.
Às bandas do bom e nunca velho Rock ‘N’ Roll, que me acompanharam em todos os
momentos.
Run rabbit run
Dig that hole, forget
the sun,
And when at last the work is done
Don’t sit down it’s time to dig another one
(Pink Floyd – Breathe)
Resumo
Esta dissertação diz respeito ao processo de identificação dos elementos das
categorias lexicais Nome e Adjetivo no Português do Brasil, buscando dar conta de
especificidades do PB, como a variação possível de ordem dos elementos constituintes do
DP complexo e a ausência de marcas morfofonológicas que distingam adjetivos de nomes
A hipótese de trabalho assumida é a de que, em um primeiro momento da aquisição da
linguagem, a informação estrutural disponibilizada pela ordem preferencial de ocorrência
destes elementos no PB atua como uma pista robusta da qual a criança faz uso. A
abordagem teórica adotada busca conciliar um modelo de língua que trate do fenômeno de
aquisição (Programa Minimalista: Chomsky, 1995), com modelos de processamento
voltados para a aquisição da linguagem (modelos de bootstrapping). Foram desenvolvidas
atividades experimentais cujos resultados apontam para a importância da informação
estrutural, em um primeiro momento, e da informação semântica em etapas posteriores do
processo de identificação de nomes e adjetivos.
Palavras-chave
Aquisição lexical; Nome; Adjetivo; bootstrapping.
Abstract
This dissertation aims at the identification process of elements in the lexical
categories of Name and Adjectives in Brazilian Portuguese trying to treat the specificities
of the BP such as the possible variation of the complex DP constituent elements order and
the absence of morphophonological marks that distinguish adjectives and names. The
working hypothesis assumed is that in a first moment of the language acquisition the
structural information made available by the preferential order of occurrence of that
elements in BP acts as a powerful clue of which the child makes use of. The theoretical
approach adopted tries to conciliate a language model that treats the phenomenon of
acquisition (Minimalist Program: Chomsky, 1995) and processing models for the language
acquisition (bootstrapping models). Experimental activities were developed and the results
point to the importance of the structural information in a first moment and the semantic
information in posterior stages of the identification process of names and adjectives.
Keywords:
Lexical acquisition; Name; Adjective; bootstrapping.
SUMÁRIO
1. Introdução 7
1.1 Hipótese de trabalho 8
1.2 Objetivos 9
2. Revisão Bibliográfica 10
2.1 A Aquisição de Nomes e Adjetivos 10
2.2. Aproximando estes resultados ao PB 12
2.3 Nomes e Adjetivos no PB 14
2.4 A posição dos Adjetivos no PB 15
2.5 A aquisição dos Adjetivos no PB 17
2.6 O desenvolvimento conceptual da criança 18
2.6.1 Teorias sobre o conceito 20
2.6.2 Capacidade de conceptualização 22
2.6.3 A capacidade de conceptualização em Não-Humanos 24
2.6.4 Conceitos e linguagem, qual a relação? 25
2.6.5 O papel da linguagem na conceptualização 28
2.7 Alguns modelos de aquisição lexical 29
2.7.1 A hipótese da exclusividade mútua 29
2.8 Aquisição lexical e organização conceptual 33
2.8.1 O modelo emergentista de coalizão 34
2.9 Conclusão 35
3. Fundamentação Teórica 37
3.1 O modelo gerativista e a aquisição da linguagem 37
3.1.1 O modelo gerativista 37
3.1.2 Reformulação do programa gerativista – O Programa Minimalista 41
3.1.3 A questão da posição do Adjetivo na Teoria Gerativa 44
3.2 O Bootstrapping 48
4. Metodologia Experimental 54
4.1 O Paradigma da Tarefa de Seleção de Imagem 54
4.2 O Paradigma da Seleção de Objetos 56
4.3 A Tarefa de Leitura Automonitorada 57
5. Experimentos 59
5.1 Experimento 1 59
5.1.2 Método 62
5.1.3 Resultados e discussão 63
5.2 Experimento 2 65
5.2.1 Método 65
5.2.2 Resultados e discussão 66
5.3 Experimento 3 69
5.3.1 Método 72
5.3.2 Resultados e discussão 72
5.4 Experimento 4 76
5.4.1 Método 77
5.4.2 Resultados e discussão 78
5.5 Conclusão 79
6. Conclusão 81
7. Referências Bibliográficas 83
Anexos: 82
85
Pseudo-palavras utilizadas nos experimentos 1 e 2 87
Pseudo-palavras utilizadas no experimento 3 88
Frases utilizadas no experimento 4 89
1. INTRODUÇÃO
Esta dissertação é parte de um estudo mais abrangente, realizado pelo grupo de pesquisa
em psicolingüística da Universidade Federal de Juiz de Fora, acerca da aquisição de Nomes
e Adjetivos por crianças adquirindo o Português do Brasil (doravante PB).
O estudo do comportamento destas duas categorias em nossa língua se mostra relevante
devido à flutuação que o adjetivo pode sofrer dentro do Sintagma Determinante (DP),
podendo ocorrer tanto nas posições pós e pré-nominal. Ao longo deste trabalho,
buscaremos mostrar que a informação estrutural disponibilizada pela sintaxe da língua
exerce um papel importante em momentos iniciais da aquisição da linguagem, servindo
como uma pista auxiliar durante a identificação dos elementos das diferentes categorias
lexicais existentes em nosso idioma. Assim, nesta dissertação adotamos como foco
principal a importância da informação estrutural disponibilizada pela língua durante o
processo de aquisição.
Para tratarmos desta nossa questão, partimos do pressuposto de que adquirir uma dada
língua é um processo que exige uma espécie de interação entre o conhecimento lingüístico
e o desenvolvimento conceptual, sendo que esses dois pólos do processo são
interdependentes. Durante a aquisição, a criança precisa ser capaz de identificar as
características particulares de sua língua e, ao mesmo tempo, estar atenta a todo tipo de
evento que ocorre ao seu redor. Estudos com crianças de várias comunidades lingüísticas
sugerem a existência de uma vinculação entre a aprendizagem de palavras e o
desenvolvimento conceptual. Esta vinculação, no decorrer do processo de aquisição,
sofreria um refinamento, colocando cada vez mais em contato as formas particulares de
uma língua e seus significados específicos. (Waxman, 2004).
Sob esta perspectiva, os vários aspectos particulares de cada língua seriam pistas sobre
as quais as crianças poderiam se apoiar durante o processo de aquisição. Assim, por
exemplo, em um momento inicial da aquisição, a informação estrutural disponibilizada pela
língua materna da criança poderia ser de grande importância para o desencadeamento do
processo de nomeação de objetos, tendo em vista que os Nomes seriam os primeiros
elementos a serem destacados e, por conseguinte, associados com categorias de objetos (ver
Waxman, 2001, para referências).
Neste nosso trabalho, partimos destes princípios e buscamos estender este tipo de
análise ao PB, visto que nosso idioma apresenta características peculiares se comparado ao
inglês, língua dos estudos realizados sob esta perspectiva.
A ordem dos elementos dentro de um DP complexo, constituído de um Determinante,
um Nome e um Adjetivo, não é fixa em nosso idioma, podendo haver uma flutuação na
posição do Adjetivo, que pode ocupar a posição p ou pós-nominal. Ainda, em muitos
casos, nenhuma marca morfofonológica difere o Nome do Adjetivo.
Portanto, a questão a ser investigada é até que ponto esta variação na ordem do adjetivo
dentro do DP traria dificuldades para as crianças no processo de identificação e
mapeamento dos elementos dessas duas categorias lexicais.
Entendemos que o estímulo lingüístico a que a criança tem acesso é proveniente, em
sua maioria, da fala do adulto. Deste modo, achamos relevante investigar se a variação da
ordem dos elementos dentro do DP complexo (composto por Nome e Adjetivo), acarreta
alguma dificuldade ou custo adicional para o processamento destas duas categorias em
adultos.
Para tratarmos dessa nossa questão, adotamos um modelo de língua proposto pela
Teoria Gerativa e buscamos integrá-lo aos modelos de Bootstrapping (semântico, sintático
e fonológico), que são modelos de processamento.
1.1 HIPOTESE DE TRABALHO
Nossa hipótese de trabalho é de que a informação estrutural disponibilizada pela língua,
juntamente com a informação conceptual, assume um papel importante nas primeiras etapas
do processo de aquisição da linguagem por crianças adquirindo o PB.
Ainda que haja a flutuação do adjetivo no DP, podemos dizer que existe uma ordem
preferencial, ou canônica, em nossa língua e, segundo nossa hipótese, essa seria uma pista
robusta sobre a qual a criança se apoiaria em um momento inicial do processo de aquisição.
Assumimos, no entanto, que a informação de natureza semântica também é usada pela
criança, sobretudo passados os primeiros anos de vida.
1.2 OBJETIVOS
Nosso objetivo geral com esta dissertação é buscar contribuir para o entendimento do
processo de aquisição lexical, particularmente no que se refere à Aquisição de Nomes e
Adjetivos pelas crianças adquirindo o PB.
Assumindo nossa hipótese de trabalho, temos como objetivos específicos: a) investigar
a importância que a informação estrutural assume no processo de aquisição do PB, frente às
variações na ordem dos elementos e às características morfofonólogicas de nossa língua; b)
buscar compreender qual a relação que se estabelece entre informação sintática e
conceptual no decorrer do processo de aquisição e c) diante dos dados de descrição da
posição do adjetivo no PB, um último objetivo é investigar a possível carga adicional, para
o processamento adulto, que o adjetivo anteposto possa demandar.
Tendo em vista tais questões, elaboramos alguns experimentos para testar nossa
hipótese e verificar como estes processos se dão em nossa língua, visto que, até onde
pesquisamos, ainda não existem trabalhos que tenham investigado esse fenômeno no PB
1
.
A dissertação obedece à seguinte divisão: no capítulo 2 fizemos uma revisão
bibliográfica relativa ao nosso problema. Nele abordaremos alguns aspectos da pesquisa de
Waxman (2001, 2004) com crianças adquirindo a língua inglesa. Faremos também uma
revisão do comportamento dos Nomes e Adjetivos no PB, focalizando suas características
morfofonológicas e estruturais. Ainda, neste mesmo capítulo, faremos uma exposição de
questões relacionadas ao desenvolvimento conceptual da criança.
O capítulo 3 expõe nossa fundamentação teórica, começando por mostrar o modelo de
língua proposto atualmente pela Gramática Gerativa. Abordaremos também um modelo de
processamento sob a perspectiva de Bootstrapping.
No quarto capítulo, expomos brevemente as técnicas experimentais utilizadas em
nossos experimentos. No capítulo 5 apresentaremos nossas atividades experimentais, seus
respectivos resultados, discussão e implicações para nossas hipóteses. Finamente, o
capítulo 6 é dedicado à conclusão deste nosso trabalho.
1
Uma tese de doutorado sobre a aquisição de adjetivos no PB está sendo desenvolvida por Teixeira (a sair),
cujo título é A delimitação da categoria adjetivo na aquisição do Português do Brasil no processamento de
relações de adjunção e predicativas”. Contudo, nosso trabalho abrange, além do enfoque em questões da
sintaxe, o desenvolvimento conceptual da criança, considerando outros tipos de informação, além da
fornecida pela sintaxe, como determinantes no processo de aquisição do PB.
2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
Neste capítulo abordaremos alguns estudos e propostas relevantes para o
desenvolvimento de nosso trabalho. Iniciaremos com a apresentação de estudos que
trataram da aquisição de Nomes e Adjetivos por crianças adquirindo o inglês como língua
materna. A partir destes estudos, passaremos a tratar do comportamento dessas categorias
lexicais no PB e apresentaremos brevemente os resultados da pesquisa em andamento sobre
a delimitação da categoria Adjetivo no processo de aquisição do PB (Teixeira, a sair).
Um último ponto tratado neste capítulo diz respeito ao desenvolvimento conceptual de
crianças durante a aquisição da linguagem.
2.1 A AQUISIÇÃO DE NOMES E ADJETIVOS
Os estudos realizados por Waxman e seus colaboradores (2001, 2004) visam a
investigar as possíveis relações existentes entre o desenvolvimento lingüístico e o
conceptual. Para abordar esta questão, ela elaborou uma série de experimentos que tinham
como objetivo verificar qual a relação entre as formas lingüísticas específicas e o
desenvolvimento de conceitos a elas ligados. Os experimentos foram realizados com
crianças que têm como língua materna o inglês.
Waxman parte do princípio de que, bem no início do processo de aquisição, a criança
dispõe de uma expectativa ampla para vincular palavras novas a aspectos comuns a grupos
de objetos. Conforme o curso da aquisição, esta expectativa sofreria modificações, se
especificando de acordo com os dados disponíveis e característicos de sua língua materna,
de modo que diferentes tipos de palavras colocariam em evidência diferentes aspectos de
uma mesma cena.
Pela hipótese de Waxman (2001, 2004), categorias lexicais distintas deveriam colocar
em evidência diferentes aspectos de uma mesma cena. Mais especificamente, diante de
vários objetos, os nomes destacariam as categorias de objetos e os adjetivos as propriedades
comuns destes.
Para testar esta hipótese, ela elaborou alguns experimentos. Para fins explicativos,
vamos apenas fazer uma síntese dos aspectos mais importantes destes experimentos para
nossa dissertação.
Um ponto importante do trabalho de Waxman é o fato de que palavras novas colocam
em evidência aspectos comuns de uma dada categoria de objetos. Partindo deste
pressuposto, ela elaborou um experimento que, basicamente, possuía as seguintes etapas:
Crianças com idades entre 11 e 14 meses passavam por uma fase de familiarização,
a qual era constituída da apresentação de quatro objetos pertencentes a uma mesma
categoria, por exemplo, animais. Todos estes objetos compartilhavam uma mesma
propriedade, neste caso, uma cor. Assim, teríamos um urso, um leão, um elefante e
um cachorro, todos roxos.
Após esta fase de familiarização, era apresentado para as crianças um objeto que
não pertencia à mesma categoria que os da familiarização (contraste), como uma
cenoura, por exemplo, e também não tinha a mesma propriedade daqueles, era da
cor laranja.
As crianças foram divididas em 3 grupos. Ao primeiro grupo de crianças, a
experimentadora apresentava juntamente com os objetos da fase de familiarização,
um pseudo-nome, como em This one is a blicket(Este aqui é um bliquete), sendo
blicket o Nome. O segundo grupo ouvia, no lugar do Nome, um adjetivo, como em
This one is blickish (este aqui é bliquetoso), com blickish correspondendo ao
adjetivo. Ao terceiro grupo não era apresentada nenhuma palavra nova. A
experimentadora apenas dizia: “Look at this one” (olhe só este aqui).
Na fase de contraste a experimentadora abanava a cabeça, como que indicando
reprovação ao que via, e dizia: Ahn-ahn, this one is not a blicket” (Ih, este aqui não
é bliquete) na condição Nome. Na condição Adjetivo ela dizia: Ahn-ahn, this one
is not blickish(Ih, este aqui não é bliquetoso). Por último, na condição nenhuma
palavra, “Ahn-ahn, look at this one” (Ih, olha só este aqui).
Terminando a fase de contraste, eram apresentados à criança dois objetos. Um deles
pertencia à mesma categoria que os objetos da fase de familiarização (um cavalo), o
outro não (uma cadeira). Estes dois objetos compartilhavam a mesma propriedade,
nesse caso, a cor. Ao mostrar estes dois objetos, a experimentadora pedia às
crianças que escolhesse entre os dois e a entregasse, ou apontasse, somente um. A
pergunta era feita de acordo com o alvo. Sendo assim, na condição Nome a
experimentadora dizia: Can you give me the blicket?” (Me o bliquete). Na
condição Adjetivo ela pedia: Can you give me the blickish one? (Me o
bliquetoso). Na condição nenhuma palavra ela apenas dizia Can you give me this
one” (Me dá aquele ali).
Os resultados foram favoráveis à hipótese de Waxman. Na condição Nome as crianças
preferiram, quando estimuladas a escolher entre os dois alvos da fase teste, o objeto que
pertencia à mesma categoria que os da fase de familiarização, indicando que as crianças
tinham associado a palavra nova (blicket) ao que havia de comum entre os elementos da
categoria (animais).
Na condição Adjetivo os resultados foram um pouco diferentes e apresentaram uma
diferença se comparados aos obtidos com os da condição Nome. Embora as crianças mais
velhas (as que tinham por volta de 14 meses) demonstraram uma tendência a escolher, na
fase de teste, o objeto que tinha as mesmas propriedades (cor) que os da fase de
familiarização, as crianças mais novas (com idade por volta de 11 meses) optaram por
escolher o objeto que pertencia à mesma categoria dos da fase de familiarização. As
crianças na condição Nenhuma palavra tiveram resultados aleatórios.
Estes resultados podem nos dizer que: a) a expectativa inicial da criança com relação à
vinculação entre palavra e conceito é bastante ampla e se apóia, inicialmente, na nomeação
de objetos e conseqüente categorização e; b) esta expectativa inicialmente ampla vai se
tornando mais específica no decorrer do processo de aquisição, mostrando-se mais sensível
às particularidades de categorias lexicais distintas, associando a estas os conceitos que as
designam.
2.2 APROXIMANDO ESTES RESULTADOS AO PB
Embora existam muitas diferenças entre as diversas línguas do mundo, podemos falar
em alguns aspectos universais quando tratamos de aquisição da linguagem. Um desses
aspectos, como já nos referimos acima, seria a primazia do surgimento da classe dos Nomes
tanto durante a produção, quanto na compreensão dos enunciados de uma língua, sendo
seguida, em um momento posterior, pelas demais categorias lexicais. Ainda podemos dizer
que esta classe desfruta de uma estabilidade extralingüística” sendo universalmente
representada nas diferentes nguas e tendo com função básica nomear tanto objetos
individuais quanto categorias de objetos (Lyons, 1977; Maratsos, 1991, apud Waxman,
2004).
Se podemos pensar em aspectos universais no processo de aquisição da linguagem,
devemos nos ater a estes processos e ao modo como eles se manifestariam nas diferentes
línguas. Tendo isto em vista, achamos que seria proveitosa uma aproximação dos estudos
realizados por Waxman com algumas questões observadas em crianças adquirindo o PB.
Nos estudos realizados por Waxman (2001, 2004) devemos notar alguns aspectos
característicos da língua inglesa que não se manifestam da mesma forma no PB. Um destes
aspectos é o fato de que a ordem dos constituintes no sintagma determinante (doravante
DP) na língua inglesa é fixa. Podemos dizer que existe um padrão para a ocorrência dos
elementos dentro do DP. Esta ordem pode ser representada por (Determinante + Adjetivo +
Nome), como em “The blickish horse”.
Não podemos, portanto, observar esse mesmo tipo de comportamento dos constituintes
do DP no Português Brasileiro. Em nossa língua podemos ter o Adjetivo aparecendo tanto
em posição pós-nominal quanto em pré-nominal. Observe os exemplos:
A rosa linda (Det + N + Adj)
A linda rosa (Det + Adj + N)
Uma outra importante questão que surge quando comparamos os estudos de Waxman
com crianças falantes do inglês aos dados do PB é o fato de, em seus estudos, os Adjetivos
utilizados apresentam uma marca morfológica característica, como em blickish”, por
exemplo.
Se notarmos o exemplo que mostramos logo acima, veremos que no PB não temos,
necessariamente, uma marca morfológica característica para a classe dos Adjetivos,
podendo estes, em muitos casos possuir a mesma forma que os Nomes.
Mas antes de tratarmos da aquisição de Nomes e Adjetivos no PB, faremos uma revisão
destes itens lexicais, abordando suas características morfológicas e estruturais.
Em seguida, trataremos da questão da conceptualização, pois, para que as crianças
sejam capazes de identificar os membros das categorias Nome e Adjetivo, é necessário que
elas tenham desenvolvido uma capacidade de conceptualização.
2.3 NOMES E ADJETIVOS NO PB
Os adjetivos são uma classe de palavras que atribuem propriedades aos nomes
(substantivos). Essa atribuição pode ocorrer de modo a qualificar ou subcategorizar
determinado nome. No caso da qualificação, o adjetivo indica para o nome uma
propriedade que pode não ser uma parte componente de suas propriedades constituintes,
qualificando-o, desse modo. Quando o adjetivo exerce função classificadora, ele coloca o
nome que acompanha em uma subclasse, exercendo um papel delimitador ou especificador
(Neves, 2000).
Os adjetivos qualificadores geralmente atribuem uma qualificação subjetiva que
apresenta aspectos variáveis de caráter vago, podendo expressar diversos valores
semânticos, como em:
Mulheres bonitas.
Olhos bondosos.
Os classificadores, por sua vez, são considerados denominativos e atribuem uma
indicação objetiva de uma subclasse de nomes, apresentando, mais freqüentemente, caráter
não-vago, como em:
Fotografias monocromáticas.
Círculo ideológico.
Entretanto, em uso metafórico, eles podem exercer função qualificadora:
Subterrâneo temor.
Polivalente personalidade.
Nestes casos, costumam aparecer antecedendo o nome, o que não é a regra para
esta subclasse (Neves, 2000).
2.4 A POSIÇÃO DOS ADJETIVOS NO PB
No PB não temos uma ordem rígida para a ocorrência do adjetivo no sintagma
nominal. Embora possamos dizer que exista uma ordem preferencial e menos marcada, a
ordem canônica, que pode ser representada por Determinante + Nome + Adjetivo, muitos
casos de ocorrência da ordem inversa também são comuns em nossa língua, podendo o
adjetivo anteceder o nome, o que seria a ordem não canônica e mais marcada.
Observe os exemplos:
A garota frágil tem medo do escuro. (Det + N + Adj)
A frágil garota tem medo do escuro (Det + Adj + N)
Como podemos notar nos exemplos acima, tanto a ordem canônica quanto a não
canônica são possíveis no PB. Essa flutuação na posição do adjetivo dentro do sintagma
nominal está relacionada com as duas grandes subclasses de adjetivos, os qualificadores e
os classificadores.
Os adjetivos qualificadores podem aparecer tanto pospostos quanto antepostos ao
nome. Quando aparecem na posição canônica, sendo esta a posição menos marcada,
geralmente indicam qualidades atribuídas ao nome e não têm valor absoluto, referindo-se a
um aspecto desse nome. Na posição não-canônica costumam expressar um efeito de maior
subjetividade, dando um maior efeito de sentido (Neves, 2000).
Embora as duas ocorrências sejam comuns no PB, existem restrições a determinadas
colocações do adjetivo no DP. Assim, a ordem pode ser:
Livre, com o adjetivo podendo ocorrer tanto anteposto quanto posposto ao nome,
como em:
A mulher bonita.
A bonita mulher.
Fixa, com o adjetivo aparecendo obrigatoriamente posposto, como em:
A moça imatura.
A mulher ruim.
Podem existir casos em que o adjetivo aparece obrigatoriamente anteposto, como em
plena vida e mero sorrir, e isso pode acontecer devido à cristalização destas expressões
na língua (Neves, 2000).
Pertinente, alterando-se o sentido conforme a posição do adjetivo no DP:
O enorme idiota. (muito idiota)
O idiota enorme. (um idiota de grande estatura)
Quando o adjetivo aparece em anteposição, pode-se observar um maior
envolvimento do falante na qualificação.
Conforme dissemos anteriormente, os adjetivos classificadores classificam o
nome que acompanham e, na maioria das vezes, delimitam-no.
Diferentemente dos qualificadores, os classificadores aparecem normalmente
pospostos, como em gerente financeiro e cozinheiro chefe, têm caráter não-vago e podem
ser representados por forma de nome.
Nosso trabalho se baseia nesta classificação, sendo que nossa hipótese é de que a
criança, durante o processo de aquisição de sua língua, usa a informação estrutural para se
guiar no percurso da aquisição e, mesmo podendo existir a variação na ordem dos
constituintes, a forma preferencial e mais comum de ocorrência dos elementos no DP
serviria como uma base sobre a qual a criança se apoiaria nos momentos iniciais de contato
com a língua a que é exposta.
Portanto, em termos de freqüência de uso, vários estudos registram a ordem Det + N
+ Adj como preferencial. Mas, a possibilidade de flutuação, isto é, a não rigidez da posição
do adjetivo no DP complexo, sugere que, do ponto de vista do processamento, tanto a
ordem canônica quanto a não-canônica são possíveis em nossa língua.
Como não encontramos estudos focalizando essa questão no PB, desenvolvemos um
experimento a fim de investigar como se o processamento on-line do adjetivo tanto em
posição posposta quanto em anteposta ao nome em adultos. Deste modo, buscamos
observar se a ordem canônica facilita o processamento dos enunciados de nossa língua e se
a flutuação do adjetivo dentro do DP composto pode acarretar algum custo adicional para o
processamento (ver capítulo 5).
2.5 A AQUISIÇÃO DOS ADJETIVOS NO PB
Em um recente estudo sobre a aquisição dos adjetivos no PB
2
, Teixeira (a sair),
investigou a importância da informação fornecida por afixos derivacionais característicos
de adjetivos e da posição estrutural do adjetivo dentro do DP como pistas facilitadoras para
a identificação das categorias Nome e Adjetivo no PB.
Para verificar a importância dos sufixos características dos adjetivos (-oso/-ento) em
palavras novas (pseudo-palavras) e da ordem dos elementos no DP, foi desenvolvido um
experimento aplicado em crianças com idade média de 20 meses.
Os resultados obtidos com este experimento sugerem que a identificação da
categoria Adjetivo é facilitada quando os elementos desta classe apresentam terminação
característica (-oso/-ento), com maior número de respostas relativas à propriedade dos
objetos nas condições em que o adjetivo vinha acompanhado de sufixo, obtento p< .001. Na
ausência destes sufixos, a ordem dos constituintes foi tomada como fator preponderante
para a identificação da primeira pseudo-palavra com a categoria nome e da segunda como
2
Tese de doutorado em andamento.
adjetivo, com p< .001, tendo em vista que a ordem canônica do PB (Det + N + Adj), atuou,
nessa condição, como pista robusta para mapeamento entre palavra nova e categoria lexical.
Esses resultados estão de acordo com nossa hipótese, embora tenham sido obtidos
com crianças de faixa etária mais baixa que as investigadas neste nosso trabalho, o que nos
leva a algumas questões sobre a relação entre o desenvolvimento lingüístico e o
desenvolvimento conceptual.
Como dissemos anteriormente, para que a criança seja capaz de identificar os
membros das categorias Nome e Adjetivo a fim de incorporá-los ao seu léxico, é necessário
que ela possa formar conceitos de entidades e propriedades que se relacionem com essas
categorias. Tendo isto em vista, na próxima seção trataremos do desenvolvimento
conceptual da criança, discutindo suas relações com a linguagem.
2.6 O DESENVOLVIMENTO CONCEPTUAL DA CRIANÇA
A relação entre linguagem e pensamento sempre foi uma questão indispensável e
controversa tanto nos estudos que partem de uma vertente lingüística, quanto nos que se
concentram numa abordagem mais próxima da psicologia.
Nesta seção buscaremos discutir até que ponto - se é que podemos dizer que este
ponto existe - o desenvolvimento conceptual e lingüístico se mostram interdependentes.
Para isto, apresentaremos algumas propostas que tratam dessa relação. As investigações
sobre o conhecimento humano nos remetem a questões discutidas alguns séculos pela
filosofia. Nascemos dotados de alguma capacidade inata para o conhecimento ou o
adquirimos através da experiência?
Influenciado pelas idéias de Platão, René Descartes adotou uma postura inatista,
propondo que a mente poderia produzir dois tipos diferentes de idéias: as derivadas,
produto das experiências sensoriais, advindas de estímulos externos, e as inatas,
desenvolvidas apenas pela mente. Assim, ele acreditava que, ao nascermos, estaríamos
equipados com algum tipo de aparato cognitivo inato.
Na contramão da concepção inatista, os empiristas, como John Locke, por exemplo,
propõem que o conhecimento é adquirido exclusivamente através da experiência. Locke
chegou a distinguir entre dois tipos de experiência, um derivado da sensação e outro da
reflexão. As idéias advindas da sensação seriam impressões sensoriais simples,
conseqüentes de estimulação sensorial direta, sobre as quais a mente iria refletir e gerar
novas idéias. No entanto, a função mental ou cognitiva de reflexão dependeria
exclusivamente da experiência sensorial (Schultz & Schultz, 1992, p.46).
Nas pesquisas atuais sobre o desenvolvimento cognitivo ainda observamos este
embate entre teorias inatistas e empiristas. Embora muito tenha sido feito nos estudos
baseados nestas duas orientações, o debate não pode ser dado como superado.
Em um texto de Spelke e colaboradores (1992), são apresentadas duas versões
atuais deste antigo debate: a Tese da Origem Periférica se baseia nas teorias empiristas,
defendendo que as primeiras concepções humanas, em um nível muito inicial, são
inapropriadas para a realidade física do mundo externo ao sujeito e isto se deve às suas
limitações perceptuais e sensório-motoras iniciais. Assim, com o decorrer da interação
deste sujeito com o seu meio, suas capacidades para perceber e agir sobre o ambiente vão
sendo refinadas, de forma que as concepções iniciais pouco funcionais passam por um
processo de reelaboração e substituição. Desta forma, o desenvolvimento cognitivo ocorre
em função do aprimoramento da percepção (Spelke et al., 1992).
Como veremos mais adiante, este tipo de abordagem se mostra pouco adequada para
explicar fenômenos como a capacidade que crianças a partir de 3 meses de idade têm para
reconhecer propriedades de solidez e continuidade de objetos, princípios que estão na base
da interação do organismo com o ambiente.
Uma outra alternativa teórica seria a Tese da Origem Central, que adota uma
concepção inatista para tratar o desenvolvimento cognitivo. Nesta abordagem a cognição se
desenvolveria de acordo com predisposições genéticas da espécie. Assim, mesmo que um
pouco rudimentares, as concepções iniciais seriam indispensáveis para o desenvolvimento
conceptual. Embora estas concepções vão sendo enriquecidas com a evolução do
conhecimento, elas raramente seriam abandonadas ou substituídas. Evidências do
conhecimento de algumas leis físicas logo nos primeiros meses de vida do bebê podem
apoiar este tipo de abordagem (Spelke et al.,1992).
Até agora nos preocupamos em fazer um esboço sobre o desenvolvimento
conceptual e as duas grandes perspectivas teóricas que se ocupam deste assunto. Antes de
seguirmos adiante, vamos fazer uma explanação sobre o que é conceptualizar. Afinal, o que
é um conceito?
2.6.1 Teorias Sobre o Conceito
Um conceito pode ser entendido como
“idéias (representações mentais) às quais podemos vincular várias características e com
as quais podemos conectar diversas outras idéias, como através de proposições tanto
quanto pelas imagens
3
e, talvez, também de padrões motores para a implementação de
procedimentos específicos” (Sternberg, 2000, p. 263).
Algumas teorias foram desenvolvidas visando a explicar a organização dos
conceitos; dentre elas, a Teoria do Atributo de Definição é considerada como a visão
clássica. Este ponto de vista foi baseado no trabalho do filósofo Gottlob Frege (1952), e
propõe que um conceito é composto por um conjunto de atributos de definição, unidades
básicas indispensáveis para a sua formação. Cada uma dessas unidades é igualmente
representativa. Assim, existem limites bem definidos entre os membros e não membros de
uma determinada categoria.
O exemplo clássico para compreender esta perspectiva pode ser dado quando
tentamos definir os atributos do conceito solteiro, ou seja, sexo masculino, adulto e não
casado. Para ser solteiro é necessário que se tenha todos os atributos em conjunto.
Com conceitos simples esta teoria parece funcionar bem, mas se pensarmos em um
conceito mais abstrato como jogo, por exemplo, vamos ter algumas dificuldades para
definir todos os seus atributos: alguns jogos são divertidos, outros não, uns são
competitivos, mas nem todos o são e assim por diante.
Um outro problema desta proposta é o fato de que alguns membros de uma determinada
categoria são mais representativos que outros. Imagine a categoria de pássaros: tanto uma
avestruz quanto um canário fazem parte desta mesma categoria, mas, se pedirmos para uma
pessoa dizer qual destes membros é mais representativo, provavelmente ela vai optar pelo
3
Para uma análise sobre as representações analógicas e proposicionais, ver Eysenck & Keane, 1994, Cap. 7.
canário. O que não está de acordo com a premissa de que todos os membros de uma
categoria têm o mesmo grau de representatividade.
Uma vez identificados estes problemas em tal abordagem, fica clara a necessidade
de um novo modelo que dê conta da questão dos diferentes níveis de representatividade de
membros de uma mesma categoria. Chegamos, desta forma, à Teoria do Protótipo (ver
Sternberg, 2000). Um protótipo geralmente é um item original sobre o qual os modelos
subseqüentes se baseiam. Assim, qualquer modelo que represente melhor uma classe na
qual o modelo se baseia pode ser um protótipo. Portanto, ao contrário da teoria dos
atributos de definição, em que um aspecto definidor deve ser possuído por todos os
membros daquela categoria, um aspecto característico não precisa ser parte integrante de
todos os membros de uma categoria. Voltando ao exemplo da categoria ave, podemos dizer
que voar é típico das aves, mas não é um aspecto definidor do que seja uma ave.
Alguns psicólogos chegam a propor dois tipos de conceitos: os clássicos, como no
caso de solteiro, que podem ser definidos facilmente por meio dos atributos definidores; e
os imprecisos ou naturais, que são definidos, na maioria das vezes, por suas características,
uma vez que os contornos daquilo que as constitui são imprecisos, como no caso de fruto: é
muito mais provável que classifiquemos uma laranja como um fruto do que uma abóbora,
por exemplo. Desta forma, “um objeto (ou uma idéia) será classificado como um exemplo
de uma categoria se for suficientemente similar ao protótipo” (Sternberg, 2000, p. 266).
Teorias mais recentes tentam unificar a concepção de protótipo com a de atributos de
definição. Esta tentativa se justifica pelo fato de até os conceitos mais clássicos
apresentarem protótipos e de que alguns protótipos não são suficientes para caracterizar
uma categoria, como no caso do conceito de ladrão: alguns sujeitos parecem ser mais
característicos desta classe do que outros e, no entanto, somente ter características
prototípicas não é suficiente para considerarmos um sujeito como ladrão. Necessitamos de
alguns aspectos definidores para chegarmos a tal conclusão.
Vistas estas abordagens sobre a organização, definição e origem dos conceitos,
passemos agora a uma análise sobre a capacidade de conceptualização.
2.6.2 Capacidade de Conceptualização
Algumas teorias partem do pressuposto de que o desenvolvimento da linguagem
está estritamente vinculado à existência de um sistema conceptual. De certo modo, este
sistema seria a base sobre a qual a linguagem poderia ser mapeada. Pesquisas recentes
indicam que por volta dos nove meses de idade a criança tem um sistema conceptual
bastante desenvolvido. Outros dados sugerem que nos primeiros meses de vida a criança
é capaz de categorizar objetos como pertencentes ou não a uma categoria, como animal, por
exemplo, se lembrar de eventos passados e realizar inferências (Mandler, 2004).
Em uma visão mais tradicional do desenvolvimento infantil, postulava-se que
qualquer conhecimento, de modo geral, fosse aprendido pela criança a partir
exclusivamente da experiência. A criança seria capaz de apresentar capacidades
cognitivas de representação de objetos que saíssem fora de sua trajetória (princípio da
continuidade do objeto) entre 6 e 10 meses e que o desenvolvimento desta habilidade seria
resultado da observação de eventos deste tipo por várias vezes, até que a criança fosse
capaz de internalizar este conhecimento (Spelke et al., 1992). Em estudos mais recentes,
porém, foram encontrados dados indicando que, por volta dos quatro meses e meio,
crianças já apresentavam tal capacidade (Baillargeon, 1989 apud Spelke et al., 1992).
Outros estudos apontam para um conhecimento precoce em vários domínios,
fortalecendo a hipótese de que apenas a experiência não seria suficiente para dar conta de
um sistema conceptual rico, como pode ser observado em crianças muito novas. Alguns
experimentos sugerem que por volta dos três meses de idade a criança é capaz de apresentar
conhecimento sobre categorias físicas de objetos como solidez e continuidade.
Em um estudo realizado por Spelke e colaboradores (1992), observou-se a
capacidade de representação de conceitos físicos por crianças com idades entre 3 e 4 meses.
As pesquisadoras elaboraram um experimento utilizando a Tarefa de Preferência por
Novidade.
As crianças foram divididas em dois grupos, um experimental e um controle. Na
condição experimental, elas eram familiarizadas com um evento no qual uma bola era
colocada atrás de uma tela que cobria um recipiente vazio. Após dois segundos, a tela era
levantada e a bola estava no chão deste recipiente, posição consistente com todos os
princípios de movimento do objeto: a bola não ultrapassava o chão se abandonada de certa
altura. Depois uma mão retirava a bola. Este procedimento era repetido várias vezes, até
não ser mais novidade para a criança. Se um evento deixa de ser novidade, a criança tende a
não direcionar sua atenção por muito tempo.
A seqüência teste se seguia. Uma segunda superfície horizontal era colocada logo
acima da primeira, com uma certa distância. Depois, uma tela era baixada e a bola era
novamente abandonada. No grupo experimental, ao levantar a tela, em testes consecutivos,
primeiramente a bola era vista sobre a nova superfície, em um segundo momento a bola era
encontrada sobre o fundo do recipiente, como se tivesse ultrapassado a nova superfície. A
primeira vez em que a tela era levantada, o evento observado era novo, mas estava de
acordo com os princípios de continuidade e solidez: a bola parou na primeira superfície que
bloqueava o seu trajeto. Na segunda vez em que a tela era levantada, o evento também era
novo em comparação com a familiarização, mas não estava de acordo com os princípios
físicos testados: a bola parecia ter ultrapassado o obstáculo (nova superfície), o que não
estava de acordo com os princípios.
Ao grupo controle foram apresentados eventos do mesmo tipo, mas nenhum destes
eventos violavam a noção de objeto constante e o princípio de solidez, ou seja, quando a
bola era abandonada sobre a superfície colocada acima do fundo, ela não aparecia no fundo
do recipiente, mas sim sobre esta nova superfície.
A variável dependente deste estudo foi a quantidade de tempo que as crianças de
ambos os grupos olhavam para o evento após a tela ser levantada. Após medir os tempos de
observação das crianças de ambos os grupos, os pesquisadores encontraram que as do
grupo experimental olharam por mais tempo o evento não consistente, ou seja, aquele em
que a bola parecia ter ultrapassado a segunda superfície.
Esse resultado pode indicar que a criança olhou por mais tempo para o evento
inconsistente pelo fato de este não estar de acordo com os princípios de continuidade e
solidez, o que, para elas, era um evento novo. Se este evento era novo, logo, elas pareciam
já possuir um conceito do princípio de solidez e continuidade.
Esquema do experimento (grupo experimental)
Aqui devemos fazer algumas considerações: conforme uma visão mais tradicional,
as crianças seriam capazes de reconhecer o princípio de continuidade entre 6 e 10 meses.
Nesta abordagem, tal princípio seria internalizado, ou seja, aprendido através da
experiência e tentativas de ensaio e erro. Não parece ter sido esta a forma como essas
crianças adquiriram tal concepção. Conforme a análise dos resultados do experimento
apresentado acima, crianças com média de idade de 3 meses demonstraram ter uma
representação deste princípio.
Se levarmos em consideração representações em níveis básicos como vimos no
experimento apresentado, somos conduzidos a uma questão bastante pertinente: somente os
humanos seriam capazes de conceptualizar?
2.6.3 A Capacidade de Conceptualização em Não-Humanos
Até agora analisamos dados de pesquisa sobre conceptualização em humanos. Mas
dados recentes têm apontado algumas questões interessantes encontradas nas pesquisas com
primatas não-humamos.
Em um recente artigo sobre a origem da faculdade da linguagem e seu
desenvolvimento, Chomsky e colaboradores (Hauser, Chomsky & Fitch, 2002) discutiram
sobre a questão de primatas terem uma possível “teoria da mente”, possuindo alguns
conceitos abstratos como noção de quantidade e representação geométrica. Isto indica que
seria possível se pensar em um sistema conceptual-intencional em alguns animais não
humanos.
Experimentos com chimpanzés demonstraram que eles são capazes de associar a
noção de quantidade com numerais apresentados por seus treinadores. Neste estudo,
laranjas foram colocadas em caixas e o chimpanzé deveria pegar um cartão com o número
Fase de familiarização
Bola sobre a segunda superfície
Bola ultrapassando a segunda superfície
correspondente à soma destas laranjas. Após anos de treinamento os macacos conseguiam
cumprir a tarefa (Hauser et al., 2002). Mas deve-se fazer uma ressalva quanto a esses
dados: os chimpanzés aprendiam os números um de cada vez e gastavam o mesmo tempo
para todos os números, ou seja, o esforço era sempre o mesmo, o que indica que a idéia de
seqüência e continuidade de raciocínio não ocorre como no caso dos humanos.
Além disso, mesmo sendo capazes de emitir sons que comunicam aos seus
semelhantes a presença de comida ou de predadores, os chimpanzés não criam estes sons,
mas os adaptam às situações em questão, ou seja, eles já os emitem desde que nascem. Uma
outra observação importante é que cada som destes está relacionado a uma situação
específica, designando cada um uma única situação, não havendo, portanto, a criação de
novos sons e nem a relação destes com situações novas.
Estes dados nos levam a sugerir a ausência da capacidade de generalizações,
abstração e geração de novas expressões e conceitos em não-humanos.
Ora, estendendo um pouco este raciocínio, podemos dizer que a linguagem humana
e suas particularidades seriam, talvez, o grande diferencial entre humanos e não humanos.
Para analisarmos melhor esta idéia, vamos tentar entender qual o papel da linguagem na
conceptualização.
2. 6.4 Conceitos e linguagem, qual a relação?
A questão da articulação entre os diferentes sistemas de representação na mente
sempre ocupou um lugar conflituoso dentro dos estudos da linguagem. Em algumas
concepções, aceita-se a existência de uma simbologia estritamente mental que poderia
preceder o surgimento da linguagem verbal. Nesta perspectiva, aprender uma linguagem
seria algo como fazer a tradução deste “vocabulário” mental para a linguagem verbal.
Sob esse ângulo, o pensamento se organiza ele mesmo na forma de um tipo especial de
linguagem, uma linguagem abstrata que seria, por assim dizer, a mãe de todas as línguas
humanas concretas uma linguagem do pensamento, autônoma e universal, porque
logicamente anterior a qualquer língua específica (Martins, 2003: 77-78).
4
4
Para um maior esclarecimento desta perspectiva, ver o texto The Language of Thought (Fodor, 1975).
Na contramão desta proposta, defende-se que não existiria a possibilidade de uma
“linguagem privada”
5
, anterior à linguagem verbal.
Longe de refletirem qualquer estrutura prévia do pensamento ou qualquer outra as
nguas concretas do mundo, trazendo no seu próprio tecido a cultura da qual não se
dissociam, circunscrevem e determinam de forma não universal as possibilidades e limites
do pensamento (Martins, 2003: 78).
Algumas evidências obtidas através de experimentos (como apresentamos acima, no
item 2. 6.2) apontam para um desenvolvimento conceptual bastante precoce em crianças
com idades entre 3 e 4 meses.
Mas isso não é suficiente para que possamos defender uma independência inicial
entre o sistema conceptual e o lingüístico. Poderíamos pensar, por exemplo, num sistema
lingüístico, mesmo que bastante rudimentar, como um facilitador ou organizador na
compreensão das informações percebidas pela criança.
Embora, como sugerido pelas questões expostas acima, o debate entre
conceptualização e linguagem esteja longe de ser dado como uma questão superada,
algumas especulações parecem indicar caminhos promissores para um futuro entendimento
de pequenas frações deste problema.
Partindo destas questões, Landau (2004) discute a possibilidade de interação entre
os sistemas perceptuais e a linguagem. Ao entrar em contato com o mundo, mesmo sendo
auxiliada por concepções iniciais que teriam grande importância no processo de
conhecimento do meio externo, as crianças, através da percepção, criariam conceitos
internalizados sobre o mundo
6
. As informações perceptuais seriam advindas das diversas
fontes de percepção como, por exemplo, o sistema visual e o sistema perceptual-espacial.
Assim, o mapeamento entre percepção e linguagem demanda que dois sistemas de
conhecimento com formatos bastante diferentes sejam codificados em algum formato
compatível” (Landau, 2004, p. 111-112).
5
Ver Investigações Filosóficas (Wittgesntein, 1952).
6
Nas discussões sobre representações mentais isso é chamado de Isomorfismo, ou seja, alguma coisa que
ocupa o lugar da outra, portanto, uma representação. Para uma discussão mais aprofundada desse assunto,
consultar Haselager (2004).
Para entendermos um pouco melhor esse tipo de proposta, vamos analisar um
exemplo. Imagine a relação estabelecida entre o conceito da categoria cachorro e o nome
desta categoria. Quando pensamos em cachorro, podemos pensar em cachorros de diversas
raças, tamanhos, cores e assim por diante
7
. Mas para designarmos os diversos elementos
constituintes dessa classe, usamos uma única palavra: cachorro. Se considerarmos a grande
variedade de representações que se associam à palavra (rótulo), fica difícil defendermos
uma relação unívoca entre palavra e representação.
Tendo isto em vista, podemos imaginar três hipóteses acerca da relação entre sistemas
representacionais e o sistema lingüístico: numa primeira abordagem, imagina-se uma
identidade completa entre as representações e uma possível linguagem (não a nossa
linguagem verbal, mas uma linguagem própria do sistema conceptual) que as codificaria
para a nossa língua. Uma alternativa a esta visão que, pelos problemas apresentados
acima, torna esse mapeamento mais flexível, seria a possibilidade de a linguagem se basear
seletivamente em alguns aspectos prototípicos das representações, mas, ainda assim,
haveria uma correspondência bastante direta entre essas representações prototípicas e o
sistema lingüístico.
Uma terceira possibilidade seria de completa independência entre os sistemas de
representação e o lingüístico, com este emergindo independentemente dos demais (Landau,
2004).
Ainda, uma forma diferente de abordar esta questão seria pela postulação de
sistemas de interface. Embora possa existir uma certa incompatibilidade entre as
codificações utilizadas pelos diversos sistemas de representação, haveria também algumas
equivalências parciais entre estes. Assim, por exemplo, a entrada lexical da palavra
cachorro incluiria a maneira como esta palavra soa (representação fonológica), o contexto
sintático no qual ela ocorreria (representação sintática), o significado a ela associado
(representação conceptual) e as representações espaciais (dimensões, localização no espaço
etc). Desta forma, os diferentes níveis de representações estariam implicados na
representação da palavra cachorro. Tal perspectiva seria compatível com a concepção de
7
No item 2. 6.1, apresentamos uma breve discussão sobre esta variedade de classificação e organização dos
conceitos.
faculdade da linguagem do Programa Minimalista (Chomsky,1995 apud Augusto, 2005),
como veremos mais adiante.
2. 6.5 O Papel da Linguagem na Conceptualização
No início do processo de aquisição da linguagem, a criança se mostra sensível a
diferenças mínimas entre sons de diferentes línguas naturais. Com o passar do tempo, ela
vai se especializando nas distinções presentes somente em sua língua materna, perdendo
esta sensibilidade inicialmente ampla. Segundo alguns autores, esta sensibilidade estaria
relacionada mais a propriedades do sistema perceptual que do sistema conceptual (Hespos
& Spelke, 2004).
No experimento que citaremos a seguir, procurou-se investigar qual o papel que esta
capacidade perceptual exerce sobre o desenvolvimento conceptual. Para isto, foi feita uma
comparação entre distinções lexicais presentes somente no idioma coreano, mas não no
inglês. O experimento foi aplicado em crianças nascidas em comunidades que têm o inglês
como língua materna e visava a investigar se elas eram capazes de reconhecer uma
distinção conceptual entre um objeto estar “apertado” ou “frouxo” em relação ao outro.
Esta distinção é claramente marcada no idioma coreano, mas no inglês ela se restringe às
preposições “in” (conter) e “on” (suportar).
Crianças com idade média de 5 meses foram divididas em dois grupos. O
experimento foi elaborado segundo a técnica de “Fixação preferencial do olhar” (Looking
time procedure), o qual se baseia em mostrar um mesmo evento várias vezes para a criança,
até que ela se acostume com este evento. Se a criança se habitua com determinada situação,
espera-se que ela gaste mais tempo observando um evento novo, quando apresentado
simultaneamente com o anterior, e agora comum.
Em um primeiro momento do experimento, as crianças dos dois grupos, filhas de
pais falantes de inglês, foram apresentadas a um contínuo de eventos, no qual um dos
grupos via um objeto cilíndrico estreito (condição “frouxa”) e o outro via um mais largo
(condição “apertado”), sendo ambos colocados em um recipiente de largura média.
Logo em seguida, ambos os grupos foram apresentados a duas situações distintas:
na primeira, o cilindro estreito era colocado em um recipiente estreito, parecendo estar
apertado dentro dele. Na segunda, o mesmo cilindro era colocado em um recipiente largo,
ficando folgado.
Cada grupo olhou mais tempo para o evento que era novidade, conforme a situação
que tinham visto na fase de familiarização, o que pode sugerir que as crianças foram
capazes de perceber a diferença entre “apertado” e “frouxo”, embora estes eventos não
fossem lexicalizados em sua língua materna.
Como nos referimos anteriormente no item 2. 6.3, habilidades como as de
representação geométrica e de quantidade não são únicas da espécie humana, podendo ser
constatadas em alguns primatas não-humanos. Assim como estas habilidades, a capacidade
de representação e compreensão de eventos, a princípio inata, estaria ligada à representação
de objetos mecânicos e poderia, como no caso dos primatas, ter se desenvolvido de forma
independente da linguagem. Isto pode sugerir que o desenvolvimento do processo de
aquisição da linguagem conecta formas lingüísticas a conceitos que poderiam ter se
formado na mente/cérebro antes mesmo do surgimento da linguagem.
Estes dados que apresentamos sugerem a existência de habilidades inatas ou, no
mínimo, bastante precoces para a conceptualização, o que não está de acordo com o ponto
de vista de que esta capacidade é adquirida através de tentativas de ensaio e erro.
2.7 ALGUNS MODELOS DE AQUISIÇÃO LEXICAL
2. 7.1 A hipótese da exclusividade mútua
Segundo Sternberg (2000)
evidentemente, a linguagem facilita o pensamento, ao mesmo tempo em que afeta a
percepção e a memória. Em primeiro lugar, temos meios limitados para manipular as
imagens não lingüísticas. Tais limitações fazem desejável o uso da linguagem para facilitar
a representação e a manipulação mental.
Estudos realizados com crianças sugerem que a linguagem exerce um papel
fundamental na formação e classificação de conceitos (para referências, ver Waxman,
2004). Para tratarmos desta questão, analisaremos antes uma suposta situação: imagine que
uma criança é levada por seus pais para passar um final de semana na fazenda da família.
Ao chegarem, o pai, que traz a criança em seu colo, aponta e diz: “Olha o cachorro!”. A
criança olha para o cachorro.
Em uma primeira análise, esta situação pode parecer muito simples, mas podemos
levantar algumas questões: a criança precisa resolver uma espécie de quebra-cabeça. Ela
terá de segmentar o fluxo contínuo da fala e destacar o nome relativo ao referente apontado
pelo seu pai, no caso, cachorro. Aqui devemos chamar a atenção para o fato de que, além
do processo de segmentação e identificação da unidade lingüística relevante no contínuo
sonoro da fala de um adulto, a criança precisa “ligar” essa palavra a um conceito. Mas
como podemos afirmar que a criança associou o nome “cachorroao animal e não à cor
deste, ou ainda, ao seu movimento de abanar o rabo?
Esta questão é conhecida como “o problema de indução de Quine
8
e algumas
hipóteses foram criadas para tentar solucioná-la. Uma destas hipóteses sugere que a criança
é guiada por um princípio de percepção do objeto como um todo. Assim, mesmo sendo
exposta a uma cena em que vários aspectos podem concorrer igualmente como possíveis
referentes do nome pronunciado, a criança tende a observar o objeto como um todo e
associá-lo à palavra em questão (Carey, 1978; Mervis, 1987 apud Markman, 1994).
Desta forma, uma vez que a criança decide que um termo se refere a um objeto
como um todo, ela ainda precisa decidir como estender este mesmo termo à representação
deste objeto e a outros iguais ou semelhantes a ele. Para dar conta deste problema,
Markman (1994) propõe que a criança faz uso de suposições taxonômicas (Markman,
1994). Estas suposições seriam uma espécie de capacidade que guiaria a extensão de
palavras a objetos de mesmo tipo. Assim, novas palavras tendem a ser estendidas para
objetos de mesma categoria mais comumente que para os que estão tematicamente
relacionados. Para testar esta hipótese, Markman e Hutchinson (1984, apud Markman,
1994) elaboraram alguns experimentos. Um desses estudos foi realizado com crianças com
idades entre 4 e 5 anos para testar a hipótese de que escutar uma nova palavra levaria estas
crianças a olhar mais para objetos com relações taxonômicas do que para objetos com
relações temáticas. Um exemplo de objetos em relação taxonômica num nível
superordenado de categorização (animais) poderia ser encontrado entre uma vaca” e um
8
O problema da indução de Quine (apresentado em Word and Object: Quine, 1960) é questão recorrente na
literatura acerca da aquisição lexical, pois chama a atenção para o fato de que a relação entre o enunciado
lingüístico e o contexto de enunciação não é direta.
“porco”, por exemplo. Como exemplo de relação temática poderíamos citar “vaca” e
“leite”.
Para realizar este experimento, eles dividiram as crianças em dois grupos: em um
dos grupos, as crianças foram levadas a olhar para um desenho alvo sem ter escutado uma
palavra nova. No outro grupo, juntamente com o desenho alvo, era apresentada uma palavra
nova que não fosse conhecida pelas crianças, no caso “dax”. Depois disto, elas eram
apresentadas a duas novas figuras e tinham que apontar qual delas seria do mesmo tipo da
figura alvo. O uso de uma palavra desconhecida da criança teve o objetivo de eliminar um
possível conhecimento prévio do significado desta palavra, o que poderia vir a interferir nos
resultados obtidos.
As crianças que não foram apresentadas à palavra nova (Nome) juntamente com a
figura alvo mostraram uma tendência a escolher a figura com relação taxonômica apenas
25% das vezes, sendo que das outras vezes elas preferiram a relação temática ou
responderam aleatoriamente ao estímulo. Na condição em que uma palavra nova era
apresentada juntamente com o alvo, as crianças mostraram preferência por escolher a figura
que tinha relação taxonômica com o alvo 65% das vezes. Como previsto pelos
pesquisadores, na ausência de nomeação as crianças apresentaram uma tendência a agrupar
objetos em relação temática. Mas, conforme eles esperavam, as crianças preferiram
relacionar Nomes novos a objetos de mesma categoria.
Ao analisarmos estes resultados, podemos pensar em um princípio que guiaria a
classificação dos conceitos em categorias do mesmo tipo quando associados a palavras
novas. Este princípio poderia também exercer um papel fundamental na aquisição do
significado das palavras, uma vez que ele facilitaria, em um momento inicial do processo
de aquisição de linguagem, o estabelecimento de vínculos entre novas palavras e conceitos
relacionados às mesmas categorias.
O princípio do objeto como um todo é uma formulação que tenta solucionar o
problema proposto por Quine. Ao que tudo indica, este princípio tem um papel muito
importante durante o processo inicial de aquisição de linguagem, guiando o estágio inicial
de vinculação entre palavra e seu referente.
Mas, se por um lado esta proposta explica um problema do processo de aquisição,
ela acaba por gerar uma outra questão: as crianças precisam reconhecer e nomear partes,
texturas, cores e outros aspectos de um objeto.
Para dar conta desta questão, Markman propõe o que ela chama de hipótese da
exclusividade mútua” (Markman, 1994). Segundo esta hipótese, o princípio do objeto como
um todo poderia, de certa forma, ser transgredido em algumas situações específicas.
Como mostramos acima, o princípio do objeto como um todo, juntamente com a
hipótese taxonômica, leva a criança a relacionar objetos e categorias a novas palavras.
Assim, um objeto terá um e somente um nome, o que nos faz pensar na hipótese da
exclusividade mútua. Mas existem casos em que um mesmo objeto pode ter nomes
diferentes, como, por exemplo, cachorro e bichinho.
Se levarmos em conta tal possibilidade, poderemos notar que esta hipótese, apesar
de não ser infalível (as crianças cometem erros), tem um papel importante durante o
processo de aquisição: é justamente por achar que cada referente corresponde a uma única
palavra que as crianças associam novos nomes a objetos desconhecidos.
Para citar o exemplo utilizado por Markman, vamos analisar a seguinte situação:
uma criança é apresentada a dois objetos, um tem o Nome conhecido pela criança, o
outro não. Se um Nome novo acompanha a apresentação desses dois objetos, a criança
deverá:
1. Pelo princípio do objeto como um todo, olhar para um dos objetos como um
possível referente para esta nova palavra.
2. Pelo princípio da exclusividade mútua, ela deve rejeitar que este novo nome se
refira ao objeto do qual ela já conhece o nome.
3. Então, ela deve escolher o objeto não conhecido como referente da nova palavra.
Este experimento foi realizado com crianças de 3 anos e, como esperado pelos
pesquisadores, elas relacionaram a nova palavra ao objeto desconhecido.
Podemos estender esta hipótese a uma situação um pouco mais complicada: uma
criança é apresentada a um objeto do qual já sabe o nome como, por exemplo, cachorro, e o
experimentador se refere ao cachorro como bichinho. Inicialmente, a criança pode rejeitar
esta nova denominação, mas com evidências claras de que este pode ser também um
segundo nome possível daquele objeto, ela passa a considerar esta segunda possibilidade,
indo de encontro, assim, à hipótese da exclusividade mútua (Markman, 1994). Aqui temos,
possivelmente, um caso de surgimento da categorização de um mesmo objeto em diferentes
níveis: um superordenado (Animal), um básico (Cachorro) e um sub-ordenado (dálmata).
Ainda, em um outro estudo, Markman propõe que este princípio pode ajudar na
identificação de partes e outras características de objetos que possuem um nome
conhecido pela criança. Neste caso, ao serem apresentadas a objetos conhecidos e
nomeados, as crianças tenderiam a associar a nova palavra às características e partes destes
objetos.
Estes resultados nos levam a perceber a importância do contexto sintático em situações
de nomeação, pois no exemplo citado acima, diferentes aspectos de uma mesma cena
podem ser colocados em evidência conforme o contexto sintático em que a palavra é
apresentada: se a experimentadora chamasse a atenção da criança dizendo: “Olha, é lindo”
(verbo leve + Adj), o foco seria diferente de quando ela diz: “Olha, um bichinho” (Det +
N).
2.8 AQUISIÇÃO LEXICAL E ORGANIZAÇÃO CONCEPTUAL
Como vimos no item 2.1, Waxman (2004)
9
realizou estudos com o objetivo de
verificar o papel da linguagem na conceptualização. Como mostramos, ela se propõe a
tentar traçar “a origem e a evolução das relações entre o sistema lingüístico e o sistema
conceptual no desenvolvimento” (Waxman, 2004, p. 138).
Embora algumas pesquisas sugiram que habilidades de conceptualização inatas
desempenham um papel importante no desenvolvimento cognitivo (para referências, ver
Mandler, 2004), não podemos deixar de considerar o papel exercido pela experiência no
processo de conceptualização. Se as crianças são capazes de formar novas categorias de
conceitos baseadas em seu conhecimento anterior (se tendem a prestar mais atenção em um
evento que não corresponde ao seu conhecimento atual, como ficar mais atenta a
fenômenos novos), podemos pensar que a exposição a novos estímulos do meio tenha um
papel importante na formação de novas categorias conceptuais.
9
Este texto engloba uma série de experimentos apresentados em artigos como Waxman & Booth (2001),
Lidz, Waxman & Freeman (2003), por exemplo.
Em seus experimentos, Waxman (2004) trabalhou exatamente com esta hipótese:
crianças foram expostas a palavras novas (pseudo-palavas) que eram apresentadas em
associação a uma determinada entidade de uma categoria, um animal de brinquedo, por
exemplo. Assim, na fase experimental, ela apresentava simultaneamente: (i) um novo
membro da categoria familiar (um outro animal); e (ii) um objeto de uma nova categoria
(uma fruta).
Waxman trabalhou com a hipótese de que as crianças que fossem expostas a
palavras novas (neste caso, Nomes e Adjetivos) teriam maior probabilidade de formar
novas categorias conceptuais. Os resultados corroboraram esta hipótese.
Um aspecto importante nos estudos realizados por Waxman diz respeito à
vinculação inicial estabelecida entre nome-conceito, sendo que, ao que tudo indica, esta
vinculação, juntamente com a descoberta da estrutura argumental da língua a que a criança
seria exposta, serviria de base para a descoberta de significados que seriam vinculados às
demais formas gramaticais.
2. 8.1 O MODELO EMERGENTISTA DE COALIZÃO
Até agora apresentamos modelos que, de certa forma, se baseiam em alguns princípios
inatos que seriam responsáveis pelo desencadeamento do processo de aquisição da
linguagem. Embora muitos estudos apontem para a existência destes princípios, existem
sérios debates sobre a perspectiva inatista e a sócio-pragmática/cognitivista.
Numa tentativa de unificar estas duas visões opostas, Hirsh-Pasek e colaboradores
(2006) propuseram o “Modelo emergentista de coalizão da aprendizagem de palavras”.
Segundo esta perspectiva, as crianças, durante o processo de aquisição de sua língua
materna, seriam expostas a múltiplas pistas e fariam uso destas para criar a vinculação entre
conceito e palavra. Propriedades como saliência perceptual, pistas gramaticais, contexto
social e outras mais desempenhariam papéis importantes no decorrer do processo de
aquisição da linguagem. Hirsh-Pasek & col. apresentam alguns estudos desenvolvidos sob
orientação desta proposta, mas não chegam a definir se adotam a existência de princípios
inatos subjacentes ao processo de aquisição.
Como vimos nas propostas analisadas acima, muitos modelos tentam explicar a
vinculação entre palavra e conceito no processo de desenvolvimento da linguagem na
espécie humana. Até agora abordamos este problema com um enfoque maior nas questões
relativas à correspondência entre o sistema conceptual e a linguagem.
Conforme mencionamos, neste trabalho adotamos uma perspectiva de conciliação
entre uma teoria de língua e um modelo de processamento.
2.9 CONCLUSÃO
No início deste capítulo, mostramos que a aquisição de Nomes e Adjetivos foi
tratada no inglês e, logo em seguida, expusemos algumas questões que não nos permitem
estender esse mesmo tipo de análise ao PB. Os membros dessas duas categorias no PB não
se comportam da mesma forma que no inglês. Uma dessas diferenças é relativa à estrutura
do DP, que, em nosso caso, não é fixa, podendo apresentar uma flutuação na posição dos
Nomes e Adjetivos dentro do DP. Outra característica de nossa língua é a possibilidade de,
em muitos casos, as formas N e Adj não apresentarem nenhum tipo de diferença
morfológica entre si, sendo possível que um mesmo item lexical se apresente ora como
membro de uma dessas categorias, ora como de outra.
Em termos de desenvolvimento conceptual, buscamos expor quais as possíveis
relações entre a linguagem e este sistema. Para isso levantamos algumas questões e
apresentamos algumas abordagens teóricas que visam a solucioná-las.
Analisando essas questões, pudemos ver que para tratarmos da aquisição de Nomes
e Adjetivos de forma satisfatória é necessário que levemos em conta um modelo de língua
que trate das propriedades da língua, ou seja, a forma como Nomes e Adjetivos se
apresentam no PB, seja estrutural ou morfofonologicamente, e um de modelo de
processamento que considere como a criança processa a linguagem, de modo a identificar
esses elementos e mapeá-los a conceitos.
Os trabalhos em aquisição lexical voltados para a aquisição de Nomes e Adjetivos,
particularmente os de Waxman (2001, 2004), têm se preocupado com a relação entre
linguagem e conceitos. Nossa questão, no entanto, busca compreender como a criança é
capaz de identificar Nomes e Adjetivos no fluxo da fala e relacioná-los a categorias e
propriedades de objetos, isto é, quais são as pistas utilizadas pela criança nesta
identificação.
Matsuoka (2007) apresenta algumas características prosódicas do DP complexo,
como a duração do adjetivo nas posições pós e pré-nominal em contextos de fala dirigida à
criança, que poderiam ser usadas pela criança, facilitando a identificação desses elementos.
Tais propriedades prosódicas poderiam servir como ponto de partida para o processo de
aquisição. Porém, propriedades estruturais e semânticas também podem ter um papel
importante nesse processo de aquisição lexical. Teixeira (a sair) obteve resultados que
sugeriram a importância desempenhada por sufixos característicos da categoria adjetivo no
PB no processo de identificação dos elementos constituintes do DP complexo. Neste
mesmo estudo, na ausência destes sufixos, a informação disponibilizada pela ordem dos
constituintes no DP também se mostrou relevante para o mapeamento de novas palavras
com as categorias Nome e Adjetivo.
Visto isso, no próximo capítulo, vamos apresentar modelos de processamento
voltados a aquisição da linguagem que focalizam tais propriedades.
Mas antes, apresentaremos o PM (Programa Minimalista, Chomsky 1995, apud
Augusto, 2005) que é um modelo de língua que lida com a questão da aquisição lexical.
Apresentaremos também como esse modelo trata das categorias Nome e Adjetivo, assim
como da posição estrutural do adjetivo no DP.
3. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Neste capítulo faremos um resumo do modelo de língua proposto pelo programa
gerativista em suas mais recentes formulações, o Programa Minimalista.
Em seguida, vamos apresentar, resumidamente, os modelos de Bootstrapping, os quais
nos fornecem embasamento enquanto modelos de processamento.
3.1 O MODELO GERATIVISTA E A AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM
Desde suas formulações iniciais, o modelo gerativista tem se mostrado comprometido
com o problema da aquisição de línguas naturais. Por conta disso, é característico de tal
empreendimento a caracterização das línguas naturais em termos de suas propriedades e
especificidades, propondo que a linguagem na espécie humana pode ser compreendida em
parte como um conhecimento inato e, juntamente, como desenvolvida através da
experiência.
Para a questão da qual tratamos nesta dissertação, tais pressupostos se mostram
fundamentais: se, por um lado, no tratamento da aquisição de Nomes e Adjetivos, somos
levados a considerar as “generalidades” tanto lingüísticas, que são comuns a todas as
línguas, quanto as conceptuais, características de nossa espécie, não podemos, conforme
vimos na caracterização dos Nomes e Adjetivos no PB, deixar de levar em conta as
especificidades de uma dada língua durante o processo de aquisição.
Tendo estas questões em vista, passamos agora a uma breve exposição do modelo
gerativista e suas formulações quanto ao problema da aquisição da linguagem.
3.1.1 O MODELO GERATIVISTA
Na década de 50 o behaviorismo era o paradigma científico que dominava a maior
parte das pesquisas científicas que tinham como objeto, mesmo que indiretamente, algum
aspecto da natureza humana. Na psicologia, o behaviorismo de Skinner dominava boa parte
das pesquisas e publicações; na Lingüística o estruturalismo de Bloomfield orientava as
pesquisas descritivistas que tinham como principal foco a catalogação das diferentes
línguas existentes no mundo. Ainda, na filosofia, o behaviorismo analítico de filósofos
como Quine e Ryle tentava dar fim ao legado do dualismo cartesiano, utilizando a análise
da linguagem como sua principal ferramenta.
Especialmente no âmbito das pesquisas em psicologia e lingüística, o behaviorismo
começava a dar sinais de inadequação para tratar de problemas como a subjetividade e
criatividade observadas na espécie humana. A resistência de levar em consideração a
postulação de processos internos enquanto determinantes de ações ou comportamentos
parecia deixar em aberto questões importantes sobre a natureza humana.
Tais questões acabaram por colocar na pauta dos debates acadêmicos a
possibilidade de se considerar a referência a estados internos (mentais) como uma
possibilidade viável de explicação e compreensão da cognição e comportamento humanos.
Ao mesmo tempo, um outro fator seria, de certa forma, determinante no cenário do
ressurgimento de uma perspectiva mentalista como resposta aos problemas deixados pelo
legado behaviorista: o crescente avanço nas ciências da computação e o nascimento da
Inteligência Artificial.
É nesse período que nasce a teoria gerativa, proposta por Chomsky ainda na década
de 50.
Indo de encontro à tendência descritivista que até então dominara a lingüística
norte-americana, Chomsky sugere uma mudança no objeto de investigação da ciência da
linguagem: o que deveria ser estudado não eram as diferenças entre as diversas nguas,
mas algum tipo de mecanismo subjacente que daria origem a todas estas línguas, e,
portanto, deveria, ao mesmo tempo, limitar suas possibilidades de manifestação,
imprimindo, de alguma maneira, certos tipos de manifestações que seriam universais em
todas as línguas possíveis.
Em 1957, Chomsky publica Estruturas Sintáticas, em que propõe o que denominou
de gramática gerativa. Esta seria composta por um sistema de regras transformacionais que
possibilitaria a um falante/ouvinte ideal tanto produzir quanto compreender os enunciados
lingüísticos presentes em sua língua materna. Ao invés de se dedicar exclusivamente às
diferenças existentes entre as diversas línguas, Chomsky optou pelas regularidades
subjacentes a estas.
Neste primeiro momento de sua teoria, Chomsky se preocupa em elaborar um
modelo formal de gramática que tenha como principal objetivo a conciliação entre a
adequação explicativa e a descritiva. Para isto ele propõe um modelo baseado em níveis de
representações lingüísticas para sentenças de uma dada língua. Esses níveis de
representação obedeceriam a uma ordem hierárquica de transformações, até que a sentença,
em um último nível, estivesse pronta. Assim, a gramática deveria gerar as sentenças de uma
dada língua (Borges Neto, 2004).
Como este modelo era basicamente estruturado na análise sintática, a necessidade
de tratar dos aspectos semânticos da linguagem se fez presente, uma vez que, ao retomar o
pressuposto mentalista, a aproximação com psicologia era inevitável. É neste contexto que
surgem as noções de estrutura profunda, relacionada com a representação semântica das
sentenças, e estrutura de superfície, ligada à representação fonética. Neste momento, o
componente transformacional ficaria encarregado de projetar as representações semânticas
sobre as sintáticas. Este modelo ficou conhecido como Teoria Padrão.
Um outro ponto importante que surge dentro da teoria gerativa nesta época é a
questão de um dispositivo de aquisição da linguagem (Language Aquisition Device - LAD)
que guiaria a criança durante o processo de aquisição de sua língua materna. Este
componente seria composto de regras gramaticais que governariam o processo de
aquisição.
Estas regras deveriam englobar todas as variações presentes nas diversas línguas
existentes. Isto acabou por trazer alguns problemas à teoria de Chomsky, uma vez que o
número de regras tornou-se muito grande, sobrepondo a adequação descritiva à explicativa,
o que não estava de acordo com a proposta teórica.
Visando a resolver tal questão, são propostas condições restritivas sobre o
funcionamento das diversas regras então existentes. Princípios gerais e comuns a todas as
línguas são formulados e deveriam interagir com as regras características de cada língua em
particular (parâmetros), sendo que estas regras seriam diferentes manifestações destes
princípios. É neste contexto que surge a teoria de Princípios e Parâmetros (Chomsky, 1981,
apud Augusto, 2005)
Quando propôs a gramática gerativa, Chomsky buscou elaborar um modelo teórico
consistente que fosse capaz de explicar tanto questões relativas a aspectos universais
quando aos particulares das línguas naturais, filiando-se a abordagens mentalistas. Faz-se
aqui necessária a caracterização do sujeito portador da mente e seus mecanismos
relacionados à linguagem: diferentemente dos primatas e outros animais, o homem
possuiria uma habilidade ímpar, a faculdade da linguagem. Esta seria capaz de gerar
infinitas novas sentenças e interpretações para elas. Em algum ponto da história da
evolução de nossa espécie, nossos antecedentes teriam desenvolvido a faculdade da
linguagem e os que estavam equipados com este novo aparato estariam mais aptos a
perpetuar seus genes.
Ao assumir a postura inatista, Chomsky traz à tona um antigo problema filosófico, o
da dualidade entre mente e corpo, questão levantada pelo filósofo René Descartes ainda no
século XVII:
...mente e corpo são duas entidades distintas. Não semelhança qualitativa entre
o corpo (o mundo material ou físico) e a mente (o mundo mental). A matéria, a substância
material do corpo, tem extensão (ela ocupa espaço) e opera de acordo com princípios
mecânicos. A mente, contudo, é livre, não tem extensão nem substância. (Schultz &
Schultz, 1992, p. 41).
Atribuindo papel central ao processo mental na aquisição da linguagem, a aquisição
de uma língua por um sujeito pode ser caracterizada como uma espécie de julgamento que
põe em contado os estímulos lingüísticos, ou seja, os dados disponíveis na comunidade
lingüística que são captados pela percepção, e as predisposições gramaticais contidas na
Gramática Universal (GU).
Todo este processo de aquisição e conseqüente desenvolvimento da linguagem é
postulado considerando-se um falante-ouvinte ideal,
dentro duma comunidade de fala completamente homogênea, e que conhece a sua ngua
perfeitamente e que não é afetado por circunstâncias gramaticalmente irrelevantes tais como
limitações de memória, distrações, mudanças de atenção ou interesse, e erros (de acaso ou
característicos) ao aplicar o seu conhecimento da língua no desempenho efetivo (Chomsky,
1965, p. 229).
3.1.2 REFORMULAÇÃO DO PROGRAMA GERATIVISTA O
PROGRAMA MINIMALISTA
Quando propôs seu modelo teórico, na década de 50, Chomsky revolucionou os
rumos da lingüística. Ao postular a existência de um módulo específico para a linguagem e
que este trabalharia de forma independente dos demais módulos, ele, de certa forma, sugere
que a lingüística poderia se estabelecer como uma ciência autônoma das demais ciências
cognitivas, sendo que a sintaxe ocuparia o foco principal da ciência da linguagem, podendo
“ser examinada independentemente de outros aspectos da língua” (Gardner, 1995: 199).
Estas propostas, que foram, de certa forma, inquietantes para a época, geraram muita
polêmica entre os estudiosos da linguagem, o que rendeu uma série de críticas e
questionamentos à lingüística de Chomsky. Com o passar do tempo, Chomsky reelaborou
suas propostas, reformulando alguns pontos de sua teoria, o que culminou no atual
Programa Minimalista (Chomsky, 1995, apud Augusto, 2005).
Ciente da necessidade de comunicação entre os diferentes módulos cognitivos e de
que estes poderiam impor restrições ao funcionamento do processador lingüístico,
Chomsky empreende uma reestruturação de alguns pontos da teoria gerativista, sugerindo
que a faculdade da linguagem seria um componente interno da mente que poderia ser
dividida em duas partes, a faculdade da linguagem no sentido amplo (doravante FLB) e a
faculdade da linguagem no sentido estrito (FLN). (Chomsky et al., 2002).
A FLB é definida como sendo a faculdade da linguagem no sentido amplo. Ela seria
a responsável pela comunicação da faculdade da linguagem no sentido estrito (FLN) com
os sistemas cognitivos (sensório-motor e conceptual-intencional).
A FLN seria o sistema computacional lingüístico que se ocuparia do processamento
do material estritamente lingüístico, atuando de forma independente dos outros sistemas
cognitivos e geraria as representações que seriam disponibilizadas para os demais sistemas
cognitivos através de níveis de interface. O nível que faria contato com o sistema
conceptual-intencional seria a LF (Forma Lógica), e PF (Forma Fonética) faria contato com
o sistema articulatório-perceptual.
Segundo este novo modelo, o sistema computacional (FLN) operaria sobre traços
fonológicos, semânticos e formais. Estes traços estariam disponíveis no léxico, que passa a
ser o lugar responsável pelas variações presentes nas diversas línguas (o que antes deveria
ser dado pelos parâmetros, é agora fornecido pelo léxico):
As operações implementadas pelo sistema computacional, comuns às línguas humanas, não
seriam, assim, passíveis de serem tomadas como objeto de aprendizagem. O léxico
constituiria o conhecimento adquirido mediante experiência lingüística (Corrêa, 2006, p.
37-38).
Desta forma, a informação que seria disponibilizada nos níveis de representação
(Forma Lógica e Forma Fonológica) deveria ser lida pelos respectivos sistemas de
desempenho, ou seja, a interface PF deveria interpretar somente os traços fonológicos e LF
os semânticos e formais interpretáveis.
Isto nos leva a notar que os sistemas que fazem interface com a faculdade da
linguagem no sentido estrito acabam por impor restrições ao funcionamento desta. “Os
sistemas de desempenho impõem restrições de legibilidade ao sistema computacional”
(Augusto, 2005).
Para que possamos usar as nguas, então, é preciso que as expressões lingüísticas
satisfaçam algumas condições impostas por esses dois sistemas externos. Assim, a questão
fundamental do PM é o estabelecimento da “medida” que permita a avaliação da
“otimidade” das estruturas em satisfazer as condições impostas pelos sistemas externos. Em
outras palavras, será considerada “boa”, “gramatical”, “aceitável”, a estrutura que satisfizer
inteiramente as condições das interfaces (Borges Neto, 2004).
O léxico, nesta concepção do Programa Minimalista, representa um domínio de
interseção entre os sistemas de interface e o sistema computacional em si, sendo formado
por traços formais, semânticos e fonológicos. O sistema computacional operaria sobre os
traços formais do léxico durante o curso da derivação. Os demais traços, semânticos e
fonológicos, seriam lidos pelos sistemas de interface, após spell-out.
O sistema computacional seria constituído basicamente de uma operação principal
recursiva (Merge) responsável por concatenar os elementos do léxico e estabelecer relações
do tipo núcleo-complemento e núcleo-especificador, construindo, assim, uma estrutura
hierárquica a partir da projeção desses núcleos (Corrêa, 2006). A recursividade seria,
talvez, a principal responsável pelo desenvolvimento da faculdade da linguagem na espécie
humana. Embora esta capacidade pareça estar presente em outras espécies, como em
primatas não-humanos, ela teria sido associada à linguagem somente em nossa espécie,
numa forma de adaptação a esta função e seria, portanto, sujeita às imposições colocadas
pelos outros sistemas cognitivos de interface (Augusto, 2005).
Em um momento inicial do processo de derivação sintática, os itens do léxico
seriam selecionados num processo denominado Numeração. Aqui vale destacar que a
ativação do funcionamento do sistema computacional seria deflagrada pelos níveis de
interface, segundo as necessidades de comunicação de um organismo inserido em um
determinado meio.
A Numeração seria, assim, a responsável por uma seleção prévia de elementos do
léxico e seus traços. A justificativa para tal operação decorre do imenso número de
elementos que poderiam compor o léxico de um falante adulto, e, portanto, uma
delimitação dos elementos a serem usados na derivação sintática mostra-se necessária.
Uma vez que os itens lexicais fossem selecionados em uma Numeração, entraria em
cena um outro mecanismo, Select. Este processo atuaria sobre os itens da Numeração
selecionando cada item a ser utilizado, quantas vezes fossem necessárias.
As informações disponibilizadas nos níveis de interface devem ser lidas pelos
sistemas correspondentes, de modo que a informação fonológica deve ser lida pelo sistema
articulatório-perceptual e a informação semântica pelo sistema conceptual-intencional.
Quando determinados traços não são interpretáveis por nenhuma destas interfaces, eles
devem ser valorados, o que é uma condição de legibilidade imposta pelos sistemas de
interface sobre o sistema computacional.
A operação responsável pela valoração destes traços não legíveis é denominada
Agree. Assim,
traços do mesmo tipo podem ser associados a categorias que serão relacionadas no decorrer
da derivação sintática. O pareamento entre traços interpretáveis e não-interpretáveis de
mesmo tipo, relacionando diferentes categorias, expressa o mecanismo de concordância
sintática presente nas línguas naturais (Augusto, 2005, p. 250-251).
A presença destes traços não valorados daria conta de explicar, também, as
possíveis imperfeições do sistema conceptual e, ao mesmo tempo, expressar os diferentes
tipos de concordância sintática presente nas diversas línguas existentes. Esses traços
deveriam, então, ser valorados durante a derivação, antes de chegarem ao estágio em que a
informação lingüística seria disponibilizada nos níveis de interface – spell-out.
Para que possam ser valorados, eles procuram um conjunto similar de traços para
estabelecer a operação Agree e, finalmente poderem ser eliminados antes de estarem
disponíveis no nível de interface LF (forma lógica). Embora esses traços sejam eliminados
antes mesmo de chegarem a LF, eles podem aparecer na estrutura final do objeto sintático
(PF) indicando concordância morfológica.
Uma última operação é proposta: Move. Esta ocorreria concomitantemente à
atuação de Agree e seria, na verdade, entendida como Copy + Merge, ocorrendo sempre
que “uma posição de especificador for disponibilizada para abrigar a categoria que entrou
nessa relação de concordância” (Augusto, 2005).
Poderíamos, portanto, dividir todo o processo de derivação em três etapas. Em um
primeiro momento, processos pré-sintáticos estariam relacionados com a Numeração e a
identificação dos traços relevantes que constituem o léxico de cada língua. Os processos
sintáticos corresponderiam ao funcionamento do sistema computacional em si, englobando
todas as operações intrínsecas e impenetráveis deste nível da derivação. Em um momento
final, a informação resultante de todo o processo da derivação seria disponibilizada para os
níveis de interface e, finalmente, compartilhada com os demais sistemas cognitivos
constituintes da arquitetura da mente modular, caracterizando, assim, os processos pós-
sintáticos (Correa, 2006).
3.1.3 A QUESTÃO DA POSIÇÃO DO ADJETIVO NA TEORIA GERATIVA
Podemos dizer que os adjetivos funcionam como modificadores dos nomes,
atribuindo-lhes propriedades qualificadoras ou classificadoras.
Em muitas línguas, como o inglês ou o húngaro, por exemplo, a posição do adjetivo
dentro do DP é pré-nominal, isto é, antecede o nome, conforme o exemplo seguinte:
Ainda no modelo de Princípios e Parâmetros, quando temos este tipo de estrutura, o
adjetivo decorre de uma adjunção à esquerda do NP (Noun Phrase – Sintagma Nominal) ou
como seu especificador.
Mas em algumas línguas, como o português ou o francês, por exemplo, o adjetivo
não se comporta dessa mesma forma, podendo aparecer também em posição pós-nominal.
Nesse caso, ocorreria sua adjunção à direita do NP.
No PM, assumindo a restrição de adjunção à direita (Kayne, 1994, apud
Laenzlinger, 2000), a posição do adjetivo à direita de NP não é mais possível. Essa posição
pós-nominal seria resultante do movimento do Nome, que ao se movimentar afetaria,
assim, a sua posição linear, deslocando-se para o nível intermediário, colocando-se, desta
forma, à esquerda do adjetivo, como podemos ver no exemplo:
São várias as propostas de tratamento do adjetivo pós-nominal na teoria gerativa
(ver Laenzlinger, 2000 para discussão), e não cabe neste trabalho discuti-las. O que nos
interessa, conforme destacado em Laenzlinger (2000), é a relação entre a posição e
informação semântica veiculada:
We must also take into consideration movement possibilities within DP, since they affect
the linear placement of adjectives. Finally, external interface conditions (phonological,
pragmatic, stylistic conditions) can also have effects on the placement of adjectives. (p.3)
Partindo deste ponto de vista, podemos dizer que as condições externas ao sistema
computacional (intenções do falante, contexto semântico e a pragmática) exercem algum
tipo de influência sobre a organização da ordem dos constituintes nos processos sintáticos.
Deste modo, a ocorrência do adjetivo em posição pós-nomimal pode ser derivada destas
exigências semânticas, correspondentes aos sistemas de interface, impostas sobre o sistema
computacional. Assim sendo, do ponto de vista estritamente sintático, o custo processual da
posição do adjetivo antecedendo o nome não é claro. Para verificarmos esta questão,
elaboramos um experimento que iremos descrever no capítulo 5 desta dissertação (ver
experimento 4).
No programa minimalista, os níveis de interface exercem um papel fundamental,
uma vez que impõem restrições ao sistema computacional. O motivo destas restrições seria
a condição de legibilidade imposta pelos sistemas de interface sobre os traços do léxico,
sendo que traços não valorados devem passar por uma checagem, de modo a torná-los
legíveis para os níveis de interface.
Adjetivo antecedendo o Nome
Movimento do Nome dentro do DP
Como os traços são fornecidos pelo léxico de cada língua, o movimento do nome
dentro do DP pode ser visto como uma operação que acontece durante a checagem, visando
a satisfazer as condições de legibilidade imposta pelos sistemas de interface, que por sua
vez, seriam influenciados pela estrutura da língua natural do falante.
Em termos de aquisição da linguagem, podemos defender que a criança, diante dos
dados do PB, captaria a informação semântica inicial do adjetivo em função de sua posição,
a partir das interfaces. Essa informação semântica inicial poderia ser captada pelo fato de a
própria mobilidade do adjetivo ser uma pista de que a palavra em questão é da categoria
Adjetivo, ou de uma outra categoria, diferente de Nome. Juntamente a isto, a sub-
classificação dos adjetivos em qualificadores ou classificadores poderia ser também uma
pista sobre a qual a criança se apoiaria. Isto é, a informação semântica de propriedade
classificatória seria sempre veiculada na posição pós-nominal, fazendo deste padrão de
ocorrência uma pista. a informação semântica de propriedade qualificadora poderia ser
veiculada tanto pré, quanto pós-nominalmente, o que caracteriza os adjetivos
qualificadores.
Como dissemos antes, o enfoque estritamente sintático dado ao sistema
lingüístico na teoria gerativista foi um dos principais alvos de críticas a esta hipótese.
Embora ele operasse segundo suas regras internas, não havia como negar que estava
inserido dentro de um sistema maior, que fazia parte da arquitetura da mente e deveria,
portanto, interagir com os outros módulos deste sistema, levando em consideração a
informação semântica e conceptual provida por estes.
Paralelamente aos desenvolvimentos da teoria lingüística, a psicolingüística,
juntamente da psicologia do desenvolvimento, abordava o problema da linguagem dando
uma ênfase aos demais sistemas cognitivos e suas contribuições e restrições sobre o
desenvolvimento dessa habilidade. Problemas de memória e atenção eram estudados nestas
abordagens. Ao contrário da posição racionalista adotada pelo modelo de língua de
Chomsky, a psicolingüística (aqui entendida sob grande influência da psicologia do
desenvolvimento) partia de pressupostos empiristas
10
, ou seja, todo conhecimento seria
10
Como principais expoentes da corrente empirista estariam os filósofos britânicos John Locke e David
Hume.
Grosso modo, o empirismo era uma tentativa de colocar de lado a metafísica cartesiana e suas postulações de
idéias inatas presentes na mente. Segundo os empiristas, todo o conhecimento seria provido pelo aparelho
obtido através da experiência sensorial, o que, necessariamente, levaria à idéia de
aprendizagem obtida pela experiência. Muitas pesquisas em aquisição da linguagem
desenvolvidas na Psicolingüística chegaram a um compromisso entre as duas perspectivas.
Adotando uma concepção inatista, racionalista, defendem, no entanto, a necessidade da
exposição da criança à experiência, a fim de desencadear o processo de aquisição de uma
língua.
Na próxima seção, faremos uma breve exposição dos modelos de
Bootstrapping
,
modelo de processamento que tenta tratar das questões relacionadas à percepção dos
estímulos lingüísticos e de seu processamento, como forma de alavancar a aquisição da
linguagem.
3.2 O BOOTSTRAPPING
Conforme veremos mais adiante, embora nossa hipótese tenha seu foco no
processamento da informação estrutural disponibilizada em contextos de nomeação, a
informação semântica também exerce um papel importante no processo de aquisição da
linguagem, e seria mais fortemente utilizada pela criança um pouco mais tardiamente que a
informação estrutural.
A questão do mapeamento entre uma determinada cena corrente e uma unidade
lexical é conhecida como o modelo de bootstrapping semântico (Grimshaw, 1981; Pinker
1984, apud Gleitman, 1990). Segundo este modelo, a criança seria capaz de extrair o
significado de um verbo, por exemplo, relacionando-o com uma cena ou entidade no
mundo externo, uma vez que essa cena ocorreria no mesmo momento em que alguém
pronunciasse, se dirigindo à criança, o verbo em questão. Desta forma, o sentido do verbo
seria fixado pela observação de sua relação com o mundo real.
Uma vez que o significado do verbo tenha sido extraído pela observação, a criança
utilizaria a estrutura argumental deste verbo para prever com quais elementos ele se
relacionaria. Um exemplo disso pode ser observado quando analisamos a seguinte situação:
por meio da observação de ocorrências do verbo “dar” relacionado a eventos simultâneos, a
sensorial. Uma alternativa ao empirismo britânico seria proposta por Immanuel Kant, que chegaria a
reconhecer o importante papel da experiência na internalização do conhecimento, mas, em contrapartida, ele
iria sugerir a idéia de categorias a priori que seriam responsáveis pela percepção estruturado do mundo.
criança conseguiria predizer seu significado, ou seja, uma pessoa dá uma determinada coisa
para outra, como em Júlia a boneca para o papai. Neste caso, a lógica do verbo implica
que alguém dê alguma coisa para outrem.
Assim, conforme essa proposta, sendo o significado do verbo extraído por meio da
observação, a criança seria capaz de projetar estruturas inatas de conhecimento das regras
que mapeiam estruturas semânticas nas estruturas sintáticas (Gleitman, 1990). Nas palavras
de Corrêa (2006, p. 47), “uma análise semântica a partir do significado lexical das palavras
de um enunciado impulsionaria a criança para o domínio da sintaxe”.
Como podemos observar, esta proposta pressupõe que a entidade a ser relacionada
com o item lexical em questão precisa, necessariamente, estar presente no momento de sua
enunciação pelo falante que se dirige à criança. Isto acaba por trazer um problema
fundamental para esta hipótese quando analisamos verbos que não se referem a nenhuma
entidade no mundo real, como pensar, gostar e crer, por exemplo.
Para dar conta desta e de outras questões, foi proposta a idéia de um bootstrapping
sintático (Gleitman, 1990). Segundo este modelo, as crianças, no decorrer de seu primeiro
ano de vida, possuiriam capacidades, ainda que rudimentares, de análise sintática (parsing),
sendo sensíveis à informação advinda do contexto sintático em que verbos e outros itens
lexicais ocorreriam.
Como a observação dos eventos que ocorrem no mundo real se mostra insuficiente
para dar conta da associação do significado com itens lexicais, nesta proposta, o próprio
contexto sintático seria uma fonte de informação pela qual a criança se guiaria durante o
processo de aquisição.
Ao contrário da proposta do bootstrapping semântico, nesta abordagem o
significado do verbo seria deduzido por meio de seus argumentos. Seguindo este raciocínio,
podemos dizer que certos conceitos semânticos abstratos como “crer”, “pensar” e “gostar”,
poderiam ser inferidos através das estruturas oracionais que trariam informações semânticas
que se relacionariam com o verbo e cada estrutura possuiria um número limitado de
interpretações possíveis para determinado verbo. Este tipo de proposta se relaciona com o
objeto desta dissertação, uma vez que propriedades semânticas abstratas expressas por
adjetivos, por exemplo, podem não ficar claras durante a observação de uma cena em curso
observada pela criança, o que dificultaria o mapeamento entre o adjetivo e seu referente. A
estrutura sintática, ou seja, a posição dos elementos dentro do DP, facilitaria este
mapeamento, servindo como pista importante para a criança durante o processo de
aquisição.
Embora estas duas propostas de
bootstrapping
partam de pressupostos distintos,
devemos ressaltar, conforme os autores de ambas as propostas defendem, que é muito
provável que durante o processo de aquisição elas atuem de modo complementar.
Um ponto crucial nos modelos de
bootstrapping
diz respeito à questão da
capacidade de segmentação do fluxo fala em unidades lingüísticas pela criança. Os modelos
acima partem do pressuposto de que a criança seria capaz de identificar uma unidade
lexical ou sintagmática na fala. Mas como seria possível destacar estas unidades?
Uma possível estratégia seria guiar-se pela estrutura sintática das frases a que são
expostas. Mas para poder haver acesso à sintaxe, torna-se necessário um conhecimento que
antecede tal processo: a identificação, uma a uma, das palavras que constituem tal
enunciado. Temos aqui o que chamamos de um problema circular.
Encontrar palavras na sentença se torna difícil pela falta de fronteiras delimitadoras
precisas, como pausas entre uma palavra e outra. Não temos, em um contínuo da fala, uma
delimitação entre suas unidades constituintes. Ao contrário, o que percebemos é uma massa
sonora em que o final de uma palavra é literalmente “mescladocom o início da palavra
que a segue.
Como podemos perceber, não estamos diante de um problema de fácil resolução.
Mas estudos recentes têm sugerido que a análise da prosódia pode ser uma fonte preciosa
de informação para resolver este problema. Crianças expostas a uma determinada língua
podem apreender alguns aspectos estruturais desta língua através da análise fonológica do
estímulo lingüístico a que são expostas. Chamamos a este processo
Bootstrapping
fonológico (Morgan & Demuth, 1996; Christophe et al., 1997).
Estudos realizados com crianças em seus primeiros dias de vida sugerem que o bebê
mostra uma preferência aos estímulos lingüísticos em detrimento de outros tipos de
estímulos sonoros, manifestando sensibilidade a mudanças na intensidade e freqüência do
sinal lingüístico (ver Boysson-Bardies, 1996 para referências).
Ainda, estudos experimentais apontam para o fato de a criança, desde seus
primeiros meses de vida, ser sensível a propriedades de sua língua. Bebês nascem com uma
capacidade de discriminar as vogais e consoantes de qualquer língua natural. Aos poucos,
eles se “especializam” no reconhecimento dos fonemas de sua língua, perdendo a
sensibilidade a contrastes entre vogais que não sejam de sua língua materna por volta dos
seis meses, e entre consoantes, entre 10 e 12 meses (ver Gout & Christophe, 2006 para
referências).
Ao mesmo tempo, o bebê vai se tornando sensível a constituintes da oração cada
vez menores. Aos 4 meses, bebês são sensíveis à fronteira entre orações, aos 9 meses são
sensíveis a fronteiras entre sintagmas e, aos 11 meses, sensíveis à fronteira de palavras. Por
volta de 1 ano e meio, a criança já é sensível à posição estrutural dos itens funcionais (ver
Name, 2002 e 2005 para referências).
Assim,
capacidades perceptuais básicas na identificação de padrões recorrentes e sensibilidade à
informação pertinente à distribuição de unidades lingüísticas assumidas na formulação de
estratégias cognitivas seriam exploradas no estudo do processamento do sinal acústico por
parte de bebês” (Corrêa, 2006, p 48. ).
A relação entre prosódia e sintaxe seria um importante fator desencadeador do
processo de aquisição. Supõe-se que a diferença entonacional característica de categorias
lexicais distintas serviria como base sobre a qual a criança se apoiaria para ”destacaros
diferentes elementos constituintes da fala a ela dirigida.
Conforme o modelo de
bootstrapping
sintático, a percepção da ordem dos
constituintes de uma oração seria de grande importância na identificação dos itens lexicais
e suas respectivas categorias, facilitando, por conta disso, o estabelecimento da referência,
uma vez que a criança utilizaria a informação lexical como pista para seu estabelecimento.
O mapeamento semântico, conforme apontado, seria, também, um aspecto
facilitador na identificação dos elementos lexicais e de suas categorias, mas, conforme
sugerido por Gleitman (1990), em situações naturais de interação da criança com seus pais,
a focalização de uma cena em curso pode não ser suficiente para a identificação do
referente a um determinado item lexical. A postulação do
bootstrapping
sintático seria uma
tentativa de resolver este impasse, sugerindo que a criança poderia se apoiar nas pistas
fornecidas pela estrutura sintática da língua, como a ordem estrutural dos constituintes, por
exemplo, para se guiar durante a aquisição lexical.
Esta é uma hipótese que se mostra fundamental para nossa dissertação. No PB,
como vimos anteriormente, embora não tenhamos uma ordem fixa para Adjetivos e
Nomes dentro do DP, podemos observar a existência de uma ordem preferencial, ou
canônica, para a ocorrência destes constituintes. Ainda, conforme veremos na análise de
nossos experimentos, a informação semântica disponibilizada no contexto de nomeação se
mostra de grande importância neste mesmo contexto.
Resultados apresentados por Matsuoka (2007), como previsto no modelo de
Bootstrapping
fonológico, sugerem que propriedades prosódicas distintivas da ordem dos
nomes e adjetivos no DP estariam presentes na fala dirigida à criança, sendo que os
adjetivos apresentados em situações de fala dirigida à criança, tanto na ordem canônica
quanto na não-canônica, tendem a ter sílabas mais longas que os nomes, sendo que a tônica
do adjetivo anteposto apresenta maior pico. Ainda, em termos de freqüência fundamental
(F0), a tônica do primeiro elemento do DP é mais elevada quando se trata de adjetivo.
Portanto, podemos dizer que a criança seria sensível a essas propriedades e as
utilizaria como pista no mapeamento sintático.
Conforme vimos acima, somente a observação de um evento e a conseqüente
associação deste com um item lexical pronunciado no mesmo momento de sua ocorrência
não parece ser suficiente para que aconteça o mapeamento entre um item do léxico e seu
referente. A utilização de informação estrutural fornecida pela sintaxe seria uma pista da
qual a criança faria uso juntamente com a informação semântica.
Ainda que no PB tenhamos a questão da flutuação do adjetivo dentro do DP,
sugerimos que a informação estrutural disponibilizada pela ngua poderia desempenhar um
importante papel num momento inicial do processo de aquisição.
Observado isso, nossa hipótese de trabalho propõe que a criança utilizaria a
estrutura sintática de sua língua para guiar-se durante o período de aquisição da linguagem
e faria uso, inicialmente, da informação estrutural disponibilizada pela ordem canônica. Em
seguida, informação de natureza semântica teria grande importância na identificação de
novos nomes e adjetivos.
Para verificarmos esta hipótese, elaboramos alguns experimentos que serão
descritos no capítulo 5. Como veremos, a informação semântica, conforme esperávamos,
foi utilizada pelas crianças juntamente com a informação estrutural disponibilizada pelos
enunciados constituintes do experimento.
4. METODOLOGIA EXPERIMENTAL
Neste capítulo iremos descrever as técnicas utilizadas para a realização dos
experimentos desenvolvidos conforme os objetivos desta dissertação. Realizamos três
experimentos distintos, sendo que o primeiro, e suas reformulações, foi elaborado
utilizando o paradigma da Tarefa de Seleção de Imagem, o segundo utilizou o paradigma
da Seleção de Objetos e o terceiro foi desenvolvido segundo a tarefa de leitura auto-
monitorada (
self-paced reading
) .
Os dois primeiros experimentos foram aplicados em crianças de creches da cidade
de Juiz de Fora, Minas Gerais, Brasil, sendo que o segundo foi aplicado também no
Laboratório do Centro de Humanidades do ICH na UFJF. O terceiro experimento foi
aplicado em adultos, alunos do período noturno do curso de Letras da UFJF, no
laboratório do Centro de Humanidades da UFJF.
A seguir comentaremos as técnicas que utilizamos.
4.1 O PARADIGMA DA TAREFA DE SELEÇÃO DE IMAGEM
A tarefa de seleção de imagens tem sido utilizada em experimentos que têm como
objetivo investigar diversos aspectos da compreensão e percepção lingüística., podendo ser
utilizada tanto com crianças quanto com adultos.
Esta metodologia é indicada para o desenvolvimento de experimentos realizados
com crianças que ainda não produzem determinados enunciados de sua língua, mas os
compreendem, podendo, desta maneira, responder à tarefa proposta pelo experimentador
apontando para as imagens que constituem o experimento em questão.
Neste tipo de tarefa, pede-se para que a criança, ou adulto, aponte para a imagem
escolhida entre outras que compõem o experimento. O ato de apontar para uma imagem é
tomado como resposta do sujeito.
Os experimentos que se utilizam desta técnica podem ser aplicados em qualquer
ambiente, desde que se tenha silêncio e que não estejam ocorrendo eventos que possam
desviar a atenção dos sujeitos.
Descrição da técnica:
Material:
- Pranchas com desenhos elaborados no programa
Microsoft Power Point
.
- Computador portátil em que são apresentadas as pranchas.
- Gravador portátil de voz.
- Livros infantis interativos utilizados na familiarização com o experimento.
Procedimentos:
- A criança é apresentada a alguns livros interativos para que se estabeleça uma
interação com o experimentador.
- Quando a criança está ambientada, o experimentador a convida a participar de
uma brincadeira usando computador.
- São apresentadas nove pranchas com pseudo-imagens e cinco com imagens
distratoras.
- O experimentador apresenta a primeira prancha, que é utilizada como elemento
distrator, e fala o nome dos personagens que compõem tal prancha.
- As pranchas são apresentadas de modo a haver alternância entre pranchas
distratoras e experimentais. O objetivo das pranchas distratoras é o de familiarizar a
criança tanto com a situação experimental quanto com o modelo do experimento.
Além disso, elas servem para evitar que a criança identifique uma padronização das
tarefas propostas e, por conta disso, passem a responder de forma automática.
- Ao apresentar as pranchas experimentais, o experimentador nomeia os objetos
mostrados com pseudo-nomes e, ao final de cada uma, pede à criança que aponte
uma imagem entre as que são mostradas como possíveis respostas para a pergunta
feita.
4.2 O PARADIGMA DA SELEÇÃO DE OBJETOS
O paradigma da seleção de objetos é uma variação do de seleção de imagens e pode
ser utilizado nas mesmas circunstâncias. O procedimento básico deste paradigma é fazer
com que o sujeito aponte para um determinado objeto entre outros, conforme os objetivos
do experimento. Em nosso caso, optamos por utilizar esta variação da tarefa de seleção de
imagens por ela proporcionar uma maior interação da criança com o experimento em
questão, podendo manipular os objetos, além de possibilitar uma maior clareza na
apresentação das propriedades (texturas) dos objetos.
Descrição técnica:
Material:
- Pseudo-objetos confeccionados com o mesmo material utilizado em bonecas de
tecido que, quando necessário, eram bordados com materiais visando a reproduzir
texturas desconhecidas pelas crianças.
- Objetos conhecidos pela criança, feitos com o mesmo material.
- Fantoche de mão
- Brinquedos utilizados para a familiarização da criança com o experimento.
- Câmera de vídeo.
Procedimentos:
- A criança é apresentada a um fantoche para o qual é convidada a mostrar os
brinquedos que vão ser disponibilizados durante o experimento.
- Antes de iniciar a fase experimental, são apresentados brinquedos que têm por
finalidade familiarizar e ambientar a criança com o experimento.
- Após esta fase inicial, são mostrados os pseudo-objetos, sendo que estes são
apresentados em associação com pseudo-nomes, e suas propriedades (texturas) com
pseudo-adjetivos.
- Ao final de cada grupo, o experimentador pede à criança que escolha um objeto
entre os vários que são apresentados.
4.3 A TAREFA DE LEITURA AUTOMONITORADA
A tarefa de leitura automonitorada é uma técnica utilizada para tentar investigar o
processamento on-line de leitura dos sujeitos do experimento. O procedimento básico desta
técnica consiste em pedir para que os sujeitos leiam frases segmentadas em oito partes. O
experimento foi elaborado utilizando o programa Psyscope instalado em um computador
iMAC e para ler as frases segmentadas o sujeito deveria pressionar a barra de espaço do
teclado deste computador, conforme seu ritmo normal de leitura. Cada vez que o sujeito
pressionava a barra de espaço, um segmento da frase aparecia no monitor até que a frase
terminasse.
Descrição técnica:
Material:
- Experimento elaborado e aplicado com o programa
Psyscope
.
- Computador iMAC, G3, 233 Mhz
Procedimentos:
- O experimentador explica o procedimento para o sujeito, e pede para que este leia
em uma tela inicial do computador as instruções para a realização do experimento.
- Após as instruções, o experimentador pede para que o sujeito passe para a fase de
treinamento, que consiste em uma etapa na qual o sujeito treina, sem ser testado, o
procedimento para a realização do experimento. Essa etapa consiste em ler o
primeiro segmento de uma frase e apertar a barra de espaço para que o próximo
segmento apareça, e assim por diante, até o fim da frase.
- Ao final de cada frase é feita uma pergunta relacionada com a frase em questão, mas
esta pergunta pode focalizar qualquer aspecto da frase, não estando relacionada com
o objetivo do experimento. Cada pergunta deve ser respondida ao apertar o botão
(marcado no teclado do computator) verde, para resposta positiva e vermelho, para
negativa. O objetivo dessas perguntas é tentar manter o sujeito atento ao conteúdo
das frases que são mostradas durante o experimento.
Após a fase de treinamento, o experimentador deixa o sujeito só na sala e pede para
que ele comece quando se sentir preparado e que avise ao terminar o experimento.
5. EXPERIMENTOS
Neste capítulo vamos apresentar os experimentos que elaboramos para testar nossa
hipótese de que a informação estrutural seria uma pista robusta sobre a qual a criança em
processo de aquisição do PB, em um momento mais inicial, se apoiaria. Esta hipótese
pressupõe que, inicialmente, a criança faria uso da informação sintática disponibilizada pela
língua para se guiar durante a identificação das entidades nomeadas no mundo (conforme a
proposta de
bootstrapping
sintático). Em etapas posteriores, informação semântica também
seria explorada pela criança.
Inicialmente elaboramos um experimento que utilizou o paradigma de seleção de
imagens.
Ao aplicarmos esse experimento, observamos alguns problemas em sua estrutura e,
devido a isso, passamos para uma segunda etapa, que constou de uma reformulação desse
experimento inicial, com algumas alterações pertinentes e aplicação em um número maior
de sujeitos.
Novamente, observamos que os resultados que obtivemos não eram claros o
suficiente para que pudéssemos, através deles, avaliar nossa hipótese. Resolvemos, então,
fazer uma análise da estrutura do nosso experimento, tendo em vista verificar possíveis
problemas relacionados a estes resultados.
Ainda assim, detectamos alguns possíveis problemas e resolvemos partir para a
elaboração de uma nova etapa, fazendo uma modificação no paradigma que até então
vínhamos usando, e adotamos um novo procedimento.
Por último, elaboramos um experimento a ser aplicado em adultos falantes do PB,
visando a obter algum tipo de informação sobre o processamento
on-line
do adjetivo tanto
posposto quanto anteposto ao Nome.
5.1 Experimento 1:
Para a realização de nosso primeiro experimento, nos apoiamos inicialmente nos
estudos realizados por Waxman e Booth (2001) e procuramos, a partir deste ponto inicial,
reformular alguns de seus aspectos, modificando toda a estrutura experimental. Para isto,
elaboramos um experimento que fosse capaz de satisfazer os objetivos de nossa pesquisa.
Considerando os resultados apresentados por Waxman e Booth, podemos levantar a
hipótese de que a identificação de pseudo-palavras como elementos da categoria Nome, em
um primeiro momento, pode ser atribuída a uma disposição universal entre crianças de
todas as línguas, para destacar primeiramente os membros desta categoria no inicio do
processo de aquisição. Ainda, um outro fator que pode ter atuado como elemento facilitador
desta identificação pode ter sido a presença de ordem fixa de constituintes dentro do DP na
língua inglesa. no caso dos Adjetivos, embora a identificação de elementos desta
categoria ocorra um pouco mais tardiamente que no caso dos Nomes, temos uma
sobreposição de pistas, pois, além da ordem estrutural ser fixa no inglês, os adjetivos
utilizados nos experimentos de Waxman tinham uma marca morfológica característica.
Ainda, os objetos apresentados para as crianças nestes estudos eram conhecidos,
como elefantes e cadeiras, sendo que o mesmo se aplica a suas características, que eram
designadas por cores como azul e roxo.
Conforme já dissemos anteriormente, no PB é muito comum adjetivos e nomes
possuírem exatamente as mesmas formas, como em:
a) A camisa rosa.
b) A rosa bonita.
Neste caso não existe nenhuma marca morfofonológica, como alguma flexão, por
exemplo, que diferencie o Adjetivo do Nome.
Um outro problema, que seria também um elemento diferencial entre a estrutura do
inglês e a do português, é a questão da flutuação do adjetivo dentro do DP. No PB podemos
ter o adjetivo aparecendo tanto anteposto quando posposto ao Nome, embora possamos
reconhecer a existência de uma ordem preferencial descrita como Determinante + Nome +
Adjetivo, conforme notamos no exemplo (b) acima.
Tendo em vista tais questões, procuramos desenvolver um experimento que
explorasse a questão da posição estrutural servindo, em um momento inicial, como pista
para a aquisição de Nomes e Adjetivos por crianças brasileiras. Para não haver
sobreposição de pistas, os pseudo-adjetivos não apresentaram marcas morfológicas.
Para isto, elaboramos, no programa
Corel Draw 9
, pseudo-imagens que eram
preenchidas com texturas igualmente criadas de forma a não serem reconhecidas pelas
crianças, não sendo parecidas com nenhum tipo de cor ou propriedade comuns a crianças
com faixa etária igual a das que foram testadas por nós.
A estas imagens associamos pseudo-palavras, que deveriam ser usadas na posição
de Adjetivos e de Nomes, conforme a estrutura da frase.
Exemplos de pseudo-imagens nomeadas:
No exemplo 1 temos: Um (Det.)
mabo
(N)
tobe
(Adj.), com o nome
mabo
sendo
ligado à forma do pseudo-objeto e o adjetivo
tobe
à propriedade (textura).
No exemplo 2 temos: Um (det)
bado
(Adj.) qu
ipo
(nome), com o adjetivo
bado
se
referindo à propriedade do peseudo-objeto e o nome qu
ipo
à sua forma.
Hipótese:
A criança é sensível à informação de ordem sintática, e a usa no reconhecimento dos
nomes referentes a objetos e dos adjetivos referentes às propriedades dos mesmos, em
função das propriedades da língua, i.e., da ordem preferencial do PB – Det + N + Adj.
Previsão:
Ex 1: Um mabo tobe
Ex 2: Um bado quipo
Se a criança faz uso da informação estrutural disponibilizada pelos enunciados de
sua língua, ela deverá identificar o referente do Nome e do Adjetivo nas frases que
apresentamos em nosso experimento, com base na ordem canônica do PB (Det + N + Adj),
mapeando o elemento que segue o determinante como o Nome e o que segue o Nome como
Adjetivo.
Conforme o segundo exemplo que mostramos acima, a criança deverá mapear
bado
como o nome do pseudo-objeto e
quipo
como sua propriedade.
5.1.2 Método:
- Participantes:
Participaram desta fase do experimento 11 crianças com idades entre 2,10 e 3,5 anos
(idade dia: 3,0 anos). Os experimentos foram aplicados em creches da cidade de Juiz de
Fora e os pais foram informados de todos os procedimentos através de uma carta aprovada
pelo comitê de ética da UFJF.
O experimento:
O experimento foi aplicado por duas pessoas, sendo que enquanto uma aplicava e
interagia com a criança, a outra anotava os resultados e observações. Ao chegar na creche o
equipamento era ligado dentro de uma sala e, terminada esta fase, o experimentador pedia
para que a criança entrasse e se sentasse em uma cadeira. Alguns livros infantis eram
apresentados com a finalidade de familiarização com a situação experimental. Em seguida
o experimentador convidava a criança a participar de uma brincadeira com um computador
portátil.
As duas telas iniciais eram compostas por imagens conhecidos pela criança, como
bichos ou árvores, por exemplo, e nomeados pelo experimentador com seus nomes
originais.
Na terceira tela era apresentado um teste, com as pseudo-imagens sendo
nomeadas com pseudo-nomes e as texturas com pseudo-adjetivos. No fim de cada tela
experimental fazíamos uma pergunta, sendo que a criança deveria apontar na tela qual seria
sua resposta. A pergunta focalizava 50% das vezes o Nome e 50% das vezes o Adjetivo.
Controlamos também a ordem dos constituintes nas frases utilizadas no
experimento, sendo que apresentamos 50% das frases na ordem canônica e 50% na não
canônica (ver anexos).
Exemplo de tela do experimento
11
:
5.1.3 Resultados e discussão:
Em termos percentuais, esta primeira etapa de nossos experimentos apresentou 60%
das crianças mapeando o elemento seguinte ao determinante como Nome e 48% mapeando
11
As frases não constavam da tela, mas eram proferidas pelo experimentador. Neste exemplo colocamos as
frases a fim de facilitar a compreensão do funcionamento do experimento.
este elemento como Adjetivo. Ainda que tenha havido uma tendência de respostas
favorável à nossa hipótese, a análise dos resultados demonstra que não houve diferença
estatisticamente significativa entre as médias de acertos.
0%
20%
40%
60%
1
Resultados do experimento 1
Total de acertos na ordem canônica
Total de acertos na ordem não-canônica
Contudo, alguns problemas foram identificados durante a aplicação do experimento
e, tendo isto em vista, partimos para uma reestruturação de nosso experimento, visando a
torná-lo mais eficaz e adequado para nossa pesquisa.
Possíveis problemas:
Quando aplicamos os experimentos nas creches, pudemos observar que algumas
crianças mais novas pareciam não estar conseguindo se concentrar no experimento. Isto
poderia estar ocorrendo pelo fato de as pseudo-imagens não serem tão interessantes quanto
as distratoras, que eram apresentadas entre as telas experimentais.
Para tentarmos resolver este problema, modificamos algumas pseudo-imagens e
buscamos modificar também algumas telas distratoras de modo que nenhuma se destacasse
mais que outra.
5.2 Experimento 2:
Dados os resultados insatisfatórios que obtivemos com nosso primeiro experimento
e os problemas que observamos em sua estrutura, resolvemos reestruturá-lo, a fim de torná-
lo mais adequado a nossos objetivos e, ao mesmo tempo, mais interessante para as crianças.
Fizemos alterações em algumas pseudo-imagens que vínhamos utilizando até então,
buscando torná-las mais atrativas. Quanto às imagens distratoras, ao aplicarmos o
experimento 1 nas creches, notamos que determinadas pranchas pareciam chamar mais a
atenção das crianças. Por conta disso, resolvemos modificar algumas dessas pranchas,
buscando uma certa homogeneização tanto no tipo de figura utilizada quanto nas cores.
Feitas essas modificações, partimos para a aplicação deste novo experimento.
Continuamos indo às creches da cidade e mantivemos a mesma rotina de aplicação.
Hipótese
Nesta nova etapa mantivemos nossa hipótese feita para o primeiro experimento, ou
seja, de que a informação estrutural, fornecida pela ordem canônica e disponibilizada pela
sintaxe nos enunciados representados por pseudo-palavras serviria como uma importante
fonte de identificação das categorias Nome e Adjetivos, respectivamente associadas às
categorias de objetos e suas propriedades.
Previsão:
Mantivemos também nossa previsão feita para o experimento 1, ou seja, de que as
crianças seriam capazes de identificar, através das pistas estruturais fornecidas pelos
enunciados, os referentes do Nome (a categoria da imagem) e do Adjetivo (a propriedade).
5.2.1 Método:
- Participantes:
Participaram desta segunda etapa do nosso experimento 14 crianças, com idades entre
2,10 e 3,6 anos (idade média: 3;0 anos).
A aplicação continuou sendo feita em diferentes creches da cidade de Juiz de Fora,
mas nunca com as mesmas crianças. Novamente informamos os pais, através de cartas,
sobre o experimento.
O experimento:
Mantivemos todos os procedimentos que utilizamos na aplicação do experimento 1.
A única alteração feita em relação a esta nova etapa foi a divisão das crianças em dois
grupos com limites de idade diferentes.
Quando analisamos os resultados do experimento 1, notamos que as crianças mais
velhas vinham apresentando uma tendência a emitir respostas aleatórias. Um outro fator
que nos chamou a atenção foi o fato de que algumas dessas crianças chegaram a obter
melhores resultados na condição não canônica, indo de encontro à nossa hipótese.
Para verificarmos se havia, de fato, alguma diferença significativa no desempenho
das crianças mais velhas, resolvemos fazer um estudo piloto com sujeitos de idade entre 3,8
a 4 anos.
5.2.2 Resultados e discussão:
Os resultados foram marginalmente significativos, mostrando que 60% das crianças
mapearam o elemento antecedido pelo Determinante como membro da categoria Nome,
enquanto 42% o identificaram como Adjetivo, com p= 0,06.
0%
20%
40%
60%
1
Resultados do experimento 2
Total de acertos na ordem canônica
Total de acertos na ordem não-canônica
Tal resultado, marginalmente significativo, aponta para a pertinência de nossa
hipótese. No entanto, com ele não podemos sustentar nossas previsões de forma
estatisticamente segura. Isto nos levou a levantarmos algumas questões acerca de possíveis
intervenções, não controladas por nós, em nossa atividade experimental.
Na literatura em aquisição da linguagem, em abordagens que sugerem a existência
de algum tipo de expectativa inicial para o desencadeamento deste processo, muitos estudos
indicam que o curso do desenvolvimento da linguagem não ocorre de forma homogênea,
focalizando sempre e ao mesmo tempo, o mesmo tipo de informação disponibilizada pelo
meio linístico. Pelo contrário, o que podemos observar é que, em momentos distintos
deste processo, as crianças são sensíveis a diferentes tipos de informação disponibilizada
pelo material lingüístico a que são expostas (Naigles, 2002).
Segundo esta perspectiva a criança estaria inicialmente mais atenta à forma de sua
língua, priorizando informações de ordem estrutural e morfológica, criando primeiro uma
representação lingüística dos itens lexicais para, somente depois disso, mapeá-la com seu
conteúdo conceitual, ou representação mental (Landau, 2004)
12
.
Levando em consideração este tipo de proposta, podemos sugerir que, de acordo
com a idade das crianças que aplicamos nosso experimento, diferentes focos da cena
experimental estavam sendo priorizados, sendo que no grupo de crianças mais novas a
informação estrutural recebia maior atenção, enquanto que entre as crianças do segundo
grupo, a informação semântica, ou seja, o sentido dos enunciados, era priorizado, em
12
Para uma discussão entre diferentes tipos de abordagens para esta questão, consultar Name, 2005.
detrimento da informação estrutural, o que, de certa forma, explicaria o bom desempenho
de algumas crianças maiores na condição ordem não-canônica.
Partimos, então, para a aplicação de um piloto do experimento em um grupo de
crianças maiores, com idades entre 3,8 a 4 anos, tendo como objetivo verificar se a
explicação exposta acima poderia ser confirmada.
Testamos 5 crianças deste segundo grupo e os resultados que recolhemos não foram
favoráveis às nossas expectativas. 36% dos sujeitos obtiveram um maior número de acertos
na condição ordem canônica, enquanto 35% preferiram a não-canônica, com p=0,5.
35%
35%
36%
36%
1
Resultados do experimento piloto
Total de acertos na ordem canônica
Total de acertos na ordem não-canônica
Estes resultados indicam que as crianças deste grupo se comportaram de forma
totalmente aleatória, o que, ao nosso ver, poderia ser uma resposta a uma atividade pouco
interessante e atrativa para crianças maiores.
Neste ponto de nossa pesquisa, havíamos reestruturado nosso experimento
realizando alguns ajustes em sua estrutura, a fim de torná-lo mais eficiente e preciso,
conforme os objetivos de nosso trabalho. No entanto, os resultados continuaram
inconclusivos.
Considerando todas as questões que mencionamos, resolvemos criar um novo
experimento, baseado na tarefa de seleção de objetos, modificando, portanto, o paradigma
experimental que vínhamos utilizando até este momento.
Nossa intenção com esta nova etapa era a de obter resultados mais esclarecedores,
que nos permitissem avaliar nossa hipótese de forma estatisticamente segura.
5.3 Experimento 3:
Para verificar a consistência dos resultados que vínhamos tendo, elaboramos um
novo experimento com objetos que pudessem ser manipulados pelas crianças, numa
tentativa de tornar a tarefa mais interessante para elas e, com isso, aumentar suas
participações na atividade.
Quando analisamos toda a estrutura dos dois experimentos anteriores, seus
resultados e recorremos às nossas observações feitas durante as seções de aplicação, um dos
principais problemas que percebemos dizia respeito à extensão da atividade. Ao todo, eram
apresentadas às crianças 14 pranchas, sendo 9 experimentais e 5 distratoras. Durante a
aplicação, várias vezes notamos que algumas crianças se mostravam dispersas nos
momentos finais da tarefa.
Uma outra questão que levantamos foi a da possibilidade de pouca interação entre a
criança e o computador, uma vez que era o experimentador, na maioria das vezes, que o
manipulava. Apenas apontar e ver as imagens poderia não ser o suficiente para atrair a
atenção necessária para o desempenho da tarefa proposta pelo experimento.
Tendo em vista todas estas questões, decidimos elaborar um experimento que se
adaptasse melhor aos nossos objetivos de pesquisa.
Mudamos o paradigma experimental que vínhamos usando, substituindo-o pela
tarefa de seleção de objetos, que, ao nosso ver, proporcionaria uma maior interação da
criança com a atividade experimental. Projetamos alguns objetos que foram confeccionados
com o mesmo tipo de material utilizado para se fazer alguns brinquedos infantis como
almofadas e algumas bonecas.
Ao todo foram feitos 24 objetos, dentre os quais 4 eram distratores, que possuíam
formas de objetos conhecidos das crianças, como um lápis e uma flor, por exemplo, e 20
eram objetos que não possuíam formas conhecidas pelas crianças. Na apresentação, as
crianças podiam manipular estes objetos, tocando as texturas e as formas. Nosso objetivo
de utilizar pseudo-objetos era o mesmo pelo qual usamos as pseudo-imagens nos dois
experimentos anteriores, ou seja, de não exercerem influência na tarefa de nomeação.
Os pseudo-objetos possuíam formas variadas, que na apresentação eram associadas
com os pseudo-nomes que criamos. Todos eram revestidos com algum tipo de material que
lhes fornecessem texturas desconhecidas, que eram associadas aos pseudo-adjetivos.
Os objetos foram divididos em 4 grupos, sendo que dois deles eram apresentados
em associação com enunciados na ordem canônica, e os outros dois com enunciados na
ordem não-canônica.
No início da atividade experimental, a criança era convidada a participar de uma
brincadeira, na qual ela ia ser apresentada a vários brinquedos. Primeiramente, o
experimentador mostrava alguns brinquedos conhecidos, como fantoches, carros e alguns
bichinhos, visando a familiarizar a criança com a situação experimental.
Após este momento inicial, o primeiro grupo de pseudo-objetos era apresentado. A
atividade começava com um membro do primeiro grupo que possuía uma forma preenchida
por alguma textura. O experimentador mostrava o objeto e dizia qual era o seu nome, como
por exemplo, “Esse é um mibo puco”. Neste caso, mibo se referia à forma do objeto,
enquanto puco designava sua textura. Em seguida, um objeto de mesma forma que o
primeiro era mostrado, que desta vez sem a textura. O experimentador dizia: “Esse é um
mibo”, com mibo se referindo à forma do objeto.
Logo, um terceiro objeto era mostrado, que desta vez possuía uma forma
diferente dos dois anteriores, porém, tinha a mesma textura do primeiro. O experimentador
apresentava: “Este é puco”.
Estas três etapas eram repetidas, a fim de garantir que a criança tivesse tido tempo
suficiente para extrair a informação necessária.
O experimento seguia com a apresentação de três objetos simultaneamente: um
distrator, um que possuía a mesma forma do primeiro que tinha sido apresentado e o
último, que tinha a mesma textura que o primeiro, mas a com uma forma diferente.
A criança era convidada a apontar qual o objeto que correspondia ao pseudo-nome,
quando o foco da pergunta era o Nome, ou qual se relacionava com o pseudo- adjetivo,
quando o alvo era o Adjetivo. Se o alvo fosse o Nome, ela deveria escolher o objeto que
tinha a mesma forma que o primeiro apresentado, se fosse o Adjetivo, ela deveria apontar o
que possuía a mesma textura.
Este procedimento era repetido para cada um dos quatro grupos de objetos
constituintes do experimento.
Exemplo de grupo de objetos:
Hipótese:
Com este novo experimento mantivemos nossa hipótese de que a informação
estrutural é uma pista robusta na identificação dos membros das categorias lexicais em uma
atividade de nomeação e identificação de propriedade.
Previsão:
Nossa previsão é de que as crianças irão mapear as formas dos objetos apresentados
com os Nomes e as texturas com os adjetivos preferencialmente quando os enunciados
forem apresentados na ordem canônica.
5.3.1 Método:
Participantes:
Participaram deste experimento 11 crianças com idades entre 2;1 e 3;9 anos. As
crianças foram divididas em dois grupos: no primeiro, as perguntas feitas pelo
experimentador focalizavam sempre o nome (referente à forma do objeto), no segundo, a
pergunta focalizava sempre o adjetivo (propriedade do objeto). Nosso objetivo com esta
divisão é comparar se há diferença de comportamento de acordo com a variação do alvo.
O experimento foi aplicado em creches da cidade de Juiz de Fora e no laboratório
do Centro de Humanidades do ICH, na Universidade Federal de Juiz de Fora.
5.3.2 Resultados e discussão:
Para termos uma visão mais clara dos dados que obtivemos com este último
experimento aplicado em crianças, vamos desenvolver nossa análise, inicialmente, de
acordo com as idades das crianças e com o alvo da pergunta feita pelo experimentador, ou
seja, focalizando ora o nome, ora o adjetivo.
Posteriormente, faremos uma análise geral dos dados, agrupando crianças de todas
as idades em um grupo que teve como alvo o nome e as outras em um outro grupo, que teve
como alvo o adjetivo.
No grupo de crianças menores de 3 anos, com a pergunta focalizando o nome, a taxa
de acertos foi de 83,3% quando os enunciados eram apresentados na ordem canônica.
quando esses enunciados foram apresentados na ordem não-canônica, a taxa de acertos foi
de 66,7%, ficando um pouco acima do nível de chance (by chance).
0
20
40
60
80
100
1
Crianças menores de 3 anos com alvo
no Nome
Número de acertos na ordem canônica
Número de acertos na ordem não canônica
Embora não faça sentido uma análise estatística (em termos de t-student), podemos
notar que estes resultados sugerem que a informação semântica, disponibilizada através da
apresentação dos enunciados na ordem estrutural canônica, facilitou a identificação do
nome.
Neste mesmo grupo, porém com o alvo sendo fixado no adjetivo, as crianças
tiveram um total de acertos de 100% na ordem não-canônica, enquanto que na ordem
canônica elas obtiveram apenas 50%. Contrariamente às nossas expectativas, nesse grupo
de crianças a pista estrutural não parece ter tido um papel facilitador na identificação do
alvo. O adjetivo foi mais facilmente identificado quando aparecia imediatamente após o
Determinante, na posição não-canônica. As crianças parecem ter utilizado a informação
semântica para identificar o alvo, não considerando a informação estrutural.
0
20
40
60
80
100
1
Crianças menores de 3 anos com alvo
no Adjetivo
Total de acertos na ordem canônica
Total de acertos na ordem não-canônica
Além disso, sabendo que o adjetivo tem forte marcação prosódica na posição não-
canônica (cf. resultados de Matsuoka, 2007), podemos pensar que pistas prosódicas possam
ter facilitado a identificação do adjetivo nessa posição. Novamente, não podemos tirar
conclusões a partir dos dados de apenas duas crianças (que foi o número que conseguimos
para este grupo), mas, devido à constância dos resultados, uma vez que essas duas crianças
responderam exatamente da mesma forma, temos razões para defender a ampliação dos
testes, e supor que os resultados caminhem nessa direção.
Em termos percentuais, as crianças com idades acima de 3 anos, com o alvo da
pergunta no Nome, obtiveram os mesmos resultados na ordem canônica que as menores,
acertando 83,3% na ordem canônica e 66,7% na não-canônica, um pouco acima do nível de
chance. No entanto, houve uma maior variação de respostas entre os sujeitos, sendo que
duas crianças acertaram 100% o alvo na ordem canônica, e outras duas acertaram 50% na
ordem não-canônica.
0
20
40
60
80
100
1
Crianças maiores de três anos com
alvo no Nome
Total de acertos na ordem canônica
Total de acertos na ordem não-canônica
Quando o alvo foi o adjetivo, as 3 crianças com idades acima de 3 anos mostraram
resultados mais consistentes, uma vez que todas responderam no nível de chance (50%) na
ordem canônica, e duas delas acertaram 100% das vezes quando a condição era a não-
canônica. Esses resultados, ainda que não possam ser generalizados pelo número restrito de
sujeitos testados, apontam para pistas prosódicas e semânticas facilitando a identificação do
adjetivo, mais uma vez.
0
20
40
60
80
100
1
Crianças maiores de 3 anos com alvo
no Adjetivo
Total de acertos na ordem canônica
Total de acertos na ordem não-canônica
Uma última análise desse experimento pode ser obtida se compararmos todos os
resultados obtidos por condição, ou seja, na ordem canônica e não-canônica, agrupando em
cada um desses dois grupos crianças de todas as idades que realizaram o experimento, não
levando em conta a idade e o alvo da pergunta.
Assim, podemos observar que as taxas de acertos foram bastante semelhantes entre
si, com 68, 2% de acertos na ordem canônica e 77,3% na não-canônica.
60
65
70
75
80
1
Resultados sem distinção de idade ou
alvo
Total de acertos na ordem canônica
Total de acertos na ordem não-canônica
Dessa forma, os resultados desse experimento sugerem que a informação sintática
não facilitou a identificação de pseudo-palavras como nomes e adjetivos. Ao contrário, as
crianças parecem ter privilegiado informação de natureza semântica no mapeamento entre o
objeto e sua propriedade e as novas palavras.
Comparando estes resultados com os de Teixeira (a sair), observamos que as
crianças acima de 2 anos já levam em conta a informação de natureza semântica na
identificação do elemento-alvo, sobretudo quando este é o adjetivo, ao passo que crianças
com idades abaixo de 2 anos parecem privilegiar informação de ordem sintática, conforme
constatado nos resultados de Teixeira (a sair).
5.4 Experimento 4:
Nosso objetivo ao elaborar este experimento foi o de conseguir algum tipo de
informação sobre o processamento on-line realizado por adultos de elementos das
categorias Nome e Adjetivo.
O experimento foi preparado nos moldes da tarefa de leitura auto-monitorada, que é
um tipo de atividade que nos permite verificar algumas questões sobre o processamento on-
line de enunciados lingüísticos.
Para a aplicação do experimento, elaboramos 40 frases que eram segmentadas em 8
partes. Destas, apenas 10 eram experimentais e as outras 30 eram distratoras. Ao fim de
cada frase era feita uma pergunta, entre as frases distratoras metade destas frases faziam
perguntas que deveriam obter respostas positivas, enquanto a outra metade não.
As frases experimentais foram preparadas para receberem sempre respostas
positivas e eram divididas de modo a separarem os Nomes e Adjetivos. Os segmentos
deveriam ser lidos um a um por cada sujeito do experimento, e, a cada segmento, o
respectivo tempo de leitura era gravado.
Exemplo de frases experimentais utilizadas:
O urso/ da floresta/ encontrou/ um/ caçador/ incrível/ no/ bosque.
O urso/ da floresta/ encontrou/ um/ incrível/ caçador/ no/ bosque.
Pergunta: O urso era da floresta?
Hipótese:
Nossa hipótese é de que sentenças apresentadas na ordem canônica são processadas
mais rapidamente do que as de ordem não-canônica.
Previsão:
O tempo gasto na leitura do Adjetivo posposto a Nome deverá ser menor do que
quando aparecer anteposto a Nome.
5.4.1 Método:
-Participantes:
Participaram deste experimento 30 alunos do segundo período do curso de Letras
noturno da UFJF. Deste grupo, todos foram apresentados a frases experimentais com
adjetivos ocorrendo 50% das vezes na ordem canônica e 50% na não-canônica. A divisão
entre as duas ordens foi feita de forma aleatória pelo próprio software utilizado.
5.4.2 Resultados e discussão:
Quando o adjetivo foi apresentado na posição anteposta ao nome (ordem não-
canônica), foi lido com média de tempo de 612 ms. quando o Adjetivo aparecia em
posição posposta (ordem canônica), ele foi lido com média de 672ms, ou seja, quando
estava na ordem não canônica, o adjetivo foi lido mais rápido que na ordem canônica. Essa
diferença deu um p=0,056, o que configura um efeito marginal por ter sido um pouco acima
de 0,05.
580
600
620
640
660
680
1
Resultados do experimento 4
Tempo de leitura na ordem não-canônica
Tempo de leitura na ordem canônica
Isto contraria nossa previsão de que o tempo de processamento poderia ser
facilitado pela informação estrutural advinda da ordem canônica, que seria menos custosa.
Mas, mesmo não estando de acordo com nossa previsão, estes dados podem nos esclarecer
algumas questões. Aparentemente, podemos ter uma explicação plausível para essa
tendência de tempo de leitura a partir do seguinte raciocínio: quando a pessoa lê o verbo da
sentença, ela tem acesso à sua grade argumental e procura logo o seu argumento para fechar
esta grade. Ao se deparar com o adjetivo antecedendo o nome, que seria o responsável pelo
fechamento desta grade, o sujeito passa rapidamente a procurar o nome, para obter esse
fechamento, acelerando assim o tempo de processamento do adjetivo. quando o adjetivo
ocorre em posição posposta, ou seja, na ordem canônica, a grade argumental já está fechada
ao ler o nome e, portanto o adjetivo é lido mais lentamente.
Com essa explicação também daríamos conta da não distinção em termos de tempo
de leitura para o nome seja na posição antes do adjetivo ou depois do adjetivo 642 ms e
620ms respectivamente, com p= 0,24.
5.5 Conclusão:
Os resultados dos experimentos 2 e 3 são, aparentemente, conflitantes. No
experimento 2, os resultados sugerem que as crianças de 3 anos privilegiaram a informação
sintática para a identificação das pseudo-palavras como membros das categorias N e Adj,
ainda que o grau de significância estatística tenha sido marginal. No experimento 3,
crianças a partir de 2 anos de idade fizeram uso preferencialmente de informação
semântica. Porém, tal paradoxo é apenas aparente e pode ser explicado pelas diferentes
tarefas experimentais. No primeiro experimento, a técnica usou imagens apresentadas na
tela do computador, enquanto que o segundo experimento usou objetos que as crianças
puderam manipular. As crianças puderam sentir tactilmente as formas e as texturas dos
objetos ao mesmo tempo em que novas palavras eram apresentadas, tendo informações
mais claras e robustas dos eventos de nomeação e de apresentação de propriedades dos
novos objetos. Diante dessas pistas precisas, a criança pôde fazer uso da infromação
semântica, o que não aconteceu no experimento 2.
Tais resultados seguem os resultados encontrados por Gleitman (2004), no que diz
respeito à aquisição de verbos. A autora defende que em contextos em que não clareza
da apresentação do sentido dos verbos, a criança se vale de informação sintática.
Dessa forma, podemos defender que, a partir dos dois anos a criança tem acesso a
informação semântica para identificar nomes e adjetivos em situações em que tal
informação se apresenta claramente. Com menos de dois anos, a criança parece privilegiar
a informação sintática, pois a atividade experimental desenvolvida por Teixeira (a sair) foi
semelhante à nossa, com objetos. Porém, quando informação semântica não se mostra
claramente acessível, como em nosso experimento 2, a criança se guia pela informação de
ordem.
Quanto ao experimento com adultos, os resultados corroboram os dados compilados
em estudos descritivos do PB: ainda que o adjetivo posposto seja preferencial, a ordem não
canônica ainda é freqüente e não apresenta custo maior de processamento na compreensão,
pelo menos no contexto lingüístico objeto do experimento.
Com base nos nossos pressupostos teóricos e nos nossos resultados experimentais,
podemos avançar uma proposta provisória, dando conta de etapas presentes no processo de
aquisição lexical da criança adquirindo o PB, no que se refere a palavras desconhecidas
como possíveis membros das categorias Nome e Adjetivo:
a) a criança tem acesso a enunciados com DPs complexos, cuja ordem preferencial é
Det + N + Adj, mas ocorrendo também o adjetivo anteposto ao nome. Em termos de
custo de processamento, o adjetivo anteposto não parece significar maior demanda
(conforme resultados do exp. 4);
b) até os dois anos de idade, a criança privilegiaria a informação sintática ao buscar
identificar novos elementos lexicais como nome ou adjetivo (conforme resultados
de Teixeira, a sair);
c) a partir dos dois anos de idade, a criança teria acesso a informação semântica
quando claramente apresentada, e a usaria como fonte robusta de identificação
desses elementos (conforme resultados do exp. 3);
d) na ausência de informação semântica explícita, a sintaxe seria usada
preferencialmente por crianças ainda aos 3 anos de idade (conforme resultados do
exp. 2).
Vale ressaltar que se trata de uma exploração inicial dos resultados dessa dissertação. A
aplicação dos experimentos apresentados em um número maior de crianças e em diferentes
faixas etárias se faz necessária para que possamos desenvolver a proposta esboçada.
6. CONCLUSÃO
Esta dissertação teve como foco central os momentos iniciais da identificação de
Nomes e Adjetivos por crianças adquirindo o PB. Para isso, buscamos compreender como
se daria a relação entre estas categorias lexicais e o desenvolvimento do sistema conceptual,
sendo que, para adquirir uma língua, a criança deve ser capaz de mapear as formas
lingüísticas disponibilizadas por sua língua materna com seus respectivos conceitos.
Para que este mapeamento seja possível, a criança se apóia em diferentes pistas
facilitadoras desse processo em diferentes momentos da aquisição. Neste trabalho
buscamos investigar qual a importância que a pista estrutural fornecida pela ordem dos
constituintes do DP complexo, constituídos por Nomes e Adjetivos, exerce durante os
primeiros momentos do processo de aquisição.
Como objetivo geral deste nosso trabalho, buscamos contribuir para o entendimento
do processo de aquisição lexical, particularmente no que diz respeito à aquisição de Nomes
e Adjetivos no PB.
Partindo de nossa hipótese de trabalho, nossos objetivos específicos foram: a)
investigar a importância exercida pela informação estrutural durante o processo de
aquisição da linguagem, no nosso caso, do PB, levando em consideração a variação na
ordem dos elementos constituintes do DP complexo; b) buscar compreender qual a relação
entre informação sintática e conceptual no decorrer do desenvolvimento lingüístico; e c)
diante dos dados de descrição da posição do adjetivo no PB, tentamos verificar se a
variação na ordem dos constituintes do DP complexo, com o adjetivo anteposto, acarretaria
algum tipo de custo adicional para o processamento on-line em adultos.
Em relação aos nossos objetivos específicos, realizamos experimentos que visavam
a investigar a capacidade de identificação de Nomes e Adjetivos por crianças adquirindo o
PB e, embora nossa hipótese principal não tenha sido corroborada totalmente a partir de
nossos dados, desenvolvemos uma análise que nos leva a postular que o processo de
aquisição lexical passa por diferentes momentos, sendo que a importância da informação
estrutural disponibilizada pela língua predomina até cerca dos dois anos de idade. A partir
desse momento, nossos resultados sugerem que a informação semântica disponibilizada
pelos enunciados proferidos em contextos de nomeação passa a ser levada em conta pela
criança, assumindo, assim, um papel predominante a partir desse momento, em contexto em
que tal informação se manifesta de forma robusta à criança. Na ausência de informação
semântica clara, a informação sintática ainda é fortemente explorada pela criança até por
volta dos três anos de idade.
Quanto à relação entre informação sintática e conceptual, no decorrer do
desenvolvimento lingüístico, pudemos observar que em diferentes momentos da aquisição
o foco nesses diferentes tipos de informação é dependente do tipo de tarefa no qual a
criança se empenha em um mesmo contexto de nomeação, partindo de um enfoque maior
na informação sintática em momentos iniciais, e chegando à preferência pela informação
conceptual em um momento mais posterior. Ainda, tomando o processo de aquisição de
modo geral, podemos dizer que estes dois tipos de informação atuam de forma
complementar, conforme previsto pelos modelos de
bootstrapping
semântico e sintático.
Por último, levando em conta o fato de que a maioria dos estímulos lingüísticos aos
quais as crianças têm acesso o provenientes da fala dirigida pelos adultos, buscamos
investigar se o processamento relativo às ordens anteposta e posposta, presentes no PB,
acarretaria algum tipo de gasto processual adicional. Os resultados encontrados nos
experimentos que aplicamos em adultos sugerem que o processamento do adjetivo
anteposto não apresenta custo adicional de processamento, o que justificaria sua ocorrência
juntamente com o adjetivo posposto, não sendo nenhum dos dois eliminados do uso.
Embora a criança seja capaz de lidar com estes dois tipos de estruturas, vimos em
nossos resultados que em momentos diferentes do processo de aquisição ela se concentra
ora nas formas usuais da ngua, atendo-se à informação estrutural, aqui representada pela
ordem canônica, ora nas formas não canônicas, aqui representadas pela posição anteposta
do adjetivo ao nome.
Com esses resultados e análises, entendemos que contribuímos, ainda que
modestamente, para o entendimento do processo de aquisição de Nomes e Adjetivos no PB,
que é o objetivo geral dessa dissertação. Temos consciência do caráter exploratório de
nossos resultados, mas eles permitem abrir outros caminhos para novas pesquisas que
busquem desenvolver esse estudo a fim de obter resultados mais precisos e novas
descobertas.
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Anexo 1
Pseudo-palavras utilizadas nos experimentos 1 e 2.
Pseudo-nomes:
Mabo
Mopa
Mipo
Bida
Mape
Tebo
Toba
Mepe
Coda
Pseudo-adjetivos:
Bipo
Depa
Bafe
Puco
Bope
Depe
Dapo
Daba
Tabe
Anexo 2
Pseudo-palavras utilizadas no experimento 3:
Pseudo-nomes:
Quipo
Guepo
Mibo
Tebo
Pseudo-adjetivos:
Bado
Mafo
Puco
Dapo
Anexo 3
Frases utilizadas no experimento 4
Frases experimentais
1a- O urso/ da floresta/ encontrou/ um/ caçador/ incrível/ no/ bosque.
2a- O urso/ da floresta/ encontrou/ um/ incrível/ caçador/ no/ bosque.
Pergunta: O urso era da floresta?
2a- A mulher/ do vizinho/ tinha/ um/ cabelo/ estranho/ na/ adolescência.
2b- A mulher/ do vizinho/ tinha/ um/ estranho/ cabelo/ na/ adolescência.
Pergunta: A mulher tinha um cabelo estranho?
3a- O repórter/ da bandeirantes/ contou/ uma/ história/ terrível/ no/ jornal.
3b- O repórter/ da bandeirantes/ contou/ uma/ terrível/ história/ no/ jornal.
Pergunta: O repórter era da bandeirantes?
4a- A cliente/ do shopping/ encontrou/ um/ vendedor/ honesto/ na/ loja.
4b- A cliente/ do shopping/ encontrou/ um/ honesto/ vendedor/ na/ loja.
Pergunta: A cliente encontrou um vendedor honesto?
5a- A enfermeira/ do hospital/ ajudou/ uma/ velhinha/ esperta/ no/ banho.
5b- A enfermeira/ do hospital/ ajudou/ uma/ esperta/ velhinha/ no/ banho.
Pergunta: A enfermeira ajudou a velhinha?
6a- O garçom/ do restaurante/ serviu/ uma/ comida/ gostosa/ no/ almoço.
6b- O garçom/ do restaurante/ serviu/ uma/ gostosa/ comida/ no/ almoço.
Pergunta: A comida foi servida no almoço?
7a- O estilista/ da agência/ contratou/ uma/ modelo/ famosa/ no/ carnaval.
7b- O estilista/ da agência/ contratou/ uma/ famosa/ modelo/ no/ carnaval.
Pergunta: A modelo foi contratada no carnaval?
8a- O ator/ da globo/ tinha/ um/ bigode/ charmoso/ na/ novela.
8b- O ator/ da globo/ tinha/ um/ charmoso/ bigode/ na/ novela.
Pergunta: O ator era da globo?
9a- O professor/ de matemática/ conheceu/ uma/ menina/ amável/ na/ escola.
9b- O professor/ de matemática/ conheceu/ uma/ amável/ menina/ na/ escola.
Pergunta: O professor conheceu a menina?
10a- A mãe/ da garota/ prometeu/ um/ passeio/ alegre/ no/ feriado.
10b- A mãe/ da garota/ prometeu/ um/ alegre/ passeio/ no/ feriado.
Pergunta: A mãe fez uma promessa à garota?
Frases distratoras:
Respostas sim:
1- Ronaldinho/ foi/ eleito/ o/ melhor/ jogador/ do/ mundo.
P: Ronaldinho é jogador?
2- A /guerra/ no Iraque/ é um/ dos maiores/ problemas/ do/ mundo atual.
P: A guerra do Iraque é um problema?
3- O/ surto/ de meningite/ tem/ preocupado/ a/ população/ mineira.
P: O surto é de meningite?
4- O/ presidente Lula/ pareceu/ preocupado/ com/ a condição/ física/ de Ronaldo.
P: O presidente pareceu preocupado?
5- O ladrão/ roubou/ a carteira/ do homem/ no ponto/ de/ ônibus/ vazio.
P: O homem foi roubado?
6- O filme/ “Código da Vinci”/ arrecadou/ milhões/ de/ bilheteria/ no/ mundo.
P: O nome do Filme é “Código da Vinci”?
7- A revista/ Veja/ publicou várias/ reportagens/ sobre/ a crise/ na política/ brasileira.
P: As reportagens sobre a crise foram publicadas?
8- A/ gripe /do frango/ assustou/ a população/ mundial/ nos últimos/ meses.
P: A população mundial se assustou?
9- A/ morte/ do comediante/ Bussunda/ entristeceu/ o/ povo/ brasileiro.
P: Bussunda morreu?
10- A/ cidade/ de/ Juiz de Fora/ foi/ fundada/ em/ 1850.
P: Juiz de Fora é uma cidade?
Respostas “Não”
11- Os/ portugueses/ descobriram/ o/ Brasil/ no/ ano de/ 1500.
P: Os espanhóis descobriram o Brasil?
12- Marisa/ Monte/ lançou/ seus/ últimos/ cd’s/ em/ 2006.
P: Marisa Monte abandonou a carreira?
13- As técnicas/ de clonagem/ evoluíram/ a/ partir de/ experimentos/ com/ bactérias.
P: A clonagem começou com experimentos com cachorros?
14- Os/ dinossauros/ foram/ extintos/ há/ milhares/ de/ anos.
P: Ainda existem dinossauros?
15- Marcos/ Pontes/ foi/ o/ primeiro/ astronauta/ e cosmonauta/ brasileiro.
P: Marcos Pontes é russo?
16- Kaká fez/ o primeiro/ gol/ do/ Brasil/ na/ copa/ de 2006.
P: Robinho fez o primeiro gol do Brasil?
17- Manuel/ Carlos/ escreveu/ a/ novela/ “Laços/ de/ Famíla”.
P: Faustão escreveu “Laços de Família”?
18- O/ cantor/ Milton/ Nascimento/ fundou/ o clube/ da esquina/ em BH.
P: O Clube da Esquina fica no RJ?
19- Paul/ McCartney/ completou/ 64/ anos/ no mês/ de/ junho.
P: Paul McCartney morreu?
20- Um grande/ terremoto/ destruiu/ muitas/ cidades/ no sul/ do/ Japão.
P: Esse terremoto destruiu a Argentina?
21- Um/ perigoso/ cachorro/ Pit-Bull/ atacou/ duas/ crianças/ na rua.
P: O cachorro atacou o gato?
22- Os/ livros/ antigos/ da biblioteca/ foram/ restaurados/ pelo/ Fernando.
P: Os livros foram jogados no lixo?
23- A médica/ desenvolveu/ uma/ vacina/ nova/ contra/ a/ AIDS.
P: A vacina era contra o sarampo?
24- Bentinho/ desconfiou/ da/ traição/ de/ Capitu/ com/ Escobar.
P: Bentinho desconfiou de Maria?
25- A/ invenção/ do/ microchip/ no século XX/ revolucionou/ a/ tecnologia.
P: O microchip foi inventado no século V?
26- O poeta/ Osório Duque-Estrada/ compôs/ a letra/ do/ hino/ nacional/ brasileiro.
P: José de Alencar compôs o hino nacional?
27- Os/ vôos/ da Varig/ foram/ cancelados/ por/ tempo/ indeterminado.
P: Os vôos da Varig continuam acontecendo normalmente?
28- João e/ Maria/ comemoraram/ seu/ 15º/ aniversário/ de/ casamento.
P: João e Maria são namorados?
29- O goleiro/ Dida/ defendeu/ um/ pênalti/ na/ última/ partida.
P: Tafarel defendeu o pênalti?
30- O/ primeiro/ aparelho/ móvel/ de telefone/ foi/ criado por/ Martin Cooper.
P: Santos Dumond inventou o telefone móvel?
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